PROSPECTI VA E PLANEAMENTO, Vol. 16 2 0 0 9
DESAFI DESAFI OS CONTEMPOR ÂNEOS DO ORDENAM ENTO DO TERRI TÓRIO: PARA UMA GOVERNABILI DADE INTELIGENTE DO(S) DO(S) 1 TERRITÓRIO(S)
Margarida Pereira 2 Regional, e-Geo – Centro de Estudos de Geografia e Planeamento Regional, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa
1. ENQUADRAMENTO ENQUADRAMENTO DA PROBLEMÁTICA Os acontecimentos económicos, sociais e políticos que marcam a primeira década do século XXI são inequívocos quanto ao agudizar da incerteza e da turbulência nas dinâmicas e mutações dos territórios e quanto à fragilidade das respostas dadas pelas estruturas político-administrativas e pelos instrumentos de planeamento e gestão a velhos e novos problemas de incidência territorial. Embora a política de ordenamento do território tenha conquistado protagonismo formal em Portugal, e a União Europeia dê atenção crescente às questões territoriais, na prática as abordagens sectoriais mantêm a liderança das intervenções públicas, sem que os resultados obtidos correspondam ao que era (é) esperado. O insucessos das acções e o agudizar das disfunções têm antecedentes longínquos. A título ilustrativo relembra-se que a Carta Europeia de Ordenamento do Território (1984), produzida pelo Conselho da Europa, na Conferência de Ministros responsáveis pelo Ordenamento do Território (CEMAT), sublinhava no seu preâmbulo que “(…) as profundas modificações intervenientes nas estruturas económicas e sociais dos países europeus (…) exigem uma revisão crítica dos princípios orientadores da organização do espaço a fim de evitar que eles sejam inteiramente determinados por objectivos 1
No âmbito do Projecto Territorial Cohesion in Portugal: new insights for spatial planning . Financiamento Plurianual FCT.
2
[email protected] Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacio nais
78
Margarida Pereira
económicos no curto prazo (…)” e “(…) os objectivos do ordenamento do território necessitam de novos critérios para a orientação e utilização do progresso tecnológico em conformidade com as exigências económicas, sociais e do ambiente (…)” (DGOT, 1988:7). E os propósitos que eram apontados ao ordenamento do território – desenvolvimento socioeconómico equilibrado das regiões, melhoria da qualidade de vida das diferentes camadas da população, gestão responsável dos recursos naturais e protecção do ambiente, utilização racional do território – continuam por alcançar. Anos mais tarde, a mesma entidade define os Princípios Orientadores para o Desenvolvimento Territorial Sustentável do Continente Europeu (Conferência de Hanôver): “promover a coesão territorial através de um desenvolvimento social e económico mais equilibrado das regiões e de uma maior competitividade; incentivar o desenvolvimento gerado pelas funções urbanas e melhorar a relação cidade-campo, promover uma acessibilidade mais equilibrada; desenvolver o acesso à informação e ao conhecimento; reduzir os danos ambientais; valorizar e proteger os recursos naturais e o património cultural como factor de desenvolvimento; explorar os recursos energéticos com segurança, incentivar um turismo sustentável e de grande qualidade; minimizar o impacto das catástrofes naturais” (CEMAT, 2000:9-12). Contemporâneo destas orientações, é o Esquema de Desenvolvimento do Espaço Comunitário (EDEC) (CE, 1999). Com carácter indicativo, apontava três objectivos de política: coesão económica e social, preservação do património natural e cultural e competitividade mais equilibrada do território europeu. E as linhas de orientação para o desenvolvimento territorial podem ser assim sintetizadas: “desenvolvimento de um sistema de cidades policêntrico e equilibrado, bem como o reforço da parceria entre os espaços urbanos e rurais (…); promoção de sistemas de transportes e comunicações que favoreçam o desenvolvimento policêntrico do território da União Europeia (…); desenvolvimento e preservação do património natural e cultural, através de uma gestão prudente” (CE, 1999). Mais recentemente, a Agenda Territorial da UE (CE, 2007) identifica seis prioridades: desenvolvimento territorial policêntrico e inovação; novas parcerias e governança territorial entre áreas urbanas e rurais; clusters regionais de concorrência e inovação; alargamento das redes transeuropeias; gestão dos riscos; e reforço das estruturas ecológicas e dos recursos culturais. Como as transcrições anteriores demonstram, num mundo marcado pela globalização e pelas preocupações ambientais, a competitividade e a sustentabilidade são transversais aos documentos produzidos desde o final da última década. Competitividade entendida como a capacidade efectiva dos territórios (em diferentes âmbitos espaciais) atrair investimento, gerar riqueza, reter valor e recursos humanos em benefício das populações e das empresas. Ao conceito está associado um elemento de comparação Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
79
entre as performances de empresas, regiões ou nações que disputam (de modo cada vez mais concorrencial) recursos e fluxos com valor económico (Mateus, coord., 2005:23). A definição original de sustentabilidade (Relatório Brundtland, 1987) defende que o desenvolvimento da sociedade actual não pode comprometer o das gerações futuras, por força do uso descontrolado dos recursos. Neste entendimento há um pressuposto organizacional que importa relevar. Assim, a sustentabilidade deve ser entendida como um processo inteligente, auto-organizativo e de aprendizagem permanente. Numa primeira fase, visa criar uma sensibilidade colectiva para os problemas induzidos pelas formas de crescimento e de consumo do mundo ocidental; num segundo tempo, visa contrariar tendências instaladas e encontrar novos caminhos. Ao conceito está, pois, associada uma auréola transformadora dos modelos territoriais existentes, das práticas instaladas e dos comportamentos dominantes (Emalianoff, 2002:39). Sendo a competitividade e a sustentabilidade conceitos estruturalmente antagónicos, o discurso voluntarista encontrou já plataformas de convergência no plano formal, mas as dificuldades de operacionalização são inegáveis. Esta contradição tem de ser reconhecida e enfrentada com realismo, caso haja vontade efectiva de encontrar caminhos sólidos de aproximação. Em Portugal, a responsabilidade pela política de ordenamento do território é do Estado (Constituição da República Portuguesa, 1976), mas só a Lei de Bases do Ordenamento do Território e Urbanismo (1998) explicita os princípios que lhe devem ser subjacentes – sustentabilidade e solidariedade intergeracional, economia, coordenação, subsidariedade, equidade, participação, responsabilidade, contratualização e segurança jurídica. A aprovação do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT)(MAOTDR, 2007) representa um marco que merece ser sublinhado, apontando uma visão estratégica para o país num horizonte alargado (2025). Os problemas inventariados são muitos (24) e diversificados, e a sua superação está em parte dependente do modo como os demais instrumentos de gestão territorial derem seguimento às orientações aí expressas e como os principais actores responsáveis pelas dinâmicas territoriais (públicos e privados) lhes derem acolhimento. Apesar do curto período de tempo que mediou desde a sua entrada em vigor, há sinais contraditórios sobre os progressos entretanto conquistados (Pereira e Carranca, 2009). O avanço dos planos de desenvolvimento territorial à escala das regiões são um passo positivo no sentido de aprofundar e adaptar as orientações nacionais às particularidades regionais; mas várias políticas sectoriais de cariz territorial foram entretanto assumidas, ignorando o PNPOT. Ao nível local, “(…) os instrumentos de planeamento municipal continuam a dispor de forma demasiado rígida sobre a ocupação dos solos, descurando o seu papel de definição das estratégias locais de evolução” (Galvão, 2008:3).
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
80
Margarida Pereira
Neste contexto duas interrogações pertinentes podem ser colocadas: ◆
◆
Que política de ordenamento do território faz sentido no início da segunda década do século XXI? Quais os contributos que pode assegurar para ser bem acolhida como guião das transformações territoriais por parte de quem tem responsabilidades decisivas na sua permanente (re)configuração?
