ISSN: 1809-2950
FISIOTERAPIA e PESQUISA REVISTA DE FISIOTERAPIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL
Volume 15 – número 2
Abril – Junho 2008
Fisioterapia e Pesquisa em continuação a Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Reitora Profa. Dra. Suely Vilela Sampaio Vice-Reitor Prof. Dr. Franco Maria Lajolo
Faculdade de Medicina Diretor Prof. Dr. Marcos Boulos
Depto. Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional Chefe Profa. Dra. Claudia Regina Furquim de Andrade
Curso de Fisioterapia Coordenadora Profa. Dra. Silvia Maria Amado João
Fisioterapia e Pesquisa v.15, n.2, abr./jun. 2008 Fisioterapia e Pesquisa / (publicação do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) v.1, n.1 (1994). – São Paulo, 2005. v. : il. Continuação a partir de v.12, n.1, 2005 de Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. Semestral: 1994-2004 Quadrimestral: a partir do v.12, n.1, 2005 Trimestral: a partir do v.15, n.1, 2008 Sumários em português e inglês ISSN 1809-2950 1. FISIOTERAPIA/periódicos I. Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Filiada à
ISSN: 1809-2950
FISIOTERAPIA e PESQUISA REVISTA DO CURSO DE FISIOTERAPIA DA FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL
Volume 15 – número 2
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Fisioterapia e Pesquisa Publicação trimestral do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da USP Fisioterapia e Pesquisa visa disseminar conhecimento científico rigoroso de modo a subsidiar tanto a docência e pesquisa na área quanto a fisioterapia clínica. Publica, além de artigos de pesquisa originais, revisões de literatura, relatos de caso/s, bem como cartas ao Editor. indexada em: LILACS – Latin American and Caribbean Health Sciences; LATINDEX – Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Cientifícas de Américas; CINAHL – Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature; e SportDiscus. EDITORAS-CHEFES
Amélia Pasqual Marques Fofito / FMUSP – Depto. Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional, Faculdade de Medicina / USP
Débora Bevilaqua Grossi RAL/ FMRP/USP Depto. Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP
EDITORES ESPECIALISTAS
Celso R. Fernandes de Carvalho – Fofito / FMUSP Isabel de Camargo Neves Sacco – Fofito / FMUSP Jefferson Rosa Cardoso – Depto. Fisioterapia / Univ. Estadual de Londrina Raquel Simoni Pires – Laboratório de Neurociências / Univ. Cidade de São Paulo
Rosângela Corrêa Dias – EEFFTO – Escola Educ. Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional / Univ. Federal de Minas Gerais
Silvia Maria Amado João – Fofito / FMUSP
CORPO EDITORIAL
Anamaria Siriani de Oliveira
RAL, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP Ribeirão Preto SP Brasil Depto. Engenharia Telecomunicações e Controle Escola Andre Fabio Kohn São Paulo SP Brasil Politécnica / USP Anke Bergmann Curso de Fisioterapia / Centro Univ. Augusto Motta Rio de Janeiro RJ Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Estadual de Londrina Antonio Fernando Brunetto Londrina PR Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de Pernambuco Armèle Dornelas de Andrade Recife PE Brasil Barbara M. Quaney Medical Center / University of Kansas Kansas City KA EUA Fofito / Faculdade de Medicina / USP Clarice Tanaka São Paulo SP Brasil Cláudia R. Furquim de Andrade Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil School of Allied Health and Life Sciences / New York Chukuka S. Enwemeka Nova Iorque NY EUA Institute of Technology École de Réadaptation et GRIS, Faculté de Médecine / Univ. Debbie Feldman Montréal QC Canadá de Montréal Faculdade Ciências da Saúde/ Univ. Metodista de Piracicaba Piracicaba SP Dirceu Costa Brasil Fofito / Faculdade de Medicina / USP Fátima A. Caromano São Paulo SP Brasil Neurological Science Institute/ Oregon Health & Science Univ. Portland OR Fay B. Horak EUA Laboratoire d’Automatique, de Méchanique et d’Informatique, Franck Barbier Le Mont Houy França Industrielles et Humaines / Univ. de Valenciennes Depto. Fisioterapia / Univ. de Ribeirão Preto Gil Lúcio Almeida Ribeirão Preto SP Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos Helenice Jane C. Gil Coury São Carlos SP Brasil Dept. Public Health and Primary Health Care / Univ. of Bergen Bergen HD Jan Magnus Bjordal Noruega Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho João Carlos Ferrari Corrêa São Paulo SP Brasil Luci Fuscaldi Teixeira-Salmela EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Belo Horizonte MG Brasil Marcelo Bigal Dept. of Neurology, Albert Einstein College of Medicine Bronx NY EUA Escola de Educação Física / Univ. Federal do Rio Grande do Sul Porto Alegre RS Marco Aurélio Vaz Brasil Marcos Duarte Escola de Educação Fisica e Esportes / USP São Paulo SP Brasil Instituto do Coração, Faculdade de Medicina/ USP Maria Ignêz Zanetti Feltrim São Paulo SP Brasil Mariano Rocabado Facultad de Odontología / Univ. Andres Bello Santiago RMS Chile Fofito / Faculdade de Medicina / USP Raquel A. Casarotto São Paulo SP Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Federal Rio Grande do Norte Ricardo Oliveira Guerra Natal RN Brasil Rinaldo R. J. Guirro RAL / Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP Ribeirão Preto SP Brasil EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Sérgio Teixeira da Fonseca Belo Horizonte MG Brasil Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho Simone Dal Corso São Paulo SP Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos Tânia de Fátima Salvini São Carlos SP Brasil Vera Lúcia Israel Curso Fisioterapia / Univ. Federal do Paraná – Litoral Matinhos PR Brasil
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S UMÁRIO C ONTENTS Editorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117 Editorial
PESQUISA ORIGINAL ORIGINAL RESEARCH
Comparação dos efeitos da estimulação elétrica nervosa transcutânea e da hidroterapia na dor, flexibilidade e qualidade de vida de pacientes com fibromialgia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118 Comparison of transcutaneous electrical nerve stimulation and hydrotherapy effects on pain, flexibility and quality of life on patients with fibromyalgia Tatiana F. Gomes da Silva, Eneida Yuri Suda, Camila Aparecida Marçulo, Fábio H. da Silva Paes, Gisele Targino Pinheiro
Impacto do grau de obesidade nos sintomas e na capacidade funcional de mulheres com osteoartrite de joelhos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125 Impact of the degree of obesity on symptoms and functional capacity of women with knee osteoarthritis Karina Simone de S. Vasconcelos, João Marcos D. Dias, Rosângela Corrêa Dias
Incidência de lesões na prática do rúgbi amador no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131 Incidence of injuries in the practice of amateur rugby in Brazil Luciane Machado Alves, Renato Paranhos Soares, Richard Eloin Liebano
Efeitos da reabilitação aquática na sintomatologia e qualidade de vida de portadoras de artrite reumatóide . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 136 Effects of aquatic rehabilitation on symptoms and quality of life in rheumatoid arthritis female patients Luis Roberto F. Ferreira, Paulo Roberto Pestana, Jussara de Oliveira, Raquel A. Mesquita-Ferrari
Interferência mútua entre atividade visual e atividade motora em jovens e idosos . . . . . . . . . . . 142 Mutual interference between a visual and a motor task in young and elderly subjects Patrícia P. dos Santos Teixeira, Mariana Callil Voos, Mariane S. Andrade Machado, Lílian Zanchetta Castelli, Luiz Eduardo R. do Valle, Maria Elisa P. Piemonte
O preparo bioético na graduação de Fisioterapia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149 Bioethical education in physical therapy undergraduate course Fernanda Degilio Alves, Aline Bigongiari, Luis Mochizuki, William Saad Hossne, Marcos de Almeida
Atividade eletromiográfica do vasto medial oblíquo em portadoras da síndrome da dor patelofemoral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157 Electromyographyc activity of the vastus medialis oblique muscle in female patients with patellofemoral syndrome Sâmia Najara F. Bessa, Elielton Pedroza dos Santos, Renata A. Gomes Silveira, Paulo Henrique B. Maia, Jamilson Simões Brasileiro
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Validação da versão para a língua portuguesa do questionário de Medida Funcional para Amputados (Functional Measure for Amputees Questionnaire). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 164 Brazilian-Portuguese validation of the Functional Measure for Amputees Questionnaire Eneida R. Ono Kageyama, Mariana Yogi, Celisa Tiemi N. Sera, Leda Shizuka Yogi, André Pedrinelli, Olavo Pires de Camargo
Avaliação da amplitude de movimento e força da cintura escapular em pacientes de pós-operatório tardio de mastectomia radical modificada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172 Shoulder motion range and strength assessment in late post-operative patients having undergone modified radical mastectomy Priscila Fernandes Gouveia, Estela de Oliveira Gonzalez, Patrícia Arduino Grer, Camila Amaro Fernandes, Maurício Corrêa Lima
Perfil de fisioterapeutas brasileiros que atuam em unidades de terapia intensiva . . . . . . . . . . . . 177 A profile of Brazilian physical therapists in intensive care units Emilia Nozawa, George J. V. Sarmento, Joaquim M. Vega, Dirceu Costa, José Euclides P. Silva, Maria Ignez Z. Feltrim
Correlação entre cefaléia e disfunção temporomandibular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 183 Correlation between headache and temporomandibular joint dysfunction Mariana Sampaio Menezes, Sandra Kalil Bussadori, Kristianne P. Santos Fernandes, Daniela A. Biasotto-Gonzalez
Intervenção psicomotora em crianças de nível socioeconômico baixo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188 Psychomotor intervention on children of low socioeconomic status Ana Carolina de Campos, Luiz Henrique Silva, Karina Pereira, Nelci A. C. Ferreira Rocha, Eloisa Tudella
Comportamento quimiometabólico do músculo sóleo na fase aguda da imobilização articular. . 194 Chemical metabolic behaviour of the soleus muscle during the acute phase of joint immobilisation Luciano Júlio Chingui, Rommel Padovan Braquinho, Maria Theresa M. Severi, Carlos Alberto da Silva
REVISÃO REVIEW
Estabilização segmentar da coluna lombar nas lombalgias: uma revisão bibliográfica e um programa de exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 200 Spinal segmental stabilisation in low-back pain: a literature review and an exercise program Fábio Jorge R. França, Thomaz Nogueira Burke, Daniel Cristiano Claret, Amélia Pasqual Marques
Fatores de risco para linfedema após câncer de mama: uma revisão da literatura . . . . . . . . . . . . 207 Risk factors of arm lymphedema after breast cancer: a literature review Anke Bergmann, Inês Echenique Mattos, Rosalina Jorge Koifman Instruções para os autores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 214 Ficha de assinatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 216
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E DITORIAL E DITORIAL A área da Fisioterapia vem apresentando nos últimos anos um crescimento vertiginoso no país, tanto no número de cursos de graduação e especialização quanto, principalmente, no número de programas de pós-graduação. Hoje contam-se nove programas, dos quais três preparam o doutorado. Além disso, docentes e pesquisadores se organizam nas diferentes regiões do país para solicitar novos programas. Essa intensificada atuação docente e de pesquisa pressiona ainda mais para que haja canais de qualidade para a circulação do conhecimento produzido. O crescimento da Fisioterapia e sua inserção na comunidade científica brasileira é um processo sem volta. O novo patamar atingido, com muito empenho de muitos, tem sido cada vez mais reconhecido por todos. E requer esforços de aprimoramento da qualidade, tanto dos produtores de conhecimento quanto dos veículos que o publicam. Fisioterapia e Pesquisa pretende cada vez mais crescer nos padrões de qualidade e de indexação para melhor servir à crescente comunidade cientifica da Fisioterapia no Brasil. Desde 2005, quando iniciamos o processo de mudanças, fizemos muitos avanços no sentido de atender aos padrões de qualidade exigidos. Dentre as mudanças atuais, para adequar a Revista aos critérios de excelência foi necessário alterar o corpo editorial, convidando pesquisadores de renome de diferentes regiões geográficas, para ampliar nossa abrangência. Também agregamos mais quatro membros estrangeiros ao corpo editorial. Ainda, foram instituídos editores especialistas, que terão como principal tarefa conferir agilidade e transparência ao processo de julgamento dos manuscritos. Os membros do corpo editorial e os editores especialistas terão participação ativa e irão contribuir permanentemente com a Revista, citando-a, encorajando alunos ou pós-graduandos a submeter artigos, submetendo eles próprios sua produção, além da emissão de pareceres. Finalmente, a partir deste número, a chefia de editoria será partilhada: à anterior editora-chefe junta-se agora a Profa. Débora Bevilaqua Grossi, unindo esforços para que a revista conquiste um lugar de destaque entre as revistas de Fisioterapia e possa ser um veículo eficiente e de qualidade para a circulação do conhecimento científico em nossa área, sempre tendo em mira o aprimoramento da qualidade da pesquisa e da assistência em Fisioterapia. Agradecemos a todos que nos vêm dando apoio, com o qual contamos para prosseguir aperfeiçoando Fisioterapia e Pesquisa. Amélia Pasqual Marques Débora Bevilaqua Grossi Editoras-chefes
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.118-24, abr./jun. 2008
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Comparação dos efeitos da estimulação elétrica nervosa transcutânea e da hidroterapia na dor, flexibilidade e qualidade de vida de pacientes com fibromialgia Comparison of transcutaneous electrical nerve stimulation and hydrotherapy effects on pain, flexibility and quality of life in patients with fibromyalgia Tatiana Fernandes Gomes da Silva1, Eneida Yuri Suda2, Camila Aparecida Marçulo3, Fábio Henrique da Silva Paes3, Gisele Targino Pinheiro3 Estudo desenvolvido na Clínica de Fisioterapia do Unicapital – Centro Universitário Capital, São Paulo, SP, Brasil 1
Fisioterapeuta da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia, São Paulo, SP, Brasil
2
Profa. Ms. do Curso de Fisioterapia do Unicapital (Centro Universitário Capital, São Paulo, SP, Brasil)
3
Graduandos em Fisioterapia no Unicapital, São Paulo, SP, Brasil
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Eneida Yuri Suda R. Masuzo Naniwa 105 apto. TA84 Mogilar 08773-535 Mogi das Cruzes SP e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO abr. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
Fisioter Pesq. Pesq. 2008;15(2):118-24 2008;15(2) 118 Fisioter
RESUMO: Este estudo visou comparar a eficácia da hidroterapia e da estimulação elétrica transcutânea do nervo (TENS) na melhora da sintomatologia de pacientes com fibromialgia Participaram do estudo 10 sujeitos com fibromialgia (48,8±9,8 anos) divididos em dois grupos: um tratado com hidroterapia e outro com TENS. Todos foram avaliados antes e após o tratamento quanto à flexibilidade (pelo índice terceiro dedo-solo), dor (por escala visual-analógica), qualidade de vida relacionada à saúde (pelos questionários SF-36 e Nottingham Health Profile – NHP) e tendência à depressão (pelo Inventário de Beck). Os dados foram tratados estatisticamente, com nível de significância fixado em p<0,05. O grupo TENS obteve melhora estatisticamente significante na intensidade da dor, na qualidade de vida medida pelo SF-36 e em alguns quesitos do NHP, enquanto a hidroterapia promoveu uma melhora na qualidade de vida medida pelo SF-36. Ambos os tratamentos foram assim eficazes ao melhorar o condicionamento físico, porém a TENS propiciou melhores resultados quanto à dor e em maior número das variáveis analisadas do que a hidroterapia, sugerindo ser mais eficaz no tratamento da fibromialgia. DESCRITORES: Estimulação elétrica transcutânea do nervo; Fibromialgia/ reabilitação; Hidroterapia ABSTRACT: The purpose of this study was to compare the effects of hydrotherapy and of transcutaneous electric nerve stimulation (TENS) on symptomology of patients with fibromyalgia. Ten subjects (aged 48.8±9.8 years) with fibromyalgia were divided into two groups, one treated with hydrotherapy, the other with TENS. All were evaluated before and after treatment as to flexibility (by means of the fingertip-to-floor test), pain (by visual analogue scale), health-related quality of life (by the SF-36 and the Nottingham Health Profile – NHP – questionnaires) and trend to depression (by the Beck’s Depression Inventory). Data were statistically analysed, and significance level set at p<0.05. Results show that patients treated with TENS had significant pain reduction and better quality of life as measured by the SF-36 and some NHP items, while patients treated with hydrotherapy showed improvement in SF-36 scores. It may hence be said that both treatments were efficient in improving physical functioning, but TENS produced better results in relieving pain and in a greater number of variables, suggesting that it is more efficient for treating fibromyalgia. KEY WORDS: Fibromyalgia/rehabilitation; Transcutaneous electric nerve stimulation; Hydrotherapy
Silva et al.
TENS e hidroterapia na fibromialgia
INTRODUÇÃO A fibromialgia é uma patologia crônica caracterizada por dor muscular esquelética generalizada, distúrbios do sono, rigidez articular, alterações psicológicas e fadiga muscular, não apresentando sinais de inflamação 1-6 . Ocorre de forma isolada ou associada a outras doenças reumáticas, como o lúpus eritematoso sistêmico e a artrite reumatóide, sendo mais prevalente em mulheres da raça branca de 35 a 55 anos6. Acomete 5% da população mundial e 8% da população brasileira6. Pacientes com fibromialgia apresentam níveis elevados de dor, ansiedade e depressão, apresentando uma piora na qualidade de vida7-11, apresentando, também, desordens compulsivas e obsessivas 12 . É importante lembrar que a fibromialgia é mais prevalente entre as mulheres, que apresentam maior risco de desenvolverem quadros de dor e depressivos quando comparadas aos homens13. Vários programas de tratamento têm mostrado eficácia na melhora da função e no autocontrole dos sintomas em pacientes com fibromialgia. A hidroterapia é relatada como um recurso terapêutico que promove relaxamento muscular, diminuição dos espasmos musculares e redução da sensibilidade à dor, proporcionando um aumento da tolerância ao exercício e do nível de resistência física, ocorrendo a melhora do condicionamento geral. Quando se melhora o condicionamento físico, ocorre simultaneamente a melhora de sintomas como presença de dor após esforço e a fraqueza muscular6,14. O uso da estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS) também é relatado como sendo eficiente no alívio da dor em pacientes com fibromialgia15. Esse tipo de estimulação teria a capacidade de produzir informações sensitivas a partir de estímulos de baixo limiar, inibindo a transmissão da dor na medula espinhal através da inibição das células T, via células da substância gelatinosa1,16-18. Apesar de a característica mais marcante da fibromialgia ser a dor19, vale
destacar, ainda, a presença da sensação de rigidez articular. Ambos os fatores limitam as atividades da vida diária em maior ou menor grau, dependendo do acometimento de cada indivíduo, afetando, também, os aspectos emocionais e a qualidade de vida. A TENS tem sido utilizada em pacientes com fibromialgia como um recurso de analgesia local, diminuindo a rigidez pela melhora da condição dolorosa, melhorando o desempenho das atividades de vida diária e a qualidade de vida17,20. Assim, tanto a hidroterapia quanto a TENS trazem diminuição da dor em pacientes fibromiálgicos. Este estudo tem como objetivo comparar a eficácia da hidroterapia e da TENS na melhora da dor, flexibilidade, sono, condições emocionais e qualidade de vida em pacientes com fibromialgia.
METODOLOGIA Este estudo teve delineamento de pesquisa intervencional e foi aprovado pelo Comitê de Ética do Centro Universitário Capital. Foram incluídos 10 pacientes clinicamente diagnosticados como portadores de fibromialgia e que preenchiam os critérios de fibromialgia do Colégio Americano de Reumatologia 21 . Foram excluídos pacientes que apresentavam doenças neurológicas, cardiovasculares, portadores de marca-passo cardíaco, gestantes e com afecções cutâneas6,16. Para a realização do estudo, todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
Material e procedimentos Os voluntários foram inicialmente avaliados quanto à presença de tender points. Para tanto, manteve-se o paciente sentado sobre a mesa de exame, questionando-o sobre a sensação dolorosa após a pesquisa de cada ponto padronizado, um a um, bilateralmente em cada região, no sentido crâniocaudal. Os sujeitos foram, então, avaliados quanto à flexibilidade pelo teste terceiro dedo-solo. A medida da distância entre o terceiro dedo e o solo
é utilizada como medida do grau de encurtamento dos músculos posteriores de membros inferiores e tronco6,15,18. Os pacientes também tiveram o nível de dor avaliado por escala analógica visual de dor (EVA)6,22,23 e, quanto à qualidade de vida relacionada à saúde, pelo questionário SF-3624. Este é um questionário multidimensional formado por 36 itens, agrupados em oito domínios: capacidade funcional, aspectos físicos, dor, estado geral da saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais e saúde mental. O escore varia de zero a 100 e quanto maior o escore final, melhor a qualidade de vida relacionada à saúde24. Aplicaram-se, ainda, o questionário Nottingham Health Profile (NHP) adaptado25, que avalia o nível de energia, reações emocionais, distúrbios do sono, isolamento social e capacidade física, e o Inventário de Beck para depressão, que avalia a presença de alterações psicológicas26. No questionário NHP, cada resposta positiva corresponde ao escore 1 e cada resposta negativa, ao escore 0, perfazendo uma pontuação máxima de 38. Quanto mais alto o resultado final, pior a qualidade de vida percebida pelo indivíduo. No Inventário de Beck, em que a pontuação varia de 0 a 63, quanto mais alto o escore, maior o nível de depressão; um escore acima de 16 indicaria possível depressão27. Os pacientes com fibromialgia foram divididos aleatoriamente em dois grupos de tratamento: o grupo TENS (GT, n=5) e o grupo Hidroterapia (GH, n=5), cujas características sociodemográficas são apresentadas na Tabela 1. O protocolo de tratamento com estimulação elétrica nervosa transcutânea teve como recurso um aparelho de TENS da marca Quark (Brasil), eletrodos de superfície e gel condutor à base de água. Os eletrodos foram localizados nos tender points dos músculos do trapézio, supra-espinhoso, glúteo e interlinha medial do joelho, bilateralmente. Os parâmetros utilizados foram freqüência de pulso de 15 Hz e tempo de pulso de 150 us, que correspondem ao modo convencional. A intensidade foi determinada pelo sujeito, devendo referir um formigamen-
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Tabela 1 Características sociodemográficas dos sujeitos dos dois grupos
Variável
Grupos (n=5) Hidroterapia TENS
Categoria
Idade (anos)
47,0±5,6
50,6±13,4
Sexo (n)
Masculino Feminino
0 5
1 4
Escolaridade (n)
1º grau completo 2º grau completo
2 3
3 2
Ocupação (n)
Serviços domésticos Trabalho manual Comércio Desempregado
2 2 1 0
2 1 1 1
Estado civil (n)
Casado Divorciado Solteiro
2 2 1
3 1 1
to constante durante todo o tempo da aplicação. Gashu e Marques15 mostraram que esses parâmetros são eficientes para promover o alívio da dor, melhorando a sintomatologia. O programa de tratamento com TENS foi realizado em dez sessões com duração de 40 minutos cada, na freqüência de três vezes por semana. Cada sessão de atendimento da hidroterapia compôs-se de quatro fases. A primeira fase consistiu em cinco minutos de aquecimento, por meio de caminhada pela extensão da piscina, e mobilização ativa com flexão, extensão e inclinação da coluna cervical, circundução do ombro, flexão e extensão de quadril, flexão e extensão de joelho e flexão e extensão de tornozelo6. A segunda fase, de 20 minutos, consistiu em exercícios de alongamento muscular, que foram realizados em três séries de 20 segundos cada, nas posições de flexão máxima de pescoço, inclinação lateral do pescoço, semiflexão de ombro com extensão de cotovelo, punho e dedos, abdução de ombro com flexão de cotovelo levando as mãos atrás da cabeça, extensão e adução de quadril, flexão de quadril e joelho, extensão de quadril com flexão de joelho e abdução do quadril. A inclusão de exercícios de alongamento se faz necessária uma vez que promovem a melhora da elasticidade muscular, contribuindo para a diminuição da rigidez articular, que é uma das características da fibromialgia2,15. A tercei-
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ra fase, de 15 minutos, consistiu na realização de exercícios aeróbicos – caminhada associada a movimentos de membros superiores e inferiores. Os exercícios aeróbicos contribuem para a promoção de consciência corporal e para o aumento do limiar de dor, melhorando a resistência à fadiga, reduzindo assim a gravidade dos sintomas da fibromialgia2,28. Esses exercícios têm ainda como benefício a melhora do condicionamento físico, da eficiência cardiovascular, o aumento do aporte de oxigênio aos músculos e da circulação periférica. Pacientes com fibromialgia têm descondicionamento físico, que acarreta redução da capacidade cardiovascular29. Após o término do tratamento todos os pacientes foram reavaliados utilizando-se os mesmos instrumentos da avaliação inicial.
Análise estatística Para a análise estatística, foi utilizado o programa SPSS® versão 10.0. Foi realizada análise descritiva e testada a normalidade na distribuição das variáveis por meio do teste de ShapiroWilks. Análises inferenciais foram feitas entre os grupos GT e GH antes e após o tratamento para as variáveis flexibilidade, dor e escores do SF-36, NHP e Inventário de Beck. As mesmas análises foram feitas para os grupos GT e GH, comparados antes e após o tratamento. Além disso, compararam-se as categorias de cada um dos
questionários de avaliação antes e após o tratamento em cada um dos grupos, a fim de identificar os aspectos que estariam mais envolvidos nos grupos avaliados. Para essas análises, foram utilizados o teste t independente quando a distribuição era normal, e o teste de Mann-Whitney quando a distribuição não era normal. Foi adotado α=0,05 para considerar diferenças significativas.
RESULTADOS Inicialmente, os grupos mostraramse homogêneos quanto a todas as variáveis exceto flexibilidade: o GH (14,6±13,5 cm) apresentou maior flexibilidade do que o GT (29,8±3,6; p=0,016). Após o tratamento os grupos mantiveram a diferença de flexibilidade observada antes do tratamento, além de os indivíduos tratados com TENS apresentarem um nível menor de dor. As Tabelas 2 e 3 mostram, respectivamente, os resultados das avaliações realizadas antes e após o tratamento dos grupos Hidroterapia e TENS. O grupo tratado com hidroterapia apresentou melhora significante apenas nos resultados do questionário SF-36 e no item reações emocionais do NHP, apresentando apenas uma tendência à melhora na dor e nos outros itens do questionário NHP. O grupo tratado com TENS apresentou melhora estatisticamente significante em boa parte das variáveis analisadas; não houve melhora significativa na flexibilidade, nos domínios capacidade funcional, estado geral de saúde, vitalidade e saúde mental do questionário SF-36, e nos itens sono, isolamento social e capacidade funcional do NHP – embora se tenham registrado escores melhores em quase todos esses itens.
DISCUSSÃO O tratamento da fibromialgia tem como principais objetivos o alívio da dor, a melhora da qualidade do sono, a manutenção ou restabelecimento do equilíbrio emocional, e a melhora do condicionamento físico e da fadiga,
Silva et al.
TENS e hidroterapia na fibromialgia
Tabela 2 Grupo tratado com hidroterapia (n=5): resultados (média±desvio padrão) da avaliação antes e após o tratamento e valores de p
Variável
Antes
Flexibilidade (cm)
14,6±13,5
Dor (cm na EVA)
8,0±0,7
Depois
p
13,8±12,7
0,345‡
6,6±1,5
SF-36 (escore total) Capacidade funcional Aspectos físicos Dor Estado geral de saúde Vitalidade Aspectos sociais Aspectos emocionais Saúde mental
70,8±12,2 33,0±18,2 5,0±11,4 20,6±12,2 30,8±14,8 26,0±9,6 38,2±18,9 13,2±18,0 32,8±21,7
99,1±16,0* 37,0±14,4 90,0±22,3* 53,8±20,5* 45,6±14,9 55,0±11,7* 62,4±21,6* 86,6±30,0* 56,0±17,4*
0,076‡ 0,007† 0,355† 0,002‡ 0,007† 0,084‡ 0,001† 0,040‡ 0,005‡ 0,050†
NHP (escore total) Nível de energia Dor Reações emocionais Sono Isolamento social Capacidade funcional
24,0±2,6 2,4±0,8 7,0±2,2 4,2±0,8 3,4±1,1 2,6±2,0 4,4±1,1
18,4±6,7 1,2±1,3 5,8±2,2 2,6±1,5* 3,0±1,5 1,6±1,3 4,2±1,3
0,060† 0,064‡ 0,165† 0,036† 0,329† 0,195‡ 0,401†
Beck
21,2±2,7
15,8±10,6
0,163†
* Diferença estatisticamente significante; † Teste t independente; ‡Teste U de Mann-Whitney; EVA = escala visual-analógica; NHP = questionário Nottingham Health Profile; Beck = escore no Inventário de depressão de Beck
Tabela 3 Grupo tratado com TENS (n=5): resultados (média±desvio padrão) da avaliação antes e após o tratamento e valores de p
Variável Flexibilidade (cm) Dor (cm na EVA) SF-36 (escore total) Capacidade funcional Aspectos físicos Dor Estado geral de saúde Vitalidade Aspectos sociais Aspectos emocionais Saúde mental NHP (escore total) Nível de energia Dor Reações emocionais Sono Isolamento social Capacidade funcional Beck
Antes 29,8±3,6 7,6±0,9 74,6±10,0 25,0±18,0 10,0±13,6 18,2±8,7 34,0±9,61 35,0±13,6 34,8±16,4 6,6±14,7 45,6±21,4 25,2±2,8 2,2±0,8 7,6±0,8 5,6±1,1 3,6±1,6 2,6±1,6 3,6±1,1 28,0±8,3
Depois
p
3,4±2,2*
0,065† 0,004‡
99,2±13,7* 55,0±21,5* 65,0±48,7* 64,8±17,9* 54,6±17,6 54,0±24,0 79,8±18,8* 79,8±30,0* 51,2±14,8 14,4±3,4* 0,8±0,4* 3,8±1,4* 2,2±1,7* 2,4±1,5 1,0±1,7 3,8±1,0 11,6±6,1*
0,006 † 0,018‡ 0,038‡ 0,001† 0,087‡ 0,082† 0,002† 0,004‡ 0,322† 0,001† 0,009‡ 0,004‡ 0,003† 0,134† 0,095‡ 0,392† 0,004†
24,6±5,9
* Diferença estatisticamente significante; † Teste t independente; ‡Teste U de Mann-Whitney; EVA = escala visual-analógica; NHP = questionário Nottingham Health Profile; Beck = escore no Inventário de depressão de Beck
além do tratamento especifico de desordens associadas15. O grupo tratado com TENS mostrou uma tendência à melhora da flexibilidade, embora não estatisticamente significante, que pode ter ocorrido devido à redução da sintomatologia dolorosa, que é o principal fator limitante da amplitude de movimento15. Além disso, os grupos não eram homogêneos em relação a essa variável antes do início do tratamento, o que pode ter influenciado os resultados. Diferentemente do esperado, o grupo tratado com hidroterapia não apresentou melhora da flexibilidade. Provavelmente essa melhora não foi observada devido a dois aspectos. Em primeiro lugar, o grupo tratado com hidroterapia já apresentava inicialmente flexibilidade melhor, quando comparado ao outro grupo, reduzindo os possíveis ganhos que a piscina terapêutica poderia trazer. Além disso, mesmo após o tratamento o GH apresentou melhor flexibilidade que o grupo TENS. Outro fator importante a ser levado em conta é que, no protocolo de tratamento utilizado na hidroterapia, não foi feito exercício específico que trabalhasse a flexibilidade dos grupos musculares avaliados pelo teste terceiro dedo-solo. Como esperado, houve melhora significante na intensidade da dor no grupo tratado com estimulação elétrica, uma vez que a TENS produz um efeito analgésico local e imediato. Woolf17 sugere que o uso da TENS pode distorcer o funcionamento do sistema nervoso, ao interferir em algum de seus inputs ou informações, pois a estimulação das fibras aferentes alfa e beta de rápida condução podem inibir a entrada do estímulo doloroso conduzido pelas fibras C, não mielinizadas e de condução mais lenta, antes que o estímulo doloroso transite até a medula espinhal. Essa melhora da dor não foi observada de forma estatisticamente significante no grupo tratado com hidroterapia, mostrando que essa modalidade terapêutica provavelmente não age diretamente no mecanismo de dor. Houve melhora estatisticamente significante da qualidade de vida em
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ambos os grupos, constatada pelos resultados do questionário SF-36. De forma interessante, ambos os grupos apresentaram melhora nos mesmos aspectos, ou seja, na dor, na vitalidade, nos aspectos físicos, sociais e emocionais, embora apenas o grupo tratado com hidroterapia tenha apresentado melhora no domínio da saúde mental. Pacientes com fibromialgia têm um nível de condição aeróbica ou cardiovascular menor que a média e seus músculos não utilizam o oxigênio muito bem15,30. Como resultado, eles tendem a ficar descondicionados muito facilmente, o que diminui sua eficiência cardiovascular e circulação periférica. Em muitos casos, a fibromialgia leva à redução nas atividades habituais que, se sustentada, causa um ciclo de descondicionamento2. Assim, provavelmente a melhora da qualidade de vida observada pelo questionário SF-36 no GH ocorreu devido ao fato de a hidrocinesioterapia trabalhar o condicionamento físico, interferindo positivamente no estado mental, melhorando a auto-estima e a depressão. Assim, o condicionamento aeróbico, com exercícios de baixo impacto, somado aos efeitos hidrostáticos da piscina e aos alongamentos enfocados nos tender points, gera a liberação de substâncias analgésicas, melhorando as alterações isquêmicas e metabólicas nos tender points, promovendo um relaxamento não apenas físico, mas também mental, acarretando quebra do ciclo vicioso de dor, estresse, depressão e distúrbio do sono. A qualidade de vida está associada à maior ou menor intensidade dos sintomas e, portanto, a eliminação ou diminuição dos mesmos pode propiciar sua melhora. A melhora da qualidade de vida relacionada à saúde observada no gru-
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po tratado com TENS, representada pelos resultados do questionário SF-36, pode ser analisada em conjunto com outros resultados positivos observados após o tratamento. A melhora da dor, medida por EVA, provavelmente está relacionada à grande melhora observada tanto no NHP quanto no Inventário de Beck. O NHP mostrou uma melhora no nível de energia, na dor e nas reações emocionais. Com o alívio da dor, espera-se que haja melhora das habilidades funcionais efetivas em casa ou no trabalho, além de melhora na qualidade do sono e, conseqüentemente, uma diminuição dos distúrbios emocionais. Outros aspectos que devem ser levados em conta na fibromialgia são os níveis freqüentemente graves de ansiedade e depressão31. Goldenberg et al.32 e Berber et al.33 relatam que se forma um ciclo vicioso, em que alterações psicológicas e em alguns mecanismos neuroendócrinos podem levar às manifestações clínicas de dor, incapacidade para o trabalho, maior limitação funcional nas atividades de vida diária, fadiga, sono não-reparador e, conseqüentemente, a um quadro depressivo. Assim, ao haver alívio da dor, como a observada no grupo TENS, era de se esperar que houvesse uma melhora dos distúrbios psicológicos, como foi observado nos resultados do Inventário de Beck. Além disso, de forma interessante, ambos os grupos apresentavam antes da intervenção valores que correspondiam à presença de depressão e, após o tratamento, ambos apresentaram valores que não correspondem à presença de depressão, embora a melhora nesse quesito tenha sido estatisticamente significante apenas no grupo tratado com TENS. Mais uma vez, o grupo tra-
tado com hidroterapia apresentava melhores escores antes do tratamento, o que pode ter mascarado a presença de níveis de melhora. Deve-se lembrar que a amostra deste estudo foi pequena e estes resultados devem, portanto, ser verificados estudando-se um maior número de indivíduos. Os resultados aqui encontrados não podem ser extrapolados para a população em geral. Uma amostra mais significativa poderia, ainda, confirmar as tendências à melhora aqui observadas. Sugere-se ainda, futuros estudos para verificar o efeito de ambas as técnicas utilizadas não só em separado, mas também em conjunto, uma vez que ambas apresentam efeitos benéficos em diferentes aspectos avaliados.
CONCLUSÃO Tanto a hidroterapia como a TENS, neste estudo, mostraram-se eficazes na melhora da sintomatologia dos pacientes com fibromialgia, embora os indivíduos tratados com TENS tenham obtido mais ganhos em relação ao tratado com hidroterapia. Esse resultado sugere que a principal limitação dos pacientes com fibromialgia é a dor e, se há alívio na intensidade da dor, ocorre subseqüentemente melhora dos sintomas secundários como distúrbios do sono, condições emocionais e qualidade de vida relacionada à saúde. Talvez os pacientes tratados com hidroterapia pudessem ter mostrado resultados mais positivos se o tempo de tratamento fosse maior, uma vez que a piscina terapêutica pode ter maior efeito no condicionamento e na capacidade funcional a longo prazo.
Silva et al.
TENS e hidroterapia na fibromialgia
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.125-30, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Impacto do grau de obesidade nos sintomas e na capacidade funcional de mulheres com osteoartrite de joelhos Impact of the degree of obesity on symptoms and functional capacity of women with knee osteoarthritis Karina Simone de Souza Vasconcelos1, João Marcos Domingues Dias2, Rosângela Correa Dias2
Estudo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Reabilitação da EEFFTO/UFMG – Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil 1
Fisioterapeuta Ms.
2
Profs. Drs. Adjuntos do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Reabilitação da EEFFTO/UFMG
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Karina S. S. Vasconcelos R. Zenite 470 apto. 101 Caiçara 30720-530 Belo Horizonte MG e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO jul. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
RESUMO: As mulheres apresentam risco aumentado para a osteoartrite (OA) de joelhos e obesidade. Associadas, essas doenças podem gerar dor e prejuízos funcionais, principalmente em atividades de locomoção. Este estudo visou comparar o impacto do grau de obesidade nos sintomas e capacidade funcional de mulheres com OA de joelhos. Foram selecionadas 13 mulheres obesas (com índice de massa corporal – IMC>30 kg/m 2) e 15 com obesidade mórbida (IMC>40 kg/m2), todas com OA bilateral de joelhos. Os sintomas de dor, rigidez e dificuldades funcionais foram avaliados pelo questionário The Western Ontario and McMaster Osteoarthritis Index (Womac). A capacidade funcional foi verificada por quatro testes de velocidade: marcha usual, marcha rápida, subir e descer escadas. Os dois grupos apresentaram um impacto moderado da obesidade na OA de joelhos, sem diferença quanto aos sintomas. As obesas se saíram melhor do que as obesas mórbidas nos testes de marcha usual e subir escadas, mas não nas atividades de marcha rápida e descer escadas, mais complexas e estressantes para a articulação do joelho. Conclui-se que o grau de obesidade não teve impacto nos sintomas de dor, rigidez e dificuldades funcionais associadas à OA de joelhos entre mulheres obesas e obesas mórbidas. E, em dois testes de capacidade funcional, as obesas dos dois grupos tiveram desempenho semelhante, sugerindo que outros fatores podem influenciar o desempenho funcional de obesas com OA de joelhos. DESCRITORES: Análise e desempenho de tarefas; Obesidade; Obesidade mórbida; Osteoartrite do joelho A BSTRACT: Women are at higher risk to knee osteoarthritis (OA) and obesity. Together, these diseases may ensue pain and functional limitations, mainly during locomotion. The purpose of this study was to compare the impact of the degree of obesity in symptoms and functional capacity of women with knee osteoarthritis. The sample studied was made up by 13 obese women (body mass index – BMI>30 kg/m2) and 15 morbid obese women (BMI>40 kg/m2), all with bilateral knee OA. The symptoms of pain, stiffness and functional difficulty were measured by the questionnaire The Western Ontario and McMaster Osteoarthritis Index (Womac). Functional capacity was evaluated by four speed tests: usual gait, fast gait, climbing and descending stairs. Both groups presented a moderate impact of obesity on knee osteoarthritis, with no differences between them concerning symptoms. Obese women had better results in the usual gait and climbing stairs tests than morbid obese ones, but not in fast gait and descending stairs, which are more complex and stressful tasks for the knee joint. It may be said that the degree of obesity had no impact on knee OA symptoms of pain, stiffness and functional difficulty; and, in two functional capacity tests, both obese women and women with morbid obesity showed similar performances, thus suggesting that other factors may influence functional capacity of obese women with knee osteoarthritis. KEY WORDS: Obesity; Obesity, morbid; Osteoarthritis, knee; Task performance and analysis
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INTRODUÇÃO A prevalência de obesidade vem aumentando não só nos países desenvolvidos, mas também naqueles em transição socioeconômica como o Brasil, tornando-se um problema de saúde pública1,2. Além dos riscos cardiovasculares e metabólicos associados, indivíduos obesos são mais propensos a apresentar doenças articulares como a osteoartrite (OA) de joelhos 3. A OA é uma doença degenerativa que acomete a cartilagem sinovial e estruturas periarticulares, associada a sintomas de dor, rigidez articular e crepitações4. Tanto a obesidade 5,6 quanto a OA de joelhos7 estão associadas a diversas incapacidades funcionais, principalmente em atividades de locomoção como a marcha e o uso de escadas. Estudos apontam uma relação crescente entre o grau de excesso de peso e as incapacidades, levando a maiores prejuízos entre as pessoas com obesidade grave ou mórbida, isto é, com índice de massa corporal (IMC) maior que 40 kg/cm2 8,9. Dentre a população em geral, as mulheres apresentam maior risco para desenvolver tanto obesidade10 quanto OA de joelhos 3,7. Uma vez que não há cura para essas doenças crônicas, compreender suas inter-relações e impactos sobre a capacidade funcional é essencial para que os profissionais de saúde possam direcionar suas intervenções e planejar as estratégias de tratamento mais adequadas a essa população de risco. O objetivo deste estudo foi comparar o impacto do grau de obesidade nos sintomas e capacidade funcional de mulheres com OA de joelhos. Dois grupos foram comparados: obesas e obesas mórbidas. A hipótese inicial era de que o maior excesso de peso entre as mulheres com obesidade mórbida estaria associado a maiores prejuízos funcionais e sintomas mais intensos.
METODOLOGIA A realização deste estudo foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesqui-
126
Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 25-30
sa da Universidade. Todas as voluntárias assinaram e receberam uma cópia do termo de consentimento livre e esclarecido. Os dados referentes a este estudo são provenientes de uma pesquisa sobre dor e capacidade funcional em obesos com OA de joelhos11,12. A amostra foi selecionada por conveniência, com pacientes de ambulatórios de tratamento de obesidade ou de serviços de reabilitação de hospitais universitários da cidade de Belo Horizonte, MG. Para o presente estudo, foram analisados os dados referentes a 28 mulheres, de acordo com a ordem de entrada no estudo, sem cálculo amostral específico. Elas foram divididas em dois grupos: grupo I, 13 mulheres obesas (IMC>30 kg/m2); e grupo II, 15 mulheres com obesidade mórbida (IMC>40 kg/m2). Todas as mulheres apresentavam diagnóstico clínico e radiográfico de OA em ambos os joelhos, segundo os critérios do Colégio Americano de Reumatologia 4 e deambulavam sem auxílios para a marcha. Foram excluídas as voluntárias que apresentassem: dor no joelho ou incapacidade funcional referente a essa articulação devido a lesões ligamentares, meniscais ou musculares não inerentes à OA; prótese total ou parcial em um ou ambos os joelhos ou quadris; artrite reumatóide, fibromialgia, lúpus eritematoso sistêmico e doenças reumáticas sistêmicas; cardiopatias descompensadas; défices auditivos ou visuais que impedissem a realização dos testes e medidas; agudização da OA de joelho; doenças neurológicas que afetassem a locomoção. Para a classificação da OA das participantes, um examinador que desconhecia seu estado clínico examinou as radiografias das articulações tibiofemorais em imagens anteroposteriores, com carga sobre os membros inferiores, e classificou cada imagem de acordo com os critérios de KellgrenLawrence (K-L), nos graus I a IV 13 . Cada articulação do joelho era analisada separadamente e, para efeito de análise dos dados, considerava-se a classificação do joelho com o maior grau de acometimento.
Procedimentos Sintomas da OA de joelhos: foi utilizado o questionário The Western Ontario and McMaster Osteoarthritis Index (Womac) para avaliar a intensidade de dor, rigidez articular e dificuldades funcionais decorrentes da OA de joelhos. O questionário, com três seções, foi aplicado na sua versão traduzida e validada para o Brasil14, por meio de entrevista assistida. As respostas de cada seção foram assinaladas em uma escala do tipo likert, nos níveis nenhuma, pouca, moderada, intensa e muito intensa. Para análise dos dados, esses níveis foram transformados respectivamente nos escores 0, 25, 50, 75 e 100. As respostas de cada seção eram somadas e obtinha-se uma média para cada sintoma avaliado. A mesma escala likert do Womac foi adaptada para avaliar a dor, sendo as voluntárias questionadas durante cada teste de capacidade funcional. Foi registrado, ainda o tempo de duração dos sintomas da OA de joelhos, considerando a época de aparecimento das dores articulares. Testes de capacidade funcional: a capacidade funcional foi avaliada por quatro testes de velocidade: marcha usual (MU), marcha rápida (MR), subir escadas (SE) e descer escadas (DE). Os testes de marcha foram realizados em um corredor plano e sem obstáculos, com distância percorrida de 25 m. Os três primeiros e os dois últimos metros foram desprezados como aceleração e desaceleração. Para medir a velocidade foram utilizadas células fotoelétricas que marcavam a passagem da voluntária ao início e ao final dos 20 metros mensurados (Kit Multisprint®, Inserra Ind. Mec. Ltda., Belo Horizonte, MG). Para familiarização, cada voluntária percorreu o corredor uma vez. Para o teste MU, elas eram orientadas a “caminhar em um ritmo normal”. Para o teste MR, a “caminhar o mais rápido possível”, com o estímulo verbal “rápido, rápido”. Os outros testes foram realizados em uma escada comum de prédio, de seis degraus, com corrimão. Para familiarização, cada voluntária subia e descia os seis degraus uma vez. Para
Vasconcelos et al.
Grau de obesidade e OA de joelhos
os testes, foram instruídas a realizar a atividade “em um ritmo normal, da maneira como tivessem costume de fazer no dia-a-dia“, sendo permitido o uso do corrimão. Também era permitido realizar os testes colocando os dois pés em cada degrau, ou alternando o apoio com cada pé em um degrau. O mesmo padrão quanto ao uso do corrimão e o tipo de apoio era utilizado durante todo o teste. As voluntárias iniciavam os testes ao comando “já” do examinador, momento em que era disparado o cronômetro. A contagem de tempo era interrompida quando era alcançado o último degrau com os dois pés, com a voluntária sempre olhando para frente. A ordem dos testes foi aleatorizada por sorteio e todas as voluntárias foram instruídas a utilizar um calçado usual, que considerassem confortável e seguro. Foram realizadas três medidas para cada teste, com intervalo de 15 a 30 segundos entre cada medida e 30 a 60 segundos entre cada tipo de teste. A coleta de dados foi realizada em uma única sessão, no horário entre as 14 e 17 horas.
Tabela 2 Resultados (média±desvio padrão) dos testes de velocidade segundo os grupos
Velocidade (média±desvio padrão) MU (m/s) Grupo I (Obesas)
1,18±0,16 1,60±0,25 64,57±15,93 67,46±18,58
Grupo II (Obesas graves) 1,02±0,13 1,44±0,23 51,35±14,94 53,52±22,00 Diferença entre os grupos p=0,009*
crita em termos de distribuição de freqüência. Foi utilizado o teste t para amostras não-relacionadas para comparar os grupos I e II em termos de idade, duração dos sintomas e resultados nos testes de velocidade. Para comparar os resultados da classificação radiográfica, do questionário Womac e do nível de dor durante a realização dos testes de capacidade funcional, foi utilizado o teste de Mann-Whitney, não-paramétrico. O nível de significância foi estabelecido como α=0,05.
RESULTADOS
Análise estatística Foi realizada a análise descritiva da amostra, com medidas de tendência central (média) e dispersão (desvio padrão) das variáveis idade, duração dos sintomas e IMC, além dos sintomas da OA de joelhos e resultados nos testes de capacidade funcional. A classificação radiográfica foi des-
Quanto à classificação da OA, a maioria das mulheres apresentaram nível II ou III na classificação K-L. No grupo I, quatro apresentavam nível II e cinco, nível III. No grupo II, havia cinco mulheres com nível II e cinco com nível III. Não foi possível obter as radiografias de duas mulheres do
Tabela 1 Dados descritivos das participantes (n=28) segundo os grupos
Grupo II Grupo I (Obesas (Obesas, n=13) graves, n=15)
Diferença entre os grupos
Idade (anos)
Mín. 29,5 36,6 Máx. 67,1 67,8 Média±dp 51,27 ± 11,76 53,37 ± 8,44
p=0,588
Tempo de OA (anos)
Mín. Máx. Média±dp
1,50 15 6,50 ± 4,56
0,66 17 6,78 ± 3,97
p=0,86
Mín. Máx. Média±dp
30,41 37,31 33,39 ± 2,25
41,25 59,83 47,56 ± 5,76
NA NA NA
Valores
2
IMC (kg/m )
p=0,097
p=0,032*
p=0,084
MU = Marcha usual; MR = Marcha rápida; SE = Subir escadas, em degraus por segundo; DE = Descer escadas,, em degraus por segundo; * diferença estatisticamente significante
Os dois grupos não apresentaram diferença quanto à idade ou duração dos sintomas (Tabela 1).
Variável
MR (m/s) SE (degraus/s) DE (degraus/s)
Mín.= Mínimo; Máx.= Máximo; dp = Desvio padrão; IMC = Índice de massa corporal; NA = Não se aplica
grupo II. Com o teste de Mann-Whitney, não foi observada diferença estatisticamente significante entre a classificação dos dois grupos (p=0,433). Em relação aos sintomas da OA, avaliados pelo Womac (onde o escore varia de 0, nenhum, a 100, muito intenso), no grupo I os resultados médios foram: 47,3±17,9 de intensidade de dor, 32,7±22,6 de rigidez e 32,4±21,6 de dificuldades funcionais. No grupo II, a média da intensidade de dor foi de 41,0±18,9, da rigidez, 30,0±33,0 e a de dificuldades funcionais foi de 40,4±18,2. Não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos quanto aos sintomas avaliados pelo questionário Womac (p=0,487 para dor, p=0,619 para rigidez e p=0,310 para dificuldades funcionais). O nível de dor durante os testes também não apresentou diferença estatística entre os grupos. No teste MU, os níveis médios de dor foram de 25,0±27,0 no grupo I e 11,7±16,0 no grupo II (p=0,196). No teste MR, 34,6±31,5 e 20,0±23,5 para os respectivos grupos (p=0,216). No teste de subir escadas, os níveis médios de dor foram de 30,8±25,3 (grupo I) e 30,0±19,4 (grupo II), com p=0,941; e, no teste de descer escadas, 42,3±31,3 (grupo I) e 33,3±22,5 (grupo II), com p=0,391. A Tabela 2 apresenta os resultados de cada grupo nos testes de capacidade funcional, avaliada pela velocidade desenvolvida. Pode-se observar que o grupo I obteve melhor desempenho nos testes MU e SE, alcançando maior velocidade. Nos outros testes, não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos.
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DISCUSSÃO Este estudo procurou compreender como o grau de obesidade pode influenciar a capacidade funcional e o nível de sintomas em dois grupos de mulheres com OA de joelhos: obesas e obesas mórbidas. Considerando os sintomas da OA de joelhos, os resultados não confirmaram a hipótese inicial. Ambos os grupos apresentaram nível moderado de dor, rigidez e dificuldades funcionais e, na classificação radiográfica do grau de acometimento da articulação, sem diferenças estatisticamente significantes. Durante os testes de capacidade funcional, também não foram observadas diferenças quanto ao nível de dor. Alguns estudos mostram que o IMC pode influenciar os sintomas da OA de joelhos, estando os obesos em maior risco de apresentar dor15,16 e dificuldades funcionais17,18 quando comparados a indivíduos com peso normal. Marks19 observou que indivíduos com OA de joelhos e maiores níveis de IMC apresentam dor mais intensa em relação àqueles com menor IMC, utilizando uma escala analógica-visual e outro instrumento diverso do Womac. Não foram encontrados na literatura estudos que comparassem o nível dos sintomas da OA de joelhos entre indivíduos com obesidade e obesidade mórbida utilizando o Womac. No presente estudo, os resultados relativos aos sintomas apresentaram altos valores de desvio-padrão em ambos os grupos, o que já foi observado em outros estudos que utilizaram o questionário Womac20,21. Essa grande variabilidade pode ter influenciado a ausência de diferenças entre os grupos. Clinicamente, esses achados refletem a diversidade de respostas a doenças crônicas como a OA de joelhos e a obesidade. Segundo a Organização Mundial de Saúde 22, as doenças podem impactar a qualidade de vida e a capacidade funcional de diversas formas, com efeitos nas funções e estruturas do corpo, atividades funcionais e participação social. Fatores pessoais e ambientais também podem influenciar a funcionalidade e incapacidade22. Este estudo reforça a importância de se avaliarem as incapa-
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cidades de forma abrangente, considerando as diferenças e necessidades individuais dos pacientes. Com relação à capacidade funcional, os grupos apresentaram resultados diversos. Era esperado que as mulheres com obesidade mórbida desenvolvessem as atividades em menor velocidade, devido à maior massa corporal a ser deslocada8. Browning e Kram 23 também observaram que as forças compressivas nos joelhos durante a marcha são muito maiores em indivíduos obesos que naqueles com peso normal. Assim, uma menor velocidade de marcha pode ser uma estratégia utilizada pelos obesos para diminuir o impacto nessas articulações. Stenholm et al.24 confirmaram que o risco de limitações à velocidade de marcha aumenta a cada grau de obesidade, fato agravado pela presença de OA de joelhos entre as mulheres. No presente estudo, o maior grau de excesso de peso também teve impacto negativo na capacidade funcional das mulheres obesas mórbidas com OA de joelhos, considerando a velocidade de marcha usual. Quanto ao teste de marcha rápida, por outro lado, as obesas não conseguiram alcançar melhores resultados quando comparadas às obesas mórbidas. A maior velocidade exigida nesse teste pode ter provocado força excessiva nas articulações dos joelhos, limitando seu desempenho. A marcha rápida também parece ser uma atividade mais complexa e pouco comum no dia-a-dia dessas mulheres11, fatores que podem ter contribuído para esse baixo desempenho. Nas escadas, as obesas alcançaram maior velocidade no teste de subida, mas não no de descida. Atividades em escadas exercem maior estresse mecânico na articulação do joelho do que a marcha no plano25. Além disso, essas atividades estão associadas a altos níveis de dor e dificuldade funcional, tanto entre pessoas com OA de joelhos 11,26 quanto entre obesos 27,28 . Descer ou subir escadas exigem angulações de movimento e produção de forças diferenciadas, o que pode explicar os resultados diferentes para cada teste 29. A atividade de descer
escadas parece ser mais complexa e estressante para a articulação do joelho do que a de subir escadas, de forma que a simples diferença de peso corporal não favoreceu as mulheres obesas no teste de velocidade deste estudo. É possível que, se o teste SE fosse realizado de forma mais complexa, por exemplo, com maior número de degraus ou sem o uso do corrimão, o desempenho das mulheres obesas também não fosse melhor. Os grupos deste estudo apresentaram níveis semelhantes de dor durante os testes de velocidade, de forma que as diferenças encontradas em alguns testes parecem ser devidas a outros fatores. No entanto, os possíveis efeitos analgésicos de medicamentos não foram controlados neste estudo. Três mulheres do grupo II usavam antiinflamatórios não-esteróides no dia dos testes e as conseqüências disso não podem ser avaliadas nos presentes resultados. Sabia-se que duas mulheres do grupo I e quatro do grupo II praticavam atividade física regular, não sendo possível estabelecer o papel do condicionamento físico nos resultados do presente estudo. Indivíduos obesos, em geral, tendem a se exercitar pouco, apresentando baixos níveis de atividade física. Os sintomas da OA de joelhos podem fazer com que os indivíduos evitem atividades que provoquem ou intensifiquem sua dor, o que levaria à piora do condicionamento físico e maior fraqueza muscular. Alterações biomecânicas, causadas pela obesidade e pela OA de joelhos, podem ainda aumentar os gastos energéticos durante atividades de locomoção, com maiores exigências de condicionamento físico. Sutbeyaz et al.30 observaram que, em relação a indivíduos obesos sem OA de joelhos, obesos com OA de joelhos apresentam pior condicionamento físico geral e pior desempenho de mobilidade com os membros inferiores. Um menor condicionamento físico entre as mulheres com obesidade mórbida pode ter contribuído para seu pior desempenho nos testes MU e SE. Nesse caso, poder-seia concluir que, nos testes de marcha rápida e descida de escadas, o condicionamento físico teria sido menos
Vasconcelos et al.
importante do que os efeitos deletérios da OA de joelhos sobre a capacidade funcional. Dessa forma, mesmo que apresentassem melhor condicionamento, as mulheres obesas não conseguiriam alcançar melhores resultados, como nos testes de marcha usual e subida de escadas. O presente estudo analisou a obesidade apenas em termos do IMC, uma medida do excesso de peso para uma determinada altura. Outros fatores podem estar associados à obesidade, influenciando os sintomas e incapacidades associadas à OA de joelhos, como a composição corporal de massa gorda e massa magra31,32 e alterações metabólicas ou inflamatórias33,34. A força muscular também interage com a obesidade, podendo ser considerados os dois fatores mecânicos mais importantes na determinação da capacidade funcional de indivíduos com OA de joelhos35,36. O presente estudo apresenta outras limitações. A escolha da amostra não se baseou em cálculo específico e
Grau de obesidade e OA de joelhos
contamos com um pequeno número de participantes. As participantes dos grupos apresentavam heterogeneidade quanto à idade e tempo de sintomas da OA de joelhos e não houve pareamento por essas variáveis.
tégias de tratamento mais específicas e direcionadas às necessidades e possibilidades dos pacientes.
Os resultados deste estudo demonstram que as inter-relações entre obesidade e OA de joelhos são complexas e agem de diferentes formas sobre a capacidade funcional de mulheres. Estudos explorando a funcionalidade dessa população devem levar em conta essas inter-relações e especificidades, a fim de contribuir para a compreensão dos impactos das doenças crônicas e os mecanismos de adaptação e reação a seus efeitos. Ainda há muito a ser explorado neste tema, com a observação de outras variáveis de influência e a ampliação das maneiras de se avaliar a capacidade funcional, incluindo não só a velocidade, mas outras características. A compreensão dos impactos das doenças crônicas sobre a funcionalidade humana pode levar à elaboração de estra-
Os resultados permitem concluir que o grau de obesidade não teve impacto nos sintomas de dor, rigidez e dificuldades funcionais associadas à OA de joelho entre obesas e obesas mórbidas. No que se refere à capacidade funcional, o grau de obesidade teve influência diversa conforme o tipo de atividade: nos testes de marcha usual e subir escadas, as obesas mórbidas apresentaram pior desempenho, confirmando a hipótese do estudo. No entanto, nos testes de marcha rápida e descer escadas, atividades mais complexas e estressantes para a articulação do joelho, os dois grupos tiveram desempenhos semelhantes, sugerindo que outros fatores, além do grau de obesidade, podem influenciar o desempenho funcional de obesas com OA de joelhos.
CONCLUSÃO
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.131-5, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Incidência de lesões na prática do rúgbi amador no Brasil Incidence of injuries in the practice of amateur rugby in Brazil Luciane Machado Alves1, Renato Paranhos Soares2, Richard Eloin Liebano3
Estudo desenvolvido no Curso de Fisioterapia do Centro Universitário São Camilo, São Paulo, SP, Brasil 1
Fisioterapeuta
2
Prof. do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário São Camilo
3
Prof. Dr. do Programa de Mestrado em Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Luciane M. Alves R. Ângelo Alegro 76 02881-040 São Paulo SP e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO set. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
RESUMO: Este estudo visou verificar a incidência de lesões traumáticas na prática esportiva do rúgbi amador no Brasil. A amostra constituiu-se de 42 praticantes amadores de duas equipes de rúgbi de São Paulo, do sexo masculino, com idade entre 18 e 30 anos. Foi aplicado a cada jogador um questionário em forma de entrevista para verificar a ocorrência de lesões após cada jogo de rúgbi disputado pela respectiva equipe durante cinco meses de 2006. Lesão foi definida como alguma dor ou dano físico sofrido por um jogador durante o treino e durante ou imediatamente após uma partida de rúgbi. Os dados das respostas dos jogadores foram analisados estatisticamente, com nível de significância estabelecido em p≤0,05. A incidência total de lesões foi de 574,16 por 1.000 horas de jogo. Houve predomínio de lesões nos membros inferiores em ambas as equipes. A manobra conhecida como tackle foi a maior causa de lesões. O segundo tempo foi o período do jogo em que a maioria das lesões ocorreu. Atacantes foram mais freqüentemente lesionados quando comparados aos defensores. A incidência de lesões traumáticas no rúgbi amador no Brasil mostrou-se extremamente alta, caracterizando uma importante diferença quando comparada à incidência de lesões em outros estudos feitos em países onde o rúgbi é um esporte mais popular. DESCRITORES: Futebol americano; Incidência; Traumatismos em atletas ABSTRACT: This study aimed at estimating the incidence of traumatic injuries in the practice of amateur rugby in Brazil. The sample consisted of 42 male, 18 to 30 year-old rugby amateur athletes from two different São Paulo teams. A questionnaire (by means of interview) was applied to each player inquiring on injuries suffered during and/or after every match (and training) his team played along five months of 2006. An injury was defined as any pain or physical impairment sustained by a player during or immediately after a rugby match or training. Data from volunteers’ answers were statistically analysed, and significance level set at p≤0.05. The total incidence of injuries was 574.16 per 1,000 match hours. Injuries were predominant in lower limbs. Tackling was the major cause of injuries. The second half was the period when most injuries occurred. Forwards were more often injured than backs. The incidence of traumatic injuries in rugby in Brazil were extremely high when compared to the injury incidence found by studies made in countries where rugby is usually practised. KEY WORDS: Athletic injuries; Football; Incidence
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INTRODUÇÃO O rúgbi é um esporte de colisão jogado pelos níveis de jogador júnior, amador, semiprofissional e profissional. Em um campo semelhante ao de futebol (com 15 jogadores em cada time, no caso do rugby union ou convencional), o objetivo é fazer passar a bola, que pode ser carregada nas mãos ou chutada, por entre dois postes que delimitam a área de gol adversária, de modo a que ela toque no chão na área de gol. Diz-se “de colisão” porque o jogador que estiver com a bola pode ser derrubado; o ato de derrubá-lo chama-se tackle. Jogadores se envolvem na disputa que inclui freqüentes períodos de atividade de alta intensidade (corrida, trote, lançamento da bola, tackle) separados por períodos de baixa intensidade (caminhando)1,2,3. As demandas fisiológicas do jogo de rúgbi são complexas, exigindo jogadores que tenham agilidade, velocidade altamente desenvolvida, força e potência muscular e potência aeróbia máxima. O jogo é disputado em dois tempos de 30 a 40 minutos cada (dependendo do nível da competição), separados por um intervalo de 10 minutos3. Esse esporte impõe freqüente e poderoso contato corporal, expondo potencialmente os jogadores a um grande número de lesões4. Considerando as diferenças nas aptidões e habilidades, condições do solo, padrões de arbitragem e atitudes de agressão e violência, as taxas de lesões podem ser mais elevadas em jogadores amadores de rúgbi, segundo a literatura pesquisada5,6,7. É importante conhecer a incidência de lesões na prática do rúgbi em jogadores do esporte amador, pois possibilita classificar as lesões mais freqüentes quanto ao risco, situações associadas ou predisponentes, o que permitirá elaborar programas de prevenção. O esporte é principalmente praticado nas regiões do mundo de forte influência inglesa (Austrália, Nova Zelândia, África do Sul, além do Reino Unido) e na França; na América do Sul, destacam-se a Argentina e o Uruguai. A literatura sobre lesões
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no rúgbi refere-se pois a esses países. Como não foram encontrados estudos a respeito no Brasil, o objetivo deste trabalho foi verificar a incidência de lesões traumáticas na prática esportiva do rúgbi amador no país.
METODOLOGIA O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos do Centro Universitário São Camilo. Todos os voluntários foram previamente esclarecidos e orientados sobre os procedimentos experimentais a que seriam submetidos no presente estudo. No caso de aceitação plena, assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. Dentre os entrevistados, foram selecionados 42 jogadores de rúgbi do sexo masculino, com idade entre 18 e 30 anos, saudáveis, com prática esportiva referida de no mínimo uma vez por semana e participação em no mínimo duas partidas por suas respectivas equipes durante o período de realização da pesquisa. Todos os voluntários eram amadores, ou seja, não recebiam qualquer pagamento para jogar ou treinar, e atuavam nas posições de atacantes e defensores. A Tabela 1 apresenta os dados de idade e características antropométricas da amostra estudada. Os jogadores integram duas equipes diferentes. A coleta de dados foi feita aos finais dos jogos de suas respectivas equipes durante o Campeonato Paulista de rúgbi (Time A, n=23) e a Liga Universitária (Time B, n=19), no período de fevereiro a junho de 2006. O Campeonato Paulista de 2006 Tabela 1 Idade e características antropométricas (média ± desvio padrão) dos jogadores estudados
Variável Média±desvio padrão Idade (anos) 23,78±3,38 Peso (kg) 85,92±12,01 Altura (m) 1,78±0,072 2 26,78±2,67 IMC (kg/m ) IMC = Índice de massa corporal
foi disputado por cinco equipes, resultando em oito jogos para cada equipe, além da final entre duas destas, por clubes do Estado de São Paulo. A Liga Universitária foi disputada em 2006 por 10 equipes universitárias da cidade de São Paulo em duas fases, resultando em seis jogos por equipe em média. Entretanto, durante o período da pesquisa, foram disputadas apenas três partidas pela equipe universitária. Os voluntários responderam a um questionário aplicado ao final de todos os jogos disputados por suas respectivas equipes. Para a proposta deste estudo, uma lesão foi definida como alguma dor ou dano físico sofrido por um jogador durante o treino e durante ou imediatamente após uma partida de rúgbi. Todas as lesões relatadas foram registradas indiferentemente de sua gravidade2,5,8,9. As lesões registradas foram classificadas de acordo com a região anatômica, período do jogo em que ocorreram, a posição (atacante, defensor) do jogador lesionado e a habilidade envolvida no momento da lesão: corrida, tackle, choque, scrum (disputa da bola lançada no meio de duas formações adversárias de oito jogadores cada), maul (disputa da bola por no mínimo três jogadores em pé), ruck (agrupamento de pelo menos um jogador de cada equipe, em pé, em torno da bola no chão).
Cálculo da incidência de lesões A taxa de lesões (ou incidência) é mais freqüentemente registrada por 1.000 horas de jogo segundo a posição do jogador2,3,5,8,10-14. A incidência de lesões foi calculada dividindo-se o número total de lesões sofridas pelos jogadores do time pelo tempo de exposição a lesões, multiplicando-se esse resultado por 1000. Para calcular o tempo de exposição a lesões (em horas de jogo, segundo a posição do jogador), multiplica-se o número total de partidas disputadas pelo número de jogadores em campo (em geral, 15) e pelo tempo de duração da partida (em média, 80 minutos, ou 1,33 horas)2,3,8,11.
Alves et al.
Incidência de lesões no rúgbi amador no Brasil
Análise estatística Os dados obtidos das respostas ao questionário foram organizados em tabelas, utilizando os programas SPSS v11.5®, Minitab 14® e Microsoft Excel XP®. A análise estatística foi realizada mediante o teste de igualdade de duas proporções, um teste não-paramétrico que verifica se a proporção de respostas de duas determinadas variáveis são estatisticamente significantes. Para este estudo, foi considerada estatisticamente significante a diferença ou correlação tal que p<0,05 (5%). Todos os intervalos de confiança construídos ao longo da análise foram realizados com 95% de confiança estatística.
RESULTADOS A incidência de lesões no Time A foi de 626,56 por 1.000 horas de jogo por posição do jogador e, no Time B, de 434,42 por 1.000 horas. Entretanto, como o Time B jogou menos partidas, sua exposição a lesões foi de 59,85 horas, contra 159,6 horas do Time A (Tabela 2). Além disso, o número de jogadores entre as equipes diferiu, sendo 23 voluntários do Time A e 19 do Time B. Em relação às regiões anatômicas, houve predomínio de lesões em membros inferiores (MMII), com 36,5% do total de lesões, seguida de membros superiores (MMSS) e tronco, com 24,6% das lesões. A Tabela 3 permite ver que o percentual de lesões nos MMII é significantemente maior do que nas demais regiões do corpo. A situação que levou ao maior número de lesões foi o tackle, em 24,6% do total de lesões. No entanto, não se
Tabela 3 Comparação dois a dois (valores de p) entre as regiões anatômicas de lesão durante os jogos de rúgbi (n de lesões=126)
Região do corpo Tronco MMSS MMII Cabeça e pescoço Face Outros
1,000 0,040* <0,001* <0,001* <0,001*
MMSS
MMII
0,040* <0,001* <0,001* <0,001*
<0,001* <0,001* <0,001*
Partidas
Time A Time B Total
8 3 11
N sofridas 100 26 126
Face
0,554 0,776
0,758
MMSS = Membros superiores; MMII = Membros inferiores; * valores estatisticamente significantes
Tabela 4 Comparação dois a dois entre as situações em que ocorreram lesões (n=126) durante os jogos de rúgbi Situação Maul Ruck Scrum Corrida Choque Não lembra Outros Treino
Tackle Maul Ruck Scrum Corrida Choque Não lembra Outros <0,001* 0,452 <0,001* 0,120 <0,001* 0,419 <0,001* 0,271 0,002* 0,020* <0,001* 0,250 <0,001* <0,001* 0,031* 0,009*
0,020*
0,060#
0,280
0,001* 0,079# 0,014* 0,093# <0,001* 1,000 <0,001* <0,001*
0,198
0,001*
0,494 0,271
0,006* 0,250
0,541 0,020*
0,079#
* valores de p estatisticamente significantes; # valores de p que, pela proximidade do limite de aceitação, considera-se que tendem a ser significantes
Tabela 5 Comparação dois a dois entre os períodos em que ocorreram lesões durante os jogos de rúgbi (n de lesões=126)
Período 2 tempo Final do Jogo Aquecimento Treino
1 tempo <0,001* <0,001* <0,001* <0,001*
2 tempo
Final do jogo
Aquecimento
<0,001* <0,001* <0,001*
0,701 0,734
0,472
* valores de p estatisticamente significantes
pode considerar esse percentual estatisticamente diferente (Tabela 4) dos percentuais do ruck (20,6%) e do scrum (16,7%). O período do jogo que levou ao maior número de lesões foi o 2o tempo, com 55,6% do total, seguido do
Tabela 2 Exposição e incidência de lesões sofridas (n=126) pelos jogadores estudados
Equipe
Cabeça e pescoço
Lesões Exposição (h) 159,60 59,85 219,45
Incidência* 626,57 434,42 574,16
Exposição: E = n de partidas X 15 X 1,33 h; * Incidência expressa em lesões por 1.000 horas de jogo 8 = N de lesões sofridas/E X 1000
1o tempo, em que ocorreram 34,9% das lesões. A Tabela 5 permite ver que o percentual do 2o tempo é significativamente maior em relação aos demais períodos. Os atacantes foram mais freqüentemente lesionados (58,7%) quando comparados aos defensores (41,3%), e essa diferença foi estatisticamente significante.
DISCUSSÃO A incidência total de lesões encontrada no presente estudo foi 574,16 por 1.000 horas de jogo (Tabela 2). Podese observar que a incidência de lesões do Time A foi aproximadamente quatro vezes maior do que a observa-
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da no Time B. Porém, é válido destacar que a exposição a lesões no Time A foi equivalente a aproximadamente o triplo da exposição do Time B, devido ao número de partidas realizadas, justificando essa diferença nas taxas entre as equipes. Quando comparada à encontrada por outros estudos4,5,9,13,15,16 realizados com jogadores de rúgbi amadores e das demais categorias, a taxa de incidência de lesões encontrada no presente estudo foi extremamente alta. Os estudos de Gabbett5,9 com jogadores amadores, por exemplo, encontraram incidências de 160,6 por 1.0005 e de 238,5 por 1.000 horas de jogo9; no estudo de Jakoet e Noakes15, também com amadores, a taxa de incidência de lesões encontrada foi de 78 por 1.000 horas de jogo. De maneira geral, o alto número de colisões físicas nas quais os jogadores são envolvidos durante o decorrer do jogo justifica uma elevada incidência de lesões11. Entre os jogadores estudados, porém, a falta de condicionamento físico da maioria pode ter colaborado para a alta incidência de lesões encontrada: segundo relataram nas respostas ao questionário, não fazem condicionamento físico ou o fazem apenas uma vez por semana. Além disso, embora crescente, a literatura sobre lesões no rúgbi é pequena e sofre de falta de consistência e indefinição de diagnóstico do que seja lesão, causando grande variabilidade na mensuração de incidência e prevalência de lesões17. Quanto à região anatômica de lesão, no presente estudo os resultados mostraram nos dois times o predomínio de lesões nos membros inferiores (36,5%), o que concorda com outros estudos realizados com amadores e jogadores das demais categorias na Argentina4, Nova Zelândia13,18 e Copa do Mundo de rúgbi (disputada na África do Sul)15.
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Vários estudos identificaram que a maioria das lesões ocorridas na liga de rugby sevens*9, na Copa do Mundo de 1995 (disputada na África do Sul)15, nas ligas de rúgbi da Nova Zelândia18 e da Austrália 19 são causadas pelo tackle. O tackle pode ser descrito como um ato para impedir de qualquer forma que o portador da bola corra com a mesma, passe-a ou chute-a para outro membro de seu time. A passagem da bola carregada pode ser impedida por qualquer jogador do time oposto20. Uma porcentagem que varia de 46,3 a 91,0% das lesões tem mostrado ocorrer nos tackles. Esses achados são esperados, dado que jogadores são envolvidos em uma média de 41 colisões físicas por partida21. Além disso, lesões também foram identificadas3 por terem ocorrido devido ao esforço excessivo (7,8%), colisões com jogadores adversários e/ou objetos fixos (15,5%), quedas e tropeções (5,5%) e deslizamentos e escorregões (0,3%). Neste estudo, também se verificou que o tackle foi a maior causa de lesões na soma total de ambos os times, corroborando os dados da literatura internacional9,15,18,19. O choque com outro jogador ou objeto fixo foi o mecanismo que levou ao menor número de lesões. O período do jogo em que a maioria das lesões (55,6%) ocorreu foi o segundo tempo, o que concorda com outros estudos realizados com jogadores amadores e de todas as categorias4,5. Esses achados sugerem que fadiga ou microtraumas acumulados, ou ambos, podem contribuir para as lesões em jogadores amadores de rúgbi 5 . Em um estudo realizado por
* Rugby sevens é uma modalidade do rúgbi convencional jogada com apenas sete jogadores em cada time, e em dois tempos de 7 minutos cada.
Gabbett 23 com 35 amadores da liga australiana de rúgbi para verificar suas características fisiológicas e antropométricas, observou-se que jogadores amadores têm aptidão aeróbia, velocidade e potência muscular consideravelmente baixas e significante maior porcentagem de gordura no corpo, quando comparados aos profissionais9. Quanto à posição do jogador – como atacante ou defensor –, os resultados aqui encontrados corroboram os da literatura no sentido de que atacantes são mais freqüentemente lesionados quando comparados aos defensores (58,7% contra 41,3% na soma total, respectivamente) 3,15,22. Na liga amadora de rúgbi da Austrália, atacantes e defensores têm em média 32 e 19 confrontos físicos por partida, respectivamente 3 . Vê-se pois que, à exceção da incidência de lesões, as demais características estudadas – posição do jogador, região do corpo lesada, período e situação do jogo em que a lesão ocorreu – são similares às encontradas na literatura sobre jogadores amadores de rúgbi em outros países. É importante realizarem-se novos estudos para alcançar maior precisão na definição de “lesão”, bem como mais estudos sobre jogadores brasileiros, para o desenvolvimento e implementação de intervenções preventivas para reduzir a taxa de lesões.
CONCLUSÃO A incidência de lesões traumáticas no rúgbi amador no Brasil mostrou-se extremamente alta, caracterizando grande diferença quando comparada à incidência de lesões em outros países, sugerindo-se que isso talvez se deva ao insuficiente preparo físico dos jogadores amadores brasileiros.
Alves et al.
Incidência de lesões no rúgbi amador no Brasil
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Agradecimento Aos jogadores, comissão técnica e dirigentes do Med Rugby e do Rio Branco Rugby Clube, sem os quais este estudo não teria sido possível.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.136-41, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Efeitos da reabilitação aquática na sintomatologia e qualidade de vida de portadoras de artrite reumatóide Effects of aquatic rehabilitation on symptoms and quality of life in rheumatoid arthritis female patients Luis Roberto Fernandes Ferreira1, Paulo Roberto Pestana1, Jussara de Oliveira2, Raquel Agnelli Mesquita-Ferrari3
Estudo desenvolvido no Curso de Fisioterapia da Uniara – Centro Universitário de Araraquara, Araraquara, SP, Brasil 1
Fisioterapeutas
2
Profa. Ms. do Curso de Fisioterapia da Uniara
3
Profa. Dra. do Programa de Mestrado em Ciências da Reabilitação da Universidade Nove de Julho, São Paulo, SP, Brasil
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Raquel M. Ferrari R. Vilela 239 Tatuapé 03068-000 São Paulo SP e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO out. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
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RESUMO : A artrite reumatóide (AR) tem manifestações articulares e extraarticulares, afetando diretamente a qualidade de vida dos pacientes. A hidroterapia é um recurso muito utilizado na reabilitação desses pacientes devido às propriedades físicas e efeitos fisiológicos da água. O objetivo do trabalho foi avaliar o efeito da hidroterapia na sintomatologia e qualidade de vida de portadoras de AR. Participaram do estudo oito voluntárias com média de idade 56,4±5,2 anos e diagnóstico clínico de AR. Antes e após o tratamento todas foram submetidas a avaliação fisioterapêutica, que incluiu a aplicação do Questionário Short-Form 36 (SF-36) e avaliação da rigidez matinal, dor e qualidade do sono, por escalas analógico-visuais. O protocolo de tratamento consistiu de 10 sessões de hidroterapia de 45 minutos cada, duas vezes por semana. Os dados coletados foram tratados estatisticamente, com nível de significância fixado em p≤0,05. Após o tratamento foi possível verificar redução da rigidez matinal (p=0,003) e da dor (p=0,004), além da melhora na qualidade do sono (p=0,006). Também foi verificada melhora significativa (p≤0,05) na maioria dos domínios do SF-36 após o tratamento. Conclui-se que o protocolo de hidroterapia proposto possibilitou melhora na qualidade de vida relacionada à saúde, redução dos sintomas de dor e rigidez matinal, além de melhora da qualidade do sono de portadoras de AR. DESCRITORES: Artrite reumatóide; Hidroterapia; Qualidade de vida ABSTRACT: Rheumatoid arthritis (RA) has both joint and extra-joint manifestations and may directly affect patients‘ quality of life. Hydrotherapy is a very useful resource for treating RA due the water physical properties and physiological effects. The aim of this study was to evaluate the impact of a hydrotherapy program on RA female patients’ symptoms and health-related quality of life. Eight volunteers, aged 56,4±5.2 years old, were selected for this study, all with RA diagnosis. Before and after treatment they were submitted to a physical therapy evaluation that included application of the Short Form-36 Questionnaire (SF-36) and assessment of pain, morning stiffness, and quality of sleep, by means of visual analogue scales. The treatment consisted of ten 45-minute hydrotherapy sessions, held twice a week. Collected data were statistically analysed, and significance level set at p≤0.05. At the end of treatment results showed significant decrease in pain (p=0.004) and morning stiffness (p=0.003), and improvement in quality of sleep (p=0.006). Also, significant improvement was detected in most SF-36 domains (p≤0.05). The proposed aquatic therapy program may be thus said to having improved health-related quality of life, reduced pain and morning stiffness, and improved quality of sleep of women with RA. KEY WORDS: Arthritis, rheumatoid; Hydrotherapy; Quality of life
Ferreira et al.
Hidroterapia para artrite reumatóide
INTRODUÇÃO Artrite reumatóide (AR) é uma desordem auto-imune de etiologia desconhecida caracterizada pela ocorrência de vários episódios de processos inflamatórios reativos que podem afetar muitos tecidos e órgãos – pele, vasos sangüíneos, coração, pulmões e músculos – mas que ataca principalmente as articulações (preferencialmente articulações periféricas e esqueleto axial), produzindo uma sinovite proliferativa não supurativa que progride freqüentemente para a destruição da cartilagem articular e anquilose das articulações1-4. Acredita-se que a prevalência da AR seja em torno de 1 a 5 % da população mundial. Em adultos a AR é mais comum em mulheres numa proporção de 5:1 e ocorre especialmente na faixa de 40 a 60 anos; porém, quando há acometimento masculino, o curso da doença tende a ser pior2,5,6. A AR instala-se de maneira insidiosa e progressiva. Suas manifestações podem ser tanto articulares como extraarticulares. Em manifestações articulares apresentam-se dor e entumecimento, derrames em grandes articulações, rigidez matinal, atrofia muscular periarticular, deformidades. Como manifestações extra-articulares na AR podemse citar febre, astenia, fadiga, modificações cutâneas e vasculares, linfadenopatia, esplenomegalia, manifestações oculares, cardíacas, respiratórias, neuropatias reumáticas, anemia e a presença de nódulos reumatóides subcutâneos (em superfícies extensores principalmente) 7 . Todas as articulações sinoviais podem ser acometidas, mas é mais freqüente o acometimento das articulações metacarpofalangianas (MCF), interfalangianas proximais (IFP) das mãos e dos pés, articulações carpais, articulação radioulnar distal e radiocarpal. As articulações acromioclavicular, esternoclavicular, temporomandibular, ombro, cotovelo, quadril, joelho e tornozelo também podem ser afetadas; na coluna vertebral a região mais acometida é a cervical8. Um paciente é considerado portador de AR quando apresentar quatro
dos sete critérios definidos pelo Colégio Americano de Reumatologia em 19981,9: 1, rigidez matinal por no mínimo 60 minutos; 2, artrite em três ou mais áreas articulares; 3, artrite nas articulações das mãos; 4, artrite simétrica; 5, presença de nódulos reumatóides; 6, positividade do fator reumatóide (80% dos casos); e 7, alterações radiográficas típicas. Tem-se recorrido cada vez mais à fisioterapia para o tratamento de doenças reumáticas, em especial nos casos de artrite reumatóide, normalmente associada ao tratamento medicamentoso, o que tem permitido resultados favoráveis8,10. A hidroterapia é um dos recursos mais antigos da fisioterapia, sendo definida como o uso externo da água com propósitos terapêuticos. É um recurso muito utilizado no processo de reabilitação especialmente em pacientes reumáticos, por possuir algumas vantagens devido às propriedades físicas e efeitos fisiológicos propiciados pelo meio aquático 11,12. É freqüentemente recomendada para pacientes com artrite, pois proporciona uma gama de benefícios incluindo redução de edema, dor e da sobrecarga sobre as articulações já lesionadas13. A hidroterapia promove reações diferentes daquelas experimentadas em solo, melhorando a circulação periférica, beneficiando o retorno venoso, além de proporcionar um efeito massageador e relaxante, atuando dessa forma nas principais queixas de pacientes com AR. Os exercícios na água são muito bem tolerados, especialmente em água aquecida, pois o ambiente morno ajuda a reduzir a dor e espasmos musculares14. A água oferece suave resistência durante os movimentos e, ainda, a oportunidade de treinamento em várias velocidades. Esses componentes fazem com que o exercício aquático seja um excelente método para aumento da resistência e força muscular15. Por décadas o repouso foi, juntamente com a medicação, o tratamento predominante para AR em adultos e crianças (AR juvenil). Essa atitude vem mudando, uma vez que os bene-
fícios do tratamento com exercícios físicos regulares em pacientes com artrite são cada vez mais evidentes. Vários estudos pilotos utilizando diferentes programas de tratamento vêm sendo realizados, porém existe grande necessidade de padronização e controle dos protocolos propostos16. Segundo Foley et al.13, que fizeram um levantamento de trabalhos utilizando a hidroterapia no tratamento de artrites, achados positivos foram detectados na maioria dos trabalhos avaliados, mas em nenhum deles foi alcançada de maneira satisfatória uma conclusão baseada em evidências, quanto à eficácia da hidroterapia para pacientes com AR. Por ser uma doença crônica, a AR interfere diretamente na qualidade de vida incluindo aspectos físicos, psicológicos e sociais; é tradicionalmente considerada a doença de maior impacto em todos os aspectos de qualidade de vida. Assim, as intervenções terapêuticas propostas no tratamento dessa patologia visam a melhora na qualidade de vida dos pacientes6,17. O termo qualidade de vida relacionada à saúde surgiu no final da década de 1940, quando a Organização Mundial da Saúde definiu saúde como um estado de bem-estar físico, mental e social, mais que simplesmente ausência da doença ou enfermidade18. Em 1948, Karnofsky foi um dos pioneiros ao introduzir no campo médico uma escala para medir a qualidade de vida de pacientes, que se chamava Karnofsky performance status scale. Vários questionários-escalas foram desenvolvidos e aperfeiçoados desde então; atualmente, o questionário mais utilizado para avaliar a qualidade de vida é o Short-Form-36 (SF-36), multidimensional, formado por 36 itens distribuídos em dois grandes componentes, físico e mental19. Com base na escassa existência de estudos que avaliem recursos não-medicamentosos úteis para o tratamento da AR, o presente estudo teve como objetivo avaliar o efeito da terapia aquática na sintomatologia e qualidade de vida de portadoras de AR.
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METODOLOGIA Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Uniara. As pacientes que participaram do estudo foram encaminhadas pela reumatologista responsável pelo acompanhamento clínico da doença, esclarecida quanto aos objetivos e protocolo de tratamento aquático adotados no estudo e consultada sobre eventuais contra-indicações. Todas as pacientes mantiveram o acompanhamento médico durante a realização do estudo e assinaram um Termo de Consentimento Pré-informado, após terem sido esclarecidas quanto aos objetivos e métodos do estudo. Foram avaliadas nove pacientes, com idade de 56,4±5,2 anos, encaminhadas ao setor de fisioterapia com diagnóstico médico de AR. Após a avaliação, oito voluntárias foram selecionadas para participar do estudo pois atenderam aos critérios de inclusão: diagnóstico médico de AR atestando por meio de exames laboratoriais que a doença não se encontrava em período de exacerbação, ausência de patologias associadas como estado depressivo severo, patologias cardíacas ou pulmonares graves e doenças metabólicas não-controladas (diabetes, dislipidimias), além de não estar realizando qualquer outro tipo de tratamento fisioterapêutico ou que envolvesse atividade física. Os critérios de
exclusão foram presença de contraindicações para realizar atividade aquática, como ulcerações, febre, fobia de água e incontinência urinária. As voluntárias selecionadas foram convidadas a participar do programa de tratamento em piscina descrito a seguir.
Procedimentos
As EVAs utilizadas e os respectivos graus foram as que se seguem. Para dor e rigidez matinal: 1 ausente; 2 fraca; 3 moderada; 4 forte; 5 muito forte; e para qualidade do sono: 1 dorme bem, sem acordar durante a noite; 2 sono interrompido, acorda algumas vezes durante a noite; 3 sono interrompido, acorda várias vezes durante a noite; 4 insônia20.
Protocolo de tratamento
As pacientes foram submetidas a uma avaliação fisioterapêutica consistindo em anamnese, avaliação da qualidade de vida por meio do Questionário SF-36 e avaliação de rigidez matinal, dor e qualidade do sono por meio de escalas analógico-visuais (EVAs) adaptadas de Rocha20.
As voluntárias foram submetidas a um protocolo de hidroterapia, em piscina com temperatura da água mantida entre 28o e 32oC. O tratamento totalizou dez sessões de 45 minutos cada, com freqüência de duas vezes semanais.
O Questionário SF-36 é formado por 36 itens, reunidos nos componentes físico e mental. Cada componentes é formado por quatro domínios constituídos de itens que avaliam uma mesma área da vida dos pacientes. O componente físico é composto pelos seguintes domínios: capacidade funcional (10 itens), aspectos físicos (4 itens) dor (2 itens) e estado geral de saúde (5 itens); o componente mental abrange domínios como vitalidade (4 itens), aspectos sociais (2 itens), aspectos emocionais (3 itens) e saúde mental (5 itens)19, 21-25. Quanto mais alto o escore obtido, melhor é a qualidade de vida relacionada à saúde.
Cada sessão foi composta por aquecimento, condicionamento, alongamento e relaxamento. O aquecimento (10 min) consistiu em caminhada na lateral da piscina, de frente e de lado; no condicionamento (25 min) foram realizadas atividades enfatizando movimentação de punho e mão, pé e tornozelo, incluindo o “esqui cross country” (movimentos de flexão e extensão dos membros inferiores para a frente, deslizando como nesse esporte), associada à utilização de flutuadores, “bicicleta” com auxílio de flutuador e exercícios de propriocepção para membros inferiores (oscilação de peso em apoio uni e bipodálico)
120 110 Escore obtido no SF-36
100
Pré
*
90
*
*
*
*
Pós
80 70 60 50 40 30 20 10 0 Capacidade funcional
Aspecto físico
Dor
Estado Vitalidade Aspectos geral da sociais saúde Domínios do SF-36
Aspecto emocional
Saúde mental
Grafico 1 Escores (média±desvio padrão) nos domínios do SF-36, antes (pré) e após (pós) tratamento aquático, obtidos pelas voluntárias com artrite reumatóide (* p≤0,05)
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Ferreira et al.
Hidroterapia para artrite reumatóide
e superiores (submersão de objetos freando seu retorno à superfície) com auxílio de flutuadores, entre outros; alongamento – geral e específico para as articulações periféricas – e relaxamento, como flutuação associada à respiração diafragmática, ocupava os 10 minutos finais da sessão11.
Análise estatística As médias e desvios padrões foram calculados para os escores obtidos nos domínios do SF-36 e para os valores obtidos pelas EVAs de rigidez, dor e sono, antes e após o protocolo de hidroterapia. O teste t de Student nãopareado (para o SF-36) e pareado (para as EVAs) foi aplicado aos dados obtidos antes e após o tratamento, para verificar diferenças significativas, considerando-se significante se p≤0,05.
RESULTADOS Ao término do tratamento foi verificada melhora significativa nos domínios capacidade funcional (p=0,004), dor (p=0,022), vitalidade (p=0,015), estado geral de saúde (p=0,027) e saúde mental (p=0,05) (Gráfico 1), além de uma tendência a melhores escores em todos os domínios do SF-36. Além disso, foi possível verificar uma redução significativa da rigidez
matinal (p=0,003) e dor (p=0,004) e melhora significativa na qualidade do sono (p=0,006) das voluntárias após o tratamento (Gráfico 2).
DISCUSSÃO Há atualmente grande preocupação em determinar possibilidades de tratamento que possam auxiliar portadores de doenças inflamatórias crônicas como a AR. Também é crescente a preocupação em determinar a eficácia dos tratamentos propostos. A utilização de questionários como o SF-36 tem sido intensificada na pesquisa científica nos últimos anos em decorrência do interesse em métodos subjetivos de avaliação clínica que valorizam a opinião do paciente sobre sua condição de saúde26. Estudos mostraram que programas de treinamento físico trazem benefícios a pacientes com AR, como o aumento da força muscular e capacidade aeróbica, redução da dor e inflamação, e incremento na função, refletindo-se diretamente na qualidade de vida e na realização das atividades diárias dos sujeitos5,8,13. O intuito do presente estudo foi avaliar o efeito de um tratamento hidroterapêutico na qualidade de vida e sintomatologia de portadores de artrite reumatóide por meio do Questionário SF-36 e de EVAs para rigidez, dor e qualidade do sono.
4,5
Pré
Valor obtido por EVA
4 3,5
*
Pós
*
3
*
2,5 2 1,5 1 0,5 0 Rigidez matinal
Dor
Qualidade do sono
Grafico 2 Escores (média±desvio padrão) nas EVAs de rigidez matinal, dor e qualidade do sono, antes (pré) e após (pós) tratamento aquático, obtidos pelas voluntárias com artrite reumatóide. Graduação de dor e rigidez matinal: 1 ausente; 2 fraca; 3 moderada; 4 forte; 5 muito forte; graduação de qualidade do dono: 1 dorme bem, sem acordar durante a noite; 2 sono interrompido, acorda algumas vezes durante a noite; 3 sono interrompido, acorda várias vezes durante a noite; 4 insônia (* p≤0,05)
Os escores do SF-36 obtidos ao término do tratamento aquático proposto foram significantemente maiores para os domínios capacidade funcional, dor, estado geral de saúde, vitalidade e saúde mental, indicando melhora na qualidade de vida após a terapia proposta. Nos demais domínios, houve uma tendência à melhora, porém não significante. Isso aponta para o fato de que o exercício regular, além do incremento na condição física e no bem-estar, também influencia fatores emocionais e sociais, uma vez que foi verificada influência direta nos domínios que avaliam esses aspectos8. Antes da realização do tratamento aquático, os escores obtidos nos domínios do SF-36 capacidade funcional, aspecto físico, dor, estado geral de saúde e vitalidade foram maiores que os encontrados por Talamo27 em mulheres portadoras de AR. Isso significa que as voluntárias do presente estudo apresentavam qualidade de vida relacionada à saúde melhor que as estudadas por esse autor. Wiles28 e Roux29, que avaliaram por meio desse mesmo questionário pacientes com AR, porém sem distinguir sexo, encontraram valores diferentes: Roux29 evidenciou valores superiores aos de Wiles28 e aos encontrados no presente estudo na maioria dos domínios. Isso pode ter ocorrido em função da heterogeneidade da amostra quanto à distinção entre sexos. Essa interferência pôde ser também evidenciada no estudo de Talamo27 que encontrou escores maiores em seis dos oito domínios no sexo masculino em comparação com o sexo feminino, especialmente nos domínios dos aspectos sociais, emocionais e na saúde mental. Assim, um ponto importante a ser ressaltado é o fato de alguns estudos utilizarem amostras de pacientes sem fazer distinção de sexo, o que pode interferir e dificultar a comparação de dados da literatura e dados encontrados em novos estudos. A avaliação da rigidez matinal, dor e qualidade do sono antes e após o tratamento permitiu verificar uma melhora em todos esses aspectos. Com relação à rigidez e dor, verificou-se que antes do tratamento o grau médio obtido foi “moderado a forte” e, ao
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término do tratamento, “fraco a moderado”. Quanto à qualidade do sono, também foi possível verificar melhora, pois antes do tratamento o grau obtido ficou entre “sono interrompido, acorda algumas vezes durante a noite” e “sono interrompido, acorda várias vezes durante a noite” e, após o tratamento, passou a ser “sono interrompido, acorda algumas vezes durante a noite”. Isso sugere fortemente que a terapia aquática, por seus efeitos fisiológicos e físicos, que induzem respostas como melhora do condicionamento físico, relaxamento muscular, redução de sobrecarga articular entre
outras, é uma ferramenta útil para reduzir a dor e rigidez, além de propiciar melhora na qualidade do sono em pacientes portadoras de AR30,31. Esses achados foram similares aos encontrados por Santoni et al. 30, que utilizaram o tratamento aquático para um portador de artrite reumatóide juvenil.
peso, relaxamento muscular pelo aumento do fluxo sanguíneo e liberação de endorfinas11,31,32. Em concordância com esses fatores, foi constatada, pelo SF-36, melhora significativa no domínio saúde mental após o tratamento.
Um dos fatores que pode ter contribuído para a melhora da sintomatologia das voluntárias foi o estabelecimento da prática regular de atividade física, especialmente por esta ser realizada em piscina terapêutica. A água torna algumas atividades mais prazerosas pela redução de descarga de
Com base nos resultados obtidos, pode-se afirmar que o protocolo de tratamento aquático utilizado neste estudo foi eficaz em promover a melhora na qualidade de vida relacionada à saúde, além de propiciar redução de dor e rigidez matinal e melhora do sono em portadoras de artrite reumatóide.
CONCLUSÃO
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.142-8, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Interferência mútua entre atividade visual e atividade motora em jovens e idosos Mutual interference between a visual and a motor task in young and elderly subjects Patrícia Pereira dos Santos Teixeira1, Mariana Callil Voos2, Mariane Silva Andrade Machado1, Lílian Zanchetta Castelli1, Luiz Eduardo Ribeiro do Valle3, Maria Elisa Pimentel Piemonte4
Estudo desenvolvido no ICB/ USP – Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil 1
Fisioterapeutas
2
Doutoranda em Neurociências e Comportamento no Instituto de Psicologia da USP
3
Prof. Dr. do ICB/USP
4
Profa. Dra. do Depto. de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da USP
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Mariana C. Voos Fofito/ FMUSP Rua Cipotânea 51 Cidade Universitária 05360-160 São Paulo SP e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO out. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
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RESUMO: Como o envelhecimento provoca dificuldade na capacidade de dividir a atenção, este estudo visou verificar, em jovens e idosos: (1) a eventual interferência entre uma tarefa visual e uma motora; (2) se essa interferência (caso exista) ocorre de forma diferente no desempenho de jovens e idosos; (3) se as tarefas propostas têm correlação com testes validados, de seqüência alfanumérica (TMT) e de levantar e caminhar cronometrado (TLCC). A tarefa visual consistiu na verbalização do reconhecimento de duas figuras iguais ou diferentes apresentadas rapidamente. A tarefa motora consistiu na alternância de passos do chão a uma plataforma fixa de 10 cm de altura. As tarefas foram avaliadas isoladas (tarefa-simples) e associadas (tarefa-dupla) em dois grupos: 10 jovens (23±2,8 anos) e 10 idosos (68,8±8,6 anos). Na tarefa visual, os jovens fizeram menos erros que os idosos (p<0,001); nos dois grupos não houve maior número de erros na tarefa-simples quando comparada à tarefa-dupla. Na tarefa motora, os idosos tiveram pior desempenho na tarefa-dupla em relação à tarefasimples (p=0,009). Houve correlação positiva entre o TMT e o número de alternâncias de passos (p<0,05) e correlação negativa entre o número de alternâncias de passos e o TLCC (p<0,05). A tarefa motora não interferiu na tarefa visual em jovens nem em idosos, mas a tarefa visual diminuiu a velocidade da tarefa motora dos idosos. A proposição das tarefas sem atribuir primariedade a uma ou outra permitiu detectar essas interferências. DESCRITORES: Análise e desempenho de tarefas; Atividade motora; Envelhecimento; Percepção visual ABSTRACT: Since aging brings about difficulty in dividing attention, this study aimed at verifying, in youth and aged: (1) the possible interference between a visual and a motor task; (2) whether such interference varies between young and elderly subjects; (3) whether there is correlation between the proposed tasks and the trail making test (TMT) and the timed up-and-go test (TUGT). The visual task measured the ability to state whether two quickly presented figures were same or different. The motor task consisted on alternating steps from the ground to a 10 cm-high platform. Tasks were assessed both as single-task (isolated) and dual-task (simultaneous) in two groups: 10 young people (aged 23±2.8) and 10 elderly (aged 68.8±8.6). In the visual task, young volunteers presented less errors than the elderly (p<0.001); in both groups no increase in the number of errors was detected at dual-task when compared to the singletask. At the motor task the elderly presented lower speed in dual-task as compared to the single-task (p=0.009). TMT correlated positively to the number of alternations of step (p<0.05) and TUGT correlated negatively to the number of alternations of step (p<0.05). For both young and elderly, the motor task did not interfere on the visual task; however, the elderly showed lesser speed in the motor task when associated to the visual task. The non-assignment of primality to either task proved useful to detect these interferences. KEY WORDS: Aging; Motor activity; Task performance and analysis; Visual perception
Teixeira et al.
Tarefa visual-motora em jovens e idosos
INTRODUÇÃO A associação entre tarefas visuais e motoras é comum e necessária nas atividades diárias, como dirigir, atravessar a rua, tomar conta de crianças, usar o computador, passear com o cachorro… Muitos trabalhos discutem o desempenho visual-motor em experimentos com tarefa-dupla1-4. Uma tarefa primária é apresentada ao voluntário e testada na condição isolada e, posteriormente, associada a uma tarefa secundária. A tarefa secundária pode evidenciar mudanças na tarefa primária. Quando duas tarefas são associadas, há maior probabilidade de uma ou ambas serem realizadas com menor velocidade e maior número de erros, o que é chamado de interferência mútua negativa 3 . Quanto mais complexa for a tarefa secundária, maior será a interferência negativa, ou seja, a piora na tarefa primária2,5. Por outro lado, se a tarefa primária for de alta complexidade, a adição de uma tarefa secundária simples poderá acarretar perda de desempenho. Quando há interferência negativa entre tarefas, assume-se que ambas competem para a mesma classe de recursos de processamento de informação no sistema nervoso, pois processar recursos é algo limitado e compartilhado. A demanda de atenção reflete o grau de competição de resposta entre representações corticais sobrepostas que participam das duas tarefas associadas6. Se duas tarefas são mediadas pela mesma área cortical, há piora de desempenho quando são realizadas ao mesmo tempo (hipótese do campo cortical). Se uma população de neurônios está engajada em uma atividade específica, não estará disponível para desempenhar uma atividade concorrente 7. A interferência irá ocorrer quando a capacidade de recursos centrais disponíveis for excedida 4. Muitos artigos mostram que idosos apresentam dificuldade de dividir a atenção entre duas tarefas 5,8-15. Isso ocorre devido a défices sensoriais e perceptuais16, aumento do tempo de reação da resposta frente ao estímu-
lo10,17, ou redução da habilidade de planejamento e seleção de estratégias motoras 8 , principalmente quando é solicitada a associação a tarefas cognitivas5,13,18; ou ainda a perda de memória de longo prazo e memória operacional19. Alterações de memória operacional, atenção e flexibilidade mental são bem detectadas pelo teste de seqüência alfanumérica, também conhecido como teste das trilhas (TMT, sigla do inglês trail making test)20,21, que mede o tempo necessário para o sujeito ligar em seqüência 25 círculos contendo números ou letras e números. Foi encontrada correlação entre desempenho no TMT, mobilidade funcional e risco de quedas em idosos21, o que também se relaciona à velocidade de realização do teste de levantar e caminhar cronometrado (TLCC, em inglês TUGT) 22. O TLCC é uma medida de mobilidade funcional que quantifica em segundos o tempo que o indivíduo leva para levantar de uma cadeira (com assento a cerca de 46 cm do solo), caminha três metros, vira, volta e se senta novamente. O paciente é instruído a realizar o trajeto o mais rápido possível. Indivíduos com tempo de realização acima de 13 segundos apresentam maior risco de queda23. O TMT20 e o TLCC22 são amplamente utilizados em idosos e apresentam grande confiabilidade e validade inter e intra-observadores20-22. Um estudo17 analisou idosos atravessando a rua e concluiu que a dificuldade de associar o ato motor de atravessar a rua ao de olhar os carros que se aproximam ocorre devido à redução da capacidade de dividir a atenção. Idosos são dependentes da visão quando andam e olham mais para o chão durante a marcha. Pedestres idosos têm maior dificuldade de atravessar a rua em segurança17. A marcha apresenta alto custo de atenção, porém, como é uma prática comum no dia-a-dia, não inibe a capacidade de realizar outras atividades ao mesmo tempo, tendo caráter automático 14. Com o envelhecimento, o controle rítmico de passos deixa de ser realizado predominantemente por regiões subcorticais e espinhais e passa a ser gerenciado por regiões corticais,
também envolvidas em tarefas cognitivas. Logo, a interferência causada pela competição de demandas de atenção é mais evidente em idosos11. Além de alterações na marcha, idosos têm dificuldades em outras tarefas cotidianas que requerem divisão de atenção, como dirigir 16 e deambular em ambientes externos9,12,24. Estudos sobre associação de tarefas costumam determinar arbitrariamente uma tarefa como primária e outra como secundária; nesses casos, a generalização dos achados para atividades diárias poderia não ser adequada, já que não parece possível estipular peso maior, por exemplo, para uma tarefa motora em relação a uma tarefa visual; para atravessar a rua, a alternância de passos e o equilíbrio dinâmico são tão importantes quanto a detecção de obstáculos e veículos em nosso trajeto. Para melhor compreensão dos mecanismos envolvidos em tarefas-duplas, seria necessário o estudo da interação entre tarefas motora e visual sem atribuir primazia a uma ou outra. E, para avaliar o desempenho de idosos, é útil compará-lo ao de jovens. Além disso, para avaliar o desempenho em tarefa-dupla é conveniente verificar se este apresenta correlação com o de testes funcionais validados na literatura, que medem a capacidade de realizar tarefas visualmotoras. Frente ao exposto, os objetivos deste estudo foram verificar: (1) a eventual interferência entre uma tarefa visual de detecção, discriminação e comparação de dois estímulos e uma tarefa motora de alternância de passos do chão a uma plataforma; (2) se essa interferência (caso exista) ocorre de forma diferente no desempenho de jovens e idosos; (3) se o desempenho nos testes realizados apresenta correlação com o desempenho em outros dois testes, o TMT e o TLCC.
METODOLOGIA Participaram deste estudo dez voluntários idosos saudáveis (cinco homens), com 60 a 85 anos (68,8±8,6
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anos de idade), pareados com dez voluntários jovens (cinco homens) com 20 a 35 anos (23±2,8 anos de idade). Foram adotados como critérios de inclusão: escolaridade de 8 a 16 anos, pontuação no miniexame do estado mental (MEEM)26 maior que 25 e visão normal ou corrigida com lentes (acuidade visual de longe medida pelo teste de Snellen, visão de perto medida pelo teste de leitura e presença de escotoma avaliada pela grade de Amsler)27. Os critérios de exclusão foram: uso habitual de jogos eletrônicos, participação prévia em outros experimentos semelhantes a este e problemas musculoesqueléticos, cardiovasculares, respiratórios ou neurológicos. Os participantes foram esclarecidos quanto aos objetivos do estudo e os que consentiram em participar assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB/USP). O estudo foi conduzido em uma sala com isolamento acústico e iluminação reduzida, no laboratório de Psicofisiologia do ICB/USP. Foram feitas investigações clínicas nos voluntários sobre os critérios de inclusão e exclusão.
Materiais Foram utilizados: um computador com o aplicativo MEL2 ®; uma plataforma de 10 cm de altura, fixa no chão; e anteparos para ajuste da altura do monitor conforme a altura dos voluntários. Foram aplicados dois instrumentos, o miniexame do estado mental (MEEM) 26 e o teste de seqüência alfanumérica (TMT); este é dividido em duas partes: na parte A, o voluntário deve conectar em ordem crescente, traçando retas, círculos contendo 25 números espalhados randomicamente (1,2,3...); na parte B, há maior demanda cognitiva, pois o voluntário deve seguir uma seqüência crescente de números e letras (1,A,2,B,3,C...). A pontuação é dada pela subtração do tempo gasto na parte B menos tempo gasto na parte A.
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Procedimentos A tarefa visual foi realizada com base na parte 2 do teste UFOV (Useful field of view test)16. Consistia na nomeação de dois estímulos simultâneos, um apresentado no centro da tela do computador e outro na periferia (a dez graus do centro, em uma das oito possíveis posições demarcadas em sentido horário), ambos com duração de 150 ms. A atividade era constituída por 32 tentativas, com duração total média de 2,5 minutos. A tela do computador, de fundo cor cinza, trazia no centro uma cruz de fixação e oito retângulos brancos circundandoa (luminância de 20 cd/m2 , 2,2º de altura por 3,6º de largura e 0,04º de borda). Após 1750 ms aparecia um estímulo de duração de 150 ms no centro da tela (sobre a cruz) e, simultaneamente, outro dentro de um dos retângulos periféricos. Os estímulos podiam ser um caminhão (1,5º de largura, 0,5º de altura anterior, 0,9º de altura posterior) ou um ônibus (1,5º de largura, 0,5º de altura), ambos com luminância de 20/m2. As possibilidades de aparecimento dos estímulos eram: ônibus no centro e na periferia; ônibus no centro e caminhão na periferia; caminhão no centro e na periferia; e caminhão no centro e ônibus na periferia. O estímulo da periferia podia aparecer em qualquer um dos oito retângulos (Figura 1).
Os voluntários mantinham-se em bipedestação a 70 cm da tela do computador. A altura da tela foi ajustada para que os olhos ficassem no nível da cruz, no centro da tela. Foram orientados a manter os olhos na cruz durante todo o experimento, deixando sua atenção difusa para conseguir reconhecer os estímulos apresentados no centro e na periferia da tela. Os participantes deviam falar em voz alta se os estímulos eram iguais ou diferentes. Após a exibição dos dois alvos, o programa era interrompido até que o/ a participante respondesse (“iguais” ou “diferentes”). Foi proporcionada retroalimentação auditiva (beep) a cada resposta correta. Após cada tentativa, um examinador, que não tinha acesso à tela do teste, registrava a resposta com o mouse e uma nova tentativa era iniciada. Caso não houvesse resposta em 10 segundos, o programa emitia um novo estímulo e a resposta era considerada errada. O programa fornece o número de erros de cada participante. A tarefa motora consistia na alternância de passos do chão a uma plataforma com superfície antiderrapante, de 10 cm de altura, fixa ao solo, localizada à frente dos voluntários. Foi solicitado que realizassem a tarefa o mais rápido possível e olhassem para frente durante a atividade. O tempo da atividade motora era igual ao tem-
Figura 1 Tarefa visual: imagem apresentada na tela do computador; um ônibus ou um caminhão apareciam no centro e em um dos oito retângulos (estímulos simultâneos, de 150 ms) (Parte 2 do UFOV adaptada de Ball & Owsley16)
Teixeira et al.
Tarefa visual-motora em jovens e idosos
Todos os voluntários receberam detalhada explicação sobre o experimento. Foram aplicados então, nesta ordem, 1o o teste TLCC, 2o treino da tarefa visual (TVtr), 3o treino da tarefa motora (TMtr), 4o TMT–parte A, 5o tarefa visual (TV), 6o tarefa motora (TM), 7 o TMT–parte B, 8 o tarefas visual e motora associadas (TD, tarefa-dupla), 9 o MEEM, 10 o repetição da tarefa motora (TMrep). Foram alternadas tarefas mais aeróbicas (motora e tarefa-dupla) com tarefas menos cansativas (tarefa visual, TMT partes A e B, MEEM), para maior conforto dos voluntários. Por isso, apesar de a pontuação no MEEM ter sido usada como critério de inclusão, o teste foi o nono da seqüência. Se tivesse havido algum voluntário com pontuação abaixo de 25, teria realizado todo o experimento normalmente, mas seus dados seriam descartados da análise estatística. A tarefa motora foi repetida ao final do experimento para avaliar se o cansaço interferiu no desempenho; em caso afirmativo, seria observada diminuição do número de alternâncias de passo por segundo. A pressão arterial dos voluntários foi mensurada em repouso e após as tarefas motoras e a tarefa dupla. Caso a pressão arterial de algum dos voluntários tivesse chegado a 150 x 100 mmHg, o experimento teria sido interrompido por segurança, mas isso não aconteceu.
Análise estatística Para testar a possibilidade de ocorrência de interferência negativa mútua entre as tarefas, o número de passos por segundo na ausência e na presença da tarefa visual e o número de erros na tarefa visual na ausência e na presença da tarefa motora foram submetidos a análises de variância (ANOVAs). As mesmas análises foram utilizadas para comparar o desempe-
nho de jovens e idosos. Também foram feitos testes de correlação de Spearman para verificar se o desempenho na tarefa motora apresentou correlação com o TLCC e se o desempenho na tarefa visual apresentou correlação com o TMT. O nível de significância adotado foi de 5% (α=0,05).
RESULTADOS A análise dos resultados na tarefa visual evidenciou que os jovens apresentaram menor número de erros (6,6±3,5) que os idosos (14,8±4,1) [F1,18=56,16; p<0,001]. Houve diferença entre os testes [F2,36=3,89; p=0,030]: a comparação post hoc mostrou que o resultado no treino da tarefa visual isolada (TVtr) foi pior (p=0,034) que na tarefa visual associada à motora (TD); mas não houve menor número de erros na tarefa-simples quando comparada à tarefa-dupla, portanto não ocorreu interferência negativa da tarefa motora sobre a visual. Não foi encontrada relação entre grupos e testes [F2,36=0,42; p=0,660]: os grupos de jovens e de idosos apresentaram comportamento semelhante no treino (TVtr), na tare-
fa-simples (TV) e na tarefa-dupla (Figura 2). Quanto à tarefa motora, os idosos apresentaram uma média de 1,06±0,4 passos por segundo e os jovens, 1,47±0,3 passos por segundo [F1,18=10,31; p=0,005]. Houve diferença entre os testes [F=3,54=9,01; p<0,001]: a comparação post hoc mostrou que o desempenho no treino da tarefa motora (TMtr) foi pior do que na própria tarefa TM (p<0,001), evidenciando aprendizado (Figura 3). O desempenho na tarefa-dupla (motora associada à visual) também foi pior do que na TMsimples (p=0,002). Houve interação entre grupos e testes [F3,54=4,47; p=0,007]. A comparação post hoc mostrou que, entre os jovens, o desempenho no treino da tarefa-simples (TMtr) foi pior que na última (teste de fadiga) (p<0,001). Nos idosos, o desempenho foi melhor na tarefa-simples (TM) quando comparada à tarefa-dupla (p=0,047), e pior na tarefa-dupla quando comparada à última realização da tarefa motora (TMrep, teste de fadiga) (p=0,009) (Figura 3). Enquanto os jovens melhoraram o desempenho na tarefa motora na condição tarefa-dupla, os idosos apresentaram menor número de alternâncias de pas-
Desempenho de jovens e idosos na tarefa visual 200 188 166 144 Número de erros
po que os voluntários haviam levado para realizar a atividade visual. As alternâncias dos passos sobre a plataforma foram filmadas e posteriormente contadas e registradas pelo examinador.
122 Jovens Idosos
100 88 66 44 22
TVtr
TV
TD
Figura 2 Desempenho médio de jovens e idosos na tarefa visual. TVtr = treino da tarefa visual; TV = tarefa visual; TD = tarefa visual associada à tarefa motora (tarefa-dupla)
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portanto não houve interferência negativa da tarefa motora sobre a tarefa visual. Mas, embora a tarefa visual não tenha prejudicado o desempenho dos jovens na tarefa motora, esse prejuízo ocorreu para os idosos.
Desempenho de jovens e idosos na tarefa motora
Número de alternâncias de passos por segundo
2,0 1,8 1,6 1,4 1,2 1,0 0,8 Jovens Idosos
0,6 0,4 TMtr
TM
TD
TMrep
Figura 3 Desempenho médio de jovens e idosos na tarefa motora. TMtr = treino da tarefa motora; TM = tarefa motora; TD = tarefa motora associada à tarefa visual (tarefa-dupla); TMrep = repetição da tarefa motora para avaliar interferência do cansaço no desempenho sos nessa situação. Logo, houve interferência negativa da tarefa visual sobre a tarefa motora para idosos, mas não para jovens.
Correlações Foi criado um índice para verificar a interferência da tarefa visual sobre a tarefa motora: número de alternâncias de passos dados na TM menos o número de alternâncias na TD, tarefa motora associada à visual (índice 1). Esse índice foi correlacionado com o tempo-delta do TMT (tempo gasto na parte B menos tempo gasto na parte A), aqui chamado índice 2, pelo teste de correlação de Spearman. Foi observada correlação significativa entre os índices (r=0,451, p<0,05), ou seja: quanto menos passos o indivíduo tiver alternado durante a tarefa-dupla do que na tarefa motora isolada, menor o tempo a mais necessário para alternar números e letras no TMT–parte B do que o tempo requerido para seguir apenas a seqüência numérica no TMT–parte A. O número de alternâncias de cada indivíduo no treino da tarefa motora (que foi o primeiro contato do sujeito
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Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 42-8
com essa tarefa) foi relacionado ao desempenho no TLCC, por meio do teste de correlação de Spearman. Houve correlação negativa entre o número de alternâncias e o TLCC (r= 0,649; p<0,05), ou seja, os indivíduos que precisaram de menos tempo para realizar o TLCC deram maior número de alternâncias de passos – ou, como era de se esperar, maior rapidez no TLCC coincide com maior rapidez na tarefa motora.
DISCUSSÃO Foi importante não ter sido atribuída relevância diferente a cada tarefa. Se uma tarefa tivesse sido estabelecida como primária e outra como secundária, não teria sido possível estudar a interferência da tarefa motora sobre a visual e vice-versa. O primeiro objetivo do presente estudo foi verificar eventual interferência negativa mútua entre as tarefas visual e motora. O segundo objetivo foi verificar diferenças no desempenho de jovens e idosos. Quanto aos dois objetivos, verificamos que a tarefa motora não prejudicou o desempenho da tarefa visual dos jovens nem dos idosos,
Assim como andar demanda alto custo de atenção em idosos13,14, a alternância de passos também parece ter essa característica. Como os idosos apresentam redução da habilidade de manter a postura estável, devido ao declínio da capacidade sensorial 12 , cognitiva e motora5,8,13,18, precisam alocar mais atenção ao controle postural, prejudicando assim a tarefa motora, sobretudo quando esta é associada à visual. É importante mencionar o fato de, com a idade, ocorrer um aumento na dependência visual para atividades do dia-a-dia, como a marcha12. Foi solicitada a manutenção do olhar na tela do monitor durante todo o experimento e os idosos podem ter sido prejudicados por não terem podido usar a estratégia visual compensatória durante as tarefas motoras, tanto na isolada quanto na associada à visual. Idosos apresentam prejuízo das funções executivas 10,17, o que explica o fato de terem cometido mais erros na tarefa visual. Por outro lado, já que os idosos foram mais lentos na execução da tarefa motora na condição tarefadupla, tiveram mais tempo entre cada alternância para realizar a tarefa visual. Por isso, mesmo tendo mais dificuldade em dividir a atenção, conseguiram manter o mesmo número de erros na tarefa visual nas condições tarefa-simples e tarefa-dupla. Tanto jovens quanto idosos apresentaram melhora na última tarefa motora, que visava verificar se o cansaço havia interferido no experimento: caso nessa tarefa (TMrep) apresentassem desempenho pior que nas anteriores, o cansaço do voluntário poderia ter interferido no resultado. Com a melhora no desempenho, constata-se que houve aprendizado durante a realização da tarefa motora e que o cansaço não interferiu no resultado. Nas execuções da tarefa motora simples (TMtr e TM), podem ter sido
Teixeira et al.
ativadas tanto as estruturas corticais como as subcorticais11. Ao ser associada à tarefa visual (tarefa-dupla), é possível que a tarefa motora tenha solicitado menos das estruturas corticais, conforme sugerido por Dubost et al.11, tendo utilizados circuitos subcorticais para deixar livre maior número de redes neuronais corticais para a tarefa visual. Assim, criaram-se novas estratégias e novos esquemas neurais para lidar com a situação de tarefa-dupla e novas áreas corticais podem ter sido ativadas para gerenciar simultaneamente as tarefas visual e motora 28 . Portanto, ao realizar novamente a tarefa-simples motora, o indivíduo teria contado com maior número de estratégias neurais. Isso pode complementar a explicação de melhor desempenho de jovens e idosos na última repetição da tarefa motora simples, após executá-la na condição tarefa-dupla. Embora a diferença de desempenho na tarefa motora antes e depois da tarefa-dupla não tenha alcançado nível significativo, houve maior velocidade na última realização da tarefa motora.
Tarefa visual-motora em jovens e idosos
Este estudo teve como terceiro objetivo verificar se os testes realizados tinham correlação com testes validados que avaliam o mesmo comportamento, como o TMT e o TLCC. Quanto ao TMT, foi observada correlação com a tarefa-dupla: quanto menor o impacto da perturbação no TMT (ligar letras e números na parte B, ao invés de só números na parte A), menor o impacto da perturbação da tarefa visual sobre a motora (executar apenas a alternância de passos ou executá-la simultaneamente à discriminação de estímulos visuais). Essa correlação pode ser explicada pelo fato de os dois testes exigirem divisão de atenção, memória operacional e flexibilidade cognitiva. A alternância de passos correlacionou-se ao TLCC pelo fato de ambos exigirem fatores em comum, como velocidade, habilidade de recrutar sinergias musculares alternadas e ajustes antecipatórios. Quanto mais rápido o indivíduo conseguiu completar o TLCC, maior foi sua velocidade de alternância de passos.
Por terem sido avaliadas nesse estudo apenas três vezes a tarefa visual, contra quatro vezes a tarefa motora, pode-se supor que, se tivesse havido uma quarta etapa visual, talvez fosse possível ter observado melhora no desempenho visual após a realização da tarefa-dupla, assim como foi observado na tarefa motora. Estudos futuros terão como objetivo investigar essa questão.
CONCLUSÃO A tarefa motora não interferiu no desempenho da tarefa visual em jovens nem em idosos, mas a tarefa visual diminuiu a velocidade da tarefa motora entre os idosos; portanto, houve diferença entre o desempenho de jovens e idosos. Verificou-se ainda correlação entre os desempenhos nos testes de seqüência alfanumérica e levantar e caminhar cronometrado (TMT e TLCC) e nas tarefas propostas neste experimento.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.149-56, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
O preparo bioético na graduação de Fisioterapia Bioethical education in physical therapy undergraduate course Fernanda Degilio Alves1, Aline Bigongiari2, Luis Mochizuki3, William Saad Hossne4, Marcos de Almeida5
Estudo desenvolvido no Centro Universitário São Camilo, São Paulo, SP, Brasil 1
Profa. Ms. do Curso de Fisioterapia da Universidade Nove de Julho, São Paulo, SP, Brasil
2
Profa. Ms. Curso de Fisioterapia na Universidade São Judas Tadeu, São Paulo, SP, Brasil
3
Prof. Dr. da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
4
Prof. Livre-Docente do Mestrado em Bioética do Centro Universitário São Camilo
5
Prof. Livre-Docente de Ética do Curso de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Fernanda D. Alves R. Profa. M. José Barone Fernandes 300 Vila Maria 02117-020 São Paulo SP e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO out. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
RESUMO: O desenvolvimento da Fisioterapia, aliado às mudanças na educação e na saúde, faz com que a autonomia e os dilemas éticos do fisioterapeuta sejam maiores a cada dia, expandindo seu papel no cuidado do paciente. Para além do Código de Ética, as noções de Bioética são centrais no preparo de graduandos para os desafios profissionais. Este estudo verificou a capacidade de tomar decisões éticas de alunos no último ano de Fisioterapia de duas universidades na cidade de São Paulo, das quais uma oferece no currículo a disciplina Bioética e a outra não. Cinqüenta alunos de cada universidade responderam a um questionário sobre dilemas éticos correspondentes a artigos do Código de Ética; cada questão oferecia três alternativas de resposta: uma bioética, outra referente ao Código e uma não-ética. As respostas foram analisadas estatisticamente. Os resultados mostraram um bom preparo ético em pouco mais de metade dos alunos das duas universidades, sugerindo que ambas oferecem preparo ético similar aos graduandos, independente da diferença curricular. No entanto, os alunos da universidade que oferece Bioética tiveram resultados significantemente melhores nos quesitos referentes à relação com outros profissionais da saúde, sugerindo que essa disciplina oferece melhores condições para o relacionamento interprofissional, fator importante tanto na prática clínica quanto para elevar o status da Fisioterapia. D ESCRITORES: Bioética; Ética profissional; Fisioterapia/educação ABSTRACT: Physical therapy recent expansion, along with changes in education and health, enhance physical therapists’ role in patient care, while increasing both their autonomy and the ethical challenges they face in daily clinic. In addition to knowledge of the professional ethical code, notions of Bioethics are thought to be central to students training. This study analysed the ability to make ethical decisions among 100 physical therapy undergraduate students at two universities in São Paulo, of which only one offers the discipline Bioethics. Fifty students of each university answered a questionnaire of dilemmas related to items of the Physical Therapy Code of Ethics; for each question there was a choice between three answers, bioethical, in accordance with the ethical code, or non-ethical. Answers were statistically analysed. About half the students of both universities seemed to be satisfactorily prepared to act ethically, thus suggesting that both offer similar ethical training, regardless of curricula differences. However, students from the university that offers Bioethics had significantly better results in questions concerning the relationship with other health providers, thereby suggesting that this discipline may provide better student training for inter-professional relationship, which is important both to clinical practice and to raise physical therapy status. KEY WORDS: Bioethics; Ethics, professional; Physical therapy/education
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INTRODUÇÃO O desenvolvimento da Fisioterapia está associado à evolução de procedimentos e métodos de ensino-aprendizagem de conteúdos curriculares e aos avanços clínico-científicos da saúde. Em decorrência dessa evolução, aumentou a expectativa por resultados positivos pós-tratamento e, também, a responsabilidade no ato de cuidar do paciente1-4. Exige-se do profissional, assim, uma formação generalista, humanista, crítica, reflexiva, autônoma, responsável e balizada em princípios éticos5. O investimento de instituições de ensino superior em cursos de Fisioterapia, especialmente em São Paulo6, levou ao aumento no número de fisioterapeutas no mercado de trabalho. E à transformação do ato de cuidar, que atualmente enfatiza o vínculo terapeuta-paciente 2,3,7, mas carece de desenvoltura ética e moral6,7. A disciplina Ética e Deontologia é obrigatória no ensino superior na área da saúde, mas o foco e extensão variam entre cursos, podendo levar a lacunas na formação6,8. A Bioética oferece subsídios para decisões referentes à saúde, vida, morte, dignidade, solidariedade, confidencialidade, privacidade, vulnerabilidade, responsabilidade, qualidade de vida 9,10 e defende a humanização do atendimento na saúde11. O processo de identificar questões, tomar decisões e agir requer habilidades e conhecimentos de ética8. Pouco se sabe sobre o nível de desenvolvimento moral e os efeitos da educação na tomada de decisão ética na fisioterapia1,2, ao contrário da quantidade maior de estudos em outras áreas da saúde, como medicina e enfermagem 1,2,12. Especialmente, não foi encontrada informação sobre o preparo bioético do estudante de Fisioterapia. O Código de Ética Profissional é a base para a boa conduta e requisito mínimo de incorporação dos valores da profissão. O aluno tem conhecimento suficiente do Código para a escolha da conduta moral adequada? Além dos subsídios oferecidos pelo
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Código de Ética, o referencial bioético é incorporado ao ensino? O aluno aplica o conteúdo na prática clínica? Esse tema é pouco explorado e, para responder essas questões, o objetivo desta pesquisa é analisar a formação bioética de estudantes de Fisioterapia de duas universidades privadas da cidade de São Paulo, sendo que uma oferece a disciplina de Bioética na grade curricular e a outra não.
METODOLOGIA Esta pesquisa é prospectiva e quantitativo-controlada, realizada por meio da aplicação de um questionário. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética nas duas universidades, cujas identificações foram mantidas em sigilo.
Amostra Participaram 100 universitários divididos igualmente em dois grupos: Uni1, sem a disciplina de Bioética, e Uni2, com a disciplina de Bioética. A Uni1 não oferece disciplina exclusiva de Bioética e ministra no conteúdo programático da disciplina Ética em Filosofia o tópico de Bioética, além de ética e moral; deontologia; código e comissões de ética; direitos dos pacientes; deveres do fisioterapeuta, postura profissional e outros. Na Uni2 é oferecida a disciplina Bioética com o seguinte conteúdo programático: ética e moral; gênese, desenvolvimento e abrangência da Bioética; princípios da Bioética; bioética e tecnologia, meio ambiente, início e fim da vida; experimentação em seres vivos; comitês de ética em pesquisa; resolução 196/96; bioética do cotidiano e interdisciplinaridade; dilemas da bioética. Além disso, a disciplina História e Fundamentos de Fisioterapia apresenta os temas: história da Fisioterapia e reabilitação; habilidades e competências da Fisioterapia; modelo de capacidade funcional; população que usa os serviços de fisioterapia; a relação terapeuta-paciente e o código de ética profissional; conceito de multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade; liderança e as-
pectos gerais da gestão em fisioterapia, dentre outros. Foi adotado como critério de inclusão estar regularmente matriculado no 7o semestre do curso de bacharelado em Fisioterapia nas duas universidades. O semestre foi escolhido para garantir que o aluno estivesse iniciando o contato direto com pacientes, no estágio supervisionado. Foram excluídos alunos matriculados no 8 o semestre ou com dependência no estágio supervisionado, pois já teriam tido contato com pacientes e vivenciado dilemas éticos durante o atendimento.
Instrumento O questionário (Quadro 1) com 12 questões de múltipla escolha está baseado no Código de Ética Profissional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional aprovado pela Resolução Coffito (Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional) n.10 de 3 de julho de 197813. A coleta de dados ocorreu no início do ano letivo. As três primeiras questões são introdutórias e as demais referem-se à prática da fisioterapia. Destas, cinco referem-se ao relacionamento do terapeuta com o paciente e quatro a seu relacionamento com colegas e com outros profissionais de saúde. Para cada questão, há três alternativas de resposta: uma correspondente à conduta bioética (que incorpora os referenciais de beneficência*, não-maleficência, justiça e respeito à autonomia do paciente e/ou de demais profissionais da saúde); uma baseada no Código de Ética, que aborda apenas o aspecto deontológico e moral do relacionamento terapeuta-paciente; e a terceira é considerada não-ética. *
Em Bioética, o termo beneficência, considerado um princípio da disciplina, é definido como a promoção do bem a si próprio, aos semelhantes ou ao meio ambiente, sem qualquer relação com o significado de seu uso comum, de filantropia. Na área da saúde, implica buscar o melhor para o paciente, tanto técnica quanto eticamente.
Alves et al.
Bioética na Fisioterapia
Quadro 1 Questionário aplicado a graduandos em Fisioterapia
[Nesta versão as alternativas para cada resposta foram ordenadas e está indicado, entre parênteses, se correspondem a padrões bioéticos, ao Código de Ética, ou se são consideradas não-éticas; também foram omitidas as menções à Terapia Ocupacional. Para a aplicação aos graduandos essas menções foram mantidas, não havia, claro, as indicações entre parênteses e a ordem das alternativas era aleatória.] 1 Na graduação você teve aulas de Ética Profissional? ( ) sim ( ) não 2 Você conhece o Código de Ética da sua profissão? ( ) sim ( ) não 3 Quantifique seu conhecimento sobre o Código de Ética: ( ) baixo ( ) médio ( ) alto As questões seguintes são precedidas dos artigos correspondentes do Código de Ética Profissional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, aprovado pela Resolução Coffito (Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional) n.10 de 3 de julho de 1978. 4 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item V - respeitar o natural pudor e a intimidade do cliente. Questão: Durante a terapia, ao realizar um determinado manuseio, de grande importância ao tratamento, o paciente relata estar intimamente desconfortável nessa posição. Você: explica a importância do mesmo, porém não mais o realiza até que o paciente dê o consentimento novamente; (Bioética) pára imediatamente e não o realiza mais, respeitando o pudor do paciente; (Código de É tica) explica a importância do mesmo e continua a realizá-lo, por considerar que esse manuseio trará benefícios para ele. (Não-ética) 5 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item VI - respeitar o direito do cliente de decidir sobre sua pessoa e seu bemestar.
Questão: Você variou a conduta rotineira com um paciente usando, numa sessão, um recurso fisioterapêutico de ótima qualidade para a patologia em questão. Na sessão seguinte, porém, ele lhe diz que não gostaria de usá-lo novamente, pois não se sentiu bem, apresentando dores durante toda a semana. Diante dessa situação, você: explica os benefícios, mas dá autonomia ao paciente para decidir por si mesmo o que ele julga melhor; (Bioética) não mais utiliza o recurso, respeitando o direito do paciente de decidir sobre seu bem-estar; (Código de É tica) explica os benefícios do recurso e combina com o paciente de empregar tal método mais uma vez, para realmente ter certeza de que o mesmo foi o causador do mal-estar. Sendo a resposta negativa, você continuará com essa nova forma de tratamento. (Não-ética) 6 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item VII - informar ao cliente quanto ao diagnóstico e prognóstico fisioterápico (…) e objetivos do tratamento, salvo quando tais informações possam causar-lhe dano.
Questão: Você considera como seu DEVER, informar seu paciente e/ou familiares quanto ao diagnóstico e prognóstico fisioterapêutico, mesmo que essas informações possam acarretar sérios danos para o paciente? sim, já que todos têm o direito de saber a verdade a respeito da sua própria vida, independente de trazer pioras significativas ao quadro; (Bioética) não, pois estando certo que isso prejudicaria muito o quadro do paciente, a omissão da informação seria benéfica; (Código de É tica) não considera um dever, pois estas informações são responsabilidades do médico. (Não-ética) 7 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item VIII - manter segredo sobre fato sigiloso de que tenha conhecimento em razão de sua atividade profissional e exigir o mesmo comportamento do pessoal sob sua direção.
Questão: O paciente lhe relata confidencialmente o que ocorreu com ele, para estar requerendo fisioterapia, e pede para esse fato não ser revelado a ninguém. Você acredita ser seu DEVER manter sigilo ABSOLUTO sobre o assunto? só seria permitido quebrar o sigilo se houvesse um imperativo categórico de consciência moral para fazê-lo, ou se as circunstâncias indicassem uma necessidade inevitável para tal; (Bioética) sim, pois a confidencialidade, sigilo e fidelidade deve ser mantida no relacionamento fisioterapeutapaciente; (Código de É tica) não, já que revelar essas informações a outras pessoas não irá alterar ou prejudicar o quadro de saúde do paciente. (Não-ética)
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Quadro 1 Questionário aplicado a graduandos em Fisioterapia (continuação)
8 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 8º, item XXII - desviar, para clínica particular, cliente que tenha atendido em razão do exercício de cargo, função ou emprego.
