ENSINO CLINICO EM SAÚDE MENTAL
autora
PAULA ISABELLA MARUJO NUNES DA FONSECA
1ª edição SESES rio de janeiro
2018
Conselho editorial
roberto paes e gisele lima
Autora do original
paula isabella marujo nunes da fonseca
Projeto editorial
roberto paes
Coordenação de produção
gisele lima, paula r. de a. machado e aline karina
rabello paulo vitor bastos
Projeto gráfico Diagramação
bfs media
Revisão linguística
bfs media
Revisão de conteúdo Imagem de capa
elaine aparecida soi
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Ensino clínico em saúde mental / Paula Isabella Marujo Nunes de Fonseca. Rio de Janeiro : SESES, SESES, 2018. 160 p: il. isbn: 978-85-5548-537-4. 1. Saúde Mental. 2. Enfermagem psiquiátrica. 3. Psiquiatria. 4. Enfermagem. 5. Psiquiatria na literatura. I. SESES. II. Estácio. cdd 616.89
Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário Prefácio
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1. A história da loucura, o desenvolvimento da política de saúde mental e o papel do enfermeiro neste contexto
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A perspectiva histórica da loucura No mundo No Brasil
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A reforma psiquiátrica brasileira A crítica ao modelo hospitalocêntrico – 1978 a 1989 O nascimento da rede de serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico – década de 1990 A reforma no século XXI
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A política de saúde mental
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O papel atual do enfermeiro na saúde mental A influência de Hildegard Peplau na construção do papel do enfermeiro As transformações do papel do enfermeiro até os dias atuais
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2. Saúde mental, a família e a loucura e o cuidado do enfermeiro Conceito e determinantes de saúde mental Conceito Determinantes de saúde mental “E a família, como fica?”: a relação dos familiares com o portador de transtorno mental e o serviço psiquiátrico A família A relação do(s) familiar(es) com o portador de transtorno psiquiátrico A relação do(s) familiar(es) com o serviço e os enfermeiros de saúde mental
30 31
39 41 41 43 44 44 45 47
Prevenção em Saúde Mental e as intervenções de enfermagem
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Processo de cuidados de enfermagem em saúde mental
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3. Transtornos mentais: classificação e a assistência de enfermagem
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Semiologia psiquiátrica – anamnese realizada pelo enfermeiro
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Transtornos do humor e a assistência do enfermeiro Transtorno afetivo bipolar Episódio depressivo ou depressão
76 77 80
Transtornos de ansiedade e a assistência do enfermeiro Transtorno de ansiedade generalizada Transtorno do pânico Agorafobia Transtorno obsessivo compulsivo (TOC) Intervenções de enfermagem
83 83 84 84 85 86
Transtornos psicóticos, a esquizofrenia e a assistência do enfermeiro Esquizofrenia
88 88
4. Transtornos mentais: classificação e a assistência de enfermagem (cont.)
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Transtornos de personalidade e a assistência do enfermeiro (a) Transtorno de personalidade paranoide Transtorno de personalidade esquizoide Transtorno de personalidade antissocial Transtorno de personalidade borderline Transtorno de personalidade histriônica Transtorno de personalidade anancástica ou obsessivo-compulsivo Tratamento Intervenções de enfermagem
97 98 98 99 100 100 100 101
Transtornos dismórficos (síndromes comportamentais associadas a perturbações fisiológicas e fatores físicos, com foco nos transtornos alimentares) e a assistência do enfermeiro
102
99
Anorexia nervosa Bulimia nervosa Tratamento Intervenções de enfermagem Dependência química, as comorbidades psiquiátricas e a assistência do enfermeiro Síndrome de dependência Transtornos mentais e comportamentais causados pelo uso de substâncias psicoativas (SPA)
5. Crise, emergência psiquiátrica e psicofarmacologia
103 105 106 106 107 109 110
125
Crise Fases da crise Intervenção na crise e a assistência de enfermagem
127 128 128
Emergência psiquiátrica (EP) Heteroagressividade, violência e situações de emergência psiquiátrica Contenção física Intervenções de enfermagem
129 131 132 135
Psicofarmacologia Um pouco de história 3.2 Aspectos gerais dos psicofármacos Farmacocinética e farmacodinâmica Ansiolíticos e Hipnóticos Antidepressivos Estabilizadores do humor Antipsicóticos (Neurolépticos)
136 136 137 138 140 143 147 151
Intervenções de Enfermagem Gerais
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Prefácio Prezados(as) alunos(as), Este livro foi confeccionado para você. Isso mesmo, você é o motivo central para que este material tenha sido produzido. Ao pensar em nosso aluno, pensamos quase que simultaneamente sobre o que é preciso para ajudá-lo em sua caminhada para o conhecimento. Afinal de contas, fazemos parte deste momento, na estrada de sua história. Dessa maneira, é refletindo sobre como podemos auxiliá-lo a abrir e explorar os melhores caminhos do conhecimento, que pensamos na realização deste material com cuidado e qualidade, utilizando uma linguagem leve, acessível, ou seja, fácil de ser entendida sempre respeitando os limites acadêmicos. Além da leitura, você encontrará dicas de vídeos, endereços com sugestões de artigos científicos relevantes sobre o conteúdo ao qual você está tendo acesso, caixas informativas com detalhamentos, explicações e exemplos de aplicabilidade dos assuntos estudados, que têm por objetivo complementar e dinamizar o conteúdo disponibilizado. É com todo este aporte teórico e visual, portanto, que você irá começar a percorrer a trajetória teórica da disciplina de Saúde Mental. Assim, traçamos uma rota do conhecimento que se inicia com um pouco da história da psiquiatria, de modo que você compreenda a origem de tudo isso, como foi que começou a ser criada a história da loucura no mundo e aqui no Brasil. Cheia de caminhos com curvas, subidas e descidas, é assim essa rota, que vai fazer você chegar ao capítulo 2 para saber sobre o que é a Saúde Mental, como são as relações dos familiares com o universo que envolve o transtorno mental de seu parente e os serviços de psiquiatria e ainda, o que faz o enfermeiro nas intervenções em Saúde Mental. No capítulo 3 você pegará a próxima curva à direita e irá entrar em outra rota de conhecimento que é a dos transtornos mentais que se estende até o capítulo 4. A reta final é o capítulo 5 em que você terá de respirar fundo e seguir a com convicção de que ao conhecer a psicofarmacologia dos medicamentos mais utilizados em psiquiatria e o que é crise e emergência psiquiátrica, você certamente chegará a tão desejada linha de chegada, que nada mais é do que a finalização com grande sucesso desta disciplina. Bons estudos!
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1 A história da loucura, o desenvolvimento da política de saúde mental e o papel do enfermeiro neste contexto
A história da loucura, o desenvolvimento da política de saúde mental e o papel do enfermeiro neste contexto Neste capítulo você estudará sobre como se iniciou a psiquiatria. Faz toda a diferença no compreender de um tema ou assunto, saber como ele começou, quais foram as motivações históricas e necessidades reais que levaram à criação do que se transformou no contexto atual. Conhecer a história da psiquiatria, e logo em seguida entender como ela foi se desenvolvendo pelos países do mundo, o ajudará a compreender como as peças do que parece ser um grande quebra-cabeças foram se juntando para se formar o movimento mais importante da história da psiquiatria nacional, que foi a reforma psiquiátrica brasileira. Ao entrar em contato com os caminhos que levaram à Reforma e ainda os caminhos que ela possibilitou e possibilita até os dias atuais, você já estará inserido nesta rota do conhecimento, que o levará ao fim deste capítulo, em que irá descobrir qual a importância e o papel do enfermeiro na saúde mental. Portanto, boa viagem!
OBJETIVOS •
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Explorar a história da loucura no mundo e no Brasil; Explicar a Reforma Psiquiátrica Brasileira; Informar sobre a atual Política de Saúde Mental e as formas de cuidado oferecidas na área; Descobrir qual o papel atual do enfermeiro na Saúde Mental.
A perspectiva histórica da loucura No mundo
Será que você consegue imaginar, olhando para os serviços de psiquiatria hoje – e tudo bem se você não conhece muitos – como foi que tudo isso surgiu?
capítulo 1 •
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Pois bem, houve um longo caminho de lutas e conquistas de direitos desde quando nasceu a Psiquiatria. E, como toda boa história, vale parar um pouco para saber como tudo começou. Vamos lá? Vamos viajar no tempo para a época da Renascença, tempo em que a segregação dos loucos se dava pelo seu banimento dos muros das cidades europeias e o seu confinamento errante, já que eram condenados a andar de cidade em cidade ou eram colocados em navios que, na inquietude do mar, vagavam sem destino, chegando, ocasionalmente, a algum porto. Os que chegavam alguns eram acolhidos e mantidos presos, pois literalmente não tinham chão. Ou estavam com água em sua volta ou eram mantidos com grades. Agora, imagine que você irá retornar à época clássica, com ruas mal iluminadas, pessoas andando com roupas antigas; um tempo em que os bons costumes, a honra familiar e a ressignificação da pobreza para desordem moral caracterizandose como obstáculo a uma nova ordem social, eram iminentes. Neste contexto, o hospício ainda não era o hospício que você conhece atualmente, e também não tinha este nome. Leprosos, ladrões, prostitutas, vagabundos, loucos e todos mais que representassem uma ameaça à lei e à ordem social eram recolhidos e levados para as Santas Casas de Misericórdia e os hospitais gerais que tinham uma função de “hospedaria” (AMARANTE, 2009). Esta “hospedagem” era na verdade um enclausuramento, que neste período, não dispunha de serviços médicos e não realizava medicalização daqueles que eram recolhidos. Dessa maneira, isso significava que a loucura era colocada no mesmo patamar das outras categorias marginais. E o Grande Enclausuramento significava um antídoto contra a pobreza (MACHADO apud AMARANTE, 2009).
G R O . A I D E M I K I W ©
Figura 1.1 – A Extração da pedra da loucura, óleo sobre madeira, 48 x 35 cm.
capítulo 1 •
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Produzida entre 1475 e 1480, a tela intitulada como A Extração da pedra da loucura do pintor holandês Hieronymus Bosch, ficou reconhecida mundialmente como importante fonte de análise da loucura. Atualmente, se encontra no Museu do Prado, em Madrid. Na tela, Bosch visou representar a loucura e a credulidade humanas ao delinear uma espécie de cirurgia, comum na Idade Média. Acreditava-se que os loucos tinham essa pedra e era preciso que ela fosse retirada para obter a cura. A imagem foi usada para criticar aqueles que acreditavam ter a posse do saber, mas que na verdade, eram mais ignorantes que aqueles que tinham a intenção de curar a sua loucura. A representação da freira com um livro na cabeça pode ser uma alusão à superstição e à ignorância, pelas quais o clero era fortemente acusado. O tema da pintura, somada ao seu formato circular, poderia remeter de alguma maneira a um espelho que reflete o mundo à imagem da sua própria estupidez, ao desejar superá-la desta maneira. A legenda que aparece escrita no quadro diz Meestersnyt die Keyeras , myne name is lubbert das , que traduzido significa “Mestre, extrai-me a pedra, meu nome é Lubber Das.” Esta última era uma personagem satírica da literatura holandesa que representava a estupidez (MATIAS, 2015). Portanto, na época da Idade Clássica a loucura era apreendida como desorganização familiar, desordem e perigo para o estado ondeo internamento se baseava em praticar a “proteção” e guarda no hospital geral, que não significava uma instituição médica, mas sim, um local onde se buscava estabelecer a ordem social de exclusão/filantropia/ assistência para os abandonados que eram desafortunados material e divinalmente. Diferente do que aconteceu no século XVIII, que se destacou pela confluência entre conhecimento, percepção e dedução, o que permitiu adicionar ao internamento características terapêuticas e médicas. Num movimento progressivo, lá pela segunda metade do século XVIII, a “desrazão” vai perdendo o espaço e a alienação vai representando um critério de distinção do louco frente à ordem social. Nesse contexto, o louco passa a ser propriedade do Estado, o louco não era dono do seu pensamento e de sua cidadania, nem tão pouco de seu comportamento. Assim, a institucionalização da loucura pela classe médica e a ordenação do hospital por estes profissionais foi inaugurada pelo fato de o louco ser identificado como aquele que representava risco e perigo à ordem social. Daí, conforme afirma Barros (apud AMARANTE, 2009), ter sido formulada pela medicina a noção de periculosidade social conectada ao conceito de doença mental, possibilitando
capítulo 1 •
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uma espécie de acoplamento entre punição e tratamento, o que levou ambos a significarem praticamente a mesma coisa. Tornam-se então pilares constitutivos das práticas manicomiais: a relação tutelar com o louco e o delineamento de territórios de segregação, ausência da verdade e morte. Esta transformação do hospital de hospedaria/hotel/hospedagem numa instituição medicalizante, por meio da ação que sistematizava e dominava por meio da disciplina, da organização e da incidência cada vez maior dos profissionais médicos foi descrita por Foucault, em seu livro chamado O nascimento da clínica (FOULCAULT, 1977). É a partir do ano de 1973 que o símbolo do médico clínico tem sua expressão destaca na figura de Pinel, que por sua vez estabelecia que a doença era um problema de ordem moral e assim, iniciou a partir disso, um tratamento com base na adjetivação de sinais e sintomas daqueles que tratava. Pinel compreende que o isolamento é fundamental para observar e descrever os sintomas dos clientes. Assim, a medicina mental buscava atentar para os sinais e sintomas, de modo a agrupá-los de acordo com sua ordem natural, conforme fossem aparecendo com as manifestações da doença e não se importava em identificar a origem da doença no corpo. Considerado como um passo histórico para a medicalização do hospital, ao transformá-lo em instituição médica e não mais social e filantrópica, levando à apropriação da loucura pelo discurso e prática dos médicos, está a obra de Pinel. Esta se estruturou sobre uma tecnologia de saber e intervenção sobre a loucura e o hospital onde se constituiu a primeira nosografia (tratado com descrição ou explicação das doenças), a imposição de uma relação terapêutica e a organização do espaço asilar. Quando Pinel assume a direção de uma instituição pública de beneficência, fica marcada a primeira reforma da instituição hospitalar, pois coloca em prática a obra por ele pensada, e desta forma, funda a psiquiatria e o hospital psiquiátrico (AMARANTE, 2009). A psiquiatria reformada
Com Pinel apontando contradições entre a prática psiquiátrica entre as instituições de enclausuramento e o projeto terapêutico-assistencial originário da medicina mental, o período após a Segunda Guerra se torna propício para uma
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reforma psiquiátrica contemporânea, dando espaço para críticas e reformulações da instituição asilar. Procurou-se questionar a natureza e o papel: Da instituição asilar; Do saber psiquiátrico. •
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Você poderá realizar adiante um breve passeio por estas reformas. Birman& Costa (1994) elencam as psiquiatrias reformadas da seguinte forma: •
Psicoterapia institucional e as comunidades terapêuticas
Iniciada em 1946 por T. H. Main, é consagrada em termo e delimitada por seu mais importante autor e operador prático, Maxwell Jones, na Inglaterra em 1959. As comunidades terapêuticas procuraram desarticular a estrutura hospitalar considerada segregadora e cronificadora, entendendo que a realização de reuniões diárias e assembleias gerais tinham como objetivo dar conta das atividades, que poderiam ser desde participar da administração do hospital à gestão da terapêutica, o que promoveria a dinamização da instituição e da vida das pessoas. Jones afirma que uma característica marcante na organização de uma comunidade terapêutica é a reunião diária da comunidade, que é compreendida como uma reunião de todos, pacientes e equipe (JONES apud AMARANTE, 2009). Ainda que dispusesse de estratégias de tratamentos diferentes da proposta da psiquiatria original, a experiência inglesa não conseguiu resolver a raiz do problema da exclusão, sendo reduzida praticamente ao espaço asilar. •
A psiquiatria de setor e psiquiatria preventiva
Desencadeada na França, no pós-guerra, a psiquiatria de setor foi incorporada a partir dos anos 1960 como política oficial, e tinha o hospital psiquiátrico se resumindo a um papel coadjuvante ao tratamento. A psiquiatria de setor entendia a internação somente como uma etapa, apontando como o principal momento, o tratamento para a comunidade. Desta forma, a direção do tratamento a ser priorizada era justamente a possibilidade de assistência terapêutica ao cliente em sua própria comunidade. Embora tenha investido em um tipo mais alternativo de tratamento aos doentes mentais, a prática da psiquiatria de setor não alcançou os resultados esperados, por conta da resistência oposta por grupos de intelectuais somada a resistência dos setores conservadores contra uma possível invasão dos doentes mentais nas ruas e pelo expressivo custo para implantar os serviços de prevenção e ‘pós cura’. capítulo 1 •
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Já a psiquiatria preventiva nasce nos Estados Unidos de modo mais definitivo, intuindo representar uma terceira revolução psiquiátrica, pois utilizava-se da estratégia até então “inédita”, de intervir nas causas ou no surgimento das doenças mentais, ansiando não somente a prevenção destas, mas principalmente a promoção da saúde mental. Em virtude disso, a psiquiatria preventiva representa um delineamento de um novo território para a psiquiatria cuja terapêutica das doenças mentais dá espaço para novos objetos que se contrapõem com aqueles instituídos pelo modelo psiquiátrico clássico. “Um novo objeto – a saúde mental; Um novo objetivo – a prevenção da doença mental; Um novo sujeito de tratamento – a coletividade; Um novo agente profissional – as equipes comunitárias; Um novo espaço de tratamento – a comunidade; Uma nova concepção de personalidade – a unidade biopsicossocial.” COSTA, 1989, p.24 apud AMARANTE, 2009
Os programas de prevenção acarretaram aumento significativo da demanda ambulatorial e extra-hospitalar, fazendo ingressar novos contingentes de clientes para os tratamentos mentais enquanto que os clientes naturais dos hospitais psiquiátricos permaneceram internados, já que o modelo asilar é retroalimentado pelo modelo preventivista. Esta dinâmica gera massificação das medidas preventivas, comunitárias e pedagógicas em saúde mental sem produzir uma resposta terapêutica adequada. Este processo acaba por representar uma metamorfose do dispositivo de controle e disciplinamento social, que se estende desde o confinamento dos loucos até a moderna “promoção da sanidade mental”, como conhecemos atualmente (AMARANTE, 2009). •
A antipsiquiatria e as experiências surgidas a partir de Franco Basaglia
Nasce na Inglaterra, na década de 1960, e representa a primeira crítica radical ao saber médico-psiquiátrico, procurando romper, no âmbito teórico, com o modelo assistencial corrente. Buscava destituir de modo definitivo o valor do saber médico no que tange à explicação/compreensão e ao tratamento das doenças mentais. A Antipsiquiatria procura fazer conversar a razão e a loucura, ao enxergar a loucura entre os homens e não dentro deles. Expressa crítica a nosografia que prevê o ser neurótico, denunciando a cronificação da instituição asilar e a pressão
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quase imposta do mercado sofrida pelo sujeito para se submeter a um tratamento psiquiátrico. Por isso, seu método terapêutico não prevê medicalização química ou tratamento físico, mas sim, valoriza a análise do “discurso”, da viagem ou do delírio do louco, que não deve ser bloqueado, anulado. O louco, portanto, é acompanhado pelo grupo que se utiliza de métodos de investigação, não repressão da crise, psicodramatização ou recursos de regressão. Para Amarante (1995, p. 45) a: [...] tradição da Antipsiquiatria traz contribuições relevantes para a transformação prático-teórica do conceito de desinstitucionalização como desconstrução; no mesmo sentido em que está sendo desenvolvido, ao mesmo tempo, por Franco Basaglia, a partir da experiência de Gorizia. (AMARANTE, 2009 p. 45)
Quanto às experiências do psiquiatra italiano Franco Basaglia, na Itália, Barros (1994 apud AMARANTE, 2009) afirma que houve um confronto com os princípios utilizados no hospital psiquiátrico, o modelo estabelecido pela comunidade terapêutica inglesa e a política de setor francesa, ainda que tenha conservado destas o princípio de democratização das relações entre aqueles representantes institucionais e a noção de territorialidade. Logo, a tradição iniciada por Basaglia e continuada pelo movimento da psiquiatria democrática italiana, afirma o manicômio como metáfora da exclusão e a urgência de revisão das relações a partir das quais o saber médico no campo da psiquiatria. Dessa forma, pode se caracterizar por um movimento político, ao trazer à centralidade, a organização das relações econômicas e sociais, atribuindo aos movimentos sociais um lugar sede, com atores sociais concretos no embate com o cenário institucional que perpetuavam ou questionavam. É na década de 1960, no manicômio de Gorizia, que a prática crítica à psiquiatria tradicional tem início, a partir de um trabalho de humanização do hospital começado por Franco Basaglia (AMARANTE, 2009). Por consequência, agora estava em jogo um projeto de desinstitucionalização, de desmontagem e desconstrução de saberes/práticas/discursos comprometidos com um tipo de redução da loucura à doença e não somente a desospitalização (extinção de organizações hospitalares/manicomiais). Mais à frente, na década de 1970, Basaglia chega a Trieste, onde inicia um processo de desmontagem do aparato manicomial, seguido da construção de novos espaços e novas maneiras de lidar com a doença mental e a loucura. Em capítulo 1 •
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virtude disso, são construídos “sete centros de saúde mental, um para cada área da cidade, cada qual abrangendo de 20 a 40 mil habitantes, funcionando 24h por dia, sete dias por semana.” (AMARANTE, 2009, p.49). Grupos-apartamento que são residências onde moram usuários, vezes acompanhados por técnicos e/ou operadores voluntários ou a sós, também são abertos e prestam cuidados em mais de trinta locais diferentes a diversas pessoas. Assim, a experiência de Trieste demonstrou a possibilidade de se constituir um “circuito” de atenção, que oferecia e produzia, simultaneamente, cuidados e formas outras, novas de sociabilidade e de subjetividade para os que precisavam de assistência psiquiátrica. Em resumo, a partir da segunda metade do século XX, impulsionada principalmente por Franco Basaglia, inicia-se uma radical crítica e transformação do saber, do tratamento e das instituições psiquiátricas. Esse movimento iniciase na Itália, mas tem repercussões em todo o mundo e muito particularmente no Brasil. No Brasil Período colonial e republicano
Não diferente do que acontecia na Europa, até o século XVIII, os denominados loucos, ou seja, os que viviam à margem nas ruas eram levados às prisões ou confinados nos fundos das casas em aposentos-prisões, e logo em seguida, eram enviados à Europa. Outra semelhança que você poderá observar é que no Brasil, a questão das diferenças sociais e econômicas, assim como lá fora, também era vista como um fator excludente, que poderia levar ao confinamento. Para atender a estratégia de um projeto social, os hospitais representavam um espaço para doentes e sem abrigo, desvalidos, surgindo assim as Santas Casas de Misericórdia. Aqui no Brasil, ao passo que estas foram surgindo, recolhendo os doentes mentais sem que qualquer tratamento fosse oferecido, a psiquiatria ia se institucionalizando, se utilizando de castigos físicos como maneira de contenção de comportamentos ditos “inapropriados”. Por conta do aumento vertiginoso das queixas de maus-tratos após a criação da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, e por solicitação de médicoshigienistas, fora construído o Hospício Pedro II, autorizado pelo Decreto no 82/1841 expedido por Dom Pedro II. (CARVALHO, 2012)
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Inaugurado em 1852, o Hospício Pedro II surgiu como a primeira instituição psiquiátrica brasileira, concebido com o conceito moderno, seguiu o modelo francês e serviu de modelo para os demais que viriam a ser construídos. Localizava-se na Praia Vermelha, estando subordinado à Santa Casa de Misericórdia, e contava com freiras, auxiliadas por funcionários leigos designados como “enfermeiros” para prestarem assistência aos doentes mentais. Ainda no ano de 1852, foi criado o Asilo Provisório do Largo dos Curros, localizado em São Paulo, que funcionou até a inauguração do Hospital do Juquery, cuja capacidade de pacientes atendidos extrapolou, num período de quase 10 anos, pouco mais de 50% da capacidade total. (CUNHA, 1988) Seguido da experiência de Rio de Janeiro e São Paulo, foram criados outros hospitais psiquiátricos públicos em todo país: Salvador (1874), Porto Alegre (1884), Fortaleza (1886), Maceió (1891), Cruz do Peixe (1893); Manaus (1894), São Paulo (1895/1945), Barbacena (1903). (CARVALHO, 2012) O Hospício Pedro II, por questões políticas entre o Clero e o Estado, que se tornara agora uma República, passa em 1890, da Santa Casa para o governo republicano e com isso passa a se chamar Hospital Nacional de Alienados. Essa mudança gera uma grande crise que faz as freiras saírem da administração do hospital e também da ala masculina, que fica a encargo dos “enfermeiros” e médicos que passam a dominar hierarquicamente os setores em que trabalhavam. Com vistas a diminuir os impactos da falta de pessoas para trabalhar, o governo cria a Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras, nos moldes da escola francesa Salpetrière. Século XX
Você consegue recapitular o quanto de mudanças aconteceu no século XX? Se você se lembra do início da internet, desde quando ela era discada, e de quando o telefone celular era um objeto para poucos, você está no caminho certo. Entretanto, estes fatos representam uma porcentagem pequena do tanto que ocorreu. Mesmo sem grandes aprofundamentos é possível elencar: duas guerras, inúmeras mudanças sociais amplamente influenciadas pelos diversos avanços tecnológicos que aconteceram, que vão desde a corrida espacial, o surgimento da televisão, ampliação da disponibilidade do telefone, a ditadura, o movimento do feminismo, o surgimento de novas mídias, das redes sociais. Acontecimentos que revolucionaram e continuam revolucionando praticamente a vida de todo o mundo.
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Toda essa movimentação não foi diferente na área da psiquiatria que tem alguns marcos importantes neste século, nos quais se pode citar: a insulinoterapia, a eletroconvulsoterapia (ECT), a psicocirurgia, os medicamentos psicotrópicos e a fundação das comunidades terapêuticas, que aconteceram logo na primeira metade do século XX. Em território nacional, nesta época, por meio de decretos, a psiquiatria foi sendo regulamentada de modo que institucionalizava a loucura e dividia os espaços entre “loucos delinquentes” e “loucos”. A seguir, vamos acompanhar uma linha do tempo que destaca os principais acontecimentos ocorridos na psiquiatria brasileira até a chegada da Reforma Psiquiátrica que será discutida mais a frente. 1901 − Hospital do Juquery, em São Paulo, aumenta a população institucionalizada em
mais de 3.000%, em quase 30 anos, confirmando a única via de tratamento psiquiátrico.
1921 − Cria-se
o Manicômio Judiciário do Rio de Janeiro recomendado a internos “perigosos” e “incuráveis”.
1950 − Surgem novos serviços de atendimento ao paciente psiquiátrico, como leitos em:
ambulatórios, hospitais gerais e emergências.
1954 − Surge a primeira Unidade de Internação Psiquiátrica em Hospital Geral (UIPHG),
na Bahia.
1955 − Começa a
funcionar o primeiro serviço de emergência psiquiátrica, chamado de Pronto-Socorro Psiquiátrico do Instituto de Psiquiatria do Centro Psiquiátrico.
1964 − Golpe Militar que trouxe a medicina preventiva e a psiquiatria
de massa. No ano seguinte, ao serem unificados os Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP) aumentou-se os leitos psiquiátricos na rede privada, que foi financiado pelo Instituto de Previdência Social (INPS).
1970 − Marcado pelas denúncias dos profissionais de saúde mental contra a “indústria
da loucura”.
1978 e 1979 − Ocorre
3 importantes eventos que fortalecem a voz dos profissionais de saúde mental na luta contra as barbáries cometidas nas instituições psiquiátricas. Foram eles: o Congresso de Psiquiatria de Camboriú (SC), o Primeiro Encontro Nacional de Trabalhadores em Saúde Mental e o Terceiro Congresso Mineiro de Psiquiatria.
Figura 1.2 – Linha do tempo da psiquiatria no século XX no Brasil. Carvalho, 2012. Adaptado.
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A reforma psiquiátrica brasileira A reforma psiquiátrica no Brasil data de um período recente, marcado por uma época de fragilidade política pós golpe militar, em que o governo, por ocasião das eleições, perdeu força e legitimidade. Isso representou uma espécie de brecha que abriu espaço para que os mais diferentes segmentos dos trabalhadores brasileiros se organizassem em defesa de maiores direitos, buscando uma redemocratização. Neste período, a exemplo desta corrida democrática, eclodiu o “movimento sanitário”, nos anos 1970, que era favorável à mudança dos modelos de atenção e gestão nas práticas de saúde, ao defender a saúde coletiva, a equidade na oferta dos serviços, e o protagonismo de trabalhadores e usuários dos serviços de saúde nos processos de gestão e produção de tecnologias de cuidado. (BRASIL, 2005) Não foi diferente com o movimento da reforma psiquiátrica brasileira, que foi sendo organizado para mudar o paradigma de tratamento violento e amplamente desumano praticado nas instituições psiquiátricas da época, o que chamou atenção de autoridades internacionais ligadas ao movimento da Antipsiquiatria e da psiquiatria democrática italiana. De uma maneira global, a reforma psiquiátrica começou a ser gerada nos diversos encontros de trabalhadores de saúde mental que se realizaram, destacandose as cidades da Região Sudeste, foi fortalecendo seus pilares nas Conferências Nacionais de Saúde Mental, nos anos de 1987, 1992 e 2001. Compreendida como um conjunto de transformações de práticas, saberes, valores culturais e sociais, é no cotidiano da vida das instituições, dos serviços e das relações interpessoais que o processo da reforma psiquiátrica avança, marcado por impasses, tensões, conflitos e desafios. Brasil (2005 p. 6)
Ao passo que foi avançando no tempo, mais atores se envolveram neste processo sociopolítico complexo, tais quais: instituições e forças de diferentes origens que incidem em territórios diversos; os governos federal, estadual e municipal; as universidades; o mercado dos serviços de saúde; os conselhos profissionais; as associações de pessoas com transtornos mentais e de seus familiares; os movimentos sociais; e os territórios do imaginário social e da opinião pública.
capítulo 1 •
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A reforma passou desde seu nascimento por períodos distintos, marcados por diferentes características, ao passo que a luta por mudanças e novos direitos se desenrolava social e politicamente. A crítica ao modelo hospitalocêntrico – 1978 a 1989
Num primeiro1 momento, delimitado de 1978 a 1989, majoritariamente se criticou o modelo hospitalocêntrico e violento praticado na assistência psiquiátrica. Com início entre os anos de 1978 e 1980, o movimento da reforma contou com diferentes atores e instituições públicas, privadas e acadêmicas. Dentre os quais, se destacou como sujeito político fundamental nesta empreitada, o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) formado por integrantes do movimento sanitário, associações de familiares, sindicalistas, membros de associações de profissionais e pessoas com longo histórico de internações psiquiátricas. Assim, o MTSM se configurou como o primeiro em saúde com participação popular, não sendo identificado como uma entidade da saúde, mas sim um movimento que buscava a luta popular no campo da saúde mental. Cabe destaque a este ator, pois é a partir dele que se consolida o pensamento crítico ao saber psiquiátrico e pelo qual emergem originalmente as propostas de reformulação da assistência psiquiátrica. (AMARANTE, 2009) Pelo advento da cogestão – em que o governo abria espaço para a atuação do Estado nas instituições públicas – os trabalhadores decidem ocupar ambientes estratégicos nos setores críticos da saúde mental. E a partir de 1985, parte considerável dos postos de chefia de programas estaduais e municipais de saúde mental estavam sob condução de fundadores e ativistas do MTSM. No ano de 1987, acontece o II Congresso Nacional do MTSM (Bauru, SP), que registra caráter inovador, pois reuniu lideranças municipais, técnicos, usuários e familiares para participarem um opinião favorável à luta antimanicomial (AMARANTE, 2009). Esta abertura à participação popular inaugurou uma tendência em uma série de eventos em saúde mental acontecidos entre 1988 e 1990. Ainda no ano de 1987, a busca por mudanças no modelo assistencial de saúde mental vence mais uma etapa, pois surge o primeiro CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) no Brasil, na cidade de São Paulo, que passou a exercer forte influência na criação e nas mudanças de muitos serviços pelo país. 1
Divisão temporal meramente didática. capítulo 1 •
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Em 1988, seguindo a tendência da participação popular e de profissionais na construção dos serviços de saúde, cria-se junto com a Constituição, o Sistema Único de Saúde (SUS), que ao passo que segmentava o governo em 3 esferas (gestão federal, estadual e municipal) as articulava sob o poder de controle social, exercido por meio dos “Conselhos Comunitários de Saúde”. No ano de 1989, a notícia sobre a intervenção e fechamento da Casa de Saúde Anchieta, hospital psiquiátrico privado reconhecido pelos maus-tratos e óbitos de pacientes, realizado pela Secretaria Municipal de Saúde de Santos (SP), repercute nacionalmente, o que denuncia inequivocamente a urgência da construção de uma rede de cuidados em saúde mental, que fosse substitutiva em relação ao hospital psiquiátrico.
G R O . A I D E M I K I W ©
Figura 1.3 – Foto do Hospital Colônia da Barbacena, inaugurado em 1903, local de maustratos e condições subumanas.
Isso de fato aconteceu ainda neste ano (1989), ao serem implantados os Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS) que funcionam 24 horas, cooperativas, associações e residências para egressos de hospitais psiquiátricos. A experiência do município de Santos se torna um ponto de destaque no processo de Reforma Psiquiátrica brasileira. E, a partir da criação dos primeiros CAPS e NAPS, o governo na figura do Ministério da Saúde, regulamenta a implantação e o financiamento
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de serviços de mesma natureza, de modo que estes se tornem modelo em todo território nacional. Produtivo também no aspecto legal e normativo, o ano de 1989 ainda contou com a entrada no Congresso Nacional do Projeto de Lei do deputado Paulo Delgado (PT/MG), que propunha a regulamentação dos direitos da pessoa com transtornos mentais e a extinção progressiva dos manicômios no país. Portanto, até aqui a reforma psiquiátrica tinha como objetivos. Questionar o modelo assistencial até então vigente, e propor estratégias para a transformação do paradigma para a psiquiatria: Reverter o hospitalocentrismo; Implantar rede extra-hospitalar e de atenção multiprofissional; Proibir e construção de novos hospitais psiquiátricos ou a ampliação dos existentes, fazendo a desativação progressiva dos leitos existentes; Inserir leitos e unidades psiquiátricas em hospitais gerais; Integrar a saúde mental a outros programas de saúde, movimentos sociais e instituições. •
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O nascimento da rede de serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico – década de 1990
Em 1990, o Brasil torna-se signatário da Declaração de Caracas a qual propõe a reestruturação da assistência psiquiátrica. O ano de 1992 fica marcado pelos movimentos sociais, inspirados pelo Projeto de Lei Paulo Delgado, que aprovou em alguns estados brasileiros as primeiras leis que preveem a gradativa implantação dos serviços substitutivos à assistência psiquiátrica hospitalar, que dispunham de ações como: implantação de CAPS, notificação quando houvesse internação do tipo involuntária, utilização de leitos em hospitais gerais, e a demarcação dos direitos das pessoas com transtornos mentais. Soma-se aos acontecimentos anteriormente mencionados a realização da II Conferência Nacional de Saúde Mental, ainda nos anos 1990. A ideia da reestruturação da assistência em psiquiatria vai se concretizando aos poucos e novas leis passam a entrar em vigor no país, sendo as primeiras normas federais regulamentando a implantação de serviços de atenção diária, fundadas nas experiências dos primeiros CAPS, NAPS e Hospitais-dia. Nascem também as primeiras normas para fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos (BRASIL, 2005), explicitando uma organização maior em termos operacionais da nova rede de saúde mental. capítulo 1 •
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Ressalta-se que mesmo sendo observados com bons olhos pelo Ministério da Saúde, que tinham como aliado o MTSM assumindo formalmente suas proposições enquanto estratégia política, os CAPS e NAPS neste período, não dispõem de uma linha específica de financiamento próprio, o que parecia ir contra o objetivo final da reforma. Neste mesmo ritmo, estavam as normas para fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos que poderiam, mas não previam mecanismos organizados para a redução de leitos. Com isso, fica claro o posicionamento ainda com fortes traços da psiquiatria clássica do Ministério da Saúde para a Saúde Mental, já que aproximadamente 93% dos recursos (BERLINK, 2008) ainda eram destinados aos hospitais psiquiátricos. A reforma no século XXI
A virada do século é marcada logo em seu início pela criação dos Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) auxiliando os serviços substitutivos criados. Normatiza-se o serviço pela Portaria no 106/GM/MS, de 11 de fevereiro de 2000. (BRASIL, 2000) Após longos 12 anos de tramitação no Congresso Nacional, a Lei Paulo Delgado é sancionada no país no ano de 2001, sob o registro de Lei Federal no 10.216 que redireciona a assistência em saúde mental e privilegia o tratamento em serviços comunitários, dispondo sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais. Ainda que imponha novo fôlego e ritmo para o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil, a lei não dispõe de mecanismos explícitos para a diminuição dos manicômios. Porém, é sob a égide da lei 10.216 e da III Conferência Nacional de Saúde Mental, que a política de saúde mental do governo federal, alinhada com as diretrizes da reforma psiquiátrica, passa a ter maior visibilidade e sustentação. Com o ganho obtido por meio da lei Paulo Delgado e a III Conferência, o Ministério da Saúde toma um posicionamento mais bem definido em relação à Reforma e estabelece linhas específicas de financiamento aos serviços abertos e substitutivos ao hospital psiquiátrico. Dessa forma, amplia-se de modo relevante e vasto, a rede de atenção diária à saúde mental; o que significa conseguir alcançar regiões reconhecidamente muito tradicionais no quesito hospitalar, no qual a assistência comunitária em saúde mental era praticamente inexistente. No ano de 2003, é promulgada a Lei no 10.708 que estabelece o Programa “De Volta para Casa” e as portarias no 2077/GM e 2078/GM, de 31 de outubro de 2003, regulamentam como o aderir. Este programa está voltado para o processo capítulo 1 •
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de desinstitucionalização de pessoas longamente internadas. Recebe atenção ainda a questão do álcool e outras drogas, que ganham uma política incorporando a estratégia de redução de danos. Portanto, você pode observar que o período de 1990 a 2003 se concentra um grande volume de acontecimentos políticos, sociais e normativos que podem resumir em pontos estratégicos a Reforma Psiquiátrica Brasileira.
A política de saúde mental Você percebeu o quanto foi feito da década de 1980 para cá no campo da saúde mental, mais ou menos? Então você pode relembrar que os princípios do movimento iniciado na década de 1980 acabaram se tornando uma política de estado, já que todas as normativas federais e leis estaduais aprovadas nesta área acabaram por traduzir o avanço político iniciado por uma verdadeira mobilização social que ultrapassou o campo da saúde, chegando a contar com o suporte da sociedade. Mais à frente, na década de 2000, à exemplo da mudança de mentalidade e atitude do governo, é editada a Portaria no 251/GM,em 31 de janeiro de 2002, que estabelece diretrizes e normas para a assistência hospitalar em psiquiatria, reclassifica os hospitais psiquiátricos, define e estrutura a porta de entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS. Ela dispõe no artigo 2o que a classificação para os hospitais psiquiátricos integrantes da rede do SUS será apurada pelos indicadores de qualidade aferidos pelo Programa Nacional de Avaliação do Sistema Hospitalar/Psiquiatria (PNASH). (BRASIL, 2002) Diante disso, aqui você pode observar que agora há fiscalização que estabelece critérios mínimos para realização da assistência hospitalar psiquiátrica, e isso antes não acontecia, o que permitia a estas instituições operarem superlotadas na esmagadora maioria das vezes, oferecendo um tratamento desumano, violento e indigno para as pessoas com transtornos mentais. Ainda nesta época, é aprovado o financiamento e regulação tripartite, ou seja, tais responsabilidades deixam de ser centralizadas no governo federal e se dividem pelas esferas federal, estadual e municipal, o que possibilita uma ampliação importante da rede de atenção psicossocial (Raps), que passa a integrar o conjunto das redes indispensáveis na constituição das regiões de saúde, a partir da publicação do Decreto Presidencial no 7508/2011.
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Desta forma, de conquista em conquista, foi sendo mais bem delineada a política de saúde mental que tem como base até os dias atuais, a Lei no 10.216/2001, que garante os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Destaca-se na Lei Paulo Delgado que: Pessoas com transtornos mentais têm direito a ter acesso ao tratamento de saúde que melhor se adapte às suas necessidades; Devem ser tratadas com humanidade e respeito; Por meio do tratamento, devem se reinserir na família, no trabalho e na comunidade; Deverão ser protegidas contra qualquer forma de abuso e exploração, tendo garantia de sigilo nas informações prestadas a respeito de sua doença e com direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de uma possível hospitalização involuntária; Podem ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis e devem receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento. •
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A referida lei ressalta também no artigo 3o sobre a responsabilidade do Estado no desenvolvimento da política de saúde mental, seja na assistência, seja na promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, prevendo a participação da sociedade e da família. E, no artigo 6o, considera os seguintes tipos de internação (BRASIL, 2001):
I – INTERNAÇÃO VOLUNTÁRIA
acontece com o consentimento do usuário.
II – INTERNAÇÃO INVOLUNTÁRIA
acontece sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro.
III – INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA
acontece por determinação da Justiça.
CONEXÃO Quer saber mais sobre a criação e reflexões a respeito da lei 10.216? Acesse o vídeo: documentário – saúde mental e dignidade humana, disponível em: . Acesso em: out. 2017.
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Você pode estar se perguntando, mas como a Política Nacional de Saúde Mental é operacionalizada? Ela funciona por meio dos chamados equipamentos substitutivos ao modelo manicomial que, nos dias atuais, estão mais diversificados em termos de área de atuação. E o que isso quer dizer? Significa que não são somente dispositivos de saúde mental que vão promover ou mesmo realizar o tratamento da pessoa com transtorno mental. A seguir você verá que, oficialmente, as políticas públicas contemplam dispositivos em outras áreas de especialidade além psiquiatria, como por exemplo, a saúde pública, como potente para a pulverização da atenção prestada em saúde mental. Outras áreas e meios que não são da saúde funcionam comprovadamente como importantes fontes de auxílio ou mesmo de tratamento aos acometimentos psiquiátricos, como: a arte, a aproximação com animais (geralmente cães e gatos) utilizada amplamente pela psiquiatra alagoana Nise da Silveira 2 com seus clientes; e ainda a produção de vida em ambientes conectados ao território do cliente, podendo ser um parque, uma praia, uma praça, a casa de um amigo próximo etc. Fique atento ao conceito de território em Saúde Mental! Território: lugar de referência e de cuidado, promotor de vida, que tem a missão de garantir o exercício da cidadania e a inclusão social de usuários e de familiares. (CGSMAD, 2015)
Agora convido você a conhecer os equipamentos substitutivos ao modelo manicomial. São eles: •
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)
Criados pela Portaria no 224 de 29 de janeiro de 1992, os CAPS visam proporcionar atendimentos individuais, em grupos e oficinas terapêuticas, atendimentos familiares, atividades comunitárias, culturais, expressivas, esportivas, de alfabetização e geração de renda, assembleias de familiares, grupos de convivência, entre outras atividades que promovam integração e interação social (BRASIL, 2004; ONOCKO-CAMPOS, 2006;SCHNEIDER, 2009). A Portaria no 3.088, de 23 de dezembro de 2011, republicada em 21 de maio de 2013 sobre os Centros de Atenção Psicossocial os organiza nas modalidades de:
2 Saiba mais sobre o trabalho desenvolvido por Nise da Silveira assistindo ao filme “Nise - O coração da loucura”.
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I S P A C
– Atende pessoas de todas as faixas etárias que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida
Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 15 mil habitantes;
– Atende a mesma população do CAPS I
Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 70 mil habitantes.
– Atende a mesma população do CAPS I; – Funciona 24h, incluindo feriados e finais de semana, ofertando retaguarda clínica e acolhimento noturno a outros serviços de saúde mental, inclusive CAPS AD.
Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 150 mil habitantes.
– Atende pessoas de todas as faixas etárias que apresentam intenso sofrimento psíquico decorrente do uso de crack, álcool e outras drogas
Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 70 mil habitantes
– Atende a mesma população do CAPS AD; Proporciona serviços de atenção contínua, com funcionamento vinte e quatro horas, incluindo feriados e finais de semana, ofertando retaguarda clínica e acolhimento noturno.
Indicado para municípios ou regiões com população acima de 150 mil habitantes.
– Atende crianças e adolescentes que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida.
Indicado para municípios ou regiões com população acima de 70 mil habitantes.
I I S P A C
I I I S P A C
D A S P A C I I I D A S P A C
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Tabela 1.1 – Disponível em: . Acesso em: out. 2017. Adaptado.
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Unidade de Acolhimento (UA)
Funciona 24 horas nos 7 dias da semana e é um ponto de atenção em ambiente residencial com acolhimento, definido exclusivamente pelo Centro de Atenção Psicossocial de referência da pessoa com necessidade decorrente do uso de crack, álcool e outras drogas, de ambos os sexos que apresentem acentuada vulnerabilidade social e/ou familiar que demandem acompanhamento terapêutico e protetivo de caráter transitório (permanência máxima de 6 meses) e de cuidados contínuos de saúde. As Unidades de Acolhimento estão organizadas nas modalidades: Unidade de acolhimento Adulto, destinados a maiores de 18 anos, podendo variar de 10 a 15 vagas e Unidade de Acolhimento Infantojuvenil, destinadas a adolescentes e jovens (de 12 até 18 anos completos) com disponibilidade de 10 vagas. •
Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT)
São casas localizadas no espaço urbano, constituídas para responder às necessidades de moradia de pessoas portadoras de transtornos mentais graves, institucionalizadas ou não. Varia o número de usuários que nela reside, já que pode ir de uma pessoa até um pequeno grupo de 8, no máximo. Seus moradores contam com suporte profissional (seja o CAPS de referência, seja uma equipe da atenção básica, sejam outros profissionais) sensível às demandas e necessidades de cada um. A inserção em um SRT é o início de longo processo de reabilitação que deverá buscar a progressiva inclusão social do morador. Também considerados como equipamentos são: Leitos de Saúde Mental em Hospital Geral; Centros de Convivência (Cecos); Enfermarias de Saúde Mental em hospitais gerais; Oficinas de geração de renda; Consultórios na Rua 3. Adiciona-se ainda os serviços dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) e as Estratégias de Saúde da Família (ESF), pertencentes à atenção básica/saúde pública que realizam atendimento em saúde mental ao funcionarem como porta de entrada também para as demandas psíquicas. Nesses locais, as intervenções são concebidas na realidade do dia a dia do território, com as singularidades dos clientes e de suas comunidades.
3 Ficou curioso para saber como funcionam os Consultórios na Rua? Dê uma olhada no vídeo “Consultório na Rua – A rua não é um mundo fora do nosso mundo”. Disponível em: . Acesso em: out. 2017.
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O papel atual do enfermeiro na saúde mental “É provável que o processo de enfermagem seja educativo e terapêutico quando a enfermeira e o paciente podem vir a conhecer e respeitar um ao outro, como pessoas que são semelhantes, e no entanto, diferentes, como pessoas que participam em comum da resolução de problemas”. (PEPLAU, 1991, p. 9)
A influência de Hildegard Peplau na construção do papel do enfermeiro
Ícone da enfermagem contemporânea e importante teórica de enfermagem na área da psiquiatria, a enfermeira Hildegard Peplau contribuiu amplamente para a enfermagem, sobretudo a enfermagem psiquiátrica, ao criar a teoria das relações interpessoais, abrindo o caminho para um cuidado humanizado que em vez de “para”, deveria ser realizado “com” o cliente portador de distúrbios mentais. Esta relevante figura colaborou diretamente para a construção do papel do enfermeiro psiquiátrico com trabalhos publicados em diversos anos (1952, 1962), sendo que no ano de 1978, Peplau descreveu as ações que compõem o papel do enfermeiro que atua na assistência psiquiátrica. Considerou, para isso, que as intervenções de enfermagem na saúde mental e na psiquiatria abrangem um domínio extenso, não se restringindo aos serviços psiquiátricos, mas também o lar, a escola, e aqueles serviços que demandam assistência ao ser humano. Por isso, da pré-concepção ao cuidado após a morte, as relações interpessoais desenvolvidas entre cliente, familiares e profissionais da saúde devem ser consideradas. Deste modo, as metas com o processo interpessoal, em todos os serviços de atendimento em saúde mental e psiquiatria, segundo Peplau deviam ser: Educar o cliente e a família sobre a promoção, manutenção e recuperação de comportamento que contribua para o seu funcionamento integrado. Contribuir para melhorar as habilidades de enfrentamento de desafios em saúde mental, sem desconsiderar outras dimensões da pessoa, pois o cliente deve ser visto como uma pessoa, família ou comunidade, com direitos e deveres relacionados a sua saúde.
Figura 1.4 – Peplau, 1978. Adaptado.
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As transformações do papel do enfermeiro até os dias atuais
Ao longo da história da humanidade a enfermagem teve uma prática historicamente estruturada constituída por diferentes maneiras de cuidar que foram sendo determinadas pelas relações sociais de cada momento histórico. A assistência de enfermagem à pessoa portadora de transtorno mental já foi caracterizada pela punição, vigilância e repressão, muitas vezes sendo realizada por sujeitos desprovidos de qualquer formação na área. Assim, aquele mentalmente doente, não recebia tratamento digno, sendo tratado, quase sempre com truculência e violência. Sem motivações e estímulos, todas as potencialidades desses doentes eram reduzidas até se tornarem incapazes de retornar a viver em sociedade. A reforma psiquiátrica que você teve a oportunidade de estudar ao longo deste capítulo trouxe muitas mudanças no paradigma da saúde mental, não somente no cenário internacional, mas também em nosso país. Dessa maneira, ao serem implementados nos serviços de psiquiatria os aspectos que envolvem as diretrizes desinstitucionalizantes e desospitalizantes nos equipamentos substitutivos do modelo manicomial ou não, iniciou-se lentamente uma mudança no papel do enfermeiro. Logo, o enfermeiro que era preparado para executar e orientar ações técnicas claras e definidas, se viu frente ao novo modelo proposto pela Reforma Psiquiátrica que exigia (e continua exigindo) deste profissional, iniciativa, criatividade e o estabelecimento de vínculos afetivos e sociais. Tais mudanças no papel dos enfermeiros que atuam na psiquiatria vão apresentando características diversas ao se consolidarem por meio de lutas e posicionamentos estratégicos. Assim, estas transformações acontecem em maior ou menor grau dependendo do modelo de atenção ao qual o enfermeiro atuante no serviço de psiquiatria está ligado, do impacto que a Reforma Psiquiátrica gerou e continua gerando sobre esses serviços, e dos dispositivos utilizados para o acolhimento e acompanhamento dos usuários. Neste contexto, é preciso salientar que estudos (OLIVEIRA, 2003; MONTEIRO, 2006) denunciam que o trabalho do enfermeiro em psiquiatria ainda é muito burocratizado, em que grande parte do tempo é destinada a atividades administrativo-burocráticas, separação de medicações psicotrópicas, sobrando pouco espaço-tempo para se desenvolver atividades como a “comunicação terapêutica, o relacionamento interpessoal e o atendimento individual”. (SOARES, 2011, p. 113)
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Você deve estar se perguntando, mas afinal quais são as funções que compõem o papel do enfermeiro? Pois bem, ao reunir diversos estudos que tratavam sobre este assunto, Stefanelli & Fukuda (2008, p. 34) indicaram as funções primordiais a serem desenvolvidas na enfermagem em saúde mental e psiquiátrica que são Criar e manter ambiente terapêutico; Atuar como figura significativa sobre a saúde mental; Gerenciar o cuidado; Realizar a terapia do cotidiano (estabelecendo relações interpessoais); Atuar em equipe interdisciplinar; Participar e criar ações comunitárias para a saúde mental; Participar da elaboração de políticas de saúde mental. •
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Diante do exposto, as competências clínicas em enfermagem em saúde mental e psiquiatria, seja em unidades básicas de saúde, centros de saúde, ambulatórios gerais e de saúde mental, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), emergências psiquiátricas, unidade psiquiátrica em hospital geral, hospital-dia, hospital psiquiátrico, residências terapêuticas, oficinas abrigadas, entre outros, compreendem:
EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE
CONHECIMENTO DE PRECEITOS ÉTICO-LEGAIS SOBRE A ASSISTÊNCIA AO PORTADOR DE TRANSTORNOS MENTAIS
DOMÍNIO DO CONHECIMENTO SOBRE GERÊNCIA E A ASSISTÊNCIA DO CUIDADO DE ENFERMAGEM
DEFESA DOS DIREITOS E DEVERES DO CLIENTE E DE SUA FAMÍLIA
Figura 1.5 – Stefanelli & Fukuda, 2008, p. 35. Adaptado.
Vamos supor que após conhecer estas dimensões, você se pergunte o seguinte: “Se o foco do meu cuidado precisa estar no cliente, e preciso estabelecer com ele uma relação interpessoal, o que preciso dispor para isso? ”
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Townsend (2011) pode lhe ajudar na resposta, pois a autora, a partir das pesquisas de alguns teóricos e estudiosos sobre o assunto, indicou algumas condições que considera essenciais para o desenvolvimento de uma relação terapêutica que estão dispostos a seguir.
SINTONIA OU HARMONIA E AUTENCIDADE
CONFIANÇA (BASE DE UMA RELAÇÃO TERAPÊUPETICA)
Deve ser conquistada não podendo ser presumida. A confiabilidade é demonstrada por intervenções de enfermagem que transmitem aos clientes um sentimento de calor humano e carinho. Algumas intervenções de enfermagem que promovem confiança são: cumprir as promessas feitas; frequentar como cliente as atividades às quais ele tem dificuldade de comparecer sozinho; considerar na medida do possível, as preferências, solicitações e opiniões do cliente em decisões relacionadas a seu cuidado
RESPEITO
É acreditar na dignidade e valor de um sujeito, mesmo que seu comportamento seja inaceitável. Grande parte dos clientes psiquiátricos tem pouquíssimo respeito próprio, devido ao fato de terem sido rejeitados por outras pessoas em outros momentos de vida por conta de seu comportamento. Reconhecer que eles estão sendo aceitos e respeitados como sujeitos singulares pode servir para aflorar sentimentos de valor pessoal e respeito a si próprio. Portanto, ao chamar o cliente pelo nome, passar algum tempo com ele, dar tempo suficiente para responder suas perguntas e preocupações, levar em consideração suas ideias, preferências e opiniões ao planejar o cuidado, e tentar compreender a motivação por trás do comportamento do cliente mesmo parecendo inaceitável, se configuram ações que transmitem uma atitude de respeito por parte da enfermeira para o cliente.
EMPATIA (UMA DAS CARACTERÍSTICAS MAIS IMPORTANTES DE UMA RELAÇÃO TERAPÊUTICA)
Ao se colocar no lugar do outro o enfermeiro pode perceber e compreender com maior precisão o significado e a relevância dos pensamentos e sentimentos do cliente. A percepção empática quando realizada pela enfermeira ajuda o cliente a identificar seus próprios sentimentos o que contribui para seu processo de autoconhecimento.
Tabela 1.2 – Townsend, 2008, p. 77-78. Adaptado.
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ATIVIDADES Aqui você pode começar a exercitar o que aprendeu neste capítulo. Vamos lá? 01. Quais os tipos de internação que são propostos na Lei 10.216 de 6 de abril de 2001, também conhecida como Lei Paulo Delgado? 02. Indique as principais diretrizes da Reforma Psiquiátrica brasileira. 03. “O cuidado em psiquiatria está centrado nos equipamentos substitutivos ao modelo manicomial”. Faça uma reflexão sobre esta afirmativa com base no conceito de território em saúde mental, indicando qual(is) ação(ões) você enquanto enfermeiro pode realizar neste contexto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMARANTE, Paulo. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009. ANDRADE, Rubia Laine de Paula; PEDRÃO, Luiz Jorge. Algumas considerações sobre a utilização de modalidades terapêuticas não tradicionais pelo enfermeiro na assistência de enfermagem psiquiátrica. Revista Latino-Americana de Enfermagem 2005, 13 (Septiembre-Octubre) Disponível em:
www.redalyc.org/articulo.oa?id=281421849019>. Acesso em: 28 jul. 2017. BARROS, DDA (1990). A desinstitucionalização é desospitalização ou desconstrução? In: AMARANTE, Paulo. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009. BARROS, D. D. (1994) Jardins de Abel: A desconstrução do manicômio de Trieste. In: AMARANTE, Paulo. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009. BERLINCK, Manoel Tosta; MAGTAZ, Ana Cecília; TEIXEIRA, Mônica. A Reforma Psiquiátrica Brasileira: perspectivas e problemas. Rev. Latino-am. psicopatol. fundam., São Paulo , v. 11, n. 1, p. 21-28, Mar. 2008 . Disponível em: . Disponível em: . Acesso em: 27 jul. 2017. BIRMAN, J & COSTA, J. P. (__) Organização das instituições para uma psiquiatria comunitária. In: AMARANTE, Paulo. (ORG) Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1994.
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BRASIL. A reforma psiquiátrica brasileira e a política de saúde mental. Humaniza SUS, Coordenação de Saúde Mental (SAS) e a Coordenação-Geral de Documentação e Informação (CGDI/ SA/SE). Disponível em: . Acesso em: 25 jul. 2017. BRASIL. Centros de Atenção Psicossocial. Portal da Saúde. Disponível em: . Acesso em: 28 jul. 2017. BRASIL. Lei no 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Disponível em . Acesso em: 27 jul. 2017. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde mental / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Cadernos de Atenção Básica, n. 34. – Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 176 p.: il. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. DAPE. Coordenação Geral de Saúde Mental. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. Documento apresentado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas. OPAS. Brasília, novembro de 2005. Disponível em: . Acesso em 27 jul. 2017. BRASIL. Portaria no 106/GM/MS, de 11 de fevereiro de 2000. Cria os Serviços Residenciais Terapêuticos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Disponível em: . Acesso em: 27 jul. 2017. BRASIL. Portaria no 251/GM, em 31 de janeiro de 2002. Estabelece diretrizes e normas para a assistência hospitalar em psiquiatria, reclassifica os hospitais psiquiátricos, define e estrutura, a porta de entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em: 27 jul. 2017. Brasil. Ministério da Saúde. Saúde mental no SUS: os centros de atenção psicossocial. Brasília (DF); 2004. BRASIL. Serviços Residenciais Terapêuticos. Portal da Saúde. Disponível em: . Acesso em: 28 jul. 2017. BRASIL. Unidades de Acolhimento. Portal da Saúde. Disponível em: . Acesso em: 28 jul. 2017. CARVALHO, Marissol Bastos (ORG). Psiquiatria para enfermagem. São Paulo: Rideel, 2012.
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2 Saúde mental, a família e a loucura e o cuidado do enfermeiro
Saúde mental, a família e a loucura e o cuidado do enfermeiro Você avançou mais no caminho do conhecimento ao chegar até aqui, muito bem. Mas tenha calma, beba uma água, pois o percurso ainda guarda muitas curvas e informações importantes que certamente farão você chegar ao seu objetivo final, que é encerrar a disciplina mais preparado para lidar com o portador de transtorno mental em qualquer área de conhecimento da enfermagem. Para isso, o estudo deste capítulo é fundamental, haja vista que nele você saberá qual é conceito atual de saúde mental e quais são os determinantes estabelecidos mundialmente para o sujeito ser considerado saudável mentalmente. Além disso, você fará uma reflexão sobre a importância da família no tratamento e cuidado da pessoa com transtorno mental, percebendo que após a reforma psiquiátrica, esse núcleo ficou muito mais próximo, se constituindo parte, muitas vezes fundamental, do tratamento e da reinserção social do parente com transtorno mental. Uma placa muito importante no decurso de sua viagem aparecerá ao fim deste capítulo, e ela indicará como se dá o processo de cuidado realizado pelo enfermeiro, norteando mais precisamente para você alcançar sua linha de chegada. Boa aven(lei)tura!
OBJETIVOS Conhecer o conceito e os determinantes de Saúde Mental; Saber sobre a relação da família com o parente portador de transtorno mental e o serviço psiquiátrico; Identificar as ações do enfermeiro nos três níveis de prevenção em saúde mental; Compreender como é traçado o processo de cuidado do enfermeiro na área. •
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Conceito e determinantes de saúde mental Conceito
Para a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) (s.d), o conceito de saúde mental é “Estado de bem-estar no qual o indivíduo é capaz de usar suas próprias habilidades, recuperar-se do estresse rotineiro, ser produtivo e contribuir com a sua comunidade”. Em 2016, a organização acrescentou em “um ambiente que respeite e proteja os direitos básicos civis, políticos, socioeconômicos e culturais é fundamental para a promoção da saúde mental”, pois sem a segurança e a liberdade asseguradas por esses direitos, torna-se muito difícil manter um elevado nível de saúde mental (OPAS/OMS, 2016). Dessa maneira, a OMS compreende que a saúde mental e o bem-estar são peças fundamentais para as pessoas, coletiva e individualmente, pensarem, se emocionarem, interagirem uns com os outros, ganharem e aproveitarem a vida. Nesse contexto, a promoção, proteção e restauração da saúde mental podem ser consideradas como preocupação vital dos sujeitos, comunidades e sociedades habitantes deste planeta. Por afirmar que a promoção da saúde mental envolve ações que permitam às pessoas adotar e manter estilos de vida saudáveis, a Organização Mundial de Saúde destaca:
A SAÚDE MENTAL É MAIS DO QUE A AUSÊNCIA DE TRANSTORNOS MENTAIS. A SAÚDE MENTAL É UMA PARTE INTEGRANTE DA SAÚDE OU SEJA, NÃO HÁ SAÚDE SEM SAÚDE MENTAL.
ESTRATÉGIAS E INTERVENÇÕES CUSTO-EFETIVAS DE SAÚDE PÚBLICA E INTERSETORIAIS EXISTEM PARA PROMOVER, PROTEGER E RESTAURAR A SAÚDE MENTAL.
Figura 2.1 – OPAS/OMS, 2016. Adaptado.
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A SAÚDE MENTAL É DETERMINADA POR UMA SÉRIE DE FATORES SOCIOECONÔMICOS, BIOLÓGICOS E AMBIENTAIS.
Townsend (2011) explora a saúde mental sob a perspectiva de dois teóricos, Maslow (1970) e Jahoda (1958). O primeiro, Maslow (1970), identifica a hierarquia das necessidades simbolizadas em uma pirâmide, que tem no topo a “Realização Pessoal” que é atingida, segundo o autor, quando se atinge o mais alto potencial pessoal. Também pode ser compreendida a realização pessoal com o “ser psicologicamente sadio, integralmente humano, muito evoluído e plenamente maduro”. E, para ser “sadio” ou “realizado” Maslow cita as seguintes características como: 1) Percepção adequada da realidade
12) Criatividade 3) Capacidade de manifestar espontaneidade
2) Capacidade de se aceitar, aceitar aos outros e a natureza humana 4) Capacidade de se concentrar na resolução de problemas
5) Necessidade de distanciamento e desejo de privacidade
13) Um certo grau de não conformismo
6) Independência, autonomia e resistência à enculturação
11) Uma estrutura de caráter democrático e um forte sentido ético
9) Identificação com a humanidade
8) Frequentes experiências máximas, validando a dignidade, riqueza e beleza da vida
10) Capacidade de estabelecer relações interpessoais satisfatórias
7) Uma intensidade de reação emocional
Figura 2.2 – Maslow (apud TOWNSEND, 2011). Adaptado.
E para Jahoda (1958 apud TOWNSEND, 2011 p. 15) representam um reflexo da saúde mental os seguintes indicadores: Atitude positiva quanto a si mesmo; Crescimento, desenvolvimento e capacidade de conseguir a realização pessoal; Integração (manutenção do equilíbrio entre os processos vitais); Autonomia (desempenho individual independente e autodirigido); Percepção da realidade (percepção do ambiente sem distorções, com capacidade de empatia, sensibilidade social, respeito e preocupação com o desejo dos outros); Domínio do ambiente (indicador de que o sujeito conseguiu um papel satisfatório no grupo social ou ambiente). •
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Determinantes de saúde mental
Devemos entender que as circunstancias em que vivemos são os determinantes sociais da nossa saúde, fazendo parte os fatores sociais, psicológicos e biológicos que determinam o nível de saúde mental de uma pessoa. Por exemplo: as pressões socioeconômicas contínuas são reconhecidas como riscos para a saúde mental de indivíduos e comunidades. A evidência mais clara está associada aos indicadores de pobreza, incluindo baixos níveis de escolaridade.
ATENÇÃO É importante que você lembre que diversos fatores podem colocar em risco a saúde mental dos indivíduos, entre eles: rápidas mudanças sociais, condições de trabalho estressantes, discriminação de gênero, exclusão social, estilo de vida não saudável, violência e violação dos direitos humanos, como informa a OMS (2016).
Sobre o estilo de vida é relevante que seja ressaltado que as demandas midiáticas consumistas sobre o corpo (incluindo um conceito fechado de beleza), o modo de viver e a alimentação, se não bem equilibrados pelo sujeito, acabam por torná-lo escravo do que a sociedade vende como “bonito”, “popular”, “melhor” e “saudável”. Desta forma, muitos acabam, ao não conseguirem atingir os padrões editados, sobretudo pelos meios de comunicação, adoecidos mentalmente. Isso se comprova pelo alarmante número de casos de depressão, por exemplo. Globalmente, estima-se que 350 milhões de pessoas de todas as idades sofrem com esse transtorno (OMS, 2017). Depressão é a principal causa de incapacidade em todo o mundo e contribui de forma muito importante para a carga global de doenças. Mais mulheres são afetadas pela depressão que os homens. Ao piorar, a depressão pode levar ao suicídio. Portanto, assim como você pôde ver, os fatores psicológicos e também os de personalidade específicos tornam as pessoas vulneráveis aos transtornos mentais. Não se pode esquecer também das causas biológicas, incluindo fatores genéticos, que contribuem para desequilíbrios químicos no cérebro, levando ao aparecimento dos transtornos.
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“E a família, como fica? ”: a relação dos familiares com o portador de transtorno mental e o serviço psiquiátrico A família
As famílias, por representarem sistemas sociais, têm grande variação de características estruturais, o que significa que a forma abstrata de instituição cede lugar aos “imponderáveis da vida real”, isto é, às mais variadas combinações concretas daqueles elementos e papéis descritos abstratamente (PRADO,1986). Entretanto, ainda que diante das mais variadas conformações que a família possa tomar, alguns são os elementos que caracterizam um grupo familiar (PRADO,1986): Espaço de apoio à sobrevivência e proteção integral dos filhos e demais membros; Espaço dos extremos da vida: do nascimento à morte, vivência das emoções e dos afetos extremos; Espaço de conflito e de negociação, em que os sujeitos aprendem a viver saudavelmente em sociedade; Espaço de educação informal e apoio à educação formal, podendo haver ou não absorção de valores éticos e humanitários e aprofundamento de laços de solidariedade; Espaço de disponibilização de aportes afetivos e materiais necessários ao desenvolvimento e bem-estar de seus componentes. •
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M O C . S E G A M I E E R F ©
Figura 2.3 – Família. capítulo 2 •
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Sob a óptica das perspectivas, a família pode ser compreendida como: SOCIOLÓGICA
(especificam os papéis sociais e os preceitos para o comportamento dos indivíduos
ANTROPOLÓGICA
(agregado que partilha um universo de símbolos e valores, códigos e normas, relacionados aos processos de socialização) PSICOLÓGICA
(considerada uma unidade emocional em que o funcionamento de uma afeta o conjunto da família
BIOLÓGICA
(pai, mãe e filhos)
Figura 2.4 – Chapadeiro (2011). Adaptado.
Ademais, a família é a primeira célula social da qual fazemos parte e se constitui o alicerce mais sólido da ordem social, representando desta forma, a base do sistema social, sendo uma instituição criada por homens para responder às demandas sociais e também controlar a conduta de seus membros. A relação do(s) familiar(es) com o portador de transtorno psiquiátrico
Imagine o quanto delicado é saber que seu parente possui um transtorno mental. Você já parou para pensar nisso? Ou ainda, você possui um familiar com acometimento psiquiátrico? Os distúrbios psiquiátricos não são incomuns na população, pelo contrário, qualquer um pode passar por isso. Certamente essa não é uma notícia fácil e pode causar abalo na estrutura familiar, seja num primeiro ou em algum momento após o diagnóstico. Muitos familiares não estão preparados para enfrentar os problemas e não sabem como agir, por conseguinte, ao encararem as dificuldades, tentando explicar o aparecimento da doença, essas pessoas acabam por mergulhar em um caldeirão de dúvidas e conflitos (MELMAN, 2001).
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Normalmente, essa é uma situação drástica, assim mobilizam-se sentimentos de lealdade e compromisso, unindo mais os familiares em torno de seus laços sanguíneos. Mas nem sempre funciona dessa maneira, e alguns familiares acabam por se afastar, principalmente da vida social, após anos e anos de repetidos fracassos sociais, dificuldades de comunicação e interação e internações psiquiátricas recorrentes de seu familiar. Logo, essas situações geram frustrações, desespero e são um convite para um avanço lento e contínuo, na maioria das vezes, para o isolamento da vida comunitária e de suas próprias vidas, uma vez que o que passam a viver fica muito aquém das suas possibilidades existenciais (MELMAN, 2001). A imprevisibilidade no comportamento do portador de transtorno mental enfraquece as expectativas sociais e gera incertezas e dificuldades no grupo familiar e na sociedade. Isso porque, ter um membro da família com doença psiquiátrica mobiliza a rotina diária de atividades, já que geralmente não há a colaboração da pessoa mentalmente doente no cotidiano familiar e isso desgasta e sobrecarrega outros membros que nem sempre estão preparados ou dispostos a isso. Ests isolamento frequentemente é motivado pelo estigma que, ainda nos dias de hoje, se mostra muito presente na sociedade, como afirma Carvalho (2012, p.266): “Observamos que quando um membro da família adoece mentalmente (independente do diagnóstico médico), toda ela sobre com o estigma, com a sobrecarga do papel do cuidador (destinado historicamente às mulheres do núcleo familiar), com o impacto socioeconômico do tratamento (custo de medicamentos, interrupção no processo de trabalho do portador e, talvez, do membro que assume o papel de cuidador) e com a maneira de lidar com o diagnóstico e o prognóstico de uma doença crônica” (CARVALHO, 2012 p. 266). Mesmo frente ao fato de que o poder grupal tem a função de proteger seus integrantes das forças ameaçadoras, uma doença mental afronta este poder, o que gera tensão, estimulando sentimentos como, impotência e vitimização, alimentando assim, amarguras (MELMAN, 2001). É importante ressaltar que ainda que se formulem teorias de como o familiar receberá a notícia do diagnóstico do transtorno psiquiátrico de seu parente, cada pessoa é diferente, assim como as famílias. Portanto, do início do processo, ou
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seja, do primeiro contato até quando se mantiver uma relação interpessoal com os familiares daquele que é adoecido mentalmente, é preciso fazer o exercício de ouvir e respeitar o tempo dessas pessoas, suas singularidades, seu grau de instrução, suas crenças etc. A relação do(s) familiar(es) com o serviço e os enfermeiros de saúde mental Com o serviço psiquiátrico
São diversas e concretas as evidências que demonstram a eficácia das intervenções familiares para colaborar na melhora do quadro clínico, atenuar recaídas e diminuir as reincidentes internações naqueles clientes com transtorno mental severo. O suporte familiar satisfatório influencia diretamente no bom funcionamento social dos clientes psiquiátricos, embora se saiba que este vínculo possa ser permeado de problemas e obstáculos traduzidos por encargos físicos, econômicos, sociais e emocionais quando se trata de cuidar com pessoas com transtornos mentais severos, cotidianamente (MELMAN, 2001). Ainda que diante das dificuldades que surgem diariamente, a relação “clientes psiquiátricos e familiares” tomou outros rumos após a reforma psiquiátrica. Isso porque antes, os hospitais psiquiátricos não consideravam os familiares como um pilar do tratamento do cliente. Diferente disso, a partir da reforma, a família foi trazida para o atendimento, e sua transição promoveu implicações relevantes para os familiares, para o cliente e os profissionais de saúde. Dessa forma, a desinstitucionalização é essencialmente realizada quando a família também está incluída na assistência. Estes últimos, por sua vez, se viram desafiados com a proposta da inclusão da família na continuidade do tratamento, bem como, quando foram inseridos na demanda de cuidados (CARVALHO, 2012). É consenso que a família é configurada como a primeira rede social de uma pessoa e é primordial para a manutenção do cliente com doença mental fora do hospital psiquiátrico, possibilitando assistência ampliada em saúde mental, ao se levar em conta os recursos que oferece e a atuação na comunidade.
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REFLEXÃO Até aqui você percebeu que a família tem ao menos dois grandes papéis? Você saberia dizer quais são eles? Reflita um pouco... o primeiro é que a família representa um suporte, seja social, emocional, econômico, moral etc. Para o parente com transtorno psiquiátrico. Aí está um dos papéis. Mas e o outro? O segundo é que a família também tem que ser tratada, orientada, medicada quando necessário for, e isso significa participar dos atendimentos oferecidos no serviço junto aos profissionais de saúde mental, em atividades em grupo ou individuais. Lembre que este movimento representa também o que a reforma psiquiátrica propõe na desinstitucionalização!
Cientes de que cada família tem sua dinâmica, é preciso estar atento ao tipo de ambiente em que o cliente vive, pois ambientes familiares excessivamente críticos e estressantes são desfavoráveis para o tratamento. Por exemplo: um adulto jovem de 22 anos, que faz uso rotineiro de drogas (drogadicto) como cocaína e maconha, reside em uma casa de 3 cômodos, junto com o pai que é dependente de álcool e usa de violência com a mãe, e mais 6 irmãos de idades que variam de 3 a 21 anos. A casa não tem sistema sanitário. Você consegue imaginar como é ter que conviver neste ambiente com os familiares diariamente? Diante de sua reflexão, como você pensa que deve ser para este rapaz se recuperar do vício? O ambiente familiar o ajuda? Existem ainda famílias, que por serem superprotetoras e ora demasiadamente envolvidas, intensificam de forma exagerada os conflitos e dificultam os acordos, sendo também prejudiciais ao tratamento. Além disso, há aquelas famílias que chegam ao serviço psiquiátrico já desacreditadas após terem passado por diversas tentativas fracassadas de estabilização de seu parente. Por isso, encontram-se desiludidas e com expectativas pessimistas em relação à melhora do quadro, desacreditadas na transformação de uma realidade que se mantém insatisfatória por períodos longos. Com isso, o resgate da esperança destes sujeitos é uma forma de respeito e incentivo, fundamentais no desenvolvimento do cuidado. Uma estratégia para isso é se aproximar do universo desses familiares pacientemente e de maneira sensível, procurando os sentidos embutidos em suas histórias. Ao atentar para a subjetividade dos familiares abre-se um caminho para conhecê-los mais abrangente e globalmente, o que permite o desenvolvimento de capítulo 2 •
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modalidades de cuidado mais aderentes às suas necessidades. Ou seja, considerar e conhecer como um sujeito constrói sua visão de mundo pode estimular o estabelecimento de um diálogo entre a observação científica e as interpretações das experiências de vida (MELMAN, 2001). Isso quer dizer que por mais que você saiba o caminho correto científico da condução deste ou daquele cliente, se não respeitar as subjetividades dele e de seus familiares, pode colocar todo o vínculo e até o tratamento a perder. Sendo assim, os pensamentos de dois autores, indicam posicionamentos e visões, que são quase dicas, as quais podem ser valiosas para a pessoa-enfermeiro, principalmente quando se trata da atuação em saúde mental, e são eles: Rubem Alves, que afirma que é preciso fazermos o exercício e o curso da “escutatória”, pois ouvir, às vezes (ou talvez, na maioria delas), é mais importante do que falar; e Saint-Exupery que nos lembra que “o essencial é invisível aos olhos”. Dessa forma, os serviços que se utilizam de encontros individualizados com os familiares, de modo que possam se sentir mais confortáveis em falar de suas questões, e/ou podem propor atividades em grupos, têm se mostrado um valioso instrumento para dinamizar, enriquecer e humanizar o cuidado, e vem se revelando como tecnologia efetiva e eficiente para expandir o potencial terapêutico. Com o enfermeiro
A enfermagem é uma das categorias profissionais que mais tem contato com o cliente e esta afirmação não funciona diferente na saúde mental. É o enfermeiro que habitualmente orienta a família sobre normas e rotinas do serviço psiquiátrico. Ao realizar a entrevista admissional no serviço psiquiátrico é importante que o enfermeiro pergunte, com o objetivo de apontar relações fortalecidas ou pontos de conflito, sobre os vínculos: Com a família; Com amigos; No ambiente de trabalho; Em outras atividades sociais destacadas pelo cliente. •
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Ao conhecer a família, o enfermeiro deve avaliar pontos fortes e fracos da mesma assim como os recursos, ainda que sejam emocionais, para lidar com a situação que se instalou. Estando mais próximo, o enfermeiro então, pode compreender melhor e identificar mais especificamente o diagnóstico de enfermagem relacionado
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ao processo de desgaste da família. Sobre tais diagnósticos, existe uma gama variada disposta em NANDA 2009-2011, e você pode visualizar alguns deles a seguir. Manutenção do lar prejudicada Risco de tensão do papel do cuidador Tensão do papel do cuidador Risco de paternidade ou maternidade prejudicada Disposição para paternidade ou maternidade melhorada Paternidade ou maternidade prejudicada Processos familiares disfuncionais Disposição para processos familiares melhorados Conflito no desempenho do papel mãe/pai Processos familiares interrompidos Tabela 2.1 – Carvalho, 2012.
O enfermeiro lança mão de diferentes formas de intervenção. O estímulo às trocas de experiências em grupos é uma delas e pode se dar em um grupo interdisciplinar, em que os membros da equipe do serviço também estejam presentes. Essa ferramenta além de estimular a empatia (exercício de se colocar no lugar do outro), estimular a gradativa construção de confiança que possibilita a expressão da singularidade de cada um e possibilitar que o outro saiba que não está sozinho no mundo, pressupõe uma disponibilidade para acolher o sofrimento e a angústia alheia, ao mostrar que muito do que é vivido por aquele que fala pode ser semelhante à narrativa daquele que, por ora, ouve. No embalo das diretrizes da Reforma, o trabalho deste profissional voltouse mais à observação do sujeito e menos para os sintomas, enfatizando as possibilidades de conviver com as limitações e expandir as potencialidades, tanto na família como na comunidade. Este olhar que abrange as dimensões constituintes do sujeito é realizado na ClínicaAmpliada(clínicadosujeito), que é um modo de operar a assistência, em que adoençanuncaocupatodoolugardosujeito; o cuidado, portanto, fica centradonavidadocliente. Esse que é um ser biológico, social, sub jetivo e histórico e, dessa maneira, suas demandas mudam no tempo, posto que seus valores e desejos são (re)construídos socialmente. Tomando isso em conta, as necessidades de cuidado ao familiar em convivência com a pessoa em sofrimento psíquico devem revelar ao enfermeiro dados da avaliação de riscos, e não apenas epidemiológicos, mas sociais e subjetivos também (SILVA, 2011). capítulo 2 •
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Neste contexto, o enfermeiro tem a possibilidade e o potencial de construir as estratégias de cuidado a partir da observação das necessidades e da capacidade de cada pessoa, identificadas individualmente ou em grupo. Com efeito, o cuidado clínico de enfermagem deve permear a politização dos sujeitos, na qual os atores buscam a produção de autonomia por meio da realização de práticas que envolvem dignidade, criatividade, acolhimento, interdisciplinaridade, escuta e compartilhamento de saberes. Portanto, são amplas as possibilidades de intervenções existentes a partir dos diagnósticos de enfermagem feitos no atendimento a famílias de pessoas com transtorno mental, listado a seguir conforme (CARVALHO, 2012 p. 269): O enfermeiro pode: Investigar os fatores contribuintes, como o estigma social associado à doença e seus encargos financeiros; Ao orientar um familiar sobre a necessidade de adesão ao tratamento, fazer uso da empatia e das técnicas de comunicação terapêutica; Avaliar o déficit de conhecimento do familiar disposto a prestar apoio ao portador de transtorno mental; Incluir os familiares nas sessões de educação em saúde, como também encaminhar os familiares a grupos de autoajuda; Investigar a compreensão dos familiares sobre a doença; Proporcionar empatia ao cuidador, permitindo o compartilhamento de seus sentimentos e frustrações; Ao realizar uma visita domiciliar, avaliar os fatores contribuintes para a manutenção prejudicada do lar, como a incapacidade para a realização de tarefas domésticas ou a insuficiência de recursos financeiros; Identificar os sistemas de apoio dos familiares, seus pontos fortes e fracos, não somente no sentido cognitivo, mas pela óptica das emoções por eles vividas. •
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Embora sejam sugeridas intervenções, o enfermeiro tem a total capacidade de avaliar a situação e atuar de forma individual ou em grupo interdisciplinar, colocando em prática a intervenção que entende ser a mais compatível com as questões observadas e dialogadas com os sujeitos que irá assistir. Dessa maneira, o cuidado em saúde mental realizado pelo enfermeiro não é e não deve ser engessado, devendo sempre levar em consideração a voz do cliente, do familiar e a certeza de que a saúde mental é produzida por uma gama de possibilidades desde artísticas à geográficas que devem, sempre que possível, colaborar como relevantes elementos no processo do cuidado. capítulo 2 •
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Prevenção em Saúde Mental e as intervenções de enfermagem O conceito dos níveis de prevenção em saúde iniciaram por Leavell &Clarkna década de 1970. A divisão feita em três níveis de prevenção tinha base na saúde pública. Já após a Carta de Otawa (década de 1980), a promoção da saúde tornouse objeto de políticas públicas em várias partes do mundo. No entanto, até hoje tem diferença de objeto em relação à prevenção da doença, ou seja, enquanto a promoção da saúde procura orientar um público livre de doenças de modo que seja evitado seu adoecimento; a prevenção de enfermidades tem como objetivo a redução do risco de se adquirir uma doença específica por reduzir a probabilidade de que uma doença ou desordem venha a afetar um indivíduo. A seguir você pode compreender melhor as diferenças dos níveis de prevenção: PREVENÇÃO PRIMÁRIA
PREVENÇÃO SECUNDÁRIA
PREVENÇÃO TERCIÁRIA
Ação tomada para remover causas e fatores de risco de um problema de saúde individual ou populacional antes do desenvolvimento de uma condição clínica. Inclui promoção da saúde e proteção específica
Ação realizada para detectar um problema de saúde em estágio inicial, muitas vezes em estágio subclínico, no indivíduo ou na população, facilitando o diagnóstico definitivo, o tratamento e reduzindo ou prevenindo sua disseminação e os efeitos de longo prazo.
Ação implementada para reduzir em um indivíduo ou população os prejuízos funcionais consequentes de um problema agudo ou crônico, incluindo reabilitação.
Figura 2.5 – Brasil (2013). Adaptado.
As ações de enfermagem em saúde mental também podem ser divididas de acordo com o nível de prevenção, conforme divide Stefanelli (2008), enunciada com adaptações e ajustes que foram julgados necessários. •
Atividades do enfermeiro na: prevenção primária
Aqui o objetivo é de contribuir para tornar pessoas, famílias e comunidades mais capazes de enfrentar as situações conflitantes ou estressantes, o que significa diminuir sua suscetibilidade aos transtornos mentais. Podem ser realizadas ações de identificação e avaliação de grupos vulneráveis a agravos de saúde mental como adolescentes, filhos de pais dependentes do álcool, pais jovens, idosos, mães solteiras etc.; fatores de riscos; potencial para enfrentamento de situações estressantes; atividades em ações comunitárias e políticas de saúde mental. capítulo 2 •
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Incluem-se atividades de orientação e educação sobre: Melhores condições de vida; Desenvolvimento sexual; Princípios de saúde mental; Direitos e deveres em relação a si mesmo e aos outros; Promoção e manutenção da saúde mental; Prevenção de transtornos mentais em hospital geral; Crescimento e desenvolvimento normais. •
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Exemplos de atuação na prática: grupos de conscientização sobre escolha de gênero nas escolas; participação nos sistemas sociais de apoio como nas ONG’s. •
Atividades do enfermeiro na: prevenção secundária
Neste nível de prevenção, o enfermeiro objetiva detectar precocemente e dar assistência imediata à pessoa com transtorno mental ou em situação de crise. As seguintes ações podem ser realizadas: Desenvolvimento de terapia fundamentada nas relações interpessoais enfermeiro-cliente; Criação de atendimento pós-alta para o cliente e família nos serviços de saúde mental; Planejamento e avaliação de unidades psiquiátricas em hospital geral, e a seguinte avaliação de seu funcionamento; Gerência e avaliação de serviços de enfermagem de saúde mental; Criação de serviço de interconsulta de enfermagem em saúde mental e psiquiátrica; Criação e manutenção do ambiente terapêutico nos diversos serviços de saúde mental; Atuação na comunidade e em organizações relacionadas à saúde mental; Intervenção em crise. •
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Atividades que o enfermeiro deve ter participação neste nível de prevenção podem ser exemplificadas como: formação de grupos de familiares de pessoas com transtorno mental e pessoas da comunidade; formação de grupos de autoajuda para os transtornos mais incidentes observados no serviço e/ou na comunidade a qual atua.
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Palestras, orientação do cuidado em domicílio, encaminhamento de participantes dos grupos, estímulo à criação de associações de familiares e amigos com transtornos mentais para engrossar a rede de solidariedade e apoio também são atividades que podem ser realizadas pelo enfermeiro neste nível de prevenção. •
Atividades do enfermeiro enfermeiro na: prevenção prevenção terciária terciária e reabilitação social
O foco está voltado para os mecanismos de enfrentamento de prejuízos em decorrência de transtornos mentais e a reabilitação do cliente, por meio de ações como: Promoção e reabilitação social do cliente; Encaminhamento para serviços existentes na comunidade como oficinas abrigadas , grupos de autoajuda, residências terapêuticas, hospital-dia; Organização e participação em programas e organizações que ajudem na reinserção social do cliente; Esclarecimento da população sobre os recursos existentes na comunidade, sua utilização e a conscientização de seus direitos e deveres. •
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Outras atividades como: educação continuada em serviço, gerência dos serviços de enfermagem em saúde mental e psiquiátrica, supervisão do pessoal de enfermagem, pesquisas em enfermagem em saúde mental e psiquiátrica e participação em políticas públicas são indicadas para serem realizadas pelo enfermeiro especialista e saúde mental e psiquiatria, preferencialmente.
Processo de cuidados de enfermagem em saúde mental Para que você possa realizar o cuidado em saúde mental, é necessário além de observar o cliente, levando em consideração que ele é um ser biológico, social, subjetivo e histórico, é preciso organizar suas ações e registrá-las, tanto para fins de comprovação legal das atividades exercidas, quanto para orientar outros profissionais no cuidado que está sendo realizado, para dar continuidade de outros enfermeiros da equipe, para orientar a equipe de enfermagem na assistência ao cuidado, entre outros. Com isso, o enfermeiro precisa de uma organização no modo como desenvolve seus registros e para isso deve adotar um processo de enfermagem. Sobre isso, você já deve conhecer a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) expedida pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) pela Resolução
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no 358/2009. No entanto, a literatura especializada em Enfermagem Psiquiátrica sugere a utilização processo de enfermagem delineado pela American Nurses Association (ANA) (1994). Ambas têm semelhanças, no entanto, há alguns itens diferentes. Dessa maneira, vamos ver uma comparação entre o que é proposto por cada uma?
SISTEMATIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM – SAE (2009)
AMERICAN NURSES ASSOCIATION – ANA (1994)
PROCESSO DE ENFERMAGEM
PROCESSO DE ENFERMAGEM
1ª Etapa: investigação (anamnese +
Padrão I – Avaliação
exame físico)
Coleta de dados de saúde do cliente Padrão II – Diagnóstico
2ª Etapa: diagnósticos de enfermagem
Análise dos dados da avaliação para determinar o diagnóstico – Identificação dos resultados Avaliação dos resultados esperados individualizados para o cliente
Padrão III 3ª Etapa: identificação dos resultados
4ª Etapa: implementação da assis-
tência de enfermagem (prescrição de enfermagem) 5ª Etapa: avaliação da assistência em
enfermagem
– Planejamento Elaboração de plano de cuidados que prescreve intervenções para atingir os resultados esperados Padrão IV
Padrão V – Implementação
Implementação das intervenções identificadas no plano de cuidados Padrão VI – Análise final
–
Analise o progresso do cliente em atingir os resultados esperados
Tabela 2.2 – SAE e ANA - um comparativo." Townsend Townsend (2011).
Embora a nomenclatura tenha diferenças, se compararmos as etapas, você perceberá a semelhança entre elas, ou seja, mesmo objetivos a serem atingidos ao menos até a 4a etapa (SAE) e Padrão IV (ANA). Neles a nomenclatura é diferente, mas a ação final que é a prescrição de enfermagem ou prescrição das intervenções
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de enfermagem é a mesma. O que é possível inferir é que a SAE comprime na 4a etapa dois padrões da ANA, o IV e o V. Desse modo, a 5a etapa e o Padrão VI avaliam/analisam o progresso do cliente ao indicarem o registro dos resultados atingidos. O importante aqui é você saber que há semelhanças entre o que você já aprendeu na SAE e o que a ANA propõe, sendo assim ao saber utilizar a SAE sabe-se também utilizar a ANA. Agora que você sabe que os processos de enfermagem são semelhantes, conheceremos melhor aquele proposto pela ANA, que está presente na literatura de enfermagem psiquiátrica. Para isso, serão utilizados Townsend (2011) e Stefanelli (2008) com as adaptações e os acréscimos que se julgaram necessários. •
O processo de enfermagem
Composto por seis etapas que utilizam a abordagem de problemas. O processo de enfermagem é contínuo, portanto não estático e deve acompanhar as modificações das respostas físicas ou comportamentais do cliente. Em relação aos padrões, eles representam as atividades profissionais de enfermagem que são evidenciadas no processo de enfermagem pelos enfermeiros. •
Padrão I – Avaliação
A entrevista de avaliação possibilita à enfermagem psiquiátrica fazer julgamentos clínicos válidos e planejar intervenções aderentes ao problema apresentados pelo portador de transtorno mental. Na entrevista, deve ser observado o comportamento do cliente e deve ser utilizada comunicação adequada ao grau sociocultural seu e de sua família, que contemple as dimensões:
BIOPSICOSOCIAL
ESPIRITUAL
CULTURAL
INTELECTUAL
Os dados que devem constar na entrevista são: história e evolução do estado emocional e mental do cliente (histórico de enfermagem), considerando também
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sua saúde física. O enfermeiro deve levar em consideração dados da família e ainda acrescentar algum elemento ou fato que considere relevante.
COMENTÁRIO Nesta etapa você pode começar uma espécie de banco de dados do cliente captando informações: da entrevista, de observações do cliente em seu ambiente, da consulta realizada por outros membros da equipe, do prontuário e/ou da realização de um exame físico, deve identificar informações sobre o sono, a higiene, alimentação, hidratação, as ideias expressas, atividades e intercorrências. Após algumas destas informações reunidas, você poderá registrá-las diariamente no prontuário.
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Padrão II – Diagnóstico
O diagnóstico de enfermagem é fundamental para a seleção e a provisão das intervenções de enfermagem. Aqui, portanto, são analisados os dados colhidos durante a avaliação que devem estar em ordem de prioridade. Os diagnósticos devem ter base em sistemas de classificação conhecidos como o NANDA (North American Nursing Diagnosis Association), a ®CIPE (Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem), o que não significa estar somente engessado a estas ideias, uma vez que são bem-vindos novos olhares e construções atuais dos diagnósticos, ainda mais quando se trata de saúde mental, em que há muito mais sutilezas e subjetividades envolvidas na maioria das vezes, do que questões físicas. As ações de enfermagem neste momento são: Identificar, listar e priorizar os problemas; Elaborar os diagnósticos de enfermagem; Priorizar os diagnósticos; Registrar em impresso adequado; •
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Padrão III – Identificação dos resultados (Objetivos)
Os resultados esperados são derivados a partir do diagnóstico e podem ser identificados segundo a Classificação dos Resultados Esperados (NOC), desde que sejam delineados da forma mais realista possível, de acordo com a capacidade atual e em potencial do cliente, levando-se em consideração o contexto da assistência.
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Devem ser estabelecidos a curto, médio e longo prazos, refletindo a evolução do conhecimento em relação a saúde mental. As ações de enfermagem neste momento são: Priorizar os problemas; Elaborar os resultados esperados a partir dos problemas identificados; Registrar os resultados esperados no prontuário do cliente. •
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Padrão IV – Planejamento (Intervenções)
O planejamento das intervenções deve ser seguro, individualizado, apropriado e com base em evidências. Para cada diagnóstico são selecionadas as intervenções mais apropriadas, que são elaboradas com o cliente, familiares e membros da equipe interdisciplinar, quando possível. Sobre isso, o aspecto interdisciplinar não deve ser ignorado, mas no planejamento de enfermagem são especificadas as ações do papel do enfermeiro. O trabalho dos outros membros da equipe é deveras considerado e a discussão com estes é a melhor forma de contribuição para o sucesso da assistência de enfermagem integrada à interdisciplinaridade, que oferece por meio de cada profissional, seu olhar voltado para o cuidado do cliente. As ações de enfermagem neste momento são Planejar intervenções individualizadas; Envolver a família do cliente e dos demais membros da equipe; Registrar as intervenções em impressos próprios. •
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Padrão V – Implementação
Ao implementar o plano de cuidados, deve ser usada ampla variedade de intervenções que visam prevenir doenças mentais e físicas, a fim de promover, manter e restaurar a saúde mental e física do cliente. Deve-se atentar para aspectos como a coordenação do cuidado (orientação da equipe quanto a prescrição do cuidado); as interações terapêuticas (ter como meta a independência e a interdependência saudável do cliente e da família em suas vidas cotidianas); ambiente terapêutico (utiliza o ambiente físico, as estruturas social e cultural e demais recursos disponíveis com os familiares e outros profissionais, quando possível); intervenções biopsicossociológicas; e orientação ao cliente (o enfermeiro identifica as necessidades de educação do cliente e orienta-o sobre
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princípios básicos da saúde física e mental, sobre enfrentamento, habilidades sociais, saúde e transtorno mental). As ações de enfermagem neste momento são Implementar intervenções adequadas e atuais; Respeitar os aspectos éticos e legais na implementação do cuidado. •
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Padrão VI – Análise Final
Neste momento o enfermeiro irá medir o êxito das intervenções em atingir os resultados esperados, sendo a resposta do cliente ao tratamento documentada, o que irá validar o processo de enfermagem na prestação do cuidado. A revisão dos diagnósticos é efetuada e documentada, assegurando a continuidade do cuidado. Ressalta-se que as pessoas importantes para o cliente devem ser englobadas na avaliação, para se verificar o nível e a satisfação do cliente e da família com o cuidado. Conhecer os padrões do cuidado de enfermagem em saúde mental e psiquiátrica orienta o desempenho do enfermeiro na prática cotidiana no trabalho a ser desenvolvido nos serviços de saúde mental. Destaca-se que cada instituição irá dispor de uma rotina em que o trabalho de enfermagem será adaptado de diferentes maneiras. No entanto, ainda que estas diferenças de rotina existam, é preciso reforçar que a essência do processo de enfermagem não deve e não pode ser perdida. Essa profissão permite flexibilização de condutas terapêuticas e maneiras diversas de intervir, o que não descaracteriza de modo algum o trabalho que é desenvolvido. Havendo um propósito, ou seja, um resultado esperado, construído a partir do diagnóstico de enfermagem identificado, as intervenções de enfermagem deverão seguir os princípios éticos que poderão incluir ou não, o que está disposto nas classificações padronizadas. Em saúde mental o que vale é (re)produzir a vida, ajudando-a a se reinserir de volta num trilho (ou em novos trilhos) que em algum momento dela se desvinculou. E, o enfermeiro em saúde mental tem a nobre e importante participação nesta recuperação ao exercer sua prática dentro das diretrizes éticas, profissionais, com respeito e dignidade, de maneira competente e séria. Portanto, que este argumento signifique usar sua criatividade, leveza, sensibilidade e amor em seu trabalho fazendo-o crescer e evoluir.
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ATIVIDADE 01. A partir do estudo de caso disposto a seguir, formule um plano de cuidados indicando três diagnósticos de enfermagem, três intervenções de enfermagem e três resultados esperados. M. T. P., 38 anos, sexo feminino, estudou até a 4a série, nunca trabalhou, católica não praticante. Foi adotada com 1 ano de idade e não possui informações de familiares biológicos. Sem histórico pregresso de crises convulsivas e traumatismos importantes. Considerada tímida e um tanto isolada no colegial, no entanto, refere amizades e por vezes era agressiva na escola. Apresentou dificuldades de aprendizagem, chegando a permanecer cinco anos na mesma série. Iniciou comportamento isolado após o falecimento de uma das irmãs. Aos 17 anos saiu de casa para morar com o companheiro com o qual teve um filho. Informa parto difícil, inquieto. Apresentava intensas dificuldades de cuidar do filho. Família refere primeira crise seguida de internação psiquiátrica aos 20 anos. Apresentava um quadro de insônia, discurso pobre e desconexo, confusão, desorientação, fugas (saindo de casa sem retornar), alucinações visuais, comportamento bizarro e pueril, heteroagressiva, não conseguia fazer atividade alguma. Depois desse internamento, passou por vários outros. Ao iniciar o tratamento no CAPS em 2003, quando tinha 26 anos, apresentou um quadro clínico que persistiu nas admissões subsequentes no mesmo serviço, cursando com insônia, embotamento afetivo, discurso pobre, repetitivo e desconexo, delírio persecutório, alucinações visuais e auditivas, agressividade com a mãe adotiva e com os transeuntes na rua, comportamentos inadequados, sem iniciativa para realizar quaisquer atividades em casa, sem consciência de sua morbidade e com dificuldades em seguir o projeto terapêutico proposto pela equipe interdisciplinar. M. T. P negou etilismo, tabagismo, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus e outras doenças clínicas. Mediante a obtenção dos dados e pelo acompanhamento de M. T. P. no serviço substitutivo percebeu-se: descuido da aparência pessoal, vestimentas sujas, cabelos despenteados, odor de suor, discurso pobre, comportamento pueril, afeto embotado e falta de consciência sobre sua doença, não adesão ao tratamento medicamentoso.(Com adaptações, MESQUITA, 2015)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Rastreamento
/ Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica.
– 1. ed., 1. reimpr. – Brasília: Ministério da Saúde, 2013.95 p. : il. – (Cadernos de Atenção Primária, n. 29) BRASIL. Resolução COFEN no 358/2009. Dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos ou privados, em
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que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem, e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em: 5 ago. 2017. CARVALHO, Marissol Bastos (ORG). P siquiatria para enfermagem. São Paulo: Rideel, 2012. CHAPADEIRO, Cibele Alves; OKANO,Helga Yuri Silva Andrade; ARAUJO, Maria Rizoneide Negreiros de Araújo. A família como foco da atenção primária à saúde. Belo Horizonte: Nescon/UFMG, 2011. Disponível em: . Acesso em: 1 ago. 2017. CZERESNIA, Dina; FREITAS, C. M. (Org.) Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003. Disponível: . Acesso em: 1 ago. 2017. JAHODA, Marie. (1978). Currents concepts of positive mental health. In: TOWNSEND, Mary. Enfermagem psiquiátrica: conceitos de cuidados. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
MASLOW, Abraham. (1970). Motivation and personality. In: TOWNSEND, Mary. Enfermagem psiquiátrica: conceitos de cuidados. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
MELMAN, Jonas. Família e doença mental: repensando a relação entre profissionais de saúde e familiares. São Paulo: Escrituras Editora, 2001. MESQUITA, Keysse Suélen Fidelis de; SANTOS, Cândida Maria Rodrigues dos. Assistência de enfermagem na saúde mental com elaboração de um plano de cuidados. Revista Contexto &Saúde, Ijuí, Editora Unijuí v. 15n. 29 jul./dez. 2015 p. 30-36. Disponível em: .Acesso em: 5 ago. 2017. NAVARINI, Vanessa; HIRDES, Alice. A família do portador de transtorno mental: identificando recursos adaptativos. Texto contexto - enferm.,Florianópolis ,v. 17, n. 4, p. 680-688,Dec.2008 . Disponível em: . . Acesso em: 5 ago. 2017. Organização Pan-Americana de Saúde/Organização Mundial de Saúde Brasil. OPAS/OMS apoia governos no objetivo de fortalecer e promover a saúde mental da população. 2016. Disponível
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3 Transtornos mentais: classificação e a assistência de enfermagem
Transtornos mentais: classificação e a assistência de enfermagem Após saber sobre o papel do enfermeiro na saúde mental e psiquiatria, agora você irá pegar a próxima curva à direita e irá entrar em outra rota de conhecimento que é a dos transtornos mentais. Atenção, essa rota não é curta, tanto que ela continuará no próximo capítulo. Mas essa direção você só verá mais à frente. Neste caminho você passará pela anamnese realizada pelo enfermeiro, andará pelos principais transtornos do humor, atravessará alguns transtornos de ansiedade e despontará nos transtornos psicóticos elementares. Surpreso? Você ainda não viu nada! Mas não desista porque o meio do caminho se aproxima e você ainda aprenderá muita coisa! Até breve!
OBJETIVOS •
Adquirir conhecimentos sobre a semiologia psiquiátrica (anamnese realizada pelo
enfermeiro; •
Conhecer os principais transtornos do humor e a assistência de enfermagem;
•
Descrever as características de alguns transtornos de ansiedade e a assistência de
enfermagem; •
Descobrir os transtornos psicóticos mais recorrentes e a assistência de enfermagem.
O texto deste capítulo teve como base Stefanelli (2008), Delgalarrondo (2008), Carvalho (2012), Kaplan & Sadock (2007), CID-10 (1998), DSM-IV (2003), NANDA (2015) e outras fontes que subsidiaram tais produções, tendo sofrido adaptações conforme julgou-se necessário.
Semiologia psiquiátrica – anamnese realizada pelo enfermeiro A anamnese que o enfermeiro realiza no cliente em saúde mental e psiquiatria além da parte física, conta também com o exame psíquico ou exame do estado mental ou a súmula psicopatológica. Esse exame, para ser realizado, depende da capacidade de observação do enfermeiro e também de uma postura que envolve respeito e empatia com o cliente. capítulo 3 •
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Dessa forma, todos os enfermeiros, independentemente do contexto de sua prática, devem estar aptos a realizar o exame do estado mental, incorporando os dados identificados no plano de assistência de enfermagem, já que sua realização é imprescindível para que seja traçado o diagnóstico de enfermagem e seja elaborado um plano de assistência individualizado. O enfermeiro deve registrar o exame do estado mental em sua evolução de enfermagem, ou em algum impresso específico, este último pode variar de serviço para serviço. Desta forma, o que é importante saber sobre a construção do exame psíquico?
Deve ser apresentado como um roteiro. No início, a descrição geral e em seguida, as funções psíquicas.
Não há nenhum tipo de padronização no modo como as funções psíquicas são organizadas e agrupadas
Não é necessário se preocupar em definir precisamente os sinais e sintomas, nem explicar como eles são reconhecidos na prática.
Agora que você sabe um pouco mais do exame psíquico, vamos conhecer quais são as funções psíquicas, suas definições e alterações que podem ser avaliadas. 1. Descrição geral o entrevistador);
(aparência,
comportamento
e
atitude
diante
É no momento inicial que devem ser observadas a aparência, o comportamento e a atitude diante do examinador. Descreve-se o estado geral de saúde e nutrição, a postura, a idade (ou idade aparente), a marcha, o olhar, a expressão facial, se as pupilas estão dilatadas ou constritas, o vestuário e o que chamar atenção neste quesito (podem ser incluídos acessórios e maquiagem), corte de cabelo, presença de piercings e/ou tatuagens, higiene e o que mais chamar atenção num primeiro momento do examinador. Tais fatores ajudam na compreensão dos aspectos culturais e da personalidade dos clientes. Estes, por sua vez, não podem ser julgados pelo enfermeiro, independentemente de seus parâmetros de valores e suas atitudes pessoais. capítulo 3 •
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Ressalta-se que alguns clientes poderão adotar, neste momento, uma postura colaborativa ou mesmo poderão ignorar de modo intencional, as perguntas que serão realizadas. Assim, o examinador deverá estar preparado emocionalmente para este tipo de reação. 2. Psicomotricidade
A psicomotricidade reflete as comorbidades neurológicas e os efeitos colaterais de psicotrópicos. Inclui o comportamento e a atividade motora, envolvendo a velocidade e intensidade da mobilidade geral, os impulsos, as motivações, as vontades, os desejos e os instintos expressos pela atividade motora e o comportamento de um sujeito. Quando desordenada, pode causar; Lentificação psicomotora que é o retardamento do pensamento e dos movimentos (hipoatividade); Agitação psicomotora que representa a excessiva hiperatividade que frequentemente é improdutiva, e é em resposta a uma tensão interna; Estereotipia, que são repetições automáticas e uniformes de um determinado ato motor de ação física ou da fala; A presença de sinais característicos de catatonia (anomalias motoras) como o estupor catatônico (lentificação motora, imobilidade); flexibilidade cérea (manutenção de posturas impostas por outros), obediência automática, resistência passiva e ativa, negativismo (resistência imotivada); Rigidez catatônica é a manutenção de uma postura rígida, contrária a todos os esforços para a movimentação; Cataplexia é a perda temporária do tono muscular somada a uma fraqueza que pode ser iniciada por uma variedade de estados emocionais; Compulsão é o impulso incontrolável para realizar um ato repetitivamente (tricotilomania: compulsão por arrancar os cabelos; cleptomania: é a compulsão por furtar); Catalepsia é uma acentuação exagerada do tônus postural, com redução da mobilidade passiva dos seguimentos corporais e com hipertonia muscular; Conversão, surgimento de sintomas físicos (paralisias, cegueira, anestesias, parestesias etc;); Dentre outros. •
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capítulo 3 •
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3. Nível de consciência
É identificada como estado de lucidez que promove a integração da pessoa ao meio ambiente. Quando preservada, a pessoa está lúcida, vigil ou consciente. Quanto às perturbações, a consciência pode estar alterada qualitativa e/ ou quantitativamente. Sobre as alterações qualitativas, que podem se dar mesmo sem ocorrência das alterações quantitativas, temos; Despersonalização que é o senso subjetivo de ser irreal, estranho ou mesmo não familiar consigo mesmo; Desrealização que é o senso subjetivo de que o ambiente é estranho ou irreal, sendo um sentimento de realidade alterada. •
•
No que diz respeito às alterações quantitativas, essas podem estar aumentadas ou diminuídas, como você verá, a seguir: Hipervigilância ou hipervigília, que é o estado de intensa clareza da consciência, acompanhado do aumento da capacidade de apreensão de impressões pela percepção; Sonolência ou letargia, que é quando o sujeito se encontra dormindo, mas desperta com estímulos; Obnubilação é o estado de diminuição da clareza da atividade psíquica, em que se necessita ser intensamente estimulado, com impulsos auditivos e táteis, para se responder a comandos simples; Estupor ou torpor é quando o sujeito não desperta se não for estimulado de maneira intensa e dolorosa, e quando cessam os estímulos, volta ao estado de inconsciência apresentando resposta com sons incompreensíveis e/ou com abertura ocular; Coma é um grau profundo de inconsciência, no qual a pessoa não demonstra conhecimento de si e do meio externo, não respondendo aos estímulos advindos do ambiente; Assim, permanece de olhos fechados como num sono profundo e apresenta somente respostas de reatividade; Estado confusional agudo ou Delirium é quando o sujeito apresenta diversos graus de rebaixamento do nível da consciência que vai de leve a moderado, apresentando uma reação desnorteada, aguda, que pode ser flutuante, intranquila, desorientada, associada a alucinações e ao medo, com diminuição da concentração, desorganização do pensamento, desorientação espaço-temporal, sonolência, aumento ou redução da psicomotricidade, tendo como origem orgânica, oscilando ao longo do dia. •
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4. Orientação
A capacidade de se orientar é classificada em orientação autopsíquica e halopsíquica. A orientação autopsíquica é a orientação que a pessoa tem em relação a si mesma. Ela revela se a pessoa sabe quem é ao identificar seu próprio nome, idade, data de nascimento, profissão, estado civil etc. A orientação halopsíquica é a orientação em relação ao mundo, ou seja, quanto ao espaço (orientação espacial) e quanto ao tempo (orientação temporal). Como você pode verificar alterações na orientação? Observe o senhor L. abaixo. Na entrevista realizada no ambulatório do serviço de saúde mental e psiquiatria, ele diz a enfermeira: “Meu nome é L., tenho 26 anos, nasci em 25 de abril de 2011 e neste momento acho que estou no apartamento da minha irmã que fica na Rússia”. M O C . S E G A M I E E R F ©
Figura 3.1 – A desorientação auto e halopsíquica no cliente.
Pode parecer difícil ou surreal isso acontecer, mas acredite, não é. Portanto, neste momento o enfermeiro deverá escrever na evolução de seu exame psíquico: “Sr. L. apresenta desorientação auto e halopsíquica (espacial e temporal)”.
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5. Linguagem
Representa o principal instrumento de comunicação dos seres humanos, sendo avaliada em quantidade, velocidade, volume e qualidade. Algumas das alterações que podem aparecer na fala (ou linguagem) são: Pobreza da fala, que é a restrição na qualidade da linguagem, respostas monossilábicas; Logorreia que é o aumento da velocidade da fala; Bradilalia que é a diminuição da velocidade da fala; Disartria é a incapacidade de articular corretamente as palavras devido a alterações neurológicas referentes ao aparelho fonador, portanto a fala é pastosa, arrastada, parecendo “embriagada”, sendo de difícil compreensão; Dislalia, distúrbio que acomete a fala, troca as palavras por outras similares na pronúncia, fala erroneamente as palavras, trocando as letras; Diafemia, conhecida como gagueira ou gaguez, é a mais comum desordem de fluência da fala; Mutismo, que é a ausência de respostas verbal (palavras) e oral (qualquer emissão de som) por parte do cliente; Ecolalia é a repetição da última ou das últimas palavras que o entrevistador ou outra pessoa presente no ambiente falou ou dirigiu ao cliente; Por exemplo: Ao perguntar “Conseguiu descansar a noite?”, o cliente fala: “Noite, noite, noite”; Jargonofasia forma de afasia, caracterizada por rapidez excessiva na fala, tornam a linguagem incompreensível (salada de palavras). •
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6. Pensamento (curso, forma e conteúdo)
O pensamento é um fluxo de ideias, símbolos e associações que têm objetivo. É constituído por curso, processo ou forma e conteúdo. O curso do pensamento é o mesmo que o fluxo do pensamento, que pode se apresentar normal, lentificado ou acelerado. Quando alterado pode apresentar: Aceleração do pensamento (taquipsiquia); Lentificação do pensamento (bradipsiquia); Fuga de ideias1 é quando uma ideia se segue a outra de forma extremamente rápida, produzindo uma mudança constante de uma ideia para outra, havendo um progressivo afastamento da ideia diretriz ou principal; A fuga de ideias é uma alteração geralmente associada a quadros maníacos; •
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1 Enquanto Delgalarrondo (2008) considera a fuga de ideias uma alteração da forma do pensamento, Carvalho (2012) classifica a fuga de ideias como perturbação do curso do pensamento;
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Interceptação ou bloqueio: há interrupção brusca do que vinha falando e o cliente pode retomar o assunto como se não tivesse interrompido (comum na esquizofrenia). •
O processo ou a forma do pensamento é a estrutura básica com que as ideias se apresentam, de maneira lógica e organizada no pensamento. Quando alterados, podem causar: “Salada de palavras” (jargonofasia) que é uma mistura incoerente de palavras e frases que demonstram uma extrema desorganização do pensamento; Desacarrilamento, que é o desvio súbito ou gradual no curso do pensamento, sem bloqueios. Por exemplo, vamos tomar o Sr L. como sujeito da fala a seguir. A enfermeira pergunta: “Sr, L. qual é a atividade que o senhor mais gosta de fazer?”. E o Sr L. responde: “Eu gosto de cantar mas minha irmã vai chegar em casa daqui a pouco e o verde da sala me lembra salada. Quando acordo vejo o pássaro e a neve e está quente aqui hoje”. Perceba a nítida mudança das ideias que se dá de modo contínuo e sem interrupções, como acontece na fuga de ideias; Verbigeração, que é a repetição sem sentido de palavras e frases específicas. Prolixidade que é a descrição repetitiva de ideias, com introdução de palavras ou frases supérfluas (não consegue separar o essencial do acessório); Neologismo que é a criação de novas palavras. •
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O conteúdo do pensamento é aquilo que preenche a estrutura do processo de pensar. Nesse sentido, o conteúdo corresponde ao tema do pensamento. Quando o conteúdo do pensamento é alterado pode causar: Pobreza do conteúdo, que é quando o pensamento oferece poucas informações, com caráter vago e repetições vazias; Roubo de pensamento, que é o delírio de que os próprios pensamentos sejam removidos da mente por outras pessoas ou forças; Obsessão; Coprolalia, que é a verbalização compulsiva de palavras vulgares e obscenas; Fobia, que é o temor persistente, irracional, exagerado e, invariavelmente, patológico, de algum tipo de estímulo ou situação específica; Delírio é uma falsa crença, com base em inferência incorreta sobre a realidade externa, não é compartilhado por pessoas da mesma cultura e tem alta significação individual, podendo haver situações em que se passa a viver fora da realidade. •
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Uma distinção faz-se importante: – Delirium: rebaixamento da consciência (delirium tremens; delirium febril); – Delírio: alteração do pensamento (alteração do juízo). •
As ideias delirantes (delírio) podem ser agrupadas em tema típico: •
Expansão do eu
– Delírio de grandeza, que traduz uma concepção exagerada da própria importância, poder ou identidade. – De controle, que é a falsa impressão de que a própria vontade, pensamentos ou sentimentos estão sendo controlados por forças externas. – Místico ou religioso, que é a crença de que a pessoa é favorecida por um ser superior ou de que é um instrumento desse ser. •
Retração do eu
– Paranoide ou persecutório (perseguição) – Autorreferência •
Negação do eu
– Hipocondríaco, que é quando a pessoa tem a certeza de que está gravemente doente ou sofre de um mal incurável. – De autoacusação, em que a pessoa se sente responsável por atos que geram remorso ou culpa. – De tendência ao suicídio. 6. Percepção
É compreendido como um processo de reação a estímulos nos órgãos do sentido e pode também ser denominado de sensopercepção. Apresenta alterações quantitativas e qualitativas. As perturbações quantitativas são relacionadas ao aumento na intensidade e duração das percepções, chamado de hiperestasia; e a diminuição da sensibilidade aos estímulos, denominado de hipoestasia. As alterações qualitativas envolvem majoritariamente: A ilusão que é a percepção deformada de um objeto presente e real, geralmente é visual. •
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A alucinação é uma percepção sensorial falsa, que não está associada a estímulos externos reais (não tem objeto). Apresenta diversos tipos alguns dos quais apresentados a diante: – Auditiva, que é a falsa percepção de sons, em geral, vozes que podem ser ameaçadoras e que insultam. Corresponde ao tipo mais comum. – Visual, que é a falsa percepção envolvendo a visão, consistindo em imagens, com ou sem forma. – Tátil, que é a falsa percepção de toque ou sensação na superfície da pele. – Gustativa e olfativa. – Cenestésicas (corpórea, sensibilidade visceral). – Cinestésicas (movimento). – Pseudoalucinação é uma atividade intensa da imaginação, a imagem adquire o aspecto de percepção real. •
7. Humor / M O C . S E G A M I E E R F
O humor é uma emoção abrangente e constante que dá cor a percepção que a pessoa tem do mundo, é subjetivamente experimentada e relatada pelo sujeito. Quando alterado, o humor pode ser: Eutímico que é a faixa normal; Disfórico que é o estado de ânimo desagradável; Lábil, que são oscilações súbitas e imotivadas de um estado para o outro; Eufórico, que é o estado de alegria intensa, exagerada e desproporcional às circunstâncias; Deprimido que é o sentimento patológico de tristeza; Anedonia que é a perda total ou parcial do interesse e afastamento de todas as atividades regulares e prazerosas.
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8. Afeto
Pode ser entendido como componente emocional de uma ideia. Usa-se também o termo afeto para designar, de modo inespecífico, qualquer estado de humor, sentimento ou emoção. O afeto pode estar: Adequado, em que o tom emocional está em harmonia com a ideia e o pensamento que o acompanha; Lábil representado por mudanças bruscas e rápidas no tom emocional, sem relação com estímulos externos; Embotado que é quando há uma severa redução no sentimento externado com a redução do tônus e da modulação. •
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9. Atenção
Pode ser compreendida como a direção da consciência em que se destaca a vigilância (consciência sem foco, difusa, com atenção em tudo ao redor) e a tenacidade (capacidade de se concentrar num foco). O cliente não pode ter essas duas funções concomitantemente exaltadas. Observa-se assim: Euprossexia – atenção normal; Normovigilância – vigilância normal. •
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Suas alterações apresentam-se como: Hipoprosexia em que se verifica perda básica da capacidade de concentração, com fatigabilidade aumentada, dificultando a percepção dos estímulos ambientais e a compreensão; Aprossexia representa a total abolição da capacidade de atenção, por mais intensos e diversos que sejam os estímulos; Hiperprossexia que significa um estado de atenção exacerbada; Hipotenacidade a atenção se afasta com demasiada rapidez. •
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10. Memória
A memória é uma função psíquica extremamente complexa que registra, armazena e recupera a informação. A memória pode ser imediata, que reproduz ou recorda o que aconteceu em segundos ou minutos; recente (anterógrada), que
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recorda eventos recentes; remota (retrógrada), que recorda eventos de um passado distante; de evocação, que é a capacidade de recuperar e atualizar os dados fixados; e a de fixação, que capta os novos fatos. A memória pode sofrer alterações quantitativas e qualitativas. As quantitativas são: Amnésia que é a incapacidade de recordar fatos acontecidos; Hipermnésia que é um grau ampliado de recuperação e atualização dos fatos. •
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Já algumas alterações qualitativas são: Confabulação que é a invenção consciente de respostas falsas, nas quais se crê, que preenchem vazios, sem a intenção de enganar alguém. Déjà-vu que é a ilusão de reconhecimento visual de uma situação que pode ser considerada como repetição de uma lembrança anterior. •
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11. Inteligência
É a função psíquica complexa que determina a resolução de problemas. Considera-se como alteração da inteligência, o retardo mental, que apresenta gradações.
GRAU DE RETARDO MENTAL
IDADE MENTAL CORRESPONDENTE
Leve
Criança de 9 a 12 anos
Moderado
Escolar de 6 a 9 anos
Grave
Criança de 3 a 6 anos
Profundo
Criança menor de 3 anos
Tabela 3.1 – Grau de retardo mental e idade mental correspondente. Stefanelli (2008). Adaptado.
12. Julgamento
É a capacidade de avaliar uma situação de modo correto e apropriado conforme o contexto envolvido e a idade do sujeito. Pode ser divido em crítico, que é a capacidade para discernir e escolher entre diferentes opções em determinada
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situação; e prejudicado, que é a redução na capacidade de compreender corretamente uma situação e agir adequadamente. 13. Insight
É o grau de conscientização e compreensão de que se está doente. Alguns clientes podem negar a doença, outros ter uma ligeira consciência. Portanto, é preciso informar se o insight está ou não preservado, considerando seus níveis.
COMENTÁRIO Para saber sobre como está o insight da pessoa, pode-se perguntar sobre como está sua situação atual.
14. Vontade
É ela quem determinará a passagem da intenção para a ação, e este processo envolve intenção, deliberação, pragmatismo e execução. Enquanto o pragmatismo é a capacidade de o sujeito transformar suas ideias e vontades em comportamentos e ações práticas, determinando a execução ou interrupção da atividade pela pessoa, o apragmatismo é a incapacidade de realizar condutas volitivas simples, como a higiene pessoal e atividades cotidianas. A vontade (bulia) possui alterações quantitativas que são: Abulia , que é a falta de vontade, abolição da energia, do estado de vigor, da iniciativa e motivação da pessoa; Hiperbulia , que é o aumento da energia, do vigor, da iniciativa e motivação da pessoa; Hipobulia que é a redução da quantidade da energia, do estado de vigor, da iniciativa e motivação da pessoa. •
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15. Consciência do eu
Pode ser compreendida como a consciência de estar vivo, existindo fisicamente. Essa consciência pode ser entendida por meio de atributos como o da identidade que é a consciência de ser o mesmo na sucessão do tempo, entendendo que apesar da mudança de alguns aspectos da personalidade “sou eu mesmo sempre”.
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COMENTÁRIO Para saber se a consciência do eu está preservada, pergunte como seu cliente se sente em relação a si próprio.
16. Impulsividade
Os impulsos são necessidades inatas para determinado tipo de comportamento, mas quando excessivos podem escapar ao controle. Representa uma medição do perigo potencial a si mesmo e a outros, podendo ser avaliado por informações da história recente do cliente e por seu comportamento percebido no momento da entrevista.
Transtornos do humor e a assistência do enfermeiro As pessoas que possuem transtorno do humor exibem características extremas do humor que variam de manifestações e comportamento deprimido (em todos os graus de depressão) às manifestações de comportamento agitado, eufórico e agressivo em diferentes nuances. A respeito das manifestações do comportamento deprimido, estas ocorrem geralmente em pessoas com episódio depressivo (F.32) ou com depressão do transtorno bipolar (F.31) por conta da tristeza profunda, incapacidade de se sentir feliz ou ter prazer, cansaço etc. As manifestações que decorrem do comportamento agitado, eufórico ou agressivo são geralmente apresentadas por clientes que apresentam episódio maníaco (F.30) em vários níveis.
REFLEXÃO Você reparou algo diferente no texto apresentado? Observe com atenção. Ao lado dos diagnósticos, episódio maníaco, episódio depressivo e transtorno bipolar, apareceu uma letra e um número. Você sabe o que isso representa? Representa a classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde, na prática, conhecida como CID-10. Ela fornece códigos relativos à classificação de todas as doenças conhecidas e de uma grande variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas externas para ferimentos ou doenças e é publi-
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cada pela Organização Mundial de Saúde (OMS). A parte de saúde mental é representada no “capítulo V Transtornos Mentais e Comportamentais (F00-F99)” representados pela letra fF Outra ferramenta que auxilia na identificação dos transtornos psiquiátricos é o DSM-5 (Manual Estatístico e Diagnóstico de Transtornos Mentais) que está em sua 5a versão. Portanto, enquanto o CID-10 trata da classificação de todas as doenças, o DSM se direciona somente para os diagnósticos em saúde mental. Ambos são válidos nos serviços de saúde mental e psiquiatria.
A seguir você conhecerá alguns transtornos de humor que são transtorno afetivo bipolar (F31) e episódio depressivo (F32). Transtorno afetivo bipolar
O transtorno afetivo bipolar (TAB) é caracterizado pela presença de episódios depressivos, episódios maníacos e períodos de normalidade. Nestes episódios pode haver mania, hipomania, depressão, sendo comum ocorrerem sintomas depressivos em um episódio de mania. Os episódios de mania são caracterizados por autoestima inflada ou grandiosidade; redução da necessidade do sono, pressão de fala, fuga de ideias, distraibilidade, aumento da atividade psicomotora, envolvimento excessivo de atividades prazerosas. No episódio maníaco, o portador de transtorno bipolar possui aparência que pode ser de exuberante à bizarra. O cliente pode optar por usar roupas extravagantes (no formato ou combinação), curtas, acessórios, maquiagens exageradas (batom borrado, muita maquiagem nos olhos, geralmente chamativas e borradas). Dispõe de um olhar fixo, por vezes, intimidante. Apresentam-se inquietos ou com agitação psicomotora (têm dificuldades de ficarem parados). Seu humor fica exaltado, eufórico, lábil e até irritadiço, o que pode gerar uma atitude hostil. O tom de voz é alto e o curso é rápido, ficando complicado de assimilar o que está sendo dito, o que pode levar a fuga de ideias e delírios que estarão alinhados ao humor. O sono fica diminuído devido ao aumento de energia, desinibição social o pode levar a um comportamento heteroagressivo. Já nos episódios depressivos, o cliente inverte o humor e fica calado, sua energia fica baixa o que o leva a não querer fazer atividades comuns como tomar banho, por exemplo. A fala fica retraída assim como a postura corporal. As ideações suicidas podem aparecer nesta parte do ciclo do humor.
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MULTIMÍDIA Quer entender melhor como funcionam esses sinais e sintomas na vida de um portador do transtorno bipolar? Então pegue uma pipoca e assista aos filmes: O lado bom da vida e Sentimentos que curam.
Geralmente, entre os episódios de depressão e mania, ocorre um momento de eutimia (humor normal, tranquilo) que pode revelar prejuízos em diferentes áreas da vida, como profissional, social e pessoal. Em relação à epidemiologia, o transtorno bipolar pode ter seu início da infância aos 50 anos, com uma média de acometimento aos 30 anos de idade. Por isso, este transtorno ocupa o sexto lugar de causas de incapacitação no mundo, e cerca de 15% dos casos não tratados se encaminham para o suicídio. As comorbidades físicas e mentais, o risco de suicídio, o prejuízo sociocupacional e a baixa aderência ao tratamento levam ao aumento da carga global da doença e ainda dos custos a ela relacionados. Assim, esse transtorno está associado a altas taxas de recorrência e recaída. M O C . K C O T S R E T T U H S |
MANIA SEVERA HIPOMANIA
C O D H T A P
NORMAL
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DEPRESSÃO MÉDIA DEPRESSÃO SEVERA
Figura 3.2 – Sujeito com transtorno bipolar.
ATENÇÃO Transtorno ciclotímico se caracteriza pela alternância entre períodos hipomaníacos e depressivos ao longo de pelo menos dois anos em adultos e um ano em crianças.
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Tratamento
São utilizados estabilizadores do humor (lítio e anticonvulsivantes), antipsicóticos atípicos e típicos, antidepressivos, eletroconvulsoterapia2, ansiolíticos e terapias complementares como a cognitivo-comportamental, psicossociais e interpessoais. Intervenções de enfermagem
Uma prerrogativa para qualquer intervenção de enfermagem em qualquer área de atuação, principalmente em saúde mental e psiquiatria, é o estabelecimento de limites como medida terapêutica básica para aumentar o autocontrole do cliente. Estes limites devem ser respeitados não só pelo cliente como também pela equipe de enfermagem, e não deve ser visto como uma atitude punitiva. A seguir, alguns diagnósticos e intervenções de enfermagem para clientes com TAB:
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Déficit no autocuidado para banho relacionado ao prejuízo de atenção e à inquietação
Supervisionar e, se necessário, auxiliar o cliente na realização, adequação e escolha das atividades de autocuidado
Risco de suicídio relacionado à culpa, à vergonha em consequência das alterações de comportamento presentes no episódio maníaco
Incentivar autocontrole do cliente Manter o cliente próximo do posto de enfermagem para visualização contínua Avaliar a ideação suicida quanto aos fatores de risco, planos e possibilidade de execução
Privação de sono relacionado à atividade diurna inadequada, à estimulação ambiental por tempo prolongado, caracterizado por agitação, alucinações, ansiedade, incapacidade de concentração e irritabilidade
Estimular períodos de repouso e higiene do sono com medidas relaxantes
Figura 3.3 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem no transtorno afetivo bipolar.
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Temos como ações de enfermagem também: Registrar todas as manifestações relatadas ou observadas que indiquem a ideia de suicídio. Estar atento a mudanças de comportamento do cliente, que pode apresentar além das oscilações de humor pertinentes ao transtorno, manifestações de ciclagem (mudança de um estado depressivo para o maníaco e vice-versa) rápida. Orientar o cliente, cuidadores e familiares para os períodos de eutimia em que deve se dar continuidade ao tratamento, prevenindo recaídas e/ou internações. Estabelecer plano de orientação à família ou ao cuidador sempre que for possível em parceria com eles. •
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Episódio depressivo ou depressão
Alterações e sintomas da depressão estão centrados na função psíquica da afetividade, mais estreitamente do humor. Pode haver redução da energia e atividade pela perda da capacidade de sentir prazer, que vem acompanhado de queixas ou uma aparência que denota tristeza profunda. Quando perguntada sobre o que sente, a pessoa tem dificuldades ou mesmo não consegue traduzir o que vivencia. O episódio depressivo ou depressão é caracterizado por um ou mais casos sem história de episódios maníacos ou hipomaníacos em qualquer época da vida, deve ter duração de pelo menos duas semanas e não deve estar relacionado ao uso de substâncias psicoativas. De acordo com o CID-10 (1998), dois ou mais dos sintomas a seguir devem estar presentes: humor depressivo, tristeza profunda; inibição ou ausência da capacidade de sentir alegria ou prazer (anedonia); redução da energia e fatigabilidade aumentada (hipoatividade, apragmatismo, fadiga). M O C . S E G A M I E E R F ©
Figura 3.4 – Episódio Depressivo ou Depressão.
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Diante disso, o enfermeiro deve observar expressão facial que sugere tristeza profunda; com ou sem choro; rima bucal voltada para baixo; olhar fixo (geralmente para o horizonte ou voltado para baixo); emagrecimento; isolamento social e quietude (retraimento); descuido com a aparência e higiene pessoal, principalmente cabelo e roupas; lentidão psicomotora; fala lenta, em baixo tom de voz, e, sua maioria monossilábica e monótona; padrão de sono afetado; vontade frequentemente comprometida; conteúdo do pensamento formado de ideias de nulidade, nuli dade, desesperança, culpa, vazio, muitas vezes de morte ou suicidas. O episódio depressivo pode ser leve, moderado ou grave, acompanhados ou não de sintomas psicóticos. Sobre a etiologia, atualmente a depressão é compreendida como a interação de fatores ambientais em sujeitos que tenham predisposição genética. Sabe-se que os episódios depressivos acontecem, geralmente, após perdas significativas de pessoas próximas queridas, do emprego, do status social, de moradia, de familiares, e também por conta de eventos adversos precoces, como o abuso físico e/ou sexual e baixo suporte social. A respeito da epidemiologia, a Organização Mundial de Saúde (OMS) indicou que a depressão é a principal causa de incapacidade em todo o mundo e contribui de forma impactante para a carga global de doenças. Em um de seus relatórios, a OMS informa que até 2020 a depressão será a maior causa de doenças, perdendo somente para as doenças cardíacas. Globalmente, estima-se que 350 milhões de pessoas de todas as idades sofrem com esse transtorno, sendo que mais mulheres são afetadas pela depressão do que homens. Uma grande barreira ao atendimento eficaz é a avaliação imprecisa. Em países de todos os níveis de renda, pessoas com depressão frequentemente não são diagnosticadas corretamente. Tratamento
É feito com antidepressivos que podem estar associados a outros medicamentos. Caso não estejam produzindo o resultado desejado, o cliente é reavaliado e pode ser introduzido no tratamento antipsicóticos estabilizadores do humor (lítio como potencializador) ou eletroconvulsoterapia (ECT).
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MULTIMÍDIA Quer saber mais sobre a ECT? Leia o artigo: ANTUNES, Paula Barros et al. Eletroconvulsoterapia na depressão maior: aspectos atuais. Rev. Bras. Psiquiatr., São Paulo, v. 31, supl. 1, p. S26-S33, May 2009 . Disponível em: . t=sci_arttext&pid=S1516-4446200 9000500005&lng=en&nrm=iso>. . 005>. Acesso em: 18 ago. 2017.
Terapias complementares como as psicoterapias, a terapia ocupacional, a psicoeducacional, a de enfermagem e a terapia cognitivo comportamental (TCC) associadas à farmacoterapia também têm sido utilizadas. Intervenções de Enfermagem
A assistência de enfermagem ao cliente com depressão deve estar centrada na proteção da vida da pessoa, já que a ideação suicida é frequente.
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Déficit no autocuidado para alimentação relacionado ao cansaço e/ou desconforto e/ou diminuição da motivação, caracterizada pela incapacidade de ingestão suficiente de alimentos.
Estimular e, se necessário, auxiliar o cliente na realização das atividades de autocuidado.
Desesperança relacionada à incapacidade para atingir as metas valorizadas na vida e/ou incapacidade de participar das atividades desejadas, caraterizada por alterações no padrão de sono, diminuição do apetite.
Oferecer apoio, sem uso de expressões clichês. Transmitir empatia para verbalização de dúvidas e medos. Auxiliar o cliente a identificar razões para viver.
Risco de violência direcionada a si mesmo relacionada à história de múltiplas tentativas de suicídio, à ideação suicida, aos indícios comportamentais e/ou verbais, à presença de um plano de autoaniquilamento.
Manter o cliente o mais próximo possível do posto de enfermagem para visualização contínua e, se possível, acomodá-lo em enfermaria com mais de um cliente.
Manutenção do lar prejudicada relacionada à depressão.
Monitorar o responsável sobre a administração de medicamentos. Avaliar recursos comunitários.
Figura 3.5 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem na depressão. Carvalho (2012). capítulo 3 •
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Temos como ações de enfermagem também: Oferecer apoio se mantendo ao lado do cliente, mesmo que ele não diga nada, pois seu tempo e silêncio devem ser respeitados; Utilizar frases curtas e objetivas de modo que sejam facilmente compreendidas pelo cliente ao se explicar algo ou valorizar seus progressos; Mantê-lo ocupado em atividades de acordo com suas condições e preferências; Oferecer experiências que propiciem o desenvolvimento de sua autonomia. •
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Transtornos de ansiedade e a assistência do enfermeiro A ansiedade é comumente experimentada pelos seres humanos. Desta forma, ela é básica na condição humana e oferece um alerta muito importante à capacidade de sobrevivência e de autopreservação. No entanto, a partir do momento em que a ansiedade deixa de ser uma espécie de mola impulsionadora do desenvolvimento pessoal, passa a ser objeto de perturbações frente às crescentes e estressantes exigências da sociedade atual. Assim, Peplau (apud STEFANELLI, STEFANELLI, 2008) indica quatro níveis de ansiedade que vão do leve (associado à tensão da vida cotidiana), moderado (preocupações imediatas), intenso (focalizar em um detalhe e não pensar em outras coisas), e o pânico (associado com a perplexidade, temor, terror; os detalhes parecem fora de proporção). Portanto, para a ansiedade ser considerada patológica, deve-se avaliar a intensidade, a duração, a frequência e o prejuízo gerado na vida da pessoa. Neste contexto, você estudará a seguir, alguns transtornos de ansiedade, que são: transtorno de ansiedade generalizada (TAG) (F41.1), transtorno do pânico (F41), agorafobia (F40), e transtorno obsessivo compulsivo (TOC) (F42). Transtorno de ansiedade generalizada
A ansiedade generalizada caracteriza-se por ansiedade persistente, persis tente, de nível intenso, incontrolável e desproporcional ao estímulo recebido, levando l evando à preocupação crônica, não realista e claramente excessiva em relação aos eventos e problemas do cotidiano. A preocupação excessiva com o cotidiano, desse modo, é a característica central e invade diversos aspectos da vida da pessoa, como saúde, finanças, filhos, trabalhos, relações sociais, entre outros.
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O portador desse transtorno apresenta intensa ansiedade, com interferência em diferentes aspectos da vida, tremores, dispneia, palpitações, queixas abdominais, sudorese excessiva e humor irritadiço. Sintomas como insônia, dificuldade para relaxar, angústia, irritabilidade aumentada e dificuldade de concentração, além de sintomas físicos como taquicardia, tontura, cefaleia, tremores, dor muscular, epigastralgia, boca seca, parestesia, sudorese, lipotímia etc. Apresenta etiologia multifatorial, influenciada amplamente por fatores biopsicossociais. Transtorno do pânico
É caracterizado pela ocorrência inesperada e espontânea de ataques de pânico. Os ataques se dão com início abrupto, chegando ao ápice de 5 a 10 minutos, e geralmente têm a duração de 5 a 30 minutos. Os ataques vêm acompanhados de ansiedade intensa, taquipneia, palpitações, sudorese, tremores, sensação de asfixia, aperto no peito, náuseas, tonturas, ondas de calor ou calafrios, medo intenso (de morrer, enlouquecer ou perder o controle), boca seca, parestesia nos membros e lábios e sensação de desfalecimento. Em crises intensas, os portadores deste transtorno podem experimentar diversos níveis de despersonalização, com sensação de perda de controle, e ainda, desrealização que é a sensação de que o ambiente está estranho, não familiar. Pode ocorrer na crise, medo de morrer, enlouquecer ou mesmo medo de ter um infarto. Motivo este que leva grande parte dos que estão tendo um ataque de pânico ir parar nas emergências de hospitais. Ao não ser identificado nenhum acometimento físico, tais pessoas podem ser taxadas de histéricas ou descontroladas. Em termos epidemiológicos, as mulheres são 2 a 3 vezes mais propensas ao desenvolvimento do transtorno do que os homens. E o início desse transtorno pode ocorrer em qualquer idade, mas em média, surge em torno dos 25 anos (KAPLAN & SADOCK, 2007). O curso geralmente é crônico e flutuante enquanto a frequência e a gravidade variam amplamente, podendo eventos como perdas, serem associados com a reagudização do quadro. Agorafobia
É definida como o medo de espaços abertos, sendo caracterizada também como medo de estar em locais públicos e de multidão ou de estar em locais nos
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quais seria difícil uma saída rápida ou um socorro imediato, em caso de uma possível crise ou ataque de pânico. É apontada como uma complicação do ataque de pânico. Em termos epidemiológicos, a agorafobia se desenvolve em torno dos 30-40 anos, sendo mais frequente em mulheres. Acarreta prejuízos na vida de seus portadores, pois estes não conseguem sair de casa desacompanhados, ou irem ao trabalho, o que pode ainda ocasionar conflitos familiares. Transtorno obsessivo compulsivo (TOC)
Este transtorno é caracterizado por obsessões e/ou compulsões. Geradoras de ansiedade, as obsessões, podem aparecer por pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes que se impõem a pessoa de modo intrusivo, repetitivo, estereotipado, gerando ansiedade intensa e sofrimento. A pessoa tenta frequentemente ignorá-los ou eliminá-los sem sucesso, e reconhece que se trata de seus próprios pensamentos que, no entanto, são adversos à sua vontade, e que geralmente, vão contra seus valores, causando maior sofrimento e mal-estar intenso. Já as compulsões são atos ou atitudes mentais repetitivas que o portador realiza voluntariamente em resposta às obsessões. Quando executados levam à diminuição da ansiedade, por exemplo: lavar as mãos repetidas vezes, fazer rituais de limpeza, buscar simetria ou ordenação de objetos sempre no mesmo lugar, na mesma sequência, da mesma forma, e verificações repetidas da execução de alguma ação (como trancar a porta, por exemplo), entre diversos outros. A ansiedade aumenta quando não se realiza o que a compulsão demanda. M O C . S E G A M I E E R F ©
Figura 3.6 – Exemplos de ações compulsivas.
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O impacto negativo na qualidade de vida do portador deste transtorno e de seus familiares é subestimado, possivelmente por não ser considerado como um transtorno grave. O enfermeiro deve estar atento, portanto à aparência geral, pois pode haver despreocupação com as vestimentas e a higiene; a inquietação demonstrada por pernas que balançam ou dedos que tamborilam na mesa; fala rápida; curso do pensamento acelerado; sentimento de vergonha e culpa; humor deprimido; padrão do sono comprometido com aumento ou perda de apetite. Sobre a epidemiologia deste transtorno, a prevalência é de aproximadamente de 2 a 3% da população geral, podendo surgir na idade adulta (20 anos) ou na infância e adolescência quando o prognóstico é considerado pior. O maior predomínio é em homens (KAPLAN & SADOCK, 2007). Enquanto os rituais compulsivos são sempre excessivos, irracionais, não prazerosos e tendem a aliviar as obsessões, estas causam desconforto emocional, que é o aspecto que as diferem dos delírios. Intervenções de enfermagem
Em todas as situações de ansiedade, o recurso terapêutico elementar é oferecer apoio.
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Ansiedade relacionada à ameaça real ou percebida à integridade biológica, ao autoconceito caracterizado por irritabilidade, a um sentimento de inadequação, à atenção prejudicada, ao medo de consequências inespecíficas, à preocupação, à ruminação, ao aumento da tensão.
Minimizar estímulos. Auxiliar o cliente a identificar situações ansiogênicas. Manter uma postura empática e de tranquilidade. Administrar medidas físicas de relaxamento, como banho morno, música etc. Ajudar o cliente a identificar sentimentos antes de um ataque.
Isolamento social relacionado a recursos pessoais inadequados, caracterizado por ações sem sentido, por meio de expressão de sentimentos de rejeição, solidão.
Transmitir uma atitude de aceitação incondicional. Proporcionar reconhecimento positivo dos esforços feitos pelo cliente.
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DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Baixa autoestima crônica relacionada a evento ou situação traumática, a ser portador de transtornos de ansiedade, por meio de expressões de culpa e vergonha.
Transmitir empatia. Auxiliar na expressão de sentimentos e percepções, por meio de técnicas de comunicação terapêutica. Estar atento às verbalizações autodepreciativas.
Padrão respiratório ineficaz relacionado à ansiedade, caracterizado por alterações na profundidade respiratória.
Ensinar a respiração abdominal para ser imediatamente utilizada quando a ansiedade for detectada.
Interação social prejudicada relacionada a desconforto em situações sociais.
Oferecer atividades diárias que envolvam a partilha e a cooperação. Estimular a participação em atividades grupais.
Figura 3.7 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem nos transtornos de ansiedade. Carvalho (2012)
Temos como ações de enfermagem para o transtorno de ansiedade generalizada: Ensinar o cliente a identificar os sinais e sintomas do aumento da ansiedade e maneiras de interromper sua evolução, como técnicas de relaxamento, respiração, meditação, exercícios, caminhadas e/ou corridas, atividades manuais etc., de acordo com o nível de ansiedade; Encorajar a verbalização dos sentimentos, medos e percepções do cliente; Saber ouvir, demonstrando empatia e compreensão quando o cliente verbalizar seus sentimentos desagradáveis, aceitando-o como pessoa e promovendo um ambiente seguro e acolhedor; Usar palavras simples e mensagens breves, ditas com calma e clareza; Desencorajar tomadas de decisão quando o cliente estiver claramente em altos níveis de ansiedade. •
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Temos como ações de enfermagem para o transtorno fóbico-ansiosos (transtorno do pânico e agorafobia): Incluir o cliente na tomada de decisões relacionadas à seleção de estratégias de enfrentamento, de acordo com o nível de ansiedade; Por exemplo: o cliente pode tentar eliminar o medo associado ao estímulo fóbico. •
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Temos como ações de enfermagem para o transtorno obsessivo compulsivo (TOC): Dar reforço positivo a comportamentos não ritualísticos, ajudando o cliente a aprender maneiras de interromper os pensamentos obsessivos e o comportamento ritualístico por meio de relaxamento e exercícios; Oferecer tempo suficiente para a execução de rituais no início do tratamento e não fazer críticas ao comportamento da pessoa; Encorajar o cliente a identificar e discutir conflitos evidentes na família e identificar com o cliente e com membros da família como estes respondem e reagem ao comportamento ritualístico; Começar gradualmente a limitar o tempo que o cliente gasta na execução do ritual à medida que o mesmo se envolva nas atividades do serviço. •
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Transtornos psicóticos, a esquizofrenia e a assistência do enfermeiro As síndromes psicóticas são representadas por sintomas clássicos e característicos como alucinações e delírios, pensamento desorganizado e comportamento explicitamente bizarro. Como há uma desestruturação do pensamento, também podem ser conhecidos como transtornos do pensamento que envolvem ainda, dificuldade de comunicação, isolamento, introversão, desagregação da personalidade e perda do contato com a realidade. Este último pode ser considerado como a dimensão central da psicose, passando o cliente psicótico, portanto, a viver sem ser regido pelo princípio da realidade. Frente a isso, clientes psicóticos tem tipicamente o insight prejudicado, com pouca ou nenhuma consciência quanto a sua condição clínica geral e quanto aos sintomas da doença. Esquizofrenia
A esquizofrenia é conceituada como uma doença da personalidade total, que afeta a zona central do eu e que altera toda a estrutura vivencial. Pelo ponto de vista cultural, o esquizofrênico apresenta o típico estereótipo do “louco”, representado por um sujeito que produz estranheza e afastamento social devido a seu desprezo com a realidade reconhecida. Assim, ao agir como alguém que rompeu as amarras do contrato social, o esquizofrênico menospreza a razão.
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A forma principal de psicose, por conta da relevância clínica e frequência, é a esquizofrenia. A psicose esquizofrênica ocupa o 3o lugar entre as doenças mais incapacitantes – orgânicas e mentais e desse modo, o custo da esquizofrenia é muito alto para a sociedade e pessoas de diferentes culturas, uma vez que se sobrecarrega o doente, sua família e a comunidade. Ademais, em geral a esquizofrenia se dá em torno dos 15 anos e raramente após os 50. Por serem mais vulneráveis à morte por causa de acidentes e causas naturais do que a população em geral, os portadores de esquizofrenia morrem mais, inclusive pelo suicídio que é uma das principais causas de mortalidade neste transtorno. Quanto à etiologia as causas da esquizofrenia não possuem esclarecimento, não possuindo uma fundamentação biológica exata para explicar as manifestações clínicas do transtorno. Sabe-se que os fatores estressantes, assim como os psicossociais e orgânicos, devem ser considerados nos estudos sobre as causas da esquizofrenia. Quanto aos sintomas, as manifestações mais comumente encontradas podem ser organizadas, em sintomas positivos e negativos, conforme mostra o quadro a seguir.
SINTOMAS POSITIVOS
SINTOMAS NEGATIVOS
Pensamento
Atividade
Desagregação; eco do pensamento ou sonorização do pensamento; roubo do pensamento; inserção do pensamento; delírios: de controle, persecutórios, de ciúme, de influência, de referência, de grandeza, místico e de culpa.
Apragmatismo.
Sensopercepção
Vontade
Pseudoalucinações ou vozes alucinatórias; alucinações: visual, auditiva, tátil, gustativa e olfativa.
Abulia ou Hipobulia. Afetividade
Comportamento bizarro
Falta de ressonância afetiva; embotamento afetivo; apatia.
expresso no modo de ser.
Pensamento
Respostas verbais e não verbais incoerentes ou diminuídas; pobreza do pensamento expresso na comunicação verbal e não verbal. Tabela 3.2 – Características dos sintomas positivos e negativos na Esquizofrenia. S tefanelli (2008, p. 417 e 418). Adaptado. capítulo 3 •
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Considera-se ainda que a esquizofrenia reflete na vida social, pois pode causar isolamento social, ausência de objetivos, introspecção, não estabelecimento de vínculos afetivos, manifestações de agressividade e de sexualidade inadequadas; déficit no autocuidado e ausência de insight da doença e das situações vivenciadas. São denominados sinais e sintomas prodrômicos manifestações comportamentais que são comuns no histórico de pessoas com esquizofrenia, que são retraimento social, as pessoas tornam-se quietas, introvertidas e com tendência a se isolar e a manifestar excentricidade e desconfiança; histórico de poucos amigos e dificuldades escolares, não estabelecendo no período da adolescência relacionamentos afetivos com o sexo oposto; não conseguem participar de esportes, atividades profissionais ou sociais, principalmente em equipe; interesse por assuntos esotéricos, filosóficos ou de ficção, podendo manifestar de modo isolado, ansiedade, obsessão, fobia e compulsão. De acordo com o CID-10 (1998), são quatro as formas de esquizofrenia mais comuns, que são: esquizofrenia paranoide (F20); esquizofrenia catatônica (F20.2); esquizofrenia hebefrênica ou desorganizada (F20.1) e a esquizofrenia indiferenciada ou simples (F20.3). Esquizofrenia paranoide
É caracterizada por delírios pouco estáveis, que geralmente, vêm acompanhado de alucinações, principalmente auditivas, entre outras alterações sensoperceptivas. É conhecida como uma das formas mais comuns de esquizofrenia em termos mundiais. Os tipos de delírios mais comuns são o de ciúme, o de referência, o persecutório e o de grandeza, acompanhados de alucinações que geralmente são auditivas, que têm caráter ameaçador à pessoa ou que dão ordens imperativas ao doente. O curso pode ser episódico ou crônico. O enfermeiro deve estar atento aos delírios, pois a pessoa nesta situação vive de acordo com eles, dizendo se sentir perseguida por outras pessoas, julgando-se superior aos demais e expressando ideias místicas, como por exemplo, diz que é enviada de Deus e irá salvar o mundo, dentre outras coisas. Esquizofrenia catatônica
Predominam-se os distúrbios psicomotores que podem ser alterados entre polos opostos como hipercinesia (motilidade patologicamente excessivamente),
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hiperatividade, estupor catatônico, verbigeração, obediência automática, ecolalia, estereotipia e negativismo. As manifestações clínicas ocorrem entre 25 e 30 anos. O enfermeiro deve estar atento à movimentação da pessoa, já que aqui ela permanece na mesma posição por um longo tempo e parece não perceber o que está sendo solicitado, desta forma, não responde a estímulos de qualquer espécie. No entanto, às vezes, de modo brusco, agita-se, podendo voltar a ficar parada novamente. Esquizofrenia hebefrênica ou desorganizada
O comportamento envolve hiperatividade desorganizada, incongruência emocional com maneirismos e estereotipias. A pessoa manifesta comportamento pueril, imprevisível, bizarro, apresentando desagregação e incoerência do pensamento. Destacam-se os delírios e alucinações auditivas inconsistentes e fragmentados, com raro contato com a realidade. Há presença forte de sintomas negativos como hipobulia e embotamento afetivo. Em geral, ocorre antes dos 25 anos. O enfermeiro deverá atentar para as alterações de comportamento, já que esta forma de esquizofrenia é a mais exuberante em termos de alterações comportamentais. Por exemplo, a pessoa pode se comportar como se fosse um animal ou um objeto e este comportamento é expresso de forma extravagante aparentemente sem lógica. Esquizofrenia indiferenciada ou simples
Desenvolve-se progressivamente e os sintomas negativos, como embotamento afetivo, abulia ou hipobulia e hipoatividade são percebidos; e é escassa a manifestação de sintomas positivos, podendo aparecer excentricidades e o não atendimento de exigências sociais. O enfermeiro deve prestar atenção à expressão facial mais marcante que é a que o portador da doença se mostra alheio à realidade. A pessoa se mantém isolada, parecendo não se importar com o que acontece ao seu redor, e volta sua atenção, geralmente, para objetos ou animais, não mostrando motivação para nada, querendo apenas ficar isolada.
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Tratamento
Os psicofármacos mais utilizados são os psicofármacos atípicos. No entanto, as condutas complementares à terapia medicamentosa são tão importantes quanto às medicações utilizadas, uma vez que é preciso integração de informações para realizar o tratamento mais eficaz possível. A integração dos profissionais para que sejam tratadas as dimensões biológicas, psicológicas, sociais e culturais, bem como os familiares do portador de esquizofrenia é muito importante. Intervenções de enfermagem
Para o cliente, os sinais e sintomas se apresentam de forma global o que acarreta problemas, pois ele se sente incompreendido e não entende o porquê da reação das pessoas a seu redor, e como consequência, acaba se isolando mais dentro de seu viver esquizofrênico. Neste contexto, o enfermeiro deve anotar os dados observados no comportamento do cliente, identificando os comportamentos a serem mantidos, a serem modificados, destacando a atitude do cliente.
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Déficit no autocuidado para banho/ higiene. Déficit no autocuidado para vestir-se, arrumar-se.
Estimular e, se necessário, auxiliar o cliente na realização das atividades de autocuidado (banho, vestimentas e higiene íntima).
Interação social prejudicada relacionada à ausência de pessoas significativas e/ou distúrbio no autoconceito e/ou processos de pensamento perturbados caracterizados por comportamentos de interação social malsucedido e/ou relato familiar de mudança na interação.
Encorajar vínculos interpessoais saudáveis. Atentar ao presente e a realidade. Valorizar esforços para mudanças de comportamento, estimulando o fortalecimento da autoestima.
Atividade de recreação deficiente relacionada à falta de amigos e/ou falta de motivação.
Reconhecer esforços feitos pelo cliente. Explorar preocupações e medos sobre a participação em atividades. Ajudar o cliente que apresenta sentimentos de raiva e pesar.
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DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Risco de solidão relacionado à falta de energia e/ou isolamento social.
Participar inicialmente de atividades com o cliente. Incentivar o suporte social, como a inserção em grupos de autoajuda, de apoio.
Interação social prejudicada relacionada a desconforto em situações sociais.
Oferecer atividades diárias que envolvam a partilha e a cooperação. Estimular a participação em atividades grupais.
Figura 3.8 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem nos transtornos psicóticos e esquizofrenia. Carvalho (2008). Adaptado.
Temos como ações de enfermagem para os transtornos psicóticos: Pesquisar junto com o cliente suas habilidades e propiciar atividades de seu interesse para mantê-lo na realidade e socializá-lo; Tentar mantê-lo centrado em assuntos ou atividades concretas, valendo-se de acontecimentos diários como a visita recebida; Pintar, oferecer material para escrever, folhear revista, entre outros para que ele possa se manter na realidade por mais tempo; Expressar assertivamente as solicitações para os cuidados pessoais, da aparência, de higiene, com a alimentação, eliminações e participação nas atividades diárias; Incluir sempre a família no tratamento e no plano de cuidados, orientando -a sobre as primeiras manifestações de alteração do comportamento ou os primeiros sinais prodrômicos, indicativos de recorrência ou recaída, para que se procure assistência assim que possível. •
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ATIVIDADES 01. “C. de 27 anos chegou ao serviço aparentando descuido com a higiene corporal (odor forte, cabelos seborreicos), com vestimentas sujas e rasgadas em algumas partes, emagrecido, dizendo que havia saído de casa por ter recebido uma mensagem de um anjo, que dizia que ele a partir daquele momento, era filho do Sílvio Santos (apresentador de TV). C. informa que ao receber essa mensagem, passados uns dias, teve que sair de casa, pois ouvia barulhos e sussurros de sequestradores, que estavam escondidos em sua casa. Com medo de ser sequestrado, já que acreditava ser uma pessoa extremamente rica, C.
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abandonou sua casa e começou a viver nas ruas, fugindo dos supostos sequestradores, que afirma sussurrarem ao seu ouvido que estão perto e que irão pegá-lo”. O quadro de C. sugere esquizofrenia paranoide segundo o relatório de admissão no serviço psiquiátrico. Diante de parte da evolução de enfermagem acima, faça o que se pede. a)
Identifique quais os sintomas de C. classificando-os em positivos ou negativos.
b) Identifique dois diagnósticos e intervenções de enfermagem para C. que farão parte do plano de cuidados do enfermeiro do serviço. 02. Cite três ações de enfermagem no cuidado com clientes com transtorno afetivo bipolar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARVALHO, Marissol Bastos (ORG). Psiquiatria para enfermagem. São Paulo: Rideel, 2012. DELGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. DSM-IV-TR. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4. ed. Trad. Cláudia Dornelles. Porto Alegre: Artmed, 2003. HERDMAN, Heather T; KAMITSURU Shigemi. Diagnósticos de enfermagem da NANDA: definições e classificação 2015-2017. [NANDA International]; organizadoras; tradução: Regina Machado Garcez; revisão técnica: Alba Lucia Bottura Leite de Barros ... [et al.].– Porto Alegre : Artmed, 2015. Nações Unidas no Brasil. Depressão é tema de campanha da OMS para Dia Mundial da Saúde de 2017. Disponível em:
dia-mundial-da-saude-de-2017/>. Acesso em: 18 ago. 2017. Organização Mundial de Saúde. Classificação de Transtornos mentais e de comportamento da CID-10 – Critérios diagnósticos para pesquisa. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
PEPLAU, Hildegard (1978). Psychiatric nursing: roles of psychiatric and nurses. In: STEFANELLI, Maguida Costa; FUKUDA, Ilza Marlene Kuae; ARANTES, Evalda Cançado (ORG). Enfermagem psiquiátrica em suas dimensões assistenciais. Barueri, SP: Manole, 2008.
SADOCK & KAPLAN. Compêndio de psiquiatria: ciências do comportamento e psiquiatria clínica. 9. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2007. STEFANELLI, Maguida Costa; FUKUDA, Ilza Marlene Kuae; ARANTES, Evalda Cançado (ORG). Enfermagem psiquiátrica em suas dimensões assistenciais. Barueri, SP: Manole, 2008.
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4 Transtornos mentais: classificação e a assistência de enfermagem (cont.)
Transtornos mentais: classificação e a assistência de enfermagem (cont.) Este capítulo é a continuação de nossa rota do conhecimento que começa a apontar para a linha de chegada. Sim, você já passou da metade do caminho. Neste percurso você poderá conhecer alguns dos Transtornos de Personalidade que resultam muito da interação da vulnerabilidade herdada com fatores ambientais, por exemplo, como traumas na infância. Verá também os Transtornos Dismórficos, que são nomeados pelo CID10 como Síndromes Comportamentais Associadas a Perturbações Fisiológicas e Fatores Físicos, em que o foco serão os Transtornos Alimentares, amplamente influenciados pela maneira como a sociedade “vende” a imagem da beleza ideal. E por fim, verá a questão da Dependência Química e a Comorbidades Psiquiátricas associadas a ela. Tudo isso virá acompanhado da assistência de enfermagem para que, além do conceito destes transtornos, você compreenda o que, basicamente, pode fazer com o cliente nestas situações. Portanto, recupere seu fôlego, endireite a postura, arrume os óculos com as lentes especiais da disposição e vamos que vamos!
OBJETIVOS Caracterizar os principais transtornos de personalidade e a assistência de enfermagem. Explanar sobre as síndromes comportamentais associadas a perturbações fisiológicas e fatores físicos, com foco nos transtornos alimentarese a assistência de enfermagem; Compreender como se dá a dependência química e quais são as comorbidades psiquiátricas a ela associadas e a assistência de enfermagem; •
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O texto deste capítulo teve como base Stefanelli (2008), Delgalarrondo (2008), Carvalho (2012), CID-10 (1998), DSM-IV (2003), NANDA (2015), NIC (2004), SUPERA (2016) e outras fontes que subsidiaram tais produções, tendo sofrido adaptações conforme julgou-se necessário.
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Transtornos de personalidade e a assistência do enfermeiro (a) Conhecida como um conjunto de características dos traços emocionais e comportamentais da pessoa em condições normais do cotidiano ao longo de sua vida, que nem sempre são estáveis e previsíveis, a personalidade pode sofrer mudanças acentuadas. Quando isso acontece nestes traços, pode-se dizer que há um transtorno de personalidade (TP) que é marcado por modificações associadas à rigidez marcante e ao não ajustamento à determinada função ou ao sofrimento subjetivo. Desta maneira, os atos de desajustamento de comportamento, inabilidade para acompanhar as normas da sociedade e para atender às próprias necessidades são destaques dos transtornos de personalidade. O TP também pode ser conhecido como sociopatia ou psicopatia, e é caracterizado quando a pessoa apresenta um repertório limitado de respostas às situações comuns e estressantes, não demonstrando adaptação, ou seja, seus padrões de comportamento estão desajustados, inflexíveis ou mesmo não adaptados, o que leva a uma disfunção nos papéis sociais. Tais manifestações de não adaptação social ocorrem na maioria das vezes no relacionamento com outras pessoas, nas esferas cognitivas, afetiva, no controle ou gerenciamento das situações sociais e impulsivas. Ressalta-se que em crianças e adolescentes, transtorno semelhante é denominado transtorno de conduta. Sobre a etiologia não há uma causa específica para os TP, sendo que a literatura os atribuem a fatores biológicos, constitucionais, genéticos e socioculturais, de modo que resultam da interação da vulnerabilidade herdada com fatores ambientais, como por exemplo, trauma na infância. Quanto à epidemiologia, há escassez de informações pela dificuldade universal de definir limites do que é normal e do que é patológico. Pode-se afirmar que o transtorno borderline é a forma mais comum em todas as culturas.
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Deve-se levar em consideração a existência de pelo menos três dentre os critérios descritos para indicar o diagnóstico deste transtorno, como: Propensão para enganar; Fracasso em conformar-se com as normas legais; Agressividade; Impulsividade; Irresponsabilidade que possa estar vinculada ao trabalho ou às finanças; Ausência de remorso; Desrespeito pela segurança própria ou alheia. •
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Dependendo dos traços, o transtorno de personalidade pode variar em diferentes tipos, alguns deles você poderá conhecer a seguir. Transtorno de personalidade paranoide
A pessoa apresenta padrão de desconfiança excessiva; dúvida; suspeita quanto à lealdade de amigos e parceiros; sensibilidade exagerada à críticas; possuem tendência à distorcer os fatos; tem tendência a se envolverem em disputas legais; fanatismo; tem reações agressivas decorrentes das interpretações erradas de outras pessoas; podem formar círculos sociais fechados ou cultos e propagarem o medo nos outros. Eles tendem a interpretar as ações dos outros propositadamente maldosas, ameaçadoras, prejudiciais ou com a finalidade de enganar ou se aproveitar da situação; tem tendência persistente a guardar rancores; e se preocupam com conspirações ainda que a situação seja considerada normal, e pode ser por esse fato que questionam a lealdade dos demais sem justificativa aparente, o que gera campo fértil para o ciúme patológico que podem apresentar. Transtorno de personalidade esquizoide
É possível observar um padrão de distanciamento de relacionamentos e social, há ausência de desejo ou prazer em fazer amizades ou em atividades sexuais, havendo uma preferência por atividades solitárias, por isso há uma frequente inexistência de confidentes ou amigos próximos e passividade em situações adversas, havendo ainda indiferença com a opinião alheia e afeto frio. Em geral, o transtorno se inicia na infância.
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Transtorno de personalidade antissocial
Tem como principal característica a impulsividade que incapacita o planejamento do futuro, isso acontece por conta do desprezo às normas e obrigações sociais. Pessoas com este transtorno apresentam ainda baixa tolerância às frustrações, baixo limiar para agressividade, incapacidade para adiar prazeres, irresponsabilidade. Mentem e agridem para atingir os objetivos, roubam e estão em constante conflito com a sociedade. Buscam a satisfação imediata sem considerar as consequências, manipulam, são indiferentes e insensíveis aos sentimentos alheios, sendo incapazes de aprenderem com a experiência, especialmente, com a punição. Racionalizam seus atos sempre culpando os demais e não possuem empatia. Têm dificuldades para relacionamentos interpessoais, seja na relação familiar ou profissional, que geralmente é superficial. Tais comportamentos favorecem o envolvimento da pessoa que possui esse transtorno com criminosos, em fraudes, e em atos antissociais. Transtorno de personalidade borderline
Apresenta como características dependência de outras pessoas; esforço para evitar abandono real ou imaginário; intolerância à solidão; busca intensa de companhia; idealização e monopolização; sensação crônica de vazio e solidão; medo de abandono; imprevisibilidade; falta de controle; tendência a comportamento autodestrutivo; alterações do humor ora deprimido; ora irritável e às vezes diz “não sentir nada”; impulsividade; raiva intensa e descontrolada diante de mudanças naquilo que foi planejado e quando frustrado; relações interpessoais instáveis com apego e distanciamento comuns. A intensa alteração da afetividade gera a tendência a comportamento autodestrutivo, autoagressão, tentativa de suicídio e uso de substâncias psicoativas. A pessoa está sujeita a ataques de fúria e manifestações de comportamento teatral de curta duração. As comorbidades são depressão, abuso de substâncias e transtornos alimentares.
MULTIMÍDIA Muitas informações, não é mesmo? Quer entender melhor sobre este transtorno? Acomode-se no sofá e assista ao filme Minha super ex-namorada que apresenta de uma forma bem-humorada um pouco deste transtorno.
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Transtorno de personalidade histriônica
A pessoa tende a se colocar no centro das atenções, apresenta um padrão de afetividade superficial, faz dramatizações, é egocêntrica, apresenta falta de consideração com os outros, é sugestionável, tem necessidade de estimulação e excitação, é promíscua ou tem aversão sexual, apresentando dificuldades em alcançar intimidade nos relacionamentos. Apresenta comportamento suicida ou hipocondríaco frequente, o que pode ratificar a tônica deste transtorno que é a busca de atenção. Transtorno de personalidade anancástica ou obsessivo-compulsivo
Padrão de perfeccionismo, teimosia, dúvidas, preocupação com pormenores, detalhes, organização, regras, listas, rigidez excessiva, dedicação excessiva às atividades, às amizades e ao trabalho e à produtividade são algumas das características deste transtorno. Os portadores são escrupulosos, apresentam estresse e dificuldades diante de novas situações que demandam flexibilidade, são exageradamente críticos, relutam em delegar tarefas, possuem inflexibilidade moral e ética e têm dificuldades de jogar objetivos fora mesmo que sejam sem utilidade ou valor.
CONCEITO Você pode estar se perguntando: qual é a diferença do transtorno de personalidade obsessivo-compulsivo e o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC)? No TOC, há ansiedade vivida pela pessoa para se livrar dos pensamentos repetitivos e os rituais, o que não acontece no transtorno de personalidade.
Tratamento
Para cada tipo de transtorno da personalidade e para cada alteração e/ou dificuldade informada pelo cliente são utilizados antidepressivos, ansiolíticos e antipsicóticos. É importante ressaltar que quando planejado junto com a família, o abandono do tratamento tende a ser menor, já que o afastamento deste tem alta incidência, pois o cliente na maioria das vezes não quer encarar seus problemas.
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Intervenções de enfermagem
É importante ressaltar que os problemas serão evidenciados pelo cliente, seus familiares, pela observação do enfermeiro e equipe e do histórico realizado por outros profissionais da saúde. Dessa forma, o planejamento da assistência será iniciado pelos dados levantados e obtidos neste histórico e prosseguirá enquanto o cliente for atendido. Devem ser estabelecidas metas de curto, médio e longo prazos e as atividades precisam ser elaboradas e avaliadas periodicamente.
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Risco de violência direcionada a outros
Manter o cliente em observação para prevenir auto (a si mesmo) e heteroagressão (aos outros). Ser autêntico diante das manifestações de comportamento que chocam os outros clientes, familiares e profissionais. Expressar com segurança, sem conotação de julgamento e de modo claro ao cliente, o que seu comportamento está provocando nos demais.
Processos familiares interrompidos
Planejar a assistência em consonância com as equipes envolvidas com o cliente, incluindo os familiares. Analisar com o cliente os objetivos estabelecidos para o futuro, verificando se estes condizem com a realidade e orientar a família quanto a estes objetivos e formas de apoiar o cliente estabelecendo limites.
Isolamento social
Tentar criar vínculo, estimular a expressão de emoções e sentimentos relacionados à rejeição, medo da solidão e abandono. Analisar as mudanças necessárias de acordo com a real necessidade do cliente.
Processo de pensamento perturbado
Oferecer apoio para incentivar o cliente a testar novos padrões de comportamento; demonstrar reconhecimento de seus esforços. Envolver o cliente em medidas de reabilitação atendendo suas preferências.
Figura 4.1 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem nos transtornos de personalidade.
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Transtornos dismórficos (síndromes comportamentais associadas a perturbações fisiológicas e fatores físicos, com foco nos transtornos alimentares) e a assistência do enfermeiro As sensações de fome, sede e saciedade são as que basicamente conduzem a fome. Elas são geradas, monitoradas e controladas pelo hipotálamo (saciedade) e diversas estruturas límbicas e corticais. Os transtornos alimentares estão diretamente conectados com o modo como o sujeito vivencia seu corpo e (re)organiza sua imagem corporal durante a passagem pela adolescência. M O C . K C O T S R E T T U H S | Z G N I K D E E P S
Alvo de preocupação com o peso, a forma do corpo e a aparência, a população feminina é a mais afetada neste tipo de desordem que começa a afetar a pessoa na infância, ficando mais evidente e perigosa, geralmente na adolescência. Os transtornos alimentares são bem mais frequentes em sociedades desenvolvidas em que há abundância da oferta de alimentos e ao mesmo tempo enfatizam a magreza. Esta ênfase cultural, massificada no ocidente, acaba sendo responsável pela incidência aumentada de transtornos alimentares nas pessoas. Sobre isso é importante refletirmos que ao criticarmos alguns aspectos culturais como o uso da burca no Oriente, por exemplo, não percebemos o quanto repetimos também esta mesma lógica, simbolizada por uma espécie de burca na cultura ocidental traduzida por regras e normas de beleza em que não se pode ser gordo, tampouco ter celulites ou estrias, para nos sentimos aptos socialmente a nos relacionarmos com outras pessoas ou para frequentarmos lugares como a praia. Atualmente muito desse comportamento social-ocidental vem sendo criticado, sobretudo pelas mulheres que vêm colocando em xeque esta beleza idealizada e muitas vezes impossível de ser atingida. Movimentos de valorização e respeito ao corpo da mulher, seja no formato e tamanho que for, vêm cada vez mais se fortalecendo e sendo apoiados e divulgados, paulatinamente, pela grande mídia.
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Neste contexto, você certamente já deve ter ouvido falar nos transtornos que iremos tratar aqui, que são a anorexia nervosa e a bulimia nervosa. Só que agora vamos conhecê-los mais profundamente.
CONEXÃO Caso tenha curiosidade, seu conhecimento pode ser complementado pelo documentário “Transtornos alimentares: um olhar mais atento (versão reduzida)”, disponível em: . Nada como ver o depoimento real das pessoas que já passaram por isso, então aproveite esta oportunidade.
Assistir o documentário é também uma maneira de você saber como podem aparecer, aparecer, na prática, as características que serão reveladas a seguir s eguir.. Anorexia nervosa
Os transtornos alimentares não são considerados desordens contemporâneas, visto que há relatos a este respeito desde a Idade Média quando era descrita uma doença caracterizada pela perda de peso grave, decorrente de dietas autoimpostas. Portanto, a anorexia não é recente, como pode parecer. Ela é caracterizada por um transtorno alimentar em que há busca deliberada e inexorável da magreza, por meio de intensa restrição alimentar, por comportamentos voltados ao controle de peso como o excesso de atividades físicas, por exemplo, comportamentos chamados purgativos que envolvem o uso de laxantes, diuréticos, enemas e vômitos autoinduzidos, e manutenção do peso corporal abaixo do mínimo adequado para a idade e altura. Assim, há uma distorção da imagem corporal, já que apesar de muito emagrecida, a pessoa percebe-se gorda, e sente que algumas partes do seu corpo como abdome, coxas e glúteos estão volumosos. O pânico de engordar persiste como uma ideia constante, mesmo o sujeito estando bem abaixo de seu peso normal. Assim, muitos iniciam dietas que inicialmente parecem inocentes, mas que acabam evoluindo para quadros anoréxicos graves. Por conta deste comportamento, comportamento, o sujeito sofre importantes desordens físicas em que o estado de desnutrição é acompanhado de distúrbios endócrinos que ocasionam amenorreia nas mulheres, além da persistente distorção na imagem corporal e o desprezo pelo risco físico. capítulo 4 •
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São dois os tipos de anorexia: – o cliente atinge seu objetivo de perder peso limitando Anorexia restritiva – a ingestão; Anorexia purgativa purgativa – o cliente perde peso pela indução de vômitos ou uso de laxantes e diuréticos. •
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A perda perda de peso peso fica fica em torno torno de 15% ou mais do do peso corporal corporal total total e a redução extrema da ingestão alimentar pode chegar a um consumo de 500 a 700 caloria/ dia. Em alguns casos, o sujeito ingere menos que 200 calorias/dia ou mesmo não come nada por vários dias. Este transtorno pode ocorrer entre 13 e 20 anos o que não impede de acontecer em outro grupo etário, e é geralmente mais incidente em mulheres, apresentando-se em 5 a 10% do total da população com o diagnóstico, na população masculina. A anorexia nervosa apresenta altíssima taxa de mortalidade. M O C . K C O T S R E T T U H S | A V E L I M E Z D A N A Y T A T ©
Os principais sinais e sintomas são a hipotensão ortostática, perda de tecido subcutâneo, irregularidade menstrual, bradicardia, hipotermia, queda capilar, aumento das glândulas salivares, cicatrizes no dorso das mãos (Sinal de Rusell), corrosão do esmalte dentário, sendo estes três últimos secundários aos vômitos autoinduzidos. A perda de peso é vista como uma u ma conquista e também como forma de autodisciplina e controle do corpo, enquanto que o ganho de peso é notado como fracasso do autocontrole. Os portadores quando estão muito abaixo do peso apresentam humor deprimido, irritabilidade, retraimento social, diminuição do interesse pelo sexo e insônia. capítulo 4 •
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Bulimia nervosa M O C . K C O T S R E T T U H S | U E . E E H P A R G O T O H P
É um transtorno caracterizado por ingestão excessiva de alimentos, acompanhado de medidas purgativas. O termo bulimia tem uma história antiga. Derivada do grupo bous (boi) (boi) e limus (fome) designa um apetite tão grande que seria possível um homem comer um boi, ou quase. Portadores deste transtorno consomem grandes porções de alimento em curtos períodos – episódios de binge , que podem chegar a dez ocorrências por dia. Após um binge , os sujeitos provocam vômitos, fazem exercícios físicos extenuantes, abusam de laxantes e diuréticos diu réticos e fazem também jejuns para evitarem o ganho de peso. Nos episódios compulsivos (binge ), ), os portadores optam por alimentos, geralmente altamente calóricos, fáceis de engolir e regurgitar, regurgitar, como pizzas, sorvetes, sor vetes, bolos, chocolates, mousses, podendo consumir em um episódio entre 2.000 e 5.000 calorias. Não raro, os alimentos nem chegam a ser mastigados. Os episódios de binge se se encerram por falta de alimento, cansaço, interrupção social, necessidade de purgação ou sensação de mal-estar e dor abdominal. A alcalose metabólica, secundária a vômitos ou ao abuso de diuréticos e laxantes é comum, e a hipopotassemia ocorrem em 5% das pessoas portadoras, representando fator predisponente para arritmia cardíaca. Pessoas com bulimia nervosa apresentam pensamentos e emoções desadaptativas a respeito de seus hábitos alimentares e peso corporal. De maneira geral, apresentam autoestima flutuante. Procuram sanar um problema emocional adotando estratégias imperativas de emagrecer e em consequência, desenvolvem atitudes radicais, com base na ideia de que a magreza é um dos caminhos mais curtos para serem felizes. A grande maioria dos portadores desta desordem são mulheres, na proporção de nove mulheres para um homem.
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Para o diagnóstico definitivo de bulimia, os seguintes critérios devem ser observados: Preocupação persistente com a alimentação e um desejo irresistível de comer. Tentativa de neutralizar os efeitos engordativos dos alimentos por meio de vômitos autoinduzidos, abuso de purgativos, períodos alternados de inanição, uso de drogas como anorexígenos. Pavor mórbido de engordar. •
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Os sinais e sintomas clínicos mais comuns são a fadiga, diarreia, epigastralgia, obstipação intestinal, desidratação, sudorese, sonolência, taquicardia, irregularidade menstrual, desgaste do esmalte dentário, o sinal de Rusell e irritabilidade. Tratamento
Aconselha-se a se estabelecer um programa em que participem, o cliente e todos os membros da equipe interdisciplinar. A prioridade é o restabelecimento do estado nutricional do cliente, visto que as complicações podem levar à morte, como é o caso daquelas relacionadas ao distúrbio eletrolítico e a desidratação. O tratamento psicofarmacológico é a base de antidepressivos e é voltado para os sintomas associados, como ansiedade e depressão. Terapias de grupo também são amplamente utilizadas, incluindo a terapia cognitivo-comportamental, psicopedagógica, psicodinâmica e a interpessoal. Intervenções de enfermagem
Na fase da entrevista, o enfermeiro deve atentar para coleta das seguintes informações junto ao cliente e a família: peso atual e desejado; menarca e padrão da menstruação; padrões alimentares (restrições e jejuns, preferências e peculiaridades alimentares); frequência e extensão da hiperfagia e dos vômitos; uso abusivo de laxantes, diuréticos, pílulas para emagrecer e outros; padrões de exercícios físicos; e, distorções na imagem corporal.
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DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Nutrição desequilibrada: não supre as necessidades corporais relacionadas ao medo de ganhar peso, evidenciada pelo não atendimento das necessidades requeridas pelo corpo.
Avaliar regularmente o turgor e a integridade da pele, umidade e cor das membranas da mucosa oral. Manter um registro rigoroso do controle hídrico. Após as refeições (que devem ser acompanhadas por algum membro da equipe), o cliente deve permanecer, no mínimo 1 hora ao lado da equipe de enfermagem, para evitar o vômito autoinduzido e/ou prática de exercícios físicos rigorosos.
Distúrbio na imagem corporal relacionado à supervalorização da aparência física e do medo de ganhar peso, evidenciado na verbalização de sentimentos sobre visões alteradas do próprio corpo.
Auxiliar o cliente a desenvolver percepção realista da imagem corporal e da relação com o alimento. Oferecer apoio, orientações e recursos como treinamento da assertividade, aumentando assim a sua confiança.
Isolamento social
Tentar criar vínculo, estimular a expressão de emoções e sentimentos relacionados à rejeição, medo da solidão e do abandono. Analisar as mudanças necessárias de acordo com a real necessidade do cliente.
Baixa autoestima crônica relacionada à percepção de que os outros estão sempre julgando.
Permitir que o cliente expresse sentimentos de medo sobre o ganho de peso. Transmitir comentários positivos e realistas sobre as conquistas e os esforços do cliente na adoção de resolução de problemas.
Figura 4.2 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem nos transtornos alimentares.
Dependência química, as comorbidades psiquiátricas e a assistência do enfermeiro Desde os períodos remotos, como no Império Mesopotâmico, onze séculos antes de Cristo, havia o consumo de substâncias extraídas de plantas que serviam como fonte de nutrientes e de prazer. Foi a partir do século XI d.C. que surgiram críticas ao uso do ópio, droga anestésica, por conta do uso inadequado e superdosado. Desta forma, ao longo da história foram sendo descobertas e inventadas novas drogas, que foram usadas em diferentes contextos (experimental, ritual ou
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recreacional). Esses contextos se mantêm até hoje e este uso pode não necessariamente criar problemas de saúde para o sujeito. No entanto, é relevante salientar que existem padrões individuais de consumo que variam em intensidade e quantidade. Nesse contexto, os profissionais de saúde devem se pautar pelo respeito e pela autonomia de decisão da pessoa usuária levando em consideração suas crenças e sua cultura, sem abrir mão do destaque à promoção da saúde. Ao se considerar e se compreender os fatores etiológicos, genéticos, pessoais, familiares e dos mecanismos neuroquímicos que envolvem o uso das substâncias psicoativas (SPA), assimilando como esta sensação altera química e plasticamente as células do sistema nervoso central (SNC), permite-se uma visão mais clara dos processos da doença e reabilitação, ampliando o espectro de conhecimento e atuação da equipe interdisciplinar. Nesta direção, a dopamina – potente neurotransmissor associado aos efeitos da sensação de prazer em vias específicas do sistema de recompensa e de motivação – é o principal mediador dos efeitos das SPA. Essas vias, anatomicamente associadas ao sistema límbico, se neuroadaptam de tal maneira quando expostas às drogas, que na ausência delas, o usuário pode experimentar um desconforto intenso. M O C . S E G A M I E E R F . W W W ©
Este episódio é conhecido como fissura (craving ) que é quando se expressa um forte desejo pela substância, levando o usuário a consumir a droga novamente. Em função dessa fissura, o usuário não somente volta a consumir, como também dirige suas ações para encontrar a droga (em não raras vezes, esta busca é feita a qualquer custo, que podem envolver roubos dentro e fora da residência, violência, prostituição etc.), perdendo a capacidade aos poucos, de controlar a si mesmo no início, término do consumo e nos níveis de uso.
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Geralmente, esse processo é acompanhado pela tolerância , que é quando a mesma quantidade ou quantidades maiores da droga não produz(em) mais o mesmo efeito.
O usuário também pode experimentar a abstinência , ou seja, sofrer efeitos físicos e psíquicos desagradáveis, de intensidade variável, que surgem quando há uma redução ou ausência do consumo da(s) droga(s). Diante disso, o usuário abandona ou reduz grande parte de suas atividades, mesmo as que anteriormente eram interessantes, prazerosas ou divertidas. O enfermeiro deve saber que a pessoa que faz uso de substâncias psicoativas apresenta-se emagrecida, com as narinas avermelhadas ou lesadas, ou hematomas nos braços decorrentes do uso de substâncias injetáveis e com a pele ressecada. O usuário de álcool apresentará fala pastosa, hálito alcoólico, andar desordenado, e outras alterações mais graves dependendo do nível de intoxicação que podem ir desde a confusão mental ao coma e a óbito. O cliente demonstra sarcasmo, ridiculariza as possas e dá demonstrações inadequadas de afeto, tendo dificuldades de manter relacionamentos sociais ou mesmo com familiares. Apresenta déficit no cuidado com a higiene, não se alimenta direito e pode apresentar lesões em membros inferiores que muitas vezes passam despercebidas por conta da redução da sensibilidade. Demonstra grande preocupação com a droga e nega seus problemas, sendo incapaz de admitir que precisa de tratamento. Está constantemente envolvido em problemas sociais, legais e morais. Embora afirme que tem controle, demonstra inabilidade para controlar o impulso de consumo da SPA. Geralmente se vale da sedução e persuasão para conseguir a SPA, inclusive com profissionais nos serviços de saúde mental. Não assume a culpa de seus atos sempre os atribuindo a terceiros e tem ampla dificuldade de aceitar orientações das pessoas quanto aos efeitos adversos da droga. Desta forma, é muito sensível a críticas e racionaliza seus atos. Síndrome de dependência
O quadro que se instala nesta situação envolve prejuízos físicos, psíquicos e sociais decorrentes do uso crônico da SPA somados aos três ou mais critérios informados a seguir, que deverão ocorrer conjunta e repetidamente por um ano.
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DIAGNÓSTICOS PARA DEPENDÊNCIA DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS CONJUNTO DE Conjunto de manifestações comportamentais, cognitivas e fisiológicas que se desenvolvem após repetido consumo de uma SPA, tipicamente associado ao Forte desejo de tomar a droga. Dificuldade de controlar o consumo. Utilização persistente apesar das consequências ruins. Maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações. Aumento da tolerância da droga. Estado de abstinência física.
A síndrome de dependência pode estar relacionada: à substância psicoativa específica (ex.: álcool, Diazepam, fumo); ao um conjunto de substâncias farmacologicamente diferentes; à categoria de substâncias psicoativas (ex.: substâncias opiáceas). Então, como você viu a síndrome de dependência pode ser causada por qualquer uma das substâncias psicoativas (SPA). No entanto, cada uma delas irá causar transtornos mentais e comportamentais característicos, que estão descritos logo abaixo. Destaca-se que no CID 10, eles estão representados pelo F10 ao F19. Transtornos mentais e comportamentais causados pelo uso de substâncias psicoativas (SPA) Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso do álcool
Na chegada dos portugueses ao Brasil, no início da colonização, eles descobriram que um dos costumes indígenas era de produzir e beber uma bebida forte, fermentada a partir da mandioca, denominada “cauim”. Essa mesma bebida era utilizada em rituais e em festas, o que significava que apresentava pauta cultural bem definida. Os índios usavam também o tabaco, que era desconhecido dos portugueses e de outros europeus. Os portugueses logo mais aprenderiam a fazer a cachaça, por conta do processo de produção do açúcar, já que a partir da cana-de-açúcar, no processo de fabricação do mosto (caldo em processo de fermentação), descobriram um melaço que colocavam no cocho para animais e escravos, denominado de “cagaça”. Este,
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logo depois veio a ser a cachaça, destilada em alambique de barro e, bem mais tarde, de cobre. Portanto, assim como cachaça é conhecida de muito tempo, desde os primeiros momentos em que se começava a fazer no Brasil, é possível afirmar que o álcool faz parte de nossa cultura, principalmente no que diz respeito a comemorações festivas. Por isso o álcool é a substância lícita que representa a principal droga de consumo em nosso país. Ao ser metabolizado no fígado, o álcool pode causar lesões de diversos níveis e com padrões reversíveis ou não, como a esteatose hepática e também a cirrose. Outros órgãos que podem também ser atingidos pelo álcool são: o coração, o pâncreas, os músculos, os vasos, e o sistema nervoso central e o periférico.
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COMENTÁRIO Por conta de diversas carências nutricionais, o dependente de álcool tem grandes chances de ser desnutrido, notadamente com deficiências de vitaminas do complexo B, como a tiamina. Quanto ao sistema cardiovascular, seu uso está associado à insuficiência cardíaca congestiva.
Quando o dependente reduz o consumo ou a metabolização do álcool, ou quando para de consumi-lo, podem surgir sintomas que irão se caracterizar como síndrome de abstinência de álcool. Tais sintomas podem variar como:
ANSIEDADE DE NÍVEIS VARIÁVEIS O D A I A C D N A Ê C I N I L T P S B M A O C E D L O E O M C O L Á R D N Í S
TAQUICARDIA ALTERAÇÕES DA PRESSÃO ARTERIAL SUDORESE AGITAÇÃO ALTERAÇÕES DA PRESSÃO ARTERIAL
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O agravamento da crise de abstinência pode causar o delirium tremens que é um quadro grave que envolve perturbação da consciência, alucinações, medo infundado, confusão mental, agitação ou inquietação, além de ideação paranoide. Geralmente o delirium tremens tem duração de 3 a 5 dias, com bom desfecho quando tratado; diferente de quando não tratado, visto que pode levar a óbito. Podem ocorrer complicações neurológicas chamada de Wernicke e Korsakoff em que ocorre lesão no diencéfalo, associada a vitamina B1 (tiamina), duas doenças distintas que podem ocorrer ao mesmo tempo. O cliente apresentará sintomas de encefalopatia de Wernicke como: nistagmo, ataxia, sangramento nas porções inferiores do cérebro, incluindo o tálamo e o hipotálamo, causando danos cerebrais envolvendo a visão, coordenação e equilíbrio. Se esta doença de Wernicke for tratada com rapidez (reposição da tiamina) e eficácia a síndrome de Korsakoff pode não se desenvolver. Síndrome de Korsakoff é caracterizada pela perda da amnésia anterógrada e retrógrada, ou seja, há a incapacidade de formar memórias novas ou mesmo em acessar os registros mnêmicos antigos, respectivamente. Podem ainda se desenvolver déficits cognitivos e de atenção de diferentes graus. Tratamento
Deve ter base em conhecimentos relacionados aos processos de psicoterapia cognitivo-comportamental e aos mecanismos fisiopatológicos. Utiliza-se o naltrexone para reduzir a capacidade de o álcool produzir e estimular efeitos prazerosos no SNC e tem sido indicado para cliente com sintomas intensos de fissura. O acamprosato e topiramato são indicados para clientes com sintomas mais intensos da síndrome da abstinência, assim como de fissura. Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso da cocaína
A cocaína é reconhecida como estimulante do sistema nervoso central e pode provocar sintomas psíquicos, como: sensação de bem-estar, euforia, aceleração do pensamento, aumento do estado de vigília, autoconfiança elevada; bem como sintomas físicos, como aumento da frequência cardíaca, da frequência respiratória e da temperatura corporal, tremor leve de extremidades, sudorese, tiques, midríase e espasmos musculares (principalmente na língua e mandíbula).
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As desordens psiquiátricas podem surgir na forma de ideação persecutória, agitação, ansiedade, irritabilidade, heteroagressividade, confusão mental e alucinações. Podendo provocar em termos físicos: infarto agudo do miocárdio, dispneia, dor torácica, lesões no SNC e convulsões. Quanto aos padrões de consumo, a cocaína pode ser usada sob forma de pó, aspirado pelo nariz, fumada como crack ou pasta-base, ou por via injetável. O crack forma pedras como cristais, que são fumadas em uma espécie de cachimbo e também pode ser injetado intravenosamente após a diluição, assim como o pó. A cocaína está em grande parte das vezes associada com consumo do álcool, e esta combinação tem um potencial bem mais agressivo sobre o coração. Tratamento
A síndrome da dependência da cocaína não tem tratamento específico, no entanto, o uso de antidepressivos inibidores da recaptação de serotonina, como a paroxetina, a fluoxetina e a sertralina podem reduzir os sintomas da fissura. Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de canabinoides
Foi com propósitos medicinais datados de 2700 a.C, que se registrou o uso da maconha. Amplamente utilizada na Europa com esse propósito, durante os séculos XVIII e XIX, ela foi introduzida no Brasil pelos escravos africanos e difundida também entre os indígenas, sendo no início usada com propósitos medicinais e recreativos. No final do primeiro quarto do século XX, distinguiam-se duas classes de “vícios”: os “vícios elegantes”, que eram o da morfina, da heroína e da cocaína, consumidos pelas elites (brancas, em sua maioria) e os “vícios deselegantes”, destacando-se o alcoolismo e o maconhismo, próprios das camadas pobres, em geral, formadas por negros e seus descendentes. Atualmente, a maconha representa a substância ilícita mais utilizada em todo mundo. A Cannabis (Cannabis sativa) é uma planta de sexos separados. A planta feminina contém mais princípios ativos. As flores e folhas secretam uma resina que
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contém mais de 400 compostos químicos, e aproximadamente 60 deles são princípios ativos, chamados de canabinoides, entre eles o tetra-hidrocanabinol (THC), que tem propriedades psicoativas. M O C . S E G A M I E E R F . W W W / ©
Seus principais efeitos são: No sistema nervoso central (dependem da dose, experiência, expectativa, ambiente) provocam: leve estado de euforia, relaxamento (redução da ansiedade), sensações agradáveis ligadas à música, ao paladar e ao sexo, o prolongamento da percepção de tempo, risos imotivados; torna o usuário mais falante e sujeito a delírios; No resto do corpo provocam: olhos avermelhados, boca seca e taquicardia. •
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O quadro de dependência não é frequente, mas pode ocorrer associado ao aparecimento de síndrome do pânico, especialmente quando o consumo é interrompido. A absorção da maconha ocorre de 90 a 95% na cavidade oral e 50% no pulmão; desta maneira, os usuários têm maior risco para desenvolver câncer no pulmão, orofaringe e bexiga. Seu consumo pode levar à reagudização de quadros psicóticos. Ela pode ser fumada sob a forma de folhas secas preparadas para o fumo (cigarro) ou ingerida pela utilização de sua resina (haxixe). A maconha também apresenta potenciais efeitos terapêuticos, como: redução do vômito e aumento do apetite em quimioterapia e tratamento da AIDS; alívio a dorneuropática, podendo ser usada como adjunta no tratamento de pacientes com AIDS, câncer e diabetes; efeito antiespástico em pacientes com esclerose múltipla; uso no tratamento de glaucoma, por diminuir a pressão intraocular.
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Cigarro de maconha
Haxixe.
Há a necessidade de mais estudos controlados para comprovar sua eficácia por outras formas de administração diferente da fumada (a ser evitada pelos efeitos lesivos desta via de administração). Transtornos Mentais e Comportamentais devido ao uso de Opiáceos
A palavra opioide é usada para nos referirmos às substâncias produzidas pelo nosso organismo (como as endorfinas, encefalinas e dinorinas) que agem se ligando aos receptores opioides endógenos. Alguns autores usam o termo opioide também para se referirem a substâncias totalmente sintéticas, fabricadas em laboratório e que não são derivadas do ópio, como é o caso da meperidina, do propoxifeno e da metadona, que são chamadas de opioides (isto é, semelhantes aos opiáceos). Por este grupo envolver substâncias como a morfina e a dolantina que são de uso clínico, há um alto potencial para desenvolvimento de dependência desse tipo de substância. Clientes que são submetidos a procedimentos prolongados de analgesia e profissionais da área de saúde representam os principais usuários. A intoxicação aguda por opiáceos provoca humor normal tendendo ao eufórico, sedação e miose (contração da pupila). Em situações de overdose, os sinais são inconsciência, bradicardia, miose, convulsões, depressão respiratória e coma. A utilização dos opiáceos é diversificada: A morfina pode ser consumida por via oral, intravenosa, intramuscular e intratecal; A heroína pode ser fumada, e consumida por via intravenosa, intramuscular e oral; A buprenorfina pode ser utilizada por via sublingual, intratecal e subcutânea; O fentanil pode ser consumido por via epidural e pelo emplastro transdérmico (adesivo). •
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A síndrome de abstinência inicia quando a pessoa interrompe repentinamente o uso dos opiáceos e pode ser muito intensa, com midríase (dilatação da pupila), dores generalizadas,náuseas e vômitos, diarreia, câimbras musculares, cólicas intestinais, lacrimejamento, corrimento nasal, sintomas que podem durar até 12 dias. Tratamento
Os dependentes de opiáceos são tratados, geralmente, pela chamada terapia de substituição. A desintoxicação pode incluir a buprenorfina ou a metadona, opiáceos de ação prolongada e com baixo risco de abuso. Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de alucinógenos
O pico do consumo de alucinógenos foram os anos 1960 e 1970. Tais drogas, que ainda são encontradas nos dias atuais, provocam alucinações muito exuberantes e delírios. É possível classificar os alucinógenos, de acordo com a sua origem, em naturais (como o tetra-hidrocanabinol e a mescalina), semissintéicos (como o LSD) e sintéticos (como a MDMA ou ecstasy). Efeitos psíquicos mais importantes: distorções perceptivas (cores e formas alteradas); sinestesia (fusão dos sentidos, ex.: “ver um som”, “ouvir uma cor”); perda da discriminação de tempo e espaço (minutos parecem horas); alucinações visuais e auditivas (“boa” ou “má” viagem); delírios; flashback (retorno de sensações experimentadas anteriormente, porém sem ter usado a droga) – atualmente englobado dentro de um quadro denominado “distúrbio de percepção persistente”. O ácido lisérgico (LSD) é considerado a mais potente droga alucinógena e pode ser encontrado em diferentes apresentações como tabletes, cápsulas, líquido ou colado no verso dos selos.
Forma de apresentação do LSD.
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Alucinações exuberantes. ©
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A MDMA (meilenodioxometanfetamina) é um derivado anfetamínico sintético de efeitos mistos, estimulantes e perturbadores, usado na forma de comprimido, conhecido como ecstasy. Tem vários nomes de rua: E, Adam, Bala, Balinha etc.
Apresentação do Ecstasy (MDMA).
Os efeitos psíquicos que se destacam: causa ansiedade e percepções alteradas (menos intensas que o LSD); afeta o pensamento, o humor e a memória; sentimentos de cordialidade e empatia; efeitos reforçadores e estimulantes (potencial); redução do apetite. Outros efeitos importantes: frequência cardíaca e pressão arterial aumentadas; sudorese e boca seca; fadiga e espasmos musculares (devido ao efeito sobre os motoneurônios da medula espinhal); descontrole da temperatura (geralmente ocorre hipertermia em função do ambiente e da agitação motora); bruxismo (ranger de dentes, sendo que alguns usuários referem quebra dos dentes).
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Tratamento
Não há tratamentos padronizados. Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso sedativos e hipnóticos
Os benzodiazepínicos apresentam alta capacidade ansiolítica e de sedação, por isso tem motivado a associação dessas substâncias a quadros de uso prejudicial, excessivo, de dependência e, não raro, a tentativa de suicídio. São indicados terapeuticamente, principalmente como tranquilizantes ou ansiolíticos, ou seja, diminuem a ansiedade, ou como hipnóticos, visto que auxiliam na indução do sono. São utilizados também para controlar estados convulsivos, inclusive aqueles decorrentes da síndrome de abstinência ao álcool, bem como promover o relaxamento muscular e a sedação pré-anestésica. Essas drogas também prejudicam as funções psicomotoras, dificultando atividades que exijam atenção, como dirigir automóveis ou operar máquinas, aumentando a probabilidade de acidentes.
ATENÇÃO É preciso alertar os clientes para não usar essas substâncias juntamente com o álcool, pois seus efeitos são potencializados, provocando risco de morte.
O uso regular de benzodiazepínicos e de outros sedativos produz sonolência, vertigem e confusão mental; náusea, dor de cabeça, alteração da marcha; dificuldade de concentração e de memorização problemas de sono; ansiedade e depressão; tolerância e dependência, após um período relativamente curto de uso; sintomas significativos de abstinência, na sua retirada abrupta; overdose e morte, se usados com álcool, opiáceos ou outras drogas depressoras. Os benzodiazepínicos podem provocar defeitos nos lábios e no céu da boca (como lábios leporinos),principalmente se usados pela mulher grávida no primeiro trimestreda gestação. A Organização Mundial da Saúde recomenda a prescrição dos benzodiazepínicos por períodos entre duas e quatro semanas, no máximo, e apenas nos
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quadros de ansiedade ou insônia intensa, pois é comum haver tolerância a esses medicamentos. Embora a compra desse tipo de medicamento seja controlada (só pode ser vendido com a retenção de um receituário especial, chamado de Notificação B, que tem a cor azul), essas substâncias são usadas de forma indiscriminada. Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de tabaco
Os produtos à base de tabaco levam mais de 4.000 substâncias químicas, sendo que uma dos acessos mais fáceis à nicotina é o cigarro. Logo após a administração da nicotina, as glândulas adrenais são estimuladas e ocorre uma descarga de adrenalina. E, no SNC a nicotina ativa o sistema de recompensa por meio do aumento dos níveis de dopamina.
CURIOSIDADE Cerca de 1 a 2 mg de nicotina são rapidamente conduzidas ao cérebro a cada cigarro fumado.
Tais efeitos são produzidos tão rápido quanto duram, mas ainda sim, o fumante sente-se estimulado a repetir o processo de fumar para que sejam mantidos os efeitos de prazer. M O C . S E
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Os sintomas relacionados à abstinência da substância são: déficits de atenção, fissura, irritabilidade, alteração de sono, aumento de apetite. Apresenta altíssima incidência de dependência. Tratamento
Inclui estratégias de abstinência, medicações que diminuem a sensação de fissura, participação em grupos de ajuda mútua, administração de gomas de mascar ou adesivos de reposição de nicotina. Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso solventes voláteis
Inalantes são substâncias voláteis que ao serem vaporizadas são rapidamente absorvidas pelos pulmões e chegam ao SNC produzindo efeitos depressores. Os solventes, por terem a propriedade de se evaporar facilmente, são inalados para obter alterações psíquicas, chamadas por alguns usuários de “barato”. Essas substâncias fazem parte da composição de diversos produtos de uso doméstico ou industrial, como produtos de limpeza que contêm nitritos (limpadores de cabeça de videocassete, limpadores de couro, aromatizadores líquidos para carro), colas (especialmente a cola de sapateiro), lança-perfume (cloreto de etila), combustíveis (tíner, aguarrás, removedores em geral, gasolina, gás de isqueiro etc.), produtos de beleza (spray para cabelo, acetona, removedor de esmalte, esmalte) e de papelaria (corretor líquido –“branquinho”), entre outros. Os inalantes podem ser mais atrativos para uso por terem início do efeito rápido (por ser inalado, chega rapidamente ao pulmão e ao cérebro), as pessoas relatam inicialmente uma sensação de bem-estar e cabeça leve, tem baixo custo, facilidade de aquisição, menos problemas legais do que com outras substâncias e há uma grande variedade desses produtos, o que facilita o seu abuso. Por ser consumida geralmente por inalação, a Ketamina que tem efeitos anestésicos e é utilizada em procedimentos veterinários, faz parte deste grupo. Seu uso está associado à cena eletrônica em função do potencial sociabilizador. Já o GHB que é conhecido como ecstasy líquido, visto que tem características semelhantes às da MDMA, tem ação semelhante a de um neurotransmissor, pois inicialmente supre a liberação de dopamina e depois aumenta sua liberação, assim como de opioides endógenos.
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Os efeitos causados pelos inalantes estão dispostos no quadro a seguir:
PRIMEIRA FASE SEGUNDA FASE TERCEIRA FASE QUARTA FASE
Excitação :
sintomas de euforia, excitação, tonturas, pertubações auditivas e visuais. Efeitos indesejados: náuseas, espirros, tosse, salivação, fotofobia e vermelhidão na face. Depressão inicial do SNC: confusão menta, desorientação, visão em-
baçada. Podem surgir cefaleia e palidez. Depressão média do SNC:
redução acentuada do estado de alerta, incoordenação ocular e motora, fala pastosa e perda dos reflexos Depressão profunda do SNC: inconsciência,
podendo ocorrer convulsões e mesmo morte súbita, por problemas cardíacos ou parada respiratória.
Tabela 4.1 – Efeitos dos inalantes. SUPERA, Mód. 2 (2016). Intervenções de enfermagem
É preciso observar de modo geral o comportamento do cliente que faz uso de SPA. São três as principais etapas que caracterizam a atuação do enfermeiro: Identificação de casos – durante a consulta de enfermagem, identificar problemas clínicos relacionados ao uso de álcool e outras drogas, por meio de instrumentos de rastreamento como o CAGE, AUDIT, TWEAK, entre outros. Segmento terapêutico – aconselhar sujeitos, promovendo reflexões e mudanças de comportamento; adotar intervenção motivacional, incentivando o sujeito para mudanças de comportamento, com planejamento de ações para se proteger das situações de risco; realizar promoção da saúde por meio de técnicas educativas com o usuário e a família. Manejo da abstinência – implementar protocolos de manejo medicamentos junto com o psiquiatra; preparar o cliente e a família para o programa de tratamento apropriado; fazer indicações para a educação mais intensiva, com terapia e grupos de autoajuda. •
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CONEXÃO Quer saber mais sobre instrumentos de rastreamento do uso de álcool e outras drogas? Visite o site:
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM Risco de infecção relacionado à desnutrição e a alterações imunológicas
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM Observar e anotar a ingestão de alimentos e líquidos.
Processo de pensamento perturbado
Ajudar o cliente a aceitar que o comportamento dele é consequência do consumo de substâncias psicoativas, não admitindo suas racionalizações nem a atribuição de culpa a outras pessoas.(mecanismos de defesa)
Enfrentamento ineficaz
Não demonstrar, de modo verbal ou não verbal, descrença na recuperação, principalmente quando houver recaída.
Processos familiares disfuncionais
Listar com o cliente comportamentos substitutivos da procura e do uso das substâncias psicoativas, como a realização de atividades voluntárias na comunidade, prática de atividades esportivas junto a um familiar, práticas de lazer, artísticas, entre outras que sejam da preferência do cliente.
Figura 4.3 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem em clientes que fazem o uso de substâncias psicoativas.
ATIVIDADES 01. cocaína e a maconha se apresentam em diferentes formas, quais são elas, respectivamente? a) Haxixe e Balinha b) LSD e Loló c) Crack e Ecstasy d) Crack e Haxixe e) Nenhuma das opções anteriores
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02. Indique V para verdadeiro e F para falso nas afirmativas a seguir e justifique os erros que encontrar nas alternativas falsas: ( ) A fissura (cracking ) é quando se expressa um desejo controlável pela substância, levando o usuário a consumir a droga novamente. Em função dessa fissura, o usuário não somente volta a consumir, como também dirige suas ações para encontrar a droga. ( ) A tolerância é quando baixas quantidades da droga não produzem mais o mesmo efeito. ( ) O usuário pode experimentar a abstinência, ou seja, sofrer efeitos físicos e psíquicos desagradáveis, de intensidade variável, que surgem quando há uma redução ou ausência do consumo da(s) droga(s). ( ) Os benzodiazepínicos são indicados para gestantes até o primeiro trimestre. 03. A tolerância e síndrome de abstinência são sinais que caracterizam uma dependência. O que ocorre na tolerância e síndrome de abstinência?
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARVALHO, Marissol Bastos (ORG). P siquiatria para enfermagem. São Paulo: Rideel, 2012. DELGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. DSM-IV-TR. Manual diagnóstico e estatístico de
transtornos mentais. 4. ed. Trad. Cláudia
Dornelles. Porto Alegre: Artmed, 2003. HERDMAN, Heather T; KAMITSURU Shigemi. Diagnósticos de enfermagem da NANDA: definições e classificação 2015-2017. [NANDA International]; organizadoras; tradução: Regina Machado Garcez; revisão técnica: Alba Lucia Bottura Leite de Barros [et al.].– Porto Alegre : Artmed, 2015. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Classificação de Transtornos mentais e de comportamento da CID-10 – Critérios diagnósticos para
pesquisa. Porto Alegre: Artes Médicas,
1998. PERNAMBUCO FILHO, P.; BOTELHO, A. Vícios sociais elegantes. Rio de Janeiro: Livraria Alves, 1924. SADOCK & KAPLAN. Compêndio de psiquiatria: ciências do comportamento e psiquiatria clínica. 9. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2007. STEFANELLI, Maguida Costa; FUKUDA, Ilza Marlene Kuae; ARANTES, Evalda Cançado (ORG). Enfermagem psiquiátrica em suas dimensões assistenciais. Barueri, SP: Manole, 2008.
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SUPERA: Sistema para detecção do Uso abusivo e dependência de substâncias Psicoativas: Encaminhamento, intervenção breve, Reinserção social e Acompanhamento. Efeitos de substâncias psicoativas: módulo 2. – 10. ed. – Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, 2016.146 p.
Coordenação [da] 10. ed. Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni. SUPERA: Sistema para detecção do Uso abusivo e dependência de substâncias Psicoativas: Encaminhamento, intervenção breve, Reinserção social e Acompanhamento. O uso de substâncias psicoativas no Brasil: módulo 1. – 10. ed. – Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas,
2016.146 p. Coordenação [da] 10. ed. Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni.
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5 Crise, emergência psiquiátrica e psicofarmacologia
Crise, emergência psiquiátrica e psicofarmacologia Pode ficar orgulhoso porque você está na reta final! Você também tem a sensação de ter passado bem rápido mesmo depois de todo esse caminho que percorreu? Para aqueles que acharam que passou rápido, esse capítulo vai ser só passeio até a linha de chegada. Nada de cansaço ou respiração ofegante. Já para aqueles que pensaram que demorou chegar até aqui, a chegada vai ter um sabor especial, já que todo o trajeto terá terminado (digamos que temporariamente). Mas sem mais delongas, vamos ver o que lhe espera nesta reta final. Neste percurso, você entenderá mais sobre o que é crise em psiquiatria e também saberá mais sobre a emergência psiquiátrica. Ambos têm a ver com a contenção mecânica, um dos meios terapêuticos utilizados em psiquiatria que muitas vezes aprendemos a ter medo de antemão, pela visão violenta, que em grande parte das vezes, vemos nos filmes. Aqui você verá que há toda uma técnica e um cuidado envolvido nesta medida que nunca pode ser utilizada como medida punitiva. Temos, para finalizar, a parte da psicofarmacologia e uma sugestão de leitura que vai colocar você para refletir sobre a questão da medicalização do cuidado, que digamos, representa aquela força maior que nos faz vencer os desafios! Você verá que este capítulo é muito importante para a construção do saber técnico, teórico, humano e ético do profissional que atua em saúde mental. Então o que você está esperando? Iremos nos encontrar na chegada!
OBJETIVOS •
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Explicar o que é crise e seus níveis de intervenção; Compreender o que é uma emergência psiquiátrica e como proceder nesta situação; Adquirir conhecimentos sobre a psicofarmacologia.
O texto deste capítulo teve como base Stefanelli (2008), Delgalarrondo (2008), Carvalho (2012), Townsend (2011), NANDA (2015) e outras fontes que subsidiaram tais produções, tendo sofrido adaptações conforme julgou-se necessário.
capítulo 5 •
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Crise A crise pode ser caracterizada como estado de desequilíbrio emocional em que há uma inabilidade para resolver um problema real ou percebido, que envolve mudança, perda ou ameaça psicológica, biológica, cultural, espiritual, social. Quando a pessoa se depara com uma situação de conflito para seu equilíbrio e não se sente capaz de ignorar ou de resolver este problema com seus mecanismos conhecidos de enfrentamento, surge uma crise, que representa um esforço maior para a recuperação deste equilíbrio emocional. Mas neste processo, a pessoa pode se desorganizar, o que aumenta sua vulnerabilidade ou transforma sua vivência deste momento em oportunidade de crescimento por meio do aprendizado de novas formas de enfrentamento. A crise tem características principais que são: Ocorre em pessoas saudáveis Pode ser uma oportunidade de crescimento
Caráter agudo
CRISE A gravidade do evento é definida pela pessoa que o experimenta e não por sua magnitude
Duração limitada Reação emocional excessivamente opressora
Figura 5.1 – Stefanelli (2008). Adaptado.
As crises são de caráter pessoal, pois o que é estressante para uma pessoa pode não ser para a outra. Isso pode levar outras pessoas a julgarem pejorativamente o comportamento observado. A percepção da crise dependerá da extensão da ameaça que ela representa para os valores objetivos da vida de quem a vivencia. Alguns eventos na vida podem tornar a pessoa vulnerável à crise, como perdas significativas, desemprego, dificuldade para lidar com os problemas diários, separação conjugal, história de transtornos psiquiátricos ou situações mal resolvidas, que geralmente estão associadas à redução da autoestima.
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Fases da crise
As fases da crise correspondem ao aumento da ansiedade quando os mecanismos habituais de resposta falham, levando a pessoa a um estado de desorganização.
FASE 1
A pessoa experimenta o aumento da ansiedade, porque seus mecanismos de enfrentamento não estão sendo suficientes para resolver o problema ou diminuí-la.
FASE 2
A ansiedade aumenta e começa o processo de desorganização do funcionamento da pessoa.
FASE 3
A ansiedade se torna intensa e são acionados de modo automático todos os recursos internos e externos para se obter o alívio desta sensação. Caso isso não ocorra, a ansiedade torna-se intensa e a pessoa busca alívios automáticos, como isolamento e fuga.
FASE 4
Em não havendo sucesso nas outras tentativas, a ansiedade se intensifica, tornando-se esmagadora, o que provoca a desorganização da personalidade, pânico, confusão, tentativa de suicídio e violência contra outros.
Intervenção na crise e a assistência de enfermagem
Representa uma forma de terapia breve, com foco pontual no problema a ser resolvido, estando centrada na solução imediata da crise. Espera-se como resultado a esta ação, a recuperação da pessoa do evento crítico. Os objetivos iniciais da intervenção na crise são a segurança e a redução da ansiedade do cliente. Após isso, o objetivo é conseguir que o cliente se acalme e se organize um pouco mais, ou seja, que ele retorne para o estágio de funcionamento anterior à crise ou a um nível mais adequado, já que novas formas de enfrentamento podem ser aprendidas na resolução deste evento. Portanto, ao avaliar uma pessoa em crise, o enfermeiro deve observar as manifestações de comportamento, a percepção do evento pelo cliente, o evento desencadeante da crise, os recursos de enfrentamento, as competências e os mecanismos de enfrentamento pregressos, somado aos sistemas de apoio. Desta forma, a avaliação da pessoa e de seu problema atual é o foco da primeira fase. É preciso ainda determinar quando o evento ocorreu; avaliar as condições físicas e mentais; avaliar se o comportamento do cliente é um risco para si mesmo ou para os outros, não se esquecendo da possibilidade de suicídio ou homicídio; e
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tomar decisão, em equipe, se possível sobre a intervenção e o local de atendimento, sempre evitando a internação hospitalar.
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Ansiedade,
em elevado grau, relacionada a uma ameaça real ou percebida como tal à integridade biológica ou ao conceito do eu, evidenciada por respostas fisiológicas e afetivas de medo e pânico decorrentes da situação de crise, impedindo-o de identificar suas necessidades.
Ouvir reflexivamente a pessoa, ajudando-a a descrever e reconhecer seus sentimentos e pensamentos sobre sua experiência atual, estimulando-a a ter uma compreensão intelectual da crise.
Sentimento de impotência
Caso o cliente comece a falar sobre fatos não conectados com o momento atual, redirecionar sua atenção para o evento, em clima de apoio e confiança.
Enfrentamento ineficaz individual
Ajudar o cliente a tornar-se consciente de seus sentimentos atuais.
Risco de suicídio
Estabelecer limites às manifestações de comportamentos agressivos e destrutivos.
Desesperança
Explorar novos métodos de enfrentamento, de acordo com a situação atual, o que geralmente, estimula a pessoa a pensar em métodos originais que ela não havia tentado antes.
Interações sociais e familiares prejudicadas
Identificar e encaminhar a pessoa e a família para sistemas de apoio da comunidade.
Tabela 5.1 – Diagnósticos de enfermagemIntervenções de enfermagemQuadro 1: Diagnósticos e intervenções de enfermagem na crise. Stefanelli (2008) e Townsend (2011). Adaptado.
Emergência psiquiátrica (EP) É considerada emergência psiquiátrica qualquer situação na qual exista risco significativo e iminente de morte ou de lesão grave provocada por sentimentos, pensamentos ou ações que colocam em risco a integridade da própria pessoa, de outras, do ambiente e da sociedade. Esse tipo de situação exige intervenção
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terapêutica imediata com a intenção de prevenir a conclusão danosa individual e social. As emergências psiquiátricas podem ocorrer em diversos cenários, que podem ser hospitalares (pronto-socorro de hospitais gerais, hospitais psiquiátricos, dispositivos de saúde mental) ou não (podendo ocorrer na rua, em casa etc.). É relevante lembrar a diferença de urgência e emergência. URGÊNCIA
EMERGÊNCIA
Riscos menos graves, mas que exigem intervenção em curto prazo, dias ou semanas.
Está implicado o risco iminente de vida ou sofrimento intenso, exigindo tratamento médico imediato.
Figura 5.2 – Stefanelli (2008) e Resolução CFM no 1.451/1995. Adaptado.
Quando o assunto é emergência psiquiátrica, é preciso pensar na equipe e no local em que ocorrerá este atendimento. É importante que haja uma equipe de saúde e de segurança qualificadas e preparadas para o atendimento da pessoa nesta situação. O espaço deve ser próprio, seguro, livre para a circulação dos membros da equipe de atendimento, e deve dispor do equipamento necessário para a assistência na situação da emergência psiquiátrica (EP) e do material adequado para a contenção mecânica.
ATENÇÃO É importante evitar objetos supérfluos que possam ser usados num momento de auto ou heteroagressividade ou em outras pessoas presentes na sala de atendimento.
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Outro ponto a se destacar é que quando o funcionário estiver sozinho com o cliente, a porta da sala deve permanecer aberta e as outras pessoas da equipe devem ser avisadas. Essa situação não deve ser comum, uma vez que o atendimento a situações de emergência psiquiátrica deve ser feito por equipe interdisciplinar composta, no mínimo, por médico psiquiatra, enfermeiro psiquiátrico, auxiliar de enfermagem e equipe de apoio ou de segurança, disponível para colaborar nas situações em que a agressividade e agitação são muito intensas. Heteroagressividade, violência e situações de emergência psiquiátrica
A agitação psicomotora é caracterizada por tensão, hiperatividade, inquietação, manifestada por um estado psicomotor. A agressividade significa um estado de violência, uma atitude dirigida a alguém ou a algo e é secundário ao estado psíquico do cliente. Destaca-se que a situação de emergência psiquiátrica não se resume apenas aos transtornos mentais, mas podem ser motivadas também por violência, fatores sociais, envelhecimento, entre outros. Existem alguns sinais de agitação que são prévios a uma violência iminente que são inquietação, bater portas ou destruir objetos, caminhar constante, dentes cerrados, falar em alto tom de voz ameaçadora, tensão muscular, impaciência. Algumas situações caracterizam a emergência psiquiátrica nos clientes, independentemente da idade que possuam, que de modo geral estão relacionadas a:
ANSIEDADE AGUDA (PÂNICO)
IDEIA E TENTATIVA DE SUICÍDIO
ANOREXIA E BULIMIA
SITUAÇÃO DE CRISE INTOXICAÇÃO AGUDA E SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA DO ÁLCOOL E OUTRAS SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS
SURTOS PSICÓTICOS AGUDOS AGITAÇÃO, AGRESSIVIDADE E RISCO DE VIOLÊNCIA AGUDA
Figura 5.3 – Stefanelli (2008). Adaptado.
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INTOXICAÇÃO E EFEITOS ADVERSOS GRAVES DE PSICOFÁRMACOS
Já as situações de emergência psiquiátricas mais comuns são: Tentativa de suicídio – frequentes em transtorno bipolar, depressão (incluindo depressão pós-parto), uso de substâncias psicoativas, transtornos orgânicos (delirium), sensação de desesperança e desemparo com sentimentos de ambivalência entre a sobrevivência e a angústia insuportável; Agitação e agressividade – frequentes em transtorno afetivo bipolar (fase de mania), esquizofrenia catatônica e paranoide, depressão agitada ou ansiosa, transtornos mentais orgânicos, uso de substâncias psicoativas, transtorno de personalidade Borderline e antissocial, reação aguda ao estresse; Ansiedade aguda – quando a pessoa chega ao ponto de ter um ataque de pânico, que são quadros de início súbito, episódicos e intensos, associados à sensação de pavor, morte iminente, que são acompanhados de desconforto precordial, vertigem, parestesias, palpitações, tremores e sudorese; Intoxicação alcoólica – caracterizada com marcha instável, fala pastosa, labilidade emocional, diminuição da atenção, euforia, depressão, agressividades, incapacidade de julgamento. •
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Contenção física
Representa uma forma de tratamento que deve ser utilizada em último caso, podendo ser a única forma possível de abordagem, até que se estabeleçam outras medidas a fim de evitar que o cliente coloque em risco sua integridade física ou de qualquer outra pessoa ao seu redor. A decisão de conter o cliente mecanicamente cabe ao médico e ao enfermeiro em casos que envolvem agitação psicomotora intensa que traduzem risco para a própria pessoa ou para as demais, potencial de queda, resistência do cliente à sedação ou outras situações que possam oferecer risco à integridade das pessoas ou do ambiente. O enfermeiro pode decidir a respeito da contenção ou retirada dela, em caráter emergencial (seguindo o protocolo da instituição), no entanto, deve providenciar a avaliação e prescrição médica em até 30 minutos. O Conselho Federal de Enfermagem tem a resolução COFEN no 427/2012 que normatiza os procedimentos da enfermagem no emprego de contenção mecânica de pacientes e traz: – Art. 2º A contenção mecânica de paciente será empregada quando for o único meio disponível para prevenir dano imediato ou iminente ao paciente ou aos demais.
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– Art. 4º Todo paciente em contenção mecânica deve ser monitorado
atentamente pela equipe de enfermagem, para prevenir a ocorrência de eventos adversos ou para identificá-los precocemente. – § 1º Quando em contenção mecânica, há necessidade de monitoramento clínico do nível de consciência, de dados vitais e de condições de pele e circulação nos locais e membros contidos do paciente, verificados com regularidade nunca superior a 1 (uma) hora. – § 2º Maior rigor no monitoramento deve ser observado em pacientes sob sedação, sonolentos ou com algum problema clínico, e em idosos, crianças e adolescentes. – Art. 3º É vedado aos profissionais da enfermagem o emprego de contenção mecânica de pacientes com o propósito de disciplina, punição e coerção, ou por conveniência da instituição ou da equipe de saúde. – Art. 5º Todos os casos de contenção mecânica de pacientes, as razões para o emprego e sua duração, a ocorrência de eventos adversos, assim como os detalhes relativos ao monitoramento clínico, devem ser registrados no prontuário do paciente. (RESOLUÇÃO COFEN no 427/2012) Técnica da contenção física e as etapas para sua realização
A fim de realizar a contenção física de modo que o cliente não se machuque, é preciso seguir uma técnica que deve ser realizada de forma adequada e com segurança, respeitando o cliente, explicando o motivo pelo qual ele está sendo contido, independente de suas condições. Para isso são necessárias cinco pessoas da equipe de enfermagem, que pode contar se houver na instituição, com o pessoal treinado da segurança. Para ocorrer a contenção, é indicado ter um quarto individual com cama baixa, coberta e lençol que deve se manter pronto para receber quem chegar; faixas de contenção confeccionadas em tecido de algodão resistente, reforçadas com costuras de modo a não provocarem garroteamento ou lesões no cliente. As faixas para adulto devem ser de, minimamente, 12 a 14 cm de largura para contenção feita no tórax e de 5 a 6 cm para fazer a contenção dos pulsos e tornozelos; lençol ou cobertor para cobrir o cliente.
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As etapas para a contenção física dizem mais sobre o posicionamento e as ações dos cinco elementos que devem estar rodeando o cliente. Portanto, temos: Geralmente o enfermeiro se posiciona na frente do cliente, abordando-o na tentativa de acalmá-lo, chamando-o pelo nome e explicando o que está acontecendo; No momento que julgar melhor, o enfermeiro poderá dar um sinal aos demais elementos para que segurem o cliente. Cada um imobilizará um membro do cliente, evitando que ele consiga fazer o uso do movimento das pernas e braços, o que dificulta a contenção física. O enfermeiro ajudará na contenção ao segurar o cliente por trás, pelo tórax; Manter o cliente vestido durante o procedimento; Levar o cliente para o leito, contendo primeiramente o tórax prestando atenção aos movimentos respiratórios, depois os pulsos e tornozelos, que nunca podem ser contidos juntos e fixar as faixas de contenção na cama; Observar se há sinais de garroteamento nos locais de contenção (caso sim, deixar mais frouxa as amarras) e proteger o cliente com lençol ou cobertor; Sempre que o cliente for contido, ao menos pulsos e pernas deverão ser imobilizados para que sejam evitados acidentes. As pernas soltas podem fazer o cliente tentar pular da cama. •
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É preciso tomar cuidados após a contenção física: explicando novamente ao cliente o motivo da contenção, validando sua compreensão; o médico deverá avaliar o cliente a cada 30 minutos; um integrante da equipe deve permanecer junto ao cliente para lhe dar assistência integral de enfermagem durante o tempo que permanecer contido, observando sua higiene, mudança de decúbito, eliminações e deverá documentar em prontuários todas as avaliações; oferecer continuamente apoio como medida terapêutica ao cliente, procurando interagir com o mesmo para lhe dar ciência de sua situação. Não devem ser admitidas lesões provocadas pela contenção física.
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Intervenções de enfermagem
DIAGNÓSTICOS DE ENFERMAGEM Processo de pensamento perturbado
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM Providenciar atendimento imediato.
Confusão aguda
Dirigir-se ao cliente chamando-o pelo nome, e aos familiares ou acompanhantes informando-lhes quem você é, a sua função e o que está sendo feito, mantendo o ambiente o mais calmo possível.
Angústia espiritual
Manter atitude positiva de aceitação e de não julgamento em relação ao cliente e aos familiares, transmitindo-lhes segurança.
Risco de violência direcionado a si mesmo
Colher os dados essenciais para o atendimento inicial do cliente por meio de breve histórico de enfermagem.
Tentativa de suicídio
Estabelecer limites às manifestações de comportamentos agressivos e destrutivos. Manter a segurança do cliente, com vigilância constante e discreta para evitar automutilações e nova tentativa de suicídio. Orientar e oferecer apoio aos familiares. Orientar os profissionais da equipe de enfermagem quanto aos seus sentimentos em relação ao cliente e quanto ao suicídio, quando este ocorre.
Agitação e agressividade
Avaliar sempre as contenções para verificar se não há garroteamento. Evoluir o cliente periodicamente (indica-se a cada 15 minutos) Retirar as contenções quando o cliente apresentar remissão das manifestações apresentadas. Procurar tomar esta decisão junto à equipe de tratamento.
Ansiedade aguda
Deixar o cliente expressar a seu modo seus sentimentos, sem julgá-los, oferecendo apoio sincero e segurança.
Tabela 5.2 – Diagnósticos e intervenções de enfermagem na emergência psiquiátrica. Stefanelli (2008) e Townsend (2011). Adaptado.
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Psicofarmacologia Um pouco de história
Historicamente, é possível estabelecer uma divisão de tempos, quando o assunto são os psicofármacos, pois até perto de 1950, o tratamento do doente mental limitava-se a algumas medidas físico-químicas, como a insulinoterapia (que nos dias de hoje não é mais utilizada), a fisioterapia e a eletroconvulsoterapia. Nessa época, o enfermeiro estava mais ocupado em conter e vigiar os clientes. Já após os anos 1950, com as sucessivas pesquisas sobre novos fármacos, a síntese da clorpromazina e suas indicações no tratamento do doente mental e de pessoas com distúrbios emocionais mudou de modo radical os cenários dos hospitais, pois os doentes que eram confinados em quartos fortes, podiam caminhar mais livremente nas enfermarias. Dessa maneira, o advento dos psicofármacos proporcionou a abreviação do tempo de internação e abriu a possibilidade destes sujeitos voltarem à comunidade. As oportunidades novas facultadas ao uso dos psicofármacos fizeram com que muitas vezes eles fossem usados de modo inadequado, representando uma espécie nova de “camisa de força”, ou mesmo uma nova contenção, mas só que química. Com prós e contras vinculados a seu uso, é inegável que os psicofármacos possibilitaram que o tratamento fosse realizado em hospital dia e ambulatórios, proporcionando ao cliente o maior convívio com seu grupo social e familiar; os medicamentos ainda deixam o cliente em melhores condições para que participem da psicoterapia (seja individual ou em grupo), das atividades de lazer, com outros profissionais, atividades educacionais, de trabalho etc.
COMENTÁRIO Certamente toda a mudança não estará somente relacionada ao uso dos psicofármacos, sendo extremamente importante o tratamento ser realizado em parceria com familiares, pessoas próximas, profissionais, parcerias sociais (com inserção em projetos na comunidade de pertencimento do cliente, se possível). É importante também se utilizar de meios que auxiliam o cliente a expressar suas emoções e seus sentimentos, sejam individuais ou em grupo (como aqueles ligados à cultura, como a arte, a música; esportes, convívio com animais, por exemplo). Este conjunto de ações auxiliará na reintegração social da pessoa.
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Portanto, o enfermeiro que trabalhava em um hospital psiquiátrico ou mesmo em hospital geral, teve que se atualizar, adquirindo mais conhecimento acerca dos psicofármacos, de sua administração e de seus efeitos colaterais, para que fosse possível se prestar melhor assistência de enfermagem ao cliente com transtornos mentais.
LEITURA Neste contexto, você precisa saber o quanto é importante a avaliação em equipe e quais as ações que podem ser colocadas em prática com o cliente, de modo a evitar a medicalização do cuidado. Portanto, sugerimos a leitura do artigo: ZANELLA, Michele et al. Medicalização e saúde mental: Estratégias alternativas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Porto , n. 15, p. 53-62, jun. 2016 . Disponível em . < http:// dx.doi.org/10.19131/rpesm.0132>. Acessos em: 25 set. 2017.
3.2 Aspectos gerais dos psicofármacos
São caracterizados como substâncias que alteram a atividade psíquica, aliviando sintomas de transtornos psiquiátricos ou promovendo alterações no pensamento e na percepção. M O C . S E G A M I E E R F . W W W ©
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O tratamento com psicofarmacológicos envolve os seguintes passos: Fase Inicial – fase em que se orienta o cliente e seus familiares sobre os efeitos e evolução esperados. Ainda que a resposta terapêutica demore alguns dias ou semanas (a depender da medicação), os efeitos colaterais mais frequentes ocorrem nos primeiros dias de uso da medicação ou nos aumentos de dose. A orientação sobre esta situação contribui para uma melhor adesão à medicação. •
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Estabilização; Manutenção.; Retirada (desmame) – é realizada a retirada da medicação quando se avalia
essa possibilidade. Deve ser feita de modo gradual e os sintomas de retirada devem ser acompanhados e avaliados pelo enfermeiro. Farmacocinética e farmacodinâmica
O fato de atravessarem a barreira hematoencefálica para exercerem seus efeitos é o que difere os psicofármacos das demais drogas. Com relação à farmacocinética, a divisão é feita em quatro etapas: 1. Absorção – que é a passagem do fármaco do local de administração para a corrente sanguínea; 2. Distribuição – que é a circulação do fármaco pelo organismo, feita pelo fluxo sanguíneo e na forma livre e ligado à proteínas plasmáticas; 3. Biotransformação – que corresponde à inativação do fármaco e ocorre mais especificamente no fígado; 4. Excreção – que é a eliminação do fármaco após sua biotransformação, por vias como: a urina, as fezes, o suor e o leite materno. Já a farmacodinâmica é a ação do fármaco no organismo em seu sítio de ação (enzimas ou proteínas de membrana [receptores]) e efeitos colaterais. No que diz respeito à ação sobre as enzimas, geralmente ocorrerá a inibição desta pelo fármaco, assim como acontece nos antidepressivos, por exemplo, em que a ação dos antidepressivos inibidores de monoaminaoxidade (MAO) metaboliza as catecolaminas cerebrais, de modo reversível ou irreversível. O fármaco, desse modo, irá se ligar ao sítio ativo da enzima, impedindo sua ação sob o substrato. Quando apresenta ação reversível, sua atuação acaba com o tempo de vida fisiológica; no entanto, se a ligação do fármaco à enzima se dá de modo
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irreversível, o organismo terá de sintetizar uma nova enzima, processo que pode levar até 96 horas. Destaca-se que os receptores de fármacos estão na membrana plasmática das células-alvo e que no caso dos psicofármacos, majoritariamente eles estão na região pós-sináptica do local de conexão entre os neurônios. Assim, a afinidade do fármaco aos receptores pode promover 2 tipos de respostas: Antagonistas – representadas por fármacos que, ao se ligarem aos receptores, bloqueiam a ação de substâncias endógenas, reduzindo ou inibindo a resposta sobre o estímulo endógeno. Como a ação do haloperidol sobre os receptores dopaminérgicos na região mesolímbica do SNC, diminuindo as respostas estereotipadas da esquizofrenia, por exemplo; Agonistas – representadas por fármacos que, ao se ligarem aos receptores, evocam uma resposta semelhante a uma substância endógena. Como quando se utiliza um antiparkinsoniano que irá se ligar aos receptores dopaminérgicos, como já faria a dopamina na via nigroestriatal do SNC, por exemplo. •
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A ação farmacológica também está ligada à recaptação de neurotransmissores. Alguns antidepressivos como a fluoxetina, por exemplo, agem inibindo a recaptação de neurotransmissores, aumentando sua concentração na fenda e, como resultado, aumentam sua atuação sobre os receptores pós-sinápticos. É possível apontar diversos fatores que podem alterar a farmacocinética e a farmacodinâmica dos psicofármacos. São eles: CARACTERÍSTICAS INDIVIDUAIS Idade; Sexo; Peso; Composição corpórea; Alimentação; Fatores genéticos.
ESTADOS PATOLÓGICOS Disfunção cardíaca; Disfunção hepática; Infecções.
PADRÃO DE USO Dose; Ambiente em que o fármaco é usado; Vias de administração; Hora de administração; Uso de álcool ou tabaco; Interação medicamentosa;
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Figura 5.4 – Stefanelli (2008). Adaptado.
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Ansiolíticos e Hipnóticos
Conhecidos como drogas antiansiedade ou tranquilizantes, representando a classe de psicofármacos mais prescrita, os ansiolíticos e hipnóticos modificam os efeitos do estresse e as sensações de desconforto, tensão e disforia do estado de ansiedade. São conhecidos como calmantes que diminuem o estresse, reduzem as crises de insônia e induzem ao sono em procedimentos hospitalares e pré-anestésicos, pois têm efeitos hipnóticos que, em dosagens moderadas, não levam à depressão do centro respiratório do SNC e são considerados fármacos úteis e seguros no tratamento de diferentes transtornos. Os benzodiazepínicos (BDZ) são medicações amplamente utilizadas, embora haja o risco de dependência associado a seu uso prolongado. Apresentam rápido início de ação, diferente dos antidepressivos, proporcionando alívio de sintomas como a ansiedade e a insônia e aumentam a adesão ao tratamento antidepressivo. São utilizados: como anticonvulsivantes, relaxantes musculares, para tratamento da síndrome de abstinência do álcool e hipnóticos. Seu poder de sedação está no fato de reduzirem a latência para conciliarem o sono e diminuírem o número de vezes que o cliente desperta, ou seja, sua ação no ciclo sono-vigília ocorre por diminuição do tempo do sono REM, no primeiro estágio do sono, aumentando o número de ciclos REM no sono tardio. Dessa forma, ao se utilizar o BDZ para o tratamento de distúrbios do sono, ele aumentará o número total de horas de sono restaurador, com a diminuição de pesadelos e terror noturno.
ATENÇÃO Os BDZ têm alto risco de dependência, não devendo ser utilizados por períodos prolongados (mais de 8 semanas), no entanto por conta da automedicação, observa-se o aumento desta dependência.
Ressalta-se que após períodos maiores de uso, deve-se proceder a retirada gradual (desmame) para amenizar os sintomas de ansiedade rebote. O cliente deve evitar o consumo simultâneo com álcool, pois pode haver a potencialização dos efeitos depressores sobre o SNC.
capítulo 5 •
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Os BDZ podem apresentar, portanto, ação hipnótica e ansiolítica, conforme poderemos ver no quadro a seguir.
FÁRMACO
NOME COMERCIAL/FANTASIA
VIA DE ADMINISTRAÇÃO
Flurazepam
Dalmadorm®
Oral
Flunitrazepam
Rohypinol®
Oral, IV
Estazolam
Noctal®
Oral
Midazolam
Dormonid®, Dormire®
Oral
Nitrazepam
Sonebon®, Nitrazepol®, Sonotrat®
Oral
Tabela 5.3 – Benzodiazepínicos com ação Hipnótica/Sedativa. Carvalho (2012) e Stefanelli (2008).
O Zolpidem (Stilnox®, Lioram®) e o Zopiclone (Imovane®) são hipnóticos não benzodiazepínicos com menos potencial de abuso. Além disso, eles têm início rápido de ação e pouco efeito residual e têm sido bastante utilizados no tratamento da insônia.
FÁRMACO
NOME COMERCIAL/FANTASIA
VIA DE ADMINISTRAÇÃO
Clordiazepóxido
Psicosedin®, Limbritol® (associado ao antidepressivo Amitriptilina)
Oral
Diazepam
Dienpax®, Valium®, Kiatrium®,
Oral, IV, IM, retal.
Clonazepam
Rivotril® (também utilizado como anticonvulsivante)
Oral, IV, IM, Sublingual.
Bromazepam
Lexotam®, Somalium®
Oral
Alprazolam
Frontal®, Altrox®, Apraz®, Tranquinal®
Oral
Lorazepam
Lorax®,Lorazefast®, Mesmerim®, Lorium®, MaxPax®
Oral, IV, IM, Sublingual.
Clorazepatodipotássico
Tranxilene®
Oral
Clobazam
Urbanil®
Oral
Tabela 5.4 – Benzodiazepínicos com ação Ansiolítica. Carvalho (2012) e Stefanelli (2008). capítulo 5 •
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A Buspirona (Buspar®) é um ansiolítico não benzodiazepínico e seu potencial de abuso também é menor do que os benzodiazepínicos. Mecanismos de ação
Os BDZ potencializam a ação do ácido - aminobutírico (GABA), principal neurotransmissor inibitório do SNC. Os BDZ ligam-se a sítios de reconhecimento próprios, associados ao receptor GABA-A, que é um receptor ionotrópico (associado ao canal iônico). A ligação de um BDZ a seu sítio facilita a ligação do GABA ao receptor GABA-A, hiperpolarizando a membrana e reduzindo a atividade neuronal. O Flumazenil é o principal antagonista BDZ, muito útil para reversão da superdosagem por BDZ, associada ou não a outros fármacos. Efeitos Adversos
Os efeitos adversos mais comuns nos BDZ são aqueles relacionados com a sedação, a sonolência, redução da atenção, cansaço, amnésia anterógrada (redução da lembrança de eventos ocorridos após a administração do medicamento) e diminuição da coordenação psicomotora, que desaparecem e diminuem rapidamente após os primeiros dias de tratamento. Destaca-se que isolado ou em associação com o álcool, os BDZ prejudicam os reflexos. Após o uso prolongado, mais esporadicamente, pode ocorrer ganho de peso, prejuízo da função sexual, erupções cutâneas, anomalias sanguíneas e irregularidades menstruais. Intervenções de enfermagem específicas
No que diz respeito ao período gestacional, o enfermeiro deve estar ciente que o uso dos BDZ em gestantes no primeiro trimestre pode provocar lábio leporino ou deformidades congênitas. Já no final da gestação ou durante o período de aleitamento materno, os BDZ podem provocar sintomas de abstinência no recém-nascido, dificuldade de sucção e hipotonia. Daí decorre a relevância de saber se a mulher é não gestante ao se iniciar o tratamento; •
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Quando utilizado por via intravenosa, a administração deve se dar de forma lenta, por aproximadamente 1 minuto. Não misturar com solução salina ou dextrose porque pode haver precipitação do medicamento; Orientar o cliente a não interromper bruscamente o tratamento seja por iniciativa própria, seja por ter acabado a medicação, pois há casos que registraram parestesias, ansiedade, insônia, tremores, dificuldades de concentração, em alguns casos convulsões e pânico; Se o cliente apresentar efeitos colaterais como sonolência e cansaço, amnésia, entre outros, esclarecer que estes, em geral, diminuem após os primeiros dias de tratamento. •
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Antidepressivos
São utilizados no tratamento de quadros depressivos (unipolares, bipolares e aqueles associados a quadros demências e à esquizofrenia), transtornos ansiosos (como o transtorno do pânico, ansiedade generalizada, síndrome do estresse pós-traumático e transtorno obsessivo compulsivo), incontinência urinária e em síndromes que causam dor crônica, enxaqueca, nevralgias, além de bulimia nervosa hiperatividade e transtorno de déficit de atenção. Existe uma série de evidências que mostram as alterações químicas no SNC do sujeito deprimido, principalmente quando se trata da redução de neurotransmissores excitatórios, como a serotonina, a noradrenalina e, em menor proporção, a dopamina. Portanto, a utilização de fármacos reforça a teoria da carência de neurotransmissores, pois alguns são agonistas e outros inibem a recaptação do neurotransmissor, aumentado a possibilidade de ativação os receptores póssinápticos, o que gera a melhora do quadro depressivo. Quanto à farmacologia da depressão, os antidepressivos podem ser classificados de acordo coma a estrutura química ou as propriedades farmacológicas e são divididos em: •
Antidepressivos Antidepressivos Tricíclicos Tricíclicos (ADTs) (ADTs)
Considerados fármacos de primeira escolha em depressões graves e para clientes hospitalizados. O local de ação dos ADTs é no sistema límbico, aumentando a noradrenalina e a serotonina na fenda sináptica, e em menor proporção a dopamina. Embora essa inibição aconteça já na primeira administração desses fármacos, os efeitos clínicos vão acontecer somente 2 a 3 semanas após o início
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do tratamento. Essa demora na resposta terapêutica aos antidepressivos deve ser informada ao cliente. Os ADTs, em linhas gerais, são indicados para o tratamento de estados depressivos de etiologia diversa, que são síndromes depressivas senis ou pré-senis, depressão com esquizofrenia e distúrbios de personalidade, distimia, depressão de natureza reativa, neurótica ou psicopática, transtornos obsessivos-compulsivos (TOCs), fobias e ataques de pânico, estados dolorosos crônicos. Os efeitos indesejáveis dos ADT A DTss estão relacionados às suas ações autonômicas, como vômitos, náuseas, boca seca, anorexia, visão turva, confusão, taquicardia, constipação, disfunção sexual e retenção urinária.
FÁRMACO
NOME COMERCIAL/FANTASIA
VIA DE ADMINISTRAÇÃO
Imipramina
Tofranil®
Oral
Clomipramina
Anafranil®
Oral, IM, IV
Amitriptilina
Tryptanol®, Amitril®
Oral
Nortriptilina
Pamelor®
Oral
Doxepina
Sinequan®
Oral
Tabela 5.5 – Antidepressivos tricíclicos. tricíclicos. Carvalho (2012). (2012).
As intervenções de enfermagem indicadas neste tipo de tratamento são: Clientes e familiares deverão ser orientados no sentido de que o tratamento é prolongado, e que os seus efeitos desejados surgem somente após algum tempo que em geral vai de duas a três semanas do início do tratamento; Ficar atento a possíveis tentativas de suicídio. •
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Inibidores Seletivos Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRSs) e antidepressivos atípicos •
Nos dias atuais, os ISRSs são eficazes no transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), na depressão, no transtorno do pânico, em episódios depressivos do transtorno bipolar, na bulimia nervosa (fluoxetina em doses altas), na fobia social (sertralina, fluoxetina, paroxetina), no estresse pós-traumático (sertralina), na ansiedade generalizada (paroxetina). Alguns ISRSs podem afetar o apetite. Os associados ao ganho de peso são a paroxetina e o citalopram, enquanto que associados a perda de peso estão a fluoxetina e a sertralina. capítulo 5 •
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O mecanismo de ação dos ISRSs funciona inibindo a recaptação pré-sináptica de serotonina, aumentando sua disponibilidade na fenda sináptica e seu contato com receptores pós-sinápticos. Destaca-se a demora de 2 a 4 semanas antes de se desenvolver o efeito terapêutico. Os efeitos colaterais mais comuns são ansiedade, cefaleia, desconforto gástrico (náuseas, dor epigástrica, constipação e vômitos), redução do apetite, inquietude, tremores, nervosismo e disfunção sexual.
FÁRMACO
NOME COMERCIAL/FANTASIA
VIA DE ADMINISTRAÇÃO
Fluoxetina
Prozac®, Daforin®, Deprax®, Depress®, Eufor®, Fluoxetin®, Fluxene®, Psiquial®,Verotina®
Oral
Sertralina
Zoloft®, Serenata®, Seronip®, Tolrest®
Oral
Paroxetina
Aropax®, Cebrilin®, Pondera®, Roxetin®
Oral
Citalopram
Cipramil®, Alcytam®, Denyl®, Proximax®
Oral
Escitalopram
Lexapro®
Oral
Fluvoxamina
Luvox®
Oral
Tabela 5.6 – Antidepressivos Inibidores da Recaptação de Serotonina (ISRS). Carvalho (2012) e Stefanelli (2008).
MULTIMÍDIA Atualmente muitas pessoas acabam fazendo o uso indiscriminado de antidepressivos não somente pela automedicação, mas também pelo modo como os profissionais de saúde mental atuam ao medicalizarem o enfrentamento dos problemas. Essa é uma questão a se refletir, já que o uso da medicação também traz benefícios ao cliente. Portanto, quais são os limites sobre este assunto? Para saber mais, se acomode no sofá e veja o filme Geração Prozac (2001).
capítulo 5 •
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Esses antidepressivos apresentam melhor perfil de tolerabilidade, com menos efeitos colaterais e menor risco de toxicidade em casos de superdosagem. Os antidepressivos atípicos são novos antidepressivos elaborados para tentar solucionar os problemas encontrados com os tricíclicos, IMAOs e ISRSs.
FÁRMACO
NOME COMERCIAL/FANTASIA
Bupropriona
Wellbutrin®, Zyban®
Milnaciprano
Ixel®
Mirtazapina
Remeron®
Nefazodona
Serzone®
Reboxetina
Prolift®
Tianeptina
Stablon®
Trazodona
Donaren®
Venlafaxina
Efexor®, Venlift®
Tabela 5.7 – Antidepressivos atípicos. Carvalho (2012) e Stefanelli (2008).
As intervenções de enfermagem indicadas neste tipo de tratamento são: Ministrar ISRS durante as refeições, pois podem provocar mal-estar gástrico; Estar atento ao aparecimento de reações indicativas da síndrome serotoninérgica (confusão mental, hipomania, agitação, diarreia, febre, alterações na pressão arterial, náuseas, vômitos, incoordenações e tremores). •
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Inibidores da Monominoxidase (IMAOs)
Os IMAOs são usados normalmente como drogas de terceira linha para depressão, por conta de exigir restrições alimentares. Tais fármacos são indicados quando há quadros de depressão atípica, sendo também úteis no distúrbio do pânico ou na depressão refratária. Eles sofrem biotransformação hepática rápida por oxidação. O início da ação se dá entre 7 e 10 dias, com doses adequadas em alguns clientes, mas pode também levar de 4 a 8 semanas para atingir o efeito terapêutico pleno. Efeitos colaterais dos IMAOs são hipotensão ortostática grave (com vertigens e tonturas, principalmente ao levantar, podendo ocorrer quedas), taquicardia, palpitação, nervosismo, excitação, diarreia e edemas nos pés e tornozelos.
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Uma questão importante que envolve a utilização dos IMAOs está na sua interação com alimentos que contêm alto teor de tiramina (que é precursora da tirosina, usada para a síntese de neurotransmissores). Essa associação de IMAO com alimentos pode levar a um aumento vertiginoso de catecolaminas (noradrenalina, adrenalina e dopamina no SNC e periférico). Resulta desta interação, uma crise hipertensiva que pode ser tratada com nifedipina 10 mg mastigada e colocada sob a língua, o que normaliza a pressão sanguínea entre 1 e 5 minutos. As principais restrições dietéticas para o uso de IMAOs são queijos (exceto o cremoso), queijo cottage e iogurte fresco; carnes fermentadas ou envelhecidas, como salsicha e salame; vagem larga, como a chinesa; qualquer tipo de fígado; extratos de carne e levedura; vinho tinto, conhaque, cerveja do tipo alemã; molho de soja, pasta de camarão; figos, bananas, ananás (tipo de abacaxi), pera, abacate, passas, ameixas enlatadas e framboesas. As intervenções de enfermagem indicadas neste tipo de tratamento são: Não se deve oferecer alimentos que contenham tiramina quando o cliente recebe tratamento com drogas IMAO, porque a associação destes pode levar a grave crise hipertensiva. O enfermeiro deve orientar o cliente e sua família sobre as restrições alimentares; O enfermeiro deve dispensar atenção especial aos clientes diabéticos porque, apesar de previamente controlados com insulina, podem apresentar hipoglicemia acentuada quando recebem o IMAO. •
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ATENÇÃO Todos os antidepressivos potencializam os efeitos do álcool sobre o SNC, devendo os clientes serem orientados quanto à restrição no uso de bebidas alcoólicas.
Estabilizadores do humor
Em 1949, quando um pesquisador australiano observou que, quando administrado, o lítio acalmava os animais, pensou também que esta seria uma opção para conseguir efeito calmante em clientes maníacos. Dessa maneira é que começam a ser usados os estabilizadores do humor. Assim, descobriu-se a contribuição do lítio para a estabilização do humor, embora até hoje não se saiba de modo
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totalmente claro, como funciona seu mecanismo de ação. São usados em emergências ou na recorrência do transtorno afetivo bipolar. O lítio (Carbolitium®) na forma de sais (carbonato de lítio, citrato de lítio e cloreto de lítio) tornou-se o estabilizador do humor de uso padrão, e é eficaz em cerca de 80% dos casos de mania aguda. Embora tenha destaque na lista dos estabilizadores do humor, não é somente o lítio que é utilizado nesta classe de fármacos. O quadro a seguir indica outros estabilizadores do humor e suas indicações mais específicas.
FÁRMACO
NOME COMERCIAL/FANTASIA
OBSERVAÇÃO
Carbamazepina
Tegretol®
Anticonvulsivante. Requer monitoramento da função hepática.
Depakene®, Depakote®, Valpakine®
Anticonvulsivante. Requer monitoramento da função hepática. Especialmente útil no tratamento de clicladores rápidos e estados mistos.
Lamictal®
Medicação mais recente. Especialmente útil para tratamento de clientes com predomínio de fases depressivas.
Neurontin®, Progresse®
Carece de mais estudos para avaliação e eficácia na manutenção de clientes bipolares.
Topamax®
Carece de mais estudos para avaliação e eficácia na manutenção de clientes bipolares.
Valproato
Lamotrigina
Gabapentina
Topiramato
Tabela 5.8 – Estabilizadores do humor. Stefanelli (2008). Adaptado. Mecanismo de ação
Após administrado por via oral, ele é completamente absorvido, tendo sua concentração máxima atingida de 2 a 4 horas após a ingestão, com meia-vida de 24 a 48 horas. O lítio depende de proteínas transportadoras, o que lentifica sua passagem pela barreira hematoencefálica. Um fato que o diferencia dos demais
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fármacos é que ele pode ser encontrado no sangue somente na forma livre, e sempre é excretado pela via renal. Efeitos colaterais
É fundamental o monitoramento quanto aos níveis séricos do lítio (litemia), pois as doses consideradas eficazes são próximas das doses tóxicas. É importante destacar que, ainda que utilizado em doses terapêuticas, por conta de suas múltiplas ações, este fármaco causa efeitos colaterais, como poliúria por diminuição da produção de hormônio antidiurético (ADH), o que pode ser caracterizado como diabetes insípido nefrogênico; hipotireoidismo (bócio), pois o lítio interfere com a ação do hormônio estimulante da tireoide (TSH) e diminui a liberação de T3 e T4; anormalidades no eletroencefalograma (EEG) e eletrocardiograma (ECG); aumento de leucócitos circulantes; náuseas; diarreia; fraqueza muscular; letargia, tremor nas extremidades; escotomas transitórios dos campos visuais; alteração do metabolismo; acne; manchas na pele e aumento de peso. Por conta das reações adversas poderem surgir em doses muito próximas às terapêuticas, é necessário vigilância contínua dos níveis plasmático do lítio, para que esteja garantido o uso de uma dose efetiva e segura.
ATENÇÃO O nível terapêutico do lítio varia individualmente, mas em geral, está entre 0,5 e 1,5 mEq/L para as fases agudas, e entre 1,0 e 1,5 mEq/L na prevenção dos episódios. O aumento de concentrações séricas para níveis além dos propostos como terapêuticos não melhora a eficácia, causando mais efeitos colaterais.
A toxicidade do lítio fica a cargo dos altos níveis plasmáticos que podem comprometer a vida do cliente caso não sejam detectados em tempo. A intoxicação vai se estabelecendo gradualmente, e pode ocorrer devido ao acúmulo de lítio em decorrência de alguma alteração no estado do cliente, tais como, dieta hipossódica, variação da função renal ou ainda introdução sem aviso de diuréticos tiazídicos. O cliente deve ser orientado quanto aos riscos e cuidados necessários para o tratamento com o lítio, e em caso de intoxicação deve ser levado para atendimento médico urgente.
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Ao considerarmos o nível plasmático, são estabelecidos três graus de intoxicação conforme mostra o quadro a seguir.
NÍVEL PLASMÁTICO DE LÍTIO
SINAIS E SINTOMAS
1,5 a 2 mEq/L
Sonolência, vômito, diarreias mais frequentes, debilidade muscular, tremores intensos nas mãos e pernas, dor abdominal, secura na boca, fraqueza generalizada, letargia, vertigem,disartria (distúrbio da articulação da fala) e ataxia (incoordenação, perda de controle muscular). Às vezes ocorre agitação enistagmo (oscilações rítmicas, repetidas e involuntárias de um ou ambos os olhos),
2 a 2,5 mEq/L
Visão turva, anorexia, vômitos, náuseas persistentes, fasciculações musculares, movimentos clônicos, crises convulsivas, psicose, síncope, alterações no EEG, estupor e coma.
Acima de 2,5 mEq/L
Os sintomas evoluem rapidamente causando oligúria, convulsões generalizadas e morte.
Tabela 5.9 – Níveis plasmáticos do lítio e os sinais e sintomas de intoxicação. Stefanelli (2008). Adaptado.
Você pode estar se perguntando, então uma pessoa com intoxicação de lítio pode ter este quadro revertido? Sim. O tratamento da intoxicação vai se concentrar: Na restauração do equilíbrio hidroeletrolítico; Em medidas que visam à remoção do íon do organismo; Na manutenção das funções vitais. •
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Deve-se infundir solução salina para acelerar a excreção, administrar diuréticos e realizar diálise peritoneal. A hemodiálise é um dos meios mais eficazes de remover o íon do organismo e restabelecer o equilíbrio eletrolítico, sendo indicada quando a intoxicação é moderada à grave.
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Intervenções de enfermagem específicas
A coleta de sangue para a litemia deve ser realizada de 10 a 14 horas após a ingestão da última dose; O enfermeiro deve acompanhar os resultados da litemia, pois a dose terapêutica varia de acordo com o cliente (0,5 a 1,2 mEq/L), e é muito próxima a dose tóxica; Ministrar o lítio após as refeições para minimizar as queixas gastrintestinais, como náuseas e irritação gástrica; Em havendo tremores nas mãos, orientar o cliente sobre a redução destes sintomas com o passar do tempo. O consumo excessivo de chá, café, refrigerante e chocolate podem piorar o tremor; Caso o cliente apresente poliúria, observar os resultados da dosagem do lítio, pois poderá estar instalada a litemia; O enfermeiro deverá informar o cliente sobre a importância da litemia periódica e dos demais exames, de acordo com a periodicidade necessária, que geralmente, é indicada pela instituição de acompanhamento. •
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Antipsicóticos (Neurolépticos)
Os antipsicóticos ou neurolépticos passaram a ser utilizados no início da década de 1950 na psiquiatria, pela descoberta de Delay e Deniker. A clorpromazina, além de produzir a sedação, diminuía a intensidade dos sintomas psicóticos. Mais tarde, foram sendo introduzidos no mercado outros fármacos derivados das clorpromazinas, fenotiazinas, butirofenonas (haloperidol) e, mais modernamente outras substâncias que você verá a seguir. Os antipsicóticos (neurolépticos) são usados no controle de delírios e alucinações em clientes psicóticos. Estes fármacos são eficazes no controle da agitação, e também são conhecidos como tranquilizantes maiores. Os neurolépticos são utilizados em quadros de esquizofrenia, episódios de mania, depressões psicóticas, estados mistos maníaco-depressivos, comportamento de violência impulsiva, psicoses orgânicas, distúrbios de comportamento em doença de Alzheimer e Parkinson.
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São classificados em: •
Tradicionais ou típicos, também chamados de primeira geração - são efi-
cazes no combate de sintomas positivos (delírios e alucinações), mas apresentam efeitos colaterais que potencialmente comprometem a adesão dos clientes. Seus principais efeitos colaterais são extrapiramidais, tais como: tremores, rigidez muscular, inquietação psicomotora e parkinsonismo. Para minimizar estes efeitos que podem acontecer no início do tratamento, recomenda-se o uso concomitante de anticolinérgicos, como o Biperideno (Akineton®); Atípicos ou de segunda geração – são mais modernos, eficazes também nos sintomas negativos (apatia e falta de motivação) e causam menos efeitos colaterais, sendo a medicação eleita para a maioria dos clientes. •
FÁRMACO
NOME COMERCIAL/FANTASIA Tradicionais de alta potência
Haloperidol
Haldol®
Flufenazina
Anatensol®
Pimozida
Orap® Tradicionais de média potência
Trifluoperazina
Stelazine®
Tradicionais de baixa potência
Clorpromazina
Amplictil® Atípicos
Tioridazina*
Melleril®
Sulpirida
Equilid®
Clozapina
Leponex®
Risperidona
Risperal®
Olanzapina
Zyprexa®
Quetiapina
Seroquel®
Aripiprazol
Abilify®
Ziprasidona
Geodon®
Figura 5.5 – Antipsicóticos (neurolépticos). *Stefanelli (2008) indica a Tioridazina (Melleril®) como neuroléptico típico, enquanto Carvalho (2012) considera o mesmo fármaco como neuroléptico atípico. Carvalho (2012) e Stefanelli (2008). Adaptado. capítulo 5 •
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Todos os antipsicóticos podem causar a síndrome neuroléptica maligna, que é um quadro raríssimo (ocorre em 0,5 a 1% dos clientes) de toxicidade provocado pelo antipsicótico, que ocorre de forma imprevisível e independente da dose. É uma reação adversa que funciona como uma espécie de hipersensibilidade à droga. Parece uma forma grave de parkinsonismo com catatonia, tremores e instabilidade no sistema autonômico (alterações na pressão arterial e frequência cardíaca). Clinicamente, observa-se um grave distúrbio extrapiramidal acompanhado por intensa hipertermia (de origem central), tremores, alteração do nível de consciência e convulsões. A mortalidade ocorre em 10% dos casos e o tratamento consiste na administração de anticolinérgicos de ação central. Mecanismo de ação
Todos os neurolépticos são antagonistas de receptores dopaminérgicos D2. Sendo que, os antipsicóticos atípicos bloqueiam o receptor dopaminérgico (D4, com a clozapina) e o receptor serotonérgico (5-HT2). Dessa forma, o efeito terapêutico dos antipsicóticos são atribuídos ao bloqueio dos receptores da via mesolímbica e mesocortical. Efeitos colaterais
É possível observar que os antipsicóticos atípicos provocam sintomas motores. Há também a síndrome extrapiramidal aguda que consiste em tremor e rigidez – sintomas semelhantes ao Parkinson, com redução de movimentos, acinesia ou bradicinesia (o cliente parece mover-se em câmera lenta, indiferente aos estímulos); fraqueza muscular e máscara facial. Esse quadro é reversível com a interrupção do tratamento. Ressalta-se que estes sintomas praticamente não aparecem com os antipsicóticos atípicos. Os antipsicóticos aumentam o apetite e determinam desta maneira, o ganho de peso. Efeitos colaterais ligados ao sistema nervoso autônomo por bloqueio colinérgico são: boca seca, constipação e perda de acomodação visual. Já os provocados por bloqueio α-adrenérgico, são dificuldade de ejaculação, hipotensão ortostática e impotência. Em havendo administração prolongada, os antipsicóticos podem provocar discinesia tardia (prejuízo de movimentos voluntários, movimentos involuntários, repetitivos, estereotipados, da face – laterais de queixo, lábios – do tronco, e dos
capítulo 5 •
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membros. De 15 a 20% dos clientes desenvolvem a síndrome, que é mais prevalente em clientes idosos. Intervenções de enfermagem específicas
Considerar que o objetivo do tratamento não é colocar o cliente para dormir o tempo todo. Portanto, o enfermeiro deverá tentar manter o cliente desperto, ocupando-o a maior parte do tempo possível em atividades que sejam de seu interesse. Quando o cliente apresentar acatisia (inquietação motora contínua em que a pessoa não fica sentada nem de pé, movimentando-se como se estivesse marchando), orientar o cliente de que essa manifestação é um efeito esperado, e é temporário, havendo medicação para combatê-la. •
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Intervenções de Enfermagem Gerais Embora nos últimos anos tenha se observado uma evolução nos fármacos utilizados nos tratamentos dos transtornos psiquiátricos, o que levou a uma relevante diminuição de seus efeitos colaterais, não quer dizer que ainda hoje estes efeitos não existam. Pelo contrário, tanto que a maioria dos fármacos psiquiátricos causam efeitos colaterais parecidos que não podem ser ignorados. Desta forma, o enfermeiro deve ficar atento no momento do histórico de enfermagem sobre as condições físicas e o uso anterior (prescritos ou não) destes medicamentos. A seguir, você verá algumas das intervenções de enfermagem que podem ser utilizadas para clientes que fazem uso de qualquer psicofármaco. Dados fisiológicos básicos (pressão arterial, pulso, respiração, peso, temperatura, deambulação e padrão de sono) do cliente devem ser aferidos e registrados de acordo com a especificidade da droga e do protocolo do serviço em que o tratamento é realizado; As ações de cuidado de enfermagem ao cliente que faz uso de psicofármacos exigem atenção à orientação e ao preparo do cliente e da família; O controle de ingestão do medicamento deve ser monitorado porque muitos clientes começam a rejeitá-lo. Dessa forma, é preciso observar se após colocar o medicamento na boca, o cliente realmente o engoliu e não o reteve para jogar fora em seguida; •
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A maioria dos psicofármacos provocam uma gama de efeitos colaterais que devem ser observados e registrados pelo enfermeiro, como: •
EFEITOS COLATERAIS
INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM
Visão turva
Esclarecer ao cliente que este sintoma deve regredir em algumas semanas e orientá-lo para não dirigir enquanto durar este efeito.
Retenção urinária
Observar e registrar a ingestão, a eliminação de líquidos e a presença de edema.
Hipotensão postural e tontura
Verificar e registrar a pressão arterial do cliente, se possível em pé e deitado. Informar que esta é uma disfunção temporária.
Disfunção sexual
Boca seca
Oferecer água com frequência e orientá-lo a fazer bochecho e higiene oral algumas vezes ao longo do dia.
Diminuição do hábito intestinal
Orientar a ingestão de alimentos ricos em fibra e hidratação.
Tabela 5.10 – Towsend (2011) e Stefanelli (2008).
ATIVIDADES 01. Indique três situações de emergência psiquiátrica que são mais comuns. 02. Use V para verdadeiro e F para falso: ( ) A contenção mecânica é a medida terapêutica utilizada em caso de agitação psicomotora, sendo sempre a primeira opção a ser tomada no atendimento ao cliente psiquiátrico. ( ) Os BDZ não têm alto risco de dependência, podendo ser usados por longos períodos. ( ) Todos os antidepressivos potencializam os efeitos do álcool sobre o SNC. ( ) Antipsicóticos atípicos podem causar efeitos colaterais extrapiramidais que envolvem sintomas como tremores, parkinsonismo e queda capilar temporária. 03. Indique três intervenções de enfermagem par clientes que fazem uso do Carbolitium®.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARVALHO, Marissol Bastos (ORG). Psiquiatria para enfermagem. São Paulo: Rideel, 2012. DELGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. DSM-IV-TR. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4. ed. Trad. Cláudia Dornelles. Porto Alegre: Artmed, 2003. HERDMAN, Heather T; KAMITSURU Shigemi. Diagnósticos de enfermagem
da NANDA:
definições e classificação 2015-2017. [NANDA International]; organizadoras; tradução: Regina Machado Garcez; revisão técnica: Alba Lucia Bottura Leite de Barros [et al.].– Porto Alegre : Artmed, 2015. Organização Mundial DE Saúde. Classificação de Transtornos mentais e de comportamento da CID-10 – Critérios diagnósticos para pesquisa. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
SADOCK & KAPLAN. Compêndio de psiquiatria: ciências do comportamento e psiquiatria clínica. 9. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2007. STEFANELLI, Maguida Costa; FUKUDA, Ilza Marlene Kuae; ARANTES, Evalda Cançado (ORG). Enfermagem psiquiátrica em suas dimensões assistenciais. Barueri, SP: Manole, 2008.
TOWNSEND, Mary. Enfermagem psiquiátrica: conceitos de cuidados. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
GABARITO Capítulo 1 01. Os tipos de internação propostos pela Lei Paulo Delgado são: internação voluntária que acontece com o consentimento do usuário; internação involuntária que acontece sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e, internação compulsória que acontece por determinação da Justiça. 02. Desinstitucionalização que é representada pela desmontagem, desconstrução de saberes/práticas/discursos comprometidos com um tipo de redução da loucura à doença e a desospitalização que é a extinção de organizações hospitalares/manicomiais. 03. Ao levar em consideração o conceito de território, entendendo que este pode estar representado pelos espaços de produção de vida de um sujeito, o cuidado de saúde mental não deve estar centrado somente nos serviços de saúde mental, uma vez que capítulo 5 •
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experimentações em outras áreas, como a arte/cultura, por exemplo, e acesso a outros lugares que possibilitam maior reinserção social do cliente representam potentes meios de promoção e cuidado a sua saúde mental. Enquanto enfermeiro é possível: estar presente com o cliente seja nas atividades dentro ou fora dos serviços psiquiátricos fortalecendo a relação de confiança e respeito; atuar em equipe interdisciplinar pensando em grupo opções de atividades e cuidados que podem ser oferecidos ao cliente, levando em consideração suas preferências e desejos.
Capítulo 2 01. Plano de cuidados de enfermagem
DIAGNÓSTICO DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
Risco de comportamento agressivo
Promover conforto por meio de terapia por música; tranquilizar; ouvir sempre as tristezas e emoções; mobilizar o corpo em situação de crise.
Autoestima comprometida
Obesidade atual
Estimular a autoestima Mediante a terapia de grupo; estimular a participação em oficinas que propõem o contato com a autoimagem; apoiar e elogiar a cliente com a sua imagem corporal; reconhecer os pequenos avanços de melhora de comportamento. Verificar padrão alimentar; monitorar peso; diminuir o peso; explicar sobre o alimento; avisar ao serviço de nutrição; estimular regime dietético.
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RESULTADOS ESPERADOS* Ausência de comportamento agressivo
Autoestima melhorada
Peso diminuído
DIAGNÓSTICO DE ENFERMAGEM
INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
RESULTADOS ESPERADOS*
Autocuidado comprometido
Reforçar atitude sobre o cuidado; melhorar a higiene; auxiliar na escovação dos dentes; estimular a cliente para banhar-se.
Padrão de higiene melhorado
Alucinação atual
Explicar à família sobre o pensamento distorcido da cliente; vigiar o regime medicamentoso.
Alucinação em nível diminuído
Resposta à medicação comprometida
Identificar a percepção da cliente; promover o bem-estar psicológico; avaliar a orientação; observar comportamento sempre; promover vigilância contínua do regime medicamentoso.
Comportamento em nível esperado
Mesquita, 2015. Adaptado. *Os resultados esperados também podem ser divididos em curto, médio e longo prazo.
Capítulo 3 01. a) C. apresenta delírio místico, de grandeza e persecutório acompanhado de alucinações auditivas, que representam sintomas positivos. b) Diagnósticos de enfermagem: déficit no autocuidado para banho/higiene. Déficit no autocuidado para vestir-se, arrumar-se; nutrição desequilibrada. Intervenções de enfermagem: estimular e, se necessário, auxiliar o cliente na realização das atividades de autocuidado (banho, vestimentas e higiene íntima). Oferecer refeições pequenas e frequentes. 02. Registrar todas as manifestações relatadas ou observadas que possam indicar a ideia de suicídio; estar atento a mudanças de comportamento do cliente, que pode apresentar além das oscilações de humor pertinentes ao transtorno, manifestações de ciclagem (mudança de um estado depressivo para o maníaco e vice versa) rápida. Orientar cliente, cuidadores e familiares para os períodos de eutimia em que deve se dar continuidade ao tratamento, prevenindo recaídas e/ou internações; estabelecer plano de orientação à família ou ao cuidador sempre que for possível em parceria com eles.
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Capítulo 4 01. D 02. (F) Fissura (craving)/desejo incontrolável; (F) Altas quantidades; (V); (F) Os BZD não são indicados para gestantes neste período. 03. Tolerância: necessidade de doses cada vez maiores para obter o efeito de quando iniciou o uso. Síndrome de abstinência: sinais e sintomas que ocorrem ao cessar o uso de substâncias que alteram o sistema nervoso central.
Capítulo 5 01. .As situações de emergência psiquiátrica mais comuns são: tentativa de suicídio, agitação e agressividade, ansiedade aguda e intoxicação alcoólica. 02. A ordem fica: (F) Ainda que a situação do cliente psiquiátrico seja de agitação, deve haver a tentativa de estabelecer um diálogo, de modo que o cliente consiga se acalmar. A contenção mecânica sempre deve ser a última opção de medida terapêutica. (F) Os BDZ têm alto risco de dependência. (V). (F) Queda capilar temporária não é um dos efeitos extrapiramidais causados pelos antipsicóticos. 03. As intervenções de enfermagem para clientes que fazem uso do Carbolitium® são coletara mostra de sangue para a litemia que deve ser realizada de 10 a 14 horas após a ingestão da última dose. Acompanhar os resultados da litemia, pois a dose terapêutica varia de acordo com o cliente (0,5 a 1,2 mEq/L) e é muito próxima a dose tóxica. Ministrar o lítio após as refeições para minimizar as queixas gastrintestinais, como náuseas e irritação gástrica. Orientar o cliente que os tremores nas mãos passam com o tempo. Informar o cliente para evitar o consumo excessivo de chá, café, refrigerante e chocolate, pois podem piorar o tremor. Caso o cliente apresente poliúria, observar os resultados da dosagem do lítio, pois poderá estar instalada a litemia. Informar o cliente sobre a importância da litemia periódica e dos demais exames, de acordo com a periodicidade indicada pela instituição de acompanhamento.
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