CLÁUDIO SARIAN AL ALTOUNIAN TOUNIAN
OBRAS PÚBLICAS LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
Legislação e Jurisprudência do TCU e STJ atualizadas: 2014 e 2015 Novos entendimentos sobre o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) Novos textos sobre Orçamento, Fiscalização, Regime de Execução, Prazos de Execução e Vigência, Habilitação, Aditivos, Procedimentos da Comissão de Licitação, Sanções, Pregão, Sistema de Registro de Preços, Margem de preferência, Desenvolvimento Sustentável, e boas práticas sugeridas Prefácio
Marcos Vinicios Vilaça
a a d z i a l u u t a a , a t s i i a d e v p e l r o a m ã i ç e e d ª 5
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN
Prefácio
Marcos Vinicios Vilaça
OBRAS PÚBLICAS LICITAÇÃO, CONTRAT CONTRATAÇÃO, AÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO (Legislação, decretos, jurisprudência e orientações normativas atualizados até 30 nov. 2015) 5ª edição revista, atualizada e ampliada
Belo Horizonte
2016
© 2007 Editora Fórum Ltda. 2007 1ª reimpressão 2008 2ª reimpressão 2009 2ª edição revista e ampliada 2009 2ª edição revista revista e ampliada, 1ª reimpressão 2010 2ª edição revista revista e ampliada, 2ª reimpressão 2011 2ª edição revista revista e ampliada, 3ª reimpressão 2011 2ª edição revista revista e ampliada, 4ª reimpressão 2012 3ª edição revista, atualizada e ampliada 2013 3ª edição revista, revista, atualizada e ampliada, 1ª reimpressão reimpressão 2014 4ª edição, revista, atualizada e ampliada 2016 5ª edição, revista, atualizada e ampliada É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio eletrônico, inclusive por processos xerográcos, sem autorização expressa do Editor.
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A469o A46 9o Alt Altoun ounian ian,, Cláu Cláudio dio Sar Sarian ian Obras públicas: licitação, contratação, scalização e utilização: (Legislação,
decretos, jurisprudência e orientações normativas atualizados até 30 nov. 2015) / Cláudio Sarian Altounian; prefácio de Marcos Vinicios Vilaça. – 5. ed. rev. atual. e ampl. – Belo Horizonte: Fórum, 2016. 576 p. ISBN 978-85-450-0111-9 1. Direito administrativo – Brasil. 2. Obras O bras públicas – Contratação. 3. Licitação. 4. Contratação direta. 5. Controle. 6. Projeto básico. 7. Projeto executivo. 8. Orçamento. 9. Cronograma físico-nanceiro. I. Vilaça, Marcos Vinicios. II. Título.
CDD: 341.3 CDU: 342.9 Informação bibliográca bibliográca deste livro, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira
de Normas Técnicas (ABNT): ALTOUNIAN, Cláudio Sarian. Obras públicas: ALTOUNIAN, públicas: licitação, contratação, scalização e utilização: (Legislação, decretos, jurisprudência e orientações normativas atualizados até 30 nov. 2015). 5. ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2016. 576 p. ISBN 978-85-450-0111-9
Aos que ilumi iluminam nam o meu camin caminho: ho: Márci Márcia, a, Elisa Elisa,, Maria Maria,, Melki Melkin, n, Pedro Felipe, Rodrigo, Pedro e Avedis. Avedis.
SUMÁRIO
LISTA LIST A DE FIGURAS .................................................................................................................... ............................................................................................................................. ......... 15 LISTA LIST A DE TABELAS .................................................................................................................... ............................................................................................................................. ......... 17 PREFÁCIO DA 1ª EDIÇÃO Marcos Vinicios Vilaça........................................................................................................21
APRESENTAÇÃO APRESENT AÇÃO DA 5ª EDIÇÃO .................................................................................................... 23 APRESENTAÇÃO APRESENT AÇÃO DA 4ª EDIÇÃO .................................................................................................... 25 APRESENTAÇÃO APRESENT AÇÃO DA 3ª EDIÇÃO .................................................................................................... 27 APRESENTAÇÃO APRESENT AÇÃO DA 2ª EDIÇÃO .................................................................................................... 29 APRESENTAÇÃO APRESENT AÇÃO DA 1ª EDIÇÃO .................................................................................................... 31 CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... .................................................................................................................................. ......... 33 1.1 1.2 1.3 1.4
1.5
Considerações iniciais............................................................................................................ 33 Histórico ........................................................................................................................ .................................................................................................................................. .......... 34 Características importantes de obras................................................................................... 35 Defnições ....................................................................................................................... ................................................................................................................................ ......... 36 Leitura e consulta complementares ..................................................................................... 37
CAPÍTULO 2
LEIS E NORMA NORMATIVOS TIVOS APLICÁVEIS ......................................................................................... 41 2.1 2.2 2.3 2.3.1 2.3.2 2.3.3 2.4 2.5 2.6 2.7 2.8 2.9
2.10 2.11 2.12 2.13
Considerações iniciais............................................................................................................ 41 Constituição Federal .............................................................................................................. 42 Lei de licitações (Lei nº 8.666/93) .......................................................................................... 42 Aplicabilidade e objetivo....................................................................................................... 42 Exceções .......................................................................................................................... ................................................................................................................................... ......... 43 Pontos positivos e necessidade de aprimoramento .......................................................... 46 Plano Plurianual (PP (PPA A) .......................................................................................................... 47 Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) .............................................................................. 47 Lei Orçamentária Anual (LOA (LOA)) ............................................................................................ 48 Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) (LRF).................................................................................. .................................................................................. 49 Lei do Pregão ................................................................................................................ .......................................................................................................................... .......... 49 Leis e resoluções relativ relativas as à profssão de engenheiro e arquiteto................................... 50 Lei das micro e pequenas empresas .................................................................................... 50 Regime Diferenciado de Contratações Públicas (Lei nº 12.462/2011 e Decretos nº 7.581/2011 e nº 8.080/2013) ................................................................................................ 52 Decreto nº 7.983/2013 ............................................................................................................. 53 Decreto nº 6.170/2007 e Instrução Normativa (IN) nº 01/97 – STN ................................. 53
2.14 2.15 2.16
Instrução Normativa nº 2/2008 – SLTI/MPOG e Instrução Normativa nº 1/2010 – SLTI/MPOG SLTI/MPOG .......................................................................................................................... 54 Resoluções Conama ............................................................................................................... 54 Súmulas e decisões dos tribunais superiores ..................................................................... 55
CAPÍTULO 3
ETAPAS DE CONTRATAÇÃO DO EMPREENDIMENTO – VISÃO GERAL ...... ............ .......... 57 3.1 3.2 3.3 3.3.1 3.3.2 3.3.3 3.3.4 3.4 3.5 3.5.1 3.5.2 3.5.3 3.6 3.7
Considerações iniciais............................................................................................................ 57 Fase preliminar à licitação ..................................................................................................... 59 Fase interna da licitação ........................................................................................................ 60 Projeto básico .......................................................................................................................... 61 Licenciamento ambiental ...................................................................................................... 61 Preparação do edital ou convite ........................................................................................... 62 Projeto executivo .................................................................................................................... 62 Fase externa da licitação ........................................................................................................ 62 Fase contratual ........................................................................................................................ 63 Assinatura do contrato e ordem de serviço ........................................................................ 63 Fiscalização da execução da obra ......................................................................................... 64 Recebimento da obra.............................................................................................................. 64 Fase posterior à contratação .................................................................................................. 64 Considerações nais............................................................................................................... 65
CAPÍTULO 4
AVALIAÇÃO DE VALORES PARA CONTRA CONTR ATAÇÃO DE OBRAS OB RAS ................................. 67 4.1 4.2 4.3
4.4 4.4.1
4.4.2 4.5 4.6
Importância da avaliação de custos nos estudos iniciais.................................................. 68 Avaliação expedita ................................................................................................................. 69 Avaliação Av aliação expedita em edicações ....................................................................................... 70 Utilização da NBR 12.721 – ABNT ....................................................................................... 70 Denições importantes da norma........................................................................................ 70 Custo Unitário Básico (CUB) ................................................................................................ 72 Estudo de caso ........................................................................................................................ 72 Considerações nais............................................................................................................... 73
CAPÍTULO 5
ORÇAMENTO................................................................................................................. .................................................................................................................................... ................... 75 5.1 5.1.1 5.1.1.1 5.1.1.2 5.1.1.3 5.1.2 5.1.3
Principais conceitos ................................................................................................................ 76 Custos ................................................................................................................... ....................................................................................................................................... .................... 76 Custo direto (CD) ................................................................................................................... 76 Custo indireto (CI).................................................................................................................. 76 Preço ..................................................................................................................... ......................................................................................................................................... .................... 77 Insumos................................................................................................................. .................................................................................................................................... ................... 77 Serviços ................................................................................................................. .................................................................................................................................... ................... 77 5.1.4 BDI (Benefício/Bonic (Benefício/Bonicação ação e Despesas Indiretas) ............................................................. 77 5.1.5 Planilha orçamentária ............................................................................................................ 77 5.1.6 Cronograma físico-nanceiro............................................................................................... 78 5.1.7 Curva ABC............................................................................................................................... 78 5.1.8 Conceitos do Decreto nº 7.983/2013 ..................................................................................... 79 5.2 Custos ................................................................................................................... ....................................................................................................................................... .................... 79 5.2.1 Custos de insumos ................................................................................................................. 79 5.2.1.1 Material ................................................................................................................. .................................................................................................................................... ................... 79 5.2.1.2 Mão de obra............................................................................................................................. 80
5.2.1.3 5.2.1.4 5.2.1.5 5.2.2 5.2.2.1
Desoneração da folha de pagamentos ................................................................................. 80 Equipamentos ......................................................................................................................... 84 Sinapi .............................................................................................................................. ........................................................................................................................................ .......... 84 Custo de serviços .................................................................................................................... 87 Considerações ......................................................................................................................... 87 5.2.2.2 Exemplo simplicado ............................................................................................................ 87 5.2.2.3 Cálculo de custo de serviços ................................................................................................. 88 5.2.3 Obtenção dos custos de insumos ou serviços .................................................................... 90 5.3 Preços ............................................................................................................................ ....................................................................................................................................... ........... 91 5.3.1 Introdução .................................................................................................................... ............................................................................................................................... ........... 91 5.3.2 BDI (Benefício/Bonicaç (Benefício/Bonicação ão e Despesas Indiretas) ............................................................. 91 5.4 Reajustamento ....................................................................................................................... 137 5.5 Estudos de casos ................................................................................................................... 137 5.5.1 Caso 1 – Cálculo de custos e quantidade de insumos..................................................... 137 5.5.2 Caso 2 – Cálculo de quantidade de equipamentos para a realização de serviços ...... 140 5.5.3 Caso 3 – Avaliação da pertinência de serviços executados ............................................ 141 CAPÍTULO 6
FASE PRELIMINAR À LICITAÇÃO ......................................................................................... 143 6.1 6.2 6.3 6.4 6.5
Considerações iniciais.......................................................................................................... 143 Programa de necessidades .................................................................................................. 145 Estudos preliminares ........................................................................................................... 145 Anteprojeto de engenharia engenharia.................................................................................................. .................................................................................................. 146 Considerações nais............................................................................................................. 147
CAPÍTULO 7
LICITAÇÃO – FASE INTERNA .................................................................................................. 149 7.1 7.2 7.2.1 7.2.1.1 7.2.1.2 7.2.1.3 7.2.1.4 7.2.1.5 7.2.1.6
7.2.1.7 7.2.2 7.2.2.1 7.2.2.2 7.2.3 7.2.3.1 7.2.3.2 7.2.3.3 7.2.4 7.2.5 7.2.6 7.3 7.3.1 7.3.2 7.3.3
Considerações iniciais.......................................................................................................... 149 Caracterização da obra ........................................................................................................ 153 Projeto básico ........................................................................................................................ 155 Conceitos ...................................................................................................................... ............................................................................................................................... ......... 156 Requisitos ..................................................................................................................... .............................................................................................................................. ......... 158 Responsabilidade pela elaboração e acompanhamento ................................................. 158 Contratação do projeto básico ............................................................................................ 161 Nível de precisão .................................................................................................................. 163 Denição de marca............................................................................................................... 164 Validação e atualização do projeto..................................................................................... 165 Licenciamento ambiental .................................................................................................... 166 Procedimento ........................................................................................................................ 166 Licenças ambientais ............................................................................................................. 167 Orçamento detalhado – Preços ........................................................................................... 170 Referência de preços............................................................................................................. 171 Detalhamento das composições de serviços..................................................................... 181 BDI ................................................................................................................................. .......................................................................................................................................... ......... 184 Confrontação das novas informações com os estudos de viabilidade ......................... 189 Projeto executivo .................................................................................................................. 189 Documentação “as built” .................................................................................................... 190 Previsão de recursos orçamentários .................................................................................. 191 Plano Plurianual (PP (PPA A) e Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) ................................. 192 Lei Orçamentária Anual (LOA (LOA)) .......................................................................................... 193 Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) (LRF)................................................................................ ................................................................................ 193
7.3.4 7.3.5 7.3.6 7.4 7.4.1
Recursos internacionais ....................................................................................................... 195 Convênios Conv ênios .............................................................................................................................. 196 Etapas de implantação ......................................................................................................... 198 Regras para estruturação da licitação ................................................................................ 198 Modalidades de licitação previstas na Lei nº 8.666/93 e na Lei nº 10.520/02 (Pregão) .................................................................................................................................. 198 7.4.2 Parcelamento e fracionamento ........................................................................................... 205 7.4.3 Tipos de licitação .................................................................................................................. 209 7.4.4 Sistema de Registro de Preços (SRP) ................................................................................. 215 7.5 Regras para a contratação ................................................................................................... 219 7.5.1 Forma de execução ............................................................................................................... 220 7.5.2 Regime de execução ............................................................................................................. 221 7.5.3 Forma e limite para pagamento ......................................................................................... 235 7.5.4 Prazos de execução e vigência dos contratos ................................................................... 235 7.5.5 Garantias ................................................................................................................................ 238 7.5.6 Possibilidade de subcontratação ........................................................................................ 238 7.5.7 Minuta do contrato............................................................................................................... 239 7.6 Regras para habilitação dos interessados ......................................................................... 243 7.6.1 Considerações iniciais.......................................................................................................... 243 7.6.2 Vedações ................................................................................................................................ 244 7.6.3 Habilitações ........................................................................................................................... 246 7.6.3.1 Qualicação técnica operacional e prossional ............................................................... 247 7.6.3.2 Qualicação econômico-nanceir econômico-nanceiraa .................................................................................... 259 7.6.3.3 Atestado de visita às obras .................................................................................................. 261 7.6.4 Consórcios ............................................................................................................................. 263 7.7 Regras para o julgamento.................................................................................................... 265 7.7.1 Requisitos legais e critérios objetivos ................................................................................ 265 7.7.2 Avaliação e critério de aceitabilidade de preços unitário, por etapa e global ............. 266 7.8 Procedimentos especiais ...................................................................................................... 272 7.8.1 Audiência pública................................................................................................................. 272 7.8.2 Pré-qualicação .................................................................................................................... 273 7.8.3 Metodologia de execução .................................................................................................... 276 7.8.4 Análise comparativa ............................................................................................................ 277 7.9 Avaliação por assessoria jurídica da administração........................................................ 278 7.10 Responsabilidade dos agentes públicos............................................................................ 280 ............. ............. ............ .......... .... 283 7.11 A normatização de procedimentos internos na busca da eciência ...... 7.12 Cuidados recomendáve recomendáveis is ao nal da fase interna........................................................... 283 CAPÍTULO 8
LICITAÇÃO – FASE EXTERNA ................................................................................................. 287 8.1 8.2 8.3 8.4 8.5 8.6 8.6.1 8.6.2 8.7 8.8 8.9
Considerações iniciais.......................................................................................................... 287 Publicação e prazos .............................................................................................................. 289 Criação e atuação de comissão de licitação ...................................................................... 291 Procedimento e julgamento ................................................................................................ 294 Análise da habilitação .......................................................................................................... 295 Análise das propostas de preços ........................................................................................ 296 Avaliação da fronteira de aceitabilidade de preços máximos........................................ 299 Avaliação da fronteira da exequibilidade relativa a preços mínimos........................... 302 Recursos ................................................................................................................................. 308 Estudo de caso ...................................................................................................................... 309 Cuidados recomendáveis – Final da fase externa ............................................................ 315
CAPÍTULO 9
CONTRATAÇÃO CONTRAT AÇÃO DIRETA ........................................................................................................... 317 9.1 9.2 9.2.1 9.2.2 9.2.3 9.2.4 9.2.5 9.2.6 9.2.7 9.3 9.3.1 9.3.2 9.4
Considerações iniciais.......................................................................................................... 317 Licitação dispensável ........................................................................................................... 318 Obras e serviços de engenharia de pequeno valor .......................................................... 318 Casos de emergência ou calamidade pública................................................................... 320 Licitação deserta ................................................................................................................... 324 Licitação fracassada fracassada.............................................................................................................. .............................................................................................................. 325 Contratação de remanescente de obra .............................................................................. 325 Contratação de instituição incumbida de pesquisa, ensino ou desenvolvimento ...... 326 Compra ou locação de imóvel ............................................................................................ 327 Inexigibilidade de licitação ................................................................................................. 333 Contratação de fornecedor exclusivo ................................................................................ 333 Contratação de serviços técnicos por notória especialização......................................... 334 Considerações fnais............................................................................................................. 335
CAPÍTULO 10
FASE CONTRATUAL .................................................................................................................... 339 10.1 Considerações iniciais.......................................................................................................... 339 10.2 Contratos administrativos................................................................................................... 341 10.3 Formalização ................................................................................................................ ......................................................................................................................... ......... 342 10.4 Cadastramento dos contratos ............................................................................................. 343 10.5 Início dos serviços ................................................................................................................ 344 10.6 Fiscalização ................................................................................................................... ............................................................................................................................ ......... 345 10.6.1 Responsáveis ................................................................................................................. ......................................................................................................................... ........ 345 10.6.1.1 Pela Administração .............................................................................................................. 345 10.6.1.2 Pela empresa ................................................................................................................. ......................................................................................................................... ........ 347 10.6.2 Documentos ................................................................................................................. .......................................................................................................................... ......... 347 10.6.3 Atividades..................................................................................................................... .............................................................................................................................. ......... 348 10.7 Prorrogação de prazos ......................................................................................................... 350 10.8 Subcontratação e sub-rogação ............................................................................................ 353 10.9 Fusão, incorporação ou cisão .............................................................................................. 357 10.10 Escopo do contrato ............................................................................................................... 357 10.11 Medições e regime de execução ......................................................................................... 358 10.12 Pagamentos ................................................................................................................... ........................................................................................................................... ........ 369 10.13 Responsabilidade previdenciária e trabalhista ................................................................ 370 10.14 Alterações contratuais ......................................................................................................... 375 10.14.1 Alteração unilateral .............................................................................................................. 378 10.14.2 Alteração por acordo............................................................................................................ 378 10.14.3 Limites para alteração .......................................................................................................... 379 10.14.4 Problemas em relação a preços preços........................................................................................... ........................................................................................... 387 10.14.5 Problemas em relação a prazos de execução .................................................................... 393 10.15 Alterações do valor do pagamento .................................................................................... 394 10.15.1 Reajustamento e repactuação ............................................................................................. 394 10.15.2 Atualização .................................................................................................................... ............................................................................................................................ ........ 398 10.15.3 Compensação e penalização ............................................................................................... 399 10.15.4 Descontos ...................................................................................................................... ............................................................................................................................... ......... 399 10.15.5 Recomposição ....................................................................................................................... 399 10.16 Extinção do contrato ............................................................................................................ 407 10.16.1 Conclusão e recebimento do objeto ................................................................................... 407 10.16.2 Inexecução, rescisão e sanção ............................................................................................. 409
10.16.3 10.17 10.17.1 10.17.2
Limitação do valor de aditivos ........................................................................................... 420 Cuidados na fase de contratação ........................................................................................ 421 Assinatura do contrato ........................................................................................................ 421 Emissão da ordem de serviço ............................................................................................. 422 10.17.3 Acompanhamento e scalização........................................................................................ 422 10.17.4 Extinção.................................................................................................................................. 423 CAPÍTULO 11
FASE POSTERIOR À CONTRATAÇÃO .................................................................................. 425 11.1
11.2 11.3 11.4 11.5
Caderno de especicações e documentação “as built”................................................... 425
Operação ................................................................................................................................ 426 Garantia dos serviços ........................................................................................................... 427 Intervenções .......................................................................................................................... 429 Licitação, contratação e prioridade de recursos ............................................................... 431
CAPÍTULO 12
CONTROLE E FISCALIZAÇÃO ................................................................................................ 433 12.1 12.2 12.3 12.3.1 12.3.2 12.4
Considerações iniciais.......................................................................................................... 433 Controle administrativo ...................................................................................................... 433 Controle externo ................................................................................................................... 435 Obras irregulares .................................................................................................................. 436 Obras inacabadas e obras paralisadas ............................................................................... 438 Controle social ...................................................................................................................... 442
CAPÍTULO 13
PLANILHAS ORÇAMENTÁRIAS – VISÃO PRÁTICA ..................................................... 445 13.1 13.2 13.3 13.4 13.5 13.6 13.7 13.8
Considerações iniciais.......................................................................................................... 445 Elaboração da planilha base do orçamento ...................................................................... 445 Relação dos insumos que serão utilizados e a pesquisa de preços ............................... 446 Orçamento sintético de custos diretos............................................................................... 447 Orçamento sintético de preços ........................................................................................... 447 Relação das composições de serviço e orçamento analítico ........................................... 448 Curva ABC............................................................................................................................. 448 Cronograma físico e nanceiro........................................................................................... 449
CAPÍTULO 14
SUSTENTABILIDADE SUSTENTA BILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS ................................................................. 477 14.1 14.2 14.3 14.4 14.5 14.6 14.7
Considerações iniciais.......................................................................................................... 477 A sustentabilidade e o desenvolvimento econômico nacional nas compras e investimentos públicos ........................................................................................................ 478 Mudanças comportamentais – A cultura dos 5 Rs .......................................................... 481 A evolução legislativa e regulamentar .............................................................................. 481 Critérios legais afetos à sustentabilidade e ao desenvolvimento nacional para a análise de propostas e xação de margem de preferência preferência .......................................... 483 O processo de planejamento, execução e utilização das obras públicas e a sustentabilidade.................................................................................................................... 498 Considerações nais............................................................................................................. 501
CAPÍTULO 15 ............ ............. ............. ......503 503 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC) ...... 15.1 15.2 15.2.1 15.2.2 15.3 15.4 15.5
Considerações iniciais .......................................................................................................... 503 Regimes de execução e matriz de riscos ........................................................................... 506 Contratação integrada – utilização e critério de julgamento ......................................... 511 As novidades da Lei nº 12.980/2104 ................................................................................... 520 Elaboração, publicação, sigilo do orçamento base e remuneração variável ................ 522 Critérios de julgamento ....................................................................................................... 529 Modalidades de licitação, prazos para apresentação de propostas e publicidade do instrumento convocatório .............................................................................................. 531 15.6 Sistema de Registro de Preços e Catálogo Eletrônico de Padronização ....................... 532 15.7 Habilitação, pré-qualicação e cadastramento ................................................................ 540 15.8 Procedimento ........................................................................................................................ 541 15.8.1 Análise das propostas previamente à avaliação da habilitação .................................... 542 15.8.2 Modo e forma de disputa .................................................................................................... 542 15.8.3 Análise das propostas e negociação .................................................................................. 544 15.9 Contrato e execução ............................................................................................................. 547 15.10 Considerações nais............................................................................................................. 549 CAPÍTULO 16
GOVERNANÇA E GESTÃO DAS OBRAS PÚBLICAS...................................................... 551 16.1 16.2 16.3 16.3.1 16.3.2 16.3.3 16.3.4 16.3.5 16.3.6 16.4 16.5 16.5.1 16.5.2 16.5.3 16.5.4
Considerações iniciais .......................................................................................................... 551 Governança e gestão ............................................................................................................ 552 Princípios e ferramentas para a governança .................................................................... 555 Prestação de contas .............................................................................................................. 556 Planejamento estratégico institucional .............................................................................. 556 Conselhos ou comitês estratégicos de acompanhamento .............................................. 557 Ferramentas para execução da estratégia ......................................................................... 558 Gestão de riscos .................................................................................................................... 558 Sistema de controles ............................................................................................................. 559 Gestão e gerenciamento de projetos .................................................................................. 560 Governança e gestão nas obras públicas rodoviárias...................................................... 562 Análise de projetos ............................................................................................................... 564 Aplicação de penalidades a empresas ............................................................................... 566 Fiscalização e medição de obras rodoviárias.................................................................... 566 Pouca integração entre os setores ...................................................................................... 567 16.5.5 Deciências nos sistemas de informações gerenciais...................................................... 567 16.6 Governança em conv convênio ênio de obras públicas..................................................................... 568 16.7 Caminhos para a boa gestão e governança nas obras públicas ..................................... 572 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................... .................................................................................................................................... ......... 575
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1.a
Ilustração dos diversos contratos que podem fazer parte de um empreendimento ....................................................................................................... 36
FIGURA 2.a
Conjunto normativo aplicado à licitação e contratação de obra pública .......... 42
FIGURA 3.a
Estrutura das fases envolvidas no processo de licitação, contratação e utilização do empreendimento, com referência aos capítulos em que cada matéria será tratada ......................................................................................... 59
FIGURA 5.a
Esquema dos principais conceitos envolvidos em orçamento de obra pública......................................................................................................................... 76
FIGURA 6.a
Esquema das etapas compreendidas na fase preliminar à licitação ................ 144
FIGURA 7.a
Questões e diretrizes a serem observados na fase interna de licitação de obra pública.............................................................................................................. 151
FIGURA 7.b
Comportamento do Índice Preço Custo do Contrato – IPCC (relação entre o valor global proposto para a realização da obra de engenharia pela empresa vencedora do certame licitatório, ou selecionada no processo de dispensa ou inexigibilidade, e o custo da obra estimado com base nos preços unitários dos serviços obtidos das tabelas de preços) em função do número de participantes classifcados ...................................................................................... 153
FIGURA 7.c
Elementos básicos para caracterização da obra .................................................. 155
FIGURA 7.d
Conjunto normativo a ser observado para previsão de recursos ..................... 191
FIGURA 7.e
Ilustração das modalidades de licitação previstas em lei.................................. 199
FIGURA 7.f
Elementos constantes das regras para contratação ............................................ 220
FIGURA 7.g
Exigências para habilitação .................................................................................... 244
FIGURA 7.h
Ilustração gráfca dos momentos em que ocorrem os procedimentos
FIGURA 8.a
especiais (lembrar que cada um depende dos requisitos estabelecidos em lei) ........................................................................................................................ 277 Resumo das etapas compreendidas na fase externa da licitação ..................... 288
FIGURA 10.a Resumo das etapas compreendidas na fase de contratação de obra pública . 340 FIGURA 10.b Ciclo de controle do escopo do contrato .............................................................. 357 FIGURA 10.c Aspectos relevantes para o controle do escopo .................................................. 358 FIGURA 10.d Aditivos aos projetistas em caso de alteração de projeto .................................. 361 FIGURA 10.e
Procedimentos básicos para a defnição de aditivos de preços ........................389
FIGURA 15.a Questões e diretrizes a serem observadas na contratação de obras da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, de acordo com as inovações trazidas pelo RDC................................................................................................................... 506
FIGURA 15.b Elementos técnicos utilizados na contratação de uma obra pública ............... 507 FIGURA 15.c
Ciclo de vida de um Projeto................................................................................... 509
FIGURA 15.d Metodologia de elaboração do orçamento em função do regime de execução escolhido .................................................................................................. 524
LISTA DE TABELAS
TABELA 4.1
Precisão de metodologias de avaliação de custo x fase do empreendimento .................................................................................................... 68
TABELA 4.2
Publicação do CUB pelo Sinduscon/MG ........................................................... 71
TABELA 5.1
Consequências da má avaliação orçamentária do empreendimento ............. 75
TABELA 5.2
Exemplo de serviços e insumos utilizados......................................................... 77
TABELA 5.3
Exemplo de planilha orçamentária ..................................................................... 78
TABELA 5.4
Curva ABC .............................................................................................................. 78
TABELA 5.5
Cálculo do custo do material (MAT) ................................................................... 88
TABELA 5.6
Cálculo do custo de mão de obra (MO) e lei sociais (LS) ................................. 88
TABELA 5.7
Cálculo dos coecientes dos insumos utilizados no serviço forma ................ 89
TABELA 5.8
Cálculo do custo unitário do serviço forma (m²) com base em coecientes.............................................................................................................. 89
TABELA 5.9
Planilha orçamentária de preços (com BDI) referente à planilha de custos diretos apresentados na TABELA 5.3...................................................... 92
TABELA 5.10
Referência de valores para BDI .......................................................................... 124
TABELA 5.11
Composições para o cálculo do custo de serviços........................................... 138
TABELA 5.12
Custo de insumos................................................................................................. 138
TABELA 5.13
Composição para o cálculo do custo de serviços ............................................ 140
TABELA 7.1
Elementos exigidos na elaboração do edital pela Lei nº 8.666/93 ................. 152
TABELA 7.2
Elementos exigidos no projeto básico e objetivos ........................................... 157
TABELA 7.3
Modelo de planilha orçamentária com referência aos comandos exigidos na Lei nº 8.666/93 .................................................................................. 171
TABELA 7.4
Composição de serviço forma calculada corretamente (idem TABELA 5.8) .............................................................................................. 182
TABELA 7.5
Composição de serviço forma — equívoco na denição do valor da hora do carpinteiro em R$4,00 (ao invés de R$2,00): ocasiona um sobrepreço de R$9,00 por m² (39% superior) no valor do serviço ................ 183
TABELA 7.6
Composição de serviço forma — equívoco na denição do valor das leis sociais em 155% (ao invés de 125%): ocasiona um sobrepreço de R$1,80 por m² (8% superior) no valor do serviço ............................................ 183
TABELA 7.7
Composição de serviço forma — equívoco na denição do coeciente da tábua de pinho em 5,00ml (ao invés de 2,5ml): ocasiona um sobrepreço de R$6,75 por m² (30% superior) no valor do serviço ................ 183
TABELA 7.8
Planilha orçamentária com custos diretos (idem TABELA 5.3) .................... 185
TABELA 7.9
Planilha orçamentária com preços dos serviços (custos diretos + BDI de 30%, já incluída a administração local) – CORRETO (idem TABELA 5.9) .............................................................................................. 185
TABELA 7.10
Planilha orçamentária com preços dos serviços (utilizou-se o mesmo BDI de 30% — que já computava o item administração local, apesar desse item estar detalhado na planilha) — INCORRETO EM FACE DA COBRANÇA DUPLA DO MESMO SERVIÇO ......................................... 186
TABELA 7.11
Planilha orçamentária com custos diretos e inclusão do item administração central .......................................................................................... 186
TABELA 7.12
Planilha orçamentária com preços dos serviços e inclusão do item administração central (custos diretos mais BDI de 23,81%, não incluída a administração local) — CORRETO ................................................................ 187
TABELA 7.13
Limites de valor para denição das modalidades de licitação no caso de obras e serviços de engenharia, válidos a partir de 1998 .......................... 199
TABELA 7.14
Análises de preço global e unitário exigidas pela legislação......................... 266
TABELA 7.15
Planilha do orçamento-base da Administração............................................... 270
TABELA 7.16
Planilha do orçamento apresentada pela empresa com majoração dos serviços iniciais..................................................................................................... 270
TABELA 7.17
Planilha apresentada pela empresa com majoração do Serviço 2................. 271
TABELA 8.1
Prazos mínimos até o recebimento das propostas ou realização do evento..................................................................................................................... 290
TABELA 8.2
Esquema gráco das quatro análises a serem feitas para vericação de preço global e unitário ................................................................................... 298
TABELA 8.3
Planilha de preços do orçamento-base elaborado pela Administração (com BDI de 30%)................................................................................................. 310
TABELA 8.4
Planilha de preços do orçamento elaborado pela empresa A ....................... 311
TABELA 8.5
Planilha de custos diretos do mercado com base em referenciais conáveis............................................................................................................... 312
TABELA 8.6
Cálculo do custo do aditivo com base nos referenciais da empresa e da Administração ...................................................................................................... 314
TABELA 9.1
Limites legais estabelecidos para a contratação direta por valor no caso de obras e serviços de engenharia ..................................................................... 319
TABELA 10.1
Valores limites para celebração de aditivos denidos pela lei de licitações ................................................................................................................ 379
TABELA 10.2
Problemas denidos na lei de licitações que podem ensejar a rescisão contratual .............................................................................................................. 410
TABELA 12.1
Achados de auditoria mais recorrentes em 2013 ............................................. 438
TABELA 13.1
Planilha dos serviços pertencentes à obra, acompanhados de suas quantidades e unidades de medição................................................................. 450
TABELA 13.2
Planilha dos insumos a serem empregados, acompanhados de suas respectivas quantidades ...................................................................................... 451
TABELA 13.3
Planilha de custos diretos dos serviços............................................................. 452
TABELA 13.4
Planilha de preços unitários ............................................................................... 453
TABELA 13.5
Relação das composições de serviços ............................................................... 454
TABELA 13.6
Curva ABC de insumos ....................................................................................... 465
TABELA 13.7
Curva ABC de serviços........................................................................................ 467
TABELA 13.8
Planilha do cronograma físico............................................................................ 468
TABELA 13.9
Planilha do cronograma nanceiro................................................................... 470
TABELA 13.10
Planilha do cronograma físico-nanceiro......................................................... 472
TABELA 13.11
Planilha do cronograma de consumo dos insumos ........................................ 474
TABELA 15.1
Seleção de proposta com base no critério de julgamento de maior retorno econômico ............................................................................................... 530
TABELA 15.2
Critérios de julgamento em função do objeto a ser licitado .......................... 531
PREFÁCIO DA 1ª EDIÇÃO
Cláudio Sarian Altounian traz à lembrança o esforço despendido pelo Tribunal de Contas da União em cooperação com as Casas do Congresso, para o aprimoramento das atividades de scalização de obras públicas, sobretudo na última década. O texto menciona o fato de, nos idos de 1995, terem sido identicadas mais de duas
mil obras inacabadas, para não dizer abandonadas, nas quais haviam sido empregados recursos públicos da ordem de R$15 bilhões. A situação caótica em que se encontravam as obras públicas no país impôs desaos
ao Controle, que teve de desenvolver metodologias mais efetivas de acompanhamento de obras, com ênfase na agilidade para a correção das irregularidades. No âmbito do TCU, buscou-se em um primeiro momento a uniformização dos trabalhos de suas secretarias e a formação de um corpo técnico especializado, que culminou na criação da Secretaria de Fiscalização de Obras e do Patrimônio da União (Secob), no ano de 2001. O autor, que, no desempenho de suas atividades no Tribunal, sempre esteve ligado ao processo de aperfeiçoamento dos mecanismos de controle de obras públicas, assumiu o comando da Secob. Coube-lhe papel fundamental na capacidade que o Tribunal tem demonstrado de adaptar-se às demandas crescentes do Congresso Nacional e da sociedade, provendo-lhes informações cada vez mais dedignas e tempestivas
acerca das obras públicas. Aqui está o fruto de amplo trabalho de pesquisa de legislação, doutrina e jurisprudência. Reete mais o resultado desse estudo do que uma visão pessoal do autor.
O texto é simples e prático, para ser utilizado no dia a dia de agentes públicos e privados no enfrentamento das questões que surgem desde a avaliação preliminar dos valores da contratação e elaboração do orçamento, passando pelas fases de licitação para a seleção de propostas, até a formalização, realização e scalização do contrato,
aspecto esse último raramente encontrado nos compêndios especializados. A clareza e a funcionalidade do texto acabam servindo de contraponto às armações daqueles que, à primeira diculdade que se apresenta na realização de seus
projetos, procuram desvencilhar-se de suas responsabilidades atribuindo ao Controle a razão de seus problemas. Fique o leitor desde logo prevenido que não temos um livro destinado aos acomodados. Trata-se de livro de uso, um manual, para car aberto sobre as pranchetas
e mesas de trabalho de projetistas, membros de comissão de licitação, gestores públicos, assessores jurídicos, auditores e de todos aqueles que se envolvam com a matéria. Não chega a ser detalhista como “As regras para uso dos que frequentam bonds”, de Machado de Assis, que tem nada menos do que setenta artigos, mas ajuda muito... Marcos Vinicios Vilaça
Ministro do Tribunal de Contas da União Presidente da Academia Brasileira de Letras (Biênio 2006-2007) Fevereiro/2007
APRESENTAÇÃO DA 5ª EDIÇÃO
Prezados amigos leitores: Com muita alegria, eis a 5ª edição do livro “Obras Públicas: Licitação, contratação, fscalização e utilização”. Mais uma vez, obrigado pela receptividade deste trabalho
em suas quatro primeira edições. A dinâmica da legislação e da jurisprudência exigem a atualização periódica de publicação que aborda matéria tão relevante para o país. Muitas novidades! Atualização de toda a legislação aprovada no período 2014 a 2015. A exemplo das edições anteriores, trouxe novas orientações dos Tribunais, em especial do TCU, para o tratamento de temas que costumam gerar insegurança na ação dos diversos agentes que tratam com licitações das obras públicas: Projeto, Orçamento, BDI, Regime de Execução, Medições, Aditivos, Prazos de Execução e Vigência dos contratos, Regras para Habilitação, Aditivos, Procedimentos da Comissão de Licitação, Sanções, RDC, Pregão, Sistema de Registro de Preços; Margem de preferência, Desenvolvimento Sustentável e boas práticas sugeridas. Como de praxe, aproveitei esta publicação para inserir respostas a dúvidas importantes ou interessantes que me foram encaminhadas por e-mails ou trazidas durante treinamentos e palestras neste dois últimos anos. Espero que esta publicação continue representando um instrumento prático de auxílio àqueles profssionais responsáveis por licitação e contratação das Obras
Públicas, que se dedica, de corpo e alma para que o nosso Brasil seja cada vez melhor para os nossos flhos.
Sucesso! O autor Novembro/2015
APRESENTAÇÃO DA 4ª EDIÇÃO
Prezados amigos leitores: O momento da publicação de nova edição é sempre uma grande alegria para o autor. Mostra que todo o trabalho despendido desde a 1ª edição, em 2007, até a 3ª edição, em 2012, valeu a pena. A receptividade em relação a todo esse trabalho me faz estar em dívida permanente com todos vocês leitores. E essa dívida só pode ser paga com dedicação na atualização desta obra que agora é publicada em sua 4ª edição. Para variar, muitas novidades! Atualização de toda a legislação aprovada no período 2012 a 2013. Novas orientações dos Tribunais, em especial do TCU, para o tratamento de temas que aigem cotidianamente os agentes que tratam com licitações das obras públicas:
Orçamento, BDI, Desoneração da folha de pagamento, Regime de Execução, Medições, Aditivos, Prazos de Execução e Vigência dos contratos, Regras para Habilitação, Aditivos, Procedimentos da Comissão de Licitação, Sanções, Pregão, Sistema de Registro de Preços; Margem de preferência, Desenvolvimento Sustentável, Contratos “ Built to suit” ou “Locação sob medida” e boas práticas sugeridas. Grandes evoluções no entendimento da aplicação do Regime Diferenciado de Contratações Públicas desde a publicação da edição anterior deste livro: em termos legais, a ampliação signicativa de sua utilização, com a inclusão de diversos tipos de
obras, como, por exemplo, as inseridas: no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC); na área da saúde e da educação; e, recentemente, na modernização, construção, ampliação ou reforma de aeródromos públicos; na execução de unidades armazenadoras; e em serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo. Em termos jurisprudenciais, posicionamentos fundamentais a respeito do sigilo do orçamento-base na licitação, da amplitude de utilização da contratação integrada, e da melhor forma de orçamentação em função do regime de execução escolhido. Ao nal do ano, a Medida Provisória
nº 630, trouxe uma grande inovação, ao dispensar o critério de julgamento de técnica e preço para as contratações integradas. Aproveitei o ensejo para incluir respostas a dúvidas importantes ou interessantes que me foram encaminhadas por e-mails ou trazidas durante treinamentos e palestras. Mas não é tudo. Tenho por hábito trazer sempre um capítulo novo em cada edição. Para a escolha do assunto, busquei junto às recentes diretrizes de atuação dos órgãos de controle um dos temas que pode resolver de modo signicativo a causa raiz
dos problemas vividos pelo Brasil: a Governança e a Gestão desses empreendimentos. Espero que seja um instrumento prático de auxílio àqueles profissionais responsáveis por licitação e contratação das Obras Públicas, objeto de extrema relevância para que o Brasil alcance patamares de crescimento que o coloque em futuro não tão distante no rol dos países desenvolvidos. Sucesso! O autor
Janeiro/2014
APRESENTAÇÃO DA 3ª EDIÇÃO
Prezados amigos leitores: A publicação da 2ª edição deste livro ocorreu em 2009. A dinâmica do mundo atual, com a aprovação de novas leis e materialização de importantes posicionamentos dos Tribunais no período 2009 a 2011, exige constante atualização de uma obra que tem como objetivo auxiliar todos os que trabalham em uma das áreas mais relevantes para o desenvolvimento do país — as obras públicas. Procurei acrescentar nesta 3ª edição temas indispensáveis ao trato da matéria: o aprimoramento de comandos legais, com destaque para a aprovação do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), para as obras da Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016 a serem realizadas no Brasil; a lei de diretrizes orçamentárias; o novo foco legal dado à sustentabilidade nas licitações públicas; e a criação do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) e dos Conselhos de Arquitetura e Urbanismo dos Estados e do Distrito Federal (CAUs). A jurisprudência não foi esquecida. Diversos entendimentos dos Tribunais rmados a partir de 2009, com destaque para a aprovação de Súmulas, foram inseridos
para que o leitor tenha a exata dimensão do caminho seguro a ser trilhado no processo de contratação das obras públicas. Orientações Normativas da Advocacia-Geral da União (AGU) também foram relacionadas. Busquei, ainda, inserir sugestões de colegas e alunos apresentadas nestes últimos anos, com destaque para temas como regime de execução, elaboração de orçamento, avaliação das propostas e critérios de acompanhamento e scalização de obras.
Espero que o presente livro seja útil ao trabalho de todos. Sucesso! O autor
Janeiro/2012
APRESENTAÇÃO DA 2ª EDIÇÃO
Prezados amigos leitores: Foi com grande satisfação que recebi o convite da Editora Fórum para a elaboração do texto da segunda edição de Obras públicas: licitação, contratação, fscalização e utilização. Devo registrar que a recepção deste livro superou minhas expectativas iniciais. Não apenas pela aceitação de todos os envolvidos na licitação e contratação de obras públicas, mas também pelo grande número de sugestões que recebi pessoalmente ou por e-mail , todas de extrema valia para o aprimoramento desta publicação. Procurei inserir as decisões mais importantes do TCU proferidas em 2007 e 2008, atualizar a legislação, e acrescentar tópicos sugeridos pelos leitores e alunos dos cursos de que participo. Destaco o aprofundamento de temas relacionados à denição de BDI,
regime de execução de obra — empreitada por preço unitário e global, utilização de pregão para contratação de obras e serviços de engenharia, medições e responsabilidade dos gestores. Destaco, ainda, o novo e último capítulo que trata da apresentação e detalhamento do orçamento, que procura relacionar, de forma prática, as principais planilhas utilizadas na condução de um processo de contratação de obras e auxiliar os leitores na visualização e compreensão desses documentos. Espero que as sugestões aqui registradas auxiliem todos os gestores na administração eciente da execução de empreendimentos patrocinados com recursos
públicos. Sucesso! O autor Fevereiro/2009
APRESENTAÇÃO DA 1ª EDIÇÃO
Selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração é um desao para
todos aqueles que lidam com processos licitatórios na esfera federal, estadual ou municipal: projetistas, membros de comissão de licitação, gestores públicos, assessores jurídicos, responsáveis pela scalização e repassadores de recursos. Esse desao ganha
maior dimensão quando a contratação tem como foco a realização de uma obra pública. A diculdade é da mesma grandeza para os prossionais pertencentes aos
quadros de empresas que contratam com órgãos públicos. O grau de informalidade que rege a contratação na iniciativa privada não se aplica à esfera pública. Diversas normas, por vezes desconhecidas, devem ser observadas para a correta condução de todas as atividades inerentes a empreendimento patrocinado por recursos públicos. Parece uma tarefa extremamente complexa. Mas não tanto! O objetivo desta publicação é auxiliar o trabalho de todos, agentes públicos e privados, na implantação de empreendimentos governamentais por meio de uma abordagem simples e objetiva a respeito dos principais temas correlatos ao processo de contratação — legislação aplicável, parâmetros de custos e principais irregularidades cometidas —, a m de
evitar a ocorrência de futuros problemas. Diferentemente de um objeto padronizado, que traz preço denido com melhor precisão pelo mercado, cada obra tem suas especicidades como, por exemplo, local em que será realizada, padrão de acabamento, prazo para conclusão e projeto especíco.
Diante dessas características próprias, os cuidados a serem adotados no gerenciamento desses empreendimentos devem ser redobrados. Pequenas falhas em qualquer uma das etapas podem ocasionar signicativos prejuízos ao erário e trazer
sérias consequências para os responsáveis pelos atos que deram causa ao dano. Em face da amplitude do tema, diversas foram as diretrizes pensadas para o desenvolvimento de um trabalho na área de obras públicas: “Licitação, contratação, fiscalização e utilização”, “Convênios”, “Gerenciamento de contratos”; “Projeto básico e projeto executivo”; “Aspectos polêmicos na jurisprudência”; “Auditoria de obras públicas”; e “Licenciamento ambiental e aspectos relevantes”. Não obstante a importância de todas as diretrizes, assim como a existência de material para cada uma delas, optei pelo aprofundamento do primeiro tema nesta publicação, por sua abrangência e pela possibilidade de destacar os principais tópicos atinentes aos demais, sem prejuízo de desenvolver os outros futuramente. O texto a seguir busca apresentar de forma prática a todos os técnicos envolvidos com licitação, contratação, scalização e utilização de obras públicas, as principais etapas
do processo, desde a concepção até a operação do objeto, acompanhadas de sugestões a serem adotadas em cada uma delas para que seja possível gerenciar o empreendimento de forma segura, nos custos e prazos previstos. Para tanto, procurei consolidar as principais constatações advindas de minha experiência prossional, da legislação aplicada à área, da jurisprudência dos tribunais
e das diversas questões suscitadas em treinamentos que ministrei pelo país.
32
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
O lançamento pelo governo federal do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no início de janeiro de 2007, que prevê investimentos públicos e privados na ordem de R$500 bilhões nos próximos quatro anos, principalmente na área de obras públicas, demonstra o acerto do tema escolhido para nortear o presente trabalho. Uma das medidas inseridas no referido plano está relacionada a ajustes na Lei nº 8.666/93, dentre os quais: a possibilidade de inversão das fases licitatórias; a utilização de meios eletrônicos em todas as modalidades de licitação; e a inclusão de fase saneadora especial. Considerando tratar-se, ainda, apenas de proposta que deverá ser avaliada e aprimorada pelo Congresso Nacional durante algum período, que poderá ser longo, além de não afetar a substância dos critérios e procedimentos já estabelecidos na lei de licitações, entendi oportuna a publicação neste momento, visto que grande número de processos de contratação de obras públicas deverá estar em curso durante este período. Espero que as informações e subsídios constantes deste livro sejam úteis a todos os agentes, públicos ou privados, especialistas ou não, designados para participar de procedimentos licitatórios em obras ou, até mesmo, em outros objetos. Sugestões para o aprimoramento da presente obra são bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail
. O autor Fevereiro/2007
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
Sumário: 1.1 Considerações
iniciais – 1.2 Histórico – 1.3 Características importantes de obras – 1.4 Denições – 1.5 Leitura e consulta complementares
1.1 Considerações iniciais O processo de qualquer contratação na qual estejam envolvidos recursos públicos deve ser conduzido com cautela pelos responsáveis designados para cada uma das tarefas inseridas em seu contexto. Além do fato desses recursos pertencerem à sociedade, existem regras preestabelecidas, com destaque para a Lei nº 8.666/93, as quais devem ser obedecidas a m de que seja selecionada a proposta mais vantajosa
para a Administração Pública. No caso especíco de obras públicas a cautela deve ser redobrada, uma vez
que o conjunto de normas e procedimentos que regulam a matéria se amplia consideravelmente. Outro ponto importante a ser considerado é a diculdade de obtenção
de preços padronizados para contratação, visto que cada obra guarda em sua execução peculiaridades próprias. Por esses motivos, este livro foi estruturado de maneira a fornecer uma visão sistêmica de todo o processo de contratação de obras, desde as fases concernentes aos estudos de viabilidade até aquelas relativas ao recebimento e à operação do objeto. Para tanto, necessária se fez a criação de capítulos iniciais que familiarizassem o leitor com conceitos de orçamento e planejamento de execução de obras, de forma a subsidiar a análise das diretrizes legais estabelecidas nos capítulos seguintes. Conforme será demonstrado, existe uma estreita relação entre as planilhas orçamentárias e os textos legais. As diversas fases do processo de licitação e contratação foram divididas e estruturadas com o objetivo de registrar os principais procedimentos a serem adotados. Ao nal de cada uma das fases, contempladas em capítulos especícos, é apresentado um
grupo de atividades que devem estar concluídas de forma satisfatória para que seja possível passar às etapas seguintes.
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
34
No Capítulo 2, é relacionado o conjunto normativo aplicável ao processo de contratação de obras públicas, enquanto no seguinte, é apresentada uma visão geral e resumida das etapas de contratação do empreendimento. Nos capítulos 4 e 5, matéria de especial destaque referente a técnicas de estimativa de custos é apresentada em linguagem simples com o intuito de familiarizar o leitor com a terminologia orçamentária. Nos demais capítulos, são tratadas com detalhes todas as fases de uma obra pública: preliminar à licitação; licitação; contratação; posterior à contratação; scalização e controle. Ao nal, foram inseridos capítulos especícos que apresentam uma visão prática das diversas planilhas orçamentárias atinentes a um empreendimento, para ilustrar os documentos que deverão ser avaliados pelos responsáveis com o objetivo de assegurar o correto gerenciamento da contratação; aspectos relevantes afetos à sustentabilidade das obras públicas; as diretrizes para contratação de empreendimentos com base no Regime Diferenciado de Contratações Públicas; e um novo tema afeto a governança e gestão nas obras públicas.
1.2 Histórico A área de obras públicas sempre se destacou no grupo de investimentos realizados no âmbito da Administração Pública, quer pela sua materialidade, quer pela importância social da conclusão do empreendimento para a comunidade. Lamentavelmente, não é rara a constatação de graves irregularidades na gestão de recursos canalizados para essa área, como superfaturamento, direcionamento, demora na conclusão ou, até mesmo, abandono dos empreendimentos. Em 1995, Comissão Temporária do Senado Federal destinada a inventariar as obras inacabadas vericou a existência de 2.214 obras inconclusas patrocinadas com recursos públicos que chegavam, à época, ao montante de R$15 bilhões. Para ilustração do cenário encontrado, vale destacar trechos do relatório nal: Encontramos obras inacabadas de todas as idades e em diversos estágios de abandono. A Ferrovia Transnordestina, por exemplo, deve ser considerada a obra inacabada mais antiga do País, pois sua construção teve início ainda no Império e continua inconclusa, a desaar administrações e gerações. [...] O prédio da Justiça Estadual do Amazonas, em Manaus, está há tanto tempo abandonado — quase 20 anos — que sua eventual retomada deverá ser precedida de uma avaliação técnica, para que sejam determinadas as possibilidades de aproveitamento de sua estrutura, e a readequação do projeto às atuais necessidades da Justiça e suas Varas. 1
Ainda no mencionado relatório, valiosas considerações foram registradas: Uma obra paralisada representa um claro desrespeito ao princípio da moralidade pública, em razão do desperdício de recursos sabidamente escassos, sem falar na possibilidade político-eleitoral da obra inacabada, com a promessa de busca de novos recursos para sua conclusão. [...]
1
BRASIL. Senado Federal. Comissão Temporária das Obras Inacabadas. Relatório fnal: o retrato do desperdício no Brasil, p. 7.
INTRODUÇÃO
Como já exaustivamente dito, uma obra paralisada acaba signicando dupla penalização
à população: pela ausência da obra e pelo desperdício dos recursos já aplicados.
2
Além do trabalho desenvolvido pela Comissão Temporária do Senado Federal, outras iniciativas importantes para o controle e acompanhamento de obras foram implementadas, como, por exemplo, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Judiciário, em 1999, e nova CPI para tratar de obras inacabadas, em 2001. A partir de 2000, o Congresso Nacional, com o apoio técnico do Tribunal de Contas da União, iniciou um controle efetivo no setor, com o bloqueio de dotação orçamentária para os empreendimentos nos quais foram identicados indícios de irregularidades
graves até o saneamento das questões pelos órgãos e entidades responsáveis pelas obras. Diante do cenário atual e das iniciativas ilustradas, percebe-se uma nova conscientização de todos os agentes responsáveis direta ou indiretamente pela contratação de obras públicas. Nessa linha, o treinamento dos prossionais envolvidos
no processo de contratação é de extrema relevância para que as expectativas da sociedade sejam alcançadas com a conclusão dos empreendimentos nos prazos e custos inicialmente previstos.
1.3 Características importantes de obras As peculiaridades inerentes à execução de uma obra transformam cada empreendimento em um objeto singular, diferentemente de outros produtos ou serviços que são encontrados de forma padronizada no mercado. Na indústria da construção, ao contrário do processo convencional de produção industrial, não existem ganhos signicativos de escala na fabricação, em face da ausência
de repetição. A fábrica se desloca para o local onde será elaborado o produto, ou seja, diversos são os imprevistos que podem ocorrer durante o processo de execução de uma obra. Cada projeto apresenta características ímpares que devem ser consideradas caso a caso, como, por exemplo, padrão de acabamento, concepção estrutural, custos locais, produtividades regionais de mão de obra, tipos de solo e prazos para conclusão. Dessa forma, é fundamental que sejam adotadas, durante o processo de contratação, todas as medidas para se evitar “acidentes de percurso”. Não é raro o surgimento de falhas que pareciam inicialmente de pequena monta, mas que causam efeitos ou prejuízos de grande dimensão. Além disso, a implementação de uma obra exige a correta administração de diversos contratos e procedimentos licitatórios, como, por exemplo: elaboração do projeto básico; execução da obra; implementação das instalações especiais; aquisição de equipamentos; supervisão; compra de materiais. Apenas a perfeita concatenação de todos eles trará o sucesso na materialização do objeto. A falha na condução de um contrato, mesmo que de valor pequeno em relação ao todo, pode comprometer todo o empreendimento. A FIGURA 1.a ilustra o cenário.
2
BRASIL. Senado Federal. Comissão Temporária das Obras Inacabadas. Relatório fnal: o retrato do desperdício no Brasil, p. 5, 66.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
FIGURA 1.a - Ilustração dos diversos contratos que podem fazer parte de um empreendimento
Apesar das diculdades relacionadas, os diversos ramos da engenharia estão sucientemente desenvolvidos sob o prisma técnico para assegurar a conclusão dos empreendimentos sem desvios signicativos em relação ao projeto inicial. Contudo, os técnicos responsáveis pela condução da contratação devem, cada qual dentro de sua competência, assegurar que as normas estão sendo cumpridas e que prossionais habilitados estão à frente do gerenciamento e da execução da obra.
1.4 Denições A Lei nº 8.666/93 não dene de forma precisa o conceito de obra pública. Em seu art. 6º, I, apenas relaciona de forma exaustiva quais atividades podem ser caracterizadas como tal: “toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação, realizada por execução direta ou indireta”. No caso de serviços , a denição legal inserida no inciso II também indica diversas atividades, porém de forma apenas exemplicativa: demolição, conserto, instalação, montagem, operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção, transporte, locação de bens, publicidade, seguro ou trabalhos técnico-prossionais. Da avaliação das atividades listadas, parece que o legislador procurou denir serviços como aquelas atividades em que há predomínio do emprego de mão de obra em relação ao de material e, no caso de obra, o contrário. Claro que a responsabilidade pela execução de obras e serviços técnicos correlatos é privativa de engenheiro ou arquiteto, consoante estabelecem a Lei nº 5.194/66, a Resolução nº 1.048/2013 do Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura (Confea), a Lei nº 12.378/10 e a Resolução nº 51/13 do Conselho de Arquitetura e Urbanismo.
INTRODUÇÃO
O TCU refere-se a essa linha: 43. Convém que se tenha em mente, desde logo, que o objeto licitado no Pregão nº [...] refere-se a serviços de engenharia, segundo a conceituação doutrinária que assim classica
as atividades do ramo nas quais o emprego de mão-de-obra e equipamentos prepondera sobre a aplicação técnica. (TCU. Acórdão nº 2.079/07, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 05 out. 2007)
Outra interessante diretriz para a distinção em comento é apresentada por Lucas Rocha Furtado: O critério usualmente adotado para distinguir esses dois contratos (obras e serviços) é o da vericação da tangibilidade, da materialidade de seu objeto. Será obra o contrato que crie nova materialidade, o mesmo não sendo vericado nos serviços. Assim, no caso
de um edifício que necessite de “reforma”, como será criado novo aspecto material, será licitada e contratada a execução de obra. Ao contrário, na conservação (serviço), não será criado nenhum aspecto material visualmente novo. 3
Até 2001, a diferenciação precisa entre obras e serviços de engenharia não apresentava importância signicativa, visto que a lei de licitações tratava com as mesmas
diretrizes os dois processos de contratação. A questão começou a ganhar relevância com o advento do pregão e a evolução da jurisprudência, no sentido de aceitar a utilização desta modalidade para contratação de serviços de engenharia comuns, conforme será abordado adiante, no Capítulo 7, seção 7.4.1.
1.5 Leitura e consulta complementares A presente publicação não pretende esgotar todos os temas relacionados à contratação de obras públicas, até mesmo pela amplitude das matérias que devem ser tratadas. Existem diversas fontes disponíveis na internet, gratuitas, que podem complementar as informações aqui trazidas, entre as quais: a) sítio do Tribunal de Contas da União ;
a.1) Licitações & Contratos – Orientações Básicas (link: Publicações): orientações básicas para a realização das diversas modalidades de licitação, inclusive com roteiro de procedimentos a serem adotados; a.2) Obras Públicas – Recomendações Básicas para a Contratação e Fiscalização de Obras de Edicações Públicas (link: Publicações): orientação a órgãos
e entidades públicos, em linguagem de fácil entendimento; a.3) Cartilha de Licenciamento Ambiental: relação da legislação ambiental aplicável e principais procedimentos referentes ao processo de licenciamento; a.4) Convênios e outros repasses: orientações quanto à regulamentação, aos procedimentos, e às regras para obtenção, aplicação e controle dos recursos públicos federais transferidos por meio desses instrumentos;
FURTADO. Curso de licitações e contratos administrativos , p. 642.
3
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
a.5) Jurisprudência do Tribunal de Contas da União (link: Normas e Jurisprudência): íntegra de todos os acórdãos e decisões proferidos, inclusive os que serão citados na presente publicação; a.6) Informativo de Licitações e Contratos: boletim eletrônico que traz as novidades afetas a deliberações semanais do Plenário e das Câmaras para os interessados que se cadastrarem no sítio; a.7) Orientações para elaboração de planilhas orçamentárias de obras públicas: documento que apresenta as principais novidades afetas a metodologia e deliberações do TCU para preparar o orçamento base de obras e serviços de engenharia; b) sítio do Governo Federal (link: Publicações
– Manuais); b.1) Manual de Obras Públicas – Edicações – Práticas da SEAP – Projeto:
diretrizes para a elaboração e contratação de projetos de construção ou reforma de edicações; b.2) Manual de Obras Públicas – Edicações – Práticas da SEAP – Construção: linhas detalhadas para a execução, reforma ou ampliação de edicações; b.3) Manual de Obras Públicas – Edicações – Práticas da SEAP – Manutenção:
diretrizes para a execução de serviços de conservação e manutenção de edicações; c) sítios da Presidência da República ou do Senado Federal : íntegra de toda a legislação federal,
inclusive com as devidas alterações;
d) sítio da Câmara dos Deputados : informações a
respeito da elaboração do PPA, LDO e LOA, assim como sobre a execução das dotações orçamentárias aprovadas; e) sítio do Superior Tribunal de Justiça (STJ) : juris-
prudência relativa à interpretação de lei federal, em especial a Lei nº 8.666/93; f) sítio da Fundação Getulio Vargas : indicadores
econômicos; g) sítio do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes
www.dnit.gov.br>: manuais referentes à execução de serviços, tabela de custos rodoviários – Sistema Sicro, e relação de normas atinentes à área rodoviária; h) sítio do Ministério do Meio Ambiente : legislação
ambiental;
i) sítio da Caixa Econômica Federal (CEF) :
i.1) informações sobre o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), evolução de índices econômicos, cartilhas e manuais técnicos de engenharia, e informações referentes a acompanhamento de obras operacionalizado pela CEF; i.2) Sinapi – Manual de Metodologias e Conceitos: reúne em uma publicação
as metodologias e conceitos gerais utilizados para a construção do sistema de referência de preços e custos da CEF;
j) sítio do Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura : normativos (leis e resoluções) referentes ao exercício prossional de
engenharia;
INTRODUÇÃO
k) sítio do Conselho de Arquitetura e Urbanismo : normativos referentes ao exercício prossional da arquitetura; l) sítio da Associação Brasileira de Normas Técnicas :
relação de normas técnicas aplicáveis a projetos e obras de engenharia.
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CAPÍTULO 2
LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
Sumário : 2.1 Considerações
iniciais – 2.2 Constituição Federal – 2.3 Lei de licitações (Lei nº 8.666/93) – 2.3.1 Aplicabilidade e objetivo – 2.3.2 Exceções – 2.3.3 Pontos positivos e necessidade de aprimoramento – 2.4 Plano Plurianual (PPA) – 2.5 Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) – 2.6 Lei Orçamentária Anual (LOA) – 2.7 Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – 2.8 Lei do Pregão – 2.9 Leis e resoluções relativas à profssão de engenheiro e arquiteto – 2.10 Lei das micro e pequenas empresas – 2.11 Regime Diferenciado de Contratações Públicas (Lei nº 12.462/2011 e Decretos nº 7.581/2011 e nº 8.080/2013) – 2.12 Decreto nº 7.983/2013 – 2.13 Decreto nº 6.170/2007 e Instrução Normativa (IN) nº 01/97 – STN – 2.14 Instrução Normativa nº 2/2008 – SLTI/MPOG e Instrução Normativa nº 1/2010 – SLTI/MPOG – 2.15 Resoluções Conama – 2.16 Súmulas e decisões dos tribunais superiores
2.1 Considerações iniciais Os dispositivos legais que norteiam o processo licitatório para a contratação de obra pública não se restringem à Lei nº 8.666/93. Os responsáveis pela condução desse tipo de processo devem ter conhecimento de todo o conjunto normativo que estabelece diretrizes relativas a procedimentos, preços, responsabilidade e estudos técnicos. O presente capítulo fará um resumo das normas aplicáveis à licitação e contratação de obras, ilustrado pela FIGURA 2.a, com destaque para as questões tratadas por cada uma delas. A visão sistêmica da legislação aplicável facilitará a compreensão dos próximos capítulos, quando serão apresentadas as etapas a serem observadas para a contratação e a conexão da legislação com os aspectos técnicos da área de engenharia relacionados ao orçamento e ao planejamento de obras.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
FIGURA 2.a - Conjunto normativo aplicado à licitação e contratação de obra pública
2.2 Constituição Federal A Constituição Federal estabelece em seu art. 37 que todas as ações da Administração Pública direta e indireta de quaisquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios deverão obedecer aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e efciência. Nesse diapasão, complementa, no inciso XXI, que a regra para a contratação de obras, serviços, compras e alienações é a “licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualifcação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”. A Carta Magna defne, ainda, no art. 22, XXVII, que é competência privativa da União estabelecer “normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, §1º, III”. Observados os ditames constitucionais, foi sancionada a Lei nº 8.666/93, que “estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios” (art. 1º).
2.3 Lei de licitações (Lei nº 8.666/93) 2.3.1 Aplicabilidade e objetivo A lei de licitações se aplica a todos os órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de
CAPÍTULO 2 LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Marçal Justen Filho destaca que “a disciplina da Lei nº 8.666/93 vincula os Três Poderes das entidades políticas. A expressão ‘Administração’, utilizada de modo generalizado, não deve ser interpretada como ‘Poder Executivo’”. 4
Vale ressaltar que a lei de licitações dene procedimentos, alguns com elevado
grau de detalhamento, que ultrapassam o caráter de norma geral estabelecido pela Constituição Federal. Por esse motivo, o referido autor sustenta que “apenas as normas ‘gerais’ são de obrigatória observância para as demais esferas de governo, que cam
liberadas para regular diversamente o restante, exercendo competência legislativa irredutível para dispor acerca de normas especícas”.
5
É, sem dúvida alguma, o principal normativo afeto à licitação e contratação do setor público. Trata da absoluta maioria das questões referentes aos procedimentos e diretrizes que devem ser observados pelos gestores, desde a concepção até o recebimento denitivo do objeto.
O art. 3º do normativo em comento registrava, até 2010, que o principal objetivo da licitação era garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa para a administração. A partir de dezembro de 2010, a Lei nº 12.349 promoveu um ajuste do referido artigo e acrescentou a necessidade de que os processos de contratação se preocupem também com a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, sendo possível o estabelecimento de margem de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras. Cabe registrar que algumas unidades da Federação aprovaram legislação própria que trata do tema de licitações e contratos administrativos, como, por exemplo, o Estado da Bahia (Lei nº 9.433/2005). Essas leis podem regular normas especícas apenas,
que devem estar em consonância com aquelas de caráter geral estabelecidas pela Lei nº 8.666/93.
2.3.2 Exceções A análise do parágrafo único do art. 1º da lei de licitações deve ser feita com certa cautela. Os tribunais têm se manifestado pela restrição da aplicação do dispositivo em alguns casos. O art. 173, §1º, da Constituição Federal, preceitua que “lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: [...] III - licitação e contratação de obras, serviços, compras
e alienações, observados os princípios da administração pública”. Apesar de não haver proposta concreta para a materialização de dispositivo previsto no referido artigo, o TCU tem exibilizado seu entendimento em relação
a estatais quanto à necessidade do uso irrestrito dos comandos inseridos na lei de 4 5
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 20. JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 17.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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licitações, e aceitado a possibilidade de a empresa valer-se da inexigibilidade de licitação para a contratação de serviços que constituam sua atividade-m. Entretanto,
“sempre que a realização de licitação não trouxer prejuízos à consecução dos objetivos da entidade, por não afetar a agilidade requerida para sua atuação eciente no mercado
concorrencial, remanesce a obrigatoriedade da licitação” (TCU. Acórdão nº 624/03, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 13 jun. 2003). No caso especíco da Petrobras, o art. 67 da Lei nº 9.478/97 estabelece que os
contratos celebrados pela estatal “para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplicado, a ser denido em decreto do Presidente da
República”. Para tanto, foi aprovado o Decreto nº 2.745/98. O TCU, ao avaliar questão relativa à constitucionalidade do referido Decreto, resolveu:
8.1. determinar à Petrobras que se abstenha de aplicar às suas licitações e contratos o Decreto 2.745/98 e o artigo 67 da Lei 9.478/97, em razão de sua inconstitucionalidade, e observe os ditames da Lei 8.666/93 e o seu anterior regulamento próprio, até a edição da lei de que trata o §1º do artigo 173 da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional 19/98; 8.2. aceitar como legítimos os procedimentos praticados, no âmbito da Petrobrás, com arrimo nas referidas normas, ante a presunção de legalidade então operante; 8.3. dar ciência à Petrobras do entendimento consignado no item 8.1 retro, alertando-a de que os atos doravante praticados com base nos referidos dispositivos serão considerados como irregulares por esta Corte e implicarão na responsabilização pessoal dos agentes que lhes derem causa, devendo a entidade valer-se, na realização de suas licitações e celebração de seus contratos, das prescrições contidas na Lei nº 8.666/93. (TCU. Decisão nº 663/02, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 08 jul. 2003)
Na mesma linha, a Corte de Contas manteve seu entendimento em diversos outros casos, como por exemplo, em decisão para que a Petrobras, com base na lei de licitações: 9.2.1. justique, de modo circunstanciado, a aplicação das sanções previstas no art. 87 da
Lei nº 8.666/93, garantindo prévia defesa da contratada e mantendo no respectivo processo administrativo os documentos que evidenciem tais procedimentos; 9.2.2. obedeça ao estabelecido nos arts. 22 e 23 da Lei nº 8.666/93 no que se refere às modalidades de licitação e seus respectivos limites, tendo em vista o valor estimado da contratação. (TCU. Acórdão nº 1.498/04. Órgão julgador: Plenário. Relator: Ministro Ubiratan Aguiar. Brasília, 29 set. 2004. DOU , 08 out. 2004) 6
Entretanto, foi suspensa a ecácia da aludida decisão pelo Supremo Tribunal
Federal que, ao avaliar mandado de segurança contra o Acórdão TCU nº 39/06, Plenário, em sede de medida cautelar, assim se posicionou: A hipótese prevista no art. 177, §1º, da CRFB/88, que relativizou o monopólio do petróleo, remete à lei a disciplina dessa forma especial de contratação. A Lei nº 9.478/97, portanto, disciplina a matéria. Em seu artigo 67, deixa explícito que “os contratos celebrados pela
6
O conteúdo deste acórdão foi mantido por meio dos acórdãos TCU nº 1.767/05, Plenário (DOU , 22 nov. 2005), e nº 39/06, Plenário (DOU , 1º fev. 2006).
CAPÍTULO 2 LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
Petrobras, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplicado, a ser denido em decreto do Presidente da República”. A matéria está
regulamentada pelo Decreto nº 2.745, de 1998, o qual aprova o regulamento licitatório simplicado da Petrobras. A submissão legal da Petrobras a um regime diferenciado de licitação parece estar justicado pelo fato de que, com a relativização do monopólio
do petróleo trazida pela EC nº 9/95, a empresa passou a exercer a atividade econômica de exploração do petróleo em regime de livre competição com as empresas privadas concessionárias da atividade, as quais, frise-se, não estão submetidas às regras rígidas de licitação e contratação da Lei nº 8.666/93. Lembre-se, nesse sentido, que a livre concorrência pressupõe a igualdade de condições entre os concorrentes. Assim, a declaração de inconstitucionalidade, pelo Tribunal de Contas da União, do art. 67 da Lei nº 9.478/97, e do Decreto nº 2.745/98, obrigando a Petrobras, conseqüentemente, a cumprir as exigências da Lei nº 8.666/93, parece estar em confronto com normas constitucionais, mormente as que traduzem o princípio da legalidade, as que delimitam as competências do TCU (art. 71), assim como aquelas que conformam o regime de exploração da atividade econômica do petróleo (art. 177). [...] Tais fatores estão a indicar a necessidade da suspensão cautelar da decisão proferida pelo TCU, até o julgamento nal deste mandado de segurança. Ante o exposto, dero o pedido de medida liminar, para suspender os efeitos
da decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União (Acórdão nº 39/2006) no processo TC nº 008.210/2004-7 (Relatório de Auditoria). (STF. MS nº 25.888-MC/DF. Rel. Min. Gilmar Mendes. DJ , 29 mar. 2006)
Vale destacar que o TCU, mesmo com a interposição de pedido de reexame pela Petrobras contra a Decisão nº 663/2002 - Plenário, manteve o entendimento de que: 1. O TCU possui competência para declarar, em concreto, a inconstitucionalidade de atos normativos e demais atos do poder público. 2. A Petrobras está sujeita, até o advento da lei a que se refere o art. 173, § 1º, inciso I da Constituição Federal, à Lei nº 8.666/1993, em face da inconstitucionalidade do Decreto nº 2.745/1998. (TCU. Decisão nº 560/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 26 mar. 2010)
Aliás, o entendimento por parte do TCU em relação à inconstitucionalidade dos referidos dispositivos não se alterou a respeito da matéria: 9.3. reiterar o entendimento deste Tribunal no sentido de que até que seja regulamentado o art. 173, §1º, da Constituição Federal de 1988, aplica-se à Petrobras a Lei nº 8.666/1993; 9.4. reiterar o entendimento deste Tribunal quanto à inconstitucionalidade do art. 67 da Lei nº 9.478/1997 e do Decreto nº 2.745/1998, consoante pacíca jurisprudência desta
Corte. (TCU. Acórdão nº 2.811/2012, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 26 out. 2012)
Além da discussão relativa à Petrobras, vale destacar a situação das entidades do “sistema S” (SESI, SENAI, SENAC etc.). O TCU entendeu, “por não estarem incluídos na lista de entidades enumeradas no parágrafo único do art. 1º da Lei nº 8.666/93, que os serviços sociais autônomos não estão sujeitos à observância dos estritos procedimentos da Lei nº 8.666/93, e sim aos seus regulamentos próprios devidamente publicados” (TCU. Decisão nº 907/97, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. DOU , 26 dez. 1997), que deverão estar em consonância com os princípios estabelecido no art. 37 da Constituição Federal.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
2.3.3 Pontos positivos e necessidade de aprimoramento Apesar de algumas críticas dirigidas à lei de licitações, é inegável que diversas boas práticas estão assentes nesse normativo, como, por exemplo, a necessidade de projeto básico e a precisa denição do objeto a ser licitado, a exigência de orçamento referencial da Administração detalhado em planilhas, a regra do parcelamento para contratação e a obrigatoriedade de critérios de aceitabilidade de preço unitário e global na avaliação das propostas. Considerando que essas boas práticas estão em absoluta consonância com o princípio da eciência, é recomendável que sejam utilizadas em qualquer processo de contratação, público ou privado, até mesmo porque garantem a conabilidade de execução do empreendimento. Por esse motivo, mesmo para os gestores de órgãos e entidades que não estão obrigados a seguir o estrito teor da Lei nº 8.666/93, vale a maioria das recomendações presentes nesta publicação. Não obstante, inegável que alguns ajustes em aspectos formais estabelecidos pela lei em comento poderão ser feitos para o aprimoramento do processo de contratação. Como exemplo, pode-se citar a inversão das fases de habilitação e avaliação das propostas. Atualmente, são analisados os requisitos de habilitação de todos os concorrentes em primeiro lugar para, somente após, serem estudadas as propostas de preços. Procedimento mais célere, a exemplo do que se faz com o pregão e o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), seria vericar de plano os preços apresentados e concentrar a análise na habilitação apenas do primeiro colocado. O Congresso Nacional vem avaliando as medidas necessárias para o aprimoramento da Lei nº 8.666/93, porém, em ritmo lento. Vale lembrar que, em 21 de junho de 2013, a referida lei completou 20 anos de existência. Diversas são as iniciativas pensadas, como o Projeto de Lei da Câmara (PL) nº 32, de 2007 (nº 7.709, de 2007, no Senado Federal) — que, em novembro de 2008, encontrava-se aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos, aguardando apreciação pelo Plenário — e o PL Câmara nº 5.970/2013, recentemente apresentado, apensado ao PL nº 1.292/2005. No Senado, ao nal de 2013, também foi aprovado por comissão temporária criada para tratar do assunto um novo texto. A Relatora, Senadora Katia Abreu, resume as linhas gerais da proposta em seu parecer: Em relação ao projeto ora oferecido, é importante salientar que o seu exame forçou considerações que ultrapassaram os limites da Lei nº 8.666, de 1993. Nesse sentido, o projeto pretende substituir não apenas a Lei nº 8.666, de 1993, mas também a Lei nº 10.520/2002, que instituiu o pregão, e a Lei nº 12.462/2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC). Pelas suas características muito especícas, não pretendeu, entretanto, adentrar no mérito das questões atinentes às Concessões, moldadas pela Lei nº 8.987, de 1995, às Parcerias Público-Privadas, ditadas pela Lei nº 11.079, de 2004, e nem mesmo às licitações de publicidade e de produtos de defesa, reguladas pela Lei nº 12.232, de 2010, e pela Lei nº 12.598, 2012, respectivamente. Reconhecidos os êxitos da legislação vigente, não faria sentido a simples substituição de suas cláusulas por regramento inteiramente novo. Por isso, em grande medida, o projeto pode ser entendido como uma proposta de compilação dos diplomas legais citados, acrescida de inovações.
CAPÍTULO 2 LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
Aliás, o RDC (Lei nº 12.462/11), concebido inicialmente para a Copa do Mundo e Olimpíadas, acabou por aprovar rapidamente as novas diretrizes para licitações de vários outros grupos de obras. A situação é interessante: ao invés de um novo texto legal que regulamente a matéria, o legislador vem optando por ampliar os objetos que podem ser contratados com base no RDC.
2.4 Plano Plurianual (PPA) Consoante o art. 165, §1º, da Constituição Federal, o Plano Plurianual, aprovado por lei de iniciativa do Poder Executivo, tem como nalidade estabelecer “de forma
regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada”. A lei, com periodicidade quadrienal, procura normatizar o planejamento de médio prazo das ações do Governo, visto que cabe ao Estado exercer as funções de scalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. Nenhuma obra poderá ser iniciada caso o produto esperado não estiver contemplado nas metas estabelecidas no Plano Plurianual (art. 7º, §2º, IV, Lei nº 8.666/93). 7
2.5 Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) Nos termos do art. 165, §2º, da Constituição Federal, a “Lei de Diretrizes Orçamentárias compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o exercício nanceiro subseqüente, orientará a
elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências nanceiras ociais de fomento”.
O projeto de lei de diretrizes orçamentárias da União é submetido anualmente ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo e tem previsão para aprovação até a data de 30 de junho, caso contrário, a sessão legislativa será interrompida apenas após a sua aprovação. Nos últimos anos, as LDOs tinham apresentado diversos comandos para a execução de obras públicas patrocinadas com recursos federais, como, por exemplo: - Regras para cadastramento de contratos e convênios — recursos federais — no Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais (Siasg); - Critérios de aceitabilidade de custos unitários de obras e serviços; 8
9
- Conceito de indício de irregularidade grave que justica a paralisação do uxo
de recursos orçamentários; - Metodologia de controle externo desenvolvida pelo Congresso Nacional e Tribunal de Contas da União para a scalização de obras públicas; 7 8 9
Ver art. 174 da Constituição Federal. Ver art. 57, §2º, da Constituição Federal. Diante da periodicidade anual da LDO, consultar a lei especíca válida para cada exercício. Para 2015, a LDO é
a Lei nº 13.080/2015.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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- Denição de procedimentos para bloqueio e desbloqueio de dotações orçamentárias relativas a empreendimentos que apresentam indícios de irregularidades graves. Entretanto, conforme será detalhado no item 7.2.3.1 deste livro, o texto aprovado pelo Congresso Nacional para a LDO de 2015 (Lei nº 13.080/15) abordou a questão afeta a custos de obras públicas de forma resumida em relação às leis afetas aos exercícios anteriores e acabou sendo vetado na integralidade pela Presidente da República por ocasião da sanção, com base nos seguintes argumentos: Os critérios para a elaboração do orçamento de referência de obras e serviços de engenharia transcendem um exercício nanceiro e por isso já estão disciplinados pelo Decreto nº 7.983, de 08 de abril de 2013, que assegura a necessária segurança jurídica sobre as regras a serem aplicadas. Além disso, a redação proposta não contempla especicidades previstas no Decreto, como as regras para empreitada a preço global e o Regime Diferenciado de Contratação – RDC, podendo gerar insegurança jurídica.
Tendo em vista que cada ente político aprova sua lei de diretrizes orçamentárias anual, as obras nanciadas apenas com recursos estaduais ou municipais seguem os comandos contidos nas leis aprovadas no âmbito de cada ente.
2.6 Lei Orçamentária Anual (LOA) A Lei Orçamentária Anual tem como nalidade aprovar a previsão da receita e a xação da despesa relativas a cada exercício nanceiro. Nos termos do art. 165, §5º, da Constituição Federal, compreenderá: I - o orçamento scal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público; II - o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto; III - o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público. Os orçamentos previstos nos incisos I e II deverão estar compatibilizados com o plano plurianual e terão entre suas funções a de reduzir desigualdades inter-regionais, segundo critério populacional. Em suma, investimentos em obras públicas só poderão ser realizados caso contemplados na Lei Orçamentária Anual (art. 7º, §2º, III, Lei nº 8.666/93). Contudo, importante lembrar que a referida lei apenas autoriza o limite da execução da despesa, ou seja, a critério do órgão ou entidade gestor, valores inferiores aos aprovados poderão ser executados. Além disso, o Poder Executivo pode, por meio de decreto, estabelecer contingenciamento para valores aprovados pela Lei Orçamentária, o que limita o valor da execução dos investimentos autorizados. 10
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10 11
Ver art. 165, §8º, da Constituição Federal. Ver art. 165, §7º, da Constituição Federal.
CAPÍTULO 2 LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
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2.7 Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) A Lei Complementar nº 101/2000 (LRF) estabeleceu normas de fnanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fscal. Defniu importante marco ao limitar
despesas governamentais relativas a pessoal e à dívida pública e ainda ao determinar que fossem criadas metas para controlar receitas e despesas. Também exigiu dos gestores públicos a análise sistêmica dos investimentos a ser realizada para horizonte mínimo de três anos, fxando, em seu art. 16, a necessidade
de que a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa seja acompanhada de: “I - estimativa do impacto orçamentário-
fnanceiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes; declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e fnanceira
com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias”. Além disso, no art. 45, a LRF ressalta que os novos projetos só poderão ser propostos após “adequadamente atendidos os em andamento e contempladas as despesas de conservação do patrimônio público, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias”. Segundo Walton Alencar Rodrigues, “a LRF é o mais importante instrumento já criado para estimular e assegurar o planejamento das fnanças públicas, além
de possibilitar a transparência dos registros e facilitar o controle, tanto dos órgãos competentes, quanto pela própria sociedade, em benefício desta e das gerações futuras”.
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2.8 Lei do Pregão A Lei nº 10.520/02, resultante da conversão das medidas provisórias nº 2.026 e nº 2.182 autorizou a implementação de uma nova modalidade de licitação que possibilita maior celeridade no procedimento de contratação para bens e serviços comuns, entendidos como “aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente defnidos pelo edital, por meio de especifcações usuais no mercado”
(art. 1º, parágrafo único). A referida lei traz duas importantes inovações em relação às demais modalidades previstas na Lei nº 8.666/93: a) autoriza a inversão de fases da licitação, ou seja, analisa-se primeiramente as propostas e a habilitação da vencedora é verifcada posteriormente, evitando-se
amplo trabalho de avaliação da habilitação de todas as empresas participantes, bem assim o elevado número de recursos interpostos; b) divide a fase de julgamento em duas etapas: a primeira, com a abertura de todas as propostas e ordenação de acordo com os preços ofertados; e a segunda, na qual os proponentes com propostas superiores têm a possibilidade de ofertar novos valores até que a Administração obtenha o menor preço. Vale destacar a existência de dois tipos de pregão: o presencial e o eletrônico: no primeiro, os licitantes encontram-se fsicamente presentes no momento dos lances,
12
RODRIGUES. Tribunal de Contas da União, Lei de Responsabilidade Fiscal e municípios. Contas da União , p. 16.
Revista do Tribunal de
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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enquanto no último, os lances são ofertados por meio de sistemas via internet. Esses tipos de pregão foram regulamentados pelos decretos federais nº 3.555/00 e nº 5.450/05, respectivamente. Em seu art. 9º, a Lei nº 10.520/02 estabelece que “aplicam-se subsidiariamente, para a modalidade de pregão, as normas da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993”.
2.9 Leis e resoluções relativas à prossão de engenheiro e arquiteto Existem diversas lei relacionadas ao exercício da engenharia e arquitetura, dentre as quais pode-se destacar: - Lei nº 5.194/66 – Regula o exercício das prossões de engenheiro, arquiteto e dá outras providências; - Lei nº 6.496/77 – Institui a Anotação de Responsabilidade Técnica na prestação de serviços de engenharia, de arquitetura e agronomia; - Lei nº 12.378/10 – Regulamenta o exercício da Arquitetura e Urbanismo; cria o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) e os Conselhos de Arquitetura e Urbanismo dos Estados e do Distrito Federal (CAUs). Além da legislação especíca, o Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura (Confea) aprova diversas resoluções com o objetivo de regulamentar matéria de sua competência: - Resolução nº 221/74 – Dispõe sobre o acompanhamento pelo autor ou coautores do projeto de execução da obra respectiva. - Resolução nº 361/91 – Dispõe sobre a conceituação de projeto básico em consultoria de engenharia e arquitetura. - Resolução nº 413/97 – Dispõe sobre o visto em registro de pessoa jurídica. - Resolução nº 1.048/13 – Consolida as áreas de atuação, as atribuições e as atividades prossionais relacionadas nas leis, nos decretos-lei e nos decretos que regulamentam as prossões de nível superior abrangidas pelo Sistema Confea/ Crea. - Resolução nº 1.025/09 – Dispõe sobre a Anotação de Responsabilidade Técnica e o Acervo Técnico Prossional.
2.10 Lei das micro e pequenas empresas A Lei Complementar nº 123/06, alterada pela Lei Complementar nº 139/2011, instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, com o objetivo de denir regras que objetivam beneciar a criação, estruturação e manutenção dessas empresas por meio de condições especiais de tratamento e recolhimento de 13
13
Art. 3º, LC nº 123. Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que: I - no caso da microempresa, aura, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$360.000,00; e II - no caso da empresa de pequeno porte, aura, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$360.000,00 e igual ou inferior a R$3.600.000,00.
CAPÍTULO 2 LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
tributos (simples nacional), além de fornecer vantagens especícas na participação de
procedimentos licitatórios públicos, previstas nos artigos 42 a 49, como, por exemplo: a) exigência de comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de pequeno porte somente para efeito de assinatura do contrato; b) havendo alguma restrição na comprovação da regularidade scal, será asse-
gurado o prazo de dois dias úteis, cujo termo inicial corresponderá ao momento em que o proponente for declarado o vencedor do certame, prorrogável por igual período, a critério da Administração Pública, para a regularização da documentação, pagamento ou parcelamento do débito, e emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa; c) preferência de contratação em casos de empate, assim considerados: situações em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% superiores à proposta mais bem classicada; e,
na modalidade de pregão, o intervalo percentual estabelecido for de até 5% superior ao melhor preço; d) possibilidade de emissão de cédula de crédito microempresarial nas situações em que detenham direitos creditórios decorrentes de empenhos liquidados por órgãos e entidades da União, Estados, Distrito Federal e Município não pagos em até 30 dias contados da data de liquidação; e) viabilidade de, nas contratações públicas da União, dos Estados e dos Municípios, ser concedido tratamento diferenciado e simplicado objetivando
a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal
e regional, a ampliação da eciência das políticas públicas e o incentivo à
inovação tecnológica, desde que previsto e regulamentado na legislação do respectivo ente. Em face de todas essas prerrogativas concedidas, o TCU tem se manifestado pela inabilitação para participar de licitação no âmbito da Administração Pública Federal de 14
licitantes que se beneciem indevidamente da condição de empresa de pequeno porte,
com consequente obtenção de tratamento favorecido nos certames: 7. É preciso ter em vista que a referida lei, por excepcionar os princípios constitucionais e legais da licitação, da isonomia e da livre competição entre as empresas, tem aplicação bastante restrita ao real universo de pequenos empreendimentos que necessitam da proteção do Estado em seus anos iniciais de existência. Incorre, sem dúvida, em falha gravíssima quem tenta se valer de suas disposições excepcionais para obter vantagens sobre seus competidores em licitações públicas. Não por outro motivo, esta Corte de 14
Art. 48 da LC nº 123: “Para o cumprimento do disposto no art. 47 desta Lei Complementar, a administração pública poderá realizar processo licitatório: I - destinado exclusivamente à participação de microempresas e empresas de pequeno porte nas contratações cujo valor seja de até R$80.000,00 (oitenta mil reais); II - em que seja exigida dos licitantes a subcontratação de microempresa ou de empresa de pequeno porte, desde que o percentual máximo do objeto a ser subcontratado não exceda a 30% (trinta por cento) do total licitado; III - em que se estabeleça cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte, em certames para a aquisição de bens e serviços de natureza divisível. §1º O valor licitado por meio do disposto neste artigo não poderá exceder a 25% (vinte e cinco por cento) do total licitado em cada ano civil. §2º Na hipótese do inciso II do caput deste artigo, os empenhos e pagamentos do órgão ou entidade da administração pública poderão ser destinados diretamente às microempresas e empresas de pequeno porte subcontratadas”.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
Contas tem sido severa na punição de empresas agradas em desacordo com o verdadeiro espírito da lei de proteção das EPPs. Apenas para ilustrar, cito os Acórdãos 588/2011, 744/2011, 1.137/2011, 1.439/2011 e 1.589/2011, todos do Plenário, este último proferido em sede de recurso. 8. Por essas razões, o argumento principal da recorrente relativamente ao sigilo scal não
pode ser acolhido, data venia , assim como todos os demais argumentos, a maioria dos quais
já apresentados na fase de julgamento inicial, são também insucientes para alteração da deliberação recorrida. Para essas alegações, considero sucientes as contrarrazões expendidas pela Serur, incorporando-as a este voto como se dele zessem parte.
9. Acrescentaria apenas que, para muitas dessas alegações, especialmente a concernente à falta de razoabilidade e de proporcionalidade da pena de inidoneidade, a relativamente curta pena de inidoneidade aplicada amolda-se à perfeição às circunstâncias do processo e à sua condição de empresa recém-saída da condição de EPP, como, aliás, bem declarou o Sr. Relator a quo, eminente Ministro José Jorge. (TCU. Acórdão nº 1.782/2012, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 13 jul. 2012)
2.11 Regime Diferenciado de Contratações Públicas (Lei nº 12.462/2011 e Decretos nº 7.581/2011 e nº 8.080/2013) O Regime Diferenciado de Contratações (RDC) foi aprovado, inicialmente, para otimizar as licitações e contratos necessários à realização: I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser denida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e
II - da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação – Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014, denidos pelo Grupo Executivo – Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para denir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano
Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 – CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; III - de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e II. (art. 1º, Lei nº 12.462/2011)
Posteriormente, teve sua abrangência ampliada para a contratação das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC (art. 1º, IV, da Lei nº 12.462/2011, incluído pela Lei nº 12.688/2012); das obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS (art. 1º, V, da Lei nº 12.462/2011, incluído pela Lei nº 12.745/2012); das obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino (art. 1º, §3º, da Lei nº 12.462/2011, incluído pela Lei nº 12.722/2012). Recentemente, o legislador aceitou mais três hipóteses de utilização desse regime: a) modernização, construção, ampliação ou reforma de aeródromos públicos (art. 63-A da Lei nº 12.462/2012, incluído pela Lei nº 12.833/2013); b) contratação de todas as ações relacionadas à reforma, modernização, ampliação ou construção de unidades armazenadoras próprias destinadas às atividades de guarda e conservação de produtos agropecuários em ambiente natura pela Companhia Nacional de Abastecimento – CONAB (Lei nº 12.873/2013); e
CAPÍTULO 2 LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
c) obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo (MP nº 630, de 24.12.2013). Traz interessantes inovações que serão apresentadas em detalhes no Capítulo 15 deste livro, como: possibilidade de inversão de fases da licitação com a avaliação de preços antes da análise da habilitação; inserção de novo regime de execução denominado contratação integrada, no qual permite-se a contratação do projeto básico em conjunto com a execução da obra; utilização de forma eletrônica e lances sucessivos de preços por parte dos concorrentes; e manutenção do sigilo do orçamento-base da Administração até o rece bimento das propostas. O Decreto nº 7.581/2011, com ajustes promovidos pelo Decreto nº 8.080/2013, regulamenta diversos comandos do RDC e apresenta com maior nível de detalhe questões afetas a habilitação, avaliação de preços, sistema de registro de preços e catálogo eletrônico de padronização. No nal de 2013, houve a publicação da Medida Provisória nº 630, convertida
em Lei nº 12.980/2014, que promoveu ajustes nos critérios de julgamento da contratação integrada, conforme será explicado no item 15.2.2 deste livro.
2.12 Decreto nº 7.983/2013 O Decreto nº 7.983/2013 estabeleceu regras e critérios a serem observados por órgãos e entidades da administração pública federal para a elaboração do orçamento de referência de obras e serviços de engenharia, contratados e executados com recursos dos orçamentos da União. Nada mais fez do que incorporar os comandos de orçamentação contidos nas sucessivas leis de diretrizes orçamentárias. É uma boa iniciativa no intuito de padronizar a metodologia para elaboração do orçamento de referência para licitações públicas e estabelecer parâmetros para o controle da aplicação dos recursos federais. Com o veto da Presidente da República ao artigo que tratava de orçamentação de obras pela Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2015 (Lei nº 13.080/2015), o Decreto nº 7.983/2013 teve sua importância ampliada por ser o dispositivo regulamentador do tema, sem limites legais.
2.13 Decreto nº 6.170/2007 e Instrução Normativa (IN) nº 01/97 – STN Parcela signicativa de obras executadas por Estados e Municípios tem aporte
de recursos federais. O mecanismo utilizado para a descentralização de recursos é o convênio, denido como o instrumento que disciplina a transferência de recursos
públicos e tenha como partícipe órgão da administração pública federal direta, autárquica ou fundacional, empresa pública ou sociedade de economia mista que estejam gerindo recursos dos orçamentos da União, visando à execução de programas de trabalho, projeto/atividade ou evento de interesse recíproco, em regime de mútua cooperação. Os convênios celebrados até a data de 14.04.2008 devem atender aos comandos da IN nº 01/97 – STN. A partir dessa data, o gerenciamento dos repasses passa a ser regrado pelo Decreto nº 6.170/2007 (com alterações feitas pelos decretos nº 6.329/07,
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nº 6.428/08, nº 6.497/08, nº 7.568/11 e nº 8.180/13) e pela Portaria Interministerial nº 127, de 29.5.2008, dos Ministérios do Planejamento, Orçamento e Gestão, da Fazenda e do Controle e da Transparência. Esses normativos regulamentam os procedimentos a serem observados para a execução dessas obras, desde os requisitos para a celebração do convênio até a prestação de contas. A não observância de seus comandos poderá ensejar a instauração de tomada de contas especial contra os responsáveis a m de que os recursos malversados sejam restituídos aos cofres públicos.
2.14 Instrução Normativa nº 2/2008 – SLTI/MPOG e Instrução Normativa nº 1/2010 – SLTI/MPOG A Instrução Normativa nº 2/2008 da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (IN nº 2 – SLTI) dispõe sobre regras e diretrizes para a contratação de serviços, continuados ou não, por órgãos ou entidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais (SISG). Apesar de não ser obrigatória para toda a Administração Pública, traz interessantes conceitos a serem observados na contratação de serviços, inclusive os de engenharia, como: a) Vedação de atividades que possam gerar vínculo de subordinação dos funcionários de empresas contratadas com a Administração; b) Denições relativas a preço e avaliação das propostas; c) Regras para contratação de serviço de natureza intelectual; d) Preferência de contratação por execução indireta; e) Mensuração de serviços por resultado e não por hora. Já a IN nº 1/2010 – SLTI dispõe sobre os critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Em seu art. 4º, ca estabelecido que “nos termos do art. 12 da Lei nº 8.666, de 1993, as especicações e demais exigências do projeto básico ou executivo, para contratação de obras e serviços de engenharia, devem ser elaborados visando à economia da manutenção e operacionalização da edicação, a redução do consumo de energia e água, bem como a utilização de tecnologias e materiais que reduzam o impacto ambiental”.
2.15 Resoluções Conama A conscientização da sociedade a respeito da importância do desenvolvimento sustentável tem aumentado de forma signicativa nos últimos anos. Toda execução de obra que cause impacto ambiental só pode ser desenvolvida de acordo com os normativos aprovados pelos órgãos ambientais competentes. A Resolução Conama nº 237/97, em seus artigos 4º a 6º, dene as competências do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e dos órgãos estaduais ou municipais ambientais, com fulcro na “predominância do interesse” dos entes federativos.
CAPÍTULO 2 LEIS E NORMATIVOS APLICÁVEIS
Outras questões relevantes são tratadas por resoluções do Conama, como, por exemplo, defnições, responsabilidades, critérios básicos e diretrizes gerais para uso e
implementação da Avaliação de Impacto Ambiental (Resolução nº 01/86) e revisão de procedimentos e critérios utilizados pelo Sistema de Licenciamento Ambiental instituído pela Política Nacional de Meio Ambiente (Resolução nº 237/97).
2.16 Súmulas e decisões dos tribunais superiores Apesar da amplitude e do detalhamento da lei de licitações, bem assim de todo o conjunto normativo já apresentado, existem diversas matérias controversas quando da aplicação da legislação no caso concreto. Por esse motivo, ganham relevância as deliberações do Tribunal de Contas da União, corte administrativa, e do Superior Tri bunal de Justiça, órgão que detém atribuição constitucional para dirimir controvérsias atinentes à interpretação de lei federal, em face da farta jurisprudência existente e do signifcativo universo de casos concretos já tratados. Recentemente, o TCU aprovou um
conjunto de súmulas importantes no trato do tema obras públicas, todas relacionadas no texto desta publicação. A propósito, cabe lembrar que “as Decisões do Tribunal de Contas da União, relativas à aplicação de normas gerais de licitação, sobre as quais cabe privativamente à União legislar, devem ser acatadas pelos administradores dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios” (TCU. Súmula nº 222. DOU , 03 jan. 1995).
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CAPÍTULO 3
ETAPAS DE CONTRATAÇÃO DO EMPREENDIMENTO VISÃO GERAL
Sumário: 3.1 Considerações iniciais – 3.2 Fase preliminar à licitação – 3.3 Fase interna da licitação
– 3.3.1 Projeto básico – 3.3.2 Licenciamento ambiental – 3.3.3 Preparação do edital ou convite – 3.3.4 Projeto executivo – 3.4 Fase externa da licitação – 3.5 Fase contratual – 3.5.1 Assinatura do contrato e ordem de serviço – 3.5.2 Fiscalização da execução da obra – 3.5.3 Recebimento da obra – 3.6 Fase posterior à contratação – 3.7 Considerações fnais
3.1 Considerações iniciais O objetivo deste capítulo é fornecer uma visão sistêmica e resumida das principais etapas que integram a contratação de empreendimento público. Toda percepção a respeito da importância de cada fase de uma obra requer conhecimento básico sobre os custos dos serviços que a compõem. Por esse motivo, após o apanhado geral de que se trata, os capítulos seguintes estarão focados nos principais conceitos de orçamento, para, em seguida, serem aprofundados os temas inerentes a cada uma dessas etapas. A conclusão de uma obra é evento que depende do bom gerenciamento de diversas etapas intermediárias. Por isso, é necessária a participação de profssionais que detenham conhecimento técnico sufciente para a administração de cada uma delas.
A materialização do empreendimento se inicia com estudo de concepção que considere todas as variáveis envolvidas, como a comparação em relação a outras alternativas de investimento, a viabilidade técnica e econômica, as estimativas de custos, os recursos disponíveis e a elaboração de anteprojetos. Apenas com respostas satisfatórias obtidas na fase inicial, deve o empreendedor avançar na realização de estudos mais detalhados, como projeto básico ou executivo, a fim de definir com clareza os parâmetros de contratação da obra. Da mesma forma, somente após a posse de elementos que caracterizem o objeto com precisão, o empreendedor deve buscar a empresa que executará os serviços. A explicação para o cumprimento ordenado dessas etapas é simples. Basicamente se resume ao fato de que quanto menos preciso for o conjunto de informações para se avançar de fase, maior o risco de prejuízos ao proprietário da obra.
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Por exemplo, a ausência de um estudo preliminar que justique a elaboração de projeto básico pode levar à conclusão futura de que a confecção deste não deveria ter sido contratada, por força da inviabilidade econômica e, consequentemente, que todo o valor despendido nesse projeto foi desperdiçado. Na mesma linha, a contratação de uma obra sem projeto básico adequado poderá ocasionar expressivo número de serviços a serem refeitos, além de novos serviços antes não previstos com preços elevados, o que se traduzirá em maiores custos ou dano ao erário. A lógica até aqui apresentada vale para qualquer tipo de empreendimento, público ou privado. A diferença é que para o público, todas as etapas, com as devidas exigências, estão disciplinadas por comandos legais, principalmente a lei de licitações e contratos (Lei nº 8.666/93). O art. 2º da referida lei estabelece como regra para a contratação de obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, a realização de licitação pública. Apenas casos especiais, cujas hipóteses estão previstas na própria lei, constituem exceção à regra. A principal razão desse comando é possibilitar, por meio do princípio constitucional da isonomia, a obtenção de maior número de propostas mediante a ampliação do universo concorrencial e, em consequência, a seleção daquela mais vantajosa para a Administração Pública. Para facilitar a contextualização das etapas da contratação, o processo licitatório costuma ser dividido em duas fases, a interna e a externa. A primeira delas é desenvolvida pela Administração até a publicação do edital ou entrega do convite, enquanto a segunda fase se inicia partir daí e termina com a contratação do empreendimento. Não se deve esquecer, contudo, da fase preliminar em que, como mencionado, são desenvolvidos os estudos que indicam a viabilidade do início da licitação. A fase contratual está compreendida entre a assinatura do contrato e o recebimento denitivo do objeto. Após o recebimento, surge a fase posterior à contratação, não menos importante das demais, na qual devem ser adotados todos os cuidados para que o empreendimento se mantenha nas condições de operação previstas em projeto. Em face dessa divisão, são apresentadas a seguir as principais características de cada fase: preliminar, interna e externa da licitação, contratual, e posterior à contratação, consoante ilustra a FIGURA 3.a.
CAPÍTULO 3 ETAPAS DE CONTRATAÇÃO DO EMPREENDIMENTO – VISÃO GERAL
FIGURA 3.a - Estrutura das fases envolvidas no processo de licitação, contratação e utilização do empreendimento, com referência aos capítulos em que cada matéria será tratada
3.2 Fase preliminar à licitação É comum o pensamento de que o início do empreendimento se dá com a execução do projeto básico. Contudo, essa não é a melhor linha de raciocínio, em face da existência de fases precedentes, conforme esclarece o art. 2º da Resolução nº 361/91 (Confea): “o projeto básico é uma fase perfeitamente denida de um conjunto mais abrangente
de estudos e projetos, precedido por estudos preliminares, anteprojeto, estudos de viabilidade técnica, econômica e avaliação de impacto ambiental, e sucedido pela fase de projeto executivo ou detalhamento”. Também é comum pergunta relativa à utilidade de tantos estudos. A questão primordial está atrelada ao fator custo. Estudos iniciais, apesar de menos precisos, têm custos signicativamente menores que os posteriores; na medida em que etapas
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evoluem, maior é o aporte de capital. Dessa forma, para evitar o desperdício de recursos em fases posteriores, é fundamental que se avalie de antemão a conveniência econômica de cada investimento por meio de estudos preliminares. O primeiro passo para qualquer empreendedor na área de obras é defnir um
programa de necessidades, tendo em mente os recursos disponíveis. É importante que se tenha o universo potencial de obras a serem executadas, acompanhado do benefício esperado e da estimativa de custos para cada projeto. A decisão nessa fase tem forte componente político, visto que estão sendo analisadas alternativas de investimento em setores distintos. O objetivo é que sejam eliminadas alternativas inviáveis sob o aspecto técnico, econômico ou social e priorizados os empreendimentos que melhor se mostrarem oportunos e convenientes. Não pode deixar de ser mencionada a importância de que o plano de investimentos em obras esteja compatível com o Plano Estratégico da Instituição — processo que contempla a formulação de objetivos e programas de ação no médio e longo prazo, com base nas condições internas e externas da organização. A propósito, a Resolução nº 114 – CNJ, que trata do planejamento, execução e monitoramento de obras no Poder Judiciário, estabelece em seu art. 2º que “os tribunais elaborarão o plano de obras a partir de seu programa de necessidades, de seu planejamento estratégico e das diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça” e que cada obra terá indicador de prioridade obtido a partir de sistema de avaliação técnica que contemple a estrutura física do imóvel ocupado e do atendimento às necessidades da atividade jurisdicional. 15
Defnidas as prioridades, será necessário avaliar as opções de concepção e
respectivos estudos de viabilidade do empreendimento para a seleção daquela que melhor atenda ao interesse público. Para cada alternativa, haverá o estabelecimento dos custos médios, prazos de execução e benefícios da implantação. Por vezes, alternativas que importam em maiores investimentos são melhores diante dos benefícios alcançados. Todos os aspectos deverão ser observados: legal, econômico, social e ambiental. Surge, então, o anteprojeto, constituído pela elaboração e representação técnica da solução aprovada. Contempla a concepção da estrutura e instalações em geral e os principais componentes do projeto arquitetônico. Nesta fase, já é possível a melhor defnição do custo estruturado do empreendimento. Importa destacar que, com o
advento do RDC, o anteprojeto poderá ser utilizado como base na licitação da obra quando houver opção pelo regime de contratação integrada, conforme detalhamento a ser feito no Capítulo 15 deste livro.
3.3 Fase interna da licitação Consoante art. 38 da Lei nº 8.666/93, o “procedimento da licitação será iniciado com a abertura de processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e numerado, contendo a autorização respectiva, a indicação sucinta de seu objeto e do recurso próprio para a despesa”, ao qual serão juntados oportunamente diversos documentos previstos nos incisos do mencionado artigo.
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BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 114/2010. Brasília, 20 abr. 2010. DJe , 23 abr. 2010.
CAPÍTULO 3 ETAPAS DE CONTRATAÇÃO DO EMPREENDIMENTO – VISÃO GERAL
A fase interna da licitação compreende todos os atos praticados entre a abertura do processo correspondente e a publicação do edital ou entrega da carta convite, ou seja, elaboração de projeto básico, obtenção de licença ambiental e preparação do edital. Nesta fase serão estabelecidos os requisitos da convocação. Vale lembrar que, por ser procedimento interno, eventuais falhas poderão ser facilmente corrigidas, visto que não há terceiro interessado. Por esse motivo, todos os cuidados deverão ser adotados a m de que sejam evitados problemas futuros.
3.3.1 Projeto básico O projeto básico representa “o conjunto de elementos necessários e sucientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a denição dos métodos e do prazo de execução” (art. 6º, IX, da Lei nº 8.666/93). Sem dúvida, é a peça mais importante para a condução da licitação, tanto que a legislação estabelece como requisito para licitar a existência desse documento. Falhas graves na denição desse projeto trarão enormes diculdades ao gerenciamento das obras sob os aspectos prazo, custo e qualidade. Diversos questionamentos surgem em relação a qual seria o nível de precisão adequado estabelecido pela lei. Excelente parâmetro está no art. 3º, alínea “f”, da Resolução nº 361/91 do Confea, que estabelece como característica de um projeto básico a denição de quantidades e dos custos de serviços e fornecimentos com precisão compatível com o tipo e porte da obra, de tal forma a ensejar a determinação do custo global da obra com precisão de mais ou menos 15%.
3.3.2 Licenciamento ambiental O processo de licenciamento ambiental não é exigido para todos os empreendimentos. Os requisitos estão estabelecidos na Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus ns e mecanismos de formulação e aplicação: Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis [...]. §4º Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA o licenciamento previsto no caput deste artigo, no caso de atividades e obras com signicativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional.
Em face da diretriz legal, percebe-se que as situações em que haverá a necessidade do licenciamento ambiental deverão ser avaliadas diante das peculiaridades do caso
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concreto. De qualquer modo, a Resolução Conama nº 237/97 relaciona, em seu Anexo 1, um grupo de atividades que deverão estar submetidas ao referido processo. Nesse sentido, a qualidade do projeto básico está diretamente relacionada à precisão dos estudos ambientais, bem como ao fato de contemplar todas as medidas mitigadoras exigidas. Por esse motivo, quando for o caso, o edital somente poderá ser publicado após a existência de licença prévia e de projeto básico que atenda a todas as determinações formuladas pelo órgão ambiental competente.
3.3.3 Preparação do edital ou convite Cabe aos representantes da Administração defnir os requisitos que serão inseridos no edital ou convite, os quais não devem contrariar as normas e princípios estabelecidos pela Lei nº 8.666/93. Questões relativas ao projeto básico, preços referenciais, critérios de aceitabilidade de preços, requisitos para habilitação, previsão de recursos orçamentários, forma de execução, modalidade de licitação, dentre outras, devem estar perfeitamente estudadas e justifcadas nos documentos relacionados com a licitação. Alterações após a publicação do edital, via de regra, exigirão ampliação de prazos para que os concorrentes procedam aos ajustes das propostas, o que poderá ocasionar uma série de transtornos, como atrasos e recursos.
3.3.4 Projeto executivo O projeto executivo representa o conjunto dos elementos necessários e sufcientes à execução completa da obra, observadas as normas pertinentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Tem como peculiaridade a possibilidade prevista em lei de ser desenvolvido concomitantemente com a execução das obras e serviços, desde que assim autorizado pela Administração.
3.4 Fase externa da licitação Esta fase se inicia com a publicação do edital e termina com a assinatura do contrato. Com o ingresso de interessados no processo, todos que adquiriram o edital, a Administração deverá estar atenta para o esclarecimento de possíveis questões suscitadas. A detecção de falhas nas diretrizes estabelecidas no instrumento convocatório e a constatação da necessidade de modifcações para as devidas correções exigem que a Administração reabra o prazo inicialmente fxado, consoante art. 21, §4º, da Lei nº 8.666/93, e divulgue as alterações pela mesma forma com que se deu o texto original, exceto quando, inquestionavelmente, essas alterações não afetarem a formulação das propostas. A Comissão de Licitação deverá verifcar, por meio de critérios objetivos, a conformidade das propostas às exigências estabelecidas no edital ou convite. Esse procedimento envolve, habitualmente, dois estágios. No primeiro deles, é estudada a documentação de habilitação dos concorrentes (jurídica, técnica, econômico-fnanceira, fscal, e prova de cumprimento no disposto
CAPÍTULO 3 ETAPAS DE CONTRATAÇÃO DO EMPREENDIMENTO – VISÃO GERAL
no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal). Aqueles que não atenderem aos
comandos xados serão inabilitados. No segundo estágio, restrito àqueles licitantes habilitados, são abertas as pro-
postas e vericados o atendimento aos requisitos do edital e a adequação dos preços fornecidos aos parâmetros do mercado ou xados por órgão ocial competente. As propostas que não estiverem em conformidade com as exigências estabelecidas no
edital serão naturalmente desclassicadas. Em seguida, é realizada a classicação das propostas para posterior deliberação das autoridades competentes quanto à homologação do processo licitatório e adjudicação do objeto licitado. Neste particular, cabe lembrar que a ordem desses estágios dependerá do normativo que está sendo utilizado como base para licitação: a) Lei nº 8.666/93: primeiro a habilitação, depois as propostas de preços; b) Lei nº 10.520/02 (pregão): primeiro as propostas de preços, depois a habilitação; c) Lei nº 12.462/11 (RDC): em regra, primeiro as propostas de preços, depois a
habilitação; porém, mediante justicativa técnica, poderá haver inversão das fases. Com efeito, o TCU já alertou que a sistemática de licitação estabelecida pela Lei nº 8.666/93 impõe — contrariamente à disciplina dos regramentos estabelecidos para as concessões, as parcerias público-privadas, o pregão e o RDC — que o exame das propostas de preços oferecidas pelos licitantes deve ocorrer somente após a etapa de habilitação das empresas:
21. É cediço que nos certames regidos pela Lei n. 8.666/1993 a etapa de vericação dos documentos de habilitação precede a de proposta de preços. 22. Apesar de alguns diplomas legais posteriores à Lei n. 8.666/1993 terem disciplinado, de forma impositiva ou facultativa, a inversão dessas fases, como a Lei n. 8.987/1995 (Concessão de Serviços Públicos), a Lei n. 10.520/2002 (Pregão), a Lei n. 11.079/2004 (Parcerias Público-Privadas) e a Lei n. 12.462/2011 (Regime Diferenciado de Contratação), não há que se baralhar os procedimentos de um e de outro regramento, sob pena de se criar um mecanismo híbrido sem guarida no ordenamento jurídico. 23. A Lei n. 8.666/1993 contempla a sistemática em que a análise das propostas oferecidas
pelos licitantes ca condicionada ao preenchimento das exigências relativas à habilitação. Essa sucessão preordenada de atos instituída pelo legislador deve ser observada, pois a procedimentalização, em matéria de licitação, é pressuposto de validade do certame,
razão pela qual deve ser obedecida a ordem sequencial xada na lei de regência. (TCU.
Acórdão nº 1.415/2013, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 10 jun. 2013)
3.5 Fase contratual 3.5.1 Assinatura do contrato e ordem de serviço Nos termos do art. 54, §1º, da lei de licitações, “os contratos devem estabelecer com clareza e precisão as condições para sua execução, expressas em cláusulas que
denam os direitos, obrigações e responsabilidades das partes, em conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vinculam”. Consoante art. 64 da mesma lei, “a Administração convocará regularmente o interessado para assinar o termo de contrato, aceitar ou retirar o instrumento equivalente,
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dentro do prazo e condições estabelecidos, sob pena de decair o direito à contratação”. Esse prazo poderá ser prorrogado uma vez, por igual período, quando solicitado pela parte, desde que apresente justicativa aceita pela Administração. Caso o convocado não assine o termo de contrato, é facultado à Administração convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classicação, para fazê-lo em igual prazo e nas mesmas condições propostas pelo primeiro classicado, inclusive quanto aos preços atualizados de conformidade com o ato convocatório, ou revogar a licitação.
3.5.2 Fiscalização da execução da obra A lei de licitações estabelece, no art. 67, que “a execução do contrato deverá ser acompanhada e scalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição”. Todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato deverão ser anotadas em registro próprio, assim como as determinações para a correção das falhas ou defeitos observados. O contratado também deve manter representante no local da obra ou serviço para responder pelo empreendimento junto à Administração e assegurar que o responsável técnico indicado à época da licitação acompanhe a execução do empreendimento de forma efetiva. A lei autoriza a substituição deste responsável no decorrer dos trabalhos por “prossionais de experiência equivalente ou superior, desde que aprovada pela administração” (art. 30, §10, da Lei nº 8.666/93).
3.5.3 Recebimento da obra As obras ou serviços são recebidos em duas etapas, consoante art. 73 da Lei nº 8.666/93: a) provisoriamente, pelo responsável por seu acompanhamento e scalização, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes em até 15 (quinze) dias da comunicação escrita do contratado; b) denitivamente, por servidor ou comissão designada pela autoridade competente, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes, após o decurso do prazo de observação, ou vistoria que comprove a adequação do objeto aos termos contratuais, observado o disposto no art. 69 desta Lei. Vale lembrar que o recebimento por parte da Administração não exclui a responsabilidade civil da contratante pela solidez e segurança da obra ou do serviço, nem ético-prossional pela perfeita execução do contrato, dentro dos limites estabelecidos pela lei ou pelo contrato.
3.6 Fase posterior à contratação Não basta a perfeita conclusão do empreendimento para garantir benefício à sociedade. A Administração deverá adotar todas as medidas para que o empreendimento se mantenha nas condições operacionais previstas.
CAPÍTULO 3 ETAPAS DE CONTRATAÇÃO DO EMPREENDIMENTO – VISÃO GERAL
Para tanto, deverá implementar plano sistêmico de intervenções, bem como zelar para que a obra seja utilizada nas condições técnicas denidas em projeto. Pouco adianta, por exemplo, a excelente qualidade na execução de serviços rodoviários, se não houver controle de peso do tráfego.
3.7 Considerações nais Todas as etapas descritas são importantes. Problemas na condução de uma delas podem comprometer signicativamente as subsequentes. A atenção dada às etapas iniciais nem sempre é a mesma relativa à execução da obra e à sua operação. O desenvolvimento de estudos preliminares e projetos de qualidade demandam tempo, recurso e esforço de equipe técnica especializada. Todos os casos em que essa atenção é falha apresentam resultados negativos para a obra. Por esse motivo, os responsáveis pela condução de determinada fase devem vericar se as anteriores foram gerenciadas de forma a propiciar um conjunto de documentos e informações que lhes permitam seguir com segurança em suas atividades. O objetivo dos capítulos seguintes é apresentar os cuidados a serem observados pelos gestores de cada uma das fases descritas, assim como a documentação que deve estar disponível para os responsáveis pelas etapas seguintes.
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CAPÍTULO 4
AVALIAÇÃO DE VALORES PARA CONTRATAÇÃO DE OBRAS
Sumário: 4.1 Importância
da avaliação de custos nos estudos iniciais – 4.2 Avaliação expedita – 4.3 Avaliação expedita em edicações – 4.4 Utilização da NBR 12.721 – ABNT – 4.4.1 Denições importantes da norma – 4.4.2 Custo Unitário Básico (CUB) – 4.5 Estudo de caso – 4.6 Considerações nais
A condução de todo o processo de contratação de obra está intrinsecamente atrelada à avaliação dos valores dos custos para sua consecução. Esses valores podem ser estimados por meio de diversos métodos, cada qual com nível de precisão próprio. Para métodos de melhor precisão, é necessário conjunto de informações mais detalhado e aprofundado trabalho da equipe técnica, o que acarreta maior investimento por parte do empreendedor. Porém, o aporte de maior volume de recursos deve-se dar na medida em que esse empreendedor tenha a convicção da viabilidade da implantação do projeto. Por esse motivo, em fases iniciais de concepção, como programa de necessidades e estudos preliminares, são utilizados métodos simples de estimativa de custos que, apesar de menos precisos, possibilitam visão gerencial para a avaliação da conveniência da continuidade de estudos detalhados. Vale destacar que cada método de avaliação de custo, simples ou detalhado, tem extrema utilidade em fases especícas da condução do processo de contratação. Se
por um lado, as avaliações expeditas, de menor custo, permitem que o gestor analise inicialmente a conveniência do investimento em etapas seguintes ou a inviabilidade da obra, apesar da menor precisão; por outro, estudos detalhados em fases posteriores, e logicamente mais dispendiosos, possibilitam a perfeita caracterização do objeto e de custos que serão denidos no pacto com a empresa vencedora da licitação. A TABELA
4.1 ilustra a argumentação apresentada.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
TABELA 4.1 Precisão de metodologias de avaliação de custo x fase do empreendimento
Fase do empreendimento
Avaliação de custo
Referências
Precisão
Recurso para a avaliação
Inicial
Expedita
Custos por m² ou km
Baixa
Pouco
Intermediária
Resumida
Orçamento estimado dos serviços
Média
Médio
Final
Detalhada
Orçamento detalhado dos serviços
Alta
Elevado
Pela importância do tema, serão apresentadas, neste capítulo e no próximo, formas de avaliação de custos a m de que seja possível ao gestor do empreendimento deter as informações necessárias nos momentos adequados de decisão. O conhecimento desses métodos será de extrema valia quando forem mostrados os principais cuidados a serem adotados nas fases de licitação e contratação.
4.1 Importância da avaliação de custos nos estudos iniciais Avaliações de custos de boa qualidade, acompanhadas de projetos bem conce bidos, permitem ao gestor decisões gerenciais com reduzido risco de problemas em etapas futuras. Em regra, toda decisão relativa a parâmetros técnicos tem como um dos pilares a análise de custos. Diversas são as vantagens que podem ser suscitadas em relação a um perfeito trabalho na área: a) possibilidade de planejamento global das obras no país: é possível denir prioridades em face dos recursos disponíveis e submeter ao Poder Legislativo projeto de lei orçamentária conável; b) redução de obras inacabadas: uma das principais origens das obras inacabadas está em projetos de má qualidade e em avaliações de custos pouco precisas, o que impossibilita processo de planejamento eciente e ocasiona problemas que levam à insuciência de recursos para a conclusão dos empreendimentos; c) análise da viabilidade técnico-econômica da execução do empreendimento: projetos iniciados sem os devidos estudos podem, em face do acréscimo de custos no decorrer das obras, se mostrar inviáveis sob diversos aspectos, o que caracterizará desperdício de recursos públicos; d) denição das melhores alternativas construtivas (especicação de materiais, denição de traçado de rodovias): o momento para a denição de todas as diretrizes em uma obra é o da elaboração do projeto. Qualquer estudo comparativo referente à técnica executiva, traçado de rodovia, local de implantação, ou especicação de materiais deve ser desenvolvido antes da licitação com vistas a evitar signicativos ajustes contratuais;
CAPÍTULO 4 AVALIAÇÃO DE VALORES PARA CONTRATAÇÃO DE OBRAS
e) denição das etapas de implantação de uma obra: caso não haja recursos
para a execução da totalidade do empreendimento, é possível avaliar sua implantação em etapas de forma a disponibilizar parcela da obra à população de forma mais rápida; e
f) redução de termos aditivos: projetos e custos bem denidos evitam diversas
alterações no decorrer da obra que costumam gerar inúmeros transtornos ao gestor, como a necessidade de buscar recursos adicionais e negociar novos preços de serviços não previstos, bem como a possibilidade de não concluir o objeto em face de aditivos superiores aos limites legais.
4.2 Avaliação expedita A maneira mais fácil e rápida de se avaliar valores de execução de obras é por meio de indicadores que reitam custos médios por unidade que caracterizem o
empreendimento, por exemplo:
- obras de edicação: custo por metro quadrado (m²);
- rodovias: custo por quilômetro (km), considerando as características da rodovia (número de faixas, tipo de pavimento, etc.); - obras de geração de energia: custo por kW. Esses indicadores podem ser obtidos em publicações de órgãos públicos ou empresas especializadas (revistas técnicas etc.). Podem, ainda, ser denidos com base
em contratos existentes de obras semelhantes. A forma de cálculo é extremamente simples, ainda que pouco precisa. Basta multiplicar a quantidade de serviço que será executado pelo respectivo indicador. CT = (QT) x (I) CT - Custo Total Estimado QT - Quantidade de unidades relativas à execução da obra I - Indicador do custo por unidade
Porém, são necessários alguns cuidados a m de que sejam reduzidas as chances
de erros: a) o indicador utilizado deve se referir a obra com as mesmas características da que está sendo analisada; b) a data de referência (mês e ano) do custo do indicador deve ser atualizada, caso necessário; c) a região em que será executada a obra deve ser próxima àquela tomada por base na denição do indicador;
d) as parcelas não previstas no indicador (como lucro da empresa ou despesas indiretas) devem ser acrescidas ao custo, a m de que se tenha o preço a ser
contratado. Apesar da simplicidade desse método, e da pouca precisão, é possível a obtenção de um valor referencial importante para os agentes responsáveis por tomada de decisão. O empreendedor, por exemplo, poderá iniciar os estudos atinentes à viabilidade do empreendimento, comparar alternativas, assim como denir a conve-
niência do desenvolvimento de projeto básico; e o auditor avaliará a necessidade de aprofundamento dos estudos para vericar a existência de preços elevados.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
4.3 Avaliação expedita em edicações O indicador mais utilizado para o cálculo de custos de edicações é o Custo Unitário Básico (CUB). Esse indicador tem como origem comando da Lei nº 5.194/64, que estabeleceu, em seu art. 54, a obrigatoriedade de os Sindicatos Estaduais da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) divulgarem mensalmente os custos unitários de construção a serem adotados nas respectivas regiões jurisdicionais, calculados com observância dos critérios estabelecidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). A denição dos lotes básicos de insumos, acompanhados de seus pesos, está na NBR 12.721 – ABNT, que trata da “avaliação de custos unitários e preparo de orçamento de construção para incorporação de edifício em condomínio”. Essa norma, elaborada com base nas diretrizes do art. 53 da mencionada lei, contempla tipos padronizados de edicações, xando: o número de pavimentos e a existência de pavimentos especiais (subsolo, pilotis etc.); o padrão da construção (baixo, normal, alto), tendo em conta as condições de acabamento, a qualidade dos materiais empregados, os equipamentos, o número de elevadores e as inovações de conforto; e as áreas de construção. Todavia, cabe registrar que parcelas de custos relevantes nas obras de edicações não são consideradas na composição do CUB, conforme se pode depreender das observações que acompanham a publicação das tabelas, tais como fundações especiais, elevadores, instalações de incêndio, ar condicionado, despesas com instalação e regulamentação do condomínio, impostos, taxas, projetos, remuneração da construtora e do incorporador, despesas com corretagem e publicidade, entre outros. Por esse motivo, alguns ajustes devem ser feitos a m de aprimorar o referencial. Além do CUB, existem outros indicadores relativos a custos nacionais de obras de edicação, como o Sinapi/CEF-IBGE. Para ilustrar a metodologia, será feita a seguir breve apresentação da estimativa de custo de edicações com base na NBR 12.721.
4.4 Utilização da NBR 12.721 – ABNT 4.4.1 Denições importantes da norma Existem duas questões básicas para a utilização deste método de cálculo: as denições para os parâmetros estabelecidos no cálculo do custo unitário básico pelo Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção Civil) e as descrições para o cômputo das áreas que serão utilizadas. No que tange à primeira, a norma dene os grupos de insumos que deverão ser utilizados e os respectivos pesos por tipo de edicação para o cálculo do CUB. Como exemplo, a TABELA 4.2 ilustra publicação do Sinduscon do Estado de Minas Gerais/MG.
CAPÍTULO 4 AVALIAÇÃO DE VALORES PARA CONTRATAÇÃO DE OBRAS
TABELA 4.2 Publicação do CUB pelo Sinduscon/MG Nº quartos
2
3
Padrão / Pavimento
Baixo
Normal
Alto
Baixo
Normal
Alto
H01
935,57
1.065,40
1.169,16
790,64
892,67
983,98
H04
695,75
810,30
999,38
616,21
711,28
858,20
H08
679,66
793,88
977,17
591,97
689,80
837,92
H12
661,27
779,69
959,73
581,22
680,30
827,44
H16
681,14
803,09
988,50
598,68
700,71
852,24
H20
700,94
826,48
1.017,31
616,11
721,13
877,07
Custos em R$/m² – ref. jul. 2005 As tabelas se referem aos custos unitários básicos de construção (m2), calculadas conforme a Lei nº 4.591 de 16.12.1964 e o disposto na NBR-12.721 – ABNT, com os insumos ajustados nas condições locais para os projetos H16, H20 (residenciais). Na formação destes custos unitários básicos não foram considerados os seguintes itens, que deverão ser levados em conta na determinação dos preços por m2 de construção, de acordo com o estabelecido no projeto e especicações correspondentes a cada caso particular: fundações especiais; elevadores; instalações de incêndio, ar condicionado, calefação, telefone interno, fogões, aquecedores, “playgrounds”, equipamento de garagem etc.; obras complementares de terraplenagem, urbanização, recreação, ajardinamento, ligações de serviços públicos etc.; despesas com instalação, funcionamento e regulamentação do condomínio, além de outros serviços especiais; outras despesas indiretas; impostos e taxas; projeto, incluindo despesas com honorários prossionais e material de desenho, cópias etc.; remuneração da construtora e do incorporador; despesas com corretagem e publicidade, entre outros.
Para a segunda questão, a norma traz denições importantes para utilização da metodologia de cálculo de custos: - Área coberta real – medida da superfície de quaisquer dependências cobertas, nela incluídas as superfícies das projeções das paredes, de pilares e demais elementos construtivos; - Área coberta padrão – área coberta padrão de acabamento semelhante ao do tipo escolhido, dentre os padronizados na Norma, para avaliação do custo global de construção; - Área coberta de padrão diferente – área coberta de padrão de acabamento substancialmente inferior ou superior ao tipo escolhido dentre os padronizados na Norma, para avaliação do custo global da construção; - Área equivalente de construção – área estimada, ctícia, que, ao Custo Unitário Básico denido tenha o mesmo valor que o estimado para a área real correspondente, descoberta ou coberta de padrão diferente. Essa conceituação deve ser utilizada visto que as distintas áreas dentro de uma edicação podem apresentar padrões de acabamento diferentes. Não se poderia, por exemplo, considerar o custo das áreas do pavimento tipo igual ao das áreas da garagem. Nesse contexto, é fundamental que se proceda a ajustes no cômputo das áreas a m de
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que se possa alcançar um custo com melhor precisão. É importante consultar o texto da norma para obter o detalhamento de todos os elementos, bem como os coecientes
médios sugeridos para o cálculo de áreas equivalentes. Por exemplo, se para uma determinada área real coberta de padrão diferente de 100m², for estimado que, em virtude de sensível melhora no padrão de acabamento, o custo unitário efetivo é cerca de 50% maior que o CUB adotado para as áreas cobertas padrão do edifício considerado, deverá ser efetuado o ajuste antes da multiplicação da área total equivalente (Aeq.) pelo CUB da seguinte forma: Aeq. = (100m²) x (1 + fator ajuste) = (100 m²) x (1,50) = 150 m²
4.4.2 Custo Unitário Básico (CUB) Como se pode depreender da análise das observações atinentes à tabela apresentada na seção anterior, existe uma série de elementos que não foram considerados no cálculo do CUB como: fundações especiais; elevadores; instalações especiais (incêndio, ar condicionado, calefação, telefone interno, fogões, aquecedores, “playgrounds”, equipamento de garagem etc.); custos administrativos (ligações de serviços públicos, despesas com instalação, funcionamento e regulamentação do condomínio, outras despesas indiretas, impostos e taxas, projetos); e remuneração da construtora e do incorporador. Dessa forma, o valor do metro quadrado de construção nal do empreendimento,
sem computar o custo do terreno, deve ser ajustado de acordo com a seguinte fórmula:
VF - preço nal por m²
CB - custo unitário básico por m² (Sinduscon) E - custo dos elevadores Dif.F - acréscimo devido às fundações especiais Ie - custo das instalações especiais S - área construída equivalente F - custo nanceiro
A - taxa de administração L - lucro sobre o total investido
4.5 Estudo de caso Determinado incorporador que atua na área de construção de edifícios solicitou a seu departamento técnico uma avaliação expedita sobre o valor de um prédio de apartamentos de alto padrão com 16 pavimentos e apartamentos de dois quartos, em Belo Horizonte, em jul. 2005, levando-se em conta os seguintes aspectos:
CAPÍTULO 4 AVALIAÇÃO DE VALORES PARA CONTRATAÇÃO DE OBRAS
- área total sem garagem: 5.000m² - área de garagem: 1.000m² - acréscimo devido às fundações especiais: R$200.000,00 - instalações especiais: R$300.000,00 - custo nanceiro: 5%
- lucro: 10% - administração: 10% - elevadores: R$400.000,00 - custo garagem: 50% custo padrão Quais os passos que deverão nortear o trabalho do referido departamento? - 1º Passo: Obter o valor do custo do m² (padrão) na tabela referencial com base nas características do edifício: CUB/m² = R$988,50/m² - 2º passo: Cálculo da área equivalente total (Aeqt.) do empreendimento: Aeqt = Atot s/ gar. + 0,50 x Agar Aeqt = 5000 + 1000 x 0,5 = 5.500m² - 3º Passo: Cálculo do valor nal ajustado do metro quadrado (VF):
VF = [988,50 + 163,63] x 1,05 x 1,1 x 1,1 = 1.463,78/m²
- 4º Passo: Cálculo do valor total do empreendimento (VT) VT = 1.463,78 x 5.500 = R$8.050.790,00 Dessa forma, por meio de avaliação expedita, pode-se estimar o custo do empreendimento em valor aproximado de R$8 milhões.
4.6 Considerações nais A utilização de métodos simplicados fornece parâmetros importantes para
que se analise a viabilidade de continuação do empreendimento, seja em relação à contratação de projetos, seja na negociação da compra do terreno. Contudo, vale sempre lembrar que o método não garante excelente precisão.
Serão necessários estudos posteriores para uma denição de melhor qualidade no que
tange ao real valor a ser despendido. Extremo cuidado, com vistas a minorar erros, deve ser adotado na leitura atenta das observações feitas na tabela que acompanha os custos referenciais para que seja
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possível acrescentar valores não computados, bem assim ajustar o preço de referência à data do estudo. Consultas ao projetista, nesta etapa, também podem aprimorar a precisão do valor que será submetido ao empreendedor. Para os demais tipos de obra, como drenagem ou rodovias, a utilização do método é semelhante, bastando que sejam consultadas tabelas referenciais especícas publicadas por órgãos especializados ou referências de contratos de obras similares.
CAPÍTULO 5
ORÇAMENTO
Sumário: 5.1 Principais
conceitos – 5.1.1 Custos – 5.1.1.1 Custo direto (CD) – 5.1.1.2 Custo indireto (CI) – 5.1.1.3 Preço – 5.1.2 Insumos – 5.1.3 Serviços – 5.1.4 BDI (Benefício/Bonicação e Despesas Indiretas) – 5.1.5 Planilha orçamentária – 5.1.6 Cronograma físico-nanceiro – 5.1.7 Curva ABC – 5.1.8 Conceitos do Decreto nº 7.983/2013 – 5.2 Custos – 5.2.1 Custos de insumos – 5.2.1.1 Material – 5.2.1.2 Mão de obra – 5.2.1.3 Desoneração da folha de pagamentos – 5.2.1.4 Equipamentos – 5.2.1.5 Sinapi - 5.2.2 Custo de serviços – 5.2.2.1 Considerações – 5.2.2.2 Exemplo simplicado – 5.2.2.3 Cálculo de custo de serviços – 5.2.3 Obtenção dos custos de insumos ou serviços – 5.3 Preços – 5.3.1 Introdução – 5.3.2 BDI (Benefício/Bonicação e Despesas Indiretas) – 5.4 Reajustamento – 5.5 Estudos de casos – 5.5.1 Caso 1 – Cálculo de custos e quantidade de insumos – 5.5.2 Caso 2 – Cálculo de quantidade de equipamentos para a realização de serviços – 5.5.3 Caso 3 – Avaliação da pertinência de serviços executados
A elaboração de orçamento detalhado produz diversos benefícios: denição do
valor a ser investido, com maior precisão do que a avaliação efetuada de forma expedita; visualização dos serviços a realizar e seus quantitativos; identicação dos insumos que serão aplicados; e futura elaboração do cronograma nanceiro da obra.
O manuseio da peça orçamentária requer do técnico o conhecimento de conceitos
básicos, a m de que sejam evitadas falhas na obtenção dos valores previstos para a
conclusão do empreendimento. Avaliações equivocadas dos parâmetros iniciais podem ensejar transtornos tanto para o contratante, quanto para o contratado, conforme ilustra a TABELA 5.1. TABELA 5.1 Consequências da má avaliação orçamentária do empreendimento Avaliações em relação ao valor de mercado
Para quem deseja contratar
Para quem pretende executar a obra
A maior
Desperdício de recursos
Ausência de competitividade
A menor
Não obtenção de propostas de interessados ou contratação de proposta inexequível
Prejuízo
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Diante desse cenário, não devem ser poupados esforços na fase inicial, na busca de um orçamento que reita com boa precisão o valor de mercado. Para tanto, serão descritas, a seguir, defnições de conceitos básicos e metodologias de cálculo empregadas.
O Capítulo 13 deste livro apresenta as principais planilhas orçamentárias constantes do processo de planejamento de empreendimentos públicos.
5.1 Principais conceitos A correta compreensão dos conceitos relativos a orçamento e de seus impactos nos valores fnais do empreendimento são pressupostos para o efciente gerenciamento
de todo o processo. A FIGURA 5.a ilustra esses conceitos que serão detalhados a seguir. Insumo A Insumo B Insumo C Insumo D
Preço
Custo
s e d a d i t n a u Q
Serviço
Custos Diretos Custos Indiretos Lucro
Preço BDI
FIGURA 5.a - Esquema dos principais conceitos envolvidos em orçamento de obra pública
5.1.1 Custos É a denominação dada ao valor gasto em serviços ou bens na produção de outros serviços ou bens.
5.1.1.1 Custo direto (CD) É a parte do custo do serviço que depende diretamente da quantidade de bens produzidos, ou seja, pode ser facilmente vinculada à execução de determinado bem ou serviço. Por esse motivo, guarda relação proporcional ao quantitativo produzido.
5.1.1.2 Custo indireto (CI) É a parte do custo do serviço que não pode ser associada de forma proporcional às quantidades produzidas.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
5.1.1.3 Preço É a importância paga por um bem ou serviço na sua comercialização. Corresponde à soma dos custos, diretos e indiretos, e do lucro da empresa fornecedora dos serviços.
5.1.2 Insumos São os bens naturais ou intermediários empregados na produção de outros bens econômicos, ou seja, qualquer item utilizado na execução de serviços da obra, denido sempre em função de uma unidade. Dividem-se em três grupos importantes: material, mão de obra e equipamento. Exemplos: areia (m³), cimento (saco ou kg), porta (un), pedreiro (h), ou retroescavadeira (h).
5.1.3 Serviços É qualquer atividade realizada na construção, denida em função da combinação de quantidades de insumos. A TABELA 5.2 apresenta exemplos de serviços e insumos utilizados em sua execução. TABELA 5.2 Exemplo de serviços e insumos utilizados Insumos Serviço
Concreto (m³)
Material
Mão de obra
Equipamento
Areia, pedra, cimento
Pedreiro, servente
Betoneira
Escavação manual (m³) Forma de madeira (m²)
Servente Madeira, prego
Carpinteiro, servente
5.1.4 BDI (Benefício/Bonicação e Despesas Indiretas) Corresponde ao valor das despesas indiretas e do lucro da empresa. É usualmente expresso em forma de percentual e estabelecido como fator multiplicador que, aplicado ao valor total do custo direto, fornece o preço nal da obra. Por sua importância será detalhado na seção 5.3.2 deste capítulo.
5.1.5 Planilha orçamentária É a planilha que relaciona todos os serviços atinentes a obra, acompanhados dos respectivos quantitativos, unidades de execução, preços unitários e preços totais, conforme exemplo na TABELA 5.3.
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TABELA 5.3 Exemplo de planilha orçamentária Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Concreto
m³
250,00
200,00
50.000,00
Escavação manual
m³
400,00
25,00
10.000,00
Forma
m²
800,00
50,00
40.000,00
TOTAL
100.000,00
5.1.6 Cronograma físico-nanceiro É a distribuição da execução dos serviços no período de duração do empreendimento. Pode ser físico, relativo às quantidades de serviços executadas no tempo, ou nanceiro, referente aos valores monetários correspondentes às quantidades desses
serviços executados.
5.1.7 Curva ABC Corresponde à tabela ou gráco que demonstra a participação percentual de cada
componente de custo no valor total da obra. Pode ser elaborada tanto para insumos quanto para serviços. Em geral, qualquer empreendimento apresenta grupo de insumos ou serviços que, embora em menor percentual, representa valor signicativo, conforme ilustra
a TABELA 5.4. Para esses itens, pertencentes ao grupo A, especial atenção deve ser dedicada quando da análise de custos. Por esse motivo, a elaboração da curva é de extrema importância no estudo do orçamento de uma obra, pois permite a visualização clara dos itens relevantes. Contudo, apesar da importância dada ao grupo A, os itens intermediários (grupo B) e os de menor relevância (grupo C) não podem ser desprezados na avaliação da peça orçamentária, visto que poderão existir aditivos futuros a serem celebrados que ocasionem o aumento de seus quantitativos e valores e, consequentemente, alterem suas posições na curva. TABELA 5.4 Curva ABC Grupo
% dos itens de serviços ou insumos
% do custo de serviços ou insumos
A
10
70
B
20
20
C
70
10
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
5.1.8 Conceitos do Decreto nº 7.983/2013 O Decreto nº 7.983/13, que estabelece regras e critérios para elaboração do orçamento de referência de obras e serviços de engenharia, contratados e executados com recursos dos orçamentos da União, traz defnições muito próximas aos conceitos
relacionados nos itens anteriores:
Art. 2º Para os fns deste Decreto, considera-se:
I - custo unitário de referência – valor unitário para execução de uma unidade de medida do serviço previsto no orçamento de referência e obtido com base nos sistemas de referência de custos ou pesquisa de mercado; II - composição de custo unitário – detalhamento do custo unitário do serviço que expresse a descrição, quantidades, produtividades e custos unitários dos materiais, mão de obra e equipamentos necessários à execução de uma unidade de medida; III - custo total de referência do serviço – valor resultante da multiplicação do quantitativo do serviço previsto no orçamento de referência por seu custo unitário de referência; IV - custo global de referência – valor resultante do somatório dos custos totais de referência de todos os serviços necessários à plena execução da obra ou serviço de engenharia; V - benefícios e despesas indiretas (BDI) – valor percentual que incide sobre o custo global de referência para realização da obra ou serviço de engenharia; VI - preço global de referência – valor do custo global de referência acrescido do percentual correspondente ao BDI; VII - valor global do contrato – valor total da remuneração a ser pago pela administração pública ao contratado e previsto no ato de celebração do contrato para realização de obra ou serviço de engenharia; VIII - orçamento de referência – detalhamento do preço global de referência que expressa a descrição, quantidades e custos unitários de todos os serviços, incluídas as respectivas composições de custos unitários, necessários à execução da obra e compatíveis com o projeto que integra o edital de licitação;
5.2 Custos 5.2.1 Custos de insumos Conforme já destacado, existem três grupos de insumos: material, mão de obra e equipamento. Para cada um deles, cuidados deverão ser adotados no momento da cotação de custos em face de peculiaridades próprias.
5.2.1.1 Material A cotação dos valores do primeiro grupo poderá ser realizada por meio de pesquisa a fornecedores (lojas de materiais de construção, indústrias ou produtores), revistas especializadas na publicação de preços do setor de construção ou tabelas referenciais de órgãos públicos. Especial atenção deve ser dada às condições de pagamento, se à vista ou a prazo; bem assim a outros encargos incidentes, como, por exemplo, os custos relativos a transporte (frete) do local de fornecimento até a obra; manuseio, carga e descarga dos materiais; armazenamento; impostos e taxas não inclusos no valor cotado.
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5.2.1.2 Mão de obra O custo da mão de obra de cada região pode ser obtido por meio de pesquisa à convenção coletiva de trabalho celebrada entre o sindicato da indústria de construção civil ou similar e o sindicato dos trabalhadores do setor. Mas é necessário computar, além dos valores pagos aos trabalhadores, os custos relativos aos encargos decorrentes dos dispositivos legais, denominados “encargos sociais” ou “leis sociais”, que contemplam: Previdência Social; Fundo de Garantia por Tempo de Serviço; salário-educação; Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai); Serviço Social da Indústria (Sesi); Serviço de Apoio a Pequena e Média Empresa (Sebrae); seguro contra os acidentes de trabalho (INSS); Serviço Social da Indústria da Construção e do Mobiliário (Seconci); repouso semanal e feriados; auxílio-enfermidade; licença-paternidade; décimo terceiro salário; férias (indenizadas); e aviso prévio. A construção trabalha com duas formas de remuneração de empregados, denidas com base no preço da hora trabalhada ou no pagamento mensal. O cálculo exato dos valores dos encargos para cada uma das formas deve ser efetuado em função da situação concreta, mas é importante destacar que existe uma diferença signicativa entre eles: de 110 a 130% para horistas, e de 60 a 80% para mensalistas, principalmente pelo fato do descanso semanal remunerado (DSR) já estar incluído na remuneração destes.
5.2.1.3 Desoneração da folha de pagamentos A desoneração da folha de pagamento representa medida governamental com o objetivo de promover o crescimento nacional por meio da eliminação da atual contribuição previdenciária sobre a folha de pagamentos e inclusão de nova contribuição sobre a receita bruta das empresas. Com efeito, a contribuição patronal paga pelas empresas, equivalente a 20% de suas folhas salariais, será dispensada em troca de uma alíquota calculada sobre a receita bruta da empresa a ser denida em função da atividade comercial praticada. Todas as demais contribuições incidentes sobre a folha de pagamento permanecerão inalteradas, inclusive a contribuição dos próprios empregados, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, seguro de acidente de trabalho, salário-educação, FGTS e sistema S. Em suma, a desoneração da folha de pagamento importa em elevada renúncia scal porque a alíquota sobre a receita bruta foi xada em um patamar inferior à alíquota neutra, ou seja, aquela que manteria inalterada a arrecadação. De acordo com o governo, os objetivos da política de desoneração da folha são os seguintes: parte importante da Reforma Tributária; redução do custo da mão de obra, sem diminuir os salários e os direitos dos trabalhadores; redução do custo de produção e exportação; redução do preço dos bens e serviços para o consumidor (redução da inação); aumento da competitividade do produto brasileiro; geração de mais empregos; formalização da mão de obra; e expansão maior do PIB. 16
16
Art. 2º, §2º, da Lei nº 12.546/11: “O Poder Executivo poderá xar o percentual de que trata o §1º entre zero e 3% (três por cento), bem como poderá diferenciar o percentual aplicável por setor econômico e tipo de atividade exercida”.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
A previsão inicial da referida desoneração foi trazida pela Lei nº 12.546/11. Posteriormente, a Lei nº 12.844/13 procedeu a inserção de setores complementares no rol beneciado. Atualmente, estão contempladas as seguintes empresas na área de
infraestrutura: - as empresas do setor de construção civil, enquadradas nos grupos 412, 432, 433 e 439 da CNAE 2.0; - as empresas de transporte ferroviário de passageiros, enquadradas nas subclasses 4912-4/01 e 4912-4/02 da CNAE 2.0; - as empresas de transporte metroferroviário de passageiros, enquadradas na subclasse 4912-4/03 da CNAE 2.0; - as empresas de construção de obras de infraestrutura, enquadradas nos grupos 421, 422, 429 e 431 da CNAE 2.0. Mas existem algumas limitações para o uso dessa vantagem, mesmo para as 17
18
atividades beneciadas com a desoneração, em função da data de matrícula da obra no Cadastro Especíco do INSS (CEI), nos termos do art. 7º, § 9ª, da Lei nº 12.546/11
(ajustado pela Lei nº 12.844/13): I - para as obras matriculadas no Cadastro Especíco do INSS – CEI até o dia 31 de março
de 2013, o recolhimento da contribuição previdenciária deverá ocorrer na forma dos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, até o seu término; II - para as obras matriculadas no Cadastro Específico do INSS – CEI no período compreendido entre 1º de abril de 2013 e 31 de maio de 2013, o recolhimento da contribuição previdenciária deverá ocorrer na forma do caput , até o seu término; III - para as obras matriculadas no Cadastro Especíco do INSS – CEI no período
compreendido entre 1º de junho de 2013 até o último dia do terceiro mês subsequente ao da publicação desta Lei, o recolhimento da contribuição previdenciária poderá ocorrer, tanto na forma do caput , como na forma dos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; IV - para as obras matriculadas no Cadastro Especíco do INSS – CEI após o primeiro dia
do quarto mês subsequente ao da publicação desta Lei, o recolhimento da contribuição previdenciária deverá ocorrer na forma do caput , até o seu término; V - no cálculo da contribuição incidente sobre a receita bruta, serão excluídas da base de cálculo, observado o disposto no art. 9º, as receitas provenientes das obras cujo recolhimento da contribuição tenha ocorrido na forma dos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Por sua vez, a Lei nº 13.161, de 31.08.2015, estabeleceu, em seu art. 2º, a seguinte orientação: Art. 2º A contribuição de que trata o caput do art. 7º da Lei nº12.546, de 14 de dezembro de 2011, permanecerá com a alíquota de 2% (dois por cento) até o encerramento das obras referidas: I – no inciso II do § 9ºdo art. 7ºda Lei nº12.546, de 14 de dezembro de 2011; 17
18
CNAE: 412 - Construção de edifícios; 432 - Instalações elétricas, hidráulicas e outras instalações em construções; 433 - Obras de acabamento; 439 - Outros serviços especializados para construção. CNAE: 421 - Construção de rodovias, ferrovias, obras urbanas e obras-de-arte especiais; 422 - Obras de infraestrutura para energia elétrica, telecomunicações, água, esgoto e transporte por dutos; 429 - Construção de outras obras de infraestrutura; 431 - Demolição e preparação do terreno.
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II – no inciso III do § 9º do art. 7º da Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011, nos casos em que houve opção pelo recolhimento da contribuição previdenciária incidente sobre a receita bruta; e III – no inciso IV do § 9º do art. 7º da Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011, matriculadas no Cadastro Especíco do INSS - CEI até o dia anterior à data da vigência do art. 1º desta Lei.
Esses benefícios devem ser considerados quando da elaboração de orçamentos de obras contempladas no programa de desoneração por meio da redução do item “Encargos Sociais”, relativo à contribuição patronal, e do aumento de BDI diante da nova alíquota calculada sobre a receita bruta da empresa. Cabe lembrar que o próprio sistema Sinapi já disponibiliza tabelas distintas para as situações normais ou para casos em que ocorre a desoneração. Com efeito, o TCU já analisou casos que tratam da matéria: Em resumo, consta do relatório de scalização os seguintes indícios de irregularidade: a) sobrepreço decorrente da não consideração da Lei nº 12.844/2013, que alterou o art. 7º da Lei nº 12.546/2011, a reduzir os custos previdenciários das empresas de construção civil nas obras de construção de edifícios; instalações elétricas, hidráulicas e outras instalações em construções; obras de acabamento e outros serviços especializados de construção; [...] No que se refere ao primeiro apontamento, a desoneração dos encargos previdenciários instituída pela Lei nº 12.546/2011 (modicada pela Lei nº 12.844/2013), impacta diretamente e signicativamente nos encargos sociais sobre a mão de obra, aplicável ao objeto da presente contratação. São 20% a menos a serem aplicados sobre os custos de todos os operários. Ao mesmo tempo, como medida compensatória, deve-se incluir 2% sobre o lucro bruto relativo à Contribuição Previdenciária sobre a Renda Bruta (CPRB), a ser incluída diretamente no BDI. No caso concreto, a não consideração dessa novidade em matéria tributária ensejou um sobrepreço em toda a mão de obra do empreendimento. Houve, ainda, sobreavaliações em serviços como fundações, equipamentos, administração local, ponte de embarque e fornecimento de esquadrias (item “b”). Instada a se manifestar sobre o assunto, a Infraero republicou o edital e corrigiu os preços questionados, como também aplicou a dita desoneração estabelecida pela Lei nº 12.546/2011, de modo a expurgar R$6,2 milhões indevidos do orçamento da obra. Um ganho efetivo — no que parabenizo a SecobEdicação — uma vez que o valor adjudicado foi muito próximo da montante estimado pela Administração. (TCU. Acórdão nº 2.293/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 30 ago. 2013)
Interessante caso foi avaliado pelo TCU a respeito de como deve o gestor proceder nas licitações em que houver a necessidade de contratar os serviços referidos pelos artigos 7º e 8º da Lei nº 12.546/2011. Na oportunidade foi questionado qual o valor global estimado da contratação a ser adotado pela Administração: se é o que leva ou aquele que não leva em consideração o regime diferenciado de tributação. O relator da matéria assim se manifestou em seu voto: 5. Ainda segundo o embargante, a adoção de orçamento que não considera os benefícios da Lei 12.546/2011 pode gerar contratações superfaturadas, pois a Administração ca sem parâmetros para julgar se as licitantes repassaram ou não eventuais benefícios advindos da desoneração da folha de pagamento; a opção por orçamento especíco que contemple o regime tributário diferenciado pode ser prejudicial àquelas licitantes não incluídas
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
na mencionada política governamental; e, “neste último caso, é preciso esclarecer qual medida a Administração deve tomar na pouco provável, mas possível, hipótese em que não participem licitantes não incluídas na desoneração”. 6. Por oportuno, esclareço que os serviços a que se referem o embargante são aqueles em que as empresas usufruem do benefício da desoneração da folha salarial, nos termos da Lei nº 12.546/2011. 7. Quanto ao mérito, verico, pelas razões que a seguir passo a expor, que não assiste
razão ao embargante. 8. Em primeiro lugar, o referido Acórdão cuidou adequadamente da matéria, porquanto, na parte dispositiva, apenas orientou os gestores da Câmara de Deputados, ao dar ciência, portanto, sem qualquer efeito cogente, da seguinte impropriedade no pregão em referência: “1.6.1.1.ausência de amparo legal para a adoção de dois orçamentos diferentes, a serem utilizados como critério de aceitabilidade de preços máximos, a depender de a licitante recolher a contribuição previdenciária incidente sobre o valor da receita bruta ou recolher as contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de pagamento, considerando-se, ainda, que o ordenamento legal pátrio prevê o tratamento diferenciado, sem que haja afronta à isonomia, nos termos da Lei 12.546/2011”. 9. Em segundo lugar, não caberia, como não cabe, ao Tribunal dizer ao gestor o como fazer ou o exato modo de proceder nas licitações em que houver necessidade de contratar os serviços referenciados, senão apontar, como o fez, a ausência de amparo legal para determinado procedimento. 10. Em terceiro lugar, parecem-me claros os termos da impropriedade apontada pelo Tribunal e que acima reproduzi, ao dizer da ausência de amparo legal para adoção de dois orçamentos diferenciados no caso em questão, uma vez que a peça instrutiva esclarece os exatos contornos da proposição e que o embargante, conquanto tenha manejado alguns dos itens da instrução técnica, absteve-se de registrar em sua peça recursal, senão vejamos: “43. Quanto à alegação de ser indevida a inclusão de critérios de aceitabilidade distintos no pregão 94/2015, aduz-se razão à representante, ante a ausência de amparo legal para a adoção da medida, considerando-se que o ordenamento legal pátrio permite o tratamento diferenciado entre as empresas e, ainda, tendo em vista que, na prática, tal medida é inócua em função do exposto na presente análise (itens 40 e 41). 44. Todavia, considerando-se que a previsão de diferentes critérios de aceitabilidade de preços máximos não impactará o critério de julgamento do certame (menor preço) e que, apenas na situação improvável de não participação de empresa beneciada pela
Lei 12.546/2011 o preço máximo para empresas que recolhem a contribuição pela folha de pagamentos seria aplicado, considera-se medida suciente dar ciência ao órgão
acerca da impropriedade, não se demonstrando oportuno determinar a anulação do certame pleiteada pela representante”. 11. Em reforço e por esclarecedores, reproduzo, igualmente, o item 39 bem como os supra referenciados itens 40 e 41 da instrução: “39. Tendo em vista que o critério de julgamento do pregão é o menor preço, para que uma determinada empresa se sagre vencedora do pregão deverá ofertar a proposta de menor valor, independentemente do regime de contribuição previdenciária em que se enquadre. 40. Além disso, na hipótese de qualquer empresa beneciada pela desoneração ofertar
proposta válida, necessariamente, toda proposta apta a vencer o certame (seja para licitante desonerada ou não) já se situaria em patamar inferior ao máximo xado para
a Administração para empresas incluídas na Lei 12.546/2011, o que tornaria inócua a dupla previsão. 41. A única possibilidade de aplicação do valor máximo aceitável para empresas que
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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recolhem as contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de pagamento (não desoneradas) ocorreria na hipótese de não participação, na disputa de lances, de qualquer empresa que conte com a desoneração, situação improvável, uma vez que esse grupo inclui a maioria das licitantes, conforme informado pela própria representante”. (TCU. Acórdão nº 6.013/2015, Segunda Câmara. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 31 ago. 2015)
5.2.1.4 Equipamentos Para o cálculo do custo de equipamentos, é importante que se considere, preliminarmente, a existência de três parcelas: a) Custo de propriedade: valor devido à remuneração do capital investido no equipamento durante a sua utilização. Lembrar que, ao nal de determinado tempo de utilização, existe valor residual, isto é, o custo deve ser calculado com base no período de utilização e na perda do valor inicial do equipamento; b) Custo de operação: total do custo de insumos (material e mão de obra) neces19
sários à operação dos equipamentos, como combustível, lubricante, ltros,
pneus, operador e encargos;
c) Custo de manutenção: referente ao custo para manutenção da eciência do
equipamento prevista em projeto. O principal motivo da utilização dessas parcelas é o fato de que os equipamentos trabalham por determinados períodos e cam ociosos parte do tempo, ensejando custos
denominados produtivos e improdutivos, respectivamente. O custo produtivo considera a totalidade dos custos contidos nas três parcelas já descritas. Por sua vez, o improdutivo não considera os custos de manutenção e a maioria dos custos de operação. Essa distinção de custos é de grande valia quando da elaboração de obras de grande porte, visto que os equipamentos trabalham em conjunto, cada qual com tempo de ciclo distinto, o que enseja períodos em que determinadas máquinas cam paradas,
ou seja, com custos menores. Para as obras de pequeno porte, como solução alternativa, é possível considerar os custos horários de locação de equipamento, com os ajustes necessários às peculiaridades do local em que será executado o serviço.
5.2.1.5 Sinapi O Sistema Nacional de Pesquisas de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI) teve início em 1969, pelo BNH - Banco Nacional de Habitação, em parceria com o Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística, o IBGE, sendo adotado pela Caixa
Econômica Federal em 1986. A partir daí, tornou-se um sistema corporativo, utilizado como referência de custos e índices para obras habitacionais no Brasil. Em 2003, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) adota o SINAPI como referência de valores de custos para serviços contratados com recursos do Orçamento Geral da 19
Algumas metodologias consideram como custo de propriedade apenas a depreciação, sendo os juros sobre o capital contemplados em parcela do lucro.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
União. Em 2014, foi retirado da LDO e inserido no Decreto nº 7.983/2013. Para as obras licitadas com base no Regime Diferenciado de Contratação (RDC), a utilização desse sistema tem previsão expressa na Lei nº 12.462/2011. 20
Em 2009, a CEF passa a publicar na internet o Banco Referencial de serviços e custos, tornando-o uma das principais fontes de consulta pública de custos da construção civil.
O Manual de Metodologias e Conceitos do SINAPI, disponibilizado no site da CEF, traz todo o detalhamento do funcionamento da metodologia utilizada para esse sistema: 3.1 Insumos Os insumos do SINAPI compõem o Banco Nacional de Insumos, cujos relatórios de preços são divulgados mensalmente na página da CAIXA para todas as capitais brasileiras. 3.1.1 Responsabilidades Segundo o acordo de cooperação vigente entre IBGE – Instituto Brasileiro de Geograa
e Estatística – e a CAIXA para a gestão do SINAPI, cabe a cada uma das instituições, no que diz respeito aos insumos, as seguintes responsabilidades: 3.1.1.1 CAIXA
Denição e atualização, a partir de critérios de engenharia, das especicações técnicas
dos insumos;
Denição de conjuntos de famílias homogênea com as especicações dos insumos que
as compõem. 3.1.1.2 IBGE Coleta mensal de preços de insumos (materiais, salários, equipamentos e serviços); Coleta extensiva periódica para subsidiar a revisão das famílias homogêneas, a revisão dos coecientes e a formação de novas famílias de insumos.
3.1.2 Coleta de preços Os insumos do SINAPI são organizados em famílias homogêneas (ex: Família de tubos em PVC para esgoto predial), para as quais é selecionado o insumo mais recorrente (ex: 9863 - TUBO PVC SERIE NORMAL - ESGOTO PREDIAL DN 100MM - NBR 5688) como insumo representativo, sendo os demais da mesma família denominados representados. O preço dos insumos representativos é coletado mensalmente, enquanto que os preços dos demais insumos são obtidos por meio da utilização de coecientes de representatividade,
os quais indicam a proporção entre o preço do chefe de família (insumo representativo) e os preços de cada um dos demais insumos da família. Esses coecientes são obtidos nas coletas extensivas, quando são coletados os preços de todos os insumos de determinadas famílias e denida a proporção (correlação) existente
entre eles. Os preços dos insumos representativos na pesquisa mensal são coletados nas 27 capitais do país, em estabelecimentos regulares, para aquisição de uma unidade de comercialização de cada produto, para pagamento à vista, e não incluem frete, exceto se indicado na descrição do insumo. Não contemplam, portanto, diferenças entre preços praticados em capitais e outras regiões da unidade da federação, e efeitos obtidos durante o processo de negociação e compra.
Ver capítulo 15 deste livro.
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A partir dos preços de referência de 11/2014 divulgados na página da CAIXA, o usuário do SINAPI passou a contar com a informação da origem de preços para cada insumo por localidade, sendo necessário observar a seguinte marcação no relatório de insumos: C – para preço coletado pelo IBGE no mês de referência do relatório; CR – para preço obtido por meio do coeciente de representatividade do insumo (metodologia família homogênea de insumos); AS – para preço atribuído com base no preço do insumo para a localidade de São Paulo (devido à impossibilidade de denição de preço para localidade em função da insuciência de dados coletados) Em decorrência da indicação da origem de preço para os insumos, foi necessário também identicar que a composição pode ser formada por insumos com uma ou mais origem de preço, sendo adotada a seguinte marcação no relatório de composições: C – quando todos os itens utilizados na composição têm preço coletado pelo IBGE no mês de referência do relatório; CR – quando existe ao menos um item da composição com preço obtido por meio do coeciente de representatividade do insumo, desde que não haja nenhum item com preço atribuído; AS – quando existe ao menos um item da composição com preço atribuído com base no preço de insumo para a localidade de São Paulo. Os salários são pesquisados junto às construtoras e as categorias prossionais também são divididas em famílias (insumos representativos e representados). Os custos de mão de obra do Sistema reetem mão de obra própria, e não captam regimes de empreitada ou terceirização. Sobre os insumos de mão de obra incidem Encargos Sociais, de forma percentual, com cálculo especíco para cada Estado do Brasil. Desde abril de 2013, a CAIXA divulga relatórios de preços (denominados desonerados) considerando os efeitos da desoneração da folha de pagamentos da construção civil (Lei nº 12.844/2013), ou seja, obtidos com exclusão dos custos com INSS no cálculo do percentual relativo aos encargos sociais, e relatórios com encargos sociais que contemplam os 20% de INSS (denominados não desonerados). A metodologia e memória de cálculo de Encargos Sociais do SINAPI podem ser encontradas no Anexo III deste manual e em versão mais atual no ambiente do SINAPI na página da CAIXA na internet . A metodologia de coleta, bem como do tratamento estatístico empregado para a obtenção do preço dos insumos, é de responsabilidade do IBGE . Cabe ressaltar que o orçamentista, de posse de informações sobre a origem dos preços e metodologia de coleta empregada, deve fazer o ajuste necessário da referência para o caso especíco que quer orçar. Esta condição surge quando as premissas de coleta de preços de insumos do SINAPI são muito diferentes do caso particular do orçamento. Como exemplo cita-se o caso de obras de grande porte, onde a compra de material seja predominante por atacado e/ou diretamente com fornecedores; de obras distantes da capital que tenham preços de insumos locais diferenciados ou que precisam ser transportados de outro centro urbano, com a necessidade de inclusão de frete; o caso de insumo com preço “AS” atribuído e que é muito representativo na curva ABC do orçamento.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
5.2.2 Custo de serviços 5.2.2.1 Considerações A obtenção de custo de serviços de engenharia exige o conhecimento de técnica própria de orçamento, em face de ser necessária a combinação das quantidades e preços de todos os insumos que serão utilizados para a execução desses serviços. A utilização da referida técnica é, em regra, simples. Contudo, a experiência do orçamentista é relevante para o ajuste das condições gerais às condições especícas da
obra, uma vez que cada empreendimento possui características ímpares que devem ser consideradas, como distância aos centros fornecedores de material e mão de obra, forma de acesso (rodovia, hidrovia etc.) e condição climática. O referido ajuste pode transformar a proposta em peça de redução de custos, tornando a empresa competitiva no mercado; ou em peça que superestima custos, excluindo a empresa da competição. Pelo lado da Administração, orçamento referencial superestimado pode acarretar contratação com sobrepreço e, consequentemente, a responsabilização dos agentes envolvidos na contratação; enquanto subestimado pode inviabilizar a contratação ou legitimar validação de proposta inexequível. Por esses motivos, a habilitação e conhecimento dos engenheiros responsáveis pelo projeto e elaboração da peça orçamentária é a chave para o sucesso do empreendimento. A seguir, serão apresentados os passos referentes à metodologia de cálculo de custos de serviços de forma simplicada, com o objetivo de familiarizar os agentes
envolvidos no processo, principalmente os não engenheiros, com a linguagem orçamentária. Esse conhecimento será extremamente importante para o entendimento, nos capítulos subsequentes, das diretrizes legais que disciplinam a licitação e a contratação de obras.
5.2.2.2 Exemplo simplicado O seguinte exemplo hipotético fornecerá subsídios para o entendimento da matéria: determinado empreiteiro foi contratado para a execução de 1.000m² de forma de madeira em uma obra. Sem deter conhecimento detalhado de custos, apesar de bom conhecimento técnico, resolveu apropriar todos os valores gastos com insumos para, ao nal do serviço, apresentar o custo do metro quadrado detalhado do serviço
ao contratante. Foram utilizados os seguintes materiais: 240kg de prego misto; 2.500m de tábua de pinho 3ª (1”x12”); e 3.000m de sarrafo pinho 1”x4”. Trabalharam para a execução desse serviço 10 carpinteiros e 10 serventes durante 25 dias úteis (a jornada diária de trabalho é de 8h). Considerar leis sociais de 125%. Os valores pagos foram: preço da madeira (m³) = R$360,00; prego (kg) = R$1,25; servente (h) = R$1,00; e carpinteiro (h) = R$2,00. Pergunta-se: Qual o valor apropriado para custo total? Quanto custou o m² de forma? Para a resolução deste problema, pode-se subdividir o cálculo dos custos em dois subgrupos em função do tipo de insumo: material e mão de obra. Deve-se ter em mente, também, que a multiplicação do valor do preço pela quantidade de cada insumo tem que ser feita com base na mesma unidade de medida, ou
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seja, será necessário o ajuste das unidades do insumo madeira, visto que o preço está em metro cúbico (m³) e a quantidade em metro linear (ml) (o preço da madeira deve ser multiplicado por 0,025m e 0,3m para que seja transformado em preço por m, assim como o do sarrafo por 0,025m e 0,1m). As TABELAS 5.5 e 5.6 demonstram o detalhamento do cálculo do material e mão de obra empregados, respectivamente. TABELA 5.5 Cálculo do custo do material (MAT) Insumos
Custo (R$)
Prego misto
240kg x (R$1,25)
300,00
Tábua de pinho
2500ml x (R$360 x 0,025 x 0,3)
6.750,00
Sarrafo de pinho
3000ml x (R$360 x 0,025 x 0,1)
2.700,00
TOTAL
9.750,00
TABELA 5.6 Cálculo do custo de mão de obra (MO) e lei sociais (LS) Mão de obra
Custo (R$)
Servente
10 serv x 25d x 8h x R$1,00
2.000,00
Carpinteiro
10 carp x 25d x 8h x R$2,00
4.000,00
Subtotal Leis sociais
6.000,00 125% x R$6.000,00
TOTAL
7.500,00 13.500,00
Com base nos valores obtidos nas tabelas, pode-se calcular o custo do serviço e o custo do m² de forma, da seguinte forma: Custo total = MAT + (MO + LS) = 9.750,00 + (6.000,00 + 7.500,00) = R$23.250,00 V(m²) = 23.250,00 / (1.000m²) = R$23,25/m²
5.2.2.3 Cálculo de custo de serviços A forma de cálculo de custo de serviço exposta no item anterior foi apresentada apenas a título ilustrativo. A técnica orçamentária corrente utiliza procedimentos distintos, até mesmo pela impossibilidade de no início da obra se possuir a apropriação exata dos materiais que serão utilizados. O método usual procura defnir o custo unitário de cada serviço que será realizado com base nos insumos utilizados em sua composição. Para tanto, defne a quantidade de cada insumo empregada na produção de uma unidade do serviço ao qual se
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
busca a denição do custo. O resultado é também denominado “coeciente” a m de evitar confusão com o conceito de quantidade do serviço. Com efeito, o coeciente de
determinado insumo representa o total desse insumo utilizado na execução de uma unidade do correspondente serviço. Para o cálculo do custo total do serviço, multiplica-se o custo unitário pela quantidade a ser executada desse serviço. Por m, para a denição do valor da obra,
somam-se os custos globais de todos os serviços. Com vistas a facilitar o entendimento desses conceitos, é possível traçar um paralelo com o exemplo anterior. Para o cálculo dos coecientes de cada insumo aplicado na execução do serviço “forma de madeira”,
basta dividir a quantidade total desse insumo pela quantidade do serviço, conforme TABELA 5.7. TABELA 5.7 Cálculo dos coecientes dos insumos utilizados no serviço forma Insumos
Coefciente
Prego misto
240kg / 1000m2 =
0,24kg
Tábua de pinho 1”x12”
2500ml / 1000m2 =
2,5ml
Sarrafo de pinho 1”x4”
3000ml / 1000m2 =
3,00ml
Servente
10 serv x 25d x 8h / 1000m2 =
2,00h
Carpinteiro
10 carp x 25d x 8h / 1000m2 =
2,00h
Da TABELA 5.7, pode-se armar que para a execução de 1m² do serviço “forma
de madeira” é necessário o emprego dos seguintes insumos: 0,24kg de prego; 2,5ml de tábua de pinho 1x12”; 3,00m de sarrafo de pinho; 2,0h de servente e 2,0h de carpinteiro. É exatamente esse tipo de tabela que se utiliza para o cálculo de custos de serviços, visto que a variação se dá, em regra, nos custos dos insumos e não nos valores dos coecientes. A execução do cálculo é feita nos moldes apresentados na TABELA 5.8.
TABELA 5.8 Cálculo do custo unitário do serviço forma (m²) com base em coecientes Insumos
Coefciente
Custo unitário
Total (R$)
Prego misto
0,24kg
R$1,25
0,30
Tábua de pinho 1”x12”
2,5ml
R$360 x 0,025 x 0,30
6,75
Sarrafo de pinho 1”x4”
3,00ml
R$360 x 0,025 x 0,30
2,70
Servente
2,00h
R$1,00
2,00
Carpinteiro
2,00h
R$2,00
4,00
125% da mão de obra
7,50
Leis sociais Custo unitário do serviço
23,25
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As tabelas de composição de serviços são disponibilizadas por órgãos públicos ou editoras especializadas. Diversas empresas têm rotina própria para a apropriação de custos e denição de tabelas com vistas a incrementar sua competitividade no mercado.
5.2.3 Obtenção dos custos de insumos ou serviços Existem diversas fontes no mercado que disponibilizam valores de insumos e serviços que valem ser consultadas: a) Sistema Sinapi/CEF, referência legal para contratação de obras, nos termos da LDO; b) Sistema Sicro/DNIT, também considerado como referência pela LDO e reconhecido pelo TCU como parâmetro para contratação de obras rodoviárias; c) Tabelas referenciais de órgãos públicos (Secretarias de Obras nos Estados, etc.); d) Revistas de editoras especializadas (Pini). A propósito, o Decreto nº 7.983/13 estabelece conjunto de orientações para a obtenção dos custos dos insumos: Art. 3º O custo global de referência de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços e obras de infraestrutura de transporte, será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil - Sinapi, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de construção civil. Parágrafo único. O Sinapi deverá ser mantido pela Caixa Econômica Federal - CEF, segundo denições técnicas de engenharia da CEF e de pesquisa de preço realizada pelo Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística - IBGE. Art. 4º O custo global de referência dos serviços e obras de infraestrutura de transportes será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais aos seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema de Custos Referenciais de Obras - Sicro, cuja manutenção e divulgação caberá ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes - DNIT, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de infraestrutura de transportes. (...) Art. 6º Em caso de inviabilidade da denição dos custos conforme o disposto nos arts. 3º, 4º e 5º, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal em publicações técnicas especializadas, em sistema especíco instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.
A pesquisa de mercado também é excelente referencial. Recomenda-se, entretanto, que na elaboração de orçamentos-base sejam documentados os preços dos insumos mais signicativos, pertencentes ao grupo A da curva ABC. É importante lembrar que a cotação dos insumos e a denição dos coecientes dependem do ganho de escala na execução dos serviços. No caso de obras de grande porte, essa economia deverá ser considerada, conforme manifestação do TCU em análise de caso concreto: I - As peculiaridades da obra não justicam a majoração de índices de produtividade de mão de obra e de equipamento, visto que os ganhos de escala em obra de grande
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
vulto tendem a superar substancialmente eventuais limitações decorrentes dessas especicidades.
II - A despeito dos evidentes ganhos de produtividade obtidos em obras dessa dimensão, por reconhecer a inuência de contingências decorrentes da natureza da obra, agura-se adequada a adoção dos valores de referência do Sinapi, Sicro e Pini [...].
III - Os valores dos insumos obtidos no Sinapi, Sicro e Pini são conservadores e revelam, em regra, preços comumente superiores aos que são obtidos por uma grande empreiteira em negociação com seus fornecedores. (TCU. Acórdão nº 2006/06, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 6 nov. 2006)
5.3 Preços 5.3.1 Introdução Até o momento foi abordada a metodologia de cálculo dos custos diretos unitários dos serviços. A soma da multiplicação das quantidades pelos respectivos preços unitários dos serviços fornece o custo direto total da obra. Cdt = Soma [(qi) x (Cdi)]
Cdt - custo direto total qi - quantidade de cada serviço Cdi - custo unitário direto de cada serviço Porém, para a apresentação do preço nal da execução dos serviços, existem
outros custos que ainda não foram computados, denominados como o lucro da construtora.
custos indiretos ,
bem
Pt = Cdt + Cit + L Pt - preço nal total
Cdt - custo direto total Cit - custo indireto total L - lucro
5.3.2 BDI (Benefício/Bonicação e Despesas Indiretas) Os valores referentes a despesas indiretas e lucro podem ser transformados em uma taxa percentual na fórmula acima. Essa taxa é denominada Benefício e Despesas Indiretas (BDI). 21
Pt = Cdt + (Cit + L) Pt = Cdt x (1 + BDI)
Pt - preço nal total
Cdt - custo direto total BDI - taxa de benefício e despesas indiretas (%)
21
Outra sigla comumente utilizada para traduzir a taxa que representa o lucro e as despesas indiretas é LDI (Lucro e Despesas Indiretas).
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Para facilitar o entendimento, uma obra que tenha custo direto total de R$100.000,00 (ver planilha da TABELA 5.3), custos indiretos de R$20.000,00 e lucro previsto de R$10.000,00, teria taxa de BDI de 30%, calculada de acordo com a fórmula:
Para obtenção da planilha orçamentária de preços, basta multiplicar todos os custos diretos dos serviços pelo valor do BDI. A planilha de custos apresentada na TABELA 5.3 se transformaria na planilha de preços da TABELA 5.9. TABELA 5.9 Planilha orçamentária de preços (com BDI) referente à planilha de custos diretos apresentados na TABELA 5.3 Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço Total (R$)
Concreto
m³
250,00
260,00
65.000,00
Escavação manual
m³
400,00
32,50
13.000,00
Forma
m²
800,00
65,00
52.000,00
TOTAL
130.000,00
Nesse contexto, uma questão se impõe: quais seriam então os valores apropriados e razoáveis a serem computados no cálculo do BDI? Com o objetivo de maior transparência à contratação, facilidade da gestão do empreendimento e economia em futuros aditivos, é importante que a maior parte das despesas indiretas esteja detalhada na planilha, ou seja, não incluída no BDI. A não observância dessa orientação poderá ensejar pagamentos desnecessários ao contratado. Caso, por exemplo, determinado orçamento inclua taxa de mobilização e desmobilização de 5% no BDI, todo serviço que vier a ser aditivado no curso da obra poderá ser contemplado desnecessariamente com essa taxa adicional, visto que, a princípio, não ocorre o devido incremento nos valores de mobilização e desmobilização. O ideal, portanto, é que apenas despesas indiretas proporcionais ao custo total de execução ou ao preço fnal, além do lucro, estejam no BDI. Para as demais despesas indiretas que podem ser estimadas sem a utilização de percentuais é recomendável que sejam especifcadas na própria planilha orçamentária. A uma, pela transparência do orçamento; a duas, pela facilidade no gerenciamento dos aditivos; e a três, pela diminuição do risco de cobrança de valores em duplicidade. A seguir são destacadas, de forma resumida, as principais parcelas que devem compor o BDI: a) Despesas fnanceiras: são aquelas decorrentes do custo do capital de giro para fazer frente às despesas realizadas antes do efetivo recebimento das
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
devidas receitas. Pode ser apropriada por estimativa ou, com precisão, por meio de elaboração de uxo de caixa detalhado que espelhe todas as receitas e
despesas mensais atinentes ao empreendimento. Vale lembrar que o pagamento antecipado por serviço é, em regra, vedado pela legislação; b) Administração central: são as despesas relativas à manutenção de parcela do custo do escritório central da empresa. Importante destacar que essa parcela deve ser calculada por meio de rateio do custo da administração central pela totalidade das obras gerenciadas pela empresa, de preferência, proporcionalmente ao valor de cada contrato. É claro que a administração pública na elaboração de seu orçamento base para licitação deverá trabalhar com estimativa para a denição desse percentual;
c) Benefício e lucro: é a parcela que contempla a remuneração do construtor, denida com base em valor percentual sobre o total dos custos diretos e
despesas indiretas, excluídas aquelas referentes às parcelas tributárias. “A taxa adotada como benefício deve ser entendida como uma provisão de onde será retirado o lucro do construtor, após desconto de todos os encargos decorrentes de inúmeras incertezas que podem ocorrer durante as obras, difíceis de serem mensuradas no seu conjunto”; d) Riscos imprevistos e seguros: deverão ser computados, se necessários, valores para cobertura de despesas imprevisíveis e seguros para casos fortuitos ou de força maior; e) Valores relativos aos tributos, com destaque para os seguintes itens: e.1) Imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS): é imposto de competência municipal, consoante art. 156, inciso III, da Constituição Federal, que 22
tem por fato gerador a prestação de serviços por empresa ou prossional
autônomo, ou seja, pode ter valor variável em função do local em que a obra será executada. Tem como base de cálculo, consoante Decreto-Lei nº 406/68, no caso de obras hidráulicas ou de construção civil, o preço total da operação deduzido das seguintes parcelas: valor dos materiais adquiridos de terceiros, quando fornecidos pelo prestador do serviço, e valor das subempreitadas já tributadas pelo imposto. Considerando que a alíquota incide apenas sobre mão de obra e varia de 2 a 5% em função do município, deve-se calcular o valor mais adequado para o empreendimento em função da local da realização dos serviços. De forma simplicada, pode-se utilizar 3% sobre o faturamento;
e.2) Contribuições para os Programas de Integração Social (PIS) e para o Financiamento da Seguridade Social (Cons): A legislação que trata desses
dois tributos é complexa e passa por diversas atualizações. De forma resumida, pelo disposto na Lei nº 10.637/2002, na Lei nº 10.833/2003, na Lei nº 10.865/2004 e na Lei nº 10.925/2004, existem dois regimes de incidência desses tributos, quais sejam:
TISAKA. Orçamento na construção civil: consultoria, projeto e execução, p. 56.
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a) Regime de incidência cumulativa: O chamado “PIS/COFINS cumulativo” é a forma mais antiga de incidência destas contribuições, que consiste na cobrança dos tributos sobre o faturamento das pessoas jurídicas, pela venda de produtos ou prestação de serviços. Nesse regime, a base de cálculo é o total das receitas da pessoa jurídica, sem deduções em relação a custos, despesas e encargos; e as alíquotas de contribuição para o PIS e da COFINS são, respectivamente, 0,65% e 3,00%. As pessoas jurídicas de direito privado, inclusive as que lhes são equiparadas, que apuram o IRPJ com base no lucro presumido ou arbitrado, estão sujeitas à incidência cumulativa. b) Regime de incidência não cumulativa: Este regime permite o desconto de créditos apurados com base em custos, despesas e encargos da pessoa jurídica. Nesse caso, as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS são, respectivamente, 1,65% e 7,60%. As pessoas jurídicas de direito privado, e as que lhes são equiparadas pela legislação do imposto de renda, que apuram o IRPJ com base no lucro real, estão sujeitas à incidência não cumulativa. Observe-se que a pessoa jurídica cuja receita bruta total, no ano-calendário anterior, tenha sido superior a R$48.000.000,00 ou a R$4.000.000,00 multiplicado pelo número de meses de atividade do ano-calendário anterior, quando inferior a doze meses, estão obrigadas ao regime de tributação com base no lucro real. Nesse contexto, com o advento do PIS/COFINS não-cumulativo, a apuração das contribuições no regime cumulativo tornou-se a exceção à regra de apuração. No entanto, o art. 8º da Lei n. 10.637/2002 e o art. 10 da n. Lei 10.833/2003 apontam as pessoas jurídicas e receitas que permanecem sujeitas ao regime cumulativo. Dentre elas, destacam-se: i) as pessoas jurídicas tributadas pelo imposto de renda com base no lucro presumido ou arbitrado; ii) as pessoas jurídicas optantes do SIMPLES; iii) as receitas decorrentes da execução por administração, empreitada ou subempreitada de obras de construção civil, até 31/12/2015 (Lei n. 12.375/2010). Assim, as obras de construção civil, inclusive as receitas decorrentes da execução por empreitada de obras de construção de estações e redes de distribuição de energia elétrica (Jurisprudência RFB, Consulta n. 68, de 17 de março de 2008), permanecem sujeitas ao regime cumulativo, ou seja, contribuem para o PIS e a COFINS utilizando as alíquotas de contribuição de 0,65% e 3,00% do faturamento bruto, respectivamente. No entanto, tal situação não se repete para os serviços técnicos especializados (projeto, consultoria, gerenciamento, scalização), aos quais incidem as alíquotas de contribuição de, respectivamente, 1,65% e 7,60% do faturamento bruto. As empresas especializadas que se enquadram no regime não-cumulativo podem utilizar o desconto de créditos apurados com base em custos, despesas e encargos. No entanto, esses créditos possuem peso relativamente baixo na composição de custos dos Serviços Técnicos de Engenharia e foram desconsiderados para os ns de composição do BDI. Cabe ressaltar que a Lei 12.375/2010, no caso especíco de obras de construção civil, sejam elas realizadas por administração, empreitada ou subempreitada, prorrogou mais uma vez a vigência da alteração estabelecida pelas Leis 10.637/ 2002 e 10.833/2003, passando-a para 31 de dezembro de 2015. Essa mudança, quando efetivada, trará ajustes para o cálculo da parcela de tributos da taxa de BDI, já que a alíquota aplicável será de 1,65% e 7,60%, respectivamente, para o PIS e a COFINS, mas com direito a crédito das contribuições sobre as despesas, custos e encargos listados no art. 3º das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Por tudo isso, é importante que esses tributos tenham os seus respectivos percentuais discriminados, uma vez que parte dos valores pagos poderá ser recuperada posteriormente, o que pode inuenciar no custo nal da obra. (TCU. Acórdão
nº 2.369/2011, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 09 set. 2011)
e.3) Contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza nanceira (CPMF): correspondia à
alíquota de 0,38% no período relativo aos anos-calendário de 2004 a 2007, observadas as disposições da Lei nº 9.311/96, alterada pela Lei nº 9.539/97. Essa contribuição deixou de existir a partir do início de 2008. O TCU, em minucioso estudo (Acórdão nº 325/2007, Plenário), com o objetivo de propor critérios de aceitabilidade para o Lucro e Despesas Indiretas (LDI) em obras de implantação de linhas de transmissão de energia elétrica, detalhou as principais variáveis envolvidas na composição do BDI. Quatro anos depois, novo estudo ampliou o leque dos valores de BDI para outros tipos de obras (Acórdão nº 2.369/2011, Plenário). E, em 2013, aprovou o Acórdão nº 2.622/2013, Plenário, em que estabeleceu novos parâmetros para taxas de BDI, em substituição aos referenciais contidos nos Acórdãos nº 325/2007 e nº 2.369/2011. Pela relevância do tema, e em face da viabilidade de aplicação dos conceitos para outros tipos de empreendimentos, vale transcrever trechos dos relatórios atinentes aos estudos iniciais, para, ao nal, apresentar a última posição a respeito do tema. Vale
lembrar que, apesar da substituição dos referencias dos primeiros acórdãos datados de 2007 e 2011, continuam valendo as considerações técnicas lá registradas. 2 OBJETIVO DO TRABALHO O principal objetivo deste trabalho é propor critérios/parâmetros de aceitabilidade para o LDI – Lucro e Despesas Indiretas, também denominado BDI (1) – Bonicação e Despesas Indiretas ou Benefícios e Despesas Indiretas em obras de implantação de linhas de transmissão de energia elétrica. Cabe ressaltar que, além das obras de implantação de linhas de transmissão, o trabalho abrangeu obras de subestações, que também compõem o sistema de transmissão de energia elétrica. Além disso, procurou-se identificar os elementos passíveis de serem incluídos na composição do LDI, os valores praticados e a respectiva faixa de variabilidade desses itens. Embora trate de LDI para obras de linhas de transmissão e de subestações, o presente 23
trabalho pode fornecer uma referência genérica, pois sua especicidade limita-se aos
valores observados para o setor, sendo os conceitos e a composição do LDI propostos aplicáveis a outros tipos de obras. [...]