Questão: Seu colega de trabalho, atuante com você em uma instituição, pede demissão e convida alguns dos pacientes dele para acompanhá-lo para seu consultório particular. Do ponto de vista ético, sua opinião é: só seria adequado eticamente se ele tivesse mais recursos terapêuticos para oferecer; (Bioética) não julga adequado; (Código de É tica) julga esse procedimento adequado do ponto de vista ético. (Não-ética) 9 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 10º - O fisioterapeuta (…) reprova quem infringe postulado ético ou dispositivo legal e representa à chefia imediata e à instituição, quando for o caso; em seguida, se necessário, ao Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional.
Questão: Você presencia, de um grande companheiro de trabalho, um delito do ponto de vista ético durante o expediente. Você: conversa seriamente com seu colega, aponta seus erros e explica os princípios éticos profissionais envolvidos, para que o fato não se repita; (Bioética) informa imediatamente seu superior e/ou encarregado, já que atitudes assim podem causar danos sérios às pessoas envolvidas; (Código de É tica) não toma qualquer providência, pois conversar diretamente com ele seria intromissão na sua vida profissional e informar ao superior seria anti-ético. (Não-ética) 10 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 13º - O fisioterapeuta (…), à vista de parecer diagnóstico recebido e após buscar as informações complementares que julgar convenientes, avalia e decide quanto à necessidade de submeter o cliente à fisioterapia (…), mesmo quando o tratamento é solicitado por outro profissional.
Questão: Paciente chega ao seu consultório com encaminhamento médico, solicitando tratamento fisioterapêutico. Ao avaliar o caso, você conclui que esse paciente não necessita de fisioterapia. Você: entra em contato com o médico, explica as razões pelas quais a fisioterapia não irá funcionar e põe-se à disposição para informar o paciente; (Bioética) não atende e explica ao paciente que ele não necessita do tratamento, já que a fisioterapia não irá melhorar seu problema; (Código de É tica) atende o paciente mesmo assim, e realiza o tratamento, pois ele possui indicação médica para tal. (Nãoética) 11 Capítulo IV; Art. 24º - O fisioterapeuta e/ou terapeuta ocupacional que solicita, para cliente sob sua assistência, os serviços especializados de colega, não indica a este a conduta profissional a observar.
Questão: Você precisa encaminhar seu paciente a um colega de trabalho, já que, no seu local de atuação, falta um recurso fundamental ao tratamento do mesmo. Ao fazer isso, você: explica o caso ao fisioterapeuta e sugere uma conduta a ser seguida com o propósito de continuidade da reabilitação, associada ao recurso em questão; (Bioética) explica o caso ao fisioterapeuta e deixa que ele mesmo estabeleça a conduta que achar adequada, associada ao recurso que possui; (Código de É tica) explica o caso para o fisioterapeuta e estabelece a conduta fisioterapêutica a ser realizada, além do recurso em questão. (Não-ética) 12 Capítulo IV; Art. 25º - O fisioterapeuta (…) que recebe cliente confiado por colega, em razão de impedimento eventual deste, reencaminha o cliente ao colega uma vez cessado o impedimento.
Questão: Outro fisioterapeuta lhe encaminha seus pacientes, pois está afastado do trabalho temporariamente. Você os atende por um certo período de tempo, até que o fisioterapeuta retorna apto a trabalhar novamente. Nesta situação, você: informa os pacientes do retorno do fisioterapeuta e só mantém os que se manifestarem expressamente desejosos de ficar sob sua assistência; (Bioética) imediatamente reencaminha os pacientes ao fisioterapeuta responsável; (Código de É tica) aguarda um contato do fisioterapeuta para fazer o reencaminhamento. (Não-ética)
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Alves et al.
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Análise dos dados Na análise descritiva calcularam-se os percentuais de alternativas marcadas pelos respondentes das duas universidades. Foram atribuídas às alternativas, previamente classificadas segundo seu significado ético – bioética, ética ou não-ética – respectivamente as pontuações: três pontos, um ponto e zero. O escore máximo do questionário é 27. Foi adotado o critério de 70% do escore máximo como referente a um bom preparo, por corresponder à avaliação mínima aceita para aprovação nas disciplinas nas universidades. Foi assumida a seguinte classificação, segundo a pontuação obtida pelo respondente: preparo bom - resultado acima de 70% da pontuação (de 19 até 27 pontos); preparo razoável – resultado entre 50 e 70% da pontuação (de 14 até 18 pontos); preparo ruim – resultado inferior a 50% (13 pontos ou menos). A análise estatística dessa classificação foi feita por meio do teste KruskalWallis nos dois agrupamentos de questões: relacionamento fisioterapeutapaciente e relacionamento do fisioterapeuta com colegas e outros profissionais da saúde.
RESULTADOS Sobre o conhecimento do Código de Ética do fisioterapeuta, na Uni1 48% dos alunos afirmam conhecê-lo (e 52% não). Na Uni2, 78% dos alunos o conhecem. Ninguém quantificou seu conhecimento sobre esse documento como alto.
Relacionamento fisioterapeuta-paciente Nas respostas referentes ao relacionamento fisioterapeuta-paciente (Tabela 1), nota-se similaridade entre os alunos das duas universidades. Sobre o pudor e intimidade do paciente, a maior parte dos respondentes dos dois grupos optou pela alternativa bioética.
Tabela 1 Distribuição (%) das respostas às questões referentes ao relacionamento terapeuta-paciente pelos alunos das duas universidades
Alternativa assinalada (%) correspondente a Código de Bioética Não-ética Ética
N. da questão e conceito
Grupo
4 Pudor e intimidade do paciente
Uni1 Uni2
84 82
6 4
10 14
5 Direito de decidir sobre si mesmo e seu bem- estar
Uni1 Uni2
42 44
10 6
48 50
6 Informar o paciente sobre o diagnóstico e prognóstico fisioterapêutico
Uni1
52
38
10
Uni2
67
20
13
7 Confidencialidade das informações
Uni1 Uni2
54 54
40 44
6 2
8 Beneficência ao paciente X benefício do terapeuta
Uni1 Uni2
38 22
46 62
16 16
Uni1 = alunos da Universidade 1; Uni2 = alunos da Universidade 2 (que oferece a disciplina Bioética)
Quanto ao direito do paciente de decidir sobre seu bem-estar, cerca de metade não o respeitariam. No que se refere à transmissão de informações ao paciente sobre o diagnóstico e prognóstico fisioterapêutico, mais alunos (67%) da Uni2 (que oferece a disciplina Bioética), optaram pela alternativa bioética do que os alunos da Uni1 (52%); inversamente, quanto à beneficência ao paciente versus benefício do terapeuta, mais alunos da Uni1 optaram pela alternativa bioética, tendo a maioria dos respondentes optado pelo Código de Ética.
Relacionamento com colegas da profissão e outros profissionais da saúde Como mostra a Tabela 2, há maior concentração de respostas revelando opção pela conduta bioética, exceto no que se refere à justiça aplicada a outro fisioterapeuta, em que 70% dos alunos da Uni1 e 58% da Uni2 optaram pelo Código de Ética. É de se notar que, sobre o relacionamento do fisioterapeuta com outros profissionais da saúde, ninguém optou pela alternativa não-ética nos dois grupos.
Tabela 2 Distribuição (%) das respostas às questões referentes ao relacionamento com outros profissionais da saúde pelos alunos das duas universidades
N. da questão e conceito
Grupo
Alternativa assinalada (%) correspondente a Código de Bioética Não-ética Ética
9 Omissão de responsabilidade com colegas de profissão
Uni1 Uni2
78 98
6 2
16 0
10 Relacionamento do fisioterapeuta com outros profissionais da saúde
Uni1
78
22
2
Uni2
80
18
2
11 Imposição de conduta terapêutica a colega
Uni1 Uni2
18 32
70 58
12 10
12 Justiça aplicada a outro fisioterapeuta
Uni1 Uni2
92 90
8 10
0 0
Uni1 = alunos da Universidade 1; Uni2 = alunos da Universidade 2 (que oferece a disciplina Bioética)
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Universidade Universidade 11
Universidade Universidade 2
preparo ruim 14%
preparo razoável 32%
apropriada dos serviços, comunicação com o paciente e promoção de cuidado adequado8. A interiorização de princípios e de valores humanos são aspectos do ensino cuja relevância tem aumentado na graduação7,8.
2
preparo ruim 2%
preparo bom 54%
preparo razoável 46%
preparo bom 52%
Escores nas questões 9 a 12
Gráfico 1 Nível de preparo bioético nas duas universidades
15 10 5 0 Universidade 1
Universidade 2
Gráfico 2 Escore médio obtido pelos alunos das universidades 1 e 2 nas questões referentes ao relacionamento do fisioterapeuta com colegas e com outros profissionais da saúde (questões 9 a 12 do questionário; escore máximo = 12 pontos)
Classificação Considerando os escores obtidos pelos respectivos alunos, a classificação das duas universidades é mostrada no Gráfico 1. As pontuações total (H=0,1, p=0,71) e a referente ao relacionamento do fisioterapeuta com o paciente (H=1,9, p=0,31) são similares nas duas universidades. Já a pontuação referente ao relacionamento do fisioterapeuta com colegas e outros profissionais da saúde (Gráfico 2) é diferente entre as universidades (H=5,5, p=0,01), tendo a Uni2 apresentado maior pontuação.
DISCUSSÃO A disciplina Ética e Deontologia é obrigatória nos cursos de Fisioterapia e está inserida no currículo mínimo proposto pelo MEC5, mas a abordagem desse conteúdo difere entre as instituições6,14. Para a amostra da Uni1, a disciplina de Ética em Filosofia foi oferecida no 1 o semestre com carga horária de 40h/aula. Na Uni2, o conteúdo de ética foi ministrado também no 1o semestre do curso, na disciplina História e Fundamentos da Fisiotera-
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pia com a mesma carga horária, e na disciplina Bioética, no 5 o semestre, com 40h/aula. O conhecimento do Código de Ética e o bom caráter moral são necessários para o comportamento profissional8. Os educadores precisam valorizar a ética e os componentes do comportamento por meio da estruturação curricular adequada7,8. Na opinião dos respondentes, nenhum deles, dos dois grupos, julga conhecer bem o Código de Ética. E, segundo os escores obtidos, um número maior de não-conhecedores do Código foi encontrado na Uni1. É provável que o enfoque didático dado ao Código tenha pontos falhos, que precisam ser identificados. Sugere-se que ministrar uma disciplina que discute os dilemas éticos da profissão, a Bioética, pode permitir aos alunos estabelecer melhor relação entre os problemas enfrentados e o que é estabelecido pelo Código.
A Bioética no relacionamento terapeuta-paciente A maioria dos dilemas enfrentados na prática refere-se à interação do paciente com o profissional: utilização
Autonomia: O relacionamento de cuidado com o paciente requer uma atitude de sensibilidade7. O graduando que percebe o desconforto do paciente respeita seus sentimentos e sua autonomia. Nas duas universidades, a maioria dos estudantes optou pela resposta bioética, o que sugere a incorporação de valores para situações específicas (Tabela 1, questão 4). O paciente tem o direito de decidir sobre seu bem-estar e o fisioterapeuta precisa ser sensível aos sentimentos do paciente, respeitá-lo e não impor sua vontade ou ser paternalista. Na atitude paternalista, o fisioterapeuta pode exercer autoridade demasiada com os pacientes, gerando um desequilíbrio que pode impedir um bom relacionamento, devendo pois ser evitado7. Em outra situação (Tab.1, q.5), apenas metade em cada grupo indica saber que, apesar da intenção de promover o bem-estar, é preciso antes respeitar a autonomia do paciente. A conduta fora do contexto ético pode ser justificada pelo fato de a alusão ao benefício ao paciente estar explícita na resposta. Embora a motivação mais comum dos fisioterapeutas seja o desejo de ajudar e cuidar das pessoas14, os alunos que optaram pela alternativa não-ética mostram não estarem preparados para ouvir o paciente e respeitar sua vontade. O fisioterapeuta precisa ser receptivo ao que o paciente requer em termos de reabilitação, para ser o sujeito do processo e não mais o objeto7. Veracidade e confidencialidade: A veracidade e a confiança são importantes no relacionamento terapeutapaciente. De acordo com o Código de Ética, a veracidade só não é primordial quando as informações podem causar danos. A maioria dos dois grupos (Tab.1, q.6) acredita que a veracidade sempre é a base da confiança no relacionamento e, agindo assim, serão justos com o paciente. A complexidade da decisão ética apresentase quando há dois pontos relevantes e ações opostas: a veracidade e a com-
Alves et al.
paixão, a honra da confidencialidade e a revelação de informação que envolve riscos15. A confiança e a confidencialidade estão presentes quando uma pessoa revela uma informação à outra, que promete não a divulgar a um terceiro sem permissão16. O terapeuta pode aceitar a quebra de sigilo quando houver um imperativo categórico de consciência moral para fazê-lo, ou quando as circunstâncias forem inevitáveis. Os resultados mostram que mais da metade dos dois grupos adotam a alternativa bioética (Tab.1, q.7), assumindo postura reflexiva diante do fato. Manter a confidencialidade 17 para os fisioterapeutas é um problema complexo, pois o ambiente e o sistema de trabalho, em hospitais ou ambulatórios, não favorecem o sigilo das informações, tampouco o Código oferece auxílio nesse tópico. Beneficência ao paciente x benefício do terapeuta: o Código de Ética postula que desviar paciente de uma Instituição em benefício próprio não é adequado nem permitido. Embora 46% dos alunos da Uni1 e 62% da Uni2 sigam o instrumento (Tab.1, q.8), 16% nos dois grupos optaram pela conduta não-ética, visando o benefício do fisioterapeuta, revelando estar na fase imatura de tomadas de decisões éticas. No desenvolvimento ético e moral, os indivíduos agem na fase inicial priorizando a autoridade ou si próprios; em estágios mais avançados, interiorizam os princípios universais, o que muda a perspectiva de benefício próprio8.
A Bioética no relacionamento interprofissional Relacionamento do fisioterapeuta com colegas da profissão: Orientar e explicar as regras deontológicas que regem a profissão ao colega que errou para que o fato não se repita é uma atitude de compaixão e respeito. Mais de 75% dos alunos de ambas as universidades concordam com isso (Tab.2, q.9). A falta de responsabilidade do fisioterapeuta diante de uma conduta antiética é vista em 16% dos graduandos na Uni1, que preferem o não-envolvimento em uma situação
Bioética na Fisioterapia
que não lhes diz respeito. Tais alunos podem carecer de coragem moral, por meio da qual o profissional é capaz de agir com motivação e segurança dentro dos valores humanos para a promoção do bem-estar de todos os envolvidos15. Na Uni2, ninguém optou pela conduta não-ética.
vel, e bem menos com preparo ruim na Uni2 (Gráfico 1). Como os alunos da Uni2 têm a disciplina Bioética, sugere-se que o estudo da disciplina funcione como um aprimoramento para enfrentar dilemas éticos mais complexos, que o Código de Ética não aborda.
Respeitar a autonomia do colega de trabalho para traçar conduta de tratamento mediante encaminhamento de pacientes é defendido pelo Código13. Mas a sugestão de linhas de tratamento é benéfica ao paciente para continuar a evolução clínica. Nessa questão (Tab.2, q.11), mais de 3/4 dos alunos de ambas as universidades adotariam essa conduta. A justiça com outro profissional deve ser aplicada em todas as situações, como se vê pelas respostas da grande maioria dos dois grupos à última questão (Tab.2, q.12), diante do dilema apresentado.
Por outro lado, de forma geral os escores das duas universidades foram semelhantes. Ambas oferecem preparo ético aos graduandos de forma similar, independente da diferença curricular. As noções de Bioética oferecidas no conteúdo programático da disciplina Ética em Filosofia da Uni1 foram capazes de promover um preparo básico semelhante ao da Uni2.
Relacionamento do fisioterapeuta com outros profissionais da saúde: O fisioterapeuta é autônomo para avaliar e decidir a prescrição terapêutica, mesmo que o serviço seja feito por outro profissional. A autonomia do fisioterapeuta eleva o status da profissão18. A maciça maioria dos alunos de ambas as universidades escolhem a conduta bioética (Tab.2, q.10), fator importante para o crescimento e reconhecimento da profissão; e ninguém optou pela alternativa não-ética, o que mostra que os graduandos agiriam com veracidade e justiça, sem tirar proveito ou benefício próprio diante da situação. Como a maior parte das respostas optam pela conduta bioética, podese ponderar que o Código não parece ser suficiente para guiar os fisioterapeutas na complexidade dos dilemas sugeridos, mas que os graduandos incorporam valores fundamentais ao relacionamento com os colegas de profissão e de outras áreas da saúde.
Diferenças entre universidades Percebe-se uma diferença importante entre as universidades quanto ao preparo dos alunos em Bioética. Embora a porcentagem de bem preparados seja semelhante, encontraram-se bem mais alunos com preparo razoá-
Entretanto, vale lembrar que, além dos valores adquiridos ao longo do curso, os alunos guardam suas características inviduais no que se refere a princípios éticos, valores humanos, caráter moral e índole. E, ainda, outros fatores, além do próprio paciente, são considerados polêmicos na prática clínica, tais como a equipe de profissionais da saúde, a família e a sociedade19 . Sobre o relacionamento do fisioterapeuta com colegas de profissão ou outros profissionais da saúde, foi evidenciado que na Uni2 os escores foram mais altos nesse grupo de questões, sugerindo que esses graduandos têm um preparo melhor para o relacionamento interprofissional. Na grade curricular dessa instituição, nas disciplinas Bioética e História e Fundamentos da Fisioterapia, há um enfoque importante sobre o relacionamento interprofissional, abordando-se conceitos como interdisciplinaridade20, que oferece base para ação em equipe, respeitosa e solidária. Na Uni1, não constam esses temas no conteúdo programático disciplinar, o que justificaria o melhor preparo dos graduandos da Uni2. Não houve diferença entre os grupos quanto ao relacionamento do fisioterapeuta com o paciente. Apesar das diferenças de formação, os resultados sugerem que outros mecanismos, formais ou não-formais, contribuem para a formação bioética do aluno. A se-
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melhança no relacionamento com o paciente também pode refletir a inerente preocupação com este e sua saúde.
CONCLUSÃO Cerca de metade dos alunos das duas universidades têm um bom pre-
paro bioético para o exercício de sua profissão. Como mais alunos da universidade 2, que oferece a disciplina Bioética, revelaram um preparo razoável, sugere-se que essa disciplina oferece melhores condições para desenvolver os valores e virtudes requeridas na profissão, além de estabelecer bases mais adequadas para o relacionamento
interprofissional, fator importante para a elevação do status da Fisioterapia. No entanto, em uma parcela de graduandos de Fisioterapia, persiste carência de conhecimento do Código de Ética, bem como dificuldade para a tomada de decisões frente aos dilemas éticos da prática clínica.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.157-63, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Atividade eletromiográfica do vasto medial oblíquo em portadoras da síndrome da dor patelofemoral Electromyographyc activity of the vastus medialis oblique muscle in female patients with patellofemoral syndrome Sâmia Najara Freitas Bessa1, Elielton Pedroza dos Santos1, Renata Augusta Gomes Silveira2, Paulo Henrique Barros Maia2, Jamilson Simões Brasileiro3 Estudo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia da UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil 1
Fisioterapeutas
2
Graduandos em Fisioterapia na UFRN
3
Prof. Dr. do Curso de PósGraduação em Fisioterapia da UFRN
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Sâmia N. F. Bessa R. Joca Soares 1858 Parque das Colinas 59066-070 Natal RN e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO dez. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
RESUMO: A síndrome da dor patelofemoral (SDPF) é uma das afecções que mais acometem a articulação do joelho. Embora sua etiologia não seja completamente conhecida, uma disfunção do músculo vasto medial oblíquo (VMO) tem sido apontada como possível fator desencadeante. Este estudo visou avaliar, por meio de eletromiografia, se algum exercício, dentre dez exercícios resistidos usuais, produz ativação seletiva do VMO, com vistas a sua utilização clínica. Vinte voluntárias do sexo feminino, sendo dez com SDPF (24,7±4,35 anos) e dez saudáveis, controle (22,5±1,58 anos), foram submetidas à avaliação eletromiográfica dos músculos VMO, vasto lateral longo e vasto lateral oblíquo (VLO) durante a realização de 10 exercícios, incluindo cadeia cinética aberta e fechada, em diferentes angulações do joelho e posições do quadril. Os resultados mostram que nenhum dos exercícios se revelou seletivo para o VMO, tendo alguns mostrado ativação seletiva do VLO. No grupo com SDPF observou-se menor atividade eletromiográfica de todos os vastos em oito dos dez exercícios propostos, quando comparado ao controle; observou-se ainda, no grupo SDPF, menor relação VMO/VLO (0,63) do que no grupo controle (0,82, p<0,05). Embora, dentre os propostos, nenhum exercício tenha se mostrado eficaz para promover a ativação seletiva do VMO, os exercícios de agachamento unipodal com rotação medial e lateral da tíbia mostraram-se mais indicados para sujeitos com SDPF. DESCRITORES: Eletromiografia; Exercício; Músculo quadríceps; Síndrome da dor patelofemural ABSTRACT: The patellofemoral pain syndrome (PFPS) is among the most common knee pathologies. Although its etiology is not fully known, a dysfunction of the vastus medialis oblique (VMO) muscle has been pointed out as a possible cause. This study aimed at assessing, by means of electromyography, whether one or more, among ten usual resisted exercises, might produce VMO selective activation, in view of its clinic application. Twenty female volunteers, ten with PFPS (aged 24.7±4.35) and ten healthy ones (aged 22.5±1.58) were submitted to electromyographic evaluation of VMO, vastus lateralis longus and vastus lateralis oblique (VLO) muscles during ten exercises, including open and closed kinetic chain, at different degrees of knee flexion and of hip positions. None of the exercises showed to be selective for VMO activation, but some showed selective activation of the VLO. In the PFPS group all vastii showed lesser electromyographic activity than control group, in eight of the ten exercises; the VMO/VLO ratio was also lower (0.63) in PFPS group than in control (0.82, p<0.05). Although none of the proposed exercises showed efficient to promote VMO selective activation, squatting on one foot, with medial and lateral tibia rotation, seemed appropriate for treating PFPS. K EY WORDS : Electromyography; Exercise; Quadriceps muscle; Patellofemoral pain syndrome
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INTRODUÇÃO A síndrome da dor patelofemoral (SDPF) é umas das desordens mais comuns no joelho, sendo geralmente manifestada por dor localizada na região anterior e/ou retropatelar1. Essa patologia, comum em adolescentes e atletas de ambos os sexos 2,3, é mais freqüente no sexo feminino: representa 33% das patologias de joelho entre mulheres e 17% dessas patologias no sexo masculino4. A dor pode ser desencadeada por alguma atividade da vida diária, como ajoelhar-se ou sentar-se por tempo prolongado, subir e descer escadas e agachar-se. Em todos esses casos ocorre uma força compressiva na articulação patelofemoral, responsável pela sensação dolorosa5. Apesar de bastante comum, a SDPF ainda tem etiologia desconhecida, embora alguns autores relatem alterações biomecânicas dos membros inferiores como principal causa. Dentre essas alterações destacam-se as relacionadas ao equilíbrio estático, como pronação subtalar excessiva, aumento do ângulo Q, torção tibial externa, retração do retináculo lateral e comportamento patelar inadequado6. Alguns autores apontam ainda a relação da rotação do quadril na atividade do vasto medial oblíquo (VMO) e vasto lateral (VL)5,7. Umas das características mais comuns da SDPF é a insuficiência ou desequilíbrio entre os estabilizadores dinâmicos mediais e laterais da patela, causando um deslizamento e mau alinhamento patelar8,9. Sabe-se que o vasto medial (VM) é dividido em duas porções, o vasto medial longo (VML) e o vasto medial oblíquo (VMO), sendo este inserido no bordo súpero-medial da patela, atuando assim na medialização desta10. O vasto lateral (VL), por sua vez, também é apresentado em alguns estudos com duas divisões: o vasto lateral longo (VLL) e o obliquo (VLO)5,6. As fibras do VLO têm sua inserção inferior e lateral ao tendão do VLL, unindo-se com este na borda súpero-lateral da patela 11. A atividade eletromiográfica dos músculos VMO e VLL tem sido bastante estudada em cadeia aberta nos
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diferentes ângulos de flexão de joelho e posicionamento da perna2,8,12-15. No entanto, poucos autores11,16 estudaram a atividade eletromiográfica dos músculos VMO e VLO em indivíduos normais, encontrando diferenças na ativação dessas porções. Na tentativa de restabelecer o equilíbrio da estabilização patelar, diversos estudos vêm sendo desenvolvidos para encontrar um exercício capaz de promover ativação seletiva do VMO e, assim, poder ser utilizado no tratamento clínico da SDPF5,7,17,18,20. Porém tais estudos mostram divergência nos resultados: alguns relatam não haver seletividade do VMO durante a realização de exercícios resistidos, como os estudos de Serrão et al.5 e GramaniSay et al.(2006) 19 – que avaliaram a ativação desses músculos durante exercícios resistidos com diferentes posicionamentos de rotação do quadril; e outros, como o estudo de Coqueiro et al.18, não encontraram ativação seletiva do VMO nos exercícios de semiagachamento com e sem adução do quadril, ocorrendo, no entanto, maior equilíbrio entre a ativação do VM e do VL no agachamento associado com adução do quadril. Pesquisas envolvendo sujeitos com e sem SDPF avaliando a atividade eletromiográfica do VMO e VLO poderiam apresentar resultados mais precisos quanto ao tratamento dessa patologia, uma vez que esses músculos são apontados em alguns estudos como antagonistas na estabilização patelar11. Levando em consideração a falta de consenso na literatura sobre a ação dos exercícios resistidos no recrutamento seletivo do VMO, o presente estudo visou avaliar, por meio de eletromiografia, se algum exercício, dentre dez exercícios comumente usados na prática clínica, era capaz de produzir em indivíduos com SDPF uma ativação seletiva do VMO.
METODOLOGIA O estudo foi um ensaio clínico randomizado controlado cego, realizado entre os meses de dezembro de 2006 e abril de 2007, no Hospital Universitário da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte).
Optou-se por estudar voluntárias do sexo feminino devido às grandes diferenças biomecânicas entre os sexos9 e a maior incidência dessa patologia entre mulheres8. Foram selecionadas dez mulheres saudáveis entre as estudantes do curso de Fisioterapia para o grupo controle e dez pacientes de um hospital e clínicas locais para o grupo experimental. As voluntárias do grupo controle não podiam referir história de dor na articulação do joelho, nenhuma história de doença, cirurgia, trauma ou lesão do sistema osteomioarticular do membro inferior 21 . Cada voluntária foi submetida à avaliação física para se descartar a presença de dor e outras patologias na articulação do joelho, sendo o membro inferior dominante avaliado nesse grupo. Os critérios de inclusão no grupo experimental foram diagnóstico médico de SDPF, sem lesões associadas de joelho; e relatar dor em pelo menos duas das seguintes atividades: subir e descer escadas, agachar, ajoelhar-se, permanecer sentada por tempo prolongado, pular e correr. A dor deveria ser de início insidiosa, não-traumática e referida, na articulação femoropatelar na última semana, como pelo menos 2 cm em escala visual analógica. Caso apresentassem dor no joelho bilateralmente, o joelho com maior dor referida subjetivamente foi avaliado. Não foram incluídas voluntárias com história de cirurgia no membro inferior, subluxação ou deslocamento patelar, evidência clínica de lesão meniscal, patelar e/ou ligamentar, ou que haviam realizado tratamento fisioterápico prévio no último semestre. As 20 voluntárias formaram assim dois grupos: o grupo controle com 10 mulheres saudáveis (média de idade 22,5±1,58 anos; peso médio 52,1±7,18 Kg e altura média 1,61±0,06 m); e o experimental, com 10 mulheres com SDFP (média de idade 24,7±4,35 anos; peso médio 61,6±12,27 Kg e altura média 1,66±0,06 m). A análise estatística utilizando o teste t de Student não revelou diferenças antropométricas entre os grupos. Todas as voluntárias foram previamente informadas sobre os objetivos da pesquisa e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido; o
Bessa et al.
Atividade do VMO na síndrome da dor patelofemoral
estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes, da UFRN.
Instrumentos Foi utilizado um módulo condicionador de sinais de 4 canais (EMG System do Brasil Ltda.) interfaceado com um microcomputador, que recebeu o sinal eletromiográfico e o armazenou em arquivo, além do software AqDados® (v. 5.0) para análise digital de sinais. Foram utilizados, para a captação da atividade elétrica dos músculos, eletrodos ativos de superfície diferencial simples (EMG System do Brasil Ltda.), compostos por duas barras paralelas retangulares de Ag/AgCl, e um eletrodo de referência tipo garra. O ganho foi de 1000 vezes, sendo 20 no eletrodo ativo e 50 no conversor A/D. A taxa de aquisição do sinal foi de 1000 Hz, sendo passado um filtro entre 20-500 Hz. Um goniômetro universal foi utilizado para monitorar a amplitude da articulação do joelho em todos os exercícios propostos no estudo. Um dinamômetro isocinético (Medisa ®, Espanha) foi utilizado na realização dos exercícios de cadeia cinética aberta (CCA).
Procedimentos Todas as voluntárias foram submetidas a uma avaliação clínica prévia, considerando os critérios de inclusão. O estudo consistiu em propor à voluntária um exercício uma vez, solicitarlhe que mantivesse a posição em contração voluntária máxima durante 5 segundos e medir a atividade eletromiográfica dos músculos VMO, VLO e VLL nessa posição. Antes da realização dos exercícios as voluntárias foram submetidas a aquecimento em bicicleta estacionária por cinco minutos, com selim posicionado na altura do trocânter maior do fêmur e sem resistência; em seguida foi realizado alongamento passivo do quadríceps femoral, isquiotibiais, tríceps sural e adutores (duas séries de alongamentos sustentados por 30 segundos, com intervalo entre as séries de um minuto).
Antes da avaliação eletromiográfica as voluntárias foram submetidas à preparação da pele com tricotomização e limpeza da área com álcool a 70%. Os eletrodos foram untados com gel condutor e fixados sobre os pontos motores do VMO, VLO e VLL com fita adesiva e reforçados com tiras de velcro, para evitar seu deslocamento durante a realização dos procedimentos. Os eletrodos para o VMO e para o VLL foram posicionados segundo os critérios do Seniam *22. O posicionamento dos eletrodos no VLO foi o mesmo utilizado por Bevilaqua-Grossi et al.11, a 2,2 cm do epicôndilo lateral do fêmur entre o início e meio do ventre muscular do VLO, com uma inclinação de 50º. O eletrodo de referência, também untado com gel condutor, foi posicionado sobre o maléolo medial do membro contralateral. As voluntárias realizaram cada exercício uma única vez, para evitar os efeitos de fadiga e/ou aprendizagem motora, sendo a posição mantida por cinco segundos, com um intervalo de um minuto entre os exercícios. Foram desprezados o primeiro e o último segundo de coleta visando melhor análise do sinal com a respectiva atividade elétrica. Os exercícios propostos foram: 1 Extensão isométrica voluntária máxima com o joelho a 60º, tíbia em rotação neutra; 2 Extensão isocinética de joelho dos últimos 30º em CCA, com tíbia em rotação neutra; 3 Extensão isocinética de joelho dos últimos 30º em CCA, com rotação medial de tíbia; 4 Extensão isocinética de joelho dos últimos 30º em CCA, com rotação lateral de tíbia; 5 Extensão isocinética de joelho dos últimos 60º em CCA, com tíbia em rotação neutra;
* Seniam, ou Surface electromyography for the non-invasive assessment of muscles (Eletromiografia de superfície para avaliação não-invasiva de músculos), é um projeto da União Européia para padronização da metodologia de utilização de eletromiografia.
6 Extensão isocinética de joelho dos últimos 90º em CCA com tíbia em rotação neutra; 7 Agachamento unipodal (sobre o membro a ser testado) apoiado na bola-suíça até 45º de flexão do joelho, com tíbia em rotação neutra; 8 Agachamento unipodal (sobre o membro a ser testado) apoiado na bola-suíça até 45º de flexão do joelho, com rotação medial de tíbia; 9 Agachamento unipodal (sobre o membro a ser testado) apoiado na bola-suíça até 45º de flexão do joelho, com rotação lateral de tíbia; 10 Agachamento com bola-suíça sustentado até 45º de flexão do joelho, posição neutra, com adução isométrica contra resistência de uma bola. O sinal eletromiográfico foi normalizado em cadeia cinética aberta pela contração voluntária máxima (CVM), com o joelho da participante posicionado a 60º de flexão (considerandose zero a extensão completa), já que esse ângulo tem demonstrado gerar o maior torque isométrico do joelho23. Após ampla revisão da literatura, os exercícios foram selecionados e confrontados com a prática clínica, sendo avaliados como os mais usados para se obter uma ativação seletiva do VMO em sujeitos com SDFP. A ordem destes foi aleatória para cada voluntária, com o intuito de não gerar fadiga nem aprendizado motor, sendo os exercícios em CCA realizados no dinamômetro isocinético (a 30º/s); as voluntárias foram estabilizadas na cadeira por meio de cintos de velcro nas regiões torácica e pélvica. Os exercícios de agachamento foram realizados com auxílio da bola-suíça, visando aumentar a instabilidade e facilitar o deslizamento do sujeito até a angulação desejada, o que aumenta o nível de atividade muscular nos membros inferiores. Todas as voluntárias foram instruídas sobre a forma de realizar cada exercício e receberam um comando para iniciar a contração logo após o
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Grupo com SDPF *
100 100
VMO VLL VLO
*
80 80
Percentual da CVM Percentual da CVM
Análise estatística
60 60
40
20
0 Ex 1
Ex 2
Ex 3
Ex 4
Ex 5
Ex 6
Ex 7
Ex 8
Ex 9
Ex10
Gráfico 1 Atividade eletromiográfica dos músculos VMO, VLL e VLO no grupo controle durante os exercícios propostos (*p<0,05). CVM = Contração voluntária máxima; Ex = Exercício; Ex 1= Extensão isométrica máxima com joelho a 60º; Exs 2,3 e 4 = Extensão isocinética de joelho dos últimos 30º, com tíbia em rotação neutra, medial e lateral; Exs 5 e 6 = Extensão isocinética de joelho dos últimos 60º e 90º, tíbia neutra; Exs 7, 8 e 9 = Agachamento unipodal com tíbia em rotação neutra, medial e lateral; Ex 10 = Agachamento com adução isométrica. VMO VLL VLO
Grupo controle
140 140 *
**
120 120
Para a análise estatística foi utilizado o software SPSS® 14.0. A normalização dos dados foi verificada pelos procedimentos da estatística descritiva utilizando-se o teste de ShapiroWilks. A relação VMO/VLO expressa a média entre os valores obtidos em todos os exercícios avaliados; foi calculada para cada grupo. A análise foi realizada por testes paramétricos. A diferença entre os vastos foi calculada utilizando-se uma ANOVA com o valor de RMS normalizado, seguido pelo teste de Tukey, quando indicado. Em todas as análises foi adotado o nível de significância p=0,05.
RESULTADOS O estudo mostrou que a atividade eletromiográfica dos músculos VMO e VLO é menor no grupo com SDPF em oito dos dez exercícios avaliados (Gráfico 1), quando comparada à do grupo controle (Gráfico 2). Observando-se os gráficos, percebe-se que não foi encontrado, em qualquer dos exercícios avaliados, um que proporcionasse recrutamento seletivo para o VMO. Houve porém ativação seletiva do VLO nos exercícios 2 (p=0,02) e 10 (p=0,004) no grupo controle e nos exercícios 3 (p=0,05) e 4 (p=0,03) entre as voluntárias com SDPF.
Percentual da CVM Percentual da CVM
100 80 60 40 20 0 Ex 1
Ex 2
Ex 3
Ex 4
Ex 5
Ex 6
Ex 7
Ex 8
Ex 9
Ex 10
Gráfico 2 Atividade eletromiográfica dos músculos VMO, VLL e VLO no grupo com SDPF durante os exercícios propostos (*p<0,05; **p<0,01). SDPF = Síndrome da dor patelofemoral; CVM = Contração voluntária máxima; Ex = Exercício; Ex 1= Extensão isométrica máxima com joelho a 60º; Exs 2,3 e 4 = Extensão isocinética de joelho dos últimos 30º, com tíbia em rotação neutra, medial e lateral; Exs 5 e 6 = Extensão isocinética de joelho dos últimos 60º e 90º, tíbia neutra; Exs 7, 8 e 9 = Agachamento unipodal com tíbia em rotação neutra, medial e lateral; Ex 10 = Agachamento com adução isométrica.
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eletromiógrafo ser acionado. Durante todo o experimento foi oferecido comando verbal solicitando contração voluntária máxima.
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Constatou-se ainda que há maior ativação do VLO em relação ao VMO entre sujeitos saudáveis e com SDPF: a razão VMO/VLO no grupo controle foi de 0,82±0,12 e, no grupo SDPF, 0,63±0,10 (p=0,002, Gráfico 3). A relação VMO/VLL encontra-se próxima de um, sendo de 1,10±0,2 para os sujeitos saudáveis e de 1,01±0,17 para os portadores de SDPF, não se encontrando resultado estatisticamente significativo para a ativação seletiva desses músculos.
Bessa et al.
Atividade do VMO na síndrome da dor patelofemoral
1 0,9 0,9 **
Relação VMO/VLO
Relação VMO/VLO
0,8 0,8 0,7 0,7 0,6 0,6 0,5 0,5 0,4 0,4 0,3 0,3 0,2 0,2 0,1 0,1 00 Controle
Com SDPF
Gráfico 3 Relação VMO/VLO (média entre os valores obtidos em todos os exercícios) no grupo controle e no grupo com síndrome da dor patelofemoral (SDPF) (**p<0,01)
DISCUSSÃO Segundo Sperandei 24 , a ativação seletiva do VMO é entendida como uma maior solicitação desse músculo em relação ao vasto lateral durante a execução de um dado exercício. Neste estudo, não foi encontrado exercício algum, dentre os propostos, que proporcionasse ativação seletiva do VMO. Esse achado coincide com o de Ribeiro et al.25 que, ao utilizarem exercícios resistidos de extensão de joelho em diferentes velocidades, não encontraram maior ativação do VMO em caso algum. No presente estudo foi observada, em alguns exercícios, ativação seletiva do VLO (no grupo controle os exercícios 2 e 10 e, no experimental, os exercícios 3 e 4). Com relação à maior ativação do VLO no exercício 10, há uma discordância com os achados de Coqueiro et al.18, que também avaliaram mulheres com a síndrome e encontraram maior ativação do VMO e VLL durante realização do mesmo exercício, comparado ao agachamento sem adução. É provável que essa diferença se deva ao posicionamento dos eletrodos no VMO e VLL ou, ainda, pelo fato de o referido estudo não ter avaliado a atividade eletromiográfica do VLO. No presente estudo em portadoras da síndrome, o achado de exercícios que priorizaram o recrutamento do VLO – 3 e 4, de extensão do joelho
com rotação medial e lateral da tíbia – coincidem com os de Mirzabeigi et al.17 e de Bevilaqua-Grossi et al.11, segundo os quais os últimos graus de extensão não promovem a ativação seletiva do VMO, o que contribui para um mau alinhamento patelar – o que, no presente estudo, foi acentuado pela maior ativação do VLO. Assim, reforça-se a idéia de que os exercícios de extensão do joelho nos últimos graus, por promoverem maior ativação do VLO, não devam ser utilizados no tratamento de pacientes com SDFP. Observaram-se ainda valores mais baixos da relação VMO/VLO no grupo experimental, o que é reforçado por outros estudos segundo os quais o desequilíbrio muscular entre os estabilizadores dinâmicos da patela poderiam predispor à SDPF26-30. Nos exercícios 8 e 9 – de agachamento com rotação medial e lateral da tíbia –, a relação VMO/ VLO nas voluntárias com SDPF foi próxima àquela encontrada nas saudáveis, mostrando esses exercícios com melhor relação VMO/VLO (levando-se em consideração a média de 0,81 como normal) serem os mais indicados para o tratamento de pacientes com SDFP. A diferença entre os valores encontrados para os dois grupos sugere que não há validade em aplicar conhecimentos retirados de pesquisas com sujeitos saudáveis em portadores da SDPF. Isso ocorre devido à diferença de comportamento de ativação muscular: um exercício que pareceria ser
benéfico quando estudado em pessoas saudáveis, na verdade iria aumentar o desequilíbrio muscular na presença de uma patologia. Bevilaqua-Grossi et al.11, ao avaliar sujeitos saudáveis, encontraram uma maior ativação do VMO e VLO quando comparados ao VLL durante exercício resistido, dado este que apóia o presente estudo, onde foi encontrada a mesma relação nos sujeitos saudáveis. Porém, em portadores da SDPF, a ativação do VMO é próxima à do VLL; e a do VLO encontra-se estatisticamente mais elevada. Isso reforça a idéia do VLO como estabilizador lateral da patela, em virtude de sua maior atividade quando comparado às demais porções dos vastos em pessoas com SDPF, sendo responsável pelo o mau alinhamento patelar. O presente estudo também sugere que, mesmo em sujeitos assintomáticos, a relação VMO/VLO é menor que um (0,82), apresentando-se uma relação ainda menor (0,69) nos portadores da SDPF. Sugerimos que novos estudos sejam realizados, com uma amostra maior, para verificar o valor da relação VMO/VLO em diversas atividades, de modo a se poder estabelecer a real relação entre esses músculos na dinâmica normal de estabilização patelar.
CONCLUSÃO O presente estudo mostrou não haver exercício seletivo para o VMO dentre os avaliados. No entanto, enfatizou a ação do VLO como antagonista do VMO na estabilização da patela, sendo este um importante fator no surgimento da SDPF. Assim, para o tratamento da SDPF o que se deve procurar não é o exercício em que o VMO apresente maior amplitude de ativação e sim aquele que ofereça uma razão VMO/VLO mais próxima de um, com conseqüente maior estabilidade ativa da patela. Dessa forma, dentre os exercícios propostos, os de agachamento unipodal com rotação medial e lateral da tíbia foram os que mais se aproximaram dessa relação, sugerindo que sejam os mais recomendados para o tratamento da SDPF.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.164-71, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Validação da versão para a língua portuguesa do questionário de Medida Funcional para Amputados (Functional Measure for Amputees Questionnaire) Brazilian-Portuguese validation of the Functional Measure for Amputees Questionnaire Eneida Ritsuko Ono Kageyama1, Mariana Yogi2, Celisa Tiemi Nakagawa Sera3, Leda Shizuka Yogi1, André Pedrinelli4, Olavo Pires de Camargo5 Estudo desenvolvido no Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da FMUSP – Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil 1
Fisioterapeutas Ms. do Instituto de Ortopedia e Traumatologia da FMUSP
2
Graduanda na Faculdade de Medicina do ABC, Santo André, SP, Brasil
3
Profa. Dra. do Depto. de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da FMUSP
4
Prof. Dr. do Instituto de Ortopedia e Traumatologia da FMUSP
5
Prof. Titular do Instituto de Ortopedia e Traumatologia da FMUSP
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Eneida R. O. Kageyama R Ovídio Pires de Campos, 333 Cerqueira César 05403-010 São Paulo SP e-mail:
[email protected];
[email protected] Esta é uma versão abreviada da dissertação da autora 1, apresentada à FMUSP para obtenção do título de Mestre em Ciências, sob orientação do autor 5.
APRESENTAÇÃO fev. 2008
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO maio 2008
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RESUMO: O objetivo deste estudo foi traduzir e adaptar culturalmente o Functional Measure for Amputees Questionnaire (FMA) para a população brasileira e analisar sua validade e eficácia quando aplicado em pacientes amputados de membro inferior. O procedimento seguiu as etapas de tradução, retro-tradução, análise das versões português e inglês por um comitê multidisciplinar, e préteste. O questionário traduzido foi aplicado em 44 pacientes (39 homens e 5 mulheres) com amputação em nível transtibial (N=27) e transfemoral (N=17), com idade média de 47,5±17,2 anos. No estudo da confiabilidade, em média, os coeficientes Kappa foram superiores a 0,80; e 25% deles foram iguais a 1,0, indicando haver excelente concordância inter e intra-entrevistadores. Na análise da consistência interna, o valor do coeficiente para a questão sobre o Índice de Capacidade Locomotora foi igual a 0,79, demonstrando haver consistência no bloco de questões relacionadas à mobilidade. A adaptação transcultural foi satisfatória; algumas modificações foram necessárias, porém sem implicar mudança na estrutura ou no conteúdo do questionário original. Os resultados sugerem que a versão brasileira do FMA, MFA – questionário de Medida Funcional para Amputados pode ser um instrumento confiável para medir o resultado funcional de pacientes brasileiros reabilitados após amputação de membro inferior. DESCRITORES: Amputação/reabilitação; Estudos de validação; Questionários ABSTRACT: The aim of this study was to translate into Brazilian-Portuguese and culturally adapt the Functional Measure for Amputees Questionnaire (FMA), also testing its reliability and validity for assessing lower-limb amputees functional capacity. The FMA was translated, back-translated, evaluated by a multidisciplinary committee, and pre-tested. The final version was submitted to field test on a group made up of 44 subjects (39 men and 5 women) with transtibial (N= 27) and transfemoral (N=17) amputation level. The inter- and intra-examiner test showed high reliability; Kappa mean values were higher than 0.80; and in 25% of the items values reached 1.0, thus suggesting excellent examiner agreement. Question 2 (which determines the Locomotor Capabilities Index) internal consistency value found was 0.79, showing consistency as to mobility assessment. The FMA cultural adaptation was satisfactory; a few changes were needed, without altering the original structure or content. Results suggest that the FMA Brazilian-Portuguese version is a reliable instrument to measure functional outcomes of Brazilian lower limb amputees having undergone rehabilitation. KEY WORDS: Amputation/rehabilitation; Questionnaires; Validation studies
Kageyama et al.
Validação de questionário para amputados
INTRODUÇÃO
nas parcialmente comparáveis uns com os outros.
A perda da capacidade de realizar a marcha normal é a principal limitação do indivíduo com amputação de membro inferior, dificultando a realização das atividades funcionais necessárias à independência pessoal. A reabilitação visa evitar que a condição física se deteriore e que o indivíduo com amputação possa ser reintegrado à sociedade. Isso envolve a melhora da mobilidade, capacitação para o uso da prótese e realização das atividades de vida diária e prática, restabelecendo todo o seu potencial funcional. A avaliação funcional é de grande importância para mensurar o resultado do processo de reabilitação e dos programas de tratamentos propostos. Ao avaliar a população de pacientes com amputação, é importante considerar todos os aspectos: idade, sexo, biótipo, nível da amputação, causa, existência de doença associada, condição socioeconômica e cultural e, também, as expectativas do sujeito. Em geral, os protocolos de avaliação usados levam em consideração apenas a força muscular e a amplitude de movimento dos segmentos envolvidos, bem como o padrão de marcha após a protetização. Pouco se sabe se os pacientes, após a alta, continuam a usar a prótese; tampouco se tem informação acerca do impacto dos diferentes programas de tratamento sobre a recuperação da função ou dos fatores que podem predizer o uso ou não da prótese.
O objetivo deste estudo foi desenvolver uma versão transcultural do Functional Measure for Amputees Questionnaire para a língua portuguesa e analisar sua confiabilidade quando aplicado, após a reabilitação, em pacientes amputados de membro inferior.
Não existe um padrão ouro de avaliação funcional para pacientes com amputação de membro inferior e, no Brasil, não há qualquer instrumento desenvolvido ou traduzido. Muitos autores buscam definir um método ideal utilizando escalas ou questionários para outras doenças e os adaptam a seus estudos; outros desenvolvem instrumentos e avaliam suas propriedades psicométricas, como o Functional Independence Measure (FIM), Reintegration Normal Living (RNL), Prosthetic Profile of the Amputee (PPA), Prosthesis Evaluation Questionnaire (PEQ), Functional Measure for Amputees Questionnaire (FMA), Índice de Barthel e outros1-6. As escalas e questionários diferem na forma de medir os resultados e são ape-
METODOLOGIA O procedimento seguiu as etapas: tradução para o português, retro-tradução, análise das versões por um comitê multidisciplinar e pré-teste. A tradução do Functional Measure for Amputees Questionnaire (FMA) foi realizada separadamente pela pesquisadora e por dois professores de inglês, brasileiros e cientes da finalidade da pesquisa. A tradução considerou os aspectos lingüísticos e o significado atribuído aos termos de acordo com a realidade da população brasileira. As três versões foram analisadas em conjunto, gerando a versão 1. Esta foi retro-traduzida por dois professores de inglês nativos, para averiguar se existia divergência no significado e no conteúdo entre as versões original e traduzida. Dessa forma gerou-se a versão 2, que foi avaliada por um comitê multidisciplinar constituído por cinco profissionais com conhecimentos da área abordada (dois fisioterapeutas, um médico, um enfermeiro e um professor de inglês). Foram realizadas análise de equivalência semântica e idiomática e análise cultural e conceitual. A análise de todos os itens gerou a versão 3, que foi aplicada em um pré-teste com 10 pacientes, utilizando-se a técnica da prova7. Após o pré-teste, a versão consolidada do questionário (Anexo 1) foi aplicada em entrevista, três vezes a uma amostra de 44 pacientes, com predominância do sexo masculino (88,6%), média de idade 47,5±17,2 anos, matriculados no Grupo de Próteses e Órteses do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da FMUSP – Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Os critérios utilizados para inclusão foram: idade igual ou superior
a 18 anos; amputação no nível transtibial ou transfemoral; ter completado o processo de reabilitação há pelo menos seis meses, com prótese; ter capacidade para compreender as instruções e responder verbalmente o questionário. Critérios para exclusão: foram excluídos os pacientes que, após a primeira e a segunda aplicações do questionário, não retornaram para a terceira entrevista. Todos os sujeitos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa do Hospital das Clínicas da FMUSP. A primeira e a terceira entrevistas foram realizadas pela pesquisadora (entrevistador 1) e a segunda por um profissional que atuava na mesma área (entrevistador 2). Todas as entrevistas foram conduzidas individualmente, sendo permitida a presença de um acompanhante sempre que o paciente desejasse, porém sem interferência na resposta. Para avaliação da confiabilidade teste-reteste, os entrevistadores 1 e 2 aplicaram o questionário no mesmo dia, com um intervalo de 45 minutos entre uma entrevista e outra. Posteriormente, uma nova aplicação, com intervalo médio de 18,5 dias (7 a 30 dias) foi realizada pelo entrevistador 1. Os dados das respostas foram tratados estatisticamente Para análise da confiabilidade inter e intra-entrevistador foi utilizado o coeficiente Kappa8. Para as variáveis ordinais foi calculado o coeficiente Kappa ponderado9. Para a 4a questão (número de horas de uso da prótese), foram criadas categorias delimitadas por seus quartis: (0 a 7), (8 a 10), (11 e 12) e (13 a 20). O escore obtido na questão 2, que inquire sobre 14 movimentos do dia-adia, fornece o Índice de Capacidade Locomotora; sua consistência interna foi testada pelo coeficiente alfa de Cronbach10.
RESULTADOS Os valores do coeficiente Kappa para as variáveis do estudo podem ser observados na Tabela 1, tanto para a concordância inter- como intraentrevistador.
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Tabela 1 Valores do coeficiente Kappa (média e erro padrão, EP) obtidos em cada questão, no estudo da concordância interentrevistador (Inter) e intra-entrevistador (Intra)
Questão * 1 2a 2b 2c 2e 2f 2g 2k 2l 2m 2n 3a 3b 3c 4a 4b 5a 5b 5c 5d 5e 5f 5g 5h 5i 6a 6b 6c 7a 7b 7c 7d 7e 7g 7h 7i 8 9 10D 10F 13
Inter Kappa EP 0,66 0,01 0,88 0,07 0,72 0,13 0,21 0,95 1 0,84 0,84 0,94 1 0,72 0,58 0,84 0,87 1 0,25 0,25 1 1 0,67 0,4
0,22 0,06 0 0,1 0,1 0,05 0 0,17 0,17 0,06 0,09 0 0,41 0,41 0 0 0,29 0,28
1 1 0,64 0,85 0,88 1 1 1 0,5 0,5 1 1 0,83 0,88 0,98 1 1
0 0 0,22 0,15 0,12 0 0 0 0,38 0,38 0 0 0,08 0,06 0,02 0 0
Intra Kappa EP
0,56 0,86 1 0,88 0,51
0,23 0,07 0 0,13 0,25
0,74 0,74 0,34 1 0,67 0,63 0,81 0,81 0,91 0,25 1 1 1 1 0,67 0,57 1 1 0,78 0,54 0,73 1
0,14 0,14 0,24 0 0,17 0,17 0,07 0,07 0,89 0,41 0 0 0 0 0,29 0,35 0 0 0,16 0,24 0,18 0
1 1 1 1 0,68 0,81 0,98 1 1
0 0 0 0 0,09 0,08 0,02 0 0
* Os itens e questões que não aparecem na Tabela correspondem a respostas insuficientes para tratamento estatístico.
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Tabela 2 Valores observados (média, desvio padrão DP, mínimo, 1o quartil, mediana, 3o quartil e máximo) para os coeficientes Kappa obtidos na análise de confiabilidade interentrevistador e intra-entrevistador
Confiabilidade
N Média DP Mínimo 1o quartil Mediana 3 o quartil Máximo
Inter-entrevistador 38 0,81 0,24
0,21
0,67
0,88
1,00
1,00
Intra-entrevistador 36 0,82 0,21
0,25
0,67
0,87
1,00
1,00
e máximo. Verificou-se que, em média, os coeficientes Kappa foram superiores a 0,80; e, ainda, 75% dos coeficientes calculados foram superiores a 0,67, mostrando que a concordância foi pelo menos moderada. Além disso, mais de 25% foi igual a um, indicando uma concordância excelente. Esses resultados são representados na Tabela 2. Para análise da consistência interna da questão 2 foi calculado o coeficiente a de Cronbach. O Gráfico 1 mostra os dados referentes ao Índice da Capacidade Locomotora, ou seja, a soma dos valores de cada item da questão 2 nas três entrevistas, representando a escala de mobilidade de cada paciente. Considerando as respostas obtidas pelo entrevistador 1, o valor do coeficiente para a questão 2 foi igual a 0,79; o intervalo de confiança de 95% foi de 0,69 a 0,87. O coeficiente a de Cronbach varia de 0 a 1; valores maiores ou iguais a 0,70 indicam consistência interna, portanto pode-se afirmar que houve consistência no bloco de questões relacionadas à mobilidade.
DISCUSSÃO Após a reabilitação, o objetivo principal dos pacientes com amputação é obter uma deambulação ativa, independente e o mais fisiológica possível, com o uso de prótese. O resultado funcional dos amputados protetizados é multifatorial, ou seja, depende de fatores físicos, emocionais, sociais e do tipo de prótese prescrita. A vivência dos autores na área que envolve as amputações levou a questionar os métodos habituais de avaliação funcional, pois verifica-se que, quando reavaliados seis meses após a alta da fisioterapia, alguns apresentavam melhor padrão de deambulação e retorno às atividades sociais, enquanto outros queixavam-se de dor ou desconforto, necessitando de meio auxiliar para deambular, e continuavam afastados do convívio social. Os estudos disponíveis em geral utilizam escalas de avaliação desenvolvidas para medir a função nas atividades de vida diária e prática, dor, lazer e transporte. Na busca por um instrumento de avaliação funcional
42
* *
40 Índice da capacidade locomotora
Considerando somente os valores de Kappa inter- e intra-entrevistador maiores do que zero (Tabela 1), foram calculados a média, desvio padrão, mínimo, 1o quartil, mediana, 3o quartil
38 36
* *
* *
34 32
*
30 28 26
* * *
*
* *
* 1a entrevista
2a entrevista
3a entrevista
Gráfico 1 Escore total na questão 2 (índice da capacidade locomotora) nas três entrevistas (* = outliers)
Kageyama et al.
capaz de mensurar resultados, não foi encontrado consenso sobre a melhor maneira de avaliar os fatores que interferem no uso ou desuso da prótese pelos pacientes quando desligados da reabilitação 11 . Além do FMA – Functional Measure for Amputees, os questionários como Prosthetic Profile of the Amputee (PPA) e Prosthesis Evaluation Questionnaire (PEQ) foram criados especificamente para pacientes amputados, mas nenhum foi validado para a língua portuguesa. Para a escolha de uma escala a ser traduzida e utilizada em nosso meio, considerou-se a facilidade de aplicação, rapidez e avaliação de aspectos relevantes referentes ao uso da prótese. O questionário FMA apresentava as características ideais, enquanto o PPA foi excluído por ser muito extenso e o PEQ foi descartado principalmente pela utilização de respostas baseadas em escala visual analógica, não muito bem compreendida em nossa população – dadas as características de baixa escolaridade e nível socioeconômico – podendo levar a respostas contraditórias. Traduzir simplesmente o original inglês para outra língua não é adequado devido às diferenças lingüísticas e culturais. A adaptação transcultural inclui tradução, ajustamento das palavras, do idioma e do contexto, possivelmente envolvendo uma completa transformação de alguns itens, de maneira a manter o mesmo conceito12. Muitos questionários traduzidos apresentam erros devido à tradução inadequada de frases coloquiais, jargões, expressões idiomáticas comumente usadas em inglês, que pode afetar sua validade 13 . Foram então necessárias modificações nos enunciados de algumas questões, substituindo-se termos e situações mais comumente utilizados e vivenciados pela população alvo. Algumas palavras, como na questão 1, artificial leg e supervision from another person, traduzidos literalmente por perna artificial e supervisão de outra pessoa, foram substituídas por “prótese” e “outra pessoa orientando”. A modificação mais relevante feita no questionário foi referente à questão 13, sobre o interesse nas diversas ativi-
Validação de questionário para amputados
dades que requerem uso da perna: o original cita os exemplos de atividade gardening, walking the dog, golfing, bowling, riding, racket sports, curling*, não comuns no Brasil, muito menos na população atendida pela instituição. Os exemplos, considerados inadequados, foram excluídos. Após o préteste e avaliação, observou-se que ocorreu grande heterogeneidade nas respostas à questão nas três entrevistas, possivelmente por dificuldade de compreensão. Após reformulação, a questão foi testada em outros 10 pacientes e o resultado mostrou-se aplicável, porém a amostra deve ser ampliada para sua confirmação. As respostas não foram coerentes com o estado funcional, por exemplo: alguns responderam que tinham abandonado todas as atividades habituais após a amputação mas, ao mesmo tempo, eram totalmente independentes com a prótese e realizavam todas as atividades da vida diária. No questionário original, os próprios autores sugerem a reestruturação da questão 13 com um índice similar ao da Capacidade Locomotora, que representaria a extensão com que as atividades e os interesses dos amputados foram afetados pela amputação e uso da prótese1. Quanto à reprodutibilidade, em média os coeficientes Kappa foram superiores a 0,80; e 75% dos coeficientes calculados foram superiores a 0,67; e 25% foram igual a 1, indicando concordância perfeita intra e interentrevistador. Houve um período de até 30 dias entre as avaliações, podendo ter-se alterado nesse entretempo a capacidade funcional do paciente, tanto positivamente, pela melhora da capacidade no uso da prótese, quanto negativamente, por alguma complicação no estado geral. Dessa forma, o resultado da concordância intra-entrevistador pode ter sofrido influência das alterações nas respostas. O intervalo entre avaliações deu-se principalmente devido à dificuldade dos pacientes em comparecer ao hospital num curto período de tempo; alguns trabalhavam, outros dependiam de transporte ou de acompanhantes. A questão 2 (que gera o Índice da Capacidade Locomotora), única a apresentar um índice ou escore (0 a
42 pontos), foi considerada adequada para análise da consistência interna, obtendo-se coeficiente igual a 0,79 – demonstrando haver consistência interna. Esse resultado indica que é possível avaliar a mobilidade dos pacientes que usam prótese por meio do Índice da Capacidade Locomotora. Na amostra, todos os participantes usavam a prótese regularmente e o resultado foi acima de 40 pontos, considerado um bom índice de mobilidade, assim como encontrado por Franchignoni et al.14. Nas questões 5, 7, 11 e 12, constituídas de vários itens de possíveis respostas para o não-uso da prótese, houve um reduzido número de respostas, pois todos a utilizavam, situação também observada por Callaghan et al.1. Os instrumentos descritos na literatura, inclusive o questionário original FMA, são auto-aplicáveis e em geral enviados pelo correio1,14,15. Considerando que a população usuária do sistema de saúde pública em nosso país apresenta baixo nível socioeconômico e educacional, além de freqüente mudança de endereço, optamos pela entrevista, garantindo não só a compreensão das perguntas como a obtenção das respostas. Este estudo limitou-se a pacientes do Hospital das Clínicas. É importante salientar a necessidade de continuidade desta pesquisa, aplicando o questionário em uma amostra mais ampla, buscando identificar melhor os fatores que interferem no resultado funcional desses pacientes. Expandir o conhecimentos na área da reabilitação de amputados poderá contribuir para analisar o custo e benefício da protetização, bem como possibilitar a diminuição do ônus social e financeiro do sistema de saúde e do próprio paciente.
CONCLUSÃO Os resultados sugerem que a versão brasileira do FMA, Medida Funcional de Amputados, aqui proposta, pode ser um instrumento confiável para medir o resultado funcional, após a reabilitação, de pacientes brasileiros com amputação de membro inferior.
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Validação de questionário para amputados
Anexo 1
Questionário de Medida Funcional para Amputados
Algumas pessoas decidem não usar sua prótese por várias razões. Ao responder este questionário, por favor, lembre-se que não importa se você usa ou não a sua prótese, contanto que se sinta feliz com a decisão.
Este questionário é absolutamente confidencial; suas respostas não irão comprometer seu benefício da Previdência Social.
1 Você diria que é capaz de colocar a sua prótese...
sozinho, sem qualquer dificuldade? sozinho, mas com dificuldade? sozinho, mas com uma outra pessoa o orientando? somente se tiver ajuda de outra pessoa? 2 (escore 0 a 42 pontos:) Atualmente, você consegue realizar as seguintes atividades usando a sua prótese? Mesmo que, para isso, tenha que usar uma bengala ou qualquer outro auxílio para realizá-las? NÃO = 0; SIM, se alguém me ajudar = 1; SIM, se alguém estiver próximo = 2; SIM, sozinho = 3 0 1 2 3 a Levantar-se de uma cadeira? b Pegar um objeto do chão quando você está em pé com a sua prótese? c Levantar-se do chão? (por exemplo, se você tivesse caído) d Andar pela casa? e Andar fora de casa em piso liso? Andar fora de casa em piso irregular ou acidentado? (por exemplo, grama, f cascalho, ladeira) g Andar fora de casa com mau tempo, por exemplo, com chuva? h Subir escadas segurando um corrimão? i Descer escadas segurando um corrimão? j Subir na calçada? k Descer da calçada? l Subir alguns degraus sem um corrimão? m Descer alguns degraus sem um corrimão? n Andar enquanto carrega um objeto ? (por exemplo, xícara ou copo, bolsa ou sacola)
a b c d
3 Quando você precisa se locomover dentro de casa, aproximadamente
quanto das suas atividades são feitas... Quase nenhuma Metade Quase todas a Na cadeira de rodas? b Andando com sua prótese? (mesmo que precise usar bengala ou andador) c Andando sem sua prótese, mas usando um auxílio para andar, como muletas ou andador? 4 Quantas horas por dia você usa sua prótese? Quantos dias por semana você usa sua prótese? 5 O que o impede de usar sua prótese para se locomover dentro de casa: Concordo Discordo a Eu sempre uso a minha prótese para me locomover dentro de casa Se o paciente responder que concorda, ignore os itens seguintes e passe para a questão 6; se responder que não concorda, então complete o restante desta questão, até o item i.
Eu não me locomovo rápido o suficiente com a minha prótese dentro de casa Eu acho muito cansativo me locomover com a minha prótese dentro de casa Usar a minha prótese para me locomover dentro de casa causa problemas para a minha perna não amputada (por ex. cansaço, dor, inchaço etc.) e Quando uso a minha prótese para me locomover dentro de casa, ela me causa problemas (por ex: desconforto, transpiração, má circulação etc.) f Usar a minha prótese para me locomover dentro de casa causa problemas para o meu coto (por ex., irritação da pele, desconforto, dor, feridas etc.) g Usar a minha prótese para me locomover dentro de casa me faz sentir inseguro h Eu não uso a minha prótese para me locomover dentro de casa, porque sinto que ela precisa de ajustes (por ex., o cartucho está muito apertado ou muito largo; ou é muito pesada, não há espaço suficiente em casa etc.) i Eu não uso a minha prótese para me locomover dentro de casa por outras razões b c d
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6 Quando você precisa se locomover fora de casa, aproximadamente quanto das suas
atividades são feitas... Quase nenhuma Metade Quase todas Na cadeira de rodas? Andando com sua prótese, mesmo se usando bengala ou andador? Andando sem sua prótese, mas usando muletas ou andador?
a b c
7 O que o impede de usar a sua prótese para se locomover fora de casa: Concordo Discordo Eu sempre uso a minha prótese para me locomover fora de casa Se o paciente responder que concorda, ignore os itens seguintes e passe para a questão 8; se responder que não concorda, então complete o restante desta questão, até o item i. b Eu não me locomovo rápido o suficiente com a minha prótese fora de casa c Eu acho muito cansativo usar minha prótese fora de casa d Usar a minha prótese para me locomover fora de casa causa problemas para a minha perna não amputada (por ex. cansaço, dor, inchaço etc.) e Quando uso a minha prótese para me locomover fora de casa, ela me causa problemas (por ex: desconforto, transpiração, má circulação, etc.) f Usar a minha prótese para me locomover fora de casa causa problemas para o meu coto (por ex., irritação da pele, desconforto, dor, feridas etc.) g Quando uso minha prótese fora de casa tenho medo de cair h Não uso a minha prótese fora de casa quando a distância a percorrer é muito longa i Eu não uso a minha prótese para me locomover fora de casa por outras razões por ex., é muito pesada, por dificuldade de acesso fora de casa etc.) a
8 Quando você anda com a sua prótese, aproximadamente, qual a distância que consegue
percorrer sem parar? a Eu posso andar o quanto eu quiser. b Eu posso andar aproximadamente 100 passos sem parar. c Eu posso andar mais que 30 passos de uma vez, mas menos do que 100 passos sem parar. d Eu posso andar entre 10 e 30 passos sem parar. e Eu posso andar menos de 10 passos sem parar. f Eu não consigo andar com a minha prótese. 9 Desde que você recebeu alta, você caiu enquanto usava a sua prótese? Sim Quantas vezes no último mês? _____ Não 10 Que tipo de auxílio(s) para andar você mais usa para realizar as atividades com a prótese? (por ex., levantar-se, andar, subir escadas etc.) Dentro de casa Fora de casa a Nenhum b 1 bengala c 2 bengalas d 1 bengala com 4 pés e Muletas f Andador g Outros (especificar)
As duas próximas questões, 11 e 12, só serão feitas se o paciente não estiver usando a prótese. Se o paciente usa a prótese, passe para a questão 13. 11 Quando você parou de usar a sua prótese? a Há menos de 1 mês e Há menos de 3 anos b Há menos de 6 meses f Há menos de 4 anos c Há menos de 1 ano g Há 4 anos ou mais d Há menos de 2 anos h Eu nunca a usei
12 Por que você parou de usar a sua prótese? a b c d e
170
O cartucho da minha prótese estava muito largo para o meu coto. O cartucho da minha prótese estava muito apertado para o meu coto. Era muito cansativo. Foi realizada uma nova cirurgia no meu coto (por ex., nova amputação, outra cirurgia). Outros motivos (especificar)
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13 (Reformulada) Nas suas atividades do dia-a-dia, dentro e fora de casa, qual a resposta que melhor descreve o grau de dificuldade que você apresenta depois da amputação? a Eu não era uma pessoa muito ativa antes da minha perna ser amputada. b Eu deixei de fazer a maioria das minhas atividades após a amputação da minha perna. c Eu só consigo realizar as atividades dentro de casa. d Eu faço todas as atividades dentro de casa e só consigo fazer algumas fora de casa. e Eu retornei às minhas atividades exatamente como antes da amputação.
14 Você tem algum comentário a fazer a respeito da sua amputação, da prótese ou da reabilitação?
Obrigado por responder este questionário.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.172-6, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Avaliação da amplitude de movimento e força da cintura escapular em pacientes de pós-operatório tardio de mastectomia radical modificada Shoulder motion range and strength assessment in late post-operative patients having undergone modified radical mastectomy Priscila Fernandes Gouveia1, Estela de Oliveira Gonzalez1, Patrícia Arduino Grer1, Camila Amaro Fernandes1, Maurício Corrêa Lima2 Estudo desenvolvido na Clínica de Fisioterapia do Unicapital – Centro Universitário Capital, São Paulo, SP, Brasil 1
Fisioterapeutas
2
Prof. Especialista do Curso de Fisioterapia do Unicapital
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Priscila F. Gouveia R. Prof. Jorge Meyer 25 Vila Graciosa 03160-090 São Paulo SP e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO dez. 2006
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO maio 2008
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RESUMO: O câncer de mama é a neoplasia que mais afeta as mulheres e a cirurgia tem sido o tratamento de escolha, que pode assumir vários graus, até mastectomia radical modificada e alargada. Após a cirurgia, podem surgir seqüelas como alterações na amplitude articular do ombro homolateral, diminuição da força muscular, linfedema e aderências. O objetivo deste estudo foi avaliar a amplitude de movimento e força muscular da cintura escapular em mulheres submetidas à mastectomia radical modificada em pós-operatório tardio. Foram avaliadas nove mulheres, em pós-operatório de 2 a 7 anos, com média de idade de 53,22±6,5 anos. A amplitude de movimento e força muscular do lado da cirurgia foram avaliadas em relação ao membro contralateral, tomado como parâmetro normal. Os dados foram tratados estatisticamente e o nível de signifcância fixado em p<0,05. Os resultados mostraram redução significativa na amplitude de movimento do ombro acometido em todas as pacientes, principalmente nos movimentos de flexão e abdução ativas e passivas, bem como na força muscular, principalmente nos músculos trapézio médio e supra-espinhal, em comparação com o membro saudável. Isso enfatiza a necessidade da intervenção fisioterapêutica desde o primeiro dia pósoperatório, para minimizar essas possíveis seqüelas e melhorar a qualidade de vida das pacientes. DESCRITORES: Amplitude de movimento articular; Força muscular; Mastectomia/ reabilitação; Ombro ABSTRACT : Breast cancer is the most frequent neoplasm among women; it is traditionally treated by surgery ranging from quadrantectomy to widened modified radical mastectomy, of which common sequels are changes in articular range of motion, muscle strength decrease, lymphedema, and adherences. The aim of this work is to evaluate shoulder motion range and muscle strength in late post-operative patients having undergone radical modified mastectomy. Nine women, mean aged 53.22±6,5 years, in 2-to-7 year post-operative span, were evaluated as to shoulder motion range and muscle strength of the surgery side, considering the contralateral shoulder and limb as the standard reference for comparison. Data were statistically analysed and significance level set at p=0.05. Results showed significant reduction in shoulder range of motion in all patients, mainly in active and passive flexion and abduction, as well as lesser muscle strength, especially in Middle Trapezius and Supraspinatus muscles, as compared to the healthy limb. Findings stress the need to physical therapy to be onset at immediate post-operative, in order to minimize possible sequels and improve women’s quality of life. KEY WORDS: Mastectomy/rehabilitation; Muscle strength; Range of motion, articular; Shoulder
Gouveia et al.
ADM e força muscular de mastectomizadas
INTRODUÇÃO O câncer de mama é a neoplasia maligna que mais afeta as mulheres brasileiras 1. A mortalidade vem aumentando significativamente nos últimos 20 anos, acentuando-se a partir da década de 1990. Estudos verificaram que a avaliação percentual relativa de 64% na taxa bruta de mortalidade, passando de 5,77% em 1979 para 9,75% em 1999, para cada 100.000 mulheres, é compatível com outros países no mesmo estágio de desenvolvimento e urbanização; e os fatores que levaram ao aumento da prevalência da exposição ao risco de câncer de mama seriam histórico familiar, obesidade (20% das pacientes que fazem quimioterapia adjuvante têm um aumento de peso de aproximadamente 10 kg) 2 e gravidez após os 35 anos1. Em contrapartida, os fatores protetores para o câncer de mama seriam menarca tardia, gravidez entre os 20 e 28 anos, de 3 a 12 meses de amamentação e menopausa precoce 3 . Desde o final do século XIX, a cirurgia tem sido o tratamento tradicional do câncer de mama. A mastectomia radical clássica descrita por Halsted permaneceu como tratamento de escolha por aproximadamente 60 anos. A técnica cirúrgica consiste na retirada total do tecido mamário, músculo peitoral maior e menor e linfadenectomia axilar completa, podendo ocorrer também a retirada dos linfonodos paraesternais (mamários internos), caso o tumor esteja localizado nos quadrantes mediais da mama, e dos linfonodos supraclaviculares. Quando esses linfonodos são retirados, a cirurgia é chamada de mastectomia radical alargada4. Na segunda metade do século XX, algumas alterações foram introduzidas na mastectomia clássica: técnicas com preservação do músculo peitoral maior ou de ambos os peitorais, descritas respectivamente por Patey & Dyson e por Madden, passaram a ser conhecidas como mastectomia radical modificada 4-6, sendo uma cirurgia menos agressiva, porém com resultados similares aos da radical. A mastectomia radical clássica representava um processo curativo para boa parcela das
pacientes, porém causava danos psicológicos e físicos desnecessários às pacientes com tumores em estágio pouco avançado. Há também a mastectomia total, onde se retira toda a mama, preservando as demais estruturas; a mastectomia subcutânea, na qual se retiram as glândulas mamárias, preservando a aréola e a papila mamária; e a quadrantectomia, na qual se retira o quadrante da mama onde o tumor estava localizado. Em mulheres com risco elevado para desenvolver a doença, mas que nunca tiveram câncer de mama, ou em mulheres que já trataram câncer em uma das mamas, remove-se a mama normal – ou, no segundo caso, a mama contralateral – para prevenir futura ocorrência de malignidade, na chamada mastectomia profilática5-8. As cirurgias de mama levam a alterações funcionais, sociais e psicológicas na paciente, incidindo sobre a auto-estima. Portanto, a reabilitação funcional é fundamental 9 . Segundo Kisner e Colby10, as alterações na amplitude articular e força muscular do ombro do lado envolvido surgem como uma das seqüelas de grande incidência, além da dor, linfedemas e aderências na parede torácica, que interferem negativamente na vida da mulher mastectomizada. O tratamento fisioterapêutico desempenha um papel fundamental nessa etapa da vida da paciente, por ser susceptível de propiciar desde a recuperação funcional da cintura escapular e membros superiores até a profilaxia de complicações como retração, aderência cicatricial, fibrose, linfedema, que são responsáveis pela dificuldade das pacientes em realizar as atividades de vida diária11. O objetivo deste estudo foi avaliar a amplitude de movimento e força muscular da cintura escapular em mulheres submetidas à mastectomia radical modificada em pós-operatório tardio.
METODOLOGIA Foi conduzido um estudo retrospectivo, em mulheres submetidas a mastectomia radical modificada, sendo avaliadas quanto à amplitude de mo-
vimento (ADM) e força muscular (FM) dos músculos da cintura escapular bilateralmente. O estudo foi desenvolvido no período de setembro a outubro de 2006, nos Laboratórios Multidisciplinares de Fisioterapia I e II e na Clínica de Fisioterapia do Centro Universitário Capital (Unicapital). Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Unicapital, adotando-se os princípios éticos da privacidade e do anonimato das participantes, que assinaram o termo de livre consentimento informado. A avaliação foi aplicada a nove pacientes, selecionadas dentre as que tinham sido submetidas à mastectomia radical modificada unilateral no Hospital Ipiranga, em São Paulo, estando num pós-operatório de dois a sete anos, com idades de 40 a 65 anos12. Foram adotados como critérios de exclusão: paciente submetida à cirurgia bilateral ou a outro tipo de cirurgia da mama que não a radical modificada; portadora de outros tipos de carcinomas; portadora de qualquer outra doença que pudesse comprometer a ADM do membro superior homolateral à mastectomia, como por exemplo síndrome do impacto, bursite etc.)12; e apresentando um estado de confusão mental ou inabilidade para compreender os comandos solicitados pelo fisioterapeuta13. A avaliação da força muscular baseou-se no estudo de Kendall et al.13, sendo avaliados os músculos flexores de ombro (deltóide anterior, coracobraquial e bíceps braquial); extensores de ombro (deltóide posterior, tríceps braquial, grande dorsal, rombóides maior e menor); abdutores do ombro (deltóide médio e supra-espinhal); adutores de ombro (peitoral maior e grande dorsal); rotadores medial (redondo maior, subescapular e grande dorsal) e lateral (redondo menor, infra-espinhal, além dos músculos serrátil anterior e abdutor da escápula); peitoral menor, protrador de ombro; trapézio superior, médio e inferior, elevador, adutor e depressor da escápula, respectivamente. Para avaliação da amplitude de movimento (ADM) utilizou-se um goniômetro simples, seguindo o padrão de angulação de Kapandji14, mensurado de maneira ativa e passiva15.
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173
Para avaliação da ADM, foi considerada a diferença de amplitude entre o membro envolvido e o membro contralateral à cirurgia nos movimentos de flexão/extensão, abdução/adução e rotação medial/lateral da articulação do ombro. Para a avaliação da FM, foi mensurado o grau de força de 0 a 5 seguindo o sistema de graduação modificada para avaliação da força segundo O’Sullivan16, sendo 0 (zero) ausência de contração muscular palpável ou observável, 1 contração perceptível à palpação, sem movimento articular; 2 movimento parcialmente realizado, sem vencer a ação da gravidade; 3 movimento completo realizado contra a ação da gravidade; 4 movimento completo realizado contra a ação da gravidade com pequena resistência; 5 movimento realizado contra a ação da gravidade com máximo de resistência. Também foi feita avaliação da cintura escapular, que consistia na inspeção das escápulas a fim de verificar se eram abduzidas, aladas, ou se não havia alteração. Os dados foram analisados usando o programa estatístico SPSS para Windows v.15.01. Foram realizados testes não-paramétricos de Wilcoxon (teste de postos sinalizados de Wilcoxon que leva em consideração as grandezas das diferenças, assim como seus sinais); o nível de significância adotado foi p<0,05 (5%).
RESULTADOS A média das idades das nove pacientes foi 53,22±6,5 anos (mínima 43, máxima 63). Sete pacientes apresentavam acometimento na mama direita. Quanto ao estado civil, quatro são casadas, três solteiras, uma viúva e uma em união consensual. Cinco não tinham filhos, uma tinha um, e três tinham dois filhos; destas, três amamentaram até seis meses e uma amamentou durante um ano. Quanto ao histórico familiar de câncer, os resultados foram: primeiro caso na família, duas mulheres; câncer em familiares de primeiro grau, quatro; e em outro
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Tabela 1 Amplitude de movimentos da cintura escapular (em °): média, desvio padrão e valor de p da comparação entre os membros homolateral e contralateral à mastectomia
Movimento
Ombro homolateral Ombro contralateral
p
Flexão ativa
153,33 (19,20) *
170,00 (9,01)
0,04
Flexão passiva
160,11 (15,98) *
174,67 (7,48)
0,04
Extensão ativa
45,33 (16,42)
51,78 (14,39)
0,17
Extensão passiva
50,78 (21,16)
56,56 (17,80)
0,31
Abdução ativa
135,67 (23,43) *
162,78 (13,94)
0,01
Abdução passiva
141,89 (19,45) *
171,11 (10,16)
0,01
Adução ativa
27,56 (11,71)
33,89 (12,87)
0,05
Adução passiva
31,33 (9,98)
38,56 (13,41)
0,05
Rotação medial ativa
72,22 (19,86)
77,89 (22,44)
0,27
Rotação medial passiva
75,89 (18,39)
81,11 (22,04)
0,31
Rotação lateral ativa
74,56 (24,06)
76,89 (22,53)
0,72
Rotação lateral passiva
76,78 (20,63)
80,67 (23,56)
0,14
* diferença signficativa em relação ao ombro contralateral
grau de parentesco, três pacientes. Também foram questionados hábitos e vícios: cinco delas praticam esportes, quatro são sedentárias e, des-
tas, uma é etilista. Apenas uma participante referiu dificuldade funcional nas atividades da vida diária (AVD) quanto à higiene.
Tabela 2 Força de músculos da cintura escapular (grau de 0 a 516): média, desvio padrão e valor de p da comparação entre os lados homolateral e contralateral à mastectomia
Músculo
Homolateral
Peitoral maior Peitoral menor Redondo maior Serrátil Trapézio médio Trapézio inferior Redondo menor Subescapular Infraespinhal Rombóide maior Rombóide menor Grande dorsal Tríceps braquial Trapézio superior Deltóide anterior Deltóide médio Deltóide posterior Coracobraquial Bíceps braquial Supra-espinhal
4,22 (0,83) 4,56(0,72) 4,33 (0,50) 4,44 (0,88) 3,44 (0,52) * 3,44 (0,52) 4,56 (0,52) 4,33 (0,50) 4,67 (0,50) 4,00 (0,70) 4,00 (0,70) 4,44 (0,52) 4,44 (0,72) 4,78 (0,44) 4,44 (0,52) 4,44 (0,72) 4,22 (0,83) 4,56 (0,52) 4,56 (0,52) 0,00 (0,86) *
*
Contralateral 4,67 4,78 4,56 4,89 4,22 3,89 4,67 4,78 4,78 4,67 4,67 4,44 4,56 5,00 4,89 4,89 4,67 4,89 5,00 3,50
diferença signficativa em relação ao ombro contralateral
(0,50) (0,44) (0,72) (0,33) (0,66) (0,78) (0,50) (0,44) (0,44) (0,50) (0,50) (0,72) (0,72) (0,00) (0,33) (0,33) (0,50) (0,33) (0,00) (0,50)
p 0,21 0,32 0,41 0,19 0,02 0,16 0,32 0,05 0,32 0,06 0,06 1,00 0,65 0,16 0,05 0,05 0,10 0,08 0,05 0,01
Gouveia et al.
ADM e força muscular de mastectomizadas
Três pacientes relataram não terem recebido tratamento fisioterapêutico no pós-operatório imediato, duas tiveram-no até oito meses, duas até quatro meses e duas logo após a cirurgia. Questionadas acerca de doenças associadas, as pacientes indicaram que quatro eram hipertensas, das quais uma era diabética e duas apresentavam disfunção hormonal (hipertireoidismo e/ou hipotireoidismo); as demais não referiram doenças associadas. As Tabelas 1 e 2 apresentam descritivamente os resultados (média ± desvio padrão) da mensuração da amplitude de movimento e força muscular, da cintura escapular contralateral e homolateral à mastectomia. Os valores médios da amplitude de todos os movimentos avaliados foram inferiores no ombro homolateral à cirurgia, mas a diferença em relação ao ombro contralateral só foi significativa nos movimentos de flexão e abdução, tanto no movimento ativo quanto passivo. Quanto à força muscular, de forma semelhante, os valores médios de todos os músculos avaliados foram inferiores no ombro homolateral à cirurgia, mas a diferença em relação ao ombro contralateral só foi significativa nos músculos trapézio médio e supra-espinhal.
DISCUSSÃO As mulheres com história de câncer de mama em familiares de primeiro grau (mãe e irmã) apresentam risco relativo aproximadamente duas vezes maior para câncer de mama, em relação às que não têm antecedentes 8 . Neste estudo, quatro das nove pacientes mastectomizadas tinham história de câncer em parentes de primeiro grau. Uma das pacientes é etilista e, segundo a literatura, há uma forte associação entre consumo de álcool e câncer de mama8. Na avaliação postural da cintura escapular quatro pacientes apresentaram escápulas abduzidas e apenas uma alada, bilateralmente, contradizendo os achados de Campos e Vilela18, cuja revisão bibliográfica mostrou maior
incidência de escápulas aladas em pacientes que sofreram o esvaziamento axilar na mastectomia radical modificada. Nas cirurgias oncológicas, além da retirada do tumor, é necessária a ressecção de nódulos e vasos linfáticos para a definição do estádio da doença e o tratamento pós-operatório. No entanto, essas ressecções constituem obstáculos à circulação linfática local, culminando em linfedema6-9. Neste estudo, quatro pacientes apresentavam o membro edemaciado, porém não foi objetivo avaliar o linfedema. Os resultados em relação à ADM concordam parcialmente com os achados de Baraúna et al.19, que avaliaram quantitativamente a ADM do ombro nos movimentos de flexão, extensão e abdução em mulheres mastectomizadas, comparando-o com o lado contralateral à cirurgia e, nas 29 pacientes avaliadas por biofotogrametria computadorizada, encontraram diferenças significantes nos movimentos de flexão do ombro 19; neste estudo, além da flexão, foi encontrada limitação significativa também na abdução do ombro. A mastectomia radical modificada é uma cirurgia invasiva; conseqüentemente as pacientes avaliadas apresentaram, além da redução de amplitude do movimento do membro superior, comprometimento da força dos músculos do lado acometido. Destaca-se aqui a necessidade de estudos sobre a força muscular de pacientes submetidas à mastectomia, visto que são escassos na área fisioterapêutica, o que limita a presente discussão. Na paciente submetida ao tratamento cirúrgico do câncer de mama, o estigma da doença, a mutilação, a estética, a limitação das atividades da vida diária após a cirurgia, a rotina de exames, os tratamentos (quimioterapia, radioterapia) e as seqüelas de curto e médio prazo não são os únicos problemas apresentados. A ausência ou alteração da mama traz efeitos físicos, psicossociais, sexuais e emocionais que irão afetar diretamente sua qualidade de vida. Tais alterações superam o marco individual e estendemse aos familiares, amigos e às relações profissionais, o que implica so-
brecarga emocional, segundo vários estudos citados por Manaia et al. 17. Segundo Box et al.4 , a fisioterapia é muito eficaz, principalmente até os dois anos de pós-operatório, quanto ao ganho de ADM; esses autores sugerem que o fisioterapeuta deva estar inserido nos hospitais logo no primeiro dia pós-mastectomia. Com relação ao tratamento fisioterapêutico no pós-operatório, o grupo não foi homogêneo. Seis pacientes relataram ter tido acompanhamento fisioterapêutico, porém não se sabe quais os tipos de exercícios realizados, sua intensidade, e se receberam ou não alta da fisioterapia. Além disso, dado o reduzido tamanho da amostra, não foi possível fazer comparações quanto ao tratamento fisioterapêutico. Segundo Henscher 9, o tratamento cuidadoso durante o pós-operatório imediato, até o limite da dor, assim como sua continuação dosada durante a rádio e quimioterapia, aumentam a mobilidade articular, favorecem o sistema imunológico e reduzem os efeitos colaterais do tratamento médico. Além disso, o treinamento moderado a regular do condicionamento físico reduz a fadiga, melhora a mobilidade articular, combate as restrições motoras, melhora a percepção do próprio corpo, aumenta a capacidade de relaxamento e favorece uma atitude positiva diante da vida9. Estudo prospectivo20 realizado no Setor de Oncomastologia do Hospital São Paulo da Universidade Federal de São Paulo, cujos objetivos eram verificar a adesão de mulheres mastectomizadas ao início precoce de um programa de reabilitação da amplitude de movimento do ombro homolateral à cirurgia e identificar as dificuldades na realização de exercícios e das atividades de vida diária, contou com 28 mulheres que participaram do programa de reabilitação desde a alta hospitalar até o primeiro retorno ambulatorial. As pacientes receberam um folheto explicativo com orientações de exercícios que deveriam fazer três vezes ao dia. Das 28 participantes, 82% referiram dificuldade para execução dos exercícios, principal-
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mente devido à dor. A maioria realizou as atividades de vida diária sem dificuldades. Segundo as autoras, fazse necessário um melhor controle da dor pós-operatória e reforço das orientações para incrementar a adesão das pacientes ao programa de reabilitação 20 .
CONCLUSÃO Neste estudo, as mulheres mastectomizadas em pós-operatório tardio apresentaram reduzida amplitude articular nos movimentos ativo e passivo de flexão e abdução do ombro em relação ao contralateral à cirurgia, as-
sim como menor força dos músculos trapézio médio e supra-espinhal, o que enfatiza a necessidade de intervenção fisioterapêutica desde o primeiro dia pós-operatório, para minimizar essas possíveis seqüelas e melhorar a qualidade de vida das pacientes.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.177-82, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Perfil de fisioterapeutas brasileiros que atuam em unidades de terapia intensiva A profile of Brazilian physical therapists in intensive care units Emilia Nozawa1, George J.V. Sarmento2, Joaquim M. Vega3, Dirceu Costa4, José Euclides P. Silva5, Maria Ignez Z. Feltrim1
Estudo desenvolvido pela Assobrafir – Associação Brasileira de Fisioterapia Respiratória e Terapia Intensiva, São Paulo, SP, Brasil 1
Fisioterapeutas Dras. do Serviço de Fisioterapia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
2
Fisioterapeuta do Hospital N.S. de Lourdes, São Paulo, SP, Brasil
3
Prof. Dr. do Depto. de Fisioterapia da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, SP, Brasil
4
Prof. Dr. do Programa de Pósgraduação em Fisioterapia da Universidade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, SP, Brasil
5
Presidente do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, Brasília, DF, Brasil
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Dra. Emilia Nozawa Av. Enéas de Carvalho Aguiar 44 2o andar 05403-000 São Paulo SP e-mail:
[email protected] Pesquisa elaborada pela Assobrafir com apoio do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional Uma versão deste estudo foi apresentada ao 17th European Respiratory Society Annual Congress, Estocolmo, Suécia, set 2007.
APRESENTAÇÃO
RESUMO: Este estudo visou investigar o perfil dos fisioterapeutas que atuam nas unidades de terapia intensiva (UTIs) no Brasil, focalizando a direção do serviço, técnicas fisioterapêuticas empregadas e nível de autonomia em relação à ventilação mecânica invasiva e não-invasiva. Questionários foram enviados aos chefes dos serviços de fisioterapia de 1.192 hospitais registrados na Associação Médica de Terapia Intensiva, com retorno de 461 (39%) UTIs. Em 88% destas, os serviços são chefiados por fisioterapeutas; em 78%, compostos por até oito fisioterapeutas; 44,4% dos fisioterapeutas trabalham em regime de 30 horas semanais e 46,1% têm contrato de trabalho. Há assistência fisioterapêutica durante 24 horas em 33,6% das UTIs; 88% delas mantêm assistência nos finais de semana. Quanto às técnicas fisioterapêuticas, todos realizam mobilização, posicionamento e aspiração; 91,5% atuam na ventilação não-invasiva, sendo que 43% trabalham com total autonomia. Em relação à ventilação mecânica invasiva, 80% realizam extubação; 79,2% realizam regulagem e desmame do ventilador; entretanto, só 22% têm total autonomia (78% necessitam de protocolo ou opinião da equipe médica). Os fisioterapeutas brasileiros atuam, em sua maioria, em instituições privadas e assistenciais, cujos serviços são chefiados por fisioterapeutas. Têm relativa autonomia quanto às técnicas fisioterapêuticas e o manuseio da ventilação mecânica não-invasiva mas, no caso da invasiva, atuam sob diretiva da equipe médica. DESCRITORES: Serviço hospitalar de fisioterapia/estatística & dados numéricos; Unidades de terapia intensiva ABSTRACT: The purpose of this study was to outline a profile of physical therapists who work in intensive care units (ICU) in Brazil, focusing on service management, techniques used, and the degree of therapists’ autonomy regarding invasive and non-invasive mechanical ventilation. Questionnaires were sent to the heads of physical therapy (PT) services of 1,192 hospitals registered at the Brazilian Intensive Care Medicine Association and 461 (39%) ICUs replied. In 88% of these, PT services are headed by physical therapists and up to eight therapists work in 78% of the ICUs. Therapists work 30 hours a week in 44.4% of the units; 46.1% are formally hired. PT 24-hour assistance is available in 32.8% of the ICUs and on weekends, in 88%. Concerning PT techniques, all therapists perform mobilization, positioning, and aspiration; 91.5% play an active role in non-invasive ventilation, with 42.5% working with full autonomy. As to invasive mechanical ventilation, 80% perform extubation, 79.2% adjusting and weaning; however, only 22% have full autonomy (the others requiring physicians’ protocol). Brazilian physical therapists work mostly in private institution ICUs, in services headed by physiotherapists, and have relative autonomy in handling PT techniques and non-invasive mechanical ventilation; as to invasive mechanical ventilation, most depend on protocols or discussions with a physician. KEY WORDS: Intensive care units; Physical therapy department, hospital/ statistics & numerical data
ago. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO maio 2008
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INTRODUÇÃO Nas últimas décadas as unidades de terapia intensiva (UTIs) têm se tornado uma concentração não somente de pacientes críticos e de tecnologia avançada, mas também de uma equipe multiprofissional experiente com competências específicas 1. O profissional fisioterapeuta, como integrante desta equipe, necessita cada vez mais de aprimoramento e educação especializada para fazer frente ao avanço dos cuidados intensivos. Em países desenvolvidos, a função do fisioterapeuta depende de muitos fatores, como a própria característica da inserção da Fisioterapia em cada país, a tradição, o nível do curso de graduação, treinamento e competência 2 . Embora existam poucos relatos na literatura sobre o perfil e a atuação profissional fisioterapêutica em UTIs, Norremberg et al.1 estudaram esse assunto em 17 países da Europa Ocidental e, apesar do número pequeno de respostas, constataram que havia diversidade quanto à função do fisioterapeuta e às técnicas empregadas. Outros estudos demonstraram que essas diferenças dependem também do número de profissionais fisioterapeutas exercendo funções 2-4. No Brasil, embora os fisioterapeutas estejam cada vez mais presentes nas UTIs, sua atuação difere em cada instituição, não estando suas competências bem definidas. Diferentemente de outros profissionais, como médicos e enfermeiros que, tradicionalmente têm suas funções já consagradas devido à histórica existência 5,6 , a fisioterapia é uma profissão que só recentemente foi reconhecida no Brasil. Em nosso meio, a inserção do fisioterapeuta em UTI começou no final da década de 1970 e sua afirmação como integrante da equipe de assistência intensiva tem sido progressiva. Embora a aplicação das técnicas fisioterapêuticas se faça por profissionais da área e o processo educacional e de treinamento em terapia intensiva seja divulgado em todo o país, não se conhece a real inserção do fisioterapeuta nessa área de especialidade. Existem no Brasil mais de 1.500 unidades de terapia intensiva cadastradas na Associação de Me-
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dicina Intensiva Brasileira (Amib), com diferentes características e, possivelmente, com fisioterapeutas aí trabalhando. Porém, é difícil analisar as práticas assistenciais fisioterapêuticas e as responsabilidades assumidas por esse profissional sem dimensionar e caracterizar as condições da fisioterapia nas várias UTIs brasileiras. Assim, justifica-se a realização deste estudo sobre o perfil do fisioterapeuta que atua nesse ambiente hospitalar para que, com base na realidade constatada, possam ser postas em prática perspectivas quanto à profissionalização e à educação na área da Fisioterapia em Terapia Intensiva. O objetivo deste estudo foi delinear o perfil dos fisioterapeutas que atuam nas unidades de terapia intensiva, focalizando aspectos administrativos, as técnicas fisioterapêuticas empregadas e o nível de autonomia em relação à ventilação mecânica invasiva e nãoinvasiva, bem como características das UTIs.
METODOLOGIA Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Divisão Clínica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Caracteriza-se como uma pesquisa de campo, prospectiva, transversal, com abordagem predominantemente quantitativa. O instrumento utilizado para a coleta de dados constou de um questionário elaborado para este fim, contendo 20 questões fechadas versando sobre três temas principais: a) características da instituição, envolvendo dados demográficos, tipo e tamanho da instituição, áreas de atuação do fisioterapeuta dentro da instituição, categoria de pacientes por unidade, número de leitos e horário de atendimento fisioterapêutico da unidade; b) perfil do fisioterapeuta que atua nas UTIs, envolvendo formação do fisioterapeuta, vínculo empregatício, estrutura administrativa em que está inserido, jornada de trabalho, existência de programas de treinamento e educação continuada; c) tipo de técnicas fisioterapêuticas utilizadas, incluindo nível de decisão
sobre o paciente em relação à ventilação mecânica invasiva e não-invasiva e procedimentos que o fisioterapeuta decide dentro da UTI. Além das 20 questões, foi acrescentada uma questão livre para que o questionado pudesse externar eventuais informações relevantes ao estudo. Para efeito de possíveis ajustes metodológicos, realizou-se um estudo piloto junto aos fisioterapeutas chefes de uma UTI de cada estado da federação, sendo um hospital público e outro privado, selecionados por randomização prévia. Após o estudo piloto foram realizados ajustes no questionário e o mesmo foi encaminhado, via correio, aos chefes dos Serviços de Fisioterapia de todos os hospitais cadastrados na Amib, em envelope contendo: carta de apresentação com explicação dos objetivos do estudo e procedimentos adotados para a coleta de dados, Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; o questionário e um envelope selado para envio das respostas. Os hospitais onde havia mais de uma UTI foram orientados a fazer cópias extras dos questionários. Passados 30 dias do envio, todos os hospitais foram contatados por telefone para confirmação de recebimento do material. Estipulou-se o prazo de dois meses (60 dias) para encerramento do recebimento das respostas. As variáveis quantitativas estão apresentadas de forma descritiva, por meio de média e desvio padrão, levando-se em consideração a natureza e especificidade dos dados.
RESULTADOS Dos questionários enviados a 1.192 hospitais, obtiveram-se respostas de 356 instituições (29,9%) correspondendo a 461 UTIs (38,6% dos questionários enviados). Essas UTIs estão alocadas em instituições privadas (54,6%) e públicas da administração estadual (16,7%), municipal (10,7%) ou outra (16,2%). Os números de leitos no hospital e nas UTIs são apresentados na Tabela 1. O maior número de respostas proveio de serviços que atuam junto a UTIs de pacientes adultos denominadas “geral” por admitirem casos de
Nozawa et al.
Fisioterapeutas em terapia intensiva
Tabela 1 Distribuição das UTIs (%) segundo características e especialidade
Característica Números de leitos no hospital 50 51-150 151 – 300 > 300 Especialidade da UTI Adulto geral Adulto cirúrgico Adulto neurológico Pediátrica Neonatal Coronariana Queimados Oncológica Outros Número de leitos na UTI 1-5 6-10 11-15 16-20 21-30 >31
% 8,3 30,1 39,5 22,1 64,9 54,4 29,5 34,4 29,1 25,4 8,2 2,8 11,1 7,2 41,3 22,3 12,7 11,6 5,0
UTI = unidade de terapia intensiva
etiopatogenia variada (64,5%), seguido de UTIs de caráter cirúrgico (54,4%), de pediatria (34,4%), neonatal (29,1%) e coronariana (25,4%). De acordo com as informações recebidas, constata-se que a organização da atuação dos fisioterapeutas é exercida por uma estrutura administrativa denominada de Serviço (70,9%), seguida de Setor (21,2%), Unidade (2,6%) ou outras (5,4%). Para uniformizar a terminologia e com base nessa informação, tal estrutura é aqui referida como Serviço de Fisioterapia. Esta estrutura administrativa é liderada por fisioterapeuta em 91,9% dos casos, embora outros profissionais exerçam o cargo de chefia, entre eles um médico (5,6%), psicólogo (1,1%) ou outros profissionais (1,4%). O vínculo que os fisioterapeutas mantêm com os Serviços é trabalhista (contratado) em 46,1% dos casos; terceirizado, 29,9%; profissional autônomo, 26,2%; e em cooperativas, 3,7%. Em relação à força de trabalho no Serviço de Fisioterapia, verificou-se
que 60% dos fisioterapeutas estão alocados nas UTIs e o restante atua possivelmente em unidades de internação geral e ambulatório. O número de fisioterapeutas que trabalham exclusivamente em UTI varia de acordo com a dimensão do hospital: em quase metade dos casos trabalham entre um e três fisioterapeutas, como mostra a Tabela 2; e em apenas 13 casos as UTIs comportavam mais de 30 profissionais. As funções exercidas pelos fisioterapeutas que atuam nas UTIs são predominantemente (52,4%) de assistência (Tabela 2). Para a maioria (64,4%), a jornada de trabalho é de 30 horas semanais; a jornada de 20 horas e com plantões de 12 horas por 60 horas de descanso aparecem ocasionalmente. Os Serviços estão organizados a prestar assistência durante 24 horas somente em 1/3 das UTIs, porém, a maioria (88,8%) apresenta cobertura nos finais de semana (Tabela 2). Os fisioterapeutas estão se aprimorando cada vez mais nessa área: verificou-se que 71% dos fisioterapeutas atuantes possuem curso de especialização em Fisioterapia Cardiorrespiratória ou em terapia intensiva; 67% responderam que seguiram programas de treinamento e desenvolvimento.
A atuação fisioterapêutica caracteriza-se predominantemente pela aplicação de técnicas de remoção de secreção brônquica e de reexpansão pulmonar (99,3%); a preocupação com a mobilização do paciente é tão importante quanto as técnicas de terapia respiratória (91,5%). A utilização de dispositivos instrumentais como incentivador inspiratório, exercício com pressão positiva e flutter têm menor aplicação, como pode ser observado na Tabela 3. A tomada de decisão sobre os procedimentos fisioterapêuticos é de responsabilidade do profissional fisioterapeuta de forma preponderante em mais de 90% dos casos. Quanto aos procedimentos de assistência ventilatória, cerca de 80% dos fisioterapeutas realizam os procedimentos de extubação, regulagem dos parâmetros ventilatórios e as etapas do desmame, como mostra a Tabela 3. Em relação à ventilação nãoinvasiva (VNI), 42,5% deles têm total autonomia em sua indicação e aplicação e 49% realizam esse procedimento com base em protocolo discutido com a equipe médica; são raros os fisioterapeutas que não têm autonomia, como mostra o Gráfico 1. Quanto aos procedimentos de venti-
Tabela 2 Distribuição (%) dos Serviços de Fisioterapia segundo características administrativas
Funções exercidas Assistência Assistência e ensino Assistência e pesquisa Assistência, ensino e pesquisa N. de Fts que compõem o Serviço 1-3 4-8 6-10 11-20 21-30 31-40 >40 Horário de atendimento Raramente < 12 horas 12 horas 18 horas 24 horas
% Atendimento nos finais de semana 52,4 Sim 28,5 Não 5,7 Raramente 13,4 N. de Fts exclusivos na UTI 1a3 1,0 29,9 4a8 21,0 9 a 12 20,3 13 a 20 10,7 21 a 30 10,2 + de 30 6,9 Jornada de trabalho 3,3 20 horas 22,9 30 horas 34,2 40 horas 5,8 12 x 60 horas 33,6 Mediante solicitação médica
% 88,8 7,2 4,
45,0 33,6 13,2 5,9 2,0 0,3
5,2 64,4 17,6 7,8 5,0
UTI = unidade de terapia intensiva; Fts = fisioterapeutas
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Tabela 3 Distribuição dos fisioterapeutas (%) segundo os procedimentos que realizam
Procedimento Remoção de secreção Exercícios de expansão pulmonar Aspiração orotraqueal Posicionamento Mobilização Bag squeezing Inspirometria de incentivo Treinamento muscular respiratório Exercícios com pressão positiva intermitente Flutter Medidas de pressão dos músculos respiratórios Extubação Ajuste do ventilador mecânico Desmame da ventilação mecânica Auxílio na intubação Transporte intra-hospitalar Auxílio na PCR
% 99,5 99,3 99,0 98,0 91,5 78,1 76,3 76,3 64,8 53,1 51,6 80,0 79,2 79,2 73,6 37,2 66,9
PCR = Parada cardiorrespiratória
100 VMI
90
VNI
80 70
62
60 50
49
43
40 30
22 16
20
8
10 0 Total autonomia
Mediante protocolo
Sem autonomia
Gráfico 1 Distribuição percentual dos fisioterapeutas segundo o grau de autonomia em relação à ventilação mecânica invasiva (VMI) e à ventilação mecânica não-invasiva (VNI) lação mecânica invasiva, somente 22% dos fisioterapeutas gozam de total autonomia sobre a condução do processo ventilatório e 62% necessitam, previamente, discutir com a equipe médica para determinar a conduta (Gráfico 1).
DISCUSSÃO A atuação dos fisioterapeutas nas UTIs no Brasil vem aumentando de forma sistemática e gradual nas últi-
180
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mas três décadas, mas até o presente momento não foi realizado um levantamento para descrever essa ação nas UTIs brasileiras; este é o primeiro estudo de abrangência nacional. O percentual de respostas recebidas (30%) possibilitou descrever as tendências dessa atuação, considerando que estudos semelhantes, realizados na Europa1 e na França7, obtiveram percentuais semelhantes, respectivamente 22% e 21%. Este estudo mostrou que os Serviços de Fisioterapia de instituições privadas prevalecem em relação às
instituições públicas. Esse fato pode ser atribuído a um maior número de hospitais privados, enquanto a melhor estruturação hierárquica do Serviço aí pode ter propiciado maior retorno dos questionários. Nas instituições públicas, os poucos fisioterapeutas atendem a uma demanda expressiva de pacientes sem a organização de uma equipe para a assistência exclusiva em UTI. Os resultados mostram que os Serviços de Fisioterapia atendem principalmente pacientes adultos em vários tipos de terapia intensiva, o que revela a importância da atuação específica junto ao paciente crítico. Por outro lado, é expressiva a percentagem de atendimento na área de neonatologia e pediatria, que foi o segmento no qual a fisioterapia conquistou espaço mais recentemente, devido à complexidade e especificidade desses pacientes e/ou à resistência à presença do fisioterapeuta. A atuação fisioterapêutica nas UTIs no Brasil ocorre no âmbito de uma estrutura administrativa denominada Serviço, tendo na liderança um fisioterapeuta. Esse dado justifica políticas de investimentos educacionais a serem destinados à gestão de processos, visando melhor preparo de lideranças administrativas de fisioterapeutas para gerir processos, resultados e capital intelectual. Na dinâmica de trabalho das equipes destaca-se o percentual discreto (33,6%) da assistência 24 horas, embora haja ampla cobertura diurna, incluindo finais de semana (88,8%). Vários fatores podem justificar esse dado: a) na maioria das instituições, o reduzido número de fisioterapeutas vinculados (Tabela 2) pode não ser suficiente para a assistência ideal, particularmente na unidade de terapia intensiva, pois no atendimento 24 horas torna-se necessária a criação de três turnos (manhã, tarde, noite), o que equivale a, no mínimo, seis profissionais, mesmo para UTIs de pequeno porte; b) a jornada de trabalho de 30 horas reduz o total de horas vezes número de fisioterapeutas, levando necessariamente ao aumento no quadro de pessoal, o que pode onerar a
Nozawa et al.
folha de pagamento; c) a limitação do número de atendimentos por paciente, imposta pelos prestadores de saúde, independente das condições da fisioterapia, cria um sistema que enfoca atendimentos somente diurnos, deixando esses pacientes muitas vezes com um longo período sem intervenção. Na caracterização da ação terapêutica junto aos pacientes críticos, há total concordância no emprego de técnicas de remoção de secreção brônquica e de reexpansão pulmonar realizada de forma manual. O dispositivo mecânico para tais fins vem secundariamente e pode ser devido ao custo adicional desses recursos. Este estudo não objetivou conhecer as técnicas mais empregadas, dada a grande variedade de técnicas existentes e a relação de seu uso com o treinamento recebido. Nos últimos anos foram desenvolvidas novas técnicas manuais8, porém ainda sem ampla divulgação e treinamento. O importante é que os fisioterapeutas brasileiros desenvolvem, em seus locais de trabalho, ações de remoção de secreções brônquicas, reexpansão pulmonar, posicionamento e mobilização. Essas são as principais ações necessárias aos pacientes críticos, conforme o Consenso Europeu de Fisioterapia de Pacientes Críticos da European Respiratory Society 9 . O estudo mostra ainda que 71% dos fisioterapeutas em ação foram treinados por meio de cursos de especialização em fisioterapia cardiorrespiratória ou em terapia intensiva, vinculados à ação desenvolvida. Embora a dimensão geográfica do Brasil cause problemas quanto à uniformidade e acessibilidade aos programas de educação continuada, percebe-se claramente a preocupação de tornar mais específica a formação do fisioterapeuta para sua atuação em terapia inten-
Fisioterapeutas em terapia intensiva
siva. Marques et al., em 199810, realizaram uma pesquisa sobre o perfil e as expectativas dos fisioterapeutas do Complexo Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e verificaram que 98% dos fisioterapeutas demonstravam interesse em participar de eventos científicos, sugerindo que programas de atualização e reciclagem encontram um público constante. A área concernente à ventilação mecânica invasiva, nos procedimentos de manuseio, regulagem e interrupção, merece atenção especial. Nota-se que essas práticas são exercidas amplamente por fisioterapeutas, seja nos pacientes intubados ou com suporte ventilatório nãoinvasivo. No entanto, a tomada de decisão que envolve iniciar, alterar e interromper a ventilação mecânica invasiva é realizada sob protocolo (62%) ou sob ordem médica (16%). As instituições estão cada vez mais adotando protocolos preestabelecidos pelos membros da equipe multiprofissional que atua nas UTIs, com base nas condições clínicas dos pacientes e nas recomendações adotadas mundialmente. Estudos randomizados demonstram que protocolos bem estruturados para descontinuar a ventilação mecânica realizados por fisioterapeutas adequadamente habilitados não requerem a presença do médico, podendo inclusive reduzir a duração da ventilação mecânica e melhorar os resultados11-13. Norremberg et al. 1 relatam que na Europa Ocidental o ajuste e desmame da ventilação mecânica realizado por fisioterapeutas difere de país para país: enquanto na Bélgica 57% dos fisioterapeutas realizam procedimentos de ventilação mecânica, na Suécia estes raramente são realizados. Portanto, é possível ampliar a participação do fisioterapeuta na ventilação mecânica invasiva, dependendo da organização e do grau de inter-
relação das diferentes equipes que trabalham na UTI. Gestões que incentivem essa comunicação e intercâmbio de habilidades e competências devem ser propostas no âmbito local de trabalho, como também entre as instituições de representatividade dessas categorias. O grau de autonomia do fisioterapeuta aumenta na VNI: no Brasil, 43,8% dos fisioterapeutas têm total autonomia em relação à indicação e execução do procedimento. Estudos que mostram essa realidade enfatizam a necessidade de treinamento apropriado e experiência para se obter sucesso com a técnica 14,15. Os achados deste estudo mostram que os pacientes de terapia intensiva no Brasil recebem cuidados de fisioterapia de forma rotineira por fisioterapeutas, organizados e treinados para esse fim. A reflexão sobre esses resultados por parte de nossos órgãos e pelos próprios fisioterapeutas poderá gerar diretrizes e metas que propiciem recomendações de ações terapêuticas, normatização da estrutura administrativa, treinamentos técnicos e gerenciais, definições das relações de trabalho, efetividade no custo-saúde e remuneração qualificada, com resultados mais eficientes junto à população de pacientes críticos.
CONCLUSÃO Pode-se concluir que o perfil dos fisioterapeutas brasileiros em unidades de terapia intensiva caracteriza-se por profissionais qualificados, que aplicam técnicas fisioterapêuticas especializadas com autonomia e estão envolvidos em ventilação mecânica invasiva e não-invasiva. A estrutura administrativa está relativamente bem organizada e promissora para o processo evolutivo profissional.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.183-7, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Correlação entre cefaléia e disfunção temporomandibular Correlation between headache and temporomandibular joint dysfunction Mariana Sampaio Menezes1, Sandra Kalil Bussadori2, Kristianne Porta Santos Fernandes2, Daniela Aparecida Biasotto-Gonzalez2
Estudo desenvolvido no Programa de Mestrado em Ciências da Reabilitação da Uninove – Universidade Nove de Julho, São Paulo, SP, Brasil 1 Fisioterapeuta 2 Profas. Dras. do Programa de Mestrado em Ciências da Reabilitação da Uninove
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Daniela A. Biasotto-Gonzalez Condomínio Aruã – Estrada do Itapeti, 100 Quadra 79A Lote 01 08771-910 Mogi das Cruzes SP e-mail:
[email protected] Este estudo recebeu apoio financeiro da Fapic/Uninove.
APRESENTAÇÃO set. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO maio 2008
RESUMO: A relação entre disfunções temporomandibulares (DTM) e os diferentes tipos de cefaléias ainda não está bem compreendida, mas a dor de cabeça é provavelmente o sintoma mais comum da DTM. O objetivo deste estudo foi correlacionar cefaléia com o índice clínico de Fonseca de avaliação da DTM. Participaram 160 voluntários estudantes da Universidade Nove de Julho na faixa dos 18 aos 36 anos, sendo 80 mulheres e 80 homens. Foram aplicados dois questionários: o índice clínico de Fonseca e um questionário sobre cefaléia. Os dados foram analisados estatisticamente e o nível de significância fixado em p≤0,05. Os resultados mostram maior prevalência de DTM entre as mulheres com cefaléia, mas não foi possível verificar uma relação direta entre cefaléia e nível de gravidade da disfunção da articulação temporomandibular. DESCRITORES: Cefaléia; Índice de gravidade de doença; Transtornos da articulação temporomandibular ABSTRACT: The relationship between temporomandibular joint disorders (TMD) and different kinds of headaches is still not well understood, though headache is probably the most common symptom of TMD. The aim of this study was to correlate headache with Fonseca’s TMD clinical index. A total of 160 university students aged 18 to 36 years old were selected, half women, half men. Two questionnaires were applied to them: the Fonseca clinical questionnaire and one on headache. Data were statistically analysed and significance level set at p≤0.05. Results showed a higher prevalence of TMD among female individuals with headache, but a direct relationship between headache and degree of temporomandibular joint dysfunction could not be found. KEY WORDS: Headache; Severity of illness index; Temporomandibular joint disorders
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INTRODUÇÃO
tivos da aproximação entre essas duas afecções 6,8,12-14.
A articulação temporomandibular (ATM) é parte do sistema estomatognático, capaz de realizar movimentos complexos. A função e a estabilidade dessa articulação regem a mastigação, deglutição, fonação e a própria postura mandibular1.
As cefaléias relacionadas à DTM e estruturas do crânio são consideradas na classificação da International Headache Society (IHS) de 1988; em 2004, foram incluídas na categoria IHS.11: Cefaléia ou dor facial associada com distúrbios do crânio, pescoço, desordens da ATM, músculos mastigatórios e outras estruturas craniofaciais (apud Gomes et al.10).
A disfunção temporomandibular (DTM) corresponde a um conjunto de condições articulares e musculares na região crânio-orofacial que pode desencadear sinais e sintomas como dores na região da ATM, cefaléia, dor nos músculos da mastigação, otalgia, dor facial, limitação funcional, dor cervical, cansaço, limitação de abertura de boca, dor durante a mastigação, zumbido, dor na mandíbula, dentre outros. A somatória ou a exacerbação desses sinais e sintomas acaba por limitar ou mesmo incapacitar o indivíduo em suas atividades fisiológicas2-6. Embora a etiologia da DTM não esteja totalmente elucidada, em geral tem caráter multifatorial e pode envolver alterações na oclusão, restaurações ou próteses mal-adaptadas; lesões traumáticas ou degenerativas da ATM; alterações esqueléticas; fatores psicológicos e emocionais; ausências dentárias, mastigação unilateral; má-postura e hábitos orais inadequados. Geralmente, apenas um fator isolado não é desencadeante da disfunção, mas sim a associação entre eles 2,4,7,8. As disfunções podem ser classificadas em extra e intraarticulares, ou disfunções dos músculos mastigatórios e disfunções intra-articulares e podem envolver uma abordagem interdisciplinar para seu tratamento4,9. A cefaléia consiste em qualquer dor referida no segmento cefálico, sendo uma manifestação extremamente comum. Na população geral, durante o curso da vida, a prevalência de cefaléia é maior que 90%, representando o terceiro diagnóstico mais comum (10,3%) nos ambulatórios de neurologia10,11. Ainda não é bem compreendida a relação entre a DTM e os diferentes tipos de cefaléias, mas a dor de cabeça é provavelmente o sintoma mais comum e a queixa mais relatada pelos portadores de DTM; indícios clínicos são fortemente suges-
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Este estudo teve por objetivo verificar, em uma população de universitários, se há correlação entre a presença de cefaléia e de DTM, esta determinada pelos parâmetros do índice clínico de Fonseca.
METODOLOGIA Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Uninove. Para ser incluído/a na pesquisa, cada participante assinou um termo de consentimento livre e esclarecido. Foram selecionados por meio de randomização (por um programa que gera números aleatórios sem reposição) 160 estudantes da Universidade Nove de Julho (campus Vila Maria), em São Paulo, na faixa etária de 18 a 36 anos, sendo 80 do sexo feminino e 80 do sexo masculino. Os sujeitos responderam, no mesmo dia, a dois questionários: o questionário do índice clínico de Fonseca e um questionário de triagem, consistindo nas seguintes questões:
•
Aperta ou range os dentes?
Só foram incluídos os voluntários que responderam afirmativamente à primeira pergunta, com dor na região temporal; e afirmativamente à segunda e a uma das outras duas perguntas. O questionário de Fonseca é composto por dez questões, com três alternativas cada (não, sim ou às vezes), onde o sujeito deve assinalar apenas uma. Dependendo do escore (que varia de 0 a 100), permite classificar os respondentes por grau de severidade da DTM. As instruções necessárias para o preenchimento dos questionários foram dadas até que os sujeitos as compreendessem completamente. Os participantes os responderam enquanto o pesquisador permaneceu à disposição para qualquer esclarecimento. Não houve controle de tempo para responder, para minimizar a chance de indução a respostas imprecisas. Ao término do preenchimento do questionário de Fonseca, foi realizada a somatória das respostas e a classificação nas categorias: ausência de disfunção temporomandibular (0 a 15 pontos); disfunção leve (20 a 40 pontos); moderada (45 a 65 pontos) e grave (70 a 100 pontos)15. Para a análise estatística utilizouse o teste qui-quadrado para avaliar a associação entre os escores, tendo como objetivo comparar as divergências entre as freqüências observadas.
•
Apresenta dor de cabeça? Se sim, em qual região?
RESULTADOS
•
Apresenta cansaço na musculatura mastigatória?
•
Apresenta dor na articulação temporomandibular?
Do total de voluntários, 18 mulheres (22,5%) e 31 homens (38,8%) não apresentaram qualquer sintoma. A Tabela 1 mostra os dados relativos à presença ou
Tabela 1 Distribuição das voluntárias do sexo feminino (%) segundo a presença ou não de cefaléia e de DTM, e classificação de Fonseca da DTM
Mulheres
Com cefaléia (%) Sem cefaléia (%)
DTM leve DTM moderada DTM severa Total com DTM Sem DTM
26,25 15,00 8,75
Total
58,75
50 8,75
12,50 6,25 0,00 18,75 22,50 41,25
Total (%) 38,75 21,25 8,75 68,75 31,25 100,00
Menezes et al.
Cefaléia e disfunção temporomandibular
Tabela 2 Distribuição dos voluntários do sexo masculino (%) segundo a presença ou não de cefaléia e de DTM, e classificação de Fonseca da DTM
Homens
Com cefaléia (%) Sem cefaléia (%)
DTM leve DTM moderada DTM grave Total com DTM Sem DTM Total
Total (%)
21,25 5,00 1,25 27,50
25,00 2,50 0,00 27,50
46,25 7,50 1,25 55,00
21,25
38,75
45,00
33,75
66,25
100,00
não de cefaléia e de gravidade da DTM segundo o índice anamnésico de Fonseca nas voluntárias do sexo feminino. É possível observar, naquelas com cefaléia, que não há relação direta com os níveis de disfunção, mas entre as que não têm cefaléia, pode ser estabelecida uma relação linear inversa com o grau de severidade da DTM. Na Tabela 2 são apresentados os dados relativos à correlação entre cefaléia e gravidade da DTM nos voluntários do sexo masculino. Também nesse caso há uma relação linear inversa entre o grau de disfunção em indivíduos sem cefaléia e, naqueles com cefaléia, não há relação direta desta com os níveis de disfunção. Do total de participantes, 74 (46,3%) relataram cefaléia e 99 (55% do total, sendo 55 mulheres e 44 homens,) foram classificados como portadores de DTM. O Gráfico 1 representa a distribuição dos portadores de DTM nos
dois sexos segundo tivessem ou não cefaléia. Pode-se observar que há uma relação direta entre DTM e cefaléia apenas no sexo feminino. Com a aplicação do teste quiquadrado, foi possível observar que há uma relação direta entre as variáveis estudadas (DTM X presença ou ausência de cefaléia), com um alto poder significativo em ambos os sexos (feminino: 0,0008; masculino: 0,003), ou seja, os indivíduos com DTM leve e sem DTM (segundo a classificação do índice clinico de Fonseca) não apresentam cefaléia.
DISCUSSÃO O índice clínico de Fonseca foi escolhido para este estudo por ter sido idealizado para a população brasileira e ser sensível na determinação da gravidade de portadores de DTM 15. Nossos resultados com relação à por-
50% Mulheres Homens
45% 40% 35% 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0%
Com cefaléia
Sem cefaléia
Gráfico 1 Distribuição percentual, dentre os portadores de DTM, dos que apresentam ou não cefaléia, segundo o sexo
centagem de indivíduos universitários portadores de DTM concordam com os obtidos por Garcia et al.16, que avaliaram 200 estudantes universitários com idades entre 17 e 25 anos, por meio do questionário de Fonseca15 e pela medida da amplitude de movimento mandibular; os autores encontraram que 61% dos indivíduos apresentavam algum grau de DTM. No presente estudo, 61,9% dos indivíduos foram assim classificados. Com relação à gravidade da disfunção, os resultados obtidos pelos autores também são semelhantes, tendo sido encontrada prevalência da DTM leve sobre as DTM moderada e grave. Nossos dados também foram semelhantes aos obtidos por Tomacheski et al.4 que, avaliando estudantes, encontraram 46,1% portadores de DTM leve, 4,4% de moderada, nenhum apresentou DTM grave; e 48,7% não eram portadores de DTM (sic); respectivamente, os achados do presente estudo foram 42,5%, 14,4%, 5,0%; e 38,1% não eram portadores de DTM. A prevalência de DTM no sexo feminino, aqui encontrada, também coincide com os dados da literatura segundo os quais a DTM é mais comum entre mulheres2,4,17-19. A variação em relação às porcentagens encontradas nos diferentes estudos está ligada a diferentes tipos de populações e a variações de metodologia e de leitura de resultados20-22. Segundo Okeson8, a prevalência de DTM no sexo feminino pode estar relacionada a uma maior flacidez dos tecidos nas mulheres, relacionada ao aumento do nível de estrógeno. As articulações das mulheres são geralmente mais flexíveis e menos densas que as dos homens. Gage et al.23 encontraram nas mulheres aproximadamente o dobro de colágeno tipo III no ligamento posterior da ATM, indicando que, nelas, esses tecidos são menos capazes de suportar pressão funcional. Para Rieder et al.24, a mulher é mais freqüentemente acometida por estresse que o homem e apresenta maior índice de doenças com envolvimento psicossomático. A soma dos fatores anatômicos e psicossomáticos poderia explicar a maior prevalência de DTM no gênero feminino. No presente estudo,
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ao avaliar a relação entre DTM e cefaléia, os dados mostram que, dentre as mulheres portadoras de DTM, 50% apresentam cefaléia, enquanto no sexo masculino essa proporção cai para 27,5%. No estudo realizado por Maciel25, 80% de todas as dores de cabeça relatadas estavam associadas a fontes musculares. Acredita-se que as atividades musculares da cabeça e do pescoço provavelmente desempenham um papel importante na etiologia de muitas dores de cabeça, sendo este o sintoma mais comum e a queixa mais relatada dentre os sintomas da disfunção temporomandibular. Garcia e Souza26 analisaram 34 pacientes portadores de disfunção temporomandibular e constataram que 53,9% apresentavam dor de cabeça; o sintoma mais comum entre seus pacientes foi o mioespasmo. Rocha et al.27, examinando mil pacientes portadores de DTM, demonstraram presença significativa de cefaléia em quase todos os grupos etários. Foram apontadas como principais queixas: cefaléia (70,1%), artralgia (75,7%), estalos articulares (72,7%) e mialgias (71,7%). A análise da distribuição da sintomatologia
por sexo revelou que uma parcela significativa dos sinais e sintomas estudados tinha maior prevalência nas mulheres que nos homens. Magnusson e Carlsson13 analisaram a relação entre cefaléia e sintomas clínicos relatados por 80 pacientes com DTM. Os resultados mostraram que 70% dos sujeitos apresentavam cefaléia recorrente e que a relação entre dor articular e cefaléia existia somente quando associada ao comprometimento muscular. Os pacientes com DTM apresentaram maior freqüência e gravidade de dor de cabeça do que os participantes do grupo controle e, em ambos os grupos, as mulheres eram mais afetadas pela cefaléia. Montal e Guimarães28, avaliando 121 pacientes com DTM, encontraram que a cefaléia foi relatada como queixa principal por 82,2% dos participantes, seguida de dor na região mandibular (68,0%) e otalgia (62,3%). Bove et al.29 avaliaram 150 indivíduos com DTM e a maioria referiu dor de cabeça (84%). Vários outros estudos corroboram a relação entre DTM e cefaléia, apontando que pacientes com cefaléia têm freqüentemente três ou mais sintomas
ligados à DTM ou já foram diagnosticados como portadores de DTM e que a correlação positiva desses dois fatores pode indicar maior agravamento no quadro clínico de dor30-33. O presente estudo pôde observar que em indivíduos não-portadores de cefaléia, de ambos os sexos, é menor a presença de DTM grave; em contrapartida, nos indivíduos portadores de cefaléia, não foi possível estabelecer uma relação direta com os níveis de disfunção. A compreensão da relação entre cefaléia e DTM ainda carece de estudos que determinem novos critérios de classificação e abordagem multidisciplinar, a fim de subsidiar o diagnóstico e tratamento dessas patologias.
CONCLUSÃO A porcentagem de universitários portadores de DTM e a prevalência desta no sexo feminino, encontrados neste estudo, corroboram os descritos na literatura. A relação entre DTM e cefaléia foi mais prevalente no sexo feminino. Não foi encontrada uma relação direta entre a gravidade da DTM e a presença de cefaléia.
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.188-93, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Intervenção psicomotora em crianças de nível socioeconômico baixo Psychomotor intervention on children of low socioeconomic status Ana Carolina de Campos1, Luiz Henrique Silva2, Karina Pereira3, Nelci Adriana Cicuto Ferreira Rocha4, Eloisa Tudella4
Estudo desenvolvido no Depto. de Fisioterapia da UFSCar – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil 1
Fisioterapeuta; mestranda no Programa de PG-FT – PósGraduação em Fisioterapia da UFSCar
2
Fisioterapeuta; aprimorando em Ortopedia e Traumatologia no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/USP, Ribeirão Preto, SP, Brasil
3
Profa. Dra. do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário de Araraquara, Araraquara, SP, Brasil
4
Profas. Dras. do Programa de PG-FT da UFSCar
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Ana Carolina de Campos R. Dona Alexandrina 1106 Centro 13566-290 São Carlos SP e-mail:
[email protected] Este estudo teve apoio de Bolsa de Iniciação Científica da Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Trabalho apresentado no XIII Congresso de Iniciação Científica da UFSCar e no XIII Simpósio de Fisioterapia da UFSCar, com publicação de resumo.
APRESENTAÇÃO jan. 2008
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO maio 2008
188
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RESUMO: Visou-se identificar o perfil psicomotor de crianças de baixo nível socioeconômico e verificar o efeito nelas de um programa de intervenção psicomotora. Participaram do estudo seis crianças do sexo masculino, na faixa de 10 a 12 anos (11,5±0,92). Os participantes foram avaliados utilizando-se uma bateria psicomotora que avalia sete fatores psicomotores: tonicidade, equilibração, lateralização, noção do corpo, estruturação espaço-temporal, praxia global e fina; de acordo com o desempenho da criança, os fatores são pontuados de 1 a 4; o escore 1 refere-se ao perfil apráxico, 2 ao dispráxico, 3 ao eupráxico e 4 ao hiperpráxico. Com base nas dificuldades detectadas foi elaborado um programa de intervenção psicomotora, aplicado durante três meses, em 16 sessões de uma hora de duração, duas vezes por semana. Ao término da intervenção os participantes foram reavaliados. Pela avaliação inicial, o perfil dos participantes foi predominantemente eupráxico nos fatores equilibração, lateralização, noção do corpo, praxia global e praxia fina; nos fatores tonicidade e estruturação espaço-temporal o perfil foi predominantemente dispráxico. Após o programa de intervenção houve aumento estatisticamente significativo (p<0.05) na pontuação nos fatores tonicidade, equilibração, estruturação espaço-temporal, praxia global e praxia fina, sugerindo que o programa de intervenção psicomotora aplicado beneficiou o desempenho psicomotor de crianças de baixo nível socioeconômico. DESCRITORES: Criança; Desempenho psicomotor; Fatores socioeconômicos A BSTRACT : This study aimed at outlining the psychomotor profile of socioeconomically disadvantaged children and at verifying the effect on them of an assessment-based psychomotor training program. Participants were six 10-to-12 year-old children (mean age 11.5±0.92), who were evaluated before and after the program by means of a psychomotor battery which assesses seven categories: tonus, equilibrium, lateralisation, body perception, time-space orientation, gross and fine praxis; scores range from 1 to 4, determining the following profiles: 1, apraxic; 2, dyspraxic; 3, eupraxic; 4, hyperpraxic. By drawing on children’s difficulties, a psychomotor playing program was applied during 3 months, in 16 one-hour sessions, twice a week. The initial evaluation showed participants profile to be predominantly eupraxic in equilibrium, lateralisation, body perception, gross and fine praxis; profile was mostly dyspraxic as to tonus and time-space orientation. After the program, scores significantly improved in tonus, equilibration, time-space orientation, gross, and fine praxis (p<0.05), thus suggesting that the program applied was able to benefit psychomotor performance of low socioeconomic status children. KEY WORDS: Child; Psychomotor performance; Socioeconomic factors
Campos et al.
Intervenção psicomotora em crianças
INTRODUÇÃO Na criança, a motricidade e a inteligência se desenvolvem como resultado da interação de fatores genéticos, culturais, ambientais e psicossociais. Um dos modos de avaliar o resultado da ação conjunta desses fatores é determinar o perfil psicomotor da criança, que indica a qualidade do desenvolvimento psicomotor, especificando as habilidades motoras mais e menos elaboradas adquiridas até o momento1. A organização do sistema nervoso é ricamente estimulada pela interação entre o indivíduo e o ambiente, que proporciona sensações de origem interoceptiva, proprioceptiva e exteroceptiva. No entanto, caso a integração com o meio não forneça os estímulos sensório-motores suficientes, é possível que a motricidade apresente desenvolvimento insatisfatório 1. Diversos autores apontam que fatores socioculturais exercem influência negativa sobre o desenvolvimento da criança 2-5. Barros et al. 2 destacam a baixa condição socioeconômica da família como aspecto fortemente prejudicial. Para Bowman e Wallace3, o ambiente pode influenciar negativamente o desenvolvimento da função vestibular, da integração visomotora, da força manual e da praxia. O nível de educação materno, o envolvimento dos pais e a estruturação familiar são outros itens que afetam o desenvolvimento psicomotor da criança4-6. O efeito das condições ambientais sobre o desenvolvimento psicomotor é um objeto de estudo bastante explorado, porém ainda com diversas lacunas. É consenso na literatura que o ambiente tem influência sobre a qualidade das aquisições da criança, uma vez que pode limitar suas possibilidades de interação. No entanto, o período de 10 a 12 anos permanece pouco discutido na literatura, tanto no que concerne à forma como o ambiente – especificamente, as condições socioeconômicas – podem afetar o desenvolvimento psicomotor das crianças nessa faixa5 quanto às possibilidades de atuação sobre as dificuldades apresentadas por essas crianças.
A identificação de fatores deficitários pela avaliação do perfil psicomotor é importante para traçar diretrizes de intervenção direcionadas à população em questão, seja para fins de prevenção ou de reeducação, no ambiente escolar ou terapêutico. Com base no perfil, podem ser elaborados programas de educação ou reeducação psicomotora, visando proporcionar motricidade espontânea, coordenada e rítmica e tornar o cérebro da criança um órgão com maior capacidade para captar, integrar, armazenar, elaborar e expressar informações1.
que podem ocorrer por meio da intervenção psicomotora pode auxiliar educadores e terapeutas a elaborar estratégias de intervenção adequadas para estimular seu desenvolvimento.
A intervenção psicomotora foi eficazmente aplicada em diversos estudos. Rintala et al. 7 , utilizando para avaliação o teste de desenvolvimento motor global, compararam os efeitos da educação física convencional e de um programa de intervenção psicomotora durante dez semanas, aplicados a crianças de 6 a 12 anos com desordens de linguagem. Os autores relatam aprimoramento das habilidades motoras globais após ambos os programas, mas a intervenção psicomotora exerceu maior influência sobre o resultado encontrado.
O estudo foi desenvolvido com 22 crianças que freqüentam o Projeto SOS Bombeiros no Resgate da Cidadania, dedicado ao atendimento socioeducativo de crianças e adolescentes de baixo nível socioeconômico. Todos os participantes tinham passado por avaliação socioeconômica prévia para poder freqüentar a instituição. Do total, apenas seis crianças do sexo masculino, com idade média de 11 anos e 6 meses, concluíram o programa de intervenção psicomotora, sendo quatro pertencentes ao nível socioeconômico C e dois ao nível D, de acordo com o critério da Abipeme – Associação Brasileira de Pesquisa de Mercado. Foram incluídas no estudo as crianças com idades entre 10 e 12 anos que participassem do Projeto acima mencionado e cujos responsáveis consentissem com sua participação no estudo, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Além daquelas que apresentassem transtornos no desenvolvimento, foram excluídas as crianças cujos responsáveis não assinaram o termo de consentimento, ou as que deixaram de freqüentar o Projeto SOS no período de intervenção psicomotora proposto neste estudo. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de São Carlos.
De acordo com Taneja et al.8, um programa de intervenção com duração de três meses é capaz de acelerar o desenvolvimento motor, mental e social de bebês e crianças institucionalizados. Kelly et al.9 e Connor-Kuntz & Dummer 10 verificaram aprimoramento de habilidades motoras globais em pré-escolares após a intervenção motora. As habilidades motoras finas também podem ser significativamente aprimoradas em pré-escolares com atraso no desenvolvimento11. Os relatos encontrados na literatura concentram-se no efeito da intervenção realizada precocemente, possivelmente porque se verifica que, quanto menor a idade das crianças, maior é o efeito positivo da estimulação8-11. Porém, poucos estudos esclarecem se crianças que não tiveram oportunidade de estabelecer desenvolvimento psicomotor adequado no início da infância podem ser estimuladas posteriormente ou estão fadadas a conviver com dificuldades. Conhecer o perfil psicomotor dessas crianças e as modificações
Diante do exposto, o presente estudo teve como objetivo identificar o perfil psicomotor e verificar o efeito de uma intervenção psicomotora em crianças de baixo nível socioeconômico na faixa de 10 a 12 anos.
METODOLOGIA
Instrumento de avaliação O instrumento de avaliação aplicado foi a Bateria Psicomotora (BPM) de Fonseca 1 . Esse instrumento, o mais adequado para atingir os objetivos aqui propostos, é de baixo custo e fácil aplicação, tendo sido empregado em
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alguns estudos visando caracterizar o perfil psicomotor e verificar efeitos de intervenção 12,13. Trata-se de um conjunto de testes que avalia o desenvolvimento da criança em sete fatores psicomotores: tonicidade, equilibração, lateralização, noção do corpo, estruturação espaçotemporal, praxia global e praxia fina, constituindo no total 42 tarefas. Cada fator é pontuado de 1 a 4 de acordo com o desempenho da criança, sendo 1 referente ao perfil apráxico, 2 ao dispráxico, 3 ao eupráxico e 4 ao hiperpráxico. Somando-se as pontuações dos sete fatores, obtém-se o escore que permite classificar o perfil psicomotor geral em deficitário (7 a 8 pontos), dispráxico (9 a 13 pontos), normal (14 a 21 pontos), bom (22 a 26 pontos) ou superior (27 a 28 pontos), ou seja, quanto maior o escore, melhor é o perfil psicomotor da criança.
Procedimentos Previamente, foram coletados dados sobre o desenvolvimento neurossensório-motor dos participantes utilizando-se ficha de avaliação elaborada especificamente para este estudo, e dados sobre o nível socioeconômico da família por meio do questionário da Abipeme. O estudo consistiu em avaliação Inicial, intervenção e reavaliação, como exposto a seguir. Avaliação individual: consistiu na aplicação da BPM a cada criança, com duração de 50 minutos, em uma sala oferecida pelo Projeto SOS. Antes do início da avaliação, os pesquisado-
res interagiam com a criança, explicando o que aconteceria durante a avaliação, para que ficasse familiarizada e tranqüila. A criança deveria estar vestida com roupas confortáveis e as tarefas da BPM eram apresentadas de forma lúdica, a fim de obter maior interesse e participação por parte da criança. Intervenção: após a análise do perfil obtido pela BPM, foi elaborado um programa de intervenção psicomotora, de atividades que pudessem favorecer o aprimoramento das dificuldades detectadas. O programa de intervenção psicomotora teve a duração de três meses, aplicado em duas sessões semanais de uma hora de duração (total de 16 sessões). Cada sessão foi subdividida em três fases: preparação, atividades motoras e retorno às condições de repouso. As atividades eram desenvolvidas de forma lúdica para envolver e motivar os participantes: Fase 1 (10 minutos), preparação: nessa etapa eram realizados alongamentos preparatórios gerais, incluindo da musculatura de membros superiores, membros inferiores e tronco; Fase 2 (40 minutos), atividades motoras: realizavam-se aí atividades lúdicas, incluindo jogos individuais ou em grupo, elaboradas com base na literatura referente à intervenção psicomotora14,15. O Quadro 1 sintetiza as atividades para cada fator psicomotor.
Quadro 1 Atividades motoras propostas para cada categoria psicomotora
Fator psicomotor Tonicidade Equilibração Lateralização Noção do corpo Estruturação espaço-temporal Praxia global Praxia fina
190
Atividades motoras Alongamentos, exercícios de suporte de peso Brincadeiras envolvendo equilíbrio dinâmico e estático, com apoio uni e bipodal Conscientização dos hemicorpos Relaxamento e vivências corporais Brincadeiras envolvendo músicas e gestos, atividades de planejamento espacial Jogos para coordenação óculo-manual e óculopedal, dissociação de membros superiores e inferiores, agilidade e velocidade Recorte e dobraduras; manuseio de objetos pequenos
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Fase 3 (10 minutos), retorno à condição de repouso: as crianças eram conduzidas em atividades de alongamento e relaxamento visando controle tônico e emocional, melhora da concentração e da auto-imagem. Reavaliação: ao final do programa de intervenção psicomotora, as crianças foram reavaliadas empregando-se a mesma bateria de testes.
Análise estatística Para verificar o efeito do programa de intervenção psicomotora, comparou-se a pontuação obtida na reavaliação com aquela obtida na avaliação inicial, por meio do teste t de Student para a pontuação em cada fator psicomotor e à somatória da pontuação em todos os fatores (p=0,05). Também foi feita uma análise descritiva, incluindo valores percentuais, para observação da distribuição dos perfis psicomotores pré e pós-intervenção.
RESULTADOS Na avaliação inicial, constatou-se predomínio do perfil psicomotor eupráxico nos fatores equilibração (84%), lateralização (67%), noção do corpo (84%), praxia global (84%) e praxia fina (67%). Por outro lado, constatou-se perfil psicomotor dispráxico nos fatores tonicidade (50%) e estruturação espaço-temporal (67%). Na reavaliação, ou seja, após o programa de intervenção, constatou-se que no fator equilibração manteve-se o predomínio do perfil eupráxico (67%), porém não houve participantes com perfil dispráxico (como anteriormente), e sim participantes apresentando perfil hiperpráxico (33%). No fator lateralização, a reavaliação revelou aumento na porcentagem de participantes com perfil hiperpráxico (50%). No fator noção do corpo não se verificou alteração na distribuição dos perfis. O fator praxia global o perfil evoluiu de predominantemente eupráxico para predominantemente hiperpráxico (67%); no fator praxia fina, embora o perfil tenha permane-
Campos et al.
100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0
Intervenção psicomotora em crianças
%
*
*
Dispráxico Eupráxico Hiperpráxico
*
A
R T
A
R E
*
*
A
R
A
L
R NC
A
R
A
EET
R PG
A
R PF
Perfil constatato nos fatores psicomotores
Gráfico 1 Distribuição (em %) dos perfis psicomotores observados nos participantes na avaliação e reavaliação psicomotora. A: avaliação; R: reavaliação; T: tonicidade; E: equilibração; L: lateralização; NC: noção do corpo; EET: estruturação espaço-temporal; PG: praxia global; PF: praxia fina; * diferença estatisticamente significativa cido eupráxico, nenhum participante revelou perfil dispráxico, e outros passaram a apresentar perfil hiperpráxico (33%). Quanto aos fatores tonicidade e estruturação espaço-temporal, a reavaliação permitiu constatar que todos os participantes atingiram o perfil eupráxico. O Gráfico 1 sumariza os resultados da avaliação inicial e da reavaliação. As diferenças de pontuação foram estatisticamente significativas nos fatores tonicidade (p=0,008), equilibração (p=0,01), estruturação espaço-temporal
(p=0,05), praxia global (p=0,0006) e praxia fina (p=0,03). O perfil psicomotor geral (escore correspondente à soma das pontuações nos sete fatores) foi significativamente diferente após o programa de intervenção psicomotora (t=7,52, gl=6, p<0,001), conforme se observa no Gráfico 2. A média da pontuação antes da intervenção psicomotora foi 19,46 pontos (±1,7), classificando o perfil geral como normal e, após o programa de intervenção psicomotora, foi 22,83 pontos (±1,1), classificando o perfil geral como bom. *
25
Pontuação média na BPM
24 23 22 21 20 19
Máximo
18
Desvio padrão Média
17
Mínimo
16 15 Avaliação
Reavaliação
Gráfico 2 Pontuação média dos participantes na avaliação e reavaliação psicomotora. BPM = bateria psicomotora; * diferença estatisticamente significativa
DISCUSSÃO O presente estudo buscou verificar o efeito de intervenção psicomotora em crianças de baixo nível socioeconômico, constatando diferenças no perfil após a intervenção. Na avaliação inicial, predominou o perfil eupráxico na maioria dos fatores, exceto tonicidade e estruturação espaço-temporal, em que as crianças apresentaram perfil dispráxico, ou seja, abaixo do esperado para a faixa etária. No estudo de Pereira16, o perfil psicomotor eupráxico predominou em crianças saudáveis de 7 anos de idade, freqüentadoras da rede particular de ensino. Assim, seria esperado que na faixa de 10 a 12 anos houvesse predomínio do perfil hiperpráxico, ou que, ao menos, crianças nessa idade estivessem passando por uma transição do perfil eupráxico para o hiperpráxico. Na reavaliação, manteve-se o predomínio do perfil eupráxico na maioria dos fatores, porém já delineando uma transição para o perfil hiperpráxico, visto que nos fatores equilibração e praxia fina houve participantes que passaram a apresentar perfil hiperpráxico e, no fator praxia global, passou a haver predomínio do perfil hiperpráxico. No fator tonicidade todos os participantes passaram a apresentar perfil eupráxico, o que pode proporcionar uma base estável para o desempenho psicomotor nos outros fatores, uma vez que a organização tônica é um suporte para toda a atividade motora 1 . Da mesma forma, o aprimoramento da equilibração favorece que o indivíduo possa realizar atividades motoras com baixo gasto energético. Com isso, o desempenho motor de forma geral é favorecido1. Após a intervenção psicomotora, a maior diferença foi notada no desempenho no fator estruturação espaçotemporal. Este era o fator com maior porcentagem de participantes com perfil dispráxico e todos evoluíram para o perfil eupráxico. O aprimoramento observado nas habilidades de estruturação espaço-temporal permite movimentos rítmicos e organizados, sendo crucial no desempenho coordenado de qualquer ato motor17. O re-
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sultado observado pode, ainda, favorecer a capacidade de aprendizagem das crianças, uma vez que a má estruturação espaço-temporal está associada com dificuldades de aprendizagem escolar 18. Na praxia global, o perfil médio das crianças evoluiu de predominantemente eupráxico para hiperpráxico, favorecendo a habilidade na execução das atividades motoras. Este resultado concorda com o de Valentini19, que também verificou, após intervenção motora, ganho qualitativo nas habilidades motoras globais, como chutar e arremessar, em crianças em idade escolar que apresentavam atraso motor em relação a sua faixa etária. O resultado observado quanto à praxia fina sugere transição para o perfil hiperpráxico, fato que pode ter impacto positivo no desempenho escolar dos participantes 18. Além disso, de acordo com Piek et al.20, crianças com desempenho motor fraco estão em risco de dificuldades sociais, emocionais e comportamentais, o que justifica a importância de intervir nas dificuldades motoras apresentadas. Quanto ao fator lateralização, apesar de não se ter observado diferença estatisticamente significativa, observou-se evolução no perfil psicomotor dos participantes. Com relação ao fator noção do corpo, não se verificou alteração com o programa de intervenção. Macedo et al.21 observaram, em escolares de baixo nível socioeconômico, grande prevalência de dificuldade na formação do esquema corporal, independentemente da participação em programas de estimulação. No entanto, considerando-se que essa habilidade está em constante adaptação ao longo da vida do indivíduo, sugere-se que uma intervenção mais
192
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especificamente direcionada para a noção corporal possa resultar em aprimoramento. Considerando-se a pontuação geral, verificou-se que a intervenção psicomotora aplicada favoreceu significativamente o aprimoramento do perfil psicomotor dos participantes, que passou de normal para bom. Diversos estudos confirmam o fato de que programas de intervenção psicomotora exercem importante contribuição no desenvolvimento de crianças expostas a fatores de risco. Para Goodway e Branta22 as habilidades de locomoção e controle de objetos (como lançar e chutar a bola) podem ser aprimoradas com programas de intervenção direcionados a pré-escolares com atraso motor. Pré-escolares típicos também podem se beneficiar da intervenção, como relatado por Kelly et al.9, o que sugere que a reeducação é viável e benéfica no ambiente escolar, onde se encontram tanto crianças expostas a fatores de risco quanto crianças com desenvolvimento saudável. Além dos benefícios citados, a expansão das habilidades promovida pela intervenção psicomotora representa um resultado importante também pelos efeitos psicossociais proporcionados à criança. De acordo com Miller et al.23, dificuldades motoras na infância podem ter impacto negativo sobre a autopercepção de competência, resultando em prejuízo ao autoconceito, baixa auto-estima, problemas comportamentais e desajuste social. Como as dificuldades motoras são potencialmente modificáveis, a identificação e tratamento dos défices motores são importantes para amenizar os possíveis efeitos negativos dessas dificuldades. Para crianças de baixo nível
socioeconômico, acrescenta-se a possibilidade de promover maior inclusão social, contribuindo para reduzir as barreiras sociais que interferem em seu desenvolvimento. Os resultados obtidos sugerem que a amostra estudada apresentava desempenho inadequado para a faixa etária, pois espera-se que crianças a partir de 8 anos não tenham dificuldades com habilidades psicomotoras básicas 1,17, mas que o programa de intervenção foi capaz de induzir mudanças em seu perfil psicomotor. Tendo em vista que nesta faixa etária as mudanças não são tão rápidas como as ocorridas em crianças mais jovens17, considera-se que os resultados observados em tão curto período de tempo refletem efeitos positivos do programa de intervenção.
CONCLUSÃO Os resultados sugerem que o programa de intervenção foi capaz de beneficiar o desempenho psicomotor dos participantes. Novos estudos são necessários, com amostra maior e maior período de intervenção psicomotora, porém o fato de os participantes terem apresentado evolução no perfil psicomotor sugere que, na faixa de 10 a 12 anos, ainda é possível intervir, promovendo aprimoramento no perfil psicomotor das crianças. Desse modo, programas de intervenção psicomotora devem ser incentivados, principalmente em comunidades de baixo nível socioeconômico, a fim de permitir as melhores oportunidades possíveis para um desenvolvimento saudável e amenizar os efeitos desfavoráveis das condições socioeconômicas sobre o desenvolvimento infantil.
Campos et al.
Intervenção psicomotora em crianças
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Fisioter Pesq. 2008;15(2) :188- 93
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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.194-9, abr./jun. 2008
ISSN 1809-2950
Comportamento quimiometabólico do músculo sóleo na fase aguda da imobilização articular Chemical metabolic behaviour of the soleus muscle during the acute phase of joint immobilisation Luciano Júlio Chingui1, Rommel Padovan Braquinho1, Maria Theresa Munhoz Severi1, Carlos Alberto da Silva2
Estudo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia da Unimep – Universidade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, SP, Brasil 1
Fisioterapeutas Ms.
2
Prof. Dr. do Programa de PósGraduação em Fisioterapia da Unimep
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Luciano J. Chingui R. São Sebastião 125 Vila Monteiro 13418-485 Piracicaba SP e-mail:
[email protected] Este estudo contou com apoio financeiro da Capes – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
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ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jun. 2008
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RESUMO: O objetivo foi avaliar o perfil fisiológico do músculo sóleo na fase aguda da imobilização articular na posição de 90o. Ratos Wistar foram divididos em 4 grupos (n=6 cada): controle (C), imobilizado por 1 (Im1), 2 (Im2) e 3 dias (Im3). Após o período experimental, o músculo sóleo foi retirado e foram mensurados: o peso muscular, o índice de hidratação, a concentração de glicogênio e a concentração de DNA/proteínas totais. Os dados foram submetidos a análise estatística, com nível de significância fixado em p<0,05. No primeiro dia não houve alterações nas reservas glicogênicas, sendo observada redução progressiva das reservas: 53% no segundo dia e 65% no terceiro dia de imobilização. O peso muscular sofreu redução de 28,57% apenas no terceiro dia; o índice de hidratação aumentou 6,44% no segundo e 8,58% no terceiro dia. As concentrações de DNA tiveram elevação de 43,18% no primeiro dia, 59,09% no segundo e 75% no terceiro. Quanto à concentração de proteínas totais, houve elevação de 45,9% no primeiro dia, 32,25% no segundo e 58,95% no terceiro dia. Os resultados sugerem que a hipotrofia muscular é um processo desencadeado precocemente, envolvendo alterações quimiofisiológicas que são deflagradas na fase aguda da imobilização. DESCRITORES: Atrofia muscular; Imobilização; Músculo esquelético/metabolismo ABSTRACT: The purpose of this study was to outline a physiological profile of the soleus muscle during the acute phase of joint immobilization at a 90º position. Male Wistar rats were divided into four groups (n=6): Control (C), immobilised for 1 (Im1), 2 (Im2), and 3 (Im3) days. After the experimental period, the soleus muscle was obtained in order to assess: glycogen content, muscle weight, hydration index, and protein-DNA interactions. Data were statistically analysed and significance level set at p<0.05. On the first day, no changes were observed on glycogen content, but progressive reduction was witnessed along the following days –53% on the second day and 65% on the third day of immobilization. Muscle weight suffered a reduction of 28.57% only on the third day, while hydration index increased 6.44% on the second day and 8.58% on the third day. Concentrations of DNA raised 43.18% on the first day, 59.09% on the second, and 75% on the third day. Protein concentrations also increased, reaching values of 45.9% on the first day, 32.25% on the second day, and 58.95% on the third day. These results suggest that muscular hypotrophy is an early-developing process, involving chemical-physiological alterations that are launched during the acute phase of immobilization. KEY WORDS: Immobilisation; Muscle, skeletal/metabolism; Muscular atrophy
Chingui et al.
Efeito da imobilização no músculo sóleo
INTRODUÇÃO A musculatura esquelética constitui um dos principais tecidos alvos da fisioterapêutica, uma vez que está envolvida com diversas afecções, em especial as ortopédicas. No âmbito da ortopedia, a imobilização é um recurso terapêutico eficiente e amplamente utilizado, mas que acarreta diversos efeitos indesejados, como o comprometimento da homeostasia das fibras musculares. A literatura científica mostra que, simultaneamente ao desuso, ocorrem alterações como hipotrofia muscular, fibrose intramuscular, redução da extensibilidade muscular, além de limitação de movimento articular1. Nesse contexto, tem-se caracterizado a hipotrofia como um processo específico em cada tipo de músculo 2 . As fibras do tipo I têm menor capacidade de adaptação do que as fibras do tipo II, sendo conseqüentemente mais afetadas pelo desuso3. Isso é ratificado por Caiozzo et al.4, segundo os quais músculos cuja ação é antigravitacional têm maior grau de hipotrofia em situações de desuso. Kasper et al.5 observaram maior susceptibilidade à hipotrofia em fibras lentas oxidativas e Tanaka et al.6 observaram no músculo sóleo maior comprometimento em situação de desuso, por ser predominantemente formado por fibras do tipo I, ao passo que o extensor longo dos dedos, que tem predomínio de fibras do tipo II, é menos comprometido. Observou-se ainda que as fibras lentas em situação de desuso apresentam marcantes alterações histofisiológicas como irregularidades no retículo sarcoplasmático, fibrilas desintegradas, lesão mitocondrial, linhas Z estendidas, bem como condensação e fragmentação da cromatina nuclear e redução de sarcômeros em paralelo5,7,8. Alguns estudos vêm tentando elucidar as alterações metabólicas geradas pela imobilização. Assim, Hilder et al.9 em estudo realizado com suspensão de membros posteriores de ratos, demonstraram que a resistência à insulina acompanha o processo de atrofia muscular induzida pelo desuso em músculos esqueléticos de contração lenta, como o músculo sóleo. Simultaneamente, esses autores observaram
uma redução na expressão de proteínas nos músculos hipotrofiados e a correlacionaram à degradação da proteína IRS-1; e, ainda observaram uma redução na atividade da Akt. Esses achados evidenciam uma redução na efetividade da sinalização insulínica. Diversas pesquisas encontraram perdas de massa muscular em períodos de imobilização. Ohira et al. 10 observaram em ratos a implantação rápida da hipotrofia em períodos de sete e dez dias de imobilização por suspensão, sendo evidenciado que, após o 10o dia, a perda de massa ocorre com menor velocidade. Outros estudos indicam que longos períodos de imobilização promovem redução nas fibras musculares, merecendo destaque o estudo de Veldhuizen et al. 11, que verificaram, através de biópsia muscular, redução de 16% no diâmetro da fibra do músculo vasto lateral após quatro semanas de imobilização. Chakravarthy et al. 12 demonstraram uma significativa redução na massa do músculo sóleo e no potencial de proliferação das células satélites residentes após três semanas de imobilização. Outros estudos, como os realizados por Ohira et al. 10 , Kano et al. 13 , Edgerton et al.14 e Morris et al.15, também observaram implantação da hipotrofia muscular em períodos de imobilização que variam de cinco dias a várias semanas. Vale salientar que não há na literatura estudos direcionados à compreensão dos mecanismos fisiológicos deflagrados nos primeiros dias de imobilização, sendo esse considerado o período agudo do desuso. Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi avaliar o perfil metabólico do músculo sóleo na fase aguda da imobilização do tornozelo de ratos na posição de 90o, com foco no período que se estende do primeiro ao terceiro dia de desuso.
METODOLOGIA Foram utilizados ratos albinos Wistar com 3 meses de idade, alimentados com ração (Purina® para roedores) e
água ad libitum, submetidos a ciclos de 12 h claro/escuro e distribuídos em quatro grupos experimentais com seis animais, a saber: controle (C) e imobilizados 1 dia (Im1), 2 dias (Im2) e 3 dias (Im3). O trabalho foi aprovado pelo comitê de ética em experimentação animal da UFSCar. Após anestesia com pentobarbital sódico (50 mg/kg, i.p), a pata posterior esquerda dos animais foi imobilizada com o modelo de órtese de resina acrílica proposto por Silva et al.16. Após a fase de imobilização, os animais foram sacrificados por deslocamento cervical e o músculo sóleo (S) foi retirado e preparado para a determinação de reservas glicogênicas, peso seco, porcentagem de hidratação e concentrações de DNA e proteínas totais. Para a determinação do glicogênio, as amostras dos músculos foram digeridas em KOH 30% a 100°C e o glicogênio precipitado a partir da passagem por etanol a quente. Entre uma fase e outra da precipitação, a amostra foi centrifugada a 3.000 rpm durante 10 minutos. O glicogênio precipitado foi submetido à hidrólise ácida na presença de fenol, segundo a proposta de Siu et al.17, estando os valores expressos em mg/100mg de peso úmido. Para a obtenção do índice de hidratação e do peso seco, imediatamente após a retirada do músculo, o mesmo foi pesado em balança semi-analítica e em seguida colocado em uma estufa a 60ºC. Subseqüentemente, o músculo foi pesado a cada 1 hora até permanecer com peso constante (em mg). Assim, pela diferença entre o peso inicial (peso úmido) e o peso final, foi determinado tanto o índice de hidratação muscular (em %) como o peso seco (em mg). A determinação das proteínas totais foi realizada com kit laboratorial da marca BioDiagnóstica ® , e do DNA pela metodologia proposta por Giles e Myers18. Assim, para a determinação do DNA muscular foi preparado inicialmente o homogenato composto por 100 mg de músculo e 1 ml de HclO 4 , misturando-se em seguida o
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Glicogênio mg/100mg
homogenato com solução de difenilamina e HclO4, seguido de agitação e banho-maria a 30°C durante 12 horas; após esse período foi realizada leitura espectrofotométrica a 595 nm; os valores estão expressos em mg/ 100mg. 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0
Os valores estão representados pelas médias ± erro padrão (média±ep). Na análise estatística foi utilizado o teste de normalidade de KolmogorovSmirnov, seguido da análise de variância ANOVA e teste de Tukey, com nível de significância de 5% (p<0,05).
* *
C
Im1 Im2 Grupos experimentais
Im3
C
Im1 Im2 Grupos experimentais
*
*
0,06 0,04 0,02 0
*
*
76 74 72 70 68 C
Im1 Im2 Grupos experimentais
Im3
Gráfico 3 Índice de hidratação muscular (%) nos grupos controle (C) e imobilizados um dia (Im1), dois dias (Im2) e três dias (Im3); valores em média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao controle (C) 10 8
*
*
*
6 4 2 0
C
Im1 Im2 Grupos experimentais
Im3
Gráfico 4 Concentração de DNA muscular (mg/100mg) nos grupos controle (C) e imobilizados um dia (Im1), dois dias (Im2) e três dias (Im3); valores em média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao controle (C)
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78
Proteínas totais (mg/100mg)
DNA muscular (mg/100mg)
*
0,08
80
Im3
Gráfico 2 Peso muscular (mg) nos grupos controle (C) e imobilizados um dia (Im1), dois dias (Im2) e três dias (Im3); valores em média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao controle (C) 0,1
Hidratação muscular (%)
Peso muscular (mg)
*
Em relação às reservas glicogênicas (Gráfico 1), a imobilização não provocou alterações significativas nas primeira 24 horas, sendo observados os seguintes valores: C, 0,52±0,07 e Im1, 0,46±0,04 mg/100mg (p>0,05). Por outro lado, houve redução significativa progressiva no segundo e terceiro dias, de 53% no grupo imobilizado 2 dias (C, 0,52±0,07 e Im2, 0,24±0,06 mg/100mg, p<0,05) e 65% no grupo imobilizado 3 dias (C, 0,52±0,07 e Im3, 0,18±0,03 mg/ 100mg, p<0,05). A avaliação do peso muscular revelou diferença significativa apenas no terceiro dia de desuso, quando foi observada redução de 28,57% (C, 35±2 e Im3, 25±1 mg, p<0,05 – Gráfico 2). O Gráfico 3 ilustra o índice de hidratação, observando-se aumen-
Gráfico 1 Conteúdo de glicogênio (mg/100mg) nos grupos controle (C) e imobilizados um dia (I1), dois dias (I2) e três dias (I3); valores em média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao controle (C) 40 35 30 25 20 15 10 5 0
RESULTADOS
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C
Im1 Im2 Grupos experimentais
Im3
Gráfico 5 Concentração de proteína total muscular (mg/ 100mg) nos grupos controle (C) e imobilizados um dia (Im1), dois dias (Im2) e três dias (Im3); valores em média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao controle (C)
Chingui et al.
Efeito da imobilização no músculo sóleo
to de 6,44% no segundo dia (C, 71,42±0,42 e Im2, 76,02±1%, p<0,05); de 8,58% no terceiro dia (C, 71,42±0,35 e Im3, 77,55±0,38%, p<0,05). A avaliação das concentrações de DNA (Gráfico 4) mostra elevação de 43,18% (C, 0,044±0,0017 e Im1, 0,063±0,0061 mg/100mg, p<0,05) no primeiro dia; de 59,09% no segundo dia (C, 0,44±0,0017 e Im2, 0,070±0,0047 mg/100mg, p<0,05); e 75% no terceiro dia (C, 0,044±0,0017 e Im3, 0,077±0,011 mg/100mg, p<0,05). Quanto ao conteúdo de proteínas totais, foi observada no primeiro dia elevação de 45,90% (C, 5,058±0,26 e Im1, 7,38±0,27 mg/100mg, p<0,05); de 32,25%, no segundo (C, 5,58±0,26 e Im2, 7,38±0,78 mg/100mg, p<0,05); e de 58,95% no terceiro dia (C, 5,058±0,26 e Im3, 8,04±0,7 mg/100mg, p<0,05), como mostra o Gráfico 5.
DISCUSSÃO Desde a década de 1970, não se obtém um consenso frente às alterações histo-quimiofisiológicas induzidas pelo desuso muscular, sendo observados resultados contraditórios, que descrevem graus diferenciados de susceptibilidade à atrofia e relações funcionais diferenciadas de acordo com o tipo da fibra muscular e o local em que esta se encontra19-22. Alguns estudos sugeriram que as alterações mais evidentes da atrofia ocorrem nos dias iniciais do desuso, indicando a possibilidade de haver certa temporização nas alterações da homeostasia das fibras musculares quando submetidas à imobilização23,24. Nesse sentido, entende-se que os maiores comprometimentos homeostásicos ocorram na fase inicial do desuso, de modo que, à medida que a situação de desuso torna-se crônica, o declínio das funções metabólicas ocorre de forma mais rápida25, como evidenciado em trabalho recente26.
No presente estudo iniciou-se avaliando o conteúdo glicogênico muscular, uma vez que esta reserva é marcadora tanto das condições energéticas quanto da condição de performance do músculo esquelético27. Ao avaliar as reservas de glicogênio, observa-se que, no primeiro dia de desuso, não houve alteração significativa; mas na progressão da análise, observou-se redução no conteúdo, que foi intensificada no segundo e terceiro dias.
Após evidenciar a perda de massa muscular, avaliou-se a concentração de DNA e proteína total, sendo observado que os músculos apresentaram elevação progressiva nas concentrações. Alguns pontos a esse respeito merecem destaque, como por exemplo o fato de que as medidas de proteína e DNA têm sido muito utilizadas em diferentes estudos para indicar tamanho e número de células em um tecido 35.
O músculo sóleo é composto por 84% de fibras tipo I. Por essa razão, a redução no conteúdo glicogênico pode dever-se ao fato de os músculos vermelhos apresentarem uma maior população de receptores de insulina; dessa maneira, esse trabalho ratifica estudos que sugerem que, entre a terceira e oitava hora após a imobilização, já há significante redução na população dos receptores insulínicos, comprometendo a cascata sinalizadora da insulina, principalmente no que se refere às vias citosólicas ligadas à síntese de glicogênio, predispondo ao quadro de resistência à insulina e concomitante redução nas reservas glicogênicas 28-30.
O desenvolvimento de hipotrofia observado nos resultados tem relação direta com o balanço entre a taxa de síntese e degradação das proteínas36. Por outro lado, por haver elevação no índice de hidratação, é sugestivo o fato de neste estudo ter se verificado comprometimento de outros sistemas ativados, concomitante à elevação na permeabilidade capilar, como por exemplo a elevação no extravasamento de proteínas plasmáticas. Levanta-se aqui uma hipótese explicativa. De acordo com observações de Durigan37, o modelo de órtese aqui utilizado geraria redução na deambulação logo no primeiro dia do desuso. Assim, sincronicamente à imobilização também ocorre edema leve, contribuindo ainda mais para a redução na movimentação exploratória. Possivelmente, os resultados da mensuração da concentração de DNA e proteínas totais podem representar um somatório do conteúdo pertencente às fibras musculares in situ e do proveniente de outros fatores decorrentes do maior índice de hidratação, como um possível infiltrado de células do sistema imunológico e/ou de outras estruturas.
Quanto ao comportamento do peso muscular, foi observado que somente no terceiro dia de imobilização o peso mostrou-se reduzido, fato que pode ter relações com a redução na síntese proteica simultânea à elevação na proteólise26,31-33. Optou-se por também avaliar o índice de hidratação, sendo verificado que no segundo e terceiro dia da imobilização a hidratação foi significativamente maior. Esse aumento da hidratação pode ser reflexo da liberação local de substâncias vasoativas na tentativa de melhorar a perfusão tecidual e assim modificar o padrão de oferecimento de substratos ou oxigênio34. Assim, a redução no peso observado no terceiro dia de desuso é resultante de um processo de proteólise que ocorre simultaneamente à elevação no índice de hidratação.
CONCLUSÃO Durante a imobilização, uma diversidade de fatores compromete a homeostasia do tecido muscular desencadeando hipotrofia. Tais fatores são ativados logo nos primeiros três dias do desuso.
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Estabilização segmentar da coluna lombar nas lombalgias: uma revisão bibliográfica e um programa de exercícios Spinal segmental stabilisation in low-back pain: a literature review and an exercise program Fábio Jorge Renovato França1, Thomaz Nogueira Burke1, Daniel Cristiano Claret2, Amélia Pasqual Marques3
Estudo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Reabilitação do Fofito/ FMUSP – Depto. de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil 1
Mestrandos no Programa de Ciências da Reabilitação do Fofito/FMUSP
2
Fisioterapeuta Ms.
3
Profa. Livre-Docente do Fofito/ FMUSP
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Fábio J. R. França Fofito/FMUSP Rua Cipotânea 51 Cidade Universitária 05360-160 São Paulo SP e-mail:
[email protected]
APRESENTAÇÃO nov. 2006
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO ago. 2007
200
Fisioter Pesq. 2008;15(2) :200-6
RESUMO: No tratamento de lombalgias, exercícios tradicionais de fortalecimento dos músculos abdominais e extensores do tronco têm sido alvo de críticas por submeter a coluna vertebral a altas cargas de trabalho, aumentando o risco de nova lesão. Estudos recentes comprovam a eficácia da estabilização segmentar como tratamento para a lombalgia, sendo menos lesiva por ser realizada em posição neutra. Pesquisas sugerem que, sem a ativação correta dos estabilizadores profundos do tronco, as recidivas do quadro álgico são notadas com muita freqüência. Este estudo procedeu à revisão da literatura sobre o tratamento das lombalgias mediante estabilização da coluna e propõe exercícios para seu tratamento baseados na estabilização segmentar lombar. Na base PubMed, por meio dos descritores estabilização lombar, multífido lombar, transverso do abdome e os equivalentes em inglês, foram selecionados 47 artigos e livros publicados entre 1984 e 2006. A literatura estabelece um elo entre lombalgia e escasso controle dos músculos profundos do tronco, em especial o multífido lombar e o transverso do abdome; estudos também indicam os músculos quadrado lombar e diafragma como estabilizadores lombares. Propõem-se assim exercícios de contrações isométricas sincronizadas, sutis e específicas, que atuam diretamente no alívio da dor por meio do aumento da estabilidade do segmento vertebral. DESCRITORES: Dor lombar/reabilitação; Terapia por exercício; Multífido lombar; Transverso do abdome; Revisão ABSTRACT: When treating low-back pain, traditional exercises for strengthening abdomen and trunk erector muscles have been criticised for their submitting spinal structures to high loads, thereby increasing the risk of new injury. Recent studies have pointed to the effectiveness of segmental stabilisation in treating low-back pain, less damaging since it is done in neutral position. Current research suggests that, unless the trunk deep stabilizers are correctly activated, recurrence of pain is more often noticed. This is a review of 47 articles and books published between 1984 and 2006, resulting from a search in PubMed database by means of key words lumbar stabilization, lumbar multifidus and transversus abdominis muscles. Literature has established a link between lowback pain and poor control of deep trunk muscles, particularly the lumbar multifidus and transversus abdominis muscles; some studies also point out the quadratus lumborum and diaphragm muscles as lumbar stabilizers. By drawing on the reviewed material, we suggest exercises of subtle and specific synchronized isometric contractions for these lumbar stabilisers, which act directly upon pain relief by increasing lumbar spine stability. KEY WORDS: Low-back pain/rehabilitation; Lumbar Multifidus; Transversus Abdominis; Review
França et al.
Estabilização segmentar lombar na lombalgia
INTRODUÇÃO A lombalgia está hoje presente em todas as nações industrializadas1. Afeta de 70% a 80% da população adulta em algum momento da vida2, com predileção por adultos jovens, em fase ativa3. É uma das causas mais freqüentes de atendimento médico, e a segunda causa de afastamento do trabalho4. Citam-se como causas processos degenerativos, inflamatórios e alterações congênitas e mecânico-posturais. Estas últimas são responsáveis por grande parte das dores. Nelas ocorre um desequilíbrio entre a carga funcional (esforço requerido para atividades do trabalho e da vida diária) e a capacidade funcional, que é o potencial para a execução 2. Um grande número de intervenções fisioterapêuticas tem sido utilizadas, como exercícios aeróbios, de flexão e extensão da coluna para o tronco, realizados com os membros inferiores, de inclinação pélvica, órteses e alongamentos5. O exercício realizado em prono com extensão do tronco e dos membros inferiores é contra-indicado, pois há risco de lesão ou recidiva. Nessa tarefa, a região lombar submete-se a carga maior que 4000 N, transferindo-a para as facetas, podendo oprimir o ligamento interespinhoso6. A aplicação de terapias passivas superiores a seis semanas, além de ocasionar custos, é pouco eficaz 7. Mesmo na melhora da dor, é difícil precisar quais características dos exercícios são responsáveis pelo sucesso do tratamento8. Entre as técnicas utilizadas, encontra-se o conceito da estabilização segmentar lombar (ESL), caracterizada por isometria, baixa intensidade e sincronia dos músculos profundos do tronco, com o objetivo de estabilizar a coluna lombar, protegendo sua estrutura do desgaste excessivo 8 . O´Sullivan et al. 9 observaram que exercícios para o músculo multífido lombar eram efetivos na redução da dor e da disfunção lombar causada por espondilólise ou espondilolistese, mesmo após 30 meses do término do tratamento. Este trabalho objetivou reunir evidências em ensaios clínicos que de-
monstrem a eficácia da ESL no alívio da dor e na recorrência, além de propor exercícios para os músculos profundos do tronco, em vista da estabilização da coluna lombar, para prevenção e/ou tratamento da lombagia.
METODOLOGIA Procedeu-se à busca na base de dados PubMed mediante os descritores estabilização lombar, multífido lombar, transverso do abdome e os correspondentes em inglês lumbar stabilization, lumbar multifidus, transversus abdominis, tendo sido selecionados 47 artigos e livros publicados entre 1984 e 2006. Os principais achados são a seguir comentados discutindo-se a estabilidade da coluna, o papel dos principais músculos em sua estabilização, os mecanismos compensatórios, para, finalmente, propor um programa de exercícios com base nesses achados.
ESTABILIDADE DA COLUNA Segundo Panjabi10, a estabilidade da coluna decorre da interação de três sistemas: passivo, ativo e neural. O sistema passivo compõe-se das vértebras, discos intervertebrais, articulações e ligamentos, que fornecem a maior parte da estabilidade pela limitação passiva no final do movimento. O segundo, ativo, constitui-se dos músculos e tendões, que fornecem suporte e rigidez no nível intervertebral, para sustentar forças exercidas no dia-a-dia. Em situações normais, apenas uma pequena quantidade de co-ativação muscular, cerca de 10% da contração máxima, é necessária para a estabilidade. Em um segmento lesado pela frouxidão ligamentar ou pela lesão discal, um pouco mais de co-ativação pode ser necessária. O último sistema, o neural, é composto pelos sistemas nervosos central e periférico, que coordenam a atividade muscular em resposta a forças esperadas ou não, fornecendo assim estabilidade dinâmica. Esse sistema deve ativar os músculos corretos no tempo certo, para proteger a coluna de lesões e permitir o movimento.
Barr et al.11 definiram a estabilidade como um processo dinâmico que inclui posições estáticas e movimento controlado. Isso inclui um alinhamento em posições sustentadas e padrões de movimento que reduzam a tensão tecidual, evitem causas de trauma para as articulações ou tecidos moles, e forneçam ação muscular eficiente. Bergmark 12 propôs o conceito de vários músculos com diferentes papéis na estabilidade dinâmica. A hipótese é que há dois sistemas atuando na estabilidade. O global consiste de grandes músculos produtores de torque, atuando no tronco e na coluna sem serem diretamente ligados a ela. São eles o reto do abdome (RA), o oblíquo externo (OE) e a parte torácica do iliocostal lombar. Fornecem estabilidade ao tronco, não sendo capazes de influenciar diretamente a coluna. O sistema local é formado por músculos ligados diretamente à vértebra e responsáveis pela estabilidade e controle segmentar. Tais músculos são o multífido lombar (ML), o transverso do abdome (TA) e as fibras posteriores do oblíquo interno (OI). O quadrado lombar (QL) também tem funções estabilizadoras, discutidas abaixo.
Multífido lombar na estabilidade Os músculos lombares estabilizam o segmento lombar12. Alguns, contudo, têm um potencial maior e contribuem mais especificamente na estabilidade. Um estudo mostrou que o ML é capaz de fornecer rigidez e controle de movimento na zona neutra13. Consiste em pequenos feixes dirigidos do sacro à C2, atingindo seu máximo desenvolvimento na lombar. No sacro, origina-se da superfície posterior e medial da espinha ilíaca póstero-superior e ligamentos sacroilíacos posteriores. Na inserção, abrange duas a quatro vértebras, inserindo-se no processo espinhoso de uma vértebra acima14. Wilke et al.15 observaram que, próximo à L4-L5, o ML contribui com 2/3 do aumento da rigidez segmentar resultante da contração. Assim, qualquer lesão no segmento pode comprome-
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ter a estabilidade16. Evidenciou-se uma forte relação entre a má funcionalidade do ML e a recorrência da dor após cirurgia discal17. Estudos16,18,19 mostraram que ocorre uma disfunção do ML após um primeiro episódio de lombalgia unilateral. Uma rápida atrofia no ML foi demonstrada ipsilateralmente ao local de dor por meio de ultra-som18. Hides et al.16 notaram que a recuperação do ML não ocorre espontaneamente na remissão da dor. Acredita-se que possíveis mecanismos para a atrofia sejam a inibição reflexa ou a inibição da dor via arco reflexo18. Em virtude dos efeitos indiretos da inibição terem sido vistos na ausência de dor, o mecanismo mais provável foi o reflexo de inibição19. Uma das explicações para a alta taxa de recidivas em lombálgicos pode ser o fato de o ML não recuperar o volume mesmo após a redução da dor, comprometendo a estabilidade16. Hides et al.20 mostraram que os exercícios específicos de ESL para o ML podem aumentar seu volume em lombálgicos, diminuindo a atrofia. Nesse estudo, indivíduos com o primeiro episódio de lombalgia unilateral com atrofia do ML foram divididos em grupo controle, recebendo orientação postural e cuidados, e tratados realizando treinamento específico para o ML. Nos dois grupos notaramse melhoras na dor em quatro semanas. No controle, a área de secção transversa (AST) do ML permaneceu inalterada após quatro semanas, ao passo que, no tratado, a AST voltou aos níveis normais após quatro semanas de tratamento. Um acompanhamento em longo prazo revelou que 84% dos pacientes do controle tiveram recorrência dolorosa em um ano, contrastando com 30% do tratado. Ainda, o controle mostrou nove vezes mais chances de recidiva do que o grupo submetido à ESL, após três anos.
Transverso do abdome como estabilizador O TA atua primariamente na manutenção da pressão intra-abdominal (PIA), ao conferir tensão à vértebra lombar por meio da fáscia toracolom-
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bar (FTL) 21 . As fibras do TA correm horizontalmente ao redor do abdome, ligando-se via FTL ao processo transverso de cada vértebra lombar 22. O aumento na PIA e na tensão da FTL foi inicialmente atribuído à diminuição da carga na coluna por meio da produção de um momento extensor do tronco23. Essa teoria foi largamente refutada 24 e, subseqüentemente, cresceu a idéia de que a contração do TA pudesse aumentar a estabilização 25 . McGill e Norman25 sugeriram que a contração do TA cria um cilindro, resultando em rigidez espinhal. Do mesmo modo, espera-se que a tensão lateral por meio do processo transverso da vértebra resulte em limitação da translação e da rotação vertebral26. Há evidencias de que o TA e os músculos profundos lombares são preferencialmente afetados na presença de lombalgia16, dor lombar crônica27 e instabilidade28. Hodges e Richardson29 observaram que o TA se ativa antes do deltóide na flexão, extensão e abdução do ombro em indivíduos sem lombalgia, demonstrando a antecipação desse músculo na região lombar para os movimentos do membro superior. Em sujeitos lombálgicos, a ativação do TA foi mais lenta que o deltóide nos mesmos movimentos. Notou-se que o RA, OE e OI raramente precediam o movimento do membro. Houve então fortes indicativos de que há diferença de função entre os abdominais superficiais e profundos no sentido da ESL. O TA tem um papel fundamental na antecipação. Previamente à execução de movimentos gerais, esse músculo ativa-se, evitando perturbações posturais. Essas respostas que antecedem o movimento podem ser pré-programadas pelo sistema nervoso central e iniciadas como parte de um comando motor para a ação. Hides et al. observaram, correlacionando ultra-som e ressonância magnética, que a correta contração do TA melhorava a estabilidade lombar30. Em outro trabalho, a ativação do TA diminuiu significativamente a lassidão sacroilíaca, o que não foi observado quando os outros músculos abdominais se contraíram31.
Papel de outros músculos na estabilidade A estabilidade lombar não depende apenas do ML e TA. Um cilindro de músculos profundos ao redor da coluna fornece estabilidade11. O músculo QL atua como estabilizador lateral lombar da coluna6. Como teto, o diafragma é o principal contribuinte para a pressão intra-abdominal. Para que o TA aumente sua tensão na FTL, a atividade do diafragma é requerida para prevenir descolamento da víscera abdominal 32. O diafragma contribui para o aumento da PIA previamente ao início de grandes movimentos dos membros, contribuindo para a estabilidade 4.
Fáscia toracolombar A FTL cobre os músculos profundos lombares e do tronco. Na região lombar a fáscia possui três camadas. A posterior é ligada ao processo espinhoso, crista mediana do sacro, e ligamento supra-espinhoso; a média é ligada ao processo transverso e aos ligamentos intertransversais, abaixo da crista ilíaca e acima da borda inferior da décima segunda costela e do ligamento lombocostal; a anterior cobre o QL e é ligada medialmente à face anterior do processo transverso, dorsalmente à região lateral do músculo psoas maior4. As camadas posterior e média unemse na margem lateral do eretor da coluna e na borda lateral do QL. São unidas pela camada anterior, originando a aponeurose do TA. A contração do OE e TA aumenta a tensão na FTL, elevando a pressão dentro da fáscia, o que pode resultar em rigidez aumentada da coluna lombar, contribuindo para melhor estabilidade, somada aos mecanismos posturais paravertebrais e abdominais33.
Mecanismos compensatórios Sugere-se que os três sistemas de estabilização, passivo, ativo e neural, sejam interdependentes, e que um sistema possa compensar défices em outro. A instabilidade poderia ser o resultado de uma lesão tecidual, tornando o segmento mais instável, com
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força ou resistência (endurance) insuficientes, ou fraco controle muscular10. Instabilidade pode ser definida como diminuição na capacidade de estabilizar os sistemas da coluna para manter as zonas neutras dentro de limites fisiológicos, sem deformidade, sem deficit neurológico ou sem dor incapacitante. A instabilidade lombar tem sido sugerida como causa de desordens funcionais e tensões, assim como dor. A força de deformação dos ligamentos e dos discos induzida por cargas passivas da coluna dessensibiliza os mecanoceptores teciduais, diminuindo ou eliminando a força estabilizadora muscular reflexa no ML34. Panjabi propôs que a disfunção muscular ao longo do tempo pode levar à lombalgia crônica via lesão adicional de mecanoceptores e inflamação do tecido neural35.
Exercícios específicos para os estabilizadores lombares Há evidências de que os exercícios tradicionais prescritos para a lombalgia tenham um importante componente lesivo 34. Um exemplo é a realização de retroversão da pelve durante exercícios para a coluna lombar, que aumenta o risco de lesão por comprimir as articulações e aumentar a carga nas estruturas passivas. McGill6 concluiu que exercícios em série para a lombar, realizados em aparelhos com carga, podem produzir herniações. Músculos mais fortes parecem não ter valor profilático na redução de problemas lombares. Os músculos de resistência (endurance) têm sido evidenciados como protetores. Maior mobilidade da coluna lombar, ao contrário do que se pensava, aumenta as chances de problemas no segmento 36 . McGill 6 sugeriu que o mais seguro modelo de estabilização lombar não seria o exercício de força, mas sim o de resistência, que manteria a coluna em uma posição neutra, enquanto encorajaria o paciente a co-contrações dos estabilizadores. Em virtude das evidências da importância dos músculos locais TA, ML
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e QL na estabilização, assim como suas disfunções em episódios de lombalgia, sugere-se focar a atenção nesses músculos8. O desenvolvimento de testes e exercícios reprodutíveis na clínica estabeleceu a ESL como prática no tratamento de disfunções lombares37. O treino de estabilização local tem sido aplicado também na reabilitação do ombro por meio de exercícios para os músculos da bainha rotatória e escápula 39 , bem como dos flexores profundos do pescoço40. O papel dos estabilizadores segmentares consiste em fornecer proteção e suporte às articulações por meio do controle fisiológico e translacional excessivo do movimento 41. Os músculos globais atuam encurtando-se ou alongando-se e gerando torque e movimento às articulações. Os locais ligam-se de vértebra a vértebra e são responsáveis pela manutenção da posição dos segmentos lombares durante movimentos funcionais. Essas demandas indicam que exercícios isométricos são mais benéficos por atuarem na reeducação dos músculos profundos. Em um estágio mais avançado de treino, a isometria pode ser combinada com exercícios dinâmicos para outras partes do corpo8.
A co-contração e a estabilidade A co-contração é outro mecanismo que pode fornecer rigidez por meio de músculos antagonistas e, assim, manter a estabilidade na presença de cargas externas e internas nas articulações42. Há posições em que a co-contração dos músculos profundos pode ser realizada enquanto se mantêm os globais relaxados e a coluna em posição neutra8. A co-ativação pode ser alcançada pela inibição ativa dos interneurônios em vias recíprocas43. A co-contração dos antagonistas do tronco é necessária para manter o equilíbrio mecânico estável4. O controle do equilíbrio e estabilidade mecânica requer recrutamento muscular apropriado e tempo ótimo de recrutamento muscular (timing). Disfunção muscular e erros no controle motor têm sido sugeridos como
possíveis causas de desordens agudas e crônicas44. McDonald et al.45 questionam a falta de evidências da cocontração do TA e do ML durante atividades abdominais.
EXERCÍCIOS ESTABILIZADORES Em virtude das diferenças funcionais entre os músculos locais e globais, os exercícios devem ser feitos de formas diferentes quando se objetiva o tratamento das disfunções e das dores. Há pacientes em que os globais mais ativos predominam nos exercícios gerais. É difícil detectar se a ativação dos locais ocorre durante esses exercícios. Por isso, são propostos exercícios específicos que isolam os músculos locais dos globais. A ESL não coloca a estrutura lesada em risco, principalmente no início da reabilitação, reduzindo a carga externa e mantendo a coluna em posição neutra. Os exercícios são sutis, específicos e precisos, reduzindo a chance de dor ou reflexo de inibição. Para um máximo benefício, precisam ser repetidos tantas vezes quantas forem necessárias8. A progressão pode ser realizada em inúmeros estágios. As séries podem ser progredidas de cargas baixas com peso mínimo até posições mais funcionais com aumento gradual de carga. Para pacientes com disfunção local, o isolamento do ML e TA não é uma tarefa fácil. Em virtude disso, Richardson e Jull8 desenvolveram estratégias incluindo palpação, observação de mudanças na forma do corpo e retroalimentação (biofeedback). Comerford e Mottram46 propuseram um guia clínico para o re-treino dos estabilizadores. Segundo eles, a palpação deve estimular a correta ativação. É necessário observar o padrão de controle correto e o recrutamento tônico das fibras, sem que se note fadiga. O paciente não deve sentir dor e a respiração deve ser normal. A contração deve se manter por 10 segundos e ser repetida 10 vezes.
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a
b
Dada a importância do QL como estabilizador lateral, a técnica ideal para maximizar a ativação e minimizar a carga parece ser a ponte lateral e, para aprimorar o controle motor, há a técnica avançada da ponte em decúbito lateral (ver Figuras a seguir)6.
Reeducação em quatro apoios para o transverso do abdome Figura 1 Reeducação do transverso do abdome (TA) em quatro apoios: a, note-se o relaxamento da parede abdominal; b, contração do TA
a
b
Figura 2 Ponte lateral: em a, o suporte do peso do corpo inferior com os joelhos sobre a plataforma (nos casos de maior preocupação com a segurança do segmento lombar, nesta posição há redução da demanda adicional); em b, o suporte inferior com os pés aumenta o recrutamento muscular, mas também aumenta a carga na coluna
a
Há posições em que se consegue isolar os músculos específicos em isometria, ao mesmo tempo que se relaxam os globais, mantendo a coluna em posição neutra. Preconiza-se que a posição inicial no aprendizado seja a posição em quatro apoios (Figura 1). Richardson e Jull8 sugerem que esse exercício seja o ideal para o aprendizado mais fácil da contração da parede abdominal e para a manutenção dessa posição em isometria. Ensina-se ao paciente como localizar e manter as curvas torácica e lombar em posições normais para a execução de exercícios. A partir da posição inicial, é necessário treinar esse mesmo exercício em decúbito dorsal, em pé e sentado. A contração do TA pode ser
b
c
Figura 3 Ponte lateral avançada: após a manutenção da ponte lateral (a), girar de um cotovelo a outro (b, c) com o abdome em contração, mantendo a estabilidade da pelve e da caixa torácica a
b
Figura 4 Co-contração dos multífidos e do transverso do abdome: em a, nota-se a parede abdominal relaxada; em b, observa-se a co-contração
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palpada medialmente à espinha ilíaca ântero-superior e inferiormente à cicatriz umbilical. Treinamento do quadrado lombar: a ponte lateral é a técnica escolhida para ativação do estabilizador lateral, quadrado lombar, em virtude de otimizar a ativação e de minimizar a sobrecarga na coluna lombar (Figura 2). Na ponte inicial, o apoio inferior é realizado com o joelho, evoluindo para os
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pés. Em um exercício mais avançado, ponte lateral avançada (Figura 3), o paciente começa da posição lateral da ponte, isto é, com apoio inferior dos pés e gira sobre os cotovelos enquanto o abdome realiza o suporte segmentar “travando” a pelve e a caixa torácica. Exercícios para o multífido lombar: deita-se em prono, com os joelhos estendidos e os braços ao longo do corpo. O terapeuta toca com seus polegares os ML adjacentes ao processo espinhoso. Solicita então que o paciente realize uma contração leve como se quisesse empurrar os dedos, e a
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mantém por 10 segundos. Repete-se 10 vezes. O terapeuta deve sentir com seus polegares a contração no local palpado e verificar a capacidade de execução de uma contração simétrica e bilateral por parte do paciente, assim como a intensidade e a capacidade da manutenção de forma homogênea, sem compensações 47. A co-contração dos músculos TA e ML começa preferencialmente nas posições em pé e sentada. Em ambas, o paciente realiza exatamente os mesmos exercícios para o TA e o ML ao mesmo tempo. A contração do TA
pode ser palpada medialmente à espinha ilíaca ântero-superior (Figura 4).
CONCLUSÃO A revisão permitiu constatar a eficácia da estabilização segmentar nas lombalgias e, principalmente, na prevenção de sua recidiva, por atuar diretamente no controle motor, devolvendo a função protetora dos músculos profundos. Os exercícios propostos, por serem sutis, específicos e em posição neutra, são adequados para o início da terapia, por submeterem as estruturas articulares lesadas a sobrecarga leve.
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ISSN 1809-2950
Fatores de risco para linfedema após câncer de mama: uma revisão da literatura Risk factors of arm lymphedema after breast cancer: a literature review Anke Bergmann1, Inês Echenique Mattos2, Rosalina Jorge Koifman2
Estudo desenvolvido no DEMQS/Ensp/Fiocruz – Depto. de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ, Brasil 1
Fisioterapeuta Dra. do Grupo de Pesquisa em Fisioterapia do Unisuam – Centro Universitário Augusto Motta, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
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Profas. Dras. do DEMQS/Ensp/ Fiocruz
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Anke Bergmann Seção de Fisioterapia / HC III R. Visconde de Santa Izabel 274 20560-120 Rio de Janeiro RJ e-mail:
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APRESENTAÇÃO out. 2006
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO abr. 2008
RESUMO: O linfedema representa uma das principais seqüelas do câncer de mama. Esta revisão da literatura visou discutir os principais fatores associados ao linfedema após o tratamento do câncer de mama. Foram selecionados 26 artigos publicados entre janeiro de 2000 e março de 2008 nas bases Medline e Lilacs, utilizando os descritores breast neoplasms, lymphedema, upper extremity, arm e risk factors. Sua revisão permitiu discutir os fatores relacionados ao linfedema, quanto a: clínica e paciente (tabagismo, escolaridade, etnia, comorbidades, hipertensão arterial, diabetes melito, menopausa, idade, peso corporal, índice de massa corporal, atividade física, membro dominante, restrição articular, infecção, seroma e trauma no membro superior); tratamento do câncer de mama (cirurgia, reconstrução mamária, número de linfonodos retirados, nível da linfadenectomia axilar, radioterapia, quimioterapia, hormonioterapia e tempo transcorrido após o tratamento); tumor (tamanho, grau, localização, comprometimento dos linfonodos axilares e estadiamento). A revisão feita indica que a linfadenectomia axilar, a radioterapia em cadeias de drenagem e a obesidade são fatores preponderantes do risco para desenvolvimento do linfedema. DESCRITORES: Fatores de risco; Linfedema; Neoplasias da mama/complicações ABSTRACT: Arm lymphedema is one of the most frequent sequelae of breast cancer treatment. The purpose of this literature review was to discuss main risk factors of lymphedema after breast cancer treatment. The search in Medline and Lilacs databases, by means of key words breast neoplasms, lymphedema, upper extremity, arm, and risk factors, allowed selecting 26 studies published between January, 2000, and March, 2008. This review discusses factors linked to: clinic and the patient (smoking, education level, race/ethnicity, comorbidity, hypertension, diabetes, menopause, age, weight, body mass index, physical activity, handedness, impaired range of motion, infection, seroma and arm injuries); breast cancer treatment (type of surgery, breast reconstruction, number of axillary lymph nodes removed, level of axillary surgery, radiotherapy, chemotherapy, tamoxifen treatment, and time-span after axillary lymph node dissection); tumour (size, grade, location, node status, number of positive nodes and stage of the tumour). This review shows that the axillary surgery, axillary radiotherapy and obesity are important risk factors of lymphedema. KEY WORDS: Breast neoplasms/complications; Lymphedema; Risk factors
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INTRODUÇÃO O câncer de mama representa um importante foco de atenção mundial devido ao crescente aumento de sua incidência 1. Uma das principais seqüelas do seu tratamento é o linfedema de membro superior que, após sua instalação, se torna uma condição crônica e incapacitante, causando importantes problemas físicos, sociais e psicológicos2,3. Entretanto, nem todas as mulheres submetidas ao tratamento para câncer de mama desenvolvem linfedema, em decorrência da instalação de mecanismos compensatórios entre o sistema linfático e sanguíneo4. Algumas características relacionadas à mulher, as complicações pós-operatórias, as atividades desenvolvidas e a exposição a traumas e temperaturas elevadas5 podem desencadear o desequilíbrio entre esses sistemas. O conhecimento dos fatores de risco para o desenvolvimento do linfedema é primordial para o estabelecimento de condutas preventivas, sejam elas pré, intra ou pós-operatórias. Este artigo tem como objetivo discutir, através de uma revisão bibliográfica sistemática, os principais fatores associados ao linfedema após o tratamento do câncer de mama.
METODOLOGIA Esta foi uma revisão bibliográfica de artigos originais disponíveis nas bases de dados Medline e Lilacs, no período de janeiro de 2000 a março de 2008, publicados em inglês, francês, português e espanhol, utilizando as palavras chaves: breast neoplasms; lymphedema; upper extremity; arm; e risk factors. Foram identificados 31 estudos, sendo 5 excluídos3,6-9 por incluírem mulheres com edema transitório, não caracterizando, portanto, uma condição crônica 10. Esta revisão contemplou pois 26 artigos. Foi realizada uma análise crítica dos artigos localizados segundo o tipo de estudo (prevalência, incidência e caso-controle) e as variáveis aí estudadas (características das mulheres, do tratamento e do tumor).
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RESULTADOS E DISCUSSÃO Os estudos de prevalência11-28 (Quadro 1) coletam as informações em um único momento, tornando difícil estabelecer a temporalidade entre as exposições. Os estudos de coorte 31-37 (Quadro 2) acompanham os indivíduos durante um período de tempo, sendo indicados para verificar fatores de risco38. Sendo o linfedema uma patologia crônica e freqüente, o estudo de coorte é o mais indicado para avaliar seus fatores de risco, o que não exclui a importância dos outros tipos, mas os resultados destes devem ser interpretados com cautela. O estudo caso-controle é especialmente indicado para doenças raras ou com longo período de latência, sendo vulnerável a vários erros sistemáticos38 *. Nesta revisão, as variáveis foram agrupadas segundo fatores relacionados à clínica e à paciente; ao tratamento oncológico; e ao tumor40. A etnia18,28, escolaridade13,15,27, tabagismo13,15, idade da menopausa18,25,27,28,32 e a presença de comorbidades19,22,23,28 parecem não influenciar a ocorrência de linfedema, sendo relatados resultados divergentes entre os autores. A idade não foi associada ao linfedema na maioria dos estudos11,12,15,1720,22,23,25,27,32-36 ; apenas Meeske et al.28 relataram associação com as mulheres mais jovens. A relação da idade com o linfedema precisa ser melhor estudada pois, com o processo de envelhecimento, ocorre diminuição do mecanismo de abertura das anastomoses linfovenosas41,42, podendo levar ao aumento do risco13,14,16. * O único estudo desse tipo encontrado nesta revisão examinou 142 mulheres mastectomizadas, das quais 71 com linfedema e 71 controle, pareadas segundo a idade e outras variáveis, buscando fatores para o desenvolvimento do linfedema, como o tipo de tratamento após a cirurgia, ocupação e estilo de vida das mulheres; e encontrou que apenas um elevado índice de massa corporal (medido antes da cirurgia e por ocasião do estudo) aumenta o risco de linfedema39.
O aumento do peso corporal após o diagnóstico do câncer de mama foi considerado fator de risco para o linfedema11,15-19,23,25,28,36,39. A diminuição da taxa de fluxo sangüíneo e linfático é considerada uma das condições para a lipogênese e posterior depósito de gordura, levando à hipertrofia do tecido adiposo43,44. Além disso, a obesidade é fator de risco para infecção e retardo do processo de cicatrização45, recidiva tumoral e co-morbidades 46, além de outras complicações pós-operatórias como seroma47, hematoma48 e síndrome da rede axilar 49. Parece, portanto, que há uma associação positiva entre linfedema e sobrepeso, mas o mecanismo biológico dessa relação ainda não está claro. As atividades realizadas com o braço e os exercícios vigorosos não foram associados ao linfedema15,27,28,39, tampouco a dominância11,36, mas resultado diferente foi obtido por Veen et al. 25 . Essa variável merece maior atenção, uma vez que exercícios vigorosos podem atuar como fatores promotores do desequilíbrio entre o sistema linfático e sangüíneo, levando ao linfedema 50 . A restrição articular foi associada ao linfedema17,18 e pode ser considerada decorrência de lesão nervosa, radioterápica, alterações ortopédicas ou reumatológicas50-52. A infecção parece ser conseqüência do linfedema, uma vez que foi associada nos estudos de prevalência11,15,17, mas não nos de incidência 31,35. O seroma não foi associado ao linfedema 15,23,31,35,39. A história de traumatismos no membro superior homolateral ao câncer de mama foi associada ao linfedema em dois estudos de prevalência18,25. O tipo de cirurgia mamária e a reconstrução não mostraram associação com linfedema12,15-18,25,27,28,31,32,34. Entretanto, considerando as diferenças metodológicas dos estudos consultados e seus resultados, acreditamos que a abordagem axilar do primeiro nível dos linfonodos axilares já possa acarretar risco de linfedema, devido à maior rede linfática disposta nesse nível12,13,17,20,26,28,32. Isso pode ser observado
9 anos Vol indireto (> 200 ml)
Subjetivo Vol indireto (10%)
Volumetria > 10 % Subjetivo
MRM
109
S/info
Perimetria (> 2,0 cm)
CC c/ LA 266 6,6 anos Perimetria (> 2,0 cm) NB I e II Auto-perimetria < 1,27 cm MRM e 263 20 anos associado a edema subjetivo ou MR perimetria > 1,27 cm do MS
MRM c/ LA 84 NB I e II
ñ/ espec 396 34 meses
ñ/ espec 201 37 meses
CC c/ ou s/ 265 61 meses Exame clínico LA + RXT
Ganho de peso, LA, TMX sem QT
Peso corporal, CC+LA, Infecção no MS Etnia não-branca, IMC, nº de LFN retirados, Volume axilar retirado, AIM, Trauma MS
Idade > 45 anos, Peso > 50 kg
Etnia, idade, HAS, diabetes, RXT tangencial, energia do feixe de radiação, QT, QT+ HMT, tempo de PO
Idade, menopausa, tipo de cirurgia, reconstrução, RXT + CC, QT, estadiamento
Idade, nº de LFN retirados e positivos, RXT axila, QT, tamanho do tumor
Tipo de MRM
Escolaridade, idade, atividade física, laboral e de lazer, tipo de mastectomia, nº LFN retirados, LA contra-lateral, volume e duração da drenagem PO
No de LFN positivos
Idade avançada, no LFN retirados, RXT em cadeias de drenagem Ganho de peso, Infecção no MS
Tabagismo, obesidade, RXT axila, QT, HMT, nº LFN positivos, tamanho do tumor
Idade, nº LFN retirados
Variáveis estudadas e resultados Fatores associados ao linfedema Fatores não associados ao linfedema IMC (na avaliação), Tipo de Idade, peso, altura, dominância, lateralidade, cirurgia, Cirurgia axilar, Tamanho infecção, RXT axila, QT, HMT, tempo de edema do tumor, Grau do tumor Idade, cirurgia, nível da LA, nº LFN retirados e Nenhum positivos, QT, tempo de PO
CC e LFN 370 3.3 anos Subjetivo LA, RXT mamária Idade , IMC negativos Relato (de prontuário ou paciente) Nº de LFN retirados Goffman et al. 2004 21 Mínimo Etnia, IMC, irradiação multifield, nº de LFN RXT 240 de edema em MS ou mama, EUA 1,5 anos positivos, local do tumor Tamanho do tumor hiperemia, alterações cutâneas Deo et al. 2004 22 LA NB II 299 2,5 anos Perimetria (> 3,0 cm) Comorbidade, RXT axila Idade, obesidade, RXT, QT, HMT, estádio Índia MRM LA Idade, tabagismo, HAS, diabetes, nº LFN retirados, Ozaslan & Kuru 18 a 43 Perimetria (>2,0 cm) IMC > 25, RXT axila NB III, QT 240 total de drenagem (sucção), QT, HMT, status LFN, 2004 23 meses Turquia e/ou RXT estadiamento Armer et al. 2004 24 LA e/ou 100 28 meses Perimetria (> 2,0 cm) Nenhum Peso corporal, LA, RXT BLS EUA * Características de tratamento e estadiamento da população estudada; N = número de mulheres estudadas; ** Tempo médio decorrido desde a cirurgia até a avaliação do linfedema CC = Cirurgia conservadora; MRM = Mastectomia radical modificada; MR = Mastectomia radical; LA = Linfadenectomia axilar; BLS = Biópsia do linfonodo sentinela; NB = Nível axilar de Berg; QT = Quimioterapia; HMT = Hormonioterapia; RXT = Radioterapia; TMX = Tratamento com tamoxifeno; IMC = Índice de massa corporal; LFN = Linfonodos; PO = pós-operatório; MS = Membro superior; HAS = Hipertensão arterial sistêmica; AIM = Amplitude incompleta de movimento; FO = Ferida operatória; nº = número; Vol= volume; c/ = com; s/ = sem; ñ/ espec = várias ou não especificadas.
Deustch et al. 2003 19 EUA Yap et al. 2003 20 Canadá
CCc/LA NB 294 1 a 120 Perimetria < 3 cm no antebraço, ou II + RXT meses > 3 cm no braço Beaulac et al. 200218 CC c/ RXT e MRM s/ 151 4,8 anos Vol. direto (200 cm3) EUA RXT
Freitas et al. 200116 Brasil Meric et al. 2002 17 EUA
Petrek et al. 200115 EUA
Kuehn et al. 2000 12 Alemanha Hojris et al. 2000 13 Dinamarca Johansen et al. 200014 Dinamarca
Edwards 2000 11 Austrália
Autoria, data, país
Quadro 1 Principais características dos estudos de prevalência
População N Tempo Diagnóstico do linfedema médio*** *
Bergmann et al. Risco de linfedema após câncer de mama
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Quadro 1 Principais características dos estudos de prevalência (continuação) Tempo médio** Diagnóstico do linfedema
População *
Menopausa, IMC >25, Dominância, Trauma, RXT axila, Status LFN
N
Autoria, data, país S/info.
Variáveis estudadas e resultados Fatores associados ao linfedema Fatores não associados ao linfedema Idade, tabagismo, lado e tipo de cirurgia, no de LFN retirados e positivos, RXT mama ou plastrão, Dose RXT, QT, tamanho e local do tumor
LA, NB III 245
Perimetria (>2,5 cm)
Veen et al. 2004 25 Bélgica
Tipo de cirurgia axilar
ñ/ espec 1123 4,3 anos Relato de edema (subjetivo)
Vol. opto-eletrônica (> 200 ml)
Tempo Diagnóstico do linfedema médio ** 1 ano
Perimetria (>2,0 cm) Subjetivo
3 anos Vol. indireto (>5%) 212 12 meses Vol. indireto (média)
LFN positivos
Nenhum
Idade, IMC, Tipo de cirurgia, nº LFN retirados, RXT axilar, Nenhum QT, HMT, nº LFN positivos, tamanho do tumor, tempo PO Idade, IMC, nº LFN retirados, infecção, nº dias com Dose total RXT > 60 Gy, boost dreno, RXT FSC, dose FSC, RXT mamária int., boost em axilar, RXT antes de 1999, Reforço plastrão, dose em plastrão, tangência parede torácica, RXT QT, TMX, status dos LFN, estadiamento IMC >26, Mastectomia c/ LA NB II, Idade, dominância, RXT, status LFN Punção MS afetado
Nº LFN retirados (>30) RXT em cadeias de drenagem RXT cadeias drenagem, LA NB I e II + RXT axilar
Variáveis estudadas e resultados Fatores associados ao linfedema Fatores não associados ao linfedema Tipo de cirurgia, nº de LFN retirados, infecção da FO, Nenhum seroma, status LFN Idade, menopausa, tratamento, QT, status dos linfonodos, tamanho do tumor, estadiamento Idade, nível da LA, QT, TMX, nº LFN positivos, tamanho tumor
Quadro 2 Principais características dos estudos de incidência
494 50 meses Relato de edema (subjetivo)
N 100
1278 56 meses Perimetria (> 5%)
1 a 14 anos
727 72 meses Perimetria (>2,0 cm) 94
Tempo após PO, RXT, Escolaridade, Idade, tamanho do tumor, status dos linfonodos, QT, Dor na mama, plastrão, axila ou braço, HMT, tipo de cirurgia, menopausa, estado civil, Restrição articular, Parestesia no braço ocupação Etnia, história familiar, menopausa, uso de CO, Idade, HAS, Obesidade (IMC>30), 10 diabetes, artrite, cefaléia, flebite, etilismo, atividade ou + LFN retirados física, tipo de cirurgia, reconstrução imediata, No de LFN positivos, RXT, QT, HMT
Mathew et al. 200626 Mínimo 2 CC e RXT 504 anos Perimetria (> 2,0 cm) Inglaterra Bani et al. 2007 27 Alemanha Meeske et al. 200828 ñ/ espec EUA
LA
ñ/ espec 188
MRM 105 741 dias Anotação prontuário com RXT
População Autoria, data, país * Duff et al. 200131 LA Irlanda Heard-Smith et ñ/ espec al.200132 Itália Coen et al.2003 33 CC com RXT EUA Silberman et al. 2004 ñ/ espec EUA 34
Hinrichs et al. 200435 EUA Clark et al.2005 36 Inglaterra Purushotham et al. 200737 Inglaterra
* Características de tratamento e estadiamento da população estudada; N = número de mulheres estudadas; ** Tempo médio decorrido desde a cirurgia até a avaliação do linfedema CC = Cirurgia conservadora; MRM= Mastectomia radical modificada; MR = Mastectomia radical; LA = Linfadenectomia axilar; BLS = Biópsia do linfonodo sentinela; NB=Nível axilar de Berg; QT= Quimioterapia; HMT=Hormonioterapia; RXT=Radioterapia; TMX = Tratamento com tamoxifeno; IMC= Índice de massa corporal; LFN= Linfonodos; PO = pós-operatório; MS = Membro superior; HAS = Hipertensão arterial sistêmica; AIM = Amplitude incompleta de movimento; FO = Ferida operatória; FSC= Fossa supra-clavicular; TC = Tomografia computadorizada; CO = Contraceptivo oral; nº = número; Vol= volume; c/ = com; s/ = sem; ñ/ espec = várias ou não especificadas.
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Bergmann et al.
nos estudos que compararam a ocorrência de linfedema em mulheres submetidas à biópsia do linfonodo sentinela (BLS) e à linfadenectomia (LA)53-56. A RXT não foi fator de risco para o linfedema quando realizada em mama residual ou em plastrão22,24,25,28, mas sim em cadeias de drenagem 14,22,23,25,35 , possivelmente pelo aumento da permeabilidade58, redução da regeneração linfática 59 , fibrose e cicatriz tecidual 60 . O tratamento sistêmico com quimioterapia e/ou hormonioterapia não influenciou a ocorrência de linfedema11,13,17,18,22,23,25,27,28,32-35.
Risco de linfedema após câncer de mama
O tempo transcorrido após o tratamento do câncer não apresentou associação com linfedema11,12,19,34. É de se esperar que, quanto maior o tempo, maior seja o risco de linfedema. Para melhor definição da incidência de linfedema nos diferentes momentos após o tratamento do câncer de mama, faz-se necessária a realização de estudo com longo período de seguimento. O tamanho do tumor, sua localização, o comprometimento dos linfonodos axilares e o estadiamento não foram associados ao linfedema na maioria dos estudos consultados12-14,17,18,21-23,25,27,28,32-36.
CONCLUSÃO A revisão e análise crítica indicam que a lifadenectomia axilar, a radioterapia em cadeias de drenagem e a obesidade são fatores preponderantes de risco de linfedema. Entretanto, a ocorrência do linfedema não é totalmente explicada, provavelmente devido à gênese multifatorial envolvida na estase linfática. São necessários estudos de seguimento que contemplem outras exposições, assim como as condições prévias do sistema linfático e sangüíneo.
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Risco de linfedema após câncer de mama
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INSTRUÇÕES A revista FISIOTERAPIA E PESQUISA, editada pelo Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, prioriza a publicação de pesquisas originais, cujos resultados possam ser replicados, publicando também ensaios de revisão sistemática ou crítica de literatura, relatos de casos e cartas ao editor. Os manuscritos apresentados à Revista devem ser originais, redigidos em português. Caso uma versão semelhante, em qualquer língua, já tiver sido publicada ou enviada a outro veículo, essa informação deve constar da folha de rosto, para que o Conselho Editorial possa ponderar sobre a pertinência de sua publicação. Processo de julgamento Todo manuscrito enviado para FISIOTERAPIA E PESQUISA é examinado pelo Conselho Editorial, para consideração de sua adequação às normas e à política editorial da Revista. Os manuscritos que não estiverem de acordo com estas normas serão devolvidos aos autores para adequação antes de serem submetidos à apreciação dos pares. Em seguida, o manuscrito é apreciado por dois pareceristas de reconhecida competência na temática abordada, garantindo-se o anonimato de autores e pareceristas. Dependendo dos pareceres recebidos, os autores podem ser solicitados a fazer ajustes (no prazo de um mês), que serão examinados para aceitação. Uma vez aceito, o manuscrito é submetido à edição de texto, podendo ocorrer nova solicitação de ajustes formais – nesse caso, os autores têm o prazo máximo de duas semanas para efetuá-los. O nãocumprimento dos prazos de ajuste será considerado desistência, sendo o artigo retirado da pauta da Revista. Os manuscritos aprovados são publicados de acordo com a ordem cronológica do aceite na secretaria da Revista. Responsabilidade e ética O conteúdo e as opiniões expressas são de inteira responsabilidade de seus autores. Artigos de pesquisa envolvendo sujeitos humanos devem indicar, na seção Metodologia, sua expressa concordância com os padrões éticos e com o devido consentimento livre e esclarecido dos participantes (de acordo com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que trata do Código de Ética para Pesquisa em Seres Humanos). As pesquisas com humanos devem trazer na folha de rosto o número do parecer de aprovação pela respectiva Comissão de Ética em Pesquisa, que deve estar registrada no Conselho Nacional de Saúde. Estudos envolvendo animais devem explicitar o acordo com os princípios éticos internacionais e instruções nacionais (Leis 6638/79, 9605/98, Decreto 24665/ 34) que regulamentam pesquisas com animais. A menção a instrumentos, materiais ou substâncias de propriedade privada deve ser acompanhada da indicação de seus fabricantes. A reprodução de imagens ou outros
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PARA AUTORES
elementos de autoria de terceiros, que já tiverem sido publicados, deve vir acompanhada da autorização de reprodução pelos detentores dos direitos autorais; se não acompanhados dessa indicação, tais elementos serão considerados originais do/s autor/es do manuscrito. Autoria Deve ser feita explícita distinção entre autor/es e colaborador/es. O crédito de autoria deve ser atribuído a quem preencher os três requisitos: (1) deu contribuição substantiva à concepção, desenho ou coleta de dados da pesquisa, ou à análise e interpretação dos dados; (2) redigiu ou procedeu à revisão crítica do conteúdo intelectual; e (3) deu sua aprovação final à versão a ser publicada. No caso de trabalho realizado por um grupo ou em vários centros, devem ser identificados os indivíduos que assumem inteira responsabilidade pelo manuscrito (que devem preencher os três critérios acima e serão considerados autores). Os nomes dos demais integrantes do grupo serão listados como colaboradores. A ordem de indicação de autoria é decisão conjunta dos co-autores. Em qualquer caso, deve ser indicado o endereço para correspondência do autor principal. A carta que acompanha o envio dos manuscritos deve ser assinada por todos os autores, tal como acima definidos. Envio dos manuscritos Os manuscritos devem ser submetidos por via eletrônica pelo site www.mdpesquisa.com.br/FP. Ao submeter um manuscrito para publicação os autores devem enviar: Declaração de responsabilidade, de conflitos de interesse e de autoria do conteúdo do artigo. Os autores devem declarar a existência ou não de eventuais conflitos de interesse (profissionais, financeiros e benefícios diretos e indiretos) que possam influenciar os resultados da pesquisa e a responsabilidade do(s) autor(es) pelo conteúdo do manuscrito. Ver modelo no site www.mdpesquisa.com.br/FP. Declaração de transferência de direitos autorais (copyright) para Fisioterapia e Pesquisa, assinada por todos os autores, com os respectivos números de CPF, caso o artigo venha a ser aceito para publicação (modelo também no site acima). No caso de ensaio clínico, informar o número de registro validado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), cujos endereços estão disponíveis no site do ICMJE: www.icmje.org/faq.pdf. Preparação dos manuscritos 1 Apresentação – O texto deve ser digitado em processador de texto Word ou compatível, em tamanho A4, com espaçamento de linhas e tamanho de letra que permitam plena legibilidade. O texto completo, incluindo páginas de rosto e de referências, tabelas e legendas
de figuras, deve conter no máximo 25 mil caracteres com espaços. 2 A página de rosto deve conter: a) título do trabalho (preciso e conciso) e sua versão para o inglês; b) título condensado (máximo de 50 caracteres) c) nome completo dos autores, com números sobrescritos remetendo à afiliação institucional e vínculo; d) instituição que sediou, ou em que foi desenvolvido o estudo (curso, laboratório, departamento, hospital, clínica etc.), faculdade, universidade, cidade, estado e país; e) afiliação institucional dos autores (com respectivos números sobrescritos); no caso de docência, informar título; se em instituição diferente da que sediou o estudo, fornecer informação completa, como em “d)”; no caso de não-inserção institucional atual, indicar área de formação e eventual título (a Revista não indica em quê nem em qual instituição o título foi obtido); d) endereços postal e eletrônico do autor principal; e) indicação de órgão financiador de parte ou todo o estudo, se for o caso; f) indicação de eventual apresentação em evento científico; g) no caso de estudos com seres humanos, indicação do parecer de aprovação pelo comitê de ética; no caso de ensaio clínico, o número de registro internacional. 3 Resumo, abstract, descritores e key words – A segunda página deve conter os resumos do conteúdo em português e inglês. Recomenda-se seguir a norma NBR68, da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) para redação e apresentação dos resumos: quanto à extensão, com o máximo de 1.500 caracteres com espaços (cerca de 240 palavras), em um único parágrafo; quanto ao conteúdo, seguindo a estrutura formal do texto, ou seja, indicando objetivo, procedimentos básicos, resultados mais importantes e principais conclusões; quanto à redação, buscar o máximo de precisão e concisão. O resumo e o abstract são seguidos, respectivamente, da lista de até cinco descritores e key words (sugere-se a consulta aos DeCS – Descritores em Ciências da Saúde da Biblioteca Virtual em Saúde do Lilacs (http://decs.bvs.br) e ao MeSH – Medical Subject Headings do Medline (www.nlm.nih.gov/ mesh/meshhome.html). 4 Estrutura do texto – Sugere-se que os trabalhos sejam organizados mediante a seguinte estrutura formal: a) Introdução, estabelecendo o objetivo do artigo, justificando sua relevância frente ao estado atual em que se encontra o objeto investigado; b) em Metodologia, descrever em detalhe a seleção da amostra, os procedimentos e materiais utilizados, de modo a permitir a reprodução dos resultados, além dos métodos usados na análise estatística – lembrando que apoiar-se unicamente nos testes estatísticos (como no valor de p) pode levar a negligenciar importantes informações quantitativas; c) os Resultados
são a sucinta exposição factual da observação, em seqüência lógica, em geral com apoio em tabelas e gráficos –cuidando tanto para não remeter o leitor unicamente a estes quanto para não repetir no texto todos os dados dos elementos gráficos; d) na Discussão, comentar os achados mais importantes, discutindo os resultados alcançados comparando-os com os de estudos anteriores; e) a Conclusão sumariza as deduções lógicas e fundamentadas dos Resultados e Discussão. 5 Tabelas, gráficos, quadros, figuras, diagramas – são considerados elementos gráficos. Só serão apreciados manuscritos contendo no máximo cinco desses elementos. Recomenda-se especial cuidado em sua seleção e pertinência, bem como rigor e precisão nos títulos. Note que os gráficos só se justificam para permitir rápida apreensão do comportamento de variáveis complexas, e não para ilustrar, por exemplo, diferença entre duas variáveis. Todos devem ser fornecidos no final do texto, mantendose neste marcas indicando os pontos de sua inserção ideal. As tabelas (títulos na parte superior) devem ser montadas no próprio processador de texto e numeradas (em arábicos) na ordem de menção no texto; decimais são separados por vírgula; eventuais abreviações devem ser explicitadas por extenso, em legenda. Figuras, gráficos, fotografias e diagramas trazem os títulos na parte inferior, devendo ser igualmente numerados (em arábicos) na ordem de inserção. Abreviações e outras informações vêm em legenda, a seguir ao título. 6 Remissões e referências bibliográficas – Para as remissões no texto a obras de outros autores adota-se o sistema de numeração seqüencial, por ordem de menção no texto. Assim, a lista de referências ao final não vem em ordem alfabética. Visando adequar-se a padrões internacionais de indexação, para apresentação das referências a Revista adota a norma conhecida como de Vancouver, elaborada pelo Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (www.icmje.org), também disponível em www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_ requirements.html. Alguns exemplos: Forattini OP. Ecologia, epidemiologia e sociedade. São Paulo: Edusp; 1992. Laurenti R. A medida das doenças. In: Forattini OP, editor. Epidemiologia geral. São Paulo: Artes Médicas; 1996. p.64-85. Simões MJS, Farache Filho A. Consumo de medicamentos em região do Estado de São Paulo (Brasil), 1988. Rev Saude Publica. 1988;32:71-8. Riera HS, Rubio TM, Ruiz FO, Ramos PC, Castillo DD, Hernandez TE, et al. Inspiratory muscle training in patients with COPD: effect on dyspnea and exercise performance. Chest. 2001;120:748–56. [nomear até seis autores antes de “et al”] Rocha JSY, Simões BJG, Guedes GLM. Assistência hospitalar como indicador da desigualdade social. Rev Saude Publica [periódico on-line] 1997 [citado 23 mar 1998];31(5). Disponível em: http://www.fsp.usp.br/ ~rsp.
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Correia FAS. Prevalência da sintomatologia nas disfunções da articulação temporomandibular e suas relações com idade, sexo e perdas dentais [dissertação]. São Paulo: Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo; 1991. Sacco ICN, Costa PHL, Denadai RC, Amadio AC. Avaliação biomecânica de parâmetros antropométricos e dinâmicos durante a marcha em crianças obesas. In: VII Congresso Brasileiro de Biomecânica, Campinas, 28-30 maio 1997. Anais. Campinas: Ed. Unicamp; 1997. p.447-52. 7 Agradecimentos – Quando pertinentes, dirigidos a pessoas ou instituições que contribuíram para a elaboração do trabalho, são apresentados ao final das referências. Apresentação eletrônica da versão final Após a comunicação do aceite do artigo, o autor deverá proceder aos eventuais ajustes sugeridos pelos pareceristas, para o quê terá o prazo de quatro semanas (findo esse prazo, se a versão final não tiver sido enviada à Revista, será considerada desistência). A versão final será ainda editada, ocasião em que o editor poderá solicitar novos ajustes e esclarecimentos – e, nesse caso, o prazo para os ajustes será de apenas duas semanas. Solicita-se que, na preparação da versão final, o autor: • use fonte comum, simples; use itálico apenas para títulos de obras e palavras em língua estrangeira; o negrito é reservado a títulos e intertítulos, claramente diferenciados; • não use a barra de espaço para recuos nem a tecla “tab”, apenas recursos de formatação do processador de texto; • não separe parágrafos com sinal de parágrafo adicional; • use o próprio processador de texto (e não planilhas) para elaborar tabelas; • use o próprio processador de texto (recurso “Desenho”) para elaborar diagramas simples, organogramas etc. (não insira figuras ou organogramas do Microsoft PowerPoint®);
• inversamente, use programa apropriado (como Microsoft® Excel) para elaborar gráficos, e não o recurso “Gráficos” do processador de texto; • no caso de gráficos ou diagramas elaborados por softwares específicos, devem ser convertidos (exportados) em formatos que possam ser abertos por programas de uso comum (verifique os tipos de arquivos que podem ser abertos no Adobe Photoshop®, para figuras em escala de cinza, no CorelDraw®, para desenhos, ou no Excel® ou Origin®, para gráficos), para permitir eventuais ajustes, adequação de fonte etc.; • forneça fotografias ou outras ilustrações com resolução mínima de 300 dpi, e em tamanho compatível; • em qualquer caso, forneça simultaneamente um arquivo em TIFF do elemento gráfico, para permitir visualização e conferência. Envio dos arquivos Os dados de texto (em Word ou compatível) e de ilustrações devem ser enviados em arquivos separados. Os dados devem ser acompanhados da informação precisa de todos os programas utilizados, inclusive de compressão, se for o caso; sugere-se que os nomes dos arquivos sejam curtos e permitam rápida identificação (por exemplo, “sobrenome do autor fig1....”). Exemplares dos autores Serão enviados ao autor principal dois exemplares do número da Revista em que seu artigo for publicado, mais um exemplar para cada co-autor. *** No bojo do processo de aprimoramento de FISIOTERAPIA E PESQUISA, estas normas estão em construção, podendo sofrer alterações. Para informação atualizada, sugere-se a consulta ao site da Revista (http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/ revista.php) ou às instruções do último número publicado. Para contato com a secretaria da Revista, use
[email protected]. O endereço completo da Revista encontra-se na terceira capa, a seguir.
Assinatura Para assinar Fisioterapia e Pesquisa, preencha o cupom abaixo e envie-o à revista (ver endereço página 2), junto com um cheque nominal à Fundação Faculdade de Medicina (ver endereço ao lado, na 3a capa) no valor de R$ 64,00 ou recibo de depósito no Banespa (banco 033), agência 0201, cc 13004086-7. A ficha de assinatura está disponível no site da revista:
. Números anteriores solicitar à revista. Valor unitário: R$ 16,00. FICHA DE ASSINATURA Assinatura anual (quatro números) de Fisioterapia e Pesquisa a contar de (data) _____________________ Nome: _______________________________________________________________________________________ Endereço: ____________________________________________________________________________________ CEP: _____________ Cidade: ___________________________________________________ Estado: _______ e-mail: _______________________________________________________________________________________ Instituição (opcional): _________________________________________________________________________
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Fisioterapia e Pesquisa Revista do Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Fofito/FMUSP SECRETARIA Patrícia Pereira Alfredo INDEXAÇÃO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGÁFICA Serviço de Biblioteca e Documentação da FMUSP e-mail: [email protected] EDIÇÃO DE TEXTO, PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Tina Amado, Alba A. G. Cerdeira Rodrigues e Daniel Carvalho Pixeletra ME IMPRESSÃO
Gráfica UNINOVE
Tiragem: 800 exemplares
FISIOTERAPIA E PESQUISA
Curso de Fisioterapia Fofito/FM/USP R. Cipotânea 51 Cidade Universitária 05360-160 São Paulo SP e-mail: [email protected] http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/revista.php Telefone: 55 xx 11 3091 8416 INSTITUIÇÕES PARCEIRAS
INSTITUIÇÕES COLABORADORAS
ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL
FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO / USP
APOIO
FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO