5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
tes e ates tes
IE
Proximo lan~lIj ento Ensaios Lingii.i' ICOS Louis Hielmsl~I ./'
filosofia
'. A obra de Marlin Buber, que apenas comeea a ser difundida no BralUl,tornou-se intemacionalmente conhecida e passou a ser discutia. como uma das expressoes marcantes do modemo existencialismo reUgioso,.n io s6 por sua origiDlllreelabora.,:ioda mfstica pietista do Hassidismo judeu, mas tambem por sua proposta, a partir desta raiz especliica, de uma filosof)a da Relaf,:io,do Encontro e do Dialogo. Eu e Tu veio a ser a !r eferenda principal do pensamento buberiano. Sem duvida e neste livro que ele se concentra de maneira mais sistematica e e deste f oco que irradia algumas suas proposi.,:oesmais Entretanto, a medita.,:io dedeBuber, sendo, como e , inovad daga.,:io em .eonstante uma j as. processo de aprofundamento e captaf,:iod universe da existencia humana, como experiencia do relacionam nto e da revela.,:io de Deus na sua criatura fenomenaI e do homem como ser dia-lcgal e Inter-humeno,nio esta circunscrlta um Unico escrito, por importante que seja. Na verdade, para apreender mais precisamente as idefas e abranger a riq.; .. a coniplexidade das colccaeoes do mestre dialogista, e mister que seu interlocutor-leiter se familiar ize com outras expressoes de sua ref lexio, tais como os ensaios aqu] reunidos. Transpostos com dedica,.ao e proficiencia por Marta E. de Souza Queiroz e Regina Weinberg, introduzidos pela analise esclarecedora do Prof. Marcelo Dascal, abririo certamente ao publico Ifrasileironovos acessos as vias da espirituaJidade relacional e do bumanis",o "cntusiastico" Do Dialogo e do Dia16gico.·
J. G.
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
martin
buber
DO DIALOGO E DO DIALOGICO
1/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Colecao Debates Dirigida por J. Guinsburg
martin buber
DO DIALOGO E DO DIALOGICO
Equipe de realiza~ao - Traducao: Marta Ekstein de Souza Queiroz e Regina Weinberg; Producao e Revisao: Plinio Martins Filho
~\,~
~,\~
~
~ http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
~
~
E D IT O R A P E R S P E C T IV A
2/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Titulo original alemio D a a D i Il lo rg t sc h e P r ln z ip
Co pyright Raph ael Buber. Todo s o s direitos reservad os. A reprod ucjo des ta obra por qu alquer meio, total ou parcial, sem autorizaejo expressa da Editora, sujeitara 0 infrator, no s termos da Lei 6.895 de 17-12-1980, as pen alid ade s previstas no s artigo s 18 4 e 1 86 do Cod igo Pen al, a s abe r: reclusiO de 1 a 4 anos e multa de CrS 10.000,00 a CrS 50.000,00.
S UM ARIO Pre facio do Tradutor , 7 A Ideia de Paz na Filosofia de M. Buber - Marcelo Dascal 11
mALOGo 1. Descricao , . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..
EDITORA PERSPECTIVA S.A. Av. Brigadeiro Luis AntOnio, 3025 01401 - Sio Paulo - Brasil Telefone: 288-8388 1982
1. Recordadio Primeira . . . . . . . . . . . . . . . . . 2. 0 Silencio que Comunicafao ... , . . . . . . . 3. As Opinioes e 0e Fato Concreto. . . . . . . . . . . 4. Coloquiose m Torno da ReligiiiO.. . . . . . . . . 5. Colocaaio da Questao 6. Observar,Contemplar, Tomar Conhecimento Intimo
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
.. .. .. ..
33 33 35 37
38 40 41
3/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
7. 8.
O s Signos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. U m a C onversdo, . .
43
46
9. 10. 11.
F a lae ?E m .....ba ixo : : : : : : : : : : : : : : : : : EQuem m Cima . 47 R esponsa bilida de . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 48
12.
M ora l e R eligiiio : : : : : : : : : : : : : : : : : : : : ::
~~
2. Limitacao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 1. O s Domtnios 2. O s M ovim ento~ B d~i~~s· . . . . . . . . . . . . . . . ..
53 53 56
3. 4.
A Profundidade sem P a kzv~~s· . . . . . . . . . . . ..
5.
D o P ensa m ento Eros
6.
C om ~~i:kzde:::::::::::::::::::::::::
'It
59
. •••••••••••••••••••••••
60 ~~
3. Conflrmacao. . . . . . . . . . . . . . . . . . 1. Coloquio co m 0 Adversdrio ..... : : : .. : : : : ..
69 69
A QUEST~O QUE SE COLOCA AO INDIVIDUO 1. "0Unico e 0 Individuo 2. 0 Individuo e Seu Tu 79 . . . . . . . . . . . . . . 91 3. 0 Individuo e a Coisa PUblica : : : .. .. ·101 4. 0 Indi:iduo na ~esponsabilidade Tentativas de Dissociacao . . . . . . . . . . . 65. AQ
.
uestao . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
ELEMENTOS DO INTER-HUMANO 1. 0 Social e 0 Inter-Humano 2. 3. 4. 5. 6.
: : : 111 . 119 ......... 129
135
Ser e Parecer. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141 0 "Tornar-se Presente" da Pessoa : : : : : : : 145 Imposicao e Abertura 149 A Conversacao Genuina 153 Obse!,,:a9[O Posterior 157 Posfacio: A Historia do Principio Dial6gico 159
PREFAcIO DO TRADUTOR Os ensaios reunidos nesta eoletanea constituem, de certa forma, uma evolucao e explicitacae da filosofla do diilogo desenvolvida por Buber em Eu e Tu 1, considerada por muitos a mais importante obra do autor. 0 cerne do pensamento de E u e Tu (publicado em 1923) e a tao citada frase: "Toda vida verdadeira e encontro". Eu s6 existo na medida em que digo Tu ao outro, aceitando-o irrestritamente em sua alteridade, com a totalidade do meu ser, e por ele sou assim aceito. 0 Eu sem apenas uma abstracao.
e
0 Tu
1. Tradu~io de Newton Aquiles von Zuben, Editora Cortez e Moraes,
_ Sao Paulo, 1977.
7
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
4/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Poderfamos compreender assim a conceituacao de dialogo e situacao dial6gica. A preocupacao para com estes transparece nos escritos de Buber aqui publicados. 0 pr6prio autor diz na sua Introducao a B etw een M an a nd M an 2 que "0 ensaio Didlogo originou-se do desejo de esclarecer 0 p ri nc ip io 'd ia lo gi co ' a pr esentado em Eu e Tu, de ilustra-lo e de tomar precisa a sua relayao com as esferas essenciais da vida". Parece-nos que esta afirmayao pode abranger toda esta publicacao. Para realizar plenamente 0 seu Eu, 0 homem precisa entrar em relacao dial6gica com 0 mundo - ele precisa dizer Tu ao ou tro, e este dizer -Tu s6 se fez com a totalidade do ser. ~ preciso perceber e aceitar 0 outro "na sua totalidade, na sua unidade e sua unicidade", E preciso que el e se tome presenca para mim.
o d ia lo g o g e nu f no s6 se da em clima de plena reciprocidade, quando 0 individuo experiencia a relayao tambem "do lado do outro", sem cOl\tudo abdicar a especificidade pr6pria. No ensaio Diillogo (publica do em 1930) Buber distingue entre 0 genuino dialogo - "que nao necessita de nenhum som, nem sequer de urn gesto" - e 0 mon61ogo disfarcado de dialogo, "0 mais ardoroso falar de urn para 0 outro nao constitui uma conversacao." 0 encontro, 0 dialogo verdadeiro, se da quando "cada urn em sua alma volta-se-para-o-outro de maneira que, daqui por diante, tomando 0 outro presente, fala-lhe e a ele se dirige verdadeiramente. . . A s palavras que nos sao transmitidas traduzern-se para n6s no nosso humano voltar-se-um-para-o-outro".
o que Buber chama de dial6gico nao e apenas 0 relacionamento dos homens entre si, mas eo seu comportamento, a sua atitude um-para-com-o-outro, cujo elemento mais importante e a reciprocidade da aylio interior. Numa situacao dialogica, 0 homem que esta face a mim nunca pode ser meu objeto; eu "te-nho algo a ver com ele". "Talvez eu tenha que realizar algo nele; mas talvez eu apenas tenha que aprender algo e 56 se trata do meu 'aceitar' ... 0 que importa agora e unicamente que eu me encarregue deste responder."
servir de recipiente a palavra." E eu devo apenas estar presente, estar ai, atento, abrindo 0 meu ser em toda sua totalidade para perceber a palavra que me e dirigida pelos acontecimentos do mundo e recebe-la como minha palavra - recebe-la e responder a ela e por ela, ~ 0 mundo atraves dos seus acontecimentos do dia-a-dia que se dirige a mim. Tudo 0 que me acontece diz algo a mim de uma forma (mica, numa linguagem nunca antes pronunciada. "N6s respondemos ao instante, mas respondemos ao mesmo tempo por ele, somos responsaveis por ele ... "
A vidadial6gica nao implica de forma alguma uma perda de individualidade. Pelo contrario, Buber insiste, justamente a este respeito, na distinyao entre a coletividade e a comunidade: a coletividade fundamenta-se numa atrofia organizada da existencia p essoal; a c omunid ade, no aumen to e na con flrmaca o d esta ex istencia , no interior da reeiprocidade.
Em A Q uesta o que se Coloca ao Individuo (elaboracao de uma conferencia pronunciada em 1933) 0 autor faz uma severs crftica a Kierkegaard para quem 0 homem deve renunciar ao mundo, a toda e qualquer relayao essencial com 0 outro, e deve "falar essencialmente consigo mesmo e com Deus". Mas que Deus seria este, que exigiria de nos a renuncia aos outros homens, a sua propria cria<;:ao?"A cria<;:aonao e 'uma barre ira no caminho que leva a Deus, ela e este proprio caminho." Deus eo homem nlIo sao rivais. Deus quer que n6s venhamos a ele atraves do mundo que criou e nao atraves da nossa remincia a ele. "Nao e possfvel que a relacao da pessoa humana com Deus seja estabelecida pela omissao do mundo." Pelo contrario, 0 Individuo deve aceitar em sua integralidade a parcela do mundo quelhe e confiada, ele deve "circundar com seus braces este triste mundo, cujo verdadeiro nome e cnacao". Deve aceitar a hora hist6rica que a ele se dirige em toda a sua alteridade e perceber a mensagem que nesta hora the e dirigida, reconhecer que e a ele que a questao se dirige e responder.
Nao e somente urn outro homem que se torna urn Tu para mim - pode ser urn animal, uma arvore, ate uma pedra e, atraves de todos esses, Deus, 0 Tu Etemo. "Nada pode se recusar a
Buber insiste sobre a posiyao Indivfduo na responsabilidade. E esta posiy!o nao se altera na comunidade. 0 grupo nlIo pode aliviar-nos da nossa responsabilidade, ele nao pode responder por n6s.
2. Trad uzido pa ra 0 in gles po r R onald Gre gor Smith , M acmilla n Publishing Co., Inc., New York, 1975.
Nio temos aqui de modo algum em mente que 0 homem deva, sozinho e desaconselhado buscar a resposta no seu pr6prio seio. . . Mas a or ien~io nio deve ,{.bstitu ir a deci sio; nenh uma su bstitui~ o e aceita.
8 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
9 5/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Aq uele que tern urn mestre pod e entregar-t'se" a ele, po de entrega r-lhe sua pessoa ffsica, mas nao sua responsabilidade. Para esta, ele precisa empreender 0 caminho ele mesmo ...
E le me nto s d o In te r-h um a no (de 1953) explora a esfera do "entre", 0 espaco onde se realiza 0 dialogo, 0 encontro entre Eu eparceiros, Tu. 0 sentido deste dialogo nao se acha em urn somente dos dois nem nos dois em conjunto, mas"nem encontra-se neste encarnado jogo entre os dois, neste seu Entre".
o autor frisa a distin~ao entre a esfera do "inter-humane" e a do puramente "social" no qual os homens se acham ligados por experiencias e acontecimentos em comum, sem que necessariamente haja relacoes pessoais entre os diferentes membros do grupo. Naturalmente 0 dominic do inter-humane estende-se muito alem do domfnio da sir npat ia ... A tinica coi sa importante e que, para cada urn dos dois acon teca do c omo estedeoutal troforma de terminad o; qu e cad a urn dohomens, s d ois se o·~utro tome con sciente outro que precisamente por iss o assu ma para com ele urn co mpo rtamento, q ue n ao 0 considere e nlo 0 trate como seu objeto mas como seu parceiro num acontecimento da vida, me smo que se ja ape nas u ma luta de bo xe. E este 0 fator decisivo: o nao-ser-objeto ... A esfera do inter-humano e aquela do face a face, do um-ao-outro; eo seu desdobramento que chamamos de dialogico,
A I DEI A DE PAZ NA FILOSOFIA DE MARTIN BUBER·
Finalmente 0 Posfdcio da-nos urn apanhado do cIima intelectual em que se desenvolve a filosofla do dialogo de Buber, a afinidade do seu pensamento com a busca de outros pensadores preocupados com esta mesma fllosofia, cujas obras se desenvolvern as vezes em caminhos estranhamente gentes.
M a rc el o D a sc a l . . . el h om bre nu nca sa be para q uih l p a de ce y espera. P a de ce y espera y t ra ba ja p a ra g en te s q ue n u nc a c o no c er d , y qu e a su v ez p a de ce rd n y esperara n y trabajaran p ara otros q ue t a mp o co ser6n felic es , p ue s e l h om b re a ns ia s ie m pr e u na f eli ci dl Jd s itu ad a m els aliOd e /8 p o rc i O n q u e le es otorgru;/ll.Pe del h om bre e sta precisa mente en TO /8 g ra n de za querer mejorar 1 0 qu e es. En tmponen« tarul. En e l R e in o d e l os C te lo s n o h a y g ra n de za q ue c on qu i. ta r, pu esto que a lid t o do e s j e ra r q u iI J e l ta b l ec i da , i nc og ni ta d e sp ei a da , e xi st ir s in t b7 n in o , I m po ni bi l id a d d e s a cr if fc io , r ep os e y d e le it e. P o r e ll o, agob ia do d e p en as y d e ta re os , h e rm o/lO d en tr o d e. III m ise ria , ca pa z de a ma r en m edia de la , pla ga s, el h om br e s olo p ue de h alk lT IU g ran d eza, III mtlxlma m ed id a e n e l R ein o d e E ste M un do .
paralelos ou conver-
Alejo Cerpentier
..
Trabalho apresentado na III Sema na Internac iona l de Filoso ila, Sa lvador, 17 a 23 de julho de 1976.
10 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
11 6/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
S e c on su lt a rm o s n os so c on h ec im e nt o intemo a respeito do que ordena Deu s a h u m a n t: d ad e, n 40 h es it ar em os u m sO t ns ta nt e e m d iz er q ue e a pa».
profundo
Mordechai
Martin
Buber
P a ra e nc on tr a ra s ig ni {i ca f 60 d e u m a hIeID, te m os q ue e xa m in ar a s c on se qa en cta s d a a ¢o p ar a a s q ua is e ssa id elD n os le va ; d e o utr o m od o a d is pu ta sab re essa hU ID po der d e te mizar -se,
sem ne nhu m
fruto. Charles Sanders Peirce
A primeira vfta, nada mais impr6prio do que a justaposicao dos textos de Buber e Peirce. De urn lado, 0 espiritualismo de Buber, a olhada para "cima", sugerida pela mencao de Deus. De outro, 0 pragmatismo de Peirce, colocando como condicao da propria significa~ao de uma ideia 0 exame de suas consequencias praticas, A oposicao e , porem, apenas aparente. Porque Buber, longe de ser urn fllosofoespeculativo "tfpico", alheio - em sua reflexao fllos6fica - ao que passa ao seu redor, e , pelo contrano, urn homem-de-acao no sentido pleno do termo: sua a~ao politica, social e humana e permeada por sua filosofia; e sua re flexao ftlos6fica e toda ela, mesmo quando parece pairar em alturas mistico-miticas, absolutamente alheias realidade deste mundo, orientada, em ultima analise, para 0a concreto, para 0 homem e sua esfera de a~ao, para 0 reino deste mundo. Se, no turbilhao dos acontecimentos, volta-se para 0 plano da ideia, para 0 espiritual, nio e paraencontrar hi urn refugio, para escapar a tormenta, mas sim porque acredita no poder da ideia como guia de a~ao e como instrumento para a compreensao e transform a~a:oda realidade. A orientacao para
0 concreto,
a capacidade de agir sobre ele
e, aos olhos de Buber, urn elemento constitutivo do espiritual e, como tal, deve figurar em qualquer tentativa de defin i-lo satisfatoriamente. ~ sobretudo por ignorar tal requisito que peca, segundo Buber, a antropologia filosofica de M ax Scheler, entre outras. Ao "espirito impotente" descrito por Scheler, urn espfrito que "em sua forma pura e desprovido de qualquer poder" (Buber, 1942, pJ26), Buber opoe a concepcao do espiritual co-
mo dotado de poder, talvez nao no sentido de urna forca que produz mudancas imediatas, mas pelo menos como uma "capacidade de por em movimento semelhantes forcas, de forma direta ou indireta" (1942, p. 127). Face a tentativa de Scheler de definir 0 espfrito atraves de seu afastamento da experiencia imediata, de sua nao imiscuicao com 0 concreto, Buber concebe 0 espiritual como intimamente entrelacado com 0 mundo com a vida, com a a~iio. Para ele, "nao ha outro espfrito a nao ser aquele que se nutre da unidade da vida e da uniao com 0 rnundo" (1942, p. 138-139). E, ao contrario de Scheler, a imagem que nos propoe para ilustrar a natureza do conhecimento nao e a do espetaculo em que 0 espirito contempla, de fora, seu objeto, mas sim a da iniciacao, em que 0 iniciado participa diretamente na "danea", "penetra" a realidade que pretende conhece r (1942, p.133)1. Esta concepcao do espiritual como orientado para a a~ao, Buber a retira das profundezas da tradicao judaica. "Aquele que estuda sem a intencao de agir", diz 0 Talmud, "melhor seria que' nunca fosse criado" (1934, p.141). 0 conceito bfblico de ch o ch m d (sabedoria) e , segundo Buber, profundamente distinto da sofia grega: enquanto este ultimo se refere a urn conhecimento contemplativo, valorizado em si mesmo, aquele se volta inteiramente para a uniao entre conhecimento e vida. 0 saber desvinculado da a~ao e considerado esteril, urn desvirtuamento da funcao primordial do espfrito: Aquele cuja sabedoria ultrapassa suas ~CSes[ e noramente 0 Talmu d que nos fala] a que se parece? A uma more com muitos ramos e poucas rafzes: urn vento qualquer a arranca e der ruba. Mas aquele cujas ~O'es ultrapassam sua sabedori a a que se par ece? A uma more com poucos r a-
1. " (Sche ler) apres enta es te ex emplo: urn ho me m tern u rna do r no bra~o . A intelig enc ia pergunta c omo su rgiu ess ado r e co mo pode ria se r eliminada, e responde a pergunt a com a ajuda da cienci a. 0 espfrit o toma ess a mes ma dor c omo ex emplo d a c on dicdo ess enc ial de qu e 0 mun do se ac ha impregn ad o de d or, interrog a a respeito da es sen cia da propria d or e , aind a mais alto, se pergun ta co mo ' d ev e se r 0 fundamento das coisas para qu e s eja poss fve l a lgo como a 'do r em g eral' ... Na o se con he ce a ess enc ia da dor afastando-se 0 espfrito dela, refestelando-se, por assim dizer, em u ma poltron a pa ra con templar 0 e spe tac ulo d a do r, c omo u rn e xemplo real; aquele cuj o espfrit o mio f ica de for a e se desrea1iza, mas se l an~ a fun do na d ar rea l, s e a sse nta n ela, s e iden tifica co m ela, enc he -a de espfrito, e e entio que a dor se the abre, em tal intimida de. Nio se obtem co nhecimento mediante a desrealizacao, mas sim presicamente penetrando a realidade concreta ... " (Buber, 1942, p. 132-133).
12 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
13 7/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
mos mas muitas raizes ; mesmo s e tod os os v en tos d o mu nd o viess em a soprar so bre e la, n io se mov eria (Ibid., 141-2).
Isto na o implica, porern, uma glorificacao da aylio per se, urn mere ativismo. A ayao na o guiada pelo conhecimento su cumbe inevitavelmente na "problematica abissal do momento" e e incapaz de "libertar-nos das limitacoes e ligar-nos ao incondicional" (ibid., p.144). Os sabios do Talmud concluem urn debate sobre 0 que e mais importante, ensinamento ou ayao, afirmando unanimemente: "Os ensinarnentos sao mais importantes, porque eles engendram as acoes". Mas nao se trata de uma contradicao, explica Buber. Tomadas em conjunto, as duas teses se complementam, apontando para a interdependencia essencial, 0 laco in separav el que une reflexao a ayao. Finalmente, para eliminar qualquer duvida porventura restante a respeito
cos. Urn pequeno episodic servira para ilustrar 0 profundo engagement pessoal de Buber na causa da paz. No infcio da decada de 60, Buber, juntamente com Bertrand Russell, Martin Luther King e outros, concordou em apoiar a formacao de uma "Brigada Intemacional da Paz". A cerimonia de fundacao da Brigada deveria realizada em Buber dezembro de empreender 1961, no Lfbano. Aos 83 anos de ser idade, doente, decidiu a jomada ao Lfbano, cheia de dificuldades previsfveis e imprevisfveis, na esperanca de poder desta forma contribuir para 0 inicio de urn dialogo entre israelenses e arabes, A proibicao terminante de seu medico impediu-o finaIrnente de ir, e seu desapontamento por isso foi indescritfvel. .. (Hodes, 1972, pp.72-5).
Justifica-se assim, do interior do pensamento e da ayao de Buber, a tentativa de esclarecer sua concepcao de paz, de determinar de maneira mais precisa sua sign ific ac ao, atrav es do proce0
dimento sugerido porde Peirce: suas "consequencias de aylio". Nao se trata procurarexame emitirdeurn juizo a respeito das ayOes especificas empreendidas pelo proprio Buber em nome de sua ideia de paz", embora elas possam servir para iluminar urn ou outro aspecto dessa ideia, Como todo 0 ser humano, ele pode ter falhado ao passar da ideia a ayao concreta. Seria igualmente futil esperar desta analise uma receita pormenorizada de como cada urn deve agir para que a paz seja atingida. Trata-se, antes, de procurar ver como uma certa concepcao da paz ~ associa intimamente a uma certa filosofia do homem e da sociedade, formando assim a base de uma doutrina etica suficientemente especffica para, ao contrario da grande parte da etica contemporanea que aspira a "neutralidade", poder servir de guia global de aylio ao s que estao dispostos a deixar-se persuadir por s eu s a rg u m en tos e adota-la. Talvez 0 caminho natural a tomar nesta exposiyio fosse comecar pelas teses de Buber a respeito do ser hum~o .~dividual, passando depois, passo a passo, a s esferas do i~tenndiVldu~, como do cultural, do social, do nacional e do polnico - esta Ultuna,.a esfera em que se costuma definir 0 conceito de paz'"Tomarel, porem, 0 caminho inverso, ja que parti da noyao do poder do espfrito" em sua forma mais geral. . "segue" de uma doutrina ou 3. Uma a~iio ou conjunto de acoes ~ao se nto dedutivo isto c onjunto d e i~eias c ~~o u ma CO?C~usaod e u rn.d :aed etenninad o ~od e e, co m ne ces sidade logica. No !llaXlmo ,.um racio otiv a~o forte pa ra ag ir "engendrar" uma acao no sent ido de cnar uma m dessa forma (cf.sobre isto Black, 1975).
14 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
15 8/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
A comparacao com Scheler novamente se impoe. Para Scheler a ideia de "paz perpetua" e , em si mesma, absolutamente clara; sem qualquer modiflcacao substancial acompanha 0 homem desde a Antiguidade ate nossos dias e encontra-se nas mais diferentes culturas (Scheler, 1953, p.23). 0 que exige explicacao
0 que e preciso fazer para promover a paz europeia e fixar t ar ef as e ur opeias comuns, "tarefas cuja realizacao em cooperacao permitiria aos povos (europeus) unir-se e atenuar suas paixoes guerreiras" iibid., p.138). Todas as formas de pacifismo de nada servem pa-
nao e a natureza da ideia de paz, mas sim 0 fato paradoxal de que, apesar de ter sido defendida pelos maiores e mais puros genios da humanidade em todas as epocas, a ideia de paz "nao leyou a praticamente nenhum resultado, nem mesmo a comecos de realizacao certos e distintamente reconhecfveis" (ibid., p.25). N ao s er ia essa ineficiencia no plano da realidade historica urn sinal de que ha algo errado com a ideia de paz perpetua? - pergunta Scheler. E sua resposta e incisiva: nao. Porque 0 espiritual por si so, a ideia pura ou 0 puro valor moral, sao desprovidos de poder. A eficacia que pode vir a ter uma ideia nao depende de sua propria natureza, mas sim de seu encontro conjuntural e fortuito com "graribes interesses de grupo ou de massa formados segundo suas leis proprias" (ibid., p.2S). sao esses interesses, tendencies dinamicas, impulsos e instintos que constituem a unica fonte de poder. Uma ideia - por mais perfeita, justa e recornendavel que seja - tem que aguardar pacientemente 0 surgimento de interesses suficientemente poderosos, que "aspirem" a ela, para entao transformar-se em uma "forca", em uma "vontade polftica", A explicacso da ineficacia historica da ideia de paz perpetua toma-se entao 6bvia: em nenhum momenta da hist6ria do homem surgiu uma conjuntura de interesses tal que per-
ra tal fim. Em particular; de nada serve 0 "pacifismo cultural", a ideia de uma vasta confederacao de intelectuais de todas as na90es, que se preocuparia, entre outras coisas, em esclarecer os povos a respeito das consequencias nefastas da guerra. Porque "nao e 0 saber intelectual que poe em marcha nosso viver enos'so agir, mas si m 0 possante instinto da vida" (ibid., p. 137).
da". Aplicado a Europa, este principio significa que
o fundamental para Scheler, portanto, e mobilizar as fontes do poder - instintos, interesses, tendencias dinamicas - sob 0 estandarte da ideia de paz. Em outras palav ras, t rat a-se de converter a paz no interesse dominante, no instrumento principal de satisfacao do instinto de poder. Isto nao exige, porern, nenhuma transforrnacao radical da estrutura social, cultural e ne m mesmo pohtica reinantes. Apenas aquela re-orientacao do instinto de poder que chamei anteriormente de "sublimacao" e requerida. E ela po de se r obtida dentro das estruturas vigentes, porque depende, em essencia, de uma re-organizacao apropriada das foreas polfticas emjogo no cenario rnundial". Muitas vezes, a linguagem usada por Buber para descrever varios aspectos do processo de obtencao da paz e extremamente semelhante a de Scheler. Por exemplo, em uma entrevista a revista em 1962, Buber sugere que a paz poderia ser obtida
Life,
mitisse sua realizacao. acredita, porem, na existencia de 0 progresso da evolucao", leis que levacertas "leis que dirigemScheler rao, finalmente, ao surgimento da conjuntura apropriada para 0 advento da paz perpetua. Em essencia, 0 processo que antevs e um processo de "sublimacao" do instinto de poder, cujo objeto se modifica progressivamente: "da violencia ao poder, do poder ffsico ao poder espiritual, do poder sobre os homens ao poder sobre a natureza, primeiro sobre a natureza organica, depois sobre a inorganica" (ibid, p.64). Paralelamente, a "guerra" passa por urn processo de reorientacao:
4. 0 equi lfbri o a ssi m obtido seria devido ao fat.o do ~ste~ o~r~ "eficientemente", isto e , de forma que qualquer modifica~o na distribui~ao de "bens" dada (neste caso, incluindo, evidentemente,.vantagens polftico-militares, economicas, etc.) tivesse sempre que pre.Judicar algum membro (estados), ao mesmo tempo que beneficiasse outros. Ou seja, sem pre algum me mbro te ria a perd er com toda e qualq uer Neste sentido, a situa~ao existente - a situa~o de paz - serla para t odos", isto e , seria "i nteresse " geral ma nte-la. En tretanto . e ste p cipio de eficiCncia nao leva em conta e portanto nio.garan=S:~: dis tribuic ao dos "bens ". E is to intro duz urn fator de JDstab prin '{.
J J 'l v~a cn at ar; o: ' '
• -~t~~'
A luta entre homens e entre grupos humanos recebe ... pouco a poueo, cedendo lugar a luta comum, urn combate coletivo, em coopera~ao, que a humanidade travacom a natureza infra-humana (ibid., p.65).
mental r equer a ana lise situa~a:ode em' 1ustil(a" termos de ~ outr~ aq W noco alem doe da eficiencia, urn da principio (apliCO senvolvidas por Rawls, 1971, pp. 67-75). .
Uma v e z a ti n gi d o esse estagio, 0 combate coletivo absorvera a maior parte do instinto de poder, e a paz perpetua, isto e, a ausencia de guerras i nt ra -h u m an a s, e st ar a praticamente garanti-
:;::t
5. Mesmo quando Scheler (pp. 108-119) rejeita 0 que. ch~ fismo jurfdico" inc1uindo as diferentes formas de orgarusmos Ultra Kan°t ., ' . tr . s defensores se encon a sua ineficacia polt-, mils existentes (Liga ~as Na~(Jes~,en e cUJ~ as raz5es que alega dizem respeito, essencialmente, tica,
16 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
17 9/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
se as partes em conflito distinguissem c1aramente entre seus interesses comuns e seus interesses opostos, e tratassem entao de chegar a urn compromisso, como "bons mercadores", Esse compromisso deve ser algo de positive,
~r~
i/
surgir nos cora~oes dos membros das duas na~oes sentimentos de respeito rmitu o e d e bo a vo ntade , qu e atuarao s obre a vida tan to da c omun id ad e co mo d e cad a urn de s eu s membros. e ntio se enc cntrarao os do is povos em urn novo e glorioso encontro histcrico (ibid., p.l07).
So
E, na sua opiniao, 0 que mais poderia contribuir para 0 advento da paz organica, da cooperacso real, entre judeus e arabes seria "a influencia do melhor que Israel produziu, as novas for.mas de vida social, sobre 0 povo arabe" (ibid., p. 119)6.
~S~S c omun s sa o fll~en tll ma iores, ape sa r dasaparencias, que os interesses opostos, tentarn chegara urn entendimento Par!l resolver os problemas comuns. Que eu saiba, nenhum polftico tentou este carninho (Hodes, 1972, p.120). I
Aparentemente, portanto, Buber - como Scheler - acredi"ta que a paz pode ser obtida por meio de urn "calculo de interescorno interesse predornir ses", do qual resultaria a "cooperacao" .nante, Este interesse predominante, alem disso, se tornaria 0 objete de "uma forre vontade dos povos de explorar e administrar coniuntamente 0 planeta Terra, seus territ6rios, jazidas de materias-primas e populacoes" (Buber, 1950, p.194); "vontade" essa que lembra de perto a "vontade polftica" e 0 "instinto de po.der" de Scheler. o
Entretanto, essa semelhanca de linguagem esconde diferencas profundas, relativas tanto a natureza da paz a ser aspirada quanta ao modo de atingi-la, Uma paz que consiste apenas na cessacao da guerra, obtida por meio de compromissos politicos, nao e, segundo Buber, urna verdadeira paz. "A verdadeira paz, a paz que seria uma solucao ( real, e a paz organica" (Hodes, 1972, p.119). Tal "paz organica" significa acima de tudo a cooperacao das partes para a melhoria de suas condicoes de vida e de sua cultura, e para a eliminacao \ das diferencas existentes entre elas. Mas essa cooperacao nao pode surgir apenascomo 0 interesse dominante, resultante de urn "calculo de interesses". Ela tern que ser uma cooperacao nao puramente "interesseira", mas mais profunda, resultante de uma \ "mudanca nos coracoes" dos dois lados da fronteira (ibid., p.11S). Se fala ainda de interesses, Buber opoe os "interesses genufnos" aos interesses de momenta: s6 os primeiros sao capazes de engendrar a "solidariedade profunda e constante" capaz de superar os interesses e conflitos (ibid., p. 107). Referindo-se - ja em 1921! - ao futuro das relacoes entre judeus e arabes na Palestina, Buber insiste em que somente 0 reconhecimento por outros dos seus interesses genufnos fara
A verdadeira paz, portanto, requer mudancas profundas, tanto na vida individual de cada urn como nas estruturas sociais. Uma mudanca no plano puramente organizacional, isto e, polltieo, de nada serviria. Pelo contario, a mera criayao de institui~oes polfticas internacionais, dotadas de poder suficiente para controlar a exploracao conjunta dos recursos do planeta, por exemplo, po de ser muito mais perigosa do que util, se nao for acompanhada por modificacoes radicais no plano individual e social. 0 perigo, nesse caso, seria
0 de
urn centralismo planetario, que devoraria toda a comunidade livre. Tudo depende de que nao entreguemos ao princf pio polit ico a tar efa de explorar os recursos da terra (Buber, 1950, pp. 194-5).
Esse perigo nada mais e que uma das manifestacoes - a mais grave, talvez - de urn fenomeno que, aos olhos de Buber, constitui urn dos problemas cruciais da hurnanidade, hoje em r dia: 0 problema do e xc es so d e p od er (politico). Para compreende-le, e preciso examinar uma das dicotomias basicas com que opera Buber, a oposicao entre 0 social e 0 politico.
6. Ele serefere aqui as formas de vida comunitaria. p~cip:!:~e::rs p:ra ' esse t ipo de comunidade poderia servir de modelo e de mce~ nto d~ reforma agraria e economlca, indispensavel para 0 desenvo e povo arabe na Palestina.
kibutzim, desenvolvidas pelospioneirosjudeusnaPa1es~
m :,
19
18 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
10/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
'~.!!§MOaso mes!1l!t_t!l.mPQ:de.pe~e~_~.independentes entre ~L(1950, p. 191). E esse tipo de ligayao inter-humana, e nao a l~gayao baseada na dominacao, a cooperacao imposta, caracterfstica da forma de organizacao politica, que constitui 0 "mundo social", por cuja criayao 0 homem efetivamente se distingue dos demais animais. Uma comunidade baseada no fundamento social e uma u ni do e nt re s er es s em e lh a nt es . Isto garante, por urn lado, : a autonomi~ re!ativa de cada indivfduo em seu selo, a possibilix dade .de~se mdlvf~uo explorar sua capacidade de improvisacao, de cnacao espontanea, e, por outro, atraves do reconhecimento e responsabilidade rmituos de seus membros, a coesao social necessaria para seu funcionamento organico (1950, p.192). Comunidades "autenticas" desse tipo sempre existiram como forma de agrupamento humano, nas mais diversas culturas, mas raramente foram reconhecidas como tais e claramente distinguidas
7. Compare-se isto c~m a ~esedeR_?usse.au: "Para que a vontade geral venha a expressar-se e precise que nao haJa sociedades parciais no seio d o E stado " (cit ado em Bube r, 196 5a, p. 405). A est a c oncep ~ao se o poe n _ a ? somente Buber, mas tambem urn fllosofo pertencente a tradi~iio anaIitica, como J ohn Ra wls, p ara quem a "so ciedad e bern ord enada " e uma "uni iio soci al d e u nides soci ais", se ndo que uma "un iiio socia l" e uma "comunidade de indivfduos que tern metas em comum e atividades em (Rawls, 1971, pp. 522-525;grifo meu). cornum valorizadasemsimesmas" 8. Em Russell, 1938 (cf. Buber, 1965a, p. 397).
tambem 0 erro de Hegel, cuja descricao da sociedade modema peca, segundo Buber, precisamente por omitir totaImente as rnanifestacoes da "sociabilidade ": a solid arieda de, a ajuda m utua , a amiza de lea l, 0 entusiasmo ativo na realizacao de urn empreendimento conjunto; falta na descri!;io oferecida por He gel - tod a aquel a e sponta neida de social c riador a, que, ap esar d e nao se r un ificada e cont rolave l com o 0 e a forca do Estado, existe em abundancia num grande numero de fenomenos sociais (1965 a, p. 407).
A grande crise da humanidade, hoje em dia, provem do fato de que, emb ora nao tenha desaparecido totalmente, esse fund amento "social" tenha sido inteiramente subjugado pelo fund amento politico. Buber nao nega a legitimidade e a necessidade da organizacao polftica, como um a das muitas dimensoes da inter-ayao humana. 0 que rejeita e a subjugacao das demais dimensoes pelo fundamento politico. Ia l subjugacao se to rn a p os sf ve l a tr a> yes doaparecimento, na sociedade modema.de U n J . "excesso de poder", que surge no. intervalo, inicialmente~ID1.mQ.,.J1lis.l!e:_. pois ahismal, entre "adminlstracao" e "governo", A administrayao, que pertence ao fundamento social. e definida como a, autoridade de decisao e comando, limitada por condi~es tecnicas dadas, e reconhecida de jure e de facto dentro desses limites, mas que seanula a si mesma caso os ultrapasse.,
p ''.&.oy~rI1():·>9r outro lado, e
a
io limitada por .condi~Oestecnica&, jllltoridade . d e . .d ecisio e COIDlUJ.(I.o, mas apenas por limita\ioes chamadas "constitucionais" (quando ~ limitado de alguma forma) (1965, pAll).
o que torna necessaria esta segunda forma e a instabilidade das condicoes intemas e extemas, a situacao de crise potencial, que em qualquer momento pode tornar-se crise real, exigindo poderes amplos e obediencia indiscutfvel, Essa "amplitude", isto e, relativa indefinicao, do direito de decidir e comandar e que constitui 0 "excesso de poder", ou "excesso politico ". Quando uma sociedade vive em "crise permanente", 0 excesso de poder torna-se urn fator constante e dominante da organizayio social, tendendo sempre a subjugar os outros fatores, e principalmente
°
a eliminar a espontaneidade social. Esta, sufocada, se torna urn fator de instabilidade potencial, e 0 cfrculo se completa. Nas condicoes acima descritas, isto e , sob a domlnacao exclusiva do fundamento politico, uma verdadeira paz e impossfvel, evidentemente. Tudo que se pode obter e uma "pacifica-
20
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
21
11/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
~ao"9 . Em grande parte, a "paz perpetua" de Scheler, assim como a de Kant, nada mais e do que uma paz politica, e portanto, quando muito uma pacificacao, A esta concepcao, Buber opoe a ideia de uma paz vital. "que arrebate ao principio politico a soberania sobre 0 social" (1950, p. 194). Isto e , a verdadeira paz , requer 0 restabelecimento da autonomia das diversas dimensoes da inter-acao humana, a nao dominacao de uma sobre as demais. A "paz vital", entao, esta muito longe de ser uma "paz de tumu10", obtida atraves da uniformizacao, da eliminacao de todocontraste ou diferenca capazes de gerar conflitos. Pelo contrario, ela 'e uma paz "vital", precisamente na medida em que a "vida" e possfvel gracas a urn equilfbrio dinamico entre tendencias.iorgaos e funcces multiples e extremamente diferentes uns dos outros. A pluralidade de formas sociais, de nacoes, de culturas, e uma ten sao ou equilfbrio dinamico entre elas, permitindo a preservacao de sua autonomia relativamente umas as outras, e 0 ingrediente indispe~savel da paz tal qual concebida por Buber'". Reconhecer a crise atual e urn primeiro passo na direcao de soluciona-la, 0 passo seguinte e sabermos para onde queremos ir, que tipo de paz queremos obter. Conhecendo a ideia que de9. A pacifica~o e a im posica o d a paz, po r uma forca ou interess e superior . A p az que assi m s e o btem e do tipo da po x romana ou da pa x britanniCil. Evidentemente, para obter a pacifica~o, a guerra pode ser usada como in strumen to legftim o, e taiv ez necessa rio, "A paz e 0 objetivo da guerra", afirmava Aristdteles, E 0 proprio Scheler, embora seoponha ao " militar ismo de princ fpio", que ve na guerra urn t im, defen de 0 "militaris mo in strumen tal", que v e na gue rra ur n i nstrum ento para a o btencao dapaz. 10. Esta valoriza~o do pluralismo, do equilfbrio dialetico e nao estatico, encontramos em todo 0 pensamento de Buber. Por exemplo, em sua tentativa de caracterizar a n~o de "cultura" - em urn ensaio sobre a "es sencia da cul tura" que p oderia se rvir, p asso a pass o, de m odelo p ara urn ensaio buberiano, inexistente, sobre "a essencia da paz" - Buber afirrna q ue a "unida de da cu ltura e uma unidade engendrada atraves de processos polares". Entre esses, distingue quatro formas basicas de oposiCao, cuja tensao e equilfbrio garantem, segundo ele, a possibilidade da criatividade cultural: 1) tradi~o v s . inova~o (revolu~o VS. conservaeio): 2) form~ io d e r elacoes sociai s i nstrum entals co ncretas v s . criacao de uma esfera independente de produtos e valores culturais; 3) desenvolvimento de formas de cultura v s . desenvolvimento da consciencia dessas formas pelos individuos envolvidos em seu desenvolvimento; 4) tendencia a autonomia das diferentes formas e esferas de cultura v s . necessidade de manter entre elas algum Iaco, alguma forma de ' 'u nidade'' cultural (1965 b. pp. 383- 386). A vita iidade de uma cu ltura depend e da coe xistenci a desses polos: a dorninacao de urn deles sobre os demais traz a estagnacao e a decadencia cultural.
ve servir de guia para nossas decisoes, a idei~ de p~ vital, p ' 0dem os agora procurar determinar de forma m a r s p re ci sa suas conseqiiencias de a~ao".
Se 0 problema basico e 0 do excesso de poder, que t:_nde a' , liquidar todo pluralismo, as medidas a serem tomadas nao. podem de forma alguma contribuir para urn incremento ainda maior desse excesso. A centralizacao, portanto, deve ser comb atida. A descentralizacao, tanto no plano nacional, como no plano internacional, deve ser recomendada e implem~nta~a. Isto implica no abandono da ideia de urn universalismo sirnplista, baseada na extincao das diferencas entre os grupos humanos. Para, Buber, o unicc universalismo pratico, isto e, passivei de realiza~o - _?inda. qu~ com esf orco ina udito - e 0 universalismo dos profetas, que ~ao aspira a dissoiuCao das sociedades nacionais e de suas formas de orgamzacao, mas sim a sua reform a e cura, como base para sua unifi~io (1965a, p.402).
Esta mencao dos profetas leva imediatamente ao estab~le~imento de uma c on e xa o i nd is so lu v el entre a ideia de paz e a ideia de justica: s6 sepode estabelecer uma paz vital, verdadeira, entre sociedades internamente~Utasll . A passagem que colocamos com o mota deste trabalho e parte de urn diiscurso 12 em que B uber, citando Isaias, exorta a juventude judaica a ter sempre em mente a conexao entre paz e [ustica: "Sion nso podera ser re construfda 'por qualquer meio', mas somente bamishpat (Isa!as, 1:27), isto e , somente com justica (Buber, 1~32. p.23~). E isto se aplica tanto a justica interna, que deve remar no seio .da ~omunidade judaica em criacao na terra de Sion, como a JustI~a
esta exigi!l!cia 6 0 se11 . Urn argumento freqiientemente usado contra " alista" . to e nlo apeguinte "paradoxo": a exigencia de 1;'ma"paz ma~ ,u: . ' a interna nas a ausencia de guerra mas tambem 0 estabelecimente daJustic _ e m cada urn dos esta dos, [u stifica a int ervencio n<:,s~ stados que !lato "" de i t" int - que s""'1fica guerra, 1S0 preenchem os requisites e JUs 1 Ca,m e~enCao -;.. tentar-se com e' na-o paz Portanto se costuma concluir, 0 melhor d con guerraeaoard t uma "paz minirnalista", isto e , com a simples a,!senC13 e t ·:m·ernos': , " '" d -" t rvencae nos assun os paralelamente urn "principio nao mer. ~ de " r ealismo" _ unide outros es tados". A pr etensa eefici~ ncia de s!e tiP tremam ente du,
••
A
•
ca base para atribuir-lhe qualqu~r"validade -,~eit<:,rem:.e:m geral no final ismo vi dosa, F aco urn breve com entano so bre 0 deste trabalho (ver tambem Buber, 1958, p. 257). convenr,Aode jovens ju12. Pronunciado por Buber em 1932, e~ u.~a ,.deus ded icada a o tema "Isr ael e a paz Mun dial .
22 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
23
12/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
"externa", a que diz respeito a atitude dessa comunidade aos arabes que habitam a Palestina:
face
Nio pretendemos voltar a terra com a qual temos laces ~istoricos e espirituais inseparaveis para suprimir um outro povo ou domina-lo; ... nosso retorno a terra de Israel. . . nao sera feito as custas dos direitos de urn outro povo •
- afirmava Buber no X II Congresso Sionista, em 1921 (Hodes, 1972, p. 106). S6 nessas condicoes podem os dois povos atingir uma "paz vital". No plano intemo, alem da descentralizacao do poder, deve haver tambem uma mudanca em sua natureza, isto e , urn desIocamento de uma porcao cada vez maior do poder do tipo "governe" para 0 tipo "administracao" (1965a, p.412). Ou seja, e preciso a cada momento examinar e reexaminar em que medida 0 "excesso de poder", justificado por condi. s~oes e pode restr in~ atraves de "crise", de uma delimita~ao e especificacao rigorosas da autoridade delegada a um individuo ou institui~lio. Aqui 0 que esta em questao e a natureza do socialismo que sera o sistema social da sociedade justa (porque para Buber e evidente que a exploracao comum dos recursos, a cooperacao genufna, 56 e possivel se socialista). A simples passagem do controle dos meios de producao das maos dos empresarios para a~ maos da "coletividade", se esta Ultima nada mais e que 0 Estado, de nada serve, segundo Buber (1950, p.195). Que sejam "representantes" dos operarios os que tomam decisoes por si s6 nao garante a
,justi~a dessas decisoes, nem a revitalizacao da espontaneidade 'social. "Nlo sera porventura a pior def iciencia da sociedade moderna justamente 0 fato de deixar-nos representarem demasia?, pergunta Buber (ibid) Onde M " re pr es en ta ca o" s em p re ha 0 pe rigo de surgimento de urn "excesso de poder", pelo distanciamento inevitavel que se cria entre representante, representado e objetivo da representa~lo13. AMm disso, ha 0 empobrecimento do "conteudo comunitario" na vida dos individuos representados, porque a comunidade "s e manifesta sobretudo no tratamento comum ativo do que e comum, e na o pode existir se m esse tratamento" ( 1950, p.196). A conclusao e que tudo depende de que a coletividade a cujas mios passe 0 controle dos meios de produ~o tome possfvel e fomente, em virtude de sua estrutu-
13. Sobre alguns dos problemas e paradoxos da ideia de "representa~ao", mesmo em urn Estado "democratico", ver Wolff (1970, pp. 17-27).
ra e institui~Oes, a verdadeira vida de comunidade dos diferentes grupos, precisamente ate que eles mesmos passem a ser os sujeitos genufnos do processo de produ~io (ibid.).
Essa verdadeira vida comunitaria, cujo modelo e para Buber o ideal da comuna - parcialmente realizado nos kibutzim israelenses - nio tern nada de puramente sentimental ou mistico. Sua base e sempre 0 trabalho comum, 0 esfo rc o c om um : "e c om un idade de atli~io, e s6 a partir daf, comunidade de espfrito; e comunidade de esforco, e s6 a partir dai comunidade de salva~ilo" (id., p. 197). M as nem por isso trata-se de algo puramente instrumental, de uma mera comunidade de interesses que gera uma comunhao de poder. Nela se forjam rela~Oes inter-humanas autonomas, r el ac oe s h o me m -h o me m e nao r elaco es ho m e m -o b je to (id., p. 194). Em termos da filosofla do dialogo - talvez a parte mais conhecida do pensamento de Buber - a verdadeira vida comunitaria e aquela que permite a cada lndivfdu o r elaciona r- se com 0 proximo em termos da rel~llo Eu-Tu, e nao em termos da rela~llo Eu-Isto. A verdadeira comunidade de cujo "renasciwmto.das..aguas depende a ,SQ[!~ do aenerohumano" (1950, p. 199)6.aQyelacujostnembros formam urn "Nos" e nlo meramente um "A gell~'-'14 . Ela pertence, na verdade, a um a dimensso especial no seio do social, a dimencao do inter-humane (0 Zwischenmenschliche), essa dimensao que se situa entre 0 par eu-tu e a m u ltid ao a mo rfa , d im en sa o na qual se estabelecem re l~oes humanas "essenciais", dimensaoem que 0 verdadeiro didlogo suplanta 0 mere debate como forma de comunicacao basica entre os individuos. A paz vital. de um a sociedade e entre sociedades requer 0 florescimento dessa d im e ns ao , a ci ma de tudo. ~ nela que se torna possivel a "mudanca dos cora~l)es"(Gesinnungswandel, Buber, 1929, p. 442), pela qual passa necessariamente o caminho para a paz.
E e precisamente por exigir algo tao dificil c~mo essa "m~danca nos coracoes", que a paz nao pode ser obtida de um dia para outro, mas somente atraves de um lento processo de cons14. "Chamo d e 'Nos' urna uniao de pessoas independentes, pre?aradas para a individualidade e para a responsabilidade pessoal, u~a. ~io .que tern seu fundamento e sua condicao de possibilidade nessa mdiVldualida1de e nessa responsabilidade pessoal. A natureza pecu liar d0 'N" os se rev ela na rela~io essencial que existe ou que surge momentanc:amente ~ntre seus membros. Isto e , 'N6s' e permeado pela imediat~z ontica q_?e~ a pres~posi~o decisiva da rela~o eu-tu, 0 'N6s' contem, em potencia, 0 'Tu. S O indiyfduos capazes de dizer verdadeiramente ' T~' ~~,ao outro sao capazes de dizer verdadeiramente, um com 0 outro, Nos (1942, p. 107).
24 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
25
13/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
trw ;ao, q ue d ev e tom ar v arias g eracoes (1958, p. 253)15. Nada 1!l..~~ ~ ~ ur ~,~ le m br ar rn Q _ ~q ue 0 p od ~ r d e u m ~_ i~ ei '! zc l( )~ ~ J. >J ri ty~. conslsre.em .um a_ fQ ~ ime_djat~meD le.e ficaz, masape~apacidage _ _~~:J.>_Qm r _ m ov im e nt o:. ' t ai s f 0. !E s . N em p or isso a paz e ur n sonho in atin gfv el; ela e urn ideal, q ue n os sa s ay oes te.em Atodo m omrelev entaan tes podem rnais pr6xim ou m ais d istan s ay oes n ao tornar sao p rojetos h urn anoitarios ou e u rn pa cif is ta radical 16 • palavras conciliat6rias (1932, p. 239). B ub er n lio
Fa zemos paz , a jud arnos a en ge ndrar a pa z mu nd ial on de qu er q ue s eja que somos chamados a faze-la: n a vida ativa de n oss a propria co mu nid ade en os s eus as pe ctos q ue pode m ajuda r a tivamente pa ra d etermina r seu relacionamen to c om uma ou tra comunidade ... E s e n ao ag ora, q ua ndo? (193 2, p. 23 9).
OJll1!nidllU r n d os a sp ec to s f un da m en ta ls q .a _y i_ g a_ d _e _n os sa ~..sob.m_Q. qJi-i--P9d~I!!.Q_sg,j{ II : fun. de J0 1J! ! {__! __pa zital majs proxima, e , s eg u nd o B u b er , a e d uc a ya o. M ~ ~ _ J I ar ~i ss o, l !a ti ~_ d ade edll<;_!!.tiYa.t~m_Qll_e.gr..cuidado.samente..distjng)lidada propaganda 0p r op a ga n di st a n ao .. w n. n m ll U m m t ~r es ~ .r e. a. lp _ el _9 h om e m sabre Q qu a l de se ja i nih! !r_;__~ll _~qua li dade sndividuafsso 0 inte- r e M8 ,m na me di dJ_«Lm_ql l.! !e l lJ_s _.~c:l e servir p a ra n e le i nc u lc a r ..sua·:~m" (1263 d, pp. 226-27). ~ e.o p rQ P;:tgandista e ~~_:)ullltCQ.':a ,l:ela¥io_e.a.~n~_ell:i3~1W lh8. q u al qu er d ia lo g o :f.£.aJ,.O.:v:en.1a
is. E
este
0
sentido da op~ao de Buber pelo sionismo "pratico"
-
que, para ele, consiste na cria~ao progressiva de uma comunidade judaica em que se regeneram os valores humanos e que estabeleca lacos genufnos co m s eus v izinho s - face ao sionismo "po lftico ", qu e bus ca c onc ess oe s e compromissos das grandes potencias, 16. "Nio so u u rn pa CiflSta rad ical; niio c reio q ue se mpre se dev e res-ponder a violen cia co m a nao -violencia. Eu sei 0 que a tragedia implica; quando hli guerra, el a tern que ser lutada" (1958, p. 256, nota). ~ no mesmo espfr ito que Buber rejei tou a sugestao de Gandhi para que os j ude us s ob 0 jug o naz ista ernprega sse m a u tica da na o-violen cia, a SIltya,graha, por ele preconizada. 1 7. Ta mbem e m sua co nce p~o d o ind ividuo , Buber coloca mo como aspecto fundamental. Assim, ele serecusa a conceber
~ que i st a n a a_ e .p o ss iv . el a tr3ves.da impOsi'taO-~¥OIl-tad.e.e
cl~_~\la~ideiauob.re.
0 outre,
m au om en tes e. fo r.. ca pa z
d e,re !l1 ;
mente .." esc utar" ao outro, d e e st ab e le c er .u m d i. al og o _ .a uJ ~ l1 ti co ~ Q m . •d~,A dicotomia pr9~lI&\!.ndavs. ,edu~lio_.cauespande_a o p os i¥ a o p o li ti co vs.. social. Enquantu.que Q prllp~andista de.
u9 ,.rn~~pUartid olitico in lic stituic ov ta erndeam penretal !lteno ciop na " in cuoulc ard e num o, ap ub o uao m a gr on -fa brq icualsd a, isto e , im plan ta r e m c ad a um a certeza de q ue essa e su a prop ria v on tad e, n ascid a em seu p rop rio seio ", a in ten cao d a ed uc a9a O s o ci al e "despertar e d esen volv er em c ad a urn d os educandos a e sp on ta ne id ad e d a so ciab ilid ad e, q ue e xis te .p ote nc ialm en te. em tod os n6s, e que e perfeitam ente com patfv el com. a Yivencia e a r ef le x ao i nd iv id u al " (1965, p. 413). T en do . p ar tid o. d a esfera abstrata do puro espfrito, chegam os a ssim , d ep ois d e u ma jo ma da a tr av es d as e sfer as in te rm ed iarias, ao am ego basica, da almcap a individual, se deve processar a paz, m asa transforrnacao az de levar onde nao sornente tambem a concretizacao d e to das as ou tras dimensoes d a m o ra lidade. A p er gu nta in cisiv a d e N ic olas B er dia ev , " on de d ev e co rnecar a lu ta contra 0 m al? ", B ub er responde, d e f or m a nao m en os in cisiv a: " A lu ta d ev e c om ec ar n a alm a d e c ad a ser h um an o; tod o 0 resto sera c on seq uen cia d isto" (1965 c, p. 326). M as ao voltar-se para sua alm a, a fim d e b an ir 0 m al de dentro de si mesm o, 0. individuo nso tern q ue se encerrar em si m esm o, nem tern qu e se tonar um asceta'" (1942, pp. 130-31). D entre a pluralidad e d e c om po nen te s p ositiv os q ue d esc ob re e m su a a lm a en c on tr ase a tendencia a voltar-se para 0 outro, 0 "instinto de comunica9lio"; e en tlio q ue ele ap ren de a "dizer-tu" e , a p ar tir dar, a dizer , " N 6 s . . 19• E 56 aguele que_:;I.PI_~n I O S da ~qm!l.l!idllde.y~Jtlhll;~~.~nt!.~ eles po:) . de:~. ~stab~l_ecerum~l>,3.?_-_;'~i~ID.,_
0 pluralis-
dos (1963 e, passim). Note-se que 0 reconhecimento dessa pluralidade essencial do indivfduo e seu direito de escolher seu proprio caminho constitue m talvez a u n i c a base solida para uma verdadeira toletincia. ,
0 homem
18. Neste ponto, Buber critica detalhadamente tanto a posi~o teorica',
(versus co mo egov ernad o mesrno ess enc ialmen te por primordial este ou aqfor ue leconcebido "instinto"como Freud Scheler), se 0 instinto urn " ins tinto criado r", Apes ar d e recon he cer a importanc ia des se e lemen to, Buber, face aos pedagogos que querem definir a educa~o exclusivamente. e m termos d o des env olvimen to d a "c riatividad e" d a crianc a, a po nta para a pluralida de d e co mpone ntes ou "instintos" que ex istem em tod o ser hu ma no , e insiste e m q ue a edu ca lfao nio d eve c onc en trar-se apena s e m u rn deles, mas sim permitir 0 desenvolvimento organico e harmonioso de to-
como a op~lfovital (afastamento do casamento) adotada por IGerkegaard (Buber, 1 963b, pp. 18 0 e ss .). 19 . Urn co nto h as sfdico , c on tad o por Bu be r, ilus tra v ivid~ente e sse duplo processo de voltar-se para si mesmo, abrin~o-se. em seguida para a comun id ade . Ra bi Aizik, de Krak au, filho d e Rabi Iekil: qu e Vlvta em ex trema po breza, rec ebe u, e m urn s on ho, a o rde m de ir ~te Prag~ e pro~ar h i urn tes ou ro en terrad o s ob a po nte que lev a ao palacio do re~. ~po1S ~e sonhar tres vezes a mesma coisa, pos-se a caminho. Ao chegar a ponte, VlU
26 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
27
14/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
A tudo isto poderia 0 "realista" objetar: "Muito bonito, mas trata-se de 'puraetica'; uma utopia querer aplica-la a realidade; a polftica rnundial nada tern a ver com isso, suas regras sao outras, crueis; entre os lobos, nao ha lugar para cordeiros", Entretanto,
nurn rnundo em que todas as receitas para urna
1965a:"Entre Sociedade e Estado", in Buber, 1965, pp. 397-413. 1965b:"Sobre a Essencia da Cult ura", in Buber, 1965, pp, 377-396. 1965c: "Fl agr ant es do Bern e do Mal ", in Buber, 1965, pp. 325- 376. BUBER, M.; MAGNES, Y. e SMILANSKY, M. 1946: Palestine - A Bi-National State, New York. HODES, Ausbrey
"paz instantanea" ate hoje falhararn, nso seria de abandonar 0 "realismo" de vista curta e dar urna chance a urn "idealismo" com urn pouco rnais de folego?
1972: Encounter with Martin Buber, London. RAWLS,John 1971: A The ory of Justi ce, Oxford.
Bibliografia
RUSSELL, Bertrand 1938: Power, London.
0 caso
BLACK,Max. 1975: Al gumas Questeos a Respeito do "Raciocfnio Pr atico" em M. Dascal e A. Barush (orgs.), 0 Racioruzl e oIrracioruzl, Boer-Sheva, pp. 48-59 (em hebraico). BUBER, Merdechai Martin. 1 92 9: "Jiidisclf Nation alheim un d Nation ale Po litik in Palestina ", in
SCHELER, Max 1953: L'ide e de paix et l e pacifl sme, Paris (traduzido do original alemao d e 19 31 ). WOLFF, Robert Paul 1970: In Defense of Anarchism, New York.
Kamef um Ismel, Bedim (1933),pp. 432-451. 1932: "And if not n ow, when ?" in Bube r,19 63, pp. 2 34-23 9. 1 93 4: "Toac hing an d dee d", in Buber, 19 63 , pp. 13 7-145 . 1942: Que e s el hombre ?, Mexico (1954), primeira edi~ao, em hebrai00,1942. 1950: Caml nos de utopia, Mexico (1955); primei ra edi~o, em alemfo, 1950. 1958: "Israel and the command of the spirit", in Buber, 1963, pp. 253-257. 1963: Igael and the World. ES/Jilysin a Ttme of Cr isis , New York. 1963a:No Segredo do Dldlogo, Jerusalem (em hebraico). 1 963 b:"A Pergun ta qu e s e Coloca a o Indivfdu o" , in Bu be r, 1 963 a, pp. 157-213. 1963c: "A Atividade Educativa", in Buber, 1963a, pp. 237-261. 1963d!"Os Fundamentos do Inter-humane" , in Buber,1963a, pp. 215235. 1964: 0 Caminho do Homem Segundo a Doutrina HassfdiCll, Jerusalem (em hebraico). 1965: A Face do Homem - E8tOOolde Antropologia FiIoa6{iCll,Jerusalem (em hebraico).
que estava guardada dia e noi te, 0 que impedia de procurar 0 tesouro. Apesa r disso, d ia a d ia v oltava ao lug ar e fic ava por 13 durante 0 dia inteiroo Por f lm, 0 coman dante da guarda perguntou-lhe 0 que fazia por ali. Ra biAizik c ontou-lhe seu s onh o, ao q ue 0 comandante da guarda riu-se as ga rga lha das : "Caminh as te tan to por cau sa de u rn s on hol Que sofram os q ue ac red itam em son ho sl Se eu ac red itasse em s onh os teria qu e ir ate um lugar mui to dist ant e, p o i s me ordenaram em sonho que fosse a~ Krakau, a casa de um judeu, urn tal de Aizik, filho d o Iekil, e e sca vas se sob 0 seu foglo ond e s e e nco ntra u rn tes ou ro. Ima gine s O , numa cidade em que a metade dos habi tantes j udeus se chama Ai zik e a outra met ade Iekil, certamente teria que destruir todas as casas da cidadel" - Rabi Aizik saudo-o e voltou para casa. L a desenterrou 0 tesouro que estava-sob o fogao, e construiu uma sinagoga (Buber, 1964, pp. 42-3). 29
28 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
15/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
mALOGO
AP.
o abismo
e a luz do mundo,
Urgencill e a n se t o p e 14 e t em i n da d e , VisIfo, e v em o e p o es il l; Era e e di4logo contigo.
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
16/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
1. DESCRI<;AO 1. Recordaoio Primeira Com toda especie de variacoes, as vezes depois de urn intervalo de alguns' anos, repete-se para mim 0 mesmo sonho. Doulhe 0 nome de sonho do duplo apelo. 0 ambiente em que ele decorre permanece sempre semelhante; e urn mundo pobre em aparatos, "primitivo": encontro-me numa grande cavema, como as Latomias de Siracusa, ou numa construeao de taipa que me lembra, ao acordar, as aldeias dos felas; ou entio na orla de uma floresta t~o gigantesca, que nao me recordo tel visto jamais uma semelhante.O sonho comeca com as mais diversas formas, mas sempre, no inicio, algo extraordinario me acontece: por exemplo, urn pequeno animal, com a aparencia de urn filhote de leao, 33
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
17/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
cujo nome conheco no sonho mas nao ao acordar, dilacera-me 0 brace e eu s6 0 domino com dificuldade. Ora, 0 estranho e que esta parte do enredo do sonho, a primeira e de longe a de mais interesse, tanto pela sua dura~ao como pela significa~ao exterior dos acontecimentos, desenrola-se sempre num ritmo galopante, co mo se ela nao fosse importante. E entao 0 ritmo torna-se, subitamente, mais lento: eu estou af e lance urn apelo. A visao global que tenho dos acontecimentos quando estou acordado deveria certamente fazer-me supor que, segundo os fatos que 0 precederam, 0 apelo fosse ora alegre, ora assustado, ou ainda ao mesmo tempo doloroso e triunfante. Pela manha, todavia, m inha memoria na o me reporta este apelo tao marcado por sentimentos nem tlio rico em mutacoes; e toda vez 0 mesmo apelo, na o articulado,mas de urn ritmo rigoroso, ressurgindo de quando em quando, inflando ate atingir uma plenitude que minha la ringe, em vigilia, nlio suportaria; longo e lento, totalmente lento e muito longo, urn apelo que e urna can ca o - e, quando ele termina, melt coracao cessa de bater. ~3nt~.
em aliwnlugar,
a c JOllie. diri~:..~l:! 1l1im Q_ulrQ_~~~JUll outro e () mesmo;
0
Q Q ! _ Y _ i l l l : ! _ outraY()~J ~_I1!Q_o~stante !D!l_mlo..J:I1l:!ffiadQ~Qll_~~_1a_4.Q IWlo.meSmQ;__n[Q.._n30_~qe formaali.uma,.um. "~~~.. dO.rneu ape)a, e IlllllliLmais sua verdadeira replica,-.I!~.r.e~ti!l
maneira que 0 sonho tern retornado todas as vezes E desta - com excecao de urna vez, a ultima, fazem agora dois anos. De infcio, tudo se deu como sempre (era 0 sonho do animal); meu apelo extinguiu-se e novamente meu coracao parou, Mas entao houve 0 silencio. Nio veio replica alguma. Agucei 0 ouvido, porem nlIo percebi nenhum som. E que, pela primeira vez,
eu esperava a resposta que sempre me surpreendera, como se eu dela nao tivesse jamais tido a experiencia; e a resposta esperada nao veio. Mas eis que agora algo aconteceu comigo: como se ate entao eu na o tivesse possufdo outras vias de acesso entre 0 mun do e os meus sentidos a nao ser aquelas que passam pelos ouvidos, eu me descobria agora como um ser pura e simplesmente provido de sentidos, sentidos revestidos de orgaos e sentidos nus; ofereci-me assim ao espaco distante, aberto a toda recepcao, a toda percepcao. E entao veio, nao deste espaco distante, mas do ar bem proximo a mim, eis que veio, silenciosamente, a resposta. fa~~!.,a,y.l!rgade..l.!lIIl.na9_.Yeio, ela af eS,tllya.Elajii ai d e . e x p . li ca . ~ [ Q ,= _ l ID t e s _ d Q _ ~~t!lva.,::-._ a l _ v e z P9~1l.. di~a__gujsa meu.apelo: ela.estavasimplesmente af e deixou-seacolher por ruim.agora.que.meabn paraela.Eu a percebi de uma forma tio plena, como s6 percebera a replica nos meus sonhos anteriores. Se devesse relatar po r que meios isto se deu, seria obrigado a di zer: por todos os poros do meu corpo. Como somente 0 fizera a replica num dos sonhos anteriores, a resposta correspondia, respondia. E la ainda a ultrapassava numa perfeicso desconhecida, diffcil de se definir, justamente pelo fato de jii af estar. Quando eu tinha terminado de acolhe-la, senti novamente, com m a is p er cu ss ao do que nunca, aquela certeza: Eis que aeonteceu,
2. 0 Siiencio que e Comunicacdo I Assim como 0 mais ardoroso falar de urn para 0 outro nlio constttui uma conversacao (isto e mostrado claramente naquele \esporte estranho, denominado com justica de discussao, de fragmentacao, praticado por pessoas razoavelmente dotadas de intetecto), assim, por sua vez, urna conversacao na o necessita de som algum, nem sequer de um gesto. A linguagem pode renunciar a toda mediacao de sentidos e ainda assim e linguagem.
!
Nao estou me referindo, naturalmente, ao temo silencio dos amantes, interpenetrante, cuja expressao e conc6rdia podem satisfazer-se com urn olhar, mesmo com a simples comunhlo de uma contemplacao rica em relafoes. Mas tambem nio estou me referindo ao mistico silencio compartilhado, tal como se relata a proposito do franciscano Egidio e Luis de Franca (ou, de uma forma quase identica, a proposito de dois rabis hassfdicos) que, encontrando-se urna unica vez, nlo proferiram uma s6 palavra, mas, "na reflexao da face divina", experienciaram-se reciprocamente; pois ha aqui ainda a expressao de urn gesto, de uma atitude fisica de um para 0 outro. -/-
34
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
35
18/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Tornarei mais claro aquilo a que me refiro por meio de urn exemplo. Im~~m.se dois homens, sentados lado a lado, em algum lugar solitario do mundo. Eles nao falam urn com 0 outro, n[o olham urn para 0 outro, nem sequer se voltaram urn para 0 outro. Eles nao se conhecem intimamente, urn nada sabe sobre a vida do outre, conheceram·se hoje cedo em suas perambulacoes. Nenhum dos dois pensa neste momento no outro; nao precisamos saber quais os seus pensamentos. Urn deles esta sentado no banco comum da maneira que, obviamente, the e habitual: sere. no, disposto de uma forma receptiva para tudo que possa aeontecer; seu ~r parece dizer que nao e suficiente estar preparado, q~e e preciso tambem estar realmente ai presente. 0 outro, sua atitude nao 0 trai, e urn homem reservado, controlado, mas q~e~ 0 conhece sabe que desde sua infancia pesa sobre ele urn feitico, que 0 seu auto~ontrole e algo mais do que uma atitude, ~ue po~ tras de toda atitude esta entrincheirada a impenetravel incapacidade de se comunicar. E agora - imaginemos que esta seja uma daquelas horas que conseguem romper as sete tiras de ferro que envolvem 0 nosso cora~ao - 0 feiti~o dissolve.se de reo pent~. Mas mesmo agora 0homem nao diz uma palavra, nlo mo. ve.~ m dedo. E, entretanto, ele faz alguina coisa. A dissolu~[o do feItI~~ aconteceu-lhe - pouco importa de onde - sem sua a~ao; mas ers 0 que este homem faz entao: libera dentro de si uma reo serva sobre a. q ual ~mente ele tern 0 poder de a~ao. S em reservas, a comurucaeso jorra do seu interior e 0 silencio a leva ao seu vizinho, para quem era destinada recebe semencontro. reservas, como recebe todo 0ela destino autenticoe que que avern ao seu Ele nio podera con t ar a ninguem, nem a si mesmo, 0 que experi, encieu. 0 que "sabe" ele agora do outro? Nenhum saber e mais -' , ; Ii necessario, Pois ande a ausen!;JlI:qeJ:e~_Ieinollentre-DS.ho" . : l' mens, embora~.~_p_~a,:~~~~ _aconteceu a palavra dialozica de _------!.r:-----_ ;, uma forma sacramental." .1
~-
. -
•
~ _~ >_ •. _
, .• _ ,,~ ., . '_"'_"'
' __
~ _'
3. As Opinioes e 0 Fate Concreto
o di~og~ ~umano pode pois.tl~!s_ti~~s.eI~L9_S!gn_o,.l!pe_~~~. ter.neste, lsto e. nO.SOJIle.no.gesto, a vida que lhe.e.prnpria (a.; letra pertence ao campo do signo somente em casos especiais, como por exemplo numa reuniao, quando os amigos fazem circular entre si, pela mesa, notas descrevendo 0 clima reinante ); esta existencia sem signo, todavia, nao tern forma objetivamente
captavel. Por outro lado, urn elemento de comunicacao - por mais intimo que seja - parece pertencer a sua essencia, Mas, nos seus momentos mais elevados, 0 dialogo transcende tambem estes limites. Ele se completa fora dos conteudos comunicados ou i comunicaveis, mesmo os mais pessoais; nao se completa, no en. tanto, num acontecimento "mfstico", mas sim num acontecimento que e concreto no sentido estrito da palavra, totalmente inserido no mundo comum aos homens e na sequencia temporal concreta. Poderfarnos talvez estar inclinados a admitir a validade disto para 0 campo especial do erotico. Mas e justamente este campo que eu nao pre tendo trazer aqui para uma explanacao, Pois 0 Eros e , na realidade, muito mais estranhamente composto do que no mito geneal6gico de Platao e 0 er6tico nao e, de mane ira alguma, como tenderfamos a supor, uma pura condenacao ou urn puro desdobramento do dialogo, P elo contrario, nao conheco outro campo onde, como neste (voltarei a este assunto mais adiante), Q dial6gico_e_0 monol6giCQ_s_e_entIe1.a~mIlll!$t.amMm_ se choquem tanto urn contra 0 outr'?. Muitos extases de am~r famoSQs nlIo_-p.as.samde_um_gele!1!!r:~.g_Q_lillllill!~J!9_m ua~r_9: prias possjbiljd~d_e~,_!lt_u_alj.zad~s uma plenitude ~~~~it_a: Estaria ainda mais propenso a pensar talvez num recanto despercebido e no entanto significativo da existencia: nos olhares que, no tumulto da rua, esvoacam de repente entre desconhecidos que se cruzam sem mudar de passo; existem, entre estes, olhares que, flutuando sem destino, revelam, uma-a-outra, duas naturezas dial6gicas. Mas na realidade s6 posso demonstrar aquilo que tenho em mente por meio de acontecimentos que desembocam numa verdadeira transformacao d~,<:Qm~I!ica~aoem comunh[o, portanto numa _p~QIi.ficl!.~~_~a palavra diiiIOgiCa Nao podemos transmitir ao leitor, sob a forma de conceitos, aquilo de que aqui tratamos. Podemos, entretanto, representslopor meio de exemplos, con t anto que nao tenhamos receio, quando se trata de assunto importante, de procure-los nos mais fntimos recessos da vida pessoal. Pois onde mais podedamos encontrar exemplos semelhantes? Minha amizade com urn homem ja falecido originou-se num acontecimento que, se quisermos, poderfamos definir como uma c..onvers~ao jnterrompida. A data e a Pascoa d~ 1914. Alguns homens pertencentes a diferentes P?voseurope'!s tinhamse reunido para preparar, com urn tndeflmvel pressentimento de
36
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
37
19/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
catastrofe, uma tentativa de constituir uma autoridade supranacional. As c on ve rs ac oe s e ra m marcadas por aquela !1!~ "~ cuja fecundidade substancial eu raramente tinha experienciado de forma tao intensa; el a agiu de tal maneira sobre todos os participantes que tudo que era ficticio se desfez e cada palavra era urn fato. Quando entao discutiarnos a composicao de
que os dois sofrarn em comum 0 destino da nossa contingencia e que nele encontrem um-ao-outro.
urn cfrculo mais arnplo, do qual deveria proceder a iniciativa publica (foi resolvido que este c frc ulo reun ir-se-ia em agosto do mesmo ano), urn de nos, urn homem de concentracao apaixonada e de urn poder de arnor proprio de urn juiz, levantou a duvida: urn mirnero demasiado grande de judeus tinha sido nomeado, de maneira que alguns pafses seriam representados numa proporcao indevida por s eu s j ud eu s. R e fl ex oe s semelhantes na o me erarn estranhas, pois sou da opiniao que e 5 6 dentro de sua comunidade e naocomo membros dispersos que 0 Judafsmo po de tomar parte ativa,· mais do que meramente estimulante, na edifica~iio de uqt mundo firme de paz. Contudo, as considera~oes assim forrriuladas parecerarn-me prejudicadas na sua legitimidade. Judeu obstinado que sou, protestei contra 0 protesto. Nao sei mais por que vias cheguei a falar, dentro deste contexto, de Jesus e dizer que nos, judeus, 0 conheciamos do interior, nos impulsos e emocoes do seu se r judaico, de urna forma que permanece inacessivel aos povos que estao sob a sua egide. "De uma forma que vos permanece inacessfvel" - assim falei diretamente ao antigo padre. E le levantou-se, tambem eu estava de pe , olhamo-nos, urn no fundo dos olhos do outro. "Desapareceu", disse ele, e demo-nos, diante de todos, 0 beijo fraternal.
completar no terreno da "visao de mundo", mas sim naquele da realidade. Nenhum daqueles dois precisa renunciar a sua opiniao; s6 que, fazendo eles algo de improviso e acontecendo-lhes de im proviso este algo que se chama WliIg, eles penetrarn num reino onde nao e mais valida a lei da cpiniao. Sofrem tambem 0 destino da nossa contingencia, mas eles 0 honrarn na forma suprema quando, tal como nos e concedido, d ei xa m -n a d is so lv er -s e p or urn instante imortal. 0encontloja setinha dado anteriormente, quando, cada urn em spa aIma, voltou-se para-o-outro, de maneira que, daqui por diante, cadaum, tornando 0 outro presente, falava-lhe e a ele seQidgi8,veJdadeirarnente.
A discussao da situa~ao entre judeus e cristaos tinha-se transformado numa alianca entre 0 crfstao e 0judeu; w.tIl.1WlsfQUll~~Q!]~i:z.c?1!~~2..di~o. Opin!oes desa,par~~lI£l?nteceufisi£am~n~. giJ.tg cQW;rlUo.
ganar por sentimentos. 0 adepto de urna fe diferente, isto 1 5 , uma fe falsa, deve ser convertido ou, pelo menos, instrufdo; um cotato direto com ele pode ser conseguido somente fora da defesa da fe, nao a partir dela. Nao e permitido que a tese da discussao religiosa "desapareca".
4 . C olo qu ios em T orn o d a Religiiio
A esta objeyao, priedade de nao se espfrito relativizado, so posso responder
rosa.
Antecipo aqui duas objeyoes, uma ponderavel e outra pode'
A isto respondo: a experiencia da nossa limita~o esta contida nisto a que me reflro, como tam bem esta ai contida a experiencia da sua superacao comum, que certarnente nlio pode se
A outra obje~o, que vem de um lado totalmente diverso,· mesmo oposto, diz: isto pode ser verdadeiro dentro dos limites do terreno da opiniao, mas cessa de se-Io para a profissao de fe. Os adeptos de duas crencas religiosas que se disputam pelas suas doutrinas interessam-se pela execucso da vontade divina e nilo por um acordo pessoal, passageiro. Quem diante da fe tem urna postura tal que estll preparado a morrer ou a matar por ela, para ele nao pode haver reino onde nao seja mais valida a lei da fe. Cabe a ele ajudar a verdade a sair vitoriosa, ele nlio se deixa en-
cujo poder reside no fato de ela ter. a propreocupar com a falta de c?mpronusso do propriedade esta que e considerada natural, de uma forma adequada por um a profisslo
de fe.
e
possfvel que me objetem: onde se trata de opinioes essenciais, opinioes que dizem respeito a "visao de mundo", nao e permitido que a conversacao seja interrompida desta maneira; cada um tem que se expor de uma forma real e integral, na sua parcialidade humanarnente inevitavel e, justarnente por isso, experienciar-se realmente como um ser limitado pelo outro, assim
Nao tenho possibilidade de julgar Lutero, que recusa solidariedade a Zwinglio em Marburgo; ou Calvino, que propoe a morte de Serveto: pois Lutero e Calvino creem que a palavra de Deus tenha descido entre os homens de tal maneira que ela pode ser conhecida sem equivoco e que deve portanto ser representa-
38
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
39
20/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
da dentro de uma forma exclusiva. Niio sou desta opiniao; a palavra de Deus baixa diante dos meus olhos como uma estrela cadente, de cu]o fogo servira de testemunha 0 meteoro, sem faz e -lo ilu m inar - se para mim; e eu pr6prio s6 posso testemunhar a luz, mas n4'o posso produzir a pedra e dizer: "15esta aqui", Entretanto, esta diferenca de fe nao deve, de forma alguma, ser apenas compreendida como uma diferenca subjetiva; ela nao se fundamenta no fato de que nos, que vivemos hoje, somos fracos na nossa fe, e ela vai subsistir por mais que a nossa fe se fortale~a. A propria situacjo do mundo, no seu sentido mais serio, ou, mais exatamente, a rela~ao entre Deus e 0 homem, modificouse. E esta mudanca certamente nao 15compreendida na sua essencta quando se pensa somente no obscurecimento, que nos e t4'o familiar, da luz suprema, somente na noite da no ssa e xiste ncia, desprovida de revelacao, :e a noite de uma expectativa - nao de uma esperanca vaga, mas de uma expectativa. Estamos na expectativa de uma, teofania, da qual nada conhecemos a nao ser seu lugar, e 0 lugar chama-se comunidade.
0
Nas catacumbas publicas desta expectativa nao existe uma palavra divina singular que possa ser inequivocamente conhecida e representada, mas as palavras que nos 84'0 transmitidas manifestam-se paia n6s no nosso humano voltar-se-um-para-o-outro. Nao ha obediencia Aquele que vern, sem lealdade para com a sua criatura. Assim ter experienciado e 0 nosso carninho - nao urn "progresso", mas urn caminho. Uma epoca de geuninos coloquios religiosos esta-se iniciando, - nlo dos que assim se denominavam e eram fictfcios, nos quais ninguem realmente olhava para seu parceiro e nem a ele se dirigia, mas uma epoca de dialogos genufnos, de certeza para certeza e tambem de um a pessoa receptiva para outra pessoa receptiva. Somente entao aparecera a comunidade autentica, nlio aquela de urn conteudo de fe sempre identico, supostamente encontrado em todas as religioes, mas a comunidade da situa~ao, da angustia e da expectativa.
5. -
C otoca caod a Qu e stiio
o dial6gi.c..QJliQ.J.eJimitaaotrafego dQShQIDen.$.entJ!; .!t;Jll~6_
e as.sim_JlU_e_demol}$J{OU e r para n6s - urn comportamento
dQ~_ll~~ens.IJ.1l!.p!lr~~~m~~l?lltro!que 15apenas rep!~seI!Jlldo no sell_~ra~ego
Assim sendo, mesmo que se possa prescindir da fala, da comuni(!a~ao, ha contudo urn elemento que parece pertencer indls-
soluvelmen1e.-.a....constjtni!tac minima JlQ.__dialQgi~_.1l«9rdQ le.om se u pI6prio sentido:a re.ciprocidade da_a\l8o interior, Dais 'hoIIl!)Il§que est~o dialogicamente ligados devem estar _obyiatlle!1 I te voltados um-para-o-outro;,,gevem, portanto •.-::e;naolmFIta com que medida de atividade ou mesmo consciencra de atividade - ter-se voltado um-para-o-outro-
Convern adiantar isto de uma maneira tlio crua e formal. Pais, por tras da questao formuladora sobre os limites de uma categoria em d is cu ss ao , e sc on d e- se u rn a pergunta que rompe todas as formulas. 6 . O b se rv a r, C o nte m pl a r, T om a r C o nh ec im e nt o
Intima
. E valido distinguir tres maneiras pelas quais podemos pew:berurn hO!llemqu.~vive.diante dos nossos olh~~ (~ao me re?ro a' urn objeto cientifico, pois nao falo aqui de ciencia), 0 o~Jeto da nossa percepcao nao precisa saber nada a nosso respeito e nem saber da nossa presenca; e indiferente aqui se ele tern ~m relacionamento ou urn comportamento para com a percep~ao. G . . I J ~ T ' J ? m i I P . CJt~ iJl.teir.ameQ.te ..Cgn«entra,do.,em .& \y lJ I' na. ~V!!rn~nte.9 hornem q\1eobserva, er n "an~~lo··:~El.e ~ perscruta e .< > desenha. E na verdade ele se empenha ~IIl de~n4~ .!~tos "tXa,¥os" quanto possfvel, Ele os vigia para que nenhum _l!le.es~pe. 0 objeto e constituido de .tra~os e sab:-se 0 que es~po~,~r# ~dll),l.w ~e.l~~.g.conhe5~e.~t? d9S1~tepta h~Jn!!!~e~. preSSa Q assimila sempre de Imediato as n()va,~,YW$l~~ .wQiyi-
duais aparecem e de permanece ~tilizavel.~a~!.!n~~ l.!lllro~tonada mais eque do que uma fisionomia, os movimentos do do quegestos expressivos. pcen~(adQI W e Q u e I b e ",Mite let a 9 W s : tg l jy r e m e u te Ml~Al!.Il!~'lj; ~<> ~.
.
ft~"il....
l
~ ~slZe,a ~s12!e2IilJ»l!-1l,Q.~·~ e J .l: ~ .~ '-_ .-. ' inicio 2Pde.J¥I ggy'~ J?el~ ~t~~~
p.V!ntaTd
56
DC
.
Ki!!.~tJ!l·
~ih!ll!Sigl_Iit~n!2,~.<1~, . 1f!~S9HmlP~IDU~$,Jl~tt=
·~ra~&
§ . .g u!l.~c\e.r,. !! ~~.~,ta}.~~,g~..!~~..~.2J~~ ..... !Qtra. b . a l b o om Y,lZele) Nao imooe taieTas a mem ._.." ,;;,;,.........I I I . .. JMI 'I'I! organic~l d e s t a : c o Q S G P ' A Q o · Niio recolhe como 0 faz 0 obserV'iiQ"Of,agramacomo se ela fosse fo!ragem, ele a revolve e deixa que 0 sol a il~e. tiIQ ~, alenc1M2 a tracos, ("Tra~os", diz, "enganam".) 'yal~nn pp QR!fl2..ogue,.. nao e" at rn e nem "ex resd ". ( 0 l.nteressante ,dlZ ele, 0 os os grandes artistes eram contempla"nao e importante.
gUe"~~;i.~=-iie~~~';¥$~ 9,
dores.
40
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
41
21/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Existe, no entanto, uma percepcao que cididamente diferente.
e
de uma especie de-
o observador e 0 contemplador tern em comum 0 fato de os dois terem a mesma posicao, justamente < J desejQ.cl~JUmt.eJ2.~r 9A9lDem,.~.'dy~diallt, dQ§ D2§soSo1hQ~;Q!LlWl!..~_I!l~~~!e su~s pew PimW_~K1?!lf~,a~!l1J2r2Rti.~~~s ~a~ peMQAi~.,w..~qM'pQJ:,~,po~e se.rpe.fI.;rbido "de lUna. waPj~jta certa"; 0 Qlleeles experienciaro desta forma, seja ela uma soma de traces, como acontece com 0 observador, ou uma existencia, no caso do contemplador, na9~~g~A~Irs.Jlw.bU!;tlU~ $. l U ; W lbli~mRSie.~slillQ. a J i W P ' ~~l~ri~. tudo s e p a M a nos campos dj~pUi:ta~~~
e
As coisas acontecem de outra maneira quando, numa hora receptiva da minha vida pessoal, IlD"QOtta-Wc um homem em
pessoa, quem sabe em que idioma; e 0 que importa agora e unicamente que eu me encarregue deste responder. Mas em cada instancia aconteceu-me uma palavra que exige urna resposta. Chamemos esta forma de perceber de tomada de conhecimento intimo. Aquilo de que tomo conhecimento fntimo nlo precisa ser, de forma alguma, urn homem; pode ser urn animal, uma planta, uma pedra. Nenhuma especie de fenomeno, nenhuma especie de acontecimento e fundamentalmente exclufdo do rol das coisas atraves das quais algo me e dito todas as vezes. ,tja l1a lu u lc a e.l.e :
,gg~be4~
~~~R~YJi~.,.QiJ.iwiteSR.~
~2 , _ , , ~~a. C Wl sl iI D J ! ~1 ~~PiU , g ~e . , 9 ~< ! Q ~. · ~~cimento§ intJw2. Z O s S ig n o s Cada urn de nos esta preso numa couraca, cuja tarefa e repelir os signos. Signos nos acontecem sem cessar. Viver significa ser alvo da palavra dirigida; nos s6 precisar.famos tomar-nos pr~sentes, s6 precisariamos perceber. Mas 0 t lS CO nos e por d.em~s~rigoso, trovoes silenciosos parecem ameacar-nos de aniquilacao: e aperfeicoamos, de gera~ao em gera~ao, 0 aparato de defesa. Toda a nossa ciencia nos assegura:
~eTJa~-=~$:~;~~~i~~~~:'1:x,::=~ rna que esta coisa me diga como este homem e, 0 que se passa nele ou coisa semelhante. Mas significa que ele diz algo a mim, ~,iI.1iQ ilm i m i fiUuA&.9..Sl\l~<~e,introdll;{ d ~ Q 1W a U P i n b a ~,-. Pode ser algo sobre este homem, por exemplo que ele precise de mim. Mas pode ser tambem algo sobre mim. 0
~~,.,~~,.mim~.!1I1,~.i\J~m-:a
C om
,esledizlil; ele nao tern conduta alguma para comigo, v,s.r. certamente nem me percebeu. ~, como aquele homem solitario que confessava silenciosamente seu segredo ao vizinho de banco; ~ ~ t d iu m a . (; Q W l .Q . U e gQi.z. Quem compreende aqui 0 "dizer" como uma metafora nlo esta compreendendo. A frase "isto nao me diz nada" desgastouse metaforicamente; mas 0 dizer a que me refiro e uma linguagem real. Na casa da linguagem ha muitos compartimentos e este e urn dos mais fntimos,
o efeito de ter sido 0receptor deste dizer e totalmente diferente do efeito de observar e de contemplar. Nlo posso retratar nem descrever 0 homem no qual, pelo qual, algo me foi dito, nada posso contar sobre ele; se tentasse faze-lo, ja seria 0 fun do !igo 11ver homem 010 J .W£Il-._Q.bj"Q~~~iY~L'!'!~!,
ro m e rei§·wTalvez dizer.
tenha que realizer algo nele; mas talvez apenas tenha que aprender algo e s6 se trata do meu "aceitar". :e possfvel que eu tenha que responder imediatamente, justamente a este homem diante de mim; e igualmente possivel que 0 dizer seja precedido de urna transmissao longa e multipla e que eu deva responder num outro lugar, num outro instante, a uma outra
S e tranqu ilo, tud o ac ontece da forma c omo tern qu e a contecer, mas nada e dir igido a ti, ni o se t rata de ti; este e simplesme~te "0 mun~o" . tu podes vivencia-lo como queres, mas 0 que quer que seja qu~ em tl .d~l~
f~as, prove m d e ti somente; nada da, tudo e silencio.
e
exigido de ti, a palav ra n ao te
e
dirigi-
Cada urn de n6s esta preso numa couraca que, gra~as Ii for~a do habito, deixa logo de sentir. Sio apenas instantes q~e atravessam a couraca e que incitam a alma Ii receptividade. E quando tal instante agiu sobre nos enos tomamos entao atentos, perguntamo-nos: "Que e que aconteceu ai de peculiar? Nlo era algo semelhante ao que me acontece todos os dias?", entso podelll:0s nos responder: ~dQs ~ dii§.
~ml:llt.e..~.a"~l~i.i!' '
.-.:..
Q~~~,~1k
:;u::;;~
t
sA:fll!
Q!
PlJiVU.=~it~~~f;
!r!lQ~~w.~n9,...~ QWrse~-.
~~g~..¥'"'$Pl~,.
i l Wn Wl W
3!lQlQ!.!{ a U " S S Q t e S
~~
lh.."p.
~R£ e
~!!i9: @ _II,rJ!,~W !~~,,$wW ilUUt'lSjLD~ ram.~ll7i:m a~os ~i'!.,~M,,¥~~G.S~.~~Jl.2ss.>s , ... I~.21.o!t.".....i., Q!lJ,,~,pp~a.,@ "U,lijQII&J,Wap'!{~,~~~a;n;
42
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
43
22/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
~quilQ
QUt: m~
as;ontes;e e..~ilyU~quecJUe~e.,dirigida.
Q!WltQ.£~,!l§.Q,W:,~.Jl~.QS~to$d9
En-
mun.doSiQ_-
vJ;~.me1~.,~~..Q.UiUldo.eu.~~~e.p •..e li~ll~.e3,-'tgWll& ..da.RmaYr~.Qiri&W.a~'·QMe~~$mgerJI,Qy,ijQ.. qu,e )lle.~QDjec~ C9m9.JI,ma..~e.y~U'p 0sistema interligado, esteri~. l l J ! Q . ~, Q ~U o . lizado, no qual tudo isto s6 precisaria ser inserido, e a obra titdnica da humanidade. E a linguagem, ela tambem, foi colocada ao seu service. . Ser-me-a objetado, do alto desta torre dos tempos, - se algum dos seus guardiaes der qualquer atencao a tais vias de pensamento - que nao passa de uma especie de supersticao primitiva crer que os fen o men os c6smicos e tehiricos tenham uma significayao inteligfvel e direta para a vida da pessoa humana. Porque, ao ~ves. de comereendermos fenomeno bioI6gicapois ou sociologicamente (para 0 que urn eu tenho muita ffsica, consideracao, sempre tive a tendencia de admirar atos de pesquisa autentica, quando aqueles que a fazem sabem realmente 0 que estao fazendo e nlo perdem de vista os limites do campo em que estao se movimentando), procurarfamos, de acordo com a objeyao, chega r por tras da suposta significaylo do fenomeno, significayao para a qual nao ha lugar num continuum espaco-temporal do mundo que obedecesse as leis da razao. Assim, inesperadamente,
teria eu caido na companhia de
adivinhos, de quem existem, como se sabe, variedades modemas dignas de atencjo, Mas, trate-se da leitura do figado ou das estrelas, seus signos tern a peculiaridade de estarem contidos num dicionario, mesmo que nfo necessariamente num dicionario escrito. E, por mais secretamente que seja transmitida a informacao, aquele que esta a sua busca sabe orientar-se nela, sabe quais as mudancas nas conjunturas da vida que ora este, ora aquele signo significam; e, embora 0 encontro de varies signos de especies diferentes apresente dificuldades especiais de esperar e combinar, ha uma possibilidade de "consulta", A caracterfstica comum de todas estas praticas e ser "para sempre": elas permanecem sempre iguais, seu resultado foi verificado uma vez por todas; suas regras, leis e conclusoes anal6gicas slio universalmente aplicaveis. 0 que e chamado comumente de supersticao, isto e, uma falsa fe, parece-rne muito mais urn falso saber. Da "supersticao" relativa ao numero treze, uma escada ininterrupta conduz as alturas mais vertigino-
sas da gnose; isto nem chega a ser uma imitacao simiesca da fe verdadeira. a..f e verd ad eira - se assim me for permitido denominar 0 nosso estar presente e 0 perceber - m.j'£~j:~qJlMdp termina.a c;onsultaaQ,cij.cioJll1rio. quando este IS deixadQ Q a lado. 0 gID} ijle. a c O l l te s ; e . d . i z - a l g Q . . » . . 1 o l l . i 1 . l .l _
mas 0 que el e me diz n a o pode ser revelado por nenhuma informacao secreta, pois este algo nunca tinha sido antes pronunciando e nem e composto de sons que ja tivessem sido pronunciados. El~e tamQouCQjnterpreH'ld, .< a m ; W wraduzlxel~Ne,xp~-JQ~UI.~~PQW>
d~I!§UMg,;.Wli~
niP .&~~Ql¥~~
J ! . J l l. . Q 1 J e . •~
w~s
~ urn sUzer W te pen etm ll em mmha.Ylda; nao e uma expenencia que possa ser recordada independentemente da situayao em que se tenha dado; e algo que permanece a palavra pronunciada, a palavra daquele instante, que nao pode ser isolada; ela permanece a pergunta de urn questionador, pergunta que exige sua resposta.
(A pergunta. Pois e [ustamente este 0 outro grande contraste entre todo 0 conjunto de signos de interpretacao arbitraria e a linguagem de signos a que nos referimos aqui: est~ linguagem nunca e informaeao, nunca e decisao, nunca ISapaztguamento.) A fe esta na corrente do acontecimento unico, sob 0 teto do conhecimento. 8:10 Indtspensaveis para 0 trabalho do espirito humano todas asestruturas de emergencia da analogia e da tipologia; mas seria uma fuga penetra-las quando a pergunt~ do .interpelador dirige-se a ti, dirige-se a mim; ~ ~Irente qu e se aperienQii e s e reaUZ:ia xW yiyia,.. Com todo 0 respeito ao continuum espayo-temporal do mundo - na vida conheco unicamente a realidade concreta do mundo, que me e oferecida constantemente, a todo inst~tc:. Posso decompo-la em seus elementos constitutivos; posso distribuir estes elementos, comparativamente, entre grupos de ~enomenos semelhantes, posso deduzi-los de fenomen~ antenores, posso reduzi-los a mais simples, - e, depois de tudo .1~tO,n~o terei tocado na minha realidade concreta do mundo. m~~1Siv:, incomparavel irreduzfvel, ela me olha com 0 olhar hom.pilan , olhar que acontece uma s6 vez. Assim, no bale de Stravmsky, ~ diretor do teatro ambulante de marionetes quer mostrar ao ~blico da feira que 0 pierre que 0 assustava era apenas urn mo . 0 de Pilha, vestido; rasga-o em pedacos e cai, cambaleando, pois, sentado no teto da barraca, zombando dele, esta 0 Petrouchka
vivo. 45
44 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
23/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Q ...m > m e ver~ !2 .el[Q ~_ .~_ ~ ll.lJl!lg,gj: a sria~ woofjad a a tuim cQpfjada a ~agj S~l tUl,mang.. De!l!!0_£~!~1:l0S ~.do~.Qlsi~QS.cl?p.~:vaJl!!t:.1JQu.~![!&!c1.!:.... 8 . U ma C on ve rsiio Quando eu era mais jovem, 0 fenomeno "religiose" constitufa-se para mim numa excecao. Havia horas subtrafdas ao curso normal das coisas. De urn lugar qualquer, perfurava-se a salida crosta do cotidiano. Fracassava af a constancia fidedigna das aparencias; a agressao que se dava rompia sua lei. A "experiencia religiosa" era a experiencia de uma alteridade que nao se enquadrava dentro do contexto da vida. Tudo isto podia iniciar-se com algo corriqueiro, com a observacao de qualquer objeto familiar, mas que ai se tomava, subitamente, misterioso e ameacador, penetrando, por fim, transparente nas trevas do proprio misterio, com sells relampagos fulminantes. Mas era possfvel, no entanto, que 0tempo se rompesse de imediato - desintegrava-se primeiro a estrutura salida do mundo, em seguida a certeza de si mais solida ainda; e 0 ser, 0 ser sem substancia, que agora erase somente mas que' nao se sabia mais, este ser era entregue a plenitude. 0 fenomeno "religiose" destacou-o, elevando-o. Do lado de Ii i havia agora a vida comum com os seus negocios; mas aqui reinava libertacao, revelacao, extase, sem tempo, sem sequencia. A pr6pria existencia do individuo abrangia entao urn aqui e urn alem, entre os quais nao havia outro vinculo a nao ser o momento afetivo da transicao, A ilegitimidade de tal divisao da vida temporal, cujo curso e dirigido para a morte e eternidade, diante das quais ela pode se realizar somente enquanto realiza precisamente a sua temporalidade, me foi revel ada por meio de urn acontecimento do dia-adia, um acontecimento que julga, que julga com aquela sentenca pronunciada com Ii i bios cerrados e olhar im6vel que e do agrado do curso normal das coisas.
o que aconteceu nada mais foi do que isso: certa vez, apos uma manha de entusiasmo "religioso", recebi a visita de urn jovem desconhecido, sem que eu estivesse ai presente em espfrito. Alias, eu nao deixei de acolhe-lo amavelmente, nao 0 tratei com descaso maior do que a todos os seus contemporaneos que costumavam procurar-me a esta hora do dia, como a urn Dracula acessivel a uma discussao; conversei com ele de uma forma atenciosa e franca - e deixei apenas de adivinhar as perguntas que ele nao colocou. Fiquei conhecendo 0 conteudo essencial dessas
perguntas mais tarde, nao m~i~o te~po depois, de ~m ~igo do , vern - ele proprio ja nao VIVlamats; soube que tinha vmdo a JOmim, levado nao pelo acaso, mas pelo desti - em, b usca d e ,e~tmo, n~o uma conversa informal, mas de uma decisao: ele tinha vmdo precisamente a mim, precisamente aquela hora, Oque e~e!.a.mQ~ ~~,me.sJllOassim, pr?curamos alguem? ~.~!~_Q.s £91~.m~I1te uma p~esen~a, por meio da qualnos.e~h-
nQs,,"and~~.~~ra40s
to que de, 0 sentido, ainda existe. Renunciei, desde entao, aquele fenomeno "religiose" que nao passa de uma excecao, de um realce, de ~m destaque. de urn extase; ou ele renunciou a mim. Eu nada mais ~o~suo a nao ser 0 cotidiano do qual nunca sou afastado. 0 miste~lO na~ se revela mais; desapareceu ou entao instalou sua moradia aqui, ~nde tudo se passa da forma como se pass~. ~a:~ conheco mais ~~tra plenitude a nao ser a plenitude da exigencia e da responsabihdade de cada hora mortal. Longe de estar a sua altura, sei entr~~anto que na reivindicacao sou reivindicado e que na responsabiltdede me e permitido responder; e sei quem fala e quem exige uma resposta. Nao saberia dizer muito mais. Se isto for religiao, ~n~~oela e simplesmente tudo, 0 tudo singelo, vivido, na sua posstbilidade de dialogo. Ha tambem aqui espaco para as mais altas formas da religiao. Como quando turezas e .com.isto ..n a o te.afastas.desta.1ua vida, mas~pel0 cOl1tnlIi~§.iu~tamente..n.U)receque.Q~U~' . t: I em que sela apenas para entrega-la; aSS1m . . • _R ... !!!,~l9 se ret ere a e a, n . "'Y.I.... 'es tambem no inaudito ..e nos1;1rpre!lIldente, quando •. de,,~~~- a - .... chamado, es requisltado, eleito, investido de p~deres, .:e n~.!l.'!,?:j~. it ti, com (:s!e..teu pe_
9. Quem FaIa? , 'd a nos Sign . os da vida que nos aconteA palavra nos e. diingi ceoMas quem fala? , , ' voclibulo "Deus" 1 h a de De nada nos servina colocarmos aqui 0 d OS do interior fize aque a or como resposta, se nao 0 lZessem f b igados a esquecer cisiva da existencia pessoal, em que omos 0 r nao nos foi pertudo que acreditlivamos saber de Deus, em que 47
46
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
24/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
mitido conservar nada de transmitido, nada de aprendido, nada de por nos mesmos imaginado, nenhuma flapo de saber, hora em que fomos mergulhados na noite. Quando dela emergimos para wna vida nova e e nt so c om e ca mos a receber os signos, 0 que podemos saber de que - de quem no-los da? Somente 0 que nos mesmos experienciamos, todas as vezes, atraves dos pr6prios signos. Se chamamos de Deus 0 emissor desta linguagem, entao ele e sempre 0 Deus de urn momento, urn Deus do momento. Quero utilizar-me agora de urn exemplo canhestro, ja que nao conheco nenhum apropriado. Quando compreendemos realmente wna poesia, tudo 0 que conhecemos do poeta e apenas aquilo que dele ficamos sabendo atraves deste poema - nenhwna erudiyao biografica e de para a ~ompreensao pura da materia a ser compreendida: valor 0 Eu que no'Sinteressa e 0 sujeito desta poesia singular. Mas quando lemos da mesma forma autentica outras poesias deste poeta, u n em - s e e n ta o os seus sujeitos em toda a sua multiplicidade, completando e confirmando-se reciprocamente, para formar a unica existencia poliIonica da pessoa. Desta mane ira, daqueles que dispensam os sign os, dos que pronunciam as palavras na vida vivida, dos deuses do momento, constitui-se para nos, por identidade, 0 Senhor da voz, 0 Unico.
10. Em Cima e Embaixo
o em
cima e
0 embaixo
estao ligados um-ao-outro, ~-
X!t!,4lap.~I~~9JU tqJ.W .f~';c om.os40we.9~,~m[!HI!! .e9P.Q~_s, na:Q~.r.!(Jl,Uza;_!f1asa Plllavz:;tdaquele que quer f il l S ! com Deus, se m f~.~9m,()~,bo~Il$, extravia-se. • Conta-se que urn homem cheio de entusiasmo por Deus saiu certa vez dos domfnios das criaturas e passou para 0 grande va zio. Perambulou por ai, ate chegar Ii porta do misterio, onde ba teu. Do interior, veio-lhe a voz: "0 que queres aqui?" "Eu proclamei louvores a ti, nos ouvidos dos mortals", disse ele, "mas eles estavam surd os para mim. Venho entao Ii tua presence, para que tu pr6prio me escutes e me respondas". "Volta para tras", veio a voz do interior, "aqui nao ha ouvido para ti. Mergulhei meu ouvir na surdez dos mortais", ~~!g~Ji~i.mmmte,dirigida por.Deus envia QhQrn.emao .espaco.da .linguagem vivida, onde as vozes das cri!lwras
pass~m uma.perto da. outra e, tateando, conseguem alcancar, pre~~~enteJIQ
11. Responsabilidade
o conceito da responsabilidade precisa ser recambiado, do campo da etica especializada, de urn "dever" que flutua livremente no ar, para 0 domfnio da vida vivida. ,Re$J)Onsahilidade ~ e . ! ! . \ . l U J 3 86 exiUe Q11~ste.ve~onW vetds!
J ;;~ 'I I U P &Y a& S lW
.,'
_,
Espera-se entao do homem que esta atento que enfrente com firmeza 0 ato da criayll'o. Este ato acontece na forma da pa lavra, niIo da palavra que passa voando sobre nossas cabeyas, mas de um a palavra que e dirigida precisamente a ele; e se um individuo perguntasse a urn outro se ele tambem esta ouvindo e este r es p on d es se . afirmativamente, teriam eles concordado somente sobre uma experiencia e niio sobre algo experienciado. Entretanto, os sons pelos quais e constituida a palavra - re- / pito isto a fun de afastar urn mal-entendido ainda possiv~l, q~e l consiste em crer que esteja me referindo a algo extraordin~~o, ( de dimensoes sobrenaturais - sll'o os acontecimentos do cotidia- .' J . no da pessoa. E- neles, como siio agora, "d" gran es ou. "eqe p uenos", que nos e dirigida a palavra e aqueles que slIo tidos pOI grandes nao fornecem signos maiores que os outros.
48
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
49 25/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Contudo, nossa atitude ainda nao esta decidida pelo fato de tomannos conhecimento intima dos signos. Resta-nos sempre a possibilidade de nos envolvermos no s ile nc io - urn resposta que caracteriza urn tipo significativo dos nossos tempos - ou de nos esquivarmos, refugiando-nos no habito; apesar de, em ambos os
da palavra a que esta respondendo - ele 0 conhece na substancia da palavra que, pressionando, penetrando, assumindo a cadencia de uma interioridade, move-lhe 0
casos, sermos atingidos por urn ferimento que nenhuma produtividade e nenhum atordoamento farao esquecer. Pode accntecer, entretanto, que nos atrevamos a responder, talvez balbuciando; a alma raramente con s egue alcancar uma articulacao muito firme; mas e urn balbuciar honesto, como se, apesar de 0 sentido e a laringe estarem de acordo sobre aquilo que deve ser dito, a laringe estivesse demasiado assustada para emitir, de uma forma pura, 0 sentido ja ordenado. Da me s ma forma que a palavra dirigida, as palavras da nossa resposta sao faladas na linguagem intraduzivel da ayao e da om issao - onde a ayao pode comportar-se como uIIlf omissao e a omissao como uma ayao. 0que assim dizemos com 0 nosso ser e 0 nosso penetrar na situacao, no seu interior; ela, que s e apresentou a nos agora mesmo, cuja aparencia na o conheciamos e nem podiamos conhecer, pois, ate agora, semelhante a ela nenhuma outra existira.
Nao se pense, no entanto, que eu torno a moral questionavel a fun de glorificar a religiao. A religiao, certamente, tern sobre a moral a vantagem de ser urn fenorneno e nao urn pos tulado e, mais, de poder encerrar, alem da deterrninacao, tambem a serenidade; a realidade da moral, a exigencia daquele que exige, tern lugar na religiao; mas a realidade desta, 0 ser incondicionado daquele que exige, nao tern lugar na moral. Entretanto, quando a religiao se satisfaz a si mesma e se afirma, torna-se muito mais duvidosa que a moral, justamente por ser mais fatual e mais englobante. Religiao enquanto risco, prestes a entregar-se a si mesma, eo fluxo arterial que alimenta; enquanto sistema, possessiva, assegurada e assegurando, religiao, que acredita na religiao, e 0 sangue venal que cessa de circular. E se nada como a moral pode mascarar tanto a face do nosso proximo, a religiao pode, como nada, mascarar para n6s a face de Deus. La o principio, aqui 0 dogma - eu sei apreciar a densidade "objetiva" do dogma, mas por tras dos dois esta Ii espreita a guerra - profana ou santa - contra 0 dominio dialogico da situayao, esta Ii espreita ou uma-vez-por-todas, que resiste ao momento imprevisivel. 0 dogma tornou-se a forma mais alta de imunidade contra a revelacao, mesmo quando sua reivindicacao
N6s nao conseguimos domina-la agora, a isto fomos obrigados a renunciar; nunca e possivel dominar uma situayao da qual tomamos conhecimento fntimo, Mas nos a subjugamos, incorporando-a na substancia da vida vivida. Somente entao, fieis ao momento, experienciamos uma vida que e algo diferente do que uma soma de momentos. Respondemos ao momento, mas respondemos ao mesmo tempo por ele, responsabilizamo-nos por ele. Uma .wJidade concreta"do Dllmdo..Jl.Q_Y..lWWl!~sJi~Jla1Joit!2§ cglpcada W br~Qs; U Q ~..w .D Q 1 !!!~m 2§ . ,pOI~,eJg.",JJm.cao ~"JLa,mJjJ Jll mSPQ!l~§.l1~lQ.~Jl.J~1b.,ClIil1mli PJ1~tn \l,.i m . t s t t i a . om e d.!;,J,j,""ty,J:~~qI)4~~,~lll.
quanta Ii sua origem permanece incontestada. A r ev e la ca o nao quer tolerar 0 "perfeito" de urn preterito, mas 0 homem, levado pelos artificios de sua mania de seguranca, impele-a para a rigidez da perfeicao.
12. Moral eRe/igi5o Uma responsabilidade que nao responde a uma palavra e uma metafora da moral. FatuaImente, responsabilidade existe somente quando existe a instancia diante da qual me responsabilizo e a auto-respons abilidade tern uma realidade somente quando 0 "eu-mesmo" diante do qual me responsabilizo penetra transparente no absoluto. Mas quem pratica a responsabilidade real, a responsabilidade dial6gica, nao precisa nomear 0 emissor 50 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
51 26/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
2 . L IM I T A yA O
1. O s D om i ni os Os domfnios da vida dial6gica e da vida mono16gica nlo coincidem com os do dialogo e do monologo, mesmo se nestes incluirmos suas formas sem som e sem gesto. Nlo existem somente grandes esferas da vida dial6gica que na sua aparencia nao sao dialogo, mas existe tambem 0 dialogo que nao dialogo enquanto forma de vida, isto e , que tern aaparencia ede urn dialogo, mas nao a sua essencia, Alias, parece, as vezes, que esta ultima especie e a tinica que ainda existe. Conb~Q t e e s e s p e c i c s Ik.l1i~geo· oau,enticp lI«u.jmpgrQ uae < : : a d a ym do~ciRjUltes ta s e fa!;I~Q ou sil$ (uQ ioSQ tern cklalo em me,nte 0 Dutro oy os pUltpS O f sua presepca e ~,Jc;.1!
53 http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
27/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
,lJlO dQ d,e,~er e.l.rltl.~yoI!.1J_~ jnteP(i® de es~ entre eles e si p ro Ud Q ~ cip ro cid id e v iv a,j. ,~ iQ ._ tec nic _Q .jll1 J~ ,e \ ' \..I JlO Vi dou nica me nte ge la ne ces si d2de ~Y. Ul e nte nd 4P .s nto ~ ~ tjVOje 0 m o n ol og o d is fa rc ad o ~ d il il o~ o ,. ~ ,! 1 de 2 . 2 !~ . .. ? ~m _ a .! s. ._ l i~ ~!l~4!,ll.!0~~fli1~ ....o §_~~~~ ~ns i B2_~me s m~E9r
j jtarja pe la s mQt! t.a nba he ~l W l .....e _'~" ,Ql.! j,g~~." p.te _}m~, . tW a e m m e ta m Q 1; .fg S Csdg O utNS W £ 0 "QIJUCWiI. A q uele q ue vive um a vida m onoI6gica nunca perce b e 0 outro com o algo que, ao m esm o tem po, nao e ab solutam en te ele p rop rio m as com q ue eIe, assim m esrn o, se com un ica. A solid lio p od e sig nifi-
cre~m ~~Q sc §_tg,.~_9S~~~e.~tr~.~p,ll:.~n.!!eT ap ad o! c on tuaQ J ao foq nen tod e ~i~s tel Q ue c on t ar eaeen as c....!er o,J !.l QS. mOI!uQ,s [~.illtq&C om o e u d iss e, a p rim eira especie de dialog o t or n ou -s e rara; onde eia surge, por m ais "nao espiritual" qu e s ej a s ua f or m a, t ra z 0te ste m un ho d a p er pe tu ac ao d a s ub sta nc ia o rg an ic a d o esp irito h um an o. A seg un da esp ec ie faz p arte d os seus b en s es se nc ia is e in alie ru iv eis d a " ex isten cia m od em a" , em b or a 0 d ialog o v erd ad eiro ain da aq ui se escon da em tod a esp ec ie d e rincees e s ur ja o ca si on aI m en te , d e u rn a f or m ain co nv en ie nte ;m a is f re quentemente to le ra do c om arrogancia d o q ue realm en te esc an d aliz an do, ap arey 'e talv ez n a ton alid ad e d a v oz d e urn c on dutor de trem , no olh ar de um a velha v en ded ora de jornais, no sorriso d o lim pad or d e c ham in es, E a terc eira ...
car para ele um a m ultiplicid ad e crescente de rostos, de pensam en to s, m as n un ca 0 r el ac io na m en to p ro fu nd o, c on qu is ta do n urna nova profun didade, com 0 i nc o m pr ee n si ve lm e n te v e rd a de iro o Na ture za e para ele ou urn etat dame. p or ta nto u ma " viv en cia" em si p r6p rio, ou u rn ob jeto p assiv o d e c on hecim en to, id ealistic am en te d ota do d e alm a o u r ealistic am en te alie na do ; e la nao se transform a para ele num a p alav ra, a ser ap reendid a por m eio d a c on te m pla ca o e d a s en si bili da de . A exjstepcia W W Q & i l j i l r e" e. b e. . m e s P lS 2 ~ n o, u mD se n~ a£ lI o a§w~~~AJ.~o.W~
e ~ nl JU 9 p .b a nd S l..a
em -
~a~~~:~iii
U rn debate, no qual os pensam entos na o sa o e xp re sso s d a form a em que existiam na m ente m as que, no ato de falar, sao tlo agucados que pod em acertar 0 p onto m ais sensivel e isto sem se c on sid erar os in div fd uo s c om q uem se fala co mo p esso as p r es en te s; u m a conversacao, q ue n ao e d eterrn in ad a n em p ela n ecessidad e de com unicar alg o, nem por aquela de aprender algo, nem de influenciar alguem , nem de entrar em contato com alg uem , m as e d eter min ad a u niea men te p elo d es ejo d e v er c on fir -
N ao se d ev e c on fu nd ir e ste c on tra ste c om a qu ele im ag in ad o p or a lg un s m or alista s e ntr e "egofsmo" e "altrufsmo ". Conheco p essoas q ue sao ab so rv id as p ela "atividade social" e q ue nunea falaram com urn sem elhan te de hom em para hom em ; e outras, qu e na o te rn r el ac oe s p es so ai s c om ninguem a na o ser c om s eu s inim igos, m as que tern com eles urn tal relacionam ento que e unieam ente por culp a deles se 0 r el ac io na m en to n li o e vo lu i p ar a u rn di al 6gi co .
m ad a a p rop ria au toc on fian ca, d ec ifran do n o outro a im pressao d eix ad a, ou d e te-la reforcad a q uan do v ac ilan te; um a c on versa am istosa, na qual cada urn se v e a si proprio com o absoluto e legftim o e ao outro com o relativ izad o e questionavel; urn coloquio am oroso, em que tanto urn parceiro quanta ao outro se reg oz ija n o esp len do r d a p rop ria alm a e n a su a v iv en cia p rec iosa: - q ue subm undo de fantasm as se m rosto!
M u ito m e no s a in da p od e- se e qu ip ar ar 0 d ialo go ao am or. E u nao sei de ning uern, em tem po algum , que tivesse conseguido am ar a todos os hom ens q ue encontrou. M esm o Jesus am ou, m an if es ta da m en te , e nt re o s " pe ca do re s" , s om e nte o s d es pr en d id os , os amaveis, os que pecavam contra a Lei, e nao os tmpermeaveis, presos aos seus patrim onios, que pecavam contra ele e a sua m e ns ag em ; n o e nt an to , el e p e rm a n ec ia n u m r el ac io n am e n to direto tanto com os prim eiros com o com os ultimos. A dia16gica n ao p od e serequiparada ao amor. ,a . 6 'ea 's e v e-si-e -d'
A v id a d ialog ica n ao e um a vida em que se tern m uito aver . com os hom ens, m as e um a vida em que, quando se tern aver I c om os h om en s, faz -se isto d e um a form a v erd ad eira. N lio e a v id a d o h om em solitario q ue d ev em os c ham ar d e m on olog ic a, m as daquele que nllo e cap az de atualizar, de um a form a essencial, a so cie da de n a q ua l 0 s e u de stino 0 fa z m ov er -se . S om en te a so lida o e capaz de m ostrar a natureza m as intim a do contraste. A guele Q ue v W : s :l ia lo i !ca me nl e , ru gyma cQi sa e d ita n o a ec or re r JW ljtyJll 9aJ_~~d2 a te~llonder; e W es lll9
~~.,~:_!~!~,!!:.?'.~J!~ ..~~!P.e!.?'!'}!~~w.1?~~~~:
I
WQ[
i U di 90 S
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
\
.
. i. !! p $1 n ~ ~J W 1 _ e' !~ . 9. ~ 9; ~ .~ . ~U ; lI :! l~ ~ =
e.k.se... r ~ tJ ~ U ~ .J 1 Q I. .q u ~ m ~i Q ~ .. £ ~ ~ .~ ! ~ ~1 J m .J l2 m e m .. ta n "
54
'I
.. .- :. . 55
28/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
o que e dito aqui e 0 oposto verdadeiro do grito pela ausencia total de reservas, ouvido, asvezes, no crepusculo das epocas.
emerge esta pessoa singular e transforma-se numa presenca; e eis que, na nossa percepcao, 0 mundo cessa de ser uma multiplicidade indiferente de pontos, a urn dos quais talvez prestemos atenyaO momentanea; mas e urn movimento de ondas sem limites, em torno de urn dique estreito, de contornos bern definidos, apto para suportar pesadas cargas -, urn movimento sem limites,
Aquele que pode abordar sem reservas qualquer transeunte nao tern substancia a perder; mas aquele que nlio pode ter urn relacionamento direto com cada urn que encontra possui uma plenitude va. Lutero nao teve razao quando transformou em urn "proximo" 0 "companheiro" hebraico (do qual os Setenta ja tinham feito "urn que esta perto", urn vizinho). Se tudo que e concreto esta igualrnente perto, esta igualrnente pr6ximo, en t ao a vida nao possui mais urn vinculo e uma estrutura com 0 mundo, nso possui mais urn sentido humano. ~~.C9tp.AAjda"de da £!.!~~Jl!9.!.,~S! d]_me!i.!~~~o,e,IJ.~rctm:@~. ~,,~!.9.s
mas limitado por este dique, assim que, embora nao circunscrito, tornou-se movimento finito em si pr6prio, recebeu uma forma, liberou-se da sua propria indiferenca! E contudo, nenhum dos contatos que se dao a cada momenta e indigno de aprender tudo 0 que for possfvel sobre 0 nosso ser - pois, como sabemos, nenhum homem e desprovido de forca de expressao e nosso voltar-se-a-ele produz uma resposta, por mais imperceptivel que seja, por mais rapidamente que seja sufocada; num olhar, num som, vindos da alma, que sepassam talvez na mera interioridade mas que, assim mesmo, existem. Constitui urn erro grotesco a
rn~ys cOIWlanh!i!:0~ ~_do ao9,±~.g~~.nos ap!oJCiJ:n~!D?s urn-do-P~l!9,.~i~. estamos llgados mesmo nucleo. . .... ' :K .". . ,. . ,_ .~ ,~ _~ . . . . . ~_ ;~ , ~. ." .~ ... . " ". ,. ~,,,,,,,,
nocao do homem que moderno quede acordo voltar-se-para-o-outro urn sentimentalismo nso esta com a densidadesejacompacta da vida atual e sua aflrmacao que 0voltar-se-para-o-outro seja impraticavel no tumulto desta vida e apenas a confissao mascarada da fraqueza de sua pr6pria iniciativa diante da situayao da epoca; ele consente que esta situayiio lhe ordene 0 que e possfvel ou permissivel, em vez de, como parceiro sereno, estipular com ele - como e possivel estipular com qua/quer epoca qual 0 espaco e qual a forma que ela deve conceder a existencia de criatura.
mar-se, tao essencialmente, de individuo em pessoa, senao pelas experiencias austerase ternas do dialogo, que the ensinam 0 contendo ilimitado do limite?
~§t.m.r
0 ....,.".
2 . O s M o vim en tos B tisico s Chamo de movimento basico uma a~ao essencial do homem, em torno do qual se constr6i uma atitude essencial. (Pode-se compreende-la como uma ayao "interior", mas ela na~ esta presente se esta presenca nao se fizer sentir ate na tensao dos musculos oculares e no calcar do p e no chso.) Isto na~ e pensado de uma forma temporal, como se a ayao singular precedesse a atitude permanente; esta ultima encontra sua verdade muito mais no fato de que q moyiweuw..b~£9.~!!t~xmPI~,J!,~~
M s jc o d ia l~ o
cO!l1~~_no voltar-se-Para-o-
~ Aparentemente trata-se de algo que acontece toda hora, algo banal; quando olhamos para alguern, quando the dirigimos a palavra, e com urn movimento natural do corpo que a ele nos voitamos; porem, na medida do necessario, quando a ele dirigimos a nossa atencao, fazemo-lo tambem com a alma. Mas qual e , em tudo isto, a ayao essencial, realizada com a essencia do ser? Da incapacidade de apreendermos totalmente 0 que nos cerca,
p e u s ar o,
movimento basiCQ Ql.lil8lQiiio na~ e, _colllQse poderia 0desviar-$l-do-9Utm em QDos~Q iW XgUi&t-~ilu:a-2"2\l-
t [ Q ;_ 1 J ln . e . .Q.•dab.l:at:.~~&:!p...!s~2.... . Aos onze anos de idade, passando 0 verso na propriedade de meus av6s, costumava - sempre que conseguia faze-lo sem despertar atencao - ir furtivamente ao estabulo e acariciar 0 pescoco do meu favorito, urn cavalo robusto e cinzento. NAo era para mim urn divertimento casual, mas urn acontecimentoimportante que, se bern que agradavel, despertava em mim .lima emocao profunda, Se tivesse que explica-lo agora, a partir da recordaeao ainda viva em minha mao, teria que dizer:o que experienciei no animal foi 0 Outro, a enorme alteridade do Outro~ mas uma alteridade que nlio permanecia estranha como a do bOI ou do carneiro, mas que, pelo contrario, deixava que eu m~ aproximasse dela e a tocasse. Quando eu alisava a poderosa enna, as vezes esplendidamente penteada, outras vezes surpr~endentemente selvagem, e sentia a vida palpitando sob a minha
57 56
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
29/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
mao, era como se 0 elemento da pr6pria vitalidade resvalasse a minha pele; algo que nao era eu, absolutamente nao era eu e nem urn pouco intimo ao meu eu; algo que era precisa e palpavelmente 0 Outro, na~ simplesmente urn outro qualquer, mas realmente 0 Outro ele-mesmo, e que contudo deixava que eu me aproximasse, que se confiava a mim, que se colocava comigo, de uma forma elementar, na relacao do "Tu e Tu". Antes mesmo de eu comecar a despejar aveia na manjedoura, 0 cavalo levantava com indulgencia sua pesada cabeca, abanando fortemente as orelhas e depois roncava baixinho, como urn conspirador que da ao outro conspirador urn sinal que s6 para este e perceptfvel; e eu estava confirmado. Uma vez, contudo - nllo sei 0 que aeonteceu com 0 menino, de qualquer forma era algo de bastante infantil - ocorreu-me, ao acariciar a crina do cavalo, 0 quanto este acarariciar me divertia - e de repente tornei-me consciente da minha mao. A brincadeira continuou como sempre, mas alguma coisa tinha se IJl4ldificado; n a o era mais Isto. E quando, no dia seguinte, depois de ter-lhe dado fartamente a comer, acariciei a nuca do meu amigo, ele na~ levantou a c ab ec a. J a poucos anos depois, ao relembrar 0 incidente, nao supunha mais que 0 animal tivesse notado a m in ha d ese rc ao ; m as na epoca pareceu-me que eu tivesse sido condenado. .QJ1~~.~sli!ers:nte do egoismo ou.megmO "£Kotismo". NA'oe que 0 homem se ocupe de si mesmo, se contemple, se apalpe, se saboreie, se adore, se lamente; tudo isto pode ser-lhe acrescentado, mas na~ e parte integrante do dobrar-s e-e m- si- me sm o - assim como, ao ato de voltar-se-ao-outro, completando-o, pode ser acrescentado 0 tomarmos 0 outro presente, na sua existencia especffica, mesmo englobarmo-lo, ~
.4.0
arm} _ g U $ i as.Jij~~£2J!~.~'1l:SJl,.~~_ct.!Jl.~.m~!I!W seJamP.QL n6s experienciadas tambem 30 §CUIlado,do lado do Outro. Chan mo de do.9W·se-Gm·si·mesmo 0 ~e~~:1i9P:em'(fi~.w. ~m~iQ.}l! essenci~...4 Q_~.lJw~t,Q~ ..llrrHt.Q];!{j,"pJ;~!l,.I!~.,~!la ~idade. sin&ulati4.a~~.ill~,n.llQ.RQQ~.!!h~~I!~!~~· gn~j.lW! ; U : ~ W Q slg l1I:2lw.!~'pri~, ~Ulent~...omo'~"tIll ..RIll1~,~9Jn~!,1,~1l".~_Q,i5QJ.Qm!7.~.oai 0 relacionamento yma ilusao misterioso entre mundo humano ~";f:l" .','I" , ,.,... ,-'''~''_''''~',,*-''._'1>;,,,.,,,._ .,,;,;. ".,.· .,-: t'.<1"'· .... .e p1!:1~~(),h~~(). t
" " ~
>
'_,_ , ,q
•
. >
t~.,.,.'.-.,_·.-:'"
3. A Profundidade sem Palavras
OUyO as vezes dizer que todo Eu e Tu nao passa de uma SUn perffcie, que na profundidade deixam de existir a palavra e a resposta, que s6 existe af 0 unico ser primitivo, sem outro que 0 confronte; deveriamos, portanto, mergulhar na unidade silenciosa, mas de resto deixar que a vida a ser vivida conserve sua relatividade, em vez de the impor este Eu e este Tu absolutizados, com 0 seu dialogo. Ora, da minha pr6pria e inesquecivel experiencia sei que M ocasioes em que liames da nossa personalidade parecem ter-nos deixado e n6s vivenciamos uma unidade indivisa. Mas na o sei ter nisto atingido uma uniao com 0 ser primitivo ou com a divindade - como a alma de certo gosta de imaginar e, sem duvida, e obrigada a imaginar (a minha tambem 0 fazia em outros tempos). Este e urn exagero na~ mais permitido ao entendirnento quer dizer eu que, como urn homem responsavel,implantado Responsavel, firmemente na realidade, somente posso concluir daquelas experiencias que por meio delas cheguei a uma unidade de mim mesmo, se m forma nem conteudo e que na~ e passfvel de decomposicao. P osso chamar esta unidade de original, de pre-biografla e supor que ela se esconde, imutavel, sob todas as transformacoes biograficas, sob todo desdobramento e toda absorcao da alma; contudo, dentro da honesta e sagradamente precisa prestacso de contas do entendimento responsavel, esta unidade nada mais e senao a unidade da minha propria alma, cu jo "fundo" eu alcancei, fundo tao abaixo de todas as formacoes e conteudos que meu espfrito na~ pode deixar de compreende10 como 0 mais fundo dos fundos. Entretanto, a unidade basica da minha alma resguardou-se, ao que parece, de toda a multiplicidade recebida ate agora da vida, mas nao se resguardou, de forrna alguma, da individuayA'o e nem da multiplicidade de todas as almas do mundo, das quais ela e uma: existindo uma s6 vez, uni· ca, inigualavel, irreduzivel - esta alma da criatura. Uma das almas humanas e.n A'oa "alma universal". Urn modo de ser e nfo oSer. A unidade basica da criatura, numa criatura ligada a Deus, como o e , ao creator spiritus, a criatura no momento antes da sua lin bertaeao; nA'oligada a Deus, como
tu s no instante da sua libertaeao.
0
e
a criatura do creator spin-
No sentir do homem, a unidade do seu pr6prio eu nao e distingufvel da unidade em geral; pois aquele que, no ato ou processo de mergulhar, afundou-se sob 0 campo de toda a multiplicidade que inunda a alma, na o pode experienciar 0 nao-ser-mais da
58
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
59
30/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
mu1tiplicidade de outra forma a nao ser como unidade enquanto tal. Isto e , el e experiencia 0 nao-ser-mais-multiplo de si mesmo como 0 nao-ser-mais-a-dois do Ser, como a inexistencia da dualidade, revelada ou realizada. 0 ter-se-tomado-um nao pode mais se compreender a sipr6prio aquem da individuacao, nem mesmo aquem da dualidade de Eu e Tu, pois, para a experiencia-limite
homem, s O consigo mesmo, mente solitario?
da alma, "urn" parece significar necessariamente que 0 urn.
urna na porem, qual uma "interior" rese questionada e a genese ponde.fase Esta, na oinstancia do pensamento, mas eoe primeiro exame e a p ri m ei ra e x pe ri en c ia daquilo que ja surgiu. A genese do pensamento na o se efetua no col6quio do eu consigo mesmo. 0 carater monol6gico nilo e proprio nem ao atendimento das relacces basicas, com 0 qual se inicia 0 pensamento cognitivo; nem a apreensao, a delimitacao e a condensacao do entendimento; nem a transformacao deste numa forma conceitual independente; nem a recepcao desta forma, que confere as rela~oes, que insere e liga, numa ordem de formas conceituais; nem mesmo, enfim, pertence 0 carater monol6gico a expressao e a clarificacao.do sentido pela linguagem (que, ate agora, tinha apenas uma fun~ao simb61ica e tecnica, sob reserva). Ja e mais facil descobrir aqui elementos dialogicos: nso e a si proprio que 0 pensador se dirige nos degraus da formacao do pensamento, nas responsabilidades que eles implicam, mas dirige-se talvez A rela~ao basica, face a qual ele deve responder pelo seu entendimento, 0\1 a ordem, face a qual deve responder pela forma conceitual que ora emerge; e seria urn mau conhecimento da dini· mica do processo do pensamento supor que estas ap6strofes de urn ser que existe na natureza ou na ideia sejam "realmente"
a mesma coisa
Mas na facticidade da vida vivida 0 homem de urn tal instante mIo esta acima, mas abaixo da situacao da criacao, que e mais poderosa e mais verdadeira do que todos os extases; nao esta acirna, mas abaixo do dialogo. Nao esta mais pr6ximo do Deus oculto, que esta acima do Eu e Tu, e esta mais afastado do Deus voltado para os homens, do Deus que se da como Eu a urn Tu e como Tu a urn Eu, do que aquele outro que, rezando, servindo, vivendo, nao se ausenta da situacao de confronto e que nao esta na expectativa de uma unidade se m palavras, a nao ser aquela que talvez nos seja revelada pela morte ffsica. ~ntretan!o ..~JJ.om.em "~ii~~~~'£.P.wM:Ct!, ele t~!>~Il!~Jlma U!Jldade Ym~=sta::;~;;te=a ..1!nj.~.!.q~_~.a, ~ 1 ~ " . . 9 . Y ~ ~.m~-ys'U!l!~~
..~~e~~!!f-
4. Do Pensamento
Torna-se evidente para a reflexao espontanea que, desde sua origem, toda arte e essencialmente dial6gica: toda musics e dirigida a urn ouvido que nilo eo do proprio musico, toda escultura, a urn olho que nao e 0 do escultor; tambem a arquitetura e dirigida aos passos que medem a obra. Todas elas dizem, aquele que as recebe, algo que s o pode ser dito nesta linguagem unica (nao urn "sentimento", mas urn segredo percebido). Ao pensamento, entretanto, parece aderir algo de monol6gico, ao qual se acrescenta, como urn segundo elemento, urn elemento secundario, a comunieacao; 0 pensamento parece nascer monologicamente. Seta assim? Sera que aqui - onde, como dizem os filosofos, 0 sujeito puro se desprende da pessoa concreta para fundar para si proprio urn mundo e indaga-lo - sera que se ergue aqui, acima da vida dialogica, uma cidadela inacessfvel a esta vida, na qual 0
0 indivfduo,
sofre e triunfa gloriosa•
Platao, repetidamente, chamou 0 pensamento de COl6qUiO\ sem voz da alma consigo mesma. Todo aquele que realmente . pensou sabe que ha, dentro deste processo digno de atencao,
col6quios do eu consigo mesmo. Entretanto, 0 primeiro exame e a primeira experiencia do pensamento provisoriamente terminado diante da instincia "interior", isto e , no sentido platonico, no degrau do monologo, tern tambem, alem da sua forma de manifestacao habitual, urna outra forma, importante e dialogizante, conhecida por Platlo melhor do que por qualquer outro; quem esta sendo a:£julgado nao e 0 eu empfrico, mas 0 genio, 0 espirlto para 0 q u a l s o u visa· do, a auto-imagem, espfrito diante do qual 0 novopensamento e exposto para ser aprovado, isto e ,· para ser por ele admitido dentro do seu pr6prio pensamento consumado. E agora aparece, a partir de uma dimenslo para a qual mesmo esta aprovacao nao satisfaz ainda, 0 anseio por urn exame e uma experiencia puramente dial6gicos, onde a ~unyio de rece~er nao e mais confiada ao Tu-Eu, mas e transferida a urn genumo
60
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
61
31/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo slidepdf.com apesar dedial tudo, gico irreal? -Mantern-se finne 0 pensador de quem
Tu, que, ou pennanece urn Tu pensado e contudo sentido como extremamente vivo e "outro" ou entao se encama numa pessoa familiar.
o homem [ d i z Wilhelm von Humboldt em seu nouvel tratado sobre
0
D U J l l i s (1827)] anseia, mesmo para efeito do seumeropensamento,porum
1\1 que corresponde aoEu; 0conceito, para ele, parece alcancar sua determina~ao e certeza por meioEle dae rproduzido eflexdo queaosesearrancar produz a da parti r de um outro poder somente do pensamento. massa movirnentada da represe ntac ao e ao ass umir a forma de u rn objeto face ao sujeito. A objetividade aparece entretanto numa forma ainda mais perfeita qu and o esta d ivisao nao se d a so me nte no su jeito , qu an do 0 agente da representacao realmente percebe 0 pen samen to no exterio r d e si mesmo, e isto s6 e poss fvel n um outro ser que , como ele, e capaz de representar e pensar. Entre um poder do pensamento e outro ha, entretanto, s O um mediador: a linguagem.
Uma referencia que retorna, na forma mais simples de urn aforismo, em Ludwig Feuerbach (1843): it!
aqui falamos diante do fato ffsico da alteridade?
Se levannos a serio 0 ato de pensar entre Eu e Tu, entao nao e suficiente dirigirmos 0 nosso pensamento ao outro sujeito pensante por nos apenas pensado; deverfamos tambem, com 0 pensamento, precisamente com 0 pensamento, viver dirigidos ao outro nao-pensado, ao outro fisicamente presente, deveriamos viver dirigidos a sua concretude. Nao dirigidos a urn outro pensador, de quem nada queremos saber a nao ser 0 seu pensamento, mas, mesmo que 0 outro seja urn pensador, dirigidos ao seu nao-pensar fisico, dirigidos mais do que isto a sua pessoa, a qual tambern pertence assim mesmo a atividade de pensar. Quando e que a a~lio de pensar suportara, incluira, tera por objeto a presenca de quem vive face a nos? Quando e que a dialetica do pensamento se tornara dial6gico? Quando se tornara ela urn dialogo nao sentimental, nlio relaxado, urn dialogo nos rigidos moldes do pensamento, com 0 homem presente a todo
A dialetica verdad eira na o e um mo n6log o do pe nsa dor so lita rio consigo mesmo, e um malogo entre Eu e Tu . .
momento?
Todavia, esta palavra ja aponta para alem daquela "refledo"; ela mostra que, ja no estagio primitivo do ato legitimo do pensamento, a a~ao interior procura acontecer em rela~lio a urn Tu autentico e nlio apenas "fntimo" (Novalis). E na ftlosofia modema, em diversas varia~oes, mais urn passo importante foi da~o para frente, quando esta ftlosofia procura, da maneira mais seria, formular suas questoes a partir da existencia humana da situa~lio, do presente. Certamente nao se trata mais aqui simplesmente de urn Tu pronto para acolher e disposto a ftlosofar c~m-o-outro; trata-se muito mais e de preferencia do Tu que resiste, por ser ele realmente 0 Outro, que pensa de forma diferente e em coisa diferente; nso se trata, portanto, tampouco de urn jogo de tabuleiro na torre de urn castelo no at', mas de urn compromisso vital concreto, fincado em terra firme, no qual nos tornamos inexoravelmente conscientes da alteridade do Outro, sem contesta-la agora na sua presentiflcacao, mas onde assimilamos sua natureza no nosso proprio pensamento, pensamos em rela~ao a ela, dirigindo-nos a ela em pensamento.
5. Eros
Entretanto, este homem da ftlosofia moderna que desta maneira nao pensa mais dentro do ambito intocavel da ideacao pura, mas pensa na realidade, pensa, de fato, na realidade? E nao apenas numa realidade pensada? Nlio sera 0 Outro, que ele aceita e acolhe desta maneira, 0 Outro apenas pensado, portanto,
I \
Os gregos distinguiam urn Eros poderoso, criador do mundo, de urn de menos peso. que rege as almas, mas tambem a Eros celeste de urn Eros comum. Nenhuma das duas distin~eses me parece absoluta. Pois 0 deus primitivo Desejo, de quem e derivado o mundo, e precisamente ele, sob a forma de urn "suave espirito proprio aos duendes" (Jacob Grimm), que penetra na esfera das almas e, com uma arbitrariedade demoniaca, executa sua obra cosmogonica por meio da fecundacao dos seres; ele e a grande borboleta portadora de p6len da psicogenia. E 0 " ea n! W n os " presumindo-se que ele seja urn Eros genuino e nao urn ~ que se faz passar impudentemente por urn superior - precisa somente bater suas asas para que, nos jogos pr6prios ao corpo, se revele 0 fogo original. Evidentemente, trata-se do seguinte: se Eros 010 perdeu seu poder de voar e se nlio esta agora condenado a viver entre duros mortais e a dirigir apenas os pobres gestos de arnor de sua mortalidade. E entao, embora as almas dos amantes fa~arn uma-l-outra aquilo que fazem, mas, de asa mutilada, sob 0 regime d? Eros de asa mutilada - pois 0 poder e a imporencia deste mamfestam-se sempre por intermedio delas - as almas agacharn-se onde estao, cada uma em sua capsula, em vez de voar para fora,
63
62
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
32/89
5/17/2018
ao encontro da parceira amada e Ii i LIV__Martin "conhecer", num Buber. alem queDo di logo edo dial gico -slidepdf.com se tornou proximo. 10 nada parecido com ele. Ai, alguem se aquece no calor d il que lhe coube. Ai, a lg u em f az e xp er te n cl as E as . a«:lu 0 Os fieis adeptos do Eros dial6gico, do Eros de asas fortes, - todos os multiplos monologistas do espelho sun por diante conhecem 0 se r amado. Eles experienciam sua vida peculiar na mais fntimo dialogo. no aposento do simples presenca: nao como uma coisa vista e apalpada, mas das inerva~oes aos seusmovimentos, do "interior" ao seu "exterior". te Falei .dos peixes pequenos, mas sao os peixes grandes ue Com isto nao temos em mente outra coisa que nao seja a nho mal.s em mente. Existem alguns que entram em acoido experiencia bipolar; e mais do que urn instantaneolancar-se-para-oucom ? objeto que se propoem a devorar de tal maneira ue 0 pr6J?rIo ato de devorar e visto COmo urn direito ssgrad q tro-lad o - uma simultaneidade em repouso. Aquele inclinar da cabeca la do outro lado, tu sentes como a alma 0 impoe a nuca; sofrunen~o IS visto ~omo um dever bem-aventurado e os ~~t:~:n~ J tu na o 0 sentes na tua nuca, mas precisamente naquela outra, na ~~s,~~;stlt~.em aquilo que ~evemos charnar de amor her6ico. Se i nuca amada; e contudo tu proprio nao estas sendo de certa rnaque, com s ua mterferencia, nio so tancam em conf 1 eres neira para hi arrebatado, tu estas aqui, em teu sensfvel ser-pro~sao 0 plasma ?e um ser humane em formaeao, mas 0 decomprio e acolhes 0 inclinar da cabeca, a sua imposicao, como resp em ~m seu nucleo, tomando-o incapaz de uma forrna~o' eles posta a palavra do teu proprio silencio; tu fazes e experiencias 0 ~borelarn. este poder da sua influencia mais iludem-se ao m;smo dialogo na simultaneidade em repouso. O s dois fieis do Eros diaempo a Sl mesmos e ~o se~ grupo, no sentido de serem eles os moldadores das almas juvems e proclarnam como d 16gico, que lIIl1am um-ao-outro, recebem cada urn a sensacao do desta ob E· " eus protetor evento comum tambem do lade dooutro, isto e , recebem a senra a ros, m a c es sf ve l a o p ro /a n um v u lg u s. sa~ao dos seus dois lados ; assim, somente ass im, compreendem t T~dos eles se iludem. Somente aquele que se volta para 0 fisicamente 0 que significa um evento. ou ro omem enquanto tal e a ele se associa recebe neste outro o mundo. Somente 0 s er c uia alteridade acolhida I o reino do Eros de asa mutilada IS um mundo de espelhos e pe 0 meu ser . face a mt :I , espelhamentos . Mas la onde reina 0 Eros alado nao l ui e spe lha ~ve a~e a .mun com toda a densidade da existencia ~ que m~ ~az a Irradiaeao da eternidade. Somente quando duas pess oas mento: aqui eu , 0 amante, volto-me para es te outro homem, 0 amado, na sua alteridade, na sua independencia, na sua realidade dlZem,.uma-a-outra, com a totalidade dos seus seres : ":es tu!" e que se mstala entre elas 0 Ente. . pr6pria, e volto-me para ele com todo 0 poder de inten~ao do m eu pr6prio coracao, Certamente volto-me para ele como para 6. Comunidade alguem que esta ai voltado para mim, mas precisamente dentro daquela realidade parapara mimele.mas registravel na o eestou circunda e na qual que tambem af voltado Eu que nao me assimilo para dentro de minha alma aquele que vive face a mim; ligo-o a mim por uma promes sa e prometo-me a ele; eu prometo, eu tenho fe. 0Eros dial6gico tem a simplicidade da plenitude; 0 monol6gico e multiple. Percorri durante longos anos a terra dos homens e ainda nio acabei de estudar as variedades do "homem er6tico" (assim se denomina as vezes 0 vassalo do Eros de asa mutilada). Um apaixonado erra por ai e esta apaixonado somente pela sua pr6pria paixao. Ai, alguem veste seus sentimentos di ferenciados como medalhas. A i, alguem saboreia a aventura do seu proprio fascmio. Ai, alguem contempla, encantado, 0 espetaculo do seu suposto abandono de si mesmo. Ai, alguem esta colecionando emocoes. Af, alguem exibe 0 seu "poder", Af, alguem se envaidece com vitali dade emprestada. Ai, alguem se diverte, existindo simultaneamente como ele pr6prio e como fdo-
a n otant a~ordo0 ~om a visao nos comum ss a e po ca , determinada pela De polftica, tmportante grupos , hi t6 . 0 no presente como fa s n~, e a~en~s 0 que visam e os resultados de sua 8 9 1 0 . Pe o contano, atribui-se urn significado ao que neles acontece somente enquanto ~s te acontecirnento influenciar a a~ao do g r u po :~~ue diz respeito ~o seu objetivo. Concede-se, por exemplo, grupo de consplradores que se unem para conquistar 0 podtr .estatal que a carnaradagem que os anima seja um v alo r p ois e a tntensifica a forca de agressao da qual 0grupo depende: ume obedieneia rigo , u . rosa, ~o entanto, surtira 0 mesmo efeito, quando m trelnarnento cheio de entus iasmo compens ar 0 lato de os co mp anhetelIOS perrnanecerem estranhos um-ao-outro: M realmente bons motivos para se preferir 0 sistema rigido. · 8 0 porvent~ra 0 grupo se empenba para alcanear uma forma superior de vl~a s ocial, entlio pode parecer perigoso quando na vida do pr6pno ~po alguma coisa desta forma superior coJD e98 a germinar; pois receia-se que tal seriedade prematura abafe 0 impeto
64
6S
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
33/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
"efetivador", Sup6e-se aparentemente que nlo se pode contar co m 0 homem que esta devisita a urnoasis para urn projeto de irriga~lIo do Saara.
Gracas a este modo de avalia~ao simplificado, 0 valor essencial e pr6prio do grupopermanece tlIQ incompreendido como quando julgamos uma pessoasomente pela sua atua~ao e nfo pelas suas qualidades. 0 erro no julgar aumenta aindaquando se acrescenta a isto uma eonversa sobre 0 sacriffcio da existencta, sobre a remincia a auto-realizacao, com uma possivel referencia It popular rnetafora do estrumejpode-se renunciar a felicidade, a propriedade, ao poder, a liberdade, a vida, mas urn sacriffcio da existencia e urn contra-sense sublime. De mais a mais,nenhum instante, para justificar·sua rela~lIo com a realidade, pode invocarinstantes posteriores, futuros, alegando que e por causa destes, para alimenta-los, que ele permaneceu tiIbpobre: "Os destinos das estrelas, por vir, / nlo justifieam que algo dose deu, /
nizada da existencia pessoal; a comunidade, no aurnento e na confirmacao desta existencia, no interior da reciprocidade, 0 atual zelo devotado a coletividade e uma fuga da pessoa diante da prova e da consagracao da comunidade, diante da dia16gica vital que esta no coracao do mundo e que exige 0 engajamento de si-rnesmo.
do alto, num gesto de as homens do coletivo contemplam superioridade, a "sentimentalidade" da geracao que os precede, geracao do "movimento dejuventude ", Os homens ocupavam-se en tao ampla e profundamente com a problematica de todas as relacoes da vida, visavam "comunidade" e problematizavam ao mesmo tempo, giravam em cfrculos e nao saiam do lugar. Agora, pelo contrario, comanda-se e marcha-se, pois agora existe a "causa". Os falsos caminhos da subjetividade foram deixados para tras e chegou-se ao caminho do objetivismo que leva direto aos seus fins. Mas assim como havia no primeiro uma pseudo-
nenhum instw'rte I pode ser transferido". o espfrito comunitario nlIo reina ai onde se 1uta em comum, mas nao ern comunidade, para arrancar a urn mundo que resiste a almejada transformacaodas institui~oes; ele reina onde a luta que e travada tem lugar numa comunidade que pugna por sua propria realidade eomunitaria. Mas tambem 0 futuro esta sendo aqui decidido ao mesmo tempo; todas as "realizacoes" politieas sao, na methor das hip6teses, tropas auxiliares da atua~ao transformadora do nucleo, efetivada pelo instante nas vias imprevisfveis da hist6ria secreta. Nenhum caminho leva a um
-subjetividade, pois faltava a forca elementar de urn ser-Pessoa, assim tambern existe no ultimo urn pseudo-objetivismo, pois nao se esta inserido no mundo, mas numa facyao sem mundo. Assim como no primeiro todas as cancoes de louvor a liberdade eram cantadas no vazio, pois s6 se conhecia 0 desengajamento dos vmculos e desconhecia-se a libertacao para a responsabilidade, assim tambem no ultimo os hinos mais nobres entoados a autoridade sao agora urn mal-entendido; de fato, eles fortalecem apenas 0 simulacro da autoridade, conseguida por palavras e gritos, e por tras' desta autoridade abriga-se uma inconsistencia envolta nas poderosas pregas da atitude. Entretanto, a autoridade genuf-
objetivo de ordem diferente da sua. Mas quem, no interior destas coletividadesmassificadas, misturadas .....coletividades em marcha - tern ainda alguma ideia do que seja aquela comunidade pela qual ele pensa se empenhar, o que e comunidade? Todos renderam-se aquilo que the e oposto. A coletividade nlo e uma liga~ao, e urn enfeixamento: atados, urn individuo junto ao outro, armados em comurn, equipados em comurn, de hornem para homem s6 tanta vida quanto necessario para inflamar 0 passo da marcha. A comunidade, entretanto, a comunidade em evolu~ao (que e a unica que conhecemos
na, celebrada naqueles hinos, a autoridade do genufno carisrnatico na sua constante responsabilidade para com 0 Senhor do carisma, permaneceu desconhecida ao espaco politico do presente. Superficialmente, as duas geracoes sao diferentes em especie, chegando a .ser contradit6rias; na verdade, estao as duas submersas no mesmo caos. 0 homem do movimento da juventude, problematizador, preocup.ava-se, qualquer que tenha sido naquele momenta 0 assunto em questao, com a sua participa9iio altamente pessoal; ele "vivenciava" seu Eu, sem por em risco 0 seu ser-proprio, para nao ter que po-lo em risco na resposta e na responsabilidade; 0 homem de aya:o da empresa coletiva conseguiu de antemao livrar-se de si e escapar assim radicalmente a questao de por-se em risco. Pode-se, contudo, assinalar urn progresso. No primeiro caso, 0mqn6logo apresentava-se como dialogo; no ultimo, as coisas acontecem de uma forma muito mais simples, pois, de acordo com 0 pr6prio desejo da maioria, 0 mono16gico e de-
ate agora) eo estar nao-mais-um-ao-lado-do-outro, mas estar um-com-o-outro, de uma multidao de pessoas que, embora movimentem-se juntas em dire~ao a Urn objetivo, experienciam em todo lugar urn dirigir-se-um-ao-outro, urn face-a-face dinamtco, urn fluir do Eu para 0 Tu; a comunidade existe onde a comunidade acontece. A coletividade fundamenta-se numa atrofla orga66
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
67
34/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
les exorcizado ou eles perdem dele 0 costume; e os outros, os q~e c~mandam, n!o precisam de forma alguma simular qualquer dialogica, Calam-se 0 dialogo e 0 monologo. Sem 0 Tu, mas tam. bern sem 0 Eu, ~archam en~eixados os homens; os da esquerda, que quere~ abohr a memoria, e os da direita, que querem regula-la; hostis €Yseparadas, as hostes marcham para urn abismo comum. '
3 . C O N FI RM A < ;A O
1. C olo qu io c om
0 Adversdrio
Para estas reflexoes, espero duas especies de leitores: 0 amicus, que conhece a realidade para a qual aponto com 0 dedo indicador, dedo que gostaria de alongar tanto como 0 de Batista de Grunewald; e 0 hostis ou adversarius, que nega esta realidade e que portanto me combate, porque eu a aponto (a seu ver de uma forma enganadora) como sendo uma realidade. Consequentemente, ele leva 0 que aqui e dito tio a serlo como eu proprio que, apes uma longa espera, escrevo 0 que e para ser escrito, leva-o t!o a serio como eu, s6 que com 0 sinal negativo. Dispensaria de boa vontade 0 simples inimicus e como tal considero todo aquele que quer me relegar ao campo ideol6gico e s6 entllo me conceder algum valor.
68
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
69
35/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Ao amicus, nada preciso dizer neste momento. 0 bater das horas da m?rtalidade e do caminho que nos sao comuns atinge os seus ouvidos e os meus, como se estivessemos juntos tambem no espaco e conhecessemos um-ao-outro.
Ao adversarius, entretanto - nao ~ suficiente dizer aqui 0 que estou the apontando: 0 encobrimento de sua vida pessoal, seu segredo;: 0 que ele, atravessando urn limiar que cuidadosamente evita, descobrira aquilo que nega. Isto nao e suficiente. Nao posso recusar sua objecao mais grave, devo aceita-la onde e como ela for levantada, e devo entao responder. Eis que agora 0 adversarius senta face a mim, na sua forma de ~anifestayaO atu~, de acordo com 0 espfrito da epoca e fala, mais para alem de'rnim do que a mim se dirigindo, na totalidade e atitude costumeira do duelo universal, livre de comprometimento pessoal: . E m tudo i s., mi'o e levad o em con sidera cao 0 carater fatual da nossaVIdapresent~, nem mesmo a natureza contingente da vida em geral. Tudo de ,que falais ocorre na terra de ninguern, nao no contexto social em que nos, qu erendo . ou nao , p assam os os n ossos dias e pel o qual, m ais d o que por outra coisa qualquer, nossa realidade e determinada. Vossos "dois homens" estso sentados em a1gum banco solitario, obviamente nurna excursao de ferias; nao poderfeis coloca-los sentados num escrit6rio d e uma cidad e g rande , p ois Ia eles nao atingiriam 0 "sacramental". Vossa "conversacao interrompida" tern lugar entre intelectuais que disp5em do lazer para , algun s mese s ante s ~ o m onstru oso aco ntecim ento qu e mo vimentara . as m~~s, te~~ fantasias sobre sua possfvel preveneao por meio d~ ull!a mflue~cla espiritual, Isto pode interessar muito a s pessoas que n~ o sao ab sorvi das por nenhu m dev er. Mas d eve o e mpreg ado do c omercolegas?
dizer que existe algurna coisa e indicar no que ela consiste; eu simplesmente relato. E como seria possivel querer exigir 0 dialogico! 0 di:Uogo nao se impoe a ninguem. Respondernso e urn dever,mas e urn poder.
E
realmente urn poder. 0 dialoglco.nzo e,como
0 dialeti-
co, urn priviIegio da atividade intelectual. Ele nao comeca no andar superior da hUJTI211idade,ele nao comeca rnais alto do que ela comeca. Nao ha aqui dotados e nao-dotados, somente hI1 aqueles que se dao e aqueles que se retraem. E aquele que se da. amanha, nele nao se nota isto hoje, ele proprio nso sabe ainda que tern este algo dentro de si, que nos 0 temos dentro de n6s, ele vai simplesmente encontra-lo, "e encontrando-o, surpreen-
der-se-a". Apresentam-se 0 homem absorvido pelo dever e pela empresa. Sim, ~ justamente a ele que me refire, ele, na fabrica,.na homem. loja, escritorio, nas dos minas, no trator, na escolho, tipografia:eu0aceito Ii procura Nito no estou homens, nito os os que ai estao; e este que tenho em mente, este, atrelado ao serviyo, 0 que move aroda, 0 condicionado. 0 dililogo nso e.urn assunto de luxo intelectual e de luxuria intelectual, ele diz respeito Ii criayao, Ii criatura; eo homem de quem falo,o homem,de quem falamos, e isto, e criatura, trivial e insubstitufvel. Em minhas renexees sobre 0 dial6gico, tive que escolher meus exemplos tao "puros", tao paradigmaticos, como minha memoria a mim os apresentou, para fazer-me compreensivel SO.-
0
Deve CIO"comunicar-se reservas" comque seus na linha c;lemontagem sem "perceber aquilo !he acontece comooperario uma palavra ~ue ~e e dirigida"? ?eve 0 diri.~ente ~e uma enorme empresa tecnica pra~lcar a respo~sablhdade .de dl~OgO' ? Ao exigir que penetremos na situ acao q ue de no s se a proxim a, vos ne gligen ciais a si tua~ o perm anent e em que cada urn de nos se encontra de uma forma elementar na medida ~ q!le participamos da vida da sociedade. A despeito de todas as referenciasa ~nfretude, tudoisto e 0 individualismo de antesda guerra numa novaedicjo me!horada.
Eeu, na profunda consciencia da impossibilidade quase total de urn pensar em comum, mesmo que seja no sentido de um-contra-o-outro, quando nao sefaz a experiencia em comum, resp,ondo: Antes de tudo, caro adversario: se nos devemos conversar urn-com-o-outre e nlio apenas falar sem que as nossas palavras se e~contrem, entli~ peco-vos notar que eu nao exijo. Para tanto nao tenho vocacao e nem sequer cornpetencia. Tento somente
bre que se tomouaquilo tao pouco familiar, fato tao esqo~cido. algo Por esta razao, que digo parece deprovir do dominio que chamais de intelectual, mas a realidade provem do dO,IJ,'lipi? onde as coisas sao bem-sucedidas, onde elas se completarh~p~C1samente do dominio das coisas exemplares. Mas nao e . 0 } ) # r < . l que me interessa aqui. 0 que me Interesse e 0 turvo, orepr,umdo, a rotina, a fadiga, 0 tedioso absurdo - e a ruptura; Ihruptura e nao a perfeicao: e, na verdade, a ruptura nfo provinda do desespero, com suas foreas mortiferas e renovado1'8S',010, nlo aquela grande e catastrofica, rupturaque acontece'umas6 vez,(a seu respeito convem calar-se por algum tempo, mesdlO n::~ coracao) mas a ruptura que liberta do estado deadversid e impassivel 'de contrariedade e absurdo, onde vive 0homem que eu destaco' ao acaso do tumulto, ondeele vive e com 0 qual ele. po-: de romper e a s vezes rompe.Para onde? Para nadadesublline, de hereico de sagrado, para nenhurndilema, apensS para este. , t'dianosem que chegoa me pequeno rigor e a pequena graya co 1 ,
70
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
71
36/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
rela~ionar precisamente com esta mesma "realidade" cujo dever e service me prendem de tal maneira que a experiencio olhar por olhar, sinal por sinal, palavra por palavra, como ela oferecendose.a mim e eu oferecendo-me a ela, sendo uma palavra dirigida a mim e eu, uma palavra dirigida a ela; e agora, em todo 0 retinir da rot~a.que eu c~amava de minha realidade, aparece, modesta
por satisfazer, uma insatisfacao desconhecida, muito profunda, para a qual nao existe ainda receita de satisfayio em lugar algum, mas que crescera a uma tal potencia que passara a ditar 80S d irigentes tecnicos, aos empresarios, aos inventores: prossegui racionalizando, mas humanizai em v6s a ratio racionalizadora, para que ela inclua, nos fins que se propoe, nos seus calculos, 0 ho-
~ esplendida, < I realidade atuante, a realidade da criatura, que me e confiada e pela qual respondo. Nos nao encontramos 0 sentido nas coisas, ta~bem nio 0 colocamos dentro das coisas, mas entre n6s e as COIsaSele pode acontecer.
mem que vive, que sente a necessidade de estar em reciprocidade com 0 mundo! Sera que, caro oponente.ja se move nas profundezas - um impulso para uma grande construcao ou uma pequena centelha da ultima revolucao - a nostalgia pela dialogizacjo da empresa? Isto e, segundo a formula do q ua ntu m s atis : a nostalgia por uma ordem de trabalho pela qual a empresa seja tao continuamente impregnada da dial6gica vital quanta 0 permitem as tarefas a serem cumpridas? E em que medida elas podem perrniti-lo, disto temos apenas um pressentimento hoje - numa hora em que a questao que coloco esta entregue a fanaticos do conformismo com 0 tempo, cegos a realidade, e aos anunciadores da inacessivel tragedia do mundo, cegos a possibilidade.
" De nada vale:,caro ad~ersario, atribuir-me primeiro 0 patos do tudo ou nada e depois provar a impossibilidade da minha suposta exigencia. Eu nao sei 0 que e tudo, nem 0 que e nada; um .me parece tao desumano e tao imaginado como 0 outro; e aquilo a que me refiro e 0 simples q ua ntu m sa tis disso que este homem e capaz ~e realizar e de receber nesta hora da sua vida _ se entregar. Isto e: se ele nio se deixar persuadir pela opis c : elecorrente mao e compacta, de que Ita espacos excluidos da cria~io e que ele trabalha num destes espacos, s6 podendo retornar ao espaco da cria~ao depois de terminado seu trabalho: ou mesmo que a cria~ao seja superada, que ela seja coisa do passado, irrevogavelmente des.aparecida; que 0 que existe agora e a empresa e que entao e precise desfazer-se de todo romantismo, cerrar os d~ntes e conseguir aquilo que se reconhece como necessario. Eu di~o: se ele nao se deixar persuadir por esta opiniao! Nao ha fabrica nem escrit6rio tao abandonado pela criacao que neles um olhar da criatura nao se possa elevar de um lugar de trabalho ao outro, de uma escrivaninha Ii outra, um olhar s6brio e fraternal, que gar~ta a realidade da cria~ao que esta acontecendo: quantu m sa tts. E nada esta tao a service do dialogo entre Deus e 0 homem como esta troca de olhares, sem sentimentalidade e romantismo, entre dois homens num lugar estranho, Mas e este, irrevogavelmente, um lugar estranho? Deve a vida do homem ligado a empresa, de agora em diante atraves de todos os tempos, permanecer dividida em dois um lugar estranho, ? "trabalho"? e uma patria, que e 0 "lazer:'? E mais.ja que as n~1tes e os domingos nso podem libertar-se do carater pr6prio ao dia de trabalho mas sio por ele inevitavelmente marcados deve a vida entao ser dividida entre a empresa do trabalho e aempresa do lazer, sem umresto de espontaneidade, sem um excedente que nada regulamenta - sem liberdade? (E a liberdade a que me ~efuo tambem nfo e instituida por nenhuma nova ordern SOCIal.)Ou sera que ja se move, sob todas as insatisfacoes
Compreendam bem 0 que testemunha este fato que um operario pode experienciar tambem a sua reIayi'o com a maquina como uma relacao dial6gica, quando, por exemplo, um tip6grafo conta que ocasionalmente perce be 0 zumbido da sua rnaquina como "um sorrir alegre e grato dirigido a mim, que a ajudei a eliminar as dificuldades e obstaculos que a incomodavam, arranhavam e lhe causavam dor, para que ela pudesse agora funcionar livremente". Isto nao vos faz tambem pensar na hist6ria de Androcles e 0 leao? Mas onde 0 homem arrasta para 0 seu anseio de dialogo um ente inanimado, emprestando-lhe independencia e uma especie de alma, ai pode surgir nele 0 pressentimento de um dialogo universal, do dialogo com 0 acontecer do mundo, que se the apresenta precisamente no seu ambiente, tambem no ambiente material. Ou pensais v6s seriamente que 0 dar e 0 receber de signos cessam no limiar de uma empresa onde existe um espirito honesto e aberto? Sera que 0 dirigente de uma grande empresa tecnica pode exercer uma responsabilidade dial6gica? - perguntais rindo, Ele pode faze-lo. Pois ele aexerce quando, na medida do possivel, q ua n tu m s atis , torna presente para si, na sua concretude, a empresa que dirige; ele a exerce, quando a experiencia nao como uma estrutura de centros de energia mecanicos e os seres organicos que os servem (nao havendo para ele, entre os ultimos, diferenciacao alguma que nao seja a funcional), mas experienciando-
72
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
73
37/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
a como urn conjunto de pessoas dotadas de rostos, de nomes e biografias, ligadas por uma obra que se manifesta atraves das realiza~oes de urn mecanismo complicado, masque nao consiste nestas r ea hz ac oe s. E l e a exerce quando, gracas a um a fantasia la tente e disciplinada, tern consciencia intima desta rnultidao de peSSOaSque naturalmente nao pode conhecer individuaIrnente e das quais n!o pode se lembrar ,de tal forma que, quando uma delas, po r urna razao ou outra, apareceagora realmente enquanto individuo no circulo da sua visao e no ambito da sua decisao, ele a percebe nao como urn mimero Com uma mascara humana mas, sem esforco, como uma pessoa. Ele a exerce quando compreende e trata estas pessoas como pessoas, na maioria das ve zes necessariarnente de urna for ma indireta, atraves de urn sisterna de media~iio que varia de acordo com 0volume, com a especie e a estrutura da empresa, mas tambem diretamente nos setores que 0 interessam de uma forma organizacional, Naturalmen01
0
eventos - au se ele se e sq u iv a. E urn olhar da criatura dirigido a outra criatura pode, as vezes, ser resposta suficiente.
o condicionamento sociologico do homem aumenta. Mas e st e a um e nt o e 0 am adurecim ento de um a tarefa, nao no que diz respeito ao dever, mas no que e permitido e no que e necessario, no anseio e na graca. E necessario renunciar imania ou ao habito pantecnicos que "dominam" qualquer situacao; e necessaria acolher no poder dialogico da vida autentica desde os trio viais rnisterios do cotidiano ate a m aje sta de d o destino destruidor. A tarefa torna-se cada vez mais dificil e cada vez mais essencial; a realizacao, cada vez mais obstruida e cada vez mais rica em decisoes, Todo a caos organizado da epoca espera pela ruptura e, onde quer que 0 homem perceba e responda, esta ele contribuindo para este fim.
0
te, de inicio sua magistral dois campos, capital e como do proletariado, condenarao atitude dofantasiosa urn fantasiar descabido e sua atitude pratica face as pessoas como ur n diletantismo, mas de uma forma iguaImente natural 56 0 farao ate que o aumento das suas realizacees tecnicas 0 abonem diante de seus olhos (0 que obviamente niro implica que tais aumentos de realiza~ao acontecam necessariamente: entre a verdade e 0 sucesso Mo ha har monia preestabelecida). Entao, certamente, algo pior seguir-se-a: ele sera pragmaticamente imitado, isto e , procurar-se~ausar seu "procedimento", sem se possuir sua menta1idade nem imaginayao; maseste carater demoniaco inerente a histona do espirito (lembrai apenas de todas as tentativas de transformar a religiio em rnagia) fracassara possivelmente aqui, diante da capacidade de discernimento das almas humanas. E, enquanto isto, esperarnos. que uma nova gera~ao surgira, ger a~ao esta que fara aprendizagem com as coisas vivas e levant tudo tifo a ser io como
ele
0 faz:
Indiscutivelmente, aumenta na nossa epoca 0 condicionamento dos homens pelas "circunstancias" em curso. Nao cresce somente a massa absoluta dos objetivos sociais mas tambem seu poder r elativo. Na suasituacso de ser por eles codeterminado, 0 individuo esta a cada momento face a concretude do mundo, que a ele quer se entregar e dele quer receber uma resposta; sob o peso da situacao, ele encontra novas situacoes. E contudo, a despeito de toda multiplicidadee complexidade, ele permaneceu Adao: mesmo agora e tomada dentro dele. a decisao real se ele enfrenta a voz de Deus que se Ihe torna audivel nas coisas enos 74
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
75
38/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
A Q U ESTA O Q UE SE CO LOC A A O IN DIV ID UO
A r er po n ll ll bU id Il de ~
0 c ord 60
u mb ilic al d a crltIpfo. P.B.
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
39/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
1."0
ONICO" E 0 INDWIDUO
Soeren Kierkegaard tornou-se 0 pensador a estudarprofundamente 0 Cristianismo como urn problema paradoxal para 0 "Cristae" individual gracas Ii categoria do "Indivfduo" que dele tomou conta e que ele elaborou ate a extrema pureza, Ele foi capaz deste feito, no entanto, gracas Ii natureza- raejical de sua solidso, Nao e possfvel compreender seu "Indivfduo" sem compreender a sua solidao, Esta diferia em especie daquela professada pelos mais antigos pensadores cnstaos, como Agostinho ou talvez Pascal, cujos nomes gostarfamos de ligar ao sen. Nlio e por acaso que Agostinho tenha tide uma mle perto de si e Pascal uma Irma, que mantinham a conexso orgdnica com 0 mundo, como s6 uma mulher, como emissaria do Elemento, pode faze-to; 0 acontecimentocentral da vida de 79
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
40/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Kierkegaard, porern, e 0 rnicleo da cristalizacao do seu pensa~ento fol sua renuncia a Regina Olsen, ou seja,uma remincia a mulher e ao mundo. N so podemos tampouco comparar esta solidao a de u rn monge, a de urn eremita; para este, a renuncia coloca-se de uma forma essencial somente no infcio e, embora ela tenha que, ser constantemente reconquistada e consumada, nao e ela 0 tema da vida, nao e ela 0 problema fundamental e a materia de que se teee todo ensinamento; mas e precisamente isto que a remincia significa para Kierkegaard. Ela se inscreve na categoria do Individuo, "a categoria pela qual, do ponto de vista religioso, devem passar 0 tempo, a hist6ria, a geracao" (Kierkegaard, 1874).
somente aquela na qual se pode dizer nlo apenas Eu, mas tambern Tu, Costuma-se subestimar esta flgura-limite de urn Protagoras alemao: 0 esvaziamento que a responsabilidade e a verdade sofreram na sua realidade e que caracteriza os nossos dias tern, aqui, senao sua origem espiritual, pelo menos seu prenuncio conceitual exato. "0 homem que s6 pertence a si pr6prio ... e originalmente livre, pois ele nada reconhece a nao ser a si mesmo" e "Verdadeiro e 0 que e Meu" sfo f6rmulas que prefigurarn urn congelar das almas n so imaginado por Stirner em toda a seguranca da sua ret6rica. Mas muit_o~_c!.Q~igiq_osN6s £oJ~'Ws~. que. .recusam lJI!!Lirrs®l_ciasup~:dor, P9demJacilraducreda linguagerndo J!1entt;.ser__poJ!1QfCleJldi
m confronto nos dara, de infcio, uma consciencia exata daquilo que 0 Individuo nao e, num sentido especial e especialmente lmportanje. Poucos anos antes de Kierkegaard ter esbocado sua Meldung an die Geschichte, sob 0 titulo Der Gesichtspunkt fur meine Wirksamkeit als Schriftsteller, em cujas "Netas" a categoria do Individuo encontrou sua formulacao adequada, Max Stirner compunha seu livro sobre 0 "Unico ". Este ultimo e tambem urn conceito-limite como "0 Individuo" s6 que do extreme oposto. Nominalista patetico e desmascarado de ideias, Stirner queria dissolver os pretensos restos do idealismo alemao (assirn ele encarava Ludwig Feuerbach), elevando nao mais 0 sujeito pen s ante e nem 0 homem, mas 0 individuo concreto ai presente como "0 Eu exclusivo" a cate-
A categoria do Individuo nao se refere tampouco ao sujeito ou "ao homern", mas a singularidade concreta; nao se refere, entretanto, ao indivfduo af presente mas, antes, a pessoa que se encontra a si mesma. 0 encontrar-se-a-si-mesmo, ainda que primitivamente remoto, pOI mais contrario que seja ao "utilizante" de Stimer, nao se aproxima tampouco daquele "conhece-te"
goria de sustentaculo do mundo, isto e , do "seu" mundo. 13 que nao existe aqui, primariamente, urn outro qualquer, a nao ser este Unico que se "consome a si mesmo" na "fruicao de si proprio", ja que nao existe senao ele, primariamente, sempre que alguem, tao intensamente, toma posse e consciencia de si pr6prio - por causa da "unidade e da onipotencia do nosso Eu, que e auto-suficiente, pois nao deixa nada de estranho subsistir fora de si" - desaparece tambem a questao de uma relacso essencial entre ele e os outros. Ele s6 tern relacao essencial consigo mesmo (a pretensa "participacao viva" "na pessoa do Outro" de Stimer nao tern essencia, ja que para ele ooutro nfo existe de forma primaria). Isto quer dizer: ele possui somente aquela estranha relacao consigo mesmo a qual nao faltam certas possibilidades rnagicas, pois toda a existencia que nao seja a sua torna-se uma caca aos espfritos, semidependentes e semilivres; mas 0 genuino poder de se relacionar e para o Un ic o tao ausente que e preferivel continuarmos chamando de relacao
que visivelmente tanto trabalho deu a Kierkegaard. Pois significa urn tornar-se, e isto com urn peso deseriedade que s6 se tomou possfvel, pelo menos para 0 Ocidente, atraves do Cristianismo; urn tornar-se, portanto, que tern uma forma decididamente diferente da do parto socratico, embora Kierkegaard ja faca Socrates utilizar esta categoria para "a dissolucao do paganismo", "Ninguern, ninguem esta exclufdo da possibilidade de tornar-se urn Indivfduo, com excecao daquele que se exclui a si mesmo tornando-se multidao." Aqui nao somente 0"Indivfduo" defronta-se com a "multidao ", mas tambem 0 tornar-se se defronta com 0 modo de ser que diante dele recua. Isto poderia ainda concordar com 0 pensamento socratico. Mas 0 que significa tornar-se urn Individuo? 0 relata de Kierkegaard mostra claramente a natureza nao-mais-socratica de sua categoria. Diz ele, com efeitc, que preencher "a primeira condicao de toda religiosidade" e precisamente "ser um homem individual". g por esta razao que "0 Indivfduo" e "a categoria pela qual,
o Individuo de Kierkegaard tern em comum com 0 Onico de Stirner, seu oponente, que os dois sfo categorias-limite; nao tern nada mais em comum com ele e nem nada menos.
80
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
81
41/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com do ponto de vista religioso, devem passar a tempo, a hist6ria, de Abeao - Genesis 12,1 e 22,2, no mesmo "segue em frente", a gera~ao ", ' exigem da mesma maneira que nospossamos nos libertarde todos os vrnculos, dos vinculos com 0 mundo do pai e COin 0 Jaque 0 conceito de religiosidade tornou-se desde entao mundo do mho -'- e, isto e , de Cristo. indefinido, torna-se necessario definir com mais exatidao 0 que Para maior c1areza, e ainda necessaria uma dupla delimitaKierkegaard tem em mente. Ele nao pode ter em mente que
tornar-se urri Indivfduo seja a primeira condicao do estado de alma chamado de religiosidade. Nao se trata do estado de uma alma, mas da existencia naquele sentido estrito da palavra em que ela, precisamente pelo fato de realizar a natureza da pessoa, ultrapassaessencialmente 0 limite destapessoa, de forma que o Ser, 0 Ser que me e familiar, deixa de ser familiar e nao significa mais 0 meu Ser, mas a minha participacao no Ente. B exatamente isto que Kierkegaard tern em mente; ele 0 expressa pela palavra fundamental, quando ~diz que 0 Individuo "corresponde" a Deus. No relata de Kierkegaard, entao, 0 conceito de "toda religiosidade" deve ser mais precisamente definido como: toda realidade religiosa, Mas ja que isto tarnbem esta expos to ao mal epidemico (de que sofre a palavra no nosso tempo, pelo qual todas aspalavras ficam recobertas instantanea:mente pela lepra da rot ina e transformam-se num slogan), e necessario ir mais longe ainda, tao longe quanto possivel e, renunciando a incomoda "religiao", assumir um risco, mas um risco necessario , e explicitar 0 significado da frase: de todo verdadeiro intercambio humano com Deus. Kierkegaard tem isto em mente e ele assim 9 demonstra, referindo-se a um "falar com Deus", E de fato, ohomem s6 pode ter um intercambio com Deus enquanto
9!Io.Primeiro, no que diz respeito ao misticismo. Este deixa tarnbem 0 homem sozinho diante de Deus, mas 0[0 enquanto Individuo. A relacao com Deus; ~omo e pensada pelo misticismo, e , como sabemos, 0 "des-parecimentc" do Eu, eo Indivrduo cessa de existir quart ~:J,mesmo no abandono, nso e mais capaz de dizer Eu. Assim como 0 misticismo nao quer permitir que Deus assuma a forma de urn servo, propria da pessoa que fala e que age, de urn criadore de urn revelador e nao permite que Deus percorra, atraves do tempo, 0 caminho da paixao, como 0 parceiro da hist6ria que compartilha com e13 todoo sofrimento do destino; assim ele profbe tambem ao homem, enquanto Individuo, que persiste Como tal, de orarverdadeiramente, de servir verdadeiramente, de amar verdadeiramente, como s6 e possivel faze-lo de urn Eu a urn Tu; 0 misticismo tolera o Individuo apenas para queele se dissolva integralmente. Kierkegaard sabe entretanto 0 que e 0 amor, pelo menos no que diz respeito a Deus; e sabe,portanto, que - ernbora nao exista urn amar-a-si-mesmo que DaO seja auto-ilusao (pois aquele que ama, e e aquele que importa, s6 arna 0 outro e essencialrnente nao a si mesmo) - nao existe amor sem eu ser ~u-mesmo esem eu permanecer eu-mesmo.
Individuc, enquanto hom em que se tornou Indivfduo, - isto e expresso pelo Antigo Testamento de tal forma que, em b ora nele um povoencantre tambem a. d ivindade enquanto povo, ele permite que apenas uma pessoaportadora de urn nome, Enoch, Noe, possa a cada vez , "ter um intercambio como Elohim". Na:oantes que ohomem possaxcom toda realidade, dizer eu isto-e, encontrando-se asi mesmo, pode ele, com toda realidade, dizer Tu - isto e , a Deus. E mesmo que ele 0 faca numa cornunidade, s6 po d e faze-lo "sozinho". "Enquan to 'Individuo', ele (todo homem) esta sozinho, sozinho no . mundo inteiro, sozinho
A segunda delimitacao necessaria' diz respeito ao " O ' ll i c o " de Stirner (para uma maior exatldao conceitual, esta expreS Slo e preferivel a outras rnais humanfsticas, tal como 0 egotistade Stendhal).
diante de Deus." Isto e - e e estranho que Kierkegaard nisto nliopensc - inteiramente nao-socratico. Nas palavras "0 divino faz-me um sinal". a. "religiosidade" de Socrates manifesta-se significativamente para todasas epocas; mas as palavras "Eu estou sozinho diante de Deus" sao inconcebiveis na sua boca. o "sozinho" de Kierkegaard nao e mais socratico; e 0 "sozinho"
Impoe-se, porem, uma delimitacao prelin$ar em relll~!o ao assim chamado individualismo que, como sabemoa.produziu tambem uma variedade v''religiosa". 0 '.Indivfduo, a •.p essoa pronta e apta a estar-sozinha-diante-de-Deus, e ooppsto ,daqujlo que se chamava, em tempos ainda nao distantes, de personalidade (termoque e uma tra~ao ao espiritode Goethejreo tornarse Indivfduo do homem e 0 opostodo "desenvolvimento pessoal". Todo individualismo, assuma ele 0 nome deestetico, etico ou religioso, acha um prazer faci1 e frivolo no homem, con tanto que este se "desenvolva". Em outras palavras: oindividualismo "etico" e 0 "religiose" sao somente variacoes do "estetico .. (que e tao pouco Aisthesis genufnacomo aquelas
82
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
83
42/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com Ii forca pela leald ade da resposta. Eis a realidade da responsabi-
sao Ethos genuino e religiao genu ina). A moralidade e a piedade, levados a tornar-se desta forma urn fim em si, devem tambem contar-se entre as exibicoes e os espetaculos de um espfrito que nao conhece mais 0 Ser, mas apenas suas reflexoes no espelho. Stirner -comeca onde 0 individualismo cessa de ser frivolo. E verdade que tambem se preocupa com uma "formacao da personalidade livre", mas no sentido de um retirar-se do mundo do "homem que so pertence a si-proprio": ele preocupa-se com o rompimento de seus vinculos t) seus compromissos existenciais, com sua Iibertaeao de toda alteridade antica das coisas e dos seres, que s6 podem servir ainda de "alimento" ao seu serpr6prio. A oposicao entre 0 Unico de Stirner e 0 Individuo de Kierkegaard chega ao maximo de clareza quando surgem as questoes que se referem Ii responsabilidade e Ii verdade. Para Stirn~r, ambas tern que ser, necessariamente, questoes falsas. Mas e importante constatar que, crendo destruir os dois conceitos fundamentais, Stirner destruiu somente sua forma rotineira, preparando assim, contrariamente a qualquer intencao sua, a purificacso e renovacao de ambos. Contemporaneos seus, ten tan do escrever hist6ria, tacharam-no de moderno sofista: mas desde entao a funyii'o de sofistas e; com isto, tambem ~ funyao dos que se Ihes assemelham, foi reconhecida como uma funcao de preparar dissolvendo. E possivel que Stirner tenha compreendido tlio pouco a Hegel quanto Protagoras a Heraclito; mas assim como nada e dito ao se criticar Protagoras por ter devastado os jardins do grande cosmologo, assim tambem Stirner nao e atingido ao ser ridicularizado como intruso, insuspeito e irreverente, nos campos da filosofia pos-kantiana. Stirner nlio e, e os sofistas tambem nii'o 0 sao, urn curioso interludic na historia do pensamento humano. Como eles ele e um Epeisodion no sentido original: no seu monologo, a ;yli'O muda secretamente; 0 que se segue e algo de novo; assim como Prota. goras levaao seu contemporaneo S6crates, Stirner leva ao seu contemporaneo Kierkegaard. A responsabilidade pressupoe alguem que se dirige a mim de. uma forma primaria, isto e , de urn ambiro independente de mim mesmo, e a quem eu devo prestar contas. Ela se dirige a , mim a respeito de algo que me confiou e de cuja tutela estou incumbido. Ele se dirige a mim no imago da sua confianca e eu respondo na minha leald ade ou recuso-me a responder na minha deslealdade ou entao, tendo cafdo eu na deslealdade, me liberto
I
lidade: prestar contas daquilo que nos foi confiado, diante daquele que no-lo confiou, que lealdade e deslealdade venham II luz do dia, mas nao ambas com 0 mesmo direito, ja que precisamente agora permite-se a lealdade renascida dominar a deslealdade. La onde nenhuma reivindicacao primaria pode me tocar, pois tudo e "Minha propriedade", a responsabilidade tornou-se um fantasma. Todavia, dissolve-se com isto, ao mesmo tempo, o carater de reciprocidade da vida. Quem cessa de dar a resposta, cessa de ouvir a palavra. Mas 0 que esta sendo questionado por Stirner nao e absolutamente esta realidade da responsabilidade; ela the e desconhecida. Stirner simplesmente desconhece aquilo que, de realidade elementar, acontece entre urn ser e outro ser; ele desconhece entao tambem os misterios da ap6strofe e da resposta, da reivindicacao e da negacao, da palavra e da replica; isto nunca foi por ele experienciado, porque 0 homem s6 pode experiencia-lo quando n[o se fecha a alteridade, II primitiva e ontica alteridade do outro (ll primitiva alteridade do outro que, naturalmente, mesmo em se tratando de Deus, nli'o se deve restringir a uma "total alteridade "), 0 que Stirner, com sua forca destrutiva, ataca com sucesso e 0 substituto de uma realidade em que nao se acredita mais; e a responsabilidade fictfcia face a uma razao, a uma ideia, a uma natureza; uma instituicao face a toda especie de fantasmas ilustres, face a tudo aquilo que nao e essencialmente uma pessoa e portanto nao pode realmente levar II responsabilidade, como faze-lo pai e mae, prfncipe e mestre, esposo e amigo, como pode faze-lo Deus. Ele quer mostrar a nulidade da palavra que degenerou numa frase; mas nunca conheceu a palavra viva; desvela aquilo que conhece; ignorante da realidade, cuja aparencia e a aparencia, demonstra que sua natureza e aparencia. Stirner dissolve a dissolucao. "0 que voces cham a m de responsabilidade e uma mentira!" grita - e tem razao; e uma mentira. Mas ha urna verdade. E 0 caminho que a ela leva estara mais desimpedido depois que a mentira tiver sido desmascarada, Kierkegaard tem em mente a responsabilidade verdadeira quando, passando por Stirner numa disparada parab6lica, fala sobre a multidao e sobre 0 Individuo: "Ou bem a multidao permite uma total falta de arrependimento e de responsabilidade ou entao ela enfraquece a responsabilidade do Indivfduo, pois a reduz ao tamanho de um fragmento." Estas palavras, as quais pretendo retornar, nao se referem mais a uma Ilusao de
84
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
85
43/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial sucubo,-slidepdf.com com 0 qual 0 homem s6 pode imaginar fantasma, e urn gico
responsabilidade sem receptor, mas referem-se a responsabilidade genufna, novamente reconhecida, onde aquele que me confiou urn bern exige-o de mim e eu devo abrir as maos ou elas petrificarao. U~il
,.
Stimer desmascarou como irreal a responsabilidade
apenas
etica, exporldo a nao-existencia dos pretensos receptores enquanta tais; Kierkegaard proclamou novamente a responsabilidade que reside na fe. E 0 que vale para a responsabilidade, vale para a pr6pria verdade. Aqui 0 encontro parab6lico torna-se mais inquietante ainda. "Verdade ... s6 existe - na tua cabeca." "A verdade e uma - criatura." "Para Mim nao existe verdade, pois nada Me supera!" "Enquante tu cres na verdade, nao cres em ti... Tu sozinho es a verdade." 0 que Stirner empreende aqui e a dissolucao da verdade possuida, da verdade de que se pode tomar posse e que e possufvel, do bem comum "verdade" que e ao mesmo tempo independente da pessoa e acessivel a pessoa. Ele nao a empreende, como os sofistas e outros ceticos, por rneios epistemologicos; 0 metodo epistemol6gico parece nao the ser conhecido, ele se comporta de forma tio audaciosarnente ingenue como se Hume e Kant nunca tivessem vivido. A epistemologia, entre tanto,. tambem nio the teria fornecido aquila de que precisava; POtS ela, bem como a teoria solipsista, conduz sempre somente ao sujeito cognoscente e nao a pessoa humana concreta, visada por Stirner com urn fanatismo indesviavel. 0 meio pelo qual empreende a dissolu~io da verdade possufda e a demonstracao de que ela e condicionada pela pessoa. "Verdadeiro e 0 que e Meu" - esta ja af oculto 0 principio basico dos nossos dias: "0 que eu considero verdadeiro e condicionado por aquilo que eu sou"; a este juntam-se duas sentences para servir de alternativa ou combinacao - certamente para 0 espanto de Stirner, mas numa sequencia 16gica e como uma exposicao inseparavel. Sao elas: "e 0 que eu sou, e condicionado por meus complexos" e "e 0 que eu sou e co~dicionado pela classe a que pertenco", com todas as suas vanantes. Stirner e 0 pai involuntario das modemas relativizacoes psicol6gicas e sociol6gicas que, por seu lado - antecipemos isto desde ja - sao ao mesmo tempo verdadeiras e falsas. E novamente S tirner tem razao, novamente dissolve a disso-
lucso. A verdade possutda nem chega a ser uma criatura, e um
eficazmente estar vivendo, mas com 0 qual n so pode viver. Tu nao podes deglutir a verdade, eia nfo e cozida em nenhuma panela do mundo, tu nem podes flta-la boquiaberto, pois ela nao e urn. objeto. E contudo, existe uma participacao no Ser da verdade .inacessivel - para 0 homem que passa pela prova. Existe uma rela~ao real entre a totalidade da pessoa humana e a verdade nao pos suida, nao possurvel, e esta rela~ao se completa somente no ato de pass ar pela prova. Esta relacao real, qualquer que seja 0 nome que lhe e dado, e a relacao com 0 Ente.
o redescobrimento da verdade, destronada no mundo humano pela aparencia da verdade mas que e, na verdade, eternamente irremovtvel, que nao podemos possuir mas a qual e pela qual podemos servir por meio da percepcao e do ato de passar pela prova, este redescobrimento e realizado por Kierkegaard numa serie paradoxal de sentences. Comeca com as pal a vras: Aquele que a (a verdade) comunica e soment e urn I ndivf duo; e portanto, sua comunicacao e urn comport ament o face ao Indi vfduo; pois esta vis~o da vida, "0 Indivfduo", e precisamente a verdade.
Escutemos com atencao, Nao e 0 fato do Individuo existir e nem que ele deva existir que e aqui descrito como verdade, mas e "esta vis ao da vida", que consiste no existir do Individuo e, por isso, e tambem com ele simplesmente identificada: sec 0 Indivfduo e a comunicacao da verdade, isto e , da verdade humana. "Tu sozinho es a verdade", e 0 que diz Stirner; "0 Indivfduo 6 a verdade", 6 0 que se diz aqui; este 0 inquietante e parab6lico fenomeno de palavras que apontei: e numa "epoca de dissolucso" (Kierkegaard) existe um ponto vazio, no qual 0 Nao e 0 Sim encontram um-ao-outro e passam um-pelo-outro, com toda a sua forca, mas de uma maneira puramente objetiva e sem disto ter consciencia, Kierkegaard prossegue: A verdade nio pode ser comunicada nem recebida, exceto como se fosse diante dos olhos de Deus, exceto com a ajuda de Deus, exceto a ss im, q ue De us e steja tambem af prese nte, qu e ele seja a de termina ~io intermediaria, assim como ele e a verdade ... Pois Deus e a verdade e a sua codetermlnacao.
Entao: " '0 Indivtduo' e a verdade" e "Deus e a verdade", Isto e verdadeiro, porque 0 Indivfduo "corresponde" a Deus. e por isso que Kierkegaard pode dizer que a categoria "0 Indivfduo" e e permanece "0 ponto fixo que pode oferecer apoio contra a confusao pantefsta", 0 Indivfduo corresponde 87
86
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
44/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
a Deus. Pois "ser homem quer dizer ser aparentado com a divindade". Na linguagem do Antigo Testamento: 0 Indivfduo realiza a "imagem" de Deus, justamente por ter-se tornado urn Indivfduo, Na unica linguagem em que uma geracao que luta com 0 problema da verdade, que a ele sucumbe, que dele se desvia, mas que tambem 0 agr ide de novo, pode compreender
talmente estranhos urn ao outro, nada tendo a ver urn com 0 outro, mas que - um-com-o-outro - nos interessam: nao ha cern anos, mas hoje; urn anunciando a decadencia como decadencia, 0 outro demonstrando a inviolabilidade da estrutura eterna. Nao obedecer mais a nenhum senhor usurpador, eis a exigencia de Stimer; Kierkegaard nao tern nenhuma - ele
a dominacao: 0 Indivf duo passa existencialmente pela prova da verdade que emerge pelo fato de "0 existir pessoal expressar 0 que e dito (eu diria: 0 que nao e dito) ", Existe este lado humane da verdade: na existencia humana. Deus e a verdade, porque ele e; 0 Indivfduo e a verdade, porque ele se encontra para a sua existencia.
repete 0 antigo, abusado, profanado, gasto, 0 inviolavel: obedecer ao Senhor. Se urn homem se toma urn Indivfduo, "en tao a obediencia e aceitavel", mesmo no tempo da dissolucao, quando a obediencia nao e aceitavel de outra forma.
Stimer dissolveu a verdade apenas noetica e, contra to d o 0 seu saber e 0 seu querer, liberou 0 espaco em que penetrou a verdade acr editada e compr ovada de Kierkegaard, a verdade que nso se pode m~s receber e possuir apenas pela noese, mas que deve ser existencialmente realizada a fun de ser intimamente conhecida e ser comunicada. Mas ha aqui ainda urn terceiro e ultimo fator de contato e de repulsao, Par a Stirner, todo homem e 0 Unico, se ele somente se descartar de toda carga Ideologica (a qual pertence aqui 0 religioso) e se estabelecer como 0 dono de sua propriedade, 0 mundo. Para Kierkegaar d, "todo, absolutamente todo homem" que "pode e deve" ser "0 Indivfduo", - ele s6 deve ... , sim, deve ele somente? Ele s6 deve tornar-se urn Indivfduo. Pois "0 caso e este, esta categoria nao pode ser ensinada de uma catedr a, ela e uma aptidao, uma arte, ... e uma arte cuja pratica poderia, com 0 tempo, exigir a vida daquele que a exerce". Mas quando investigamos com cuidado se afinal de contas niio existe em algum lugar uma def lnicao mais pr6xima, mesmo que nao seja ensinada de urna catedra, encontraremos uma, - nao mais do que uma, nao mais do que uma unica palavra, mas ela e encontrada: "obedecer". Em todo caso, isto e proibido ao Unico de Stimer pelo seu autor em qualquer circunstancia: sirn, e facil verificar que par tras de todas as proibicoes de Stimer ao seu Unico esta se apresenta como a proibicao real, a abran-
°
gente, a decisiva. Com este unico verbo, com esta "palavracoman do". Kierkegaard repele decisivamente 0 espmto que "na epoca da dissolucao" e sem que ambos 0 soubessem aproximouse tanto dele, aproximou-se demais dele. E contudo - como mostram as luzes do nosso tempo ambos atuam juntos, fundamentalmente difer entes, fundamen-
Stimer leva os homens de r uelas de toda especie para 0 campo aberto, onde cada urn e 0 Unico e onde 0 mundo e sua propriedade. Af eles se agitam na futil ausencia de compromissos e nada resulta a nao ser a agitayao, ate que, urn ap6s 0 outro, comece a perceber qual 0 nome deste campo. Kierkegaard leva a urn "desflladeiro": sua tarefa e , se possfvel, levar multos, convida-los, induzi-los a forear 0 caminho por este desflladeiro que e "0 Indivfduo", pelo qual, bern entendido, ninguem passa sem tomar-se "0 Indivfduo": 0 contrano e claramente u r na i m p os sibilidade categorial.
E u penso, entr etanto, que na hist6ria r eal ocaminho para este desflladeiro atravessa aquele campo aberto que se chama em primeiro lugar de egofsmo individual, depois de egofsmo cole. tivo e, finalmente, por seu verdadeiro nome, que e desespero. Mas ha realmente urn caminho atraves do desfIladeiro? g possfve1 realmente tornar-se urn Indivfduo? Eu proprio nao pretendo se-Io ja, diz Kierkegaard, porque, embora por isto ja tenha lutado, ainda Dio 0 consegui; continuo porem lutando, mas como alguem, no entanto, que nfo esquece que ser "urn Indiv{duo", no sentido mais elevado, esta alem da s forcas de urn homem.
"No sentido mais elevado" - e 0 dizer cristae e cristol6gico e manifesta 0 paradoxo da tarefa crista: mas e convincente tambem para 0 nao-cristso. Esta implfcito neste dizer 0 pensamento que nenhurn homem pode afirmar de si mesmo que tenha se tornado 0 Indivfduo, ja que permanece sempre, superior a ele, irrealizado, urn sentido ainda mais alto da eategoria; mas esta implfcito ao mesmotempo 0 pensamento que todo homem tern, apesar de tudo, a possibilidade de tornar-se urn I ndivfduo. As duas coisas s[o verdadeiras.
88
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
89
45/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com poss ive l trabalhar d e urna rnane ira dec isiva para a e te~i~de onde 0 Urn existe; e ser este Urn, que todos podern se tomar , slgnifi ca querer deixar-se ajudar por Deus.
So e
Este
e
urn caminho.
E, entretanto,
nao
e
0 caminhc:
por razoes de que nao falei
neste capitulo e das quais terei que falar agora.
2.0 INDIVIbUO E SEU TU Como vimos, 0 "tornar-se urn Individuo" de Kierkegaard nao e pensado no sentido socratico: este tornar-se tern por finalidade nao a vida "verdadeira", mas 0 penetrar em uma relaYlO. Tornar-se signiflca aqui tornar-se para alguma coisa, "para" no sentido rigoroso da palavra, em urn sentido que simplesmente transcende o ambito da pr6pria pessoa; significa estar preparado para a unica relaylio, que s6 pode ser penetrada pelo Indivfduo, o Urn, relacao em funcao da qual 0homem existe. Esta relacao e exclusiva. n a relacao exclusiva, e isto significa, de acordo com Kierkegaard, que e a relayao excludente, que exclui todas as outras relacoes ou, mais exatamente: que, gracas a sua essencialidade unica, bane todas as outras relacoes para 0 reino da inessencialidade. 91 90
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
46/89
5/17/2018
Mas desse modo a categoria do Individuo, recem-descoberta de uma forma adequada, esta sendo funestamente mal compreLIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com "Cada urn deve ser apenas cauteloso no seu contato com endida. 'os outros' e apenas deve falar de urna forma essencial com Kierkegaard, 0 cristae preocupado com a "contemporaneiDeus e consigo mesmo", di z ele na exposicao da categoria; dade" Com Jesus, contradiz aqui 0 seu mestre. cada urn - e assim que devemos compreender isto - ja que cada A pergunta feita a Jesus de qual 0 "grande" mandamento urn pode tomar-se 0 Urn. que englobe e fundamente todos os outros -. pergunta que 0 "com Deus" e 0 "consiAqui, a ja liga~o estabelecida entre go mesmo" constitui urna grave discordancia que nada pode atenuar. Todo 0 entusiasmo dos fllosofos pelo monologo, de Platso a Nietzsche, nao toea a simples experiencia da fe de que falar com Deus e algo to to g en er e diferente do "falar consigo-mesmo", enquanto, de forma estranha, nao e algo to to g e ne re diferente do falar com urn outro ser humano. Pois no Ultimo caso e comum a urn e outro 0 fato de serem alvo de uma aproximacao, de urn toque, de uma palavra, fato que n[o pode ser antecipado em nenhuma profundidade da alma; isto nao lhes e comum no p~ir() caso, a despeito de todas as aventuras que desdobram a alma .;_jogos, inebriacoes, sonhos, visoes, surpresas, imprevistos e encantamentos -, a despeito de todas as tensoes e divisOes e de todas as imagens nobres e fortes usadas no intercambio consigo mesmo. "E entao urn tomou-se dois" (Nietzsche) - 0 que nunca pode ser onticamente verdadeiro, como tambem nso pode se-lo 0 contrario "urn e urn reunidos em urn" (Eckhart). S6 quando eu chego a ter urna relacao essencial com urn outro, de forma que ele nao e mais urn fenomeno do meu Eu, mas e 0meu Tu, s6 entao eu experiencio a realidade do falar-com-alguem - na inviolavel autenticidade da reciproci-
dade. Mas neste ponto Kierkegaard parece corrigir-se a si mesmo. No seu Didrio onde coloca a questao: "E como e que alguem se torn a urn Indivfduo?", a resposta inicia-se com a formulacao obviamente mais valida para 0 problema em discussao: "No que diz respeito as aspiracoes suprernas", devemos "nos relacionar unicamente com Deus".
nlt'o. e ~a apenas imaginada para "tenta-lo", mas que era uma po~eIDlca co~um e significativa da epoca -, responde Jesus, urundo os dois mandamentos do A n ti go T e sta m e nt o, os quais, melhor que todos os outros, se apresentavarn para a escolha da resposta: "Ama a Deus com todo 0 teu poder" e "Ama teu companheiro como a ti rnesmo". Ambos devem, pois, ser "arnados",Deus e 0 "companheiro" (isto e. nao 0 homem em sua generalidade, mas 0 homem que. vez apos vez, me en contra n~ decorrer da vida), porem de formas diferentes: 0 companhei- :1 ro deve ser amado como meu igual (nao "como eu me arno a § mim mesmo"; em ultima realidade 0 hom em n[o se arna a si ~ mesmo; pelo contrari~, deve aprende~ a se arnar somente atraves € d~ amo r do companheiro), cornpanheiro a quem devo, portanto.Yt evidenciar amor assim como desejo que 0 amor me seja evidenciado - mas Deus deve ser arnado com toda a minha alma e com toda a minha forca. Unindo os dois mandamentos, Jesus traz a luz a verdade do A ntig o T es ta m en to , segundo a qual Deus e 0 homem nao SIlo rivals. arnor exclusivo a Deus ("com todo o teu coracso") e , p orq ue e le e D eus, urn amor inclusive, pronto a acolher e incluir todo 0 arnor. Nao e a si mesmo que Deus cria, nao a si mesmo que ele redime; e mesmo quando ele "se e e a si mesmo que ele revela: sua revelacao nso 0 revela", nao tern por objeto. Ele se limita em toda sua ausencia de limites cria urn espaco para os seres - e assim, no amor que lhe e dedi: cado, cria urn espaco para 0 amor aos seres.
a
Se compreendermos nesta frase a palavra "supremas" como restritiva quanta ao seu conteudo, entao a frase torna-se auto-
"Para chegar a amar", diz Kierkegaard sobre sua renuncia a Regina Olsen, "tive que remover 0 objeto", Isto signiqca'entender mal a Deus da forma mais sublime. A criacao 0[0 e urna barreira no caminho que leva a Deus, ela e este proprio caminho. S omas criados um-com-o-outro e tendo em vista uma existencia
-evidente: as aspiray('jes supremas s6 podem ser recebidas pelo Ser supremo. Mas ela nao pode ser assim compreendida, como fica claro na outra sentenca ("Cada urn deve .;" ). Se juntarmos as duas sentencas, entao resulta como pensamento de Kierkegaard que 0 Indivfduo relaciona-se essencialmente (sem "cautela") unicamente com Deus.
ern As criaturas saoencontre colocadasDeus no atraves meu caminho que comum. eu, criatura como elas, delas e para com elas. Urn Deus que fosse alcancavel pela exclusao das criaturas nao seria 0 Deus de todos os seres, em que todos os seres se realizam. Urn Deus em quem somente se cruzam as vias paralelas de acesso seguidas pelos Individuos e mais aparentado com 0
92
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
93
47/89
"Deus dos filosofos" 5/17/2018
do que com
0
"Deus de Abrao, de Isaac
Deus e portanto,
de acordo com ele, Lutero nfo fala essencial-
e de Jaco .... Deus quer que a ele venhamos porrneio das Reginas mente mas apenas simbolicamente com Catarina; apesar de vinLIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
que criou e na o por meio da nossa renuncia a elas, Quando remo ve mo s 0 objeto, entao - rem ovem os o objeto; sem objeto, simulando ainda apenas 0 objeto a partir da plenitude do espirito humane e chamando-o de "Deus", este amor habita 0 vazio. "Devemos conduzir
0 assunto
de volta ao mosteiro do qual
seevadiu Lutero",pode assim Kierkegaard a tarefa de sua epo-a ca. "Mosteiro" ser define aqui compreendido somente como protecso institucional do homem contra uma relacao essencial que inclui sua.totalidade - com outros a nao sec Deus. E certamente para alguem tao protegido torna-se possivel a orientacao para 0 ponto chamado Deus com uma precisao que n ao se ria alcancavel de outra forma. Mas "Deus", neste caso, so ed e fato ainda 0 ponto final de uma linha de orientacao do homem. Ora, para atingir 0 Deus real nao existe linha.mais curta do que a linha mais longa de cad a homem: a linha que circunda 0 mundo acessivel a este ,,"omem. Pois ele, 0 verdadeiro Deus, e 0 criador e todosos seres, na su a criacao, estao diante dele, um em relac;ao ao outro, to rn an do -s e u te is nasua coexistencia para os seus objetivos de criador. Ensinar uma relacao ac6smica com Deus e nio eonhecer 0 c riad or, A ad orac ao ac osm ic a de ur n Deus, de quem sabemos com Kierkegaard "queele quer ser urna pessoa na sua relac;aocontigo" como umato de sua graca, e marcionismo sem c o er en c ia l og ic a : esta adoracao nao separa radicalmente o criador do redentor, como deveria faze-to se fosse coerente. Nllo podemos,
entretanto,
deixar de considerar
o fato de
que interessado desaereditar Kierkegaardnse Lutero por este estaabsolutamente seevadir do mosteiro. Ele trataem uma vez 0 casamento de Luterocomo algo despojado de todo carater proprio Il pessoa, de tudo que erelacao imediata entre homem e mulher, como uma a9ao simb6lica, urn ato que manifesta representativamente a transformacao da historia espiritual do
culado ao mundo, ele permanece na realidade sem mundo e "sozinho diante de Deus". Mas as a90es simbolicassao justamenteopostas: por meio de uma, e afirmada a um destes seculos a palavra de urn restabelecimento do vinculo corn 0 mundo, mesmo que talvez este vinculo seja,em ultima analise, se m compromisso; por meioda outra, e afirmada ao outro seculo a palavra de uma remlncia novo e, em todo caso. rica em compromisso. E por que razao? Porque 0 seculo dezenove caiu sob 0 poder da "multidao" e "a multidao e a nao-verdade".
Mas temos agora duas possibilidades. O u 0 vinculo com 0 mundo, pregado por Lutero con forme a propria vida, e para Kierkegaard contudo apenas urn vrnculo semcompromissos, nao "essencial" e nao necessario para que sua epocaseja conduzida a Deus. Mas este seria urn Lutero quedeixa algo que e livre de compromisso agir como se. fosse compromissivo; que tern para os homensum depoimento diferente do que para Deus e que trata 0 sacramento como se este se realizasse exteriormente a Deus; e· seria este urn Lutero em cuja a~ilosimb6lica nao poderia residir autoridade alguma. Ou entao 0 vinculo com o mundo pregado con forme a propria vida por Lutero e para Kierkegaard urn vinculo compromissivo, essencial e necessario para-conduzir a Deus. Neste caso, a diferenca entre as epocas historicas, indubitavelmente uma diferenca qualitativa, Intrometer-se-ia em algo que e , fundamentalmente, independente da historia, ainda mais independente desta do que 0 nascimento e a morte: a relacao do Individuo com Deus. A natureza essencial desta relacao nao pode assumir uma forma naquele seculo e outra neste; ela nao pode num seculo passar atraves do murido e, no outro, passar par cima e alem dele. As representaeoes hurnanas da relacao mudam, a verdade da rela~!o e imutJvel, pois esta situada na reciprocidade etema e Olio e 0 homem quem determina como chegar a ela mas e oCriador que, na inequivocidade da sua criayao do homem, instituiu 0 caminho de
faze-lo. Certamerite nao e possivel falar de Deus em outros termos que nao sejam dialeticos, pois ele nao esta sujeito ao princfpio de contradicao. Mas existe urn limite da dialetica oode, embora cessem as afirmacoes, existe 0 conhecimento. Quem daqueles que professam 0 Deus que Kierkegaard e eu professamospoderia super com entendimento decisivo que Deus quer que se diga Tu de uma forma verdadeira somente a ele e que a todos os
94
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
95
48/89
5/17/2018
aquele na casa de banhos, antes de pular na agua: "eu nada mais outros se diga apenas urn Tu nao essencial e na realidade sem tenhoedo a ver com gico 0 mundo". Ele desnuda diante de nossos olhos LIV__Martin Buber. Do di logo dial -slidepdf.com valor, - quem poderia supor que Deus exige que escolhamos algumas raizes da sua "melancolia", Sabe exatamente 0 que 0 entre ele e sua criacao! Faz-se a objecao de que 0 rnundo enlevou a ter relacoes apenas cautelosas corn os outros e a falar quanta mundo decaido nao pode ser identificado com a criacao. de uma forma essencial somente com Deus e consigo mesmo. Mas que queda poderia ser tao poderosa que, pa ra D eus, separasE contudo, tilo logo corneca com a linguagem "direta", ele a se violentamente 0 mundo de sua criacao! Isto signiflcaria fazer expressa como urn irnperativo: cada um deve agir assim. Mostra da a
sua propria sombra sem cessar - e quer, por cima dela, saltar. excluido e abandonado .e, certamente, assirn somos todos nos. pois assim e 0 hom em como homem; Kierkegaard entretanto foi levado ao limite da exclusao e do abandono e ele 56 man tern ainda 0 equihbrio gracas a incrivel florescencia da sua existencia "de escritor", contidamente comunicativa, com as complicadas defesas de todos seus "pseudonimos"; enquanto que nos nao estamos no limite e isto nso significa nenhum ainda-nao e nenhuma especie de compromisso, nenhum agarrar-se ao lado de ca da melancolia; e a existencia organica e a graca da preservacao e e significativo para 0 futuro do espirito. Kierkegaard comporta-se para conosco como urn esquizofrenico que tenta atrair 0 Individuo amado para "seu" mundo como se este fosse 0 verdadeiro. Mas este nao e 0 mundo verdadeiro. Nos pr6prios, que caminhamos num cume estreito, nao podemos recuar diante da visao da saliencia do rochedo em que ele esta de pe, pairando sobre 0 abismo, e nem nele devemos pisar. Temos muito que aprender com ele, mas nso a ultima li
E um homem
Nossa rejei
96
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
a
97
49/89
5/17/2018
teria permanecido com Regina". Com isto ele quer dizer: Se eu sao submetidos a relacao essencial com LIV__Martin Deus. Porem somente Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com tivesse realmente acreditado que "para Deus, tudo e possfvel" aqueJe que se relaciona de uma forma essencial com os homens e que the e portanto tambem possivel resolver minha melancopode agir e sofrer de uma forma essencial em relacao a eles. lia, minha fraqueza, meu medo, meu sentimento de alienacao, Se 0 etico e 0 unico meio pelo qual Deus se comunica com 0 marcado pelo destino, para com a mulher e com 0 mundo, entao homem, entao a mim e proibido falar essencialmente somente eu teria permanecido com Regina. Mas querendo isto dizer, diz com Deus e comigo mesmo. E assim e de fato. Nao digo que isto ainda algo diferente: que 0 Indivfduo - se ele realmente acrediseja proibido a Kierkegaard na sua ponta de rochedo, sozinho ta, e isto significa: se ele e realmente 0 Individuo (Individuo com a miseric6rdia do misericordioso. Digo somente que isto e que ele se tornou, como vimos, para a unica relacao de fe) proibido a mim e e proibido a ti. po de e e-lhe permitido travar uma relacao essencial com urn Kierkegaard esta profundamente consciente da problematioutro, Mas por tras disto desponta 0 extremo: que aquele que ca que surge da expansao negativista da categoria do Individuo. po de e para quem e permitido tambem deve faze-lo. "0 unico Ele escreve no seu Didrio, e n6s 0 lemos com 0 mesmo medo e meio pelo qual Deus se comunica com 0 homem e 0 etico" tremor com que ele escreveu: "0 ternvel e que justamente a o etico, entretanto, na sua verdade nao falsificada, significa: mais alta forma da piedade - abandonar as coisas terrestres ajudar Deus, amando sua criacao em suas criaturas, amandopode ser 0 mais alto egofsmo". Evidentemente, faz-se aqui ainda as em direcao a ele. Para isto, sem duvida, e preciso deixar-se uma distincao de acordo com os motivos, e 0 conceito de egofsajudar por ele. mo aqui usado t'um conceito de monvacao. Se colocarmos em seu lugar urn conceito objetivo, urn conceito que diz respeito a uma situacso, a sentenca transformar-se-a numa mais terrivel ainda: "aquilo que se nos apresenta como a forma suprema de pie dade - abandonar tudo que e terrestre - e justamente 0 supremo egofsmo".
e
verdade que 0 Individuo "corresponde" a Deus? Atualiza a "imagem" de Deus somente por ter-se tornado urn Individuo? Falta ainda alguma coisa para que assim seja, - a coisa decisiva. "Certamente ", diz Kierkegaard, "Deus nao e egofsta, mas ele infinito". Contudo, isto e dizer pouco do Deus por n6s professado - se de todo nos atrevermos a fazer qualquer afirma~iIo. Ele paira sobre sua criacao nao como sobre urn caos, ele a abraca. Ele eo Eu infinito, que transforma to d o Isto em seu Tu.
e
0 Ego
o Indivfduo cor • esponde a Deus quando, de urn modo humano, abraca a porcao do mundo que lhe e oferecida, assim como Deus abraca, de urn modo divino, a sua criacao. Ele atualiza a imagem quando, na medida do possivel, ao seu modo pr6prio de pessoa, diz Tu com seu ser aos seres que vivem em seu redor. Ninguem pode refutar Kierkegaard como 0 faz 0 pr6prio Kierkegaard. Argumentando consigo mesmo, julgando-se, corrige-se das profundezas seu pr6prio esptrito, as vezes antes deste ter pronunciado sua palavra. Em 1843 Kierkegaard registra em seu Didrio a indelevel confissao: "Se eu tivesse tide fe,
"0 Indivtduo e a categoria pela qual, do ponto de vista religioso, devem passar 0 tempo, a hist6ia, a geracso." Que e isto, ponto de vista religioso? Urn ponto de vista entre outros pontos de vista? A nossa visao de Deus, adquirida por termos desviado 0 olhar de todo 0 resto? Deus, urn objeto ao lado de outros objetos, 0 eleito ao lado dos rejeitados? Deus, como 0 rival bern-sucedido de Regina? E este ainda Deus? N[o e este apenas urn objeto adapt ado a genialidade religiosa? (Bern entendido, nao falo da santidade verdadeira, para a qual, ja que ela santifica religiosa? exite urnexistir "pontogenies de vista religioso".) tudo, nao Podem genialidade religiosos? NlioDae esta uma contradictio in adjecto? Pode 0 religioso ser uma especificacao? Os "genies religiosos" sao genies teol6gicos. Seu Deus e 0 Deus dos teologos. E verdade que este nlo e 0 Deus dos fil6sofos, mas tambern nlo e 0 Deus de Abrao, de Isaac e de Jac6. 0 Deus dos teologos tambern e urn Deus logicizado; tambern 0 e 0 Deus de uma teologia que s6 quer falar dialeticamente e que se coloca acima do princfpio de contradicao, Enquanto praticam teologia, nlo conseguem libertar-se da religiao como uma especiflcacso. Quando Pascal, numa hora vulcanica, fez aquela balbuciante distincao entre Deus e Deus, ele nao era urn genic, mas urn homem que experienciava 0 ardor primitivo da fe; em outras ocasioes, entretanto, era urn genic teol6gico e perrnanecia na religiao especificadora da qual 0 arrebatara 0 acontecimento daquela hora. 99
98
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
50/89
5/17/2018
0 seu alvo. DeusBuber. A religifo como especifica~lo erraLIV__Martin nao e Do di logo edo dial gico -slidepdf.com objeto ao lade de outros objetos e por isso n so pode ser arcancado pela remincia aos objetos. E : verdade que Deus nfo e o universo, mas muito menos verdade ainda e que ele seja 0 Ser menos 0 universo. N so 0 encontraremos pela subtracso e n so o arnaremos pela reducao. IIm
3. 0 lNDIVIDUO E A C OISA P UB LIC A
o pensarnento de Kierkegaard gira em tome do fato dele ter renunciado essencialmente a uma relacao essencial com uma determinada pessoa. Ele nao 0 fez casualmente ou na relatividade das multiples experiencias e decisoes da vida, ou mesmo resignando-se meramente com a alma, mas 0 fez de uma forma essencial. A essencialidade, a essencialidade propriarnente positiva de sua remincia, e 0 que ele quer expressar ao dizer: "Em desafio a todo 0 seculo dezenove, eu nlo posso me casar". A renuncia torna-se essencial pelo fato dela representar no concreto da biografia a renuncia a uma rela~lo essencial com 0 mundo que estorva 0 estar-se sozinho diante de Deus; e isto, como ja foi dito, nlo se da numa s6 vez, como quando alguem entra para urn mosteiro e com isto se desliga do mundo e, desde 100
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
101
51/89
5/17/2018
entao, vive fora deste na qualidade LIV__Martin de quem dele se Buber. desligou, Do di logo edo dial gico -slidepdf.com mas num conc reto particularmente duradour o; a renunc ia torn aurn Individuo, a uma vida de fe solitaria, a urn estar sozinho se 0 ponto de referencia de urn sistema espiritual de coordenadiante de Deus. Certamente, casar- se ou nao se casar e a questao das, no qual cada ponto recebe seu valor posicional em relacao tfpica quando se trata do "mosteiro". Se, como pensa Kierkea este ponto de referencia. E assim justamente que este sistema gaard, 0 Indivfduo deve ser realmente urn homem que nao se recebe seu carater propriamer.te existencial, por meio do qual relaciona essencialmente com os outros, entao 0 casamento e,le deu 0 impulso para uma nova f1losofia e uma nova teologia. E certamente pertence a este concreto da biografia, secularmente significativo, a motivat;ao da rernincia - estranhamente multipla e no entanto indubitavelmente legftima, encontrada, pega por peca, nas sondagens da interioridade - que Kierkegaard expressa direta e indiretamente, insinuando e dissimulando. Mas a1en: disto, numa observacao mais precisa, e possfvel notar ~ue existe uma conexao secreta e inarticulada, importante para Kierkegaard e para nos, entre de urn lado a renuncia e do outro uma opiniao e uma atitude cad a vez mais fortes, finalmente expressas com clareza penetrants em "Anexos" a Meldung.
"A multidao e a nao-verdade." "Esta forma de considerar a vida, 0 Indivfduo, e a verdade." "Ninguem esta excluido da possibilidade ~e s~ tornar urn I ndividun, com excecao daquele que se exclui a SI mesmo ao se tornar multidao." E ainda: " '0 Individuo' e a categoria do esptrito - do despertar e do revivificar espirituais - tao oposta quanta possfvel a pohtica." Indivf duo e a multidao, 0 "espirito" e a "polftica" _ esta oposicao nao poderia ser separada daquela em que Kier kegaard se coloca face ao mundo, manifestando-a simbolicamente
o
o estorva se ele 0 leva a serio - e, se ele na o 0 levar a serio, entao e incompreensivel, apesar da observacao de Kierkegaard a respeito de Lutero, como este Indivfduo pode, enquanto ser existente, ser a "verdade". Para 0 homern - que, no fundo, constitui a unica preocupacao de Kierkegaard - ha ainda urn f ator adicional que, ao seu ver , a mulher permanece, "bern diferentemente do homem", em "urn contato perigoso com a finitude ". Mas acrescenta-se a isto ainda urn assunto especial, que convem agora deixar claro. Quando de certa forma consideramos em sua totalidade a estrutura labirintica do pensamento lderkegaardiano sobre a rennncia, reconhecemos que na o se fala aqui apenas de uma renuncia a vida com uma pessoa, r en un cia d if fc il, dificilmente conquistada, adquirida com 0 sangue do coracao mas, alem desta, da renuncia valorizada pelo pensador de uma fo~a totalmente positiva, renuncia a vida - condicionada pela vida com uma pessoa - com urn ser impessoal que, no primeiro plano do acontecimento, e denominado "gente" e, no fundo, "multidao". Entretanto, este ser na sua essencialidade - da qual Kierkegaard nada sabe ou nada quer saber - recusa estas desi~-
por mein da sua remincia. Kierkegaard na o se casa "ern desafio ao seculo dezenove ". o que ele designa por s ec ul o d ez en ov e c a "epoca da dissoluyao" a epoca da qual diz que urn so homem nao pode "nem ajuda-Ia, nem salva-la", da qual ele pode "somente expressar que ela est a sucumbindo", - que ela sucurnbira, se ela nao vier a Deus atraves do "desfiladeiro ". E K ierkegaard nao se casa num simb6lico. ato de negacao, em desafio a esta epoca, que e 'a epoca da "multIdao" e a epoca da "politica". Lutero casa-se num ato simb6lico, porque queria retirar 0 homem crente da sua epoca
nacoes como caricatur ais e reconhece como se u nome verdadeiro apenas 0 de uma r e s p u b lic a , de uma coisa publica. Quando Kierkegaard di z que a categor ia do "Indivfduo" e "tao oposta quanta possivel a p olftic a", ele se refere o~viamente a urn ~ecanismo que niro tern mais c on ex ao e ss en cia l com a sua ongem, com a polis; mas este mecanismo, ainda que degenerado, e uma das decisoes e manifestacoes da coisa publica. Toda degenerag~o indica 0 seu genero e de uma tal forma que ela nunca se relaciona com 0 ge nero de uma maneira simples como 0 presente com o passadornas como, num rosto desfigurado, a d~formay[o .se relaciona com a forma que por baixo dela subsiste, A coisa
de urn rigido isolamento religioso - que, em ultima lnstancia o isolou da pr6pria graca - para conduzi-Io a uma vida com Deus no mundo. Kierkegaard nao se casa (naturalmente, isto nao pertence a motlvacao subjetiva multipla mas e a significagao objetiva do sfrnbolo), porque ele quer conduzir 0 homem descrente da sua epoca, emaranhado na multidao, a tornar-se
publica que e jambem as vezes cognominada "0 mundo", a saber, o mundo humano, busca realizar nas suas formacoes genufnas, consciente ou inconscientemente, nos moldes da criacao 0 voltar-se-um-ao-outro dos homens; as formacoes falsas deformam, mas elas nao podem eliminar a origem eterna. Kierkegaard, na sua aversao 11 deformacao, da-lhes as costas; mas 0 homem que nao cessou de amar 0 mundo humane em
102
103
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
52/89
5/17/2018
produziremos uma opiniao que seja mais alta. 0 casamento e LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com toda sua degradacao ve, hoje ainda, a forma genuina. Suponhao vinculo exemplar, ele nos leva, como nenhum outro, para a mos que a multidao seja a nao-verdade: ela e apenas urn dos grande vinculacao e e somente enquanto seres vinculados que estados da coisa publica; de que maneira aqui a verdade se compodemos alcancar a liberdade dos mhos de Deus. Sob 0 ponto porta para com a nao-verdade, eis no que devera tocar a verdade vista do hom em: sim, a mulher esta "num relacionamento deira questao que se coloca ao Individuo, questao para a qual perigoso com a finitude" e sim, a finitude e 0 perigo, pois nada aquela advertencia a respeito da multidao s6 pode ser urn constitui para n6s maior ameaca do que a ela ficarmos presos; prologo, mas e justamente a este perigo que esta soldada a nossa esperanca de salvacro, ja que somente atraves da realizacao da finitude A partir d~qui e possivel esclarecer aquele assunto especial e que os nossos caminhos humanos conduzem ao infinite. que, como falei, vern se acrescentar para Kierkegaard aos outros embaracos cau~dos pelo casamento. 0 casamento, compreendido como essencial, leva a pessoa a uma relacao essencial com 0 "mundo"; mais exatamente: com a coisa publica, com a sua deformacao _e sua verdadeira forma, com a sua desgraea e com a sua salva~ao. 0 casamento, como 0 vinculo decisive entre urn ser humano e outro, leva a pessoa ao confronto com a coisa publica e seu destine: n[o e mais possiveI ao homem desviar-se deste confronto no casamento, nesta ele s6 pode ainda provar-se ou fracassar. A pessoa isolada, nao casada ou cujo casamento e a~.nas ficticio, pode conservar-se no isolamento; a "comunidade do casamento e uma parte da grande comunidade inserida com sua problematica pr6pria, na problematica geral, vinculada, com sua es~eran~a .de s~va~ao, a esperanca do grande ser que, na sua condicao mats miseravel, e chamado de multidao, Aquele que "entrou num .casamento ", que penetrou urn casamento, compenetrou-se senamente, na intencao do sacramento do fato ~ue 0 out~o e : do fato que nao posso participar de forma legftima daquilo que e sem participar do ser do outro; do fato que nao posso responder a palavra que Deus me dirige no decorrer de toda a minha vida sem responder tam bern pelo outro; do fato que nao posso responder por mim, sem responder tam bern pelo outro enquanto alguem que me foi confiado. Assim, no entanto o homem entrou decisivamente na relacao com a alteridade: e ~ estrutura basica da alteridade - freqiientemente ameacadora ~~s nunca comp~etamente destituida de santidade ou da possibilidade de santificacao, na qual estamos inseridos eue os outros que me encontram em minha vida - e a coisa publica. E para ela, para dentro dela, que 0 casamento quer nos levar. pr6prio Kierkegaard faz uma vez com que urn dos seus pseud~nimos, 0 "marido" dos "Stadien", expresse isto, porem no estilo de u~a opiniao inferior, que e destinada a ser superad~ ~o~ uma mats alta; mas ela s6 e uma opiniao inferior quando tn~lalizada.' nao existe outra mais alta, porque elevando-nos acnna da situacao em que estamos colocados nunca, na verdade,
o
Este ser humano e outro, essencialmente outro do que eu; e e esta sua alteridade queeu tenho em mente, porque e ele que tenho em mente; eu a confirmo, eu quero que ele seja outro do que eu, porque eu quero seu modo de ser especifico. Este e o princfpio basico do casamento e a partir deste principio, se for realmente urn casamento, ele leva ao entendimento do direito e da legitimidade da alteridade e com isto aquele reconhecimento vital da alteridade multiface - mesmo na contradi~ll'o e no conflito com ela - do qual as relacoes com a coisa publica recebem seu Ethos religioso. Que os homens com os quais estou inserido conjuntamente na coisa publica e com os quais nela tenho aver direta ou indiretamente sejam essencialmente outros do que eu, que este ou aquele nao tenha apenas urn outro modo de sentir, urn outro modo de pensar, uma outra conviccao e uma outra atitude, mas tambem uma outra percep~!Odo mundo, urn outro conhecimento, uma outra sensitividade, urn outro modo de ser tocado pelo Ser; dizer sim a tudo isto, dizer sim de urn modo pr6prio A criatura, em meio de duras situacoes de conflito, sem enfraquecer a seriedade da sua realidade: e isto que nos permite oficiar como auxiliares neste amplo campo que tambem a n6s foi confiado e que e 0 unico onde nos e permitido de quando em quando tocar, em nossas duvidas, com humildade e investigacao honesta, a "verdade" ou "nloverdade ", a "fidelidade" ou "infidelidade ", a "justi~a .. ou "injustica" do outro. Mas a isto leva-nos com urn poder quase insubstituivel 0 casamento se ele e real, pela sua experiencia uniforme da substancia vital do outro enquanto outro e mais ainda pelas suas crises e pela superacao destas que se eleva das ultimas profundezas organicas: quando 0 monstro da alteridade - que ainda ha pouco em n6s soprava 0 seu gelido halite demonfaco e que agora se liberta gracas ao ressuscitar da nossa aflrmacao do outro, que conhece e destr6i qualquer
104
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
105
53/89
5/17/2018
negacso - transforma-se no poderoso anjo de uniao com 0 qual LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gicolatente, -slidepdf.com sonhavamos no utero materno. multidao permanece ela nao aparece sob a forma de uma multidao, ela somente exerce sua acao; e, como se sabe, Ha, scm duvida, entre a coisa privada a qual pertence 0 isto acontece de tal forma que ou eu sou totalmente desobricasamento e a coisa publica uma diferenca generica: a identifigado de formar uma opiniao ou tomar uma decisao OU entao cartio realiza-se, ali e aqui, de uma forma qualitativamente estou, .de certa forma, convicto, numa camada turva da minha diferente. A coisa privada e precisamente aquela com que 0 interioridade, da invalidade do meu opinar e do meu decidir e, homem - pelo menos nas epocas saudaveis desta - pode identino lugar destes, sou equipado com urn decidir e urn opinar reficar-se em toda a concretude, nao obstante as diferencas conhecidamente validos. Os outros aqui eu nem percebo, ja individuais, tais como as de natureza e de espmto, como por que sua sorte e a mesma que a minha e sua alteridade foi exemplo entre os membros de uma familia; ele po d e identifiredescoberta de uma camada de verniz. car-se dizendo, em toda concretude, N6s, mesmo Eu, quando se refere a esta sua familia ou a este seu grupo (0 grupo genufno Destas duas atitudes basicas a primeira e de tal especie que esta, deste ponto de vista, do lado da coisa privada e de outros, ela nos arrebata extasiados para alern da confrontacao com a do lado da coisa pnblica). E com isto ele tern em mente nao grande figura da alteridade na coisa publica, a mais dificil das apenas a totalidade, mas tambem as pessoas singulares reconhetarefas intramundanas, levando-nos para 0 historico paraiso cidas e confinnadas por ele no seu modo de ser especffico; por das multidoes; a segunda solapa 0 terreno onde deve se dar a outro lado, a iijentificayao com a coisa publica nlio pode realconfrontacao, ela apaga os emocionantes signos da alteridade mente englobar as pessoas concretas de uma forma concreta. Talvez eu diga Nos ao falar do meu povo e isto po d e elevar-se ~te atingir 0 elementar "Isto sou Eu"; mas tao logo se junte a isto a concrecao, a atencao as pessoas que constituem 0 povo, abre-se uma fenda ..; 0 conhecimento da intransponivel alteridade multipla penetra a identificacao como urn largo c6rrego. Se coisa semelhante se desse no dominic da coisa privada, ele tornar-se-ia questionavel em si ou passaria a fazer parte da coisa publica; para a relacao com a coisa publica, cada uma destas experiencias pode ser uma prova e uma consolidacao. Em duas atitudes basicas, entretanto, a identificacao com a coisa publica defende-se da concrecao, da atenyliO dirigida a pessoas e afirma-se de uma maneira transit6ria ou duradoura· muito diferentes entre si, todavia, elas exercem frequentemente uma ayao quase igual. Uma deriva do ate de entusiasmo das horas "historicas": a multidao atualiza-se, entra em acao e nela se transfigura e a pessoa, dominada pelo extase embriagador, mergulha no movimento da coisa publica. Nao existe aqui conhecimento que se contraponha a alteridade das outras pessoas ou que a tolha: a transfiguracao da multidao of usc a toda alteridade e 0 ardente impulso de identificacao pode produzir urn real sentimento de "familia" para com 0 desconhecido que acompanha 0 cortejo dos manifestantes ou que se precipita nos nossos braces no entusiastico tumulto da rua. A outra atitude basica e passiva e constante; e a costumeira "adesao" a opiniao publica e a publica "tomada de posicao". Aqui a
e convence-nos entao explicitamente coisa certa.
que a unifonnidade
e
a
A partir daqui torna-se compreensivel a confusao feita por Kierkegaard entre a coisa publica e a multidao. Certamente tambem ele conhece a coisa publica sob a forma de Estado, que e para ele, no entanto, apenas urn fato estranho a transcendencia no mundo da relatividade, urn fato respeitavel, mas sem significacao para a relacao religiosa do Indivfduo; e depois, ele conhece uma multidao que nao e respeitavel mas que tern uma signiflcacao forte mente negativa, dizendo respeito a transcendencia, mas sob a forma de urn compacto satanismo. A esta confusao, que traz consequencias cada vez mais graves para 0 pensamento da nossa epoca, devemos contrapor a forca do discernimento,
o homem na multidao e uma lasca de madeira comprimida num feixe que se move na agua, entregue a correnteza ou empurrado da margem por uma vara nesta ou naquela direcao, Mesmo que para a lasca este movimento pareca as vezes como sendo-lhe proprio, ele nao 0 e ; e tambem 0 feixe em que ela f1utua tern deste movimento autonomo apenas uma ilusao. Nao sei se Kierkegaard tern razao quando diz que a multidao is a nao-verdade - eu preferiria designa-la como a ausencia de verdade, pois ela (diferindo de alguns dos seus senhores) nao esta absolutamente no mesrno plano que a verdade, ela nao lhe e absolutamente oposta. Mas ela e certamente a nao-liberdade.
106 107
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
54/89
5/17/2018
em eteda a fragilidade ser humane - recebe Deus por comBuber.Do di logo do dial gico -de slidepdf.com e possfvel experienciar Em que a nao-liberdade consiste nao LIV__Martin panheiro. adequadamente sob a pressao de uma fatalidade - trate-se da coercao de uma necessidade oude uma coercao human a - pois "0 Individuo" nao e aquele que se relaciona essencialmente resta-nos ainda ai a rebeliso do que ha de mais intimo no nosso com Deus e somenteinessencialmente com os outros, que trata coracao e 0 apelo tacite ao misterio da eternidade; somente e incondicionalmente com Deus e condicionalmente com a coisa possivel experiencia-lo adequadamente quando se esta enfeixado publica. Mas 0 Individuo e 0 homem para quem a realidade da na multidao, pensando 0 que ela pensa, querendo 0 que ela rela~ao com Deus, relacao exclusiva, inclui e abarca a possibiliquer, e so ainda percebendo embrutecidos que e esta a condicao dade de relacao com toda a alteridade e para quem a totalidade em que estamos. da coisa publica, celeiro da alteridade, oferece suficiente alteridade para com isto passar a vida. Bern diferente e 0 caso do hom em que vive com a coisa publica. Para ele, nao se trata de urn enfeixamento mas sim de uma vinculacao. Ele esta vinculado as coisas piiblicas, com ela comprometido, casado, partilhando portanto do sofrimento do seu destino, ou melhor: sofrendo este destino com ela, sempre disposto e pronto para sofre-lo, mas nao se entregando cegamente a nenh4Jl1 dos movimentos da coisa publica, confrontando-os, pelo contrario, atenta e preocupadamente, para que nao percam seu cunho de verdade e de lealdade. Ele ve forcas dando 0 impulso e ve as maos todo-poderosas de Deus, nas alturas, contendo-se im6veis, a fim de que os mortais aqui embaixo possam decidir por si pr6prios. Em toda a sua fraqueza, ele se sabe colocado ao service da decisao. Se e a multidao, a rnultidao alheia a decisao, a multidao contraria a decisao, que 0 cerca fervilhante, nao a aceita: em qualquer lugar que esteja, elevado ou insignificante, com as forcas que possui, poder condensado ou palavra que se perde, ele faz 0 que pode para que a multidao deixe de ser multidiio. A alteridade envolve-o, a alteridade com a qual esta comprometido; mas ele a acolhe em sua vida somente na forma do outro, cada vez do outro, do outro que 0 encontra, do outro procurado, do outro tornado a multidao, do "companheiro". Mesmo quando ele precisa falar a multidao, procura a pessoa, porque e somente atraves das pessoas, das pessoas postas a prova, que 0 povo pode encontrar e reencontrar sua verdade, Este e 0 Indivfduo, que "transforma a multidao em Individuos" - como poderia ser alguem que permanece afastado da multidiio! Nao pode ser aquele que se reserva, somente aquele que se da; que se da. mas que nao se entrega. E uma obra paradoxal aquela na qual ele empenha sua alma, fazer com que a multidao deixe de ser multidao; e retirar 0 homemda multidao e conduzi-Io ao caminho da cria~1I0,que leva ao Reino. E se nao for bem-sucedido, tern tempo, tern 0 proprio tempo de Deus. Pois 0 homem que ama ao mesmo tempo Deus e 0 companheiro - embora permaneca
108
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
109
55/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
4.0
INDIVIDUO NA RESPONSABILIDADE
A categoria do Individuo transformou-se. Nao e possivel que a relacao da pessoa humana com Deus seja estabelecida pela omissao do mundo; 0 Individuo deve, portanto, levar 0 seu mundo, 0 que do mundo de vital lhe e oferecido e confiado, sem reducao, para a devocao de sua vida e deixar este mundo participar integralmente da essencialidade desta sua devocao. Nao e possfvel que 0 Individuo encontre as rnaos de Deus quando estende suas maos para ele por cima e para alem da criacao; ele deve circundar com seus braces este triste mundo, cujo verdadeiro nome e criacao; so entao e que seus dedos alcancam 0 reino do relampago e da graca. Nao e possfvel que 0 espfrito de reducao reine tambem na relacao de fe: 0 Individuo que vive na sua relacao de fe precisa querer que esta se realize nas
111
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
56/89
5/17/2018
dimensoes irreduzidas da sua vida vivida. Ele deve enfrentar com cia que lhe sio feitos, se ele nao poupa a si inesmo e nem a sua LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com comunidade diante de Deus, entao ele experiencia 0 limite. firmeza a hora que dele se aproxima, a hora biograflca e historiEle o experiencia com tanta dor como se the cravassem na alma ca, assim como ela e, com todo 0 seu conteudo do mundo, com o marco do limite. 0 Individuo, 0 homem que vive de uma fortoda a sua contradicao que parece urn contra-senso, sem que ma responsavel, pode tambem realizar suas acces politicas - e as nela ele enfraqueca 0 peso da alteridade. A mensagem que lhe omissces sao naturalmente tambem acoes - somente a partir e transmitida por esta hora, quando. esta situacao se apresenta, ele deve para ouvi-la sem embeleza-la enobrece-la; para nema casta deve traduzir si sua selvagem e asperaou profanidade religiosidade; deve reconhecer que a pergunta que Ihe e dirigida, que se esconde na linguagem da situacao - quer soe ela agora como sons angelicos ou demomacos - continua sendo a pergunta de Deus a ele dirigida, naturalmente sem que com isto os dem6nios se transformem em anjos. Esta e uma pergunta milagrosamente entoada num tom selvagem e aspero; e ele, 0 Individuo, deve responder, responder com sua a~ao e sua omissso, aceitar a hora, a hora do mundo, a hora do mundo inteiro, como hora que se to~u sua, que lhe foi confiada e pela qual deve responder. A reducao e proibida, nso te e permitido escolher aquilo que te convem, a hora cruel esta, toda ela, emjogo, toda ela clama por ti, tu deves responder - a Ele. Ouvir a palavra que te e dirigida, por mais desafinado que seja 0 som com que ela fira 0 teu ouvido, - e nao deixar ninguem interferir! Dar a resposta vinda das tuas profundezas, onde vibra ainda urn sopro daquilo que te foiinsuflado, - e a ninguem e permitido te influenciar! Este arquimandamento,
que
e
0 motivo
pelo qual as Escri-
com quedeseuurna Deusnova ja tale desdequando a cria~ao do mundo,a turas fazem tambem determina forma, obedecido, relacao do Indivfduo com sua comunidade. A pessoa hurnana, queira ela admiti-lo e leva-lo a serio ou nao, pertence a comunidade dentro da qual nasceu ou onde passou a viver por acaso. Entretanto, todo aquele que reconheceu 0 que significa 0 destino, mesmo quando este se assemelha a urn exflio, e que reconheceu 0 que significa estar colocado em algum lugar, mesmo quando parece estar deslocado, este homem sabe que deve admiti-lo e leva-lo a serio, Mas entao, precisamente entso, perce b e ele que pertencer verdadeiramente a uma comunidade encerra a experiencia do limite deste pertencer, experiencia esta que e multiplamente mutavel e nunca pode ser definitivamente formulada. Se 0 Indivfduo percebe fielmente a palavra da hora hlstorlco-biografica, se ele capta a situa~[o do seu povo, a sua pr6pria situa~!o, como urn signo e urna exigen-
daquela profundidade da sua existencia qual quer da penetrar reivindicacao do Deus temfvel e benevolo,nado Senhor hist6riaa e nosso Senhor.
£ evidente que, para 0 homem que vive na comunidade, o solo da decisao essencial da pessoa e constantemente ameacado pelo fato das assim chamadas decisoes coletivas. Eu vos lernbro a advertencia de Kierkegaard: A multidao outorga ou uma ausencia total de arrependimento e uma total irres pons abilldade o u ela en fraq uece em todo ca so a responsa billdade do Indivfduo, reduzindo-a ao tamahho de um fragmento.
Mas isto deve ser colocado de uma maneira diferente: in praxi, no momenta da execucao, trata-se somente da aparencia de urn fragmento, mas em seguida, quando depois de meianoite, es carregado em sonho de vigflia paira diante do Trono e es assaltado pela vocacao a existencia de Individuo que negligenciaste, entao e a responsabilidade total que ressurge.
£ preciso certamente acrescentar que, habitualmente, a comunidade a que a pessoa pertence nao expressa de uma maneira uniforme e inequfvoca 0 que ela considera como certo ou nao numa dada situacso. Ela se desmembra em grupos mais ou menos visiveis, que nos fomecem interpretacees extremamente diferentes do destino e da tarefa, mas que reivindicam todas de uma forma igual a autenticidade incondicional. Cada grupo sabe 0 que e util para a comunidade, cada urn exige que para 0 bern da comunidade tu participes sem reservas do seu saber. Por decisao polftica compreende-se hoje, em geral, a adesao a urn grupodestes. Se a adesao se consumou, entao tudo esta definitivamente em ordem, 0 tempo do decidir-se esta terminado. Daqui por diante n[o preciso fazer outra coisa a nao ser participar dos movimentos edo grupo. Nunca mais nos encontramos numa encruzilhada, nunca mais temos de escolher dentre as atitudes possfveis a atitude certa, tudo ja esta decidido. 0 que acreditavamos antes: que e preciso responder sempre de novo, situacao ap6s situacao, pela escolha que fizemos, disto
112
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
113
57/89
5/17/2018
estamos livres agora. 0 grupo aliviou-nos da nossa responsabiestare'edo pervertendo a minha relacao de fe, estarei cortando do LIV__Martin Buber.Do di logo dial gico -slidepdf.com lidade politi ca. Dentro dele, sentimos que ele responde por domidio do poder de Deus 0 dominic do meu grupo. Mas nao n6s. e comb se este ultimo nao me preocupasse em minha decisao ele md preocupa enormemente; pois em minha decisao eu nao A atitude que acaba de ser descrita, quando acontece ao home abstralo do mundo, olho para ele e para 0 seu interior e e mem de fe (6 s6 dele que aqui quero falar), significa para ele, neste mundo, ao qual devo fazer justica em rninha decisao, que quando ela lhe acontece, sua queda do alto desta f6 - sem que ele esteja disposto a confessa-lo a si mesmo ou admiti-lo, Significa sua queda efetiva do alto da fe, por mais sonora e enfaticamente que ele continue a proclama-la nao s6 com os labios mas tambem com a alma, que com seus gritos se sobrepoe a realidade mais intima. Quando a relacao da f e com 0 Ente Unico nao e todo-englobante, ela e pervertida, tornando-se aparencia e auto-engano. A "religiao" pode concordar em ser urn compartimento da vida entre outros, que como tal s a o independentes e autonomos - com isto ela ja perverteu a relacao da fe. Subtrair qualquer dominio fundamentalmente desta relacao, do poder da sua deterrnlnacao, ~querer subtrai-lo ao poder de determinacao de Deus que reina sobre a relacao da fe. Prescrever a relacao da fe que: "Ate at e nao mais adiante podes determinar 0 que eu devo fazer, aqui termina teu poder e corneca 0 do grupo ao qual pertenco" significa dirigir-se a Deus precisamente da mesma maneira, Aquele que nao permite que a sua relacao de fe se realize nas medidas nao reduzidas da vida em que vive, tanto quanta e capaz de faze-lo nas diferentes ocasioe . " atreve-se a restringir a realizacao do dominio de Deus sobre 0 mundo. A relacao de fe certamente nao e urn livro de preceitos que pode ser consultado segundo as circunstancias para saber 0 que se deve fazer em determinada hora. Eu descubro 0 que Deus exige de mim para esta hora, se e que 0 descubro, nao antes do que em est a hora, Mas mesmo entao nao me e dado descobri-la a nao ser respondendo diante de Deus por esta hora como sendo minha hora, responsabilizando-me por ela em sua direcao tanto quanta eu puder. Aquilo que de mim agora se aproximou, 0 imprevisto, 0 imprevisfvel, e palavra dele, palavra que nao se en contra em nenhum dicionario, palavra que agora tornou-se palavra -- e 0 que ela exige de mim e a minha resposta a ele dirigida. Eu formulo minha resposta ao realizar, entre as acoes possiveis, aquela que parece ao mcu entendimento devotado ser a acao certa. Com a minha escolha, decisao e a9lio - fazer ou nao-fazer, intervir ou perseverar - eu respondo a palavra , ainda que insuficientemente, mas com legitimidade; eu respondo pela minha hora, Mel! grupo nao pode me aliviar desta responsabilidade, eu nao devo permitir que deja ele me alivie; se eu 0 fizer,
me e permitido ver em primeiro lugar 0 meu grupo, a cuja salva930 estou ligado; talvez seja antes de tudo a este grupo que eu deva fazer justica. Entretanto nao como uma coisa em si, mas fazer-lhe justica diante de Deus; e nenhum programa, nenhuma decisao tatica, nenhuma ordem pode me dizer como eu, ao decidir, devo fazer justica ao meu grupo diante de Deus. Pode ser que me seja permitido servi-lo da maneira como tinham prescrito 0 programa, a decisao, a ordem; pode ser que eu deva servi-le de uma forma diferente; poderia mesmo ser - se no ato da minha decisao algo de tao inaudito se abrisse a mim -- que eu me colocasse numa oposicao cruel ao seu sucesso, pois eu teria me tornado intimamente ciente de que Deus 0 ama de uma forma diferente, que nao e a deste sucesso. Somente uma coisa importa; que eu seja todo ouvidos a situacao tal qual ela se oferece para mim, isto e , a manifestacao da palavra a rnim dirigida, ate as profundezas onde 0 ouvir se confunde com 0 Ser, e que eu ouca 0 que deve ser ouvido e que a isto responda. E aquele que me sugerir uma res posta de tal forma que estorve 0 meu ouvir e urn estorvador, quem quer que ele seja. Nao temos aqui de modo algum em mente que
0 homem
deva, sozinho e desaconselhado, buscar a resposta no seu proprio seio. Nao tern os nada disto em mente: como poderia a orientacao daqueles que dirigem 0 meu grupo deixar de entrar essencialmente na substancia de que e fundida a decisao? Mas a orientacao nao deve substituir a decisao; nenhuma substituicao 6 aceita. Aquele que tern urn mestre pode entregar-"se" ~ ele, pode entregar-lhe sua pessoa ffsica, mas nao sua responsabilidade. Para esta, precisa empreender 0 eaminho ele mesmo, armado com todo 0 senso de dever forjado no grupo, mas exposto ao destino, assim que no momenta da exigencia toda a sua armadura caia. Ele pode mesmo agarrar-se com toda sua forca ao "interesse" do grupo, -- ate que, talvez, no ultimo c~nfronto com a realidade toque nele urn dedo, apenas perceptivel, mas que nunca deve ser desprezado. Este certamente nao e 0 "de~o de Deus", 0 qual nao temos 0 direito de esperar, e portanto nao e permitida a menor seguranca que estejamos certos em nossa decisao , a nao ser do ponto de vista pessoal. Deus oferece-me a
114
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
115
58/89
5/17/2018
sitl1a~lio a qual eu devo responder; nao LIV__Martin me cabe esperar que ele Do di logo ser verdadeiramente chamada de comunidade. Mesmo hoje ern Buber. edo dial gico -slidepdf.com me ofereca uma parte da minha resposta; certamente na rninha dia, se 0 homem de fe aderir a qualquer coisa apresentada por resposta eu estou sob sua graca, mas nela na o posso medir a urn grupo, pode ele ter razao ern juntar-se a este grupo; mas, participacao superior e mesmo 0mais b em - av en tu ra do s en ti m en passando a pertencer a ele, deve este homem permanecer ~el to de graca pode enganar. 0 dedo de que falo e sirnplesmente corn toda a sua vida, conseqiientemente tambem corn sua vida o dedo da "consciencia", mas nao da consciencia rotineira, de grupo, ao Unico que e seu Senhor.
utilizavel, utilizada e gasta, da consciencia do jogo da superficie, corn cujo descredito pensava-se ter elirninado a efetividade de uma resposta positiva do homem; eu aponto para a consciencia desconhecida, a consciencia da profundidade, que incessantemente necessita ser redescoberta, a conscisncia da "pequena fafsca", pois a fafsca genuina e tambem atuante na harrnoniosa calma de toda decisao genufna, A certeza produzida por esta consciencia e naturalmente apenas uma certeza pessoal; e a certeza incerta; mas aquilo que aqui e chamado de pessoa e precisamente a pessoa a quem e dirigida a palavra e que responde.
Assim sua decisao respon sav el sera ocasionalmente oposta a uma eventual decisao tatica do grupo; ocasionalmente isto 0 movera a levar a luta pela verdade, a verdade humana, a verdade incertamente certa e Q, Ih e e fornecida pela sua profunda consciencia ao seu proprio grupo e corn isto construir ? U fortaleeer neste uma frente interior. Esta frente pode - pois, se ern todos os lugares for firrne e forte, podera passar atraves ~e todos os grupos como uma unidade secreta - tornar-se mars importante para 0 futuro do nosso mundo do que todas as frentes que se alastram hoje entre urn grupo e outro, entre um a
0 homem que Eu digo, pcJrtanto, que 0 Individuo, isto vive de urna forma responsavel, s6 pode executare , adequadamente suas decisoes polfticas tambem, ern cada caso, a partir daquela profundidade da sua exlstencia na qual se conscientiza intimamente do acontecirnento enquanto palavra de Deus a ele dirigida; e que, perrnitindo a seu grupo que estrangule nele esta consciencia da profundidade, estara recusando a Deus uma resposta atual.
e outra associacao de grupos. Aquilo que e correto ern eada caso nao sera conhecido por nenhum dos grupos hoje existentes ~ nao ser que os _ homens a eles pertencentes empenhem a pr6pna alm~ para sabe-lo e, por mais amargo que seja, revelem-no ern seguida aos ~us companheiros, - poupando, se for possfvel, de uma maneira cruel, se for necessario. Neste banho de fogo 0 grupo mergulha vez ap6s vez ou entso se consome numa morte interior.
Aquilo de que falo nada tern de comum corn "individualis0 individuo nem como 0 ponto de partida nem como a meta do mundo hurnano. Mas considero a pessoa humana como 0 lugar central nao deslocavel da luta entre 0 movirnento do mundo que afasta de Deus e 0 movimerito do mundo ern direcao a Deus. Esta luta e travada hoje num espaco ameacadoramente grande no ambito da vida publica, naturalmente nao entre grupo e grupo, porem dentro de cada urn deles. Contudo, as lutas decisivas deste ambito tambern sao travadas nas profundezas, no fundo ou no abismo sem fundo da pessoa. mo", Nao considero
E se alguem ainda perguntar se temos eerteza de encontrar aquilo que e correto nesta trilha fngrime: mais urna vez, a reSposta e nao, nao existe certeza. Ha apenas uma chance; e nao ha outra alem desta. 0 risco nao nos garante a verdade; e ele, somente ele, nos conduz ao espaco onde 0 seu halite se faz sentir.
Nossa geracao tende a esquivar-se de urn exigente "sempre-de-novo", pr6prio a urn dever de responsabilidade, fugindo para urn protetor uma-vez-por-todas. A intoxicacao pela liberdade da geracao precedente seguiu-se a paixao desta geracao pelos grilhoes, Ii infidelidade da embriaguez seguiu-se a infidelidade da histeria. Fiel ao Ente Unico e somente quem se sabe vinculado ao seu proprio Iugar - e livre, precisamente neste lugar, para sua pr6pria responsabilidade. E somente de homens assirn vinculados e livres que pode ainda surgir uma conflguracao que merece 116
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
117
59/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
5 . T EN TA TIV AS D E D IS SO CIA <;A O Contra a posicao do Individuo na responsabilidade aqui esbocada, devera levantar-se aquela opiniao poderosa dos nossos tempos, pela qual em Ultima instancia s6 sao reais os fatos ditos objetivos, ou mais exatamente os fatos que dizem respeito a coletividade, enquanto que e atribufda a s pessoas uma significay a O somente de realizadores ou instrumentos desta. Na verdade, a categoria meramente religiosa de Kierkegaard pode permaneeer indiferente a esta opiniao; para ele somente a pessoa e essencial, 0 fato objetivo tem apenas uma existencia secundaria ou como multidao - e 0 elemento negativo a ser evitado. Se contudo 0 Individuo, precisamente enquanto tal, tiver uma relacao essencial com 0 mundo, mesmo com 0 mundo em particular, com a coisa publica, mas nao no intuito de, conscientemente
119
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
60/89
5/17/2018
e com fe professada com enfase, permitir doravante que dele disponham, porem responsabilizando-se LIV__Martin por aquilo de que ele Buber. Do di logo edo dial gico -slidepdf.com Oswald Spengler quer provar 0 dominic especffico da participa diante de Deus, entao aquela opiniao deve opor-se a politica como independente e inacessfvel Ii "Etica", classificanele e querer refuta-lo uma vez por todas. Ela pode empreender do 0 homem entre os animais ferozes. Mesmo se este nao for isto com razoes que encontra numa determinada corrente do mais 0 caso dos individuos domados, entre os grupos as coisas pensamento da nossa epoca, de conformidade com ela e aparense d[o sempre necessaria e significativamente de uma forma temente por ela legitimada. E uma corrente cujos representanigual Ii que acontece nos bandos de animais ferozes. Aqui, na sua tes, com todas as suas multiplas diferencas, tern, antes de mais existencia dentro do grupo, 0 homem teria permanecido urn nada, urn objeto de agressao comum, - seja ele designado de animal' feroz nao enfraquecido e 0 Individuo deve guardar-se de liberalismo ou de individualismo ou de qualquer outro slogan aplicar parametres estranhos a este dominio. " que nos aprouver. (Negligencia-se aqui habitualmente - e e Esta tese e a banalizacao de uma teoria nietzschiana. compreensivel acontecer freqiientemente em casos dessa especie Nietzsche acreditava que 0 importante e que a potencia na - empreender no "ismo" agredido uma analise conceitual e hist6ria se declare abertamente; se isto for reprimido, entao separar 0 que se tern em mente daquilo que nao se tern, portansegue-se a degeneracao. Com isto Nietzsche permanece numa to 0 que vale a pena ser combatido daquilo que nao deve ser pressuposirao. A coisa importante e que a potencia na hist6ria molestado. Se por acaso uma tal analise fosse aplicada ao se declare como urn dos parceiros do processo dial6gico, no "liberalismo", surgiriam nocoes singulares de tendencias varias, qual mesmo a atividade mais forte pode significar urn esquivardiante das quais'" poderiamos adotar uma posicao de clareza e se da resposta, a recusa de uma reposta. inequivocidade bern diferentes, como por exemplo: 0 libertinisA tese de Nietzsche fala a linguagem da hist6ria; a de mo, como 0 mesquinho modo de pensar de quem foi libertado, Spengler, a linguagem da biologia. Toda tentativa de compreque somente sabe tudo que e ou deveria ser permitido a ele, ender biologicamente a ay[o humana e uma banalizacao (emboao "homem "; mas de outro lado tenamos 0 liberismo, como 0 ra nao se deva esquecer a existencia biol6gica ao explicar 0 homodo de pensar do homem que nasceu livre, para quem a libermem), e umama simplificacao, porque ele e uma renuncia a exisdade e a pressuposicao do vinculo, da verdadeira aceitacao tencia pr6pria antropol6gica, portanto uma remincia aquilo pessoal do vinculo, nem mais nem menos, - urn modo de penque, na realidade, constitui propriamente a categoria do homem. sar, portanto, digno de ser preservado na cidadela que guarda o tesouro do espirito e digno de ser com ela defendido por todo aquele que sabe 0 que e 0 espfrito.) Mas 0 mais importante e que os representantes desta corrente tern tambem urn prop6sito comum ou ao menos uma atuacao comum: eles conferem ao setor politico uma autonomia exagerada, eles destacam a vida publica de todos os outros setores da vida, eles a subtraem da responsabilidade do Individuo que dela participa. Para .indicar como poderfamos replicar a tais argumentos do ponto de vista da categoria transformada do Individuo, consideremos dois exemplos da corrente do pensamento em questao, urn relativo a filosofia do Estado e 0 outro a teologia do Estado. Facamo-los, no entanto, preceder de urn terceiro exemplo, menos importante mas tambem instrutivo, urn exemplo historios6fico.
120
Os animais ferozes nao tern hist6ria. Vma pantera pode ate ter uma biografla, uma colonia de termites pode talvez ter ate uma cronies do Estado, mas hist6ria, no seu sentido grande, distintivo do termo, que nos permite falar da historia humana como da "historia do mundo", esta hist6ria eles nao tern. Pela ayao das presas ferozes nao se consegue uma hist6ria. 0 homem adquiriu uma hist6ria assumindo fundamentalmente algo que deveria parecer sem sentido e grotesco ao animal feroz: a responsabilidade; e assim procedendo, consentiu tornar-se uma pessoa relacionada com a verdade. Mas tornou-se desta forma irnpossfvel compreender 0 homem somente do ponto de vista biol6gico. "Historia" nao e a sucessao dasconquistas do poder e dos atos do poder, mas e 0 encadeamento das responsabilidades do poder no decorrer do tempo. A tese do animal feroz significa portanto uma negacao da essencialidade humana e uma falsificacao da hist6ria humana. E verdade que "os grandes animals ferozes sao criaturas nobres da especie mais perfeita", como alega Spengler em defesa desta
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
12J
61/89
5/17/2018
Entretanto, a formula nem chega mesmo a englobar toda a tese, mas isto nlio prova nada; 0 que importa e que 0 homem, instabilidade de uma estrutura politica. Esta instabilidade tern LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com dentro da su a es pecie, determinada pela sua evolucao e sua sempre urn carater ambivalente: uma instabilidade exterior, que hist6ria, torne-se tlio "nobre criatura" como os animais na .deles, se manifesta pela pressao exercida na fronteira pelo vizinho ou - e isto quer dizer: que ele realize aquela "liberdade dos mhos o agressor que se tornou vizinho; e uma interior, manifestada de Deus", em cuja direcao, nas palavras de Paulo, toda criatura pelo rebelde. .Schmitt chama este ultimo de "inimigo interior", "estende a cabeca", mas por este motive desconhece uma diferenca fundamental Deve ser contemplada de maneira mais seria a definicao conceitual daquilo que e 0 politico, que nos e oferecida por urn renomado professor cat6lico de direito publico, Carl Schmitt. Aquilo que e 0 politico tern, conforme ele, seu pr6prio criterio, nao deduzivel do enteric de algum outro dominio. E a distinejo entre amigo e inimigo que, conforme S chmitt, corresponde "aos criterios relativamente independentes de outras oposicoes: bern e mal no dominic da moral, belo e feio no dominic estetico, etc." Ao conceito de inimigo pertence contudo a eventualidade de uma luta real, que encerra a "possibilidade de matar fisica-
entre as duas especies de instabilidade. 0 inimigo nao tern interesse na preservacao da estrutura, mas 0 rebelde 0 tern; ele quer "modifica-la": e precisamente el a que ele quer modificar. S6 0 primeiro e suficientemente radical para justificar a seriedade da f6rmula. A formula armgo-inlmigo s6 compreende, portanto, urn lade da instabilidade e nao pode ser estendida para abranger o outro.
mente"; e e desta possibilidade que "a vida do homem" adquire "sua tensao especificamente p ol itic a " ,
somente quando 0 bern e a beleza se constituem num conteudo significativo essencial e que tern sentido definir 0 mal e a feiura. "Amigo e inimigo", contudo, nao designa urn conceito normativo da essencia, mas somente urn conceito de situacao, relative a uma atitude.
A "possibilidade de matar fisicamente" - na realidade deveria dizer-se: a intencao de matar fisicamente. Pois a tese de Schmitt transpoe uma situacao da vida particular, a classica situacao do duelo, a vida publica. Esta situacao surge quando dois homens consideram urn couflito existente entre eles como absoluto, conflito para 0 qual, portanto, s6 pode ser encontrada uma solucao na destruicao de urn pelo outro: nao existe reconciliayao, nem mediacao, nem reparacao suficiente ; a mao que desfecha nao Todo pode duelo ser outra a naoe ser do adversario; mas esta e0 agolpe solucao. classico urn a"julgamento de Deus" disfarcado; em cada urn deles persiste a crenca de que homens possam instituir urn julgamento de Deus. E isto que, transposto a relacao dos povos entre si, Schmitt denomina 0 especificamente politico. Mas a tese repousa num erro de metodo. 0principio essencial de urn dominio, 0 principio que 0 constitui como tal, nl[o pode ser deduzido da instabilidade das estruturas deste dominio, mas somente do carater duradouro destas estruturas. A f6rmula amigo-inimigo origina-se na esfera dos abalos das estruturas polfticas, nao na esfera da coerencia destas. A distincao radical a que Schmitt se refere aparece sempre em epocas em que a comunidade esta ameacada, nao em epoces em que esta experienciasua estabilidade como coisa evidente e garantida, A distincao nao e, portanto, adequada para fomecer 0 principio daquilo que e 0 politico,
As oposicoes "bern e mal no dominic moral, belo e feio no estetico", junto com as quais Schmitt coloca a oposicao amigo-inimigo, distinguem-se dela por uma intencao normativa, isto e:
Parece-me, alias, que por tras dos habituais pares conceituais de oposicoes bem-e-mal e belo-e-feio ha outros, em que 0 conceito negativo se liga intimamente ao positivo, como a carencia e ligada a plenitude, 0 caos ao seu cosmos: atras do bern e do mal enquanto criterios do dominic etico estao os criterios de direcao e da au sen cia de direcao; atras do bela e do feio enquanto criterios do estetico estao os da forma e da ausencia de forma. Para 0 dominio do politico nao ha urn par de conceitos no primeiro plano, evidentemente porque e mais diffcil ou impossfvel tornar nele independente 0 p610 negativo; eu gostaria de denominar os conceitos do segundo plano de ordem e aussncia de ordem, mas 0 conceito de ordem deve ser libertado da depreciacao que ocasionalmente lhe e atribufda: a verdadeira ordem significa direcao e forma no dommio politico. Mas nao se pode permitir que estes dois conceitos se petrifiquem; sua verdade provem somente da concepcao de uma homogenea dindmica do ordem, que e 0 principio real daquilo que e 0 politico. A ~erdadeira hist6ria de uma comunidade deve ser compreendIda como seu esforco para atingir a ordem que lhe e conven~ente. Este esforco, esta luta pel a realizacao da ordem verdadelf~ luta entre ideias, planos , esbocos da ordem verdadeira tao dife-
123
122
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
62/89
5/17/2018
rentes, mas tambem uma luta comum a todos eles, luta inconsos problemas eticos nao recebem sua relevancia do campo reliciente, inexprimrvel - constitui a dinamica da ordem da estrugioso, eentao temosgico novamente no interior da vida do homem LIV__Martin Buber.Do di logo do dial -slidepdf.com tura politica. Como resultado luta-se sempre de novo por uma "religiose ", ainda que numa forma politizada, a etica desvincuordem e uma ordem e sempre de novo instaurada. Ela se tom a lada que Kierkegaard nos ajudou a superar. Gogarten po de firme e abrangente, se fortalece tambem contra a resistencia falar com a enfase que quiser em termos teol6gicos, ele estreita, da dinamica que restou, se enrijece e morre interiormente, contudo, a relacso fundamental do Individuo, a relacso do desligando-se -completamente da dinamica que a instaurou e Individuo com Deus, quando faz com que seu agir - e que mais contudo preserva a sua forca para a luta que ressurge por uma sao os "problemas eticos" do que questoes do homem a respeito ordem verdadeira. 0 inimigo ameaca toda a dinamica da ordem do seu pr6prio agir e 0 senti do deste! - receba sua validez de da comunidade; 0 rebel de ameaca somente a ordem como ela e urn lugar diferente, seja mesmo do destino considerado em si num dado momento. Toda ordem, quando examinada do ponto mesmo da comunidade a qual 0 Individuo pertence. Se e verdade vista da din arnica total, e questionavel, Esta e a dupla essende que 0 Indivfduo nao pode conquistar a legitimidade da sua cia do Estado: a estrutura pohtica sempre em realizacso e semrelacao com Deus sem uma relacao legitim a com a coisa publica, pre posta em questao. Os "pontos culminantes da polftica afinal de contas e tambem verdade que nao e a coisa publica concreta" nao sao, como pensa Schmitt, "ao mesmo tempo os mas e ao Individuo somente que cabe a forca determinante, momentos em que 0 inimigo e percebido", mas sao os momenisto e: que eu devo deixar que Deus trace sempre, no interior tos nos quais uraa ordem, em face da responsabilidade mais grada minha relacao com a minha comunidade, 0 limite entre a ve que prova com ela confronta, provaque a legitimidade da do suaIndivrduo estabilidade, seusecarater - ainda necessariamente relativo - de realizacao. De acordo com Schmitt, todas as teorias pohticas "genuinas" pressupoem que 0 homem seja "mau", (Alias, por que supoem isto as teorias que 0 fazem? Ja que do ponto de vista de Schmitt a teoria poIitica e apenas urn setor da poIitica pratica, teriamos que responder de acordo com ele: po!que isto parece politicamente conveniente aos seus autores.) E verdade que ele esclarece este "mau" como "de maneira alguma nao problernatico" "perigo so " - duas caracterfsticas que eu tam0 homem possua -, mas ele se apoia para bern considero eque fundamentar a exatidao da sua pressuposicao na doutrina teologica da pecabilidade absoluta do homem. Ele encontrou urn poderoso aliado teol6gico em Friedrich Gogarten. Gogarten explica em sua obra P o lit is c he E t hik que todos os problemas eticos receberam sua relevancia etica somente do problema politico, isto e , 0 etico e valido enquanto tal somente gracas a sua conexao com 0 ser politico do homem. Com esta proposicao abandona-se completamente a categoria de Individuo de Kierkegaard. Gogarten pensa provavelmente combater apenas 0 individualismo, mas ele combate ao mesmo tempo a posicao da vida pessoal no rigor da sua total responsabilidade. Se os problemas eticos recebem sua relevancia do dominio politico, eles nao podem recebe-la tambem do dominio religioso, mesmo que 0 politico tenha urn fundamento religioso. Mas, se
participacao e a nao-participacso. Dizeis muitas vezes nao perceber nada? P ois bern, n6s devemos escutar com urn esforco sem reservas do nosso ser. Se mesmo af nada percebermos, entao, e somente entao, podemos nos voltar para a direyl'o que nos e indicada por Gogarten. Mas se n6s nao escutarmos desta maneira ou se ouvirmos mas nao obedecermos, entao a nossa omissao e nao a nossa referencia a qualquer relay!o entre os problemas eticos e politicos e que permanecera na etemidade. De acordo com' Gogarten, 0 homem e "radicalmente e portanto irrevogavelmente mau, isto e, sucumbido sob 0 poder do mal". A relevancia daquilo que e 0 politico provem do fato que "somente no campo politico" e que 0 homem tern "a possibilidade de existir face a este reconhecimento". "A qualidade etica" do Estado "reside no fato de que, gracas ao seu poder soberano, pelo direito que tern sobre a vida e a propriedade dos seus suditos, ele se opoe ao mal sob 0 qual sucumbiram os homens". (Alias: uma versao teol6gica do antigo conceito de Estado policial.) Pois "donde pode provir opoder soberano do Estado, sense-do reconhecimento do l\icumbir do homem sob 0 poder do mal ...?"
o
conceito utilizado por Gogarten do homem radic~ente mau e da sua pecabilidade absoluta e extraido do domfnio em que 0 homem se confronta com Deus e e somente af '!ue este conceito tern uma significacao. No meu saber e entendimento, o que ensina a teologia crista, em nome da qual fala Gogar~en, e que 0 homem, ou mais exatamente este homem sucumbido,
124
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
125
63/89
5/17/2018
considerado do ponto de vista de sua nao-redencao, e "diante esteja na periferia do cosmos, ele permanece 0 centro de surprede Deus" (coram Deo) urn pecador e urn corrompido. Nao vejo sa do euniverso. e entretanto a surpresa algemada, livre ape· LIV__Martin Buber. Do di logo do dialEle gico -slidepdf.com como a nao-redencao pode ser arrancada do vinculo dialetico nas no seu interior ,e suas algemas sao s6lidas. que mantern com a redencao (ab his malis liberemur et serv~mur) e usada separadamente; nao vejo tampouco como 0 concerto da o homem nao e bom, 0 homem nao e mau, ele e , no sentimal dade pode ser transferido do dominio do estar "diante de do eminente, born-e-mau. 0 bern-e-o-mal, quem dele cO.me0 Deus" para p dominio do estar diante de autoridades terrenas conhece, como 0 conhece quem corneu daquele fruto. E esta e no entanto conservar toda a sua radicalidade. Face a Deus e a sua limitacao, e este 0 gracejo da scrpente: 0 homem devia possrvel atribuir ao homem 0 carater de ser radicalmente mau tornar-se semelhante a Deus, conhecendo 0 bern e 0 mal, mas porque Deus e Deus e homem e home~ e a distancia e~tr~ el~s aquilo que ele "reconheceu", aquilo com 0 que se misturou, e uma distancia absoluta e porque e precisamente nesta distancia e entao reconheceu como mistura, e 0 bern-e-o-mal; ele tornoue emvirtude dela que se efetua a acao redentora de Deus. Face se bom-e-mau, esta e a nudez na qual ele se reconhece. Mas a aos seus semelhantes, a grupos de homens e ordens de homens, limitacao e apenas fatual, ela nao muda a sua essencia, nem nao e possivel - assim me parece - designar legitimamente 0 destr6i a obra de Deus. Atribuir a serpente 0 poder de destruihomem como simplesmente pecador, pois falta a distancia, que y!o e eleva-la ao papel de rival de Deus, rival que the e superior e a unica capaz de fundamentar a incondicionalidade. Nada inicialmente (como durante urn tempo Ahriman a Ormuzd), disto se modiflia quando se considera um~ ordem de homens pois perverte a sua criacao, Mas nao e esta a serpente das Escricomo instituida e autorizada por Deus. POlS em nenhum caso turas. Ela nao e urn anti-Deus, e somente a criatura que quer empresta-se com isto a uma ordem de homens aquela distancia corromper 0 homem por ele pr6prio. E a criatura "astuciosa", absoluta em relacao ao homem que confere a incondicionalidade a asnicia da criatura secrctamente venenosa, que trama a desor(mas que simultaneamente abre 0 espaco da redencao), possibilidem' e da desordem nasce a hist6ria que, tateando, experimendade unica de conceber que 0 homem tarnbern seja radicalmente tando, errando, esforca-se pela ordem de Deus. 0 evento origimau face a coisa publica. 0 conceito de pecabilidade humana nal, mostrado pelas imagens das Escrituras, nao se coloca sob 0 nao pode, portanto, ser explorado politicamente de uma forma princfpio da contradicao: a e ndo-a relacionam-se aqui urn com 0 legitima e nem mesmo nateoria politica. outro de uma forma estranha. Entretanto, de acordo com 0 meu entendimento, 0 homem certamente nao e de forma alguma "radicalmente" isto ou aquilo. Nao e uma radicalidade que caracteriza 0 homem como profundamente destacado de tudo 0 que e apenas-animal, mas e a sua potencialidade. Se 0 colocarmos sozinho d~ante da totalidade da natureza, aparece entao encarnado nele 0 carater de possibilidade da existencia natural, carater que ate entao pairava em volta da densa realidade apenas como uma nevoa. 0homem e a potencialidade estorvada pelos fatos. A plenitude de possibilidade da existencia, da qual 0 animal e conservado a distancia pela exiguidade da sua realidade, manifesta-se no homem num signo incompreensivel do ponto de vista da natureza; esta plenitude, entretanto, nao reina tao livre mente para que a vida possa seguir, em cada caso, impetuosamente, as antecipacoes do espfrito; ela e limitada. A limitacao nao e essencial, ela e apenas fatual. Isto significa que a acao do homem e imprevisivel quanta a sua natureza e extensao e que, mesmo que para todo 0 resto
o bern e 0 mal nao podem entao ser aqui urn par de oposi
estado de alma individual, 0 mal. e 0 esquivar-se
0 convulsivo da totalno dtrecao alma, que se elevadaemdirecso, ordenadas esquivar-se que determinam espaco adaresponsabilidade pessoal diante de Deus. 0esquivar-se pode se ~ar pela paixao ou pela indolencia. 0 homem passional se esq~lva com sua paixao 0 indolente, com sua indolencia. Nos dois casos, o homem se desorienta e perde-se dentro de si mesmo. Os ver-
126
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
127
64/89
5/17/2018
dadeiros fatos demonfacos hist6ricos sao as exploracoes deste esquivar-se pelos poderes da hist6ria. LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com Mas a dtrecao, a unica, a direcao da hora orientada para Deus, que se transforma sempre na sua concretizacao, 0 Estado enquanto tal nlio pode indicar. S6 0 Indivfduo que permanece nas profundezas da responsabilidade pode faze-lo. E naturalmente urn homem de Estado pode tambem ser este Indivfduo. Gogarten coloca 0 Estado no lugar deste ou daquele Estado da Hist6ria, isto e, deste ou daquele governo efetivo, que justamente nao pode impedir 0 "mal" enquanto Estado impessoal, mas que s6 pode faze-lo a partir da sua pr6pria responsabilidade pessoal; que esta tambem, contudo, ele pr6prio sujeito 1 \ dinamica existente entre 0 bern e 0 mal. 0 Estado e a forma vis{velde autoridade e para Gogarten a autoridade e simplesmente aquilo que e estabelecido, que e hierarquico; 0 poder e poder pleno. Mas quando seJeva a serio 0 estabelecimento do poder, quando ele e levado a serio teol6gica e biblicamente, este estabelecimento transforma-se em uma incumbencia precisa e 0 poder revelase como 0 grande dever de responsabilidade. Nas hist6rias sobre os reis de Israel e nas hist6rias sobre os soberanos estrangeiros o Antigo Testamento sabe relatar a degeneracao da legitimidade em ilegitimidade e do poder pleno em poder antagonico. Nenhum conceito filos6fico do Estado, assim como tambem nenhum conceito teo16gico de Estado conduz para alem da realidade da fe da pessoa humana e - seja ele escravo ou imperador - nao conduz 0 homem para alem da sua responsabilidade pela coisa publica face a Deus. 6. A Q U E S T A O Na crise do homem que experienciamos hoje em dia duas coisas sli'opostas em questao: a pessoa e a verdade.
o ato da responsabilidade nos fornece a conexao entre ambas. Para que ela, a resposta responsavel, esteja presente, e necessaria a realidade da pessoa atingida pela palavra no aeontecimento, reivindicando-a; e e necessaria a realidade da verdade, para a qual a pessoa caminha com a unidade do seu ser e que justamente por causa disto ela almeja receber na palavra, nao numa generalidade, mas na especificidade que diz respeito a eia pr6pria. e
A questao em que sio colocadas hoje a pessoa e a verdade a questli'o dirigida ao Indivfduo.
128
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
129
65/89
5/17/2018
A pessoa
e
posta em questao pelo fato de ser coletivizada.
A verdade, no entanto,
e
posta em questso pelo fa to de ser
politizada. LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
Esta coletivizacao da pessoa liga-se, na hist6ria espiritual, a urn empreendimento fundamentalmente diferente, do qual eu tambem participei e de que devo aqui portanto fazer a minha profissso de fe. Trata-se daquela luta das ultimas decadas contra o conceito idealista do Eu autocrata, do Eu que engloba 0 universo, que 0 sustem e que 0 cria. Nesta luta teve-se em vista entre outras coisas -- os negligenciados vinculos da pessoa humana concreta enquanto criatura. Mostrou-se como e fundamentalmente importante 0 pensador saber tambem, a cada urn dos momentos que constituem 0 pensamento, que ele esta ligado a urn setor do espaco, a uma hora hist6rica, ao genero humano, a urn povo, a uma familia, a uma sociedade, a urn grupo profissional, a urn grupo que compartilha das suas convic~Oes, por vfnculos que variam quanta ao grau da sua substancialidade, mas quesnunca sao puramente funcionais. Este entrelacamento dentro de urn N6s multiple, quando efetivamente conhecido, protege contra a tentacao de um pensamento de carater soberano; o homem encontra-se na estreita situa~ao de criatura; mas ele e colocado na situay 80 de reconhecer que e esta sua amplitude genufna, pois este vinculo e uma alianca.
Aconteceu, entretanto, que uma tendencia de uma origem e natureza essencialmente diferentes apoderou-se das novas opiniOes e, por exagero e perversao, transformou a percepcso .do vinculo numa doutrina de sujei~a:o. A prioridade e concedida aqui a uma coletividade; esta recebe 0 direito de conservar .a pessoa de tal maneira a ela vinculada que a esta pessoa nem mars cabe a plena responsabilidade. 0 coletivo torna-se aquilo que e verdadeiramente existente, a pessoa, 0 elemento derivado; em todos os domfnios que a unem A totalidade eia deve ser eximida da resposta pessoal.
A doutrina sociol6gica da epoca exerceu uma relativizacao plena de consequencias sobre 0 conceito da verdade quando demonstrou a liga~:ro entre 0 pensamento e 0 ser, ao indicar que os processos era intelectuais processos sociais. Esta relativizacao justificada,dependem pois ela dos vinculava a "verdade" de urn homem a realidade que 0 determinava; mas sua justifica~ao converteu-se no seu oposto quando seus autores deixaram de tracar uma linha divis6ria fundamental entre 0 que pode 0 que nao pode ser compreendido a partir desta determinacao, isto e, deixaram de captar na sua total realidade a pessoa que se empenha e que luta pela verdade. Se partirmos do lndividuo desejoso de conhecer enquanto ser total, com a integralidade do seu ser, entao verificamos que a forca do seu anseio pela verdade pode, em pont os decisivos, explodir os laces "ideologicos" do seu modo de ser social. 0homem que pensa "existencialmente", isto e, 0 homem que, em seu pensamento, arrisca sua vida, traz ao seu real relacionamento com a verdade nao apenas seus condicionamentos mas tambem a incondicionalidade da sua busea que os transcende, a incondicionalidade da sua a~io, do indornavel anseio pela verdade que arrasta para si todo o poder probat6rio da pessoa. Naturalmente nao poderemos fazer, naquilo que repetidas vezes ele encontra como verdade resultante, uma distincao entre 0 que e derivavel do fator social e 0 que nao e; mas constitui um dever indispensavel afirmar 0 que nao como 0urn conceito-lirnite apontar assime e derivavel 0 que para acontece entre inderivavel na pessoae cognoscente o inderivavel no objeto do seu conhecimento como para urn
Fica com isto ameacado urn valor inestimavel, precisamente aquele que constitui 0 homem. No dialogo dos tempos, que a Divindade mantem com a humanidade, 0 coletivo n40 pode tomar olugar da pessoa. A percepcao humana se ausenta.a resposta
horizonte inatingtvel da diferenciacao cientffica sociol6gica. Este dever foi negligenciado. Consequentemente, a teoria polltica dos coletivismos modernos pede apoderar-se facilmente do principio que estava disponfvel e proclamar aquilo que correspondia aos interesses vitais (verdadeiros ou imaginaries) de urn grupo como sua verdade legitim a e inapelavel. Diante desta ultima nao cabia mais ao Individuo reivindicacao algoma a uma verdade por ele reconhecida e a ser por ele comprovada.
humana se cala, quando a pessoa nl[o esta mais af presente para ouvir e para falar. Uma reducao A privacidade e irrealizavel: e somente dentro das medidas nao reduzidas da vida vivida, portanto somente com a inclusac daparticipacso na coisa publica, que pode ser ouvida- a reivindicaeao e pronunciada a replica.
lniciou-se assim a desintegracao da fe humana em uma verdade que nunca pode ser possuida mas que pode ser compreendida dentro de uma real relacao existencial; iniciou-se assim a paralisacao do empenho do homem pela verdade.
130
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
131
66/89
"Aquilo de que falo", diz Kierkegaard, "6 algo simples e ingenuo: a verdade s6 existe para 0 Individuo quando ele pr6prio LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com a produz na a~ao". Mais precisamente: 0 homem en contra a veidade de urna forma verdadeira somente quando ele passa pela sua prova. A verdade human a esta aqui vinculada Ii responsabilidade d~ pessoa.
5/17/2018
"E verdadeiro", diz Stimer, "aquilo que e Meu", A verdade hurnana esta aqui vinculada a irresponsabilidade da pessoa. Os coletivismos traduzem-no para a linguagem do grupo: "Verdadeiro e 0 que e Nosso", Mas, para que 0homem nao chegue a se perder, sao necessarias pessoas que nao sejam coletivizadas e uma verdade que nao seja politizada. Sao necessaries pessoas, nao apenas "representantes" em qualquer sentido, eleitas ou designadas, que eximam os representados da re\ponsabilidade, mas sao tambem necessaries os "representados", que nao se deixem representar somente no que diz respeito Ii responsabilidade. E necessaria a pessoa enquanto fundamento a que nao se pode renunciar, que foi e que sera a unica possibilidade do infcio de urn col6quio entre 0 fmito e 0 inflnito,
E n~cessaria a fe do homem na verdade como algo indepen-
E LE M E NT OS D O IN TE R -H U M AN O
dente dele, algo que ele nao pode possuir, mas com 0 qual ele pode travar uma rela~ao real de vida; a fe das pessoas humanas na verdade como aquilo que as mantsm todas juntas, inacessfvel em si, mas que se abre ao homem que se empenha pela verdade prova.
no fato da responsabilidade
pronta
a ser posta em
E necessario, para que 0homem nao chegue a se perder, que a pessoa responda pela verdade na sua situa~ao hist6rica. E necessario 0 Individuo que enfrente todo 0 Ser que lhe e presente e portanto enfrente tambem a coisa publica; e que responda por todo 0 Ser que lhe e presente, portanto tambem pela coisa I publica,
I
!
Uma verdadeira comunidade e urna verdadeira vida comunitaria s6 se realizarao na medida em que se tomarem reais os Individuos em cuja existencia responsavel se renova a coisa publica.
\\ \.
132
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
67/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
1. 0 SO CIA L E 0 IN TE R-H U MA NO
Costuma-se situar 0 que acontece entre os homens no terreno do "social"; atenua-se com isto uma linha de separa~lo de importancia fundamental entre dois dominios essencialmente diferentes do universo humano. Eu proprio cometi 0 mesmo erro quando, ha cerca de cinqiienta anos, comecei a me farniliarizar, de uma forma independente, com a ciencia da sociedade, utilizando-me do entao ainda desconhecido conceito de inter-humano", Desde entao, tornou-se cada vez mais claro para mim que 1. Cf. meu Prefacio a 1~ e di~o de Dtzs Proletariat d e So mbart (vo l. I _ da Cole~io Di e Ge sellsc h a ft por mim editada em 1905).
135
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
68/89
5/17/2018
A diferenca entre os dois domfnios tornou-se muito palpatemos aqui diante de n6s uma categoria particular da nossa exisvel para mim numa ocasiao, quando me juntei, numa cidade tencia e, se nos for pennitido usar figurativamente urn termo LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com grande, a uma passeata em prol de urn movimento ao qual eu tecnico matematico, uma dimensao particular da nossa existennlio pertencia; fiz isto por interesse pelo destino de urn amigo, cia, uma dimensao que nos e tao familiar que ate agora nao nos urn dos lfderes daquele movimento, destino cujo desenvolvimentomamos realmente conscientes da sua particularidade. E no ento tragico eu pressentia. Enquanto se formava 0 cortejo, fiquei tanto 0 entendimento desta particularidade e da maior significaconversando com meu amigo e urn outro homem, "homem sel930 nao somente para 0 nosso pensamento, mas tambem para vagern", de born coracao, mas que tambem ja trazia sobre si a nossa vida. marca da morte. Neste momenta eu ainda sentia os dois como se estivessem realmente face a face comigo, sentia cada urn como Podemos falar de fenomenos sociais sempre que a coexistencia de uma multiplicidade de homens, 0 vinculo que os une meu proximo, proximo mesmo aquilo que me era mais remoto; tao outro do que eu, que minha alma se chocava, cada vez, doum-ao-outro, tern como consequencia experiencias e reacoes em lorosamente contra esta alteridade, mas que, precisamente por comum. Mas este vinculo significa apenas que todas as existenesta alteridade, me confrontava autenticamente com 0 Ser. Encias individuais sao delimitadas por uma existencia de grupo e tao as formacoes puseram-se em marcha e, pouco depois, eu ja nela contidas; ele nlio significa que entre urn e outro membro do nao estava mais em nenhum confronto, 56 fazia parte do cortegrupo exista qualquer especie de rela9lio pessoal. Certamente jo, acompanhando 0 passo sem destino e, evidentemente, 0 meseles se sentem como pertencendo um-ao-outro de uma forma especifica, que, por assim dizer, e fundamentalmente diferente de qualquer forma de pertencer um-ao-outro na conexlio com al guem exterior ao grupo; e certamente resultam sempre, especialmente na vida de grupos menores, contatos que favorecem com frequencia 0 surgimento de relacoes individuais mas que, de outro lado, muitas vezes as dificultam. Entretanto, em nenhum caso 0 pertencer a urn grupo implica por si 56 uma relaylio essencial entre urn membro do grupo e 0 outro. E verdade que existiam na hist6ria grupos que comportavam mesmo relacoes altamente intensas e intimas entre pares de seus membros - por exemplo rel~Oes hornoeroticas, como entre os samurais japoneses e entre os guerreiros d6rios - relacoes que eram favorecidas no interesse de uma coesao mais rigorosa do grupo; pode-se, entretanto, dizer em geral que as liderancas dos grupos, sobretudo em epocas mais tardias da hist6ria humana, tendem antes a afastar 0 elemento de rela oes pessoais em roveito_i:lo elemento puramente coletivo .. On e este u tuna reina exclusivamente ou enos predomina, 0 homem sente-se carregado pela coletividade, que 0 liberta da solidao, do seu medo diante do cosmos, da sensacao de estar perdido; e nesta funylio essencial para 0 homem modemo, 0 inter-humane, a vida entre pessoa e pessoa, pa-
mo acontecia de uma foi:ma identica com os dois com quem, M pouco, eu trocara a palavra humana. Algum tempo depois, passamos em frente de urn cafe onde eu estivera sentado no dia anterior com urn rmisico a quem conhecia superficialmente. No mesmo instante abriu-se a porta; 0 mnsico estava no limiar, viume - aparentemente s6 a mim viu - e para mim acenou. Imediatamente tive a sensacao de que fora retirado do cortejo e da presenca dos amigos que comigo marchavam e que fora colocado la, face a face com 0 musico. Eu nao sabia que continuava a marchar no mesmo ritmo, me experienciava como estando do outro lado, respondendo silenciosamente com urn sorriso de compreensao aquele que me chamava. Quando retomei a.c onsciencia dos fatos, 0 cortejo, a testa do qual estavam meus como. panheiros e eu.ja tinha deixado 0 cafe arras de si.
P;\O
rece retrair-se cada vez mais diante do coletivo. 0um-com-o-outro coletivo preocupa-se em conter dentro de limites a tendencia E como se os homens da pessoa para 0 um-em-direcao-ao-outro, vinculados num grupo 56 devessem juntos estar voltados para a obra do grupo e, somente em encontros de valor secundario, dei vessem dedicar-se aos parcel!~ pessoais teleflldos-pelo grupoJ
-~~------. 136
_._-------
!
J
Naturalmente, 0 domfnio do inter-humane estende-se muito alern do domfnio da simpatia. Incidentes muito simples podem ja pertencer a ele como quando, num bonde superlotado, dois desconhecidos trocam olhares atentos para, em seguida, afundar novamente na conveniencia do nlio-querer-saber-nada-um-do-outro. Mas deve tambem contar-se como pertencente a este domfnio todo encontro entre adversaries, por casual que seja, quando ele influi no comportamento mutuo, isto e, quando algo se realiza entre os adversaries, por mais imperceptivel que seja, nao importando naquela hora se e carregado de sentimento ou nao. A unica coisa importante e que, para cada urn dos dois hornens, 0 outro aconteca como este outro detenninado; que ca-
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
137
69/89
5/17/2018
do ele escuta e 0 que acontece quando ele proprio se dispoe a fada urn dos dois se tome consciente do outro de tal forma que lar. Contudo, isto e somente 0 acompanhamento secreto da proprecisamente por isso assuma para com LIV__Martin ele urn comportamento, Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com pria conversacao, de urn acontecimento fonetico carregado de que nlio 0 considere e nao 0 trate como seu objeto mas como sentido, cujo sentido nao se encontr a nem em urn dos parceiros, seu par ceiro num acontecimento da vida, mesmo que seja apenas nem nos dois em conjunto, mas encontra-se somente neste enuma luta de boxe. E este 0 fator decisivo:€n~0.ser.06Jet0Cocar nado jogo entre os dois, neste seu Entre. mo se sabe, alguns existencialistas af irmam que 0 fato basico entre os homeris e que urn seja urn objeto para 0 outro; mas enquanto as coisas se dao desta forma, a realidade caracteristica do inter-humano, 0 misterio do contato, jli esta fortemente eliminada. Mas ela certamente nao pode ser eliminada totalmente. Tomemos como urn exemplo crasso 0 caso de dois homens que se observam mutuamente: 0 essencial do acontecimento nlio e que urn fa~a do outro seu objeto, mas 0 fato que ele nio consegue faze-lo completamente e a razao do seu insucesso. N6s temos em comum com todas as coisas 0 poder tornar-se objeto de observa~ao; mas eu, pela a~ao oculta do meu ser, posso opor uma barreira intranspon'lvel a objetivacao: este eo privilegio do homem. E somente entre parceiros que este privilegio pode se r percebido, percebido como um todo existente. Pode-se objetar, do ponto de vista sociol6gico, a distiny 30 por mim estabelecida entre 0 social e 0 inter-humano com base em que a sociedade se c on stroi precisam en te sobre relac oes h umanas e que a doutrina proveniente destas relacoes deve ser , portanto, considerada na realidade como 0 fundamento da sociologia. Mas revela-se aqui uma ambiguidade no corfceito de "relacao". Falamos por exemplo de uma relacao de camaradagem de trabalho entre dois homens e, de maneira alguma, temos apenas em mente 0 que acontece entre eles enquanto camaradas, mas tambem urna atitude duradoura que se atualiza naqueles acontecimentos, mas que tambem inclui fenomenos psfquicos individuais, tais como a r ecordacao do camar ada ausente. Entretanto, por esfera do inter-humano entendo apenas os acontecimentos atuais entre h om e ns , d ee m- se em mutualidade ou sejam de tal natureza que, completando-se, possam atingir diretamente a mutualidade; ~is a participaclIo.dos dajs parcejros e , p O T principio, indis.pensavel..A esfera do inter-humano e agueJe do V IC e ~.face, do urn-ao-outroj e 0 seu desdobramento que chamamos de dial6gjcQ~~. De acordo com isto,e tam bern fundamentalmente errado querer compreender os fenomenos inter-humanos como fenomenos psfquicos. Quando por exemplo dois homens conver sam entre si, entilo pertence a esta sttuacao, de uma forma eminente, o que acontece na alma de cada urn deles, 0 que acontece quan-
138
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
139
70/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
2. SE R E PA RE CE R A verdadeira problernatica no ambito do inter-humane dualidade do ser e do parecer.
ISa
E urn fato conhecido por todos que os homens se preocupam frequente e insistentemente com a impressao que causam nos outros; mas este fato tem sido ate agora discutido mais do ponto de vista da filosofla moral do que da antropologia. E, no entanto, oferece-se aqui a observacso antropo16gica urn dos seus objetos mais importantes. Nos podemos distinguir duas especies de existencia humana. Uma delas pode ser designada como a vida a partir do ser, a vida determinada por aquilo que se IS;a outra, como a vida a partir da imagem, uma vida determinada pelo que se quer parecer. Em ge-
141
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
71/89
5/17/2018
ral, estas duas especies apresentam-se sob a forma de uma mistunao uma simulacao. Mas onde a aparencia se origina na mentira ra; deve ter havido poucos homens inteiramente independentes e por esta e impregnada, af 0 inter-humano e ameacado na sua edo dial gico -slidepdf.com da impressao que causavam nos outros, LIV__Martin mas provavelmenteBuber. Sera Do di logo existencia. Nao e tam bern como se alguem dissesse uma mentira, dificil encontrar alguem que seguie exclusivamente pela imprestalvez relatasse urn conteudo de fatos falsificando-o: a mentira a sao que causa. Temos que nos contentar em distinguir entre os que me refiro nao se da em relacao a um conjunto de fatos, mas homens aquele cujo comportamento essencial e predominanteem relacao a pr6pria existencia, e ela afeta a pr6pria existencia mente de uma ou de outra especie, do inter-humano. Pode-se as vezes - para satisfazer uma vaidade insipida - fazer-se perder levianamente a grande oportunidade Esta diferenca manifesta-se naturalmente com maior vigor do acontecimento verdadeiro entre Eu e Tu. no ambito do inter-humano, isto e , nas relayOes dos homens en. tre si. Imaginemos agora dois hornens-imagem, sent ados lado-a-lado e falando um-corn-o-outro - chamemo-los de Pedro e Paulo Tomemos como 0 exemplo mais simples e contudo bastante - e contemos as figuracoes que entram no jogo. Temos de infcio nftido uma situacao em que duas pessoas olham uma para a ouPedro como ele quer aparecer a Paulo e Paulo como quer aparetra, uma pessoa pertencendo ao tipo basico da primeira especie e cer a Pedro; em seguida Pedro como ele realmente aparece a a outra ao da segunda. 0 homem que vive conforme 0 seu ser Paulo, isto e , a imagem que P aulo tem de Pedro, que comurnenolha para 0 outro precisamente como se olha para alguem Com te nao correspondera de forma alguma a imagem de si que Pedro quem se mantesa relacoes pessoais; e urn olhar "espontaneo" "sem reservas"; pela que,denaturalmente, ele nao deixa de e verdade ser influenciado intenyao fazer-se compreender pelo outro, mas nao e influenciado por qualquer pensamento sobre a imagem que pode ou deve despertar no outro, quanta Ii sua propria natureza. E diferente com 0 seu oposto: ja que para ele 0 que importa e a imagem que sua aparencia produz no outro, isto e , 0 componente mais "expressive" desta aparencia 0 seu olhar ele "faz" este olhar; com a ajuda da capacidade q~e 0 home~ possui em maior ou menor medida de fazer aparecer urn elemento determinado do Ser no olhar, ele fabrica urn olhar que deve atuar como uma manifestaeao espontanea e, com bastante fre-
deseja que ePaulo e ainda Pedro como aparece si pr6prio Paulotenha comoe vice-versa; aparece a si proprio; e finalmente Pedroa encarnado e Paulo encarnado. Dois seres vivos e seis aparencias fantasmag6ricas que se misturam de maneiras diversas na conversa entre os dois! Onde sobraria aqui ainda espayo para a legitimidade do inter-humane!
quencia, assim atua; e nlio somente como manifestacao do aeontecimento psfquico que. supostamente se da neste momento, mas tambem ao rnesmo tempo como a reflexao de urn ser pessoal de tal ou tal natureza.
mente que ele nao permita que entre ele e 0 outro se introduza sub-repticiamente alguma aparencia. Nao importa que urn "se abandone" perante 0 outro, mas importa que ele permita ao homem com 0 qual se comunica de participar do seu ser. E a autenticidade do inter-humano que importa; onde ela nlio existe, 0 humane tambem nao pode ser autentico.
De certo devemos de1imitar este campo cuidadosamente em relayi[o a urn outro campo do parecer, cuja legitimidade onto16gica nao pode ser posta em dnvida, pois trata-se aqui, por assim dizer, de algo autentico. Tenho em mente 0 reino da "aparencia genufna", em que, por exemplo, urn jovem imita 0 her6i que tern por modelo e e dominado pela faticidade her6ica nesta sua atitude; ou a manifestacao de urn destino, que evoca 0 destino autentico. "So la sst m ic h s ch ein en b is ich w erd e" - "Deixai-me pois, parecer ate eu ser" - toea exatamente neste misterio. Aqu1 justamente nao ha nada de falso, a imitayao e imitayaO genufna e a representacao genufna, tambem a mascara e uma mascara e
Qualquer que seja em outros campos 0 sentido da palavra "verdade", no campo do inter-humano ela significa que os homens se comunicam um-com-o-outro tal como sao. Nao importa que urn diga ao outro tudo que lhe ocorre, mas importa unica-
Por isso devemos, n6s que comecamos a reconhecer a crise do homem como a crise do Entre, libertar 0 conceito da honestidade do fnigil tom de predica moral que a ele aderiu e fazer com que ele entre de novo em consonancia com 0 conceito da retidao. Se nos tempos primitivos a pressuposicao do ser-ho~em deu-se atraves da retidao da sua postura ao caminhar, a realizaylio do ser-homem s6 pode dar-se atraves da rettdao da alma n~ seu caminhar, atraves de uma grande hone$tidade que ~a:o e m~s afetada por nenhuma aparencia, ja que ela venceu a simulacao.
142
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
143
72/89
5/17/2018
Mas 0 que acontece - poder-se-a perguntar - quando urn homem, pela sua natureza, torna sua vida subserviente a s imaLIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com gens que produz nos outros? Pode ele assim mesmo tornar-se ainda um homem que vive conforme 0 seu ser -pode ele fugir a sua natureza? A tlfo difundida
tendencia
de viver a partir da diversidade
da Impressao causada, em lugar de viver a partir da permanencia do Ser nlio e uma "natureza". Ela se origina de fato no avesso do proprio inter-humano: na dependencia dos homens entre si. Nfo f. facil f azer-se confirmar no seu Ser pelos outros; ai a aparencia oferece a sua ajuda. A ela ceder e a verdadeira covardia do homem; resistir, sua ver dadeir a coragem. M as este nao e um ser-assim inexoravel, nao e urn ter-que-permanecer-assim. 0 homem pode lutar para se encontrar, isto e , para encontrar a conflanca no Ser. Ele luta com maior ou menor sucesso, mas nunca em vlio, mesmo quando pensa que esta sendo derrotado. A s vezes ele precisa pagar1.:aro pela vida a partir do Ser, mas 0 preco pago nunea e demasiadamente alto. Nao existe, entre tanto , 0 Ser mau, nao viceja ele em todo lugar? Eu nunca conheci jovem al gum que me parecesse irremediavelmente mau. Certamente, torna- se depois cada vez mais difieil per fur ar a cr osta cada vez mais endurecida que se formou sobre 0 Ser. E assim que se origina a falsa perspectiva de uma "natureza" imutavel. Ela e falsa; a fachada e enganosa; 0 homem, enquanto homem, pode ser redimido. Vemos outra vez diante de n6s os dois homens, cercados pelos fantasmas das figuras da aparencia. Fantasmas podem ser exorcizados. Imaginemos urn Pedro e urn Paulo aos quais comeya a repugnar, aos quais repugna com uma frequencia cada vez maior, 0 fato de serem representados por fantasmas. Em cada urn dos dois aeor da, fortalece-se a vontade de ser confirmado como este ente que ele e e nao de outra forma. Vemos as forcas do real na sua obra de exorcizar, ate que a falsa aparencia se dissolva e os abismos do ser-pessoa invoquem-se mutuamente.
3. 0 "T ORNAR·SE PRESENTE" DA PESSOA Decididamente a maior parte daquilo que se denomina hoje entre os homens de conversa.yao deveria ser designado, com m:a~ justeza e num sentido preciso, de palavreado. Em geral os mens nao realmente um-ao-outro mas, cada .um~ ~ esteja voltado para outro, fala na verdade a uma Ud tfcia cuja eXistencia se reduz ao fato de escuta-lo. A ld a ex pres~ao poetica para este estado de coisas ja foi fomeci ~ por Tchekov em sua peca 0 Pomar de Cerejeiras, peya esta on e os
falam
0
m S :e ~ : c ; : :
o~stroa membros de uma familia nao usam seu estar-juntos parar . e scute: mas 101 coisa a nao ser palavrear sem, que nmgu I ? e{ io de vida 0 que I ado mente Sartre que elevou ao nfvel de urn pnnc p . fli -0 do homem enc ausur aqui nos aparece ainda como a a Iya . de uma em si mesmo. Ele considera os muros entre os parcerros
145 144
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
73/89
5/17/2018
conversaeao como simplesmente intransponiveis; para ele, 0 desTomar conhecimento fntimo de uma coisa ou de urn ser signifltina inevitavel do homem e que ele s6 tenha aver diretamente ca, em geral, experiencia-lo como uma totalidade e ~ont.~do, ao LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com consigo mesmo e com os seus pr6prios assuntos; a existencia inmesmo tempo, sem abstracoes que 0 reduzam, experiencia-lo em terior do outro diz respeito a ele e nao a mim; nao existe e nao toda a sua concretude. Mas 0 homem, embora se encontre como pode existir contato direto com 0 outro. Aparece aqui, com ser entre seres e como coisa entre coisas, constitui uma categoria uma clareza jamais demonstrada, 0 funesto fatalismo do homem diferente de todas as coisas e todos os seres: pois 0 homem s6 modemo, que ve na degeneracao natureza no infortunic de ter-se perdido num beco asem saida 0imutavel destino eoriginal do H om o s ap ie ns , e que rotula qualquer pensamento de uma ruptura de rornantismo reacionario, Quem reconhece realmente qudo longea nossa geracao se transviou da verdadeira liberdade, da livre generosidade do Eu e Tu, deve, por forea do carater de missao de todo grande conhecimento deste genero, exercer ele pr6prio - mesmo que seja 0 unico na terra a faze-lo - 0 contato direto e a este nao abdicar, ate que os escarnecedores se assustem e percebam na voz deste homem a voz de sua propria nostalgia 't! reprimida.
o principal pressuposto para 0 surgimento de uma conversayao genufna e que cada urn veja seu parceiro como este homem, como precisamente este homem e. Eu tomo conhecimento intimo dele, tomo conhecimento intimo do fato que ele e outro, essencialmente outro do que eu e essencialmente outro do que eu desta maneira detenninada, unica, que lhe e pr6pria e, aceitando 0 homem que assim percebi, posso entao dirigir minha palavra com toda seriedade a ele, a ele precisamente enquanto tal. Talvez eu precise, a cada vez, com toda a severidade, contrapor a minha opiniao it sua opiniao sobre 0 objeto de nossa conversacao; se trata mas aqui,esta de pessoa, forma alguma, urnconviccao afrouxamento de nao conviccoes, portadorade da no seu carater de pessoa, eu a aceito nesta maneira de ser no qual se desenvolveu sua conviccao, precisamente a conviccao na qual eu talvez tenha de tentar mostrar ponto por ponto 0 que ela tern de errado. Eu digo sim a pessoa com quem luto, luto . com ela como seu parceiro, a confirmo como criatura e como criayao, confirmo tambem 0 que esta face a mim naquilo que se me contrapoe. Certamente depende dele agora que surja entre n6s uma conversacao genuina, a reciprocidade tomada linguagem. Mas uma vez que eu tenha legitimado de tal forma, face a mim, o outro enquanto homem com quem estou pronto a entrar em dialogo, entao posso nele confiar e dele esperar que tambem ele aja como parceiro. Mas 0 que significa entao, no sentido exato em que utilizo aqui a expressao, tomar conhecimento intimo de urn homem?
pode ser compreendido realmente do ponto de vista do dom do espfrito que entre todas as coisas e seres 56 a ele pertence, 0 es· pirito como fazendo parte decisiva da vida pessoal do h?mem, isto e , 0 espirito que determina a pessoa. Tomar conhecimento intimo de urn homem significa entao, principalmente, perceber sua totalidade enquanto pessoa determinada pelo espirito, perceber 0 centro dinamico que imprime 0 perceptivel signo da unicidade e toda a sua manifestacao, ayiio e atitude. Mas urn tal conhecimento fntimo e impossivel se 0 outro, enquanto outro, e para mim 0 objeto destacado da minha contemplacao ou mesmo observacao, pois a estas ultimas esta totalidade e este centro nao sedao a conhecer: 0 conhecimento intima 56 se toma possfvel quando me coloco de uma forma elementar em relacso com o outro, portanto quando ele se toma presenca ~ara mim. E ~r isso que designo a tomada de conhecimento fntimo neste sentido especial como 0 tornar-se presente da pessoa.
A percepcao do homem dade unidade e unicidade tejam na maioria das vezes opoe-se nos nossos tempos preender por especificamente
que vive conosco enquanto. totalimesmo que estas caracterfsticas esinsuficientemente desenvolvidas quase tudo que se c~sturna cO.m· mode~no. Hoje em dia predomma
urn olhar analitico, redutor e dedutivo entre h,?mem ~ homem. o olhar e analitico ou, melhor, pseudo-analftico, pois trata a totalidade do ser psicofisico como composta e p?rtanto des. membravel, nlio somente 0 assim chamado inconSCle?te, acessl vel a uma relativa objetivacao, mas tambem a pr6pr~ psfquica, que na realidade nunca e captavel como eXlstm:wti jetivamente. Redutor e 0 olhar l'0rque ~le quer .reduzir • do plicidade da pessoa, nutrida pela plenitude nucr~~e possfvel a estruturas esquematicamente abrangfvelS pe!adr'em ' ,.' - poder enqua .ar recorrentes. E ele e dedutivo, P01S supoe . ser 0 IOU f6rmulas geneticas a maneira de co~o .0~ome~~~l~: centraI d. devir, e ainda poder representar 0 dm~P geral Nio 6 individualidade neste devir atraves de urn ooncet p em rltir q ue "d ..,.... lsto poderfamos apenas uma esm egicizacao d ar do mist6rio q u e dieal desven aconteca - mas e tambem urn ra E nivelada a natureza e pretendido hoje entre homem e hornern.
~orre:: o
o
't t
147 146
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
74/89
da pessoa, 0 misterio incessantemente dos mais calmos entusiasmos. 5/17/2018
o que
pr6ximo, outrora m6vel LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
acabo de dizer nao se volta de forma alguma contra 0 metodo analitico das ciencias humanas; este metodo e imprescindivel sempre que ele faz progredir 0 conhecimento de urn fenomeno, sem influenciar 0 conhecimento da sua individualidade - alcancado de outra forma - que transcende 0 legitimo §mbito de validez do rnetodo. A ciencia do homem que se utiliza do metodo analitico deve, portanto, ter sempre em vista 0 limite intransponivel de tal observacao, que se apresenta como urn horizonte. E este dever que torna tao questionavel a transposicao do metodo para a vida; pois aqui e excessivamente dificil respeitar em cada caso 0 limite enquanto tal. Se queremos ao mesmo tempo nos dedicar com atencao aos assuntos do presente e preparar com lucidez os de amanha, entao devemos .{.l.esenvolverem nos mesmos e nas geracoes que nos seguirao urn dom que vive na interioridade do homem como uma Cinderela predestinada a ser princesa. Alguns chamam 0 dom de intuicao, mas este nao e urn conceito totalmente sem ambiguidade. Eu preferiria 0 nome de fantasia do real, pois na sua essencia este dom nao e mais urn olhar para ~ outro; e urn penetrar audacioso no outro, potente como urn voo, penetrar no outro que reivindica 0 movimento mais intensivo do meu ser, a maneira de toda fantasia verdadeira, s6 que aqui 0 campo de minha ayao nao e 0 todo-possfvel, mas a pessoa real e singular que vern ao meu encontro, que eu posso tentar tomar presente para mim, assim rnesmo e nao de outra forma, na sua totalidade, sua unidade e unicidade, e no seu centro dinamico que realiza tudo isto sempre de novo. Mas isto, repitamo-lo mais uma vez, s6 pode acontecer nurna parceria viva, isto e, quando, numa situacao comum com 0 outro, me exponho vitalmente a sua participacao nesta situa9ao como sendo realmente sua. Sem duvida, esta minha atitude basica pode permanecer sem resposta e a dialogica pode morrer em germe. Mas, se a mutualidade e conseguida, 0 inter-humano desabrocha na conversacao genuina.
4. IMPOSI~AO E A BE R TU R A _ Indi~uei do~s f ~tores ~ue impedem 0 crescimento do interThumano. a ap~enc1a que ,lI1vade e a insuficiencia da percepcao. emos ag~ra diante de nos urn terceiro fator, mais 6bvio que os °dutros dois e, nesta hora critica, mais poderoso e mais perigo so o que nunca. . Existem'duas maneiras basicas de influenciar os homens no seu modo d~ pensar ~ na sua forma de viver. Na primeira, a pessoa quer se impor a Sl propria, impor sua oplniao e atitude de ta l fo~m~ que 0 o~tro pense que 0 resultado psiquico da a~ao e seu proprio entendimento, apenas liberado por aquela influencia, Na segunda maneira basica de agir sobre outro, a pessoa quer encontrar tambem na alma do outro, como nela instalado, e incen.
°
148
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
tivar aquilo que em si mesmo ele reconheceu como certo.ja que
149
75/89
5/17/2018
a secompreendercomo urn auxiliar das forcas atualizadoras. Ele e 0 certo, entao deve tambern estar vivo no microcosmo do ouconhece estas forcas: elas tambem giram sobre ele e sobre ele tro como uma possibilidade dentre outras possibilidades; 0 outro LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com continuam a agir. ~ esta obra sobre ele realizada que eIe as faz deve apenas abrir-se nesta sua potencialidade e esta sua abertura encontrar sempre de novo e coloca a sua disposicao para uma da-se essencialmente nao atraves de urn aprendizado mas atraves do encontro, atraves da comunicacao existencial entre urn ente nova luta e uma nova obra. Ele nao pode querer impo-la, pois er e na ayao das forc as atualizadoras, isto e , e re que, em todo ho que e e urn outro que pode vir a s er. A p ri m ei ra maneira desenvolmem, 0 certo esta instaIado de um a maneira singular, de uma veu-se com mais intensidade no campo da propaganda, a segunda maneira unica, pr6pria da sua pessoa; nenhuma outra mane i ra no da ed1:lca~ao. deve impor-se a este homem, mas uma outra maneira, a deste o propagandista que tenho em mente, que se impoe, nao se educador, pode e deve propiciar a abertura daquilo que e certo interessa em absoluto pela pessoa que ele quer influenciar, en- tal como aqui este quer se realizar - e ajuda-lo a se desenvolquanto pessoa; quaisquer caracteristicas individuais sio para ele ver, significativas somente na medida em que pode delas t ir ar p r ov e ito e conseguir a adesao do outro para os seus objetivos e para iso propagandista que se impoe nao ere sequer realmente na to ele tern que chegar a conhece-las. Na sua indlferenca para propria causa, pois nao confia na possibilidade de que ela atinja com tudo que diz respeito a pessoa, 0 propagandista vai ainda seu efeito por suas proprias forcas, sem os metodos que ele usa, muito alem d~partido para 0 qual atua. P ara 0 partido, as pescujos simbolos sao 0 alto-falante e 0 anuncio luminoso. 0edusoas na sua diversidade tern urn significado, pois cada uma delas cador que propicia a abertura ere na forca primitiva que se espapode ser utilizada, de acordo com sua caracterfstica especial, em lhou e se espelha em todos os seres humanos para crescer dentro uma fun~ao especial; e verdade que tudo isto que e proprio a de cada urn, tornando-se uma figura particular; ele tern fe que pessoa e somente considerado em vista da sua utiliza~ao especieste crescimento s O necessite em cada momento do auxflio presfica, mas, dentro desses Iimites, e contudo reconhecido na pratitado nos encontros, auxflio que tambem ele e chamado a dar. ca. Pelo contrario, para a propaganda enquanto tal, aquilo que e individual e antes urn estorvo, el a se interessa simplesmente pelo Esclareci em dois exemplos extremamente antiteticos 0 ca"mais" - mais membros, mais adeptos, uma superficie de apoio rater das duas atitudes basicas e a relacao que entre elas ex iste. crescente. 0 meio politico, onde ela govema na sua forma extreMas, onde quer que os homens mantenham relacoes entre si, ma, significa como neste caso: apoderar-se do o ut ro , d es pe rs on auma ou outra atitude e encontrada em maior ou menor escala. lizando-o. Este genero de propaganda associa-se de formas diverEntretanto, estes dois principios, de impor-se a alguem e de de acordonada commais a necessa s Ii c oa e la a completa propiciar a abertura a alguem, nao devem de forma alguma ser e do sidade e ca aso,perspectivas, masouemsubstitui, ultima instancia confundidos com conceitos tais como orgulho e humildade. Urn que a coacao sublimada, tomada imperceptivel. A coacao coloca homem pode muito bern ser orgulhoso, sem querer se impor aos as almas sob uma pressao que possibilita a ilusao da autonomia. outros, e nao basta ser hurnilde para propiciar uma abertura ao o meio politico completa-se na supressao efetiva do fator humaoutro. Orgulho e hurnildade sio disposicoes da alma, fatos indino. viduais psicologicos que contem urn acento etico; imposicao e o educador que tenho em mente vive num mundo de indiabertura sao processos que ocorrem entre homens, estados de faviduos, do qual uma determinada parte esta constantemente to antropologicos que apontam para uma ontologia, justamente confiada a sua guarda. Ele reconhece cada urn destes indivfduos aontologia do inter-humano. como apto a se tornar urna pessoa unica, singular e portadora de uma especial tarefa do Ser que ela, somente ela pode cumprir. 0 No campo enunciou da maior im-e Todo ser com caracteristicas pessoais mostra-se para ele como portancia que 0etico, nosso Kant semelhante nunca principio deve ser considerado incluido num tal processo de atualizacao e ele sabe de pr6pria extratado Como urn Simples meio, mas sempre e ao mesmo tempo periencia que asforcas atualizadoras estao cada vez mais ernpenhadeve ser considerado e tratado como urn fim em si. 0 principio das numa Iuta rnicrocosmica com forcas contrarias. Ele aprendeu coloca-se sob 0 signo de urn dever que e sustentado pela ideia da dignidade humana. No seu micleo, 0 nosso ponto de vista apro150 151
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
76/89
5/17/2018
xima-se do de Kant, mas provern de uma origem diferente e dirige-se para urn objetivo diferente. 0que nos interessa sao os presLIV__Martin Buber. Do di logo edo dial gico -slidepdf.com supostos do inter-humano. 0homem e antropologicamente existente na o no seu isolamento, mas na integridade da relacao entre homem e homem: e somente a reciprocidade da a9ao que possibilita a cornpreensao adequada da natureza humana. Para isto, para do inter-humano, como foi e necessario, trado,a existenoia que a aparencia nao intervenha perruciosamente na mosrela9ao entre urn se r pessoal e urn outro se r pessoal; e outrossim necessario, como foi tambem mostrado, que cada urn tenha 0 outro em mente e que 0 tome presente no seu ser pessoal. Que nenhum dos parceiros queira impor-se ao outro e 0 terceiro pressuposto basico do inter-humano. N ao pertence rnais a estes pressupostos 0 fato que urn exerca sobre 0 outro uma aqao no sentido de propiciar-lhe a abertura; mas e este certamente urn elemento capaz de conduzir a urn estagio mais alto do inter-humano. Que a cada homem seja inerente 0 destino de alcancar a maneira certa de ser-hornem dentro da forma que lhe e peculiar, so a ele especffica, pode-se compreender na imagem aristotelica da entelequia, da auto-realizacao inata; e preciso somente considerar que esta e uma entelequia da obra de criacao. Esta errado falar aqui unicamente da individuacao; esta significa apenas a marca pessoal, extremamente necessaria, de toda realizacao do ser-homem. Nao e 0 set-proprio como tal que e 0 essencial em ultima instancia, mas 0 fato que 0 sentido da criacao da existencia humana se completa, vez apos vez; como set-proprio. E a funcao de abertura entre os homens, e 0 auxflio ao vir a ser do horriem enquanto ser-pr6prio, e a assistencia mutua na realizacao do ser-proprio da natureza humana conforme a criacao, e isto que leva o inter-humano a sua verdadeira altura. E somente quando ha dois homens, dos quais cada urn, ao ter 0 outro em mente, tern em mente ao mesmo tempo a coisa elevada que a este e destinada e que serve ao cumprimento do seu destino, sem querer impor ao outro algo da sua propria realizacao, e somente ai que se manifesta de uma forma encarnada toda a gl6ria dinamica do ser do homem.
5 . A C ON VE RSA <;A O G EN UIN A
•
Resta-nos ainda resumir de uma forma esclarecedora as caracteristicas da conversacao genuina. Na conversacao genufna, 0 voltar-se para 0 parceiro da-se numa verdade total, ou seja, e urn voltar-se do ser. Todo aquele que fala tern aqui em mente 0 parceiro ou os parceiros para quem se volta enquanto existencia propria de pessoa. Ter al guern em mente significa dentro deste contexto, para aquele que fala, exercer ao mesmo tempo 0 tornar-presente na medida que lhe e possfvel neste mom en to. Os sen tid o s que fazem a experiencia e a fantasia do real que complete os resultados por eles encontrados atuam em conjunto, para que 0 outro se tome presente como pessoa total e unica, como precisamente a pessoa 153
152
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
e
77/89
5/17/2018
que ele e . Aquele que fala, entre tanto, nao somente percebe a do ser, toda invasao da aparencia pode prejudica-la. pessoa que lhe esta assim presente, ele a aceita como seu parceiLIV__Martin Buber. Do di logo eMas do dial -slidepdf.com ro, e isto significa: ele confirma este outro ser na medida em que conversacao onde agico se realiza em sua essencia, entre lhe cabe confirmar. 0 verdadeiro voltar do seu ser para 0 outro parceiros que verdadeiramente voltaram-se um-para-o-outro, que ser inclui esta confirmacao e esta aceitacao. Naturalmente tal se expressam com franqueza e que estao livres de toda vontade confirrnacao nao significa ainda, de forma alguma, uma aprovade parecer, produz-se uma memo ravel e comum fecundidade yao; mas, no que quer que seja que eu seja contrario ao outro, que nao encontrada em nenhum outro lugar. A palavra nasce eu disse Sim a sua pessoa, aceitando-a como parceiro de uma e substancialmente, vez apos vez, entre homens que, nas suas proconversacao genuina. fundidades, sao captados e abertos pela dinamica de urn elementar estar-juntos. 0 inter-humano propicia aqui uma abertura Por outro lado, se uma conversacao genuina deve surgir, enaquilo que de outra maneira permanece fechado. 1[0 cada urn dos seus participantes deve trazer-se a si mesmo paEste fenomeno e freqiientemente conbecido no malogo a ra ela. E isto significa tam bern que ele deve estar pronto a dizer dois; mas eu 0 tenho experienciado as vezes tam bern no dialogo em cada ocasiao aquilo que verdadeiramente tern em mente no a m ultip le s v oz es. que diz respeito ao objeto da conversacao. E isto por sua vez sigNas proximidades da Pascoa de 1914, reuniu-se urn grupo nifica que em cada ocasiao ele faca a contribuicao do seu espfrito, sem reduyao,; sem desvio. Mesmo pessoas de grande honestide representantes espirituais de alguns povos europeus para uma dade julgam que na o sao obrigadas a dizer numa conversacao do "0 que elas tern a dizer", Mas na grande fidelidade, que etu0 espaco em que respira a conversacao genuina, aquilo que tenho a dizer em cada ocasiao ja tern em mim 0 carater daquilo que quer se r dito, e eu na o devo d ete -lo , n ao devo rete-lo dentro de mim. Pois 0 que tenho a dizer leva 0 signo, inconfudfvel para mirn, de que a palavra pertence a vida comunitaria. Onde a palavra dial6gica existe deuma forma autentica, e pela franqueza que se deve fazer-lhe justica, A franqueza, entretanto, e 0 oposto exato de urn palavrear a esmo. Tudo depende da legitimidade daquilo "que tenho a dizer". E certamente devo tambem estar atento para elevar ao nivel de uma palavra interior e em seguida ao nivel da palavra proferida aquilo que tenho a dizer precisamente agora mas que ainda nao possuo sob a forma de linguagem. 0 dizer e ao mesmo tempo natureza e obra, broto e formayao, e onde ele aparece dialogicamente, no espaco onde a grande fidelidade respira, este dizer precisa realizar sempre de novo a unidade dos dois. Associa-se a isto aquela superacao da aparencia a qual acirna me referi, Mesmo na atmosfera da conversacao genufna age como aquele que e governado pelo prio destruidor efeito produzido quando diz 0 que ternpensamento que dizer. do Se,pr6em lugar daquilo que tenho a dizer, proponho-me a fazer falar urn eu que se faz valer, entao eu falhei irremediavelmente no que teria a dizer; isto se introduz na conversacao de uma forma falha e a conversacao assume uma forma falha. Ja que a conversacao ge-
conferencia de tres dias, que pretendia se r uma prelirninar de discussoes futuras. Queria-se ponderar em comum a eventual possibilidade de prevenir a catastrofe por todos pressentida. Sem que se tenha combinado de antemao quaisquer modalidades da discussao, todas as c on di co es p re via s da con versac ao genu fna estavam preenchidas, Desde a primeira hora reinou entre todos urn contato direto, embora alguns tivessem acabado de se conhecer; todos falavam com uma franqueza jamais ouvida e evidentemente na o havia entre o s p a rt ic i pa n te s urn u ni co e sc ra vo da aparencia. Do ponto de vista dos seus objetivos, a reuniao deve ser considerada como urn fracasso (embora mesmo hoje, no meu inti-
mo, eu nao esteja seguro da inevitabilidade do seu fra~~sso); a ironia da situ ac ao q uis que s e f ix a ss e as d is cu ss oe s d ef ln in va s .p~ra meados de agosto e 0 curso dos acontecimentos mundiais conseguiu logo, naturalrnente, desfazer de abrupt~.o grupo: N? tempo que se seguiu, contudo, nenhum dos partlcl~antes duvidou certamente de ter participado de urn triunfo do mter-humano. Deve-se salientar ainda u m a o bs er va ca o. Naturalmente nao e necessario que todos que estllo reuni, 6' s ue dos para uma conversacao genufna falem eles pr pnos; 0 q permanecem calados podem as vezes tornar-se particularmente importantes. Entretanto cada urn deve estar decidido a nao se • 'II' deterrninar a sua vez de . esqurvar quando 0 curso da conversayaO . . . dizer E certamente nmdiz Ii e dizer precisamente aquilo que tern a tnzer. guem pode saber de antemao 0 que e que ele tern a er: n 0
154
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
155
78/89
5/17/2018
possivel preordenar uma conversacao genufna. Ela obedece, e verdade, desde 0 inicio, a uma ordem basica que Ihe e inerente, LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com mas nada pode ser deterrninado, 0 seu curso e 0 do espirito e alguns s6 descobrem 0 que tinham a dizer quando perce bern 0 apelo deste espirito. Contudo,
e 6bvio tambern que todos os participantes, sem
excecao, tern que ser constituidos de tal maneira que sejam capazes e prontos para satisfazer as condicoes previas da conversa~ao genufna. A genuinidade ja e posta em questao quando os participantes, por men o r que seja 0 seu numero, vejam-se eles pr6prios ou sejam pelos outros percebidos como nao Ihes sen do atribuida uma participacao ativa. Tal estado de coisas po de levar a uma problematica grave. Eu tinha urn amigo que conto entre os homens mais consideraveis da nossa epoca. Era urn mestre da conversacao e ele a arnava; quando falava, sua genuinidade era evidente. Aconteceu, entre tanto, que uni'a vez, sentado com dois amigos, suas esposas e a sua, surgiu uma conversacao de tal natureza que as muIheres visivelmente dela nao participaram, embora sua presenca fosse altamente determinante. A conversacao entre os homens transformou-se logo num duelo entre dois (eu era 0 terceiro). Ooutro, tambern amigo meu, era uma natureza nobre; tambem ele possufa 0 dom da palavra, mas era mais dado a equidade objetiva do que a reinvidicacoes do espfrito e totalmente estranho a qualquer enstica. 0 amigo a quem chamei de mestre da conversayao nao falou da forma descontrafda e seria que Ihe era habitual mas "brilhando", esgrimindo, triunfando. A conversacao deteriorou-se. Na nossa epoca, onde tomou-se raro encontrar a verdadeira compreensao do que e a essencia da conversacao genufna, urn falso senso de publicidade faz com que se conheca suas condi~6es previas de uma maneira a tal ponto errada, que se supoe ser possivel organizar uma destas conversacoes, por meios apropriados de propaganda, para urn publico de ouvintes interessados. Mas, por mais elevado que seja 0 seu niveau, um debate pulico nao pode ser nem espontaneo, nem direto e nem franco; urn coloquio apresentado como audicao esta separado da conversacao
6. OBSERVA~AO POSTERIOR Terminando 0 manuscrito, minha atencao foi despertada por dois trechos em Briefe eines Unbekannten de Alexan~er von Viller, que me parecem suficientemente dignos de atencao para serem aqui mencionados: Wiesen haus, 27 d e Dezem bro d e 18 77. E u ten ho uma supers~ ..iio quanto ao mter-homem, 0 homem do espaco int~r-humano. Eu nao 0 s ou, tu tam pouco , m as entre nos surge um que me diz tu, ao outr? eu sou. 0
genuina por uma barreira intransponfvel.
Assim cadaos um seu inter-homem com umum nome reciprococom ,e de todos cerntem inter-hom ens dos quais cada de d~plo nos participa c inqiien ta por cento n ao hi um i gual ao outr o. M as aq uele que ~en sa, sente e fala e 0 Inter-homem e a ele pertencem os pensamentos; IStOtornanos livres. Wiese nhaus, 28 de Feve reiro d e 1879 . Be ~, ago ra esta~ os ~o ~m inho certo. E falar e responder, objeto VIVO,a trito, talvez a interioridade
156
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
157
79/89
5/17/2018
da procriaeao. Po~stenho uma representacao de algo, niio ern si, mas algo p ara rrum e p~a ti, Para que este algo tenha urn nome, uma alca pela qual possamos pega-lo, dou-lhe 0 nome de inter-homem. 0 inter-homern Buber. e uma Do di logo edo dial gico -slidepdf.com LIV__Martin repre.senta~ao do outro, propria e pertencente somente a dois homens det~mmados. E 0 B entre 0 A e 0 C, no seu espaco intermediario. Na relacao entre A e urn D, E, F nunca reaparece este inter-homem, embora se trate sempre do n:esrno A; ele pertence somente a relacao de A a C.
P O S F . A CI O A H IS TO RIA
D O PR IN CIPIO D IA LO GIC O
Em todas as epocas, pressentiu-se indubitavelmente que a relaltao essencial reciproca entre dois seres significa uma oportunidade do Ser, oportunidade esta que surgiu gracas ao fato de que 0 homem existe. Pressentiu-se sempre tambem de que justamente pela razao de penetrar na relacao essencial e que 0 homem revela-se como homem; que e de fato somente com isto e atraves disto que ele atinge a participacao valida no Ser, a ele reservada; que portanto 0 dizer-Tu vindo do Eu esta na origem de todo singular tornar-se homem. 158
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
159
80/89
5/17/2018
Este pressentimento encontra-se expresso no imediatismo tuindo-o por urn antropologico Deus-substituto. Em vez de conda sua propria linguagem, numa carta escrita por Friedrich Heincluir logicamente: "A unidade do Eu e Tu e homem (no sentido LIV__Martin edo dial gico rich Jacobi ern 1775, dirigida a urn desconhecido (citadaBuber. numa Do di logo verdadeiro)", introduz-slidepdf.com uma construcao pseudomistica, a qual carta de Jacobi a Lavaterem 1781). Diz 0 autor: "Eu abro 0 olho nem ele proprio nem ninguem apos ele conseguiu dar urn conou 0 ouvido ou estendo minha mao e sin to no mesrno instante teudo genuino. de uma forma inseparave]: Tu e Eu, Eu e Tu", Passando isto paA eliminacao desta construcao foi facilitada pouco tempo 0 criterio aqui estabelecido esta expresso num ra a Fliegende li~guagehl,Blatter dos de Jacobi: "A origem de teda certeza: Tu es e Eu sou!" E a formulacao ja madura diz (1785): "Sem 0 Tu o Eu e irnpossfvel"!
Mas somente depois de meio seculo, Ludwig Feuerbach _ urn pensador totalmente diferente de Jacobi mas que nao deiX?U de ser in~uenciado por este dispos-se a enquadrar 0 conhecirnento que tinha da relacao primitiva do Eu e Tu em teses filosoficas complementares, De infcio, ele Sose orienta na ante-sala do :difici? que ~.ele se abriu: "P ara 0 Eu, a consciencia do mundo ~ medl~a atraves da consciencia do Tu" - com 0 que se podena associar a sentenca posterior, que no entanto nao supera 0 pensamento de Jacobi, de que 0 Eu verdadeiro e "somente urn Eu face ao qual esta urn Tu e que, ele pr6prio, e urn Tu face a u~ outro Eu": Pouco tempo apos esta afirmacao entre tanto, ~vld~nte_mente inundado por urn ir e vir de ondas de uma genial mspiracao, Feuerbach escreve sobre 0 "misterio da necessidade do Tu .para 0 Eu", sentenca que tern obviamente para ele urn carater final e na qual ele estacionou sem sequer ten t ar ir mais adiante: "0 homem para si e homem (no sentido comum); 0 homem com hornem - a unidade do Eu e Tu e Deus". P enetra-se aqui com seguranca na posicao da nova mane ira de pens~r, mas .d~-seno mesmo momenta urn passo para alern dela, p~a a indeflnicao de uma rna rnfstica, onde nao espera mais ao fiiosofo urn solo firme. A sentenca esta clararnente consciente ou in~onscientemente, encaminhada contra 0 opini~o basica de Jacobi que 0 leva naquela carta, depois de ter colocado 0 Tu como urn Tu terreno ("apoio da propria existencia do outro: urn Tu querido "), a dirigir-se a Deus com 0mesmo Tu. A este ac~plam~n.to do Tu hum.an~ com 0 Tu divino Feuerbach responde nao exigindo uma renuncia radical ao conceito de Deus mas substi-
depois pelo pensamento de Soeren Kierkegaard que, ao mesmo tempo, preserva a concepcao de realidade de Feuerbach. A categoria de "ser 0 Indivfduo" que ele apresentou a sua epoca deve ser compreendida, no sentido rigoroso, como 0 pressuposto decisivo para a mais alta retacao essencial, pois Deus "quer 0 Indivfduo, ele so quer relacionar-se com 0 Individuo, nao importa se o Indivfduo e superior ou insignificante, excelente ou deploravel". Mas prevalece aqui, nao de uma forma fundamental, mas assim mesmo fatualmente, uma seria limitacao. Certamente Kierkegaard exige que 0 homem tambem aja como Individuo no 0
comportamento com relacao seu semelhante, mas a sentido relacao rigocom o semelhante naopara setoma essencial naquele roso.ela nao pode assim tomar-se para Kierkegaard, por mais brilhantemente que este saiba pregar 0 amor ao proximo. Quando Jacobi comunicava em sua carta acerca de seu imediatismo, chegava ele a urn transbordamento de sentimento cuja expressao lembra literalmente a resposta de Fausto a Gretchen ("Cora9ao! Amor! Deus!") - de fato, 0 Urfaust procede precisamente deste tempo - 0 Tu do "outro" e 0 de Deus unidos, on d e de certo nao se evitava inteiramente 0 perigo de uma vaga confluencia, Num contraste extremo com isto, no pensamento existencial de Kierkegaard 0 Tu humane nunca penetra transparente no divino, 0 limitado nunca penetra transparente no ilimitado. Colocase a partir deste Nao uma grande questao as geracoes que se seguem, que exige uma sobria e descontrafda ponderacao e respostao Pois com a fresta que se abre no Ser entre Tu e Tu esta ameacada de perverter-se a significacao mais intima daquele descobrimento do "Eu e Tu"; assim como esta ameaca provinha antes de urn ateismo ficticiamente mfstico, provem ela agora de uma piedade teista quase monadicamente intencionada.
o movimento
quando da P rimeira Guerra Mundial 1. Pode -se co mpa rar esta formulaeao com a de claracao de Fichte de 1797, que deve ser compreendida natura1mente num contexto de sentido totalmente diverse: "A consciencia do indivfduo e necessariamente acompan hada ?e _u ma o utra , a co nscienc ia d e urn Tu, e e possfvel somente sob esta condicao",
.
2
recomeca somente uns setenta anos depois , 0
estranho anseio de fazer
2. Uma impo rtan te a firmaca o d e William Ja mes , ne ste Interim (The Will to Believe, 1897), nao pode, entretanto, deixar de ser aqui mencionad a. Diz eIa: " Se so mo s c ren tes (religious), 0 Universe nao e mais urn mero Ist o mas urn Tu; e quaJquer relacao que possa ser possfvel de pe ssoa a pessoa torna-se possfvei aqui".
160
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
161
81/89
5/17/2018
justica com 0 pensamento ao proprio existir desperta da expeesta expressao ganhou na nossa epoca; ela e para ,Ebne~ ::nada riencia da hora vesuviana e este anseio apodera-se tambem dos original", mas a consequimcia do "encerrar-se em SIdo ,1u .DaLIV__Martin Buber.Do di logo edo dialseguindo gico sistematicos, E significativo que 0 neokantiano Hermann Cohen, qui por diarte, osslidepdf.com p~ssos de Hamann, mas um,nd? ,com no inverno de 1917/1918, estando proximo da morte, tenha simais forca os criterios entre SI, e le se aprofunda no misteno ~a do 0 primeiro a renovar a visao do Tu no livro Religion der linguagem com 0 estabelecimento eternamente novo da relacao Vernunft aus den Quellen des Judentums (1919). Isto po d e ser entre 0 Eu e 0 Tu. Confessa-se, de uma forma mais direta de que considerado um·prolongamento da linha de Jacobi se se recoKierkegaard. como alguem que nao f~i capaz de enc.ontr~r .0 Tu nhece aqui que "somente 0 Tu, 0 descobrimento do Tu", leva no homem. Ja em 1917 indicara 0 pengo de sucumbir espiritual"a mim mesmo a consciencia do meu Eu" e que e "a personalimente na consciencia desta "impossibi1idade~·. Ele encon:r~ a dade" que "6 trazida a luz do dia pelo Tu", Mas algo ate entao salvacao no pensamento: "Hi somente urn unico Tu e este e J U s nunca expresso em filosofia torna-se expltcito quando se fala da tamente Deus". E verdade que tam bern ele postula, como reciprocidade do homem com Deus, da sua "correlacao", que Kierkegaard: "0 homem nao deve amar somen:e. a Deus, m~s ela nao poderia "se cornplctar se nao fosse precedida peia corretambem ao hornem". Mas on d e se trata da autentlcld~de da exislacao nela inclufda entre homem e homem". tencia, desaparece tambern para ele todo out.ro Tu diante do T~ de Deus. Se perguntamos aqui, co~o em Klerk~gaard, 0 que e o admiravel aluno de Cohen, Franz Rosenzweig, nao se valido enfim, estamos novamente diante do Indivfduo ~ue, emafastou tanto de Kierkegaard. Ao travar conhecimento naquele bora ollie para 0 mundo, e, em ~lt~a ~nst~nc~a,acosrmco; eminverno com a Rell'kion der Vemunft ainda em forma de manusbora ame aos hornens, tern, em ultima mstancia, urn comportacrito nao foi de certo por esta obra centralmente influenciado; mento anantr6pico. conservou-a entre tanto em mente quando comecou, no verao seguinte, nas trincheiras macedonicas, a construir sua obra Stem Neste ponto e preciso que eu fale demim mesmo. der Erlosung (1921). Mas, inflamado pela s6lida concretude da Desde a minha juventude fui abordado pela questao da possua reflexao sobre a linguagem, Rosenzweig supera notavelmente a Cohen na compreensao do Tu enquanto Tu falado: a verbasibilidade e realidade de uma relacao dialogica entre homem e lizaltao essencial do Tu esta para ele contida no "Onde estas?" Deus, portanto de uma parceria livre do homem numa ~onversadirigido por Deus a Adao; isto interpretando, pergunta Rosenz9ao entre 0 ceu e a terra. A linguagem ?esta conversacao, no faweig: "Onde esta urn Tu tao independente que enfrenta livrelar e no responder, eo pr6prio aconteclillent~, 0 aconte.cunento mente 0 Deus oculto, urn Tu em quem ele pode descobrir-se code cima para baixo e 0 acontecimento de baIXOpara clII~a. Em mo Eu?" A partir daqui fica visfvel urn caminho interior bfblico para aquele "Chamei-te pelo nome. Tu es meu", com 0 qual Deus se identifica como "aquele que origin a e abre todo este dialogo entre ele e a alma". E esta a significativa contribuicao teol6gica de Rosenzweig ao nosso assunto",
o Stern estava terminado em fevereiro de 1919. Mas, no mesmo inverno e estendendo-se pela primavera, Ferdinand Ebner, urn professor de escola primaria, na provincia austrfaca, catolico, seriamente abalado pela doenca e pela depressao, escreveu seus Pneumatoiogische Fragmente, que reuniu em seguida no livro Das Wort und die geistige Realitaten (1921), Ebner parte da experiencia da "solidao do Eu" naquele sentido existencial que 3 . No qu e diz resp eito a este assun to, Fra nz R osenz weig prec isa tam bern se r vis to no con texto de um cfrcul o do qu al devem ser a qui d estaca dos em particular Hans Ehrenberg e Eugen Rosenstock.
particular, desde que a tradtcao hassidica cresceu par~ ml~ ate tornar-se 0 sustentaculo do meu pr6prio pensamento, ISt~e, de~de aproxirnadamente 1905, esta questao passou. a ser muito f~tlrna para mim. Na forma da linguagem dos.escntos sobre 0 prmcipio dial6gico surgidos muitos anos depots. ela s~ encont!a de certo pela primeira vez no outono de 1907, na mtrodu9ao ao meu livro Die Legende des Baalschem. Esta introdu~ao trata .da distincao radical entre 0 mito no sentido mais restrito (0 mito das mitologias) e a lenda. Diz ela:
A lenda e 0 mito do ch ama do. No mito pur o m Io hi disti~liao de es•. Mesmo 0 heros permanece somente num degrau diferente d? sencia. . . 0D d 0 rru que Deus, nao face a ele; eles nao sao 0 Eu e 0 Tu. . . eus ~ p~r ha~ to nao chama ele gera; ele envia 0 gerado, 0 heros. 0 Deus da e~ a c. r na ele cham a 0 filho do homem: 0 profeta, 0 santo . .. A lenda e .0mito do 'Eu e Tu, daquele que e chamado e ~quele qu~ chama, do finito que penetra 0 infinito e do infinite que necessita do finito.
162
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
163
82/89
5/17/2018
procurar 0 tesouro enterrado. Logo depois, vindos de outras diA relacao dial6gica acha-se aqui exemplificada na sua mais revelaram-se a mim. r ec oe s,edo f en om e n os gico semelhantes alta culminan~ia; pois .mesmo nesta altura,LIV__Martin a diferenca essencial Buber.Do di logo dial -slidepdf.com entre os p a rc ei ro s p er si st e sem enfraquecer e mesmo nesta proxiDos iniciadores, eu ja tinha conhecido como estudante midade a independencia do homem continua ao mesmo tempo Feuerbach e Kierkegaard; Sim e N ao a eles tinha-se tornado um a preservada. parte da minha existencia; Jacobi eu conhecia entao de uma for0 Deste fenomeno da excecao, do excetuar, pensamento lema totalmente insuficiente (M pouco tempo somente que 0 li you-me agora com uma seriedade cada vez maior para aquilo que adequadamente); envolvia-me agora espiritualmente urn cfrculo e c om u m , e x pe ri en c ia v el por todos. 0 esclarecimento deu-se em crescente de homens das geracoes atuais que se preocupavam, primeiro lugar tam bern aqui em conexao com a rninha interpreemb ora em medida desigual, com aquele algo que para mim torta~ao do Hassidismo: no "Prefacio" escrito em setembro de nara-se urn assunto cada vez mais vital. Eu ja tinha preparado 0 1919 ao livro Der grosse Maggid und seine Nachfolge(1921), 0 caminho para 0 seu entendimento no meu livro Daniel (1913), ensinamento judaico esta caracterizado como "totalmente ba mediante a distincao af exposta entre uma atitude basica "orienseado na relacao bidirecional do Eu-humanc e Tu-divino, na re tadora", que objetiva, e uma "realizadora", que torna presente, ciprocidade, no encontro ", Logo depois, no outono, seguia-se 0 uma distincao que coincide no seu cerne com a distincao efetivaprimeiro rascunho, ainda canhestro, do Eu e Tu (originariamente da em Eu e Tu entre a relacao-Eu-Isto e a relacao-Eu-Tu, com a devia ele constitua a primeira parte de uma obra em cinco voludiferenca que mais tarde eia nao se alicerca mais na esfera da mes, cujo conteudo eu ja esbocara rapidamente em 1916, cujo subjetividade, m as na esfera entre os seres. Esta e entretanto a carater sistematico, entretanto, t or na v a- o v is iv e lm e n te alheio patransforrnacao decisiva que se deu numa serie de espintos na ra mim)". epoca da Primeira Guerra Mundial. Ela manifestou-se em sentidos e ambitos multiples, mas a cornunhao fundamental, origin a S eg u ir ar n- se e nt ao dois anos, nos quais quase na o pude traria da reveladora transformaeao da situaeao humana, e inconfunbalhar a na o ser em assuntos hassidicos, rnas tam bem - com excecao do Discours de la Methode que mais uma vez me propus
a estudar - nada li de Philosophica (por isso, somente mais tarde, e com atraso, li as mencionadas obras de Cohen, Rosenzweig! e Ebner). Isto faz parte da continuidade de um processo que na quele tempo eu compreendi Como uma ascese espiritual, Em se guida pude inieiar a redacao definitiva do Eu e Tu, tenninada na primavera de 1922, depois de ter exposto 0 desenvolver do meu pensamento em janeiro e fevereiro de 1922, na conferencia "Religion als Gegenwart", no Freies Juedisches Lehrhaus em Frankfurt ·a.M. Enquanto escrevia a terceira e ultima parte, interrompi a ascese de leitura e comecei com os fragmentos de Ebner6. 0 livro mostrou-me, como nenhum outro desde entao, em certas partes numa contiguidade quase inquietante, que homens de diferentes especies e tradicces puseram-se nestes nossos tempos a
4. Cf. minha observacao que se segue Ii primeira edi930 de Eu e Tu. 5. Explica-se aqui a cornunicacao de Rosenzweig numa carta (Briefe p. 426 ) qu e em de zembro de 192 1 eu a inda na o conh ecia seu livro. 6. Depare i-me de infcio com algurna coisa publica da num ca demo de "Brenner" e em seguida encomendei 0 livro.
dfvel.
Sob este ponto de vista, um numero de publicacoes da decada que se segue pode-se reunir as obras acima mencionadas como pertencendo ao periodo em que se completa 0 esclarecimento. Do circulo de Rosenzweig vieram - o s livros de dois pensadores protestantes: Disputationen I Fichte (1923) de Hans Ehrenberg e Angewandte Seelenkunde (1924) de Eugen Rosenstock, pela qual Rosenzweig, que conhecia uma versao anterior da obra, foi decisivamente influenciado ao escrever 0 seu livro (cf. agora tambern 0 Der Atem des Geistes (1951) de Rosenstock). Da teologia protestante deve-se mencionar em primeiro lugar Ich glaube an den dreieinigen Gott (1926) de Gogarten. Este livro pretente entender a historia como "0 encontro do Eu e Tu", mas ao mesmo tempo prende-se a tese nao dialetica de que a "historia e obra de Deus" e por isso falha necessariamente em ultima instancia em apreender 0 carater da hist6ria como encontro. Em Glaube und wirklichkeit (1928), do mesmo autor, 0 ~nsinamento que 0 encontro do Eu e Tu e realidade e tratado sim-
164
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
165
83/89
5/17/2018
livro de Lowith a propria contribuicao da fenomenoloplesmente como uma parte constituinte do Protestantismo da gia 7, uma analise estrutural digna de confianca, que valoriza so Reforma. Temos em seguida diante de n6s a abrangente tentatibretudo com conviccao grandes descoberas da filosofia da linLIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gicoas -slidepdf.com va de sistematizacao teologico-filosofica de Karl Heirn, Glaube guagem de Wilhelm von Humboldt; mas esta analise nao conseund Denken (1931), na qual se aponta para a significacao do noguc evitar 0 trancar cuidadoso das portas que, sem ter side assim vo rumo tornado, possivelmente de forma mais enfatica. programado, querem se abrir de repente. Se de in fcio h avia a rela ~o Eu- Isto e abre -se ago ra pa ra n os 0 Tu, . .. deu-se uma revolucao muito mais radical do que 0 descobrimento de uma nova parte do mundo ou 0 desvendamento de novos sistemas solares. A totalidade do mundo-do-Isto espaco-temporal, inclusive todas as constela~oes e nebulosas da Via Lactea, entraram numa nova perspectiva.
Tambem nos trabalhos de Emil Brunner desse perfodo ja esta incluido 0 nosso problema. A filosofia eatolica produziu naquela epoca, antes de mais nada, 0 Journal metaphysique (1927) de Gabriel Marcel, no qual, de uma forma aparentemente independente daquilo que ate ai tinha sido
A rigorosa, extremamente rigorosa coerencia da cntica radical de Grisebach sacrifica muitos conteudos concretos da relao;:ao-do-Tuao postulado do reconhecimento do Tu do semelhante na sua existencial apost- ,10 e contestacao, Nao se leva aqui em consideracao 0 fato que, num verdadeiro encontro com a meu proximo, a pratica exagerada de ouvir a alteridade do outro, exigida pelo autor, pode deixar escapar justamente aquela ajuda posta em questao: a abertura de alga a ser contemplado em comum. Deixar-se limitar realmente pelo Tu e importante, mas pode ser muito mais import ante expor-se, junto com ele, ao llimitado que elimina as limites entre nos. "Que a palavra nos seja dirigida pelo Absoluto", diz Grisebach, "e urn dogma da memoria" - mas 0 que dizer se, na presenca do outro e precisamente atraves dela, a palavra nos e dirigida? Grisebach acrescenta: "Certamente urn Individuo pode, pela sua essencia, reivindicar a posse da incondicionalidade mas nunea do Incondiciona~o", e sua sinceridade inexoravel impede-o de reconhecer que e justamente 0 verdadeiro ser-alvo-da-palavra-dirigida - certamente nao do "Absolute", que nao fala, mas do Deus que fala 0 mundo para mim - que incinera toda reivindicacao a posse de urn absoluto. Jaspers pertence eminentemente a este movimento gracas ao capitulo sobre comunicacao em seu Existenzerhellung e aquele sobre 0 ensino da leitura da escrita cifrada em sua Metaphysik. Os dois juntos constituem a conclusao exemplar de uma fase de desenvolvimento em que a filosofia "livre" toma posse do novo descobrimento, reduzindo-o. Eu digo "reduzindo", porque ela trata como arbritario 0 vinculo caractenstico deste des7. Apesar de toda sua significaeao, W e se n u nd F o rm e n d er S ym p at hi e (1923) de Max Scheler mlo pertence aqui, pois nao corresponde a nature0 "rnundo-doza stion to. essSe ntenc es co moa" aqquela T u"d osenosso ja t antoque"u ma amen esf era encia l auto nom uantoqu ae esfera d o m undo exter ior, a esfer a do m undo int erior, a "es fera d o div ino" , n ao tr ansc ende m est a lim itacao de pers pecti va, ( Em bo ra origi nado s nu ma epoc a po steri or, dev ern ser co ntud o aqui menc ionad os c omo in terpre tacao do pensamento de Husser! os capitulos pertinentes em Phenomenologie und Metaphysik (1948) de Ludwig Landgrebe.)
166
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
167
84/89
cobrimento entre a transcendencia e a concrecao, anulando ao S6 que 0 que antes foi mencionado e que esta cifra e , "mimesmo tempo 0 avanco em direcao a infinitude do Tu. Sem ticarnente falando, a cifra do demonic, 1[0 visfvel como a cifra Buber.Do di logo edo dialTorna-se gico -assim slidepdf.com mais se prender a qualquer solo que sirva LIV__Martin de raiz a uma realidade da divindade". claro 0 diferente significado das de fe, esta f ilosofia ere ser capaz de governar sem impedimentos coisas que se tern em mente aqui e laoQ ue especie de "transcenna nova terra se somente preservar a s it ua ca o b as ic a de uma exisdencia" maravilhosa e esta em que as escritas cifradas eonfuntencialidade da pessoa filosofante - e ela 0 consegue a seu modern-se fatalmente! Com 0 devido respeito ao demonic, mitica-
5/17/2018
do.
Tfnhamos reconhecido que e precisamente 0 mesmo Tu, que vai de homem para hornem, que e precisamente este mesmo Tu que desce do divino para nos P que de nos para ele se eleva. Na total ausencia daquilo que e comurn, e deste elemento comum que se tratava e se trata. No duplo mandamento, aquela uniao bfblica do arnor de Deus e 0 amor do homem dirigiu 0 nosso olhar para a transparencia do Tu finito, mas tam bern para a graca do Tu infinito, que aparece onde e como quer. Agora, no entanto, 0 nosso dizer-Tu a divindade e censurado como ilegfti~de certo inviolavelmente para afirmo. mar 0 quefil6sofo "a existencia fllosofica" tolera "aqualificado nao-apr oximacao do Deus oculto". Mas ele nao e qualificado para designar como "questionavel'" a oracao que e assim estranha a sua experiencia, As coisas nao se dao de uma forma muito diferente no que diz respeito ao ensino da leitura da escrita cifrada. "Signos", dissemos", "acontecem-nos sem cessar, viver significa ser alvo da palavra dirigida" e "Aquila que me acontece e palavra que me e dirigida. Enquanto coisas que me acontecem, os eventos do mundo sao palavras que me sao dirigidas". Parece ter-se algo semelhante em mente quando a f ilosofia nos aponta 0 fato de que "0 mundo nao e uma r evelacao direta mas uma linguagem que, sem tornar-se universalmente valida, torna-se por vezes historic amente perceptivel somente para a existencia e mesmo ai nao pode ser decifrada de uma vez par todas" e quando se diz mais enfaticamente ainda sobra a transcendencia: Ela vern a este mundo como urn poder estranho, vindo do seu sentido longinquo, e fala para a existencia; ela dela se aproxima, sem nunca mostrar mais do que uma cifra, 8. No livro Der philosophische
Glaube de 1948, Jaspers se expressa,
e
verdade, de uma maneira notadamente mais positiva sobre a oracao, a firn de aproximar os dois domfnios; mas ele atenua a diferenca mais vital, quando compreende a "certeza especulativa", "onde cia setornou genufna contemplacao", como a mais alta forma de oracao, 9. "Dililogo" (1930), capitulo "Os Signos"; no presente volume g i na 43.
a
pa-
mente falando, nao se deveria contudo atr ibuir-lhe tanto poder para que com 0 seu c6digo ele pudesse nao somente perturbar mas tambem transtornar 0 c6digo de Deus. Se 0 conceito da "escrita cifrada" deve ter urn sentido inequivoco, entao deve ser pressuposta uma instancia cifradora que quer que eu decifre de uma forma correta a sua escrita destinada para a rninha vida e que ela tome esta decifracao possivel, mesmo que com dificuldade. E verdade que Jaspers explica aqui clara mente que "a consciencia genuina da transcendencia" defende-se contra "pensar" Deus "simplesmente como uma personalidade ". Pois bern, muito homem de f e concordaria com isto; se apenas a palavra "simplesmente" fosse suficientemente enfatizada. Para ele, para este homem de fe, Deus nao e simplesmente uma pessoa; para ele, Ele e tambem pessoa que, de toda a infinidade de seus atributos, volta-se para ele, homem de fe, no seu relacionamento com ele, neste urn atributo, a caracterfstica de pessoa, tambem apenas urn atributo existente entre outros atributos. Mas, apesar daquele "simplesmente", Jaspers nao quer de forma alguma ser assim compreendido. "Eu recuo", continua ele, "imediatamente no impulso que faz com que a divindade se tome Tu para mim, pois sinto que violo a transcendencia". Desta maneira e permitido que Deus seja tudo, mas nao pode ser, justarnente, uma pessoa e isto devido ao fato de que a personalidade e per de/initionem "a mane ira pr6pria do ser", "que pela sua essencia nao pode ser sozinho ". Como se uma definicao destas devesse conservar sua validez mesmo no paradoxo da Pessoa absoluta, ja que 0 Absoluto, na medida em que existe uma possibilidade de pen sa lo, s6 pode aparecer ao pensarnento como complexio oppositorum! E mesmo se eia conservasse sua validez. "A divindade", censura Jaspers, "precisaria de n6s, do homem, para a comunica9ao"; mas, entre as doutrinas de fe, parece-me nao ser indigna a da transcendencia, que permite que Deus tenha criado os homens para se comunicarem com ele. Estabelece-se contudo finalmente que a "comunicacao com a divindade" tern "a tendencia de tolher a comunicacao entre os hornens", pais a "comunica930 de individuo a individuo, enquanto realidade verdadeiramente presente, onde a transcendencia po d e vir a falar", e "pa169
168
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
r
ralisada quando a transcendencia
e trazida diretamente como
85/89
5/17/2018
e pergunta com toda legitimidade: "Deverfamos n6s abstermodegradada". Vejamos bern: 0 homem que ora, que se atreve hunos por isso destas afirmacoes?"; sim, ele pretende se "alegrar, mildemente a dirigir-se de uma forma pessoal edireta ao Buber. Ente com toda tranquilidade, com 0 fato que, na direcao geral da LIV__Martin Do di logo edoadial gico -slidepdf.com supremo enquanto Ente que lhe esta presente, degrada-o justanossa pesquisa e da nossa apresentacao, encontramo-nos numa mente com isto e justamente com isto paralisa em si a capacidacerta concordancia com os mais sabios entre os sabios deste de de comunicar-se com os seus semelhantes. No interior do mundo"; mas ele guarda - certamente sem querer "insistir" pensamentoaquido'aoque parece ser a mesma ideia nifesta-se nosso entendimento.
0 p610
oposto rna-
A esta conclusao filosofica que nao era urn fim seguiram-se duas decadas nas quais destacaram-se muitos trabalhos notaveis - que nao serao aqui discutidos - especialmente no que ~iz re~peito a valorizacao da nova visao para campos intel~ctual~: ta~s como sociologia, pedagogia, psicologia, psicoterapia e ciencta medica. Mas nao posso renunciar a abordagem de uma destas obras, certamente uma obra importante, pois nela uma passagem faz parecer neces~ario urn esc1arecimento meu, pessoal e fatual. E a segunda parte de Lehre von der Schopfung (1948) da obra Kirchlicher Dogmatik de K a r l Barth.
uma duvida: "se vez e em medida eles (aqueles "maisconsabios")forte podem por sua nosque seguir nas ultimas e decisivas sequencias desta concepcao ... " Em oposicao a este pronunciamento, devo fazer antes de tudo uma pequena ressalva a linguagem: nao seria concebivel que estes mais ou men os sabios acima mencionados, embora nao "sigam" aqueles teologos ("nos"), nao 0 facam somente porque chegaram eles mesmos, nas suas pr6prias buscas, senao necessariamente a "consequencias" iguais, mas a "consequencias" sernelhantes? Barth preocupa-se aqui com "aquela libcrdade do coracao entre homem e homem enquanto raiz e coroa do conceito de humanidade" - de certo e
Para a sua apresentacao da "forma basica da humanidade", com toda a plenitude e forca pr6prias do seu pensamento teologico, Barth recorre assim mesmo ao produto especffico de u~ movimento espiritual cujo caminho tinha side trilhado pela pnmeira vez nos seculos dezoito e dezenove por urn idealista nao pertencente a Igreja, mas homem de fe e por urn sensualista d~scrente, movimento que encontrou uma expressao bastante sansfat6ria no seculo vinte com a participacao nao insignificante de alguns judeus religiosos, Ns o que Barth 0 tenha anexado ao Protestantismo da Reforma como fez uma vez Gogarten num gesto quase ingenue: exercendo ele pr6prio "a liberdade d~ coracao" que prega, numa esfera tao diffcil quanta a da teologia, procura fazer justica ao espfrito que sopra fora da Cristandade. Adot~ as· sim de urn lado, naturalmente na forma de urn pensar proprio e genuino, 0 nosso reconhecirnento da separacao fundamental entre 0 Isto eo Tu e 0 verdadeiro ser do Eu no encontro: de outro lado, ele nao pode admitir exatamente que esta especie de visao da humanidade possa ter crescido em qualquer outro terreno que nao seja 0 cristologico (Jesus Cristo como "0homem para 0
ela que ele pensa necessariamente nao encontrar nos mencionados nao-cristaos, justamente enquanto tais. 0 que a ale interessa e que 0 homem e homem, enquanto lhe agrada ser humane: "agrada no sentido em que urn 'desagrada' esta fora de questao ", Onde pode ser encontrado este "agradar" e onde nao? "Enfim nao nos parece", diz Barth, "que este seja seguramente 0 caso de Confucio, de Feuerbach, de Buber". Nao gostaria de defender neste contexto nem a sublime - se bern que para mim algo estranha - doutrina confucionista, nem a doutrina de Feuerbach, que e mais antropologicamente postulativa do que originalmente humanitaria. Mas, no que diz respeito a mim mesmo, nao posso deixar de prestar urn esclarecimento. Seria certamentc desagradavel depender de con trap o r as pr6prias certezas as duvidas que nos acometem de fora. Mas de fato e tao desnecessario falar aqui do meu mundo de pensamento pessoal enquanto tal como e desnecessario falar do mundo de Barth; alias, e 0 mundo hassfdico no meu entendimento que esta em confronto com 0 mundo de fe protestante no entendimento de Barth. E at, entre os hassidim - num mundo de fe, cuja doutrina e, em ultima instancia, o comentario a uma vida vivida - 0 "agradar" da liberdade do coracao nao e, e verdade, consequencia, mas e 0 mais fntimo
seu semelhante e assim a imagem de Deus"). Ele constata, na verdade, que "a antropologia teologica, aqui no seu pr6prio caminho, ao trilha-lo decididamente ate 0 fim, chega a principios que sao muito semelhantes lqueles pelos quais a humanidade ja foi abordada de lados totalmente diferentes (por exemplo pelo pagao Confucio, pelo ateu L. Feuerbach, pelo judeu M. Buber)",
pressuposto, e 0 fundamento dos fundamenos. Oucamos s O como e dito ai: "Inteligencia sem coracao nao e nada. Piedade e falsa ". Pois "0 verdadeiro arnor a Deus micia-se com 0 arnor ao homern". Mas eu gostaria de poder mostrar a Karl Barth aqui, em Jerusalem, como os hassidim - dancam a liberdade do coraryaopara com 0 semelhante.
170
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
171
86/89
5/17/2018
LIV__Martin Buber.Do di logo edo dial gico -slidepdf.com
COLE<;AO DEBATES 1. A P en on og em d e F ic fi lo , Antonio Candido e outros. 2. 1l1formflftTo.,Lin g u ag em. Co mu n ictlfiTo , Declo Pignatari. 3. Baianro da B o s Sl l e D u tr a s B o S Sl l' , Augusto de Campos. 4. O b ra A b er ta , Umberto Eco. S. Sexo e Temperamento, Margaret Mead. 6 . F im d o P ov o J ud eu ?, Georges Friedmann. 7. Textoltlontexto, Anatol Rosenfeld. 8. 0 Sentido e a M asca ra , Gerd A. Borheim. 9 . P roblem as da F isica M odem a, W . Heisenberg, E. SchBdinger, M. Born e P. Auger. 10. D is tU rb io s E m oc io na il e A nti- Se miti lm o, N. W. Ackermann e M. Jahoda. 11. B a r ra c o M i n ei ro , Lourival Gomes Machado. 12. Kafka: Pr O e C o nt ra , Gunther Anders. 13. N ov a H il to ril z e N ov o M u nd o, Frederic Mauro. 14. A s E s tr ut ur a , N a rr a tW a " Tzvetan Todorov. IS. S o ci ol og i a d o E s p or te , Georges Magnane.
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
87/89
5/17/2018
6 7 .1 82 2: D im en so es , Carlos Guilherme Mota e outros. 16. A Arte no Horizonte d o P r ov lN e l, Haroldo de Campos. 6 8. 0 K itsch . Abraham Moles. 17 . 0 D orsa do Tigre, Benedito Nunes. LIV__Martin Buber.Do di logo gico -slidepdf.com e Filosofia, 6 9 . Besdo te ti c«dial Mikel Dufrenne. 18. Q ua dro da Arquitetura n o B ra si l, Nestor G. Reis Filho. 7 0.0 S iste ma dos Objetos, Jean BaudiUlard. 1 9. A po ca lip tic os e In te gr ad os , Umberto Eco. 71. A Arte na Era da MlJquina, Maxwell Fry. 2 0 . B a be l & Antibabel, Paulo Ronai, 72. Teoria e Realidade, Mario Bunge. 21. Pl a ne ja m e nt o no Brasil, Betty Mi"dlin Lafer. 7 3.A N ova Arte, Gregory Battcock. 22. L i ngfi /s i ic a . Poette« CineTfUl, Roman Jakobson. 7 4.0 C arta z, Abraham Moles. 2 3. L SD , John Cashman. 7 5. A Prova de Giidel, Ernest Nagel e James R. Newman. 24 . Critice e Verdede, Roland Barthes. 7 6 . h iq ui at ri a e A n ti ps iq ui at ri a, David Cooper. 25. Ra ca e C iinda I, Juan Comas e outros. 77. A Caminho da Cidade, Eunice Ribeiro Durhan. 2 6 . S ha za m !, Alvaro de Moya. 7 8 . 0 E sc or pU 1 o E n ca la cr ad o , Davi Arrigucci JUnior. 27 . Artes P Us tic af n a S eT fU ln o d e 22, Aracy Amaral. 7 9. 0 C am inho Crttico, Northrop Frye. 2 8. H isto ria e Ideologia, Francisco Iglesias. 80 . Economia Colonial, J . R. Ama ral Lapa. d Militar. A. Pedroso d 'Ho rta. 29. P eru: d a O liga rqu ia E co n6 mica 8 1. F a li nc ia d a Cr it ic a , Leyla Perrone Moises. 3 0. P e qu en o E st et ic a . Max Bense. 8 2. L azer e C ultu re P op ula r, Joffre Dumazedier. 3 1. 0 S oc ia lis mo Utopico, Martin Buber. 83 . O s S ig no s e a C r it ic a , Cesare Segre. 32 . A T ra ge dia G re ga . Albin Lesley. 84.lntrodu~tlo a Seman6lise, Julia Kristeva. 3 3 . F i los ofi a em N ov a C ha ve. Susanne K. Langer. 8 5. C r is es d a R e pU b li ca , Hannah Arendt. 3 4. T ra dlrtfo . O Iin cia d o P ovo, Luis da Cimara Cascudo. 8 6 . F o rm u la e FlJbula, W i ll Bolle. 35.0 L udicoGerd e asA.Proje¢es 8 7. Sa id a. V oz e L ea ld ade, Albert Hirschman. 36 . Sartre, Borheim.d o M undo B arra co. Affonso Avila. 88 . Repensando a Antropologia, E. R. Leach. 3 7. P ia ne ja m en to U rb an o. Le Corbusier. e Estruturalismo, Andrea Bonomi. 8 9 . F e n om e n ol og la 3 8. A R e li gi tf o e 0 S ur gim en to d o C a plta lism o. R. H. Tawney. 9 0. L im itel do C rescim ento , Donella H. Meadows e outros 39. A Poetic« d e M a i a ko v sk i. Boris Schnaiderman. 40.0 Vis/vel e o Invisivel, M. Merleau-Ponty. 4 1. A M ultid tfo S olita ria . David Reisman. 4 2 . M a i a kO v sk i e 0 Teetro d e V an gu ar da . A. M. Ripellino. 4 3. A G ra nde E sp era lrfa do S eculo XX, J. Fourastie. 44. Conl ra c om un;cl lf tf o. Decio Pignatari. 45 . Unissexo, Charles F. Winick. 46. A Arte d e A go ra . A go ra . Herbert Read. 4 7 . B a u h au s : N o v a rq u it et u ra . Walter Gropius. 4 8. S ig no s e m R ot aftfo . Octavio Paz. 4 9. A E sc ritu ra e a Diferelrfa. Jacques Derrida. 5 0. L in gua gem e M ito. Ernst Cassirer. 51. A s Formes d o F als o. WaJnice N. Galvio. 5 2. M ito e Realidade. Mircea Eliade. 53.0 Tra ba lho em Migalhas. Georges Friedmann. 5 4. A S ig nific llf4 'o n o C in eT fU l. Christian Mea. 55. A M usica H ole. Pierre Boulez. 56 . R llfa e C iJncia II. L. C. Dun n e o utros. 5 7 . F ig ur as . Gerard Genette. 58 . Rumos d e U T fU lC u lt ur a T e cn o lo g ic a . Abraham Moles. 5 9. A L ingua gem do EspIlfo e do Tem po. Hugh M. Lacey. 6 0 . F o rm a l ls m o e Futurismo. Krystyna Pomorska. 61 0 Cris4ntem o e a Espa da , Ruth Benedict. 6 2. E ste tic a e H is to ria , Bernard Berenson. 6 3. M o ra da P au lis ta , Lufs Saia. 6 4 . E n tr e 0 P assa do e 0 Futuro. Hannah Arendt. 6 5. P olltic a C ie nt/fic a, Heitor G. de Souza, Darcy F. de Almeida
e Carlos Costa Ribeiro. 6 6. A N otte da M adrinlu J. Sergio Miceli.
( Cl ube
de Roma).
9 1. M a nic om io s, P rlltJ ese C on ve nto s, Erving Goffman. 9 2. M aneirism o: 0 M undo com u Labirinto, Gustav R. Hocke. 9 3. S em io tic e e L ite ra tu ra , Decio Pignatari. 94. C o zi nh a s, e tc ., Carlos A. C. Lemos. 9 5. A s R el ig i( Je s d os Oprimidos, Vittorio Lanternari. 9 6. O s T res B sta bele cim en to s H um an os, Le Corbusier. 97 . A s P ala vra s so b a s Palevras, Jean Starobinski. 9 8. 9 9. 1 00 . 101.
I nt rodur tf o d L i te ra t ur e F e nt es ti ca , Tzvetan Todorov. S ig nific ad o n as A rtes Y isu ais, Erwin Panofsky. V ila R ic a, Sylvio de Vasconcellos. T r ibut ll ft f o Indireta nas Economies e m D e se n vo l vi m en to ,
J. F.
Due. 102. 103 . 1 04 . 1 05 .
106. 107. 1 08 . 109 .
M e tl Jf o ra e Montagem. Modesto Carone. Re pe rt oe io, Michel Butor. V alis e d e C ro no pio . Julio Cortazar. A M etlJ fo ra C rftic a, Joao Alexandre Barbosa. M undo, H o m em , A rt e e m C ris e, Mano Pedrosa. Bnsaios Criticol e Filos6ficos, Ramon Xirau. D o B ra sil d America. Frederic Mauro. 0 Ja zz, do Ra g ao Rock, Joachim E. Berendt.
110. Etc ... , Etc... (U m L ivro 100% Bra sileiro), Blaise Cendrars. 111. Temtorio da Ar q uit e tur a , Vittorio Gregotti. 1 12 . A C rise M un dia l d a E du ca ~tfo , Philip H. Coombs. 113. Teoria e Projeto na Prim eim Era da M a quina . Reyner Banham. 114.0 Substa ntivo e 0Adjetivo, Jorge Wilheim. 1 15 . A E str utu ra d as R ev olu co es C ie ntffic as, Thomas S. Kuhn. ,. 116 . A Bela Epoca do Cinem a Bra siletro, Vi cente de Paula Ar aUJO.
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
88/89
5/17/2018
1 1 8. 119. 120 . 1 21 . 122. 1 2 3.
e Amelia Cohn. 1 6 7 . 0 F u tu r is m o lt a li a n o, Org. Aurora FornoniBernardini. 0 S is te m a P o lt ti co B r as il ei ro , Celso Lafer. 1 6 8. S em i Ot ic a , I nf or m /l f4 'o e C o m un ic /l f4 'o , J. Teixeira CoeD10Netto J ! xt a se R e li gi o so , I. Lewis. 1 6 9. lI Iceado n: O pe ra d or ezgico d a Le itslidepdf.com ur a , Americo Vallejo. LIV__Martin Buber.Do di logo dial P ur ez e e Perigo, M & r y Douglas. 170 . Do, M u l 't li s d e P o r ti n a ri aD, E sp Q fo , d e B ra lf ll a, Mano Pedrosa. H is ta ria , C or po d o T em po , Jose Honono Rodrigues. 17 1. 0 Ltrico e 0T r 6 gi co e m L e o pl lT d i, Helena Parente Cunha. E s cr it o s ob re u m C orp o, Severo Sarduy. 1 7 2 . A C r iI I1 If ae a F E BE M , Marlene Guirado. L in gu a ge "" e C i ne m a , Christian Metz. 1 73. A rquitetu", Ita liollll em Sa o P tm lo, Anita Salmoni e E. D e b e -
0 DisC 'JTSOEngen holO , Antonio Jose Saraiva. 124 . hic!llllllisar, 125: Serge Leclaire. 1 2 6 . M a g / st ra d o :r e F e i ti c ei r o: ; 1 1 1 1 F rl l7 lfa d o S lc ul o X V II , R. Mandrou. 1 27 .0 T ea tr o e s ua R ea lid ad e, Bernard Dort. 1 28 . A C ab ala e seu Simbolismo, Gershom G. Scholem, 129. Sintaxe e Semdntica I'Ul Gram4 tica Tran sj'o mu Jclo n al, A. Bonomi e G. Usberti. 1 3 0 . C o n ju n rO e s e Disjunrt5es, Octavio Paz. 1 3 1. E s cr it os s a br e a H i st Or la , Fernand Braudel. 132. Escrito s, Jacques Lacan. 1 3 3. D e A n it a eo ],fu:reu, Paulo Mendes de Almeida. 1 3 4. A O p er Q f4 'o d f i Texto, Haroldo de Campos. 1 3 5. A r qu it et ur a , I nd u: rt rl a ii zQ f 4' o e D e :r e" "o h it m en to , Paulo J. V. Bruna. 136 . Po eI ia·Exp erilncia, Mario Faustino. 137. O s N o vo « ReIIlistQl, Pierre Restany. J.38. S em lo lo gia d o T ea tr o, J. Gui nsburg e J. Teixeir a Coel ho Nett o. 1 3 9 . A r te ·E d u c/ lf 4 'o n o B r a s il , Ana Mae T. B ., Barbosa. 1 4 0. B o rg es : U m a P o et iC I ld IJ Leitu"", Emir Rodriguez Monegal. 141. 0 F im deum a Tradlflo, Robert W. Shirley. 1 42 . S et im ll A rt e: U m Culto Mo d emo , Ismail Xavier. 1 4 3. A E : rt et ic a d o O b je ti vo , Aldo Tagliaferri. 1 4 4. A C o nl t1 U r4 'o d o S en ti do n a A r qu it et u" " J. Teixeira Coelho Netto. 1 4 5. A G r a m 4t ic ll d o D e ca m e ro n, Tzvetan Todorov. 14 6 . E:rcrr:vid4 o ,R efo Tmil e I mp erlaU:rmo , R. Graham. 1 4 7 . H i s ta r ia d o S u rr e ll li :r m o , M. Nadeau. 1 4 8 . P o d er e L e g it im i cl ll d e, Jose Bduardo Faria. 1 49 . P r6 xis d o C in em a , Noel Burch. 1 .5 0.A s E str utu "" e 0Temp o , Cesare Segre. 1 51 . A P oe tic a d o S il ln cl o, Modesto Carone. 1 5 2 . P / a ne ja m e n to e I J m I- E lt ll l' So t 'l a l, Henrique Rattner. 1 5 3. T e at ro M o d em o , Anatol Rosenfeld. , 154 . De:ren Jlo lvimen to e Co n ltru r4 'o Naclo n lli, S. H. Eisenstadt. ISS. U m e L it e" ,t u" , n os T rO pic oI , Silviano SantillO. 1 56 . C ob ", d e V id ro, sergio Buarque de Holanda. 1 5 7 . T e st a nd o 0 LeJllatium, Antonia Fernanda Paccade Almeida Wn,ht. 1 58 . D o D i4 lo go e d o D la lO gi co , Martin Buber. 1 5 9. E n .l os L in g/ U st ic o. , Louis Hjelmsiev.
nedetti. 1 7 4. F ei tu ra d Q l Artes; Jose Neistein. 1 7 5 . O f rc in a : D o T ea t ro e o Te-Ato, Armando sergio da Silva. 1 7 6 . C O n J le r ll ll co m I go r S tr t n' in s 1 cy , Robert Craft 1 7 7 . Arte co mo Medidll, Sheila Leimer. 178 . NZin g ll, Roy Glasgow. 1 7 9 . M i to e H er oi n o Teatro Bralileiro, Anatol Rosenfeld. 1 80 . A l(ld ultr la lizQ f4 'o d o A lg od 60 n a C id Jld e tk S4'o Ptmlo, Maria Regina de M. Ciparrone Mello.
1 6 0. 0 R e a/ li m o M a r tl Jl il ho so , Irlemar Chiampi. 1 6 1. T e nt at iv a s d e M i to lo gi a , Sergio Buarque de Holanda. 1 6 2 . S e m iO t ic a R U I II I, Boris Schnaiderman. 1 6 3. S a /4 es , C i rc a l e a nem ll de S4'o P tm lo, Vicente de Paula Araujo. 1 64 . S oc io lo gi a E m pfr ic a d o w e r, Joffre Dumazedier.
http://slidepdf.com/reader/full/livmartin-buber-do-dialogo-e-do-dialogico
89/89