Contrariedades Eu hoje estou cruel, frenético, exigente; Nem posso tolerar os livros mais bizarros. Incrvel! "# fumei tr$s ma%os de cigarros Consecutivamente. &'i(me a cabe%a. )bafo uns desesperos mudos* +anta +anta deprava%o deprava%o nos usos, usos, nos costumes! )mo, insensatamente, insensatamente, os #cidos, os gumes E os -ngulos agudos. entei(me / secret#ria. )li defronte mora 0ma infeliz, sem peito, os dois pulm1es doentes; ofre de faltas de ar, morreram(lhe os parentes E engoma para fora. 2obre es3ueleto branco entre as nevadas roupas! +o +o lvida! 4 doutor doutor deixou(a. deixou(a. 5orti6ca. 7idando sempre! E deve a conta na botica! 5al ganha para sopas... 4 obst#culo estimula, torna(nos perversos; )gora sinto(me eu cheio de raivas frias, 2or causa de um jornal me rejeitar, h# dias, 0m folhetim de versos. 8ue mau humor! 9asguei uma epopeia morta No fundo da gaveta. 4 3ue produz o estudo: 5ais duma reda%o, das 3ue elogiam tudo, 5e tem fechado a porta. ) crtica segundo o método de +aine Ignoram(na. "untei numa fogueira imensa 5uitssimos papéis inéditos. ) imprensa ale um desdém solene. Com raras exce%1es merece(me o epigrama.
&eu meia(noite; e em paz pela cal%ada abaixo, olu%a um sol(e(d'. Chuvisca. 4 populacho &iverte(se na lama. Eu nunca dedi3uei poemas /s fortunas, 5as sim, por defer$ncia, a amigos ou a artistas. Independente! ' por isso os jornalistas jornalistas 5e negam as colunas. 9eceiam 3ue o assinante ing$nuo os abandone, e forem publicar tais coisas, tais autores. )rte: No lhes conv$m, visto 3ue os seus leitores &eliram por
Nas letras eu conhe%o um campo de manobras; Emprega(se a reclame, a intriga, o an>ncio, a blague, E esta poesia pede um editor 3ue pague +odas as minhas obras
) pobre engomadeira ir(se(# deitar sem ceia: ejo(lhe luz no 3uarto. Inda trabalha. ? feia... 8ue mundo! Coitadinha!
E estou melhor; passou(me a c'lera. E a vizinha:
Ces#rio erde, in @4 7ivro de Ces#rio erde@
A. Nas duas primeiras estrofes, a sua atitude est# mais ligada a uma auto(imagem, / constru%o de um eu( lrico descontente, irritado, ansioso e com dores de cabe%a. )djectiva%o Bcruel frenético, exigenteD. 0tiliza outro recurso estilstico, a tripla met#fora, segunda estrofe, B)mo, insensatamente, os #cidos, os gumes F E os -ngulo agudosD, através da 3ual o poeta mostra ter consci$ncia das caractersticas inovadoras da sua arte, bem como do desagrado 3ue estas provocam nos crticos. 9evela(se, na terceira estrofe, cheio de raivas friasD pelos seus poemas terem sido rejeitados e pela desconsidera%o por a3ueles 3ue esto excludos do sistema. G. )lém de desabafo, estes versos fazem(nos antever 3ue a realidade 3ue nos vai ser oferecida ser# condicionada por fatores fsicos e psicol'gicos do poeta. +udo isto causado por uma sociedade corrupta,
injusta e decadente 3ue se encontra representada pela reda%o do jornal e pela vizinha. H. BEspa%o 4 eu(lrico est# num escrit'rio 3ue 6ca / frente da casa de uma mulher pobre, endividada, doente e 3ue muito trabalha para pouco viver. 4 sujeito poético est# sentado / secret#ria e da avista a janela de um prédio onde mora a infeliz engomadeira. ) luz est# acesa, portanto é de noite. Estes so elementos realistas, uma vez 3ue a poesia de Ces#rio se apresenta como um lugar de observa%o do mundo e da vida.
Neste texto so duas as tem#ticas a considerar, a 3uesto social e a humilha%o de 3ue o sujeito e a engomadeira so vtimas. 4 poeta coloca(se ao lado dos desfavorecidos, vtimas da opresso social da sociedade e denuncia as situa%1es sociais injustas, por exemplo, no retrato da engomadeira. 4 poeta come%a por revelar o seu estado emocional. 4 primeiro verso resume o 3ue depois ser# desenvolvido Bconsci$ncia do euD, distancia%o. Este primeiro verso é 3uase um desabafo e faz(nos antever 3ue a realidade 3ue nos vai ser oferecida ser# condicionada por fatores fsicos e psicol'gicos Bfrenesi; agita%o; ansiedade; dor de cabe%a; impaci$ncia "# fumei tr$s ma%os de cigarrosF Consecutivamente.. )lém de desabafo, este primeiro verso funciona como um aviso prévioD do 3ue vir# a seguir e 3ue detém a aten%o do poeta* a descri%o de uma sociedade corrupta, injusta e decadente 3ue se encontra representada pela reda%o do jornal 3ue rejeitou os seus poemas e pela vizinha tsica. 2odemos ento concluir 3ue o tema do poema é a crtica a uma sociedade alienada e desumana. Esta crtica faz(se através da den>ncia de atitudes 3ue muito ferem a sensibilidade do euD* ( o abandono dos doentes Bengomadeira;
( o abandono dos poetas Bsimbolizado pela recusa da publica%o dos seus versos. poeta F engomadeira* paralelismo das duas situa%1es* J ambos trabalham curvados, um sobre a secret#ria, outro sobre a t#bua; J ambos sentem di6culdade em respirar, ele por3ue fuma exageradamente, ela devido /s brasas do ferro de engomar; J ela tem dor de cabe%a resultante dos cigarros e das contrariedadesD, ela as6xia em resultado da doen%a e da combusto do ferro; J ele abafa uns desesperos mudos; ela ofre de faltas de ar; J ele v$ recusados os seus poemas; a ela 4 doutor deixou(a. BK F 5al ganha para sopas... +E5L+IC) ( Mumilha%o ( estética, por3ue v$ a sua produ%o poética posta em causa e incompreenso relativamente / mesma; ( social, centrada na situa%o da engomadeira, abandonada por todos e 3ue tem de trabalhar para sobreviver.
no entanto, ele ainda poderia aceitar os valores sociais ou interesses liter#rios mas ela, nem isso. ! M# em Ces#rio erde, a preocupa%o de aliar as 3uest1es sociais realistas ao aperfei%oamento poético, caracterstica do parnasianismo. ! 4s limites sufocantes da cidade so também identi6cados com os pr'prios limites dos padr1es sociais e artsticos da burguesia sendo 3ue a cidade representa também um conjunto de normas /s 3uais o sujeito poético no admite vergar(se. ! +tulo O o euD contrariado, sugerindo as tens1es F contradi%1es de um poeta 3ue se debate entre dois desejos contr#rios* a aspira%o a uma felicidade liter#ria e a necessidade de escapar aos padr1es 3ue lhe so impostos. Ces#rio no abdica dos temas F formas invulgares na poesia e situa( se ao lado do povo por oposi%o aos outros 3ue o rodeiam.
! 4s 3ue controlam a imprensa esto ao mesmo nvel da mulher citadina de &eslumbramentos pois so ambos conse3u$ncias da moda P na roupa ou nas ideias P ambos produtos arti6ciais da cidade.
M# 3uem veja em Ces#rio erde um lrico realistaD devido ao 3uotidiano citadino e burgu$s da sua poesiaD. "acinto do 2rado Coelho acentua a sua proximidade do Naturalismo pela pretenso de objetividade e pela 6delidade / estética do positivo e do sinceroD, com alus1es a Qalzac, a +aine e a pencer , com um vocabul#rio cheio de termos concretos, alguns deles técnicos ou de linguagem familiar, e com uso abundante de adjetivosD, para dar o contorno exato dos homens e das coisasD. )daptado
Contrariedades é construdo no momento em 3ue tendo ad3uirido a atitude de observa%o 3ue permitira uma certa representa%o do espa%o urbano, Ces#rio desenvolve e particulariza essa atitudeD BIbidem, p.RSG, mas acredita(se a3ui 3ue tal representa%o est# mais ligada a uma auto( imagem, / constru%o de um eu(lrico descontente no s' com a urbaniza%o, mas sobretudo com a desconsidera%o por a3ueles esto excludos do sistema. Em outras palavras, o poeta demonstra o 3uanto ele pr'prio é simbolicamente valioso, / revelia da desconsidera%o 3ue o seu pr'prio campo social lhe imputa, e utiliza(se das imagens dos populares como forma de ilustra%o de sua pr'pria condi%o social frente / produ%o liter#ria. +entemos esmiu%ar tal hip'tese.
Na primeira estrofe do poema temos, de imediato, acesso ao sentimento predominante do eu(lrico durante todo o texto Bcruel, frenético, exigente, denotando um posicionamento arredio frente a sua principal 3ueixa Bnem posso tolerar os livros mais bizarros. 4s dois >ltimos versos so a concretiza%o imagética deste estado de esprito. Essa l'gica permanece na segunda estrofe e desemboca em uma curiosa descri%o na terceira estrofe.
4 eu(lrico est# em um escrit'rio 3ue 6ca a frente da casa de uma mulher pobre, endividada, doente e 3ue muito trabalha para pouco viver. ob este ponto, assume(se 3ue, apesar da aura realista 3ue perpassa grande parte da obra de Ces#rio erde, este apelo ao nvel social 3ue no texto se demonstra é correlativo a uma identi6ca%o da pr'pria voz do poema, um reTexo de sua imagem de excludo do campo de intelectuais e artistas reTetida Bou simbolizada na imagem da3uela mulher excluda socialmente do grupo dominante da sociedade. Esta idéia se refor%a na pr'xima estrofe em 3ue é mostrada a rejei%o 3ue o jornal empreende contra a publica%o dos versos do poeta. ? neste momento em 3ue 6ca mais clara a tentativa de valora%o simb'lica 3ue Ces#rio faz neste poema. Nas estrofes posteriores falar# da falta de sensibilidade Be compet$ncia das reda%1es 3ue tanto o rejeitam, e do 6m tr#gico 3ue d# a suas produ%1es, uma vez 3ue de nada servem se no so publicadas P o 3ue, por si s' j# indica a busca pelo mercado, ainda 3ue no seja perceptvel 3ual o mercado 3ue o autor 3uer alcan%ar.
5ais claro se torna a tentativa de valora%o simb'lica nas estrofes de nona / décima segunda. Em primeiro lugar ele identi6ca seu p>blico(alvo, os amigos e artistas, pertencentes e basti1es das regras de aceita%o de campo intelectual e artstico, pessoas 3ue o entendem em contrapartida Bou contradi%o /s pouco competentes reda%1es. Esta pouca compet$ncia é constantemente rea6rmada, dizendo o autor 3ue a arte no importa ao editor, a ele é importante 3ue seus leitores, no to doutos ou h#beis 3uanto os artistas, no compreendero a3uela arte. Ces#rio se reveste agora de um arcabou%o simb'lico extremamente grande, embutindo a si mesmo o dom de fazer boas poesias em recusa a facilidade e pouco engenhosidade 3ue as narrativas, segundo ele, t$m P agora sim a demonstra%o de 3ue no é 3ual3uer mercado a 3ue ele 3uer se inserir, mas sim o erudito. Conclui, ento, 3ue seus versos, de sentimentos 6nos e boa técnica, valem mais pela consci$ncia da compet$ncia 3ue o pr'prio autor tem sobre si P o 3ue o acalma, mesmo sem resolver o problema da3uela mulher pobre e moribunda, talvez por se ter certeza 3ue ainda o seu pr'prio problema no tenha sido resolvido.
+em(se, com essa brevssima an#lise, um estopim de crtica 3ue pretende perceber a l'gica desta poesia no apenas pelo viés formal, mas também por sua rela%o com a sociedade em 3ue foi produzida. 4 sujeito, no caso o poeta, busca incessantemente sua valoriza%o simb'lica frente aos seus iguais e, em >ltima inst-ncia, frente ao todo formador da camada dominante do sistema de produ%o. =ato 3ue, no presente caso, s' obteve resultados concretosD postumamente.
A. 4 sujeito poético est# sentado / secret#ria e da avista a janela de um prédio onde mora uma infeliz engomadeira. ) luz est# acesa Bejo( lhe luz no 3uartoD P v.UV, portanto é de noite. Estes so elementos realistas, uma vez 3ue a poesia de Ces#rio se apresenta como um lugar de observa%o do mundo e da vida. G. Inicialmente, o sujeito poético est# irritado, ansioso e com dores de cabe%a. Incomoda(o +anta deprava%o nos usos, nos costumes!D. &epois revela(se cheio de raivas friasD face / rejei%o dos seus versos, o 3ue é percecionado pelo euD lrico como uma contrariedade. =inalmente, alcan%a algum grau de paz, 3uando lhe passa a c'leraD e 6nda sem azedumeD. O poema pode ser dividido em seis partes que correspondem à alternância de dois planos: o do sujeito poético e o da engomadeira. Nas duas primeiras estrofes, o sujeito revela o seu estado emocional: está irritado e ansioso, devido à depravação de usos e costumes q ue oserva na sociedade! nas duas estrofes seguintes, o sujeito "e, por conseguinte, tamém o leitor# centra a sua atenção na engomadeira e no seu sofrimento! nas estrofes $ a %&, é retomado o plano do sujeito, numa violenta cr'tica à imprensa, motivada pela rejeição dos versos do poeta por parte desta! voltando ao plano da engomadeira, as estrofes %( e %) focam a situação de pore*a e+trema da muler! num quinto momento, nas estrofes %$ e %-, o sujeito mostrase mais conformado com a sua situação, /sem a*edume0! finalmente, a estrofe %1 traça um paralelo entre os dois planos. 2o n'vel dos recursos estilísticos destacase a tripla metáfora da segunda estrofe "/2mo, insensatamente, os ácidos, os gumes 3 4 os ângulo agudos0#, através da qual o poeta mostra ter consci5ncia das caracter'sticas inovadoras da sua arte, em como do desagrado que estas provocam nos cr'ticos! esta metáfora é reforçada pelo uso e+pressivo do advério 6 /insensatamente0! tamém e+pressiva é a adjetivação, soretudo na caracteri*ação do estado emocional do sujeito poético "/cruel frenético, e+igente0#! a ironia está patente na cr'tica à sociedade, particularmente à imprensa 6 /2rte7 Não les convém80 6, reforçada pela interrogação! importa referir finalmente o prosa'smo da linguagem, através da utili*ação de e+press9es coloquiais, dentre as quais se destaca o diminutivo final 6 /oitadina;0 6 denunciador da solidariedade do sujeito em relação à pore engomadeira, em como da forte cr'tica à sociedade injusta "/