A arquitetura escolar brasileira: um recorte histórico Resumo A importância da arquitetura escolar e a história da evolução dos prédios escolares perpassam o próprio desenvolvimento da educação brasileira, além de revelarem as simbologias e os aspectos culturais de diferentes épocas. Neste sentido, este trabalho tra um apanhado histórico acerca da arquitetura escolar no !rasil sob as perspectivas de diferentes autores. A arquitetura, como incorporadora de tend"ncias, de s#mbolos e como escri es critu tura ra no es espa paço, ço, e$ e$pr pres essa sa di disc scur urso sos. s. %e %egu gund ndo o &r &rag ago o '( '()) ))*+ *+,, el elaa inu in uen enci ciaa a so socie cieda dade de,, fa favo vorec recen endo do o se seu u de dese senv nvol olvi vime ment nto. o. -u -uan ando do analis ana lisada ada na per perspe specti ctiva va da edu educaçã cação, o, e$p e$pres ressa sa pol pol#ti #ticas cas ped pedagó agógic gicas, as, ressalta o momento histórico no qual se insere e revela o curr#culo. ogo, a organi org aniaç ação ão es espac pacial ial da esc escola ola se rel relaci aciona ona / evo evoluç lução ão da arq arquit uitetu etura ra escolar. 01 espaço escolar tem de ser analisado como um constructo culltu cu tura rall qu quee e$ e$pr pres essa sa e re ree ete te,, par araa alé lém m de sua mate teri rial alid idaade de,, determinados discursos2 '&RA31, ())*, p.(4+. 5m arquitet etu ura, o programa de uma edi6cação é o co con n7unto de necessidades que um pro7eto deve completar e o roteiro de como os requisitos funcionais devem estar dispostos em um novo prédio. No caso espec#6co da tipologia escolar, o 0programa2 de6ni o n8mero de salas de aula e quais serão os outros ambientes de ensino, como, por e$emplo, biblioteca, quadras, laboratório, etc., além de estabelecer as caracter#sticas dese7a des e7adas das a tai taiss amb ambien ientes tes e as res respec pectiv tivas as dis dispos posiç9 iç9es es na edi edi6ca 6cação ção ':1;A<1;%:=, ()**, p.4>+. Um histórico da arquitetura escolar brasileira
A primeira escola brasileira foi criada na cidade de %alvador, no século ?@=. época, os 7esu#tas detinham o monopólio sobre a educação. A peda pedagogia gogia 7esu# 7esu#tica tica era base baseada ada no 0Ratio %tudi %tudiorum2 orum2,, con7un con7unto to de norm no rmas as cr cria iado do pa para ra re regu gula lame ment ntar ar o en ensi sino no no noss co colé légio gioss 7e 7esu su#ti #tico cos. s. Representava a ordenação das funç9es, das atividades, dos métodos de
avaliação nas escolas. Borém, a interfer"ncia dos missionCrios 7esu#tas quanto a quest9es acerca do trabalho ind#gena 'que para eles era e$ercido sob atos de brutalidade por parte dos colonos+ e sua crescente inuencia nas autoridades locais, fe com que os missionCrios passassem a ter problemas com poderosos. 5m *DEF, os 7esu#tas foram e$pulsos, 0pela reformulação pombalina de inspiração iluminista, laica, cient#6ca e nacionalista2 '%A5%, ())), p.44+. Gouve, então, a implementação de um novo sistema de educação p8blica para substituir o anterior. HeramIse as reformas educacionais institu#das pelo Jarqu"s de Bombal, para quem a pedagogia devia pautarIse pelo ideCrio =luminista. Komo os colégios e seminCrios foram fechados quando da e$pulsão dos 7esu#tas, a educação primCria 6cou por conta de tutores privados. %egundo KA%
L estabeleceu que as Assembléias Brovinciais se tornassem responsCveis pela regulamentação e promoção do ensino primCrio e secundCrio, o que gerou pluralidade no sistema educacional brasileiro. =sto permitiu a cada prov#ncia autonomia para estruturar a educação em seu território, uma ve que não havia padroniação. 5m *M>D, foi criado, no Rio de aneiro, o Kolégio =mperial Bedro ==, que atendia / instrução secundCria. 5ste deveria servir de modelo educacional para o Ba#s e foi constru#do segundo padr9es de arquitetura européia. He acordo com %ales '())), p.LF+, por volta de *MD), dCIse o in#cio da construção mais sistemCtica de prédios escolares p8blicos no !rasil. 5ra a fase da industrialiação que começava a despontar no Ba#s, acarretando o princ#pio do processo de urbaniação e, por conseguinte, a necessidade de novas demandas por educação. Hesse modo, a construção da 5scola de %ão %ebastião, prédio escolar p8blico, no Rio de aneiro, inaugura uma fase de pro7etos de edi6caç9es escolares inspiradas em programas educacionais europeus. O sabido que a organiação espacial da escola européia no século ?=? revelava a importância dada / ordenação.
1 espaçoIescola, na segunda metade do século ?=?, incorporou assim como as demais construç9es da sua época, a preocupação com a higiene e, posteriormente, com o conforto e a tecnologia. 5ssa mudança foi impulsionada pelas inovaç9es pedagógicas, como também pelas e$ig"ncias advindas da sociedade, por meio do industrialismo e do positivismo cient#6co, o que reforça o aspecto cultural 'e pedagógico+ do prédio escolar '5%K1AN1, *FFM, p.L4ILD+. 5m &oucaut '*FMD+, destacaIse a inu"ncia do espaço sobre a produção submissa, treinada e domesticada dos su7eitos no ambiente escolar. 5le aborda o 0espaço serial2, associado / organiação dos lugares, / ordenação do espaço da sala de aula por 6leiras, con6gurando o valor dado / obedi"ncia, / hierarquia, ao controle da vigilância na sala de aula. A arquitetura escolar na história, principalmente no século ?=?, teve duas tend"ncias dialéticasQ de um lado, o dese7o de controle e disciplina por espaços bemIdeterminados, com pro7etos baseados no isolamento autnomoS de outro, as inu"ncias das teorias pedagógicas, que valoriavam mais a criatividade e a individualidade ':1;A<1;%:=, ()**, p.4E+. As marcas da inu"ncia estrangeira na arquitetura escolar brasileira estão presentes nas semelhanças arquitetnicas observadas nas escolas do Rio de aneiro e %ão Baulo, do per#odo =mperial até os primeiros anos da Rep8blica '%A5% , ())), p.E)+. 1 Ba#s não possu#a uma arquitetura escolar própria, tipicamente brasileira, por isso importava e reproduia modelos estrangeiros, principalmente vindos da &rança, 0pa#s que até recentemente constitu#a refer"ncia cultural e educacional para o !rasil2 '!T&&AS B=N<1, ())(, p.>>+. época do =mpério, os pro7etos de construç9es escolares p8blicas eram pautados pela monumentalidade e se serviam de caracter#sticas de construç9es religiosas medievais, eram pro7etados para faer cumprir um modelo ideal de ordem, correspondente ao da estrutura divina do universo 'U+Q espaço cont#nuo, homog"neo, mensurCvel, ordenado de maneira a que cada elemento dessa estrutura encontrasse seu 0locus naturalis2, colaborando assim para a unidade e a integridade do todo, apesar da diversidade de suas partes. '1=@5=RA, *FF*, p.M4+.
A similitude com os templos religiosos medievais europeus se deve ao fato de que os prédios escolares, neste primeiro momento da educação p8blica brasileira, eram pensados para e$pressarem carCter de monumentos e causarem deslumbramento, evocando sentimento de respeito e contemplação tal como faiam os conventos da =dade Jédia. Gavia um apelo simbólico muito forte, pois as escolas propagavam em si mesmas a ação do poder pol#tico, ostentavam status de elementos representantes e divulgadores da inu"ncia das elites sócioIpol#ticas. A Broclamação da Rep8blica deuIse em *FMF, e trou$e consigo os ares iluministas de progresso e modernidade para diversos setores da sociedade, inclusive para a arquitetura e pedagogia escolares. %egundo !encostta '())E, p.(4F+, a função simbólica de um edif#cio escolar, inclusive sua apar"ncia e localiação, estC intrinsecamente ligada a um momento pol#tico e a uma mensagem que se dese7a passar a quem o v". 5sta função simbólica, uma estratégia de visibilidade, é fortemente valoriada nas primeiras décadas da Rep8blica, acompanhando o discurso da educação popular. No discurso daqueles que implantaram, no !rasil, o novo regime pol#tico em *MMF, era preciso, além da 7usti6cação racional do poder, a 6m de legitimar a Rep8blica, construir uma nação pautada em valores que demonstrassem estar em de6nitivo sintoniados com as mudanças que o mundo moderno apresentava. 5sse discurso sofreu o impacto de concepç9es elaboradas a partir das e$peri"ncias civiliatórias norteI americana e européia, que inspiravam os pol#ticos e intelectuais na construção de argumentos discursivos e prCticas que enalteciam a Rep8blica 'ibid., p. FE+. No momento seguinte, a arquitetura escolar brasileira adota o estilo classicista. 1 Klassicismo, como 6cou conhecido, ou se7a, a imitação de modelos da Antiguidade clCssica grecoIromana se fe presente nas artes plCsticas, teatro e literatura e ocorreu no per#odo do Renascimento Kultural, nos séculos ?=@ e ?@=. Representou um momento de ruptura com as caracter#sticas copiadas da arquitetura medieval. No !rasil, esse estilo se destacou a partir do 6nal do século ?=? e primeiras décadas do século ??. Apresentava como caracter#sticas bCsicas o apelo / racionalidade e a evocação dos valores universais.
A proposta arquitetnica classicista para os edif#cios p8blicos escolares correspondiaIse perfeitamente com a nova proposta pedagógica. 5ra tida como a melhor refer"ncia representativa de qualidade, economia e conveni"nciaQ 1 Klassicismo, como doutrina, confere maior importância /s faculdades emocionais no processo da concepção art#stica, porque alme7a a e$pressão de valores tidos como universais e supostamente eternos, em detrimento dos valores particulares, regionais ou nacionais e representativos de momentos passageiros '%=@A, *FF*, p.*)4+. !uVa e Binto '())(+ ressaltam que, ao entrar numa escola p8blica constru#da / época da Brimeira Rep8blica '*FMFI*F()+, notaIse a importância atribu#da / educação por meio do estilo e da impon"ncia de seus edif#cios, com detalhamento voltado / so6sticação, com entrelaçamento harmonioso entre pro7eto arquitetnico e pro7eto pedagógico. 1 estilo neocolonial deu sequ"ncia /s transformaç9es no campo da arquitetura escolar. %egundo %ales '())), p.E4+, a busca por uma arquitetura nacional possibilitou que a tend"ncia neocolonial, surgida em meio aos embates pol#ticos educacionais dos anos de *F() entre a Bedagogia Nova e a Bedagogia
1 prédio escolar concebido em estilo moderno deveria, pois, cumprir as e$ig"ncias das novas conquistas pedagógicas e ser constru#do com base em uma arquitetura funcional, caracteriada pela eliminação de tudo o que fosse supéruo. A aus"ncia de retórica decorativa, a "nfase na percepção dos aspectos funcionais e espaciais do edif#cio, o interesse pelo método e a con6guração das massas e formas empregadas num equil#brio dinâmico eram caracter#sticas que abrangiam grande parte da produção arquitetnica moderna da linha racionalista '1=@5=RA, *FF*, p.(4L+. Andreotti 's.d+ a6rma que a moderniação capitalista brasileira das primeiras décadas do século ??, possibilitou a e$pansão de novas camadas sociais, e permitiu mobilidade social na estrutura de classes da sociedade brasileira, com a ampliação do mercado de trabalho e do mercado consumidor. Heste modo, seguindo este conte$to de e$pansão das forças produtivas, a educação escolar passou a ser visada como um instrumento fundamental de inserção social, tanto por educadores, quanto para uma ampla parcela da população que alme7ava uma colocação nesse processo 'ANHR51<<=, s.d+. As pol#ticas educacionais começaram a ser pensadas no sentido de legitimar as mudanças inerentes ao processo de moderniação capitalista. A renovação da escola tornouIse, então, pauta importante. 1s embates, na época, entre as concepç9es pedagógicas se deram entre os defensores da Bedagogia Nova e os da Bedagogia ) foi particularmente fértil para as idéias que deram base a um considerCvel con7unto de mudanças nas propostas para a educação. A Bedagogia
prCticas, quer em situaç9es de sentido social e moral, reais ou simbólicos '1TR5NY1 &=G1, *FDM, p.*E*+ Bara uma nova maneira de faer pedagogia, tornouIse necessCrio um novo tipo de ambiente escolar. 1s edif#cios escolares, aos poucos, dei$aram de ser compactos e passaram a apresentar caracter#sticas mais e$#veis. As construç9es escolares passaram a ter sanitCrios dentro dos edif#cios. AboliuIse a divisão entre se$os, meninos e meninas podiam agora freqZentar o mesmo espaço para as aulas. 5 a ornamentação e pompa t#picos da arquitetura escolar imperial e da Brimeira Rep8blica foram dei$ados de lado, especialmente por motivos 6nanceiros. As construç9es escolares passaram a retratar o crescimento social e econmico da educação no Ba#s ':1;A<1;%:=, ()**, p.M4+. 5ra um novo tipo de arquitetura escolar que despontava, caracteriada pela busca da padroniação devido / necessidade de especi6cidade do edif#cio escolar, de6nida por um programa a6nado com a nova pedagogia, pautada no viés racionalista, simples, sem ornamentação, funcionalista. A sala da aula recebeu atenção diferenciada, por ser o espaço elaborado para a e6ci"ncia da aprendiagem. A arquitetura e$terna representava a consolidação da modernidade pelas formas geométricas simples e o concreto aparente, ruas e pCtios internos. Borém, certos detalhes importantes foram negligenciados, como a alocação da biblioteca entre salas de aula, os sanitCrios distantes das salas e os confortos térmico, ac8stico e de iluminação, que foram, muitas vees, preteridos em função da forma ' ibid ., p.F)+. A arquitetura escolar brasileira segue reetindo as mudanças de cada época. @ale destacar que entre a década de *F4) e a década de *FF), por quest9es de custos, de verbas limitadas, houve uma simpli6cação no sistema de construç9es escolares. %impli6cavaIse o padrão construtivo para um atendimento mais rCpido / constante demanda de novas escolas, ampliaç9es ou reformas '%1AR5%, *FFE+. 1 ambiente escolar é apreendido em suas especi6caç9es, desde os curr#culos que são adotados, desde os ob7etivos dos diferentes setores do prédio escolar, / e$ibilidade no uso dos espaços, e aos fatores de acessos e u$os dentro e fora da escola. -uest9es de conforto térmico, ac8stico e
funcional passam a ser posta em destaque para se pensar a melhoria do ambiente escolar. Has 8ltimas décadas aos dias atuais, a arquitetura escolar no Ba#s de forma geral é caracteriada pela padroniação. GC o apelo pela utiliação qualitativa dos espaços escolares, e$emplo disso é a incorporação de salas de informCtica e da quadra de esporte, elementos que ampliam as funç9es do prédio escolar. Juitas edi6caç9es escolares seguem um pro7eto padrão. 5ntretanto a padroniação nem sempre leva em conta situaç9es locais espec#6cas, resultando em ambientes escolares desfavorCveis, com problemas de conforto ambiental. 'U+ 1 pro7eto padrão para instituiç9es como escolas, hospitais e creches é uma prCtica comum em pro7etos p8blicos de interesse social, que usam programas de necessidades padroniados das atividades estipuladas pelos órgãos administrativos de equipamentos urbanos. 1 partido arquitetnico procura atender aos ob7etivos econmicos, / racionalidade construtiva e / funcionalidade ':1;A<1;%:=, ()**, p.*)*+. A padroniação relacionaIse intimamente com o dese7o de identi6car edi6caç9es p8blicas a determinados momentos pol#ticos ou determinadas administraç9es. A relação entre a história brasileira e o desenvolvimento da arquitetura escolar revela a necessidade do plane7amento educacional visando / melhoria das condiç9es de ensino e / implantação de pro7etos arquitetnicos de escolas p8blicas que atendam /s atuais demandas educacionais.