4 LUCRO E DESPESAS INDIRETAS – LDI 4.1 Conceito Vários conceitos podem ser utilizados para se compreender o LDI. Explicados de formas distintas, tentam denir uma parcela do orçamento de obras, em razão da sua segmentação
em custos diretos e indiretos. O Instituto de Engenharia conceitua BDI como “o resultado de uma operação matemática para indicar a margem que é cobrada do cliente incluindo todos os custos indiretos,
23
Neste trabalho será usado indistintamente tanto o termo LDI como BDI. (Nota constante do original).
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tributos, etc. e logicamente sua remuneração pela realização de um empreendimento”.
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André Luiz Mendes e Patrícia Reis Leitão Bastos denem BDI como a “taxa correspondente
às despesas indiretas e ao lucro que, aplicada ao custo direto de um empreendimento
(materiais, mão-de-obra, equipamentos), eleva-o ao seu valor nal”. O TCU, na Decisão 255/1999-Plenário, deniu o BDI “como um percentual aplicado sobre 25
o custo para chegar ao preço de venda a ser apresentado ao cliente”. Compreendida como uma relação matemática entre os custos indireto e direto para formação do preço da obra, essa incidência pode ser explicitada pela seguinte fórmula: PV = CD (1 + LDI ) onde PV = preço de venda; CD = custo direto; LDI = taxa de lucro e despesas indiretas. Visto o papel do LDI no orçamento de uma obra, para que se possa avaliar sua adequada aplicação, faz-se necessária a classicação dos componentes orçamentários em custos diretos e indiretos, bem como a denição daqueles que devem ou não integrar o LDI.
Sendo uma relação matemática que estimará o preço de uma obra, qualquer componente indevido no LDI causará distorções na estimativa. A parcela de custo direto (CD) sobre a qual incidirá o BDI é denida pelo Instituto
de Engenharia como o “resultado da soma de todos os custos unitários dos serviços necessários para a construção da edicação, obtidos pela aplicação dos consumos dos
insumos sobre os preços de mercado, multiplicados pelas respectivas quantidades, mais os custos da infra-estrutura necessária para a realização da obra”. O custo direto, consoante o Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon/SP), é conceituado como a “soma de todos os custos parciais obtidos através da composição de custos unitários pela aplicação dos consumos dos insumos representados por materiais, mão-de-obra e equipamentos, multiplicados pelas respectivas quantidades, formatados numa planilha de custo direto ou planilha orçamentária”. De forma mais objetiva, consideram-se custos diretos, aqueles que podem ser associados aos aspectos físicos da obra, detalhados no projeto de engenharia, bem como ao seu modo de execução, determinados pela organização operacional e pela infra-estrutura necessária. Assim, custos diretos são aqueles relacionados aos materiais e equipamentos que comporão a obra, além dos custos operacionais e de infra-estrutura necessários para 26
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sua transformação no produto nal, tais como mão-de-obra (salários, encargos sociais,
alimentação, alojamento e transporte), logística (canteiro, transporte e distribuição de materiais e equipamentos) e outros dispêndios derivados, que devem ser discriminados e quanticados em planilhas.
O DNIT considera os seguintes custos diretos: “- Custo Direto dos Serviços – representa a soma dos custos dos insumos (equipamentos, materiais e mão-de-obra) necessários à realização dos serviços de todos os itens da planilha. 28
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INSTITUTO DE ENGENHARIA. Metodologia de cálculo do orçamento de edifcações - composição do custo direto e do BDI/LDI . Disponível em: . Acesso em: 3 maio
25
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2006. (Nota constante do original). MENDES; BASTOS. Um aspecto polêmico dos orçamentos de obras públicas: Benefícios e Despesas Indiretas (BDI). Revista do Tribunal de Contas da União , p. 13-28. (Nota constante do original). INSTITUTO DE ENGENHARIA. Metodologia de cálculo do orçamento de edifcações - composição do custo direto e do BDI/LDI . (Nota constante do original). SINDICATO DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO CIVIL DO ESTADO DE SÃO PAULO. Nova conceituação do
28
BDI .
Disponível em:
RECOMENDAÇÕES.DOC>. Acesso em: 30 mar. 2006. (Nota constante do original). BRASIL. Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes. Manual de custos rodoviários , p. 7-8. (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
- Custo de Administração Local – representa todos os custos locais que não são diretamente relacionados com os itens da planilha e, portanto, não são considerados na composição dos custos diretos. Inclui itens como: Custo da Estrutura Organizacional (pessoal), Seguros e Garantias de Obrigações Contratuais e Despesas Diversas. - Mobilização e Desmobilização – a parcela de mobilização compreende as despesas para transportar, desde sua origem até o local aonde se implantará o canteiro da obra, os recursos humanos, bem como todos os equipamentos e instalações (usinas de asfalto, centrais de britagem, centrais de concreto, etc.) necessários às operações que aí serão realizadas. Estão, também, aí incluídas as despesas para execução das bases e fundações requeridas pelas instalações xas e para sua montagem, colocando-as em condição de funcionamento. Como, de um modo geral, a desmobilização de equipamentos e instalações se faz a m de transportá-los para uma nova obra, não será prevista parcela especíca para este m,
com vistas a evitar dupla remuneração.
- Canteiro e Acampamento – esta rubrica tem por nalidade cobrir os custos de construção das edicações e de suas instalações (hidráulicas, elétricas, esgotamento) destinadas a
abrigar o pessoal (casas, alojamentos, refeitórios, sanitários, etc.) e as dependências necessárias à obra (escritórios, laboratórios, ocinas, almoxarifados, balança, guarita, etc.), bem
como dos arruamentos e caminhos de serviço”. 4.2 Despesas Indiretas
Denidos os custos diretos, necessário se faz apresentar aqueles que não podem ser denidos como tais, e que, associados aos custos diretos e ao lucro, formarão o preço nal
da obra. A Eletrobras diz que o custo indireto “compreende todas as despesas não alocáveis diretamente à execução da obra”. São custos decorrentes, por conseguinte, das necessidades e obrigações do executor e não diretamente do projeto de engenharia. 29
Enquanto os custos diretos são objetivos e vinculados à especicação do projeto da obra e suas quanticações, os indiretos são subjetivos e associados ao executor, às
suas necessidades operacionais (administração central, seguros, garantia, caixa), de rentabilidade e obrigações tributárias. A denominação indiretos se dá em razão da sua valoração ser obtida em função de percentuais dos custos diretos, representando o caráter intrínseco ao projeto da obra que tem os custos diretos, diferentemente dos indiretos, que poderiam ser considerados extrínsecos, pois são subseqüentes ao projeto já quanticado. Portanto, consideram-se inadequados aqueles conceitos que denem como indiretos os custos que são associados com objetividade e segurança a uma obra especíca e que,
para serem apropriados, precisariam ser rateados, isto é, distribuídos entre as diversas obras realizadas pela mesma empresa. A falha deste conceito se torna evidente em uma análise de itens de despesas indiretas, a exemplo dos tributos, cujo valor é resultante de uma obra determinada. São normalmente considerados custos indiretos: despesas nanceiras, administração central, tributos federais (PIS/Cons, CPMF), tributos municipais (ISS), seguros, riscos
e garantias.
4.2.1 Despesas nanceiras Despesas nanceiras são gastos relacionados ao custo do capital decorrente da necessidade de nanciamento exigida pelo uxo de caixa da obra e ocorrem sempre que os desembolsos
acumulados forem superiores às receitas acumuladas. Nas obras públicas, as empresas construtoras normalmente necessitam investir capital, pois as entidades contratantes só podem legalmente pagar pelos serviços efetivamente realizados (Lei nº 4.320/1964,
29
Revisão das diretrizes para elaboração de orçamentos de linhas de Transmissão. Divisão de Engenharia de transmissão – Eletrobras S.A. 2005. p. 19. (Nota constante do original).
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arts. 62 e 63) e dispõem de 30 (trinta) dias para realizar o pagamento. No entanto, a empresa pode equilibrar seu uxo de caixa com os prazos obtidos junto aos seus fornecedores. O capital investido pelas empresas pode ser próprio, quando utilizarem recursos que já possuam em seus caixas, ou de terceiros, quando adquiridos junto a operadores nanceiros (bancos, nanceiras, etc.). No caso do capital próprio, sua remuneração normalmente é calculada com o m de promover sua atualização monetária. Com relação a capital de terceiros, deve-se analisar qual o custo de oportunidade do capital, ou seja, deve-se apurar qual seria o seu rendimento se o capital de giro tivesse sido aplicado no mercado nanceiro naquele período. Assim, a Administração deve resguardar-se de taxas abusivas, pois o preço da obra não pode ser onerado por ineciência operacional do executor. Dessa forma, a taxa de juros referencial para o mercado nanceiro mais adequada é a taxa SELIC, taxa ocial denida pelo comitê de política monetária do Banco Central. As despesas nanceiras podem ser calculadas pela fórmula:
onde: - DF é a taxa de despesa nanceira; - j é a taxa mensal de atualização monetária ou de juros de referência; - n é o número de dias decorridos entre o centro de gravidade dos desembolsos e a efetivação do pagamento contratual. Ressalte-se que a competitividade nas licitações estimula a queda dos preços propostos pelas empresas e faz com que as empresas que possuam capital próprio ou acesso a capital de baixo custo obtenham vantagem nas propostas para obras públicas. 4.2.2 Administração Central Toda empresa possui uma estrutura administrativa com custo e dimensão próprios. A sua representação no LDI de uma obra é denida estabelecendo em que proporção esse custo é apropriado como despesa de uma obra. Pode ser de forma integral, quando a empresa executa apenas uma obra, de forma parcial, na hipótese de rateio entre várias obras executadas pela empresa ou, até mesmo, não ser apropriada em uma obra especíca, caso a empresa tenha como alocar esses custos em outras atividades. O Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT) dene Administração central como a parcela do Preço Total que corresponde à quota parte do custo da Administração central do Executor, a ser absorvida pela obra em tela. O Instituto de Engenharia dene como rateio da administração central a parcela de despesa da Administração central debitada a determinada obra segundo os critérios estabelecidos pela direção da empresa. As despesas da Administração central são aquelas incorridas durante um determinado período com salários de todo o pessoal administrativo e técnico lotado ou não na sede central, no almoxarifado central, na ocina de manutenção geral, pró-labore de diretores, viagens de funcionários a serviço, veículos, aluguéis, consumos de energia, água, gás, telefone xo ou móvel, combustível, refeições, transporte, materiais de escritório e de limpeza, seguros, etc. Diversos fatores podem inuenciar as taxas de administração central praticadas pelas empresas, dentre elas podem ser citadas: estrutura da empresa, número de obras que a empresa esteja executando no período, complexidade e prazo das obras. 30
31
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31
BRASIL. Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes. Manual de custos rodoviários , p. 8. (Nota constante do original). INSTITUTO DE ENGENHARIA. Metodologia de cálculo do orçamento de edifcações - composição do custo direto e do BDI/LDI . (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Daí se depreende que, por exemplo, uma empresa com maior número de obras poderá praticar uma taxa de administração central inferior à empresa do mesmo porte com apenas um canteiro. 4.2.3 COFINS/PIS O Programa de Integração Social (PIS) foi instituído pela Lei Complementar nº 7, de 7 de setembro de 1970. O PIS tem como objetivo o nanciamento do programa do Seguro-Desemprego e o abono
aos empregados que recebem até dois salários mínimos mensais. A Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) foi instituída
pela Lei Complementar nº 70, de 30 de dezembro de 1991, com a nalidade de nanciar
as despesas das áreas de Saúde, Previdência e Assistência Social. Até janeiro de 1999, as bases de incidência do PIS e da COFINS, eram, salvo exceções, a receita bruta das vendas de mercadorias e da prestação de serviços, tendo como alíquota 0,65% para o PIS e 2% para a COFINS, calculados sobre as referidas receitas. A partir de fevereiro de 1999, com a edição da Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998, as bases de incidências do PIS e da COFINS foram ampliadas e passaram a contemplar não somente a receita bruta de vendas e da prestação de serviços, mas também as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica, independente de sua classicação contábil.
A alíquota do PIS foi mantida em 0,65% e a alíquota da COFINS foi majorada para 3%. Com a Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, foi estabelecido o sistema não cumulativo para o cálculo desta contribuição para o PIS, passando a mesma a incidir sobre o valor agregado em cada etapa do processo produtivo. A alíquota do tributo foi majorada de 0,65%, para 1,65%. Com o advento da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, a apuração não-cumulativa foi estendida também para a COFINS, com alteração da alíquota de 3% para 7,6%. A não-cumulatividade de PIS/COFINS, consoante os arts. 10, inciso XX, e 15, inciso V, da Lei nº 10.833/2003, só será aplicável às receitas decorrentes da execução por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil a partir de 01/01/2007, até a véspera vigorarão as alíquotas de 3% e 0,65%. Essa não-cumulatividade signica a
possibilidade de se efetuar descontos de créditos obtidos pela empresa, de acordo com o art. 3º da referida norma, sobre os valores resultantes da aplicação das novas alíquotas. Cabe ressaltar que as pessoas jurídicas tributadas pelo imposto de renda com base no lucro presumido ou arbitrado e as optantes pelo simples não se enquadram no novo sistema de não-cumulatividade, ou seja, permanecem sujeitas às normas da legislação do PIS e da COFINS vigentes anteriormente às Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, respectivamente, consoante o art. 8º, incisos II e III, e art. 10, incisos II e III, das referidas leis. Essa mudança na legislação traz uma nova complexidade para o cálculo do LDI, já que esses tributos deixam de ser xos para assumirem percentuais variáveis conforme o perl
dos dispêndios da empresa. Como a legislação discrimina os dispêndios que podem gerar esses créditos (dentre eles bens adquiridos para revenda; bens e serviços utilizados como insumos na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda; despesas como aluguéis, energia etc.), os que não estão relacionados (custo de mão-de-obra, tributos e lucro, por exemplo) não irão gerá-los. Assim, as empresas que têm maior participação das operações geradoras de crédito nas suas atividades levam vantagem na redução das alíquotas efetivas para o PIS e a COFINS. Por exemplo, para as empresas que já estão operando sob o efeito dessa nova forma de cálculo, observa-se que na indústria e no comércio, devido a créditos recebidos, as alíquotas efetivamente pagas têm cado abaixo dos 0,65% e 3%, para as alíquotas de PIS e COFINS, respectivamente.
No entanto, para empresas prestadoras de serviços, que têm na mão-de-obra seu principal insumo, as alíquotas geralmente são superiores aos referidos percentuais, pois não possuem muitos créditos para compensar.
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A complexidade advém de se estabelecer parâmetros para esses valores que são variáveis. No caso concreto, as empresas proponentes poderão xar os percentuais de PIS e COFINS para o cálculo do seu LDI, pois já conhecem, pela sua estrutura organizacional e pelo tipo de contrato a ser executado, os possíveis créditos e valores aproximados das alíquotas sob as quais deverão trabalhar. Para efeito de orçamentação do contratante, esses percentuais deverão ser estimados. Como exercício para simulação dos efeitos das novas alíquotas do PIS e da COFINS no cálculo do LDI para obras do setor elétrico, tomou-se como referência inicial os valores médios observados na Tabela II (Tópico 9.7 - Faixa de Variação do LDI, deste trabalho). Em seguida, foi necessário estimar o percentual de crédito que a empresa pode obter para se estabelecer a alíquota efetiva. No caso da construção civil, há estudos que estimam, de forma geral, que o custo da mão-de-obra representa em torno de 40% do custo total de uma obra, enquanto os materiais representam cerca de 60%. No entanto, como há incidência do LDI sobre o custo direto para a formação do Preço de Venda, o custo com a mão-de-obra representará um percentual menor que 40% em relação ao faturamento. Por exemplo, com a utilização de um valor médio de LDI de 22,61% (Tabela II), a mão-de-obra representará um percentual de aproximadamente 33% (0,40/1,2261) do Preço de Venda. De forma geral, esse percentual mais os relativos aos tributos e ao lucro representam a parte do faturamento que não gera crédito para apuração dos valores devidos do PIS e da COFINS. Portanto, ao avaliar esses últimos percentuais, a parte remanescente do faturamento, teoricamente, corresponderia aos créditos possíveis de serem utilizados para determinar a base de cálculo e a alíquota efetiva desses tributos. Considerando-se, por hipótese, que 50% dos créditos poderão ser descontados (um valor intermediário entre a expectativa desses benefícios para os setores de indústria e comércio e para o setor de serviços), as alíquotas efetivas da COFINS e PIS resultarão em percentuais de 3,8% e 0,825%, respectivamente. Agregando-se aos valores médios de ISS – 3,5% e CPMF – 0,38%, obtém-se um total de tributos de 8,5%. Para nalizar, considerando um percentual médio de lucro de 8%, e somando-se todas essas parcelas (mão-de-obra - 33%, tributos - 8,5% e lucro - 8%), alcança-se um total de 49,5% do faturamento, que não representam crédito para abatimento na apuração do PIS e da COFINS. Isso quer dizer que 50,5% poderiam ser descontados do faturamento para se chegar à base de cálculo da COFINS e do PIS. Pelo exercício hipotético, as alíquotas efetivas desses tributos, de forma simplicada, resultariam em 3,76% (7,6% x 49,5%) e 0,82% (1,65% x 49,5%) para COFINS e PIS, respectivamente. Evidentemente, trata-se de uma análise hipotética e que sofre de valores reincidentes, como as próprias alíquotas do PIS e da COFINS. Entretanto, considerado o perl do setor de construção civil, supõe-se que a utilização possível de créditos para se estabelecer a taxa efetiva desses tributos não deve ser inferior a 50%. Pode-se notar também que uma pequena variação em torno desse percentual não afeta signicativamente a estimativa desses tributos no LDI. No caso concreto, o orçamentista terá uma melhor condição de estimar esses valores. Como exemplo, adotando uma variação de 5% positiva e negativa em torno da média de 50%, com um crédito sobre o faturamento de 45%, as alíquotas efetivas da COFINS e do PIS cam em 4,18% e 0,91%, respectivamente. De outro modo, se esse percentual car em 55% as alíquotas passam para 3,42% e 0,74%. Ou seja, a apropriação desses tributos somados no LDI, variaria de 4,16% a 5,09%. Além disso, é interessante notar que, para os casos em que a não-cumulatividade desses tributos já está vigorando, a legislação sobre o assunto ainda não está consolidada. 32
32
LIMMER, Carl V. Planejamento, orçamentação e controle de projetos e obras . Rio de Janeiro: LTC, 1997. p. 101, 104. (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Inúmeros atos normativos já foram editados para denir questões ligadas ao cálculo dos dois tributos. Como essa nova sistemática de cálculo só entrará em vigor a partir de 01/01/2007 para as receitas decorrentes da execução por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, não é possível prever com exatidão como ela funcionará na prática. Não há como enquadrar o PIS e a COFINS como custos de produção, pois não são gastos obtidos no processo de obtenção dos serviços e/ou bens que estão sendo executados. Tratam-se, portanto, de despesas indiretas. De acordo com o que já foi mencionado para distinção dos custos diretos e indiretos, o cálculo desses tributos, como demonstrado, está relacionado com a empresa e com suas receitas, não sendo conseqüência direta do projeto e da execução da obra e, sim, da receita dela resultante, conrmando o caráter de despesa indireta.
4.2.4 CPMF e ISS 4.2.4.1 CPMF A Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira (CPMF) foi instituída pela Lei nº 9.311, de 24 de outubro de 1996, que considerou como movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza nanceira qualquer operação liquidada ou lançamento realizado pelas
entidades referidas no seu art. 2º, que representam circulação escritural ou física de moeda e de que resulte ou não transferência de titularidade dos mesmos valores, créditos e direitos. O fato gerador da CPMF, conforme o inciso I do art. 2º da Lei nº 9.311/1996, é o lançamento a débito, por instituição nanceira, em contas correntes de depósito, em contas correntes
de empréstimo, em conta de depósito de poupança, de depósito judicial e de depósitos em consignação de pagamento. A CPMF possui as seguintes alíquotas, de acordo com seu período de incidência: I - 0,20%, relativamente aos fatos geradores ocorridos no período de 23 de janeiro de 1997 a 22 de janeiro de 1999; II - 0,38%, relativamente aos fatos geradores ocorridos no período de 17 de junho de 1999 a 16 de junho de 2000; III - 0,30%, relativamente aos fatos geradores ocorridos no período de 17 de junho de 2000 a 17 de março de 2001; IV - 0,38%, relativamente aos fatos geradores ocorridos no período de 18 de março de 2001 a 31 de dezembro de 2007; 4.2.4.2 ISS O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços relacionados na lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, de 01 de agosto de 2003, mesmo que tais serviços não se constituam atividade preponderante do prestador do serviço. O contribuinte do ISS é o prestador do serviço (art. 5º da LC nº 116/2003). O art. 3º da LC nº 116/2003 estabelece que o serviço se considera prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses relacionadas nos itens I a XXII do citado artigo, que indicam o local em que o imposto será devido. Considera-se estabelecimento prestador, conforme denição do art. 4º da LC nº 116/2003, o
local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente
ou temporário, e que congure unidade econômica ou prossional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, lial, agência, posto de atendimento, sucursal,
escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas. Conforme o art. 7º da LC nº 116/2003, a base de cálculo do imposto é o preço do serviço,
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nela não se incluindo o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa à lei. O art. 88 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 37/2002, xou a alíquota mínima do ISS em 2% (dois por cento), ao passo que a alíquota máxima foi xada em 5% (cinco por cento) pelo art. 8º, II, da LC nº 116/2003. Os municípios gozam de autonomia para xar as alíquotas do ISS, desde que respeitados esses limites. Seguindo a mesma linha de raciocínio aplicada à classicação do PIS/COFINS, a CPMF e o ISS são tributos que devem ser considerados como despesas indiretas. Estes, como aqueles, não decorrem da especicação do projeto ou da execução da obra e, também, são subseqüentes a esses custos diretos, pois tanto a movimentação nanceira da empresa, base de cálculo da CPMF, quanto as faturas da obra, base de cálculo do ISS, englobam as parcelas correspondentes aos custos diretos e indiretos. 4.2.5 Risco, Garantias e Seguros O Instituto de Engenharia conceitua a taxa de risco do empreendimento como aquela que se “aplica para empreitadas por preço unitário, preço xo, global ou integral, para cobrir eventuais incertezas decorrentes de omissão de serviços, quantitativos irrealistas ou insucientes, projetos mal feitos ou indenidos, especicações decientes, inexistência de sondagem do terreno, etc”. Embora o Instituto de Engenharia tenha conceituado o risco para obras comuns, sob a ótica do empreendedor, esse não se aplica às obras regidas por contratos administrativos. Para a realização desses contratos, é necessária a existência prévia de projeto básico pelo qual os licitantes devem se orientar assumindo os riscos da avaliação e precicação do projeto, dada por preços unitários e quantitativos especicados. Cabe lembrar que, conforme denido no art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666/1993, o projeto básico deve contemplar o conjunto de elementos necessários e sucientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a denição dos métodos construtivos e do prazo de execução. Ou seja, se esses requisitos forem cumpridos a necessidade de modicações decorrentes de projetos mal feitos ou indenidos serão minimizados. Assim, no contrato administrativo, a obra é pactuada pelos quantitativos do projeto e os custos unitários estabelecidos. Quaisquer alterações dependerão de repactuação do contrato, a ser aprovada pela Administração, não incorrendo o executor em riscos de quantitativos. Entretanto, existem ocorrências não previstas em projetos e que podem repercutir no custo da obra e deverão ser arcadas pelo contratado. Dentre elas podemos citar: perdas excessivas de material (devido a quebra ou retrabalho), perdas de eciência de mão-deobra, greves, condições climáticas atípicas, dentre outros. A taxa de riscos é determinada em percentual sobre o custo direto da obra e depende de uma análise global do risco do empreendimento em termos orçamentários. Questões que podem ser previamente convencionadas no contrato ou ensejarem solicitação de reequilíbrio econômico-nanceiro, como a variação cambial (e o seu seguro – hedge) não devem ser enquadradas no LDI. 33
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7.02 - Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços, que ca sujeito ao ICMS). (Nota constante do original). INSTITUTO DE ENGENHARIA. Metodologia de cálculo do orçamento de edifcações - composição do custo direto e do BDI/LDI . (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
A m de se resguardar de incidentes do empreendimento, o licitante pode rmar contrato de seguro, a m de ser indenizado pela ocorrência de eventuais sinistros. Dessa forma, o seguro deve corresponder a objetos denidos da obra, pelos quais o empreendedor deseja
ser ressarcido no caso de perdas e pode abranger casos de roubo, furto, incêndio, perda de máquinas ou equipamentos, dentre outros aspectos das obras civis. A garantia contratual está prevista no art. 56 da Lei nº 8.666/1993, que estatui poder a Administração Pública para exigi-la: “Art. 56 A critério da autoridade competente, em cada caso, e desde que prevista no instrumento convocatório, poderá ser exigida prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e compras”. Esta exigência faz parte das cautelas que a Administração Pública pode tomar para assegurar o sucesso da contratação. Trata-se, contudo, de exigência discricionária, que poderá ser requerida nas hipóteses em que existirem riscos de lesão ao interesse público, caso contrário, a Administração pública não necessitará impô-la. A exigência de garantia deve constar do instrumento convocatório. As garantias e os seguros das obrigações contratuais são custos que resultam de exigências contidas nos editais de licitação e só podem ser estimadas caso a caso, mediante avaliação do ônus econômico-nanceiro que poderá recair sobre o licitante.
4.3 Lucro O lucro é um conceito econômico que pode ser descrito de diversas formas para representar uma remuneração alcançada em conseqüência do desenvolvimento de uma determinada atividade econômica. Para o setor em comento, execução de obras civis, são enunciados diversos conceitos, que, em resumo, irão reproduzir essa mesma idéia. O Sinduscon/SP conceitua lucro como: “parcela destinada a remunerar o acervo de conhecimentos acumulados ao longo dos anos de experiência no ramo, capacidade administrativa e gerencial, conhecimento tecnológico acumulado, treinamento do pessoal, fortalecimento da capacidade de reinvestir em novos projetos e o risco do negócio em si”. 35
O Instituto de Engenharia dene lucro como:
“parcela destinada a remunerar o custo de oportunidade do capital aplicado, capacidade administrativa, gerencial e tecnológica adquirida ao longo de anos de experiência no ramo, responsabilidade pela administração do contrato e condução da obra por estrutura organizacional da empresa e investimentos na formação prossional do seu pessoal e criar
a capacidade de reinvestir no próprio negócio”.
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O DNIT utiliza o termo margem para denir a parcela que:
“complementa a formação do Preço de Venda, sem que possa ser considerada como item de custo, ela é, na verdade, uma parcela destinada a remunerar os fatores da produção do Executor que intervêm na obra, tais como: custo de oportunidade do capital aplicado nos equipamentos mobilizados na obra; capacidade administrativa e gerencial para a administração do contrato e a condução da obra, representada pelas estruturas organizacionais da empresa e pelo conjunto de normas e procedimentos de que se utiliza; conhecimento tecnológico adquirido através de experiências pregressas e pelo investimento em formação, treinamento de pessoal e compra de ‘know-how’ e, nalmente, o risco do negócio.
A margem é, assim, um excedente sobre o custo orçado, através do qual o Executor buscará realizar seu Lucro, bem como prover recursos para pagamento de impostos sobre o resultado”. 35
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SINDICATO DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO CIVIL DO ESTADO DE SÃO PAULO. Nova conceituação do BDI . (Nota constante do original). INSTITUTO DE ENGENHARIA. Metodologia de cálculo do orçamento de edifcações - composição do custo direto e do BDI/LDI . (Nota constante do original).
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O lucro esperado num contrato de obras civis é expresso por um percentual sobre o valor do contrato disposto como parcela do LDI. Esse percentual é determinante para formação do preço da obra e, embora seja fruto da expectativa de cada licitante, pode ser previsto um padrão para cada ramo de atividade econômica. No caso dos contratos administrativos, o próprio histórico de percentuais praticados pode fornecer uma referência para esse padrão. Desse modo, muitos órgãos da Administração pública procuram identicar uma tendência de lucro praticada dentro de suas atividades, com base em estudos disponíveis ou em registros de contratos. A Secretaria de Governo e Gestão Estratégica do Estado de São Paulo, com base em estudos da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – FIPE, considera que deve ser adotada uma faixa de valores obtida a partir das demonstrações nanceiras das empresas do setor, o que limitaria uma possível variação da taxa de lucro (“Estudos de Serviços Terceirizados” - Publicações - Versão maio/1999 - Volume I - “Prestação de Serviços de Limpeza, Asseio e Conservação Predial” - Capítulo VII - Benefícios e Despesas Indiretas). Com base nesse critério, aquela Secretaria adota para a contratação com órgãos da Administração pública estadual uma margem de lucro de 7,2%. Esse percentual foi obtido a partir da média aritmética das relações Lucro/Vendas da demonstração de resultados nanceiros e contábeis das 309 maiores empresas de construção civil (dados obtidos na revista Conjuntura Econômica). O estudo publicado pela Associação Brasiliense de Construtores – ASBRACO (Estudo sobre composição de BDI, obtido diretamente junto a Associação Brasiliense de Construtores – ASBRACO em maio de 2000) considera como margem de lucro o valor de 7,2%. O Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte, no Sistema de Custos Rodoviários – SICRO-2 (2003), considera uma margem de lucro de 7,2% na composição do BDI, sendo 5,0% de lucro líquido, 1,2% de IRPJ e 1,0% de CSLL. Com base nos estudos anteriormente citados, poder-se-ia considerar que uma margem de lucro entre 7,0% e 8,5% estaria perfeitamente adequada aos valores atualmente praticados no mercado da construção civil. Embora os diversos estudos citados procurem estabelecer uma faixa de variação considerada aceitável para o percentual de lucro praticado pelas empresas em licitações públicas, lembramos que trata-se apenas de uma faixa de referência, não havendo previsão legal para que essa seja xada ou limitada. Este raciocínio encontra supedâneo na interpretação de artigos da Constituição que disciplinam a ordem econômica, bem como na correspondente legislação regulamentadora. A Constituição Federal, no seu art. 173, §4º, condena o abuso do poder econômico, exteriorizado pela “dominação dos mercados”, pela “eliminação da concorrência” e pelo “aumento arbitrário dos lucros”: “Art. 173. §4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”. A m de regulamentar o dispositivo constitucional, foi editada a Lei nº 8.884/1994, que, no inciso IIII do seu art. 20, tipica a conduta de “aumentar arbitrariamente os lucros” como infração da ordem econômica: “Art. 20. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: [...] 37
37
Esta lei trata da transformação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica e dá outras providências. (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
III - aumentar arbitrariamente os lucros; [...] ”. Observa-se que não há condenação à prática de lucros ou qualquer denição que considere
o que seja lucro abusivo ou aceitável, o que se condena é o aumento arbitrário, que caracterize abuso de poder econômico. Acerca do aumento arbitrário de lucros Gastão Alves de Toledo explica que: “o aumento dos lucros em si mesmo considerado não é incompatível com uma sadia atividade econômica, apenas quando arbitrário o mesmo deve ser combatido”. 38
Dos citados dispositivos, verica-se que não há, nos textos constitucional e legal, con-
denação ao poder econômico, mas sim ao seu abuso. Sobre o assunto, Carlos Jacques Vieira Gomes leciona que “a detenção de poder econômico, além de lícito em si, constitui fato comum no atual estágio do sistema capitalista, deve o direito voltar-se para o controle do exercício abusivo do poder econômico”. O ordenamento jurídico vigente no país, fundado nos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, assegura à empresa a liberdade para agir e conquistar mercados, para estabelecer os preços pelos quais vai vender seus produtos e serviços, sendo vedados o abuso do direito, o uso arbitrário da condição de agente econômico e a obtenção de vantagens ilícitas, na medida em que impõe a toda a coletividade condições que lhe são absolutamente desfavoráveis. Vale observar, ainda, a disposição do parágrafo único do art. 21 da Lei nº 8.884/1994: “Art. 21. Parágrafo único. Na caracterização da imposição de preços excessivos ou do au39
mento injusticado de preços, além de outras circunstâncias econômicas e mercadológicas
relevantes, considerar-se-á:
I - o preço do produto ou serviço, ou sua elevação não justicados pelo comportamento
do custo dos respectivos insumos, ou pela introdução de melhoria de qualidade. II - o preço do produto anteriormente produzido, quando se tratar de sucedâneo resultante de alterações não substanciais. III - o preço de produtos e serviços similares, ou sua evolução, em mercados competitivos comparáveis. IV - a existência de ajuste ou acordo, sob qualquer forma, que resulte em majoração de bem ou serviço ou dos respectivos custos”. Resta ainda claro que para a caracterização do aumento arbitrário de lucros será levado em consideração o grau de concentração econômica do setor eventualmente acusado daquela prática. Não foram identicados outros dispositivos legais que impusessem limitação aos lucros
ou que conceituassem o que seriam lucros abusivos ou excessivos. A Lei nº 1.521/1951, ao
tipicar no seu art. 4º, alínea “b”, o crime de usura pecuniária ou real, quanticou como
excessivo o lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida. Contudo, tal denição só se aplica aos casos de abuso da premente
necessidade, inexperiência ou leviandade de outra parte. Trata-se, por conseguinte, de negócio jurídico eivado de vício de lesão, nos termos do art. 157 do Código Civil, passível de anulação. “art. 4º, b. obter, ou estipular, em qualquer contrato, abusando da premente necessidade, inexperiência ou leviandade de outra parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida”.
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TOLEDO, Gastão Alves de. O direito constitucional econômico e sua efcácia . Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 221. (Nota constante do original). GOMES, Carlos Jacques Vieira. Ordem econômica constitucional e direito antitruste . Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2004. p. 90. (Nota constante do original).
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A Lei nº 8.666/1993, no seu art. 43, IV, ao estabelecer o critério de julgamento dos preços praticados na licitação, considera como parâmetro o preço de mercado. Por conseguinte, sendo o preço proposto pelo licitante, incluindo o BDI, compatível com o preço de mercado estimado pela Administração, não há que se falar em lucro excessivo. Suponhamos uma empresa que, ao otimizar a utilização de seus fatores de produção, minimize seus custos totais. Ao participar de um procedimento licitatório, essa empresa deverá, necessariamente, reduzir sua margem de lucro ou poderá ser selecionada para prestar serviços à Administração, mesmo que sua margem de lucro atinja percentual considerado elevado? A redução poderá ser cogitada, caso desconheça o mercado. Porém, como na maioria das vezes, sendo empresa de mercado, detentora de informações, utilizará de sua vantagem na otimização dos custos para maximizar seu lucro por meio da diferença entre a receita e o custo de produção. Isto é lícito e aceitável. Ademais, se utilizarmos o conceito de lucro anteriormente mencionado e considerarmos que o lucro representa a remuneração de fatores como “o custo de oportunidade do capital aplicado, capacidade administrativa, gerencial e tecnológica adquirida ao longo de anos de experiência no ramo, responsabilidade pela administração do contrato e condução da 40
obra por estrutura organizacional da empresa e investimentos na formação prossional
do seu pessoal e criar a capacidade de reinvestir no próprio negócio”, e não somente da atividade econômica da empresa, cará evidente a árdua tarefa de se denir um percentual
máximo para a aceitação do lucro. Diante do exposto, consideramos que não há, pela mera análise do percentual de juros praticados, como caracterizá-lo como excessivo ou abusivo, também não se podendo limitar o lucro praticado pelo empreendedor se não for constatado abuso de poder econômico decorrente de seu aumento abusivo. Mais importante que estabelecer limitação de lucros é denir adequadamente os itens
que devem integrar o LDI, bem como assegurar que o procedimento licitatório permita a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública. 5 DESPESAS QUE NÃO DEVEM SER INCLUÍDAS NO LDI Vistos os principais componentes do LDI e, em razão da sua incidência sobre os custos diretos para formação do preço da obra, é importante evitar a inclusão de itens inadequados, cujas características predominantes determinem sua classicação como custos diretos, ou não se classiquem como custos diretos ou indiretos, como os tributos
sobre o lucro e a renda, que não devem ser computados no preço da obra. Como se depreende dos já lançados conceitos de custos diretos e indiretos, a distinção entre eles é essencial nesse método de formação de preço de obra, pelo qual se utiliza o LDI. Este critério, além de facilitar a medição e a scalização dos itens executados, possibilita
à Administração evitar indesejáveis impactos que eventuais aditivos para mudança de
especicações de materiais e/ou equipamentos, por exemplo, possam acarretar no preço nal da obra sem que aumento nos custos indiretos de fato tenha ocorrido.
Como exemplo, a administração local, a mobilização/desmobilização e a instalação do canteiro, são itens que, embora não representem serviços unitários, são custos diretos e devem ser apropriados como tais no orçamento da obra, pois decorrem diretamente da sua execução. Há também elementos que, por sua natureza, não devem estar embutidos no preço da obra e, portanto, não podem compor o LDI. Entre eles estão o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
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Lei 8.666/93, Art.43, IV - vericação da conformidade de cada proposta com os requisitos do edital e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou xados por órgão ocial competente, ou ainda com os constantes do
sistema de registro de preços, os quais deverão ser devidamente registrados na ata de julgamento, promovendose a desclassicação das propostas desconformes ou incompatíveis. (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Embora tenha sido vericado que algumas empresas e entidades públicas, ao elaborarem
os seus orçamentos, incluem alguns deles, ou até todos, como parte do LDI, considera-se inadequada essa prática. Nas próximas linhas são analisadas cada uma dessas despesas quanto a sua adequada classicação.
5.1 Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL): O IRPJ e a CSLL são tributos que têm como fato gerador a obtenção de resultados positivos (lucros) pelas empresas em suas operações industriais, comerciais e de prestação de serviços, além do acréscimo patrimonial decorrente de ganhos de capital (receitas nãooperacionais). A base de cálculo do IRPJ e da CSLL é o lucro real, presumido ou arbitrado, correspondente ao período de incidência, e deve ser determinado observando-se a legislação vigente na data da ocorrência do fato gerador (Lei nº 9.430/1996, art. 1º, c/c o art. 28). 41
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Quanto à sua natureza, esses tributos são classicados como tributos diretos.
No ordenamento jurídico brasileiro, existem tributos que por sua natureza permitem a transferência do respectivo encargo nanceiro para terceiros, e outros que não permitem.
Este fenômeno é chamado de repercussão econômica dos tributos, ou seja, o contribuinte de jure ou de direito ao pagar o tributo sofre um ônus econômico que procurará transladar para outra pessoa, o contribuinte de fato. Este, ao suportá-lo, consuma o fenômeno da trajetória do ônus econômico do tributo, isto é, sua repercussão. A repercussão econômica do tributo é um critério utilizado por grande parte da doutrina especializada, pela quase totalidade da jurisprudência dos tribunais superiores pátrios, e, sobretudo, pelo legislador do Código Tributário Nacional para classicação dos tributos
como diretos ou indiretos. O professor Luiz Emygdio F. da Rosa Junior descreve: “Observando-se o fenômeno econômico da translação ou repercussão dos tributos, impostos diretos são aqueles que, por sua natureza, não comportam a transferência da carga tributária do contribuinte obrigado por lei ao seu pagamento (contribuinte de direito) para o contribuinte de fato (pessoa não obrigada por lei ao pagamento). Em outras palavras, os impostos diretos não se prestam à repercussão, pelo que o contribuinte de direito suporta 43
em denitivo a carga tributária, sem transferi-la para outra pessoa. Impostos indiretos
são aqueles que se prestam, por sua natureza, à repercussão, podendo o ônus tributário ser transferido pelo contribuinte designado pela lei (contribuinte de direito) para outra pessoa que suportará, em denitivo, e ao nal do processo econômico de circulação de
riquezas, a carga tributária (contribuinte de fato). Por esse critério são impostos diretos o IR, o IPTU, o ITR etc., enquanto são impostos indiretos o IPI, o ICMS etc”. Hugo de Brito Machado esclarece que: “pode-se dizer que o tributo é direto quando o respectivo ônus nanceiro é suportado
pelo próprio contribuinte; e indireto quando esse ônus é transferido para terceiros. Em outras palavras, o tributo é direto quando a pessoa legalmente obrigada a seu pagamento
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Os argumentos utilizados neste ponto tem como base um estudo desenvolvido pela 1ª SECEX denominado “Análise sobre a inclusão do IRPJ e CSLL nos orçamentos e nos preços propostos pelas licitantes no âmbito da Administração Pública” (s. 176/209 Anexo II). (Nota constante do original).
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Esta lei dispõe sobre a legislação tributária federal (especialmente IRPJ), as contribuições para a Seguridade Social (especialmente CSLL), o processo administrativo de consulta e dá outras providências. (Nota constante do original). Manual de direito fnanceiro & direito tributário. 16. ed. Rio de Janeiro: Renovar. p. 358-359. (Nota constante do original).
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suporta efetivamente o ônus. Diz-se que é indireto quando a pessoa legalmente obrigada a seu pagamento transfere o ônus correspondente para terceiros”. A Secretaria da Receita Federal (SRF), a própria administradora desses tributos, utiliza a repercussão econômica em seus estudos e trabalhos, como visto abaixo: “A teoria econômica abriga a tradicional classicação dos tributos, segundo a incidência efetiva da taxação, em diretos e indiretos. Na incidência direta o gravame nanceiro imposto pelo Estado é direta e integralmente assumido pelo contribuinte, que tem sua renda reduzida pelo exato valor da exação. Na incidência indireta, surge a gura de um intermediário (contribuinte de direito) que, embora se encontre na obrigação de apurar e antecipar o pagamento do tributo devido, não o suporta, pois tem a faculdade de reaver de outro agente econômico (contribuinte de fato) o valor repassado aos cofres públicos. O tributo paradigmático do primeiro caso (incidência direta) é o imposto de renda das pessoas físicas, em que o contribuinte recolhe ao erário uma fração de sua renda, reduzindo seu bem-estar na proporção do montante subtraído. Não é por acaso que as políticas tributárias de cunho redistributivo apoiam-se basicamente nesse imposto, pois ca garantido, ao menos teoricamente, que o contribuinte não poderá transferir a outrem à carga tributária que lhe é imposta. Portanto, uma vez denida (como é praxe em quase todos os países) uma estrutura progressiva de taxação (tabela progressiva de alíquotas), garante-se uma tributação progressiva em relação à renda auferida. De outra espécie é o tributo indireto. Em geral a incidência indireta tem como alvo os atos negociais praticados pelas pessoas jurídicas. O valor do imposto pago antecipadamente por uma empresa é recuperado, em geral, pela incorporação do custo tributário ao preço negociado nas transações com terceiros. Se o terceiro também é uma pessoa jurídica, o processo de transferência de custo se repete de tal sorte que assumirá o ônus tributário o consumidor nal do bem ou serviço transacionado. Praticamente todos os impostos pagos pelas empresas, sejam sobre a venda de mercadorias, folha de pagamentos, ativos, etc., são, integral ou parcialmente, agregados ao preço e suportados por quem dá o destino nal ao produto/serviço. Este estudo limita-se à análise da incidência indireta sobre a venda de mercadorias e serviços ou, de forma equivalente, sobre o faturamento. [...] Considerando que os tributos analisados têm incidência indireta (PIS/COFINS, IPI e ICMS) e são, portanto, regressivos em relação à renda total, propõe-se investigar as características da incidência em relação ao consumo das famílias. Tendo em vista que cada tributo tem estrutura de alíquotas e grau de abrangência própria, é de se esperar que produza efeitos distintos sobre as famílias, resultando em cargas tributárias diferenciadas. O principal desao dessa abordagem é estimar, em uma economia complexa como a brasileira, o impacto nal de cada tributo no consumo nas diversas faixas de renda”. Em outros estudos, a SRF explicita que o IR é um tributo direto: “Embora a lei que institua o tributo dena, entre outras coisas, o fato gerador e o sujeito passivo da obrigação tributária, persiste o problema da identicação do real receptor da carga tributária. Seguiremos, aqui, a abordagem usualmente adotada em que os tributos considerados indiretos são integralmente repassados aos consumidores nais de bens e serviços. [...] Neste cômputo, limitar-nos-emos, quanto à tributação direta (sobre os rendimentos), ao imposto de renda e às contribuições para a seguridade social e, quanto à tributação indireta (sobre o consumo), ao ICMS, IPI, COFINS e PIS. Esta limitação prende-se tanto a questões 44
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Curso de direito tributário . 25. ed. São Paulo: Malheiros. p. 201. (Nota constante do original). Estudo realizado pela Receita Federal. A progressividade no consumo: tributação cumulativa e sobre o valor agregado. Disponível em: . (Nota constante do original).
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de ordem prática (falta de dados relativos aos impostos patrimoniais e ao Imposto sobre a Prestação de Serviços – ISS) como à falta de uma análise mais rigorosa quanto ao efeito translação, descrito na Seção 02.2, de alguns tributos indiretos como o IOF. Os conceitos de tributação direta e indireta utilizados de forma recorrente no texto devem ser assim entendidos: Tributação Direta: refere-se às incidências tributárias que guardam relação direta com a renda do contribuinte. [...]
Tributação Indireta: refere-se às incidências tributárias que não visam a fonte de renda do contribuinte, gravando a circulação de mercadorias, a prestação de serviço ou o faturamento das empresas. No presente contexto equivale à tributação sobre o consumo. [...]
Entretanto, ao considerar a abordagem aqui adotada, e para captar com maior precisão os efeitos reais da tributação direta e indireta, deve-se levar em conta o seguinte: a) A tributação direta tem como principal apelo o sempre desejável princípio da justiça scal, pois individualiza o contribuinte, tributando-o segundo sua real capacidade
contributiva. b) A tributação indireta, que em sua forma mais racional, limita-se aos impostos sobre o valor agregado, apresenta o atrativo da simplicidade e universalidade. [...] Para se determinar a carga scal sobre o consumo, é necessário considerar não apenas os
tributos que, por sua natureza econômica e jurídica, são transferidos aos preços (impostos sobre valor agregado) como também aqueles que, independentemente da incidência legal, ndam por onerar o produto nal, recaindo de fato sobre o consumidor. O primeiro passo consiste na identicação de ambos tipos de incidência e na determinação, quando
possível, da alíquota aplicada”.
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Dessa forma, verica-se que esses tributos (IRPJ e CSLL) apresentam o mesmo fato gerador,
obtenção de resultados positivos (lucros), praticamente a mesma base de cálculo e possuem a mesma natureza tributária, quando se trata da repercussão econômica. Além disso, se esses tributos fossem repassados, o “contribuinte de fato” seria a própria Administração. Ora, isso seria uma forma disfarçada e não prevista em lei de Incentivo Fiscal, ferindo a isonomia entre empresas de diferentes ramos. Um outro aspecto a ser analisado é a questão da repercussão da alteração da carga tributária do IRPJ e da CSLL para o pleito de recomposição do equilíbrio econômico-nanceiro
conforme preceitua o art. 65, II, alínea “d” e o §5º do mesmo artigo da Lei nº 8.666/1993, in verbis: “Art. 65. Os contratos regidos por esta lei poderão ser alterados, com as devidas justicativas, nos seguintes casos: [...] II - por acordo das partes: [...]
d) para restabelecer a relação que as parte pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-nanceiro inicial
do contrato, na hipótese de sobreviverem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, congurando álea econômica extraordinária e extracontratual. [...]
§5º Quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados ou extintos, bem como a superveniência de disposições legais, quando ocorridas após a data da apresentação da 46
Estudo realizado pela Receita Federal. Carga tributária sobre os salários. Disponível em: . (Nota constante do original).
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proposta, de comprovada repercussão nos preços contratados, implicarão a revisão destes para mais ou para menos, conforme o caso”. Apesar de a alteração da carga tributária ensejar revisão dos preços contratados, o professor Marçal Justen Filho ressalta que no caso da alteração da carga do IR não caberia recomposição, conforme descrito abaixo: “O §5º alude, expressamente, à instituição ou supressão de tributos ou encargos legais como causa de revisão dos valores contratuais. O dispositivo seria desnecessário, mas é interessante a expressa determinação legal. O fato causador do rompimento do equilíbrio econômico-nanceiro pode ser a instituição de exações scais que onerem, de modo especíco, o cumprimento da prestação pelo particular. Assim, por exemplo, imagine-se
a criação de contribuição previdenciária sobre o preço de comercialização de um certo produto agrícola. O fornecedor da Administração Pública terá que arcar com o pagamento de uma nova contribuição, a qual inexistia no momento da formulação da proposta. É necessário, porém, um vínculo direto entre o encargo e a prestação. Por isso, a lei que aumentar a alíquota do imposto de renda não justicará alteração do valor contratado.
O imposto de renda incide sobre o resultado das atividades empresariais, consideradas globalmente (lucro tributável). O valor percebido pelo particular será sujeito, juntamente com o resultado de suas outras atividades, à incidência tributária. Se a alíquota for elevada, o lucro nal poderá ser inferior. Mas não haverá relação direta de causalidade que caracterize rompimento do equilíbrio econômico-nanceiro (e não aumentará o ‘custo’). A forma prática de avaliar se a modicação da carga tributária propicia desequilíbrio da equação econômico-nanceira reside em investigar a etapa do processo econômico sobre
o qual recai a incidência. Ou seja, a materialidade da hipótese de incidência tributária consiste em certo fato signopresuntivo de riqueza. Cabe examinar a situação desse fato signo-presuntivo no processo econômico. Haverá quebra da equação econômico-nanceira quando o tributo (instituído
ou majorado) recair sobre atividade desenvolvida pelo particular ou por terceiro necessária à execução do objeto da contratação. Mais precisamente, cabe investigar se a incidência tributária congura-se como um ‘custo’ para o particular executar sua prestação. A resposta
positiva a esse exame impõe o reconhecimento da quebra do equilíbrio econômiconanceiro.
Diversa é a situação quando a incidência recai sobre a riqueza já apropria pelo particular, incidindo economicamente sobre os resultados extraídos da exploração. Assim, a elevação do ICMS produz desequilíbrio sobre contratos que imponham ao particular, como requisito de execução de sua prestação, a necessidade de participar de operações relativas à circulação de mercadorias. O mesmo se diga quando se eleva o IPVA se a execução da prestação envolver necessariamente a utilização de veículos automotores. Mas a instituição de imposto sobre a renda apresenta outro contorno, eis que a incidência se dá sobre os resultados obtidos pelo particular na exploração de um empreendimento”. Além disso, existe a questão da imprevisibilidade de o lucro se realizar, pois como este será determinado em função de um conjunto de obras executadas pela empresa pode 47
acontecer que a empresa tenha prejuízo no exercício nanceiro em questão e não tenha IRPJ
e CSLL a pagar. André Mendes e Patrícia Bastos ressaltam esse aspecto conforme abaixo: “Mostra-se bastante lógica essa não-inclusão do imposto de renda no BDI, já que por não 48
ser um imposto que incide especicamente sobre o faturamento, não pode ser classicado
como despesa indireta decorrente da execução de determinado serviço.
47
48
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos . 10. ed. São Paulo: Dialética, 2004. p. 532. (Nota constante do original). MENDES; BASTOS. Um aspecto polêmico dos orçamentos de obras públicas: Benefícios e Despesas Indiretas (BDI). Revista do Tribunal de Contas da União , p. 13-28. (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Se a contratante concordar em pagar determinada taxa percentual do imposto de renda embutida no LDI, estará pagando um gasto que na verdade é imprevisível, podendo coincidir ou não com o valor pactuado como despesa indireta. Ademais, pode até ser que ao nal do exercício o desempenho nanceiro negativo de
outras obras da contratada suplante o lucro obtido com a obra da contratante, e aquela, de acordo com a atual legislação scal, não recolha imposto de renda. Assim, teria sido ressarcido à contratada o valor de uma despesa que, na verdade, não se efetivara. [...]
Como a legislação que instituiu a CSLL determina que a incidência seja sobre o lucro líquido do exercício, excluída a provisão para o imposto de renda, não se pode, contabilmente, denir este gasto como sendo despesa indireta resultante da execução de alguma obra.
Dessa forma, assim como o IRPJ, não é adequado incluir o CSLL no BDI do orçamento da construção civil, já que ele não está atrelado ao faturamento decorrente da execução de determinado serviço, mas ao desempenho nanceiro da empresa como um todo”.
É interessante apresentar a estrutura da Demonstração de Resultado do Exercício – DRE (Anexo I deste trabalho), segundo o art. 187 da Lei nº 6.404/1976, onde se verica
claramente a distinção entre tributos que incidem sobre o faturamento (PIS, COFINS, ISS, por exemplo), alterando o resultado operacional da empresa, dos tributos que só incidem sobre o resultado do exercício (IRPJ e CSLL), que ao nal do ano, depois de consideradas
todas as atividades da empresa, podem até não serem devidos caso o conjunto de obras vier a trazer prejuízo. Estudos da Secretaria de Governo e Gestão Estratégica do Estado de São Paulo e da Associação Brasiliense de Construtores (ASBRACO) também não consideram o imposto de renda como integrante do BDI. Ora, conforme exposto nos parágrafos acima, o IRPJ e a CSLL, por serem tributos diretos, 49
50
não permitem a transferência do seu encargo nanceiro para outra pessoa, ou seja, a
pessoal legalmente obrigada ao seu pagamento suportará efetivamente o ônus. Dessa forma, considera-se inadequada a inclusão do IRPJ e da CSLL na composição do LDI. Cabe ressaltar que este Tribunal já se pronunciou sobre a inclusão indevida desses tributos na composição do LDI, como, por exemplo, no Acórdão 1.595/2006-Plenário no item 9.5.11 transcrito abaixo: “9.5. determinar à Petrobras que: [...]
9.5.11. exclua dos seus orçamentos parcelas relativas ao IRPJ e à CSLL, bem como oriente as licitantes, em seus editais, que tais tributos não deverão ser incluídos no BDI, por se constituírem em tributos de natureza direta e personalística, que onera pessoalmente o contrato, não devendo ser repassado ao ofertado, conforme, inclusive, conclusões do setor jurídico da estatal, mediante o DIP SEJUR/DITRIB 37216/97 e DIP/Jurídico/JFT 4391/03”. 5.2 Administração Local: A Administração Local consiste em despesas incorridas para manutenção das equipes técnica e administrativa e da infra-estrutura necessárias para a consecução da obra. Entre as despesas que normalmente são alocadas nesse item, encontram-se: gastos relativos a pessoal (engenheiros, mestres, encarregados, almoxarifes, vigias, pessoal de recursos humanos e demais mãos-de-obra não computadas nas planilhas de custos unitários dos serviços) e despesas administrativas (contas de telefone, luz e água, cópias, aluguéis), dentre outros. A Administração Local, conforme denido pelo DNIT no Sistema de Custos Rodoviários
2 – SICRO 2:
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“Estudos de serviços terceirizados” - Publicações - Versão maio/1999 - v. 1 - “Prestação de serviços de limpeza, asseio e conservação predial” - Capítulo VII - Benefícios e despesas indiretas. (Nota constante do original). Estudo sobre composição de BDI , obtido diretamente junto a Associação Brasiliense de Construtores - ASBRACO em maio de 2000. (Nota constante do original).
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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“Compreende o conjunto de atividades realizadas no local do empreendimento pelo Executor, necessárias à condução da obra e à administração do contrato. É exercida por pessoal técnico e administrativo, em caráter de exclusividade. Seu custo é representado pelo somatório dos salários e encargos dos componentes da respectiva equipe, que inclui pessoal de serviços gerais e de apoio. Segundo a metodologia adotada, estão incluídos também na administração local, os mestres e encarregados gerais, visto que os níveis inferiores da hierarquia estão incluídos diretamente nas Composições de Atividades e Serviços. Este custo depende da estrutura organizacional que o Executor vier a montar para a condução de cada obra e de sua respectiva lotação de pessoal. Não existe modelo rígido para esta estrutura. As peculiaridades inerentes a cada obra determinarão a estrutura organizacional necessária para bem administrá-la”. Os itens que integram a Administração Local, apesar de comporem o custo direto, não estão associados diretamente a uma composição de serviço do empreendimento. Cabe, portanto, ressaltar que o custo direto pode ser visto de modo stricto senso e lato senso. De maneira restrita pode-se considerar o custo direto como aquele em que estão inseridos os 51
serviços que integrarão o produto nal. De forma ampla, o custo direto, além dos custos anteriormente descritos, englobará aqueles que, apesar de não especicamente associados ao produto nal, estão diretamente ligados à execução dos serviços de construção civil como um todo. O estudo de André Luíz Mendes e Patrícia Bastos exemplica essas 52
situações: “Assim, por exemplo, o item de serviço ‘alvenaria’ contempla os custos de mão-de-obra do pedreiro e do servente (além dos materiais aplicados), mas os custos com o encarregado de pedreiros ou com o mestre-de-obras (que supervisionaram o trabalho) serão computados no componente ‘administração local’. [...]
Sabe-se que a estrutura da administração local varia de acordo com as características de cada obra. Há entretanto algumas atividades básicas que são inerentes à execução da administração de qualquer projeto: a) trânsito entre obras : transporte no trajeto entre o escritório central e o local da obra, do engenheiro de obras, de documentos em geral, de pequeno suprimento de materiais, etc.; b) direção técnica dos serviços: denição, junto aos operários, do ritmo de andamento dos
serviços e da forma de execução; c) atendimento a clientes: elaboração de relatórios para esclarecimento aos clientes sobre o andamento e a qualidade dos serviços e atendimento nas visitas para medição dos serviços executados; d) scalização da qualidade dos materiais e serviços: conferência da qualidade dos
materiais que foram recebidos no canteiro e supervisão das condições de estocagem e de distribuição ao local de aplicação dos materiais; e) controle do consumo da mão-de-obra: scalização da quantidade de horas gastas com
cada serviço, observando a produtividade e o andamento geral dos serviços e comparando com o cronograma físico-nanceiro da obra;
f) pedido antecipado de insumos: solicitação de material para o canteiro de obras, tomando como base o planejamento existente e o andamento real dos serviços; g) programação e scalização dos serviços: distribuição de tarefas e scalização da quali-
dade de execução dos serviços; h) apontamento das horas trabalhadas: conferência e contabilização das horas trabalhadas pelos operários, para efeito de pagamento de salários;
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52
DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA- ESTRUTURA DE TRANSPORTES. Sicro 2- Manual de Custos Rodoviários , 2003. v. 1, p. 12. (Nota constante do original). MENDES; BASTOS. Um aspecto polêmico dos orçamentos de obras públicas: Benefícios e Despesas Indiretas (BDI). Revista do Tribunal de Contas da União , p. 13. (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
i) recebimento e controle de estoque de materiais: recebimento de materiais entregues, conferência da quantidade e da descrição de cada material analisando a nota scal e o
pedido interno, documentação da entrada e da saída de materiais no canteiro e controle do estoque de materiais; j) equipe de limpeza contínua: efetuar a limpeza permanente da construção e do canteiro de obras; k) equipe de carga e descarga: descarregar os materiais entregues no canteiro de obras e carregar aqueles que irão ser transportados para fora do canteiro”. No mesmo sentido, em estudo apresentado no site do Sinduscon-SP (“Nova Conceituação do BDI”) foi proposto que o item Administração Local não mais integrasse o BDI: “1 - ADMINISTRAÇÃO LOCAL - Propõe-se passar a compor a planilha de Custo Direto e não mais o BDI. Todas as despesas havidas ou incorridas direta ou indiretamente em torno do ambiente 53
da obra para a consecução do produto nal serão considerados CUSTOS DIRETOS.
A Administração Local compreende as seguintes atividades básicas: Chefia da obra - engenheiro responsável; Administração do Contrato; Engenharia e Planejamento; Segurança do Trabalho; Produção - mestre de obra e encarregados; Manutenção dos equipamentos; Gestão de Materiais; Gestão de Recursos Humanos; Administração da obra. Assim, as despesas da Administração Local e a sua manutenção, Alimentação e Transporte do pessoal administrativo e de produção da obra, EPI e uniformes, controle tecnológico e ensaios, ferramentas e equipamentos não contemplados na composição de custos unitários, deverão fazer parte da Planilha de Orçamento e não mais na composição do BDI. Essas despesas farão parte da Planilha de Orçamento em itens independentes da composição de custos unitários, especicados como Administração Local, podendo-se adotar
as seguintes alternativas: Preços compostos analiticamente; Custo mensal ou horário de mão-de-obra administrativa ou técnica; Custo mensal reembolsável; Custo mensal ou total de manutenção do canteiro de obras; Verba; Módulo de Verba”. Estudo semelhante foi apresentado no site do Sinduscon-BA, onde também é defendida a inserção da Administração Local no custo direto e não no BDI. É importante destacar, além da alocação da administração local nos custos diretos, a 54
abrangência deste item. Os custos diretos são geralmente quanticados em planilhas
de valores unitários dos serviços. Nos casos em que isso não é possível, os custos associados diretamente à execução da obra devem estar alocados em algum subitem do item administração local. Por exemplo, além de todas as despesas administrativas e de infra-estrutura necessárias, a administração local deve abrigar os custos derivados da mão-de-obra, que não foram apropriados nas planilhas de custos unitários, usualmente os encargos complementares como alimentação, transporte, alojamento, EPI (equipamentos de proteção individual) e ferramentas. É importante esse destaque, pois em deliberações do TCU que versam sobre contratos de obras, vericou-se a orientação de desonerar o LDI dos respectivos contratos com a exclusão de custos a esses assemelhados. Conrma-se, dessa forma, a orientação de evitar, 55
no cálculo do LDI, o cômputo de qualquer custo que possa ser associado diretamente à 53
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55
Estudo no site do Sinduscon-SP. Nova conceituação do BDI . p. 5. Disponível em: . (Nota constante do original). Estudo no site do Sinduscon-BA. Metodologia de cálculo do orçamento de edifcações: composição do custo direto e
do BDI/LDI. Disponível em: . (Nota constante do original). Decisão 1332/2002 - TCU - Plenário. Ver também Manual de custos rodoviários - v. 1 - Metodologia e Conceitos do DNIT (2003) que na p. 12 cita a mesma Decisão deste Tribunal para justicar a mudança na metodologia de
cálculo do LDI. (Nota constante do original).
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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execução da obra, impedindo a incidência indevida ou em duplicidade desses elementos sobre os demais custos diretos calculados para a obra. Vale ressaltar que a inclusão da Administração Local ou de algum elemento que a devesse integrar eleva o percentual do LDI, o que, em casos de repactuação de preços ou de mudanças de especicação de algum item da obra, pode elevar o preço da obra de forma inadequada. Como exemplo, cite-se o caso da mudança de especicação de um piso cerâmico comum para granito. Essa mudança não trará mais trabalho para o engenheiro, para o mestre ou o almoxarife (cujos custos estão inseridos na Administração Local). Afetará apenas o custo direto da composição referente ao serviço de assentamento do piso (o material, a mão-de-obra e os equipamentos envolvidos no serviço) e o preço nal. Caso a Administração Local esteja no LDI, haverá um aumento do preço da obra sem um correspondente aumento de trabalho para o engenheiro, o mestre ou o almoxarife, por exemplo. 5.3 Instalação de Canteiro e Acampamento e Mobilização e Desmobilização: “Denomina-se de Canteiro e Acampamento ao conjunto de instalações destinadas a apoiar as atividades de construção. Compreende número expressivo de elementos, com características bastante diferenciadas, que, embora não se incorporem sicamente ao empreendimento, representam parcela signicativa do custo de investimento e, como tal, devem ser criteriosamente orçados. Não existem padrões xos para esse tipo de instalações. Elas são função do porte e das peculiaridades do empreendimento, das circunstâncias locais em que ocorrerá a construção e das alternativas tecnológicas e estratégicas para sua realização”. O Acampamento se constitui de um local onde as pessoas que irão executar a obra carão alojadas e terão apoio de certas instalações para o seu conforto e segurança. Já o Canteiro compreende as instalações físicas das unidades técnicas, administrativas e de apoio da obra como por exemplo: escritório de engenharia, almoxarifado, refeitório, sanitários, ambulatório, laboratórios, sistemas de abastecimento de água, luz, ocina de manutenção de equipamentos, central de concreto, armação, carpintaria, entre outros. “A mobilização e desmobilização são constituídas pelo conjunto de providências e operações que o Executor dos serviços tem que efetivar a m de levar seus recursos, em pessoal e equipamento, até o local da obra e, inversamente, para fazê-los retornar ao seu ponto de origem, ao término dos trabalhos. No momento em que se necessita desses valores, para incluí-los no orçamento, uma série de parâmetros relativos às circunstâncias reais em que se darão a mobilização e a desmobilização são ainda desconhecidas, pois dependem de particularidades inerentes à empresa que vier a se encarregar dos serviços. Esse obstáculo só poderá ser contornado através da admissão de algumas hipóteses que supram a deciência apontada”. As empresas, geralmente, após transportarem os seus equipamentos para uma obra, ao m desta, buscam deslocá-los para uma nova obra. Então, é comum que constituam pátios de equipamentos em locais próximos às obras concluídas para que aguardem uma remobilização para outra obra. Para se calcular os gastos com mobilização, além da questão da origem e do destino, devem ser consideradas a estimativa de força de trabalho a ser deslocada e os custos de mobilização de equipamentos. Como os itens de Instalação de Canteiro e Acampamento e Mobilização e Desmobilização são passíveis de serem orçados analiticamente e como, contabilmente, são gastos incorridos 56
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DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA- ESTRUTURA DE TRANSPORTES. Sicro 2 – rodoviários , p. 13. (Nota constante do original). DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES. Sicro 2 – rodoviários , p. 16. (Nota constante do original).
Manual de custos Manual de custos
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
no processo de obtenção de bens e serviços destinados à venda, podem ser inseridos no custo direto, em um item independente da composição dos custos unitários. As mesmas observações tecidas à Administração Local quanto ao impacto de uma eventual repactuação de preços ou mudança na especicação de algum material/equipamento
valem para a Instalação de Canteiro e Acampamento e a Mobilização e Desmobilização, casos esses itens sejam considerados no LDI. 6 DESPESAS REFERENTES À AQUISIÇÃO DE EQUIPAMENTOS Situação peculiar quanto à aplicação do LDI, surge na aquisição de bens (equipamentos e materiais) que correspondam a um percentual signicativo do preço global da obra, na
qual a incidência da mesma composição de LDI paga para serviços pode gerar distorções no preço nal do insumo, razão pela qual consideramos que a composição de LDI aplicável,
neste caso, deve ser mais restrita que aquela referente à prestação de serviços. Primeiramente, durante os estudos de viabilidade e anteprojetos, ou seja, antes mesmo de se realizar a licitação para contratação do empreendimento, o gestor deve estudar a possibilidade de adquirir os equipamentos em separado com o objetivo de proceder o parcelamento do objeto previsto no art. 23, §1º, da Lei nº 8.666/1993. Esse dispositivo legal dispõe que: “§1º As obras, serviços e compras efetuadas pela administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade, sem perda da economia de escala”. O próprio Tribunal já se pronunciou diversas vezes sobre essa questão, como nos Acórdãos 159/2003-Plenário, 446/2005-Plenário e o 1601/2004-Plenário que reproduzimos trecho in verbis: “[...] constitui irregularidade grave a falta de licitação autônoma, sem o parcelamento do
objeto da licitação quanto à compra de equipamentos, conforme preconizado no art. 23, §1º, da Lei nº 8.666/1993”. Assim, quando existir parcela de natureza especíca que possa ser executada por empresas
com especialidades próprias e diversas ou quando for viável técnica e economicamente, o parcelamento em itens se impõe, desde que seja vantajoso para a Administração. Uma das vantagens que se pode apontar é que a administração estará evitando pagar LDI sobre LDI, ou seja, o LDI da empresa fabricante de equipamentos/materiais e o da empresa construtora que incidirá sobre aquele. Um outro benefício é que, realizando uma licitação autônoma para aquisição de equipamentos/materiais, poderá haver uma ampliação da competitividade e a administração terá a possibilidade de obter preços mais vantajosos. Caso tal parcelamento não se comprove técnica ou economicamente viável, com base em estudos fundamentados, a aquisição dos equipamentos e materiais poderá ser realizada juntamente com a execução da obra. Neste caso, o administrador público no seu orçamento deve adotar para compra dos equipamentos/materiais uma taxa de LDI diferenciada em relação aos adotados para os serviços de engenharia e deve exigir dos licitantes a composição das suas taxas para comparação com o que foi orçado. No que tange aos itens do LDI passíveis de serem cobrados, no caso da aquisição de equipamentos/materiais por intermédio dos empreiteiros, inicialmente cabe uma ressalva em relação aos tributos. Em que pese ter sido observado o ICMS em composições da Chesf, quando da adoção de um LDI diferenciado para equipamentos/materiais, este não é um tributo passível de cobrança. Primeiramente, porque empresas construtoras não se enquadram como contribuintes deste imposto, conforme se depreende dos artigos 3º, V, e 4º da Lei Complementar nº 87/1996. Além disso, o valor deste tributo já está embutido no custo dos equipamentos/materiais a serem adquiridos, ou seja, a administração ao pagar à empreiteira pelo bem, o valor do ICMS já está inserido no preço pago. Pelo exposto,
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verica-se que a discriminação desse imposto na composição do LDI está incorreta, pois a sua cobrança não é devida. Quanto à Administração Central e ao Lucro, nesta situação, entende-se que seus percentuais devem ser inferiores em relação aos estabelecidos para a execução da obra, tendo em vista que a natureza desta operação tem complexidade menor, exigindo menos esforço e tecnologia para sua realização do que os demais serviços prestados. Também deve-se considerar que as atividades precípuas da construtora são serviços de engenharia e o fornecimento de equipamentos uma atividade acessória. Portanto, sua estrutura e seus recursos tecnológicos são dedicados à prestação de serviços e têm seus custos estimados para isso. A intermediação para fornecimento de equipamentos é uma tarefa residual, que não deve onerar os custos operacionais da empreiteira e, em conseqüência, seu impacto no custo de administração central previsto no LDI deve ser mínimo. Assim sendo, o LDI resultante calculado para aquisição de equipamentos será menor que o calculado para a prestação de serviços. Portanto, o gestor deve avaliar a forma mais vantajosa de adquiri-los, se diretamente, junto ao fabricante ou fornecedor, ou através da intermediação da contratada, a m de identicar qual alternativa se revela técnica e economicamente mais adequada. É importante esclarecer que a possibilidade de discricionariedade ca bastante limitada quando uma das alternativas se apresentar mais onerosa. 7 FÓRMULA DO LDI Para que se obtenha a taxa que corresponda ao LDI é necessário dispor de uma fórmula que reita adequadamente a incidência de cada um de seus componentes sobre os custos diretos. Para o cálculo do LDI considera-se a seguinte fórmula: 58
onde AC = taxa de rateio da Administração Central; DF = taxa das despesas nanceiras; R = taxa de risco, seguro e garantia do empreendimento; I = taxa de tributos; L = taxa de lucro. As taxas no numerador incidem sobre os custos diretos e as taxas no denominador, sobre o preço de venda (faturamento). Serão denidos, a seguir, os principais aspectos envolvidos no cálculo do LDI em empresas do setor elétrico brasileiro. 8 LDI NAS EMPRESAS DO SETOR ELÉTRICO BRASILEIRO 8.1 Eletrosul Centrais Elétricas S.A.
58
Fórmula elaborada pela equipe com base nas fórmulas de Furnas e na fórmula do trabalho de MENDES; BASTOS. Um aspecto polêmico dos orçamentos de obras públicas: Benefícios e Despesas Indiretas (BDI). Revista do Tribunal de Contas da União , p. 26. (Nota constante do original).
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Identicou-se que a Eletrosul contrata suas obras de subestações e de linhas de transmissão
em licitações do tipo menor preço, sob regime de empreitada por preço global, podendo incluir o fornecimento de equipamentos. O preço total orçado e o proposto contemplam o lucro e todos os tributos, encargos sociais, previdenciários e trabalhistas incorridos pela contratada, não sendo indicado o percentual de BDI praticado, tampouco a sua composição. 8.2 CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco Nos contratos analisados, a CHESF contratou obras de subestações e de linhas de transmissão em licitações do tipo menor preço, sob regime de empreitada por preço global, que incluem o fornecimento dos equipamentos. Contudo, houve casos em que a CHESF contratou apenas os serviços, adquirindo os equipamentos separadamente. Tanto a CHESF, para ns de orçamento, quanto os fornecedores, para ns de proposta,
preenchem planilha com o detalhamento do LDI, cuja fórmula e composição são descritas a seguir. 8.2.1 Composição de LDI A CHESF adota a seguinte composição de LDI detalhada: Salários e Encargos Material de Escritório Administração Central (AC)
Material de Limpeza Passagens Diárias Despesas com comunicação
Administração Local (AL)
Água e Energia Salários e Encargos Alimentação Material de Escritório Material de Limpeza Aluguéis Medicina e segurança do trabalho Despesas com comunicação Mobilização e desmobilização Transporte/conduções Manutenção equipamentos escritório Ferramentas Água e Energia Rateio das verbas fxas
Encargos Financeiros (EF)
Tributos (T)
IRPJ ISS PIS COFINS CPMF CSLL
Lucro (L)
Alguns itens podem variar de licitação a licitação, a depender do serviço e da estrutura de custos do fornecedor. Em contratações de obras, nas quais a representatividade dos equipamentos tenha maior participação relativa no valor total, foram observadas composições de LDI diferenciadas
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para os serviços de engenharia e para o fornecimento desses bens. Em relação ao LDI estabelecido para o fornecimento de equipamentos, quando o contratado atua apenas como um intermediário entre o fabricante e a administração pública, sua composição consistiu apenas do lucro e dos tributos incidentes sobre a transação. 8.2.2 Fórmula do LDI A Fórmula utilizada pela CHESF para o cálculo do LDI é dada por: LDI (%) = AC(%) + AL (%) + EF (%) + T(%) + Lucro (%) Trata-se de um somatório dos itens que compõem o LDI. Diverge da fórmula proposta no item 7, à medida que naquela, por ser um produto das taxas, há a incidência de um item sobre o outro, o que forneceria um percentual de LDI superior. Nota-se, também, a presença na fórmula de itens que se considera não dever integrar o LDI, tais como Administração Local e tributos como o IRPJ e a CSLL. A inclusão da Administração Local na fórmula se deve ao fato de a empresa utilizar as denições da PINI nas Tabelas de Composição de Preços para Orçamentos – TCPO. O IRPJ e a CSLL têm sua inclusão considerada inadequada por serem tributos diretos, que não permitem a transferência do encargo nanceiro para outra pessoa, isto é, a pessoa legalmente obrigada ao seu pagamento deverá suportar efetivamente o ônus. 8.2.3 Valores praticados em licitações Nos contratos analisados foram praticados os valores relacionados na Tabela III. 8.3 FURNAS Centrais Elétricas S.A. Nas licitações realizadas pela empresa é publicado nos editais apenas o orçamento dos custos diretos sem o LDI. No entanto, as propostas devem contemplar tanto os custos diretos quanto o LDI, ou seja, o preço total da obra. Em FURNAS, o detalhamento do LDI ocorre apenas para ns de orçamentação e controle interno. Com os custos diretos e a composição de LDI, a empresa tem o seu preço total da obra para comparar com os valores praticados no certame. As licitações analisadas foram realizadas sob o regime de empreitada global, na qual o preço total contempla o lucro e todos os custos, despesas, tributos e encargos sociais e trabalhistas incorridos pela contratada. Furnas não realiza licitações que incluam fornecimento conjunto de serviços e equipamentos. Estes são adquiridos em processo licitatório separado. 8.3.1 Composição de LDI Para ns de elaboração de orçamentos, FURNAS adota a seguinte composição de LDI e faixa de variação dos itens: (continua)
Item
Discriminação
1.
Administração Central
2.
Encargos Financeiros
2.1.
Encargos referentes ao período de processamento dos pagamentos
2.2.
Financiamento Obra
2.3.
Proteção dos preços dos insumos por anualidade do reajuste
3.
Taxa de Risco
4.
Impostos e Seguros Percentuais Fixos
4.1.
PIS
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
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(conclusão)
Item
Discriminação
4.2.
COFINS
4.3.
CPMF Percentuais Variáveis
4.4.
CSLL
4.5.
IRPJ
4.6.
ISSQN
4.7.
GARANTIA CONTRATUAL
5.
Lucro
8.3.2 Fórmula do LDI A Fórmula adotada por FURNAS para o cálculo do LDI é dada por:
Onde: ACC% = Administração Central da Contratada EF% = Encargos Financeiros TR% = Taxa de Risco IS% = Impostos e Seguros (PIS, COFINS, CPMF, CSLL, IRPJ, ISSQN, Garantias) L% = Lucro Furnas aloca o item Administração Local como parte do custo direto, em sintonia com a proposta contida neste trabalho. A fórmula considerada pela empresa inclui, contudo, tributos diretos como o IRPJ e a CSLL, cujo encargo deve ser suportado pela pessoa legalmente obrigada ao pagamento, não sendo permitida a transferência do encargo fnanceiro para outra pessoa.
8.3.3 Valores praticados em licitações Os valores fornecidos por Furnas encontram-se consolidados na Tabela IV, e variam entre 24,50% e 33,84%. 8.4 Eletrobras – Centrais Elétricas Brasileiras S.A. No âmbito do acordo de cooperação técnica frmado entre a ANEEL e a Eletrobras, em outubro de 2002, com o objetivo de conceber um banco de dados de custos de linhas de transmissão e de subestações, visando a geração e a atualização dos custos padrões de transmissão, foram desenvolvidos estudos que levaram à revisão e à reformulação das diretrizes para elaboração de orçamentos de ilhas de transmissão e de subestações. 59
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ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica. (Nota constante do original). BRASIL. Revisão das diretrizes para elaboração de orçamentos de linhas de transmissão – OLT, Divisão de Engenharia de Transmissão – Eletrobras S.A, fev. 2005. (Nota constante do original). BRASIL. Diretrizes para elaboração de orçamentos de subestações. Divisão de Engenharia de Transmissão – Eletrobras S.A, 2005. (Nota constante do original).
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Participaram dos trabalhos Eletrosul, Furnas, Chesf, Eletronorte e CEPEL, além da própria Eletrobras. De acordo com esses estudos, o custo total de uma obra é dado pela soma dos custos diretos, indiretos e eventuais. O custo indireto compreende o total das despesas não alocáveis diretamente à execução da obra, e envolve, segundo a Eletrobras, apenas os custos referentes à Administração Central. O item denominado eventuais é calculado através de um índice percentual sobre o custo direto e destina-se a cobrir imprevistos que virtualmente possam ocorrer durante a execução do projeto ou construção, entre os quais sobressaem: gastos com indenizações de danos causados aos proprietários de terrenos ao longo da faixa de passagem da linha, desvios de estradas, relocação de linhas de transmissão e redes de distribuição ou telecomunicações, etc. Cabe ressaltar que a Eletrobras não realiza contratações de obras, serviços e ou equipamentos, os conceitos abordados referem-se a custos modulares, visando auxiliar a ANEEL na elaboração de orçamentos para os leilões do setor elétrico. 8.5 Eletronorte – Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. A Eletronorte contrata suas obras de linhas de transmissão e de subestações para execução sob regime de empreitada por preço unitário, contudo, na seleção da proposta é considerado o menor preço global. O licitante discrimina o preço para a execução do empreendimento objeto da licitação, o qual deverá incluir todos os impostos e taxas vigentes para a execução do empreendimento objeto da licitação, bem como os custos diretos e indiretos inerentes, tais como os a seguir indicados, porém sem se limitar aos mesmos: despesas com pessoal (inclusive obrigações sociais, viagens e diárias), despesas administrativas, administração, lucro e outras despesas necessárias a boa realização dos serviços. Quaisquer tributos, custos e despesas diretas ou indiretas omitidos da Proposta ou incorretamente cotados serão considerados como inclusos nos preços, não sendo considerados, em caso de adjudicação, pleitos de acréscimos. O licitante vencedor rma declaração (contudo, sem efetuar a discriminação por itens) informando o percentual de LDI praticado no preço ofertado, o qual inclui todos os custos de administração central, taxas, emolumentos, impostos, contribuições, seguros, benefícios e materiais de consumo necessários para a execução das obras civis e montagem eletromecânica, com fornecimento parcial de materiais, para ampliação da obra. (TCU. Acórdão nº 325/07, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 16 mar. 2007)
Como se vê, diversas são as metodologias empregadas para a denição do valor do BDI. Todas estão corretas quando não implicarem cobrança de valores em duplicidade ou incompatíveis com os efetivamente praticados. Uma dessas metodologias para o cálculo do BDI subdivide as parcelas que o compõe em dois grupos básicos: as que incidem sobre o custo direto total e as que incidem sobre o preço de venda. Nesse caso, a fórmula para o cálculo nal do BDI será: 62
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Vale lembrar que as demais metodologias sempre serão corretas quando não implicarem cobrança de valores em duplicidade ou incompatíveis com os efetivamente praticados.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Em resumo, algumas questões interessantes surgem quando se discute a composição do BDI. A primeira delas é a pertinência da inclusão do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro das Pessoas Jurídicas (CSSL) na taxa de BDI. Nesse particular, releva observar a natureza desses dois tributos: A Doutrina, a Jurisprudência dos Tribunais superiores e do TCU e a própria administradora tributária, SRF, armam que existem tributos que, por sua natureza, não repercutem economicamente, isto é, não transferem para terceiros o seu encargo nanceiro, oneram
pessoalmente os contribuintes (personalíssimos), são tributos diretos. Entre estes, encontramos o IR e a CSLL. Neste mesmo sentido, a Jurisprudência dos Tribunais superiores e a própria administradora tributária, SRF, vinculam que para os tributos indiretos faz-se necessária a comprovação de haver assumido o encargo nanceiro, ou, no
caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-lo. E que para os tributos diretos, como o IRPJ e a CSLL, não se faz necessário esta comprovação, pois estes não repercutem economicamente para terceiros, pois, sabe-se que apenas o contribuinte suportou o ônus nanceiro, portanto este é que pode pleitear e compensar
os créditos tributários do IR e da CSLL. Portanto, a contratante não deve suportar o ônus destes tributos, primeiramente, devido as suas naturezas tributárias, tributos diretos, que não repercutem economicamente a terceiros. Em segundo lugar, e, conseqüentemente pela natureza destes tributos, as contratantes não podem compensar-se nos casos de repetição do indébito, pois, como pacicamente entendido pela Jurisprudência dos Tribunais
superiores e a própria administradora tributária, SRF, tais tributos não foram suportados, transferidos, por terceiros. (TCU. Acórdão nº 1.595/2006, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006)
Em face dessas ponderações, o TCU formulou determinação à entidade pública no sentido de que “exclua dos seus orçamentos parcelas relativas ao IRPJ e à CSLL, bem como oriente as licitantes, em seus editais, que tais tributos não deverão ser incluídos no BDI, por se constituírem em tributos de natureza direta e personalística, que onera pessoalmente o contrato, não devendo ser repassado ao ofertado, conforme, inclusive, conclusões do setor jurídico da estatal” (TCU. Acórdão nº 1.595/2006, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006). Esse entendimento foi posteriormente consolidado por meio da Súmula nº 254/2010 (TCU. Acórdão nº 625/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 13 abr. 2010). Entretanto, o próprio Tribunal reconhece, em relação às situações pretéritas, que a evolução de sua jurisprudência a respeito da correta estruturação do BDI “não deve impactar as relações jurídicas já constituídas, salvo se comprovada a existência de sobrepreço”. A manifestação do Relator ilustra esse posicionamento: Por m, volto a ressaltar que o provimento ao presente recurso, no tocante à determinação
para que se procedesse à exclusão dos tributos IRPJ e CSLL do BDI, não implica, em absoluto, alteração da jurisprudência rmada a partir dos Acórdãos 325/2007 e 950/2007,
ambos do Plenário. As decisões desta Corte têm buscado a padronização da composição do BDI, de forma a garantir maior transparência na execução dos gastos públicos. A mudança imprimida pelo mencionado acórdão na jurisprudência do TCU é salutar. Sendo o IRPJ e a CSLL tributos diretos, devem ser considerados individualmente pelas empresas como item do lucro bruto, a ser cotado no BDI. Ou seja, não pode haver transferência automática
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desses tributos para a contratante, mormente porque o regime tributário — especialmente no tocante ao IRPJ — pode diferir de empresa para empresa. Contudo, aplicar o novo entendimento às situações já constituídas altera o equilíbrio nanceiro do contrato, porque não é dada à empresa a possibilidade de considerar esses custos como componentes do lucro, anteriormente cotado no BDI. Diferente seria se houvesse sobrepreço global no contrato, o que não foi sequer alegado nas instruções técnicas. (TCU. Acórdão nº 1.591/08, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 18 ago. 2008)
A segunda questão que merece ser abordada refere-se ao melhor local de inserção de determinadas despesas: se diretamente na planilha de preços ou na composição do BDI. Em relação às despesas de instalação e mobilização, a própria lei de licitações deniu, em seu art. 40, inciso XIII, a obrigatoriedade de que fossem previstas em separado das demais parcelas, etapas ou tarefas, inclusive, com a xação em edital dos limites a serem aceitos pela Administração. No que se refere às despesas atinentes à administração local, ou seja, aquelas realizadas no pagamento da equipe técnica e administrativa alocada diretamente na obra (salários, encargos, equipamentos, veículos etc.), apesar de alguns orçamentos as contemplarem sob a forma percentual no BDI, é mais adequado o detalhamento de todos os componentes diretamente na planilha, inclusive a m de vericar se a equipe proposta inicialmente está sendo efetivamente empregada na realização do empreendimento. Alguns orçamentos cometem grave equívoco quando contemplam em duplicidade essa despesa: de forma detalhada na planilha com a descrição de toda a estrutura que será utilizada e sob a forma percentual no BDI. Por esse motivo, a orientação do TCU no sentido de que “os itens Administração Local, Instalação de Canteiro e Acampamento e Mobilização e Desmobilização, visando a maior transparência, devem constar na planilha orçamentária e não no LDI” (TCU. Acórdão nº 325/07, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 16 mar. 2007). Como evolução desse entendimento no tocante à administração local, o TCU formulou determinações, por ocasião do Acórdão nº 2.622/2013, Plenário, a órgãos e entidades para que adotem medidas visando guardar a proporcionalidade do pagamento de valores afetos a este item: 9.3.2.1. discriminar os custos de administração local, canteiro de obras e mobilização e desmobilização na planilha orçamentária de custos diretos, por serem passíveis de identicação, mensuração e discriminação, bem como sujeitos a controle, medição e pagamento individualizado por parte da Administração Pública, em atendimento ao princípio constitucional da transparência dos gastos públicos, à jurisprudência do TCU e com fundamento no art. 30, §6º, e no art. 40, inciso XIII, da Lei n. 8.666/1993 e no art. 17 do Decreto n. 7.983/2013; 9.3.2.2. estabelecer, nos editais de licitação, critério objetivo de medição para a administração local, estipulando pagamentos proporcionais à execução nanceira da obra, abstendo-se de utilizar critério de pagamento para esse item como um valor mensal xo, evitandose, assim, desembolsos indevidos de administração local em virtude de atrasos ou de prorrogações injusticadas do prazo de execução contratual, com fundamento no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e no arts. 55, inciso III, e 92, da Lei n. 8.666/1993; [...].
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Outra questão tange ao valor do benefício a ser incluído na composição. Maçahico Tisaka arma: “Os construtores costumam adotar um percentual médio de lucro da
ordem de 10,0%”. Em interessante artigo, André Mendes e Patrícia Bastos observam: 63
A Secretaria de Governo e Gestão Estratégica do Estado de São Paulo, com base em estudos da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – FIPE, considera que deve ser adotada uma faixa de valores obtida a partir das demonstrações nanceiras das empresas do setor,
o que limitará a possível variação da taxa de lucro. Com base no critério, aquela Secretaria adota para a contratação com órgãos da administração pública estadual uma margem de lucro de 7,2%. Esse percentual foi obtido a partir da média aritmética das relações Lucro/Vendas da demonstração de resultados nanceiros e contábeis das 309 maiores empresas de
construção civil (dados obtidos na revista Conjuntura Econômica). Também o estudo publicado pela Associação Brasiliense de Construtores – ASBRACO considera como margem de lucro o valor de 7,2%. Já o Departamento Nacional de Estradas e Rodagem – DNER, em recentes estudos efetuados para a atualização do Sistema Nacional de Custos Rodoviários – SICRO, considera um lucro de 8,49% na composição do BDI. Com base nos estudos anteriormente citados, pode-se considerar que uma margem de lucro entre 7,0% e 8,5% estaria perfeitamente adequada aos valores atualmente praticados no mercado da construção civil. 64
Em relação aos valores dos BDIs, os referidos autores concluem: Verica-se que há certa variabilidade e que os percentuais adotados estão entre 20 e 40%.
Essas diferenças observadas entre os BDI’s adotados pelos órgãos públicos devem-se, possivelmente, ao fato da composição dos mesmos incluir itens bastante diferenciados. Se forem utilizados os critérios propostos nesse estudo para inclusão de despesas no BDI, obtêm-se uma taxa em torno de 30%. 65
Vale lembrar que as características da obra têm inuência no valor do BDI, como por exemplo: tipo, prazo, valor, região, diculdade de execução, inovação técnica etc.
A título de exemplo, o TCU aprovou em 2007 os valores a seguir listados como faixa referencial para o LDI em obras de linhas de transmissão e subestações. 66
TISAKA. Orçamento na construção civil: consultoria, projeto e execução, p. 115. MENDES; BASTOS. Um aspecto polêmico dos orçamentos de obras públicas: Benefícios e Despesas Indiretas (BDI). Revista do Tribunal de Contas da União , p. 25-26. 65 MENDES; BASTOS. Um aspecto polêmico dos orçamentos de obras públicas: Benefícios e Despesas Indiretas (BDI). Revista do Tribunal de Contas da União , p. 27. 66 TCU. Acórdão nº 325/07, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 16 mar. 2007. 63 64
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TABELA 5.10 Referência de valores para BDI Descrição
Mínimo
Máximo
Média
0,00
0,42
0,21
Risco
0,00
2,05
0,97
Despesas Financeiras
0,00
1,20
0,59
Administr. Central
0,11
8,03
4,07
Lucro
3,83
9,96
6,90
Tributos
6,03
9,03
7,65
COFINS
3,00
3,00
3,00
PIS
0,65
0,65
0,65
ISS
2,00
5,00
3,62
CPMF*
0,38
0,38
0,38
Total
16,36
28,87
22,61
Garantia
* A CPMF deixou de vigorar a partir de janeiro de 2008.
Importante notar que as faixas denidas pelos entendimentos do TCU são referenciais. Cada caso concreto deverá ser avaliado em função de suas peculiaridades, conforme posicionamento do próprio Tribunal: Permito-me comentar, a título de exemplo, um dos pontos questionados pela Equipe do TCU, a saber: o BDI adotado na licitação. Ao analisar o processo que redundou na prolação do aludido Acórdão, várias foram as justicativas trazidas aos autos pelos responsáveis, no caso, pela construtora interessada, vencedora do Lote 4, inclusive quanto à utilização inadequada de BDI fundamentado no Acórdão nº 325/2007, o qual estabeleceu parâmetros ou referências para a adoção de BDI em obras de linhas de transmissão e subestações. Neste particular e após rever os argumentos apresentados pelos auditados, entendo que lhes assiste razão. A meu ver, não se deve generalizar a utilização de percentuais para BDI, vez que não se trata de uma fórmula justa e cabal. O BDI varia de acordo com uma série de fatores que estão presentes nas diversas espécies de obras, tendo em vista sua singularidade e riscos, para citar apenas dois pontos importantes a serem considerados. Relembro que o Acórdão nº 325/2007, usado como referência no caso em tela, tratou de obras de linhas de transmissão e subestações elétricas, enquanto no presente caso, estamos de diante de um tipo de obra que têm fatores de risco completamente diversos daquelas obras do setor elétrico.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Não se pode afrmar, então, que os percentuais de BDI defnidos pelo Acórdão nº 325/2007
possam ser aplicados de forma generalizada ou mesmo linear para todas as obras públicas. Por óbvio, existem nuances nas obras que diferenciam umas das outras. (TCU. Acórdão nº 1.211/2013, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU, 28 maio 2013)
Conforme já mencionado, o TCU, após novo estudo realizado em 2011, orientou as suas unidades técnicas a utilizar os parâmetros para taxas de BDI contidos no item 9.2 do Acórdão nº 325/2007, Plenário, quando se tratar de obras de linhas de transmissão de energia elétrica e de subestações; e os valores referenciais para taxas de BDI contidos nos quadros a seguir, específcos para cada tipo de obra discriminado (TCU. Acórdão
nº 2.369/2011, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 09 set. 2011). BDI para obras de edifcações – Construção a
Descrição
Mínimo
Máximo
Média
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
Até R$150.000,00
4,00%
7,50%
8,15%
11,35%
5,75%
9,65%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
3,50%
7,00%
7,65%
10,85%
5,25%
9,15%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
3,00%
6,50%
7,15%
10,35%
4,75%
8,65%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
2,50%
6,00%
6,65%
9,85%
4,25%
8,15%
Acima de R$150.000.000,00
2,00%
5,50%
6,15%
9,35%
3,75%
7,65%
Administração Central – Lucro
A. Lucro Central
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,25%
2,01%
1,07%
Seguros
0,00%
0,81%
0,36%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,25%
0,57%
0,43%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,29%
0,65%
0,50%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,35%
0,78%
0,60%
Tributos
4,65%
6,15%
5,40%
ISS*
1,00%
até 2,50%
1,75%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
20,80%
30,00%
25,10%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
19,70%
28,80%
23,90%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
18,60%
27,60%
22,80%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
17,40%
26,50%
21,60%
Acima de R$150.000.000,00
16,30%
25,30%
20,50%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município. a Esta tabela foi acrescida àquelas aprovadas originalmente no Acórdão nº 2.369/11, Plenário, por meio do Acórdão nº 2.409/11, Plenário.
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BDI para obras de edicações – Reforma (com ampliação de até 40%) Descrição
Mínimo
Máximo
Média
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
Até R$150.000,00
5,40%
7,00%
10,00%
9,90%
7,50%
8,75%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
4,90%
6,50%
9,50%
9,40%
7,00%
8,25%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
4,40%
6,00%
9,00%
8,90%
6,50%
7,75%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
3,90%
5,50%
8,50%
8,40%
6,00%
7,25%
Acima de R$150.000.000,00
3,40%
5,00%
8,00%
7,90%
5,50%
6,75%
Administração Central – Lucro
Despesas nanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,35%
2,40%
1,32%
Seguros
0,00%
0,81%
0,36%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,35%
0,85%
0,65%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,40%
0,98%
0,75%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,48%
1,17%
0,90%
Tributos
4,85%
6,65%
5,75%
ISS*
1,20%
até 3,00%
2,10%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
22,40%
31,90%
26,80%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
21,30%
30,70%
25,70%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
20,10%
29,60%
24,50%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
19,00%
28,40%
23,30%
Acima de R$150.000.000,00
17,90%
27,20%
22,20%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
BDI para obras hídricas – Irrigação e canais Descrição Administração Central – Lucro
Mínimo A. Central
Lucro
Máximo A. Central
Lucro
Média A. Central
Lucro
Até R$150.000,00
4,15%
7,60%
8,00%
11,70%
5,75%
9,00%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
3,65%
7,10%
7,50%
11,20%
5,25%
8,50%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
3,15%
6,60%
7,00%
10,70%
4,75%
8,00%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
2,65%
6,10%
6,50%
10,20%
1,25%
7,50%
Acima de R$150.000.000,00
2,15%
5,60%
6,00%
9,70%
3,75%
7,00%
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,25%
1,74%
0,95%
Seguros
0,00%
0,54%
0,24%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,25%
0,57%
0,43%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,29%
0,65%
0,50%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,35%
0,78%
0,60%
Tributos
4,65%
6,15%
5,40%
ISS*
1,00%
até 2,50%
1,75%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
20,60%
28,70%
24,20%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
19,40%
27,60%
23,00%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
18,30%
26,40%
21,90%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
17,20%
25,20%
20,70%
Acima de R$150.000.000,00
16,10%
24,10%
19,60%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
BDI para obras hídricas – Saneamento básico
Descrição
Mínimo
Máximo
A. Central
Lucro
A. Central
Até R$150.000,00
7,70%
9,90%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
7,20%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
Média A. Central
Lucro
10,00% 10,00%
8,70%
9,20%
9,40%
9,50%
9,50%
8,20%
8,70%
6,70%
8,90%
9,00%
9,00%
7,70%
8,20%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
6,20%
8,40%
8,50%
8,50%
7,20%
7,70%
Acima de R$150.000.000,00
5,70%
7,90%
8,00%
8,00%
6,70%
7,20%
Administração Central – Lucro
Lucro
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,35%
2,40%
1,32%
Seguros
0,00%
0,81%
0,36%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,35%
0,85%
0,65%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,40%
0,98%
0,75%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,48%
1,17%
0,90%
Tributos
4,65%
6,15%
5,40%
ISS*
1,00%
até 2,50%
1,75%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
25,30%
31,80%
28,30%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
24,20%
30,60%
27,10%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
23,00%
29,40%
25,90%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
21,90%
28,20%
24,80%
Acima de R$150.000.000,00
20,80%
27,00%
23,60%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
BDI para obras hídricas – Redes adutoras e estações elevatória e de tratamento
Descrição
Mínimo
Máximo
Média
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
Até R$150.000,00
4,00%
10,30%
8,00%
11,00%
5,60%
10,40%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
3,50%
9,80%
7,50%
10,50%
5,10%
9,90%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
3,00%
9,30%
7,00%
10,00%
4,60%
9,40%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
2,50%
8,80%
6,50%
9,50%
4,10%
8,90%
Acima de R$150.000.000,00
2,00%
8,30%
6,00%
9,00%
3,60%
8,40%
Administração Central – Lucro
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,32%
1,98%
1,10%
Seguros
0,00%
0,54%
0,24%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,32%
0,74%
0,57%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,37%
0,85%
0,65%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,44%
1,02%
0,78%
Tributos
4,65%
6,15%
5,40%
ISS*
1,00%
até 3,00%
1,75%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
22,20%
30,50%
25,80%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
21,10%
29,30%
24,60%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
19,90%
28,10%
23,50%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
18,80%
26,90%
22,30%
Acima de R$150.000.000,00
17,70%
25,80%
21,20%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município.
129
130
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
BDI para obras portuárias – Estruturas portuárias
Descrição
Mínimo
Máximo
Média
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
Até R$150.000,00
5,50%
9,50%
7,50%
11,50%
6,50%
10,50%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
5,00%
9,00%
7,00%
11,00%
6,00%
10,00%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
4,50%
8,50%
6,50%
10,50%
5,50%
9,50%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
4,00%
8,00%
6,00%
10,00%
5,00%
9,00%
Acima de R$150.000.000,00
3,50%
7,50%
5,50%
9,50%
4,50%
8,50%
Administração Central – Lucro
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,32%
2,11%
1,16%
Seguros
0,00%
0,67%
0,30%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,32%
0,74%
0,57%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,37%
0,85%
0,65%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,44%
1,02%
0,78%
Tributos
4,65%
6,15%
5,40%
ISS*
1,00%
até 2,50%
1,75%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
24,10%
30,20%
27,00%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
22,90%
29,00%
25,90%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
21,80%
27,80%
24,70%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
20,70%
26,60%
23,50%
Acima de R$150.000.000,00
19,50%
25,50%
22,40%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
BDI para obras aeroportuárias – Pátios e pistas de pouso
Descrição Administração Central – Lucro
Mínimo A. Central
Lucro
Máximo A. Central
Lucro
Média A. Central
Lucro
Até R$150.000,00
4,40%
8,50%
6,40%
10,50%
5,40%
9,35%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
3,90%
8,00%
5,90%
10,00%
4,90%
8,85%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
3,40%
7,50%
5,40%
9,50%
4,40%
8,35%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
2,90%
7,00%
4,90%
9,00%
3,90%
7,85%
Acima de R$150.000.000,00
2,40%
6,50%
4,40%
8,50%
3,40%
7,35%
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,32%
2,25%
1,22%
Seguros
0,00%
0,81%
0,36%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,32%
0,74%
0,57%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,37%
0,85%
0,65%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,44%
1,02%
0,78%
Tributos
4,65%
6,15%
5,40%
ISS*
1,00%
até 2,50%
1,75%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
21,50%
27,70%
24,50%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
20,40%
26,50%
23,30%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
19,20%
25,30%
22,20%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
18,10%
24,20%
21,00%
Acima de R$150.000.000,00
17,00%
23,00%
19,90%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município.
131
132
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
BDI para obras aeroportuárias – Terminal de passageiros Descrição
Mínimo
Máximo
Média
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
A. Central
Lucro
Até R$150.000,00
5,50%
8,00%
8,00%
10,00%
6,50%
9,00%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
5,00%
7,50%
7,50%
9,50%
6,00%
8,50%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
4,50%
7,00%
7,00%
9,00%
5,50%
8,00%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
4,00%
6,50%
6,50%
8,50%
5,00%
7,50%
Acima de R$150.000.000,00
3,50%
6,00%
6,00%
8,00%
4,50%
7,00%
Administração Central – Lucro
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,35%
2,40%
1,32%
Seguros
0,00%
0,81%
0,36%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Obras simples, em condições favoráveis, com execução em ritmo adequado
0,35%
0,85%
0,65%
Obras medianas em área e/ou prazo, em condições normais de execução
0,40%
0,98%
0,75%
Obras complexas, em condições adversas, com execução em ritmo acelerado, em áreas restritas
0,48%
1,17%
0,90%
Tributos
4,65%
6,15%
5,40%
ISS*
1,00%
até 2,50%
1,75%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Até R$150.000,00
22,60%
29,20%
25,50%
De R$150.000,01 até R$1.500.000,00
21,40%
28,00%
24,30%
De R$1.500.000,01 até R$75.000.000,00
20,30%
26,80%
23,20%
De R$75.000.000,01 até R$150.000.000,00
19,20%
25,70%
22,00%
Acima de R$150.000.000,00
18,00%
24,50%
20,90%
Riscos
BDI
Obs.: (*) % de ISS considerando 2%, 3,5% e 5% sobre 50% do preço de venda – Observar a legislação do Município.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
BDI para fornecimento de materiais e equipamentos Descrição
Mínimo
Máximo
Média
Administração Central
1,30%
8,00%
5,20%
Despesas fnanceiras
0,50%
1,50%
1,00%
Seguros, riscos e garantias
0,25%
1,53%
0,88%
Seguros
0,00%
0,54%
0,24%
Garantias
0,00%
0,42%
0,21%
Riscos
0,25%
0,57%
0,43%
Tributos
3,65%
3,65%
3,65%
ISS
0,00%
0,00%
0,00%
PIS
0,65%
0,65%
0,65%
COFINS
3,00%
3,00%
3,00%
Lucro
1,75%
6,50%
4,10%
10,50%
19,60%
15,60%
TOTAL
Por m, em 2013, por meio do Acórdão nº 2.622/2013, Plenário, o TCU orientou suas unidades técnicas a utilizarem os parâmetros de BDI a seguir especicados, em
substituição aos referenciais contidos nos Acórdãos nº 325/2007 e nº 2.369/2011. Em suma, foi trocada a opção anterior da denição de valores limites mínimo e máximo
pelo estabelecimento de variações em função do 1º quartil, médio e 3º quartil. Valores do BDI por tipo de obra Tipos de obra
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Construção de edifícios
20,34%
22,12%
25,00%
Construção de rodovias e ferrovias
19,60%
20,97%
24,23%
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas
20,76%
24,18%
26,44%
Construção e manutenção de estações e redes de distribuição de energia elétrica
24,00%
25,84%
27,86%
Obras portuárias, marítimas e fuviais
22,80%
27,48%
30,95%
BDI para itens de mero fornecimento de materiais e equipamentos
11,10%
14,02%
16,80%
133
134
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
O TCU assim orientou suas unidades técnicas:
Administração Central Tipos de obra
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Construção de edifícios
3,00%
4,00%
5,50%
Construção de rodovias e ferrovias
3,80%
4,01%
4,67%
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas
3,43%
4,93%
6,71%
Construção e manutenção de estações e redes de distribuição de energia elétrica
5,29%
5,92%
7,93%
Obras portuárias, marítimas e fuviais
4,00%
5,52%
7,85%
Seguro + Garantia Tipos de obra
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Construção de edifícios
0,80%
0,80%
1,00%
Construção de rodovias e ferrovias
0,32%
0,40%
0,74%
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas
0,28%
0,49%
0,75%
Construção e manutenção de estações e redes de distribuição de energia elétrica
0,25%
0,51%
0,56%
Obras portuárias, marítimas e fuviais
0,81%
1,22%
1,99%
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Construção de edifícios
0,97%
1,27%
1,27%
Construção de rodovias e ferrovias
0,50%
0,56%
0,97%
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas
1,00%
1,39%
1,74%
Construção e manutenção de estações e redes de distribuição de energia elétrica
1,00%
1,48%
1,97%
Obras portuárias, marítimas e fuviais
1,46%
2,32%
3,16%
Risco Tipos de obra
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Despesa fnanceira Tipos de obra
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Construção de edifícios
0,59%
1,23%
1,39%
Construção de rodovias e ferrovias
1,02%
1,11%
1,21%
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas
0,94%
0,99%
1,17%
Construção e manutenção de estações e redes de distribuição de energia elétrica
1,01%
1,07%
1,11%
Obras portuárias, marítimas e uviais
0,94%
1,02%
1,33%
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Construção de edifícios
6,16%
7,40%
8,96%
Construção de rodovias e ferrovias
6,64%
7,30%
8,69%
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas
6,74%
8,04%
9,40%
Construção e manutenção de estações e redes de distribuição de energia elétrica
8,00%
8,31%
9,51%
Obras portuárias, marítimas e uviais
7,14%
8,40%
10,43%
Lucro Tipos de obra
BDI para itens de mero fornecimento de materiais e equipamentos Parcela do BDI
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Administração Central
1,50%
3,45%
4,49%
Seguro + Garantia
0,30%
0,48%
0,82%
Risco
0,56%
0,85%
0,89%
Despesa fnanceira
0,85%
0,85%
1,11%
Lucro
3,50%
5,11%
6,22%
135
136
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
Em relação à administração local no valor total do orçamento, o TCU relacionou os seguintes valores percentuais: Percentual de administração local inserido no custo direto Tipos de obra
1º Quartil
Médio
3º Quartil
Construção de edifícios
3,49%
6,23%
8,87%
Construção de rodovias e ferrovias
1,98%
6,99%
10,68%
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas
4,13%
7,64%
10,89%
Construção e manutenção de estações e redes de distribuição de energia elétrica
1,85%
5,05%
7,45%
Obras portuárias, marítimas e fuviais
6,23%
7,48%
9,09%
Em complementação à sugestão dos valores das parcelas de BDI feita no acórdão retromencionado, o TCU alertou aos responsáveis pela elaboração de orçamentos de obras e serviços de engenharia: 9.3.2.3. adotar, na composição do BDI, percentual de ISS compatível com a legislação tributária do(s) município(s) onde serão prestados os serviços previstos da obra, observando a forma de denição da base de cálculo do tributo prevista na legislação municipal e, sobre esta, a respectiva alíquota do ISS, que será um percentual proporcional entre o limite máximo de 5% estabelecido no art. 8º, inciso II, da LC n. 116/2003 e o limite mínimo de 2% xado pelo art. 88 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; 9.3.2.4. estabelecer, nos editais de licitação, que as empresas sujeitas ao regime de tributação de incidência não cumulativa de PIS e COFINS apresentem demonstrativo de apuração de contribuições sociais comprovando que os percentuais dos referidos tributos adotados na taxa de BDI correspondem à média dos percentuais efetivos recolhidos em virtude do direito de compensação dos créditos previstos no art. 3º das Leis n. 10.637/2002 e n. 10.833/2003, de forma a garantir que os preços contratados pela Administração Pública reitam os benefícios tributários concedidos pela legislação tributária; 9.3.2.5. prever, nos editais de licitação, a exigência para que as empresas licitantes optantes pelo Simples Nacional apresentem os percentuais de ISS, PIS e COFINS discriminados na composição do BDI que sejam compatíveis com as alíquotas a que a empresa está obrigada a recolher, previstas no Anexo IV da Lei Complementar n. 123/2006, bem como que a composição de encargos sociais não inclua os gastos relativos às contribuições que essas empresas estão dispensadas de recolhimento (Sesi, Senai, Sebrae etc.), conforme dispões o art. 13, §3º, da referida Lei Complementar; 9.3.2.6. exigir, nos editais de licitação, a incidência da taxa de BDI especicada no orçamento base da licitação para os serviços novos incluídos por meio de aditivos contratuais, sempre que a taxa de BDI adotada pela contratada for injusticadamente elevada, com vistas a garantir o equilíbrio econômico-nanceiro do contrato e a manutenção do percentual de desconto ofertado pelo contratado, em atendimento ao art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e ao art. 14 do Decreto n. 7.983/2013.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
5.4 Reajustamento A conjuntura inacionária ocasiona aumento periódico do preço dos insumos de construção civil, exigindo, portanto, reajustamento dos preços de serviços pagos às construtoras, de modo a evitar o desequilíbrio econômico-nanceiro do contrato. Para a atualização dos preços são geralmente utilizados índices que reetem a variação dos custos do setor, com base na fórmula:
sendo, Pn - preço no mês desejado Po - preço relativo à proposta inicial In - índice do mês desejado para atualização Io - índice do mês da proposta inicial
Existem diversos índices referentes ao setor publicados por órgãos e empresas especializadas, entre os quais destacamos: a) Fundação Getulio Vargas (FGV): afere a evolução dos custos mensais de construções por meio de diversos índices, como por exemplo: Índice Nacional de Custo da Construção (INCC); Índice de Custo da Construção (ICC) por capitais; Índice Nacional de Custo da Construção do Mercado (INCC-M); Índice Nacional de Custo de Obras Especícas (edicações, pavimentação, terraplenagem, portuárias e outras); b) Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística (IBGE) em convênio com a Caixa Econômica Federal (CAIXA): realiza a produção de custos e índices da construção civil, a partir do levantamento de preços de materiais e salários pagos na construção civil, divulgando-os no Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi); c) Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE): divulga índices que reetem a variação de custo de diversos tipos de obras de construção, com foco no Estado de São Paulo; d) Editora Pini: publica índices referentes à variação de custos de edicações (habitacional, comercial e industrial).
5.5 Estudos de casos O conhecimento da técnica básica de orçamento amplia consideravelmente o campo de análise de todo prossional envolvido na área de licitações e contratos. Os exemplos a seguir, além de auxiliar na xação dos conceitos apresentados, fornecerão uma visão de hipóteses em que a utilização desses conceitos auxiliará a tomada de decisões gerenciais.
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138
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
5.5.1 Caso 1 – Cálculo de custos e quantidade de insumos A empresa X solicitou ao engenheiro, em dezembro 2003, que defnisse a melhor alternativa sob o ponto de vista econômico para a execução de concreto (fck = 15Mpa) em determinada obra com base nas seguintes opções: compra junto à empresa especializada na produção do concreto ou execução na própria obra. Solicitou, ainda, estimativa de quantos sacos de cimento deveriam ser adquiridos para a execução de 1.000m³ de concreto, caso fosse preparado na obra. O engenheiro pesquisou tabelas de composição de custos para esses dois serviços e encontrou as informações da TABELA 5.11. TABELA 5.11 Composições para o cálculo do custo de serviços Serviço: Preparo de concreto com betoneira (1m³)
Serviço: Concreto pré-misturado (1m³) Insumos
Concreto pré-misturado
Coefciente
Unidade
Insumos
1,02
m³
Coefciente
Unidade
Cimento
340,20
kg
Areia média
0,6222
m³
Brita 1
0,263
m³
Brita 2
0,615
m³
Betoneira
0,714
h
Servente
6,00
h
Por meio de pesquisa de preço de insumos no mercado, o engenheiro encontrou os valores da TABELA 5.12. TABELA 5.12 Custo de insumos Insumos
Unidade
Preços (R$)
Concreto pré-misturado
m³
155,42
Cimento
saco de 50kg
16,78
Areia média
m³
27,06
Brita 1
m³
23,85
Brita 2
m³
23,85
Servente
h
1,32
Para a resolução deste caso, como hipótese simplifcadora, considerar o custo do lançamento similar nos dois casos; o custo da betoneira nulo; e leis sociais de 125%.
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
Resolução
a) Cálculo do custo dos dois serviços para denição da solução mais vantajosa: Serviço: Concreto pré-misturado (1m³) Insumos
Coefciente
Unidade
Preço insumo (R$)
Custo total (R$)
1,02
m³
155,42
158,52
Concreto pré-misturado
Serviço: Preparo de concreto com betoneira (1m³) Coefciente
Unidade
Preço insumo (R$)
Custo total (R$)
Cimento
340,20
kg
16,78/50
114,17
Areia média
0,6222
m³
27,06
16,84
Brita 1
0,263
m³
23,85
6,27
Brita 2
0,615
m³
23,85
14,66
Betoneira
0,714
h
0
-
Servente
6,00
h
1,32
7,92
Insumos
Leis sociais
125%
TOTAL
9,90 169,76
Portanto, a execução do serviço concreto pré-misturado com a aquisição de insumo junto à empresa especializada (R$158,52/m³) é mais vantajosa do que o preparo em obra (R$169,76/m³). b) Denição da quantidade de sacos de cimento a serem adquiridos para execução de
1000m³ de concreto, caso fosse preparado na obra: O coeciente do insumo cimento demonstra que são necessários 340,20kg para
a execução de 1m³ do serviço concreto. Portanto: 340,20kg/m³ = (340,20kg / 50kg/saco) = 6,8 sacos/m³ Em 1.000,00m³ serão gastos 6.800 sacos Observações
a) O caso exemplica a forma de cálculo do custo de serviço com base em
composições e custos de insumos. Em função da elevada quantidade de serviços executados em uma obra, os cálculos são efetuados por meio de sistemas computacionais, mas é importante que o técnico responsável avalie a consistência das planilhas emitidas por esse sistema;
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140
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
b) Cada composição de serviço fornece diversas informações além do preço unitário. O exemplo demonstrou que é possível calcular a quantidade de materiais a serem empregados na obra; c) Existem situações em que a denominação do insumo é parecida com a do serviço, como foi o caso do concreto pré-misturado, mas é importante perceber que os custos são diferentes; e d) Se o BDI utilizado pela empresa fosse de 30%, o preço do serviço concreto pré-misturado a ser cobrado do contratante deveria ser: P = (Custo Direto) x (1+BDI) = 158,53 x 1,3 = R$206,09/m³
5.5.2 Caso 2 – Cálculo de quantidade de equipamentos para a realização de serviços Foi solicitada ao engenheiro a defnição da quantidade de retroescavadeiras que seriam necessárias para escavação mecanizada de 1km de valas com largura 2m e profundidade 4m, solo de qualquer categoria, exceto rocha. O serviço deveria ser executado no prazo de 20 dias, com a possibilidade de trabalho de 10h por dia. Qual a resposta para o questionamento? Existem soluções para a redução do custo desse serviço? A TABELA 5.13 apresenta a composição de custos pesquisada pelo engenheiro. TABELA 5.13 Composição para o cálculo do custo de serviços Serviço: Escavação mecanizada de valas (1m³) Insumos
Retroescavadeira
Coefciente
Unidade
0,055
h
Resolução
a) Cálculo do volume de serviços a ser executado: Volume de escavação = 1.000,00 x 4,0 x 2,0 = 8.000,00m³ b) Cálculo da produção de 1 retro em 1 dia: 0,055h - 1,0m³ 10h - P P = 10,0 / 0,055= 181,82m³/dia c) Cálculo da produção de 1 retroescavadeira em 20 dias P = 20 x 181,82 = 3.636,40 m³
CAPÍTULO 5 ORÇAMENTO
d) Cálculo do número de retroescavadeiras:
Observações
a) O caso demonstra a utilidade da composição de serviço para o cálculo do número de equipamentos. O número de equipamentos deve ser inteiro, ou seja, serão necessárias três retroescavadeiras. Com isso, haverá tempo improdutivo de equipamentos. b) Existem soluções a serem avaliadas para a redução desse tempo improdutivo e, consequentemente, para a redução de custos de serviço. Uma delas seria aumentar em 10% o número de horas trabalhadas por dia, o que possibilitaria a realização do trabalho com duas máquinas.
5.5.3 Caso 3 – Avaliação da pertinência de serviços executados A execução de obras de drenagem em uma cidade foi prevista para o prazo de 1 ano, sendo o volume aproximado de escavação de 230.000m³. No fnal da obra, a equipe de auditoria solicitou os documentos utilizados na
licitação, cópia dos diários de obra e medições, constatando os seguintes pontos: a) a primeira medição (realizada no 1º mês de obra) apresentava o volume pago de 100.000m³ de escavação; b) durante os doze meses de obra, o diário apontava a utilização de quatro retroescavadeiras. Pergunta-se: existe algum indício de irregularidade no processo? (considerar 10h máquina/dia e 26 dias trabalhados/mês) Considerar a mesma composição de serviço escavação das valas apresentada no caso anterior. Resolução
a) Cálculo da produção de uma retroescavadeira em 1 mês:
b) Cálculo do prazo para a execução do serviço com 4 retroescavadeiras
c) Cálculo do número de equipamentos necessários para realizar a quantidade medida no 1º mês (100.000m³):
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
d) Conclusão: Apesar da quantidade do serviço total executado no período de contrato ser compatível com o número de máquinas existentes no canteiro de obra, não seria possível a realização do serviço medido no primeiro mês com as quatro máquinas existentes. A princípio, pode ter ocorrido medição fraudulenta com o objetivo de antecipar pagamento por parte do contratante. Observações
a) O caso apresenta uma nova utilidade para as composições de serviço: a vericação da compatibilidade dos serviços medidos com a avaliação dos insumos (máquinas, mão de obra ou materiais) existentes na obra; e b) Esse tipo de cálculo simplicado é valioso para engenheiros que assumem a scalização da obra após o início, a m de registrar e informar esse tipo de ocorrência a seus superiores hierárquicos e evitar futura responsabilização diante do problema identicado pela equipe de auditoria.
CAPÍTULO 6
FASE PRELIMINAR À LICITAÇÃO
Sumário: 6.1 Considerações
iniciais – 6.2 Programa de necessidades – 6.3 Estudos preliminares – 6.4 Anteprojeto de engenharia – 6.5 Considerações nais
6.1 Considerações iniciais Questão de fundamental importância, e por muitas vezes esquecida, é o conjunto de atividades preliminares praticadas com o objetivo de viabilizar a concentração de esforços e recursos para o início do procedimento licitatório. Não basta para o aludido início apenas o desejo de realizar a obra pública. São necessários estudos técnicos que permitam concluir pelo cabimento do investimento no empreendimento em análise quando comparado a outras alternativas para atender aos anseios da sociedade. Anal, os recursos públicos são limitados e devem ser alocados
com vistas à maximização dos benefícios para a comunidade. Oportuno lembrar que, em face do expressivo volume de recursos necessários, não faria sentido a execução de projeto básico elaborado nos termos exigidos pela legislação para todos os empreendimentos relacionados como possíveis de serem realizados em uma análise preliminar, uma vez que muitos deles serão descartados no decorrer dos estudos, seja por não se situarem entre os prioritários, seja por não haver recursos sucientes para a materialização de todos.
A própria diretriz do Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura, inserida no art. 2º da Resolução nº 361/91, ao denir projeto básico, estabelece fases que o precedem: Art. 2º O Projeto Básico é uma fase perfeitamente denida de um conjunto mais abrangente
de estudos e projetos, precedido por estudos preliminares, anteprojeto, estudos de viabilidade técnica, econômica e avaliação de impacto ambiental, e sucedido pela fase de projeto executivo ou detalhamento.
Entretanto, não é rara a constatação de casos em que elevadas quantias foram investidas em projetos básicos para a vericação da inviabilidade do empreendimento
quando seria possível chegar a essa conclusão por meio de estudos preliminares muito
mais econômicos. Mais grave, ainda, é a vericação de investimentos em diversos projetos
144
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
contratados e inacabados em face da insuciência de recursos quando, facilmente, seria possível prever o resultado antes mesmo do início dos processos licitatórios. O que se pretende neste capítulo é alertar, mesmo que de forma resumida, para a importância de estudos preliminares que subsidiarão a decisão de início da fase interna da licitação. A FIGURA 6.a apresenta resumo das etapas contempladas nesta fase.
Programa de necessidades
Estabelecimento de alternativas
Estudos preliminares das alternativas Viabilidade técnica
Viabilidade econômica
Avaliação ambiental
Escolha das alternativas
Anteprojeto das alternativas escolhidas
Seleção das alternativas para projeto básico
FIGURA 6.a - Esquema das etapas compreendidas na fase preliminar à licitação
Vale ressaltar que no decorrer dos estudos, haverá redução substancial de alternativas diante de sucessivas avaliações, para que sejam iniciadas apenas as licitações que tenham viabilidade orçamentária e que apresentem a melhor relação benefício/ custo do grupo inicialmente estudado.
CAPÍTULO 6 FASE PRELIMINAR À LICITAÇÃO
6.2 Programa de necessidades A primeira matéria relevante enfrentada pelos responsáveis pela decisão de alocar recursos públicos é a denição do universo de ações e empreendimentos que deverão
ser relacionados para estudos de viabilidade. Não é tarefa simples. É preciso otimizar as demandas sociais em todas as áreas (social, saúde, educação, desenvolvimento) com a previsão da receita. De plano, é razoável que se trabalhe com a hipótese de que não haja recursos sucientes para o
atendimento a todas as necessidades. Por esse motivo, cabe à equipe responsável pela elaboração das peças orçamentárias a denição de um programa de necessidades da coletividade, no qual
será procurada a maximização da relação benefício/custo dos investimentos. Nesse programa, as receitas estimadas deverão estar compatibilizadas com os investimentos a serem realizados. Vale lembrar que a Lei de Responsabilidade Fiscal exige o planejamento sistêmico de todos os empreendimentos, visto que “a lei orçamentária e as de créditos adicionais só incluirão novos projetos após adequadamente atendidos os em andamento e contempladas as despesas de conservação do patrimônio público, nos termos” (art. 45 da LC nº 101/2000.). Além disso, a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa deverá ser acompanhado de estimativa do impacto orçamentário-nanceiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos
dois subsequentes e da declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e nanceira com a lei (art. 16 da LC nº 101/2000).
Qualquer decisão tem conteúdo político e econômico, mas não pode carecer de fundamentação técnica. Não seria razoável, por exemplo, a denição da implantação
de um hospital de 100 leitos em uma comunidade que necessitasse de apenas 50 leitos. Na mesma linha, temerosa seria a decisão de implantar um hospital de 100 leitos, mesmo que necessários, se não houvesse recursos sucientes para tanto. Mais apropriado
seria materializar a execução de 50 leitos, com previsão de ampliação futura, do que ter como resultado uma obra inacabada de 100 leitos e, por isso, totalmente inútil para a comunidade a que se destinava.
6.3 Estudos preliminares O atendimento às necessidades denidas deve ser feito por meio de estudos preliminares que contemplem possíveis alternativas de concepção e que denam a
melhor opção para o atendimento do programa sob o aspecto legal, econômico, social e ambiental. Para cada empreendimento em estudo, deverá haver resposta para questões básicas, tais como: alternativa mais econômica para atendimento da demanda social, volume de recursos necessários, população atendida, limitações ambientais, benefícios com a implantação e prejuízos pela ausência do empreendimento. Em face da diversidade dos tipos de obras, muitas serão as formas de mensuração de benefícios, como, por exemplo, população atendida, melhoria no uxo de veículos,
redução de mortalidade, e aprimoramento da educação. Os custos, nesta fase inicial, não precisam ser denidos com alta precisão, seja pela ausência de informações pormenorizadas, seja pela nalidade da decisão que será
145
146
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
tomada. Na maioria das vezes são utilizados macroindicadores de custo, como valores médios por metro quadrado de construção, quilômetro de rodovia, número de alunos atendidos etc. Contudo, também não pode haver erro grosseiro nessa estimativa, sob pena de invalidar o processo de escolha. Nesta fase, apesar da impossibilidade de obtenção de custos precisos dos empreendimentos em estudo, visto que ainda não há projeto, é primordial que se tenha uma boa noção dos valores envolvidos para a efetiva implantação de toda a obra, inclusive pelo fato desses valores serem a referência para a denição da melhor alternativa e a vericação da viabilidade do projeto. A técnica para estimativa de investimento nesta fase é a avaliação expedita, conforme detalhado no Capítulo 4. Vale sempre lembrar que é importante a participação de técnico capacitado para coordenar os trabalhos, uma vez que a consequência de estudo preliminar de má qualidade é geralmente desastrosa. Nesse estudo, é possível a denição de implantação da solução escolhida por etapas em face de características apresentadas na região em que a obra será implantada. Os parâmetros de viabilidade denidos nesta fase deverão ser revistos quando da elaboração do projeto básico, a m de que seja vericada a sua exatidão. Em alguns casos, o projeto básico acaba por demonstrar que os valores considerados nos estudos de viabilidade sofreram incrementos signicativos e que, por esse motivo, o empreendimento deixou de ser viável e não deve ser licitado. A avaliação equivocada do estudo de viabilidade do empreendimento pode ensejar duas situações extremas, ambas danosas: permitir o aprofundamento dos estudos, com gasto desnecessário de recursos, para se concluir futuramente pela inviabilidade do empreendimento; ou concluir equivocadamente pela inviabilidade da continuidade do processo. Gravidade maior surge quando a má qualidade dos estudos continua na elaboração do projeto básico e permite a contratação de uma obra inviável que tem, na maioria dos casos, gerado empreendimentos inacabados. Não é possível admitir, por exemplo, uma obra no campo dos transportes que tenha sua viabilidade denida em função de diversas variáveis, como uxo de passageiros e valor de tarifa, que no decorrer do contrato necessite aditivos com valores extremamente superiores aos xados no contrato inicial. A uma, pois o limite máximo de aditivo em um contrato admitido por lei é de 25% (art. 65, §1º, da Lei nº 8.666/93); a duas, porque o novo valor necessário poderá ensejar a inviabilidade do empreendimento, tendo em vista que não será possível o incremento proporcional das tarifas ou do número de passageiros. Por m, é fundamental que se tenha, por meio de análises técnicas, a convicção da viabilidade ambiental do empreendimento, assim como a avaliação do impacto ambiental que será causado. Vale lembrar que ainda hoje existem projetos básicos que são substancialmente alterados, ou até abandonados, em face de exigências ambientais não previstas.
6.4 Anteprojeto de engenharia Algumas vezes, é utilizado como referencial para licitação em face de seu conceito ser confundido com o do projeto básico. Porém, são absolutamente distintos.
CAPÍTULO 6 FASE PRELIMINAR À LICITAÇÃO
Em caso de obras de maior porte, após a conclusão dos estudos preliminares, é necessário o desenvolvimento de anteprojeto para a elaboração e representação técnica da solução aprovada; a denição dos principais componentes arquitetônicos e estruturais da obra; o estabelecimento das instalações em geral; e a denição do custo médio.
Esta fase possibilita o melhor conhecimento do empreendimento, o aprimoramento dos valores dos investimentos, bem assim a denição de diretrizes para a contratação do
projeto básico. Contudo, ainda faltam diversos requisitos para a perfeita caracterização da obra em virtude da ausência de estudos que só serão conduzidos nas próximas fases. Não se pode esquecer que projetos básicos para obras de maior complexidade são contratados junto a empresas especializadas e, não raro, apresentam custos elevados. Quanto melhor a qualidade do anteprojeto, melhor serão as regras estabelecidas no edital de contratação do projeto básico e mais fácil o gerenciamento desse contrato em face do menor número de alterações. Com a aprovação da Lei nº 12.462/2011, o anteprojeto passou a ter especial importância na contratação de obras passíveis de serem licitadas com base no Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), em virtude de, no caso especíco
de regime de execução por contratação integrada, ser o elemento referencial para a contratação do empreendimento. Isso porque será permitido à própria empreiteira a realização do projeto básico. A matéria será analisada com maior detalhe no Capítulo 15 deste livro.
6.5 Considerações nais As etapas apresentadas neste capítulo são por muitas vezes desprezadas por responsáveis pela condução de uma obra pública. Talvez por esse motivo exista um quadro grave sistêmico nessa área, com elevado número de empreendimentos inacabados. Iniciar as ações atinentes à fase interna de uma licitação, sem antes ter sinalização positiva da viabilidade do empreendimento com base nas informações obtidas em um bom programa de necessidades, em estudos preliminares e em anteprojeto de qualidade, é, sem dúvida alguma, adentrar em campo de alta probabilidade de desperdício de recursos públicos. Claro está que os agentes que não obedeçam aos requisitos mínimos de um bom gerenciamento deverão ser responsabilizados pelos órgãos de controle competentes.
147
CAPÍTULO 7
LICITAÇÃO FASE INTERNA
Sumário: 7.1 Considerações
iniciais – 7.2 Caracterização da obra – 7.2.1 Projeto básico – 7.2.1.1 Conceitos – 7.2.1.2 Requisitos – 7.2.1.3 Responsabilidade pela elaboração e acompanhamento – 7.2.1.4 Contratação do projeto básico – 7.2.1.5 Nível de precisão – 7.2.1.6 Denição de marca – 7.2.1.7 Validação e atualização do projeto – 7.2.2 Licenciamento ambiental – 7.2.2.1 Procedimento – 7.2.2.2 Licenças ambientais – 7.2.3 Orçamento detalhado – Preços – 7.2.3.1 Referência de preços – 7.2.3.2 Detalhamento das composições de serviços – 7.2.3.3 BDI – 7.2.4 Confrontação das novas informações com os estudos de viabilidade – 7.2.5 Projeto executivo – 7.2.6 Documentação “as built” – 7.3 Previsão de recursos orçamentários – 7.3.1 Plano Plurianual (PPA) e Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) – 7.3.2 Lei Orçamentária Anual (LOA) – 7.3.3 Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – 7.3.4 Recursos internacionais – 7.3.5 Convênios – 7.3.6 Etapas de implantação – 7.4 Regras para estruturação da licitação – 7.4.1 Modalidades de licitação previstas na Lei nº 8.666/93 e na Lei nº 10.520/02 (Pregão) – 7.4.2 Parcelamento e fracionamento – 7.4.3 Tipos de licitação – 7.4.4 Sistema de Registro de Preços (SRP) – 7.5 Regras para a contratação – 7.5.1 Forma de execução – 7.5.2 Regime de execução – 7.5.3 Forma e limite para pagamento – 7.5.4 Prazos de execução e vigência dos contratos – 7.5.5 Garantias – 7.5.6 Possibilidade de subcontratação – 7.5.7 Minuta do contrato – 7.6 Regras para habilitação dos interessados – 7.6.1 Considerações iniciais – 7.6.2 Vedações – 7.6.3 Habilitações – 7.6.3.1 Qualicação técnica operacional e prossional – 7.6.3.2 Qualicação econômico-nanceira – 7.6.3.3 Atestado de visita às obras – 7.6.4 Consórcios – 7.7 Regras para o julgamento – 7.7.1 Requisitos legais e critérios objetivos – 7.7.2 Avaliação e critério de aceitabilidade de preços unitário, por etapa e global – 7.8 Procedimentos especiais – 7.8.1 Audiência pública – 7.8.2 Pré-qualicação – 7.8.3 Metodologia de execução – 7.8.4 Análise comparativa – 7.9 Avaliação por assessoria jurídica da administração – 7.10 Responsabilidade dos agentes públicos – 7.11 A normatização de procedimentos internos na busca da eciência – 7.12 Cuidados recomendáveis ao nal da fase interna
7.1 Considerações iniciais A contratação de obra pública exige, normalmente, a realização de licitação, apesar de existirem situações excepcionais previstas em lei nas quais o gestor poderá realizar a contratação direta, como será demonstrado no Capítulo 9. Em caso de dúvida em relação à melhor forma de condução do processo, a licitação é sempre o caminho mais seguro para os responsáveis.
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
150
A principal nalidade da licitação é propiciar ambiente para a competição das diversas empresas que detenham capacidade suciente para a execução do objeto a m de que a Administração possa selecionar a proposta mais vantajosa. Com propriedade a respeito do tema, assim se manifesta Jessé Torres Pereira Junior: O processo administrativo da licitação é o testemunho documental de todos os passos dados pela Administração rumo à contratação daquele que lhe oferecerá a melhor proposta. Todos os atos praticados em seus autos estarão comprometidos com esta nalidade, sejam decisões, pareceres, levantamentos, estudos, atas, despachos, recursos ou relatórios. O processo bem instruído e articulado consubstancia a prova mais irrefutável de que a licitação alcançou o único m de interesse público que se compadece com sua natureza jurídico-administrativa — competição para a escolha da proposta mais vantajosa. 67
A fase interna de uma licitação compreende todas as atividades realizadas após a denição da viabilidade do empreendimento por meio dos estudos preliminares e anteprojeto até a publicação do edital para a contratação da empresa, ou seja, as ações com vistas à denição das regras para a seleção da melhor proposta, sempre com base nas diretrizes legais. Portanto, o produto principal a ser materializado nesta fase é o edital, ao qual a doutrina se refere como “lei interna da licitação”. O princípio de vinculação ao instrumento convocatório estabelece a impossibilidade de apresentação de propostas em desacordo com os parâmetros xados, bem como da alteração das principais regras estabelecidas no decorrer do processo. Apesar de pouco visível, é fase de extrema relevância no processo licitatório, se não a mais importante, pois é dela que nasce a perfeita especicação do que será contratado, em parâmetros técnicos e de custo, e a denição de requisitos para aqueles que desejarem apresentar proposta. Para o início da fase interna, a equipe responsável pela elaboração do edital deverá se certicar da existência dos estudos relacionados no capítulo anterior que demonstrem a viabilidade do empreendimento. Posteriormente, buscará responder às seguintes perguntas básicas: “o que contratar?”; “com quais recursos?”; “com quem contratar?”; “como executar?”; “como contratar?”. A solução se dará por meio da denição de seis diretrizes básicas, conforme detalhamento deste capítulo: caracterização da obra; previsão de recursos orçamentários; regras para a habilitação dos interessados; regras para a contratação; regras para estruturação da licitação; e regras para o julgamento, consoante ilustra a FIGURA 7.a. 68
67
PEREIRA JUNIOR. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública , p. 474. MEIRELLES. Direito administrativo brasileiro , p. 290.
68
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Licitação – Fase interna
O que contratar
Com quais recursos
Quem contratar
Como executar
Caracterização da obra
Previsão de recursos
Regras para habilitação
Regras para contratação
Como contratar
Regras para julgamento
Regras para estruturação da licitação
FIGURA 7.a - Questões e diretrizes a serem observados na fase interna de licitação de obra pública
De plano, cabe destacar que a Lei nº 8.666/93 exige expressamente, em seu art. 7º, §2º, a observância às duas primeiras diretrizes para a licitação de obras e serviços, perfeita caracterização do objeto e previsão adequada de recursos, sob pena de nulidade dos atos ou contratos realizados e responsabilidade de quem lhes tenha dado causa. A referida lei estabelece que o edital deverá ser adequadamente estruturado e conter um conjunto de informações obrigatórias, relacionadas em seu art. 40, com o objetivo de propiciar aos licitantes a perfeita compreensão de toda a licitação. Esse conjunto de exigências está em consonância com a estrutura dada ao presente capítulo, conforme a TABELA 7.1.
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TABELA 7.1 Elementos exigidos na elaboração do edital pela Lei nº 8.666/93 Art.
Conteúdo
Caracterização da obra
7º, §2º, incisos I e II, e 40, incisos I e V, e §2º
- Objeto da licitação - Projeto básico e/ou executivo - Orçamento estimado em planilha de quantitativo e preços unitários
Previsão de recursos orçamentários
7º, §2º, incisos III e IV
- Previsão de recursos orçamentários - Produto contemplado no PPA
22 a 26 e 45
- Modalidade - Parcelamento - Tipo
Regras para a contratação
40, incisos IX, XI, XIV e XVI, e §2º
- Condições de pagamento - Critério de reajuste - Condições de recebimento do objeto - Minuta do contrato
Regras para a habilitação dos interessados
40, inciso VI
- Condições para participação da licitação
Regras para o julgamento
40, incisos VII e X
- Critério para julgamento, com disposições claras e parâmetros objetivos
40, incisos II, III, IV, VIII, XV
- Prazo e condições para assinatura do contrato ou retirada dos instrumentos - Sanções para inadimplemento - Local onde o projeto poderá ser examinado - Instruções e normas para os recursos legais - Informações complementares
Regras para estruturação da licitação
Procedimentos e informações complementares
Com efeito, o principal objetivo desta fase é o desenvolvimento de produto que permita a perfeita denição do objeto que será licitado, com estimativa de valores compatíveis com o mercado, bem assim a xação de regras que possibilitem a máxima
competitividade entre empresas aptas a realizar o escopo desejado. Interessante estudo que contemplou mais de 1.000 obras públicas similares no Estado de Pernambuco demonstra que, nos processos licitatórios onde concorreram mais de seis participantes, os preços contratados situaram-se em patamares inferiores aos valores estimados pelo órgão contratante, como mostra a FIGURA 7.b. 69
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PEREIRA. Ferramentas auxiliares nas auditorias de tabelas de preços. In: SÁ; PEREIRA (Org.). Auditoria de engenharia : uma contribuição do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, p. 421.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
FIGURA 7.b - Comportamento do Índice Preço Custo do Contrato – IPCC (relação entre o valor global proposto para a realização da obra de engenharia pela empresa vencedora do certame licitatório, ou selecionada no processo de dispensa ou inexigibilidade, e o custo da obra estimado com base nos preços unitários dos serviços obtidos das tabelas de preços) em função do número de participantes classicados
Fonte: PEREIRA. Ferramentas auxiliares nas auditorias de tabelas de preços. In: SÁ; PEREIRA (Org.). Auditoria de engenharia : uma contribuição do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, p. 421.
Deve o edital, portanto, denir as regras que evitarão, por um lado, a restrição
do número de concorrentes, e, por outro, afastarão empresas sem condições técnicas ou nanceiras de executar o empreendimento. Esse equilíbrio possibilitará a contratação
mais vantajosa para a Administração Pública.
Especicações técnicas de má qualidade ensejarão a necessidade de diversos
aditivos no decorrer do empreendimento; custos mal avaliados acarretarão contratação a preços superiores aos de mercado; e falhas na denição dos requisitos de habilitação
poderão restringir a competitividade ou atrair aventureiros para o processo licitatório. Em todos os casos relacionados haverá desperdício de recursos, com alto grau de comprometimento da conclusão da obra.
7.2 Caracterização da obra Com exatidão, o Tribunal de Contas da União estabeleceu que “a denição precisa e suciente do objeto licitado constitui regra indispensável da competição, até mesmo
como pressuposto do postulado de igualdade entre os licitantes, do qual é subsidiário o princípio da publicidade, que envolve o conhecimento, pelos concorrentes potenciais das condições básicas da licitação, constituindo, na hipótese particular da licitação para
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compra, a quantidade demandada em uma das especicações mínimas e essenciais à denição do objeto do pregão” (TCU. Súmula nº 177. DOU , 9 nov. 1982). Nessa linha, são comuns determinações do TCU aos órgãos e entidades para que se abstenham “de inserir nos editais denições de objeto imprecisas ou demasiadamente amplas, cuja interpretação possa levar à possibilidade de contratação de mais de uma obra, serviço ou fornecimento em decorrência de uma única licitação” (TCU. Decisão nº 420/02, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 10 maio 2002). Portanto, a condução de licitação para contratação de obra pública ou serviço de engenharia, pelas características ímpares de cada empreendimento, deve ser extremamente cautelosa na perfeita caracterização do objeto a ser executado, tanto sob o aspecto técnico quanto o econômico. Caso contrário, signicativas alterações serão necessárias no decorrer dos trabalhos, com acréscimos de quantitativos de serviços licitados ou de novos serviços com preços a serem denidos sem os parâmetros de mercado. Em qualquer das hipóteses, haverá risco na continuidade da obra. Por esse motivo, o art. 7º, §2º, da Lei nº 8.666/93 estabelece que as obras e os serviços somente poderão ser licitados quando, entre outros: I - houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório; II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários. O legislador demonstrou nesse comando a necessidade não apenas da perfeita caracterização do objeto a ser licitado, mas também da existência de orçamento que reita os valores a serem contratados, inclusive com a composição de seus custos unitários. Releva notar que a necessidade da chancela da autoridade competente, gura distinta do responsável técnico pela elaboração do projeto, tem como objetivo principal a identicação e validação do interesse público em nome da Administração. A propósito, o TCU destaca a diferença conceitual entre o recebimento e o instituto da aprovação do projeto básico: A segunda irregularidade aborda a ausência de aprovação do projeto básico que subsidiou a licitação, em desacordo com o disposto no art. 7º, §2º, inciso I, da Lei 8.666/93. Das informações contidas nos autos, verico que o projeto básico teria sido contratado no âmbito do Ministério da Integração Nacional e, posteriormente, repassado à Serhmact/ PB que, por conta disso, se absteve de promover a aprovação formal no procedimento administrativo que conduziu a licitação. Destaco a natureza peculiar deste caso, haja vista que o ato de recebimento do projeto ocorreu em órgão distinto daquele responsável pela condução do certame. Diante disso, entendo que o fato de o Ministério da Integração Nacional receber o projeto básico não afasta, por si só, a necessidade de aprovação de tal projeto pela autoridade competente da Serhmact/PB. A esse propósito, anoto que o recebimento do objeto contratado, qual seja, o projeto básico, na forma prevista no art. 73 da Lei 8.666/93, não se confunde com o instituto da aprovação de projeto, prevista no art. 7º, §2º, inciso I, da mesma norma. O primeiro instituto tem por objetivo averiguar se o produto contratado foi entregue nos termos e condições previstos no contrato, enquanto que o segundo remete a um juízo de adequação do projeto no momento em que se decide promover a contratação da execução daquele projeto, não se confundindo, por óbvio, com o ato de recebimento.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Desse modo, acompanho a proposta formulada pela unidade técnica no sentido de dar ciência à Secretaria de Estado dos Recursos Hídricos, do Meio Ambiente e da Ciência e Tecnologia do Estado da Paraíba quanto à ausência de aprovação do projeto básico que subsidiou a licitação, em afronta ao disposto no art. 7º, §2º, inciso I, da Lei 8.666/93. (TCU. Acórdão nº 3.213/2014, Plenário. Rel. Min. Bruno Dantas. DOU, 19 nov. 2014)
Além dos elementos relacionados de forma expressa no texto legal, projeto e orçamento detalhado, a questão atinente à área ambiental também não pode ser esquecida, visto ser uma das que mais afeta a continuidade dos processos de contratação de obra pública, conforme estrutura apresentada na FIGURA 7.c.
Caracterização da obra
Licença ambiental prévia
Projeto básico
Orçamento detalhado
Projeto executivo
Documentação “as built”
FIGURA 7.c - Elementos básicos para caracterização da obra
7.2.1 Projeto básico Sem dúvida alguma, é o quesito mais importante de um processo licitatório. Projeto básico mal elaborado é certeza de sérios problemas futuros. A preocupação com a questão é antiga. Pesquisa aos acórdãos do Tribunal de Contas da União demonstra que a má qualidade do aludido projeto é recorrente em empreendimentos fnanciados com recursos públicos e tem causado excessivos prejuízos
ao erário. O cenário é contextualizado com muita propriedade:
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Creio que se possa, nesse ponto, repetir o que tenho, insistentemente, armado acerca do açodamento com que são feitos os projetos de engenharia para a grande maioria de obras realizadas pelo poder público em nosso País, independentemente da esfera governamental em que se encontrem tais obras. O Projeto Básico, que deve ser encarado como elemento fundamental para a realização de qualquer licitação, deve, também, ser considerado o pilar de todo empreendimento, público ou privado, mas que tem sido constantemente mal-elaborado, quando há envolvimento de recursos públicos, em quaisquer das esferas administrativas, sem a atenção mínima necessária quando da sua confecção, o que é lamentável por se tornar fonte de desvios e toda sorte de irregularidades que se tem notícia no Brasil. (TCU. Acórdão nº 77/02, Plenário. Rel. Min. Adylson Moa. DOU , 11 abr. 2002)
O mesmo Tribunal destaca o grave quadro decorrente do afã no gasto de recursos públicos, não obstante a qualidade técnica das empresas brasileiras, e a correlação entre a má qualidade do projeto básico e as consequências malécas dos aditivos: Merece observação, também, que tais falhas, naturalmente, não ocorreram, como frisou a Equipe de Inspeção, por falta de capacidade técnica de empresas brasileiras de engenharia. Pelo contrário, tais empresas já provaram sua total capacidade quando da realização de grandes projetos de engenharia. Infelizmente, tais falhas ocorrem pela falta de zelo, pelo açodamento de maus administradores públicos, no afã de se obter recursos a qualquer custo, o que incrementa a lamentável estatística de mais de duas mil obras paralisadas em todo o Brasil, conforme apurado pela já citada Comissão Especial do Senado Federal em 1995, como é do conhecimento desta Casa, tendo em vista o elevado número de Inspeções realizadas por esta Corte de Contas nas citadas obras. (TCU. Acórdão nº 24/99, Plenário. Rel. Min. Adylson Moa. DOU , 26 mar. 1999) A propósito, a equipe de auditoria consignou que não lhe foi apresentado o projeto básico, mas tão-somente planilhas de serviços com os respectivos quantitativos. As características das alterações ocorridas em relação ao previsto originalmente levam a acreditar que, de fato, não houve uma denição precisa do objeto, a partir de um projeto básico que delineasse os serviços a serem executados. Com relação ao real percentual dos reajustes, observo que, mesmo tomando por base o valor inicial atualizado, como requer um dos responsáveis, somente o Aditivo XIV promoveu um acréscimo de serviços da ordem de 70%. A situação até aqui evidenciada se agrava com a constatação de que a obra até esta data não foi concluída. (TCU. Acórdão nº 90/02, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. , 10 abr. 2002) DOU
7.2.1.1 Conceitos A Lei nº 8.666/93 dedicou especial atenção ao conceito de projeto básico em seu art. 6º, inciso IX, denindo-o como “conjunto de elementos necessários e sucientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a denição dos métodos e do prazo de execução”. A referida denição é complementada pela exigência de elementos relacionados nas alíneas “a” a “f” do mencionado inciso, por meio de uma relação de estudos a serem desenvolvidos para a caracterização da solução escolhida, a identicação dos serviços a executar, a montagem do plano de licitação e gestão da obra e demonstração dos
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
métodos construtivos. Importante perceber o objetivo de cada um dos elementos do projeto básico relacionados na lei, conforme detalha a TABELA 7.2. TABELA 7.2 Elementos exigidos no projeto básico e objetivos Elemento
Objetivo
a) desenvolvimento da solução escolhida, de forma a fornecer visão global da obra e identicar todos os seus elementos constitutivos com clareza;
Deve existir apenas uma solução escolhida sob os aspectos técnicos e econômicos dentre diversas alternativas estudadas previamente. Essa solução deve contemplar todos os elementos detalhados com clareza de forma a possibilitar a todos (licitantes, agentes públicos e sociedade) uma visão precisa do que será realizado.
b) soluções técnicas globais e localizadas, sucientemente detalhadas, de forma a minimizar a necessidade de reformulação ou de variantes durante as fases de elaboração do projeto executivo e de realização das obras e montagem;
O detalhamento da solução deve ser suciente para evitar alterações no decorrer do empreendimento que desvirtuam a solução escolhida e, em casos mais graves, descaracterizam o objeto licitado. Caso contrário, não haverá a implementação da solução inicialmente escolhida e, sim, de outra concepção.
c) identicação dos tipos de serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorporar à obra, bem como suas especicações que assegurem os melhores resultados para o empreendimento, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
A denição de serviços e materiais no projeto deve ter como única nalidade o bom resultado do empreendimento sob os aspectos econômicos, técnicos, operacionais e de manutenção, sendo vedada qualquer iniciativa relativa a especicações que direcionem a licitação ou restrinjam a competitividade.
d) informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos, instalações provisórias e condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
Os licitantes precisam ter informações corretas e precisas que subsidiem a elaboração de suas propostas, de forma a tornar o procedimento competitivo. Não é admitido o fornecimento de dados de projeto que sabidamente serão alterados após a contratação, sob pena de violação do princípio da isonomia e da vinculação ao instrumento convocatório.
e) subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendendo a sua programação, a estratégia de suprimentos, as normas de scalização e outros dados necessários em cada caso;
Os responsáveis pela condução da licitação necessitam de elementos para denir o edital e regras para contratação a m de evitar pedidos de aditivos futuros pela empresa vencedora, além de gerenciar a questão relativa ao cronograma físico-nanceiro do empreendimento.
f) orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados.
Peça fundamental para que a Administração possa ter perfeito conhecimento dos valores atinentes ao empreendimento em face de dois motivos: - vericar a adequação das propostas dos licitantes e selecionar aquela mais vantajosa para a administração; - propiciar visão a respeito da viabilidade do empreendimento e da adequação orçamentária.
O objetivo principal do legislador foi garantir aos interessados em participar da licitação o conhecimento de todas as informações necessárias para a preparação
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de proposta, sem que houvesse benefício quando da contratação a qualquer dos concorrentes, como, por exemplo, aditivos em serviços com preços elevados, supressão de serviços com subpreço, alteração de especicação de serviços, ou antecipação do cronograma físico-nanceiro. As questões habitualmente formuladas em relação à elaboração de projeto básico, que serão respondidas a seguir, são: “quais são os elementos necessários e sucientes?”; “esses elementos são os mesmos para qualquer tipo de obra: edicação, rodoviárias, hídricas e outras?”; “qual o nível de precisão adequado; como a comissão de licitação tem condições de avaliar a qualidade do projeto básico? e do orçamento-base?”; “como identicar o responsável pela elaboração?”.
7.2.1.2 Requisitos O art. 12 da Lei nº 8.666/93 estabelece de forma exemplicativa alguns dos requisitos que deverão ser observados na elaboração dos projetos básicos e executivos: segurança; funcionalidade e adequação ao interesse público; economia na execução, conservação e operação; possibilidade de emprego de mão de obra, materiais, tecnologia e matérias-primas existentes no local para execução, conservação e operação; facilidade na execução, conservação e operação, sem prejuízo da durabilidade da obra ou do serviço; adoção das normas técnicas, de saúde e de segurança do trabalho adequadas; e impacto ambiental. O cumprimento desses requisitos permite, sem dúvida alguma, o melhor atendimento ao interesse público em face da materialização de produtos que apresentem menor custo de implementação, conservação e manutenção. A padronização de projetos possibilita o constante aprimoramento de suas denições e especicações, bem como a redução de erros e incertezas de sua execução. Essa padronização deve ser buscada, com especial atenção dos repassadores de recursos, principalmente em empreendimentos com elevado número de repetição, como escolas, creches, postos de saúde, hospitais de menor porte e quadras esportivas. A denição dos insumos a serem utilizados na obra deve atentar para as disponibilidades e custos locais, a m de reduzir os valores do empreendimento, sem que haja queda de qualidade. Outra questão relevante na denição dos insumos é a análise do empreendimento durante todo o seu período de utilização. Por vezes, a utilização de insumos mais baratos pode representar custos mais elevados de manutenção ou operação, o que exige uma análise detalhada por parte do projetista a m de denir a melhor relação benefício/ custo da especicação de serviços e materiais a serem empregados. Essa análise deve ser realizada em qualquer tipo de empreendimento, com especial destaque para a construção de rodovias, visto que existe estreita dependência entre custos de manutenção e conservação com a solução técnica denida em projeto.
7.2.1.3 Responsabilidade pela elaboração e acompanhamento Para tratar de questões referentes à responsabilidade, a preliminar da competência para o desenvolvimento de projetos de engenharia deve ser sempre lembrada.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
A Lei nº 5.194/66, que regula o exercício das prossões de engenheiro, arquiteto e
engenheiro-agrônomo, estabelece em seus artigos 6º e 7º que são atividades e atribuições desses prossionais, dentre outras, o planejamento ou projeto, em geral, de
regiões, zonas, cidades, obras, estruturas, transportes, explorações de recursos naturais e desenvolvimento da produção industrial e agropecuária; estudos, projetos, análises, avaliações, vistoria, perícias, pareceres e divulgação técnica; scalização de obras e
serviços técnicos; direção de obras e serviços técnicos; e execução de obras e serviços técnicos; e que “exerce ilegalmente a prossão de engenheiro, arquiteto ou engenheiro-
agrônomo: a pessoa física ou jurídica que realizar atos ou prestar serviços, públicos ou privados, reservados aos prossionais de que trata esta Lei e que não possua registro
nos Conselhos Regionais”. Vale lembrar a aprovação da Lei nº 12.378/10, que regulamentou o exercício da arquitetura e urbanismo, criou conselhos de scalizações prossionais especícos e estabeleceu as atividade e atribuições dessa categoria prossional. O seu art. 7º preceitua que “exerce ilegalmente a prossão de arquiteto e urbanista a pessoa física ou jurídica que realizar atos ou prestar serviços, públicos ou privados, privativos dos prossionais
de que trata esta Lei ou, ainda, que, mesmo não realizando atos privativos, se apresenta como arquiteto e urbanista ou como pessoa jurídica que atue na área de arquitetura e urbanismo sem registro no CAU”. Vale lembrar, ainda, que, consoante art. 12 da Lei nº 5.194/66, “na União, nos Estados e nos Municípios, nas entidades autárquicas, paraestatais e de economia mista, os cargos e funções que exijam conhecimentos de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, relacionados conforme o disposto na alínea ‘g’ do art. 27, somente poderão ser exercidos por prossionais habilitados de acordo com esta Lei”; e que, nos termos do
art. 13, “os estudos, plantas, projetos, laudos e qualquer outro trabalho de Engenharia, de Arquitetura e de Agronomia, quer público, quer particular, somente poderão ser submetidos ao julgamento das autoridades competentes e só terão valor jurídico quando seus autores forem prossionais habilitados de acordo com esta Lei”.
Dessa forma, é necessária para a execução de projeto de engenharia ou arquitetura a existência de prossional habilitado para a tarefa. Para caracterização do vínculo entre
os autores do projeto básico e o contratante, sejam eles contratados ou pertencentes ao quadro técnico do órgão contratante, deverá ser providenciada a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), instituída pela Lei Federal nº 6.496/77. Os artigos 2º e 3º da Resolução nº 1.025/09 e o art. 7º da Resolução nº 361/91, ambas do Confea, regulamentam com precisão a matéria referente à aludida anotação. 70
70
71
“Art. 2º A ART é o instrumento que dene, para os efeitos legais, os responsáveis técnicos pela execução de obras ou prestação de serviços relativos às prossões abrangidas pelo Sistema Confea/Crea. Art. 3º Todo contrato escrito ou verbal para execução de obras ou prestação de serviços relativos às prossões abrangidas pelo Sistema Confea/Crea ca sujeito ao registro da ART no Crea em cuja circunscrição for exercida
a respectiva atividade. Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo também se aplica ao vínculo de prossional, tanto a pessoa jurídica de direito público quanto de direito privado, para o desempenho de cargo ou função técnica que envolva atividades para as quais sejam necessários habilitação legal e conhecimentos técnicos nas prossões
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abrangidas pelo Sistema Confea/Crea”. “Art. 7º Os autores do Projeto Básico, sejam eles contratados ou pertencentes ao quadro técnico do órgão contratante, deverão providenciar a Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, instituída pela Lei Federal nº 6.496, de 07 dez. 1977, e regulamentada através de Resoluções especícas do Conselho Federal de Engenharia,
Arquitetura e Agronomia – Confea”.
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O TCU já se manifestou pela necessidade de que o órgão contratante “colha a assinatura dos responsáveis por cada etapa do projeto básico (cadernos de especicações, de encargos, plantas, orçamentos etc.) [...], como forma de evidenciar autorias e atribuir responsabilidades” (TCU. Acórdão nº 1.387/06, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 11 ago. 2006). Também rmou entendimento, por meio da Súmula nº 260, de que “é dever do gestor exigir apresentação de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART referente a projeto, execução, supervisão e scalização de obras e serviços de engenharia, com indicação do responsável pela elaboração de plantas, orçamento-base, especicações técnicas, composições de custos unitários, cronograma físico-nanceiro e outras peças técnicas” (TCU. Acórdão nº 1.524/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 9 jul. 2010). Vencida essa preliminar, ou seja, a de que todo projeto básico deve ser respaldado por prossional habilitado, necessariamente com a existência de ART, surge questão atinente aos quesitos necessários e sucientes para a caracterização da obra. Nesse particular, cada tipo de obra tem elementos próprios para sua denição. Não seria possível nesta publicação, até mesmo por não integrar a proposta principal, apresentar todos os levantamentos, estudos e projetos que devem ser realizados para cada tipo de obra, visto que seria necessário o desenvolvimento de diversos manuais para tanto. Entretanto, excelente referencial de conteúdo é a Orientação Técnica 1/2006 do Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas (IBRAOP), reconhecida pelo Tribunal de Contas da União (Acórdão nº 632/2012-Plenário) e pelo Conselho Federal de Engenharia (Decisão Normativa nº 106/2015-Confea). O que se deve ter em mente é a necessidade de que os técnicos responsáveis pela elaboração do projeto tenham experiência prossional e pleno conhecimento das normas aplicáveis e atividades que serão desenvolvidas. Esses técnicos deverão fornecer apoio à equipe responsável pela elaboração do edital em toda denição de diretrizes de engenharia que constarão no mesmo. Nesse contexto, importante o alerta do TCU no sentido de que “os responsáveis pela elaboração e aprovação de projeto básico inadequado e sem assinatura ou identicação do responsável técnico devem ser sancionados” (TCU. Acórdão nº 2.352/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 13 dez. 2006). A Comissão de Licitação, apesar de não necessariamente deter conhecimentos para avaliação da qualidade do projeto e do orçamento, deve, sob pena de responsabilidade solidária, se certicar da existência de ART de elaboração dessas peças, antes de dar andamento ao processo. 72
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Informações a respeito dos conteúdos de projetos básicos relativos a edicações, obras rodoviárias e pavimentação urbana podem ser obtidas no site do Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas, , em documento intitulado Orientação Técnica - OT - IBR 001/2006. 73 A Associação Brasileira de Noarmas Técnicas disponibiliza no site instrumento de fácil consulta, por meio de palavra-chave, à relação das normas técnicas existentes. Entretanto, a visualização do texto integral só é permitida após pagamento dos valores estabelecidos. Outras normas referentes a obras especícas podem ser obtidas em sítios de órgãos públicos, como por exemplo, o do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes: .
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
7.2.1.4 Contratação do projeto básico O projeto básico pode ser desenvolvido por meio de empresas contratadas ou por técnicos pertencentes ao próprio órgão ou entidade, sempre que reunirem habilitação para tanto. No caso de empresas contratadas, deve haver procedimento licitatório específco.
Nesse caso, considerando o caráter intelectual dos trabalhos, o TCU estabeleceu: A elaboração de projeto de engenharia e arquitetura está sujeita, em princípio, ao concurso ou ao procedimento licitatório adequado e obediente a critério seletivo de melhor qualidade ou de melhor técnica, que é o escopo do julgamento, independentemente da consideração de preço, que há de vir balizado no edital. (TCU. Súmula nº 157. DOU , 14 jan. 1980)
Nesse sentido, o art. 13 da lei de licitações considera como serviço técnico especializado, dentre outros: estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; pareceres, perícias e avaliações em geral, e destaca, em seu §3º, que nessas contratações, a empresa fcará obrigada a garantir que os integrantes do corpo técnico
da relação apresentada no procedimento licitatório realizem pessoal e diretamente os serviços objeto do contrato. Na prática, apesar de pequeno número de concursos realizados, é fundamental que a contratação de projeto seja norteada por critérios técnicos. A execução desses estudos por empresas pouco capacitadas poderá ensejar incrementos nos custos da execução do empreendimento que superam o próprio valor do projeto. Além disso, aplica-se o disposto no art. 111 da aludida lei, ou seja, o autor deve ceder os direitos patrimoniais relativos ao projeto à Administração para que esta possa “utilizá-lo de acordo com o previsto no regulamento de concurso ou no ajuste para sua elaboração”. Vale, aqui, trazer o art. 3º da Resolução CAU nº 67/2013, que dispõe sobre os direitos autorais na Arquitetura e Urbanismo e estabelece normas e condições para o registro de obras intelectuais no Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), por deixar clara a diferença entre direito autoral moral, inalienável e perpétuo, e direito autoral patrimonial, transmissível e prescritível: Art. 3º Os direitos autorais referentes a projetos, obras e demais trabalhos técnicos de criação no âmbito da Arquitetura e Urbanismo pertencem ao autor correspondente e consistem em: I - direitos autorais morais: são os direitos relativos à paternidade da obra intelectual, indicados no art. 24 da Lei 9.610, de 1998; e II - direitos autorais patrimoniais: são os direitos de utilizar, fruir e dispor da obra intelectual. §1º Os direitos autorais morais são inalienáveis e perpétuos. §2º Os direitos autorais patrimoniais são transmissíveis e prescritíveis. §3º Os direitos autorais patrimoniais perduram por setenta anos contados a partir de 1º de janeiro do ano subsequente ao do falecimento do autor da obra intelectual protegida.
A Instrução Normativa nº 2 da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (SLTI) recomenda, em seu art. 19,
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inciso XVI, a inserção de regras em Editais que prevejam, nas contratações de serviços não continuados, os seguintes direitos a contratante: a) o direito de propriedade intelectual dos produtos desenvolvidos, inclusive sobre as eventuais adequações e atualizações que vierem a ser realizadas, logo após o recebimento de cada parcela, de forma permanente, permitindo a contratante distribuir, alterar e utilizar os mesmos sem limitações; e b) os direitos autorais da solução, do projeto, de suas especifcações técnicas, da documentação produzida e congêneres, e de todos os demais produtos gerados na execução do contrato, inclusive aqueles produzidos por terceiros subcontratados, fcando proibida a sua utilização sem que exista autorização expressa da contratante, sob pena de multa, sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis. As linhas gerais que serão implementadas deverão estar bem defnidas com base em estudos preliminares e anteprojeto já realizados, conforme explanação feita no capítulo anterior, a fm de que seja iniciado o processo de contratação. Por vezes, diante da existência de diversos tipos de projeto (arquitetônico, estrutural, licitações etc.) poderá haver a necessidade de vários processos licitatórios. Importante destacar algumas regras estabelecidas pela Lei nº 5.194/66 em seu Capítulo II do Título I que trata da “Responsabilidade e Autoria” dos projetos: a) os profssionais que participarem do projeto deverão ser mencionados explicitamente como autores da parte que lhes tiver sido confada, assinando todos os documentos pertinentes, como plantas, desenhos, cálculos, pareceres, relatórios, análises, normas, especifcações e outros documentos relativos ao projeto; b) quando o autor do projeto solicitar o concurso de profssionais especializados e legalmente habilitados, serão estes corresponsáveis na parte que lhes diga respeito; c) é assegurado ao autor o direito de acompanhar a execução da obra, de modo a garantir a sua realização, de acordo com as condições, especifcações e demais pormenores técnicos nele estabelecidos. Cabe registrar que o direito assegurado ao autor de acompanhar a obra não obriga a sua contratação pela Administração para a supervisão do empreendimento, consoante entendimento do TCU: A Lei nº 5.194, de 24/12/66, e, em especial, o seu art. 22, não atribuem ao autor do projeto o direito subjetivo de ser contratado para os serviços de supervisão da obra respectiva, nem dispensam a licitação para a adjudicação de tais serviços, sendo admissível, sempre que haja recursos sufcientes, que se proceda aos trabalhos de supervisão, diretamente ou por delegação a outro órgão público, ou, ainda, fora dessa hipótese, que se inclua, a juízo da Administração e no seu interesse, no objeto das licitações a serem processadas para a elaboração de projetos de obras e serviços de engenharia, com expressa previsão no ato convocatório, a prestação de serviços de supervisão o acompanhamento da execução, mediante remuneração adicional, aceita como compatível com o porte e a utilidade dos serviços. (TCU. Súmula nº 185. DOU , 09 nov. 1982)
Para o gerenciamento das atividades do projeto, vale consultar algumas diretrizes registradas no Manual SEAP – Projetos , válidas para todos os tipos de obra:
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Todos os estudos e projetos deverão ser desenvolvidos de forma harmônica e consistente, observando a não interferência entre os elementos dos diversos sistemas da edicação, e
atendendo às seguintes diretrizes gerais de projeto: - apreender as aspirações do Contratante em relação ao empreendimento, o plano de desenvolvimento em que se insere, os incentivos e as restrições a ele pertinentes; - considerar a área de inuência do empreendimento, relacionada com a população e a região a serem beneciadas;
- utilizar materiais e métodos construtivos adequados aos objetivos do empreendimento e às condições do local de implantação; - adotar solução construtiva racional, elegendo sempre que possível sistemas de modulação e padronização compatíveis com as características do empreendimento. 74
O aludido Manual registra também algumas observações importantes para a condução dos trabalhos, com foco na área de edicações: [...] o Projeto Básico será constituído por um relatório técnico, contendo o memorial
descritivo dos sistemas e componentes e o memorial de cálculo onde serão apresentados os critérios, parâmetros, grácos, fórmulas, ábacos e “softwares” utilizados na análise e dimensionamento dos sistemas e componentes [...]
3.5.1 Cumprirá a cada área técnica ou especialidade o desenvolvimento do Projeto especíco correspondente. O Projeto completo, constituído por todos os projetos especícos
devidamente harmonizados entre si, será, de preferência, coordenado pelo autor do Projeto de Arquitetura ou pelo Contratante ou seu preposto, de modo a promover ou facilitar as consultas e informações entre os autores do Projeto e solucionar as interferências entre os elementos dos diversos sistemas da edicação. 3.5.4 [...] A aprovação do Projeto não eximirá os autores do Projeto das responsabilidades estabelecidas pelas normas, regulamentos e legislação pertinentes às atividades prossionais [...]
O Relatório de Serviços, com páginas numeradas em 3 (três) vias, 2 (duas) destacáveis, será destinada ao registro de fatos e comunicações que tenham implicação contratual como: modicações de dados básicos de projeto, conclusão e aprovação de etapas de
projeto, autorização para execução de trabalho adicional, autorização para substituições e modicações na equipe técnica responsável pela execução dos trabalhos, ajustes no
cronograma e plano de elaboração dos projetos, irregularidades e providências a serem tomadas pela Contratada e Fiscalização [...]
As reuniões realizadas no local de execução dos trabalhos serão documentadas por Atas de Reunião, elaboradas pela Fiscalização e que conterão, no mínimo, os seguintes elementos: data, nome e assinatura dos participantes, assuntos tratados, decisões e responsáveis pelas providências a serem tomadas. 75
7.2.1.5 Nível de precisão A denição de projeto básico na lei de licitações refere-se à expressão “nível de
precisão adequado”, sem apresentar valores limites de tolerância, o que, a princípio 74
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BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio. Manual de obras públicas: projetos: práticas da Seap, p. 6. BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio. Manual de obras públicas: projetos: práticas da Seap, p. 6 -7.
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deixaria os responsáveis pelo acompanhamento de empreendimento sem referenciais objetivos de aferição. Entretanto, a possível lacuna matemática é preenchida por comando inserido na Resolução nº 361/91 – Confea, que, em seu art. 3º, alínea “f”, estabelece como característica de um projeto básico “denir as quantidades e os custos de serviços e fornecimentos com precisão compatível com o tipo e porte da obra, de tal forma a ensejar a determinação do custo global da obra com precisão de mais ou menos 15% (quinze por cento)”. Esse é o referencial aceitável para variações em virtude de possíveis imprecisões de projeto. Valores superiores a esse limite caracterizam, na maioria das situações, falhas na elaboração do projeto que devem ser apuradas. Quatro observações importantes merecem ser enumeradas: a) O valor de 15% se refere a todos os ajustes à previsão inicial necessários para a efetiva conclusão da obra, qualitativos e quantitativos; b) O patamar de 15% não é utilizado apenas para acréscimo, mas também para redução do valor original previsto, ou seja, uma estimativa inicial de 100 poderá redundar em execução que varie na faixa de 85 a 115; c) O limite máximo autorizado por lei para a celebração de aditivos, no valor de 25% (art. 65, §1º, da Lei nº 8.666/93), contempla, com folga, as possíveis imprecisões do projeto básico, o que desautoriza a não conclusão do empreendimento em face de insuciência de valores contratuais; e d) Não é razoável sob o ponto de vista técnico a retirada de parcela do objeto licitado do contrato, a m de que não seja ultrapassado o limite legal xado para os aditivos.
7.2.1.6 Denição de marca O questionamento relativo à possibilidade de denição de marca para produtos, insumos ou serviços é recorrente no momento da elaboração do Edital. A respeito, o TCU tem se pronunciado pela excepcionalidade da referida denição, com sugestões ao órgão ou entidade no sentido de que: [...] evitando também a indicação de marcas, características e especicações exclusivas, salvo nos casos em que for tecnicamente justicável , em face das disposições constantes do art. 7º, §5º da Lei nº 8.666/93; [...]. (TCU. Acórdão nº 597/08, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 14 abr. 2008) [...] se abstenha de fazer referências nas denições dos objetos a licitar a quaisquer marcas de produtos, mesmo que seguidas da expressão ‘ou similar’, exceto, neste último caso, se inexistir outra maneira para denição do objeto desejado, e desde que o produto similar seja, de fato e sem restrições, aceito pela administração; 2.2 - evite a inclusão, nos editais das futuras licitações, de expressões que caracterizem, na prática, preferência por marca, a exemplo da condição [...], devendo, nos casos em que for imprescindível a indicação de marca, fazer constar dos respectivos processos, previamente ao lançamento do edital, a justicativa técnica prevista no art. 7º, §5º, da Lei nº 8.666/93; 2.3 - faça constar dos editais das futuras licitações, quando admitida a substituição de materiais especicados no edital, que esta cará condicionada à comprovação de similaridade e à correspondência de preços entre eles; [...]. (TCU. Decisão nº 103/98, Plenário. Rel. Min. Humberto Souto. DOU , 30 mar. 1998)
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
7.2.1.7 Validação e atualização do projeto A autoridade competente deverá se certicar, quando da aprovação do projeto
básico prevista no art. 7º, §1º, da Lei nº 8.666/93, que os elementos mínimos exigidos estão presentes. Qualquer dúvida deverá ser saneada junto ao projetista antes do prosseguimento das atividades. Peça que merece especial atenção é o orçamento-base estabelecido. Nesse caso, é recomendável a vericação de, pelo menos, todos os preços de insumos e serviços do grupo A da curva ABC, bem como da documentação utilizada para a denição desses
valores (tabelas referenciais, propostas etc.). Outra questão fundamental para a validação refere-se à vericação da atualização
do projeto que será utilizado como referência para a licitação. De acordo com o TCU, “a elaboração de projeto básico adequado e atualizado, assim considerado aquele que possua os elementos descritivos e que expressem a composição de todos os custos unitários, é imprescindível para a realização de qualquer obra pública, resguardando a Administração Pública de sobrepreços e manipulação indevida no contrato original” (TCU. Acórdão nº 2.641/07, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 11 dez. 2007). Os motivos para essa preocupação estão delineados de forma clara pelo próprio TCU: Entendo que se trata de freqüente ocorrência com que esta Corte de Contas tem se deparado (Acórdão nº 1.175/2006- Plenário), objeto, inclusive, de determinações expressas ao [...]
para que se abstenha de realizar licitações com esteio em projetos básicos desatualizados,
que não contemplam as soluções denitivas exigidas pelo ordenamento legal em vigor,
ferindo, entre outros dispositivos, o art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666/1993. Posteriormente, mostra a experiência que aquela autarquia tem recorrido à prática ilegítima denominada “revisão de projetos em fases de obras”, cuja nalidade consiste em reparar as falhas do
projeto original ou, muitas vezes, praticamente alterá-lo, com mudança de sua própria concepção preliminar. Nesse sentido, por meio do Acórdão nº 1.175/2004-Plenário, o Tribunal determinou àquela autarquia que procedesse à anulação das disposições internas que autorizavam as alterações de projeto imediatamente após o início das obras, por falta de previsão legal. 8. No presente caso, é exatamente essa a situação observada. Conforme consignado no relatório de auditoria, o projeto básico data de janeiro de 1998, e as obras se iniciaram em 13/6/2005; logo após, em setembro de 2005, foi aprovada a 1ª revisão de projeto. 9. O problema maior é que, com isso, há grandes chances de se ver quebrada a equação econômico-nanceira do contrato, dando lugar ao chamado “jogo de planilha”, cuja
efetivação ocorre, alternativamente, quando: - há acréscimo de quantitativos de serviços com sobrepreço; - os itens incluídos no contrato apresentam preços unitários superiores aos referenciais de mercado; - há supressão de serviços com subpreço; - há redução de quantitativos daqueles itens cujos preços unitários contemplam descontos em relação aos parâmetros de mercado. (TCU. Acórdão nº 760/07, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 04 maio 2007) Em função desse cenário, o TCU rmou entendimento, por meio da Súmula
nº 261, de que “em licitações de obras e serviços de engenharia, é necessária a elaboração
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de projeto básico adequado e atualizado, assim considerado aquele aprovado com todos os elementos descritos no art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, constituindo prática ilegal a revisão de projeto básico ou a elaboração de projeto executivo que transfgurem o objeto originalmente contratado em outro de natureza e propósito diversos” (TCU. Acórdão nº 1.536/2010, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 23 jul. 2010). Com efeito, a premissa de uma concorrência efetiva está na qualidade de Projeto Básico que permita que todos os licitantes tenham as mesmas informações no momento do certame licitatório, conforme assevera o próprio TCU: A existência de defciências graves no Projeto Básico que impossibilitam a adequada descrição dos serviços que serão implementados na obra compromete o certame realizado, tendo em vista que tal procedimento afasta da licitação empresas que optam por não correr o risco de apresentar um orçamento elaborado sem a necessária precisão, havendo, portanto, prejuízo à competitividade do certame e à contratação da proposta mais vantajosa pela Administração Pública, o que enseja a nulidade da concorrência efetivada. (TCU. Acórdão nº 2.819/2012, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 26 out. 2012) A atualidade do projeto básico é, antes de qualquer exigência legal, uma questão de lógica, porque, se a entidade se propõe a realizar determinado procedimento licitatório, tem dever de assegurar aos participantes que o que se busca está balizado em parâmetros e elementos que traduzem felmente o objeto almejado, na sua adequação, composição e atualidade. Caso contrário, induz os participantes a erro na apresentação da proposta baseada em realidade que não mais existe, o que acarreta, como ocorreu nestes autos, a celebração de uma série de termos aditivos, que descaracterizaram totalmente o objeto licitado, uma vez que foram feitas alterações substanciais em serviços necessários à execução da obra. (TCU. Acórdão nº 1.169/2013, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 21 maio 2013)
7.2.2 Licenciamento ambiental A questão ambiental vem ganhando relevo nos últimos anos, principalmente em face da conscientização da sociedade a respeito da importância do equilíbrio entre o desenvolvimento, a evolução tecnológica e o meio ambiente. O conceito de desenvolvimento sustentável dado pela Organização das Nações Unidas (ONU) reete com clareza a importância do tema: “é aquele que atende às necessidades presentes sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras satisfazerem suas próprias necessidades”. A preocupação do legislador com o tema segue a mesma linha. A lei de crimes ambientais (Lei nº 9.605, de 12.02.1998) estabeleceu sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Como inovações podem ser exemplifcadas a defnição de responsabilidade da pessoa jurídica, inclusive no campo penal, e da pessoa física autora e coautora da infração, motivo pelo qual deve ser redobrada a cautela na condução do processo licitatório que exija estudos nessa área.
7.2.2.1 Procedimento As regras básicas para o processo de licenciamento ambiental estão estabelecidas na Lei nº 6.938/81 e nas resoluções nº 001/86 e nº 237/97 (Conama).
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
A Resolução Conama nº 237/97, em seu art. 1º, I, o dene como “procedimento
administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso”. Dene, também, as
diretrizes gerais e atividades técnicas que deverão estar contempladas no estudo de impacto ambiental. A Lei nº 6.938/81 estabelece, em seu art. 10, a competência para aprovação do mencionado processo: Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.
A Resolução Conama nº 237/97, em seus artigos 4º a 6º, regulamentou o comando retromencionado, definindo as competências do Ibama e dos órgãos estaduais ou municipais ambientais, com fulcro na “predominância do interesse” dos entes federativos.
7.2.2.2 Licenças ambientais A mesma Resolução, no art. 1º, II, dene licença ambiental como o “ato admi-
nistrativo pelo qual o órgão ambiental competente, estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental”. Em seu art. 8º, relaciona as espécies de licença ambiental: I - Licença Prévia (LP) – concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação; II - Licença de Instalação (LI) – autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especicações constantes dos planos, programas e projetos aprovados,
incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante; III - Licença de Operação (LO) – autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a vericação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as
medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação. Parágrafo único. As licenças ambientais poderão ser expedidas isolada ou sucessivamente, de acordo com a natureza, características e fase do empreendimento ou atividade.
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Considerando que a resolução em comento, no art. 11, fxa a responsabilização do empreendedor e profssionais que subscrevem os estudos previstos, inclusive com a previsão de sanções administrativas, civis e penais, é recomendável especial cuidado na contratação de técnico legalmente habilitado. O resumo a seguir ilustra a integração entre as etapas do processo de licenciamento ambiental de competência do Ibama e do processo de licitação l icitação e contratação. 76
I - empreendedor comunica ao Ibama e às Oemas a intenção de realizar o empreendimento (Resolução Conama nº 237/97, art. 8º, inciso I, primeira parte); II - o Ibama elabora os termos de referência referência dos estudos e projetos ambientais (Resolução Conama nº 237/97, art. 10, inciso I); III - o empreendedor elabora os estudos e projetos ambientais, entre eles o EIA/Rima, se for o caso (art. 8º da Resolução Conama nº 01/86); IV - o Ibama realiza visita in loco para defnir se há necessidade de realizar audiências públicas (caput do art. 2º da Resolução Conama nº 09/87 e inciso V do art. 10 da Resolução Conama nº 237/97); V - o Ibama convoca audiências públicas por defnição própria, por solicitação solicitação do Ministério Público ou por convocação de no mínimo 50 pessoas; ou deixa transcorrer prazo de 45 dias regimentais para a convocação da audiência pública (parágrafos 1º a 3º do art. 2º da Resolução Conama nº 09/87); VI - o Ibama emite parecer a favor ou contra a concessão da licença prévia (inciso VII do art. 10 da Resolução Conama nº 237/97); VII - o Ibama emite a licença prévia, aprovando a concepção, a localização e os requisitos ambientais necessários para que o empreendime empreendimento nto seja viável ambientalmente (inciso I do art. 8º da Resolução Conama nº 237/97); VIII - o empreendedor fnaliza o projeto básico (inciso 9º do art. 6º da Lei nº 8.666/93); IX - o empreendedor contrata a execução do projeto executivo e inicia a licitação para a contratação da execução das obras (caput e parágrafo 1º do art. 7º da Lei nº 8.666/93); X - o empreendedor apresenta ao Ibama o detalhamento dos programas ambientais (sistemática adotada pelo Ibama); XI - o Ibama aprova ou não o detalhamento dos programas ambientais (sistemática adotada pelo Ibama); XII - aprovado o detalhamento desses programas, o Ibama emite a licença de instalação (inciso II do art. 8º da Resolução Conama nº 237/97); XIII - o empreendedor inicia as obras; XIV - o Ibama realiza vistoria no empreendimento com vistas a verifcar o cumprimento dos programas ambientais aprovados quando da concessão co ncessão da licença prévia e detalhados quando da concessão da licença de instalação (sistemática adotada pelo Ibama); XV - o Ibama emite a licença de operação (inciso II do art. 8º da Resolução Conama nº 237/97). (TCU. Acórdão nº 516/03, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. DOU , 26 maio 2003)
Vale registrar as principais defciências constatadas em Estudos de Impacto Ambiental (EIA) relacionadas em publicação do Ministério Público Federal atinente à matéria:
76
Válido por analogia para órgãos ambientais estaduais.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
I - Objetivos do empreendimento: - adoção dos objetivos do conjunto total de obras interdependentes como justicativa para
aprovação de apenas um dos trechos ou projetos; - omissão, ou registro supercial, supercial, da relação do projeto especíco especíco com o conjunto de obras ao qual se lia, possibilitando a conclusão pela sua independência;
II - Estudos de alternativas tecnológicas e locacionais: - ausência de proposição de alternativas; - apresentação de alternativas reconhecidamente inferiores à selecionada no EIA; - prevalência dos aspectos econômicos sobre os ambientais na escolha de alternativas; III - Delimitação das áreas de inuência: - desconsideração da bacia hidrográca; - delimitação das áreas de inuência sem alicerce nas características e vulnerabilidade
dos ambientes naturais e nas realidades sociais regionais; IV - Diagnóstico ambiental:
- prazos insucientes para realização das pesquisas de campo;
- caracterização da área baseada, predominantemente, em dados secundários; - ausência ou insuciência de informações sobre a metodologia;
- proposição de execução de atividades at ividades de diagnóstico em etapas do licenciamento posteriores à Licença Prévia; V - Identicação, caracterização caracterização e análise aná lise de impactos: - não-identicação de determinados impactos ou identicação parcial de impactos; - identicação de impactos genéricos ou de impactos mutuamente excludentes;
- subutilização ou desconsideração de dados dos diagnósticos; - tendência à minimização ou subestimação dos impactos negativos e à supervalorização dos impactos positivos; VI - Mitigação e compensação de impactos: - proposição de medidas que não são a solução para mitigação do impacto; - indicação de medidas mitigadoras pouco detalhadas; - ausência de avaliação da eciência das medidas mitigadoras propostas;
- não-incorporação de propostas dos grupos sociais afetados, na fase de formulação for mulação do EIA; - ausência de informações detalhadas acerca dos recursos nanceiros destinados aos
programas e projetos ambientais; VII - Programas de acompanhamento e monitoramento ambiental: - erros conceituais na indicação de monitoramento; - ausência de proposição de programa de monitoramento de impactos especícos.
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O Tribunal de Contas da União, atento à questão, questã o, entendeu, em relação à ausência de licenças ambientais: [...] como indício de irregularidade grave, as seguintes ocorrências: ocorrências:
- a contratação de obras com base em projeto básico elaborado sem a existência e xistência da licença prévia, conforme art. 2º, §2º, inciso I e art. ar t. 12, ambos da Lei nº 8.666/93 c/c o art. 8º, inciso I, da Resolução Conama nº 237/97;
77
BRASIL. Ministér Ministério io Público Federal. Federal. 4ª Câmara de Coordenação e Revisão. Defciências em estudos de impacto ambiental : síntese de uma experiência, p. 14-39.
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- o início de obras sem a devida licença de instalação, bem como o início das operações do empreendimento empreendime nto sem a licença de operação com base nas Resoluções Conama nº 237/97 e 06/87. (TCU. Acórdão nº 516/03, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. DOU , 26 maio 2003)
No mesmo sentido, deniu, ainda, que “a falta de providências de responsável, com vistas a vericar a efetiva viabilidade ambiental e econômica de obra pública, justica sua apenação” apenação” (TCU. Acórdão nº 865/06, Plenário. Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 09 jun. 2006). Importante perceber que a exigência de licença prévia aprovada por órgão competente como requisito para licitação é essencial em face de ser elemento para perfeita denição do projeto básico. A “licença prévia expedida após a licitação e a aprovação do projeto executivo não é falha meramente formal” (TCU. Acórdão nº 2.352/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 13 dez. 2006). A denição das medidas mitigadoras deve existir antes da licitação, sob pena de impossibilitar a denição precisa do custo do empreendimento. Maior gravidade pode ocorrer se, depois de concluído o projeto básico sem a devida licença, o órgão ambiental se manifestar pela inviabilidade da obra. Por vezes, em face de divergências entre órgãos federais e estaduais competentes, o atraso na emissão da licença acaba prejudicando o andamento do empreendimento. Nesse caso, o TCU já formulou determinação no sentido de que esgotadas as possibilidades de concessão, na via administrativa, de licenças pertinentes, deve-se adotar as ações judiciais cabíveis para sua obtenção. 78
7.2.3 Orçamento detalhado – Preços O orçamento detalhado traduz em termos quantitativos e nanceiros os serviços que serão contratados e, por esse motivo, situa-se entre os documentos importantes do processo licitatório pelos seguintes fatores: a) funcionará como parâmetro para a Administração fixar os critérios de aceitabilidade de preços globais e unitários do edital; e b) será a principal referê referência, ncia, na fase externa da licitação, para a análise das propostas das empresas concorrentes. Qualquer falha em sua elaboração causará sérios problemas durante o decorrer de todo o empreendimento. Não é por acaso que a Lei nº 8.666/93 se refere a orçamento e a preços ou quantidades em diversos dispositivos de seu texto, e exige a existência de planilhas que expressem a composição de todos os custos unitários unitário s do empreendimento para o início da licitação de obras e serviços. A pesquisa à jurisprudência do Tribunal de Contas da União demonstra elevado percentual de irregularidades exatamente neste quesito. Por esse motivo, a presente publicação procurou abordar, nos capítulos 4 e 5, a conceituação, estruturação estruturação e dinâmica da elaboração do orçamento. 79
78 79
TCU. Acórdão nº 1.772/06, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 29 set. 2006. Art. 6º, IX, f; art. 7º, §2º, II; art. 40, XI; art. 40, §2º, II; art. 46, §1º, II da Lei nº 8.666/93.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Alguns requisitos são necessários para subsidiar um bom trabalho na construção do orçamento detalhado: a existência de projeto básico de engenharia de boa qualidade, elaborado por prossional competente; a quanticação precisa dos serviços que serão executados; e a utilização de parâmetros de preços de insumos conáveis.
Nesse contexto, o Decreto nº 7.983/13 estabelece, em seu art. 10, que “a anotação de responsabilidade técnica pelas planilhas orçamentárias deverá constar do projeto que integrar o edital de licitação, inclusive de suas eventuais alterações”. Vale registrar que a exigência inserida no art. 7º, §2º, inciso II, da Lei nº 8.666/93, relativa ao detalhamento de todos os custos c ustos unitários dos serviços em planilha culmina por proibir a inserção de verbas para a estimativa de custos. No mesmo sentido, todos os custos indiretos que fazem parte do BDI deverão estar propriamente aferidos. Existe intrínseca relação entre os dispositivos legais e as colunas da planilha orçamentária que será utilizada na licitação, uma vez que a Lei nº 8.666/93 exige a perfeita caracterização caracterização da obra e denição dos serviços, veda a inclusão de quantidades
que não correspondam às previsões reais, e a obrigatoriedade da apresentação de todos os custos unitários de serviços, conforme c onforme demonstra a TABELA 7.3. TABELA 7.3 Modelo de planilha orçamentária com referência aos comandos exigidos na Lei nº 8.666/93 Planilha Orçamentária (art. 6º, IX, “f” a c/c art. 7º, §2º, II b) Serviços
Un.
art. 6º, IXc
Qtde.
Custo Unitário
art. 7º, §4ºd
art. 7º, §2º, IIe
Preço Total
a
Art. 6º, IX, f - orçamento detalhado detalhado do custo global da obra, obra, fundamentado em quantitativos quantitativos de serviços serviços e fornecimentos propriamente avaliados. avaliados.
b
§2º As obras obras e os serviços somente somente poderão ser licitados licitados quando: [...] II - existir existir orçamento detalhado em
planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários.
c d
e
Art. 6º, IX - Projeto Básico – conjunto de elementos necessários e sucientes, com nível de precisão adequado,
para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação. Art. 7º, §4º É vedada, vedada, ainda, a inclusão, inclusão, no objeto da licitação, de fornecimento fornecimento de materiais e serviços serviços sem previsão de quantidades ou cujos quantitativos não correspondam às previsões reais do projeto básico ou executivo.
Art. 7º, §2º As obras e os serviços somente somente poderão ser licitados licitados quando: quando: [...] II - existir orçamento orçamento detalhado
em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários.
7.2.3.1 Referência de preços O legislador, além dos comandos referentes a custos de obras estabelecidos na lei de licitações, procurou, a partir de 2001, denir regras na lei de diretrizes orçamentárias
(LDO) para a elaboração do orçamento-base da Administração, com vistas a orientar 80
80
Art. 66 da Lei nº 10.266/2001 (LDO/2002): “Os custos unitários unitários de obras executadas executadas com recursos dos orçamentos da União, relativas à construção de prédios públicos, saneamento básico, pavimentação e habitação popular, não poderão ser superiores ao valor do Custo Unitário Básico – CUB por m², divulgado pelo Sindicato da Indústria da Construção, por Unidade da Federação, acrescido de até trinta por cento para cobrir custos não previstos no CUB.
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os gestores a respeito da importância dos preços referenciais. A lógica adotada foi o estabelecimento de um sistema referencial de custos, acima do qual o responsável pela contratação deveria justicar as condições especiais que ensejavam a elevação.
Em 2002, a Lei nº 10.524 (LDO/2003) estabeleceu como base para o custo de materiais e serviços de obras patrocinadas com recursos federais o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi) e, no caso de obras rodoviárias, o Sistema de Custos de Obras Rodoviárias (Sicro). A partir de então, o texto da LDO foi sucessivamente aprimorado, com a incorporação de comandos afetos à necessidade de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) nas peças orçamentárias, aos critérios de aceitabilidade em função do regime de execução, à inclusão do Sistema de d e Custos Rodoviários (Sicro) como referência alternativa em obras rodoviárias e métodos de pesquisa de custos para situações em que os serviços pesquisados não estivessem contemplados nos sistemas de referência. A Lei nº 12.708/2012 (LDO/2013) foi a que mais detalhou todos t odos os procedimentos a respeito de orçamentação de obras públicas: 81
Art. 102. O custo global das obras e dos serviços de engenharia contratados e executados e xecutados com recursos dos orçamentos da União será obtido a partir de composições de custos unitários, previstas no projeto, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes no Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – Sinapi, mantido e divulgado, na internet, pela Caixa Econômica Federal e pelo IBGE, e, no caso de obras e serviços rodoviários, à tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias – Sicro, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de construção civil. §1º O disposto neste artigo não impede que a administração federal desenvolva sistemas de referência de custos, aplicáveis no caso de incompatibilidade de adoção daqueles de que trata o caput , , incorporando-se às composições de custo unitário desses sistemas, sempre que possível, os custos de insumos constantes do Sinapi e do Sicro, devendo sua necessidade ser demonstrada por justicação técnica elaborada pelo órgão mantenedor
do novo sistema, o qual deve ser aprovado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e divulgado pela internet. §2º No caso de inviabilidade da denição dos custos consoante o disposto no caput deste artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema especíco
instituído para o setor ou em pesquisa de mercado. §3º Na elaboração dos orçamentos-base, os órgãos e entidades da administração pública federal poderão considerar especicidades locais ou de projetos na elaboração das
respectivas composições composições de custos unitários, desde que demonstrada, em relatório técnico elaborado por prossional habilitado, a pertinência dos ajustes para obras ou serviços de
engenharia a ser orçada.
Parágrafo único. Somente em condições especiais, devidamente justicadas, poderão os respectivos custos ultrapassar os limites xados no caput deste artigo, sem prejuízo da avaliação dos órgãos de controle interno e
81
externo”. “Art. 93. Os custos unitários de materiais materiais e serviços de obras executadas com recursos dos orçamentos da União não poderão ser superiores a 30% (trinta por cento) àqueles constantes do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – Sinapi, mantido pela Caixa Econômica Federal. §1º Somente em condições especiais, devidamente justicadas em relatório técnico circunstanciado, aprovado pela autoridade competente, poderão os respectivos custos ultrapassar o limite xado no caput deste artigo, sem
prejuízo da avaliação dos órgãos de controle interno e externo”.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
§4º Deverá constar do projeto básico a que se refere o inciso IX do caput do art. 6º da Lei nº 8.666, de 1993, inclusive de suas eventuais alterações, a anotação de responsabilidade técnica pelas planilhas orçamentárias, as quais deverão ser compatíveis com o projeto e os custos do sistema de referência, nos termos deste artigo. §5º Ressalvado o regime de empreitada por preço global de que trata a alínea “a” do inciso VIII do caput do art. 6º da Lei nº 8.666, de 1993: I - a diferença percentual entre o valor global do contrato e o preço obtido a partir dos custos unitários do sistema de referência utilizado não poderá ser reduzida, em favor do contratado, em decorrência decorrência de aditamentos que modiquem a planilha orçamentária; II - em casos excepcionais e devidamente justicados, a diferença a que se refere o inciso I deste parágrafo poderá ser reduzida para a preservação do equilíbrio econômico-nanceiro
do contrato, devendo ser assegurada a manutenção da vantagem da proposta vencedora ante à da segunda colocada na licitação e a observância, nos custos unitários dos aditivos contratuais, dos limites estabelecidos no caput para os custos unitários de referência; III - o licitante vencedor não está obrigado a adotar os custos unitários ofertados pelo licitante vencido; e IV - somente em condições especiais, devidamente justicadas em relatório técnico circunstanciado, elaborado por prossional habilitado e aprovado pelo órgão gestor dos
recursos ou seu mandatário, poderão os custos unitários do orçamento-base da licitação exceder o limite xado no caput e §1º, sem prejuízo da avaliação dos órgãos de controle interno e externo. §6º No caso de adoção do regime de empreitada por preço global, previsto no art. 6º, inciso VIII, alínea “a”, da Lei no 8.666, de 1993, devem ser observadas as seguintes disposições: I - na formação do preço que constará das propostas dos licitantes, poderão ser utilizados custos unitários diferentes daqueles xados no caput , , desde que o preço global orçado e o de cada uma das etapas previstas no cronograma físico-nanceiro do contrato, observado o §7º, que igual ou abaixo do valor calculado a partir do sistema de referência referência utilizado, assegurado ao controle interno e externo o acesso irrestrito a essas informações para ns de vericação da observância deste inciso; II - o contrato deverá conter cronograma físico-nanceiro com a especicação física
completa das etapas necessárias à medição, ao monitoramento e ao controle das obras, não se aplicando, a partir da assinatura do contrato e para efeito de execução, medição,
monitoramento, scalização e auditoria, os custos unitários da planilha de formação do
preço; III - mantidos os critérios estabelecidos no caput , , deverá constar c onstar do edital e do contrato cláusula expressa de concordância do contratado com a adequação do projeto básico, sendo que as alterações contratuais contra tuais sob alegação de falhas ou omissões em qualquer das peças, orçamentos, plantas, especicações, memoriais e estudos técnicos preliminares do
projeto não poderão ultrapassar, no seu conjunto, 10% (dez por cento) do valor total do contrato, computando-se esse percentual para vericação do limite do §1º do art. 65 da
Lei nº 8.666, de 1993;
IV - a formação do preço dos aditivos contratuais contará com orçamento especíco
detalhado em planilhas elaboradas pelo órgão ou entidade responsável pela licitação, detalhado mantendo-se, em qualquer aditivo contratual, a proporcionalidade da diferença entre o valor global estimado pela administração nos termos deste artigo e o valor global contratado, mantidos os limites do art. 65, §1º, da Lei nº 8.666, de 1993; V - na situação prevista no inciso IV deste parágrafo, uma vez formalizada a alteração contratual, não se aplicam, para efeito de execução, medição, monitoramento, scalização
e auditoria, os custos unitários da planilha de formação do preço do edital, assegurado ao controle interno e externo o acesso irrestrito a essas informações para ns de vericação
da observância dos incisos I e IV deste parágrafo; e
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VI - somente em condições especiais, devidamente justicadas em relatório técnico circunstanciado, elaborado por prossional habilitado e aprovado pelo órgão gestor dos recursos ou seu mandatário, poderão os custos das etapas do cronograma físico-nanceiro exceder o limite xado nos incisos I e IV deste parágrafo, sem prejuízo da avaliação dos
órgãos de controle interno e externo. §7º O preço de referência das obras e dos serviços de engenharia será aquele resultante da composição do custo unitário direto do sistema utilizado, acrescido do percentual de Benefícios e Despesas Indiretas – BDI, evidenciando em sua composição, no mínimo: I - taxa de rateio da administração central; II - percentuais de tributos incidentes sobre o preço do serviço, excluídos aqueles de natureza direta e personalística que oneram o contratado; III - taxa de risco, seguro e garantia do empreendimento; e IV - taxa de lucro. §8º Entende-se por composições de custos unitários correspondentes, às quais se refere o caput , , aquelas que apresentem descrição semelhante a do serviço a ser executado, com discriminação dos insumos empregados, quantitativos e coecientes aplicados.
§9º (VETADO). §10. Comprovada a inviabilidade inviabilidade técnico-econômica de parcelamento do objeto da licitação, quando exigível nos termos da legislação em vigor, os materiais e equipamentos de natureza especíca que possam ser fornecidos por empresas com especialidade especialidadess próprias e diversas e que representem percentual signicativo do preço global da obra devem
apresentar incidência incidên cia de taxa de BDI reduzida em relação à taxa aplicável aos demais itens. §11. No caso do fornecimento de equipamentos, sistemas e materiais em que o contratado não atue como intermediário entre o fabricante e a administração pública ou que tenham projetos, fabricações e logísticas não padronizados e não enquadrados como itens de fabricação regular e contínua, nos mercados nacional ou internacional, o BDI poderá ser calculado e justicado com base na complexidade da aquisição, excetuando-se a regra
prevista no parágrafo anterior.
As obras passíveis de contratação por meio do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) também seguiram a mesma linha, nos termos do art. 8º da Lei nº 12.462/11: §3º O custo global de obras e serviços de engenharia deverá ser obtido a partir de custos unitários de insumos ou serviços menores ou iguais à mediana de seus correspondentes ao Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), no caso de construção civil em geral, ou na tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias (Sicro), no caso de obras e serviços rodoviários. 82
Em 08 de abril de 2013 foi aprovado o Decreto nº 7.983, que incorporou o texto adotado pelas sucessivas LDOs e estabeleceu “regras e critérios a serem seguidos por órgãos e entidades da administração pública federal para a elaboração do orçamento de referência de obras e serviços de engenharia, contratados e executados com recursos dos orçamentos da União”. O sistema de referência de custos continuou sendo o mesmo: 82
Importa registrar que a Lei nº 12.462/11 12.462/11 estabelece em seu art. 8º, §6º, que no “caso de contratações realizadas pelos governos municipais, estaduais e do Distrito Federal, desde que não envolvam recursos da União, o custo global de obras e serviços de engenharia a que se refere o §3º deste artigo poderá também ser obtido a partir de outros sistemas de custos já adotados pelos respectivos entes e aceitos pelos respectivos tribunais de contas”.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Art. 3º O custo global de referência de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços e obras de infraestrutura de transporte, será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema Nacional Nac ional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – Sinapi, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de construção civil. Parágrafo único. O Sinapi deverá ser mantido pela Caixa Econômica Federal – CEF, segundo denições técnicas de engenharia da CEF e de pesquisa de preço realizada pelo Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística – IBGE.
Art. 4º O custo global de referência r eferência dos serviços e obras de infraestrutura de transportes será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais aos seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema de Custos Referenciais de Obras – Sicro, cuja manutenção e divulgação caberá ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de infraestrutura de transportes. (...) Art. 6º Em caso de inviabilidade da denição dos custos conforme o disposto nos arts. 3º,
4º e 5º, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização ut ilização de dados contidos em tabela de referênci referênciaa formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal em publicações técnicas especializadas, em sistema especíco
instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.
Neste particular, importa registrar orientação do TCU no sentido de que deve ser observada a ordem estabelecida pelos normativos no momento de obtenção dos custos dos insumos: 9.1.1.9. na hipótese de inserção de serviços novos ou mudança de quantitativos não contemplados até o término desta scalização, adotar, nesta ordem, os seguintes critérios
para avaliação dos preços referenciais refere nciais máximos permitidos: 9.1.1.9.1. mediana dos preços do Sinapi, localidade Rio Grande do Norte; 9.1.1.9.2. subsidiariamente, preços do Sicro2, localidade Rio Grande do Norte; Nort e; 9.1.1.9.3. subsidiariamente, preços de outros sistemas aprovados pela Administração Pública, na hipótese de não serem encontradas referências nos sistemas anteriores, ou em caso de incompatibilidade técnica das composições desses paradigmas frente às peculiaridades do serviço, desde que demonstrada documentalmente mediante justicativa
técnica; 9.1.1.9.4. subsidiariamente, cotação de mercado contendo o mínimo de três cotações de empresas/fornecedores empresas/forneced ores distintos, fazendo constar do respectivo processo a documentação comprobatória pertinente aos levantamentos e estudos que fundamentaram o preço estimado (TCU. Acórdão nº 3.272/2011, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 15.dez. 15.dez. 2011).
Também é necessário estar atento que os sistemas de preço referem-se à cotação realizada nas capitais dos estados, ou seja, “na elaboração dos orçamentos orçament os de referência, referência, os órgãos e entidades da administração pública federal poderão adotar especicidades
locais ou de projeto na elaboração das respectivas composições de custo unitário, desde que demonstrada a pertinência dos ajustes para a obra ou serviço de engenharia a ser orçado em relatório técnico elaborado por prossional habilitado”.
83
Art. 8º do Decreto nº 7.983/2013.
83
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Para o exercício de 2014, o texto votado pelo Congresso Nacional abordou a questão de forma resumida em relação aos exercícios exerc ícios anteriores e acabou sendo vetado na integralidade pela Presidente da República por ocasião da sanção da Lei nº 13.080, de 02.01.2015 (LDO/2015), nos seguintes termos: Art. 122 (VETADO). O custo global das obras e dos serviços de engenharia contratados e executados com recursos dos orçamentos da União será obtido a partir de composições de custos unitários, previstas no projeto, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes no Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – Sinapi, mantido e divulgado, na internet , , pela Caixa Econômica Federal e pelo IBGE, e, no caso de obras e serviços rodoviários, à tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias – Sicro, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de construção civil. §1º O disposto neste artigo não impede que a administração federal desenvolva sistemas de referência de custos, aplicáveis no caso de incompatibilidade de adoção daqueles de que trata o caput , , incorporando-se às composições de custo unitário desses sistemas, sempre que possível, os custos de insumos constantes do Sinapi e do Sicro, devendo sua necessidade ser demonstrada por justicação técnica elaborada pelo órgão mantenedor
do novo sistema, o qual deve ser aprovado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e divulgado pela internet.
§2º No caso de inviabilidade da denição dos custos consoante o disposto no caput
deste artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema especíco instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.
§3º Na elaboração dos orçamentos-base, os órgãos e entidades da administração pública federal poderão considerar especicidades locais ou de projetos na elaboração das
respectivas composições composições de custos unitários, desde que demonstrada, em relatório técnico elaborado por prossional habilitado, a pertinência dos ajustes para obras ou serviços de
engenharia a serem orçados. §4º Deverá constar do projeto básico a que se refere o inciso IX do caput do art. 6º da Lei nº 8.666, de 1993, inclusive de suas eventuais alterações, a anotação de responsabilidade técnica pelas planilhas orçamentárias, as quais deverão ser compatíveis com o projeto e os custos do sistema de referência, nos termos deste artigo. §5º Somente em condições especiais, devidamente justicadas em relatório técnico circunstanciado, elaborado por prossional habilitado e aprovado pelo órgão gestor dos
recursos ou seu mandatário, poderão os custos unitários do orçamento-base da licitação exceder o limite xado no caput e §1º, sem prejuízo da avaliação dos órgãos de controle interno e externo. Razões dos vetos
Os critérios para a elaboração do orçamento de referência de obras e serviços de engenharia transcendem um exercício nanceiro e por isso já estão disciplinados pelo Decreto
nº 7.983, de 08 de abril de 2013, que assegura a necessária segurança jurídica sobre as regras a serem aplicadas. Além disso, a redação proposta não n ão contempla especicidades previstas
no Decreto, como as regras para empreitada a preço global e o Regime Diferenciado de Contratação – RDC, podendo gerar insegurança jurídica, inclusive por seu caráter anual e transitório, em contraste com sua aplicação a contratos que, normalmente, têm vigência plurianual.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
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Dessa forma, o Sinapi e o Sicro continuam sendo a fonte referencial para a orçamentação das obras públicas patrocinadas com recursos federais, agora com base no decreto e não mais na lei de diretrizes orçamentárias. orçamentárias. Por esse motivo, o leitor perceberá em leitura comparativa desta edição em relação às anteriores que a fundamentação jurídica de procedimentos orçamentários será feita em função do decreto e não da LDO. Cabem, aqui, alguns comentários: a) de certo modo, houve uma fragilização da referência Sinapi e Sicro, pois passou passo u a fazer parte de normativo infralegal, ou seja, o processo de alteração de texto de um decreto é muito mais fácil e rápido do que o de uma lei; b) enquanto estabelecida na LDO, restava clara a utilização obrigatória desses sistemas para os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Com o decreto, poderão ser suscitadas dúvidas em relação aos dois últimos Poderes. Porém, vale lembrar que a Resolução nº 114/2010 – CNJ xa a obrigatoriedade do Sinapi e Sicro para as obras
orçadas no âmbito do Poder Judiciário; c) o Sinapi e o Sicro já estão previstos na Lei nº 12.462/11 (RDC), regulamentado pelo Decreto nº 7.581/11, que disciplina a contratação de diversos tipos de obra, em especial ao do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), da educação e da saúde, ou seja, continuam válidos; d) toda a jurisprudência xada a respeito desses sistemas referenciais pelos
Tribunais, em especial o TCU, continua válida para a orçamentação das obras que sejam orçadas com fulcro na Lei nº 12.462/11, no Decreto nº 7.983/2013 ou na Resolução nº 114/2010 – CNJ. A pesquisa de preços do Sinapi é realizada mensalmente pela Fundação Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística (IBGE) em todas as capitais do país, sendo a
manutenção de sua base técnica de engenharia e base cadastral realizada pela Caixa Econômica Federal. A jurisprudência do TCU “tem considerado que os preços medianos constantes do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi) são indicativos dos valores praticados no mercado e, portanto, há sobrepreço quando o preço global está injusticadamente acima do total previsto no Sinapi” (TCU. Acórdão
nº 618/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 02 maio 2006). Para os empreendimentos que não têm seus preços contemplados pelo Sinapi ou Sicro, o Decreto nº 7.983/13 estabelece que deverá ser realizada pesquisa de mercado, ajustada às especicidades do projeto, acompanhada de justicativa da Administração.
84
Aliás, o Tribunal de Contas da União aceita, há algum tempo, a utilização alternativa de
85
tabelas especícas dos órgãos públicos especializados, consoante ilustra a recomendação
formulada ao DNIT no sentido de que regulamentasse, para as licitações de obras
84
Art. 6º do Decreto Decreto nº 7.983/13: “Em caso de inviabilidade da denição dos custos conforme o disposto nos arts. arts.
3º, 4º e 5º, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal em publicações
85
técnicas especializadas, em sistema especíco instituído para o setor ou em pesquisa de mercado”. Para obras contratadas pelo pelo RDC, ver art. 8º, §4º, da Lei nº 12.462/11: “No caso de inviabilidade da denição
dos custos consoante o disposto no §3º deste artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da
administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema especíco instituído para o
setor ou em pesquisa de mercado”.
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rodoviárias, a obrigatoriedade de utilização dos preços referenciados pelo Sicro2 (sistema de custos rodoviários) na elaboração dos orçamentos. O TCU já analisou casos que envolvem a condução da pesquisa de custos dos insumos para a elaboração do orçamento, posicionando-se pela necessidade de aprofundamento dos trabalhos em itens materialmente relevantes e pela possibilidade de adoção de preços médios das cotações: 86
27. Estou convicto de que a busca pela denição de parâmetros de mercado não deveria ter se limitado a simples consultas junto a um ou dois fabricantes, principalmente ante a magnitude do empreendimento, a envolver importâncias importân cias signicativas. Pelo menos é essa a impressão que tenho ao analisar a nalisar as parcas propostas comerciais anexadas ao processo. O estudo prévio para a denição de preços referenciais, principalmente principalmente quando inexista correspondênciaa nos sistemas referenciais aceitos pelo Tribunal (Sinapi, Sicro e outros), correspondênci como é caso dos tubos, deve se estender não só para cotações diretas junto a fabricantes, mas para o resultado de licitações realizadas por órgãos e entidades da Administração Pública, com especial atenção nos pregões eletrônicos. Abro parêntese parêntese para registrar que os preços das tubulações de ferro fundido, no Sinapi, foram, excepcionalmente, considerados inaptos, conforme se verá adiante, não obstante gozarem de previsão legal. (TCU. Acórdão nº 3.059/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Augusto Nardes. DOU , 24 nov. 2010.) 21. Os subitens 9.3.18, 9.3.20 e 9.3.25 do Acórdão 896/2010 - Plenário determinaram, em síntese, que o TRT 17ª Região alterasse a planilha orçamentária de forma a utilizar os menores preços, e não os preços medianos para os diversos insumos cotados no mercado. Deve-se destacar que tais insumos não apresentam cotação no Sinapi, razão pela qual os gestores utilizaram como preço de referência referência os preços medianos, quando havia pelo menos três propostas, e o menor preço nos demais casos. 22. Tanto a Secretaria de Obras quanto a de Recursos manifestaram-se pela manutenção das determinações,, pugnando pela utilização da menor cotação dos preços na orçamentação determinações da obra, em detrimento da mediana utilizada pelo TRT. 23. Em que pese a abalizada argumentação apresentada pelas unidades instrutivas, constantes do relatório precedente, divirjo do encaminhamento proposto. 24. Cumpre registrar que a Lei n.º 8.666/93 não prescreve como deve ser realizado este orçamento. A Lei de Diretrizes Orçamentárias, por sua vez, não prev prevêê a forma pela qual será realizada a cotação de preços quando ausente o insumo no Sinapi e inexistente a tabela de referência formalmente aprovada por órgão ou entidade da administração pública p ública federal. 25. Verica-se, Verica-se, portanto, a existência de uma lacuna no ordenamento na medida em que os normativos não denem como será realizada a orçamentação de insumo quando este não estiver cotado no Sinapi e tampouco haja tabela de referência referência ocial. 26. Não me parece razoável a exigência de que a orçamentação nestes casos deva sempre considerar o menor preço cotado no mercado. Entendo que a utilização de preços médios ou da mediana, além de bem reetir os preços praticados no mercado, não implica ofensa à Lei de Licitações, à LDO/2009 ou aos princípios gerais da Administração Administração Pública. (TCU. Acórdão nº 3.068/2010, Plenário Plenário.. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 24 nov. 2010)
Interessante alerta em relação à obtenção de preços referenciais é o de “se evitar consultas prévias de preços de mercado junto a empresas que poderão participar do certame, com prejuízos ao princípio constitucional da isonomia, citado no art. 3º da Lei nº 8.666/93, assegurando-se a igualdade de condições a todos os concorrentes, prevista no
86
TCU. Acórdão nº 267/03, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. Vilaça.
DOU ,
07 abr. 2003.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
inciso XXI do art. 37 da CF/88” (TCU. Acórdão nº 1.087/07, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 11 jun. 2007). A importância de tabelas referenciais para subsidiar os gestores na contratação de obras públicas levou o TCU a sugerir ao Congresso Nacional a adoção de medidas tendentes a: [...] atribuir legalmente competência a um órgão estatal independente (em cujas funções
não se inclua, prioritariamente, a execução de obras públicas), como, por exemplo, a Fundação Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística – IBGE, ou, mesmo, a designar
legalmente uma entidade privada, também independente e idônea, como, por exemplo, a Fundação Getúlio Vargas – FGV, mas que tenham um ou outro tradição na coleta e tabulação de dados econômicos, para construir e manter um sistema ocial de custos de
obras públicas, completo e atualizado, abrangendo todos os tipos de obras passíveis de serem executadas. (TCU. Acórdão nº 617/06, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. Revisor Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 2 maio 2006)
Ainda, em relação a pesquisa de preços, o TCU teceu as seguintes considerações que podem auxiliar os gestores: 42. Pelas razões que a seguir aduzidas, entendo que o conteúdo da orientação jurisprudencial desta Corte que a unidade técnica propõe seja passado tanto ao Ministério da Justiça quanto à SLTI/MPOG, com vistas, no caso desta última, ao aprimoramento da Instrução Normativa SLTI/MPOG 5/2014, carece de complementação. 43. Impende transcrever, preliminarmente, o teor do art. 2º da IN SLTI/MPOG 5/2014 (alterado pela IN SLTI/MPOG 7/2014): Art. 2º A pesquisa de preços será realizada mediante a utilização de um dos seguintes parâmetros: I - Portal de Compras Governamentais - www.comprasgovernamentais.gov.br; II - pesquisa publicada em mídia especializada, sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo, desde que contenha a data e hora de acesso; III - contratações similares de outros entes públicos, em execução ou concluídos nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores à data da pesquisa de preços; ou IV - pesquisa com os fornecedores. (grifei) 44. Acerca do alcance dessa disposição regulamentar, que, segundo o TCU, não deve ser literalmente (gramaticalmente) interpretada, trago à colação o seguinte trecho do Acórdão 2.816/2014-TCU-Plenário: 9.2. recomendar à Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão , ao Conselho Nacional de Justiça, ao Conselho Nacional do Ministério Público, à Câmara dos Deputados, ao Senado Federal e ao Tribunal de Contas da União que: 9.2.1. orientem os órgãos, entidades e secretarias administrativas que lhe estão vinculados ou subordinados sobre as cautelas a serem adotadas no planejamento de contratações de empresas para prestação de serviços de organização de eventos , de modo a não restringir a pesquisa de preços às cotações realizadas junto a potenciais fornecedores, adotando também outros parâmetros, conforme previsto no art. 2º da IN SLTI/MP 5/2014 , c/c o art. 15, inciso V, da Lei 8.666/1993; (grifei)
45. Dito isso, tanto na situação concreta que deu ensejo ao referenciado Acórdão 2.816/2014-TCU-Plenário quanto no âmbito das deliberações mencionadas pela própria unidade técnica (Acórdãos 1.375/2007, 2.479/2009, 265/2010 e 280/2010, todos do Plenário), constato que a administração efetuou tão somente pesquisa junto a fornecedores, razão
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
por que o TCU expediu orientação no sentido da observância também de outras fontes com vistas a respaldar a orçamentação, aí se inserindo a pesquisa junto a entes da própria administração. 46. A corroborar o acima exposto, urge destacar o conteúdo do subitem 9.1.12 do Acórdão 265/2010-TCU-Plenário, mencionado pela Selog: 9.1. determinar à Caixa Econômica Federal - CEF que: 9.1.12. realize uma detalhada estimativa de preços com base em pesquisa fundamentada em informações de diversas fontes propriamente avaliadas, como, por exemplo, cotações especícas com fornecedores, contratos anteriores do próprio órgão, contratos de outros órgãos e, em especial, os valores registrados no Sistema de Preços Praticados do SIASG e nas atas de registro de preços da Administração Pública Federal , de forma a possibilitar
a estimativa mais real possível, em conformidade com os arts. 6º, inciso IX, alínea “f”, e 43, inciso IV, da Lei nº 8.666/97; (grifei) 47. É pertinente, portanto, a proposta da Selog de que chegue ao conhecimento do Ministério da Justiça (sob a forma de ‘ciência’) e também da SLTI/MPOG (mas não sob a forma de ‘ciência’ e sim de ‘recomendação’) que “a jurisprudência do TCU orienta que
o orçamento estimado das licitações seja elaborado com o uso de fontes diversicadas, a m de dar maior segurança no que diz respeito aos valores a serem adjudicados”.
48. No entanto, é de se ressaltar, em homenagem ao princípio da hierarquia das leis, que o conteúdo do sobredito art. 2º da Instrução Normativa SLTI/MPOG 5/2014 deve ser harmonizado com o teor do art. 15, V, da Lei 8.666/93, que assim dispõe: Art. 15. As compras , sempre que possível , deverão: (...) V - balizar-se pelos preços praticados no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública. (grifei) 49. E o alcance do referido dispositivo legal foi bem delineado pelo próprio TCU no voto condutor do Acórdão 171/2012-TCU-Plenário, do qual julgo oportuno transcrever o seguinte excerto: 19. Não se pode aceitar aqui o argumento do Sr. Manoel (pregoeiro) no sentido de que “o atendimento ao inciso V do art. 15 da Lei 8.666/1993 [as compras, sempre que possível, deverão balizar-se pelos preços praticados no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública] só poderia ser feito após a realização do certame”. Ao contrário, agura-se-me inconteste que a intenção do legislador foi justamente orientar os que elaboram orçamentos – denem valores de referência – em certames licitatórios visando à aquisição de determinado objeto a, antes de mais nada, vericar os preços pelos quais a própria administração pública vem contratando o mesmo item demandado. O melhor parâmetro, portanto, são os preços que vêm sendo praticados em contratos envolvendo outros entes públicos. Nesse sentido, a mera consulta de preços a alguns fornecedores do segmento de mercado em que se insere o aludido objeto deve, pois, ser vista como prática subsidiária, suplementar. (grifei)
50. Nesse mesmo sentido encontramos o seguinte trecho do voto condutor do Acórdão 1.266/2011-TCU-Plenário: (...) a Hemobrás apresentou cotações de mercado, de modo a justicar os preços adotados.
Todavia, limitou-se a uma única cotação para cada serviço, prática que vai de encontro à jurisprudência deste Tribunal . Conforme salientado pela Secob-1, o entendimento é no sentido de que, no caso de não ser possível obter preços referenciais nos sistemas ociais para a estimativa de custos que antecederem os processos licitatórios, deve ser realizada pesquisa de preços contendo o mínimo de três cotações de empresas/fornecedores distintos , fazendo constar do respectivo processo a documentação comprobatória
pertinente aos levantamentos e estudos que fundamentaram o preço estimado. E que, caso não seja possível obter esse número de cotações, deve ser elaborada justicativa
circunstanciada. (grifei)
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
181
51. Da interpretação sistêmica do art. 15, V, da Lei 8.666/93, do art. 2º da Instrução Normativa SLTI/MPOG 5/2014 e dos acórdãos supracitados, extrai-se conclusão no sentido de que, para m de orçamentação nas licitações de bens e serviços, devem ser
priorizados os parâmetros previstos nos incisos I e III do art. 2º da referida IN, quais sejam, “Portal de Compras Governamentais” e “contratações similares de outros entes públicos”, em detrimento dos parâmetros contidos nos incisos II e IV daquele mesmo art. 2º, isto é, “pesquisa publicada em mídia especializada, sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo” e “pesquisa com os fornecedores”. Em que pese desde já manifestar meu entendimento sobre o assunto, proponho tão somente que tal conclusão seja passada ao MJ, sob a forma de ‘ciência’, sem prejuízo de remeter cópia da presente deliberação à SLTI/MPOG para conhecimento. (TCU. Acórdão nº 1.445/15, Plenário. Rel. Min. Vital do Rêgo. DOU , 19 jun. 2015);
Relevante inovação foi trazida pelas LDOs, posteriormente absorvida pelo Decreto nº 7.983/13, no sentido de que a diferença percentual entre o valor global do contrato e o obtido a partir dos custos do Sinapi ou Sicro não poderá ser reduzida, em favor do contratado, em decorrência de aditamentos que modiquem a planilha orçamentária.
87
O principal objetivo desse texto é evitar que empresas apresentem preços baixos para vencer a licitação e procurem, posteriormente, reverter a situação por meio de aditivos que contemplem serviços novos. Por esse motivo, é fundamental o registro do valor do orçamento preparado com base no referencial Sinapi ou Sicro para que o desconto fornecido pela licitante vencedora seja registrado no momento da assinatura do contrato. 88
7.2.3.2 Detalhamento das composições de serviços As referências legais não excluem a necessidade da existência de planilha que expresse a composição de todos os custos unitários dos serviços das obras, consoante art. 7º, §2º, da Lei nº 8.666/93, ou seja, o detalhamento de todos os parâmetros utilizados para o cálculo dos custos denidos no Capítulo 5: valor dos insumos, coecientes de
produtividade e encargos sociais. Nas hipóteses em que não seja possível encontrar o custo de determinado insumo ou serviço em planilhas referenciais, é recomendável na elaboração da nova composição que sejam solicitadas propostas junto a fornecedores a m de juntá-las aos autos do
processo licitatório. O número de propostas dependerá do valor do bem que está sendo avaliado, devendo ser acrescido em função da materialidade envolvida. Importa ressaltar que, por vezes, em face de peculiaridades da obra em estudo, é necessária a realização de ajustes nos custos unitários em função de distância de transporte, disponibilidade de jazidas ou de mão de obra. Para tanto, é fundamental que todos esses ajustes, principalmente os acréscimos, estejam registrados no processo licitatório pelos seguintes motivos:
87 88
Ver art. 14 do Decreto nº 7.983/13. Para obras contratadas pelo RDC, vale comando similar, conforme art. 42, §7º, do Decreto nº 7.581/11.
182
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
a) facilitar a análise das propostas apresentadas pelas empresas na fase externa; b) esclarecer dúvidas suscitadas pelos órgãos de controle; e c) caracterizar a responsabilidade do prossional responsável pela elaboração do orçamento, eximindo os demais membros da equipe encarregada da condução da licitação. Com efeito, o TCU pacicou entendimento, por meio da Súmula nº 258, de que “as composições de custos unitários e o detalhamento de encargos sociais e do BDI integram o orçamento que compõe o projeto básico da obra ou serviço de engenharia, devem constar dos anexos do edital de licitação e das propostas das licitantes e não podem ser indicados mediante uso da expressão ‘verba’ ou de unidades genéricas” (TCU. Acórdão nº 1.350/2010, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 23 jul. 2010). Em relação à orçamentação por verba, a Corte de Contas Federal entende que “só deve ser aplicável quando não há como se denir unidades, aferir quantitativos de consumos de materiais e de utilização de mão-de-obra e equipamentos, ou ainda quando o serviço é praticamente imensurável” (TCU. Acórdão nº 80/2010, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 20 fev. 2010). O cuidado na denição dos preços deve estar na correta identicação de todos os parâmetros, visto que o equívoco em qualquer parâmetro poderá ensejar denição de preços superiores aos razoáveis. O exemplo fornecido no Capítulo 5, relativo ao cálculo do custo do serviço forma de madeira, pode ser utilizado para demonstrar as consequências de falhas cometidas por implementação de parâmetros equivocados, consoante tabelas 7.4 a 7.7. TABELA 7.4 Composição de serviço forma calculada corretamente (idem TABELA 5.8) Insumos
Coefciente
Custo unitário
Total (R$)
Prego misto
0,24kg
R$1,25
0,30
Tábua de pinho 1”x12”
2,5ml
R$360 x 0,025 x 0,30
6,75
Sarrafo de pinho 1”x4”
3,00ml
R$360 x 0,025 x 0,30
2,70
Servente
2,00h
R$1,00
2,00
Carpinteiro
2,00h
R$2,00
4,00
125% da mão de obra
7,50
Leis sociais Custo unitário do serviço
23,25
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
TABELA 7.5 Composição de serviço forma — equívoco na denição do valor da hora do carpinteiro em R$4,00
(ao invés de R$2,00): ocasiona um sobrepreço de R$9,00 por m² (39% superior) no valor do serviço Insumos
Coefciente
Custo unitário
Total (R$)
Prego misto
0,24kg
1,25
0,30
Tábua de pinho 1”x12”
2,5ml
R$360 x 0,025 x 0,30
6,75
Sarrafo de pinho 1”x4”
3,00ml
R$360 x 0,025 x 0,30
2,70
Servente
2,00h
1,00
2,00
Carpinteiro
2,00h
4,00
8,00
125% da mão de obra
12,50
Leis sociais Custo unitário do serviço
32,25
TABELA 7.6 Composição de serviço forma — equívoco na denição do valor das leis sociais em 155% (ao
invés de 125%): ocasiona um sobrepreço de R$1,80 por m² (8% superior) no valor do serviço Insumos
Coefciente
Custo unitário
Total (R$)
Prego misto
0,24kg
1,25
0,30
Tábua de pinho 1”x12”
2,5ml
R$360 x 0,025 x 0,30
6,75
Sarrafo de pinho 1”x4”
3,00ml
R$360 x 0,025 x 0,30
2,70
Servente
2,00h
1,00
2,00
Carpinteiro
2,00h
2,00
4,00
155% da mão de obra
9,30
Leis sociais Custo unitário do serviço
25,05
TABELA 7.7 Composição de serviço forma — equívoco na denição do coeciente da tábua de pinho em 5,00ml
(ao invés de 2,5ml): ocasiona um sobrepreço de R$6,75 por m² (30% superior) no valor do serviço Insumos
Coefciente
Custo unitário
Total
Prego misto
0,24kg
1,25
0,30
Tábua de pinho 1”x12”
5,00ml
R$360 x 0,025 x 0,30
13,50
Sarrafo de pinho 1”x4”
3,00ml
R$360 x 0,025 x 0,30
2,70
Servente
2,00h
1,00
2,00
Carpinteiro
2,00h
2,00
4,00
125% da mão de obra
7,50
Leis sociais Custo unitário do serviço
30,00
183
184
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
Considerando diversas falhas na adequação das planilhas orçamentárias apresentadas tanto pelo responsável pela elaboração do projeto básico, quanto pelas licitantes, o TCU tem formulado diversas determinações a órgão ou entidade no sentido de que: 9.1.4 promova a análise da compatibilidade dos preços do projeto básico entregue pela empresa vencedora da Concorrência [...] com os praticados no mercado como forma de garantir o alcance da melhor proposta na licitação da obra – art. 3º, caput , da Lei nº 8.666/1993; 9.1.5 exija a composição de preços de todos os itens da planilha orçamentária do projeto básico, bem como das futuras planilhas de preços da licitação a ser realizada para a construção da nova sede do [...], em atendimento ao art. 7º, §2º, II, da Lei nº 8.666/1993. [...] 9.1.6.11 retire da planilha orçamentária itens quanticados porém não precicados, a exemplo dos relativos aos códigos [...] 9.1.6.12 promova a alteração de unidades de medidas em diversos itens cotados como verba, tendo em vista que em vários casos a denição da unidade de medida é perfeitamente viável. (TCU. Acórdão nº 1.387/06, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 11 ago. 2006)
Tem, ainda, ouvido gestores em face das seguintes irregularidades: [...] ter autorizado, homologado e adjudicado o processo licitatório [...] com base em edital contendo projeto básico deciente, notadamente em decorrência da orçamentação de itens relevantes em verba, da não disponibilização do relatório de sondagens às empresas interessadas em participar da licitação e da incompatibilidade dos serviços previstos no orçamento básico e aqueles constantes das plantas do empreendimento, em desrespeito ao art. 6º, inciso IX, ao art. 7º, §2º, incisos I e II e ao art. 47, caput , todos da Lei 8.666/93 (itens 168/188 do relatório). (TCU. Acórdão nº 411/08, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 14 mar. 2008)
7.2.3.3 BDI A vericação apenas da composição do custo do serviço não é suciente, visto que a contratação da empresa se fará pelos preços ofertados, ou seja, é necessária análise detalhada da composição do BDI a ser incluído no orçamento-base. Todas as parcelas deverão estar justicadas de forma adequada, não sendo razoável a denição de um percentual de BDI sem que se tenha conhecimento da sua composição e respectivos valores. Vale lembrar que as irregularidades nesse item podem se apresentar de três formas que ensejarão uma má contratação pela Administração: a) utilização de BDI superior ao de obras similares, o que elevará o preço de todos os serviços; b) ausência de detalhamento das parcelas que compõem o BDI, o que dicultará a avaliação da compatibilidade de cada valor denido e a futura denição de preços de eventuais aditivos, já que muitos itens constantes do BDI não são acrescidos proporcionalmente a esses aditivos; c) cobrança em duplicidade de serviços que se encontram detalhados na planilha orçamentária e previstos no BDI, caso de alguns orçamentos que preveem percentuais para determinado grupo de despesas indiretas no BDI e apresentam esse mesmo grupo de despesas descriminado na planilha.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Para ilustrar a possibilidade de equívoco mencionada no item “c”, retro, apresenta-se o seguinte exemplo com base nas planilhas orçamentárias relacionadas no Capítulo 5, referentes a custos (TABELA 7.8) e preços (TABELA 7.9). TABELA 7.8 Planilha orçamentária com custos diretos (idem TABELA 5.3) Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Concreto
m³
250,00
200,00
50.000,00
Escavação manual
m³
400,00
25,00
10.000,00
Forma
m²
800,00
50,00
40.000,00
TOTAL
100.000,00
TABELA 7.9 Planilha orçamentária com preços dos serviços (custos diretos + BDI de 30%, já incluída a administração local) – CORRETO (idem TABELA 5.9) Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço Total (R$)
Concreto
m³
250,00
260,00
65.000,00
Escavação manual
m³
400,00
32,50
13.000,00
Forma
m²
800,00
65,00
52.000,00
TOTAL
130.000,00
Naquele caso, utilizou-se uma taxa de BDI de 30%. Caso essa taxa já contemplasse os valores atinentes à administração local (caso de engenheiros, mestres, carros etc.), estimados, por exemplo, em R$5.000,00, não seria cabível a inserção dessa despesa de forma detalhada na planilha orçamentária, visto que haveria cobrança em duplicidade do item administração local (na planilha e no BDI). Mais grave, ainda, é o fato de que esse item aberto na planilha receberia a incidência de BDI, ou seja, seria cobrado indevidamente o valor de R$6.500,00, consoante TABELA 7.10. Na verdade, a incorreção do método está aumentando a taxa de BDI para 36,5%.
185
186
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
TABELA 7.10 Planilha orçamentária com preços dos serviços (utilizou-se o mesmo BDI de 30% — que já computava o item administração local, apesar desse item estar detalhado na planilha) — INCORRETO EM FACE DA COBRANÇA DUPLA DO MESMO SERVIÇO Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$) Preço total (R$)
Concreto
m³
250,00
260,00
65.000,00
Escavação manual
m³
400,00
32,50
13.000,00
Forma
m²
800,00
65,00
52.000,00
Adm. Central (engenheiro, mestre etc.)
mês
1
6.500,00
6.500,00
TOTAL
136.500,00
A forma correta, nesse caso, é a retirada do valor de R$5.000,00 da taxa de BDI, em face de sua inserção na planilha, o que acarretará uma redução nessa taxa a ser aplicada aos itens da nova planilha, conforme demonstram as tabelas 7.11 e 7.12. TABELA 7.11 Planilha orçamentária com custos diretos e inclusão do item administração central Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Concreto
m³
250,00
200,00
50.000,00
Escavação manual
m³
400,00
25,00
10.000,00
Forma
m²
800,00
50,00
40.000,00
Adm. central (engenheiro, mestre etc.)
mês
1
5.000,00
5.000,00
TOTAL
105.000,00
É necessária, portanto, para a manutenção do preço de venda inicialmente esta belecido (R$130.000,00), a correção do BDI pela seguinte fórmula:
A nova planilha, com base na TABELA 7.11, referente a custos, terá todos os seus preços alterados, tomando a confguração da TABELA 7.12.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
187
TABELA 7.12 Planilha orçamentária com preços dos serviços e inclusão do item administração central (custos diretos mais BDI de 23,81%, não incluída a administração local) — CORRETO Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Concreto
m³
250,00
247,62
61.905,00
Escavação manual
m³
400,00
30,95
12.380,00
Forma
m²
800,00
61,90
49.520,00
Adm. central (engenheiro, mestre etc.)
mês
1
6.195,00
6.195,00
TOTAL
130.000,00
Vale notar que os preços unitários de todos os serviços foram reduzidos diante da transferência da parcela “administração central” do BDI para a planilha orçamentária, o que facilitará a análise pela administração de eventual aditivo futuro. A questão relativa à taxa de BDI tem sido tratada com frequência nos julgados do TCU, dos quais podem ser exemplifcadas as seguintes determinações e orientações
a órgãos e entidades para correção dos processos licitatórios: a) “verifque se os itens relativos a vale-transporte, alimentação e equipamentos de
proteção individual (códigos) não sofreram dupla contagem” (TCU. Acórdão nº 1.387/06, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 11 ago. 2006); b) “atente, nas futuras licitações, para os percentuais aplicados de BDI sobre serviços, materiais e equipamentos, de forma a corrigir eventual distorção comparativamente aos preços de mercado, avaliando quanto a estes dois últimos (materiais e equipamentos) a possibilidade de a própria Companhia reavaliar as compras de equipamentos e materiais ou promover a sistemática de pagamento direto aos fornecedores, buscando reduzir os custos de aquisição” (TCU. Acórdão nº 1.595/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006), uma vez que atribuir à simples aquisição de máquinas e equipamentos pela contratada um percentual de BDI equivalente àquele aplicado à prestação de serviços ocasiona ônus contratual sem correspondente contrapartida; c) “exclua dos seus orçamentos parcelas relativas ao IRPJ e à CSLL, bem como oriente as licitantes, em seus editais, que tais tributos não deverão ser incluídos no BDI, por se constituírem em tributos de natureza direta e personalística, que onera pessoalmente o contrato, não devendo ser repassado ao ofertado, conforme, inclusive, conclusões do setor jurídico da estatal” (TCU. Acórdão nº 1.595/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006); 89
89
Irregularidade registrada com certa frequência é a previsão em duplicidade de valores na planilha orçamentária, como exemplos: inserção de item percentual no BDI relativo a despesas de administração local e detalhamento de todas essas despesas locais em item próprio da planilha (engenheiro, mestre etc.); previsão de equipamentos de proteção individual ou de transporte no BDI e “em aberto” na planilha etc.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
d) “o IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e a CSSL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido) não se consubstanciam em despesa indireta passível de inclusão na taxa de BDI, quando sua base de cálculo é o lucro real da construtora, apurado ao nal do exercício nanceiro, após aplicação de compensações e ajustes previstos na legislação tributária” (TCU. Acórdão nº 1.020/07, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 5 jun. 2007); e) exija a apresentação da composição das bonicações e despesas indiretas (BDI), estimados em 20% do valor da obra, da empresa vencedora da Concorrência [...], bem como faça a mesma demanda no edital de construção da obra a ser publicado (TCU. Acórdão nº 1.387/06, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 11 ago. 2006); f) observe que “o percentual de Bônus e Despesas Indiretas (BDI) a ser adotado, por não ser diretamente mensurável, deve levar em consideração as especicidades de cada contrato, não devendo ser prexado no edital, sob pena de restringir a obtenção de proposta mais vantajosa para a Administração” (TCU. Acórdão nº 1.595/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006); g) deve-se exigir, nos editais de licitação, a especicação do percentual de Benefícios e Despesas Indiretas (BDI) para todos os itens a serem contratados, discriminando todas as parcelas que o compõem, independente de o certame se processar pelo menor preço global ou unitário (TCU. Acórdão nº 818/07, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 11 maio 2007); h) promova adequada redução no índice percentual do BDI, uma vez consignados na Planilha de Custos Diretos (Grupo 1 “Implantação” – Subgrupo 1.1 “Serviços Gerais”) vários componentes característicos da Administração Local, cujo percentual igual ou inferior a 9%, estabelecido no §1º do art. 3º do Ato nº 01 de 2006, compõe o limite máximo de 30% para o BDI, evitando, assim, a duplicidade de apropriação e a correspondente ocorrência de sobrepreço nos custos da obra, alterando-se, por conseguinte, o valor global orçado para o empreendimento (TCU. Acórdão nº 597/08, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 14 abr. 2008); i) O IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) não se consubstanciam em despesa indireta passível de inclusão na taxa de Bonicações e Despesas Indiretas (BDI) do orçamento base da licitação, haja vista a natureza direta e personalística desses tributos, que oneram pessoalmente o contratado – Súmula nº 254/2010 (TCU. Acórdão nº 625/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 13 abr. 2010); j) os itens Administração Local, Instalação de Canteiro e Acampamento e Mobilização e Desmobilização, visando a maior transparência, devem constar na planilha orçamentária e não no LDI; k) o gestor público deve exigir dos licitantes o detalhamento da composição do LDI e dos respectivos percentuais praticados; l) comprovada a inviabilidade técnico-econômica de parcelamento do objeto da licitação, nos termos da legislação em vigor, os itens de fornecimento de materiais e equipamentos de natureza especíca que possam ser fornecidos por empresas com especialidades próprias e diversas e que representem percentual
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
signicativo do preço global da obra devem apresentar incidência de taxa de Bonicação e Despesas Indiretas – BDI reduzida em relação à taxa aplicável
aos demais itens (TCU. Súmula nº 253. DOU , 13 abr. 2010).
7.2.4 Confrontação das novas informações com os estudos de viabilidade Questão frequentemente esquecida no decorrer da fase interna refere-se à confrontação de novas informações obtidas, como preço e solução técnica denida, com
aquelas utilizadas nos estudos prévios. Como já mencionado no capítulo anterior, os estudos prévios devem ser elaborados para vericar a viabilidade do empreendimento,
com base em estimativas de diversos parâmetros, até mesmo para que o empreendedor conclua se é adequada sua contratação. Por esse motivo, depois de concluído o projeto básico, deve ser avaliado se os novos valores previstos para o investimento situam-se em patamares próximos aos xados nos estudos prévios, de forma a obter sinalização positiva para a publicação
do edital. Contudo, é possível que os valores sejam superiores, o que exigirá da Administração reexão a respeito dos ajustes necessários ou, em caso extremo, do abandono
do projeto e, em consequência, do processo licitatório, sob pena de prejuízos futuros.
7.2.5 Projeto executivo O projeto executivo denido no art. 6º, X, da Lei nº 8.666/93, como “o conjunto dos elementos necessários e sucientes à execução completa da obra, de acordo com as
normas pertinentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)” é de precisão signicativamente maior que o projeto básico.
Com efeito, diversas são as determinações do TCU para que o órgão ou entidade “abstenha-se de deixar para o projeto executivo o papel de identicar os elementos necessários e sucientes da especicação dos serviços da obra que sejam materialmente
relevantes, tais como: construção de estruturas (vigas, pilares e fundações) e das
instalações de água, esgoto, pára-raios, telefone, contra-incêndio e elétrica, especicandoos, de modo a que quem sucientemente caracterizados, por meio de um projeto
básico adequado” (TCU. Acórdão nº 80/2010, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 29 jan. 2010). Para determinados tipos de obra, principalmente as de maior complexidade, a sua elaboração só é possível no decorrer dos serviços, em face da necessidade de ajustes a serem feitos na medida em que houver a evolução de outras contratações, como equipamentos especiais. Por esse motivo, a lei de licitações autoriza o seu desenvolvimento concomitante com a execução das obras, desde que também autorizado pela Administração (art. 7º, §1º, da Lei nº 8.666/93), e a possibilidade de inclusão de sua elaboração como encargo do contratado ou por preço previamente xado pela
Administração (art. 9º, §2º, da Lei nº 8.666/93). Situação diversa ocorre em obras de menor complexidade, na qual é perfeitamente exequível, e muito mais seguro para a Administração, a realização da licitação com base em projeto executivo.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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Vale registrar que, em face do excessivo número de projetos básicos de má qualidade, o que vicia a contratação e ocasiona signicativos prejuízos à Administração, a doutrina tem sugerido a alteração da lei de licitações no sentido de se exigir projeto executivo como requisito de processos licitatórios em obras de maior vulto, consoante argumentação apresentada por Marçal Justen Filho: Congura-se um acinte à Constituição e à Lei quando se promove licitação de obras de enorme complexidade (rodovias, metrôs, projetos de irrigação) sem projeto executivo. A maior causa de inovações e modicações nas contratações consiste precisamente nesse ponto. Talvez uma das providências mais essenciais que a reforma da Lei de Licitações deva contar seja a vedação à instauração de licitação de obra fundada apenas em projeto básico. A existência do projeto executivo é uma garantia inafastável para o interesse coletivo. A situação é tanto mais grave porque se introduziu um expediente terminológico que agravou ainda mais o problema. Passou-se a denominar de “Projeto Básico” o estudo que não contempla as exigências previstas no art. 6º, inc. IX, da Lei. Isso conduziu a licitações em que nem projeto básico (efetivo) existia. Daí a produção de decisão saneadora do TCU no sentido no sentido de que o “Projeto Básico exigido na licitação de obras rodoviárias [...] é o Projeto Final de Engenharia da rodovia denominado pelos órgãos licitantes de Projeto Executivo, que atende aos requisitos denidos no art. 6º, inciso IX...” (Acórdão nº 67/2002 – Plenário, invocado no Acórdão nº 1.684/2003 – Plenário, rel. Min. Marcos Vilaça). 90
O TCU também encaminhou sugestão ao Congresso Nacional para que fosse avaliada a alteração da “Lei de Licitações e Contratos (Lei 8.666/93), no sentido de fazer constar dispositivo que exija a prévia elaboração de projeto executivo para licitação e contratação de obras públicas de maior vulto (custo superior a determinado valor especicado na lei), sem reduzir as exigências já existentes, em termos de projeto básico, para as demais obras” (TCU. Acórdão nº 617/06, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. Rev. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. Brasília, 26 abr. 2006. DOU , 2 maio 2006).
7.2.6 Documentação “as built” Além dos projetos básico e executivo, é importante que, ao nal do empreendimento, seja elaborada documentação que reita exatamente o que foi executado na obra, denominada de “as built” ou “como construído”. Essa documentação contempla, com exatidão, por meio de plantas e memoriais, todos os serviços executados e especicações detalhadas dos insumos utilizados (materiais, códigos de fabricante, cores etc.). Será de extrema valia para a manutenção e conservação do empreendimento e, até mesmo, para decisões futuras de ampliação ou reforma. Por esse motivo, convém inserir no edital como responsabilidade da empresa que executará a obra, sempre que possível, a incumbência de elaborar a referida documentação.
90
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 167.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
7.3 Previsão de recursos orçamentários Apesar de necessária, a perfeita caracterização do empreendimento não é condição sufciente para o início da licitação. Existe um conjunto normativo, apresentado na
FIGURA 7.d, composto pelo Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentária, Lei Orçamentária Anual e Lei de Responsabilidade Fiscal que deve ser observado de forma global.
Previsão de recursos orçamentários
LRF
PPA
LDO
LOA
FIGURA 7.d - Conjunto normativo a ser observado para previsão de recursos
A preocupação do legislador sempre foi a criação de mecanismos que possibilitassem a alocação planejada de recursos e assegurassem a efetiva conclusão do empreendimento, principalmente em face da limitação dos recursos públicos. Para tanto, diversas são as exigências nos textos legais: correta previsão de prazos e dos custos atual e fnal da obra; programação do empreendimento em sua totalidade; regras
para o início de obra; elaboração de proposta orçamentária que contemple todos os empreendimentos sob a responsabilidade do órgão ou entidade. O exemplo a seguir descrito, tratado pelo TCU, ilustra os problemas vividos na área de obras pela não observância das regras postas:
Com efeito, ao realizar a licitação, o ex-Prefeito já tinha pleno conhecimento de que os recursos envolvidos seriam insufcientes para completar a execução, ou seja, iniciou a obra
já sabendo que ela restaria inacabada. Mais ainda, dos recursos despendidos nada restou em proveito da comunidade, haja vista a posterior demolição da parcela construída, a qual ocasionava acúmulo de detritos e inundações. Ressalta-se, assim, o descaso com que as verbas repassadas foram tratadas. Esse fato ganha maiores proporções ao ser lembrado que tais recursos poderiam ter aplicação alternativa se tivessem sido tempestivamente devolvidas ao concedente. Da forma como foram gastos, porém, somente trouxeram prejuízo social, pois além de nada servir a parcela construída, de causar prejuízos à população ribeirinha, ainda tiveram que ser gastos recursos adicionais para demoli-la. (TCU. Acórdão nº 335/03, 2ª Câmara. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 25 mar. 2003)
Vale registrar que, nos termos do art. 7º, §3º, da Lei nº 8.666/93, “é vedado incluir no objeto da licitação a obtenção de recursos fnanceiros para sua execução, qualquer
que seja a sua origem, exceto nos casos de empreendimentos executados e explorados sob o regime de concessão, nos termos da legislação específca”.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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7.3.1 Plano Plurianual (PPA) e Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) A lei de licitações preceitua, em seu art. 7º, §2º, incisos III e IV, que as obras e serviços somente poderão ser licitados quando houver “previsão de recursos orçamentários que assegurem o pagamento das obrigações decorrentes de obras ou serviços a serem executadas no exercício fnanceiro em curso, de acordo com o respectivo cronograma” e “o produto dela esperado estiver contemplado nas metas estabelecidas no Plano Plurianual de que trata o art. 165 da Constituição Federal”. O Plano Plurianual (PPA) é a primeira referência para os investimentos que ultrapassem um exercício fnanceiro, nos termos do art. 167, §1º, da Constituição Federal. O descumprimento dessa regra caracteriza crime de responsabilidade. O objetivo do legislador foi o de assegurar que empreendimentos de maior duração não fossem inseridos em determinada lei orçamentária anual com ausência de visão de médio prazo e sem garantia de serem contemplados em leis orçamentárias seguintes, o que ocasionaria expressivo volume de obras inacabadas. A lei do PPA representa instrumento de planejamento de maior horizonte que compreende diretrizes, objetivos e metas da Administração Pública, para despesas de capital e para programas de duração continuada. Não obstante a sua periodicidade quadrienal, são realizadas revisões anuais com o encaminhamento de projetos de lei ao Congresso Nacional até o dia 31 de agosto de cada ano. O TCU encontra diversos problemas a respeito da ausência da inclusão de empreendimentos que ultrapassam um exercício fnanceiro no PPA: Quanto à falta de previsão do investimento no plano plurianual vigente, considero a questão de relevante gravidade, já que pode até comprometer a integral execução do objeto. O hospital foi contemplado com previsões das leis orçamentárias de 2011 e de 2012, além de constar do plano plurianual 2008-2011. Apesar disso, a complexidade das obras e o porte do empreendimento exigem que, em eventual retomada do processo, também o plano plurianual 2012-2015 traga previsão orçamentária sufciente para completa execução do objeto, mormente porque as obras devem ultrapassar um exercício fnanceiro e não foram sequer iniciadas. (TCU. Acórdão nº 2.760/2012, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 22 out. 2012)
Claro está que os valores utilizados na fase da elaboração do PPA para a execução de cada empreendimento são estimativos e não têm a precisão exigida no orçamento do projeto básico, até mesmo pelo fato de, na maioria das vezes, não se possuir nesta etapa o projeto básico concluído. Contudo, a inclusão do projeto no Plano Plurianual traz para o administrador a obrigação de adotar todas as medidas para sua conclusão, conforme apropriada consideração de Marçal Justen Filho: Ora, se o projeto foi incluído no plano plurianual, sua execução se constitui em dever do administrador. Cabe-lhe cumprir felmente o plano plurianual, o que signifca precisamente executar, a cada exercício, a parcela correspondente do projeto. Afnal, se um determinado empreendimento tiver sua execução paralisada em um exercício, tal afetará o todo do projeto, constrangendo à necessidade de reprogramação dos cronogramas originais. 91
91
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 174.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
193
Já a Lei de Diretrizes Orçamentária, de periodicidade anual, tem como objetivo denir as metas e prioridades da Administração Pública, incluindo as despesas de capital para o exercício nanceiro seguinte, ou seja, parametrizar a forma e o conteúdo da lei orçamentária a ser elaborada. É necessário, portanto, além de vericar a inserção prévia do projeto em estudo no PPA, avaliar se a despesa não contraria qualquer dos preceitos da LDO ou de seus anexos.
7.3.2 Lei Orçamentária Anual (LOA) A exigência de previsão de recursos orçamentários que assegurem o pagamento no exercício nanceiro em curso dos valores previstos no cronograma também é requisito legal para o início da licitação. O princípio da universalidade estabelece que nenhuma despesa pode ser realizada sem previsão orçamentária. Vale observar que não se exige a disponibilidade nanceira, mas, apenas a previsão orçamentária para o início da licitação. Para empreendimentos com dotações orçamentárias especícas, cabe a vericação da suciência do valor previsto em face do cronograma estabelecido. Para aqueles contemplados em programa de trabalho genérico, a vericação de que a soma do valor das parcelas para atender cada obra prevista não ultrapasse o total aprovado.
7.3.3 Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) A Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar nº 101/2000, estabelece normas importantes de nanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão scal com impacto direto no processo orçamentário. Enquanto a Lei nº 8.666/93 tem maior foco na obra que será licitada, a LRF exige do administrador uma visão sistêmica dos empreendimentos, com vistas a assegurar a conclusão do conjunto de obras em execução. Vale registrar que a LRF é lei complementar, enquanto a lei de licitações, ordinária. O art. 16 da LRF exige que a criação ou expansão de ação governamental que acarrete aumento da despesa tenha como requisitos a “estimativa do impacto orçamentário-nanceiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes” e “declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e nanceira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias”. O legislador, neste caso, foi de extrema prudência ao xar não apenas os comandos a serem observados, mas também a necessidade de declaração expressa do ordenador de despesa de que o ato encontra-se em consonância com a norma.
92
92
Art. 16, §1º, da Lei Complementar nº 101/2000: “Para os ns desta Lei Complementar, considera-se: I - adequada com a lei orçamentária anual, a despesa objeto de dotação especíca e suciente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exercício; II - compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não infrinja qualquer de suas disposições”.
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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Oportuna a consideração de Marçal Justen Filho a respeito da nova diretriz trazida pelo mencionado artigo: 8.3 As exigências do art. 16 da LRF Por outro lado, é imperiosa a observância das exigências do art. 16, que são condições não apenas para empenho, mas também para licitação (§4º). Isso signica que a criação de qualquer despesa deve ser acompanhada da estimativa do impacto orçamentárionanceiro no exercício em que vigorará (e, se for o caso, nos dois subseqüentes) tal como a declaração do ordenador de despesa de que a obrigação compatibiliza-se orçamentária e nanceiramente com a legislação orçamentária. 8.3.1 Adequação orçamentária A adequação orçamentária envolve a previsão de recursos orçamentários para satisfação da despesa a ser gerada por meio da futura contratação. Observe-se que o art. 16, §1º, inc. I, da LRF afastou um expediente primário, mas largamente utilizado pela Administração Pública. Impôs o dever de considerar todas as despesas subordinadas a determinada rubrica orçamentária. Tornou-se explicitamente vedado o artifício de sujeitar uma série de despesas a um crédito genérico, tomando em vista o valor isoladamente de cada despesa. Assim, cada despesa isoladamente era inferior ao crédito orçamentário, mas o somatório total das despesas ultrapassava largamente a previsão orçamentária. Portanto, há um dever de previsão e acompanhamento, que exige que cada licitação e contratação produzam a redução dos valores disponíveis nos créditos orçamentários gerais — ainda que tal não equivalha a uma espécie de empenho antecipado. 93
Por sua vez, o art. 45 do mesmo normativo inovou consideravelmente ao proibir a inclusão de novos projetos na lei orçamentária, caso não adequadamente atendidos os em andamento e contempladas as despesas de conservação do patrimônio público, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias. Nesse particular, vale destacar que a LDO/2015 (Lei nº 13.080/15) traz, em seu art. 19, a regulamentação dessa diretriz: Art. 19. O Projeto e a Lei Orçamentária de 2014 e os créditos especiais, observado o disposto no art. 45 da Lei de Responsabilidade Fiscal e atendido o disposto nos arts. 2º e 3º desta Lei, somente incluirão ações ou subtítulos novos se: I - tiverem sido adequada e sucientemente contemplados: a) as despesas mencionadas no art. 4º; e b) os projetos e respectivos subtítulos em andamento; II - os recursos alocados, no caso dos projetos, viabilizarem a conclusão de uma etapa ou a obtenção de uma unidade completa, considerando-se as contrapartidas de que trata o §1º do art. 60; e III - a ação estiver compatível com o Plano Plurianual 2012-2015. §1º Serão entendidos como projetos ou subtítulos de projetos em andamento aqueles, constantes ou não da proposta, cuja execução nanceira, até 30 de junho de 2013, ultrapassar 20% (vinte por cento) do seu custo total estimado. §2º Entre os projetos ou subtítulos de projetos em andamento, terão precedência na alocação de recursos aqueles que apresentarem maior percentual de execução física.
93
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 170.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
À vista do exposto, cumpre ao administrador responsável pela proposta orçamentária, quando necessário o início de novo projeto, vericar:
a) a compatibilidade do novo projeto com o PPA e a LDO; b) a disponibilidade de recursos após descontados os valores para atender os projetos em andamento e as despesas de conservação; c) se a previsão de recursos para o novo empreendimento se insere nessa disponibilidade em horizonte de, no mínimo, três anos.
7.3.4 Recursos internacionais Não é raro que o nanciamento de determinado empreendimento seja realizado
com recursos de organismos internacionais. Considerando que esses organismos possuem regras próprias para nortear a contratação e acompanhamento das obras, é frequente a formulação de perguntas a respeito de qual o normativo a ser observado. O art. 42, §5º, da Lei nº 8.666/93, admite, nas licitações com nanciamento externo: [...] as condições decorrentes de acordos, protocolos, convenções ou tratados internacionais
aprovados pelo Congresso Nacional, bem como as normas e procedimentos daquelas entidades, inclusive quanto ao critério de seleção da proposta mais vantajosa para a administração, o qual poderá contemplar, além do preço, outros fatores de avaliação, desde que por elas exigidos para a obtenção do nanciamento ou da doação, e que também não conitem com o princípio do julgamento objetivo e sejam objeto de despacho motivado do órgão executor do contrato, despacho esse raticado pela autoridade imediatamente
superior.
O TCU apreciou a questão, tendo se posicionado pela possibilidade da aplicação das normas dos organismos internacionais nas licitações, “desde que não haja conito
com dispositivos constitucionais e respeitado o princípio do julgamento objetivo” (TCU. Acórdão nº 370/04, Plenário. Rel. Min. Humberto Souto. DOU , 20 abr. 2004). Nesse sentido, também formulou recomendação à Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão para que oriente o mutuário de empréstimo com organismo nanceiro multilateral de que o Brasil seja parte a:
a) observar o disposto no art. 42, §5º, da Lei nº 8.666/93 e a Decisão nº 245/92 – Plenário TCU, na adoção das normas da instituição nanceira internacional, caso haja conito
entre elas e a legislação brasileira;
b) adotar os parâmetros estabelecidos na norma vigente no País, caso não haja conito entre as normas da instituição nanceira internacional e a legislação brasileira;
c) inserir no edital cláusula prevendo a interposição de recursos pelos licitantes ao julgamento da comissão, nos termos do art. 109, inciso I, da Lei nº 8.666/93; d) não incluir no edital cláusulas que restrinjam o acesso dos licitantes a toda a documentação do processo, em observância aos arts. 3º, §3º, e 63 da Lei nº 8.666/93 e ao pleno exercício do contraditório e da ampla defesa assegurados pela Constituição Federal no art. 5º, inciso LV. (TCU. Decisão nº 411/02, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 10 maio 2002)
Com efeito, na realização de obras patrocinadas com recursos de organismo nanceiro internacional poderão ser efetuadas exigências mais rigorosas que as contidas
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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na Lei nº 8.666/1993, desde que não conitem com os princípios constitucionais, a exemplo de caso analisado pelo TCU: 9. Conforme análise da Secob-2 não teriam sido adequadamente comprovados e justicados pela [...] a adoção desses índices, embora a [...] tenha alegado que o art. 42, §5º da Lei de Licitações possibilitaria a admissão de normas e procedimentos das entidades nanciadoras em licitações de obras a serem realizadas com recursos delas provenientes. Ademais, segundo alegou a [...], o índice utilizado no Edital seria o usualmente adotado (o capital de giro anual médio) e estaria de acordo com as políticas de contratação do BID. 10. Peço vênias à Unidade Técnica por entender que assiste razão à [...] para o caso em tela, uma vez que a Lei nº 8.666/1993 no alegado dispositivo (art. 42, §5º), desde que não conitem com o princípio do julgamento objetivo, prevê, de fato, que poderão ser admitidas na licitação as condições decorrentes de acordos, protocolos, convenções ou tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, bem como as normas e procedimentos daquelas entidades. Ademais, como mencionado, o BID informou que participou da confecção do Edital em tela, como adiante transcrito (item 16 deste Voto), fato que ratica o posicionamento adotado pela [...]. 11. Embora não tivesse havido um condicionamento explícito do BID relativamente à liberação dos recursos, houve a participação da entidade na feitura do Edital, fato que está a convalidar o processo e a confecção do edital. Há que se destacar, ainda, que se deve perseguir o que dispõe o art. 3º, §1º da Lei de Licitações, adiante transcrito. (TCU. Acórdão nº 324/2012, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 01 mar. 2012)
7.3.5 Convênios Os convênios têm sido importante fonte de recursos para a execução de obras públicas junto a União por Estados e Municípios. A regulamentação da celebração desse instrumento está basicamente denida na Instrução Normativa nº 01/1997 – STN, Decreto nº 6.170/07 e Portaria Interministerial nº 127/08 dos Ministérios do Planejamento, Orçamento e Gestão, da Fazenda e do Controle e da Transparência, em capítulos que tratam da: formalização; alteração; publicação; liberação dos recursos; execução; prestação de contas; rescisão; e tomada de contas especial. A execução de obras públicas patrocinadas com recursos de convênios apresenta falhas com certa frequência, conforme pode ser observado na pesquisa da jurisprudência do TCU. Em geral, as falhas apontadas relacionam-se com: a) celebração de convênios cujos objetos não se coadunam com o objetivo do programa e a nalidade da ação orçamentária; b) ausência de justicativas para a celebração que demonstrem a viabilidade do empreendimento; c) ausência de elementos característicos com a descrição detalhada, objetiva, clara e precisa do que se pretende realizar ou obter; 94
95
96
94
95 96
Alterações: IN STN nº 2/2006; IN nº 5/2004; IN nº 1/2004; IN nº 4/2003; IN nº 3/2003; IN nº 2/2002; IN nº 1/2002; IN nº 6/2001; IN nº 5/2001; IN nº 1/2000; e IN nº 1/99. Com dispositivos alterados pelos decretos nº 6.329/07 e nº 6.428/08, e acrescidos pelo Decreto nº 6.497/08. TCU: Acórdão nº 46/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 7 fev. 2006; e Acórdão nº 498/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 17 mar. 2006.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
d) inobservância de disposições legais pertinentes quanto à correta e suciente
descrição e detalhamento das metas, etapas/fases a serem executadas, tanto nos seus aspectos quantitativos como qualitativos; e) inexigência quanto à necessidade de a Declaração de Adimplência integrar o Plano de Trabalho; e, se esta datar há mais de 30 dias, da sua raticação para
a celebração do convênio, nos termos da IN/STN nº 01/97, art. 2º, VI, c/c §2º do art. 3º; f) descumprimento dos dispositivos legais insertos na Lei nº 8.666/93, art. 27, I, e art. 29 e na IN-STN nº 01/97, art. 3º, incisos I a IV, bem como no §1º, IV, a, do art. 25 da Lei nº 101/2000; g) ausência de certidões comprobatórias da regularidade dos convenentes; h) celebração de convênios sem fundamentação nos pareceres das unidades técnicas e de assessoria jurídica; i) ausência de análises detalhadas dos custos indicados nas propostas, bem como carência de elementos de convicção como cotações, tabelas de preços de associações profissionais, publicações especializadas e outras fontes disponíveis, de modo a certicar-se e a comprovar que tais custos estão
condizentes com os praticados no mercado da respectiva região; j) scalização e acompanhamento deciente sobre a execução local dos objetos
conveniados, em descumprimento às disposições contidas no art. 23 da INSTN nº 01/97; no art. 10, §6º, do Decreto-Lei nº 200/67; no art. 54 do Decreto nº 93.872/86; no §3º, I, do art. 116 da Lei nº 8.666/93, bem como disposições no mesmo sentido constantes nas Leis de Diretrizes Orçamentárias aprovadas para cada exercício; k) inobservância de ocorrência das hipóteses que ensejem instauração de Tomada de Contas Especiais, conforme previsto no art. 38 da IN-STN nº 01/97 (art. 40 da IN-STN nº 01/97); l) ausência de cuidados básicos na vericação da correção do processo de
licitação e contratação em face de falhas graves, como: execução de projeto básico elaborado por engenheiro pertencente ao quadro da construtora; convite a empresas envolvidas em esquema de fraude em licitações públicas em outros municípios, e aceite, pela Comissão Permanente de Licitação, de certidões vencidas, sem que as empresas responsáveis fossem desclassicadas,
contrariando o art. 3º da IN/STN nº 01/97; m) ausência de comprovação de scalização da obra pelo convenente, bem como
inexistência de registro em livro de ocorrências (Diário de Obras), relatando a evolução da edicação, sendo a liquidação da despesa efetuada no próprio
setor de contabilidade da Prefeitura, sem a efetiva comprovação da realização das etapas da obra, contrariando a cláusula [...] do Convênio e o art. 67 da Lei
de Licitações. Por esses motivos, convém que concedente e convenente mantenham constante intercâmbio com vistas a sanar qualquer irregularidade durante a execução do empreendimento.
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7.3.6 Etapas de implantação Outra análise relevante que deve ser empreendida na fase interna refere-se às etapas de implantação da obra em confronto com os recursos disponíveis. É notória a dificuldade do aporte de recursos no decorrer do empreendimento da forma inicialmente prevista, seja por questões ligadas a indisponibilidade de recursos, seja pelos contingenciamentos que ocorrem após a aprovação da lei orçamentária. Uma solução para minimizar os efeitos dessas diculdades é a denição de um
plano de execução que permita a implantação da obra por etapas. Nesse sentido, cabe lembrar os subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, elemento do projeto básico por vezes pouco considerado, que são diretrizes fundamentais para a viabilização da conclusão do empreendimento. De nada adianta, por exemplo, a execução de toda a fundação e estrutura do empreendimento, se não há recursos disponíveis para sua conclusão. Melhor aproveitamento dos recursos se daria caso estes fossem empregados de forma a possibilitar a conclusão de parte da obra que proporcionaria imediato retorno à comunidade.
7.4 Regras para estruturação da licitação 7.4.1 Modalidades de licitação previstas na Lei nº 8.666/93 e na Lei nº 10.520/02 (Pregão) A Lei nº 8.666/93 dene, em seu art. 22, as modalidades possíveis de licitação:
concorrência; tomada de preços; convite; concurso; leilão. Em seus parágrafos seguintes procura conceituar cada uma das modalidades: §1º Concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualicação
exigidos no edital para execução de seu objeto. §2º Tomada de preços é a modalidade de licitação entre interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualicação.
§3º Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual axará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o
estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas. §4º Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, cientíco ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa ocial com
antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias. §5º Leilão é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis inservíveis para a administração ou de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis prevista no art. 19, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação.
Além das previstas na Lei nº 8.666/93, foi criada uma nova modalidade, denominada pregão, por meio da Lei nº 10.520/2002, regulamentada pelos
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Decretos nº 3.555/2000 e nº 5.450/2005, para aquisição de bens e serviços comuns, considerados como “aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente defnidos pelo edital, por meio de especifcações usuais no mercado”
(art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 10.520/2002). Dessa forma, dois são os critérios estabelecidos no conjunto normativo para defnição da modalidade de licitação: valor e natureza do objeto, consoante ilustra
a FIGURA 7.e. Oportuno destacar que é vedada a criação de outras modalidades de licitação não previstas no texto legal (art. 22, §8º, da Lei nº 8.666/93).
Licitação – Modalidades
Natureza do objeto
Valor
Concorrência
Tomada de preços
Convite
Concurso
Leilão
Pregão
FIGURA 7.e - Ilustração das modalidades de licitação previstas em lei
Em relação ao primeiro critério, a defnição da modalidade a ser utilizada se dará
pelo confronto do valor estimado no projeto básico para o empreendimento com os limites estabelecidos no art. 23, inciso I, da lei de licitações para a contratação de obras e serviços de engenharia, conforme ilustra a TABELA 7.13. 97
TABELA 7.13 Limites de valor para defnição das modalidades de licitação no caso de obras e serviços de
engenharia, válidos a partir de 1998
Modalidade
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Valor
a) convite
até R$150.000,00
b) tomada de preços
até R$1.500.000,00
c) concorrência
acima de R$1.500.000,00
Valores estabelecidos pela Lei nº 9.648/98.
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Apesar desses limites, a utilização de modalidade superior ao valor previsto será sempre possível, consoante estabelece o art. 23, §4º, da aludida lei. O pregão, modalidade extremamente célere em face da inversão das fases de análise de proposta de preços e habilitação, com a avaliação desta apenas para a proposta mais vantajosa, tem crescido de forma substancial nos últimos anos no âmbito da Administração. Consoante deliberação do TCU, “é irregular a utilização da modalidade pregão visando a contratação de obras e serviços de engenharia que possuam complexidade de
especicação e de execução inconciliáveis com o caráter comum dos objetos passíveis de serem contratados por meio da citada modalidade licitatória” (TCU. Acórdão nº 1.617/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 11 set. 2006).
Entretanto, apesar de pacíco entendimento quanto à impossibilidade do pregão para contratação de obras públicas, o TCU rmou entendimento, por meio da Súmula nº 257, de que “o uso do pregão nas contratações de serviços comuns de engenharia encontra amparo na Lei nº 10.520/2002” (TCU. Acórdão nº 841/2010, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 05 maio 2010). Resta, então, a discussão a respeito de quais os parâmetros indicarão a existência de serviço de engenharia comum que poderá ser contratado por meio de pregão. Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, na análise da questão, conclui que, juridicamente: a) obra – não se enquadra como “compra e serviço comum”. Logo, não pode ser licitada por pregão; b) serviço de engenharia, pode ser considerado como comum, quando:
b.1) as características, quantidades e qualidade forem passíveis de “especicações usuais no mercado”;
b.2) mesmo que exija prossional registrado no CREA para execução, a atuação desse não assume relevância, em termos de custo, complexidade e responsabilidade no conjunto do serviço; c) em sendo comum o serviço de engenharia poderá ser licitado por pregão, sendo a forma eletrônica ou presencial. 98
99
A respeito deste debate, são interessantes as palavras de Jessé Torres Pereira Junior: Em aproximação inicial do tema, pareceu que “comum” também sugeria simplicidade. Percebe-se, a seguir, que não. O objeto pode portar complexidade técnica e ainda assim ser “comum”, no sentido de que essa técnica é perfeitamente conhecida, dominada e oferecida pelo mercado. Sendo tal técnica bastante para atender às necessidades da Administração,
a modalidade pregão é cabível a despeito da maior sosticação do objeto.
Será imprescindível a elaboração de projeto básico quando o objeto do pregão for serviço?
Justica-se a indagação. É que tal exigência gura, expressa, como condição para a 98
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Nesse sentido, o TRF 5ª Região julgou regular a exigência de registro no CREA para execução de serviço precedido de pregão e legal a inabilitação da “empresa individual que não atendeu aos requisitos do edital no que tange à comprovação da capacidade técnica reconhecida pelo CREA”. AG nº 48.941/CE. Processo 200305000099342. 4ª Turma. Diário da Justiça , p. 435, 3 nov. 2003. Fórum Administrativo , v. 3, n. 33, p. 3117, nov. 2003. JACOBY FERNANDES. Licitação e contratos de obras e serviços de engenharia. TCM Informativo – Tribunal de Contas do Município de São Paulo , n. 32, p. 16, jul./set. 2006.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
instauração válida de licitação, no art. 7º, §2º, da Lei nº 8.666/93, que não distingue entre serviços de engenharia e serviços em geral. Conquanto a doutrina ponderasse, desde a edição daquela lei, que a exigência haveria de ser interpretada como dirigida apenas aos serviços de engenharia, o fato é que o texto legal não os extrema e as Cortes de Controle Externo, em especial o Tribunal de Contas da União, entendem que o projeto básico é de rigor para a instauração de qualquer modalidade de licitação, qualquer que seja a natureza do serviço. No caso do pregão para licitar-se a contratação de serviço, haverá incompatibilidade lógica entre as características da nova modalidade e o conteúdo do projeto básico, tal como enunciado no art. 6º, IX, da Lei nº 8.666/93. Se o serviço, em função de suas características técnicas, houver de ser especicado mediante projeto básico, com as minudências do mencionado inciso do art. 6º, não pode ser classicado como “comum”. 100
Na primeira edição deste livro, publicada no início de 2007, foi feito o seguinte registro: “Sem dúvida, a discussão dos limites a partir do qual o serviço de engenharia poderá ser considerado como bem comum ainda deverá ser amadurecida nos próximos anos, seja pela doutrina, seja pela jurisprudência”. Neste período, a jurisprudência tem, por um lado, rmado posição quanto à
inviabilidade de pregão para obras públicas, e, por outro, ampliado a possibilidade do uso do pregão para serviços de engenharia. Em relação a obras, conforme já salientado, o TCU formulou determinação para que a entidade “se abstenha de utilizar a modalidade licitatória denominada pregão, seja presencial ou eletrônico, para a contratação de obras de engenharia, atendendo aos ditames estabelecidos pela Lei nº 10.520/2002 (art. 1º e seu parágrafo único), bem como pelos arts. 5º e 6º dos Decretos nº 3.555/2000 e 5.450/05”, visto “que não há amparo legal para adoção desse procedimento para contratação de obras de engenharia” (TCU. Acórdão nº 296/07, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 09 mar. 2007. Ver também: TCU. Acórdão nº 2.312/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 06 set. 2012). Entretanto, o referido Tribunal rmou posição de que “a Lei nº 10.520/02 não
exclui previamente o uso do pregão para contratação de serviços de engenharia, determinando, tão-somente, que o objeto a ser licitado se caracterize como bem ou serviço comum; as normas regulamentares que proíbem a contratação de serviços de engenharia pelo pregão carecem de fundamento de validade, visto que não possuem embasamento na Lei nº 10.520/02” (TCU. Acórdão nº 2.079/2007, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 05 out. 2007). Vale destacar os principais trechos do Voto do Relator quando da análise da matéria pela Corte de Contas: 42. Finalmente, a peça motivadora da representação ainda contesta o uso da modalidade pregão para a contratação dos serviços de escavação e remanejamentos. 43. Convém que se tenha em mente, desde logo, que o objeto licitado no Pregão nº [...] refere-se a serviços de engenharia, segundo a conceituação doutrinária que assim classica
as atividades do ramo nas quais o emprego de mão-de-obra e equipamentos prepondera sobre a aplicação técnica. Cai por terra, portanto, o pressuposto da peça inicial de que os serviços de escavação e remanejamentos se constituem de uma obra, na acepção exata do vocábulo.
PEREIRA JUNIOR. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública , p. 1058.
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44. Aliás, quase nunca, no cotidiano ou mesmo nos instrumentos jurídicos, existe, salvo se houver tal preocupação, o rigor terminológico dos livros de engenharia. Por essa razão, não se é de estranhar que em cláusulas editalícias esparsas e outros documentos os serviços de escavação e de remanejamentos, como apontado na representação, tenham sido chamados de obras, embora formalmente não o sejam. 45. Há tanta jurisprudência do TCU que ampara e até recomenda a contratação de serviços comuns de engenharia mediante pregão que bastaria encerrar a questão dizendo que a Administração do Tribunal, ao usar a modalidade para adjudicação dos trabalhos preliminares à construção do edifício Anexo III, andou na mais pura sintonia com o pensamento desta Corte de Contas, manifestado nos julgamentos dos atos dos seus jurisdicionados. 46. A bem da verdade, há um único julgado, aduzido na representação, que, por ser mais restritivo, apoiaria a contenda, desde que se tivesse sucesso na tentativa de caracterizar o objeto do Pregão nº [...] como obra ou serviço complexo. Porque, se o serviço de
engenharia é comum, o correspondente Acórdão nº 296/2007-2ª Câmara nada tem contra sua contratação por pregão, conforme a ementa: “Carece de amparo legal a utilização da modalidade licitatória denominada pregão ou a utilização de sistema de registro de preços objetivando a contratação de empresa para execução de obras e serviços não comuns de engenharia”. Mais ainda, ao dispor dessa maneira, o acórdão admite que existem serviços de engenharia que são comuns. 47. O fato é que a lei que disciplina a modalidade pregão não proíbe aplicá-la a serviços comuns de engenharia. E não é porque não seja expressa em aceitar o pregão nesse propósito que se deva entendê-la como proibitiva, pois, mesmo com o conceito dado pelo parágrafo único do art. 1º da Lei nº 10.520/2002, “serviço comum” ainda é uma expressão relativamente aberta, bastando que o serviço de engenharia, para nela se enquadrar, tenha “padrões de desempenho e qualidade” que “possam ser objetivamente denidos pelo edital, por meio de especicações usuais no mercado”. Ficou para o juízo administrativo
categorizar o comum e o incomum, dentro desses parâmetros. 48. Conquanto o Decreto nº 3.555/2000 tenha estatuído que o pregão não se aplica aos serviços de engenharia, cabe ressalvar que sua base normativa era a Medida Provisória nº 2.026-3/2000, que conferia ao regulamento a incumbência de dispor sobre o elenco de
serviços comuns. Porém, tal poder caiu quando a medida provisória nal foi convertida
na Lei nº 10.520/2002. No máximo, o rol de serviços comuns ainda presente no decreto poderia funcionar como um guia para o administrador, mas não compete ao regulamento instituir vedação não sinalizada pela lei, sobretudo por ir de encontro às nítidas vantagens proporcionadas pela modalidade pregão. Note-se, a propósito, que o Decreto nº 5.450/2005, que regulamenta o pregão na forma eletrônica e é mais recente, visivelmente resolveu excluir a vedação da modalidade para os serviços de engenharia. 49. Assinalo que esse posicionamento não é nenhuma novidade no Tribunal, como mostra a ementa do Acórdão nº 2.272/2006-Plenário: “A Lei nº 10.520/02 não exclui previamente a utilização do Pregão para a contratação de serviço de engenharia, determinando, tãosomente, que o objeto a ser licitado se caracterize como bem ou serviço comum. As normas regulamentares que proíbem a contratação de serviços de engenharia pelo Pregão carecem de fundamento de validade, visto que não possuem embasamento na Lei nº 10.520/02”. 50. No pregão, o cuidado que se tem que ter está em demarcar com clareza o que se quer comprar, para proteção da exeqüibilidade técnica e nanceira do objeto, já que a fase
de habilitação é desembaraçada e posterior aos lances. É importante fazer o licitante compreender com boa precisão o que a Administração deseja, sem induzi-lo a erros nem levá-lo a se comprometer com uma proposta que não pode cumprir pelo preço oferecido. Assim, tem-se favorecida a normalidade da execução contratual e, antes disso, evita-se que a licitação vire um transtorno, com inúmeras inabilitações após aceito o preço, ou mesmo que se inabilitem licitantes por avaliações subjetivas ou não sucientemente explicitadas
no edital, frustrando expectativas.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
51. De tudo isso, percebe-se que o pregão apenas é vedado nas hipóteses em que o atendimento do contrato possa car sob risco previsível, pela diculdade de transmitir aos
licitantes, em um procedimento enxuto, a complexidade do trabalho e o nível exigido de capacitação. Logo, a eventual inaplicabilidade do pregão precisa ser conferida conforme a situação, pelo menos enquanto a lei não dispuser de critérios objetivos mais diretos para o uso da modalidade. E ouso imaginar que, pelos benefícios do pregão, no que concerne à efetivação da isonomia e à conquista do menor preço, o administrador público talvez deva car mais apreensivo e vacilante na justicativa de que um serviço não é comum
do que o contrário.
52. Neste caso do Pregão Eletrônico nº [...], os serviços licitados foram: instalação do
canteiro, remanejamento da infra-estrutura do estacionamento externo, demolições, escavação e transporte de terra e implantação de duas vias provisórias. 53. Constituem serviços de fácil caracterização, que não comportam variações de execução relevantes e que são prestados por uma gama muito grande de empresas. Não era complicado passar aos licitantes as especicações desses serviços, tanto que, na prática,
nenhuma empresa participante do pregão interessou-se em questionar aspectos do termo de referência, que, segundo o §2º do art. 9º do Decreto nº 5.450/2005, “é o documento que deverá conter elementos capazes de propiciar avaliação do custo pela administração diante de orçamento detalhado, denição dos métodos, [...] valor estimado em planilhas de acordo com o preço de mercado, cronograma físico-nanceiro, se for o caso, critério de aceitação do objeto, deveres do contratado e do contratante, procedimentos de scalização e gerenciamento do contrato, prazo de execução e sanções, de forma clara, concisa e objetiva”. 54. Como são serviços de execução freqüente e pouco diversicada, de empresa para
empresa, não houve problema em conformá-los no edital segundo padrões objetivos e usuais no mercado. Mesmo quanto às estradas de acesso às áreas de escavação e do
estacionamento temporário, que infundiram desconança na peça motivadora desta
representação, consistem tão só em pequenas vias de natureza rústica e duração efêmera, que estão mais para serviço de engenharia do que para obra, e cujo valor orçado foi de 57 mil reais, dentro de 2,4 milhões. 55. Não se deve também confundir especialização do licitante com complexidade do serviço, pois o primeiro termo refere-se à segmentação das atividades empresariais, ao passo que o segundo, à arduidade do trabalho. Uma empresa especializada — não se está falando de notória especialização — pode sê-lo relativamente a um serviço comum. 56. Para concluir, renovo que o Pregão Eletrônico nº [...] tornou a licitação acessível a uma
quantidade maior de interessados e, graças ao uso dessa modalidade, foi possível obter uma economia espetacular para o erário, comprovada pelos referenciais de custos mais habituais, à qual, com certeza, não se chegaria no modelo tradicional de concorrência. (TCU. Acórdão nº 2.079/2007, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 5 out. 2007)
A análise do acórdão apresenta questão interessante: a preferência que o administrador deve dar ao pregão em caso de dúvida quanto ao fato do serviço de engenharia ser ou não comum, principalmente devido aos benefícios que essa nova modalidade traz na ampliação da competitividade do certame. Apresenta, ainda, algumas sugestões para a caracterização de serviços comuns: “padrões de desempenho e qualidade” que “possam ser objetivamente denidos pelo edital, por meio de especicações usuais no mercado”; execução frequente e pouco diversicada, de empresa para empresa;
simplicidade em conformá-los no edital segundo padrões objetivos e usuais no mercado; ausência de variações de execução relevantes; e prestação por uma gama muito grande de empresas.
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No mesmo sentido, segundo o TCU, deve-se estar atento para a amplitude do conceito de serviço comum: 20. Outra irregularidade atribuída aos gestores foi a utilização possivelmente indevida do pregão eletrônico para contratação dos seguinte bens e serviços, que não se enquadrariam na condição de bens e serviços comuns (item 2.b acima): fretamento de helicóptero para transporte aéreo de cargas de grande porte; estruturas metálicas e postes de concreto, ferramentas e passageiros para construção de linha de transmissão de alta tensão em lugares de difícil acesso (morros com vegetação nativa); serviços de manipulação, carga e descarga de grandes estruturas metálicas da linha de transmissão; fornecimento de escadas de manutenção para postes de concreto da dita linha de transmissão; e serviços de movimentação, transporte e descarregamento de três bobinas de cabo submarino e acessórios no porto de Santos/SP, também, para a mesma obra. 21. Aqui também concordo com os dirigentes da Secex/SC, que consideram que não houve irregularidade nas referidas contratações. 22. Há consenso que a utilização do pregão vem beneciando a administração pública com descontos maiores que os anteriormente vistos em concorrências. Ademais, a inversão de fases do pregão elimina conitos demorados sobre a habilitação dos participantes. Apesar disso, volta e meia deparamo-nos com questionamentos acerca da pertinência do enquadramento do objeto licitado na condição de bens e serviços comuns. 23. No caso concreto, percebo que as análises do Auditor e do MP/TCU que concluíram pela inviabilidade do pregão eletrônico fundam-se não em uma avaliação criteriosa da complexidade dos objetos licitados, mas das obras como um todo. Veja-se, a propósito, o seguinte excerto da análise feita pelo Auditor da Secex/SC sobre o assunto (grifos meus): “35. As licitações questionadas dizem respeito à implantação da linha de transmissão 230 kV Desterro - Palhoça - Biguaçu, a qual sofreu alteração de seu traçado em decorrência de exigências do órgão responsável pelo licenciamento ambiental, conforme é informado no item 16 e seguintes desta instrução processual. 36. Assim, os bens e serviços licitados destinam-se a um empreendimento considerado inédito, complexo e com signicativas diculdades logísticas, segundo a própria Eletrosul: (...) 36.1. São esses os bens e serviços que seriam ‘facilmente’ encontrados no mercado, portanto, seriam comuns. Isso, porém, não condiz com as características e as especicações dos materiais e serviços contratados e o nível de diculdade logística do projeto correspondente, conforme armam os próprios responsáveis: (...)” 24. Ora, o fato de o fretamento de helicóptero servir a projeto inédito e com eventuais complexidades logísticas não repercute necessariamente no nível de diculdade intrínseca do serviço. Por sinal, no Acórdão 798/2005-2ª Câmara, o Tribunal, no exame de licitação promovida pela Eletronorte, já decidiu acerca da viabilidade da contratação desse item mediante pregão. 25. Merece menção também a observação do Diretor da Secex/SC de que o serviço complexo para determinada empresa pode não sê-lo para outra a ele acostumado. Nessa linha, não me parece que seja incomum ao mercado e, em especial, a empresas da área de atuação da Eletrosul a aquisição de estruturas metálicas e postes de concreto, serviços de manipulação dessas estruturas, escadas de manutenção e serviços de movimentação e transporte de bobinas de cabos. (TCU. Acórdão nº 1.666/2015, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 12 fev. 2015)
Por m, vale colacionar entendimento do TCU a respeito da utilização do pregão na contratação de serviços de natureza intelectual, com destaque para a possibilidade de contratação de alguns tipos de projeto, consultoria ou supervisão de obra:
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
1. O pregão não deverá ser utilizado para a contratação de serviços de natureza predominantemente intelectual, assim considerados aqueles que podem apresentar diferentes metodologias, tecnologias e níveis de desempenho e qualidade, sendo necessário avaliar as vantagens e desvantagens de cada solução. 2. Se o projeto ou estudo a ser elaborado por um prossional ou empresa for similar ao que
vier a ser desenvolvido por outro(a), o serviço pode ser caracterizado como comum. Caso contrário, se a similaridade dos produtos a serem entregues não puder ser assegurada, o objeto licitado não se enquadra na categoria de comum. 3. É possível a existência de soluções distintas para o objeto licitado, mas a consequência advinda da diferença entre elas não deverá ser signicativa para o ente público que adota
o pregão. Se, no entanto, os serviços comportarem variações de execução relevantes, a técnica a ser empregada pelos licitantes merecerá a devida pontuação no certame. (TCU. Acórdão nº 601/2011, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 21 mar. 2011) 5. Ocorre que a Lei nº 10.520/2002, que instituiu o pregão, prevê a utilização dessa modalidade para licitações em que se almeja a contratação de bens ou serviços comuns, conceituados pela mesma lei como “aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente denidos pelo edital, por meio de especicações usuais no
mercado”. Por conseguinte, para decidir sobre a questão, há de se avaliar se o serviço de supervisão de obras contratado pelo [...] se enquadra no preceito legal.
6. O subitem 9.2.3 do Acórdão nº 1.947/2008-Plenário, modificado pelo Acórdão nº 2.932/2011-Plenário, demonstra o entendimento deste Tribunal em relação ao assunto: “9.2.3. para contratação de serviços de supervisão e consultoria, realize a licitação na modalidade pregão, especicando detalhadamente os serviços que a empresa de
supervisão ou de consultoria deverá prestar, ressalvando as situações excepcionais em que tais serviços não se caracterizam como ‘serviços comuns’, caso em que deverá ser justicada, dos pontos de vista técnico e jurídico, nos autos do processo de licitação, a
utilização extraordinária de outra modalidade licitatória que não o pregão;” 7. Portanto, para esta Corte de Contas, o serviço de supervisão de obras deve ser, em regra, licitado na modalidade pregão, pois, na maioria dos casos, seu padrão de desempenho e qualidade pode ser objetivamente denido, conforme previsão legal.
8. Como bem mostra a unidade técnica, conquanto as atividades em análise sejam complexas para leigos, não o são para as empresas de supervisão e consultoria, que fornecem, habitualmente, serviços semelhantes ao que ora se discute. Desse modo, as especicações
seguem parâmetros do mercado, como obriga a lei. (TCU. Acórdão nº 3.341/2012, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 12 dez. 2012)
7.4.2 Parcelamento e fracionamento Outra questão em que frequentemente são apontados graves indícios de irregularidades refere-se à falha ou confusão na utilização dos conceitos de parcelamento e fracionamento. Em face do princípio da eciência e no intuito de selecionar a proposta mais
vantajosa para a Administração na contratação de obra pública, deve o gestor dividir o objeto a ser contratado em “tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade, sem perda da economia de escala”, conforme estabelece o art. 23, §1º, da Lei nº 8.666/93, ou seja, o parcelamento do objeto é a regra para a concepção do plano de licitação.
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Entretanto, nos termos do §2º do art. 23, para cada licitação distinta relativa à etapa ou conjunto de etapas da obra deve ser preservada a modalidade pertinente para a execução do objeto em licitação. O principal objetivo é evitar o fracionamento, conceito diametralmente oposto ao parcelamento, que decorre do desmembramento do objeto com vistas a utilizar modalidade de licitação mais simples do que deveria caso esse mesmo objeto fosse licitado em sua totalidade, consoante ilustração do §5º do artigo em análise: §5º É vedada a utilização da modalidade “convite” ou “tomada de preços”, conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de “tomada de preços” ou “concorrência”, respectivamente, nos termos deste artigo, exceto para as parcelas de natureza especíca que possam ser executadas por pessoas ou empresas de especialidade
diversa daquela do executor da obra ou serviço.
Com efeito, diversas as situações avaliadas pelo TCU no que tange a matéria em questão, ou seja, fracionamento de despesa e certame único para obras e serviços em que os potenciais interessados são os mesmos: 8. No que concerne aos indícios de fracionamento de despesa em relação Convites 13/2006 e 14/2006, esta Corte de Contas pronunciou-se sobre a matéria em diversas assentadas, como no caso do Voto condutor do Acórdão 1.570/2004 - Plenário, transcrito em parte no Relatório precedente. Naquela oportunidade, exarou entendimento no sentido de que não se deve realizar licitações distintas para a contratação de serviços de mesma natureza, mesmo em locais diversos, quando os potenciais interessados forem os mesmos. 9. O art. 23, §5º, da Lei 8.666/93, veda a utilização da modalidade “convite” ou “tomada de preços”, conforme o caso, para obras de mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de “tomada de preços” ou “concorrência”. 10. À luz dessa norma, à primeira vista, assistiria razão ao responsável que argumenta que os municípios de Cujubim e Pimenteiras, onde seria feita a adequação dos prédios para o funcionamento das Agências de Correio, distam um do outro 766 km, tratando-se, a seu ver, de obras independentes. 11. Entretanto, tomo por empréstimo trecho do Voto que antecedeu o Acórdão 1.570/2004Plenário por ser elucidativo da matéria: “12. Vê-se, pois, que o Estatuto das Licitações, ao vedar o fracionamento de despesas, pretendeu preservar a competitividade dos certames licitatórios, obrigando a que as obras e os serviços realizados no mesmo local fossem englobados em uma única licitação, de maior valor. Interpretando-se a norma de forma sistêmica, orientados pelo princípio da isonomia que norteou sua promulgação, só se pode conceber que a menção a um “mesmo local” tenha por objetivo único permitir o maior aproveitamento das potencialidades regionais, observando-se a área geográca de atuação das empresas que executam os serviços ou obras a serem contratados”. 12. Examinando o caso concreto em maior profundidade, verico que, com exceção das empresas [...] que receberam apenas o Convite 14/2006, as demais potenciais licitantes [...]
foram convidadas a participar das duas licitações e retiraram o edital. 13. Tal fato demonstra que essas quatro construtoras podem atuar indiferentemente em qualquer das duas cidades, não sendo permitida, assim, a realização de licitações distintas para obras e serviços de mesma natureza, uma vez que os potenciais interessados nos dois
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
certames são os mesmos. Nesse sentir, aplica-se o entendimento deste Tribunal que visa assegurar o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e a ampliação da competitividade sem perda da economia de escala. (TCU. Acórdão nº 1.620/2010, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 14 jul. 2010)
Vale apenas uma ressalva. No caso de serviços especializados acessórios em relação à obra, a lei autoriza a utilização da modalidade específca com base no valor
de contratação desses serviços, com vistas a viabilizar o maior número de empresas participantes. Exemplo dessa situação é a licitação do sistema de ar condicionado, serviço executado por empresas especializadas, em separado da licitação da obra, uma vez que, caso licitado em conjunto com a licitação principal, a empreiteira acabaria por subcontratar a empresa especializada e cobrar BDI sobre o valor desse serviço, ocasionando elevação dos preços pagos pela Administração Pública. Em suma, parcelamento enseja a ampliação da competitividade, enquanto fracionamento facilita possível direcionamento. O TCU, no mesmo sentido fxado pela lei, estabeleceu:
É obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global, nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a essa divisibilidade. (TCU. Súmula nº 247. Ata nº 43/04)
A jurisprudência é farta quando trata da matéria, sempre com determinações para a observância das diretrizes legais, como, por exemplo: a) “proceda ao parcelamento do objeto, sempre que a natureza da obra, serviço ou compra for divisível, com vistas a propiciar a ampla participação dos licitantes, devendo as exigências quanto à habilitação dos mesmos ser proporcionais ao parcelamento” (TCU. Acórdão nº 1.544/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 22 jun. 2006); b) “é obrigatório o parcelamento das obras quando não prejudicial ao gerenciamento dos serviços, pois esse parcelamento, via de regra, permite a participação de maior número de interessados no certame e, por conseguinte, obtenção de proposta mais vantajosa para a Administração” (TCU. Acórdão nº 618/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 02 maio 2006); c) “avalie previamente à elaboração de editais, quando da contratação de prestação de serviços a magnitude dos valores envolvidos com os custos de materiais consumíveis, equipamentos e ferramentas, considerando a relação custo-benefício entre as opções de permitir a sua inserção como custo dos serviços prestados e a aquisição direta; caso contrário, avalie os valores e/ou percentuais propostos pelas licitantes, de forma a aferir a sua adequabilidade aos termos do seu orçamento” (TCU. Acórdão nº 1.595/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006);
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d) “o gestor deve promover estudos técnicos demonstrando a viabilidade técnica e econômica de se realizar uma licitação independente para a aquisição de equipamentos/materiais que correspondam a um percentual expressivo das obras, com o objetivo de proceder ao parcelamento do objeto previsto no art. 23, §1º, da Lei nº 8.666/1993; caso seja comprovada a sua inviabilidade, que aplique um LDI reduzido em relação ao percentual adotado para o empreendimento, pois não é adequada a utilização do mesmo LDI de obras civis para a compra daqueles bens” (TCU. Acórdão nº 325/07, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 16 mar. 2007); e) “a falta de licitação especíca para a compra de equipamentos necessários à obra pública respectiva, sem o parcelamento do objeto da licitação, constitui irregularidade, salvo se comprovada a inviabilidade técnica ou econômica para o parcelamento preconizado pelo art. 23, §1º, da Lei 8.666/93” (TCU. Acórdão nº 2.641/07, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 11 dez. 2007). Não se pode esquecer, entretanto, que algumas situações peculiares poderão ensejar decisão do gestor pelo não parcelamento quando avaliada a relação custo benefício, como, por exemplo: o custo de diversas licitações, a dificuldade de responsabilização dos diversos contratados por determinada falha, a insuciência de equipe de gerenciamento ou ganhos de escala resultantes de modulação ou padronização. Como ilustração deste último, o TCU se manifestou da seguinte maneira: Quanto ao primeiro ponto, o [...] evidenciou que a opção adotada garantiu ganho de escala, proporcionado pelas características de modulação e padronização das obras de arte especiais e correntes que compõem o objeto e que favorecem a execução por uma única empresa. Além disso, o parcelamento do objeto imporia maior dispêndio aos cofres públicos com custos de instalação e manutenção de canteiros de obras, que, a depender do número de lotes em que seriam divididos o objeto da licitação, poderia corresponder a grande percentual do valor orçado para a obra. Ainda com o intuito de corroborar a armação de que os canteiros múltiplos gerariam maior dispêndio, o [...] aponta questão de cunho logístico: a identicação de somente uma área de extração de material pétreo a ser utilizada na obra, impondo acréscimo nas distâncias médias de transporte, caso adotados vários canteiros de obra. Assim, resta evidente que a opção pelo não parcelamento decorreu de parâmetros técnicos e econômicos, restando demonstrada a regularidade da licitação em um único lote, na linha defendida pela unidade técnica. (TCU. Acórdão nº 2.381/2012, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 26 out. 2012)
A essência dessas determinações está relacionada à ampliação do universo de competidores, o que ensejará a obtenção de propostas mais vantajosas, visto que as exigências de habilitação serão reduzidas para cada uma das parcelas a serem contratadas. A respeito, o TCU rmou entendimento de que: [...] em decorrência do disposto no art. 3º, §1º, inciso I; art. 8º, §1º e artigo 15, inciso IV, todos da Lei nº 8.666/93, é obrigatória a admissão, nas licitações para a contratação de obras, serviços e compras, e para alienações, onde o objeto for de natureza divisível, sem prejuízo do conjunto ou complexo, da adjudicação por itens e não pelo preço global, com vistas a propiciar a ampla participação dos licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam,
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
contudo, fazê-lo com referência a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequarem-se a essa divisibilidade. (TCU. Decisão nº 393/94, Plenário. Rel. Min. Paulo Aonso de Oliveira. DOU , 29 jun. 1994)
Todavia, diversas são as situações encontradas em que não houve o devido cuidado para o parcelamento da contratação. Nesses casos, além da devida responsabilização, as determinações da Corte de Contas têm sido na procura de corrigir as falhas encontradas, seja pela renegociação do contrato a m de excluir parte do BDI xado inicialmente,
seja pela anulação do contrato. A título de exemplo, vale relacionar o conteúdo das determinações formuladas pelo TCU em caso de ausência de licitação autônoma para aquisição dos equipamentos com potencial dano ao erário: 9.1.1 adote, à luz do §3º do art. 49 da Lei nº 8.666/1993, os procedimentos administrativos necessários para a anulação da licitação CP nº [...], relativa às obras [...], caso não seja
possível garantir a continuidade da licitação por meio de renegociação das propostas feitas pelas empresas vencedoras, de forma a coaduná-las com as seguintes estipulações:
9.1.1.1 o BDI xado sobre o fornecimento de tubulações, conexões, válvulas, acessórios e
equipamentos deverá ser de, no máximo, 10%, caso ele seja feito sem parcelamento. (TCU. Acórdão nº 1.600/03, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. DOU , 07 nov. 2003.) 9.1 xar o prazo de 45 dias para que o [...]:
9.1.1 promova, após negociação com a contratada, a exclusão da parte referente aos equipamentos eletromecânicos do Contrato [...], que deverão se objeto de outra licitação a ser realizada oportunamente; [...]
9.1.3 alternativamente, na impossibilidade de realização das medidas constantes dos subitens 9.1.1 e 9.1.2, adote as providências necessárias ao exato cumprimento do art. 71, IX da Constituição Federal c/c o art. 78, XII da Lei nº 8.666/93, no sentido da anulação da Concorrência nº 21/2002 e, conseqüentemente, do Contrato [...], em razão da infringência ao princípio da eciência previsto no art. 37 da Constituição Federal, tendo em vista a
ausência de licitação autônoma para a compra dos Equipamentos Hidromecânicos e Eletromecânicos, cujos valores correspondiam a 54,6 % do valor do Orçamento-Base da
Concorrência [...], em inobservância ao disposto no art. 23, §1º, da Lei nº 8.666/93. (TCU.
Acórdão nº 1.914/03, Plenário. Rel. Min. Humberto Souto. DOU , 23 dez. 2003)
7.4.3 Tipos de licitação O §1º do art. 45 da lei de licitações estabelece os tipos de licitação possíveis de serem realizados para contratação de obra pública: “menor preço”; “melhor técnica”; e “técnica e preço”. O tipo “maior lance ou oferta” só é cabível nos casos de alienação de bens ou concessão de direito real de uso. De plano, vale destacar que a lei é exaustiva quando se refere aos tipos de licitação, consoante preceitua o §5º do artigo em comento, ou seja, não é possível a criação de outros tipos não previstos. A licitação do tipo menor preço, que deve ser utilizada como regra, é aquela que terá como vencedor “o licitante que apresentar a proposta de acordo com as 101
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Art. 45, §5º, Lei nº 8.666/93: “É vedada a utilização de outros tipos de licitação não previstos neste artigo”.
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especicações do edital ou convite e ofertar o menor preço” (art. 45, §1º, I, da Lei nº 8.666/93). Importante lembrar que o menor preço global não é condição absoluta para a denição da melhor proposta, visto que será necessário o cumprimento de todas as condições xadas no edital. Por esse motivo, a xação dessas condições é extremamente relevante a m de evitar que sejam selecionadas propostas que, apesar de menor valor apresentado: a) sejam feitas por empresas não habilitadas para a execução do objeto; ou b) tenham vícios na elaboração do orçamento que possam comprometer o equilíbrio econômico-nanceiro do contrato quando da celebração de aditivos. Segundo jurisprudência dominante, é essencial que os pesos atribuídos aos quesitos técnica e preço sejam equilibrados, devendo, sempre que necessário prestigiar um deles, inserir justicativa a respeito. Em análise de caso concreto, assim se manifestou o TCU: 53. Em relação a esse assunto, o Ministério, de início, cita alguns itens do edital (item 12 do edital cotejado com os subitens 6.6 e 6.7 do Apêndice III do Anexo I do edital). Vericando esses itens, observou-se que eles não justicam os pesos atribuídos aos quesitos técnica e preço, apenas informam como se dará o cálculo do índice técnico. 54. Ao tentar justicar a ponderação 6 e 4 para técnica e preço, respectivamente, o Ministério limita-se a declarar que “por se referir a serviços com características efetivamente técnicas, cou entendido pela área demandante da contratação, que a proposta técnica deveria ser vista com critérios mais apurados”. Ou seja, o Ministério, mais uma vez, não prestou justicativas técnicas, sucientemente embasadas, para explicar a ponderação feita entre a técnica e o preço, congurando descumprimento de determinação do Tribunal. 55. Desta forma, considerando-se o atendimento dos demais itens questionados, entendese suciente alertar o Ministério de que descumprimento reincidente de determinação do Tribunal pode ensejar a aplicação da multa prevista no art. 58, inciso VII, do RI/TCU. 34. Estando de acordo com a unidade, observo que o Ministério alegou estar seguindo os ditames do mencionado acórdão apenas com a alteração dos pesos atribuídos para técnica (de 7 para 6) e preço (de 3 para 4). Ocorre que a redução da diferença entre os pesos, embora signique avanço em relação ao edital anterior, não atende integralmente a determinação do Acórdão 1.488/2009 - Plenário. É essencial, e não constou do edital da Concorrência 1/2010, a apresentação de justicativas técnicas que demonstrem a razoabilidade da ponderação, uma vez que a adoção de critério desproporcional poderia acarretar prejuízo à competitividade do certame e à obtenção da proposta mais vantajosa pela Administração. (TCU. Acórdão nº 546/2011, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 17 mar. 2011)
Em complemento ao assunto, o TCU destaca em relação à utilização de critérios objetivos na aplicação das notas a m do julgamento: 27. Mas o que é critério objetivo? O Professor Diógenes Gasparini, ao proferir palestra no II Seminário de Direito Administrativo, promovido pelo Tribunal de Contas do Município de São Paulo – TCMSP, em junho de 2004, fez essa pergunta para, em seguida, dar a resposta (sítio do TCMSP, visitado em 18/6/2012): “Critério objetivo é aquele que por si só dene uma situação. É aquele que independe de qualquer argumento para conrmá-lo. Basta o confronto das várias propostas para selecionarmos a vencedora, sem precisar justicar absolutamente nada. O menor preço, por exemplo, é critério objetivo. Quando estabelecemos no edital, que a licitação será julgada
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
pelo critério do menor preço, temos aí estabelecido qual é o critério de julgamento e que esse critério é objetivo. Se temos uma proposta de sete, uma de sete e meio e outra de oito, sendo o critério de julgamento o de menor preço, não temos dúvida nenhuma para dizer que aquela proposta de sete é a vencedora. Não precisamos dizer para ninguém que nossa grande experiência como Presidente de Comissão de Licitação indica que sete é a melhor proposta, ou que somos professor de matemática, que somos isso ou aquilo para justicar essa escolha. Não temos que justicar nada. O achômetro, desculpem a expressão, não
pode estar presente no julgamento, devendo, assim, ser banido do processo licitatório qualquer critério subjetivo”. 28. E o prosseguimento da lição do festejado administrativista naquele evento iria dizer o que acontece, em termos de critérios de julgamento, quando a licitação não é do tipo “menor preço”, mas sim do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço”, que é o caso da
concorrência lançada pela [...] e da qual cuidamos nesta oportunidade, vindo então à tona
o seguinte ensinamento do saudoso mestre: “Talvez os Senhores digam, mas e no caso de licitação de melhor técnica ou de técnica e preço, que são critérios adotados para o julgamento de certas licitações, não há aí o subjetivismo quando os membros da Comissão de Licitação devem atribuir notas a certos fatores como qualidade, quantidade, produtividade e metodologia, por exemplo. Isso é uma realidade, mas a lei diz que técnica e preço e melhor técnica são critérios de julgamento de licitações cujos objetos envolvem importantes trabalhos intelectuais
[refere-se ao disposto no art. 46 da Lei nº 8.666/1993]. Esses critérios só são utilizados excepcionalmente [...]. Portanto, já temos uma restrição para a sua aplicação imposta
pela própria lei licitatória. De outro lado, quando possível a sua aplicação, ainda exige-se um cálculo matemático. Esse cálculo levará em conta certas pontuações atribuídas pelos membros da Comissão de Licitação. A tais pontos serão aplicados determinados pesos. Multiplicam-se todos esses pontos pelos respectivos pesos e divide-se pela somatória dos
pesos e aí se têm vários números no nal dessas continhas. Nesses cálculos ainda deve ser considerado o preço ofertado pelo proponente, também inuenciado por um peso. Com
a conjugação de todos esses dados chegaremos, depois da comparação dos resultados nais de cada licitante, à proposta vencedora. Portanto, a própria lei se encarrega de, ao máximo, retirar a subjetividade que possa existir nesses critérios de julgamento”.
29. O magistério que acabo de expor, do renomado especialista em direito administrativo, ajuda a compreender as razões pelas quais o critério de julgamento absolutamente objetivo só é possível na licitação do tipo “menor preço”. 30. Portanto, o que deve ser esperado e exigido em relação a convocações semelhantes à concorrência em pauta, do tipo “técnica e preço”, é o menor nível possível de subjetividade no seu julgamento, com avaliações devidamente fundamentadas por parte dos membros da comissão de licitação. 31. Isso, a partir de parâmetros bem denidos no edital, para a atribuição de notas
aos diversos fatores avaliatórios nele previstos, cuja conjugação, na forma igualmente estabelecida no ato convocatório, há de ser suciente para mitigar eventuais resquícios
de imprecisão na maneira de julgar as propostas oferecidas, de modo a evitar decisão que não seja impessoal ou não favoreça o interesse público. 32. É assim que se resguardam sobretudo os princípios da isonomia e da impessoalidade, entre outros, na seleção da proposta mais vantajosa para a administração em licitações da espécie, normalmente com o uso de fórmulas aritméticas ou pontuações capazes de permitir uma classicação justa e compreensível para as licitantes envolvidas, em
julgamento necessariamente vinculado ao edital e aos documentos por elas apresentados, e sempre subordinado a juízo de rigorosa imparcialidade. 33. Ou seja, não se admite solução administrativa que deixe transparecer a imposição da vontade pessoal do agente público, ou que se apresente como desvirtuadora dos princípios
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fundamentais da legalidade, da igualdade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade ou da vinculação ao instrumento convocatório. (TCU. Acórdão nº 1.542/2012, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 20 jun. 2012)
As licitações do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço” para obras e serviços de engenharia, nos termos do art. 46 da lei de licitações, serão utilizadas “exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual, em especial na elaboração de projetos, cálculos, scalização, supervisão e gerenciamento e de engenharia consultiva
em geral e, em particular, para a elaboração de estudos técnicos preliminares e projetos básicos e executivos”. A lei prevê, em caráter excepcional, a possibilidade de utilização desses dois tipos de licitação: [...] para fornecimento de bens e execução de obras ou prestação de serviços de grande vulto majoritariamente dependentes de tecnologia nitidamente sosticada e de domínio restrito, atestado por autoridades técnicas de reconhecida qualicação, nos casos em
que o objeto pretendido admitir soluções alternativas e variações de execução, com
repercussões signicativas sobre sua qualidade, produtividade, rendimento e durabilidade
concretamente mensuráveis, e estas puderem ser adotadas à livre escolha dos licitantes, na conformidade dos critérios objetivamente xados no ato convocatório. (art. 46, §3º, da
Lei nº 8.666/93)
É importante atentar que não basta que a obra ou serviço seja de grande vulto. É necessário também que haja soluções alternativas e variações de execução com repercussões signicativas, fato raro em licitação de obra na qual a administração xa
a absoluta maioria dos parâmetros no projeto básico. O TCU tem reiterados entendimentos nesse sentido, consoante exemplo de determinação formulada a órgão público no sentido de que: 9.2.2.1 observe que, de acordo com o art. 46 da Lei 8.666/93, a licitação do tipo técnica e preço só pode ser realizada para serviços com características predominantemente intelectuais; 9.2.2.3 estabeleça, com clareza, a experiência das empresas licitantes a ser exigida na habilitação, observando estritamente os limites do que for necessário para a garantia da qualidade do serviço, de modo a atender o art. 37, inciso XII, da Constituição Federal; 9.2.3 ao realizar licitação do tipo melhor técnica ou técnica e preço: 9.2.3.1 analise adequadamente os seus objetos observando que, nos termos do art. 46 da Lei 8.666/93, estes tipos de licitação são adotados exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual. (TCU. Acórdão nº 2.601/04, 2ª Câmara. Rel. Min. Adylson Moa. DOU , 20 dez. 2004) Também deve se atentar para a xação de tempo de experiência de prossionais
para efeito de pontuação, conforme se depreende de diversas decisões da Corte de Contas Federal: Todavia, ainda sobre esse ponto da oitiva, a 5ª Secex entendeu que o número de anos de experiência dos prossionais (6, 8 ou 10 anos), que seriam exigidos, na contratação, é destoante do requerido para ns de habilitação (5 anos em média). Portanto, a forma
como se encontra a letra “a” do item 7.1.3 do edital iria de encontro à jurisprudência
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
deste Tribunal, que considera inadequado exigir tempo de experiência dos profssionais
que prestarão os serviços, uma vez que a empresa deve demonstrar aptidão técnica para executar o contrato, sem que isso esteja necessariamente ligado, por ocasião da licitação, à experiência do quadro de pessoal utilizado em avenças anteriores. Realmente, a conclusão da unidade técnica é acertada, pois se deve ponderar a possibilidade de uma empresa, que anteriormente tenha prestado os mesmos tipos de serviços exigidos na licitação do [...], recrutar parte dos profssionais apenas no caso de adjudicação ao
contrato decorrente. Isso é condizente com a dinâmica do mercado de comunicação. Esta conjectura está em harmonia com a jurisprudência do TCU, explicitada nos Acórdãos 600/2011 e 473/2004, do Plenário, que propugna pelo estabelecimento recrudescente de requisitos para cada categoria profssional como condição apenas de contratação.
Tal precaução seria uma forma de ampliar a competitividade dos certames e, por corolário, obter a proposta mais vantajosa para a Administração. Ademais, situação contrária poderia, ainda, inibir o desenvolvimento de pequenas e médias empresas, na medida em que elas não estariam aptas a participar de muitos certames, o que levaria ao risco de engessamento do mercado, diminuição da concorrência e, por fm, aumento dos preços.
Por oportuno, reproduzo o seguinte trecho que constou da ementa do Acórdão 600/2011 - Plenário: “A exigência de comprovação, para fm de qualifcação técnica, de tempo de experiência dos profssionais a serem disponibilizados pela licitante para a execução do
objeto afronta o disposto no art. 30, §5º, da Lei nº 8.666/93”. Também, convém explicitar o que dispõe esse dispositivo da Lei de Licitações e Contratos: “É vedada a exigência de comprovação de atividade ou de aptidão com limitações de tempo ou de época ou ainda em locais específcos, ou quaisquer outras não previstas nesta Lei, que inibam a
participação na licitação”. Para uma exegese integradora, é ainda conveniente relembrar o que estabelece a LLC no principiológico artigo 3º, com grifos acrescidos para ressaltar o que está sendo tratado nestes autos: “A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos”. Destarte, acolho a proposta da unidade técnica de se determinar ao [...] que, no caso de
seguimento da Concorrência, altere o referido dispositivo editalício, de modo a excluir as exigências relativas ao número de anos de experiência dos profssionais que comporão a
equipe responsável pelos serviços. (TCU. Acórdão nº 727/2012, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 03 abr. 2012)
Em segundo lugar, no que tange mais especifcamente à exigência de comprovação de tempo de experiência dos profssionais a serem disponibilizados pelo licitante, impende
frisar que tal procedimento afronta o disposto no art. 3º, §5º, da Lei nº 8.666/1993, bem como a jurisprudência do TCU, em especial os Acórdãos nºs 1529/2006-Plenário, 473/2004-Plenário, e Decisão nº 134/2001-Plenário. Inclino-me a adotar o entendimento externado no Acórdão nº 264/2006, no sentido de que tais requisitos podem ser aceitáveis, como critérios de pontuação, desde que se mostrem imprescindíveis à execução do objeto e esteja acompanhada de expressa justifcativa técnica
nos autos do processo de licitação. 8. Embora o responsável no âmbito da Unifesp tenha alegado que o item 1.3.3 do edital disponha sobre a necessidade de elaboração de um plano de comunicação a ser desempenhado pela empresa, e argumentado que tal plano seria considerado quando da contratação da vencedora, a unidade técnica observou que “inexistem critérios para avaliação da proposta técnica da licitante, constituída pelo plano de comunicação
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exigido no Anexo VI”. Dessa forma, torna-se inequívoca a utilização de critérios baseados unicamente na experiência anterior do licitante. (TCU. Acórdão nº 210/2011, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 07 fev. 2011)
Em face da relevância do tema, vale ilustrar entendimentos da Corte de Contas a respeito da matéria, consubstanciados em determinações formuladas: a) abstenha-se de adotar certame do tipo “técnica e preço” quando não estiver perfeitamente caracterizada a natureza predominantemente intelectual da maior parte do objeto que se pretende contratar, a exemplo do vericado na Concorrência [...], considerando que tal procedimento restringe o caráter competitivo da licitação, consagrado no art. 3º, §1º, inciso I, da Lei 8.666/1993, além de contrariar o disposto no art. 46, caput , do mesmo diploma legal (TCU. Acórdão nº 653/07, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 23 abr. 2007); b) nas licitações do tipo técnica e preço é vedado incluir quesitos de pontuação imprecisos ou que prejudiquem o julgamento objetivo das propostas, a exemplo das horas de serviços prestados e do tempo de experiência do licitante (TCU. Acórdão nº 1.626/07, 1ª Câmara. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 17 ago. 2007); c) promova o julgamento dos certames a partir de critérios objetivos previamente estabelecidos no edital, com a adequada motivação das pontuações atribuídas, e em conformidade com o tipo da licitação, de forma a preservar os princípios da impessoalidade e do julgamento objetivo das propostas, evitar impropriedades como as ocorridas na Concorrência nº 01/2004 e atender ao disposto nos artigos 3º, 44, 45 e 46, §1º, I, da Lei nº 8.666/93; d) evite a utilização de critérios do tipo “Conhecimento do Problema” e “Plano de Trabalho”, como forma de julgamento de propostas técnicas, em que as licitantes descrevam metodologias ou especicações técnicas que devam estar contidas no projeto básico, de forma a evitar julgamentos subjetivos com base nesses itens, conforme os artigos 3º, art.44, art.45 e art.46, §1º, I da Lei nº 8.666/93; e) estabeleça a comissão julgadora com, no mínimo, três especialistas nas próximas licitações do tipo “técnica” ou “técnica e preço”, com o intuito de reduzir qualquer parcela de subjetividade no julgamento das propostas, sobretudo quando a materialidade dos valores envolvidos for signicativa (TCU. Acórdão nº 2.405/07, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 22 nov. 2007). Os procedimentos para a realização desses tipos estão previstos, respectivamente, nos parágrafos 1º e 2º do referido artigo. A diferença básica entre os dois é a forma de classicação das empresas. No primeiro, a classicação será feita entre os licitantes previamente qualicados e que obtiveram a pontuação mínima xada em edital, de acordo com os critérios pertinentes e adequados ao objeto licitado. O valor limite para contratação será o preço mínimo apresentado entre os licitantes que obtiveram a valorização mínima, respeitando-se a ordem de classicação. Já no segundo, a classicação dos proponentes será feita com base na média ponderada das valorizações das propostas técnicas e de preço, de acordo com os pesos preestabelecidos no instrumento convocatório.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
7.4.4 Sistema de Registro de Preços (SRP) O Sistema de Registro de Preços (SRP) está previsto no art. 15 da Lei nº 8.666/93 e regulamentado, em âmbito federal, pelo Decreto nº 7.892/13. O art. 2º do referido 102
decreto o dene como “conjunto de procedimentos para registro formal de preços
relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para contratações futuras” e o art. 3º estabelece as hipóteses de sua utilização:
I - quando, pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações frequentes; II - quando for conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; III - quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; ou IV - quando, pela natureza do objeto, não for possível denir previamente o quantitativo
a ser demandado pela Administração.
Com efeito, o SRP representa ferramenta importante para exibilizar as aquisi-
ções pela Administração Pública, a exemplo do modelo “just in time” empregado pela iniciativa privada. A licitação para registro de preços será realizada nas seguintes modalidades: concorrência, do tipo menor preço, ou pregão. Existe a possibilidade, em caráter excepcional, de o julgamento ser realizado por técnica e preço, mas será necessário despacho fundamentado da autoridade máxima do órgão ou entidade. Após a licitação, é formalizado termo de compromisso, denominado Ata de Registro de Preços, que autoriza a Administração a contratar apenas quando surgir a necessidade da efetiva aquisição de bens ou serviços. O processamento da licitação pode contar com os seguintes órgãos: - órgão gerenciador – órgão ou entidade da administração pública federal responsável pela condução do conjunto de procedimentos para registro de preços e gerenciamento da ata de registro de preços dele decorrente; - órgão participante – órgão ou entidade da administração pública federal que participa dos procedimentos iniciais do Sistema de Registro de Preços e integra a ata de registro de preços; e - órgão não participante – órgão ou entidade da administração pública que, não tendo participado dos procedimentos iniciais da licitação, atendidos os requisitos desta norma, faz adesão à ata de registro de preços. O SRP traz a grande vantagem de não ser necessária indicação da dotação orçamentária no momento da licitação, que somente será exigida para a formalização do 103
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O Decreto nº 7.892/13 revogou o Decreto nº 3.931/01. in time traduz-se em um sistema que objetiva a redução de custos com estoques por meio de programação que induza a entrega da matéria prima no local de consumo no exato momento em que for necessária a sua utilização. 104 Art. 2º, II, do Decreto nº 7.892/13: “Ata de registro de preços – documento vinculativo, obrigacional, com característica de compromisso para futura contratação, em que se registram os preços, fornecedores, órgãos participantes e condições a serem praticadas, conforme as disposições contidas no instrumento convocatório e propostas apresentadas”. 102
103 Just
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contrato ou outro instrumento hábil. Concluída a homologação da licitação e assinatura da referida ata, o gestor passa a contar com sistema ágil de requisição, empenho e recebimento do objeto. Vale lembrar que, nos termos do art. 12 do Decreto nº 7.892/13, “o prazo de validade da ata de registro de preços não será superior a doze meses, incluídas eventuais prorrogações, conforme o inciso III do §3º do art. 15 da Lei nº 8.666, de 1993” e que: §1º É vedado efetuar acréscimos nos quantitativos xados pela ata de registro de preços, inclusive o acréscimo de que trata o §1º do art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993. §2º A vigência dos contratos decorrentes do Sistema de Registro de Preços será denida nos instrumentos convocatórios, observado o disposto no art. 57 da Lei nº 8.666, de 1993. §3º Os contratos decorrentes do Sistema de Registro de Preços poderão ser alterados, observado o disposto no art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993. §4º O contrato decorrente do Sistema de Registro de Preços deverá ser assinado no prazo de validade da ata de registro de preços.
Não obstante suas facilidades, o SRP não pode ser utilizado para a contratação de Obras Públicas, conforme entendimento do TCU: Carece de amparo legal a utilização da modalidade licitatória denominada pregão ou a utilização de sistema de registro de preços objetivando a contratação de empresa para execução de obras e serviços não comuns de engenharia. (TCU. Acórdão nº 296/07, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 09 mar. 2007) No que se refere à utilização de sistema de registro de preços (SRP) para contratar obras ou projetos de engenharia, a equipe sustenta que não há amparo no art. 2º do Decreto 3.931/2001. Nesse sentido, cita precedente deste Tribunal (Acórdão 296/2007-TCU-2ª Câmara), entre outros. (TCU. Acórdão nº 2.006/12, Plenário. Rel. Min. Weder de Oliveira. , 08 ago. 2012) DOU
Para serviços contínuos, o TCU já aceita a utilização desse instrumento, desde que congurada uma das hipóteses delineadas no decreto regulamentador: É fato que os serviços de natureza continuada devem ser objeto de programação tal que permita a denição prévia dos quantitativos a serem contratados e, portanto, em regra não se enquadram na exigência disposta no inciso IV transcrito acima. Entretanto, não vejo óbices para que eventuais contratações atendam a um dos demais incisos do referido dispositivo, pois a subsunção da situação de fato a apenas uma dessas condições pode tornar regular a utilização do sistema de registro de preços. A proibição apenas em razão de não haver incerteza nos quantitativos a serem contratados resultaria em interpretação tal que condicionaria a adoção do registro de preços aos casos de preenchimento cumulativo de todas as hipóteses elencadas no artigo 2º do Decreto, o que considero limitar o SRP excessivamente e extrapolar os limites legalmente estabelecidos. Vislumbro a importância da utilização do SRP nos casos enquadrados no inciso III, por exemplo, onde a partir de uma cooperação mútua entre órgãos/entidades diferentes, incluindo aí um planejamento consistente de suas necessidades, a formação de uma ata de registro de preços poderia resultar em benefícios importantes. Também nos casos de contratação de serviços frequentemente demandados, mas que não sejam necessários ininterruptamente, a ata poderia ser uma solução ecaz e que coaduna com a eciência e a economicidade almejadas na aplicação de recursos públicos.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Outro embargo apontado como intransponível pelo Parquet é a validade da ata de registro de preços, limitada a um ano pela Lei 8.666/1993. Não observo qualquer impedimento para utilização do SRP em face da aludida limitação, já que, nos termos do §1º do art. 4º do Decreto 3.931/2001, os contratos decorrentes do SRP terão sua vigência conforme as disposições contidas nos instrumentos convocatórios e respectivos contratos, obedecido o disposto no artigo 57 da Lei Geral de Licitações e Contratos. Dessa forma, rmados dentro da validade da ata de registro de preços, os serviços de
natureza continuada podem alcançar, regularmente, até 60 meses, ou mesmo 72 em casos excepcionais. Importa esclarecer que, como bem consignou o MPTCU colacionando doutrina atinente, os serviços de natureza continuada são denidos não pelo prazo de sua prestação
e nem pelo exame propriamente da atividade desenvolvida pelos particulares, mas pela perenidade da necessidade pública a ser satisfeita. Desde que obedeçam ao prazo legalmente estabelecido, penso ser possível a utilização do sistema de registro de preços para contratação de serviços de natureza continuada. O SRP possui vantagens inerentes ao instituto que podem resultar em signicativos
benefícios à Administração, motivo porque considero que esta Corte deve deliberar no sentido da maior ampliação possível de sua utilização, obviamente dentro dos limites da legalidade e tendo sempre como foco o atendimento ao interesse público. Ao tratar desse tema, não posso deixar de registrar preocupação constante desta Corte acerca do recorrente desvirtuamento do Sistema de Registro de Preços, provocado por numerosas contratações realizadas por instituições não participantes do processo licitatório, tendo como base as atas formadas, muitas vezes, por um único órgão/entidade. Nesse contexto, o planejamento conjunto para a criação de uma ata deixa de ser a regra para que a adesão tardia torne-se prática comum. Notadamente por meio do Acórdão 1.487/2007 - Plenário, o TCU já pugnou pela irregularidade das ilimitadas adesões a uma mesma Ata de Registro de Preços, tendo em vista a ofensa aos princípios da competição, da igualdade de condições entre os licitantes e da busca da maior vantagem para a Administração Pública. Dessa forma, penso que o cerne da discussão é não permitir o desvirtuamento do sistema, ao invés de restringir sua utilização, que tem enormes potenciais para conferir benefícios à sociedade. (TCU. Acórdão nº 1.737/2012, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 11 jul. 2012) 16. No caso em tela, além de estar sendo prevista a contratação de obra por pregão, há, como agravante, a intenção de utilizar o sistema de registro de preços para a contratação de obras, com base em uma planilha que contempla 797 diferentes itens de serviços, dos quais alguns são bastante característicos de construções, ampliações e reformas, como é o caso dos concretos estruturais de 15 fck e de 25 fck, dosados em central, e a aplicação de concreto asfáltico. 17. O Decreto 7.892/2013 prevê, em seu art. 3º, o uso do Sistema de Registro de Preços nas seguintes hipóteses: “I - quando, pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações frequentes; II - quando for conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; III - quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; ou IV - quando, pela natureza do objeto, não for possível denir previamente o quantitativo a ser demandado pela Administração”.
18. A realização de obras não atende às hipóteses acima. Entendo que o aludido normativo viabiliza a contratação de serviços comuns de engenharia com base no registro de preços quando a nalidade é a manutenção e a conservação de instalações prediais, em que a
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demanda pelo objeto é repetida e rotineira. Mas o uso desse sistema com o intuito de contratar obras não pode ser aceito, uma vez que não há demanda de itens isolados, pois os serviços não podem ser dissociados uns dos outros. Não há, nessa situação, divisibilidade do objeto. 19. Sob esse aspecto, ressalto que a opção de utilização do registro de preço está prevista no art. 15, inciso II, da Lei 8.666/1993, contudo, quanto à obra, esta Lei é bastante explícita, em seu art. 10º, em denir os regimes de contratação (empreitada global, empreitada por preços unitários, tarefa e empreitada integral), sem fazer menção à possibilidade de emprego do registro de preço. (TCU. Acórdão nº 3.605/2014, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 5 nov. 2014)
A propósito, o TCU determinou ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão que: 9.3.1. evite utilizar o sistema de registro de preços quando as peculiaridades do objeto a ser executado e sua localização indiquem que só será possível uma única contratação ou não houver demanda de itens isolados, pelo fato de os serviços não poderem ser dissociados uns dos outros, não havendo, assim, a divisibilidade do objeto, a exemplo de serviços de realização de eventos; 9.3.2. observe que o sistema de registro de preços não é adequado nas situações em que o objeto não é padronizável, tais como os serviços de promoção de eventos, em que os custos das empresas são díspares e impactados por vários fatores, a exemplo da propriedade dos bens ou da sua locação junto terceiros; de sazonalidades (ocorrência de feiras, festas, shows e outros eventos no mesmo dia e localidade); do local e do dia de realização do evento; e do prazo de antecedência disponível para realização do evento e reserva dos espaços/apartamentos; 9.3.3. em futuras licitações para registro de preços, atente que é obrigatória a adjudicação por item como regra geral, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes e a seleção das propostas mais vantajosas, de forma que a adjudicação por preço global é medida excepcional que precisa ser devidamente motivada, além de ser incompatível com a aquisição futura por itens; 9.3.4. em futuras licitações para registro de preços, justique eventual previsão editalícia de adesão à ata por órgãos ou entidades não participantes (“caronas”) dos procedimentos iniciais, visto que a adesão prevista no art. 22 do Decreto 7.892/2013 exige motivação da vantagem em se adotar tal possibilidade. (TCU. Acórdão nº 1.712/2015, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , ata 20 jul. 2015)
Por m, interessante consulta foi formulada ao TCU para indagar sobre a legalidade da inclusão de cláusula, nos respectivos termos de convênio, exigindo dos convenentes que utilizem atas de registro de preços gerenciadas por órgãos ou entidades federais, para a aquisição de bens ou serviços custeados com recursos dessa avença. O TCU assim se posicionou: 9.2. com fundamento no art. 1º, inciso XVII, da Lei 8.443/92, responder ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) que não é possível exigir, como condição para celebração de convênios, que as entidades públicas (Estados, Distrito Federal e Municípios, inclusive suas autarquias e fundações públicas) a serem beneciadas com verbas federais se utilizem, sempre que houver e desde que atendidas as exigências legais e regulamentares, de atas de registro de preços gerenciadas por órgãos ou entidades federais, quando da aquisição de bens ou serviços com recursos oriundos da transferência voluntária, ante a ausência de amparo nas normas constitucionais e legais vigentes;
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
9.3. a título de orientação, esclarecer ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) que a legislação vigente possibilita a adoção de alternativas ao procedimento objeto de consulta quando da celebração de convênios com entidades públicas (Estados, Distrito Federal e Municípios, inclusive suas autarquias e fundações públicas) visando à execução de programas de governo, entre outras: 9.3.1. alternativa 1: com fundamento no art. 10, §6º, do DL 200/67, no art. 15, §4º, da Lei 8.666/93 e nos arts. 15, I, da Lei 8.666/1993 e 14 do Decreto 6.170/2007, a instituição de cláusulas no convênio para: 9.3.1.1. recomendar a adesão à ata de registro de preços vinculada ao programa de governo executado, licitada sob responsabilidade ou supervisão do Ministério com fundamento no art. 2º, inciso III, do Decreto 3.931/2001 para atender especicamente ao programa, e que
contemple os quantitativos máximos necessários a seu atendimento, consoante orientado no Acórdão 1.233/2012-Plenário; 9.3.1.2. estabelecer que, caso o ente público convenente decida pela realização de procedimento licitatório próprio em detrimento à recomendação referida no item 9.3.1.1 retro, ca obrigado a demonstrar ao Ministério a vantajosidade das propostas assim
obtidas quanto ao preço e à qualidade em relação àqueles constantes da ata vinculada ao programa e, na hipótese de vericadas condições iguais ou desvantajosas em qualquer
desses fatores, deverá aderir à ata vinculada ao programa concedendo preferência ao beneciário do registro para ns de padronização ou adotar providências para obter novas
propostas em conformidade com os padrões estabelecidos pelo Ministério; 9.3.1.3. no caso de as normas locais vigentes obstarem a adesão nos moldes recomendados no convênio conforme referido no item 9.3.1.1 retro, estabelecer que as condições propostas para a contratação sejam previamente submetidas pelo ente público convenente à apreciação do MCTI, o qual somente autorizará que a contratação seja custeada pelos recursos federais do convênio se vericadas condições de preço e qualidade iguais ou
mais vantajosas do que as constantes da ata vinculada ao programa executado; 9.3.2. alternativa 2: a realização de licitação pelo Ministério para registro de preços destinado a atender ao programa de governo, contemplando o quantitativo máximo de bens ou serviços necessários à execução dos convênios que serão celebrados com as demais esferas, com fundamento no art. 2º, inciso III, do Decreto 3.931/2001 e consoante orientado no Acórdão 1.233/2012-Plenário, podendo os demais entes públicos convenentes gurar
como participantes devidamente incluídos no processo de planejamento da aquisição, conforme previsto no art. 3º do mencionado regulamento; 9.3.3. alternativa 3: a realização de licitação pelo Ministério para registro de preços destinado a atender ao programa de governo, contemplando o quantitativo máximo de bens ou serviços necessários à execução dos convênios que serão celebrados com as demais esferas, com fundamento no art. 2º, inciso III, do Decreto 3.931/2001 e consoante orientado no Acórdão 1.233/2012-Plenário, podendo o MCTI utilizar a ata resultante para adquirir e distribuir os bens constantes do registro aos convenentes, com fulcro na padronização prevista no art. 15 do Decreto 6.170/2007. (TCU. Acórdão nº 1.717/2012, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 11 jul. 2012)
7.5 Regras para a contratação Existe um conjunto de elementos a serem observados para a estipulação das regras para a contratação, conforme demonstra a FIGURA 7.f, que deverão estar inseridos na minuta do contrato.
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Regras para contratação
Forma e regime de execução
Forma e limite de pagamento
Prazos de execução
Garantias
Subcontratação
Minuta do contrato
FIGURA 7.f - Elementos constantes das regras para contratação
7.5.1 Forma de execução A Administração deve defnir, em um primeiro momento, com base nas suas possibilidades e nas características do serviço, se irá executar a obra por seus próprios meios ou se a contratará com terceiros, formas que se denominam execução direta ou indireta, previstas no art. 6º, incisos VII e VIII, da lei de licitações, respectivamente. Atualmente, são raros os casos de execução direta, visto ser pouco recomendável a manutenção de estrutura interna para a construção de empreendimentos diante do alto custo, além da ociosidade dessa estrutura em momentos em que não houver serviço. Portanto, a absoluta maioria das contratações é feita na forma de execução indireta, que se subdivide nos seguintes regimes autorizados pela Lei nº 8.666/93: empreitada por preço global, empreitada por preço unitário, tarefa e empreitada integral. Releva notar que existem outros regimes de execução, porém, não autorizados pela referida lei. Exemplo é o de administração contratada que foi aprovado no texto inicial da lei, mas vetado pelo Presidente da República, visto que: [...] nesse regime de execução interessa ao contratado, que se remunera à base de um percentual incidente sobre os custos do que é empregado na obra ou serviços, tornar esses custos os mais elevados possíveis, já que, assim, também os seus ganhos serão maximizados. 105
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Razões do veto do Presidente da República ao art. 6º, inciso VIII, alínea “c”, da Lei nº 8.666/93.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
7.5.2 Regime de execução A Lei nº 8.666/93 especifica os regimes possíveis e os define, no art. 6º, inciso VIII, da seguinte forma: a) empreitada por preço global – quando se contrata a execução da obra ou do serviço por preço certo e total; b) empreitada por preço unitário – quando se contrata a execução da obra ou do serviço por preço certo de unidades determinadas; c) (Vetado) d) tarefa – quando se ajusta mão-de-obra para pequenos trabalhos por preço certo, com ou sem fornecimento de materiais; e) empreitada integral – quando se contrata um empreendimento em sua integralidade, compreendendo todas as etapas das obras, serviços e instalações necessárias, sob inteira responsabilidade da contratada até a sua entrega ao contratante em condições de entrada em operação, atendidos os requisitos técnicos e legais para sua utilização em condições de segurança estrutural e operacional e com as características adequadas às nalidades
para que foi contratada.
De plano, cabem algumas considerações a respeito da diferença entre os dois principais regimes utilizados, empreitada por preço global e por preço unitário, até mesmo por ser tema simples em teoria, mas que causa grandes discussões no momento da aplicação. Inegável que são regimes distintos. Caso contrário, o legislador não os teria denido em incisos separados. A diferença básica está na forma em que os serviços
contratados serão medidos e pagos. Na empreitada por preços unitários, a regra de medição é a aferição dos serviços na exata dimensão em que foram executados no local da obra. Os riscos dos contratantes em relação a diferenças entre o previsto e o realizado são pequenos. Na empreitada global, a licitante vencedora se compromete a realizar o serviço por preço certo e total, ou seja, assume o risco de eventuais distorções de quantitativos a serem executados a maior do que os previstos no contrato. Por outro lado, a Administração também assume o risco em pagar serviços cujas quantidades foram avaliadas em valor superior no momento da licitação. O que importa é o preço ajustado. Apesar de não ter sido renovado na LDO/2014, a Lei nº 12.708/12 (LDO/2013) continha expresso comando que deixava clara essa diferença ao determinar, em seu art. 102, §6º, II, que, no caso de empreitada por preço global, “o contrato deverá conter cronograma físico-nanceiro com a especicação física completa das etapas necessárias
à medição, ao monitoramento e ao controle das obras, não se aplicando, a partir da
assinatura do contrato e para efeito de execução, medição, monitoramento, scalização
e auditoria, os custos unitários da planilha de formação do preço”. A referida questão do risco é tão delicada que o legislador inseriu no art. 47 da Lei nº 8.666/93 o seguinte comando:
Nas licitações para a execução de obras e serviços, quando for adotada a modalidade de execução de empreitada por preço global, a Administração deverá fornecer obrigatoriamente, junto com o edital, todos os elementos e informações necessários para que os licitantes possam elaborar suas propostas de preços com total e completo conhecimento do objeto da licitação.
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Importa perceber que os elementos necessários e sucientes para a caracterização do objeto são requisitos do projeto básico que, por sua vez, é obrigatório para todas as licitações, independentemente do regime de execução adotado. Com efeito, o legislador foi rme ao raticar a regra da suciência de elementos no projeto em caso de execução por preço global, inclusive para maior transparência do processo. Claro se faz que o regime de preço global é aquele que, se materializado com base em projeto básico bem elaborado, representa maior facilidade de gerenciamento pela administração, visto possibilitar o pleno conhecimento do valor nal do empreendimento e o pagamento por etapa da obra concluída, enquanto o de preço unitário permite a variação do preço inicialmente previsto em face de alteração de quantitativos aferidos durante a medição. A constatação prática relativa a este regime demonstra que os valores nais são, na maioria dos casos, extremamente superiores aos previstos no projeto básico. Para obras de menor complexidade técnica, a regra deveria ser a utilização de contratação por preço global com base em projeto básico de boa qualidade ou, até mesmo, em projeto executivo; porém, o cenário demonstra exatamente o contrário, regime de preços unitários com projetos básicos de qualidade questionável. Sem dúvida alguma, essa disparidade é um dos principais motivos para o quadro alarmante de obras inacabadas no país. No mesmo sentido se manifesta Marçal Justen Filho, em relação à importância do projeto na empreitada por preço global e a sua relação com os riscos do particular e da Administração: Outra questão problemática envolve o risco assumido pelo particular. Pretende-se que a empreitada global imporia ao particular o dever de realizar o objeto de modo integral, arcando com todas as variações possíveis. Vale dizer, seriam atribuídos ao contratado os riscos por eventuais eventos supervenientes, que pudessem elevar custos ou importar ônus imprevistos inicialmente. Essa concepção é equivocada, traduz enorme risco para a Administração e infringe os princípios fundamentais da licitação. Como regra geral, a partilha de riscos em contratações administrativas obedece ao princípio geral de que o particular não responde por efeitos decorrentes de força maior, caso fortuito, ato do príncipe, sujeições imprevistas ou fatos imprevisíveis, ou, se previsíveis, de consequências incalculáveis. Assim está denido no art. 65, inc. II, “d”, da Lei 8.666. Daí decorre que a contratação, ainda quando pactuada por empreitada por preço global, não transfere para o contratado os riscos por eventos desconhecidos ou imprevisíveis, não cogitados nem mesmo pela própria Administração. [...] Ora, quando promove a licitação, a Administração necessita cotejar propostas equivalentes, versando sobre a execução do mesmo objeto. Se a Administração não denir precisamente o objeto que será executado, cada licitante adotará interpretação própria e assumirá uma conguração distinta para tanto. Logo, as propostas não serão comparáveis entre si e a Administração não poderá selecionar uma como a mais vantajosa. [...] Uma situação dessa ordem acabaria desaguando em uma de duas alternativas. Poderia imaginar-se que todos os licitantes incluiriam em suas propostas verbas destinadas a fazer face a essas eventualidades. Logo, todas as propostas teriam valor mais elevado. Por resultado, se nenhum esperado viesse a ocorrer, a Administração teria pago valor superior ao necessário. Outra alternativa é que todos ou alguns dos licitantes resolvessem correr o risco e formulassem proposta não comportando imprevistos. Se esses viessem a ocorrer,
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
a execução do objeto se tornaria inviável ou o particular acabaria por adotar execução de péssima qualidade. 106
A discussão a respeito da escolha do regime de execução e suas consequências sempre foi uma constante no processo de contratação de obra pública. Apesar de alguns entendimentos pontuais da jurisprudência, a matéria carecia de uma posição mais robusta e consolidada. Em 2013, o TCU trouxe, nalmente, luz denitiva sobre a questão:
9.1. determinar à Segecex que oriente às unidades técnicas desta Corte a observarem as seguintes disposições em suas scalizações de obras e serviços de engenharia executadas
sob o regime de empreitada por preço global, a serem aplicadas de acordo com as circunstâncias de cada caso concreto: 9.1.1. a escolha do regime de execução contratual pelo gestor deve estar fundamentada nos autos do processo licitatório, em prestígio ao denido no art. 50 da Lei 9.784/99; 9.1.2. os instrumentos convocatórios devem especicar, de forma objetiva, as regras
sobre como serão realizadas as medições, a exemplo de pagamentos após cada etapa
conclusa do empreendimento ou de acordo com o cronograma físico-nanceiro da obra,
em atendimento ao que dispõe o art. 40, inciso XIV, da Lei 8.666/93; 9.1.3. a empreitada por preço global, em regra, em razão de a liquidação de despesas não envolver, necessariamente, a medição unitária dos quantitativos de cada serviço na planilha orçamentária, nos termos do art. 6º, inciso VIII, alínea “a”, da Lei 8.666/93, deve ser adotada quando for possível denir previamente no projeto, com boa margem
de precisão, as quantidades dos serviços a serem posteriormente executados na fase contratual; enquanto que a empreitada por preço unitário deve ser preferida nos casos em que os objetos, por sua natureza, possuam uma imprecisão inerente de quantitativos em seus itens orçamentários, como são os casos de reformas de edicação, obras com grandes
movimentações de terra e interferências, obras de manutenção rodoviária, dentre outras; 9.1.4. nas situações em que, mesmo diante de objeto com imprecisão intrínseca de quantitativos, tal qual asseverado no item 9.1.3. supra, se preferir a utilização da empreitada por preço global, deve ser justicada, no bojo do processo licitatório, a vantagem dessa
transferência maior de riscos para o particular — e, consequentemente, maiores preços ofertados — em termos técnicos, econômicos ou outro objetivamente motivado, bem assim como os impactos decorrentes desses riscos na composição do orçamento da obra, em especial a taxa de BDI – Bonicação e Despesas Indiretas;
9.1.5. a proposta ofertada deverá seguir as quantidades do orçamento-base da licitação, cabendo, no caso da identicação de erros de quantitativos nesse orçamento, proceder-se
a impugnação tempestiva do instrumento convocatório, tal qual assevera o art. 41, §2º, da Lei 8.666/93; 9.1.6. alterações no projeto ou nas especicações da obra ou serviço, em razão do que
dispõe o art. 65, inciso I, alínea “a”, da Lei 8.666/93, como também do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, repercutem na necessidade de prolação de termo aditivo; 9.1.7. quando constatados, após a assinatura do contrato, erros ou omissões no orçamento relativos a pequenas variações quantitativas nos serviços contratados, em regra, pelo fato de o objeto ter sido contratado por “preço certo e total”, não se mostra adequada a prolação de termo aditivo, nos termos do ideal estabelecido no art. 6º, inciso VIII, alínea “a”, da Lei 8.666/93, como ainda na cláusula de expressa concordância do contratado com o projeto básico, prevista no art. 13, inciso II, do Decreto 7.983/2013;
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 137.
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9.1.8. excepcionalmente, de maneira a evitar o enriquecimento sem causa de qualquer das partes, como também para garantia do valor fundamental da melhor proposta e da isonomia, caso, por erro ou omissão no orçamento, se encontrarem subestimativas ou superestimativas relevantes nos quantitativos da planilha orçamentária, poderão ser ajustados termos aditivos para restabelecer a equação econômico-nanceira da avença, situação em que se tomarão os seguintes cuidados: 9.1.8.1. observar se a alteração contratual decorrente não supera ao estabelecido no art. 13, inciso II, do Decreto 7.983/2013, cumulativamente com o respeito aos limites previstos nos §§1º e 2º do art. 65 da Lei 8.666/93, estes últimos, relativos a todos acréscimos e supressões contratuais; 9.1.8.2. examinar se a modicação do ajuste não ensejará a ocorrência do “jogo de planilhas”, com redução injusticada do desconto inicialmente ofertado em relação ao preço base do certame no ato da assinatura do contrato, em prol do que estabelece o art. 14 do Decreto 7.983/2013, como também do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal; 9.1.8.3. avaliar se a correção de quantitativos, bem como a inclusão de serviço omitido, não está compensada por distorções em outros itens contratuais que tornem o valor global da avença compatível com o de mercado; 9.1.8.4. vericar, nas superestimativas relevantes, a redundarem no eventual pagamento do objeto acima do preço de mercado e, consequentemente, em um superfaturamento, se houve a reticação do acordo mediante termo aditivo, em prol do princípio guardado nos arts. 3º, caput c/c art. 6º, inciso IX, alínea “f”; art. 15, §6º; e art. 43, inciso IV, todos da Lei 8.666/93; 9.1.8.5. vericar, nas subestimativas relevantes, em cada caso concreto, a justeza na prolação do termo aditivo rmado, considerando a envergadura do erro em relação ao valor global da avença, em comparação do que seria exigível incluir como risco/ contingência no BDI para o regime de empreitada global, como também da exigibilidade de identicação prévia da falha pelas licitantes — atenuada pelo erro cometido pela própria Administração —, à luz, ainda, dos princípios da vedação ao enriquecimento sem causa, da isonomia, da vinculação ao instrumento convocatório, do dever de licitar, da autotutela, da proporcionalidade, da economicidade, da moralidade, do equilíbrio econômico-nanceiro do contrato e do interesse público primário; 9.1.9. avaliar a conveniência e a oportunidade de, em seu relatório de scalização, propor ao Colegiado, com base no art. 250, inciso III do Regimento Interno do TCU, recomendação à jurisdicionada, para que, doravante, inclua nos editais cláusula a estabelecer, de forma objetiva, o que será objeto de aditamentos durante a execução da avença, bem como a denição do que venha a ser “subestimativas ou superestimativas relevantes”, a que se refere o subitem 9.1.8 supra, como, por exemplo, o estabelecimento de percentuais de tolerância quantitativa admitida em cada item do orçamento que torne descabida a celebração de aditivo, como, ainda, a necessidade de que a imprecisão se rera a serviço materialmente relevante do empreendimento (avaliado de acordo com a metodologia ABC), em prestígio ao princípio da segurança jurídica, como ainda do art. 6º, inciso VIII, alínea “a” c/c art. 47, art. 49 e art. 65, inciso II, alínea “d”, todos da Lei 8.666/93; 9.2. nos contratos executados mediante o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicam-se, no que couber, os entendimentos expressos nesta decisão, por força do disposto no art. 2º, inciso II; art. 8º, §1º; art. 39; art. 45, inciso I, alínea “b” e art. 63, todos da Lei 12.462/2011, como também no Acórdão 1.510/2013-Plenário, mormente no que se refere à necessidade de estabelecer uma matriz de riscos, a explicitar as exatas responsabilidades e encargos a serem assumidos pelos particulares - inclusive no que se refere a erros quantitativos. (TCU. Acórdão nº 1.977/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 05 ago. 2013)
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
O voto condutor do retrocitado acórdão, pelo excelente nível de detalhamento, merece ser destacado para que o leitor perceba os detalhes que diferenciam os regimes de execução: Examino, nesta oportunidade, estudo sobre o regime de empreitada por preço global (EPG) — desenvolvido pela Secretaria de Fiscalização de Obras Aeroportuárias e de Edicação (SecobEdicação) —, com vistas a uniformizar procedimentos de scalização
atinentes a objetos executados mediante o regime de empreitada por preço global, de modo a apresentar diretrizes e orientar os auditores do Tribunal sobre o tema. Julgo de extrema importância a matéria aqui tratada. É sabido que, não raro, a empreitada por preço global, por suas particularidades, quando não assentada em ambiente de regras claras, tem gerado um clima contratual de insegurança, em terreno infértil para abalizar o bom andamento dos contratos e, consequentemente, garantir o sucesso das contratações. A experiência haurida pelas auditorias realizadas por esta Corte em obras e serviços sob esse regime tem identicado tanto o desvirtuamento do instituto (com a medição
como se preço unitário fosse) como também a aplicação distorcida do art. 65 da Lei de Licitações, no que se refere às condições para a prolação de termos aditivos aos contratos. As repercussões vão desde o superfaturamento até o abandono dos contratos, afora os inndáveis litígios judiciais.
Nesse viés, tendo em vista que a jurisprudência do TCU não delineia, com precisão, as regras para aplicação do instituto, de todo oportuno dotar o corpo técnico desta Casa de um instrumento objetivo para melhor subsidiar suas scalizações. Também é salutar, tendo
em vista a contribuição do Tribunal para a melhoria da Administração Pública, orientar os gestores sobre os preceitos e riscos a serem observados nesse tipo de contratação. Feita a contextualização, organizo este voto de modo a desvendar aspectos essenciais para o julgamento da proposta da unidade instrutiva: - caracterização da diferença entre o regime de empreitada global e o regime de empreitada por preços unitários; - identicação dos elementos que motivem, de acordo com as características de cada objeto,
a preferência da adoção de empreitada por preço global, em detrimento da empreitada por preço unitário; - fundamentação dos elementos exigíveis no projeto básico de um e outro instituto; - esclarecimento das condições para a realização de termos aditivos em empreitadas por preço global, tanto no que se refere à eventuais modicações no projeto da obra, como
também quando constatados erros ou omissões no orçamento contratado. Passo a abordar cada item em especíco.
II O primeiro passo, neste deslinde meritório, é denir os regimes. Nos termos do art. 6º,
inciso V, da Lei 8666/93: a) empreitada por preço global – quando se contrata a execução da obra ou do serviço por preço certo e total; b) empreitada por preço unitário – quando se contrata a execução da obra ou do serviço por preço certo de unidades determinadas; A acepção abrigada na Lei de Licitações indica que ambos os institutos destinam-se a contratar a execução de obra ou serviço por “preço certo”, pré-avaliado e de modo judicioso. No preço global, contudo, tal oferta para execução do objeto deve se fazer em razão do todo (preço certo e total), como entidade una; concisa. No preço unitário, tal “preço certo” será realizado em termos de unidades pré-determinadas que compõem esse todo. Intui-se nesse último instituto, pela diferença redacional, que o objeto é visto como
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uma soma de várias parcelas; de frações que, juntas, formarão a unidade. A empreitada por preços unitários é o conjunto de retalhos vistos, cada qual, de maneira individual na contratação, de maneira a formar a totalidade. Na prática, tendo em vista que ambos os regimes podem levar à realização do mesmo objeto, a diferença encontrar-se-á, basicamente, na maneira de como serão realizadas as medições — e nos riscos assumidos pela contratada em razão dessa distinção na forma de pagamento. Nas empreitadas por preço unitário, mede-se cada unidade de serviço e os pagamentos far-se-ão mediante a multiplicação das quantidades executadas pelos seus respectivos preços unitários. O memorial de medições — peça necessária e fundamental para a regular liquidação de despesas — trará, em detalhes, a fundamentação dessas quantidades, para cada item constante do orçamento contratado. Nas empreitadas por preço global, de outro modo, medem-se as etapas de serviço de acordo com o cronograma físico-nanceiro da obra ou mediante as etapas objetivamente
estabelecidas no instrumento convocatório. Em exemplo prático, terminadas as fundações, paga-se o valor global das fundações; feita a estrutura, remunera-se o valor previsto para essa etapa; concluída determinada fase da obra, com marco previamente estipulado, retribui-se o montante correspondente; até chegar ao nal da empreitada, que deverá
corresponder ao valor total ofertado para o objeto como um todo, no ato da licitação (preço certo e total). Trata-se, em consequência, em algum termo, da transferência de imprecisões quantitativas para o particular, como ainda, de um esforço scalizatório menor, no que se refere à vericação em pormenores dos quantitativos de cada serviço. Embora os cuidados com
a qualidade do objeto permaneçam, não se fazem necessárias avaliações meticulosas e individuais de quantidades. Ao executar, por exemplo, um piso cerâmico de uma obra em uma empreitada por preço unitário, uma vez que se contrata um preço por unidades determinadas, pega-se a trena e se mede exatamente o que foi feito. Se as medidas indicarem que se executarem 100,5m², 100,5m² serão pagos (e não 100m²). No preço global, de outro modo, como se contratou a obra por preço certo e total (se não houver modicação de projeto), uma vez que o piso da sala foi feito, remunera-se o previsto em
contrato — ou exatamente 100m². Em verdade, a forma de medir os serviços feitos nas empreitadas globais deve ser precisamente estipulado no instrumento convocatório. Pode-se pactuar que as medições serão realizadas de acordo com o término de determinada etapa da obra (como o piso), ou proporcionalmente ao cronograma físico-nanceiro do empreendimento, sem a necessidade de medir “na trena” cada ligrana realizada. O edital e o instrumento de
contrato devem ser cristalinos acerca de tais critérios; sob pena de o preço global se transformar em um preço unitário, porque, na ausência de regra, os serviços serão medidos um a um. Uma orientação especíca aos auditores quanto a este ponto é cabida, visto que
tal omissão nas licitações são casos comuns. É óbvio, nesse caso, que se o projeto contiver imprecisões relevantes e se tal peça fundamental não abrigar todos os seus elementos exigidos em lei, as empreitadas globais embutem um risco maior para o construtor (como também para administração). Projetos incompletos repercutirão em consequências ainda mais nefastas nas empreitadas globais. É a primeira porta para a celeuma contratual. As contratadas solicitarão aditivos para compensar as omissões orçamentárias. A Administração argumentará que o preço foi contratado para a totalidade, não para a fração. E seguirão todas as mazelas decorrentes desse clima de insegurança. De tal conclusão, tomada a partir dessas eventuais imponderabilidades de quantitativos que os objetos possam carregar intrinsecamente, já se pode intuir em que objetos se faz mais vantajoso se utilizar de um ou de outro regime; o que buscarei explicitar adiante.
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III Existem certos tipos de obras e sistemas construtivos que, por suas características, não possibilitam uma quanticação absolutamente acurada dos exatos volumes a executar.
Há uma imprecisão nata nesses afazeres. São os casos, por exemplo, da execução de grandes volumes de terraplenagem. Quando se compacta um material, o volume in natura é reduzido; e cada solo, em razão de suas características geotécnicas, possui um comportamento diferenciado para essa retração. Tal medida pode ser traduzida por um índice, chamado “fator de contração” ou “fator de homogeneização”. Quanto maior esse índice, mais escavações devem ser feitas para viabilizar a construção dos respectivos aterros. O valor da obra, portanto, é altamente impactado em decorrência dessa particularidade. Em uma jazida de solos é comum existirem vários extratos de material com “fatores de contração” distintos. Quer dizer que, não obstante a realização prévia de ensaios geotécnicos, é inviável oferecer uma acurácia absoluta no projeto. Até porque existe, também, um fator perdas nas operações de transporte (dos cortes para os aterros). Essas perdas, claro, também são relevantemente imprecisas. Sem contar a existência de uma capa orgânica nos cortes (de espessura irregular) imprestável para servir de suporte nos aterros. Quanto maior essa capa, mais escavações serão necessárias. Outra camada supercial no leito dos aterros (mais uma vez de medida indeterminada, a priori) também
deve ser retirada, o que ocasionará mais ou menos volumes de material aterrado para atender as cotas de projeto. Natural concluir que, não obstante os cuidados no projeto básico para adequadamente quanticar os volumes de terraplenagem, sempre haverá uma boa margem de
indeterminação.
Idêntica armativa pode ser imposta em contratos de reforma de edicação. Não há como
prever o exato estado das tubulações no interior dos pisos e paredes, sem antes demoli-las. Em restaurações de prédios históricos, igualmente tortuoso identicar, com antecedência¸
a perfeita quantidade de pisos, portas, esquadrias e janelas a serem totalmente substituídos e quais serão recuperados. Obras urbanas, que intuam interferências diversas, possuirão mesma peculiaridade. Alguns tipos de fundações, principalmente as cravadas, também. Recuperações estruturais e manutenção rodoviária são outro exemplo. Existe uma gama de outras situações. Caso utilizada uma empreitada por preço global nesses tipos de objetos, as medições serão realizadas por etapas; não por quantitativos medidos. Resultado: os construtores irão alocar uma parcela muito alta de risco para adimplir, com segurança, o objeto licitado. Na verdade, essa segurança não existirá, porque o imponderável é muito alto. A melhor proposta para a administração mais se voltará para a aleatoriedade que propriamente a uma boa oferta licitatória. Por esse motivo, nesses empreendimentos eivados de imprecisão congênita, é preferível a utilização de empreitadas por preço unitário, pelas características próprias do sistema de medição. Nisso, concordo inteiramente com as conclusões tomadas pela unidade instrutiva. É essa, também, a inteligência que deve ser extraída do art. 47 da Lei 8.666/93, no que reproduzo in verbis: Art. 47. Nas licitações para a execução de obras e serviços, quando for adotada a modalidade de execução de empreitada por preço global, a Administração deverá fornecer obrigatoriamente, junto com o edital, todos os elementos e informações necessários para que os licitantes possam elaborar suas propostas de preços com total e completo conhecimento do objeto da licitação. Esse completo conhecimento do objeto se faz prejudicado em obras que carreguem uma imprecisão intrínseca e relevante de quantitativos. Daí a preferência pelo preço unitário. Ainda sobre o conteúdo do citado art. 47 da Lei 8.666/93, poderia haver uma compreensão
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(equivocada) de que os projetos básicos elaborados em regimes de empreitada por preço unitário admitiriam um projeto mais simplicado. Tal conotação deve ser veementemente rejeitada. O art. 6º, inciso IX, da Lei de Licitações (como também o art. 2º, inciso IV, da Lei do RDC) em nenhum momento diferencia o projeto básico — em sua denição e em seus elementos fundamentais — para empreitadas globais ou unitárias. Seja em um preço unitário; seja em preço global, aqueles requisitos hão de ser atendidos. Nesse diapasão, alinho-me, em perfeita congruência, aos comentários do professor Marçal Justen Filho (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 14. ed.): O art. 47 formulou disposição de cristalina obviedade e teoricamente dispensável. Em qualquer caso, a Administração tem o dever de detalhar o objeto da licitação e fornecer aos interessados informações completas, que permitam a formulação de propostas perfeitas. Isso se verica não apenas no caso da empreitada por preço global, tema que foi examinado por ocasião da exposição acerca dos arts. 6º, VIII e 10, acima. O dispositivo legal aludido, deste modo, não deve ser interpretado como uma escusa à perfeita delimitação do projeto em empreitadas por preço unitário. A correta leitura é que, em empreendimentos carregados de incertezas, as empreitadas globais, em regra, não se fazem vantajosas. As consequências de um projeto deciente têm potencial lesivo muito maior nessas medições globais. Tal qual consta da obra do Ministro Benjamim Zymler, e do auditor Laureano Canabarro Dios (Regime Diferenciado de Contratação – RDC. Belo Horizonte: Fórum, 2013): Na verdade, a denição dos regimes de execução de obras e serviços de engenharia deve ocorrer de acordo com o objeto a ser contratado. Veja-se a empreitada por preço unitário, a qual é melhor aplicável a situações em que há maiores incertezas acerca dos quantitativos dos serviços mais relevantes¸ como obras que envolvam grandes movimentos de terra, cujas características somente seriam adequadamente denidas quando da execução contratual. [...] Cito, ainda, o Acórdão 3.260/2011-Plenário, de competente relatoria do Ministro José Múcio Monteiro: 9.2.1. embora o regime de empreitada por preços globais tenha previsão explícita da Lei de Licitações e, em razão disso, não se possa considerá-lo propriamente ilegal, as obras de restauração e manutenção rodoviária, por suas características, e considerando o histórico de desalinhamento dos projetos ao art. 47 da Lei nº 8.666/93, não são indicadas para esse regime de contratação. Na busca da maior vantagem, deste modo, ao medir — e pagar — exatamente o que foi realizado, tanto se confere maior segurança para a contratada para oferecer o seu preço, como, em consequência, se aança segurança à administração quanto a certeza na nalização do objeto. Diante disso, neste ponto, creio que se deva orientar as unidades técnicas desta Corte para que observem a motivação da escolha do regime de execução contratual pelos gestores, nos moldes a que discorri. Nas situações em que, mesmo diante de objeto com imprecisão intrínseca de quantitativos, se preferir a utilização da empreitada por preço global — por motivos objetivamente apostos no processo licitatório —, deve ser justicada a vantagem dessa transferência maior de riscos para o particular — e, consequentemente, maiores preços ofertados — em termos técnicos, econômicos, ou outro objetivamente motivado, bem assim como os consequentes impactos decorrentes desses riscos na composição do orçamento da obra, em especial a taxa de BDI – Bonicação e Despesas Indiretas. V Aprecio, neste ponto, um dos temas polêmicos acerca da condução de empreitadas por preço global. Trata-se da viabilidade de deixar a cargo do particular as responsabilidades por modicações do projeto, como ainda de todo e qualquer risco advindo, por exemplo,
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de incertezas provenientes das sondagens; ou da inviabilidade de utilização de jazidas, areais e pedreiras; ou da assunção de erros de projetos sem a respectiva contraprestação econômica devida. Existem situações clássicas, como a dúvida acerca da necessidade de rever o contrato quando, de ofício, o particular modica alguma solução previamente estabelecida no projeto básico do empreendimento. Em caso ilustrativo, se existisse a liberdade de o particular idealizar solução de fundação distinta, ou modelo estrutural diferente, sem que haja modicação da avença, poder-se-ia intuir que, por se tratar de preço global, os meios para atingir aquele objetivo cariam a cargo da empreiteira, não devendo a Administração imiscuir-se nesses assuntos, no que se refere ao quantum remuneratório devido. A Lei, entretanto, não diferencia as empreitadas por preço unitário das globais quando dene as situações que ensejarão a prolação de termo aditivo. Ao contrário, caso se tratar de fato respectivo à álea extraordinária ou extracontratual, denida com precisão no art. 65 da Lei 8.666/93, haverá de se providenciar a revisão do contrato. O equilíbrio entre os encargos e a justa remuneração denida no ato da contratação tem suporte constitucional. Disposição contratual até poderia xar que esses riscos e responsabilidades seriam do particular. Os resultados dessa regra, contudo, têm altíssimo potencial de ofender princípios fulcrais licitatórios. O poder público estaria exposto a riscos concretos de desvirtuamento do procedimento concorrencial. Trago, mais uma vez, os comentários de Marçal Justen Filho (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 14. ed.): [...] Tem sido extremamente comum o edital estabelecer que incumbirá ao particular arcar com os riscos do empreendimento, em licitações relativas à execução por preço global. Por decorrência, introduz-se uma espécie de aleatoriedade incompatível com a contratação administrativa de obras e serviços. Isto é tanto mais sério quando a Administração conhece, de antemão, as peculiaridades do objeto. Em tais hipóteses, surge enorme risco de desvios éticos. É que a informação acerca das diculdades do objeto torna-se de fundamental relevância para a elaboração da proposta. Quem dispuser das informações será o vencedor da licitação, eis que poderá formular o menor preço, com menores riscos. Já os terceiros, desconhecendo a extensão dos possíveis encargos, acabarão por agregar valores a suas propostas. Acabarão derrotados. Essa seria uma porta para a Administração direcionar indevidamente a licitação. [...] A Administração tem o dever de apurar todas as circunstâncias que possam inuenciar na execução do futuro contrato, especialmente quando a empreitada for por preço global. É nulo o edital que albergue fatores ocultos ou aleatórios acerca da execução do objeto licitado. Em todo caso, não é porque se trata de empreitada por preço global que deixa de incidir a proteção constitucional do equilíbrio econômico-nanceiro aos respectivos contratos. Em outro trecho da publicação: [...] Seria bastante simples obter esse resultado reprovável através do expediente da “empreitada por preço global”. Para tanto, é necessário que a Administração conheça todas as características do objeto e tenha noção de todos os custos. No entanto, formula edital com objeto geral e mal denido, impondo aos licitantes o dever de arcar com todos os riscos. Depois, fornece ao apadrinhado todos os dados acerca da execução do objeto. Por decorrência, todos os demais licitantes serão obrigados a considerar riscos inexistentes ou situações imponderáveis. Logo, suas propostas serão muito mais elevadas. O licitante favorecido, ao contrário, formulará proposta contendo apenas os valores necessários a executar aquilo que a Administração já sabia, de antemão, ser necessário. Daí, o licitante protegido sairá vencedor, por formular a menor proposta. Frise-se que, se todos os demais licitantes tivessem tido acesso às mesmas informações, a Administração poderia ter recebido propostas ainda menores.
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Caso não estipulada condição contratual diversa, alterações de projeto — devidamente motivadas, diante dos riscos aos quais expus — vinculam a aplicação do art. 65 da Lei 8.666/93. No m das contas, a alteração do projeto será um ato unilateral. Além do mais, deve haver um fato novo a caracterizar álea extraordinária e extracontratual. Mesmo que se demonstre existir solução de engenharia melhor que a denida no projeto básico (o que seria questionável, em termos de eciência e economicidade exigidas nessa peça fundamental), tal condição deve ser entendida como novidade, não passível de conhecimento prévio na fase licitatória. Havendo modicação das especicações a que foi dado conhecimento a todos os licitantes, há de se rever o contrato, tanto em proteção a princípios basilares como o da obtenção da melhor proposta, da isonomia e da moralidade. Deste modo, creio que se deva claricar às unidades deste Tribunal que modicações de projeto ou especicações da obra ou serviço, em razão do que dispõe o art. 65, inciso I, alínea “a”, da Lei 8.666/93, combinado com o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, repercutem na necessidade de prolação de termo aditivo. Mesma conclusão chegou o Plenum do TCU ao julgar os Acórdãos 3.260/2011 e 93/2009. VI Sem dúvida, o ponto mais controverso sobre a prática contratual nas empreitadas globais encontra-se na discussão sobre a viabilidade de prolação de termo aditivo em casos de erros ou omissões do orçamento. Discute-se, se, nesse regime, a contratada é automaticamente responsável por todo e qualquer risco proveniente de erros de quanticação de serviços no projeto básico. Se a armativa for correta, mesmo que se constate, durante a execução contratual, que determinado serviço foi sub ou superavaliado, o particular (ou o ente público, conforme o caso) deve assumir o ônus dessa omissão (ou se beneciar dela), tendo em vista que a contratação foi ajustada para preço certo e total. A unidade instrutiva entende que, em extrato, se a falha for de pequena monta, tendo em vista o que dispõe o art. 6º, inciso VIII, alínea “a”, nenhum aditivo seria devido. Caso contrário, a empreitada por preço global iria se transformar em uma empreitada por preço unitário, caindo em letra morta na lei — em desarranjo com a boa hermenêutica. Por justeza, todos os outros serviços haveriam de passar pela mesma “auditoria”, e as medições seriam realizadas uma a uma. Por outro lado, ainda segundo o relatório prévio, quando os erros forem relevantes, no intuito de não inviabilizar a continuidade do contrato, as condições contratuais poderiam ser revistas. Nessa hipótese, em uma visão proporcional, as imprecisões em diferentes itens da planilha não poderiam se compensar. Os limites de aditamento estabelecidos no art. 65, §1º da Lei 8.666/93 e no art. 102 da LDO (10% para erros ou omissões e empreitadas globais) igualmente haveriam de ser respeitados. Existe, em paralelo, a proposta de tolerar aditivos unicamente em casos de fatos imprevisíveis, inclusive no que se refere à “impossibilidade de o licitante constatar as eventuais discrepâncias de quantidades com base nos elementos presentes no projeto básico”. De maneira sintética, a proposta redundaria em uma objetivação de que, se o erro não for “constatável” previamente e for superior ao percentual de risco estabelecido no BDI, haverá de se prolatar o aditivo, desde que não haja compensação com outros itens e desde que não extrapolados os limites contratuais. Passo, então, a ajuizar os fundamentos da proposta. A dicotomia em questão está em balancear a idealização da empreitada global com a vedação do enriquecimento sem causa. Não seria concebível que falhas na elaboração do edital redundem, com justa causa, em um superfaturamento. Tampouco a Administração poderia se beneciar de erro que ela própria cometeu, pagando por um produto preço relevantemente inferior que o seu justo preço de mercado. Erro preliminar da própria Administração, independentemente do tipo de empreitada, não pode redundar em ganhos
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ilícitos; porque se ilícito for, o enriquecimento de uma parte, em detrimento de outra, sem causa jurídica válida, faz-se vedado. A depender do “erro”, não obstante a assunção de riscos quantitativos pela contratada (decorrente pela própria forma global de medição), pode haver um vício intransponível no edital, a ser necessariamente corrigido. Erro não é sinônimo de imprecisão (esta sim tida como álea ordinária nas empreitadas globais). Procurarei aclarar a questão ao aplicar, supletivamente, a teoria geral dos contratos. Segundo o art. 884 da Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro): Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Analiso, pois, essa “justa causa” ou “causa jurídica válida”. Não haverá enriquecimento ilícito se houver razão lícita que fundamente o ganho. E a legitimidade de qualquer contrato perpassa pela livre manifestação de vontade — sempre pautada pela boa-fé. Se materializado um vício nesse requisito subjetivo de livre manifestação de vontade, o acordo pode estar fadado à anulação. Em aplicação direta ao que se discute, quando identicado um erro hábil a induzir a uma noção inexata sobre o negócio, que, se constatado anteriormente, inuenciaria nessa “livre manifestação de vontade”, o próprio desiderato da avença é maculado — aquilo que deu causa ao ajuste. Se estivesse expresso que, na verdade, os encargos para o adimplemento do contrato eram superiores, a vontade poderia ser expressa de outro modo; e a oferta poderia ser outra. Como ensina Sílvio de Salvo Venosa ( Direito Civil: parte geral. São Paulo: Atlas, 2004. p. 433-436): O erro manifesta-se mediante compreensão psíquica errônea da realidade, ou seja, a incorreta interpretação de um fato [...]. O primeiro vício de consentimento é o erro, com as mesmas consequências da ignorância. Trata-se de manifestação de vontade em desacordo com a realidade, quer porque o declarante a desconhece (ignorância), quer porque tem representação errônea dessa realidade (erro) [...]. Quando o agente paga preço desproporcional ao real valor da coisa, sob certas circunstâncias, estaremos perante hipótese de lesão [...]. Esses vícios afetam a vontade intrínseca do agente e a manifestação de vontade é viciada. Se não existisse uma dessas determinantes, o declarante teria agido de outro modo ou talvez nem mesmo realizado o negócio. Consta, ainda, do art. 138 do Código Civil: Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio. Um erro é substancial quando tem papel preponderante na formação de vontade. Caso se soubesse a verdadeira natureza do negócio, o acordo seria realizado sob outra égide. É o caso de falhas na denição das qualidades essenciais do objeto; ou que possam inuir de maneira relevante na formação de vontades (art. 130 do CCB). Ao contrário, o erro acidental diz respeito à qualidades secundárias; acessórias. Por isso, não conduz à anulação do negócio jurídico, porque, “além de não incidir especicamente sobre a declaração de vontade, não possui relevância econômica” (Kumpel, Vitor Frederico. Direito Civil, direito dos contratos , 3. São Paulo: Saraiva 2008). O erro substancial, entretanto, para que se possa pensar na anulabilidade do trato, deve atravessar um juízo de escusabilidade; qualquer pessoa normal poderia ter cometido (parte nal do art. 138 do Código Civil). Aplica-se, aqui, o princípio da boa-fé objetiva. Novamente citando Sílvio Venosa, “o erro grosseiro, facilmente perceptível pelo comum dos homens, não pode ser idôneo para autorizar a anulação do ato. O princípio geral é do homem médio. Trata-se do conceito do homem médio para o caso concreto. Assim,
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poderá ser anulável o negócio para um leigo em um negócio, para o qual admitiria o erro de um técnico na matéria”. Essa teoria geral tem perfeita incidência com o que se discute. Erros relevantes (substanciais) na informação disponibilizada aos licitantes têm o potencial de anular o certame, tanto pela indução errônea acerca da real dimensão do objeto, como pela consequência mediata de não conduzir à “melhor oferta”, objetivo primordial de qualquer licitação. Na realidade, aquele erro, se constatado tempestivamente antes da abertura dos envelopes, levaria à alteração compulsória da planilha orçamentária, com reabertura de prazo aos concorrentes, em poder de autotutela, para reavaliarem o seu preço (art. 53 da Lei 9.784/99 e art. 21, §4º c/c art. 49 da Lei de Licitações). Quando identicado, durante a execução contratual, para convalidação desse vício, um aditivo contratual faz-se cabível (art. 55 da Lei 9.784/99). Pequenos lapsos na quanticação dos serviços (até certo ponto comum, visto que cada orçamentista não apresentaria, nas vírgulas, quantidades idênticas), levando em conta a característica das empreitadas globais — em estabelecer imprecisões quantitativas como álea ordinária da contratada —, não conduzem à mácula no procedimento licitatório, tanto por não afetar essa “livre manifestação de vontade”, como, principalmente, por não inviabilizarem a obtenção da “melhor proposta”. Tal visão também se harmoniza com a teoria administrativa, em sobrelevar o que pode ser chamado de “fato novo”, legítimo para ensejar a revisão contratual, capaz de sanear — ou convalidar — aquela anulabilidade. Se aquele erro praticado pela Administração não podia ser percebido pela empresa média, pode-se classicá-lo como evento posterior, em álea extraordinária, não derivado de conduta culposa do particular, em congruência com a teoria de imprevisão. A aplicação do art. 65 da Lei de Licitações, em densicação ao disposto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, faz-se compulsória. Segundo Marçal Justen Filho, em publicação já citada: O restabelecimento da equação econômico-nanceira depende da concretização de um evento posterior à formulação da proposta, identicável como causa do agravamento da posição do particular. Não basta a simples insuciência da remuneração [...]. A tutela à equação econômico-nanceira não visa a que o particular formule proposta exageradamente baixa e, após vitorioso, pleiteie elevação da remuneração. Exige-se, ademais, que a elevação dos encargos não derive de conduta culposa imputável ao particular. Se os encargos tornaram-se mais elevados porque o particular atou mal, não fará jus à alteração de sua remuneração. [...] De toda essa digressão, resume-se que, de pequenos erros quantitativos, não decorrerão termos aditivos em empreitadas globais, por se tratarem de erros acidentais, incapazes de interferir na formação de vontades e, principalmente, na formação de proposta a ser ofertada, a ser tida como a mais vantajosa. Indicação contrária também tornaria o regime de empreitada global em desuso, posto que, na prática, toda obra seria executada como se preço unitário fosse. Erros de materialidade relevante (por erros substanciais) sujeitam-se a um juízo acurado de valor, que envolverá, também, além das consequências nanceiras — em termos de materialidade — a avaliação culposa da contratante, em um juízo de boa-fé objetiva. Na realidade, quando a Administração erra ao subestimar consideravelmente as quantidades (e consequentemente, preços), a ponderação acerca da nulidade da relação contratual — a ser eventualmente convalidada via termo aditivo — deve se pautar pela exigibilidade da percepção da falha pela parte lesada (a contratada); até mesmo para evitar um dolo negativo do particular, com o objetivo de obter proveito próprio. Não signica dizer, em paralelismo, que se detectadas superestimativas relevantes, consideradas imperceptíveis às licitantes — e, portanto, com ausência de culpa do particular — não estaria evidenciada nulidade (a “autorizar o superfaturamento”). Nesses casos,
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aplicam-se imperativamente outros princípios fundamentais do direito público (como o da economicidade e o da obtenção da maior vantagem). O erro do agente da Administração pode ser considerado inescusável, em seu dever de moderar a contratação sob os preços de mercado. Nesta situação, o contrato superfaturado seria uma nulidade a ser corrigida de forma imediata. Existem, ainda, outras questões. Mesmo em caso de evidência de culpa do particular nas subestimativas, afora a imprecisão na avaliação dessa responsabilidade, existe a culpa concorrente da Administração. Em atenuante, a própria administração incorreu no erro, como também todos os outros licitantes que não impugnaram o edital. Ademais — e isso é o mais importante — a avaliação de nulidade deve tocar, primeiro, no interesse público primário a ser tutelado. Não se admitiria interromper um ajuste, mesmo se constatada a obviedade do erro, em casos onde exista prejuízo maior de patrimônio ou à vida das pessoas. Pode estar em jogo, também, a própria continuidade do serviço público; ou interesses secundários superiores. Não é uma equação simples. Na verdade, em razão dessas inúmeras interveniências, cada caso concreto apresentará solução distinta. Creio ser tarefa hercúlea positivar as quase infnitas possibilidades desse mundo real.
Justamente para facilitar esse juízo e de modo a conferir segurança jurídica aos contratos é que entendo que os instrumentos convocatórios devem explicitar, com precisão, o que virá a ser intitulado como “erro substancial”. Creio que a ausência dessas disposições seja o motivo dos infndáveis litígios administrativos e judiciais envolvendo empreitadas
por preço global. Em exemplo, os contratos podem, com simplicidade, objetivar que erros unitários de quantidade de até 10% não sejam objeto de qualquer revisão. Menos que isso, esses erros acidentais serão álea ordinária da contratada. Para que não haja incontáveis pedidos de reequilíbrio decorrentes de serviços de pequena monta, pode-se, ainda, defnir que somente
serviços de materialidade relevante na curva ABC do empreendimento incorrerão como tarja de “erro relevante”. Mantém, assim, a lógica da medição por preço global, ao mesmo tempo em que se veda o enriquecimento sem causa de qualquer das partes, sem ferir o princípio fundamental da obtenção da melhor proposta. Situação parecida foi tomada por esta Corte ao apreciar o Acórdão 2.929/2010-Plenário, quando julgou regular cláusula semelhante. Acredito que outras soluções sejam possíveis. Prefro esse regramento objetivo, a ser estabelecido pela própria Administração, que a proposta da SecobEdifcação em defnir, genericamente, que erros substanciais serão os
que ultrapassarem as previsões de contingências e riscos no BDI das contratadas. Bastaria o particular cuidadoso, por exemplo, superestimar a sua administração central, ou mesmo seus custos diretos, de maneira a diminuir ao máximo seus lucro e contingências formais declarados. A tolerância seria menor para justifcar revisões. Na prática, estaria se criando
outro problema. Também não julgo adequada a regra universal, recorrentemente observada em auditorias, de que “todo e qualquer erro será risco da contratada”. Tal opção, avalio, não é a que mais atende o interesse público, por menos garantir a “melhor proposta” como resultado do certame. Tais falhas capitais implicam a apresentação de preços para uma obra desvinculada do objeto real pretendido. O valor ofertado deve se referir ao empreendimento almejado, não ao negócio fctício licitado. Ademais, pelo que discorri, haveria dúvidas quanto à
legalidade da licitação feita sob esse erro substancial. Se ignorada a boa-fé objetiva, em avaliação do licitante médio e diligente, tal cláusula carregaria conteúdo de lesividade que, por excessiva, também se predisporia à anulação. E não se alegue que os “quantitativos reais” jaziam nas pranchas gráfcas disponíveis
aos licitantes. O poder público, na fase interna da licitação, dispôs de meses para avaliar corretamente as quantidades. Não se pretenda que, em alguns dias, em empreendimentos que não raramente ultrapassam a centena de milhões de reais, os particulares tenham as
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mesmas condições de devassar os quantitativos tal qual os gestores poderiam fazê-lo. Existe, no mínimo, uma indução ao erro, a pesar nessa avaliação de boa-fé objetiva. A assunção desmedida de riscos provenientes de erros tampouco se faz interessante para o poder público. Constatada a omissão na avaliação de fração fundamental da obra, o empreiteiro pode não ter condições nanceiras de adimplir o contrato. A “quebra” da licitante não é boa para a Administração, que também errou na avaliação daquela parcela importante da obra. Decorrerão, afora o atraso ou a paralisação da obra, inndáveis litígios judiciais. O contrato administrativo não deve, anal, ser um joguete em que o licitante que primeiro encontrar o erro sagrar-se-á vencedor. Um ambiente de justeza e segurança inibe os chamados aventureiros; em outra mão, atrai boas empresas, aptas a atenderem o chamamento licitatório com seriedade e responsabilidade. Somente nos casos concretos em que os editais não estabeleçam essas regras é que a equipe de scalização procederá, em uma valoração justa, a licitude da prolação do termo aditivo. Sem prejuízo de noticar o órgão licitante que tais parâmetros se fazem compulsórios. O juízo de valor nas subestimativas incluirá a envergadura do erro em relação ao valor global da avença, em comparação do que seria exigível incluir como risco/contingência em uma proposta para o regime de empreitada global, como também da exigibilidade de identicação prévia da falha pelas licitantes, à luz, ainda, dos princípios da vedação ao enriquecimento sem causa, da isonomia, da vinculação ao instrumento convocatório, do dever de licitar, da autotutela, da proporcionalidade, da economicidade, da moralidade, do equilíbrio econômico-nanceiro do contrato e do interesse público primário. Por esse motivo, no essencial, ponho-me de acordo com a proposta da unidade técnica, ressalvando que a regra deva ser o estabelecimento objetivo, em matriz de riscos adequada, da tolerância de erro quantitativo a ser admitida. Quando omisso o regramento no edital, a equipe de scalização deve noticar os gestores para que, doravante, as disponha, em prestígio à segurança jurídica, à isonomia, e a obtenção da melhor proposta. VII Termino ao comentar o impacto dos entendimentos aqui tratados em licitações regidas pelo Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), a que se refere a Lei 12.462/2011. Por força do disposto no art. 2º, inciso II; no art. 8º, §1º; no art. 39; no art. 45, inciso I, alínea “b” e no art. 63, todos da Lei 12.462/2011, a decisão prolatada tem inteira aplicação com o novo instituto. Faço um parêntese, apenas, para comentar o regime de contratação integrada em que, compulsoriamente, é aplicado o preço global. Como disse, em obras que carreguem uma imprecisão intrínseca de quantidades, é preferível a utilização do preço unitário, em razão da majoração relevante dos riscos a que estaria exposta a contratada. Existe na contratação integrada, entretanto, outros objetivos e vantagens. Como inscrito no voto condutor do Acórdão 1.510/2013-Plenário, de minha relatoria, “as características do objeto devem permitir que haja a real competição entre as contratadas para a concepção de metodologias/tecnologias distintas, que levem a soluções capazes de serem aproveitadas vantajosamente pelo Poder Público”. Ainda, “Os ganhos advindos da utilização da contratação integrada devem compensar esse maior direcionamento de riscos aos particulares. Essa demonstração é o cerne para a motivação da vantagem para utilizar o novo regime”. Signica que, não obstante essa maior assunção de riscos, mesmo em objetos imprecisos, caso se demonstre a vantagem de transferir as soluções e metodologias construtivas à contratada, em termos técnicos e econômicos, não está automaticamente descartada a utilização dessa nova modalidade contratual. Caberão, no entanto, todas as ressalvas
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
— com ainda mais gravame — no que se refere à objetivação dos riscos com relação a imprecisões de projeto (no caso anteprojeto), como também às demais responsabilidades a serem suportadas pelo particular.
Já a empreitada por preço integral é caracterizada pela “abrangência da prestação imposta ao contratado, que tem o dever de executar e entregar um ‘empreendimento’ em sua integralidade, pronto, acabado e em condições de funcionamento”. É reco107
mendável que haja detalhado estudo preliminar que justique a vantagem da opção por
esse tipo de regime, visto que, em regra, o parcelamento da contratação traz maiores benefícios econômicos ao erário.
7.5.3 Forma e limite para pagamento A elaboração da proposta de preços pelos licitantes está vinculada às condições de pagamento estabelecidas pela Administração. Por esse motivo, o art. 40, XIV, estabelece como requisito obrigatório do edital a denição dessas condições: a) prazo de pagamento não superior a trinta dias, contado a partir da data nal
do período de adimplemento de cada parcela: condição importante para o
estabelecimento dos custos nanceiros a serem inseridos no BDI da proposta,
visto que quanto mais longo o prazo, maior a incidência desses custos; b) cronograma de desembolso máximo por período, em conformidade com a disponibilidade de recursos nanceiros: demonstrativo que possibilita
à contratada planejar o andamento dos serviços em consonância com a disponibilidade nanceira da Administração, de forma a reduzir os custos nanceiros e apresentar proposta mais vantajosa; c) critério de atualização nanceira dos valores a serem pagos, desde a data nal
do período de adimplemento de cada parcela até a data do efetivo pagamento; d) compensações nanceiras, penalizações por eventuais atrasos e descontos
por eventuais antecipações de pagamentos: regra importante que estabelece a previsão de ajustes dos valores em face de ocorrências que fogem ao andamento normal do contrato; e) exigência de seguros, quando for o caso.
7.5.4 Prazos de execução e vigência dos contratos O art. 57 da lei de licitações estabelece que a duração dos contratos administrativos “cará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos
relativos: I - aos projetos cujos produtos estejam contemplados nas metas estabelecidas no Plano Plurianual, os quais poderão ser prorrogados se houver interesse da Administração e desde que isso tenha sido previsto no ato convocatório; e II - à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses”.
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 138.
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Sobre o assunto, o TCU deniu: Torna-se, em princípio, indispensável a xação de limites de vigência dos contratos administrativos, de forma que o tempo não comprometa as condições originais da avença, não havendo, entretanto, obstáculo jurídico à devolução de prazo, quando a Administração mesma concorre, em virtude da própria natureza do avençado, para interrupção da sua execução pelo contratante. (TCU. Súmula nº 191. DOU , 09 nov. 1982) A prorrogação de prazo fundamentado no art. 57, inciso II, da Lei 8.666, pode ser efetuada, desde que com a nalidade de garantir preços e condições mais vantajosas à Administração, acompanhada das devidas motivações, em consonância com o interesse público e o princípio da economicidade. (TCU. Acórdão nº 1.626/07, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 17 ago. 2007)
Em primeiro lugar, vale diferenciar os contratos por prazo certo e por escopo. O primeiro, caso dos serviços contínuos, tem o nal de sua execução em face do decurso do prazo inicialmente estabelecido; o segundo, ilustrado pelas obras públicas, só é encerrado quando a Administração recebe o objeto pactuado. O prazo de vigência do contrato situa-se no intervalo de tempo em que ele está apto a produzir efeitos, ou seja, da publicação do extrato no Diário Ocial até o recebimento denitivo e solução de todas as pendências. O prazo de execução compreende o período em que o contratado se compromete a executar o objeto. Na maioria das vezes, principalmente em obras públicas, o prazo de vigência é superior ao de execução: no início do empreendimento, a ordem de serviço autoriza, em regra, a entrada da empresa no canteiro após a publicação do extrato do contrato; no nal, as pendências relativas à liberação de garantias, por exemplo, são posteriores à efetiva entrega da obra pela empreiteira. Importa notar, para o caso das obras públicas, que a ausência de conclusão do empreendimento no prazo pactuado não acarreta a extinção automática do contrato, visto ser uma contratação por escopo. O TCU ilustra com clareza essa matéria: 33. Nessa linha, a jurisprudência do Tribunal tem-se manifestado no sentido de permitir a retomada ou o prosseguimento de contratos quando sua inexecução é provocada pela Administração, como no presente caso, decorrente da descontinuidade de liberação de recursos orçamentários. Pode-se aplicar a interpretação de que a contratada adquiriu o direito de executar o objeto pactuado, tendo sido impedida por motivos aos quais não deu causa. Analisando o aspecto da vigência do contrato, deve-se entender que o prazo está vinculado também à conclusão do objeto, e não somente ao decurso do tempo. 34. Citem-se decisões do Tribunal em que a questão formal do prazo de vigência dos contratos foi suplantada em virtude de circunstâncias materiais: TC 925.214/1998-1 - Decisão 732/1999 - Plenário - Voto do Relator, Ministro Bento Bugarin: “No entanto, ao meu ver, inexistindo motivos para sua rescisão ou anulação, a extinção de contrato pelo término de seu prazo somente se opera nos ajustes celebrados por tempo determinado, nos quais o prazo constitui elemento essencial e imprescindível para a consecução ou ecácia do objeto avençado, o que não é o caso do contrato rmado pelo DER/MG, no qual a execução da obra é o seu objetivo principal. Dessa forma, não havendo motivos para a cessação prévia do ajuste, a extinção do contrato rmado com o DER/MG operar-se-ia apenas com a conclusão de seu objeto e recebimento pela Administração, o que ainda não ocorreu”. TC 005.296/2002-1 - Acórdão 1740/2003 - Plenário - Relatório do Ministro Marcos Vinícius Vilaça:
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
“d) O Contrato PG-022/93-00 foi objeto de 15 (quinze) Termos Aditivos, vericando-se que, destes, 11 referem-se a Suspensão de Prazo Contratual / Devolução de Prazo Contratual; todos causados por descontinuidade de liberação de recursos orçamentários/nanceiros;
1 refere-se à conversão de padrão monetário; 2 referem-se à prorrogação de prazo contratual e 1 refere-se a aumento de valor contratual, com inclusão de novos preços unitários, para serviços não constantes na planilha contratual”.
TC 008.151/94 - Decisão 606/1996 – Plenário - Voto do Relator, Ministro Paulo Aonso
Martins de Oliveira: “A bem da verdade, impende frisar que a questão do prazo máximo de duração dos contratos previsto nas normas atinentes à licitação e contratos sempre se operou, no que diz respeito à construção de obras e serviços de engenharia, computando-se, para efeito de contagem do tempo, as devoluções das interrupções de responsabilidade da Administração, que via de regra patrocina as tão conhecidas e combatidas ‘obras
paralisadas ou inacabadas’, muitas vezes fruto da insuciência de dotação orçamentária gerada pelos constantes contingenciamentos de recursos feitos pelo Governo Federal”. 35. Por m, há que se considerar que as decisões de retomar os contratos originariamente rmados quando da continuidade às obras, tanto para alteração do projeto arquitetônico
quanto para construção da cobertura espacial, não visaram obtenção de vantagens
injusticadas, foram acompanhados de pesquisa de preço e buscaram fundamento legal
junto ao setor jurídico da Companhia, demonstrando a boa-fé dos responsáveis. Ante todo o exposto, considero justicadas as ocorrências. (TCU. Acórdão nº 1.980/04, 1ª Câmara.
Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 19 ago. 2004)
A denição do prazo de execução do empreendimento, ao qual se refere o art.
57 da Lei nº 8.666/93, deve considerar a melhor relação benefício/custo da implantação da obra. Quanto menor o prazo para conclusão, mais rápida será a utilização do empreendimento e, consequentemente, maiores serão os benefícios. Contudo, a redução do prazo poderá ensejar a adoção de metodologias executivas mais dispendiosas, pagamento de horas extras e noturnas, o que ocasionará o incremento do custo. A análise deverá constar dos estudos de viabilidade e do projeto básico, a m de demonstrar
a solução que melhor atenda ao interesse público. Em relação a essa questão, o TCU formulou recomendação a órgão federal para que:
[...] dimensione os prazos contratuais considerando a eciência em função da possibilidade
da redução de custos pela sua diluição no tempo, em especial a amortização de equipamentos, em confronto com outros fatores de natureza estratégica, respeitando-se os limites inscritos no art. 57, inciso II, da Lei nº 8.666/1993. (TCU. Acórdão nº 1.529/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 30 ago. 2006) Os prazos também deverão ser xados de forma a evitar datas de término muito além das previstas para o recebimento denitivo do objeto, consoante manifestação
do TCU:
[...] determinar à [...] que se abstenha de rmar contratos de fornecimento com vigência
determinada em função do prazo de garantia técnica dos bens e/ou materiais, de modo a evitar instrumentos com datas muito além da prevista para recebimento denitivo do
objeto, adequando os prazos de vigência para conciliá-los com as datas de execução,
entrega, observação e recebimento denitivo do objeto contratual, conforme o caso, nos
termos do art. 55, inciso IV, da Lei nº 8.666/93, devendo ser observado, ainda, o disposto no art. 57, da mesma Lei. (TCU. Acórdão nº 997/02, Plenário. Rel. Min.Ubiratan Aguiar. , 16 ago. 2002) DOU
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Por m, “a vigência dos contratos regidos pelo art. 57, caput , da lei 8.666, de 1993, pode ultrapassar o exercício nanceiro em que celebrados, desde que as despesas a eles referentes sejam integralmente empenhadas até 31 de dezembro, permitindo-se, assim, sua inscrição em restos a pagar” (AGU. Orientação Normativa nº 39. DOU , 14 dez. 2011).
7.5.5 Garantias As garantias poderão ser exigidas apenas se estiverem previstas no instrumento convocatório (art. 56 da Lei nº 8.666/93), ou seja, é importante que autoridade competente avalie as condições de execução do empreendimento e estabeleça o valor a ser exigido, respeitado os seguintes limites: a) 5%, em regra, para a execução de obras e serviços de engenharia; ou b) 10% para obras, serviços e fornecimentos de grande vulto envolvendo alta complexidade técnica e riscos nanceiros consideráveis, demonstrados através de parecer tecnicamente aprovado pela autoridade competente. Caberá ao contratado a opção por uma das modalidades previstas em lei que deverão ser liberadas ou restituídas após a execução do contrato e, quando em dinheiro, atualizada monetariamente: I - caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública, devendo estes ter sido emitidos sob a forma escritural, mediante registro em sistema centralizado de liquidação e de custódia autorizado pelo Banco Central do Brasil e avaliados pelos seus valores econômicos, conforme denido pelo Ministério da Fazenda; II - seguro-garantia; III - ança bancária. (§1º do art. 56 da Lei nº 8.666/93)
O seguro-garantia tem sido o preferido pelos licitantes, consoante Marçal Justen Filho: O seguro-garantia passou a ter grande relevo, na medida em que seu custo passou a ser menor do que o das demais modalidades previstas no elenco do art. 56. Como decorrência, difundiu-se a opção dos interessados pelo seguro-garantia. Ressalte-se, no entanto, que a aceitabilidade do seguro-garantia depende da capacitação econômico-nanceira da seguradora e da observância das regras própria do setor de seguros. Essa advertência é fundamental porque o valor do seguro-garantia pode superar os limites da capacidade de determinada seguradora. Em outros casos, a dimensão do risco pode acarretar a necessidade de a seguradora obter o resseguro perante outras entidades – o que é imposto pela regulação setorial produzida pela SUSEP. 108
7.5.6 Possibilidade de subcontratação O art. 72 da lei de licitações estabelece a possibilidade de subcontratação de partes da obra, serviço ou fornecimento, até o limite admitido, em cada caso, pela Administração. Esse limite será xado no instrumento convocatório.
108
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 825.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Apesar da subcontratação não eximir o contratado de suas responsabilidades contratuais e legais, é importante que a Administração se resguarde de eventuais abusos nesse processo, até mesmo pelo fato de que o licitante foi aquele que efetivamente demonstrou a capacidade técnica para a execução do objeto. No Capítulo 10 deste livro, serão detalhadas questões operacionais importantes afetas à subcontratação no momento de execução da obra. Outra questão relevante é que a subcontratação de percentual expressivo do empreendimento pode caracterizar uma “cessão” de direitos do contrato ou, ainda, acobertar negócios proibidos, seja pelo ajuste prévio entre empresas, seja pela participação de agente que teve sua atuação vedada na licitação pela lei. Nesse sentido, o TCU formulou a seguinte determinação a órgão público para que: [...] inclua cláusula estabelecendo que as empresas subcontratadas também devem comprovar, perante a Autarquia, que estão em situação regular fscal e previdenciária
e que entre seus diretores, responsáveis técnicos ou sócios não constam funcionários, empregados ou ocupante de cargo comissionado no órgão contratante. (TCU. Acórdão nº 1.529/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 30 ago. 2006)
Com efeito, considerando a realidade do mercado, é aceitável que seja prevista no edital a hipótese de haver subcontratação da obra em percentual razoável, desde que autorizada pela Administração. Interessante inovação em relação ao tema foi trazida pela Lei Complementar nº 123, que inseriu, para microempresa ou empresa de pequeno porte, a possibilidade da exigência de subcontratação em até 30% do total licitado ou de estabelecimento de cota de até 25% do objeto em certames para a aquisição de bens e serviços de natureza divisível. Algumas considerações importantes e complementares a respeito da matéria foram registradas no Capítulo 10 deste livro, item 10.8. 109
7.5.7 Minuta do contrato A lei de licitações se refere à necessidade da minuta do contrato integrar o edital nos artigos 40, §2º, III, e 62, §1º, e exige prévio exame e aprovação por assessoria jurídica da Administração no art. 38. A referida minuta deverá contemplar todos os elementos previstos no art. 55 da lei de licitações como, por exemplo: o objeto e seus elementos característicos; o regime 109
“Art. 48. Para o cumprimento do disposto no art. 47 desta Lei Complementar, a administração pública poderá realizar processo licitatório: I - destinado exclusivamente à participação de microempresas e empresas de pequeno porte nas contratações cujo valor seja de até R$80.000,00 (oitenta mil reais); II - em que seja exigida dos licitantes a subcontratação de microempresa ou de empresa de pequeno porte, desde que o percentual máximo do objeto a ser subcontratado não exceda a 30% (trinta por cento) do total licitado; III - em que se estabeleça cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte, em certames para a aquisição de bens e serviços de natureza divisível. §1º O valor licitado por meio do disposto neste artigo não poderá exceder a 25% (vinte e cinco por cento) do total licitado em cada ano civil. §2º Na hipótese do inciso II do caput deste artigo, os empenhos e pagamentos do órgão ou entidade da administração pública poderão ser destinados diretamente às microempresas e empresas de pequeno porte subcontratadas”.
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de execução ou a forma de fornecimento; preço e as condições de pagamento; prazos; crédito pelo qual correrá a despesa; garantias; direitos e responsabilidades das partes; penalidades cabíveis e os valores das multas; os casos de rescisão; e a vinculação ao instrumento convocatório. A importância da existência da minuta está na transparência do processo de contratação e no fato de evitar que o licitante vencedor venha se recusar à assinatura do termo, quando convocado, sob o pretexto de que a sua proposta não contemplou o cumprimento de determinado item exigido no contrato. A título de exemplo, cabe destacar alguns comandos sugeridos pelo TCU para serem inseridos em contratos para a prestação de serviços de natureza contínua, que englobam parte das explicações já apresentadas neste livro: 9.1 recomendar à Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento que incorpore os seguintes aspectos à IN/MP 2/2008: 9.1.1 que os pagamentos às contratadas sejam condicionados, exclusivamente, à apresentação da documentação prevista na Lei 8.666/93; 9.1.2 prever nos contratos, de forma expressa, que a administração está autorizada a realizar os pagamentos de salários diretamente aos empregados, bem como das contribuições previdenciárias e do FGTS, quando estes não forem honrados pelas empresas; 9.1.3 que os valores retidos cautelarmente sejam depositados junto à Justiça do Trabalho, com o objetivo de serem utilizados exclusivamente no pagamento de salários e das demais verbas trabalhistas, bem como das contribuições sociais e FGTS, quando não for possível a realização desses pagamentos pela própria administração, dentre outras razões, por falta da documentação pertinente, tais como folha de pagamento, rescisões dos contratos e guias de recolhimento; 9.1.4 fazer constar dos contratos cláusula de garantia que assegure o pagamento de: 9.1.4.1 prejuízos advindos do não cumprimento do contrato; 9.1.4.2 multas punitivas aplicadas pela scalização à contratada; 9.1.4.3 prejuízos diretos causados à contratante decorrentes de culpa ou dolo durante a execução do contrato; 9.1.4.4 obrigações previdenciárias e trabalhistas não honradas pela contratada. 9.1.5 quanto à scalização dos contratos a ser realizada pela administração com o objetivo de vericar o recolhimento das contribuições previdenciárias, observar os aspectos abaixo: 9.1.5.1 xar em contrato que a contratada está obrigada a viabilizar o acesso de seus empregados, via internet, por meio de senha própria, aos sistemas da Previdência Social e da Receita do Brasil, com o objetivo de vericar se as suas contribuições previdenciárias foram recolhidas; 9.1.5.2 xar em contrato que a contratada está obrigada a oferecer todos os meios necessários aos seus empregados para a obtenção de extratos de recolhimentos sempre que solicitado pela scalização; 9.1.5.3 xar em contrato como falta grave, caracterizada como falha em sua execução, o não recolhimento das contribuições sociais da Previdência Social, que poderá dar ensejo à rescisão da avença, sem prejuízo da aplicação de sanção pecuniária e do impedimento para licitar e contratar com a União, nos termos do art. 7º da Lei 10.520/2002. 9.1.5.4 reter 11% sobre o valor da fatura de serviços da contratada, nos termos do art. 31, da Lei 8.212/93; 9.1.5.5 exigir certidão negativa de débitos para com a previdência – CND, caso esse documento não esteja regularizado junto ao Sicaf;
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
9.1.5.6 prever que os scais dos contratos solicitem, por amostragem, aos empregados terceirizados que veriquem se essas contribuições estão ou não sendo recolhidas em
seus nomes. O objetivo é que todos os empregados tenham tido seus extratos avaliados ao nal de um ano — sem que isso signique que a análise não possa ser realizada mais de
uma vez para um mesmo empregado, garantindo assim o “efeito surpresa” e o benefício da expectativa do controle; 9.1.5.7 comunicar ao Ministério da Previdência Social e à Receita do Brasil qualquer irregularidade no recolhimento das contribuições previdenciárias.
9.1.6 quanto à scalização dos contratos a ser realizada pela Administração com o objetivo de vericar o recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, observe
os aspectos abaixo:
9.1.6.1 xar em contrato que a contratada é obrigada a viabilizar a emissão do cartão cida-
dão pela Caixa Econômica Federal para todos os empregados;
9.1.6.2 xar em contrato que a contratada está obrigada a oferecer todos os meios
necessários aos seus empregados para a obtenção de extratos de recolhimentos sempre que solicitado pela scalização; 9.1.6.3 xar em contrato como falta grave, caracterizado como falha em sua execução, o
não recolhimento do FGTS dos empregados, que poderá dar ensejo à rescisão unilateral da avença, sem prejuízo da aplicação de sanção pecuniária e do impedimento para licitar e contratar com a União, nos termos do art. 7º da Lei 10.520/2002. 9.1.6.4 xar em contrato que a contratada deve, sempre que solicitado, apresentar extrato
de FGTS dos empregados; 9.1.6.5 solicitar, mensalmente, Certidão de Regularidade do FGTS;
9.1.6.6 prever que os scais dos contratos solicitem, por amostragem, aos empregados
terceirizados extratos da conta do FGTS e os entregue à Administração com o objetivo de vericar se os depósitos foram realizados pela contratada. O objetivo é que todos os empregados tenham tido seus extratos avaliados ao nal de um ano — sem que isso signique que a análise não possa ser realizada mais de uma vez em um mesmo
empregado, garantindo assim o “efeito surpresa” e o benefício da expectativa do controle; 9.1.6.7 comunicar ao Ministério do Trabalho qualquer irregularidade no recolhimento do FGTS dos trabalhadores terceirizados. 9.1.7 somente sejam exigidos documentos comprobatórios da realização do pagamento de salários, vale-transporte e auxílio alimentação, por amostragem e a critério da administração; 9.1.8 seja xado em contrato como falta grave, caracterizada como falha em sua execução, o não pagamento do salário, do vale-transporte e do auxílio alimentação no dia xado, que
poderá dar ensejo à rescisão do contrato, sem prejuízo da aplicação de sanção pecuniária e da declaração de impedimento para licitar e contratar com a União, nos termos do art. 7º da Lei 10.520/2002;
9.1.9 a scalização dos contratos, no que se refere ao cumprimento das obrigações traba-
lhistas, deve ser realizada com base em critérios estatísticos, levando-se em consideração falhas que impactem o contrato como um todo e não apenas erros e falhas eventuais no pagamento de alguma vantagem a um determinado empregado; 9.1.10 sejam xadas em edital as exigências abaixo relacionadas como condição de habilitação econômico-nanceira para a contratação de serviços continuados:
9.1.10.1 índices de Liquidez Geral (LG), Liquidez Corrente (LC) e Solvência Geral (SG) superiores a 1 (um), bem como Capital Circulante Líquido (CCL) ou Capital de Giro (Ativo Circulante – Passivo Circulante) de, no mínimo, 16,66% (dezesseis inteiros e sessenta e seis centésimos por cento) do valor estimado para a contratação, índices calculados com base nas demonstrações contábeis do exercício social anterior ao da licitação;
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9.1.10.2 patrimônio líquido igual ou superior a 10% (dez por cento) do valor estimado da contratação; 9.1.10.3 patrimônio líquido igual ou superior a 1/12 (um doze avos) do valor total dos contratos rmados pela licitante com a Administração Pública e com empresas privadas, vigentes na data de abertura da licitação. Tal informação deverá ser comprovada por meio de declaração, acompanhada da Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) relativa ao último exercício social, e se houver divergência superior a 10% (para cima ou para baixo) em relação à receita bruta discriminada na DRE, a licitante deverá apresentar as devidas justicativas para tal diferença; 9.1.10.4 apresentação de certidão negativa de feitos sobre falência, recuperação judicial ou recuperação extrajudicial, expedida pelo distribuidor da sede do licitante. 9.1.11 seja xada em contrato a obrigatoriedade de a contratada instalar, em prazo máximo de 60 (sessenta) dias, escritório em local (cidade/município) previamente denido pela administração; 9.1.12 seja xada em edital, como qualicação técnico-operacional, para a contratação de até 40 postos de trabalho, atestado comprovando que a contratada tenha executado contrato com um mínimo de 20 postos e, para contratos de mais de 40 (quarenta) postos, seja exigido um mínimo de 50%; 9.1.13 seja xada em edital, como qualicação técnico-operacional, a obrigatoriedade da apresentação de atestado comprovando que a contratada tenha executado serviços de terceirização compatíveis em quantidade com o objeto licitado por período não inferior a 3 anos; 9.1.14 seja xado em edital que a contratada deve disponibilizar todas as informações necessárias à comprovação da legitimidade dos atestados solicitados, apresentando, dentre outros documentos, cópia do contrato que deu suporte à contratação, endereço atual da contratante e local em que foram prestados os serviços; 9.1.15 seja xado em edital que somente serão aceitos atestados expedidos após a conclusão do contrato ou decorrido no mínimo um ano do início de sua execução, exceto se houver sido rmado para ser executado em prazo inferior; 9.1.16 deve ser evitado o parcelamento de serviços não especializados, a exemplo de limpeza, copeiragem, garçom, sendo objeto de parcelamento os serviços em que reste comprovado que as empresas atuam no mercado de forma segmentada por especialização, a exemplo de manutenção predial, ar condicionado, telefonia, serviços de engenharia em geral, áudio e vídeo, informática; 9.1.17 a vantajosidade econômica para a prorrogação dos contratos de serviço continuada estará assegurada, dispensando a realização de pesquisa de mercado, quando: 9.1.17.1 houver previsão contratual de que os reajustes dos itens envolvendo a folha de salários serão efetuados com base em convenção, acordo coletivo de trabalho ou em decorrência da lei; 9.1.17.2 houver previsão contratual de que os reajustes dos itens envolvendo insumos (exceto quanto a obrigações decorrentes de acordo ou convenção coletiva de trabalho e de Lei) e materiais serão efetuados com base em índices ociais, previamente denidos no contrato, que guardem a maior correlação possível com o segmento econômico em que estejam inseridos tais insumos ou materiais; 9.1.17.3 no caso de serviços continuados de limpeza, conservação, higienização e de vigilância, os valores de contratação ao longo do tempo e a cada prorrogação forem inferiores aos limites estabelecidos em ato normativo da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – SLTI/MP. Se os valores forem superiores aos xados pela SLTI/MP, caberá negociação objetivando a redução dos preços de modo a viabilizar economicamente as prorrogações de contrato;
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
9.1.18 seja fxada em edital exigência de que o domicílio bancário dos empregados
terceirizados deverá ser na cidade ou na região metropolitana na qual serão prestados os serviços; 9.2 recomendar à Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento que realize estudos a respeito dos seguintes assuntos: 9.2.1 viabilidade jurídica da edição de normativo que possibilite a consideração de falhas e irregularidades pregressas do fornecedor por ocasião da aplicação de nova sanção; 9.2.2 determinação de percentuais mínimos de lucro, LDI, despesas administrativas e outros, para que as propostas sejam consideradas exequíveis no âmbito de processos licitatórios para a contratação de serviços de natureza contínua; 9.3. esclarecer à Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento que os parâmetros numéricos apontados nos subitens 9.1.11, 9.1.13 e 9.1.14 são indicativos, cabendo àquela unidade defnir os valores que constarão da norma;
9.4 recomendar à Advocacia-Geral da União que elabore normativos disciplinando os seguintes aspectos: 9.4.1 procedimentos a serem adotados pelos órgãos/entidades com o objetivo de viabilizar junto ao Judiciário acordo para o pagamento de verbas trabalhistas não honradas pelas contratadas; 9.4.2 procedimentos específcos a serem adotados pelos órgãos/entidades com o objetivo
de executar as garantias contratuais quando a contratada não cumprir com as obrigações trabalhistas e previdenciárias. (TCU. Acórdão nº 1.214/2013, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 28 maio 2013)
Vale lembrar que há exceções no tocante à obrigatoriedade da presença dessa minuta, visto que o art. 62, caput , estabelece que: [...] o instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de
preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.
7.6 Regras para habilitação dos interessados 7.6.1 Considerações iniciais A defnição das regras para habilitação dos interessados é tema da maior rele-
vância no processo licitatório. As exigências feitas pelo gestor devem se restringir aos limites da razoabilidade e balancear as preocupações de afastar empresas sem condições de realizar o empreendimento com o interesse em ter o maior número de participantes, de forma a aumentar a competitividade e receber a proposta mais vantajosa. Com vistas a disciplinar a questão, a lei de licitações limita, em seu art. 27, as exigências que podem ser efetuadas aos licitantes no tocante à documentação relativa à habilitação jurídica, qualifcação técnica, qualifcação econômico-fnanceira, regularidade fscal, e ao cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal,
conforme ilustração da FIGURA 7.g.
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Habilitação
Habilitação jurídica
Qualificação técnica
Operacional
Qualificação econômicofinanceira
Regularidade fiscal
Art. 7º, XXXIII, Const. Federal
Profissional
FIGURA 7.g - Exigências para habilitação
A própria Constituição Federal trata da questão quando em seu art. 37, inciso XXI, estabelece que o processo de licitação pública “somente permitirá as exigências de qualifcação técnica e econômicas indispensáveis à garantia do cumprimento das
obrigações”. Vale lembrar os comentários de Marçal Justen Filho: Nesse ponto, é imperioso destacar que a Constituição autoriza apenas exigências que confgurem um mínimo de segurança. Portanto, não se admitem exigências que vão além
disso. Logo, a Administração não poderá respaldar seus atos com a invocação de que a exigência amplia sua segurança. É evidente que o máximo de segurança corresponderia ao máximo da restrição. Essa não é a solução autorizada pela Constituição. 110
7.6.2 Vedações Preliminarmente, cabe destacar os casos em que é proibida a participação de possíveis interessados em licitações ou execução de obra ou serviço e do fornecimento de bens a eles necessários. São basicamente quatro casos, todos listados no art. 9º da Lei nº 8.666/93: a) autor do projeto, básico ou executivo, pessoa física ou jurídica; b) empresa, isoladamente ou em consórcio, responsável pela elaboração do projeto básico ou executivo ou da qual o autor do projeto seja dirigente, gerente, acionista ou detentor de mais de 5% do capital com direito a voto ou controlador, responsável técnico ou subcontratado;
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 458.
110
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c) servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante ou responsável pela licitação; e d) membros da comissão de licitação. Vale lembrar que, consoante o mesmo artigo, a participação do autor do projeto ou da empresa relacionada no item b na licitação de obra ou serviço, ou na execução, só é permitida “na condição de consultor ou técnico, nas funções de scalização, supervisão
ou gerenciamento, exclusivamente a serviço da Administração interessada”. Nesse sentido, nos casos em que a empreiteira tiver o encargo de realizar o projeto executivo, não poderá ser aceito, em hipótese alguma, que haja a subcontratação dessa tarefa para a empresa responsável pela elaboração do projeto básico. O TCU já se manifestou diversas vezes a esse respeito: De fato, a vedação à subcontratação da autora do Projeto Básico pela empresa executora da obra não é tema controverso. Está claramente disposta no art. 9º, I, §3º, da Lei 8.666/1993, e já foi questão enfrentada por este Tribunal (Acórdão 2.006/2006-TCU-Plenário) justamente em processos relativos a obras em aeroportos. (TCU. Acórdão nº 157/2013, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 19 fev. 2013) Ademais, o art. 9º, §1º da Lei nº 8.666/1993 permite, na licitação de obra, a participação de empresa, isoladamente ou em consórcio, responsável pela elaboração de projeto básico ou executivo, nas funções de scalização, supervisão ou gerenciamento. (TCU. Acórdão
nº 3.156/2012, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 27 nov. 2012)
O motivo das restrições está relacionado ao fato de que, por serem pessoas responsáveis pela denição de todas as linhas gerais do empreendimento, bem assim da
elaboração dos orçamentos detalhados do custo da obra, ou da condução do processo, poderiam gerenciar o processo em seu benefício, por deterem informações privilegiadas. Pior ainda é a possibilidade de alterações fraudulentas de especicações e quantitativos de serviços no projeto básico da licitação, a m de prejudicar as propostas dos demais
concorrentes, tornando-as pouco competitivas e, consequentemente, impossibilitando a Administração de contratar a proposta mais vantajosa. Contudo, não há impedimento da “licitação ou contratação de obra ou serviço que inclua a elaboração de projeto executivo como encargo do contratado ou pelo preço previamente xado pela Administração”.
Nessa situação, é imprescindível que os agentes públicos responsáveis pela condução do processo estejam amparados em projeto básico de boa qualidade, visto que pode haver interesse da empresa em alterar diretrizes de projeto a m de se beneciar
indevidamente. Outra questão importante a respeito das vedações está relacionada à participação de empresa cujo sócio tenha vínculo de parentesco com servidor da entidade licitante. Apesar de não expressa na Lei nº 8.666/93, o TCU entende que, por interpretação analógica, há infringência ao disposto no art. 9º, inciso III: Das justicativas apresentadas pelo ex-prefeito, depreendo que a contratação de parente
próximo não soa irregular para o gestor público, mesmo tendo sua conduta confrontada com os princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade. Sustenta o ex-prefeito que do parentesco não se presume a violação dos princípios constitucionais, vez que a contratação teria sido fruto de procedimento licitatório regular. E aí vejo que, não se
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congurando a licitação regular, como visto no Relatório precedente e pelos fatos acima, cai por terra a tese da contratação legítima e impessoal. Assevero que a irregularidade verificada no item 3.4 acima afronta os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade que devem orientar a atuação da Administração Pública e, mesmo que a Lei nº 8.666, de 1993, não possua dispositivo vedando expressamente a participação de parentes em licitações em que o servidor público atue na condição de autoridade responsável pela homologação do certame, vê-se que foi essa a intenção axiológica do legislador ao estabelecer o art. 9º dessa Lei, em especial nos §§3º e 4º, vedando a prática de conito de interesse nas licitações públicas, ainda mais em casos como o ora apreciado em que se promoveu a contratação de empresa do sobrinho do prefeito mediante convite em que apenas essa empresa compareceu ao certame. Ressalto que a ação dos gestores públicos deve pautar-se sempre pela busca do atendimento aos princípios insculpidos na Constituição, mormente os que regem a Administração Pública. E, como ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, in Curso de Direito Administrativo , Editora Malheiros, 17ª Ed., 2004, pág. 842: “violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um especíco mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos”. Condutas tais como a ora examinada têm sido reiteradamente rechaçadas por este Tribunal, como se observa nas deliberações constantes dos Acórdãos 2.136/2006-1ª Câmara, 1785/2003-2ª Câmara, 778/2009 1.170/2010 e 1.893/2010, ambos do Plenário. (TCU. Acórdão nº 607/2013, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 26 mar. 2013)
7.6.3 Habilitações A Lei nº 8.666/93 possui em seu “Capítulo II – Da Licitação”, artigos 27 a 33, seção especíca que regulamenta o tema habilitação, delimitando a relação de elementos que poderá ser solicitada no edital. A lei de licitações estabeleceu para cada tipo de habilitação um rol de exigências limite, como se pode depreender da análise dos verbos “consistir” e “limitar” inseridos no caput de cada um dos artigos, sendo vedado aos responsáveis pela licitação inserir outras exigências que entendam oportunas, consoante ilustra determinação formulada pelo TCU no sentido de que: 9.2.2 nos editais de licitação, de maneira geral: 9.2.2.1 abstenha-se de exigir dos licitantes, na qualicação técnica realizada com ns de habilitação, a comprovação da regularidade com o conselho de scalização prossional ao qual a empresa e os prossionais estejam ligados, pois isto não está previsto na lei, em especial o caput do art. 30 da Lei nº 8.666/1993, e já foi objeto de decisão pelo TCU, como no Acórdão nº 1.708/2003 – Plenário, Ata 45/2003, para que não ocorra novamente a ilegalidade vericada no item 14.4 “a” do edital da Concorrência nº [...]; 9.2.2.2 não exija, na habilitação técnica, documentos além dos constantes no art. 30 da Lei nº 8.666/1993, evitando-se falhas como a encontrada na Concorrência nº [...], que exigiu indevidamente o Termo de Compromisso e a Portaria de Aprovação de Modelo emitida pelo Inmetro. (TCU. Acórdão nº 1.529/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 30 ago. 2006)
Por oportuno, a expressão “limitar” está inserida no texto legal, pois, em algumas situações, não se justica solicitar o rol integral dos documentos listados. Por exemplo, a
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
comprovação de aptidão exigida no art. 30, inciso II, da lei de licitações não é compatível com um processo de simples compra. No entanto, é entendimento do TCU que o responsável deverá exigir todos os elementos pertinentes ao caso concreto da licitação, com o objetivo de reduzir os riscos da contratação, sendo, portanto, incabível a ausência de solicitação da referida comprovação de aptidão no caso de certame relativo a obras públicas. Nos termos do art. 32 da lei em comento, a documentação deve ser apresentada “em original, por qualquer processo de cópia autenticada por cartório competente ou por servidor da administração ou publicação em órgão da imprensa ofcial”, e poderá
ser dispensada, no todo ou em parte, nos casos de convite, concurso, fornecimento de bens para pronta entrega e leilão. Considerando que as questões relativas à habilitação jurídica, à regularidade fscal
e trabalhista e ao cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição apresentam menor complexidade, serão tratadas a seguir as atinentes à qualifcação técnica — operacional e profssional — e à qualifcação econômico-fnanceira, por serem
as mais polêmicas no curso do procedimento licitatório de obras públicas. Antes, porém, vale lembrar que a Lei nº 12.440/11 acrescentou aos artigos 27 e 29 da Lei nº 8.666/93 a viabilidade da exigência de documentação afeta à regularidade trabalhista, ao lado da fscal, com especial destaque para a prova de inexistência de
débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho, mediante a apresentação de certidão negativa, nos termos do Título VII-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
7.6.3.1 Qualifcação técnica operacional e profssional O art. 30 da lei de licitações limita as exigências que poderão ser feitas a quatro linhas básicas: I-
registro ou inscrição na entidade profssional competente;
II - comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualifcação de cada um dos membros da equipe técnica que se respon-
sabilizará pelos trabalhos; III - comprovação, fornecida pelo órgão licitante, de que recebeu os documentos, e, quando exigido, de que tomou conhecimento de todas as informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação; IV - prova de atendimento de requisitos previstos em lei especial, quando for o caso. No caso de obras e serviços de engenharia, a primeira exigência está relacionada à necessidade de registro ou inscrição da empresa no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CREA, órgão responsável pela fscalização do exercício e das atividades das profssões reguladas pela Lei nº 5.194/66. Vale destacar que, nos termos do art. 25, §2º, da referida lei, “Cada unidade da Federação só poderá fcar na
jurisdição de um Conselho Regional”.
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Contudo, consoante entendimento do TCU, o visto no CREA do local da realização do serviço somente deverá ser exigido quando da contratação: [...] determinar ao [...] que não inclua em futuros editais de licitação exigência acerca de que o registro do CREA do local de origem da empresa licitante receba visto do CREA do local de realização das obras, com ns de mera participação em licitação, uma vez que, segundo pacíca jurisprudência desta Corte, o visto somente deve ser exigido quando da contratação. (TCU. Decisão nº 348/99, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 22 jun. 1999)
Em relação ao inciso II do art. 30, que trata da comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente, existem, basicamente, duas exigências para a plena capacidade técnica do licitante: a) capacidade técnica operacional: refere-se à estrutura que a empresa possui para realizar o empreendimento (equipamentos, equipe técnica, conhecimento do problema, fornecedores etc.) e deve ser comprovada por meio da experiência da empresa na realização de contratos de obras similares. “A capacidade técnico-operacional da empresa não é afastada em razão de mudanças do seu responsável técnico”. (TCU. Acórdão nº 478/2015. Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 25 mar. 2015); b) capacidade técnica prossional: está relacionada ao aspecto intelectual dos profissionais que compõem o quadro permanente da empresa, ou seja, a experiência que esses profissionais possuem na execução anterior de empreendimentos similares em complexidade à obra licitada. Preliminarmente, vale destacar que há orientação jurisprudencial para que o órgão se abstenha “de incluir no comando das exigências habilitatórias expressão que possa levar à interpretação restritiva quanto à demonstração de execução de serviços atrelada a determinada tipologia de obra, como, por exemplo, a ‘obras portuárias’, em face do guardado no art. 3º, §1º, inciso I, da Lei 8.666, de 1993, bem como no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, salvo se imprescindível à certeza da boa execução do objeto e desde que devidamente fundamentado no processo licitatório” (TCU. Acórdão nº 1.226/2012. Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 30 maio 2012). Para análise do tema, é pertinente a lembrança de que a regulamentação da capacidade técnica operacional foi a que encerrou maior discussão para o seu entendimento, principalmente em face do veto ao inciso II do §1º do art. 30 da Lei nº 8.666/93 que regulamentava sua denição. Vale uma retrospectiva a respeito desse veto. O texto original do projeto de lei vetado foi o seguinte: II - quanto à capacidade técnico-operacional: a comprovação do licitante de ter executado, no somatório de até 3 (três) contratos, quantitativos mínimos não superiores a 50% (cinqüenta por cento) daqueles previstos na mensuração e exclusivamente nas parcelas de maior relevância técnica ou de valor signicativo, do objeto da licitação e a 50% (cinqüenta por cento) das relações quantitativos/prazo global destas, admitida a soma de atestados quando referidos a um mesmo período, sem limite de contratos.
Na mensagem nº 335 foram relacionadas as seguintes razões do veto:
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Reconhecidamente, a competição entre possíveis interessados é princípio ínsito às licitações, pois somente ao viabilizá-la o Poder Público pode obter a proposta economicamente mais vantajosa, barateando, assim, os preços de suas obras e serviços. Ora, a exigência de “capacidade técnico-operacional”, nos termos defnidos no primeiro dos
dispositivos supra, praticamente inviabiliza a consecução desse objetivo, pois segmente, de forma incontornável, o universo dos prováveis competidores, na medida em que, embora possuindo corpo técnico de comprovada experiência, uma empresa somente se habilita a concorrer se comprovar já haver realizado obra ou serviço de complexidade técnica idêntica à que estiver sendo licitada. Ademais, dependendo do vulto da obra ou serviço, essa exigência pode afastar pequenos e médios competidores, já que pode chegar a até 50% (cinqüenta por cento) das “parcelas de maior relevância técnica ou valor signifcativo”, conceitos, aliás, sequer defnidos
objetivamente no projeto. Impõem-se, assim, expungir do texto os dispositivos em foco, que, por possibilitarem possíveis direcionamentos em proveito de empresa de maior porte, se mostram agrantemente contrários ao interesse público.
Vale lembrar que, em 1994, a repetição do texto foi novamente vetada pelo Presidente da República, quando da sanção da Lei nº 8.883: O texto reproduz aquele que foi objeto de veto, quando da sanção da Lei nº 8.666, de 1993, o que não permite seja agora sancionado, tendo em vista o disposto no art. 66, §4º da Constituição Federal. Após uma série de discussões, a avaliação dos Tribunais é pacífca no sentido
de que é possível exigência da comprovação de capacidade operacional, desde que se refra apenas a itens de maior relevância e valor signifcativo, nos moldes defnidos no
inciso I do §1º do art. 30 da Lei nº 8.666/93:
Não obstante a nítida intenção consignada nos vetos, de assegurar a maior competitividade ao certame mediante a democratização das exigências para a habilitação dos concorrentes, este Tribunal e, majoritariamente, a doutrina especializada — inclusive calcada, diga-se, em entendimentos deste próprio Tribunal — entenderam que não existem óbices a que sejam exigidos atestados de capacitação técnico-operacional dos licitantes. Mencionem-se, como exemplos, as Decisões nº 767/98 - Plenário e 285/2000 - Plenário. Também outros Tribunais se alinharam à posição defendida por esta Corte, valendo-se mencionar, também a título exemplifcativo, o RESP nº 155861/SP, do Superior Tribunal de Justiça. [...] Assim é que a analogia nos permite afrmar que os limites impostos à cobrança de
atestados de comprovação da capacidade técnico-operacional são os mesmos relativos à comprovação da capacitação técnico-profssional defnidos no inciso I do §1º do art. 30
da Lei nº 8.666/93, ou seja, tal comprovação somente é possível em relação “às parcelas
de maior relevância e valor signifcativo do objeto da licitação”. Observe-se atentamente
que a lei utiliza a conjunção aditiva “e”. Assim, não basta o cumprimento de uma ou de outra condição; ambas as condições devem ser atendidas. Então, somente podem ser cobrados atestados em relação a itens que, simultaneamente, representem parcelas de maior relevância da obra e que possuam valor signifcativo em relação ao objeto da
licitação. (TCU. Decisão nº 574/02, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 11 jun. 2002)
Esse entendimento foi robustecido com a aprovação da Súmula nº 263: “Para a comprovação da capacidade técnico-operacional das licitantes, e desde que limitada,
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simultaneamente, às parcelas de maior relevância e valor signicativo do objeto a ser
contratado, é legal a exigência de comprovação da execução de quantitativos mínimos em obras ou serviços com características semelhantes, devendo essa exigência guardar proporção com a dimensão e a complexidade do objeto a ser executado” (TCU. Acórdão nº 32/2011, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar, 19 jan.2011. DOU , 21 jan. 2011). A segunda questão refere-se à forma e ao limite, dentro dos poderes discricionários da Administração, para solicitação da comprovação da capacidade operacional. A denição de quantidade de serviços já executados representa excelente referencial para
que a licitação seja conduzida de maneira objetiva, conforme posicionamento do STJ.
1. As exigências tendentes a comprovar a capacitação técnica do interessado em contratar com o ente público devem ser concebidas dentro das nuanças e particularidades que caracterizam o contrato a ser formalizado, sendo apenas de rigor que estejam pautadas nos princípios que norteiam o interesse público. 2. Em se tratando de licitação de serviços de engenharia de grande porte, não há por que cogitar de ilegalidade da norma editalícia que exige a comprovação de experiência anterior em obra similar à licitada, porquanto concebida com propósito de permitir à Administração Pública avaliar a capacidade técnica dos interessados em com ela contratar nos exatos termos do que prescreve a primeira parte do inciso II do art. 30 da Lei nº 8.666/93: “comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação [...]”. 3. Há situações em que as exigências de experiência anterior com a xação de quantitativos mínimos são plenamente razoáveis e justicáveis, porquanto traduzem modo de aferir se
as empresas licitantes preenchem, além dos pressupostos operacionais propriamente ditos
— vinculados ao aparelhamento e pessoal em número adequado e suciente à realização
da obra —, requisitos não menos importantes, de ordem imaterial, relacionados com a organização e logística empresarial. 4. A ampliação do universo de participantes não pode ser implementada indiscriminadamente de modo a comprometer a segurança dos contratos, o que pode gerar graves prejuízos para o Poder Público. (STJ. REsp nº 295.806/SP, 2ª Turma. Rel. Min. João Otávio de Noronha. DJ , 06 mar. 2006)
Contudo, quais os quantitativos adequados para serem solicitados? O TCU, em análise dessa questão, entendeu que cada caso deverá ser analisado em função de suas peculiaridades, com base na razoabilidade e proporcionalidade: 4.4.5 Com propriedade, a exigência de atestado de capacitação técnico-operacional da empresa é perfeitamente compatível e amparada por lei. Todavia, há um limite a ser observado pela Administração. Repisando o tema, colacionamos da obra do precitado autor (p. 311): “Vale insistir acerca da inconstitucionalidade de exigências excessivas, no tocante à qualicação técnica. Observe-se que a natureza do requisito é incompatível com disciplina
precisa, minuciosa e exaustiva por parte da Lei. É impossível deixar de remeter à avaliação da Administração a xação de requisitos de habilitação técnica. Essa competência
discricionária não pode ser utilizada para frustrar a vontade constitucional de garantir o mais amplo acesso a licitantes, tal como já exposto acima. A administração apenas está autorizada a estabelecer exigências aptas a evidenciar a execução anterior de objeto similar. Vale dizer, sequer se autoriza exigência de objeto idêntico...”. 4.4.6 O problema do limite de condições para habilitação, mesmo tendo sido regulado em lei e tratado na doutrina, é acima de tudo questão de bom-senso, de razoabilidade e de
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
proporcionalidade. Quaisquer exigências excessivas, podem ser entendidas como intenção de excluir a participação de outras empresas também capazes de executar a obra, o que violaria o princípio da competitividade e a isonomia entre os licitantes. (TCU. Acórdão nº 307/01, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 03 abr. 2002) Entretanto, destaco que a jurisprudência deste Tribunal — Decisão 1.618/2002 e Acórdão 515/2003, ambos de Plenário — já se manifestou no sentido de que o art. 30, §1º, inciso I, da Lei 8.666/1993 somente se aplica à qualicação técnico-prossional, estando a limitação da
capacidade técnico-operacional insculpida no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal de 1988, o qual somente permite exigências de qualicação técnica e econômica que sejam
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. Por oportuno, colaciono abaixo excerto do Voto apresentado pelo Ministro Guilherme Palmeira na condução da Decisão 592/2001 – Plenário: “Ainda que, a meu ver, esteja autorizada a xação de parâmetros quantitativos quando se
tratar de comprovação de capacitação técnico-operacional, a exigência da Administração encontrará limites no princípio da razoabilidade, ex vi do disposto no art. 37, inciso XXI, da Lei Maior, que somente admite exigências de qualicação técnica indispensáveis
à garantia do cumprimento das obrigações. Exigências desarrazoadas não podem ser legitimadas sob o argumento de que a Administração necessita de segurança maior do que a efetivamente necessária à execução do objeto a ser contratado, sob pena de ofensa ao texto constitucional, que, como frisei, autoriza apenas o mínimo de exigências, sempre alicerçadas em critérios razoáveis”. (TCU. Acórdão nº 1.891/06, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 16 out. 2006)
O TCU tem se posicionado da seguinte maneira em relação aos limites para comprovação da qualicação técnico-operacional:
16. Nesse sentido é a jurisprudência desta corte de contas, podendo ser citados como exemplo os acórdãos 1.284/2003, 2.088/2004, 2.656/2007 e 2.215/2008, todos de Plenário, havendo neste último determinação que limita “as exigências de capacidade técnicooperacional aos mínimos necessários que garantam a qualicação técnica das empresas para a execução de cada contrato do empreendimento, devendo [a unidade jurisdicionada]
abster-se de estabelecer exigências excessivas, que possam restringir indevidamente a competitividade dos certames, a exemplo da comprovação de experiência em percentual superior a 50% (cinquenta por cento) dos quantitativos a executar” (TCU. Acórdão nº 1.390/2010, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 23 jun. 2010). 111
Em casos extremos, o TCU tem realizado audiência dos responsáveis pela denição de “exigência de quantitativo exagerado para comprovação da capacitação técnica operacional, o que congura restrição à competitividade da licitação, infringindo,
assim, o artigo 3º, §1º, inciso I, da Lei 8.666/93 e o artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal” (TCU. Acórdão nº 216/08, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 22 fev. 2008). Outra questão interessante refere-se à possibilidade do somatório de atestados para a comprovação de quantidades de serviços a serem atestadas. Apenas o correto entendimento do empreendimento poderá subsidiar os responsáveis nessa denição,
consoante expressa com propriedade Marçal Justen Filho: 111
Ver também TCU. Acórdão nº 1.432/2010, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 30 jun. 2010.
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A qualificação técnico-operacional consiste na execução anterior de objeto similar àquele licitado. Ora, isso signica que a identidade do objeto licitado é que determina a possibilidade ou não de somatório. Dá-se um exemplo: uma ponte de mil metros de extensão não é igual a duas pontes de quinhentos metros. Muitas vezes, a complexidade do objeto licitado deriva de certa dimensão quantitativa. Nesses casos, não terá cabimento o somatório de contratações anteriores. Já haverá outros casos em que a questão não reside numa contratação única, mas na experiência de executar certos quantitativos, ainda que em oportunidades sucessivas. Enm, a solução deverá ser encontrada a partir da natureza do objeto licitado. 112
Em acréscimo, o TCU avaliou a matéria afeta à apresentação de número mínimo de certidões em diversos casos concretos. As decisões a seguir ilustram o posicionamento da Corte de Contas: A restrição ao caráter competitivo da licitação foi caracterizada pela proibição do somatório de atestados de capacidade técnica. Dezoito empresas adquiriram o edital e apenas duas apresentaram proposta. Além disso, se o objeto licitado fosse parcelado para incluir no escopo do certame somente as obras referentes ao Termo de Compromisso já rmado, os serviços e quantitativos exigidos para a qualicação técnica das licitantes teriam sido reduzidos, fazendo com que mais empresas pudessem participar da licitação. São duas condições restritivas com potencial de reduzir o universo de empresas aptas a participar da licitação. A explicação para a proibição do somatório de atestados de capacidade técnica não foi convincente. Em circunstâncias semelhantes, o Tribunal tem determinado que “a comprovação de capacidade técnica seja feita mediante o somatório de atestados, sempre que não houver motivo para justicar a exigência de atestado único, em observância ao disposto no art. 30, §§1º, 3º e 5º, da Lei nº 8.666/93” (acórdãos 1.237/2008, 2.150/2008 e 2.882/2008, do Plenário). (TCU. Acórdão nº 1.231/2012, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 28 maio 2012) 3. No que concerne aos critérios de qualicação técnica, vejo que o instrumento convocatório exigiu a comprovação de experiência anterior mediante a apresentação de, no mínimo, três certidões de acervo técnico fornecidas pelo Crea/RO, para cada um dos quantitativos mínimos das parcelas de maior relevância da obra xados no edital, os quais deveriam estar registrados exclusivamente no nome do responsável técnico da empresa licitante. 4. Tal prática tem sido condenada em deliberações desta Corte de Contas, a exemplo do Acórdão 571/2006-TCU-Plenário, exarado sob a relatoria do Ministro-Substituto Marcos Bemquerer Costa, em cujas razões de decidir constaram as seguintes considerações: “15. A Lei de Licitações estabelece diretrizes, limitações e exigências relativas ao conteúdo dos atestados de comprovação de aptidão, mas silencia no tocante à quantidade de documentos necessários para se fazer tal prova. Ao fazer uma interpretação sistêmica dos normativos acerca do assunto, este Tribunal tem entendido que uma imposição dessa espécie somente poderia ser admitida se claramente explicitada no texto legal. 16. Nesse contexto, pode-se dizer que o estabelecimento de uma quantidade mínima de atestados fere o preceito constitucional da isonomia, porque desiguala injustamente concorrentes que apresentam as mesmas condições de qualicação técnica. Não se pode inferir que um licitante detentor de um atestado de aptidão é menos capaz do que o licitante que dispõe de dois.
112
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 510.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
17. Isto porque a capacidade técnica de realizar o objeto existe, independentemente do número de vezes que tenha sido exercitada, ou não existe. Garantida a capacitação por meio de um atestado, não vejo como a administração exigir algo a mais sem exorbitar as limitações constitucionais”. 5. Há diversos outros julgados deste Tribunal no mesmo sentido, como é o caso dos Acórdãos 298/2002, 351/2002, 330/2005, 539/2007, 739/2007, 167/2006, 1.706/2007, 43/2008, do Plenário, e dos Acórdãos 1.873/2007 e 1.526/2008, da 2ª Câmara. (TCU. Acórdão nº 1.593/2010, 2ª Câmara. Rel. Min. André Luís de Carvalho. DOU , 16 abr. 2010)
Por esses motivos, vale destacar determinações formuladas pelo TCU no sentido de que a entidade: [...] agura-se desarrazoada a restrição editalícia de que “a comprovação de cada qual dos
serviços seja feita por um único atestado, o que, de fato, potencializa a restrição à licitação, estando, assim, em desconformidade com a jurisprudência deste Tribunal, que admite o somatório de atestados, sempre que não houver motivo para justicar a exigência de
atestado único, conforme a inteligência do art. 30, §§1º, 3º e 5º da Lei de Licitações”. (TCU. Acórdão nº 342/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 1º mar. 2012) [...] abstenha-se, na qualicação técnica, de xar número máximo de atestados, em consonância com o previsto nos arts. 3º, §1º, inciso I, e 30, caput e §§3º e 5º, da Lei
nº 8.666/1993, art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e com a jurisprudência do TCU, exceto quando for expressamente justicada a necessidade da exigência para a garantia
da execução do contrato, a segurança e perfeição da obra ou do serviço, a regularidade do fornecimento ou o atendimento de qualquer outro interesse público. (TCU. Acórdão nº 1.678/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 15 set. 2006) [...] observe as disposições contidas no art. 30, §1º, inciso I, da Lei nº 8.666/93, abstendo-
se de fazer exigências que possam restringir o caráter competitivo das licitações, como a obrigatoriedade de apresentação, na fase de habilitação, de mais de um atestado de capacidade técnica. (TCU. Acórdão nº 989/06, 1ª Câmara. Rel. Min.Valmir Campelo. DOU , 02 maio 2006)
[...] promova a readequação do subitem [...] do Edital, de modo a suprimir o estabelecimento
de limite numérico para o somatório de atestados de capacitação técnico-operacional, por constituir restrição ao caráter competitivo do certame licitatório, nos termos do art. 3º, §1º, I da Lei nº 8.666/93, estando também em desacordo com o deliberado pelo E. TCU na Decisão nº 86/2001 - Plenário (TC - 001.799/2000-6). (TCU. Acórdão nº 597/08, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 14 abr. 2008) É vedada a imposição de limite para a quantidade de atestados ou de certidões de execução de serviços para ns de comprovação de qualicação técnica dos licitantes quando o seu objetivo for, tão-somente, vericar se os empreendimentos anteriormente realizados pela
licitante têm dimensão semelhante à do objeto do certame, excetuada a hipótese em que
tal limitação tenha por nalidade única e exclusiva garantir que a empresa contratada
detenha o conhecimento técnico e a capacidade operacional inerentes à metodologia construtiva a ser aplicada. (TCU. Acórdão nº 2.616/08, 2ª Câmara. Rel. Min. André Luis de Carvalho. DOU , 31 jul. 2008)
Por oportuno, cabe lembrar o teor do §4º do art. 31 da lei que permite a exigência da “relação dos compromissos assumidos pelo licitante que importem diminuição da
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capacidade operativa ou absorção de disponibilidade nanceira, calculada esta em função do patrimônio líquido atualizado e sua capacidade de rotação”. Essa exigência é conveniente em licitações efetuadas por lote, visto que se a empresa se sagrar vencedora do primeiro, perde parcela da capacidade operativa para os seguintes. Outra questão discutida em termos de acervo de empresas licitantes refere-se à viabilidade da transferência da capacidade técnico-operacional entre pessoas jurídicas. O TCU já se posicionou a respeito dessa possibilidade não somente na hipótese de transferência total de patrimônio e acervo técnico entre tais pessoas, mas também no caso da transferência parcial desses ativos: 12. No entanto, consoante amplamente demonstrado pela Serur, embora a questão relativa à possibilidade da transferência de capacidade técnica operacional entre pessoas jurídicas objeto de reestruturação empresarial não tenha merecido tratamento expresso na legislação sobre licitações, esta viabilidade já está devidamente consagrada na doutrina e na jurisprudência brasileiras. [...]
14. Outro aspecto importante a ser destacado consiste em se levar em consideração, na aferição da validade dos atestados apresentados, a existência de tratamento expresso, no negócio jurídico que tenha formatado a operação reestruturante, quanto à divisão do acervo técnico da empresa. Isto porque, de acordo com o que for determinado no negócio jurídico que ensejou a reformulação societária, haverá de ser dimensionada a extensão e aproveitamento dos atestados técnicos até então expedidos em favor das empresas envolvidas. [...]
17. É oportuno ressaltar, como bem lembrou a Unidade Técnica, que, no caso em exame, existe a particularidade de que a transferência de acervo ocorreu entre empresas fortemente vinculadas, porquanto uma delas é a holding e a outra sua subsidiária integral, a qual atua como uma longa manus da controladora. 18. Registrou-se, igualmente, que existe “total compatibilidade entre os responsáveis técnicos que constam do acervo transferido e os responsáveis técnicos da empresa EIT Construções S/A”, ou seja, “Os mesmos responsáveis técnicos que executaram os serviços que constam do acervo técnico transferido foram instituídos como responsáveis técnicos da EIT Construções S/A”. 19. Observa-se, ademais, que o Consórcio juntou aos autos as declarações de indicação dos responsáveis técnicos na execução das obras para remanejamento da adutora, bem como os respectivos contratos de trabalho rmados com a empresa [...].
20. Neste ponto, é oportuno destacar, na linha igualmente defendida pela Serur, que não pode subsistir o raciocínio utilizado na deliberação recorrida de que somente seria permitida a transferência da capacidade técnica entre pessoas jurídicas quando ocorresse a transferência total do patrimônio e dos prossionais correspondentes, uma vez que
o próprio Tribunal já reconheceu essa possibilidade nos casos de cisões, posição esta inaugurada pelo Acórdão 1.108/2003 - TCU - Plenário, no que foi seguido por outras deliberações, a exemplo dos Acórdãos 2.071/2006, 634/2007, 2.603/2007 e 2.641/2010, todos do Plenário. [...]
23. Nesse aspecto, entendo que o Tribunal não tem fundamentação jurídica para avaliar a legalidade e legitimidade de eventuais reestruturações de empresas que licitam ou contratam com União. Entendo, ademais, que o Tribunal, ao contrário, deve continuar no processo de evolução da sua jurisprudência, como já o fez mediante as deliberações mencionadas no item 20 anterior, de modo a acompanhar a dinâmica das modicações
societárias que afetam o mundo empresarial globalizado, que impõe a necessidade de alterações na organização da sociedade para a sua própria sobrevivência, como bem disse
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
o eminente Ministro emérito deste Tribunal Marcos Vilaça, ao proferir o Voto condutor do Acórdão 2071/2006 - TCU - Plenário. 24. Dessa forma, creio que a tarefa desta Corte de Contas em relação à matéria consistirá em exigir sempre que os órgãos e entidades públicas exerçam as prerrogativas de que dispõem, de modo a prevalecer o interesse público nas relações com tais organismos empresariais, independentemente da sua forma de organização. (TCU. Acórdão nº 2.444/2012, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 14 set. 2012) Por sua vez, a capacidade técnica prossional está relacionada ao conhecimento
e experiência que os profissionais indicados detêm em face de realização de empreendimentos anteriores. De plano, a lei de licitações determina, em seu art. 30, §10, que “os prossionais indicados pelo licitante para ns de comprovação da capacitação técnico-prossional
de que trata o inciso I do §1º deste artigo deverão participar da obra ou serviço objeto da licitação, admitindo-se a substituição por prossionais de experiência equivalente
ou superior, desde que aprovada pela administração”, ou seja, é vedada a prática pelas empresas de indicação de engenheiros com excelente experiência apenas formalmente. Para esse tipo de comprovação, cuja principal característica está atrelada ao intelecto do prossional, a lei veda a exigência de quantidades mínimas de serviços e prazos máximos de execução, bastando que o atestado se rera a “execução de obra
ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor signicativo do objeto da licitação” (art. 30, §1º, da Lei
nº 8.666/93). Portanto, “a exigência de quantitativo mínimo para ns de comprovação da capacidade técnico-prossional contraria o estabelecido no art. 30, §1º, inciso I, da Lei
8.666/93, c/c o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, bem como na jurisprudência deste Tribunal de Contas, conforme consta nos Acórdãos 2.081/2007, 608/2008, 1.312/2008, 2.585/2010, 3.105/2010 e 276/2011, todos do Plenário” (TCU. Acórdão nº 165/2012, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 09 fev. 2012). O TCU tem acolhido, em casos excepcionais devidamente justicados, a exigência de quantitativos mínimos para a comprovação de capacidade técnico-prossional: 1. A exigência de atestados de capacidade técnica emitidos em nome dos prossionais
consubstancia-se em elemento de convicção para a comprovação da capacitação das licitantes, especicamente da parte técnico-prossional.
2. Não afronta o art. 30, §1º, inciso I, da Lei nº 8.666/1993 a exigência de atestados com quantitativo mínimo, para ns de comprovação de capacitação técnico-prossional, quando este quantitativo reita características intrínsecas a cada contrato mencionado
nos atestados e quando o objeto licitado for de natureza predominantemente intelectual, dicultando, por conseguinte, a aferição dessa capacitação. 3. A exigência de certa quantidade de atestados é uma forma da Administração se certicar
da experiência e aptidão das empresas em realizar o serviço a ser contratado. (TCU. Acórdão nº 492/06, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. DOU , 07 abr. 2006) Por oportuno, a questão atinente ao vínculo entre o licitante e o prossional
detentor do atestado de capacidade técnica prevista no art. 30, §1º, inciso I, da Lei nº 8.666/93 deve ser analisada com cautela, segundo o TCU:
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2. A compreensão de quadro permanente contida no art. 30, §1º, inciso I, da Lei nº 8.666/93 deve ser que, tanto na data da entrega da proposta quanto ao longo da execução do contrato, a contratada deve contar com prossional qualicado, vinculado à empresa por meio de contrato de prestação de serviços, celebrado de acordo com a legislação civil comum, ou que tenha vínculo trabalhista ou societário com a empresa. (TCU. Acórdão nº 141/08, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 15 fev. 2008) 9. Todavia, há que se atentar para o fato de que a Lei nº 8.666/93 não dene o que seja “quadro permanente”. Assim, essa expressão poderia ser compreendida como o conjunto de pessoas ligadas à empresa de modo permanente, sem natureza eventual, por meio de vínculos de natureza trabalhista e/ou societária. Esse conceito, entretanto, reclama certa ampliação nas hipóteses em que a autonomia no exercício da prossão descaracteriza o vínculo empregatício sem afastar a qualicação do sujeito como integrante do quadro permanente, como é o caso dos prossionais da área de engenharia. 10. A exigência de que as empresas concorrentes possuam vínculo empregatício, por meio de carteira de trabalho assinada, com o prossional técnico qualicado mostra-se, ao meu ver, excessiva e limitadora à participação de eventuais interessados no certame, uma vez que o essencial, para a Administração, é que o prossional esteja em condições de efetivamente desempenhar seus serviços no momento da execução de um possível contrato. Em outros termos, o sujeito não integrará o quadro permanente quando não estiver disponível para prestar seus serviços de modo permanente durante a execução do objeto do licitado. 11. A regra contida no artigo 30, §1º, inciso I, da Lei nº 8.666/93, não pode ser tomada em caráter absoluto, devendo-se sopesá-la diante dos objetivos que se busca alcançar com a realização das licitações, quais sejam, a garantia de observância ao princípio da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração. 12. Assim, se o prossional assume os deveres de desempenhar suas atividades de modo a assegurar a execução satisfatória do objeto licitado, o correto é entender que os requisitos de qualicação prossional foram atendidos. Não se pode conceber que as empresas licitantes sejam obrigadas a manter prossionais de alta qualicação, sob vínculo empregatício, apenas para participar da licitação, pois a interpretação ampliativa e rigorosa da exigência de vínculo trabalhista se conguraria como uma modalidade de distorção. 13. Atender, no caso em tela, à letra fria desse dispositivo, sem considerar os objetivos da Administração e os limites de exigência de qualicação técnica, sucientes para a garantia do cumprimento das obrigações, seria desbordar para o formalismo que se basta em si mesmo, sem ter em vista qualquer outro objetivo consentâneo com o interesse público. (TCU. Acórdão nº 2.297/05, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 03 jan. 2006)
Nesse sentido, é válida a sugestão de que o edital estabeleça como condição para comprovação do vínculo: apresentação de cópia da carteira de trabalho do prossional que comprove a condição de que pertence ao quadro da licitante, de contrato social que demonstre a condição de sócio do prossional ou, ainda, da declaração de contratação futura do prossional responsável, acompanhada da anuência deste. Também não se pode exigir no edital que a empresa rme o compromisso de que o prossional indicado irá participar até o nal do contrato, visto que a lei autoriza a substituição, desde que por outro técnico com a mesma capacidade. A respeito, o TCU assim se manifestou: 26. Outra previsão editalícia que se mostra irregular refere-se ao “Compromisso de participação do pessoal técnico qualicado” — subitem 5.5, alínea “e” (. 44, v.p.) —, no
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
qual os prossionais indicados pela licitante para ns de comprovação de capacitação
técnica devem declarar que participarão, permanentemente, da obra licitada. A ilegalidade de tal cláusula já foi reconhecida por esta Corte de Contas, conforme se depreende do seguinte excerto do Voto condutor do Acórdão 1.332/2006 – Plenário, in verbis: “Também não se harmoniza com a lei a exigência editalícia de o prossional indicado pela licitante rmar o compromisso de participar permanentemente das obras e serviços licitados, como vericado no subitem 5.6.2, alínea “b.4”, do instrumento convocatório.
Conforme se depreende do art. 30, §10, da Lei 8.666/93, a Administração não poderá furtarse, em circunstâncias excepcionais, de aprovar a substituição de prossional indicado para ns de capacitação técnico-operacional por outro de experiência equivalente ou superior”. (TCU. Acórdão nº 513/03, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU ,
26 maio 2003)
A restrição à competitividade por meio de exigências descabidas tem sido tratada por diversas vezes no âmbito do TCU: Em relação ao procedimento de licitação, há fortes indícios de que os critérios para habilitação se destinaram a restringir a competitividade entre os interessados e a garantir que apenas uma única licitante atendesse a todas as exigências. De fato, para ns de comprovação de experiência anterior, foram estabelecidas demandas referentes a parcelas de valor não signicativo para o objeto da licitação e restrições quanto ao quantitativo de contratos anteriores e ao seu somatório. Além disso, verica-se que os percentuais mínimos de experiência técnico-operacional foram xados de tal forma que atendessem exatamente à situação especíca do consórcio vencedor.
Essas irregularidades culminaram na assinatura de contrato cujos preços estão, em grande maioria, superiores aos preços unitários constantes do Sistema Sicro do DNIT. (TCU. Acórdão nº 513/03, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 26 maio 2003) Por m, para a correta condução do processo, é imprescindível a justicativa de
todos os elementos requisitados no processo, consoante Marçal Justen Filho: Deve considerar-se que incumbe à Administração justicar as exigências de experiências
anterior que introduz no ato convocatório. Não é dever dos particulares demonstrarem que as exigências impostas pela Administração são excessivas. Ou seja, não é possível a Administração invocar algum tipo de presunção de legitimidade de atos administrativos para transferir ao particular o ônus de prova extremamente complexa. Assim o é porque foi a Constituição que determinou a admissibilidade apenas das exigências as mais mínimas possíveis. Portanto, quando a Administração produzir exigências maiores, recairá sobre ela o dever de evidenciar a conformidade de sua conduta em face da Constituição. 113
Em outro sentido, o TCU fez severas restrições a exigências descabidas ou malintencionadas, como se vê a seguir: 10. Convém ressaltar que a restrição ao caráter competitivo presente no edital resultou, conforme comprovado nos autos, em um direcionamento explícito do certame à Construtora [...], empresa adjudicada na licitação. Conforme está demonstrado no Relatório,
os requisitos de qualificação técnica exigidos aos licitantes, que não poderiam se
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 514.
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apresentar como consorciados, são idênticos aos constantes em um atestado expedido pelo Departamento [...] em nome da mencionada construtora. Tal evidência constitui forte
indício de que e licitação em tela fora direcionada.
11. Com respeito à exigência injusticada da tecnologia consignada no edital da concor-
rência, para a execução do objeto, a despeito de outras tecnologias, inclusive utilizadas anteriormente pelo [...] em obras da mesma natureza, o responsável tenta se justicar apenas armando que “a solicitação para apresentação de justicativas transcende o
aspecto da legalidade, cingindo-se a apenas uma opinião partidária do uso de tecnologias, como também cerceadora do Órgão licitante quanto à tecnologia a ser empregada na obra. Admitir-se um possível direcionamento do certame, ante a adoção de nova tecnologia, parece ao defendente ‘ir na contramão’ do processo evolutivo e necessário aprimoramento de todas as tecnologias, tendo como resultado o atraso”. 12. Entendo essa justicativa inaceitável, uma vez que não houve sequer a preocupação
de demonstrar a motivação da opção pela tecnologia exigida, de maneira a esclarecer sua vantagem econômica ou técnica sobre as outras. (TCU. Acórdão nº 307/01, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 03 abr. 2002)
Por essa razão, o TCU tem formulado determinações no sentido de que: [...] na elaboração de editais de licitações, realizadas com recursos públicos federais, ao
inserir exigência de comprovação de capacidade técnica (art. 30 da Lei 8.666/93), seja sob o aspecto técnico-prossional, ou técnico-operacional, consigne no respectivo processo,
expressa e publicamente, os motivos dessa exigência, e demonstre, tecnicamente, que os parâmetros fixados são necessários, suficientes e pertinentes ao objeto licitado, assegurando-se de que a exigência não implicará restrição do caráter competitivo do certame. (TCU. Acórdão nº 1.524/06, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 30 ago. 2006) Também é pacíco o entendimento quanto à impossibilidade de inserção de
exigências relacionadas à habilitação que não estejam previstas na própria lei de licitações: [...] não exija, como requisito para habilitação das licitantes, a apresentação de certicados
de qualidade e outros documentos que não integrem o rol da documentação exigida por lei para comprovação de capacidade técnica, nos termos do inciso II c/c o §1º, ambos do art. 30 da Lei nº 8.666/93, abstendo-se especialmente de exigir certicado do Programa
Brasileiro de Qualidade e Produtividade de Habitat – PBQPH Nível A, aceitando-o, se for
o caso, apenas como critério de pontuação técnica [...]. (TCU. Acórdão nº 608/08, Plenário.
Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 14 abr. 2008)
[...] com fundamento no art. 43, inciso II, da Lei 8.443/92, c/c o art. 250, inciso IV, do Regimento Interno/TCU, ouvir em audiência o Sr. [...], na condição de autoridade gestora, homologadora, adjudicadora e contratadora por [...] ter autorizado, homologado e adjudicado o processo licitatório da Concorrência [...] com base em edital contendo
exigências para a capacitação técnica das licitantes em desconformidade com o art. 30 da Lei 8.666/93, notadamente em decorrência do estabelecimento de critérios subjetivos com vistas a aferir a qualicação dos concorrentes; bem como da solicitação de apresentação de atestado de qualicação vinculado ao programa QUALIOP, o que contribuiu para a reduzida competitividade do certame [...]. (TCU. Acórdão nº 411/08, Plenário. Rel. Min.
Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 14 mar. 2008).
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
[...] inserir no ato convocatório exigência relativa a tempo de permanência de empresa
participante do certame no mercado, ainda que sob a forma de critério de pontuação na avaliação da proposta técnica, vez que tal prática restringe o caráter competitivo da licitação, consagrado no art. 3º, §1º, inciso I, da Lei 8.666/1993, além de ser contrária à jurisprudência desta Corte, em especial aos Acórdãos 264/2006, 944/2006 e 1.094/2004, todos do Plenário [...]. (TCU. Acórdão nº 653/07, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler.
, DOU
23 abr. 2007)
7.6.3.2 Qualicação econômico-nanceira Na mesma linha adotada para a qualicação técnica, as exigências de qualicação econômico-nanceira devem, sempre de forma justicada, estar adstritas aos requi-
sitos necessários que uma empresa deve possuir para gerenciar adequadamente o empreendimento que será licitado, bem assim compatíveis com a realidade do mercado no setor. Diversas são as constatações de irregularidades pelo TCU referentes a esse item: - exigência, para ns de qualicação econômico-nanceira, de forma cumulativa,
de capital social mínimo, patrimônio líquido mínimo ou garantias que assegurem o adimplemento do contrato a ser celebrado, no caso de compras para entrega futura e de execução de obras e serviços (TCU. Acórdão nº 2.239/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 24 ago. 2012);
- exigência de índices contábeis para qualicação econômico-nanceira mais
restritivos que os usualmente adotados para correta avaliação de situação nanceira suciente ao cumprimento das obrigações decorrentes da licitação,
infringindo o art. 31, §5º, da Lei nº 8.666/93;
- exigência de índices contábeis para qualicação econômico-nanceira sem a devida justicativa no processo administrativo da licitação que deu início ao
certame licitatório, infringindo o art. 31, §5º, da Lei nº 8.666/93 (TCU. Acórdão nº 513/03, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 26 maio 2003); - exigência simultânea, nos instrumentos convocatórios de licitações, de requisitos de capital social mínimo e garantias para a comprovação da qualicação econômico-nanceira dos licitantes; - exigência de índices nanceiros e contábeis não usualmente adotados para a correta avaliação da situação nanceira suciente ao cumprimento das
obrigações decorrentes da licitação, conforme vedação contida no §5º do art. 31 da Lei nº 8.666/93 (TCU. Acórdão nº 326/2010, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 05 mar. 2010);
- ausência de fundamentação para a exigência de índices econômico-nanceiros
mínimos ou máximos em estudo contábil que indique que tais índices foram
xados em níveis apenas o bastante para atestar que a licitante possui condições sucientes para solver suas obrigações, a exemplo do índice de endividamento
menor ou igual a 0,8, estabelecido no edital licitatório, em desacordo com as determinações desta Corte contidas na Decisão nº 1.070/2001 e nos acórdãos nº 778/2005, nº 308/2005, nº 247/2003 e nº 112/2002, todos do Plenário (TCU. Acórdão nº 1.379/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 11 ago. 2006); - comprovação da boa situação nanceira da empresa, mediante a apresentação
de índices de Liquidez Geral (LG), de Liquidez Corrente (LC) e de Solvência Geral (SG) em valores superiores a 2,0 (dois), considerado muito elevado
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face a doutrina contábil corrente, infringindo, pois, o art. 31, §1º e §5º, da Lei nº 8.666/93, alterada pela Lei nº 8.883/94, assim como o art. 3º, §1º, inciso I, da mesma Lei (TCU. Acórdão nº 2.028/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 31 jul. 2006); - promova a reformulação do Edital, alusiva à Idoneidade Financeira, no sentido de serem incluídas disposições referentes à possibilidade de atualização do balanço patrimonial e demais demonstrações contábeis por índices ociais, quando encerrados a mais de 3 (três) meses da data de apresentação da proposta, nos termos previstos no art. 31, inciso I da Lei nº 8.666/93 (documentação relativa à qualicação econômico-nanceira); - inclua, no processo licitatório, as justicativas para os índices de qualicação econômico-nanceira exigidos, reformulando as disposições constantes do subitem 3.1.5 (Idoneidade Financeira) da minuta de edital, sendo vedada a exigência de índices e valores não usualmente adotados para correta avaliação de situação nanceira suciente ao cumprimento das obrigações decorrentes da licitação, conforme o art. 31, §5º, da Lei nº 8.666/93 e jurisprudência do Tribunal de Contas da União (Acórdão nº 112/2002 - TCU - Plenário; Acórdão nº 778/2005 - TCU - Plenário; Acórdão nº 1519/2006 - TCU - Plenário; Acórdão nº 587/2003 - TCU - Plenário; Acórdão nº 1668/2003 - TCU - Plenário; Acórdão nº 1898/2006 - TCU - Plenário; Decisão nº 417/2002 - TCU - Plenário; Decisão nº 417/2002 - Plenário) (TCU. Acórdão nº 597/08, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 14 abr. 2008); - exigir, para efeitos de comprovação de qualicação econômico-nanceira do licitante ou de garantia ao adimplemento contratual, capital mínimo ou valor do patrimônio líquido superior a 10% (dez por cento) do valor estimado da contratação, considerando que tal prática contraria o disposto no art. 31, §3º da Lei nº 8.666/1993 (TCU. Acórdão nº 653/07, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 23 abr. 2007); - restrinja suas exigências para habilitação das empresas em certames licitatórios às previstas nos artigos 27 a 31 da Lei 8.666/1993, abstendo-se de exigir, conforme se vericou na Concorrência nº 02/2004: Certidão Negativa de Multas e Débitos Salariais e Declaração expedida pelo Sindicato Laboral representativo da classe preponderante, que comprove estar a licitante regular quanto à entrega das guias de INSS (TCU. Acórdão nº 2.409/07, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 23 ago. 2007). Ainda sobre o tema, cabe alertar que a denição dos valores de índices de qualicação econômico-nanceira de licitante deve estar suportada em estudos e levantamentos que embasem satisfatoriamente a escolha da Administração: 12. A obrigação de realizar pesquisa e apurar o índice usual de mercado, como foi feito pela Secex/MT, era da administração municipal. A partir desse levantamento, o município estaria apto a xar um índice que atendesse à segurança da contratação, sem afetar a competitividade do certame. Essa preocupação não restou demonstrada nestes autos. As defesas se limitaram a arguir genericamente que buscaram resguardar o erário, mas não comprovaram que zeram levantamento de dados ou estudos que, de fato, dessem a segurança necessária para xação dos índices ora questionados. Ou seja, não atenderam ao dispositivo legal acima referenciado e, portanto, ao interesse público.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
13. Este Tribunal já enfrentou essa questão e deliberou no sentido da obrigatoriedade de fundamentação em estudos/levantamentos especícos que demonstre a necessidade e
adequação da adoção desses índices, principalmente, quando os adotados não sejam os usuais, como no caso ora examinado (acórdãos do Plenário 2.495/2010, 170/2007 e 291/2007). 14. Repito: só foram apresentados argumentos no sentido da segurança/resguardo/ zelo na contratação. Os responsáveis não atentaram, com a mesma preocupação, para a necessidade de assegurar um mínimo de competitividade ao certame. Deixaram de buscar um índice que pudesse ser considerado conável e, ao mesmo tempo, possibilitasse a
participação de uma quantidade razoável de empresas. Um dos princípios a ser preservado em um certame é a competitividade, que irá assegurar o melhor preço. Com pouca competitividade (duas propostas), não há como armar que foi alcançado esse objetivo. (TCU. Acórdão nº 932/2013, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 26 abr. 2013)
7.6.3.3 Atestado de visita às obras É natural que para o efetivo conhecimento das condições da obra que será realizada, seja necessária uma visita técnica prévia por parte da empresa que apresentará a proposta. A Administração deverá facilitar todas as condições para que essa visita seja viabilizada. Contudo, em alguns casos, percebe-se certo exagero por parte do Edital em exigir que a visita seja comprovada por meio de atestados que só poderão ser fornecidos pelo representante do órgão ou entidade responsável pelo procedimento. Em relação ao tema, o TCU tem aceitado, para cumprimento do teor do art. 30, inciso III, da Lei nº 8.666/93, “a substituição do atestado de visita por declaração formal assinada pelo responsável técnico, sob as penalidades da lei, de que tem pleno conhecimento das condições e peculiaridades inerentes à natureza dos trabalhos, assumindo total responsabilidade por esse fato e informando que não o utilizará para quaisquer questionamentos futuros que ensejem avenças técnicas ou nanceiras com o DNIT” (TCU. Acórdão nº 1.174/08, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 24
jun. 2008), em face de não haver comprometimento da competitividade do certame, conforme art. 3º, §1º, I, do mesmo dispositivo legal. Ou, ainda, determinado ao órgão que “abstenha-se de estabelecer, em licitações que venham a contar com recursos federais, cláusulas impondo a obrigatoriedade de comparecimento ao local das obras, de maneira a preservar o que preconiza o art. 3º, caput , e §1º, inciso I, da Lei 8.666/1993, sendo suciente a declaração do licitante de que conhece as condições locais para a
execução do objeto” (TCU. Acórdão nº 1.599/2010, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 14 jul. 2010). A análise do TCU do caso concreto a seguir ilustra com precisão os limites a serem estabelecidos na exigência de visita técnica: 25. No que tange à exigência de atestado de visitação ao local da obra por prossional do quadro permanente da licitante, emitido em visita realizada em duas datas pré-denidas,
destaco que concordo integralmente com a análise da unidade técnica, no sentido de que a jurisprudência deste Tribunal estabelece que a vistoria ao local das obras somente deve ser exigida quando imprescindível, bem como o edital de licitação deve prever a possibilidade de substituição de tal atestado por declaração do responsável técnico de que possui pleno conhecimento do objeto.
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26. Aduzo que a exigência de visita técnica é legítima, quando imprescindível ao cumprimento adequado das obrigações contratuais, o que deve ser justificado e demonstrado pela administração no processo de licitação. No caso em exame, julgo que a realização de visita técnica pouco contribui para o conhecimento do objeto, pois não seria possível aos interessados realizar exame minucioso dos 12,37 km do traçado da linha férrea a ser construída, levantando todas as eventuais interferências existentes. Ademais, trata-se de obra realizada em campo aberto, não havendo nenhuma restrição ao acesso ou necessidade de presença da Administração para que os potenciais interessados inspecionem o seu sítio e realizem os levantamentos que entenderem pertinentes. 27. A exigência de que a visita deveria ser realizada, necessariamente, por engenheiro do quadro permanente das licitantes é outro procedimento que infringe a jurisprudência deste Tribunal, a qual aponta no sentido de que a vistoria, quando exigida, não deve sofrer condicionantes, por parte da Administração, que resultem em ônus desnecessário às licitantes e importem restrição injusticada à competitividade do certame, podendo ser realizada por qualquer preposto das licitantes, a m de ampliar a competitividade do procedimento licitatório. Nesse sentido, elenco os Acórdãos 800/2008-Plenário, 874/2007-2ª Câmara, 2.477/2009-Plenário, 2.028/2006-1ª Câmara, 1.733/2010-Plenário e 3.373/2013-Plenário. 28. Considero possível, nos casos em que a exigência de vistoria técnica se mostrar necessária, que os licitantes contratem um técnico ou outro prossional para esse m especíco, que posteriormente passaria as informações necessárias ao responsável pela execução do contrato, caso a empresa se sagrasse vencedora. Nesse sentido, o voto condutor do Acórdão nº 785/2012-Plenário arma: “em tese, não há óbices para que a visita técnica seja feita por prossional terceirizado pela empresa, sendo razoável, somente, exigir que o mesmo possua conhecimento técnico suciente para tal incumbência”. 29. Assim, as condições de realização dessa visita devem ser ponderadas e avaliadas de modo a evitar a restrição indevida ao caráter competitivo do certame, em atendimento ao art. 3º , caput, e § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993 e ao art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal. 30. As visitas ao local de execução da obra devem ser prioritariamente compreendidas como um direito subjetivo da empresa licitante, e não como uma obrigação imposta pela Administração. Essa é a melhor interpretação do art. 30, inciso III, da Lei de Licitações e Contratos. Tais visitas devem ser facultadas aos participantes do certame, pois têm por objetivo servir de subsídio à elaboração da proposta de preços e dirimir eventuais dúvidas acerca dos projetos e demais elementos que compõem o edital. Deixando de permitir o acesso dos licitantes ao local da obra, estará a Administração se expondo a pleitos futuros dos contratados, durante a execução de uma obra ou da prestação de um serviço, a respeito da insuciência de informações nos projetos. 31. Reputo ser particularmente preocupante a previsão editalícia de realização de visitas coletivas, exigência contrária aos princípios da moralidade e da probidade administrativa, na medida em que permite tanto ao gestor público ter prévio conhecimento das licitantes quanto às próprias empresas terem ciência do universo de concorrentes, criando condições propícias para a colusão. 32. No caso em tela, o contexto em que foi exigida a visita técnica acarretou ônus excessivo aos interessados, restringindo o caráter competitivo do certame. Ata de julgamento da licitação relata que apenas dois consórcios compareceram na sessão pública de abertura das propostas, sendo que uma das propostas foi desclassicada. A única licitante restante apresentou proposta de preço com apenas 2% de desconto em relação ao orçamento base da licitação, sendo declarada vencedora do certame. (TCU. Acórdão nº 234/2015, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 4 mar. 2015).
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
Ainda, em relação à visita técnica, o TCU sugere os seguintes cuidados: - estabelecer prazo adequado para a realização da visita técnica, não a restringindo a dia e horário fxos, com vistas a inibir que potenciais licitantes tomem conhecimento prévio do
universo de concorrentes, bem assim permitir aos possíveis interessados, após a realização da visita, tempo hábil para a fnalização de suas propostas;
- incluir, no caso de visita técnica facultativa, cláusula editalícia que estabeleça ser da responsabilidade do contratado a ocorrência de eventuais prejuízos em virtude de sua omissão na verifcação dos locais de instalação, com vistas a proteger o interesse da
Administração na fase de execução do contrato; - viabilizar meios de fácil acesso que visem disponibilizar aos licitantes todos os itens integrantes do projeto básico, incluindo o memorial descritivo, planilha orçamentária, cronograma de obras, plantas do projeto básico e de modelo de planilha do BDI, de modo a permitir a formulação das propostas, de acordo com o disposto no art. 6º, inciso IX e alíneas, no art. 7º, §2º, incisos I e II, e no art. 40, §2º, incisos I, II e IV, da Lei nº 8.666/1993 (TCU. Acórdão nº 3.459/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 17 dez. 2012).
7.6.4 Consórcios Consórcio representa a união de empresas, que não perderão sua personalidade jurídica, para a realização de determinado empreendimento, geralmente de maior vulto e complexidade técnica. Nos termos do art. 278 da Lei nº 6.404/76, “as companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento” e “o consórcio não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade”. A IN SRF nº 2/2001, em seu art. 14, estabelece a obrigatoriedade de inscrição no CNPJ dos consórcios constituídos. O art. 33 da Lei nº 8.666/93 os requisitos a serem cumpridos quando da participação de consórcios em licitação: I - comprovação do compromisso público ou particular de constituição de consórcio, subscrito pelos consorciados; II - indicação da empresa responsável pelo consórcio que deverá atender às condições de liderança, obrigatoriamente fxadas no edital;
III - apresentação dos documentos exigidos nos artigos 28 a 31 desta Lei por parte de cada consorciado, admitindo-se, para efeito de qualificação técnica, o somatório dos quantitativos de cada consorciado, e, para efeito de qualifcação econômico-fnanceira, o somatório dos valores de cada con-
sorciado, na proporção de sua respectiva participação, podendo a Administração estabelecer, para o consórcio, um acréscimo de até 30% dos valores exigidos para licitante individual, inexigível este acréscimo para os consórcios compostos, em sua totalidade, por micro e pequenas empresas assim def-
nidas em lei; IV - impedimento de participação de empresa consorciada, na mesma licitação, através de mais de um consórcio ou isoladamente; V - responsabilidade solidária dos integrantes pelos atos praticados em consórcio, tanto na fase de licitação quanto na de execução do contrato.
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Diversas são as considerações a serem tecidas a respeito do assunto. A primeira refere-se à responsabilidade solidária, isto é, quando, na mesma obrigação, concorrem mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda. A lei de licitações estabelece a referida responsabilidade, enquanto a Lei nº 6.404/76 é expressa ao se reportar à ausência de presunção de solidariedade. No caso de licitação pública vale a solidariedade das empresas participantes do consórcio em função do princípio da especialidade e do comando inserido no art. 2º, §2º, da Lei de Introdução ao Código Civil. A segunda deve ser avaliada em relação ao texto do caput do artigo em estudo “quando permitida na licitação a participação de empresas em consórcio”. Apesar de divergência doutrinária, a jurisprudência tem se manifestado de que a regra é a autorização em obras de maior vulto a m de que se amplie o universo de concorrentes: Em princípio deve ser considerado que a possibilidade de admissão de consórcios é uma possibilidade dada pela lei ao Administrador, que, tendo em vista o interesse público, analisa se o objeto comporta a execução por meio de empresas consorciadas. Em sendo viável essa alternativa, cabe ao Administrador adotá-la, pois assim seria ampliado o leque de possíveis licitantes. (TCU. Decisão nº 1.090/01, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 24 jan. 2002)
Entretanto, trata-se de escolha discricionária do gestor, a ser avaliada caso a caso, consoante diversas decisões nesse sentido: 39. [...] A jurisprudência deste Tribunal entende que o juízo acerca da admissão ou não de empresas consorciadas na licitação dependerá de cada caso concreto. Para elucidar a questão, reproduzimos a seguir trechos de Acórdãos que evidenciam o entendimento deste Tribunal acerca da matéria: Acórdão nº 1.094/2004 – Plenário “50. Em geral, entende-se que o art. 33 da Lei 8.666/93 deixa à discricionariedade do gestor a decisão de admitir, ou não, a participação de empresas organizadas em consórcio na licitação. No entanto, se as circunstâncias concretas indicarem que o objeto apresenta vulto ou complexidade que tornem restrito o universo de possíveis licitantes, ca o Administrador obrigado a prever a participação de consórcios no certame com vistas à ampliação da competitividade e à obtenção da proposta mais vantajosa”. Acórdão nº 22/2003 – Plenário “9. No mesmo sentido é a regra insculpida no art. 33 da Lei nº 8.666/93, que estipula as normas a serem seguidas pela Administração nas hipóteses em que for permitida a participação de consórcios na licitação. Trata-se de escolha discricionária da Administração, a ser vericada caso a caso. Muitas vezes, a formação de consórcio pode ensejar redução no caráter competitivo, pois facilitaria que empresas, que seriam naturalmente competidoras entre si, acordassem para participar da licitação. 10. Em regra, a formação de consórcios é admitida quando o objeto a ser licitado envolve questões de alta complexidade ou de relevante vulto, em que empresas, isoladamente, não teriam condições de suprir os requisitos de habilitação do edital. Nestes casos, a Administração, com vistas a aumentar o número de participantes, admite a formação de consórcio 11. Não é, contudo, o que ocorre na hipótese sob comento. O objeto licitado não envolve questão de alta complexidade técnica nem apresenta grande vulto nanceiro. Trata-se de contrato de prestação de serviços comuns relacionados ao arquivamento de documentos da Entidade”. (TCU. Acórdão nº 1.946/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 20 out. 2006)
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
A última está atrelada à necessidade de o licitante vencedor estar obrigado a promover, antes da celebração do contrato, a constituição e o registro do consórcio, consoante art. 33, §2º, da lei de licitações. A não apresentação do registro deverá ser considerada como recusa em assinar o contrato, sujeito às sanções previstas em lei. É inegável a importância da abertura da licitação à participação de consórcios por diversos motivos: ampliação da competitividade, possibilidade de redução de custos, facilidade do gerenciamento em relação à administração de responsabilidades. Entretanto, deve-se estar atento ao risco da cartelização em obras de vulto, situação em que empresas de grande porte têm a possibilidade de se unir com o objetivo de reduzir o número de propostas e aumentar o valor do preço ofertado. Por esse motivo, se faz importante um orçamento-base da administração com excelente qualidade a m de servir como referencial dedigno à análise de todas as propostas.
7.7 Regras para o julgamento 7.7.1 Requisitos legais e critérios objetivos A denição dos critérios que serão utilizados no julgamento das propostas é
extremamente relevante para o bom andamento dos trabalhos na fase externa, com a redução da possibilidade de interposições de recursos, bem como da scalização
dos serviços do contrato, quando necessários aditivos. Vale lembrar o princípio do julgamento objetivo que deve nortear o processo, consoante art. 3º da lei de licitações. Se não forem denidos critérios para a avaliação sistêmica da proposta, a comissão
de licitação poderá incorrer em erros de grande consequência que só serão detectados em momentos posteriores. É comum o raciocínio equivocado de que a proposta mais vantajosa para a Administração é aquela que apresenta apenas o menor preço global. Puro engano, conforme será demonstrado a seguir. Por esse motivo, existe no art. 48 da Lei nº 8.666/93 comando que obriga a desclassicação de propostas que não atendam às exigências
do ato convocatório da licitação ou que apresentem valor global superior ao limite estabelecido ou com preços manifestamente inexequíveis. A própria lei de licitações dene a forma de cálculo para a xação de preço manifestamente inexequível, consoante art. 48, §1º. No entanto, essa denição se restringe à análise pontual de limite inferior do preço nal global.
A referida lei, por outro lado, com vistas a que seja realizada análise sistêmica na fase externa dos preços ofertados pelos proponentes, determina aos responsáveis pela elaboração do edital para contratação de obras e serviços de engenharia o seguinte rol de encargos obrigatórios: a) elaboração de orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados (art. 6º, IX, “f”); b) inserção de cláusula obrigatória no edital que dena o critério de aceitabilidade dos preços unitário e global, permitida a xação de preços máximos e vedada a xação de preços mínimos, critérios estatísticos ou faixas de variação em
relação a preços de referência, ressalvado o disposto nos parágrafos 1º e 2º do art. 48 (art. 40, X).
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7.7.2 Avaliação e critério de aceitabilidade de preços unitário, por etapa e global A lei de licitações xa parâmetros para o julgamento das propostas de preços dos licitantes, tanto em relação ao preço global, quanto no tocante aos preços unitários. No que se refere aos valores máximos, exige que a Administração xe os critérios a partir dos quais as propostas serão desclassicadas. Relativamente aos valores inferiores, apesar de vedada a xação de preços mínimos, critérios estatísticos ou faixas de variação em relação a preços de referência, a própria lei estabelece possibilidades de desclassicação quando os preços se mostrarem “manifestamente inexeqüíveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coecientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especicadas no ato convocatório da licitação”. A TABELA 7.14 apresenta resumo das análises que devem ser feitas para o enquadramento das propostas na faixa de preços aceitável, o que ensejará a desclassicação daquelas que não atendam às exigências do ato convocatório (art. 48 da Lei nº 8.666/93) dentro dos seguintes limites: superior, a partir do qual a Administração corre o risco de dano ou prejuízo; e o inferior, atrelado à região de segurança mínima para conclusão do empreendimento. TABELA 7.14 Análises de preço global e unitário exigidas pela legislação Preço global Limite superior
Preço unitário ou por etapa*
art. 48, II c/c art. 40, X
art. 48, I c/c art. 40, X
Critério de aceitabilidade previsto no edital
Critério de aceitabilidade previsto no edital
FAIXA ACEITÁVEL DOS PREÇOS Limite inferior
art. 48, II e §1º
art. 48, II c/c art. 44, §3º
- propostas cujos valores globais sejam inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores:
- propostas que não comprovarem que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coefcientes de produtivida de são compatíveis com a execução do objeto do contrato;
a) média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinquenta por cento) do valor orçado pela administração, ou b) valor orçado pela administração. ou
ou
- proposta que apresente preços global simbólico, irrisório ou de valor zero, incompatíveis com os preços dos insumos e salários de mercado, acrescidos dos respectivos encargos, ainda que o ato convocatório da licitação não tenha estabelecido limites mínimos, exceto quando se referirem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração.
- proposta que apresente preços global ou unitários simbólicos, irrisórios ou de valor zero, incompatíveis com os preços dos insumos e salários de mercado, acrescidos dos respectivos encargos, ainda que o ato convocatório da licitação não tenha estabelecido limites mínimos, exceto quando se referirem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
* No caso de regime por preço global, o Decreto nº 7.983/13, em seu art. 13, inciso I, estabeleceu a possibilidade de que os preços unitários das proponentes sejam aceitos quando superiores a valores de referência, “desde que o preço global orçado e o de cada uma das etapas previstas no cronograma físico-nanceiro do contrato, observado o art. 9º, quem iguais ou abaixo dos preços de referência da administração pública obtidos na
forma do Capítulo II”.
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Vale notar que os limites superiores são conhecidos previamente à licitação, enquanto os inferiores deverão ser avaliados pela comissão após o recebimento das propostas pelos seguintes motivos: a fórmula de cálculo do limite mínimo do preço global envolve o valor da proposta de todos os licitantes; e o licitante deverá comprovar, quando necessário, a compatibilidade de seus custos ou então registrar que renuncia à parcela ou à totalidade da remuneração. A exigência de critérios de aceitabilidade de preços tem importância muito maior do que aparenta. Esses critérios devem ser utilizados em todos os processos licitatórios de obras públicas, mesmo que o regime de execução seja por preço global. A preocupação básica é evitar a contratação de preços acima dos parâmetros de mercado ou, então, a de preços inicialmente vantajosos, mas que, pela distribuição de seus valores unitários, se convertam em prejuízo da Administração no decorrer de eventuais aditivos. Em relação ao tema, existem diversas manifestações do Tribunal de Contas da União: O fato de os processos licitatórios terem sido realizados em regime de preço global não exclui a necessidade de controle dos preços de cada item. É preciso ter em mente que, mesmo nas contratações por valor global, o preço unitário servirá de base no caso de eventuais acréscimos contratuais, admitidos nos limites estabelecidos no Estatuto das Licitações. Dessa forma, se não houver a devida cautela com o controle de preços unitários, uma proposta aparentemente vantajosa para a administração pode se tornar um mau contrato. Esse controle deve ser objetivo e se dar por meio da prévia xação de critérios
de aceitabilidade dos preços unitário e global, tendo como referência os valores praticados no mercado e as características do objeto licitado. (TCU. Decisão nº 253/02, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 07 abr. 2002) A experiência da scalização de obras públicas demonstra que são correntes situações
como a descrita, que envolvem a conjugação dos seguintes fatores: má qualidade do projeto básico; falta de denição de critérios de aceitabilidade de preços unitários; contratação
de proposta de menor preço global, compatível com a estimativa da Administração, mas com grandes disparidades nos preços unitários, alguns abaixo dos preços de mercado — justamente os de maiores quantitativos no projeto básico — e outros muito acima dos preços de mercado, de pouca importância no projeto básico; e, nalmente, o aditamento
do contrato com o aumento dos quantitativos dos itens de preços unitários elevados e a diminuição dos quantitativos dos itens de preços inferiores. (TCU. Decisão nº 1.054/01, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 03 abr. 2002)
Existem casos, não raros, em que determinada empresa procura vencer a licitação utilizando-se de subterfúgios que lhe permitam ofertar um preço inicial global menor, mas obter vantagens indevidas no decorrer dos contratos, seja por meio de antecipação de recebimentos, seja pela celebração de aditivos. 114
Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 42, §4º, do Decreto nº 7.581/11.
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Para antecipação de recebimentos, a proposta poderá trazer preços unitários dos serviços que serão executados inicialmente muito superiores aos de mercado, com a redução dos preços dos serviços a serem executados ao nal. A respeito, cabe destacar posição do TCU: Essa manobra foi clara e objetivamente descrita pelo Ministro-Relator Augusto Sherman Cavalcanti no TC 004.742/2001-5, ao proferir o voto condutor da Decisão nº 4.054/2001-TCUPlenário, em sessão realizada em 11.12.2001: “12. A experiência da scalização de obras públicas demonstra que são recorrentes situações como a descrita, que envolvem a conjugação dos seguintes fatores: má qualidade do projeto básico; falta de denição de critérios de aceitabilidade de preços unitários; contratação de proposta de menor preço global, compatível com a estimativa da Administração, mas com grandes disparidades nos preços unitários, alguns abaixo dos preços de mercado - justamente os de maiores quantitativos no projeto básico - e outros muito acima dos preços de mercado, de pouca importância no projeto básico; e, nalmente, o aditamento do contrato com o aumento dos quantitativos dos itens de preços unitários elevados e a diminuição dos quantitativos dos itens de preços inferiores. Os aditivos, normalmente, respeitam o limite legal de 25% para acréscimos contratuais. 13. O resultado dessa equação são obras interrompidas antes de seu término, na medida em que não mais podem ser aditadas, incapazes de proporcionar o esperado retorno à população, e executadas a preços superfaturados, tudo isso sob o manto de uma licitação aparentemente correta, em que supostamente houve competição, tendo sido adjudicada à licitante de melhor proposta, e executada com aparente respeito à legislação. 14. O nó de toda a questão reside, a meu ver, no descumprimento ou, com vênias pelo neologismo, no ‘mal-cumprimento’ de comandos da Lei de Licitações por parte de órgãos licitantes em geral, e da COMDEPI no caso em apreço, mais especicamente dos dispositivos referentes às características e elementos constitutivos do projeto básico (art. 6º, inciso IX) e da denição de critérios de aceitabilidade dos preços unitários (art. 40, inciso X). Não é demais frisar, como informado no Relatório, que a 1ª Câmara do TCU, ao apreciar o TC 926.037/1998-6, de relatoria do Ministro Humberto Souto (Decisão nº 60/1999), já se manifestou no sentido de que o estabelecimento dos critérios de aceitabilida de de preços unitários, com a xação de preços máximos, ao contrário do que sugere a interpretação literal da lei, é obrigação do gestor e não sua faculdade”. O TCU tem se mostrado rme quanto à exigência de estabelecimento, em edital de licitação, de critérios de aceitabilidade de preços. A grande preocupação do Tribunal com essa exigência reside, na grande possibilidade, comprovada em inúmeros casos examinados pela Corte, de os contratos virem a ser aditados de forma lesiva aos cofres públicos. Indiscutivelmente, a prévia adoção de critérios de aceitabilidade de preços unitários em edital de licitação representa a providência correta e mais adequada a ser adotada pelo administrador público, uma vez que essa medida presta-se a servir de cautela da Administração contra eventuais alterações contratuais que envolvam majoração dos quantitativos de itens previstos no contrato original. (TCU. Acórdão nº 1.650/06, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 15 set. 2006)
Essa posição foi raticada pelo TCU por meio da Súmula nº 259, com a xação do entendimento de que “o estabelecimento dos critérios de aceitabilidade de preços unitários, com a xação de preços máximos, ao contrário do que sugere a interpretação literal da lei, é obrigação do gestor e não sua faculdade, uma vez que o limite constitui fator ordenador da licitação, ao evitar a disparidade exagerada dos preços unitários e global constantes das propostas, predispondo a contratação futura a alterações indevidas” e, por isso, “os editais das licitações para contratação de serviços devem
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
estabelecer os critérios de aceitabilidade de preços unitários e global, com a xação de
preços máximos” (TCU. Acórdão nº 1.380/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. , 23 jul. 2010). DOU A Advocacia-Geral da União, em sua Orientação Normativa nº 5, partilha do mesmo entendimento, com base na seguinte fundamentação: 115
O jogo de planilha consiste na prática ilegal de se efetivar a contratação de proposta de menor preço global, mas com disparidade entre seus preços unitários e os apurados pela Administração. Dessa forma, com os aditamentos contratuais, permite-se o aumento dos quantitativos dos itens de preços unitários cotados por valores acima do mercado e a redução dos quantitativos dos itens cotados a preços inferiores ao de mercado. A ilegalidade ocorre em virtude de a Administração xar, em seus editais, apenas o
critério de aceitabilidade dos preços globais e não o dos preços unitários, a despeito da literalidade do inc. X do art. 40 da Lei nº 8.666, de 1993, que, ao disciplinar o conteúdo do edital, exige: “o critério de aceitabilidade dos preços unitários e global, conforme o caso, permitida a xação de preços máximos e vedados a xação de preços mínimos, critérios
estatísticos ou faixas de variação em relação a preços de referência”. No Acórdão 1.684/2003 - Plenário da Corte de Contas, foi consignado que “a diferença entre critério de aceitabilidade e preço máximo é que se o licitante apresenta uma proposta com preço máximo um centavo além daquele indicado pela administração pública, essa proposta deve ser desclassicada”. Quando se trabalha com critério de aceitabilidade,
ao contrário, é comum os próprios editais dizerem, indicarem: eis o preço unitário, eis o preço padrão, e serão admitidas variações de até quinze por cento, de até vinte por cento, com base naquele preço unitário adotado não como preço máximo, mas de aceitabilidade. E, eventualmente, as próprias comissões de licitações podem admitir eventuais até extrapolações desses limites, desde que justicados. Isso que signica falar em critérios
de aceitabilidade de preço unitário.
De se registrar que a exigência legal para a xação do critério de aceitabilidade nos
editais de obras e serviços de engenharia independe do regime de execução adotado pela Administração, se por empreitada por preço global ou unitário, conforme já pacicado
pelo Tribunal de Contas da União no Acórdão 818/2007 - Plenário. (AGU. Orientação Normativa nº 5, de 1º de abril de 2009. DOU , 07 abr. 2009)
Cabe, entretanto, uma importante observação a respeito da interferência do regime de execução escolhido para a obra na denição do critério de aceitabilidade de
preços. Seguindo os comandos previstos nas leis de diretrizes orçamentárias, o Decreto
nº 7.983/13, em seu art. 13, exibilizou, em parte, o referido critério no caso de regime
por preço global, admitindo que os preços unitários das proponentes sejam aceitos quando superiores a valores de referência, desde que “o preço global orçado e o de
cada uma das etapas previstas no cronograma físico-nanceiro do contrato, observado o art. 9o, quem iguais ou abaixo dos preços de referência da administração pública
obtidos na forma do Capítulo II, assegurado aos órgãos de controle o acesso irrestrito a essas informações”. O exemplo a seguir ilustra a situação, com base no seguinte orçamento hipotético da Administração que reete preços de mercado, TABELA 7.15, e da empresa,
TABELA 7.16.
115
Ver também TCU. Acórdão nº 1.090/07, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 11 jun. 2007.
269
270
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
TABELA 7.15 Planilha do orçamento-base da Administração Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Serviço 1 (inicial)
m³
100,00
30,00
3.000,00
Serviço 2 (inicial)
m³
100,00
20,00
2.000,00
Serviço 3 (intermediário)
m²
100,00
10,00
1.000,00
Serviço 4 (fnal)
m³
200,00
20,00
4.000,00
TOTAL
10.000,00
TABELA 7.16 Planilha do orçamento apresentada pela empresa com majoração dos serviços iniciais Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Serviço 1 (inicial)
m³
100,00
40,00
4.000,00
Serviço 2 (inicial)
m³
100,00
35,00
3.500,00
Serviço 3 (intermediário)
m²
100,00
5,00
500,00
Serviço 4 (fnal)
m³
200,00
9,00
1.800,00
TOTAL
9.800,00
A análise das duas tabelas permite concluir que, apesar do preço da empresa (R$9.800,00) ser menor do que o estipulado pela Administração (R$10.000,00), considerado como de mercado neste exemplo, o valor faturado relativo aos serviços iniciais (1 e 2) seria de R$7.500,00 em confronto com o valor base de R$5.000,00, ou seja, 50 % a mais do que o devido. Em compensação o saldo a receber pelos serviços futuros seria R$2.300,00, enquanto o correto, R$5.000,00. Tal fato, além de prejudicar os demais concorrentes na competição, ocasiona sérios danos à Administração em face da antecipação de pagamentos, e, até mesmo, da possibilidade de paralisação da obra em seu transcorrer pela alegação da empresa que o valor do saldo de serviços a realizar está desequilibrado sob o ponto de vista econômico-nanceiro. Já para se beneciar na celebração de aditivos, a empresa detecta falha na estimativa de quantidades de serviço denidas no projeto básico e eleva o preço relativo àquele serviço. Por exemplo, se no mesmo orçamento elaborado pela Administração no caso anterior, a empresa vericar que houve falha de cálculo nos quantitativos do Serviço 2 e que será necessária a correção por meio de aditivos futuros, poderá apresentar proposta com elevação articial do preço desse serviço, com redução dos demais a m de manter a competitividade inicial, consoante TABELA 7.17.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
TABELA 7.17 Planilha apresentada pela empresa com majoração do Serviço 2 Serviços
Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Serviço 1 (inicial)
m³
100,00
20,00
2.000,00
Serviço 2 (inicial)
m³
100,00
40,00
4.000,00
Serviço 3 (intermediário)
m²
100,00
10,00
1.000,00
Serviço 4 (fnal)
m³
200,00
15,00
3.000,00
TOTAL
10.000,00
Na realização desse aditivo, a empresa estará com preço unitário de R$20,00 maior que o de mercado (R$40,00 - R$20,00), ou seja, 100% superior, o que permitirá um elevado lucro na execução do trabalho em prejuízo da Administração. Os exemplos mencionados apenas raticam a importância de que seja observada
a diretriz legal inserida no art. 40, X, da lei de licitações, e ilustram o potencial prejuízo ao erário que o seu descumprimento ocasiona. Por esses motivos, o Tribunal tem formulado diversas determinações para evitar tais tipos de ocorrências: - recomendar ao [...] que:
- regulamente, para as licitações de obras rodoviárias: - a obrigatoriedade de utilização dos preços referenciados pelo Sicro2 na elaboração dos orçamentos; - a obrigatoriedade de adoção de critérios de aceitabilidade de preços unitários e global; - a obrigatoriedade de justicação dos critérios de aceitabilidade de preços unitários e
global adotados, em confronto com os preços referenciados pelo Sicro2. (TCU. Acórdão nº 267/03, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 07 abr. 2003) [...] alertar à [...] que, mesmo nos casos de contratação por preço global (Lump Sum),
impõe-se à estatal a adoção de providências com vistas à adequação dos valores unitários quando se revelarem incompatíveis com os preços de mercado; [...]. (TCU. Acórdão nº 1.595/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006) [...] determinar ao [...] que, antes de publicar o edital para a construção da obra de seu novo edifício-sede, observe os seguintes comandos: [...]
- promova a análise da compatibilidade dos preços do projeto básico entregue pela empresa vencedora da Concorrência [...] com os praticados no mercado como forma de garantir o alcance da melhor proposta na licitação da obra – art. 3º, caput , da Lei nº 8.666/1993;
- exija a composição de preços de todos os itens da planilha orçamentária do projeto básico, bem como das futuras planilhas de preços da licitação a ser realizada para a construção da nova sede do Ministério Público do Trabalho, em atendimento ao art. 7º, §2º, II, da Lei nº 8.666/1993. (TCU. Acórdão nº 1.387/06, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 11 ago. 2006)
271
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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Com efeito, o STJ também reconhece a sintonia desse comando: 1. A partir da publicação do edital de licitação, nasce o direito de impugná-lo, direito que se esvai com a aceitação das regras do certame, consumando-se a decadência (divergência na Corte, com aceitação da tese da decadência pela 2ª Turma – ROMS 10.847/MA). 2. A licitação da modalidade menor preço compatibiliza-se com a exigência de preços unitários em sintonia com o valor global – arts. 40, 44, 45 e 48 da Lei 8.666/93. 3. Previsão legal de segurança para a Administração quanto à especicação dos preços
unitários, que devem ser exeqüíveis com os valores de mercado, tendo como limite o valor global. 4. Recurso improvido. (STJ. RMS nº 15.051/RS, 2ª Turma. Rel. Min. Eliana Calmon. DJ , 18 nov. 2002)
Por m, dúvida frequente refere-se à forma de xação dos critérios de aceita bilidade. Apesar de não haver denição estabelecida em lei, deve-se assumir, em função
da própria dinâmica do mercado e características do empreendimento, a possibilidade de variações entre os preços unitários da proposta das empresas e o estabelecido no orçamento-base. Contudo, quatro regras devem nortear a contratação: a) essas variações não podem ser extremamente significativas a ponto de possibilitar jogo de planilha pelos licitantes; b) apesar dessas variações serem, por vezes, favoráveis e, por outras, contrárias à empresa, os preços globais não podem se situar em patamares distintos; c) se houver erro na estimativa do orçamento-base, este deve ser questionado pelas licitantes antes da entrega da proposta; e d) “somente é admissível que um empreendimento seja contratado por valores superiores aos obtidos a partir da utilização dos sistemas referencias de preço ociais ante a presença de condições extraordinárias que assim justiquem”
(TCU. Acórdão nº 3.095/14, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU, 19 nov. 2014).
7.8 Procedimentos especiais A lei de licitações prevê procedimentos especiais para a contratação de obras de valor signicativo ou que apresentem complexidade técnica que recomende análise mais detida da qualicação técnica dos interessados.
7.8.1 Audiência pública É obrigatória a realização de audiência pública, nos termos estabelecidos no art. 39 da Lei nº 8.666/93, oportunidade em que terão “acesso e direito a todas as informações pertinentes e a se manifestar todos os interessados”, “sempre que o valor estimado para uma licitação ou para um conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas 116
116
Denidas no art. 39, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93 como aquelas com objetos similares e com realização
prevista para intervalos não superiores a 30 dias e licitações sucessivas aquelas em que, também com objetos similares, o edital subsequente tenha uma data anterior a 120 dias após o término do contrato resultante da licitação antecedente.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
for superior a 100 vezes o limite previsto no art. 23, inciso I, alínea ‘c’”, da aludida lei, ou seja, R$150.000.000,00. Deverão ser observados os seguintes prazos: a) a audiência deverá ser concedida pela autoridade responsável com antecedência mínima de 15 dias úteis da data prevista para a publicação do edital; e b) a divulgação da referida audiência será feita, com a antecedência mínima de 10 dias úteis de sua realização, pelos mesmos meios previstos para a publicidade da licitação. O principal objetivo dessa audiência é ampliar o debate a ser realizado a fm de
colher subsídios de todos os atores envolvidos a respeito de problemas ou sugestões atinentes ao projeto. Vale notar que, por ser procedimento obrigatório, sua não realização acarretará a nulidade de toda a licitação, devendo a autoridade ser responsabilizada pelos danos incorridos por essa irregularidade.
7.8.2 Pré-qualifcação A fgura da pré-qualifcação pode ser utilizada, nos termos do art. 114 da Lei
nº 8.666/93, nos casos de concorrência, sempre que o “objeto da licitação recomende análise mais detida da qualifcação técnica dos interessados”. Por ser procedimento
especial, a lei exige que a proposta da autoridade competente seja aprovada pela imediatamente superior. A preocupação em relação à possível restritividade de competição com a utilização desse procedimento é constante, tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Marçal Justen Filho se posiciona da seguinte forma: A instituição da pré-qualifcação envolve uma apreciação discricionária da Administração. No entanto, não é admissível o sistema de pré-qualifcação quando a licitação não versar
sobre objeto que apresente peculiaridades. Essas peculiaridades fazem presumir que apenas particulares dotados de certos requisitos não ordinários poderiam executar satisfatoriamente o objeto.
A pré-qualifcação envolve uma ampliação dos requisitos e exigências para participar do procedimento seletivo. Verifcam-se restrições usualmente não praticadas. 117
Também preocupado com o direcionamento, Jessé Torres Pereira Junior se manifesta a respeito do tema: A inclusão, no procedimento das licitações mediante concorrência, de uma etapa de préqualifcação tem lugar, apenas, quando houver necessidade de apurar-se, com especial acuidade, a qualifcação técnica de interessados em contratar obra ou serviço de grande porte e cuja execução envolva peculiar grau de difculdade, a demandar do executor nível
correspondente de especialização e experiência. Este nível será o alvo da aferição a que
a Administração procederá na pré-qualifcação, de sorte a somente admitir ao certame
aqueles que o alcançarem, comprovadamente. Sugerirá direcionamento indevido do torneio competitivo a inserção dessa etapa excepcional previamente à concorrência cujo objeto não apresentar aquele grau de
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 1084.
117
273
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
274
diculdade. Por isso o §1º do art. 114 exige que a adoção do procedimento da préqualicação seja proposta e aprovada pelas autoridades respectivamente competentes, relacionadas hierarquicamente. Do que também se deduz que o ato de sua autorização será necessariamente motivado, sujeitando-se aos controles internos e externos dos atos administrativos. 118
O TCU, por sua vez, reconhece a possibilidade de utilização desse procedimento para licitações que tenham as características xadas na lei, ressalvando, apenas, que as exigências de capacitação devam se restringir a parcelas de maior relevância e valor signicativo, bem como a denição de critérios de pontuação de preço ser formulada sem inibir a competitividade dos licitantes: 1. Desde que atendidos certos requisitos, é possível, em concorrência concernente a obras aeroportuárias, que a fase de pré-qualicação substitua a habilitação liminar. [...] 3. As exigências de comprovação de capacitação técnico-operacional devem se restringir às parcelas de maior relevância do objeto licitado. 4. As exigências de comprovação de qualicação técnico-prossional devem se restringir às parcelas que sejam, cumulativamente, de maior relevância e valor signicativo e indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. [...] 6. São vedados os critérios de pontuação de proposta de preço que, na prática, resultem na xação de preços mínimos, abaixo dos quais a referida pontuação se torna constante. (TCU. Acórdão nº 1.891/06, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. Brasília, 11 out. 2006. DOU , 16 out. 2006)
Vale relacionar as observações tecidas quando da discussão da matéria no âmbito do referido Tribunal: [...] não vejo óbice — desde que atendidos os requisitos adiante apontados — a que a fase de pré-qualicação substitua a etapa de habilitação ordinária prevista nos arts. 27 a 31 da Lei de Licitações e Contratos, pois, sendo aquela fase restrita a licitações cujos objetos recomendem análise mais detida da qualicação técnica dos interessados — art. 114, caput , da sobredita Lei —, certamente faz-se necessário maior rigor na aferição da capacidade operacional das licitantes, resultando inócua eventual etapa de habilitação, que serviria apenas para repetir atos do procedimento licitatório. 6. Ressalte-se, maxima venia , que essa repetição me faz dissentir também da tese acolhida por alguns administrativistas, para os quais a pré-qualicação não deve ser confundida com a habilitação liminar. 7. Em sentido contrário, sustentando a possibilidade de substituição da habilitação pela pré-qualicação, cito Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, para quem esse procedimento “acelera o processo de licitação convencional, pois quando a licitação convencional for realizada, o universo dos licitantes será restrito aos que efetivamente têm condição de licitar e já foram habilitados” (in Vade-Mecum de Licitações e Contratos, Editora Fórum, 2004, p. 784). Nessa mesma linha, Marçal Justen Filho registra que “A pré-qualicação consiste em dissociar a fase de habilitação do restante do procedimento da concorrência” (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 8ª ed., 2000, p. 664). 8. Contudo, conforme ressaltado anteriormente, alguns pressupostos devem ser atendidos para que o procedimento licitatório não vá de encontro aos princípios e dispositivos da Lei nº 8.666/1993.
118
PEREIRA JUNIOR. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública , p. 1012-1013.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
9. Primeiramente, devem ser observados os arts. 27 a 31 do aludido Diploma, os quais, sendo de aplicação obrigatória na fase de habilitação das concorrentes, necessariamente o deverão ser na pré-qualicação substituta daquela etapa ordinária. Também devem existir
informações mínimas que possibilitem às licitantes ter noções razoáveis do que venha a ser contratado, como forma de compatibilizar as exigências para a habilitação, requeridas na pré-qualicação, com a realidade que se pretende executar — Acórdãos 1.290/2004 e
1.708/2003, ambos deste Plenário —, permitindo, ainda, que as interessadas, sob pena de preclusão, exercitem seu direito de impugnar eventuais exigências habilitatórias indevidas. [...]
DECLARAÇÃO DE VOTO Acompanho a proposta do eminente Ministro Ubiratan Aguiar. Apenas suscito questão discutida no Voto proferido por Sua Excelência relativa à possibilidade de o procedimento de pré-qualicação vir a substituir a habilitação de interessados na licitação.
No presente caso, pelos motivos apresentados pelo nobre Relator, entendo razoável a dispensa de habilitação na referida concorrência, especialmente à vista da informação constante do parágrafo 10 do Voto distribuído: “10. No caso em estudo, observo que o edital de pré-qualicação da Concorrência [...], não obstante a inexistência de projeto básico,
vem acompanhado de planilha indicativa dos itens a serem executados e dos respectivos quantitativos e preços unitários [...]
Considero, no entanto, relevante observar que em regra os procedimentos de préqualicação e habilitação não se confundem. No procedimento da pré-qualicação previsto no art. 114 da Lei nº 8.666/93, se avalia a qualicação técnica dos interessados, ou seja, se as
empresas atendem os requisitos técnicos necessários para participar da licitação, enquanto que na fase de habilitação disposta nos arts. 27 a 31 da mesma lei, exigir-se dos interessados além da comprovação da qualicação técnica documentação relativa a habilitação jurídica, qualicação econômico-nanceira, regularidade scal e o cumprimento do disposto no
inc. XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.
Ocorre que, no presente caso, a [...] foi, no aludido procedimento, além da qualicação técnica, uma vez que o edital de pré-qualicação incluiu, também, o exame dos requisitos
de habilitação previstos nos arts. 27 a 31 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos. [...]
Apenas apresento essas ponderações para evitar que eventualmente algum ente jurisdicionado a este Tribunal venha equivocadamente entender que o procedimento de pré-qualicação possa substituir a fase de habilitação das concorrentes. (TCU. Acórdão nº 1.891/06, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 16 out. 2006)
A jurisprudência aponta diversas falhas na utilização do procedimento, razão pela qual é determinado a órgão responsável que: [...] abstenha-se de prever fase de pré-qualicação quando não se estiver diante de licitações
a serem realizadas na modalidade concorrência, e ainda assim somente nos casos de o objeto licitado recomendar uma análise mais detida da capacidade técnica dos potenciais interessados, face ao disposto no art. 114 da Lei nº 8.666/93. (TCU. Acórdão nº 2.028/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 31 jul. 2006) [...] não realize a pré-qualicação das empresas com base na metodologia exigida na Concorrência nº [...], tendo em vista que essa metodologia não mede a qualicação técnica
das propostas e não possui objetividade de julgamento, falhando, assim, no atendimento dos requisitos impostos pelo art. 114, caput e §2º, da Lei nº 8.666/1993. (TCU. Acórdão nº 1.529/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 30 ago. 2006)
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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Cabe notar a especial atenção a ser dada quando da utilização desse procedimento. Se, por exemplo, número reduzido de empresas lograrem êxito na pré-qualifcação, será alto o risco de conluio quando da apresentação das propostas, visto que serão previamente conhecidos os licitantes que poderão apresentar seus preços. Pior se houver apenas uma empresa pré-qualifcada, situação em que deixará de haver competitividade na apresentação dos preços. Nesses casos, a Administração deverá avaliar a conveniência da revogação do certame, sob pena de não conseguir obter a proposta mais vantajosa. 119
7.8.3 Metodologia de execução Cabe também registrar que a lei de licitações faculta a Administração, em seu art. 30, §8º, “exigir dos licitantes a metodologia de execução, cuja avaliação, para efeito de sua aceitação ou não, antecederá sempre à análise dos preços e será efetuada exclusivamente por critérios objetivos”, nos casos de obras, serviços e compras que apresentem cumulativamente as seguintes características: a) sejam de grande vulto, consideradas aquelas que possuam valores superiores a 25 vezes ao limite estabelecido no art. 23, inciso I, alínea “c”, ou seja, R$37.500.000,00; e b) tenham elevada complexidade técnica. A avaliação da metodologia para efeito de aceitação é prévia à análise de preços, até mesmo pelo fato de que os preços estão diretamente relacionados à metodologia. 120
Nada impede que a Administração opte por remeter a proposta de metodologia a julgamento em etapa especial. Assim, a licitação seria desdobrada em três etapas. Haveria um envelope para documentação em geral, outro para metodologia de execução e um terceiro para proposta comercial. 121
Os critérios de julgamento deverão ser objetivos, de forma a permitir a abertura dos envelopes de preços apenas daquelas propostas de empresas que obtiverem pontuação mínima fxada no edital. As que não alcançaram o patamar defnido serão desclassifcadas, sendo imprópria a utilização da expressão “inabilitada”, visto que não há correlação entre a capacidade da empresa e a metodologia apresentada. O TCU tem indicado a órgão responsável pela licitação que utilize a faculdade da solicitação da metodologia apenas nos casos restritos previstos em lei e que defna de forma objetiva os critérios de avaliação, conforme podemos depreender das seguintes determinações:
119
O caso é diferente de um processo licitatório normal em que todos os licitantes apresentam proposta de preço no mesmo momento em que entregam a relativa à habilitação, ou seja, procuram ser competitivos ao máximo, pois não se conhece todas as empresas que serão habilitadas. 120 Art. 30, §9º, da Lei nº 8.666/93: “Entende-se por licitação de alta complexidade técnica aquela que envolva alta especialização, como fator de extrema relevância para garantir a execução do objeto a ser contratado, ou que possa comprometer a continuidade da prestação de serviços públicos essenciais”. 121 JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 532.
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
[...] abstenha-se de exigir metodologia de execução dos serviços para obras que não sejam denidas em lei como de grande vulto, haja vista o ocorrido nas Concorrências nº [...],
de modo a não cercear a competitividade dos certames licitatórios, em observância ao disposto no art. 30, §8º, c/c os arts. 6º, inc. V, e 23, I, alínea c; e no art. 3º, §1º, inc. I, da Lei nº 8.666/93. (TCU. Acórdão nº 1.074/03, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. , 18 ago. 2003) DOU [...] caso venha a exigir a metodologia de execução prevista no §8º do art. 30 da Lei
nº 8.666/1993, aperfeiçoe os critérios de julgamento e pontuação dessa metodologia, de modo a torná-los objetivos e claros, em obediência à legislação pertinente, em especial ao princípio do julgamento objetivo, consagrado no art. 3º da mencionada Lei, abstendo-se, ainda, de incluir na metodologia exigida itens que nada dizem respeito à eventual atuação do licitante vencedor no âmbito do contrato, tais como os consignados no denominado “Plano de Metodologia de Execução dos Serviços”, indicado no item 15.2 “c” do edital da Concorrência. (TCU. Acórdão nº 1.529/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 30 ago. 2006) [...] dena previamente à publicação do edital as características técnicas e a metodologia
necessária para a execução dos serviços conforme determinado no art. 6º, inciso IX c/c o art. 7º, §2º, inciso I da Lei 8.666/93, evitando a utilização de critérios do tipo “Conhecimento do Problema” e “Plano de Trabalho” como forma de julgamento de propostas técnicas em que as licitantes descrevam metodologias ou especicações técnicas que devem estar
contidas no projeto básico, de forma a evitar julgamentos subjetivos com base nestes itens das propostas técnicas, pois isto fere o art. 44, §1º e o art. 46, §1º, inciso I e §2º do mesmo artigo, da Lei 8.666/93. (TCU. Acórdão nº 2.601/04, 2ª Câmara. Rel. Min. Adylson Moa.
, DOU
20 dez. 2004)
7.8.4 Análise comparativa Interessante notar, em relação ao momento dos procedimentos, que a préqualicação e a análise da metodologia de execução ocorrem após a publicação do edital
(fase externa), enquanto audiência é prévia a essa publicação, ou seja, implementada na fase interna, conforme ilustra a FIGURA 7.h. Contudo, enquanto na pré-qualicação
antecipa-se a análise de conteúdo relativo à habilitação das empresas, na metodologia de execução antecipa-se a avaliação de conteúdo relativo à proposta. Fase externa
Fase interna
Audiência
Préqualificação
Habilitação
Met. de execução
Proposta
FIGURA 7.h - Ilustração gráca dos momentos em que ocorrem os procedimentos especiais (lembrar que
cada um depende dos requisitos estabelecidos em lei)
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Em relação ao aspecto discricionário do gestor, o único procedimento especial obrigatório é o da audiência quando ocorrerem as hipóteses previstas em lei. A realização dos demais será avaliada pela autoridade competente, porém, apenas quando as características da licitação se enquadrarem nas exigências legais.
7.9 Avaliação por assessoria jurídica da administração O art. 38, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, estabelece que “As minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes devem ser previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração”. Questão interessante em relação ao tema refere-se à responsabilidade dessa assessoria em relação ao parecer emitido. A respeito, o TCU assim se manifestou: A responsabilidade do advogado autor de um parecer jurídico deve ser desdobrada em pelo menos duas esferas distintas. Na primeira, apurar-se-ia a responsabilidade do advogado
pelo exercício prossional da advocacia, na qual caberia ao Conselho Seccional da OAB,
nos termos do art. 32 da Lei 8.906/94, a aplicação das sanções disciplinares, como censura, suspensão, exclusão e multa nas hipóteses discriminadas no Estatuto da Advocacia, sem exclusão da jurisdição comum, perante as autoridades judiciais competentes. Na segunda, a responsabilidade imputada ao autor do parecer jurídico está interrelacionada com a responsabilidade pela regularidade da gestão da despesa pública,
disciplinada pela Lei 8.443/92, cuja scalização se insere na competência deste Tribunal, em hipóteses especícas de fraude e grave dano ao erário. É certo que a atividade de controle externo contempla, entre outros aspectos, a vericação da legalidade, legitimidade e economicidade dos atos relacionados com a gestão de
recursos públicos no âmbito da scalização contábil, nanceira orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta. O parecer jurídico emitido por consultoria ou assessoria jurídica de órgão ou entidade, via de regra acatado pelo ordenador de despesas, constitui fundamentação jurídica e integra
a motivação da decisão adotada, estando, por isso, inserido na vericação da legalidade, legitimidade e economicidade dos atos relacionados com a gestão de recursos públicos
no âmbito da scalização contábil, nanceira, orçamentária, operacional e patrimonial da administração pública federal, exercida pelo Congresso Nacional com o auxílio deste Tribunal, ex vi do art. 70, caput , e 71, II, da Constituição Federal. O fato de o autor de parecer jurídico não exercer função de execução administrativa, não ordenar despesas e não utilizar, gerenciar, arrecadar, guardar ou administrar bens,
dinheiros ou valores públicos não signica que se encontra excluído do rol de agentes
sob jurisdição deste Tribunal, nem que seu ato se situe fora do julgamento das contas dos gestores públicos, em caso de grave dano ao erário, cujo principal fundamento foi o parecer jurídico, muita vez sem consonância com os autos. Na esfera da responsabilidade pela regularidade da gestão, é fundamental aquilatar a existência do liame ou nexo de causalidade existente entre os fundamentos de um parecer desarrazoado, omisso ou tendencioso, com implicações no controle das ações dos gestores da despesa pública que tenha concorrido para a possibilidade ou concretização do dano ao erário. Sempre que o parecer jurídico pugnar para o cometimento de ato danoso ao erário ou
com grave ofensa à ordem jurídica, gurando com relevância causal para a prática do ato, estará o autor do parecer alcançado pela jurisdição do TCU, não para ns de scalização do exercício prossional, mas para ns de scalização da atividade da Administração Pública. A mera inscrição do servidor ou empregado público, na Ordem dos Advogados do Brasil,
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
não serve de passaporte para a impunidade por condutas que tenham papel determinante na ocorrência de danos ao erário ou de atos praticados com grave violação à ordem jurídica, como intermitentemente tem ocorrido no âmbito do serviço público. (TCU. Acórdão nº 462/03, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 26 maio 2003)
Vale registrar que matéria semelhante foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal, que rmou entendimento no sentido de que “prevendo o artigo 38 da Lei
nº 8.666/93 que a manifestação da assessoria jurídica quanto a editais de licitação, contratos, acordos, convênios e ajustes não se limita a simples opinião, alcançando a aprovação, ou não, descabe a recusa à convocação do Tribunal de Contas da União para serem prestados esclarecimentos” (STF. MS nº 24.584/DF, Pleno. Rel. Min. Marco Aurélio. DJ , 20 jun. 2008). Dessa forma, rma-se entendimento de que o assessor jurídico é responsável
pelo conteúdo de seu parecer, visto ser essa peça elemento fundamental no processo de aprovação do Edital, nos termos previstos na lei de licitações. A esse respeito, o texto do acórdão do TCU a seguir registra:
9.2.1. em razão do disposto no art. 38, parágrafo único, da Lei 8.666/1993, as minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, necessitam ser previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração, de modo que, havendo o órgão jurídico restituído o processo com exame preliminar, torna-se necessário o retorno desse, após o saneamento das pendências apontadas, para emissão de parecer jurídico conclusivo, sobre sua aprovação ou rejeição; 9.2.2. caso venha discordar dos termos do parecer jurídico, cuja emissão está prevista no inciso VI e no parágrafo único do art. 38 da Lei nº 8.666/1993, deverá apresentar por escrito a motivação dessa discordância antes de prosseguir com os procedimentos relativos à contratação, arcando, nesse caso, integralmente com as consequências de tal ato, na hipótese de se conrmarem, posteriormente, as irregularidades apontadas pelo órgão
jurídico. (TCU. Acórdão nº 521/2013, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 18 mar. 2013) Além disso, o parecer precisa contemplar detalhamento suciente para supor-
tarem a boa contratação, devendo-se tomar cuidado com conteúdos genéricos e pouco objetivos: 26. De fato, a utilização de pareceres jurídicos sintéticos, de apenas uma página, com conteúdo genérico, sem demonstração da efetiva análise do edital e dos anexos, em especial quanto à legalidade das cláusulas editalícias, permitiu, no caso concreto, a presença de itens posteriormente impugnados, inclusive por meio da presente representação, e que foram alterados nos certames subsequentes. 27. Este Tribunal já se posicionou acerca da necessidade de os pareceres jurídicos exigidos pelo art. 38 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, integrarem a motivação dos atos administrativos, com abrangência suciente, evidenciando a avaliação integral
dos documentos submetidos a exame (v. g.: Acórdão 748/2011-Plenário). (TCU. Acórdão nº 1.944/2014, Plenário. Rel. Min. André Luis de Carvalho. DOU , 23 jul. 2014).
De qualquer modo, independentemente da participação da assessoria jurídica, os prossionais encarregados da elaboração e aprovação do edital, bem como a autoridade
que o aprovou, serão sempre responsáveis por futuros problemas decorrentes de irregularidade nesta etapa.
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7.10 Responsabilidade dos agentes públicos O TCU, no curso do julgamento de processos afetos a obras públicas, tem rmado diversos entendimentos a respeito da possibilidade de responsabilização dos agentes públicos — gestores, membros de comissão de licitação e assessoria jurídica — que deram ensejo a prejuízo ao erário: 9. O ato omisso da recorrente, que estava investida como autoridade homologadora da licitação, está materializado na ausência de conferência dos requisitos essenciais do procedimento sob sua responsabilidade. 10. Ficou caracterizada, portanto, a negligência, ou seja, a inobservância de normas que lhe ordenariam a agir com atenção, capacidade, solicitude e discernimento. Tal negligência não pode ser descaracterizada simplesmente alegando-se possível erro de subordinados ou suposta ausência de prejuízo nanceiro computado. Mesmo porque a responsabilidade, neste caso, pode advir de culpa in eligendo , ou seja, da má escolha daquele em quem se cona a prática de um ato ou o adimplemento da obrigação, e da culpa in vigilando , decorrente da falta de atenção com o procedimento de outrem. Há que se considerar, ainda, que responsabilidade não se transfere. (TCU. Acórdão nº 137/2010, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 07 fev. 2010) 4. O ex-prefeito [...] foi o único ouvido pela ocorrência descrita na alínea “a” supra, que consistiu em ofensa à regra do art. 51, §4º, da Lei 8.666/1993, e não apresentou defesa especíca para este item. A Lei, ao prever a rotatividade da composição da Comissão Permanente de Licitação, busca preservar a Administração da perpetuação de falhas cometidas por determinados integrantes, sejam decorrentes de má-fé ou de deciência técnica. Além disso, considerando a natureza dessa atividade, que envolve a gestão de recursos públicos e o interesse de particulares, a alternância nessas atribuições busca reduzir a margem para fraudes decorrentes da ingerência de licitantes junto aos trabalhos da Comissão. (TCU. Acórdão nº 1.281/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 20 jun. 2010) c) a aprovação da minuta pela Procuradoria-Geral do Estado do Amazonas não tem o condão de vincular a administração, tendo em vista o entendimento desta Corte quanto ao tema, conforme exposto no TC 010.770/2000-7, quando cou consignado que: “Além disso, vale salientar que o parecer é opinativo e não vincula o administrador. Este tem o comando da empresa e assume a responsabilidade de sua gestão. Se se entendesse de forma diversa, estar-se-ia considerando que o parecer jurídico é um alvará para o cometimento de ilícitos, o que constitui um absurdo. O dirigente de uma Companhia possui o comando da máquina administrativa e deve estar ciente de todas as decisões que adota, independentemente da natureza delas. O administrador público não é simplesmente uma gura decorativa na estrutura da empresa. Ao contrário, deve ter uma postura ativa no comando da empresa. Com mais razão, nas licitações, os gestores devem ser ainda mais cuidadosos, vez que estas envolvem princípios fundamentais da administração pública, tais como: legalidade, eciência, moralidade, impessoalidade, publicidade, controle, coordenação, planejamento, isonomia, proposta mais vantajosa, dentre outros (Constituição Federal, Decreto-lei nº 200/67, Lei nº 8.666/93)”. (TCU. Acórdão nº 1.379/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 21 jun. 2010)
Entretanto, oportuno trazer análise do TCU em caso no qual se discutia a responsabilidade da autoridade delegante. Na oportunidade, cou registrada a necessidade da análise de cada caso concreto relativa às culpas in eligendo e in vigilando , em especial
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
pela impossibilidade de que a totalidade dos atos exercidos sob o manto da delegação de competência seja vigiada e controlada: 10. É evidente que a delegação de competência é princípio fundamental das atividades da Administração Federal, nos termos do Decreto-Lei 200/1967, cujo art. 11 dispõe que “será utilizada como instrumento de descentralização administrativa, com o objetivo de assegurar maior rapidez e objetividade às decisões, situando-as na proximidade dos fatos, pessoas ou problemas a atender”. 11. E o parágrafo 2º do art. 80 desse dispositivo legal arma: “O ordenador de despesa, salvo conivência, não é responsável por prejuízos causados à Fazenda Nacional decorrentes de atos praticados por agente subordinado que exorbitar das ordens recebidas”. 12. Ou seja, a responsabilidade da autoridade delegante pelos atos delegados não é automática ou absoluta. Pelos precedentes judiciais, doutrina e dispositivo legal mencionados, verica-se que a análise das situações fáticas é imprescindível para denir essa responsabilidade. Do contrário, inviabiliza-se o próprio instituto da delegação e cai por terra o objetivo pretendido por ele. 13. É necessário vericar se existem condutas desabonadoras cometidas pela autoridade delegante. Enumeram-se, a seguir, três condutas que podem conduzir à responsabilidade da autoridade delegante pela ocorrência do ato delegado: (i) comprovado conhecimento da ilegalidade cometida pelo delegado, que caracteriza conivência do delegante; (ii) má escolha daquele a quem conou a delegação, que congura culpa in eligendo; e (iii) falta de scalização dos procedimentos exercidos por outrem, que consubstancia culpa in vigilando. 14. Relativamente à comprovação do conhecimento dos fatos ora inquinados, por parte do diretor-geral, não consta dos autos nenhum indício, documento ou depoimento que corrobore essa conclusão. Pelo processo, os fatos vieram à tona por meio de denúncia de favorecimento de empresa contratada, que ensejou a realização de perícias pelo Denasus e culminou com a constatação de pagamentos indevidos de serviços de manutenção. Antes disso, não há informação a respeito dessas irregularidades, nem depoimentos de testemunhas de que tais fatos eram de conhecimento do diretor-geral. Não há provas dessa conduta por parte do ex-gestor. Afasta-se, pois, a hipótese de conivência. 15. A responsabilidade pela má escolha dos agentes delegados é apontada nos relatórios periciais do Denasus em razão de os scais das obras de engenharia serem agentes administrativos, sem formação na área especíca, não havendo engenheiros ou arquitetos incumbidos ocialmente desses serviços. Num primeiro exame, conclui-se, então, pela culpa do diretor-geral. 16. Contudo, análise mais detalhada dos autos traz à tona o fato de que o referido gestor não tinha engenheiros ou arquitetos em seu quadro de funcionários, consoante depoimento prestado por ele junto à equipe do Denasus. Naquele depoimento, armou que nunca pôde implementar o serviço de engenharia e a contratação de prossionais com habilitação para tal no hospital, por falta de autorização superior. Isso o fez solicitar o apoio do Ministério da Saúde, do Hospital Cardiológico de Laranjeiras/RJ e de estagiária para se desincumbir das obras necessárias à instituição. Também não havia recursos orçamentários para contratação de empresa para realização de anteprojetos à época. [...] 18. Afastada a existência na entidade, à época (1997), de prossionais capacitados preteridos pelo gestor, resta analisar a escolha efetivada. Foram designados como scais e chefes de serviço agentes administrativos. Não há nos autos informações de que tais servidores tivessem alguma mácula moral ou prossional que os desabonassem para ocupação das funções designadas pelo gestor. Dessa feita, não havia escolha “melhor” a ser efetuada e não há, então, que se falar em culpa in eligendo do recorrente.
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19. Resta examinar a ocorrência de culpa in vigilando do ex-gestor, caracterizada pela falta de scalização dos procedimentos exercidos por outrem. Ao posicionar o gestor
frente a suas atribuições, observo que se trata do cargo mais alto de um hospital federal de grande porte situado no Rio de Janeiro. Não autorizava ele apenas a realização de obras e manutenção predial, mas também atos administrativos concernentes a toda a estrutura hospitalar: compra de medicamentos, próteses e órteses, recursos humanos, área médica e de pesquisa. 20. Não é razoável, nem possível, que a totalidade dos atos exercidos sob o manto da delegação de competência seja vigiada e controlada, pois, se o exercício da supervisão fosse irrestrito, a delegação de competência perderia seu sentido. 21. Sobre o assunto, o voto condutor do acórdão 372/2001 - 2ª Câmara consignou: Esta Corte de Contas também já entendeu que em algumas situações essa presunção de responsabilidade do ordenador em relação a todos os atos que compõem sua gestão não deve subsistir, sob o fundamento de que não se deve exigir dos dirigentes máximos da entidade que sua atividade de supervisão seja tão profunda a ponto de tornar sem sentido o instituto da delegação de competência. 22. É preciso determinar, portanto, quais, dentre os atos praticados pelos agentes delegados, devem ser, obrigatoriamente, supervisionados pela autoridade delegante. Necessário se faz denir alguns parâmetros. Desponta como razoável a exigência de que sejam observados
os aspectos da materialidade, relevância, grau de intensidade dos possíveis impactos deles advindos, probabilidade de ocorrência de erros e grau de risco. 23. No caso em tela, as obras contratadas referiam-se a serviços de rotina, concernentes à manutenção e adaptação de áreas e resfriamento de ambientes, e não envolviam nenhum grande projeto de construção. Todas as contratações eram importantes e pertinentes às atividades do hospital, mas nenhuma chamava a atenção pelo vulto ou materialidade. O grau de risco resta minimizado por essa pouca materialidade, que pode ser aferida comparando o valor das impugnações com o orçamento da entidade. Nessa linha de raciocínio, os impactos sofridos pela entidade advindos dos atos impugnados foram mínimos. 24. Portanto, podem ser aceitos os argumentos recursais relativos à delegação de competência, eis que não se vericam as hipóteses de autoria do recorrente ou sua conivência, da culpa in eligendo ou da culpa in vigilando. Assim, os atos impugnados
caracterizam extrapolação, pelos delegados, das ordens recebidas. 25. No que toca à responsabilidade pelos pagamentos por serviços não medidos, constato que as notas scais foram atestadas pelas áreas técnicas, antes de sua assinatura para
autorizar pagamentos. Como dirigente máximo da entidade, não lhe cabia “ir a campo para medir a área em que o material seria aplicado, conferir o quantitativo de material efetivamente utilizado e se os preços praticados conferiam com os da tabela EMOP”. 26. Quanto à responsabilidade pela homologação dos processos licitatórios, este Tribunal tem se posicionado pela responsabilização solidária da autoridade competente pelos vícios ocorridos em procedimentos licitatórios, exceto se as correspondentes irregularidades decorrerem de vícios ocultos, dificilmente perceptíveis na análise procedida pela autoridade encarregada da homologação do certame (acórdãos do Plenário 3.389/2010, 1.457/2010, 787/2009; acórdão da 2ª Câmara, 1.685/2007 e acórdão da 1ª Câmara, 690/2008, dentre outros). 27. Nesse aspecto, observo que, constando no processo a pesquisa de preços/orçamento com os valores levantados pela área técnica ou mesmo as propostas ofertadas nos certames, não havia como o referido gestor checar os preços dos itens unitários da planilha de cada obra ou realizar nova pesquisa de preço, para comparar com a existente nos autos, antes da homologação. Ou seja, os fatos que ensejaram a irregularidade destas contas, não eram
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
facilmente detectados pela autoridade encarregada da homologação do certame. Acolho, pois, os argumentos deste recorrente. (TCU. Acórdão nº 2.300/2013, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 04 set. 2013)
7.11 A normatização de procedimentos internos na busca da eciência Desde a sua publicação, a Lei nº 8.666/93 já previa, em seu art. 115, a possibilidade de os órgãos da Administração expedirem “normas relativas aos procedimentos operacionais a serem observados na execução das licitações, no âmbito de sua competência”. Essa diretriz é extremamente importante para que os procedimentos do órgão possam incorporar a inteligência das pessoas, ao tempo em que possam ser aprimorados constantemente. A formalização também permite que novos servidores se integrem rapidamente às rotinas de licitação, com menor percentual de erros. Apesar de avanços tímidos durante os primeiros anos, é notável a busca de alguns órgãos em normatizar seus procedimentos, com destaque para o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP) e para o Ministério dos Transportes (MT) que publicaram as seguintes instruções normativas: a) IN/SLTI-MP nº 2, de 30.04.2008 – dispõe sobre regras e diretrizes para a contratação de serviços, continuados ou não; b) IN/SLTI-MP nº 4, de 19.05.2008 – dispõe sobre o processo de contratação de serviços de tecnologia da informação pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional; c) IN-MT nº 1, de 04.10.2007 – uniformiza os procedimentos e rotinas a serem observados pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) na instrução de processos licitatórios. A consulta a esses normativos poderá fornecer excelentes subsídios para que cada órgão ou entidade discipline seus procedimentos. A título de exemplo, vale consultar o texto da Resolução CNJ nº 114/2010, que estabelece diversos procedimentos a serem observados no planejamento, a execução e o monitoramento de obras no poder judiciário; os parâmetros e orientações para precificação, elaboração de editais, composição de BDI, critérios mínimos para habilitação técnica e cláusulas essenciais nos novos contratos de reforma ou construção de imóveis no Poder Judiciário; e a referência de áreas a serem utilizadas quando da elaboração de novos projetos de reforma ou construção de imóveis no Poder Judiciário. 122
7.12 Cuidados recomendáveis ao nal da fase interna Diante do exposto no presente capítulo, cabe elaborar um breve resumo dos quesitos que devem ser vericados antes da publicação do edital pela Comissão de
Licitação e que pode, inclusive, ser disciplinado internamente por órgão ou entidade:
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Disponível no sítio: .
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a) projeto básico que detalhe de forma adequada o empreendimento que será licitado, e demonstre sua viabilidade, consoante art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666/93, com os seguintes elementos: a.1) informações e desenhos que permitam visão global da obra e identicação
de todos os seus elementos constitutivos com clareza; a.2) identicação dos responsáveis técnicos pela elaboração do todos os
projetos com o recolhimento das devidas Anotações de Responsabilidades Técnicas (ART); a.3) especial atenção deve ser dada à atualização do projeto em relação ao momento licitação, uma vez que intervalos de tempo signicativos entre
a elaboração do projeto e a realização da licitação podem comprometer a execução do empreendimento; b) orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados, que permitam a análise do valor nal executado do empreendimento com precisão de mais ou menos 15%:
b.1) com base em custos unitários referenciais que tomem por referência a mediana do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), mantido pela Caixa Econômica Federal (CEF), ou, no caso de obras rodoviárias, o Sistema Nacional de Custos Rodoviários (Sicro); b.2) caso não haja a inserção de preços no Sinapi ou Sicro, procurar referências nos demais sistemas da Administração, ou, realizar pesquisa de mercado devidamente documentada; b.3) quando for necessário qualquer ajuste ao preços referenciais, anexar aos autos a devida justicativa a m de facilitar qualquer análise posterior.
Sugere-se, inclusive, que cópias das tabelas referenciais e das cotações de preços sejam anexadas aos autos; c) previsão adequada de recursos no Plano Plurianual e na Lei Orçamentária Anual (LOA), compatível com os valores previstos no projeto básico, bem como estar em consonância com os comandos da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei de Responsabilidade Fiscal; d) licença prévia emitida pelo órgão ambiental competente, quando for o caso, cujas exigências estejam contempladas no projeto básico utilizado como referência para licitação; e) modalidade de licitação escolhida compatível com os valores referenciais ou com a natureza do objeto estabelecidos em lei; f) parcelamento do objeto de forma a ensejar maior competitividade e, consequentemente, o recebimento da proposta mais vantajosa para a administração. Especial atenção deve ser dada para evitar o fracionamento; g) previsão no Edital dos elementos exigidos no art. 40 da lei de licitações, em especial, dos critérios de aceitabilidade de preço unitário, por etapa e global, em função do regime de execução escolhido; h) compatibilidade de exigências de habilitação e qualicação com a realidade
da obra a ser licitada; i) minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração;
CAPÍTULO 7 LICITAÇÃO – FASE INTERNA
j) quando o valor estimado para a licitação ou para conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas for superior a 100 vezes o limite previsto no art. 23, I, “c” da Lei nº 8.666/93, o processo licitatório deverá ser iniciado, previamente à publicação do edital, com audiência pública concedida pela autoridade responsável, nos termos estabelecidos pelo art. 39 da referida lei.
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CAPÍTULO 8
LICITAÇÃO FASE EXTERNA
Sumário: 8.1 Considerações iniciais – 8.2 Publicação e prazos – 8.3 Criação e atuação de comissão
de licitação – 8.4 Procedimento e julgamento – 8.5 Análise da habilitação – 8.6 Análise das propostas de preços – 8.6.1 Avaliação da fronteira de aceitabilidade de preços máximos – 8.6.2 Avaliação da fronteira da exequibilidade relativa a preços mínimos – 8.7 Recursos – 8.8 Estudo de caso – 8.9 Cuidados recomendáveis – Final da fase externa
8.1 Considerações iniciais Esta fase se inicia com a publicação do edital. Considerando a determinação legal de reabertura de prazo nos casos em que houver modicação do edital que ocasione alteração na formulação das propostas, é
fundamental que a fase interna tenha sido conduzida de forma correta sob os aspectos técnico e jurídico, a m de evitar atraso no andamento do processo em razão de
sucessivas correções. Para os responsáveis pelo andamento da licitação que iniciam suas atividades a partir deste momento, cabe vericar se os elementos constantes dos autos da licitação
atendem à relação inserida na última seção do capítulo anterior, denominada “Cuidados
recomendáveis ao nal da fase interna”. Caso ocorra qualquer divergência, vale a realização de diligência aos técnicos que conduziram a elaboração do edital a m de
que seja providenciado o devido esclarecimento ou saneamento.
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A FIGURA 8.a ilustra a estrutura básica de atividades realizadas na fase externa.
Publicação do edital
Esclarecimento a quesitos
Reabertura de prazo em caso de alteração
Recebimento das propostas
Análise da habilitação
Diligências
Análise das propostas Preço global e unitário
Análise de recursos
Classificação
Homologação e adjudicação
Convocação para contrato
FIGURA 8.a - Resumo das etapas compreendidas na fase externa da licitação
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
8.2 Publicação e prazos Em face do princípio constitucional da publicidade e com o objetivo de viabilizar maior número de licitantes, o art. 21 da lei de licitações estabelece a necessidade de publicação, em função do caso, em Diário Ocial e jornais de grande circulação, dos avisos contendo os resumos dos editais das concorrências, das tomadas de preços, dos concursos e dos leilões com a devida antecedência, no mínimo por uma vez. Vale lembrar que a publicação de aviso de abertura de licitação gerenciada por 123
Estado ou Município e patrocinada com recursos federais nos Diários Ociais dos respectivos entes federados não supre a publicação no Diário Ocial da União (TCU.
Acórdão nº 1.987/2012, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU, 8 ago. 2012) No caso de convite, a Administração deverá axar, em local apropriado, cópia
do instrumento convocatório e estendê-lo aos demais cadastrados, na correspondente especialidade, que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 horas da apresentação das propostas (art. 22, §3º, da Lei nº 8.666/93). O principal objetivo da lei é propiciar a maximização do universo de proponentes com o intuito de receber a proposta mais vantajosa. Tanto que, ao nal do inciso III do
art. 21, há especial destaque para que a Administração, conforme o vulto da licitação, utilize-se de outros meios de divulgação para ampliar o universo de competidores. Consoante o mencionado artigo, os prazos mínimos para o recebimento das propostas ou realização do evento “serão contados a partir da última publicação do edital resumido ou da expedição do convite, ou ainda da efetiva disponibilidade do edital ou do convite e respectivos anexos, prevalecendo a data que ocorrer mais tarde” (art. 21, §3º, da Lei nº 8.666/93), sendo denidos conforme ilustração da TABELA 8.1.
123 “I
- no Diário Ocial da União, quando se tratar de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Federal e, ainda, quando se tratar de obras nanciadas parcial ou totalmente com recursos federais ou
garantidas por instituições federais.
II - no Diário Ocial do Estado, ou do Distrito Federal quando se tratar, respectivamente, de licitação feita por
órgão ou entidade da Administração Pública Estadual ou Municipal, ou do Distrito Federal; III - em jornal diário de grande circulação no Estado e também, se houver, em jornal de circulação no Município ou na região onde será realizada a obra, prestado o serviço, fornecido, alienado ou alugado o bem, podendo ainda a Administração, conforme o vulto da licitação, utilizar-se de outros meios de divulgação para ampliar a área de competição”.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
TABELA 8.1 Prazos mínimos até o recebimento das propostas ou realização do evento Inciso do art. 21, §2º
Prazo
Modalidade
Tipo ou regime
a) concurso I
II
III
b) concorrência
Quando o contrato a ser celebrado contemplar o regime de empreitada integral ou quando a licitação for do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço”
a) concorrência
Nos casos não especifcados na alínea “b” do inciso I
b) tomada de preços
Quando a licitação for do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço”
tomada de preços
Nos casos não especifcados na alínea “b” do inciso II
45 dias
30 dias
15 dias leilão
IV
cinco dias úteis convite
Nos termos do art. 21, §4º, da lei de licitações, “qualquer modifcação no edital exige divulgação pela mesma forma que se deu o texto original, reabrindo-se o prazo inicialmente estabelecido, exceto quando, inquestionavelmente, a alteração não afetar a formulação das propostas”. Especial cuidado deve ser adotado para que as alterações sejam divulgadas nos moldes legais, diante do risco de anulação do procedimento, consoante manifestação do STJ: O princípio da vinculação ao “instrumento convocatório” norteia a atividade do Administrador, no procedimento licitatório, que constitui ato administrativo formal e se erige em freios e contrapesos aos poderes da autoridade julgadora. O devido processo legal se traduz (no procedimento da licitação) na obediência à ordenação e à sucessão das fases procedimentais consignadas na lei e no edital de convocação, sendo este inalterável através de mera comunicação interna aos licitantes (art. 21, §4º, da Lei 8.666/93). Desde que iniciado o procedimento do certame, a alteração do edital, com reexo nas propostas já apresentadas, exige a divulgação pela mesma forma que se deu ao texto original, determinando-se a publicação (do edital) pelo mesmo prazo inicialmente estabelecido. O aviso interno, como meio de publicidade às alterações subseqüentes ao instrumento de convocação, desatende à legislação de regência e gera aos participantes o direito subjetivo a ser protegido pelo mandado de segurança. (STJ. MS nº 5.755/DF, 1ª seção. Rel. Min. Demócrito Reinaldo. DJ , 03 nov. 1998)
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
8.3 Criação e atuação de comissão de licitação O art. 51 da lei de licitações dene os principais requisitos para a constituição de comissão de licitação: número mínimo de membros; número de servidores qualicados pertencentes aos quadros permanentes dos órgãos; tempo de permanência limite; e rodízio. A designação dos membros deve ser feita mediante portaria com a devida publicação nos órgãos ociais de comunicação (TCU. Acórdão nº 1.997/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 31 jul. 2006). A respeito do momento da constituição da comissão, Marçal Justen Filho se posiciona da seguinte maneira: A Lei não determina o momento em que a comissão de licitação deverá ser constituída. Em princípio, é possível a fase externa da licitação iniciar-se sem a constituição da comissão julgadora. Admite-se a expedição do edital sem que exista a comissão — o que não é recomendável, ainda que possa ser válido. Mas a comissão terá de estar constituída até a data prevista para apresentação das propostas. Se não estiver, haverá nulidade insanável do procedimento. Não se admite que a autoridade administrativa aguarde a manifestação dos interessados para, apenas após denida a identidade dos licitantes, determinar os integrantes da comissão de licitação. Isso acarretaria sério risco de ofensa ao princípio da isonomia e lesionaria o princípio da moralidade administrativa. 124
Apesar da lei de licitações referir-se expressamente à necessidade da comissão ser integrada por prossionais legalmente habilitados apenas para o julgamento dos pedidos de inscrição em registro cadastral, o entendimento partilhado pela doutrina e pela jurisprudência é de que, para empreendimentos de maior complexidade, pelo menos um membro detenha conhecimento técnico a respeito da área. Marçal Justen Filho se posiciona com propriedade sobre a questão: É necessário que os membros da comissão tenham habilitação especíca para apreciar as propostas efetivadas. Embora o §2º rera-se apenas aos casos de inscrição, alteração ou cancelamento de registro cadastral, a regra deverá ser interpretada ampliativamente. É desejável e usual que ao menos um dos integrantes tenha conhecimento jurídico que lhe permita adequar os atos praticados aos dispositivos norteadores da licitação. Isso, porém, não é obrigatório. Não se concebe, contudo, a absoluta ausência de capacitação técnica dos membros da comissão quando o objeto licitado envolver requisitos especícos ou especiais. Ainda quando os membros da comissão não necessitem ser especialistas, é necessário que detenham conhecimentos técnico-especícos compatíveis com as regras e exigências prevista no ato convocatório. Em suma, não se admite que a comissão de licitação para construção de uma hidrelétrica seja integrada por nutricionistas. A nomeação de membros técnica e prossionalmente não habilitados para julgar o objeto da licitação caracteriza abuso de poder da autoridade competente. Se a Administração impõe exigências técnicas aos interessados, não pode invocar sua discricionariedade para nomear comissão destituída de condições para apreciar o preenchimento de tais requisitos. 125
JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 794. JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 793.
124 125
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
292
Nesse diapasão, o TCU tem formulado diversas determinações para que os órgãos adotem “providências no sentido de tornar mais eciente e ecaz o planejamento e
a execução dos procedimentos licitatórios, inclusive com a indicação de servidores adequadamente preparados para comporem Comissão Permanente de Licitação” (TCU. Acórdão nº 1.219/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 22 maio 2006). Na mesma linha, o TCU determina que se “adote as providências necessárias ao aperfeiçoamento do processo de comunicação interna relacionado com as comissões de licitação, de modo que se evite entendimentos equivocados quanto à denição dos
objetos pretendidos pelos setores demandantes de bens e serviços” (TCU. Decisão nº 103/98, Plenário. Rel. Min. Humberto Souto. DOU , 30 mar. 1998). Importante, também, lembrar a necessidade da correta designação e formalização das atividades da comissão de licitação, conforme posicionamento de Jessé Torres Pereira Junior: Se o órgão, por seus agentes, pratica atos estranhos à sua competência legal, tais atos nascem com vício de competência e podem ser invalidados, a menos que a autoridade efetivamente competente os ratique, sanando a ilegalidade. A tais riscos se lançam as
Comissões de Licitação quando procedimentos internos do órgão ou da entidade da Administração Pública — por vezes, sequer estabelecidos mediante atos administrativos, muito menos mediante lei — cumulam-nas de atribuições em nada compatíveis com aquelas denidas em lei.
Note-se que o art. 6º, XVI, declara que cabe à Administração criar a Comissão, mas já traça as funções para as quais deve ser criada, retirando da Administração discrição para atribuir-lhe tarefas que desnaturem aquelas funções ou desviem a Comissão de seu cumprimento. 126
A lei de licitações forneceu importante instrumento à comissão ou autoridade superior para o esclarecimento ou complementação da instrução do processo, que foi a promoção de diligência em qualquer fase da licitação, vedada, logicamente, a inclusão posterior de documento ou informação que deveria constar originariamente da proposta. Considerando que os membros da comissão, no caso de obras e serviços de engenharia, nem sempre detêm conhecimento suciente e detalhado para a análise da
qualidade do projeto e dos orçamentos envolvidos, é recomendável que recorram à assessoria de engenheiro capacitado, sob pena de omissão, em todas as questões que envolvam aspectos técnicos que não puderem ser saneados pelos seus integrantes. Nesse contexto, a comissão deverá se certicar, no mínimo, da existência da
seguinte documentação que comprove que as diretrizes estabelecidas no edital foram
preparadas por prossional capacitado: existência de projeto básico e orçamento
detalhado, bem como as respectivas ART no CREA recolhidas pelos engenheiros responsáveis; e justicativas técnicas para a denição dos requisitos de habilitação e
estruturação da licitação. É dever, ainda, da referida comissão, sob pena de responsabilidade solidária, a adoção de todas as medidas administrativas, quando constatar irregularidades no curso da licitação, contra os prossionais que praticaram atos que possam ensejar
comprometimento da contratação: elaboração de projeto básico de má qualidade, PEREIRA JUNIOR. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública , p. 127.
126
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
denição de orçamento com preços superestimados, ou qualquer outro problema que
prejudique a conclusão do empreendimento. Releva notar a linha de análise da documentação a ser adotada pela comissão
de licitação. A jurisprudência é pacíca no sentido da inadequação de interpretação
restritiva pela comissão das regras do edital para inabilitação de “concorrente com
base em circunstância impertinente ou irrelevante para o especíco objeto do contrato, fazendo exigências sem conteúdo de repercussão para a conguração de habilitação jurídica, da qualicação técnica, da capacidade econômico-nanceira e da regularidade scal” (STJ. MS nº 5.779/DF, 1ª Seção. Rel. Min. José Delgado. DJ , 26 out. 1998).
Em relação à análise de preços, a Comissão de Licitação, o pregoeiro e a autoridade
superior devem vericar se houve pesquisa recente de preço junto a fornecedores do bem
com base em critérios aceitáveis e se os preços da proposta vencedora estão coerentes com o orçamento estimado pelo setor competente, conforme entendimento do TCU:
10. Desse modo, antes da realização de qualquer procedimento licitatório o administrador deverá realizar pesquisa de preço no âmbito da administração pública, direta e indireta, e também junto a fornecedores do bem objeto da licitação, com a nalidade de elaborar orçamento, o qual será utilizado para se denir a modalidade de licitação, bem como
proceder à necessária adequação orçamentária da despesa, consoante dispõem os arts. 14 e 15, inciso V, da Lei nº 8.666/93. Além disso, aludido orçamento constitui instrumento essencial e obrigatório para que a comissão permanente de licitação, pregoeiro e a autoridade superior que homologa o procedimento licitatório, nos termos do art. 43 dessa lei,
veriquem a pertinência dos preços contratados com aqueles praticados pelo mercado. 11. Note-se que a Lei 8.666/93 não dene que a responsabilidade pela pesquisa de preço
e a consequente elaboração do orçamento incumbem ao responsável pela homologação do procedimento licitatório, à CPL ou ao pregoeiro. Aliás, de outro modo não poderia ser pois é inegável que não teriam condições de realizar esses trabalhos para grande parte dos objetos licitados. Cito a título de exemplo dessas diculdades, e porque não dizer
impossibilidades, a elaboração de projetos ou termos de referência e dos respectivos orçamentos para objetos, no mais das vezes, completamente díspares, tais como aquisição de soluções de TI, prestações de serviços de limpeza e vigilância, execução de obras complexas, bens permanentes e materiais de consumo dos mais diversos tipos. 12. No mais das vezes, os projetos básicos, os termos de referência, estimativas de preço são elaborados pelas respectivas unidades requisitantes do bem, serviço ou obra, ou por algum outro setor especializado e não necessariamente pela CPL, pregoeiro ou autoridade superior. 13. Em verdade, a CPL, o pregoeiro e a autoridade superior devem vericar: primeiro, se
houve pesquisa recente de preço junto a fornecedores do bem e se essa observou critérios aceitáveis; segundo, se foi realizada a adequação orçamentária; e, por último, se os preços da proposta vencedora estão coerentes com o orçamento estimado pelo setor competente. 14. No entanto, não existe nenhum impedimento legal para que a própria CPL, o pregoeiro ou mesmo a autoridade superior, também, realize essas pesquisas, obviamente desde que tenham as condições técnicas para essa nalidade e os seus atos não representem repetição
daqueles já efetivados por outros setores. (TCU. Acórdão nº 5.216/2007, 1ª Câmara. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 21 jun. 2007)
Por esse motivo, a referida decisão estabeleceu que: 1. As pesquisas de preços que dão suporte à elaboração de orçamento, à denição da modalidade de licitação e à efetivação da adequação nanceira e orçamentária da
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
despesa, devem ser realizadas previamente à adjudicação do objeto e homologação do procedimento. 2. Não constitui incumbência obrigatória da CPL, do pregoeiro ou da autoridade superior realizar pesquisas de preços no mercado e em outros entes públicos, sendo essa atribuição, tendo em vista a complexidade dos diversos objetos licitados, dos setores ou pessoas competentes envolvidos na aquisição do objeto. 3. Não cabe responsabilização por sobrepreço de membros da CPL, do pregoeiro ou da autoridade superior, quando restar comprovado que a pesquisa foi realizada observando critérios técnicos aceitáveis por setor ou pessoa habilitada para essa nalidade.
Por m, vale lembrar que a lei de licitações, em seu art. 51, §3º, estabeleceu a responsabilidade solidária dos membros das comissões de licitação por todos os atos praticados pela comissão, salvo se posição individual divergente estiver devidamente fundamentada e registrada em ata lavrada na reunião em que tiver sido tomada a decisão. Por esse motivo, sugere-se a adoção das seguintes medidas pelos membros: a) conforme já mencionado no início do capítulo, vericar inicialmente se os elementos constantes dos autos da licitação atendem à relação inserida no último item do capítulo anterior, denominada “Cuidados recomendáveis ao nal da fase interna”; b) avaliar minuciosamente as propostas das empresas, principalmente a da melhor classicada, por meio de julgamento objetivo; c) caso haja qualquer divergência, oportuno diligenciar, por escrito, em função da situação, aos técnicos que conduziram a elaboração do edital, aos técnicos especializados na área de obras, ou à empresa licitante, e que seja dado prosseguimento ao certame apenas após o devido esclarecimento ou saneamento; d) caso um dos membros discorde da postura dos demais, fundamentar a decisão e registrar em ata lavrada na reunião a posição pessoal que tiver tomado, sob pena de responder solidariamente por problemas futuros.
8.4 Procedimento e julgamento Os procedimentos para o processamento e julgamento da licitação estão estabelecidos no art. 43 da Lei nº 8.666/93. São realizadas basicamente, pelos membros da comissão de licitação, duas análises em etapas distintas, relacionadas à habilitação e à proposta. O art. 44 destaca que, no julgamento pela comissão, deverão ser considerados os critérios objetivos denidos no edital ou convite, os quais não devem contrariar as normas e princípios estabelecidos pela lei. A primeira consiste na oportunidade em que são vericados os parâmetros xados no edital relativos à habilitação dos concorrentes. Os licitantes que não preencherem esses parâmetros serão inabilitados e receberão de volta os envelopes fechados de suas propostas comerciais. Já na segunda, para os licitantes habilitados, serão analisadas as propostas diante dos requisitos constantes do edital. Nesta etapa, a lei faz especial referência à necessidade de análise da compatibilidade dos preços ofertados aos preços correntes de mercado, ou seja, será fundamental que a vericação se dê com base nas diretrizes legais relativas a
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
preços unitários e preço global. Como resultado nal, serão classicadas as propostas
das licitantes. “A decisão de excluir o representante pela ausência de informação que constava implicitamente em sua documentação revela-se como formalismo exagerado por parte dos responsáveis pela análise do certame, com prejuízo à sua competitividade” (TCU. Acórdão nº 1.795/15, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 31 jul. 2015). Cabe esclarecer que é vedada a abertura simultânea dos envelopes de habilitação e propostas de preços, consoante determinação formulada pelo TCU: [...] na promoção de licitações públicas que envolvam recursos federais, abstenha-se de xar cláusulas editalícias que permitam a abertura, de modo simultâneo, dos envelopes
de habilitação e das propostas de preços, bem assim de promover atos processuais dessa natureza durante o desenvolvimento dos certames, visto que representam procedimentos que infringem o disposto no art. 43, incisos I, II e III, da Lei nº 8.666/93. (TCU. Acórdão nº 289/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 17 fev. 2006) Por m, haverá a deliberação das autoridades competentes quanto à homologação
e à adjudicação do objeto da licitação.
8.5 Análise da habilitação A princípio, a avaliação da observância dos requisitos do edital pelos licitantes não parece tarefa complexa. Contudo, algumas falhas simples têm sido cometidas como: [...] aceite, pela Comissão Permanente de Licitação, de certidões vencidas, sem que as empresas responsáveis fossem desclassicadas, contrariando o art. 3º da IN/STN nº 01/97;
o art. 29 da Lei de Licitações e a cláusula 2.1 do Termo de Convênio. (TCU. Acórdão nº 498/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 17 mar. 2006)
Além dessas falhas mais simples, o TCU tem constatado irregularidades graves e formulado determinações especiais aos gestores responsáveis pela condução de licitações na fase da habilitação, como, por exemplo: a) “ao realizar licitações, verique junto aos sistemas Sicaf, Siasg, CNPJ e CPF,
estes dois últimos administrados pela Receita Federal, o quadro societário e
o endereço dos licitantes com vistas a vericar a existência de sócios comuns,
endereços idênticos ou relações de parentesco, fato que, analisado em conjunto com outras informações, poderá indicar a ocorrência de fraudes contra o certame” (TCU. Acórdão nº 2.136/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Augusto Nardes. , 04 ago. 2006); DOU b) avalie “evidências de pré-ajustamento entre as empresas habilitadas — apenas 2 (duas) num universo de 35 (trinta e cinco) que obtiveram o edital — como o emprego de envelopes idênticos no tamanho, material, modelo e etiquetas de identicação, chegando até mesmo a apresentarem erro em comum” (TCU.
Acórdão nº 1.866/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 20 jul. 2006); c) não realize procedimento licitatório de forma a ensejar a frustração do caráter competitivo da licitação, visto terem sido constatadas irregularidades que impossibilitam “estabelecer o nexo entre a execução física e a execução
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contábil/nanceira da obra, ou seja, impedem assegurar se as obras foram, de fato, realizadas com os recursos oriundos do Contrato de Repasse [...]: 9.4.1.1 falhas no processo licitatório que indicam sua realização a um só turno, tais como: 9.4.1.1.1 declaração de recibo do convite recebido com a mesma letra (com exceção da assinatura), em recortes (e não em um documento em folha inteira, como convém a um convite para participar de licitação) e, supostamente, entregues em mãos (não há indicação de envio pela via postal) no mesmo dia da ordem de início ao Processo Licitatório, apesar das empresas distarem cerca de 120 a 200 km da sede do Município; 9.4.1.1.2 termo de renúncia assinado por todos os licitantes e com data da abertura dos envelopes, sem que estivessem presentes à abertura dos envelopes com os documentos de habilitação e preenchido com a mesma letra, uma vez que a renúncia prévia é típica da ausência do legítimo interesse na lisura do certame; 9.4.1.1.3 homologação, adjudicação e assinatura do contrato antes de decorrido o prazo legal para possíveis recursos, de cinco dias úteis, conforme determina o art. 109, inciso I, da Lei de Licitações; 9.4.1.2 evidência da inexistência física e/ou funcionamento irregular das empresas licitantes à época da licitação [...], tendo em vista não terem sido encontradas por equipe de auditoria do TCU nos endereços apresentados no certame licitatório e nem em documento scal; 9.4.1.3 as empresas [...] têm registrado no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Minas Gerais – CREA/MG o mesmo responsável técnico, [...], e participaram do mesmo processo licitatório do Convite [...]; 9.4.1.4 indícios de ligação da empresa [...] com a empresa [...], ambas sem existência física comprovada [...]”. (TCU. Acórdão nº 470/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 13 mar. 2006) As questões referentes à capacidade técnica também podem adentrar campo que exija análise mais acurada, principalmente em relação à avaliação da capacidade técnico-prossional aferida por comparação com obra ou serviço de características semelhantes. Nas situações em que houver dúvida, sugere-se à comissão que recorra, por meio de diligência, a parecer técnico especializado. Por m, vale acrescentar que, após concluída a fase de análise de habilitação, não cabe a desclassicação de licitante por esse motivo em momento posterior, salvo em face de ocorrência de fato superveniente. (TCU. Acórdão nº 956/2013, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 26 abr. 2013)
8.6 Análise das propostas de preços A análise dos preços das propostas dos licitantes é uma das etapas mais importantes do processo licitatório, pois será responsável pela classicação das empresas e consequentemente pela denição daquela que realizará o empreendimento. Falhas nesta etapa de análise, ainda que aparentemente pequenas, poderão ensejar enormes prejuízos ao erário e, por via de regresso, aos agentes públicos responsáveis pela contratação.
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
Preliminarmente, convém lembrar entendimento do TCU de que, no caso de convites, na hipótese de não ser atingido o mínimo legal de três propostas válidas quando da realização do certame, seja justicado expressamente, nos termos do art.
22, §7º, da Lei nº 8.666/93, as circunstâncias impeditivas da obtenção desse número mínimo referencial, sob pena de repetição do certame com a convocação de outros possíveis interessados (TCU. Acórdão nº 1.089/03, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 18 ago. 2003). Apenas o menor preço global não assegura a proposta mais vantajosa. É necessário que se realize detalhada vericação das propostas recebidas. Conforme demonstrado
na seção 7.7.2 do capítulo anterior, a análise dos preços unitários das propostas é muito
importante a m de evitar problemas futuros, seja por antecipação de pagamentos, seja
por pagamento de aditivos superfaturados. O primeiro passo é a verificação do preço global. O segundo, não menos importante, é a análise dos preços unitários. Para tanto, é necessário que a comissão
possua orçamento referencial conável, denido em projeto básico de qualidade, e
tenha claros os critérios de aceitabilidade de preços unitários e global. A lei de licitações trata do tema nos artigos 40, X, 44, §3º, e 48, II, com o objetivo de disciplinar a análise a ser feita pela comissão. Além disso, o Decreto nº 7.983/13, seguindo a linha das leis de diretrizes orçamentárias anuais anteriores também traz comando para avaliação dos custos unitários. 127
128
129
130 131
Vale consultar o quadro apresentado no capítulo anterior, a m de detalhar as
quatro análises que deverão ser feitas, consoante TABELA 8.2: (1) aceitabilidade de preço global; (2) aceitabilidade de preços unitários; (3) exequibilidade de preço global; e (4) exequibilidade de preços unitários. 127
“Art. 40. [...] X - o critério de aceitabilidade dos preços uni tário e global, conforme o caso, permitida a xação de preços máximos e vedados a xação de preços mínimos, critérios estatísticos ou faixas de variação em relação a
preços de referência, ressalvado o disposto nos parágrafos 1º e 2º do art. 48”.
128 “Art.
44. [...] §3º Não se admitirá proposta que apresente preços global ou unitários simbólicos, irrisórios ou
de valor zero, incompatíveis com os preços dos insumos e salários de mercado, acrescidos dos respectivos encargos, ainda que o ato convocatório da licitação não tenha estabelecido limites mínimos, exceto quando se referirem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração”.
129
“Art. 48. Serão desclassicadas: [...] II - propostas com valor global superior ao limite estabelecido ou com preços
manifestamente inexeqüíveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que
os coecientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especicadas no ato convocatório da licitação”. 130
Decreto nº 7.983/13: “Art. 3º O custo global de referência de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços e obras de infraestrutura de transporte, será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – Sinapi, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de construção civil. Parágrafo único. O Sinapi deverá ser mantido pela Caixa Econô mica Federal – CEF, segundo denições técnicas de engenharia da CEF e de pesquisa de preço realizada pelo Instituto Brasil eiro de Geograa e Estatística – IBGE.
Art. 4º O custo global de referência dos serviços e obras de infraestrutura de transportes será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais aos seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema de Custos Referenciais de Obras – Sicro, cuja manutenção e divulgação caberá ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de infraestrutura de transportes”. 131 Para obras contratadas pelo RDC, comando similar está inserido no art. 8º, §§3º e 4º, da Lei nº 12.462/11 e no art. 42 do Decreto nº 7.581/11.
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TABELA 8.2 Esquema gráco das quatro análises a serem feitas para vericação de preço global e unitário Preço Unitário ou por etapa *
Preço Global
Limite superior
Análise 1 art. 48, II c/c art. 40, X Critério de aceitabilidade previsto no edital
Análise 2 art. 48, I c/c art. 40, X Critério de aceitabilidade previsto no edital
Fronteira da aceitabilidade FAIXA ACEITÁVEL DOS PREÇOS Fronteira da exequibilidade Limite inferior
Análise 3 art. 48, II e §1º - propostas cujos valores globais sejam inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores: a) média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinqüenta por cento) do valor orçado pela administração, ou b) valor orçado pela administração. ou
Análise 4 art. 48, II c/c art. 44, §3º - propostas que não comprovarem que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coef cientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato;
- proposta que apresente preços global simbólico, irrisório ou de valor zero, incompatíveis com os preços dos insumos e salários de mercado, acrescidos dos respectivos encargos, ainda que o ato convocatório da licitação não tenha estabelecido limites mínimos, exceto quando se referirem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração.
- proposta que apresente preços global ou unitários simbólicos, irrisórios ou de valor zero, incompatíveis com os preços dos insumos e salários de mercado, acrescidos dos respectivos encargos, ainda que o ato convocatório da licitação não tenha estabelecido limites mínimos, exceto quando se referirem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração.
ou
* No caso de regime por preço global, o Decreto nº 7.983/13, em seu art. 13, inciso I, estabeleceu a possibilidade de que os preços unitários das proponentes sejam aceitos quando superiores a valores de referência, “desde que o preço global orçado e o de cada uma das etapas previstas no cronograma físico-nanceiro do contrato, observado o art. 9º, quem iguais ou abaixo dos preços de referência da administração pública obtidos na forma do Capítulo II”.132
132
Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 42, §4º, do Decreto nº 7.581/11.
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
8.6.1 Avaliação da fronteira de aceitabilidade de preços máximos Existem duas avaliações a serem feitas em relação aos limites máximos de preço global e unitários que delimitam a fronteira da aceitabilidade dos preços. As propostas que apresentam valores superiores aos xados para essa fronteira poderão ensejar prejuízo ao erário, devendo, portanto, serem desclassicadas. A denição dos critérios de aceitabilidade dos preços global e unitário é feita no
momento da publicação do edital, consoante art. 40, X, da Lei nº 8.666/93, ou seja, são do prévio conhecimento de todos os licitantes. Dessa maneira, as propostas apresentadas deverão ser, de plano, vericadas, em face da simplicidade das análises 1 e 2.
A existência de orçamento-base elaborado pela Administração na licitação de acordo com as orientações legais representa requisito essencial para uma análise efetiva pela comissão dos preços ofertados, sendo, portanto, primordial a presença dos seguintes elementos: quantitativos de serviços estimados de forma adequada, preços calculados com base em parâmetros referenciais conáveis e documentados, como o Sinapi, e responsável técnico pela sua execução capacitado e devidamente identicado.
O TCU reconheceu a necessidade do detalhamento de todos os elementos do orçamento-base e das propostas dos licitantes por meio da Súmula nº 258: As composições de custos unitários e o detalhamento de encargos sociais e do BDI integram o orçamento que compõe o projeto básico da obra ou serviço de engenharia, devem constar dos anexos do edital de licitação e das propostas das licitantes e não podem ser indicados mediante uso da expressão “verba” ou de unidades genéricas. (TCU. Acórdão nº 1.350/2010, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 23 jul. 2010) Reconheceu, ainda, a viabilidade da desclassicação das propostas de licitantes
que não contenham a composição de todos os custos unitários dos itens, bem como a responsabilidade dos membros da comissão de licitação que não estiverem atentos ao detalhamento exigido em edital: 11. Desse modo, ainda que aparentemente mais vantajosa à Administração, a proposta que não guardar consonância com o edital deverá ser desclassicada em atenção ao disposto
no art. 48, inciso I, da Lei nº 8.666, de 1993, por meio de decisão motivada, registrada em ata. [...] 16. Ressalto, por m, que, em julgados desta Corte, a inobservância a dispositivos do
edital, incluindo-se a obrigatoriedade de apresentação da composição de todos os custos unitários, tem, por vezes, levado à imposição de penalidade aos membros da CPL e a gestores que não promovem a desclassicação das propostas desconformes com o
instrumento convocatório, em desacordo com o art. 41 da Lei de Licitações (v.g. Acórdãos 1.291/2007-Plenário e 1.060/2009-Plenário). (TCU. Acórdão nº 550/2011, Plenário. Rel. Min. André Luis Carvalho. DOU , 17 mar. 2011)
Com referência no orçamento-base, todas as análises das propostas serão facilitadas. Para a vericação da adequação dos preços globais, análise 1, o procedimento
é bastante simples, visto ser necessário apenas o confronto dos valores apresentados pelos licitantes com aquele constante do orçamento-base. Já em relação aos preços unitários ou por etapa, em função do regime de execução escolhido, análise 2, devem ser observados pela comissão os seguintes passos:
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a) comparação de todos os preços unitários das propostas com os critérios de
aceitabilidade denidos no edital em relação aos preços do orçamento-base, com especial atenção àqueles serviços que têm maior representatividade no orçamento;
b) desclassicação das propostas que apresentarem relação de serviços com preços ou custos superiores aos limites estabelecidos (em face do critério obrigatório exigido pelo art. 40, X, da Lei nº 8.666/93 e da diretriz inserida nos arts. 11 e 13 do Decreto nº 7.983/13). Nesse sentido, o TCU estabeleceu clara fronteira de análise de preços em função do estágio da contratação: 133
É certo que, para o caso de contratos já rmados, a análise dos preços deve ser realizada levando em conta as compensações entre subpreços e sobrepreços, de tal forma que o valor global a ser pago pelo contrato não exceda os referenciais de mercado. Nesses
casos, o interesse público na continuidade do empreendimento justica a manutenção do acordo inicial, ressalvados os casos em que aditivos provoquem desequilíbrio econômico-
nanceiro da avença. Tal entendimento encontra-se consubstanciado nos Acórdãos
1.923/2011, 1.887/2010, 2.540/2008, 2.482/2008, todos do Plenário, dentre outros. Entretanto, quando se trata de análise de edital de licitação, nenhum sobrepreço unitário é aceitável, ainda que a planilha orçamentária apresente preço global inferior aos referenciais adotados por este Tribunal, nos termos do art. 8º, §§ 3º e 4º, da Lei 12.432/2011. Dessa forma, caberia a aplicação da metodologia descrita no Acórdão 2.319/2009-TCU-Plenário,
de forma a não considerar eventuais compensações para ns de cálculo do sobrepreço. (TCU. Acórdão nº 3.473/2014, Plenário. Rel. Min. Bruno Dantas. DOU , 24 nov. 2014).
Importante lembrar, conforme já mencionado na seção 7.7.2 deste livro, que o art. 13 do Decreto nº 7.983/13 exibilizou, em parte, o referido critério no caso de regime de execução por preço global, admitindo que os preços unitários das proponentes sejam aceitos quando superiores a valores de referência, desde que “preço global orçado e o de 134
cada uma das etapas previstas no cronograma físico-nanceiro do contrato, observado o art. 9º, quem iguais ou abaixo dos preços de referência da administração pública obtidos na forma do Capítulo II”. O TCU tem reiterado a necessidade de que os membros da comissão de licitação estejam atentos à aplicação dos critérios de aceitabilidade de preços em virtude do potencial prejuízo ao erário que poderá advir de uma análise
supercial das propostas dos licitantes: 7. Destarte, em virtude da xação de valor máximo anual de contratação e de homemhora, não poderia a comissão de licitação admitir proposta com valores superiores aos estabelecidos no Projeto Básico. Assim, assiste razão à Unidade Técnica quando propõe a
responsabilização dos membros da Comissão de Licitação pela: ausência de desclassicação das propostas de preços apresentadas pelas licitantes, as quais consignaram preços acima do valor máximo estipulado no Projeto Básico constante do Edital de Concorrência;
ausência de observância dos critérios máximos de aceitabilidade de preços xados no Edital, com indicação de propostas que continham indicativos de sobrepreço. Nesse
sentido, anuo à proposta de rejeição das razões de justicativa apresentadas pelos membros
133 134
Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 42 do Decreto nº 7.581/11. Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 42, §4º, inciso I, do Decreto nº 7.581/11.
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
da Comissão de licitação e de aplicação de multa. Fundamento-a, no entanto, no art. 58, inciso II da Lei nº 8.666/93 e não no inciso III, conforme alvitrado, uma vez que o que houve, de fato, foi a ocorrência de ato praticado com grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, nanceira, orçamentária, operacional e patrimonial.
(TCU. Acórdão nº 413/2010, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 12 mar. 2010)
Em relação à análise 2, existe uma discussão interessante a respeito da possibilidade de desclassicação de empresa em virtude de ter relacionado alguns poucos serviços com preços unitários superiores ao critério de aceitabilidade xado no edital, apesar de ter apresentado menor preço global válido. Argumenta-se que a referida desclassicação
poderia caracterizar falha da comissão de licitação por interpretação restritiva do edital e violação ao princípio do formalismo moderado, visto que a Administração estaria escolhendo proposta de maior valor apresentada pela segunda colocada. Essa questão especíca foi submetida à análise do judiciário que avaliou a
legitimidade do ato administrativo que inabilitou licitante por ter apresentado três itens em um conjunto de 119 acima do valor máximo unitário previsto no ato convocatório, apesar de ter fornecido proposta de menor valor global. O STJ, discordando da instância de 2º grau, assim se manifestou: Administrativo. Licitação. Preço máximo. Unitário. Desclassicação. 1. Legalidade da desclassicação de licitante que descumprira exigência editalícia quanto
ao preço máximo unitário. Inteligência do artigo 40, X, da Lei de Licitações. 2. Recurso especial provido. (STJ. REsp nº 651.395/SC, 2ª Turma. Rel. Min. Castro Meira. DJ , 30 maio 2006)
No caso em comento, o relator assim concluiu seu voto: Em nada lhe favorece a constatação de que fora consignado valor superior da proposta vencedora da licitação, tirada entre aquelas que observaram elmente o que fora esta-
belecido no edital convocatório. O edital, como norma que rege o concurso, e a lei geral de licitações (Lei nº 8.666/93) devem ser rigorosamente observados pelos participantes, em todas as suas fases, não se permitindo que a comissão responsável possa dispensar a sua exigibilidade de qualquer dos licitantes. Haveria, inclusive, ofensa ao princípio da isonomia.
Dessa forma, inquestionável a aplicação do critério de aceitabilidade de preço xado no Edital para todas as propostas, mesmo para aquela que tenha apresentado
menor valor global válido. Entretanto, cabe destacar a diretriz mais exível que o Tribunal vem adotando
em algumas situações nas quais inexiste sobrepreço no valor total do contrato, mas foram detectadas ocorrências de excessos em alguns preços de serviços na planilha da licitante vencedora: A unidade instrutora consignou que os gestores não apresentaram justicativas para
adoção de preços superiores aos referenciais e acrescentou que os valores praticados foram calcados apenas em duas cotações de mercado. Nesse panorama, entendeu que as irregularidades não foram dirimidas e que ensejam a imputação de multa aos responsáveis.
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Concordo com a unidade técnica que os gestores não afastaram as evidências de superestimativa nos preços unitários contratados para os serviços de estaca escavada. Entretanto, dissinto do encaminhamento proposto, pois considero que as circunstâncias atenuantes reduzem a gravidade dos apontamentos realizados e afastam a necessidade de apenação dos gestores. Devo ponderar que a principal faceta das análises de preços realizadas por esta Corte nas mais diversas scalizações de obras é o preço global contratado — momento em que é vericada a compatibilidade deste valor com aqueles praticados no mercado. No feito em exame a própria unidade técnica afasta a existência de sobrepreço global nos contratos auditados. Também de suma importância são os exames da regularidade dos preços unitários contratados. A aderência dos valores de cada item contratado com aqueles indicados nas tabelas ociais de custos é exigência expressa das leis de diretrizes orçamentárias e sua inobservância deve estar justicada em relatório técnico circunstanciado. Não é possível olvidar a irregularidade do procedimento relativo à contratação de serviços com preços unitários em patamares superiores aos referenciais calculados e sem que conste justicativa para tal. Apesar disso, a Secob-2, em percuciente análise, evidenciou que as alterações contratuais não resultaram em incremento exorbitante que pudesse indicar ofensa ao equilíbrio econômico-nanceiro estabelecido, razão porque entendo reduzido o potencial ofensivo da irregularidade tratada. Para resguardar o Erário de futuras alterações nos contratos ainda vigentes, considero suciente dar ciência ao [...] que eventuais aditamentos não poderão resultar em redução, a favor do contratado, do desconto global inicialmente pactuado, conforme disposto no art. 109, §6º, da Lei 11.768/2008 - Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2008. (TCU. Acórdão nº 2.167/2012, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 20 ago. 2012)
Na mesma linha, em termos de avaliação da taxa de BDI, há orientação da Corte de Contas para que o órgão responsável pela licitação “somente desclassique proposta de licitante que eventualmente tenha apresentado BDI em percentual superior àquele informado em Acórdão desta Corte, após a completa análise do preço global ofertado, dado que o excesso na cobrança do BDI pode ser compensado pelo custo de serviços e produtos” (TCU. Acórdão nº 1.804/2012, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 13 jul. 2012).
8.6.2 Avaliação da fronteira da exequibilidade relativa a preços mínimos O maior problema relativo a valores extremamente baixos das propostas está na probabilidade de prejuízos ao andamento normal dos serviços, em relação a prazos e qualidade, ou até mesmo na desistência da empresa no decorrer do contrato. Por esse motivo, a lei de licitações prevê a necessidade da avaliação dos valores mínimos de preços globais e unitários. Para a avaliação do preço global mínimo, análise 3, o valor que caracteriza o preço inexequível só é conhecido, na forma denida pela lei, após o recebimento de todas as propostas, uma vez que a metodologia xada no art. 48, §1º, prevê a utilização da “média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinquenta por cento) do valor orçado pela administração”:
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
§1º Para os efeitos do disposto no inciso II deste artigo consideram-se manifestamente inexeqüíveis, no caso de licitações de menor preço para obras e serviços de engenharia, as propostas cujos valores sejam inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores: a) média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinqüenta por cento) do valor orçado pela administração, ou b) valor orçado pela administração.
Questão interessante está relacionada ao comando legal inserido no art. 48, §2º, relativo à necessidade de garantia adicional quando a proposta mais bem classicada for
inferior a 80% do menor valor a que se referem as alíneas “a” e “b” do §1º, no montante calculado pela diferença entre o valor resultante do parágrafo anterior e o valor da correspondente proposta. O principal objetivo dessa medida é assegurar a conclusão do contrato pela proposta da empresa que, mesmo não considerada inexequível, teve valor muito baixo em relação aos parâmetros estimados pela administração, o que poderá ensejar maior risco da não conclusão do objeto. O exemplo a seguir ilustra a forma de cálculo denida em lei para aceitabilidade
do preço global: em determinado certame, a Administração estabeleceu, com base em projeto bem elaborado, o preço global máximo de R$9.000.000,00 para a contratação. Foram apresentadas as seguintes propostas: empresa A = R$9.000.000,00; empresa B = R$7.200.000,00; empresa C = R$4.800.000,00; empresa D = R$4.000.000,00; empresa E
= R$10.000.000,00. Qual o procedimento da comissão para a identicação da proposta
mais vantajosa sob o aspecto do preço global? a) Análise 1 – desclassicar as empresas que não atenderam as condições xadas
no edital, ou seja, critério de aceitabilidade de preço global máximo: estará 135
desclassicada a empresa E por ter apresentado valor elevado (R$10.000.000,00). b) Análise 2 – vericar a exequibilidade, nos termos do art. 48, II e §1º da lei de licitações:
b.1) 1º passo: calcular a média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% do valor orçado pela Administração, denida no art. 48, §1º, “a”: deverá
ser excluída a proposta de R$4.000.000,00 visto ser inferior a 50% do valor estipulado pela Administração.
b.2) 2º passo: considerar o valor orçado pela Administração, nos termos do art. 48, §1º, “b”. V = 9.000.000,00
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As propostas acima do limite de aceitabilidade xado pela Administração devem ser desclassicadas antes do
cálculo da média, caso contrário, valores excessivos apresentados por licitantes desvirtuariam o critério legal previsto na art. 48, §1º, alínea “a”, da Lei nº 8.666/93.
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b.3) 3º passo: denir o valor equivalente a 70% do menor dos seguintes montantes calculados nos 1º e 2º passos, nos termos do art. 48, §1º. V = 70% do menor dos valores = R$(0,7) x 7.000.000,00 = R$4.900.000,00 b.4) 4º passo: classicar as empresas que apresentaram preços superiores ao limite mínimo calculado na forma da lei (R$4.900.000,00): devem ser desclassicadas, em virtude de apresentar o preço menor que o limite mínimo, as empresas C e D. Restam, portanto, as empresas A e B. b.5) 5º passo: B foi o vencedor com menor preço (R$7.200.000,00) do que A (R$9.000.000,00). Apesar da simplicidade de aplicação do método exposto, algumas constatações têm demonstrado falhas na utilização dos dispositivos legais, o que enseja débito aos responsáveis, conforme deliberação do TCU: 136
2.4 O certame contou com a participação de 3 empresas que apresentaram as seguintes propostas: a) [...] (R$118.598,68); [...] (R$75.867,48) e [...] (R$129.515,10). O valor estimado da contratação, conforme orçamento da Administração, foi de R$126.251,75. 2.5 Aplicando-se os critérios denidos no art. 48 da Lei nº 8.666/93, para a determinação da exeqüibilidade das propostas, obtém-se os seguintes valores: R$75.595,63 (alínea “a”) e R$88.376,23 (alínea “b”). Como o referido art. 48 estabelece que o valor considerado como parâmetro para a desclassicação de propostas deva ser o menor dentre os dois apurados, o parâmetro legalmente admitido passa a ser o primeiro, R$75.595,63 (alínea “a”), e não o maior como adotou a entidade. 2.6 Assim, a argumentação oferecida não elide a irregularidade apontada, pois o preço apresentado pela empresa desclassicada era exeqüível à luz do critério objetivo trazido pela alínea “a” do §1º do art. 48. Com aquela desclassicação ilegal, por parte da Comissão de licitação da FUMBEL e homologada pelo Presidente do órgão, a administração deixou de obter a proposta mais vantajosa, resultando em contratação dos serviços por um preço R$42.731,20 maior que a proposta de menor valor apresentada. (TCU. Decisão nº 66/00, 1ª Câmara. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 06 abr. 2000)
Por m, resta a análise 4, ou seja, a vericação de que os preços unitários são exequíveis. O objetivo dessa vericação é assegurar à Administração a ausência de problemas futuros que podem ser apresentados pela empresa, como pedido de reequilíbrio econômico-nanceiro, inexecução ou baixa qualidade de serviços. Vale lembrar que, a m de poupar esforços da comissão, a análise detalhada de preços unitários deverá recair sobre a proposta de menor preço global válido, visto ser aquela que, a princípio, deverá ser escolhida pela Administração. Caso haja eliminação dessa proposta, a análise recairá sobre a seguinte, e assim sucessivamente. Não se pode olvidar, entretanto, do comando insculpido da Lei Complementar nº 123/2006, relativo à preferência de contratação de microempresas e empresas de pequeno porte nos casos em que estas ofertarem preços iguais ou até 10% superiores à proposta mais bem classicadas em licitações comuns ou até 5% na modalidade pregão:
136
Cabe aqui um cuidado: conforme será descrito ao nal deste capítulo, o TCU orienta os gestores que, antes da desclassicação por inexequibilidade de preços, deve ser esclarecido junto ao licitante acerca da sua capacidade de cumprimento do objeto no preço ofertado.
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
Art. 44. Nas licitações será assegurada, como critério de desempate, preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte. §1º Entende-se por empate aquelas situações em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (dez por cento) superiores à proposta mais bem classicada.
§2º Na modalidade de pregão, o intervalo percentual estabelecido no §1º deste artigo será de até 5% (cinco por cento) superior ao melhor preço. Art. 45. Para efeito do disposto no art. 44 desta Lei Complementar, ocorrendo o empate, proceder-se-á da seguinte forma: I - a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classicada poderá apresentar
proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado; II - não ocorrendo a contratação da microempresa ou empresa de pequeno porte, na forma do inciso I do caput deste artigo, serão convocadas as remanescentes que porventura se enquadrem na hipótese dos §§1º e 2º do art. 44 desta Lei Complementar, na ordem classicatória, para o exercício do mesmo direito;
III - no caso de equivalência dos valores apresentados pelas microempresas e empresas de pequeno porte que se encontrem nos intervalos estabelecidos nos §§1º e 2º do art. 44 desta Lei Complementar, será realizado sorteio entre elas para que se identique aquela
que primeiro poderá apresentar melhor oferta.
Com vistas a propiciar maior foco de análise, a referida comissão deverá avaliar todos os preços que se situem em patamar inferior a um determinado percentual daqueles constantes do orçamento-base. A título de sugestão, pode-se xar o valor de
20%, ou seja, todos os preços unitários inferiores a 80% do orçamento-base deverão ser avaliados. Em caso de dúvida, deverão ser solicitados esclarecimentos adicionais da proponente e/ou declaração expressa de que os valores se referem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais haverá renuncia de parcela ou à totalidade da remuneração (art. 44, §3º, da Lei nº 8.666/93). A análise deverá contemplar as seguintes vericações, conforme explanação no Capítulo 7, seções 7.2.3.2
e 7.2.3.3: a) preços dos insumos e salários compatíveis com os de mercado (ver TABELA 7.5); b) encargos sociais e tributários devidamente justicados (ver TABELA 7.6); c) compatibilidade dos coecientes de produtividade (ver TABELA 7.7); d) detalhamento do BDI (ver tabelas 7.10 a 7.12), com justicativas no caso de
renúncia à determinada parcela da remuneração; e) relação de materiais e instalações de propriedade do licitante que não estão sendo cobrados, com a devida documentação comprobatória. Importante instrumento para subsidiar essa análise é a planilha referente à Curva ABC de insumos e serviços, visto que possibilita uma melhor visão dos itens de maior materialidade. Caso necessário, vale diligenciar à empresa e solicitar a Curva ABC da sua proposta para compará-la com a do orçamento-base ou requerer que as propostas sejam apresentadas em meio eletrônico para a elaboração da referida curva. O TCU determina que o responsável “exija de cada licitante de obras públicas, nos instrumentos convocatórios, a documentação que comprove a compatibilidade dos
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custos dos insumos com os de mercado, segundo o art. 48, inciso II, da Lei nº 8.666/93, tais como: composição unitária de preços; curva ABC de insumos e serviços; tabelas de preços consagradas, como SINAPI, PINI, DNIT, etc.; e demonstrativo de cálculo dos encargos sociais e do BDI utilizados na composição dos preços” (TCU. Acórdão nº 1.461/03, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 13 out. 2003). A respeito dessas verificações, o TCU tem solicitado a órgão ou entidade responsável pela licitação que “oriente os integrantes de suas Comissões de Licitação para que examinem detalhadamente as propostas dos licitantes habilitados, classicando tão-somente as propostas que apresentem a correta incidência das alíquotas de tributos e dos encargos sociais” (TCU. Acórdão nº 262/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 24 fev. 2006). Cabe destacar que “antes da desclassicação por inexeqüibilidade de preços deve ser esclarecido junto ao licitante acerca da sua capacidade de cumprimento do objeto no preço ofertado” (TCU. Acórdão nº 1.159/07, 2ª Câmara. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 25 maio 2007) e que “as razões da desclassicação de licitantes devem estar claras na ata dos pregões eletrônicos” (TCU. Acórdão nº 1.159/07, 2ª Câmara. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 25 maio 2007). O TCU pacicou esse entendimento por meio da Súmula nº 262: O critério denido no art. 48, inciso II, §1º, alíneas “a” e “b”, da Lei nº 8.666/93 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, devendo a Administração dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta. (TCU. Acórdão nº 3.240/2010, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 14 dez. 2010)
Com efeito, “o critério para aferição de inexeqüibilidade de preço denido no art. 48, inciso II, §1º, alíneas ‘a’ e ‘b’, da Lei nº 8.666/93 conduz a uma presunção relativa de inexeqüibilidade de preços, cabendo à administração exigir que o licitante comprove a efetiva capacidade de executar os serviços, no preço oferecido, assegurado o alcance do objetivo da licitação, que é a seleção da proposta mais vantajosa, e, por conseqüência, do interesse público, bem tutelado pelo procedimento licitatório” (TCU. Acórdão nº 612/04, 1ª Câmara. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 08 abr. 2004). A propósito, o regulamento do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) segue a mesma linha acolhida pela jurisprudência, conforme se extrai da leitura do art. 41 do Decreto nº 7.581/11: Art. 41. Nas licitações de obras e serviços de engenharia, consideram-se inexequíveis as propostas com valores globais inferiores a setenta por cento do menor dos seguintes valores: I - média aritmética dos valores das propostas superiores a cinquenta por cento do valor do orçamento estimado pela administração pública, ou II - valor do orçamento estimado pela administração pública. §1º A administração deverá conferir ao licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta. §2º Na hipótese de que trata o §1º, o licitante deverá demonstrar que o valor da proposta é compatível com a execução do objeto licitado no que se refere aos custos dos insumos e aos coecientes de produtividade adotados nas composições de custos unitários.
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
§3º A análise de exequibilidade da proposta não considerará materiais e instalações a serem fornecidos pelo licitante em relação aos quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração, desde que a renúncia esteja expressa na proposta. Evidente que as vericações propostas acima só se fazem viáveis caso os licitantes
apresentem todo o detalhamento de suas composições de custo e BDI, ou seja, são peças que devem ser exigidas na licitação, ou, caso não tenham sido, solicitadas por meio de diligência complementar. Em alguns casos, em face da complexidade da análise, a comissão de licitação deverá solicitar parecer a técnicos especializados do quadro da Administração ou para o prossional responsável pela elaboração do orçamento.
É possível, no âmbito das análises, aceitar situações em que as empresas trabalhem com lucros irrisórios: 1. Não há vedação legal à atuação, por parte de empresas contratadas pela Administração Pública Federal, sem margem de lucro ou com margem de lucro mínima, pois tal fato depende da estratégia comercial da empresa e não conduz, necessariamente, à inexecução da proposta (Acórdão 325/2007-TCU-Plenário). 2. A desclassicação de proposta por inexequibilidade deve ser objetivamente demonstrada,
a partir de critérios previamente publicados (Acórdãos 2.528/2012 e 1.092/2013, ambos do Plenário). (TCU. Acórdão nº 3.092/2014, Plenário. Rel. Min. Bruno Dantas. DOU , 19 nov. 2014).
Haverá, sem dúvida, casos limítrofes, como este registrado pelo TCU: O exame de propostas que se enquadrem como inexequíveis deve ser minucioso por parte da unidade responsável pela licitação, de maneira a não se perder oportunidade de contratação por preço vantajoso à Administração Pública. No entanto, a situação em apreço é um caso limite dessa aferição de exequibilidade. A proposta da representante para fornecimento da tubulação de aço carbono representa tão somente 1,66% do valor orçado pelo AMRJ. A planilha de preços constante do edital estimou o valor dessa rubrica em R$3.387.700,00, ao passo que a empresa Sand Serviços Ltda. ofereceu proposta de R$56.166,50. É o nítido exemplo de proposta irrisória, inadmissível, conforme disposto no §3º do art. 44 da Lei 8.666/1993. Nestes casos, a aceitação excepcional poderia ocorrer quando do fornecimento de “materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração”, mas o representante não logrou êxito em comprovar a mencionada singularidade. Suas alegações de que está em vistas de realizar volumosa compra dos materiais, que lhe permitiriam considerável desconto na aquisição, não são sucientes para que sua proposta,
em patamar tão inferior ao estimado, possa ser aceita. Não possuir os insumos em estoque, como declarado pela própria empresa, importa em elevado risco para a Administração,
que, ao contratá-la, poderia car sujeita ao sucesso do processo de compra dos materiais
para viabilizar a execução do contrato. A excepcionalidade prevista para aceitação de propostas irrisórias ou nulas, que se dá quando os materiais são de propriedade do licitante, advém da mitigação real de um risco para a Administração Pública, eis que os insumos para os quais o concorrente não realizou provisão em sua proposta, não demandariam novos gastos. Ou seja, é razoável admitir que a empresa licitante não preveja recursos para aquele item, pois, de fato, eles não importariam em novas despesas.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
No caso em exame, contudo, reitero que o cenário é outro. A própria representante declarou que: “A Impetrante já está negociando a reposição do seu estoque de tubulação e aguarda apenas a adjudicação da proposta ora apresentada para incluir neste pedido os materiais de que necessita o Arsenal”. É de se observar que a empresa ainda não possui os materiais demandados e, sem que tenha feito provisão suciente em seu orçamento, declarou que realizará as aquisições
necessárias ao adimplemento do contrato. A insegurança instaurada pela aceitação de proposta desse teor é justamente aquela repelida pelo §3º do art. 44 da Lei 8.666/1993, que não admite propostas irrisórias/nulas dissociadas de garantias fáticas que mitiguem o risco de inexecução do contrato. Nos dizeres do doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello “Proposta séria é aquela feita não só com o intuito mas também com a possibilidade de ser mantida e cumprida”. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, 15ª ed. Malheiros Editores. Rio de Janeiro: 2003, p. 547. Além disso, não é razoável que o gestor público aceite proposta vazada em preço inferior a 2% do estimado, mormente quando a licitante não evidencia de forma contundente a possibilidade de execução de sua oferta. Como a Administração não alcança os traços da estratégia comercial da empresa e não pode vislumbrar seus artifícios para alcance de metas e objetivos internos, alegações de que os insumos a serem fornecidos seriam comprados com descontos signicativos, ou
mesmo de que é interesse comercial da empresa realizar o contrato para facilitar a captação de clientes privados não tornam aceitável uma proposta desse patamar. (TCU. Acórdão nº 2.186/2013, 2ª Câmara. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 30 abr. 2013)
Outra consideração, a lei de licitações prevê situação em que todos os licitantes sejam inabilitados ou todas as propostas sejam desclassicadas. Nesse caso, com base no art. 48, §3º, “a administração poderá xar aos licitantes o prazo de oito dias úteis
para a apresentação de nova documentação ou de outras propostas escoimadas das causas referidas neste artigo, facultada, no caso de convite, a redução deste prazo para três dias úteis”. Entretanto, a regra denida no retromencionado artigo “não pode ser aplicada a
licitantes já excluídos em outras etapas no curso da licitação, sendo possível sua aplicação ou aos licitantes desclassicados, quanto houver desclassicação de todas as propostas,
ou aos inabilitados, quando todos os licitantes participantes da fase de habilitação forem considerados inabilitados, e não a ambas as situações simultaneamente (inabilitados e desclassicados)” (TCU. Acórdão nº 429/2013, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman
Cavalcanti. DOU , 14 mar. 2013).
8.7 Recursos Considerando toda a dinâmica do processo de avaliação das propostas que deverá sempre considerar os critérios objetivos expressos no edital ou convite, é razoável que na fase externa, em alguns casos, sejam apresentados recursos pelos licitantes. Deve ser dada especial importância à análise desses recursos, bem como à necessidade de que a apreciação por parte da comissão esteja devidamente fundamentada e juntada aos autos, nos termos do art. 38, inciso VIII, da lei de licitações.
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
Nesse sentido, o TCU formulou determinação ao órgão responsável para que “faça constar da ata de julgamento, na hipótese de desclassifcação de propostas em razão de preço excessivo, o parâmetro utilizado para a desclassifcação, consoante determina o
inciso IV do art. 43 da Lei nº 8.666/93” (TCU. Decisão nº 855/2002, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 31 jul. 2002). Por fm, vale lembrar que a jurisprudência do TCU “é no sentido de condenar
a inabilitação de licitantes em virtude da ausência de informações que possam ser supridas por diligência, sem que essa pesquisa se constitua inserção de documento novo ou afronta à isonomia” (TCU. Acórdão nº 918/2014, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 24 abr. 2014).
8.8 Estudo de caso O presente estudo procura alertar a respeito da importância das análises das propostas na forma exigida pela lei. No caso hipotético, considerar as seguintes informações: a) o orçamento da Administração, elaborado com base em boa técnica, previa a execução da obra fcta, em regime de preço unitário, pelo valor de R$535.214,60,
com BDI de 30%, conforme TABELA 8.3; b) a empresa A apresentou menor proposta de preço global na licitação no valor de R$533.359,80, consoante TABELA 8.4, tendo sido considerada vencedora; c) para simplifcar a resolução deste caso, supor que os custos diretos calculados
pela administração, apresentados na TABELA 8.5, representam de forma confável os custos de mercado.
309
310
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
TABELA 8.3 Planilha de preços do orçamento-base elaborado pela Administração (com BDI de 30%) Orçamento - Administração obra fcta – Preços (com BDI 30%)
Unid.
Qtde.
P. un. (R$)
P. total (R$)
Raspagem e limpeza manual de terreno
m²
10.000,00
1,73
17.300,00
Escavação manual de vala em solo de 1ª cat.
m³
1.000,00
27,59
27.590,00
Escavação de solo mole
m³
10,00
97,50
975,00
Estacas pré-moldada de concreto protendido, carga 40t
m
500,00
47,27
23.635,00
Lastro de concreto
m³
100,00
276,20
27.620,00
Concreto
m³
40,00
256,89
10.275,60
Forma para fundação
m²
400,00
29,41
11.764,00
Armadura Aço - CA50
kg
3.800,00
4,54
17.252,00
Transporte e Lançamento de concreto em fundação
m³
200,00
58,34
11.668,00
Serviços Infraestrutura
Total Subitem
148.079,60
Estrutura Concreto
m³
100,00
256,89
25.689,00
Forma de chapa compensada e = 12mmm, 3 reapr.
m²
1.000,00
46,93
46.930,00
Armadura aço - CA50
kg
10.000,00
4,54
45.400,00
Transporte e lançamento de concreto em estrutura
m³
100,00
25,06
2.506,00
Laje pré-fabricada
m2
300,00
63,73
19.119,00
Total Subitem
139.644,00
Vedações Alvenaria de vedação com tijolo cerâmico e = 9 cm
m²
2.000,00
24,97
Total Subitem
49.940,00 49.940,00
Cobertura Estrutura de madeira para telha cerâmica
m²
1.000,00
44,72
44.720,00
Cobertura telha cerâmica
m²
1.000,00
41,94
41.940,00
Total Subitem
86.660,00
Acabamentos Chapisco traço 1:3 em teto
m²
300,00
6,93
2.079,00
Emboço em teto
m²
300,00
15,48
4.644,00
Chapisco em parede
m²
4.000,00
3,28
13.120,00
Emboço em parede
m²
4.000,00
12,65
50.600,00
Azulejo c/ argamassa pré-fabricada
m²
300,00
21,02
6.306,00
Pintura látex PVA duas demãos
m²
4.300,00
7,94
34.142,00
Total Subitem
110.891,00
TOTAL GERAL
535.214,60
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
TABELA 8.4 Planilha de preços do orçamento elaborado pela empresa A Orçamento obra fcta - Proposta empresa A
Unid.
Qtde.
P. un. (R$)
P. total (R$)
Raspagem e limpeza manual de terreno
m²
10.000,00
2,00
20.000,00
Escavação manual de vala em solo de 1ª cat.
m³
1.000,00
31,83
31.830,00
Escavação de solo mole
m³
10,00
250,00
2.500,00
Estacas pré-moldada de concreto protendido, carga 40t
m
500,00
54,54
27.270,00
Lastro de concreto
m³
100,00
318,69
31.869,00
Concreto
m³
40,00
296,42
11.856,80
Forma para fundação
m²
400,00
33,93
13.572,00
Armadura Aço - CA50
kg
3.800,00
5,24
19.912,00
Transporte e Lançamento de concreto em fundação
m3
200,00
67,32
13.464,00
Serviços Infraestrutura
Total Subitem
172.273,80
Estrutura Concreto
m³
100,00
296,42
29.642,00
Forma de chapa compensada e = 12mmm, 3 reapr.
m²
1.000,00
54,15
54.150,00
Armadura aço - CA50
kg
10.000,00
5,24
52.400,00
Transporte e lançamento de concreto em estrutura
m³
100,00
28,92
2.892,00
Laje pré-fabricada
m²
300,00
73,53
22.059,00
Total Subitem
161.143,00
Vedações Alvenaria de vedação com tijolo cerâmico e = 9 cm
m²
2.000,00
20,17
Total Subitem
40.340,00 40.340,00
Cobertura Estrutura de madeira para telha cerâmica
m²
1.000,00
36,12
36.120,00
Cobertura telha cerâmica
m²
1.000,00
33,87
33.870,00
Total Subitem
69.990,00
Acabamentos Chapisco traço 1:3 em teto
m²
300,00
5,60
1.680,00
Emboço em teto
m²
300,00
12,51
3.753,00
Chapisco em parede
m²
4.000,00
2,65
10.600,00
Emboço em parede
m²
4.000,00
10,22
40.880,00
Azulejo c/ argamassa pré-fabricada
m²
300,00
16,98
5.094,00
Pintura látex PVA duas demãos
m²
4.300,00
6,42
27.606,00
Total Subitem
89.613,00
TOTAL GERAL
533.359,80
311
312
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
TABELA 8.5 Planilha de custos diretos do mercado com base em referenciais conáveis
Orçamento obra fcta - Custo direto
Unid.
Qtde.
P. un. (R$)
P. total (R$)
Raspagem e limpeza manual de terreno
m²
10.000,00
1,33
13.300,00
Escavação manual de vala em solo de 1ª cat.
m³
1.000,00
21,22
21.220,00
Escavação de solo mole
m³
10,00
75,00
750,00
Estacas pré-moldada de concreto protendido, carga 40t
m
500,00
36,36
18.180,00
Lastro de concreto
m³
100,00
212,46
21.246,00
Concreto
m³
40,00
197,61
7.904,40
Forma para fundação
m²
400,00
22,62
9.048,00
Armadura Aço - CA50
kg
3.800,00
3,49
13.262,00
Transporte e Lançamento de concreto em fundação
m³
200,00
44,88
8.976,00
Serviços Infraestrutura
Total Subitem
113.886,40
Estrutura Concreto
m³
100,00
197,61
19.761,00
Forma de chapa compensada e = 12mmm, 3 reapr.
m²
1.000,00
36,1
36.100,00
Armadura aço - CA50
kg
10.000,00
3,49
34.900,00
Transporte e lançamento de concreto em estrutura
m³
100,00
19,28
1.928,00
Laje pré-fabricada
m²
300,00
49,02
14.706,00
Total Subitem
107.395,00
Vedações Alvenaria de vedação com tijolo cerâmico e = 9 cm
m²
2.000,00
19,21
Total Subitem
38.420,00 38.420,00
Cobertura Estrutura de madeira para telha cerâmica
m²
1.000,00
34,4
34.400,00
Cobertura telha cerâmica
m²
1.000,00
32,26
32.260,00
Total Subitem
66.660,00
Acabamentos Chapisco traço 1:3 em teto
m²
300,00
5,33
1.599,00
Emboço em teto
m²
300,00
11,91
3.573,00
Chapisco em parede
m²
4.000,00
2,52
10.080,00
Emboço em parede
m²
4.000,00
9,73
38.920,00
Azulejo c/ argamassa pré-fabricada
m²
300,00
16,17
4.851,00
Pintura látex PVA duas demãos
m²
4.300,00
6,11
26.273,00
Total Subitem
85.296,00
TOTAL GERAL
411.657,40
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
Perguntas
1. Qual o BDI (em %) utilizado pela empresa A? 2. Qual o valor global cobrado pela empresa A para execução dos serviços referentes às etapas infraestrutura e estrutura e qual o valor previsto pela administração. Qual o BDI (em %) em cada caso? E quanto seria pelos parâmetros da Administração? 3. Se houvesse um aditivo de 2000m³ para o serviço “escavação de solo mole”, qual seria o valor cobrado pela empresa A? Qual o BDI para o serviço? E quanto seria pelos parâmetros da Administração? 4. Ao terminar o serviço de estrutura, a empresa A paralisou os serviços alegando desequilíbrio econômico-fnanceiro do contrato. Qual o valor do saldo dos
serviços da empresa A e qual o saldo de serviços previsto pela administração no orçamento-base? E os BDIs (em %)? E quanto seria pelos parâmetros da Administração? 5. Qual a falha da comissão da licitação no momento da avaliação da proposta e qual deveria ter sido o procedimento correto? Resolução
1. Para o cálculo do BDI, deve-se considerar a fórmula: BDI = (Preço Venda) / Custo Com base nos valores abaixo, - Custo Direto = R$411.657,40 - Orçamento Administração = R$535.214,60 - Orçamento empresa A = R$533.359,80 Os valores dos BDI serão: - BDI administração = 30 % (como já esclarecido no enunciado) - BDI A = 29,5% 2. Para o cálculo dos valores dos serviços referentes às etapas infraestrutura e estrutura, basta somar os totais correspondentes a esses serviços apresentados nas planilhas: - Custo Direto = 113.886,40 + 107.395,00 = 221.281,40 - Preço Administração = 148.079,60 + 139.644,00 = 287.723,60 - Preço empresa A = 172.273,80 + 161.143,00 = 333.416,80
3. Para o cálculo do valor do serviço aditivado, é necessário consultar os preços e custos nas planilhas orçamentárias, o que propiciará a estruturação da TABELA 8.6.
313
314
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIA ALTOUNIAN N OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
TABELA 8.6 Cálculo do custo do aditivo com base nos referenciais da empresa e da Administração Unidade
Quantidade
Preço unitário (R$)
Preço total (R$)
Custo Direto
m³
2.000
75,00
150.000,00
Preço Administração
m³
2.000
97,50
195.000,00
Preço empresa A
m³
2.000
250,00
500.000,00
4. Para o cálculo dos valores dos serviços referentes ao saldo, basta somar os totais correspondentes apresentados nas planilhas: - Custo Direto = R$190.376,00 - Preço Administração = R$247.488,80 - Preço empresa A = R$199.894,80
5. A principal falha da comissão foi ter adotado como critério único de classicação a avaliação do preço global (análises 1 e 3 da TABELA 8.2), sendo, por esse motivo, a empresa A vencedora em face do menor valor apresentado. O correto, como co mo já explicado neste capítulo, é que também fosse realizada a avaliação dos preços unitários, com base nos critérios de aceitabilidade (análises 2 e 4 da TABELA 8.2), o que resultaria na desclassicação da empresa A por dois motivos: preços excessivos dos primeiros e preços inexequíveis dos últimos serviços. Fica visível, da análise da proposta da empresa A, que os preços dos serviços iniciais foram majorados (BDI = 50%) e os nais reduzidos substancialmente (BDI = 5%), enquanto para o serviço escavação de solo mole o preço foi incrementado expressivamente (BDI = 230%). Como os serviços com preços elevados foram todos realizados no início, a empresa, além de ter antecipado receita, deixou de ter interesse em fazer os serviços nais e procurou procurou adequá-los com pedido de reequilíbrio econômiconanceiro.
CAPÍTULO 8 LICITAÇÃO – FASE EXTERNA
O valor do aditivo pago à empresa (R$500.000,00) importou em signicativo
prejuízo à Administração (R$305.000,00), visto que o preço base para o serviço era de apenas R$195.000,00. A comissão teria, por meio de análise de preços unitários com base em solicitação do orçamento detalhado da proponente, desclassicado a empresa A em face de:
a) preços unitários iniciais excessivos excessivos superiores aos critérios de admissibilidade; admissibilidade; b) preços unitários nais inexequíveis inexequíveis diante dos baixos valores apresentados. Qualquer pedido de manutenção do equilíbrio econômico-nanceiro em face de
um cenário como o apresentado deve ser rejeitado de plano.
8.9 Cuidados recomendáveis – Final da fase externa Com base no exposto neste capítulo, cabe elaborar um breve resumo das avaliações a serem empreendidas pela comissão: a) vericação da observância aos prazos mínimos legais; b) vericação de impedimento dos licitantes; licitantes;
c) análise da habilitação das empresas com base nas exigências do edital; d) detalhada análise dos preços globais e unitários da empresa vencedora, em confronto com o orçamento-base da administração, a m de que sejam
avaliados por meio das análises 1, 2, 3 e 4 descritas neste capítulo, com especial atenção a: d.1) adequação aos critérios de aceitabilidade denidos no edital;
d.2) exequibilidade de preço unitários mais baixos: d.2.1) preços dos insumos e salários salários compatíveis como os de mercado; d.2.2) encargos sociais e tributários tributários justicados; d.2.3) compatibilidade dos coecientes coecientes de produtividade; produtividade; d.2.4) detalhamento do BDI, com justicativas justicativas no caso de renúncia renúncia a par-
cela dessa remuneração; d.2.5) relação de materiais e instalações de propriedade do licitante que não estão sendo cobrados, com a devida documentação comprobatória. d.3) para casos excepcionais, é importante que seja mantida justicativa técnica
anexada aos autos. e) avaliação da adequação do cronograma físico-nanceiro apresentado pela
empresa às reais necessidades da Administração; f) lembrar que a comissão de licitação tem o poder-dever de realizar todas as diligências saneadoras necessárias à perfeita elucidação de todas as questões atinentes à contratação.
315
CAPÍTULO 9
CONTRATAÇÃO DIRETA
Sumário: 9.1 Considerações
iniciais – 9.2 Licitação dispensável – 9.2.1 Obras e serviços de engenharia de pequeno valor – 9.2.2 Casos de emergência ou calamidade pública – 9.2.3 Licitação deserta – 9.2.4 Licitação fracassada – 9.2.5 Contratação de remanescente de obra – 9.2.6 Contratação de instituição incumbida de pesquisa, ensino ou desenvolvimento – 9.2.7 Compra ou locação de imóvel – 9.3 Inexigibilidade de licitação – 9.3.1 Contratação de fornecedor exclusivo – 9.3.2 Contratação de serviços técnicos por notória especialização – 9.4 Considerações fnais
9.1 Considerações iniciais A Constituição Federal, em seu art. 37, XXI, defne como regra para a contratação
de obras públicas a realização de “processo de licitação lic itação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes”. Portanto, a contratação direta é absoluta exceção a essa regra. Fica o alerta de que a opção pelo caminho da contratação direta deve ser avaliada com cautela, a fm de evitar equívocos e, consequentemente, possíveis demandas administrativas e judiciais contra os profssionais responsáveis pela defnição das
diretrizes do processo. Existem, no âmbito da lei de licitações, três casos em que é viável a utilização da contratação direta: licitação dispensada, licitação dispensável e inexigibilidade de licitação. O primeiro, licitação dispensada, refere-se a procedimento previsto no art. 17 da Lei nº 8.666, relativo à alienação de bens da Administração Pública subordinada à existência de interesse público devidamente justifcado, imóveis ou móveis, nos termos
dos incisos I e II, respectivamente. O segundo, licitação dispensável, retrata os casos em que a licitação seria possível, mas não de caráter obrigatório, em face de condições excepcionais autorizadas pelo legislador e expressas taxativamente no art. 24 da lei l ei de licitações, ou seja, só poderá ser feita contratação direta por dispensa nos casos expressamente previstos no texto legal.
CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIA ALTOUNIAN N OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
318
O terceiro, inexigibilidade de licitação, ocorre nos casos em que há inviabilidade de competição, como, por exemplo, aqueles relacionados nos incisos I a III do art. 25 da Lei nº 8.666/93. Eros Roberto Grau ilustra com clareza a diferença dos conceitos de dispensa e de inexigibilidade de licitação: 137
Deixe-se este ponto bem sublinhado: o direito positivo enuncia hipóteses de licitação e o conceito de inexigibilidade de licitação. Quero salientar, com isso, o fato de que, na dispensa, a lei autoriza a Administração a, excepcionalmente, contratar sem licitação. Atua, aí, a conveniência administrativa, em nome da qual há dispensa do dever de licitar. O dever de licitar incide, mas é afastado pelo preceito legal. A enunciação legal das hipóteses de dispensa é exaustiva. Não está a Administração autorizada a dispensar a licitação senão, e exclusiv exclusivamente, amente, nas hipóteses expressamente indicadas pela lei. No que concerne aos casos de inexigibilidade de licitação, ao contrário, não incide o dever de licitar. A não realização da licitação decorre não de razão de conveniência administrativa, administrativ a, mas da inviabilidade de competição. 138
Vale o registro de que “o ato administrativo que autoriza a contratação direta (art. 17, §§2º e 4º, art. 24, inc. III e seguintes, e art. 25 da Lei nº 8.666, de 1993) deve ser publicado na imprensa ocial, sendo desnecessária a publicação do extrato contratual” (AGU. Orientação Normativa nº 33. DOU , 14 dez. 2011).
9.2 Licitação dispensáve dispensávell Apesar de a lei de licitações autorizar, autori zar, em 27 incisos do art. 24, de forma for ma exaustiva, diversas situações nas quais será possível a contratação por dispensa de licitação, estão relacionados a seguir apenas os casos mais comuns na área de obras.
9.2.1 Obras e serviços de engenharia de pequeno valor Caso previsto no art. 24, inciso I, e parágrafo único, a lei de licitações autoriza a contratação direta de obras e serviços de engenharia de pequeno valor, “desde que não se reram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente”.. Os valores limites admitidos estão apresentados na TABELA 9.1. concomitantemente”
137
138
“Art. 25. [...] I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o u o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes; II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com prossionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; III - para contratação de prossional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública”. GRAU. Inexigibilidade de licitação: aquisição de bens e serviços que só podem ser fornecidos ou prestados por determinado agente econômico. Revista de Direito Público , p. 31-32.
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
TABELA 9.1 Limites legais estabelecidos para a contratação direta por valor no caso de obras e serviços de engenharia Obras e serviços de engenharia
Limite
Valor limite (R$)
I - (em geral)
até 10% do limite previsto na alínea “a”, do inciso I do artigo anterior
R$15.000,00
Parágrafo único – consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação
até 20% do limite previsto na alínea “a”, do inciso I do artigo anterior
R$30.000,00
qualicadas, na forma da lei, como
Agências Executivas Executivas
Considerando que o limite fxado no art. 24, inciso II, para contratação direta de
compras e serviços comuns é inferior ao de obras e serviços de engenharia, vale o alerta de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes: Por vezes, o órgão busca enquadrar o serviço como de engenharia porque, em vista do maior limite de valor, terá mais exibilidade nas contratações.
É bom lembrar que a Resolução nº 218 do CONFEA é muito abrangente, permitindo amplamente as contratações. 139
O objetivo do legislador no presente caso foi o de racionalizar os procedimentos proc edimentos em face do baixo valor das obras e serviços de engenharia e viabilizar a redução de custos administrativos gastos na elaboração de uma possível carta-convite. Entretanto, com vistas a evitar o fracionamento do objeto a ser contratado, destacou a impossibilidade de contratação direta em duas hipóteses. A primeira, no caso de parcelas de uma mesma obra ou serviço, apenas reforça o comando estabelecido no art. 23, §2º, da Lei nº 8.666/93, de que deverá ser sempre preservada a modalidade pertinente para a execução de todo o objeto a ser licitado. Dessa forma, não é cabível a divisão de uma obra de valor previsto em R$60.000,00, que exigiria carta-convite, em quatro parcelas de R$15.000,00 para que seja viabilizada contratação direta. A segunda, na execução de obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, foi mais restritiva. restrit iva. No caso da soma dos valores de diversas obras com as características característ icas mencionadas ser superior ao limite fxado, a motivação da dispensa perde a sustentação, pois o administrador poderá
realizar um único processo licitatório, com racionalização de custos administrativos, com o objetivo de ampliar a competitividade e possibilitar a obtenção da proposta global mais vantajosa. Oportuno registrar entendimento da AGU no sentido de que “as hipóteses de inexigibilidade (art. 25) e dispensa de licitação (incisos III e seguintes do art. 24) da lei JACOBY FERNANDES. Contratação direta sem licitação: modalidades, dispensa e inexigibilidade de licitação, p. 280.
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nº 8.666, de 1993, cujos valores não ultrapassem aqueles xados nos incisos I e II do art. 24 da mesma lei, dispensam a publicação na imprensa ocial do ato que autoriza a contratação direta, em virtude dos princípios da economicidade e eciência, sem
prejuízo da utilização de meios eletrônicos de publicidade dos atos e da observância dos demais requisitos do art. 26 e de seu parágrafo único, respeitando-se o fundamento jurídico que amparou a dispensa e a inexigibilidade” (AGU. Orientação Normativa Normativa nº 34. DOU , 14 dez. 2011).
9.2.2 Casos de emergência ou calamidade pública É, inegavelmente, o caso que apresenta maior número de ocorrência de irregularidades. O art. 24, inciso IV, estabelece as seguintes condições para a dispensa de licitação em casos de emergência ou de calamidade pública, “quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares”: a) somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa; b) apenas para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluíd concluídas as no prazo máximo de 180 dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade; e c) vedação à prorrogação dos respectivos contratos. As decisões do TCU analisam, com certa frequência, contratações embasadas nesta hipótese que não preenchem a totalidade dos requisitos exigidos. Por óbvio, a situação crítica exigida em lei deve ter sido causada por fato imprevisível e não por falhas administrativas ou desídia do administrador. Além disso, deve haver um conjunto de pressupostos que validem a opção pela dispensa, conforme se manifestou o TCU em atendimento a consulta: Responder ao ilustre consulente, quanto à caracterização dos casos de emergência ou de calamidade pública, em tese: a) que, além da adoção das formalidades previstas no art. 26 e seu parágrafo único da Lei nº 8.666/93, são pressupostos da aplicação do caso de dispensa preconizado no art. 24, inciso IV, da mesma Lei: a.1) que a situação adversa, dada como de emergência ou de calamidade pública, não se tenha originado, total ou parcialmente, parcialme nte, da falta de planejamento, da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos disponíveis, ou seja, que ela não possa, em alguma medida, ser atribuída à culpa ou dolo do agente público que tinha o dever de agir para prevenir a ocorrência de tal situação; a.2) que exista urgência concreta e efetiva do atendimento à situação decorrente do estado emergencial ou calamitoso, visando afastar risco de danos a bens ou à saúde ou à vida de pessoas; a.3) que o risco, além de concreto e efetivamente provável, se mostre iminente e especialmente gravoso; a.4) que a imediata efetivação, por meio de contratação com terceiro, de determinadas obras, serviços ou compras, segundo as especicações e quantitativos tecnicamente apurados, seja o meio adequado, efetivo e eciente de afastar o risco iminente detectado.
(TCU. Decisão nº 347/94, Plenário. Rel. Min. Carlos Átila da Silva. DOU , 21 jun. 1994)
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
No mesmo sentido, e com vistas a evitar a contratação direta, o administrador deve adotar as medidas cabíveis quando tem prévio conhecimento da possibilidade de ocorrências que poderão ensejar situações críticas, consoante ilustra caso analisado pelo TCU: No tocante ao segundo fato impugnado, as justicativas apresentadas centraram-se no
enfrentamento do critério sustentado pela Unidade Técnica para refutar a invocação do inciso IV do art. 24 da Lei nº 8.666/93 na dispensa da licitação, é dizer, que a natureza cíclica das chuvas determinaria a previsibilidade das suas conseqüências. Nesse ponto, o argumento da Unidade Técnica é espantosamente lógico e simples: se o Administrador tem, com alguma margem de segurança, prévio conhecimento da possibilidade de ocorrência de situações que certamente demandarão a ação do Poder Público, por que não empreender, também previamente e em melhores condições de decisão, as medidas idôneas a dotar o Poder Público dos instrumentos necessários à efetivação daquelas ações? Em suma, e esse é o holding da argumentação da Unidade Técnica, o que é previsível não congura um “caso de emergência” e, de conseguinte, não se subsume à hipótese tipicada no inciso IV do art. 24 da Lei de Licitações. (TCU. Acórdão nº 37/00, Plenário. Rel. Min. Adylson Moa. DOU , 07 abr. 2000)
Não cabem, também, alegações genéricas e abstratas para o embasamento de contratação emergencial, conforme análise do referido Tribunal: 2. Para começar, o uso da dispensa de licitação mostrou-se indevido, uma vez que a caracterização carac terização de urgência não correspondeu a uma situação concreta, colidindo com o preceituado no inciso IV do art. 24 da Lei nº 8.666/93. Nesse dispositivo, está claro que a emergência a ser contornada é especíca, fortuita e imprevista, enquanto o serviço
contratado para atendê-la possui data de início — a do seu acontecimento — e prazo máximo para terminar de 180 dias, no que se refere a obras. 3. Não pode obviamente ser invocado para sustentar o desvio da licitação o fato abstrato e genérico de que a administração pública “vive sempre em situação emergencial de combate à criminalidade”, como apregoado no parecer jurídico que opinou pela regularidade da contratação direta (s. 106/113 do vol. 1). Nem é admissível a posição, ali também
exteriorizada, de que a adoção da dispensa de licitação traduziria, nas circunstâncias, a eciência da administração na resolução do problema. Ao contrário, o problema é fruto de contínua ineciência administrativa, administrativa, em todas as esferas de governo, e por isso mesmo
não há de ser tido como pressuposto de dispensa de licitação. (TCU. Acórdão nº 2.134/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 23 nov. 2006)
Vale lembrar que, mesmo no caso de contratações emergenciais, é importante a existência de projeto básico e a negociação com o contratado para que os preços estejam em patamar de mercado: 1.6 determinar ao [...] que, mesmo em obras emergenciais, providencie providen cie projeto básico com
todos os elementos do art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666/93, em obediência ao art. 7º, § 2º, inciso II, e 9º, da Lei nº 8.666/1993, sob pena anulação dos contratos com base no § 6º do mesmo artigo, ressalvando, para o caso de obras emergenciais de baixa complexidade executiva, em caráter excepcional, a possibilidade de substituição do projeto básico por planilha estimativa, desde que esta se encontre devidamente fundamentada em relatório técnico;
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1.7 recomendar ao [...] que, nas n as contratações de obras por emergência, envide esforços para para negociar os contratos adotando como referência de preços máximos aqueles observados em licitações de obras semelhantes em que tenha havido competitivid competitividade, ade, devendo, em todo caso, observar como limite a mediana dos preços constantes do SICRO. (TCU. Acórdão nº 614/2010, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 6 abr. 2010)
Especial atenção deve ser dada para que não ocorra confusão entre os conceitos de “urgência” e “urgência controlada”, visto que esta última, como a ausência ou precariedade de equipamentos e serviços públicos, não caracteriza por si só a imprevisibilidade e a excepcionalidade exigidas para a contratação direta fundamentada no inciso IV do art. 24 da Lei nº 8.666/1993: A contratação direta, a título de emergência, foi justicada pela [...] com base em laudo do Corpo de Bombeiros que indicou a necessidade da interdição do Estádio e em parecer da Procuradoria Municipal que concluiu por ser dispensável a licitação. Contudo, os elementos constantes dos autos evidenciam que os pressupostos para legitimação da dispensa licitatória não estavam presentes e, portanto, os responsáveis pela irregularidade devem ser apenados. Destacou o MPTCU entendimento doutrinário que bem traduz o posicionamento jurisprudencial jurisprudenci al desta Casa e deixa clara a irregularid irregularidade. ade. Para caracterizar a situação emergencial emer gencial deve restar evidente que a contratação imediata é a via adequada e efetiva para eliminar iminente risco de dano ou de comprometim comprometimento ento da segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares. Em outros termos: “No caso específico das contratações diretas, emergência significa necessidade de atendimento imediato a certos interesses. Demora em realizar a prestação produziria risco de sacrifício de valores tutelados pelo ordenamento jurídico. Como a licitação pressupõe certa demora para seu trâmite, submeter a contratação ao processo licitatório propiciaria propicia ria a concretização do sacrifício sacrif ício a esses valores” (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Administrativ os, Marçal Justen Filho, Ed. Dialética, 11ª ed., São Paulo, 2005, p. 238). No caso concreto, para mitigar o risco decorrente das más condições estruturais do estádio, bastaria a interdição do local, como se depreende do relatório do Corpo de Bombeiros. Tal medida importaria na inviabilidade de utilizar-se o estádio como praça de eventos públicos, mas não há elementos que permitam concluir pela existência de riscos tais a ensejar a antecipação das intervenç intervenções ões com o sacrifício do processo licitatório. Nessa linha foi a manifestação do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Norte que, antes de ser rmada a contratação por emergência, enviou ao Executivo municipal manifestação no sentido da irregularidade de se dispensar licitação para contratação das obras de reforma do Estádio Machadão, já que não se conguravam os pressupostos indispensáveis para justicar a medida de exceção. Ademais, além de não caracterizada emergência, é possível inferir que os problemas estruturais do estádio foram provocados pela própria inércia da administração pública. Isso porque constam dos autos avaliações técnicas técn icas do documento “Diagnóstico, “Diagnóst ico, Avaliação Avaliação e Recomendações quanto à Segurança e Recuperação Estrutural” Estrutural ” datado de 15 de julho de 1999 que detalham variadas patologias no empreendimento, inclusive quanto à estrutura. Contudo, o contrato emergencial foi assinado apenas em 2006, o que evidencia que o problema, já antigo, não mereceu o tratamento esperado dos gestores. Mesmo que se admitisse a existência da situação emergencial, o que só se cogita para demonstrar a irregularidade manifesta da dispensa, outra disposição legal inarredável quanto aos objetos dos contratos rmados por emergência foi desrespeitada, qual seja: “somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa” (24, inciso IV, da Lei 8.666/93).
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
O escopo contratual ultrapassa em grande monta o universo dos serviços estritamente necessários à recuperação estrutural do estádio, já que abrange intervenções atinentes à modernização e melhoramentos no empreendimento, das quais são exemplos a interligação das arquibancadas, a recuperação do gramado e da fachada, a reforma dos túneis e a adequação das instalações elétricas e hidrossanitárias. Penso que o enquadramento em situação emergencial tendente a dispensar a realização de licitação deve ser natural, evidente, e não forçado ou provocado. Em similaridade com a questão enfrentada no acórdão 1.020/2008 - 1ª Câmara, a reforma do estádio pode ser considerada como de “urgência controlada”, não enquadrável em hipótese motiv motivadora adora de dispensa e, portanto, sendo obra licitável. Entender como regular a contratação direta nos casos de “urgência controlada” contro lada” poderia levar a uma aplicação generalizada da dispensa de licitação sob tal motivação, mormente em um contexto geral de defciência de equipamentos
públicos. (TCU. Acórdão nº 513/2013, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 18 mar. 2013)
Em relação ao prazo limite de validade do contrato direto fxado em lei, cabe
destacar a impossibilidade, em regra, da prorrogação por período superior a 180 dias, sendo necessária, caso outro estado emergencial ou calamitoso ocorra dentro desse período, outra aquisição, devidamente justifcada, através de outra contratação direta,
ainda que seja com a mesma pessoa física físic a ou jurídica. O que se veda é a prorrogação de um mesmo contrato, para além de cento e oitenta dias; isto parece mais razoável do que entender ter a lei proibido toda e qualquer prorrogação dentro desse prazo, até porque estaria, nesse passo, tumultuando terrivelmente ter rivelmente o disciplinamento das prorrogações, previsto nos art. 57 e seguintes. (TCU. Decisão nº 822/97, Plenário. Rel. Min. Humberto Souto. DOU , 12 dez. 1997)
Não obstante, em casos excepcionais relativos à extrapolação do referido prazo, o TCU entendeu: [...] é possível, quando da dispensa de licitação nos casos de emergência ou calamidade,
consoante o disposto no inciso IV do art. 24 da Lei nº 8.666/93, o retardamento retardamen to do início e da devolução da contagem do prazo de 180 (cento e oitenta) dias, desde que as ações tomadas pela Administração Administração tenham sido prejudicadas pela superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que altere fundamentalmente as condições de execução do contrato, a teor do disposto no art. 57, §1º, da mencionada Lei, devendo ser adequadamente fundamentado, levando em conta, inclusive, as determinações deter minações contidas na Decisão nº 347/94 – TCU – Plenário (“in” D.O.U. de 21/06/94). (TCU. Decisão nº 820/96, 820/96 , Plenário. Rel. Min. Bento Bugarin. DOU , 26 dez. 1996) Por fm, há que se registrar que a ausência de planejamento não é sufciente para
descaracterizar a situação emergencial. Em situação concreta, c oncreta, devidamente comprovada, que ponha em risco iminente a comunidade, deverão ser adotadas as providências imediatas pela Administração, sem prejuízo da responsabilização dos gestores que deram causa ao cenário por falta de planejamento anterior adequado. Nesse diapasão, a Advocacia-Geral da d a União, por meio da ON nº 11/2009, destaca que “a contratação direta com fundamento no inc. IV do art. 24 da lei nº 8.666, de 1993, exige que, concomitantemente, seja apurado se a situação emergencial foi gerada por falta de planejamento, desídia ou má gestão, hipótese que, quem lhe deu causa será
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responsabilizado na forma da lei” (AGU. Orientação Normativa nº 11, de 1º de abril de 2009. DOU , 07 abr. 2009), com base na seguinte fundamentação: A situação de emergência é apurável no mundo fenomênico. A emergência possui diversas causas: caso fortuito, força maior, desídia, falta de planejamento, má gestão, dolo ou culpa de agente público, etc., porém, o efeito é apenas um: o risco de dano a bens jurídicos tutelados pelo Estado, como a vida e a integridade de pessoas e bens. Assim, não há diferença entre emergência emergênc ia oriunda de força maior, ou caso fortuito, e aquela provocada pela desídia ou falta de planejamento, considerados os resultados danosos que o Poder Público tem o dever de evitar. A contratação direta com base no inc. IV do art. 24 da Lei nº 8.666, de 1993, visa efetivamente a afastar os efeitos das emergências e não suas causas. [...]
Em suma, caracterizada a circunstância emergencial, emergenc ial, independentemente de suas causas, vericada a adequação entre a contratação que se pretende levar a efeito, como medida
saneadora da emergência, aplica-se o disposto no inc. IV do art. 24 da Lei nº 8.666, de 1993, sem prejuízo da apuração da responsabilidade do agente público que lhe deu causa, total ou parcialmente. De recomendar-se, também, na ocorrência da hipótese, a instauração imediata de certame licitatório. Essa posição é reverenciada no Acórdão 1.876/2007-Plenário. (AGU. Orientação Normativa nº 11, de 1º de abril de 2009. DOU , 07 abr. 2009) Conrmando a tese acima, o TCU registrou que, “caso fosse identicada essa
situação emergencial, mesmo decorrente de inércia ou incúria administrativa, poderia a contratação se dar por meio do permissivo legal invocado, devendo ser apurada, todavia, a responsabilidade do agente público que não adotou tempestivamente as providências a ele cabíveis” (TCU. Acórdão nº 425/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. , 13 mar. 2012). DOU
9.2.3 Licitação deserta Neste caso, será possível a contratação direta, nos termos do art. 24, V, “quando não acudirem interessados à licitação anterior”. É recomendável a observância a todos os requisitos contidos no artigo, ou seja: realização de licitação; prova da ausência de interessados; justicativas da impossibilidade de repetição da licitação sem prejuízo
para a Administração; e manutenção de todas as condições condiç ões preestabelecidas. O objetivo do legislador foi possibilitar a contratação quando, apesar de o administrador ter adotado todas as providências previstas em lei para a licitação, não houve comparecimento de empresas ao certame, e a necessidade da execução do objeto não pode ser postergada sob pena de prejuízo à própria Administração. No caso, não se poderá alegar qualquer forma de desídia ou omissão aos agentes responsáveis, visto que o problema ocorreu em âmbito externo à Administração.
O TCU tem entendimento rmado de que a aplicação do inciso V do art. 24 da lei de licitações só deve ser feita caso o certame não possa, justicadamente, ser repetido
sem prejuízo para a Administração: 13. O fundamento invocado para a contratação direta da referida empresa — art. 24, inciso V, da Lei n. 8.666/1993 — somente pode ser empregado no caso de não acudirem interessados à licitação anterior e se o certame, justicadamente, não puder ser repetido
sem prejuízo para a Administração.
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
14. Não se vislumbram dos autos evidências de que os requisitos pertinentes à contratação direta foram observados, sobretudo porque não restou demonstrada a inviabilidade da repetição do certame nem a potencialidade de eventual prejuízo à Administração se ocorresse nova licitação. 15. Havia tempo hábil para a repetição do certame, com bem anotado no exame feito pela unidade instrutiva. O prazo para a execução do objeto pactuado era até 31/05/2003 e a declaração de licitação deserta se deu em 13/11/2002, portanto, à época, dispunha-se de mais de seis meses para refazer o torneio licitatório. (TCU. Acórdão nº 342/2011, 1ª Câmara. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 02 fev. 2011)
9.2.4 Licitação fracassada De forma distinta da licitação deserta, a licitação fracassada prevista no inciso VII caracteriza-se quando houve a realização da licitação e foram apresentadas propostas por empresas. Contudo, essas propostas foram inabilitadas ou desclassicadas por terem
apresentado preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional,
ou incompatíveis com os xados pelos órgãos ociais competentes. Nesse caso, após a xação do prazo de oito dias, nos termos do §3º do art. 48
da Lei nº 8.666/93, se persistir a situação, será admitida a adjudicação direta dos bens ou serviços, por valor não superior ao constante do orçamento-base, devidamente equacionado aos sistemas referencias de preços existentes. exist entes. Vale lembrar que “não se dispensa licitação, com fundamento nos incs. V e VII do art. 24 da Lei nº 8.666, de 1993, caso a licitação fracassada ou deserta tenha sido realizada na modalidade convite” (AGU. Orientação Normativa nº 12, de 1º de abril de 2009. DOU , 07 abr. 2009).
9.2.5 Contratação de remanescente de obra O presente caso ocorre quando há rescisão de contrato de obra, serviço ou fornecimento forneciment o rmado com a empresa vencedora da licitação original. Para a continuidade
do saldo dos serviços, a lei autoriza a contratação direta, desde que atendida a ordem de
classicação classicaç ão da licitação anterior e aceitas as mesmas condições oferecidas pelo licitante
vencedor original, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido. corrigi do. Na hipótese, deve a administração providenciar toda a documentação, inclusive
fotográca, dos serviços já realizados realizado s a m de poder acionar, caso necessário, a empresa responsável por sua execução e devidos responsáveis técnicos, bem como a identicação do saldo dos serviços para poder rmar o contrato com a nova empresa.
Importante perceber perce ber que a lei se refere a remanescente de obra, ou seja, a hipótese não se aplica quando à época da rescisão a execução do empreendimento não havia começado, consoante entendimento do TCU:
1. Não é possível a convocação de segunda colocada em licitação para a execução do remanescente de obra, serviço ou fornecimento (art. 24, XI, da Lei 8.666/93), quando à época da rescisão contratual não havia sido iniciada a execução do objeto licitado. 2. Na convocação para a execução de remanescente de obra, serviço ou fornecimento ou para assinatura de contrato em substituição à licitante desistente do certame, devem ser observadas as mesmas condições propostas pelo primeiro classicado, inclusive quanto aos preços atualizados de conformidade com o ato convocatório.
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3. É indevida a assinatura de contrato após transcorrido prazo que inviabilize a verifcação da adequabilidade das condições propostas no certame. (TCU. Acórdão nº
1.317/06, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 07 ago. 2006)
9.2.6 Contratação de instituição incumbida de pesquisa, ensino ou desenvolvimento A lei de licitações admite, no art. 24, XIII, a dispensa “na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profssional e não tenha fns lucrativos”.
O TCU observa que esse tipo de dispensa “somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto contratado, além de comprovada razoabilidade do preço cotado” (TCU. Acórdão nº 1.448/05, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 20 set. 2005). A propósito, em detida análise relativa à contratação direta de fundações de apoio no âmbito das Universidades Federais (art. 1º da Lei nº 8.958/94), o mesmo Tribunal recomendou a observância dos seguintes quesitos: a) são condições indispensáveis que: a1) a instituição contratada tenha sido criada com a fnalidade de dar apoio a projetos de pesquisa, ensino e extensão e de desenvolvimento institucional, científco e tecnológico;
a2) o objeto do contrato esteja diretamente relacionado à pesquisa, ensino, extensão ou desenvolvimento institucional; b) a Fundação, enquanto contratada, deve desempenhar o papel de escritório de contratos de pesquisa, viabilizando o desenvolvimento de projetos sob encomenda, com a utilização do conhecimento e da pesquisa do corpo docente das IFES, ou de escritório de transferência de tecnologia, viabilizando a inserção, no mercado, do resultado de pesquisas e desenvolvimentos tecnológicos realizados no âmbito das Universidades; c) o contrato deve estar diretamente vinculado a projeto a ser cumprido em prazo determinado e que resulte produto bem defnido, não cabendo a contratação de atividades continuadas nem de objeto genérico, desvinculado de projeto específco;
d) os contratos para execução de projeto de desenvolvimento institucional devem ter produto que resulte em efetivo desenvolvimento institucional, caracterizado pela melhoria mensurável da efcácia e efciência no desempenho da instituição benefciada;
e) a manutenção e o desenvolvimento institucional não devem ser confundidos e, nesse sentido, não cabe a contratação para atividades de manutenção da instituição, a exemplo de serviços de limpeza, vigilância e conservação predial. (TCU. Decisão nº 655/02, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 08 jul. 2002)
Ainda a respeito do tema, foi formulada determinação à entidade para que se “abstenha de dispensar licitação com fundamento no art. 24, inciso XIII, da Lei nº 8.666/93, quando restar comprovado que a instituição de que trata o referido dispositivo não tem condições de desempenhar as atribuições para a qual foi contratada, uma vez que nesse caso é inadmissível a subcontratação” (TCU. Decisão nº 138/98, Plenário. Rel. Min. Adhemar Ghisi. DOU , 07 abr. 1998).
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
9.2.7 Compra ou locação de imóvel O art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666/93 prevê a possibilidade de contratação por dispensa para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das fnalidades
precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia. Mas seria possível a aplicação desse dispositivo às contratações de “locação sob medida”, também conhecido como built-to-suit , de imóvel a ser construído de acordo com parâmetros mínimos estabelecidos por órgão ou entidade da Administração Pública? Em caso positivo, quais seriam os aspectos legais aplicáveis e quais as exigências técnicas necessárias para a celebração dessa modalidade de contrato administrativo? Essa questão foi submetida ao TCU por meio de consulta formulada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT): 3. De acordo com a peça inicial, o consulente encaminha questionamento quanto à aplicabilidade do art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, às contratações de locação sob medida de imóvel a ser construído de acordo com parâmetros mínimos estabelecidos por órgão ou entidade da Administração Pública, solicitando respostas para as seguintes dúvidas (Peça nº 1): “a) é possível a aplicação do disposto no art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666/93 na contratação de locação de imóvel a ser construído de acordo com parâmetros mínimos a serem estabelecidos por órgão da Administração Pública? b) em caso positivo, quais seriam os aspectos legais aplicáveis e quais as exigências técnicas necessárias para a celebração dessa modalidade de contrato administrativo?” 4. Após a análise da matéria, a unidade técnica propõe responder ao consulente que é possível a dispensa de licitação, com fundamento no art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666, de 1993, para a contratação de locação de imóvel a ser construído de acordo com parâmetros mínimos estabelecidos por órgão ou entidade da Administração Pública. 5. A unidade técnica propõe, ainda, alertar que: “estando a decisão fundamentada em estudos técnicos, pareceres e documentos comprobatórios que justifquem a opção, após a verifcação de todas as opções disponíveis para uso ou integração de imóvel público,
a única distinção que se observa entre o procedimento para uma locação convencional e o procedimento para uma locação built-to-suit é a necessidade de se demonstrar que, comprovada a impossibilidade de suprir a demanda de outras formas, tal modalidade de contratação é mais vantajosa que a realização de benfeitorias em imóvel alugado”. 6. De início, registro que concordo com o encaminhamento proposto, sem prejuízo de tecer algumas considerações adicionais, já que a questão envolve contornos mais amplos que ensejam uma análise ainda mais abrangente dos aspectos legais e técnicos suscitados. I - Operações built-to-suit (locação sob medida) 7. Em primeiro lugar, convém esclarecer os principais aspectos que se relacionam com a chamada operação built-to-suit ou build-to-suit (“construída para servir” ou “construir para servir”), que é mais conhecida no Brasil como “locação sob medida”, “locação sob encomenda” ou “locação com obrigação de fazer”. 8. A operação ou contrato built-to-suit constitui-se em instrumento utilizado pelo mercado imobiliário, comumente adotado pelo setor industrial e de varejo, na Europa e nos Estados Unidos e, de forma mais recente, no Brasil. 9. A utilização dessa operação se deu a partir da necessidade, observada pelas empresas, de restringir a alocação de recursos na imobilização de ativos fxos, uma vez que isso
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compromete parcelas, por vezes, signicativas do uxo de caixa operacional em atividades não diretamente vinculadas à atividade nalística da entidade. 10. Em apertada síntese, pode-se dizer que a operação built-to-suit consiste na locação de um imóvel construído pelo futuro locador conforme especicações pré-denidas pelo futuro locatário. [...] 14. Ante a crescente utilização desse instituto pelo empresariado brasileiro, antes de qualquer previsão legal, numa signicativa demonstração de que o fato geralmente antecede a norma jurídica, segundo a teoria tridimensional do direito, foi editada, em 19 de dezembro de 2012, a Lei nº 12.744 que acrescentou à chamada Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991) o artigo 54-A, que trata da contratação de locação com prévia aquisição, construção ou reforma de imóvel urbano não residencial. 15. O referido artigo 54-A da Lei nº 8.245/1991 assim dispõe: “Art. 54-A. Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especicado pelo pretendente à locação, a m de que seja a este locado por prazo determinado, prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições procedimentais previstas nesta Lei. §1º Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação. §2º Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo nal da locação”. 16. Vê-se, pois, que, até o advento dessa lei, o contrato built-to-suit era tratado juridicamente no Brasil como um contrato atípico. 17. Demais disso, observa-se que a edição dessa nova regra legal proporcionou maior segurança às partes contratantes, uma vez que a falta de previsão legal sobre a revisão do valor dos aluguéis e sobre a possibilidade de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário impactava negativamente na realização das operações. 18. Ocorre que, nesse tipo de contrato, a manutenção do valor de aluguel fixado dentro de um prazo de locação mais alongado mostra-se fundamental para garantir ao empreendedor-locador o retorno do investimento realizado. 19. Nesse ponto, é importante destacar que uma operação built-to-suit não pode ser considerada como mero contrato de locação. 20. Eis que, além da locação, a operação envolve, para o locador (empreendedor ou investidor contratado), a aquisição do terreno, a elaboração de projetos, a construção e entrega do imóvel pronto, o recebimento de remuneração pelo uso do imóvel e pelo retorno dos investimentos alocados, com a possibilidade de securitização do contrato, cujos títulos terão como lastro o valor dos aluguéis acordados. 21. Já para o locatário, a operação abrange, em síntese, a denição da localização ideal, as especicações detalhadas das instalações necessárias, a análise e aprovação dos projetos, a scalização da execução da obra, o recebimento do imóvel pronto e o pagamento das parcelas locatícias, que são valoradas com base na remuneração pelo uso e fruição do imóvel e pelos valores investidos na customização, durante o prazo acordado, que varia, em média, de 8 a 15 anos. 22. Como vantagens auferidas pelo locatário do setor privado em operações dessa natureza, pode-se citar, além da reserva signicativa de ativos nanceiros com a correspondente alocação desses valores na atividade m da empresa, a possibilidade de dedução dos valores pagos a título de aluguel na apuração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ, se tributado com base no lucro real, e da Contribuição Social sobre o Lucro – CSSL.
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
23. É esse fator tributário, aliás, que, por vezes, tem se mostrado preponderante para tornar a operação built-to-suit mais atrativa para os empresários da iniciativa privada, ainda que tenham de desembolsar valores, por vezes, superiores ao valor locatício convencional. II - Operações built-to-suit no âmbito da Administração Pública. 24. Feito esse breve escorço acerca das principais características das operações built-to-suit , com origem e aplicação predominante no âmbito da iniciativa privada, passo a tratar da aplicação dessa operação de “locação sob medida” no setor público. 25. No setor público, a “locação sob medida” vem sendo utilizada de modo cauteloso pelos gestores, até porque, somente em 19 de dezembro de 2012, foi publicada a Lei nº 12.774 que incorporou os dispositivos tratando da matéria à Lei do Inquilinato, trazendo maior segurança jurídica para as partes contratantes. 26. Para justicar a estruturação dessa operação no setor público, os motivos informados
pelos gestores públicos situam-se, em essência, na inexistência ou no contingenciamento de dotação orçamentária para aquisição plena de terreno e construção completa de imóveis, no alto custo das reformas realizadas em imóveis alugados pela administração pública junto ao setor privado sem devolução posterior pelo locador dos valores não amortizados e na falta, junto ao mercado imobiliário, de edicações que atendam às necessidades de estruturação operacional dos órgãos, de forma a melhor prestarem os serviços públicos. [...]
31. Não é demais lembrar que a construção, pela iniciativa privada, de imóvel em terreno público requer a concessão de direito de superfície, o que foi providenciado nos casos logo acima citados. 32. Registre-se que, no caso da construção da subseção de Campo Mourão, no Paraná, valiosos esclarecimentos foram prestados pelo Sr. Josias Soares da Silva, representante da Justiça Federal do Paraná, no Encontro Técnico Nacional de Auditoria de Obras Públicas promovido, em 2011, pelo Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina — hp://
servicos.tce.sc.gov.br/enaop/ —, quando ele se manifestou nos seguintes termos: “A recomendação do Conselho Nacional de Justiça para que os Tribunais adotem políticas administrativas com vistas a substituir imóveis locados ou cedidos por próprios impôs a reformulação dos mecanismos tradicionais para superar os entraves e obter soluções. A contratação built-to-suit , desenvolvida em caráter experimental na Justiça Federal – Seção Judiciária do Paraná, foi concebida para implementar a nova política contornando a ausência de orçamento para construção (investimento) e edicando um imóvel adequado
para sediar a Subseção de Campo Mourão utilizando-se do orçamento destinado ao aluguel de imóveis (despesa corrente). Nos moldes de uma parceria público-privada, o particular constrói em terreno da União, sobre o qual se constitui direito de superfície, aluga o imóvel à Administração por tempo determinado, o qual, com o término da vigência do contrato de locação, consolida-se denitivamente ao patrimônio público.
A conjugação de diversos institutos do direito público e privado confere a estabilidade jurídica necessária para a realização do objetivo público”. 33. No caso concreto acima apontado, segundo informações também obtidas junto à rede mundial de computadores, inicialmente estava prevista a realização de um pregão presencial. Todavia, posteriormente, ante a percepção de que o valor total da transação superaria o montante de R$20 milhões, valor a partir do qual é autorizada a realização de parceria público-privada, regulada pela Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, o órgão da Justiça Federal resolveu alterar a modalidade de licitação para concorrência pública e incorporar alguns procedimentos ou controles previstos na Lei nº 11.079/2004, com vistas a trazer maior garantia às partes, a despeito de a operação em questão não se enquadrar exatamente na contratação ali regulada. 34. Ante o exposto acima, constata-se que, no âmbito da Administração Pública, já vem ocorrendo estruturação sob a forma de “locação sob medida” em duas situações distintas:
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(i) quando a edicação do imóvel “sob medida” será realizada em terreno sob propriedade
da construtora (incorporadora) ou em terreno de terceiros; (ii) quando a Administração é proprietária do terreno onde será construído o imóvel a ser locado. [...]
III - Aplicação da Lei nº 8.666, de 1993. 39. Passo, enm, a tratar da aplicabilidade, ou não, da licitação dispensável insculpida no
art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666, de 1993, à contratação da “locação sob medida”. 40. De acordo com o art. 2º da citada lei, as locações efetivadas pela Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas na mesma lei. 41. Por sua vez, tratando das hipóteses de licitação dispensável, o art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666, de 1993, estabelece que: “Art. 24. É dispensável a licitação: [...] X - para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das nalidades
precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia”. 42. Vê-se, pois, que a licitação pode ser dispensada apenas nos casos em que as necessidades de instalação e de localização condicionem a escolha de determinado imóvel que a Administração pretende buscar a locação e desde que o preço da locação se mostre compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia. 43. Desse modo, observa-se que a contratação de locação sob medida mediante licitação dispensável fundada no art. 24, X, da Lei nº 8.666/1993 só será admitida se atender a todos esses requisitos legais. 44. Conforme apontado pela unidade técnica, no que diz respeito à seleção do local do imóvel pretendido pelo órgão ou entidade, pode haver casos em que a localização, em determinada posição geográca, condicione de fato a escolha a ser feita pela administração
pública, podendo-se citar, como exemplo, o caso de uma locação de imóvel para instalação de uma delegacia de polícia onde a localização especíca é condição essencial, e não
negociável, para o alcance do interesse público. 45. Nesse ponto, deve-se lembrar que, na licitação dispensável, a administração pública pode escolher entre realizar a licitação ou dispensá-la nas hipóteses exaustivamente apontadas no art. 24 da Lei nº 8.666/1993, mas tal escolha deve estar acompanhada da devida justicativa (motivação), em respeito ao disposto no art. 50, inciso IV e §1º, da Lei
nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da administração federal. 46. Com base nesse artigo da Lei nº 9.784/1999, é que se vê que a administração pública deve demonstrar claramente o devido cumprimento de todos os requisitos previstos no art. 24, inciso X, da Lei de Licitações, em especial, quanto à comprovação da compatibilidade do preço a ser contratado com o valor de mercado, bem assim que, na encomenda, a junção do serviço de locação (parte principal) com o de execução indireta de obra (parte acessória) apresenta economia de escala e que, por isso, tal locação sob encomenda não ofende o princípio do parcelamento do objeto, previsto no art. 23, §1º, e no art. 15, IV, da Lei nº 8.666/1993. 47. Demais disso, devem ser observadas, no que couber, as disposições concernentes aos contratos da administração consignadas na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, destacando que a locação sob medida constitui-se em contrato da administração, e não em contrato administrativo stricto sensu, nos termos do art. 62, §3º, inciso I, da mesma lei, que aduz: “Art. 62. O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
§3º Aplica-se o disposto nos arts. 55 e 58 a 61 desta Lei e demais normas gerais, no que couber: [...] I - aos contratos de seguro, de nanciamento, de locação em que o Poder Público seja
locatário, e aos demais cujo conteúdo seja regido, predominantemente, por norma de direito privado” [...] 48. Registro, enm, que o fato de a locação sob medida envolver a realização adicional e
concomitante de obra pública não proíbe, por si só, o emprego da dispensa de licitação fundada no art. 24, X, Lei nº 8.666/1993, não só porque, no caso da locação sob encomenda, a aludida obra apresenta-se como acessória ao serviço de locação, que se congura como
o objeto principal, mas também porque, no caso de obra autônoma, o pagamento ocorre de modo integral, ao passo que, no de obra acessória à locação sob medida, o pagamento ocorre de modo diferido segundo a parcela de utilidade auferida em cada período de
efetivo uso da atividade de locação, enquadrando-se, pois, na denição de serviço dada
pelo art. 6º, II, da Lei nº 8.666/1993. IV - Conclusão 49. Por todas essas considerações, entendo que o TCU deve responder ao nobre Presidente do Conselho Superior da Justiça do Trabalho que, nos termos do art. 62, §3º, I, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, c/c o art. 54-A da Lei nº 8.245/1991 (incluído pela Lei nº 12.744, de 19 de dezembro de 2012), a despeito de a realização de licitação dever ser a regra, admite-se excepcionalmente a contratação direta de “locação sob medida”, em operação built-to-suit , por meio de licitação dispensável fundada no art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666/1993, mas desde que, neste caso, a administração pública demonstre claramente que as necessidades de instalação e de localização condicionam a escolha de determinado imóvel e que o preço da locação se mostra compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia, bem assim que a junção do serviço de locação (parte principal) com o de execução indireta de obra (parte acessória) apresenta economia de escala e que, por isso, tal locação sob encomenda não ofende o princípio do parcelamento do objeto, previsto no art. 23, §1º, e no art. 15, IV, da Lei nº 8.666/1993, sem prejuízo de se destacar que tudo deve estar devidamente justicado nos autos do processo de licitação, em respeito ao art.
50, IV, da Lei nº 9.784, de 1999. 50. Vê-se, ainda, que tudo isso deve ser observado sem prejuízo de a administração pública atender a outros requisitos que devem ser também respeitados na contratação de “locação sob medida”, os quais, inclusive, já haviam sido em parte enumerados pela Assessoria Jurídico-Administrativa do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, no Parecer nº 280/2012, destacando-se, em síntese, o atendimento das seguintes exigências: a) caracterização da efetiva necessidade do imóvel, com demonstração de que o imóvel até então porventura em uso não atende mais ao interesse público e que não comporta readequação; b) inexistência de imóveis disponíveis no âmbito da Administração Pública federal, distrital, estadual ou municipal, de acordo com as “Orientações para destinação do Patrimônio da União”, que foram editadas pela SPU/MPOG no exercício de 2010; e c) conguração da compatibilidade do preço exigido com aqueles praticados no mercado,
podendo-se utilizar, como parâmetro, valor obtido em laudo de avaliação a ser emitido pela Caixa Econômica Federal, à época da efetiva locação do imóvel, estabelecendo-se, antecipadamente, valores máximo e mínimo admitidos, em razão da necessária previsão de dotação orçamentária; d) fundamentação da decisão pela locação sob medida em estudos técnicos, pareceres e documentos comprobatórios que justiquem tal opção contratual, incluindo a necessidade
de se demonstrar que, comprovada a impossibilidade de suprir a demanda por outras formas, a utilização da locação sob encomenda mostra-se inequivocamente mais favorável economicamente do que a realização de reforma ou adequação em imóvel alugado sob a forma convencional. [...]
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Ante todo o exposto, proponho que seja adotado o acórdão que ora submeto à apreciação deste colegiado. ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em: 9.1. conhecer da presente consulta, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade previstos nos arts. 264 e 265 do Regimento Interno do TCU; 9.2. responder ao nobre Presidente do Conselho Superior da Justiça do Trabalho que, nos termos do art. 62, §3º, I, da Lei nº 8.666/1993 c/c o art. 54-A da Lei nº 8.245/1991 (incluído pela Lei nº 12.744, de 19 de dezembro de 2012), a despeito de a realização de licitação dever ser a regra, admite-se excepcionalmente a contratação direta de locação sob medida (operação built-to-suit), por meio de licitação dispensável fundada no art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666/1993, desde que, além da observância das demais disposições legais aplicáveis ao caso, o terreno onde será construído o imóvel seja de propriedade do particular que será o futuro locador; 9.3. informar ao Conselho Superior da Justiça do Trabalho que, adicionalmente, a administração pública deverá demonstrar claramente que as necessidades de instalação e de localização condicionam a escolha de determinado imóvel e que o preço da locação se mostra compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia, bem assim que a junção do serviço de locação com a eventual execução indireta de obra apresenta economia de escala e que, por isso, tal locação sob encomenda não ofende o princípio do parcelamento do objeto, previsto no art. 23, §1º, e no art. 15, IV, da Lei nº 8.666/1993, sem prejuízo de se destacar que tudo isso deve estar devidamente justicado nos autos do processo de licitação, por meio de estudos técnicos, pareceres e documentos comprobatórios, em respeito ao art. 50, IV, da Lei nº 9.784, de 1999, cabendo à administração pública fazer prova da legalidade dos atos e da regularidade da despesa pública perante os órgãos de controle nanceiro, em obediência ao disposto no art. 70, parágrafo único, da Constituição de 1988 e nos termos do art. 113 da Lei nº 8.666/1993; 9.4. esclarecer, ainda, ao Conselho Superior da Justiça do Trabalho que as contratações de locação sob medida de instalações prediais, inclusive de imóvel a ser construído de acordo com parâmetros mínimos estabelecidos por órgão ou entidade da administração pública, devem observar, também, as seguintes orientações: 9.4.1. caracterização da efetiva necessidade do novo imóvel, com demonstração de que o imóvel até então porventura em uso não atende mais ao interesse público e de que não comporta readequação; 9.4.2. comprovação da inexistência de imóveis disponíveis no âmbito da administração pública federal, estadual, distrital ou municipal, de acordo com as “Orientações para destinação do Patrimônio da União”, que foram editadas pela SPU/MPOG em 2010; 9.4.3. fundamentação da decisão pela locação sob medida baseada em estudos técnicos, pareceres e documentos comprobatórios que justiquem tal opção contratual, incluindo a necessidade de se demonstrar que, comprovada a impossibilidade de suprir a demanda por outras formas, a utilização da locação sob encomenda mostra-se inequivocamente mais favorável economicamente do que a realização de reforma ou adequação em imóvel alugado sob a forma convencional; 9.5. recomendar ao Conselho Superior da Justiça do Trabalho e ao Conselho Nacional de Justiça que avaliem a conveniência e a oportunidade de celebrar parcerias públicoprivadas, na modalidade concessão administrativa, com vistas a dotar os Tribunais Regionais do Trabalho de imóveis adequados com serviços públicos adicionados para o bom funcionamento institucional. (TCU. Acórdão nº 1.301/2013, Plenário. Rel. Min. André Luís de Carvalho. DOU , 05 jun. 2013)
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
9.3 Inexigibilidade de licitação O art. 25 da Lei nº 8.666/93 traz a possibilidade de contratação direta em face da inviabilidade de competição, ou seja, não haveria qualquer sentido em se proceder à licitação quando as características do objeto a ser contratado não permitirem competitividade. O mencionado artigo exemplica três situações, consoante entendimento da
expressão “em especial”; dessa forma, outras poderão ocorrer quando não for possível a devida competição.
9.3.1 Contratação de fornecedor exclusivo Será inexigível a licitação, nos termos do art. 25, I, para “aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo”. Para que a gura da inexigibilidade não sirva de
instrumento de direcionamento de licitação, o legislador restringiu as oportunidades para aplicação desse dispositivo, com destaque para: a) vedação de preferência de marca; e b) comprovação de exclusividade feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes. A impossibilidade da denição de preferência de marca a ser licitada é absolu-
tamente coerente com os princípios da Lei nº 8.666/93, visto que, nos termos do seu art. 3º, §1º, I, é vedado aos agentes públicos “admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o especíco objeto do contrato”. Nesse sentido, deve o administrador motivar o ato em que dene a aquisição a
ser realizada como exclusiva, de forma a deixar claro que não haveria outra alternativa que propiciasse competição. O TCU rmou entendimento, por meio da Súmula nº 255, a respeito da matéria:
Nas contratações em que o objeto só possa ser fornecido por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, é dever do agente público responsável pela contratação a adoção das providências necessárias para conrmar a veracidade da documentação
comprobatória da condição de exclusividade. (TCU. Acórdão nº 633/2010, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 13 abr. 2010)
O legislador também não deixou a critério único do administrador declarar a exclusividade do fornecedor. É necessária a juntada de atestado fornecido por órgão ou entidade denido em lei para caracterizar o fato. Com efeito, “compete à administração
averiguar a veracidade do atestado de exclusividade apresentado nos termos do art. 25, inc. I, da Lei nº 8.666, de 1993” (AGU. Orientação Normativa nº 16, de 1º de abril de 2009. DOU , 07 abr. 2009).
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9.3.2 Contratação de serviços técnicos por notória especialização A análise desta hipótese deve ser feita considerando a combinação dos art. 25, II, e art. 13 da lei de licitações. São necessários os seguintes requisitos para os serviços de engenharia serem enquadrados na contratação por inexigibilidade: serem executados por prossional ou empresa de notória especialização; possuir natureza singular; e estarem relacionado no art. 13 da lei de licitações. Os serviços de notória especialização, assim considerados, nos termos do §1º do referido artigo, são aqueles realizados por “prossional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato”. Importante o entendimento rmado pelo TCU na Súmula nº 252: A inviabilidade de competição para a contratação de serviços técnicos, a que alude o inciso II do art. 25 da Lei nº 8.666/1993, decorre da presença simultânea de três requisitos: serviço técnico especializado, entre os mencionados no art. 13 da referida lei, natureza singular do serviço e notória especialização do contratado. (TCU. Acórdão nº 618/2010, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 13 abr. 2010)
A natureza singular é bem conceituada por Eros Roberto Grau: Serviços singulares, assim, são aqueles que apresentam, a conformá-los, características, de qualidade, próprias de seu prestador. Singulares são porque apenas podem ser prestados, de certa maneira e com determinado grau de conabilidade, por um determinado prossional ou empresa. Por isso mesmo é que a singularidade do serviço está contida no bojo da notória especialização. 140
Com efeito, o conceito de singularidade não está relacionado à ideia de unicidade, mas de complexidade e especicidade, conforme atesta o TCU: 14. Trata-se, na verdade, de exemplo típico de inexigibilidade de licitação. 15. Primeiramente, porque o conceito de singularidade não está vinculado à ideia de unicidade. Para ns de subsunção ao art. 25, inciso II, da Lei 8.666/93, entendo não existir um serviço que possa ser prestado apenas e exclusivamente por uma única pessoa. A existência de um único sujeito em condições de ser contratado conduziria à inviabilidade de competição em relação a qualquer serviço e não apenas em relação àqueles considerados técnicos prossionais especializados, o que tornaria letra morta o dispositivo legal. 16. Em segundo lugar, porque singularidade, a meu ver, signica complexidade e especicidade. Dessa forma, a natureza singular não deve ser compreendida como ausência de pluralidade de sujeitos em condições de executar o objeto, mas sim como uma situação diferenciada e sosticada a exigir acentuado nível de segurança e cuidado. (TCU. Acórdão nº 1.074/2013, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU, 13 maio 2013)
140
GRAU. Inexigibilidade de licitação: serviços técnico-prossionais especializados: notória especialização. Revista de Direito Público , p. 72.
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
Os serviços atinentes a obras previstos no art. 13 são: estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; pareceres, perícias e avaliações em geral; e scalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços. O §1º do mencionado
artigo lembra que a inexigibilidade é exceção e que esses serviços deverão, preferencialmente, ser contratados mediante a realização de concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração.
9.4 Considerações nais A lei procurou criar alternativas que auxiliassem o administrador em determinadas situações por meio da contratação direta, seja por dispensa, seja por inexigibilidade, diante da necessidade da preservação do interesse público. Entretanto, registrou no parágrafo único do art. 26 algumas obrigações ao responsável, com destaque para a necessidade da existência dos seguintes elementos no processo: I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justique a dispensa,
quando for o caso; II - razão da escolha do fornecedor ou executante; III - justicativa do preço.
Em relação à escolha do fornecedor, o TCU tem entendimento interessante no sentido do afastamento do princípio da isonomia quando da sua escolha em prol de outros interesses públicos: 5. O primeiro conjunto de ocorrências consiste no fato de que, em 22 processos de dispensa de licitação, de um total de 65, a denição da empresa contratada teria ocorrido
anteriormente à apresentação das propostas apresentadas para a orçamentação do objeto. 6. A unidade técnica argumenta que esses fatos caracterizariam fraude na condução do processo de dispensa, em razão do direcionamento da contratação para determinada empresa e a consequente violação do princípio da isonomia. 7. A respeito, observo que o raciocínio estaria correto caso se estivesse a tratar da realização de licitação. Nesse caso, sim, poder-se-ia falar em direcionamento ilícito da contratação e violação aos princípios da isonomia e da moralidade. 8. Entretanto, trata-se aqui de contratação direta. Ora, a essência desse instituto é exatamente a escolha do futuro contratado pela administração. Trata-se de opção do legislador, com expresso amparo no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, em que se entende que o interesse público será melhor atendido caso a administração efetue contratações sem a realização de prévia licitação. 9. Nessas situações, o princípio da isonomia tem a sua aplicação pontualmente afastada em prol de outros interesses públicos. No caso concreto, de acordo com o disposto no art. 24, inciso IV, da Lei 8.666/1993, a urgência em atendimento de situações de calamidade pública provocou a necessidade de realização de contratações por dispensa de licitação. 10. Em sendo assim, não vislumbro sentido em se falar em direcionamento ilícito para a realização de contratações diretas. 11. É certo que a situação motivadora da contratação direta deve ser devidamente evidenciada, a escolha da contratada deve ser justicada e os preços praticados devem
ser os de mercado, sempre de acordo com o disposto nos incisos I, II e III do parágrafo único do art. 26 da Lei 8.666/1993. 12. Nessa linha, a existência de outras propostas de preços, além daquela contratada, possui por objetivo justicar o preço a ser contratado. Não há que falar, como aponta a
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
unidade técnica, na realização de um procedimento de disputa para se averiguar a proposta mais vantajosa. Caso assim fosse, não se estaria falando de dispensa de licitação, mas de licitação propriamente dita. 13. É bem verdade que, caso a contratação não ocorra pela proposta de menor preço, o gestor deve justicar o preço praticado e demonstrar as razões de seu procedimento. Nos casos em tela, entretanto, não há indicativos de que não tenha sido contratada a proposta mais vantajosa economicamente e tampouco os gestores foram instados a se manifestar a respeito. (TCU. Acórdão nº 1.157/2013, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 21 maio 2013)
Problema frequentemente encontrado nas contratações diretas é o preço excessivamente elevado em relação aos parâmetros de mercado. As alegações do gestor são no sentido da diculdade em face do tempo exíguo para desenvolver estimativa de qualidade em relação a esse item. Contudo, releva notar que nem todas as hipóteses legais de contratação direta referem-se a situações emergenciais, ou seja, a justicativa de tempo escasso não pode ser apresentada em qualquer caso. Por outro lado, situações emergenciais não autorizam o pagamento de valor sem estudo prévio, mesmo que sucinto, a respeito dos preços a serem pagos. Como sugestão, nesses casos, a utilização de tabelas referenciais de órgãos públicos confrontada com o orçamento detalhado da contratada poderão ser de grande valia. Nesse sentido, o TCU determinou à entidade responsável por contratação direta que: [...] quando da contratação de serviços, por meio de dispensa de licitação, além da verificação da compatibilidade dos preços praticados com os de mercado, deve a companhia exigir da entidade contratada o orçamento detalhado desses serviços, em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários, em consonância com art. 7º, §2º, inciso II, da Lei 8.666/93. (TCU. Acórdão nº 262/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 24 fev. 2006)
Sobre o tema, assim se manifesta a Advocacia Geral da União, em sua ON nº 17: É obrigatória a justicativa de preço na inexigibilidade de licitação, que deverá ser realizada mediante a comparação da proposta apresentada com preços praticados pela futura contratada junto a outros órgãos públicos ou pessoas privadas. (AGU. Orientação Normativa nº 17, de 1º de abril de 2009. DOU , 07 abr. 2009)
O parecer jurídico nestes casos tem especial relevância. Aliás, o TCU constata algumas situações nas quais esta peça deixa a desejar: 6. Como pontuei quando do julgamento do referido processo, a jurisprudência deste Tribunal, desde a vetusta Súmula nº 39 (publicada em 27/8/1973), tem se consolidado no sentido da necessidade de se demonstrar, nas contratações diretas de serviço técnico prossional especializado, que tal serviço tenha características singulares (incomum, anômalo, não usual) e, ainda, que o prestador do serviço detém notória especialização (o que signica competências que o diferenciem de outros prossionais, a ponto de tornar inviável a competição) [...]. 19. No que concerne à conduta do [...], assessor jurídico do [...] e responsável pela emissão dos pareceres jurídicos que respaldaram as contratações em questão, antecipei-me a observar, quando do exame do TC 003.832/2008-7, que tais pareceres eram lacônicos, vez
CAPÍTULO 9 CONTRATAÇÃO DIRETA
que se limitavam a argumentar, em textos idênticos, que os contratados eram “profssionais
consagrados na esfera trabalhista, especialistas que são no trato da matéria, o que, aliás, é público e notório no meio jurídico”. 20. Por conseguinte, lembro o entendimento já manifestado quando da prolação do Acórdão 1.038/2011-Plenário no sentido de que o parecer jurídico é obrigatório e vinculante no procedimento licitatório e na contratação, nos termos do art. 38 da Lei de Licitações, de modo que, no presente caso concreto, por ter sido lavrado com erro grosseiro e dolo, mormente quando se verifca que o texto se mostra lacônico e repetitivo, sobressai a
necessidade de responsabilização do parecerista jurídico, como apregoado no Acórdão 462/2003-Plenário. (TCU. Acórdão nº 2.176/2012, Plenário. Rel. Min. André Luís de Carvalho. DOU , 20 ago. 2012)
Vale lembrar que o art. 25, §2º, estabelece que “se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis”. A Lei nº 8.666/93, diante do risco da utilização do instrumento de contratação direta em prejuízo do devido processo licitatório, estabelece fortes sanções aos casos em que a dispensa ou inexigibilidade forem utilizadas fora das hipóteses previstas em lei, inclusive na esfera penal. 141
Por todo exposto, cabe o registro fnal de que, em caso de dúvida, a licitação é
o melhor caminho.
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“Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) ano s, e multa”.
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CAPÍTULO 10
FASE CONTRATUAL
Sumário: 10.1 Considerações iniciais – 10.2 Contratos administrativos – 10.3 Formalização – 10.4
Cadastramento dos contratos – 10.5 Início dos serviços – 10.6 Fiscalização – 10.6.1 Responsáveis – 10.6.1.1 Pela Administração – 10.6.1.2 Pela empresa – 10.6.2 Documentos – 10.6.3 Atividades – 10.7 Prorrogação de prazos – 10.8 Subcontratação e sub-rogação – 10.9 Fusão, incorporação ou cisão – 10.10 Escopo do contrato – 10.11 Medições e regime de execução – 10.12 Pagamentos – 10.13 Responsabilidade previdenciária e trabalhista – 10.14 Alterações contratuais – 10.14.1 Alteração unilateral – 10.14.2 Alteração por acordo – 10.14.3 Limites para alteração – 10.14.4 Problemas em relação a preços – 10.14.5 Problemas em relação a prazos de execução – 10.15 Alterações do valor do pagamento – 10.15.1 Reajustamento e repactuação – 10.15.2 Atualização – 10.15.3 Compensação e penalização – 10.15.4 Descontos – 10.15.5 Recomposição – 10.16 Extinção do contrato – 10.16.1 Conclusão e recebimento do objeto – 10.16.2 Inexecução, rescisão e sanção – 10.16.3 Limitação do valor de aditivos – 10.17 Cuidados na fase de contratação – 10.17.1 Assinatura do contrato – 10.17.2 Emissão da ordem de serviço – 10.17.3 Acompanhamento e scalização – 10.17.4 Extinção
10.1 Considerações iniciais Concluída a fase licitatória, com a seleção da melhor proposta para a Administração, surge a etapa de contratação, que se inicia com a assinatura do contrato e naliza com o termo de recebimento denitivo da obra.
Em face de grande número de atividades envolvidas, como assinatura do contrato,
acompanhamento e scalização da qualidade e quantidade dos serviços, prazo e custo
do empreendimento, materialização de termos aditivos, é necessária a existência de equipe, na maioria das vezes, com diversos responsáveis. Não raro, diante do elevado tempo para conclusão do objeto, essa equipe é totalmente alterada no curso da obra. Por esse motivo, é importante que estejam claros a área e o momento de atuação
de cada responsável, a m de que não haja futuramente a imputação de responsabilidade
solidária a todos pela ausência de documentação, juntada ao processo pertinente, que permita inferir a adequada separação de competências. De qualquer modo, é oportuno que cada responsável, ao assumir determinada atribuição, avalie a existência dos elementos mínimos que caracterizem a regularidade do empreendimento até aquele momento.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
No início do contrato, a título de sugestão, vale a pena vericar os itens referentes a “cuidados recomendáveis” relacionados nos capítulos atinentes à fase interna e externa desta publicação. Caso não haja os elementos necessários, procede a realização das diligências e dos saneamentos adequados para que seja dado seguimento normal às atividades. A FIGURA 10.a ilustra resumo das principais atividades envolvidas nesta fase.
Assinatura do contrato
Cadastramento do contrato
Ordem de serviço
Execução dos serviços
Aditivos
Fiscalização Subcontratação Medição e pagamento
Sanção
Recebimento dos serviços Provisório
Definitivo
FIGURA 10.a - Resumo das etapas compreendidas na fase de contratação de obra pública
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
10.2 Contratos administrativos Antes de iniciar as considerações práticas a respeito do tema em estudo, releva destacar que o contrato de obra pública é contrato administrativo e, como tal, goza de privilégios em relação ao privado. Hely Lopes Meirelles, com precisão, exemplifca a questão:
Todo contrato — privado ou público — é dominado por dois princípios: o da lei entre as partes (lex inter partes) e o da observância do pactuado ( pacta sunt servanda). O primeiro impede a alteração do que as partes convencionaram; o segundo obriga-as a cumprir felmente o que avençaram e prometeram reciprocamente. O Código Civil/2002 consignou
expressamente mais dois princípios que antes já eram aceitos implicitamente, em especial nos contratos de Direito Público. O primeiro diz respeito à boa-fé que os contratantes são obrigados a guardar na elaboração e na execução do contrato (art. 422), Do segundo decorre que a liberdade de contratar deve ser exercida em razão e nos limites da função social do contrato (art. 421), o que é evidente nos contratos administrativos, que só tem razão de ser na medida em que atendem ao interesse público. No Direito Privado a liberdade de contratar é ampla e informal, salvo as restrições da lei e as exigências especiais de forma para certos ajustes, ao passo que no Direito Público a Administração está sujeita a limitações de conteúdo e a requisitos formais rígidos, mas, em contrapartida, dispõe sempre dos privilégios administrativos para a fxação e alterações das cláusulas de interesse público e até mesmo para pôr fm ao contrato em meio de sua
execução.
142
Como peculiaridades desse tipo de contrato, continua o mestre: Da sua característica essencial, consubstanciada na participação da Administração com supremacia de poder , resultam para o contrato administrativo certas peculiaridades que os contratos comuns, sujeitos às normas do Direito Privado, não ostentam. Tais peculiaridades constituem, genericamente, as chamadas cláusulas exorbitantes, explícitas ou implícitas em todo contrato administrativo. Cláusulas exorbitantes , pois, as que excedem do Direito Comum para consignar uma vantagem ou uma restrição à Administração ou ao contratado. A cláusula exorbitante não seria lícita num contrato privado, porque desigualaria as partes na execução do avençado, mas é absolutamente válida no contrato administrativo, desde que decorrente da lei ou dos princípios que regem a atividade administrativa, porque visa a estabelecer uma prerrogativa em favor das partes para o perfeito atendimento do interesse público, que se sobrepõe sempre aos interesses particulares [...].
As cláusulas exorbitantes podem consignar as mais diversas prerrogativas, no interesse do serviço público, tais como a ocupação do domínio público, o poder expropriatório e a atri buição de arrecadar tributos, concedidos ao particular contratado para a cabal execução do contrato. Todavia, as principais são as que exteriorizam na possibilidade de alteração e rescisão unilateral do contrato; no equilíbrio econômico e nanceiro; na revisão de preços e tarifas; na inoponibilidade da exceção do contrato não cumprido; no controle do contrato, na ocupação provisória e na aplicação de penalidades contratuais pela Administração. 143
MEIRELLES. Direito administrativo brasileiro , p. 223. MEIRELLES. Direito administrativo brasileiro , p. 225-226.
142 143
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A Lei nº 8.666/93 retrata com clareza as reexões apresentadas. Primeiro, em seu art. 54, quando estabelece os preceitos de direito público como reguladores dos contratos administrativos, e depois, no art. 58, quando relaciona essas cláusulas exorbitantes: Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: I - modicá-los, unilateralmente, para melhor adequação às nalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado; II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especicados no inciso I do art. 79 desta Lei; III - scalizar-lhes a execução; IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste; V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo.
São essas características diferenciadas em relação ao direito privado que devem ser percebidas com clareza por aqueles que irão gerenciar o contrato administrativo de obra pública. Contudo, vale registrar que o conjunto normativo, apesar de trazer determinadas vantagens na administração do contrato, atribui ao gestor uma ampla gama de responsabilidades em face de ser o responsável que assegurará a concretização do interesse público, como o dever de prestar contas de todos os seus atos e zelar pelos atos dos demais agentes. Com efeito, o art. 8º da Lei nº 8.443/92 estabelece: Diante da omissão no dever de prestar contas, da não comprovação da aplicação dos recursos repassados pela União, na forma prevista no inciso VII do art. 5º desta lei, da ocorrência de desfalque ou desvio de dinheiros, bens ou valores públicos, ou, ainda, da prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano ao erário, a autoridade administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá imediatamente adotar providências com vistas à instauração da tomada de contas especial para apuração dos fatos, identicação dos responsáveis e quanticação do dano.
10.3 Formalização A minuta do contrato a ser rmado entre a Administração e o licitante vencedor já era peça obrigatória no momento da publicação do edital, nos termos do art. 40, §2º, inciso III, da lei de licitações, ou seja, o trabalho para formalização resume-se ao ajuste da minuta às novas informações e à convocação do licitante vencedor. Conforme os art. 60 e art. 61, todo contrato “deve mencionar os nomes das partes e os de seus representantes, a nalidade, o ato que autorizou a sua lavratura, o número do processo da licitação, da dispensa ou da inexigibilidade, a sujeição dos contratantes às normas desta Lei e às cláusulas contratuais” e ser lavrado “nas repartições interessadas, as quais manterão arquivo cronológico dos seus autógrafos e registro sistemático do seu extrato”. O art. 62 complementa que o “instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
de compra ou ordem de execução de serviço”. Nesse particular, o parágrafo único do art. 60 estabelece ser “nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a 5% (cinco por cento) do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea ‘a’ desta Lei, feitas em regime de adiantamento”. Consoante art. 64 da lei em comento, decairá o direito à contratação caso a parte não se manifeste no prazo xado pela Administração, sem prejuízo das sanções previstas
no art. 81. Será permitida apenas uma prorrogação de prazo, por igual período, quando solicitado pela parte durante o seu transcurso e desde que ocorra motivo justicado
aceito pela Administração. Caso a parte não se manifeste, o art. 64, §2º, faculta à Administração, “convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classicação, para fazê-lo em igual prazo e nas mesmas condições propostas pelo primeiro classicado, inclusive quanto aos
preços atualizados de conformidade com o ato convocatório, ou revogar a licitação independentemente da cominação prevista no art. 81 desta Lei”. É possível, ainda, utilizar este artigo, por analogia, “para fundamentar a contratação de licitante remanescente, segundo a ordem de classicação, quando a empresa
originalmente vencedora da licitação assinar o contrato e, antes de iniciar os serviços, desistir do ajuste e rescindir amigavelmente o contrato, desde que o novo contrato possua igual prazo e contenha as mesmas condições propostas pelo primeiro classicado”
(TCU. Acórdão nº 740/2013, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 03 abr. 2013). Vale lembrar, entretanto, a importância da celeridade das ações internas dos órgãos ou entidade responsável pela assinatura do contrato, visto que, decorridos 60 dias da data da entrega das propostas, cam os licitantes liberados dos compromissos assumidos,
o que ensejará a necessidade de novo processo licitatório, e, consequentemente, atraso na conclusão do objeto e desperdício de recursos. Outro ponto a ser vericado antes da formalização do contrato é a apresentação
das garantias previstas no instrumento convocatório, que não poderá exceder 5% do valor do contrato no caso de obras simples e 10% no de obras de grande vulto (art. 56 da Lei nº 8.666/93).
10.4 Cadastramento dos contratos Todo órgão ou entidade público deve possuir sistema de cadastramento das informações contratuais, especíco ou comum a outros órgãos, com vistas a garantir a conabilidade do acompanhamento do empreendimento.
Para contratos ou convênios patrocinados com recursos federais é obrigatória a alimentação do Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais (Siasg) e do Sistema de Gestão de Convênios (Siconv), quando for o caso, consoante estabelece a Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei nº 13.080/15 – LDO/2015), em seu art. 17. 144
144
“Art. 17. Os órgãos e as entidades integrantes dos Orçamentos Fiscal, da Seguridade Social e de Investimento deverão disponibilizar no Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais – SIASG e no Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse – SICONV, no que couber, informações referentes aos contratos e aos convênios ou instrumentos congêneres rmados, com a identicação das respectivas categorias de
programação e fontes de recursos quando se tratar de convênios ou instrumentos congêneres, observadas as normas estabelecidas pelo Poder Executivo.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
Louvável a iniciativa do legislador na inserção desse comando legal como instrumento para maior controle das informações e publicidade dos contratos nanciados com recursos públicos.
10.5 Início dos serviços O início dos serviços ca condicionado à existência dos seguintes documentos: a) Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) dos responsáveis técnicos pelo empreendimento recolhida junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA) do Estado em que a obra será realizada, nos termos dos art. 1º e art. 2º da Lei nº 6.496/77; b) licença ambiental de instalação junto ao órgão ambiental competente, nos casos previstos em lei; c) ordem da Administração autorizando o início dos serviços; d) alvará de construção junto à Prefeitura Municipal, quando cabível, e, se necessário, o alvará de demolição; e) quando for o caso, aprovação do projeto de prevenção e combate a incêndio pelo corpo de bombeiros e dos projetos de instalação elétrica, hidráulica e de telefonia das concessionárias competentes; f) certicado de matrícula no Cadastro Especíco do INSS (CEI), a ser efetuada no prazo máximo de 30 dias do início de sua atividade; g) comprovação da titularidade da área pela Administração (TCU. Acórdão nº 1.681/20104, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 3 jul. 2014); h) autorizações exigidas em obras com características especiais, como aqueles pertencentes a patrimônio histórico-cultural. Vale lembrar a necessidade de que o cronograma físico-nanceiro esteja ajustado às necessidades da Administração. Como sugestão, é importante que os gestores tenham sempre um “Plano Alternativo” de execução da obra para os casos imprevistos, como contingenciamento de recursos ou ausência de execução orçamentária, a m de 145
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§1º As normas de que trata o caput deverão prever a possibilidade de os órgãos e as entidades manterem sistemas próprios de gestão de contratos e convênios ou instrumentos congêneres, desde que condicionada à transferência eletrônica de dados para o SIASG e o SICONV, devendo ser apresentados relatórios trimestralmente. §2º Os projetos técnicos cadastrados no âmbito do SICONV, aptos para execução e não conveniados, integrarão um banco de projetos, mantido no Portal de Convênios, no qual poderão ser disponibilizados projetos básicos e de engenharia pré-formatados para adesão”. 145 “Art. 1º Todo contrato, escrito ou verbal, para a execução de obras ou prestação de quaisquer serviços prossionais referentes à Engenharia, à Arquitetura e à Agronomia ca sujeito à ‘Anotação de Responsabilidade Técnica’ (ART). Art. 2º A ART dene para os efeitos legais os responsáveis técnicos pelo empreendimento de engenharia, arquitetura e agronomia”. 146 “[...] é indício de irregularidade grave o início de empreendimento sem a devida licença de instalação” (TCU. Acórdão nº 516/03, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. DOU , 26 maio 2003). 147 O TCU determinou a responsável que “na execução de obras nanciadas com recursos públicos federais, nos termos do art. 1º e 2º, §1º, da Lei nº 6.496/77, exija da empresa contratada a elaboração da Anotação de Responsabilidade Técnica do correspondente contrato (ART – Matriz), bem como sua inscrição no Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de Minas Gerais [...], devendo dar ordem de início aos serviços tãosomente após a adoção de tais medidas” (TCU. Acórdão nº 289/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 14 fev. 2006).
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
viabilizar a conclusão de partes do empreendimento no menor prazo possível e sua disponibilização ao uso da comunidade. Em relação ao início de empreendimentos em período pré-eleitoral, cabe o entendimento do TCU no sentido de que “para os ns do art. 73, inciso V, a alínea ‘a’,
da Lei nº 9.504, de 1997 (Lei Eleitoral), entende-se como obra em andamento aquela que tenha sido efetivamente iniciada, ou seja, que tenha havido alguma execução física, não se caracterizando para tanto os atos meramente preparatórios, como os serviços de mobilização de equipamentos e de instalação e arrumação do canteiro de obras” (TCU. Acórdão nº 954/08, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 30 maio 2008).
10.6 Fiscalização 10.6.1 Responsáveis 10.6.1.1 Pela Administração A lei de licitações exige, no art. 67, a designação especial de representante da Administração para o acompanhamento e scalização do contrato. Vale notar que a lei atribui, de início, toda a responsabilidade a esse prossional, e fornece alternativas
para que recorra a outras instâncias quando não puder solucionar eventual problema, visto que: a) faculta, em face da possível complexidade técnica do empreendimento, a contratação de terceiros para auxiliar esse representante na condução da tarefa; e b) determina que as situações que ultrapassem a competência do representante sejam submetidas a seus superiores em tempo hábil para a adoção das providências cabíveis. Lucas Rocha Furtado manifesta-se com pertinência sobre a scalização de
contratos administrativos: Ao tratar dessa questão, deve-se enfatizar a distinção existente entre o contrato administrativo e o contrato de direito privado. Nesse último, como regra, incumbe às partes vericar se a outra cumpriu o resultado, se o objeto contratual foi de fato cumprido.
Interessa aos contratos de direito privado, basicamente, a obtenção do resultado esperado. No âmbito dos contratos administrativos, ao contrário, a Administração terá não apenas o direito, mas igualmente o dever de acompanhar a perfeita execução do contrato. Fala-se, assim, em poder-dever da Administração de promover a devida scalização da execução
do contrato.
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Não é raro em processos de tomada de contas especiais para imputação de débito, serem apresentadas, por esses representantes, alegações de defesa no sentido de que não tinham conhecimento da matéria ou de que alertaram verbalmente seus superiores sem que as providências fossem adotadas. Nesse caso, a inexistência de documento comprobatório impossibilita o acolhimento dessas alegações, visto que a permissão para a continuidade da obra sem a adoção das medidas corretivas é de responsabilidade FURTADO. Curso de licitações e contratos administrativos : teoria, prática e jurisprudência, p. 234.
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imediata do representante da Administração, a não ser que tenha, comprovadamente, obedecido a ordens superiores, desde que não manifestamente ilegais. Também não se pode olvidar que, em face da necessidade da segregação de funções, é importante que o órgão ou entidade “designe servidores distintos para
compor comissão de licitação e para efetuar a scalização de contratos, em respeito ao princípio da segregação de funções” (TCU. Acórdão nº 1.997/06, 1ª Câmara. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 31 jul. 2006). Em complemento, o TCU tem orientado órgãos e entidades para que “instituam ato normativo regulamentando os procedimentos a serem adotados pelos representantes
da Administração especialmente designados para acompanhar e scalizar a execução dos contratos rmados pelo órgão, nos termos do art. 67, §§1º e 2º, da Lei nº 8.666/1993, de forma a possibilitar que os respectivos scais de contratos tenham conhecimentos
claros a respeito de suas atribuições e responsabilidades” (TCU. Acórdão nº 2.958/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 08 nov. 2012).
É importante que o scal detenha conhecimento básico das regras estabelecidas no procedimento licitatório que não foram registradas no contrato, como, por exemplo,
o orçamento-base denido no edital, de modo a ter subsídios para análises de pleitos formulados pela empresa no decorrer do contrato.
Nesse sentido, o TCU alertou sobre a importância da atuação do scal sobre o conhecimento das regras contratuais, bem como a necessidade de alertar seus superiores em casos mais graves:
Sob tais circunstâncias, o senso de diligência exigível a um engenheiro scal de contrato, aqui considerado sob o conceito de
homo medius ,
impor-lhe-ia o dever de conhecimento
dos limites e regras para alterações contratuais denidos no Estatuto de Licitações, e, por conseguinte, a obrigação de noticar seus superiores sobre a necessidade de realizar o necessário aditivo contratual, em respeito à exigência estabelecida no caput do art. 60 da Lei 8.666/93. 24. Ressalto que, no caso em exame, a gravidade do procedimento escolhido – de apenas anotar a alteração diretamente nos boletins de medição – foi ampliada em virtude da
elevada proporção das modicações em relação ao total das medições (mais de 60%). E
é precisamente a expressiva dimensão das alterações do objeto sem o necessário aditivo contratual que me levam a rejeitar a atenuante alegada pelo responsável de que tal procedimento seria uma praxe na Seap/RJ.
25. Nesse contexto, é razoável presumir que, se o scal da obra houvesse alertado seus superiores para a dimensão das alterações de objeto, estes provavelmente adotariam as providências necessárias à formalização do necessário aditivo, sob pena de corresponsa-
bilização pela irregularidade vericada. (TCU. Acórdão nº 43/2015, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 26 jan. 2015).
A propósito, é fundamental que o órgão ou entidade “esteja dotado de aparelha-
mento e de pessoal capacitado e em quantidade suciente para proceder à scalização de obras ou parcelas de obras terminadas, com o objetivo de detectar desvios quantitativos e qualitativos em serviços medidos e/ou pagos” (TCU. Acórdão nº 1.999/2009, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 04 set. 2009).
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
10.6.1.2 Pela empresa O contratado “deverá manter preposto, aceito pela Administração, no local da obra ou serviço, para representá-lo na execução do contrato”, bem como garantir a presença do engenheiro responsável técnico pelo acompanhamento dos serviços. O preposto é o representante da empresa que deverá estar presente de forma contínua no empreendimento para o atendimento a qualquer solicitação da Administração. Precisa deter o mínimo de conhecimento a respeito do objeto em execução para adotar as providências necessárias no tempo adequado. Por sua vez, o responsável técnico, prossional indicado pela empresa no processo
licitatório que detém experiência anterior na execução de obra com características similares, deverá apresentar a ART, em seu nome, do empreendimento a ser executado e, nos termos do art. 30, §10, da Lei nº 8.666/93, participar do objeto da licitação, admitindo-
se a sua substituição por prossionais de experiência equivalente ou superior, somente se aprovada pela Administração. A scalização deverá assegurar que esse responsável
técnico participe de forma efetiva do acompanhamento técnico da obra, visto que, em muitos casos, ocorre a indicação apenas formal de prossional qualicado no curso do
procedimento licitatório, mas o gerenciamento é realizado por outro engenheiro sem a necessária experiência. De qualquer modo, é conveniente lembrar que, na forma do art. 70 da lei de licitações, “o contratado é responsável pelos danos causados diretamente à Administração ou a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo na execução do contrato, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a scalização ou o acompanhamento
pelo órgão interessado”.
10.6.2 Documentos Não basta, apenas, a designação dos responsáveis para o acompanhamento do contrato. A lei exige que o representante designado anote em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato e determinações para a devida regularização das faltas ou defeitos observados. No caso de obra, documento de extrema relevância é o “Diário de Obra”, livro que registra todas as informações diárias relativas ao empreendimento: equipamentos disponíveis, condições meteorológicas, número de funcionários por categoria, presença de subcontratadas, observações quanto a irregularidades constatadas pela scalização,
pendências de projeto etc. Em regra é composto por três vias, cujas folhas são assinadas pelo representante da Administração e da empresa contratada: a primeira permanece
na obra; a segunda é destacada pelo scal e a terceira pela empresa. O Confea, em sua Resolução nº 1.024/2009, xa a obrigatoriedade de adoção do
Livro de Ordem de obras e serviços de Engenharia que constituirá a memória escrita de todas as atividades relacionadas com a obra ou serviço e servirá de subsídio para: I - comprovar autoria de trabalhos; II - garantir o cumprimento das instruções, tanto técnicas como administrativas; III - dirimir dúvidas sobre a orientação técnica relativa à obra; IV - avaliar motivos de eventuais falhas técnicas, gastos imprevistos e acidentes de trabalho. V - eventual fonte de dados para trabalhos estatísticos.
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É importante, também, que sejam mantidas no canteiro de obras, para rápida consulta, cópias da completa documentação dos elementos que auxiliam no entendimento da situação do empreendimento, como por exemplo: projetos, especicações técnicas
constantes do edital, caderno de encargos, cronogramas, correspondências, resultados de ensaios, laudos e atas de reunião.
10.6.3 Atividades Não são poucas as tarefas que deverão ser realizadas pela scalização para a
garantia do bom andamento dos trabalhos. Referencial ilustrativo dessas tarefas pode ser encontrado no item 3.4 do Manual de obras públicas: edicações: - analisar e aprovar o projeto das instalações provisórias e canteiro de serviço apresentados pela Contratada no início dos trabalhos; - analisar e aprovar o plano de execução e o cronograma detalhado dos serviços e obras a serem apresentados pela Contratada no início dos trabalhos; - obter da Contratada o Manual de Qualidade contendo o Sistema de Gestão de Qualidade e vericar a sua efetiva utilização;
- promover reuniões periódicas no canteiro de serviço para análise e discussão sobre o andamento dos serviços e obras, esclarecimentos e providências necessárias ao cumprimento do contrato; - esclarecer ou solucionar incoerências, falhas e omissões eventualmente constatadas nos desenhos, memoriais, especicações e demais elementos de projeto, bem como fornecer
informações e instruções necessárias ao desenvolvimento dos trabalhos; - solucionar as dúvidas e questões pertinentes à prioridade ou seqüência dos serviços e obras em execução, bem como às interferências e interfaces dos trabalhos da Contratada com as atividades de outras empresas ou prossionais eventualmente contratados pelo
Contratante; - promover a presença dos Autores dos projetos no canteiro de serviço, sempre que for
necessária a vericação da exata correspondência entre as condições reais de execução e os parâmetros, denições e conceitos de projeto;
- paralisar e/ou solicitar o refazimento de qualquer serviço que não seja executado em conformidade com projeto, norma técnica ou qualquer disposição ocial aplicável ao
objeto do contrato; - solicitar a substituição de materiais e equipamentos que sejam considerados defeituosos, inadequados ou inaplicáveis aos serviços e obras; - solicitar a realização de testes, exames, ensaios e quaisquer provas necessárias ao controle de qualidade dos serviços e obras objeto do contrato; - exercer rigoroso controle sobre o cronograma de execução dos serviços e obras, aprovando os eventuais ajustes que ocorrerem durante o desenvolvimento dos trabalhos; - aprovar partes, etapas ou a totalidade dos serviços executados, vericar e atestar as
respectivas medições, bem como conferir, vistar e encaminhar para pagamento as faturas emitidas pela Contratada;
- vericar e aprovar a substituição de materiais, equipamentos e serviços solicitada
pela Contratada e admitida no Caderno de Encargos, com base na comprovação da equivalência entre os componentes, de conformidade com os requisitos estabelecidos no Caderno de Encargos;
- vericar e aprovar os relatórios periódicos de execução dos serviços e obras, elaborados
de conformidade com os requisitos estabelecidos no Caderno de Encargos;
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
- solicitar a substituição de qualquer funcionário da Contratada que embarace ou diculte
a ação da Fiscalização ou cuja presença no local dos serviços e obras seja considerada prejudicial ao andamento dos trabalhos; - verificar e aprovar os desenhos “como construído” elaborados pela Contratada, registrando todas as modificações introduzidas no projeto original, de modo a documentar elmente os serviços e obras efetivamente executados.
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Caso ocorra falha no projeto, é essencial que a scalização “promova a responsabilidade devidamente anotada das empresas ou prossionais que elaboraram o projeto executivo da obra, sempre que for vericada a omissão ou insuciência de elemento
essencial do projeto, conforme previsto no art. 70 da Lei nº 8.666/93 e no art. 2º da Resolução nº 425/1998 – Confea” (TCU. Acórdão nº 756/04, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 25 jun. 2004). O aludido Manual ilustra, ainda, responsabilidades da empresa contratada: - submeter à aprovação da Fiscalização até 5 (cinco) dias após o início dos trabalhos o projeto das instalações provisórias ou canteiro de serviço compatível com o porte e características do objeto do contrato, denindo todas as áreas de vivência, dependências,
espaços, instalações e equipamentos necessários ao andamento dos serviços e obras, inclusive escritórios e instalações para uso da Fiscalização, quando previstas no Caderno de Encargos; - providenciar as ligações provisórias das utilidades necessárias à execução dos serviços e obras, como água, esgotos, energia elétrica e telefones, bem como responder pelas despesas de consumo até o seu recebimento denitivo;
- manter no local dos serviços e obras instalações, funcionários e equipamentos em número, qualicação e especicação adequados ao cumprimento do contrato;
- submeter à aprovação da Fiscalização até 5 (cinco) dias após o início dos trabalhos o plano de execução e o cronograma detalhado dos serviços e obras, elaborados de conformidade com o cronograma do contrato e técnicas adequadas de planejamento; - providenciar para que os materiais, mão-de-obra e demais suprimentos estejam em tempo hábil nos locais de execução, de modo a satisfazer as necessidades previstas no cronograma e plano de execução dos serviços e obras objeto do contrato; - alocar os recursos necessários à administração e execução dos serviços e obras, inclusive os destinados ao pagamento de todos os impostos, taxas e demais obrigações scais
incidentes ou que vierem a incidir sobre o objeto do contrato; - submeter previamente à aprovação da Fiscalização eventuais ajustes no cronograma e plano de execução dos serviços e obras, de modo a mantê-la perfeitamente informada sobre o desenvolvimento dos trabalhos; - submeter previamente à aprovação da Fiscalização qualquer modicação nos métodos
construtivos originalmente previstos no plano de execução dos serviços e obras; - executar os ajustes nos serviços concluídos ou em execução determinados pela Fiscalização; - comunicar imediatamente à Fiscalização qualquer ocorrência de fato anormal ou extraordinário que ocorra no local dos trabalhos; - submeter à aprovação da Fiscalização os protótipos ou amostras dos materiais e equipamentos a serem aplicados nos serviços e obras objeto do contrato; BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio. Manual de obras públicas: edicações: práticas da Seap, Anexo 3, p. 10-11.
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- realizar, através de laboratórios previamente aprovados pela Fiscalização, os testes, ensaios, exames e provas necessárias ao controle de qualidade dos materiais, serviços e equipamentos a serem aplicados nos trabalhos; - evitar interferências com as propriedades, atividades e tráfego de veículos na vizinhança do local dos serviços e obras, programando adequadamente as atividades executivas. 150
10.7 Prorrogação de prazos Pelo caráter dinâmico dos contratos, principalmente os de execução de obras públicas, o §1º do art. 57 da lei de licitações prevê a possibilidade de prorrogação dos prazos de início de etapas de execução, de conclusão e de entrega, mantidas as demais cláusulas do contrato e assegurada a manutenção de seu equilíbrio econômico-fnanceiro, desde que ocorra uma das seis hipóteses previstas em seus incisos. Na ocorrência desses casos, o TCU tem recomendado aos órgãos e entidades que orientem “seus administradores de contratos para que, na ocasião de ocorrências que possam ensejar atrasos na execução de obras e, conseqüentemente, futuros aditivos de prorrogação do respectivo contrato, promova o registro desses fatos no Diário de Obra, observando, assim, os ditames do art. 67, §1º, da Lei 8.666/93” (TCU. Acórdão nº 262/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 24 fev. 2006). A Corte de Contas tem, ainda, se posicionado no sentido de que “não é irregular a postergação de obra de investimento vultoso, a depender de condição futura e incerta” (TCU. Acórdão nº 2.352/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 08 dez. 2006). Por sua vez, a Advocacia Geral da União frmou entendimento, por meio da ON nº 3, de que “na análise dos processos relativos à prorrogação de prazo, cumpre aos órgãos jurídicos verifcar se não há extrapolação do atual prazo de vigência, bem como eventual ocorrência de solução de continuidade nos aditivos precedentes, hipóteses que confguram a extinção do ajuste, impedindo a sua prorrogação” (AGU. Orientação Normativa nº 3, de 1º de abril de 2009. DOU , 07 abr. 2009). A respeito da possibilidade da celebração de aditivo a contrato extinto, o TCU assim se manifestou: 151
8. A principal tese jurídica da defesa é que o aditamento de prazo não é necessário nos chamados contratos de escopo, em que o objeto é a aquisição de um determinado bem ou benfeitoria, a exemplo de uma obra, como no caso. Não abono tal tese, que no recurso vem chancelada pela doutrina de Joel de Menezes Niebuhr, não só porque contradiz a remansosa jurisprudência desta Corte, mas também porque é contrária à Lei 8.666/1993, cuja disciplina acerca do assunto, estabelecida no art. 57, veda a duração indeterminada
150
BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio. Manual de obras públicas: edifcações: práticas da Seap, Anexo 3, p. 5. 151 “I - alteração do projeto ou especifcações, pela Administração; II - superveniência de fato excepcional ou imprevisível; III - interrupção da execução do contrato ou diminuição do ritmo de trabalho por ordem e no interesse da Administração; IV - aumento das quantidades inicialmente previstas no contrato, nos limites da lei; V - impedimento de execução do contrato por fato ou ato de terceiro; VI - omissão ou atraso de providências a cargo da Administração, inclusive quanto aos pagamentos previstos de que resulte, diretamente, impedimento ou retardamento na execução do contrato, sem prejuízo das sanções legais aplicáveis aos responsáveis”.
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do contrato administrativo e permite a prorrogação apenas nos acasos ali relacionados. É dizer: considera-se extinto o contrato que atingiu o termo fnal do prazo de duração nele fxado. Daí a necessidade de prorrogá-lo, por um dos motivos previstos em lei, ainda durante sua vigência. 9. Porém, não se pode deixar de admitir que, de fato, para os contratos visando obra certa, essas exigências legais têm apenas o objetivo de evitar a prorrogação indefnida ou abusiva dos contratos, sem responsabilização de alguma das partes. Na disciplina da Lei 8.666/1993, o contrato administrativo há de produzir efeitos a partir de sua celebração, vedada, entre outras práticas, a de suspender prazos de execução sob alegação de falta de recursos sem qualquer responsabilização dos agentes administrativos. 10. No caso em comento, essa preocupação da lei no sentido da imediata execução do contrato sem solução de continuidade, não está presente. As partes estiveram sempre comprometidas com o a execução do objeto. O episódio poderia ser atribuído à mera negligência administrativa na gestão de contratos se realmente ocorresse de forma generalizada em todos os ajustes. Esse não é o caso em pauta, sem dúvida. Segundo entendo, além do acréscimo de serviços, concorreu para o atraso dos dois aditamentos o próprio processo de negociação e aprovação dos instrumentos. Em ambos os casos, as advertências foram geradas pelos controles internos da entidade e isso deve servir para o aprimoramento dos procedimentos futuros. (TCU. Acórdão nº 3.131/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 26 nov. 2010)
No mesmo sentido, em análise de caso concreto, o TCU entendeu que a retomada de contrato com prazo de vigência expirado confgura recontratação sem licitação: 15. Com relação ao assunto, a SecobEnerg sugere que, diante da expiração da vigência do Contrato 01/99-SEMAR e da impossibilidade jurídica de sua prorrogação, consoante a jurisprudência desta Corte de Contas, seja alterada a classifcação do presente achado de IG-P para IG-C, sem prejuízo de continuidade à tomada de contas especial para apurar o montante do débito e ressarcir o erário do dano já ocasionado. 16. Em complemento, propõe que seja dada ciência à Semar que a retomada do Contrato 01/99-SEMAR, cujo prazo de vigência encontra-se expirado, confgura recontratação sem licitação, o que infringe a Lei 8.666/1993, art. 2º e 3º, e a Constituição Federal/88, art. 37, inciso XXI. 17. Diante do contexto fático analisado e das razões expostas pela SecobEnerg, cuja análise incorporo como razão de decidir, acato a proposta supramencionada. Todavia, julgo escorreito adotar medida processual adicional, visando prevenir os efeitos de eventual prorrogação da vigência do Contrato 01/99-SEMAR, inclusive por força de medida judicial. 18. Nesse passo, diante da similitude do presente caso com o apreciado por este Tribunal no Acórdão 2.929/2013-Plenário (Barragem do Rio Arraias), entendo adequado que seja determinado ao Ministério do Meio Ambiente, órgão responsável pelo programa de trabalho pertinente ao presente objeto, conforme o Anexo VI da LOA/2014, que se abstenha de repassar recursos federais para o custeio do Contrato 01/99-SEMAR, mediante a celebração de novos convênios ou instrumentos congêneres, sem que, previamente, seja comprovado perante o órgão, o cumprimento da medida corretiva especifcada no subitem 9.1.1 do Acórdão 1.727/2010-Plenário. (TCU. Acórdão nº 1.936/2014, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 29 jul. 2014)
Não obstante o entendimento majoritário da Corte de Contas exposto anteriormente, existe entendimento que acena no sentido de poder se enquadrar o contrato de obra na condição de contrato com escopo, sujeito a aditivo de prazo fora do período de vigência:
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9. No tocante à retomada da avença, a unidade técnica e a Procuradoria acreditam ser possível, por se tratar de contrato por escopo, cuja extinção ocorreria apenas com a conclusão do objeto. Para fundamentar essa posição, foram mencionados o Acórdão 778/2012 - Plenário e a Decisão 732/1999 - Plenário. Reproduzo trecho dos votos condutores de dois acórdãos que descrevem esse entendimento: - Acórdão 2.068/2004 - Plenário: “O voto acima demonstra a tendência doutrinária de diferenciar entre os efeitos da extinção dos prazos nos contratos de obra e nos de prestação de serviços. Nos primeiros, em razão da natureza de seu objeto, a extinção do prazo não acarretaria, de imediato, a extinção do contrato, eis que essa somente ocorreria com a entrega do objeto. O término do prazo não teria por efeito a extinção do contrato, mas sim a caracterização de mora, se fosse o caso, do contratado. Já nos segundos como, por exemplo, contrato de prestação de serviço de limpeza, o término do prazo teria o condão de encerrar o contrato. É que, nesses contratos, o lapso temporal previsto no contrato integraria o seu objeto, de modo que, terminado o prazo, terminado o contrato. Seguindo essa linha de raciocínio, vale trazer a lume Hely Lopes Meirelles (Licitação e Contrato Administrativo, 10ª ed., p. 230): “A extinção do contrato pelo término de seu prazo é a regra dos ajustes por tempo determinado. Necessário é, portanto, distinguir os contratos que se extinguem pela conclusão de seu objeto e os que terminam pela expiração do prazo de sua vigência: nos primeiros, o que se tem em vista é a obtenção de seu objeto concluído, operando o prazo como limite de tempo para a entrega da obra, do serviço ou da compra sem sanções contratuais; nos segundos, o prazo é de efcácia do negócio jurídico contratado, e assim
sendo, expirado o prazo, extingue-se o contrato, qualquer que seja a fase de execução de seu objeto, como ocorre na concessão de serviço público, ou na simples locação de coisa por tempo determinado. Há, portanto, prazo de execução e prazo extintivo do contrato”.” - Acórdão 5.466/2011 - 2ª Câmara: “Como demonstrou a Srª Abreu, a doutrina e a jurisprudência dividem os contratos públicos em duas espécies: 1) por prazo determinado, que se extinguem pela expiração do prazo de sua vigência; e 2) “por escopo”, que se extinguem pela conclusão de seu objeto. No caso dos segundos, expirado o prazo de sua vigência sem a conclusão do respectivo objeto, seria permitida a devolução do prazo, como previsto no art. 79, § 5º, da Lei nº 8.666/1993, in verbis: “Art. 79 (...) § 5º Ocorrendo impedimento, paralização ou sustação do contrato, o cronograma de execução será prorrogado automaticamente por igual tempo”. A jurisprudência do TCU também se postou nesse sentido, como se observa no voto condutor da Decisão 732/1999 - Plenário, de que se extraiu o trecho a seguir: “No entanto, ao meu ver, inexistindo motivos para sua rescisão ou anulação, a extinção de contrato pelo término de seu prazo somente se opera nos ajustes celebrados por tempo determinado, nos quais o prazo constitui elemento essencial e imprescindível para a consecução ou efcácia do objeto avençado, o que não é o caso do contrato frmado pelo
DER/MG, no qual a execução prévia é o seu objetivo principal. Dessa forma, não havendo
motivos para a cessação prévia do ajuste, a extinção do contrato frmado com o DER/MG
operar-se-ia apenas com a conclusão de seu objeto e recebimento pela Administração, o que ainda não ocorreu”.” 10. Observo que não há, nos autos, notícia da rescisão do ajuste; consta apenas o documento por meio do qual o Presidente da Comissão de Fiscalização determinou a paralisação das obras para o dia 23/4/2002, em decorrência da “insufciência de recursos fnanceiros” -
Memorando 01/2002, de 18/4/2002 (peça 3, p. 95).
11. Adicionalmente, verifco que o art. 79, § 5º, da Lei 8.666/1993 fxa que, em casos de
paralisação do contrato, o cronograma de execução deve ser prorrogado automaticamente
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
por igual tempo e que o art. 57, § 1º, inciso III, da mesma norma prevê a possibilidade de prorrogação dos prazos para a execução contratual quando a Administração tenha provocado sua interrupção. 12. Assim, creio que, para o caso em exame, a reativação do contrato pode ser aceita como legítima, com o consequente acolhimento das alegações de defesa dos responsáveis, tendo em vista a natureza do seu objeto e o fato de que, conforme as informações disponíveis, a suspensão da execução não foi causada pela contratada. (TCU. Acórdão nº 1.674/2014, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 3 jul. 2014). Por m, vale alertar que a questão afeta à prorrogação contratual indevida
reveste-se de tamanha gravidade que foi inserida no art. 92 da Lei de Licitações como crime, com pena de detenção, de dois a quatro anos, e multa.
10.8 Subcontratação e sub-rogação A subcontratação é o instrumento utilizado pela empresa vencedora da licitação para repassar parcela da execução dos serviços para outra empresa que tenha melhor capacidade técnica especíca ou que trabalhe com custos menores. O art. 72 da lei de
licitações autoriza a subcontratação de partes da obra, serviço ou fornecimento, até o limite admitido, em cada caso, pela Administração. Contudo, as responsabilidades contratuais e legais serão sempre da empresa principal. O tema foi abordado inicialmente no Capítulo 7 deste livro, item 7.5.6, mas merece ser complementado em termos de execução contratual. A jurisprudência é farta em relação à matéria, com detalhamento dos requisitos a serem observados na subcontratação: É regra de exceção, visto que o interesse da Administração é pelo cumprimento do contrato na forma originalmente avençada. Não é útil à Administração promover licitações em quantidade que extrapole ou que que aquém daquilo que julga ideal para manter
assegurado o interesse público, mas, também, não lhe é proveitoso permitir que a ausência de licitação comprometa a igualdade entre os potenciais concorrentes, sob pena de prejuízo de seus próprios interesses. Em outras palavras, a faculdade conferida à Contratada pelo artigo 72 da Lei nº 8.666/93 para subcontratar parte do objeto evita que a Administração venha a ter de promover outras tantas licitações como forma de complementar a execução do contrato. De acordo com o que consta das citadas normas, nos é possível armar que qualquer
forma (subcontratação, cessão, transferência, fusão, cisão, incorporação) pela qual se opte para transmitir direitos e obrigações a outrem: 1º) não pode isentar a contratada de suas responsabilidades contratuais e legais; 2º) somente pode-se lançar mão de tais mecanismos se previamente autorizados pela Administração, para o quantitativo e para as partes do objeto contratado que essa especique; e
3º) a previsão da transmissão de direitos e obrigações, para que possa ser levada a efeito, precisa estar prevista tanto no edital quanto no contrato. (TCU. Acórdão nº 153/02, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 10 maio 2002) Não obstante, o TCU aceita, em casos excepcionais, a gura da subcontratação
sem previsão em edital e contrato, quando for comprovada a ocorrência de fato superveniente:
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11. De fato, é farta a jurisprudência do TCU no sentido de que, embora a Lei 8.666, de 21.06.1993, permita a subcontratação parcial da obra, serviço ou fornecimento, é imprescindível que essa possibilidade esteja previamente prevista no edital e constante do contrato. É o que se depreende dos arts. 72 e 78, inciso VI, do referido diploma legal. 12. Como exemplo de precedentes, além do acórdão 1.982/2010-Plenário mencionado pela unidade instrutiva, cito os acórdãos 180/2001, 19/2002, 1.199/2004, 1.014/2005, 355/2006 e 1.932/2009, todos também de Plenário (Acórdão nº 717/2011 - 2ª Câmara). “Faz-se fundamental, concluo, regular adequadamente as subcontratações. Os editais devem prever, explicitamente e objetivamente, os limites de admissibilidade para essas eventuais sub-rogações. Os instrumentos convocatórios, ainda, devem limitar — ou pelo menos regulamentar — tal possibilidade, mormente no que se refere às parcelas fundamentais do objeto. [...] conveniente que se determine à estatal que, no caso da subcontratação de itens para os quais houve solicitação de atestados de qualicação técnica na licitação, a empresa
exija das contratadas originais, como condicionante de autorização para execução dos serviços, a apresentação de atestados das subcontratadas, nos mesmos moldes das previsões editalícias para aquele encargo, disposição que deve constar, necessariamente, do instrumento convocatório” (Acórdão nº 2992/2011 - Plenário) [...].
8. O ente público contratante tem a faculdade de autorizar a subcontratação parcial de obra, serviço ou fornecimento, desde que a possibilidade de subcontratar esteja prevista no edital e no contrato, e ainda com seus limites expressamente denidos. Não se pode
olvidar que a simples perspectiva da subcontratação, prevista no corpo do edital ou na minuta do contrato, acaba por contribuir para a ampliação da competição. Explico.
9. Para fundamentar a escolha da forma de conguração dos “grupos” ou “lotes” a serem
constituídos em função do parcelamento do objeto, deve o ente público contratante empreender estudos que considerem as características de mercado e que indiquem a alternativa de divisão que melhor satisfaça os princípios da competitividade, da isonomia e da obtenção da proposta mais vantajosa para a Administração, respeitadas as limitações de ordem técnica, sem prejuízo de realizar contratação isolada de todo o complexo ou conjunto com um único licitante, mas, neste caso, desde que admitida expressamente a participação, no certame, de empresas reunidas em consórcio, no caso de objeto de alta complexidade, ou então permitida a subcontratação parcial, como formas de assegurar o parcelamento material do objeto, ampliando assim o universo de competidores. Em ambos os casos, permite-se que empresas mais especializadas executem as parcelas do objeto que estão a requerer maior especialização por parte do seu executor. 10. Como restou consignado no voto condutor do Acórdão nº 1151/2011 - 2ª Câmara, “a subcontratação é regra de exceção, somente admitida quando não se mostrar viável sob a ótica técnica e/ou econômica a execução integral do objeto por parte da contratada, e desde que mediante autorização formal do ente contratante”. [...]
14. Ante o exposto, é de se concluir que a orientação emanada do Acórdão nº 5532/2010 1ª Câmara, invocado pela Secex-MG em sua instrução, no sentido de que a subcontratação parcial de serviços contratados “não necessita ter expressa previsão no edital ou no contrato, bastando apenas que não haja expressa vedação nesses instrumentos” deve ser vista não como regra, mas sim como hipótese absolutamente excepcional, extraordinária, resultante de fato superveniente, de forma a atender, aí sim, na expressão usada pela unidade técnica, “a uma conveniência da administração”. 15. Nessa situação excepcional, a necessidade da subcontratação surgirá no curso da execução contratual, à evidência, pois, de um fato superveniente à celebração da avença, de sorte a garantir a viabilidade da execução do contrato administrativo mesmo ante a eventuais circunstâncias que impeçam a execução integral do avençado nos moldes originais em que fora pactuado.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
16. É, portanto, providência de exceção, haja vista que o interesse da Administração é pelo cumprimento do contrato na forma originalmente avençada. A faculdade conferida à contratada pelo art. 72 da Lei nº 8.666/93 para subcontratar partes do objeto evita que a Administração venha a ter de promover outras tantas licitações a m de complementar a
execução do contrato que não pôde ser realizado, na sua integralidade, pela contratada. Não se pode perder de perspectiva que realizar licitação demanda tempo e acarreta custos para o poder público. (TCU. Acórdão nº 3.378/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 12 dez. 2012)
Vale acrescentar que as partes da relação contratual existente são a Administração e a contratada, ou seja, não é admissível que o órgão ou entidade público realize pagamentos ou outras ações diretamente à subcontratada, até mesmo por ocasionar uma série de vantagens à empreiteira principal não previstas na licitação, como a redução de despesas tributárias. A gura da subcontratação não deve ser confundida com a da sub-rogação, visto ser esta prevista no Código Civil, art. 346 a 351, e não na Lei nº 8.666/93. O TCU rmou
entendimento no sentido de que: [...] em contratos administrativos, é ilegal e inconstitucional a sub-rogação da gura da
contratada ou a divisão das responsabilidades por ela assumidas, ainda que de forma
solidária, por contrariar os princípios constitucionais da moralidade e da eciência (art. 37, caput , da Constituição Federal), o princípio da supremacia do interesse público,
o dever geral de licitar (art. 37, XXI, da Constituição) e os arts. 2º, 72 e 78, inciso VI, da Lei 8.666/93. (TCU. Decisão nº 420/02, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 08 maio 2002)
No mesmo sentido, concluiu que “a cessão de contratos administrativos ao invés da rescisão do ajuste anterior e realização de novo certame constitui fuga ao dever de licitar” (TCU. Acórdão nº 618/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 02 maio 2006). A argumentação para tal entendimento é bem apresentada nos seguintes termos: Ora, a sub-rogação plena, como operada, simplesmente substitui o juízo da Administração — único e soberano, formado durante e por meio do procedimento licitatório — pelo juízo do licitante vencedor, o qual, por ato próprio, escolhe — agora sem qualquer critério e sem empecilhos — terceiro para executar o objeto a ele adjudicado e responder pelas obrigações e direitos previstos no contrato administrativo, passando a assumir a posição de contratado. Esse sacrifício do princípio da eciência por ato unilateral de pessoa alheia
à Administração Pública — única constitucionalmente autorizada a laborar juízos nessa
área — representa ato diretamente atentatório à ecácia e à própria validade do preceito
constitucional. A mera anuência da Administração à sub-rogação contratual não substitui nem supre o juízo anteriormente formulado na escolha do contratado, em rigoroso procedimento licitatório. (TCU. Acórdão nº 153/02, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 10 maio 2002) Questão interessante refere-se aos requisitos especícos que devem ser observados
pelas empresas subcontratadas para que possam ser aceitas como prestadoras de serviços pela Administração, principalmente diante do fato de o TCU não ter entendimento pacíco a respeito da matéria, conforme demonstram os acórdãos a seguir:
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Endosso as providências sugeridas pela Unidade Técnica relacionadas às questões abordadas as este tópico, com exceção da que condiciona a realização de pagamentos por serviços já executados por terceiros não autorizados após a análise “da regularidade das empresas subcontratadas, notadamente no que diz respeito à idoneidade, frisando os aspectos de habilitação jurídica, qualifcação técnica (operacional e profssional quanto ao serviço ou obra subcontratado), situação econômico-fnanceira e regularidade fscal”. Observo, a esse respeito, que a Administração, na hipótese de subcontratação,
tem assegurada, nos termos do art. 72, a possibilidade responsabilizar a empresa que subcontratou os serviços, por falhas em sua execução. Essa garantia fundamental preserva os interesses da Administração. A Lei de Licitações, porém, não estabelece requisitos específcos que devam ser atendidos
pela empresa subcontratada para que possa executar os respectivos serviços. Quanto a essa matéria, a despeito da existência do precedente citado pela equipe de auditoria (Acórdão nº 2884/2008), considero excessiva a extensão à empresa contratada da apresentação de toda documentação relativa à habilitação jurídica e qualifcação técnica exigidas da empresa
contratada após regular procedimento licitatório. Alinho-me, isto sim, à orientação contida no subitem 9.2.2.3 do Acórdão nº 1529/2006 - Plenário, no sentido de que se deva exigir das empresas subcontratadas apenas a comprovação de regular situação fscal e previdenciária.
(TCU. Acórdão nº 1.570/2009, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 17 jul. 2009)
19. É necessário, ainda, examinar a divergência existente entre os pareceres do auditor federal de controle externo e do secretário de controle externo substituto acerca da exigência de qualifcação técnica de eventuais subcontratadas. 20. O auditor propõe que o Tribunal fxe o entendimento de que “não é aplicável a exigência de comprovação, por parte de eventuais subcontratadas, da mesma qualifcação
técnica exigida no edital para habilitação das licitantes”, por entender possível que a administração autorize a subcontratação de parcela de alta complexidade técnica ou de valor signifcativo do objeto.
21. Já o secretário substituto, por considerar que tal parcela relevante não pode ser subcontratada, propôs a formulação de determinação ao Dnit para que não inclua, em seus editais-padrão, cláusula “que permita a subcontratação do principal do objeto, esse entendido como os itens para os quais, como requisito de habilitação técnico-operacional, fora exigida a apresentação de atestados que comprovem a execução de serviços com características semelhantes”. 22. Não obstante a argumentação do auditor federal de controle externo, acompanho o posicionamento do secretário substituto. 23. A licitação se destina a selecionar a proposta mais vantajosa para a administração. E a proposta mais vantajosa não é apenas a de menor preço, mas igualmente a que contempla a técnica adequada e a execução por empresa apta para tanto. Ou seja, busca-se com o certame licitatório também selecionar o contratado que melhor atenda às necessidades da administração. 24. Para assegurar a boa execução do objeto, é exigida do futuro contratado a demonstração de capacidade fnanceira e sua capacidade técnico-profsssional e técnico-operacional, de
forma a comprovar sua aptidão mediante desempenho de tarefas semelhantes. 25. Tal comprovação de aptidão, obviamente, está relacionada às frações tecnicamente complexas e fnanceiramente relevantes do objeto, sob pena de serem absolutamente
descabidas as exigências de habilitação. 26. Assim, não faria sentido admitir que tais parcelas cruciais do objeto, para cuja execução foi selecionado o licitante mais apto, fossem posteriormente transferidas a terceiro por este escolhido. Isso tornaria completamente desnecessário o procedimento de habilitação e, consequentemente, esvaziaria de qualquer signifcado ou fnalidade os dispositivos da
lei que o preconizam, o que não pode ocorrer.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
27. Conclui-se, pois, que não é possível a subcontratação das parcelas tecnicamente mais complexas ou de valor mais signicativo do objeto, que motivaram a comprovação de capacidade nanceira ou técnica. (TCU. Acórdão nº 3.144/2011, Plenário. Rel. Min. Aroldo
Cedraz. DOU , 09 dez. 2011)
10.9 Fusão, incorporação ou cisão Outra questão analisada, com menos frequência, refere-se à continuidade dos contratos de obras públicas quando ocorrer fusão, incorporação ou cisão no âmbito das empresas contratadas. O TCU decidiu pela viabilidade dessa continuidade, desde que cumpridos, cumulativamente, os seguintes requisitos: (1) sejam observados pela nova pessoa jurídica todos os requisitos de habilitação exigidos na licitação original; (2) sejam mantidas as demais cláusulas e condições do contrato; (3) não haja prejuízo à execução do objeto pactuado; e (4) haja a anuência expressa da Administração à continuidade do contrato. 152
10.10 Escopo do contrato A conclusão adequada do escopo denido na fase de planejamento tem sido um verdadeiro desao aos gestores incumbidos da condução do empreendimento.
Diversas são as atividades que devem ser bem gerenciadas durante todo o ciclo voltado ao acompanhamento da execução do objeto, conforme ilustra a FIGURA 10.b, desde a denição de um projeto básico de qualidade até o recebimento denitivo.
ESCOPO
Iniciar
Receber
Contratar e desenvolver Projeto Básico
Corrigir rumos
Ciclo Decompor a obra em serviços
Acompanhar / Medir de acordo com o regime
Calcular a quantidade dos serviços
Contratar execução e supervisão
Definir a forma e o regime de execução
FIGURA 10.b - Ciclo de controle do escopo do contrato
Ver TCU. Acórdão nº 634/07, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 23 abr. 2007. Obs: houve pequena alteração de entendimento em relação ao Acórdão nº 1.108/03 (Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 25 ago. 2003), que exigia que essa possibilidade estivesse prevista no Edital.
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Além do referido ciclo, as atenções devem estar focadas em diversos aspectos atinentes a questões relevantes no gerenciamento de contratos, de acordo com esquema apresentado na FIGURA 10.c: a adequada medição dos serviços sob os aspectos quantitativos e qualitativos; o efetivo gerenciamento dos aditivos de forma a evitar a necessidade de acréscimos superiores aos limites legais; e a efciente gestão de medidas corretivas em função de possíveis falhas de projeto.
Controle de Escopo
Preocupações - Conclusão do objeto
Falhas de projeto
Medições
Aditivos
Conhecimento dos serviços projetados (por partes)
Gerenciamento dos acréscimos e supressões
Medidas a serem adotadas
Aferição dos serviços executados
Ajustes para a conclusão do objeto
Repercussões no regime de execução
Quantitativa
Qualitativa
Limite 25% Integração Custos e prazos
FIGURA 10.c - Aspectos relevantes para o controle do escopo
10.11 Medições e regime de execução Uma das principais atividades da fscalização está relacionada à realização das medições dos quantitativos dos serviços executados e ao ateste da qualidade desses serviços. A difculdade se acentua quando ocorre troca dos responsáveis pela fscalização no decorrer da obra. Para reduzir os riscos de futuros problemas, é recomendável que:
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
a) toda medição seja acompanhada de memorial de cálculo detalhado, indicando os setores e áreas em que o serviço está sendo aferido; b) as planilhas de medição demonstrem os serviços executados no mês e os serviços acumulados desde o início da obra; c) sejam feitas comparações entre as quantidades de serviços executadas e as previstas para aquela etapa da obra e, de imediato, consultado o projetista a respeito de eventuais distorções; d) sejam avaliados os saldos dos serviços contratados para a vericação da devida adequação à conclusão do empreendimento; e) os scais que estejam entrando ou saindo realizem inventário, inclusive por meio de foto ou lme, a respeito da real situação da obra. Para aqueles que, ao assumir o novo encargo, encontrarem distorções quando comparados os serviços já medidos com os aferidos no inventário, é importante que haja registro da informação e consulta ao scal anterior para saneamento de qualquer dúvida e, em casos críticos, comunicação a seus superiores (art. 67, §2º, da Lei nº 8.666/93). Ponto muitas vezes esquecido pelos scais, e de extrema gravidade, é a vericação prévia do regime de execução em que a obra foi contratada. É comum em empreendimentos licitados por empreitada global que a equipe de scalização efetue as medições por meio de simples aferição dos serviços executados, ou seja, pelo regime de preços unitários. Tal fato acarreta, por vezes, o incorreto pagamento de serviços em quantitativos superiores aos pactuados em contrato, visto que a obra foi contratada por preço certo e total, o que enseja débito aos responsáveis. A propósito, vale a leitura do item 7.5.2 deste livro, no qual são trazidos importantes conceitos a respeito da condução da scalização em função do regime de execução. O Decreto nº 7.983/13 deixa claro em seu art. 12 que “a minuta de contrato deverá conter cronograma físico-nanceiro com a especicação física completa das etapas necessárias à medição, ao monitoramento e ao controle das obras”. “No regime de execução por preço unitário, em que a remuneração de cada serviço passa pela efetiva conferência de cada atividade executada, tanto em termos quantitativos como qualitativos. Aliás, no ato da assinatura da avença, é pactuada a justa contraprestação remuneratória para cada serviço e estabelecido o equilíbrio do ajuste. As condições iniciais da proposta devem ser mantidas, inclusive durante a execução contratual, com equilíbrio entre os pagamentos e os encargos dela decorrentes (art. 37, inciso XXI da Constituição Federal de 1988 e art. 65 da Lei 8.666/1993)” (TCU. Acórdão nº 826/2015, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 28 abr. 2015). 153
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Foi determinado que “na execução dos contratos de conservação e restauração rodoviária, exija, como condição para o pagamento das medições, que os quantitativos medidos sejam discriminados em relatório de scalização que identique, por meio de mapas lineares ou outros instrumentos, a estaca e posição geográca inicial e nal da execução de cada serviço e seja acompanhado por arquivo de fotos digitais datadas e que enquadrem a indicação, com precisão mínima de uma centena de metros, da localização em que foram obtidas, de forma a evidenciar sucientemente a situação dos trechos concernentes antes e depois dos trabalhos e registrar inequivocamente a realização das atividades” (TCU. Acórdão nº 978/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. , 26 jun. 2006). DOU Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 8º, §2º, inciso I, do Decreto nº 7.581/11.
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Por sua vez, o regime de empreitada por preço global é compatível com a realização de medições mensais para o pagamento de serviços executados, até mesmo pelo fato de que o propósito da medição ultrapassa a simples aferição de quantidades, ou seja, deve contemplar o ateste da qualidade dos serviços e dos prazos pactuados. Vale colacionar o posicionamento do TCU: 15. Por m, relativamente à previsão de realização de medições mensais dos serviços executados, as quais no entender inicial da unidade técnica seriam incompatíveis com o regime de empreitada por preço global (alínea “d” do item 1), é pertinente esclarecer que a jurisprudência deste Tribunal não tem por inconciliável a adoção desse regime e a feitura de medições (vide, por exemplo, os Acórdãos nºs 1.998/2008 e 81/2010 e a Decisão 535/2000, todos do Plenário). 16. As medições — que podem até ser mensais — são necessárias para vericar o andamento das etapas previstas da obra ou do serviço e evitar que haja pagamentos antecipados ou indevidos. Isso é o que se depreende da análise transcrita no relatório que fundamentou o citado Acórdão nº 1.998/2008 - Plenário: “[...] O regime de empreitada por preço global não afasta a necessidade de medição, uma vez que tal procedimento se congura em importante ferramenta gerencial de controle para a Administração, principalmente neste caso concreto, em que não foi feito um estudo de etapalização da obra, mas tão somente apresentado um cronograma de desem bolso nanceiro sem que se possa, na ausência de medições, aferir sua aderência ao desenvolvimento físico da obra”. 17. No presente caso, em que sequer houve elaboração de cronograma das obras, de fato, segundo armou a unidade técnica na instrução constante do relatório precedente, é preciso denir, prévia e objetivamente, as etapas previstas para execução da obra, mediante a apresentação de memorial descritivo ou cronograma físico-nanceiro detalhado. (TCU. Acórdão nº 534/2011, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 17 mar. 2011)
Claro que os aditivos serão sempre devidos quando houver novas demandas apresentadas pela Administração ou incorreção de projeto. Neste último caso, a scalização deverá propor a oitiva dos projetistas e, se necessário, a devida responsabilização. Releva notar que a correção de erros de projeto é dever daqueles que o elaboraram, não cabendo qualquer tipo de ressarcimento pelo trabalho adicional do devido conserto. A FIGURA 10.d apresenta um resumo esquemático do tema.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
Alteração de projeto
Falhas
Novas demandas
Não há ônus
Há ônus
Responsabilidade do projetista
Menos de 25%
Mais de 25%
Aditivo
Outro contrato
FIGURA 10.d - Aditivos aos projetistas em caso de alteração de projeto
Cabe alertar para o risco de realização de medições provisórias, sem os devidos cuidados e detalhamentos, conforme demonstra caso analisado pelo TCU: Outra irregularidade grave refere-se às planilhas das 1ª e 2ª medições provisórias da obra, que contemplavam serviços não executados. Segundo apurou a equipe de auditoria, “não se trata de um erro de medição normal e tolerável dentro da execução de uma obra, mas da medição de R$2.524.973,14, quando o executado foi de apenas R$318.080,69” (. 234).
Isso representa a autorização indevida para pagamento de R$2.206.892,45. Conforme informações colhidas em entrevista pela equipe de auditoria, o objetivo do procedimento não seria lesar o Erário, mas garantir recursos para a obra. Instados a se pronunciar, os responsáveis pelo [...], bem como os responsáveis pela medição, recebimento e scalização da obra, apresentaram razões de justicativa que se substanciam,
basicamente, na provisoriedade das medições, que alegam foram anuladas em virtude da incorreção, e na inexistência de dano aos cofres públicos, já que não foram efetuados os pagamentos correspondentes. Ocorre que a alegada anulação das medições e a conseqüente não ocorrência de dano ao Erário decorreram exclusivamente da ação scalizatória do Tribunal. Caso inexistente, ou intempestiva, essa scalização, certamente o desembolso ter-se-ia consolidado, com
evidente prejuízos ao Erário. (TCU. Acórdão nº 278/02, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 13 ago. 2002)
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Com efeito, nas medições afetas a contratos de supervisão de obras, o TCU formulou determinação para que o responsável pela scalização: 9.1.1.1 limite o pagamento dos serviços contratados à apresentação de documento comprobatório do recolhimento mensal do INSS e do FGTS, a cargo das empresas contratadas, gerado pelo SEFIP – Sistema Empresa de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social – GFIP; Guia de Recolhimento do FGTS – GRF ou documento equivalente), de acordo com a legislação e os padrões estabelecidos pela Previdência Social e pela Caixa Econômica Federal; 9.1.1.2 exija das empresas contratadas, no ato do recebimento do Boletim de Medição e de entrega dos relatórios mensal e nal, a apresentação de relação nominal dos empregados designados para execução dos serviços, com CPF, cargo, valor do salário mensal, carga horária mensal trabalhada, período trabalhado, valor pago do INSS e do FGTS, Número de Identicação do Trabalhador – NIT, entre outras informações que se zerem necessárias à vericação do efetivo e tempestivo controle do recolhimento, pela contratada, dos encargos trabalhistas e previdenciários (FGTS e INSS) relacionados aos pagamentos de salários dos trabalhadores alocados no contrato; e 9.1.1.3 explicite que as empresas contratadas se obrigam a pagar aos prossionais por ela contratados os salários lançados em suas propostas de preços. (TCU. Acórdão nº 446/2011, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 17 mar. 2011)
Por m, ainda em relação a contratos de supervisão e consultoria, o TCU avaliou caso interessante em que se discutia a necessidade da empresa contratada manter durante a execução os exatos termos da proposta em relação ao pagamento de salário e quantidade de seus engenheiros denida na avença original. Após acalorado debate, por maioria, o voto vencedor assim concluiu: O último ponto sobre o qual desejo discorrer é a viabilidade de se exigir, no instrumento convocatório, a identidade entre o salário real dos funcionários das prestadoras de serviço e o valor declarado nas propostas das contratadas. Deixo claro, desde já, que defendo tal possibilidade apenas para os contratos medidos por homem/hora. Embora seja certo que os serviços a serem contratados pelo poder público devam prever uma unidade de medida que permita a mensuração dos resultados, também é cediço que algumas contratações, por suas características, têm especial diculdade — ou mesmo impossibilidade — de adotar essa providência; o que é mesmo reconhecido na própria IN-MPOG 02/2008, em seu art. 11, §1º. Atualmente, a imensa maioria dos contratos de supervisão do Dnit — se não todos — estão sendo feitos por homem/hora. Por esse motivo, inclusive, louvo e acompanho a proposta do Ministro José Múcio e do Ministro Substituto Weder de Oliveira em criar um grupo de trabalho para analisar os parâmetros possíveis de serem adotados no dimensionamento de equipes em contratos de engenharia consultiva. Estou certo que as discussões travadas neste processo poderão vir a ser matéria prima para os trabalhos a serem desenvolvidos naquele foro. Voltando às particularidades das contratações realizadas por postos de trabalho, caso não previsto no contrato, realmente entendo não se fazer possível a devolução da diferença de salários reais e declarados. Externo minha convicção, contudo, de que a inclusão de cláusula nos editais que estipulem tal exigência — para contratações medidas por homem/ hora, repito —, tanto se faz possível juridicamente, quanto, nesse tipo de ajuste, é a opção que melhor atende ao interesse público.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
Digo isso porque o maior obstáculo jurídico oferecido pelo douto Ministério Público para a vedação de tal possibilidade são as travas legais próprias do regime de empreitada. Nas palavras do Parquet, em alusão ao renomado jurista Silvio de Salvo Venosa: “Na Administração, em regra, o dono da obra assume os riscos e o prazo; na empreitada, no sistema do Código Civil, o empreiteiro assume os riscos, de acordo com o art. 629 (antigo art. 1.246), bem como se compromete a concluir em certo prazo, salvo as hipóteses de aplicação da teoria da imprevisão”. Pondero, contudo, que as características desse contrato em espécie — empreitada — devem ser utilizadas com reservas, quando se trata de avenças pactuadas segundo os preceitos da Lei 8.666/93. A Lei de Licitações prevê três regimes de contratação para obras e serviços: empreitada por preço global, empreitada por preço unitário e empreitada integral (art. 10). Assim, mesmo um “serviço” será executado por “empreitada”. Uma típica prestação de serviços — o labor advocatício, por exemplo — inevitavelmente será contratado por “empreitada” na Lei 8.666/93. A concepção civil do termo “prestação de serviço”, entretanto, se distingue do “serviço”, segundo a Lei Geral de Licitações. Pela interpretação sistemática da Lei 8.666/93, poder-seia entender que quando não se trate de obra (construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação), o objeto do ajuste será um “serviço”. A preceituação de “prestação de serviços” do código civil, por outro lado, repercute em obrigações e consequências jurídicas distintas da “empreitada”. Trata-se de um contrato em espécie diferente. O primeiro tem positivação inscrita nos arts. 593 a 609 do CC; o segundo nos arts. 610 a 626. São avenças com princípios e consequências diferenciadas. Segundo o mesmo Silvio de Salvo Venosa (Direito Civil: contratos em espécie, 8ª Ed.): “Na empreitada ou contrato de obra, busca-se a obra perfeita e acabada dentro do que foi contratado. Trata-se de critério nalístico. A prestação de serviços não destaca o m
da obra, mas a atividade do obreiro, em favor do dono do serviço, durante certo lapso de tempo. Desse modo, divisa-se na empreitada uma obrigação de resultado, enquanto na prestação de serviços há obrigação de meio”. Na “prestação de serviços” há obrigação de fazer; na “empreitada”, obrigação de entregar. Logo, apesar de mesma palavra, o signicado do termo “empreitada” na Lei de Licitações
não é o mesmo do Código Civil. Quero dizer que os óbices de um e outro contrato em espécie não se aplicam imediatamente aos contratos administrativos. Os termos editalícios são muito mais caracterizadores das mútuas obrigações — e possibilidades — que as amarras civis (de aplicação apenas subsidiária). Assim, o simples fato de a contratação em exame ser uma “empreitada” — a da Lei 8.666/93 — não é impeditiva da disposição, em instrumentos convocatórios, de cláusula que vincule o real salário a ser pago com o explicitado na proposta de preços. Caso se demonstre que essa seja a disposição que melhor atenda o interesse público, ela pode ser realizada — à semelhança, aliás, do que é corriqueiramente praticado em contratos de manutenção de automóveis, onde se remunera a contratada a partir de valores efetivamente praticados em cada tipo de conserto especíco no veículo.
Veja-se que, na composição de serviços de supervisão, apenas a menor parcela dos custos da contratada refere-se aos salários dos funcionários. Existem, ainda, os encargos sociais, as despesas administrativas, os riscos, os custos nanceiros, os seguros e os demais encargos
dispostos no BDI, correspondentes a quase duas vezes o valor dos salários. Só o chamado “overhead” (a administração central das supervisoras) representa por volta de 30% do custo dessas avenças. À época do contrato em análise, aceitavam-se valores de até 50%. A eciência dessas empresas, então, é muito melhor caracterizada pela capacidade
de reduzir seus custos em razão desses percentuais aplicáveis sobre o salário de seus
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empregados que a remuneração propriamente dita. Aliás, essa é a grande diferença competitiva entre uma e outra concorrente. Destaco que a contratante não vinculará o quanto a contratada irá pagar; a empresa é quem declarará tal valor, de acordo com a sua estrutura e política remuneratória. Todos os outros custos associados a esse salário — como visto, de dimensão muitíssimo maior que a remuneração dos empregados — serão de responsabilidade (e risco) da contratada. Na execução contratual por administração, a margem de retribuição seria um percentual xo, aplicado sobre todos os reais custos da empresa, o que, como visto, não será este o caso. Na verdade, nessas contratações de serviços de consultoria por homem/hora, a identidade entre o valor declarado e o realmente pago é condição para a garantia da vantajosidade e moralidade dos certames. Os serviços de engenharia consultiva que aqui tratamos têm como cliente, na prática, unicamente os entes públicos. Rodovias, portos, usinas, ferrovias, saneamento: são obras executadas eminentemente pelo poder público. Especialistas nessa área, assim, trabalham para empresas que prestam serviços para a Administração ou para empresas que executam obras para a mesma Administração; ou, ainda, para concessionárias de serviço público. Existe, então, uma diculdade intrínseca desses tipos de contrato para a aferição do que vem a ser o “preço de mercado”. Na realidade, o parâmetro para esse preço justo são outras contratações realizadas pelo próprio governo. Surge a pergunta: o “salário de mercado” é o salário declarado pela empresa em sua proposta ou o salário real despedido? O Dnit, em sua referência balizadora para estimar seus orçamentos nessa área (“Tabela de Preços de Consultoria”), faz sua pesquisa em outros órgãos e contratos governamentais; mas com base no valor contratual, não no valor real. Essa deciência na boa avaliação dos preços de mercado pode ser perfeitamente visualizada no caso concreto que ora se examina. Como relatado, o balizamento dos preços praticados pela Ecoplan com os praticados no mercado, segundo tabela do Dnit, resultou em um sobrepreço pouco superior a 12%. Como apurou a Secex-RS, todavia, no período de abril de 2007 a abril de 2008, a empresa teria faturado 88% mais que se tivesse pago salários idênticos ao de sua proposta. Dessa constatação se conrma não apenas a deciência dos “referenciais” utilizados para balizamento de preços de mercado, como também se auspicia que o salário real pago à mão de obra seja diferente do que o trabalhador verdadeiramente recebe em carteira. Existe uma porta aberta para pagamentos “por fora”, em esquiva aos encargos trabalhistas e previdenciários a ele associados. Reduzem-se irregularmente os encargos necessários para o cumprimento do contrato. Trata-se de uma vantagem competitiva indevida, em forte desprestígio ao princípio da isonomia. A proposta só foi a mais “vantajosa” porque a empresa já sabia, de antemão, que não pagaria todos os encargos previdenciários e trabalhistas a ela incumbidos. Tal prática deve ser duramente combatida. Afora o golpe em valores caros à licitação, a Administração é solidária em matéria previdenciária; e o scal do contrato não detém meios para constatar ou evitar essa diferença de valor. Ele ca refém dessa prática, viabilizada (ou facilitada) pela existência dessas tamanhas gorduras nas contratações. As margens exageradas, ainda, em contratações com menor disputa, são convidativas a toda sorte de irregularidades. Esses excessos desconhecidos podem representar um risco à moralidade da contratação. Em licitações realizadas prioritariamente por “técnica e preço”, com a disposição de critérios de classicação muitas vezes pouco objetivos, essas sobras são o combustível para desvios de conduta de gestores e particulares. Pergunto: por qual razão legítima existe o interesse de “esconder” que o real valor pago é tão desproporcional ao salário real? Tal fato tem sido recorrentemente observado por equipes de auditoria deste Tribunal.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
Disso emana que a disposição do edital da obrigatoriedade de a contratada respeitar o valor declarado em sua proposta, tanto evita a concepção de lucros ocultos exagerados — a materializar possível enriquecimento sem causa da contratada (por sobrepreço nos contratos) —, quanto facilita a missão scalizatória do adequado recolhimento dos encargos previdenciários, de cuja responsabilidade a Administração é solidária. Também acrescento que a alternativa viabiliza a parametrização do real preço de mercado para balizamento de licitações futuras com o poder público, garantindo uma contraprestação pecuniária mais justa e desencorajando — ou ao menos dicultando — eventuais condutas que desabonem a moralidade do certame. É verdade que o ordenamento jurídico, como também os termos editalícios, tem um poder muito limitado de coibir violações legais e desvios de conduta. Não acredito que a proposição que discorri tenha o condão de resolver todos os problemas afetos ao superfaturamento desses tipos de contratos. Tal fato, entretanto, não é óbice para a disposição de instrumentos e cláusulas que dicultem esses abusos. É nesse sentido que, em um sopesar de valores, entendo ser vantajosa essa disposição contratual a que me rero. Sobre a impossibilidade, destacada no parecer do Ministério Público, de uma empresa em recuperação judicial negociar com seus empregados eventual redução de salário — opção inviável ao exigir a identidade entre o salário pago e o destacado na proposta — penso que seja uma situação excepcional e, como tal, como exceção deve ser tratada. Até porque uma prestadora de serviços nessas condições dicilmente estaria em dia com suas condições econômico-nanceiras habilitatórias, o que, nos termos do art. 55, inciso XIII, da Lei 8.666/93, faz-se obrigatório. Quanto à pretensa variação dos insumos que compõe o preço de um contrato, a impossibilitar a manutenção do salário durante o transcorrer de toda a avença, penso que a utuação da remuneração da mão de obra dentro de uma mesma empresa não se compara à variabilidade de preços de outros insumos, como cimento, areia e brita. A aquisição desses últimos tem natureza bem distinta da política salarial de uma rma. Os aumentos remuneratórios decorrem, em última instância, de decisão da própria empresa — ou fruto de convenções coletivas supervenientes, em que os índices de reajuste apontarão tais variações. Ao contrário dos demais insumos, que têm custos reais desassociados de qualquer decisão gerencial da contratada. Outro ponto que desejo claricar é sobre o argumento de se tratar, na realidade, de um contrato por resultado, não de meio. As empresas supervisoras deveriam entregar relatórios e avaliações periódicas, não propriamente a presença dos prossionais na canteiro de obras, como uma “locação de mão de obra”. Ocorre que, nesses tipos de contrato, muito do objeto da contratação depende da efetiva presença da scalização na frente de serviço. A obra a ser executada carece dos “olhos” da Administração para aançar a sua execução com qualidade e de acordo com a boa técnica. Um engenheiro e um técnico não têm a mesma capacidade scalizatória que três engenheiros e três técnicos. Logo, se o orçamento estimativo prevê três engenheiros e três técnicos, pode-se contestar a admissão de que a contratada exerça suas funções com número menor de prossionais, mesmo apresentando todos os relatórios e pareceres — teoricamente, objeto do contrato. É nesse ponto que — pelo menos em parte — esses contratos de supervisão se aproximam muito da locação de mão de obra. Se o órgão tivesse à disposição funcionários para essa presença scalizatória, eventualmente não careceria de contratar esse apoio com base no art. 67 da Lei de Licitações. No passado, o DNER, por exemplo, detinha prossionais para a scalização das obras em rodovias por todo o Brasil. Pela míngua do corpo técnico atual, entretanto, não é raro um engenheiro residente cuidar de mais de mil quilômetros de vias. Contratam-se empresas supervisoras, assim, para auxiliá-lo nessa tarefa. Na realidade, precisa-se de prossionais em número suciente para garantir a presença scalizatória da Administração.
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A diculdade está no quantum necessário de mão de obra para bem acompanhar o empreendimento. Muito embora existam diferentes maneiras de orçar esses objetos, é reconhecido que tais contratações têm especial diculdade em parametrizar esse número; e esse é o principal motivo para a criação do grupo de trabalho a que se refere o TC 008.477/2008-0. Poder-se-ia alegar, também, que a identicação das categorias prossionais e a quanticação das horas de trabalho desses prossionais expressaria, apenas, o método de apropriação de custos aos produtos entregues à contratante. Não pretenderia a Administração simplesmente ter a sua disposição a mão de obra relacionada no orçamento estimativo; desejaria, na verdade, receber os produtos especicados em item editalício. Far-se-ia irrelevante, portanto, a quantidade de mão de obra realmente aplicada. Vejo, contudo, pelo que expus, que a atividade scalizatória depende, sim, da exigência da presença efetiva da mão de obra no contrato. Mais uma vez, dez prossionais, com mais “olhos”, scalizam melhor que um. A scalização depende da presença do scal. Um número mínimo de prossionais devem ser exigidos, de acordo com metodologia estimativa própria (e isso é um dos assuntos a serem tratados no grupo de trabalho a ser constituído). Tal qual defendi, nesse sentido, a qualidade do serviço prestado depende, e muito, da presença e do número de funcionários estimados no orçamento. Em arremate, pelo que discorri, defendo que o Dnit deve fazer constar em seus instrumentos convocatórios, doravante, cláusula que estipule a necessidade da correspondência entre o valor do salário contratado com o realmente pago à mão de obra nos contratos de supervisão. Tenho, contudo, que uma determinação generalizante, no âmbito destes autos, irá extrapolar as estreitas possibilidades deste recurso. (TCU. Acórdão nº 2.784/2012, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 17 dez. 2012)
Outro caso paradigma semelhante em relação à contrato de consultoria, no qual houve incompatibilidade entre os salários efetivamente pagos pelas empresas contratadas e aqueles informados nas suas Planilhas de Composição de Custos apresentadas por ocasião das licitações, foi analisado pelo TCU: 2. Como os salários pagos eram inferiores aos que constaram das propostas, restaria caracterizado o “superfaturamento aliado ao enriquecimento sem causa”, o que levou, entre outras medidas, às determinações no Acórdão 1233/2008-Plenário, ora recorrido, para que o Dnit faça levantamento dos valores pagos a maior, “instaurando os respectivos processos de tomada de contas especial no caso de as contratadas negarem a restituir ao erário os valores recebidos indevidamente”. (...) 6. Lembro que o assunto é idêntico ao do TC-008.477/2008-0, que contou também com a douta opinião do então Procurador-Geral, na mesma linha da manifestada nestes autos. 7. No referido processo, do qual também solicitei vistas na apreciação de pedido de reexame, acolheu-se a tese fundamental de não considerar irregular, naquele caso concreto - de todo semelhante a este -, o pagamento de salários pela contratada em patamares inferiores aos declarados na sua proposta de preços, o que conduziu ao provimento do recurso, por meio do Acórdão 2784/2012-Plenário, deixando-se assim de cobrar a devolução, determinada no Acórdão 327/2009-Plenário, de quantia correspondente à diferença entre os valores pagos e os efetivamente despendidos na consecução do contrato. 8. Passando então aos presentes autos, noto que o voto trazido à discussão pelo Relator recorre a argumentos da posição vencida na referida deliberação, cabendo, portanto, fazer algumas ponderações à luz do entendimento acolhido por este colegiado naquele julgado. 9. O primeiro ponto que abordo é a armação de que o pagamento de salários inferiores aos da proposta caracterizaria descumprimento de cláusula contratual.
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10. Tenho para mim que tal questão foi devidamente debatida no julgamento do Acórdão 2784/2012-Plenário, quando se reconheceu a inadequação da tese de que os valores constantes da proposta de preços do contratado devem corresponder aos seus custos, tanto mais em um regime de execução contratual por empreitada. Demonstram isso os seguintes trechos do voto de minha lavra proferido naquela oportunidade, que servem de contraponto aos argumentos ora apresentados pelo Relator: “8. Com efeito, é certo que a planilha com os preços unitários apresentados na licitação vincula o proponente. O equívoco, todavia, é entender que as quantias ali constantes devem corresponder aos custos que serão incorridos pelo contratado para cumprir o objeto, pois, no regime de execução contratual por empreitada, no qual a retribuição do contratado se dá mediante o preço avençado, e não por uma margem de lucro, como na contratação por administração, o que a planilha ostenta são os preços dos insumos considerados pelo concorrente na formação do valor a ser cobrado da Administração, e não os seus reais custos.
(...) 15. A tese que vincula os gastos com insumos aos valores da proposta confunde custos da contratada com os seus preços (os quais somente são custos sob o ponto de vista da Administração), incidindo em contradições e equívocos que muito me preocupam, sobretudo por envolverem preceitos que são caros ao Direito e a este Tribunal. 16. Veja-se que, como consequência disso, a aferição do superfaturamento acaba sendo feita em relação aos custos do contratado, e não aos valores de mercado, mesmo diante da inexistência, como no caso concreto, de diculdade prática para a estimativa destes com base em sistemas de referência ou outra fonte conável de preços, e desconsiderando-se o fato de o regime de execução contratual ser por empreitada”.
11. Tal posição foi reforçada pelo voto do Ministro Valmir Campelo, segundo o qual, “ pactuados preços nos patamares de mercado, não há que se falar em retenção” e “a possibilidade - de exigir a identidade entre salários pagos, de acordo com a proposta - deveria estar explícita ... já no instrumento convocatório”. 12. O que se depreende, portanto, dos fundamentos do Acórdão 2784/2012-Plenário, é que o pagamento de salários inferiores aos da proposta somente conguraria descumprimento
contratual caso houvesse cláusula expressa no edital e no contrato exigindo a identidade entre esses valores, sendo a regra geral a de que as quantias constantes da proposta correspondem aos preços dos serviços, e não aos custos da contratada. Assim, uma vez que não há cláusula dessa natureza nos contratos de engenharia consultiva em comento, não se pode falar em violação ao contrato na realização desses pagamentos. 13. Em outra parte do seu voto, o Relator, mesmo considerando plausível essa tese, defende que “ela não se ajusta ao caso concreto, principalmente em face das características próprias do contrato rmado entre o DNIT e a STE – Serviços Técnicos de Engenharia S/A, objeto da representação, bem como da forma como foi executado”. No tocante à suposta singularidade da avença, arma que o “Contrato DNIT/AQ/061/2002-00 possuía cláusulas bem especícas e precisas que vinculavam as obrigações de pagamento, pelo DNIT, aos preços unitários cotados pela STE S/A, vedando alterações de valores, inclusive para menor, sem o prévio consentimento da contratante” (grifos do original). Em seguida, reproduz as tais regras especícas do contrato (cláusulas primeira a quarta), que denem os preços contratuais e as condições
para a sua alteração. 14. Com todas as vênias, considero que referidas cláusulas corroboram o entendimento do Acórdão 2784/2012-Plenário ao estipularem expressamente (cláusula quarta) que o contratante “ pagará à contratada, pelos serviços contratados e executados, os preços integrantes da proposta aprovada” e que “os preços unitários incluem todos os custos diretos e indiretos para a execução dos serviços (...) constituindo assim a sua única remuneração pelos trabalhos” (grifei). 15. Não vejo como deduzir dessas regras algum compromisso do contratado em relação aos seus custos e que a realização desses em valores menores que os propostos congure
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“redução indevida” de preços unitários tampouco descaracterize a obrigação do Dnit de pagar e o direito do contratado de receber os valores combinados. 16. Outro ponto que merece ser comentado são circunstâncias que, para o Relator, seriam agravantes da suposta violação ao contrato, quais sejam, pagamentos não baseados em “ produtos entregues”, mas “tão somente nas horas-homens trabalhadas”, e utilização de parte da mão de obra do contrato em atividades rotineiras da administração interna do Dnit, que “contratou, no plano formal, prossionais com um determinado nível de capacitação, compatível com os salários prexados entre as partes, mas recebeu os serviços de prossionais com capacitação bem inferior”. 17. Segundo armado, tais elementos “afastam, no caso concreto, a incidência da tese apresentada pelo Procurador-Geral, que se baseia no conceito de contrato por empreitada, ou seja, em que há um produto a ser entregue”, sendo que, “no contrato sob exame, como se viu, o único ‘produto’ identicável nos boletins de medição é o número de horas-homens trabalhados”. 18. Ocorre que, conforme armado na apreciação do Acórdão 2784/2012-Plenário, o fato de os pagamentos do contrato serem feitos com base em medições por hora trabalhada não descaracteriza o regime de empreitada. 19. De regra, qualquer produto ou resultado pode ser descrito em termos dos quantitativos de insumos que o compõem, sendo que, nos contratos de gerenciamento e supervisão, o pagamento em função das quantidades de insumos efetivamente utilizados (no caso, predominantemente mão de obra) é uma forma prática de aferição da execução dos serviços, sem representar, contudo, mudança do objeto do contrato ou do regime de execução contratual. 20. Por sinal, a própria cotação e precicação dos serviços de gerenciamento ou supervisão tomam por base, fundamentalmente, os preços dos insumos. Nos orçamentos estimativos desses contratos, os custos das atividades a serem executadas são apropriadas com base nos insumos necessários à sua consecução (fundamentalmente, horas de trabalho e tipos de mão de obra, além de eventuais materiais e equipamentos que se façam necessários à realização da atividade). 21. De todo modo, ainda que se concluísse pela inadequação da metodologia de mensuração utilizada, caberia a adoção de providências com vistas à correção da forma de medição, mas não a equiparação, a posteriori , dos valores da proposta de preços com os salários efetivamente pagos, por meio do qual o contrato acaba, aí sim, ganhando contornos de locação de mão de obra, que é justamente o que o Tribunal não admite que ele seja. 22. Quanto aos indícios de emprego de mão de obra com qualicação diferente da prevista contratualmente, vejo como irregularidade na realização do contrato que deve ser apurada, com base nessa concepção, de forma objetiva. 23. Veja-se, a propósito desse tipo de desvio nas avenças em comento, que a denúncia que deu origem à presente representação reclamou da existência de “ funcionários da STE desenvolvendo serviços alheios à nalidade ” na execução dos contratos (. 85), mas essa questão deixou de ser apurada na instrução dos autos, em face de monitoramentos que vinham sendo realizados pela 1ª Secex em outros processos (. 93). 24. Assim, não me parece apropriado justicar a equiparação de valores, pressupondo de algum modo que o desvio de função teria ocorrido em todos os serviços prestados na consecução do contrato, com base em índicos que sequer foram conrmados nos autos. 25. Em suma: o fato de serviços serem medidos e cotados por horas-homens de trabalho e de a execução do contrato apresentar irregularidades não descaracteriza o regime de empreitada e, por consequência, não invalida o argumento do então Procurador-Geral para o provimento dos recursos. (TCU. Acórdão nº 2.438/2013, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 15 set. 2013)
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10.12 Pagamentos Consoante artigos 62 e 63 da Lei nº 4.320/64, “o pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação”, entendida esta como “a verifcação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos
comprobatórios do respectivo crédito”. A liquidação da despesa terá por referência os elementos descritos na referida lei: o contrato, ajuste ou acordo respectivo; a nota de empenho; os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço. No caso de obras, é imprescindível que os responsáveis observem as condições de pagamento previstas no contrato e os valores consignados nas planilhas de medição. A regra para o pagamento dos serviços é a efetiva liquidação da despesa, em face das disposições do art. 62 da Lei nº 4.320/64 c/c o art. 58 do Decreto nº 93.872/86 e o art. 40, XIV, “d”, da Lei nº 8.666/93. No caso de obras, essa liquidação se faz com base em medição atestada e detalhada pela fscalização competente, bem como pela
comprovação do recolhimento dos devidos tributos e da implementação das demais condições exigidas no edital. O TCU entende que, em caráter excepcional, “a realização de pagamentos antecipados aos contratados somente poderá ocorrer se houver a conjunção dos seguintes requisitos: previsão no ato convocatório, existência no processo licitatório de estudo fundamentado comprovando a real necessidade e economicidade da medida e estabelecimento de garantias específcas e sufcientes que resguardem a Administração dos risco inerentes à operação (v.g.: Acórdãos ns. 1.442/2003 - 1ª Câmara, e 1.726/2008
- Plenário)” (TCU. Acórdão nº 1341/2010, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 17 jun. 2010). A AGU tem a mesma compreensão a respeito do tema: A antecipação de pagamento somente deve ser admitida em situações excepcionais, devidamente justifcada pela administração, demonstrando-se a existência de interesse
público, observados os seguintes critérios: 1) represente condição sem a qual não seja possível obter o bem ou assegurar a prestação do serviço, ou propicie sensível economia de recursos; 2) existência de previsão no edital de licitação ou nos instrumentos formais de contratação direta; e 3) adoção de indispensáveis garantias, como as do art. 56 da lei nº 8.666/93, ou cautelas, como por exemplo a previsão de devolução do valor antecipado caso não executado o objeto, a comprovação de execução de parte ou etapa do objeto e a emissão de título de crédito pelo contratado, entre outras. (AGU. Orientação Normativa nº 37. DOU , 14 dez. 2011)
A IN nº 2 SLTI/MP apresenta, em seu art. 34, §5º, I, interessante relação de documentos que devem ser exigidos do contratado no processo de liquidação de despesa relativa a serviços, no caso de empresas regidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas: a) recolhimento da contribuição previdenciária estabelecida para o empregador e de seus empregados, conforme dispõe o artigo 195, §3º da Constituição Federal, sob pena de rescisão contratual; b) recolhimento do FGTS, referente ao mês anterior; c) pagamento de salários no prazo previsto em Lei, referente ao mês anterior; d) fornecimento de vale transporte e auxílio alimentação quando cabível; e) pagamento do 13º salário;
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f) concessão de férias e correspondente pagamento do adicional de férias, na forma da Lei; g) realização de exames admissionais e demissionais e periódicos, quando for o caso; h) eventuais cursos de treinamento e reciclagem; i) encaminhamento das informações trabalhistas exigidas pela legislação, tais como: a RAIS e a CAGED; j) cumprimento das obrigações contidas em convenção coletiva, acordo coletivo ou sentença normativa em dissídio coletivo de trabalho; e k) cumprimento das demais obrigações dispostas na CLT em relação aos empregados vinculados ao contrato. Em casos excepcionais, o TCU tem admitido a antecipação “mediante as indispensáveis cautelas ou garantias, efetuando-se, posteriormente, os respectivos descontos nos créditos da empresa contratada em valores atualizados na forma do contrato” (TCU. Acórdão nº 606/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 02 maio 2006).
10.13 Responsabilidade previdenciária e trabalhista O art. 71 da Lei nº 8.666 preceitua que “o contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, scais e comerciais resultantes da execução do contrato”. Em relação aos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, o mencionado artigo, em seu §2º, xa que a Administração Pública responde solidariamente com o contratado, nos termos do art. 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. A polêmica atual está na responsabilidade pelos encargos trabalhistas. O artigo em comento, em seu §1º, estipula que “a inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, scais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edicações, inclusive perante o Registro de Imóveis”. Ocorre que o Tribunal Superior do Trabalho decidiu pela inconstitucionalidade do dispositivo que preceitua a irresponsabilidade da Administração em relação aos débitos trabalhistas. O entendimento inicial do TST foi questionado no Supremo Tribunal Federal, por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 16, que entendeu que o Estado não pode responder, em todas as situações, de forma subsidiaria, quando a empresa terceirizada não honrar o pagamento de verbas trabalhistas a seus empregados. Por esse motivo, o texto inicial da Súmula nº 331 do TST foi ajustado para a seguinte redação: IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na scalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como
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empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI - A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Dessa forma, para o resguardo da Administração Pública, deverá ser exigido do contratado, já no texto do Edital, que sejam apresentados no decorrer da obra todos os documentos que comprovem o cumprimento das obrigações relativas aos encargos trabalhistas e previdenciários. Cabe aqui uma consideração importante aprovada pelo TCU em análise de caso que versava sobre deciente scalização de contrato acerca do descumprimento das
obrigações trabalhistas pela contratada: 33. Em sua instrução, a unidade técnica concluiu ter cado evidente “o procedimento leniente e negligente da Administração no que toca à scalização do contrato quanto ao cumprimento das obrigações trabalhistas, uma vez que tal inércia [...] proporciona
a possibilidade de dano à União, em razão de sua responsabilidade subsidiária com a
contratada, em caso de condenação na Justiça laboral e insolvência desta”. [...] 34. Diferentemente do que sustenta a unidade técnica, entendo que, no caso especíco de
obras contratadas por entes da administração pública, não há falar em responsabilidade subsidiária do contratante em decorrência de encargos trabalhistas não honrados pela contratada, senão vejamos. 35. Preliminarmente, cabe destacar que a inobservância das normas de medicina e segurança do trabalho é infração administrativa, apenável com multa prevista no art. 201 da CLT. Assim, os procedimentos a cargo do empregador e dos seus empregados (arts. 157 e 158 da CLT; NR 18 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego), atinentes à higiene e medicina do trabalho, são de responsabilidade destes. Em caso de inobservância, a sanção é administrativa e não alcança o ente público contratante da obra. Não têm aplicação, na espécie, os dispositivos do art. 71 da Lei nº 8.666/93, tampouco o art. 37, §6º, da Constituição Federal de 1988. 36. Em caso de acidente na obra, provocado por inobservância das normas de higiene, segurança e medicina do trabalho, é possível a responsabilização do empregador, mas somente se este tiver agido com culpa ou dolo. A Constituição Federal, no art. 7º, XXVIII, estabelece a obrigação de o empregador prover seguro contra acidente do trabalho e impõelhe, adicionalmente, o dever de indenizar o trabalhador em caso de acidente do trabalho para o qual tenha concorrido dolosa ou culposamente. Assim, a responsabilidade civil por danos oriundos de acidente do trabalho é do empregador , empreiteiro, e não do dono da obra. Essa responsabilidade é subjetiva , vale dizer, será atribuída mediante a vericação de ato culposo ou doloso — omissivo ou por perpetração — do empregador, que tenha concorrido para o evento danoso. É claro que a inobservância das normas revela, por si só, a culpa. Eis o entendimento do TST: “Acidente de trabalho. Responsabilidade subjetiva. Dano material e moral. Culpa concorrente da vítima. Adequação do quantum indenizatório. Artigo 945 do Código Civil. É subjetiva a responsabilidade do empregador pelo dano moral ou material decorrente do acidente do trabalho, nos moldes do art. 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal, e do art. 159 do CC/1916, em vigor à época dos fatos. O dever de indenizar depende da demonstração do ato ilícito por parte do empregador, ou seja, da comprovação de que agiu com dolo ou culpa (imprudência, negligência ou imperícia). Conclusão acerca da ocorrência de ato ilícito do empregador, que deixou de observar e scalizar o cumprimento
das normas de segurança e medicina do trabalho, autorizando o exercício do serviço em
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rede energizada, o que ocasionou no infortúnio. Indenização por dano material e moral devida, ainda que na espécie a vítima também tenha concorrido culposamente para o evento danoso, ao não observar as normas de segurança estabelecidas, circunstância que autoriza a mitigação do quantum indenizatório, o qual deve ser arbitrado na medida de participação de cada uma das partes para a ocorrência do sinistro, nos moldes do art. 945 do Código Civil”. (TST - RR - 191500-59.2005.5.04.0030, Relator Juiz Convocado: Flavio Portinho Sirangelo, Data de Julgamento: 15/12/2010, 7ª Turma, Data de Publicação: 04/02/2011) [...]
37. Nessas situações, por óbvio, a indenização não se enquadra nos chamados encargos trabalhistas. É decorrente de condenação judicial por ato ilícito e não por inadimplemento de obrigações trabalhistas; é evidente que a inobservância de normas administrativas gera a responsabilização, mas não se trata, a toda evidência, de encargo trabalhista inadimplido. 38. E nesse contexto, pode o ente público contratante, na condição de dono da obra, ser também responsabilizado? Entendo que não. O art. 37, §6º, da Constituição Federal estabelece a responsabilidade objetiva da administração pública pelos danos que seus agentes causarem a terceiros. É o empreiteiro agente da administração? Penso que não, pois não se trata de serviço público concedido ou delegado, mas de contratação por empreitada para a consecução de objeto específco. O empreiteiro não age representando
a administração pública; é contratado dela para a execução da obra. Ademais, não haveria, no caso, nexo de causalidade entre a atuação da administração e o evento danoso, pois as normas administrativas que regem a matéria são dirigidas aos empregadores e empregados. 39. Agora, atenção: há responsabilidade da administração pública no dever de indenizar o empregado acidentado em contratos de terceirização , serviços, portanto. Essa obrigação decorre da aplicação do art. 932, III, do Código Civil, c/c o item 4.5 da NR 4 da Portaria nº 3.214/78 do MTE. Essa responsabilização no âmbito dos serviços terceirizados tem sido reconhecida — em inúmeras decisões — pelo próprio TST. Cito um acórdão, para exemplifcar (trecho do voto):
“Da responsabilidade da tomadora dos serviços pelas indenizações decorrentes do acidente do trabalho. [...] A responsabilidade do tomador que adota a terceirização dos
serviços por acidente do trabalho lato sensu não se restringe às cláusulas do contrato de prestação frmado e nem à responsabilidade subsidiária nos moldes da SJ 331, IV, do TST.
Nos casos de danos decorrentes de acidente do trabalho lato sensu que ocasiona lesões ao empregado da empresa prestadora de serviços, cujo evento ocorreu quando este laborava em favor da empresa tomadora dos serviços, prepondera o fato de que a tomadora é legítima comitente, ou seja — que ou quem constitui —, atraindo o disposto no art. 932, III, do Código Civil, no sentido de que: ‘Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no
exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.’ [...] Ademais, dispõe a NR 4 da
Portaria 3.214/78 que trata dos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho no seu item 4.5 a obrigação do empregador estender toda a proteção e segurança aos empregados que laboram por meio de empresa prestadora de serviços, reforçando o dever do tomador/comitente resguardar o bem maior vida (integridade física, mental e emocional) do trabalhador que insere sua energia produtiva no empreendimento econômico. O ordenamento jurídico frma a responsabilidade do tomador/comitente pela
prática de ato ilícito (dano) em razão da responsabilidade, equiparando-o ao empregador
quanto ao dever de indenizar. [...] Por conseguinte, entende-se que a segunda reclamada,
tomadora da prestação dos serviços, seria até mesmo responsável solidária com a primeira reclamada pelos créditos decorrentes da presente ação relativos ao acidente do trabalho da qual foi vítima a trabalhadora. A sentença da origem, no entanto, reconheceu tão somente a responsabilidade subsidiária, não havendo insurgência recursal da reclamante no particular. [...] Nega-se provimento ao recurso”. (AIRR - 2649-53.2010.5.04.0000 , Relator
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Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, Data de Julgamento: 25/08/2010, 3ª Turma, Data de Publicação: 03/09/2010) [...]
40. Portanto, em se tratando de obra, o supracitado regramento não é aplicável, tampouco o entendimento do TST, por uma razão muito simples: obra não é serviço; não se trata, pois, de terceirização. Como já frisado, a responsabilidade civil por danos oriundos de acidente do trabalho numa obra é do empregador , empreiteiro, e não do tomador/dono da obra. E a indenização não é decorrente de encargo trabalhista inadimplido. 41. De outro tanto, no que concerne aos encargos trabalhistas propriamente ditos, o art. 71, §1º, da Lei nº 8.666/93 disciplina que, ao contratar obras e serviços, a administração pública não responde pelas obrigações não adimplidas pela contratada. “Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, scais e
comerciais resultantes da execução do contrato. §1º A inadimplência do contratado com referência aos encargos trabalhistas, scais e comerciais não transfere à Administração
Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edicações, inclusive perante o registro de imóveis”. [...]
42. Ao interpretar o referido dispositivo, em cotejo com o art. 37, §6º, da Constituição Federal, que dene cláusula geral de responsabilidade objetiva da administração por
danos que causar ao particular, o TST editou a Súmula 331, aplicável aos contratos de prestação de serviços terceirizados (serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra), cujo item IV prescreve: “IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação e constem do título executivo judicial”. [...]
43. Da leitura emerge a seguinte questão: Quem é o “tomador de serviços” a que se refere a Súmula 331 do TST? Obra de construção civil estaria enquadrada nesse conceito? Dúvida não há de que se trata do contratante beneciário da mão de obra cedida pela contratada.
Parece-me claro que somente em contratos de cessão de mão de obra (dedicação exclusiva de mão de obra) subsiste responsabilidade do tomador/contratante. 44. A contratação de obra de construção civil, em que a construtora assume responsabilidade direta e total pela obra (não confundir com serviço de engenharia, que pode ser executado mediante cessão de mão de obra), tem por característica a realização física do objeto. Não tem por essência a colocação de pessoal à disposição do contratante/dono da obra. 45. E uma das características dos serviços realizados mediante cessão de mão de obra é justamente o seu caráter de continuidade. Portanto, se o serviço não é contínuo, não se trata de terceirização, e não há, via de consequência, responsabilidade subsidiária no que tange às obrigações trabalhistas. Resulta, pois, da análise empreendida que o contratante/ dono da obra não responde pelo descumprimento de obrigações trabalhistas por parte da contratada. 46. O TST tem entendimento rmado no sentido de que só haverá responsabilidade no
que concerne às obrigações trabalhistas contraídas pela contratada, se o dono da obra for empresa construtora ou incorporadora. Tal entendimento está consolidado na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-1: “Dono da obra. Responsabilidade. Diante da inexistência de previsão legal, o contrato de empreitada entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora”. 46.1 Os arestos a seguir transcritos ilustram o entendimento do TST sobre a matéria: “Recurso de Revista. Responsabilidade subsidiária. Dono da obra. OJ 191 da SBDI-1 do TST. Na medida em que o contrato rmado entre o Município e a primeira reclamada
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objetivou a realização de obras e, não sendo a Municipalidade empresa construtora ou incorporadora, o quadro fático delineado amolda-se às disposições da OJ nº 191 da SBDI-1 desta Corte. Recurso de revista conhecido e provido”. (RR - 16100-35.2009.5.03.0057, Relator Ministro: Horácio Raymundo de Senna Pires, Data de Julgamento: 16.02.2011, 3ª Turma, Data de Publicação: 25.02.2011) “Recurso de Revista. Responsabilidade subsidiária. Dono da obra. Extrai-se do acórdão recorrido que o Estado celebrou contrato de empreitada com a primeira reclamada para realizar a construção de casas populares. Com efeito, se os reclamantes foram admitidos por empresa contratada pelo ora recorrente para a execução de obras, a hipótese dos autos não se confunde com a de terceirização, prelecionada na Súmula nº 331 do TST. Assim, vericando-se a condição do Estado de dono da obra, haja vista o objeto do contrato r-
mado entre os reclamados, nos termos da decisão regional, é aplicável o entendimento
rmado na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-1 do TST. Recurso de revista
conhecido e provido” (RR - 74540-81.2006.5.20.0016, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 16.02.2011, 2ª Turma, Data de Publicação: 25.02.2011) [...]
47. Portanto, os entes públicos contratantes não respondem por encargos trabalhistas não adimplidos pela empreiteira contratada para a realização de obra de construção civil. À luz da jurisprudência do TST, só há possibilidade de responsabilização caso a obra esteja associada à atividade-m do ente da administração pública. A respeito dessa temática,
destaco a seguinte deliberação:
“Agravo de Instrumento. Dono da obra. Responsabilidade. Empreitada. Atividade-m.
Se empresa de saneamento contrata empreiteira inidônea para realização de obra ligada à sua atividade-m, mais precisamente a execução de obras de expansão do sistema de
esgotos sanitários, evidentemente que não pode querer se eximir de sua responsabilidade, no mínimo subsidiária, quanto a quitação dos direitos dos empregados que laboraram na obra, mas não tiveram ressarcidos seus créditos trabalhistas pela empreiteira. Aplicação analógica do entendimento consubstanciado na parte nal da Orientação Jurisprudencial
nº 191 da SBDI-1 do TST. Agravo não provido”. (AIRR 4039/2001-513-09-40, 2ª Turma,
DJ de 18.08.2006, Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle) [...] 48. Por m, impende ressaltar que, em recente decisão proferida no âmbito do Supremo
Tribunal Federal, o Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16 — movida pelo então Governador do Distrito Federal — para declarar a constitucionalidade do art. 71, §1º, da Lei nº 8.666/93, conforme noticiado no Informativo STF nº 610. 49. Quanto ao mérito da ADC-16, entendeu-se que a mera inadimplência da contratada não poderia transferir à administração pública a responsabilidade pelo pagamento dos encargos trabalhistas por ela não honrados, mas reconheceu-se que isso não signicaria que eventual omissão do ente público contratante, na obrigação de scalizar as obrigações
da contratada, não viesse a gerar responsabilidade.
50. Signica dizer que a Justiça do Trabalho não deverá aplicar irrestritamente a Súmula
331 do TST, ou seja, não poderá generalizar as situações e terá de analisar, caso a caso, a omissão da administração. Terá, pois, de investigar com mais rigor se a inadimplência tem como causa principal a falha ou falta de scalização pelo órgão público contratante.
Se tiver, caberá sim a responsabilidade subsidiária deste por débitos trabalhistas oriundos de prestação de serviços terceirizados. 51. Cabe frisar, por oportuno, que o entendimento do Pretório Excelso no âmbito da ADC-16 não tem reexos na situação delineada nos presentes autos, em que o objeto
envolve obra de construção civil e não prestação de serviços, contexto em que incide a sobredita súmula. 52. Em síntese, não há necessidade — para m de minorar o risco de responsabilização,
o qual, como visto, não existe — de o ente público contratante exigir da empreiteira
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
contratada para execução de obra de construção civil documento que comprove o cumprimento das obrigações trabalhistas (comprovante do pagamento de salários e demais direitos trabalhistas — férias, 13º salário, verbas rescisórias, etc. —; comprovante de entrega do vale-transporte e do vale-alimentação; recibo do CAGED; certidões trabalhistas), pois não há responsabilidade do dono da obra em caso de inadimplemento. 53. A despeito dessas considerações, no caso concreto, o item 7.4 da Cláusula Sétima do Contrato nº 130/2008 (“Dos preços e condições de pagamento ”) apresenta a seguinte redação (Principal: Vol. 1, s. 273/274): “7.4 Os pagamentos carão condicionados à previa aprovação da Fiscalização do contratante e à comprovação, pela contratada , dos recolhimentos devidos ao INSS e ao FGTS, até a data de apresentação da fatura, cando obrigatória cópia das quitações salariais devidas aos prossionais (folha de pagamento)”. [...] 54. A exigência dessa documentação se faz, pois, necessária não em razão de eventual responsabilização subsidiária do ente público contratante - pelas razões já aduzidas -, mas sim em decorrência de cláusula contratual, a vincular a atuação da comissão de scalização. 55. No caso concreto, por conta desse item 7.4 da Cláusula Sétima do Contrato nº 130/2008, considero não elidida a irregularidade atinente à “não averiguação, nas seis medições entregues à equipe da Secex-MA, da regularidade das quitações salariais e do depósito do FGTS dos empregados na obra”. 56. Manifesto-me, assim, por que seja mantida a responsabilidade do presidente da comissão de scalização pela aludida irregularidade, não havendo falar em conduta culposa do dirigente do Ifet/MA, pois se trata de questão inerente ao acompanhamento da execução do contrato. (TCU. Acórdão nº 242/2013, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 27 fev. 2013)
10.14 Alterações contratuais As modicações das condições de um contrato de obra pública, em face da dinâmica da execução do seu objeto, são pertinentes. Contudo, essas modicações não podem ser entendidas como atos necessários a corrigir grandes falhas de projeto ou especicações de serviços, até mesmo porque a lei de licitações exigiu para o início do procedimento a existência de projeto básico que caracterizasse com precisão necessária e suciente o que seria contratado. A Resolução nº 361/91 (Confea), em complemento a essa denição, estabeleceu como razoável a possibilidade de variação do valor realizado em relação ao previsto em uma faixa de mais ou menos 15%. Com efeito, o TCU tem posição clara a respeito do assunto: É indevida a alteração de contratos de obras públicas com a nalidade exclusiva de corrigir erros no projeto que serviu de base à licitação e que se revelou incompleto, defeituoso ou obsoleto, devendo o fato acarretar, nos termos do art. 7º, §6º, da Lei 8.666/1993, a nulidade do contrato e conseqüente realização de nova licitação, após refeitura do projeto, e a responsabilização do gestor que realizou a licitação original com projeto inepto. (TCU. Acórdão nº 353/07, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 16 mar. 2007)
A lei foi exível em denir um limite máximo para aditivo em 25%, visto que poderá ser necessária a inclusão de alguns serviços não previstos. Por esse motivo, é razoável supor que a maioria dos projetos desenvolvidos em condições normais não terá problemas para sua conclusão.
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De plano, vale lembrar que: 1. A interrupção da execução de contratos por iniciativa da Administração deve-se fazer acompanhar de exposição de motivos. 2. A formalização de termos aditivos somente deve ocorrer em contratos cuja vigência não se encontre expirada. 3. As alterações de projetos de contratos em andamento devem-se fazer acompanhar de
justicativas técnicas sucientemente detalhadas. (TCU. Acórdão nº 866/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 09 jun. 2006)
Essencial que existam justicativas técnicas para todos os serviços que alterem o objeto inicialmente denido na licitação, sob pena de responsabilização da equipe encarregada de scalizar o empreendimento, conforme destaca o TCU em análise de caso concreto: 13. Com relação à execução de serviços em desacordo com o projeto executivo, a equipe de auditoria confrontou as previsão dos principais elementos construtivos do empreendimento , identicando diversas modicações não justicadas, no projeto executivo com o as built conforme apresentado na tabela do relatório que fundamenta esta deliberação.
14. Considero que algumas modicações são possíveis, até mesmo esperadas, entre o objeto executado e o seu projeto, sem que exista necessidade de haver justicativas técnicas ou celebração de aditivos contratuais. Seria o caso de modicações pontuais de locação dos elementos construtivos ou de encaminhamento das redes e instalações diversas. Porém,
tais mudanças não podem trazer reexo nos quantitativos, nas especicações técnicas ou no dimensionamento dos serviços contratados, o que exigiria necessariamente a prévia celebração de aditamento contratual, nos termos do art. 65, inciso I, alínea “a”, da Lei
8.666/1993. É pacíca a jurisprudência do TCU no sentido de que as alterações realizadas em projeto de obra pública, com as consequentes alterações na planilha de quantitativos e quaisquer outras alterações porventura necessárias, devem ser registradas em termos
aditivos, juntamente com as justicativas técnicas para tanto (por exemplo, os Acórdãos 2.161/2011, 517/2011, 1.597/2010, 2.588/2010, 2.032/2009, todos do Plenário). 15. Foi o que ocorreu na obra fiscalizada, em que foram constatadas as seguintes
modicações, dentre outras, que têm impacto relevante na concepção do objeto contratado. i. Supressão de um pontilhão no Canal C-1; ii. Supressão de um extravasor no Canal C-1 e outro no Canal C-1.8; iii. Acréscimo dos Bueiros BE-40, BE-41, BE-42, BE-47 e BT-10; e iv. Aumento de 291,00 m na extensão do sifão invertido. 16. Concordo com a equipe de auditoria de que a realização de tais alterações, sem
as devidas justicativas, pode se enquadrar como infração ao disposto nos artigos 60,
parágrafo único, e 66 da Lei 8.666/1993, bem como ao art. 76 da mesma Lei. 17. Além dos aspectos levantados pela unidade técnica, pondero que alterações de projeto de tal magnitude só poderiam ser realizadas com a anuência do projetista e do registro de nova anotação de responsabilidade técnica (ART). Nesse sentido, cabe apresentar as seguintes disposições da Lei 5.194/1966: “ Art. 18 - As alterações do projeto ou plano original só poderão ser feitas pelo prossional que o tenha elaborado. Parágrafo único - Estando impedido ou recusando-se o autor do projeto ou plano original a prestar sua colaboração prossional, comprovada a solicitação, as alterações ou modicações deles poderão ser feitas por outro prossional habilitado, a quem caberá a responsabilidade pelo projeto ou plano modicado.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
(...) Art. 22 - Ao autor do projeto ou aos seus prepostos é assegurado o direito de acompanhar a execução da obra, de modo a garantir a sua realização, de acordo com as condições, especifcações e demais pormenores técnicos nele estabelecidos. Parágrafo único - Terão o direito assegurado neste Artigo, o autor do projeto, na parte que lhe diga respeito, os profssionais especializados que participarem, como co-responsáveis, na sua elaboração.
18. No Acórdão 2.581/2009-Plenário, de relatoria do eminente Ministro Marcos Bemquerer Costa, cou consignado que, havendo modicação de projeto, a Administração deve
providenciar a atualização da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) da obra junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea) competente, de modo a deixar registrada a alteração. 19. O Ministro Valmir Campelo também registrou no Acórdão 1.981/2009-Plenário que a Administração deve identicar cada peça técnica que compõe o Projeto Básico/Executivo (plantas, orçamento-base, composições de custos unitários, cronograma físico-nanceiro,
etc.) por meio das Anotações de Responsabilidade Técnica (ART) dos responsáveis por
sua autoria, e também com a identicação dos últimos revisores, em conformidade com a Resolução CONFEA 425 (arts. 1º e 2º), atualizando-as a cada modicação de projeto, com o intuito de permitir a identicação e imputação de responsabilidade do projeto inicial e
após suas alterações, em conformidade com o disposto na Lei 5.194/1966. 20. Ante o exposto, em vez de acolher a proposta de oitiva do Dnocs formulada pela equipe de auditoria, entendo mais adequado determinar à entidade a observância de que as eventuais alterações de projeto devem ser precedidas de procedimento administrativo no qual que adequadamente consignada a motivação das alterações tidas por necessárias,
que devem ser embasadas em pareceres e estudos técnicos pertinentes. (TCU. Acórdão nº 2.053/2015, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 26 ago. 2015)
Vale lembrar, ainda, que alterações contratuais não contempladas em termo aditivo podem congurar contrato verbal e consequente apenação dos gestores respon-
sáveis pela omissão, conforme assevera o TCU: Em relação ao primeiro tópico, identicou-se a execução de serviços sem a cobertura
contratual, o que denota contrato verbal com a Administração, em afronta ao art. 60 da Lei de Licitações. Na ocorrência desse tipo de artifício — ilegal, diga-se — costuma-se contra-argumentar que a dinâmica de uma obra pública (ainda mais desta complexidade) exige uma tomada de decisões ágil, incompatível com a ritualística para a celebração dos termos aditivos. Esse tipo de argumento, entretanto, afora a mácula a valores caros à Administração, embute toda sorte de riscos, que vão desde o desvio de objeto; serviços executados com preços acima do mercado; qualidade deciente (pela eventual incapacidade técnica da
empresa executora); malversação de recursos; e nulidade da intervenção. A lei, todavia, possui dispositivos próprios para lidar com emergências. O cumprimento das formalidades anteriores às alterações contratuais é que possibilita a ampla scalização do contrato administrativo, em todos os seus níveis. O termo aditivo, como requisito de validade, precisa atravessar todas as suas fases, até atingir a sua ecácia, desde a solicitação e fundamentação, vericação de disponibilidade orçamentária, até o
exame de legalidade (pelo jurídico), atravessando o juízo de conveniência e oportunidade
em todos os planos de controle do órgão; do scal do contrato, ao ordenador de despesas. (TCU. Acórdão nº 1.227/2012, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 28 maio 2012)
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Existem dois tipos de alterações contratuais previstas na lei de licitações: unilaterais e por acordo.
10.14.1 Alteração unilateral É facultada a alteração unilateral pela Administração, em decorr dec orrência ência da possi bilidade de cláusulas exorbitantes em contrato administrativo, consoante art. 65, I, da Lei nº 8.666/93, nos seguintes casos: a) quando houver modicação do projeto ou das especicações, para melhor
adequação técnica aos seus objetivos; b) quando necessá necessária ria a modi modicação cação do valor contra contratual tual em decor decorrência rência de
acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos pela lei. A lei de licitações destaca aqui duas hipóteses: a primeira, atinente à alteração qualitativa; e a segunda, quantitativa. Vale notar que essas hipóteses não foram criadas para correção de projetos básicos mal elaborados, mas para ajustes que se zerem
necessários em função de eventos realmente imprevistos à época de sua elaboração, como o aparecimento de nova tecnologia ou impossibilidade de exata quanticação de
todos os serviços em obras de maior complexidade.
10.14.2 Alteração por acordo A alteração é permitida, ainda, por p or acordo entre as partes, conforme inciso II do do art. 65, nas seguintes hipóteses: a) quando conveniente a substituição da garantia de execução; b) quando necessária a modicação do regime de execução da obra ou serviço, bem como do modo de forn fornecim ecimento, ento, em face de veri vericação cação técni técnica ca da
inaplicabilidade dos termos contratuais originários; c) quando necessária a modicação da forma de pagamento, por imposição de
circunstâncias supervenientes, mantido o valor inicial atualizado, vedada a antecipação do pagamento, com relação ao cronograma nanceiro xado,
sem a correspondente contraprestação de fornecimento de bens ou execução de obra ou serviço; d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do
equilíbrio econômico-nanceiro econômico-nanceiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem
fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, congurando álea econômica
extraordinária e extracontratual. A última hipótese, pela importância que se reveste, será apresentada, com maior detalhe, no item 10.15.5, relativo à recomposição do equilíbrio econômico-nanceiro
do contrato.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
10.14.3 Limites para alteração Os limites estabelecidos pela lei para celebração de aditivos estão, nos moldes dos parágrafos 1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/93, apresentados na TABELA 10.1. TABELA 10.1 Valores limites para celebração de aditivos denidos pela lei de licitações Objeto
Aditivo
Limite
Acréscimo
Incremento de 25% do valor inicial
Absoluto
Supressão
Supressão de 25% do valor inicial
Poderá exceder o limite caso haja acordo entre as partes
Acréscimo
Incremento de 50% do valor inicial
Absoluto
Obras, serviços ou compras
Reforma de edifício ou equipamento
Valor
O TCU, apesar de firmar entendimento de que as alterações contratuais quantitativas e qualitativas estão sujeitas aos limites impostos na lei, reconheceu a faculdade da Administração, em casos excepcionalíssimos, de ultrapassar esses limites, nos termos da seguinte decisão: a) tanto as alterações contratuais quantitativas — que modicam a dimensão do objeto
— quanto as unilaterais qualitativas — que mantêm intangível o objeto, em natureza e em dimensão, estão sujeitas aos limites preestabelecidos nos §1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/93, em face do respeito aos direitos do contratado, prescrito no art. ar t. 58, I, da mesma Lei, do princípio da proporcionalidade e da necessidade de esses limites serem obrigatoriamente xados em lei;
b) nas hipóteses de alterações contratuais consensuais, qualitativas qualitativas e excepcionalíssimas de contratos de obras e serviços, é facultado à Administração ultrapassar os limites aludidos no item anterior, observados os princípios da nalidade, da razoabilidade e da
proporcionalidade, além dos direitos patrimoniais do contratante privado, desde que satisfeitos cumulativamente os seguintes pressupostos: I - não acarretar para a Administração encargos contratuais superiores aos oriundos de uma eventual rescisão contratual por razões de interesse público, acrescidos aos custos da elaboração de um novo procedimento licitatório; II - não possibilitar a inexecução contratual, à vista do nível de capacidade técnica e econômico-nanceira do contratado; econômico-nanceira III - decorrer de fatos supervenientes que impliquem em diculdades não previstas ou
imprevisíveis por ocasião da contratação inicial;
IV - não ocasionar a transguração do objeto originalmente contratado em outro de
natureza e propósito diversos; V - ser necessárias à completa execução do objeto original do contrato, à otimização do cronograma de execução e à antecipação dos benefícios sociais e econômicos decorrentes; VI - demonstrar-se — na motivação do ato que autorizar o aditamento contratual que extrapole extra pole os limites legais mencionados na alínea “a”, supra — que as conseqüências da outra alternativa (a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação) importam
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sacrifício insuportável ao interesse público primário (interesse coletivo) a ser atendido pela obra ou serviço, ou seja gravíssimas a esse interesse; inclusive quanto à sua urgência e emergência. (TCU. Decisão nº 215/99, Plenário. Rel. Min. Adhemar Ghisi. Revisor Min. Adylson Moa. DOU , 21 maio 1999)
Vale registrar que as condições xadas na mencionada decisão são cumulativas e que, realmente, é extremamente difícil que ocorram ao mesmo tempo em obra com adequado planejamento. A assinatura de aditivos com base nesse entendimento deve ser bem avaliada para que não ocorram problemas futuros em relação à identicação de indícios de irregularidades graves. Outra ressalva a respeito da aplicação da decisão em comento é que as alterações qualitativas não podem decorrer de culpa do contratante ou do contratado, conforme assevera o próprio TCU: Ora, se visualmente foi possível apontar que existiam problemas na caracterização do terreno, está patente a falha no projeto básico. Uma sondagem, em tese, seria muito mais precisa. Não vejo assim, em princípio, como enquadrar tal situação como “imprevisív “imprevisível”; el”; e, como consequência, nos requisitos da Decisão 215/1999. [...] Finalmente, convém alertar que novas alterações a lterações nas tecnologias construtivas para execução dos elementos de fundação no terminal de passageiros, para preenchimento dos requisitos estabelecidos na Decisão-TCU 215/1999-Plenário, devem ser motivadas pela comprovação de que as alterações não decorreram de projeto básico insuciente, precisamente no que se refere às sondagens. (TCU. Acórdão nº 89/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 05 fev. 2013)
Outro ponto de destaque refere-se ao sentido a ser dado à utilização de aditivos. Não se pode entender razoável que o limite de 25% xado permita artifícios de retirada de parte signicativa dos serviços inicialmente contratados para inserção de novos, sob pena de alteração do objeto licitado. Vale relacionar análise a respeito da matéria: 5. Naquela oportunidade o que se armou é que alterações para menos de 62% do valor do contrato inicial e o aumento do saldo remanescente em 133% desvirtuaram o objeto inicialmente licitado, violando, assim, o art. 3º da Lei de licitações e o art. 37 da Constituição Con stituição Federal. Para que tenhamos uma idéia da magnitude da alteração promovida pelo primeiro termo aditivo, dos R$40.468.707,70 inicialmente contratados, foram excluídos R$25.298.307,82 e incluídos R$35.361.836,36, isto é do total inicialmente licitado restaram apenas R$15.170.399,88. Por certo, o art. 65 não autoriza modicações no projeto dessa monta. 6. Marçal Justen Filho (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 9ª edição, p. 495), ao discorrer sobre o tema, orienta de forma apropriada que “como princípio geral, não se admite que a modicação do contrato, ainda que por mútuo acordo entre as partes, importe alteração radical ou acarrete frustração aos princípios da obrigatoriedade da licitação e isonomia”. 7. Argumentando, questiono se seria razoável admitir que seja adjudicado a um certo licitante a compra de dez carros populares a um preço global de R$230.000,00 e, posteriormente, se assine termo aditivo substituindo aqueles por seis automóveis de luxo, no valor total de R$280.000,00, sob a alegação de que ambos são carros e que, dessa forma, não houve alteração do objeto e não foi ultrapassado o limite xado no art. 65 multicitado. Tal procedimento além de ferir o princípio da isonomia entre os licitantes, não assegura à administração o melhor preço, como exigido pelo art. 3º da Lei nº 8.666/93. Aliás,
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nem mesmo se pode falar em licitação, já que foi licitado um objeto e adquirido outro completamente diferente, ainda que ambos tenham a mesma designação genérica. 8. Diante do exposto, não posso concordar com o raciocínio simplista de que a alteração realizada no projeto inicialmente licitado não ultrapassou o limite de 25% e, por isso mesmo, não existiu nenhuma ilegalidade. Muito menos posso concordar com os fundamentos apresentados pela [...] quando defende que “se uma barragem de terra,
por exemplo, tem seu método construtivo alterado para uma de concreto compactado a rolo (CCR) não pode de modo algum armar que houve alteração do objeto”. Por certo
continuará sendo uma barragem, mas jamais poderá ser considerado o mesmo objeto licitado [...].
10. Não se alegue que não houve alteração do projeto básico, mas apenas o seu detalhamento no projeto executivo, pois, apesar de reconhecer que este possa fazer algumas correções naquele, não pode alterá-lo de modo a se constituir objeto completamente distinto do inicialmente licitado. Alterações Alterações signicativas, antes de iniciada a obra exige a realização
de novo procedimento licitatório e não assinatura de termo aditivo.
11. Novamente argumentando, questiono se poderia a [...] ter efetuado uma redução do
contrato em 62% antes do início da obra e seis meses depois alterar o saldo remanescente em 133%. Não tenho dúvida de que o Analista, caso realizasse alguma auditoria nesse interregno de seis meses, registraria a ilegalidade, sob a alegação de violação do art. 65 já citado. O fato de as alterações terem ocorrido ocor rido concomitantemente, não altera o raciocínio, pois o objeto inicialmente licitado, em qualquer das situações, terá sido radicalmente modicado. (TCU. Acórdão nº 1.428/03, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 03 out. 2003)
No mesmo sentido, o TCU reprovou conduta do gestor na análise de caso concreto: 39. A respeito dos acréscimos contratuais superiores aos limites legais previstos no art. 65, §1º, da Lei 8666/1993, registrados nos Contratos 14/2006 e 16/2006, foram ouvidos em audiência os senhores José Francisco das Neves e Ulisses Assad. 40. No Contrato 14/2006, o terceiro, quinto e sétimo termos de aditamento promoveram, em conjunto, supressões e acréscimos de serviços de, respectivamente, 71,49% e 96,45% em relação ao valor original do contrato. Por sua vez, no valor inicial do Contrato 16/2006 foram procedidas supressões de 30,55% e acréscimos de 51,08%. 41. Tais percentuais foram calculados pela equipe de auditoria segundo jurisprudência consolidada desta Corte de Contas, no sentido de que as reduções ou supressões de quantitativos devem ser consideradas de forma isolada, ou seja, o conjunto de reduções e o conjunto de acréscimos devem ser sempre calculados sobre o valor original do contrato, aplicando-se a cada um desses conjuntos, individualmente e sem nenhum tipo de compensação entre eles, os limites de alteração estabelecidos no art. 65 da Lei 8.666/1993. 42. Os responsáveis alegaram, em síntese, síntese , que foi observada a disposição da Lei 8.666/1993, que não especica que os acréscimos e supressões devam ser contabilizados de forma
individual e sim sobre o valor contratual. 43. No exame de mérito, a unidade técnica propõe acolher as manifestações de defesa apresentadas com base em entendimento adotado pelo TCU no Acórdão 3.105/2013-TCUPlenário, o qual respondeu consulta formulada pelo Ministério dos Transportes que “é juridicamente viável a compensação entre o conjunto de acréscimos e supressões ao objeto dos contratos referentes a obras de infraestrutura celebrados antes do trânsito em julgado do Acórdão 749/2010 - Plenário Plenário por órgãos e entidades vinculados vinculados ao Ministério dos Transportes”.
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44. Tenho entendimento diverso ao manifestado pela Unidade Técnica, pois o caso em questão possui algumas particularidades. Por isso, enfatizo desde logo que, nos termos da LOTCU, o Acórdão que responde à consulta tem caráter normativo e constitui prejulgamento da tese, mas não do fato ou caso concreto. 45. Conforme registrado pela equipe de auditoria, a situação encontrada alterou signicativamente os quantitativos dos projetos inicialmente contratados, ocasionando
relevantes alterações em relação ao projeto básico originalmente licitado. Do contrato 14/2006, por exemplo, permaneceu na planilha menos de 29% do objeto originalmente licitado. Embora não tenha ocorrido variação superior a 25% do valor inicial do contrato, o objeto licitado foi profundamente alterado. 46. No âmbito da auditoria realizada no Fiscobras/2012, apreciada recentemente pelo
Acórdão 1.351/2015-TCU-Plenário, também foi vericada que a assinatura de aditivos
contratuais promoveu a exclusão de serviços descaracterizando descaracte rizando funcionalmente o objeto inicialmente licitado. Trata-se de caso muito semelhante ao apreciado no Acórdão 1.428/2003-TCU-Plenário, ocasião em que o Ministro Ubiratan Aguiar fez valiosas ponderações:
“5.Naquela oportunidade o que se armou é que alterações a lterações para menos de 62% do valor do contrato inicial e o aumento do saldo remanescente em 133% desvirtuaram o objeto inicialmente licitado, violando, assim, o art. 3º da Lei de licitações e o art. 37 da Constituição Federal. Para que tenhamos uma ideia da magnitude da alteração promovida pelo primeiro termo aditivo, dos R$ 40.468.707,70 inicialmente contratados, foram excluídos R$ 25.298.307,82 e incluídos R$ 35.361.836,36, isto é do total inicialmente licitado restaram apenas R$ 15.170.399,88. Por certo, o art. 65 não autoriza modicações no projeto dessa monta. (...) 7.Argumentando, questiono se seria razoável admitir que seja adjudicado a um certo licitante a compra de dez carros populares a um preço global de R$ 230.000,00 e, posteriormente, se assine termo aditivo substituindo aqueles por seis automóveis de luxo, no valor total de R$ 280.000,00, sob a alegação de que ambos são carros e que, dessa forma, não houve alteração do objeto e não foi ultrapassado o limite xado no art. 65 multicitado. Tal procedimento além de ferir o princípio da isonomia entre os licitantes, não assegura à administração o melhor preço, como exigido pelo art. 3º da Lei nº 8.666/93. Aliás, nem mesmo se pode falar em licitação, já que foi licitado um objeto e adquirido outro completamente diferente, ainda que ambos tenham a mesma designação genérica. 8.Diante do exposto, não posso concordar com o raciocínio simplista de que a alteração realizada no projeto inicialmente licitado não ultrapassou o limite de 25% e, por isso mesmo, não existiu nenhuma ilegalidade. ilegalidade. (...)”.
46. É de se observar também que há evidências de que houve supressão de itens que eram essenciais para a conclusão do objeto ou à integridade da ferrovia (proteção vegetal de taludes e drenagem) em alguns pontos, causando perda de serviços já realizados, conforme relatado no relatório que fundamentou o Acórdão 1.351/2015-TCU-Plenário. 47. Foi observado que no lote 1 da FNS (Contrato 14/2006) caram pendentes de execução
os seguintes serviços: a) a execução da superestrutura no Túnel 2;
b) o reparo e complemento complemento da infraestrutura e execução da superestrutura superestrutura do trecho trecho nal
de aproximadamente 7 km entre o Túnel 2 e o Pátio Intermodal do Porto Seco; c) a solução para as oito interferências com redes elétricas de 69 kV e 138 kV existentes entre o Túnel 2 e o pátio Intermodal do Porto Seco; e d) a execução do Pátio Intermodal I ntermodal de Anápolis, junto ao Porto Seco, motivo de existência do Ramal Ouro Verde – Anápolis formado pelos lotes S/N e 1. 48. No Lote 3, objeto do Contrato 16/2006, o relatório que embasa o Acórdão 1.351/2015-TCUPlenário informa que houve modicação por termo aditivo que retirou 100% 100 % dos dormentes
com bitola mista e, em seu lugar, permitiu a construção do lote apenas com dormentes de
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
bitola larga, ou seja, sem os shoulders para a instalação do terceiro trilho, criando cr iando para a Valec ou para a futura concessionária a necessidade de substituição de todos os dormentes do lote para levar a ferrovia à sua condição operacional de projeto. 49. Assim, a supressão de serviços indispensáveis para a operação da ferrovia teve como único objetivo aumentar a margem para acréscimos de serviços, de forma que o valor nal do contrato não superasse em mais de 25% o seu valor original.
50. O resultado das alterações contratuais também acabou por comprometer o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de forma desfavorável para a Administração, conforme os indícios de superfaturamento decorrente de jogo de planilha apurados no TC 012.613/2012-6. 51. Dessa forma, adoto na presente deliberação o mesmo posicionamento acolhido no Acórdão 1.910/2012-Plenário, que multou os referidos responsáveis por falha idêntica. Na ocasião, o Ministro Valmir Valmir Campelo teceu as seguintes considerações: “Mesmo raciocínio não pode ser empreendido no que se refere à irregularidade ‘l ’, relativa, aí sim, de modo especíco, à extrapolação dos 25% contratuais na avença CT 10/2002. Na iminência de ultrapassar o limite instituído no art. 65, §§ 1º e 2º da Lei 8.666/93, e ausentes os pressupostos inscritos na Decisão-TCU 215/99, caberia aos gestores providenciar nova contratação, em tempo hábil para tal. Os responsáveis pela execução contratual não podem se escudar em um projeto básico falho como guarida para infringência dessa norma legal; sob pena da esquiva do regular processo licitatório, por alteração relevante do objeto contratado. Nessa última questão, discordo da retirada o então Diretor-Presidente da Valec, Sr. José Francisco das Neves. A ultrapassagem dos limites legais de aditamento poderia ser vista sem uma avaliação meticulosa: ela salta aos olhos. Não se trata de irregularidade, assim, que pudesse passar despercebida pelo dirigente. Claramente, entendo, caberia conduta diversa, distinta daquela omissiva”. (TCU. Acórdão nº 1.498/2015, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 23 jun. 2015)
Em relação ao desvirtuamento do objeto por meio de aditivos, vale citar caso avaliado pelo TCU: 4. Mas não é somente essa grave gra ve irregularidade que vicia vic ia as obras em questão. Também foi identicada nos autos a descaracterização do objeto licitado, mediante a modicação do
projeto original por meio de alterações não apenas nos quantitativos de serviços previstos, mas também alterações qualitativas no projeto. Por elucidativo, transcrevo o seguinte excerto do relatório da Secob que apresenta, em resumo, a irregularidade: “[...] A única conclusão plausível é a desvirtuação das condições iniciais licitadas. O objeto do contrato é outro, totalmente modicado do inicial. O projeto básico, se comparado com o projeto executivo, resta omisso, impreciso, deciente e inadequado para denir com precisão um objeto a ser licitado [...]”
5. Com efeito, diante das graves irregularidades apontadas, que macularam as obras em questão desde a origem, uma vez que o objeto da licitação, baseado em projeto básico deciente não corresponde à obra que se pretende realizar, realiza r, além de apresentar sobrepreço, considero que a solução que melhor atende o interesse público, neste caso, é a xação de prazo à [...], para que cumpra os exatos termos da lei, adotando as providências necessárias
para a anulação dos atos e contratos irregulares. (TCU. Acórdão nº 396/08, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 14 mar. 2008)
O mesmo raciocínio deve ser empregado para os chamados aditivos “sem reexos nanceiros”,, nos quais não há alteração de valor em face do equilíbrio entre os acréscimos nanceiros”
e supressões dos serviços. Caso grave, nesses casos, ocorre quando são retirados do escopo serviços contratados inicialmente com preços inferiores aos referenciais de mercado e acrescidos outros com preços elevados.
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Por esses motivos, o TCU se posicionou a respeito da aplicação dos limites legais atinentes ao conjunto de acréscimos e supressões do objeto contratado, formulando relevante determinação ao órgão ou entidade que: [...] para efeito de observância dos limites de alterações contratuais previstos no art. 65 da Lei nº 8.666/1993, passe a considerar as reduções ou supressões de quantitativos de forma isolada, ou seja, o conjunto de reduções e o conjunto de acréscimos devem ser sempre calculados sobre o valor original do contrato, aplicando-se a cada um desses conjuntos, individualmente e sem nenhum tipo de compensação entre eles, os limites de alteração estabelecidos no dispositivo legal. (TCU. (TC U. Acórdão nº 591/2011, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 21 mar. 2011) 155
Diante da relevância desse entendimento, oportuno transcrever decisão do TCU que analisou recurso interposto com o objetivo de que fosse esclarecida a modulação temporal e o alcance em relação aos futuros contratos que vierem a ser celebrados: 9.1. com fundamento nos arts. 48 da Lei nº 8.443/1992, c/c os arts. 285, §§1º e 2º e 286, todos do Regimento Interno do TCU, conhecer Pedido de Reexame, apenas no efeito ef eito devolutivo, para, no mérito, dar-lhes provimento parcial, dando à determinação contida no subitem 9.2 do Acórdão nº 749/2010, alterado pelo Acórdão Acórdão 591/2011 - Plená Plenário, rio, a seguinte redação; “9.2. determinar ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes que, nas futuras contratações celebradas a partir da data de publicação deste Acórdão no Diário Ocial da União, passe a considerar, para efeito de observância dos limites de alterações contratuais previstos no art. 65 da Lei nº 8.666/1993, as reduções ou supressões de quantitativos quantitativ os de forma isolada, ou seja, o conjunto de reduções e o conjunto de acréscimos devem ser sempre calculados sobre o valor original do contrato, aplicando-se a cada um desses conjuntos, individualmente e sem nenhum tipo de compensação entre eles, os limites de alteração estabelecidos no dispositivo legal;” 9.2. determinar ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes que, em cada caso abrangido por essa solução temporária e intertemporal indicada no subitem anterior deste acórdão, os aditivos que vierem a ser celebrados deverão ser justicados quanto à sua pertinência e conformidade às características e diretrizes fundamentais estabelecidas no projeto básico, devendo ser devidamente registrados nos respectivos processos administrativos, estando, assim, disponíveis disponíveis à scalização dos órgãos de controle. (TCU. Acórdão nº 2.819/11, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Alencar Rodrigues. DOU , 09 nov. 2011)
Esclarecedor o Voto do Relator na análise da matéria: Não satisfeitas cumulativamente as condições estabelecidas pela Decisão nº 215/1999 Plenário, para justicar as alterações excepcionais que extrapolem os limites legais, há de ser observada a regra estabelecida no art. 65, §1º, do Diploma Legal de Licitações e Contratos, na exata dicção da deliberação vergastada, lembrando sempre que tais alterações devam ser previamente justicadas pela autoridade auto ridade competente e calculadas sobre o valor inicial atualizado do contrato. Com efeito, esse é entendimento majoritário do Tribunal, já consubstanciado no Acórdão 1.733/2009 - TCU - Plenário:
155
Ver também TCU: Acórdão nº 749/2010, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 16 abr. 2010; Acórdão nº 1.200/2010, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer. DOU , 04 jun. 2010; e Acórdão nº 1.338/2010, 1.338/ 2010, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer. DOU , 17 jun. 2010.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
“1. A previsão normativa que autoriza à Administração exigir do contratado acréscimos e supressões até os limites estabelecidos nos §§1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/1993 8.66 6/1993 não lhe legitima agir contrariamente aos princípios que regem a licitação pública, essencialmente o que busca preservar a execução contratual de acordo com as características da proposta vencedora do certame, sob pena de se ferir o princípio constitucional constit ucional da isonomia; referido comando legal teve como nalidade única viabilizar correções quantitativas do objeto licitado, conferindo certa exibilidade ao contrato, mormente em função de eventuais
erros advindos dos levantamentos de quantitativos do projeto básico.
2. Os limites mencionados nos §§1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/1993 8.6 66/1993 devem ser vericados, vericados,
separadamente, tanto nos acréscimos quanto nas supressões de itens ao contrato, e não
pelo cômputo nal que tais alterações (acréscimos menos decréscimos) decréscimos) possam provocar na equação nanceira do contrato”. [...]
A mencionada decisão paradigma ainda esclarece em seu item 9.10.2: “I - tais limites não se referem ao saldo dos acréscimos menos os decréscimos, mas ao total tanto dos acréscimos quanto dos decréscimos; II - para se efetuar o cálculo do valor possível a ser aditado, deve-se, além de atualizar at ualizar o valor inicial do contrato, atualizar também os valores dos aditivos já efetuados; III - o valor encontrado considerando a atualização do contrato se refere ao valor possível de ser aditado na data em questão, mas, para se efetuar e fetuar os aditivos a preços iniciais, devese deacionar o valor encontrado até a data-base”.
O Acórdão nº 1.203/2011-Plenário, alegado nas razões recursais, não socorre à pretensão do recorrente, pois o referido aresto não nã o armou que o saldo líquido de acréscimos acréscimo s menos supressões contratuais seja critério admitido para atender os limites de aditivo xados
no art. 65,§1º, da Lei nº 8.666/1993. Ao contrário, o voto condutor do Auditor Weder de Oliveira deixou claro que os aditivos contratuais não devem ser feitos sobre o valor líquido da planilha do contrato original, com o desconto de eventuais supressões de itens de serviços julgados desnecessários, mas, sim, sobre o formato integral da avença inicial. Com a mesma ênfase, o Relator afastou precedente apontado pelos responsáveis do DNIT, alusivo ao Acórdão nº 2206/2006 - Plenário, supostamente utilizado como referência metodológica para considerar a base de cálculo de aditivos com o expurgo de eventuais supressões de serviços. Sua Excelência explicitou que, naquele aresto, buscou-se, apenas, corrigir a inclusão de itens de trabalho em e m duplicidade na planilha do contrato original. Dessa maneira, os itens de trabalho que se encontravam em bis in idem , naqueles autos, devem ser retirados da base de cálculo para apuração do limite legal de aditivo. Essa situação especíca não se amolda ao argumento defendido pelo apelante, segundo o
qual a base de cálculo de apuração de alterações contratuais deva expurgar as supressões de itens de serviços do contrato original, consideradas desnecessárias, pois tal modus operandi tem o condão de distorcer os limites legais para mudança da avença e levar à desguração do seu objeto.
Ainda sobre o Acórdão nº 1.203/2011-Plenário, brandido pela defesa do recorrente, o Tribunal afastou a ocorrência apontada pela equipe de auditoria quanto à possível extrapolação do limite de aditivo a que alude o art. 65, §1º, da Lei nº 8.666/1993, 8.666/1993 , pois não havia provas sucientes para conrmar essa ocorrência.
A ausência de materialidade que comprovasse esse suposto ilícito não implica o reconhecimento genérico, por parte deste Tribunal, da legitimidade da extrapolação dos limites legais de celebração de aditivos, ao contrário do que apregoa o recorrente. Pelas razões técnicas e jurídicas aduzidas neste voto, não haveria outra solução que negar provimento ao recurso em apreço por ser lídima e escorreita a deliberação vergastada. Acorrem, contudo, mais de cem situações concretas, relativas a contratos em plena vigência, relativamente às quais a aplicação imediata da deliberação ora fustigada poderá implicar a interrupção dos contratos. É para esse fato que chamo a atenção do Plenário.
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Estando os autos em meu gabinete, recebi em audiência as atuais instâncias máximas e consultivas do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte, representadas pelo Diretor-Geral do DNIT, General Jorge Hernesto Fraxe, pelo Diretor de Infraestrutura Infraestrutu ra Rodoviária, Sr. Roger da Silva Pêgas, Pêgas, pelo Coordenador-Ger Coordenador-Geral al de Concessão Rodoviária, Sr. Elói Palma Filho, e pela Gerente de Projeto e Assessora do Diretor-Geral Diretor-Geral do DNIT Sra. Sílvia Schmi, que, em conjunto, narraram a atual situação e a gravidade que ela apresenta. Na ocasião, apesar de o DNIT haver manifestado sua contrariedade em recurso, recurso, os diretores dignaram-se a cumprir o cerne da determinação exarada pelo Tribunal de Contas da União nos moldes delineados no Acórdão nº 591/2011-Plenário. A autarquia ao adotar o entendimento do Tribunal, manifesta o desejo de observar as alterações contratuais previstas no art. 65 da Lei nº 8.666/1993, para considerar as reduções ou supressões de quantitativos, de forma isolada, isolada , ou seja, o conjunto de reduções e o conjunto de acréscimos sempre calculados sobre o valor original do contrato, aplicando a cada um desses conjuntos, individualmente e sem nenhum tipo de compensação entre eles, os limites de alteração estabelecidos no dispositivo legal. Entretanto, o Diretor-Geral do DNIT, acompanhado de sua equipe, manteve a discordância apenas quanto à imediata aplicação da determinação aos contratos vigentes, em razão de que a rápida realização das alterações contratuais, disciplinadas pelo art. 65 da Lei nº 8.666/1993, nos vários ajustes em curso, nos moldes denidos pelo referido diploma legal e pelo TCU, provocará a imediata paralisação de cerca de 100 obras rodoviárias, haja vista a necessidade de rescindir as avenças administrativos, readequar todos os respectivos projetos básicos e promover novos procedimentos licitatórios com todos os trâmites burocráticos a eles inerentes. Sem declinar do cumprimento dos ditames constitucionais e normativos que regem a licitação, sobretudo o princípio da isonomia e o imperativo da seleção e manutenção propostas técnica e economicamente vantajosas ao Erário, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, em sua nova gestão, propõe-se a observar rigorosamente as decisões desta Corte de Contas, destacando o rme propósito de dotar aquela autarquia federal de órgão interno especializado na elaboração de projetos básicos consistentes e atualizados, provendo ao novo setor os recursos técnicos e humanos necessários. Porém, a apelante clama pela atenção do E. Tribunal para o risco iminente de haver paralisação paralisaç ão de serviços e de obras relevantes em curso, a comprometer o interesse público quanto à segurança das rodovias federais e ceifar vidas de cidadãos que diariamente trafegam por esse modal de transporte. Como fundamento de seu novo pedido, o recorrente acosta aos autos balanço do estágio dos cronogramas físico e nanceiro de alguns contratos ativos de empreendimentos importantes, cujas prováveis rescisões, ante a aplicação imediata da medida propugnada por esta Corte de Contas, poderá causar danos imponderáve imponderáveis is ao interesse público. Com exemplo, o quadro demonstrativo abaixo evidencia a situação de alguns contratos relevantes, relevant es, grande parte dos quais em avançado estágio de implementação: [...] Em síntese, requer, o DNIT, a adoção da modulação temporal dos efeitos da deliberação guerreada, para alcançar os futuros contratos que vierem a ser celebrados por aquela autarquia federal. De fato, a problemática apresentada pelo novo Diretor-Geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte, relativa ao quadro atual das rodovias brasileiras, é extremamente delicada delicada e requer pronta solução desta Corte de Contas, a m de prevenir que o rigor da lei, em sua literalidade, venha a contrapor-se ao interesse público primário de continuidade de serviços importantes, bem como a manutenção das condições de trafegabilidade de importantes rodovias federais. Entendo que a solução deve advir da conciliação do princípio da legalidade e da supremacia do interesse público, neste caso revelado pela incolumidade e integridade física de milhares de pessoais que fazem uso diário dos modais rodoviários de propriedade da União.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
De fato, não haveria como a decisão do TCU proporcionar, em vista de louvável objetivo de legalidade, a paralisação de mais de cem contratos em andamento, sem antes proceder ao juízo de adequação da interpretação em vista da atual situação de fato. Nesse diapasão, proponho dar provimento parcial ao Pedido de Reexame, a m de alterar a determinação contida no subitem 9.2 do Acórdão nº 749/2010-Plenário para os seguintes termos: “9.2. determinar ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes que, nas futuras contratações celebradas a partir da data de publicação deste Acórdão no Diário Ocial da União, passe a considerar, para efeito de observância dos limites de alterações alter ações contratuais previstos no art. 65 da Lei nº 8.666/1993, as reduções ou supressões de quantitativos de forma isolada, ou seja, o conjunto de reduções e o conjunto de acréscimos devem ser sempre calculados sobre o valor original do contrato, aplicando-se a cada um desses conjuntos, individualmente e sem nenhum tipo de compensação entre eles, os limites de alteração estabelecidos no dispositivo legal;” Essa proposta de provimento parcial não signica “salvo conduto” para que a unidade jurisdiciona jurisd icionada, da, a seu tala talante, nte, promo promova va alte alteraçõ rações es dos cont contratos ratos ativo ativoss que venham desvirtuar os respectivos objetos e solapar os princípios que regem a licitação pública. Para tanto, faz-se necessário determinar ao DNIT que, em cada caso especíco abrangido por essa solução temporária e intertemporal, os aditivos que vierem a ser celebrados deverão ser previamente justificados quanto à sua pertinência e conformidade às características e diretrizes fundamentais estabelecidas no projeto básico, registrando a fundamentação desses motivos nos respectivos processos administrativos, disponíveis para scalização pelos órgãos de controle. Tal determinação não extrapola o âmbito de devolução do recurso, porquanto tem natureza cogente e é ínsito à matéria em análise. (TCU. Acórdão nº 2.819/11, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 09 nov. 2011)
Por m, vale a observação do TCU no sentido de que: 3. A elaboração de projeto básico deciente, a celebração de aditivos contratuais que impliquem radical modicação do objeto acordado, com a conseqüente necessidade de adaptação de projetos anteriormente executados conguram grave infração a comandos contidos na Lei nº 8.666/1993 e justicam a apenação dos respectivos responsáveis. 4. A atuação insatisfatória de técnicos (engenheiros e consultores jurídicos) que tenham contribuído para a consumação de irregularidades como as apontadas no item anterior, justica a apenação desses responsáveis, condicionada, porém, à prévia instauração de contraditório, a m de garantir ampla defesa a esses agentes; 5. A vericação vericação de que, ordinariamente, ordinariament e, a investigação da responsabilidade por atos ilícitos relacionados especialmente com a elaboração de projeto básico e de orçamento e com a revisão dos respectivos orçamentos de obras conduzidas pela Infraero se limita aos dirigentes máximos da entidade justica a expedição e xpedição de orientação às Unidades Técnicas do Tribunal, a m que se estenda tal avaliação a todos os agentes que tenham contribuído de alguma forma para a consumação das irregularidades. (TCU. Acórdão nº 2006/06, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 06 nov. 2006)
10.14.4 Problemas em relação a preços A matéria afeta a preços de d e serviços aditivados é a que mais desperta discussão disc ussão no âmbito do TCU. É pacíco o entendimento de que “os editais devem conter critérios de aceitabilidade de preços unitários e global, com c om a xação de preços máximos, tendo
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por referência os preços de mercado e as especicidades, devidamente justicadas,
do objeto licitado” (TCU. Acórdão nº 1.772/06, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 29 29 set. 2006); contudo, é importante a denição de procedimentos para os agentes
públicos caso o edital não tenha contemplado essa diretriz. Com efeito, “pode ocorrer na contratação de obras públicas, em regime de empreitada por preço unitário, que haja determinados itens com preços superfaturados, embora o preço global da obra seja compatível com o de mercado. Esses itens superfaturados, no decorrer da execução da obra, podem ter os seus quantitativos aumentados mediante aditivos contratuais — é o chamado jogo de planilha. Assim, o custo global da obra ca em desacordo com o de mercado, arcando a União com
o prejuízo” (TCU. Decisão nº 1.090/01, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 24 jan. 2002). Nesses casos, o agente público deve incorporar todas toda s as precauções na celebração de aditivos, conforme avaliação do TCU:
24. Em terceiro lugar, estão presentes na situação examinada pelo Acórdão 1.842/2003 todos os pressupostos usualmente considerados necessários por este Tribunal para se caracterizar a ocorrência do “jogo de planilha”: licitação processada sem a denição e
o emprego de critérios efetivos de aceitabilidade de preços unitários; adjudicação pelo menor preço global; existência, no orçamento contratado, de serviços com sobrepreço e de outros com subpreço, que se compensam na análise da compatibilidade do preço global; alterações quantitativas posteriores, por meio de aditivos, em decorrência de deciências ou insuciências do projeto básico, que privilegiam serviços com sobrepreço em detrimento
dos com subpreço. Todas essas circunstâncias estão evidenciadas nas diversas análises que foram feitas no decurso do processo. 25. Ademais, não é necessário se demonstrar a conduta dolosa do agente público ou do contratado beneciado para se caracterizar a ocorrência do “jogo de planilha”. A
responsabilidade civil decorre de condutas dolosas e culposas, stricto sensu , consoante responsabilidade o esta belecido pelos arts. 186, 18 6, 187 e 927 do Código Civil. É dever do gestor público públic o zelar para que as condições contratuais não se tornem prejudiciais ao erário. Havendo vontade deliberada ou não de beneciar indevidamente o contratado, deve o gestor
ser responsabilizado responsabilizado por seus atos, omissivos ou comissivos, dolosos ou culposos, que contrariem o interesse público e provoquem prejuízo ao erário. A contratada não pode beneciar-se beneciar -se de ganhos exorbit exorbitantes antes e ilegítim ilegítimos os a custa do sacrifíc sacrifício io de recurs recursos os públicos públicos,,
devendo ser solidariamente responsabilizada, consoante estabelece o art. 16, §2º, alínea b, da Lei Orgânica deste Tribunal. Tribunal. (TCU. Acórdão nº 1.650/06, Plenário. Rel. Min. Valmir Valmir Campelo. DOU , 15 set. 2006)
A linha a ser adotada, tanto pelos agentes responsáveis pela execução, quanto pelo controle “em contrato inicialmente equilibrado, equil ibrado, que sofreu aditivos, deve pautar-se, prioritariamente, pela busca da manutenção da vantagem obtida pela Administração na contratação original” (TCU. Acórdão nº 865/06, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU ,
09 jun. 2006). A preocupação da scalização deve ser evitar o pagamento de
serviços aditivados, sejam novos ou estabelecidos no contrato inicial, com preços elevados. A FIGURA 10.e resume os procedimentos básicos a serem observados na condução de aditivos de preços de serviços.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
Aditivos Preços & custos
Serviços já previstos
Ok
Cuidado com jogo de planilha
Serviços novos
Já existem insumos no original
Insumos novos
Aproveitar nas composições
Usar a técnica orçamentária
Atentar para o desconto original fornecido pela empresa na licitação
FIGURA 10.e - Procedimentos básicos para a denição de aditivos de preços
A respeito do tema, cabem as seguintes observações ao órgão ou entidade: a) Com o m de evitar a realização de aditamentos contratuais viciados, que inclua,
no contrato que vier a ser celebrado, regra dispondo sobre a obrigatoriedade de adoção de preços unitários condizentes com a prática do mercado, caso se faça necessária a celebração de termos aditivos versando sobre inclusões de novos itens ou sobre acréscimos de quantitativos de itens da obra, facultando-lhe, porém, na hipótese, lançar mão dos valores de referência constantes da tabela Sinapi (TCU. Acórdão nº 1.600/03, Plenário. Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha. DOU , 07 nov. 2003); b) Ante a falta de estipulação de critérios de aceitabilidade de custos unitários e com vistas a se evitar a orquestração de “jogo de planilha”, caso sejam rmados termos aditivos ao contrato, [...] efetue alterações de quantitativos
ou inclusões de serviços não pelos valores praticados no contrato mas pelos custos mais vantajosos para a Administração Pública dentre os indicados no orçamento-base da licitação e os constantes na tabela Sinapi (TCU. Acórdão nº 2.469/07, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 22 nov. 2007); c) Na eventualidade de ter sido celebrado termo aditivo que evidencie a manipulação indevida da planilha contratual, em prática denominada de “jogo de planilha”, deverá ser exigida a restauração do desconto percentual ofertado
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inicialmente pela licitante vencedora, a m de manter as condições efetivas da proposta e preservar a vantagem do contrato e, se for o caso, anulado o termo aditivo modicador das condições originais (TCU. Acórdão nº 355/07, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 16 mar. 2007). Vale lembrar que, na aprovação dos preços de serviços novos, deverá ser vericada a manutenção dos valores dos insumos pertencentes à composição de serviços já contratados, bem como a pertinência relativa de coeciente de produtividade. O Decreto nº 7.983/13, a exemplo das leis de diretrizes orçamentárias de anos anteriores, trouxe diretriz clara a respeito da necessidade de manutenção do equilíbrio das condições econômicas e nanceiras pactuadas, em seu art. 14, ao exigir que “a diferença percentual entre o valor global do contrato e o preço global de referência não poderá ser reduzida em favor do contratado em decorrência de aditamentos que modiquem a planilha orçamentária”. Vale, entretanto, a ressalva feita no parágrafo único de que “em caso de adoção dos regimes de empreitada por preço unitário e tarefa, a diferença a que se refere o caput poderá ser reduzida para a preservação do equilíbrio econômico-nanceiro do contrato em casos excepcionais e justicados, desde que os custos unitários dos aditivos contratuais não excedam os custos unitários do sistema de referência utilizado na forma deste Decreto, assegurada a manutenção da vantagem da proposta vencedora ante a da segunda colocada na licitação”. A orientação legal tem sido observada nas decisões do TCU, com determinações para que o responsável “ao realizar o aditivo de aumento de quantitativos, mantenha o valor do desconto ofertado pela contratada no preço global inicialmente ajustado” (TCU. Acórdão nº 1.120/2010, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU, 1º jun. 2010; ver também TCU. Acórdão nº 2.654/2012, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 03 out. 2012). A análise do caso a seguir ilustra a questão: 156
De acordo com o referido dispositivo legal, já transcrito neste voto, a denição dos preços de serviços novos não contemplados na planilha orçamentária original da avença dependerá de prévio acordo entre as partes, uma vez respeitados os limites legais de aditamento estipulados no parágrafo primeiro do mesmo artigo 65. A interpretação que mais harmoniza o alcance e sentido do referido dispositivo legal com as demais exigências do ordenamento jurídico (condições efetivas da proposta denidas ao tempo da licitação; parametrização dos preços aos sistemas ociais de custos vigente da data base dos contratos, vinculação ao instrumento convocatório) é a de facultar às partes a livre negociação dos preços dos serviços novos, desde que não extrapolem o limite máximo de preços referenciais estimados pela Administração com base na composição dos custos unitários do Sistema SICRO vigentes à época da licitação, acrescidos da taxa de BDI referencial. Reforça a convicção da obrigatoriedade de os preços resultantes dos aditivos preservarem o equilíbrio da equação econômico-nanceira original estabelecida à época da licitação, a exigência contida, não somente no parágrafo 6º do artigo 109 da Lei 11.768, de 18/8/2008 (LDO 2009), em vigor ao tempo do torneio licitatório, como o artigo 125, § 5º, inciso I, da Lei 12.465, de 12 de agosto de 2011 (LDO para o exercício de 2012), vigente à época da aprovação dos termos aditivos questionados. Saliento que tais dispositivos legais aplicam-se plenamente aos contratos de obras públicas sob regime de empreitada por preço unitário, caso das avenças em análise:
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Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 42, §7º, do Decreto nº 7.581/11.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
“Art. 125. O custo global de obras e serviços de engenharia contratados e executados com recursos dos orçamentos da União será obtido a partir de composições de custos unitários, previstas no projeto, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes no Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil - SINAPI, mantido e divulgado, na internet , pela Caixa Econômica Federal e pelo IBGE, e, no caso de obras e serviços rodoviários, à tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias - SICRO, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de construção civil. (...) § 5o Ressalvado o regime de empreitada por preço global de que trata o art. 6º, inciso VIII, alínea “a”, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993: I - a diferença percentual entre o valor global do contrato e o obtido a partir dos custos unitários do sistema de referência utilizado não poderá ser reduzida, em favor do contratado, em decorrência de aditamentos que modiquem a planilha orçamentária ;” (grifei)
Ora, a manutenção do desconto global do contrato em face de aditamentos que alterem a planilha orçamentária há de ser aferida com base no sistema ocial de custos unitários
em vigor ao tempo da licitação. Isso porque a diferença percentual originária entre o valor global da avença e o obtido pelo sistema referencial de preços, cuja manutenção é exigida por lei, foi obtida na época do torneio licitatório. A utilização de tabelas de preços referenciais em voga à época da celebração aditamentos poderá distorcer o referido percentual original de desconto para mais ou para menos, com risco de prejuízo tanto para Administração como para o próprio contratado, na medida em que o novo paradigma de preços poderá contemplar alteração custos dos serviços e obras não necessariamente coincidentes com aqueles vericados ao tempo do procedimento
licitatório. Vê-se, assim, que a parametrização dos preços unitários de serviços resultantes de aditivos ao Sistema SICRO vigente na época da licitação e ao BDI referencial impõe-se como necessidade de assegurar a segurança jurídica das relações contratuais e o correto balanceamento da equação econômico-nanceira.
Dessa forma, é irrelevante o argumento de a nova metodologia adotada pelo DNIT para apuração de preços de serviços novos em aditivos, descrita no Ofício 23/2013-CGCIT/ DIREX/DNIT, ter vigorado a partir de junho de 2012, após a celebração dos aditamentos questionados pela auditoria. Pelas razões expostas neste voto, a manutenção das condições efetivas da proposta delineadas ao tempo do certame licitatório, mesmo em face de termos aditivos que acresçam itens novos de serviço, é inerente ao regime jurídico dos contratos administrativos. Como demonstrou a Unidade Técnica, nenhum dos arestos colacionados pelos defendentes abona a tese de o Tribunal adotar, como regra geral, a data base do período dos aditamentos, para denição dos preços referenciais dos serviços novos de termos
aditivos. As deliberações da defesa referem-se a situações excepcionais, derivadas do largo período havido entre a realização do procedimento licitatório e o início da execução das obras, provocado por paralisações determinadas pela Administração e irregularidades identicadas pelo TCU, ou mesmo de anomalias no projeto básico que justicariam a
adoção dos preços vigentes ao tempo do começo da realização do empreendimento. Nenhuma daquelas circunstâncias excepcionais se adequa ao caso, porquanto o início das obras de implantação e pavimentação da BR-448/RS não sofreu solução de continuidade de longo curso que pudesse distorcer a estrutura de preços referenciais da data base da licitação. Nesse sentido, são copiosos os precedentes deste Tribunal que exigem a limitação dos preços unitários de serviços novos constantes de Termos Aditivos aos preços unitários referenciais apurados com base em parâmetros do Sistema de Custos Rodoviários, acrescidos da taxa de BDI do orçamento base, vigentes à época da licitação. Cito como exemplos os Acórdãos 1.874/2007, 2.152/2010, 1.922/2011, 1.923/2011, 1.379/2012, 1.220/2013,
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2065/2013 e 2.440/2014, todos do Plenário, transcritos no Relatório que fundamenta este acórdão. Além da obrigatoriedade de os preços unitários dos serviços aditivados observarem os limites corretos dos valores de referência da Administração, deveria ser mantida, nos aditamentos, o mesmo percentual de desconto entre o valor global do contrato original e o obtido a partir dos custos unitários e BDI do Sistema SICRO à época da licitação. Ao revés do que defendem os consórcios construtores, a manutenção do desconto da proposta original não está condicionada a prévia extrapolação dos preços unitários referenciais da Administração pelos valores do termo aditivo.
Outra sugestão interessante do TCU a órgão público, quando a licitação se processar em lotes, é que na “inclusão de novos serviços, observe o valor médio de serviços similares presentes nos demais lotes da mesma licitação, em atendimento ao que determina o Acórdão nº 2013/2004 - TCU - Plenário, cuidando, ainda, de observar o disposto no §6º do art. 109 da Lei nº 11.768/2008, no sentido de que, no que se refere ao valor total contratado, seja mantido o percentual de desconto oferecido no certame licitatório” (TCU. Acórdão nº 1.754/2013, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 18 jul. 2013). Segundo o Tribunal, nos casos em que o contratante perceber a mudança de metodologia de execução de determinado serviço especicado no orçamento ou no contrato, e a realmente empregada na obra deve proceder aos necessários ajustes: A execução de alguns serviços pelos consórcios contratados se diferencia, de maneira signicativa, do modo pelo qual foram concebidas as respectivas composições de custos unitários. Nesse caso, a mudança signicativa na metodologia de execução do serviço implicaria, na realidade, na execução de serviço diferente do contratado. Essa diferença deve ser retratada na composição de custo do serviço. Além disso, foram detectadas outras inconsistências, como o fato de a produtividade da composição de custo de alguns serviços se mostrar contraditória em relação à própria memória de cálculo do projeto. Observei, ainda, superestimativa de quantidades de serviços no orçamento da obra, implicando sobrepreço nos contratos analisados. O argumento, por diversas vezes trazido pelas partes, de que só seriam medidos os serviços efetivamente executados, não pode ter o condão de proteger ou abrandar orçamentos inados nas obras públicas, que possibilitem a extrapolação do limite dos termos aditivos exigido pela Lei 8.666/1993, nem ser condizente com projetos falhos e que demandam a necessidade de diversas readequações durante a obra. Todas essas inconsistências são resultado de falhas no orçamento do projeto básico (considerado na licitação) e ocasionaram as irregularidades suscitadas no presente processo. Portanto, faz-se necessária uma readequação/correção do projeto contratado, de modo a que o preço unitário pago pela Administração retrate o processo construtivo empregado na execução dos serviços questionados e as quantidades contratadas reitam as estritamente necessárias para a realização da obra. Essa readequação, tal como proposta, encontra amparo nos artigos 6º, incisos IX e X; 12, incisos III e V; 65, inciso I, e 66 na Lei 8.666/1993, bem como no princípio da eciência da Administração Pública, estabelecido no art. 37 da Constituição Federal. (TCU. Acórdão nº 2.872/2012, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 05 nov. 2012)
A Corte de Contas admite, ainda, “nos casos excepcionais em que a licitação revelou-se altamente competitiva, capaz de traduzir com delidade o estado de mercado
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
em relação a uma determinada obra, xar, como referência de preços para efeitos da avaliação futura de alterações contratuais que modiquem quantitativos de serviços
já existentes na planilha contratual, a média dos preços dos serviços constantes das propostas válidas oferecidas na licitação” (TCU. Acórdão nº 702/08, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 25 abr. 2008). Por m, cabe ao gestor, “quando da necessidade de rmar aditivos contratuais,
cujo objeto contenha serviços não contemplados inicialmente na licitação e cujos preços sejam de difícil comparação com os de mercado, preceder da contratação dos aditivos a respectiva análise do orçamento detalhado desses serviços, em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários, em consonância com art. 7º, §2º, inciso II, da Lei 8.666/93” (TCU. Acórdão nº 262/06, 2ª Câmara. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 24 fev. 2006).
10.14.5 Problemas em relação a prazos de execução A manutenção dos prazos pactuados para a entrega da obra é um dos grandes desaos de todos os envolvidos em sua execução: gestores, scais e empreiteiras.
A origem dos problemas está na contratação com base em projeto de má qualidade. A necessidade de ajustes dos serviços no decorrer do empreendimento, quantitativos e qualitativos, ocasionam atrasos signicativos no cronograma planejado.
Em relação a esses ajustes, com destaque para as falhas recorrentes, o TCU tem formulado diversas orientações a gestores, como, por exemplo, “não mais se admite a alteração de contrato para inclusão de serviço de remoção de bolsões de solos moles dos terrenos de fundações de rodovias e outras obras públicas, por não se mostrar factível que a existência desses bolsões já não tenha sida detectada antes da elaboração do projeto da obra, podendo esta Corte, em casos em que constatem ocorrências dessa natureza, determinar a realização de procedimento licitatório em separado, sem prejuízo da apenação dos responsáveis e projetistas que, de uma forma ou de outra, vierem a dar causa a esse tipo de irregularidade” (TCU. Acórdão nº 1.033/08, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 06 jun. 2008). Além de irregularidades no projeto, outras causas costumam impactar no andamento dos serviços: contingenciamento de recursos, ausência de regras claras no Edital, refazimento de serviços por falhas de execução, problemas nanceiros das
empresas, e novas necessidades da Administração. O que demanda atenção é que, na maioria desses cenários, a Administração não conta com um Plano de Gerenciamento de Riscos para atuar de forma tempestiva na solução das questões. Nesse plano, devem estar registrados previamente ao início do empreendimento: possíveis acontecimentos, suas probabilidades e impactos, e as potenciais medidas a serem adotadas. Assim, a resposta será rápida e amenizará de forma signicativa os reexos no tempo de execução.
Oportuno tratar do problema relativo a chuvas, visto que tem sido comumente alegado pelas empresas para pedidos de prorrogação de prazos. O TCU também já se posicionou a respeito: Mas em uma análise mais cuidadosa, no caso de chuvas ordinárias, não se trata de eventos imprevisíveis e, assim, não são passíveis de enquadramento nos ditames do
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art. 65, II [...]. Então, o efeito das chuvas ordinárias no prazo de obra execução da obra, já que constituem-se eventos plenamente previsíveis, devem ser já considerados no cronograma físico-nanceiro dos editais de licitação e, em razão disso, do prazo constante dos contratos. Portanto, segundo estas premissas, chuvas ordinárias e previsíveis não ensejam repactuação do valor dos contratos em razão da suposta dilatação do prazo dos empreendimentos. (TCU. Acórdão nº 396/08, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 14 mar. 2008)
Por m, não se pode esquecer a relação entre preços e prazos, principalmente em face da inuência dos custos indiretos no valor total da obra. Prorrogações não previstas podem ocasionar, por exemplo, incremento de despesas administrativas que serão repassadas ao valor nal do contrato; enquanto reduções de prazos previstos geram, em regra, decréscimos dessas despesas. O TCU se depara frequentemente com casos desse gênero: V. Impactos no orçamento contratado da redução no prazo de execução da obra. 50. Restou vericado nos presentes autos que mediante o 1º Termo Aditivo ao Contrato n. [...] a data de nalização das obras foi antecipada de 13/12/2009 para 30/05/2008. Contudo, não foi efetuado qualquer ajuste no orçamento em decorrência dessa redução vericada no prazo de execução do empreendimento. 51. Consoante bem ressaltou a Secex/PR [...], há várias despesas que variam conforme o número de meses em que os serviços são executados, sendo necessário proceder a ajustes em caso de alterações nos prazos inicialmente previstos. 52. Analisando a composição da taxa de BDI da Construtora [...] verico que dentre as despesas gerais, há gastos com consumo de energia e água do canteiro que são orçados por mês, bem como itens com compõem despesas com a administração local do empreendimento que são orçados por homem/hora e que sofrem impactos em decorrência do prazo previsto para nalização da obra.
10.15 Alterações do valor do pagamento Existem cinco formas básicas de pagamento em valor nal total diferente do valor calculado com base na proposta apresentada na licitação pela contratada: reajustamento; atualização; compensação ou penalização; descontos; e recomposição de preços. A lei de licitações, em seu art. 65, §8º, estabelece os casos que não são considerados como alteração, ou seja, não se situam nos limites legais de acréscimos estabelecidos de 25 ou 50% e não precisarão de termo aditivo: A variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio contrato, as atualizações, compensações ou penalizações nanceiras decorrentes das condições de pagamento nele previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suplementares até o limite do seu valor corrigido, não caracterizam alteração do mesmo, podendo ser registrados por simples apostila, dispensando a celebração de aditamento.
10.15.1 Reajustamento e repactuação O reajustamento tem como principal objetivo assegurar que os preços contratuais sejam compensados em função de variações dos preços dos insumos
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(material, mão de obra e equipamentos) que ocorrem em determinado período, ou seja, nada mais é do que a atualização do poder aquisitivo da moeda em face da inação setorial. Os conceitos básicos desta questão foram apresentados na seção 5.4
do Capítulo 5. Para a atualização dos preços é geralmente utilizada a fórmula:
sendo, Pn - preço no mês desejado Po - preço relativo à proposta inicial In - índice do mês desejado para atualização Io - índice do mês da proposta inicial
Algumas vezes, em face da complexidade técnica da obra e da existência de insumos de diversos setores, a fórmula de cálculo é denida por meio da ponderação de diversos índices de maneira a reetir com melhor exatidão a variação dos preços. Em épocas passadas de alta inação, o reajustamento era calculado de forma mensal. Contudo, com a recente estabilização dos preços, a Lei nº 10.192/2000 xou a
impossibilidade de reajuste ou correção monetária com periodicidade inferior a um ano, bem como a data inicial para contagem do prazo aquela limite para apresentação da proposta ou do orçamento a que essa se referir. Ainda assim, o TCU determina a órgão ou entidade que “ em licitações que envolvam recursos federais, faça constar nos editais e nos respectivos contratos, mesmo quando o prazo de duração do ajuste for inferior a 12 (doze) meses, cláusula que estabeleça o critério de reajustamento dos preços, indicando expressamente no referido instrumento o índice de reajuste contratual a ser adotado, nos termos do disposto nos arts. 40, inc. XI, e 55, inc. III, da Lei nº 8.666/93” (TCU. Acórdão nº 73/2010, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 29 jan. 2010). 157
Denidas as regras no edital, não serão aceitos reajustamentos não previstos, caso
atrasos não tenham ocorrido por culpa da Administração, conforme pode se depreender do Acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região em caso concreto de valor xo estipulado para execução da obra:
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“Art. 2º É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração
igual ou superior a um ano. §1º É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano. §2º Em caso de revisão contratual, o termo inicial do período de correção monetária ou reajuste, ou de nova revisão, será a data em que a anterior revisão tiver ocorrido. Art. 3º Os contratos em que seja parte órgão ou entidade da Administração Pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, serão reajustados ou corrigidos monetariamente de acordo
com as disposições desta Lei, e, no que com ela não conitarem, da Lei nº 8.666/93. §1º A periodicidade anual nos contratos de que trata o caput deste artigo será contada a partir da data limite para
apresentação da proposta ou do orçamento a que essa se referir.
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1. Tendo a parte autora concordado que o valor relativo à obra seria xo e não reajustável, não é admissível o pedido de reajustamento da quantia previamente estabelecida. 2. A prorrogação de prazo para o término das obras não ocorreu por culpa da Administração, pois tal pedido partiu do próprio demandante. 3. O art. 57 da Lei nº 8.666/93 estabelece as hipóteses em que se admite a prorrogação dos contratos e o reajuste dos valores xados, como forma de manter o equilíbrio econômiconanceiro. A alegação de que adversidades climáticas seriam a causa do atraso das obras
não se enquadra em nenhuma das situações previstas na norma legal. 4. Apelação improvida. (TRF4. Apelação Cível nº 2001.04.01.078680-0/RS, 4ª Turma. Rel. Des. Sérgio Renato Garcia. DJ , 25 jun. 2003)
Cabe aqui um acréscimo referente à diferença entre repactuação e reajustamento: 11. O reajustamento de preços pode ser entendido como o realinhamento do valor contratual em razão da elevação do custo de produção no curso normal da economia, tendo por base índices ou critérios previamente xados em edital, a m de preservar a contratada do processo inacionário. 12. A esse respeito, Marçal Justen Filho (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002, p. 504) assevera que: “[...] o ‘reajuste’ de preços é uma solução desenvolvida a partir da prática contratual pátria. Convivendo em regime de permanente inação, vericou-se a impossibilidade e a inconveniência da prática de preços nominais xos. Com o passar do tempo, generalizou-
se a prática da indexação em todos os campos. A indexação foi encampada também nas contratações administrativas. A Administração passou a prever, desde logo, a variação dos preços contratuais segundo a variação de índices (predeterminados ou não). Essa prática é identicada como ‘reajuste’ de preço. Trata-se da alteração dos preços para compensar (exclusivamente) os efeitos das variações inacionárias. [...]”
13. A Lei 9.069, promulgada em 29.06.1995, ao dispor as regras do Plano Real, determinou a periodicidade anual e a data-base para o reajustamento dos contratos vigentes e futuros, nos seguintes termos: “Art. 28. Nos contratos celebrados ou convertidos em REAL com cláusula de correção monetária por índices de preço ou por índice que reita a variação ponderada dos custos
dos insumos utilizados, a periodicidade de aplicação dessas cláusulas será anual. §1º É nula de pleno direito e não surtirá nenhum efeito cláusula de correção monetária cuja periodicidade seja inferior a um ano. §2º O disposto neste artigo aplica-se às obrigações convertidas ou contratadas em URV até 27 de maio de 1994 e às convertidas em REAL. §3º A periodicidade de que trata o caput deste artigo será contada a partir: I - da conversão em REAL, no caso das obrigações ainda expressas em Cruzeiros Reais; II - da conversão ou contratação em URV, no caso das obrigações expressas em URV contratadas até 27 de maio de 1994; III - da contratação, no caso de obrigações contraídas após 1º de julho de 1994; e IV - do último reajuste no caso de contratos de locação residencial. [...] §5º O Poder Executivo poderá reduzir a periodicidade de que trata esse artigo”. [...]
14. No dia subseqüente à promulgação dessa Lei, foi editada a Medida Provisória 1.053 — reeditada até a de 2.074-72, de 27.12.2000 —, convertida, em 14.06.2001, na Lei 10.192, que trouxe medidas complementares ao Plano Real. O legislador passou a tratar, no tocante ao reajuste, da seguinte forma:
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“Art. 2º É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reitam a variação dos custos de produção ou dos insumos
utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano. §1º É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano. §2º Em caso de revisão contratual, o termo inicial do período de correção monetária ou reajuste, ou de nova revisão, será a data em que a anterior revisão tiver tiver ocorrido. [...]
Art. 3º Os contratos em que q ue seja parte órgão ou entidade da Administração Pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, serão reajustados ou corrigidos monetariamente de acordo com as disposições desta Lei, e, no que com ela não conitarem, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. §1º A periodicidade anual nos contratos de que trata o caput deste artigo será contada a
partir da data limite para apresentação da proposta ou do orçamento a que essa se referir. §2º O Poder Executivo regulamentará o disposto neste artigo”. 15. Antes, porém, da conversão da referida Medida Provisória, foi publicado o Decreto 2.271, de 07.07.1997, que disciplina a contratação contrat ação de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Em seu artigo 5º, passou a admitir a repactuação repact uação dos preços para os contratos que tivessem por objeto a prestação de serviços contínuos — aqueles enquadrados no artigo 57, inciso II da Lei 8.666/1993 e defnidos, pela Instrução
Normativa Mare 18/1997, como “serviços auxiliares, necessários à Administração para o desempenho de suas atribuições, cuja interrupção possa comprometer a continuidade de
suas atividades e cuja contratação deva estender-se por mais de um exercício fnanceiro” — a fm de adequá-los aos novos preços de mercado, desde que: a) previsto no edital; b)
observado o interregno mínimo de um ano; e c) demonstre analiticamente a variação dos componentes dos custos do contrato, devidamente justifcada. 16. Esclareça-se que a fgura da repactuação da maneira abordada surge na vigência
do Plano Real, quando a economia começa a ganhar estabilidade depois de conturbado
período de elevada inação. Foi o mecanismo encontrado pelo Governo para dissociar
a correção dos preços dos contratos de prestação de serviços de natureza continuada de um “gatilho” automático e evitar o retorno das altas inacionárias. Assim, em vez de adotar um percentual eleito pelas partes — índice geral ou setorial, que reita a variação
dos custos dos insumos —, passou-se a exigir uma planilha na qual se demonstrasse analiticamente a efetiva variação dos custos na formação dos preços. (TCU. Acórdão nº 1.563/2004, Plenário. Rel. Min. Augusto Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 06 out. 2004)
Não obstante, o TCU entende correta a utilização do instrumento do reajustamento dos valores em contratos de prestação de serviço de duração continuada em que não há prevalência de mão de obra: 8. Diante de tudo que expõe, o MP/TCU reafrma sua posição de que a repactuação deve
ser a regra a ser aplicada nos casos das contratações de prestação de serviços de natureza continuada, sem restringir a sua adoção aos casos em que haja a prevalência dos custos de mão de obra. Nesse sentido, entende adequada a determinação constante no subitem 9.8.1 do Acórdão, defendendo, assim, o improvimento do recurso e a manutenção, em seus exatos termos, da deliberação anteriormente adotada. 9. A par de concluir pela razoabilidade da tese defendida pelo MP/TCU, que consiste em que “a melhor exegese da norma é a de que o termo “critério de reajuste” não se confunde com a singela fxação de um índice setorial, e que o gestor deve estabelecer sistemática de
revisão dos valores arrimada em um conjunto de critérios, do qual o índice setorial pode ser um dado, não o único, sem descartar a obrigatoriedade de o gestor aferir a adequação em face dos valores de mercado”, pondero pela circunstancial inconveniência de engessar
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a administração em situações que pode ser adequada a adoção de uma ou outra forma, a depender do contrato, de prever cláusulas de efeito similar à repactuação de preços ou revisão com base em índices. 10. Pelo que depreendo não há qualquer afronta ao ordenamento jurídico, quando se fazem faz em presentes em um contrato de serviços de natureza continuada cláusulas que preveem seu reajuste, isso supondo que a vigência do contrato extrapola 12 meses, bem como sua repactuação. Entendimento nessa mesma linha foi adotado por esta Corte de Contas em recentes julgados (Acórdão 54/2012-TCU-Plenário e Acórdão 2760/2012). (TCU. Acórdão nº 3.388/2012, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 12 dez. 2012)
Em relação ao momento em que deve ocorrer a repactuação, é importante estar atento à possibilidade da preclusão lógica, relativa à assinatura de termo aditivo sem questionamento pela empresa dos aumentos celebrados em acordo coletivo, conforme entendimento do TCU: 22. Do mesmo modo, verifco que não ocorreu, na situação em exame, preclusão do direito de solicitar a repactuação do contrato, quando da assinatura do Termo Aditivo Aditivo nº 2/2008, em 1/12/2008, questão não abordada pela unidade técnica, mas relevante para o exame da legalidade da repactuação. 23. Acerca do assunto, cabe destacar que este Tribunal, seguindo votos por mim elaborados no âmbito dos Acórdãos 1.827/2008 e 1828/2008, ambos do Plenário, adotou o seguinte entendimento: “8. A partir da data em que passou a viger as majorações salariais da categoria profssional que deu ensejo à revisão, a contratada passou deter o direito à repactuação de preços. Todavia, ao frmar o termo aditivo de prorrogação contratual sem suscitar sus citar os novos valores pactuados no acordo coletivo, ratifcando os preços até então acordados, a contratada deixou de exercer o seu direito à repactuação pretérita, dando azo à ocorrência ocorrência de preclusão preclusão lógica”. 24. No caso em exame, a Convenção Coletiva de Trabalho que deu ensejo à solicitação de repactuação contratual levada a efeito no Termo Aditivo nº 02/2009 foi assinada em 18/12/2008 (peça 33, p. 32), ou seja, posteriormente à celebração do Termo Aditivo nº 2/2008, em 1/12/2008. 25. Dessarte, concluo que não houve, no presente caso concreto, preclusão do direito de solicitar a revisão dos preços contratuais, de forma que também não ocorreu, na espécie, violação à referida jurisprudência do TCU. (TCU. Acórdão nº 1.601/2014, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 26 jun. 2014)
10.15.2 Atualização O principal objetivo da atualização fnanceira é proteger o contratado de atrasos praticados pela Administração, até mesmo para que não sejam embutidos valores na proposta inicial para fazer frente a esses acontecimentos. O critério para atualização fnanceira deverá estar defnido no edital, consoante exigências do art. 40, inciso XIV, alínea “c”, da lei de licitações, e ser contado no período decorrido entre a data d ata fnal do período de adimplemento de cada parcela até a data do efetivo pagamento.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
10.15.3 Compensação e penalização O atraso na execução de serviços implica elevado ônus à sociedade, que passará maior tempo sem usufruir do empreendimento, além de acréscimos dos custos de scalização. Por esse motivo, a lei de licitações dene como exigência do edital, no art. 40, XIV, “d”, o estabelecimento de regras para compensações nanceiras e penalizações
por eventuais atrasos.
10.15.4 Descontos Outra questão importante relativa ao pagamento refere-se às condições xadas
no edital. A lei estabelece que o pagamento deve ser estipulado em prazo não superior a
trinta dias, contado a partir da data nal do período de adimplemento de cada parcela,
o que faz com que as empresas embutam no valor do BDI de suas propostas custos nanceiros para cobrir o intervalo decorrido até o efetivo pagamento.
Com vistas a evitar a ocorrência dessa previsão de forma danosa à Administração quando ocorre a antecipação do pagamento, a própria lei xa a necessidade de descontos
por eventuais antecipações, consoante art. 40, inciso XIV, alínea “d”. Apesar dessa exigência legal, o desconto, com relativa frequência, não é realizado pelos gestores.
10.15.5 Recomposição O objetivo da recomposição, prevista no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei nº 8.666/93, é assegurar “o equilíbrio entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-nanceiro inicial do contrato”. Contudo, a
própria lei estabelece as condições necessárias para a realização do novo pacto, relativas à ocorrência de: a) fatos imprevisíveis; b) previ previsíve síveis, is, porém de conse consequênc quências ias incalc incalculáv uláveis, eis, retar retardadore dadoress ou imped impeditivos itivos da execução do ajustado; ou c) caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, congurando álea
econômica extraordinária e extracontratual. No Direito Administrativo, essas condições estão relacionadas à chamada “teoria da imprevisão”. Segundo Hely Lopes Meirelles: A teoria da imprevisão consiste no reconhecimento r econhecimento de que eventos novos, imprevistos e imprevisíveis pelas partes e a elas não imputáveis, reetindo sobre a economia ou a execução
do contrato, autorizam a sua revisão para ajustá-lo às circunstâncias supervenientes. É a aplicação da velha cláusula rebus sic standibus aos contratos administrativos, a exemplo do que ocorre nos ajustes privados, a m de que sua execução se realize sem a ruína do
contratado, na superveniência de fatos não cogitados pelas partes, criando ônus excessivo para uma delas, com vantagem desmedida para a outra. 158
MEIRELLES. Direito administrativo brasileiro , p. 250.
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Apesar do detalhamento da recomposição estar previsto no artigo atinente à alteração por acordo das partes, a lei de licitações também prevê, no art. 65, §6º, que no caso de alteração unilateral do contrato que aumente os encargos do contratado, a Administração deverá restabelecer, por aditamento, o equilíbrio econômico-nanceiro inicial. De plano, vale lembrar que a recomposição pode ser solicitada pela empresa, o que acarreta o incremento dos valores contratados, mas também deve ser utilizada pela Administração sempre que circunstâncias permitirem a redução dos custos. A Advocacia Geral da União, por meio da ON nº 22, sustenta que “o reequilíbrio econômico-nanceiro pode ser concedido a qualquer tempo, independentemente de previsão contratual, desde que vericadas as circunstâncias elencadas na letra ‘d’ do inc. II do art. 65, da lei no 8.666, de 1993” (AGU. Orientação Normativa nº 22, de 1º de abril de 2009. DOU ,07 abr. 2009). A principal questão prática que se põe é que não cabe à empresa requerer recomposição no decorrer do contrato, mesmo com estudo atual e detalhado para comprovar que seus preços são inferiores aos de mercado, se o problema relativo aos preços reduzidos advém de estratégia de preços baixos, denominada popularmente de “mergulho”, utilizada para vencer a licitação. Marçal Justen Filho adverte quanto à carga semântica das palavras: Não é desnecessário advertir contra o risco de interpretações literais das expressões equilíbrio e equação. Assim, em primeiro lugar, não se imagine que os vocábulos indiquem uma igualdade econômica em sentido absoluto. Utilizam-se essas palavras para indicar uma relação de equivalência que se poderia qualicar como convencional (para não dizer arbitrária). Signica que, para as partes, a extensão dos encargos assumidos é considerada como equivalente equivale nte à extensão dos benefícios correspondentes. correspondentes. Sob o mesmo enfoque, não há cabimento em armar que está respeitado o equilíbrio quando a empresa não tem prejuízo. Trata-se da aplicação não técnica do vocábulo. Quando se alude a equilíbrio econômico-nanceiro não se trata de assegurar que a empresa se encontre em situação lucrativa. A garantia constitucional se reporta à relação original entre encargos e vantagens. O equilíbrio exigido envolve essa contraposição entre encargos e vantagens, tal como xada por ocasião da contratação. Bem por isso, não há h á cabimento em investigar o equilíbrio da empresa. A situação subjetiva do particular é irrelev irrelevante ante para identicar o conteúdo da equação econômico-nanceira. Cada contratação retrata uma relação jurídica diversa, que reete uma equação especíca e determinada entre encargos e vantagens. Por m, não cabe investigar se a contratação é “equilibrada”, no sentido de produzir lucros satisfatórios e adequados. Tal como acima indicado, o equilíbrio de que se cogita é puramente estipulativo. As partes reputam que os encargos equivalem às vantagens, o que não signica que, efetivam efetivamente, ente, haja um equilíbrio econômico real, material, de conteúdo. 159
O renomado autor complementa a matéria por meio das hipóteses em que não há justicativa para o reequilíbrio econômico-nanceiro: Uma vez vericado o rompimento do reequilíbrio-econômico-nanceiro, o particular deve provocar a Administração para a adoção das providências adequadas. Inexiste
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JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 888.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
discricionariedade. A Administração Administração pode recusar o restabelecimento da equação apenas mediante invocação dos pressupostos necessários. Poderá invocar: - ausência de elevação dos encargos do particular; - ocorrência do evento antes da formulação das propostas; - ausência de vínculo de causalidade entre o evento ocorrido e a majoração dos encargos do contratado; - culpa do contratado pela majoração dos seus encargos (o que inclui a previsibilidade da ocorrência do evento). 160
Se, no caso concreto, houve fornecimento de descontos signicativos em relação
ao preço referencial da Administração, esse abatimento abat imento deve ser mantido durante toda a execução dos serviços, ou seja, será logicamente l ogicamente previsível que durante todo o contrato os preços da empresa estarão inferiores aos de mercado. Por esse motivo, conforme destacado no capítulo que tratou da fase externa da licitação, é muito importante que a comissão deixe assente nos autos todas as diligências que comprovam o valor do desconto originalmente fornecido. O TCU analisou caso concreto que ilustra bem a questão: A segunda falha refere à celebração de termo aditivo com o intuito de acrescer em 25% todos os preços dos itens ainda a serem objeto de medição a partir de 09/09/2009 — perfazendo um total de R$227.424,83. O motivo para tanto seria que “os preços relativos às presentes contratação contrat ação quedaram-se aquém daqueles praticados no mercado”. Assim, a título de reequilíbrio econômiconanceiros, houve a majoração linear dos preços inicialmente pactuados.
A respeito, observo que a matéria é regida pela alínea “d” do inciso II do art. 65 da Lei 8.666/93: “[...] para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos
do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-nanceiro
inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado,
ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, congurando área
econômica extraordinária e extracontratual”. Ou seja, trata-se de hipótese em que se busca o reestabelecimento da relação contratual inicialmente ajustada pelas partes, a qual teria sofrido alteração por álea extraordinária superveniente ao originalmente contratado. A matéria também encontra assento constitucional, quando é armado que no bojo dos
processos licitatórios deve estar assegurada a manutenção das “condições efetivas da proposta” (art. 37, inciso XXI). Nesse sentido são precisas as palavras de Marçal Justen Filho (in Comentários à Lei de Licitações e contratos - 11ª ed. - p. 543):
“O restabelecimento da equação econômico-nanceira depende da concretização de um evento posterior à fórmula da proposta, identicável como causa do agravamento da posição do particular. Não se caracteriza rompimento da equação econômico nanceira
quando a proposta do particular era inexequível”. Entretanto, consoante exposto no relatório, os responsáveis além de não apontarem nenhum fato superveniente à celebração do contrato, expressamente afirmam que JUSTEN FILHO. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , p. 891.
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o suposto problema decorreu de subavaliação dos preços constantes do orçamento efetuado pela Prefeitura e adotado como referência referência para a proposta da empresa. Assim, aparentemente a empresa foi beneciada pelo fato dela, no entender dos gestores, haver apresentado uma proposta desconectada dos preços de mercado. Não há contudo amparo legal para procedimentos da espécie, mesmo que, apenas por argumentar, estivesse estivesse demonstrada a inadequação da proposta aos preços de mercado. Em havendo erro em determinada proposta de empresa licitante, deve ela responder por tanto, rescindindo eventual contrato, por exemplo, e arcando com as consequências daí decorrentes. Não importa que o orçamento base esteja equivocado, pois as licitantes devem elaborar as propostas de acordo com o seu conhecimento do mercado e não de acordo com o conhecimento da Administração. Mais. Tal espécie de de alteração contratual acabaria por descaracterizar o processo licitatório, pois afetaria o princípio da isonomia ao se propiciar uma vantagem à contratada que não era de conhecimento dos demais potenciais licitantes. Violar-se-ia também o princípio da competitividade, competitivid ade, pois, se fosse superior o orçamento base adotado como preço máximo, outras empresas poderiam ter se interessado em participar da licitação. (TCU. Acórdão nº 5.686/2010, 2ª Câmara. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 05 out. 2010)
Por exemplo, não seria razoável situação em que a empresa vencesse a licitação fornecendo o preço de determinado insumo a R$10,00 enquanto o de mercado era R$13,00 e solicitasse, no decorrer do 1º ano, em face do preço de mercado ter subido para R$13,50 (aumento de 8%), um pedido de recomposição de 35% (de R$10,00 para R$13,50) para esse item, com justicativa do desequilíbrio do contrato pelo fato do reajustamento não ser compatível com a variação do preço do insumo. Esse exemplo deixa clara a diferença difer ença entre reajustamento e recomposição, ou seja, enquanto o primeiro tem por objetivo cobrir variações naturais de custos, espelhadas por indicadores, o segundo deve-se a algo imprevisível ou previsível, porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado. Nesse sentido, se manifestou o TRF 3ª Região: i - Não se deve confundir reajuste de preços contratuais com a recomposição da equação econômico-nanceira do contrato. O reajuste congura-se numa previsão inicial dos custos a maior. A obra é estimada em determinada quantia, devendo sobre tal quantia incidir percentuais corretivos corretivos da inação, mantendo-se integro o quantum debeatur. ii - Por conseguinte, o reajuste não visa recompor a equação econômico-nanceira, quando desbalanceada por situações anômalas. Há, tão somente, uma previsão da desvaloriação da moeda, consistindo, portanto, em atualização permanente da mesma. iii - Os juros moratórios devem ser xados nos limites dos arts. 1062 e 1536, §2º do Código Civil. iv - A titulo de correção monetária, deve-se adotar o índice do IPC elaborado pelo IBGE, posto que e o indexador que melhor retrata a corrosão inacionaria ocorrida entre março de 1990 à janeiro de 1991. Precedentes do STJ. v - Apelo improvido. Recurso adesivo provido. (TRF3. Ap. Cível. Cível. Processo nº 95.03.04244395.03.0424 437/SP, 1ª Turma. Rel. Juiz Domingos Braune. DJ , 27 fev. 1996)
Por oportuno, vale lembrar que a avaliação de possível desequilíbrio econômiconanceiro deve ser, em regra, conduzida sob análise global da variação de todos os preços do contrato e não com foco em apenas determinado grupo, consoante análise do TCU:
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
Importa destacar que eventual desequilíbrio econômico-nanceiro econômico-nanceiro não pode ser constatado
a partir da variação de preços de apenas um serviço ou insumo. A avaliação avaliação da equidade do contrato deve ser resultado de um exame global da avença, haja vista que outros itens podem ter passado por diminuições de preço. Diferentemente do alegado pela empresa, em que pesem as diversas modicações no objeto inicialmente licitado, não
restou demonstrado desequilíbrio no contrato, especialmente em face das repactuações procedidas. Devo registrar ainda que eventual desequilíbrio econômico-nanceiro no contrato não
tornaria legítima a ausência da contraprestação de serviços para os quais houve efetivo recebimento por parte da construtora. Se cabível, a solução legalmente possível para a suposta falta de equidade seria a repactuação da avença, e não a inexecução de atividades que já haviam sido pagas. (TCU. Acórdão nº 1.466/2013, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. , 19 jun. 2013) DOU Entretanto, em casos excepcionais, devidamente justicados, o TCU aceita a
análise focada em determinado grupo de insumos:
35. A par dessa discussão metodológica, nenhuma das análises (SeinfraRodovia e Dnit), contudo, denota que as variações identicadas – à exceção dos insumos betuminosos –,
tanto positivas quanto negativas, enquadram-se na álea econômica extraordinária capaz de provocar alteração de contrato visando ao restabelecendo das condições pactuadas na origem, com fundamento no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei 8.666/1993. 36. Somente alguma outra constatação de natureza extraordinária e com potencial de impactar os contratos de forma signicativa é que deveria ser computada, em conjunto
com a reconhecida necessidade de recomposição dos preços dos materiais betuminosos, no cálculo do reequilíbrio econômico-nanceiros dos contratos. E, como vimos, não houve, com relação ao demais insumos, qualquer tendência de aumento ou redução signicativ signicativaa
de preços a ponto de indicar que o cenário seja de desbordamento da álea ordinária (inerente aos riscos do contratado) em direção à álea extraordinária. 37. Assiste razão à SeinfraRodovia ao armar que a análise não deve se furtar da possi-
bilidade bilida de de exist existênci ênciaa de outr outros os insum insumos os cujo compo comportam rtamento ento de preç preços os possa ter demonstrado aumento ou redução atípica, também imprevisív imprevisível, el, que modique o equi-
líbrio contratual de forma acentuada. Por outro lado, data maxima venia , incorreta a assertiva que intende fazer dessa premissa analítica regra absoluta para se promover, na prática, a revisão do contrato com amparo na teoria da imprevisão. 38. Como visto, o exame realizado pelo Dnit evidencia que não houve, dentre os principais insumos em contratos de obras rodoviárias, variações imprevisíveis nos preços dos demais insumos. Logo, não se pode pretender provocar ampla e irrestrita revisão dos preços contratuais a m de se computarem compensações em favor daquela autarquia,
em virtude de reduções de preços de alguns insumos, ou mesmo inclusões de novos itens cujas variações também lhe sejam também t ambém desfavoráveis. 39. Em outras palavras, a análise para demonstração de desequilíbrio econômico-nanceiro
em contrato administrativo não requer que se considerem, como procedimento geral, todas as variações ordinárias nos preços dos insumos contratados – cobertos naturalmente pelos índices de reajustamento da avença –, mas apenas alterações de preços signicativas e imprevisíveis (ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis), capazes de justicar
a aplicação da teoria da imprevisão. 40. A propósito, este Tribunal já se deparou com caso semelhante na análise do Acórdão 3.289/2011-Plenário, quando identicou variação signicativa no preço de um item do
contrato. Na oportunidade, foi determinado ao Dnit que procedesse à “repactuação” – no sentido de “revisão” (ou “recomposição”) – dos contratos em virtude de evento
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imprevisível, concernente à abertura de funcionamento de nova fábrica de cimento mais imprevisível, próxima do local das obras. Esse fato havia permitido o fornecimento do insumo em uma distância menor de transporte, com redução signifcativa no custo (por tonelada) e, por consequência, desequilíbrio desequilíbrio dos contratos em desfavor da União. 41. Logo, entendeu-se viável viá vel exigir providências com vistas ao reequilíbrio das avenças em benefício da da Administração, Administração, com fundamento no art. 65, II, alínea alínea “d”, da Lei 8.666/1993, ante a imprevisibilidade daquele acontecimento. Na espécie, não se cogitou de análise global do comportamento dos demais preços porque não havia indícios de fatores imprevisíveis de ordem análoga que pudessem minimizar o impacto da medida que se impunha à contratada, seja em termos de elevações atípicas de preços ou de eventos inesperados como o que ocorreu. 42. Cabível uma última observação sobre este precedente. A rigor, o caso não é afeto à teoria da imprevisão, inerente à álea econômica extraordinária, extraordinária, mas, ao que me parece, à hipótese de caso fortuito. Contudo, em nada altera a conclusão acima, pois, sem embargo de qualquer discussão conceitual que possa existir em âmbito doutrinário, é certo que o legislador ordinário abarcou todas essas hipóteses no mesmo dispositivo legal citado acima. 43. A unidade técnica menciona dois julgados desta Corte que amparariam a sua tese calcada na impossibilidade de haver reequilíbrio econômico-fnanceiro de contrato administrativo com base apenas em insumos isolados: Acórdãos 2.408/2009 e 1.466/2013, ambos do Plenário. 44. No primeiro, o Tribunal enfrentou revisão ampla de preços em contrato celebrado pela Petrobras, a qual abarcou 33 (trinta de três) itens de serviço da avença, tendo-se confgurado “jogo de planilha” em um cenário no qual o contrato, em vias de ser encerrado, foi prorrogado e contemplou reduções nos preços de 32 (trinta e dois) itens cujo consumo teria sido superestimado e aumento no preço de um item (“unidade de serviço” – US) cujo consumo teria sido subestimado. Essa manobra teria conferido aparência de equilíbrio contratual após o aditamento responsável responsável pela prorrogação e pelas alterações de preços. 45. Nesse contexto, o relator, acompanhado por este colegiado, reputou que não estavam presentes os pressupostos autorizadores da revisão de preços com amparo na teoria da imprevisão: “Somente se admite a repactuação, quando decorre de fato: a) superveniente; b) imprevisível, ou previsível, mas de consequências incalculáveis; c) alheio à vontade das partes; e d) que provoque grande desequilíbrio ao contrato. A elevação anormal do preço de serviço, decorrente de variação inesperada dos seus custos, pode motivar a revisão dos preços contratados, desde que observados todos os pressupostos legais. Tal situação deve ser objetiva e exaustivamente demonstrada. demonstrada. A comprovação comprovação da necessidade de reajustamento reajustamento do preço, resultante da suposta elevação anormal de custos, exige a apresentação das planilhas de composição dos preços contratados, com todos os seus insumos, e dos critérios de apropriação dos custos indiretos da contratada. Cabia à CNO comprovar que o suposto acréscimo dos custos da US desequilibrava a equação econômico-nanceira de sua proposta. proposta. Inadmissível Inadmissív el e inaceitável juridicamente a revisão de preços sob o frágil argumento de compatibilizálos aos preços praticados em outros contratos da companhia, companh ia, porque a adoção de preços diferentes diferente s em contratos distintos não implica ruptura do equilíbrio econômico-nanceiro da proposta vencedora da licitação. (...) Houvesse previsto a quantidade correta de US, o custo anual, ignorada a superestimativa dos itens cujos preços foram reduzidos, seria acrescido em aproximadamente R$ 4,1 mi, equivalente a 20% do valor contratado. Os trinta e dois itens de serviço objeto de desconto, por sua vez, foram superestimados, aumentando o sobrepreço da repactuação.
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No primeiro ano do contrato, eles eles apresentaram execução nanceira equivalente a 50% da prevista. Mesmo assim, suas quantidades quantidades foram duplicadas. Mas, nem mesmo o desconto nos preços de trinta e dois itens se materializou, porque incidiu, sobre eles, reajuste anual contratualmente previsto, de 11,67%. Essa situação praticamente anulou o desconto teórico oferecido, de aproximadamente 17%. O reajuste foi aplicado também ao preço repactuado da US. (...) Não era difícil perceber que os preços repactuados repactuad os não decorriam da ruptura do equilíbrio contratual, uma vez que as justicativas apenas mencionavam suposta compatibilidade compatibi lidade entre eles e os praticados em outros contratos. De fácil percepção, também, que a suposta compatibilidade de preços era falaciosa, porque os preços propostos eram superiores superiores aos praticados no contrato tido por paradigma”. (grifei)
46. A leitura atenta dos trechos acima evidencia que a tese propugnada pela unidade técnica não encontra respaldo neste julgado. Em verdade, o entendimento perlhado foi
de que a contratada não logrou comprovar que o impacto causado pela alegada elevação de custos referentes aos serviços típicos do item US – “serviços prestados em plataformas de petróleo por técnicos de segurança do trabalho fornecidos pela contratada, por solicitação da Petrobras ” - provocara quebra da equação econômico-nanceira do contrato.
47. Para tanto, haveria a contratada de ter t er demonstrado o suposto desequilíbrio mediante exposição detalhada de seus custos e da forma de apropriação de suas despesas indiretas, referentes ao item em questão , porque porque a justicativa justicativa para o aumento aumento de preços centrou-se em alegação singela, sem base probatória, de que a revisão destinava-se a compatibilizar os preços com os praticados em outros contratos. 48. Com relação ao Acórdão 1.466/2013-TCU-Plenário, baseia-se a unidade especializada em trecho do voto no qual a relatora asseriu que a situação em apreço não evidenciava desequilíbrio do contrato como um todo, apesar de evidências da elevação anormal dos preços do item “esquadrias de alumínio”: “23. Importa destacar que eventual desequilíbrio econômico-nanceiro não pode ser constatado a partir da variação variação de preços de apenas apenas um serviço serviço ou insumo. insumo. A avaliação da equidade do contrato deve ser resultado de um exame global da avença , haja vista que outros itens podem ter passado por diminuições de preço. (...)” (grifei).
49. Como é de se ver, aquela decisão apenas reiterou a obrigatoriedade de a análise contemplar outros serviços contratuais diante da possibilidade de identicar possíveis variações a menor, ou seja, favoráveis à Administração. Não armou que a opção pela
recomposição, caso levada adiante, devesse necessariamente considerar toda e qualquer diminuição de preços, até mesmo porque, se assim fosse, estaria em desacordo com as próprias disposições legais aplicáveis ao instituto da revisão (ou recomposição), r ecomposição), fundado no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei 8.666/1993. 50. E, conforme visto em outra passagem, passa gem, os insumos utilizados em obras de manutenção e restauração rodoviária, ao menos os mais importantes em termos de materialidade, foram objeto de análise pelo Dnit, a qual indicou inexistirem demais oscilações enquadráveis na teoria da imprevisão. Tal constatação supre, a meu ver, a necessidade de exigir daquela autarquia que proceda, no âmbito de cada contrato em andamento, a novo exame sobre o comportamento das variações de preços dos materiais. 51. Mais uma vez, importante deixar claro que o instituto da revisão (ou recomposição) aplica-se diante de quadro de imprevisibilidade (ou de previsibilidade, porém diante de consequências incalculáveis) e de grande impacto na relação contratual, sendo desarrazoado exigir-se, como regra geral, o cômputo de todas as possíveis variações de preços sofridas pelos insumos, as quais se inserem, via de regra, em álea ordinária afeta ao risco do contratado.
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52. Essa possibilidade jurídica não implica dizer que a Administração está autorizada a omitir-se em investigar outras modicações contratuais de ordem extraordinária que possam modicar a equação econômico-nanceira. Essa análise ampliativa é necessária e faz todo sentido como mecanismo de identicação de mudanças ou comportamentos
imprevisíveis e atípicos (teoria da imprevisão, por exemplo) em outros itens do contrato. Uma vez identicados, a próxima etapa consistirá no cálculo nal dessas variações
extraordinárias para efeito de se restabelecer o reequilíbrio econômico-financeiro. (TCU. Acórdão nº 1.604/2015, Plenário. Rel. Min. Augusto Augusto Nardes. DOU , 17 jul. 2015)
Outra questão discutida com certa frequência refere-se à aplicação do reequilíbrio econômico-nanceiro para fazer face a aumentos salariais decorrentes de dissídio coletivo. O entendimento dos Tribunais é pacíco em relação ao tema, no sentido do
descabimento de pleito nessa linha, visto que não se trata de fato imprevisível, consoante posição do STJ: 1. O aumento salarial a que está obrigada a contratada por força de dissídio coletivo não é fato imprevisível capaz de autorizar a revisão contratual de que trata o art. 65 da Lei 8.666/93. 2. Precedente da Segunda Turma desta Corte no REsp 134.797/DF. 3. Recurso especial improvido. (STJ. REsp nº 411.101/PR, 2ª Turma. Rel. Min. Eliana Calmon. DJ , 08 set. 2003) O TCU, ao analisar a questão atinente a reequilíbrio econômico-nanceiro em
contratos de prestação de serviços de forma contínua em decorr dec orrência ência de incremento de custos de mão de obra ocasionado oc asionado pela data-base das categorias, assim se manifestou: 9.1.2 os incrementos dos custos de mão-de-obra ocasionados pela data-base de cada categoria prossional nos contratos de prestação de serviços de natureza contínua não se constituem em fundamento para a alegação de desequilíbrio econômico-nanceiro; econômico-nanceiro;
9.1.3 no caso da primeira repactuação dos contratos de prestação de serviços de natureza contínua, o prazo mínimo de um ano a que se refere o item 8.1 da Decisão 457/1995 Plenário conta-se a partir da apresentação da proposta ou da data do orçamento orç amento a que a proposta se referir, sendo que, nessa última hipótese, considera-se c onsidera-se como data do orçamento a data do acordo, convenção, dissídio coletivo de trabalho ou equivalente que estipular o salário vigente à época da apresentação da proposta, vedada a inclusão, por ocasião da repactuação, de antecipações e de benefícios não previstos originariamente, nos termos do disposto no art. 5º do Decreto 2.271/97 e do item 7.2 da IN/Mare 18/97; 9.1.4 no caso das repactuações dos contratos de prestação de serviços de natureza contínua subseqüentes à primeira repactuação, o prazo mínimo de um ano a que se refere o item 8.1 da Decisão 457/1995 - Plenário conta-se a partir da data da última repactuação, nos termos do disposto no art. 5º do Decreto 2.271/97 e do item 7.1 da IN/Mare 18/97; 161
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“O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator e com fundamento no art. 1º, inciso XVII e §2º, da Lei nº 8.443/92, c/c o disposto no art. 216 do Regimento Interno, DECIDE conhecer da presente consulta para responder ao órgão consulente que: [...] 8.1 - os preços contratados não poderão sofrer reajustes por incremento
dos custos de mão-de-obra decorrentes da data base de cada categoria, ou de qualquer outra razão, por força do disposto no art. 28 e seus parágrafos da Lei nº 9.069/95, antes de decorrido o prazo de um ano, contado na forma expressa na própria legislação” (TCU. Decisão nº 457/1995, Plenário. Rel. Min. Carlos Átila Álvares da Silva. DOU , 25 set. 1995).
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
9.1.5 os contratos de prestação de serviços de natureza contínua admitem uma única repactuação a ser realizada no interregno mínimo de um ano, conforme estabelecem o art. 2º da Lei 10.192/2000 e o art. 5º do Decreto 2.271/97; 9.1.6 nas hipóteses previstas nos itens 9.1.3 e 9.1.4 deste Acórdão, a repactuação poderá contemplar todos os componentes de custo do contrato que tenham sofrido variação, desde que haja demonstração analítica dessa variação devidamente justicada, conforme
preceitua o art. 5º do Decreto 2.271/97. (TCU. Acórdão nº 1.563/04, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Sher man Cavalcanti. DOU , 18 out. 2004) Por m, a argumentação para aprovação de pedido de recomposição deve
estar devidamente comprovada, com detalhamento dos novos fatos que ensejaram a alteração do cenário em relação à situação da época da licitação. O TRF 1ª Região tem entendimento que ilustra o exposto: 1. A revisão do contrato somente se legitima diante de fatos novos surgidos durante sua execução e que causem onerosidade excessiva e insuportável. 2. Se a contratada não se desincumbiu de provar argüido ônus através de meio idôneo, tendo permanecido só nas meras referências, carece do postulado direito. 3. Apelação desprovida. (TRF1. Ap. Cível nº 96.01.24079-9/BA. Rel. Juiz Evandro Reimão dos Reis. DJ , 14 jan. 2002)
10.16 Extinção do contrato 10.16.1 Conclusão e recebimento do objeto O art. 73, I, da lei de licitações especica as etapas para o recebimento de
obras e serviços: a primeira, provisória, realizada diretamente pelo responsável pelo acompanhamento do empreendimento; a segunda, denitiva, realizada por servidor
ou comissão designada pela autoridade competente.
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A denição de duas etapas de recebimento demonstra a importância que o
legislador conferiu ao momento da entrega do objeto contratado à Administração, sem prejuízo de a empresa executora dos serviços responder civilmente pela qualidade, solidez e segurança da obra, no prazo de cinco anos, nos termos dos art. 69 e art. 73, §2º, da Lei nº 8.666/93 c/c art. 618 do Código Civil Ci vil Brasileiro, e efetuar a reparação de quaisquer falhas, vícios, defeitos ou imperfeições que se apresentem nesse período, sem 163
ônus para a contratante. Se houver recusa ou demora na correção dos vícios identicados,
a Administração poderá executar os serviços e deverá adotar todos os procedimentos cabíveis a m de ter reparado os custos incorridos.
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“Art. 73. Executado o contrato, o seu objeto será recebido: I - em se tratando de obras e serviços: a) provisoriamente, pelo responsável por seu acompanhamento e scalização, mediante termo circunstanciado,
assinado pelas partes em até 15 (quinze) dias da comunicação escrita do contratado;
b) denitivamente, por servidor ou comissão designada pela autoridade competente, mediante termo
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circunstanciado, assinado pelas partes, após o decurso do prazo de observação, ou vistoria que comprove a adequação do objeto aos ao s termos contratuais, observado o disposto no art. 69 desta Lei”. A propósito, recomenda-se leitura do Título VI, Capítulo Capítulo VIII, do Código Civil, relativo a contrato de empreitada, artigos 610 a 626.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
No recebimento provisório, deverão estar saneadas todas as pendências relativas
à execução dos serviços, seja em relação a prazos, seja em relação a pagamentos. O scal deverá providenciar uma relação detalhada dos vícios encontrados e xar prazo para a correção. A empresa, após a execução dos devidos reparos, comunicará por escrito a
scalização e, no prazo de até 15 dias, será assinado termo circunstanciado. É momento de extrema relevância para a scalização em face da responsabilidade assumida com a assinatura do referido termo.
Já no denitivo, o principal objetivo é propiciar que prossionais não envolvidos diretamente na scalização façam uma avaliação nal independente a respeito da viabilidade do recebimento. O TCU tem entendimento importante em termos de recebimento do objeto, com determinação ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e ao Conselho Nacional de Justiça para que orientem os órgãos/entidades nas respectivas esferas de competência, que, ao contratarem a execução de obras públicas: 9.1.1. apliquem os critérios e parâmetros técnicos prescritos na norma NBR 9050/2004
relacionados com a acessibilidade de pessoas portadoras de deciência ou com mobilidade reduzida; 9.1.2. incluam cláusulas em edital e em contrato que estabeleçam a obrigação de o contratado, em conjunto com a Administração Pública, providenciar a seguinte
documentação como condição indispensável para o recebimento denitivo de objeto: 9.1.2.1. “as built” da obra, elaborado pelo responsável por sua execução;
9.1.2.2. comprovação das ligações denitivas de energia, água, telefone e gás; 9.1.2.3. laudo de vistoria do corpo de bombeiros aprovando a obra; 9.1.2.4. carta “habite-se”, emitida pela prefeitura; e
9.1.2.5. certidão negativa de débitos previdenciários especíca para o registro da obra junto ao Cartório de Registro de Imóveis;
9.1.3. exijam da contratada a reparação dos vícios vericados dentro do prazo de garantia da obra, tendo em vista o direito assegurado à Administração pelo art. 618 da Lei nº 10.406/2002 (Código Civil), c/c o art. 69 da Lei nº 8.666/93 e o art. 12 da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); e 9.1.4. abstenham-se de realizar o recebimento provisório de obras com pendências a serem solucionadas pela construtora, uma vez que o instituto do recebimento provisório, previsto no art. 73, inc. I, da Lei nº 8.666/93, não legitima a entrega provisória de uma obra inconclusa, mas visa resguardar a Administração no caso de aparecimento de vícios ocultos, surgidos após o recebimento provisório. (TCU. Acórdão nº 853/2013, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 12 abr. 2013)
Apesar da aparente simplicidade dos procedimentos legais para o recebimento
do objeto, por vezes ocorrem casos em que há agrante descumprimento aos preceitos, conforme situação analisada pelo TCU:
[...] o sr. Presidente da Comissão de Fiscalização da obra, ouvido em audiência, não logrou justicar a irregularidade concernente ao recebimento provisório da referida obra em desobediência aos arts. 81 e 82 da IN/COSEG/SAG/nº 01/92, porquanto não haviam sido cumpridas todas as obrigações contratuais, estando a obra não concluída, consoante se depreende da própria listagem e orçamento de serviços pendentes apresentados pelo responsável em causa, bem como pelo Relatório de Inspeção Técnica elaborado para ns
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
do recebimento denitivo, onde há o registro de que o prédio ainda estava em fase de
conclusão. (TCU. Acórdão nº 247/99, 1ª Câmara. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 1º jul. 1999)
Há, contudo, uma exceção para o recebimento provisório de obras e serviços. A lei dispensa esse tipo de recebimento quando o valor não exceder o limite denido para
a contratação por carta convite, em face da pequena magnitude do empreendimento. Interessante decisão foi adotada pelo STJ no sentido de que os pagamentos dos valores ajustados devem ser feitos no caso de contrato por empreitada, independentemente do termo de recebimento denitivo da obra:
I - Demonstrado que o contrato de empreitada foi realizado com etapas, ou seja por preço unitário, o termo de recebimento e entrega denitivo da obra é desnecessário para
comprovar a execução dos serviços, devendo haver o pagamento dos valores ajustados no contrato sob pena de enriquecimento ilícito do Estado. II - O termo de recebimento e entrega denitivos da obra somente é lavrado quando do
término da execução da obra, não tendo relação com os serviços executados e cujo preço reclamado foi faturado pelo executor da obra e permanece sem pagamento. (STJ. REsp nº 687.774/MT, 1ª Turma. Rel. Min. Francisco Falcão. DJ , 27 jun. 2005)
10.16.2 Inexecução, rescisão e sanção No decorrer da execução do empreendimento podem ocorrer diversos problemas graves que darão margem à rescisão contratual, com consequências contratuais e previstas em lei ou regulamento. Inexecução do contrato está relacionada ao descumprimento das cláusulas pactuadas, seja pela empresa, seja pela Administração, e pode ocorrer em duas modalidades: culposa e sem culpa. Segundo Hely Lopes Meirelles, “a inexecução ou inadimplência culposa é a que resulta de ação ou omissão da parte, decorrente de negligência, imprudência, imprevidência ou imperícia no atendimento de cláusulas contratuais”, enquanto a “sem culpa é a que decorre de fatos estranhos à conduta da parte, retardando ou impedindo totalmente a execução do contrato”. Enquanto nesta, “embora ocorra inadimplência e possa haver rescisão do contrato, não haverá responsabilidade alguma para os contratantes”, naquela deverá haver a “aplicação das sanções legais ou contratuais proporcionalmente à gravidade da falta cometida pelo inadimplente”. A lei de licitações prevê em seu art. 78, de forma exaustiva, todos os casos em que será possível a referida rescisão, ou seja, casos não relacionados na lei não poderão ser motivo para adoção dessa medida radical. A TABELA 10.2 apresenta as situações previstas na lei agrupadas pelos principais problemas que podem ocorrer. 164
MEIRELLES. Direito administrativo brasileiro , p. 249.
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TABELA 10.2
Problemas defnidos na lei de licitações que podem ensejar a rescisão contratual Problemas
Incisos do art. 78
I - o não cumprimento de cláusulas contratuais, especicações, projetos ou prazos; II - o cumprimento irregular de cláusulas contratuais, especicações, projetos e praNão cumprimento zos; ou cumprimento VI - a subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação do contratado com irregular de outrem, a cessão ou transferência, total ou parcial, bem como a fusão, cisão ou incorcláusulas poração, não admitidas no edital e no contrato; contratuais XVIII - descumprimento do disposto no inciso V do art. 27, sem prejuízo das sanções penais cabíveis; III - a lentidão do seu cumprimento, levando a Administração a comprovar a impossibilidade da conclusão da obra, do serviço ou do fornecimento, nos prazos estipulados; Não cumprimento IV - o atraso injusticado no início da obra, serviço ou fornecimento; de prazos pela V - a paralisação da obra, do serviço ou do fornecimento, sem justa causa e prévia empresa comunicação à Administração;
Descumprimento de ordens da scalização
VII - o desatendimento das determinações regulares da autoridade designada para acompanhar e scalizar a sua execução, assim como as de seus superiores; VIII - o cometimento reiterado de faltas na sua execução, anotadas na forma do §1º do art. 67 desta Lei;
Em relação à constituição societária da empresa
IX - a decretação de falência ou a instauração de insolvência civil; X - a dissolução da sociedade ou o falecimento do contratado; XI - a alteração social ou a modicação da nalidade ou da estrutura da empresa, que prejudique a execução do contrato;
Interesse público
XII - razões de interesse público, de alta relevância e amplo conhecimento, justi cadas e determinadas pela máxima autoridade da esfera administrativa a que está subordinado o contratante e exaradas no processo administrativo a que se refere o contrato;
Causados pela Administração
XIII - a supressão, por parte da Administração, de obras, serviços ou compras, acarretando modicação do valor inicial do contrato além do limite permitido no §1º do art. 65 desta Lei; XIV - a suspensão de sua execução, por ordem escrita da Administração, por prazo superior a 120 (cento e vinte) dias, salvo em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, ou ainda por repetidas suspensões que totalizem o mesmo prazo, independentemente do pagamento obrigatório de indenizações pelas sucessivas e contratualmente imprevistas desmobilizações e mobilizações e outras previstas, assegurado ao contratado, nesses casos, o direito de optar pela suspensão do cumprimento das obrigações assumidas até que seja normalizada a situação; XV - o atraso superior a 90 (noventa) dias dos pagamentos devidos pela Administração decorrentes de obras, serviços ou fornecimento, ou parcelas destes, já recebidos ou executados, salvo em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, assegurado ao contratado o direito de optar pela suspensão do cumprimento de suas obrigações até que seja normalizada a situação; XVI - a não liberação, por parte da Administração, de área, local ou objeto para execução de obra, serviço ou fornecimento, nos prazos contratuais, bem como das fontes de materiais naturais especicadas no projeto;
Caso fortuito ou força maior
XVII - a ocorrência de caso fortuito ou de força maior, regularmente comprovada, impeditiva da execução do contrato.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
A própria lei de licitações estipula, no art. 79, as três formas de condução da rescisão: a) por ato unilateral e escrito da Administração, nos casos enumerados nos incisos I a XII e XVII do art. 78; b) amigável, desde que haja conveniência para Administração; c) judicial. Cabem algumas considerações a respeito do assunto. Pelas formas denidas em lei, verica-se que a empresa jamais poderá decidir pela rescisão de forma unilateral, devendo, sempre que necessário, recorrer à esfera judicial. Por isso, inadmissíveis os casos em que a contratada simplesmente abandona o canteiro sob qualquer alegação. Verica-se, ainda, que a Administração, em caso de rescisão amigável, deverá motivar a conveniência do ato. Não basta a argumentação genérica da conveniência. É necessária a apresentação detalhada de justicativas que efetivamente embasem a alegada conveniência do interesse público. A propósito, “a rescisão amigável de contrato administrativo, especicada no art. 79, inciso II da Lei 8.666/1993, somente é cabível se houver conveniência para a administração e não ocorrer nenhuma das hipóteses previstas na lei para a rescisão unilateral da avença” (TCU. Acórdão nº 740/2013, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. , 10 abr. 2013). DOU “O instituto da rescisão amigável previsto na Lei 8.666/1993 tem aplicação restrita. Em primeiro lugar, não é cabível quando congurada outra hipótese que daria ensejo à rescisão. Em segundo lugar, somente pode ocorrer quando for conveniente para a administração. Por conseguinte, não pode, jamais, resultar em prejuízo para o contratante” (TCU. Acórdão nº 3.567/214, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 16 dez. 2014). O art. 79, §2º, da Lei nº 8.666/93 prevê o ressarcimento dos prejuízos regularmente comprovados que o contratado houver sofrido, a devolução de garantia, e pagamentos devidos pela execução do contrato até a data da rescisão e do custo da desmobilização, apenas nos casos em que a rescisão for causada por problemas da Administração, ou pela ocorrência de interesse público, de caso fortuito ou de força maior, sem culpa do contratado, conforme incisos XII a XVII do art. 78. No caso de inexecução por culpa do contratado a lei de licitações prevê a aplicação das seguintes sanções: advertência, multa, suspensão e declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração. Nesse sentido, o TCU tem determinado a contratante de obra pública “que, no caso de inexecução de contrato, adote as medidas que se zerem necessárias para ns de aplicação à empresa inadimplente das sanções previstas nos incisos I a IV do art. 87 165
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“Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: I - advertência; II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato; III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos; IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior”.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
da Lei nº 8.666/1993” (TCU. Acórdão nº 991/06, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 26 jun. 2006). Aliás, oportuno lembrar que a aplicação de multa a contratada pela Administração Pública, na ocorrência de irregularidade prevista em contrato, é obrigatória e não facultativa, nos termos postos pelo TCU: [...] não se encontra na esfera de disponibilidade do gestor da [...] deixar de multar a contratada, eis que lhe incumbe agir proativamente, respaldado no ordenamento jurídico e nas previsões legais, editalícias e contratuais que regem a avença com a recorrente, não lhe sendo legítimo omitir-se nem renunciar às prerrogativas conferidas à administração em situações da espécie (precedentes: Acórdão 1262/2009 e 949/2010, ambos do Plenário). (TCU. Acórdão nº 2.445/2012, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 14 set. 2012)
Com efeito, a omissão de gestor em aplicar sanções, a exemplo de suspensão do direito de licitar, justica sua apenação com multa do art. 58, II, da Lei nº 8.443/1992: 6. Como a interessada ocupava, à época, o cargo de Diretora de Engenharia da Infraero, resta evidente que foi omissa no dever de sancionar a contratada, no sentido de continuar a execução das obras no aeroporto de Vitória/ES, como bem destacado no voto condutor da decisão recorrida: “5. No que tange aos temas concernentes à delegação de competência e à descentralização dos serviços, consta dos autos que no âmbito da [...], a aplicação de sanção a contratados é competência do Presidente, atribuição que foi delegada a outros atores envolvidos no processo de descentralização administrativa, conforme revelam os Atos Administrativos nos 2.006/PR/2005 e 206/PR/2007. De acordo com esses normativos, o diretor da respectiva área de interesse da licitação ou do contrato tem competência para aplicar sanção de suspensão do direito de licitar e contratar com a [...]. Por sua vez, os gestores dos contratos são competentes para aplicar as sanções de advertência e multa, mediante a expedição de ato administrativo”. 7. Ao contrário do que alega, a recorrente não foi apenada por não ter multado ou advertido a contratada, mas por não suspender o direito do consórcio inadimplente de licitar e contratar com a [...], competência que não foi delegada ao scal do contrato, mas à responsável em comento, que não agiu conforme deveria. Eis, a seguir, trecho do voto condutor do acórdão recorrido que bem explica tal circunstância: 8. Vale lembrar que o não atendimento do Consórcio à solicitação de retomada das obras, formulada pela [...], por meio de correspondência de sua autoria, já seria, ao meu ver, motivo suciente para a adoção de providências por parte da responsável, na condição de Diretora da área de interesse do Contrato 067-EG/2004/0023. 9. Conforme descrito no Relatório precedente, a paralisação da obra do Aeroporto de Vitória por aproximadamente sete meses era passível de aplicação de multa ou rescisão do Contrato nº 67-EG/2004/0023, com a instauração do devido procedimento para o exercício do direito de defesa. 10. Nesse mesmo sentido pronunciou-se esta Corte ao exarar o Acórdão nº 2.046/2006 Plenário, do qual permito transcrever excerto do Voto condutor, de relatoria do Ministro Valmir Campelo: 8. Segundo, a ameaçada paralisação dos serviços caracterizar-se-á como medida unilateral da contratada, sujeita às cominações contratuais e legais, inclusive quanto aos custos e às indenizações decorrentes de mobilização, desmobilização, perda de serviços, etc. A recorrente alega, mas não demonstra que os percentuais de retenção determinados inviabilizariam a continuidade da execução das obras. Ao contrário, os percentuais
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
determinados parecem-me extremamente razoáveis. Aliás, como foi extremamente razoável a proposta da Unidade Técnica, acolhida por mim e raticada pelo Plenário
desta Casa. Conforme consignei no Despacho que determinou a retenção cautelar, esse tipo de medida, retenção parcial dos pagamentos, ao mesmo tempo em que resguarda o erário de eventual prejuízo e confere efetividade à futura decisão de mérito, permite a continuidade das obras e o pagamento da maior parte das faturas. 9. No caso em exame, estão sendo retidos 13,12% de cada medição e, apenas no caso dos serviços atinentes a “Equipamentos e Sistemas Especiais” e “Serviços Técnicos e Prossionais”, 20,96%. Ora, estes percentuais são bem inferiores ao BDI estabelecido pelo
contrato, de 35%. Portanto, estão sendo pagos todos os custos diretos incorridos e mais parte dos custos indiretos. Isto é bastante razoável tendo em confronto a magnitude do prejuízo que pode estar sendo perpetrado contra os cofres públicos, na forma da cobrança de preços exorbitantes em relação aos praticados pelo mercado. (TCU. Acórdão nº 836/2012, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 20 abr. 2012)
Restam, ainda, algumas questões acessórias quanto à aplicação de penalidades que merecem ser discutidas. A primeira trata da possibilidade da extensão da aplicação da sanção de inidoneidade aos sócios e administradores, ou a futuras empresas constituídas com o mesmo quadro societário de empresas declaradas inidôneas. O TCU, assim como o STJ, se manifesta pela impossibilidade da referida extensão: 16. Nessa mesma linha, pronunciou-se o STJ em julgado de 2003, o qual trago à colação excerto: Administrativo. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. Licitação. Sanção de inidoneidade para licitar. Extensão de efeitos à sociedade com o mesmo objeto social, mesmos sócios e mesmo endereço. Fraude à lei e abuso de forma. Desconsideração da personalidade jurídica na esfera administrativa. Possibilidade. Princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos. - A constituição de nova sociedade, com o mesmo objeto social, com os mesmos sócios e com o mesmo endereço, em substituição a outra declarada inidônea para licitar com a Administração Pública Estadual, com o objetivo de burlar a aplicação da sanção administrativa, constitui abuso de forma e fraude à Lei de Licitações Lei n.º 8.666/93, de modo a possibilitar a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica para estenderem-se os efeitos da sanção administrativa à nova sociedade constituída. - A Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade constituída com abuso de forma e fraude à lei, desde que facultado ao administrado o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo regular. - Recurso a que se nega provimento. (STJ, RMS n. 15.166-BA, Relator Ministro Castro Meira, 2ª Turma, DJ de 08.09.2003). 17. No âmbito desta Corte de Contas, o Ministro Aroldo Cedraz pronunciou-se, em duas assentadas, sobre matéria conexa à posta nos autos. No voto gerador do Acórdão 2.549/2008 - Plenário, manifestou-se pela impossibilidade de declarar a inidoneidade dos sócios de determinada empresas em vista do disposto no art. 46 da Lei 8.443/92. No voto que precedeu o Acórdão 2.809/2009 do mesmo Colegiado, entendeu ser solução jurídica inadequada estender a futuras empresas que viessem a ser criadas as penalidades impostas a empresas envolvidas em conluio: VOTO (Acórdão 2.549/2008 - Plenário) [...]
28. Dada a gravidade da ocorrência e tendo em vista que a contratada foi devidamente ouvida neste feito, concordo com a Secex/1 que o Tribunal deve declarar a inidoneidade
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
da ICMA para licitar e contratar com a administração, consoante autoriza o art. 46 da Lei 8.443/1992. Friso, entretanto, que não vislumbro condição para declarar também a inidoneidade dos sócios daquela empresa, como sugere a unidade técnica, eis o fundamento legal invocado menciona apenas o licitante. VOTO (Acórdão 2.809/2009 - Plenário) [...] 11. No que tange às duas propostas de declaração de inidoneidade para licitar para participarem de licitação na Administração Pública Federal, com as vênias de estilo, divirjo da unidade técnica e alinho-me à proposta do Ministério Público. Decido dessa forma, pois creio que estender a penalidade que deve ser aplicada às empresas envolvidas no conluio que foi evidenciado nos presentes autos às futuras sociedades que vierem a ser constituídas, apresentando como sócio-administrador, sócio-gerente ou administrador de fato, conjunta ou individualmente, os membros da família Ferreira de Melo arrolados nos presentes autos não é uma solução juridicamente adequada. Isso se deve ao fato de que tais empresas sequer existem no mundo jurídico, não lhes tendo sido assegurados, previamente à aplicação da sanção proposta, os direitos constitucionais ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório. 18. Como se pode observar, a doutrina e a jurisprudência vêm confrmando a aplicabilidade da teoria da desconsideração da personalidade jurídica no âmbito administrativo, em homenagem aos princípios da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, quando a pessoa jurídica for o meio de realização de fraude, desde que assegurados o contraditório e a ampla defesa a todos os interessados. 19. No caso vertente, entendo que, decretada a inidoneidade das empresas do grupo Planam, a Administração poderá proibir a participação de empresas constituídas, após a apenação, com o mesmo objeto e que tenham em seu quadro societário qualquer dos responsáveis ouvidos nestes autos ou seus parentes, até o terceiro grau. Nesse caso, poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica para estender os efeitos da sanção imposta pelo TCU a eventuais empresas fundadas com o intuito de ultrapassar a proibição de licitar com a Administração Pública dentro do prazo estabelecido no decisum, desde que adotadas as providências essenciais para tal. 20. Assim, considero que não se pode antecipar a aplicação de sanção a empresas inexistentes com base em previsões que podem não se concretizar, eis que a apenação não estaria motivada por prova documental do ilícito. Ademais, o prazo para o contraditório e para a ampla defesa só poderia ser aberto aos interessados diante de fato concreto. 21. Quanto à declaração de inidoneidade dos sócios, alinho-me às conclusões do Ministro Aroldo Cedraz no voto condutor do Acórdão 2.549/2008 - Plenário, cujo excerto transcrevi no item 17 supra, no sentido de que o art. 46 da Lei 8.443/92 menciona apenas o licitante, no caso em comento as empresas do grupo Planam. 22. Não obstante entender não ser apropriado lançar mão da teoria da desconsideração da personalidade jurídica para declarar a inidoneidade dos sócios e/ou administradores das empresas envolvidas no esquema de fraudes à licitação, ressalto que podem ser desenvolvidos mecanismos destinados a coibir a burla relacionada à declaração de inidoneidade de empresas, como o aperfeiçoamento do cadastro do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. (TCU. Acórdão nº495/2012, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 18 mar. 2013)
Em complemento, o TCU entende que a declaração de inidoneidade de determinada empresa somente poderá ser ampliada a outra de propriedade dos mesmos sócios quando comprovada ter sido essa última constituída com o propósito deliberado de burlar a referida sanção:
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
14. De outra parte, foi destacado pela unidade técnica que o Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do RMS 15166/BA, considerou a possibilidade de estender os efeitos da penalidade a outra empresa com o mesmo objeto social, mesmos sócios e mesmo endereço, em substituição a outra declarada inidônea para licitar, verbis: “Administrativo. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. Licitação. Sanção de inidoneidade para licitar. Extensão de efeitos à sociedade com o mesmo objeto social, mesmos sócios e mesmo endereço. Fraude à lei e abuso de forma. Desconsideração da personalidade jurídica na esfera administrativa. Possibilidade. Princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos. - A constituição de nova sociedade, com o mesmo objeto social, com os mesmos sócios e com o mesmo endereço, em substituição a outra declarada inidônea para licitar com a Administração Pública Estadual, com o objetivo de burlar a aplicação da sanção administrativa, constitui abuso de forma e fraude à Lei de Licitações Lei nº 8.666/1993, de modo a possibilitar a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica para estenderem-se os efeitos da sanção administrativa à nova sociedade constituída”. [...]
15. Penso que, para se valer dessa decisão, seria necessário caracterizar, primeiro, a burla à licitação, a qual, por sua vez, só seria possível com a defnição da abrangência
da punição imposta à EFP, questão ainda não harmonizada nesta Corte, como visto. 16. De qualquer maneira, ainda que prevalecesse o entendimento de que a sanção imposta à EFP pela Superintendência da Polícia Rodoviária Federal no Estado do Paraná, em 15/7/2009, impediria aquela empresa de licitar no âmbito da Funasa/PR, há que se ponderar, nesse caso, que a empresa Triângulo Florestal foi constituída bem antes da suspensão dirigida à EFP, dando-se, da mesma forma, a alteração de seu objeto social original anteriormente à tal penalidade, não restando confgurada, portanto, a
constituição de sociedade com o propósito deliberado de burlar a aplicação da sanção administrativa. 17. Nesses termos, manifesto-me contrariamente à declaração de inidoneidade da empresa Triângulo Florestal para contratar com a administração pública, posicionamento, aliás, consentâneo com a proposição do Ministério Público. (TCU. Acórdão nº 2.958/2012, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 05 nov. 2012) A segunda, motivo de diversos debates no TCU, refere-se ao alcance da sanção de suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, prevista no art. 87, inciso III, da Lei nº 8.666/1993: se existe restrição apenas ao órgão ou a entidade que a aplicou ou vale para toda a Administração Pública? O Plenário do TCU tem se manifestado, de forma majoritária, em diversas oportunidades a respeito da matéria: A sanção de suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, prevista no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993, alcança apenas o órgão ou a entidade que a aplicou. (TCU. Acórdão nº 842/2013, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 22 abr. 2013) 166
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Ver também TCU. Acórdão nº 3.243/2012, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro.
, DOU
06 dez. 2012.
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A sanção prevista no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993 (suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração) tem aplicação restrita ao órgão ou entidade que a cominou. (TCU. Acórdão nº 1.017/2013, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 10 maio 2013)
Pela riqueza da discussão, e para não ser esquecida, vale lembrar argumentação da corrente contrária a esse entendimento no âmbito do Plenário. O Ministro Walton Rodrigues apresenta consistentes considerações de sua posição (contrária), enriquecida por decisões do STJ, que corroboram sua tese: Discordo da tese de que apenas a sanção do art. 87, inciso IV, da Lei de Licitações e Contratos — a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública — alcançaria a Administração Pública em todas as suas esferas. O Ministro ou Secretário que aplica a sanção de inidoneidade para licitar ou contratar o faz enquanto responsável por órgão, entidade ou unidade administrativa. A competência é exercida, portanto, em nome da Administração. Saliento, também, a extrema raridade da aplicação dessa sanção. Considero adequado o entendimento de que, para efeito da aplicação da sanção de suspensão temporária (art. 87, inciso III, da Lei nº 8.666/93), os conceitos de “Administração Pública” e “Administração” são sinônimos. Parto do princípio da unidade da Administração, para concluir que não se trata de conceitos contrapostos, nem um deles é mais ou menos abrangente do que o outro. “Administração” é simplesmente a expressão concreta da Administração Pública. A Administração Pública é uma só, sendo apenas descentralizado o exercício de suas funções. A redução de signicância de um termo em
relação ao outro operaria em desprestígio da legislação. Não se trata, absolutamente, de sancionar de acordo com o grau de gravidade da conduta encetada pela empresa. Fraudes intentadas no âmbito municipal podem muito bem ser de lesividade e astúcia innitamente maior do que qualquer outra praticada no âmbito
federal, demonstrando a total incapacidade ética da empresa para atuar no âmbito social ou da Administração, em todas as suas distintas esferas federativas. Qualquer distinção que se faça em relação aos efeitos e à abrangência das sanções, aplicadas por entidades da federação, minora e enfraquece o poder da Administração de efetivamente reprovar condutas lesivas de particulares. Nestes termos, o discrimen inicialmente apresentado pela legislação entre a Administração e a Administração Pública não se aplica para o especial efeito de sancionar condutas ilícitas de gestores privados. Esta é a concepção que melhor prestigia os interesses da Administração Pública e da moralidade administrativa, bem como permite a máxima abrangência a sanções aplicadas por irregularidades apuradas, dentro de quadro de ampla preservação da defesa dos particulares. A propósito, exatamente por esta razão, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça corrobora tal entendimento, em inúmeros acórdãos, dos quais transcrevo os seguintes trechos: “É irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração, por isso que ambas as guras (suspensão temporária de participar em licitação (inc. III) e
declaração de inidoneidade (inc. IV) acarretam ao licitante a não-participação em licitações e contratações futuras. A Administração Pública é una, sendo descentralizadas as suas funções, para melhor atender ao bem comum. A limitação dos efeitos da ‘suspensão de participação de licitação’ não pode car restrita a um órgão do poder público, pois os
efeitos do desvio de conduta que inabilita o sujeito para contratar com a Administração se estendem a qualquer órgão da Administração Pública” (STJ - REsp 151.567/RJ, Relatoria: Ministro Peçanha Martins).
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
“A Administração Pública é a acepção subjetiva de Estado-administrador e sua natureza executiva é única. Apenas as suas atribuições são distribuídas de forma descentralizada, para melhor gerir o interesse de sua comunidade” (STJ - RMS 9707/PR, Relatoria: Ministra Laurita Vaz). “O entendimento do Tribunal a quo, no sentido de que a suspensão imposta por um órgão administrativo ou um ente federado não se estende aos demais, não se harmoniza com o objetivo da Lei nº 8.666/93, de tornar o processo licitatório transparente e evitar prejuízos e fraudes ao erário, inclusive impondo sanções àqueles que adotarem comportamento impróprio ao contrato frmado ou mesmo ao procedimento de escolha de propostas. Há,
portanto, que se interpretar os dispositivos legais estendendo a força da punição a toda a Administração, e não restringindo as sanções aos órgãos ou entes que as aplicarem. De outra maneira, permitir-se-ia que uma empresa, que já se comportara de maneira inadequada, outrora pudesse contratar novamente com a Administração durante o período em que estivesse suspensa, tornando esta suspensão desprovida de sentido” (STJ, REsp 174.274/SP, Relatoria: Ministro Castro Meira). (TCU. Acórdão nº 3.243/2012, Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU , 28 nov. 2012).
Entretanto, a aplicação da sanção de suspensão temporária de licitar quando da utilização do pregão, Lei nº 10.520/2002, tem lógica diferente em relação à Lei nº 8.666/93, conforme deliberação do TCU: Em jurisprudência predominante, mais recentemente o TCU tem conferido abrangência limitada às suspensões temporárias de licitar, coerentemente com as defnições insculpidas
no próprio texto legal (Acórdãos 1.457/2014, 2.556/2013, 2.242/2013, 1.017/2013, 3.243/2012, todos do Plenário): “Art. 6º Para os fns desta Lei, considera-se: (...)
XI - Administração Pública - a administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas; XII - Administração - órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente;” Segundo os julgados relacionados, quando se aplica a punição baseada no art. 87, inciso III, da Lei de Licitações, a proibição de contratar adstringe-se à entidade sancionadora. O que o embargante pleiteia é justamente o paralelismo de entendimento relativo à aplicação do sobredito art. 87 da Lei 8.666/93 e do art. 7º da Lei 10.520/02. Nessa visão, seria irregular a aludida inscrição no SICAF, estendendo punição respectiva a um contrato com a IFSul para todos os demais órgãos da União. Reconhecendo que existiu, de fato, a omissão na análise do argumento, a Secex-RS enfrentou o mérito da questão. O relatório instrutivo, majoritariamente, discorre sobre o posicionamento doutrinário e jurisprudencial sobre a aplicação do art. 87 da Lei 8.666/93. Defendeu, todavia – ao contrário da jurisprudência mais recente do TCU – a sua extensão à toda a administração pública federal, estadual e municipal. De forma analógica, igual posicionamento seria devido com relação ao pregão. Eis a conclusão a que chegou o auditor da Secex-RS: “17. A propósito do teor das Leis e sua aplicação, não vejo margem para dúvidas em relação ao que dispõe o artigo 7º da Lei 10.520, tampouco em relação à intenção do legislador, quando está expresso que quem falhar ou fraudar na execução do contrato (como atrasar salários) será descredenciado no SICAF pelo prazo de até cinco anos. Ora, a empresa que não estiver cadastrada no SICAF fca impedida de contratar com a Administração. Como
é então possível interpretar que tal penalidade se restringe apenas ao órgão sancionador?”
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Passo a julgar o mérito da matéria. De início, corroborando as ressalvas empreendidas pelo diretor da unidade, creio que a intelecção sobre a abrangência do art. 87 da Lei de Licitações não seja, exatamente, a tese a ser desnudada para o presente julgamento; controvérsia, aliás, em que concordo com a linha jurisprudencial menos ampliativa conferida pelo TCU em seus últimos julgados. Trata-se, aqui, de avaliação especíca obre a interpretação conferida ao art. 7º da Lei 10.520/2002: Art. 7º Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude scal, cará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4º desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais. (grifei) Sobre o assunto, o posicionamento doutrinário majoritário – ao qual me alinho – é que a punição pautada na Lei do Pregão aplica-se para toda o ente federativo aplicador da sanção. Cito, como exemplo, o entendimento de Marçal Justen Filho (Comentários à legislação do pregão comum e eletrônico. 4ª ed. São Paulo: Dialética, 2005, p.193): A utilização da preposição ‘ou’ indica disjunção, alternatividade. Isso signica que a punição terá efeitos na órbita interna do ente federativo que aplicar a sanção. Logo, e considerando o enfoque mais tradicional adotado a propósito da sistemática da Lei n. 8.666, ter-se-ia de reconhecer que a sanção prevista no art. 7º da Lei do Pregão consiste em suspensão do direito de licitar e contratar. Não é uma declaração de inidoneidade. Portanto, um sujeito punido no âmbito de um Município não teria afetada sua idoneidade para participar de licitação promovida na órbita de outro ente federal. No mesmo entendimento, Joel Menezes Niebuhr argumenta (Pregão presencial e eletrônico. 4ª ed. Curitiba: Zênite, 2006, p. 257): Perceba-se que o legislador, ao dispor da amplitude das sanções administrativas, utilizou a conjunção alternativa ‘ou’, o que signica que o impedimento de contratar abrange apenas ao ente federativo que aplicou a penalidade, sem estender-se aos demais. Noutras palavras, empresa impedida de participar de licitação pela União, pode participar, livremente, de licitações nos Estados, Distrito Federal e Municípios. O Desembargador Jessé Torres e a professora Marinês Restelao também discorrem sobre o tema (Responsabilidade do contratado na administração de compras, serviços e obras. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano11, n.122, fev. 2012): “Os efeitos da sanção de impedimento prevista no art. 7º da lei acima citada são restritos à órbita interna do ente federativo a que pertence o órgão ou a entidade sancionadora. Ilustra-se: A aplicação de sanção de impedimento por órgão ou entidade da Administração Pública federal, com supedâneo no art. 7º, torna o licitante ou o contratado impedido de licitar e contratar com a União, o que quer dizer: impedido de licitar e contratar com todos os seus órgãos respectivamente subordinados, bem como com as entidades vinculadas, nomeadamente, autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista, além do descredenciamento do licitante ou do contratado no Sistema de Cadastramento Unicado de Fornecedores (SICAF). O licitante ou contratado impedido, nessas condições, não estará proibido de participar de licitações e contratar com órgãos e entidades da Administração Pública estadual, municipal ou do Distrito Federal. A utilização da conjunção “ou” no texto do art. 7º indica alternatividade, o que fundamenta a interpretação de que a punição deva ter seus efeitos restritos à órbita interna do ente federativo em que a sanção foi aplicada.
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O elemento histórico fortalece essa compreensão. É que a referência, no dispositivo, a todos os entes federativos (União, Estados, Distrito Federal ou Municípios) deve-se ao fato de que a Lei nº 10.520/02, quando convertida de Medida Provisória em lei ordinária, já estava corretamente adaptada à competência legislativa geral estatuída pelo art. 22, XXVII, da Constituição Republicana de 1988. Tal adaptação corrigiu o equívoco original, quando a modalidade fora criada por Medida Provisória, com a pretensão de regrar apenas contratações federais. Visite-se, a respeito, o texto do art. 7º da Medida Provisória nº 2.026/2000, verbis: “Quem zer declaração falsa ou deixar de apresentar a documentação exigida para o certame cará impedido de contratar com a União, e, se for o caso, será
descredenciado no SICAF, pelo prazo de até cinco anos, sem prejuízo das multas previstas no edital e no contrato e das demais cominações legais”. O TCU, identicamente, tem ajuizado mesma amplitude na avaliação das sanções baseadas na Lei 10.520/2002, como no Acórdão 2.242/2013-Plenário: “9.3. dar ciência ao Serpro/SP, relativamente aos subitens 2.2.2 e 2.2.4 do edital do Pregão Eletrônico 1.317/2013, de que a sanção prevista no inciso III do art. 87 da Lei 8.666/1993 produz efeitos apenas em relação ao órgão ou entidade sancionador, enquanto a prevista no art. 7º da Lei 10.520/2002 produz efeitos apenas no âmbito interno do ente federativo que a aplicar;” Igual juízo extrai-se dos Acórdãos 653/2008, 739/2013, 1.006/2013 e 1.017/2013, todos do Plenário. Nessa visão, no que se refere à conduta dos gestores da IFSul, inexistiu arrepiou à norma legal na inscrição da pena no SICAF extensiva à todos os órgãos da União. Aliás, mesmo na tese defendida pela Secex-RS – a de ampliar a punição para toda a administração pública – não se veria guarida para o provimento do que requer a Clinsul.
A última versa sobre a dependência de dano ao erário para aplicação da declaração de inidoneidade. O TCU entende que é suciente a existência de indícios robustos de
fraude à licitação para que a pena seja utilizada: 24. A primeira delas diz respeito à necessidade de prova da fraude para aplicação da penalidade recorrida, não sendo suciente a presença de forte indício que a caracterize. 25. O TCU o Supremo Tribunal Federal já rmaram entendimento de que a presença de robusto indício se mostra suciente para fundamentar a declaração de inidoneidade,
justificando a aplicação da penalidade recorrida. Tal diretriz está sedimentada na jurisprudência deste Tribunal (acórdãos do Plenário 1.498/2009, 2.135/2009, 339/2008 e 57/2003, dentre outros), assim como na do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual a robustez do indício o equipara a verdadeira prova nos autos. 26. No caso vertente, tal indício está consubstanciado na comparação entre os orçamentos apresentados pelas empresas [...]. Neles, à exceção do item 12.1 (estrutura pré-moldada:
pré-moldado em concreto armado com montagem da estrutura), todas as demais cotações possuem preços idênticos, na forma evidenciada no relatório condutor do acórdão recorrido, cujo excerto peço vênia para transcrever: “12.62 Em verdade, o exame detido das propostas apresentadas pelas empresas que participaram da licitação demonstra de forma bastante clara que os preços dos três participantes estavam escalonados, de forma que os preços do vencedor estavam 10% menores que os do segundo colocado e 21% menores que os do terceiro, tendo tal fato ocorrido em todos os itens cotados, situação bastante inusitada e praticamente impossível de se vericar, particularmente em se tratando de empresas sediadas no mesmo município,
portanto sujeitas aos mesmos tributos, bem assim por se tratar de uma licitação, ou seja, uma competição, com itens comuns, que não suportariam variações tão elevadas e constantes de preço entre uma empresa e outra.
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12.63 Some-se a isso o fato de que, na planilha de s. [...], a empresa [...] ter apresentado, quando da suposta pesquisa de preços, valores bem abaixo do que os oferecidos pela mesma empresa apenas um mês depois, quando da licitação. Ora, quando comparados os preços cotados por essa rma em 10 de março de 2008 (data da pesquisa de preços) com os apresentados na licitação, no dia 11 de abril de 2008, constata-se que houve uma majoração de R$ 6.923,40 para o lote 1 e R$ 21.600,00 para o lote 2, enquanto o lote 3 teve um decréscimo de R$ 1.855,25. Ou seja, na licitação os preços da empresa Zoron estavam aproximadamente R$ 26.700,00 maiores do que quando da pesquisa de preços, realizada apenas um mês antes [...]”. 27. A jurisprudência colacionada pela recorrente [...] (Acórdão 2.927/2009-Plenário) evidencia hipótese em que os indícios do caso concreto não foram considerados sucientes para punir as empresas envolvidas. [...] 31. Os argumentos relativos à lisura do processo licitatório, à efetiva execução das obras e à observância da planilha de quantidades e preços unitários aos termos do edital não socorrem os interessados. Não se discute nos autos nenhum desses pontos, mas o conluio entre as participantes do certame para frustrar o caráter competitivo do certame, não identicado pelos agentes públicos que examinaram o respectivo processo licitatório, conforme excerto do voto condutor a seguir transcrito: “8. Com relação às evidências de fraude às licitações (ocorrências 5 e 7), não obstante sua constatação, foram afastadas as responsabilidades dos gestores (Presidente do Conselho do Senai/AC e Presidente e Membros da CPL), pois não se pôde inferir a participação na fraude, concluindo que os próprios licitantes é que se aliaram com o objetivo de simular uma disputa inexistente e burlar o certame”. 32. A atuação pretérita das recorrentes também não interfere na sujeição dos envolvidos à penalidade em si. Pode sim ser levada em consideração na dosimetria da pena aplicada, se houver pertinência com os fatos tratados nos autos, como parece ter sido o caso, posto que a penalidade, conquanto a gravidade dos fatos narrados, foi de apenas um ano. 33. Destaco que a fraude não foi caracterizada pela diferença entre os preços praticados entre as empresas ou pelo não preenchimento dos requisitos legais da proposta apresentada, mas pela similaridade das propostas apresentadas pelas envolvidas no Convite 1/2008 e na Concorrência 1/2008. 34. Assim, tais argumentos não tem o condão de alterar a deliberação recorrida. 35. Por m, não há que se falar em boa-fé das empresas recorrentes. Conforme evidenciado na jurisprudência deste Tribunal, a boa-fé deve ser demonstrada nos autos, o que não ocorreu. A própria natureza da fraude afasta qualquer traço de boa-fé dos envolvidos. (TCU. Acórdão nº 2.596/2012, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 04 out. 2012)
10.16.3 Limitação do valor de aditivos A extinção neste caso decorre da impossibilidade da continuidade dos serviços quando os pagamentos do contrato tiverem alcançado os limites permitidos de aditivos previstos no art. 65, §1º, ou seja: a) na execução de obras e serviços: até 25% do valor inicial atualizado do contrato; e b) no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento: até o limite de 50% para os seus acréscimos. Nesse caso, é essencial que sejam vericados os motivos do alcance do limite legal sem a conclusão do objeto, geralmente atrelados à má qualidade de projeto, e adotadas as providências cabíveis.
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
10.17 Cuidados na fase de contratação Diante do exposto, vale elaborar breve resumo dos quesitos que devem ser vericados na fase de contratação. Como esta fase é extensa e envolve elevado número
de atividades, os cuidados foram subdivididos nas seguintes etapas: assinatura do contrato, emissão da ordem de serviço, acompanhamento e scalização, e extinção.
10.17.1 Assinatura do contrato a) Preparar o contrato com base na minuta publicada no edital, com atenção para as seguintes informações necessárias denidas em lei: os nomes das partes e os de seus representantes, a nalidade, o ato que autorizou a sua lavratura, o
número do processo da licitação, da dispensa ou da inexigibilidade, a sujeição dos contratantes às normas da lei e às cláusulas contratuais; a.1) o instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço; a.2) não é possível contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a 5% do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea “a” desta Lei, feitas em regime de adiantamento; a.3) o contrato deverá ser lavrado nas repartições interessadas, as quais manterão arquivo cronológico dos seus autógrafos e registro sistemático do seu extrato; b) convocar o licitante vencedor para assinatura do contrato em prazo xado,
sendo permitida apenas uma prorrogação, por igual período, quando solicitado pela parte durante o seu transcurso e desde que ocorra motivo justicado
aceito pela Administração; b.1) otimizar todos os procedimentos na convocação do licitante vencedor em face de que, decorridos 60 dias da data da entrega das propostas, cará
liberado dos compromissos assumidos, o que poderá ensejar a necessidade de novo processo licitatório, atraso na conclusão do objeto e desperdício de recursos; c) caso o vencedor não se manifeste, convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classicação, para fazê-lo em igual prazo e nas mesmas condições propostas pelo primeiro classicado, inclusive quanto aos preços atualizados
de conformidade com o ato convocatório, ou revogar a licitação; c.1) adotar as ações para aplicação da cominação prevista no art. 81 da lei de licitações ao licitante vencedor que desistiu da convocação; d) vericar as garantias apresentadas previstas no instrumento convocatório,
que não poderão exceder a 5% do valor do contrato no caso de obras simples e 10% no de obras de grande vulto.
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10.17.2 Emissão da ordem de serviço Deve ser vericada a existência dos seguintes documentos para autorização do início da execução: a) Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) dos responsáveis técnicos recolhida junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA) do Estado em que a obra será realizada; b) licença ambiental de instalação junto ao órgão ambiental competente, nos casos previstos em lei; c) ordem da administração autorizando o início dos serviços; d) alvará de construção junto à Prefeitura Municipal, quando cabível, e, se necessário, o alvará de demolição; e) quando for o caso, aprovação do Projeto de Prevenção e Combate a Incêndio pelo Corpo de Bombeiros e dos projetos de instalações elétricas, hidráulicas e de telefonia das concessionárias competentes; f) certicado de matrícula no Cadastro Especíco do INSS (CEI), a ser efetuada no prazo máximo de 30 dias do início de sua atividade; g) autorizações exigidas em obras com características especiais, como aquelas pertencentes a patrimônio histórico-cultural.
10.17.3 Acompanhamento e scalização a) designar representante da Administração para o acompanhamento e scalização do contrato; a.1) caso o representante verique situações que ultrapassem a sua competência, deverá submetê-las a seus superiores, em tempo hábil, para a adoção das providências cabíveis; a.2) vericar a necessidade de contratação de terceiros para auxiliar esse representante na condução da tarefa; b) exigir a indicação de preposto da empresa, tecnicamente capacitado, para acompanhar a execução do contrato; b.1) vericar se o prossional que forneceu o atestado de capacitação técnica na licitação exerce permanente acompanhamento de todos os serviços em execução; c) inaugurar o livro “Diário de Obra” que registrará todas as informações diárias relativas ao empreendimento: equipamentos disponíveis, condições meteorológicas, número de funcionários por categoria, presença de subcontratadas, observações quanto a irregularidades constatadas pela scalização, pendências de projeto etc.; d) vericar a correção das medições efetuadas, com destaque para a quantidade e qualidade dos serviços, acompanhadas de memorial de cálculo detalhado, indicando os setores e áreas em que o serviço está sendo aferido; d.1) realizar permanente comparação entre as quantidades de serviços executadas e as previstas para aquela etapa da obra e, de imediato, consultar o projetista a respeito de eventuais distorções;
CAPÍTULO 10 FASE CONTRATUAL
d.2) avaliar os saldos dos serviços contratados para a vericação da devida
adequação à conclusão do empreendimento; d.3) caso constatadas falhas graves no projeto, adotar as medidas administrativas e judiciais cabíveis; d.4) para os scais que estejam iniciando ou encerrando suas atividades, realizem inventário, inclusive por meio de foto ou lme, a respeito da
real situação da obra; e) na liquidação e pagamento vericar se toda a documentação comprobatória, inclusive scal, foi apresentada; e.1) vericar a correção do cálculo de reajustes; e.2) atentar para as compensações nanceiras e penalizações por eventuais
atrasos e descontos por eventuais antecipações de pagamentos, conforme previsto no edital; e.3) não proceder a pagamentos antecipados, salvo em situações excepcionais e com as devidas garantias; f) Vericar se as subcontratações estão sendo realizadas no limite admitido pela
Administração; g) na celebração de aditivos, atentar para os limites legais estabelecidos; g.1) vericar se o preço de novos serviços tem respaldo nos preços de mer-
cado, principalmente se está ocorrendo a manutenção das características ofertadas na licitação, como preços de insumos e BDI; g.2) se houver necessidade de aditivos de serviços já contratados com preços elevados, adotar as providências para adequá-los aos de mercado ou manter o desconto inicialmente fornecido pelo licitante; g.3) atentar para que o excessivo número de aditivos não altere o objeto licitado; g.4) para efeito de observância dos limites de alterações contratuais previstos no art. 65 da Lei nº 8.666/1993, considerar as reduções ou supressões de quantitativos de forma isolada, ou seja, o conjunto de reduções e o conjunto de acréscimos devem ser sempre calculados sobre o valor original do contrato, aplicando-se a cada um desses conjuntos, individualmente e sem nenhum tipo de compensação entre eles, os limites de alteração estabelecidos no dispositivo legal. h) prestar especial atenção à análise de recomposição de preços, visto que não servem para cobrir eventuais equívocos da empresa quando apresentou proposta na licitação.
10.17.4 Extinção a) o responsável pelo acompanhamento deverá providenciar detalhada vericação
de pendências para correções e deverá assinar termo circunstanciado do recebimento provisório apenas após o devido saneamento; b) o recebimento denitivo deve ser feito por servidor ou comissão designada
pela autoridade competente, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes, após o decurso do prazo de observação, ou vistoria que comprove a adequação do objeto aos termos contratuais;
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c) em caso de inexecução do contrato, deverá ser avaliada a conveniência e oportunidade de rescisão, nas hipóteses previstas em lei, bem como a aplicação das devidas sanções; d) caso o contrato tenha sido extinto por ter alcançado o limite dos aditivos denidos em lei, importante que se faça relatório técnico circunstanciado a respeito dos motivos, bem como sejam adotadas as providências para apurar as devidas responsabilidades.
CAPÍTULO 11
FASE POSTERIOR À CONTRATAÇÃO
Sumário: 11.1 Caderno
de especificações e documentação “as built” – 11.2 Operação – 11.3 Garantia dos serviços – 11.4 Intervenções – 11.5 Licitação, contratação e prioridade de recursos
Após o recebimento do objeto contratual de forma denitiva, inicia-se fase relativa
à utilização do empreendimento. As principais atividades compreendidas na aludida fase são operação e intervenções (manutenção, conservação, restauração, recuperação, melhoramento e reforma). A Administração deverá se cercar de todos os cuidados a m
de que as condições previstas em projeto sejam obedecidas de modo a evitar o desgaste prematuro da obra e a redução de sua condição funcional. O gestor responsável pelo gerenciamento desta fase deverá solicitar da autoridade que contratou e scalizou a execução do empreendimento a seguinte documentação: caderno de especicações, documentação “as built”, condições de operação denidas
em projeto, e devidas licenças emitidas pelos órgãos públicos competentes (habite-se, licença ambiental de instalação etc.). Essa documentação servirá como referência para as ações que deverão ser implementadas para assegurar a qualidade da obra.
11.1 Caderno de especicações e documentação “as built” O perfeito detalhamento de todo o empreendimento é essencial para que o gestor possa ter subsídio para as intervenções a serem feitas, como substituição de materiais, pequenas reformas ou, até mesmo, ampliações. Esse detalhamento é realizado por meio de dois elementos: a) caderno de especicações: onde estão descritos, de forma detalhada, todos as
marcas, códigos e referências dos materiais e serviços executados; e b) documentação “as built”: que demonstrará todos os detalhes executivos referentes à estrutura e instalações, na exata dimensão e localização em que cada um dos serviços foi executado. Esses elementos são imprescindíveis para a correta operação do empreendimento. Diversas ocorrências como trincas, rachaduras, defeitos, somente poderão ser reparadas a contento, com o menor gasto possível, caso o gestor detenha todos os
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elementos em arquivo. Caso contrário, haverá imensa diculdade em se encontrar, por exemplo, o mesmo material empregado, a mesma tonalidade de tinta utilizada ou a localização de determinada tubulação.
11.2 Operação O início da operação do empreendimento deverá ocorrer após obtenção de todas as licenças exigidas pelos órgãos públicos competentes (habite-se, licença ambiental de operação, etc.). Considerando o caráter dinâmico das diversas condições de operação, os agentes responsáveis deverão gerenciá-las de forma permanente. As especicações denidas em projeto para a operação do empreendimento devem ser conhecidas a m de que não sejam desobedecidas de forma a danicar o empreendimento. Inserem-se como características importantes: sobrecargas utilizadas para denição de elementos estruturais; tensões limites; previsão de intervenções corretivas e períodos previstos. A propósito, “é recomendável a realização de acompanhamento periódico da obra concluída, mormente nos cinco anos posteriores ao seu término, com a nalidade de identicar falhas que devam ser corrigidas pelo executor sem ônus para a Administração Pública, bem como de garantir o seu adequado funcionamento durante a vida útil de projeto, sendo boa prática a elaboração de um manual de utilização, inspeção e manutenção para o empreendimento em questão”. (TCU. Acórdão nº 1.816/2014, Plenário. Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa. DOU , 15 jul. 2014) Caso típico de violação às condições projetadas pode ser constatado na operação de rodovias. No manual de conservação rodoviária, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) destaca: As cargas transmitidas ao pavimento pelos veículos são regulamentadas por lei, em cada país. No Brasil, como na maioria dos países, a carga máxima por eixo simples é de 10 toneladas. [...] As variações entre acréscimos de carga por eixo e os correspondentes efeitos de destruição do pavimento ocorrem de forma exponencial: daí, a importância em se evitar o uso de veículos com cargas em excesso. Nesse sentido, o DNIT controla pesos por eixos que os veículos de carga e alguns tipos de ônibus transmitem ao pavimento, através de balanças xas, instaladas em pontos estratégicos, e de balanças móveis. 167
Contudo, apesar da correta normatização, o cenário encontrado ainda é crítico, conforme questão apontada em scalização sobre o tema: Outro fator que contribui bastante para o estrago do pavimento consiste na ausência, pode-se dizer, de controle do peso dos veículos que transitam pelas estradas federais. O excesso de carga compromete a vida útil das rodovias, que são projetadas para suportar até um limite de quantidade de tráfego e de pressão sobre a superfície. Superado o limite de peso, começam a surgir ssuras no pavimento, que abrem caminho para a entrada de água, que, por sua vez, danicam a estrutura da rodovia, originando as crateras.
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BRASIL. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes. Diretoria de Planejamento e Pesquisa. Coordenação Geral de Estudos e Pesquisa. Instituto de Pesquisas Rodoviárias. Manual de conservação rodoviária , p. 45-46.
CAPÍTULO 11 FASE POSTERIOR À CONTRATAÇÃO
De acordo com informações recentes do DNIT, há pelas rodovias brasileiras 75 postos de pesagem, o que já signica um número pequeno, em face dos 56 mil quilômetros
existentes de estradas pavimentadas (1 posto para 750km). O mais incrível é que 67 estão inoperantes e tão-somente 8 estão em atividade, o que perfaz uma relação de 1 posto para 7.000km. Alguns postos não têm balanças; outros, para os quais foram gastos recursos para equipá-los, não contam com pessoal de operação. Outros tantos estão ocupados, creia-se, por sem-terra. Pesquisas realizadas a pedido do então DNER mostraram que mais de 60% dos caminhões trafegam com até 20% de excesso de carga. Ainda segundo essas pesquisas, se metade da frota roda com excesso de carga ela pode ser capaz de reduzir o tempo de vida útil das rodovias em 52%. Sem falar na situação de risco em que coloca a estrutura das pontes. O problema da falta de controle do excesso de cargas nas estradas já foi por diversas vezes debatido neste Tribunal, mas até agora não recebeu do poder público uma resposta à altura de sua relevância. É certo que os recursos orçamentários são restritos, mas igualmente “falta vontade política”. Já se vão oito anos da Decisão nº 786/95 - Plenário, oportunidade em que foi determinado ao então DNER que “dê prioridade na alocação de recursos para o Plano Diretor de Pesagem, de tal forma que os postos xos de pesagem existentes entrem
efetivamente em operação, como forma de evitar a deformação permanente das rodovias, com o conseqüente aumento nos custos de conservação e recuperação”. (TCU. Acórdão nº 938/03, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 31 jul. 2003)
Os prejuízos são imensos em face da ruptura da pavimentação e das camadas estruturais inferiores, como a base e sub-base. Mais grave é que esses danos se agravam em progressão geométrica na medida em que novas chuvas ocorrem. Outra matéria relevante quando se aborda a operação de obra pública é o conjunto de ações necessárias para assegurar a continuidade da utilização do objeto previsto nos projetos e estudos de viabilidade iniciais. Se o empreendimento foi implementado com o objetivo de gerar renda a determinada população carente, o apoio técnico e nanceiro após a sua conclusão não pode ser esquecido, sob pena de inviabilizar todo
o investimento público, conforme preocupação demonstrada em auditoria de projetos de irrigação: Em que pese a informação de que a maioria dos créditos solicitados são aprovados, é importante considerar que, em razão das garantias exigidas e restrições cadastrais impostas, muitos irrigantes se abstêm de procurar os bancos por não disporem das qualicações necessárias. Por isso é necessário que as linhas de crédito sejam compatíveis
com a situação dos irrigantes. Outro fator que parece comprometer o sucesso dos perímetros é a liberação intempestiva dos créditos quando da entrega dos lotes. No perímetro de Barreiras Norte foi observado um atraso que comprometerá o atingimento dos objetivos, visto que os lotes foram entregues aos produtores há mais de um ano e até o momento nenhum empresário nem pequeno irrigante conseguiu a liberação do crédito. (TCU. Decisão nº 614/02, Plenário. Rel. Min. Iram Saraiva. DOU , 24 jun. 2002)
11.3 Garantia dos serviços O recebimento denitivo do empreendimento por parte da Administração não
exclui a responsabilidade da contratada pela correção dos vícios de construção que surgirem, consoante texto da Lei nº 8.666/93 e advertência do TCU.
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Vale salientar que o inciso I do artigo 73 da Lei nº 8.666/93, que trata do recebimento da obra, não impede, como adverte o próprio dispositivo, a aplicação dos artigos 69 e 70 da mesma lei, que determinam que “o contratado é obrigado a reparar, corrigir, remover, reconstruir ou substituir, às sua expensas, no total ou em parte, o objeto do contrato em que se vericarem vícios, defeitos ou incorreções resultantes da execução ou de materiais empregados” e que ele “é responsável pelos danos causados diretamente à Administração ou a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo na execução do contrato, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a scalização ou o acompanhamento pelo órgão interessado”. (TCU. Acórdão nº 938/03, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça.DOU , 31 jul. 2003)
Nesse sentido, o próprio Código Civil estabelece, no art. 618, a responsabilidade do empreiteiro em responder, em contratos de empreitada de edifício ou outras construções consideráveis, “durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo”. Por esse motivo, deverá o gestor acionar, de imediato, a empresa responsável pelo serviço, abstendo-se de efetuar pagamento pelo reparo de falhas de execução, consoante ilustra a situação em que o TCU determina para que o órgão público: 9.1.1 se abstenha de realizar quaisquer pagamentos, com recursos da União, à [...] destinados a recuperar, restaurar, reparar ou reformar as pontes, mata-burros e respectivos aterros de encabeçamento, tendo em vista que esses serviços já foram adequadamente pagos, sendo da empreiteira a responsabilidade tanto pelo projeto quanto pela execução da obra; 9.1.2 com base no item 6.16 do Contrato [...], exija, junto à empresa [...] a reparação imediata das pontes e mata-burros, dos respectivos aterros de encabeçamento e drenagem, dos ramais 2, 10 e 11, bem como de qualquer outra estrutura que apresente vícios ou defeitos, atentando para os prazos estabelecidos no art. 618 do Código Civil; 9.1.3 na hipótese de a empresa se recusar em atender ao item 6.16 do Contrato, utilize-se das prerrogativas inseridas no art. 87 da Lei nº 8.666/1993, bem como dos meios legais para a responsabilização civil da contratada. (TCU. Acórdão nº 732/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 19 maio 2006)
No mesmo sentido, o TCU tem entendimento importante em termos de acompanhamento de qualidade de obras concluídas sob gestão própria, com determinação ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e ao Conselho Nacional de Justiça para que orientem os órgãos/entidades nas respectivas esferas de competência a adotarem os seguintes procedimentos: 9.2.1. realização de avaliações periódicas da qualidade das obras, após seu recebimento, no máximo a cada doze meses; 9.2.2. noticação do contratado quando defeitos forem observados na obra durante o prazo de garantia quinquenal, certicando-se de que as soluções por ele propostas sejam as mais adequadas; 9.2.3. ajuizamento de ação judicial caso os reparos não sejam iniciados pelo contratado; e 9.2.4. arquivamento, entre outros documentos, de projetos, “as built”, especicações técnicas, orçamento, termos de recebimento, contratos e aditamentos, diário de obras, relatórios de inspeções técnicas após o recebimento da obra e noticações expedidas. (TCU. Acórdão nº 853/2013, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 12 abr. 2013)
CAPÍTULO 11 FASE POSTERIOR À CONTRATAÇÃO
Entretanto, um cuidado deve ser adotado pela Administração para evitar que o construtor se exima de responsabilidade, diante de manutenção inadequada da obra, conforme destaca o TCU: No que tange aos problemas de qualidade na obra, a equipe de auditoria registrou a ocorrência de bueiros assoreados/obstruídos, trincas e descolamento de placas de concreto, estradas de serviços com alagamento, processos erosivos às margens do canal; vegetação e lixos no interior do canal; calcicação no concreto da chaminé de equilíbrio (saída do
sifão); e vazamento na junta de impermeabilização da ponte-canal. 10. Julgo que deva ser determinado ao Dnocs que acione o consórcio contratado para corrigir os problemas de qualidade no empreendimento apontados no relatório de auditoria que possam ser atribuídos ao executor da obra, visto que o art. 69 da Lei de Licitações e Contratos estatui que o contratado é obrigado a reparar, corrigir, remover, reconstruir ou substituir, às suas expensas, no total ou em parte, o objeto do contrato em que se vericarem vícios, defeitos ou incorreções resultantes da execução ou de materiais
empregados. 11. O construtor tem responsabilidade objetiva no tocante à solidez e à segurança da obra durante o prazo irredutível de cinco anos, nos termos do art. 618 do Código Civil, cabendo exclusivamente a ele o ônus de demonstrar que não possui nenhuma parcela de culpa na consecução dos vícios eventualmente encontrados. Por isso, a Administração deve estar atenta a resguardar o direito de reparação do seu empreendimento, por meio da realização de vistorias periódicas seguidas e, a depender do caso, do acionamento da empresa no prazo legal. A omissão do gestor, que venha a trazer ônus ao erário, pode implicar sua responsabilização, na linha do disposto no art. 10 da Lei 8.429/1992. 12. Ressalto, no entanto, que nem todos os problemas de qualidade detectados pela equipe de auditoria estão associados a vícios construtivos de responsabilidade exclusiva do construtor. Algumas das ocorrências que comprometem a operação do canal decorrem visivelmente de falta de manutenção ou de operação inadequada, a exemplo da presença de lixo e vegetação no interior do canal. Caberá ao Dnocs realizar a avaliação, caso a caso, exigindo que o consórcio contratado tome as providências adequadas nas circunstâncias em que for responsabilizado pela ocorrência. (TCU. Acórdão nº 2.053/2015, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 26 ago. 2015)
11.4 Intervenções Existe um conjunto de intervenções realizado em obra pública com o objetivo de manter as condições técnicas e operacionais na forma prevista inicialmente. Importante não confundir essas intervenções com o reparo de serviços que a empresa executora deve assegurar no caso de defeitos de construção. Apesar de dirigidas às obras rodoviárias, as denições estabelecidas pelo DNIT
podem ilustrar os diversos tipos de intervenção necessários em obra pública:
- Conservação: refere-se às intervenções que são executadas diariamente durante todo o período, de caráter rotineiro ou eventual; - Recuperação: refere-se às intervenções que são executadas para elevar qualitativamente os componentes já existentes na rodovia, de forma a atender os parâmetros técnicos preestabelecidos; - Melhoramentos: refere-se às intervenções necessárias a dotar a rodovia de componentes novos e/ou mais modernos, inclusive os decorrentes de avanços tecnológicos e que serão executadas durante todo o período;
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- Manutenção: refere-se às intervenções periódicas, de maior monta, que serão executadas para restabelecer os parâmetros técnico preestabelecidos quando eles atingem os respectivos limiares máximos, após os trabalhos de Recuperação e/ou melhoramentos. 168
Na área de edicações são mais utilizadas as nomenclaturas manutenção e conservação para serviços rotineiros e reforma para intervenções mais signicativas. A questão importante que se apresenta nessa discussão refere-se à necessidade do empreendimento se manter em boas condições a m de que os custos de sua operação se comportem de forma a propiciar a razoabilidade desta e a redução de custos para o país. A ausência de intervenções adequadas, por exemplo, eleva signicativamente os custos atinentes a rodovias por dois motivos: a) a ausência de intervenções de menor custo em momento oportuno acarretará a necessidade de investimentos muito maiores posteriormente; e b) os custos dos passageiros, calculados com base em rendimentos médios dos usuários, e custos para cargas, em taxa de juros e em comparação a outras alternativas de transporte, são relacionados a tempo de viagem que, por sua vez, estão atrelados às condições de trafegabilidade. A análise efetuada pelo TCU em scalização na área demonstra a relevância da questão: Entidades especializadas estimam que as más condições das rodovias brasileiras fazem aumentar em até 38% o custo operacional dos veículos, 58% o consumo de combustíveis, 100% o tempo das viagens e 20% o custo do frete. Por outro lado, de acordo com o Banco Mundial, cada dólar não gasto na manutenção das estradas implica a necessidade de despender cinco dólares em reconstrução. Mas os custos da deterioração da malha rodoviária não se resumem a prejuízos materiais. Calcula-se que num trecho de rodovia em estado crítico a elevação do número de acidentes pode chegar a 50%. Em geral, organizações não-governamentais indicam que os defeitos nas vias são responsáveis por cerca de 6% dos acidentes. Para o Ministério dos Transportes, que administra o Programa de Redução de Acidentes de Trânsito (PARE), esse percentual se limita a 2,9% nas rodovias federais (considerando os últimos números para defeitos nas vias e na sinalização), conquanto reconheça um crescimento desse índice de 32,19% entre 2001 e 2002. Isso signica que 3.086 acidentes e 180 mortes foram causados em 2002 por deciência das estradas, pelos índices ociais. (TCU. Acórdão nº 938/03, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 31 jul. 2003)
A propósito, interessante estudo realizado pelo Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), denominado “Infra-estrutura do Rio de Janeiro: prazo de validade vencido”, concluído em 14 nov. 2006, com o objetivo de “alertar as autoridades e a sociedade sobre a urgência e a importância da adoção por parte dos órgãos públicos das três esferas de poder (federal, estaduais e municipais) de uma política permanente de manutenção, com destinação de recursos nanceiros, humanos e tecnológicos para essa questão”, apresentou recomendações para o trato do problema:
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BRASIL. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes. Diretoria de Planejamento e Pesquisa. Coordenação Geral de Estudos e Pesquisa. Instituto de Pesquisas Rodoviárias. Manual de conservação rodoviária , p. 32.
CAPÍTULO 11 FASE POSTERIOR À CONTRATAÇÃO
- Alocar recursos orçamentários para obras de manutenção nas três esferas de poder – federal, estaduais, e municipais; - Realização de vistoria rotineira, devendo ser realizada a intervalo de tempo regular, não superior a um ano (NBR 9452/86, ABNT); - Denir programa permanente de manutenção com:
-- Estrutura organizacional para planejamento e execução dos trabalhos; -- Manual de especicações e procedimentos padronizados, incluindo os diferentes tipos de vistorias no campo, as análises e classicações das estruturas, e os trabalhos de
restauração, quando necessários; - Contratar projetos de qualidade, gerenciamento e scalização de obras, visando à
melhoria dos empreendimentos e ao aumento da durabilidade da infra-estrutura; - Desenvolver cadastro das pontes e viadutos, com dados quantitativos e históricos; - Colocar placas de nalização de obras de reforma;
- Fiscalização rigorosa de peso e altura de caminhões.
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11.5 Licitação, contratação e prioridade de recursos Os serviços de intervenção devem ser adequadamente planejados e projetados a m de que sejam licitados de forma tempestiva. Todas as ações devem ser adotadas pelo gestor a m de que não ocorra contratação direta, sob a pretensa alegação de
“estado de emergência”. As considerações já feitas nos capítulos relativos às fases interna e externa da licitação e à de contratação são válidas para a execução das intervenções necessárias. Vale acrescentar as seguintes observações: a) consoante art. 65, §1º, da Lei nº 8.666/93, será aceito aditivo com acréscimo de até 50% no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento; b) alguns serviços de manutenção em edicações, como em parte elétrica, ar
condicionado e elevadores, por sua natureza contínua, poderão ser prorrogados por iguais e sucessivos períodos, até o limite de 60 meses; e c) “é dever da Administração contratante aprimorar os procedimentos de 170
scalização e supervisão das obras de manutenção e recuperação de rodovias
sob sua gestão, de modo a evitar a entrega e o respectivo pagamento de serviços de má qualidade ou que não atendam aos normativos técnicos aplicáveis” (TCU. Acórdão nº 1973/06, Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. DOU , 27 out. 2006). Vale ressaltar que o legislador, nessa questão, forneceu comando na Lei de Responsabilidade Fiscal, exigindo prioridade na alocação de recursos para despesas 171
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Estudo disponível em: . Acesso em: 25 nov. 2006. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei cará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos: [...] II - à prestação de serviços a serem executados de forma
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contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses”. 171 Art. 45 da Lei Complementar nº 101/2000: “Observado o disposto no §5º do art. 5º, a lei orçamentária e as de créditos adicionais só incluirão novos projetos após adequadamente atendidos os em andamento e contempladas as despesas de conservação do patrimônio público, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias”.
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com conservação do patrimônio público em relação ao início de novos empreendimentos. A propósito, é oportuna a observação do TCU a seguir: 13.5.6 Apesar de haver essa previsão legal, o que acontece acintosamente na prática é o desrespeito a essa regra, pelo próprio Poder Público, que mantém uma enorme quantidade de obras paralisadas, principalmente por falta de recursos, enquanto, talvez por decisões políticas, novos projetos são incluídos no orçamento. (TCU. Acórdão nº 938/03, Plenário. Rel. Min. Marcos Vilaça. DOU , 31 jul. 2003)
CAPÍTULO 12
CONTROLE E FISCALIZAÇÃO
Sumário: 12.1 Considerações
iniciais – 12.2 Controle administrativo – 12.3 Controle externo – 12.3.1 Obras irregulares – 12.3.2 Obras inacabadas e obras paralisadas – 12.4 Controle social
12.1 Considerações iniciais O controle da aplicação de recursos é de extrema relevância para o crescimento do país, tanto que a matéria foi alçada ao texto constitucional na Seção IX (Da Fiscalização Contábil, Financeira e Orçamentária) do Capítulo VII (Da Administração Pública). Apenas a atuação integrada de todas as esferas de controle assegurará uma eciente aplicação dos recursos públicos na execução de obras. O sistema de controle deverá estar estruturado para identicar as irregularidades, de forma tempestiva, com o
objetivo de evitar o desperdício de recursos públicos. Basicamente, existem três esferas de controle: administrativo, externo e social.
12.2 Controle administrativo Segundo Hely Lopes Meireles, controle administrativo: [...] é todo aquele que o Executivo e os órgãos de administração dos demais Poderes
exercem sobre suas próprias atividades, visando mantê-las dentro da lei, segundo as necessidades do serviço e as exigências técnicas e econômicas de sua realização, pelo que é um controle de legalidade e de mérito. Sob esses aspectos pode e deve operar-se o controle administrativo para que a atividade pública em geral se realize com legitimidade e eciência, atingindo sua nalidade plena, que é a satisfação das necessidades coletivas
e atendimento dos direitos individuais dos administrados. Daí por que o STF já sumulou que: “A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”. (Súmula 473) O controle administrativo deriva do poder-dever de autotutela que a Administração tem sobre seus próprios atos e agentes. Esse controle é normalmente exercido pelos órgãos superiores sobre os inferiores (controle hierárquico próprio das cheas e corregedorias),
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com auxílio de órgãos incumbidos do julgamento de recursos (controle hierárquico impróprio), ou, ainda, de órgãos especializados em determinadas vericações (controle técnico de auditorias, etc.), mas integrantes da mesma Administração, pelo quê se caracteriza como controle interno, pois que o externo é sempre atribuído a órgão estranho ao Executivo. 172
Nessa questão, vale desmembrar o controle administrativo sistêmico em dois: o controle administrativo exercido pelos próprios órgãos e entidades executores da despesa e o controle interno. Em relação ao primeiro, deve-se considerar que é o controle mais próximo ao momento e local do gasto, visto estar diretamente envolvido com a realização da despesa. Os agentes responsáveis pela condução do processo — membros da comissão de licitação, scais do contrato, autoridades competentes, repassadores de recursos — devem estar atentos a todos os atos praticados em face da possível responsabilidade a ser imputada no caso de irregularidades. Vale lembrar que “o ônus de comprovar a regularidade integral na aplicação dos recursos públicos compete ao gestor por meio de documentação consistente, que demonstre cabalmente os gastos efetuados” (TCU. Acórdão nº 1.556/06, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 1º set. 2006). Em caso de irregularidades, a avaliação da aplicação de pena aos gestores é realizada com base nos seguintes elementos: a) ação comissiva ou omissiva e antijurídica; b) existência de dano ou infração a norma legal, regulamentar ou contratual (irregularidade); c) nexo de causalidade entre a ação e a ilicitude vericada; e d) dolo ou culpa (negligência, imprudência ou imperícia) do agente. (TCU. Acórdão nº 2006/06, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 06 nov. 2006)
Por sua vez, o controle interno tem suas diretrizes de atuação traçadas no art. 74 da Constituição Federal e deverá dar ciência ao Tribunal de Contas da União do conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, sob pena de responsabilidade solidária: Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a nalidade de: I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União; II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à ecácia e eciência, da gestão orçamentária, nanceira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado; III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União; IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.
172
MEIRELLES. Direito administrativo brasileiro , p. 746.
CAPÍTULO 12 CONTROLE E FISCALIZAÇÃO
12.3 Controle externo O controle externo dos recursos federais é exercido pelo Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União e tem suas competências denidas
no art. 71 da Constituição Federal. Na mesma linha, as Assembleias Legislativas e os Tribunais de Contas dos Estados ou Municípios efetuam o controle dos recursos estaduais ou municipais. Todos os administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e aqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público, terão suas contas julgadas pelo Tribunal de Contas da União, ou pelos Tribunais de Contas dos Estados ou Municípios, conforme a origem dos recursos. O Tribunal de Contas da União poderá realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de comissão técnica ou de inquérito, inspeções e 173
auditorias de natureza contábil, nanceira, orçamentária, operacional e patrimonial,
nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II do art. 71 da Carta Magna. O TCU poderá, ainda, assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se vericada ilegalidade; e, se
não atendido, sustar a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal. No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis. 173
“Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento; II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público; III - apreciar, para ns de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na admi-
nistração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório; IV - realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Comissão técnica ou de inquérito, inspeções e auditorias de natureza contábil, nanceira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas uni-
dades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II;
V - scalizar as contas nacionais das empresas supranacionais de cujo capital social a União participe, de forma
direta ou indireta, nos termos do tratado constitutivo;
VI - scalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou
outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município; VII - prestar as informações solicitadas pelo Congresso Nacional, por qualquer de suas Casas, ou por qualquer das respectivas Comissões, sobre a scalização contábil, nanceira, orçamentária, operacional e patrimonial e
sobre resultados de auditorias e inspeções realizadas; VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário; IX - assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se vericada ilegalidade;
X - sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal; XI - representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos apurados”.
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
Nesse particular, cabe destacar decisão do STF que reconheceu a competência do TCU para determinar à autoridade competente que anule o contrato em caso de ilegalidade, desde que ouvidos todos os interessados: I. Tribunal de Contas: competência: contratos administrativos (CF, art. 71, IX e §1º e 2º). O Tribunal de Contas da União — embora não tenha poder para anular ou sustar contratos administrativos — tem competência, conforme o art. 71, IX, para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se for o caso, da licitação de que se originou. II. Tribunal de Contas: processo de representação fundado em invalidade de contrato administrativo: incidência das garantias do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa, que impõem assegurar aos interessados, a começar do particular contratante, a ciência de sua instauração e as intervenções cabíveis. Decisão pelo TCU de um processo de representação, do que resultou injunção à autarquia para anular licitação e o contrato já celebrado e em começo de execução com a licitante vencedora, sem que a essa sequer se desse ciência de sua instauração: nulidade. Os mais elementares corolários da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa são a ciência dada ao interessado da instauração do processo e a oportunidade de se manifestar e produzir ou requerer a produção de provas; de outro lado, se se impõe a garantia do devido processo legal aos procedimentos administrativos comuns, a fortiori , é irrecusável que a ela há de submeter-se o desempenho de todas as funções de controle do Tribunal de Contas, de colorido quase jurisdicional. A incidência imediata das garantias constitucionais referidas dispensariam previsão legal expressa de audiência dos interessados; de qualquer modo, nada exclui os procedimentos do Tribunal de Contas da aplicação subsidiária da lei geral de processo administrativo federal (L. 9.784/99), que assegura aos administrados, entre outros, o direito a “ter ciência da tramitação dos processos administrativos em que tenha a condição de interessado, ter vista dos autos (art. 3º, II), formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente”. A oportunidade de defesa assegurada ao interessado há de ser prévia à decisão, não lhe suprindo a falta a admissibilidade de recurso, mormente quando o único admissível é o de reexame pelo mesmo plenário do TCU, de que emanou a decisão. (STF. MS nº 23.550/DF, Pleno. Rel. Min. Marco Aurélio. DJ , 31 out. 2001)
12.3.1 Obras irregulares Em relação à scalização de obras públicas, vale ressaltar o trabalho desenvolvido em conjunto pelo Congresso Nacional e pelo TCU nos últimos anos que contempla anualmente 300 empreendimentos com dotação orçamentária aproximada de R$20 bilhões. A regulamentação desse trabalho é feita pelas sucessivas Leis de Diretrizes Orçamentárias Anuais em capítulo denominado “Da Fiscalização pelo Poder Legislativo e das Obras e Serviços com Indícios de Irregularidades Graves”. Considerando que essa lei tem ajustes anuais, será feito a seguir breve relato da metodologia utilizada, sem referência a artigos especícos. A linha básica de todo o trabalho é o encaminhamento de informações atualizadas ao Congresso Nacional a respeito dos principais empreendimentos executados com recursos públicos federais a m de subsidiar a análise e aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA). O TCU realiza programa anual de scalização de obra com base em diversos critérios de seleção: o valor empenhado no exercício anterior e o xado para o em curso,
CAPÍTULO 12 CONTROLE E FISCALIZAÇÃO
a regionalização do gasto, o histórico de irregularidades pendentes obtido a partir de scalizações anteriores, e a reincidência de irregularidades cometidas.
O Congresso Nacional, com base nas informações recebidas, avaliará a cada exercício a conveniência e oportunidade de deliberação pelo bloqueio ou desbloqueio da execução física, orçamentária e nanceira dos contratos, convênios, etapas, parcelas ou
subtrechos relativos aos subtítulos de obras e serviços com indícios de irregularidades
graves, a classicação da gravidade do indício, e as razões apresentadas pelos órgãos
e entidades responsáveis pela execução, em especial:
I - os impactos sociais, econômicos e nanceiros decorrentes do atraso na fruição dos
benefícios do empreendimento; II - os riscos sociais, ambientais e à segurança da população local decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do empreendimento; III - a motivação social e ambiental do empreendimento; IV - o custo da deterioração ou perda das parcelas executadas; V - as despesas necessárias à preservação das instalações e serviços já executados; VI - as despesas inerentes à desmobilização e ao posterior retorno às atividades; VII - as medidas efetivamente adotadas pelo titular do órgão ou entidade para o saneamento dos indícios de irregularidades apontados;
VIII - o custo total e o estágio de execução física e nanceira dos contratos, convênios,
obras ou parcelas envolvidas; IX - empregos diretos e indiretos perdidos em razão da paralisação; X - custos para realização de nova licitação ou celebração de novo contrato; e XI - custo de oportunidade do capital durante o período de paralisação. 174
Vale aqui ressaltar os conceitos de indícios de irregularidades trazidos pela LDO 2014, em seu art. 98, §1º, incisos IV a VI: IV - indícios de irregularidades graves com recomendação de paralisação – IGP, os atos e fatos materialmente relevantes em relação ao valor total contratado que apresentem potencialidade de ocasionar prejuízos ao erário ou a terceiros e que: a) possam ensejar nulidade de procedimento licitatório ou de contrato; ou b) congurem graves desvios relativamente aos princípios constitucionais a que está
submetida a administração pública federal; V - indício de irregularidade grave com recomendação de retenção parcial de valores – IGR, aquele que, embora atenda à conceituação contida no inciso IV do §1º, permite a continuidade da obra desde que haja autorização do contratado para retenção de valores a serem pagos, ou a apresentação de garantias sucientes para prevenir o possível dano
ao erário, até a decisão de mérito sobre o indício relatado; e VI - indício de irregularidade grave que não prejudique a continuidade – IGC, aquele que, embora gere citação ou audiência do responsável, não atende à conceituação contida nos incisos IV ou V do §1º.
Os resultados do trabalho em comento têm se mostrado extremamente positivos ao erário, consoante demonstra a consolidação dos resultados das scalizações de obra pelo Tribunal: 174
Ver art. 113 da Lei nº 13.080/2015 (LDO/2015).
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
27. No ano passado registrei que a atuação tempestiva do Tribunal possibilitou economia imediata na ordem de R$500 milhões. Essa cifra tende a ser maior ainda este ano, diante dos resultados já alcançados e do potencial de benefícios revelados pelos indícios levantados nas scalizações ainda em fase de análise. 28. A propósito do tema benefícios, merece registro a redução de R$102.401.462,62 no orçamento-base para a Construção [...], a constatação de possível sobrepreço de aproximadamente R$122 milhões nas obras [...], além de outros potenciais benefícios na ordem de 562,8 milhões em empreendimentos nos quais foram apontados indícios de irregularidades graves em fase de análise, conforme indicado no relatório consolidado da Secob. (TCU. Acórdão nº 1.731/06, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 22 set. 2006)
Como ilustração, a TABELA 12.1 apresenta os achados de auditoria mais recorrentes em scalizações no exercício de 2011. TABELA 12.1 Achados de auditoria mais recorrentes em 2013 Achado de auditoria
Qtde. Achados
Qtde. Obras
% de obras
Processo licitatório
90
48
35,3%
Sobrepreço / superfaturamento
55
40
29,40%
Projeto básico / executivo defciente ou desatualizado
58
32
23,5%
Fiscalização da obra
71
24
17,6%
Formalização e execução do contrato
36
21
15,4%
Execução da obra
24
18
13,2%
Descumprimento / obstrução
21
13
9,6%
Formalização e execução de convênio
13
6
4,4%
Dotação orçamentária
4
4
2,9%
Meio ambiente
9
1
0,7%
Total geral
381
Fonte: TCU. Acórdão nº 2.969/13, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues.
DOU ,
13 nov. 2013.
12.3.2 Obras inacabadas e obras paralisadas O tema obras inacabadas também tem sido uma preocupação do controle externo e da sociedade. A questão não é simples, visto envolver um número extremamente elevado de empreendimento em todos os níveis: federal, estadual e municipal. O TCU desenvolveu amplo trabalho a respeito da matéria. A primeira diculdade esteve na precisa conceituação do termo “obras inacabadas” e “obras paralisadas”: 2.1.4. A primeira limitação deste trabalho diz respeito à identicação de quais são as obras inacabadas que tiveram aplicação de recursos da União. Em todos os locais visitados foi freqüente a indagação sobre quais obras seriam classicadas como inacabadas, tendo
CAPÍTULO 12 CONTROLE E FISCALIZAÇÃO
em vista que o fornecimento da relação dessas obras dependia de uma padronização do signicado do termo. Com o objetivo de obter esse conceito, perguntou-se aos responsáveis pelos Ministérios visitados como eles classicavam essas obras. As respostas foram as mais variadas possíveis; contudo, todos foram unânimes em armar que não tinham
obras inacabadas, mas sim paralisadas. 2.1.5. Constatou-se de antemão que o termo “obra inacabada” tem sentido muito amplo. Para alguns, obra paralisada ainda não pode ser classicada como inacabada, pois existe
a perspectiva de continuação. Para outros, obra inacabada é apenas aquela que pode ter sido abandonada, ou seja, não há mais interesse em retomá-la ou mesmo condições para tal. Em virtude das várias peculiaridades que o tema envolve, o principal desao foi denir um conceito abrangente, que envolvesse todos os tipos de obras e situações
de paralisação. Há obras do tempo do Império que ainda não foram acabadas, como a Ferrovia Transnordestina; tem-se a obra interrompida por fraude ou por um motivo qualquer, como a falência da empresa que rmou o contrato ou um erro de projeto; e, ainda, a obra paralisada temporariamente por falta de recursos orçamentários. Enm, há vários tipos de obras paralisadas. [...]
2.1.8. O terceiro grupo são as obras abandonadas, que não possuem mais previsão de recursos, nem contrato vigente, e cujo eventual reinício deve ser precedido de uma apuração da responsabilidade do gestor negligente na aplicação dos recursos. Ainda assim, mesmo que haja interesse em retomá-las, tem-se incorporações de mais custos ao projeto, visto ser necessária uma prévia recuperação de suas instalações devido ao estado da obra, geralmente bastante deteriorada. 2.1.9. Tendo em vista a conceituação denida, as obras inacabadas podem estar situadas
entre as obras em andamento anormal e as obras abandonadas. Estas, como explicado anteriormente, necessitam de uma apuração e responsabilização do gestor, naquelas precisam ser identicadas as possíveis causas das diculdades para a implementação de
soluções que permitam a sua continuidade. Em ambos os casos a origem do problema deve ser avaliada como forma de estabelecer medidas para minimizá-lo. Vale ressaltar que as obras em andamento anormal têm grande probabilidade de virem a se tornar inacabadas, pois a falta de solução para o problema que ocasionou sua paralisação pode perdurar a ponto de a obra não ter condições de ser nalizada. 2.1.10. Diante da diculdade de uniformização do conceito, o objeto da scalização passou
a ter outra denominação, apesar de não ter sido alterado o objetivo do Levantamento. As obras estudadas neste trabalho passaram a ser denominadas simplesmente como paralisadas para permitir uma melhor investigação das questões de auditoria e simplicar
a aplicação dos métodos e procedimentos que conduzissem à obtenção de achados. (TCU. Acórdão nº 1.188/07, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 22 jun. 2007) Ao nal, a Corte de Contas apresentou uma ampla gama de medidas a serem
adotadas para que, em médio prazo, esse grave problema possa ser solucionado:
9.1. determinar, com fundamento no art. 43 da Lei nº 8.443/92 e no art. 250 do Regimento Interno, ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, que: 9.1.1. implemente um sistema de informações para registro de dados das obras públicas executadas com recursos federais que consubstancie um Cadastro Geral de Obras e permita o controle e acompanhamento dos empreendimentos, bem como a ampla consulta pela sociedade; 9.1.2. na concepção do sistema de que trata o subitem anterior, contemple os seguintes parâmetros: 9.1.2.1. vinculação de todos os contratos de uma determinada obra ao mesmo código (chave OBRA);
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
9.1.2.2. necessidade do nome da obra ser diferente da ação orçamentária, visto que uma mesma ação poder contemplar mais de uma obra e vice-versa; 9.1.2.3. condicionamento da liberação inicial de recursos para a obra à criação do referido código no sistema (chave OBRA); 9.1.2.4. cadastramento dos cronogramas físico-nanceiros de todos os contratos de uma obra em módulo especíco para este m, para o posterior acompanhamento das medições, de forma a cotejar a execução prevista e a realizada, sendo o registro das informações dos cronogramas da obra e das medições condição obrigatória para emitir as notas de lançamento no SIAFI; 9.1.2.5. permanência dos registros até a efetiva conclusão da obra; 9.1.3. adote as providências cabíveis para o cumprimento do parágrafo único do art. 45 da Lei de Responsabilidade Fiscal, com o encaminhamento, ao Congresso Nacional, até a data do envio do projeto de lei de diretrizes orçamentárias, do relatório com as informações previstas no caput do citado dispositivo; 9.1.4. até que seja implementado o sistema de que trata o subitem 9.1.1 deste Acórdão, encaminhe ao TCU, anualmente, até o nal de cada exercício, informações sobre as 400 (quatrocentas) obras listadas nos Anexos I e II do relatório técnico (s. 234/245), assim como sobre outras obras inacabadas identicadas posteriormente, com nível de detalhamento que abranja o cronograma físico-nanceiro previsto, a porcentagem de execução física e nanceira já executada, a dotação consignada, bem como outros dados relevantes sobre o andamento da obra; 9.2. recomendar, com fulcro no art. 250, inciso III, do Regimento Interno do TCU, ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão que: 9.2.1. retome a implantação do Portal ObrasNet, com vistas a disponibilizar na Internet informações sobre o andamento das obras públicas realizadas com recursos federais, de forma a facilitar o controle social, passando a incorporar no referido portal as informações a serem disponibilizadas pelo sistema de que trata o subitem 9.1.1 deste Acórdão; 9.2.2. institua normativos no intuito de que os órgãos setoriais elaborem estudos técnicos preliminares das obras que pretendem incluir no orçamento anual, de forma a permitir: 9.2.2.1. a avaliação da viabilidade técnica, socioeconômica e ambiental do empreendimento; 9.2.2.2. a estimativa dos preços e prazos relativos à elaboração dos projetos e à execução da obra; 9.2.2.3. a tomada de decisão quanto à necessidade de alocar recursos especícos para estudos e projetos em exercício nanceiro distinto do previsto para a execução da obra; 9.3. recomendar, com fulcro no art. 250, inciso III, do Regimento Interno do TCU, à Secretaria do Tesouro Nacional que acrescente dispositivos na Instrução Normativa STN nº 01, de 15 de janeiro de 1997, com o to de: 9.3.1. estabelecer a sistemática a ser utilizada pelos órgãos repassadores para o acompanhamento das obras realizadas por transferências de recursos, mediante a implantação de metodologia padronizada e a utilização obrigatória do sistema de que trata o subitem 9.1.1 deste Acórdão; 9.3.2. exigir que os objetos de convênios ou instrumentos congêneres relativos a obras reram-se ao empreendimento como um todo ou às suas fases, garantindo assim o alcance da funcionalidade e o atendimento ao interesse público, denindo, para tanto, o conceito dos termos relativos a obra, quais sejam: empreendimento, etapa e fase, tal como se encontram estabelecidos no Manual de Apresentação de Estudos de Pré-Viabilidade de Projetos de Grande Vulto do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; 9.4. recomendar, com fulcro no art. 250, inciso III, do Regimento Interno do TCU, ao Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia - CONFEA que os novos procedimentos a serem implantados pelo Projeto ART e Acervo Técnico contemplem os seguintes itens, de modo a possibilitar futura integração das informações geridas pelo
CAPÍTULO 12 CONTROLE E FISCALIZAÇÃO
sistema CONFEA/CREAs aos sistemas de controle e gestão da Administração Pública: 9.4.1. uniformização dos processos de registro e baixa de ARTs nos CREAs, padronizando formulários e incentivando o uso das versões eletrônicas e on line (via Internet), que favorecem a agilidade, precisão e o acesso a informações tempestivas; 9.4.2. vinculação de um código às obras/serviços públicos, permitindo identicar todas
as ARTs relacionadas ao mesmo objeto; 9.4.3. centralização das informações dos CREAs em um banco de dados nacional; 9.4.4. possibilidade de geração de relatórios a partir de pesquisas ao banco de dados nacional por diversas combinações de chaves; 9.4.5. permissão de acesso aos dados de registro e baixa das ARTs das obras públicas aos órgãos de controle; 9.5. sugerir ao Congresso Nacional que: 9.5.1. quando da aprovação das Leis de Diretrizes Orçamentárias, regulamente a matéria disposta no caput do artigo 45 da Lei de Responsabilidade Fiscal por intermédio da criação de uma Carteira de Projetos da Administração Pública Federal que contemple informações a serem enviadas ao Legislativo juntamente com o Projeto de Lei Orçamentária Anual relativas às obras com valor superior a R$10.500.000,00 cuja execução ultrapasse um exercício nanceiro e daquelas com limite superior a R$2.000.000,00 com previsão de
realizar-se integralmente no exercício do orçamento, listadas por unidade orçamentária e por ordem de prioridade de execução, contendo as respectivas dotações consignadas, data provável de conclusão e montante necessário para os exercícios subseqüentes, compreendendo o seguinte funcionamento: 9.5.1.1. inclusão das obras na Carteira de Projetos condicionada à existência de estudos preliminares de avaliação da viabilidade técnica, socioeconômica e ambiental dos empreendimentos, inclusive os decorrentes de emendas parlamentares; 9.5.1.2. correspondência entre a dotação designada à obra e a meta nanceira estabelecida
no cronograma de execução; 9.5.1.3. obediência à ordem de prioridade atribuída às obras pelos órgãos setoriais quando da destinação de recursos orçamentários e nanceiros; 9.5.1.4. impossibilidade de modicação da lista de prioridades pelo Executivo, de um ano
para outro, sem a devida motivação; 9.5.1.5. inclusão de obras novas condicionada à existência de recursos sucientes, de modo
a não prejudicar o adequado andamento aos projetos já inseridos na Carteira; 9.5.1.6. necessidade do Poder Executivo estabelecer critérios para regulamentar a contenção de recursos orçamentários e nanceiros para os empreendimentos componentes da Carteira de Projetos, de forma a viabilizar o cumprimento dos cronogramas denidos, com vistas
a priorizar a aplicação de recursos nos empreendimentos em andamento; 9.5.1.7. vericação do cumprimento das exigências relacionadas ao funcionamento da
Carteira de Projetos a ser realizada pelo Congresso Nacional com o auxílio do Tribunal de Contas da União, de modo a subsidiar a apreciação do Projeto de Lei Orçamentária para o exercício subsequente; 9.5.2. quando da regulamentação da Carteira de Projetos nas Leis de Diretrizes Orçamentárias para os próximos exercícios, insira regras denindo, ao longo do tempo,
como se dará a transição dos valores de corte inicialmente estabelecidos para as obras constantes da Carteira, de forma a incluir gradualmente as obras de menor valor; 9.5.3. quando da aprovação das Leis de Diretrizes Orçamentárias para os próximos exercícios, estabeleça a necessidade de implementação e utilização, por parte da Administração Pública, do Cadastro Geral de Obras de que trata o subitem 9.1.1 deste Acórdão;
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9.5.4. quando da aprovação das Leis de Diretrizes Orçamentárias para os próximos exercícios, dada a importância do pleno cumprimento do art. 45 da LRF para que o início de novas obras não prejudique a continuidade daquelas já iniciadas: 9.5.4.1. inclua o conceito da expressão “adequadamente contemplados” no texto da LDO; 9.5.4.2. aperfeiçoe o atual conceito de “projetos em andamento” da LDO, permitindo que a relação de projetos a ser enviada ao Congresso Nacional inclua as obras que alcançarem o limite de 20% de execução até o período de dois meses anterior à data de envio do relatório;
9.5.4.3. avalie, a cada ano, a possibilidade de reduzir o limite de 20% de execução denido para caracterizar obras em andamento, na medida em que se vericar a redução do estoque de obras públicas federais; 9.6. determinar aos Ministérios das Cidades, Turismo, Saúde e Educação, com fulcro no art. 43 da Lei 8.443/92 e no art. 250 do Regimento Interno do TCU, que adotem as providências cabíveis para o cumprimento do artigo 21, §2º, da LDO 2007, o qual determina o lançamento
das informações físicas e nanceiras dos contratos de obras realizadas por convênios e
contratos de repasse no módulo SICONV do SIASG. (TCU. Acórdão nº 1.188/07, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 22 jun. 2007)
12.4 Controle social O controle social é entendido como aquele exercido diretamente pela população.
É de extrema eciência pela proximidade que o cidadão tem com o local da execução do gasto. Por esse motivo, as diretrizes legais inseridas em diversos textos estabelecem mecanismos para que o cidadão participe de forma efetiva desse controle: a) possibilidade de comunicação às autoridades de irregularidades na aplicação de recursos públicos por meio de denúncias e representações; b) viabilidade da participação no processo decisório, quando da realização de audiências públicas; e c) disponibilidade de informações de fácil acesso relativas aos gastos públicos. Em relação à criação de canais de comunicação de irregularidades, existe a previsão de que “qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União” (art. 74, §2º, da Constituição Federal), bem como a de que “qualquer licitante, contratado ou pessoa física ou jurídica poderá representar ao Tribunal de Contas ou aos órgãos integrantes do sistema de controle interno contra
irregularidades na aplicação desta Lei, para os ns do disposto neste artigo” (art. 113, §1º, da Lei nº 8.666/93). A realização de audiências públicas está prevista no processo de licenciamento ambiental para exposição aos interessados do conteúdo do produto em análise e do seu referido relatório de impacto (Rima) e recolhimento de críticas e sugestões a respeito. Será efetivada sempre que o órgão ambiental competente “julgar necessário, ou quando for solicitado por entidade civil, pelo Ministério Público, ou por 50 (cinqüenta) ou mais cidadãos” (art. 2º da Resolução Conama nº 09/87). 175
175
Art. 11, §2º, da Resolução Conama nº 01/86: “Ao determinar a execução do estudo de impacto ambiental e apresentação do RIMA, o estadual competente ou o IBAMA ou, quando couber o Município, determinará o prazo para recebimento dos comentários a serem feitos pelos órgãos públicos e demais interessados e, sempre que julgar necessário, promoverá a realização de audiência pública para informação sobre o projeto e seus impactos ambientais e discussão do RIMA”.
CAPÍTULO 12 CONTROLE E FISCALIZAÇÃO
A condução de audiências públicas também está prevista na realização de licitação ou conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas com valores superiores a 100 vezes o xado para concorrência pública, nos termos do art. 39 da Lei nº 8.666/93, e durante
os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos, consoante art. 48 da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF). A disponibilização de informações à sociedade pode ser percebida na obrigatoriedade de publicação de atos referentes à licitação e contratação, bem assim de divulgação das seguintes informações na homepage Contas Públicas: 176
I - os montantes de cada um dos tributos arrecadados pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, os recursos por eles recebidos, os valores de origem tributária entregues e a entregar e a expressão numérica dos critérios de rateio (caput do art. 162 da Constituição Federal); II - os relatórios resumidos da execução orçamentária da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (§3º do art. 165 da Constituição Federal); III - o balanço consolidado das contas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, suas autarquias e outras entidades, bem como um quadro estruturalmente idêntico, baseado em dados orçamentários (art. 111 da Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964); IV - os orçamentos do exercício da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e os respectivos balanços do exercício anterior (art. 112 da Lei nº 4.320, de 1964); V - os resumos dos instrumentos de contrato ou de seus aditivos e as comunicações raticadas pela autoridade superior (caput do art. 26, parágrafo único do art. 61, §3º do art. 62, arts. 116, 117, 119, 123 e 124 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993); VI - as relações mensais de todas as compras feitas pela Administração direta ou indireta (art. 16 da Lei nº 8.666, de 1993). (art. 1º da Lei nº 9.755/98) Por m, não poderia ser esquecida a aprovação da Lei nº 12.527/11que regula o
acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do §3º do art. 37 e no §2º do art. 216 da Constituição Federal. Por meio dela, o controle social terá maior efetividade diante da facilidade com que o cidadão conseguirá obter dados a respeito das despesas públicas, conforme se depreende da clareza dos artigos que tratam dos procedimentos para o acesso à informação: Art. 10. Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1º desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identicação do requerente e a especicação da informação requerida. §1º Para o acesso a informações de interesse público, a identicação do requerente não
pode conter exigências que inviabilizem a solicitação. §2º Os órgãos e entidades do poder público devem viabilizar alternativa de encaminhamento de pedidos de acesso por meio de seus sítios ociais na internet.
§3º São vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público. Art. 11. O órgão ou entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível. §1º Não sendo possível conceder o acesso imediato, na forma disposta no caput , o órgão ou entidade que receber o pedido deverá, em prazo não superior a 20 (vinte) dias: 176
Disponível em: .
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I - comunicar a data, local e modo para se realizar a consulta, efetuar a reprodução ou obter a certidão; II - indicar as razões de fato ou de direito da recusa, total ou parcial, do acesso pretendido; ou III - comunicar que não possui a informação, indicar, se for do seu conhecimento, o órgão ou a entidade que a detém, ou, ainda, remeter o requerimento a esse órgão ou entidade, cienticando o interessado da remessa de seu pedido de informação. §2º O prazo referido no §1º poderá ser prorrogado por mais 10 (dez) dias, mediante justicativa expressa, da qual será cienticado o requerente.
CAPÍTULO 13
PLANILHAS ORÇAMENTÁRIAS VISÃO PRÁTICA
Sumário: 13.1 Considerações
iniciais – 13.2 Elaboração da planilha base do orçamento – 13.3 Relação dos insumos que serão utilizados e a pesquisa de preços – 13.4 Orçamento sintético de custos diretos – 13.5 Orçamento sintético de preços – 13.6 Relação das composições de serviço e orçamento analítico – 13.7 Curva ABC – 13.8 Cronograma físico e nanceiro
13.1 Considerações iniciais O conhecimento dos conceitos de preços e custos de obras já apresentados nos capítulos anteriores deve ser complementado com a ilustração das principais planilhas orçamentárias existentes, bem assim com os estágios de elaboração desses documentos, de forma a familiarizar os agentes públicos e privados no desenvolvimento, análise e seleção do valor do empreendimento que será contratado. O pressuposto para um bom trabalho, sem dúvida alguma, é o desenvolvimento de um projeto de qualidade que assegure serviços quanticados e precicados de acordo
com a boa técnica. Apenas a partir desse momento é possível iniciar os procedimentos para a elaboração das peças orçamentárias. A seguir serão apresentados esses procedimentos e as planilhas que a equipe técnica deverá avaliar: as apresentadas pelas licitantes ou aquelas desenvolvidas pela própria Administração. Oportuno lembrar que o trabalho técnico de elaboração de orçamento de obras públicas cabe a prossionais cujas competências estejam previstas na Lei nº 5.194/66.
Mais do que isso, deverá sempre haver uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), prevista na Lei nº 6.496/77, e agora também no Decreto nº 7.983/13, recolhida por esses prossionais de forma a vinculá-los às tarefas realizadas.
13.2 Elaboração da planilha base do orçamento O primeiro passo para a materialização do orçamento é a decomposição do empreendimento em todos os serviços que serão executados.
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Após essa decomposição, deve o prossional quanticar cada um dos serviços com base na documentação existente (projetos, memoriais, especicações, etc.).
Com os serviços decompostos e suas respectivas quantidades é possível alimentar sistema informatizado de orçamento de obra pública. A título de ilustração, 177
apresenta-se no decorrer deste capítulo, para uma obra ctícia, as diversas planilhas
que caracterizam um empreendimento. A TABELA 13.1 destaca a planilha que relaciona os serviços pertencentes à obra, acompanhados de suas quantidades e unidades de medição. Neste momento, ainda não há estudo relativo aos preços dos insumos e serviços. Deve-se, ainda, na estruturação desta planilha, seguir orientação do TCU no sentido de que: a) “os itens Administração local, Instalação de canteiro e acampamento e Mobilização e desmobilização, visando a maior transparência, devem constar na planilha orçamentária e não no LDI” (TCU. Acórdão nº 325/07, Plenário. Rel. Min. Guilherme Palmeira. DOU , 16 mar. 2007); b) não é recomendável a inserção de itens como verba na planilha, a exemplo de instalações elétricas e instalações hidráulicas.
13.3 Relação dos insumos que serão utilizados e a pesquisa de preços Como o sistema de orçamento de obras possui uma base de composições de serviços previamente cadastradas, será gerada automaticamente uma relação de todos os insumos necessários a execução do empreendimento. Em suma, o sistema adota os seguintes procedimentos para o cálculo da quantidade de cada insumo: a) busca a relação dos serviços dos quais o insumo faz parte da composição; b) em cada serviço, multiplica o coeciente de produtividade do insumo pela
quantidade desse serviço, obtendo a quantidade do insumo para o serviço especíco;
c) efetua a soma das quantidades parciais do insumo utilizado nos diversos serviços, obtendo o valor nal. O resultado nal está apresentado na TABELA 13.2, que elenca todos os insumos
a serem empregados, acompanhados de suas respectivas quantidades. Neste estágio, é possível ter uma boa ideia de quais são os principais insumos que serão utilizados, bem como iniciar a pesquisa de preços dos materiais, mão de obra e equipamentos. A regra para obtenção de preços é a seguinte: a) pesquisa dos valores no sistema Sinapi da Caixa Econômica Federal ou Sicro do Dnit; 178
177
O sistema informatizado de orçamento de obra pública utilizado para a elaboração das planilhas apresentadas neste capítulo foi o Compor 90 (Informações disponíveis em: ).
Decreto nº 7.983/13: Art. 3º O custo global de referência de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços e obras de infraestrutura de transporte, será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – Sinapi, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de construção civil.
178
CAPÍTULO 13 PLANILHAS ORÇAMENTÁRIAS – VISÃO PRÁTICA
b) caso não haja preços de determinados insumos no sistema de referência, realizar pesquisa de mercado, obedecendo ao seguinte critério: quanto mais relevante for o valor global do item, maior número de empresas deverá ser consultado. Importante que a referida pesquisa seja documentada nos autos; c) por vezes, são necessários ajustes relativos a transportes, armazenamento, diferenças tributárias, que deverão estar registrados no processo; d) importante lembrar que, em regime de execução por preço unitário, somente em condições especiais, poderão os custos unitários do orçamento-base da 179 180
licitação exceder o limite xado no sistema de referência; e, em regime de
execução por preço global, somente em condições especiais, poderão os custos das etapas do cronograma físico-nanceiro exceder o valor calculado a partir
do sistema de referência utilizado. Obtidos os valores por meio da pesquisa, os preços dos insumos deverão ser inseridos no sistema de orçamento de obra. É recomendável que a data-base da cotação dos preços também seja registrada pelo sistema para solucionar eventuais dúvidas futuras. 181 182
13.4 Orçamento sintético de custos diretos O cálculo dos custos diretos é efetuado automaticamente pelo sistema por meio do cruzamento das informações constantes na base de composição de serviços, os preços dos insumos alimentados e as leis sociais denidas para o caso especíco. Ao nal, é produzida planilha de custos diretos, conforme ilustra a TABELA 13.3, cujo valor total para o caso em análise é de R$958.927,04. Para a denição dos preços unitários falta, ainda, a diluição do BDI, que deverá ser denido em função das
peculiaridades do empreendimento.
13.5 Orçamento sintético de preços Para a transformação da planilha ilustrada na TABELA 13.3 em planilha de preços unitários é necessário ratear o valor do BDI (R$287.480,93 – estimado para esta simulação) em cada serviço.
Parágrafo único. O Sinapi deverá ser mantido pela Caixa Econô mica Federal – CEF, segundo denições técnicas de engenharia da CEF e de pesquisa de preço realizada pelo Instituto Brasil eiro de Geograa e Estatística – IBGE.
Art. 4º O custo global de referência dos serviços e obras de infraestrutura de transportes será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais aos seus correspondentes nos custos unitários de referência do Sistema de Custos Referenciais de Obras – Sicro, cuja manutenção e divulgação caberá ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser considerados como de infraestrutura de transportes. 179
Decreto nº 7.983/13 “Art. 6º Em caso de inviabilidade da denição dos custos conforme o disposto nos arts. 3º,
4º e 5º, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal em publicações técnicas especializadas, em sistema especíco instituído para o setor ou em pesquisa de mercado”.
180 181 182
Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 8º, §4º, da Lei nº 12.462/11. Ver art. 13 do Decreto nº 7.983/13. Para obras contratadas pelo RDC, ver art. 42 do Decreto nº 7.581/11.
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Para tanto, é preciso denir o percentual do BDI:
A multiplicação desse percentual pelos custos diretos unitários fornecerá os preços unitários, conforme TABELA 13.4.
13.6 Relação das composições de serviço e orçamento analítico Apesar da importância dos documentos anteriores, a planilha que possibilita a visão mais detalhada do orçamento é a relação das composições de serviços, conforme ilustra a TABELA 13.5. Nela, é viável a leitura de todos os detalhes: insumos necessários para cada serviço, coecientes de produtividade, valor das leis sociais e do BDI, preços dos
insumos, quantidade de serviços. Quando essa relação computa as quantidades de cada serviço, tem-se uma nova peça denominada orçamento analítico. Cabe notar o serviço “forma para fundação”, já estudado na seção 5.2.2.2 deste livro, que está inserido no item 3.5 da planilha. O valor do custo direto estabelecido nos dois casos (R$23,25/m²) é idêntico, visto serem os mesmos insumos, coecientes, quantidades, preços e especicações. Valem, portanto, todas as considerações já
efetuadas no Capítulo 5.
13.7 Curva ABC A denição da curva ABC já foi apresentada na seção 5.1.7 desta publicação.
Essa curva, que pode ser elaborada para os insumos (TABELA 13.6) ou para os serviços da obra (TABELA 13.7), permite o conhecimento dos itens que possuem maior impacto no valor do orçamento e que deverão ter uma análise mais aprofundada no momento da denição dos preços.
Importante perceber, da análise das planilhas, que 80% do valor do empreendimento costuma se concentrar em menos de 20% dos itens de insumos ou serviços. É exatamente para esses itens que a equipe deverá dedicar total atenção. Porém, cuidado especial deve ser adotado em relação ao projeto básico. Se a qualidade não for a desejada, existe elevado risco de itens que a princípio pertenciam ao grupo C migrarem para o grupo A no decorrer da obra diante da necessidade de acréscimo de quantitativos. Nesse caso, se os responsáveis concentraram sua análise inicial de preços apenas nos itens do grupo A poderão ter uma desagradável surpresa ao perceberem que um serviço do item C, contratado a um valor unitário elevado, teve um aditivo substancial de quantidades, ocasionando dano ao erário. Com efeito, para evitar falhas dessa espécie, o TCU tem determinado aos órgãos que exijam “de cada licitante de obras públicas, nos instrumentos convocatórios, a documentação que comprove a compatibilidade dos custos dos insumos com os de
CAPÍTULO 13 PLANILHAS ORÇAMENTÁRIAS – VISÃO PRÁTICA
mercado, segundo o art. 48, inciso II, da Lei nº 8.666/93, tais como: composição unitária de preços; curva ABC de insumos e serviços; tabelas de preços consagradas, como SINAPI, PINI, DNIT, etc.; e demonstrativo de cálculo dos encargos sociais e do BDI utilizados na composição dos preços” (TCU. Acórdão nº 1.461/2003, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 13 out. 2003).
13.8 Cronograma físico e nanceiro A denição do valor-base do orçamento que será contratado não é suciente para
a correta condução do empreendimento. É preciso que seja agregado o fator tempo ao contexto para que seja possível o conhecimento dos serviços que serão executados em cada mês e os valores que serão despendidos em cada período. As tabelas 13.8, 13.9 e 13.10 ilustram as planilhas relativas a cronogramas físicos e nanceiros que os responsáveis devem ter acesso no curso de um procedimento
licitatório. Com base no cronograma, os sistemas de orçamento podem, ainda, fornecer o cronograma de consumo de insumos (TABELA 13.11) no qual é possível vericar as
quantidades de material, mão de obra e equipamento que serão empregados mês a mês. Essa planilha é ferramenta útil para a vericação da efetiva execução de serviços, visto
ser necessária a compatibilidade entre os insumos previstos e os existentes na obra.
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TABELA 13.1 Planilha dos serviços pertencentes à obra, acompanhados de suas quantidades e unidades de medição
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TABELA 13.2 Planilha dos insumos a serem empregados, acompanhados de suas respectivas quantidades
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TABELA 13.3 Planilha de custos diretos dos serviços
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TABELA 13.4 Planilha de preços unitários
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (continua)
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TABELA 13.5 Relação das composições de serviços (conclusão)
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TABELA 13.6 Curva ABC de insumos (continua)
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TABELA 13.7 Curva ABC de serviços
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CAPÍTULO 14
SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
Sumário: 14.1 Considerações
iniciais – 14.2 A sustentabilidade e o desenvolvimento econômico nacional nas compras e investimentos públicos – 14.3 Mudanças comportamentais – A cultura dos 5 Rs – 14.4 A evolução legislativa e regulamentar – 14.5 Critérios legais afetos à sustentabilidade e ao desenvolvimento nacional para a análise de propostas e xação de margem de preferência
– 14.6 O processo de planejamento, execução e utilização das obras públicas e a sustentabilidade – 14.7 Considerações nais
14.1 Considerações iniciais O amadurecimento e conscientização da população mundial a respeito da importância de controlar suas ações a m de preservar o futuro do Planeta têm gerado
grandes discussões no meio social. O desenvolvimento desordenado de curto prazo leva a uma evolução imediata
aparentemente vantajosa, mas os prejuízos de médio e longo prazo serão signicativos
e, talvez, irreversíveis, caso medidas sérias não sejam adotadas. A expressão sustentabilidade, apesar de apresentar um signicado extremamente
amplo, traz a ideia de efeitos futuros decorrentes de ações praticadas no presente. Origina-se da expressão latina sustentare. Os dicionários apontam diversos signicados relacionados ao verbo sustentar, como: suportar, preservar em bom estado, resguardar, manter, segurar por baixo, impedir que caia, servir de escora, conservar a mesma posição, equilibrar-se, manter-se, conservar-se. Existem diversas vertentes relacionadas à sustentabilidade, das quais podemos destacar a ambiental, social, econômica e tecnológica. Apesar de todas essas vertentes se apresentarem inter-relacionadas, a questão ambiental tem crescido em importância nos últimos anos. As Nações perceberam a necessidade da adoção de medidas positivas para a manutenção de equilíbrio do ecossistema em face de graves constatações atinentes a desastres naturais e mudanças climáticas radicais. Mais ainda, concluíram que esses problemas não serão resolvidos por meio de ações pontuais e sim por um conjunto de ações sistêmicas e coordenadas. Surge, então, a ampla discussão mundial e nacional a respeito da sustentabilidade!
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Na realidade, o conceito está atrelado ao fato de que o consumo de recursos necessários para o desenvolvimento presente não pode prejudicar a disponibilidade da existência de recursos que sustentem o círculo virtuoso do crescimento futuro. A degradação da qualidade de vida da população, em virtude da agressão aos recursos naturais, fez com que a sociedade alcançasse um novo patamar de consciência e exigisse a modicação do comportamento de agentes públicos e privados. O Estado percebeu a importância de sua atuação na regulamentação para evitar a degradação ambiental e de seu papel de grande comprador de bens e serviços, enquanto as empresas começaram a notar a pressão de seus clientes pela utilização de práticas não degradantes em seu processo de produção. Nesse contexto, cou claro que a essência da sustentabilidade está na adoção de medidas preventivas da poluição e degradação ambiental, por meio de uma gestão ambiental sistêmica. Entretanto, não adianta desenvolver profunda discussão apenas na área am biental se não houver a disponibilização de condições básicas de vida digna para as populações. Esse é o foco da sustentabilidade social: melhor qualidade de vida da população, facilidade no acesso à educação, diminuição das diferenças sociais, e aprimoramento na distribuição de renda. Surge, então, a sustentabilidade econômica como elemento estruturante, relacionada à capacidade de produção e distribuição de riquezas produzidas, bem como ao equilíbrio entre produção e consumo de um país. Por m, a sustentabilidade tecnológica traz a ideia de produção de conhecimento aplicado e, no caso de aquisições junto a outros países, de previsão de transferência de tecnologia ao comprador.
14.2 A sustentabilidade e o desenvolvimento econômico nacional nas compras e investimentos públicos A lei de licitações não exige que o poder público tenha como norteador para a aquisição de bens e contratação de obras e serviços apenas o menor preço, sem considerar critérios sociais e ambientais. Em essência, a lógica da sustentabilidade está no desenvolvimento harmônico entre seres humanos e natureza e baseia-se no equilíbrio dos fatores ambiental, econômico e social. Em muitas situações, ocorre forte confronto de agentes que se beneciam pela preponderância de determinado fator em relação aos demais. Caberá ao Estado induzir a adoção da melhor solução em relação à análise do benefíciocusto para todos os agentes interessados — sociedade, empresas, órgãos e entidades governamentais, e organizações não governamentais. Os governos, como grandes compradores no âmbito de cada mercado, podem e devem pautar suas aquisições em critérios de sustentabilidade. As compras governamentais no Brasil situam-se no patamar de bilhões de reais. Alguns estudos estimam valores próximos a 10% do Produto Interno Bruto (PIB). A Administração Pública, em decorrência de seu poder de compra, é um agente indutor na implementação de ações sustentáveis. Por esse motivo, é essencial que todos os gestores públicos estabeleçam, no planejamento das aquisições efetuadas com recursos públicos, diretrizes que assegurem não apenas o menor preço, mas a aquisição da proposta mais vantajosa e aquela que assegure os parâmetros da sustentabilidade em todos os seus aspectos.
CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
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Nesse sentido, oportunas as observações trazidas pela Agenda ambiental na Administração Pública: Compras sustentáveis consistem naquelas em que se tomam atitudes para que o uso dos recursos materiais seja o mais efciente possível. Isso envolve integrar os aspectos
ambientais em todos os estágios do processo de compra, de evitar compras desnecessárias a identifcar produtos mais sustentáveis que cumpram as especifcações de uso requeridas.
Logo, não se trata de priorizar produtos apenas devido a seu aspecto ambiental, mas sim considerar seriamente tal aspecto juntamente com os tradicionais critérios de especifcações
técnicas e preço. Em muitos países, como o Canadá, Estados Unidos, Japão e países da União Europeia, as iniciativas de compras sustentáveis foram introduzidas inicialmente como programas de adoção de boas práticas ambientais, entre elas o acesso às informações sobre produtos e serviços sustentáveis, mecanismos legais para garantir a preferência aos produtos sustentáveis e a capacitação dos agentes públicos. O Estado precisa incentivar o mercado nacional a ajustar-se à nova realidade da sustentabilidade, permitindo às instituições públicas assumir a liderança pelo exemplo. 183
Vale ressaltar a recente alteração da lei de licitações que inseriu expressamente “a promoção do desenvolvimento nacional sustentável”, ao lado da seleção da proposta mais vantajosa, como objetivo principal do processo licitatório: Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. (Redação dada pela Lei nº 12.349, de 15 dez. 2010) A justifcativa contida no encaminhamento do texto da Medida Provisória
nº 495/2010 ao Congresso Nacional, convertido posteriormente na Lei nº 12.349/2010, ilustra a relevância desse comando na promoção do desenvolvimento econômico nacional, bem assim o fato de que política semelhante é adotada em vários países: 3. Paralelamente, impõe-se a necessidade de adoção de medidas que agreguem ao perfl
de demanda do setor público diretrizes claras atinentes ao papel do Estado na promoção do desenvolvimento econômico e fortalecimento de cadeias produtivas de bens e serviços domésticos. Nesse contexto, torna-se particularmente relevante a atuação privilegiada do setor público com vistas à instituição de incentivos à pesquisa e à inovação que, reconhecidamente, consubstanciam poderoso efeito indutor ao desenvolvimento do país. 4. Com efeito, observa-se que a orientação do poder de compra do Estado para estimular a produção doméstica de bens e serviços constitui importante diretriz de política pública. São ilustrativas, nesse sentido, as diretrizes adotadas nos Estados Unidos, consubstanciadas no “Buy American Act”, em vigor desde 1933, que estabeleceram preferência a produtos manufaturados no país, desde que aliados à qualidade satisfatória, provisão em quantidade
183
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente – MMA. Departamento de Cidadania e Responsabilidade Socioambiental – DCRS. Agenda ambiental na Administração Pública: A3P, p. 50.
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suciente e disponibilidade comercial em bases razoáveis. No período recente, merecem
registro as ações contidas na denominada “American Recovery and Reinvestment Act”, implementada em 2009. A China contempla norma similar, conforme disposições da Lei nº 68, de 29 de junho de 2002, que estipulada orientações para a concessão de preferência a bens e serviços chineses em compras governamentais, ressalvada a hipótese de indisponibilidade no país. Na América Latina, cabe registrar a política adotada pela Colômbia, que instituiu, nos termos da Lei nº 816, de 2003, uma margem de preferência entre 10% e 20% para bens ou serviços nacionais, com vistas a apoiar a indústria nacional por meio da contratação pública. A Argentina também outorgou, por meio da Lei nº 25.551, de 28 de novembro de 2001, preferência aos provedores de bens e serviços de origem nacional, sempre que os preços forem iguais ou inferiores aos estrangeiros, acrescidos de 7% em ofertas realizadas por micro e pequenas empresas e de 5%, para outras empresas. [...] 6. A modicação do caput do artigo 3º visa agregar às nalidades das licitações públicas o
desenvolvimento econômico nacional. Com efeito, a medida consigna em lei a relevância do poder de compra governamental como instrumento de promoção do mercado interno, considerando-se o potencial de demanda de bens e serviços domésticos do setor público, o correlato efeito multiplicador sobre o nível de atividade, a geração de emprego e renda e, por conseguinte, o desenvolvimento do país. É importante notar que a proposição fundamenta-se nos seguintes dispositivos da Constituição Federal de 1988: (i) inciso II do artigo 3º, que inclui o desenvolvimento nacional como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil; (ii) incisos I e VIII do artigo 170, atinentes às organização da ordem econômica nacional, que deve observar, entre outros princípios, a soberania nacional e a busca do pleno emprego; (iii) artigo 174, que dispõe sobre as funções a serem exercidas pelo Estado, como agente normativo e regulador da atividade econômica; e (iv) artigo 219, que trata de incentivos ao mercado interno, de forma a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem estar da população e a autonomia tecnológica do país. 184
Especial destaque deve ser dado ao fato de que a expressão “sustentável” não estava contemplada no texto inicial da referida medida provisória, tendo sido inserida pelo Congresso Nacional no curso das votações para a sua conversão em lei. Depreendese, portanto, que o legislador quis destacar a absoluta necessidade da harmonização de regras constitucionais: a garantia do desenvolvimento nacional, contida expressamente no art. 3º, II, com a defesa do equilíbrio ambiental, prevista nos artigos 23, VI, 170, VI, 186 e 225. É, sem dúvida alguma, uma nova perspectiva de crescimento nacional que estabelece diretrizes afetas à sustentabilidade como limites ao desenvolvimento nacional conduzido “a qualquer custo”. As obras públicas representam tema diretamente ligado à questão da sustentabilidade. Em primeiro lugar, pelo fato de utilizarem diversos insumos extraídos do meio ambiente, como areia, madeira e brita. Além disso, sob o aspecto social, por demandarem grande quantidade de mão de obra e representarem fonte de geração de empregos. Por fim, ao impactarem fortemente o ecossistema quando do seu funcionamento, pela indução do desenvolvimento nas regiões em que são executadas, pelo consumo de outras espécies de insumo, como energia e água, e pela produção de dejetos, como poluição, esgoto e resíduos.
184
Justicativa apresentada na MP nº 495/2010 – EMI nº 104-MP/MF/MEC/MCT, 18 jun. 2010.
CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
14.3 Mudanças comportamentais – A cultura dos 5 Rs É inegável a relevância da atuação efetiva das autoridades públicas na discussão do crescimento sustentável. Mas, com certeza, o sucesso desse desafo está vinculado
também à mudança comportamental da população. A cultura dos 5 Rs, conceito ajustado para políticas de educação ambiental, traz diretrizes que devem ser observadas para a aludida mudança: - Reduzir – evitar desperdícios, diminuir consumo de produtos e prestigiar aqueles com menor potencial de produção de resíduos ou com maior durabilidade; - Reutilizar – aproveitar novamente aqueles produtos que ainda estiverem em bom estado; - Reciclar – transformar materiais já utilizados em matérias-primas apropriadas para outros produtos; - Repensar – avaliar a efetiva necessidade de consumo e os padrões de produção e descarte usualmente utilizados; - Recusar – rechaçar alternativas de consumo desnecessárias, bem assim a utilização de produtos que ocasionam impactos ambientais fortemente negativos. Essas diretrizes podem ser perfeitamente absorvidas em todas as obras públicas: na defnição das especifcações de projeto; nas normas de execução; e nas regras de
operação do empreendimento. Para que a referida cultura seja incorporada pela população, fator primordial para o sucesso da estratégia da sustentabilidade, imprescindível que as autoridades envidem esforços em políticas educacionais e de comunicação para que todos entendam a relevância da utilização dessas boas práticas em suas ações cotidianas.
14.4 A evolução legislativa e regulamentar Diversos são os normativos que orientam a questão da sustentabilidade nas contratações. Em 1981, antes mesmo da atual Constituição Federal, foi aprovada a Lei nº 6.938, que tratou da Política Nacional do Meio Ambiente e trouxe diversos conceitos importantes para o cenário ambiental: o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), qualidade ambiental, poluidor e recursos ambientais. Quatro anos depois, foi aprovada a Lei nº 7.347, relativa à Ação Civil Pública, estabelecendo a responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e turístico. A Constituição Federal de 1988 fxou, em seu art. 225, o direito de todos “ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” e o dever do Poder Público e da coletividade em defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. A Carta Magna elencou diversas incumbências para que o Poder Público assegure a efetividade desse direito, das quais podem ser destacadas aquelas diretamente relacionadas às compras e aquisições governamentais: “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de signifcativa degradação do meio ambiente, estudo
prévio de impacto ambiental”, “controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de
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vida e o meio ambiente; “proteger a fauna e a ora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”. A Lei nº 8.666/93 dene, no art. 3º, o desenvolvimento nacional sustentável como um dos objetivos da licitação. Prevê, inclusive, a possibilidade de estabelecimento de margem de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras. Em seu art. 12, estabelece como requisitos para a elaboração de projetos básico e executivo, dentre outros, a funcionalidade e adequação ao interesse público, a economia na execução, conservação e operação e a avaliação do impacto ambiental do empreendimento. Preocupação semelhante vem expressa no art. 6º, IX, da mesma lei, ao exigir a existência de Projeto Básico que apresente elementos necessários e sucientes que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento. A Lei nº 9.605/98 disciplinou as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e determinou a responsabilização das pessoas jurídicas nas esferas administrativa, civil e penal, nos casos em que a infração for cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado. A Lei nº 10.048/2000 estabelece atendimento prioritário às pessoas portadoras de deciência, aos idosos com idade igual ou superior a 60 anos, as gestantes, as lactantes e as pessoas acompanhadas por crianças de colo. Já a Lei nº 10.098/2000 xa normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deciência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação. Além das leis mencionadas, diversas são as iniciativas para a regulamentação de questões afetas à sustentabilidade das licitações públicas, como, por exemplo: - Decreto nº 7.746/2012 – Regulamenta o art. 3º da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, para estabelecer critérios, práticas e diretrizes para a promoção do desenvolvimento nacional sustentável nas contratações realizadas pela administração pública federal, e institui a Comissão Interministerial de Sustentabilidade na Administração Pública (CISAP); - Decreto nº 7.546/2011 – Regulamenta o disposto nos §§5º a 12 do art. 3º da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e institui a Comissão Interministerial de Compras Públicas; - Decreto nº 2.783/1998 – Proíbe entidades do governo de comprar produtos ou equipamentos contendo substâncias degradadoras da camada de ozônio; - Decreto nº 5.296/2004 – Regulamenta as leis nº 10.048, de 08 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especica, e nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deciência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. - Decreto nº 5.940/2006 – Instituiu a separação dos resíduos descartados pelos órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta, na fonte geradora, e sua destinação às associações e cooperativas de catadores de materiais recicláveis;
CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
- Portaria/MMA nº 61/2008 – Estabelece práticas de sustentabilidade ambiental nas licitações promovidas pelo MMA; - Portaria AGU nº 124/2009 – Divulga as metas de desempenho institucional da AGU, para ns de recebimento da GDAA, e dene indicadores referentes ao
tema estratégico Proteção e Defesa do Meio Ambiente; - Agenda ambiental na administração pública: A3P, do Ministério do Meio Am biente – Tem como objetivo estimular os gestores públicos a incorporar princípios e critérios de gestão ambiental em suas atividades de rotina, com base na economia de recursos naturais e na redução de gastos institucionais por meio do uso racional dos bens públicos e da gestão adequada dos resíduos; - Recomendação nº 11/2007 do CNJ (DJ , 28 maio 2007) – Recomenda aos Tribunais relacionados nos incisos II a VII do art. 92 da Constituição Federal de 1988, que adotem políticas públicas visando à formação e recuperação de um ambiente ecologicamente equilibrado, além da conscientização dos próprios servidores e jurisdicionados sobre a necessidade de efetiva proteção ao meio ambiente, bem como instituam comissões ambientais para o planejamento, elaboração e acompanhamento de medidas, com xação de metas anuais, visando à correta
preservação e recuperação do meio ambiente; - Recomendação nº 27/2010 do CNJ – Recomenda aos Tribunais relacionados nos incisos II a VII do art. 92 da Constituição Federal de 1988 que adotem medidas para a remoção de barreiras físicas, arquitetônicas, de comunicação e atitudinais de modo a promover o amplo e irrestrito acesso de pessoas com deciência
às suas dependências, aos serviços que prestam e às respectivas carreiras, para a conscientização de servidores e jurisdicionados sobre a importância da acessibilidade enquanto garantia ao pleno exercício de direitos, bem como para que instituam comissões de acessibilidade visando ao planejamento, elaboração e acompanhamento de projetos e metas direcionados à promoção da acessibilidade às pessoas com deciência;
- Instrução Normativa nº 01 da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (SLTI/MPOG), de 19 de janeiro de 2010 – Dispõe sobre os critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional e dá outras providências.
14.5 Critérios legais afetos à sustentabilidade e ao desenvolvimento nacional para a análise de propostas e xação de margem de
preferência
A alteração do art. 3º da Lei nº 8.666/93, feita pela Lei nº 12.349/10, apresenta nova perspectiva nas contratações públicas, pois coloca em mesmo patamar a necessidade da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável. A regra insculpida no art. 37, XXI, da Carta Magna, na qual “as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes”, deve ser avaliada em confronto com outros princípios, em especial o da “garantia do desenvolvimento
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nacional”. Portanto, os licitantes que ofertarem produtos manufaturados e serviços nacionais poderão ser beneciados por margem de preferência prevista nos processos de licitação, consoante redação do art. 3º, §5º, da Lei de licitações. A denição de produtos manufaturados e serviços nacionais foi estabelecida no art. 6º da referida lei: XVII - produtos manufaturados nacionais – produtos manufaturados, produzidos no território nacional de acordo com o processo produtivo básico ou com as regras de origem estabelecidas pelo Poder Executivo federal; XVIII - serviços nacionais – serviços prestados no País, nas condições estabelecidas pelo Poder Executivo federal.
Questão inicial a ser tratada, até por ser o tema principal desta publicação referese à possibilidade da referida margem ser utilizada em licitação de obras públicas. O Congresso Nacional, ao avaliar a MP nº 495, discutiu expressamente essa questão e rejeitou-a. Durante o processo de análise do texto, foi apresentada emenda que propunha a inserção da expressão “obras” ao texto do art. 3º, §5º. O Relator da matéria assim se manifestou em seu relatório: “Já a Emenda nº 8 inclui as obras entre os itens alcançados pela margem de preferência. A proposta é despropositada, uma vez que as obras já utilizam, quase que exclusivamente, produtos e mão-de-obra nacionais”. Contudo, não se pode olvidar a possibilidade de contratações de produtos manufaturados ou serviços nacionais para obras públicas em licitações independentes, caso que viabiliza o estabelecimento de margem de preferência previsto no dispositivo legal. O valor para a aludida margem, nos termos do §8º do art. 3º da Lei nº 8.666/93, será denido pelo Poder Executivo Federal, devendo, entretanto, ser observado o limite de 25% sobre o preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros. Essa margem será estabelecida com base em estudos revistos periodicamente, em prazo não superior a cinco anos, que levem em consideração: 185
I - geração de emprego e renda; II - efeito na arrecadação de tributos federais, estaduais e municipais; III - desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País; IV - custo adicional dos produtos e serviços; e V - em suas revisões, análise retrospectiva de resultados. (art. 3º, §6º, da Lei nº 8.666/93 – Redação ajustada pela Lei nº 12.349/2010)
A respeito de margem de preferência, o Decreto nº 7.546/11 regulamentou o disposto nos §§5º a 12 do art. 3º da Lei nº 8.666/93. Art. 1º A aplicação de margem de preferência para produtos manufaturados e serviços nacionais e de medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou de acesso a condições vantajosas de nanciamento, de que tratam os §§5º a 12 do art. 3º da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, observará o disposto neste Decreto. Art. 2º Para os ns deste Decreto, considera-se:
185
Emenda Modicativa nº 8, apresentada pelo Senador Francisco Dornelles em 06 ago. 2010.
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I - Margem de preferência normal – diferencial de preços entre os produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais e os produtos manufaturados estrangeiros e serviços estrangeiros, que permite assegurar preferência à contratação de produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais; II - Margem de preferência adicional – margem de preferência cumulativa com a prevista no inciso I do caput , assim entendida como o diferencial de preços entre produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais, resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País, e produtos manufaturados estrangeiros e serviços estrangeiros, que permite assegurar preferência à contratação de produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais; III - Medida de compensação industrial, comercial ou tecnológica – qualquer prática compensatória estabelecida como condição para o fortalecimento da produção de bens, do desenvolvimento tecnológico ou da prestação de serviços, com a intenção de gerar benefícios de natureza industrial, tecnológica ou comercial concretizados, entre outras formas, como: a) coprodução; b) produção sob licença; c) produção subcontratada; d) investimento nanceiro em capacitação industrial e tecnológica;
e) transferência de tecnologia; f) obtenção de materiais e meios auxiliares de instrução; g) treinamento de recursos humanos; h) contrapartida comercial; ou i) contrapartida industrial; IV - Produto manufaturado nacional – produto que tenha sido submetido a qualquer operação que modique a sua natureza, a natureza de seus insumos, a sua nalidade ou
o aperfeiçoe para o consumo, produzido no território nacional de acordo com o processo
produtivo básico denido nas Leis nºs 8.387, de 30 de dezembro de 1991, e 8.248, de 23 de
outubro de 1991, ou com as regras de origem estabelecidas pelo Poder Executivo federal, tendo como padrão mínimo as regras de origem do Mercosul; V - Serviço nacional – serviço prestado no País, nos termos, limites e condições estabelecidos nos atos do Poder Executivo que estipulem a margem de preferência por serviço ou grupo de serviços; VI - Produto manufaturado estrangeiro e serviço estrangeiro – aquele que não se enquadre nos conceitos estabelecidos nos incisos IV e V do caput , respectivamente; e VII - Normas técnicas brasileiras – normas técnicas produzidas e divulgadas pelos órgãos ociais competentes, entre eles a Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT e
outras entidades designadas pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – CONMETRO. Art. 3º Nas licitações no âmbito da administração pública federal será assegurada, na forma prevista em regulamentos especícos, margem de preferência, nos termos previstos
neste Decreto, para produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais que atendam, além dos regulamentos técnicos pertinentes, a normas técnicas brasileiras, limitada a vinte e cinco por cento acima do preço dos produtos manufaturados estrangeiros e serviços estrangeiros. §1º Para os ns deste Decreto, entende-se como administração pública federal, além dos
órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União. §2º Os estados, o Distrito Federal, os municípios e os demais poderes da União poderão
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adotar as margens de preferência estabelecidas pelo Poder Executivo federal, previstas nos §§5º e 7º do art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993. §3º A margem de preferência normal será calculada em termos percentuais em relação à proposta melhor classicada para produtos manufaturados estrangeiros ou serviços estrangeiros, conforme denido em decreto, nos termos do art. 5º. §4º Os produtos manufaturados nacionais e os serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País poderão ter margem de preferência adicional, denida em decreto, nos termos do art. 5º, que, acumulada à margem de preferência normal, não poderá ultrapassar o limite de vinte e cinco por cento, conforme previsto no caput. §5º Para fins de aplicação do §4º, os Ministérios da Ciência e Tecnologia e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior estabelecerão os requisitos e critérios para vericação dos produtos e serviços resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País, após proposição da Comissão a que se refere o artigo 7º. §6º A aplicação de margem de preferência não exclui o acréscimo dos gravames previstos no §4º do art. 42 da Lei nº 8.666, de 1993. Art. 4º As margens de preferência normais e adicionais não se aplicam aos bens e serviços cuja capacidade de produção ou de prestação no País seja inferior à quantidade de bens a ser adquirida ou de serviços a ser contratada. Parágrafo único. Na hipótese prevista no art. 23, §7º, da Lei nº 8.666, de 1993, não serão aplicadas as margens de preferência aos bens e serviços cuja capacidade de produção ou de prestação no País seja inferior ao quantitativo mínimo xado no edital para preservar a economia de escala. Art. 5º O Decreto que estabelecer as margens de preferência discriminará a abrangência de sua aplicação e poderá xar o universo de normas técnicas brasileiras aplicáveis por produto, serviço, grupo de produtos e grupo de serviços para os ns do disposto neste Decreto. Art. 6º Os editais de licitação para a contratação de bens, serviços e obras poderão, mediante prévia justicativa da autoridade competente, exigir que o contratado promova, em favor de órgão ou entidade integrante da administração pública ou daqueles por ele indicados, a partir de processo isonômico, medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou de acesso a condições vantajosas de nanciamento, cumulativamente ou não, na forma estabelecida em decreto, nos termos do art. 5º.
A matéria afeta a desenvolvimento nacional sustentável foi avaliada pelo TCU, logo após a edição da Lei nº 12.349/10, em caso que tratou de aquisição de objeto de fabricação exclusivamente nacional. Não obstante o órgão gestor ter anulado por iniciativa própria o procedimento, importante registrar algumas considerações trazidas na discussão do Plenário da Corte de Contas: 186
7. Em resumo, a análise da irregularidade apontada envolveu discussão em torno da interpretação e da aplicabilidade das alterações procedidas na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, pela Lei nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010. 8. No que interessa a estes autos, cabe destacar que esta última lei introduziu no art. 3º do Estatuto das Licitações e Contratos, como um dos objetivos da licitação, a “promoção do desenvolvimento nacional sustentável”. 9. E, além disso, incluiu ressalvas às vedações dispostas no §1º, inciso I, do citado artigo, no
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Ver TCU. Acórdão nº 2.857/11, Plenário. Rel. Min. André Luis de Carvalho. DOU , 1º nov. 2011.
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que se refere à admissão, no edital, de cláusulas ou condições comprometedoras, restritivas ou frustradoras do caráter competitivo do certame ou que estabeleçam preferências de qualquer ordem, trazendo as seguintes disposições: 9.1 margem de preferência para produtos manufaturados e serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras (§§5º a 10º); e 9.2. restrição da licitação a bens e serviços de informática com tecnologia desenvolvida no País, quando envolverem sistemas de tecnologia da informação e comunicação considerados estratégicos em ato do Poder Executivo Federal (§12º). [...]
“29. A atividade de planejamento deverá, igualmente, voltar-se para a promoção do desenvolvimento nacional sustentável considerando, além dos aspectos de preços, os elementos ligados ao impacto ambiental na produção do bem ou serviço, o efeito multiplicador de emprego e renda decorrente da aquisição do bem ou serviço e o desenvolvimento técnico e tecnológico que a aquisição poderá proporcionar ao mercado interno”. 19. Na mesma linha de raciocínio traçada pelo Ministério, também entendo que essa nova disposição legal nalística é autoaplicável, bem assim que ela deve ser observada não só pela administração pública, mas também pelos órgãos de controle nanceiro, em respeito
ao art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/1942 com nova redação dada pela Lei nº 12.376/2010), que determina: “Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos ns sociais a que ela se dirige e às exigências
do bem comum”. 20. Em preliminar, ressalto que os dispositivos que carecem de regulamentação, explicitada no próprio corpo da lei, são os §§5º a 12 do art. 3º, cujo objeto cou sumariado no item 10
acima. E que não carece de regulamentação para ser aplicado o disposto no caput desse artigo 3º, mesmo porque ele traz uma regra nalística.
21. A respeito desses dispositivos, é importante registrar que a margem de preferência estipulada no §5º não esgota todas as opções possíveis para a consecução dessa mais nova nalidade da licitação pública, qual seja, a de promoção do desenvolvimento nacional
sustentável. 22. Tais opções envolvem desde requisitos cuja observância pode ser exigida das empresas na produção de bens ou prestação de serviços a serem adquiridos pelo Estado (aspectos relativos à sustentabilidade ambiental, também amparados pela Lei nº 12.187, de 29 de dezembro de 2009, como nas licitações verdes ou sustentáveis), passando pela priorização para bens fabricados no Brasil (sustentabilidade econômica, como no caso destes autos), indo até a xação de margem de preferência para produtos manufaturados produzidos no País, entre outras ações, desde que, é claro, a exigência que devidamente justicada
no respectivo processo de licitação. 23. Ademais, a margem de preferência, que envolve produtos manufaturados e serviços nacionais (pode alcançar até o montante de 25% do preço de produtos e serviços manufaturados estrangeiros, nos termos do art. 3º, §6º, da Lei nº 8.666, de 1993, com as alterações da Lei 12.349, de 2010), não serviria para avalizar a compra de qualquer produto fabricado no Brasil. 24. E o produto manufaturado nacional, ante o conceito da própria Lei nº 8.666, de 1993 (art. 6º, inciso XVII), deve observar o processo produtivo básico (PPB) ou regras de origem estabelecidas pelo Poder Executivo Federal, sendo que tais conceitos denem o alcance
da margem de preferência. 25. Logo, vê-se que a margem de preferência, de acordo com os requisitos explicitados na Lei nº 8.666, de 1993, com as alterações da Lei nº 12.349, de 2010, merece ser aplicada a produtos que observarem tais critérios, quando envolver concorrência com produtos manufaturados estrangeiros. 26. Dessa forma, ca claro que o dispositivo que trata da margem de preferência é muito
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especíco (é prevista, inclusive, no §13º, a divulgação anual das empresas beneciadas e o volume de recursos recebidos por cada uma), de modo que ele, isoladamente, não serviria de base para balizar as ações do Poder Executivo na área de compras públicas em prol do desenvolvimento nacional sustentável, ainda mais no presente caso concreto em que não se discute a aquisição de produto manufaturado, mas sim de produto industrializado. 27. Desse modo, voltando à questão do novo caput do art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993, destaco que a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, preconizado como um dos objetivos da licitação, enseja a atuação do governo federal não apenas na área ambiental, mas também nas áreas econômica e social, por meio dos procedimentos legais autorizados para a compra de bens ou serviços. 28. Eis que o desenvolvimento sustentável, na conceituação original, exarada pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – CMMAD, em 1987 (Comissão Brundtland), envolvia a necessidade de conciliar as questões relativas ao desenvolvimento econômico com as variávies de natureza ambiental: “é o desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das futuras gerações de atenderem às suas próprias necessidades”. 29. Ocorre que, segundo a teoria mais moderna, defendida por John Elkington (in Cannibals with Forks: The Triple Boom Line of 21st Century Business, 1999), o desenvolvimento sustentável deve envolver três pilares básicos: sustentabilidade econômica, sustentabilidade ambiental e sustentabilidade social, ou seja, as questões econômicas e sociais também devem integrar o conceito. 30. Assim, a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, tal qual previsto na Lei de Licitações, necessariamente perpassará aspectos relativos ao desenvolvimento econômico, equidade social e proteção ao meio ambiente. [...] 58. Bem se vê que, ao contratar com terceiros, a administração pública pode ser levada a ter de estabelecer certas preferências, considerando a necessidade de atendimento ao interesse público. 59. E, em suma, considerando a relação jurídica que será futura e contratualmente estabelecida (cujos elementos são: sujeitos, objeto e vínculo), vê-se que tais preferências podem ser direcionadas para o fornecedor (sujeito), para o produto (objeto), bem como para o fornecedor e o produto. 60. Várias podem ser as formas de preferências legalmente direcionadas ao fornecedor. Esse seria o caso, por exemplo, de uma licitação pública em que se vedasse a participação de empresas estrangeiras. 61. O TCU já se debruçou sobre essa questão e, considerando as circunstâncias de fato e de direito do momento, aceitou tal restrição, à época. 62. Cite-se, como exemplo para esse caso, entre outras deliberações, a Decisão nº 607/1994 proferida pelo Plenário do TCU em processo de denúncia formulada por representante de empresas estrangeiras contra licitação em que a Petrobras restringia a participação de empresas estrangeiras em licitação nacional. Eis que, na oportunidade, acompanhando o brilhante voto do saudoso Ministro-Relator Homero Santos, este Tribunal considerou a denúncia improcedente e fez registrar: “[...] É certo que tem havido algumas ponderações, observações e até reclamações com relação a tais preceitos, achando-se que as empresas estrangeiras poderiam concorrer, livremente, com as nacionais. A lei e a doutrina, entretanto, fazem essas distinções, como por exemplo: a) LICITAÇÕES NACIONAIS em que podem participar todas as empresas em funcionamento no Brasil, inclusive as estrangeiras autorizadas a funcionar, no País. Não constituindo ‘funcionamento’ a atividade eventual, precária e isolada. ‘O funcionamento no Brasil se congura quando exista continuidade e permanência na atividade desenvolvida’ (cf. MARÇAL JUSTEN FILHO, ‘in’ ‘Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos’, Ed. AIDE, 1993, pág. 188); b) LICITAÇÕES INTERNACIONAIS são as
CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
que podem participar empresas internacionais e brasileiras, isoladas ou em consórcios aquelas com estas (cf. RAUL ARMANDO MENDES, ‘in’ ‘Comentários ao Estatuto das Licitações e Contratos Administrativos’, ed. 1991, p. 115/116). Em tais concorrências estão permitidas inclusive as empresas estrangeiras sem autorização governamental para funcionar no Brasil, podendo, por isso mesmo, produzir-se efeitos que ultrapassem os limites do órgão contratante da Administração Pública (cf. MARÇAL JUSTEN FILHO, ob. cit. pág. 236). [...] Se há bens produzidos no país e no exterior, há que se conciliar os aspectos de política
econômica interna, ligados à proteção (sempre temporária) de um determinado segmento da economia, e fatores de controle de divisas e comércio internacional com a necessidade de abertura da economia ao mercado externo e incremento da competitividade dos bens e serviços brasileiros com os produzidos no estrangeiros”. Sob tais considerações e tendo em vista que a PETROBRÁS não abriu, com o Edital SERMAT-92.584/94, concorrência internacional, entendo correto o procedimento da Estatal... [...]”.
92. Em síntese, vê-se que, a partir da ponderação suscitada pelo nobre Presidente do TCU na Sessão de 10 de agosto, o presente processo passou a comportar a discussão de duas questões processuais: 1º) se — no presente caso concreto, a partir da alteração promovida pela MP 495/2010 convertida na Lei nº 12.349, de 2010 — seria possível o MDA admitir, no edital do pregão, apenas retroescavadeiras de fabricação nacional, com vistas a promover o desenvolvimento nacional sustentável; e 2º) se — em tese, a partir dessa mesma alteração legislativa — seria possível a administração pública buscar o desenvolvimento nacional sustentável nas licitações públicas, independentemente de lei especíca e da devida
regulamentação pelo Executivo federal. 93. No que concerne à primeira questão (do caso concreto), entendo que é possível, sim, o MDA admitir, no aludido pregão, apenas retroescavadeiras de fabricação nacional, com vistas a promover o desenvolvimento nacional sustentável. 94. Esse, aliás, é o entendimento que deui das peculiares circunstâncias do presente
caso concreto, bastando, para tanto, se observar o evidente silogismo contido nos autos. 95. Ora, se a jurisprudência do TCU tem admitido a preferência por marca, quando isso se mostra tecnicamente justicável, e se a exigência de produto de fabricação nacional
corresponde a uma preferência por marca (marca de fabricação nacional), então o aludido pregão merece ser considerado válido, mesmo porque ele se mostra tecnicamente justicável. 96. E o certame se apresenta como tecnicamente justicado, não só porque a nova
dicção dada ao art. 3º, caput , da Lei nº 8.666/1993 aduz que a licitação deve promover, entre outros objetivos, o desenvolvimento nacional sustentável, mas também porque a aquisição das retroescavadeiras faz parte do PAC (programa instituído por normas legais e infralegais), cujo principal objetivo é promover o desenvolvimento nacional sustentável (pela sustentabilidade social e econômica, gerando emprego e renda). 97. De qualquer modo, devo concordar com o nobre Ministro-Revisor, quando, nos itens 71 e 72 do seu voto, Sua Excelência se preocupa com a possibilidade de infundada ampliação do objeto licitado (que poderia saltar das 140 máquinas, peremptoriamente citadas no edital, para mais de 1500 máquinas, como sugerido na ata de registro de preços). 98. Vejo que tal ampliação não pode ser promovida sem a devida justicação e sem a
adequada demonstração dos ganhos previstos com a economia de escala. 99. E, assim, a despeito de pugnar pela validade do pregão ora examinado, entendo ser necessário o envio de determinação ao MDA para que se abstenha de ampliar o objeto do aludido certame, para além das 140 retroescavadeiras originalmente previstas. 100. Enm, no que concerne à segunda questão (em tese), entendo que, em algumas hipó-
teses, seria possível a administração pública buscar o desenvolvimento nacional sustentável nas licitações públicas, com base em critérios objetivos xados no edital.
101. Vejo que isso seria possível em aquisições levadas a efeito no âmbito de programas
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que já contém boa carga legislativa e regulamentar, a exemplo do próprio PAC, que, como dito, está devidamente instituído e regulamentado por normas legais e infralegais. 102. E aí a lógica jurídica também me parece razoavelmente simples: se o programa já está legal e devidamente instituído e regulamentado, então a administração pública poderia, nos termos do edital, promover o desenvolvimento nacional sustentável. 103. Demais disso, devo destacar que tal sustentabilidade merece ser promovida não apenas sob o prisma econômico e social, mas também sob os aspectos tecnológico e ambiental, lembrando que, para este último (o ambiental), já há forte carga regulamentar denida pelo art. 28 do Decreto nº 7.063/2010 e pela bem-aventurada IN SLTI/MPOG nº 1/2010. 104. De mais a mais, observo que o caput do art. 3º, da Lei nº 8.666/1993, fala claramente que a licitação destina-se à promoção do desenvolvimento nacional sustentável, restando claro, pois, que a lei não diz que somente a licitação submetida ao emprego de margem de preferência sobre o preço comportaria tal desiderato. 105. De qualquer sorte, como esta segunda questão não se vincula ao presente caso concreto, vejo que tal entendimento não merece ser levado à parte dispositiva da presente deliberação, sob pena de o TCU promover indevido controle externo abstrato de ato normativo. (TCU. Acórdão nº 2.241/2011, Plenário. Rel. Min. André Luis de Carvalho. DOU , 02 set. 2011)
Em estudo recente, o TCU constituiu Grupo de Trabalho para analisar as repercussões geradas pela Lei nº 12.349/10 no regime licitatório. O relatório decorrente dos trabalhos foi o seguinte: Trago à apreciação deste Colegiado processo administrativo que trata de estudo elaborado por Grupo de Trabalho criado por meio da Portaria-Segecex 32/2011, de 28/9/2011, em cumprimento ao item 9.5 do Acórdão 2241/2011-TCU-Plenário, para a análise das repercussões geradas pela Lei 12.349/2010, no regime licitatório, em especial, da discussão travada nos autos do TC 002.481/2011-1. [...] 4. O cumprimento da determinação gerou o estudo ora em apreciação, que expressa opinião pela ilegalidade de inserção de restrição a produtos importados em edital de licitação, com base direta no Princípio do Desenvolvimento Nacional Sustentável, baseando seus estudos nos argumentos apresentados pelo Ministro-Substituto Augusto Sherman Cavalcanti, no Voto Revisor condutor do Acórdão 2.241/2011-TCU-Plenário. [...] 7. No referido documento são apresentados estudos comparados e dados técnicos relativos a possíveis efeitos decorrentes da eventual impossibilidade de restringir as aquisições do Governo Federal a produtos brasileiros, nos termos da nova redação do art. 3º da Lei 8.666/1993 e, ainda, elementos referentes às práticas internacionais mais recentes, que estariam em harmonia. 8. Para melhor contextualização, faço menção, preliminarmente, ao estudo elaborado pelo Grupo de Trabalho que se pautou, como já mencionado, nos argumentos do MinistroSubstituto Augusto Sherman Cavalcanti. [...] 10. Tenho por relevante esclarecer que, na oportunidade da prolação do Acórdão que determinou a realização do presente estudo, o Ministro Revisor apresentou argumentos em que defendia que a “promoção do desenvolvimento nacional sustentável” é princípio e norma jurídica, mas não é regra, porque não prescreve o comportamento a ser adotado para atingir o objetivo estabelecido, pois não haveria nesse enunciado legal a denição da conduta a ser praticada pelo administrador público para concretização do objetivo. Lembrou sua Excelência que essa conduta deve se pautar por outro princípio, o da legalidade, isto é, estar adstrita aos exatos ditames da lei. 11. Defendeu que não há como considerar autoaplicável a nova disposição do art. 3º, caput , da Lei 8.666/93 que não restaram dúvidas de que as regras necessárias para promover
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o desenvolvimento nacional sustentável foram dispostas pelo legislador nos parágrafos acrescidos ao art. 3º da Lei 8.666/93, por ocasião da edição da Lei 12.349/2010. É de todo evidente a conexão temática e lógica existente entre as alterações efetuadas pela nova lei no art. 3º, caput e §§1º e 2º, e o acréscimo dos §§5º a 12, no mesmo artigo. Essas regras seriam condutas que a lei autoriza o administrador público a adotar para a consecução do objetivo, tendo em vista a incidência do princípio da legalidade. A primeira regra encontra-se enunciada no inciso I do §1º do art. 3º da Lei 8.666/93. 12. Segundo armou, a leitura do inciso I, do §1º do art. 3º da Lei 8.666/93 deixa claro que a vedação a preferências se congura em regra geral, e não poderia ser diferente, uma
vez que essa regra deriva diretamente da isonomia, princípio fundamental da licitação, conforme disposto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e também no caput do art. 3º da Lei 8.666/93 e que as exceções à regra geral estão expressamente previstas na
lei, que xa as hipóteses em que a preferência é cabível nos §§5º a 12 do art. 3º da Lei de
Licitações e no art. 3º da Lei 8.248/91. Veja-se que são essas as regras que decorrem do princípio da promoção do desenvolvimento nacional sustentável e que lhe dão concretude. 13. Apregoou que a outra exceção à regra geral consistiria na preferência concedida às micro e pequenas empresas pela Lei Complementar 123/2006. Ressalte-se que essa modalidade de tratamento diferenciado também decorre de lei e se vincula à promoção do desenvolvimento nacional, consoante estabelecido no art. 47 da referida lei complementar. 14. Por m, assegurou que seriam precisamente as normas mencionadas nos itens
anteriores, e só essas, que prescrevem a conduta preferencial a ser adotada pelo agente público na consecução desse m (promoção do desenvolvimento nacional).
15. Ante as questões postas, o revisor defendeu, na ocasião, que a vedação a preferências se constitui na regra geral e que as exceções estão explicitamente denidas no texto da
lei, não havendo que se admitir interpretação extensiva nem para a vedação, nem para as exceções. 16. Então, tem-se que as disposições dos §§5º a 12 do art. 3º da Lei de Licitações, do art. 3º da Lei 8.248/91 e dos arts. 44, 47 e 48 da LC 123/2006 são as únicas condutas que atualmente a lei autoriza ao administrador público para estabelecer preferências com vistas à promoção do desenvolvimento nacional sustentável. Ou seja, não cabe discricionariedade. 17. Defendeu, ainda, que, a m de cumprir o objetivo de promover o desenvolvimento
nacional sustentável, o gestor, nos editais de licitação, somente poderá lançar mão dos seguintes regimes (ou mecanismos): a) xação de margem de preferência para produtos manufaturados ou serviços nacionais
(§§5º a 10); b) exigência de cumprimento de medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou de acesso a condições vantajosas de nanciamento (§11);
c) restrição, nas contratações de tecnologia da informação e comunicação consideradas estratégicas, a bens e serviços com tecnologia desenvolvida no país e produzidas de acordo com o processo produtivo básico (§12); d) concessão de preferência, nas aquisições de bens e serviços de informática e automação, a bens e serviços com tecnologia desenvolvida no País ou, em seguida, a bens e serviços produzidos de acordo com processo produtivo básico, em condições equivalentes de prazo, suporte, qualidade, padronização, compatibilidade, desempenho e preço (art. 3º da Lei 8.248/91); e, e) tratamento diferenciado às microempresas e empresas de pequeno porte (arts. 44, 47 e 48 da LC 123/2006). 18. Essas seriam, no entender do eminente Ministro-Substituto Augusto Sherman, as únicas formas de se concretizar a chamada promoção do desenvolvimento nacional sustentável; tal ação não se resumiria à aplicação da margem de preferência, mas abrangeria uma série
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de outras medidas, todas formalmente previstas em lei. Interpretação dada a essas regras deve ser restrita e, consequentemente, cingir-se aos exatos contornos legais. 19. Por m, consignou o Revisor que, a preferência em aquisições de informática; a margem de preferência; as medidas compensatórias; a restrição em contratações estratégicas de TI/ comunicação e o tratamento diferenciado a micro e pequenas empresas são mecanismos cuja aplicação deve observar requisitos especícos previstos na lei, a exemplo da realização de estudos prévios e a aderência a normas técnicas, entre outros. 20. Nesse contexto, observa que, com exceção do disposto no art. 3º da Lei 8.248/91 e nos arts. 44 e seguintes da LC 123/2006, os demais mecanismos dependem da regulamentação do Poder Executivo para sua aplicação (Decreto 7.546/2011, de 2/8/2011 e normas a serem editadas nos termos dos arts. 2º, §5º, 6º, 10 e 11 do Decreto), conforme previsto nos §§8º, 11 e 12 do art. 3º da Lei 8.666/93. 21. Assim, concluiu o Revisor que “a promoção do desenvolvimento nacional sustentável”, conforme preceituado no art. 3º, caput , da Lei 8.666/93, trata-se de disposição nalística, mas não se agura autoaplicável, visto que consiste em princípio desprovido da descrição das condutas que deverão ser adotadas para atingir esse objetivo. As condutas preferenciais que concretizam a promoção do desenvolvimento nacional sustentável estão denidas nos §§5º a 12 do art. 3º da Lei 8.666/93, no art. 3º da Lei 8.248/91 e nos arts. 44, 47 e 48 da LC 123/2006. 22. Defende que os procedimentos trazidos nos dispositivos normativos mencionados no item precedente seriam os que a lei admite na consecução do objetivo, uma vez que, por se tratarem de medidas restritivas da competitividade, constituem-se nas exceções explicitadas na lei, à regra geral denida no art. 3º, §1º, inciso I, da Lei 8.666/93, que veda o estabelecimento de restrições, distinções e preferências na licitação. 23. Faz lembrar que, no tocante às disposições dos §§5º a 12 do art. 3º da Lei 8.666/93, os respectivos regimes foram parcialmente regulamentados pelo Poder Executivo, ainda carecendo de norma disciplinadora nos termos dos arts. 2º, §5º, 6º, 10 e 11 do Decreto 7.546/2011, o que obsta a aplicação imediata dos mecanismos nelas previstos. Por conseguinte, a aplicação, em editais de licitação, por administrador ordinário, de algum desses regimes sem que tenha sido editada a devida e prévia regulamentação constitui-se em usurpação da competência do Poder Executivo Federal. 24. A conclusão do Grupo de trabalho que, como afirmado, foi baseada no voto revisor do Ministro-Substituto Augusto Sherman Cavalcanti, apresentado no Acórdão 2241/2011-TCU-Plenário; é, em apertada síntese, a seguinte (item 88, Peça 1): a) a Exposição de Motivos da Medida Provisória 495/2010 cita expressamente que a preferência a produtos nacionais em certames licitatórios deve ser viabilizada mediante a ação normativa e reguladora do Estado, visando a promover maior eciência e qualidade do gasto público; b) os recentes pronunciamentos doutrinários apontam no sentido de que a promoção do desenvolvimento nacional sustentado pode acarretar a elevação dos custos para os cofres públicos, resultado explicitamente previsto e autorizado nos §§5º e seguintes do art. 3º da Lei 8.666/1993, devendo se concretizar por meio de fórmulas compensatórias a promoção dessa preferência por produtos nacionais, as quais devem observar o princípio da equanimidade; c) a Lei 12.349/2010, ao acrescentar ao art. 3º da Lei 8.666/1993 os parágrafos 5º a 13, somente deniu como instrumentos de concretização do princípio da promoção do desenvolvimento nacional sustentável as hipóteses denidas nos parágrafos 5º, 7º, 11 e 12; d) ainda não foram apresentados à sociedade os resultados dos estudos previstos na Lei com objetivo de adequação da margem de preferência às condições econômicas vigentes; e) ainda não foi publicado ato do Poder Executivo Federal, nos termos do novo parágrafo
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8º do art. 3º da Lei 8.666/93, denindo as margens de preferência (normal e adicional) por
produto, serviço, grupo de produtos ou grupo de serviços; f) as margens de preferência são instrumentos de política pública para viabilizar o desenvolvimento nacional sustentável, e devem ser exercidas nos moldes, limites e diretrizes dessa política; g) a única possibilidade de vedação à aceitação de produto importado em licitações públicas encontra-se no parágrafo 12 do art. 3º da Lei de Licitações, que se destina à aquisição de bens e/ou serviços designados à implantação, manutenção e ao aperfeiçoamento dos sistemas de tecnologia de informação e comunicação (TIC), que sejam considerados estratégicos por meio de ato do Poder Executivo Federal; h) a ausência de previsão legal acerca da possibilidade de vedação à contratação de produtos e serviços estrangeiros em licitações nacionais, e o art. 84, IV da Constituição Federal, que estabeleceu que compete privativamente ao Presidente da República expedir
decretos e regulamentos para el execução das leis, respaldam que a expedição de decreto
ou regulamento que contenha tal restrição, extrapola as disposições previstas em Lei e é nulo, por ser inconstitucional; e i) a restrição a produtos importados em editais de licitações nacionais é ilegal e pode trazer consequências internas e externas nocivas ao mercado brasileiro, tais como retaliações ante a Organização Mundial do Comércio (OMC), bem como propositura de ações judiciais, em massa, ou em cada edital de licitação no caso concreto. [...]
26. No que interessa a estes autos, cabe destacar os principais argumentos trazidos pelo Parquet, que embasaram a proposta apresentada ao nal do parecer.
27. Como pode ser observado no parecer de Peça 8, o MP/TCU manifesta-se contrário às conclusões externadas nas alíneas a e b da proposta do Grupo de Trabalho supra, consoante as seguintes razões externadas no seu parecer, em síntese: a) a partir da apresentação de um caso hipotético, onde haveria severa retração da demanda e a compra do Governo Brasileiro teria vital importância para a contratada, não só pelos ganhos diretos que proporcionaria, mas também por criar condições de ganhos de escala que a favoreceria em outras disputas no mercado internacional, entende que não seria razoável, nesse caso, pensar em admitir a participação na licitação de produtos estrangeiros e correr o risco de sua vitória custar a sobrevivência de empresas nacionais que atuam no ramo; b) defende que essa permissão não somente consistiria conduta omissiva quanto à promoção do desenvolvimento nacional, mas se colocaria em sentido oposto, de prejudicá-lo, uma vez que criaria condições competitivas favoráveis à indústria estrangeira concorrente; c) ante a situação trazida no caso hipotético, entende haver não só a possibilidade de restrição à participação de produtos estrangeiros, como também fundamento até mesmo para a inexigibilidade de licitação, caso não houvesse outro concorrente nacional. d) na possibilidade da situação descrita, assegura não poder aderir à tese defendida pelo grupo de trabalho, que, no seu entender, subestimou a principal inovação trazida pela alteração do art. 3º da Lei 8.666/93, uma vez que a promoção do desenvolvimento nacional sustentável foi incluída ao lado da garantia à isonomia e da seleção da oferta mais vantajosa, como propósitos primeiros da licitação; e) assegura que a nova nalidade exige que a Administração avalie sempre o efeito que
a compra do objeto provocará quanto à promoção do desenvolvimento nacional e que o gestor não pode ignorar esse aspecto, como não pode ignorar o dever de tratar os interessados com isonomia ou o de selecionar a proposta mais vantajosa; f) no entender do Parquet, a nova nalidade xada para a licitação representa novo
propósito para o contrato administrativo. Este deixa de ser apenas instrumento para o atendimento da necessidade de um bem ou serviço, que motivou a realização da licitação, para constituir, também, instrumento da atividade de fomento estatal, voltado, dessa
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forma, não só para os interesses imediatos da Administração contratante como também para interesses mediatos, ligados às carências e ao desenvolvimento do setor privado. Nesse sentido, seria legítima e adequada a conclusão de que a seleção a ser procedida mediante o certame licitatório resultasse na escolha da proposta que oferecesse a maior vantagem em relação a ambos objetivos; g) a maior vantagem para a Administração não necessariamente pode estar no menor preço, pois um preço menor representará, inexoravelmente, uma vantagem maior, quando mantidas as demais condições; h) o dever de buscar a contratação mais vantajosa impõe, portanto, a necessidade de xação de limites superiores e inferiores para especicação do objeto. Acima deles, o gasto pode ser superior ao necessário, abaixo, a contratação pode resultar inútil; i) a recente nalidade estabelecida para a licitação pela Lei 12.349/2010 implica nova necessidade a ser atendida pela contratação resultante da licitação, pois, tão importante quanto atender à especíca necessidade que venha a motivar a abertura de procedimento licitatório, é, também, desde a alteração legislativa promovida no art. 3º, o atendimento dos interesses previstos no §7º do referido dispositivo legal, j) a necessidade da Administração se confundia, antes, com a utilidade do bem, agora a aquisição do bem não visa mais estritamente a atender à necessidade suprível pela utilidade que ele produz, mas também necessidades de outra ordem, relacionadas com aspectos macroeconômicos e expressamente mencionadas na lei; l) deve-se admitir que, em certas condições, a Administração respeitará o dever de buscar a contratação mais vantajosa se restringir suas compras exclusivamente a produtos nacionais, pois, assim, atenderá, a um só tempo, uma necessidade imediata, suprindo-se de um bem ou serviço, e um interesse mediato, consistente no fomento da indústria nacional, propósito compatível com as competências do Estado Brasileiro e coerente com as políticas públicas de desenvolvimento nacional, em especial o Programa de Aceleração do Crescimento. [...] 49. Retomando os pareceres, observo que o MP/TCU rmou-se em premissas que, nesse momento processual, refogem, em parte, à discussão empreendida. O desenvolvimento de todo o trabalho está voltado à imprescindibilidade de o Poder Executivo estabelecer as margens de preferência a que se refere o art. 3º Lei 8666/1993. 50. Já o Grupo de Trabalho expôs a antijuricidade de decreto autônomo e armou a impossibilidade do estabelecimento de vedação à participação de produtos manufaturados ou serviços estrangeiros em licitações. 51. Não há previsão, no direito positivo brasileiro, de decreto autônomo. Todo ato regulamentar do Poder Executivo deve estar fundado em lei. Ao abraçar essa convicção, verico que o §8º do art. 3º Lei 8666/1993, com a alteração introduzida pela Lei 12349/2010, estabelece que as margens de preferência sejam xadas por “ato do Poder Executivo Federal”, limitadas a 25% “sobre o preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros”. Observo que a lei não estabeleceu “vedação” a produtos ou serviços estrangeiros e, sim, “margens de preferência”. Enfatizo que essa diferenciação se mostra essencial para a proposição que apresentarei ao Colegiado, 52. Nessa esteira, foi editado o Decreto 7.546/2011, que “regulamenta o disposto nos §§5º a 12 do art. 3º da Lei no 8.666/1993, e institui a Comissão Interministerial de Compras Públicas (CI-CP)”. 53. Essa não era ainda a norma operacional requerida para tornar efetivo o comando introduzido pela Lei 12.349/2010. Para esse desiderato, deve ser editada normatização especíca. Exemplicando, menciono a edição dos decretos 7.709/2012, 7.804/2012 e 8.002/2013, para os produtos e limites ali especicados. 54. Esses normativos dão concretude à exigência de norma operacional necessária a viabilizar o estabelecimento da “margem de preferência” destinada ao “desenvolvimento nacional sustentável”, princípio este positivado pela Lei 12349/2010.
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55. Assim, nos termos do entendimento do Grupo de Trabalho, “enquanto não for publicado Decreto estabelecendo os percentuais das margens de preferência e discriminando a abrangência de sua aplicação, não cabe ao gestou adotar, ao seu juízo, restrições objetivando a aquisição de produtos nacionais nos editais licitatórios, em detrimento aos produtos estrangeiros”. Cumprido este condicionamento legal, para os produtos e percentuais referenciados nos decretos regulamentadores da matéria, é possível estabelecer “margens de preferência”. 56. Devo lembrar que a Lei 12349/2010, no seu §5º, ao estabelecer a margem de preferência para produtos manufaturados e serviços nacionais que atendam as normas técnicas brasileiras, defniu, no §6º e incisos de I a V, que esta margem será estabelecida com base
em estudos revistos periodicamente, em prazo não superior a cinco anos. Ou seja, a cada cinco anos, novos estudos deverão ser realizados, levando-se em consideração a geração de emprego e renda; o efeito na arrecadação de tributos federais, estaduais e municipais; o desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País; o custo adicional dos produtos e serviços; e a análise retrospectiva de resultados. 57. Considerando o conteúdo desse dispositivo, depreendo relevante que esta Corte de Contas, por meio de suas unidades técnicas competentes, acompanhe o desenvolvimento desses estudos, na forma estabelecida no art. 8º, §2º, do Decreto 7546/2011, na revalidação ou no estabelecimento de margens de preferência para novos produtos, observando os aspectos que efetivamente contribuam para o desenvolvimento nacional sustentável. ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, em acolhimento ao Parecer do Relator, em: 9.1. determinar ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), para que, no papel órgão central do Sistema de Planejamento e de Orçamento Federal, informe aos demais órgãos e entidades da Administração Pública Federal que: 9.1.1. é ilegal o estabelecimento de vedação a produtos e serviços estrangeiros em edital de licitação, uma vez que a Lei 12.349/2010 não previu tal situação; e 9.1.2. é ilegal o estabelecimento, por parte de gestor público, de margem de preferência nos editais licitatórios para contratação de bens e serviços sem a devida regulamentação via decreto do Poder Executivo Federal, estabelecendo os percentuais para as margens de preferência normais e adicionais, conforme o caso e discriminando a abrangência de sua aplicação; 9.2. com fundamento nos arts. 241 e 242 do Regimento Interno-TCU, determinar à Segecex que acompanhe o desenvolvimento dos estudos de que tratam os §§5º e 6º da Lei 12.349/2010, na forma estabelecida no art. 8º, §2º, do Decreto 7546/2011, na revalidação e/ou no estabelecimento de margens de preferência para novos produtos manufaturados e para novos serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras, observando os parâmetros estabelecidos nos normativos, bem como os aspectos que, efetivamente, contribuam para o desenvolvimento nacional sustentável; (TCU. Acórdão nº 1.317/2013, Plenário. Rel. Min. Aroldo Cedraz. DOU , 04 jun 2013)
Ainda a respeito de margem de preferência, o TCU se manifestou em consulta formulada pelo Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) em matéria afeta à dúvida na forma de fazer concretizar, nas licitações, o objetivo referente à “promoção do desenvolvimento nacional sustentável”, inserido no art. 3º da Lei nº 8.666/1993 pela Lei nº 12.349/2010: 2. Após discorrer sobre os aspectos jurídicos da matéria, o consulente formula a seguinte indagação ao TCU:
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“Constatada a pertinência da medida, a viabilidade de certames competitivos, e assegurada igualdade de condições a todos os concorrentes, fatos que comportam vericação somente caso a caso, a denição das características do objeto em futuros editais de licitação, necessário à satisfação do interesse público, incluída a exigência do produto ser nacional, nos termos do caput do art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993, atende aos princípios positivados no art. 37 da Constituição Federal, em especial os da legalidade e razoabilidade?” [...] A dúvida suscitada está relacionada à inovação trazida pela Lei 12.349/2010, que alterou a Lei 8.666/93, introduzindo no art. 3º o conceito de “Desenvolvimento Nacional Sustentável” entre os princípios a serem observados nos procedimentos licitatórios. Assim, questiona-se acerca da conformidade de se denirem características de objeto em futuros editais de licitação, com vistas à satisfação do interesse público, incluindose a exigência de que o produto seja nacional, aos princípios positivados no art. 37 da Constituição Federal, em especial os da legalidade e razoabilidade. Como mencionado, a consulta teve origem na prolação do Acórdão 2.241/2011-TCUPlenário. O mencionado julgado determinou a constituição de grupo de trabalho pela Segecex para que se aprofundasse o exame da matéria no âmbito do Tribunal, ocorrido sob o TC 032.230/2011-7, razão pela qual a presente consulta foi sobrestada. O TC 032.230/2011-7 foi apreciado por meio do Acórdão 1.317/2013-TCU-Plenário. Segundo o voto proferido, as conclusões do grupo de trabalho constituído foram, em síntese, as seguintes: a) a Exposição de Motivos da Medida Provisória 495/2010 cita expressamente que a preferência a produtos nacionais em certames licitatórios deve ser viabilizada mediante a ação normativa e reguladora do Estado, visando a promover maior eciência e qualidade do gasto público; b) os recentes pronunciamentos doutrinários apontam no sentido de que a promoção do desenvolvimento nacional sustentado pode acarretar a elevação dos custos para os cofres públicos, resultado explicitamente previsto e autorizado nos §§5º e seguintes do art. 3º da Lei 8.666/1993, devendo se concretizar por meio de fórmulas compensatórias a promoção dessa preferência por produtos nacionais, as quais devem observar o princípio da equanimidade; c) a Lei 12.349/2010, ao acrescentar ao art. 3º da Lei 8.666/1993 os parágrafos 5º a 13, somente deniu como instrumentos de concretização do princípio da promoção do desenvolvimento nacional sustentável as hipóteses denidas nos parágrafos 5º, 7º, 11 e 12; d) ainda não foram apresentados à sociedade os resultados dos estudos previstos na Lei com objetivo de adequação da margem de preferência às condições econômicas vigentes; e) ainda não foi publicado ato do Poder Executivo Federal, nos termos do novo parágrafo 8º do art. 3º da Lei 8.666/93, denindo as margens de preferência (normal e adicional) por produto, serviço, grupo de produtos ou grupo de serviços; f) as margens de preferência são instrumentos de política pública para viabilizar o desenvolvimento nacional sustentável, e devem ser exercidas nos moldes, limites e diretrizes dessa política; g) a única possibilidade de vedação à aceitação de produto importado em licitações públicas encontra-se no parágrafo 12 do art. 3º da Lei de Licitações, que se destina à aquisição de bens e/ou serviços designados à implantação, manutenção e ao aperfeiçoamento dos sistemas de tecnologia de informação e comunicação (TIC), que sejam considerados estratégicos por meio de ato do Poder Executivo Federal; h) a ausência de previsão legal acerca da possibilidade de vedação à contratação de produtos e serviços estrangeiros em licitações nacionais, e o art. 84, IV da Constituição Federal, que estabeleceu que compete privativamente ao Presidente da República expedir decretos e regulamentos para el execução das leis, respaldam que a expedição de decreto
CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
ou regulamento que contenha tal restrição extrapola as disposições previstas em Lei e é nulo, por ser inconstitucional; e i) a restrição a produtos importados em editais de licitações nacionais é ilegal e pode trazer consequências internas e externas nocivas ao mercado brasileiro, tais como retaliações ante a Organização Mundial do Comércio (OMC), bem como propositura de ações judiciais, em massa, ou em cada edital de licitação no caso concreto. O voto do Acórdão 1.317/2013-TCU-Plenário apresentou, ainda, as considerações do MP/TCU, que discordou das conclusões do Grupo de Trabalho por considerar que, se devidamente motivada, seria legal a vedação a produtos e serviços estrangeiros em edital de licitação e por entender que a previsão de tal possibilidade em Decreto do Poder Executivo não conguraria decreto autônomo, por encontrar amparo no art. 3º da Lei
8.666/93. Apresentados os entendimentos emitidos nos autos, o Ministro-Relator do TC 032.230/20117, Exmo. Sr. Ministro Aroldo Cedraz entendeu não ser razoável que cada gestor público, na atuação em casos concretos, denisse a seu critério quais seriam as contratações que
deveriam restringir a aquisição de bens e serviços àqueles produzidos no Território Nacional. Para o Relator, a preferência deve ser viabilizada mediante a ação normativa e reguladora do Estado, visando a promover a eciência e qualidade do gasto público. Como
reforço a esse entendimento emitido em seu voto, cabe citar a edição do Decreto 7.546/2011, que regulamenta dispositivos da Lei 12.349/2010 e instituiu a Comissão Interministerial de Compras Públicas (CI-CP), e dos Decretos 7.709/2012, 7.713/2012, 7.767/2012, 7.903/2013 e 8.002/2013, que instituíram margens de preferências para a aquisição pela Administração Pública de produtos como retroescavadeiras, motoniveladoras, produtos médicos, fármacos e medicamentos. Assim, depreende-se do voto do Relator do TC 032.230/2011-7 que a Lei 12.349/2010 não estabeleceu vedação a produtos ou serviços estrangeiros nos procedimentos licitatórios, mas o estabelecimento de “margens de preferência”, as quais devem ser estabelecidas conforme os dispositivos por ela introduzidos, em especial o §6º do art. 3º. Nesse sentido, como mencionado no voto condutor do Acórdão 1.317/2013-TCU-Plenário, foram editados os Decretos 7.546/2011, que regulamenta dispositivos da Lei 12.349/2010 e instituiu a Comissão Interministerial de Compras Públicas (CI-CP); 7.709/2012; 7.804/2012 e 8.002/2013, que tratam de determinados produtos beneciados por margens de preferência
e seus respectivos percentuais. VOTO Conforme decidido pelo Acórdão nº 1317/2013-Plenário, este Tribunal não compartilha do entendimento de que o critério para favorecer a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, instituído como um dos objetivos das licitações públicas pela Lei nº
12.349/2010, possa ser denido discricionariamente caso a caso, nem de que a vedação a produto estrangeiro seja uma forma razoável de xá-lo.
2. Na mesma esteira, de modo geral e objetivo, o Poder Executivo Federal vem editando decretos para estabelecer a margem de preferência de produtos nacionais sobre estrangeiros, sem proibir que haja concorrência entre ambos. 3. Assim, de acordo com a proposta da Unidade Técnica, deve ser dada resposta ao consulente nos mesmos termos denidos pelo Acórdão nº 1317/2013-Plenário.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, diante das razões expostas pelo Relator, e com fundamento no art. 1º, inciso XVII, e §2º, da Lei nº 8.443/92, c/c os arts. 264 e 265 do Regimento Interno, em: 9.2. conhecer da consulta, para responder ao consulente que, conforme o Acórdão nº 1317/2013-Plenário, o TCU tem o seguinte entendimento: 9.2.1. é ilegal o estabelecimento de vedação a produtos e serviços estrangeiros em edital de licitação, uma vez que a Lei nº 12.349/2010 não previu tal restrição;
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9.2.2. é ilegal o estabelecimento, por parte de gestor público, de margem de preferência nos editais licitatórios para contratação de bens e serviços sem a devida regulamentação via decreto do Poder Executivo Federal, estabelecendo os percentuais para as margens de preferência normais e adicionais, conforme o caso, e discriminando a abrangência de sua aplicação. (TCU. Acórdão nº 1.550/2013, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 25 jun. 2013)
14.6 O processo de planejamento, execução e utilização das obras públicas e a sustentabilidade O planejamento, execução e utilização de uma obra pública representa processo complexo multidisciplinar que envolve diversas áreas. É preciso entender o empreendimento de forma sistêmica, ou seja, o funcionamento de cada variável e o impacto que um determinado aspecto terá sobre o outro. A A3P destaca os nove princípios que devem ser observados no aspecto de sustentabilidade ambiental, de acordo com os principais sistemas de certicação
internacionais. Segundo os sistemas de certicação que são referência na área de construção
sustentável no mundo, BREEAM (Inglaterra), Green Star (Austrália), LEED (Estados Unidos) e HQE (França), existem nove princípios que norteiam as diretrizes de uma obra que se proponha a ser ambientalmente equilibrada: 1. Planejamento Sustentável da Obra; 2. Aproveitamento passivo dos recursos naturais; 3. Eciência energética;
4. Gestão e economia de água; 5. Gestão dos resíduos na edicação;
6. Qualidade do ar e do ambiente interior; 7. Conforto termo-acústico; 8. Uso racional de matérias; e 9. Uso de produtos e tecnologias ambientalmente amigáveis. A observância desses princípios é interessante diante dos diversos tipos de obras existentes, cada uma com suas peculiaridades, como, por exemplo, as obras de 187
edicação, rodoviárias, elétricas, hidroviárias e industriais. A denição de uma solução de menor custo inicial poderá acarretar altos custos
de manutenção e operação e vice-versa. É na fase de planejamento que os estudos de compatibilização deverão ser feitos, o que reforça tudo o que já foi mencionado neste livro a respeito da importância da elaboração do projeto básico. Portanto, oportuno o comando contido no art. 12 da Lei nº 8.666/93 que estabelece como requisitos desse projeto, dentre outros, a economia na execução, conservação e operação; a possibilidade de emprego de mão de obra, materiais, tecnologia e matérias-primas existentes no local para execução, conservação e operação; a facilidade na execução, conservação e operação, sem prejuízo da durabilidade da obra ou do serviço; e a avaliação do impacto ambiental.
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BRASIL. Ministério do Meio Ambiente – MMA. Departamento de Cidadania e Responsabilidade Socioambiental – DCRS. Agenda ambiental na Administração Pública: A3P, p. 81.
CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
A especicação, nesta publicação, de cada uma das medidas possíveis de serem
implementadas por tipo de empreendimento a tornaria extensa em demasia, visto haver ampla gama de espécies de obras. Entretanto, vale destacar que a IN SLTI/MPOG nº 01/2010 traz capítulo especíco que trata das obras públicas sustentáveis, com foco em edicações, em texto similar ao da A3P: Art. 4º Nos termos do art. 12 da Lei nº 8.666, de 1993, as especicações e demais exigências
do projeto básico ou executivo, para contratação de obras e serviços de engenharia, devem ser elaborados visando à economia da manutenção e operacionalização da edicação, a
redução do consumo de energia e água, bem como a utilização de tecnologias e materiais que reduzam o impacto ambiental, tais como: I - uso de equipamentos de climatização mecânica, ou de novas tecnologias de resfriamento do ar, que utilizem energia elétrica, apenas nos ambientes aonde for indispensável; II - automação da iluminação do prédio, projeto de iluminação, interruptores, iluminação ambiental, iluminação tarefa, uso de sensores de presença; III - uso exclusivo de lâmpadas uorescentes compactas ou tubulares de alto rendimento e de luminárias ecientes;
IV - energia solar, ou outra energia limpa para aquecimento de água; V - sistema de medição individualizado de consumo de água e energia; VI - sistema de reuso de água e de tratamento de euentes gerados;
VII - aproveitamento da água da chuva, agregando ao sistema hidráulico elementos que possibilitem a captação, transporte, armazenamento e seu aproveitamento; VIII - utilização de materiais que sejam reciclados, reutilizados e biodegradáveis, e que reduzam a necessidade de manutenção; e IX - comprovação da origem da madeira a ser utilizada na execução da obra ou serviço. §1º Deve ser priorizado o emprego de mão-de-obra, materiais, tecnologias e matériasprimas de origem local para execução, conservação e operação das obras públicas. §2º O Projeto de Gerenciamento de Resíduo de Construção Civil – PGRCC, nas condições determinadas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, através da Resolução nº 307, de 5 de julho de 2002, deverá ser estruturado em conformidade com o modelo especicado pelos órgãos competentes.
§3º Os instrumentos convocatórios e contratos de obras e serviços de engenharia deverão exigir o uso obrigatório de agregados reciclados nas obras contratadas, sempre que existir a oferta de agregados reciclados, capacidade de suprimento e custo inferior em relação aos agregados naturais, bem como o el cumprimento do PGRCC, sob pena de multa, estabelecendo, para efeitos de scalização, que todos os resíduos removidos deverão estar
acompanhados de Controle de Transporte de Resíduos, em conformidade com as normas da Agência Brasileira de Normas Técnicas – ABNT, ABNT NBR nºs 15.112, 15.113, 15.114, 15.115 e 15.116, de 2004, disponibilizando campo especíco na planilha de composição
dos custos. §4º No projeto básico ou executivo para contratação de obras e serviços de engenharia, devem ser observadas as normas do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – INMETRO e as normas ISO nº 14.000 da Organização Internacional para a Padronização (International Organization for Standardization). §5º Quando a contratação envolver a utilização de bens e a empresa for detentora da norma ISO 14000, o instrumento convocatório, além de estabelecer diretrizes sobre a área de gestão ambiental dentro de empresas de bens, deverá exigir a comprovação de que o licitante adota práticas de desfazimento sustentável ou reciclagem dos bens que forem inservíveis para o processo de reutilização.
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Vale, ainda, destacar interessante estudo desenvolvido pela Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (AsBEA) que agrupou, em formato simples e objetivo, pontos relevantes que podem perfeitamente ser incorporados à maioria dos projetos básicos de edicação, conforme destacado a seguir: Uso efciente da energia Medidas que resultam em uma redução do consumo energético ou maior eciência do uso em edifícios: 1. Especicação de equipamentos com menor consumo e melhor eciência possível na utilização do gás natural para todos os ns; 2. Automatização de transporte vertical com otimização de carga e menor consumo energético possível com a adoção de sistemas ecientes como o ADC, (antecipação de chamadas); 3. Iluminação de baixo consumo energético nas áreas comuns de uso contínuo, e iluminação “incandescente” com acionadores por sensor de presença nas áreas de uso esporádico ou intermitente. Este princípio, com maior tolerância, também é válido para as unidades privadas; 4. Planejamento do consumo energético e utilização de equipamentos para gerar energia em períodos de pico; 5. Melhor aproveitamento possível da iluminação natural, levando-se em conta a necessidade do seu controle; 6. Melhor condição de conforto térmico evitando a incidência da radiação solar direta através da adoção de soluções arquitetônicas tipo brises-soleil , venezianas, telas termoscreen externas, prateleiras de luz, vidros especiais que dispensam o uso de brises , etc.; 7. Implementação e otimização de ventilação natural; 8. Adoção preferencial de acabamentos claros nas áreas de grande incidência de luz solar; 9. Tratamento das coberturas do edifício analisando a possibilidade de implementação de áreas verdes ou, caso esta solução não seja possível, utilizar pinturas reexivas para diminuir a absorção de calor para o edifício; 10. Uso de soluções alternativas de produção de energia como a eólica ou a solar, de acordo com as condições locais. A indústria brasileira está se tornando cada vez mais forte na produção de equipamentos para estes ns, tornando viáveis estes projetos. Uso efciente da água Sistemas que reduzem o consumo de água em edifícios: 1. Captação, armazenamento e tratamento de águas pluviais para reutilização na irrigação, limpeza, refrigeração, sistema de combate a incêndio e demais usos permitidos para água não potável; 2. Utilização de bacias acopladas e válvulas especiais com o uxo opcional por descarga, ou de sistemas a vácuo; 3. Reaproveitamento das águas de lavagem, com tratamento local, para utilização sanitária; 4. Utilização de torneiras com acionamento eletrônico ou temporizador por pressão em todas as aplicações passíveis. Uso de materiais certifcados e renováveis 1. Maximização na especicação de materiais sustentáveis objetivando o maior volume possível de utilização de materiais certicados, de manejo sustentável e recicláveis; 2. Planejamento para maior durabilidade possível nas especificações visando alta performance e evitando obsolescência prematura;
CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE DAS OBRAS PÚBLICAS
3. Utilização de materiais cujos processos de extração de matérias primas, beneciamento,
produção, armazenamento e transporte causem menor índice de danos ao meio ambiente nem estejam baseados em condições de trabalho indignas para os operários. Qualidade ambiental interna e externa
1. Projetar utilizando técnicas que permitam uma construção mais econômica, menos poluente e que impacte de forma menos agressiva o meio ambiente; 2. Evitar ao máximo a impermeabilização do solo; 3. Evitar danos à fauna, ora, eco-sistema local e ao meio ambiente;
4. Planejar toda a obra e futura operação do edifício procurando minimizar a geração de lixo e resíduos; 5. Evitar todo e qualquer tipo de contaminação, degradação e poluição de qualquer natureza, visual, sonora, ar, luminosa, etc.; 6. Promover a segurança interna e externa do edifício e seus usuários; 7. Implantação e otimização de todos os recursos para a correta coleta seletiva do lixo visando a reciclagem de materiais e a menor geração de resíduos descartáveis; 8. Evitar grandes movimentos de terra, preservando sempre que possível a conformação original do terreno; 9. Elaborar um plano eciente de drenagem do solo para durante e após a execução das
obras, evitando-se danos como erosão ou rebaixamento de lençol freático. Utilização consciente dos equipamentos e do edifício pelo usuário
1. O arquiteto deve procurar elaborar o projeto sempre com o apoio de quem irá operar o edifício, criando espaços e sistemas racionalizados, de baixo custo operacional e com mínimo impacto ambiental. Quando se entrega uma obra, não importa a escala, esta deveria ser acompanhada de Manual de Operação, Gestão e Manutenção; 2. Orientar a criação e promoção de um curso de gestor ambiental do edifício; 3. Amparar todo corpo de funcionários com treinamento adequado visando a educação, desenvolvimento intelectual e criatividade; 4. Difusão para o corpo de funcionários e todos os usuários do edifício dos princípios de sustentabilidade e conservação do meio ambiente. Soluções que permitam fexibilidade e durabilidade 1. Adotar soluções construtivas que garantam maior exibilidade na construção, de
maneira a permitir fácil adaptação às mudanças de uso do ambiente ou de usuário, no decorrer do tempo, e evitar reformas que podem causar grande impacto ambiental, pela produção do entulho; 2. Adoção de materiais que sejam duráveis, não somente pelas suas características técnicas, mas também em função do seu desempenho e comportamento ao longo do tempo, o que resulta em longevidade para o edifício. 188
14.7 Considerações nais A matéria afeta à sustentabilidade pode ser considerada recente em termos de licitações públicas, tanto que, apenas no nal de 2010, foi incorporada menção expressa
ao tema na Lei nº 8.666/93. Sem dúvida alguma, diversas questões polêmicas deverão surgir com essa inovação legislativa. Apenas o tempo levará à uniformidade de entendimentos por parte dos Tribunais. 188
CONSELHO BRASILEIRO DE CONSTRUÇÕES SUSTENTÁVEIS – CBCS. Relatório de Grupo de Trabalho da AsBEA. Disponível em: .
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De qualquer forma, representa grande avanço que possibilitará um desenvolvimento nacional com melhor equilíbrio nas áreas ambiental, econômica, social e tecnológica.
CAPÍTULO 15
REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
Sumário : 15.1 Considerações
iniciais – 15.2 Regimes de execução e matriz de riscos – 15.2.1 Contratação integrada – utilização e critério de julgamento – 15.2.2 As novidades da Lei nº 12.980/2014 – 15.3 Elaboração, publicação, sigilo do orçamento base e remuneração variável – 15.4 Critérios de julgamento – 15.5 Modalidades de licitação, prazos para apresentação de propostas e publicidade do instrumento convocatório – 15.6 Sistema de Registro de Preços e Catálogo Eletrônico de Padronização – 15.7 Habilitação, pré-qualicação e cadastramento – 15.8 Procedimento – 15.8.1 Análise das propostas previamente à avaliação da habilitação – 15.8.2 Modo e forma de disputa – 15.8.3 Análise das propostas e negociação – 15.9 Contrato e execução – 15.10 Considerações nais
15.1 Considerações iniciais O Brasil foi o país escolhido, em 2007 e 2009, para sediar a Copa do Mundo 2014 e os Jogos Olímpicos 2016, respectivamente. Inegável a importância desses eventos para o desenvolvimento nacional em função das melhorias estruturais das cidades que sediarão as competições, como a infraestrutura urbana, rede de transportes, segurança, e a atração de turistas e riquezas para o país. Os desaos foram enormes na busca de alcançar todos os objetivos almejados, a começar pela necessidade da eciente entrega de todas as obras nos exatos
prazos pactuados, visto não haver espaço para atrasos. No conjunto de ações para a realização desses eventos esportivos, foi aprovada a Lei nº 12.462, de 05.08.2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações 189
Públicas (RDC), com o objetivo (art. 1º) de ampliar a eciência nas contratações públicas
e a competitividade entre os licitantes; promover a troca de experiências e tecnologias em busca da melhor relação entre custos e benefícios para o setor público; incentivar a inovação tecnológica; e assegurar tratamento isonômico entre os licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa para a administração pública, aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização: I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser denida pela Autoridade Pública Olímpica – APO; e
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Origem na Medida Provisória nº 527/2011.
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II - da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação – FIFA 2013 e da Copa do Mundo FIFA 2014, defnidos pelo Grupo Executivo – GECOPA 2014 do Comitê Gestor instituído para defnir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano
Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo FIFA 2014 – CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; III - de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos inciso I e II. De início, o TCU frmou entendimento de que “a utilização do RDC em obras
com término posterior à Copa do Mundo de 2014 — ou às Olimpíadas de 2016, conforme o caso — somente seria legítima nas situações em que ao menos fração do empreendimento tivesse efetivo proveito para a realização desses megaeventos esportivos, cumulativamente com a necessidade de ser demonstrada a inviabilidade técnica e econômica do parcelamento das frações da empreitada a serem concluídas a posteriori, em atendimento ao disposto nos arts. 1º, incisos de I a III; 39 e 42 da Lei 12.462/2011, c/c o art. 23, §1º, da Lei 8.666/93” (TCU. Acórdão nº 1.324/2012, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 06 jun. 2012). Entretanto, posteriormente, o RDC teve sua abrangência ampliada para a contratação: a) das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC);190 b) das obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS);191 c) das obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino;192 d) da modernização, construção, ampliação ou reforma de aeródromos públicos;193 e) de todas as ações relacionadas à reforma, modernização, ampliação ou construção de unidades armazenadoras próprias destinadas às atividades de guarda e conservação de produtos agropecuários em ambiente natura pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB);194 f) das obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo; 195 g) das ações no âmbito da Segurança Pública;196 h) das obras e serviços de engenharia, relacionadas a melhorias na mobilidade urbana ou ampliação de infraestrutura logística; 197 e i) dos contratos de locação de bens móveis e imóveis frmados pela Administração Pública, disciplinados no art. 47-A da Lei nº 12.462/2011, nos quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial, com ou sem aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especifcado pela Administração.198 Art. 1º, IV, da Lei nº 12.462/2011, incluído pela Lei nº 12.688/2012. Art. 1º, V, da Lei nº 12.462/2011, incluído pala Lei nº 12.745/2012. 192 Art. 1º, §3º, da Lei nº 12.462/2011, incluído pela Lei nº 12.722/2012. 193 Art. 63-A da Lei nº 12.462/2011, incluído pela Lei nº 12.833/2013. 194 Lei nº 12.873/2013. 195 Lei nº 13.190/2015. 196 Lei nº 13.190/2015. 197 Lei nº 13.190/2015 (acompanhar andamento de liminar suspensiva deferida, em 19 nov. 2015, no MS nº 33.889/STF). 198 Lei nº 13.190/2015 (acompanhar andamento de liminar suspensiva deferida, em 19 nov. 2015, no MS nº 33.889/STF). 190 191
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
Outras leis, que não trataram diretamente da alteração da Lei 12.462/11, também autorizaram a utilização do RDC para outros tipos de obras: a) modernização, construção, ampliação ou reforma de aeródromos públicos (art. 62-A da Lei nº 12.833/2012); b) ações relacionadas à obras de unidades armazenadoras próprias destinadas às atividades de guarda e conservação de produtos agropecuários em ambiente natura (art. 1º da Lei nº 12.873/2013); c) obras e serviços no âmbito do Programa Nacional de Dragagem Portuária e Hidroviária II (art. 54,§ 4º e art. 66 da Lei nº 12.815/2013); d) licitações e aos contratos destinados à execução de ações de prevenção em áreas de risco de desastres e de resposta e de recuperação em áreas atingidas por desastres (art. 15-A da Lei nº 12.340/2010); e) desenvolvimento de projetos, modernização, ampliação, construção ou reforma da rede integrada e especializada para atendimento da mulher em situação de violência (Lei nº 12.865/2013). De plano, cabe salientar que a escolha para licitação por esse regime diferenciado, nos casos dos empreendimentos listados no parágrafo anterior, é decisão discricionária do gestor. Entretanto, caso haja a opção, “deverá constar de forma expressa do instrumento convocatório e resultará no afastamento das normas contidas na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, exceto nos casos expressamente previstos nesta Lei” (art. 1º, §2º, da Lei nº 12.462/2011). O referido regime incorpora algumas interessantes inovações que serão detalhadas neste capítulo: a contratação integrada; o sigilo do orçamento da administração no curso do processo licitatório; o estabelecimento de remuneração variável; a possibilidade de inversão de fases; novos tipos de licitação; modos de disputa aberta ou fechada; e a utilização do sistema de registro de preços. O texto do RDC faz diversas menções a posterior detalhamento de artigos por meio de regulamento. Para tanto, foi aprovado o Decreto nº 7.581, de 11.10.2011, ajustado pelos Decretos nºs 8.080/2013 e 8.251/2014. O presente capítulo apresenta um excelente panorama da utilização desse novo regime, com vistas a fornecer ao leitor os principais conceitos para a contratação segura de Obras Públicas. Caso haja necessidade de maior aprofundamento no estudo da matéria, sugiro a leitura do livro “RDC e a Contratação Integrada na Prática: 250 questões fundamentais”, publicado pela Editora Fórum, no qual busquei, em coautoria 199
com Rafael Jardim Cavalcante, detalhar todo o uxograma da contratação e responder as
principais perguntas que gestores formulam quando da utilização da Lei nº 12.462/2011. O raciocínio estratégico da contratação para as obras em comento deve ser o mesmo aplicado àquele utilizado para as obras disciplinadas pela Lei nº 8.666/93, com a busca das respostas às seguintes perguntas básicas, já detalhadas no item 7.1 deste livro: “o que contratar?”; “com quais recursos?”; “com quem contratar?”; “como executar?”; e “como contratar?”. A diferença, em relação à norma geral de licitações, está nos comandos inseridos pelo RDC que poderão agilizar alguns procedimentos, conforme ilustra a FIGURA 15.a. 199
Ver artigos 14, parágrafo único, I; 16; 17, caput e §1º; 19, §1º; 22, §1º; 23. §2º; 24, §3º; 29; 30, §2º; 31, §2º; 32, §2º, II; 33; 34, §1º, todos da Lei nº 12.462/2011.
caput e
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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LICITAÇÃO – FASE INTERNA
O que contratar
Com quais recursos
Com quem contratar
Como executar
Caracteriz. da obra
Previsão de recursos
Regras para habilitação
Regras para contratação
Regras para julgamento
Regras para estruturar a licitação
Anteprojeto
- Orçamento sigiloso - Orçamento estimado
Contratação integrada aditivos
- Avaliação do detalhamento - Lances sucessivos
- Inversão de fases - Meio eletrônico - Novos tipos
Pré-
Como contratar
FIGURA 15.a - Questões e diretrizes a serem observadas na contratação de obras da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, de acordo com as inovações trazidas pelo RDC
15.2 Regimes de execução e matriz de riscos A grande inovação trazida pelo RDC foi o acréscimo de um novo regime de execução àqueles já previstos na Lei nº 8.666/93 denominado contratação integrada, por meio do qual é permitida uma licitação única que englobe, nos termos do seu art. 9º, §1º, “a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e todas as demais operações necessárias e sufcientes para a entrega fnal do objeto”. No que se refere aos regimes de empreitada por preço unitário, por preço global ou integral, valem as observações já registradas no item 7.5.2 deste livro. O próprio RDC estabelece, em seu art. 8º, §5º, que, com exceção do regime de contratação integrada, “deverá haver projeto básico aprovado pela autoridade competente, disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório”. Até 24.12.2013, havia exigência legal de que a contratação integrada deveria ser sempre precedida por uma licitação com critério de julgamento por técnica e preço. Porém, por meio da Medida Provisória nº 630, convertida na Lei nº 12.980/2014, conforme será detalhado no item 15.2.2, foi suprimida a exigência do referido critério para esse tipo de regime de execução, uma vez revogado o inciso III do §2º do art. 9º da redação original da Lei nº 12.462/11. Para os demais regimes, a lei previu um conjunto de procedimentos que serão descritos em tópicos a seguir para propiciar maior celeridade no curso da seleção da proposta mais vantajosa. 200
200
Art. 8º da Lei 12.462/11: “Na execução indireta de obras e serviços de engenharia, são admitidos os seguintes regimes: I - empreitada por preço unitário; II - empreitada por preço global; III - contratação por tarefa; IV empreitada integral; ou V - contratação integrada”.
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
A primeira questão a ser formulada em relação ao regime de contratação integrada é qual o elemento técnico será utilizado para embasar a contratação da obra, já que o projeto básico será elaborado pela própria contratada? O RDC apresenta a resposta no art. 9º, §2º, ressaltando que o anteprojeto de engenharia será o fundamento para estabelecer os documentos técnicos para possibilitar a caracterização da obra ou serviço, incluindo: a) a demonstração e a justifcativa do programa de necessidades, a visão global dos investimentos e as defnições quanto ao nível de serviço desejado;
b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de entrega, observado o disposto no caput e no §1º do art. 6º desta Lei; c) a estética do projeto arquitetônico; e d) os parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos impactos ambientais e à acessibilidade.
O Decreto nº 7.581/11 complementa a documentação contida no conceito de anteprojeto em seu art. 74, §1º: Deverão constar do anteprojeto, quando couber, os seguintes documentos técnicos: I - concepção da obra ou serviço de engenharia; II - projetos anteriores ou estudos preliminares que embasaram a concepção adotada; III - levantamento topográfco e cadastral;
IV - pareceres de sondagem; e V - memorial descritivo dos elementos da edifcação, dos componentes construtivos e
dos materiais de construção, de forma a estabelecer padrões mínimos para a contratação.
Vale, então, para facilitar a visualização do processo, recorrer à FIGURA 15.b, similar à FIGURA 7.c, já utilizada nesta publicação, que ilustra os elementos utilizados na caracterização de uma obra pública com a inserção do anteprojeto.
CARACTERIZAÇÃO DA OBRA
Lei nº 8.666 e demais regimes do RDC – Projeto básico não pode ser feito pelo executor
Licença ambiental prévia
Anteprojeto
Orçamento estimativo
Projeto básico
Orçamento detalhado
Projeto executivo
Documentação “As Built”
FIGURA 15.b - Elementos técnicos utilizados na contratação de uma obra pública
RDC – contratação integrada – contrato único com executor
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
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Não obstante as características técnicas próprias de cada um dos projetos e documentações apresentados na FIGURA 15.b, já apresentadas em capítulos anteriores desta publicação, podemos de uma maneira simplista denir os objetivos de cada um deles da seguinte forma: a) Anteprojeto – conceituar a obra; b) Projeto Básico – caracterizar e precisar o empreendimento; c) Projeto Executivo – detalhar o projeto básico; d) Documentação “as built” – registrar tudo o que foi executado. Ainda no intuito de aprimorar a visão sistêmica de um empreendimento, e o momento em que cada uma das peças técnicas é elaborada, vale recorrer aos conceitos do ciclo de vida de um Projeto. O gerenciamento de Projetos ecaz é fundamental para que empreendimentos de tal envergadura possam ser concluídos no prazo, qualidade e custo esperados. O PMBOK é um excelente referencial para esse gerenciamento ao estabelecer um conjunto de boas práticas reconhecidas internacionalmente. Segundo o referido guia: 201
202
203
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206
O término e a aprovação de um ou mais produtos caracteriza uma fase do projeto. Chamamos genericamente de produto o resultado mensurável e vericável do trabalho, como uma especicação, um relatório de estudo de viabilidade, um documento de projeto detalhado ou um protótipo. [...] Os produtos e, portanto, as fases fazem parte de um processo geralmente seqüencial criado para garantir o controle adequado do projeto e para conseguir um produto ou serviço desejado, que é o objetivo do projeto. Uma fase do projeto em geral é concluída com uma revisão do trabalho realizado e dos produtos para denir a aceitação, se ainda é necessários algum trabalho adicional ou se a fase deve ser encerrada. [...] Da mesma forma, uma fase pode ser encerrada sem a decisão de iniciar outras fases. Por exemplo, o projeto terminou ou o risco é considerado grande demais para que sua continuação seja permitida. 207
As fases de um projeto dependem de sua natureza, podendo chegar até o número de dez. Para a execução de uma obra pública, que pode ser perfeitamente entendida como um Projeto, é possível abordar cinco fases: iniciação, onde a necessidade é denida e são elaborados os estudos de viabilidade para o seu atendimento; planejamento, momento em que se caracteriza o que e como será atendida a necessidade; execução, que compreende as atividades para a realização do produto principal; encerramento, para o recebimento e a avaliação global do que foi realizado; e controle, que trata das
201
Ver item 6.4 deste livro. Ver item 7.2.1 deste livro. 203 Ver item 7.2.5 deste livro. 204 Ver item 7.2.6 deste livro. 205 Projeto pode ser denido como o esforço temporário empreendido para criar um produto, serviço ou resultado exclusivo. 206 O PMBOK é um Guia do Conjunto de Conhecimentos em Gerenciamento de Projetos elaborado pelo Project Management Institute – PMI (Instituto de Gerenciamento de Projetos) — organização internacionalmente reconhecida, sem ns lucrativos, composta por mais de 200.000 associados, com sede nos Estados Unidos. 207 PROJECT MANAGEMENT INSTITUTE – PMI. Um guia de conhecimentos em gerenciamento de projetos: Guia PMBOK, p. 22. 202
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
ações voltadas ao monitoramento quanto a aspectos técnicos e legais do andamento do Projeto. Conforme ilustra a FIGURA 15.c, os estudos de viabilidade são realizados e entregues na primeira fase; o anteprojeto no início e o projeto básico no nal da segunda
fase; o projeto executivo no início ou no decorrer da terceira; e a documentação “as built” na fase de encerramento. Execução
Esforço
Planejamento 4
Encerramento
Iniciação 3 2 1
Controle
5
Tempo
1 - Estudo de viabilidade 2 - Anteprojeto 3 - Projeto Básico 4 - Projeto Executivo 5 - Documentação “as built” FIGURA 15.c - Ciclo de vida de um Projeto
Importante notar que os esforços e a aplicação de recursos aumentam substancialmente na segunda e, principalmente, na terceira fase. Portanto, quanto melhor estiver o estudo que antecede cada uma dessas fases, mais seguro estará o andamento do Projeto. A Lei nº 8.666/93 entendeu oportuno, em função do risco da contratação, que a Administração tivesse em mãos o projeto básico para que desse início à licitação que envolve o maior aporte de recursos — a da execução da obra pública. Separou, portanto, a responsabilidade do empreendimento em duas partes: a primeira relacionada ao projeto básico e a segunda, independente da primeira, relativa à execução da obra. O RDC, por sua vez, avança no sentido de que em casos especícos — com a
utilização da contratação integrada — a responsabilidade pelas duas atividades pode ser única, devendo a Administração cuidar tão somente do preparo do anteprojeto. Importante perceber que para os outros regimes de execução previstos no RDC, continua sendo obrigatória a separação das responsabilidades, nos termos denidos pelo art. 36
da Lei nº 12.462/2011. Vale notar, no caso do regime diferenciado, que o legislador aceitou alguns riscos adicionais em função do prazo peremptório para a conclusão das obras, muitas delas ainda não licitadas.
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Apesar de possibilitar uma aceleração do processo de contratação, se não houver um choque de gestão, com a efetiva capacitação e compromisso dos agentes responsáveis pela condução da terceira fase — execução, os problemas poderão se repetir ainda em maior gravidade em virtude da pressão do tempo para a conclusão dos Projetos. Como exemplo da situação descrita, o TCU formulou determinação para correção de irregularidade afeta ao desenvolvimento de projeto básico pela contratada em qualidade inferior àquela denida no anteprojeto da licitação: 6. O nível de serviço da rodovia com relação às interseções também foi reduzido. A unidade técnica destaca a substituição dos ramos direcionais (cruzamentos em níveis diferentes) por rotatórias (interseções em nível). Os primeiros conferem maior segurança de tráfego ao eliminarem conitos diretos e evitarem paralisações dos veículos e grandes reduções de velocidade. 7. Por outro lado, o Dnit identicou a inadequação dos projetos básicos do Consórcio e não os aprovou. Visto que a autarquia tem tomado as medidas adequadas ao caso, entendo que cabe dar-lhe ciência das irregularidades encontradas na scalização, acompanhando a proposta da unidade técnica. 8. Acerca do descumprimento de prazo decorrente da não aprovação do projeto, no mesmo sentido da proposta da SecobRodovia, julgo que deve ser dada ciência ao Dnit da necessidade de aplicação das penalidades previstas nos contratos quando ocorrerem as seguintes situações: descumprimento de prazo na entrega de projeto básico/executivo; entrega, ainda que no prazo contratual, mas que não cumpra a condição de manter ou melhorar os níveis de serviço e as condições operacionais da rodovia previstos no anteprojeto; ou entrega, ainda que dentro do prazo, mas em desacordo com os normativos e Manuais de Projeto da autarquia. 9. Acrescento, ainda, que as graves discrepâncias vericadas nos projetos básicos, com relação ao anteprojeto da licitação e aos Manuais de Projeto, demandam do Dnit cautelosa análise por ocasião de sua aprovação, de forma que tais irregularidades não subsistam nas etapas posteriores de execução das obras. A autarquia também deve estar atenta aos possíveis atrasos no cronograma de execução do contrato como consequência da necessidade de readequação dos projetos por parte do consórcio. Sendo assim, convém determinar ao Dnit que informe ao Tribunal, no prazo de 90 dias, as providências tomadas com relação às correções dos projetos contratados, bem como, quanto a eventuais atrasos na execução do contrato e aplicação de penalidades, caso congurada alguma das hipóteses descritas no parágrafo anterior. (TCU. Acórdão nº 1.671/2014, Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 3 jul. 2014). Há, ainda, que se avaliar nesse caso o prazo a ser denido para apresentação das propostas. O art. 15, II, “b”, do RDC, estabelece que o prazo mínimo para a referida apresentação, contado a partir da data de publicação do instrumento convocatório, para a contratação de serviços e obras em hipóteses diferentes dos critérios de julgamento pelo menor preço ou pelo maior desconto, é de 30 dias úteis. Considerando que as empresas só terão o anteprojeto para formular suas propostas, parece prudente que o responsável pela elaboração de edital relativo a obras de maior complexidade estabeleça
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
prazo mais confortável do que o mínimo legal a m de que os licitantes tenham tempo suciente para estudos de melhor qualidade.
Outra questão relevante estabelecida pelo RDC foi a orientação, no art. 8º, §1º, para a escolha preferencial dos regimes de empreitada por preço global; empreitada integral; ou contratação integrada. A opção por regime diverso exigirá inserção nos autos do procedimento dos motivos que justicaram a escolha.
Aqui, vale um cuidado. A escolha do regime de execução, conforme esclarecido no item 7.5.2 desta publicação, tem como fundamento maior a natureza da obra. Não obstante o regime global apresentar facilidade em relação às medições e às estimativas do valor nal, deve ser escolhido para obras em que existe, na fase de projeto, maior precisão das denições dos quantitativos a serem executados.
Para obras com maior complexidade, salvo no caso da contratação integrada, continuará valendo a opção pelo regime unitário, visto que a forçosa escolha do global fará com que as empresas apresentem preços elevados em virtude do aumento da taxa de risco ou desistam de participar do certame. Oportuno lembrar que o TCU proferiu Acórdão nº 1.977/2013, Plenário, já apresentado no item 7.5.2 desta publicação, em que aprofundou as considerações a respeito da conceituação e utilização dos regimes de execução por preço unitário e por preço global. Naquela oportunidade, cou assente que “nos contratos executados
mediante o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicam-se, no que couber, os entendimentos expressos nesta decisão, por força do disposto no art. 2º, inciso II; art. 8º, §1º; art. 39; art. 45, inciso I, alínea ‘b’ e art. 63, todos da Lei 12.462/2011, como também no Acórdão 1.510/2013-Plenário, mormente no que se refere à necessidade de estabelecer uma matriz de riscos, a explicitar as exatas responsabilidades e encargos a serem assumidos pelos particulares — inclusive no que se refere a erros quantitativos”.
15.2.1 Contratação integrada – utilização e critério de julgamento E no caso especíco da escolha pela contratação integrada? Existiria alguma
restrição para a sua utilização? Essa questão gurou como uma das mais frequentes a partir da aprovação do
RDC. Alguns gestores, por entenderem que a elaboração do projeto básico pela Administração representava item causador dos principais aditivos das obras públicas, buscaram amplicar a utilização desse tipo de regime. Porém, o art. 9º do RDC exigia, na
redação inicial, que o critério de julgamento para a escolha desse regime fosse o de técnica e preço, que tinha hipóteses restritas de uso no art. 20. Por esse motivo, e para facilitar o entendimento dessa resposta, vale uma retrospectiva dos acontecimentos a partir das dúvidas iniciais do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), do seguinte posicionamento da Advocacia-Geral da União (AGU), do posterior entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU) e, nalmente, da edição da Medida Provisória nº 630, em 24.12.2013.
Em 2012, o MPOG entendeu oportuna a formulação de consulta a AGU com o seguinte teor: A adoção do regime de contratação integrada está restrita às hipóteses previstas nos incisos I e II do art. 20? Não sendo, qual o âmbito de abrangência delimitado pela Lei para adoção deste regime?
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A AGU, por meio do Parecer RA-03/2012, de 18.10.2012, assim se manifestou em relação aos questionamentos formulados: a) A possibilidade de adoção do regime de contratação integrada não está subsumida às hipóteses de objeto previstas nos incisos I e II do §1º do art. 20; b) A Administração Pública poderá utilizar preferencialmente o Regime de Contratação Integrada, disciplinado pelo art. 9º, para a contratação de obras e serviços de engenharia, desde que essa opção seja técnica e economicamente justicável, sendo esta a única condicionante sine qua non para se optar pela contratação integrada.
A matéria foi analisada pelo TCU, que acabou por estabelecer linhas mais sólidas a m de que o gestor oriente sua opção pelo regime de contratação integrada: 9.1.1. a obra ou o serviço de engenharia deve preencher pelo menos um dos requisitos elencados no art. 20, §1º, da Lei 12.462/2011, quais sejam, a natureza predominantemente intelectual e de inovação tecnológica do objeto licitado (inciso I); ou que possam ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado, pontuando-se na avaliação técnica, sempre que possível, as vantagens e benefícios que eventualmente forem oferecidas para cada produto ou solução (inciso II); 9.1.1.1. para enquadramento do objeto nos ditames do inciso II, §1º, do art. 20 da Lei 12.462/2011, a expressão “de domínio restrito de mercado” refere-se, especicamente, ao termo “tecnologias”, e não, necessariamente, às “diferentes metodologias”; 9.1.1.2. tendo em vista que uma obra licitada com base no anteprojeto já carrega em si a possibilidade de a contratada desenvolver metodologia e/ou tecnologia própria para a feitura do objeto, no caso de a motivação para a utilização da contratação integrada estiver baseada nessa viabilidade de emprego de diferenças metodológicas, nos moldes do art. 20, §1º, inciso II, da Lei 12.462/2011, justique, em termos técnico-econômicos, a vantagem de sua utilização, em detrimento de outros regimes preferenciais preconizados no art. 8º, §1º c/c art. 9º, §3º da Lei 12.462/2011; 9.1.2. faz-se necessária a motivação acerca da inviabilidade do parcelamento da licitação, em razão da diretriz enraizada no art. 4º, inciso VI, da Lei 12.462/2011; 9.1.3. a “matriz de riscos”, instrumento que dene a repartição objetiva de responsabilidades advindas de eventos supervenientes à contratação, na medida em que é informação indispensável para a caracterização do objeto e das respectivas responsabilidades contratuais, como também essencial para o dimensionamento das propostas por parte das licitantes, é elemento essencial e obrigatório do anteprojeto de engenharia, em prestígio ao denido no art. 9º, §2º, inciso I, da Lei 12.462/2011, como ainda nos princípios da segurança jurídica, da isonomia, do julgamento objetivo, da eciência e da obtenção da melhor proposta; 9.1.4. no caso de obra de edicação, em regra, faz-se necessário que o anteprojeto preveja a arquitetura consistente do empreendimento, tendo em vista ser essa a informação denidora do produto a ser entregue à Administração e constituir-se em elemento fundamental para a avaliação de eventuais metodologias diferenciadas para o seu adimplemento, como também para a elaboração dos demais projetos de engenharia a serem desenvolvidos à época do projeto básico; [...] 9.1.7. justique, no bojo do processo licitatório, o balanceamento conferido para as notas técnicas das licitantes, como também a distribuição dos pesos para as parcelas de preço e técnica, em termos da obtenção da melhor proposta, buscando, em razão do que dispõe o §3º, do art. 9º, da Lei 12.462/2011, a valoração da metodologia ou técnica construtiva a ser empregada e não, somente, a pontuação individual decorrente da experiência prossional das contratadas ou de seus responsáveis técnicos. (TCU. Acórdão nº 1.510/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 25 jun. 2013)
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
O voto do Relator do retromencionado acórdão é extremamente didático ao explicar os motivos da decisão atinente à contratação integrada, razão pela qual vale a pena recuperá-lo: Trata-se da primeira experiência da Infraero com o novo regime de contratação de que trata a Lei 12.462/2011 — a contratação integrada. Em razão de o novo instituto legal trazer, ainda, alguns dispositivos de interpretação controvertida, o papel desta Corte, em seu viés orientador, emerge de forma amplicada. Impõe-se o dever de bem situar os
gestores sobre os corretos caminhos da legalidade — e, consequentemente, guiá-los no zeloso dever de bem gastar o dinheiro público. [...]
Os trabalhos de auditoria abrangeram, eminentemente, o edital de licitações e o anteprojeto de engenharia que balizou as propostas de preços, como foco nos novéis institutos legais criados pela Lei 12.462/2011. Realizados os exames, a equipe de scalização teceu os
seguintes apontamentos: a) utilização do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) sem que estejam presentes as justicativas técnicas e econômicas para o emprego da contratação integrada,
tais como a ausência dos pressupostos para utilização da modalidade “técnica e preço”, estabelecidas no art. 20, §1º, da Lei 12.462/2011; b) inconsistências na metodologia para a estimativa do valor da obra, no anteprojeto; c) adoção de notas para o julgamento das propostas técnicas sem à necessária motivação para o peso conferido ao gerenciamento e execução do empreendimento; e d) adoção do modo combinado de disputa em desacordo com art. 22 do Decreto 7.581/2011. [...]
II Inicialmente, sobre os pressupostos para a utilização da contratação integrada, a contenda está em identicar se os requisitos estabelecidos no art. 20, §1º, da Lei 12.462/2011, para
licitações realizadas sob “técnica e preço”, são também condicionantes para a adoção do novo regime. Como se sabe, a contratação integrada impõe, como critério de julgamento, a utilização da modalidade “técnica e preço”, em razão do inscrito no art. 9, §2º, inciso III do RDC. Como consta da Lei 12.462/2011: Art. 9º Nas licitações de obras e serviços de engenharia, no âmbito do RDC, poderá ser utilizada a contratação integrada, desde que técnica e economicamente justicada. [...] §2º No caso de contratação integrada: [...] III - será adotado o critério de julgamento de técnica e preço. [...]
Art. 20. No julgamento pela melhor combinação de técnica e preço, deverão ser avaliadas e ponderadas as propostas técnicas e de preço apresentadas pelos licitantes, mediante a utilização de parâmetros objetivos obrigatoriamente inseridos no instrumento convocatório. §1º O critério de julgamento a que se refere o caput deste artigo será utilizado quando a avaliação e a ponderação da qualidade técnica das propostas que superarem os requisitos mínimos estabelecidos no instrumento convocatório forem relevantes aos ns pretendidos
pela administração pública, e destinar-se-á exclusivamente a objetos: I - de natureza predominantemente intelectual e de inovação tecnológica ou técnica; ou II - que possam ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado, pontuando-se as vantagens e qualidades que eventualmente forem oferecidas para cada produto ou solução. A equipe técnica, após o exame do anteprojeto, não identicou que a obra contratada se
enquadrasse como de “natureza predominantemente intelectual e de inovação tecnológica ou técnica” ou mesmo que pudesse ser executada “com diferentes metodologias ou
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tecnologias de domínio restrito no mercado”. De acordo com a SecobEdicação, ainda,
a expressão “domínio restrito no mercado”, do nominado inciso II, refere-se, tanto à palavra “tecnologia”, quanto ao termo “diferentes metodologias”. Logo, as diferentes metodologias, como também as tecnologias empregadas para o adimplemento do objeto, haveriam de ser de domínio restrito no mercado. A Infraero, por seu turno, em resposta à oitiva, apresentou o parecer da Advocacia Geral da União (AGU) com conclusão distinta. No Parecer AGU/RA nº 03/2012, exarado em resposta à solicitação pleiteada pela Ministra do Planejamento, assim se concluiu: a) A possibilidade de adoção do regime de contratação não está subsumida às hipóteses de objeto previstas nos incisos I e II do §1º do art. 20 [da Lei 12.462/2011]; e
b) A Administração Pública poderá utilizar preferencialmente o Regime de Contratação Integrada, disciplinado pelo art. 9º, para a contratação de obras e serviço de engenharia, desde que essa opção seja técnica e economicamente justicável, sendo esta a única condicionante sine qua non para se optar pela contratação integrada. [...]
A construção lógica empreendida no dito parecer baseia-se, em extrato, no fato de o regime de contratação integrada ser preferencial, segundo o art. 8º, §1º, da Lei 12.462/2011. Logo, caso se considerasse que o regime só pudesse ser aplicado em situações em que houvesse o “domínio restrito do mercado”, esse modo de contratação tornar-se-ia uma exceção, e não uma regra, tal qual limpidamente estampado na Lei do RDC. Essa suposta antinomia jurídica foi o supedâneo das conclusões da AGU. Continua a Infraero que, não obstante a existência do Parecer AGU/RA nº 03/2012, entende a estatal que o termo “domínio restrito de mercado” não tem aplicação cumulativa com a possibilidade de o objeto poder utilizar diferentes metodologias. Segundo a empresa, se a obra possibilita o emprego de diferentes metodologias para a sua execução, desde que tecnicamente justicada a vantagem, estaria motivado o emprego da contratação
integrada. Apresenta, dessa maneira, os elementos técnicos que atestariam a vantajosidade da contratação, no caso concreto. Em análise da questão, cabe, de pronto, desvendar a abrangência do art. 20, §1º, da Lei 12.462/2011, relativo aos requisitos para a utilização da modalidade “técnica e preço”. Esclareço, desde já, que, para o enquadramento do objeto nos ditames do dito dispositivo, entendo que a expressão “de domínio restrito de mercado” refere-se, especicamente,
ao termo “tecnologias”, e não, necessariamente, às “diferentes metodologias”; e nisso concordo com a Infraero. Tal conclusão, inclusive, é compartilhada pelo eminente Ministro Benjamim Zymler, em sua obra “Regime Diferenciado de Contratação – RDC”, em coautoria com o competente auditor Laureano Canabarro Dios (Belo Horizonte: Fórum, 2013): Além de se referir a objetos executados com diferentes metodologias, a norma do RDC se refere também a execução com tecnologias de domínio restrito de mercado [...].
Digo isso primeiramente porque, em termos literais, considerar que o “domínio restrito de mercado” se reporte, também, aos objetos capazes de serem executados por “diferentes metodologias”, levaria a uma técnica redacional de conclusões um tanto contraditórias. Existiriam certos tipos de objetos capazes de serem feitos por “diferentes metodologias de domínio restrito de mercado”. Não que exista uma incompatibilidade denitiva entre
a tecnologia de caráter restrito e a viabilidade de se utilizar diferentes metodologias. Ausculto, todavia, como regra, se para uma tecnologia de caráter restrito — com alguma intuição de unicidade e altíssima especialização —, haverá assim essa pluralidade recorrente de métodos. É de se denotar que a tecnologia restrita pressupõe um método particular, próprio, em algum termo único. A incoerência, no mínimo, é latente. Aduzo que, por hermenêutica básica, a lei deve ser interpretada de maneira que mais harmonize os seus múltiplos dispositivos. Entre duas possíveis leituras, prera-se a que
não causa contradição entre seus mandamentos. Nessa trilha, não vislumbro o porquê de
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
não considerar o rogatório do art. 20, §1º, como contorno, também, dos objetos a serem licitados pelo regime de contratação integrada. Até porque eles não são exaustivos. Outros elementos da obra ou serviço de engenharia devem estar presentes para consubstanciar a vantagem do novo instituto, em detrimento das outras preferências (regimes global e integral). Se tido, assim, que a diversidade de metodologias construtivas pode ser vista, isoladamente, como condição para que se licite por “técnica e preço”, não vejo, data maxima venia ao Parecer AGU/RA nº 03/2012, rudimentos para a caracterização da dita antinomia. Lembro também que existem outros regimes preferenciais estampados no art. 8º, §1º, da Lei 12.462/2011, como a empreitada por preço global e a empreitada integral. Dentre essas feições preferenciais, cada objeto, por suas características, irá moldar a melhor adequação às necessidades da administração, em termos de melhor vantagem. Aliás, nessa linha, se tomada, de maneira isolada a diversidade metodológica como variável suciente para a utilização da contratação integrada, tenho que a presente discussão se perca em funcionalidade. Anal, se uma obra é licitada com base no anteprojeto, ela já
carrega em si a possibilidade de a contratada desenvolver metodologia e/ou tecnologia própria para a feitura do objeto. Logo, se justicada a vantagem, o enquadramento no
art. 20, §1º, será quase automático. Trago, por pertinência, excerto da obra de Maurício Portugal Ribeiro (em Regime Diferenciado de Contratação: Licitação de infraestrutura para Copa do Mundo e Olimpíadas. São Paulo: Atlas, 2012): [...] a realização da licitação com apenas o anteprojeto (sem o projeto básico) em si já
abre possibilidade de que cada um dos possíveis vencedores da licitação, quando já contratado, preveja no projeto básico que vier a elaborar metodologias diferentes de execução. Portanto, a própria ideia de licitar a obra ou serviço com apenas o anteprojeto já traz ínsita a possibilidade de metodologias diferenciadas de execução que serão denidas
e adotadas após a contratação, quando da elaboração do projeto básico de engenharia pelo contratado. [...]
Portanto, a existência de metodologias diversas de execução da obra que possam ser escolhidas pelo contratado é parte da própria ideia de contratação integrada. [...]
Ao realizar a contratação da obra apenas com o anteprojeto, não é apenas a escolha da metodologia de execução que é transferida ao contratado: é a própria realização do projeto básico, o que envolve muito mais do que a mera denição da metodologia de execução, que é uma parte, um segmento do conjunto de denições que compõe o projeto básico. [...]
De modo geral, as características do objeto devem permitir que haja a real competição entre as contratadas para a concepção de metodologias/tecnologias distintas, que levem a soluções capazes de serem aproveitadas vantajosamente pelo Poder Público. Em algum termo, entendo similaridade na conclusão a que chegou o TCU no Acórdão 601/2011-Plenário, de relatoria do Ministro José Jorge, quando entendeu legal a utilização de pregão para licitar um projeto, tido como de natureza simples. Não haveria o porquê de se utilizar uma “técnica e preço” em objeto tão corriqueiro (e, em consequência, excluir o pregão): 2. Se o projeto ou estudo a ser elaborado por um prossional ou empresa for similar ao que
vier a ser desenvolvido por outro(a), o serviço pode ser caracterizado como comum. Caso contrário, se a similaridade dos produtos a serem entregues não puder ser assegurada, o objeto licitado não se enquadra na categoria de comum. 3. É possível a existência de soluções distintas para o objeto licitado, mas a consequência advinda da diferença entre elas não deverá ser signicativa para o ente público que adota
o pregão. Se, no entanto, os serviços comportarem variações de execução relevantes, a técnica a ser empregada pelos licitantes merecerá a devida pontuação no certame. [...]
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O raciocínio pode ser aplicável ao presente caso. Os ganhos advindos da utilização da contratação integrada devem compensar esse maior direcionamento de riscos aos particulares. Essa demonstração é o cerne para a motivação da vantagem para utilizar o novo regime. Lembro que, em um certame licitatório, a concorrência efetiva é apenas uma presunção. Pode haver unicamente um concorrente. Nesse caso, as estimativas de custos da licitação é que nortearão a “razoabilidade” do preço ofertado. É justamente por essa disputa poder não ser real é que a boa estimativa do valor justo de mercado pelo objeto se faz tão valiosa. Quando se licita por meio do anteprojeto, existe um “elastecimento” na precisão desse cálculo. Para justicar a perda de todos esses valores é que se condiciona a demonstração
de “vantajosidade” na utilização do regime.
Reproduzo, ao m, excerto da obra de Marçal Justen Filho sobre a matéria (Regime
Diferenciado de Contratações Públicas – RDC: Comentários à Lei nº 12.462/2011 e ao Decreto nº 7.581. Belo Horizonte: Fórum, 2012): [...] Desse modo, será possível pontuar as “vantagens e qualidades que eventualmente
forem oferecidas para cada produto ou solução”, tal como indica o art. 20, §1º, inc. II. Aliás, é possível dizer que o ato que deverá justicar “técnica e economicamente” a adoção da contratação integrada terá de reetir também alguma das hipóteses previstas na Lei 12.462
que torna necessária a adoção do critério de técnica e preço. Em se tratando, assim, das primeiras licitações realizadas por meio do instituto da
contratação integrada, para melhor instrução de processos futuros, convém que se notique
a Infraero para que, doravante, observe os requisitos insculpidos no art. 20, §1º, da Lei 12.462/2011 para a escolha das contratações integradas, esclarecendo a perfeita leitura do dispositivo, tal qual discorri. Tendo em vista, ainda, as parcas motivações, em termos de ganhos econômicos, providenciadas no processo licitatório, adequado, igualmente, elucidar que tais justicativas são essenciais e indispensáveis à legalidade do certame, em razão do que
consta do art. 9º, caput , da Lei 12.462/2011.
Indicado, ainda, cienticar a Infraero que, tendo em vista que uma obra licitada com base
no anteprojeto já carrega ínsita a possibilidade de a contratada desenvolver metodologia e/ou tecnologia própria para a feitura do objeto, no caso de a motivação para a utilização da contratação integrada estiver baseada nessa viabilidade de emprego de diferentes metodologias, nos moldes do art. 20, §1º, inciso II, da Lei 12.462/2011, justique, em termos
técnico-econômicos, a vantagem de sua utilização, em detrimento de outros regimes preferenciais preconizados no art. 8º, §1º c/c art. 9º, §3º da Lei 12.462/2011. [...]
IV No que se refere à adoção de notas para o julgamento das propostas técnicas, a unidade scalizadora aduziu que houve uma formação de nota técnica da licitante em que o peso
da “execução” foi inferior ao do “projeto de gerenciamento”, com o agravante de que não houve uma avaliação que garantisse a efetiva obtenção da melhor proposta. Alude a SecobEdicação que o entendimento retirado da jurisprudência deste Tribunal
é que, em licitações do tipo técnica e preço, a pontuação da técnica deve ser obtida a partir de critérios consistentemente estruturados e de julgamento fundamentado, capazes de minimizar o grau de subjetividade inerente a esse tipo de licitação. Ademais, o procedimento haveria de se ater à avaliação dos itens considerados como relevantes na contratação. Em apreciação da questão, ajuízo que, de fato, não houve uma fundamentação clara, por parte da Infraero, da vantagem acerca do balanceamento das notas técnicas utilizadas no julgamento; tampouco da sua relação com o preço. Justamente por esses vácuos de motivação é que não me sinto sucientemente seguro para taxar o balanceamento utilizado
como “desarrazoado”. Julgo, sim, que, de acordo com as características e interveniências
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
de cada objeto, a distribuição de pesos de notas técnicas deva ser explicada. Nisso a Infraero deve ser noticada.
Um ponto, porém, não levantado pela equipe de auditoria, chamou-me atenção. Não obstante se justicar que a obra possibilita a idealização de diversas metodologias
construtivas (característica das contratações integradas, como já disse), essas alternativas não foram objeto de pontuação. Concederam-se pontos, somente, para a experiência das contratadas e seus responsáveis técnicos, mas não para as soluções em si — essas, sim, capazes de render outras vantagens, que não, somente, o preço. Transcrevo, mais uma vez, o conteúdo do art. 9º, §3º, da Lei do RDC: §3º Caso seja permitida no anteprojeto de engenharia a apresentação de projetos com metodologias diferenciadas de execução, o instrumento convocatório estabelecerá critérios objetivos para avaliação e julgamento das propostas. Conforme já explicitado, esses critérios podem ser de qualidade, produtividade, rendimento, durabilidade, segurança, prazo de entrega, economia ou outro benefício objetivamente mensurável, a ser necessariamente considerado nos critérios de julgamento do certame. A coerência com a lógica do regime impõe essa valoração, à época do julgamento. Se não existe vantagem, anal, em atribuir a solução para contratada (capaz de ser
pontuada e comparada), que a própria administração o faça — e por um preço menor.
Diante disso, entendo devida a ciência à Infraero para que, tanto justique, no bojo do
processo licitatório, o balanceamento conferido para as notas, como busque, sempre que possível, a valoração objetiva da metodologia ou técnica construtiva a ser empregada; e não, somente, a pontuação individual decorrente da experiência prossional das contratadas
ou de seus responsáveis técnicos. V Guardo, neste tópico, referência a assunto de suma importância, mas também não elencado no relatório de auditoria como impropriedade. Trata-se da ausência de uma “matriz de riscos” no instrumento convocatório. Em sessão recente, por meio do Acórdão 1.310/20013-Plenário, de relatoria do Ministro Walton Rodrigues, este Plenum assim deliberou: 9.1) recomendar ao Dnit que, com base no art. 250, inciso III, do Regimento Interno do TCU: 9.1.1) preveja doravante, nos empreendimentos licitados mediante o regime de contratação integrada, conforme faculta o art. 9º da Lei 12.462/2011, “matriz de riscos” no instrumento convocatório e na minuta contratual, para tornar o certame mais transparente, fortalecendo, principalmente, a isonomia da licitação (art. 37, XXI da Constituição Federal; art. 1º, §1º, IV da Lei nº 12.462/2011) e a segurança jurídica do contrato; No mesmo sentido caminhou o Acórdão nº 1.465/2013-Plenário, de relatoria do Ministro José Múcio Monteiro. Sem querer ser maçante, retorno que o preço oferecido pelos particulares para o adimplemento do objeto será proporcional aos riscos por eles assumidos. Quando essa distribuição de responsabilidades não é clara, além de não haver perfeitas condições para a formulação das propostas, a situação expõe a contratação em um ambiente forte de instabilidade e insegurança jurídica. Apresento a seguinte situação hipotética: se, ao se executar a obra, a contratada constate que o solo encontrado in loco é distinto do denido nas sondagens fornecidas no anteprojeto.
Uma fundação muito mais cara haverá de ser executada para suportar as cargas da superestrutura. Nesse caso, haverá termo aditivo? Existe, no mínimo, uma situação de insegurança, passível de interpretações distintas. Em avaliação perfunctória, na medida em que não era passível de conhecimento prévio de
qualquer das licitantes, avalio que a “surpresa” quebrou a equação econômico-nanceira do ajuste, denida como imutável pelo art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal.
Como não existe disposição editalícia contrária, ajuízo que o aditivo será devido. Não
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tenho dúvidas, por outro lado, que é uma porta para a celeuma contratual. Bastaria uma disposição clara no contrato para evitar a situação. Mesma dúvida pode ter ocorrido a qualquer das licitantes (a impactar nos preços ofertados). Em outro exemplo, se na obra preponderarem insumos importados e o dólar “disparar”. Tratar-se-ia, em minha visão, de situação previsível (na medida em que todos sabem da instabilidade do preço da moeda), mas de consequências incalculáveis. Far-se-ia jus, s.m.j., a termo aditivo. Caso, porém, se dena a situação cambial como risco da contratada, ela poderá dimensionar seu preço em razão dessa informação. Poderá vericar, inclusive, como custo do contrato um hedge cambial para amortecer seu risco. Depreende-se, pois, a indispensabilidade de clarear as regras da pactuação. Essas informações, tendo em vista impactarem relevantemente as expectativas de despesa das contratadas, são mandatórias. Tais esclarecimentos também caracterizam o objeto e as suas respectivas obrigações. Aliás, a matriz deve ser elaborada em coerência com o anteprojeto, visto que, caso se estabeleça obrigação em que não haja liberdade para a contratada inovar, tais encargos devem ter detalhamento obrigatório à época da licitação. (TCU. Acórdão nº 1.510/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 25 jun. 2013)
Em complemento ao estudo afeto ao nível de detalhamento esperado nos orçamentos de uma licitação na qual a Administração fornece aos licitantes a liberdade de ajustar aspectos técnicos da execução da obra, o TCU analisou o caso concreto das contratações da Petrobras, no qual o modelo de formalização das propostas
comerciais não exige a apresentação das composições dos custos dos serviços ofertados pelos licitantes. Apesar dos normativos que regem às licitações na mencionada estatal serem especícos, a determinação formulada auxilia os gestores que se utilizam do RDC, em especial na contratação integrada: 9.1. determinar à Petróleo Brasileiro S.A., com fulcro no art. 43, I, da Lei 8.443/1992, c/c o art. 250, II, do Regimento Interno/TCU, e em prestígio aos princípios da segurança jurídica, do julgamento objetivo, da isonomia, da eciência e da obtenção da melhor proposta, que passe a adotar os seguintes procedimentos em suas contratações de obras e serviços de engenharia, em especial nas empreitadas por preço global: 9.1.1. faça constar, no instrumento convocatório das licitações, documento que estabeleça, de forma precisa, quais frações do empreendimento haverá liberdade das contratadas para inovar em termos das soluções metodológicas ou tecnológicas, seja em termos de modicação das soluções previamente delineadas no projeto-base da licitação, seja detalhando os sistemas e procedimentos construtivos do projeto-base da licitação; 9.1.2. elabore e faça constar nos seus instrumentos convocatórios e contratos uma “matriz de riscos”, capaz de denir a repartição objetiva de responsabilidades advindas de eventos supervenientes à contratação, como informação indispensável para a caracterização do objeto e das respectivas responsabilidades contratuais, como também elemento capaz de subsidiar o dimensionamento das propostas por parte das licitantes; 9.1.3. exija das empresas interessadas (seja nas licitações ou nos processos de contratação direta) a fundamentação técnica dos preços ofertados, por meio da apresentação de informações detalhadas em seus Demonstrativos de Formação de Preços (DFP), que permitam a perfeita e inequívoca caracterização dos valores propostos e a plena comparação desses valores com o dimensionamento estabelecido na estimativas de custo do projeto-base; 9.1.4. sempre que o projeto-base da licitação, por seus elementos mínimos, assim o permitir, as estimativas de preço da Companhia devem se basear em orçamento tão detalhado quanto possível, devendo a utilização de estimativas paramétricas e a avaliação
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aproximada baseada em outras obras similares serem realizadas somente nas frações do empreendimento não sufcientemente detalhadas pelo projeto-base da licitação, exigindo
no mínimo o mesmo nível de detalhamento das contratadas em seus Demonstrativos de Formação de Preços (DFP); 9.1.5. quando utilizada metodologia expedita ou paramétrica para abalizar o valor do empreendimento – ou fração dele –, consideradas as disposições do subitem anterior, dentre duas ou mais técnicas estimativas possíveis, utilize em suas estimativas de preço base a que viabilize a maior precisão orçamentária, exigindo no mínimo o mesmo nível de detalhamento das contratadas em seus Demonstrativos de Formação de Preços (DFP); 9.1.6. para a parcela da obra que possui projeto desenvolvido, ou para casos em que a totalidade do projeto já estiver defnida pela Estatal, sem que haja liberdade para os particulares modifcarem o projeto licitado, estipule a discriminação das propostas
comerciais com, no mínimo, as seguintes informações: a) relação dos serviços e/ou insumos previstos para a obra, com os respectivos preços,
quantidades e unidades de quantifcação, acompanhadas de memórias de cálculo e justifcativas;
b) composição e produtividade das equipes de trabalho; c) coefciente de consumo dos insumos; e
d) contingenciamentos considerados; 9.1.7. para a parcela da obra cujo risco de desenvolvimento do projeto estiver ao encargo da futura contratada, em que existir liberdade para as contratadas apresentarem solução de engenharia própria, estabeleça nos editais a padronização das informações mínimas necessárias nos Demonstrativos de Formação de Preços das contratadas (DFP) que viabilizem o julgamento das propostas, em termos de exequibilidade, alinhamento da oferta aos requisitos editalícios e vantagem dos preços, em comparação com o prédimensionamento estabelecido na estimativas de custo do projeto-base da licitação, solicitando das proponentes informações que demonstrem as premissas orçamentárias consideradas para cada etapa de execução do empreendimento, em especial as contingências inseridas nos preços. (TCU. Acórdão nº 1.441/2015. Plenário. Rel. Min. Vital do Rêgo. DOU , 19 jun. 2015). Por fm, vale destacar outro entendimento relevante da Corte de Contas a respeito
da necessidade de inserção de “matriz de riscos” no instrumento convocatório e na minuta contratual nos casos de contratação integrada, de modo a tornar o certame mais transparente e isonômico, assim como a conferir maior segurança jurídica ao contrato, consoante texto a seguir: 9.2. recomendar ao [...] que:
9.2.1 preveja, doravante, nos empreendimentos a serem licitados mediante o regime de contratação integrada, previsto no art. 9º da Lei nº 12.462/2011, uma “matriz de riscos” no instrumento convocatório e na minuta contratual, de forma a tornar o certame mais transparente, fortalecendo, principalmente, a isonomia da licitação (art. 37, XXI, da Constituição Federal; art. 1º, §1º, IV, da Lei nº 12.462/2011) e a segurança jurídica do contrato (art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal); 9.2.2 acrescente aos editais de obras que contemplem “seguro risco de engenharia” documento que reita adequadamente os vários aspectos e particularidades que, a
exemplo dos modelos adotados no setor privado, deverão compor as condições que a apólice abarcará, conforme as características de cada empreendimento a ser segurado; 9.2.3. acrescente aos respectivos projetos, editais de obras e contratos padrões de desempenho a serem alcançados pela rodovia ao fnal da execução da obra. (TCU. Acórdão
nº 1.465/2013. Plenário. Rel. Min. José Múcio Monteiro. DOU , 19 jun. 2013)
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15.2.2 As novidades da Lei nº 12.980/2104 Em 24.12.2013, a Presidente da República aprovou a Medida Provisória nº 630, convertida na Lei nº 12.980/2014, que ajustou a redação do art. 9º da Lei nº 12.462/11 para o seguinte texto: Art. 9º Nas licitações de obras e serviços de engenharia, no âmbito do RDC, poderá ser utilizada a contratação integrada, desde que técnica e economicamente justicada e cujo objeto envolva, pelo menos, uma das seguintes condições: I - inovação tecnológica ou técnica; II - possibilidade de execução com diferentes metodologias; ou III - possibilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no mercado.
O referido ajuste nada mais fez do que acolher o entendimento jurisprudencial consubstanciado no Acórdão TCU nº 1.510/2013, Plenário. Nesse sentido, com vistas a clarear a denição afeta a “diferentes metodologias” prevista no inciso II do art. 9º, o TCU orientou que: para o enquadramento da obra ou serviço de engenharia ao disposto no inciso II do art. 9º da Lei 12.462/2011, a “possibilidade de execução mediante diferentes metodologias” deve corresponder a diferenças metodológicas em ordem maior de grandeza e de qualidade, capazes de ensejar uma real concorrência entre propostas envolvendo diversas metodologias, de forma a propiciar ganhos reais para a Administração, trazendo soluções que possam ser aproveitadas vantajosamente pelo Poder Público, de modo que os ganhos advindos da utilização da contratação integrada compensem o maior direcionamento de riscos aos particulares, não se prestando tal enquadramento em situações nas quais as diferenças metodológicas são mínimas, pouco relevantes ou muito semelhantes, como ocorre nos casos de serviços comuns, ordinariamente passíveis de serem licitados por outras modalidades, ou outros regimes. (TCU. Acórdão nº 1.399/2014, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 5 jun. 2014).
Vale destacar que a escolha desse tipo de regime de execução exige que, além da presença de uma das três condições relacionadas, seja trazida ao processo de contratação justicativa técnica e econômica, conforme entendimento do TCU: 26. A motivação do uso da contratação integrada sob um prisma econômico, conforme estatuído pelo caput do art. 9º do RDC, deve preferencialmente demonstrar em termos monetários que os dispêndios totais realizados com a implantação do empreendimento sejam inferiores aos obtidos caso fossem utilizados os demais regimes de execução, não podendo a fundamentação apresentada se limitar a argumentos genéricos e subjetivos. 27. Também deve haver justicativa de cunho técnico para a utilização da contratação integrada, dada a redação do art. 9º, caput , da Lei 12.462/2011, que prevê a utilização da contratação integrada, “desde que técnica e economicamente justifcada”. O voto condutor do Acórdão 1.977/2013-Plenário abordou tal questão com maestria: 77. Existe na contratação integrada, entretanto, outros objetivos e vantagens. Como inscrito no voto condutor do Acórdão 1.510/2013-Plenário, de minha relatoria, “as características do objeto devem permitir que haja a real competição entre as contratadas para a concepção de metodologias/ tecnologias distintas, que levem a soluções capazes de serem aproveitadas vantajosamente pelo Poder Público”. Ainda, “Os ganhos advindos da utilização da contratação integrada devem compensar esse maior direcionamento de riscos aos particulares. Essa demonstração é o cerne para a motivação da vantagem para utilizar o novo regime”.
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28. Ou seja, quanto à motivação de ordem técnica, a contratação integrada teria como objetivo possibilitar ao contratado a incorporação de novas soluções e metodologias construtivas. Seria uma verdadeira licitação do tipo “melhor engenharia”, em que a empresa licitante com soluções técnicas mais adequadas e metodologias inovadoras estaria apta a ofertar as propostas com condições mais vantajosas para a Administração. As empresas competiriam tanto em termos de custos e margens de lucro utilizados em suas propostas quanto em termos de eciência e tecnologia aplicada à execução do objeto. (TCU. Acórdão nº 1.850/2015, Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler. DOU , 4 ago. 2015)
Porém, a grande novidade dessa medida provisória denitivamente ocorreu
na revogação do inciso III do §2º do art. 9º da Lei nº 12.462/11, ou seja, deixou de ser obrigatória nas licitações com regime de execução por contratação integrada a utilização do critério de julgamento por técnica e preço. Quais os reexos dessa decisão?
De plano, não se pode esquecer que continua válida a possibilidade da utilização do aludido critério. A medida provisória não o proibiu, apenas retirou sua obrigatoriedade. Isso signica que caberá ao gestor, em cada caso concreto, escolher a
melhor opção a ser inserida no instrumento convocatório. Se na contratação integrada o projeto básico é feito por responsável pela execução da obra, existirão diversas soluções para o atendimento da necessidade da Administração Pública, cada uma com qualidade especíca e custos de manutenção e
utilização diversos. Quando o critério de julgamento envolve técnica e preço, é possível sopesar no momento da apreciação dos valores apresentados pelos licitantes as especicidades
executivas de cada proposta, por meio de pontuação no quesito técnica, de modo a buscar um equilíbrio entre os dois fatores fundamentais na declaração de um vencedor: preço e técnica. Por isso, se o empreendimento guardar elevada complexidade técnica, parece ainda vantajoso manter o critério que envolva a apreciação dos dois componentes. Agora, observando a opção estabelecida na medida provisória em comento, se o órgão licitante dispensar a avaliação da pontuação técnica, optando, por exemplo em critério de julgamento pelo menor preço, será essencial a criação de regras para realmente selecionar a proposta mais vantajosa, em especial, repise-se, devido ao fato de todas as especicações do projeto básico estarem a cargo dos próprios licitantes. A questão essencial, de acordo com o dito popular, é: como evitar comprar gato por lebre ? O primeiro requisito na busca da solução para esse problema está na qualicação
técnica da equipe responsável pela contratação. Se não houver profundo treinamento
dos prossionais da Administração Pública, o cenário futuro afeto à execução das obras
poderá ser sombrio. O segundo deve ser buscado no texto da própria Lei nº 12.462/11 que estabelece em seu art. 19:
Art. 19. O julgamento pelo menor preço ou maior desconto considerará o menor dispêndio para a administração pública, atendidos os parâmetros mínimos de qualidade denidos
no instrumento convocatório. §1º Os custos indiretos, relacionados com as despesas de manutenção, utilização, reposição, depreciação e impacto ambiental, entre outros fatores, poderão ser considerados para a denição do menor dispêndio, sempre que objetivamente mensuráveis, conforme dispuser
o regulamento.
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O §1º do mencionado art. 19 fornece ao gestor toda a possibilidade jurídica de computar os diversos custos indiretos, bastando a criação de regras objetivamente mensuráveis no Edital para que a comissão encarregada do julgamento consiga computar todas as vantagens de metodologias de execução distintas. Apesar de não ser tarefa fácil, pior será não considerar despesas com manutenção, utilização, reposição, depreciação e impacto ambiental no momento da denição da empresa vencedora e perceber, após a conclusão dos empreendimentos, que os valores a serem ainda gastos consumirão recursos públicos de forma desnecessária.
15.3 Elaboração, publicação, sigilo do orçamento base e remuneração variável Mais uma interessante inovação traz o RDC em relação aos orçamentos: a possibilidade de sigilo até o encerramento da licitação, com exceção dos casos de critério de julgamento por maior desconto ou por melhor técnica. O art. 6º do RDC estabeleceu que, se não constar do instrumento convocatório, “o orçamento previamente estimado para a contratação será tornado público apenas e imediatamente após o encerramento da licitação, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das demais informações necessárias para a elaboração das propostas” e terá caráter sigiloso. Em síntese, as alegações para tal medida fundamentam-se na necessidade de que as licitantes não formulem suas propostas vinculadas à referência estabelecida pelo orçamento-base. Há corrente contrária a esse sigilo por entender ser afronta à transparência do uso de recursos públicos, bem como pelo risco do uso de informações privilegiadas pelos agentes públicos no curso do processo de seleção da proposta mais vantajosa. Apesar da existência de algumas ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) terem sido levadas ao Supremo Tribunal Federal, há que se reconhecer a validade do texto legal até que a Suprema Corte se manifeste a respeito. Uma observação fundamental deve ser registrada a respeito do sigilo do orçamento: o fato de ser uma opção do gestor e não uma obrigação. Com efeito, o TCU em análise da matéria pacicou esse entendimento ao recomendar à entidade pública que “em face do caráter optativo do orçamento fechado em licitações vigidas segundo o RDC, pondere a vantagem, em termos de celeridade, de realizar procedimentos com preço fechado em obras mais complexas, com prazo muito exíguo para conclusão e cuja parcela relevante dos serviços a serem executados não possua referência explícita no Sinapi/Sicro, em face da real possibilidade de preços ofertados superiores aos orçados, decorrente da imponderabilidade da aferição dos custos dessa parcela da obra”, com base na seguinte justicativa: O orçamento fechado, no RDC, foi pensado em prestígio à competitividade dos certames. Isso porque, a disponibilização prévia do valor estimado das contratações tende a favorecer a formação de conluios. Ao saber, de antemão, o valor máximo admitido pela Administração como critério de classicação das propostas, facilita-se a prévia combinação de valores ofertados. Nesse caso, em termos do princípio fundamental licitatório — o da obtenção da melhor proposta —, a isonomia e a competitividade compensariam possível perda de transparência, no que se refere à publicação dos preços estimativos.
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
Essa dualidade de princípios é perfeitamente visualizada nas compras, o que já era experimentado nos pregões realizados pela Administração Pública sob a luz da Lei 10.520/2002, visto que a descrição do objeto permite um perfeito delineamento do que será oferecido. As obras públicas possuem um caráter peculiar. Haja vista a necessidade de apresentar os serviços a serem executados — acompanhados de suas quantidades — e tendo em vista o que dispõe a LDO (e a própria Lei 12.462/2011), tais encargos devem ser referenciados pelo Sinapi/Sicro; e isso é público. O licitante cuidadoso, portanto, tem meios de investigar tais referências de modo a “prever” o preço base da Administração. Ainda mais quando a reserva orçamentária das LOAs também são públicas. Quanto mais os serviços tenham previsão direta nesses sistemas referenciais, maior a previsibilidade do preço paradigma editalício. Obras rodoviárias, por exemplo, possuem, tradicionalmente, mais serviços referenciados pelo Sicro. São menos encargos possíveis e maior a previsibilidade do preço-base. Obras portuárias e aeroportuárias, ao contrário, têm a característica de possuírem, via de regra, serviços relevantes — e complexos — não passíveis de parametrização direta com o Sinapi. A Administração, então, promove adaptações aos serviços similares, ou motiva estudos e pesquisas próprias, para estimar o valor razoável daquele item orçamentário. Da mesma maneira, na ausência de composição referencial, cada licitante promoverá mesma avaliação. Estaria, nesse caso, em tese, melhor justifcado o sigilo do orçamento.
Existe um contraponto. Esses estudos podem resultar em preços maiores ou menores que os do edital; e isso é tão mais verdade, quanto mais complexo e mais oneroso for o serviço. Se o mercado entender como maiores aqueles encargos, existirá uma grande possibilidade de fracasso do certame licitatório, por preços ofertados superiores aos valores paradigma. Muitas vezes, a licitação é “salva” por um argumento pertinente oferecido por um dos interessados; inclusive no que se refere à viabilidade do preço estimado. Concluo, então, que, como o sigilo no orçamento-base não é obrigatório, e pelo dever de motivação de todo ato, se possa recomendar à Infraero que pondere a vantagem, em termos de celeridade, de realizar procedimentos com preço fechado em obras mais complexas, com prazo muito exíguo para conclusão e em que parcela relevante dos serviços a serem executados não possua referência explícita no Sinapi/Sicro, em face da possibilidade de fracasso das licitações decorrente dessa imponderabilidade de aferição de preços materialmente relevantes do empreendimento. Quero deixar claro que entendo ser o RDC um avanço histórico em matéria licitatória. Contratos por desempenho, inversão de fases, fase recursal única, disputa aberta, préqualifcação permanente, sustentabilidade... Incluiu-se um arsenal de mecanismos para
melhor dotar os gestores de instrumentos para contratações que mais atendam o interesse público. Delinearam-se outros meios para objetivar o que vem a ser a melhor proposta. Nessa miríade de possibilidades, entretanto, com incremento na discricionariedade aos gestores, o contraponto é um maior dever motivador. Com mais caminhos, aumenta-se a necessidade de transparência quanto à escolha da trilha mais adequada a ser seguida. O sigilo do orçamento, como optativo, é uma dessas portas a serem devidamente motivadas. Orçamento aberto ou fechado, basta sopesar, em cada caso, a melhor escolha. O que ora apresentamos, deste modo, é que a extrema urgência no término da obra é um dos fatores a serem ponderados, em face do risco de licitações fracassadas. (TCU. Acórdão nº 3.011/2012, Plenário. Rel. Min.Valmir Campelo. DOU , 8 nov. 2012). Em complemento, o TCU ratifcou a diretriz de viabilidade de publicação de orçamento para obras mais complexas a fm de evitar licitações desertas ou fracassadas:
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25. Insta destacar o voto condutor do Acórdão 3.011/2012-Plenário que previa a possibilidade de fracasso em licitações que usavam o orçamento sigiloso como mecanismo para mitigar a formação de conluios. 26. Na ocasião, ponderou-se que, para estimar o valor de obras mais complexas, tais como obras portuárias e aeroportuárias, com ausência de referências ociais de preços, tanto a Administração quanto os licitantes produzem estudos e pesquisas, que podem resultar em preços maiores ou menores que os do edital, conforme a avaliação subjetiva dos encargos pelos licitantes. 27. Assim, concluiu-se que o sigilo do orçamento base não tinha caráter obrigatório e foi recomendado à Infraero que avaliasse a vantagem, em termos de celeridade, de realizar procedimentos com preço fechado em obras mais complexas, com prazo muito exíguo para conclusão e cuja parcela relevante dos serviços a serem executados não possuísse referência explícita no Sinapi/Sicro. 28. Observo que, da mesma forma que o orçamento sigiloso, o regime de contratação integrada também não é obrigatório. Tal regime pressupõe uma divisão de riscos que, no caso concreto, ante as incertezas quanto aos quantitativos, inerentes aos serviços de dragagem, pode ter contribuído com o aumento dos preços dos serviços ofertados pelos licitantes. (TCU. Acórdão nº 1.541/2014, Plenário. Rel. Benjamin Zymler. DOU , 2 jun. 2014)
No que toca à elaboração do orçamento base pela Administração para as obras de que trata o RDC, ca claro que, dependendo do regime de execução, haverá uma metodologia mais apropriada para sua elaboração, conforme ilustra a FIGURA 15.d.
Elaboração do orçamento para licitação
Lei no 8.666/93
Qualquer regime de execução
Orçamento detalhado
RDC
Demais regimes de execução
Contratação integrada
Orçamento estimativo
FIGURA 15.d - Metodologia de elaboração do orçamento em função do regime de execução escolhido
Para o regime de contratação integrada, por não haver projeto básico no momento da licitação que permita o detalhamento dos serviços, será aplicada a metodologia da avaliação apresentada no Capítulo 4 desta publicação. O próprio RDC preceitua em seu art. 9º, §2º, II, que “o valor estimado da contratação será calculado com base nos valores praticados pelo mercado, nos valores pagos pela administração pública em serviços e
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
obras similares ou na avaliação do custo global da obra, aferida mediante orçamento sintético ou metodologia expedita ou paramétrica”. Nesse particular, necessário retornar ao já citado Acórdão TCU nº 1.530/2013, Plenário, que estabeleceu o nível de detalhamento a ser buscado pelo gestor, mesmo na elaboração de orçamentos estimados: 9.1.5. sempre que o anteprojeto, por seus elementos mínimos, assim o permitir, as estimativas de preço a que se refere o art. 9º, §2º, inciso II, da Lei 12.462/2011 devem se basear em orçamento sintético tão detalhado quanto possível, balizado pelo Sinapi e/ou Sicro, devidamente adaptadas às condições peculiares da obra, conforme o caso, devendo a utilização de estimativas paramétricas e a avaliação aproximada baseada em outras obras similares serem realizadas somente nas frações do empreendimento não sucientemente
detalhadas pelo anteprojeto, em prestígio ao que assevera o art. 1º, §1º, inciso IV c/c art. 8º, §§3º e 4º, todos da Lei 12.462/2011; 9.1.6. quando utilizada metodologia expedita ou paramétrica para abalizar o valor do empreendimento — ou fração dele —, consideradas as disposições do subitem anterior, dentre duas ou mais técnicas estimativas possíveis, utilize a que viabilize a maior precisão orçamentária. (TCU. Acórdão nº 1.510/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 25 jun. 2013)
No voto do acórdão em questão, o Relator da matéria busca deixar mais claro o motivo dessa linha orientativa: Examino, neste ponto, as ditas inconsistências nas estimativas de custos empreendidas pela Infraero para balizar o valor editalício do empreendimento. O valor estimado para os custos diretos e indiretos da obra foi calculado pela estatal com base em outros empreendimentos, mais especicamente os aeroportos de Manaus, Fortaleza, Conns. De acordo com cada atividade macro (como fundações, estrutura,
instalações, arquitetura, etc.), emoldurou-se um valor esperado para o empreendimento, em um trabalho estatístico lastreado nessas etapas. A metodologia estaria autorizada pelo disposto no art. 9º, §2º, inciso II, da Lei 12.462/2011: II - o valor estimado da contratação será calculado com base nos valores praticados pelo mercado, nos valores pagos pela administração pública em serviços e obras similares ou na avaliação do custo global da obra, aferida mediante orçamento sintético ou metodologia expedita ou paramétrica; e A SecobEdicação, de outro modo, criticou o método. Entende, em síntese, que os bali-
zamentos deveriam ser realizados sem a consideração do BDI. In caso, apesar de entender regular a utilização de parâmetros gerais de outras obras para os custos diretos, a unidade técnica, no que se refere ao BDI, indica a necessidade de um estudo individual. Em análise da questão, tanto avalio que o estudo do BDI poderia ser mais especíco, como
também a avaliação dos demais custos diretos da obra. Um anteprojeto de engenharia viabiliza esses exames mais individuais. Explico: o resultado do orçamento estimativo será o balizador do critério de aceitabilidade de preços. Tal parâmetro é a informação primeira para o julgamento das propostas. Levando em conta que o resultado da licitação será um valor de mercado apenas presumido (o que dependerá do nível de competição efetiva do certame), o poder público carece de um parâmetro tão preciso quanto se consiga. É uma garantia primeira da vantajosidade do preço ofertado, barreira essencial para obstar ganhos espúrios ou enriquecimentos sem causa.
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Em um projeto básico, tendo em vista o seu detalhamento, é viável a orçamentação com base em todas as composições de custo unitário. Em um anteprojeto, por outro lado, existem lacunas de dimensionamento de partes do projeto ainda não elaboradas - cada qual com o seu preço. Costuma-se, então, utilizar procedimentos expeditos e paramétricos para o balizamento preliminar de custos. É importante assumir que cada fase do ciclo de vida de um empreendimento possibilita a estimativa orçamentária com um grau de precisão. Quanto mais tenros os estudos, menor a chance de acerto sobre o quanto a obra irá custar. É um princípio básico da engenharia de custos. Estudos preliminares de uma edicação, por exemplo, baseiam-se em conjecturas
assentadas em R$/m²; em uma usina, em R$/MW de potência instalada de energia gerada; em estádios de futebol em R$/assento. Na medida em que os estudos progridem, também avança o grau de precisão do orçamento respectivo. Na fase de anteprojeto já se fazem viáveis outras conjecturas, que podem — e devem — ser tão especícas quanto o anteprojeto permitir. Em um procedimento licitatório, anal, a Administração, necessita, em razão dos elementos de que dispõe, esmerar-se para
melhor contratar; e sem dúvida que as estimativas balizadoras de preço são protagonistas nessa avaliação de vantajosidade. Logo, se, em uma contratação integrada, o anteprojeto conta com elementos arquitetônicos de execução obrigatória, o orçamento proveniente dessa peça deve ter grau de precisão condizente. Com essas informações já se faz possível a parametrização, por exemplo, de custos especícos de alvenaria, reboco, piso, forro, pintura, revestimentos, esquadrias,
louças, etc. É uma boa fatia da obra. Por outro lado, caso a elaboração dos demais projetos seja incumbência de conta e risco das contratadas, natural que para o orçamento dos elementos elétricos, hidráulicos, estruturais, se utilizem — aí sim — de relações paramétricas ou comparativas. Mesmo nesses casos, repiso, por tudo o que disse, que, diante de duas ou mais metodologias expeditas ou paramétricas possíveis para abalizar o valor do empreendimento, devese preferir a que viabilize a maior precisão orçamentária, para guarda de valores fundamentais licitatórios, como a eciência e a economicidade, sem esquecer, claro, o da
obtenção da melhor proposta possível. No presente caso, portanto, a Infraero — de acordo com o que se exige de um anteprojeto estrutural —, em vez de ter orçado a estrutura dos terminais com base em parâmetros globais de preços de outros empreendimentos, poderia ter estimado o volume de concreto com base no pré-lançamento estrutural (exigível em um anteprojeto). A partir daí, em razão das taxas de aço e formas por metro cúbico de concreto, obtidos em outros objetos semelhantes, potencializaria a quantidade estimada também desses serviços. Com referências especícas do Sicro e Sinapi, adaptadas às condições ambientais da obra, poder-
se-ia chegar a uma estimativa um tanto quanto justa para o valor global das estruturas. A metodologia citada, por evidente viabilidade prática (ainda em nível de anteprojeto), é preferível à concepção genérica do valor geral das estruturas obtidas em empreendimentos de mesmo porte. Promover-se-ia, assim, mais segurança à comissão de licitação em julgar a razoabilidade dos valores ofertados. Aproveito a situação, em razão dos vazios de detalhamento observados na contratação que presentemente se avalia, para frisar que o anteprojeto deve oferecer elementos mínimos que permitam a efetiva caracterização da obra e comparação entre as propostas, tal qual se estampa no art. 9º, §2º, inciso I, da Lei 12.462/2011 e do art. 74, §3º, do Decreto 7.581/2011. Faz-se obrigatório conferir à licitação um lastro mínimo comparativo para a denição da
proposta mais vantajosa. Também se exige a apresentação de elementos que subsidiem as concorrentes de informações sucientes e indispensáveis para o dimensionamento de
suas soluções, capazes de nortear o oferecimento de um preço, com responsabilidade e segurança.
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
Para poder aproveitar a expertise dos particulares, eles carecem de informações para dimensionar, de acordo com o seu know-how, as metodologias construtivas para adimplir o objeto contratual. O fato é que, em uma edicação, não avalio que sem elementos arqui-
tetônicos consistentes se consiga oferecer todo esse acervo; tanto para possibilitar o real dimensionamento do objeto pelos licitantes, como para subsidiar o poder público de um padrão comparativo mínimo entre as propostas. Em uma edicação, a arquitetura é que dene o que a Administração está contratando.
Os projetos complementares restantes são, todos, realizados em função dessa arquitetura; e de modo a viabilizá-la. Não se poderia, anal, licitar o empreendimento sem delimitar qual a especicação do piso a ser colocado; sob pena de a licitante entregar o pior possível. Também não se acolheria não indicar a cor e a especicação da tinta, dos forros, dos
vidros, dos metais, etc.
A arquitetura, via de regra, é condição de meio, não de m. Exige-se, geralmente, a identi-
dade da estética, não uma inovação, sob o risco de se contratar objeto alheio ao almejado. Ante o exposto, entendo que se possa noticar a Infraero que, no caso de obra de edi-
cação, em regra, faz-se necessário que o anteprojeto preveja a arquitetura consistente do empreendimento, tendo em vista ser essa a informação denidora do produto a ser
entregue à Administração e constituir-se em elemento fundamental para a avaliação de eventuais metodologias diferenciadas para o seu adimplemento, como também para a elaboração dos demais projetos de engenharia a serem desenvolvidos à época do projeto básico. Conveniente, ainda, para melhor instrução de seus processos futuros, de forma a não repetir os erros então encontrados, elucidar que, sempre que o anteprojeto, por seus elementos mínimos, assim o permitir, as estimativas de preço a que se refere o art. 9º, §2º, inciso II, da Lei 12.462/2011 devem se basear em orçamento sintético tão detalhado quanto possível, balizado no Sinapi ou no Sicro, devidamente adaptadas às condições peculiares da obra, conforme o caso, devendo a utilização de estimativas paramétricas e a avaliação aproximada baseada em outras obras similares serem realizadas somente nas frações do empreendimento não sucientemente detalhadas pelo anteprojeto, em prestígio ao que
assevera o art. 1º, §1º, inciso IV c/c art. 8º, §§3º e 4º, todos da Lei 12.462/2011. (TCU. Acórdão nº 1.510/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 25 jun. 2013).
Para os demais regimes, será utilizado o procedimento detalhado apresentado no Capítulo 5, no qual são identicados todos os serviços do projeto básico, seus
quantitativos e preços unitários. Com efeito, o art. 8º do RDC estabelece a priorização a ser dada na pesquisa dos custos de insumos, similar à estabelecida pela Lei de Diretrizes Orçamentárias. §3º O custo global de obras e serviços de engenharia deverá ser obtido a partir de custos unitários de insumos ou serviços menores ou iguais à mediana de seus correspondentes ao Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e índices da Construção Civil – SINAPI, no caso de construção civil em geral, ou na tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias – SICRO, no caso de obras e serviços rodoviários. §4º No caso de inviabilidade da denição dos custos consoante o disposto no §3º deste
artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema especíco instituído para o setor ou em pesquisa de mercado. [...]
§6º No caso de contratações realizadas pelos governos municipais, estaduais e do Distrito Federal, desde que não envolvam recursos da União, o custo global de obras e serviços
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de engenharia a que se refere o §3º deste artigo poderá também ser obtido a partir de outros sistemas de custos já adotados pelos respectivos entes e aceitos pelos respectivos tribunais de contas.
Portanto, se o anteprojeto é realizado em etapa anterior ao projeto básico, sua precisão será pior do que os 15% denidos pela Resolução nº 361/91 – Confea, ou seja, haverá maior risco para os licitantes apresentarem suas propostas por não conhecerem todos os detalhes do empreendimento. Por outro lado, os mesmos licitantes poderão se valer de maior exibilidade no momento de denir a metodologia de execução, visto que o projeto básico será de sua competência. A propósito, deve ser evitada a conduta reprovável de utilizar-se de projeto executivo como fundamento para a licitação de obra por regime de contratação integrada, conforme destacou o TCU: 208
Há de se notar que os projetos-padrão contratados pelo (...) se pretendem “projetos executivos” dos terminais e, ainda que seja razoável admitir a necessidade de algum detalhamento adicional no momento da execução, não é esperado que os concorrentes apresentem soluções essencialmente diversas daquelas indicadas nos modelos. Aliás, sequer poderia ser admitida a utilização da contratação integrada para licitar objeto para o qual já se dispõe de projeto executivo em sua totalidade, já que as soluções de engenharia já estariam previamente postas e não é possível vislumbrar circunstância que satisfaça as condições denidas no art. 9º da lei 12.462/2011 para aplicação do instituto. Não haveria espaço para inovação tecnológica ou para competição com foco em metodologias diferenciadas e, em se tratando de obras civis comuns, reduzidas seriam as hipóteses de execução com tecnologia de domínio restrito no mercado que permitam justicar a contratação integrada. Adicionalmente, seria questionável a opção do gestor de despender recursos com a elaboração de projeto detalhado e, em seguida, conferir exibilidade ao particular na denição das intervenções. Lembro também que a contratação integrada, em geral, importa na aceitação de maiores riscos pelos contratados e na consequente majoração dos custos para a Administração. Recente decisão do TCU, proferida no acórdão 1.850/2015-Plenário, deixa clara a obrigação de se demonstrar a vantajosidade na utilização do regime de contratação integrada, especialmente quando a competição está associada às metodologias executivas propostas pelos licitantes: A opção pelo regime de contratação integrada exige, nos termos do art. 9º da Lei 12.462/11 (Regime Diferenciado de Contratações), que haja justicativa sob os prismas econômico e técnico. No econômico, a Administração deve demonstrar em termos monetários que os gastos totais a serem realizados com a implantação do empreendimento serão inferiores se comparados aos obtidos com os demais regimes de execução. No técnico, deve demonstrar que as características do objeto permitem que ocorra real competição entre as contratadas para a concepção de metodologias/tecnologias distintas, que levem a soluções capazes de serem aproveitadas vantajosamente pelo Poder Público. (TCU. Acórdão nº 2.209/2015, Plenário. Rel. Min. Ana Arraes. DOU , 16 mai. 2015).
Por fim, outra novidade é a possibilidade prevista no art. 10 do RDC do estabelecimento de “remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada,
208
Ver item 7.2.1.5 deste livro.
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com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega denidos no instrumento convocatório e no contrato”, respeitado o limite orçamentário xado pela administração pública para a contratação. O desempenho do contratado até a aprovação do RDC sempre foi visto sob a ótica do cumprimento do mínimo esperado, Com efeito, a lógica da contratação pública registrava a necessidade da observância das especicações estabelecidas no Edital, caso contrário, a legislação previa as sanções a serem aplicadas. Já era momento de se mudar o paradigma com a criação de ferramentas, típicas da iniciativa privada, que incentivassem a alteração de comportamento do contratado na busca de superar as metas e especicações superadas. Nessa linha, o RDC incorporou duas novidades: a remuneração variável e o contrato de eciência. É o jogo “ganhaganha”, no qual a Administração concorda em ceder ao contratado parte dos benefícios auferidos por conta de sua atuação.
15.4 Critérios de julgamento O RDC utiliza a expressão “critérios de julgamento” para os mesmos conceitos denominados “tipos de licitação” pela Lei nº 8.666/93 e, em seu art. 18, acrescenta três novos critérios em relação aos já previstos pela norma geral de licitações — de maior desconto, maior oferta de preço e maior retorno econômico — bem como altera a maneira do processamento em relação à melhor técnica. O julgamento pelo maior desconto, de forma similar ao de menor preço, considerará o menor dispêndio para a administração pública. Será vencedora a licitante que oferecer o maior desconto em relação ao valor global xado no instrumento convocatório, que deverá incidir linearmente sobre os preços de todos os itens do orçamento estimado constante do instrumento convocatório. O julgamento pela melhor combinação de técnica e preço será utilizado quando a avaliação da qualidade técnica das propostas for relevante aos ns pretendidos pela Administração, em especial no regime de contratação integrada. De acordo com o art. 20 do RDC, deverão ser avaliadas e ponderadas as propostas técnicas e de preço apresentadas pelos licitantes, mediante a utilização de parâmetros objetivos obrigatoriamente inseridos no instrumento convocatório, sendo o percentual mais relevante limitado a 70% da ponderação a ser efetuada. Porém, este critério está limitado aos objetos de natureza predominantemente intelectual e de inovação tecnológica ou técnica; ou que possam ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado, pontuando-se as vantagens e qualidades que eventualmente forem oferecidas para cada produto ou solução. O julgamento pela maior oferta de preço será utilizado no caso de contratos que resultem em receita para a administração pública, sendo possível a dispensa, em função do regulamento que tratar da matéria, dos requisitos de qualicação técnica e econômico-nanceira. O Decreto nº 7.581/11, em seu art. 33, autorizou a dispensa do cumprimento dos requisitos de qualicação técnica e econômico-nanceira e permitiu 209
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Nesse caso, o orçamento deverá ser disponibilizado no curso do processo licitatório, nos termos do art. 6º, §1º, do RDC.
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como requisito de habilitação a comprovação do recolhimento de quantia como garantia, limitada a cinco por cento do valor mínimo de arrematação. O julgamento pela melhor técnica, previsto no art. 21, poderá ser utilizado para a contratação de projetos, inclusive arquitetônicos, e trabalhos de natureza técnica, cientíca ou artística, excluindo-se os projetos de engenharia. Serão consideradas “as propostas técnicas ou artísticas apresentadas pelos licitantes com base em critérios objetivos previamente estabelecidos no instrumento convocatório, no qual será denido o prêmio ou a remuneração que será atribuída aos vencedores”, ou seja, o valor da remuneração é xado na publicação do Edital, diferentemente da regra contida na Lei nº 8.666/93 para o tipo “melhor técnica”, na qual é tomado como referência o limite representado pela proposta de menor preço entre os licitantes que obtiveram a valorização mínima. Por m, o julgamento pelo maior retorno econômico, nos termos do art. 23 do RDC, será “utilizado exclusivamente para a celebração de contratos de eciência”, que terá por objeto a prestação de serviços que podem incluir a realização de obras e o fornecimento de bens, com o objetivo de proporcionar economia ao contratante, na forma de redução de despesas correntes. Será selecionada a proposta que proporcionar a maior economia para a administração pública decorrente da execução do contrato, sendo o contratado remunerado com base em percentual dessa economia. Cabe ilustrar a utilização desse critério de julgamento com o seguinte exemplo: determinado órgão tem despesas correntes com energia elétrica no valor mensal de R$1.000.000,00 e resolve abrir uma licitação com critério de maior retorno econômico para reduzir esse valor. Três empresas participam do certame com as propostas apresentadas na TABELA 15.1. TABELA 15.1 Seleção de proposta com base no critério de julgamento de maior retorno econômico Resultado (R$)
Licitação
Empresa
Proposta de trabalho
A
Não realizará obras e promete reduzir em R$100.000,00 a conta mensal
Proposta de preço
Administração
Empresa
Deseja receber 10% da economia
90.000,00
10.000,00
Deseja receber 30% da economia
84.000,00
36.000,00
B
Realizará reforma da subestação e promete reduzir em R$120.000,00 a conta mensal
Deseja receber 40% da economia
120.000,00
80.000,00
C
Realizará ampla reforma na rede elétrica e na subestação e promete reduzir em R$200.000,00 a conta mensal
Nessa situação, apesar de a Empresa C apresentar o maior percentual de cobrança sobre a economia gerada ela sairá vencedora da licitação. Importante notar que o investimento desta empresa poderá será bem maior do que aquele previsto pelas
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demais, ou seja, não se pode entender que o total de resultado obtido se traduzirá em lucro, mas a questão de investimento será da empresa. A TABELA 15.2 ilustra um resumo das possibilidades de utilização dos critérios de julgamento em função do objeto pretendido: TABELA 15.2 Critérios de julgamento em função do objeto a ser licitado Utilização dos critérios de julgamento Fundamentação no RDC (Lei nº 12.462/11) Objetos
Menor preço ou maior desconto
Técnica e preço
Melhor técnica ou conteúdo artístico
Maior oferta de preço
Maior retorno econômico
Sim
Sim, desde que relacionadas no art. 20
Não
Não
Não
Sim
Não
Não
Não
Sim
Sim
Sim, desde que relacionado no art. 20
Não
Não
Não
Sim
Sim, desde que relacionado no art. 20
Sim
Não
Não
Sim
Sim, desde que relacionados no art. 20
Sim
Não
Não
Obras
Prestação de serviços Projeto de engenharia
Projeto de arquitetura
Trabalhos de natureza técnica, científca ou
artística
15.5 Modalidades de licitação, prazos para apresentação de propostas e publicidade do instrumento convocatório A Lei nº 12.462/2011, diferentemente da Lei nº 8.666/93, não faz referência a modalidades de licitação. Portanto, não será encontrada no RDC menção à concorrência, tomada de preços ou convite. Entretanto, continua válida a diretriz do parcelamento do objeto visando à ampliação da competição no certame, conforme art. 4º, VI, do RDC. O art. 15 do mencionado regime estabelece os prazos mínimos a serem observados para apresentação de propostas, contados a partir da data de publicação do instrumento convocatório, em fncão do critério de julgamento.
A observação relevante a respeito de diferenciação de procedimentos em face do valor da contratação está inserida no art. 15, §2º, que dispensa a publicação do extrato do edital no Diário Ofcial do ente federado competente no caso de licitações cujo valor não ultrapasse R$150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) para obras ou R$80.000,00 (oitenta mil reais) para bens e serviços, inclusive de engenharia.
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Nos demais casos, a publicidade dos procedimentos será realizada, nos termos do art. 15, §1º, da Lei nº 12.462/2011, mediante: I - publicação de extrato do edital no Diário Ocial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município, ou, no caso de consórcio público, do ente de maior nível entre eles, sem prejuízo da possibilidade de publicação de extrato em jornal diário de grande circulação; e II - divulgação em sítio eletrônico ocial centralizado de divulgação de licitações ou mantido pelo ente encarregado do procedimento licitatório na rede mundial de computadores.
Interessante observar que foi suprimida a obrigação prevista na Lei nº 8.666/93 de publicação em jornal diário de grande circulação no Estado e também, se houver, em jornal de circulação no Município ou na região onde será realizada a obra ou prestado o serviço. Em contrapartida, foi inserida a obrigação de divulgação do certame em sítio eletrônico ocial centralizado de divulgação de licitações.
15.6 Sistema de Registro de Preços e Catálogo Eletrônico de Padronização O Sistema de Registro de Preços (SRP) e o Catálogo Eletrônico de Padronização são procedimentos auxiliares das licitações previstos no art. 29 do RDC. O detalhamento desses procedimentos foi remetido pela lei a regulamento. No apropriado regulamento (Decreto nº 7.581/2011) foram denidas, no art. 89, as hipóteses para a adoção do SRP: Art. 89. O SRP/RDC poderá ser adotado para a contratação de bens, de obras com características padronizadas e de serviços, inclusive de engenharia, quando: (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) I - pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações frequentes; (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) II - for mais conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) III - for conveniente para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; ou (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) IV - pela natureza do objeto, não for possível denir previamente o quantitativo a ser demandado pela administração pública. (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013)
A licitação para o registro de preços, nos termos do art. 90 do mencionado decreto, poderá ser realizada por qualquer dos modos de disputa previstos no regulamento, combinados ou não; utilizar os critérios de julgamento menor preço, maior desconto ou técnica e preço; e, ainda, deverá ser precedida de ampla pesquisa de mercado. Não será necessária a indicação da dotação orçamentária, condição a ser preenchida apenas na formalização do contrato ou instrumento equivalente. Importante inovação foi a criação da compra nacional, por meio do Decreto nº 8.251/2014, denida como a “compra ou contratação de bens, serviços e obras com características padronizadas, inclusive de engenharia, em que o órgão gerenciador conduz os procedimentos para registro de preços destinado à execução descentralizada
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
de programa ou projeto federal, mediante prévia indicação da demanda pelos entes federados beneciados”. Nesse caso, nos termos do art.92 § 3º do regulamento, o órgão
gerenciador promoverá a divulgação da ação, a pesquisa de mercado e a consolidação da demanda dos órgãos e entidades da administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Em acréscimo às exigências previstas para as licitações conduzidas com base no RDC, previstas no art. 94 do aludido decreto, o instrumento convocatório para registro de preços deverá conter: I - a especicação ou descrição do objeto, explicitando o conjunto de elementos necessários e sucientes, com nível de precisão adequado, para a caracterização do bem ou serviço, inclusive denindo as respectivas unidades de medida usualmente adotadas;
II - a estimativa de quantidades a serem adquiridas no prazo de validade do registro; III - a quantidade mínima de unidades a ser cotada, por item ou lote, no caso de bens; IV - as condições quanto aos locais, prazos de entrega, forma de pagamento e, comple mentarmente, nos casos de serviços, quando cabíveis, a frequência, periodicidade, características do pessoal, materiais e equipamentos a serem fornecidos e utilizados, procedimentos a serem seguidos, cuidados, deveres, disciplina e controles a serem adotados; V - o prazo de validade do registro de preço; VI - os órgãos e entidades participantes; VII - os modelos de planilhas de custo, quando couber; VIII - as minutas de contratos decorrentes do SRP/RDC, quando for o caso; e IX - as penalidades a serem aplicadas por descumprimento das condições estabelecidas. § 1º Quando o instrumento convocatório previr o fornecimento de bens ou prestação de serviços em locais diferentes, é facultada a exigência de apresentação de proposta diferenciada por região, de modo que os custos variáveis por região sejam acrescidos aos respectivos preços. § 2º O exame e a aprovação das minutas do instrumento convocatório e do contrato serão efetuados exclusivamente pela assessoria jurídica do órgão gerenciador.
Interessante caso que trata da adoção do SRP para obras foi analisado pelo TCU, no Acórdão nº 2.600/13, Plenário, no decorrer de scalização empreendida no Programa
Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância), cuja responsabilidade de execução compete ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Foram licitadas creches padronizadas para que os municípios interessados — previamente consultados — contratassem e executassem o objeto de maneira mais célere e eciente, com adequada
assistência técnica do FNDE. Tal possibilidade, segundo o referido fundo, melhor garantiria a nalidade dos recursos federais destinados ao programa, na medida em
que eliminaria alguns gargalos do processo, a contribuir sobremaneira para o baixo adimplemento das metas então perseguidas. A riqueza da análise feita por ocasião do voto de matéria inovadora pelo Relator, Ministro Valmir Campelo, merece ser rememorada, em especial pelo fato de haver entrelaçamento com a utilização da contratação integrada: Visto isso, adentro no principal questionamento da equipe de auditoria: a viabilidade legal de se licitarem obras pelo Sistema de Registro de Preços.
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A discussão frui do comando legislativo do Decreto 7.581/2011, que regulamenta a Lei do RDC. Até o m dos trabalhos de campo da scalização, o normativo assim dispunha: “Art. 89. O SRP/RDC poderá ser adotado nas seguintes hipóteses: I - quando, pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações frequentes; II - quando for mais conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; III - quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; e IV - quando, pela natureza do objeto, não for possível denir previamente o quantitativo a ser demandado pela administração pública”. [...] Existe uma disposição especíca a autorizar a utilização do regime para a aquisição de bens ou para a contratação de serviços. Não se incluiu obra no comando do regulamento. Se, por paralelismo hermenêutico, se estudar o conteúdo do Decreto 7.892/2013 — que regulamenta de forma geral o Registro de Preços, fora do âmbito do RDC —, consta que: Art. 1º As contratações de serviços e a aquisição de bens, quando efetuadas pelo Sistema de Registro de Preços – SRP, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, fundos especiais, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas, direta ou indiretamente pela União, obedecerão ao disposto neste Decreto. Art. 2º Para os efeitos deste Decreto, são adotadas as seguintes denições: I - Sistema de Registro de Preços – conjunto de procedimentos para registro formal de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para contratações futuras; [...] Art. 3º O Sistema de Registro de Preços poderá ser adotado nas seguintes hipóteses: I - quando, pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações frequentes; II - quando for conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; III - quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; ou IV - quando, pela natureza do objeto, não for possível denir previamente o quantitativo a ser demandado pela Administração. [...] A letra dos dispositivos mencionados foi, portanto, especíca. Não existe previsão para a utilização do instituto mencionado para obras. A unidade técnica entendeu, assim, que em matéria administrativa, a discricionariedade do gestor o libera para escolher, de modo fundamentado, os caminhos legais que melhor convierem à Administração. Não autorizaria, todavia, a utilização de possibilidade alheia ao arsenal legal disponível. A utilização de um registro de preços para obras, deste modo, refugiria ao previsto na legislação. Por outro lado, segundo a SecobEdicação, a nulidade repercutiria em outros prejuízos. Ceifar o processo licitatório em sua atual fase seria limitar a vida escolar de uma gama de crianças, com prejuízos inalcançáveis a posteriori. Considerando, ainda, a situação peculiar do caso concreto, com obras de baixa complexidade técnica e em face do histórico de insucessos na contratação das creches, a unidade instrutiva avaliou, excepcionalmente, não ser cabível a anulação. Reproduzo o elucidador trecho do despacho do Secretário: “De se destacar como está desenhado esse novo modelo de contratação. Entre os principais problemas no modelo tradicional estão a condução da contratação pela prefeitura e o constante abandono das obras por parte das empresas construtoras. Disso decorre a opção pela centralização da licitação no FNDE e pelo agrupamento de várias obras sob a responsabilidade de poucas empresas. Ou seja, a nova estrutura (mais centralizada e com
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menor número de empresas a gerenciar) favorece um maior controle, opção condizente com a realidade e os problemas constatados. Outro aspecto a se considerar é a possível motivação da opção do legislador (e também deste Tribunal ao interpretar a norma) por não possibilitar a utilização do SRP para a contratação de obras. O referido instituto é adequado àquelas compras e serviços mais simples e rotineiros, que podem ser individualizados por meio de descrição simplicada
e sucinta, sem complexidades. Ou seja, uma obra de engenharia tradicional não se enquadraria nessa descrição. Nessa linha, a preocupação do legislador era evitar a contratação de objetos complexos (obras, no caso) como se rotineiros fossem. Entretanto, no caso concreto, é possível observar que se trata de obra de baixa complexidade construtiva, ainda mais se assegurada a uniformidade da declividade do terreno, conforme alega o FNDE. Em suma, cuida-se de obra (em parte) padronizável e passível de ser replicada de maneira rápida e simplicada. Por m, não se pode olvidar que o fornecimento de creches por parte do Estado tem relação
não só com o aspecto educacional da criança, mas também com a possibilidade de inclusão social da família, na medida em que possibilita a obtenção de emprego por parte dos pais. Essa face da questão deve ser ponderada numa análise de dano reverso decorrente da eventual paralisação do programa neste momento. O resultado seria a existência de milhares de crianças fora da creche por mais um ano ou dois — o que interfere não só no seu desenvolvimento educacional como na própria situação social da família”. Diante do cenário apresentado, inicio minha digressão anuindo com a necessidade de uma visão teleológica da situação que se julga. Concordo inteiramente com a necessária meditação acerca do impacto amplo desta decisão. Em verdade, atrasos na infraestrutura necessária para cumprir o papel do estado em seus compromissos ensejarão reexos
sociais indesejáveis e duradouros. É sabido que a educação pré-infantil é decisiva para a alfabetização. Um vocabulário mais rico, a motricidade, a nutrição, a melhor compreensão cultural do mundo, são todas condições decisivas para o primeiro convívio com as letras. Tolher as crianças dessa preparação é, antes mesmo de ingressar na vida educacional, carimbá-la com uma limitação de oportunidades por toda a sua existência. Nesse pensar, logo que me debrucei sobre o assunto, vislumbrava que, em uma visão imparcial, caso se considerasse a completa inviabilidade legal de se implementar a presente licitação, nos moldes em que foi concebida, em algum termo, seria como estampar que o arcabouço burocrático disponível pelo ordenamento jurídico não ampara o adequado e eciente adimplemento das políticas públicas, transparentemente estampadas neste
caso concreto.
As obras, anal de contas, não são um m em si; mas um instrumento para potencializar
a função estatal de cumprir com suas obrigações perante a sociedade. Neste caso, uma prestação de serviços públicos eficiente envolve um adimplemento tempestivo da infraestrutura necessária para realizá-la. Fato é que, na ponta da linha, algumas políticas públicas na área da rede escolar de educação infantil não estavam sendo adequadamente implementadas; e sem dúvida que um dos gargalos é a licitação pelos tomadores de recursos. O embrião da contratação faceia todas as demais fases do processo: porque esquadrinha as especicações do objeto; porque viabiliza uma boa concorrência e bons preços; porque
redunda na escolha de uma empresa hábil; neste caso, ainda, porque agiliza o trâmite necessário para a alimentação do uxo de recursos que irriga as obras.
Esse pano de fundo já imporia um argumento de peso na apreciação da eventual nulidade, in concreto. Considero, porém, que tanto a visão teleológica da lei, quanto a modicação
legislativa posterior ao término do relatório de auditoria, tem também papel contundente no julgamento.
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Como novidade, em 20 de agosto de 2013, publicou-se o Decreto 8.080/2013, com modicações pontuais e decisivas no Decreto 7.581/2011 — que regulamenta o RDC.
Entre as alterações, consta: “Art. 89. O SRP/RDC poderá ser adotado para a contratação de bens, de obras com características padronizadas e de serviços, inclusive de engenharia, quando: I - pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações frequentes; II - for mais conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; III - for conveniente para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; ou IV - pela natureza do objeto, não for possível denir previamente o quantitativo a ser
demandado pela administração pública. Parágrafo único. O SRP/RDC, no caso de obra, somente poderá ser utilizado: I - nas hipóteses dos incisos III ou IV do caput; e II - desde que atendidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) as licitações sejam realizadas pelo Governo federal; b) as obras tenham projeto de referência padronizado, básico ou executivo, consideradas as regionalizações necessárias; e c) haja compromisso do órgão aderente de suportar as despesas das ações necessárias à adequação do projeto padrão às peculiaridades da execução”. [...]
Poderia se questionar se, ao autorizar, de forma literal, a utilização do SRP para obras, não houve uma extrapolação do regulamento, em termos da dicção oferecida pela Lei 12.462/2011. Não creio, maxima venia , que tenha havido ilegalidade no novo Decreto. Óbvio que, por se tratar de matéria controversa, esta Corte irá, ainda, amadurecer a questão; o que não impede que em outros casos concretos modique meu pensamento. Não vejo prejuízo,
porém, de tecer as considerações que ora faço.
O princípio perseguido em lei, quando especicou “aquisição de bens” ou “prestação
de serviços”, não foi outro senão o de preservar o valor fundamental licitatório: o da obtenção da melhor proposta. Em um Sistema de Registro de Preços, os objetos devem ser padronizáveis, de modo a atender, amplamente, as necessidades dos adquirentes, qualquer que seja a sua localidade. Quando se compra, por exemplo, uma caneta no Rio Grande do Sul, o interessado no Acre, ao vericar as especicações do produto em ata, tem condições de motivar que aquela licitação atenderá às suas necessidades especícas.
De outro modo, objetos não padronizáveis ensejam uma altíssima imponderação em termos de satisfação das necessidades pelo adquirente. Seja porque o problema é muito especíco,
seja porque não viabiliza a oferta de um justo preço que atenda a todos os interessados. Em consequência, uma “licitação universal” não oferecerá uma contratação geral vantajosa. A questão é que as obras, pelo princípio da especicidade de seus orçamentos, não
possuem, via de regra, essas características gerais padronizáveis. As distâncias de transporte, as características do terreno, a disponibilidade dos materiais, os fatores ambientais, todos esses impõem soluções distintas e preços outros, que inviabilizariam uma taxação erga omnes da “melhor proposta”. A lei, justamente por isso, não dispôs as obras de forma direta. Seria uma “lei geral” de que as obras não podem ser padronizáveis. A novidade no caso concreto é que a modelagem da licitação foi engenhosamente concebida, de maneira a possibilitar, sim, uma padronização de propostas para as creches. Todos os componentes do objeto que pudessem variar relevantemente de um terreno para outro foram expurgados da obra em si, transmutando-se em itens individuais na ata licitada. Muros, momentos de transporte para mobilização, vias de acesso, furos de sondagens, etc., foram licitados mediante quantitativo global estimado, “por fora” das
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creches tipo “B” e “C”. Signica que para cada contrato a ser rmado, serão avaliados o
quanto desses serviços individuais da ata serão necessários; e a adesão far-se-á, somente,
com o suciente para a execução de cada obra em si. Logo, cada contratação, de fato, terá
um valor diferente. Pela regionalização dos lotes, ainda, os problemas ambientais foram mitigados. Também não haverá grandes volumes de terraplenagem — principal componente de variação — tendo em vista que para o repasse de recursos pelo Governo Federal deve se demonstrar que o terreno encontra-se, já, terraplenado. Para as fundações, considerando que se trata de edicações térreas, com cargas bastante moderadas provindas da superestrutura, a
regra deve ser um radier, independentemente do tipo de terreno. Se não o for, o risco é pequeno, em termos de custos globais, o que, por sua vez, está limpidamente inscrito nas regras do certame, como responsabilidade da contratada. Creio, então, que se faz viável precicar de forma justa as edicações — até mesmo em razão de sua baixa complexidade
e porte —, mesmo em face dessa imponderação geotécnica existente. Aliás, entendo que esse maior direcionamento de riscos para os particulares — viabilizada pela utilização da contratação integrada, o que comentarei mais adiante neste voto — foi o determinante para que se pudesse falar em “padronização da obra”. Em verdade, licitouse um anteprojeto. Caberá à contratada (por meio de um projeto de compatibilização), elaborar as soluções relativas à metodologia construtiva e aplicar o seu diferencial tecnológico para tirar vantagens competitivas no certame. E a presente licitação realmente propicia a competição metodológica e tecnológica entre as empresas. Logo, no caso em estudo, não tenho dúvidas que se demonstrou a viabilidade de se estabelecer uma padronização de contratação, que autorize uma vantajosidade global aos futuros interessados. Nesse teor, penso que o mens legis do dispositivo questionado foi plenamente atendido. A licitação em escopo teve o poder de escolher a melhor proposta para as contratações que fruam desse processo. Se foi demonstrado, nesta situação especíca, a viabilidade de se padronizar uma obra (em
verdade, se padronizar um anteprojeto), de modo que diversos adquirentes, em diferentes
localidades, possam se certicar que se trata de uma proposta vantajosa, em outros casos — pelo menos em tese — esse m igualmente pode ser atendido. Reconheço, de novo, que
a matéria ainda será esmerilhada pela própria evolução jurisprudencial deste Tribunal.
Pelo menos com relação ao caso concreto, todavia, não identico uma ilegalidade direta e inequívoca a justicar a anulação das presentes licitações por ausência de previsão legal.
Quero deixar claro que preocupação existe. O caso do FNDE foi o resultado de um processo de anos de amadurecimento, em uma idealização coerente de controles de m,
com especialíssimo acompanhamento técnico. Existem condicionantes de qualidade, coerentemente entrelaçados, que, confesso, são para mim novidade nesses quase dezesseis anos como Ministro desta Corte. São edicações de pequeno porte e baixa complexidade técnica, em que nem mesmo a
variabilidade do terreno (a potencializar a ausência das sondagens no anteprojeto de engenharia) tem papel decisivo para o custo das obras. Em outras obras de vulto, tal padrão pode não se repetir — e é provável que não se repita. Licitarem-se generalizadamente obras por registro de preços pode ser então uma temeridade. Tanto pode se pagar mais pelo mesmo objeto — em razão de riscos não controlados —, como estimular os malgrados projetos decientes, com repercussões já conhecidas de objetos entregues com má
qualidade e obras abandonadas. Em outras tipologias de construções, as características do terreno são, em regra, determinantes para as soluções técnicas e custos decorrentes. Seria a potencialização da ineciência na aplicação dos recursos públicos — o inverso
idealizado na concepção do programa analisado. Há de se ter, portanto, extrema cautela no uso desse novo instrumento. Diante de todos esses riscos, concordo com a unidade instrutiva que o programa deve ser acompanhado; desde as contratações, perpassando por sua execução, até a entrega
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das obras — inclusive o pós-obra. Tal plano de monitoramento deve, inclusive, ser primeiramente idealizado pelo próprio FNDE. Os sucessos e eventuais insucessos desse trabalho serão matéria prima para melhor orientação dos jurisdicionados, mormente em razão do novo teor do Decreto 7.581/2011, alterado pelo Decreto 8.080/2013. IV Como disse, a idealização da licitação envolveu a autorização para que as empresas apresentassem tecnologias construtivas distintas para cumprir com o projeto base do edital. Essa possibilidade envolveu a apresentação de um “projeto de compatibilização”, a ser desenvolvido durante a contratação. Na prática, o projeto editalício era um anteprojeto. As verdadeiras intervenções na obra seriam elaboradas em um projeto básico e executivo de lavra dos próprios particulares, devidamente aprovados no decorrer da avença, de acordo com cada particularidade dos locais de execução. Quer dizer que as empresas oferecerão preços para produtos distintos, mas com o mesmo fm: realizar a obra de acordo com as especifcações editalícias. Algumas exigências são de meio: ultima-se a identidade da obra a ser realizada com os projetos disponibilizados, como são os casos do layout arquitetônico e das instalações hidrossanitárias. Para outros componentes não: as obrigações são de fm e permite-se a inovação (na verdade, incentiva-se). São os casos dos sistemas estruturais e de vedação. Desde que atendidos os rígidos condicionantes de qualidade, objetivamente mensurados por ensaios técnicos, existe uma liberdade de meio. Signifca que embora o instrumento convocatório tenha classifcado o presente regime como “empreitada por preços globais”, na realidade, trata-se de uma “contratação integrada”. A modelagem envolve todas as características desse novo instituto. Vide o texto da Lei 12.462/2011: Art. 9º Nas licitações de obras e serviços de engenharia, no âmbito do RDC, poderá ser utilizada a contratação integrada, desde que técnica e economicamente justifcada. §1º A contratação integrada compreende a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e todas as demais operações necessárias e sufcientes para a entrega fnal do objeto. [...] 3º Caso seja permitida no anteprojeto de engenharia a apresentação de projetos com metodologias diferenciadas de execução, o instrumento convocatório estabelecerá critérios objetivos para avaliação e julgamento das propostas. Não por outro motivo a lei condicionou as contratações integradas à utilização do critério de julgamento “técnica e preço”, justamente para pontuar essas vantagens competitivas decorrentes da liberdade em inovar (art. 9º, §2º, inciso III). A omissão na utilização da “técnica e preço”, portanto, é irregular. Embora não seja sufciente para obstar a continuidade do processo — pelos motivos que já perflhei —, deve-se empreender notifcação ao FNDE, para que, doravante, licite suas contratações integradas nos ditames do que prescreve o art. 9º da Lei 12.462/2011. A tarefa não será laboriosa. Basta pontuar os critérios de qualidade que o FNDE já competentemente concebeu como necessários e fundamentais para a aceitação das propostas. IV O reconhecimento de que a utilização da contratação integrada viabilizou a distribuição de riscos e a padronização do objeto no caso concreto faz-se decisiva para o juízo dos demais apontamentos realizados pela unidade técnica. Questionou-se a adoção de critério de julgamento de menor preço “por grupo”, em inobservância à diretriz de parcelamento; ainda se refutou que o projeto base das creches não atendia ao disposto na legislação do RDC, por não trazer solução técnica escolhida, estimulando, ao contrário, a apresentação de novas metodologias; em outra ponta,
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indagou-se o porquê da inserção de cláusulas potencialmente restritivas, como a que exige diversos ensaios do “sistema construtivo proposto”. Creio que tais exigências é que conferiram coerência ao modelo adotado. A contratação integrada amalgamou todas essas novidades. Não se poderiam aceitar tecnologias construtivas quaisquer sem parâmetros concretos de aceitabilidade. Seria também contraproducente se parcelar os subgrupos. Por sua vez, a liberdade para o oferecimento de soluções diferenciadas é o próprio espírito da contratação integrada; é aquilo que lhe dá forma. A viabilização da verdadeira competição em termos de solução é que de fato justica a vantajosidade do novo instituto.
Todas essas peculiaridades é que viabilizaram a verdadeira competição metodológica, luz motivadora da contratação da obra com base no anteprojeto. Não verico ilegalidade,
portanto, nesses ditames questionados. Existiram, por outro lado, falhas na concepção orçamentária do anteprojeto que devem
ser noticadas. Essa peça visa, tanto oferecer aos licitantes uma visão especíca de suas
obrigações, quanto permitir que a Administração avalie os recursos necessários – em termos nanceiros e orçamentários — para concretizar o empreendimento.
Nessa segunda visão, o orçamento deve ser tão preciso quanto o anteprojeto permita. Como a licitação é uma concorrência apenas cta — pois somente um licitante pode
aparecer — a boa estimativa de custos na fase interna do certame é decisiva para garantia do bom contrato, a um preço justo. No Acórdão 1.510/2013-Plenário, de minha relatoria, ao apreciar falhas orçamentárias em empreendimento “tocado” mediante a contratação integrada, esta Corte assim decidiu: 9.1.6. sempre que o anteprojeto, por seus elementos mínimos, assim o permitir, as estimativas de preço a que se refere o art. 9º, §2º, inciso II, da Lei 12.462/2011 devem se basear em orçamento sintético tão detalhado quanto possível, balizado pelo Sinapi e/ou Sicro, devidamente adaptadas às condições peculiares da obra, conforme o caso, devendo a utilização de estimativas paramétricas e a avaliação aproximada baseada em outras obras similares serem realizadas somente nas frações do empreendimento não sucientemente
detalhadas pelo anteprojeto, em prestígio ao que assevera o art. 1º, §1º, inciso IV c/c art. 8º, §§3º e 4º, todos da Lei 12.462/2011; 9.1.7. quando utilizada metodologia expedita ou paramétrica para abalizar o valor do empreendimento — ou fração dele —, consideradas as disposições do subitem anterior, dentre duas ou mais técnicas estimativas possíveis, utilize a que viabilize a maior precisão orçamentária; No caso em questão, desenvolveram-se, no projeto base, algumas previsões quanto a metodologia construtiva a ser empregada. Com fundamento nessas estimativas, elaborou-se o orçamento. Algumas dessas previsões de solução, todavia, estavam claramente superestimadas. Foi o caso das fundações, concebidas como estacas, por exemplo. Obviamente que, em termos das cargas normais em edicações térreas, um radier seria o “previsível”.
As lajes também tiveram custos “superdimensionados”; porque se previram lajes maciças, em vez das tão utilizadas lajes pré-moldadas. Tal qual nas concessões e Parcerias PúblicoPrivadas, o anteprojeto deve, já, mesmo que sem um detalhamento exigido no projeto
básico, conceber a solução mais econômica; para daí extrair um orçamento o mais especíco
possível. Tal providência melhor acautela um futuro bom preço contratual. Embora tais falhas tenham sido mitigadas pelos descontos oferecidos na fase concorrencial dos certames — em alguns casos superiores a 20% — mais uma vez, cabível noticar o
FNDE sobre a questão.
Por sua vez, o Catálogo Eletrônico de Padronização é o sistema informatizado destinado à padronização de bens, serviços e obras a serem adquiridos ou contratados pela administração pública pelo critério de julgamento menor preço ou maior desconto, e conterá:
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I - a especicação de bens, serviços ou obras; II - descrição de requisitos de habilitação de licitantes, conforme o objeto da licitação; e III - modelos de: a) instrumentos convocatórios; b) minutas de contratos; c) termos de referência e projetos referência; e d) outros documentos necessários ao procedimento de licitação que possam ser padronizados.
15.7 Habilitação, pré-qualicação e cadastramento Os requisitos de habilitação para as licitações das obras reguladas pelo RDC, de acordo com seu art. 14, continuam similares às exigências inseridas nos artigos 27 a 33 da Lei nº 8.666/93, já detalhadas no item 7.6.3 deste livro, com as seguintes peculiaridades: I - poderá ser exigida dos licitantes a declaração de que atendem aos requisitos de habilitação; II - será exigida a apresentação dos documentos de habilitação apenas pelo licitante vencedor, exceto no caso de inversão de fases; III - no caso de inversão de fases, só serão recebidas as propostas dos licitantes previamente habilitados; e IV - em qualquer caso, os documentos relativos à regularidade scal poderão ser exigidos em momento posterior ao julgamento das propostas, apenas em relação ao licitante mais bem classicado.
A Administração poderá, ainda, nos termos do art. 7º do RDC, solicitar a certicação da qualidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, por qualquer instituição ocial competente ou por entidade credenciada; e solicitar, motivadamente, carta de solidariedade emitida pelo fabricante, que assegure a execução do contrato, no caso de licitante revendedor ou distribuidor. Não se deve olvidar, no caso da contratação integrada, a importância de ser exigida dos licitantes a documentação afeta à comprovação da capacidade técnicoprossional para a elaboração do projeto básico ou executivo da obra, por ser este um serviço de valor signicativo e materialmente relevante. Além disso, poderá ser utilizado sistema de pré-qualicação permanente, sendo facultado à administração pública restringir aos pré-qualicados a possibilidade de participação no certame. Esta pré-qualicação é diferente daquela denida pela Lei nº 8.666/93, visto situar-se em momento anterior à licitação, e destina-se, de acordo com o art. 30 do RDC, a identicar: I - fornecedores que reúnam condições de habilitação exigidas para o fornecimento de bem ou a execução de serviço ou obra nos prazos, locais e condições previamente estabelecidos; e II - bens que atendam às exigências técnicas e de qualidade da administração pública.
O procedimento de pré-qualicação cará permanentemente aberto para a inscrição dos eventuais interessados e terá validade de um ano, no máximo, podendo a administração pública realizar licitação restrita aos pré-qualicados, nas condições estabelecidas em regulamento.
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O Decreto nº 7.581/11 assim regulamentou a questão: Art. 86. A administração pública poderá realizar licitação restrita aos pré-qualicados, justicadamente, desde que: I - a convocação para a pré-qualicação discrimine que as futuras licitações serão restritas aos pré-qualicados;
II - na convocação a que se refere o inciso I do caput conste estimativa de quantitativos mínimos que a administração pública pretende adquirir ou contratar nos próximos doze meses e de prazos para publicação do edital; e III - a pré-qualicação seja total, contendo todos os requisitos de habilitação técnica
necessários à contratação.
§1º O registro cadastral de pré-qualicados deverá ser amplamente divulgado e deverá
estar permanentemente aberto aos interessados, obrigando-se a unidade por ele responsável a proceder, no mínimo anualmente, a chamamento público para a atualização dos registros existentes e para o ingresso de novos interessados. §2º Só poderão participar da licitação restrita aos pré-qualicados os licitantes que, na
data da publicação do respectivo instrumento convocatório:
I - já tenham apresentado a documentação exigida para a pré-qualicação, ainda que o pedido de pré-qualicação seja deferido posteriormente; e
II - estejam regularmente cadastrados. §3º No caso de realização de licitação restrita, a administração pública enviará convite por meio eletrônico a todos os pré-qualicados no respectivo segmento.
§4º O convite de que trata o §3º não exclui a obrigação de atendimento aos requisitos de publicidade do instrumento convocatório. A pré-qualicação poderá ser parcial ou total, contendo os requisitos de habi-
litação ou técnicos necessários à contratação em parte ou sua totalidade, sempre garantida a igualdade de condições entre os concorrentes. Por sua vez, os registros cadastrais poderão ser mantidos para efeito de habilitação dos inscritos em procedimentos licitatórios e serão válidos por 1 (um) ano, no máximo, podendo ser atualizados a qualquer tempo.
15.8 Procedimento O RDC incorpora muitos procedimentos já utilizados no pregão, disciplinado pela Lei nº 10.520/2002, como, por exemplo: a realização sob a forma eletrônica, os modos de disputa aberto ou fechado, e a análise das propostas antes da avaliação da habilitação dos licitantes. Considerando o longo período decorrido desde a aprovação da Lei nº 8.666, em 1993, e as evoluções tecnológicas surgidas, já era momento de modernização de algumas práticas, principalmente se forem levados em conta os benefícios já constatados com o advento do pregão. Entretanto, vale lembrar que a obra pública difere substancialmente de um bem ou serviço comum, visto que exige o deslocamento da indústria para o local do produto e, por esse motivo, deve considerar todas as características locais especícas
e que o sucesso da contratação só é atestado com o recebimento de todos os serviços relacionados no prazo, qualidade e custo estabelecidos.
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15.8.1 Análise das propostas previamente à avaliação da habilitação O procedimento de licitação para as obras passíveis de serem licitadas pelo RDC foi ajustado, em seu art. 12, em relação à Lei nº 8.666/93. A regra é a apresentação de propostas ou lances e devido julgamento antes da fase de habilitação, com vistas a facilitar o trabalho da comissão de licitação que precisará se deter apenas na avaliação da habilitação da proposta, em princípio, vencedora. Não obstante, ainda é possível realizar a habilitação em primeiro lugar, caso exista ato motivado e seja expressamente previsto no instrumento convocatório. Nesse caso, o Decreto nº 7.581/11, no art. 50, registra as seguintes exigências: os licitantes apresentarão simultaneamente os documentos de habilitação e as propostas; serão vericados os documentos de habilitação de todos os licitantes; e serão julgadas apenas as propostas dos licitantes habilitados. Importante considerar que, no caso da contratação integrada, a análise das propostas não será tão simples quanto nos demais regimes de execução, visto que as comissões de licitação terão por base de comparação apenas o anteprojeto da administração pública, o que poderá exigir tempo mais longo de análise, inclusive pelo fato do critério de julgamento obrigatório ser o de técnica e preço. Nesse caso, vale a pena avaliar com cautela a melhor ordem do procedimento. Em regra, nos termos do art. 27 do RDC, o procedimento licitatório terá uma fase recursal única, que se seguirá à habilitação do vencedor, momento em que serão analisados os recursos referentes ao julgamento das propostas ou lances e à habilitação do vencedor. A exceção ocorrerá quando a análise da habilitação anteceder a apresentação das propostas.
15.8.2 Modo e forma de disputa As licitações deverão ser conduzidas preferencialmente sob a forma eletrônica, admitida a presencial. O RDC autoriza, nos artigos 16 e 17, a realização dos modos de disputa aberto e fechado, que poderão ser combinados na forma do regulamento, que disporá sobre os procedimentos de apresentação de propostas ou lances, observado o seguinte: 210
I - no modo de disputa aberto, os licitantes apresentarão suas ofertas por meio de lances públicos e sucessivos, crescentes ou decrescentes, conforme o critério de julgamento adotado; II - no modo de disputa fechado, as propostas apresentadas pelos licitantes serão sigilosas até a data e hora designadas para que sejam divulgadas; e III - nas licitações de obras ou serviços de engenharia, após o julgamento das propostas, o licitante vencedor deverá reelaborar e apresentar à administração pública, por meio eletrônico, as planilhas com indicação dos quantitativos e dos custos unitários, bem como do detalhamento das Bonicações e Despesas Indiretas – BDI e dos Encargos Sociais – ES, com os respectivos valores adequados ao lance vencedor.
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Art. 24 do Decreto nº 7.581/11: “Os modos de disputa poderão ser combinados da seguinte forma: I - caso o procedimento se inicie pelo modo de disputa f echado, serão classicados para a etapa subsequente os licitantes que apresentarem as três melhores propostas, iniciando-se então a disputa aberta com a apresentação de lances sucessivos, nos termos dos arts. 18 e 19; e II - caso o procedimento se inicie pelo modo de disputa aberto, os licitantes que apresentarem as três melhores propostas oferecerão propostas nais, fechadas”.
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Poderão, ainda, ser admitidos, nas condições estabelecidas em regulamento: a apresentação de lances intermediários, durante a disputa aberta; e o reinício da
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disputa aberta, após a defnição da melhor proposta e para a defnição das demais
colocações, sempre que existir uma diferença de pelo menos 10% entre o melhor lance e o do licitante subsequente. Aliás, o TCU formulou recomendação à entidade pública para que “quando vier a estabelecer um intervalo mínimo de diferença de valores entre os lances, tal qual regrado pelo art. 17, §1º, inciso I, da Lei 12.462/2011, preveja mecanismos que coíbam a possibilidade de eventual licitante — que venha sistematicamente ofertando propostas intermediárias — de cobrir o menor preço por desconto irrisório, como, por exemplo, obrigando a apresentação de lances com intervalo mínimo aplicado, tanto com relação às propostas de cada licitante, como também com relação à melhor proposta, no caso de o lance intentar cobrir o menor preço” (TCU. Acórdão nº 306/2013, Plenário. Rel. Min. Valmir Campelo. DOU , 22 jun. 2013). Em orientação similar, recomendou que o órgão, ao estabelecer um intervalo mínimo de diferença de valores entre os lances, tal qual regrado pelo art. 17, §1º, inciso I da Lei nº 12.462/2011, preveja mecanismos que coíbam a possibilidade de eventual licitante — que venha sistematicamente ofertando propostas intermediárias — de cobrir o menor preço por desconto irrisório, como, por exemplo, obrigando a apresentação de lances com intervalo mínimo aplicado, tanto com relação às propostas de cada licitante, como também com relação à melhor proposta, no caso de o lance intentar cobrir o menor preço (TCU. Acórdão nº 1.442/2013, Plenário. Rel. Min. Raimundo Carreiro. DOU , 19 jun. 2013). Tais orientações vieram subsidiar a alteração do Decreto nº 7.581/11 por meio do Decreto nº 8.080/13, que passou a contar com o seguinte parágrafo único no art. 18: “O instrumento convocatório poderá estabelecer intervalo mínimo de diferença de valores entre os lances, que incidirá tanto em relação aos lances intermediários quanto em relação à proposta que cobrir a melhor oferta”. Vale mencionar que a Instrução Normativa nº 5 – SLTI/MPOG, de 07.11.2013, estabeleceu procedimentos para a operacionalização do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), na forma eletrônica: Art. 1º Na fase competitiva do Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC, em sua forma eletrônica, o intervalo entre os lances enviados pelo mesmo licitante não poderá ser inferior a 20 (vinte) segundos e o intervalo entre lances não poderá ser inferior a 3 (três) segundos. Art. 2º O instrumento convocatório poderá estabelecer intervalo mínimo de diferença de valores entre lances, que incidirá tanto em relação aos lances intermediários quanto em relação à proposta que cobrir a melhor oferta. Art. 3º Os lances enviados em desacordo com o artigo 1º desta Instrução Normativa serão descartados automaticamente pelo sistema. 211
Art. 20 do Decreto nº 7.581/11: “O instrumento convocatório poderá estabelecer a possibilidade de apresentação de lances intermediários pelos licitantes durante a disputa aberta. Parágrafo único. São considerados intermediários os lances: I - iguais ou inferiores ao maior já ofertado, mas superiores ao último lance dado pelo próprio licitante, quando adotado o julgamento pelo critério da maior oferta de preço; ou II - iguais ou superiores ao menor já ofertado, mas inferiores ao último lance dado pelo próprio licitante, quando adotados os demais critérios de julgamento”.
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§1º Em caso de falha no Sistema, os lances em desacordo com a norma deverão ser desconsiderados pelo presidente da comissão de licitação do RDC, devendo a ocorrência ser comunicada imediatamente à Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. §2º Na hipótese do §1º, a ocorrência será registrada em campo próprio do sistema. Art. 4º No caso de instabilidade no sistema, no decorrer da etapa de lances, se ele permanecer acessível aos licitantes, os lances continuarão sendo recebidos, sem prejuízo dos atos realizados. Parágrafo único. Quando a instabilidade no sistema persistir por tempo superior a dez minutos, a sessão pública do procedimento licitatório do RDC, na forma eletrônica, será suspensa e reiniciada somente após comunicação aos participantes, no endereço eletrônico utilizado para divulgação. Art. 5º Na hipótese do art. 3º, não será reiniciada a etapa de lances caso o presidente da comissão de licitação do RDC tenha encerrado a sessão de julgamento. Art. 6º Esta Instrução Normativa entra em vigor após decorridos noventa dias de sua publicação.
Por m, no caso de participação de microempresa ou empresa de pequeno porte, nos termos da Lei Complementar nº 123/2006, deve ser dada a preferência a esta caso a proposta apresentada seja igual ou até dez por cento superior à proposta mais bem classicada, com a possibilidade de apresentação de nova proposta de preço inferior, nos termos dos art. 38 do Decreto nº 7.581/2011.
15.8.3 Análise das propostas e negociação O art. 24 do RDC autoriza a vericação da conformidade apenas da proposta mais bem classicada e estabelece que serão desclassicadas aquelas que: I - contenham vícios insanáveis; II - não obedeçam às especicações técnicas pormenorizadas no instrumento convocatório; III - apresentem preços manifestamente inexequíveis ou permaneçam acima do orçamento estimado para a contratação, inclusive nas hipóteses previstas no art. 6º desta Lei; IV - não tenham sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela administração pública; ou V - apresentem desconformidade com quaisquer outras exigências do instrumento convocatório, desde que insanáveis.
Especial destaque deve ser dado à expressão “permaneçam acima do orçamento”, inserida no inciso III, visto que o legislador reconhece a probabilidade da comissão de licitação ter que negociar com a empresa vencedora o ajuste dos preços recebidos aos parâmetros denidos pela Administração, em especial nas oportunidades em que o orçamento-base for sigiloso. O art. 40, §2º, do regulamento estabelece: [...] nas licitações de obras ou serviços de engenharia, o licitante da melhor proposta apresentada deverá reelaborar e apresentar à comissão de licitação, por meio eletrônico, conforme prazo estabelecido no instrumento convocatório, planilha com os valores adequados ao lance vencedor, em que deverá constar:
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
a) indicação dos quantitativos e dos custos unitários, vedada a utilização de unidades genéricas ou indicadas como verba; b) composição dos custos unitários quando diferirem daqueles constantes dos sistemas de referências adotados nas licitações; e c) detalhamento das Bonicações e Despesas Indiretas – BDI e dos Encargos Sociais – ES.
O art. 41 estabelece fórmula para o cálculo da inexequibilidade idêntica àquela denida no art. 48 da Lei nº 8.666, sendo, portanto, válidas todas as observações feitas
no item 8.6.2 deste livro. Para a avaliação da aceitabilidade das propostas, o art. 42 do Decreto nº 7.581/2011 trouxe uma consolidação dos comandos insculpidos na Lei de Diretrizes Orçamentárias vigente à época, também já vistos no item 8.6.1 deste livro, com alguns ajustes em função do regime de execução escolhido: 212
§1º O valor global da proposta não poderá superar o orçamento estimado pela administração pública, com base nos parâmetros previstos nos §§3º, 4º ou 6º do art. 8º da Lei nº 12.462, de 2011, e, no caso da contratação integrada, na forma estabelecida no art. 9º, §2º, inciso II, da Lei nº 12.462, de 2011. (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) §2º No caso de adoção do regime de empreitada por preço unitário ou de contratação por tarefa, os custos unitários dos itens materialmente relevantes das propostas não podem exceder os custos unitários estabelecidos no orçamento estimado pela administração pública, observadas as seguintes condições: I - serão considerados itens materialmente relevantes aqueles de maior impacto no valor total da proposta e que, somados, representem pelo menos oitenta por cento do valor total do orçamento estimado ou que sejam considerados essenciais à funcionalidade da obra ou do serviço de engenharia; e (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) II - em situações especiais, devidamente comprovadas pelo licitante em relatório técnico circunstanciado aprovado pela administração pública, poderão ser aceitos custos unitários superiores àqueles constantes do orçamento estimado em relação aos itens materialmente relevantes, sem prejuízo da avaliação dos órgãos de controle, dispensada a compensação em qualquer outro serviço do orçamento de referência; (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) §3º Se o relatório técnico de que trata o inciso II do §2º não for aprovado pela administração pública, aplica-se o disposto no art. 62, salvo se o licitante apresentar nova proposta, com adequação dos custos unitários propostos aos limites previstos no §2º, sem alteração do valor global da proposta. §4º No caso de adoção do regime de empreitada por preço global ou de empreitada integral, serão observadas as seguintes condições: I – no cálculo do valor da proposta, poderão ser utilizados custos unitários diferentes daqueles previstos nos §§3º, 4º ou 6º do art. 8º da Lei nº 12.462, de 2011, desde que o valor global da proposta e o valor de cada etapa prevista no cronograma físico-nanceiro seja
igual ou inferior ao valor calculado a partir do sistema de referência utilizado; II - em situações especiais, devidamente comprovadas pelo licitante em relatório técnico circunstanciado, aprovado pela administração pública, os valores das etapas do cronograma físico-nanceiro poderão exceder o limite xado no inciso I; e
III - as alterações contratuais sob alegação de falhas ou omissões em qualquer das peças, orçamentos, plantas, especicações, memoriais ou estudos técnicos preliminares do projeto
básico não poderão ultrapassar, no seu conjunto, dez por cento do valor total do contrato. 212
Ver Lei nº 12.465/2011 (LDO/2012).
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§5º No caso de adoção do regime de contratação integrada, deverão ser previstos no instrumento convocatório critérios de aceitabilidade por etapa, estabelecidos de acordo com o orçamento estimado na forma prevista no art. 9º da Lei nº 12.462, de 2011, e compatíveis com o cronograma físico do objeto licitado. ( Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013) §6º O orçamento estimado das obras e serviços de engenharia será aquele resultante da composição dos custos unitários diretos do sistema de referência utilizado, acrescida do percentual de BDI de referência, ressalvado o disposto no art. 9º da Lei nº 12.462, de 2011, para o regime de contratação integrada. (Redação dada pelo Decreto nº 8.080, de 2013)
Em suma, a escolha do regime de execução impacta nos critérios de aceitabilidade de preços: a) No preço unitário – priorizam-se os critérios de aceitabilidade de preço global e unitário; b) No preço global – o foco da análise estará nos preços global e por etapa do cronograma da obra; c) Na contratação integrada – por não haver orçamento detalhado, vez que a Administração dispõe apenas de anteprojeto, a avaliação será feita por preço global, mas serão limitados os percentuais a serem pagos por etapa. Questão que merece reexão refere-se ao procedimento a ser adotado pela comissão de licitação para a avaliação das propostas quando, na prática, as licitantes não tiveram acesso ao orçamento-base da administração, visto seu caráter sigiloso. Serão considerados para efeito de avaliação da exequibilidade e de sobrepreço o preço global, os quantitativos e os preços unitários considerados relevantes, conforme dispuser o regulamento. Nesse caso, a comissão deverá: a) Sempre tentar negociar condições mais vantajosas com o primeiro colocado, nos termos do art. 26 do RDC, com destaque para as situações em que o preço base divulgado for inferior ao do primeiro colocado. A lei estabelece que “a negociação poderá ser feita com os demais licitantes, segundo a ordem de classicação inicialmente estabelecida, quando o preço do primeiro colocado, mesmo após a negociação, for desclassicado por sua proposta permanecer acima do orçamento estimado”; e b) Avaliar com cautela as situações em que for constatada possível inexequibilidade da proposta de menor preço, devendo realizar diligências para aferir a exequibilidade dessa proposta ou exigir do licitante que ela seja demonstrada. Agrava-se a diculdade da negociação se for considerado que no regime de contratação integrada o próprio valor denido pela administração foi calculado com base em anteprojeto, o que traz boa margem de imprecisão. A análise da exequibilidade ou do sobrepreço dos valores unitários dos serviços exigirá atenção redobrada, visto que não haverá no orçamento-base da administração valores unitários consistentes denidos no anteprojeto e existe a possibilidade do orçamento vencedor se situar em patamar bem superior ou inferior ao preço-base da administração. Mas como manter o sigilo do orçamento-base na fase de negociação? O TCU se deparou na análise de caso que tratava de possível quebra de sigilo exatamente nessa fase. O motivo alegado foi a proximidade do preço contratado em comparação ao de referência da Administração. O encaminhamento dado à matéria pelo Relator acolheu a tese de que existem situações em que não há como manter, de modo judicioso e a estrito rigor, o sigilo na fase de negociação:
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
Se a “menor proposta” (em casos de licitações pelo menor preço) for superior ao valor máximo admitido, existem duas possibilidades: a primeira é de, na fase de negociação, a licitante abaixar sucessivamente seu preço para tentar atingir a “cota” permitida, em um processo de tentativas e erros — quase um jogo de “quente e frio”. Na prática, o “sigilo” seria quebrado no exato momento em que o preço atingir o teto de contratação. Nessa hipótese, a manutenção do sigilo só tornou o processo mais moroso, situação que, na busca pela eciência (princípio explícito do RDC), inclusive no que se refere ao tempo
para contratação, parece-me um contrassenso. A outra hipótese é que, após consecutivas tentativas, a licitante não atinja o preço máximo admitido. A licitação restar-se-ia, então, fracassada. O próximo passo, por óbvio, seria empreender uma nova análise do orçamento, de modo a vericar-lhe a exequibilidade.
Caso se decida, porém, pela manutenção do preço paradigma, a Administração correrá o risco de, novamente, ter o certame mal sucedido. Quantas licitações, no âmbito da Lei 8.666/93, contudo, não foram “salvas” por argumentos pertinentes porados pelos licitantes na fase de impugnações — inclusive com relação ao orçamento base? Ademais, a desclassicação decorrente de preço global superior ao estimado (art. 42, §1º, do Decreto 7581/2011) deve se basear em uma presunção relativa (juris tantum). Por corolário processual, a licitante tem o direito de provar a factibilidade de sua
proposta. Nesse contraditório, por que não poderia, também, provar que o orçamento da administração é que está inexequível? Faria sentido repetir todo o ritual licitatório baseado em um orçamento irreal (pelo menos em potencial)? As respostas, acredito, serão dadas de acordo com as nuanças de cada contratação. (TCU. Acórdão nº 306/2013, Plenário. Rel. Min Valmir Campelo. DOU , 07 mar. 2013)
15.9 Contrato e execução A execução e scalização dos contratos celebrados com base no RDC serão, em
regra, regidos pelas diretrizes estabelecidas na Lei nº 8.666/93, com exceção das regras especícas previstas no próprio regulamento, nos termos estabelecidos pelo art. 39 da
Lei nº 12.462/11. Por esse motivo, vale a leitura do Capítulo 10 deste livro. As principais exceções serão tratadas a seguir. O primeiro comando interessante é a obrigatoriedade de existência do projeto executivo para realização de obras e serviços de engenharia, qualquer que seja o regime de execução denido para o contrato, nos termos do art. 8º, §7º, do RDC. Para os aditivos rmados em contratos cujo regime de execução é o de contratação integrada, consoante art. 9º, §4º, do RDC, cou vedada a celebração de qualquer termo,
exceto nos seguintes casos: I - para recomposição do equilíbrio econômico-nanceiro decorrente de caso fortuito ou
força maior; e II - por necessidade de alteração do projeto ou das especicações para melhor adequação
técnica aos objetivos da contratação, a pedido da administração pública, desde que não decorrentes de erros ou omissões por parte do contratado, observados os limites previstos no §1º do art. 65 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.
Para o regime de execução por preço global ou por empreitada integral, as alterações contratuais sob alegação de falhas ou omissões em qualquer das peças,
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orçamentos, plantas, especicações, memoriais ou estudos técnicos preliminares do projeto básico não poderão ultrapassar, no seu conjunto, dez por cento do valor total do contrato. No aspecto relativo aos preços dos aditivos, “a diferença percentual entre o valor global do contrato e o obtido a partir dos custos unitários do orçamento estimado pela administração pública não poderá ser reduzida, em favor do contratado, em decorrência de aditamentos contratuais que modiquem a composição orçamentária” (art. 42, §7º, do Decreto nº 7.581/11). Nos termos estabelecidos pelo art. 42 do RDC, os contratos para a execução das obras previstas no plano plurianual poderão ser rmados pelo período nele compreendido, observado o disposto no caput do art. 57 da Lei nº 8.666/93. Entretanto, em relação à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, o RDC inova ao permitir que os contratos poderão ter sua vigência estabelecida até a data da extinção da APO. As sanções administrativas caram mais severas, com a possibilidade de aplicação de pena de impedimento de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, pelo prazo de até cinco anos, sem prejuízo das multas previstas no instrumento convocatório e no contrato, bem como das demais cominações legais, para o licitante que: 213
I - convocado dentro do prazo de validade da sua proposta não celebrar o contrato, inclusive nas hipóteses previstas no parágrafo único do art. 40 e no art. 41 desta Lei; II - deixar de entregar a documentação exigida para o certame ou apresentar documento falso; III - ensejar o retardamento da execução ou da entrega do objeto da licitação sem motivo justicado; IV - não mantiver a proposta, salvo se em decorrência de fato superveniente, devidamente justicado; V - fraudar a licitação ou praticar atos fraudulentos na execução do contrato; VI - comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude scal; ou VII - der causa à inexecução total ou parcial do contrato.
Os contratos de eciência, consoante art. 67 do Decreto nº 7.581/11, deverão prever que nos casos em que não for gerada a economia estimada: I - a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida será descontada da remuneração do contratado; II - será aplicada multa por inexecução contratual se a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida for superior à remuneração do contratado, no valor da referida diferença; e III - aplicação de outras sanções cabíveis, caso a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida seja superior ao limite máximo estabelecido no contrato.
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Ver art. 42, §4º, III, do Decreto nº 7.581/11.
CAPÍTULO 15 REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
Uma questão muito importante também foi resolvida pelo RDC: a contratação do remanescente de obra. Esse normativo permite que, na hipótese do inciso XI do art. 24 da Lei nº 8.666/93, a contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento de bens em consequência de rescisão contratual seja feita na ordem de classicação dos licitantes remanescentes e nas condições por eles ofertadas, desde que não
seja ultrapassado o orçamento estimado para a contratação.
15.10 Considerações nais O RDC traz diversas inovações que deverão ser incorporadas em breve à Lei nº 8.666/93. O desenvolvimento da tecnologia da informação desde 1993, ano de aprovação da norma geral de licitações, exigia há algum tempo que o procedimento de contratação se aproveitasse dessas vantagens para se tornar mais célere e eciente.
A inversão de fases, o processamento eletrônico, a fase recursal única, a possi bilidade de lances sucessivos e, até mesmo, a utilização de orçamento sigiloso, já foram testados com sucesso no pregão. Mas o RDC foi além. Trouxe a possibilidade de contratação da obra com base em anteprojeto de engenharia. Sem dúvida, existem pontos favoráveis e contrários a esse tipo de contratação integrada. Só o tempo irá denir se a decisão política adotada foi o
melhor caminho para assegurar o sucesso de execução das obras públicas.
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CAPÍTULO 16
GOVERNANÇA E GESTÃO DAS OBRAS PÚBLICAS
Sumário: 16.1 Considerações iniciais – 16.2 Governança
e gestão – 16.3 Princípios e ferramentas para a governança – 16.3.1 Prestação de contas – 16.3.2 Planejamento estratégico institucional – 16.3.3 Conselhos ou comitês estratégicos de acompanhamento – 16.3.4 Ferramentas para execução da estratégia – 16.3.5 Gestão de riscos – 16.3.6 Sistema de controles – 16.4 Gestão e gerenciamento de projetos – 16.5 Governança e gestão nas obras públicas rodoviárias – 16.5.1 Análise de projetos – 16.5.2 Aplicação de penalidades a empresas – 16.5.3 Fiscalização e medição de obras rodoviárias – 16.5.4 Pouca integração entre os setores – 16.5.5 Deciências nos sistemas de informações gerenciais – 16.6 Governança em convênio de obras públicas – 16.7 Caminhos para a boa gestão e governança nas obras públicas
16.1 Considerações iniciais O presente trabalho, desde sua edição inicial, buscou fornecer a todos aqueles que atuam na área das obras públicas subsídios relevantes para o correto encaminhamento do processo de licitação e contratação. Carecia, entretanto, de um capítulo que tratasse de forma mais direta sobre os meios para evitar a maioria dos problemas atinentes à execução desses empreendimentos: faltava falar sobre governança e gestão de obras públicas. Em muitos trechos deste livro, foram destacados pontos relevantes a respeito do tema, mas ainda havia espaço para uma abordagem sistêmica e voltada diretamente para a solução, na origem, das impropriedades e irregularidades. O TCU tem percebido e indicado que a solução denitiva para a transformação
do atual cenário pouco animador das obras públicas no Brasil passará necessariamente por discussão efetiva acerca das disciplinas contempladas neste capítulo. Em voto no proferido no Plenário do TCU, o Exmo. Sr. Ministro-Substituto Augusto Sherman armou:
[...] diante de mais um caso detectado por este Tribunal — e são eles inúmeros — de
ocorrência de irregularidades graves, porque não dizer gravíssimas, na execução de obra pública, de grande monta e de grande relevância, em razão de deciências em projeto básico, grosseiras e vergonhosas, para dizer o mínimo, co me perguntando até quando
viveremos essa situação no Brasil. Até quando? Quando serão verdadeiramente envidados
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CLÁUDIO SARIAN ALTOUNIAN OBRAS PÚBLICAS – LICITAÇÃO, CONTRATAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
esforços para melhorar, de fato, os projetos, a gestão e a governança das obras públicas brasileiras? [...] A meu ver, a hora já passou. (TCU. Acórdão nº 2.910/2012, Plenário. Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti. DOU , 05 nov. 2011)
Sem dúvida alguma, a construção de sistemas ecientes de governança e gestão é o atual desao de todos os órgãos e entidades públicas para solucionar denitivamente o problema das recorrentes irregularidades, atrasos, obras inacabadas ou empreendimentos inservíveis.
16.2 Governança e gestão Mas, o que é governança? E o que é gestão? Representam o mesmo conceito? Não há consenso sobre o que seja governança, mas está claro que governança e gestão não são expressões sinônimas. Apesar disso, pode-se dizer com segurança que são conceitos próximos, ideias indissociáveis entre si. Gestão relaciona-se de forma direta com gerenciamento. Diz respeito à maneira como devem ser planejados, organizados, dirigidos e coordenados os recursos humanos, materiais e tecnológicos para a obtenção dos resultados desejados por um uma organização, projeto ou programa, sempre com ênfase no atendimento às necessidades do cliente e/ou na lucratividade da atividade. O foco da gestão é a eciência do uso dos recursos e a ecácia dos processos de trabalho. Governança está associada à gestão, mas com ênfase na transparência e controle do uso dos recursos e no atendimento às necessidades e interesses dos diversos segmentos interessados (stakeholders) na atividade de determinado sistema produtivo (organização, projeto, programa ou política pública). Qualquer organização, pública ou privada, é criada com o objetivo de suprir alguma necessidade humana por meio da produção e oferta de bens ou serviços. Para tanto, necessário se faz o aporte de recursos para que a os resultados esperados pelos investidores apareçam. Tais recursos, embora aportados pelos sócios ou condôminos, por exemplo, são gerenciados por outras pessoas, os dirigentes, gestores, diretores, governantes. Do ponto de vista da governança, essas são as duas guras relevantes no processo produtivo. Os que administram os recursos de outrem e os que colocam seus recursos nas mãos dos primeiros para que os administrem. Os primeiros são os gestores, gerentes, síndicos, governantes ou diretores, chamados de “agentes”. Essas pessoas têm governabilidade sobre os recursos da organização, do programa, do projeto, da política pública; tomam decisão sobre como dispor dos recursos para o melhor alcance dos resultados. De outro lado, situa-se o grupo de nanciadores do processo produtivo sem capacidade gerencial e com baixa capacidade de decidir sobre os rumos a tomar, que podem ser chamados de “principais”. São acionistas minoritários, condôminos, cidadãos, que esperam que seus recursos sejam aplicados de modo eciente e transparente na busca dos objetivos esperados. Porém, como é fácil perceber, os interesses do “agente” e do “principal” nem sempre são convergentes ou coincidentes; em alguns casos, são até contraditórios. A essa tensão de interesses, que conduz à real possibilidade de o gestor agir em favor de si mesmo e em oposição ao principal, a quem deveria originariamente servir, chamouse “conito de agência”.
CAPÍTULO 16 GOVERNANÇA E GESTÃO DAS OBRAS PÚBLICAS
Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), a Governança Corporativa surgiu para superar o “conito de agência”, decorrente da separação
entre a propriedade e a gestão empresarial. Trata-se de um conjunto de mecanismos de incentivo e de acompanhamento instituídos com a nalidade de assegurar que o
comportamento dos executivos esteja sempre alinhado com o interesse dos acionistas. Mantém nas mãos dos “Principais” a gestão estratégica da organização e o monitoramento da direção executiva. No mundo empresarial, as principais ferramentas que asseguram o controle dos proprietários sobre os gestores são o conselho de administração, a auditoria independente e o conselho scal.
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Na esfera pública, a composição de todos os atores é um pouco mais complexa, o que amplia a relevância da abordagem em governança. O cidadão, como célula fundamental da sociedade, é o principal “acionista” do Estado e precisa ter assegurado que as autoridades eleitas e os gestores escolhidos desempenhem a contento o papel esperado e entreguem os resultados prometidos. Em face da complexidade da máquina estatal, foi criada estrutura de controle internos, externo e social que possa viabilizar a qualidade do gasto público. Apesar de, como já armado, não haver uma denição consensual a respeito
de governança, é possível associá-la a um grupo de instrumentos que maximizem a probabilidade de o comportamento do “Agente” ocorrer de acordo com os interesses do “Principal” e que possibilitem a correção tempestiva dos problemas, nos casos em que isso não acontecer. Governança, portanto, é o conjunto de princípios e práticas ou ferramentas de pressão, controle e gestão a serviço daqueles que não têm o controle direto sobre a execução, mas tem interesse nos seus resultados e algum poder sobre os executivos, que têm, esses sim, controle direto sobre a execução das atividades de um sistema produtivo. Assim, pensar a realidade das obras públicas com o olhar de governança é ver o empreendimento sob a ótica dos diversos interessados: o cidadão contribuinte, que têm o direito a informações sobre o uso das verbas públicas e à gestão honesta e eciente; as
empresas fornecedoras que fazem jus à licitação isonômica; e, principalmente, o público beneciário do serviço ou da facilidade fornecido com a obra.
O administrador público responsável por atividades que envolvem obras públicas, deve, portanto, sob a inspiração da ideia de governança, planejar e executar as obras não como um m em si mesmas, mas como um meio para o atingimento de uma nalidade pública, dentro dos princípios da transparência, economicidade, e isonomia.
A construção de uma escola, por exemplo, deve ser pensada como parte da oferta de serviços educacionais; uma ponte, como parte de um sistema de transporte/mobilidade; um hospital, como meio para a redução da mortalidade; e assim por diante. Obra inacabada, portanto, deve ser associada com menor número de crianças alfabetizadas, maiores custos de transporte ou maior mortalidade da população. Excelente exemplo da ausência de sincronia entre os diversos contratos afetos a um empreendimento público pode ser ilustrado em scalização realizada pelo TCU,
“com vistas a avaliar o cumprimento e a sincronia do cronograma para a entrada em operação dos empreendimentos de geração e transmissão de energia outorgados a 214
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partir de 2005, bem como os impactos de eventuais atrasos e descompassos dessas obras sobre o Sistema Elétrico Brasileiro (SEB) e os mecanismos existentes para coibir tais ocorrências”. Os diversos achados encontrados demonstram a fragilidade da coordenação das contratações: 9.3 dar ciência à Casa Civil da Presidência da República, na qualidade de responsável pela articulação interinstitucional, que, considerando os empreendimentos leiloados e/ ou autorizados no período entre 2005 a 2012, foram constatados: 9.3.1 atrasos sistêmicos signifcativos na entrada em operação dos empreendimentos de geração e transmissão de energia elétrica. Na geração, ocorreram atrasos em 79% dos empreendimentos de hidrelétricas (atraso médio de oito meses), em 75% de térmicas (atraso médio de onze meses), em 88% de eólicas (atraso médio de dez meses) e em 62% de pequenas centrais hidrelétricas (atraso médio de quatro meses). Na transmissão, ocorreram atrasos em 83% das linhas de transmissão (atraso médio de quatorze meses) e em 63% das subestações (atraso médio de três meses); 9.3.2 casos relevantes de atrasos e descompassos entre as datas de entrada em operação dos empreendimento de geração e transmissão de energia elétrica, a seguir relatados, o que causou impacto sobre a segurança no suprimento de energia – em setembro de 2013, 3.439,18 MWmédios deixaram de entrar no SIN – e gerou custos desnecessários ao sistema elétrico brasileiro da ordem de R$ 8,3 bilhões, ferindo, assim, o art. 37 da Constituição Federal de 1988, na medida em que ocasiona inefciência econômica e energética para o sistema elétrico brasileiro: 9.3.2.1 uso de óleo quando há gás e hídrica disponível: o parque energético de Manaus, por não ter convertido as usinas para usar o gás, paga por 5,5 milhões m3 de gás natural, contudo, só consome 2,7 milhões m3. Dispõe de infraestrutura para transportar energia de fonte hídrica, mas como é subutilizada, continua usando óleo diesel e óleo combustível, mais caro e poluente (Custo R$ 3,2 bilhões – Janeiro 2011 a Dezembro 2013); 9.3.2.2 Linha de Transmisão Tucuruí-Manaus-Macapá: é subutilizada no abastecimento de Manaus, tem capacidade de transportar 2.500 MW, mas só transporta 35 MW. Em Macapá, embora concluída, sequer é utilizada. Essa situação é devida a ausência de obras complementares como para recepcionar a energia que passaria pela LT vinda da hidrelétrica de Tucuruí (Custo R$ 179 milhões – Junho a Dezembro de 2013); 9.3.2.3 demora na emissão de outorga: as térmicas a gás e carvão tiveram sua entrada em operação postergada face à demora em emitir suas outorgas, como UTE Itaqui, Pecém I e II, Maranhão IV e V, o que obrigou as distribuidoras a recorrer ao mercado de curto prazo para suprir os contratos adiados (Custo R$ 735 milhões – Janeiro 2012 a Setembro 2013); 9.3.2.4 geração sem transmissão: 48 usinas eólicas (RN e BA), com 1.262 MW, estão aptas a entrarem em operação desde julho de 2012 (Custo R$ 929 milhões – julho 2012 a dezembro 2013); seis usinas de biomassa em GO, MS e MT, com capacidade 568 MW, somente puderam iniciar a operação decorridos dois anos da conclusão das instalações (Custo R$ 247,8 milhões – Agosto 2009 a fevereiro 2013); a UHE Dardanelos, com capacidade instalada de 261 MW, embora sem custos repassados ao consumidor, fcou seis meses sem poder gerar energia; 9.3.2.5 interligação incompleta do sistema Acre-Rondônia: pelo fato dessa interligação ter sido parcial as térmicas permaneceram ligadas, em especial a UTE Termonorte II, encarecendo ainda mais o sistema por meio da cobrança do Encargo de Serviço do Sistema por restrição de operação (Custo R$ 2,6 bilhões – Novembro 2009 a Dezembro 2013); e 9.3.2.6 Complexo do Madeira: o descompasso entre as obras da Linha de Transmissão do 1º bipolo e a entrada em operação das unidades geradoras das usinas Santo Antonio e Jirau (Custo R$ 320,8 milhões – Abril a Dezembro de 2013). (TCU. Acórdão nº 2.316/2014, Plenário. Rel. Min. José Jorge. DOU , 3 set. 2014)
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Talvez, o maior desao atual da gestão pública seja justamente implementar essa
visão, com a qual, espera-se, possam ser minimizados os problemas hoje constatados de obras inacabadas, de escolas sem professores, de hospitais sem médicos e equipamentos, de ferrovias sem terminais intermodais, e de usinas de produção de energia sem linhas de transmissão correspondentes. Em termos práticos, pensar em termos de governança, portanto, é adotar práticas que conduzam ao real atendimento dos diversos segmentos interessados na ação pública. São princípios e ferramentas que aumentam a probabilidade de sucesso em relação a esses diversos interessados.
16.3 Princípios e ferramentas para a governança De acordo com o IBGC, os princípios básicos de Governança Corporativa são Transparência, Equidade, Prestação de Contas (accountability), e Responsabilidade Corporativa. Transparência é o princípio segundo o qual compete ao principal informar aos demais segmentos interessados tudo que seja de seu interesse, independentemente de eventual obrigatoriedade de divulgação, o que resulta em um clima de conança in-
terna e externa. Deve abranger informações relativas a toda ação gerencial, não apenas aspectos nanceiros.
O Princípio da Equidade resulta na obrigação de tratamento justo e isonômico de todos os sócios e demais partes interessadas, sem atitudes ou políticas discriminatórias. O Princípio da Prestação de Contas (accountability) destaca o dever de prestação de contas de sua atuação pelos responsáveis pelo manejo de recursos de outras pessoas, assumindo integralmente as consequências de seus atos e omissões. Já o Princípio da Responsabilidade Corporativa preceitua que os agentes devem zelar pela sustentabilidade das organizações, visando a sua longevidade, incorporando considerações de ordem social e ambiental na denição dos negócios e operações.
A governança se realiza pelas ferramentas ou práticas, que materializam os princípios, seus norteadores, dando-lhes consequência prática. Não obstante as divergências doutrinárias no tocante ao conceito de governança, todas essas correntes concordam com a necessidade de um conjunto mínimo de ferramentas destacadas a seguir: 1. Estratégia formalmente estabelecida, consubstanciada em um Plano Estratégico que dena os rumos da organização (gestão da estratégia);
2. Conselhos ou Comitês Estratégicos de Acompanhamento; 3. Acompanhamento da execução da estratégia por meio de indicadores; 4. Gestão de riscos; 5. Sistema de controles para assegurar conformidade dos procedimentos e a conabilidade das informações;
6. Prestação de contas e transparência das informações.
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16.3.1 Prestação de contas A prestação de contas é uma das regras básicas do princípio republicano ( res = coisa + publica = do povo). Todos aqueles que gerenciam recursos públicos tem o dever de prestar contas à sociedade. Aliás, a importância desse conceito fez com que o legislador inserisse na Carta Magna o dever da prestação de contas (art. 70, parágrafo único), erigido à categoria de princípio constitucional (art. 34, VI, “d”).
16.3.2 Planejamento estratégico institucional Plano Estratégico representa a denição de um conjunto de objetivos e ações
a serem executados em médio e longo prazo, considerando o cenário externo e as condições internas, para que a organização alcance os resultados esperados a m de
cumprir a missão para a qual foi criada. É nesse plano que é clareado para todos os interessados o rumo a ser trilhado, com a denição de metas e indicadores no tempo,
e critérios de priorização. Em geral, modelos de planejamento estratégico não contém apenas o rol das “coisas a fazer ou a conquistar” e seus indicadores. Comtemplam denição de missão,
visão de futuro e de valores da organização, além do exame de seus pontos fortes e fracos. Comumente, o processo de planejamento também envolve a antevisão de cenários prospectivos, de oportunidades e ameaças do ambiente, a análise da atuação dos concorrentes atuais e futuros, a existência de produtos e serviços substitutos, dentre outras análises internas e ambientais, que subsidiam o processo de escolha estratégica da alta administração. Além de ferramenta de orientação da gestão, o plano estratégico congura
importante instrumento para governança, visto que serve aos diversos segmentos interessados na xação e vericação de rumos, antevisão de resultados, harmonização
de expectativas e acompanhamento da qualidade da gestão praticada por aqueles que estão a frente da organização. Importante ressaltar que todos os investimentos de alguma monta a serem realizados, inclusive em Obras Públicas, devem estar em consonância com o Plano Estratégico da organização. Ainda, empreendimentos que tenham sua execução com prazo superior a um exercício nanceiro devem ser aprovados pelo Legislativo no Plano
Plurianual (PPA), cujo objetivo, nos termos do art. 165 da Constituição Federal, é o de reduzir desigualdades inter-regionais, segundo critério populacional. Como exemplo de elemento de governança de obras voltado à dimensão do planejamento estratégico, destacamos a Resolução nº 114/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabelece: Art. 2º Os tribunais elaborarão o plano de obras, a partir de seu programa de necessidades, de seu planejamento estratégico e das diretrizes xadas pelo Conselho Nacional de Justiça,
atendendo a Resolução nº 102, de 15 de dezembro de 2009. §1º Cada obra terá o indicador de prioridade, obtido a partir da implantação de sistema de avaliação técnica que contemple, entre outros, os critérios de pontuação e de ponderação agrupados a seguir:
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I - Conjunto 1 – Estrutura física do imóvel ocupado. São critérios voltados à avaliação, por pontuação: a) Da cobertura e dos acabamentos (piso, parede, teto, fachada, esquadrias, entre outros); b) Das instalações elétricas, de voz, de dados e congêneres; c) Das instalações hidráulicas; d) Da segurança (grades, gradil, alarme, prevenção e combate a incêndio e congêneres); e) Das condições de ergonomia, higiene e salubridade; f) Da potencialidade de patologias da edicação (em função de sua idade e/ou do estado
de conservação); g) Da funcionalidade (setorização e articulação dos espaços); h) Da acessibilidade, da localização e interligação com os meios de transporte públicos; i) De outros critérios objetivos julgados pertinentes. II - Conjunto 2 – Adequação do imóvel à prestação jurisdicional. São critérios voltados à avaliação, por ponderação, do atendimento às necessidades da atividade jurisdicional, tendo em vista: a) A política estratégica do tribunal de substituição do uso de imóveis locados ou cedidos por próprios, com ênfase na adequação à prestação jurisdicional; b) A política estratégica do tribunal de concentração ou dispersão de sua estrutura física; c) A disponibilidade do espaço atual em relação aos referenciais de área indicados pelo Conselho Nacional de Justiça; d) A movimentação processual ao longo dos anos e a sua projeção para os próximos; e) A demanda da população atendida e o desenvolvimento econômico-social da região; f) Possíveis alterações da estrutura administrativa do tribunal, como a criação de novas varas ou o aumento do número de servidores e magistrados; g) A adoção de novas tecnologias (informática, eficiência energética, diretrizes de sustentabilidade, entre outros).
16.3.3 Conselhos ou comitês estratégicos de acompanhamento Os Conselhos ou comitês são grupos de pessoas eleitas ou indicadas a m de
representar os grupos interessados para o acompanhamento de aspectos da gestão da organização. Na área privada, destacam-se os Conselhos de Administração das empresas, obrigatórios para aquelas de capital aberto ou economia mista. Com efeito, a Lei nº 6.404/76 estabelece que:
Art. 138. A administração da companhia competirá, conforme dispuser o estatuto, ao conselho de administração e à diretoria, ou somente à diretoria. §1º O conselho de administração é órgão de deliberação colegiada, sendo a representação da companhia privativa dos diretores. §2º As companhias abertas e as de capital autorizado terão, obrigatoriamente, conselho de administração.
Já na área pública, percebemos a criação de Conselhos no âmbito das empresas estatais e também na própria Administração Direta. Como exemplo citamos o Comitê Estratégico de Gestão do Ministério da Fazenda, criado pela Portaria MF nº 369, de 28 de julho de 2011, ao qual compete,
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dentre outras atribuições, denir processo integrado de planejamento estratégico, garantindo-se o alinhamento das áreas Tecnologia da Informação e Comunicação, gestão de processos, gestão de projetos, e gestão de pessoas com a estratégia ministerial; monitorar a implementação e revisar periodicamente a estratégia ministerial; denir e institucionalizar mecanismos de comunicação da estratégia ministerial ao corpo funcional; e avaliar os resultados das ações realizadas na implementação da estratégia ministerial. O setor público tem-se utilizado desse tipo de grupo como instrumento de governança em diversas políticas sociais, com função, sobretudo, supervisora do uso de recursos públicos e da execução quantitativa e qualitativa de políticas públicas. Mencionamos, à guisa de exemplo, os Conselhos de Alimentação Escolar, Conselhos Municipais de Saúde, Conselhos de Controle Social do Bolsa Família e os Conselhos de Assistência Social. São grupos que representam os “Principais” (população) junto aos “Agentes” (poder público).
16.3.4 Ferramentas para execução da estratégia A indústria da construção apresenta uma característica peculiar em relação às demais: é a única que precisa se deslocar para o local em que o produto será executado. Isso traz a necessidade de um acompanhamento mais efetivo durante todo o prazo em que a obra estará sendo executada. Prazos, custos e qualidade precisam ser monitorados não apenas pelos gestores, mas também por todos os agentes interessados, em especial os Conselhos ou Comitês Estratégicos, para que aditivos elevados não inviabilizem o andamento do empreendimento. Mais ainda, devem ser criados mecanismos para que a população, caso deseje, também possa fazer o devido acompanhamento. Para tanto, indicadores e metas referentes às principais características da obra, acompanhados dos respectivos prazos, precisam ser denidos na fase de planejamento para possibilitarem a identicação de desvios e a adoção de medidas corretivas. A já mencionada Resolução do CNJ traz interessantes linhas sobre o tema: Art. 20 No caso de empreendimento cuja execução ultrapasse um exercício nanceiro, a Administração não poderá iniciá-lo sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de ordenação de despesa não autorizada (art. 359-D do CP). Art. 21 As alterações de projeto, especicações técnicas, cronograma físico-nanceiro e planilhas orçamentárias deverão ser justicadas por escrito, analisadas pela unidade de controle interno e previamente autorizadas pela autoridade competente.
16.3.5 Gestão de riscos Essa talvez seja a grande ausência nos empreendimentos públicos. Gestão ou gerenciamento de riscos busca a antevisão de eventos incertos no futuro que possam prejudicar o andamento do empreendimento e adoção de medidas que os combatam ou, até, auxiliar a superação da expectativa em alguns casos. A prática consiste em manter uma relação de eventos futuros incertos que tenham possibilidade de interferir nas principais áreas do negócio (riscos), estimando-se a
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sua probabilidade de ocorrência e o respectivo nível de impacto sobre os resultados desejados. Com base nos riscos e na respectiva avaliação de probabilidade e impacto, são denidas estratégias que envolvem:
a) Para o risco negativo – eliminar, mitigar ou aceitar os riscos; e b) Para o risco positivo – explorar, compartilhar ou melhorar. A gestão de risco tanto pode ser aplicada a atividades, com foco nos processos de trabalho, como nos projetos.
16.3.6 Sistema de controles Todo o empreendimento deve seguir a legislação e as regras estabelecidas, como pressuposto de proteção para todos os stakeholders. É do interesse dos principais que não ocorram desvios de conduta, malversação de recursos, desperdícios, etc. Limites e alçadas precisam ser respeitados, e o que acontece deve ser acompanhado com base em informações dedignas que permitam ao “Principal” saber o que ocorre de fato no
âmbito do empreendimento, projeto ou empresa de seu interesse.
Portanto, é necessária a existência de setores e procedimentos especícos de
controles internos e externos que garantam a licitude, a regularidade das ações dos gestores em todos os níveis e a conabilidade das informações. Os controles cam a
cargo dos próprios gestores, como a contabilidade, controle de estoque e protocolos, e também de equipes exclusivamente dedicadas a essa tarefa: auditores, scais ou controladores. São equipes atentas à conabilidade das informações que, no caso de
problemas, os comunicam aos dirigentes ou os membros dos Conselhos ou Comitês. Nesse particular, a Resolução CNJ nº 114/2010 traz expressamente competências do controle interno do Judiciário: Art. 7º Para subsidiar as decisões do Presidente, dos colegiados dos tribunais e dos conselhos, as unidades de controle interno produzirão notas técnicas/pareceres, ou se socorrerão de pareceres técnicos especializados. Art. 5º, §4º Para possibilitar a alocação de recursos prevista no parágrafo anterior, o tribunal elaborará estudo técnico detalhado (anteprojeto), com estimativas e justicativas das áreas,
tipos de materiais e acabamentos, instalações e, especialmente, custos, com o intuito de subsidiar a análise da unidade de controle interno. Art. 21 As Alterações de projeto, especicações técnicas, cronograma físico-nanceiro e planilhas orçamentárias deverão ser justicadas por escrito, analisadas pela unidade de
controle interno e previamente autorizadas pela autoridade competente.
Esquemas descritivos de sistema de controles internos adequados foram desenvolvidos pelo chamado COSO (Commiee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission ), sigla em inglês para um renomado comitê estadunidense de especialistas em auditoria, contabilidade e nanças, que sugeriu caminhos para melhoria dos
controles internos nas empresas após grandes crises envolvendo fraudes nos registros de empresas de capital aberto, com elevados prejuízos para investidores. A visão atual do COSO integra controles internos, gestão de risco e dissuasão à fraude. Originalmente, o esquema referencial de controles internos baseava-se em cinco elementos:
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a) Ambiente de controle – Cultura organizacional sobre a importância dos controles internos; códigos de ética e conduta; regras de segregação de funções. b) Avaliação e gerenciamento de riscos – Apresentado no item 16.3.5. c) Atividades de controle – Denição de limites de decisórios; vericações documentais, identificação de irregularidades ou falhas, avaliação do cumprimento das metas e objetivos, normatização interna para a atribuição de responsabilidades; d) Informação e comunicação – Clareza interna na comunicação organizacional, procedimentos de controle, riscos, dados sobre desempenho, limites, avaliação da conabilidade das informações de origem externa; e) Monitoramento – Avaliação da efetividade e adequação dos controles internos ao longo do tempo.
16.4 Gestão e gerenciamento de projetos O esforço temporário empreendido para criar um produto, serviço ou resultado exclusivo pode ser considerado um projeto. Gestão de projeto é o conjunto de práticas gerenciais adotadas especicamente para que os resultados de um projeto sejam concluídos de forma adequada. Assim, o clássico desao do gestor de projetos é manter o equilíbrio entre as três variáveis básicas da gestão de projetos: custo, escopo (qualidade, quantidade) e tempo (prazo). Em regra, mantidas inalteradas outras condições, para se reduzir prazos ou se elevam os custos ou se reduzem especicações do escopo. Do mesmo modo, para aumentar a qualidade ou algum fator quantitativo do objeto pretendido, é necessário maior prazo ou mais tempo. O mesmo raciocínio aplica-se à redução de custo. Para economizar, será necessário provavelmente ajustar o prazo de um projeto ou reduzir alguma dimensão de escopo. Ou mesmo uma combinação das duas coisas. No decorrer da história da condução de projetos complexos, em especial a partir das grandes guerras do século XX, diversas empresas e prossionais desenvolveram métodos para melhorar a condução dos recursos alocados temporariamente à realização de um objeto complexo, como um avião, uma fábrica, um foguete, uma ponte. Desse aprendizado surge a disciplina da Gestão de Projeto, fortemente disseminada nos setores público e privado como área de conhecimento vital para o sucesso de organizações. Atualmente, existe farta produção acadêmica dessa disciplina, além de diversas organizações preocupadas em sugerir boas práticas de gestão no cenário internacional. Conforme já mencionado neste livro, item 15.2, uma delas, possivelmente a mais renomada, é o PMI – Project Management Institute (ou Instituto de Gerenciamento de Projetos), que apresenta no Guia PMBOK – Project Management Body of Knowledge (ou Conjunto dos Conhecimentos em Gestão de Projetos, em tradução livre) um guia com um conjunto de práticas resultantes dos conhecimentos acumulado pelos mais experientes gerentes de projetos. Considerando que Obra Pública apresenta todas as características de Projeto, é perfeitamente adequado utilizar-se dos comandos mencionados no referido Guia para aumentar a probabilidade de êxito na implantação de empreendimentos. Não se pretende aprofundar neste livro toda a metodologia do PMI, mas pode-se sugerir para os leitores interessados que busquem informações complementares junto a esse Instituto.
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Os projetos, em apertada síntese, representam um meio de atingir metas e objetivos organizacionais, e, por isso, se inserem no contexto do planejamento estratégico organizacional que, conforme destacado no item 16.3.2, é peça fundamental para a boa governança. O Guia PMBOK, em sua 5ª edição, relaciona dez áreas relevantes atinentes ao gerenciamento de projetos: 1. Gerenciamento de integração do projeto: dene os processos e as atividades
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que integram os diversos elementos do gerenciamento de projetos; Gerenciamento do escopo do projeto: descreve os processos relativos à garantia de que o projeto inclua todo o trabalho necessário, e apenas o trabalho necessário, para que seja terminado com sucesso; Gerenciamento de tempo do projeto: se concentra nos processos relativos ao término do projeto no prazo correto. Gerenciamento de custos do projeto: descreve os processos envolvidos em planejamento, estimativa, determinação do orçamento e controle de custos, de modo que o projeto termine dentro do orçamento aprovado; Gerenciamento da qualidade do projeto: descreve os processos envolvidos no planejamento, monitoramento, controle e na garantia de que o projeto satisfará os requisitos de qualidade especicados;
6. Gerenciamento de recursos humanos do projeto: descreve os processos envolvidos no planejamento, contratação ou mobilização, desenvolvimento e gerenciamento da equipe do projeto; 7. Gerenciamento das comunicações do projeto: identica os processos relativos à geração, coleta, disseminação, armazenamento e destinação nal das
informações do projeto de forma oportuna e apropriada; 8. Gerenciamento de riscos do projeto: descreve os processos envolvidos em identicação, análise e controle dos riscos do projeto;
9. Gerenciamento de aquisições do projeto: descreve os processos envolvidos na compra ou aquisição de produtos, serviços ou resultados para o projeto; e 10. Gerenciamento das partes interessadas: destaca a inuência que as partes
interessadas têm em interferir no andamento do projeto. A simples análise da descrição das áreas já nos leva a concluir a respeito da insuciência de apenas um bom gerenciamento de aquisições para o êxito do
empreendimento. É preciso muito mais do que a correta aplicação da legislação afeta às licitações públicas! O arcabouço normativo até tratou de algumas áreas, como, por exemplo: custos, ao estabelecer referências de valores no Sinapi e Sicro; tempo, quando estabeleceu a necessidade de prazos de vigência contratuais; e qualidade, ao exigir projetos básicos que denissem com precisão o atendimento à necessidade pública. Porém, áreas como
recursos humanos, comunicação e riscos possuem ainda um elevado espaço para o aprimoramento. Não é raro encontrarmos ruídos signicativos de comunicação dentro da própria
equipe da Administração, como o fato do departamento de engenharia, da assessoria jurídica e do controle interno não se entenderem para alcançar uma solução de comum acordo que viabilize caminho célere para a seleção da proposta mais vantajosa. Cada
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um deles foca a questão sob o prisma que mais lhe convém, sem avaliar o problema de modo sistêmico e interdepartamental. As cheas imediatas, por sua vez, não estão atentas às relações informais e acabam
por não tratar desse tipo de ruído. O resultado, já conhecido por todos, é o atraso nos prazos de contratação e execução, deciência na elaboração de projetos, seleção de propostas pouco vantajosas, deciências no acompanhamento dos contratos, excesso
de aditivos e objetos não entregues. Por sua vez, as autoridades máximas das organizações, em virtude de não possuírem sistemas adequados de governança, só tomam conhecimento dos problemas após a ocorrência dos fatos, e, portanto, não podem auxiliar na adoção de correções tempestivas. Por todo o exposto, é requisito essencial para qualquer entidade ou órgão público estruturar seus processos de gestão de obras em cada uma das cinco fases do empreendimento — iniciação, planejamento, execução, monitoramento e encerramento — para cada uma das dez áreas já destacadas. Claro que o grau de detalhamento dessa estruturação dependerá da complexidade do empreendimento, mas, mesmo para situações mais simples é necessária a adoção de medidas pertinentes.
16.5 Governança e gestão nas obras públicas rodoviárias Conforme já salientado, o TCU tem dedicado grande atenção à governança e gestão das Obras Públicas. Pouco adianta atuar em scalizações pontuais de contratos
se a causa dos problemas não é resolvida. É necessário enfoque mais abrangente nas scalizações de modo a corrigir o procedimento do gasto como um todo ao invés de uma irregularidade pontual em licitação ou contrato especíco.
Por esse motivo, em termos ilustrativos, especial atenção deve ser dada aos achados encontrados em auditoria operacional realizada no DNIT com o objetivo de avaliar sua gestão das obras rodoviárias. A escolha desse acórdão teve como fundamento a aprofundada abordagem feita pela equipe de scalização. As falhas detectadas
relacionadas a seguir, apesar de se referirem à autarquia, são comuns em diversos órgãos públicos e têm o potencial de gerar imensos danos ao erário, caso não corrigidas em sua essência, ou seja, no aprimoramento dos sistemas de gestão e governança: a) ineciência e insuciência na análise de projetos;
b) inexistência de procedimento padrão para apenar projetistas por falhas graves na execução do projeto contratado; c) não aplicação de penalidades às supervisoras e empreiteiras por descumprimento contratual; d) incompatibilidade da estrutura das Superintendências Regionais e Unidades Locais é incompatível com suas atribuições; e) insuciência do controle e o acompanhamento das obras para assegurar sua
qualidade e a razoabilidade dos seus custos; f) baixa integração entre as áreas responsáveis pelas obras do DNIT; g) inadequabilidade dos sistemas de informações gerenciais de obras e projetos e de protocolo; e h) atrasos nas obras devido a diculdades com questões ambientais e indígenas.
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Diante da situação encontrada, foram expedidas diversas recomendações ao DNIT, dentre as quais se destacam medidas tendentes a aperfeiçoar o sistema de scalização, o procedimento para análise de projetos, o plano de gestão de pessoas, os procedimentos de apenação de empresas projetistas, supervisoras e empreiteiras, a sistemática de gerenciamento dos empreendimentos e sistema de informações gerenciais. À Casa Civil, recomendou-se que dena mecanismos de articulação institucional que facilitem a integração entre o DNIT, o Ibama e a Funai e, consequentemente, evitem atrasos nas obras devido a questões ambientais ou indígenas. Diversos órgãos receberam alertas quanto aos riscos envolvidos em manter as atuais atribuições do DNIT sem dotá-lo de instalações, equipamentos e força de trabalho compatíveis com suas funções (TCU. Acórdão nº 3.448/2012, Plenário. Rel. Min. Weder de Oliveira. DOU , 17 dez. 2012). Em seu Relatório, a equipe de autoria apontou elementos que indicam potenciais caminhos para soluções estruturantes de problemas bem conhecidos: 10. Considerando que cada obra de engenharia é um projeto per si, foram adotados critérios de gestão de projetos recomendados pelo Project Management Body of Knowledge (PMBOK). Para avaliação de controles e riscos adotaram-se padrões do Commiee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission (Coso), conforme adaptação feita pela International Organization of Supreme Audit Institutions (Intosai). 11. O PMBOK é um documento publicado pelo Project Management Institute (PMI), uma das principais associações mundiais de gerenciamento de projetos que conta, hoje, conta com mais de 240 mil associados. 12. Segundo o PMBOK: O gerenciamento de projetos é a aplicação de conhecimento, habilidades, ferramentas e técnicas às atividades do projeto a m de atender aos seus requisitos. O gerenciamento de projetos é realizado através da aplicação e da integração dos seguintes processos de gerenciamento de projetos: iniciação, planejamento, execução, monitoramento e controle, e encerramento. O gerente de projetos é a pessoa responsável pela realização dos objetivos do projeto. 13. Entre as orientações consagradas no PMBOK, algumas são de especial interesse para o foco dessa auditoria. Uma delas pressupõe que a capacidade das partes interessadas inuenciarem as características nais do produto do projeto e o custo nal do projeto é mais alta no início e torna-se cada vez menor conforme o projeto continua. Além disso, o custo das mudanças e da correção de erros geralmente aumenta conforme o projeto continua. 14. Ainda segundo o mesmo documento, todas as mudanças solicitadas e as ações corretivas recomendadas devem ser implementadas por meio de processo de trabalho previamente estabelecido. Deve estar claramente denido quem pode propor mudanças, como esse pedido deve ser processado e quem detém poder hierárquico para autorizar essas mudanças. 15. Para haver melhor gerenciamento da obra, devem existir: sistema de informações; procedimentos de gerenciamento de problemas que permita a identicação e a resolução de problemas e imprevistos; e procedimentos de controle de mudanças - incluindo como essas mudanças serão aprovadas e validadas. 16. Em fevereiro de 2004, a Intosai aprovou uma atualização das suas diretrizes para normas de controle interno, considerando como marco referencial o trabalho do Comiee on Sponsoring Organizations of the Treadway Commission (Coso). Essa Comissão Treadway desenvolveu amplo trabalho voltado para a elaboração de proposta de sistema de controle interno que mitigasse os riscos na gestão das corporações privadas norte-americanas,
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em virtude das falências e dos escândalos que à época abalaram o mercado nanceiro estadunidense. 17. Essa proposta de estruturação de controles internos ganhou ampla aceitação, tanto no setor privado como no setor público, o que levou a Intosai à revisão das suas diretrizes para controle interno, consubstanciada no documento intitulado Guidelines for Internal Control Standards for the Public Sector (Diretrizes para as Normas de Controle Interno do Setor Público), por vezes referido como Coso Intosai, em que adaptou o arcabouço conceitual original do Coso às peculiaridades da administração pública. 18. Excertos desse documento da Intosai foram então usados como critérios para avaliar a adequabilidade de controles internos em atividades críticas dos principais processos de trabalho do DNIT voltados para a gestão das obras rodoviárias. 19. O Coso Intosai dene que deve ser vericado se os controles adotados pela instituição encampam os seguintes requisitos: a) Documentação e comunicação clara de procedimentos de autorização; b) Existência de mais de uma pessoa ou equipe que controla todas as etapas-chave de uma transação, evento ou processo de trabalho (segregação de funções); c) Limitação do acesso a recursos ou registros a pessoas autorizadas; d) Vericação das transações e os eventos signicativos antes e depois de ocorrerem; e) Avaliação periódica das operações, dos processos e das atividades para assegurar o cumprimento de regulamentos, políticas e outros requisitos especícos. 20. Pelos critérios denidos pelo Coso Intosai, a supervisão do trabalho deve incluir a comunicação clara das funções, responsabilidades e obrigação de prestar contas de cada membro da equipe; a revisão sistemática do trabalho de cada membro e a aprovação do trabalho em seus momentos críticos. [...] 34. A análise dos macroprocessos de uma instituição permite compreender o funcionamento organizacional e identicar suas vulnerabilidades estratégicas. Esta compreensão é de suma importância para o diagnóstico de gestão. Desta forma, como estratégia inicial de ação, a auditoria operacional na gestão das obras rodoviárias do DNIT buscou identicar os macroprocessos mais relevantes para a gestão das obras da autarquia, e seus pontos mais críticos para análise de riscos. [...] 39. Analisando detalhadamente os mencionados estudos e considerando a missão institucional do DNIT e os acórdãos do Tribunal de Contas da União, entendeu-se que os macroprocessos que agregam mais valor para a missão institucional do DNIT, em particular no que diz respeito à gestão das obras rodoviárias, seriam os seguintes uxos: a) Análise de projetos de infraestrutura e estrutura; b) Contratação de empresa consultora para elaboração de projeto de engenharia; c) Fiscalização e medição de obras rodoviárias.
16.5.1 Análise de projetos Em relação à análise de projetos, foram constatadas diversas causas com potencial impacto negativo presente e futuro relacionadas a falhas em priorização de análise, ausência de plano de gestão de pessoas adequado, falta de controle processual sistemático e deciências na supervisão e avaliação da documentação. A avaliação dessas deciências tomou por base dois modelos reconhecidos de gestão de projetos e de riscos — o PMBOK e o Coso Intosai — e foi relatada da seguinte maneira: 71. De forma complementar à planilha, as entrevistas efetuadas na área de projetos permitiram constatar que as equipes de análise de projeto do DNIT são compostas por
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muitos servidores com menos de um ano de casa e por grande número de terceirizados, também contratados há menos de um ano (o que demonstra alta rotatividade). Essa situação pode acarretar diminuição da velocidade da análise por falta de conhecimentos das normas referentes ao processo de análise. Além disso, o alto número de terceirizados analisando projetos representa risco de a memória institucional ser retida pelas empresas contratadas ao invés de pelo DNIT. 72. Outro fato observado foi a distribuição assimétrica da equipe de análise, quando considerados a quantidade de servidores e o tempo de atuação no DNIT. Na mesma coordenação coexistem áreas compostas por 75% de terceirizados, boa parte com menos de um ano de casa e áreas com 70% de servidores da casa, todos com mais de um ano de DNIT. 73. Há ainda que destacar a falta de estrutura da DPP para análise de projetos por conta da inadequação do quadro de pessoal, da falta de softwares de análise e controle de projetos e contratos e da necessidade, motivada por fatores externos, de aprovação veloz dos projetos. 74. Durante as entrevistas realizadas, vericou-se falta de participação das ULs na
elaboração dos Termos de Referência para licitação de projetos e a falta de acompanhamento dos trabalhos de campo efetuados pelas empresas projetistas. Corroborando essa constatação, 57% dos respondentes do questionário enviado às ULs armaram que não
conseguem acompanhar os trabalhos de campo realizados pelas projetistas dos projetos de construção e adequação de rodovias na sua UL, e 62% armaram não conseguir analisar
com o cuidado necessário os relatórios elaborados pela empresa projetista.
75. As poucas visitas ao local para vericação do projeto, aliadas à falta de integração entre
os diversos setores da autarquia, colocam a equipe de análise à mercê das informações fornecidas pela empresa projetista, com limitada capacidade de análise crítica das soluções adotadas e conhecimento apenas parcial das características da região da obra e das suas particularidades. 76. Esse limitado conhecimento sobre as condições de projeto é agravado pela falta de acompanhamento dos trabalhos de campo efetuados pela empresa projetista, o que acarreta desconhecimento do que está sendo realmente executado, aumentando o risco de ocorrência de fraudes. Esta falta de controle faz, também, com que o DNIT não consiga vericar situações que possam requerer estudos mais aprofundados na área de projeto.
77. A qualidade dos projetos de engenharia elaborados pelas projetistas depende signicativamente da análise realizada na Coordenação de Projetos de Infraestrutura,
integrante da Cgdesp. Nessa seção, as diversas disciplinas que compõem o projeto são objeto de vericação pelos analistas, de acordo com suas áreas de especialização
(Drenagem, Orçamento, Pavimentação, Sinalização e Terraplenagem). 78. São 39 analistas, distribuídos nas cinco áreas, encarregados de examinar todos os projetos, tanto de restauração como adaptação e expansão da malha viária. Há apenas um nível de supervisão, exercido pela coordenação do setor. 79. Segundo apurado nas entrevistas com a coordenadora e com quatro analistas, cada projeto é examinado por um analista de cada área. Não há revisão técnica por área. Somente quando algum analista se depara com uma diculdade maior é que busca orientação com a
coordenadora para resolver o problema. Apurou-se também que não existe procedimento de análise de projetos normatizado, em que estejam denidos os itens prioritários a serem
testados em cada projeto, daí resultando que cada projeto é analisado em todos os seus detalhes técnicos.
O relatório observou que o controle de supervisão não atende aos critérios de boas práticas de controle denidos pela Intosai. Com efeito, “a versão do Coso produzida pela Intosai dene características de um bom controle interno, dentre as quais se destacam a necessidade de que as transações e os eventos signicativos sejam vericados antes e
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depois de ocorrerem, e que a supervisão do trabalho contemple revisão sistemática do trabalho de cada integrante da equipe e a aprovação do trabalho em seus momentos críticos”, o que não era observado. Outro ponto relevante estava nos termos de referência utilizados para contratação dos projetos de obras rodoviárias, pois não envolviam todos os setores interessados e apresentavam erros de conteúdo, o que criava problemas de responsabilidade dos projetistas nas transições entre um projeto e outro.
16.5.2 Aplicação de penalidades a empresas Questão sensível recorrente em contratações de obras públicas também foi identicada: ausência de procedimento padrão para apenar a empresa projetista. Mesmo existindo mecanismos de punição, estes não eram aplicados: 104. O responsável pela Coordenação Geral de Cadastro e Licitações esclareceu que não existem procedimentos padronizados para aplicação de penalidade e que esta ausência prejudica, em especial, o devido processo legal. Em consequência, nas poucas vezes em que o DNIT decidiu apenar uma empresa contratada, foi obrigado a rever sua decisão por determinação judicial, por descumprimento direto aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.
Não se quer aqui difundir a ideia da aplicação de sanções imotivadas, mas ressaltar a necessidade da construção de estruturas que permitam a identicação de maus prestadores de serviço e a possibilidade, por meio do devido processo legal, da aplicação de sanções de forma a coibir a cultura de que erros graves serão sempre aceitos pela Administração.
16.5.3 Fiscalização e medição de obras rodoviárias Outro ponto comum apontado no relatório de scalização: o acompanhamento e o controle da scalização do DNIT nos empreendimentos sob sua responsabilidade não se mostraram sucientes para assegurar a qualidade da sua execução, a razoabilidade dos seus custos e o atendimento do prazo inicial para sua conclusão. 139. O Coso Intosai dene como procedimentos de controle as políticas e ações esta belecidas para diminuir os riscos e alcançar os objetivos da entidade. Ressalta que esses procedimentos devem existir em toda a organização, em todos os níveis e em todas as funções. Dentre a gama de procedimentos de controle, de detecção e de prevenção de riscos relata que as vericações dos eventos mais signicativos devem ser realizadas antes e depois da sua ocorrência. Adotando esse conceito para os empreendimentos a cargo do DNIT, depreende-se que o efetivo controle de uma determinada obra deve ocorrer durante e após a execução dos serviços da obra, como acontece com as medições dos serviços de obra: há a scalização durante a execução dos serviços com ensaios e aferições in loco, e há também a conferência após o serviço executado. 140. No entanto, vericou-se que o DNIT não possui controle efetivo dos serviços executados nas obras, sendo observado que muitas vezes a conferência das medições realizadas pelas empreiteiras (contratadas para execução do serviço) ou pelas empresas supervisoras (contratadas para auxiliar a scalização da execução do serviço) é apenas formal.
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16.5.4 Pouca integração entre os setores Continua o relatório da equipe de scalização com questão que apresenta elevado
impacto no atraso dos processos licitatórios e, consequentemente, nos investimentos na área de infraestrutura, a baixa integração entre setores da organização: 171. O Guia PMBOK, documento produzido e mantido pelo Project Management Institute (PMI), registra um conjunto de nove áreas de conhecimento consideradas fundamentais para a boa gestão de projetos. Dado que esse documento do PMI é uma referência internacionalmente aceita na gerência de projetos, decidiu-se usá-lo como critério de auditoria para avaliar a dimensão da integração da gestão dos projetos e das obras no DNIT. 172. O guia dene projeto como “um esforço temporário empreendido para criar um
produto, serviço ou resultado exclusivo”. Tendo em vista que esta auditoria tem seu foco nas obras rodoviárias, a equipe optou por considerar cada obra rodoviária como “produto” que resulta da realização de um projeto, segundo o conceito PMBOK. Assim, o que é conceituado como projeto no PMBOK corresponde, no caso vertente, ao projeto de engenharia somado à execução da respectiva obra. 173. Uma das nove áreas essenciais do PMBOK diz respeito ao Gerenciamento da Integração do Projeto, que consiste em “fazer escolhas sobre em que pontos concentrar recursos e esforço e em qualquer dia especíco, antecipando possíveis problemas, tratando-
os antes de se tornarem críticos e coordenando o trabalho visando o bem geral do projeto”. 174. Nesses termos, a gestão integrada do projeto permitirá a antecipação e solução de problemas antes que se tornem críticos, isto é, antes que afetem o andamento geral do projeto, e também ensejará coordenação centralizada de todas as áreas e etapas envolvidas. Destacam-se a seguir boas práticas descritas no PMBOK nessa área de conhecimento: a) um gerente de projetos deve ser designado o mais cedo possível, de preferência antes do início do projeto; b) devem existir sistemas de informações do gerenciamento de obras; c) devem ser denidos os procedimentos de gerenciamento de problemas - identicação
e resolução de problemas e imprevistos;
d) devem ser denidos os procedimentos de controle de mudanças - incluindo como essas
mudanças serão aprovadas e validadas; e) deve existir base de conhecimento corporativo da autarquia para armazenar e recuperar informações, incluindo: e.1) arquivos completos do projeto/obra (escopo, custo, cronograma e linhas de base da qualidade, medição de desempenho, registro de riscos, ações de resposta planejadas e impacto de risco denido);
e.2) base de conhecimento de informações históricas e lições aprendidas (registros e documentos de projetos/obras, todas as informações e a documentação relativas ao encerramento do projeto). 175. Confrontando a situação encontrada com os critérios estabelecidos, constatou-se que a integração entre as diversas áreas responsáveis por projetos de engenharia e obras no DNIT é insatisfatória.
16.5.5 Deciências nos sistemas de informações gerenciais Não há acompanhamento adequado de um empreendimento se a organização não construir sistema de informação gerencial de qualidade, conforme destaca o trabalho de scalização:
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190. Os sistemas de informações de gerenciamento de projetos são apontados pelo PMBOK como fatores ambientais a serem considerados na abertura de projeto. Esse normativo dene o sistema de informação como os conjuntos padronizados de ferramentas automatizadas disponível dentro da organização e integrados a um sistema, retratando essa ferramenta como ativo importante para o bom gerenciamento de projetos. 191. Foi vericado que o DNIT possui diversos sistemas que atuam de forma separada e muitas vezes desarticulada, não dispondo de ferramenta compatível com o gerenciamento de projetos. A ausência de sistema integrado prejudica a atualização das informações do empreendimento, dicultando assim o seu devido acompanhamento. O Sistema de Acompanhamento de Contratos (Siac), ferramenta principal de gerenciamento dos empreendimentos do DNIT, apresenta informações muitas vezes desatualizadas e incompletas, o que diculta a gestão em nível gerencial do andamento dos trabalhos. Um exemplo desse problema são os cronogramas físico-nanceiros do sistema, que não são atualizados com o andar das obras e não representam sua situação real. Dessa forma, para que o gestor de Brasília possa saber a real situação do projeto é necessário que ele consulte o supervisor da unidade local, ou que consulte cópia do relatório das supervisoras contratadas para acompanhar o empreendimento, tornando tal gestão ineciente. 192. Conforme já relatado no parágrafo 174, um dos requisitos estabelecidos pelo PMBOK é que cada projeto possua um agente responsável por todo o projeto, denominado gerente. Esse ator terá diversos projetos sob o seu acompanhamento, tornando esporádica a visita para vericar o andamento dos serviços: atividade realizada pelo scal do contrato. Assim, de forma a permitir que ele possa gerenciar esses projetos, é necessário um sistema de informações integrado e devidamente atualizado. Esse sistema será ferramenta importante para que o gerente acompanhe o andamento dos processos sob sua análise, permitindo assim ações tempestivas para solução de problemas e evitando atrasos de cronograma. 193. Vale lembrar que o sistema de gerenciamento deve permitir o acompanhamento das diversas etapas do empreendimento, desde o levantamento do Evtea até a sua devida operação, registrando ao longo do tempo os eventos relativos àquele projeto. Assim, será possível planejar de forma mais ecaz todas as ações necessárias para realização de determinada obra, desde a contratação dos serviços para sua realização, bem como a ação coordenada das diversas áreas do DNIT e de outros órgãos envolvidos. 194. Outro fator relevante para a gestão desses empreendimentos é a base de conhecimento corporativo da empresa para armazenar e recuperar informações. Esse conhecimento é denido pelo PMBOK como sendo parte dos ativos de processos organizacionais. Assim, são necessários arquivos completos do projeto/obra como: escopo, custo, cronograma e linhas de base da qualidade, medição de desempenho, registro de riscos, ações de resposta planejadas e impacto de risco denido. O normativo também ressalta os bancos de dados de gerenciamento de problemas e defeitos, nos quais poderá ser acompanhado o andamento dos trabalhos de correção e informações de controle. 195. O armazenamento dessas informações também permite a gestão do conhecimento das informações históricas, o que não é possível com os sistemas atualmente disponíveis no DNIT. Assim, a implantação de um bom sistema de acompanhamento de projetos irá permitir também melhor gerenciamento do conhecimento corporativo da autarquia de forma a armazenar e recuperar informações atualizadas dos seus empreendimentos, bem como das situações observadas.
16.6 Governança em convênio de obras públicas Um caso excelente para reexão a respeito de governança é o de Convênios, ocasião em que entidades públicas rmam acordo para a realização de objetivos de interesse comum. Esse instituto está previsto no Decreto-Lei nº 200/67 como uma
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das formas de descentralização da atividade administrativa para que, cada órgão da Administração Federal esteja liberado das rotinas de execução e das tarefas de mera formalização de atos administrativos, a m de que possa concentrar-se nas atividades
de planejamento, supervisão, coordenação e controle. Sem dúvida, é momento especial para que o órgão repassador dos recursos (“Principal”) dena regras para que o recebedor dos valores (“Agente”), que será o real
gestor, atue sem o desvio do objetivo previsto inicialmente na alocação orçamentária. É com essa preocupação que o art. 10, §1º, alínea “b”, do mencionado decreto-lei, prevê que a execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada mediante convênio para as unidades federadas, quando estas estejam devidamente aparelhadas. Como ilustração, vale destacar recente scalização realizada pelo TCU com o
objetivo de conhecer a estrutura da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e os fatores limitantes à sua atuação na consecução de obras de saneamento, pautado na legislação que rege transferências de recursos nanceiros, licitações e contratos, convênios, contratos de repasse e termos de cooperação. A conclusão é de que existem deciências
nos principais instrumentos de governança afetos à elaboração e aprovação de projetos básicos; diculdades estruturais dos convenentes para realização de licitações e
acompanhamento de obras; falta de transparência na aplicação de recursos relativos ao Programa de Aceleração do Crescimento; deciências no acompanhamento da execução orçamentária, nanceira e de obras por parte da Funasa; problemas relacionados a
recursos humanos; pulverização de recursos; e falta de homogeneidade de controles e processos nas superintendências estaduais da entidade, entre outras falhas. A consequência desses problemas se materializa apenas quando se constata que dicilmente a obra será concluída com os recursos previstos, ou seja, em momento no
qual todos os valores já foram repassados. Por esse motivo, foram expedidas diversas determinações ao repassador: 9.2.2. em futuras transferências, xe prazo, contado a partir da data de celebração da
transferência, para que o convenente apresente ou ajuste a documentação necessária para liberação da primeira parcela de recursos nanceiros, e cancele ocialmente a transferência,
após transcorrido o prazo sem o cumprimento dos requisitos exigíveis; 9.2.5. considerando a nova sistemática de escolha dos proponentes estabelecida pela segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento, disponibilize na internet: 9.2.5.1. relação dos proponentes que apresentaram carta-consulta com respectivos objetos e valores totais originais solicitados; 9.2.5.2. status “em análise”, “aprovado” ou “rejeitado” para cada proposta; 9.2.5.3. identicação e valores dos termos de compromissos celebrados ou motivação
resumida da não aprovação da carta-consulta apresentada. 9.2.6. adote procedimentos que possibilitem a identicação e o saneamento de irregu-
laridades ou inconsistências em transferências registradas como adimplentes, com recursos “a comprovar” e “a liberar”, com prazo de vigência e de apresentação de contas expirado; 9.2.7. adote procedimentos para evitar inconsistências relativas ao status das transferências celebradas, em registros do Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse e do Sistema Integrado de Administração Financeira, bem como para tornar obrigatória a atualização de dados a cada alteração de status;
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9.2.9. em relação ao Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse, estabeleça procedimentos para: 9.2.9.1. registro de informações de todas as transferências de recursos da Fundação, independentemente dos instrumentos jurídicos utilizados para sua celebração; 9.2.9.2. vericação da realização tempestiva de registros de informações sob responsa bilidade da Fundação e de seus convenentes/compromitentes; 9.2.9.3. orientação dos convenentes/compromitentes sobre a realização dos registros de informações sob sua responsabilidade, para que sejam tempestivos e retratem a situação real em que se encontram as transferências celebradas; 9.2.10. discipline e leve ao conhecimento dos convenentes/compromitentes as medidas punitivas no caso de descumprimento das exigências relativas à realização de registros de informações sob sua responsabilidade no Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse; 9.2.12. atualize o Sistema Gerencial de Acompanhamento de Projetos de Saneamento, de modo a: 9.2.12.1. possibilitar a inserção de informações direta e periodicamente por parte dos convenentes; 9.2.12.2. assegurar que o sistema somente aceite a inserção de relatórios, pareceres e outros documentos técnicos por servidores que detenham competência para elaboração do respectivo documento; 9.2.12.3. impossibilitar a substituição de documentos após conrmação de sua inserção no sistema pelo usuário; 9.2.13. implemente ações de capacitação e desenvolvimento institucional direcionadas aos possíveis convenentes que não demonstrem capacidade técnica e/ou administrativa para consecução das obras, ou apoie ações nesse sentido desenvolvidas por outros órgãos/ entidades federais ou estaduais; 9.2.14. formule modelos de editais de licitação e contratos de execução de obras com elementos mínimos necessários ao cumprimento das normas aplicáveis ao processo de seleção e contratação de empresas para realização de obras de drenagem urbana, abastecimento de água e sistemas de esgotamento sanitário objeto das transferências rmadas; 9.2.15. divulgue os modelos de editais e contratos de que trata o item 9.2.14 e estimule seu uso, obrigando os convenentes a apresentarem justicativas formais quando não os utilizarem; 9.3. recomendar à Fundação Nacional de Saúde que: 9.3.1. aprimore a análise de seleção de propostas de transferências para que sejam selecionadas apenas aquelas em que esteja claro que os recursos pactuados atendem à etapa útil do empreendimento e à resolução de parcela signicativa das deciências de saneamento da localidade a ser beneciada; 9.3.2. aprimore a análise de seleção dos proponentes para que, anteriormente à distribuição dos recursos, sejam considerados selecionados apenas aqueles que apresentem reais condições estruturais para elaboração de projetos básicos, contratação e acompanhamento de obras; 9.3.3. aperfeiçoe os procedimentos de programação e liberação de recursos que dão suporte à realização de visitas técnicas, evitando que as viagens necessárias quem restritas a autorizações emitidas apenas após transcorrido o primeiro trimestre ou quadrimestre de cada exercício; 9.3.4. institua mecanismos formais que disciplinem as visitas técnicas realizadas pelos Serviços de Convênios das Superintendências Estaduais, em especial, relativos à escolha das transferências a serem selecionadas e priorizadas, e às rotinas de obtenção e análise da documentação que subsidia os repasses nanceiros aos convenentes;
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9.3.12. implemente sistema informatizado que possibilite: 9.3.12.1. acompanhamento, em nível regional e nacional, de prazos e pendências relativos a instauração e conclusão de processos de prestação de contas e tomadas de contas especiais; 9.3.12.2. registro e alerta sobre prazos para conclusão das fases processuais, estipulados por normas, determinações ou recomendações relativas à instauração de tomadas de contas especiais de transferências; 9.3.12.3. extração de relatórios gerenciais das informações mencionadas nos itens 9.3.12.1 e 9.3.12.2; 9.3.13. para cumprimento das recomendações do item 9.3.12, considere a possibilidade de uso de sistemas já implantados em outros órgãos e entidades públicos, desde que se mostrem economicamente mais vantajosos e compatíveis com a estrutura e as necessidades da Fundação e das unidades/órgãos de controle interno e externo; 9.3.14. implemente sistema informatizado de análise orçamentária de projetos, com manuais e normativos, e exija sua utilização nas análises técnicas empreendidas em todas as superintendências estaduais; 9.3.15. divulgue, na internet, as pendências dos convênios/termos de compromisso não aprovados na etapa de análise técnica, identicando o município beneciado, a obra
proposta, a data de apontamento das pendências, os responsáveis pela adoção das providências necessárias, entre outras informações; 9.3.16. elabore macroindicadores de custo das obras de saneamento realizadas com recursos repassados pela Fundação; 9.3.17. realize estudo para identicar as informações necessárias a serem obtidas dos
convenentes, com a respectiva periodicidade, para acompanhamento pela Fundação das obras em execução; 9.3.18. implemente rotinas e procedimentos de avaliação de riscos para subsidiar o plano e o relatório anuais de atividades da auditoria interna da Fundação Nacional de Saúde; 9.3.19. promova a adequada articulação entre a auditoria interna e os demais setores envolvidos, em especial o de convênio e o de engenharia, para ns de atendimento
tempestivo às demandas dos órgãos de controle interno e externo; 9.3.20. adote mecanismos homogêneos em nível nacional e sistema informatizado para controle gerencial da totalidade das tomadas de contas especiais instauradas pelas superintendências estaduais, bem como dos prazos para abertura e conclusão desses processos; 9.3.21. institua e divulgue canais de denúncia e reclamações, sob controle gerencial da auditoria interna, dotando essa unidade de recursos sucientes para tratamento tempestivo
e adequado dessas denúncias/reclamações; (TCU. Acórdão nº 198/2013, Plenário. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU , 27 fev. 2013) Mais grave, ainda, é a ausência de resultados nalísticos à sociedade, mesmo com
a conclusão adequada do objeto do convênio. O TCU, ao analisar o caos da implantação de creches e pré-escolas no âmbito do Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância), sob responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), teceu relevantes considerações sobre essa questão: Fiz questão de salientar esses pressupostos basilares da estrutura de governança de qualquer organização para sublinhar o principal paradoxo que creio existir nos instrumentos formais de ajuste. O relatório instrutivo deu conta não somente que existiam diversas creches inacabadas; mas que, mesmo quando terminadas, numerosas delas não estavam em funcionamento.
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O sucesso do programa analisado – o verdadeiro objetivo que legitima o mútuo interesse para a realização das transferências voluntárias – não é a mera construção das escolas, mas o seu pleno funcionamento. O compromisso do município quando recebe os recursos não é – ou não deveria ser – a demonstração do imóvel pronto; mas a materialização de crianças beneciadas pela política pública. Esse é o indicador de qualidade a ser perseguido e o verdadeiro marco de controle da ação de governo. Um controle de m, não apenas de meio.
Em avaliação dos instrumentos formais pactuados para a prestação de contas dos recursos repassados, porém, percebi que não envolvem indicadores últimos de resultado. Consta da Resolução-FNDE nº 24/2012, em seu art. 21, que as contas são prestadas em até sessenta dias do término do prazo pactuado para a construção das creches. As formalidades necessárias para tal referem-se, somente, a documentos comprovadores da efetivação da compra/ serviço/obra, mas não do seu uso – nem ao menos da sua entrada em funcionamento. As contas podem ser aprovadas, desse modo, mesmo que na escola não existam professores; ou, em paralelismo, que no hospital não existam médicos; ou que exista a usina de energia sem a linha de transmissão para transportá-la. Seriam diversos os exemplos. Na prática, quando a coletividade não usufrui daquele bem, o resultado é idêntico ao da sua não existência. São recursos públicos desperdiçados. Infelizmente situações como essas podem ser consideradas comuns. Nas ações públicas, o compromisso deveria ser de resultado, e não de meio. O mútuo interesse das partes na celebração do convênio é a prestação efetiva do serviço público, sendo imprescindível que os convenentes avaliem todas as variáveis para que o resultado esperado seja alcançado. Não se coaduna com o princípio constitucional da eciência a transferência de recursos
para as obrigações de meio, sem que as condicionantes para o cumprimento das obrigações nalísticas sejam avaliadas.
Os termos de convênio e das respectivas prestações de contas devem prever cláusulas especícas sobre tal necessidade de m. E o FNDE deve possuir condições de avaliar tais
contornos de resultado. É essa estrutura de governança que garantirá, de fato, os objetivos da política pública a ser utilizada. De todo adequado, assim, recomendar ao FNDE que preveja, em sua Resolução, a necessidade de os instrumentos de convênio abrigarem cláusulas respectivas à necessidade de comprovar, para a adequada prestação de contas, da entrada em funcionamento das escolas construídas. Interessante, ainda, que se elabore um plano de ação das scalizações
a prever, igualmente, a inspeção quanto ao pleno funcionamento dos objetos conveniados. Para os ajustes em andamento, corroborando a proposta da unidade técnica, creio que se deve determinar a elaboração de um plano de supervisão, para materializar ações tendentes a colocar as creches (inacabadas ou concluídas) em funcionamento. (TCU. Acórdão nº 2.580/2014, Plenário. Rel. Min. Bruno Dantas. DOU , 8 out. 2014).
16.7 Caminhos para a boa gestão e governança nas obras públicas Diante de todo o conjunto de informações aqui apresentado, inegável a importância de boa gestão e governança no processo de contratação das obras públicas. Vale destacar alguns passos e sugestões a serem observados, não exatamente na ordem a seguir, para trilhar um caminho seguro rumo à conclusão do empreendimento com a harmonização dos anseios do “Principal” e do “Agente”: 1. Manter sistema integrado de gestão da estratégia e de planejamento consistente e realista, com plano estratégico e seus desdobramentos de nível tático e operacional alinhados, considerando não apenas a necessidade de conclusão de obra, mas todas as ações complementares para a efetiva utilização do empreendimento na nalidade pública a que se destina;
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2. Desenvolver habilidades técnicas, jurídicas e gerenciais nos servidores que participarão do processo de contratação (licitação e scalização dos contratos);
3. Construir espírito de equipe; 4. Fortalecer o sistema de controle interno, em especial a equipe de auditoria interna; 5. Aprovar Plano de Gerenciamento de Riscos, com as respostas predenidas;
6. Construir sistema de acompanhamento das informações de modo a subsidiar atuação proativa; 7. Realizar estudos de viabilidade antes de iniciar o Projeto Básico; 8. Estimar adequadamente os valores a serem investidos e adequá-los às leis orçamentárias (PPA, LDO e LOA); 9. Conceber projeto básico com nível de precisão adequado para evitar aditivos futuros; 10. Obter as licenças necessárias junto aos órgãos públicos competentes; 11. Estabelecer processo de trabalho integrado de gestão dos contratos de obra envolvendo não apenas o contrato com a empreiteira, mas também aqueles referentes à elaboração de projeto, supervisão e aquisição de equipamento; 12. Estabelecer cronograma integrado de execução e identicar responsáveis
por cada tarefa; 13. Monitorar tempestivamente o andamento do cronograma; 14. Planejar minuciosamente os editais, para que atenda às boas práticas na condução da licitação e permita a seleção da proposta mais vantajosa; 15. Indicar formalmente os scais de contrato e de obra;
16. Realizar reuniões periódicas de avaliação dos serviços com o contratado; 17. Promover a presença efetiva da scalização durante a execução dos serviços; 18. Capacitar e equipar a equipe de scalização para a realização de medições
adequadas nos aspectos quantidade, qualidade e custo; 19. Preparar os scais para atuarem com base no devido processo legal em caso
da necessidade de aplicação de sanções; 20. Atentar para todos os cuidados no recebimento provisório e denitivo.
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REFERÊNCIAS
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