A procura de respostas para as interrogações formuladas deve ponderar previamente mudanças estruturais no mundo globalizado, mas com implicações quotidianas à escala local: ◆
◆
◆
o funcionamento (neo)liberal do mercado e a prevalência das liberdades individuais e dos grupos de interesse dominantes sobrepõem-se às lógicas do interesse colectivo conceptualmente perseguido pela(s) intervenção(ões) pública(s); os Estados estão cada vez mais permeáveis (vulneráveis) a influências internacionais, circunstância acompanhada pela fragmentação do poder no interior de cada Administração, que induz a redistribuição de competências (rescaling), a que acresce o alargamento da interferência da União Europeia (UE) no desenho das políticas territoriais dos seus estados-membros (Coe, N. e all., 2007); a democracia representativa está a dar lugar à democracia participativa, traduzida em atitudes mais críticas e no envolvimento mais continuado (menos esporádico) dos cidadãos nas decisões que afectam os seus territórios.
O contexto descrito, que fragiliza a intervenção pública e a visão colectiva, e reforça as abordagens individuais, foi perturbado pela crise económica e financeira mundial desde 2007. Num ambiente de retracção do mercado a intervenção pública sai revalorizada, mesmo pelos tradicionais contestatários. O Estado é (agora) considerado fundamental para combater a recessão e o relançamento da economia, assegurar condições de equidade nos acessos a bens e serviços, encontrar modelos territoriais potenciadores de desenvolvimento em contextos socioeconómicos diversificados. Neste ambiente de insegurança (generalizada), incerteza (acrescida) e vulnerabilidade dos territórios (dos mais competitivos aos mais fragilizados) está criada uma oportunidade para redefinir os objectivos do ordenamento do território, actualizar o seu conteúdo e, sobretudo, consensualizar as modalidades da sua operacionalização e o envolvimento e coresponsabilização dos actores na execução das acções. Porém, importa não esquecer que “O investimento privado é um dos motores do desenvolvimento social e, portanto, do
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
81
desenvolvimento territorial. Uma das mais importantes funções da política de ordenamento do território consiste, em conformidade com os seus objectivos, em proporcionar aos investidores privados uma perspectiva de desenvolvimento prospectivo e segurança em termos de ordenamento. A política de ordenamento do território deverá, em conjunto com as políticas sectoriais pertinentes, contribuir para tornar os municípios e as regiões mais atractivos para o investimento privado, tanto a nível local como regional, de forma compatível com o interesse público” (CEMAT:2000:7). Atendendo ao enquadramento descrito, o artigo propõe uma reflexão sobre questões tidas como nucleares para a sustentabilidade e competitividade do(s) território(s): por um lado, as de natureza substantiva, ligadas à natureza dos problemas e, por outro, as de carácter instrumental e processual. Isto é, abordam-se alguns dos desafios (perante problemas novos ou velhos problemas reconfigurados) que se colocam no futuro próximo, e defende-se que a sua superação exige mudanças nos métodos de abordagem, em particular nos instrumentos e processos de actuação.
2. SITUAÇÕES-PROBLEMA PARA O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO: QUATRO ILUSTRAÇÕES Os desafios contemporâneos enfrentados pelos territórios são múltiplos e com intensas interdependências, por vezes conflituantes. Para os quatro abordados, ilustrativos de tais atributos, sintetiza-se a sua problematização, a sua leitura no contexto nacional e o modo como poderão marcar a política de ordenamento do território.
2.1. Alterações climáticas e prevenção dos ris cos naturais O reconhecimento das alterações climáticas globais tem hoje base científica sólida (Santos e Miranda, 2006; IPCC, 2007a). Indissociáveis da concentração dos gases com efeito estufa (GEE) na atmosfera, traduzem-se num aumento da temperatura média global, da frequência de fenómenos climáticos extremos (ondas de calor e precipitação intensa) e do nível médio global do mar; em mudanças na distribuição espacial da precipitação; e na maior frequência das secas em várias regiões das latitudes subtropicais. Estas alterações têm implicações territoriais óbvias, nomeadamente pelo acréscimo dos riscos naturais (cheias, inundações, movimentos de vertentes, subida do nível do mar, incêndios, secas, …), e pela degradação dos recursos hídricos (escassez e perda de qualidade) e dos solos (salinização, erosão). Para a minimização das alterações climáticas são preconizadas acções de mitigação e de adaptação (IPCC, 2007b; Alcoforado, 2009). As políticas e medidas de mitigação visam reduzir as emissões de gases com efeito de estufa para a atmosfera. Neste quadro,
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
82
Margarida Pereira
recorda-se a entrada em vigor da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (CQNUAC), em 1994, e o Protocolo de Quioto em 1997 (na 3ª conferência das Partes da CQNUAC). As políticas de adaptação pretendem minimizar os impactes negativos nos sectores socioeconómicos e nos sistemas biofísicos. Por isso, tendo em conta a articulação entre perigosidade 3, vulnerabilidade4 e risco5 (Zêzere, 2007), a avaliação da perigosidade deve anteceder a definição das localizações das populações e das actividades económicas e a prevenção do risco deve ser uma prioridade da política de ordenamento do território (e não subestimada como até agora), com a obrigatoriedade da sua consideração nos instrumentos de gestão territorial. O ordenamento do território pode dar contributos relevantes em ambas as acções, quer concebendo modelos de ocupação territorial menos consumidores de energia (e portanto de baixo carbono), quer incorporando a ponderação do risco nas tomadas de decisão associadas à (re)configuração dos assentamentos humanos. Com as alterações climáticas previstas, Portugal será particularmente afectado nos recursos hídricos, agricultura, saúde humana, florestas e biodiversidade (Santos, 2004: 27): admite-se que a floresta existente se torne inviável, o risco meteorológico de incêndio se agrave e o risco de erosão e de inundação aumente nas zonas costeiras com a subida do nível médio do mar. A Administração começa a ser sensível ao problema. O Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC) aponta um conjunto de recomendações para o período 2007-2013. O Programa Nacional da Politica de Ordenamento do Território (PNPOT) (2007) considera os riscos e as vulnerabilidades territoriais na definição do modelo territorial. No seu Programa de Acção, onde são identificados seis objectivos estratégicos, há uma referência expressa ao tema “Avaliar e prevenir os factores e as situações de risco, e desenvolver dispositivos e medidas de minimização dos respectivos efeitos” (Objectivo específico 1.11), operacionalizado através de 9 Medidas Prioritárias, de que se destaca “Definir para os diferentes tipos de riscos naturais, ambientais e tecnológicos, em sede de PROT, PMOT e PEOT, e consoante os objectivos e critérios de cada tipo de plano, as áreas de perigosidade, os usos compatíveis nessas áreas e as medidas de prevenção e mitigação dos riscos identificados (2007-2013)” (MAOTDR, 2007:189). Os Planos Regionais de Ordenamento do Território já aprovados (Algarve, Oeste e Vale do Tejo) observam estas orientações e reinterpretam-nas à luz das especificidades dos respectivos territórios. Os Planos
3
Probabilidade de ocorrência de um fenómeno perigoso – sismos, maremotos, vulcões, movimento de vertentes, cheias, inundações, etc. – num determinado período de tempo e numa dada área. 4
Grau de perda de elemento(s) vulnerável(is) resultante da ocorrência de um fenómeno – natural ou induzido pelo homem, com determinada magnitude ou intensidade. 5
Possibilidade de ocorrência e quantificação das suas consequências em resultado de um fenómeno natural ou induzido pelas actividades antrópicas. Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
83
Directores Municipais (a grande maioria em revisão) deverão produzir a cartografia municipal de risco, tendo recentemente sido publicado o Guia Metodológico para a Produção de Cartografia Municipal de Risco (Julião e all.: 2009). Aliás, é neste nível, onde ocorre o licenciamento da urbanização e da edificação, que esta temática ganha maior pertinência e acuidade, sobretudo porque as práticas de gestão revelam a sua frequente omissão. Assim, o ordenamento do território tem de integrar nos processos de decisão conducentes à ocupação do território medidas de adaptação aos efeitos das condições climáticas extremas (cheias, carência de água, desertificação, acréscimo de morbilidade e mortalidade, prejuízos económicos e perda de competitividade, alteração dos modos de vida), mesmo que tais opções pareçam ter pouco sentido no curto/médio prazo. Mas a sua consideração é insuficiente, impõe-se a sua aplicação efectiva por parte dos actores públicos e privados.
2.2. Desenvolvimento urbano, mobilidade susten tável e eficiência energética A revolução industrial representa um marco no processo de urbanização, traduzido na concentração crescente de populações e de actividades. A sua intensificação foi exponencial ao longo do século XX e perspectiva-se a sua persistência, embora mundialmente diferenciada. Na Europa a população residente em áreas urbanas era de 72% em 2007, estimando-se que passe para 84% em 20506. Esta evolução foi acompanhada por alterações estruturais na forma urbana. A cidade industrial fordista era marcada pela sua estrutura compacta e contínua, dependente da matriz das redes de transportes colectivos urbanos (eléctrico, comboio suburbano, metropolitano), que influenciaram o desenho dos aglomerados emergentes. Este modelo reconfigurou-se com a terciarização da economia, a banalização da infra-estrutura rodoviária e o incremento da taxa de motorização, passando a coexistir dois tipos de ocupação: um apoiado no transporte colectivo, favorecendo uma concentração junto das paragens e numa envolvente próxima, fomentando densidades elevadas e dominância de tipologias plurifamiliares; outro apoiado no automóvel, distendido e fragmentado, onde predomina a habitação unifamiliar. O limite à extensão urbana, de contornos cada vez mais imprecisos, é apenas condicionado pelo tempo máximo aceitável para as deslocações pendulares diárias. Embora com dimensões e intensidades diferenciadas, a dispersão é um problema transversal na Europa (Reckien and Karecha, 2007). Esta dinâmica na coroa exterior afectou a cidade consolidada, que perdeu população, 6
Nações Unidas, Departamento dos Assuntos Económicos e Sociais/Divisão de População (2008), World Urbanization Prospects: the 2007 Revision.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
84
Margarida Pereira
emprego e funções e se degradou fisicamente. A ocupação urbana extensiva é exigente em mobilidade (deslocações cada vez mais intensas, mais longas, diversificadas e aleatórias), o que se repercute no consumo de combustíveis e no acréscimo da poluição (ruído, emissões atmosféricas poluentes) e do congestionamento. Por isso é contestada à luz dos princípios da sustentabilidade: grande consumidora em energia e outros recursos escassos, aumenta os gases de efeito estufa e estimula o “desperdício urbano” (abandono precoce de tecidos equipados, multiplicação de novas infra-estruturas que permanecerão sub-utilizadas por tempo indeterminado). Este quadro de preocupações tem estimulado a procura de alternativas em duas direcções: um modelo urbano menos predador de recursos (solo, energia, paisagem, mas também espaços agrícolas e florestais e biodiversidade); uma mobilidade mais sustentável (incremento de modos suaves). As primeiras propostas surgiram nos EUA com o New Urbanism (anos 80) e mais tarde com o Smart Growth e o Low Carbon Cities . Na Europa as iniciativas multiplicaram-se, associadas ao Urban Renaissance. Por exemplo no Reino Unido, o grupo de trabalho criado pelo governo britânico ( Urban Task Force) deu origem a um documento de referência (Rogers, R., 1999); na União Europeia sucederam-se as orientações – Livro Verde do Ambiente Urbano (CCE, 1990); Carta de Aalborg (CE, 1994); Compromissos de Aalborg (CE, 2004), Carta de Leipzig (CE, 2007). Nos domínios de intervenção para uma mobilidade sustentável releva-se o do planeamento dos transportes (como sistema e cada rede de per si) e do planeamento do uso do solo, enquanto factor gerador e atractor de tráfego. Mas é neste último que aumentam os desafios para a concretização de uma mobilidade sustentável “(…) até porque é neste domínio que o peso do passado mais se faz sentir de modo estruturante e onde é mais difícil – senão mesmo impossível – obter resultados num prazo mais ou menos curto (…)” (Nunes da Silva, F., 2004: 166). Os padrões de uso do solo afectam a mobilidade de modo diverso: características da ocupação urbana, afastamento às áreas centrais, mistura funcional, compacidade, daí a importância da concertação entre os usos do solo e os transportes. Algumas cidades-centro desenvolveram o conceito de cidade compacta, recorrendo à reocupação e revitalização de terrenos abandonados ou subutilizados para criar habitação, actividades económicas e equipamentos. Mas o discurso “pró” cidade compacta está longe de reunir unanimidade e, sobretudo, corresponder às aspirações de uma parte da população. Em Portugal, os modelos urbanos extensivos generalizaram-se nos anos 90, das áreas metropolitanas às cidades médias e até às de pequena dimensão (Portas e all., 2003; Domingues, 2006), sendo um dos (24) problemas de ordenamento do território listados pelo PNPOT (MAOTDR, 2007:107). Os factores que induziram estas formas de crescimento permanecem activos, não se vislumbrando tendências consistentes de Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
85
inversão. Porém, a Administração assumiu já o propósito de contrariar essa prática e o PNPOT aponta para a sua contenção. Nesse seguimento, os PROT já em vigor – do Algarve (2007) e do Oeste e Vale do Tejo (2009) – assumiram o combate à fragmentação e dispersão urbanas, através da Normativa aplicável aos planos municipais de ordenamento do território. No primeiro caso não só restringindo as novas áreas urbanas às necessidades das dinâmicas económicas e sociais e assegurando a sua programação, mas também promovendo a reversão de perímetros urbanos quando justificado; no segundo, limitando fortemente a edificação em espaço rural (aumento da dimensão mínima da parcela para admitir edificabilidade, interdição da construção em espaços florestais, ….). Mas a eficácia destas medidas dependerá do modo como vierem a ser acolhidas na revisão dos planos directores municipais e, sobretudo, na sua gestão. Assim, as orientações para as políticas urbanas devem dar mais atenção aos modelos urbanos a adoptar, bem como procurar soluções de ocupação do território que garantam maior eficiência energética. Atendendo à situação existente, as intervenções devem ser orientadas em três sentidos: a reestruturação e qualificação da cidade fragmentada, a regeneração/revitalização da cidade consolidada e a contenção da cidade emergente, perseguindo a sustentabilidade do conjunto urbano.
2.3. Globalização e coesão territorial A globalização, associada ao progresso nas telecomunicações nos últimos anos do século XX, converteu-se na forma essencial do liberalismo económico (Merlin, 2002:363). Começou por afectar o comércio, o capital e a produção, mas depressa alastrou à língua e à cultura. A mundialização dos circuitos financeiros estimulou a concentração das empresas, que se tornaram cada vez mais internacionais, anónimas e horizontais. Este processo favorece as economias mais fortes. A competitividade dos territórios passou a ser o conceito de referência, mas são cada vez menos os que reúnem (e mantêm) os atributos exigidos. Os países estão mais dependentes de relações económicas e sociais transnacionais, que fogem à sua capacidade de influência. A sua inserção em espaços mais vastos representa uma oportunidade de desenvolvimento social, económico e cultural, mas reforça a dependência de processos de mudança de controlo impossível, quer no tempo, quer nos impactos territoriais e económico-sociais locais. Os grandes agentes económicos intervêm à escala mundial, mas os efeitos das suas decisões fazemse sentir a todas as escalas e variam de lugar para lugar. Assim, a globalização tem consequências territoriais objectivas, positivas e negativas. A capacidade dos territórios para manter o emprego e atrair mais actividades económicas e populações, e para integrar redes regionais e supra-nacionais, é decisiva no reforço da sua competitividade e na definição das estratégias de desenvolvimento. Mas os riscos são também
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
86
Margarida Pereira
indisfarçáveis, não só associados à destruição das identidades mas também à vulnerabilidade perante contextos concorrenciais muito desiguais e mutáveis em permanência. No contexto europeu, apesar da dimensão dos fundos estruturais, os desequilíbrios internos têm-se acentuado, excluindo os suscitados pelos sucessivos alargamentos (da Europa dos 12 à Europa dos 27). Efeitos similares têm ocorrido no interior dos próprios Estados-membros. O reconhecimento dos resultados limitados obtidos pela política de coesão económica e social levou a Comissão Europeia a procurar outros caminhos. A integração da coesão territorial como terceiro pilar da política de coesão no Tratado de Lisboa (2007) tem um significado político cujas consequências poderão vir a ser visíveis no próximo Quadro de Referência Estratégico Nacional. O conceito de coesão territorial surge no EDEC (1999), é retomado no 2º (CE, 2002) e 3º (CE, 2004) Relatórios da Coesão, para culminar no Livro Verde da Coesão Territorial (CE, 2008). O conceito aparece sem uma definição precisa, mas Camagni (2006:58) aponta-o como “(…) a dimensão territorial da sustentabilidade” e associa-o a três componentes: qualidade territorial, identidade territorial e eficiência territorial. Emerge em redor de duas questões nevrálgicas: o combate aos desequilíbrios territoriais e a coordenação e articulação de políticas com incidência no território. Ao conceito de coesão territorial estão associados outros: capital territorial (ligado aos recursos endógenos, olhando o território como um factor de desenvolvimento), cidades como alavancas do desenvolvimento; policentrismo (favorecimento de um sistema urbano em rede, assente em complementaridades e especializações, o que propicia uma distribuição mais equitativa de equipamentos e serviços e, consequentemente, uma maior igualdade de acesso às populações). A coordenação num sistema policêntrico permite a acumulação e partilha de recursos alcançando uma maior massa crítica. As interligações podem estimular especializações funcionais sobretudo numa óptica de complementaridade, potenciando serviços mais competitivos. Por isso, é indispensável apostar na valorização dos recursos endógenos e na mobilização dos actores locais e no incentivo à cooperação entre territórios , condição hoje necessária para o progresso económico e social. Ao mesmo tempo que competem entre si para alcançar certos objectivos de desenvolvimento, dependem da capacidade de colaboração de uns com outros em torno de objectivos comuns. As tradicionais visões hierárquicas dos territórios estão ultrapassadas. Os territórios do futuro terão de ser policêntricos, estruturados em rede e baseados na diversidade e na complementaridade das respectivas especificidades, em que a articulação entre as áreas urbanas e as áreas rurais deve merecer atenção acrescida e medidas concretas de valorização. A cooperação territorial tem, pois, de ser promovida de forma intensa e a diferentes escalas. Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
87
Portugal apresenta uma economia pequena, aberta e muito vulnerável. O PNPOT identifica quatro problemas de ordenamento do território sob o título “competitividade dos territórios”, traduzidos na “(…) forte dispersão geográfica das infra-estruturas económica e dos equipamentos terciários mais qualificados, (…); ausência de um sistema logístico global (…); insuficiente projecção externa das funções urbanas, dificultando a participação de Portugal nos fluxos de investimento internacional; reduzida extensão das cadeias de valor e insuficiente exploração das condições e dos recursos mais diferenciadores dos territórios e correspondente debilidade das relações económicas inter-institucionais e inter-regionais no espaço económico nacional” (MAOTDR, 2007:107). Assim, as políticas de ordenamento devem apostar na valorização do capital territorial e das identidades como factor de diferenciação. A falta de escala e de diversidade funcional aconselham a cooperação entre cidades e entre territórios, conquistando desse modo os benefícios de economias de escala. Os planos regionais, instrumentos de desenvolvimento territorial, explicitam os eixos estratégicos a perseguir. Mas a prossecução dessas orientações fica dependente da capacidade de articulação das políticas sectoriais, por um lado, da capacidade de cooperação inter-municipal, por outro, e ainda da capacidade de envolvimento dos agentes económicos e sociais.
2.4. Recursos h umanos e desen volvimento Os recursos humanos são vitais para o desenvolvimento de qualquer território, não só na produção de riqueza mas também na estruturação de modelos culturais e identitários. Ora, a sociedade ocidental contemporânea está confrontada com problemas demográficos de natureza diversa, com repercussões territoriais multifacetadas. Na dinâmica demográfica sublinha-se o envelhecimento da população (redução das taxas de natalidade, alargamento da esperança de vida, maior pressão sobre os activos), a alteração da família tradicional e o reforço da multiculturalidade. Uma percentagem mais elevada de idosos forçará o Estado a afectar mais recursos públicos ao pagamento de pensões e aos cuidados de saúde. E este maior encargo das finanças públicas provocado pelo envelhecimento traduzir-se-á, inevitavelmente, na redução do investimento em outros domínios. Por outro lado, a escassez de activos (e de competências) poderá afectar a economia e, por arrastamento, o modelo europeu de Estado-providência. A população activa é também confrontada com a crescente volatilidade das actividades económicas e do emprego. As mudanças tecnológicas, a intensificação da concorrência e a deslocalização das empresas ocorrem a ritmos cada vez mais rápidos e sob formas cada vez mais diversas. A prosperidade de um território e o bem-estar da sua população podem evoluir inesperadamente em sentido inverso e a
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
88
Margarida Pereira
capacidade de reacção (ou a falta dela) pode revelar-se determinante para a recuperação e readaptação a um novo enquadramento económico e social. Daí que a diversificação da base económica e a flexibilidade dos recursos humanos sejam atributos básicos a promover pelas políticas de ordenamento do território, tornando os territórios menos dependentes e conferindo-lhe maior capacidade de adaptação a mudanças inesperadas. A rotura da família tradicional e o consequente aumento das famílias monoparentais e dos celibatários alargou as disparidades de rendimento e a maior pressão sobre alguns equipamentos de apoio (sobretudo à infância e aos idosos). A garantia de equidade no acesso a esses equipamentos e aos equipamentos de saúde (em condições ajustadas) deve ser salvaguardada pela oferta pública, contrariando a marginalização dos territórios e das populações mais vulneráveis. A imigração é outra realidade em crescimento na UE. Sendo certo que dá um contributo na atenuação do envelhecimento (em geral e do mercado laboral em particular), tem (terá ainda mais) consequências territoriais marcantes, nomeadamente nos mercados de trabalho e de habitação, na oferta e na procura de serviços, nos modos de vida e nos modelos culturais de referência. A sua boa integração é essencial para a coesão social e territorial e, por arrastamento, para a redução das tensões sociais e culturais e, no extremo, para a salvaguarda de um ambiente de maior segurança. Portugal é um país muito afectado pelo envelhecimento da sua população (particularmente concentrada no território do interior e nas áreas centrais dos aglomerados urbanos) e esta tendência vai agudizar-se no futuro. Os reflexos subsequentes nas finanças públicas, bem como no próprio mercado de trabalho, são preocupantes. Neste quadro demográfico recessivo, a imigração sai revalorizada. Apesar da integração globalmente positiva, há focos de tensão (quase sempre associados a situações de marginalização urbanística) que é preciso eliminar, de forma progressiva mas persistente. Assim, é necessário enquadrar as implicações dos problemas demográficos não só nos modelos territoriais futuros mas também na adaptação e reconfiguração das áreas urbanas. Por exemplo a mudança nas procuras sociais exigirá outras respostas na concepção dos espaços públicos, na natureza dos serviços e no modo como são prestados, nas condições de mobilidade.
3. ABORDAGENS METODOLÓGICAS PAR A CONTEXTOS INSTÁVEIS Em sistemas territoriais abertos e pluralistas e em contextos socio-económicos e políticos instáveis, o ordenamento do território, ainda muito marcado pela abordagem racionalista, tem de sofrer alterações nos instrumentos e nos procedimentos, para evitar que as orientações de política sejam ultrapassadas pelos acontecimentos.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
89
3.1. Instru mentais Para melhorar a qualidade dos resultados, as mudanças no campo instrumental são inevitáveis. Duas se consideram particularmente pertinentes – recurso permanente à prospectiva e à avaliação – como de seguida se justifica. 3 . 1 . 1 . Pr o s p e c t i v a ( p a r a g e r i r a i n c e r t e z a )
O mundo globalizado torna os territórios cada vez mais permeáveis a influências externas, agudizando a incerteza sobre as evoluções possíveis. A previsão, ferramenta da abordagem racionalista para perspectivar o futuro, através da projecção de tendências instaladas, perde eficácia. Em sua substituição surge a prospectiva, que pretende antecipar as evoluções desejáveis e não desejáveis de um sistema territorial no longo prazo (Wachter, S. e all., 2000; Gabina, J.; 1998; Godet, M., 1993). Recorrendo à cenarização (cenários tendenciais ou contrastados), permite confrontar escolhas e estratégias a partir de imagens de futuros possíveis de um território, para suportar as escolhas públicas. A prospectiva deve conduzir à construção de um projecto territorial, traduzido na “(…) afirmação de uma ambição negociada e partilhada, fundada sobre uma reflexão prospectiva colectiva (…) dos actores envolvidos. Criando uma visão estratégica de um futuro possível partilhado pelos actores do território, o projecto global abre o campo às acções inovadoras donde a realização simultânea e convergente concorrem para a concretização do mesmo projecto global federador de projectos específicos” (Chappoz, Y., 1999:70). O projecto de território é mais definido pela sua utilidade (para que serve) do que pelo seu conteúdo. De facto, muitas vezes o conteúdo dos projectos é semelhante, ganhando então relevância o “percurso do projecto” (Wachter, S. e all., 2000:63). Aliás, sendo o fim do projecto a sua elegibilidade a um financiamento (nacional ou europeu), aqueles autores consideram-no mais gestionário do que visionário. Por isso Chappoz (1999) atribui-lhe três funções na perspectiva da utilidade: ◆
◆
Espaço de diálogo, que convida os actores a (re)ler o seu território (diagnóstico), identificar os desafios (objectivos estratégicos), antecipar os maiores problemas (eixos estratégicos) e a agir (operações e acções), federando múltiplas intenções heterogéneas e particulares, numa sociedade contemporânea onde o “indivíduo” se sobrepõe à “comunidade”; Espaço de negociação, já que a confrontação de pontos de vista e a dinâmica das propostas/contra-propostas contribuem para construir uma imagem partilhada (referencial) e um programa de acção;
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
90
Margarida Pereira
◆
Espaço de acção, pois permite compreender uma situação local na sua globalidade, tendo em vista a sua transformação, e passar à acção de uma forma concertada.
Para enfrentar a incerteza, a política de ordenamento do território precisa de se apoiar em visões estratégicas e cenários de futuro (Wachter, S. e all., 2000:65) e despoletar o diálogo para a negociação da programação, quer entre entidades públicas, quer entre estas e os particulares. Esta interacção com os actores do território, que deve ser permanente, permite incorporar tendências emergentes num processo sempre em (re)construção, mas balizado por uma linha de rumo que confere maior consistência às tomadas de decisão. Em Portugal, o PNPOT e os PROT deram um passo em frente na aplicação da prospectiva. Mas é necessário que o mesmo se generalize à escala local, associada a uma vontade expressa de condução do futuro. Assim, neste contexto colocam-se agora outros desafios, para conferir solidez aos processos intrínsecos às respectivas operacionalizações: dar seguimento ao(s) diálogo(s) inter-sectorial(ais) encetados às escalas nacional e regionais, mantendo-os actuais; garantir o diálogo dos principais actores (públicos e privados) responsáveis pelas dinâmicas territoriais, assegurando plataformas activas de concertação. 3 . 1 . 2 . A v a l i a çã o ( p a r a e n f r e n t a r a c o m p l e x i d a d e )
A avaliação constitui uma componente essencial do processo de planeamento. “Avaliar pode significar várias coisas: medir, valorar, comparar, escolher, rejeitar... Regra geral a justificação da avaliação está associada ao estudo retrospectivo de situações, tendo em vista a tomada de melhores decisões” (Baptista e Silva, 2003: 40). A avaliação pode ocorrer em diferentes momentos do processo, com funções distintas. Em regra, identificam-se três tipos: ex-ante, a posteriori e in continuum (monitorização). A primeira prende-se com a selecção de alternativas de intervenção e, quando estas não existem, deve traduzir-se na avaliação da robustez da solução a adoptar, confrontando a consistência entre objectivos e meios. A avaliação a posteriori fecha um ciclo e reinicia outro, procurando conhecer os resultados e os efeitos alcançados com a aplicação do plano, comparando-os com os desejados e esperados no momento da avaliação (saber da eficácia e eficiência do instrumento). A avaliação in continuum visa acompanhar a etapa da execução do plano, a mais longa do processo de planeamento. A dilatação no tempo reforça as incertezas, pelo surgimento de dinâmicas não ponderadas no plano e pelos efeitos não previsíveis do próprio plano. Esta situação é agudizada em ambientes instáveis e expostos a grandes turbulências (influências múltiplas, imprevisíveis e de
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
91
difícil controlo), que pode tornar precocemente obsoletas soluções até há pouco apontadas como adequadas. A monitorização, efectuada de forma regular e sistemática , procura perceber a capacidade de resposta do plano às dinâmicas instaladas e emergentes e detectar eventuais sinais de alerta para agir em tempo útil, corrigindo trajectórias e evitar/atenuar os efeitos perversos por desajustamento das acções (ou da inacção). A avaliação pode ainda ser feita em duas perspectivas: da conformidade (pondera a correspondência entre resultados das acções e intenções /objectivos do plano) e do desempenho (integra a anterior e foca o papel que o plano desempenha como estrutura de referência para a tomada de decisão). Em Portugal, a prática da avaliação dos instrumentos de gestão territorial é escassa, apesar do reconhecimento da sua importância. A LBOTU e o RJIGT (no final dos anos 90) deram relevância a esta componente do processo de planeamento. Introduziram os Relatórios de Estado do Ordenamento do Território (REOT), às escalas nacional, regional e local (da responsabilidade, respectivamente, da DGOTDU, das CCDR e das autarquias), com periodicidade bienal, com o objectivo de proceder à avaliação dos IGT nessas escalas. Foi ainda criado o Observatório do Ordenamento do Território. Mas os efeitos práticos foram, até ao presente, fracos. O PNPOT e os PROT contêm já um conjunto de indicadores para suportar essa avaliação, aguardando-se a sua aplicação. Ao nível municipal as avaliações que surgiram estão associadas à justificação das revisões dos PDM, conforme a lei determina; os REOT são ainda em número reduzido e não se conhece nenhuma autarquia que o tenha produzido com a periodicidade recomendada. Assim, a mudança a este nível tem de ocorrer não só na prática regular da avaliação como na divulgação dos resultados.
3.2. Processu ais As mudanças ao nível dos processos de actuação são, porventura, as mais prementes e as mais difíceis de alcançar, dado que implicam alterações estruturais de carácter comportamental e organizacional. Os dois exemplos ilustrativos – centrados na cultura do planeamento e na governança – pretendem apontar caminhos possíveis para ousar fazer diferente na gestão do(s) território(s). 3.2.1. Da cultura d e plano à cultu ra de planeam ento
Na Europa saída da II Guerra Mundial, os Estados consolidaram a sua liderança na condução das políticas públicas, nomeadamente daquelas com incidência directa na
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
92
Margarida Pereira
organização dos territórios, afirmando-se o planeamento (territorial e sectorial) como um instrumento de suporte à acção pública. O planeamento racionalista, tecnocrático, regulador e normativo dominava, associado à intervenção mais ou menos hegemónica do Estado, num ambiente de estabilidade política e económico-social (McLoughlin, 1969; Faludi, 1973). O planeamento constituía um processo contínuo e cíclico, na procura de soluções optimizadas para a resolução de problemas. A produção do plano, etapa criativa e decisional, era mediática e valorizada. A sua execução, num horizonte temporal alargado e estável, decorria da adição de acções rotineiras sequenciais, à medida das necessidades, sob a liderança pública (vista com uma só linha de rumo) e o cumprimento generalizado das orientações pelos particulares (indivíduos, empresas, organizações). Os conflitos de interesses, sobretudo público/privados, eram subalternizados, dada a dominância e a consistência da intervenção pública. A crise petrolífera dos anos 70 afectou as economias ocidentais de forma abrupta e violenta: a quebra do crescimento económico representou uma ameaça para os recursos públicos, pela retracção da sua capacidade de investimento. Depois de uma fase inicial de defesa de “mais Estado”, as ideias neoliberais floresceram nesta conjuntura difícil: a valorização do mercado passou a ser defendida para criar riqueza e emprego, reservando-se ao Estado um papel supletivo, de coordenação e incentivo. O planeamento atravessa uma fase de desregulação e de flexibilização. O plano é substituído por projectos que configuram opções estratégicas para acolher os interesses privados (sobretudo os económicos) em presença (Healey, 1997). Esta abordagem trouxe ao processo decisório actores com perfis e comportamentos desconhecidos. As preocupações de determinar, dirigir e regular, são substituídas pelas de estímulo ao mercado. O plano é descredibilizado como guião datado para enquadrar as intervenções futuras. As “certezas” racionalistas foram-se erodindo e a abordagem estratégica (Güell, 1997; Esteve, 1999; Ferreira, 2005) é adoptada para gerir (melhor) a incerteza. Nesta inovação metodológica três aspectos merecem ser sublinhados: assunção de um processo circular (isto é, permanente), aberto (à participação de todos os actores do território) e prospectivo (de longo prazo) (Güell, 1997). A negociação como suporte à construção de consensos ganha relevância crescente e mostra-se decisiva no êxito dos resultados alcançados (Woltjer, 2000). Para não perder (totalmente) o controlo dos processos de mudança, a Administração, abre o planeamento à participação dos actores privados intervenientes nas dinâmicas territoriais e das populações afectadas, procurando para si própria formas mais estruturadas de articulação. O plano passa a ser (sobretudo) uma visão concertada entre os protagonistas e ganha particular atenção o seu período de aplicação, monitorizando os resultados que vão sendo conseguidos e (re)enquadrando o processo decisório para “oportunidades” que se aguardam ou que surgem inesperadamente.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
93
Neste ambiente de incerteza e instabilidade, a construção de um projecto colectivo para o território e de um processo que o viabilize, é determinante para orientar e potenciar a diversidade de actuações. A experiência confirma que: as intervenções casuísticas tendem a beneficiar os territórios mais ricos (ou mais favorecidos) e os actores com maiores recursos (ou com maior influência) e a comprometer os territórios e as comunidades mais fragilizados; a prevalência da força do mercado e da perspectiva económica, a par do reforço da autonomia dos indivíduos, tende a acentuar os desequilíbrios, afectando transversalmente os territórios (à escala local, metropolitana, regional, nacional) (Ascher, 2001). Ora uma perspectiva integrada reúne potencial para melhor contrariar desequilíbrios e perseguir o interesse colectivo, razão de ser do envolvimento público. Porém, a turbulência que marca o mundo contemporâneo afecta as dinâmicas territoriais e o modus operandi do processo de planeamento: há soluções precocemente desajustadas ou mesmo impróprias, aparecem problemas não equacionados e surgem oportunidades não enquadráveis, que podem desaparecer se não acolhidas em tempo útil. A cultura do planeamento precisa, então, de ganhar (mais) consistência: os territórios carecem de um projecto mobilizador e aglutinador dos interesses em presença, mas também atenção redobrada à gestão do plano, nomeadamente persistência na prossecução da execução dos seus elementos estruturantes e pró-actividade nos (re)ajustamentos impostos/aconselhados pelas conjunturas que se vão sucedendo. Em Portugal, o sistema de planeamento continua centrado na elaboração do plano (a todos os níveis da Administração); a sua execução é pouco acompanhada e avaliada e os resultados alcançados quase sempre ficam aquém do anunciado (segundo avaliações empíricas). Ora é indispensável inverter esta prática. A participação pública permanece insuficiente, apesar dos aperfeiçoamentos introduzidos na lei. Ao nível local (municipal) outros instrumentos podem ser adoptados, pelo potencial de mobilização que reúnem, como a Agenda 21 Local e os Orçamentos Participativos, já com experiências positivas, mas ainda pontuais. Assim, o planeamento enquanto instrumento orientador das mudanças, tem de ser revalorizado, pois parece ser um garante da concretização das funções sociais para todos e do combate à fragmentação e à marginalização dos territórios (e das comunidades que acolhem). Mas o processo carece agora de uma atenção diferente: um acompanhamento (ainda) mais próximo das (permanentes) reconfigurações efectuadas, das dinâmicas emergentes, dos actores intervenientes. O projecto territorial, consubstanciado no plano, é continuamente posto à prova, ponderando em que medida está a corresponder aos objectivos e avaliando o possível enquadramento de novos projectos ou intenções de investimento. A pró-actividade constante exige aos intervenientes uma “cultura do território”, traduzida no seu reconhecimento como recurso vital que só gerido numa
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
94
Margarida Pereira
perspectiva de sustentabilidade pode servir as expectativas do colectivo (presente e futuro). 3.2.2. Da governação à governança
Tradicionalmente, o Estado assumiu a governação do(s) território(s), de modo mais ou menos centralizado e normativo, estando o poder referenciado a uma determinada estrutura administrativa de base territorial. A democratização das sociedades ocidentais mudou este quadro de governabilidade: por um lado, a descentralização do poder político, com a criação de estruturas regionais e locais, forçou a redefinição das competências estatais; por outro, o acréscimo da sectorialização (especialização) ao nível central, a par da desconcentração territorializada de serviços, implicou aí também alterações relevantes. A governação moderna é, pois, indissociável da fragmentação do poder político, exigindo mecanismos de articulação e coordenação (verticais e horizontais) para impedir a perda da unidade do conjunto e assegurar eficácia ao funcionamento desta estrutura mais complexa. Mas as deficiências de coordenação mostram dificuldade em ser superadas, penalizando o desempenho da acção pública. Este contexto de actuação é agravado pelas alternâncias do poder, que afectam o processo de planeamento: estando este relacionado a um ciclo longo, confronta-se com os ciclos curtos do poder político (aos níveis nacional, regional e local), muitas vezes desfasados, o que pode comprometer um projecto territorial (por abandono, adiamento, desarticulação ou amputação de elementos estruturantes) e, por arrastamento, o desenvolvimento desse território, caso aquele não esteja escorado em estruturas de governança territorial que lhe confiram continuidade e solidez. A par da reestruturação do poder político, o incremento da democracia participativa aumenta o envolvimento da sociedade civil e a audição dos interesses que convivem e conflituam nos processos de reconfiguração territorial. O reforço do poder económicofinanceiro subjacente à globalização ampliou a complexidade das relações económicas e sócio-políticas, arrastando para as lógicas da governação interesses até então ausentes e forçando o aparecimento de formas capazes de gerir a multiplicação de intervenientes, muitas vezes exógenos aos territórios visados, e por isso de difícil (quase impossível) controlo pelas autoridades locais. Assim, às estruturas estatais (agora com modelos de descentralização e partilha de competências diversas) juntam-se estruturas de regulação e de representatividade das comunidades e agentes económicos e sociais, com fórmulas organizacionais diferenciadas. A autoridade do Estado fica afectada pela sua reorganização interna (fragmentação do poder) e pela menor capacidade de investimento (menos e mais repartidos recursos financeiros), mas também pelo acréscimo de protagonismo dos actores económicos, de quem o Estado está agora mais dependente (Coe, N. e all., 2007).
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
95
O quadro descrito repercute-se na gestão do território, nomeadamente: pela multiplicação dos actores públicos intervenientes, ampliando as ópticas de apreciação da “coisa pública” e do interesse colectivo; protagonismo crescente da sociedade civil (actores económicos, sociais, culturais e cidadãos), com interesses e lógicas de actuação heterogéneos; turbulência permanente no ambiente de decisão, que amplia a instabilidade no presente e a incerteza no futuro, e provoca obsolescência precoce das soluções ou compromete a sua concretização. O conceito de governança emerge pela incapacidade da gestão pública tradicional acudir aos problemas, responder aos desafios e às formas contemporâneas de organização das sociedades. Para Ascher (2001:95), trata-se de “(…) um sistema de dispositivos e de modos de acção, associando às instituições os representantes da sociedade civil para conceber e pôr em prática as políticas e as decisões públicas”. Pressupõe, pois, uma gestão territorial multi-níveis, participada, envolvendo Administração, actores económicos e socioculturais e cidadãos para responder às necessidades de um território, através da coordenação e integração das políticas territoriais e da cooperação estruturada e voluntária, em que os envolvidos estão predispostos a agir em conjunto e a adoptar métodos de trabalho próprios. Assim, em contextos organizacionais complexos, estão criadas as condições para modelos decisionais baseados em novas formas de relacionamento (cooperação e diálogo) entre actores. Com a democratização do país, Portugal assistiu a uma reorganização do poder político, cujos traços fundamentais podem ser assim sintetizados: diversificação e desconcentração do nível central; criação de regiões autónomas nos arquipélagos dos Açores e da Madeira, mas adiamento da regionalização no território do Continente; reforço do poder municipal. A gestão do território passa a ser partilhada pelos diferentes níveis da Administração, muitas vezes condicionada por orientações da União Europeia. Mas os actores económicos e sociais são cada vez mais influentes nas configurações territoriais. Neste quadro de poder, a Administração permanece como um parceiro obrigatório, cabendo-lhe agora (mais do que nunca) um papel exemplar e pedagógico na cooperação inter-sectorial, na cooperação territorial e no envolvimento activo dos actores, através do fomento de parcerias, contratualizações ou outras fórmulas inovadoras de cooperação. Mas tal não está a acontecer. Dois sinais inequívocos estão associados aos actuais processos de operacionalização do PNPOT e dos PROT. Ao nível nacional, as várias políticas sectoriais continuam a agir ignorando a dimensão territorial plasmada no PNPOT e sem abertura para a integração inter-sectorial; a entidade responsável (Direcção Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano) pela elaboração do Programa “desapareceu” após a sua aprovação, donde resulta “(…) a ausência de uma entidade com poder (efectivo) para arbitrar conflitos de interesses ou contradições sectoriais no seio da Administração, perante a evidente incapacidade de
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
96
Margarida Pereira
articulação horizontal intersectorial” (Pereira e Carranca, 2009:7). Ao nível regional, apesar dos avanços conseguidos na definição de estratégias de desenvolvimento e nos modelos de ordenamento, as debilidades nas estruturas de operacionalização são igualmente inquestionáveis e a merecer medidas de urgência para serem superadas: a incapacidade das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (responsáveis pela elaboração dos PROT) coordenarem as políticas sectoriais à escala regional, conjugada com a não responsabilização dos departamentos centrais sobre os compromissos assumidos (durante a elaboração do plano) relativos às respectivas políticas (execução, calendarização, priorização), a par da nem sempre fácil (por vezes difícil!) articulação com as autarquias, mostra o trabalho a fazer para a estruturação de plataformas de concertação entre actores públicos, indispensável para garantir um salto qualitativo na gestão do território. Ao nível municipal, aguarda-se com expectativa os efeitos que poderão advir da recente Lei do Associativismo Municipal 7, nomeadamente como estímulo à cooperação territorial. Se as dificuldades de articulação (vertical e horizontal, a todos os níveis da Administração) são inequívocas e a exigir medidas urgentes de superação, o problema alarga-se ao (não) envolvimento estruturado dos actores económicos e sociais. A persistir esta prática, os reflexos territoriais continuarão a ser negativos, pela prevalência de acções desgarradas, por vezes tornadas incongruentes (ou sem valia) quando desligadas do conjunto em que estavam integradas, e pela perda de sinergias potenciadas pelas actuações concertadas.
4. DESAFI OS E MUDANÇAS: OS LIM ITES DO P OSSÍVEL Os desafios colocados hoje aos territórios são cada vez mais complexos. As mudanças têm uma dimensão, um tempo e um ritmo que incutem instabilidade e incerteza constantes, tornando precocemente obsoletas as políticas públicas com incidência territorial, o que fragiliza (e até põe em causa) as tomadas de decisão que lhes estão associadas. O ordenamento do território precisa, então, de rever a sua forma de actuação para enfrentar com maior sucesso este contexto e evitar ser em permanência ultrapassado pelos acontecimentos, situação de que só muito poucos (territórios e comunidades) beneficiam. Assumindo a dificuldade de intervenção em contextos com as características descritas, defende-se que as práticas dominantes só podem ser contrariadas com uma gestão inteligente do(s) território(s) (Costa Lobo, 2009), materializada através de um ordenamento inteligente, uma administração inteligente e comunidades inteligentes, exemplificando-se de seguida alguns passos que poderão trazer mudanças positivas.
7
Lei nº 45/2008, de 27 de Agosto.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
97
A. Um ordenamento do território inteligente, capaz de garantir uma gestão criteriosa de recursos, em benefício dos territórios e das comunidades aí residentes, exige actuar sobre o modo de intervenção: ◆
◆
◆
◆
◆
◆
Que promova a passagem do plano-produto ao plano-processo, invertendo a actual prática de sobrevalorizar o plano e sub-valorizar a sua gestão; Que assuma o entendimento do plano como um guião das mudanças, clarificador das linhas de rumo a perseguir, mas com capacidade de acolher oportunidades não previstas sem ser posto em causa em permanência; Que valorize as intervenções b o t t o m u p , agarradas às especificidades de cada realidade, tirando partido das identidades e combatendo as soluções padronizadas; Que actue, simultaneamente , em soluções estruturantes , de longo prazo, e em soluções micro do curto e médio prazo, e proponha a calendarização de metas (credíveis) a atingir, fundamentais para a mobilização da sociedade civil; Que estimule soluções criativas (por vezes penalizadas, ou até inviabilizadas, pela rígida componente normativa legalmente imposta), acompanhadas de mecanismos de controlo e avaliação; Que incentive em vez de penalizar, divulgando e premiando boas práticas.
B. Uma Administração inteligente, isto é, pró-activa, mobilizadora de vontades, construtora de consensos, com liderança dos processos de reconfiguração dos territórios: ◆
◆
◆
Que agilize os processos de actuação . A Administração bloqueia-se a si própria, pelo emaranhado de tutelas que institui sobre o território, pelas indefinições que promove e pelas disputas do controlo dos processos (esquecendo o território). O objecto central da actuação é, por vezes, secundarizado, e acaba por ser ultrapassado pela agilidade das dinâmicas sociais e económicas; Que mobilize os actores na concepção, construção, avaliação e utilização de um projecto territorial ; que ajude a criar uma cultura de território , ensinando a olhar para este como um recursos vital, que é preciso preservar e potenciar em favor da comunidade; Que trabalhe no fortalecimento das estruturas de articulação (verticais e horizontais) e de concertação e na transparência dos processos negociais (para serem credibilizados );
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
98
Margarida Pereira
◆
◆
Que monitorize os resultados que se vão (ou não) alcançando, os divulgue e aprenda com os erros e os sucessos ; Que fomente a informação, formação e participação da sociedade civil na gestão dos seus territórios .
C. Comunidades inteligentes, isto é, capazes de ter uma influência efectiva e persistente na configuração dos seus espaços de vida : ◆
◆
Que combatam as atitudes individualistas (do cidadão, do município, do departamento da administração central…) e ajudem a construir uma consciência de território enquanto bem colectivo, fundamental na mudança de comportamentos e na influência da tomada de decisões ; Que defendam activa e conscientemente o seu espaço de vida e contribuam para a construção de um projecto territorial . A existência de uma cultura do território (importância também enfatizada no PNPOT) é determinante, pois arrasta o reconhecimento colectivo de que os cidadãos têm direito a um território bem ordenado, mas têm também deveres /responsabilidades nesse processo.
O esforço desenvolvido nos últimos anos em Portugal, em matéria de ordenamento do território, permitiu dar saltos qualitativos inegáveis, mas os resultados deveriam ser superiores face ao investimento efectuado (técnico, financeiro, institucional). A primeira atitude inteligente (colectiva) passa, agora, por reconhecer as limitações que constrangem a competitividade e sustentabilidade de muitos territórios, e mostrar abertura para mudanças comportamentos e organizacionais, capazes de fazer um caminho mais construtivo em benefício da coesão territorial.
