STUART MIL L
ma is simples de todos os t ipos de rela çõ es econ ômica s; a s pessoa s devem ter produzido mais do que usaram, ou seja, utilizado menos do que produziram. Devem faz ê -lo mais ainda antes de terem condi çõ es de dar emprego a outros trabalhadores ou de aumentar sua produ çã o a l é m da obtida com suas pr óprias m ã os. Todos os meios que algu é m emprega para manter e executar outro trabalho que n ã o o pr óprio devem provir origina ria ment e de poupa n ça ; houve necessaria mente a lgu é m q ue produz isse e se a bst ivesse de cons um ir. P odemos, pois, dizer, sem incidir em qualquer inexatid ã o material, que todo capital, particularmente o acr é scimo de capital, é resultado de poupan ça . No est á gio primit ivo e violent o da socieda de, cont inua ment e a cont ece que a lgu é m, que te nha ca pita l, n ã o seja o mesm o que o economizou, m a s a l gu é m q ue, por ser ma is fort e ou por pert encer a uma comun ida de mais poderosa, apossou-se dele pelo saque. E mesmo numa situa çã o que contasse com a prote çã o da propriedade, o aumento de capital normalmente proviria por muito tempo de priva çõ es que, embora essencialmente equivalentes à poupan ça , n ã o costumam ser assim chamadas, por n ã o serem volunt á rias. Os atuais produtores j á foram escra vos obriga dos a produzir qua nt o a for ça conseguia extorquir-lhes e a consumir t ã o pouco quanto o interesse pr óprio ou o normalmente escasso senso humanit á rio de seus senhores o permitisse. Esse tipo de poupan ça compuls ória, por é m , n ã o teria gerado nenhum aumento de capital se uma parte desse montante n ã o fosse poupada de novo e voluntariamente pelo senhor. Se ele consumisse tudo que os seus escra vos produzira m e se a bst ivera m de consum ir e o fizesse na qu a lida de de satisfa çõ es pessoais, n ã o teria aumentado o seu capital, nem teria sido capaz de manter um n ú mero crescente de escravos. A simples m a n u t e n çã o de escra vos implica va a necessida de de poupa r: pelo menos um estoque de alimentos, acumulado antecipadamente. No entanto, essa poupan ça pode n ã o provir de alguma priva çã o auto-imposta pelo senhor; provavelmente foi conseguida a pa rt ir da priva çã o dos pr óprios escravos, enquanto estes eram livres; v í timas de rapina ou da guerra e privados de sua liberdade pessoal, eles acabaram transferindo tamb é m a s u a a c u m u l a çã o de capital ao conquistador. H á outros casos tamb é m em que o termo poupan ça (incluindo tudo que normalmente se associa ao mesmo) n ã o designa apropriadament e a opera çã o pela qu a l o a ument o de ca pit a l ocorre. S e, por exemplo, diss é ssemos que o ú nico meio de acelerar o aumento de capital é o de aumenta r a poupa n ça, provavelmente sugerir í amos o conceito de ma ior a bsten çã o e de ma ior priva çã o. Ma s é óbvio que tud o que a umenta a for ça produtiva do tr a ba lho cria um fundo a diciona l do qua l se pode fazer poupan ça , cria ndo a possibilida de de se a umenta r o ca pita l, n ã o somente sem priva çã o adicional, mas at é simultaneamente com um aumento do consumo pessoal. N ã o obsta nt e, existe, a qui, um a umento de poupan ça no sentido cient í fico da palavra. Embora o consumo seja 125
OS E CONOMISTAS
J OHN STUART MI L L PRINCÍPIOS DE E CONOMIA POLÍTICA Com Algumas de suas Aplicações à Filosofia Social Introdução de W. J . Ashley
VOLUME I
A p r esent sen t a ção d e Raul Ekerman T r a d u ção d e Luiz J oã o B a ra úna
Fundador VICTOR CIVITA (1907 - 1991)
E d i t or or a N ov ov a C u lt lt u r a l L t d a . Copyri Copyright ght © desta edi çã o 1996, C í rculo do Livro Ltda. Rua Paes Leme, 524 - 10 º a n d a r C E P 0542405424-010 - S ã o Paulo - SP Tí tulo original: Pr i ncipl es of Pol Pol i ti cal E conomy w i th som e of t hei hei r App l i cati on s to Soc Soci al Ph i l osoph y
Direitos exclusivos sobre a Apresenta çã o de autoria de Raul Ekerman, Editora Nova Cultural Ltda., S ã o P a u l o Direitos exclusivos sobre as tradu çõ es deste volume: C í rculo do Livro Ltda. Impress ã o e acabamento: D O N N E L L E Y C O C H R A N E G R ÁFICA E EDITORA BRASIL LTDA. D I V I S ÃO C Í RCULO - FONE (55 11) 4191-4633
I S B N 85-35185-351-08290829-7 7
APRESENTAÇ ÃO
1. Nota Introdutória E s t a a p r es e s en en t a çã o é desenvolvida em cinco partes. Na primeira, apresentamos os dados biogr á ficos de Mill; essa se çã o é fortemente b a s e a d a n a N o t a B i o g r á fica do volume 43 da Cole çã o Gr eat B ook s of (Encyclopaedia Britannica, Inc., Chicago, 1952, v. T h e Wes West er n W or l d 43). Na segunda, apresentamos o pensamento pol í tico e social de Mill, seguindo muit o de perto perto o a rt igo de J ohn C . Rees, Rees, a present present a do na (The MacMillan Co. and The Free E n cycl ycl opaed paed i a of of Soci Soci al Scien Scien ces Press, v. 10). Na terceira, tecemos coment á rios aos P r i n cí pios d e Eco- n o m i a P P ol í tica, tendo em mente destacar pontos que consideramos essenciais, de forma a localizar a obra e propiciar motiva çã o ao leitor. A edi çã o dos Princ í pios aqui utilizada é a d a Col Col l ected ted E di ti on of t he dois volumes volumes por por J . M. Robso Robson, n, W or or k s of J oh n S t u a r t M i l l , edita da em dois e publicada em 1965 pela U n i ver ver si t y of of T or on to Pr ess, Rou Rou t l ed ge & K egan Paul . Na quarta, apresentamos uma cronologia de Mill, traduzida da edi çã o de J a ck St illi illinger, nger, que re ú ne escritos de Mill, em parttic icul ulaa r a A (H (H ough t on Mifflin C ompa ny , B ost on, 1969 1969)). Na Autobiografia utobiografia quinta, apresentamos uma bibliografia sucinta.
2. Dados biogr áficos Mill, em sua A , decla decla ra qu e seu desenvol desenvolvimento vimento inAutobiografia utobiografia telectual se deve, basicamente, à influ ê ncia de duas pessoas: o pai, J a mes Mil M ill, l, e sua su a mulher, mulher, Ha H a rriet. rriet . Mill nunca freq ü entou escola de qualquer grau ou universidade. Isso po porq ue J a mes Mill Mill ela ela borou borou pa ra o filho filho um progra ma educa educa ciona iona l modelado nas teorias de Helvetius e Bentham. O programa era enciclop é dico dico em a bra ng ê ncia . Assim, Assim, a o completa completa r t reze a nos, Mill possu possu í a o equivalente a uma complet í ssima educa çã o universit á ria. O pai foi tutor e companheiro constante. Mill descreve o resultado dessa paternidade exacerbada com reservas: “ Fez-me um homem manufaturado, tal que eu s ó conseguia reproduzir opini ões ” . 5
OS ECONOMISTAS
A educa çã o come çou com Grego e Aritm é tica aos tr ê s anos de idade. Aos oito, Mill j á havia lido Her ódoto, seis Di á logos de Plat ã o e muita muita Hist Hist ória. Antes dos doze, dominava Euclides e Álgebra, poetas gregos e latinos, bem como alguma poesia inglesa. Aos doze, dedicou-se à L ógica, iniciando pelo Organon de Arist óteles. Ao completar treze anos, o ú ltimo sob a supervis ã o do pai, iniciou estudos de Economia P ol í tica; as notas de estudo do filho serviram de base para que o pai, post post eriorm eriorm ent e, escrevesse escrevesse os E l em en t os de E con om i a Pol p a r a í ítica. D a í pa Pol frent fre nt e, J ohn S tua rt Mill Mill co cont inuou inuou sua educa educa çã o au xiliad xiliad o po por a migos migos pa t ernos: D ireit ireit o com Aust Aust in e Economia Economia com com D a vid Rica Rica rdo. Da s obra obra s que mais o influenciaram, destaca-se o tratado de Bentham sobre legisla çã o que, segundo Mill, lhe proporcionou “ um credo credo,, uma doutr doutr ina , uma filo filosofia... sofia... uma religi religi ã o” e “ fez de mim um outr o indiv í d u o” . E mbora mbora Mill nunca tivesse rompido rela çõ es com o pai, aos 28 anos de idade sofre sofreu u um a “ crise ” mental. Foi quando lhe ocorreu a seguinte quest ã o: “ Suponha que todos os seus objetivos de vida se realizem; que todas a s m u d a n ças em insti institui tui çõ es e opini ões que voc ê busca pudessem ser completamente efetuadas neste instante. Seria isso raz ã o de grande gozo e felicidade para voc ê ? ” . Afirma Mill que a “ resposta distinta, dist inta, ” . Assim, foi tomado por uma deconsciente e irrepreens í vel foi n ão press ã o que durou anos. A primeira tr é g u a e m s ua u a “ melancolia ” aconteceu ao ler as M é m oi r es de M ar m ont el : “ Cheguei à passagem que rela rela ta a mort mo rt e de seu pa pa i, a posi posi çã o prec á r ia i a d a f a m í lia lia , e a inspira insp ira çã o s ú bita pela qual Marmontel, ent ã o um menino, sentiu e fez os outros sentirem que ele seria tudo para eles suprindo a falta de tudo o que ha via via m perdido perdido” . Mill chorou emocionado com o epis ódio e desse momento em diante sua ang ú stia diminuiu. A partir dos dezessete anos Mill passou a manter-se a si pr óprio, trabalhando para a Companhia d a s Í ndia s Ocide Ocident nt a is, da qua l seu seu pai era funcio funcion n á rio. Come çou como escritur á rio, sendo logo promovido a Assistente-Examinador. Desde a morte do pai, em 1836, e durante vinte anos, Mill permaneceu como Encarregado de Rela çõ es com os Estados Indianos. A fun çã o lhe proporci porcio ona ria gra nde experi experi ê ncia ncia pr á tica tic a nos no s probl problemas emas gove governa rna menta is. Paralelamente ao seu emprego regular, Mill participou de in ú m e r a s atividades volt adas para preparar a opini ã o p ú blica em fun çã o da reforma legislativa. (Mill, seu pai e alguns amigos formavam o grupo conhecido por “ f i l ósofos radicais ” , que contribuiu decisivamente nos debates para a introdu çã o de importantes reformas legais.) Mill era bas bastt a nt e at ivo iv o na e xpo xposi çã o de id é ia s heterodoxa heterodoxa s, gera gera lmente cr cr í ticas, a os princ princ í pio pios par la ment a res e lega lega is vigent vigent es. E sc screvia revia freq ü entemente para jornais simp á ticos à “ ca u s a r a d ic i ca l ” , a judou udou a fundar e edita edita r o ór g ã o radical Wes West m i n st er Revi Revi ew , e participou de in ú meras sociedades de debates dedicadas à discuss ã o dos problemas sociais e intelectuais contempor â neos. Todas essas atividades n ã o impediram Mill de se dedicar aos 6
STUART MIL L
seus pr óprios interesses intelectuais. Assim, editou o Rati onal e of J u - e studou u L ógica e Ci ê ncia com o objetivo di ci al E vi dence dence,, de B e nth a m; estudo de reconciliar a l ógica silog í stica com os m é todos da ci ê ncia nc ia indutiva, induti va, resulta ndo desses esfo esf or ços o livro Si stem (1843). (1843). Ao mesmo tem a d e L ógica tempo continuou a escrever sobre Economia Pol í tica. Os escritos mais impo importa ntes nessa nes sa é poca foram os E ssays on S om e U n set t l ed Q u est i on s receberam posteriormente tratai n Pol Pol i ti cal E conomy. Esses Essays mento geral e sistem á tico no Pr i ncipl es of Pol (1848). Pol i ti cal E conomy Mill atribuiu seu desenvolvimento intelectual e produtividade desses a nos a o rela ciona iona ment o com H a rriet Ta Ta ylor, ylor, com com q uem se ca ca sou sou em 1851. Mill a conhecia h á vinte anos, desde sua “ crise ” . Embora public publicaa sse pouc pouco o dura nt e os os sete a nos em qu e esteve ca ca sa do, ela ela borou borou e escreveu parte de muitos de seus trabalhos mais importantes incluindo o ensaio D a L i b er er d a d e (1861), Pen Pen sam en t os Sobr e a R efor m a evara vara m a o Gover (1861), (1861), P a r l a m e n t a r , que mais ta rde lle Gover n o Repr Repr esen t at i vo e U t i l i t a r i s m o (1863). Mill atribuiu a Harriet, particularmente, a sua compreens ã o sobre o lado humano das reformas abstratas que advoga va . Ap Ap ós sua morte decla decla rou: “ S u a m em e m ór i a é para mim uma relig reli gii ã o e suas aprova ções os padr ões que resumem o valioso, e pelas quais procuro regular minha vida ” . Mill dedicou grande parte de seus ú ltimos anos à atividade pol í tica. Foi um dos fundadores da Sociedade Pr ó Voto Feminino e, em 1865, consentiu em ser membro do Parlamento. Votando com a ala ra dica dica l do P a rt ido Libera Libera l, tomou tomou pa p a rt e a tiva nos no s deba de ba tes do P rogra rogra ma de Reforma de Disraeli, promovendo medidas que vinha advogando h á longo tempo, tais como o voto feminino, a reforma do governo londrino e a alt era çã o da propriedade fundi á ria na Irlanda. Mas foi de rrotado na reele reeleii çã o, devido devido princi principa pa lment e a seu a poio poio a medida s impopular impopular es. Retirou-se para sua pequena casa em Avignon, constru í d a p a r a q u e pudesse ficar pr óximo ao t ú mulo da esposa, vindo a falecer a 8 de maio de 1873.
3. Pensamento pol í tico tico e social O pe pensamento nsame nt o pol í t ico ico e soci sociaa l de J ohn St ua rt M Mill ill,, seguindo J o h n C . R es e s s em e m s e u a r t i g o d a E n cyc , cycl opaedi opaedi a of Soci Soci al Science Sciences s pode ser condensado em quatro t ópicos: 1) o problema do m é todo n a s ci c i ê n cia s socia soc ia is; 2) 2 ) sua elucida elucida çã o sobr sobr e o prin c í pio da utilidade; 3) a liberd libe rd a de do indiv í duo; 4) 4) sua teoria do governo governo representa rep resenta tivo. Todos esses t ópicos est ã o r elacionado s e a interdepend ê n c i a e n t r e os tr ê s ú ltimos é c a b a l . 1) O M é todo das Ci ê ncias Sociais J a mes Mill Mill,, em em seu E ssay on Gover (1820), procurou deGover n m en t monstrar a necessidade do governo representativo, partindo do postu7
lad o de que as a çõ es dos homens se conformam à quilo que considera considera m ser de seu interesse. Estes, por sua vez, podem ser analisados em t ermos ermos de dor dor e pra pra zer. Assim, Assim, uma a ssembl é ia represe represent nt a tiva deveri dev eriaa ter poder suficiente para controlar os dirigentes que, como todos os outros homens, preocupam-se somente em alcan çar seus pr óprios interesses. Atrav é s do controle, entretanto, os interesses dos dirigentes deveriam convergir para os interesses da comunidade como um todo. A identidade de interesses entre a assembl é ia representativa e a comunidade seria poss í vel com a extens ã o do direito de voto. J ohn S tua rt Mill Mil l e se seu u c í rculo de “ radicais ” consideraram, inicia lmente, o ensa io de J a mes Mill Mill uma obra -prima . P ost eriorment eriorment e, entr eta nt o, Mill Mill co convenceunvenceu-se se de que a form form a de ra cioc iocina r d o pa i n ã o e r a a d eq e q u a d a . N ã o aceitou aceitou a id é ia de que a a çã o dos dirigent es pudesse ser adequadamente explicada em termos de seus interesses. Tal explica çã o deixa deixa de la do fa fa t ores t a is co como o senso do dever, dever, a fila fila nt ropia ropia , as atividades tradicionais da comunidade, sentimentos de grupo ou classe, e padr ões de comportamento herdados dos pr óprios grupos dirigentes. Ademais, Mill acreditava que a presta çã o de contas aos governa ve rna dos dos n ã o é a ú nica nica forma forma de assegura r uma ident ident ida de de interesses intere sses entre governantes e governados, j á que, at é certo ponto, os interesses de a mbos, de fa t o, co coincidem. P or exemplo exemplo, seria do int int eresse de am bos bos a m a n u t e n çã o da lei e da ordem. Entretanto, os interesses ego í s t a s dos governantes t ê m papel importante, ainda que n ã o exclusivo; portanto, controles institucionais s ã o necess á rios. Na opini ã o de J ohn S tua rt Mill, Mill, o erro de seu seu pai e de B entha m foi supor que os fen ômenos sociais dependiam de