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ÍNDICE Capa Rosto Premissa 01. Da terra “queimada” 02. Pão, sal e coração 03. Tudo começou em família 04. Gente sem sem nada nada “que minha mãe alimentava” 05. O padre padre jesuíta e a re vista missionári missionáriaa 06. Zagreb – Dublin – Bengala 07. O remédio remédio do batismo batismo 08. O voto privado 09. A alegria 10. “Não esqueç esqueça... a... Os pobr es” es” 11. Cristo é é tudo 12. “Por mim, te recusarás a fazer isso?” 13. “As almas almas não se compram” 14. As visões visões 15. O chão como lousa 16. As cartas cartas ao irmão 17. Nunca mais se viram 18. No bairro da deusa Kali 19. Como os os estigmas de Jesus 20. O “alter ego” 21. Apagou-se no escuro 22. A santa da escuridão esc uridão Nota Bibl Biblio iográfi gráfica ca Coleção Ficha Catal Catalográfica ográfica Notas
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A todas as Mi ssionári as e todos os Missionári Mi ssionários os da Cari dade que matam a sede de Cristo no dia a dia, matando a sede dos irmãos agora e pela eternidade.
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PREMISSA
Quando se entra em uma igreja ou capela das Missionárias da Caridade, se vê logo a cruz sobre o altar, ao lado da qual está escrito: “ I thirst ” (Tenho sede). É essa a síntese da vida e das obras de Madre Teresa de Calcutá, chamada a matar a sede de Cristo, por meio das formas de caridade mais extremas. Todos sabem quem foi Madre Teresa, mas poucos conhecem a sua origem. Tudo teve início lá, em Escópia, na Macedônia. Sua mãe foi uma mulher extraordinária, de fé grande e robusta como uma sequoia, de uma caridade imensa e transbordante. A bagag agagem em cultural cultural de Anjeze Bojaxhi Bojaxhiuu já tinha tinha sido sido preparada na infância, nfância, formando-se sob o olhar vigilante de uma mãe que, com uma caridade fora do comum, ajudava a todos, a todos socorria, sem fazer distinção alguma. Drane Bernaj Bojaxhiu, de origem nobre, foi realmente a Madre Teresa de Escópia e infundiu na filha o imenso amor por Deus e pelos pelos pobres. As raízes nas quais Madre Teresa nasceu, cresceu e se formou são profundas, plantadas lantadas profundamente em um terreno nutrido por séculos de credo relig religioso, tão tenaz e sólido quanto pronto a enfrentar guerras e perseguições, como aconteceu na Albânia, primeiro rimeiro com os turcos, depois depois com o comunismo comunismo do tirano tirano Enver Hox Hoxha. ha. Deus e a família, esses foram os pilares sobre os quais se erigiu a monumentalidade espiritual e humana da mulher que se doou inteira a todos. Madre Teresa não foi uma assistente social, como alguns a veem, voluntária ou involuntariamente confundindo a missionária com a enfermeira da Cruz Vermelha. Ela mesma repetia sempre: “Nós não somos assistentes sociais, mas religiosas no mundo, contemplativas ativas no mundo, o amor de Deus em ação. Tudo o que fazemos, o fazemos por amor, com amor, por Jesus”. Em uma carta às suas irmãs, deixa claríssimo o carisma da Ordem: “Minhas caras filhas, sem o sofrimento, o nosso trabalho seria apenas uma obra social, muito boa e útil, mas não seria a obra de Jesus Cristo, não seria parte da redenção. Jesus quis nos ajudar, ajudar, compartil compartilhando a sua vida, a sua solidão, solidão, a sua agonia e a sua morte”. Mulher de fé, de esperança, caridade e de indizível coragem, Madre Teresa tinha uma espiritualidade cristocêntrica e eucarística. Costumava dizer: “Eu não posso imaginar nem mesmo um instante da minha vida sem Jesus. O maior prêmio para mim é amar Jesus e servi-lo nos pobres”. Por isso, recomendava a suas irmãs: “Se vocês souberem rezar, saberão também amar e servir, testemunhar esse amor a todos”. Não tinha tinha simpati simpatiaa pelos pelos jornali jornalistas, que a persegui perseguiam am como cães de caça. Sempre os olhava com desconfiança e suspeita, chegando a afirmar: “Prefiro lavar um leproso do que falar com um jornalista”. E, no entanto, não pôde evitar a imprensa, nem os refletores de um mundo que estava se tornando cada vez mais midiático, amplificando cada notícia, fazendo da macro e da micro-história um grande espetáculo. Ela não queria 6
entrar naquele espetáculo, mas suas obras se tornaram conhecidas demais para que ela pudesse go gozar zar o “lux “luxo” o” do sil silêncio. êncio. Todavia, Todavia, foi graças também às notícias notícias difundi difundidas das pelos elos meios de comunicação comunicação que muitos muitos conheceram a reali realidade nascida nascida das mãos de Madre Teresa, e se tornaram, assim, benfeitores das Missionárias da Caridade. E foi também graças a tal fama que Madre Teresa se tornou familiar a todos, entrou nas casas do mundo com a sua figura diminuta, com suas mãos juntas ou prestes a acariciar um doente, um moribundo, um leproso, um menino com os membros tão magros que pareciam areciam ramos de uma árvore no inverno, um menino menino com os olhos olhos tão dil dilatados que pareciam areciam maiores que o seu rosto. Como acontece com todas as personagens personagens célebres, colheu simultaneamente crítica e aprovação. Nos anos pós-maio pós-maio de 1968, se reivindi reivindicava cava a altos altos brados a libertação de tudo o que lembrava a tradição; portanto, falar de santos e beatos era como falar de algo irremediavelmente retrógrado e ridículo, porque já nos tínhamos “emancipado” dos estereótipos dos “santinhos”... A vida, se dizia, era algo completamente diferente. E, no entanto, chegou Madre Teresa, a pequena mulher que conquistou o coração de Jesus e o coração de milhares e milhares de pessoas, para demonstrar, corajosa e publicamente, que a santidade não tinha absolutamente saído de moda, e que a fé em Cristo pode mover montanhas, pode conduzir ao humanamente impossível, como impossíveis foram as ações dela. De um grão de mostarda nasceu uma árvore enorme, uma floresta, para a qual “vêm os pássaros do céu, e se aninham entre seus ramos” (Mt 13,32). Essa irmã, de características físicas europeias, trajes indianos e sandálias franciscanas, que não é estranha a ninguém, a quem crê ou a quem não crê, a católicos e a não católicos, se tornou estimada em um país no qual os seguidores de Cristo são a minoria, em um país onde hoje os cristãos são perseguidos, inclusive as irmãs de Madre Teresa. Na Índia Índia[1] de Mahatma Gandhi, da tolerância e da democracia, em dezembro de 2007, às vésperas do Natal, o Vishwa Hindu Parishad (Vhp), uma organização fundamentalista hindu, matou 3 pessoas, atacou e destruiu 13 igrejas e capelas, ferindo e deixando sem teto um grande número de cristãos do distrito de Kandhamal. Em 16 de aneiro de 2008, também a irmã Nirmala Joshi, a herdeira de Madre Teresa, [2] chegou a Orissa, região que conta 37 milhões de habitantes, e em cuja parte norte se encontram muitos católicos. Ela chegou de trem, sem nenhum pré-aviso às autoridades locais. Visitou todas as escolas, os conventos e as paróquias atacadas. Ao término de sua visita, escoltada pela polícia, a Superiora Geral escreveu uma carta endereçada a todos, “sem distinção de casta ou credo”, para convidar à reconciliação e ao perdão. Quem fomentou as hostilidades foi Swami Laxmanananda Saraswati, um dos chefes da Vhp, que em seguida foi assassinado por um grupo terrorista maoísta, na noite de 23 de agosto de 2008, o que serviu de pretexto para o desencadeamento da fúria hindu em Orissa, apesar de a polícia ter esclarecido o fato. Durante as cerimônias fúnebres do guru, milhares de radicais hindus começaram o pogrom ogrom gritando: “Matem os cristãos! Destruam as suas instituições!”. “Uma vergonha para a nossa pátria”, definiram o pogrom ogrom o primeiro-ministro Manmohan Singh e o cardeal Oswald Gracias, arcebispo de Mumbai. Um balanço grave: 7
dezenas e dezenas de mortos, mais de 50 igrejas (entre católicas e protestantes) destruídas, centenas de casas danificadas, 4 conventos, 5 albergues e alojamentos para ovens, 6 institutos católicos dedicados ao voluntariado e à assistência social devastados, centenas de carros incendiados. Milhares de cristãos que fugiram do massacre vivem hoje aterrorizados, na miséria, nas florestas do território. O padre Thomas Chellanthara é uma testemunha que sobreviveu milagrosamente àqueles trágicos fatos. Ele foi barbaramente agredido a pauladas pelos hindus, na cabeça e nas costas... foi aprisionado juntamente com algumas irmãs, que foram violentadas, foi despido e derramaram querosene sobre seu corpo para atear-lhe fogo, mas alguns hindus decidiram por fim levá-lo à polícia e assim ele conseguiu se salvar. Em 23 de maio de 2009, recebeu o prêmio Defensor Fidei, Fi dei, da Fundação Fides et Rati o, na festa da revista católica Il Timone . Nessa ocasião de forte comoção para todos os participantes, o padre Thomas disse: “Estou aqui hoje com vocês graças a uma permissão que foi muito difícil de se conseguir. Estou com vocês a dois mil quilômetros do lugar onde vivo, mas estou em comunhão com os católicos perseguidos da minha terra”. O diretor da revista Il Timone, Gianpaolo Barra, leu sem seguida os motivos para a premiação: “Porque, com as feridas infligidas à sua carne, ele é símbolo da terrível perseguição sofrida pela Igreja de Orissa e da Índia; porque, com seu testemunho de fidelidade a Cristo, contribuiu para manter e encorajar a comunidade católica, como um pastor com suas ovelhas; e porque, com sua fé, é uma testemunha viva de Cristo também para os pagãos”. Os € 10.000,00 entregues ao miles Christi serão destinados, afirmou o padre Thomas, às crianças de Orissa. Padre Bernardo Cervellera, missionário do PIME (Pontifício Instituto das Missões Exteriores), escreveu em 4 de setembro de 2008: “É uma ‘vergonha’ que os cristãos da Índia, uma força importante para o desenvolvimento social e econômico do país, sejam massacrados, enquanto os governos mundiais e as associações humanitárias se calam. Outro exemplo de ‘cristianofobia’ é aquela ‘cristofobia’ que se propaga por toda a Europa”. A violência contra pessoas e estruturas serve para eliminar a missão dos cristãos. Membros das tribos, frequentemente utilizados como escravos nos trabalhos agrícolas, e dalit , a casta mais marginalizada na Índia, veem no cristianismo, como aconteceu a muitíssimos convertidos pela Madre Teresa de Calcutá, um caminho para melhorar a sua situação, para ver afirmados os seus direitos, para dar dignidade às suas vidas. P adre Cervellera Cervellera acrescenta: “Ao se opor ao empenho dos cristãos, os fundamentali fundamentalistas hindus se opõem também ao hinduísmo de Gandhi, que queria a Índia como um país laico, aberto a todas as religiões, a eliminação das castas e a dignidade dos dalit , por ele definidos como ‘filhos de Deus’ ( harijian )”. O padre Pietro Gheddo explica: Na tradição c ristã, até tempos muito recentes, rec entes, as religiõe religiõess não cristãs cr istãs eram considerada cons ideradass obra do demônio, demônio, inimigas da cruz de Cristo a serem destruídas. São Paulo descreve a situação dos homens sem Cristo em termos radicalmente negativos e abertamente condenatórios (Rm 1). Porém, no famoso discurso da Ágora de Atenas (At 17,16-31), fala de modo positivo das crenças dos atenienses e dos esforços que faziam para procurar rocur ar o verdadeiro verdadeiro Deus. São essas ess as as duas correntes cor rentes de pensamento pens amento que permei perm eiam am toda a história cristã c ristã
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diante diante das religiõe religiõess não cristãs. c ristãs. No passado, pass ado, preval pr evaleceu eceu a leitura leitura negativa, depois do Concílio Concílio Vaticano Vaticano II se começou a entender que as religiões são uma preparação para o encontro com Cristo [...]. A evangelização não é uma imposição, mas um diálogo com os povos, com as religiões organizadas, que faz parte da missão evangelizadora da Igreja. O diálogo, uma providencial prov idencial “descobert “desc oberta” a” do Concíli Concí lioo Vaticano atican o II, está est á ligado ligado ao reconhecimento do valor de cada pessoa humana e das várias vias que o homem encontrou para chegar a Deus. Muitos documentos da Igreja afirmam que o diálogo não é a alternativa à evangelização, é uma exigência do nosso tempo, que coloca cada vez mais em contato povos, culturas e religiões diferentes.[3]
Por outro lado, também não se pode fingir que nada acontece e, assim, para não ofender a ninguém e contentar um pouco a todos, ofender a Deus, arriscando-se, por covardia, a censurar o dever primário para o qual os apóstolos foram chamados pelo Filho de Deus: evangelizar os povos da terra, levando a eles a “Boa-Nova”: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a todas as criaturas. Quem crer e for batizado, será salvo, mas quem não crer será condenado” (Mc 16,15-16). Nesse sentido, sentido, uma tomada de posição posição clara vem do beato, padre Clemente Clemente Vismara (1897-1988), missionário do PIME, que viveu sessenta e cinco anos na Birmânia: As pessoas aqui são pobres porque querem permanecer pobres, ou melhor, miseráveis. A preguiça está como encarnada neles, às vezes até se tem escrúpulos em ajudá-los, já que frequentemente ajudá-los significa tornálos até mais preguiçosos [...]. Eles não se mexem por nada. Se têm o que comer por dois dias, eles param um dia. O poupar é desconhecido; se adoecem ou lhes acontece algum infortúnio, eles já vêm chorando. Podem dizer que o budismo é uma boa religião, que deve ser respeitada. Estou convencidíssimo disto: podem receber bilhões ilhões e bilhões bilhões dos Estados Unidos nidos e da Europa, mas, se não mudarem de religiã religião, o, ficarão sempre no mesmo ponto [...]. A culpa é da má religião deles, que os faz assim. A formação espiritual cristã produz, por si mesma, como consequência, também o bem-estar material.
O Vhp, com seu nacionalismo extremista, gostaria de eliminar da Índia os cristãos, os muçulmanos, os parses. Em suma, destruir a história da Índia, desde sempre lugar de encontro entre culturas e religiões. E no Ocidente, onde se multiplicam associações de cunho pacifista, prontas a defender grupos, minorias, espécies em extinção, cala-se a respeito das perseguições e dos danos contra os cristãos em Orissa, na China e no Oriente Médio, “em nome de uma ‘cristofobia’ que procura se livrar, também com a mentira, de sua herança cristã”, como afirma o padre Cervellera. Em um contexto como esse que se foi criando, a figura de Madre Teresa é fundamental, porque fez e faz escola tanto em âmbito missionário como em âmbito ético, tanto que a sua Congregação religiosa não conhece crise vocacional e continua a abrir casas e centros em todo o mundo. Madre Teresa foi mestre de vida para suas irmãs, para os órfãos, os doentes, os pobres, os leprosos, e continua continua a sê-lo sê-lo para milhares milhares e mil milhares de pessoas. Ela Ela também o é por meio dos escritos e reflexões que nos deixou: verdadeiras minas de sabedoria e de verdade. Nesses documentos se encontra toda a sua filosofia, que às vezes ela conseguia resumir em um punhado de palavras. Ensinamentos que vão direto ao coração, à essência do existir, ao segredo que conduz à realização de si, porque sempre: “É preciso fazer coisas comuns com um amor extraordinário”, e assim fazendo se realiza o plano do amor que Deus tem para cada um de nós. A sabedoria residia no coração dela e era expressa no pensamento, nas ações e na sublime capacidade de transmitir os conceitos 9
em poesia: Qual é... O dia mais belo: hoje. A coisa mais fácil: enganar-se. O maior obstáculo: o medo. O maior erro: desistir. A origem de todos os males: o egoísmo. A distração mais bela: o trabalho. A pior derrota: o desencorajamento. Os melhores professores: as crianças. A necessidade principal: a comunicação. O que nos faz mais felizes: ser úteis aos outros. O maior mistério: a morte. O pior defeito: o mau humor. A pessoa mais perigosa: o mentiroso. O sentimento mais desastroso: o rancor. O presente mais belo: o perdão. A coisa mais indispensável: a família. O caminho mais rápido: o correto. A sensação mais agradável: a paz de espírito. A proteção mais eficaz: o sorriso. O melhor remédio: o otimismo. A maior satisfação: ter feito o próprio dever. A força mais poderosa do mundo: a fé. As pessoas mais necessárias: os pais. A coisa mais bela: o amor.
Madre Teresa adorava transmitir o amor pelo serviço, mas também pela poesia e pela prosa. Ela Ela deix deixou escrito escrito o patrimôni patrimônioo de sua alma; alma; de fato, ficaram ficaram muitos muitos de seus manuscritos, reflexões, cartas, meditações, páginas de diário, composições poéticas, ensinamentos, orações... Madre Teresa transmitia seus ensinamentos com muita facilidade por meio da escrita, que lhe vinha do coração e da mente, como a oração. Ela dizia: “O fruto do silêncio é a oração. O fruto da oração é a fé. O fruto da fé é o amor. O fruto do amor é o nosso serviço”. A oração sempre e de todas as formas, mediante disposições precisas: silêncio, distanciamento das criaturas e recolhimento. Nunca ter pressa ao orar, porque “a alma alma precisa precisa de tempo, precisa precisa distanci distanciar-se ar-se e orar, usar a boca, usar os olhos, olhos, usar o corpo todo”. Ela Ela ensinava: ensinava: “Se orarem, vocês terão um coração puro, poderão ver a Deus e então se amarão uns aos outros”. A oração, antes de qualquer outra coisa; caso contrário, o fracasso: “As nossas casas são as casas dos pobres da rua, onde morrem de fome. P recisamos recisamos do convento somente por poucas horas, para o repouso e para a oração. Precisamos muito da oração. Sem a força da oração, a nossa vida não seria possível”. Ela tinha intuições surpreendentes, que em uma perspectiva da fé se poderiam definir como verdadeiras iluminações divinas. Confiando somente e exclusivamente em Deus, não se preocupava tanto com os instrumentos necessários para alcançar o objetivo quanto com o objetivo em si. Assim, por exemplo, a fama: “Eu fui obrigada a sofrer a fama. Uso-a por amor de Jesus. Falando de mim, os jornais e as televisões falam dos 10
pobres, e assim assim atraem a atenção para os pobres. Vale a pena suportar esse peso”. [4] Em suma, sabendo que respondia a chamados provenientes unicamente de Deus (o primeiro, rimeiro, a vocação relig religiosa; o segundo, segundo, a dedicação dedicação total aos pobres), sabia sabia que a Providência nunca lhe faltaria para chegar à concretização de seus projetos. A sua labuta foi sempre de caráter espiritual, exclusivamente místico; era a alma que, enamorada loucamente de Deus, sentia toda a carência da criatura limitada que não estava unida a seu Criador. Sendo uma santa constantemente sob os refletores, as versões sobre ela se espalharam como uma mancha de óleo, e as posições também se dividiram: alguns a acusavam de proseli roselitismo, tismo, afirmando afirmando que ajudava os pobres para convertê-los convertê-los ao catoli catolicismo; cismo; enquanto outros a acusavam e denunciavam o seu comportamento demasiado ecumênico, uma espécie de caldeirão religioso, faltando com os deveres para com o hábito que vestia. Madre Teresa, nascida e crescida em Escópia, na atual Macedônia, terra onde conviviam cristãos, muçulmanos e ortodoxos, dessa terra extraiu a experiência e o ensinamento de sua gente, habituada a conviver com representantes de religiões diferentes. De fato, não foi difícil para ela trabalhar na Índia, também esta uma terra de longínquas tradições de tolerância e intolerância, conforme os períodos históricos. Terras, seja a albanesa, seja a indiana, nas quais foram pesadíssimos os ataques contra os católicos, até com as perseguições mais ferozes. Madre Teresa definia assim a sua identidade: “De sangue, sou albanesa. Tenho a cidadania indiana. Sou uma monja católica. Por vocação, pertenço ao mundo inteiro. No coração, sou totalmente de Jesus”. [5] Iconograficamente falando, o ideal seria representá-la lá, no santuário de Nossa Senhora de Letnica, Zoja Cërnagore, aonde ia quando criança em peregrinação com a sua família. Pintá-la nesse lugar, em meio a um multicolorido quadro pluriétnico e variado, como acontecia e acontece ainda com a Virgem Negra do pequeno povoado de Kosovo. A sua vocação era realmente pertencer ao mundo inteiro. Graças àquela forma mentis que se desenvolveu desde a sua tenra idade, lhe era natural, ainda que nem sempre simples, superar os obstáculos das diferenças, de qualquer tipo: O nosso objetivo é levar Deus e o seu nome aos mais pobres, sem distinção de origem étnica ou de fé. Oferecendo-lhes a nossa ajuda, não levamos em consideração as suas crenças, mas as suas necessidades. Nunca tentamos converter convert er ao cristia cr istianismo nismo aqueles aqueles que recebem nossa noss a ajuda. ajuda. Porém, o nosso noss o trabalho é o testemunho vivo da onipresença de Deus. E se, por meio desse testemunho, conseguirmos que católicos, protestantes, rotestantes , budistas ou agnósticos sejam seres humanos um pouco melhores, estaremos satisfeitos. Crescendo e vivendo circundados de amor, estarão mais próximos a Deus, e poderão encontrar a Ele e a sua imensa bondade.
Nunca ning ninguém uém foi rejeitado nas casas de Madre Teresa, pois pois ela ela nunca olhou olhou para a aparência da pessoa, e sim para a sua essência, em virtude daquele “Em verdade vos digo: toda vez que fizerdes essas coisas a um só desses meus irmãos, as tereis feito a mim” (Mt 25,40), e, exatamente por essa razão, o mais humilde dos irmãos se tornava merecedor de toda atenção. Madre Teresa respeitava as ideias alheias, mas, que fique 11
bem claro, nunca compactuou com elas, elas, permanecendo fiel à Igreja, Igreja, depositári depositáriaa da Verdade revelada, e a seu Esposo, Cristo Rei, morto na cruz para a salvação de todos; aquela cruz que ela, que fez o voto de nunca negar nada a Deus, quis abraçar completamente. O meu obrigado mais profundo e todo o meu reconhecimento ao padre Lusch Gjergji, filho espiritual de Madre Teresa, por seu apoio, sua generosidade, sua estima, por seu formidável testemunho e pelos livros e preciosos documentos que ele me permitiu consultar; ao padre Giuseppe Pelizza, salesiano, que, com sua rica experiência na Albânia, forneceu um quadro vivo daquela nação tão provada pela ditadura comunista e que, conhecendo a língua albanesa, pôde, com extrema atenção, traduzir muitos escritos de Madre Teresa publicados neste volume; ao professor Massimo Introvigne, por sua sapiente consultoria histórico-sociológica, à senhora Agi Bojaxhiu Guttadauro, única sobrinha de Madre Teresa, por sua grande paciência e colaboração; por fim, à Missionária da Caridade que respondeu a tantas questões, mas, por humildade, quis permanecer no anonimato, anonimato, representando desse modo todas as irmãs, passadas, presentes e futuras.
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DA TERRA “QUEIMADA”
Madre Teresa de Calcutá, um ícone ainda em vida, uma lenda para todos os povos da terra. Universalmente conhecida, já santa, para o mundo, quando percorria as ruas, hospitais, leprosários, encontrava chefes de governo, secretários de Estado, soberanos, embaixadores, pontífices. Foi a primeira pessoa não política a ser representada em vida em um selo. Madre Teresa, que não gostava de falar em público e tinha medo da notoriedade (“Não fui feita para encontros e congressos. Eu e o falar em público não combinamos”), [1] foi chamada a falar com os grandes do planeta, em assembleias e congressos internacionais, a receber homenagens e prêmios de enorme prestígio, até o Nobel da Paz de 1979, a aparecer nas manchetes dos jornais, nas revistas, nas telas das televisões de todo o mundo. Rios de palavras nunca parecem bastar para delinear a figura dessa pequena e imensa mulher de Deus; eis por que jornalistas e escritores continuam a tratar da mãe dos sofredores, e também por que muitíssimos continuam curiosos para c on onhecê-la hecê-la melhor. inguém, nunca, está satisfeito em relação a ela. Mas como ela fez para se tornar Madre Teresa de Calcutá? Tudo começou entre as paredes de sua própria casa. Madre Teresa nunca falava de seus familiares e de sua terra. Era de uma discrição impenetrável, trazia dentro de si os “segredos”, os afetos e o que resultou deles permaneceu sempre encerrado em seu coração. Não falava de seus entes queridos queridos nem de si: era Jesus que estava no centro de seu coração, eram os pobres o núcleo de seus interesses. Todavia, hoje que é oficialmente reconhecida como beata da Igreja, ela tem muito a dizer sobre si mesma, sobre sua história privada, sobre aquela extraordinária família em que nasceu, cresceu e se formou, tornando-se Madre Teresa de Calcutá. As premissas já estavam todas presentes em Escópia. Anjeze Bojaxhiu nasceu em 27 de agosto de 1910 em Escópia, quando, no território albanês (a cuja nacionalidade sua família orgulhosamente pertencia), ainda estava presente o domínio domínio turco, que por cinco cinco séculos, séculos, desde a morte do herói nacional nacional Gjergj Gjergj Kastrioti Skanderbeg (1405-1468), também conhecido como príncipe de Kruje – subjugou o povo albanês, até 1912. Desde criança, o herói nacional da Albânia foi treinado pelos turcos na arte militar, e em seguida fez carreira no exército otomano. O príncipe ríncipe de Kruje combateu pelos otomanos, até que, comandando um grupo fidelí fidelíssi ssimo, mo, retomou o castelo de Kruje, na Albânia. O sultão Murad II, do Império Otomano, furioso com a traição, enviou contra os albaneses um poderoso exército guiado por Ali Paxá. 13
Skanderbeg conseguiu deter o exército otomano com feitos mirabolantes, unindo as tribos do Épiro e da Albânia. As forças de Skanderbeg eram consideravelmente inferiores do ponto de vista numérico, mas, graças à sua tática militar, conseguiram infligir sobre os turcos uma pesada derrota, que enfureceu tanto o sultão que ele ordenou outra expedição contra os albaneses, mas Skanderbeg, também dessa vez, foi vitorioso, e ganhou do Papa os títulos de “defensor impávido da civilização ocidental” e de “atleta de Cristo”. Murad II não se resignou, por isso preparou dois exércitos com um total de 25.000 homens, mas o resultado para os otomanos foi igualmente desastroso. As façanhas de Skanderbeg, porém, preocuparam os venezianos, que, vendo em perigo o comércio que tinham estabelecido com os turcos, se aliaram com o sultão para combater Skanderbeg. a primavera de 1449, Murad II interveio pessoalmente contra a Albânia, com um exército imponente para a época. Entre batalhas e assédios, os turcos perderam metade do exército. A tentativa de conquista do império de Skanderbeg por parte dos mais hábeis paxás axás continuou, continuou, com expedi expedições ções contínuas, contra o castelo castelo de Kruje, mas nenhuma delas foi vitoriosa. A fama de Skanderbeg ultrapassou as fronteiras. Em 1458, foi para a Itália ajudar Ferdinando I, rei de Nápoles, filho de seu amigo e protetor, Alfonso de Aragão, na luta contra o rival João de Anjou e seu exército. Colecionou sucessivas vitórias e, enquanto viveu, os turcos não conseguiram conquistar o seu império. Skanderbeg morreu de malária em Lezha, na Albânia, em 17 de janeiro de 1468. Kruje, a heroica cidadezinha, caiu sob o domínio otomano dez anos depois, e, com ela, toda a Albânia passou para o domínio otomano. Boa parte da população albanesa, de origem ilírica, apesar do jugo otomano, conseguiu sobreviver com suas tradições e com sua profunda fé católica, que tem suas raízes em São Paulo, que, na Epístola aos Romanos, assim escreveu: “[…] de Jerusalém, e países vizinhos, até a Dalmácia, cumpri a missão de pregar o Evangelho de Cristo” (Rm 15,19). O cristianismo encontrou terreno fértil nessa região, tanto que, em 283 d.C., foi eleito o Papa Caio, que nasceu em Soloma, na antiga Dalmácia (atual Albânia). Com a queda do império albanês nas mãos dos turcos, muitos albaneses emigraram para Veneza ou para o sul da Itália; outros ficaram na Albânia e foram obrigados a se converter ao islamismo. Entre 1846 e 1848, um grande número morreu por sua fé, como os mártires de Stublla, Binça, Vërnakolla e Terzijaj, que foram deportados para a Turquia para que fossem eliminados os vestígios da fé cristã nessas terras, o que não ocorreu. Além disso, se constituiu o fenômeno dos laramani , isto é, os criptocatólicos: por convicção e consciência católicos, mas com nomes, costumes e hábitos muçulmanos. A cultura, a língua e a literatura da Albânia estão estreitamente ligadas ao cristianismo, pois ois por muitos muitos séculos séculos foram divul divulggadas em livros livros publicado publicadoss pela pela Igreja. Igreja. Foram a Igreja e seus sacerdotes que continuaram a manter viva a fé, protegendo a tradição albanesa. O papel da Igreja foi e é reconhecido por todos, inclusive pela própria Albânia, que, ainda há poucos anos, era ateia e comunista, e em 13 de novembro de 1967 aboliu e vetou, por meio de um decreto de Estado, qualquer religião. A consequência dessa medida foi imediatamente visível, com a destruição de 268 igrejas. 14
Em meio a tanta devastação religiosa e, portanto, também moral, lá aonde o espírito antirreligioso do regime estalinista de Enver Hoxha levou miséria e angústia social, emerge, como um farol muito luminoso, Madre Teresa. A família Bojaxhiu era composta por comerciantes e combatentes, porque a guerra fazia parte da casa, como em tantos e tantos outros lares albaneses que por séculos e séculos tiveram que empunhar armas para se defender. Os negócios dos Bojaxhiu se estendiam até Misir, no Egito. Um ramo dessa família se estabeleceu em Prizren, uma antiga cidade da província autônoma do Kosovo, e outro em Escópia. Os seus membros se deslocavam para seguir os fluxos comerciais, mas também para fugir das epidemias, sobretudo de cólera, que atingiram duramente a população de Prizren entre 1850 e 1855; ou então para escapar das cruentas perseguições turcas. Uma noite, os turcos reuniram todos os chefes de família católicos de Prizren para um jantar e ali mesmo os traíram, trucidando a todos de maneira horrenda, como foi transmitido pela memória oral. [2] Gente provada pelo sofrimento, pela pobreza, pelas guerras. Gente que fundava a própria rópria exi existência stência em fortes laços famili familiares, de amizade, na palavra palavra dada em qualquer qualquer ambiente ou circunstância, a assim chamada “palavra de honra”. Um dia, Madre Teresa explicou às suas irmãs: os albaneses “têm uma palavra, besa, que significa que, mesmo que você tenha matado meu pai e a polícia esteja atrás de você, se eu lhe dei a minha palavra, alavra, não revelarei revelarei nunca o seu nome, nem mesmo se eu for condenado à morte pela pela políci olícia”. a”. [3] À “palavra”, dada a Deus e aos homens, Madre Teresa foi sempre fiel e, para continuar assim, assim, estava e stava disposta disposta a pagar qualquer preço. Anjeze, em família chamada carinhosamente de Gonxhe, que significa botão de flor, sempre respirou essa cultura, e sempre viu a porta de sua casa se abrir cotidianamente para mulheres mulheres e homens necessitados necessitados de pão e de cuidados, cuidados, um prelúdi prelúdioo daquela daquela porta de madeira, com uma cruz de madeira em cima, na Lower Circular Road, 54/A, em Calcutá, a Casa Mãe das Missionárias da Caridade. Ao lado dessa porta, uma simplicíssima e pobre placa indicaria a sua nova morada: Mother Teresa Teresa M.C.[4]
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PÃO, SAL E CORAÇÃO
Os pais de Anjeze Gonxhe eram kosovares abastados. O pai, chamado Kolë (18731918), era oriundo de Prizren; a mãe, Drane (1889-1972), era de Novosella (Gjakova); não é por acaso que Madre Mad re Teresa será sempre muito ligada ao Kosovo. Quando a família Bojaxhiu chegou a Escópia, já gozava de uma situação muito boa, graças aos ótimos negócios comerciais que ela geria. A avó de Gonxhe, Çila, trabalhava junto com o marido, o avô Lazër. A “avó Çila” – contou Lazër Bojaxhiu (1908-1981), irmão de Anjeze e de Age (1913-1973), ao biógrafo por excelência de Madre Teresa de Calcutá e seu amado filho espiritual, padre Lush Gjergji [1] – “era particularmente inteligente e ativa; éramos muito ricos, tínhamos muitos trabalhadores que nos ajudavam, faziam bordados e outros trabalhos trabalhos femini femininos, enquanto ela ela se ocupava do andamento dos negócios. Era, portanto, uma família de antiga tradição mercantil”, [2] tradição que prossegui rosseguiuu com o pai de Lazër e de Gonx Gonxhe, he, Kolë Bojaxhiu, Bojaxhiu, um comerciante muito conhecido. Inicialmente trabalhav trabalhavaa e colaborava com o doutor Suškalović, que naquele tempo era um dos médicos mais conhecidos em Escópia e que gostava muito de Kolë. Provavelmente por esse motivo, muitos autores escreveram que meu pai era farmacêutico ou droguista, porque trabalhava com um médico e vendia remédios. Mas era um comerciante e um bom empreendedor. Junto com um amigo, era proprietário roprietário de uma empresa empr esa de construção c onstrução muito sólida em Esc ópia. ópia. Chegou a possuir pos suir várias casas, cas as, em uma das quais nós morávamos. Até a sua morte, tivemos uma vida agradável e serena. Era um homem muito sociável, de maneira que a nossa casa estava sempre aberta a todos [...]. Mais tarde, conheceu um comerciante italiano, um certo senhor Morten, provavelmente veneziano, muito rico, que trabalhava com várias mercadorias: gêneros alimentares, como óleo e açúcar, tecidos, peles, em suma, aqueles produtos que eram chamados “coloniais”. Papai se associou a esse senhor e começou a viajar muito, percorrendo, por assim dizer, toda a Europa.[3]
Com Morten, Kolë realizou obras privadas e públicas, como a ferrovia que liga Escópia ao Kosovo e o primeiro teatro da cidade, no qual a família Bojaxhiu se exibirá com recitais, balés, bandas musicais e, sobretudo, espetáculos dirigidos às crianças. Kolë era um grande apaixonado pela música e foi um dos fundadores da banda musical da cidade, denominada Zani i maleve, “A voz das montanhas”, que se exibiu pelas ruas e praças de Escópia, Escópia, quando, em 1912, depois depois de cinco cinco séculos séculos de submissão, submissão, a Albânia bânia e a Macedônia se tornaram independentes dos turcos. A banda de Kolë Bojaxhiu desfilou tocando hinos patrióticos, cantos populares e de batalha. Ainda há preciosas fotografias que testemunham aquele evento. Na família família de Madre Teresa se respirava respirava um grande calor calor e um grande afeto, a começar pelos pais: Quando ele voltava, queria todos em torno de si e nos contava detalhadamente tudo o que tinha visto, feito e
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projetado. Também nos trazia muitas coisas, mas, sobretudo, era divertido divertido e bom ouvi-lo ouvi-lo quando narrava as suas aventuras de viagem. Falava frequentemente e com prazer com Age [...], enquanto Nëna Loke[4] [...] falava com prazer comigo e com Gonxhe.[5]
Lazër Bojaxhiu também narrou ao padre Lush: Papai era um homem severo e esperava muito de nós. Lembro que, quando voltava para casa, à noite, me acordava para perguntar se eu tinha me comportado bem durante o dia, me tomava a tabuada e outras lições de casa, e sempre repetia: “Não esqueçam de quem vocês são filhos!”. Lembro com alegria a generosidade de meu pai. Doava a todos comida e dinheiro, sem que notassem e sem se vangloriar. Às vezes enviava também a mim para doar dinheiro, roupas, comida e outras coisas aos pobres da nossa cidade [...]. Dizia sempre assim: “Vocês devem ser s er generosos c om todos, porque por que Deus foi, e é, é, generoso c onosco, onosc o, nos deu tanto, nos deu tudo, por isso façam o bem a todos. [6]
A hospitalidade era uma regra de vida praticada com simplicidade. Na casa de Gonxhe, de fato, no almoço ou no jantar, havia sempre uma hóspede fixa, a velha senhora Markoni, que bebia café, aguardente, e comia à mesa com a família, que a acolhia amavelmente. Kolë ensinava aos filhos: “Acolham-na bem e com amor, porque é pobre e abandonada, não tem ninguém!”. ninguém!”. [7] Na Albâni Albânia, a, ser estéril é considerado uma tragédia, tragédia, de fato, como afirma um antigo antigo dito popular: opular: “Quem não tem fil filho ou fil filha não tem carne nem alma”; alma”; todavia, todavia, ter fil filhas era considerado um azar, por causa da maciça influência da cultura islâmica, na qual a mulher era considerada somente uma “bolsa” para conter filhos e o pai era o senhor da casa. O Alcorão, de fato, na sura IV, versículo 34, diz: Os homens prevalecem sobre as mulheres, por causa da preferência que Alá concede a eles em relação a elas, e porque eles gastam [por elas] os seus bens. As [mulheres] virtuosas são as devotas, que protegem no segredo o que Alá preservou. Admoestai aquelas cuja insubordinação temei, deixai-as sozinhas em seus leitos, batei nelas. nelas. Se depois elas vos obedecerem, não façais mais nada c ontra elas. Alá é altíssimo, gr ande.
Quando na Albânia nascia uma mulher, não se brindava, porque eram os filhos homens a alegria e a esperança da casa. Gonxhe era a terceira filha: Quando Gonxhe Bojaxhiu nasceu, mesmo estando a Escópia e as várias regiões vizinhas sob o domínio turco, a família a aceitou com muito amor e gratidão, como se ela fosse um dom de Deus, ainda que os pais tivessem preferido um filho homem, conforme os usos e a tradição popular daquele tempo.[8]
Ela foi batizada na Catedral do Sagrado Coração. Aos 7 anos, começou a frequentar a escola católica na mesma igreja paroquial do Sagrado Coração, onde recebeu a Comunhão e a Crisma. Depois, foi matriculada na escola pública. Gonxhe tinha um caráter muito amável, não tinha dificuldades em fazer amizades e em estabelecer relações positi ositivas vas com os professores. Sempre foi uma ótima ótima aluna, aluna, primei primeira ra da classe, classe, sempre pronta a ajudar os outros, também na família, família, como acontecia, acontecia, por exemplo, exemplo, quando a mãe mandava que os irmãos se revezassem na limpeza dos sapatos. Seu irmão, que cumpria com muita má vontade essa tarefa, considerada tarefa de mulher, pedia a Gonxhe para substituí-lo, e a irmã não deixava de contentá-lo. A mãe, orgulhosa da filha, afirmava que não gozaria por muito tempo da companhia de Gonxhe, ou porque iria logo 17
para o céu por causa de sua saúde frágil frágil, ou porque tomaria o caminho caminho da vocação religiosa. A generosidade foi uma qualidade que Gonxhe adquiriu imediatamente de seus pais. Madre Teresa se lembrava de seu pai do seguinte modo: “Papai Kolë me dizia assim: ‘Minha filha, não pegues nem aceites nunca um pouco de comida se ela não for compartilhada com os outros!’, ou então: ‘O egoísmo é uma doença espiritual que te faz escravo e não te permite viver ou servir aos outros!’”. [9] Na família de Madre Teresa, riqueza material e espiritual se amalgamavam perfeitamente. Gonxhe descobriu o “segredo” da vida entre as paredes da sua casa: combater cada mal do mundo com amor e por amor, pois, como posteriormente dirá Madre Teresa: “Somente o Amor salvará o mundo!”. Na Albânia, bânia, por causa de tantas tragédi tragédias, as, lutas e abusos que se segui seguiram ram por séculos séculos afora, se estabelecera entre a população um senso de solidariedade e acolhimento muito forte. Em tudo isso se esconde um profundo sentimento religioso, eixo sobre o qual girava e gira a tradição autóctone. A regra sobre a qual se funda a hospitalidade albanesa é: “A casa é de Deus e do hóspede”, cujos símbolos são três: pão, sal e coração. Pois bem, Madre Teresa fará dessa regra e desses símbolos símbolos a sua razão de viver viver.. Toda casa que ela abrir será a casa de Deus e, por conseguinte, a casa na qual hospedará, nutrirá, dessedentará e cuidará dos pobres, os quais ela definia como seus irmãos. O seu pão não será somente aquele feito de farinha, mas principalmente aquele de Jesus eucarístico, fonte da sua força. O seu sal será o gosto pela vida, extraído da fonte da fé, imensa, irrefreável, transbordante. Quem não conhece seu hino à vida? A vida é uma oportunidade, colha-a! A vida é beleza, admire-a! A vida é bem-aventurança, saboreie-a! A vida é um sonho, faça dela uma realidade! A vida é um dever, cumpra-o! A vida é um jogo, jogue-o! A vida é preciosa, cuide dela! A vida é uma riqueza, conserve-a! A vida é amor, desfrute-a! A vida é mistério, descubra-o! A vida é promessa, cumpra-a! A vida é tristeza, supere-a! A vida é um hino, cante-a! A vida é uma luta, aceite-a! A vida é uma tragédia, agarre-a, corpo a corpo! A vida é uma aventura, arrisque-a! A vida é felicidade, mereça-a! A vida é a vida, defenda-a!
Nesses versos está o sal, sal, aquil aquilo que dá sabor à realidade realidade visível visível,, que dá uma razão de ser a tudo aquilo que é, aquele sal que, tornando a existência saborosa, oferece a chave da sabedoria e da sapiência. Por fim, o coração, ou seja, o amor. Ainda hoje, há entre o povo albanês este hábito: 18
quando se oferece algo a alguém, se usa a mão direita, e a mão esquerda é colocada sobre o peito para simbolizar que a oferta é feita de todo o coração. Uma tradição que Gonxhe absorveu profundamente em todo o seu ser, e levará para fora de sua casa e das fronteiras de sua amada terra, nas ruas e casebres mais abandonados do mundo.
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TUDO COMEÇOU EM FAMÍLIA
Na famíli família Bojaxhi Bojaxhiuu havia havia algo algo a mais. Além Além da tradição, tradição, sobre a qual se fundavam solidariedade e sentimento religioso, tragédias sofridas, necessidades de ordem moral e material, havia a semente da fortaleza, pronta a enfrentar qualquer adversidade, e ao mesmo tempo uma fineza de sentimentos. Todos os familiares de Madre Teresa afirmam que ela parecia muito com a mãe, porque, sobretudo na caridade, uma era o espelho da outra. O “dar” sempre e de qualquer forma, característico da casa Bojaxhiu, era ditado não só pelos hábitos e costumes albaneses, mas também pela índole benigna e magnânima da mãe Drane, na qual se uniam de maneira muito feliz a pietas e a caritas cristãs. A oração e o rosário recitados em família eram o elo que unia todos os componentes do núcleo familiar. Madre Teresa costumará dizer: “Se deixarmos entrar a oração na família, ela se unirá cada vez mais; todos se amarão. Reúnam-se para orar mesmo que apenas por cinco minutos e daí nascerá a sua força”. Além disso, falando aos leitores da revista Drita ,[1] em junho de 1979, ela declarou: Quando penso em minha mãe e em meu pai, lembro-me sempre de quando, à noitinha, estávamos todos juntos untos para orar […]. Posso Poss o dar-lhes um único conselho cons elho:: voltem o quanto antes a orar juntos, porque a família que não ora junto não pode permanecer unida. E nunca tivemos tanta necessidade de orar juntos como hoje. Penso que todas as dificuldades do mundo se originam do fato de que não dedicamos tempo às crianças, à oração e à vida em comum. Todas as crises do mundo provêm disto: os pais estão tão tomados pelo elo trabal tr abalho ho que não têm tempo t empo para os filhos. filhos. Os filhos filhos estão sós e não têm diálogo diálogo com os pais. A mãe é o coração da família, ela é o lar que socorre, protege e acolhe os filhos.
Encontramos Agi Bojaxhiu Guttadauro, a única sobrinha de Madre Teresa. Filha de Lazër, vive em Mondello, a poucos quilômetros de Palermo, é casada com o siciliano Giuseppe Guttadauro, com quem teve dois filhos, Domenico e Massimiliano. É uma senhora bela e refinada, muito gentil e reservada. Nasceu em Tirana, em 11 de novembro de 1944. Tem uma lembrança esplêndida de seus pais, Maria e Lazër: No final da Segunda Guerra Mundial Mundial,, chegamos à Itália. Itália. Nossa família família era muito unida. unida. Meu pai não conseguiu rever nunca mais sua mãe e sua irmã Age. Quando o comunismo tomou o poder na Albânia, nos primeiros rimeiros anos do regime, não era possível possí vel entrar em contato com elas, elas, nem mesmo por carta. cart a. Depois, Depois, por volta do final dos anos cinquenta, meu pai enviava a vovó pacotes com alimentos e remédios, porque lá faltava tudo, mas com frequência subtraíam uma parte ou todo o conteúdo dos pacotes. Os sacerdotes e os católicos foram os heróis daquele trágico momento da Albânia, no qual foram perpetradas crueldades infames e a população foi perseguida e levada à fome. Minha avó Drane foi uma grande mulher e influenciou decisivamente toda a família. Foi ela que encorajou a filha no caminho da fé, conduzindo-a para o caminho dos pobres. Era uma mulher de uma caridade imensa, tanto que ainda hoje, em Escópia, se costuma dizer: “Você é generoso como uma Bojaxhiu”.
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Minha tia Age era jornalista. Trabalhava como locutora da Rádio Tirana em língua servo-croata, mas foi demitida porque era culpada de ser irmã de Lazër, que estava na lista negra dos albaneses refugiados na Itália, e de Anjeze, freira católica conhecida como Madre Teresa de Calcutá. Minha avó e minha tia viviam em um quarto e eram obrigadas a usar o banheiro com outras pessoas. O governo tinha expropriado tudo. A Madre [assim se refere à tia, com um tom de afeição e de grande respeito] trouxe sempre no coração a profunda e terrível dor por não ter podido fazer nada para ajudá-las. Na Albâni Albâniaa se s e podia entrar, entr ar, mas não sair; s air; nenhum de nós reviu mais a avó e a tia. Eu me c asei em dezembro de 1966, e, nos primeiros meses de 1967, a minha família encontrou, a Madre em Roma. Era a primeira vez que eu a via. Foi verdadeiramente um encontro comovente e tocante. Meu pai não a via há mais de trinta anos. Eles gostavam muito um do outro.
Passaram-se onze anos para que se pudesse estabelecer uma correspondência entre Madre Teresa e Nëna Loke. Aquela separação foi duríssima, uma dor dilacerante para ambas. Como era o temperamento de Madre Teresa? Uma pessoa simples, humilíssima, muito enérgica, ativa, com uma expressão decidida e um olhar penetrante. Poucas palavras, muita substância. Ativa e decidida, nunca perdia tempo. Uma mulher que conhecia bem o mundo e o amava enormemente, embora não fosse de modo algum uma desavisada. Uma mulher forte por fora e dulcíssima e terníssima por dentro, sobretudo em relação ao seu Jesus e aos pobres e doentes. A Madre passava segurança a quem estava a seu lado, infundia serenidade e transmitia uma grande força. Tinha sempre um rosário entre as mãos ou pendurado na cintura. Quando andávamos de carro com ela, o recitávamos sempre.
Que influência teve na existência da sobrinha? Certamente hoje eu não seria a mesma pessoa se não tivesse tido espiritualmente ao meu lado uma pessoa como ela. Não podíamos nos falar com frequência por telefone, mas ela estava sempre presente em mim e entre nós. Nos momentos mais difíceis da minha vida e quando tinha problemas, sempre pedia conselho à Madre, me confiava a ela. Comigo e com meu pai era afetuosa. Meu pai a tomava pelo braço, somente ele podia odia ter essa ess a intimidad intimidade, e, e João Paulo II, II , que c ostumava beijar-lhe beijar-lhe a face. fac e. Era extraordinári extr aordináriaa a amizade amizade que se instaurou entre ela e o Pontífice; falavam em inglês e costumavam trocar rosários, medalhas e imagens. Quando a Madre adoeceu, João Paulo II telefonava pessoalmente todo dia para ter notícias.
Agi relembra clara e limpidamente os ensinamentos da tia santa: A Madre considerava fundamental o papel da família. A família antes de tudo … me repetia sempre que o tesouro mais importante a ser conservado, protegido e cultivado é a família, elemento essencial a partir do qual cresce uma sociedade sã. Dizia-me com profunda seriedade: “Primeiro pense na sua casa, depois também nos outros”. Graças aos seus ensinamentos, me esforcei para me tornar uma boa esposa e uma boa mãe. Todo dia rezo à Madre e a revejo passear em nosso jardim; ouço de novo a sua voz, terna e firme. Ela amava os pobres e viveu como pobre. Comedida na comida, nunca se permitiu nada e como quarto tinha o aposento mais desconfortável da Mother House de Calcutá, o mais quente, por causa do fogão a carvão que estava no andar de baixo, e o mais úmido. Era um lugar pequeno, apertado, mobiliado com uma cama estreita, uma carteira escolar, que servia de escrivaninha, e um banco. O médico lhe disse que não devia ficar lá, mas ela insistiu em ficar, até o fim.
Mil atenções, mil cuidados Drane Bernaj Bojaxhiu tinha para com seus filhos, que ela amava com uma ternura infinita. Graças às suas ótimas condições econômicas, a família Bojaxhiu podia permitir-se transcorrer as férias nas termas de Vrnjačka Banja (distrito de 22
Raška, na parte central da Sérvia). “Eu darei tudo a vocês”, dizia o pai, “peçam e peguem, eguem, mas também exig exigiirei algo algo de vocês, que sejam bons e sirvam sirvam de exemplo exemplo para todos”. Lazër, o irmão, testemunha ainda: ainda: O meu pai, Kolë, frequentemente me dava dinheiro, comida ou roupas, e me dizia: “Vá até aquela família, sem que ninguém note. Se encontrar a porta ou a janela aberta, deixe lá a nossa ajuda e fuja”. Muitas vezes fiz isso, como também Age e Gonxhe. Meu pai queria ajudar, mas sem ser percebido, fazendo como dizia o Evangelho: “Quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua mão direita, para que tua esmola permaneça em segredo, e o teu Pai, que vê no segredo, te dará a recompensa”.[2]
O pai Kolë era um homem muito inteligente, conhecia várias línguas (albanês, servocroata, turco, italiano e francês), e era um ótimo comerciante; patriota fervoroso, interessava-se por questões políticas, de modo que empenhou muita energia na causa albanesa, esforçando-se ativamente pela independência da nação do domínio turco. Seu filho Lazër recordará: Em 28 de novembro de 1912, encontraram-se na nossa casa os chefes das tribos Barista, Logoraci e Pelucaj, com Naraci e outros, para celebrar a independência da Albânia! Estava também Bajram Curri, famoso patriota que lutou contra os turcos, Hasan Prishtina, Sabri Qytezi e muitos outros. No centro da sala tinham colocado caixas de fósforo, tinham colocado fogo nelas e as chamas chegavam até o teto. Eu tinha quatro anos. Por toda a noite conversaram e cantaram os contos dos heróis, acompanhados pela melodia do çifteli (tradicional bandolim andolim albanês). albanês). Isto Ist o se repetia com frequência na nossa noss a casa: cas a: meu pai Kolë ajudava ajudava materialmente materialmente os patriotas, trocava troc ava com c om eles c onselhos e opiniões. opiniões.[3]
Kolë fez com que não só seu herdeiro homem estudasse, como era costume na sua terra, mas também Age e Gonxhe. Era vereador de Escópia e deu a vida pela política. Era o outono de 1918, no final da Primeira Guerra Mundial, quando foi a Belgrado com outros vereadores vere adores e encontrou enc ontrou a morte. mort e. Foi envenenado. envenenad o. Voltou Voltou para casa muito mal, foi levado ao hospital e na manhã seguinte foi operado, mas todo o esforço para mantê-lo vivo foi em vão. Estava morto o “pai dos pobres”, como o chamava a gente de Escópia. Suas últimas palavras foram para sua esposa Drane: “Não se preocupe, tudo acabará bem. Tudo está nas mãos de Deus […] Drane, eu lhe peço que cuide cuide de nossos fil filhos […] a partir de hoje são seus... e de Deus”. No funeral havia havia uma multi multidão imensa. Muitos Muitos comerciantes fecharam suas lojas. O luto foi grande e profundo, muitíssimos pobres choravam. Kolë foi sepultado no cemitério da cidade, na parte destinada aos católicos. Em 26 de julho de 1964, Escópia foi duramente atingida por um terremoto que danificou gravemente o cemitério; por isso os corpos foram transferidos para fora da cidade, em Butel. Assim, os restos mortais do pai de Madre Teresa, na neg neglligência mais absoluta, absoluta, foram, como todos os outros, exumados e colocados em uma vala comum. Dele não existe uma lápide, uma cruz, nem mesmo um sinal que o indique. Afirma padre Lush Gjergji: Esse é o destino da família Bojaxhiu, de tantas famílias nossas e do povo albanês: o grande sofrimento faz crescer e amadurecer as grandes personalidades, porque é o caminho mais seguro, mais curto para se unir ao Cristo sofredor, para chegar à vitória da ressurreição. Kolë Bojaxhiu erigiu o maior monumento vivo, tendo criado e educado a grande Madre Teresa, a gloriosa filha, nascida, crescida e educada na grande família
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Bojaxhiu.[4]
Em um artigo publicado na revista Drita , em 1979, Madre Teresa explicará ao padre Lush que: O sofrimento nos ajuda a nos unir ao Senhor, aos seus sofrimentos. Quando vejo o sofrimento dos homens de hoje, mais intensos do que nunca, penso que o Calvário está presente mais uma vez em todo o mundo, que os sofrimentos de Cristo ainda vivem nos homens de hoje. Assim, quando vejo Cristo na cruz, com a cabeça baixa, aixa, penso que ele está lá para beijar beijar a todos nós, que tem os braços abertos para abraçar a todos e que tem t em o coração aberto para colocar-nos todos dentro de Si. Por isso ficamos contentes quando o Senhor nos usa. Não sei s ei quanta dor há no mundo, quanta miséria, quanto mal, mas é um fato que, mesmo com essa ess a dor, há pessoas que, na dor, são alegres. alegres.
Além do cemitério de Escópia, o terremoto de 1964, causou graves danos também à Catedral do Sagrado Coração, à casa do bispo, à casa paroquial e a várias construções, tanto religiosas como civis, entre as quais a casa na qual nasceu Madre Teresa, uma bela casa que ficava no centro da cidade. A família Bojaxhiu, já em Prizren, era proprietária de muitas casas, possuía quase um quarteirão da cidade, e também em Escópia era proprietári roprietáriaa de diversos diversos imóveis, móveis, alguns alguns dos quais quais colocados colocados à disposi disposição ção dos pobres. Hoje nenhuma pedra, nenhum tijolo relembra o lugar onde nasceu e cresceu Madre Teresa: no seu lugar há um supermercado. “Éramos uma família feliz, cheia de alegria, de amor e de crianças serenas. Apesar de frequentar uma escola laica, minha família primeiro, e depois a paróquia do Sagrado Coração, me deram uma sã e profunda educação religiosa”, assim falou Madre Teresa um dia a seu filho espiritual, padre Lush. A mãe Drane tinha origens nobres, nascera na rica família Bernaj, e tinha se casado com Kolë Bojaxhiu, porque assim tinham decidido as duas famílias. Apesar de o matrimônio de Drane e Kolë ter sido um casamento arranjado, foi uma união formidável. Madre Teresa contará: Nunca poderei esquecer esquec er minha mãe. Geralmente era muito ocupada durante o dia, dia, mas, quando anoitecia, anoitecia, costumava apressar-se nas suas tarefas, para ficar pronta para receber meu pai. Naquela época, não entendíamos e costumávamos sorrir e também brincar um pouco por isso. Hoje não posso deixar de evocar a grande delicadeza que ela tinha com ele: qualquer coisa que acontecesse, ela estava sempre pronta a acolhê-lo com um sorriso nos lábios.[5]
No sentimento e no coração de Madre Teresa, haverá sempre um amor imenso por sua família, e por isso sempre expressará a sua grandíssima consideração pela instituição familiar, como célula indispensável e inevitável para criar filhos sadios, corretos e íntegros. Ela usará palavras fortes e tocantes aos dotes de quem sabe se doar em família, que frequentemente se torna um ambiente de pobreza: “Às vezes deveremos nos fazer algumas perguntas para saber orientar melhor as nossas ações. Conheço os pobres? Conheço, em primeiro lugar, os pobres de minha família, de minha casa, aqueles que vivem perto de mim: pessoas que são pobres, mas não por falta de pão?”; além disso, “perguntemo-nos se sabemos se nosso marido, nossa mulher, nossos pais, mesmo vivendo conosco, não vivem talvez isolados dos outros, sem se sentir amados”, porque, 24
“muitas vezes, basta uma palavra, um olhar, um gesto, para que a felicidade encha o coração de quem amamos”. Ela dizia também: “Comece dizendo uma palavra gentil ao seu filho, ao seu marido, à sua esposa”. De fato, ela considerava que o primeiro lugar no qual devemos fazer e demonstrar caridade era justamente o ambiente doméstico; caso contrário, “como poderemos amar Jesus no nosso próximo se não o amamos nas pessoas que temos perto de nós, na nossa família?”. Estava convencida de que aqueles que não sabem chegar ao sacrifício por meio dos afetos de sua própria casa nunca poderão se aproximar das necessidades dos pobres: “Escutem o que eu digo: se não nos sacrificamos gratuitamente por quem está perto de nós, não o poderemos fazer também pelos pobres”. A família é o ponto mais sensível, do qual tudo começa: “A paz e a guerra começam em casa. Se quisermos realmente a paz no mundo, comecemos por nos amar reciprocamente nas nossas famílias. Se quisermos semear alegria em torno de nós, precisamos recisamos que toda a nossa família família viva viva alegremente”. alegremente”. Basta que um só esteja triste, triste, amuado, carrancudo, para estragar o clima e a atmosfera da casa, e o comportamento dele, dele, extremamente extremamente egoísta, recai sobre os corações de seus entes queridos. A morte de Kolë foi uma perda enorme para os infelizes de Escópia e foi uma tragédia para a família família de Madre Teresa. A relação de trabalho trabalho com Morten foi interrompida, nterrompida, e Drane, viúva, teve de enfrentar uma situação dificílima, tendo de criar e manter três filhos. Muito inteligente e muito estudiosa, Gonxhe dedicava seus dias à escola e à paróquia, que ela frequentava assiduamente e da qual era um membro ativo, além de ser uma voz preciosa reciosa para o coro. A paróquia foi a sua segunda casa. As relações da família Bojaxhiu com a comunidade católica local eram ótimas. O pai, rico e generoso, tinha sido um ponto de referência precioso recioso para o arcebispo arcebispo de Escópia, Escópia, dom Lazër Mjeda, de quem era amig amigo e a quem devia muito. Gonxhe, que era apaixonada por livros e adorava poesia, apreciava particul articularmente, armente, entre os poetas albaneses, albaneses, as líricas íricas escritas escritas e publi publicadas pelo pelo irmão do arcebispo, padre Ndrè Mjeda. Gonxhe, que tinha uma mente brilhante e muito vivaz, se dedicava intensamente nos recitais paroquiais, mas também naqueles preparados no teatro de Escópia; além disso, se apresentava com dança ou ao bandolim... e também escrevia poesias. Era muito dinâmica e eficiente, fazia tudo com uma dedicação e ímpeto, pondo em prática o ensinamento materno: “Minha cara Gonxhe, se fizer algo, um trabalho, faça-o bem e com amor, ou não o faça de modo algum!”. A família, no pensamento de Madre Teresa, é uma escola de amor, porque somente nela, e em nenhuma outra associação humana – assim ela sempre creu e pregou –, se aprende o alfabeto do doar-se: “O amor começa quando nos dedicamos àqueles que estão próximos a nós: os membros da nossa família”. Isso ela viu em sua própria casa, em torno à mesa e nas atividades de sua mãe Drane, sempre pronta a servir, por amor, marido e filhos. E, uma vez servidos, ela se dedicava a servir os pobres de Escópia. Lembra padre Lush Giergji: 25
A nossa cultura albanesa é substancialmente uma cultura da vida e pela vida, particularmente na aceitação das crianças como dom de Deus e no cuidado com os idosos, duas joias da nossa tradição. Na Albânia, onde não havia nenhuma intervenção assistencial do Estado, a mulher era o fundamento, a coluna sobre a qual se erguia todo o sistema social: a casa era o refúgio dos pequenos e dos velhos, dos sãos e dos doentes, dos pobres e dos ricos.
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GENTE SEM NADA “QUE MINHA MÃE ALIMENTAVA”
A mãe de Gonxhe teve, de uma hora para outra, de enfrentar uma situação realmente crítica. O dia não bastava para realizar todos os afazeres, então ela procurou um trabalho que pudesse fazer também à noite: costureira de vestidos de noiva e de roupas folclóricas, que eram usadas durante as festas nacionais, religiosas e familiares. O filho Lazër a recorda como uma mulher verdadeiramente forte, indestrutível, mas, ao mesmo tempo, doce e generosa e, apesar do terrível luto que tinha sofrido, continuou a ser generosíssima e misericordiosa com os pobres, que continuavam a vir, numerosos, à sua porta. A fé a sustentou: Era muito generosa. Acho que Gonxhe se parece muito com a nossa mãe: nela descubro sempre características, traços comuns a ambas. Ela sabia manter a ordem em casa, e nos educava bem, com poucas palavras, alavras, mas muitas ações e exemplos. exemplos.N N ão permitia que nada nos faltasse. Lembro-me, de modo especial, da sua fé. Toda noite rezávamos juntos.[1]
A mãe de Gonxhe tinha uma devoção especial por Nossa Senhora de Cërnagora, em Letnica, que era venerada no santuário mariano da diocese de Escópia-Prizren, e para lá ia todo mês de agosto, na festa da Assunção. Ela ia a pé, junto com outros peregrinos, e ao longo do caminho oravam e cantavam. Para esse lugar de oração e devoção, Drane levava também seus filhos, aliás, Gonxhe, que a mãe costumava chamar com o apelido carinhoso de “Giyli”, e Age; chegavam lá até um mês antes, ou mais. Alojavam-se em casas de conhecidos, ou em alguns lugares que ficavam na frente da casa paroquial. O pai deles tinha contribuído contribuído para a construção do edifíci edifício, o, por isso o proprietári proprietárioo da casa colocava à disposição alguns cômodos para a família Bojaxhiu. A mãe ia a pé, enquanto os filhos iam em uma carroça puxada por cavalos. A saúde de Gonxhe era bastante instável e uma vez, doente de coqueluche e malária, sarou completamente em Letnica, a cidadezinha mariana frequentada todo ano por milhares e milhares de peregrinos. O santuário de Letnica se encontra em um pequeno povoado do qual toma emprestado o nome; acorrem para lá, em agosto, cristãos e muçulmanos, para rezar à Virgem Negra de Cërnagora. O pequeno povoado normalmente não supera os 300 habitantes, mas nesse período do ano chegam milhares e milhares de fiéis, provenientes da Macedônia, Albânia, Kosovo, Croácia e outras regiões da ex-Iugoslávia. Trata-se de uma festa interétnica, muito diversificada, que tem também um aspecto profano. De fato, muitos vão para lá para fazer negócios na praça poeirenta, com bares improvisados, bancas e ogos de todo tipo, tudo acompanhado por música cigana. A subida que leva à Virgem Negra fica cheia de deficientes, feridos, doentes, mães com seus filhos, fiéis, ciganos, pobres e abastados, misturados a pessoas que pedem esmola ou imploram algo para comer. Há em Letnica uma humanidade heterogênea, já presente 27
em Escópia, com a qual Gonxhe se habitua a viver e com a qual, tornando-se Madre Teresa mesmo permanecendo a mesma continuará, na Índia, a conviver. Conta padre Lush: Para mim, Madre Teresa é a primeira missionária que ultrapassou todas as fronteiras e limites do tempo e do espaço, das diferenças étnicas, religiosas, socioculturais e de castas com a força da fé e a inspiração do amor. A “chave” de leitura e interpretação de Madre Teresa e de suas obras poderia ser esta: o sofrimento motivado e oferecido a Deus para o bem de todos; a vida contemplativa ativa, consagrada a Deus e ao homem; o amor em ação, ou como diria ela: “pequenas coisas feitas com grande amor”.
A devoção à Virgem de Letnica remonta ao século XVII: a primeira igreja foi construída depois do incêndio da cidade de Escópia, provocado pelos turcos. A imagem de Nossa Senhora saiu incólume das chamas, para reaparecer milagrosamente entre as montanhas de Letnica. Dentro do santuário, a procissão dos fiéis é contínua: eles rezam, caminhando na direção da imagem de Nossa Senhora, para depois dar a volta no santuário, louvando, recitando o rosário e acendendo velas. A poucas dezenas de metros, em um vasto prado, após a procissão, se reúnem centenas e centenas de pessoas. Lazër nos contará: Aqueles eram momentos maravilhosos. Estávamos juntos todo o dia, brincando, passeando, sobretudo próximo às fontes (do rio Letnica) Letnica).. À noite, nos reencontrávamos reencontr ávamos em volta da lareira, lareira, onde ficávamos até tarde, rindo e contando histórias. Gonxhe tinha sempre algum livro na mão; mamãe pedia a Age que não a deixasse ler muito, mas a levasse lá fora, para passear e descansar. A Letnica vinha muita gente dar testemunho de sua própria fé e de sua própria religiosidade. Não só católicos, mas também fiéis de outras religiões. Gonxhe gostava muito de ficar na igreja, sobretudo se estivesse vazia. Agradava a Gonxhe rezar na solidão.[2]
Drane ficava muito bem em Letnica, era o seu paraíso que refloria: “Parecia”, testemunha seu filho, “que por todo o ano mantivesse o humor alegre adquirido durante a peregrinação a Letnica”. [3] Também depois da morte do pai, apesar de as possibilidades econômicas da família estarem consideravelmente diminuídas, os pobres de Escópia, e não só os pobres, continuavam a se dirigir aos Bojaxhiu. Madre Teresa cresceu assim, em meio à pobreza, em meio à caridade de sua mãe. Confessará: Nunca ninguém ninguém saía de mãos vazias. vazias. Todo dia tínhamos alguém alguém à mesa no almoço. almoço. Nas primeiras primeiras vezes eu perguntava a minha mãe: “Quem são esses?”. ess es?”. Ela Ela me respondia: “Alguns “Alguns são parentes, outros não, mas são gente nossa”. Quando cresci, intuí que eles eram pobres, gente sem nada, que minha mãe alimentava.[4]
A mãe de Madre Teresa cuidava daquelas pessoas como se fossem gente da família, “gente nossa”, em suas próprias palavras. Assim, ia uma vez por semana à casa de uma senhora a quem levava comida e cuja casa arrumava, ou então visitava Filja, uma alcoólatra muito doente, cheia de feridas. Drane lhe dava banho e a medicava duas vezes ao dia, cuidando dela como se fosse uma criança. Havia também uma viúva com seis filhos, com pouca saúde e que trabalhava dia e noite. Quando Drane não podia visitá-la, mandava Gonxhe. Um dia, a pobre viúva morreu, de modo que Drane decidiu levar para a própria casa os seis órfãos da viúva, que cresceram junto com seus filhos. 28
Uma mulher excepcional, certamente fora do comum. Poderia ser definida como uma Madre Teresa de Escópia... A ajuda que Drane dava aos pobres era consequência direta da sua grandíssima fé: o próximo, para ela, representava Cristo, o Cristo que preenchia desmedidamente sua jornada diária. Jamais nervosa, impaciente, resmungona; sempre orante, com os lábios, com o pensamento ou com a ação. Uma mulher extraordinária, que soube infundir nos filhos a sua fé, o amor pelo Senhor, o amor para com o próximo, sobretudo pelos que sofrem, espelho espelho de Cristo. Cristo. Nas suas “expedi “expedições ções de caridade”, frequentemente levava levava também seus filh filhos, os, aos quais ensinava: “Quando fizerem o bem, façam-no como se jogassem uma pedra no fundo do mar”, nenhum rumor, mesmo imperceptível, deveria chegar à superfície, porque a caridade caridade por amor não é feita feita para ser aplaudi aplaudida da por alguém, alguém, nem mesmo por quem recebeu o benefício. A esse respeito é esclarecedor o episódio da viúva do Evangelho: na sua miséria, a mulher joga no tesouro do templo “tudo o que tinha para viver” (Mc 12,44). “A sua pequena e insignificante moeda se torna um símbolo eloquente: essa viúva doa a Deus não o que tem de supérfluo, não aquilo que ela tem, mas aquilo que ela é”, como explicou Bento XVI na mensagem para a Quaresma de 2008. Todavia, para Drane Bojaxhiu não se tratava simplesmente de dar esmolas, mas de estar sempre entre os pobres e os que sofrem, uma escolha radical, decisiva para a sua vida e para a vida de seus filhos. Foi a grande inspiradora do futuro de Gonxhe. Frequentemente, na vida dos santos, estão presentes figuras igualmente santas, que servem como modelo; assim o francês São Vicente de Paulo, o “pai dos pobres”, foi o inspirador de Giuseppe Benedetto Cottolengo. Dizia aquele pelo qual a França criou o Ministério da Caridade: “Amemos a Deus, meus irmãos, mas o amemos a nossas custas, com o cansaço dos nossos braços, com o suor do nosso rosto”. E assim afirmava São Giuseppe Benedetto Cottolengo: “Não contem nunca as moedas que vocês dão, porque eu digo sempre assim: se ao dar esmolas a mão esquerda não tem de saber o que faz a direita, também a direita não deve saber o que ela mesma faz”. [5] A mãe de Santo Agostinho, Santa Mônica, foi para o filho a mediatriz entre céu e terra. A mãe de João Bosco foi para ele mestra, apoio e colaboradora. Foi assim também com Santa Teresinha de Lisieux em relação a seus pais, os santos Luís e Zélia Martin. [6] Santa Teresinha dizia sempre que não era santa, mas era “filha de santos”, e também que: “O Senhor me deu dois pais mais dignos do céu do que da terra”. Ela, de quem a Igreja reconhece o mérito de ter indicado a “pequena via” para atingir a santidade, confessava candidamente que tinha aprendido a espiritualidade da sua “trilhinha” no colo da mãe e, “ao pensar em meu pai, ai, penso naturalmente naturalmente no bom Deus”, enquanto dizi diziaa à suas coirmãs: coirmãs: “Era só olhar olhar para meu pai para saber como oram os santos”. A santidade era de casa também no lar dos Bojaxhiu em Escópia. Drane foi para a bem-aventurada Madre Teresa a figura figura que, com o exemplo exemplo de sua alma, alma, transmiti transmitiuu à filha o que ela estava pronta para receber. A pequena Gonxhe aprendeu desde pequena a amar Jesus e a ver nos pobres o Cristo crucificado. Observando e vivendo com seus pais, ais, ela ela abriu, abriu, pouco a pouco, os olhos olhos para o Caminho, Caminho, para a Verdade e para a Vida. 29
Um dia, o Papa Paulo VI disse-lhe: “Antes de fazer de ti uma santa, seria preciso santificar teus pais”. [7] Enquanto Gonxhe cresce, desperta nela a vocação religiosa. Ela quer entrar para um convento, quer oferecer toda a sua vida ao Senhor. É a própria Madre Teresa que conta como tinha manifestado o seu desejo à sua mãe, a qual ficou sem reação, visto que o único filho homem já tinha saído de casa, pois ganhara uma bolsa para estudar na Áustria: Quando manifestei o desejo de doar a Deus a minha pureza, minha mãe ficou contrariada, mas finalmente disse: “Está bem, minha filha, vá, mas fique atenta para ser somente de Deus e de Cristo”. Não somente Deus, mas também ela teria me condenado se eu não tivesse seguido dignamente a minha vocação. Um dia me teria perguntado: “Minha filha, você viveu somente para Deus?”. Minha mãe, no começo, era contra minha vocação de me tornar missionária, apesar de ser ela uma santa. Não queria me perder. Todos em casa rezamos juntos. Um dia, ela me disse: “Eu lhe darei a permissão para entrar em um convento”, e o que fez? Trancou-se em um quarto o dia inteiro e não quis ver ninguém. Quando saí da minha casa para ir para as missões, ela me disse: “Coloque sua mão sobre a mão de Jesus e olhe para a frente. Olhe diretamente para ele. Nunca olhe para trás. Sempre para a frente!”,[8] porque “se você olhar para trás, voltará”. [9]
Gonxhe nunca mais olhou para trás.
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O PADRE JESUÍTA E A REVISTA MISSIONÁRIA
Um fator decisivo para as escolhas de Gonxhe foi o encontro com os padres jesuítas, que chegaram a Escópia em 1921. Eles pertenciam à “missão volante” da província do Vêneto. O primeiro a chegar foi padre Gaspër Zadrima, de origem albanesa, que se tornou pároco da igreja do Sagrado Coração, em 1922. Depois, chegou o padre Anton Bukovi e, em seguida, o padre Cepetić, a quem foi confiada a pastoral juvenil da igreja e que, mais tarde, foi substituído pelo padre Franjo Jambreković, que, por sua vez, foi nomeado pároco. Gonxhe participava ativamente na paróquia, ocupando um lugar importante na instrução catequética; frequentemente traduzia do servo-croata para o albanês, porque muitos jovens não entendiam aquela língua. Além disso, inscreveu-se na Congregação de Maria, fundada pelo padre Jambreković, que exerceu grande influência sobre Gonxhe. Foi exatamente nesse contexto que ela começou a aspirar a uma vida religiosa de caráter missionário. Padre Jambreković, sacerdote de profunda fé e grande evangelizador, reunia em oração os fiéis, falava sempre das missões, sobretudo aos ovens, e recolhia fundos em favor deles. Basta ler o primeiro relatório que escreveu sobre sua atividade em Escópia para perceber o entusiasmo que colocava no apostolado: Para a festa da Imaculada Conceição, em 8 de dezembro de 1925, inscrevemos e admitimos com muita festa na Congregação de Maria as primeiras nove meninas, que receberam nesses três meses cerca de cem comunhões, rezaram cerca de duzentos rosários e ofereceram muitos sacrifícios pela conversão de Escópia.
Dotado de grande espírito de iniciativa, fundou a Associação da Juventude Católica, a Congregação de São Vicente, a Congregação para as mulheres e os jovens da escola. Para preservar o mundo juvenil de influências culturais negativas, abriu uma biblioteca católica, que começou com trezentos volumes, enriquecendo-a, posteriormente, cada vez mais. “Há certos jovens que evitam qualquer relação com a Igreja”, escreveu também em seu relatório, “mas há tantos outros, rapazes e moças, que se doam e se sacrificam pela ela salvação salvação de Escópia. Escópia. Basta ver os salões salões das nossas reuniões, reuniões, para perceber como aqui se trabalha pela educação da juventude”. Entre eles, estava a vivaz Gonxhe, que não se contentava em participar, mas organizava os trabalhos, ao ponto de se tornar o braço direit direitoo de Jambreković. Jambreković. Chamavam-na “a alma da juventude católica católica de Escópia”. Escópia”. E todos a amavam. A música era parte integrante da família Bojaxhiu, por isso Age, contralto, e Gonxhe, soprano, entraram no coro, juntamente com o irmão Lazër. As duas irmãs cantavam tão bem que foram definidas “os dois rouxinóis da igreja”. “As meninas da Congregação de Maria”, escrevia o padre Jambreković em um relatório de 1927, “organizaram a oração para a conversão de Escópia [...]. Depois de tantas orações e sacrifícios, agora vêm também muitos rapazes, um de cada vez, e assim 31
o coro aumentou e melhorou”. O pároco era um organizador incansável de encontros culturais, recitais, concertos de beneficência, excursões... Assim se lembra dele o primo e coetâneo de Madre Teresa, Lorenc Antoni: Ele nos lia algo sobre as missões, sobre os pobres e sobre os leprosos. Também distribuía jornais católicos e, sobretudo, a revista Katoličke misije ( Missões issões católicas). Sei que também Gonxhe lia com muito prazer essa revista. Havia muitos escritos de missionários croatas e eslovenos na Índia, nas regiões de Calcutá, onde trabalhavam. Posso afirmar com segurança que aquele jornal inflamou Gonxhe em relação às missões, e a ajudou a desenvolver a sua vocação religiosa e missionária.
Padre Jambreković – de quem Madre Teresa dirá: “Era um bom sacerdote. Onde há bons sacerdotes, crescem e amadurecem bem também as vocações” – e a revista revista missionária católica Katoličke misi je fizeram com que nascesse em Gonxhe o grande desejo... Seu irmão Lazër testemunhou: Às vezes me parecia que minha mãe e minhas irmãs moravam na igreja, de tanto que eram devotas e generosas. O canto religioso, a liturgia e as histórias sobre as missões criavam o mundo no qual viviam. Enquanto meu pai estava vivo, a nossa casa era um viveiro político. Depois de sua morte, a fé nos nutria. Mãe e filhas eram incansáveis em organizar e ajudar as atividades religiosas. Quando fui embora de casa, Gonxhe já tinha 13 anos e estava apaixonada pelo trabalho dos missionários. Quando estes vinham de países distantes, ela os encontrava, e os escutava com prazer. Um deles, um dia, disse: “Todo homem tem seu caminho e deve segui-lo”. Essas palavras tocaram profundamente o jovem coração de minha irmã. O jesuíta, que substituíra o sacerdote albanês, abriu um dia na igreja um mapa, no qual estava assinalada a posição de todas as missões. Lembro-me de que também isso impressionou muito Gonxhe, porque veio logo me contar e me disse: “Irmão, se você soubesse como e onde trabalham os nossos missionários [...] que vida eles levam e como têm necessidade de ajuda”.[1]
Gonxhe tinha 12 anos quando começou a desejar pertencer totalmente a Deus. Não foi fácil: às vezes lhe parecia que a vocação não estivesse mais presente nela, às vezes a “tentação” era fortíssima. Começou a jejuar, a meditar, a ler muito e a rezar. Rezou por seis anos, principalmente a Nossa Senhora de Letnica, Zoja Cërnagore. Nëna Loke foi falar falar como o pároco: “Minha filha filha quer ser missi missionári onária”, a”, e o pároco lhe perguntou: erguntou: “Você “Você está certa de que é isso que Deus quer?”. Também Gonx Gonxhe he se fez a mesma pergunta. pe rgunta. Esta foi fo i a resposta respost a do padre Jambrekov Ja mbreković: ić: “V “Você ocê saberá sabe rá quando estiver e stiver intimamente feliz. Se a ideia do convite de Deus, para que o sirva e sirva o próximo, lhe deixa feliz, é a melhor prova da sua vocação”. E ela disse: “Desde quando tinha doze anos penso nisso. Agora creio que Deus está me chamando para que eu seja missionária. E estou feliz! Desejo ser uma boa freira missionária, para colaborar com a evangelização, servindo os pobres. Desejo que as pessoas amem Jesus Cristo”. [2] E o padre Jambreković replicou: “Minha filha, pela sua felicidade, se você está feliz ao pensar que Deus lhe chama para servir a Ele e ao próximo, então essa é a melhor prova da sua vocação. A alegria profunda é como uma bússola que lhe indica a direção da vida. É necessário comportar-se assim, mesmo quando o caminho a tomar não está claro e a trilha é difícil”. E em seguida completou: “A alegria é a oração. A alegria é a força. A alegria é o amor. Deus ama quem doa com alegria”. 32
Nos anos 1927 e 1928, permaneceu dois dois meses segui seguidos dos em retiro retiro espirit espiritual ual no santuário de Nossa Senhora de Letnica. Queria compreender se era realmente o Senhor que a chamava. E diante de Nossa Senhora de Cërnagora, na vigília da festa da Assunção, no dia 14 de agosto de 1928, tomou a decisão. Contará ao primo Lorenc, o qual chamava de Lenci: “Irei para as missões e me dedicarei totalmente a Deus, para a salvação das almas! Na festa da Assunção pedi a Nossa Senhora de Letnica a sua bênção maternal: ‘Senhora minha, ajuda-me a realizar o projeto e a vontade de Deus, assim como tu fizeste! Ajuda-me nessa viagem longa e desconhecida. Parto contigo, minha Senhora’. Não sei como será a minha vida futura, o trabalho, o apostolado. Tive na minha vida tantos desejos: de dedicardedicar-me me à música... música. .. Você sabe s abe bem como amo a música, mús ica, o c anto, e o amarei mais mais ainda cantando louvores ao Senhor. Também amei tanto a literatura, particularmente a poesia”. E aí me confidenciou que tinha um caderno cheio de poesias: “Quem sabe se poderei ainda escrevê-las ou lê-las” – me disse. “Eu também gostaria tanto de ser professora, de educar as novas gerações, de me dedicar à escola. Como você vê, provavelmente não poderei realizar todos esses desejos... Mas uma coisa é certa, e isto já me basta: sei que o Senhor me chama, me quer bem, me guia na direção da vocação missionária. Essa é agora a minha única certeza!”[3]
Uma companheira de escola de Gonxhe contará certa vez: Ela lia a revista Katoličke misije e as cartas que os padres jesuítas mandavam das missões da Índia. Essas leituras a apaixonavam tanto que ela falava e contava a respeito das missões como se já vivesse nelas. Eu e outras amigas estávamos convencidas de que também nós iríamos para as missões, mas a vontade de Deus foi diferente. Ela era realmente pequena de estatura, frágil, mas tinha uma grande vontade, uma alma de Deus, um coração que guiava a todos. Quando a revi em 1980 em Escópia, lembrei a ela alguns episódios da nossa juventude, uventude, mas ela ela não se s e lembrava lembrava mais; na sua s ua mente e no seu coração cor ação já havia tanta t anta gente, todo o mundo do sofrimento. [4]
Os parentes e os amigos mais íntimos sabiam já há algum tempo o que estava acontecendo a Gonxhe, a qual sempre pedia aos seus parentes e amigos que rezassem continuamente para que fossem compreendidos os mistérios divinos a seu respeito. No entanto, quando a notícia de sua tomada de decisão se espalhou, todos ficaram surpresos. Havia uma tristeza misturada com orgulho. O arcebispo de Escópia, o esloveno Dom Ivan Gnidovec, que tinha substituído Mjeda, ficou muito feliz com a notícia e apoiou a jovem na sua vocação. Gnidovec era considerado um santo pelo povo, e quando partiu de Escópia ofereceu a santa missa por Anjeze e a abençoou, dizendo-lhe para doar tudo a Jesus, para viver somente para Ele. Um dia, a tia Mrika Gjerji perguntou a Gonxhe como ela poderia viver em uma missão, visto que era frágil de saúde, e esta, sem hesitar, respondeu: “Se Deus me chama para si, é Ele quem deve pensar na minha saúde e no resto, não eu. Eu obedeço, faço o que Deus me pede”. Gonxhe pede então para ser admitida junto às Irmãs de Nossa Senhora de Loreto, em Dublin, na Irlanda, pois elas tinham missões na Índia e ela já tinha ouvido os padres esuítas falarem muito delas na igreja do Sagrado Coração. Nëna Loke vivia vivia angustiada angustiada naqueles dias dias que precediam a separação: Rezo sem parar a Deus, para que me dê muita força e coragem para ficar serena, tranquila, alegre, e para não chorar, pelo menos não chorar diante de Gonxhe, para não mostrar à minha filha a minha dor, o meu
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sofrimento... Deus me ajuda tanto que até hoje jamais chorei diante de meus filhos... Preciso estar no controle da situação... Se eu não conseguir, então vou a um quarto, me tranco lá, como se estivesse fazendo algum trabalho doméstico, e rezo e choro, e ofereço a minha Gonxhe ao Senhor.[5]
Em 25 de setembro de 1928, véspera da partida, a rua Vlashka, onde ficava a casa da família Bojaxhiu, ficou cheia de gente; todos vinham saudar Gonxhe e desejar-lhe boa sorte. Entre essas pessoas, havia muitos jovens, e também muitos pobres, que queriam particip articipar ar do acontecimento. acontecimento. Verdadeiramente erdadeiramente sentiam sentiam muito muito a partida partida de Gonx Gonxhe, he, não apenas seus familiares e amigos, mas também quem se tinha beneficiado com a sua presença. Em Escópia, Escópia, naqueles naqueles dias, dias, se falava da partida partida da jovem para uma terra, naquele tempo, praticamente desconhecida de todos. As pessoas procuravam nos mapas onde era a Índia, mas o que preocupava as mentes não era somente a distância, e sim, sobretudo, a substancial diferença entre as populações albanesa e indiana, entre a cultura local e a cultura indiana. Todos estavam admirados pela coragem que tinha o Botão de Rosa (como era conhecida Gonxhe), com apenas 18 anos, de enfrentar uma missão que todos consideravam extremamente árdua. Ela era o exemplo de mulher absolutamente fora do comum para a sociedade albanesa da época. Muitos lhe levaram presentes e muitos a acompanharam à estação, onde ela tomaria o trem direto para Zagreb, capital da Croácia, para onde a seguiriam também a mãe e a irmã. Seu primo Lorenc assim escreverá em seu diário: Todos choravam na estação, e ela também, ainda que um pouco antes tenha dito que não o faria. Também eu quase chorei, ao pensar que estava perdendo uma parente e uma boa amiga. No momento da despedida, ela apertou bem a minha mão. Eu respondi um tanto friamente, para ajudá-la a superar a dor do momento. O trem partiu. Nós todos a saudamos com os lenços da plataforma. Não paramos de saudá-la até perdê-la de vista. O sol a iluminava com os seus raios: ela se parecia com a lua, que devagar desaparece ao raiar do dia, até que se tornou um ponto cada vez menor, sempre nos saudando e se tornando cada vez menor. Por fim desapareceu totalmente. Não a vimos mais, como uma estrela diante do brilho do sol.[6]
Sua mãe, a sua primeira guia espiritual, a sua primeira mestra de noviciado, lhe tinha dado e continuava a dar-lhe ensinamentos preciosos, que ela sempre guardou em seu coração: Você deve ser somente s omente de Jesus.. Jesus .... Vá, mas deve ser uma freira santa... santa.. . Coloque Coloque a sua mão na mão de Jesus e vá segura adiante... Muito bem, minha filha, vá para o convento ser irmã missionária, mas deve ser totalmente dedicada a Deus, à vida de oração.[7]
Gonxhe partiu no dia 26 de setembro, deixando para sempre a sua terra, como Abraão, e levando consigo a herança fundamental, recebida na escola de seus pais: tinha aprendido a amar, seriamente.
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ZAGREB – DUBLIN – BENGALA
Nëna Loke, Ag Agee e Gonx Gonxhe he percorreram cerca de 800 quil quilômetros para chegar chegar a Zagreb.[1] O próximo destino seria Dublin, onde se encontrava a Casa Geral das Irmãs de Nossa Senhora de Loreto. Gonxhe perdia tudo e todos para ganhar tudo em Cristo. Tinha passado por seis anos de dúvidas e reflexões sobre aquela vocação que tinha sido forte, mas que tinha enfrentado reticências e resistências... Agora, que tinha partido, não tinha mais nenhuma certeza humana e confiava tudo a Deus. Lemos na revista revista Katolicke misi je, em seu último número do ano de 1928: Gonxhe Bojaxhiu é uma albanesa de Escópia. O chamado do Senhor a surpreendeu no ensino médio. Assim como outrora São Pedro deixou as suas redes, Gonxhe deixou seus livros e partiu em nome de Deus. Todos se admiraram, porque ela era a primeira da classe e era estimada por todos! Era a alma das atividades católicas femininas e do coro da igreja. Quando partiu de Escópia, na estação havia uma centena de pessoas que tinham vindo para saudá-la. Todos rezavam muito comovidos.
Dali em diante, o “rouxinol” cantaria para o Senhor. Na cidade cidade de Zagreb, mãe e fil filhas foram hospedadas por uma famíli família católi católica albanesa, que tinha tido relações de amizade com Kolë, o pai de Gonxhe. Foram dias cheios de emoção: encontraram amigos e conhecidos, visitaram a cidade, entraram nos museus, foram ao teatro e, sobretudo, rezaram nas igrejas e na catedral de Zagreb. Aproveitaram aquele aquele pouco tempo que lhes restava para ficar juntas e falar de seu passado, do presente e do futuro. O trem para Dublin partiu no dia 13 de outubro de 1928, e Gonxhe iniciou esse novo capítulo de sua vida junto com uma amiga que também entraria na Congregação das Irmãs de Nossa Senhora de Loreto, a eslovena Betilka Kajnč, que viria a ser a irmã Maria Madalena. Gonxhe partiu fazendo uma promessa a sua mãe: “Procurarei fazer o meu melhor. Sempre me lembrarei de seus conselhos, mas, sobretudo, da sua bondade e do seu amor”.[2] Era a última vez. Nunca mais reveria nem a irmã, nem a mãe, que assim se despediu dela com o pranto no coração: “Vá, Gonxhe Gjyli, minha filha, e o Senhor que a chamou esteja sempre com você! Lembre-se sempre de nós em suas preces, e também nós rezaremos sempre por você”. [3] Age não conseguiu deter as lágrimas. Da janela do trem, Gonxhe viu passar a Iugoslávia, a Áustria, a Suíça e a França, de onde embarcou com Betilka em um navio velho e cheio de passageiros para atravessar o canal da Mancha e chegar, primeiro a Londres, depois a Dublin. Drane, a mãe de Gonxhe, dirá a Lorenc Antoni: “Quando tenho muita vontade de ver, 35
ouvir ou ter perto de mim a minha Gonxhe Gjyli, pego uma fotografia sua, olho para ela, a beijo e depois pego o rosário e rezo. Rezando, parece que a tenho mais perto, que a ajudo e que ajudo a mim mesma”. [4] Em Dublin, a esperava a superiora das Irmãs de Nossa Senhora de Loreto. Gonxhe teve um pouco de tempo para descansar da viagem e depois começou a estudar inglês em Rathfarnham, perto de Dublin, onde se encontrava, como se encontra ainda hoje, casa-mãe das Irmãs de Nossa Senhora de Loreto. Aprendeu rápido a nova língua, como depressa aprendeu as regras para se tornar freira. Escolheu o nome Maria Teresa do Menino Jesus. Já estava pronta para partir para a Índia, que ainda estava sob o domínio britânico. Partiu no dia 1º de dezembro de 1928, no navio “Marcha”. A maioria dos passageiros eram anglicanos, exceto ela, sua companheira Maria Madalena e três missionárias franciscanas. Foi uma viagem muito difícil, com o mar agitado. Participaram da santa Missa em Porto Said. Passaram o Natal no navio, e junto com as franciscanas montaram um presépio de papel. À meia-noite do dia 24 de dezembro cantaram o Gloria in excelsis Deo, rezaram o rosário e entoaram o Adeste fideles fi deles. Nada de Santa Missa, nem no dia 25 de dezembro: não havia sacerdotes católicos, por isso comungaram apenas espiritualmente. Aqueles dias de viagem foram ocupados pela oração, pela meditação, pela leitura, pelas cartas escritas à família – nas quais Gonxhe se dizia feliz, mesmo no sacrifício e na prova da cansativa viagem pelo mar –, pela descrição daquela viagem que para ela era uma aventura que a levaria à distante Índia. Também compôs poesias. Tinha levado consigo o caderno de líricas que havia escrito até então. Lia as poesias já compostas e compunha novas. Em 9 de dezembro, escreveu “Adeus”: Deixo a casa que dá luz ao coração, a minha terra, a minha família inteira; Bengala é minha meta, prostrada pela dor, terra a mim cara, ainda que estrangeira. Em grande tormento deixo para trás os amigos amados, deixo tristes os parentes, deserto o lar, mas o coração me chama junto aos deserdados, onde poderei doar-me a Cristo. Deixo-te minha saudação, mãe amada, e também a vós, c aros amigos, amigos, adeus; adeus; leva-me para a Índia atormentada a grande força que arde em meu coração. O navio lento navega sobre o mar e fende as ondas que se elevam espumosas, uma última vez volto o olhar: deixo da Europa as margens tumultuosas. Sobre o navio, firme e exultante, a virgem que se consagrou a Deus, vai para um mundo novo, terna esposa, amante, humilde mulher de alegria iluminada. Uma cruz de ferro na mão aperta, ecoa nela a salvação ansiada
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e o espírito pronto, alegre aceita o cálice ao qual se sacrificou. Aceita o que te ofereço, ó meu Senhor, como sinal do amor que a ti jurei, ajuda a tua criatura, Criador; que eu faça com que sejas glorificado. Peço-te, em troca, Senhor onipotente, ó nosso pai, refúgio de bondade, dá-me somente aquele espírito ardente, espírito que Tu conheces, mesmo que não dito. Ainda que como orvalho da manhã, eis que brota uma lágrima enrubescida, para tornar-te tornar- te mais c lara, lara, ó meu divino, divino, a promessa que ora está consumada.[5]
Gonxhe se despede de todo o seu passado e volta seu olhar para os novos horizontes que a esperam: a Índia será a sua nova pátria, o seu novo mundo, para lá ela se sente chamada a viver o Evangelho; é justamente lá que Cristo a quer esposar, e lá ele há de querer ter sua sede saciada por ela. Nessa poesia está toda a Madre Teresa, o que ela era e o que ela será. O lugar está inscrito em seu espírito, na sua firme vontade: “é minha meta Bengala prostrada pela dor, terra a mim cara”. Os destinatários da vocação já são imaginados, mesmo que não os tenha concretamente conhecido, “mas o coração me chama para junto dos deserdados, onde poderei doar-me a Cristo”. Depois a saudação à amada mãe, a quem é profundamente grata. Era a Índia dos seus sonhos de moça, quando nas, páginas das revistas missionárias, via, com os olhos da alma, o esforço e as conquistas dos missionários entre os pobres que por crença religiosa viviam na casta que o destino lhes tinha reservado, com resignação e sem possibilidade de reabilitação. Gonxhe é “a esposa, a amante” iluminada pela alegria do Espírito Santo, pelo Deus uno e trino. Ela aceita a cruz, aceita o cálice de sofrimento, por isso está pronta para tudo, “como sinal do amor que a ti jurei”, e em virtude de tal compromisso de amor, pede ajuda para ser sustentada e poder, assim, glorificar o Senhor na terra. Desce uma lágrima como prova de sua dor por abandonar a vida segura que deixava atrás de si, além-mar. “Rezai por vossa missionária”, escreveu à revista Blagovijest de Escópia, no dia 25 de março de 1929, “para que Jesus possa ajudá-la a salvar o máximo possível de almas imortais das trevas da descrença”. A esperança de Madre Teresa é levar a luz da fé e da verdade para salvar almas em meio a religiões diferentes da sua: não instaura um confuso diálogo inter-religioso – jamais o fez –, mas se mistura entre hindus, budistas, muçulmanos, assim como fazia no santuário de Letnica, mantendo firme a sua identidade de filha da Igreja de Roma, levando a si mesma, assim como São Paulo levava a si mesmo aos gentios, como apóstolo de Cristo, e, portanto, testemunhando pelo exemplo e pela ela caridade a liberdade liberdade trazida pelo pelo Salvador. Salvador. É ela ela mesma que revela esta verdade: O calor na Índia é simplesmente tórrido. Quando saio para a rua, me parece que há fogo sob os meus pés, que queima todo o corpo. Nos momentos mais duros, me consolo com o pensamento de que, dessa maneira, almas serão salvas, e que o querido Cristo sofreu muito mais por elas... A vida de uma missionária não é coberta de rosas, mas de espinhos, mas mesmo assim é uma vida cheia de felicidade e de alegria, quando ela
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pensa que está cumprindo cumpr indo a mesma obra que Jesus Jes us realizava realizava na terra, e que está cumprindo cumpr indo o seu mandamento: “Ide e ensinai todas as nações!” (Mt 18,19).[6]
Ao padre jesuíta Franjo Jambreković, que tinha sido seu confessor em Escópia, revelará que, por um tempo, teve medo do sofrimento e das cruzes, mas naquele momento, já perto da profissão de votos (1937), estava pronta para abraçá-los: [...] ainda antes da minha chegada, assim Jesus e eu vivemos no amor. Não pense que a minha vida espiritual seja coberta de rosas. Essa é flor que raramente encontro em meu caminho. Ao contrário, com mais frequência tenho por companheira a escuridão. E quando a noite se torna muito escura e me parece que acabarei no inferno, então, simplesmente, me ofereço a Jesus. Se ele quiser que eu vá, estou pronta, mas somente se isso realmente o fizer feliz. Preciso de muita graça, de muita força de Cristo, para perseverar na confiança, naquele amor cego que conduz somente a Jesus crucificado. Mas estou feliz, sim, mais feliz do que nunca, e não gostaria de jeito nenhum de renunciar aos meus sofrimentos [...]. Mamãe me escreve com muita frequência, realmente está me dando a força para sofrer com alegria. A minha partida foi o início da sua vida sobrenatural. Quando ela for para perto de Jesus, certamente Ele a acolherá com grande alegria [...]. Há poucos dias dias voltaram à minha lembrança alguns alguns episódios episódios de Letnica Letnica e sorri sorr i de coração. cor ação. De fato, quão orgulhosa eu era, então [...] nem agora sou humilde, mas ao menos desejo sê-lo, e as humilhações são as minhas dores mais doces [...]. Agora devo ir. A Índia queima como o Inferno, mas as suas almas são belas e preciosas, porque o sangue s angue de Cristo as orvalhou. orvalhou.
A Índia queima como o Inferno. Os horrores que ela vê são trágicos. O sistema de vida regulado pelo sistema de castas não respeita a unicidade e a preciosidade das pessoas, que frequentemente perdem a dignidade aos olhos dos homens, mas não aos olhos de Deus, porque o sangue do sacrifício do Filho de Deus veio purificar também a elas, que fazem parte, como todos os povos da terra, do plano da Redenção. Foi confiada a irmã Teresa a tarefa de saciar a sede de Cristo, pois dando de beber aos desesperados, retirando a água do poço de Sicar, [7] também ela distribuiria a água da Vida eterna. Inteligente, extremamente sagaz, observadora escrupulosa, irmã Teresa descreveu, em uma carta endereçada à redação da revista Katolicke misi je, em termos extremamente eficazes, a sua chegada à terra que se tornaria também sua. Eis o primeiro quadro fotográfico que a futura Madre Teresa faz da Índia: Calcutá, 6 de janeiro de 1929. No dia 27 de dezembro, chegamos a Colombo. Colombo. Já me esperava o senhor Scalo Sc alon, n, irmão de uma de nossas irmãs. Fomos então para o Colégio missionário de São José, onde, em uma pobre capela, adoramos o Salvador. Em seguida nos dirigimos à sua casa (do senhor Scalon). Olhamos surpresas a vida que passava pela ela rua. Entre as pessoas, pessoas , se distinguiam distinguiam logo as roupas elegantes elegantes dos europeus, entre as pessoas de pele pele escura e roupas multicoloridas. A maioria delas caminhava meio nua. Sua pele e seu cabelo brilhavam sob o sol quente. Claramente se via que entre aquelas pessoas reinava uma grande miséria. Tivemos mais pena ainda daqueles que corriam puxando seus carrinhos pelas ruas, como se fossem cavalos. Decidimos unanimemente não viajar com aquele meio de transporte. Mas exatamente naquele momento o senhor Scalon, que estava acostumado a tais costumes, decidiu nos conduzir a sua casa com aqueles carrinhos. Ficamos consternadas e as outras irmãs ficaram muito surpresas, mas devíamos aceitar. Só nos restava orar para que a carga lhes fosse leve. Ficamos felizes quando chegamos à casa. Aqui a natureza é maravilhosa. A cidade toda parece um grande jardim. Palmeiras altas, cheias de frutos, se elevam majestosas até o céu, e quase todas as casas têm suas belíssimas plantas. Observando tudo isso, pedíamos a Deus que, com a sua s ua misericórdia, tornass tor nassee belas também as suas almas. almas. No dia segui s eguinte, nte, visitamos visitamos as Irmãs do Bom Pastor, que têm uma igreja igreja belíss belíssima. ima. Entre tantas coisas, coisas , nos
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contaram que em Colombo há bons católicos, apesar de viverem entre budistas e protestantes. Por volta das sete e meia da noite, quando voltávamos a bordo do nosso navio, ficamos muito felizes por encontrar um sacerdote católico, um jesuíta que fazia também o nosso caminho para Darjeeling. Assim, passamos a ter missa todos os dias, e a vida a bordo não nos parecia mais tão desolada. Passamos uma noite de ano novo muito solene, e da mesma fora em nosso coração cantamos o Te Deum. Graças a Deus começamos o ano bem; fizemos uma missa cantada que, assim, nos pareceu mais majestosa. Na mesma tarde, ao anoitecer, anoitecer, chegamos a Madras. A costa c osta já nos oferecia oferec ia um triste quadro desse povo miserável. Quando no dia seguinte visitamos a cidade, ficamos profundamente comovidas pela indescritível pobreza dessa gente. Pelas ruas, ao longo longo de suas muralhas, e também por aquelas aquelas mais cheias, viviam viviam muitíssimas famílias. Vivem dia e noite a céu aberto, sobre um tapete que fabricaram com grandes folhas de palmeira, almeira, ou frequentemente sobre o chão nu. Estão quase todos completamente nus. Usam braceletes finíssimos nos braços e nas pernas, e um tipo de ornamento no nariz e nas orelhas. Sobre a testa trazem alguns sinais de significado religioso. Passando por uma rua, encontramos uma família reunida em volta de um parente morto, envolto em trapos vermelhos puídos, coberto de flores amarelas e com a face pintada com listras multicoloridas. O quadro era horrendo. Se a nossa gente visse tudo isso, certamente não se lamentaria pelos seus problemas, mas agradeceria a Deus, que os abençoou com tanta abundância. Em um convento, no qual paramos por algum tempo, nos contaram que aqui há muitos católicos, mas são todos muito pobres. Ainda que não andem nus, vivem em situação precária, porque os missionários não podem dar-lhes tudo. A cidade é bastante interessante, mas as belezas naturais não são tão evidentes como em Colombo. No dia 6 de janeiro deixamos o mar e entramos no rio Ganges, chamado de “o rio sagrado”; pudemos, assim, observar bem a nossa noss a nova pátria: Bengala. engala. A natureza era maravilhosa, maravilhosa, em alguns alguns lugares lugares havia havia belas belas casinh cas inhas as e, ainda, sob as árvores, muitos longos ramos pendentes. Observando-as, não víamos a hora de estar lá embaixo. Soubemos que os católicos são poucos. Quando nosso navio atracou, cantamos um mudo Te Deum. No cais nos esperavam as nossas coirmãs indianas, e, com uma alegria indizível, na companhia delas, tocamos pela primeira vez o solo de Bengala. Na igrejinha do convento agradecemos ao Senhor por ter-nos concedido chegar bem ao nosso destino. Aqui ficaremos uma semana, e depois iremos para Darjeeling, onde ficaremos durante o nosso noviciado. Rezem muito por nós, para que nos tornemos missionárias boas e corajosas.
A pena (a miséria das pessoas) e o escândalo (os homens de carga) que Gonxhe vivenciou em sua chegada à Índia não foram obstáculos para ela, e sim as “boas-vindas” reais do que ela não se limitará mais, anos depois, a registrar como observadora externa: se tornará parte da sua própria existência. O impacto de Gonxhe com o novo mundo se tornará o campo de missão de Madre Teresa. A jovem enfrenta o novo caminho com espírito temerário, mas não de modo ingênuo e desavisado: tinha se preparado, nos anos anteriores, em uma espécie de pré-noviciado, um período muito precioso, que a colocou em condições de enfrentar sua nova vida. Por meio das leituras sempre cuidadosas e apaixonadas das crônicas missionárias e dos artigos publicados na revista Katolicke misi je, Gonxhe tinha formado para si uma ideia precisa recisa do que sign signiificava ser missi missionári onária. a. Ficou alguns dias com as irmãs em Calcutá, capital de Bengala Ocidental, o tempo necessário para se recuperar da viagem cansativa. Depois partiu para Darjeeling, onde começaria seu postulantado. Lançada em uma terra absolutamente estranha, Gonxhe deixava que o Senhor agisse nela, seguindo somente o que lhe ditava o Espírito. O postulantado durou alguns meses; depois, dois anos de noviciado, que começou em 23 de maio de 1929, na presença do arcebispo de Calcutá, dom Fernando Périer, que 39
entregou às noviças os símbolos da vida religiosa: a cruz, o véu, o rosário, e abençoou seus hábitos. Irmã Teresa escreveu logo a seus familiares, informando que estava bem de saúde e feliz, e mandou-lhes também uma fotografia “do dia mais belo de minha vida, quando me dediquei para toda a vida a Cristo” (à tia Maria, avó de Lorenc Antoni, em 23 de maio de 1929). Agora já não é mais Anjeze, mas irmã Maria Teresa. Em 1925, fora proclamada patrona das missões a carmelita Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face, conhecida como Santa Teresinha de Lisieux, e Anjeze, conhecendo a vida dela, ficou tão impressionada e fascinada que adotou o mesmo nome. Continua a corresponder-se com parentes e amigos. Das suas cartas se percebe a serenidade pela escolha feita. A “Pequena Teresa do Menino Jesus”, como ela assina, demonstra toda a sua proximidade e pede orações. Entre as cartas, está também aquela dirigida à revista católica de Escópia, Blagovijest , publicada com uma apresentação que revela quanta consideração todos tinham por aquela moça, que com dezoito anos tinha tomado um caminho tão rigoroso e exigente: A jovem de dezoito anos de Escópia, com o nome albanês Gonxhe, muito conhecida, se tornou irmã e assumiu o nome de Teresa do Menino Jesus. Até o outono passado ajudou em Escópia o coro da igreja, entusiasmou as suas companheiras da Congregação Mariana a ajudar as missões, instruiu as moças mais jovens ovens e era uma aluna aluna exemplar exemplar no colégio feminino feminino de Escópia. Desde o dia 9 de dezembro de 1928, viajando de navio, escreveu uma carta para os leitores de Blagovijest e expressou os mais genuínos sentimentos de espiritualidade com uma poesia breve e simples [...]
A publicação fornecia o endereço preciso da irmã Teresa, para aqueles que quisessem escrever para ela: M. Terezija Bojaxhiu, Novicijat, Loreto konvent, Darjeeling, Britsh India. O artigo terminava com um convite para seguir as suas pegadas, como “estímulo para a juventude católica católica de Escópia, Escópia, particul particularmente armente para aqueles aqueles que conhecem muito muito bem o lema: Sacrifíci Sacrifício!”. o!”. Por ora a irmã Teresa do Menino Jesus está alegre, não sente o peso do sacrifício: no noviciado dedica as horas à oração, ao estudo, à meditação, à leitura da Sagrada Escritura, aos livros que sempre amou. A sua vida é plena e harmoniosa. Até mesmo a sua saúde rejuvenesceu com essa realização íntima, a todos presente e manifesta.
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O REMÉDIO DO BATISMO
Em pouco tempo, irmã Teresa tinha aprendido a falar inglês e agora começava a adquirir o idioma bengalês. Passos de gigante, também do ponto de vista espiritual, essa pequena jovem prodig prodigiosa dava, por isso foi admitida admitida aos votos temporários já no dia 23 de maio de 1931. Ela chamará aqueles dias de os “mais belos de minha vida”; finalmente se sente inteira do Senhor Jesus e está completamente à vontade na comunidade das irmãs de Loreto. Já se passaram três anos, e irmã Teresa está pronta para o serviço, para realizar aquilo que aprendeu da Regra da congregação. A primeira tarefa que lhe é atribuída é a de enfermeira, uma função caríssima a ela, que já a tinha experimentado em Escópia, seguindo Nëna Loke. Estar junto aos doentes é para irmã Teresa como estar na presença de Jesus. Na Índia se espalham a miséria e a dor. O trabalho é de fato tamanho que, mesmo sendo de compleição frágil, ela fica de pé dia e noite quando necessário. A oração, no entanto, está acima de tudo e de todos. Superioras e coirmãs estão muito contentes com irmã Teresa do Menino Jesus, “a irmã albanesa”, como é chamada em tom bem-humorado. Ela está feliz por levar o amor de Deus em meio a tanta dor: o sofrimento é o seu mundo, e quando os doentes a veem chegar, têm o sorriso nos lábios e a luz nos olhos. Na farmácia do hospital hospital em que presta serviço, serviço, foi posta uma imagem do Salvador, Salvador, para grande aleg alegria ria de irmã T eresa, que vê aquela aquela imagem circundada por uma multi multidão dão de oprimidos, sobre os quais pesa o sofrimento do existir; toda manhã, ela olha o quadro do Redentor antes de começar a trabalhar, e nesse olhar “se resume tudo o que sinto: Jesus, para ti e para as almas!”, como escreveu em uma carta publicada na revista Katolicke misi je de novembro de 1931. Depois, entra na sala de espera, sempre cheia de pacientes, acientes, de miseráveis miseráveis e infeli nfelizes. “Todos os olhos olhos estão fix fixos em mim”, mim”, as mães lhe lhe entregam os filhos doentes, “com o mesmo gesto da imagem pendurada na parede. Meu coração bate feliz: posso herdar a tua ação, meu bom Jesus! Posso aplacar muitas dores! Consolo e cuido, repito as palavras do melhor Amigo das almas”. Semeia sempre o Evangelho: “É consolador olhar os nossos convertidos reunidos em oração diante do Possuidor do amor”. Observa e registra. Muitos pacientes vêm de longe; depois de percorrerem três horas de estrada, alguns estão cheios de chagas, das orelhas aos pés. Em suas costas, as feridas avançam de maneira impressionante, a ponto de criarem depressões e intumescimentos. Há quem apresente a febre tropical, quem esteja no último estágio da tuberculose; outros nem mesmo conseguem sair de suas casas esquálidas e sujas. Então as irmãs entregam os remédios aos parentes e conhecidos dos doentes, mas é necessário explicar-lhes ao 41
menos três vezes como se toma determinado remédio. Há tanta ignorância e a paciência é submetida a uma dura prova. Agora é a vez de um homem de estatura média, barba negra, nariz achatado. Espertamente pisca com os olhos brilhantes e ri contente sob os longos bigodes. Ele não pede nada, mas está com ele a sua pequena, graciosa senhora. Ela tem dor de ouvido; portanto, vai logo para a mesa de cirurgia, a fim de cuidar dos ouvidos, que há muito tempo esperam uma boa lavada com água. A mesa cirúrgica é muito simples: um caixote baixo dentro do qual tínhamos recebido donativos para a casa. Apesar de esse ser o mais comum dos assentos, essa pequena senhora não sabe como subir e se sentar nele. Está diante da caixa como se fosse um monstro, levantando ora a perna direita, ora a esquerda... Peço-lhe novamente para se sentar, e não ficar em pé sobre a mesa! Mas sem sucesso. suc esso. Não é capaz de resolver esse problema. Intervém um velhinho velhinho para ajudá-la. Ele se senta sobre o caixote dizendo: “Faz assim!” Aquela mulher nunca tinha sentado em um lugar mais alto do que o chão.[1]
Muitas mulheres esperam a sua vez para uma consulta para seus filhos cheios de pústulas ústulas “grandes “grandes como uma mão fechada”. Agora aos vinte vinte e um anos, a enfermeira corta, aperta, medica. A humanidade sofredora e cheia de dores físicas e morais prossegue rossegue a sua procissão diante daquela a que chamam de “mãe dos católicos”. católicos”. Ela Ela não só não se assusta com todo esse vaivém de gente que traz em si sofrimentos terríveis e chagas repugnantes, como está feliz em cuidar e curar. Nesse meio-tempo ouço a voz de uma mulher: “O meu marido não queria de jeito jeito nenhum me deixar vir, mãe dos católicos. Disse-me bravo que o barbeiro poderia fazer essa operação no menino. Mas eu lhe disse que levaria meu filho à mãe e fugi de casa como uma louca”. Acabei e estou prestes a fechar a porta quando chega outra procissão. “Que vento os traz, boa gente?”. “Viemos de Belvarave, mãe dos cristãos. As pessoas que vieram esta manhã espalharam a notícia por todo o povoado. É a desgraça que nos obriga a pedir a sua caridade, o seu amor e a sua bondade”. Com certeza precisavam de algo importante, porque na Índia não se enfrenta por nada uma viagem assim. Peço que me tragam as crianças, pelas quais os médicos não podem fazer mais nada. Para elas tenho um remédio maravilhoso. Eles prometem e mantêm a palavra. Estou feliz por poder dar-lhes o remédio religioso: religioso: o santo batismo, a bem-aventurada eternidade.
Depois é a vez de uma mulher com o braço fraturado; depois, de um jovem que levou uma facada nas costas; mais tarde, e já muito tarde, quando a jornada das “maravilhas” da mãe dos católicos está por terminar, chega um homem com um pequeno pacote nos braços, do qual despontam dois dois ramos secos: são as perninhas perninhas de um menino menino fraquíssimo, que ainda tem apenas uma pequena chama de vida. Compreendo que logo entrará na eternidade. Corro a pegar água benta... O homem teme que não queiramos ficar com o menino entre nós, e diz: “Se vocês não o quiserem, o jogarei em algum lugar, no mato: os chacais certamente não o desprezarão!”. Meu coração fica gelado. Pobre menino! Fraco e cego, completamente cego. Com muita piedade e amor tomo o menino nos braços e o coloco no meu colo [...] “Quem acolhe um menino como esse, acolhe a mim”, disse o Divino Amigo das crianças.
A pequena criatura de Deus tinha encontrado a piedade e o amor de uma mãe, que nunca olhou para a eficiência ou para a não eficiência das pessoas, todas criadas, sem nenhuma exceção, à imagem de Deus; mas olhou, sim, para a existência infundida nelas, o primeiro dos direitos de toda criatura chamada à luz por Deus, único Senhor da vida e da morte.
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O VOTO PRIVADO
As irmãs de Loreto tinham um convento muito grande em Calcutá e ali desenvolviam várias tarefas, mas a mais importante era a atividade educativa. As superioras de irmã Teresa sabiam de sua grande inteligência e de sua ótima preparação, por isso decidiram que ela continuaria seus estudos na Universidade, mas ao mesmo tempo deveria ensinar as meninas. Irmã Teresa aceitou de bom grado, não só por obediência, considerando as ordens dos superiores como a vontade da Providência, mas também porque gostava de estudar e ensinar. Assim se dividiu entre livros, exames e o ensino na escola de St. Mary, um instituto muito conhecido conhecido em Calcutá, cujas alunas pertenciam às castas superiores e provinham rovinham das famíli famílias abastadas. Mas as obrig obrigações de irmã Teresa estavam destinadas a se multiplicar; de fato, além dessas incumbências, tinha também que cuidar de muitos doentes e ajudar dez coirmãs em seus estudos. Em 1935, acrescentou-se às suas tarefas também o ensino na escola de Santa Teresa. “Era necessária muita paciência e muita fé para não se ‘arruinar’, não se destruir destruir, trabalhando trabalhando tanto assim assim e deix deixando de lado a vida vida espiritual. Teria sido o suicídio da vocação-missão, do apostolado, portanto, da vida consagrada”. [1] A escola de Santa Teresa também ficava em Calcutá, mas longe do convento, por isso era preciso tomar uma carroça indiana, isto é, um carrinho puxado por um homem; assim, irmã Teresa chegava antes de seus “fuliginosos filhos”, como chamava a criançada. Quando esses meninos a viram pela primeira vez se perguntaram se ela era um mau espírito ou se era uma deusa. Eles não conheciam nuances: ou se era bom ou se era mau. O que irmã Teresa fez assim que chegou à classe? Afastou todos os móveis, pegou egou o escovão, águ águaa e começou a limpar o piso. piso. Os cinquenta cinquenta e dois dois alunos alunos ficaram ficaram estupefatos. Nunca tinham visto uma professora limpar: a limpeza era tarefa das castas inferiores. As meninas, atraídas pelo exemplo e pela alegria de irmã Teresa, começaram a ajudá-la, enquanto os meninos traziam mais água. Duas horas de esforço e a sala de aula se transformou. Além disso, começou a ensinar também em outra escola com 200 meninos: as instalações pareciam um estábulo. Deu aulas também em um quintal, e quando viu onde os meninos dormiam e como se alimentavam, ficou profundamente tocada, como ela mesma contará, e, no entanto, eram criaturas felizes: “Bem-aventurada infância!”. Ficavam felizes, sobretudo, por estar com ela e, toda vez que ela ia visitá-los, eles lhe faziam festa, cantando alegremente. Ela colocava as mãos sobre suas cabecinhas e eles a chamavam “Ma”, mãe! Pouco a pouco, as mães começaram a levar os seus filhos para que ela os abençoasse. Todos os domingos ela ia visitar as periferias de Calcutá. Não tinha nada de material para dar, mas mesmo assim as pessoas ficavam felizes ao vê-la. As famílias que tinham a 44
possibi ossibillidade de pag pagar ar quatro rúpias rúpias de alugu aluguel el moravam em casebres de dois dois metros de comprimento por um e meio de largura, com as portas tão estreitas que até irmã Teresa, magra como sempre foi, tinha dificuldades para passar por elas, e os tetos tão baixos que obrigavam as pessoas a ficar encurvadas. Educando os meninos, irmã Teresa podia entrar em contato com suas famílias, tendo assim a oportunidade de formá-las. Somente conquistando sua confiança e sua estima poderia abrir-lhes novos horizontes espirituais e fazer com que entrasse em seus barracos a luz de Cristo. Irmã Teresa sempre pedia ao Senhor a força para ser “sempre a luz da vida deles, para que eu possa conduzi-los a ti!”. Às vezes ia a pé às escolas nas quais ensinava, porque assim, ao longo do caminho, tinha a possibilidade de encontrar pessoas, cumprimentá-las, pedir edir notícias, notícias, dar conselhos, conselhos, distri distribui buirr sorrisos sorrisos e carinhos. carinhos. Quando foi visitar visitar um viúvo viúvo moribundo, quase desmaiou por causa do cheiro desagradável presente na pequena cabana, mas resistiu e escutou as últimas vontades do homem, que confiava a ela o seu único patrimônio, as três filhas, e a “Ma” prometeu que as levaria consigo, e o velho sorriu feliz. Outra vez entrou em um casebre habitado por um homem desesperado; ao arrumar e limpar aquela miserável e caótica habitação, Madre Teresa encontrou uma bela lâmpada que estava escondida, e disse ao homem que era uma pena não usá-la, sugerindo-lhe que a utilizasse. Ele aceitou a sugestão. Desde então, naquela morada se acendeu a luz da esperança. Um dia, um inglês protestante foi visitá-la na escola St. Mary, e se surpreendeu com tantos alunos: 375. Ficou surpreso também com o grande silêncio que havia na escola, e perguntou erguntou a irmã Teresa como fazia para manter a ordem e quais quais punições punições eficazes eficazes utilizava. Ela explicou que o pior castigo para os meninos era não serem olhados, serem negligenciados e deixados a seus caprichos, sem que a professora cuidasse deles. O tempo passa muito rápido, e chega o momento do passo decisivo e definitivo: a profissão. rofissão. Antes de pronunciar pronunciar os votos perpétuos, irmã Teresa foi reti re tirada rada da escola escola e todos os seus alunos sofreram muito por não verem a sua “Ma Tiresa”. Retiro, silêncio, oração e meditação no convento de Darjeeling. No dia 24 de maio, dia da festa de Nossa Senhora Auxiliadora, pôde emitir os votos perpétuos na presença do arcebispo de Calcutá, dom Périer. Com ela estava também irmã Maria Madalena Kajnč. “Se o senhor soubesse como eu estava feliz, tanto que por minha própria vontade eu poderia oderia atear chamas à foguei fogueira ra de meu próprio próprio sacrifíci sacrifício”, o”, confessou ao padre Jambreković em 25 de novembro de 1937. “Agora [sou] sua, e por toda a eternidade! O senhor não poderá imaginar a Gonxhe de outrora agora como esposa de Jesus. Mas Ele foi sempre tão infinitamente bom para comigo, como se quisesse assegurar-se da posse do meu coração”. Além disso, continuava a explicar o seu objetivo, todo voltado para Jesus: “Se quisermos que Bengala seja de Cristo, devemos fazer muitos sacrifícios. Agora me alegro de verdade quando algo não acontece como eu gostaria, porque vejo que Ele quer a nossa confiança, por isso, quando sofremos algum dano, louvamos a Deus como se tivéssemos tudo”. Em seguida, seu pensamento vai para a amadíssima mãe: “Talvez minha mãe lhe tenha escrito. Agora está com meu irmão. Estão tão felizes! Só uma coisa lhes falta: a sua Gonxhe”. Depois pede orações: “reze mais do que nunca”, 45
porque quero ser toda de Jesus, verdadeiramente, e não só de nome ou pelo hábito. Muitas vezes isso se inverte, e assim o meu reverendíssimo “eu” assume o primeiro lugar. A mesma Gonxhe orgulhosa de sempre. Somente uma coisa é diferente: o meu amor por Jesus. Eu daria tudo, até mesmo minha vida, por Ele. Isso soa bem, mas na realidade não é fácil. E é justamente isto que quero: que não seja fácil. O senhor se lembra daquela vez em que me disse em Escópia: “Gonxhe, você quer beber o cálice até a última gota?”. Não sei se naquele tempo eu pensava como agora, mas agora sim, e bebê-lo com alegria, até mesmo sem uma lágrima […]. Nem sempre s empre é fácil quando se s e precisa prec isa estar est ar em pé de manhã à noite. Mas tudo é para Jesus; J esus; portanto, tudo é belo, elo, ainda ainda que difícil difíc il..
O papa Paulo VI dizia: “O cristianismo não é fácil, mas é feliz”. O difícil se tornará, para Madre Teresa, o lema de toda a sua vida. vida. Era tão apaixonada apaixonada por Cristo, Cristo, ao ponto de desejar subir com Ele à cruz, como todas as místicas da história da Igreja. O amor de irmã Teresa por Cristo era tão comprometido que não lhe bastou viver os três votos perpétuos: ela quis acrescentar-lhes um quarto. Em abril de 1942, de fato, fez oficialmente “um voto solene a Deus”, em que se comprometeu, sob o vínculo de pecado mortal, “a dar-lhe dar-lhe tudo o que Ele Ele possa me pedir, pedir, e não lhe recusar nada”. Um voto que proferiu nesses termos ao arcebispo Ferdinand Périer, em 1º de setembro de 1959. Ela queria oferecer algo de muito belo a Deus, sem nenhuma reserva: doar tudo, mas tudo de si, da mesma maneira que a Virgem Maria. Outra mulher que fez esse voto foi a beata Savina Petrelli (1851-1923), nascida em Siena e fundadora das Irmãs dos Pobres de Santa Catarina de Siena, figura de caráter extraordinário e vontade combativa, seja para alcançar obras-primas de caridade, seja ao destruir seus próprios defeitos. O seu percurso foi um caminho progressivo e incessante de perfeição cristã, e ela sempre quis, desde menina, tornar-se santa e uma “grande santa”. Amar a Deus se traduziu, na ação de Savina, como na beata de Calcutá, em amar os pobres. Na festa da Imaculada de 1917, no mesmo ano da aparição da Virgem Maria aos pastores de Fátima, Madre Savina, na presença de Maria Santíssima, de São José, de Santa Catarina de Siena e de toda a “Corte Celeste”, como ela mesma afirmou, fez o voto perpétuo de um completo abandono “de toda a minha pessoa a ti, meu Deus, e à tua adorável Vontade, e assim não procurar ou desejar o aplauso das criaturas e o seu compadecimento”. O “sim” heroico de Teresa, que empenhava vida terrena e vida eterna, se torna permanente e progressi progressivo, vo, a ponto de desejar “beber o cálice cálice até a últi última ma gota”, uma decisão que para os profanos poderia ser considerada uma loucura, mas que, na realidade, para aqueles que compreenderam a essência da vida, escolhendo para si a porção melhor, melhor, a mais alta, a mais feliz, feliz, aquela aquela do P araíso já na terra, é uma passagem passagem obrigatória. Seu voto foi realizado no maior segredo: somente seu confessor, padre Van Exem, que a guiava e lhe permitiu proferi-lo, estava informado a respeito. A exigência de não negar nada a Deus era ditada por sua plena compreensão daquilo que Deus, feito homem, havia realizado por seus filhos: Por que devemos nos dar plenamente a Deus? Porque Deus nos deu a si mesmo. Se Deus, que não nos deve nada, está pronto a nos doar nada menos do que a si mesmo, responderemos somente com uma pequena
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parte de nós? Doar-nos plenamente plenamente a Deus é um modo para receber o próprio própr io Deus. Eu por Deus e Deus por mim. Vivo para Deus e renuncio a mim mesma, induzindo desse modo Deus a viver por mim. Portanto, para possuir a Deus, devemos permitir que ele possua poss ua a nossa nos sa alma.[2]
Essa promessa também foi feita por Santa Teresinha de Lisieux, sua amada protetora, cuja obra havia lido muito e em quem se inspirou e de quem muito aprendeu. E possuindo ossuindo a alma, alma, Deus a torna em tudo e para tudo livre, como livre sempre foi Madre Teresa. Entre muitos textos de literatura cristã que tinha lido, irmã Teresa também se inspirou na prática dos votos privados do jesuíta irlandês William Doyle, que tinha proferido diversos votos privados, entre os quais este: “Faço voto em plena liberdade e vinculo a mim mesmo, sob a pena do pecado mortal, ao dever de não recusar a Jesus nenhum sacrifício que eu veja com clareza que me seja pedido por Ele”. [3] A alma possuída por Deus se torna uma obra-prima de beleza que todos, mas todos mesmo, inclusive os que não creem, podem admirar e ficar maravilhados. Quem, de fato, pelo menos uma vez na vida, não ficou maravilhado e extasiado com as ações realizadas por Madre Teresa de Calcutá e por seu encantador sorriso, que ela doava à crianças e aos enfermos? Aquela beleza que transparecia dos olhos e dos lábios de Madre Teresa era fruto também daquele voto proferido em 1942, um compromisso de amor à vida, ao qual nunca faltou; na plenitude de sua doação ao Senhor, adquiriu para si, por direito divino, a capacidade de refletir aos outros o amor de Deus na terra.
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A ALEGRIA
Apesar da obrigação que se tinha imposto – sob pena de perder a vida eterna –, de não negar nada a Deus, irmã Teresa estava serena e alegre, porque tinha encontrado a bemaventurança que a submissão traz. Ela repetirá com frequência às suas Irmãs da Caridade, em uma espécie de confissão autobiográfica: “A submissão, para quem ama, é mais do que um dever, é uma bem-aventurança”. Era a mulher da alegria e com desapontamento via os tristes: “Quando vejo alguém triste, penso sempre que está recusando algo a Jesus” [1]. A alegria era parte integrante da vida de Madre Teresa, que não sorria para os jornalistas, mas era alegre com os leprosos, os portadores de deficiência, os párias. [2] Na sua alegri alegria, a, Madre Teresa vivi viviaa uma antig antiga tradição tradição eclesi eclesiásti ástica. ca. Os P adres do deserto, os Padres da Igreja e os doutores da Igreja do Oriente consideravam como oitavo vício capital a tristez trist eza, a, que era o oposto da alegria cristã. Orígenes, por exemplo, descreveu a alegria daquele que tem o conhecimento íntimo de Jesus: a alma é inundada de alegria, como aquele vel ve lho Simeão, que carregou Jesus, o Salvador, em seus braços. Todos os mártires católicos, desde Estêvão protomártir até os mártires do nosso tempo, morrem cheios de alegria. O testemunho de Santo Inácio de Antioquia é esclarecedor: “Escrevo-vos quando ainda estou vivo, mas desejo morrer. O meu desejo terreno foi crucificado, e em mim não há mais fogo algum para amar a matéria, mas uma água viva que murmura e diz no meu íntimo: ‘Vem ao Pai’”. São Bernardo, São Domingos, Santo Inácio de Loyola, São João da Cruz, Santa Teresa d’Ávila, São Francisco de Sales, São João Bosco, São Maximiliano Kolbe são luminosos protetores da alegria, assim como Santa Teresinha, que se poderia definir tranquilamente o espelho de Madre Teresa. As mãos de Madre Teresa se tornaram as mãos de Teresinha, aquilo que esta gostaria de ser, não fosse a sua saúde frágil. A patrona dos missionários, que não pôde, contra sua vontade, ir para as missões na Indochina, para onde o Carmelo de Lisieux havia convidado religiosas para fundar uma comunidade em Saigon, era cheia de espírito missionário (e é o espírito que faz o mérito da obra, não a ação) e votada inteiramente para a salvação das almas. No capítulo capítulo XI da Históri a de uma alma, se lê: Abri um dia as Epístolas de São Paulo [...] e li ao acaso os capítulos XI e XIII da Primeira Epístola aos Coríntios, onde li que todos não podem ser, ao mesmo tempo, apóstolos, profetas e doutores; que a Igreja é composta de vários membros e que o olho não saberia ser simultaneamente a mão. A resposta não satisfazia meus votos: continuei a minha leitura sem me desencorajar e li: “Procurai com ardor os dons mais perfeitos, mas eu vos indicarei um caminho ainda mais excelente” (1Cor 12,13). E o Apóstolo explica como todos os dons mais perfeitos não são nada sem o Amor, e que a Caridade é o melhor caminho para se chegar seguramente a Deus. Por fim, encontrei sossego! Compreendi que a Igreja tinha um corpo composto de vários membros, tinha também um coração, e que esse coração ardia de amor, e se o amor tivesse se
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extinguido, os Apóstolos não teriam anunciado o Evangelho, e os Mártires teriam se recusado a derramar seu sangue. Compreendi também que o amor abarcava em si todas as vocações, que o amor era tudo, e abraçava todos os tempos e todos os lugares, porque é eterno! [...] Portanto, o que eu peço é o amor. As grandes obras me foram vetadas; eu não posso pregar o Evangelho, nem derramar meu sangue [...], mas o que importa? Os meus irmãos trabalham por mim, enquanto eu, pobre menina, fico bem perto do trono real e amo por aqueles que combatem [...]. Eu não tenho outro meio para provar-vos meu amor senão “espalhar flores”, e isso significa não deixar escapar nenhum sacrifício, ainda que pequeno: um olhar, uma palavra, aproveitar as menores ocasiões e realizá-las por amor [...]; e depois cantarei, cantarei sempre, ainda que eu tenha de colher minhas rosas entre os espinhos. Mas para que vos servirão minhas flores e meus cantos? [...] Farão sorrir a Igreja triunfante, que os derramará sobre a Igreja sofredora, para extinguir suas chamas, e sobre a Igreja militante, para garantir-lhe a vitória!
As grandes obras não serão “proibidas” a Madre Teresa, que assim poderá transformar o ardor espiritual, apostólico e evangélico de Santa Teresinha em realização tangível, em caridade visível e concreta. Essa é a comunhão dos santos, essa é a alegria plena das mulheres e dos homens de Deus. Na vida vida dos fil filhos da Igreja, Igreja, a partici participação pação na alegri alegriaa do Senhor não pode ser dissociada da celebração do mistério eucarístico, no qual os crentes são nutridos e saciados com o Corpo e o Sangue de Cristo. De fato, assim sustentados, como viandantes na estrada da eternidade, eles já recebem, no sacramento, as primícias da alegria escatológica. São Nilo, o Antigo, escreveu: “A doçura do espírito nasce da alegria, enquanto a tristeza é como a boca do leão que devora o homem melancólico”. A alegria é um dever para o cristão: cristão: “É necessário necessário que todo aquele aquele que quer progredi progredirr tenha a alegri alegriaa espiritual”, afirmava São Tomás de Aquino. A alegria é o passaporte do verdadeiro cristão e é, sem dúvida alguma, o presente que o cristianismo deu ao mundo. Todo ser humano é feito para a alegria. “Não se pode encontrar ninguém que não queira ser feliz”, escreveu Santo Agostinho; todavia, não “podemos dizer com segurança que todos querem ser felizes, porque quem não quer ter a alegria em ti, que és a única felicidade, não quer a felicidade”. [3] As Sagradas Escrituras estão cheias de referências à alegria: “Não te abandones à tristeza, não te atormentes com teus pensamentos. A alegria do coração é a vida para o homem, a alegria de um homem é vida longa!” (Eclo 30,21-22). “Deus ama quem doa com alegria” (2Cor 9,7). Jesus insiste muito na alegria: “Digo-vos isso para que a minha alegria esteja em vós, e a vossa alegria seja plena (Jo 15,11). Ele pede aos seus discípulos “que tenham em si mesmos a plenitude da sua alegria” (Jo 17,13). Esforça-se para assegurar-lhes que a tristeza deles por sua paixão e morte se transformará em alegria, quando eles o virem ressuscitado e glorioso: “Vós estais aflitos, mas a vossa aflição se transformará em alegria [...] Vós agora estais na tristeza, mas vos verei de novo, e o vosso coração se alegrará, e ninguém poderá tirar-vos a vossa alegria” (Jo 16,20-22). Jesus exorta seus discípulos a rezar ao Pai para provar a alegria de serem ouvidos: “Pedi e obtereis, para que a vossa alegria seja plena” (Jo 16,24). Jesus se exprime com ternura e com força, para que quem o segue compreenda que a proposta da vida cristã, que passa somente e unicamente unicamente pela pela cruz, tem, no fundo, como objetivo objetivo a aleg alegria. ria. São 49
Paulo exorta os cristãos a conservar a alegria sempre e em todos os lugares: “Meus irmãos, alegrai-vos no Senhor” (Fl 3,1); “Alegrai-vos no Senhor, vos repito mais uma vez, alegrai-vos. Que a vossa afabilidade seja conhecida por todos os homens” (Fl 4,45); “O reino de Deus [...] é justiça, paz e alegria no Espírito Santo” (Rm 14,17). O apóstolo dos gentios insiste na alegria do cristão, porque esta é a vontade de Deus: “Sede sempre alegres, orai incessantemente, em todas as coisas rendei graças: essa é, de fato, a vontade de Deus em Cristo Jesus para vós” (1Ts 5,16-18). Portanto, é mentirosa a imagem do cristianismo como “inimigo da alegria” (Anatole France) ou “maldição da vida” (Nietzsche). Iluminada pela palavra de Deus e por sua graça, a vida dos cristãos se torna uma festa: a Páscoa do mundo. A alegria não é um contraste ao sofrimento vivido por Jesus ou para Jesus, mas é consequência direta, tendo em vista o mosaico da história da Salvação, das lágrimas redentoras; por isso, tormento interior e serenidade viajam juntos sobre os mesmos trilhos do amor. Madre Teresa queria junto a si irmãs e sacerdotes prontos para o sacrifício e para a cruz, mas igualmente serenos e alegres; de fato, explicava a suas irmãs: A alegria é sinal de uma pessoa generosa e que não pensa em si, que se esquece de si, e procura agradar a Deus em tudo o que fizer para as almas. A alegria é frequentemente um manto que esconde uma vida de sacrifício, contínua união com Deus, fervor e generosidade. A pessoa que possui esse dom da alegria frequentemente atinge um alto grau de perfeição. Porque Deus ama quem doa com alegria e mantém junto a seu coração a religiosa que Ela ama.[4]
Tudo o que ela fazia, mesmo a mais insignificante das coisas, era ocasião para amar: “Não procurem grandes coisas, façam somente pequenas coisas com grande amor [...]. Quanto menor são as coisas, maior deve ser nosso amor”. [5] Assim Madre Teresa pôs em prática o ensinamento do papa Paulo VI: “Fazer tudo, fazer logo, fazer bem, fazer alegremente”, e, na alegria de cumprir tudo aquilo que Deus lhe ordenava, ela pareceu ser, a algumas pessoas e algumas vezes, precipitada nas decisões e nas realizações. De fato, se tornou para ela agradavelmente coerente responder com rapidez às exigências do momento. Ela vivia em perfeita alegria, como São Francisco, que encontrara a liberdade no amor ao Senhor e vivia a louvar e a cantar as maravilhas do Pai: “A alegria é causada pelo amor”, explicava São Tomás de Aquino. Alegria e amor caminham juntos, já que quem não ama não pode ser alegre. A alegria prospera na doação de si, enquanto não existe onde o egoísmo, o hedonismo e o rancor dominam. A alegria cristã, ditada pela esperança e pela caridade, é uma redundância do amor de Deus, é um efeito do amor. Essa explicação não é inútil, mas indispensável e fundamental, porque revela a razão pela qual muitos procuram a alegria e não a encontram. Em vão a procuram, porque pensam que ela pode ser encontrada por si mesma. Na realidade, a alegria não tem consistência em si mesma: tem sua fonte no amor. É mais alegre quem ama do que quem é amado. A fonte do amor é Deus: “Deus é amor” (1Jo 4,8), por isso Deus é alegria e, sendo onipotente e, é infinito, portanto, 50
também alegria infinita. “A alegria plena não é carnal, mas espiritual”, afirma Santo Agostinho. De fato, a alegria cristã é uma alegria de Deus, permanente, uma alegria que é fruto do Espírito de Deus que habita em nós (Gl 5,22). Todavia, a alegria cristã apreende, promove, ilumina e intensifica as diversas alegrias do homem; assim temos as alegrias da verdade, do coração, da beleza, das lembranças, da espera... A alegria espiritual tem uma reverberação exterior, que ilumina todo ser humano, o torna amável e fascinante. A Virgem Maria vem, em primeiro lugar, entre as criaturas da alegria plena, porque é plena lena de graça. Ela Ela exul exulta ta de aleg alegri riaa diante diante de sua prima prima Isabel: Isabel: “A minha minha alma alma engrandece o Senhor, e o meu espírito exulta de alegria em Deus, meu Salvador [...]. De agora em diante, todas as gerações me chamarão bem-aventurada”. Assim Paulo VI escreve a respeito de Maria no dia 9 de maio de 1975, na exortação apostólica dedicada à alegria alegria cristã, cr istã, Gaudete Gaudete in i n Domino: Ela, melhor do que qualquer outra criatura, compreendeu que Deus realiza ações maravilhosas: santo é o seu Nome, ele mostra most ra a sua misericórdia, exalta exalta os humildes, humildes, é fiel a s uas promess as. Não que o aparente curso cur so da vida de Maria saia da trama comum, mas ela reflete sobre os pequenos sinais de Deus, meditando sobre eles em seu coração. Não que os sofrimentos lhe tenham sido poupados: ela permanece de pé junto à Cruz, associada de modo eminente ao sacrifício do Servo inocente, ela que é mãe das dores. Mas ela também está aberta, sem limite algum, à alegria da Ressurreição, e também ela é elevada, em corpo e alma, à glória do Céu. Primeira criatura redimida, Imaculada desde a concepção, morada incomparável do Espírito, sacrário puríssimo do Redentor dos homens, ela é, ao mesmo tempo, a Filha predileta de Deus e, em Cristo, a Mãe universal. É o tipo perfeito da Igreja terrena e glorificada [...]. Perto de Cristo, ela retoma em si todas as alegrias, ela vive a alegria perfeita prometida à Igreja: Mater plena sanctae laetitiae . E seus filhos aqui na terra, dirigindo-se àquela que é mãe da esperança e mãe da graça, a invocam como a causa de sua alegria: Causa nostrae laetitiae.
É a fecundidade gloriosa da cruz que proporciona felicidade. Bento XVI afirmou que os crentes dão “testemunho da alegria, da razão e da beleza de ser cristãos”. E Madre Teresa, que viveu pela cruz, seja na própria dor interior, seja naquela da experiência humana, foi intérprete magistral e privilegiada dela. Quem olhava e olha para Madre Teresa percebe em seu coração um bálsamo benéfico, porque compreende que nela repousam a beleza e a alegria do Eterno.
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“NÃO ESQUEÇA... OS POBRES”
Voltando a Calcutá, irmã Teresa retomou sua atividade como professora na St. MaryHigh School, e suas alunas, que ela chamava de filhas, estavam felizes por ter de volta a “Madre”. Formada professora de História e Geografia, assistente das alunas internas do colégio, irmã Teresa ensinava também, muito provavelmente, mesmo não tendo habilitação para isso, na escola Santa Teresa, pois as irmãs da ordem à qual pertencia eram poucas em Calcutá, e as atividades eram muitas. As irmãs de Loreto se lembram del de la como uma religiosa muito boa e exemplar. Tinha um cuidado e uma predileção especiais pelos pobres; visitava-os quase regularmente, conforme as possibilidades e o regulamento da Congregação. Quando não podia fazê-lo diretamente, entregava comida, roupas e outros donativos ao padre Henry, e ele os distribuía entre os pobres. Continuava a manter correspondência com sua família, sobretudo com a amadíssima mãe. Entre 1937 e 1938, enviou-lhe uma carta em Tirana, onde Drane tinha ido viver com a filha Age: Sinto por não estar contigo, mas alegra-te, minha cara mãe, porque tua pequena Gonxhe está feliz... Esta é uma vida nova. O nosso centro é muito bonito, sou professora e gosto do trabalho. Sou também diretora de toda a escola e aqui todos me querem bem.[1]
Irmã Teresa foi nomeada diretora da St. Mary-High School; as meninas a adoram, tudo vai muito bem, a pequena flor desabrochou e obtém sucesso... Nëna Loke, em vez de compartil compartilhar o entusiasmo entusiasmo da filha, filha, fica pensando preocupada: os pobres, onde foram parar? Aqueles pobres pelos quais seu pequeno botão de flor tinha deixado tudo e todos? Não hesita então em responder, em 1938, nestes termos: Minha cara filha, não te esqueças que foste até aí pelos pobres. Lembra-te da nossa Filja? Ela está cheia de chagas, mas o que mais a atormenta é estar só no mundo. Nós fazemos o que podemos para ajudá-la. De fato, o pior não são as chagas, mas o fato de ter sido esquecida pelos seus...[2]
Sua mãe Drane lhe indicou o caminho. O que a irmã Teresa estava fazendo? Professora formada, diretora? Consideração e estima de todos? E os pobres, pelos quais tinha chegado à distante Índia, onde estavam? As palavras maternas a tocaram profundamente. Tinha Tinha ido à Índia Índia pelos pelos pobres, e não para educar meninas meninas de boa família! E agora, de fato, sua atenção tinha se deslocado, seu trabalho tinha se tornado, sobretudo, intelectual e passava suas horas em uma belíssima escola com alunas bem vestidas, sadias, de modos gentis e elegantes. Algo começou a perturbá-la. Até a intervenção materna, tudo parecia linear na sua vida, mas agora chega essa carta e sua vida é colocada em discussão. Partira par 52
encontrar Jesus Cristo, para vê-lo nos últimos dos homens, e agora estava se desviando da ideia original. O problema era realmente sério: demorara seis anos para escolher a vida religiosa na Índia, e agora a estrada parecia bloqueada: como voltar aos pobres de sua predil redileção, uma vez que o Instituto Instituto de Loreto, tendo encontrado nela nela uma diretora diretora de primeira rimeira grandeza, não a deix deixaria mais “sujar” suas mãos com os desamparados? P ara não esquecer os desvalidos, teria de mudar de caminho, voltar-se, olhar além... Era necessário pensar, orar, meditar. Padre Lush explica: “Assim começou a aventura de Madre Teresa. Já muitíssimos anos antes tinha pensado e rezado, procurado fazer algo por essa gente. Mas ensinar, trabalhar com as meninas, visitar suas famílias, lhe parecia muito pouco”. Confusa e perdida, está tentada a mudar de vida, porque sente não ter sido feita para estar entre as senhoritas de boa famíli família da Índia; Índia; sente-se atraída para estar com os últi últimos, mos, os rejeitados. rejeitados. Chegou, Chegou, graças a sua mãe Nëna Loke, o chamado no chamado. Durante os anos da Segunda Guerra Mundial, a escola de St. Mary foi requisitada pelo exército britânico para transformar-se em um hospital militar; por isso, todas as religiosas e alunas do internato deixaram Calcutá: o grupo inglês se transferiu para Simla e o grupo bengalês engalês para Morapai, para depois depois voltar, voltar, até 1946, a Calcutá. Calcutá. Grande parte do ônus da administração do internato ficou a cargo de Madre Teresa, que continuava a ensinar. Por causa do extremo cansaço, adoeceu gravemente, mas se recuperou. Entre 1942-1943, para piorar a situação, situação, já dificíl dificíliima, houve uma carestia carestia em Bengala Bengala que fez dois dois milhões milhões de vítimas. Também irmã Teresa e as alunas passavam fome e a situação era gravíssima. Madre Teresa não tinha medo, estava tranquila e serena; o postulador da sua beatificação, eatificação, padre Brian Brian Kolodi Kolodiejchuk, ejchuk, exp expllica o motivo motivo dessa tranquili tranquilidade: dade: “Madre Teresa, que prometera não recusar nada a Deus, confiou que Ele, por sua vez, não lhe recusaria recusaria nada”.[3] Uma ex-aluna do colégio testemunhará: “Um dia não havia mais nada para comer. Às oito oito da manhã, a Madre nos disse: disse: ‘Meninas, ‘Meninas, vou sair. sair. Vocês, Vocês, fiquem fiquem na capela e rezem’. Às quatro da tarde, a despensa estava cheia de vários tipos de verdura. ão podíamos acreditar acreditar nos nossos olhos!”. Em 1944, foi nomeada diretora do St. Mary e superiora de facto das Filhas de Sant’Ana, que eram as irmãs da Congregação bengalesa unidas às Irmãs de Loreto. Agora Madre Teresa é chamada a entrar em um cenário arrepiante, e não se nega, nem mesmo diante dos massacres; o seu “Sim” já é um fato assimilado e nada é posto em discussão por ela. Assim, em 1946, quando em Calcutá estourou o violentíssimo conflito hindu-muçulmano, depois denominado o “grande massacre de Calcutá”, que deixou pelas ruas da cidade cinco mil mortos e cerca de cinquenta mil feridos, Madre Teresa assistiu ao horror, porque, por causa do fechamento do comércio de alimentos, devido àqueles trágicos eventos, se colocou em busca de algo para levar para as irmãs e as meninas. Ela mesma contará: Saí do St. Mary, em Entally. Eu tinha trezentas meninas no colégio e não havia nada para comer. Não podíamos sair pelas pelas ruas, mas eu saí. Então vi corpos cor pos apunhalados, apunhalados, espancados, espancados , jogados jogados no chão em posições não naturais natur ais em meio ao seu sangue seco. sec o. Nós tínhamos ficado seguras dentro dos nossos noss os muros. Sabíamos que tinham ocorrido confrontos. Algumas pessoas tinham até pulado os nossos muros: primeiro
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um hindu, depois um muçulmano [...]. Nós ajudamos a todos a fugir sãos e salvos. Fui parada por um caminhão cheio de soldados e eles me disseram que eu não deveria andar pelas estradas, que ninguém deveria ficar fora de casa, me intimaram. Respondi a eles que eu precisava correr o risco, porque tinha trezentas estudantes sem nada para comer. Os soldados tinham arroz, e assim me levaram de volta à escola e lá descarregaram alguns sacos de arroz.[4]
Irmã Teresa tinha saído do colégio por sua espontânea vontade, para dar de comer a suas trezentas meninas, e a coragem de ferro dessa pequena mulher, que ela demonstrou ter por toda a sua vida, tinha sido premiada: ela não negava nada a Deus, e Deus não negava nada a ela em favor dos outros.
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CRISTO É TUDO
No dia dia 10 de julho julho de 1946, aos trinta trinta e seis seis anos, irmã Teresa estava no trem que a levaria a Darjeeling, para os habituais exercícios espirituais anuais. A viagem era muito sugestiva, graças às belezas da cadeia montanhosa do Himalaia, mas foi interrompida improvisamente por uma “Voz”. É o início do percurso místico de irmã Teresa, a mística missionária. Teresa era uma asceta. Jejuns, mortificações, orações, isolamento, meditações, sofrimentos abraçados não somente com resignação, mas com alegria sempre foram, por toda a sua vida, o seu exercício cotidiano. A “Voz” a reclamava fora do Instituto das Irmãs de Loreto, para se dedicar completamente aos pobres. Padre Lush conta que um dia, durante uma entrevista, dada a ele, Madre Teresa lhe disse: A juventude de hoje, assim como o homem de hoje, está cansada de palavras, de promessas. Ela tem necessidade de obras, de testemunhos concretos. As nossas irmãs mais jovens desejam ser pobres, doar-se completamente ao Senhor, em uma vida toda espiritual. O mundo hoje, mais do que nunca, precisa do Senhor e busca-o, e nós tentamos dar esse testemunho por meio do amor. Para mim, Cristo é tudo. É o amor, a vida, o pão da vida. E procuro amá-lo e servi-lo nos pobres. Mas não esqueçamos que as dores, as cruzes, as dificuldades são os maiores dons que o Senhor nos dá. Porque o Senhor disse: tomai a vossa cruz e segui-me. Assim, na dificuldade podemos imitar o Senhor, podemos unir-nos à sua cruz, cr uz, aos seus sofrimentos. sofr imentos. Os sofrimentos sofr imentos são a manifestação de Cristo, o seu beijo, eijo, e nos permitem cola c olaborar borar mai m aiss intimamente intimamente com c om ele.
Como todos os místicos, também irmã Teresa vê realizar-se a união entre a alma e Deus por degraus, em uma escada ascendente, irrigando o jardim da alma com a oração, o alimento para cultivar as virtudes. Na união, a alma se abre totalmente para a realidade divina. A oração de união comum absorve a alma em Deus, e assim se dá a ligação silenciosa, de tácita contemplação amorosa, de irrefreável efusão. Para irmã Teresa, trata-se de um “chamado dentro do chamado”, como ela mesma definirá o evento, a sua segunda vocação. A exigência divina era claríssima, não necessitava de interpretação alguma: devia sair do convento de Loreto, para poder servir livremente aos pobres e viver com eles. Padre Lush, curioso em conhecer mais a fundo como se manifestou a “Voz”, um dia perguntou erguntou diretamente diretamente à protagoni protagonista sta sobre esses fatos, e ela, ela, sorrindo sorrindo amavelmente, respondeu: Eu tinha certeza de que era a voz de Deus. Tinha certeza de que ele me chamava. A mensagem era clara: eu tinha que sair do convento para ajudar os pobres, vivendo com eles e como eles. Isso era uma ordem, um encargo, uma certeza. Eu entendi o que devia fazer, mas não sabia como fazê-lo.[1]
Depois, enquanto Padre Lush olhava maravilhado para a grandeza de Madre Teresa, 55
ela continuou: Não tem importância a forma do chamado. É uma coisa entre Deus e mim, mas o que importa é que Deus chama a cada um de modo diferente. Não temos mérito algum. O importante é responder com alegria ao chamado. Como naqueles momentos difíceis e dramáticos, também agora tenho certeza de que foi obra de Deus e não minha. E, sendo obra de Deus, eu sabia que o mundo receberia algum benefício dela, que Ele utilizaria a minha pobreza, a minha fraqueza, a minha vida para dar aos pobres entre os mais pobres o seu amor.[2] Eu entendia o que isso exigiria, mas não sabia o que fazer para cumprir essa ordem do Senhor.
O retiro espiritual de 1946 foi decisivo. O chamado pessoal de Cristo tinha aberto os horizontes: ela devia seguir a Ele, que queria dela algo de muito grande, isto é, por meio da Obra desejada por Deus, irmã Teresa levaria o amor e a graça do Pai entre os desesperados da terra. Madre Teresa considerará o dia 10 de setembro de 1946 como a data efetiva da fundação das Missionárias da Caridade. Depois dos exercícios espirituais que a marcaram para sempre, irmã Teresa voltou a dirigir o colégio de St. Mary e nele ensinar, e, apesar de já ter no coração o olhar voltado para bem além das Irmãs de Loreto, reali realizava suas ativi atividades dades com o entusiasmo entusiasmo de sempre. Infatigável no trabalho, espontânea, levava a alegria para as alunas. Mas dedicava seu tempo livre, e sobretudo o domingo, ao Senhor e aos pobres, que esperavam ansiosamente por um sorriso da sua Ma.[3] No caminho de volta para o convento, depois de ter estado nos esquálidos casebres de Calcutá, irmã Teresa, como contaram alguns de seus amigos, rezava assim: “Ó Deus, com que facilidade os faço felizes! Dá-me força para ser sempre a luz de suas vidas e assim conduzi-los todos a ti”. Madre Teresa sempre declarou que a única razão pela qual as Missionárias da Caridade nasceram foi matar a sede de Jesus, objetivo sempre presente, desde a primeira redação das Regras da nova Congregação: “O fim último das Missionárias da Caridade é saciar a sede de Jesus na Cruz, por amor e pelas almas”. Um tormento crudelíssimo da crucificação era a sede que devorava aqueles que sofriam tal suplício. Depois de ter ficado seis horas na cruz, Jesus disse: “Tenho sede”, chamando a atenção de seus algozes para a sua necessidade e testemunhando publi ublicamente a realidade realidade e a intensidade intensidade de seus sofrimentos. Essa expressão expressão de extremo extremo sofrimento físico era a última exigência, para que o Messias fosse “consagrado pelos sofrimentos” (Hb 2,10), e para que a profecia se realizasse nele. É o grito do Senhor aos homens, sede humana de água, sede divina de amor. Realizava-se a profecia do Salmo 69,22: “Colocaram veneno na minha comida / e quando eu tinha sede me deram vinagre”. Cristo oferece como dom a água da vida para a mulher samaritana, para aplacar para sempre a sede desta, a sede de todos os homens, e pede para beber na cruz, no momento do suplício: “Jesus, sabendo que tudo estava consumado, disse, para que se cumprisse a Escritura: ‘Tenho sede’. Havia ali um vaso cheio de vinagre; colocaram uma esponja embebida no vinagre na ponta de uma vara e a aproximaram de sua boca. E depois de ter recebido o vinagre, Jesus disse: ‘Tudo está consumado!’. E inclinando a cabeça, expirou” expirou” (Jo 19,28-30). 56
Cristo doa água viva e eterna, e recebe em troca vinagre. Madre Teresa, que mata a sua sede na fonte de Cristo, e é seu instrumento, lhe oferecerá, ininterruptamente, água cristalina e pura, almas belas e limpas, prontas ao abraço de Deus. Não por acaso, entre os prediletos de Madre Teresa, os moribundos ocuparão um lugar especial. A mística de irmã Teresa está prestes a se tornar “lápis” nas mãos de Deus, e no Calvário encontra a resposta para o seu novo chamado. Assim explicou a Constituição da Congregação às suas filhas: “Tenho sede”, disse Jesus na cruz, quando estava privado de qualquer consolação, morrendo na absoluta pobreza, só, s ó, desprezado e despedaçado no c orpo e na alma. Ele falava falava da sua s ua sede s ede não de água, mas de amor, de sacrifício. Jesus é Deus; portanto, o seu amor, a sua sede são infinitas. O nosso objetivo é saciar essa sede infinita do Deus feito homem. Assim como os anjos adoradores no Paraíso cantam incessantemente louvores a Deus, as irmãs, por meio dos quatro votos de absoluta pobreza, castidade, obediência e caridade aos pobres, saciam sem descanso aquele Deus sedento por meio do amor delas, e o amor das almas que elas conduzem a Ele.
Madre Teresa percebeu distintamente a sede de Cristo a partir do dia 10 de setembro, e tudo se revelou com perfeita transparência: Tudo das Missionárias da Caridade existe somente para saciar a sede de Jesus. As suas palavras, na parede de toda capela das Missionárias da Caridade, não se referem somente ao passado, mas estão vivas aqui e agora, ditas a vocês [...]. “Tenho sede” é algo de muito mais profundo, para Jesus, do que dizer simplesmente “Eu te amo”. Enquanto vocês não souberem profundamente que Jesus tem sede de vocês, não poderão começar a saber o que Ele quer ser para vocês. Ou quem Ele quer que vocês sejam para Ele.[4]
O objetivo de Madre Teresa então será salvar almas, oferecendo dignidade à pessoa: nutrindo-a, vestindo-a, curando-a. Nenhuma imposição, somente ajuda incondicionada e gratuita, na qual o indivíduo tem a possibilidade de ler o amor de Deus por ele. Eis o que Madre Teresa escreveu em 18 de agosto de 1948, quando deixou o convento das irmãs de Loreto: Jesus Cristo deseja que eu seja uma irmã livre, rica da pobreza da Cruz. Hoje aprendi uma coisa importante: a pobreza para o pobre é uma coisa muito dura! Hoje, oje, o dia inteiro, inteiro, procurei procur ei uma casa, cas a, um teto, um refúgio, caminhando o dia inteiro, até minhas pernas começarem a doer [...] este é o segundo chamado, o chamado para deixar o c onvento, onde fui feliz, feliz, para servir s ervir nas ruas r uas os mais pobres entre os pobres.
Ao término dos exercícios espirituais, irmã Teresa confiou os segredos de seu coração à Madre Superiora, à Mestra das Noviças, a algumas irmãs de Loreto, e o espanto foi geral. Madre Teresa foi irremovível, escreveu também uma carta à Superiora Geral das Irmãs de Loreto na Irlanda, Madre Gertrude Kennedy, que assim respondeu ao pedido de irmã Teresa: Se o Senhor a chama, com todo o meu coração lhe dou a permissão. Mas não se esqueça nunca que a senhora estará sempre no nosso coração. Se essa é a vontade de Deus... Mas saiba que pode contar com a amizade, estima e amor de nossa Congregação. E se acontecer que, por algum motivo, a Senhora quiser voltar, nós a aceitaremos, com muito prazer, novamente como nossa irmã.
O seu pedido, portanto, tinha sido aceito, mas, para obter a liberdade, teria que se dirigir a Roma. 57
Madre Teresa estava feliz com sua situação, antes do “chamado no chamado”; na realidade, escondia dentro de si um tormento imenso, que os documentos fazem remontar a 1937. “Tenho por companheira a escuridão”, revelara em carta ao padre Jambreković do dia 8 de fevereiro daquele ano. De fato, ela experimentou e viveu os tormentos espirituais dos místicos naquela espécie de catarse e purificação que somente a poucos eleitos eleitos é concedido concedido experimentar. experimentar. O carmelitano carmelitano João da Cruz a chamou “a noite noite escura”, dividida em “noite dos sentidos” e “noite do espírito”. Na primeira fase nos afastamos das satisfações sensíveis, somos arrebatados unicamente pela oração contemplativa, em seguida, Deus Pai transmite o seu amor e a sua luz, mas a alma, ainda imperfeita, não está em condições de recebê-los, e então caímos no tormento espiritual, provando o vazio, vazio, a escuridão, escuridão, o isolamento, solamento, a aridez. aridez. Um vazio vazio que é aparente e não substancial, mas o sofrimento é imenso, a ponto de chegarmos a ter a sensação de que caminhamos para a perdição eterna. Por isso, a fé, a esperança e a caridade são submetidas a dura prova. Quando a alma se tornou ouro líquido, porque passou pelas chamas da dor, ela está pronta para receber e dar amor, em uma troca exaltante e perene com Deus. São sofrimentos místicos que muitas esposas de Cristo e poucos homens experimentaram. “No silêncio do coração Deus fala”, costumava dizer Madre Teresa naquele silêncio no qual se refugiava para encontrar um bálsamo para as aflições. Tinha prometido nada recusar ao Senhor, por isso a obediência às superioras das Irmãs de Loreto era considerada a vontade do Pai, que ela era chamada a seguir sob pena de “pecado mortal”. Madre Teresa, no caminho do processo de amadurecimento espiritual, se prepara para se tornar uma epifania do Senhor em terras distantes e muitos, com um anjo de carne e osso como ela ao lado, verão as maravilhas de Deus e se aprestarão para acolher o Evangelho. Madre Teresa abriu seus olhos para o segredo cristão, para o mistério da fé, e tudo ficou claro. Para ela, tornou-se cada vez mais simples reconhecer, nas faces dos pobres, dos cruci c rucifi ficados, cados, dos transfigurados transfigurados pela pela dor, dor, a face de Cristo, Cristo, a face da Pai Pa ixão, a face coroada de espinhos, a face impressa no manto de Verônica, a face do Santo Sudário. Madre Teresa nos faz lembrar de outro testemunho do Evangelho, seu e nosso contemporâneo, que ainda não é um servo de Deus, ainda não é beato, mas merece sêlo: Irmão Silvestro Pia, missionário místico do Instituto da Sagrada Família, menos conhecido no resto do mundo, mas um gigante de santidade, de olhos vívidos e iluminados, magro, baixo, pele seca e queimada de sol, com mil rugas, como Madre Teresa de Calcutá. Ele que falava com Cristo Crucificado, [5] na árida terra de Burkina Fasso, criou hortas, vinhas, pomares e campos de colheita, nutrindo, cuidando, dando trabalho e confortando como um pai os burquinenses. Em seu breviário, foi encontrado um folheto: “Deus é assim: o próprio Deus desce dos quadros e dos ícones e se esconde naquele que precisa de nós e diz: ‘Eis-me aqui’. Esconde-se nos pequenos da terra e diz: ‘Procurai-me aqui’, e depois: “Velai e orai, a hora é grave. Meu pai, sacrifica-me a mim, mas salva o mundo [...] o mundo que é teu”. Dividido entre céu e terra, em um 58
intercâmbio constante e profícuo, Irmão Silvestro era um amante da Cruz, como Madre Teresa, que se espelhava no Cristo Crucificado. Eles sabiam traduzir a Cruz, de símbolo de sofrimento e de morte, na Cruz gloriosa da redenção do pecado de todos os homens, a pobreza mais pesada por suas consequências de mentira, abismo e morte. Para os místicos, o antídoto é exatamente a dor, que deixam cair sobre si, para transmutá-la em graça e salvação para os outros, os irmãos em Cristo. Madre Teresa explica lucidamente: “O sofrimento não é um castigo, não é fruto do pecado, é um presente de Deus. Deus nos faz participar participar do sofrimento sofrimento de seu Filho Filho e nos permite ermite remediar remediar os pecados do mundo”. Tudo se inverte: o sofrimento sofrimento de castig castigo, depois da queda, depois do pecado original, quando o homem se colocou no lugar de Deus, se transforma em remédio. A oração é a arma dessas criaturas, o meio eficiente para chamar a atenção de Deus para as almas e para as obras. Embora absorvidos em resolver resolver os problemas problemas do próxi próximo, sempre em estado de perene urgência, “assediados” pelos pobres, que, em número crescente – dada a difusão de seu nome e de sua presença – vão implorar-lhes ajuda, essas pessoas, esses anfíbios que vivem entre o céu e a terra permanecem equilibrados, sábios, firmes, tendo diante de si o farol da Cruz. Lemos na encíclica Deus caritas cari tas est (n. 18): A oração como meio para se obter sempre força de Cristo se torna aqui uma urgência totalmente concreta. Quem reza não desperdiça seu tempo, mesmo que a situação tenha todas as características da emergência e pareça nec essitar somente da ação. A piedade piedade não enfraquece a luta contra c ontra a pobreza ou contra contr a a miséria do próximo. A beata beata Teresa de Calcutá é um exemplo muito evidente evidente do fato de que o tempo t empo dedicado a Deus na oração não só não prejudica a eficácia e a operosidade do amor ao próximo, mas, de fato, é uma nascente inexaurível delas. Na sua carta para a Quaresma de 1996, a beata escrevia aos seus colaboradores leigos: “Nós precisamos desta ligação íntima com Deus na nossa vida cotidiana. E como podemos obtê-la? Por meio da oração”.
Padre Lush conta: “Ela amava, lia e meditava quase continuamente a Bíblia, a vida dos santos, livros de meditação e de oração. Ficava muito agradecida quando eu lhe oferecia algum livro meu de meditação”. Chamada a saciar a sede de Cristo, Madre Teresa não se negou e, com coragem, enfrentou o pântano angustiante da doença e do abandono e, como mãe misericordiosa, mergulhou nesse pântano para transformá-lo em jardim. Ela dizia: “Precisamos ter os olhos cheios de profunda esperança, para ver Cristo no corpo destruído e nas roupas fétidas que cobrem o mais esplêndido filho dos homens”, ou então: “As pessoas não conhecem a compreensão. Não conhecem outras pessoas. Se entendessem, entenderiam logo a grandeza do pobre estendido no esgoto, e não poderiam deixar de amá-lo. E esse amor poderia ajudá-lo”. A oração para Madre Teresa era frequentemente composição pessoal, invocação forte e apaixonada: Senhor, quando eu tiver fome, dá-me alguém que precise de comida; quando eu tiver sede, dá-me alguém que precise de bebida; bebida; quando eu tiver frio, manda-me alguém alguém para que eu o aqueça; quando eu tiver um desgosto, oferece-me alguém que eu possa consolar; quando minha cruz se tornar pesada, faz com que eu compartilhe a cruz de outrem; quando eu estiver pobre, guia-me para alguém necessitado; quando eu não
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tiver tempo, manda-me alguém que eu possa ajudar por um momento; quando eu estiver humilhado, faz com que eu tenha alguém para louvar; quando eu estiver desencorajado, manda-me alguém que eu possa encorajar; quando eu precisar de compreensão dos outros, dá-me alguém que precise da minha compreensão; quando eu precisar de alguém que cuide de mim, manda-me alguém de quem eu possa cuidar; quando eu pensar s omente em mim mesmo, chama minha atenção para uma outra outr a pessoa. pess oa.
A catequese de madre Teresa foi toda a sua vida e podemos encontrá-la em todos os lug ugares, ares, tanto nos seus escritos, escritos, nos seus ensinamentos constantes, nas suas advertências, advertências, como nas suas exortações, nos seus preceitos e nas suas ações. Nela conviveram, em perfeita erfeita harmonia, Maria e Marta, uma não subtraiu nada à outra, uma apoiou apoiou a outra em um sublime equilíbrio.
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“POR MIM, TE RECUSARÁS A FAZER ISSO?”
O objetivo principal que Madre Teresa colocará no centro da Regra de sua Congregação será o de levar Cristo para as casas e para as ruas das periferias, entre os doentes, os moribundos, os mendicantes e os meninos de rua. Os doentes serão cuidados no que for possível em suas pobres casas. As crianças terão uma escola nas periferias. Os mendicantes serão procurados e visitados em seus “buracos” ou pelas ruas.
O termo “buracos” tinha sido sugerido por Jesus a Madre Teresa para indicar os casebres e as periferias bengaleses. A mística, que escuta a “Voz”, ampliará o texto nas modificações sucessivas da Regra, como se pode ler nas Constituições: “A nossa missão especial é trabalhar para a salvação e a santificação dos mais pobres entre os pobres, não só nas periferias, mas também em todo o mundo, onde quer que se encontrem”. Na Regra está enunciado enunciado claramente o ideal da Congregação: Congregação: Jesus. O espírito dela é o total abandono a Deus, a recíproca e amorosa confiança, e a santa alegria para com todos, assim como se vivia na família de Nazaré. Serem possuídas por Jesus para possuílo, e “se quisermos que os pobres vejam Cristo em nós, devemos antes ver Cristo neles”. De caráter internacional, a fraternidade é chamada a participar da missão especial da Igreja Católica, isto é, universal, difundindo em todo o mundo a luz da mensagem evangélica, e “a unir sob um único espírito os povos de qualquer nação, raça ou cultura, e a ser sinal daquela fraternidade que permite um honesto diálogo, do qual extrai um novo vigor”. Além disso, está escrito na Regra: “Às crianças e aos pobres, a todos os que sofrem e estão sós, oferece sempre um belo sorriso; não dês a eles somente os teus cuidados, mas também o teu coração”. Dar dignidade aos pobres, na vida e na morte, para transmitir, por meio do socorro e do conforto, a presença e o amor de Cristo Senhor entre eles. Em suma, dar oportunidade a todos os que sofrem de conhecer a Deus, explicando que seus sofrimentos não são em vão, mas estão associados aos méritos para um destino de salvação, e não de desespero e perdição. Assim, Madre Teresa, que encontrava Cristo nos pobres, ao mesmo tempo levava a eles a luz de Cristo. Seu esforço de “levar as almas a Deus e Deus às almas” foi constante e fiel, como ela mesma escreverá ao arcebispo arcebispo Ferdinand Péri P érier, er, na festa de Corpus Christi de 5 de junho de 1947. A mística Madre Teresa experimentou manifestações diretas do pensamento de Deus, que podem acontecer de três formas: externamente, com percepções auditivas; interiormente, com percepções íntimas; subitâneas, isto é, sem percepções intelectivas. A forma na qual Madre Teresa ouviu a “Voz” pertence ao segundo tipo. Ela não somente ouvia, mas também conversava com Jesus, com o qual se estabeleceu um extraordinário diálogo sagrado de amor e de beleza. Ele a chamava “minha esposa”, ou “minha 61
pequena”, e ela ela o chamava “meu Jesus”. O chamado, recebido em Escópia, para ir ao encontro dos pobres na Índia tinha sido forte o suficiente para induzi-la a partir para “levar alegria na vida”, [1] e levar todos a Jesus; no entanto, não era suficiente. Jesus queria mais: “Vem, vem, leva-me aos ‘buracos’ dos pobres. Vem, sê a minha luz”. Esse foi o convite direto que Jesus Cristo lhe fez. Ela nunca falou: “Jesus me disse”, mas sempre “a ‘Voz’ me disse”. E foi a partir dos exercícios espirituais de Darjeeling que começou a transcrever os sagrados diálogos, dos quais se servirá quando, alguns meses depois, escreverá ao arcebispo de Calcutá para dar peso e valor aos seus pedidos. As transcrições, isto é, “a cópia da ‘Voz’”, ‘Voz’”, como ela dizia, dizia, foram f oram entregues, e ntregues, quando qu ando ela voltou para Calcutá, depois do retiro em Darjeeling, ao seu diretor espiritual, o padre esuíta Celeste Van Exem. A intenção de Madre Teresa era agir logo para a realização do convite de Jesus, mas tinha de passar por seus superiores (as Irmãs de Loreto e o arcebispo de Calcutá), dos quais desejava não só obter a permissão, mas também a bênção e a proteção, tendo assim assim a tranquil tranquilidade de observar os seus votos de obediência obediência diante dos homens, mas, sobretudo, diante de Deus, e assim estaria segura de seguir um desígnio divino, e não a sua possível imaginação. Padre Van Exem, na sua sabedoria, apesar de ter plena confiança em sua filha espiritual, pois a conhecia muito bem, para verificar se as intenções de Madre Teresa eram sinceras e verdadeiras, a proibiu de pensar na “Voz” e na inspiração, assim como a proibi roibiuu de mencioná-l mencioná-laa ao arcebispo arcebispo de Calcutá. Calcutá. O sil silêncio, êncio, na oração, durou quatro meses: de setembro de 1946 a janeiro de 1947. Depois, o padre espiritual, tendo verificado a autenticidade do chamado, deu a permissão a Madre para escrever ao arcebispo Périer. Na carta que escreveu, a irmã mencionou a vida de Santa Maria Francesca Cabrini, afirmando que era seu desejo tornar-se indiana, e assim ser para os indianos o que Madre Cabrini foi para os americanos, tornando-se uma deles: Convento de St. Mary, 13 de janeiro de 1947. Excelência, Desde setembro passado, estranhos pensamentos e desejos enchem meu coração. Tornaram-se mais fortes e claros durante o retiro de oito dias em Darjeeling [...]. Antes de comunicá-lo, quero dizer que bastará uma palavra alavra sua, Excelência, e eu estarei pronta a não considerar cons iderar nunca mais nenhum daqueles daqueles estranhos pensamentos que continuam c ontinuam a me oc orrer. Ao longo deste ano, com muita frequência desejei intensamente ser toda de Jesus, fazer com que outras almas (sobretudo da Índia) cheguem a amá-lo com fervor, e me identificar completamente com as jovens indianas, para assim amá-lo como nunca foi amado antes. Pensei que esse foi um dos meus tantos loucos desejos. Li a biografia de Santa Maria Francesca Cabrini [...]. Por que eu não posso fazer pela Índia o que ela fez pela América? Ela não esperou que as almas chegassem até ela, foi ela que se dirigiu às almas junto com as suas zelosas discípulas. Por que não posso fazer a mesma coisa para Ele aqui? Há tantas almas puras e santas, que desejam ardentemente se doar somente a Deus. As ordens religiosas europeias são ricas demais para eles, eles, recebem rec ebem mais do que dão [...]. [.. .]. Fui e sou muito feliz feliz como Irmã de Loreto; deixar deixar o que amo e expor-me a novos trabalhos e sofrimentos que serão grandes, ser objeto de escárnio para muitos, sobretudo para os religiosos, religiosos, aderir e escolh esc olher er deliberada deliberadamente mente os aspectos aspec tos mais duros da vida indiana, indiana, [escolhe [esc olher] r] a solidão, a ignomínia e a incerteza, e tudo isso porque Jesus o quer, porque algo me está chamando “a deixar tudo e reunir algumas companheiras para viver a sua vida, para realizar a sua obra na Índia [...]”. Esses
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pensamentos eram causa c ausa de grande sofrimento, s ofrimento, mas a “Voz” “Voz” continua c ontinuava va a dizer: “Recus “Recusarás?”. arás?”.
A confissão ao arcebispo é premente no seu crescimento espiritual, durante o qual a “Voz” toma tom a espaço espaç o e se dilata dilata cada ca da vez mais ma is no ânimo ânimo de Madre Mad re Teresa. Tere sa. Um U m dia, depois da santa Comunhão, a amável “Voz” disse: Quero irmãs indianas, vítimas do meu amor, que sejam Maria e Marta, que sejam unidas a mim a ponto de irradiar o meu amor sobre as almas. Quero irmãs livres, revestidas de minha pobreza na Cruz, quero irmãs obedientes revestidas da minha obediência na Cruz. Quero irmãs cheias de amor revestidas da Caridade da Cruz. Por mim, te recusarás a fazer isso?
E em outra ocasião: Minha esposa te tornaste, por amor a mim; por mim vieste até a Índia. A sede que eu tinha de almas te levou tão longe. Tens medo de dar outro passo pelo teu Esposo, por mim, pelas almas? A tua generosidade esfriou? Venho então em segundo lugar para ti? Tu não morreste pelas almas, e é por isso que não te preocupas pr eocupas com o que lhes acontece, o teu coração nunca se aprofundou na dor como o de minha Mãe. Nós demos tudo pelas almas, e tu? Tens medo de perder a tua vocação, de te tornares leiga, de não conseguir perseverar. Não, a tua vocação é amar, sofrer e salvar almas, e dando esse passo realizarás o desejo do meu coração para ti. Essa é a tua vocação. voc ação. Vestirás Vestirás s imples imples roupas r oupas indianas, indianas, ou como c omo minha mãe se vestiu, ves tiu, simples e pobre. O hábito que vestes agora é sagrado, porque é meu símbolo; o teu sári será sagrado, porque será meu símbolo.
As palavras tocaram profundamente Madre Teresa, que tentou propor um atalho: prometeu que tentaria tentaria segui seguirr o caminho caminho da santidade para se tornar uma perfeita perfeita irmã de Loreto, vítima do Amor, mas dentro dos muros da Congregação. Jesus foi irremovível: Quero Missionárias Indianas Irmãs da Caridade, que sejam o meu fogo de amor entre os mais pobres, os doentes, os moribundos, entre os meninos de rua. São os pobres que deves conduzir a mim, e as irmãs que oferecerem as suas vidas como vítimas do meu amor trarão a mim essas almas. Sei que és a pessoa mais incapaz, fraca e pecadora, mas por seres assim quero servir-me de ti para a minha glória! Recusar-te-ás?
Novamente aquele aquele interrog interrogatóri atórioo inquietante nquietante e perturbador enchia enchia de desespero Madre Teresa, que pediu a intercessão da Virgem Maria para liberá-la desse premente convite que a levaria a viver situações de extrema pobreza. Mas quanto mais rezava, mas a “Voz” se tornava nítida e precisa: Sempre disseste: faz de mim o que quiseres. Agora quero agir, deixa-me fazê-lo, minha pequena esposa, minha pequena. Não temas. Estarei sempre contigo. Tu sofrerás, e agora já sofres, mas és a minha pequena esposa, a esposa de Jesus crucificado; deverás suportar esses tormentos no teu coração. Deixa-me agir. Não te negarás a mim. Confia em mim com amor, confia cegamente em mim. Minha pequena, dá-me almas, as almas das crianças pobres da rua. Quanto dói, se soubesses, ver esses meninos manchados pelo pecado. Anseio pela pureza do amor deles. Se respondesses ao meu chamado e conduzisses a mim essas almas, arrancando-as das garras do maligno! Se soubesses quantos pequenos caem no pecado todo dia! Há conventos com um grande número de freiras que cuidam de pessoas ricas e capazes, mas para os meus pobres não há absolutamente abs olutamente ninguém. ninguém. São eles que eu desejo ardentemente, são eles eles que amo [...]. [.. .]. Recusarte-ás a mim?
Esse conteúdo responsabilizador pesava na carta que Madre Teresa enviou ao arcebispo de Calcutá, para o qual Jesus referiu o seu pensamento: “Pede a Sua Excelência para dar-me isso como agradecimento pelos vinte e cinco anos de graça que lhe concedi”. 63
Jesus Cristo tinha pedido a perfeita pobreza, a pobreza da Cruz. Tudo devia ser em Deus e para Deus. As riquezas não deviam entrar no coração das irmãs escolhidas, nada do mundo externo devia contaminar-lhes e deveriam se manter com o seu trabalho, com o seu suor; portanto, pobreza de caráter franciscana, oração e trabalho de tom benediti eneditino. no. Madre Teresa salientava ao arcebispo que as jovens desejadas por Jesus poderiam pertencer a todas as nacional nacionaliidades, mas deveriam deveriam assimi assimillar a mentali mentalidade indiana ndiana e vestir um hábito branco, simples e modesto, que cobrisse todo o corpo, da cabeça ao tornozelo, um sári branco com listras azuis, um Crucifixo pendurado no ombro esquerdo e sandálias. “Quando nos vestimos”, explicará depois Madre Teresa às suas filhas, “devemos nos dar conta do significado de cada peça do nosso vestuário. O sári com listras azuis significa a modéstia de Maria, o cinto de corda significa a pureza, as sandálias significam a nossa livre escolha. O Crucifixo um símbolo de amor”. O sári é a roupa típica das mulheres indianas, enquanto o branco, diferentemente dos povos ocidentais, ocidentais, é tido no Oriente como a cor do luto, e as mulheres que vestem roupas brancas são aquelas aquelas que não têm mais mais nada, porque perderam seus maridos, maridos, única única fonte de sustento. Madre Teresa acrescentou às bordas do hábito quatro listras azuis, [2] que representam os quatro votos das irmãs (o quarto voto especial é o de viver como pobre com os pobres): pobreza e obediência são as listras mais finas, castidade e serviço aos pobres são as mais grossas, porque, como Madre Teresa exp expllicou, icou, “o fruto da castidade castidade é o serviço prestado de todo o coração aos mais pobres dos pobres”. A cor azul foi escolhida em homenagem à Virgem Maria, porque Madre Teresa queria que suas filhas observassem o exemplo de Nossa Senhora. Além disso, no ombro esquerdo do hábito é costurada uma cruz, que lembra Jesus Crucificado, Senhor absoluto de seus corações. É impressionante a clareza com a qual Madre Teresa expõe os seus projetos ao arcebispo Périer. Ela tem tudo diante de si, tudo é plástico como o projeto de um arquiteto, não falta nenhum detalhe, até o hábito está previsto. Não há hesitação alguma. Ela detalha ao arcebispo a mística missionária: As irmãs deveriam adquirir um conhecimento muito completo da vida interior, a partir de santos sacerdotes, que as ajudariam a se tornar tão completamente unidas a Deus, a ponto de irradiar somente Ele, quando iniciarem a missão. Deverão ser vítimas autênticas, não só em palavras, mas em todos os sentidos do termo, vítimas indianas para a Índia. O amor deverá ser a palavra, o fogo, que as levará a viver plenamente essa vida [...]. Os dois anos de perfeita solidão deverão conduzi-las a se concentrarem na vida interior também quando estiverem em meio às realidades do mundo.
Para se purificar do mundo, limpando e alimentando o espírito, as irmãs deverão passar um dia dia por semana “no convento, a casa-mãe da cidade”. cidade”. Elas Elas são chamadas para estarem entre as pessoas, não nos colégios, mas nas escolas gratuitas até o segundo grau. Em cada paróquia devem estar presentes duas irmãs, uma para os doentes e outra para a instrução e, “se o número o exigir, as duplas podem aumentar”. A alfabetização é dirigida às crianças, que as irmãs devem entreter também com sãos divertimentos, “para mantêlos distantes das ruas e do pecado”. Em determinado momento, as irmãs se reunirão, provenientes rovenientes de diversas diversas paróquias, paróquias, no mesmo lug ugar, ar, e irão para casa, onde ficarão ficarão 64
totalmente totalmente separadas do mundo. É incrível a explicação dos detalhes em uma carta que devia estabelecer a primeira abordagem à “Ideia” de Madre Teresa. Incrível a visão profética e premonitória: não fala apenas de Calcutá, mas também dos povoados que devem ser alcançados mais rapidamente de bicicleta, ou predispõe irmãs como motoristas de micro-ônibus que devem deixar as esposas de Cristo lá onde são necessárias. “Talvez isso seja um pouco moderno demais, mas as almas estão morrendo por causa da falta de cuidados, da falta de amor. Essas irmãs, essas vítimas autênticas, deveriam realizar aquela obra que falta ao apostolado de Cristo na Índia”. Mas isso não basta. Fala também de um hospital para crianças pequenas com patologias graves, e indica a sua futura localização: Asansol, no distrito de Bardhaman, no estado de Bengala Ocidental, porque isso faz parte do plano divino e “lá terei mais tempo para orar e me preparar para a sua vinda”. Além disso, dá também o nome às servas que ainda não existem, mas que ela vê por meio dos olhos de Cristo: “As irmãs dessa Congregação serão as Missionárias da Caridade, ou as Missionárias Irmãs da Caridade”. Ela é uma irmã europeia formada, que pede para viver fora do convento, para se confundir com os indianos mais pobres, mais miseráveis. Talvez tenha enlouquecido? Deus está me chamando, por mais que eu seja indigna e pecadora. Desejo ardentemente dar tudo pelas almas. Todos pensarão que eu perdi o juízo para empreender, depois de tantos anos, uma obra que me levará, em grande parte, somente a sofrimentos. E, no entanto, Ele me chama também para reunir em torno de mim algumas companheiras para começar a obra, para lutar contra o demônio e subtrair-lhe os milhares de pequenas almas que todo dia ele ele destrói. destr ói.
Madre Teresa, em sua longa carta a Sua Excelência, revela o “grande segredo” com uma lucidez impressionante, detalhando, “como teria feito à minha mãe”. Nëna Loke, sua primeira mestra de cristandade e santidade, é aqui lembrada na presença do arcebispo. Sua mãe, na realidade, não pôde saber disso, pois o regime de Enver Hoxha, que tomou o poder em 1946, veta sem piedade toda comunicação entre a Albânia e o resto do mundo. Madre Teresa fica, assim, sem o apoio materno, precioso e forte, sábio e seguro, ao empreender a colossal tarefa, que vai além dos limites das possibilidades humanas, de matar a sede de Cristo em seus pequeninos.
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“AS ALMAS NÃO SE COMPRAM”
Em meados de janeiro de 1947, Madre Teresa foi afastada e transferida para a cidade de Asansol, para a comunidade das irmãs de Loreto, por ordem das superioras, porque foram vistas com suspeitas as longas e frequentes conversas entre Madre Teresa e seu confessor Van Exem, o qual, sem que as irmãs de Loreto soubessem, tinha apoiado a causa de Madre Teresa junto ao arcebispo, mas este, com muita prudência, deu tempo ao tempo. Madre Teresa não se rebelou contra essa decisão injusta, pois seu desejo ardente já era então saciar a sede de Cristo. O colégio St. Mary sentiu muitíssimo a sua ausência, mas foi ela que tirou proveito desse “confinamento”, pois ficou livre das mil incumbências que o seu cargo em Calcutá incluía, e tinha mais espaço para a oração e para a correspondência que veio a se estabelecer entre ela e o arcebispo Périer. Dessa admirável correspondência emerge, em detalhe, toda a alma apaixonada de Madre Teresa, disposta a qualquer sacrifício pelo Senhor. Escreveu ao arcebispo em 25 de janeiro de 1947: Desde os cinco anos e meio, quando o recebi pela primeira vez (na Santa Comunhão), o amor pelas almas penetrou dentro de mim. Ele Ele cresc cr esceu eu nos últimos últimos anos, até eu chegar à Índia com a esperança de salvar muitas almas. Nesses dezoito anos, tentei viver segundo os seus desejos, ardo pelo intenso desejo de amá-lo como nunca foi amado antes [...]. Acolhi a transferência como enviada por Deus para me dar força, para preparar o meu corpo cor po e minha alma para a sua vinda. vinda. Aqui não tenho nada em que pensar, exceto em como viver para os outros [...]. Por favor, me desculpe por esta carta, não tenho nada de melhor. Estou provando um pouco a pobreza franciscana. É belo ser pobre e livre de tantas coisas.
Insistente com o arcebispo, muda com o padre Van Exem. Ela não escrevia ao seu diretor espiritual, porque tinha certeza de que a sua correspondência com o padre jesuíta, tendo em vista as calúnias que circulavam a respeito da relação considerada insana entre os dois religiosos, teria sido controlada. No entanto, o arcebispo tergiversava, a freava, contemporizava, como mostra, por exemplo, a carta de 7 de março de 1947: Minha Cara Madre Teresa, A Paz de Cristo esteja com você. De volta da minha visita pastoral no Santal Parganas, encontrei a sua carta, pela qual agradeço sinceramente. Tenho a impressão, pelo que me escreve, de que a senhora está convencida de que me oponho ao seu projeto, e que está rezando intensamente para a conversão convers ão de meu coração. cor ação. Gostaria Gost aria de fazê-la mudar de ideia ideia sobre tais disposições, que a senhora parece considerar como definitivas. Não sou nem favorável, nem desfavorável ao seu projeto e, como arcebispo, nesta fase só posso me manter neutro [...]. A questão é importante demais, para que a Igreja tome uma decisão imediata. Poderiam ser necessários meses, talvez anos [...]. Deus onipotente me indicará o caminho a seguir, e quando eu estiver moralmente seguro quanto a qual é o meu dever, esteja certa de que eu não recuarei, custe o que custar [...]. Farei a vontade de Deus, mas isso deve estar bem claro para mim.
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A combativa Madre Teresa não desanima: “Não demore, Excelência, não adie. Almas estão se perdendo por falta de cuidados, por falta de amor”. Enquanto isso, dia após dia, a “Voz” continua a fazer a terrível pergunta que exige resposta: “Por mim, te recusarás a fazer isso?”. Então, como a viúva inoportuna do Evangelho, que continuava a incomodar o juiz ao qual pedia justiça (Lc 18,1-8), Madre Teresa se dirige suplicante ao arcebispo: Eu, eu sou somente um pequeno instrumento nas suas mãos e, porque não sou nada, Ele quer se servir de mim. Excelência, não permita que eu lhe seja infiel agora. Eu absolutamente não gostaria, nem mesmo por uma fração de segundo, de fazer algo que não seja de seu agrado. Quero que Ele tenha toda a alegria. O seu desejo, o seu sofrimento pelas crianças, pelos pobres que morrem no pecado, pela infelicidade de tantas famílias destruídas, são grandes [...]. Sei que a vida de uma Missionária da Caridade significará abandonar tudo. A pobreza absoluta, a vida indiana, a vida dos pobres significaram uma dura luta contra o meu grande amor-próprio. Apesar disso, Excelência, desejo com coração puro e sincero iniciar esse gênero de vida, para dar alegria ao Coração sofredor de Jesus. Deixe-me ir, Excelência. Confiemos nele cegamente. Ele fará com que a nossa fé não esmoreça.
E em seguida é muito ousada: Enquanto Vossa Excelência está ainda em Calcutá, não poderia fazer o necessário por meio do Núncio Apostólico? E quando o novo Instituto for fundado, pedir o reconhecimento de Roma? Não sei o que o Direito Canônico diz a esse respeito, mas pelo que ouvi e li recentemente num livrinho sobre a madre Maria da Paixão, fundadora franciscana, parece que não houve grandes problemas: de um dia para outro, vinte irmãs livres livres para conduzir a vida franciscana; francisc ana; mas no c aso delas, o bispo foi o fator determinante. Ou Voss Vossaa Excelência pensa que deveria apresentar o meu pedido por seu intermédio? [...] Não demore, Excelência, não adie. Almas estão se perdendo por falta de cuidados, por falta de amor.[1]
O arcebispo, que queria ganhar mais tempo para uma decisão assim tão importante, decidiu escrever uma carta em 7 de abril de 1947 à irmã de Loreto para afirmar mais uma vez as razões da sua demora: Considerava já lhe ter explicado antes, de modo claro, os motivos que me obrigam a proceder muito lentamente [...]. Se eu visse, pelas fervorosas orações e madura reflexão, que a vontade de Deus é a de mover-me na direção das decisões que a senhora me pede para tomar sem demora, eu não hesitaria [...]. Para mim, o querer de Deus é supremo e todo o resto desaparece. Todavia, para quem exerce a autoridade e age em seu nome, conhecer a vontade de Deus exige deliberação, oração e reflexão. Estou mais do que certo de que a senhora está pronta para tudo. Todavia, minha cara Madre, deve colocar-se no meu lugar de vez em quando.
Depois formula sete quesitos, aos quais pede que ela responda, para que tenha uma ideia mais clara do projeto de Madre Teresa: 1) O que a senhora quer fazer. 2) Os meios que quer utilizar para realizar a obra. 3) Formação das discípulas. 4) Pessoas que desejaria recrutar. 5) Qual o centro da obra. 6) Possibilidades de atingir os objetivos por meio das Congregações já existentes. 7) Avaliar, para o objetivo previsto, se é mais útil uma associação ou uma irmandade, em vez de uma verdadeira Congregação.
Além disso, a ideia do arcebispo é propor a Madre Teresa de se unir às Filhas de 67
Sant’Ana, ligadas às Irmãs de Loreto, mas a religiosa sabe que esse não é o desejo do Senhor. Madre Teresa responde do convento das irmãs de Loreto de Darjeeling, no dia da festa de Corpus Christi de 1947, com suma precisão e sem hesitações, não se referindo mais à “Voz”, mas diretamente a “Nosso Senhor”, que “quer irmãs indianas, vítimas do seu amor, que sejam tão unidas a Ele, a ponto de irradiar o seu amor sobre as almas; irmãs que vivam a vida dos indianos, se vistam como eles, e sejam a sua luz, o fogo de seu amor junto aos pobres, doentes, moribundos, mendigos e crianças de rua”; portanto, “levar Cristo aos ‘buracos’ infelizes das favelas da Calcutá dos pobres e, sucessivamente, também a outros lugares”. O desenho é claríssimo, poderíamos dizer tridimensional. Ela e as suas irmãs irão para unto do povo, cuidarão dos doentes nas suas casas, ajudarão os moribundos a fazer as pazes com Deus, organizarão organizarão escolas escolas gratuitas gratuitas para as crianças das periferi periferias, as, vestirão vestirão os pobres nos hospitai hospitais, s, ajudarão os mendig mendigos a ter uma vida vida dig digna de respeito. respeito. P oderiam oderiam abrir uma casa para deficientes físicos, cegos, marginalizados... As irmãs da Caridade irão aos povoados e não ficarão fixas em nenhum lugar, porque estarão sempre prontas “para realizar a obra cuja falta se percebe na Igreja da Índia”. No que concerne à formação, é decisi decisivo, para toda irmã da Caridade, Caridade, o conceito conceito do domínio da potência interior sobre aquela exterior, porque, se elas não tivessem uma vida espiritual completamente atrelada à Cruz de Cristo, seria impossível “conduzir essa vida de perene imolação pelas almas”. As candidatas deverão ser jovens a partir dos dezesseis anos, sãs e com muito bom senso. Madre Teresa não exige estudos específicos, mas uma qualidade é indispensável: conhecer perfeitamente a língua local; além disso, devem ser capazes de “pôr as mãos em todo tipo de trabalho, por mais repugnante que seja à natureza humana”. Quer em sua família temperamentos alegres, solares, jovens de qualquer nacionalidade, mas “se vier uma jovem tâmil, ela será enviada entre os tâmeis, uma jovem chinesa entre os chineses, e assim por diante”. Se jovens qualificadas se apresentarem, serão bem aceitas, mas isso não as tornará diferentes das outras irmãs; e se forem ricas, Madre Teresa aceitará “a elas, e não o dinheiro delas. Preciso de missionárias. As almas não se compram”. A contemplação e a oração devem estar previstas durante a formação religiosa, na qual, no entanto, não será negligenciado o trabalho manual, uma vez que se vestiu o hábito, porque a mente deve ser projetada na direção de Deus. Centro da obra: as favelas de Calcutá, isto é, os “buracos” indicados por Jesus, e quando o número de Missionárias da Caridade tiver aumentado, afirma Madre Teresa, irão para todas as grandes cidades da Índia, e não se esperará que um bispo, ou um padre as chamem e indiquem onde trabalhar, mas serão as próprias irmãs que procurarão as almas, oferecendo o próprio trabalho ao bispo do lugar. Para o noviciado, é escolhido Cossipore, um lugar tranquilo, isolado, rico em campos, “escolhido por Nosso Senhor”. Para o segundo ano de noviciado, a cidade de Sealdah, onde as irmãs poderão frequentar um curso de obstetrícia e cuidados de enfermagem. “Também isso foi escolhido. Pessoalmente não conheço ninguém dos dois lugares e 68
nunca os vi”. A resposta ao quesito: “Seria possível obter esse objetivo por meio de uma congregação já existente?”, Madre Teresa responde com precisão: “Não”. Primeiramente porque são europeias europeias e, portanto, seria seria impossível adquirir adquirir todos os hábitos hábitos pobres dos indianos no comer, no dormir, no vestir. Em segundo lugar, por mais que haja, em sentido positivo, a boa vontade por parte das europeias em se tornarem indianas, continuarão a ser estrangeiras aos olhos dos indianos. Madre Teresa dá indicações bem fundamentadas ao arcebispo de Calcutá de por que “Nosso Senhor” pede “irmãs indianas, vestidas com roupas indianas, que levem a mesma vida do povo indiano”. Não seria possível nem mesmo criar uma associação leiga, pois a vida “que as irmãs da Caridade deverão ter, os leigos não estarão em condições de aguentá-la. Para uma obra que exige total abnegação e imolação pelos outros, é preciso ter almas de profunda vida interior, ardentes do amor a Deus e pelas almas. Almas puras que vejam e procurem Deus nos pobres. Almas livres, dispostas a sacrificar tudo por este único objetivo: levar uma alma a Deus”. A obra precisará de muita, profunda e fervorosa oração, e muita penitênci enitência. a. Os membros de uma associação associação não consegui conseguiri riam am colocar colocar tudo isso na obra, e não alcançariam, portanto, o objetivo de “levar almas a Deus e Deus às almas”. Madre Teresa explica também como poderão manter-se: elas poderão cultivar hortas no campo; uma parte dos produtos servirá para o próprio sustento, outra parte para ser vendida. Além disso, as irmãs poderão fabricar brinquedos e artigos de artesanato; a intenção será, portanto, viver com a graça de Deus, na completa pobreza, mas em casas próprias róprias da Congregação. Congregação. Além disso, disso, deverão reali realizar todas as ativi atividades dades domésticas, domésticas, assim não seria necessário empregadas domésticas: “De resto, ou melhor, em tudo, confio nele! Ele estará conosco, e se ele está conosco, não precisaremos de mais nada”. Ela só pedia ao arcebispo ajuda espiritual, a presença de sacerdotes para a Missa cotidiana, porque somente com a Comunhão “não temo nada, nem pelas irmãs, nem por mim”, pois “sem Ele não posso ficar, sou impotente”. Escreveu o rascunho das primeiras Regras durante a novena precedente à festa de Pentecostes e enviou carta e Regras ao padre Van Exem, para que ele desse o seu beneplácit eneplácitoo e dissesse dissesse as eventuais eventuais correções a serem feitas. feitas. Inesperadamente, a resposta do diretor espiritual foi drástica e negativa: a Madre deveria deixar “toda a obra para mim e para Sua Excelência”, escreveu o padre Van Exem ao arcebispo Périer em 14 de junho de 1947, e tire da mente todo esse projeto. Deveria “abandoná-lo por toda a eternidade” se não lhe for pedido mais nada por Sua Excelência ou por mim. No que concerne aos seus escritos, não lhe dei a entender o que pretendo fazer com eles, eles, se queimá-los, queimá-los, rasgá-los, conservá-los cons ervá-los ou se os enviarei enviarei à Sua Excelência. Excelência. Disse à senhora que deveria viver somente no presente, e não no futuro, e ser uma freira perfeita. Uma freira que poderia desenvolver desenvolver algumas iniciativas iniciativas no atual apostolado, mas, m as, sobretudo, cresc cr escer er na virtude da prudênc ia, ia, da qual a senhora tem mais necessidade. Insisti na obediência, alegre, sempre pronta, simples e cega. Assegurei-lhe que nunca poderia errar se obedecesse. Permiti-lhe um pouco mais de penitência e muito mais abnegação, mas duvido que a senhora possa mortificar-se mais do que já faz. A senhora nunca recusou nada a Nosso Senhor.
Um duro golpe para Madre Teresa, que se sente só, subindo uma grande ladeira. Visto que o padre Van Exem a deixara livre para refletir sobre os pensamentos inspirados por 69
Deus, pediu um encontro com o arcebispo, que tinha voltado de uma longa viagem à Europa, também porque era seu grande desejo abrir uma nova congregação até o fim de 1947, no 50º aniversário do falecimento de Santa Teresinha do Menino Jesus. Mas Périer não quis encontrá-la. Em vez disso, fez com que ela ficasse sabendo, por meio do padre Van Exem, Exem, que não estava interessado nas “vozes e nas visões”. visões”. A essa observação, Madre Teresa respondeu diretamente e sem hesitação, segura de si: Estou feliz que Sua Excelência não esteja interessado “em vozes e visões”. Elas chegaram sem convite e depois foram embora. Não mudaram a minha vida, mas me ajudaram a ter mais confiança e a me aproximar de Deus. Aumentaram o meu desejo de ser cada vez mais a sua pequena [...]. Não atribuo a tais vozes e visões nenhuma importância no que diz respeito ao chamado, porque o desejo de me imolar tinha já a mesma intensidade antes que elas se apresentassem. Não sei por que vieram, nem tento descobrir. Estou feliz por deixar que Ele faça de mim o que mais lhe agrada.[2]
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AS VISÕES
Três foram as visões de Madre Teresa. Na primei primeira, ra, ela ela viu viu uma multi multidão dão imensa, formada por todo tipo tipo de pessoas, gente muito pobre, entre elas muitíssimas crianças. Todos tinham as mãos estendidas para ela, que estava no meio delas, e gritavam: “Vem, vem, salva-nos! Leva-nos a Jesus”. Na segunda, segunda, viu viu de novo uma grande multi multidão dão e sobre as faces das pessoas podia podia perceber um imenso sofrimento. sofrimento. Estava ajoelhada ajoelhada diante diante da Virgem Maria. Maria. Não viu viu o rosto de Nossa Senhora, mas a ouviu pronunciar estas palavras: “Cuida deles, eles são meus, conduze-os a Jesus, leva Jesus a eles. Não temas. Ensina-os a rezar o rosário, o rosário em família, e tudo dará certo. Não temas, Jesus e eu estaremos contigo e com teus filhos”. Na terceira visão, a mesma m esma grandíssima grandíssima multidão multidão estava envolta envolta na escuridão. escuridão. Todavia, Madre Teresa conseguia vê-la. Jesus se encontrava na Cruz, a Virgem a poucos metros de distância e ela, como uma menininha, diante de Maria com a mão esquerda sobre o seu ombro esquerdo, e a mão direita sobre seu braço direito. Jesus disse: “Eu te pedi. Eles te pediram e Ela, minha mãe, te pediu. Recusar-te-ás a fazer isso por mim: cuidar deles, conduzi-los a mim?”. A essa pergunta e a essa visão Madre Teresa responde: “Tu sabes, Jesus, que estou pronta para partir partir imediatamente”, e daquele daquele momento em diante diante não ouviu ouviu nem viu viu mais nada. Padre Van Exem começou a defender com maior convicção a causa de Madre Teresa. Escreveu ao arcebispo: “No meu exame das vozes, não encontrei nada que me induza a duvidar de sua origem. Estou convencido de que provêm de Deus. Não há nada que me faça duvidar disso”, duvidar, sobretudo, das excepcionais virtudes de sua filha espiritual, da sua predisposição inata pra responder ao chamado, “das terríveis provas que prepararam o próprio próprio chamado, que a acompanharam por muito muito tempo, e da ação manifesta da graça divina naquela alma”. [1] Madre Teresa não se desencoraja e volta a dirigir-se ao arcebispo, escrevendo-lhe do convento de Entally, no dia 24 de outubro de 1947, porque seu desejo de começar a obra de Deus é imenso e irrefreável. A voz entusiasmada e suplicante de Madre Teresa, que pede ao arcebispo arcebispo para deix deixá-la á-la ir, é sinal sinal indiscutível ndiscutível de uma vontade muito muito firme, firme, pronta e definida: definida: Peço-lhe, Excelência, em nome de Jesus e por amor a Jesus, para deixar-me ir. Não demore a se decidir. Não me detenha. Quero começar aquela vida na vigília de Natal. Temos pouquíssimo tempo, de agora até lá, para nos ocupar de todos os outros preparativos. Por favor, deixe-me ir. Vossa Excelência ainda teme. Se a obra for exclusivamente humana morrerá comigo, se for toda dele, viverá nos séculos. E nesse meio-tempo almas
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são perdidas. Deixe-me ir com a sua bênção, com a bênção da obediência com a qual quero começar tudo. Não tema por mim, o que me acontecerá acontec erá não tem nenhuma importância. Excelência, qualquer qualquer coisa que pedirmos edirmos ao Pai em nome de Jesus será atendida. atendida. Pelo mesmo nome peço a Vossa oss a Excelência: Excelência: por favor, deixe-me ir.
Ignorar o chamado, esquecê-lo ou resignar-se seria um pecado mortal para Madre Teresa. Intrépida, audaz e corajosa, antes de começar sua obra planificada nos detalhes com extraordinária segurança e firmeza, tinha que obter, custasse o que custasse e fora dos esquemas, às vezes lentos, da burocracia eclesiástica, o beneplácito do arcebispo, de outra forma teria rompido o voto de obediência a Deus. Depois de tanto penar, consegue a permissão: “Pode continuar”, lhe diz o arcebispo no dia 6 de janeiro de 1948 no convento das Irmãs de Loreto, aonde tinha ido celebrar a Epifania. O pastor escreverá à superiora geral das Irmãs de Loreto, Madre Gertrude Kennedy, em 13 de janeiro: “Negando o meu consenso, impediria a realização, por meio dela, da vontade de Deus. Considero que não poderia ter feito mais para obter a iluminação”. A partir desse momento, como tinha previsto a tenaz e teimosa Madre Teresa, o arcebispo de Calcutá se torna seu primeiro apoiador e o protetor das Missionárias da Caridade. Depois de uma intensa correspondência entre o arcebispo, Madre Gertrude e a própria Madre Teresa, chegou-se à plena liberdade religiosa. Em 12 de abril de 1948, o Papa Pio XII, por meio da Sagrada Congregação para os Religiosos, concedeu a irmã Teresa a permissão ermissão para deixar deixar as Irmãs de Loreto, dando início nício à sua nova missão. missão. [2] Todavia, por razões desconhecidas, desconhecidas, tanto a notícia notícia como o documento do indulto ndulto chegaram somente no dia 8 de agosto de 1948. O fervor para alcançar o objetivo era enorme, mas também o era o sofrimento de deixar, depois de vinte anos, o amado convento de Loreto, refúgio seguro. Eis o que Madre Teresa escreveu em 16 de agosto de 1948, quando deixou o convento das Irmãs de Loreto: Jesus Cristo deseja que eu seja uma irmã livre, rica da pobreza da Cruz. Hoje aprendi uma coisa importante: a pobreza para o pobre é uma coisa muito dura! Hoje, oje, o dia inteiro, inteiro, procurei procur ei uma casa, cas a, um teto, um refúgio, caminhando o dia todo até que minhas pernas começassem a doer [...] esse é o segundo chamado, o chamado para deixar o convento onde fui feliz, para servir nas ruas os mais pobres dos pobres [...].
Abandonar a segurança para abraçar o desconhecido e o perigo é terrível: Quando deixei o convento, foi para mim o dia e a decisão mais difíceis da minha vida. Muito mais difícil do que quando deixei minha família e o meu país para entrar na vida religiosa. A Comunidade de Loreto para mim era tudo. Lá ganhei a minha formação espiritual, me tornei irmã e me doei unicamente a Cristo. Eu gostava da vida e do trabalho que tinha, especialmente o ensino.[3]
Chegou, portanto, o momento de içar novamente as velas, como já acontecera em Escópia, para deixar o porto tranquilo e o mar calmo, para se lançar em alto-mar, avançar nas tempestades e nas borrascas das favelas, as cidades de barracos descritas por Dominique Dominique Lapierre em seu livro livro de sucesso A cidade ci dade da alegri a: Em um espaço um pouco mais de três vezes maior que um campo de futebol, se amontoam mais de 70.000
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habitantes, vale dizer, cerca de 10.000 famílias geograficamente divididas por sua religião [...]. [A cidade da alegria] detinha o triste primado da mais alta concentração humana do planeta, 130.000 habitantes por quilômetro quadrado [...] O ar estava tão impregnado de óxido de carbono e enxofre que a poluição causava a morte de ao menos um membro de cada família. O calor petrificava os homens e os animais nos oito meses de verão, e as monções transformavam as ruelas e os barracos em lagos de lama e de excremento. Até um passado recente, lepra, lepra, tuberculose, tuberc ulose, disenteria e todas as doenças da pobreza pobr eza reduziam reduziam a expectativa de vida a um dos níveis mais baixos do mundo [...]. Mas a Cidade da alegria era, sobretudo, um lugar em que se alastrava a mais extrema miséria econômica. Nove em dez habitantes não tinham uma rúpia para comprar 300g de arroz.
Completamente sozinha, estrangeira e europeia, ela, que não confiava nas europeias na Índia e que sabia que os hindus olhavam torto os estrangeiros, vestida com um sári tão original quanto a ideia absolutamente nova que ia semeando, Madre Teresa põe-se a caminho, acompanhada por seu Esposo. De Entally revela ao arcebispo Périer, em 15 de agosto de 1948: Excelência, Antes de mais nada, quero agradecer-lhe por tudo o que fez por mim, ajudando-me a seguir este novo chamado. Dei-lhe muito trabalho e preocupação a mais. Espero que o bom Deus o recompense a seu modo. Terça-feira partirei com o Punjab mail [trem com o qual Madre Teresa chegou a Patna]. Está tudo muito escuro, muitíssimas lágrimas, mas vou por minha espontânea vontade e com a bênção da obediência. Por favor, reze por mim, para que eu tenha a coragem de completar o meu sacrifício, depois que Ele me deu a inspiração e a graça de começar.
Poucos meses antes, a Índia, colônia do Império Britânico, com o movimento guiado por Mahatma Gandhi e o empenho políti político co de Jawaharlal Jawaharlal Nehru, depois depois que mil milhões de pessoas aderiram aderiram a uma campanha de desobediênci desobediênciaa civil civil em massa, obteve a independência da Grã-Bretanha em 15 de agosto de 1947, e foi dividida em dois governos inde inde pendentes, Índia Índia e P aquistão, aquistão, conforme a vontade da Lig Liga Muçulmana. Muçulmana. Três anos mais tarde, em 26 de agosto de 1950, a Índia será uma República com uma nova constituição. Nesse dificílimo contexto, no qual o estrangeiro representava o invasor europeu, irmã Maria Teresa, rica de fé, segue seu caminho com seu capital: cinco rúpias no bolso. As Irmãs de Loreto tinham se despedido dela com profunda comoção, convencidas de que ela tinha condições de levar a nova cruz que o Senhor lhe atribuía, como lhe escreveu a caríssima amiga, também de Escópia, irmã Gabrielle: Minha amadíssima irmã, Hoje é o dia da santa do teu nome e rezei por ti, muitíssimo obrigada por tua carta, que me deixou muito feliz. Minha irmã, te escrevi a noite passada, quando soube que nos tinhas deixado. Ah, se soubesses, quando li a tua carta, chorei o dia inteiro, apesar de entender que é a vontade de Deus. Rezo todo dia por ti, e nunca estarás ausente das minhas orações. Se queres saber, todas as irmãs falaram bem de ti, nem mesmo uma falou mal. Todas se lembram de ti. Ele, Glorioso, quer manifestar a sua vontade em ti. Quanto és bendita, por Deus te ter escolhido para cumprir este sacrifício, porque sempre recebeste coragem dele. Eis por que Deus te indicou este difícil caminho; Ele sabe que podes carregar a sua Cruz [...]. Espero que não mudes teu nome. Com muito afeto e saudações. E sabe que nunca te esquecerei. A tua irmãzinha, Maria Gabrielle.[4]
Em Patna, Madre Teresa frequentou a escola de enfermagem do Hospital da Sagrada 73
Família das Irmãs Médicas Missionárias americanas. Entre elas, onde foi muito bem recebida, encontrou Madre Dengel, que lhe ensinou as primeiras noções de caráter sanitário, diagnóstico e terapêutico.
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O CHÃO COMO LOUSA
Madre Teresa voltou para Calcutá antes do Natal de 1948. Muita gente que a tinha visto, conhecido, apreciado e amado durante os vinte anos passados nessa grande cidade indiana, a reconheceu em um hábito diferente. Era o dia 21 de dezembro, quando entrou, pela primeira vez, nos “buracos”. Os indianos a olhavam perplexos: branc bra nca, a, com um sári branco. Com a cruz nos ombros, atravessava os bairros de Tijle e Motijhil, teatros de dor e abandono. Homens e mulheres com chagas purulentas e nauseantes, sujeira e embrutecimento, moribundos e doentes nas calçadas, na rua, como cães abandonados, velhos e crianças como em um círculo infernal. “Minha filha, nunca volte atrás, sempre adiante... Nunca se renda!”, lhe ensinara a sua mãe. Não era mais a professora de História História e Geografia, Geografia, tinha tinha se tornado mestra de vida, vida, do abc do existir humano, a começar pela higiene pessoal. Começou lavando pobres e crianças, cuja pele nunca tinha tido contato com a água. Ensinava educação e religião, a ler e escrever. O chão servia como lousa. No início eram cinco os alunos, mas logo o número cresceu, e quem frequentava com regularidade as aulas era premiado com um sabonete. Ao meio-dia distribuía leite. Hoje, no lugar em que Madre Teresa usava o chão como lousa, há uma escola moderna, com mais de cinco mil alunos. Ela dizia: “Chamam-me de ‘a freira das favelas, e estou contente de ser isso mesmo, pelo elo seu amor e para sua glóri glória”. a”. [1] Muitas pessoas, impressionadas pela ação daquela pequenina irmã, que cuidava com tanta dedicação e amabilidade dos pobres de Calcutá, começaram a se aproximar dela e a lhe dar uma mão. Muitas jovens que tinham sido suas alunas no St. Mary’s de Entally foram as primeiras a ajudá-la. Eis o que escrevia em seu diário naqueles dias vividos como uma pioneira que benefici eneficiaa e saneia: Hoje me encontrei com N.N., que me perguntou: “Não tens nada para comer?”. Dei-lhe todos os trocados que tinha guardado para o ônibus. E fui a pé até em casa. Fiz isso por Jesus, e devo dizer que estou realmente feliz.
Poucos dias depois escreveu esta oração: “Tu, ó Deus, tu és tudo para mim. Usa-me como quiseres. Tu me chamaste do convento, onde talvez eu fosse pouco útil, agora guia-me como quiseres!” [2] Depois de ter visto algumas misérias humanas, registrou: “Ó Senhor, se não posso ajudar-te nestas criaturas, nesta pobreza, nesta miséria, nesta escuridão, faz com que eu possa morrer junto com eles, perto deles, para testemunhar o teu amor”. [3] 75
A primeira colaboradora de madre Teresa foi sua ex-aluna, a senhorita Quhej Shabashini Dash, futura irmã Agnes. Rica, bela, generosa, que tinha tido um sofrimento espiritual longo e pesado, mas depois encontrou a nova realidade criada por Madre Teresa, que assim acolheu o pedido para ajudá-la naquela aventura de caridade e amor: “Bem, minha filha, olhe as minhas mãos e minhas roupas e compare-as com as suas. Esta vida religiosa busca a negação de si. Deve esquecer-se de si mesma para servir ao Senhor e ao próximo”. [4] A jovem, convidada por Madre Teresa a refletir e meditar antes de tomar uma decisão tão importante, se juntou à fundadora das Missionárias da Caridade no dia de São José de 1949. Lemos, exatamente daquele ano, uma página tocante do diário da fundadora: Sinto-me como em um oceano tempestuoso, no qual o navio da minha vida está naufragando [...] O Senhor quis que eu fosse uma irmã livre para poder ficar envolta na pobreza e na cruz. Hoje tive uma boa lição: a pobreza desses des ses miseráveis miseráveis é permanente per manente e dificí dificíli lima. ma. Seria necess nec essário ário encontrar encont rar para eles eles ao menos um teto, para poder abrigar os mais miseráveis. miseráveis. Para encontrá-lo, encontrá- lo, andei o dia todo, enquanto tive forças. Agora as minhas pernas e minhas mãos tremem. Agora entendo melhor a dor do corpo e da alma dos mais pobres entre os pobres, sem teto, sem comida, sem cuidado [...]. Então me lembrei da comodidade do convento de Loreto, e foi para mim uma grande tentação.
O tentador, Satanás, se faz presente. Como uma miragem, apresenta o convento das Irmãs de Loreto, acolhedor, belo, luminoso, são, limpo. Madre Teresa afasta esse pensamento com a oração de São Francisco, Francisco, que também partiu partiu sozinho, sozinho, em perfeita perfeita pobreza: Então rezei assim: “Faz com que eu procure consolar, em vez de ser consolada; que eu procure compreender, em vez de ser compreendida; que eu procure amar, em vez de ser amada. Pois é somente dando que se recebe, somente esquecendo-se de si mesmo que se encontra a si mesmo; somente perdoando que se é perdoado; somente som ente morrendo que se nasce nasc e para a vida eterna”.
A tentação torna-se fortíssima enquanto ela percorre as ruas de Calcutá à procura de uma casa para ficar e fazer a sua base. Os braços e as pernas lhe doem, está cansada e desmoralizada, então pensa em quanta dor espiritual e corporal os pobres podem ter: Os edifícios reais de Loreto apareciam diante dos meus olhos, todas as coisas belas e o bem-estar, as pessoas que com eles convivem, em uma palavra, tudo. “Deves somente dizer uma palavra e tudo isso será teu de novo”, continuou a me repetir o tentador. Por [minha] livre vontade, meu Deus, e por teu amor, desejo ficar e realizar qualquer que seja a tua santa vontade em relação a mim. Não chorei nem uma lágrima. Ainda que eu tenha de sofrer mais do que agora, quero, mesmo assim, realizar a tua santa vontade. Esta é a noite escura do nascimento da congregação. Meus Deus, dá-me coragem agora, neste momento, para perseverar e seguir o teu chamado.[5]
A nova vida, como era previsível, lhe causa um imenso sofrimento, pois estava passando pela pela inici niciação ação à pobreza de Cristo, Cristo, e a pobreza dos pobres estava se tornando sua. As atribulações eram muito pesadas para essa pioneira de mil recursos, cuja força, de vez em quando, parecia lhe faltar. O medo de se cansar daquela vida feita de tantos sacrifícios e cansaços a leva a escrever palavras de desabafo nas páginas de seu Diári o em 28 de fevereiro de 1949: Hoje, meu Deus, que torturas de solidão! Pergunto-me por quanto tempo meu coração deverá sofrer [...]. As
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lágrimas escorreram copiosamente [...] todos veem a minha fraqueza. Meu Deus, dá-me a coragem para lutar contra o meu “eu” e o tentador.
E invoca Maria: “Coração Imaculado de minha Mãe, tem piedade desta tua pobre filha. Por teu amor quero viver e morrer como Missionária da Caridade”. No entanto, na provação e na tentação, o número de vocações cresce. Agora são três irmãs, grandes trabalhadoras, animadas pela força do zelo: Mas quantas dores e que necessidades têm os homens daqui, e nós somos tão poucas para acompanhar todos eles até Deus. Mas tu vês as faces e a felicidade deles. Oremos à Virgem Bendita para que nos mande cada vez mais irmãs. Ainda que tivéssemos vinte irmãs, teríamos aqui em Calcutá trabalho suficiente para todas. [6]
Madre Teresa encontrou hospitalidade na casa da família Gomes, em um pequeno quarto, muito pobre, no terceiro andar da Creek Lane, 14. Esta foi a primeira casa das Missionárias da Caridade. Madre Teresa estava contente, finalmente não tinha mais que contar com as casas de outras irmãs. Está convencida de que está percorrendo o caminho indicado pelo Senhor: Nós não somos s omos uma Congregação, Congregação, mas uma comunidade, uma família, família, porque não poderíamos resistir, nem as minhas irmãs poderiam ficar aqui, com uma vida e um trabalho assim, espalhadas pelos quatro cantos do mundo, sempre trabalhando, na rua, na escola ou no hospital, se não fôssemos uma comunidade, uma família[7] .
Cristo a chamou, a sua sede a despertou e agora o seu ir ao socorro dos últimos da terra é irrefreável: Quem são aqueles a quem nós servimos? Nas nossas casas recebemos aqueles que estão à beira do túmulo, nas margens das ruas.
A família vai crescendo. No final de 1950 já eram 10 jovens religiosas, todas ex-alunas, e no dia 11 de abril de 1951 é aberto o noviciado. A escola, os hospitais, os casebres, os famintos, os moribundos, os leprosos, os tuberculosos, mil atividades, mil compromissos, mil faces, mil mãos que se estendem em busca de uma palavra, de um carinho, de um remédio, de um pouco de leite, de um pouco de pão, de um pouco de sabão, de um pouco de ternura e misericórd misericórdiia daqueles daqueles anjos a njos vestidos de branco com bordas azuis que falam de Jesus, morto na cruz por amor, que veio para salvar a todos, também a eles, e a purifi urificação cação do batismo batismo frequentemente limpa faces que, à beira beira da morte, se transfiguram em faces de alegria, pois entenderam que os sofrimentos da pobreza e da doença existem por um tempo determinado, enquanto o tempo do Paraíso é a eternidade. Já em 7 de outubro de 1950, festa de Nossa Senhora do Rosário, chegou de Roma, por intermédio de Dom Ferdinand Périer, a aprovação das Constituições da nova Congregação das Missionárias da Caridade, cuja tarefa principal, como estava exposto no começo das suas Constituições, é trabalhar para a salvação e a consagração dos pobres entre os mais pobres, cuidar dos doentes e dos moribundos miseráveis, acolher e reunir as crianças de rua, visitar os mendigos, cuidar deles e de suas famílias, dar casa, refúgio, acolhimento àqueles sem um teto, amar aqueles que foram abandonados e amar Jesus na 77
Eucaristia. “Desse modo demonstramos o nosso amor por Jesus, que se esconde sob as espécies do pão e do vinho e sob as espécies dos mais pobres entre os pobres”. Em março de 1950, Madre Teresa escreve a Pio XII e lhe oferece um quadro já extraordinário do que ela tinha conseguido realizar até então: Na volta de Patna, P atna, fiquei em retiro por oito dias e depois, depois, no dia 28 de dezembro de 1948, iniciei iniciei a obra. Fui visitar e cuidar das pessoas dentro de suas casas e de seus “buracos” escuros. Tantas crianças pobres e abandonadas vinham até mim aonde quer que eu fosse. Pouco a pouco, junto com alguns ajudantes leigos, reuni as crianças de duas favelas. Depois, em março, chegou a primeira jovem bengalesa. Agora somos sete. Trabalhamos em cinco centros diferentes. Temos dispensários, onde os pobres são vestidos e recebem medicamentos gratuitamente, graças a generosos médicos católicos e hindus que, altruisticamente, ofereceram os seus serviços sem nenhuma compensação. Visitamos as famílias rua por rua. No domingo, levamos as crianças da favela para a Missa. Em maio passado, começamos as aulas dominicais de catecismo com 26 crianças. Agora temos mais de 350.[8]
Busca coragem e força na Eucaristia e na oração. O lema é “Amar como Jesus ama, ajudar como Jesus ajuda, dar como Jesus dá, servir como Jesus serve, salvar como Jesus salva, estar com Jesus vinte e quatro horas por dia, tocar Jesus em seus humildes disfarces!”. A menina que, na visão, estava no Monte do Calvário, ao lado de Nossa Senhora, consegue resultados extraordinários. Os anjos brancos, de carne e osso, chegam como uma milícia celeste. A escolha radical as atrai, e a força arrebatadora da fundadora das Missionárias da Caridade é fascinante e avassaladora. As missionárias vão pelos lugares mais infames, curvadas a recolher os moribundos pelas elas ruas, decidi decididas das a matar a fome, a miti mitiggar os sofrimentos, sofrimentos, a saciar saciar a sede de Cristo Cristo e, sobre tudo isso, a oração percorrendo o caminho da santidade, como instruía Madre Teresa: “O nosso crescimento é algo belo e votado ao sucesso, mas duas coisas devem ser bem compreendidas: elas devem progredir qualitativa e quantitativamente com a mística vida da santidade”. Uma vez Madre Teresa disse a padre Lush: Você sabe s abe o que quer dizer ser s anto? Simplesmente Simplesmente “liberar-s “liberar-se” e” de si mesmo, da própria escravi escr avidão, dão, de tudo o que não pertence a Deus. É preciso liberar o meu coração de toda criatura, para viver na sua presença e no seu amor. Quero deixar a minha vontade, a minha liberdade, toda a minha vida nas mãos de Deus, pelos nossos irmãos que sofrem. Essa é a santidade no nosso cotidiano.
Martirizadas no coração, as criaturas socorridas por Madre Teresa e por suas filhas estão felizes por serem acudidas, levadas em consideração, amadas. Nunca se poderá saber ao certo o número de pessoas que morreram nos braços da Madre de Calcutá. Centenas, milhares. Sabemos, porém, que naquela atitude extrema de abandono a Deus, essa madre lembra a Virgem Maria da Piedade.
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AS CARTAS AO IRMÃO
Em Madre Teresa, a inspiração poética juvenil não se apagou; ao contrário, com a maturidade, a experiência se tornou mais intensa e elevada, como demonstra a seguinte reflexão sobre a morte, da qual fica claro como esta mulher de Deus tinha compreendido, profundamente, o segredo segredo da vida e da morte: Não é necess nec essário ário ter medo da morte, porque a morte mor te é a volta à Casa do Pai. Para mim, a morte é a coroa mais alta da vida humana: morrer em paz com Deus... Têm medo somente quando a consciência não está limpa, quando têm medo de enfrentar a si mesmos; por isso muitas pess oas têm medo da morte: porque têm medo de enfrentar enfr entar a realidade, realidade, de enfrentar a si mesmos, olhando para Deus. O coração puro vê a Deus, e eu creio que o pobre vive intensamente na presença de Deus, por isso não tem medo da morte, mor te, vai ao encontro da morte com a alegria. Eu creio... Aqueles que se encontram nas nossas casas para moribundo moribundos, s, nossos leprosos e outros se alegram diante da morte, não porque se livram das dores, mas pela paz que sentem, a paz que irradia de seus corações. Ainda que muitos morram nas nossas casas, nunca vi ninguém morrer subestimado ou inquieto.. inquieto.... simplesmente vão para a Casa do Pai. A morte é a continuação da vida, o cumprimento da vida, o meio mais fácil e veloz para voltar a Deus.. Deus .... Voltar a Deus e voltar vo ltar para casa. c asa.
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Assim ela viveu todas as separações, também os lutos familiares. Não lhe foi possível, como sabemos, rever sua mãe e irmã. Quando ela partiu em 1928, Drane e Age ficaram sozinhas em Escópia. Em seguida, Age foi para Tirana, e ficou na Albânia para viver unto com seu irmão Lazër, que já morava lá, desde 1925, por causa de seu trabalho. Em 1934, também Drane foi para junto deles. Age não se casou, para ficar junto de sua mãe, mas foi sempre muito ativa: formou-se em economia na Iugoslávia, inicialmente trabalhou como tradutora do servo-croata para o albanês, depois como locutora de rádio e membro do coro radiofônico de Tirana. Lazër foi para a Itália estudar, em 1939, e lá ficou até sua morte, em 1981. Madre Teresa teria assim a possibilidade de encontrá-lo muitas vezes. A correspondência entre ela e o irmão, rica e intensa, mostra muito bem a união afetiva e o recíproco apoio, e toda ocasião era útil para exprimir a constante presença de Deus na vida de Madre Teresa. Em uma das cartas, ela indica o remédio a todos os males: Só Ele é Amor infinito. Só Ele pode preencher a tua vida. Só Ele pode acender o amor. Só Deus é a alegria e a serenidade do teu coração. Por isso, meu irmão, deves ir à igreja. O amável Cristo está no tabernáculo, para ti e para mim, de tal modo que tu e eu podemos tê-lo todo dia no nosso coração, meu irmão. Vai a Cristo e Ele encherá teu coração com a alegria, a serenidade e com uma grande paz que nada no mundo te pode dar, nem arrancar do teu coração.
Nessa carta de 15 de abril de 1979, se lê: Quanto temos que agradecer ao Senhor por todas essas coisas boas. Saber que o teu desejo é fazer a Comunhão só pode me deixar feliz, porque sem Jesus não é possível preencher a nossa vida. Agora tens um pouco de tempo, preenche-o com a Palavra de Deus. Reza, meu irmão, e faz com que tua vida fique chei c heiaa do amor de Deus.
Enquanto esta outra carta de Calcutá é de 10 de junho de 1978: Obrigado por tua carta. Não te preocupes comigo, agora estou bem de saúde, só que aqui faz muito calor e eu cheguei de Roma, onde fazia muito frio, e por isso peguei uma gripe. Mas não se preocupe comigo, o Senhor tem um amor muito grande por mim e Ele está sempre pronto, pensando em mim. Espero que vocês estejam bem e que todos possam ir à igreja receber Cristo no coração [receber a Comunhão]. Não sei se eu poderia viver sem a Santa Comunhão.
O tema da Eucaristia é dominante, para ela é o fundamento da existência humana, nela tudo faz sentido, tudo se justifica: Com a santa Comunhão, a nossa vida fica ligada estreitamente à vida de Jesus. Se soubermos e recebermos Jesus na espécie do pão, na Hóstia, então devemos acolher aqueles que estão ao nosso lado, e também os outros, os mais pobres, os miseráveis.
No dia 12 de maio de 1963, Madre Teresa escreveu: Recebi a tua carta. Agradeço-lhes pelas orações, que me ajudam a realizar a obra do bom Deus [...]. Nós agora somos 180 irmãs. Agora começamos a ter irmãos. Esqueci o albanês, por isso não consigo escrever-lhes mais. Rezem por mim. E eu rezarei por vocês. O amor de Deus esteja com vocês.
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Anos depois, Lazër testemunhará: Hoje, quando vejo Gonxhe – Madre Teresa –, parece que vejo nossa queridíssima mãe. Gonxhe se parece muito com ela. Quando minha mãe veio a Tirana, notei que estava muito feliz, porque estávamos todos reunidos e porque a nossa irmã Gonxhe era irmã. Naquela época, ela nos escrevia com frequência e nos fortalecia com suas orações. Minha mãe sempre rezava: na igreja, em casa, na rua. Ela sempre tinha um rosário nas mãos. [1]
Deve-se lembrar que não se podia mostrar o rosário em lugar nenhum, mas só guardálo secretamente, por causa da perversa ideologia do regime de Enver Hoxha. De 1946 a 1990, a Albânia foi um Estado nacional-comunista, extremamente isolado, estalinista e antirrevisionista, que dedicou poucos esforços à cooperação política com os outros Estados comunistas do Pacto de Varsóvia, controlado pela União Soviética. Esta última, com a subida ao poder de Nikita Kruschv, assumira forte oposição ao culto da personali ersonalidade de Stali Stalin, depois depois da publi publicação do relatóri relatórioo Sobre o culto da ersonalidade e as suas consequências. Hoxha era um marxista-leninista ortodoxo, grande admirador do ditador soviético Stalin. Tomou como modelo a União Soviética e endureceu as relações com seus velhos aliados, os comunistas iugoslavos. O seu ministro da defesa, Koçi Xoxe, foi condenado à morte e executado por supostas atividades pró-iugoslavas. A Albânia se tornou um dos países mais pobres da Europa, cada vez mais distante dos outros países europeus pertencentes ao bloco comunista. Quando o regime caiu, foi revelada ao mundo a real situação, com regiões inteiras que viviam abaixo do mínimo de subsistência, na desnutrição e com gravíssimas carências, também de caráter sanitário; e as infraestruturas se revelavam, em boa parte, as mesmas do período da dominação italiana. Em 1960, Hoxha aproximou a Albânia da República Popular da China, depois da crise sino-soviética, comprometendo assim, nos anos seguintes, as relações com Moscou. Em 1968, a Albânia se retirou do Pacto de Varsóvia, como reação à invasão soviética da Tchecoslováquia. Em 1967, depois de duas décadas de maciça ateização, Hoxha declarou triunfante que a Albânia era o primeiro país no mundo em que o ateísmo de Estado estava inscrito na Constituição. De fato, o artigo 37 da Constituição albanesa estabelecia que: “O Estado não reconhece religião alguma e apoia a propaganda ateia para incutir incutir nas pessoas a visão visão científico-materi científico-materiali alista sta do mundo”, enquanto o artigo artigo 5 do Código Penal albanês de 1977 previa a reclusão de três a dez anos para o crime de propaganda ropaganda relig religiosa e produção, distri distribui buição ção ou armazenamento de escritos escritos relig religiosos. a ex-Iugoslávia, a situação religiosa era muito diferente, porque, sob o general Tito, a liberdade religiosa era limitada, mas não tinha sido abolida como na Albânia. Perguntamos a Lush Gjergji como o mundo católico viveu a ditadura de Hoxha e, sobretudo, a família de Madre Teresa. Heroicamente, com muita coragem, com muita fé e com o martírio. Durante a ditadura de Hoxha, foram destruídas ou fechadas todas as igrejas, assassinados ou aprisionados os bispos, padres, religiosos e freiras, porque o delito delito mais grave era c onsiderado ter sua própria fé e professáprof essá-la. la. A mãe e a irmã de madre Teresa, que sofreram muito com a falta de liberdade, de sacerdotes, da vida sacramental, morreram completamente
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isoladas e abandonadas, sepultadas vivas, sem nenhum cuidado, sem ter o conforto de ver Madre Teresa e Lazër, que as tinha visto pela última vez no final da Segunda Guerra Mundial. Madre Teresa me disse uma vez assim: “A Albânia está vivendo uma Sexta-feira Santa, mas a vida de Jesus não termina nesse dia, porque tem o Domingo da Ressurreição, a Páscoa. É assim também com a Igreja na Albânia. Somente com a oração, com a fé, com o amor e com o perdão se pode vencer o muro do ódio e das divisões”.
Inspirando-se na revolução cultural chinesa, Hoxha realizou o confisco de mesquitas, igrejas, monastérios e sinagogas. Muitos desses foram destruídos imediatamente, os outros foram usados como oficinas mecânicas, armazéns, estábulos ou cinemas. Os pais foram proibidos de dar nomes religiosos aos filhos. Quem tinha feito circular cópias da Bíblia ou do Alcorão, ícones ou outros objetos religiosos, foram condenados a longos períodos de prisão. prisão. No sul, onde se concentrava a população de orig origem grega, grega, as cidades com nomes de santos foram renomeadas e laicizadas. A morte de Mao, em 1976, levou à ruptura da Albânia também com a China, e Hoxha se elevou a paladino antirrevisionista, criticando tanto Moscou como Pequim. Em 1981, com um expurgo de molde estalinista, o ditador ordenou a execução capital de diversos dirigentes do partido e do governo. O regime impedia e denegria a liberdade de palavra, de religião, de imprensa e de associação, apesar de a constituição de 1976 pretender garantir cada um desses direitos. A Sigurimi (a polícia secreta) violava habitualmente a privacidade das pessoas, das habitações, das comunicações, e fazia prisões arbitrárias, às vezes depois da acusação de nefastos delatores. Os tribunais se esforçavam para que as sentenças fossem pronunciadas ronunciadas conforme a perspectiva perspectiva políti política ca do partido, partido, e não para garantir arantir o justo processo jurídico jurídico do acusado, que às vezes era condenado sem nem mesmo a formalidade de um processo.
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NUNCA UNCA MAIS MAIS SE VIRAM IRAM
Mesmo depois da partida do filho Lazër, Drane e Age continuaram a viver em Tirana, mas, depois da Segunda Guerra Mundial, sob o feroz regime de Hoxha, foram transferidas para um edifício do Estado, em absoluta pobreza e abandono. Drane rezava sempre, dia e noite, em segredo, porque toda manifestação pública de culto era severamente punida. Algumas semanas antes de morrer mandou uma foto à amadíssima Gonxhe, com os dizeres: “Beijos, Nëna Loke”. O irmão possuía uma carta na qual a mãe manifestava o ardente desejo de rever Madre Teresa. A carta tinha sido escrita pela irmã que ficara na Albânia: Quanto me alegrei ao receber tua carta. Tu, meu espírito, não sabes quanto te quero bem, e quanto desejo ver-te o quanto antes. Nossa mãe tem sempre nas mãos uma foto tua. Eu só espero o dia em que poderei finalmente rever-te. Agora o meu coração está cheio de saudades. Não recebi mais nada de Gonxhe há tempos. Fico contente se estiver bem de saúde.
Em 12 de setembro de 1957, Madre Teresa escreve ao arcebispo Périer: Recebi uma longa carta da minha idosa mãe. Finalmente receberam notícias minhas e só agora ela ficou sabendo das Missionárias da Caridade. Em 1948, ela ficou sabendo que eu teria deixado Loreto, e depois mais nada, tanto que ela acreditava que eu tivesse morrido.
Passaram-se, portanto, 11 anos – uma separação que causou um sofrimento atroz para Madre Teresa, que ela sempre manteve escondido – até que mãe e filha pudessem se comunicar, e até que Drane pudesse saber que Gonxhe tinha decidido ficar com os mais pobres, notícia que alegrou alegrou profundamente o coração da mãe. m ãe. Por meio de uma carta se vem a saber que Escópia, por óbvias razões políticas, se tinha “esquecido” de Gonxhe Bojaxhiu, mas o pároco de Escópia, Monsenhor Branko Dorčić, escreveu, depois de tantos anos, ao botão de rosa de outrora, e Madre Teresa assim lhe respondeu em 10 de junho de 1962: Gentilíssimo, Com a sua carta fiquei sabendo das últimas notícias de Escópia depois de 33 anos, então o senhor pode imaginar a minha alegria. Muito obrigado. O nosso amado Senhor de fato abençoou a cidade de Escópia. Creio que os nossos pobres, que estão sofrendo muito, rezam ao Senhor pela cidade e pelo senhor. Estamos felizes por ter tantas vocações. A nossa comunidade lentamente cresce. Agora somos 194 irmãs. Algumas trabalham muito bem em Délhi e também em outros lugares. Rezem pela nossa nova casa. Desde que cheguei à Índia, ninguém me mandou mais notícia alguma e eu pensava que se tivessem esquecido de Gonxhe. O senhor é o primeiro que me escreveu. Rezem por mim. E, ao mesmo tempo, convidem também todos os outros de Escópia para rezarem por mim. Minha mãe e minha irmã se encontram ainda em Tirana. O Senhor sabe por que devem sofrer tanto assim. Certamente o sacrifício e as orações delas me ajudam no que estou fazendo. Que tudo seja para a glória de Deus. Em junho haverá uma grande festa para a nossa Igreja em Escópia: a festa da Santa Cruz, naquela pequena igreja, eu senti a minha vocação.
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Rezem por mim e eu rezarei por vocês! Madre Teresa Bojaxhiu.
Em uma carta de 4 de janeiro de 1970, Age escreve: “A mamãe piora cada vez mais, agora quase não me reconhece mais. Está muito fraca e perdeu muito peso (pesa só 39 quilos). Eu estou bem, ainda que esteja muito triste”. A mãe escreveu ainda uma vez ao filho na Itália, dizendo: “O único desejo que tenho é ver você mais uma vez antes de morrer, você e a sua família e a minha cara e amada Gonxhe”. Madre Teresa tentou ir à Embaixada albanesa em Roma acompanhada por uma coirmã, talvez irmã Gertrude, e por Eileen Egan, a secretária do Catholic Relief Service, uma associação católica americana. Mas ouviu deles: “Não queremos falar com você”. Saindo da Embaixada, Madre Teresa chorava. Ela parou e voltou os olhos ao céu e disse: “Senhor, eu aceito esse sofrimento por Ti, mas para a minha pobre mãe é difícil de entender e aceitar. Nos sofrimentos de sua velhice, deseja somente ver-me mais uma vez”. Ela tentou ainda por diversos canais, mas sem sucesso. Ao irmão, confidenciou: “Até hoje, com a oração e com o amor, eu consegui obter tudo, mas existem muros, barreiras arreiras que o amor não conseg c onsegue ue derrubar”. Poucos dias depois, Madre Teresa recebeu da irmã um bilhete, no qual a mãe dizia: “Se não nos virmos nesta mísera terra, minha filha, certamente nos reveremos no céu”. Não se pôde fazer nada, e com o pranto e a morte no coração Madre Teresa pronunciou ronunciou o seu fiat . No dia 12 de julho de 1972, Lazër recebeu de sua irmã Age este telegrama de Tirana: “Hoje, 12 de julho, às cinco horas, Loke morreu”. No dia 14 de ulho, o irmão telegrafou de Palermo para Madre Teresa: “Reza por Loke, que mudou de vida no dia 12 de julho”. A Madre Teresa não foi permitido nem mesmo ir ao enterro de sua mãe. A mesma coisa acontecerá, no ano seguinte, no funeral de Age. Padre Giuseppe Pelizza, salesiano e diretor das revistas Dimensi oni Nuove e Maria usiliatrice , foi um dos primeiros a entrar na Albânia livre, desfigurada e deturpada pelo ditador Enver Hoxha. Viveu por dez anos na terra natal de Madre Teresa e hoje dá continuidade ao seu interesse e ao seu apoio pelos albaneses na Itália. Foi capelão das Missionárias da Caridade de Skutari, pregando a elas também os exercícios espirituais e realizando obra missionária nos povoados. O seu testemunho é, por isso, ainda ainda mais precioso: precioso: Fui para a Albânia em 1993. Pude constatar pessoalmente as consequências terríveis e a espoliação material e espiritual dos albaneses perpetrada pela ditadura comunista. A miséria estava em todos os cantos da nação, nos campos como nos centros urbanos. Para lá Madre Teresa voltou depois de 63 anos de ausência e abriu uma casa das Missionárias da Caridade. Estava tudo destruído, a fome era geral, as lojas estavam vazias, sujeira por toda parte. Os animais de criação eram roubados dos quintais e faltavam sementes para semear os campos; os canais de irrigação dos campos estavam destruídos, e a agricultura de subsistência desaparecera e faltava até mesmo esterco para adubar os campos. Quando fui para lá, o desespero era total e as irmãs de Madre Teresa cuidavam de tudo, sobretudo das crianças com deficiências, dos órfãos e dos que tinham doenças degenerativas. As vias de comunicação estavam interrompidas, as estradas eram impraticáveis e os hospitais arruinados. As pessoas migravam do interior para os vilarejos, das montanhas para as cidades como Skutari, Tirana, Elbasan, Durazzo; famílias inteiras se deslocavam em busca de uma vida melhor, e as irmãs
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de Madre Teresa as sustentavam. Durante a guerra do Kosovo,[1] as Missionárias da Caridade abriram as suas casas c asas para os refugiados. refugiados. A espiritualidade das filhas de Madre Teresa é radical, exigentíssima, por isso sempre as vi muito serenas, apesar do contexto muito difícil e hostil. Vi cenas inacreditáveis; às vezes os pobres se tornam muito pretensiosos e difíceis de lidar, lidar, e, no entanto, as irmãs nunca nunc a perdiam a c alma, tinham sempre um sorriso s orriso nos lábios. O recurso delas estava todo na oração, sem a qual a vida que levam seria insuportável. Em Tirana, eu as vi dar de comer a centenas e centenas de pessoas de todas as idades. A caridade delas está estreitamente ligada à doação de si e ao sacrifício, que se alimenta da oração. A percepção de Deus que elas têm é profunda e sempre as acompanha aonde quer que vão. O estilo de vida delas é muito pobre. Quando eu dormia na casa delas, as refeições eram muito frugais; em relação a elas, me era concedida a mais uma xícara de chá. Possuíam apenas dois sáris e faziam tudo elas mesmas, desde a limpeza pessoal à doméstica, e se encarregavam até mesmo da construção. De fato, foram elas que construíram, com ajuda das pessoas do lugar, as casas que vi na Albânia e a igreja de Skutari. As suas relações com as instâncias eclesiásticas são ótimas e conseguem ter bons contatos com as autoridades civis, que frequentemente criam problemas com os estrangeiros, mas respeitam as irmãs de Madre Teresa. O hábito delas é o melhor salvo-conduto. Madre Teresa extraiu os fundamentos da sua ação de sua família de origem, e depois transportou a estrutura familiar de sua casa para uma escala mundial. A mulher tinha um poder fortíssimo na família albanesa. Em uma sociedade sem Estado, sem assistência social e sem previdência, a mulher assumia uma aura de sacralidade. A mãe era a rainha! Ali naquela terra, onde tudo era difícil e precário, onde os turcos tinham estabelecido o poder com a violência e a força, aonde o Islã tinha levado a diferença substancial de conceber a vida e a morte, onde havia uma convivência forçada entre muçulmanos e cristãos ortodoxos, mas onde o vento da tempestade, seja islâmica, seja comunista, não tinha conseguido apagar a chama da fé, Madre Teresa aprendeu a aceitar e a cultivar a unidade na diversidade das línguas, culturas e religiões, como um mosaico a ser composto e conservado.
Perguntamos ao padre Lush como e onde encontrou pela primeira vez Madre Teresa e o que nela o impressionou: Foi em 1968, e a encontrei na Tor Fiscale, em Roma. Já tinha ouvido falar muito dela, mas o encontro com ela me deu a certeza de que eu estava na presença de uma criatura maravilhosa. Muitos de seus dotes me impressionaram, sobretudo a simplicidade, a humildade, a cordialidade, a certeza da fé e o entusiasmo do amor. Era uma verdadeira Mãe, um pouco tímida na comunicação, mas muito segura quando testemunhava o amor de Deus por meio do amor ao próximo. Ela estava sempre à procura da presença e do amor de Deus, portanto, constantemente aberta aos outros e assim transmitia muita confiança, muito entusiasmo por acreditar e viver na fé e no amor. Para ela, Deus e o homem eram os trilhos da vida, sobre os quais corria como uma flecha o amor, por isso a sua essência era, ao mesmo tempo, contemplativa e ativa, porque estava sempre unida com Deus e com o próximo, nunca dividindo dividindo a vida em “pedaços”. Um dia me confide conf idenciou: nciou: “Nós somos uma comunidade de religiosas contemplativas no mundo, contemplativas no trabalho e na ação. Se um dia não houver mais pobres, famintos, miseráveis, miseráveis, leprosos, voltaremos aos nossos noss os conventos e dedicar dedicaremos emos completamente a nossa vida à oração, totalmente. Mas me parece que nunca chegaremos a esse ponto. Parece-me que, no nosso trabalho, nunca teremos concorrência; sofrimentos e dores existem em todos os cantos do mundo, a cada passo, não só aqueles materiais, mas crescem e se multiplicam muito mais os sofrimentos e as misérias espirituais”.
Madre Teresa tinha uma vida espiritual muito profunda, até o ponto de conseguir se retirar de tudo e de todos para estar e se comunicar com Deus; depois voltava a ficar próxi róxima e atenta aos outros. Padre Lush afirmou ainda: ainda: A “passagem” de Deus ao homem e vice-versa era excepcional nela, espontânea e imediata. Evidentemente era o contraste que se manifestava nela: de um lado, a fragilidade humana de seu pequeno
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corpo e das marcas da idade em seu rosto; por outro, a grandeza extraordinária de seu espírito, esse dom que se podia “tocar” com a mão, ao ponto de nos fazer perceber a presença de Deus na sua vida e nas suas obras. Naquele aquele primeiro primeiro encontro encontr o em Roma, no qual tomei t omei c onsciência onsc iência do meu futuro, Madre Teresa nos contou muitas coisas da Índia, das pessoas pobres, solitárias, dos leprosos, mas aquilo que jamais esquecerei era a alegria de estarmos juntos, de se poder finalmente instaurar uma ligação entre Escópia e Calcutá, depois de quarenta anos (1928-1968). Esse encontro foi o impulso decisivo para a minha vocação sacerdotal. Madre Teresa fez muitas perguntas sobre a nossa Igreja local, sobre a diocese de Escópia-Prizren, sobre as vocações sacerdotais e religiosas e sobre o nosso povo albanês no Kosovo, na Albânia, na Macedônia e em várias partes do mundo. Então tive a alegria, a intuição, a convicção, a certeza de estar diante de uma “santa viva”, e decidi dedicar a minha vida e as minhas pesquisas para conhecer, descobrir, escrever e tornar pública essa Vida, a presença de Deus por intermédio de Madre Teresa, com um desejo um pouco tímido não só de admirá-la, mas também de imitá-la.
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NO BAI BAIRRO RRO DA DEUSA DEUSA KALI KALI
A Congregação diocesana das Missionárias da Caridade, reconhecida no dia 7 de outubro de 1950, depois de quinze anos, se tornou pontifícia: Isso quer dizer que nós, agora, pertencemos diretamente ao Santo Padre. É um grandíssimo milagre o fato de uma nova congregação ser elevada ao nível pontifício. Para muitas congregações, foram necessários pelo menos trinta anos, algumas vezes quarenta anos para obter este reconhecimento.[1]
O milagre tinha se realizado em pouco tempo. Madre Teresa tinha esperado tanto antes; agora a semeadura e a colheita caminhavam lado a lado, numa ascensão prodig rodigiosa: “O Senhor foi magnífi magnífico co conosco; assim como crescia o trabalho, cresciam as vocações.[2] O serviço aumentava porque ninguém era rejeitado pelas irmãs; junto a elas, sempre se encontrava um lug lugar, ar, uma cama, um coração acolhedor, “também para teu filho doente, abandonado, pobre, não desejado”, dizia Madre Teresa, que abria casas depois de casas. Em 1963, as Missionárias da Caridade eram 181 e começaram a trabalhar também com os homens, os Brothers, rothers, os Irmãos, isto é, os Missionários da Caridade. Em 1º de fevereiro de 1965, foi concedido o decretum laudis da congregação para religiosos e religiosas, e com esse documento foi possível ultrapassar as fronteiras da Índia. O Instituto de Madre Teresa se tornou, graças ao assentimento do Papa Paulo VI, uma “Congregação de Direito Pontifício”. Em 1967, foi aberta uma casa na Venezuela, que foi seguida, nos anos de 1970 e 1980, por outras na Itália, África, Ásia, Europa e Estados Unidos. As missionárias contavam com cerca de 300 irmãs. Os anjos de Madre Teresa não circulavam mais apenas pelas favelas indianas, mas iam também pelas estradas do mundo, nas metrópoles ocidentais, nas quais o espírito não estava corrompido pela pobreza material, material, tanto quanto pela pela pobreza espiri espiritual tual:: soli solidão, suicídi suicídio, o, alcool alcooliismo, droga, divórcios, mães adolescentes, abortos, vítimas da Aids... Um dia, em 1952, Madre Teresa caminha perto do Hospital Campbell, que se tornaria depois Nilratan Sarkar Hospital, e que ficava perto da Casa das Missionárias da Caridade. Ela estava, como sempre, à procura de doentes pobres, e a certo ponto encontrou um moribundo que agonizava em meio ao lixo. E com um fio de voz ele lhe disse: “Ajuda-me, estou morrendo! Não tenho mais ninguém!”. Madre Teresa então foi ao hospital para perguntar se tinha um lugar para aquela pobre criatura, e recebeu um não como resposta. Então foi à farmácia comprar alguns remédios, mas, quando voltou para dá-los dá-los ao moribundo, moribundo, o homem já tinha tinha morrido. morrido. “Eu estava muito muito comovida comovida e triste. Então disse assim: eles dão mais cuidados aos cães e aos gatos do que aos seres 87
humanos”.[3] Decidiu ir de novo ao hospital e às autoridades competentes para protestar e propôs: “Se vocês não cuidam, ou não querem cuidar dessa gente que morre pelas ruas, então me encontrem um lugar no qual eu possa recebê-los e cuidar deles”. [4] A resposta a seu pedido foi positiva, e o lugar indicado para realizar sua obra foi no bairro airro de Kali Kaligh ghat, at, centro relig religioso dos hindus, hindus, no qual se ergue ergue o esplêndi esplêndido do templo templo da deusa Kali. A proposta, se quisermos ser maliciosos, parecia quase uma provocação. esse lugar havia um grande edifício para os peregrinos, ao qual se dirigiam para descansar depois das orações e dos ritos religiosos. Esse edifício poderia passar para a gestão da católica Madre Teresa, que lá compareceu acompanhada por um funcionário do Estado para lhe oferecer aquele lugar que deveria ser destinado aos moribundos. Proposta feita, proposta aceita. Mas os primeiros tempos foram muito difíceis e perig erigosos, pois pois tanto os sacerdotes da deusa Kali Kali como os fiéis fiéis eram completamente completamente contrários à presença de Madre Teresa, que “profanava” aquele lugar sagrado, ao ponto de um funcionário pretender desmantelar aquele projeto “insano”. Para isso, ele se dirigiu enfurecido para o edifício, mas quando entrou no salão em que Madre Teresa, com suas filhas, assistia com amor e mil atenções aos moribundos, o homem reconheceu o mérito daquela pequena grande mulher e lhe desejou todo bem. Saindo dali, depois dessa brusca e inesperada experiência, dirigiu-se nestes termos aos ministros da deusa Kali, aos fiéis e aos jornalistas que o cercaram: Sim, eu prometi, de fato, expulsar daqui essa mulher, e mantenho o meu compromisso. Mas escutem bem o que lhes digo: antes disso, é preciso que as suas mães, irmãs e vocês mesmos venham fazer o que fazem aquelas freiras. No templo vocês têm uma deusa de pedra, e aqui há uma deusa viva![5]
A casa para os moribundos, denominada Nirmal Hriday (a Casa do Coração Puro), dedicada a Nossa Senhora, foi fundada em 22 de agosto de 1952, quando a Congregação contava com vinte e duas irmãs e era ainda hóspede do senhor Gomes. Madre Teresa considerava aquela obra a “Casa do Tesouro” das Missionárias da Caridade. Os moribundos, abandonados e isolados eram semelhantes a Cristo, “sob o Seu Rosto desfigurado”, como disse Madre Teresa ao Sínodo dos Bispos de Roma, em outubro de 1980. Foi uma iniciativa corajosíssima a de Madre Teresa, correndo o risco do martírio, porque, apesar de já contar com c om o apoio das autoridades, autoridades, o obstáculo a ser superado era a desconfiança dos habitantes e dos peregrinos do bairro dominado pela deusa Kali. Inicialmente, Madre Teresa foi considerada como uma inimiga que viria insidiar um território sagrado e não seu. Como testemunho dos perigos que a fundadora e as suas filhas correram, há uma carta que Madre Teresa escreveu ao arcebispo Périer em 6 de agosto de 1953: Temos tido problemas em Kalighat. Muito friamente me disseram que devo agradecer a Deus se até agora não me agrediram ou não atiraram em mim, pois para todos aqueles que trabalharam para os habitantes deste bairro airro a recompensa recom pensa foi a morte. Muito Muito pacatamente respondi que eu estava pronta para morrer por Deus. Estão por vir tempos duros; oremos para que a nossa Congregação resista à provação da Caridade.
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Padre Lush conta o que lhe disse Madre Teresa em 1986: A Casa do Coração Puro é, para muitos, o “purgatório”, a passagem para a casa do Pai. Até agora passaram por lá mais de 60.000 60. 000 homens e mulhe m ulheres, res, cerca cer ca de 30.000 30. 000 lá morreram em paz, outros se curaram. cur aram. Eis Eis um exemplo típico: um dia encontrei um homem em um esgoto. Todo o seu corpo era uma grande chaga. Os ratos o tinham devorado quase inteiramente. Levei-o para a nossa casa para os moribundos. Sabe o que me disse aquele homem? Disse assim: “Vivi todos esses anos como um animal pela rua. Agora morrerei como um anjo, rodeado de amor e de cuidados”. Jamais poderei esquecer as suas palavras, mas, sobretudo, o seu rosto tranquilo e sorridente. Três horas depois, morreu de fato como um anjo.
A pessoa não é chamada a viver na rua, nem é chamada a viver como os animais, porque o homem, fil filho de Deus, criado à sua imagem e semelhança, semelhança, tem uma dig dignidade nidade altíssima. Madre Teresa, com piedade e misericórdia, recolhia os corpos daquelas pessoas, às vezes os colocava sobre os próprios próprios ombros, às vezes em algum algum carrinho que encontrasse. Eram indivíduos dos quais a vida, com ou sem a responsabilidade deles, tinha tirado tudo, até mesmo a respeitabilidade e a honra. A esses indivíduos, Madre Teresa e suas irmãs davam, e continuam a dar, a possibilidade de morrer com dignidade e paz. Toda manhã ela e suas irmãs saíam em busca de moribundos. No começo, as pessoas não entendiam, entendiam, ficavam ficavam confusas e desconfiadas, desconfiadas, depois depois se formou uma rede preciosíssi reciosíssima ma de colaboradores, colaboradores, e a estima estima pela pela inici niciati ativa va delas delas conquistou conquistou tamanha confiança, que as pessoas começaram a levar para a Casa do Coração Puro aqueles que estavam no fim da vida e que se encontravam na rua, ou então indicavam às Missionárias da Caridade o lugar onde os doentes se encontravam. A missão delas começava todo dia antes do amanhecer, diante da Eucaristia, como explicou Bento XVI na encíclica Deus caritas cari tas est : Os santos – pensemos, por exemplo, na beata Teresa de Calcutá – extraíram a sua capacidade de amar o próximo, de modo sempre s empre novo, do seu s eu encontro enc ontro com o Senhor eucarís tico, e esse es se encontro encontr o reciprocamente r eciprocamente adquiriu o seu realismo e a sua profundidade exatamente no serviço deles aos outros. Amor a Deus e amor ao próximo são inseparáveis, s ão um único mandamento.
No sil silêncio êncio da contemplação, contemplação, Madre Teresa sentia sentia ecoar o grito rito de Jesus na cruz: “Tenho sede”. Esse grito, colhido no fundo de seu coração, a levava pelas ruas de Calcutá e de todas as periferias do mundo, em busca de Jesus nos pobres, no abandonado, no moribundo. A mulher universalmente reconhecida como a Mãe dos pobres “deix “deixa um exemplo exemplo eloquente eloquente para todos, os que creem e os que não creem”, disse João Paulo II no Angelus do domingo, 7 de setembro de 1997: [6] Deixou para nós o testemunho do amor de Deus que, acolhido por ela, transformou a sua vida em um dom total aos irmãos. Deixou para nós o testemunho da contemplação que se transforma em amor, e do amor que se transforma em contemplação. As obras realizadas por ela falam por si e manifestam aos homens do nosso tempo aquele alto significado da vida que, infelizmente, parece ter-se perdido.
Enquanto isso, o número de missionárias crescia, assim como crescia o número das casas de Madre Teresa para os doentes e para os moribundos. Em 1969, havia já 15 casas para moribundos, doze na Índia e três no exterior. Às vezes Madre Teresa foi contestada, seja por ter-se tornado “indiana demais”, seja 89
pela ela mistura de relig religiões que se criava criava em suas casas: Há um único Deus, e é Deus para todos; por isso que é importante que todos apareçam iguais diante dele. Eu sempre disse que devemos ajudar um hindu a se tornar um hindu melhor, um muçulmano a se tornar um muçulmano melhor, e um católico a se tornar um católico melhor. Cremos que o nosso trabalho deve ser um exemplo para as pessoas. Em torno de nós temos 475 almas: dessas, somente 30 famílias são católicas. As outras são hindus, muçulmanas, siques. São todas religiões diferentes, mas todos vêm às nossas orações.[7]
Muitas vezes Madre Teresa também interveio publicamente sobre outros assuntos que para ela eram importantes. Muito Muito forte foi a sua condenação pública, pública, diante diante de políticos políticos e chefes de Estado, do aborto e dos métodos de contracepção artificiais. No discurso que fez por ocasião da entrega do Prêmio Nobel da Paz, que recebeu em 17 de outubro de 1979 em Oslo, “pelo trabalho realizado na luta para vencer a pobreza e a miséria, que constituem também uma ameaça à paz”, Madre Teresa afirmou que aceitava o prêmio exclusivamente em nome dos pobres, e surpreendeu a todos com o seu ataque duríssimo contra o aborto, [8] que ela apresentou como sendo a principal ameaça à paz. As suas palavras alavras soam muito muito atuais atuais diante diante de um mundo que, em grande grande parte, renunciou renunciou à vida vida desde a sua origem, e que vê na eugenia o seu futuro: Sinto que, hoje em dia, o maior destruidor da paz é o aborto, porque é uma guerra direta, um assassinato direto, um homicídio direto pela mão da própria mãe [...]. Porque, se uma mãe pode assassinar seu próprio filho, não há mais nada que me impeça de assassinar você, e impeça você de assassinar a mim.
Um dia padre Pio de Pietrelcina disse a um médico: “Bastaria um dia sem aborto, e Deus concederia a paz ao mundo até o final dos dias”. Por toda a sua vida, Madre Teresa lutou contra a legalização do homicídio de um menor que ainda está no ventre materno. A cultura do extermínio, que se orgulha dos 40 a 50 milhões de abortos por ano, segundo as estimativas da Organização Mundial da Saúde, tem medo da vida que deve desabrochar, assim como tem terror da idade que avança e da morte, como se a existência humana estivesse concentrada somente na uventude e na maturidade dos sadios e normais. Madre Teresa, mulher de extrema sabedoria, amava a vida em sua totalidade, do começo ao fim, não em fragmentos, como a cultura laicista contemporânea, que tenta estabelecer de maneira relativa, segundo parâmetros arbitrári arbitrários os e intercambiávei ntercambiáveis, s, conforme as conveniências conveniências,, o que é o bem e o que é o mal. Em mais de uma ocasião Madre Teresa disse: O aborto é o começo dos males no mundo. A vida da criança não nascida é um dom de Deus, o maior dom que Deus pode dar à família. Hoje há muitos países que permitem o aborto, a esterilização e outros meios para evitar evitar ou destruir a vida desde o seu início. Esse é um sinal óbvio de que esses países são os mais pobres entre os pobres, pois não têm a coragem c oragem de ac eitar nem mesmo mesm o uma vida vida a mai m ais. s. A vida da criança ainda não nascida, como a vida dos pobres que encontramos pelas ruas de Calcutá, de Roma ou de outras partes do mundo, a vida das crianças e dos adultos, é sempre a mesma vida. É a nossa vida. É o dom que vem de Deus. Eu não discuto se há necessidade de legalizar ou não o aborto. Creio somente que nenhuma mão humana tem o direito de se erguer para destruir a vida. Toda existência é a vida de Deus em nós. Também a criança que ainda não nasceu tem a vida divina dentro de si. Não temos nenhum direito de anular essa vida, com nenhum meio. Homem, mulher, criança, não há diferença alguma. Parece-me que o grito das crianças não nascidas
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sobe até nós, crianças mortas antes de virem ao mundo, uma acusação que ressoa diante do trono de Deus.
O extermínio legal em escala planetária de crianças era horrível aos olhos de Madre Teresa, como aos olhos de qualquer pessoa que não suprima a razão. A morte de um filho é também a morte de seus pais, que negaram o amor, e negar isso significa negar a vida também a si mesmos. Bento XVI afirmou na mensagem “Combater a pobreza, construir a paz” para a celebração da Jornada Mundial da Paz, de 1º de janeiro de 2009: A pobreza é frequentemente relacionada como consequência do aumento demográfico. Consequentemente, há campanhas de redução da natalidade, conduzidas em âmbito internacional, também com métodos que não respeitam nem a dignidade da mulher nem o direito de o casal escolher responsavelmente o número de filhos que quer ter, e o que é ainda mais grave, métodos que não respeitam nem mesmo o direito à vida. O extermínio de milhões de crianças nascituras, em nome da luta contra a pobreza, constitui, na realidade, a eliminação dos mais pobres entre os seres humanos. Diante disso resta o fato de que, em 1981, cerca de 40% da população mundial estavam abaixo da linha de pobreza absoluta, e hoje essa porcentagem foi praticamente reduzida à metade, e saíram da pobreza populações caracterizadas por um notável incremento demográfico. O dado agora detectado põe em evidência que os recursos para resolver o problema da pobreza existem, mesmo com o crescimento da população. Nem se deve esquecer que, do final da Segunda Guerra Mundial até hoje, a população da terra subiu para quatro bilhões e, em grande parte, tal fenômeno diz respeito a países que recentemente apareceram na cena internacional como novas potências econômicas e conheceram um rápido desenvolvimento graças ao elevado número de seus habitantes. Além disso, entre as nações mais desenvolvidas, aquelas com maiores índices de natalidade apresentam melhores potencialidades de desenvolvimento. Em outras palavras, a população está se confirmando como uma riqueza, e não como um fator de pobreza.
As esterilizações obrigatórias com fundamento eugenético para melhorar as raças, eliminando os indesejáveis e os que têm alguma deficiência, como ocorre hoje aos olhos de todos, sob a égide de leis governamentais, certamente não podem ser consideradas uma exclusividade do regime nazista. A eugenia é uma utopia, ou melhor, uma distopia, e frequentemente seus defensores se consideram benfeitores da humanidade. Mas, na realidade, ela comporta um grau altíssimo de desumanidade e violência, sem contar o ultraje a Deus, seja ela praticada por nazistas ou social-democratas suecos. Nos países em via de desenvolvimento, no entanto, prevaleceu a ideologia neomalthusiana, fundada na ideia de que a principal causa da degradação ambiental é a assim chamada superpopulação, não considerando assim o homem como um recurso. O pessimismo se torna confiança extrema nas técnicas seletivas, que inclui o aborto e a esterilização em massa, geridas por agências internacionais e por indústrias farmacêuticas interessadas nos grandes lucros decorrentes disso. Sob o mistificador manto da bondade se escondem, de fato, formas elevadas de cinismo de características também racistas, como se pode ler nos textos de Beaulieu, o inventor da pílula abortiva Ru486, ou na Magna Charta dos anticoncepcionalistas, que é o The population bomb de Paul Ehrlich. Os programas de controle de nascimento nos países do terceiro mundo, em grande parte financiado financiadoss pela pela ONU, são formas de plani planificação ficação demográfica demográfica eli elitista tista e frequentemente cruenta, que não se preocupam minimamente com os direitos humanos. Por trás das belas palavras das resoluções da ONU e no silêncio de muitíssimas 91
organizações humanitárias, há, com muita frequência, a cumplicidade com as esterilizações e os abortos forçados, com as experiências ilegais de métodos contraceptivos. Nos países subdesenvolvidos, há cerca de 160 milhões de mulheres esterilizadas, enquanto no Ocidente são pouquíssimas. É evidente que nenhuma mulher escolheria espontaneamente a esterilização como método contraceptivo. A esterilização cirúrgica é imposta por meio de diversas formas de pressão, como os pequenos incentivos econômicos ou a divulgação cultural. É conhecido o papel de Porto Rico na experimentação de pílulas anticoncepcionais em mulheres (os cientistas que trabalharam em métodos anticoncepcionais, desde Pincus até Beaulieu, passaram por lá), mas também Bangladesh, a África e a Índia são “laboratórios” de experimentação. Justamente na Índia, o governo de Indira Gandhi – a primeira ministra que afirmava: “Família pequena, família família feliz” feliz” – caiu caiu porque houve uma rebeli rebelião popular popular contra as campanhas maciças de vasectomia, a esterilização masculina, tecnicamente mais simples que a feminina. Desde então, os governos entenderam que era melhor agir sobre as mulheres. [9] Naturalmente se deve recordar a campanha do filho único na China, que durou vinte anos e foi implementada por meio de abortos forçados, prisão e retirada dos recémnascidos das famílias, controle policial, repressão violenta e retaliação não só contra quem desobedecia ou se rebelava, mas também contra seus parentes. O secretário-geral da ONU, Perez de Cuellar, deu um prêmio, em 1983, ao ministro chinês oficialmente, responsável por essa política, sem que esse fato suscitasse nenhum protesto internacional, nenhum evento jornalístico-midiático. Por outro lado, a Anistia Internacional decidiu considerar a proibição do aborto como uma violação dos direitos da pessoa, sem nem mesmo colocar-se a questão dos 160 milhões de mulheres que foram submetidas a esterilização forçada. No ano 2000, em vinte vinte e sete regi regiões indianas, ndianas, as mulheres mulheres pertencentes a famílias famílias indigentes, por isso sem condições de custear um dote para suas filhas, foram obrigadas a abortar as crianças que traziam em seus ventres. Primeiro Paulo VI, com a Humanae Vi tae, e depois Bento XVI, na sua viagem à África, defenderam com firmeza a vida desde a sua origem, confirmando o ensinamento milenar da Igreja nesse campo. Nenhuma planificação familiar é prevista pela Igreja para os povos da terra, porque cada pessoa, cada alma, esteja ela ainda no estágio de embrião, tenha ela alguma deficiência, seja ela doente, não consciente ou anciã, é desejada, querida, amada por Deus em si mesma e desde sempre. O tão falado amor livre dos anos 1960 em diante leva apenas somente à falência das relações e matrimônios, e o uso dos anticoncepcionais, cada vez mais difusos, apenas avilta e destrói a beleza do amor conjugal. Onde tudo é permitido, tudo concorre não para a liberdade do homem, mas, ao neg negar ar a sua realização, realização, contribui contribui para reduzi-l reduzi-loo à prisão. risão. A Ai Aids na África não se detém com os preservativos das indústrias ndústrias farmacêuticas farmacêuticas (usados de maneira tão errada que difundem ainda mais a pandemia), mas com os ensinamentos de uma vida sadia, limpa e fiel. Na cerimônia cerimônia de entrega entrega dos prêmios prêmios Nobel em Estocolmo, Estocolmo, Madre Teresa recusou o habitual banquete para os vencedores, e pediu que os 6000 dólares de fundos previstos 92
fossem destinados aos pobres de Calcutá, que assim poderiam comer por um ano inteiro. “As recompensas terrenas são importantes somente se utilizadas para ajudar os necessitados do mundo”, disse ela. E à pergunta: “O que podemos fazer para promover a paz mundial?”, mundial?”, ela ela respondeu segura: “Vão “Vão para suas casas e amem am em as suas famílias”. famílias”. Madre Teresa também conduziu importantes campanhas de sensibilização contra o divórcio, que ela identificou como um elemento desagregador da sociedade, sustentando que deveria se tornar ilegal, pois o matrimônio é indissolúvel aos olhos de Deus. Em 1996, se mobilizou de maneira decisiva, e faltou pouco para obter sucesso, pelo “não” no referendo que pretendia introduzir o divórcio na Irlanda. Naquele mesmo ano, porém, em uma entrevista, quando o jornalista tocou no tema “Diana Spencer”, ex-esposa do príncipe ríncipe Charles Charles da Ingl Inglaterra, e também sua grande grande benfeitora, benfeitora, afirmou afirmou que, apesar de ser um fato lamentável, ficava mais aliviada ao pensar que a sua amiga estava livre do vínculo de uma união matrimonial extremamente infeliz. Há quem a acusasse, como o jornalista britânico Christopher Hitchens, por ela ter aceitado fundos de personagens não muito honestos. Esse jornalista escreveu um artigo corrosivo, com o título provocador “The Missionary Position: Mother Teresa in Theory and Practice” (A posição da missionária: Madre Teresa na teoria e na prática) e um artigo publi ublicado pelo pelo Le Monde Diplomati que, com o título “Mère Teresa, une sainteté médiatique” (Madre Teresa, uma santidade midiática), sustentando que ela gastava o dinhei dinheiro ro doado para cuidar dos pobres em outros projetos. Madre Teresa foi alvo de investigações jornalísticas, como aquela do jornal inglês The Guardian, em 1996, e do semanário alemão Stern, que em 1998 publicou um artigo muito crítico, com o título “Madre Teresa, onde estão os teus milhões?”. Também o semanário norte-americano Time falou longamente de Madre Teresa, colocando-a na capa da revista com o título “Santos vivos: mensageiros de amor e paz”. Personagem midiático e célebre, a missionária por antonomásia se tornou, logicamente, alvo das críticas daqueles que se nutrem de má-fé. Graças à sua notoriedade, a beneficênci eneficênciaa destinada destinada às Missi Missionári onárias as da Caridade Caridade cresceu sempre, por isso foi fácil fácil lançar lama sobre Madre Teresa, como já tinha acontecido também a padre Pio de Pietrelcina, que, tendo fundado o hospital “Casa alívio do sofrimento”, de San Giovanni Rotondo (Itália), se viu administrando um imponente capital econômico. Também quando São Vicente de Paulo foi chamado, em 1643, para fazer parte do Conselho da Consciência, ou Congregação dos Negócios Eclesiásticos da regente da França, Ana da Áustria, e, em seguida, nomeado Ministro da Caridade, para organizar em escala nacional a ajuda aos pobres, se disse que por suas mãos passava mais dinheiro do que pelas mãos do Ministro das Finanças. Madre Teresa seguiu sempre adiante e, olhando para o alto, nunca errou o caminho. Um dia, uma das tantas mulheres moribundas que ela recolhia lhe perguntou por que a servia, a lavava, a abraçava e a amava, e ela respondeu: “Porque te quero bem, por que Deus te ama”, e a mulher replicou: “Diga isso mais uma vez, porque é a primeira vez na vida que ouço essas palavras”, e morreu com um sorriso nos lábios e a paz no coração. Um dia Madre Teresa confidenci confidenciará ará ao padre Lush: 93
Escuta, quando paro e penso como sou feliz, hoje e todos os dias, porque tenho a possibilidade de ajudar Cristo que sente sede, fome, sofre de lepra, e morre. Em todos esses homens eu vejo Jesus, sirvo Jesus, amo Jesus. Por isso, sou afortunada. Por isso, como podes ver, todos esses homens são um grandíssimo dom de Deus. Talvez isso possa parecer absurdo para muitos homens, mas para nós que cremos, para mim, é assim.
Os bispos de muitos países do mundo, quando tomavam conhecimento da realidade criada por Madre Teresa, mandavam chamar as Missionárias da Caridade para abrir casas em suas dioceses. Também o Papa Paulo VI, em 1968, convidou Madre Teresa, e mandou-lhe uma passagem aérea Calcutá-Roma. Mas ela tinha dúvida: encontraria pobres na capital capital da Itáli Itália? “Santidade, “Santidade, estou disposta disposta a abrir abrir uma casa também em Roma, mas somente se aí houver pobres”. Então, por indicação do Pontífice, foi visitar a periferi eriferiaa da cidade cidade e se deu conta de que também na Cidade Cidade Eterna havia havia focos de grande miséria: “Santidade”, disse ela, “parece que Deus reservou um pouco do trabalho por toda parte para nós, em qualquer bairro, bairro, em qualquer qualquer cidade...”. Casas, escolas, hospitais, centros. Madre Teresa não foi a solução para os problemas infinitos da indigência humana, mas foi um alívio, e ainda o é, com as obras que deixou ao serviço de tantos infelizes. Ela dizia: “Sei que nós somos uma gota no oceano da miséria e do sofrimento humano, mas, se não houvesse nem mesmo essa gota, a miséria e o sofrimento humano seriam ainda maiores”. Roma, Ostia (1973), Palermo (1974), Nápoles (1975), Ragusa (1979), Régio Calábria (1979), Turim. “Maria Porta de Esperança”, a casa das Missionárias da Caridade de Madre Teresa, em Turim, foi inaugurada na via Luigi Chiala, 14, no dia 2 de fevereiro de 2007. O arcebispo da cidade, o cardeal Severino Poletto, tinha pedido a presença das Irmãs de Madre Teresa em 2006, e elas chegaram no dia 7 de maio do ano seguinte. Já os seus predecessores, os cardeais Ballestrero e Saldarini tinham pedido a presença delas, mas sem sucesso. “Turim já tem muitas realidades caritativas e assistenciais, não precisa de nós”, lhe tinha respondido respondido Madre Teresa. Perguntamos a uma missionária da Caridade, Madre Elena, como a cidade de Turim acolheu as cinco filhas de Madre Teresa – duas italianas, duas indianas e uma romena: “A acolhida foi extraordinária. O arcebispo demonstrou por nós as atenções de um pai e as pessoas nos apoiaram muito. Nem sempre é assim; aqui em Turim, entretanto, a colaboração e a familiaridade são maravilhosas”. Essas anunciadoras do amor de Deus, e não assistentes sociais, presentes na Itália com aproximadamente vinte casas, não esperam até serem convidadas; a missão delas, como queria Madre Teresa, é ir de porta em porta, de família em família, como continua a nos explicar a própria missionária: A nossa tarefa é procurar a pobreza, material e espiritual, e levamos Jesus, o amor de Deus, a proteção de Maria Santíssima em meio aos nossos doentes, aos nossos infelizes. As pessoas vêm nos pedir ajuda, e somos nós, nos bairros aonde nosso Senhor nos manda, que vamos diretamente às casas das famílias.
As filhas de Madre Teresa rezam sempre com os pobres e, quando estes não creem, as irmãs pedem a permissão para rezar na presença deles, e “são poucos aqueles que não aceitam tal proposta”. A caridade e o apoio das Irmãs de Madre Teresa em Turim são endereçados às 94
mulheres sem residência fixa, que perderam suas casas por causa da dependência de drogas, despejos, problemas psiquiátricos, e também pelo aumento da presença de mulheres idosas que, mesmo tendo uma casa, não têm uma renda suficiente para viver. O acolhimento se estende também aos filhos dessas mulheres. Uma atenção particular é dedicada às cuidadoras: é normal, de fato, que muitas delas, quando perdem o trabalho por causa do falecimento falecimento da pessoa de quem cuidavam, cuidavam, se encontrem temporariamente temporariamente na rua, sem casa. A partir dos hospitais, frequentemente chegam aos centros de assistência social notícias urgentes: devem dar alta a mulheres, depois de um parto ou de uma cirurgia, sem contar com a disponibilidade de uma casa, então entram em ação as Missionárias da Caridade. Além do mais, um número cada vez maior de mulheres não aceitam ser recolhidas nos abrigos mistos, e desejam ter a sua privacidade, por isso “Maria Porta da Esperança” é para elas um refúgi refúgio confortável. confortável. Madre Teresa obedeceu, no momento da mudança da sua existência, à ordem: “Tu deves sair para servir os pobres!”, e assim continuam a fazer suas filhas espalhadas pelo mundo, reconhecíveis por todos por suas cândidas vestes com bordas azuis e por suas sandálias franciscanas. Madre Teresa tinha uma “receita” para combater a pobreza? Além de se mobilizar e mobilizar as suas irmãs, ela lançava apelos aos outros, aos poderosos da terra, para socorrer os últimos da terra? Padre Lush responde: “Ela se manifestava, sobretudo, com a vida, com o amor em ação em cada canto da terra, com o serviço a favor dos mais pobres, dos leprosos, daqueles que foram abandonados por todos”. Madre Teresa dizia: “O corpo humano pode estar deformado, destruído pela dor, pela doença, pela velhice, pela lepra [...] mas nunca pode perder a imagem de Deus, não pode deixar de se reconhecer o Cristo sofredor neles”. No Nirmal Hriday, como testemunham hoje as Missionárias da Caridade, os doentes, inclusive aqueles que estão em estado terminal, são acompanhados na passagem terrena não com um protocolo médico, como aconteceu em Udine, em fevereiro de 2009, abrindo oficialmente as portas para a eutanásia na Itália, sob os olhos de todo o mundo, mas sim com a assistência espiritual, o amor, a proteção. E ninguém parte deprimido, desesperado, alienado.
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COMO OS ESTIGMAS DE JESUS
As crianças e os leprosos sempre estiveram no coração de Madre Teresa. Para as crianças, ela fundou, em 1955, a “Casa da criança abandonada”, que hoje conta com mais de cinquenta filiais na Índia e no mundo, com cerca de 30.000 crianças abandonadas e órfãs. Para os leprosos, uma população de quatro milhões de indivíduos, fundou hospitais e mais hospitais: hoje as Missionárias da Caridade possuem mais de oitenta centros sanitários especializados na Índia. Há um cartaz pendurado na parede do Shishu Bhavan, a Casa da criança de Calcutá, no qual se lê: As pessoas são irracionais, ilógicas e egoístas, mesmo assim ama-as. Se fizeres o bem, te acusarão de fazê-lo por egoísmo, mesmo assim faze o bem. Se tiveres tiveres suc esso, encontrarás verdadei verdadeiros ros e fal f alsos sos amigos, amigos, mesmo assim tem sucesso. suc esso. O bem que fazes é logo esquecido, mesmo assim faze o bem. A honestidade e a franqueza fazem que te tornes vulneráveis, mesmo assim sê honesto e franco. O que construíste em anos, pode desaparecer desaparecer em um momento, mesmo assim constrói c onstrói..
A lepra – do grego leprós, escabroso – a doença de Hansen, é uma doença infecciosa causada pela bactéria Mycobacterium leprae, que atinge a pele e os nervos periféricos de várias maneiras e graus, chegando a ser muito invasiva. Outrora era considerada uma doença infamante, uma maldição de Deus, incurável. Na Idade Moderna se revelou muito menos temível e mais curável do que se pensava no passado. As expressões “doença de Hansen” ou “hanseníase” são hoje preferidas para evitar a conotação infame que a palavra “lepra” traz consigo no senso comum. Conforme as estimativas da Organização Mundial da Saúde, nos anos de 1980, havia cerca de 12 milhões de leprosos e, na década de 1990, teriam diminuído para 2,5 milhões aproximadamente. No ano 2000, foram identificadas 91 nações como áreas endêmicas, sendo as mais atingidas a Índia, a África Subsaariana e a América do Sul. Ao longo dos séculos, aqueles que eram atingidos por essa doença eram sempre rejeitados pela sociedade: as próprias famílias abandonavam os doentes a si mesmos, ou então, como testemunhou a própria Madre Teresa, uma vez curados, eram assassinados pelos elos famili familiares, porque estavam contaminados contaminados pela doença imunda e horripi horripillante. Medo e ignorância dominam essa mentalidade retrógrada, que marca o paciente com a infâmia. Por isso mesmo Madre Teresa abriu estruturas sanitárias específicas. A obra para os leprosos começou em 1957, apesar de Madre Teresa ter se ocupado deles desde o início do segundo chamado. Quando a Madre soube que cinco operários tinham sido afastados do trabalho porque tinham contraído lepra, decidiu montar clínicas móveis, que se deslocavam para chegar 96
até os doentes. Inicialmente a ação das Missionárias da Caridade a favor dos leprosos foi mal vista pelos próprios doentes: tinham medo dos médicos e do isolamento que poderiam oderiam sofrer. A ideia deia brilh brilhante ante das unidades unidades móveis, móveis, que circulav circulavam am por Bengala, Bengala, serviu tanto para ir à procura de leprosos, para tratá-los, como para mostrar a boa-fé dos médicos de Madre Teresa. Os pacientes eram acolhidos com amorosidade, cuidados adequadamente e educados para o comportamento que deveriam ter depois da cura. A certo ponto, as unidades móveis não foram mais suficientes, pois já se conhecia o modo de operar das Missionárias da Caridade, por isso a confiança crescia e, portanto, também a demanda de assistência. Então Madre Teresa, com suas filhas, decidiu fundar vilas somente para os leprosos, nas quais podiam viver, trabalhar e formar uma família. Mas também uma verdadeira cidade, a Shanti Nagar, A Cidade da Paz, que foi construída sob a direção da religiosa croata irmã Francesca Saveria Orees. Tudo começou com a decisão das autoridades de Asansol de queimar os bairros dos leprosos, se estes não se afastassem e se transferissem para outro lugar. O bairro ficava a cerca de cem metros da casa das Missionárias da Caridade, aberta em julho de 1961, por isso os leprosos foram pedir ajuda às missionárias. Foi assim que Madre Teresa pediu às autoridades um terreno para alojar os doentes. Obteve esse terreno em 1963, a 34 quilômetros de Asansol, no qual surgiria a Cidade da Paz, a cidade desejada pelo Senhor, como ela dizia. Irmã Francesca Saveria escreverá: Em 1964 me mandaram para construir Shanti Nagar, para cercar o terreno, abrir ruas, tudo isso também com a ajuda do senhor Johna Paiteko, um polonês dos Estados Unidos, membro do movimento pela paz. Trabalhamos juntos. Toda quarta-feira, depois de terminar o meu trabalho na clínica para os leprosos em Howrahu, How rahu, eu pegava o trem para Asansol, e todas as quintas-feiras eu ficava lá para trabalhar na construção da Cidade da Paz. Na sexta-feira de manhã, eu tinha de voltar para Calcutá para trabalhar no ambulatório de Kidderpuru, em Calcutá. E foi assim por seis meses [...]. O nosso grande amigo e benfeitor Sivaramkrishna fez o projeto urbanístico. Quando pedimos o terreno, Madre Teresa tinha pedido também uma ajuda financeira. A primeira ajuda foi de 5.000 rúpias, doação da senhora Naundu. Depois começou a chegar muita ajuda da Índia e também do exterior.[1]
P or uma série série de circunstânci circunstâncias, as, os trabalhos foram suspensos e retomados alguns alguns anos depois. Em 1968, a cidade foi benta e, em agosto, chegaram os primeiros leprosos. As irmãs cuidavam, trabalhavam, viviam com os leprosos nessa cidade de quatrocentas casas, com um hospital, uma escola e várias oficinas. Paulo VI, que em 1971 entregará a Madre Teresa o prêmio da Paz “Papa João XXIII”, foi visitar as obras dela. Ele tinha escolhido a Índia para apresentar ao mundo a Igreja missionária e colocar em primeiro plano lano a questão da pobreza, aquela aquela que matava m atava e mata ma ta de fome. O Papa partiu de Roma às 4h44 de uma quarta-feira, 2 de dezembro de 1964, em um Boeing da Air India. A bordo havia um bom número de jornalistas, como em todas as suas viagens, que Paulo VI chamava “peregrinações”. Chegou a Bombaim (hoje Mumbai) por volta das 17h30, hora local. O efeito daquela viagem se viu nos jornais, que denunciaram a fome na Índia, e, no entanto, aquele tipo de pobreza não foi mostrada ao Papa; muitos mendigos, de fato, tinham sido retirados das ruas de Bombaim, e Paulo VI se lamentou com os seus: “Não é essa a pobreza que 97
eu queria ver”. O Papa se encontrou com Madre Teresa, que o acompanhou à cidade dos leprosos. Em toda a Índia, havia entre cinco e seis milhões de católicos. Um rio de pessoas veio prestar homenagem homenagem ao P apa, foi um verdadeiro verdadeiro triunfo, triunfo, em um país no qual os cristãos cristãos eram uma minoria. Paulo VI orou no idioma local, e esse seu gesto foi muito apreciado. A viagem terminou com a Via Crucis em uma grande praça de Bombaim, diante do silêncio de seiscentas mil pessoas. Antes de deixar a Índia, Paulo VI expressou o desejo de que Madre Teresa abrisse em Roma uma casa das Missionárias da Caridade, e lhe doou o automóvel pontifício, o Lincoln branco, “para ajudá-la”, como disse o Papa, “na missão universal do amor”. O carro foi vendido e o dinheiro obtido com a venda foi destinado aos pobres. A Cidade da Paz foi inaugurada no dia de São José de 1974, na presença do arcebispo de Calcutá, Monsenhor Macachi, e do governador de Bengala, Antonio Dias, o qual, em nome do governo, doou 5 mil rúpias. Madre Teresa fez com que todos se mexessem, mobilizou sentimentos e mãos, fez com que o mundo compreendesse que se pode ajudar os outros, mesmo aqueles que se encontram nas piores e mais repugnantes condições. Uma vez, um jornalista lhe perguntou erguntou como ela consegui conseguiaa limpar, desinfetar desinfetar e medicar medicar as feridas feridas mais repugnantes repugnantes dos leprosos, afirmando que ele não faria isso por dinheiro nenhum. Ela lhe respondeu: “Também eu não o faria por dinheiro nenhum!”. “Então por que o faz?”, insistiu o ornalista. “Faço isso, ao contrário, de muito boa vontade, por Jesus. Quando toco em um leproso, toco em Jesus. Como se pode então não fazê-lo e não ficar contente?!”, respondeu Madre Teresa. Um dia o cardeal Angelo Comastri contou: A primeira vez que encontrei Madre Teresa, fiquei impressionado pelo seu olhar: ela me olhou com dois olhos límpidos e penetrantes. Depois me perguntou: “Quantas horas ao dia o senhor reza? Fiquei surpreso por tal pergunta e tentei me defender, defender, respondendo: “Madre, da senhora eu esperava um chamado à carida car idade, de, um convite para amar os mais pobres. Por que agora me pergunta quantas horas eu rezo?”. Madre Teresa tomou a minha mão entre as suas, como para me transmitir o que ela tinha no coração, e depois me confidenciou: “Meu filho, sem Deus somos pobres demais para poder ajudar os pobres! Lembre-se: eu sou somente uma pobre mulher mulher que reza. Quando rezo, Deus coloca o seu Amor no meu coração, cor ação, e assim posso poss o ajudar ajudar os pobres. Rezando!”. Rezando!”. Nunca mais esqueci esquec i aquele encontro encontr o e essas ess as suas palavras: palavras: o segredo de Madre Teresa está todo aqui.[2]
As Missionárias começaram a andar pelas ruas com um latão de leite vazio no qual estava escrito: “Toque um leproso com sua bondade!”. Os latões se encheram de doações. A presença de Madre Teresa e de suas filhas era como uma libertação para a consciência de cada um. Os anjos de branco e azul cuidavam de seus concidadãos, dos seus parentes, dos seus amigos, que haviam se tornado repulsivos. Madre Teresa não sorria para os jornalistas, mas sim para as suas crianças, para seus doentes e seus leprosos, ainda que o esforço fosse tanto e as jornadas trabalhosas, cheias de problemas para resolver. Mas isso, ela sabia muito bem, é o verdadeiro amor a Deus: “Não se pode amar a Deus comodamente, porque todo amor autêntico nos faz sofrer. ão se pode amar a Deus se não a nosso próprio custo”. 98
Madre Teresa nunca tinha descanso, estava sempre em viagem pela Índia e no avião para ati a ting ngiir todos os pontos da terra. Foi ela ela que abriu o primeiro primeiro centro para os doentes de HIV (síndrome de imunodeficiência adquirida) em Gravich Viagen, nos Estados Unidos, na véspera do Natal de 1985. Essa pequena mulher de ideias colossais desenhou o mapa da caridade. Quando os habitantes de Chernobyl foram gravemente atingidos pela ela radioati radioativi vidade dade orig originada pela pela central nuclear, nuclear, em 26 de abril abril de 1986, Madre Teresa fez com que sentissem a sua presença. Salvou muitos meninos que ficaram órfãos por causa da guerra de Beirute e foi para Pequim, para estar junto aos portadores de deficiências; mas também esteve em Cuba, na Etiópia, em Escópia, para “oferecer à nossa gente aquela gratidão, aquele amor que eu recebi aqui”, e para “oferecer minhas irmãs à minha cidade”. Madre Teresa fundou, em 1963, os Irmãos Missionários da Caridade; em 1976, o ramo contemplativo das irmãs; em 1979, os Irmãos contemplativos, e em 1984 os Padres Missionários da Caridade. Todavia, a sua inspiração não se limitou somente às vocações religiosas. Formou os Colaboradores e os Colaboradores Doentes e Sofredores, pessoas de diversas diversas confissões confissões relig religiiosas, de diferentes diferentes credos e nacional nacionaliidades, com os quais compartilhou o espírito de sacrifício. Tal espírito levou depois à fundação dos Missionários da Caridade Leigos. Em resposta ao pedido de muitos sacerdotes, em 1991, Madre Teresa criou também o Movimento Corpus Christi para sacerdotes, oferecendo a pequena via de Santa Teresinha para empreender o caminho na direção da santidade. santidade. Madre Teresa explicava: Nós somos como os cinco estigmas de Cristo: na mão direita, as Irmãs contemplativas; na mão esquerda, es querda, os Irmãos contemplativos; no pé direito, as Missionárias da Caridade; no pé esquerdo, os Missionários da Caridade; no flanco direito, os nossos colaboradores. Vocês não creem que podemos nos refugiar nas suas chagas? Os c ontemplativos ontemplativos são “as mãos”, mãos ”, porque se unem em oração; os missionários da caridade ativos são os pés, porque com estes eles vão por todo o mundo; os colaboradores são o “coração”, porque o coração de todo o mundo é a casa, a família, onde eles verdadeiramente moram. Todos nós podemos encontrar conforto em seu coração.
O “amor em ação”, como ela o definia, abraçava já os cinco continentes e cada componente do projeto era expressão do amor a Jesus crucificado.
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O “ALTER EGO”
No início, início, as Missi Missionári onárias as da Caridade Caridade tinham tinham elas elas mesmas que pedir à caridade alheia alheia para poder comer. O trabalho trabalho nas favelas era terrível: terrível: mau cheiro, cheiro, calor, calor, umidade, umidade, sujeira, doenças infecciosas. “Devemos pagar o preço das almas”, dizia Madre Teresa às suas irmãs, cuja formação espiritual e intelectual ela não negligenciava. Sofrer e padecer para “completar “completar os sofrimentos sofrimentos de Cristo”, Cristo”, como dizi diziaa São P aulo, aulo, e assim assim salvar salvar as almas na missão redentora que caracteriza a vida dos místicos. Madre Teresa, na explicação das Constituições da Congregação, explica: “A missionária deve morrer a cada dia, se quiser conduzir almas a Deus. Deve estar pronta para pagar o preço que Ele pagou agou pelas pelas almas, almas, caminhar caminhar pelo pelo caminho que ele ele percorr eu eu em busca das almas”. Em suma, pelo sofrimento, o Instituto deveria conquistar e salvar almas, “e quanto mais sacrifícios houver na Congregação, atingiremos o quanto antes o objetivo de saciar a sua sede. A nossa obra pelas almas é grande, mas sem penitência e muito sacrifício ela será impossível”; somente a dor traria frutos: “Devemos fazer muita penitência, até mais do que as Carmelitas, por causa da nossa proximidade com o pecado”. [1] O sofrimento, unido ao sacrifício de Cristo, não conduziria à tristeza, mas sim à alegria, tanta alegria a ponto de difundir em torno de si, com a firme vontade de alcançar a santidade, certamente não para se vangloriar, mas para viver em Deus, com o constante apoio e a constante ajuda da Virgem Maria: “Quero me tornar uma serva de Nosso Senhor, beber somente do seu cálice de dor e dar à Mãe Igreja verdadeiros santos. Sei que o que quero está acima das minhas forças, mas Ele, que me deu esse desejo, me dará também a força de realizar o impossível”. [2] Muitas vezes, nos escritos de Madre Teresa, se nota a sua vontade de se tornar santa, saciando desse modo a sede de Cristo de amor e de almas. Desejava matar a sua sede entregando também “à Igreja muitas santas da nossa Congregação”, como escreveu ao arcebispo Périer, de Calcutá, em 4 de abril de 1952. Riquíssima de ideias e de iniciativas, Madre Teresa instituiu, como forma de apostolado na Congregação, o alter ego. A ideia surgiu com a enfermeira e assistente social belga Jacqueline de Decker, que, por motivos de saúde, não pôde entrar para as Missionárias da Caridade, como era seu desejo. Madre Teresa, por isso, transferiu aquela vocação para o seu alter ego. Ela seria a gêmea espiritual de Madre Teresa, oferecendo a Deus orações e sofrimentos pela fundadora das Missionárias da Caridade e pela fecundidade das suas obras, enquanto, por sua vez, Madre Teresa doaria ao Senhor orações e serviços por Jacqueline. Jacqueline foi a primeira de uma longa série de colaboradores apostólicos, doentes e sofredores, que não podiam agir concretamente com as Missionárias, mas poderiam 100
particip articipar ar espiri espiritual tualmente mente em dar de beber a Jesus. Desse modo, Madre Teresa deu uma explicação concreta à dor e uma razão de vida a tantas pessoas: “O sofrimento em si mesmo não é nada, mas o sofrimento compartilhado com a Paixão de Cristo é um dom maravilhoso”. [3] Cada irmã chegou a ter seu próprio alter ego: os colaboradores doentes e sofredores eram considerados filhos da Congregação. Assim, em Calcutá, na Inglaterra, em Bruxelas, Antuérpia, Suíça, havia mulheres, homens, crianças, unidos às irmãs na missão redentora e de ampliação das obras. Madre Teresa, além da senhorita De Decker, teve outro alter ego, Nicholas Gomes, e depois mais outros, como escreveu ao arcebispo de Calcutá, em 23 de outubro de 1953: No momento, há dezoito na lista. lista. Por favor, o senhor daria a s ua bênção para essa ess a obra? São as orações e os sofrimentos deles que abençoam o nosso apostolado. Eles ficam tão felizes ao saber que têm alguém por quem sofrer, que podem ser Missionários da Caridade, mesmo sendo cegos, mancos, tuberculosos, com alguma deficiência ou doentes de câncer. Frequentemente, quando acho o meu trabalho muito difícil, ofereço os sofrimentos desses meus filhos e constato que a ajuda chega imediatamente. Creio que muitos dos nossos doentes e aqueles que sofrem seriam santificados muito mais rapidamente se sofressem para saciar a sede de Jesus.
Oração e sacrifício juntos eram o alimento necessário para que as Missionárias realizassem melhor a vontade de Deus e, portanto, a realização das obras. Os jornalistas se aproximaram dela desde o começo da década de 1950 e Madre Teresa tomou conhecimento disso com grande desgosto e temor. Tais sentimentos de receio foram comunicados também a seu arcebispo, em 17 de abril de 1953: “Temo termos publi ublicidade cidade demais. Alg Algumas coisas que ouvi esta noite noite me deix deixaram temerosa. teme rosa. Deus nos livre disso. Por favor, ore por mim, para que eu possa ser nada para o mundo e o mundo nada para mim”. Esse temor, mais os perigos aos quais Madre Teresa e suas irmãs estavam expostas, como aconteceu durante a fundação do Nirmal Hriday, em Kalighat, onde a aceitação das missionárias católicas foi uma conquista cotidiana, suada e sofrida, serviram para manter fixo o objetivo, sem se deixar distrair ou desviar pelos sucessos que se acumulavam cada vez mais. Madre Teresa sabia que era a Providência que queria tudo isso e ela era somente o instrumento para conduzir as almas a Deus e Deus às almas. Além dos perigos contingentes, havia também o tormento espiritual para impedir os possíveis ossíveis danos pessoais pessoais causados pelo pelo vasto sucesso. Era “como se tudo estivesse estivesse morto. Foi mais ou menos assim desde o momento em que comecei a obra”, escreveu Madre Teresa, em 18 de março de 1953, ao arcebispo de Calcutá. Uma escuridão que não transparece e que ninguém percebe. Ela dizia: “Quero também sorrir a Jesus, e assim esconder, se for possível, a dor e a escuridão da minha alma até mesmo dele”. [4] Não era uma maquiagem hipócrita, seu sorriso era simplesmente o sorriso de quem ama, assim como acontece com as mães, quando, ainda que com o coração partido por certas dores, conseguem sorrir com os olhos e com os lábios aos seus filhos, indo além dos próprios róprios sofrimentos. Era tão imenso o amor de Madre Teresa por Cristo que, afirmava ela, estaria disposta a 101
suportar os sofrimentos espirituais também por toda a eternidade, se esses sofrimentos servissem para o bem mesmo o de uma única alma. A escuridão na qual sua alma caiu, a partir artir de 1949, 1950, foi o meio meio privi privillegiado egiado com o qual a esposa fiel fiel penetra o mistéri mistérioo da Cruz e se torna parte ativa no plano de redenção das almas.O sofrimento, a fundadora explicava sempre, deve ser um ponto de apoio na vocação de uma Missionária da Caridade. Por cinquenta anos ela experimentaria a ausência de Deus e o desejo imenso e não satisfeito dele. No segundo chamado, para tomar a pobreza em seus ombros, a fim de matar a sede do Salvador, Jesus lhe tinha anunciado os graves sofrimentos que a sua “pequena” experimentaria, e ela, inclinando-se, aceitaria todos, aliás, os acolherá e os abraçará em uma espécie de imolação. A fama internacional de Madre Teresa cresceu enormemente depois de uma bemsucedida reportagem dedicada a ela e às suas obras, feita pela BBC em 1969. A reportagem se intitulava “Algo bonito por Deus”, e foi realizada pelo jornalista Malcolm Muggeridge. Além do prestigiadíssimo Prêmio Nobel da Paz, Madre Teresa recebeu muitos outros prêmios, rêmios, reconhecimentos reconhecimentos internacionai nternacionais, s, [5] e títulos honoris causa, como aquele em Direito da Universidade de São Francisco Saverio, de Antigonish, no Canadá, ou em Medicina e Cirurgia da Universidade Católica do Sagrado Coração de Roma (1981). Quando completou setenta e cinco anos, em 1985, foi oficialmente convidada pela ONU e apresentada como “a mulher mais forte do mundo às Nações Unidas, porque Madre Teresa une todo o mundo no amor”; nessa ocasião, foi projetado um documentário sobre sua vida. Em 1997, muitos países a indicaram como a personalidade do século XX. Em 9 de unho de 1997, recebeu a medalha de ouro do Congresso Norte-Americano, e o deputado Jackson Junior declarou: O Congresso norte-americano avalia que Madre Teresa teve uma influência determinante em todo setor da vida e em todos os cantos do mundo […]. Madre Teresa, conforme a avaliação do Congresso norteamericano, é o instrumento da vontade de Deus. O amor de Deus que nos é transmitido por Madre Teresa influenciou e mudou de maneira incancelável a história da humanidade. Madre Teresa, por meio de seu exemplo pessoal, guia e indica às pessoas como podem viver no amor pela humanidade.
No curso dos anos de 1980, nasceu a amizade entre João P aulo aulo II e Madre Teresa. O Sumo Pontífice era tão ligado a Madre Teresa que parecia, como nos disse Padre Lush, um “dueto de Deus pelas estradas do mundo”. Com o apoio do Papa Wojtila, Madre Teresa abriu três casas para os pobres em Roma, entre as quais um refeitório na Cidade do Vaticano, dedicado a Santa Marta, padroeira da hospitalidade, e uma casa de acolhimento chamada “Dom de Maria”.
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APAGOU-SE NO ESCURO
Nos últi últimos mos vinte vinte anos de sua exi existência, stência, Madre Teresa viajou viajou muitíssi muitíssimo, mo, para todos os cantos da terra, mesmo em regiões atingidas por guerras, como o Líbano, para onde viajou, em agosto de 1982, para socorrer as crianças com deficiências físicas e mentais. No Doming Domingoo de Ramos de 1987, um sacerdote, confessor do novici noviciado ado das Missionárias da Caridade de Roma, se encontrava na pequena capela das irmãs. Enquanto fazia suas orações matinais, em silêncio, com o Livro das Horas, um pensamento o invadiu nvadiu de surpresa: “Dig “Diga a Madre Teresa: Tenho sede”. O sacerdote então decidiu contar o fato a Madre Teresa em uma carta. Quando encontrou Madre Teresa, a missionária lhe perguntou: “O que mais ele lhe disse?”. Era a “Voz”, que voltava a se fazer ouvir, depois de muitos anos, mas não diretamente, e sim por meio de um mensageiro. Jesus ainda precisava dela, da luz proveniente da sua escuridão, e em 1989, apesar dos graves problemas cardíacos, Madre Teresa não se poupou, pelo contrário, com a queda do muro de Berlim, abriu casas na Rússia, Tchecoslováquia, Hungria, Albânia: “Sinto que Jesus e Maria me querem aqui, nesse momento em que se abrem as igrejas na Albânia, onde o amor de Deus tinha sido recusado por tantos anos e as pessoas, espiritualmente, estavam morrendo de fome”. Todo mês chegava até as irmãs missionárias e os colaboradores com suas cartas gerais mensais, um instrumento com o qual Madre Teresa conseguia alcançar a todos, visto que fisicamente já não era mais possível, por causa da sua saúde precária e das inúmeras casas espalhadas pelo mundo. Em 1983, cansada e esgotada, caiu da cama, machucando-se, por isso foi internada em um hospital; aquela que jamais se preocupava com as próprias condições de saúde, mas somente com a saúde dos outros, foi diagn diagnosti osticada cada com uma disfunção cardíaca. Em 1989, recebeu um marca-passo. Quando, em 1990, apresentou, pela primeira vez e sem consequências, a demissão como Superiora Geral, comentou com a lucidez que lhe era própria: “Pedi demissão como superiora geral, mas não como Madre Teresa. Não estou aposentada. Os pobres jamais se aposentam, portanto, nem o amor pode se aposentar”. No dia dia 2 de janeiro janeiro de 1991, escreveu uma carta tocante aos presidentes presidentes Bush e Saddam Hussein, para que evitassem a guerra no Iraque. No mesmo ano, teve uma pneumonia, neumonia, e em 1992, teve novos problemas problemas cardíacos. car díacos. Decidi Decidiuu então pedir pedir novamente demissão do posto de Superiora Geral da ordem, mas, depois de uma eleição, foi reeleita praticamente raticamente por unanimidade, unanimidade, com algumas algumas abstenções. Aceitou ceitou o resultado resultado e permaneceu na direção direção da Congregação. Congregação. Em abril abril de 1996, caiu e quebrou a clavícul clavícula. a. Em março, encontrou João Paulo II pela última vez antes de voltar para Calcutá. Em 13 103
de março de 1997, abandonou definitivamente o comando das Missionárias da Caridade, deixando o cargo para Nirmala Joshi. [1] Ela teria dito então: “Quando, por causa dos anos, não puderes correr, caminha rápido. Quando não puderes mais caminhar rápido, caminha. Quando não puderes mais caminhar, caminhar, usa a beng bengal ala. a. Mas não pares nunca!”. Depois de ter viajado por todo o verão entre Roma, Nova York e Washington, em condições de saúde precária, Madre Teresa voltou para Calcutá em agosto de 1997. Em 5 de setembro, depois das oito da noite, sentiu uma dor lancinante nas costas e pouco depois teve uma crise respiratória. Foram chamados um sacerdote e um médico. A certa altura, houve um apagão, e a casa das Missionárias da Caridade, assim como toda a cidade de Calcutá, ficou no escuro. Sem eletricidade, o aparelho respiratório não pôde funcionar. Aquela que tinha dado de beber a Jesus e que tinha levado a luz do Senhor pelos elos caminhos do mundo morreu na escuridão. escuridão. “Em 87 anos de vida”, testemunhou a sobrinha Agi, “praticamente nunca cuidou de si, a não ser que fosse obrigada pelos médicos, e ela, obediente, fazia. Nunca se poupou, nem física, nem psicologicamente”. Deixemos Agi Bojaxhiu contar como Madre Teresa se foi: Adormeceu no Senhor, com o rosário nas mãos, a sua arma secreta, que ela definia como “o livro de orações dos simples, o breviário dos pobres, que nos apresenta os grandes Mistérios da Redenção”. Mas, antes de ir para Ele, Ele, se dirigiu dirigiu c om estas palavras palavras a irmã Gertrude: “Estou pronta, Jesus me espera, não tenho medo”. Deixou como herança todo o seu patrimônio espiritual, além de um par de sandálias, dois sáris, uma bolsa de pano, dois ou três cadernos com seus apontamentos, um livro livro de oração, or ação,[2] um rosário e um pulôver de lã. Nada mais.
O seu corpo foi transferido para a Igreja de São Tomé de Calcutá, perto do Convento de Loreto, aonde tinha chegado 69 anos antes. Centenas de milhares de pessoas de todas as camadas sociais e religiões, vindas da Índia e do exterior, lhe prestaram homenagem. Padre Lush explica: A morte da fundadora é sempre uma grande perda para toda comunidade religiosa. Certamente também foi assim para as Missionárias da Caridade. Graças a Deus, Madre Teresa conseguiu infundir o espírito do Evangelho em tantas irmãs e, assim, inspirá-las que até agora não se verificou nenhum declínio. Ao contrário, eu diria que há um crescimento e amadurecimento surpreendente da comunidade. Madre Teresa certamente continua ativa, lá do céu, protegendo, ajudando, inspirando e guiando as suas irmãzinhas.
Isso não é uma esperança: já é uma realidade! De fato, desde o falecimento de sua fundadora, a Ordem cresceu em mais de mil integrantes, passando de 3.850 para 4.800 hoje, e foram instituídas mais de 150 novas casas. Somente dois anos após a morte de Madre Teresa, João Paulo II mandou abrir, pela primeira rimeira vez na históri históriaa da Igreja Igreja abrindo abrindo uma exceção especial, especial, o processo de beatificação, eatificação, que se conclui concluiuu em 2003. A cerimôni cerimôniaa de beatifi beatificação cação foi celebrada em 19 de outubro daquele ano, diante de uma multidão imensa reunida na Praça de São Pedro, no 25º aniversário do pontificado do Papa Wojtila, e também no dia da jornada celebrativa das Missões. Milhões de telespectadores ouviram a homilia do Pontífice, que lembrou a sua amizade com a Mãe dos pobres: 104
Sou particularmente grato a essa mulher corajosa, que sempre senti a meu lado. Ícone do Bom Samaritano, ela ia para toda parte para servir a Cristo nos mais pobres entre os pobres. Nem mesmo os conflitos e as guerras conseguiam detê-la. De vez em quando, ela vinha me falar das suas experiências a serviço dos valores evangélicos. Lembro, por exemplo, as suas intervenções a favor da vida e contra o aborto [...]. Costumava dizer: “Se ouvirem que alguma mulher não quer ter seu filho e deseja abortar, procurem convencê-la a trazer-me essa criança. Eu a amarei, vendo nela o sinal do amor de Deus”.
O governo de Nova Délhi quis homenagear Madre Teresa, cidadã indiana, com funerais de Estado. Os poderosos da Terra se ajoelharam no dia 13 de setembro diante dela, mulher dos fatos. Os soldados montaram guarda para ela na igreja de São Tomé, na qual seu corpo ficou exposto por três dias, e depois levaram nos ombros o féretro e o colocaram sobre o canhão utilizado também nos funerais de Mahatma Gandhi. Com o cerimonial usado para os grandes generais, a acompanharam e a escoltaram até o estádio de Netaji para a missa solene, celebrada pelo então Secretário de Estado do Vaticano, o Cardeal Angelo Sodano. Diante do altar, estavam presentes o primeiro-ministro indiano Gujral, o presidente da República Italiana Oscar Luigi Scalfaro, o presidente albanês Rexhep Mediani e o presidente residente de Gana, Jerry Rawling Rawlings, s, bem como as rainhas rainhas Sofia Sofia da Espanha, Noor da Jordânia, Fabíola da Bélgica, a duquesa de Kent, madame Chirac, Hillary Clinton, Sonia Gandhi, Maria Corazón Aquino: “Se estivesse viva, lady Diana teria sido a principal presença dessa reunião”, reunião”, escreveu o jornal Corriere della Sera (7 de setembro de 1997). As missionárias da Caridade, mais de mil, cantaram hinos sacros em inglês e em hindi. Eram dez horas quando o corpo de Madre Teresa entrou no estádio, precedido de soldados e guardas em uniforme de gala, com os típicos turbantes vermelhos. Uma insistente garoa acompanhou toda a cerimônia fúnebre. Depois se executou o hino indiano. O caixão estava aberto e um diáfano e pequeno rosto emergia do véu branco com bordas azuis e o resto do corpo estava envolvido pela bandeira indiana, enquanto as mãos estavam envolvidas no rosário que sempre a tinha acompanhado. Ao microfone se sucederam o arcebispo de Calcutá, Henry Souza, o cardeal Sodano, a Irmã Nirmala Joshi, sucessora de Madre Teresa, e alguns representantes das religiões presentes na Índia. Trazendo coroas de flores, um grande número de personalidades se aproximou do corpo, que em seguida foi transportado para o lugar onde foi sepultado, na Casa das Missionárias da Caridade. Os soldados a saudaram com salvas de tiros e ao som de trompas. Toda a alma e a civilização indiana estavam presentes naquele dia para homenagear a concidadã. Um artigo profanador sobre o funeral de Madre Teresa foi escrito no Corriere della Sera: Mas o momento mais vivo e interessante foi quando os representantes de outros credos religiosos intervieram para mani m anifestar, festar, comovidos, a própria pr ópria solidariedade solidariedade à defunta. defunt a. Assim, ss im, vimos sucederem-se suc ederem-se ao microfone m icrofone um hindu, um muçulmano, um budista. E foi o mais belo desmentido das acusações de proselitismo contra Madre Teresa por parte de quem sempre pensou que a sua caridade fosse, em parte, motivada por “interesses”: em outras palavras, se cuidava de doentes e moribundos com tanta abnegação era para convertê-los e depois lançá-los à força no “seu” paraíso.[3]
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Não basta, o artig artigo prossegue prossegue em sua divag divagação ação desrespeitosa, desrespeitosa, útil útil, apesar de tudo, para compreender quanto mal pode fazer, insinuando-se nsinuando-se nos pensamentos alhei alheios, os, um ornalismo ornalismo superfici superf icial: al: Mas, no final, se saía do estádio com a sensação de não se ter percebido nenhuma verdadeira, profunda vibração emotiva, e que, no final das contas, Madre Teresa era a mais alheia àquela ostentação e àquele protocolo rotoc olo redundante. O féretro retomou então o caminho para a Mother House, a Casa Mãe, número 54 da North Circ Circular ular Road, sede permanente das Miss Missioná ionárias rias da Caridade. Caridade. Mas começou a chover forte e estenderam sobre o caixão uma folha de celofane [...]. Se as coisas do mundo tivessem um sentido, penso que Madre Teresa deveria ter sido levada ao lugar de sua sepultura em um riquixá puxado por um homemcavalo, como praticamente se usa somente em Calcutá. E atrás do riquixá marcharia todo o desespero da vida que ela tinha em vão tentado derrotar, os estropiados, os leprosos, os tuberculosos e cirróticos, os moribundos de Kalighat, ou simplesmente os mais pobres dos pobres, visto que há um mar infinito deles, apesar dos esforços dela. Em Calcutá, na realidade, nada mudou, e os seus críticos continuaram a atacá-la nesse ponto. Alguém escreveu que a superiora das Missionárias da Caridade “viveu da pobreza e nunca fez nada para combatê-la e removê-la”. Um juízo exageradamente severo e injusto. Há uma frase que recoloca as coisas em seus devidos lugares e soa como um bom viático para a defunta: “Em Calcutá, nem Jesus em pessoa consegui cons eguiria ria fazer alguma coisa”.
Bem diferente desse artigo irreverente e desrespeitoso, que tenta manchar uma das realidades mais belas e construtivas do século XX, é o artigo de uma missionária da Caridade de origem italiana que quis ficar no anonimato. A sua lembrança é tocante e comovente: Quanto calor em torno de Madre Teresa no último adeus! As autoridades indianas lhe ofereceram todas as honras com os seus usos e costumes, e as pessoas se apertaram, em torno de seu corpo, com amor e reconhecimento. Os funerais duraram cinco dias. Muitos dos que conseguiram se aproximar do caixão lançaram flores sobre ele. Chuva de água e chuva de pétalas acompanharam aquelas horas de tristeza. No jardim ardim de São Tomé, uma irmã da Caridade Caridade compôs com flores o retrato maravilhoso maravilhoso da Madre. A organização foi perfeita e a multidão foi orientada da melhor maneira. Não havia somente o exército e as guardas nacionais para controlar tudo e todos, mas centenas e centenas de voluntários. As pessoas pelas ruas abriam alas para o cortejo que passava, e algumas pessoas passavam sob os cordões para tocar o caixão de Madre Teresa. Pelas ruas havia tantas faixas.
Entre tantas, uma dizia: “Madre, tu foste uma fonte de luz neste mundo de trevas”. Perguntamos à irmã como ela decidiu entrar para as Missionárias da Caridade. Foi a simplicidade do viver que me atraiu. A pobreza. Quando vi, em Roma, na casa das Missionárias da Caridade no Célio, atrás do Coliseu, ao lado da igreja de São Gregório, mas também em outras casas, que também as superioras iam para a cozinha limpar o peixe, ou se prestavam a limpar o chão, compreendi que aquela Congregação tinha sido feita pra mim. Aqui aprendi que é possível saciar a sede de Jesus. Pregar mais com o exemplo do que com as palavras, conforme o ensinamento de Madre Teresa, significa fazer com que Deus fale aos corações por meio das obras. Só olhar para ela, só escutá-la nos reconduzia a Deus, e somente Ele, dizia ela, “pode converter os corações”. Foram muitíssimos que receberam o batismo dela e muitíssimos morreram na graça de Deus, serenos e tranquilos. Quando saía e quando voltava, Madre Teresa sempre se dirigia à capela para saudar o Santíssimo Sacramento, o dono da casa.
Como é o dia de uma missionária da caridade? Acordamos todos os dias às 4h30. Começamos o dia com a oração e a meditação, e às 6h00 assistimos à missa, depois começamos a faxina. Às 8h00 se iniciam os diversos serviços, conforme os compromissos que a casa assumiu com os pobres da região. Às 8h30 todas as irmãs saem de casa. Às 12:00 voltam para o
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almoço. Depois vem a Via Crucis e um pouco de repouso por 30 minutos. Depois oramos e adoramos o Santíssimo Sacramento e, em seguida, temos um pouco de leitura espiritual. Às 15h00 saímos novamente (exceto as noviças e as postulantes). Às 19h00 voltamos para casa. Oramos e depois jantamos. Depois do jantar, antar, um pouco de recreação, rec reação, e às 21h00 vamos dormir dor mir..
Madre Teresa começava o dia com Jesus na Eucaristia e saía com o rosário nas mãos para tentar servi-lo. servi-lo. Qual o lugar lugar da oração para as a s Missionári Missionárias as da Caridade? Um lugar privilegiado. Por isso o nosso dia começa muito cedo, para sermos fortes nas ações dos nossos dias, todos eles dedicados a Nosso Senhor Jesus.
Quais Quais são as orações mais frequentes? Onde quer que estejamos, começamos o trabalho com esta oração: “Senhor nosso, tu que sabes curar, ajoelho-me diante de ti, porque todo presente perfeito provém de ti. Peço-te que tornes minhas mãos hábeis, meus pensamentos lúcidos, o meu coração bom e pacífico. Concede-me a capacidade de decidir, a força necessária para aliviar uma parte dos sofrimentos do meu próximo e a compreensão do privilégio que tenho. Afasta do meu coração todo engano e superficialidade, para que eu possa, com a fé simples de uma criança, ter confiança em ti. Amém”.
Depois, durante todo o dia, me acompanha sempre a oração que pronunciamos no final da missa e que foi composta pelo Cardeal Newman: Irradiar Jesus Caro Caro Jesus, Jesus , Ajuda-me a difundir a tua fragrância aonde quer que eu vá. Inunda a minha alma com teu Espírito e a tua Vida. Penetra e possui todo o meu ser, tão completamente que a minha vida não seja senão um reflexo luminoso da tua. Resplandece através de mim, sê tão presente em mim que toda a alma com a qual eu tiver contato experimente a tua presença na minha alma. Que levantem seus olhos e vejam não mais a mim, mas somente Jesus! Fica comigo, e então começarei a resplandecer como tu resplandeces; resplandecer de maneira a ser luz para os outros. A luz, ó Jesus, provirá toda de ti, nada dela será meu. Serás tu a resplandecer sobre os outros através de mim. Faze assim com que eu te louve do modo que mais amas: resplandecendo luz sobre os que estão à minha volta. Faz com que eu te anuncie sem pregar, não com palavras, mas com o exemplo, com uma força que arrasta, com a influência benévola do que faço, com a plenitude tangível do amor que o meu coração traz por ti. Amém.
Como era Madre Teresa com as suas filhas? Madre Teresa era sempre prudente com as aspirantes, as postulantes e as noviças. Era muito exigente, mas, ao mesmo tempo, também muito amável e maternal. Eu tive a sorte não só de conhecê-la, mas também de viver a seu lado. Ficar perto dela significava compreender o amor de Deus em ação.
Como ela conseguia fazer que convivessem em uma mesma comunidade irmãs de etnias diferentes? Seria falso negar os problemas culturais que há na convivência em uma comunidade internacional como a nossa. Mas há um remédio que Madre Teresa nunca cansava de receitar: colocar no centro Jesus. Com Ele,
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todas as divergências são superadas. Além disso, a oração é fundamental: uma comunidade que reza muito funciona muito bem. A vontade de misturar as etnias era uma de suas características. Madre Teresa mostrou a todo o mundo que a unidade é possível sob o estandarte de Cristo. Lembro que, na África do Sul, quando foi aberta uma casa lá, ela disse: “São necessárias duas brancas e duas negras”.
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A SANTA DA ESCURIDÃO
Na coleta de toda a documentação e material necessários necessários ao processo diocesano para a causa de beatificação de Madre Teresa de Calcutá, emergiu todo o sofrimento, a paixão interior por ela vivida desde 1949-1950. Padre Brian Kolodiejchuk, postulador da causa de canonização de Madre Teresa e porta-voz das Missi Missionári onárias as da Caridade, Caridade, um relig religioso de orig origem canadense que vive vive em Tijuana, no México, encontrou cartas pessoais dela no final da causa de beatificação, e depois decidiu publicá-las em um livro intitulado Come be my light, [1] que foi lançado no dia 4 de setembro de 2007, um dia antes do décimo aniversário da morte da beata. Até então ninguém poderia imaginar uma vida espiritual tão sofrida e dolorosa, pois seus diretores espirituais mantinham tudo em segredo. Os jesuítas possuíam algumas cartas, outras foram encontradas na residência do arcebispo de Calcutá, outras estavam em posse do padre Joseph Neuner. A vontade de Madre Teresa tinha sido a de não tornar público todo o seu material biog iográfico, ráfico, porque, como confidenci confidenciou ou ao arcebispo arcebispo de Calc Calc utá, utá, Ferdinand Périer, se as pessoas conhecessem o início nício da obra, então a atenção se concentraria concentraria nela, nela, e não em Cristo. De fato, repetiu até seu último dia que as Missionárias da Caridade eram “obra de Deus”. Também as irmãs mais próximas a ela nunca ficaram sabendo das suas terríveis provas espirituais, apesar de todas terem sempre acreditado que Madre Teresa tinha uma relação especialíssima, íntima e preferencial com Deus, por meio da qual foi capaz de enfrentar uma vida tão complexa e intensa. Um dos seus diretores espirituais, padre Lawrence Trevor Picahy, jesuíta e futuro arcebispo arcebispo de Calcutá, Calcutá, lhe ordenou escrever as suas confissões. A dor de Madre Teresa era imensa, mas seu abandono à vontade de Deus era total e exclusivo, e sempre respeitou muito o voto juvenil de não lhe recusar nada, nunca, como fica claro na confissão de 3 de setembro de 1959: Jesus, estou disposta com todo o meu coração a sofrer tudo o que sofro, não somente agora, mas também por toda a eternidade, eternidade, se isso fosse foss e possível. possí vel. A tua felicidade felicidade é tudo o que quero. Pelo resto, r esto, te peço, nem mesmo te preocupes por mim, ainda que me vejas desmaiar de dor. Tudo isso é a minha vontade. Quero saciar a tua sede com cada gota de sangue que puderes encontrar em mim. Não permitas que eu me defenda de modo algum, tira de mim o poder de te ferir. Trabalharei com o coração e a alma pelas irmãs, para que te pertençam. Cada uma delas delas e todas s ão tuas. Peço-te só uma coisa, não queiras voltar logo. Estou pronta para esperar-te por toda a eternidade. A tua pequena.
O seu confessor, padre Neuner, afirma que a “noite escura” da alma de Madre Teresa 109
foi a sua salvação, pois foi capaz de a proteger, preservar e defender de um perigo temível que poderia ter prejudicado a missão para a qual tinha sido chamada. O perigo estava na crescente popularidade que ela obteve, no sucesso, no consenso das plateias em torno dela, confirmado pelas câmeras de televisão, nos prêmios e reconhecimentos prestig restigiosos que recebeu. Disse Disse o padre: “Todas essas coisas coisas não podiam podiam tocar seu coração, que estava absorvido por um desejo nunca satisfeito de Deus”. [2] Em 25 de outubro de 1960, Madre Teresa, “sozinha com Jesus e por Jesus”, deixou a Índia pela primeira vez desde que tinha chegado a sua nova pátria, em janeiro de 1929. Pegou o avião para Las Vegas, onde a esperavam três mil mulheres. Antes de decidir partir, artir, pediu pediu conselhos; conselhos; a pequena e humil humilíssima íssima missi missionári onáriaa nunca teria teria enfrentado aquela plateia: “diante daqueles milhares de pessoas, eu morrerei de medo e de timidez. [3] Depois dos Estados Unidos, antes de voltar para a sua amada Calcutá e para junto de suas irmãzinhas, feliz por “ver o rosto sorridente delas”, foi para a Inglaterra, Alemanha, Suíça e Itália, e no dia 1º de dezembro escreveu ao arcebispo Périer: “Ir aos Estados Unidos foi o ato de obediência mais difícil que eu tive de doar a Deus”. Tantas e tantas vezes deveria ainda fazer esse tipo de doação. Escreveu ao padre Neuner em 10 de setembro de 1962: “Tive de ir a Manila para receber o prêmio Magsaysay. Foi um grande sacrifício. Por que Ele dá tudo, menos a si mesmo? Eu quero a Ele, não os seus presentes ou as suas criaturas criaturas [...]. [... ]. Que Ele Ele tome tudo, também a si mesmo, se isso aumentar a sua alegria. Em troca peço que torne santas as minhas irmãs”. Foi padre Neuner, em 1961, que lhe fez entender a razão de todo aquele sofrimento: a escuridão, a dúvida e a incerteza de não sentir e perceber Deus ao seu lado representavam, na realidade, a verdadeira parte espiritual de seu trabalho e da sua obra. O jornal La Stampa publicou, em 27 de agosto de 2007, uma entrevista dada ao padre Brian Kolodiejchuk, com o seguinte título: Padre adre Brian: “Ela queri a destruir destrui r as cartas, não pude obedecer”, na qual o religioso respondeu às objeções do jornalista Pablo Trincia a respeito do fato de as cartas terem sido publicadas, apesar de Madre Teresa ter expressamente pedido a destruição delas: Porque as cartas são um documento único e importante. Deliberamos por muito tempo, dentro da Ordem, antes de decidir o que fazer com elas. Depois decidimos torná-las públicas. O mundo está acostumado a conhecer Madre Teresa por meio de sua santidade. Essas cartas contam a sua profundidade, o seu aspecto humano, a sua capacidade de enfrentar situações difíceis. Quantos, depois de terem tido uma experiência semelhante, teriam tido a força de ir em frente assim mesmo e fazer o que ela fez? [...] Publicar essas cartas serve também para indicar aos outros membros da Ordem como gerir os momentos de escuridão ou de crise espiritual, ao longo de uma vida difícil de serviço aos mais pobres. Em uma dessas cartas, Madre Teresa explica isso, dirigindo-se às suas irmãs. O desafio mais difícil não deve ser combatido lá fora, mas dentro de cada um de nós.
Com a revelação do mundo interior de Madre Teresa, muito mais pessoas conseguem hoje compreender melhor e mais profundamente a sua vida e a sua obra. Ela conseguiu realizar tudo graças às alturas às quais sua espiritualidade chegou, experimentando os abismos da ausência de Deus. Ela, com o transcorrer do tempo, compreendeu que a escuridão da alma, motivada pela dolorosíssima e penosíssima sensação de estar 110
separada do Pai, era motivo de alegria, como explica em uma belíssima carta, datada de 9 de março de 1955, escrita aos “colaboradores doentes e sofredores”, isto é, aos seus alter ego e aos de suas irmãs: Minhas Minhas caríssimas c aríssimas irmãs, meus caríss imos irmãos, [...] Quanto devemos agradecer, nós Missionários da Caridade, vocês por poderem sofrer, nós por realizar a obra. Nós completamos uns aos outros aquilo que falta em Cristo.[4] Que bela vocação é a nossa, sermos os portadores do amor de Cristo nas periferias. periferias. A vida vida de sacr s acrifício ifício de vocês é o cálice, ou melh m elhor, or, os votos de vocês são o cálice, e os sofrimentos de vocês junto com o nosso trabalho são o vinho, a hóstia imaculada. Unidos, seguramos o mesmo cálice, e assim, juntos com os anjos adoradores, saciamos a sua ardente sede de almas. Meus caríssimos filhos, amemos Jesus com todo o coração e com toda a alma. Levemos a Ele muitas almas. Continuem a sorrir. Sorriam para Jesus quando sofrerem, porque, para serem autênticos Missionários da Caridade, vocês devem ser vítimas felizes. Como sou feliz por ter tudo. Vocês me pertencem do mesmo modo que me pertence cada irmã aqui, e com frequência, quando o trabalho se torna muito pesado, penso em cada um de vocês, e digo a Deus: “Olha meus filhos que sofrem e, graças ao amor deles, abençoa esta obra”, e funciona imediatamente. Vocês veem? Vocês são o nosso tesouro, a força motriz das Missionárias da Caridade [...]. Rezem por mim, caros alter ego, e continuem a sorrir por Jesus e por mim.
Ela rezava sempre ajoelhada. Quem pôde observá-la lembra que se ajoelhava à maneira indiana, às vezes apoiada na parede da capela, tamanho era seu cansaço. O seu abandono confiante a Deus Pai era absoluto, ela se dava toda a ele, pronta para escutálo. E ensinava: “Rezar não é pedir. Orar é colocar-se nas mãos de Deus, colocar-se à sua disposição e escutar a sua voz no fundo do nosso próprio coração”. Madre Teresa renunciou à sua luz interior em favor daqueles que vivem na escuridão. Ao seu superior, o arcebispo Périer, Madre Teresa tinha de escrever pelo menos uma vez ao mês, para fazer um relato de sua vida espiritual, da comunidade e do apostolado. E graças a essas inúmeras cartas, hoje é possível compreender profundamente a sua santidade, à qual Deus recorreu, para que se tornasse alegria e claridade no mundo escuro do pranto: ela não conseguia encontrar Cristo no templo de seu coração, por causa da constante e profunda noite escura, mas sim nas periferias. Sentia-se anulada e, no entanto, feliz por sentir-se ninguém, também para Deus, e quanto mais ansiava por Jesus, mais sentia a separação dele, em seu projeto bastante “ambicioso” que, volta e meia, repetia a seus diretores espirituais: Quanto a mim, tenho um único desejo: amar a Deus como nunca ele foi amado, com um amor profundo e pessoal. No meu m eu c oração não parece haver nada além além dele, dele, nenhum outro outr o amor que não seja o seu. As ruas, Kalighat, as periferias e as irmãs se tornaram lugares nos quais Ele vive plenamente a sua vida de amor. Por favor, Excelência, reze por mim, para que em mim possa haver, de fato, “apenas Jesus”.[5]
Madre Teresa se dirigia diretamente a Jesus, espontaneamente, sem véus, afirmando que, se a sua separação dele levasse outros para Cristo, e se pelo amor deles e pela proxi roximidade midade deles deles Ele Ele sentisse sentisse aleg alegria ria e agrado, agrado, então “eu estou disponível disponível,, com todo o meu coração, para sofrer tudo isso que sofro, não só agora, mas por toda a eternidade, se possível”. No dia 8 de fevereiro de 1956, Madre Teresa ofereceu ao arcebi ar cebispo spo Péri P érier, er, a quem foi muito ligada espiritualmente, uma descrição detalhada da sua própria experiência 1111 11
espiritual, para a qual ela não encontrava auxílio, nem mesmo na confissão: Excelência, Gostaria de lhe dizer uma coisa, mas não sei como exprimi-la. Anseio, com um dilacerante desejo, ser toda de Deus, ser santa de tal modo que Jesus possa viver plenamente a sua vida em mim. Quanto mais o quero, menos sou querida. Quero amá-lo como Ele nunca foi amado, e, no entanto, há aquela separação, aquele terrível vazio, aquela sensação de ausência de Deus. Há mais de quatro anos não encontro ajuda na direção espiritual do reverendo padre Van Exem. E, no entanto, lhe obedeço cegamente. Com frequência fui ao confessionário na esperança de falar, mas não sai nada [...] Não me lamento, quero somente percorrer toda a vida com Cristo. Não lhe escrevo como se escrevesse a “Sua Excelência”, mas como ao pai da minha alma, porque ao senhor, e do senhor, nunca escondi esc ondi nada [...] [.. .] por favor, Excelência, reze por mim, para que eu possa chegar muito perto de Deus.
O arcebispo respondeu no dia seguinte com uma breve síntese dos ensinamentos de São João da Cruz sobre a “noite escura”, mas sem citá-lo diretamente: Niss issoo que a senhora revela, não há nada que seja desconhecido desc onhecido da vida mís tica. É uma graça que Deus lhe concede, o desejo de ser completamente sua, sem receber nada para si ou das criaturas, de viver por meio dele e nele. Mas esse desejo que provém de Deus não pode ser satisfeito neste mundo, simplesmente porque Ele é infinito e nós somos finitos.
Em 27 de março, Madre Teresa escreveu ao arcebispo: “A única oração que consigo ainda fazer é: ‘Sagrado Coração de Jesus, confio em ti. Saciarei a tua sede de almas’”. Ela sorri para Deus, sorri para os homens, quer se tornar uma apóstola da alegria, mesmo experimentando a paixão na alma, em contínua tensão na direção da santidade. “Reconheço as minhas culpas. Às vezes fui demasiado impulsiva e dura ao corrigir as irmãs. Em algumas ocasiões fui impaciente também com outras pessoas”. [6] Oferece-se a transcorrer a eternidade nesse terrível sofrimento, desde que ela dê um pouco de alegria a Jesus, ao lhe entregar ainda que uma única alma. É perturbador o seu projeto “presunçoso” de amar a Deus como “Ele nunca foi amado antes. Que desejo absurdo!”. [7] Mas é bom que fique claro: Madre Teresa foi completamente perturbadora. Em cinquenta anos de martírio espiritual, somente uma pausa de alegria foi concedida a Madre Teresa, como ela confessou, muito feliz, ao arcebispo de Calcutá em 7 de novembro de 1958, quando morreu Pio XII: O senhor ficará contente em saber que, no dia em que o senhor ministrou a Santa Missa na Catedral pela alma de nosso Santo Padre, rezei para que ele me desse uma prova de que Deus está satisfeito com a Congregação. Imediatamente aquela longa escuridão, aquele doloroso sentimento de perda, de solidão, aquele estranho sofrimento de dez anos se dissolveram. Hoje a minha alma está cheia de amor, de uma alegria indizível, de uma união ininterrupta de amor. Por favor, agradeça a Deus comigo e por mim.
Somente um mês durou o oásis de tranquilidade, para depois voltar à escuridão, para se agarrar firmemente na Virgem Maria. Ao longo do tempo, porém, chegou a amar aquele abismo de escuridão. Depois de onze anos, de fato, veio a amar a prova que Deus lhe tinha imposto, “porque agora acredito que ela é uma parte, uma pequeníssima parte da escuridão e da dor de Jesus sobre a terra”, aprendendo a aceitá-la como “o lado espiritual de sua obra”. Compreendeu que o Pai havia colocado a escuridão sobre ela, para dar luz às almas, almas, inclui ncluindo-as ndo-as assim, e de pleno pleno direito, direito, no plano da Redenção, e ao 112
mesmo tempo ela se alegrou por não ter nada, absolutamente nada, nem mesmo a consolação do céu. Tinha chegado à pobreza absoluta, à pobreza da Cruz à qual sempre almejara, e no entanto a obra multiplicava seus frutos e suas colheitas. Quando Madre Teresa leu o livro escrito por Margaret Trouncer dedicado a Santa Margarida Maria Alacoque, publicado em 1956, percebeu o arrebatador desejo de amá-lo como essa santa o amou. Madre Teresa, desejosa de se unir a Deus na morte, já se dispunha a aceitar e a amar tudo o que Jesus lhe desse e, por sua vez, a lhe dar, “com um grande sorriso”, tudo o que ele quisesse. Era o sorriso que aprendemos a ver no rosto de Madre Teresa. Ela chegou à plena consciência de que Deus se servia de sua “nulidade para mostrar a sua grandeza”. E o apelo aos pais espirituais diminuiu de intensidade, porque Madre Teresa á achara seu caminho, o seu lugar, a sua plena identidade. As cartas que de vez em quando escrevia aos confessores mal mencionavam a sensação de vazio, como se não precisasse recisasse mais mais de apoio. apoio. P arou de falar falar também com o arcebispo arcebispo P érier érier a respeito respeito da sua dor espiritual, e as cartas começaram a ficar densas só de questões práticas. Madre Teresa deixou-se envolver pela noite de São João da Cruz, tornando-se a santa da escuridão por longuíssimos anos; essa característica a põe ao lado de São Paulo da Cruz (1694-1775), fundador do Instituto Missionário dos Passionistas, também ele chamado desse modo para a sua missão (“Vi-me vestido de preto até os pés, com uma cruz branca no peito e sobre a cruz o santíssimo nome de Jesus em letras brancas”). [8] Madre Teresa afirmava que toda a desilusão vivida pelos pobres, não somente a pobreza material, mas também o sofrimento espiritual, deviam ser remidos, e “nós devemos fazer a nossa parte”. De volta de Oslo em 1979, depois de ter recebido o Prêmio Nobel, passou por Roma antes de seguir para a sua Calcutá. Muitos jornalistas a esperavam na humilde casa das Missionárias da Caridade no monte Célio. Um deles perguntou com malícia: “Madre, a senhora tem setenta anos! Quando morrer o mundo estará como antes. O que mudou depois de tanto esforço?”. Madre Teresa não perdeu a compostura, sorriu seu sorriso luminoso e respondeu: “Veja, eu nunca pensei em poder mudar o mundo! Tentei somente ser uma gota de água limpa na qual se pudesse refletir o amor de Deus. Parecelhe pouco? Tente ser também o senhor uma gota de água limpa, e assim seremos dois. O senhor é casado?”. O jornalista respondeu que sim. “Diga isso também para a sua mulher e assim seremos três. O senhor tem filhos?”. O jornalista tinha três. “Diga isso também a seus filhos, assim seremos seis [...]”. Todos calaram-se. E ainda se calam diante de uma vida de sublime beleza e diante de sua marca profética: “Se por acaso eu vier a me tornar santa, certamente serei uma santa ‘da escuridão’. Estarei sempre ausente do Paraíso para acender a luz para aqueles que, sobre a terra, se encontram na escuridão”. [9] A luz espiritual lhe foi negada, para que pudesse ser a portadora do sorriso de Deus Pai aos pequenos da terra. E das trevas em que estava mergulhada a sua alma ela saía, e assim se elevava para os outros uma luz intensa, transfigurante. Cristo vivia nela. 113
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NOT OTA BIBL BIBLIO IOGRÁ GRÁFIC FICA A
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Direção editorial: Claudiano Avelino dos Santos
Coordenação de desenvolvimento digital: Guilherme César da Silva
Coordenação Coordenação de revisão revisão: Tiago José Risi Leme
Revisão técnica: Tiago José Risi Leme
Revisão: Jennifer Almeida Thais dos Santos Domingues Iranildo Bezerra Bezerra Lopes
Tradução: Renato Ambrósio
Capa: Raquel Ferreira Ferreira
Desenvolvimento digital: Daniela Kovacs
Conversão EPUB: PAULUS
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Siccardi, Cristina Madre Teresa: tudo começou na minha terra / Cristina Siccardi; [tradução Renato Ambrósio]. — São Paulo: Paulus, 2016. — Coleção Biografias. 1. Missionárias da Caridade - Biografia 2. Teresa, de Calcutá, Madre, 19101997 I. Título. II. Série. 652Kb; ePUB 16-03350
CDD-922. 2
Índices para catálogo sistemático: 1. Madre Teresa de Calcutá: Biografia 922.2 adre Teresa Teresa – Tutto iniziò nella mia terra Título original: Madre © 2009, Edizioni San Paolo s.r.l. – Cinisello Balsamo (MI) ISBN 978-85-349-4301-7 Tradução: Renato Ambrósio © PAULUS – 2016 Rua Francisco Cruz, 229 • 04117-091 – São Paulo (Brasil) Tel.: (11) 5087-3700 • Fax: (11) 5579-3627 paulus.c aulus.c om.br •
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NOT OTAS PREMISSA [1] As religiões na Índia estão assim divididas, em um território que conta 1.013.662.000 [1] habitantes: hindus, 74,5%; muçulmanos, 12,1%; cristãos, 6,2% (dos quais 1,5% são católicos romanos); siques, 2,2%; não religiosos, 1,3%; budistas, 0,7%; jainistas, 0,4%; bahaístas, 0,2%. Cf. a tabela tabela do ano 2000 do “Reli “Religious gious adherents in India, India, AD 19002025”, in in D . B. Barrett, G. T. Kurian, T. M. Johnson, World Christian Encyclopedia, I, Oxford University Press, 2001, p. 360. [2] A irmã Nirmala Joshi deixou o cargo para a irmã de origem alemã Mary Prema, eleita [2] em 24 de março de 2009 a nova superiora das Missionárias da Caridade. A eleição aconteceu aconteceu durante o Capítulo Geral das Missionárias da Caridade, iniciado em 1º de fevereiro fevereiro de 2009 em Calcutá. [3] P. Gheddo, Hottanta fiduci a. 80 anni i n 80 domande al missi onario più famoso [3] d’Italia, Cinisello Balsamo: San Paolo, 2009. [4] F. Zambonini, Teresa di Calcutta. La matita di Dio, Milão: Paoline, 2006 7, p. 161. [4] [5] Definição de Madre Teresa de Calcutá dada aos jornalistas antes da entrega do [5] Prêmio No No bel da Paz em Oslo, 1979. 1. DA TERRA “QUEIMADA” [1] Madr e Teresa a dom McCarthy, 29 de julho de 1960. [1] [2] Cf. L. Gjergji, Madre [2] adre della cari tà, Gorle (Bergamo): Velar, 2007, p. 37. [3] Instruções de Madre Teresa às irmãs, 19 de janeiro de 1983. [3] [4] Madre Teresa, Missionária da Caridade. [4] 2. PÃO, SAL E CORAÇÃO [1] Padre Lush Gjergji passou sua vida ao lado de Madre Teresa, a quem conhece mais [1] do que alguém da família. Ele cresceu e se formou na presença dela, seguiu-a, entrevistou-a várias vezes, e foi seu filho espiritual. Escreveu sobre ela, até agora, treze volumes, traduzidos em diversas línguas. Sacerdote solar, agudo e brilhante, escritor prolífi rolífico, co, apaix apaixonado por Cristo e por Madre Teresa, padre Lush nasceu em 21 de março de 1949, em Stublla, no município de Vitia, no Kosovo. Frequentou o colegial clássico em Dubrovnik, e depois estudou Filosofia em Split e na Universidade Urbaniana, em Roma, e simultaneamente Psicologia na Universidade La Sapienza, onde se formou com a tese em Psicologia Social dedicada à “Mulher albanesa”. Ordenou-se sacerdote em 11 de agosto de 1973, foi pároco de Ferizaj, de 1975 a 1993, e também secretário do bispo, dom Nikolla Prela. De 1993 a 2008 foi pároco de Biança, e de 2004 a 2008, vigáriogeral. Padre Lush é hoje pároco da Catedral de Prizren. [2] L. Gjergji, Madre [2] adre della cari tà, op. cit. , p. 37. 119
[3] Ibid. , p. 38. [4] Nëna Loke, a expressão que, em albanês, significa mamãe e mãe, era como os filhos [4] da família Bojaxhiu chamavam a mãe. [5] Ibid. , p. 38-39. [6] Ibid. , p. 39. [7] Ibid. , p. 39. [8] Ibid. , p. 54. [9] Ibid. , p. 39. 3. TUDO COMEÇOU EM FAMÍLIA [1] Drita é uma revista mensal albanesa, fundada em 1970. Padre Lush Gjergji é atualmente seu redator-chefe e diretor da editora que a publica, com sede em Prizren. [2] Mt 6,3. [2] [3] L. Gjergji, Madre [3] adre della cari tà, op. cit. , p. 41-42. [4] Ibid. , p. 45. [5] J. L. González Balado, La gioi a di darsi agli altri , Milão: Paoline, 1980, p. 165[5] 166. 4. GENTE SEM NADA “QUE MINHA MÃE ALIMENTAVA” [1] L. Gjergji, Madre [1] adre della cari tà, op. cit. , p. 47. [2] Ibid. , p. 47-50. [3] Ibid. , p. 50. [4] Ibid. , p. 50. [5] G. B. Cottolengo, Detti e pensieri, [5] pensi eri, Milão: Edilibri, 2005, n. 201. [6] Beatificados em Lisieux em 19 de outubro de 2008 e canonizados pelo Papa [6] Francisco no Sínodo das Famílias, em 18 de outubro de 2015. [7] E. Bambara, “Madre Teresa, una donna del Kosovo”, Sir 16, 29 de fevereiro de [7] 2008. [8] L. Depolo, [8] Depolo, “Evandjelje “Evandjelje uvijek danas”, Veritas, 12/1980. [9] Instruções de Madre Teresa de Calcutá para as Missionárias da Caridade, 24 de maio [9] de 1984. 5. O PADRE JESUÍTA E A REVISTA MISSIONÁRIA [1] L. Gjergji, Madre [1] adre della cari tà, op. cit. , p. 64. [2] Madre Teresa, Riflessi oni per l’anima [2] l’ani ma, Villorba (TV): Anordest, 2010. [3] L. Gjergji, Madre [3] adre della cari tà, op. cit. , p. 67. [4] Ibid. , p. 70. [5] L. Gjergji, Madre [5] adre della cari tà, op. cit. , p. 70. 120
[6] Ibid. , p. 71. [7] Ibid. , p. 107. 6. ZAGREB – DUBLIN – BENGALA [1] Atual capital da Croácia. (N.R.) [1] [2] Ibidem , p. 81. [3] Ibidem . [4] Ibidem . [5] Ibidem , p. 85 (tradução para o italiano de Caterina Zuccaro). [6] Madre Teresa para a revista católica Blagovijest , novembro de 1932. [6] [7] Conta o evangelista João: “O Senhor soube que os fariseus tinham ouvido dizer que [7] ele recrutava e batizava mais discípulos que João (se bem que não era Jesus quem batizava, atizava, mas os seus discípul discípulos). os). Deixo Deixouu a Judeia Judeia e voltou voltou para a Gali Galileia. eia. Ora, devia devia passar por Samaria. Chegou, Chegou, pois, pois, a uma locali localidade dade da Samaria, chamada Sicar, Sicar, junto das terras que Jacó dera a seu filho José. Ali havia o poço de Jacó. E Jesus, fatigado da viagem, sentou-se à beira do poço. Era por volta do meio-dia. Veio uma mulher da Samaria tirar água. Pediu-lhe Jesus: ‘Dá-me de beber’. (Pois os discípulos tinham ido à cidade comprar mantimentos.) Aquela samaritana lhe disse: ‘Sendo tu judeu, como pedes de beber a mim, que sou samaritana?... (Pois os judeus não se comunicavam com os samaritanos.) Respondeu-lhe Jesus: ‘Se conhecesses o dom de Deus, e quem é que te diz: Dá-me de beber, certamente lhe pedirias tu mesma e ele te daria uma água viva’. A mulher lhe replicou: ‘Senhor, não tens com que tirá-la, e o poço é fundo... donde tens, pois, ois, essa água água viva? viva? És, porventura, maior do que o nosso pai Jacó, que nos deu este poço, do qual ele ele mesmo bebeu e também os seus fil filhos e os seus rebanhos?’ Respondeu-lhe Jesus: ‘Todo aquele que beber desta água tornará a ter sede, mas o que beber da águ águaa que eu lhe der jamais jamais terá sede. Mas a água água que eu e u lhe der virá virá a ser nele nele fonte de água, que jorrará até a vida eterna’. A mulher suplicou: ‘Senhor, dá-me desta água, para eu já não ter sede nem vir aqui tirá-la!’. Disse-lhe Jesus: ‘Vai, chama teu marido e volta cá’. A mulher respondeu: ‘Não tenho marido’. Disse Jesus: ‘Tens razão em dizer que não tens marido. Tiveste cinco maridos, e o que agora tens não é teu. Nisto disseste a verdade’. ‘Senhor, disse-lhe a mulher, vejo que és profeta!... Nossos pais adoraram neste monte, mas vós dizeis que é em Jerusalém que se deve adorar’. Jesus respondeu: ‘Mulher, acredita-me, vem a hora em que não adorareis o Pai, nem neste monte nem em Jerusalém. Vós adorais o que não conheceis, nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e verdade, e são esses adoradores que o Pai deseja. Deus é espírito, e os seus adoradores devem adorá-lo em espírito e verdade’. Respondeu a mulher: ‘Sei que deve vir o Messias (que se chama Cristo); quando, pois, vier, ele nos fará conhecer todas as coisas’. Disse-lhe Jesus: ‘Sou eu, quem fala contigo’” contigo’” (Jo 4,1-26). 121
7. O REMÉDIO DO BATISMO [1] Madre Teresa, carta publicada [1] publicada na revista revista Katolicke misi je, de novembro de 1931. 8. O VOTO PRIVADO [1] L. Gjergji, Madre [1] adre della cari tà, op. cit. , p. 98. [2] Madre Teresa de Calcutá, Spiegazione delle Costituzioni delle Missionarie della [2] Carità, s.d. [3] A. O’Rahilly, Father Willi [3] Willi am Doyle. A Spiritual Study , Londres-Nova York-Toronto: Longmans, Green and Co., 1925, p. 288. 9. A ALEGRIA [1] Instruções de Madre Teresa às irmãs, 31 de março de 1987. [1] [2] Indiano não pertencente a qualquer casta, considerado impuro e desprezível pela [2] tradição cultural hinduísta. [Entre os párias, em sua maioria descendentes de tribos indianas autóctones e insubmissas ao domínio ariano, também se incluem os bastardos (pais estrangeiros ou pertencentes a castas diferentes), os filhos de meretrizes e os que cometeram graves infrações contra preceitos sociais ou religiosos.] Fonte: Dici onário Houaiss da língua portuguesa. (N.R.) [3] Santo Agostinho, Confissões , livro X, parágrafos 31-33 (N. R.). [3] [4] Explicação das Constituições das Missionárias da Caridade. [4] [5] Instruções de Madre Teresa às Missionárias da Caridade, em 30 de outubro de 1981. [5] 10. “NÃO ESQUEÇA... OS POBRES” [1] L. Gjergji, Madre [1] adre della cari tà, op. cit. , p. 114. [2] Ibidem . [3] Madre Teresa, Sii la mia luce. Gli scritti più intimi della “Santa di Calcutta”, org. [3] por B. Kolodi Kolodiejchuk, ejchuk, Milão: Milão: Rizzoli Rizzoli,, 2008, p. 47. [4] In E. Egan, Such a Vision of the Street: Mother Teresa, the Spirit and Work , Nova [4] York: Image Doubleday, 1985, p. 2. 11. CRISTO É TUDO [1] L. Gjergji, Madre [1] adre della cari tà, op. cit. , pp. 130-131. [2] Ibid. , p. 131. [3] Uma freira de Loreto, que pronunciava os votos perpétuos, normalmente era [3] chamada de Mother , e não com o termo bengalês Ma, mais afetuoso e familiar, como continuaram a chamá-la os protegidos de irmã Teresa. [4] Madre Teresa às Missionárias da Caridade, 25 de março de 1993. [4] [5] Irmão Silvestro falava com um grande Cristo Crucificado de papel machê que [5] remontava ao século XVIII que, tendo sido abandonado em um porão, ele levou de 122
Chieri (Turim) para Goundí, em Burkina Fasso. Era com esse Crucifixo que o missionário do Instituto da Sagrada Família conversava. Ele dizia: “É Ele que me dá forças para agir!”. 12. “POR MIM, TE RECUSARÁS A FAZER ISSO?” [1] Madre Teresa, in Katoličke misi je, fevereiro de 1935, p. 25. [1] [2] No livro de Números (15,37-38) se lê que as listras representam, para o povo de [2] Israel, a fidelidade de Deus à Aliança. 13. “AS ALMAS NÃO SE COMPRAM” [1] Carta de Madre Teresa ao arcebispo Fernando Périer, de Asansol, 30 de março de [1] 1947. [2] Carta de Madre Teresa ao padre Van Exem, 19 de outubro de 1947. [2] 14. AS VISÕES [1] Carta ao padre Van Exem ao arcebispo Périer, 20 de outubro 1947. [1] [2] Em vez do indulto de secularização pedido, foi concedido o indulto de exclaustração, [2] que permitia a Madre Teresa ficar fora do convento de Loreto por um ano ou ainda menos, conservando os votos de religiosa de Irmã de Loreto. [3] Cf. L. Gjergji, Dashuria tërheqëse: Nëna, jonë Tereze [3] ereze, Drita / Ferizaj, Ks / Zagreb, 1980. Trata-se da primeira biografia completa de Madre Teresa de Calcutá. O livro foi traduzido em diversas línguas. [4] Carta de Madre M. Gabrielle a Madre Teresa, 3 de setembro de 1948. Na realidade, [4] o dia do onomástico da beata era 3 de outubro, é possível que irmã Gabrielle tenha errado ao datar a carta. 15. O CHÃO COMO LOUSA [1] Cf. Ibidem . [1] [2] Madre Teresa, Diári o, 24 de janeiro de 1949. [2] [3] Cf. L. Gjergji, Dashuria tërheqëse... op. ci t. [3] [4] Cf. Ibid. [4] [5] Madre Teresa, Diári o, 16 de fevereiro de 1949. [5] [6] Cf. L. Gjergji, Dashuria tërheqëse: Nëna, jonë Ter [6] Tereze, eze, op. cit. [7] Cf. Ibidem. [7] [8] Madre Teresa, Carta a Pio XII, 1 de março de 1950. [8] 16. AS CARTAS AO IRMÃO [1] L. Gjergji, Madre [1] adre della cari tà, op. cit. , p. 73. 17. NUNCA MAIS SE VIRAM 123
[1] Em 28 de junho de 1989, Miloševič, Presidente da República Sérvia desde o dia 8 de [1] maio, pronunciou um violento discurso contra os albaneses, igualando-os aos turcos otomanos. De um lado, esse discurso foi uma das causas que levou à desagregação da Iugoslávia; por outro, marcou o início de um repovoamento forçado da província com sérvios, o fechamento das escolas autônomas de língua albanesa e a substituição de funcionários administrativos e professores albaneses por sérvios ou pessoas consideradas fiéis à Sérvia. Inicialmente os albaneses reagiram à perda dos seus direitos constitucionais com a resistência não violenta, guiada pela Liga Democrática do Kosovo (LDK) de Ibrahim Rugova. Os albaneses boicotaram as instituições e as eleições oficiais, estabeleceram instituições e escolas separadas e declararam a independência da República do Kosovo (2 de julho de 1990), reconhecida somente pela Albânia (que se democratizara pouco antes), adotaram uma constituição (setembro de 1990) e fizeram um referendum sobre a independência (1992) com a presença de 80% dos eleitores, dos quais 98% votaram pela independência (sem o reconhecimento, mas com observadores internacionais). Todavia, a partir de 1995, depois da guerra da Bósnia Herzegovina, muitos albaneses decidiram-se pela luta armada pela independência, guiada pela Ushtria Çlirimtare e Kosovës (UCK), que utilizou também os veteranos da guerra que apenas acabara. Em 1999, eclodiu um conflito armado com a intervenção de diversas forças internacionais para proteger o Kosovo, atacado pelo pelo poder central de Belgrado. Belgrado. Com base na Resolução do Conselho de Segurança da ONU, número 1244, de 1999, o Kosovo obteve um governo e um parlamento provisórios, e foi colocado sob o protetorado internacional nternacional da UNMIK e da OTA OTAN. Nos anos segui seguintes, ntes, a situação situação foi lentamente se normalizando, ainda que não faltassem episódios de violência, como em 2 de março de 2004, quando grupos compostos principalmente por kosovares de origem albanesa atacaram mais de trinta igrejas cristãs no Kosovo, matando pelo menos vinte pessoas e incendiando ncendiando dezenas de casas sérvias sérvias durante cinco cinco dias. dias. Em 10 de dezembro de 2007, terminou o período de negociações conduzidas pela ONU, que não chegaram a nenhum resultado de fato, com a Sérvia e o Kosovo permanecendo em suas respectivas posições. osições. As autoridades autoridades kosovares insisti nsistiram ram na proclamação proclamação unil unilateral de independência (solução, obviamente, preferida pela maioria albanesa e que tinha como único precedente o caso de Timor Leste). Em 17 de fevereiro de 2008, o Parlamento de Pristina, reunido em sessão extraordinária, aprovou a declaração de independência do Kosovo, lida pelo premier Hashim Thaçi. A bandeira andeira e o brasão foram escolhidos escolhidos de maneira a respeitar a composição composição multiétni multiétnica ca do país. O discurso discurso do premier remier falava de uma república democrática, secular e multiétnica, guiada por princípios de não discriminação e igualdade diante da lei. Dez minutos depois da proclamação, ocorrida por volta das 15h00, o governo sérvio logo declarou ilegítima e ilegal a proclamação, e que jamais reconheceria a República secessionista como independente. Em 9 de abril de 2008, o Parlamento do Kosovo votou por unanimidade a nova Constituição, na qual se sancionava que o país seria um Estado laico e que 124
respeitaria a liberdade de culto, garantindo os direitos de todas as comunidade étnicas. 18. NO BAIRRO DA DEUSA KALI [1] L. Gjergji, Madre [1] adre della cari tà, op. cit. , p. 145. [2] Ibidem . [3] Ibidem , p. 158. [4] Ibidem . [5] Ibidem , p. 162. [6] Angelus, 7 de setembro de 1977, in Insegnamenti di Giovanni Paolo II , XX, 2 [6] (1997), p. 272-273. [7] Cf. Mother Teresa, A Simple [7] Si mple Path, compiled by L. Vardey, London: Rider, 1995. [8] Em 1987, Madre Teresa se tornou presidente honorária dos Movimentos pela Vida de [8] todo o mundo. [9] Basta pensar na adoção da Quinacrina como meio para a esterilização química (trata[9] se de um remédio antimalárico que provoca uma espécie de necrose das paredes uterinas), ou então no uso cínico de remédios perigosos para a saúde da mulher que, no Ocidente, tem a sua comercialização proibida. 19. COMO OS ESTIGMAS DE JESUS [1] Cf. J. Gusić, Majke odbačenih. Djelovanje Maike Terezije [1] erezije iz Kalkute i njezine Družbe, Misionarki Ljubavi: Zagreb, 1976, p. 236-237. [2] A. Comastri, Madre [2] adre Teresa. eresa. Una goccia d’acqua pulita, Milão: Paoline, 2007 4, p. 32-33. 20. O “ALTER EGO” [1] Madre Teresa, Carta ao arcebispo Périer , 20 de janeiro de 1951. [1] [2] Madre Teresa, Carta ao arcebispo Périer , 15 de abril de 1951. [2] [3] Madre Teresa aos colaboradores, 1º de março de 1995. [3] [4] Madre Teresa, Sii la mia luce, op. cit. , p. 157. [4] [5] 1962: Prêmio Magsaysay pela Paz e o Entendimento Internacional; prêmio indiano [5] Padma Shri. 1971: Prêmio da Paz Papa João XXIII, que lhe foi entregue pelo Papa Paulo VI; Prêmio Kennedy. 1972: Prêmio Nehru pela Promoção da Paz e da Compreensão Internacional. 1973: Prêmio Templeton. 1975: Prêmio Internacional Albert Schweitzer. 1978: Prêmio Balzan, “pela excepcional abnegação com a qual dedicou toda a sua vida em socorrer, na Índia e em outros países do mundo, as vítimas da fome, da miséria e das 125
doenças, os abandonados, os moribundos, transformando em ação o seu incansável amor pela ela humanidade que sofre”. 1979 e 1980: Bharat Ratna, a mais alta honraria civil da Índia. 17 de outubro de 1979: Prêmio Nobel da Paz, “pelo trabalho realizado na luta para vencer a pobreza e a miséria, que também constituem uma ameaça à paz”. 1981: recebeu a Légion d’Honneur , das mãos de Jean-Claude Duvalier. 1986: Medal of Freedom, entregue pelo Presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan. 1996: nomeada cidadã honorária dos Estados Unidos. 1997: Medalha de Ouro do Congresso dos Estados Unidos da América. 21. APAGOU-SE NO ESCURO [1] Irmã Nirmla Joshi nasceu em 1934, na Índia, em uma pequena cidade, Duranda, [1] perto de Ranchi, Ranchi, no estado oriental oriental de Bihar, Bihar, de pais pais nepaleses. nepaleses. Formou-se em Direi Direito, to, para dar aux auxíl íliio legal egal aos pobres, mas nunca exerceu a profissão profissão de advog advogada. ada. Abriu briu cerca de sessenta casas, uma também em Jerusalém. [2] O seu preciosíssimo livro de orações foi traduzido e publicado na Itália: Madre [2] adre Teresa eresa di Calcutta, Il mio libro di preghiere , Milão: Mondadori, 2002. [3] E. Mo, “I potenti della terra si inginocchiano”, Corriere della Sera, 14 de setembro [3] de 1997. 22. A SANTA DA ESCURIDÃO [1] Madre Teresa, Sii la mia luce. Gli scritti più intimi della “Santa di Calcutta” , [1] organizado por B. Kolodiejchuk, Milão: Rizzoli, 2008. [Tradução brasileira: Madre Teresa, Venha, seja a minha luz , Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2008.] [2] A. Comastri, op. cit., p. 65. [2] [3] Madre Teresa a Eileen Egan, 24 de julho de 1960. [3] [4] Cf. Cl 1,24. [4] [5] Madre Teresa ao arcebispo Périer, 17 de novembro de 1956. [5] [6] Madre Teresa ao arcebispo Périer, 8 de abril de 1957. [6] [7] Madre Teresa ao padre Picachy, 28 de junho de 1958. [7] [8] Em 1721, São Paulo da Cruz foi vestido com uma túnica preta pelo bispo de [8] Alexandria, seu pai espiritual: trazia o emblema da Paixão de Jesus, andava descalço e tinha a cabeça coberta. [9] Madre Teresa a padre Neuner, 6 de março de 1962. [9]
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Índice Rosto Premissa 01. Da terra “queimada” 02. Pão, sal e coração 03. Tudo começou em família 04. Gente sem nada “que minha mãe alimentava” 05. O padre jesuíta e a revista missionária 06. Zagreb – Dublin – Bengala 07. O remédio do batismo 08. O voto privado 09. A alegria 10. “Não esqueça... Os pobres” 11. Cristo é tudo 12. “Por mim, te recusarás a fazer isso?” 13. “As almas não se compram” 14. As visões 15. O chão como lousa 16. As cartas ao irmão 17. Nunca mais se viram 18. No bairro da deusa Kali 19. Como os estigmas de Jesus 20. O “alter ego” 21. Apagou-se no escuro 22. A santa da escuridão Nota Bibliográfica Bibliográfica Coleção Ficha Catalográfica Notas 137
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