BIBLIOGRAFIA Alcoforado, M. João (coord.) (2009), Alterações climáticas e desenvolvimento urbano. Lisboa, DGOTDU. Ascher, F. (2001), Les nouveaux principles de l’urbanisme . Paris, Editions de l’Aube. Baptista e Silva, Jorge (2003), “Avaliação do processo de planeamento”, in Ferreira, Antunes J. et al. (Ed.), Planear-Transformar-Gerir – 1º Seminário de Engenharia do Território. Lisboa, IST, 39-47. Castells, Manuel (1997), La era de la información. Economia, sociedad, cultura. Madrid, Alianza.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
99
Chappoz, Yves (1999), “Les approches disciplinaires face au project de territoire”, in Gerbaux, Françoise (Dir.), Utopie pour le territoire: cohérance ou complexité?. Paris, L’Aube Éditions, 69-77. Camagni, Roberto (2006), “The rationale for territorial cohesion: issues and possible policy strategies”, in Pedrazzini, Luisa (Ed.), The process of territorial cohesion in Europe. Milano, FrancoAngeli/DIAP, 53-67. CEMAT (Conferência Europeia de Ministros responsáveis pelo Ordenamento do Território (2000) Princípios orientadores para o desenvolvimento territorial sustentável do Continente Europeu, 7, www.dgotdu.pt/cemat /site%20CEMAT /PODTSCE.pdf (acedido em 2 de Novembro de 2009) Coe, N.; Kelly, KP e Yeung, H. (2007), “The state: Who controls the economy: firms or governments?”, in Coe, N.; Kelly, KP; Yeung, H., Economic Geography. London, Blackwell, 187-221. Comissão das Comunidades Europeias (CCE) (1990), Livro verde sobre o ambiente urbano. Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento. Bruxelas. Comissão Europeia (CE) (1994), Carta das cidades europeias para a sustentabilidade. Dinamarca, Maio. Comissão Europeia (CE) (1999), European spatial development perspective: Towards balanced and sustainable development of the territory of the European Union; de http://ec.europa.eu/regional_policy/sources/docoffic/official/reports/pdf/sum_en.pdf (acedido em 2 de Novembro de 2009). Comissão Europeia (CE) (2001), Governança europeia. Um livro branco . Bruxelas, COM, 428 final. Comissão Europeia (CE) (2004), Os compromissos de Aalborg , Aalborg. Comissão Europeia (CE) (2007), Territorial agenda of the European Union ; http://www.dgotdu.pt/ue (acedido em 4 de Novembro de 2009). Comissão Europeia (CE) (2007), Carta de Leipzig sobre a sustentabilidade nas cidades europeias, in http://www.eukn.org/binaries/eukn/news/2007/5/leipzig-charter-finaldraft-020507-en.pdf (acedido em 4 de Novembro de 2009). Comissão Europeia (CE) (2008), Livro verde sobre a coesão territorial europeia: Tirar COM (2008) 616 final, Bruxelas; de partido da diversidade territorial, http://ec.europa.eu/regional_policy/consultation/terco/paper_terco_pt.pdf (acedido em 4 de Novembro de 2009).
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
10 0
Margarida Pereira
Comissão Europeia (CE) (2008), Demography report 2008: Meeting social needs in an ageing society. SEC (2008) 2911. Couch, Chris; Leontidou, Lila e Petschel-Held, Gerhard (2007), Urban sprawl in Europe – Landscapes, land use change & policy . Oxford, Blackwell Publishing. Davoudi, S. (2009), “Asymmetric development in spatial planning – Positivist content and post modernist processus?”, in Davoudi, S.; Strange, I.; (Eds), Conceptions of Space and Place in Strategic Spatial Planning . London, Routledge, 207-267. Direcção Geral do Ordenamento do Território (1988) Carta europeia do ordenamento do território. Lisboa, MPAT/SEALOT. Domingues, Álvaro (coord.) (2006), Cidades e democracia. Lisboa, Argumentum. Eurostat (2008), Population and social conditions . Statistics in Focus, 72/2008. Esteve, J.M. Pascual I (1999), La estrategia de las cuidades - Los planes estratégicos como instrumento: métodos, técnicas y buenas prácticas. Barcelona, Diputació de Barcelona. Faludi, A. (1973), Planning theory. Oxford, Pergamon Press. Ferreira, A. Fonseca (2005), Gestão estratégica de cidades e regiões. Lisboa, FCG. Gabina, Juanjo (1998), Prospectiva y ordenación del territorio. Barcelona, Marcombo. Galvão, Sofia (2008), “Repensar o planeamento local: que soluções para a rigidez das normas dos planos municipais?”, in Seminário Os dez anos da lei de bases da política de ordenamento do território e urbanismo − Génese e evolução do sistema de gestão territorial, 1998-2008. AdUrbem.
Godet, Michel (1993), Manual de prospectiva estratégica. Lisboa, Publicações D. Quixote. Güell, J.M. Fernández (1997), Planificación estratégica de ciudades. Barcelona, Editorial GG. Healey, P. (1997), Collaborative planning. Shaping places in fragmented societies. London, MacMillan Press. IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) (2007a), Climate change 2007. The scientific basis: Contribution of Working Group I to the fourth assessment report . Cambridge, Cambridge University Press. IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) (2007b), Climate change 2007. Impacts, adaptation and vulnerability: Contribution of Working Group II to the fourth assessment report. Cambridge, Cambridge University Press.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
Desafios Contemporâneos do Ordenamento do Território
10 1
Julião, Rui Pedro (coord.) (2009), Guia metodológico para a produção de cartografia municipal de risco e para a criação de Sistemas de Informação Geografica (SIG) de base municipal. Lisboa, Autoridade Nacional e Potecção Civil/Direcção Geral de Ordenamento
doTerritório e Desenvolvimento Urbano/Instituto Geográfico Português. Kooiman, Jan (Ed.) (1993), Modern governance. London, Sage. Lagarje, Romain (1999), “Quatre modalités pour «faire» du territoire”, in Gerbaux, Françoise (Dir.), Utopie pour le territoire: cohérence ou complexité?. Paris, Éditions de L’Aube, 79-100. Lobo, Manuel Costa (2009), “Smart Cities/Smart People – Guiding – Ideas”, in Proceedings REAL CORP 2009: Cities 3.0 – smart, sustainable, integrative . Strategies, concepts and technologies for planning the urban future, (CD-ROM) (ISBN: 97839502139-6-6), 809-817. http://programm.corp.at/cdrom2009/en/papers.html (acedido em 2 Novembro de 2009). Mateus, A. (coord.) (2005), Competitividade territorial e coesão económica e social. Lisboa, Observatório do QCAIII. McLoughlin, J. (1969), Urban and regional planning: a systems approach. London, Faber and Faber. Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (2007), Programa Nacional da Politica de Ordenamento do Território. Lisboa, MAOTDR. Newmam, Peter e Kenworth, Jeffery (1999), Sustainability and cities – Overcoming automobili dependence. Washington DC., Island Press. Owens, Susan e Cowell, Richard (2002), Land and limits – Interpreting sustainability in the planning process. London, Routledge. Pereira, Margarida e Carranca, Maria Adelaide (2009), “Coesão territorial e governança: abordagem multi-escalar”, Actas do VII Congresso da Geografia Portuguesa. Coimbra, Edições da Universidade de Coimbra. (No Prelo). Portas, N. et al. (2003), Políticas urbanas – Tendências, estratégias e oportunidades . Lisboa, FCG. Roger, R. (coord.) (1999), Towards an urban renaissance. London, Urban Task Force Santos, Filipe Duarte (2004), “Alterações climáticas: situação actual e cenários futuros”. GeoINova – Revista do Departamento de Geografia e Planeamento Regional , 9, 11-32.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais
10 2
Margarida Pereira
Santos, Filipe D. e Miranda, P. (eds) (2006), Alterações climáticas em Portugal. Cenários, impactes e medidas de adaptação, Projecto SIAM II. Lisboa, Gradiva. Silva, Fernando Nunes (2003), ”Políticas urbanas para uma mobilidade sustentável”. GeoINova – Revista do Departamento de Geografia e Planeamento Regional , 7, 87-102. Silva, Fernando Nunes (2004), ”Políticas urbanas para uma mobilidade sustentável: do diagnóstico às propostas”. GeoINova – Revista do Departamento de Geografia e Planeamento Regional, 10, 157-174. Silva, Graça Ponte (2008) “Forma urbana e sustentabilidade – Algumas notas sobre o modelo de cidade compacta”. Prospectiva e Planeamento, 15, 101-126. Zêzere, José Luís (2007), “Riscos e ordenamento do território”. Inforgeo, 20/21, 59-63. Wachter, S. (2000), “Conclusion. Les défis de la modernité territoriale”, in Wachter, S. e all., Repenser le territoire – Un dictionnaire critique. Paris, L’ Aube/Datar, 261-266. Wheeler, Stefen M. (2004), Planning for sustainability: Creating livable, equitable, and ecological communities. London & New York, Routledge. Woltjer, Johan (2000), Consensus planning. Aldershot, Ashgate.
Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais