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17/6/2015
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B. F. SKINNER
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reitor
Targino Targino de Araújo Araú jo Filho
v i c e - r e i t o r
Adilson Ad ilson J. A. A . de Oliveira O liveira
d ir e t o r d a e d u fs c a r
Oswaldo Mário Serra Truzzi
EdUFSCar - Editora da Universidade Federal de São Carlos
c o n s e lh o e d i to r i a l
Ana An a Claudia Clau dia Lessinger José Jos é Eduard Ed uardoo dos Santos Marco Giulietti Nivaldo Nale Oswaldo Mário Serra Truzzi (Presidente) Roseli Rodrigues de Mello Rubismar Stolf Sergio Pripas Vanice Maria Ma ria Oliveira Oliv eira Sargentini
U N I V E R S ID ID A D E F E D E R A L D E SÂ SÂ O C A R L O S Editora da Universidade Federal de Sáo Carlos Vi a Wa shin gton Luís, km 23 5 13565-905 - Sào Carlos, SP, Brasil Telefax(16) 3351-8137 www.e ww w.e ditora.ufscar. br
[email protected] Twitter: @EdUFSCar Facebook: facebook.com/editora.edufscar
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Marc N. Richelle Universidad Universidadee de L iè ge -R e al Academia Academia da da Bélgi Bélgica ca
B. F. SKINNER U M A P E R S P E C T IV I V A E U R O P E IA IA
Tradução Marina Souto Lopes Bezerra de Castro
EdUFSCar São Carlos, 2014
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All R ights igh ts Reserve d Author Aut horised ised translation transla tion from fro m the English En glish language langu age edit ion publi shed by Psychology Psyc hology Press, a m ember o f the Taylor & brands brands Group
Capa Marina Arruda Projeto gráfico Vítor Massola Gonzales Lopes Pr eparação e r evisão de texto texto Marcelo Dias Saes Peres Audrey Ludmilla do Nascimento Mi asso Daniela Silva Silva Guanais C osta Edi tor ação ele eletr tr ônica Guilherme José Garbuío Martinez
Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da Biblioteca Comunitária da UFSCar Richelle, Marc N. R528b
B.F B. F . Skinner : uma persp ectiv a europe ia / Marc N.
Richelie; tradução: Marina S. L. B. de Castro. -- São Carlos : EdUFSCar, 2014 .
295 p.
ISBN - 978-85-7600-355-7
1 . Skinner, B. F. (Burrhus Frederic), 1904- 1990 . 2 . A n á li s e do com portam por tam ento. ent o. 3 . Behaviorismo (Psicologia). I. Título.
CDD - 150 .1943
(20a) (20a)
CDU - 159.9
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônicos ou mecânicos, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema de banco de dados sem permissão escrita do titular do direito autoral.
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SUMÁRIO
A p r e s e n t a ç ã o
9
Prefácio
11
PARTE I QUEST QU ESTÕE ÕESS CONTROVERSAS E CONTRIBUIÇÕES INQUESTIONÁVEIS
17
1 U ma q u e s t ã o d e c o n t r o v é r s i a
19
Um cientista cont rove rso
19
A obra de Skinner: uma visão geral
25
Behaviorism o: um pequ eno lembrete
26
2 Es b o ç o d e u m r e t r a t o
31
Refe rênc ias biográficas
31
Uma preocupação constante com os assun tos humanos
35
Um caso de deprec iação difamatória: difamatória: a histór ia da “caixa “caixa de be bê "
38
A humanidade tem um futuro?
40
3 A caixa de Skinner: um novo microscópio para a psicologia
43
Uma grande contribu ição para as técnicas de laboratório
43
A câmara câmara do comportamento operante
44
Contingê ncias e escala s
46
Um modelo estímulo-re sposta sem nenhum estímulo
47
Discriminação: do estímulo externo para os estados internos
49
Adição experimental à droga
53
M ais fundo no mund o intern o animal Relógios internos
54 57
PARTE II SKINNER E A TRADIÇÃO EUROPEIA: PAVLOV, FREUD, LORENZ E PIAGET 61
4 A HERANÇA HERANÇA AMBÍ AMBÍGUA GUA DE DE PâVLOV PâVLOV Uma infeliz e equivocada nom eação
63 63
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Algumas especulações históricas
64
Estereotipia operante
66
Variabilidade
68
Um ou dois tipos de condicionamento: algumas advertências adicionais
72
5 Freud nos textos de Skjnner
75
Figuras inespera das
75
Um tributo ao determinism o
76
Reformulando meca nismos freudianos
79
Aparato mental
81
Cognitivismo, mente e aparato mental
82
Cogn ição ou libido
84
6 SKINNER E ATRADIÇÃO ETOLÓG1CA
87
Sobre ratos e homens
87
Etologia: um outro olhar sob re os animais
88
0 mau comportamento dos organismos
90
Skin ner e a etologia
7 P iaget
e
Skinner : construtivismo
93
97
e beh av io r ismo
Ignorância recíproca Convergências
97 100
E no com eço era a ação!
103
A analogia evolucionária I
106
PARTE III PEDRAS DE TOQUE DO BEHAVIORISMO RADICAL: CÉREBRO, COGNIÇÃO, LINGUAGEM E CRIATIVIDADE
109
8 S kinner
111
e a biologia
Quatro maus sinais no exame da biologia?
111
Devem os dispe nsar o cérebro ou a mente, ou am bos?
112
A analogia evolucionária II
119
9 Do MENTAUSMO AOCOGNITIVISMO
129
Vida mental e beha vioris mo
129
Cogn itivismo s: uma tentativa de classificação quádru pla
132
Skinner contra os cognitivismos: eu ac us o. ..
137
10 A QUESTÃO DA LINGUAGEM
145
Int ere sse inicial em linguagem
145
Interferência de Chom sky O silêncio de Skinner
146 148
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Análise funcional
versus
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análise formal do com portam ento verbal
150
Ens aio de Skinn er em interpretação
153
A questão da competência versus a ques tão da perfor mance
154
A aquis ição da linguagem na infância: a pedra de toque
156
Por que o
163
Verbal behavior ainda
é ignora do?
1 1 P r o c e s s o s d o pensamento e c r i a t i v i d a d e
16 5
Uma abordage m compo rtamental da cogn ição O
stütus
165
do pensamen to
167
O operante como resolução de problema s
169
Comportam ento governado por regras
170
Tendê ncias atuais na res oluç ão de prob lemas
172
Com portam ento criativo
176
PARTE IV O INTERESSE PELA VIDA REAL: UMA AVENTURA EM DIREÇÃO À UTOPIA
181
12 S a ú d e mental
18 3
Psic ologia científica no contexto clínico
183
Uma abordagem pragmática dos sintoma s
185
Tratamento comportamental das deso rde ns biologicamente determinadas
187
Técnicas oper antes na terapia Objeções
188 189
Psicoterapia e con troles soc iais
192
Abord agem experimen tal das terapias
193
1 3 Ed u c a ç ã o Um prec urso r
19 5 195
Máquinas de ensino
196
Objeçõ es e obstáculos
200
Computadores: “máquinas de ensino ideais”
201
O sistema escolar questionado
202
Difer enç as interindividuais, diversidad e e atividades criativas
206
14 S o c i e d a d e e u t o p i a
2 11
Uma aventura pela filosofia social WaldenTwo
211 213
Trabalho: 24 horas por sem ana e uma escala flexível
216
Arte e ciência em Walden Two
219
Educação versus seleç ão Liberação da mu lher
221 224
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231
A democracia é democracia?
235
1 5 Li b e r d a d e , f i n a l m e n t e . . . Psicologia: a ciência ambivalente
235
Um conc eito flexível
237
Liberdade para ganhar... ou perder
237
A questão da liberdade e o futuro do mundo
239
A luta pela liberdade: uma história natural e cultural
240
Mérito e dignidade
242
Liberdade contra si mesma
243
Ment alismo com o uma ferramenta de poder
246
Sobrevivência como um valor último
248
Proteção do indivíduo
250
A dimensão temporal
252
Contracontrole
253
Política experimental
256
Conclusão
261
Ín d i c e remissivo
265
Ín d i c e r e m i s s i v o po r a u t o r
279
R e f e r ê n c i a s b i b l i o g r á f i c a s
287
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APRESENTAÇÃO
Grande parte deste livro foi escrito durante o período sabático passado nas Universidades espanholas, com o apoio dos Fundos Nacionais da Pesquisa Científi ca da Bélgica. Sou m uito grato a eles e ao Reito r da Un iversidade de Liège, Professor Arthur Bod so n, por me proporcion arem um a pausa frutífe ra nas minhas atividades acadêmicas. Sou especialmente grato às várias universidades que me acolheram e aos espa nhóis, mas a sua contribuição para minha reflexão merece uma menção especial em relação ao conteúdo e é, portanto, retomada ao final do Prefácio. Parte do material incluído foi adaptado de um livro em francês publicado an teriormente por Pierre Mardaga, Editor em Bruxelas-Liège, sob o título de Skinner ou lepéril behavioriste (1976). Agradeço a Pierre Mardaga, que assumiu o controle da editora fundada por outro amigo, Charles Dessart, pela sua permissão, e também por ter contribuído para a divulgação dos textos de Skinner em francês. Citei amplamente os textos do próprio Skinner, porque essa é a melhor forma de proporcionar ao leitor evidência objetiva de seu pensamento, que foi tão fre quentemente mal interpretado. Citações de Skinner de 1938, 1957, 1968, 1972 são reproduzidas com permissão da B. F. Skinner Foundation (Senhora Julie Vargas, Presidente), a quem agradeço a cortesia. Citações de Skinner, 1953, são reproduzidas com a gentil autorização da MacMilían Publishing Co., e citações de Skinner, 1948, têm a permissão da mesma editora. Sou grato a Lawrence Erlbaum Associates, Inglaterra, por acolher mais um autor continental, com todas as suas implicações para o trabalho editorial: apesar dos meus esforços, o texto não pode, de fato, ser com parado com 0 padrão dos falantes ingleses nativos. Sou imensamente grato à editora e aos inúmeros juizes anônimos por sua va liosa ajuda para melhorar meu estilo. Restam imperfeições, claro, as minhas próprias. Por fim, os critérios estabelecidos pelas modernas editoras não poderiam ter sido atingidos sem o auxílio de minha secretária, senhorita Andrée Houyoux. Agra deço-lhe a paciência e hábil exploração do editor de texto. M. N. R. Outubro, 1992.
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PREFÁCIO
Quando este livro estava sendo escrito, no verão de 1990, Burrhus Frederic Skinner morreu em Cambrigde, Massachusetts, no sábado, dia 18 de agosto, aos 86 anos de idade. Ele havia sido informado, vários meses antes, que sofria de leucemia. Continuou a trabalhar serenamente em seus manuscritos até o dia anterior ao seu falecimento. A carreira de Skin ner como psicólogo du rou quase 60 anos. Ele exerceu ex cepcional influência e foi classificado entre os poucos psicólogos mais proeminen tes do século XX. Também foi, certamente, o mais controverso. Foi atacado por lados opostos da psicologia, da ciência como um todo e das ideologias políticas. Foi frequentemente descrito como o último representante da escola behaviorista, e, enquanto tal, considerado como um tipo de fóssil ou, nos últimos 25 anos de sua vida, como o obsoleto e único exemplar sobrevivente de uma espécie já extinta, agora substituída pelo novo filo conhecido como cognitivismo. Foi considerado o responsável por manter a psicologia, por mais de 50 anos, na “longa e enfadonha noite do behaviorismo”, como apontou um famoso filósofo.1 Reproduzindo caracterizações frequentemente ouvidas nos círculos científicos, os obituários de Skinner, mais uma vez, o retratam como um experimentador extra vagante que pod eria gastar o seu tem po ensinando pom bos a jogar pingu e-pongu e ou como um perigoso cientista ditador que teria controlado a sociedade por meio de coerção e punição, se tivesse tido uma chance de implementar práticas políticas. Felizmente, não lhe foi oferecida tal oportunidade, e novos rumos foram abertos na psicologia a tempo de neutralizar o dragão. Por que, em tal contexto, um livro sobre Skinner? Podem o homem e sua obra serem objeto de qualquer interesse para quem não é historiador da psicologia? Pode ser suficiente responder: para se ter a verdade, pois quem quer que contribua para o pensamento científico e filosófico merece uma leitura honesta de suas palavras, e, se foi amplamente mal interpretado, as razões devem ser analisadas e uma avaliação mais correta deve, por fim, ser alcançada. A questão, entretanto, não é apenas fazer justiça a um autor injustam ente condenado. Ela tem relevância para os atuais debates i
Bunge (1980).
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na psicologia. Ao descobrir ou redescobrir Skinner e as visões de Skinner como elas realmente são, os psicólogos poderiam também colocar suas próprias reflexões atuais na perspectiva adequada: isto é, considerar corretamente as raízes da pesquisa atual e, ao teorizar o passado, identificar os problemas que permaneceram sem solução ape sar da mudança de paradigma - como se pensa frequentemente a respeito da escola cognitivista —e perceber aqueles aspectos seminais da obra de Skinner que abrem novos caminhos para a pesquisa ou que convergem com as abordagens contempo râneas mais promissoras. Por alguma razão, os psicólogos tendem a pensar a história de sua ciência como uma sequência de revoluções ao invés de evolução: eles gostam de enfatizar rupturas ao invés de construir sobre continuidades. Parecem preocupados em vincular seu nome à teoria que substituirá visões anteriores, e, com tal fim, se entregam à estratégia de construir um espantalho. Skinner foi o alvo preferido de tal estratégia. Porém, ao interpretar equivocadamente suas ideias, seus oponentes perderam a m aior parte de suas contribuições genuínas para a psicologia e ignoraram completamente o fato de que, em muitas áreas da teoria e da prática, ele foi de fato um precursor. Este livro é sobre Skinner, não sobre skinnerianos. A diferença é importante, considerando que a maior parte das controvérsias em torno de Skinner envolvem uma confusão permanente entre os dois. Enquanto uma escola de pensamento, en quanto um movimento organizado, frequentemente identificado como os “analistas comportamentais”, os discípulos de Skinner, ou alguns deles, tiveram uma história bem diferente na psicologia americana. Entre outras coisas, eles se isolaram do resto da psicologia científica ao criarem suas próprias revistas e sociedades, ao se fecharem ao diálogo mais amplo com outras abordagens e ao desenvolverem uma impressão de ortodoxia, que nunca provou ser útil no progresso de uma ciência ou na disse minação de uma teoria.2 Algumas delas enfocaram a implementação da filosofia social de Skinner, numa mistura de idealismo ingênuo com militantismo sectário. As ligações entre Skinner e esses movimentos são complexas, mas está claro que ele não ratificaria tudo o que tem sido feito ou dito em referência ao seu nome. De qualquer forma, este livro não pretende dar uma explicação histórica ao movimento behaviorista e suas ramificações.3 Também não é sua intenção dar uma apresentação histórica da vida e do tra balho de Skinner. Deixo a outras pessoas a honra de vincular seu nome ao de Skin ner como seu biógrafo reconhecido, como o de Ernest Jones é vinculado a Freud. Embora eu deva colocar algumas das ideias de Skinner em seu contexto histórico 2 O próp rio Skinne r escava consciente do auto isola mento dos analistas com portam entais, que ele relacionava à dificuldade de ter arcigos sobre assuntos particulares aceitos em revistas científicas no começo dos anos 1950 e de encontrar lugar para se reuni rem, pois não havia oficialmente nenhum espaço ou tempo distribuído nas reuniões científicas (ver S k i n n e r , 1989b. capítulo 11), Procror ôc Weeks (1990) argumentaram contra essa interpretação. Ver minha revisão do livro deles (Richelle. 1991}. 3
Para o leitor interessado, várias fontes estão dispon íveis, incluin do Schorr (1984).
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adequado, de modo a considerar sua relevância no debate científico à medida que ele progride no tempo, a organização deste livro não obedece ao curso histórico. E, ao contrário, uma seleção de temas, que me parecem mais ilustrativos da contribui ção de Skinner, ou especialmente mal interpretados, apesar de fundamentais em sua teoria, ou amplamente negligenciados, pois outros pontos menos importantes foram, por alguma razão, mais enfatizados. A seleção é admitidam en te pessoal. E um a seleção feita por um psicólogo europeu, com seu passado idiossincrático. Talvez europeu não seja uma classificação suficiente: continental e mesmo falante do francês deveriam ser adicionados. Sem lançar mão de notas biográficas, dou aos leitores alguma informação para que pos sam entender melhor minha escolha. Após me graduar em Filosofia e Letras em meu país de origem, graduei-me em Psicologia na Universidade de Genebra, cujo Instituto de Psicologia era muito legitimamente considerado, naquele tempo, como um dos melhores do continente. Era dominado pela figura de Piaget, embora outros nomes, como Rey, ou Lambercier, ou Inhelder, mereçam menção. Quando tomei contato com Skinn er e sua obra, para ser preciso, em H arvard, em 1958-59, eu inevi tavelmente o li através das lentes de minha própria educação intelectual e fui levado naturalmente a confrontá-lo com grande parte dos trabalhos na tradição europeia. Isso me levou a localizar limitações maiores nas visões de Skinner —limitações que ele poderia compartilhar com a tradição psicológica norte-americana como um todo -, apontar complementaridades ao invés de contradições ou oposições, de modo a revelar convergências insuspeitas, trazer para uma perspectiva muito diferente al guns dos debates ocasionalmente violentos que ocorreram em torno das concepções de Skinner, por exemplo, em relação ao comportamento verbal (no debate iniciado com Chomsky4) ou à etologia (em um intercâmbio mais ríspido envolvendo um dos colaboradores mais próximo s de Skinner, H errnstein5). De vo dar um amplo espaço, nas páginas seguintes, ao exercício da confrontação e integração de duas tradições psicológicas diferentes. Meu desejo é que o leitor americano ache a abordagem in formativa e estimulante. E um sentimento comum entre os psicólogos europeus que a psicologia americana (com exceção de poucos historiadores profissionais da área), apesar de seu considerável desenvolvimento, ou talvez por causa dele, vem ignorando a maior parte das principais contribuições europeias à nossa ciência no século XX, exceto por aquela parte que se desenvolveu do outro lado do Atlântico
4
Ver capítulo 10.
%
Ver ca pit ulo 6.
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por causa da imigração de alguns europeus,6 ou aquela parte que foi transferida devido a traduções, frequentemente muito atrasadas.7 Como o modo como se leem os textos do autor, sejam eles científicos ou literá rios, pode obviamente ser influenciado pelo fato de ser pessoalmente familiarizado com ele, eu admito que minha própria leitura de Skinner pôde ser enviesada por meus encontros pessoais com ele. Foi um privilégio para mim me aproximar dele, inicialmente, quando eu era um estudante de graduação em Harvard, e, depois, enquanto seu colega, especialmente na ocasião da primeira tradução de alguns de seus livros para o francês, que eu implementei com Graulich nos anos 196o.8 Embora o que conte essencialmente, para todos os propósitos científicos, sejam as ideias e as contribuições empíricas como expressas nos trabalhos escritos, não pude deixar de me impressionar com os ataques ad hominem endereçados a Fred Skinner. Para aqueles que tiveram contato com ele, é difícil entender como alguns de seus oponentes científicos puderam apelar para acusações de autoritarismo. Em minha longa experiência como estudante, na qual tive a felicidade de ser aluno de muitas pessoas impo rtantes, incluindo homens que modelaram a psicologia científi ca do século XX, nomeadamente Piaget e Skinner, posso testemunhar que o ultimo é, de longe, o professor menos diretivo que já conheci. Senti ser apropriado insistir naquele detalhe pessoal quando dei entrevista a uma repórter espanhola um dia após a morte de Skinner ter sido anunciada, enquanto eu estava em San Lorenzo dei Escoriai.Ela entendeu a mensagem e o título de sua matéria se referia ao “professor menos autoritário" que R ichelle já teve.m Ao menos aquele jornal espanhol não transmitiu, naquela ocasião, a imagem co mumente distorcida de Skinner. Sou especialmente grato à repórter por aquilo: pareceu-me premonitório de um contexto favorável que a Espanha me forneceria para completar este livro durante o inverno de 1990-91. A predição foi confirmada além da expectativa, e reconheço profundamente a minha dívida com os psicólogos espanhóis que me proporcionaram o amb iente ideal para uma escrita eficiente e tranquila, assim como
6 Por exem plo, as contrib uições dos gesraltistas exilados. como Ma x Werrheimer, antes de deixarem a Europ a, permaneciam amplamente desconhecidas nos EUA. 7 O trabalho de Piaget, iniciado no come ço dos anos 192.0, era muito pouco conhe cido nos EU A até que alguns de seus livros fossem traduzidos. O trabalho de Vygotsky, interrompido por sua morte prematura em 1934, teve atenção graças à iniciativa de J. Br un er em 1962 . Outros psicólog os pro em ine nte s, com o [’ Ja ne t e H. Wa llon , para me nc ion ar ape nas do is exem plo s na área francesa, foram completamente ignorados até agora, apesar da importância de seu trabalho, provavelmente se equiparando ao de Freud e ao de Vygotsky, respectivamente. 8 Skinn er (1969a), L.a révolution scientifiqu e de l ’enseignement, e Skinner (1971b.!, L ’ analyse expérimentale du comportement, traduções de The technology o f Uachirtg c de Contingences ofTeinjorcemenl, respectivamente. 9 A ocasião era um curso de verão, organizado pela Universidade Compluren se de Ma dri, sobre o tema “I reud e após Freud” , no qual me cabia dar uma conferência sobre Freud e a psicologia científica, principalmente dedicada a Freud nos textos de Skin ner. Essa coincidência (Skinner teria observado: ele era fascinado por coincidências) me colocou em contato com a imprensa de Madri, que buscava informação em primeira mão sobre o último cientista americano. Uma versão revisada da conversa durante aquela sessão foi utilizada como parte do capítulo 4. 10
El Pats, 1 1 de agosto de 1990.
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interações estimulantes, por ocasião das conferências, seminários e simpósios sobre os vários aspectos aspectos do trabalho de Skinn er e sobre sobre outros temas." Um a lista de nomes seria muito longa e me exporia a omissões. A seguinte lista de universidades anfi triãs permitirá a cada um destes colegas e amigos entender a mensagem: Granada e seu Jaen campus, Madri Complutense, Madri Autônoma, Madri U n e d , Barcelona Central, Barcelona Autônoma e seu campus de Gerona, Valência, Sevilha, Oviedo, Salamanca, Santiago de Compostela, e, fora da Espanha, mas na península, Lisboa e Coimbra. As universidades de Granada e de Madri Complutense merecem menção especial por terem proporcionado todas as facilidades desejáveis por um período de quatro meses cada.
i [ Provavelme nte deve ter havid o mais artigos publica dos e mais reuniões sobre o trabalho de Skin ner organizadas na Espan ha, no ano seguinte seguinte a sua sua morte, que em qualquer outro país país europeu, europeu, C om o exemplo, ver Ro ales-Nieto, Luciano Soriano áí Pérr Pérr?. ?. Alvare Alv are z (19 92) . Para um a abord ab ord agem ag em europe eur opeia ia da an ális e e xpe rimen rim ental tal do com co m po rta m en to e do tra balho bal ho de Skinn Sk inn er, ver ve r Lo we et al. {1985), {1985), Blackm an & Lejeune (199 0) e Richelle (1985). (1985).
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PARTE I Q u est ões cont roversas e
C O N T R IB I B U I Ç Õ E S I N Q U E S T IO I O N Á V E IS IS
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1
UMA QUESTÃO DE CONTROVÉRSIA
U
m cientista c o n t r o v e r s o
Burrhus Frederic Skinner nasceu em 20 de março de 1904 em Susquehana, uma pequena cidade da Pensilvânia. Morreu em 18 de agosto de 1990 em Cambridge, Massachusetts. Ele permanecerá, sem dúvida, entre a dúzia de maiores mentes que modelaram a psicologia do século XX, ao lado de seus contemporâneos Piaget e Lorenz, ou de Pavlov, Thorndike e Watson, seus predecessores. Ele foi uma figura de liderança de uma escola de pensamento, o behaviorismo, que do m inou a cena por mais de meio século. Seu nome é associado ao procedimento delineado para estudar o comportamento de animais em laboratório, frequentemente chamado de “caixa de Skinner”, mas mais adequadamente nomeado “câmara de condicionamento”; a um conceito, condicionamento operante, que é agora parte das categorias familiares na mente dos psicólogos; psicólogos; a um desafio desafio teórico, teórico, direcionado à explicação explicação do co m por pela s consequê consequência ncias\ s\ tamento, seja ele ele em animais ou hu man os, em termos de controle pelas e a uma filosofia filosofia soci social al,, fundamentada, ao menos na visão do próprio Skinner, em evidências científicas que foram amplamente ignoradas, e ainda o são atualmente, para azar da humanidade. Essas várias contribuições para a ciência da psicologia e para seus subprodutos filosóficos serão descritas e discutidas em detalhe ao longo deste livro. Poderia pa recer, à primeira vista, ser possível introduzir o trabalho de Skinner como se faria com qualquer outro grande psicólogo, ou com qualquer outro grande cientista: geralmente se descreveria a abordagem metodológica e uma descoberta empírica ou conceituai, ou ambas —considerando que são raros os casos em que fatos são descobertos independen indepe nden temente tem ente de seus seus conceitos se avaliaria avaliaria a teoria e, ao final, final, se discutiriam as tentativas de derivar apropriadamente alguma visão filosófica geral. Para permanecer dentro dos limites da psicologia, todos os quatro níveis de ativida de podem ser encontrados no extenso e impressionante trabalho de Pavlov, Piaget ou Lorenz, bem como no de Skinner. Parece, entretanto, haver algo de especial a respeito do último, algo que não é fácil de entender e caracterizar, mas que está refletido nas inúmeras e variadas expressões de hostilidade em relação à pessoa de Skinner e às suas ideias. E claro que
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ideias científicas, como outras ideias, são passíveis de crítica e ninguém espera una nimidade em questões científicas, especialmente em um campo ainda tão precário como a psicologia. Mas críticas endereçadas a Skinner foram extraordinariamente viol vi olen enta tass e pass pa ssio iona nais is.. Seus Se us autor au tores es não nã o são excl ex clus usiv ivam am ente en te psic ps icól ólog ogos os,, p resu re su m ivel iv el mente competentes para avaliar o trabalho de um colega; muitos intelectuais de outras áreas da ciência, bem como leigos com fundamentos ideológicos diferentes, até mesmo opostos, se empenharam na cruzada contra ele. Uma lista completa de citações relevantes cobriria mais da metade do presente livro. Uma amostra de opiniões selecionadas será suficiente para ilustrar o espíri to geral. A seguinte amostra foi retirada de fontes europeias e americanas, jornais, discursos políticos, revistas científicas e livros. Foram escritos ou pronunciados em vá rios rio s m om en tos to s da vida vi da de Sk inn in n er ou em breves bre ves ob itu it u ário ár ioss após ap ós sua m orte or te:: Na crença da então chamada psicologia “neobehaviorista”, exclusivamente focada no comportamento puro, um homem chamado Skinner, psicólogo de Harvard, defende a robotização. Todas as rádios tomam como uma questão de honra convidar este perigoso idiota, próximo aos pavlovianos soviéticos, que afirma que o homem não é nenhum estado especial da natu reza; que ele não é senão um animal entre os outros; e que, como tal, deve ser treinado a reagir, como os outros animais o fazem, a um número de estímulos externos do ambiente. Es queça o homem. Considere apenas o animal. Analise seu con dicionamento ao ter o ambiente agindo sobre ele. Encontre o mais eficiente deles e os multiplique (...), Skinner chama isso de “condicionamento operante”. Há uma outra palavra para isso: Nazismo. Michel Lancelot'1 Claramente, nós na França somos mais cabeça fresca. O livro de Skinner [i.e., Beyondfreedom and an d dignity] não parece ter deixado muitos aqui chocados ou entusiasmados (...). Essa concepção exige o fortalecimento da ordem; fornece uma res posta às críticas contra a cultura e a sociedade. Recomenda o controle, de modo a assegurar a sobrevivência, portanto, a reprodução do que existe. Em contraste, liberdade e dignida de —ideias essenciais dos extremistas —aparecem como bolhas 12
avec Retirado de Le jeune lion dort avec
sei
dents , Paris, Paris, 1974 . Tradução minha . O autor é um jornalista jornalista francês. francês.
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do passado, baseadas em teorias pré-científicas. A América do Senhor Nixon e do Senhor Agnew deve cuidar de sua própria salvação, deve atrever-se a punir e a recompensar quando for necessário. Serge Moscovici1’ América, enquanto sociedade, foi fundada no respeito ao in divíduo e na crença inabalável em seu valor e dignidade (...). Skinner ataca os próprios preceitos sobre os quais nossa so ciedade está fundamentada, ao dizer que “vida, liberdade e a busca da felicidade” já foram objetivos válidos, mas não têm lugar na América do século XX ou na criaçáo de uma nova cultura como ele propõe. Spiro Agnew14 (...) considere um eficiente campo de concentração com os internos espiando uns aos outros e os fornos de gás fumegan do à distância, e talvez uma sugestão verbal ocasional como um lembrete do significado desse reforçador. Pareceria ser um mundo quase perfeito (...). Dentro do modelo de Skinner, náo há qualquer objeção a essa ordem social. Ao contrário, parece próxima ao ideal. Noam Chomsky15 O que explica o sucesso das visòes de Skinner apesar de suas armadilhas lógicas? Em minha opinião, é sua aderência a um conjunto de valores americanos que são amplamente expor tados pelo governo dos EUA juntamente com outros bens. J. Jacques Vonèche16 [a caixa de Skinner] foi descrita como um método limpo de descerebrar o animal. Alguns acreditam que o mesmo pode
Retirado de uma revisão da tradução francesa de Beyond freedom and digrtity, publicada com o título de Somos algo além de ratos? na revista semanal francesa Le Nouvel Obifrviitmr em 5 de fevereiro de 1973. Moscovici é um proeminente psicólogo social francês. Tradução minha. 14 Retirado de um discurso do então vice-presidente dos Estados Unidos em Ch icago, publicado no Psycbõlogy Today em jan eiro de 197 215
Retirad o de “ Psicologia e ideo logia ', o artigo inaugural da prime ira matéria da revista Cognition. sob o nome do famoso
linguista americano (C h o m s k y , 1972). 16
Retirado de M odgil & Mod gil (1987, p. 72). O autor é professor da Universidade de Genebra.
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ser dito dos efeitos da teoria skinneriana sobre seus seguidores
The Guardian, z8 de agosto de 1990 Finalmente, eu não nego que restaram poucos skinnerianos; afinal, se você conta fósseis, há ainda muitos dinossauros no mundo. Stuart Sutherland17 Enquanto os psicanalistas acreditam na complexidade do in divíduo, e, portanto, em sua liberdade, os behavioristas não estão preocupados com a consciência, e preferem se fixar em dados científicos observáveis, redesco brindo as virtudes da au toridade e as receitas de “the carrot and the stick ”lS. Contudo, graças a essa jaula, Skinner conseguiu ensinar pássaros a tocar piano e dançar. Frank Nouchi19 Este não é obviamente o tipo comum de polêmica em relaçáo a teorias cientí ficas, exceto quando elas abalam profundamente a concepção que o homem tem de sua natureza e do mundo que o rodeia, como foi o caso de Galileu ou de Darwin, ou quando elas escondem algum mau uso perverso da ciência visando à dominação ideológica, como ocorre algumas vezes em nossas sociedades civilizadas. Em algu mas das citações acima, a última interpretação é claramente sugerida: alguns autores, como Chomsky, o famoso linguista, não hesitou em acusar Skinner de Nazismo, ao recorrer a metáforas não ambíguas. Críticas europeias frequentemente descartam as contribuições de Skinner como um típico produto da sociedade americana, que não se encaixam no contexto da cultura europeia, ou que devem ser observadas com suspeita para evitar conta minação. Essas citações de Moscovici e Vonèche ilustram esse julgamento um tanto desdenhoso. Tais críticas não respondem às objeções constrangedoras à sua avaliação etnocêntrica do trabalho de Skinner. Tendem a ignorar o fato de que, gostem ou não, as coisas que se originam nos EUA acabam por invadir a Europa mais cedo ou mais tarde —como com os refrigerantes, computadores, ou de fato a revolução estudantil que recebeu o 1968 apenas por causa da ilusão europeia persistente de 17 Retirado de um obituário publicado em The Guardian , 18 de agosto de 1990. sob o tírulo de “Guru fanático do behaviorismo” . O autor é um distinto professor britânico de psicologia. 18 N . T.: Expressão utilizada para descrever desejo de recompensa e ameaça de puniçáo utilizados concomitantem ente como um meio de fázer alguém se esforçar mais em alguma tarefa. 19
Retirado do obituário publicado no respeitado jornal francês Le Monde em zt de agosto de 1990. Tradução minha.
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estar no início de tudo que é importante. Eles não dão as suas razões para aceitar, com simpatia, outras produções americanas, como as teorias humanista e cogniti vista, para permanecer no campo da psicologia. (Uma explicação, como a dada por Vonèche, é apontar para as origens europeias daquelas abordagens aceitáveis, apon tando Piaget como o fundador do cognitivismo americano! Tal explicação provém do mesmo eurocentrismo denunciado acima.) Acima de tudo, eles não explicam por que os ataques contra Skinner foram muito mais numerosos e violentos em seu país de origem que em qualquer outro lugar, nem por que personalidades tão diferentes como Noam Chomsky e Spiro Agnew (o primeiro, brilhante linguista e famoso ati vista libertário; o segundo, conservador vice-presidente dos EU A , que não term inou seu mandato por causa de um escândalo financeiro) se juntaram na luta contra o psicólogo de Harvard, apesar de recorrerem, é claro, a argumentos bastante opostos. Quando um homem é atacado por muitos ângulos diferentes, por pessoas que geralmente se opõem umas às outras, é provável que ele tenha provocado todas elas, possivelmente porque está dizendo coisas que ninguém quer ouvir. Seus adversários então recorrem a uma estratégia comum: eles obscurecem seu trabalho. Se o traba lho é escrito, eles o levam a uma má interpretação, ou eles próprios não o leem cor retamente. Um tratamento de segunda mão leva a uma generalização da distorção. Ao confiar nas críticas em destaque, as pessoas deixam de ler o trabalho em primeira mão e argumentos infundados são reproduzidos e ampliados. Esse mecanismo fun cionou em relação aos textos de Skinner ao longo de sua carreira, como veremos. O principal exemplo, e sem dúvida o mais decisivo, foi a crítica de Chomsky20 ao livro Verbal behavior, de Skinner.21 Mas muitos outros casos podem ser apontados, notadamente em duas impor tantes publicações, dedicadas, nos anos 1980, à contribuição de Skinner. A primeira é o número especial da altamente elogiada revista Bebavioral and Brain Sciences intitulado “Canonical papers of B. F. Skinner ”, no qual mais de 100 autores foram convidados a escrever “comentários abertos de pares” sobre artigos selecionados e reimpressos de Skinner. A segunda é um livro editado por M od gil & M odg il com o título de B. F. Skinner: consenso e controvérsia Aproximadam ente duas dúzias de autores argumentam a favor e contra vários aspectos da visão de Skinner. Ambas as publicações - ao mesmo tempo em que reconhecem o lugar que Skinn er ainda ocupa no cenário científico - recaem em vários erros e interpretações equivocadas, mesmo sob a pena de autores sérios. Neste ponto, alguém pode questionar: como é que Skinner foi tão mal-en tendido e mal interpretado? Os autores de um recente ensaio têm uma resposta 20
Chomsky
21
Skinner {1957).
22
Id. (1984CJ. Ver também Catauia & H am ad (1988).
23
Modgil & Mod gil (1987).
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simples e objetiva: a razão é que sua mensagem não era clara nem consistente.14 Em outras palavras, quando os leitores entendem mal um autor científico, podem apenas concluir que o texto não é claro, e que apenas o autor pode ser culpado por isso. Deve-se confiar nos julgamentos dos leitores. Temos consciência, entretanto, dos vários tipos de viés que podem levar os leitores, mesmo de material científico, a interpretar equivocadamente o que têm sob os olhos. Leitores tendem a perceber e ler o que querem ver. Eles não abandonam facilmente os estereótipos e ocasional mente vão além: ao defender seu próprio ponto de vista, constroem um espantalho que substitui o autor que eles de fato estão lendo. Veremos no capítulo 10 como as críticas de Chomsky, por exemplo, ilustram esses mecanismos, a ponto de poder ultrapassar a honestidade intelectual. Contudo, leituras equivocadas persistentes surpreendentemente também focalizam os aspectos mais básicos, quase clássicos e inequívocos da teoria de Skinner. Por exemplo, muitos psicólogos têm continua mente caracterizado a teoria de Skinner como a típica psicologia estímuloresposta, apesar de suas afirmações perfeitamente claras do contrário.1^O estilo de Skinner é especialmente elegante e inequívoco e, apesar de várias linhas de evolução poderem ser traçadas em seu pensamento ao longo de seus textos (o contrário certamente pareceria incomum em uma carreira tão longa),16 ele também fez reafirmações de sua ideias principais em vários contextos e com vários níveis de sofisticação e para audiências com diferentes repertórios. Sk inner não pode ser acusado de obscuridade e devemos olhar em outras direções para explicar as más interpretações. Se quisermos conhecer as ideias de Skinner, devemos nos voltar a seus textos ao invés de confiar em relatos de segunda mão distorcidos e supersimplificados. Este é também o único modo apropriado de elucidar os vínculos entre os textos “ filosóficos" (ou “ ideológicos” - aqueles mais amplamente lidos por não especialis tas) e os textos científicos (frequentemente mal lidos pelos próprios especialistas). Antes de tratar co m algum a p ro fu ndid ad e do que considero serem questões centrais na teoria de Skinner e alguns debates em torno delas, tenhamos uma visão geral do trabalho de Skinner e indiquemos alguns pontos de referência em sua vida e algum as características de sua personalidade.
14
Proctor 8í Weeks (1990).
25 Ver, entre os textos sobre essa questão em particular, o capítu lo introdut ório de Contingencies o f reinforcement (Skivn'kr, 1969b} e o capítulo 3 deste livro. 26Skinner mesmo estava consciente de sua própria evolução e das imperfeições na formulação de alguns problemas com os quais ele havia lidado. Ele comentou, em várias ocasiões, sobre seus trabalhos iniciais. Um caso especialmente esclarecedor está no artigo intitulado “Th e behavior o f organisms at 50” (id., 1989b, capítulo 12).
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A o b r a d e S k i n n e r : u m a v i s ã o g e r a l
Os primeiros artigos científicos de Skinner foram publicados no início dos anos 1930. Ele nunca parou de escrever desde então até o dia anterior à sua morte, e sua agora concluída bibliografia inclui mais de 200 títulos, entre eles uma dúzia de livros. Suas contribuições, entretanto, não ocorreram apenas por meio de palavras. N ão se deve esquecer (como acontece às vezes) que ele prop orcion ou ao laboratório uma técnica nova e excepcionalmente efetiva que é agora parte dos instrumentos utilizados por muitos pesquisadores, qualquer que seja sua inclinação teórica, não apenas no próprio estudo experimental do comportamento, mas em vários campos nos quais o comportamento é importante em alguma etapa da investigação, como na neurofisiologia e na psicofarmacologia. A o contribuir com muitos fatos em píricos, Skin ner esclareceu, se nem sempre resolveu, uma série de problemas nos quais a psicologia experimental e teórica se encontravam imersas há aproximadamente 50 anos. Ele foi essencial no desenvolvi men to de novas aplicações como a terapia e a modificação co mportame ntais —atual mente uma abordagem bem-aceita para ajudar pessoas com problemas psicológicos ou que sofrem algum a deficiência - e instrução program ada (apesar de sua dívida com Skinner, é raramente reconhecida por aqueles que aplicam suas ideias na apren dizagem assistida por computador). A em preitada teórica de Skin ner consistiu principalm en te em elaborar ainda mais o conceito de psicologia enquanto ciência do comportamento, inicialmente formulado por Watson no início do século XX, Ele enriqueceu e refinou o beha viorismo ao adicionar à definição inicial muitas qualificações derivadas do conhe cimento acumulado ao longo do tempo e de sua reflexão crítica, expressa em estilo menos passional que o de Watson. Mas eíe seguiu rigorosamente os princípios básicos do behaviorismo mais que qualquer outro psicólogo posterior a Watson, tornando esse ponto claro ao rotular-se um behaviorista radicai Iremos elaborar essa questão mais à frente. Finalmente, Skinner foi audacioso o suficiente para aplicar aos assuntos huma nos mais amplos as conclusões de sua análise científica do comportamento animal. Ele questionou a visão tradicional da natureza humana e a relação do homem com seu ambiente físico e social. Em seu romance utópico WaUen Two e em vários ar tigos e livros —em que Beyond frecdom and dígnity é o principal —ele denunciou a nossa indisposição para lidar com questões de comportamento humano recorrendo à abordagem científica que consideramos apropriada, e de fato efetiva, em questões tecnológicas ou médicas. Esta parte de sua obra é certamente responsável por irritar muitos de seus leitores.
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B. F. S m .VNES: UMA PERSPECTIVA EUROPEIA
B e h a v io r is m o : u m p eq u e n o l e m b r e t e
Behaviorismo é uma escola de pensamento que teve sua origem no início do século XX. Seu nascimento é geralmente identificado com o famoso artigo de J. B. Watson, “ Psych ology as th e beh aviorist views it” .27 Porém, como é frequen temen te o caso, a ideia estava no ar. E la foi afirmada explicitamente num a conferência histórica do psicólogo francês H. Piéron em 1908.^ E fora posta em prática durante alguns anos por cientistas como Pavlov. O centro da posição behaviorista é que o objeto da psicologia é o comportamento —que pode ser observado externamente, como são os fenômenos estudados nas ciências naturais —ao invés de estados mentais subjetivamente apreendidos pelo próprio sujeito. Esta foi essencialmente uma mudança metodológica. Até então, a psicologia científica, um jovem campo da ciência com pouco mais de meio século de idade, ainda recorria à introspecção como principal fonte de dados, apesar de esforços bem-sucedidos para desenvolver rigor e controle experimental e de seu uso de medidas e quantificação. Mesmo não sendo um obstáculo principal ao progresso em alguns campos, assim como a psicofísica básica e o estudo de reações motoras elementares em hum anos adultos, ela provou ser insatisfatória ao lidar com fen ôme nos mais complexos, como pensamento e resolução de problemas, ou com sujeitos que não relatavam sua vida interna, ou de forma mais simples, que não poderiam entender instruções verbais para fazer isso, como no caso de animais, pessoas pato logicamente comprometidas ou indivíduos falantes de outra língua. Em outro nível, apesar de bastante relacionado ao aspecto metodológico, o behaviorism o tinh a importantes implicações epistemológicas. E le coloca a psicologia no reino das ciências naturais,29 dispensando a velha distinção dualista entre Men te e Matéria. A questão aqui não é entre materialismo e espiritualismo ou idealismo, mas se a psicologia tem mais chances de progredir ao trabalhar com a hipótese de que seu objeto de estudo é suscetível à mesma ab ordagem que os outros aspectos do mundo, e mais especificamente do mundo vivo. O behaviorismo, u ma vez claramente formulado por Watson, se espalhou m ui to rápido. Ele invadiu não apenas a psicologia americana, mas também a psicologia europeia. D esde então até recentemente, a maioria dos livros-texto começariam com a definição da psicologia como a ciência do comportamento. Aquela altura, parecia 27
Watson (1913).
28
Piéron (1908).
29 Co m o oposta, após a dicotomia sugerida por Dilthev, às ciências da mente, ou Gtistwisiemcbafitn. O debate não está extinta na psicologia contemporânea e mais amplamente na filosofia da ciência contemporânea. A questão em jogo é se uma fronrcirj deveria ser traçada aJém da quil instrumentos diferentes de investigação deveriam ser utilizados (por exemplo, hermenêutica ao invés de heurística), e. se este for o caso, até onde tal fronteira deveria ser estabelecida. O reino das ciências humanas deveria abranger o compo rtamento hum ano individual, ou apenas a vida social c a cultura? O utra visáo é a de que cada nível de comple xidade requer ferramentas metodológicas apropriadas, mas não conceitos ep istemológicos tunda mental mente diferentes.
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haver um tipo de consenso. O que não significa, entretanto, que o behaviorismo tenha eliminado outras escolas de pensamento. N o continente europeu, a psicologia da Gestalt se desenvolveu ao mesmo tempo na Alemanha; em Genebra, Piaget co meçou seu trabalho monumental por volta de 10 anos após o manifesto de Watson, enquanto o estudo do comportamento animal no ambiente natural emergiu como a moderna etologia dos anos 1930, principalmente sob a influência de Kon rad Lorenz. Essas abordagens não eram necessariamente opostas à posição behaviorista, mas en fatizavam outros aspectos. A psicologia francesa oferece um caso interessante e peculiar em relação ao behaviorismo. Como mencionado anteriormente, Piéron pode ser considerado, his toricamente, como o fundador do behaviorismo, se a data de sua primeira formula ção fosse tomada como um critério. Ele de fato não iniciou o movimento, embora seu próprio trabalho se alinhasse, sem dúvida, com a posição behaviorista. Uma explicação pode ser a de que ele não era assertivo o bastante, como Watson. Pode-se argum entar também que a França não estava madura para aquela revolução, ou que já estava em algum sentido além dela: Pierre Janet, cuja influência se estendeu por muitas décadas, havia de fato desenvolvido a psicologia da “con duta” que, em vários aspectos, anunciou muitos princípios do behaviorismo radical de Skinner. Mas, por outro lado, psicólogos franceses, com poucas exceções, nunca foram muito recep tivos ao behaviorismo radical e se voltaram com entusiasmo para o cognitivismo quando ele surgiu nos anos 1960. O behaviorismo tomou forma principalmente nos Estados Unidos, onde, se guindo o ímpeto de Watson, um punhado de behavioristas da segunda geração — então chamados “neobehavioristas” —desenvolveram suas próprias versões de uma ciência do comportamento durante o segundo quarto do século XX. Um dos mais conhecidos, e possivelmente o mais influente, foi Hull, que ainda é tido como a principal referência quando as teses behavioristas são discutidas. Ele não contribuiu com nenhuma grande novidade metodológica nem com nenhuma importante des coberta empírica. Ele era fascinado com formalizações e se engajou na construção de um ambicioso sistema hipotético-dedutivo do comportamento. Uma das mais severas críticas ao seu livro Principies o f behavior60 está em Skinner,31 que mostra claramente que o behaviorismo não era uma igreja unificada! Observada a certa distância, a empreitada de Hull parece estéril e prematura. Outra proeminente figura entre os neobehavioristas era Tolman, cujo nome e obra abordaremos novamente. Tolman é corretamente considerado um dos pais do moderno cognitivismo. Seu principal livro, significativamente intitulado Purposive
30
Hull (1943).
31
Skinn er (1944).
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behavior in animais and m e n lida com um problema crucial e difícil da psicologia científica: a organização e antecipação de ação em direção a um fim. Ele também descobriu que animais interagindo livremente com seu ambiente, na falta de qual quer necessidade biológica, como fome ou sede, acabariam aprendendo algo sobre ele. Como a situação na qual ele descobriu isso era o então conhecido labirinto para ratos, ele sugeriu que seus sujeitos construíram um mapa cognitivo, obviamente um ancestral das representações internas da psicologia cognitiva. Vamos comentar em mais detalhes adiante. Skinner, o mais jovem dessa segunda geração de behavioristas, e diferente o bastante de todos eles para não ser incluído entre os neobehavioristas, adotou uma postura totalmente diferente. Por um lado, ele permaneceu mais estritamente vincu lado aos princípios essenciais da concepção de Watson. Por outro, ele se afastou de Watson de form a mais fundamental que os neobehavioristas e elaborou sua marca genuína na psicologia comportamental. Como vimos, ele se denominou um beha viorista radical. A medida que progredirm os, compreenderemos o que isso significa. A esta altura, algum as referências po dem ser úteis para caracterizar os aspectos co muns entre as várias linhas de behaviorismo e para apontar questões cruciais sobre as quais Skinner desenvolveu visões originais. Para um behaviorista, a psicologia não pode se atribuir um status científico se não toma, como objeto de estudo, eventos que podem ser observados com métodos utilizados em outras ciências naturais. Sua tarefa é identificar as variáveis das quais tais eventos observáveis são função. Essa visão tem muitos oponentes, pois parece reduzir o reino da psicologia a atos motores diretamente acessíveis a um observador e deixar fora da explicação os inúmeros eventos internos que cada indivíduo sabe que ocorre dentro de si mesmo. Esse é um erro sério em relação ao princípio meto dológico básico do behaviorismo. O behaviorismo não nega a existência de eventos internos. Mas, por um lado, nega a capacidade de o próprio sujeito lhes fornecer uma explicação científica (nesse sentido, é próximo à visão de Freud ou à de Janet); por outro, nega que eventos internos tenham um status essencialmente diferente dos comportamentos facilmente observados externamente. O problema da psicologia é torná-los acessíveis à análise - um problema enfrentado por qualqu er ciência - e tratá-los propriamente como comportamento, ao invés de fontes inferidas e não verificáveis do comportam ento. Antimentalismo, um tema central no pensamento de Skinner, não é uma ne gação dos eventos mentais, mas uma recusa a recorrer a eles enquanto entidades explicativas. Um exemplo clássico ajudará a entender os argumentos dessa posição. O senso comum tende a atribuir um ato a alguma fonte causal interna, frequente mente entendida com o uma necessidade ou imp ulso. Parece correto invocar a fome 32
Tolma n (1932).
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quando um animal ou um humano começa a comer ou procurar comida. É ten tador estender a mesma explicação quando alguém se engaja numa ação agressiva, atribuída a algum impulso agressivo; quando alguém imita outra pessoa por causa da necessidade de imitação ou quand o poucos indivíduos se unem po r causa de sua necessidade comum de afiliação. Nos é deixada a tarefe de explicar a necessidade e logo descobrimos q ue apenas postergamos o problema. A psicologia científica esta va infestada co m tais “ficçóes explicativas” na época em que Skinner começou sua reflexão sobre o mentalismo e desenvolveu sua concepção sobre reforçamento (que testemunha que o behaviorismo nunca foi tão dominante quanto se diz frequente mente). Como ele enfatizou, a objeção não é que essas coisas são mentais, mas que elas inviabilizam qualquer tentativa de explicação posterior. Ler a literatura psicoló gica atual mostra que o problema ainda está entre nós. Seu surgimento na psicologia científica está vinculado ao aparecimento do cognitivismo e não há dúvida de que o status dos eventos mentais nas descrições e explicações psicológicas deve ser exami nado agora de uma forma muito mais delicada. E claro, contudo, que a atitude de Skinner em relação ao cognitivismo está enraizada em sua visão tradicional do mentalismo. Devemos lidar com essa questão em detalhes mais à frente, pois ela é, de fato, um dos problemas epistemológicos centrais que os psicólogos têm de enfrentar. Um outro ponto muito debatido sobre o behaviorismo é o ambientalismo. Pode-se dizer que o comportamento encontra sua explicação na ação do ambiente sobre o organismo passivo. E verdade que os behavioristas mostraram interesse sis temático no papel do ambiente. Não deveria causar surpresa, pois, afinal de contas, a psicologia se preocupa com a relação entre o organismo e os seus ambientes. E difícil pensar em psicólogos que não tentariam, de uma forma ou outra, entender tal interação. Todavia, eles possuem várias visões sobre essa questão. Alguns deles insistem em uma herança inata que define de antemão que parte do ambiente atuará na história do organismo; a veem apenas como revelação de potencialidades pré-conectadas. Este foi o posicionamento mantido por Lorenz, ao menos em seu trabalho inicial sobre comportamento animal. Outros enfatizam a organização do indivíduo, i.e., a estrutura individual da inteligência, personalidade, inconsciente, mente e assim po r diante, sem qu alquer referência explícita ao ambiente. A escola de pensamento estruturalista, que foi tão bem-sucedida nas ciências humanas e so ciais nos anos 1960, pertence a essa categoria, assim como algumas das abordagens clássicas anteriores da psicologia. Outros, como Piaget, olham para o sujeito que age sobre o amb iente, acabando por não conseguir do miná-lo, e tendo então algum feedback dele, que o habilita a corrigir sua ação, num tipo de troca dialética. Esta é tipicamente a visão interacionista. Há ainda outros, que dão papel principal ao ambiente. Ele é concebido como provocando mecanicamente as reações do organismo, que é ativado a partir do ex terior, como uma marionete sem qualquer memória genética, estrutura ou vontade.
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Esta visão é supostamente típica das psicologias estímuloresposta (S-R), que, por sua vez, são frequentemente identificadas com o behaviorismo. Náo discutirei aqui a questão sobre se alguma vez já foi proposta uma psicologia puramente estímulo-resposta. O que é claro é que o behaviorismo skinneriano não é uma psicologia estímulo-resposta. Sua concepção a respeito do papel do ambiente é inequivoca mente diferente e é um prin cípio central de sua teoria, com o veremos no capítulo 3.
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2 ESBOÇO DE UM RETRATO
R e f e r ê n c ia s
b io g r á f ic a s
Trabalhos científicos têm uma existência própria, independente dos cientistas que os produziram. Eles são, como Popper afirmaria, parte do Mundo 3: isto é, o conjunto daqueles objetos culturais criado pelos humanos ao longo da história que são agora parte de nosso ambiente social. A qualidade intrínseca da contribuição científica não possui qualquer relação com os sentimentos do cientista ou com os eventos de sua vida pessoal. A biografia dos grandes criadores é um material valioso para historiadores da ciência e das artes ou para psicólogos interessados no processo criativo. Geralmente não é útil na avaliação do próprio trabalho. Ao expor o traba lho de Skinner e ao esclarecer alguns erros frequentes sobre ele, nós normalmente não precisaríamos nos referir ao homem. Irei, entretanto, dispor de algumas poucas referências biográficas por duas ra zões. A primeira diz respeito aos nossos hábitos e gostos: apesar das observações an teriores, todos gostam de conhecer sobre o homem ou a mulher por trás do trabalho, seja ele um romance, uma pintura ou uma equação. A mídia encorajou largamente essa tendência no seu próprio modo de popularizar a ciência, e eu não irei contra isso, forçando meu leitor a uma austeridade intelectual e curiosidade insatisfeita. A segunda razão tem a ver com a situação peculiar já aludida. Sk inner foi ata cado de muitos lados. Parte dos ataques se deu contra vários aspectos de suas ideias ou escritos, e estão, enquanto tal, na tradição do justo debate intelectual, apesar da violência que possa assumir em algumas ocasiões. Mas parte dos ataques foi ad hominem; e mais frequentemente do que o contrário, eles se misturaram com os argumentos sobre as ideias. E, portanto, necessário desembaraçar esses rumores difamatórios da controvérsia saudável. Um breve retrato do personagem e da vida de B. F. Skinner será suficiente. Pouco se conhecia da vida de Skinner, exceto de amigos mais próximos ou parentes, até a publicação de sua autobiografia, editada em três volumes, de 1976 (quando ele estava com 70 anos de idade) a 1983 (um pequeno artigo autobiográfico
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apareceu em 1970 como o capítulo de abertura de um volume da Festschripi). No primeiro volume da trilogia, Particulars o f my l i f e Skinner conta a história de sua infância e adolescência, até sua admissão em Harvard, que foi o ponto inicial de sua carreira com o psicólogo. A história não seria muito diferente da de m ilhares de outras crianças que cresceram no p rimeiro qu arto do século X X em qualquer pequena cidade do leste dos EUA. De certo modo, ele nos conta mais sobre a vida provinciana daqueles dias do que sobre 0 destino excepcional de um indivíduo: os dias do jovem Skinner não eram excepcionais. Seu pai era advogado, o que lhe deu algum status na pequena cidade de Susquehanna, às margens da ferrovia, no Estado da Pensilvânia, apesar de não estar à altura de sua ambição. Sua mãe, como todas as mulheres de classe média daqueles dias, cuidava da casa e da família. Ela era bonita, inteligente e uma boa presbiteriana. Fred tinha um irmão, dois anos mais novo, que faleceu aos 16. O jovem Fred gostava da escola. Uma primeira e duradoura paixão o tomou, sob a influência de um letrado professor: a leitura. Aos 14, estava intrigado com os debates sobre a real identidade de William Shakespeare e leu Bacon, cujo trabalho irá, mais tarde, influenciar seu pensamento científico. Ele era um garoto “ norm al” , com mais interesse em livros do que em esportes. Ele gostava de construir e plane ja r coisas, de trenós e aviões modelos a uma máqu ina de moto-perpétuo - qu e, ele confessa, realmente não funcionou! Fred entrou na Universidade Hamilton em idade normal, onde ele não encon trou o contexto intelectual estimulante que esperava. A maio ria dos estudantes não estava realmente envolvida naquilo que estudava e Skinner ressentiu ter que fazer coisas desinteressantes, como ter de frequentar as cerimônias religiosas na capela. Exceto po r seus contatos prazerosos e proveitosos com a fam ília de Dea n, na qual ele serviu de tutor a uma das crianças e conheceu livros, músicas e pessoas interessantes, a vida universitária não o animava. Ele reagiu planejando trotes, e acabou por se envolver em uma revolta estudantil contra o sistema, muito mais amena e local, puramente literária, que as revoluções no campus 40 anos mais tarde! Ele conta de um trote que fez com um amigo no início de um de seus anos universitários. Eles ti nham cartazes impressos e espalhados pelo campus, anunciando uma conferência de Charlie Chaplin, supostamente sob o patrocínio “oficial” de seu professor de com posição. O jornal local deu ampla publicidade ao evento e toda a área foi tomada por um intenso rebuliço. Uma multidão de potenciais ouvintes se dirigiu ao campus e uma multidão de crianças se juntou na estação de trem para dar boas-vindas ao grande ator. Esse foi apenas o primeiro de uma série de “gestos niilistas” que eram mais diretamente direcionados à faculdade e aos símbolos da instituição. 33
Dew s (1970).
34
Skinne r (1976).
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17/6/2015
Quando Fred deixou a universidade, ele queria se engajar na carreira literária. Ele leu Proust, parcialmente na tradução então recentemente publicada dos primei ros volumes de A la recherche du temps perdu, mas em francês nos outros volumes. Isso não estava de acordo com o desejo de seu pai de o ver estudar leis e possivelmen te se juntar a eíe como parceiro de trabalho. Contudo, seu pai aceitou sua estadia em casa, apenas como o início de seu trabalho como escritor. Nada de literário surgiu, apenas um Sumário de decisões do Conselho Antrdcito de Reconciliação , um trabalho de escritor comercial que ele realizou para se salvar do desastre literário. Ele se divertiu por uns tempos sem compromissos, passando seis meses no lugarejo de Greenwich e depois um verão na Europa. Finalmente retornou às ambições literá rias. Encon trou a psicologia moderna - Watson, por meio do artigo de Russell - e decidiu trocar literatura por ciência. Skinner mesmo comentou com humor sua falha na carreira literária:
Falhei como escritor porque não tinha nada importante a dizer, mas não podia aceitar essa explicação. Era a literatura que deveria ser culpada. Uma garota com quem joguei tênis no Ensino Médio - uma católica devota que depois se tor nou freira - certa vez citou uma observação de Chesterton a respeito do personagem de Thackeray: “Thackeray não sabia, mas ele bebia” , Eu generalizei o princípio para toda a literatu ra. Um escritor pode retratar o comportamento humano per feitamente, apesar disso, ele não o compreende. Eu permane ceria interessado em comportamento humano, mas o método literário falhou comigo; iria me voltar para o científico. Alf Evers, o artista, facilitou a transição. '‘Ciência”, disse-me ele uma vez, ‘ e a arte do século vinte”. A ciência relevante parecia ser a psicologia, embora eu tivesse apenas uma vaga ideia do que aquilo significava.” Tendo abandonado a literatura, Skinner estava para se tornar, mais tarde, um dos melhores escritores científicos de nosso tempo. Ele acabaria por retornar ao gê nero literário com seu romance utópico, com seu ensaio Beyondfreedom and dignity e em alguns artigos náo técnicos. Skinner entrou em Harvard para o semestre do outono de 1928 aos 24 anos. Ele decidiu preencher as lacunas de seu conhecimento psicológico e alcançar rapi damente os outros estudantes da graduação. Ele trabalhou duro, permitindo a si mesmo tempo mínimo de lazer, dedicado principalmente à música. Ele completou
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seu PhD em psicologia em 1931. Sua tese era de natureza puramente teórica: ele lidou com o conceito de reflexo. Foi um primeiro marco na sua reflexão sobre a causação do comp ortamento. Naquela época, Skinner já havia aderido à posição behaviorista, que não era muito bem-vista no Departamento de Psicologia de Harvard. Ele era comandado por E. G. Boring (cuja History o f experimentalpsychology se tornou um clássico), que permaneceu como um firme oponente à posição de Watson. Mas as qualidades intelectuais de Skinner eram impressionantes o bastante para convencer qualquer um .36 Foi-lhe oferecida a possibilidade de permanecer em H arvard , no laboratório de Crozier, um fisiologista, onde ele levou a cabo seus experimentos enquanto estu dante de graduação. Ele não deixou Harvard antes de 1936, passando seus últimos três anos como bolsista da recénvcriada Society o f Fellows, “à época, o suporte mais generoso que um estudante poderia ped ir”37 - e certamente o de m aior prestígio. Em 1936, Skinner recebeu convite para ensinar na Universidade de Minnesota, onde continuou seu trabalho experimental e elaborou melhor suai visões teóricas sobre o que se tornaria sua maior con tribuição científica, i.e., o m odelo do condicionamento operante (como diríamos hoje). Ele publicou seu primeiro livro, The beha vior o f organisms, em 1938. E ainda uma referência clássica para aqueles que estudam as escolas behavioristas de pensamento ou que querem entender a elaboração do pensamento skinneriano sobre o comportamento. Deixando um pouco de lado os detalhes de um período que Skinner mesmo considera como o mais gratificante de sua experiência enquanto professor, apon tarei apenas dois aspectos de seus dias em Minnesota. Um deles se refere à sua vida particular, N o mesmo an o em qu e se m udou para M in neso ta , se casou com Yvo nne Blu e, que havia estudad o literatura na Universid ad e de Chic ago. Tivera m duas filhas, as quais mencionarei mais tarde. O segundo ponto se refere às suas atividades científicas e é imp ortante para entend ermos os desenvolvimentos poste riores. Em bora seus experimentos fossem principalm ente com anim ais - preferen cialmente ratos e pom bos —, Skinner perm aneceu interessado em com portam ento humano. De fato, como a maioria dos psicólogos experimentais que trabalhavam com animais como sujeitos de laboratório naquela época, ele não estava preocu pado com comportamentos específicos da espécie, mas com leis gerais do com portamento, como os fisiologistas gerais usavam coelhos e sapos para delinear leis fisiológicas gerais. Entretanto, mais especificamente, ele despendia algum tempo com aspectos do comportamento humano à primeira vista muito distantes do
36
Isso, com o os úirimo s sucessos na carreira acadêm ica de Skinner, opõe-se à estranha acusação feita por Proctor & Weeks
(1990) de que Skinn er era um falso cientista. Ao contrário, e!e parecia táo hom. que indivíduos inteligentes que não partilhavam suas visões não se opuseram em a pontá-lo para seu Departam ento. Borin g deve certamente levar crédito por ter agido dessa forma em Harvard. 37
N.T .: Nã o há referência desta dtaçá o no original.
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pressionar a barra condicionado dos ratos: literatura e comportamento verbal. Ele ocasionalmente ministrava um curso sobre psicologia da literatura. E estabeleceu os fundamentos de seu livro posterior sobre Comportamento verbal. Após um pequeno in tervalo na Univ ersid ad e de In dia na, enquanto ch efe do Departamento de Psicologia, Skinner voltou a Harvard em 1948, onde permane ceu pelo resto de sua carreira. Na época de seu falecimento, ele galgou a posição de professor emérito - Emeritus Edgar Pierce Professor of Psycbology — após o título de chefe que ocupou antes de sua aposentadoria, e ainda desfrutava de um escritório no William James Hall. O período em Indiana, embora sobrecarregado com obrigações administrati vas, foi marcado por um evento intelectual de grande im portância. Ele escreveu o romance utópico Walden Two> publicado em 1948. O título é uma lembrança do lago Walden, perto de Concord, Massachusetts, onde o escritor Henry David Thoreau, no final do século XIX, se retirou por um ano, para uma experiência daquilo que poderíamos chamar hoje de um modo ecológico de vida. O livro descreve uma pequena comunidade onde as pessoas vivem uma vida harmoniosa e criativa, sem complicações inúteis e sem o gasto de recursos típico da vida moderna. Esta foi a primeira aplicação de Skinner em larga escala ao comportamento humano dos princípios delineados a partir de seu trabalho experimental. Mas, em um sentido, é mais do que isso. Refletiu a profunda preocupação de Skinner com os problemas do homem moderno e da sociedade moderna. Que tal preocupação não era apenas racional foi claramente mostrado pelo modo como o livro foi escrito. Enquanto admitia ser um escritor muito lento —produzindo uma média de duas palavras por minu to em seus artigos científicos - ele escreveu Walden Tivo em menos de dois meses, e com grande em oção, com o u m tipo de “autoterapia” , em suas próprias pa lavras. Uma utopia “positiva”, em contraste com Adm irável mundo novo, de Huxley, o livro foi crucial na apreensão do pensam ento de Skinne r e é tamb ém a parte de seu trabalho que mais revela seu caráter e suas preocupações pessoais.
U ma pr eo c u pa ç ã o c o n s t a n t e c o m o s a s s u n t o s h u m a n o s
A partir de então, os textos sobre comportamen to human o se acumulariam , sobretudo no aspecto científico: em 1953, Ciência e comportamento humano, seguido quatro anos mais tarde por Comportamento verbal , que deu ao linguista Chomsky a ocasião para sua famosa revisão crítica. Enquanto os experimentos com animais eram levados a cabo mais eficientemente que nunca com um pequeno grupo de colaboradores e brilhantes estudantes de graduação —resultando na publicação do
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técnico Esquemas de reforçamentcfi Skinn er se engajou em vários campos específi cos de aplicação. Um deles foi a educaçáo; outro, os distúrbios de comportamento. Não há nada surpreendente no fato de que um psicólogo, particularmente quando se especializa em mecanismos de aprendizagem, tenha interesse em educa çáo. Th orndike, Thurstone, Piaget e Bruner são apenas exemplos de um a longa lista. A motivação de Skinner, entretanto, veio de uma visita casual que ele fez à sala de aula de uma de suas filhas, onde ficou impressionado com o absurdo da situação: Aqui estavam vinte organismos extremamente valiosos. Sem qualquer culpa própria, a professora estava violando quase tudo o que conhecíamos a respeito do processo de aprendi zagem. Comecei a analisar as contingências de reforçamento que poderiam ser úteis no ensino de sujeitos escolares e plane jei uma série de máquinas de ensino que permitiriam ao pro fessor prover tais contingências para estudantes individuais.39 A análise de Sk inner sobre os processos de ensino-aprendizagem teria um a enorme influência na pesquisa educacional e —infelizmente em menor proporção —em práticas educacionais. Mas também levaria a ataques violentos, mais particu larmente direcionados ao seu projeto com máquinas de ensino. A palavra máquina evocava uma ameaça de educação mecanizada e levou à oposição de todos aqueles vinculado s a um a abordagem “humanista” da educação. O debate era passion al. Os oponen tes não entendiam os pontos levantados por Skin ner na sua crítica às práticas educacionais vigentes e não previram o desenvolvimento das novas tecnologias que ele visualizou. Máquinas de ensino mudaram de nome para ensino assistido por compu tador, do qual ninguém se queixa, e o pione irismo d o trabalho de Skinne r ge ralmente nem ao menos é mencionado nas introduções da atual amplamente aceita e em voga “tecnologia do ensino”. A abordagem de Skinner em relação aos problemas educacionais era típ ica de seu estilo ao lidar com os problemas humanos em geral, Ele começou com uma análise crítica das concepções e práticas tradicionais, à luz dos conceitos cien tíficos, e então definiu as linhas principais de um a possível aplicação destes últimos no cam po em questão. Ao m esmo tempo, ele testou suas propostas em seu próprio ensino: de lineou um curso programado, o implementou mecanicamente, usando um gravador de disco, e fez uma aplicação experimental com seus estudantes de graduação em
Ferster & Skinner (1957). J9
Sk in ne r (:97 0a , p. 16).
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Harvard, corrigindo o programa quantas vezes fossem necessárias em função dos resultados, para finalmente publícá-lo em forma de um livro-texto programado.40 Skinner juntou seus artigos sobre educação, em 1968, em um livro, Tecnologia do ensino. Mas ele nunca perdeu seu interesse em questões educacionais, como teste munhado peío espaço dedicado a elas em seus derradeiros textos.4' Ao mesmo tempo em que Skinner se engajava no campo da educação, alguns de seus estudantes se aventuravam em aplicações com pacientes mentais. Como na educação, essa não era a primeira tentativa de aplicar os princípios da aprendiza gem ao comportamento anormal. O próprio Watson foi pioneiro nessa área e Pavlov mostrara preocupação permanente com a psicopatologia. Mais recentemente, mem bros da escola de Yale despenderam muita energia na tentativa de cruzar psicologia dinâmica com teoria da aprendizagem, deixando a Dollard & Miller41 a tarefa de traduzir os processos observados na psicoterapia em termos de mecanismos de apren dizagem. De algum modo, o que logo seria chamado de terapia comportamental já tinha uma história.45 Porém, Skinner e seus seguidores lhe forneceram um ímpeto decisivo, dando-lhe uma formulação renovada dos princípios da aprendizagem, com uma riqueza de achados experimentais, sugerindo modelos explicativos para compor tamentos patológicos e estratégias para sua modificação. Também enfatizaram o rigor metodológico ao transferir a abordagem experimental para a situação clínica. O movimento se desenvolveu rapidamente, e em muitas direções, algumas ve zes inesperadas, como é frequentemente o caso na área da psicologia clínica. Skinner, é claro, não pode ser culpado por erros, excessos, conflitos, violações de normas éti cas e simplificações exageradas que ocasionalmente ocorreram nas práticas da modi ficação do comportamento. Nem pode ser considerado responsável pelas mudanças no discurso teórico - uma interessante mudança de comportamental para cognitivo-1comportamental , e então para cognitivo. Ele nunca esteve preocupado com ortodoxia e nunca pensou em manter a coerência de uma escola oficial de pensamento. O último ponto pode parecer surpreendente, pois Skinner é frequentemente representado como uma personalidade autoritária, com um desejo de poder que fe lizmente ele só podia exercer com seus ratos de laboratório. Todos aqueles que se aproximaram dele testemunharão o contrário. Ele era uma pessoa muito urbana e tolerante, na troca científica e na conversa particular. Demonstrou não gostar de polêmicas agressivas e deixaria argumentos injustos sem resposta ao invés de se enga jar em disputas. Enquanto professor, ele dificilmente poderia ser menos diretivo do que era. Ele nunca imporia seus próprios pontos de vista, mesmo em relação àqueles 40
HoUand & Skinner (1961).
41 Cada. um de seus últimos três livros de artigos selecionados (Skinner, 197 8, 1987b , 1989b) contém vários capítulos sobre questões educacionais. 41
Dollard & MiUer (1950).
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Para uma história da terapia comp ortam ental, ver, entre outras fontes, Kazdin (1978) e Scho rr (19S4).
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B. F. S N i, NEK: l MA PERSPECTIVA EUROPEIA
com quem trabalhava de forma mais próxima. Ele foi certamente muito admirado e respeitado por seus seguidores, e os convidou centenas de vezes para contribuírem em suas reuniões, revistas ou outros empreendimentos, mas nunca se preocupou em mantê-los sob seu controle, como Freud o fez, no estilo mais sectário, banindo dis sidentes; como Piaget o fez —sobre quem um respeitável e admirável colega uma vez disse, em sua presença, e numa ocasião acadêmica muito formal, que “seu gênio era equiparado apenas com a infantilidade de seu caráter”;44 como Lorenz o fez, execran do desviacionistas das escolas britânica e americana de etologia por seus envolvimen tos com os behavioristas.45 Skinn er nunca foi um daqueles monstros sagrados cujo carisma pessoal é amplamente misturado com sua influência intelectual. Skinner é também frequentemente retratado como um cientista de mente li mitada, que acreditava que o mundo se restringia àquela pequena parte que ele acabou por estudar, que pensava que seres humanos sáo como pombos e ratos, pois ele havia parado há muito tempo de compartilhar o interesse das pessoas normais a respeito dos sentimentos humanos, emoções e criações. Este julgamento precipita do ignora o músico refinado, que passava muitas horas em sua espineta; o amante da literatura, que lia clássicos franceses em sua versão original; o conhecedor de Diderot, Stendhal e Proust, não menos consciente da riqueza da cultura humana que qualquer um de seus colegas psicólogos que professavam o humanismo, e não menos interessado em sua própria experiência pessoal. Ao proeminente psicólo go francês Paul Fraisse, que o visitou pouco antes de sua aposentadoria e que lhe perguntou como conseguia manter-se ocupado, ele replicou: “Eu devo cuidar de minha vida interna”. Isso não foi uma renúncia ao behaviorismo. Era um modo de apontar que a vida interna é o que ela é, qualquer que seja a maneira científica utilizada para descrevê-la e explicá-la, assim como o arco-íris manteve toda a sua beleza após Newton ter explicado a divisão da luz branca nas cores que o formam, para usar a comparação favorita de Skinner.
v
U
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c a s o d e d e p r e c ia ç ã o d i fa m a t ó r ia : a h i s t ó r i a d a “ c a k a d e b e b ê ”
Ap esar de sua personalidade gentil - ou possivelmente po r causa disso - Skin ner foi exposto a ataques pessoais, a acusações extravagantes, a rumores de baixo nível. E claro, o indivíduo não estava em questão, mas suas ideias sobre educação,
44 R. Tissot, em sua conferência inaugural após scr indicado como professor de psicologia na Universidade de Genebra (pub li cada em M éd ia n e et H ygiène em 26 de maio de 1971). 45 Para discussão a respeito da evolu ção do pensamento de Lo rem . ver Evolution an d modification o f behavior (L o r e n z , 1965, capítulo 6).
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sobre tratamento psicológico, sobre a sociedade estavam. A história do “ berço de ar”*h ilustra melhor que qualquer outro exemplo. Em 1943, os Skinners decidiram ter um segundo filho. Depois que sua esposa lhe apontou alguns de seus medos em relação às restrições do primeiro ano, Skinner decidiu fazer algo para aliviar a sobrecarga. Ele analisou o modo como os bebês são cuidados e considerou possíveis simplificações, enquanto promovia conforto, intercâmbio social e a satisfação materna. A solução foi 0 air crib, ou “ bahytendef , como o chamava. Ele era um compartimento espaçoso, montado sobre uma mesa com rodinhas, com uma grande janela de vidro, temperatura e ar controlados, onde o bebê podia ficar nu e confortável, mantido na presença de sua mãe onde quer que ela estivesse trabalhando na casa. Uma tira de lençol cobria uma lona que servia como colchão, podendo ser removido para uma parte limpa, quando necessário, apenas girando uma manivela. O bebê, ao invés de sofrer com excessos de roupas ou por ficar molhado, ou simplesmente por acordar e se ver sozinho, podia se mover livremente, em uma atmosfera estável e apropriada e em contato visual permanente com a mãe, quando ela estivesse ocupada e não pudesse pegar o bebê no colo. O babytender estava pronto para receber Deborah Skinner ao retornar da maternidade. Ela teve uma vida de bebê muito feliz nele, apenas com um pouco mais de atenção de uma mãe menos exausta que o com um , crescendo normalmente depois. Ela era saudável e especialmente resistente a gripes. Poucos meses após seu nascimento, uma revista voltada para mulheres publicou o fato, e foi o começo do debate público sobre a “caixa de bebê”. O termo foi usado no início do artigo, infelizmente, e levou a uma confusão com a câmara de condicionamento experi mental, conhecida como “caixa de Skinner”. Essa confusão foi explorada por anos por detratores que acusavam Skinner de levar a cabo experimentos com sua própria filha. Essa história é suficiente para demo nstrar que tal acusação era equivocada, pois a motivação de Skin ner ao construir o air crib não era monta r um experimento, mas apenas cumprir o desejo legítimo de sua esposa por cuidados infantis mais fáceis. Alguns pais adotaram o invento para suas próprias crianças, mas ele nunca se tornou de fato popular. Teve um período de sucesso renovado - moderado, pois apenas poucas centenas de unidades foram vendidas - entre 1957 e 196 7, quando eles foram produzidos por uma pequena empresa. Ocasionalmente, um ex-“bebê criado pela caixa” estaria numa audiência de Skinner e viria até ele com um feliz sorriso ao final da conferência. Trinta anos depois da experiência pioneira com Deborah Skinner, um psicólogo alemão publicou resultados sobre os benefícios psicológicos e fisiológicos de se criarem bebês em ambientes semelhantes, para a satisfação de Skin ner.47 Isso talvez não tenha comp ensado os rumores difam atórios que perduraram 46
N. T \:"air crib”.
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Descrito em A mat ter o f consequentes (Skinner. 1083. p. 385-386).
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B. F.S k i n n e r : i m a
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p e r s p e c t i v e e ir o p e u
por anos sobre o terrível tratamento imposto pelo psicólogo de Harvard à sua pobre e indefesa filha, e sobre as terríveis consequências que isso teria sobre ela. Se houve, de fato, terríveis consequências, foram apenas aquelas dos ataques hostis, indiretamente direcionados às ideias de seu pai. Ele sumariza, nas últimas páginas de sua autobio grafia, de uma forma eufêmica, a história de 40 anos de ataques mal direcionados e fofocas caluniosas: Deborah sobreviveu aos rumores a respeito dela. Quando um distinto crítico inglês disse a Harry Levin que lamentava ter ouvido que ela tinha cometido suicídio, Harry replicou: “ Bem, quando ela fez isso? Eu escava nadando com ela ontem7’, Um conhecido psiquiatra contou a Eunice Shriver que a criança que nós “criamos em uma caixa” tinha se tornado psicótica; ele se desculpou de forma abjeta quando escrevi perguntando onde ele tinha ouvido aquela história. Mais tarde foi dito que Deborah estava me processando. Algumas vezes esses rumores eram alimentados por psicólogos clínicos que achavam útil criticar a terapia comportamental. Certa noite, quando já es tava sonolento, o telefone tocou e um jovem homem disse: “Professor Skinner, é verdade que o senhor manteve uma de suas filhas numa jaula?”. Possivelmente por causa do baby tender e dos rumores sobre ele eu fora muito solícito. Deborah Skinner é agora uma artista em Londres, casada com um professor de economia e estava até a morte de seu pai em relações tão harmoniosas quanto podem ser. Não haveria tanto interesse a respeito dela se seu pai não tivesse incomo dado a tantos.
A HUMANIDADE TEM UM FUTURO? As críticas de Skinner sobre educação e os tratamentos psicológicos eram apenas parte de um problema mais amplo que já tinha chamado sua atenção em Ciência e comportamento humano e em Walden Two\ a sociedade moderna como um todo está toman do o cam inho errado porque as soluções apropriadas aos problemas não estão sendo aplicadas, embora já estejam disponíveis em alguns casos. Aproximadamente metade de seus textos dos últim os 30 anos de sua carreira foi dedicada a essa questão. Ele acreditou ser importante formular suas visões para os leigos em Beyond freedom
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and dignity^ e continuou a alertar seus colegas em seus mais recentes artigos. Seu livro de 1987, Uponjurther reflection,49 é aberto com um capítulo intitulado “ Por que não estamos agindo para salvar o mundo?”. A mensagem de Skinner não é daquelas que as pessoas aceitam facilmente. Ela fere muitos valores já estabelecidos, muitos hábitos profundamente enraizados. Para os problemas ameaçadores atualmente enfrentados pela humanidade - a poluição da biosfera, o crescimento demográfico descontrolado, a crescente discrepância de riqueza entre as nações, a conduta crescentemente agressiva entre as nações e den tro delas mesmas, 0 esgotamento de recursos, o uso de armas nucleares Skinner sugere soluções que diferem daquelas frequentemente ouvidas e populares. Ele não apela para a rejeição da ciência ou ao retorno nostálgico a um idílico modo de vida pré-científico: ao contrário, ele defende que coloquemos para funcionar o que já sabemos de fontes científicas sobre o comportamento humano, como pusemos para funcionar, com sucesso, nosso conhecimento científico nas questões físicas e médi cas. Ele também não apela para nenhum tipo de renascimento espiritual, ou para uma cruzada da mente contra as forças do mal: o principal erro, e que impede qual quer progresso em direção a soluções, é a concepção que os humanos possuem sobre sua própria natureza, baseada numa crença ilusória de liberdade e soberania. Se os homens não abandonam essa ilusão e não assumem uma visão mais realista de seu lugar no universo, a humanidade pode caminhar em direção ao desastre. O perigo não é menor do que se a humanidade se recusasse obstinadamente a reconhecer sua dependência do meio biológico, e a consequente necessidade de preservá-lo. De cer to modo, o perigo é maior, pois nossos esforços para preservar nossa biosfera estão fadados ao fracasso se não começarmos a encontrar caminhos para implementá-los no comportamento humano cotidiano. Para aqueles que pensam que Skinner supersimpliftcou a psicologia, ignorar seus avisos pode não ter nenhuma consequência, porque tomá-los a sério poderia apenas levar a uma piora da situação. Mas quem sabe? Ele poderia estar certo e, um dia> poderia ser tarde demais para dizer. As vezes, as resistências às propostas de Skinner me fazem lembrar da atitude dos profissionais médicos quando Lister insistiu que os médicos e cirurgiões deveriam lavar as mãos cuidadosamente antes de atender seus pacientes e antes de ir de um paciente ao outro, porque ele pensava que era uma fonte de infecção. Soava como algo tão simples e não merecedor de atenção dos médicos. Felizmente, a mensagem finalmente foi aceita e a prática foi adotada. A q uestão é m u ito séria p a ra ser tratada c o m in sult o s p assio nais . N ã o p o d e se r descartada com a acusação de que Skinner desumanizou a humanidade. Talvez ele
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Id. (1971a).
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Id- (1987b).
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B. F.Skinner:um a
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perspectiva eiropeia
tenha apenas colocado a humanidade em seu lugar correto, após Galileu, Darwin e Freudj e, ao fazer isso, contribuiu para lhe fornecer sua verdadeira humanidade.
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3 A CAIXA DE SKINNER: UM NOVO MICROSCÓPIO PARA A PSICOLOGIA
Uma
g r a n d e c o n t r ib u i ç ã o p a r a a s t é c n i c a s d e l a b o r a t ó r i o
O que qu er que perman eça da teoria de Skinn er e de sua filosofia social, é pro vável que os psicólogos experim entais continuem a utilizar a técnica de laboratório que veio a ser cham ada de caixa de Skin ner, apesar da insistência de seu inven tor em nom eá-la “câmara de condicion amento operante” . Co m o este livro não é direcio nado a especialistas em psicologia experimental, não descreveremos em detalhes as propriedades daquele p rocedimento e a variedade de problem as que ele tornou aces sível. E essencial, todavia, se o leitor quiser avaliar corretamente o lugar de Skinner na psicologia do século XX, que ele tenha ao menos um entendimento intuitivo do que trata a caixa de Skinner e do tipo de dado empírico que ela é capaz de fornecer. Procedimentos experimentais e de observação são elementos importantes para o progresso de qualquer ciência; a história das ciências naturais foi condicionada, en tre outras coisas, pelos progressos na ampliação d o pode r do olho hu mano, primeiro recorrendo a simples lentes de aumento, posteriormente melhoradas no mecanismo óptico do microscópio, então substituído por microscópios eletrônicos muito mais poderosos. No passado, a psicologia teve sua própria série de avanços técnicos, que provaram ser mais decisivos em gerar grandes descobertas do que grandes volumes de teoria. A psicologia cognitiva contemporânea, por exemplo, faz amplo uso da chamada técnica de “cronometria mental”, que é uma aplicação da medida do tem po de reação - um dos mais antigos fenôme nos estudados pelos psicólogos científi cos do século X IX —já sugerido em 1869 pelo psicólogo holandês Do nd ers.50 De forma similar, a caixa de Skinner não é apenas um pedaço de equipamento desenhado e amplamente utilizado para o estudo do comportamento adquirido em animais; ela foi utilizada para estudar, com uma eficiência sem precedentes, uma série de outros aspectos do comportamento em vários contextos, que serão agora ilustrados po r meio de exem plos típicos. U m a questão clássica na história da ciência é se os procedimentos de pesquisa podem ser descritos e analisados independente mente das elaborações teóricas que estão geralmente vinculadas a eles. Obviamente 50
Publicação original em holandês. Tradução de Don ders (1969).
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não há uma resposta tudo ou nada para essa questão. O microscópio pode ser des crito por si mesmo, e não parece ser muito carregado de teoria. A caixa de Skinner é sem duvida mais intimamente relacionada à anáiise de Skinner do comportamento operante e à teoria geral que ele delineou a partir dele. (Outra questão interessante, apesar de igualmente difícil, em cada caso particular, é o quanto a teoria estava na origem do procedimento ou o quanto o procedimento modelou a teoria.) Não precisaremos evitar misturar os dois níveis, o nível puramente técnico e o teórico, ao descrever o procedimento, mas é claro, porém, que a caixa de Skinner adquiriu sua própria independência enquanto técnica de laboratório utilizada por muitos experimentadores ao redor do mundo com nenhum comprometimento, qualquer que seja, com a teoria de Skinner.
A CÂMARA DO COMPORTAMENTO OPERANTE A caixa de Skinner é um dispositivo extremamente simples. Sua simplicidade levou à conclusão errônea de que ela pode auxiliar apenas no estudo de aspectos muito simples do comportamento. Ao contrário, dispositivos simples (bem como conceitos simples) na ciência frequentemente parecem ter permitido maior acesso a realidades complexas que dispositivos complicados. A ampla utilização da cronometria mental, citada anteriormente, na moderna psicologia cognitiva é outro caso a ser apontado. Uma típica caixa de Skinner é uma câmara cujas dimensões permitem ao ani mal algum espaço livre para caminhar - seu tamanho é, portanto, adaptado ao tamanho da espécie utilizada. Ela é equipada com algum dispositivo de resposta, tecnicamente chamado de manipulandum\ isto é, alguma parte de equipamento, tal como uma barra, uma chave de plástico ou uma corrente, que o sujeito irá ativar. O rato ou o gato pressionará a barra, o pombo bicará a chave, o macaco puxará a corrente, etc. Geralmente, este simples gesto, ou mais corretamente o movimento comunicado ao manipulandum , será convertido em sinal elétrico, facilmente regis trado e definido, em um dado experimento, como uma resposta. Além do dispositivo de resposta, a caixa de Skinner inclui um dispositivo que libera algum estímulo reforçador. O caso mais clássico é o dispensador de comida, que libera, sob controle automático, uma bolinha de comida sob medida, que pode ser utilizada como o que se chama de reforçador positivo; embora isso não equivalha exatamente à definição precisa de reforçador positivo, para um observador leigo pareceria que um animal faminto acharia a comida atrativa e trabalharia para obtê-la. Aqui chegamos ao aspecto funcional da caixa de Skinner: isto é, a relação entre a resposta e o reforçador, um aspecto que está de fato definindo o conceito de com portamento operante. O princípio de qualquer experimento com a caixa de Skinner
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é que o sujeito obterá um reforçador se, e apenas se, eíe em itiu um a resposta. E le é, necessariamente, um organismo ativo, que pode contar apenas consigo mesmo para ser recompensado. Esse é o ponto principal, que geralmente é ignorado no uso leigo da palavra condicionamento, que possui a conotação de comportamento forçado. Em seu primeiro livro, The behavior o f organisms,5' Skinner deixou claro que estava estudando o comportamento espontâneo do organismo. Ele certamente não queria dizer que seus ratos estavam exibindo uma vontade livre, mas que eles vieram para a situação experimental com um conjunto de comportamentos potenciais que po deriam ser emitidos e levar à produção de uma resposta particular solicitada para ser reforçada. Skinner elaboraria melhor o problema das origens daquele conjunto de com portamentos, como veremos. Um ponto essencial, entretanto, que não pode ser postergado se quisermos entender o processo básico do condicionamento operante, é o mod o com o a resposta desejada finalmente emerge de um conjunto de comp or tamentos “ espontâneos” . N a prática experimental, a transição pode ser mais bem observada na fase cham ada de modelagem do operante. Embora haja outros meios de atingir o mesmo objetivo, é geralmente conveniente para o experimentador intervir manualmente controlando o reforçamento enquanto observa seu sujeito. A menos que o sujeito permaneça dormindo ou se mantenha prostrado em um canto da câma ra - casos em que não há esperança algum a de se obter a resposta ele irá se movimentar e emitir várias amostras de seu repertório comportamental. Ao fazer isso, ele estará algumas vezes mais próximo do manipulandum que outras. O experi men tador se certificará de que a bolinh a de com ida é liberada precisamente naqueles momentos. Logo, irá observar que o animal tenderá a ficar mais próximo da chave ou da barra ma is frequentemente. Ele progressivamente restringirá as condições para fornecer a bolinha, até o ponto em que a resposta final será emitida normalmente. O que aconteceu foi reforçamento seletivo, pelo experimentador, de unidades de comportamento, entre aquelas produzidas pelo sujeito, que ao final correspondem à estrutura particular ou topografia do operante estabelecido. A seleção das unidades apropriadas é claramente possível apenas p orque os sujeitos exibem variações em seu comportamento. Já podemos afirmar que a caixa de Skinner é um espaço experi mental (por conseguinte reconhecidam ente construída de mo do a rtificial) no qual o comportamento é modelado e mantido por um processo de seleção entre variações. Como Skinner coloca, é o controle pelas consequências que pode ser comparado ao processo que atua na evolução biológica. Comentaremos essa analogia em detalhes mais à frente. Neste estágio, voltemos às características básicas da caixa de Skinner.
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C ontingências
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e escalas
A relação básica entre a resposta operante e o reforçamento foi descrita ante riormente em sua forma mais simples: assumimos que, uma vez que a resposta foi modelada, é reforçada cada vez que é emitida. Essa relação simples pode ser modifi cada em relações muito mais complexas. Essas relações atraíram a atenção de Skin ner desde cedo e foram extensivamente exploradas por muitos de seus seguidores. A expressão conti ngências de reforçamento se refere aos vários tipos de relação entre resposta e reforçamento, mais precisamente implementados nas chamadas escalas de reforçamento. Não entraremos em suas complexidades em detalhes, mas alguns poucos exemplos são necessários. Um número fixo ou médio de respostas pode ser exigido antes de um reforçador ser liberado, e a razão Respostas por Reforçador pode ser estendida a ponto de, em animais, desafiar o custo em termos de energia física e, em humanos, ocasional mente resultar em ruína. O comportamento de jogo compulsivo pode ser analisado como resultado de uma Escala de R azão Vari ável, na qual o indivíduo é recompensa do intermitentemente depois de um número variável de respostas (as apostas), que pode ser tão alto que o reforçador (isto é, ganhos ou retorno) nunca será de fato alcançado. Em outros casos, os reforçadores estão disponíveis apenas depois de um intervalo de tempo ter passado; o intervalo pode ser variável, portanto imprevisível, ou pode ser fixo, tornando possível um padrão periódico de comportamento, que será descrito de forma mais completa a seguir. Escalas e contingências diferentes podem atuar simultaneamente, envolvendo sistemas motivacionais diferentes, ou possibilitando comparações entre diferentes tipos de combinações custo-benefício. Quatro classes principais de contingências são tradicionalmente diferenciadas e são mais bem apresentadas em uma matriz dois por dois, como segue: Tabela 3.1 Uma matriz dois por dois que resume as categorias básicas das contingências de reforçamento.
Na dimensão horizontal, a consequência da resposta R, seja a apresentação de algum estímulo (Sr), seja ele atrativo ou aversivo, ou a não apresentação de um (es perado) estímulo (ou a supressão de um estímulo já presente). Na dimensão vertical, o efeito da relação descrita acima sobre a resposta, cuja probabilidade p(R) pode aumentar ou diminuir. Ver texto para exemplos.
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É fácil ilustrar cada caixinha da matriz com um exem plo concreto do cotidiano do ser hum ano. As então chamadas co ntingências de reforçamento po sitivo já foram explicadas: elas envolvem a apresentação de algum evento, digamos, comida, como uma consequência da resposta, que resulta num aumento da probabilidade daquela resposta ser emitida: uma boa comida nos encorajará a retornar ao restaurante. (Na linguagem cotidiana, alguém provavelmente diria que o evento reforçador é atrativo, ou agradável, mas essa não é uma propriedade essencial na visão do espe cialista.) Reforçamento negativo se refere às contingências nas quais o término ou a não apresentação de um evento após uma resposta ser emitida resulta no aumento da probabilida de da resposta (tal evento seria classificado, de forma plausível, com o aversivo de um pon to de vista subjetivo). Por exem plo, m uitos motoristas respeitam os limites de velocidade não porque eles não gostam de dirigir rápido, o que de fato fazem, mas porque é um modo de evitar ser multado. Contingências de punição envolvem a apresentação de algum evento “aversivo” depois de uma determinada resposta, com a consequência de que a resposta será emitida menos frequentemen te, ao menos enquanto as contingências estão atuando: pesadas multas ocasionais reduziram o d irigir em alta velocidade em muitos m otoristas. Por fim, omissões, ou não recompensas frustrantes, como elas foram chamadas algumas vezes,51 referem-se às contingências nas quais um reforçador “atrativo” liberado anteriormente não é mais fornecido depois de uma resposta, resultando na extinção dessa última: um declínio na qualidade da comida reduzirá nossas visitas a um restaurante previa mente apreciado. Apesar de aparentemente técnicas, essas definições auxiliarão em discussões futuras.
Um m o d e l o
e s t í m u l o - r e sp o s t a s e m n e n h u m e s t í m u l o
Uma importante característica do procedimento operante, como delineado por Skinner, é a escolha de uma unidade muito simples de comportamento, geral mente uma pequena e bem especificada ação motora. Os dados correspondentes registrados em um experimento típico são as respostas distribuídas no tempo, com a taxa do responder, isto é, a medida do número de respostas por unidade de tem po, como a expressão preferida utilizada no tratamento dos resultados. Não há dúvidas de que a escolha da taxa foi feita às custas da estrutura das respostas, que Skinner de fato negligenciou, com argumentos que não sobreviveram a algumas das críticas formuladas pelos experimentadores inclinados à etologia. Desenvol vimen tos posteriores mos traram que o estudo da taxa e da estrutura do responder são complementares (ver capítulo 6). Isso não pode esconder o fato de que a taxa 51
Essa denom inação foi proposta por Gra y (197s).
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provou ser um a m edida mu ito eficiente para muitos propósitos, e que muitos dados empiricamente válidos foram coletados e repetidamente confirmados utilizando-se o procedimento simplificado proposto por Skinner. O leitor perceberá que, até agora, não utilizamos a palavra estímulo, que pare ceria ser um ingrediente especial se, como é frequentemente reivindicado, Skinner fosse de fato um psicólogo Estímulo-Resposta. Na verdade, mudar de uma escala para outra, implicando apenas uma relação diferente entre resposta e reforçamento, sem qualqu er estímulo ser introduzido, produz irá outro padrão de taxa de respostas, algumas vezes completamente diferente. Tal contraste pode ser observado em um caso simples, mas bastante impressionante, entre um esquema no qual o reforça mento é liberado após um número fixo de respostas e um esquema no qual ele está disponível apenas após a passagem de um intervalo de tempo: a primeira escala gera constante atividade - tipicamente em alta taxa - enquanto a segunda induz uma alternância periódica entre pausas e fases de responder, refletindo o controle da variá vel tempo. A Figu ra 3.1 ilu stra a com pa ração, utilizand o o trad icional registro cumulativo popularizado p or Skinner.
F i g u r a 3 . 1 Dois padrões distintos de comportamento, sob diferentes esquemas de reforça
mento, sem qualquer mudança em estímulos externos. Em A, uma curva cumulativa indi vidual de respostas, obtida sob uma escala de Razão Fixa, na qual 40 pressões à barra eram exigidas para um reforçamento (pequena quantidade de comida); em B, uma curva obtida em uma escala de Intervalo Fixo, com periodicidade de 5 minutos para a disponibilidade do reforçamento. Abscissa: tempo, i.e., duração da sessão, uma hora; ordenada: respostas
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acumuladas (o registro zera a cada 500 respostas). Deflexão oblíqua no registro cumulativo mostra os reforçamentos. Na linha horizontal na parte inferior de B, indica-se a disponi bilidade do reforçamento, que não é disponibilizado até que uma resposta seja emitida. Registros cumulativos, feitos em tempo real durante o experimento, são fáceis de ler: quanto mais respostas por unidade de tempo (em outras palavras, quanto mais alta a taxa de respos tas), mais íngreme a inclinação; períodos sem nenhuma resposta produzem seções planas na curva, como em B após cada reforçamento, onde pausas regulares revelam ajuste refinado ao intervalo de tempo. Os sujeitos eram gatos. E claro que estímulos de todos os tipos podem ser introduzidos e ganhar con trole sobre o responder. Todavia, eles na realidade náo causam comportamento: apenas definem as ocasiões nas quais as respostas serão reforçadas. Seu papel será facilmente com preendido a partir de alguns exemplos abaixo. Eles foram seleciona dos a partir de centenas de possíveis ilustrações do uso de técnicas operantes, apenas para mostrar a variedade dos problemas com os quais se lidou, não necessariamente o próprio Skinner, mas os pesquisadores dos mais variados campos.
D i s c r i m in a ç ã o :
d o e s t í m u l o e x t e r n o p a r a o s e s t a d o s in t e r n o s
O controle de estímulos entra em cena quando um organismo precisa dizer a diferença entre dois eventos externos, por exemplo, as cores das luzes do semáforo. Isso é facilmente alcançado quando se exige uma resposta a uma cor (parar no sinal vermelho) e nenhum a resposta ao verde (manter-se movendo), ou quando se exige uma resposta diferente para cada cor. Os animais podem ser treinados para fazer tais discriminações táo bem quanto os humanos. Pavlov já obtivera tal resultado utilizando seu próprio procedimento, mas nunca se aproximou da exatidão que se tornou rotina com as técnicas operantes. Isso se deve essencialmente a um alto nível de automatização que agora é regra: Skinner desenvolveu instrumentos eletromecânicos geniais que assegurariam o controle automático completo do experimento; o computador os substituiu e aperfeiçoou o controle online, incluindo o tratamento imediato dos resultados, mesmo aqueles de natureza complexa. Uma resposta mo tora discreta, como o bicar o disco, é, claro, muito mais fácil de ser colocada sob controle automático do que o é a salivaçáo estudada por Pavlov. Discriminação sensorial é a base dos estudos psicofísicos. A psicofísica está pri meiramente preocupada em determinar que parte do mundo físico um organismo está apto para perceber - por exemplo, q uais ondas acústicas produzem o escutar ao localizar os limites, ou os limiares absolutos sob os quais, e certamente além dos quais, náo há qualquer “sensação”. Além disso, trata do poder de resolução dentro desses limites, e, com esse fim, os chamados limiares diferenciais são medidos. Essa
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parte da psicologia teve um desenvolvimento inicial no século XIX, e teve numero sas aplicações práticas, por exemplo, no diagnóstico de déficits sensoriais. Em humanos, um experimento psicofísico clássico é implementado instruin do-se o sujeito a dar um sinal quando perceber um estímulo, ou quando ele puder dizer a diferença entre dois estímulos próximos. Pensou-se, por anos, que estudos equivalentes não poderiam ser feitos com animais, porque a eles não poderiam ser fornecidas instruções verbais sobre o que o experimentador queria que fizessem. O grande fisiologista francês Claude Bernard, que foi um forte defensor do método experimental, admitiria que ele possui algumas limitações, e deu como exemplo a impossibilidade óbvia de se abordar experimentalmente o mundo interno das sensa ções animais. Estudantes de comportamento mostraram que ele estava equivocado, mas isso não se deu até que os procedimentos operantes estivessem disponíveis, quando os dados sobre as sensações animais puderam ser coletados com o mesmo grau de rigor que em humanos. No seguinte exemp lo, retirado de Mau rissen ,53 limiares absolutos à estimulação tátil foram determinados em um macaco, utilizando um sofisticado vibrador como fonte de estímulo e um refinado procedim ento operante. Assim como para vibrações de ar que produzem sensações auditivas, a frequência (ou o número de ciclos por segundo) de vibrações mecânicas pode ser modificada, bem como sua amplitude. Receptores táteis detectam melhor algumas frequências que outras: a sensibilidade é mais alta, correspondendo ao limiar mais baixo, por volta de ioocps. Na Figura 3.2, os resultados de um macaco experimental, testado duas vezes para checar a confiabi lidade da medida, são apresentados, juntamente com os limiares obtidos, utilizando a mesma técnica, com um sujeito humano. Esses resultados não são apenas precisos e confiáveis, mas eles são comparáveis aos dados com humanos, o que permite o uso de anim ais experimentais para explorar os efeitos (como aqueles dos agentes tóxicos) que dificilmen te podem ser estudados em hum anos. O mesm o autor descreve a alteração dos limiares de vibração de acordo com a administração de uma substância que au menta a eficácia da radioterapia. Isso indica um efeito colateral neurotóxico da droga. Psicofarmacologistas deram um passo além na exploração do mundo interno dos animais. Eles treinaram sujeitos animais em tarefas de discriminação envolven do estados internos presumivelmente diferentes induzidos por drogas psicotrópicas. Compostos utilizados para reduzir ansiedade, depressão ou outras condições psicoló gicas desprazerosas deveriam, essa era a esperança, produzir mudanças nos comporta mentos observáveis do paciente e em seus sentimentos subjetivos sobre si mesmo. Foi oferecida aos ratos uma escolha entre duas barras que eles poderiam pressionar, cada uma delas associada a uma droga diferente, ou a um a droga em oposição a uma solu ção salina —droga(s) e/ou solução salina sendo injetada antes do experimento. Eram Maurissen (1979).
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tomadas precauçõ es, com o de co stum e, para se certificar de que a escolha correta não fora feita ao acaso; isto é facilmente alcançado ao se exigir um número de respostas, ao invés de apenas uma, o que m ostra que o sujeito nã o está acertando a barra correta por acaso, mas realmente “decidiu” (como os cognitivistas diriam) ativá-la. Foi mos trado, por diversos experim entado res,54 que os anim ais são capazes de discrimina r náo apenas entre classes de drogas claramente opostas, como tranquilizantes versus estimulantes, mas, de uma forma mais sutil, entre compostos quimicamente próxi mos dentro de uma mesma classe. Um exemplo simples, retirado de um estudo de H irschh orn 55 é apresentado na Figura 3.3. Ele ilustra o desenvolvim ento progressivo de uma discriminação entre uma injeção de solução salina presumivelmente neutra e uma de morfina e a generalização da morfina para outro narcótico analgésico, metadona, algumas vezes utilizada como droga de transição no tratamento da adição.
Frequências (Hz)
F i g u r a 3 . 2 Limiares absolutos a estímulo vibratório táril obtidos de um macaco (Mi & M2;
duas sessões de medida diferentes) e de um humano (H). Abscissa: frequência de vibração em ciclos por segundo (Hertz); ordenada: amplitude da onda vibratória, em mícrons (de pico a pico); ambas as escalas em unidades logarítmicas. O método de condicionamento operante proporciona resultados a partir de animais que se equiparam àqueles tradicionalmente ob tidos com humanos, com métodos psicofísicos clássicos que utilizam instruções verbais.5*
54
Ver Colpaerc & Slangen (1982) e Glenn on, Järbe & Frankenh eim ([991).
55
Hirsch horn (1978). Adap tad a d e Maur isse n (197 9}.
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F i g u r a 3.3 Explorando o mundo subjetivo dos animais. Gráfico superior: ratos foram trei
nados a discriminar entre dois estados internos após uma injeção de morfina e uma injeção de solução salina. Pontos sucessivos nas duas curvas mostram a porcentagem de respostas (ordenadas) na barra “correta”, que é reforçada quando a morfina foi injetada, ao longo de uma série de 40 sessóes (4 por bloco, na abscissa). Pode-se ver que, inicialmente, os sujeitos no treino confundiam os dois estados internos, mas eies rapidamente aprenderam a discri minar entre eles. Gráfico inferior: generalizando estados mentais induzidos por drogas muito
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semelhantes. Ratos treinados, como descrito acima, para discriminar entre morfina e solução salina foram expostos a testes com metadona ou meperidina, dois compostos semelhantes à morfina. Eles generalizaram sua discriminação a essas drogas. Como se pode ver na relação resposta-droga, a discriminação é uma função da dose administrada.57
A d i ç ã o
e x pe r ime n t a l à d r o g a
O m o d e l o d o c o n d i c i o n a m e n t o o p e r a n t e p r o v o u s er m u i t o e fi ci en t e e m t es ta r p r o p r i e d a d e s a d i t iv a s p o t e n c i a i s d e d r o g a s . A d e p e n d ê n c i a d a d r o g a p o d e s e r c o m p o r t a m e n t a l m e n t e d e f in i d a c o m o u m a f o r t e te n d ê n c i a p a r a a g i r de m o d o a c o n s e g u i r a d r o g a , a q u a l s e p o d e d i z e r q u e p o s s u i p r o p ri e d a d e s r e f o r ç a d o r a s . N o i n í c i o dos anos i960, experimentadores ofereceram a ratos a possibilidade de administrar m o r f i n a a s i m e s m o s a o p r e s si o n a r a b a rr a . A d r o g a e r a li b e r a d a a u t o m a t i c a m e n t e p o r m e i o d e u m c a t e t e r v e n o s o i n t r o d u z i d o c i r u r g i c am e n t e , d e m o d o q u e e l a c a i r i a d i r e t a m e n t e n a c o r r e n t e s a n g u í n e a . A F i g u r a 3 . 4 m o s t r a ta l p r e p a r a ç ã o e o s r e s u l ta d o s t íp i c o s q u e f o r a m a m p l a m e n t e r e p r o d u z i d o s . A u t i li d a d e p r á t i c a d a t é c n i c a p a r a d e t e c ta r p r o p r i e d a d e s a d i t i v a s d e n o v o s c o m p o s t o s é ó b v i a . A b a ix o , a d içã o d e c o c a ín a e m u m ra to . E sq u e r d a : resposta s e m itid a s e m u m a sessão de uma hora (ordenada) como função do número de respostas exigidas para um reforçamento (1 mg de cocaína por kg de peso corporal) em um esquema de R a z ã o F i x a ( a b s c i s s a ) . D i r e i t a : n ú m e r o c o r r e s p o n d e nt e d e i n f u s õ e s d e d r o g a p o r h o r a . O r a t o a g i u d e m o d o a o b t e r a m e s m a q u a n t i d a de t o t a l d e c o c a í n a , a j u s t a n d o seu output de resposta con form e exigido pela escala de reforça m en to.58 O u t r a d e s c o b e r t a d i r e t a m e n t e r e l a c i o n a d a a o s p r o c e di m e n t o s o p e r a n t e s , d o i n í c io d o s a n o s 1 9 5 0 , é c h a m a d a a u t o e s t im u l a ç ã o i n t r a c e r e b r a l .59 R a t o s , e m a i s ta r d e outras espécies, trabalharam duro, isto é, emitiam muitas respostas se a consequên c i a fo s s e u m a e s t i m u l a ç ã o e l é tr i ca e m a l g u m a s á r ea s d e s eu c é r e b r o . E s t e f e n ô m e n o f o i a f o n t e d e i m p o r t a n t e s d e s e n v o l v i m e n t o s n a p s i co f i s i o l o g i a d o s s i s t e m a s m o t i v a c io n a is - u m re su lta d o de c e n a fo r m a ir ô n ic o , se n o s le m b ra rm o s q u e S k in n e r foi muitas vezes acusado de ter substituído a riqueza das motivações internas pelo conceito mecânico de reforçamento.
57
Redesenhado conforme Hirschhorn (1978).
58
Con form e Pickens Sc Thompson (1968).
59
Olds & Müne r (1954).
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F i g u r a 3 . 4 Testando propriedades aditivas de drogas. Acima, um desenho mostrando o
dispositivo para o estudo da autoadministração de drogas em animais. Pressionar a barra produz, sob determinada escala de reforçamento, uma dose definida da droga, liberada de uma seringa automática por meio de um cateter intravenoso fixado cirurgicamente.60
M a is
f u n d o n o m u n d o in t e r n o
animal
Procedimentos operantes também foram utilizados em estudos daquilo que se chama hoje de cognição animal. Abordagens cognitivistas atuais enfatizam o estudo das representações e processo mentais. U m a grande parte da pesquisa cogn itiva tem
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a ver com h umanos, e a psicologia cogn itiva provavelmente deve parte de seu suces so ao seu foco na mente humana. A singularidade da espécie humana, entretanto, não pode nunca ser tida como garantida, a menos que os animais tenham sido testados para processos com desempenho possivelmente semelhante. Portanto, a cognição animal atraiu muitos experimentadores, fascinados pela capacidade dos animais de formar conceitos, de manipular objetos simbólicos, de resolver proble mas - mesm o de natureza lógica ao invés de prática de processar representações mentais ou de aprender alguns rudimentos de linguagem. Estudos que buscavam ensinar linguagem a chimpanzés, realizados nos anos 1960 e 1970, fizeram uso do procedimento operante; o mais típico a esse respeito foi a pesquisa de Rumbaughs com Lana, na qual um tipo de código hieroglífico foi ensinado em um ambiente interativo controlado. A questão de se os animais possuem imagens ou representa ções mentais —o que quer que isso signifique exatamente - há muito tem sido uma questão de debate. E se eles possuírem, quais seriam as similaridades e diferenças com aqueles fenômenos como inferidos em humanos permanece como uma questão intrigante. Nós todos experimentamos pós-efeitos visuais, uma percepção de algo que obviam ente não está presente como tal no mu ndo exterior após a fixação de um certo estímulo. Por exemplo, depois de olhar para um quadrado vermelho em uma tela branca, nós enxergamos um quadrado verde (cor complementar) por um tempo após o estímulo vermelho ter desaparecido. Este é um caso muito simples de ver na ausência de um estímulo, apesar de ele depender de uma estimulação imediatamen te precedente e de processos periféricos. Esse tipo de imagem é facilmente evidenciada em animais, como no seguinte experim ento.6' Pombos eram reforçados por bicar o disco na presença de um estímu lo verde. Foram então testados na presença de estímulos vermelhos ou amarelos, ou na presença de um estímulo branco que seguia imediatamente um vermelho, verde ou amarelo. Se os pombos tivessem pós-imagens coloridas, como nós temos, essas pós-imagens deveriam ocorrer, naquela situação, quando o branco é apresentado após o vermelho, e não deveria ocorrer em todos os outros casos. E foi exatamente o que se observou: o responder na presença do branco-pós-vermelho (presumivelmen te durante uma pós-imagem verde) foi significativamente mais alto. Pós-imagens, todavia, têm grandes chances de serem confun didas com imagens mentais que foram estudadas em detalhes pelos psicólogos cognitivistas. Estas não são apenas pós-efeitos periféricos, mas representações sobre as quais se diz que o sujeito opera internamente.
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F i g u r a 3 . 5 Amostras de estímulos utilizados por Shephard no estudo de rotação mental.61
Shephard é conhecido por seus elegantes experimentos sobre rotação mental em humanos.61 O princípio consiste em apresentar a sujeitos humanos estímulos, como aqueles reproduzidos na Figura 3.5, A, e solicitar-lhes que decidam se um estímulo comparação, por exemplo, B ou C, é o mesmo, apresentado em uma orientação espacial diferente, ou se é diferente. Usando a medida clássica do Tem po de Reação como um indicador dos processos mentais em atuação, Shephard demonstrou que o tempo antes da decisão varia em função do ângulo de rotação, quer dizer, 0 tamanho, em graus de arco, da modificação imposta a A para fazê-lo aparecer como B. Isso é tomado como evidência de que os sujeitos humanos ope ram sobre representações mentais de forma semelhante como operam sobre objetos diretam ente pe rceb idos.64 Isso deve ser considerado processo cognitivo superior, específico de humanos? Resultados obtidos com pombos testemunham 0 contrário. No laboratório de Delius, na Alemanha, pombos foram submetidos a uma tarefa sim ilar à do teste de rotação m ental de She ph ard;65 seu desempen ho foi m elhor que o dos humanos (Figura 3.6). Este é apenas mais um exemplo da eficiência dos procedimentos do laboratório animal delineados por Skinner para responder a questões criadas para a especificidade humana das atividades cognitivas ampla mente exploradas pela psicologia contemporânea, mostrando a contribuição dos 62
Shephard & Cooper (1981).
6}
Id. ibid.
64 Os resultados de Shephard tamb ém foram a ocasião para um debate entre duas interpretações opostas , preposic ional ivrsus icônica, dos mecanismos envolvidos; um debate que não precisa nos tomar agora. 65
Hollard & Delius (1981).
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procedimentos para importantes questões de psicologia comparativa e, portanto, também da psicologia geral.
Figura 3 .6 Rotação de imagens mentais em pombos. Superior, à esquerda: desenho do dis positivo experimental mostrando um pombo na câmara de condicionamento, que é equipada com um dispensador de comida e três discos de resposta nos quais os estímulos podem ser projetados a partir de um projetor posicionado atrás (A). Um computador (B) controla a apresentação dos estímulos e todas as outras operações experimentais. Inferior, à esquerda: amostras de estímulos utilizados, em posição normal e após uma rotação de 45o ou 180o, como submetidos para reconhecimento de similaridade ou diferença. A direita: resultados compa rados entre pombos (P) e humanos (H), expressos em Tempo de Reação (ordenada) como função do ângulo de rotação.“
R e l ó g i o s i n t e r n o s
Como um último exemplo, vamos entrar num campo que progrediu imensa mente desde o desenvolvimento das técnicas operantes, a psicologia do tempo. A adaptação dos organismos vivos ao tempo e, especificamente, a eventos periódicos tem sido observada há séculos, mas o estudo científico desses fenômen os, sob o rótu lo de cronobiologia, lentamente ganhou reconhecimento. Os ritmos circadianos do nosso corpo são agora familiares a todos nós: mu itos de nós tiveram a oportun idade de experimentar seus romp imen tos por causa de viagens de avião ou de mudanças de turno de trabalho. A capacidade do organism o de se ajustar ao tempo, porém , não é limitada aos sincronizadores naturais, como a alternância entre dia e noite: ela é,
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B. F. S k i h v e k :
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im a p er s p ec t i v a ei . r o p e ia
de fato, excessivamente flexível e se estende a quaisquer regularidades temporais que possam ocorrer no seu ambiente e à discriminação refinada da duração dos eventos externos bem como das atividades do próprio organismo. Embora ela seja intuitivamente conhecida da experiência humana, essa capa cidade de lidar com o tempo foi muito pouco explorada, com exceção de poucos estudos clássicos com humanos de estimativa do tempo, que foram contaminados, infelizmente , pe lo uso qu e os sujeitos inevitavelmente fazem de recursos cronométricos - por exemp lo, não podiam impe dir que contassem silenciosamente ao estimar a duração em segundos. Animais estão presumivelmente livres de tais transferências tecnológicas —embora eles recorram a truques de certa forma semelhantes, como agora nós sabemos - e são, portan to, sujeitos melhores para se estudar processos básicos de regulações temporais do comportamento. Ap esar de alg uns expe rim en tos pione iros no labo ratório de Pavlov, faltavam ferramentas eficientes para tal estudo, infelizmente, até que procedimentos operan tes fossem desenvolvidos, e sua automatização melhorada. O próprio Skinner estava interessado no efeito de uma de suas escalas de reforçamento, na qual a comida es tava disponível de acordo com uma periodicidade fixa, como descrevemos anterior mente. Ele descreveu em detalhes, em seu primeiro livro,67 como o responder de um rato é determinado pelo evento reforçador periódico, produzindo uma alternância de períodos de pausa e atividade, que pode ser vista como uma regulação temporal espontânea,68 sendo que espontâneo aqui significa que n ão é exigido enqua nto uma condição para o reforçamento. Ele mais tarde descreveu contingências nas quais o sujeito tem que ritmar as suas respostas para ser reforçado: neste caso, ele tem, de fato, que estimar um atraso mínimo implementado e, portanto, em seu próprio com portam ento m otor. Baseando-se nesse trabalho inicial, outros experimentadores planejaram procedimentos progressivamente refinados, que permitem um acesso preciso à capacidade de um animal de mensurar o tempo de sua própria atividade ou de estimar a duração de estímulos externos. Espécies foram comparadas na busca de se ordenarem as diferenças em relação à competência na estimativa do tempo. Várias un idades de resposta foram testadas na mesma espécie ou no mesmo in diví duo com o objetivo de se checar a situação mais “legítima da espécie” em relação à competência de estimativa do tempo. Estudos sobre desenvolvimento foram imple mentados em sujeitos muito velhos ou muito novos. Modelos matemáticos foram elaborados para explicar as peculiaridades das performances observadas e, em alguns casos, eles foram comp arados aos m odelos aplicados aos ritmos biológicos. Relações
67 The behãvior o f organhms ( S k i n n e r , 1938), capítulo 4. intitulado “ Recondidon amen to periódico”. 68 Utilizam os a expressão regulações temporais, em francês règuhitians tempnrelles, de 1962, para nomear ajustes comp ortamcntais ao tempo e 2 duração, seja em relação a eventos externos, como na estimativa da duração de eventos externos, seja em relação jo comportamento do próprio sujeito, como nos exemplos dados aqui. Para uma leitura mais aprofundada nessa área. ver Richelle & Lejeune (1980).
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com os últimos foram exploradas, com a questão básica em mente: o relógio inter no é comum aos ritmos biológicos e às regulações temporais adquiridas? Huma nos e animais foram comparados, levando à descoberta de que o desenvolvimento cognitivo e a linguagem trazem novas variáveis que mudam as propriedades das regulações temporais. Por exemplo, enquanto as crianças se comportam de forma muito semelhante aos animais sob contingências periódicas {a escala anteriormente definida como Intervalo Fixo), aquelas crianças que já desenvolveram a linguagem e os adultos exibem padrões diferentes, provavelmente baseados em sua interpretação implícita da situação como exigindo um responder sustentado (que está errado, mas que não reduz as chances de ser recompensado) ou se baseando em uma estimativa correta do tempo, que os humanos geralmente alcançam ao recorrer a alguma con tagem mental ou outro dispositivo cronométrico.69 Estes são apenas exemplos selecionados de inúmeras aplicações das técnicas operantes nas mais variadas áreas de estudo do comportamento, como é praticado hoje não apenas nos próprios laboratórios psicológicos, mas na pesquisa multidisci' plinar que envolve aspectos comportamentais, juntamente com outras dimensões, neurobiológica, farmacológica, toxicológica e assim por diante. A genialidade de Skinner ao planejar um procedimento experimental honestamente para um “pro pósito genérico” deve ser reconhecida por causa da pesquisa multifacetada que ele tornou possível.
F i g u r a 3 . 7 Performance e competência na estimativa do tempo. Quando obrigados a espaça
rem suas respostas por um atraso de 10 ou 15 segundos, pombos mostraram uma estimativa 69 Muitas das questões aludidas aqui são discutidas em Gibb on & Allan (1984), Michon & Jackson ({985), Blackman & Lejeune (1990) e Macar, Pouthas & Friedman (1992).
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do tempo muito pobre se a resposta era uma bicada no disco, mas eles foram muito melhores quando a resposta era pressionar o pedal e ainda melhores se a resposta era subir no poleiro. Os gráficos são construídos de modo a mostrar as frequências relativas de tempo entre respos tas em intervalos de tempo sucessivos, que sáo frações do atraso (na abscissa). A linha vertical C indica o valor crítico, isto é, o tempo mínimo que o pássaro precisa esperar para que uma resposta seja reforçada; não há nenhum limite superior neste caso. Uma boa estimativa do tempo é evidenciada por uma grande proporção de tempos entre respostas se aproximando ou ultrapassando o intervalo crítico. Os resultados são para um atraso crítico de 20 segundos, mas distribuições muito similares foram obtidas, como a resposta de subir no poleiro, para atrasos mais longos, acima de 60 e 70 segundos. O gráfico à esquerda é bimodal, com muicas respostas sendo emitidas logo após a anterior.70
70
Baseado em resultados de Lejeune em nosso laboratório.
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PARTE II S k in n e r e Pavlov, Fr
a t r a d iç ã o e u r o p e ia e u d
, Lo
r e n z e
P
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iaget
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A HERANÇA AMBÍGUA DE PAVLOV
U ma i n f e l i z e e q u i v o c a d a n o m e a ç ã o
O uso do mesmo termo condicionamento para designar o fenômeno comportamental envolvido no procedimento de Skinner e o tipo de associação descrita ante riormente por Pavlov teve consequências infelizes. Na linguagem leiga, e algumas vezes no uso que é feito pelos psicólogos, condicionamento evoca um tipo de aprendizagem muito simples e mecânica, possivelmente vigente nas atividades elementares dos ani mais, mas de pouca importância nas ações humanas. Ademais, ele possui a conotação de um controle forçado sobre o comportamento, o organismo se submetendo passi vamente à vontade do experimentador. Até mesmo se sente, com frequência, que o condicionamento é um fenômeno artificial, criado a partir da manipulação perversa do comportamento de animais por cientistas em seu laboratório, mas com pouca ou nenhuma relevância para a vida real. Tudo isso é igualmente aplicado ao condiciona mento pavloviano bem como ao condicionamento operante descrito por Skinner. E uma confusão séria, todavia, que requer algum esclarecimento, pois, para Skinner, condicionamento operante era algo totalmente diferente do condicionamento pavlo viano. Isto não quer dizer que as conotações da palavra, como resumidas aqui, se aplicam corretamente ao condicionamento pavloviano, mas que aquilo que Pavlov estudou pertence a um nível muito distinto e muito mais elementar do que aquilo que Skinner analisou. O modelo de Pavlov é bem conhecido a partir de seu experimento clássico so bre a reação salivar em cachorros. No procedimento utilizado por Pavlov, a salivação era transferida da comida, seu estímuío eliciador natural - ou estímulo incondicio nado - para o som de um sino, um evento inicialmente neutro em relação à saliva ção, levado ao final, por meio da associação, para o status de estímulo condicionado. Pavlov e seus colaboradores elaboraram aquele evento simples, em diversas direções: eles complexificaram a situação experimental introduzindo e combinando estímulos inibidores e excitatórios; exploraram as capacidades discriminatórias de seus su jeitos; induziram distúrbios, a então chamada neurose experimental, no processo de condicionamento ao manipular certos fatores; estenderam seu estudo inicial de associações com estímulos externos para o domínio da interocepção, a informação
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sensorial levada ao cérebro por meio de receptores viscerais; e até mesmo se voltaram para o nível da linguagem e investigaram as relações entre o que eles chamaram de Sistema de Segundo Sinal e o primeiro, limitado a estímulos não verbais e comuns a animais e humanos. Essa enumeração seletiva é suficiente para dar uma ideia da diversidade e com plexidade dos estudos pavlovianos de um fenômeno básico que exibe propriedades altamente dinâmicas. Q uan do observado com cuidado, o próprio condicionamen to pavloviano não aparece como elementar ou estereotipado, como poderia ser a visão popular. Também está claro que Pavlov nos proporcionou evidência abundante de que organismos humanos não escapam das leis do condicionamento. Entretanto, o processo que ele descreveu está basicamente vinculado a uma conexão fisiológica inicial, qual seja, a relação entre o estímulo incondicionado e a resposta que o segue - com ida e salivação, choqu e elétrico e retirada da perna, por exemplo. E, quan do a resposta é produzida pelo estímulo condicionado, ela permanece sem qualquer efeito, no sentido de que o experimentador decide se ela será ou não reforçada: isto é, se ela será ou não seguida pela apresentação do estímulo incondicionado. Daí, talvez, a ideia de que condicionamento significa submissão à vontade ou capricho de algum agente externo. Esses são precisamente os pontos que estabelecem os fatores diferenciados do condicionamento operante. Se compararmos a liberação da comida como um reforçador na situação operante com o estímulo incondicionado pavloviano, deveremos notar uma importante diferença: ele não está vinculado, antes de passar por qual quer condicionamento, à resposta operante. Comida não produz pressão à barra em ratos. E, ainda mais crucial, o agente que produz o reforçador é o sujeito (ao emitir a resposta), não o experimentador, que é apenas responsável por ter arranjado as contingências. Ao contrário do sujeito de um experimento pavloviano, o organismo em uma situação operante não é passivo: ele desempenha uma parte essencial na interação com o ambiente.
A l g u m a s e sp e c u l a ç õ e s h i s t ó r i c a s
Como é que, dadas essas diferenças básicas, o mesmo termo condicionamento foi utilizado? E por que reclamar sobre uma confusão da qual o próprio Skinner pa rece ser responsável, tendo a dotado u m rótulo que quase inevitavelm ente produziria isso? Essas são questões históricas sensatas. Parte da resposta pode ser encontrada no modo como a psicologia americana assimilou o trabalho de Pavlov e parte no contexto do trabalho inicial de Skinner. Embora não fosse psicólogo —ele sempre viu seu próprio trabalho como o trabalho de um fisiologista, estudando funções cerebrais, depois de ter estudado
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as funções do trato digestivo
Pavlov foi adotado pelo behaviorismo americano porque ele forneceu uma demonstração da viabilidade de um estudo objetivo dos eventos comportamentais. Entretanto, ele não os distraiu de sua preferência pela aprendizagem motora, um modelo mais relevante para a aprendizagem humana em geral do que o estudo de reações autonômicas. Este campo muito ativo da apren dizagem estava amplamente baseado em estudos de aprendizagem instrumental, utilizando extensivamente a técnica popular do labirinto. Um fundamento teórico muito importante foi fornecido pela Lei do Efeito, formulada por Thorndike; a lei afirmava que aqueles comportamentos seguidos de sucesso tenderiam a ser estam pados no repertório de um organismo, enquanto aqueles seguidos por falha sairiam do repertório. Isso antecipou a formulação mais concisa de que o comportamento é controlado por suas consequências. Skinner, é claro, reconheceu a relação. Quando encontrou o trabalho de Thorndike, em que gatos aprendiam a abrir o ferrolho de sua caixa [“puzzle box"] em que estavam presos, Pavlov o assimilou imediatamente ao seu próprio modelo de condicionamento.71 Como ele não tinha o estímulo incondicionado à mão, ele apelou para um “reflexo de liberdade”, uma expressão que seria substituída hoje pela noção de “fuga de resposta” . Ele não notou que o sucesso do gato estava inteiramente na própria ação do gato, uma característica não presente em seus cachorros, e sobre a qual Skinner fundaria mais tarde sua distin ção entre condicionamento pavloviano ou respondente e condicionamento operante. Considerando que o conceito de aprendizagem instrumental já havia sido forja do e utilizado para designar um processo diferente do condicionamento pavloviano, por que Skinner simplesmente não se apropriou dele ao invés de forjar seu próprio termo? Primeiro, Skinner, como ele mesmo confessa,72 estava muito impressionado e foi influenciado pelo livro de Pavlov sobre Conditioned reflexes7i e inicialmente chamou a pressão à barra de seus ratos de reflexo. Segundo, o problema com o qual ele estava lidando tinha sido cultivado entre os pesquisadores que trabalhavam nas linhas de Pavlov mais ou menos ao mesmo tempo. M iller & Konorski74 descreveram um tipo de condicionamento de certa forma diferente do tipo pavloviano tradicio nal: um choque produzia uma flexão da perna, que era seguida por comida; depois a flexão aparecia sem qualquer choque. Essa foi a ocasião para Skinner escrever seu artigo fundamental, em que ele explicitamente afirmou pela primeira vez a distinção entre o condicionamento pavloviano (chamado do tipo S) e o operante (ou tipo R). Terceiro, ele não estava satisfeito com a pesquisa implementada na maior parte dos laboratórios americanos: para ele, labirintos pareciam fornecer poucos resultados 71 Pavlov discutiu o trabalho de Thorndike em uma desuas conversas de quarta-fe ira,especificamente em 5 de dezembro de 1934 (Pa v l o v , 1954, p. 604). 72
Ver “ Pavlov's influence on psychology in America”, em Upon further reflection(Sk inn er, [987b, p.189).
7}
Pavlov (1927).
74 Miller & Konorski (1918).
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regulares em relação à energia despendida, e a teoria lhe parecia infundada.75 Daí sua relutância em enquadrar sua genuína contribuição dentro do contexto do típico laboratório de aprendizagem americano da época. Deve haver outras explicações, mas sejam quais forem suas razões, Skinner forjou a expressão condicionamento operante. Ele a utilizou extensivamente em seus textos, de modo que se tornou um termo técnico finalmente adotado universalmen te onde quer que a técnica de Skinner e seus conceitos relacionados sejam citados. Inútil especular sobre o modo como suas ideias teriam sido recebidas caso ele tivesse utilizado outro termo que tivesse marcado o contraste com o reflexo condicionado de Pavlov, não recorrendo à mesma palavra com uma qualificação, mas recorrendo a um termo ou expressão totalmente distinta. De fato, em muitas ocorrências, em tex tos seus e de outros, o termo condicionamento foi abandonado, deixando o operante em uma forma substantiva. Contudo, isso não mudou a visão popular associada ao rótulo condicionamento.
Ester eot
ip i a OPERANTE
Tal persistência não pode ser exclusivamente devida à nomeação original equivocada. Quem visitava um laboratório operante tradicional, especialmente no primeiro ano quando a técnica foi desenvolvida, ficava chocado com a atividade aparentemente compulsiva dos pombos e ratos nos seus cubículos experimentais, frequentemente emitindo suas respostas por horas e a taxas muito altas. Podia-se ter facilmente classificado tal comportamento como estereotipado e relacioná-lo a alguns fatores de coação do ambiente experimental, o que significa, afinal de contas, coação controlada pelo poderoso experimentador. Podemos ignorar a imagem do cientista todo poderoso que abusa de seus sujeitos: claramente, qualquer trabalho experimental envolve um exercício de poder sobre a natureza em vista de um melhor entendimento, mas esse poder é apenas percebido e criticado quando é exercido sobre organismos vivos, especialmente no reino do comportamento. Entretanto, a impressão de estereotipia foi baseada em características objetivas da situação. A decisão de Skinner, quando delineando seu procedimento, foi utilizar uma resposta motora muito simples, facilmente definida no espaço e no tempo, e portanto facil mente contada. Isso permitiu uma medida da taxa de respostas às custas da com plexidade estrutural, que é geralmente fonte de fascinação quando observamos o comportamento, seja animal ou humano. Um pássaro construindo seu ninho, uma aranha tecendo sua teia, uma ovelha cuidando de seu cordeirinho são, sem dúvida,
75 Vcr a revi sio criiica qu c Skinner fez do livro de Hu ll [.194'?; e seu himoso artigo “Arc theories of learning necessary?" (1950), anihos rcpublicados no Cumulative record (Skin n f.r.
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mais atrativos do que um rato pressionando a mesma barra centenas de vezes. Que algo foi perdido por causa dessa escolha é óbvio, e veremos quando discutirmos a relação entre Skinner e a tradição etológica (capítulo 6). Mas tais limitações deliberadas são cursos comuns de ação na ciência que ofe recem a possibilidade de analisar, em um contexto admitidamente simplificado, processos básicos que poderiam ser mascarados peia diversidade e complexidade das coisas conforme elas se apresentam à observação direta. A hipótese de trabalho de Skinner era que um mecanismo básico poderia explicar, no nível individual, a emergência e manutenção do comportamento, apesar de complexo; exatamente como um processo geral, baseado na seleção entre variações, explica a emergência da variedade de formas vivas ao longo da evolução biológica. Se essa hipótese foi completamente confirmada é uma outra história. O que é certo é que produziu novos e importantes resultados. A escolha da taxa de um a resposta simples teve um a consequência técnica im portante, a menos que o que tomamos como consequência pudesse ter sido a fonte da própria escolha. Uma resposta motora simples permite um registro automático fácil, e foi combinada com eventos reforçadores simples para o controle online au tomático do experimento. Se isso foi a consequência ou a fonte da escolha é uma questão que pode ser feita quando lemos a explicação do próprio Skinner a respeito da elaboração de sua técnica/6Ele nos conta como, trabalhando em reações espan tosamente simples utilizando um túnel unidirecional, calculou como iria se poupar de ter que manipular o rato para o colocar de volta no início, andando de uma ponta da comprida mesa até a outra ponta. Passo a passo, ele acabou automatizando tudo e inventou uma primeira versão mecânica do que se tornaria um registrador cumulativo, que foi utilizado por anos nos laboratórios operantes. Skinner estava sempre preocupado com eficiência e nunca parou de construir instrumentos acessórios geniais para resolver melhor os problemas práticos, seja no laboratório ou na vida diária. O babycrib é um exemplo, como foram os vários dispositivos que ele delineou em seus últimos anos e que estão descritos em Enjoy oldage.77 A automatização da câmara operante foi facilitada mais tarde pelos avanços tecnológicos: dos dispositivos puramente mecânicos, Skinner passou para circuitos de relé eletromecânicos, que mais tarde foram substituídos por controles de compu tador online. O alto grau de automatização já alcançado nos anos 1950 e 1960 não era comum, naqueles dias, em laboratórios de psicologia. A tendência natural, quan do alguém possui uma ferramenta eficiente disponível, é utilizá-la intensivamente. Foi o que Skinner e seus seguidores fizeram. Encorajados por seu equipamento, eles exploraram uma ampla variedade de contingências de reforçamento, enfatizando 76
“A case history in scientific method ” (1956). reimpresso no Cumulative record (id.. 1972).
-7
Skinner & Vaughan (1983).
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o controle ambiental sobre o comportamento. Em um processo tipicamente baseado na relação dialética entre variação e seleção, eles prestaram atenção quase exclusiva ao aspecto seletivo, às custas do outro aspecto, a variação. Uma consequência foi que eles estudaram essencialmente o que era chamado de estado estável: isto é, o compor tamento como é mantido por longos períodos de tempo, uma vez que o organismo o adqu iriu e se adaptou às contingências de controle. A fase de aprendizagem p ropria mente foi negligenciada, em que a variação no comportamento pode ser observada e analisada, como é impressionantemente óbvio na modelagem, a fase inicial de um experimento de condicionamento, na qual o experimentador cuidadosamente ob serva o sujeito e o reforça por com portam entos que progressivamente se aproximam da resposta desejada. Variação é, evidentemente, muito mais difícil de ser tratada e não é de se estranhar que ela tenha sido de certa forma negligenciada. Mas o fàto de ela ter sido negligenciada contribuiu para a ideia de que o comportamento ope rante é um tipo de condicionamento, se por essa palavra nos referimos a algum tipo de comportamento estereotipado estritamente forçado pelas variáveis ambientais. Se Skinner e seus colegas não tivessem se rendido às facilidades da experimentação automatizada e tivessem devotado ao menos algum tempo para estudar a segunda, não menos importante faceta do problema, o comportamento operante poderia ter aparecido aos observadores de uma perspectiva completamente diferente, mais pró ximo ao comportamento de resolução de problemas, à exploração e à criatividade do que ao condicionamento; uma perspectiva que é de fato a do próprio Skinner em suas últimas análises teóricas. De certo modo, há um divórcio entre o que foi feito na maior parte dos laboratórios operantes nos anos 1950 e 1960 e as ideias desenvolvidas por Skinner a partir do início dos anos 1950, como a analogia evolucionária aplicada ao comportamento operante (ver capítulos 6, 7 e 8). Uma possível fonte importante de frequentes interpretações equivocadas da contribu ição de S kinn er e de críticas direcionadas a ela poderia ser o fato de qu e ela foi avaliada com base nos experimentos daquele período ao invés de ter sido avaliada com base em seus textos teóricos. O que apareceu como uma oportunidade para a maior parte dos jovens experimentadores da área, e que de fato foi uma oportuni dade no nível técnico, pode muito bem ter sido a maior desgraça para o destino das ideias de Skinner no reino da psicologia como um todo.
V a r ia b il id a d e
O procedimento operante pode ser utilizado para explorar a outra, não menos importante, parte do processo de aprendizagem: a variação comportamental. Em bora muito poucos experimentadores tenham se engajado naquele tipo de trabalho até o final dos anos 1970, cada vez mais experimentadores o têm feito no passado
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recente.78 Um a situação experimen tal típica pode ser ilustrada com o segue. A ideia geraJ é fornecer uma demonstração da variabilidade comportamental. Suponha que você vive em um a cidade mod erna perfeita mente desenhada como um padrão de grade das ruas, com o apresentado na Figura 4.1. Você m ora na esquina do quarteirão A i e trabalha em um escritório em D 4 - as letras iden tificam as ruas no sentido Norte-Sul e os números, o eixo Leste-Oeste.
F i g u r a 4 . 1 Caminhada diária para seu escritório: fixa ou flexível?
Você pode ir por vários caminhos diferentes (de fato, 20, se excluirmos desvios que fariam a caminh ada ficar mais longa). Suponham os que eles sejam todos estrita mente equivalentes, que nen hum a rua é mais atrativa que outra. Você faria o mesmo percurso todos os dias, ou mudaria ocasionalmente? Se mudar proporciona alguma vantagem fin al, você mudaria da rotina para a variedade? Essa simples situação é facilmente transposta para um arranjo de laboratório para sujeitos animais ou humanos. Um labirinto que simula diretamente a confi guração da cidade poderia ser usado. Uma transposição na câmara operante seria, 78 Um artigo teórico de Staddon & Simmelhag (1971) foi fundamental para promover a pesquisa nessas linhas. Revisões e contribuições típicas podem ser encontradas em Boulanger et al. (1987) e Richelle (199J).
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todavia, uma solução mais simples e permitiria uma comparação mais fácil entre espécies, incluindo sujeitos humanos. Para esse fim, o padrão topográfico é trans ferido do espaço locomotor real para o espaço visual, como apresentado na Figura 4.2. Em uma das paredes da câmara, é apresentada ao sujeito uma matriz de bulbos elétricos (4x4, por exemplo). Duas barras ou discos de resposta são colocados na outra parede, junto com o dispensador de comida. No início de uma tentativa, o bulbo superior da esquerda é ligado. A tentativa é completada e reforçada quando o bulbo inferior direito estiver ligado. Apenas um bulbo é ligado por vez. Ao pres sionar a barra esquerda, o sujeito move o bulbo aceso um passo de cima para baixo; ao operar a barra da direita, ele o move um passo da esquerda para a direita. Um total de seis respostas, três em cada barra, em qualquer ordem, conseguirá terminar a tentativa. O sujeito usará sempre a mesma sequência de respostas, seguindo o mesmo caminho no labirinto visual? Se sim, sob quais condições ele exibirá varia bilidade na sua escolha? Ele poderia ser reforçado por variar, ou seja, por produzir sequências diferentes da anterior ou das anteriores? Tais questões foram colocadas em vários experimentos com animais e humanos (de modo a manter a motivação dos sujeitos humanos, a situação foi implementada numa tela de vídeo e dada uma animação adequada). Demonstrou-se, entre outras coisas, que, após exibir um certo nível de varia bilidade, os sujeitos ao final se deterão a um caminho, presumivelmente o modo mais econômico de se adaptar à situação. Se reforçado apenas intermitentemente, ao invés de a cada resposta da sequência, eles se tornarão mais variáveis, como é o caso também q uando o reforçamento é interrompido na cham ada extinção experimental. A variabilidade aumenta se ela é colocada como condição para o reforçam ento, e, em estudos de desenvolvimento em humanos, pode-se observar que a variabilidade, como considerada anteriormente, aumenta com a idade. Resultados típicos estão ilustrados na Figura 4.3. Esses são apenas exemplos do que pode ser feito para explo rar rigorosamente o aspecto negligenciado do processo de aprendizagem. Devemos retomar esses experimentos simples mais tarde, quando nos depararmos com a reso lução de problemas e a criatividade em humanos (capítulo 11).
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F i g u r a 4 . 2 , A matriz visual adap tada para explorar a varia bilida de œ m portam enta l em hu manos. A marriz é apresentada na tela da televisão e representa um prédio bancário com uma maleta de dólares visível na janela superior esquerda D. Para completar com sucesso uma tenta tiva, o sujeito tem que trazer a maleta até a janela inferior direita A, onde um guarda irá levá-la em segurança. Isso pode ser alcançado ao pressionar o botão esquerdo e o botão direito em qualquer ordem, o que leva a uma mudança de janela para a direita ou para baixo, respectiva mente. Há vinte sequências possíveis e equivalentes de três respostas no botão esquerdo e três no direito. Qualquer passo extra fora da matriz interrompe definitivamente a tentativa e um ladrão leva o dinheiro embora. É claro que toda a cena é animada e os sujeitos adoram!
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F i g u r a 4 . 3 Alg uns res ultados de um esrudo de dese nvo lv im en to sobre a var iabilidad e co mportamental utilizando a situação operante mostrada na Figura 4.2. Qu atro grupos separados por idade foram submetidos a uma situação na qual cada sequência correta era reforçada (Normal) e a uma situação na qual apenas aquelas sequências corretas que diferiam das duas anteriores eram recompensadas (Variabilidade). A variabilidade é medida em termos de número de sequências diferentes durante uma sessão. A: comparação entre a situação Normal e a de Variabilidade para sequências corretas e incorretas misturadas. B: compara ção entre sequências corretas e incorretas na situação Normal. C: o mesmo na situação de Var iabilid ad e. Contingências vigentes nas sessões de Var ia bilid ad e in duze m a va riab ilid ad e comp ortamental, cujo grau varia em função da idade.79
Um o u
d o is t ip o s d e c o n d i c i o n a m e n t o
:
a l g u m a s a d v e r t ê n c i a s a d ic i o n a is
A explicação mencionada sugere que o condicionamento operante foi mal nomeado e que ele poderia ter sido mais apropriadamente apresentado como um modelo básico para lidar com condições ambientais, um modelo de resolução de problemas ativo. Alguns especialistas seriam fortemente contra essa interpretação. Eles argumentariam que ambos os tipos de condicionamento, respondente e ope rante (tipo S e tipo R na nomenclatura inicial dada por Skinner; Tipo I e Tipo II após um uso posterior estabelecido entre especialistas da aprendizagem; pavloviano e skinneriano, se a preferência é pelos nomes próprios), são tradicionalmente tratados sob o mesmo cabeçalho nos livros de psicologia científica que tratam do processo de aprendizagem. Além disso, argumentariam que ambos os tipos têm muitas coisas em comum e alguns deles iriam tão longe a ponto de negar a legitimidade da distin ção feita e enfatizada por Skinner. De fato, em um importante ramo da psicologia 79
Resultados retirados de uma tese de doutorado não publicada de Bou kn ger {1990).
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contemporânea da aprendizagem, foram desenvolvidas teorias que reduzem ambos os tipos de condicionamento a um único processo básico, na maior parte dos casos mais próximo do mecanismo pavloviano do que do operante. Parte dessas visões está relacionada à abordagem cognitivista da aprendizagem. Aqui náo é lugar para se discutir essa questão, que nos levaria muito além de uma introdução geral às ideias de Skinner e nos exigiria uma explicação detalhada do fundamento teórico e da evidência empírica dispo nív el Isso não pode ser feito de uma man eira concisa e não técnica. De fato, essa questão não importa, pois tem pouca relevância para nosso entendimento a respeito da posição de Skinner. Ele pode ter errado, se analisado à luz do interesse contemporâneo, ao insistir na distinção entre o condicionamento pavloviano e o comportamento operante. O que importa é que ele a fez e construiu sobre ela sua teoria do comportamento e sua visão da sociedade humana. Em resumo, o lugar de Pavlov no trabalho de Skinner é ambíguo. Pavlov é devidamente reconhecido como um pioneiro na abordagem experimental do com portamento; seu condicionamento é frequentemente mencionado, mas sempre apenas para enfatizar a diferença em relação ao condicionamento operante. Ape sar dessa insistência, talvez por causa do uso do termo comum condicionamento e por causa da predileção dos experimentadores pelos efeitos mais estereotipados das contingências, o comportamento operante tem sido visto como nada além de condicionamento, com todas as conotações negativas da palavra. Uma avaliação correta do conceito de comportamento operante, entretanto, torna claro que ele é mais próximo da dinâmica do comportamento exploratório e criativo do que da monotonia das reações automáticas e repetitivas.
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5 FREUD NOS TEXTOS DE SKINNER
F ig u r
a s in e spe r a d a s
A posição de Skinner em relação a Freud e à psicanálise é de particular interesse por várias razóes. Primeiro» ele é conhecido como uma das figuras influentes no campo da terapia do comportamento, uma alternativa à abordagem freudiana dos distúrbios psicológicos, baseada em teorias sobre sua natureza e sua origem radical mente diferentes das visões de Freud e em práticas diametralmen te opostas em quase todos os aspectos. Segundo, a posição de Skinner, dentro da escola behaviorista de pensamento e em relação ao movimento psicanalítico, é diferente da dos outros behavioristas de seu tempo. Hull, o mais proeminente deles, e seus colegas da Uni versidade de Yale se engajaram ativam ente na tentativa de integrar análise freudiana e teoria da aprendizagem. Reuniões regulares do grupo de Yale ocorreram nos anos 1930 e 1940; membros do grupo acabariam por se submeter à psicanálise, alguns deles viajando à Europa para esse fim. Tais esforços se refletiram em várias publicações de significância histórica.80 Skinner não era membro daquele grupo —sua idade não é uma explicação suficiente —nem de nenhum outro. Ele levou seu trabalho inicial isoladamente em relação à escola neobehaviorista dominada por Hull e escreveu uma visão crítica muito negativa do último livro Principies o f behavior}1 Finalmente, até que ele se voltasse para extrapolações para o comportamento humano, começando com Walden Two e continuando com Science and human behavior, ele estava concentrado principal mente na pesquisa animal e estava pouco preparado, ou inclinado, à primeira vista, para escrever sobre as ideias de Freud. O mais surpreendente é que ele fez isso mais do que qualquer outro. Algumas estatísticas são relevantes aqui. Ignoraremos aqueles livros e artigos dedicados exclusivamente à pesquisa experimental com animais ou altamente re lacionados à questões técnicas ou teóricas e consideraremos aqueles livros e artigos
80 Entre outras, Frustration a nd agression (D o l l a r d et al., 1939) e Personality a nd psychotherapy: an analysis in terms o f learning, thinking and culture (D d l l a RO & M i l l e r , >950). 81
Skin ner (1944)-
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(geralmente reimpressos em forma de livro como artigos selecionados) que tratam do comportamento humano. Podemos praticamente ignorar o que Skinner publi cou entre 1930 e 1953, ano em que apareceu Science and human behavior. C o m e çando com esse importante volume, iremos nos deparar com uma ampla produção de textos sobre vários aspectos da psicologia humana, incluindo Verbal behavior, Contingencies o f reinforcement, Beyond freedom and dignity e os três volumes da au tobiografia. Confiando no índice, quando disponível, podemos contar o número de vezes que o no me de Freud aparece - ad iciona nd o, quan do ap ropriado , o número de entradas de psicanálise. Antes de nos voltarmos para as figuras, porém, um aviso é aconselhável: Skinner é um daqueles autores científicos que fazem muito poucas referências e citações. Portanto, deve-se comparar a quantidade de determinada re ferência em relação às outras. Parece que Freud é, de longe, o autor mais referenciado nos textos de Skinner. Em Science and human behavior, lhe são dadas náo menos que 15 entradas no índice, contra quatro de Thorndike, três de Darwin e Pavlov, duas de Descartes e Galton e apenas uma para muitos outros, incluindo Carl Rogers, William James e o próprio B. R Skinner! Em Verbal behavior, Freud é novamente o primeiro, com 18 entradas, Shakespeare em segundo, com 16, e outros favoritos como T. S. Eliot, A. Trollope ou B. Russell variando de cinco a dez. Encontramos algo muito semelhante em Contin gencies ofreinforcement, em que Freud aparece 17 vezes, enquan to a D arw in e Watson se faz referência seis vezes, seguidos por Lorenz, James, Pavlov, Rousseau e Marx, cada um sendo citado cinco vezes, e muitos outros - de Ch om sk y a Cervantes, de Baco n a Neisser - tendo escores mais baixos. Freud é ainda o vence dor no terceiro vo lu m e da autob iografia de Skinner, A matter of consequence^ (as duas primeiras não têm índice), e ele mantém uma honrosa, senão sempre primeira, posição nos volu mes mais recentes dos artigos selecionados —cujos tópicos provavelmente evocam menos o trabalho de Freud.
Um
tributo ao determinismo
E também às figuras. A frequência relativa de referências a Freud não revela simplesmente a obstinada op osição de Skin ner à psicanálise? E algo mais do que evi dência adicional da inescapável importância da teoria de Freud mesmo para aqueles que buscam dispensá-la? Uma olhada no tom e no conteúdo das passagens que se referem a Freud fornece uma resposta inesperada a essas questões. Vamos sumarizar as características gerais e examinar mais de perto algumas passagens como exemplos.
82
Id. (1983).
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Skinner faz uma avaliação distinta dos diferentes aspectos da contribuição de Freud. Dá-lhe crédito por ter mostrado de forma convincente que as causas do comportamento humano são geralmente inacessíveis à consciência do indivíduo e, consequentemente, que os relatos introspectivos não fornecem uma base segura para uma ciência do comportamento. Dá-lhe crédito também por sua ênfase, ao explicar a conduta atual, nas experiências e eventos da vida passada, frequentemente res ponsáveis por associações emocionais e muito mais importantes do que a crença no autocontrole emocional. Além disso, ele reconhece a qualidade das observações de Freud em relação a um número limitado de pacientes (Skinner, bem como Pavlov, Piaget, Lorenz e alguns outros poucos psicólogos criativos, nunca esteve interessado em acumular estatísticas de resultados de grupos) e seu talento em revelar relações entre eventos observados em contextos distantes (como ao fazer reaproximações en tre relações históricas e míticas, experiências cotidianas e sintomas patológicos). Por outro lado, Skinner é fortemente contra o uso de construtos internos, es pecialmente o aparato mental, como intermediários entre as variáveis originalmente vigentes e o comportamento ou sintoma observado. Para ele, Freud estava, naquele aspecto reconhecidamente mais importante de seu trabalho (e, sem dúvida, progres sivamente mais importante com a idade), trabalhando contra sua própria ambiçáo científica. Ele de fato contribuiu fortemente para o ressurgimento do mentalismo, que Skinner sempre considerou como o principal obstáculo para uma psicologia verdadeiramente científica. Embora nunca tenha tido acordo com esse ponto fun damental, a oposição de Skinner sempre foi expressa de um modo tranquilo e gentil, o qual utilizou mesmo ao discutir conceitos que se opunham aos seus próprios, em contraste com o tom agressivo adotado por muitos de seus oponentes: Chomsky foi um caso extremo nessa mistura de argumentos ad hominem com questões científi cas.8’ Essas diferentes avaliações dos vários aspectos do trabalho de Freud foram elencadas de modo conciso no artigo intitulado “A critique of psychoanalytic concepts and theory” .84 E uma leitura fundamental para aqueles que querem aprender sobre as atitudes de Skinner em relação a Freud. Ele é, em sua maior parte, dedicado à discussão crítica do aparato mental freudiano. Mas antes de se deter a essa discussão, Skinner rapidamente descreve o que a psicologia deve ao pai da psicanálise. Algumas poucas frases do parágrafo inicial merecem ser citadas:
83 Historiadores da psicologia da segunda metade do século XX não podem ignorar, além de sua inquestionável influência no campo da linguística e da psicolinguistica. o pape] desempenhado por Chomsky ao modelar o mapa sociológico da psicologia cognitiva. A esse respeito, seus ataques escritos a Skinner ( C h o m s k y , 1 9 5 9 . 1 9 7 2 ) são ilustrativos de uma mélange de genres muito diferente da troca racional de ideias entre cientistas. Para uma avaliação critica da famosa revisão de 1959. ver Richellc (1972, ou em inglês, 1976b). Ver capitulo 10 para mais desenvolvimentos sobre essa questão. 84
Publicado em Scientijic Monthly. novembro de 1954; reimpresso em CumuUtine recerd ( S k i n n e r , 1971, p. 239-248).
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Freud reduziu amplamente a esfera do acidente e do capri cho em nossas considerações sobre a condura humana. Seus achados a esse respeito parecem ainda mais impressionantes quando nos lembramos que ele nunca pôde apelar para pro vas quantitativas características de outras ciências. Ele venceu com completa persuasão - com a junção de instâncias e o delineamento de paralelos e analogias surpreendentes entre matérias aparentemente diversas,®5 Skinner não apenas admira os insights penetrantes e as reaproximaçôes criati vas, ele até mesmo o absolve, na discussão sobre mente e cérebro, de se entregar a exercícios especulativos, pois Freud estava convencid o de que o substrato neu rológi co da dinâm ica m ental e das entidades mentais seriam po r fim descobertos.86 Skinner repetidamente apontou a falha da psicologia em fornecer uma teoria consistenteda conduta hum ana que pudesse ser utilizada por outras ciências sociais e tornar aformulaçãoem um cam po traduzível e comp atível com as formulações em outros campos. Ele nota que: O estudante cujo comportam ento é assunto para o especialis ta em educação apresenta pouca semelhança com o Homem Econômico. O Animal Político Homem não é um paciente promissor na psicoterapia. Mas é o mesmo homem que está sendo estudado em todos esses campos, e deveria ser possível falar dele do mesmo modo. A Psicanálise chegou mais perto no sentido de suprir uma formulação comum, mas ela emergiu como uma forma de terapia e um toque de psicopatologia permanece quando ela é aplicada à vida diária. Apesar das afirmações em contrário, ela não contribuiu com uma teoria viável que fosse útil de forma geral.“7 Deixando um pouco de lado as reservas finais, que naturalmente levam à su gestão de que a análise experimental do comportamento é uma séria candidata para aquela finalidade, é no mínimo espantoso que a psicanálise seja apresentada como a que chegou mais perto de uma teoria unificada do homem. Poderia parecer que, aos olhos de Skinner, nenhum outro psicólogo, incluindo Watson, chegou “mais perto” do que Freud na elaboração de uma teoria consistente. Nenhum outro esteve, de Sj
Citado no Cumulative record (id., 1972, p. 239); reimpresso da publicado original de 1954 do Scientific Monthly.
86 “ Freud era livre para especular com grande liberdade, porque , enqua nto um determinista estrito, ele acreditava que o substrato fisiológico seria finalmente descoberto’’ (id., 1969b, p. 280). 87
Gritos meus. Retirado de Contingencies o f reinforcement , uma reimpressão de um artigo de 19 66 (id., 197 2. p. 96).
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fato, mais próximo da visão behaviorista de que os processos conscientes não são a chave para as leis do comportamento. Em um importante artigo, “Behaviorism at fifty” ,88 Skinner mais uma vez deu crédito a Freud por descartar a consciência e a introspecção como ferramenta eficiente de acesso aos processos mentais. Ao mesmo tempo em que estigmatizou Freud por ter inventado e nunca ter abandonado a fé em um dos mais elaborados aparatos mentais de todos os tempos. Não obstante, contribuiu para o argumento behaviorista ao mostrar que a atividade mental, ao menos, não requeria a consciência.99 Em um comentário sobre a questão do inconsciente, ele corretamente apontou para o fato de que o problema reaí não é o inconsciente, mas a emergência da cons ciência, “todo comportamento sendo basicamente inconsciente”.90 Ele vai adiante e nos lembra que o inconsciente de Freud não é simplesmente um estágio anterior à consciência, mas o produto de punição moral e social, um processo de repressão que Skinner reformula em termos de contingências de reforçamento (social e verbal) na comunidade cultural. Este é apenas um exemplo de uma transcrição frequente.
R e f o r m u l a n d o
m ec a n i s mo s f r e u d i a n o s
Uma grande parte das referências a Freud, especialmente no Science an d human behavior e no Verbal behavior , trata da reformulação dos conceitos e mecanismos freudianos em termos da análise experimental do comportamento. Isso segue a linha da tradição do grupo de Yale, embora não haja nenhuma evidência de que Skinner al guma vez tenha percebido as semelhanças da abordagem. Nenhum dos membros do Instituto de Relações Humanas é citado e parece plausível que Skinner simplesmente não tomou conhecimento do trabalho deles. De qualquer maneira, ele não perce beu seus próprios esforços teóricos de se vincular aos construtos de Hull, como sua crítica ao livro deste9Le outros comentários claramente testemunham. Este exercício é baseado na afirmação de que as observações feitas por Freud estavam basicamente corretas, embora suas interpretações teóricas pudessem estar erradas. Isso se aplica especialmente bem àqueles processos conhecidos como mecanismos de defesa, tais como deslocamento, formação reativa, racionalização e outros semelhantes. Skinner 88
Id. (1963).
89
Id. (1972 , p. 215).
90 D c uma nota - sobre Consciência - i reimpressão do “Behaviorism at fifty” em ContingenctíS o freinjhrceme»! (id. ibid ., p. 146). Sobre a visão de Skinner sobre consciência, ver Richelle (1974). 9(
Skinn er (1944).
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insiste na convergência entre sua própria análise da punição e o conceito freudiano de repressão. Ele sempre viu a punição como um modo pobre de controle do com portamento porque ela não reduz permanentemente a tendência para responder, o que está “de acordo com a descoberta de Freud a respeito da atividade que sobrevive daquilo que ele cham ou de desejos reprimidos” .91 Os efeitos da punição sobre o comportamento verbal, que resultam em fala disfarçada, deslocamento, lapsos de fala e de audição, chistes e outros, são quase sistematicamente discutidos em relação às observaçãopenetrantes de Freud. S kinner nota a convergência entre a análise de Freud dossímbolos e sua própria explicação da metáfora enquanto um m ecanismo especialmente imp ortante do comportam ento verbal.93 Ele apela novamente a Freud ao discutir o uso dos símbolos nos sonhos e ao procurar as variáveis, na experiência recente ou passada do sujeito, que são responsáveis por determinados símbolos: A tentativa de fazer isso é frequentemente chamada de inter pretação de sonhos. Freud poderia demonstrar certas relações plausíveis entre o sonho e as variáveis na vida do indivíduo.
A presente armlise está essencialmente de acordo com sua inter pretação.,94 Com o um amador em produção literária (ele gostava especialmente de ler auto res clássicos franceses, bem como ingleses, em seu texto originai), Skinner frequen temente apelou para ela, não apenas para ilustrar sua questão, mas para fornecer descrições e interpretações perspicazes da conduta humana nos numerosos casos em que a explicação científica ainda apresentava lacunas. Essa foi a ocasião para outras referências positivas ao trabalho de Freud. Ele dá crédito a Freud, por exemplo, por ter iniciado um dos dois movimentos que, na cultura Ocidental, desenvolveu uma tendência para a autodescrição, o outro sendo o movimento literário da autoanálise que culminou com Proust.9- Ele estava especialmente interessado na relação entre o trabalho literário e a psicologia do leitor, uma relação muito menos enfatizada tradi cionalmente do que os vínculos mais óbvios entre um trecho literário e a psicologia de seu autor. E le dá crédito a Freud novam ente por ter percebido aquela importante relação muito antes dos outros: “ Não era muito com um reconhecer, antes de Freud,
92
id. (1953, p. 184).
93ld. (1957, p. 92-99 c passim). 94 Os grifos são meus. Retirado de Science an d hum an behatnor (id., 1 953, p. 293). Ao ler a seção completa d i qual essa citação foi retirada, torna-se claro que efeitos distantes no tempo não criam qualquer problema na vLsão de Skinner dos processos de aprendizagem, o que significa que a história prévia, incluindo a história inicia] de um indivíduo, é crucial na explicação de seu comportamento presente. Se as práticas da terapia comportamental foram algumas vezes acusadas de negligenciar a história individual, isso não p ode ser atribuído à explicação de Skinner. 95
Id. (195 7, p. 386-388).
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que a relação entre um trabalho literário e o leitor é em parte do mesmo tipo [como a relação entre um trabalho literário e o escritor]” .96
A p a r a t o
mental
Esses exemplos serão suficientes para mostrar o lugar de Freud na obra de Skinner e o modo em geral positivo com que as contribuições do fundador da psicanálise são reconhecidas. Isso não quer dizer, conforme apontei anteriormente, que Skinner concorda com Freud em tudo. Os pontos de maior desacordo se referem às entidades mentais. As objeções de Skinner ao aparato mental de Freud foram elaboradas em detalhes naquelas partes de seus textos em que ele estabelece as bases para a terapia comportamental. E claro que as suas concepções das desordens mentais e das estra tégias mais efetivas de cura são radicalmente opostas. Entretanto, fundamental como pode ser, a oposição não se ampara em certas características da terapia comportamen tal tais como elas acabaram por se desenvolver nos mais variados ramos das modernas práticas psicológicas. Por exemplo, foco exclusivo no comportamento não verbal, negligência da história individual passada e o uso de controles aversivos não têm qualquer relação com a inspiração de Skinner.97 A essa altura, alguém pode perguntar: por que Skinner não provocou a con frontação que era típica do grupo de Yale? Por que ele não induziu os psicanalistas a perseguirem, com ele e seus colegas, o tipo de diálogo que se mostrou construtivo em torno de HulI? Esse ponto da história exigiria uma ampía investigação sobre aspectos pessoais, variáveis sociológicas e evolução dos campos em questão. Eu não levei a cabo tal investigação e posso apenas arriscar algumas sugestões. Embora Skinner tenha concordado, em várias ocasiões, em participar de debates com psicodinamistas*8ou psicoterapeutas de várias escolas, ele estava certamente mais motivado em trazer pessoas para trabalhar em sua própria linha do que em gastar tem po reconciliando pessoas com visões diferentes. Curiosamente, ele não era nem um pouco um líder de escola, como o eram Freud e Piaget - o que implica algum senso de exclusividade, certa intolerância a desvios e um fone desejo de estabelecer um núcleo permanente de devotos ao redor de alguém. A “escola skinneriana” que acabou por emergir não era tanto seu próprio produto, mas de seus estudantes e seguidores, que o tomaram como seu líder venerado. Esse movimento de autoafirmação, que tinha uma pesquisa básica e uma faceta aplicada, parou de dialogar com outros psicólogos 96 Retirado de Verbal behavior (ld. ibid., p. 173). É Importante notar que a essa relação não era dada muita atenção entre os experts em literatura, até a chamada escola da reception theory , que teve origem em Konstaiiz nos anos 1960. 97
Para discussão dessas questões, ver Richelle (1982, 1990 ).
98 Por exemplo, ele participou de um debate com F. Alexander em uma reunião sobre Integração das abordagens sobre doença meneai, cujas medida s foram editada s por K r use em 195 7. Ver Cumulative record, capítulo 16 (Skinner, 1972).
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ao dar uma série de passos que resultaram em isolamento (fundando novas revistas estritamente focadas, inaugurando uma divisão separada na Associação de Psicologia Americana, organizando reuniões especializadas, etc.). Observado de fora, o chamado movimento da análise experimental do comportamento aparecia como um grupo fechado, cujos membros tinham a fama de não gostar muito de interagir com ou tros psicólogos. Esta cumplicidade possivelmente não intencional entre Skinner e os skinnerianos deve, infelizmente, ter dissuadido os outros de se engajarem em intera ções com o próprio Skinner ou de examinar diretamente seus textos sobre questões relevantes. Parte do potencial essencial de seu trabalho deve ter sido perdida dessa forma. Não seria a primeira vez na história, e na história intelectual, que os discípulos dificultam a mensagem do mestre. E justo notar, por outro lado, que a psicanálise evoluiu de um modo que náo favoreceu, de forma geral, confrontação científica. Ela não apenas se dividiu em vá rias escolas que eram mais ou menos hostis um a às outras - um sinal de dificuldad e clara de se chegar a um acordo sobre critérios objetivos de validade científica -, mas também os discursos psicanalíticos se tornaram cada vez mais esotéricos, desenco rajando os não iniciados a olhar para possíveis convergências com outras descrições e interpretações.99 Em muitos casos, os psicanalistas explicitam ente desistiram da ambição inicial de Freud de explicar a conduta humana em termos científicos. Não é de se espantar, portanto, que psicólogos os quais, como Skinner, prestam homena gem ao trabalho de Freud não encontrem nenhum respaldo.
COGNITIVISMO, MENTE E APARATO MENTAL N a visão de m uitos, este breve levantamento sobre Freud nos textos de Skinn er pode parecer sem nenhum interesse além do histórico, considerando que se diz que a psicologia contemporânea constrói sobre as ruínas, ao invés de sobre as fundações, do behaviorismo. Mesm o que alguém conceda sua parte na tendência dos psicólogos a fim de dramatizar a história de seu próprio campo e de experimentar progressos científicos como revoluções ao invés de evoluções, o behaviorismo admitidamente não é mais o ismo dominante na cena contemporânea. Ele foi suplantado pelo cognitivismo, a ponto de muitos psicólogos terem se tornado cientistas cognitivos, deixando a psicologia para o passado ou para praticantes não científicos.
99 O caráter hermético de alguns textos psicanalíticos mereceria estudo do ponto de vista da inteligibilidade. Um a estratégia possível consistiria em ter textos selecionados traduzidos para diferentes línguas, com vários graus de disrãncia linguistica do original, e traduzir de volta para a língua original. A openção poderia ser repetida várias vezes. O cxcrcído poderia tamhém envolver diferentes tradutores trabalhando sobre os mesmos textos. A hipótese prediria diferentes resultados finais para Freud, Lacan, W atson, Piaget, Skinner, etc.
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Na medida em que o b ehaviorismo foi rejeitado por causa de seus erros científi cos e substituído por uma abordagem supostamente mais apropriada para o entendi mento da mente humana, é importante perguntar qual a posição do cognitivismo em relação à psicanálise, Essa não é uma tarefe fácil, porque, não mais que o behaviorismo em sua época, o cognitivismo não abrange uma concepção unificada. Se quisermos caracterizá-lo, vamos nos deparar com diferenças que tornam necessário falar sobre cognitivismos ao invés de cognitivismo. Uma ampla gama de abordagens cognitivas floresceu no campo da terapia, frequentemente emergindo, de uma forma uma tanto paradoxal, a partir das próprias terapias comportamen tais, porém esses cognitivismos dificilmente podem ser tomados como psicologia científica dura. O cognitivismo no reino da pesquisa básica não oferece um quadro unitário. Em outro lugar, tentei colocar ordem na situação de certo modo confusa ao distinguir quatro facetas, ingredientes ou ramos principais nos cognitivismos atuais,'00 e devo revisá-las em detalhe no capítulo 9. Mas é apropriado resumir a classificação no presente contexto. O primeiro tipo de cognitivismo parece ter segui do a tradição da psicologia científica, com aprimoramentos nos métodos que agora permitem acesso a fenômenos até então inacessíveis, e mudanças na ênfase devidas à estimulação proveniente da metáfora e do modelo computacionais. O segundo tipo tem implicações epistemológicas muito mais profundas, pois redefine o objeto de estudo da psicologia como sendo a mente, ou as representações, ou alguma outra entidade ou entidades internas, ao invés do comportamento, como costumava ser o consenso ao longo de quase cem anos. O terceiro insiste no controle exercido por um nível superior, isto é, de processos cognitivos sobre camadas inferiores de orga nização psicológica, tais como as emoções. O último aponta para a distinção bem delineada frequentem ente feita, e refletida no treino dos psicólogo s e em sua prática, entre o reino da cognição, que mereceria interesse da parte daqueles engajados em pesquisa básica, e o domínio da emoção e do afeto, que seria o cotidiano daqueles que trabalham na prática de ajudar as pessoas. Para ser conciso, rotulei essas quatro variedades de cognitivismo: metodológico, epistemológico, ético e institucional. Cognitivismo metodológico não nos interessa aqui, mas os outros três tipos precisam de alguns comentários em relação à abordagem de Freud. A o mudar o objeto de estudo da psicologia do comportam ento para entida des internas, o cognitivismo epistemológico relegou o comportamento ao status de subproduto de agentes internos, com pouco interesse próprio, no máximo um indicador útil dos processos mentais e cognitivos até que métodos diretos sejam
loc Para uma apresentação mais detalhada sobre o pont o aludid o nesse parágrafo, ver Richelle (1986a, 1987b ). Para uma visão equilibrada da história do movimento cognidvista, Gardner (1985) é uma fonte acessível. Gardner dificilmente menciona Freud cm contextos substanciais, o que indica que o interesse de Freud no aparato mental não é visto como urri precursor do interesse atual na Mente. Gardner simplesmente ahrma no início de sua explicação que psicólogos científicos realmente não sabiam o quii razeicom as especulações de Freud e se voltaram para outras direções em busca dos mistérios da Mente humana.
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descobertos para analisá-los. Isso é perfeitamente compatível com o construto de Freud. O aparato mental ou psíquico tem exatamente as mesmas propriedades bási cas: náo é diretamente observável, mas pode ser inferido e seus mecanismos podem ser supostos por meio de eventos externos —os sintomas possuindo o mesmo status na teoria de Freud que os comportamentos na concepção de alguns cognitivistas epistem ológicos.“ 1 Não há dúvid a de que, nesse aspecto, o cogn itivismo está mais próximo da psicanálise que o behaviorismo.
C o g n i ç ã o o u l i bi d o
Apelar para processos ou aparatos mentais também significa retomar o sujeito interno como fonte ou causa de sua conduta. Enquanto o aparato mental freudiano está preenchido com impulsos, afetos, desejos, símbolos de origem emocional e ten sões e conflitos de todos os tipos, o homem interno do cognitivismo epistemológico é mais do que um expert em resolução de problemas. Com um passo adicional para o cognitivismo ético, é o homem racional que é retomado, com o poder da razão controlando o afeto, o poder da vontade determinando a decisão, o poder da cons ciência dominando o inconsciente, a mágica do conhecimento resolvendo a angús tia dos sentimentos e as complicações das paixões. Causalidade descendente, uma fórmula de autogratificação emprestada da neurobiologia, apropriadamente move o pêndulo de volta em direção à racionalidade, depois do excesso de monstros freudia nos e do cérebro de réptil de MacLean. Correção de exagero é parte da empreitada científica, mas falta avaliar quão adequada à realidade, ou quão ilusória, é a nova imagem do Homem. Em grande parte, as abordagens cognitivistas da psicoterapia que recorrem a mudanças conscientes da percepção do mundo e do conhecimento a respeito do que realmente acontece podem revelar uma confiança ingênua no poder da lógica nos assuntos humanos. Q uero ap ontar aqui a situação paradoxal do co gnitivism o em relação à tradição freudiana. Por um lado, ele concorda em dar prioridade ao aparato interno; por outro, ele diverge fortemente ao favorecer uma visão de homem como um ser ra cional que Freud amplamente contribuiu p ara demolir. D essa forma, nós podem os náo estar em melhor situação ao tentarmos uma síntese do que estávamos com o behaviorismo. Resta decidir se aquele aspecto em particular da psicologia moderna, i.e., o retorno à Mente, ao invés do comportamento, enquanto seu objeto de estudo, sobreviverá como um passo crucial em direção à construção de uma teoria consis tente do homem ou se revelará um acidente nos paradigmas. Como em relação ao retorno da racionalidade, infelizmente não há sinais de que os humanos estão iot
Mesm o daqueles que lidam com comportamento animal, como , por exemplo, Dickinson (1980).
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livres da causalidade ascendente. A mensagem de Freud sobre a civilização e seu descontentamento, respaldada peta análise pessimista de Skinner das práticas sociais vigentes (ver capítulos 14 e 15), ainda são leituras recomendáveis.
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6 SKINNER E A TRADIÇÃO ETOLÓGICA
Sobre ratos e homens
A maior parte do trabalho empírico implem entado por Skinner foi com animais e, à medida que ele nos forneceu resultados regulares, pode ser visto como uma con tribuição para o estudo do comportamento animal, mesmo por aqueles que não estão prontos para aceitar sua extrapolação para humanos. Mas pesquisas com animais no laboratório são frequentemente rejeitadas como irrelevantes por estudantes do com portamento animal na tradição da etologia, com o argumento de que situações expe rimentais colocam restrições artificiais nos sujeitos animais, impedindo a expressão de seu repertório real, natural, observável apenas em campo, isto é, em seu ambiente normal, ou nicho ecológico. Se à pesquisa de Skinner é rejeitada qualquer validade fora do laboratório animal no nível da psicologia humana, e, ao mesmo tempo, qual quer validade enquanto contribuição para estudo de animais precisamente porque foi realizada em laboratório, o que resta de seu trabalho experimental? A questão não pode ser respondida sem antes situarmos o trabalho de Skinner em seu contexto histórico, o que significa, neste caso, a evolução das relações entre a psicologia Am ericana de laboratório e a tradição etológica, principalmente de origem europeia. Dev emos primeiro lembrar que a utilização de animais no laboratório comportamental, como era comum na primeira metade do século XX, não visava essen cialmente a estudar o comportamento de uma espécie por si mesmo: ratos não eram utilizados por causa de qualquer interesse especial no modo como os ratos se compor tam. Eles eram usados como uma ferramenta, ou como um modelo, como diríamos hoje, para delinear leis gerais aplicáveis a qualquer espécie, embora humanos sejam, é claro, o maior interesse dos psicólogos. Seu quadro de referência era psicologia geral, ao invés de comparativa. Isso não era fortemente questionado, dado que a fisiologia havia adotado a mesma estratégia. A consciência das diferenças entre as espécies não era ausente: a psicologia comparativa existia, bem como a fisiologia comparativa. Mas a psicologia comparativa na tradição americana era essencialmente limitada à abor dagem experimental de laboratório e, de qualquer modo, não era a preocupação dos psicólogos da aprendizagem, de Thorndike a Tolman, ou de Hull a Skinner.
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Comparando os dados que ele obteve com seu novo procedimento com aque les coletados em estudos em labirinto, Skinner pensava que ele havia ganho em potencial de generalização, portanto, em validade ao estendê-los a humanos. Ne nhum equivalente real de um labirinto fora delineado para humanos, enquanto os padróes na taxa de respostas sob vários esquemas de reforçamento provaram ser extraordinariamente similares entre as espécies, incluindo a humana. O número e a variedade das espécies eram muito lim itados, quando comparados com a diversida de zoológica: ratos, pom bos e macacos permanecem como as principais referências. Porém Skinner poderia reivindicar, com base em evidência experimental, que esses se comportavam do mesmo modo, assim como os humanos, ao justapor os registros cumulativos de sujeitos individuais pertencentes àquelas várias espécies e perguntar “qual é qual?” . O conceito de generalidade entre espécies foi, infelizmente, de algum modo vinculado à noção da arbitrariedade da resposta operante. Sk inner enfatizou que a resposta operante é arbitrária em oposição à relação permanente, estabelecida fisiologicamente, entre o estímulo incondicionado e a resposta incondicionada do condicionamento pavloviano, um pré-requisito para a formação de um reflexo con dicionado. Isso levou à ideia, possivelmente de algum modo no próprio Skinner, de que qualquer resposta pode servir como um operante, que todas as respostas que se podem imagin ar são equivalentes e, consequentem ente - se as diferenças entre es pécies são, para essa questão, irrelevantes que as leis do com portam ento operante transcendem singularidades específicas da espécie. Além disso, apesar de muitos pon tos divergentes com outros psicólogos da aprendizagem, Skinner permaneceu essencialmente na tradição do estudo do com portamento adquirido, como fora estabelecido nos EUA na primeira metade do século XX . A ênfase estava nos mecanismos de ap rendizagem sem qualquer refe rência ao desenvolvimento ou à herança genética inata. Os processos de aprendiza gem eram estudados em si e por si mesmos, com o resultado de variáveis amb ientais introduzidas a qualquer momento da vida de um indivíduo. Isso não significa que os psicólogos da aprendizagem eram ingênuos o b astante para pensar que os organis mos nascem sem quaisquer restrições genéticas, mas que os processos poderiam ser isolados de sua influência e avaliados, por assim dizer, em um estado puro.
Etol
o g ia : u m o u t r o o l h a r s o b r e o s a n im a is
Nenhuma posição poderia ter sido mais estranha à concepção defendida pela tradição etológica, fundamentada no trabalho paciente de observadores de ani mais que encontraram suas credenciais científicas nos anos 1930 e 1940 na Europa, especialmente por meio do trabalho empírico e teórico de Konrad Lorenz. Aqui
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o comportamento animal era estudado por si mesmo, por suas próprias qualifica ções; comportamento específico da espécie tinha atenção principal; e assumindo a antiga fascinação por instintos em animais, atividades filogeneticamente estabele cidas tinham prioridade sobre aprendizagem individual. A riqueza do repertório comportamental natural se equiparava à diversidade morfológica das espécies vivas e se poderia apenas observar onde ela geralmente ocorria: quer dizer, em campo, no sistema ecológico onde a espécie evoluiu e vive atualmente, e náo na situação reducionista do laboratório. Como regra, os processos comportamentais só pode riam ser entendidos por meio de uma análise de desenvolvimento no organismo em crescimento. Os etólogos, por anos, tiveram poucas interações com os psicólogos de labora tório. Geralmente eles eram membros de uma comunidade científica distinta, trei nados como zoólogos, em departamentos de biologia, e náo como psicólogos. Eles estudavam comportamento como parte da biologia e, seguindo Lorenz, pensavam sua ciência como a biologia do comportamento, ao invés de um trabalho propria mente psicológico. Com poucas exceções, eles eram praticamente ignorados pelos psicólogos que trabalhavam com animais no laboratório. E, reciprocamente, os etó logos raramente se deparavam com o trabalho dos psicólogos. Eles não publicavam nas mesmas revistas, não participavam das mesmas reuniões científicas e não liam os textos uns dos outros. Interações não ocorriam até os anos 1950 ou 1960, quando algumas tentativas foram feitas, especialmente na escola britânica, com Thorpe e outros, de fundir a contribuição da psicologia de laboratório comparativa e a abordagem etológica. Esse movimento não foi amplamente aceito; ele foi veementemente criticado por Loren z,102 que pro nunciou um tipo de excom unhão daqueles que estavam conta minando a ortodoxia etológica com elementos hereges das escolas de pensamento behavioristas. O behaviorismo foi por fim um de seus aivos em um ensaio não técni co sobre Os oito pecados capitais da civilização.1^ As coisas mu daram desde então, e o próprio Lorenz deve ser valorizado po r ter modificado sua visão após ter examin ado mais de perto a questão da aprendizagem. Embora ele nunca tenha desistido de insistir sobre a determinação genética, o comportamento específico da espécie (uma posição que os etólogos da geração seguinte abandonariam em troca de posições mais qualificadas, com o os fatores que mo delam o fenótipo), e apesar de ter mantido por muito tempo a visão paradoxal de que a aprendizagem é em si herdada (no sen tido de que o que um organismo aprende é exatamente o que é possibilitado por sua carga genética específica), ele assumiu por fim uma posição muito mais sofisticada, reconhecendo a importância do processo operante de Skinner e desenvolvendo a
102 Lorenz (1965). IOJ Id. (1973).
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noção de programas mais ou menos abertos (ou fechados) para a aprendizagem nas várias espécies. Sua obra principal, intitulada Os fundamentos da etologia ,ICMinclui uma análise do lugar da aprendizagem que é muito diferente se comparada com as visões expressas em seu trabalho inicial. Deve-se notar que a etologia ganhou uma audiência progressivamente ampla entre as ciências humanas bem como nos círculos biológicos, especialmente na psi cologia e na psiquiatria. Esta influência estava obviamente mais cedo na Europa que nos EU A 105 e, por fim, invadiu cam pos específicos, com o a psico logia infantil. O Prêmio No bel, dado em 1 972 a Lorenz e a dois outros etólogos europeus, trouxe seus trabalhos a público, e fenômenos como o imprinting e a dança das abelhas entraram na cultura leiga.
0 MAU COMPORTAMENTO DOS ORGANISMOS
Psicólogos americanos da tradição comportamental, incluindo Skinner, demo raram para prestar atenção às peculiaridades específicas da espécie. Eles finalmente o fizeram sob a influência de dois fatores: um externo e o outro interno ao seu campo. O fator externo era a influência crescente da literatura etológica e as objeçóes dos etólogos sobre o estudo de animais em laboratório, um aspecto da evolução há pou co descrita. Ao m esmo temp o - e este foi o fator interno - , experimentadores de laboratório se defrontaram com repertório específico da espécie em seus experimen tos que visavam a leis gerais, independentes de diferenças entre espécies. No laboratório operante, o evento crucial parece ter sido a descrição feita pelos Brelands da intrusão incontrolável de comportamento específico durante experi mentos de condicionamento, um fenômeno que eles chamaram de “tendência ins tintiva”. Os Brelands realizaram o condicionamento de várias espécies de animais domésticos e selvagens a serem apresentados em feiras e parques de entretenimento. Eles foram os primeiros a obterem sucesso, e de feto os pioneiros, em diversificar a amo stra de espécies subm etidas às técnicas operantes. Para fazer o sho w durar e satis fazer o público pagante, eles arranjavam as contingências no espaço e no tempo em um estilo de certa forma diferente quando comparado à configuração do laboratório normal. Por exemplo, eles treinaram porcos e guaxinins a buscar moedas em um canto de determinado espaço e levá-las até o canto oposto, onde deviam colocá-las em um tipo de “banco do porco”; depois que os animais tinham acumulado um certo núm ero de moedas, eles recebiam comida. Os animais de fato aprenderam sem
104 Id. (1981). 105 Co m o exemp lo, a etologia estava entre as tarefas obrigatórias de todos os estudantes dc psicologia na minha universidade (Liège. Bélgica) em 196 1. Ver também Richelle & Ruwet ( 1971)-
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qualquer dificuldade, porém, após terem desempenhado a tarefa de forma adequada por algum tempo, eles começaram a se engajar em comportamento indesejável, ao menos do ponto de vista dos treinadores. Os porcos começaram a se deter no cami nho, enterrar a moeda na areia e tirá-la com o focinho; os guaxinins começaram a passar muito tempo manipulando a moeda com seus movimentos bem conhecidos com os quais parecem estar lavando algo. Isso foi inicialmente divertido, mas por fim consumiu muito tempo e faria todo o show parecer muito ruim para o es pectador. Comercialmente, foi um desastre. Os Brelands, entretanto, perceberam o interesse científico no fenômeno e fizeram um estudo sistemático a respeito. Eles re lataram suas observações em um artigo,'06 com o título evocativo “The m isbehavior o f organisms” , uma alusão irônica ao primeiro livro de Skinner. A principal interpre tação deles era que comportamentos do repertório natural das espécies emergiam na situação de condicionamento e acabavam por ganhar tal extensão, que as atividades aprendidas, inicialmente modeladas e mantidas consistentemente, pareceriam errá ticas. Este fenômeno eles denominaram de tendência instintiva . A razão pela qual isso não fora observado anteriorm ente po de ser explicado pelo fato de que as situações de laboratório geralmente não fornecem as condições temporais e espaciais que favorecem a produção generalizada de comportamentos naturais e também pelo simples fato de que os experimentadores geralmente não observam diretamente o que estava acontecendo na jaula experimental. Eles cos tumavam confiar em seu equipamento automático, cujas vantagens podem apare cer, neste contexto, como contraproducentes. Eles estavam felizes e orgulhosos de mostrar como a automação os libertara da observação permanente de seus sujeitos, permitindo-lhes a liberdade de ler e escrever enquanto registros cumulativos des cortinavam a atividade de seus sujeitos (significando, é claro, a atividade que eles decidiram colocar sob o controle experimental, i.e., a resposta operante). Eles não se importavam com outros tipos de atividade que também poderiam ter ocorrido. Eles achavam que essas outras atividades não ocorriam ou que, se havia alguma, não era interessante. Nos anos que se seguiram às observações dos Brelands, mas com frequência de forma muito independente, alguns experimentadores descreveram o que os animais faziam durante a sessão experimental, além da resposta operante. Eles poderiam ser vistos na situação um tanto paradoxal de realizar experim entos automatizados com equipamentos sofisticados, enquanto espiavam a jaula experimental e anotavam, de um modo naturalista, como fariam etólogos de campo, qualquer parte de qualquer comportamento que o sujeito produzisse. Todo um subcampo de estudo passou a existir na área da aprendizagem animal, dedicado ao que veio a se chamar restrições biológicas (ou fronteiras ou limitações) da aprendizagem, ou olhando mais para o
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lado positivo , predisposições ou preparospara aprendizagem. E le considera, ao explicar performances aprendidas, as características da espécie que favorecem ou impedem a aprendizagem de uma dada combinação de respostas. Respostas simples, comuns e bem estabelecidas no laboratório operante, como o bicar o disco no po mbo, mostra ram abranger unidades de compo rtamen to mo tor de muitos tipos diferentes - tais como alguns extremamente curtos, dificilmente manipuláveis no controle operante pelo reforçamento e outros mais longos que podem ser submetidos ao controle pe las contingências. O mesmo bicar o disco provou ser inadequado quando se quer avaliar a capacidade da espécie de estimar o tempo, por exemplo, por causa de seu envolvimento, com propriedades dificilmente modificáveis, com a busca e o con sumo de alimento (pombos não podem esperar mais que 12 ou 15 segundos se deles se requer que sinalizem o fim de um intervalo mínimo estimado bicando um disco, mas, conforme apresentado na Figura 3.7, eles não podem controlar atrasos de um minuto ou mais se lhes é permitido responder pulando num poleiro).107 Também se demonstrou que o bicar o disco resiste a qualquer treino enquanto uma resposta de esquiva de um choque iminente, provavelmente porque a reação natural de um pássaro a um choque elétrico consiste em jogar a cabeça para trás, um movimento exatamente oposto àquele envolvido no bicar o disco. Essa nova área de estudo trouxe importantes modificações no cam po da aprendi zagem animal» dentro e fora da orientação skinneriana. O conceito de arbitrariedade da resposta, em seu sentido mais amplo (e, como notamos acima, errôneo), deu lugar à aceitação de que características específicas da espécie devem ser levadas em conta ao definir uma resposta, ou um estímulo, com propósitos experimentais. A ênfase deve ser colocada, novamente, sobre a estrutura das respostas, em adição a taxas, que ha viam ganho atenção exclusiva. Com o as características específicas da espécie são, por definição, vinculadas à herança genética, a aprendizagem é observad a em perspectivas mais amplas, articuland o aspectos inatos e adquiridos do com portam ento. A obser vação volto u a ser considerada um método frutífero e possivelmente um método que não se pode dispensar no laboratório animal. Todos esses pontos refletem uma significante reaproximação entre os especialistas em apren dizagem an imal e a tradição etológica. Estamos agora muito distantes da ignorância mútua que era a regra há 50 anos, ou das relações conflituosas que eram típicas há 3 o.108
107 Richelle & Lejeune (1980.1984). 108 Além dos numerosos artigos e livros dedicados aos limites biológicos da aprendizagem (referências clássicas sáo H inde & Scevenson-Hinde (197)) e Seligman & Hager ( 1972)), agora é possível escolher entre livros introdutórios ou especializados em com portam ento animal q ue comb inam elegantemente as duas tradições (ver, entre outros, Lea (1984)). Para ser completo, a evo lução paralela dentro da etologia deve ser mencionada: pesquisadores em etologia deram u ma atenção crescente à flexibilidade do com portam ento específico da espécie, especialmente quando analisado em detalhes ao longo do desenvolvim ento, o que significa que o que i preparado pela dotação genética da espécie é mo dulado peias interações do indivídu o com o seu ambiente.
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S kinner
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e a etologia
Qual foi a atitude de Skinner em relação a essas importantes mudanças na área? Ele foi frequentemente apresentado como não tendo sido receptivo a elas, mantendo, portanto» a si e a seus discípulos à parte. Ele foi cruelmente culpado por sua cegueira, ou por sua recusa deliberada a lidar com objeções ou sugestões dos etólogos, por um de seus colaboradores próximos mais antigos, R. J. Herrnstein,109 em um artigo que provocou uma réplica de sua parte.“0 Skinner corretamente aponta que ele estava entre os primeiros leitores do ma nuscrito dos Brelands e que ele os encorajou a publicá-lo: um sinal claro de seu interesse no assunto (um dos Brelands foi seu aluno). Mais importante ainda, ele os citou um tanto detalhadamente em 1965, em uma conferência como convidado na Universidade de K entu cky sobre “A filogenia e a ontogenia do comportamento” , um texto que foi publicado no ano seguinte na Science.mEssa é um marco divisório muito importante nos escritos de Skinner, porque, não pela primeira vez, mas mais explicitamente que antes, ele estabeleceu o paralelo entre os processos que atuam na evolução biológica e no condicionamento operante, paralelo que ele viria a elaborar em muitas ocasiões. No presente contexto, o artigo foi importante por ter sido uma discussão das ideias de Lorenz, como expressas em seu livro de 1965, sobre a parte correspondente aos aspectos inatos e adquiridos no comportamento. O artigo tinha algumas imperfeições, especialmente visíveis se lido por um olhar contemporâneo. Por exemplo, Skinner adotou a dicotomia entre inato e aprendido, também adotada por Lorenz, quando sabemos que nenhum compor tamento é inato stricto sensu, mas é apenas mais ou menos determinado por fatores genéticos. Ele falou sobre pressão seletiva em espécies ou grupos, quando é am plamente aceito que a seleção opera no nível do indivíduo. Ele não fez referência à genética comportamental, embora isso pudesse fornecer, mesmo então, algum insight sobre a relação entre hereditariedade e aprendizagem, etc. Isso não reduz a significância daquele texto, como um primeiro encontro aberto com a etologia, sobre as questões essenciais na aventura conjunta das duas disciplinas em busca da explicação científica do comportamento. Skinner enfatiza a dificuldade de associar o comportamento real aos seus determinantes filogenéticos e a falta de legitimidade ao classificar um dado comportamento como “inato” (vamos admitir que a palavra [09 Herrnstein (1977a, 1977b). 110
Skinner (1977).
111 Id. ([966). O artigo foi publicado novamente com notas adicionais em Contingencies o f reinforcement (id., i9<Í9b) e im presso mais uma vez entre os “artigos canônicos” submetidos a comentários de pares ao Bthavioml and Brain Sciences em 1984. Embora alguns dos comentários tenham sido muito críticos, ou apontado algumas das falhas aludidas neste texto, a maior parte dos comentadores, especialmente no campo da etologia. apesar de não concordar completamente com Skinner, reconheceu a significância do artigo no auxílio ao entendimento de sua posição e na promoção do diálogo entre etólogos e psicólogos da aprendizagem em laboratório.
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se refere à dotação genética específica da espécie), a menos que tenhamos implemen tado um estudo detalhado de sua história, individual e específica. Ele oferece alguns exemplos especulativos, embora importantes, de como as contingências ambientais e o comportamento individual modelado por elas podem ter contribuído para a seleção de comportamento específico da espécie."1 Em relação mais estritamente ao repertório específico da espécie e à tendência instintiva descrita pelos Brelands, Skinner não apenas citou suas observações, mas se referiu a um de seus próprios experimentos, publicado anteriormente,111 no qual ele já tinh a abordado o problema do comportamen to intrusivo na situação operante. Além da barra utilizada usualmente, ele e Morse forneceram ao seu rato um a roda giratória na qual ele poderia correr livremente em qualquer momento durante os intervalos que separavam dois reforçamentos no esquema de Intervalo Fixo que descrevemos an teriorme nte."4 Eles não nos con taram se a ideia se originou em uma observação casual, contudo eles claramente afirmaram suas hipóteses ao realizar aquele experimento simples: O que o organismo está fazendo quando ele não está apre sentando o comportamento produzido pelo esquema de reforçamento é algo especialmente importante quando esta belecemos comportamento complexo no qual duas ou mais respostas são estudadas ao mesmo tempo.115 Observou-se o rato correndo na roda durante parte do intervalo em que ele não estava pressionando a barra (o que um rato bem treinado geralmente faz apenas ao final do intervalo). Correr é uma atividade locomotora muito básica e pode dificil mente ser definida como específica da espécie dos ratos. Skinner comentou em seu artigo de 19 66 que o fenômeno merece atenção independentemente da natureza, específico da espécie ou individualmente aprendido, do comportamento a ser consi derado, que mais tarde passou a ser chamad o de com portam ento adjuntivo„ colateral ou intermediário. Embora o repertório específico da espécie possa ser intrusivo em alguns casos, ele mencionou observações nas quais o bicar natural emitido pelos pombos para coletar sementes foi substituído por bicadas adquiridas em altas taxas incompatíveis com a ingestão do alimento.
112 A questão do papel do comp ortam ento na evolução biológica foi central pira a reflexão não apenas de alguns etólogos, mis também de grandes psicólogos. Piaget dedicou a ela um de seus últimos livros, l.e comportement, mateurâe levolutwn (1976), que ele chama de “um trabalho pequeno e imprudente". Piaget se inspirou, por muito tempo, nas visões do biólogo Wadditigcon, com quem Skinner parecia não ter familiaridade, como pode ser inferido a partir daí raras alusões ao seu trabalho. 113
Skinner & Morse (1957).
114
Ver capitulo 3, p. 48.
11$
Skinner & M orse (1957) em Skinne r {1972, p. 538).
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Em resumo, apesar de Skinner não ter escolhido o estudo de características da espécie como seu próprio campo de pesquisa, ele não descartou como irrelevantes ou sem importância os comportamentos específicos da espécie. Pelo contrário, ele reconheceu, como tarefa essencial de qualquer ciência do comportamento, ligar a explicação do comportamento observado a suas origens filogenética e ontogenética. Ele apontou que comportamentos filogeneticamente modelados, uma vez dotados de vantagens de sobrevivência, podem ainda persistir num ambiente modificado, onde são responsáveis por danos óbvios . Por exem plo, a atração seletiva por comidas doces foi uma vantagem quando o açúcar era escasso e os indivíduos não podiam ignorar qualquer oportunidade de armazenar tal substância energética. Com açúcar disponível em excesso, o mesmo traço leva ao consumo excessivo e, por fim, a doen ças relacionadas à ingestão excessiva de algumas substâncias críticas. Agressão é um outro caso relevante. Parte do comportamen to agressivo em humanos pode ser relacionado ao tempo, em sua evolução biológica, em que eles, ou seus ancestrais animais, levavam vantagem por atacar de forma eficiente seus colegas humanos (por exemplo, ao defender seu território) ou membros de outras espécies (por razões similares, ou por comida). Daí o desenvolvimento de estrutu ras morfológicas apropriadas, tais como dentes e unhas. Até onde a agressão atual pode ser relacionada àqueles tempos, fica claro que o que era então uma vantagem para a sobrevivência se tornou uma tendên cia perigosa que p oderia levar a espécie à autodestruição quando servida, como ocorre atualmente, de ferramentas que multi plicam em milhares o poder de defesa e de ataque de partes anatómicas. Agressão também ilustra outro pon to repetidam ente enfatizado por Skinner. Ela tem, admitidamente, sua história filogenética —a qual Lorenz tentou recriar de modo brilhante e talvez totalmente inquestionável.116 Ela também possui, especialmente em humanos, uma história individual e sociocultural, que pode ser importante para ex plicar ocorrências de com portam ento agressivo. Skinner observou que as origens do comp ortamen to não po deriam ser reduzidas ao fator filogenético sem um a evidência convincente de que outros fatores são de fato irrelevantes, o que raramente ocorre, especialmente em humanos. As causas ambientais presentes ou recentes responsáveis por atos agressivos em humanos são tantas e tão familiares, que não precisam ser registradas aqui. Não há nenhuma razão para deslocar o problema apelando para alguma agressividade instintiva ancestral, que absolutamente precisaria se expressar de um modo ou de outro (esta era a visão de Lorenz, que pode apenas levar a vagas propostas de canalização por meio de atividades pacíficas e sem risco, como o espor te, a versão etológica da sublimação de Freud). Esse é um modo fácil de escapar da identificação de outras causas, mais acessíveis, e da responsabilidade de modificá-las. De qu alquer forma , qualquer que seja a imp ortância dos determinantes filogenéticos
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para os comportamentos agressivos atuais, náo há motivo para crer que eles têm de ocorrer, que sua manifestação não pode ser alterada. Exemplos simples em animais mostram que a agressão não é apenas uma ex teriorização inevitável de alguma agressividade interna. Pombos treinados a bicar um disco para evitar um choque elétrico acabam por atacar outro pombo colocado na caixa durante a sessão experimental. Este é possivelmente um caso primitivo e simples de atribuição. Pouco importa aqui se os seus ataques podem ser relacionados à história de sua espécie ou se têm uma origem mais local; o que conta realmente é que eles ocorrem sob um conjunto particular de contingências. O mesmo não será observado se o pássaro for recompensado com comida em um esquema que deixa pouca oportunidad e para comportamen to intrusivo de qualquer tipo. Para resumir, Skinner não nega a origem evolutiva de muitos aspectos do com portam ento, nem nega as diferenças específicas da espécie derivadas d a história evo lucionária. Tal negação teria sido paradoxal para um cientista que propóe estender o modelo da evolução biológica para a aprendizagem individual e para a história cultural. Ele insistiu, entretanto, para que considerássemos todos os três níveis ao explicar a conduta humana (os dois primeiros ao explicar o comportamento ani mal), e ele corretamente defendia que o primeiro nível, o nível da evolução biológi ca, não é mais “natural” que os outros dois. Esta é a atitude equilibrada que muitos tomaram depois dele, dentro e fora da psicologia e da etologia, em ocasiões poste riores, quando a questão recorrente foi retomada, como no debate na sociobioíogia.
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PIAGET E SKINNER: CONSTRUTIVISMO E BEHAVIORISMO
Ig n o r â n c i a
r e c í pr o c a
Piaget, com o Skinner, era uma das figuras proeminentes da psicologia de mea dos do século XX. A produção científica deles abrangeu aproximadamente o mesmo período, dos anos de 1930 a 1980. Piaget, oito anos mais velho que Skinner, faleceu em 1981, nove anos antes dele. Em contraste com o trabalho de muitos psicólogos europeus de países não falantes da língua inglesa, admitidamente de estatura mais modesta, o trabalho de Piaget fez seu caminho para os Estados Unidos da América, e uma parte importante de seus escritos foi traduzida para o inglês (incidentalmente, essa não foi uma condição para Skinner os ler, pois ele lia francês fluentemente, como já foi dito). Apesar dessas circunstâncias favoráveis, os dois gigantes da ciência psicológica alegremente se ignoravam mutuamente.117 Quando um dos dois, em raras ocasiões, aludia ao trabalho do outro, era sempre em forma de caricatura supersimplificada. Talvez devêssemos aceitar isso como um viés inevitável dos grandes teóricos; pode ser parte da afirmação da originalidade de seu próprio sistema, que poderia se tornar mais proeminente ao ser contrastado com teorias rivais anteriores mal representadas em prol da argumentação. Talvez este seja o preço que os teóricos tenham que pagar para alcançar formulações altamente consistentes de seus próprios pensamentos, que pode ser um fator estimulante a outros cientistas em seus campos. O preço parece ser um pouco alto, quando mantém e perpetua oposições enquanto o reconheci mento das convergências poderia ser mais frutífero. Não há dúvida de que, por volta de 1950, as teorias de Piaget e de Skinner es tavam entre as mais, se não eram de fatos as mais, influentes da psicologia. Elas evo luíram em tradições muito diferentes, o que pode explicar por que elas avançaram paralelamente por meio século, com encontro nenhum ou com mínimos encontros. Menções a Piaget na obra de Skinner são escassas e sempre simplificadas. O mesmo 117 Co m o este capítulo não foca curiosidades da vida, mas contribuições escritas dos dois gigantes da psicologia do sêcuio XX, não tentei estabelecer quando e onde Piaget e Skinner tiveram a oportunidade de se conhecer. Skinner relata em sua autobiogra fia, A ma tte r o f cortsequences, sua visita, a convite, à Universidade de Genebra em 1962. Sua conferência foi em francês e ele íoi apresentado pelo próprio Piaget, que se recusou a falar inglês, o que ele entendeu perfeitamente ( S k í n n l r , 1983, j>. i n ) .
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é verdade quanto ao mestre do construtivismo em relação ao último e mais distinto dos neobehavioristas americanos. Tal ignorância recíproca é surpreendente quando se reconhece, por trás das óbvias diferenças do discurso, a preocupação com questões similares de ambos os lados e a relação próxima, embora inesperada, entre a maneira como ambos estabeleceram algumas questões cruciais, ao final de suas carreiras, para futuros pesquisadores elaborarem melhor. Piaget nunca tom ou conhecim ento d a especificidade de Skinn er entre os beha vioristas. Em uma ocasião, em um de seus últim os livros, há uma indicação de que ele estava consciente disso, mas ele faz essa menção apenas para colocar Skinner em seu lugar, isto é, entre o time indiscriminado de behavioristas. Para Piaget, eles eram essencialmente pesquisadores empíricos Estímulo-Resposta, contra os quais ele lu tou obstinadamente ao longo de sua carreira. Ele os culpa por procurar a origem do comportamento exclusivamente no ambiente. E os acusa de exaltar o Estímulo, como, no lado oposto, acusa os neodarwinistas do erro contrário, exaltar fatores endógenos. Quando Piaget discute os princípios behavioristas, ele geralmente se refere a Hull ou a Watson. Apesar de avisar ao leitor algumas vezes de que ele estaria tratando de behavioristas clássicos, ele nunca acha necessário considerar outras for mas, mais recentes. Isto significa ignorar o fato de que Skinner, mesmo corretamente visto em muitos aspectos como o mais watsoniano entre os herdeiros de Watson, propôs, em relação a muitas questões importantes, concepções completamente dis tintas daquelas de seus colegas behavioristas, incluindo o próprio Watson. Algumas delas foram criticadas mais duramente por Skinner do que por não behavioristas. Por exemplo, Skinner repetidamente enfatizou que o pensamento não pode ser re duzido à fala subvocal, um a tese de Watson frequentemente citada por Piaget como a melhor contribuição behaviorista para o estudo do comportamento inteligente. A revisão destrutiva de Skinner ao famoso livro de Hull, Principles o f behavior, parece ter sido totalmente ignorada por Piaget."8A seguinte citaçáo é apenas uma dentre os muitos textos de Piaget que discutem a visão behaviorista, mas é uma exceção no sentido de que termina com uma das raras alusões a Skinner. Poderia ser a única ocasião em que Piaget revelasse que estava consciente da distinção a ser feita entre Skinner e os behavioristas clássicos: Na medida em que o sujeito adquire algum conhecimento, seja ele o “knowhow' característico da aprendizagem sensório-motora ou de formas superiores de entendimento, isso sempre implica que ele foi bem-sucedido ao registrar alguns observáveis nos objetos ao seu redor, o mundo externo sendo,
118 Re visã o do livro de HuLI Principles o f behavior (S k i n n e r , 1944, p. 276-181)- O artigo foi reimpresso no Cumulative record (id., 1972).
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em um sentido, a única fonte possível do progresso cognitivo: a qualquer estímulo externo dessa forma corresponde a uma resposta do sujeito, embora definida por Hull em termos de uma “cópia funcional” da situação externa. Em outras pa lavras, o ambiente é aquele que detém poder total e é, por assim dizer, ativo, de um modo muito positivo, enquanto o sujeito permanece passivo no papel de mero receptor. Mesmo quando os pombos de Skinner pressionam o disco, esta ação imatura sobre o ambiente resulta em nada mais do que na descoberta de suas propriedades para então submeter a suas variações como reforçadores externos com vários valores.'"5 De sua parte, Skinner, em muitos de seus textos nos quais ele se aventura a interpretar com portam ento h umano co mplexo à luz dos conceitos obtidos por meio do estudo da aprendizagem animal, nunca olha mais de perto a posição de Piaget. Se eventualmente ele a menciona, é apenas para descartá-la como pertencente a concepções mentalistas, responsáveis não apenas pela progressão lenta das ciências psicológicas como um todo, mas pela incapacidade de nossas sociedades de adotar uma visão de homem que poderia ajudar a resolver seus problemas. Uma das raras alusões a Piaget ocorre, de forma bastante significativa, em um parágrafo intitulado Estruturalismo. Piaget é apresentado como um caso típico de estruturalismo do desenvolvimento, para o qual mudanças que ocorrem na ontogênese sáo descritas como sequência de estágios correspondentes a alguma evolução interna: “diz-se que o que cresce é algo na mente, com o com Piaget” ,1“ A principal falha da teoria de Piaget é, portanto, seu mentalismo. Skinner parece ignorar as nuances trazidas por Piaget em sua análise crítica da noção de estrutura, que foi o tema de um pequeno livro publicado em meio à onda estruturalista em Paris, sem dúvida o mais divertido e inteligente dos trabalhos de Piag et.IZI Mais importante ainda, Skinner, de forma similar, negligencia a parte fundamental do construtivismo de Piaget, uma tentativa de toda uma vida para explicar uma parte importante daquilo a que a palavra mente se refere, estudando sua história natural por todo o desenvolvimento. Talvez tal ignorância mútua seja apenas um exemplo, talvez seja o mais im pressionante, de um paradoxo da moderna psicologia, que é a separação dos cam pos da aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo. Para o observador ingênuo, poderia parecer que esses dois campos se misturariam naturalmente. Pareceria que
119
Piaget (1974, p. 18, traduç io minha).
120 Skinner (1974, p. 67). 121
Piaget (1968).
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qualquer um que se preocupa com os processos de aprendizagem deveria ter algum interesse no desenvolvimento, considerando que as fases do desenvolvimento ge ralmente são, na maioria dos organismos, especialmente ricas em novas aquisições, e daí oferecem as condições mais apropriadas para estudá-las. De forma recíproca, pareceria que sempre que alguém se recusa a conceber o desenvolvimento como um simples desenrolar do programa inato pré-formado, deveria normalmente ser levado a apelar para processos de modificação comportamental resultante da inte ração do organismo com seu ambiente, os quais são o objeto de estudo de qualquer psicologia da aprendizagem. Longe de ser a regra, tal convergência demorou para emergir, e, mesmo atualmente, muitos a ignoram. Dar atenção para as chamadas restrições de desenvolvimento da aprendizagem, tais como os períodos críticos ou favoráveis inicialmente descritos em relação ao fenômeno do imprintíng , era exceção entre os especialistas em aprendizagem animal até os anos 1970, enquanto os desenvolvimenristas da escola de Genebra mostraram pouca preocupação sistemática com o lugar dos mecanismos de aprendizagem no desenvolvimento cognitivo até a mesma época aproximad amente. Esforços para a integração m útua tiveram lugar no campo do comportamento animal, mas, mais frequentemente, desenvolvimento e aprendizagem ainda são justapostos, quando não são colocados em oposição: uma situação particularmente prejudicial quando se trata de treinar profissionais em áreas de aplicação, tal como educação, na qual, por todos os propósitos práticos, os dois aspectos não podem ser racionalm ente m antidos separados.122
C o n v er g ê n c ia s
Se não poderia ter sido esperado que Piaget e Skinner explorassem suas complementaridad es, espera-se que seus seguidores o façam. A tarefa, de form a alguma, é estranha às intuições dos dois homens. Apesar de sua visão inicialmente rígida a respeito da psicologia da aprendizagem na tradição behaviorista, Piaget finalmente deu abertura e, em seu grupo, encorajou os estudos experimentais sobre os efeitos dos vários tipos de aprendizagem .125 Skinner, por sua vez, parece ter tido consciência da necessidade de um a síntese quan do ele escreveu, como conclusão de um pequeno comentário sobre teorias estruturalistas do desenvolvimento: “Resta-nos suplemen tar o desenvolvimentalismo na ciência comportamental com uma análise da ação seletiva do ambiente”.124
12 2
Para discussão dessas questões, ver Richelle (1986b, 1991).
123 Parte de seu trabalho foi publica da cm Inhelder. Sinclair & Bovec (1974). Para uma análise crítica, daquela abordagem , ver Richelle ((976c). 124 Abo ut behavioriim ( S k i n n e r , retirada da ediçáo de bolso. V intage B ooks, 1976 , p. 7 5 ) .
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Ambos, Piaget e Skinner, abordaram o objeto de estudo da psicologia como pertencente ao campo mais vasto das ciências biológicas, embora nenhum deles apele para processos fisiológicos propriamente ditos. Este é, admitidamente, um ponto de convergência bastante geral, mas é, no entanto, importante: a psicologia moderna ainda não alcançou unanimidade como em relação aos seus vínculos com as ciências biológicas de um lado e aos seus vínculos com as ciências sociais de outro. Uma visão consiste em assumir uma continuidade entre os processos adaptativos básicos nas coisas vivas e os processos sócio-históricos, como encontrados na espécie humana. Isto não é reducionismo, no sentido em que não está negando que novas estruturas e novos processos emergem, por exemplo, com o desenvolvimento sem precedentes em humanos das funções simbólicas e a linguagem natural, um pré-requisito para a transmissão do comportamento adquirido e do conhecimento e, portanto, da história cultural. Mas é uma recusa a uma distinção qualitativa bem delineada que oporia a espécie humana ao resto do mundo vivo, e aplicaria a ela, como muitas psicologias e filosofias humanistas ainda fazem, ferramentas concei tuais e procedimentos empíricos basicamente diferentes. Todo o trabalho de Piaget é focalizado na ideia de que existe uma continuida de entre as formas mais elementares de sistemas vivos e os produtos mais complexos da inteligência humana. Sua produção empírica abundante é totalmente direcio nada para demonstrar tal continuidade. E muitos de seus escritos teóricos, tais como Biology and k n ow ledg e são dedicados a uma elaboração explícita do mesmo tema. As raízes biológicas das noções centrais tais como assimilaçáo-acomodação, equilíbrio-desequilíbrio, foram repetidamente afirmadas por Piaget. De modo similar, Skinner definiu o behaviorismo não como uma teoria da psicologia, mas como uma filosofia da ciência que liga a psicologia definitivamente com as ciências biológicas. Ele enfatizou, com insistência crescente à medida que o tempo passava, a analogia entre o processo do condicionamento operante e os pro cessos vigentes na evolução biológica, um tema central que nos deterá mais tarde. Como os psicólogos mais biologicamente orientados, Piaget e Skinner igual mente foram além do velho debate sobre o inato versus o aprendido, sobre a heredi tariedade versus a aprendizagem, o qual foi ressuscitado de uma maneira particular mente passional há não muito tempo, no contexto da inteligência humana. Desde o início, Piaget argumentara contra as teorias inatistas e repetiu seus argumentos em várias ocasiões, quando tais visões apareciam novamente, fosse no campo da etologia, linguística ou antropologia. As visões de Skinner a esse respeito são menos familiares, porque ele é geralmente considerado um ambientalista extremo: ele toma o organismo como uma tabula rasa, que receberá passivamente as impressões do ambiente. Esta interpretação equivocada 125 Inicialmente publicado em francês, 196 7, traduzido para o inglês em 1971.
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ignora os vários textos nos quais Skinner deixou clara sua posição. Referindo-se à famosa passagem de Watson na qual o pai do behaviorismo sustenta que, dada uma dúzia de bebês saudáveis e seu próprio e específico mundo para criá-los, ele garante que pega qualquer um aleatoriamente e o treina para se tornar qualquer tipo de espe cialista, Skinner nos lembra que essas linhas, frequentemente citadas como negação de qualquer componente herdado, aparecem em um capítulo dedicado a “como o homem é equipado para se comportar no nascimento” e que elas deveriam ser lidas em seu contexto original. Ele enfatizou, como um fato óbvio, que comportamento novo não pode ser adquirido ao longo da vida individual se não houver unidades mínimas, as quais não podem se originar a náo ser na filogênese: Algumas contingências filogenéticas devem ser efetivas antes que as contingências ontogenéticas possam operar. O com portamento relativamente indiferenciado do qual operantes são selecionados é presumivelmente um produto filogenético; um repertório indiferenciado amplo pode ter sido selecionado porque ele tornava efetivas as contingências ontogenéticas.126 Mas ele fez fortes objeções àquelas visões que, para explicar formas altamente complexas de comportamento, tais como pensamento lógico ou linguagem natural, apelam para algum dispositivo inato pré-formado, que apenas teria que ser posto em ação.U7 C om o Piaget, ele queria saber com o o com portamen to individual pode encontrar seu lugar na evolução e explicar a emergência progressiva de organismos cujas ações complexas não podem ser justificadas pelo milagre de uma única muta ção. Seus esforços em explicar a origem de alguns comportamentos específicos da espécie —brevemente aludidos no capítulo 6 —náo ortodoxos, como poderiam pare cer ao biólogo n eodarwinista, foram motivados na verdade pela mesma preocupação que os esforços obstinados de Piaget para articular a história de uma espécie e a ex periência individual de seus membros lançando mão do fenômeno da fenocópia.118 Essas são aproximações de caráter geral. Há, contudo, convergências mais pro fundas, principalmente em dois pontos fundamentais. U m é o que pode ser chamado de primazia da ação; o outro está relacionado à analogia evolucionária e o lugar das variações na construção de novos comportam entos.
126 Contingencies o f reinforcement, p. 205. Reimpressão de The phytogeny an d ontogeny o f behavior (S k i n n e r . 1966). 11 7 Ver capítulo 10. 128 Piaget lidou muitas vezes com a questão, m is ela foi elaborada em profundidade e com liberdade náo usual em relaçáo à biologia “oficial” em Ad ap tat ion tn ale etpsychologie d e I'intellige nce: selection org amque et phénocopie (P i a g e t , 1974). O livro, mais uma vez, gerou acusações de lam arckism o.
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E NO COMEÇO ERA A AÇÃO! Comum às teorias de Piaget e de Skinner é o conceito de que a ênfase, ao se estu dar comportamento, não deveria ser no estímulo, nem na mente, mas na ação. Com relação a isso, ambas as teorias poderiam, de modo igualmente relevante, ser introdu zidas pelas famosas palavras de Fausto quando ele pensa sobre as origens das coisas: No princípio era o Verbo. E esta a letra expressa; aqui está,.. No sentido é que a razão tropeça. Como hei-de progredir? há ’í quem tal me aclare? O Verbo! Mas o Verbo é coisa inacessível. Se apurar a razão, talvez se me depare para o lugar de Verbo um termo inteligível... Ponho isto: No princípio era o Senso... Cautela nessa primeira iinha; às vezes se atropela a verdade e a razão co’a rapidez da pena; pois o Senso faz tudo, e tudo cria e ordena?... E melhor No princípio era a Potência... Nada! Contra isto que pus interna voz me brada. (Sempre a almejar por luz, e sempre escuridão!) ... Agora é que atinei: No princípio era a ação.119
De fato, a intuição final de Fausto foi parafraseada no jargão psicológico mo derno e aplicado a Piaget: “ No começo era a resposta”. Piaget, como é bem conheci do, traçou a origem do pensamento lógico e abstrato em ações exibidas nos primei ros estágios do desenvolvimento e progressivamente coordenadas e internalizadas.130 Goethe estava claramente sinalizando uma epistemologia genética, mas também estava antecipando o behaviorismo radical de Skinner, pois, apesar de interpretações equivocadas persistentes, uma das características mais distintivas da teoria de Skinner é, conforme já vimos, que ela definitivamente virou as costas para a visão Estímulo-Resposta que havia caracterizado alguns ramos do behaviorismo. A fórmula S -R foi substituída pela noção central de ação seletiva do ambiente. A sentença de Piaget, como citada anteriormente, que “para qualquer estímulo externo corresponde uma resposta do sujeito” , se não descreve corretamente os tipos clássicos de behaviorismo, também não se aplica ao de Skinner. No primeiro capítulo de seu livro Contingencies
129 Goeth e ([1808] 1971). N . T.: Tradução de Ant ónio Feliciano de Castilho. 130 Esta permanece como uma diferença radical entre Piaget e a escola cognitivista de pensamento, que igualmente negligenciou as origens das operações cognitivas na ação e seu resultado final na ação. Examinada mais à frente, no capítulo 9.
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ofreinforcement, Skinner afirma sua posição de uma maneira inequívoca, que torna ainda mais surpreendente que ele tenha sido persistentemente retratado como psi cólogo S-R, Depois de descartar a visão tradicional do ambiente como um simples estágio ou cenário no qual o comportamento ocorre, sem qualquer interação, ele denuncia as insuficiências da concepção que dá ao ambiente o papel de liberador ou de gatilho. E m uma seção significativamente denom inada ' Além do estímulo e da resposta’, ele deixa claro que nenhuma explicação da troca entre o organismo e o ambiente está completa até que inclua a ação do ambiente sobre o orga nismo após uma resposta ter sido emitida."1 Dois pontos são cruciais naquela frase: primeiro, o comportamento é um pro cesso interativo —há uma troca entre o organismo e o ambiente —e, segundo, o ambiente é importante por causa de sua ação após uma resposta ter sido emitida , isto é, por causa de sua ação seletiva. Obviamente, algum comportamento deve ocorrer primeiro, se o ambiente tem que exercer sua ação seletiva integralmente. Portanto, contrário à descrição de Piaget da posição behaviorista, o ambiente não é, de modo algum, na teoria de Skinner, a “única fonte” de comportamento. Como tipicamente exemplificado na câmara de condicionamento operante, começamos com a ação: ação sobre o ambiente, que, por sua vez, modelará a ação por meio de um processo de seleção. C om o a afirmação de Fausto, no início era o comportam ento! O u, após a definição inicial de Skinner de sua própria empreitada, comportamento espontâneo. Uma vez admitido esse paralelo entre Piaget e Skinner a respeito da primazia da ação, alguém poderia ser contra convergências mais profundas argumentando que há pouco em comum entre o projeto ambicioso de Piaget, que visava a explicar as mais altas formas de atividade intelectual, e a abordagem de Skinner, limitada a respostas motoras elementares em animais. Se é verdade que o trabalho empírico de Skinner não contribuiu substancialmente para nosso entendimento das funções cognitivas, ele, todavia, estendeu sua concepção geral de troca comportamental muito além das simples respostas motoras adquiridas em ratos e pombos. Ele a estendeu para a percepção, que ele entende como ação, ao invés de um registro de cópia, reproduzindo a preferência de Piaget pela nom enclatura atividades perceptuais ao invés de percepção. E , ainda de form a mais significante para nosso propósito, ele a estendeu para comportamento e conhecimento intelectual (cognitivo seria mais na moda, é claro), como apreendido na afirmação seguinte, verdadeiramente piagetiana: Nosso conhecimento é ação.''1 131
Skinn er (1969b, p. 5, grifo do autor).
132 Ab ou t bek avio rismc . p. [54 (rerirada da cdi^ao de bolso. Vintage Books. 1976).
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A explicação de sua visão epistemológica pode ser encontrada em muitas ocasiões nos textos de Skinner. O trecho abaixo é especialmente ilustrativo de sua oposição ao empirismo, considerando que foi uma réplica espontânea a Franz Alexander em um simpósio onde o famoso psicanalista estava defendendo uma teoria do conhecimento nas linhas do empirismo britânico clássico: A noção de que o conhecimento consiste em impressões sensoriais e conceitos derivados das impressões sensoriais era, é claro, a visão do empirismo britânico e ainda é sustentado por muitas pessoas. Mas outros, incluindo a mim mesmo, acreditam
que ele é incapaz de representar o conhecimento humano adequadamente. Mesmo uma ideia simples não é, como Locke supôs, uma reunião de materiais sensoriais em resposta à estimula ção. Supor que o conhecimento físico existe na mente de um físico como material psíquico ou mental —como a maneira com que ele olha para o mundo — parece muito absurdo. Em momento algum uma teoria física é um evento psíquico no sentido de uma imagem ou sensação. Dizer que a física sempre retorna às impressões sensoriais é simplesmente dizer que o organismo está em contato com o ambiente apenas através de seus órgãos dos sentidos - um axioma muito óbvio. Mas o organismo faz muito mais do que sugar o ambiente. Ele reage em relação ao ambiente e, ao longo de sua vida, ele aprende mais e mais formas de reagir.
Uma concepção alternativa de conhecimento, que muitos de nós sustentamos, é que conhecimento é ação, ao invés de sensação, e que uma formulação do conhecimento deveria ser em termos de comportamento.I” Embora eu não pretenda me entregar a múltiplas citações, não posso resistir a uma aproximação final: Comportamento operante é essencialmente o exercício de um poder: ele tem um efeito sobre o ambiente.1’4
135 Skin ner ([196 1] 19 72, p. 255). Esse tpxto registra come ntários feitos por Skinn er sobre a contribuição de Alex and er na conferência “Integrando as abordagens à doença mental”, que ocorreu em 1956, sobre a qual Skinner publicou um curto artigo: "Psycho logy in the understanding o f mental disease”. Os grifos são meus. 134 Ab ou t b eha vior ism , p. 154 (retirada da edição de bolso, Vintage Books, 1976).
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O organismo age sobre o ambiente, ao invés de simplesmen te se submeter a ele. Como nos níveis mais altos, em que o comportamento desempenha um papel não insignificante, este papel não é, de modo algum, limitado a compensar as alterações ou agressões do ambiente: ele pode consistir, ao contrário, em ações de dominação direcionadas a estender o ambiente.'5'
Qual é qual? Apenas a grafia inglesa da palavra comportamento,l}6 e talvez a concisão relativa, sugerem Skinner como autor da primeira citação, a menos que se esteja enviesado pela ideia de que Skinner era possuído de uma sede de poder e que não se possa 1er a palavra poder sem lhe dar conotações ideológicas, as quais ela não exprime mais do que “ações de dominação” Çles conduites conquérantes”) do sujeito de Piaget.
A ANALOGIA EVOLUCIONÁRIA I Estas similaridades, embora geralmente não observadas, especialmente pelos próprios Piaget e Skinner, fornecem a base para uma teoria integrativa do desen volvimento e aprendizagem que é fundamentada posteriormente pelo uso comum da anaJogia evolucionária na explicação da ontogênese do comportamento. Se ana lisarmos ambas as teorias em termos de seu valor para pesquisas posteriores, não podemos deixar de enfatizar as perspectivas abertas pela discussão sobre o papel das variações no comportamento, da parte do mestre do construtivismo, bem como do mestre do behaviorismo radical. Em ambos, o tema das variações comportamentais foi crescentemente central em seus escritos respectivos mais recentes. Ele é, de fato, o tema central do livro Adaptation vitale etpsychologie de l’intelligence, ao quai me referi diversas vezes. Mais importantes que seus argumentos que se referem ao próprio fe nômeno da fenocópia, o qual, para os biólogos poderia soar como pouco fundamen tado, a discussão de Piaget sobre a evolução nas plantas é um pretexto para lidar com uma questão que foi encarada no estudo do comportamento por tradições diferentes da sua própria e do behaviorismo. O problema da origem e do papel das variações comportamentais está relacionado, em Piaget, com os conceitos de equilíbrio-desequilíbrio. Sem adentrar nas complexidades de suas elaborações teóricas, é suficiente dizer que, para Piaget, o desenvolvimento pode ser descrito como uma sucessão de
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Piage' (i 974 . P- *8).
13 6 N.T .: Em inglês britânico, se escreve behaviour, enquanto no ingiés estadunidense, utilizado por Skinner, náo se utiliza, a vo gal V : bfhavtcr.
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estados de equilíbrio. Ele se deteve na seguinte questão: como é que o organismo náo permanece no primeiro estágio de equ ilíbrio que ele pode desfrutar? Por que ele acaba caindo em desequilíbrio apenas para começar tudo de novo em direção a um novo equilíbrio, em algum nível mais elevado? Afirmar que o ambiente oferece alguma re sistência à manutenção do equilíbrio náo explica nada se o organismo não for dotado de alguma “sensibilidade” aos desafios ambientais, que é mais bem implemen tado em termos de variações. Como Piaget sustenta, em um estilo biológico muito clássico, “ há sempre, em sucessão, variação e seleção” . Tal variabilidade não pode ser explicada pelo ambiente: O ambiente desempenha um papel fundamental em todos os níveis (isto é, na evolução biológica da espécie, bem como no desenvolvimento cognitivo), mas como objeto de conquista e náo como causação modeladora, que deveria ser procurada, de novo em todos os níveis, em atividades endógenas do or ganismo e do sujeito, ambos os quais permaneceriam con servadores e incapazes de inovar (...) na ausência dos muitos problemas criados pelo ambiente ou mundo externo, mas que podem reagir a eles por tentativas e explorações de todos os tipos, desde o nível elementar das mutações até o nível mais alto das teorias científicas.137 Este texto, apesar de aparecer nos argumentos de Piaget em resposta ao erro behaviorista, é, em conteúdo, muito próximo à visão de Skinner, exceto quando afir ma o caráter endógeno da variabilidade. Skinner seria menos assertivo nesse ponto e sugeriria, ao invés disso, que as variações se originam ou na história filogenética ou na história ontogenética, que significa, em qualquer caso, uma interação com o ambien te. E facil especular sobre como Piaget poderia ter utilizado a análise de Skinner do comportamento operante, em termos de processo seletivo, para completar, com uma ligação até então ausente, sua ambiciosa teoria baseada na continuidade dos mesmos processos em todos os níveis de evolução. Se sua teoria se sustenta, espera-se que abranja o nível da aprendizagem, que é precisamente o que Skinner disputava. A sua teoria é essencialmente uma teoria sintética que estende os princípios evolutivos ao comportamento individual. Veremos com mais detalhes no capítulo 8 como Skinner elaborou esse tema. Neste ponto, é digno de nota que os psicólogos contemporâneos, geralmente não cientes da convergência entre Piaget e Skinner em tal questão fundamental,
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Piaget (1974, p. 73, tradução e grifo no texto entre parênteses são meus).
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agora parecem reconhecê-la. Um caso é o de Mehler, que, em livro recente,138discute sua própria visão sobre “selecionismo específico”, ao contrastá-lo com três tipos de “selecionismo geral” : de Piaget, de Ch ang eux e de Skinner. A referência de M ehler a Skinner é especialmente significante, pois ele estava entre aqueles psicólogos que, há alguns anos, anu nciou a morte do behaviorismo ra dical.139 A imp ortância de Skin ner, como um dos psicólogos que, ao lado de Piaget, recorreu ao poder explicativo do modelo evolucionário, é agora devidamente reconhecida.
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Mehler & Dupoux (1990).
139 Meh ler (1969). Ver capítulo io.
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PARTE III P e d r a s d e t o q u e d o b e h a v io r is m o r a d ic a l : c é r e b r o , c o g n iç ã o , l in g u a g e m e c r ia t iv id a d e
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8 SKINNER E A BIOLOGIA
Qu a t r o maus sinais no exame d a biologia? A posição de Skin ner em relação à biologia foi fonte de im portantes mal-enten didos, apesar das afirmações perfeitamente claras de sua parte. Os mal-entendidos mais difundidos podem ser resumidos da seguinte forma: 1. Skinn er negligenciou, ou pior, negou, aquelas coisas importantes que têm lugar dentro do organismo e especialmente no cérebro. 2. Seu ambientalismo extremo o cegou para o papel da hereditariedade na determinação do comportamento e o levou a deixar fora de sua teoria as contribuições da genética moderna e da psicogenética para o nosso entendimento dos organismos vivos; do ponto de vista da biolo gia, portanto, sua teoria é obsoleta. 3. Sua defesa de que as leis da aprend izagem são universais o levou a ne gligenciar características específicas das espécies, as quais não escapam a um observador interessado em biologia consciente das diferenças interespecíficas, não menos visíveis no nível comportamental que no nível morfológico. 4. Seu último recurso ao mod elo evolutivo para explicar comp ortamen to adquirido é, na melhor das hipóteses, uma metáfora superficial e não é suficiente para colocá-lo na digna companhia dos biólogos modernos. Estas críticas tão frequentes parecem estar em desacordo com o princípio cen tral da posição de Skinner, que sua abordagem behaviorista radical da psicologia é essencialmente um modo de inserir o campo no reino das ciências naturais e, mais especificamente, das ciências biológicas. Estava ele tão ingênuo ou equivocad o para afirmar tal identificação crucial enqua nto elaborava visões estranhas ao pen samento biológico moderno? Novamente, uma leitura justa de seus textos não leva a essa conclusão. As críticas apontadas aqui são representações claramente distorcidas de seu pensamento e elas frequentemente refletem um pensamento biológico nã o sofis ticado de seus críticos mais do que da parte de seu alvo.
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Já podemos nos desfazer das críticas 2 e 3, as quais foram respondidas no capí tulo 7. Daremos atenção agora aos pontos 1 e 4.
D e v e m o s d i s p e n s a r o c é r e b r o o u a m e n t e , o u a m bo s ?
A posição de Skinner foi frequentem en te representada como a “psicologia da caixa-preta”. A expressão implicitamente transmite dois tipos muito diferentes de crítica. Um se refere à negligência em relação ao substrato neural correlato do com portamento e, de forma mais geral, em relação aos aspectos biológicos do compor tamento. O outro tipo de crítica se refere ao abandono de qualquer entidade ou variá vel interna inferida na descrição e explicação psicológica. Ambas as críticas têm longa história na psicologia, retomando o behaviorismo inicial, mas elas foram res suscitadas em relação à versão de Skin ner de beha viorismo radical e no contexto, por um lado, das tendências atuais da neurociência e, por outro, do desen volvimento do cognitivismo moderno. Poder-se-ia argumentar que essas críticas são uma única crítica, e não duas. Admitidam en te, em alguns de seus aspectos, a abordagem cogn itivista da psicologia vem se desenvolvendo em um a relação muito próxim a com as ciências do cérebro. Con tudo , como veremos, alguns cognitivistas estão defendendo que sua ciência chame-a de psicologia, ou de ciência do processamento de informação, ou do que você preferir — é claramente distinta da ciência do cérebro, qu e é autônom a na utilização de seus próprios métodos e conceitos, não redutíveis àqueles da neurofisiologia ou neuroquímica. Desse modo, parece apropriado comentar separadamente cada um a dessas críticas. A p rimeira tem a ver com a posição de Skin ner em relação à psico fisiologia e> confo rme já m enciona do, com a biologia em geral. A segunda tem a ver com o problema do mentalismo. No primeiro caso, o problema que estamos encarando é um problema justamente clássico de delimitação de fronteiras entre os campos da ciência, de definição de suas características metodológicas específicas e de especificação de relaçóes substanciais, se existem, entre eles. No segundo caso, so mos confrontados com uma questão epistemológica persistente e muito difícil, que dominou a psicologia desde seu início até o presente e que não é nada menos que a questão do objeto de estudo da psicologia e das formas com o ele deveria ser tratado. As ciências do cérebro vêm se desenvolvendo de um mod o tão fascinante nas últimas décadas que a recusa de Skinner em olhar para a caixa-preta agora parece obsoleta. Por que alguém deveria se manter na superfície das coisas quando es tão disponíveis as ferramentas que nos permitem observar em profundidade o que acontece dentro da cabeça? Por que deveríamos nos privar da possibilidade que é oferecida agora de entender os mecanismos subjacentes ao comportamento, lá onde eles ocorrem, no cérebro? Alguns neurocientistas, confiantes em seu poder, mais
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ou menos explicitamente sugerem que as ciências do cérebro podem substituir a psicologia e que o estudo do comportamento, em particular, era apenas uma etapa na história da pesquisa sobre o mistério da mente. Esta é essencialmente a posi ção tomada por Changeux, entre outros, em seu famoso livro The neuronal man.'A° Espera-se que registros cerebrais e as mais recentes e promissoras formas de imagem cerebral nos permitam acesso direto a elementos cerebrais, percepções e conceitos, que compõem a mente e o comportamento iniciador. Ninguém hoje em dia pensaria seriamente em discutir o fato de que o cérebro iem algo a ver com o comportamento, e provavelmente ninguém nunca o fez de fato, certamente Skinner também não. O que ele defendeu foi a necessidade do estudo do comportamento em si mesmo, o que é muito diferente de dizer que o estudo do cérebro não é de interesse. Pelo contrário, seu argumento repetidamente foi que, se nosso conhecimento do funcionamento cerebral vai se desenvolver, ele necessita, entre outros requisitos, de métodos adequados para estudo do comportamento. Se enten dermos as razões para sua posição metodológica, entenderemos também como é que técnicas de laboratório delineadas por Skinner foram tão amplamente aceitas em vá rios campos das neurociências. Porque poderia parecer, à primeira vista, paradoxal que o condicionamento operante, inventado como o foi por um “psicólogo caixa-preta”, conquiste agora simpatia entre os neurocientistas de todas as denominações, sejam eles neurofisiologistas, neurofarmacologistas, neuroendocrinologistas, neurotoxicologistas, para nomear apenas alguns, como destacamos no capítulo 3. A cham ada abordagem caixa-preta havia sido classicamente atribuída à inge nuidade de Skinner em questões biológicas. Deveria ter sido relembrado que um de seus primeiros artigos, e parte de sua tese de doutorado em Harvard, foi parte de um trabalho exclusivamente teórico, intitulado “O conceito de reflexo na descrição do com portam ento ” .141 Recorren do à história das principais descobertas em fisiologia, de Glisson e Swammerdam a Sherrington, passando por Robert Whytt, Marshall Hall e Magnus, ele discutiu em profundidade a noção de reflexo e sua conexão com o estudo das relações entre eventos identificáveis que poderiam ser substitutos para aquelas forças ou entidades que, sob vários nomes, haviam sido utilizadas para explicar as ações de um organismo. Naq uele artigo inicial, ele destacou as principais ideias que iria elaborar, e de certo modo reformular, mais tarde em seu primeiro e influente livro, The behavior o f organisms.M1 Para Skinner, em 19 31, o conceito de reflexo, com o era tradicionalm ente utilizado pelos fisiologistas, era obviamen te inapropriado para descrever o tipo de material no qual os psicólogos estavam interessa dos, isto é, o comporta mento. A simples relação entre um estím ulo e uma resposta
140 Chan geux (198}).
141 Skinner (1931)142 Id. (1938).
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é claramente inadequada para explicar o comportamento. Esta relação é modulada por muitas variáveis, cujo estudo é mais crucial numa análise do comportamento do que o é a própria ligação estímulo-resposta. Skinner ainda não tinha chegado à noção de operante, nem à relação fundamental para a análise do comportamento, entre resposta e reforçamento> ao invés de entre estímulo e resposta. Mas ele certamente estava no caminho. Enquanto estudante de graduação e um novato em Harvard, Skinner aprendeu fisiologia e neurofisiologia em primeira mão de professores como Crozier, Forbes e Davis. Q ua nd o ele mais tarde escreveu sobre o “voo p ara fora do lab oratório” ,143 apontando para a tendência que levava muitos psicólogos experimentais para o trabalho com neurofisiologia, ele certamente não subestimou o progresso feito no estudo do sistema nervoso, nem ignorou sua contribuição para o nosso entendi mento a respeito do comportamento. Entretanto, defendia a necessidade do estudo do comportamento em si mesmo e avisou aos psicólogos que não deixassem sua área para se voltarem para a fisiologia, A objeção não era que a fisiologia não era interessante —de fato, era excessivamente interessante, ao ponto de muitos experi mentadores de primeira categoria deixarem a psicologia para cair na sua sedução, uma sedução baseada em sua sofisticação tecno lógica, seu grau de desenvolvim ento e sua respeitabilidade acadêmica. Skinner não questiona a contribuição desses pes quisadores para a ciência, apenas lamenta que a psicologia os tenha perdido: Não podemos discutir a importância de suas contribuições; apenas podemos imaginar, com pesar, o que eles poderiam ter feito ao invés disso.144 “O que eles poderiam ter feito ao invés disso”, na mente de Skinner, é con tribuir para uma descrição consistente das relações observadas no nível comportamental. Para a psicologia se desenvolver como uma ciência, e tomar seu lugar nas ciências da vida, ela precisa produzir fatos claros e reprodutíveis, construir conceitos teóricos em seu próprio campo, ao invés de escapar das dificuldades de uma análise do com portam ento tom ando em prestados fatos e conceitos de outra disciplina. Esta foi a mensagem do artigo mencionado anteriormente, no qual Skinner denunciou o “vo o para fora do laboratório” , de várias formas, uma das quais era o recurso ao homemfisiológico interno. Isso não era ignorância ou um ataque contra a fisiologia. A reivindicação de Skinner era que os psicólogos deveriam trabalhar em seus próprios níveis de análise, i.e., o comportamento, não para preservar uma ciência psicológica autônoma ou para organizar reuniões psicológicas, mas, de modo mais importante, 143 Id. (19 71, p. 314-330). 144 Id. ibid., p. )2Ó.
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porque o comportamento é um aspecto essencial dos organismos vivos e, portan to, porque outras ciências engajadas no estudo dos organismos vivos, tais como a neurofisioíogia, neuroquímica e neurofarmacologia, não podem progredir a menos que as descrições do comportamento sejam comparáveis, em rigor e refinamento, com as descrições dos eventos em seu respectivo nível de análise. Como podemos entender o funcionamento do aparato nervoso visual, da retina às estruturas corticais em projeção e áreas associativas, se perdemos o conhecimento intermediário das estimulações às quais o organismo reage por meio de seus receptores visuais e de como sua percepção visual está organizada no nível comportamental? Se a neurofisiologia da visão vem se desenvolvendo tão eficientemente, não é apenas por causa do progresso em descrever anatômica e fisiologicamente as vias e centros nervosos envolvidos, mas também porque claras descrições comportamentais estavam dis poníveis no trabalho dos psicofísicos e especialistas em percepção na psicologia. E parte do progresso recente no campo sem dúvida se deve ao fato de que os estudos de comportamento animal atingiram um grau de refinamento sem precedentes, graças às técnicas operantes. Muitos outros exemplos poderiam ser encontrados no campo da aprendizagem e da mem ória, ou no cam po da neurofarmac ologia: imenso progresso no registro, nos métodos de estimulação e de lesão, ou no rastreamento de neurotransmissores e drogas no sistema nervoso são apenas parte da história. Outra parte pode ser encontrada nas análises comportamentais de laboratório, que tornaram possível descrever e medir rigorosamente o curso da aprendizagem indivi dual em situações controladas, ou mostrar os efeitos de drogas no comportamento animal, detectar efeitos paradoxais ou propriedades aditivas, ou demonstrar a capa cidade de um organismo de discriminar entre diferentes estados internos induzidos por diferentes drogas. Não é surpresa, portanto, que os procedimentos delineados por um psicólo go que assumiu a postura metodológica de “ignorar o que se passa na caixa-preta” tenham sido tão amplamente adotados em vários campos das neurociências. Ao trabalhar obstinadamente em sua própria área, ele conseguiu forjar uma ferramenta mais efetiva para tornar explícitas para quem estuda o cérebro algumas das coisas que o estudante tem de explicar ao lidar com as funções daquele espantoso pacote de neurônios. E, se os neurocientistas ainda estão muito frequentemente se satis fazendo com especulações verbais ao falar de consciência, pensamento, intenção e outros semelhantes, é apenas porque, naquelas questões, os psicólogos ainda estão balbuciando e estão longe de oferecer aos seus colegas neurocientistas mais do que explicações filosóficas ou de senso comum. Skinner expressou e comentou repetidamente a sua posição a respeito da rela ção entre psicolog ia e fisiologia. Há muitas possibilidades de citações que ilustrariam igualmente bem seu ponto. A seguinte passagem contém os principais aspectos de sua visão:
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Isso não significa, é claro» que o organismo seja concebido como realmente vazio, ou que a continuidade entre o input e o output não será por fim estabelecida. O desenvolvimento ge nético do organismo e as complexas trocas entre o organismo e o ambiente sáo objeto de determinadas disciplinas. Algum dia deveremos saber, por exemplo, o que acontece quando um estímulo se choca contra a superfície de um organismo e o que acontece com o organismo depois disso, em uma série de estágios, o último dos quais é o ponto em que o organismo age sobre o ambiente e possivelmente o modifica Mas todos esses eventos internos serão explicados com técnicas de observação e medida apropriadas à fisiologia das várias partes do organismo, e a explicação será expressa em termos apro priados àquele objeto. Seria uma notável coincidência se os conceitos utilizados para se referir inferencialmente aos even tos internos encontrassem lugar naquela explicação. A tarefa da fisiologia não é encontrar fomes, medos, hábitos, instin tos, personalidades, energias psíquicas ou atos de vontade, de atenção, de repressão e assim por diante. Nem é sua tarefa encontrar entidades ou processos em relação aos quais tudo isso poderia ser considerado como sendo outros aspectos. Sua tarefa é explicar as relações causais entre input e output que sáo a preocupação especial da ciência do comportamento. A fisiologia deveria ser deixada livre para fazer isso do seu pró prio jeito. A medida que os atuais sistemas conceituais falham em representar as relações entre os eventos terminais correta mente, eles representam mal o papel dessas outras disciplinas. Um conjunto amplo de explicações causais formuladas com a maior precisão possível é a melhor contribuição que nós, como estudantes do comportamento, podemos oferecer nesta aventura cooperativa de dar um explicação completa do orga nismo como sistema biológico.145 Os argumentos para manter o universo do discurso das ciências comporcamentais à parte do universo da neurofisiologia —ou ciências do cérebro em ge ral - parecem suficientes no nível metodológico. H á, entretanto, ao menos um a categoria de cientistas que não estão prontos para se submeter a essa ideia: sáo os
145 Id. ibid., p. 269-170 . Reimpresso de “ '>7hat is psychotic behavior?" (id., 1956), publicado em Theory anA treatme nt o f the psychoses: w m e new er aspects (Gildea, 1956).
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psicofisiologistas, que, por definição, estão trabalhando em ambos os níveis, fisioló gico e comportamental, simultaneamente. Eles já fizeram um trabalho muito bom na época em que Skinner fez campanha contra o recurso ao homem fisiológico interno e continuaram seu trabalho com sucesso crescente. Skinner nunca se opôs à sua abordagem pluridisciplinar, integrativa. Ele estava consciente do papel de tais iniciativas na história da ciência: É difícil atacar essa teoria [i.e., teoria pseudofisiologizante, a ser discutida na próxima seção] sem parecer que estou cri ticando o psicólogo fisiologista, mas nenhuma crítica está envolvida. Há muitos precedentes na história da ciência para disciplinas limítrofes. Integrar os fatos de duas ciências é um esforço interessante e proveitoso.1*6 N o nível epistemo lógico, é também uma con quista muito desejável. Mas, no vamente, uma ciência integrativa requer um grau equivalente de controle experi mental e de clareza conceituai nos vários campos que ela pretende integrar. Onde estamos hoje, mais de 50 anos depois que Skinner escreveu seus artigos de retratação em defesa de uma ciência do comportamento como distinta da fisioLgia? Sem dúvida, as ciências “limítrofes” tiveram tremendo progresso, como o pró prio Skinner reconheceu em resposta a um comentário apontando para a mudança na situação; progresso em parte devido, como ele também enfatiza, à qualidade das técnicas comportamentais agora disponíveis.147 O momento pode ser propício para uma verdadeira ciência integrativa do cérebro e do comportamento emergir, e o atual entusiasmo nas neurociências, renovado interesse no velho problema Mente e Matéria (Cérebro e Mente/Cérebro e C om portam ento), certamente aponta naquela direção. Isso não quer dizer que os psicólogos devam abando nar suas especificidades metodológicas. Isso pode ainda permanecer por algum tempo como o caminho mais apropriado para que eles contribuam para uma neurociência integrada. De forma bastante curiosa, o pretexto para uma ciência psicológica específica, distinta da neurofisiologia, foi dado, mais recentemente, não por behavioristas fora de moda, mas por alguns cognitivistas. Em sua influente teoria de percepção visual, o finado D avid M arr claramente distinguiu três níveis de análise - computacional, representacional e o nível da impleme ntação - e argum entou em p rol da visão de que a ciência deve lidar com eles nessa ordem, começando com o nível mais abs trato e mais geral e terminando com a implementação neurofisiológica. Marr, que
346 Skin ner (1972, p. 303). Reimp resso de Current trends in psychology (D e n n i s et al., 1947). 147 Ver resposta do autor ao comentário aberto dos pares em “Methods and theory in the experimental analysis of behavior’ (R j c h e l l e , 1984, p. 541-546).
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era também um expert em neurofisiologia (bem conhecido por seu trabalho com o cerebelo), náo é certamente mais suspeito que Skinner de ter ignorado a fisiologia de dentro dela própria. Porém, por razões admitidamente muito diferentes, ele che gou à conclusão similar de que, se a fisiologia deve elucidar o funcionamento do cérebro, ela necessita de uma descrição clara do que se passa no nível psicológico. A diferença - realmence im portante e que vai nos deter no pró xim o capítulo - está naquilo que ‘‘psicológico” significa. Enquanto, para Skinner, é essencialmente o que ocorre quando um organismo está interagindo com seu ambiente, para Marr se re fere principalmente a eventos e processos mentais que ocorrem na cabeça do sujeito. Em sua forma extrema, esta posição chamada “ funcion alista,\ MÍÍ com o defe ndida por Johnso n-L aird entre outros, sustenta que um a explicação dos requisitos "com puta cionais” não está suscetível a mudar de acordo com o que poderia por fim resultar da descrição neurobiológica. Se os comportamentos são vistos como meros indicadores de processos inter nos, úteis para fazer inferências sobre esses processos, mas sem qualquer interesse em si mesmos, o status da psicologia —definida como a ciência dos processos men tais internos —em relação à neurobiologia gera, mais uma vez, questões difíceis e cruciais. Somos ainda novamente confrontados com o velho problema filosófico da substância da mente e o cognitivismo epistemológico pode ocasionar o retorno exp lícito ou não ao du alism o, e algumas vezes ao espiritu alism o.149 Se isso será visto, em longo prazo, como uma resposta correta, não pode ser definido agora, mas, por enquanto, os psicólogos devem ser claros sobre o modo como relacionam processos mentais e processos neurais. A posição funcionalista extrema afirma que a descrição psicológica, essencialmente inferencial, pode se sustentar sem qualquer considera ção às limitações neurais como especificadas pelas neurociências. Elas prometem decodificar o nível de implementação de hardware de modo que ele se encaixe na explicação cognitiva. A psicologia é dado status independente, como tivera anterior mente em sua tão criticada abordagem “caixa-preta”, mas com a fundamental dife rença de que os processos mentais e a substância neural ocupam o mesmo espaço físico, o que não era o caso do co mp ortam ento e da atividade cerebral “caixa-preta” . O funcionalismo preserva autonomia para a psicologia, mas a separa do tremendo progresso obtido nas neurociências, privando-a de novos insights que elas fornecem em muitas questões psicológicas. Aqueles que não mais se importam com o com portamento, embora não consigam ir tão longe de modo a aderir ao funcionalismo extremo, expõem-se ao risco de deixar seu lugar aos neurobiologistas à medida que eles progridem em sua área: se percepções e conceitos podem ser evidenciados com 148 O termo fun cio nalismo Foi utilizado para qualificar várias posiçóe.ç reóricas e metodológicas ao longo da história da psicolo gia, com significados diferindo daquele que vemos no presente contexto e nas ciências cognitivas contemporânea;,. Dicionários apropriados poderão esclarecer ox vários significados. 149 Ecd es (1979) e Poppcr & Fede s (1977).
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técnicas de imagem cerebral, por que alguém deveria insistir em utilizar métodos psicológicos indiretos? Este foi de fato o tipo de questão ansiogênica que alguns psi cólogos tiveram de enfrentar após ler o livro de Ch ang eux, The neuronal man, quan do foi publicado, em 1983. Quando discutimos sobre ação no capítulo anterior, eu afirmei que a psicologia exercerá seu papel no campo mais amplo das neurociências se ela se mantiver, como sua tarefa genuína, no estudo do comportamento e dos estados mentais inferidos no mesmo continuum de interação com o ambiente.
A ANALOGIA EVOLUCIONÁRIA II Já discutimos, em muitas ocasiões nos capítulos anteriores,150 a relação do mo delo evolucionário com a teoria de Skinner. Já sabemos que ele foi aplicado ao processo do condicionamento operante, visto como análogo ao processo de seleção sobre variação vigente na evolução biológica. Fizemos alusões a convergências neste ponto com Lorenz e com Piaget. A importância de entender a posição de Skinner é tal que exige maior elucidação e comentários adicionais. Skinner pormenorizou o lugar da analogia evolucionária em sua visão do com portamento em uma série de artigos importantes publicados nos últimos 15 anos de sua carreira. Sua preocupação com esse modelo, entretanto, começou muito antes. E geralmente datada de seu artigo de 1966 em resposta ao ataque de Lorenz à abordagem behaviorista do comportamento animal. Isso pode levar à conclusão equivocada de que seu interesse no modelo de variação e seleção emergiu a partir da controvérsia sobre a tese de Lorenz. Na verdade, ele já tinha apelado para o modo de explicação de Darwin muito antes e muito significativamente em Ciência e com portamento humano, em 1953. Desde então, ele se manteve evocando 0 modelo, com dois propósitos diferentes, mas igualmente importantes. Por um lado, o Darwinismo forneceu a ele, como à biologia, um finalismo alternativo e, consequentemente, um argumento decisivo contra o mentalismo. Ao recorrer a entidades mentais como fonte de comportamento, o mentalismo dá um lugar central, ao explicar a ação animal e humana, a conceitos como objetivo ou propósito, intenção, vontade, desejo e assim po r diante. A biologia havia recorrido a um conceito similar anteriormente para explicar a adaptação de organismos vivos. No interior do amplo arcabouço adotado da teoria da evolução, as funções adaptati vas não eram mais vistas como mecanism os direcionados a um propósito , mas como subproduto da história passada das pressões seletivas. Skinner credita a Thorndike o mérito de ter entendido a significância do modelo de Darwin na explicação do comportamento individual intencional, por ter tornado possível incluir os efeitos l$o Ver, especialmente, capítulos 4, 6 í 7
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da ação sem utilizar conceitos como propósito, intenção, expectativa ou utilidade e continuando: A solução de Thorndike foi provavelmente sugerida pelo tra tamento de Darwin dos propósitos filogenéticos. Antes de Darwin, se poderia dizer que o propósito de um olho bem desenvolvido era permitir ao organismo ver melhor. O prin cípio da seleção natural moveu ‘Ver melhor” do futuro para o passado.151 Neste contexto, a analogia evolucionária aparece como um precedente inspi rador, trazido de um outro campo da ciência, que auxilia muito eficientemente a resolver um problema antigo e admitidamente complicado de uma forma totalmen te diferente. Alguém poderia alegar que isso é apenas uma analogia e, como todas as analogias, pode ser ilusória. Os que se opõem à visão de Skinner (que rejeita as causas internas do presente em prol da ação seletiva do passado) argumentaram que, qualquer que seja o destino do pensamento teleológico na biologia, os seres humanos continuam a manifestar seus desejos e intenções, como é notável a partir de suas afirmações verbais de ações futuras. O debate foi retomado na psicologia contemporânea por vários pensadores cognitivistas, psicólogos e filósofos, muitos dos quais dão como certo que os seres humanos agem de determinada maneira para implementar intenções e objetivos prévios, cujo status é deixado sem qualquer análise crítica. A análise de Skinner pode ter sido supersimplificadora, embota ele mesmo estivesse consciente das complexidades decorrentes do uso da linguagem e da possibilidade resultante de falar sobre eventos e ações futuras. Mas dar às in tenções um tipo de status axiomático, sem necessidade de qualquer explicação, não resolve o problema. Sabemos, por meio de muitas abordagens teóricas diferentes na psicologia, a psicanálise em particular, que as intenções explícitas têm seus próprios antecedentes, aos quais podem estar relacionadas de forma ambígua, e não estão relacionadas claramente às ações que seguem. Em um contexto de certo modo diferente, Skinner recorreu à analogia evo lucionária, já apontada, como modelo explicativo chave para o comportamento operante. O processo em funcionamento na modelagem e manutenção dos com portamentos adquiridos (ao menos no tipo operante) seria paralelo ao processo que explica a evolução biológica: a chamada seleção natural. A analogia evolucionária oferece uma poderosa ferramenta que nos permite entender como novas formas dc vida em ergiram através da história biológ ica, sem abandonar a abordagem causal que caracteriza a explicação científica. E tentador transferi-la para a explicação do com 151
Retirado dc Skinn er (1963) confo rme reimpressão em Contingencies o f reinforcement (id. ibid., p. 106).
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portamento individual adquirido. O empenho de Skinner, de um modo mais amplo, estava direcionado para a elaboração de uma teoria do comportamento baseada no modelo evolutivo. Ao mesmo tempo em que reconhecia a contribuição fundamental de Thorndike, quando formulou a lei do efeito, Skinner levou a ideia mais além ao utilizá-la como conceito-chave para todo comportamento adquirido que não pode ser reduzido aos mecanismos associativos pavlovianos. Comportamentos operantes não sáo disparados como os reflexos, nem como as complexas sequências motoras como os chamados Padrões Fixos de Ação descritos pelos etologistas. Eles são emiti dos, por alguma razão, antes de serem seguidos por um reforçamento. São, de certo modo, espontâneos, para usar novamente a caracterização feita pelo próprio Skinner em The behavior oforganisms. A ação seletiva do ambiente não pode atuar antes de o comportamento ser produzido. As seguintes linhas do Science and buman behavior expressam inequivocamente a força do conceito na teoria de Skinner já em 1953: No comportamento operante, bem como na seleção evolutiva das características comportamentais, as consequências alte ram a probabilidade futura. Reflexos e outros padrões inatos de comportamento evoluíram porque eles aumentaram as chances de sobrevivência da espécie. Operantes se fortalecem porque sáo seguidos de importantes consequências na vida do indivíduo.'!1 O parágrafo contin ua com comentários a respeito do pro pósito, relevantes para a discussão anterior neste capítulo: Ambos os processos levantam a questão do propósito pela mesma razáo e, em ambos, o apelo a uma causa final pode ser rejeitado do mesmo modo. O tema ganhou importância cada vez maior nos escritos de Skinner, especial mente desde o artigo de 1966 da Science já mencionado. Ele recorreu à analogia evolucionária para explicar a produção da novidade e do comportamento criativo, tais como nas obras de arte.153 E muitos dos artigos mais im portan tes que ele pub li cou nos seus últimos dez anos eram co mpleta ou parcialm ente dedicados a ela.154 Em um desses artigos, “ Seleção por consequências” , Skinner desenvolveu a visão de que o mesmo processo, i.e., seleção sobre variação, explica todos os três níveis da vida: 152
Id. ibid., p. 90.
[53 Ver, especialm ente, dois artigos, reimpressos com o capítulos 21 e 23 (id., 19 71 ), que são leituras agradáveis, além de conter importantes observações sobre a questão aqui levantada. 154 Ver, especialmente, Skinner (19 8 1,1984b).
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o nível da evolução b iológica, ou da espécie propriam ente; o nível da aprendizagem individual (outros falariam de processos individuais de ganho de informação); e o nível da cultura ou das práticas sociais. Os três níveis lidam tradicionalmente com diferentes disciplinas científicas, respectivamente, biologia, psicologia e antropolo gia cultural. Não há dúvida de que há importantes diferenças qualitativas entre os três níveis e que o mecanismo singular a que todos eles se referem opera em cada caso sobre materiais distintos: pools genéticos não são o mesmo que ações motoras, que não podem ser confundidas com traços culturais. O processo comum necessita de algumas qualificações em cada nível, que levam à especificidade dos três campos da ciência relacionados. Entretanto, o processo básico inicialmente proposto no nível da evolução biológica foi emprestado como um modelo explicativo nos outros dois níveis. Surge a questão: há algo mais naquela transferência do que mera analogia, possivelmente útil como ferramenta didática, mas sem qualquer conteúdo além disso? Pode-se argumentar que as qualificações necessárias nos níveis comportamental e cultural são tão numerosas e tão interessantes que tornam a analogia quase sem sentido.155 Pode ser verdade que a evidência empírica disponível nos níveis comportamental e cultural é muito mais escassa que no nível biológico, mas isso não é, em si mesmo, um argumento contra a fecundidade potencial da hipótese, vista como substantiva ao invés de analógica. Dev emos lembrar que o darwinismo permaneceu como uma teoria fracamente fundamentada por evidência empírica convincente, embora bastante atrativa a muitos, até ser finalmente fundida à ge nética. Não há qualquer regra ou princípio que nos levaria a descartar a utilização substancial da analogia evolucionária além do domínio da evolução da espécie ao qual foi inicialmente e com sucesso aplicada. Vários cientistas, pertencentes a di versos campos e co m diferentes inclinações teóricas, assumiram uma co ntinuidad e substancial nos mecanismos básicos da evolução biológica para o crescimento e aprendizagem individual, para a evolução cultural mais amplamente ou em um aspecto específico, tal como a história do pensamento científico. Alguns exemplos típicos, selecionados entre os representantes mais proeminentes daquela tendên cia, serão apresentados brevemente aqui, colocando Skinner em boa companhia (e reciprocamente) e mostrando que ele não foi, neste aspecto de sua obra, ingênuo, fantasioso ou isolado. Ao destacar como ele compartilhou a analogia evolucionária com muitos outros, deveremos perceber seu particular ponto de vista como menos original e como reflexo de uma intuição que aparentemente emergiu independen temente em diferentes campo s e em diferentes mentes. Tais convergências denotam um dos aspectos mais encorajadores do fazer ciência: a fusão das principais ideias por imposição dos problemas tratados, a despeito de quaisquer preocupações di15S
Esta é a posição tomada, entre outros, por Plotkin (1987}.
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vergentes. Obv iamen te, todos aqueles que recorreram à analogia evolucionária em sua própria área de pesquisa ou em seu próprio viés teórico viviam no contexto da ciência moderna, impregnada pelas ideias cruciais de Darwin. Mas eles não tomaram emprestado generalizadamente uns dos outros. Pelo contrário, em geral trabalharam em ignorância mútua, como já apontado no caso de Piaget e Skinner. Piaget é, entre os psicólo gos,156 o único q ue deu maior peso em seu trabalho monumental à analogia evolucionária, e que a tomou mais seriamente, mais lite ralmente. Já discutimos (capítulo 7) sua teoria construtivista, comparando-a com a posição de Skinner. Vimos que um de seus principais componentes é a noção de uma continuidade fundamental das formas elementares dos processos biológicos até as mais altas conquistas da mente humana como exemplificadas na lógica e na ciência. Piaget pode ser visto como o psicólogo do século XX mais “evolucionário”, com Skinner logo em seguida. A explicação evolutiva era também inerente à etologia de Lorenz, como poderia se esperar de um biólogo cuja preocupação inicial, como indicado no capítulo 6, era explicar a diversidade do comportamento específico da espécie e relacioná-lo a outros aspectos (morfológicos) da evolução. Não iremos mais comentar sua obra, mas, sem dúvida, ele possui seu lugar no presente contexto. Transitando para outro campo, a história da ciência e epistemologia, não se pode deixar de mencionar Karl Popper como um dos pensadores mais famosos de nossos tempos que lançou mão extensivamente da analogia evolucionária tomada substancialmente. Um de seus principais livros, Objective knowledge, primeiramen te publicado em 1972, traz o subtítulo an evolutionary approach.'57 O tema está, realmente, impregnado em seus escritos. E não é surpresa que um biólogo, o ga nhador do prêmio Nobel, Jacques Monod, tenha sido convidado para escrever a introdução para uma edição francesa do clássico The logic o f scientific discovery. Ele corretamente apontou: Conjectura e refutaçáo exercem, no desenvolvimento do co nhecimento, o mesmo papel lógico (como fontes de informa ção) que a mutação e a seleção, respectivamente, na evolução do mundo vivo. E se a seleção natural foi, no mundo vivo, ca paz de construir o olho dos mamíferos ou o cérebro do Homo sapiens, por que a seleção das ideias não teria sido capaz, em seu próprio reino, de construir a teoria darwiniana ou a teoria de Einstein?158 156 Para detalhes sobre os outros usuários da analogia evolucionária na psicologia, ver Plotkin (1981), Plotkin & OdUng-Smee (1981). Van Parijs (1981) discutiu com algum aprofund amen to o paradigma evolutivo nas ciências sociais. 157
O livro inclui alguns artigos escritos anteriormente. As citações feitas nesce capítulo são da edição revisada de 1979 .
158
Monod \apud P o p pe R, 5978. p. 4). A introdução de Mon od é datada de 1071 e apareceu na edição de 1973. Tradução minha.
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Monod estava apenas repetindo as inúmeras afirmações feitas por Popper, i pressando sua concepção evolucionária do desenvolvimento científico. Especialme te relevante para nossa discussão é a caracterização feita por Popper do crescimen do conhecimento como um caso especial de aprendizagem: O crescimento do conhecimento - ou o processo de aprem zagem não é um processo repetitivo ou cumulativo, mas < eliminação de erro. É seleção darwiniana, ao invés de instn çáo lamarckiana.153 Tudo isso pode ser expresso ao dizermos que o crescimenc de nosso conhecimento é o resultado de um processo mui» semelhante ao que Darwin chamou de “Seleção natural”; ist» é, a seleção natural de hipóteses: nosso conhecimento consi* te, em cada momento, naquelas hipóteses que mostraram sua adequação (comparativa) ao sobreviver na luta pela existência; uma luta comparativa que elimina aquelas hipóteses que não se adaptam.160
Popper segue adiante para enquadrar sua visáo da evolução do conhecimento científico na visáo geral do desenvolvimento do conhecimento - ou aprendizagem - nos sistemas vivos em uma fórmula que Skinner teria aprovado: Esta interpretação pode ser aplicada ao conhecimento animal, conhecimento pré-científico e conhecimento científico.
Além disso, insiste, novamente de uma forma que Piaget e Skinner teriam ratificado, no status da analogia: Esta afirmação da situação tem o propósito de descrever como o conhecimento realmente cresce. Não metaforicamente, em bora, é claro, faça uso de metáforas (...}. Da ameba até Einstein, o crescimento do conhecimento é sempre o mesmo.16'
O autor poderia ter chegado mais próximo à formulação de Skinner. Contudo, ele não reconheceu a similaridade, tendo focado sua atenção exclusivamente nos
IÇ9 Popper (1972, p. 144, grifos meus).
160 Id. ibid., p. 161. 161
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Id. ibid., p. 761.
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textos sociofilosóficos de Skinner, especialmente sua Utopia, que ele atacou vigoro samente. Skinner, de sua parte, parece não ter tido consciência do uso generalizado que Popper fez da analogia evolucionária. Este é outro caso de ignorância recíproca de dois grandes intelectuais.'61 A neurobiologia é outro campo onde os principais avanços teóricos recentes estão centrados no princípio da seleção sobre variações. Changeux recorreu ao mo delo evolutivo para explicar a formação das redes sinápticas no desenvolvimento neural em sua teoria da “ estabilização seletiva” . Estendendo seus interesses para o funcionamento do cérebro enquanto o órgão envolvido nos processos cognitivos e no comportamento, eíe propôs uma abordagem dinâmica da cognição seguindo o mesmo mo delo, chamado de “darwinism o generalizado ”. Atitude sim ilar foi tomada po r Edelman, cujo livro Neural Darwinism: the theory o f neuronal group selection163 não apenas apresenta a teoria do autor do desen vo lvimento epigenético neuronal fortemente ancorado numa versão atualizada do selecionismo e pensamento populacional, mas preenche a lacuna com as ciências comportamentais ao estender o mesmo esquema teórico para os níveis psicológicos da ação, percepção, categorização, memória e aprendizagem. Esse livro mereceria especial menção no presente contexto, por ser mais do que outro exemplo do uso do mesmo tipo de princípio explicativo nos vários campos. Ele é, muito mais ex plicitamente que em Changeux, um esforço em direção a uma síntese entre aqueles campos. Lim itar-nos-em os a duas pequenas citações do capítulo conc lusivo de Edel man que claramente ilustra as similaridades com outros pensadores citados acima, compartilhando com eles a analogia evolucionária no sentido substancial, e seu co rolário, o conceito de seres vivos como geradores de diversidade, uma condição que oferece ao processo seletivo o material sobre o qual ele pode agir: E importante, por exemplo, distinguir entre respostas com portamentais evolutivamente determinadas e aquelas que de pendem da variação individual no tempo somático164 dentro de uma espécie. No tempo somático, a primeira visão implica instrução-informação do ambiente fundamentalmente deter mina a ordem da conectividade funcional (embora náo neces sariamente aquela da conectividade física) no sistema nervoso. 162 Pop per ter declarado repugnâ ncia às ideLas sociopoliticas de S kinn er não é suficiente p ara explicar o fato de que ele não se referiu a outros aspectos de seu trabalho científico e, mais especificamente, à sua utilização da teoria evolucionária de uma forma muito próxima à sua própria. Ele ignorou Piaget de modo semelhante: nem em Objective knowledge, nem em sua importante contribuição ao livro com John Eccles, The self and ia bmin (Poppér & E c ct ís , 1977), podemos encontrar qualquer alusão ao trabalho do epistemólogo evolutivo suíço, cujos textos estavam disponíveis para qualquer u m em inglês. 163 Edelma n (1987). 1Ó4 A expressão “tempo som ático” se refere ao tempo de vida de um organismo individual. Nos termos de Skinner, poderia ser substituído por “ontogénese”.
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A segunda alternativa é seleção-grupos nos repertórios neuronais preexistentes, que formam populações determinadas pela filogênese e pelos geradores de diversidade ontogenéticos, sáo selecionados por estímulos de modo a permitir padrões de resposta altamente individuais. Edelman propõe uma teoria neuronal que integra a dimensão do desenvolvi mento e os requisitos indicados pelo estudo do comportamento na etologia e nos estudos experimentais dos mecanismos de aprendizagem (a síntese anteriormente sugerida entre Piaget, Skinner e Lorenz) e, apesar de resistir à tentação da genera lização para a evolução cultural, ele prevê a reconciliação entre as regularidades da natureza e a criação individual da novidade: Se a extensão a essas questões finalmente se mostrar viável, entáo não surpreenderia se, até certo ponto, cada percepção fosse considerada como um ato de criação e cada memória, um ato de imaginação. O sabor individualista e a riqueza ex traordinária dos repertórios seletivos sugerem que, em cada cérebro, elementos epigenéticos têm papéis fundamentais e imprevisíveis. O determinismo genético categórico não tem lugar em tais sistemas; nem o tem o empirismo instrucionisca. Em vez disso, fatores genéticos e de desenvolvimento intera gem para permitir sistemas de notável complexidade capazes de um grau igualmente notável de liberdade. As restrições impostas a essa liberdade pela cronologia e pelos limites dos repertórios, embora certas, não parecem tão impressionantes quanto a habilidade infinita dos sistemas seletivos somáticos tais como o cérebro para fazer frente à novidade, generalizar sobre ela e se adaptar de maneiras imprevistas.1^ Edelman faz referências abundantes e apropriadas a estudantes do comporta mento e especialmente da aprendizagem, de Thorndike a Macintosh, de Pavlov a Rescorla. De m odo muito relevante, ele se refere a Stadd on ,166 um dos estudantes do comportamento da geração pós-skinneriana que desenvolveu uma teoria da apren dizagem elegantemente voltada para a integração do modelo evolutivo em ambos os níveis, comportamento específico da espécie e comportamento individualmente
165 Edelm an {1987, p. 329). 166 Scaddon (1983).
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apren dido.'67 Ele tam bém se deparou com o selecionismo próprio de Skinne r e dá crédito a ele por ter insistido no controle pelas consequências. Porém lhe nega um real entendimento a respeito do que uma explicação selecionista trata. Condena Skinn er por ser apenas um instrucionista, sustentando que a aprendizagem é essen cialmente a impressão da informação do ambiente sobre o organismo. Sabemos que esta não é uma imagem justa da posição de Skinner, embora tenha sido mantida po r mu itos outros, incluind o Piaget. Talvez uma explicação para essa distorção do pensamento skinneriano esteja no fato de que ele não conseguiu encontrar suporte em pírico para seu tratamen to teórico da questão da variação-seleção, ou, mais precisamente, qu e ele não conseguiu testar experimen talmente m etade do processo, i.e., a variação. A questão “a analogia inspirou um p rograma em pírico?” Plotkin prontamen te respondeu “não” ,168 significando que nem o próp rio Sk inner nem seus seguidores submeteram a analogia à validação no nível comportamental por meio da investigação das fontes e da natureza da variação comportamental. E verdade que, com as poucas exceções citadas no capítulo 4, pouca pesquisa experimental foi dedicada àquele importante aspecto do mecanismo de aprendiza gem, a despeito do lugar que lhe fora dado nos escritos teóricos de Skinner. O traba lho imp lementad o no laboratório de Skinner, bem co mo aquele realizado por outros analistas do comp ortam ento, focalizou quase que exclusivamente a ação seletiva do ambiente. Contingências de reforçamento foram exploradas em todas as direções, e a atenção estava principalmente centrada em estados estáveis, em detrimento do próprio processo de aquisição, presumivelmente um objeto de estudo mais apro priado para quem se interessa pelo processo de variação. Como explicar tal descaso? Inicialmente, deve-se admitir que nem todas as implicações da analogia evolucionária como um modelo para o comportamento operante foram completamente consideradas pelo próprio Skinner até o final dos anos 1950 (se supomos que ele amadureceu o tema a partir de suas formulações iniciais em 1953 até o seu artigo de 1966, motivado pela publicação de Lorenz). Este é também o mom ento em que ele aband onou quase que completamen te o trabalho experimental e se voltou para os escritos teóricos. Suas importantes contribuições para o laboratório desde o início dos anos 1930 até a publicação de Schedules of reinforcement69 haviam demon strado pouca preocupação com a variação comp or tamental. Há pouca dúvida de que houve um deslumbramento, em Skinner e seus discípulos, pelos efeitos regulares das contingências de reforço, relacionado a uma fascinação pelo lado produtivo das técnicas altamente automatizadas utilizadas no laboratório operante. Também é justo observar que o estudo da variação, em
167 Edelman Utpuà Stah dc in, 1983I. Ele também pod eria ter feito referência a Scaddon & Sim melha g (1971). 168 Plotkin (1987). 169 Ferster & Sk inner (1957).
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si mesma, não é fácil. É difícil desembaraçar a variação como uma propriedade intrínseca do organismo que se comporta e a variação enquanto um subproduto de um fraco controle experimental. Psicólogos que, desde o início de sua ciên cia, lutaram para estabelecer respeitabilidade científica, nunca buscaram expor a si mesmos a culpa pela falta de rigor, e ninguém pode ter certeza de que estudos empíricos rigorosos sobre a variação no operante poderiam ter sido possíveis antes de a tecnologia computacional invadir o laboratório. Demonstrou-se que agora isso é possível por meio de uma série de experimentos, muitos dos quais foram discutidos no capítulo 4. Se considerarmos que uns 40 anos se passaram desde The phylogeny and ontogeny o f behavior, podemos perguntar por que essa questão crucial na teoria do comportamento não ensejou um maior número de testes expe rimentais e podemos entender que alguns mal-entendidos sobreviveram, sobre esse ponto em particular, entre os críticos de Skinner, mesmo entre aqueles que eram bastante favoráveis às suas visões.
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9 DO MENTALISMO AO COGNITIVISMO
VlDA MENTAL E BEHAVIORISMO Para os psicólogos contemporâneos, cuja maioria se define como cognitivista, ou ao menos como especialista em ciências cognitivas, o antimentalismo obstinado de Skinner aparece como sua maior falha, senão como seu pecado capital. Para eles, o antimentalismo definitivamente deixou Skinner para trás, alheio aos avanços recentes da psicologia, que se voltou de novo para o estudo da mente. A questão não pode ser esclarecida sem colocar o antimentalismo de Skinner em seu contexto original ou sem apontar do que o, cognitivismo trata e o que são seus problemas internos atualmente. É de especial importância, pois Skinner gastou parte conside rável de seus escritos dos últimos vinte anos repetindo sua posição básica e refinando seus argumentos contra os princípios cognítivistas. O antimentalismo de Skinner deve ser entendido dentro do arcabouço do behaviorismo e em relação ao seu próprio ramo, o behaviorismo radical. Como é bem conhecido, a revolução behaviorista era essencialmente direcionada a fugir do beco escuro em que se achava a psicologia na virada do século XX. Apesar de seu respeito pelo rigor metodológico, a psicologia continuava a confiar na introspecção como principal fonte de informação ou como a principal fonte para coleta de dados, relacionados a estados mentais ou à vida mental. A abordagem se mostrou insatisfa tória em mu itos aspectos. En tre outros, a confiabilidade nos autorrelatos em apontar os determinantes reais da condu ta foi seriamente questionada p ela psicanálise; p sicó logos da escola de Würzburg falharam em sua tentativa de elucidar processos de pen samento por meio de métodos introspectivos; estudantes do comportamento animal não podiam contar com o progresso da psicologia científica humana, enquanto o trabalho experimental com animais na fisiologia se mostrou mais e mais frutífero para delinear leis gerais e para lidar, em uma segunda etapa, com o corpo humano. Qu and o Watson proclamou que a psicologia era a ciência do com portamento, ele estava cristalizando ideias que já haviam sido expressas de uma forma menos assertiva por outros (especialmente por Pièron na França'70), ou que haviam sido
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elegantemente postas em prática, embora com pouca elaboração epistemológica, por Pavlov e sua escola. Foi um segundo passo no sentido da integração do campo das ciências naturais, após a fundação da psicologia científica meio século antes. Eventos observáveis e comportamentos eram enfatizados e estados mentais eram deixados de lado. Embora a nova visão de psicologia tenha se espalhado de forma muito rápida e tenha se tornado amplamente aceita, o mentalismo não saiu de cena, como já observamos no capítulo i: estados, entidades e construtos mentais ainda floresciam em muitas áreas da psicologia, sob nomes como aptidões, atitudes, necessidades, impulsos, traços e outros semelhantes. Aqueles psicólogos que conti nuaram a utilizar estes conceicos ou similares para explicar ações humanas nunca foram behavioristas de fato, mesmo que tivessem definido, algumas vezes, quando questionados, a psicologia como ciência do comportamento. Já vimos que o antimentalismo de Skinner enfrentou esses abusos das “ficções explicativas", as quais, para ele, tinham o efeito perverso de interromper o caminho para uma análise real do que acontece por fornecer status causal a estados internos inferidos e incontrolá veis. Esta também foi sua princ ipal ob jeção ao aparato psíqu ico da teoria freudiana, embora ele reconhecesse a qualidade das observações de Freud e lhe desse mérito em relação à abordagem determinista da psicologia humana (ver capítulo 5). O contraste entre tais posições extremas está claro o bastante e torna os argumentos pelo antimentalismo cristalinos, se ainda passíveis de debate. Uma questão muito mais sutil e muito mais importante em relação ao cresci mento recente do cognitivismo surgiu, entretanto, entre os próprios behavioristas. Ela opôs os então chamados behavioristas metodológicos aos behavioristas radicais. Eles diferem principalmente pelo status dado aos eventos e estados mentais. Os behavioristas me todológicos adm item que a vida men tal não é diretamente acessível ao escrutínio científico, enquan to assumem, mais ou menos explicitamente, que ela é o que os psicólogos realmente gostariam de entender. Então eles se satisfazem em estudar o observável, acreditando no sucesso, emb ora limitado, e se conform ando em se manterem para sempre na superfície das coisas. O behaviorismo radical toma um a postura drasticamente diferente. Ele susten ta que a vida mental não é nada essencialmente distinta do comportamento e que não há qualquer princípio que leve à distinção entre o comportamento observável e o que se passa dentro do organismo, se é que a psicologia deve de fato lidar com isso (discutimos o problema da relação entre análise comportamental e neurobiológica no capítulo 8). A distinção se deve apenas ao senso comum tradicional pré-científico ou não científico ou a interpretações filosóficas, que não são mais relevantes para uma abordagem científica da psicologia do que a explicação bíblica da criação era para o real entendimento da origem das espécies. Naquela perspectiva, o estudo do comportamento é visto como abrangendo tudo aquilo que deve ser conhecido no nível psicológico. Ela não considera nenhum território impenetrável, para cuja
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exploração fossem necessárias ferramentas que estivessem além da competência da ciência, um território em qu e se poderiam en contrar alguns agentes ou causas intan gíveis de fenômenos observados (que é a postura do behaviorismo metodológico). O significado da palavra comportamento, nesse contexto, não se restringe a simples ações motoras: ele tamb ém se estende ao compo rtamen to verbal, solução de proble mas e novidade. Não se pode esperar que essas posições estejam livres de dificuldades. Realmen te, dificuldades existem de ambos os lados, e elas possivelmente explicam, até certo ponto, por que o behaviorism o radical foi fortemente rejeitado por muitos e por que o behaviorismo metodológico acabou gerando o cognitivismo. Para os behavioristas metodológicos, duas posições são possíveis com relação ao status da vida mental, Ou ela é, em essência, inacessível à investigação científica, e os psicólogos teriam que se satisfazer em estudar apenas suas manifestações explícitas no comportamento observável: eles estariam condenados ao platonismo, por assim dizer, fadados a contemplar a imagem das essências. Ou se poderia esperar que as limitações atuais fossem apenas temporárias, que o progresso técnico da ciência que braria, por fim, a fronteira e daria acesso à vida mental. Embora os debates em torno dos limites intransponíveis do conhecimento científico reapareçam repetidamente ao longo da história de todas as ciências, os cientistas geralmente tendem a pensar de forma confiante em seu próprio poder e deixar aberta a possibilidade de que, mais tarde, poderão compreender, por fim, o que lhes está próximo atualmente, Como verem os, o cogn itivismo é em parte a evolução do behaviorismo metodológico que emergiu do progresso nos procedimentos experimentais, dando acesso a domínios até então inacessíveis; mas, em outro aspecto, ele também relegou o behaviorismo ao nível de uma simples expressão da vida mental mais profunda, finalmente revelada. O behaviorismo radical também tem seus próprios problemas. Skinner insistiu que suas objeções ao mentalismo não foram tanto em relação ao fato de que as coisas a que o mentalismo se referia eram mentais, mas que, muito frequentemente, ele destrói o camin ho para uma explicação verdadeira. Skinner reconheceu qu e existem tais coisas enquanto eventos internos (se quisermos evitar a palavra mental), que per tencem ao dom ínio do com portam ento. A pele, com o ele indica, não é a fronteira importante. Porém, se o for, permanecem as questões: qual é o status desses eventos internos e como eles podem ser abordados? Como devemos traçar os limites entre aquilo com que podemos lidar dentro da análise do comportamento e o que deve ser deixado à fisiologia —depois da sugestão de Skinner, em outras ocasiões, de que os processos mentais deveriam ser deixados para aqueles equipados para explorá-los apropriadamente? N o caso mais simples, como na fala encoberta, parece mu ito fácil explicar o processo de internalizaçáo de um comportamento inicialmente aberto e mesmo caracterizar tal “comportamento interno” recorrendo a procedimentos sim ples, como aqueles utilizados por Vygotsky com crianças naquele caso particular.
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Poder-se-ia estender o mesmo argumento para “ver na ausência do estímulo visto”, ou outros casos de “com portam ento perceptivo" sem qualquer estímulo presente, ao olhar a percepção como ação, ao invés de cópias registradas a serem armazenadas, mas, claramente, tal ação não é acessível à investigação com facilidade. Em algum ponto, os psicólogos não dispõem de outro caminho, a não ser fazer inferências e desenvolver procedimentos que deem máxima plausibilidade a suas inferências. Há pouca dúvida de que o surgimento do conceito de “psicologia cognitiva” e a emer gência do movimento “cognitivista” tiveram origem no problema das inferências. Mas o movimento evoluiu em tantas direções, que devemos primeiramente tentar analisar suas formas mutantes, antes de qualificar a posição.
COGNITIVISMOS: UMA TENTATIVA DE CLASSIFICAÇÃO QUÁDRUPLA O surgimento do cognitivismo não deixou Skinner indiferente. Ele reagiu so bre muitos aspectos e de maneiras muito diferentes. Ele foi, algumas vezes, patético e retórico, como no final de uma de suas conferências imitando o estilo de Zola em seu famoso panfleto relacionado ao caso Dreyfus;17' algumas vezes, irônico; outras, erudito, como em sua busca pela origem comportamental dos termos e conceitos cognitivos;172 algumas vezes, desencantado e resignado, como em seu artigo “Whatever hap pen ed to psycho logy as the science o f behavior?” .173 Sua ú ltima conferência, ministrada poucos dias antes de seu falecimento, cujo ma nuscrito ele comp letou um dia antes, foi outro, particularmente firme, ataque ao cognitivismo, o qual ele não hesitou em comparar ao criadonismo: A ciência cognitiva é a ciência da criação na psicologia, à me dida que luta por manter a posição de uma mente ou self.'7* Antes de resumir seus argumentos, será útil delin ear o significad o do termo cognitivismo, que se tornou a palavra mágica da moderna psicologia. Parece im possível fornecer uma única definição ao que aparece, em análise, como um rótulo comum aplicado a coisas muito distintas. E difícil não chegar à conclusão de que há cognitivismos, ao invés de um cognitivismo. Pode haver algumas mudanças de um para outro, mas há diferenças suficientes para não confundi-los. A seguinte classifi
171
Skinne r (1985), reimpresso em 1987.
m
Id. (1989a), reimpresso em 1989b.
173
ld. (1987a, reimpressão: 1989b).
174 U . (1990).
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cação é admitidam ente uma tentativa,175mas ajudará a analisar as críticas de Skinner, que nem sempre se direcionam ao mesmo tipo de cognitivismo. Parece apropriado distinguir quatro tipos de cognitivismo, caracterizados por diferentes ênfases nos níveis metodológico e epistemológico e com impactos distintos sobre aspectos práticos e sociais das ciências psicológicas. Para facilitar a referência, irei nomear esses quatro tipos de cognitivismo como metodológico, epistemológico, ético e institucional, respectivamente. O cognitivismo metodológico segue perfeitamente a linha que o precedeu na tra dição da psicologia científica, baseado também no uso de procedimentos científicos para aumentar o entendimento sobre uma determinada área da realidade. A ênfase em processos internos (processamento de informação, representação, organização da me mória e assim por diante) reflete o fàto de que se progrediu na resolução do problema da acessibilidade, um problema central enfrentado por toda ciência que se depara com os limites da observação e da plausibilidade da inferência. Novas técnicas foram desen volvidas, ou antigas técnicas foram melhoradas, que agora tornam possível o estudo de fenômenos e processos até então inacessíveis ou simplesmente não imaginados (vi mos no capítulo 3 como procedimentos operantes contribuem para esses progressos). Novas hipóteses foram formuladas, que visam a explicar as propriedades observadas em dados previamente coletados. Novos modelos teóricos foram implementados para integrar fatos que não se encaixavam em abordagens anteriores. Tudo isso constituiu uma evolução, ao invés de uma revolução\ uma evolução cujas fases principais po dem ser facilmente identificadas no passado, incluindo o passado do behaviorismo. Geralmente, Tolman leva o mérito por ter estabelecido importantes questões para a explicação do comportamento intencional ou por ter proposto mais tarde, ainda mais claramente antecipando as abordagens cognitivas, a noção de um mapa cognitivo na análise da aprendizagem latente em procedimentos de labirintos com ratos. A maior parte dos neobehavioristas se preocupava, de um modo explícito, com os processos que ocorrem entre o estímulo e a resposta e recorreu, com sucesso variado, a variáveis intervenientes. Skinner traçou a origem inicial da psicologia cognitiva, vista como um ramo da psicologia científica americana advindo da tradição behaviorista, ao re curso de Tolman às variáveis intervenientes. Na revisão do livro de Laurence Smith, Behaviorism and logicalpositivism (1987), reimpresso no Recent issuef76 como capítulo 10, página 109, ele comenta sobre Smith atribuindo a posição de Tolman à influência à qual se submeteu em Viena, durante um ano sabático (1933-1934). Skinner sugere, como alternativa plausível ou explicação suplementar, que Tolman pudesse ter sido
175 Para uma discussão mais elaborada para os vários tipos de cogn itivism o nos diferences contex tos, ver Riche lle (1986a, 1987b) e Richelle &í Fontaine (1986).
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influenciado pelo artigo de Skinner de 1931, que “ele havia lido com entusiasme discutido com seu grupo” . Tolman e Skinner usaram fórmulas semelhantes para explicar a causaçáo < comportamento, exceto pelo status dos fatores adicionais —além do estímulo, história passada e a hereditariedade. Skinner os considerou simplesmente “terct ras variáveis” , enquanto Tolman os denomino u “variáveis intervenientes” . Skinn comenta: “Aquele pode ter sido o ponto em que a análise experimental do con portamento se separou daquilo que viria a ser a psicologia cognitiva”.'77 Os artigt fundamentais de Karl Lashley, especialmente sua famosa conferência sobre a ordei serial do comportamento, abriram o caminho para a noção de programa para ação motora, que se revelou um dos conceitos mais úteis na pesquisa posterior er psicofisiologia e psicologia das ações motoras. A teorização de Heb b sobre o tipo de organização neural necessária para ; aprendizagem se revelou igualmente estimulante, se comparada às contribuições d> Tolman ou Lashley, e ainda é no contexto atual, possivelmente além do cogniti vism o, um a fonte de inspiração para os conexionistas. Geor ge Miller, Galan ter « Pribram, Broadbent e, logo depois, Neísser, seguiam os passos desses e de outros importantes precursores quando estabeleceram as fundações da chamada psicologia cognitiva. Como quase todos os outros campos da ciência, ela se beneficiou ampla mente dos avanços computacionais, tanto com o ferramenta técnica para experimen tar com uma eficiência sem precedentes (experimentos contemporâneos refinados sobre os processos de atenção, por exemplo, não teriam sido possíveis antes de o computador se tornar parte de qualquer equipamento de laboratório) quanto como fonte de metáforas explicativas, sugerindo modelos do funcionamento subjetivo suscetíveis à verificação empírica (uma condição extremamente importante se os modelos metafóricos se propõem a ser úteis). Observada à distância, descartando por enquanto os conflitos quase ideológicos que algumas vezes opõem cognitivistas e behavioristas, a pesquisa psicológica atual parece ser construída sobre o passado, o que significa expandir o trabalho anterior. Isso precisa ser feito para que novas ques tões possam emergir e novas ferramentas sejam delineadas para resolvê-las. Nem todos aqueles que estão atualmente engajados em tal pesquisa se sentem obcecados por sua afiliação a qualquer escola ou seita e pouco se preocupam a respeito da definição indiscutível do objeto da psicologia - com o muitos biólogos do passado pouco se preocupavam sobre a essência da vida, preferindo olhar de perto para os organismos vivos e progredir passo a passo em direção a um meíhor entendimento, que acabaria finalmente por elucidar o conceito de vida. O cognitivismo epistemológico, o qual poderia ser apropriadamente chamado de cognitivismo radicaL vai um passo além — um passo importante. A o invés de
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adicionar novos objetos àqueles já explorados, graças a novos processos genuínos e modelos, o cogn itivismo epistemológico mud ou radicalmente o objeto de estudo da psicologia: aos processos mentais é dada atenção exclusiva e o comportamento é re legado ao status de expressão observável das atividades mentais, possivelmente ainda útil - talvez não por m uito tem po —para inferir o que se passa no interior, mas sem qualquer interesse em si mesmo. Enquanto o behaviorismo pode ter sido acusado, alguma vez, de ignorar a vida mental e a consciência, reduzindo-as a epifenômenos do comportamento, o cognitivismo epistemológico reverteu completamente as perspectivas, entendendo o comportamento como mero subproduto de eventos mentais. Um exemplo extremo de tal cognitivismo radical pode ser encontrado na teoria de Dickinso n da aprendizagem anim al,178 na qual o autor afirma que “ mu danças comportamentais interessam apenas como índices de que a aprendizagem ocorreu e como indicadores da natureza das representações internas moldadas pela experiência”.179 As últimas, sob termos como representação, processos mentais, etc., são os verdadeiros objetos de estudo da psicologia. Os comportamentos são consi derados apenas à medida que, no presente, inferências devem se basear em algum dado observável. Supondo, porém, que alguém se proponha a ir diretamente às representações mentais e tenha sucesso, podemos dispensar o comportamento. O cognitivismo epistemológico claramente tomou a posição oposta ao behaviorismo metod ológico, especialmente na sua versão conhecida como operacionismo. Este úl timo reconheceu que a vida mental é importante, mas que apenas comportamentos observáveis são suscetíveis à análise científica. O cognitivismo epistemológico é mais otimista; ele vai, sem hesitação, ao estudo da vida mental, utilizando os comporta mentos até onde eles puderem ajudar, com a predição de que eles serão, por fim, completamente dispensados. A relação do cognitivism o epistemológico com a neurobiologia leva a um a série de questões críticas, algumas das quais foram tratadas no capítulo 8. Se nenhuma ferramenta psicológica é especificamente prescrita a priori para o estudo das repre sentações mentais, há o risco de que se abandone a psicologia e se vá diretamente à investigação neurobiológica, a qualquer momento em que os neurobiologistas
17B A teoria é exposta em detalhes em seu livro Contemporary anim ai learning theory ( D i c k i n s o n , 1980), cujo título iluso riamente sugere que nós temos a teoria, uma afirmação obviamente superotimista e pretensiosa. Para construir aquela teoria impressionantemente consistente, Dickinson teve de ignorar algumas dimensões importa.ntes da aprendizagem animal: pata citar apenas um ex emplo, a contribuição da etologia e da psicologia comparativa para os conceitos contemporâneos de aprendizagem animal é totalmente omitida !o nome de l.orenz nem mesmo é mencionado; nem o são palavras-chave, como testriçóes biológi cas. limitações específicas da espécie ou origens filogenéticas da aprendizagem individual). É interessante notar que o tradutor do livro para o francês, G. Richard, ele próprio um competente expert na área, estava consciente das pretensões infundadas do título e o converteu para o plural, L'apprentissage animal, Théories contemporaines (1984), o qual, infelizmente, não é menos ilusório, pois o livro é exclusivamente sobre uma teoria, i.e., a do autor.
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afirmem que têm acesso direto a elas.180 Isso náo seria um desastre mun dial, apenas o fim da ciência psicológica; mas a questão ainda deveria ser feita: a neurobiologia pode progredir sem uma ciência do comportamento? O cognitivismo radical pode apenas preservar a si mesmo do desaparecimento assumindo a posição funcionalista, conforme apresentada por Johnson-Laird e outros que afirmam a perfeita indepen dência da análise cognitiva em relação ao nível neural. Isso significa, por fim, que as contradições poderiam permanecer sem solução entre o nível neural e o cognitivo. Desnecessário dizer que afirmações em defesa da ruptura radical em relação às esco las anteriores de pensamento são encontradas principalmente entre os cognitivistas epistemo lógicos. O cognitivismo ético está relacionado à reabilitação do controle autônomo do agente psicológico, da racionalidade sobre as pulsóes instintivas, ou da vontade livre sobre os determinantes inconscientes da conduta. Pode ser uma reação contra a visão freudiana, bem co mo contra a visão darw iniana, de homem . Todas as teorias psicológicas que consideraram seriamente as hipóteses deterministas e que tentaram, como Skinner o fez, reformular os conceitos de propósito, intenção, desejo, prefe rência ou escolha referindo-se a fatores ambientais e históricos, se depararam com a fortaleza da vontade livre, porque estavam privando o sujeito de sua autonomia. O cognitivismo ético a traz de volta, mesmo que apenas por meio da mágica das pala vras. As metáforas co mputacionais deram renovada respeitabilidade a termos como escolha, decisão, seleção, etc. Estes termos eram geralmente tomados da linguagem leiga pelos primeiros cientistas computacionais, como nomes rápidos e fáceis, sem qualquer consciência a respeito dos problemas que eles criaram na psicologia; mais tarde, eles foram adotados pelos psicólogos cognitivistas com pouca consciência das razões puramente pragmáticas de sua presença nas ciências computacionais. O cognitivismo ético encontrou apoio em teorias recentemente elaboradas na neurobiologia e na psicologia que enfatizam a causação descendente (versus causação ascendente). Esta proveitosa distinção, ou visão bidirecional de causalidade, exem plificada por uma série de descrições convincentes em vários campos, alimentou novas formulações da racionalidade e espiritualidade humanas, como no dualismo de Eccles ou no “mentalismo náo dualista” de Sperry.lSl Apelava especialmente para os profissionais, e não surpreende que tenha invadido o campo da psicoterapia, no qual técnicas de autocontrole parecem ser favoráveis. Q uan do observado cuidadosa mente, ele apresenta muito pouca semelhança com os cognitivismos metodológico e
180 Essa redução, ou dissolução, do psicológico ao mental, e então ao neurobiológico, foi claramente sugerida, por exemplo, por Changeux em seu livro popular The neuronal man (1983). Sua famosa afirmação “O homem náo precisa mais de mente. Ele se satisfaz em ser um hom em neural” claramente descartou a psicologia cognitiva - frequentemente definida como ciência d a mente - como sem utilidade, à medida que a neurobiologia p rogredisse adentrando diretamente os mistérios do cérebro. Changeu x c o r r i g i u s u a s o p i n i õ e s desde então c respondeu à acusação dc r c d u c i o n i s m o . 181 Eccles (1979) e Spe rry (1983).
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epistemológico, o nível léxico mantendo uma unidade ilusória e confusa. De modo bastante estranho, algumas das terapias cognitivas emergiram das terapias comportamentais, conforme indicam os rótulos híbridos de terapia comportamental-cognitiva ou c ognitivo-com portam ental.'82 Finalmente, o cognitivismo institucional , em minha classificação, se refere à oposição explícita ou imp lícita entre a cognição, de um lado, e mo tivação, emoção e afeto, de outro. A ênfase na cognição ocorreu frequentemente em concomitância com a negligência ou o descarte da emoção e da motivação. Esta não é por essência uma distinção institucionalmente fundamentada: vai muito mais a fundo que isso. Mas possui importantes subprodutos institucionais à medida que estabelece uma distribuição de tarefas na psicologia acadêmica e uma divisão no currículo que, se me permitem fazer uma caricatura, reserva a cognição e a mente, com todo seu atual prestígio, para a psicologia experimental e teórica, deixando a emoção e todas as outras questões confusas para aqueles que tratam dos problemas da psicologia nos campos de aplicação. M uitos p sicólogos experimentais agora tendem a pensar a si mesm os com o “cog nocien tistas” , ao invés de psicólo gos, e estão prontos para se transferir para departamentos de ciência da comp utação o u de ciências c ogn iti vas para exercer seus talentos. N ão surpreen de, portanto , que os profission ais qu e precisam, mais que nunca, lidar com pessoas sofrendo de problemas de natureza essencialmente emocional e motivacional abandonem a ciência básica que não lhes pode ser muito útil. A recente divisão dentro da Associação Americana de Psicologia (APA) - que resultou na criação de uma nova sociedade de psicólogos acadêmicos e de pesquisa básica, com os profissionais p erman ecendo com o grande parte dos mem bros da A PA - é, em alguns aspectos, um ep isódio da revolução cognitiva.
S kinner
c o n t r a o s c o g n i t i v is m o s : e u a c u s o
. ..
Utilizando essa classificação adm itidame nte imperfeita, retornemos a Skinner e à sua posição em relação ao cognitivismo. Embora ele não tenha explicitamente tra çado o tipo de distinção que eu fiz, não é difícil diferenciar, entre seus argumentos, aqueles que se referem mais especificamente a cada tipo de cognitivismo, conforme caracterizado anteriormente. Há boas razões para pensar que, se o cognitivismo tivesse se reduzido ao seu ramo metodológico, Skinner de modo algum teria se oposto a ele. Ele teria comen tado sobre o uso de certos termos mentalistas, como o fez antes, mas não teria iden tificado qualquer novo perigo para a ciência do comportamento. Muito de acordo
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com a descrição que fizemos do cognitivismo metodológico, ele nota, na discuss dos comentários de pares aos seus principais artigos reimpressos: Muito do que se chama de ciência cognitiva é trabalho que f realizado mais ou menos do mesmo modo antes daquela obi mágica ser acrescentada.183 Ou, em outra ocasião, na mesma linha: Há muitos psicólogos cognitivistas que escáo fazendo pesqui sa de qualidade.184 Além disso, ele reconhece que importantes descobertas ocorreram sob vá ria bandeiras, e que não é necessário estar em um clube privilegiado de analistas dc comportamento para contribuir para o progresso da ciência comportamental: Muitos dos fatos, e mesmo alguns dos princípios, que os psicólogos descobriram quando achavam que estavam desco brindo outra coisa são úteis. Podemos aceitar, por exemplo, o que os psicofísicos nos dizem sobre resposta a estímulos sem concordar que eles mostram uma relação matemática entre os mundos mental e físico. Podemos aceitar muitos dos fatos relatados pelos psicólogos cognitivistas sem acreditar que os seus sujeitos estavam processando informação ou armazenan do representações ou regras.1®5 Podemos dispor ainda mais rapidamente do quarto tipo de cognitivismo, que não foi uma preocupação para Skinner. Uma distinção exata entre cognição e emo ção ou cognição e motivação foi estranha ao seu trabalho empírico e teórico. Embora ele tenha elaborado seu próprio modo de abordar questões motivacionais em termos de propriedades reforçadoras, ele sempre devotou muita atenção aos subprodutos emocionais dos controles aversivos em animais e humanos. Além disso, comentou repetidamente a respeito do lu gar dos sentimentos na análise com portamen tal, mos trando que a preocupação com uma abordagem científica não altera sua imp ortância
183 Skinn er {1984c, p. 507). 184 Id. f i^ b , p. 119). 185 Retirado de "Wh atev er happened to psychology as the science o f behavior?” (id ., 1987a), reimpresso em Recent issues in the analysis o f behavior (id.. rqSqb, p. 63).
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subjetiva.'86E le estava fortemente conve ncido de que a pesquisa básica sobre o com portamento poderia ter aplicações sociais importantes e investiu muita energia em mostrar em quais direções isso poderia ser feito (ver capítulos 14 e 15). O divórcio entre pesquisa básica e prática poderia lhe parecer apenas como um passo atrás. As objeções de Skin ner são endereçadas principalmen te para o segundo e ter ceiro tipos de cognitivismo e seus ataques são especialmente fortes contra o cognitivismo epistemológico. Seus argumentos são bem sumarizados em sua afirmação: A psicologia cognitiva é frequentemente apresentada como uma revolta contra o behaviorismo, mas não é uma revolta, é um recuo.'87 Esse recuo é em direção a hábitos e concepções que haviam sido abandonados pela psicologia científica por meio de um esforço vigoroso para se libertar do senso com um e das maneiras filosóficas de falar e explicar a conduta. Háb itos, em questão, são essencialmente hábitos no uso co mu m da palavra; concepções dizem respeito ao status dos eventos mentais. Skinner aponta para a invasão de termos que tinham sido cuidadosamente evitados no passado porque apresentavam muitos significados ou estavam conta minados com muitos usos linguísticos perdidos para se adequar a uma descrição científica. Ele acusa os cientistas cognitivos de afrouxar os padrões de definição e pensamento lógico e de permitir uma inundação de es peculação característica da metafísica, literatura e contato diário, especulação talvez adequada a tais áreas, mas inimiga da ciência.’88 Para ele, uma das explicações para o sucesso da psicologia cognitiva é que ela aceitou no vamente as antigas formas de se falar sobre o ser hum ano, retomando sem crítica o amplo uso de termos, tais como intenção, crença, mente, representação e muitos outros. Se observarmos a literatura psicológica atual, é difícil não concordar com Skinner que a terminologia se tornou menos rígida. Para tomar apenas um dos termos mais frequentes, representação, descobrimos que ela se refere a dezenas de 186 A questão dos sentimentos foi discutida em muitos textos de Skinner. Um de seus últimos artigos é de especial interesse, publicado com o título de “ The place of feelings in lhe analysis of behavior” (reimpresso como capítulo i em Reccni issues, id., 1989b). Foi escrito como resposta a um outro exemplo de interpretação equivocada da posição behaviorista, i.e,, que ela Supostamente negou os sentimentos. O caso é irônico, considerando que o equívoco clássico foi expresso por Johnson-Laird, um cognitivista bem conhecido, cuja obra certamente nos diz muito menos sobre sentimentos que a dc Skinner. 187 ld. (1987b, p. 120). 188 Id. ibid., p. 111.
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coisas e conceitos diferentes, geralmente sem definição. Skinner sustenta que, em muitos casos, esse novo estilo é desnecessário, e que termos comportamentais mais diretos expressariam as coisas de forma mais clara. Ele reformulou repetidamente afirmações típicas dos psicólogos cognitivistas em seus próprios termos behavioristas, com um resultado que deveria agradar àqueles que não desgostam da simplicidade. A preocupação com as palavras utilizadas na psicologia sempre foi central na reflexão de Skinner. Em um de seus principais artigos, publicado em 1945, ele lidou com a “análise operacional dos termos psicológicos”. Não satisfeito com as limitações impostas pelo operacionismo no estudo dos eventos privados, ele se pôs a explorar como os relatos verbais podem estar relacionados a estímulos e estados internos, e apontou para o papel da comunidade verbal na modelagem da descrição do sujeito a respeito de seu mundo privado. Esse artigo foi importante em dois aspectos. Pri me iro, ele deixou claro que Skinn er estava abordando eventos privados, que os operacionistas não negavam, mas achavam impossível de estudar. Segundo, ele deixou a base para elaboração futura de uma concepção de autoconhecimento e consciência enraizada na interação do ind ivíduo com a comu nidade verbal, uma visão que havia sido desenvolvida de forma muito independente por Vygotsky e por Luria.1*9 Um dos último s artigos de Skin ne r190 é com pletam ente dedicado ao exercício léxico de traçar a etimologia das palavras preferidas dos psicólogos cognitivistas. Ele não teve dificuldade em mostrar que, em praticamente todos os casos, aqueles termos, ou suas raízes etimológicas, se referem originalmente a comportamento ao invés de sentimentos ou estados da mente. Por exemplo, perceber originalmente significa capturar (do latim percapere), como compreender (no francês comprendre, entender) significava agarrar ou se apoderar (as palavras ainda são utilizadas em seus sentidos físicos e metafóricos) ou resolver, “libertar ou deixar livre”. Devemos admi tir que, embora interessante, tal investigação linguística realmente não demonstra que todos aqueles termos forjados pelas linguagens naturais não se referem de fato a eventos ou estados mentais; ela apenas revela, ou melhor, confirma, uma velha des coberta da linguística histórica, que eventos internos são primeiramente nomeados e descritos por palavras que se referem a eventos externos, como as abstrações são inicialmente delineadas por termos concretos, por m eio do m ecanismo da metáfora. O que Skinner estava fazendo naquela ocasião é ilustrativo de sua própria interpre
189 A origem social (paradoxal) da autoconsciência foi enfatizada repetidamente por Skinner, especialmente no Verbal behavior (1957), no qual ele aponta que o indivíduo se torna consciente através de um progressivo desenvolvimento de uma comunidade ver bal; a me sm a ide ia foi ex pre ssa po r Lu ria , que, elab ora nd o sob re as ideias de Vy go tsk y. viu a orige m da cons ciê nc ia, a mais alta forma de comportamento autofregulado, como estando náo nas profundezas de um organismo, mas nas modalidades complexas que caracterizam a interação entre a criança c seu ambiente social e na aquisição da linguagem (L u r l a , 1969); ver Richelle (1974a, 1993). 190 “T he origins o f cognitive thought”, reimpresso em Recent issues in the analysts o f beha vior (S k i k n e r , 1989b, capitulo 1).
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tação das origens do comportamento autodescritivo e da autoconsciência, ao invés de propriamente uma demonstração da irrelevância dos estados cognitivos.19' Contudo, não se trata apenas de retomar o rigor verbal no discurso dos psi cólogos. As palavras usadas têm, nesse caso, profund as imp licações - que são o nú cleo do cognitivismo epistemológico. Voltamos novamente à escolha crucial: são os chamados processos cognitivos parte do comportamento (são alguma coisa além de comportamento) ou possuem status mental em si mesmos, sendo o comportamento mero subproduto? A posição de Skinner, claramente em favor da primeira possibili dade, pode ser compreendida em poucos argumentos principais: i. A psicologia cognitiva, ao recorrer abunda ntemente e sem crítica a palavras cog nitivas”, atribui ao sujeito, animal ou humano, um conhecimento implícito ou ex plícito das regras, que estão, na verdade, na organização do ambiente do sujeito, ou, em alguns sentidos, na organização do com portam ento, mas não na cabeça do sujei to como entidade independente a ser posta para funcionar à vontade. Não há mais razões para explicar o comp ortame nto discrimin ativo, o u classificação de conceitos, ou reconhecimento facial em termos de “conhecimento”, que para explicar reações imunológicas. E óbvio que, se há alguma ordem no universo - que é a suposição fundam ental da ciência tudo que gostarmos de descrever e explicar, devemos descrever e explicar formulando regras, mas elas não precisam ser atribuídas às coisas descritas. As propriedades físicas de uma bicicleta combinadas com aquelas do cor po hum ano fortemente determinam a organização do comportamento de andar de bicicleta, mas não ajud a em nada inserir regras distintas do próprio comp ortamen to de andar de bicicleta ou que preceda sua ocorrência. A questão foi deb atida particu larmente em relação ao uso da linguagem e pensamento, que deveremos considerar em detalhes nos próxim os dois capítulos. Em bora resistente ao abuso dos cognitivistas do conhecimento das regras e da aplicação das regras, Skinner deu muita atenção ao status das regras no sentido de instruções verbais que os sujeitos humanos podem receber dos outros, ou po dem usar para si mesm os, seja na melho ria da performance motora, adquirindo comportamento adequado sem risco, como ao dirigir um carro ou ao resolver problemas. Diz-se, então, que o comportam ento é “go vernado por re gras”, de um modo explícito, e à medida que se pode dar ao comportamento verbal uma posição mais alta na hierarquia da organização do comportamento, podemos falar de uma causação descendente.
191 Um aspecto interessante do mape ame nto dos itens léxicos par a as realidades psicológicas é a diferença en.tr« as linguagens. As palavr as têm his tór ias dif eren tes em dif ere nte s lin guage ns, me sm o qu an do pr ox im am ente rela cio nad as, como po dem ser 05 idiomas indo-europeus. Por exemplo, mente não carrega algumas das conotações que fazem esprit difícil de ser retomado pelos psicólogos franceses, enquanto possui respeitabilidade adicional derivada de seu uso na recente filosofia da mente anglo-saxá. Cogntçáo não possui praticamente nenhum passado na França e seria esclarecedor analisar suas propriedades semânticas em comparação com connaiisanie e com knowledge.
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2. A psicologia cognitiva, provavelmente devido à influência invasiva da metáfora computacional, deu vida nova à velha teoria da cópia. Resumidamente, a teoria da cópia afirma que, quando percebemos algo, fazemos um tipo de duplicata da coisa percebida, que é armazenada de alguma forma em nossa cabeça; quando aprende mos algo, similarmente, as memórias são armazenadas em locais apropriados na nossa mente, de onde as retiramos quando necessário e na medida de nossa capaci dade. A palavra cópia foi amplamente abandonada e substituída por termos mais de acordo com a moda, como representação. Skinner não esperou pelo crescimento do cognitivismo para se opor à teoria da cópia aplicada à percepção e à memória/91 Ele entendeu a percepção e a aprendizagem enquanto ação, ao invés de simples registro do mundo externo. O organismo que percebe e memoriza é, obviamente, um or ganismo modificado, mas a mudança não consiste em adicionar uma percepção ou uma memória em algum lugar de armazenagem interna. A prim azia da ação, náo apenas em agir sobre o mundo , mas também em cap turar informação dele através de canais sensoriais, não é ideia exclusiva de Skinner. Ela aparece para muitos como uma conquista decisiva da psicologia científica. Foi um aspecto central nas concepções de Janet e ainda mais nas de Piaget. Como se sabe, Piaget relacionou as origens ontogenéticas do mais abstrato raciocínio lógico às ações motoras e geralmente falava de atividadesperceptuais, ao invés de percepção. A psicofisiologia sensorial deixara claro que inputs visuais ou outros tipos de input não são, via de regra, simples registros de eventos físicos prontamente convertidos em representação interna, mas processos ativos guiados por ajustes motores refinados. O funcionamento total do cérebro não pode ser entendido, assim como seu rece bimento e processamento de informação externa não fazem nenhum sentido, se o output comportamental não se segue. A psicologia cognitiva nos acostumou tanto a utilizar o conceito de representação de forma não crítica, que facilmente ignoramos todas as suas implicações. Além de rejeitar a visão de que a percepção, a aprendiza gem e a resolução de problemas são ações, ela implica, co m o coro lário, que o m undo externo possui organização inerente a si mesmo, que determina como seus vários componentes serão representados dentro da mente. Em outras palavras, o mundo externo é dado e o sujeito psicológico está lá para coletar e tratar as representações dele. Paia Skinner, bem como para muitos psicólogos náo pertencentes à escola cognitivista de pensamento, o organismo é modificado ao longo de sua interação com o ambiente, o que significa que o m undo ao redor não tem nenhum a existência nem pode ser representado independentemente das ações do sujeito.
192 Ver, entre outras fontes , “ Behavio rism at fifty’’ ( S k i n n e r , 1963b), e as natas adicionadas quando de s u a r e i m p r e s s ã o como capítulo 8 em Contingencies o f reinforcement (id., 1969b). Adm it idamente, o termo representação sc refere a entidades maLs sofisti cadas que a palavra cópia, e em alguns de seus usos técnicos pode ter pouco 1 ver com esta última. Mas, na maior p a r t e dos casos, gera basicamente os mesmos problemas.
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Deve-se destacar que a dominân cia das representações - ou, de form a mais geral, dos estados puramente mentais - sobre a ação, que m arcou duas décadas de pensamento cognitivista, foi seriamente questionada no passado recente de dentro da própria escola cognitivista. Um ataque especialmente forte contra a represen tação foi expresso por F. Varela, cujo interesse é, explicitamente, dar ao conceito de ação prevalência sobre o conceito de representação. Ele insiste que as ciências cognitivas devem retornar para as teorias interativas e propõe o conceito de “enação” em luga r do de “representação”. 1'73 Enação claramente implica que todo processo cognitivo se fundamenta nas trocas com o mundo externo. Varela retoma as di mensões históricas (filogenética, ontogenética e cultural) do conh ecimen to - uma reabilitação que também é, de certa forma, inerente ao conexionismo. Em um mapa polar que mostre como os vários pensadores podem ser localizados em relação ao cognitivismo tradicional e à teoria de emergência e ação de fendida p or Varela, pode-se encontrar Piaget mais próximo às ideias de Varela, um passo a mais distante do cognitivismo mais tradicional como exemplificado por Neisser na psicologia, por Chomsky e Fodor na linguística e na epistemologia, e por Hubel e Wiesel na neurobiologia. Varela redescobriu Piaget; ele poderia ter pensado em redescobrir Skinner. O ponto aqui não é sugerir que as visões de Varela e outras semelhantes são apenas ressurgimentos do b ehaviorismo. A ciência cogn itiva atual obviam ente se direciona a questões diferentes e utiliza uma linguagem diferente: a ciência não volta para estágios anteriores. O que está claro, entretanto, é que a recente mudança na ênfase da representação para a ação implica uma reintegração do comportamento em seu próprio campo e torna impossível enxergar o comportamento meramente como um indicado r potencialmente dispensável das representações. Incidentalmente, é importante notar, nesse contexto, uma ausência quase completa de interesse, entre os psicólogos cogmtívistas, na robótica como uma possível fonte de m odelos inspiradores. Em geral, eles foram atraídos exclusivamen te pelos modelos oferecidos por computadores, aqueles como utilizados na tarefa clássica de armazenar grandes agrupamentos de informação e de aplicar a eles ope rações lógico-matem áticas mais ou menos complexas. A primeira vista, a robótica, ao lidar com a ação sobre o mundo externo, movendo-se no tempo e no espaço, e ajustando-se ao m und o real ao invés do abstrato, pareceria mais próxim a do estudo de organismos vivos. Com as poucas exceções dos psicofisiologistas especializados em habilidades motoras e problemas similares, os modelos robóticos foram com pletamente ignorados. Se isso foi consequência de os cognitivistas terem colocado a ênfase exclusiva sobre a representação às custas da ação ou de sua fascinação exclusi va pelo computador e não pelos robôs é uma questão interessante. Está relacionada com o problema tradicional na história da ciência: as teorias são direcionadas por
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metáforas (tecnológicas) disponíveis ou os modelos metafóricos são selecionados para se ajustar às teorias? 3. A teoria da cópia inevitavelmente cai no problema de implicar algum pequeno ser —o bomúnculo —que irá perceber ou resgatar a cópia, o que ele poderá fazer apenas fabricando outra cópia, e assim por diante, ad infinitum . Isso requer, em algum p onto final, se o processo term ina em algum m om ento, u m agente irredutível que deve necessariamente escapar de qudquer análise adicional. Há alguma lógica na apelação de Fodor a um núcleo central irredutível náo suscetível à investigação científica em seu retrato modular da mente: é uma consequência de um sistema psicológico baseado em representações.194 Skinner, é claro, após uma carreira tentando explicar o comportamento sem recorrer a agentes internos no comando, não estava pronto para aceitar sua res surreição pelo cognitivismo. Suas objeções se dão no campo da teoria psicológica básica (como acabamos de ver, há uma relação próxima, talvez inerente, entre as re presentações e o apelo a um agente autônomo) bem como no campo das aplicações do conhecimento psicológico aos assuntos humanos. Elas são endereçadas tanto ao cognitivismo epistemológico quanto ao que chamamos de cognitivismo ético. Para Skinner, a concepção de seres humanos baseada na vontade livre e auto nomia, na sua capacidade de decisão, provou ser ineficiente para resolver os pro blemas da humanidade. Ele implementou uma análise comportamental e um tipo de história natural e cultural daquelas noções tradicionais e sugeriu que de veríamos mudar o foco daquelas noções para as condições que induzem indivíduos ou grupos a se engajarem em de termin ado curso de ação e se sentirem livres, autocontrolados, felizes. Ao encorajar novamente a velha ilusão do agente autônomo na mente hu mana, o cognitivismo ético favoreceu práticas de educação, psicoterapia e controle social que apelam para forças internas dos indivíduos, enquanto desconsideram as contingências que modelaram, de fato, frequentemente de modo sutil, tais disposi ções mentais. A oposição de Skinner a ele aparecerá de forma mais completa quan do considerarm os sua análise das questões sociais, educação, tratam ento psicológico e controle político (parte IV).
194 Ver, especialmente, Fodo r (19 83,19 86, 6. ed.), m ais especificamente, as partes IV', sobie os sistemas centrais, e V, contendo conclusões gerais. Após ter sustentado, em termos engraçados, “A Primeira Lei de Fod or da não existência da Ciência Cogn itiva” , i.e., “quanto mais global é um processo cognitivo, menos ele é entendido. Processos muito globais, como raciocínio analógico, nâo sáo entendidos de jeito nenhum”. Ele insiste, na seção final de seu influente e controverso livro, que “se proorssos centrais possuem, o tipo de propriedade que eu os atribuí, entáo eles sáo maus candidatos ao estudo científico” (id., 198), p. 127). E, mais adiante: “ Se, como supus, os processos cognitivos centrais são não m odulares, é uma notícia mu iro ruim para a ciência cognitiva" (id. ibid., p. 128).
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10 A QUESTÃO DA LINGUAGEM
In t e r e s s e inicial em l i n g u a g e m Para aqueles que veem Skinner como psicólogo de ratos, um capítulo sobre linguagem pode parecer um pouco fora de lugar aqui. Pelo contrário, é uma questão centra], não apenas se desejamos descrever corretamente o pensamento de Skinner, mas também para compreendermos a origem da maioria das interpretações equivo cadas amplamente difundidas a seu respeito e para capturarmos as peculiaridades das atitudes em relação ao behaviorismo que se desenvolveram entre os psicólogos nos últimos 30 anos. Ao discutir a contribuição de Skinner para o estudo do com portamento verbal, se tornou impossível evitar a referência a Chomsky, pelo motivo de que a maior parte das pessoas conhece as ideias de Skinner apenas em segunda mão, por meio das críticas destrutivas expressas pelo famoso linguista. Alguns deta lhes históricos serão úteis, de modo a esclarecer o caso. Em 1957, Skinner publicou um denso livro intitulado Verbal behavior. C o mentaremos mais à frente sobre seu conteúdo. E suficiente apontar aqui que isso não fo i, de form a algum a, resultado de algum interesse recente de Skin ner pela área para a qual ele estaria pouco preparado, nem foi realmen te material inesperado para aqueles que sabiam que Skinn er vinha trabalhando nele por muitos anos. De fato, desde os dias iniciais de sua carreira, Skinner estava intrigado com problemas espe cíficos criados pelo compo rtamento verbal em h uman os, incluindo suas produções verbais criativas únicas na poesia e na prosa. Enquanto ocupado com experimen ta ção com an imais, ele perman eceu pensand o sobre a questão e, por fim, a selecionou como tópico para as conferências William James, para as quais fora convidado a ministrar em 1947, em Harvard. Uma primeira versão confidencial do que se tor naria o livro Verbal behavior foi posta em circulação na época. Foi utilizada e citada por George Miller em seu livro seminal Language and communication, publicado em 1951 —de fato um trabalho de fundação em fornecer novo ímpeto para a então estagnada psicologia da linguagem, bem como em transmitir teoria de informação para os psicólogos num estilo mais claro.
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In t e r f e r ê n c i a
de
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Chomsky
Logo depois que o livro de Skinner foi publicado, Chomsky, então um jo vem ling uista po ssivelmente conhecido nos círculos lingu ísticos po r seu trabalho sobre Estruturas sintáticas^ mas totalmente descon hecido pelos psicólogo s, escreveu uma revisão crítica incomumente longa, publicada em Language, uma revista de linguística.196 De modo muito inesperado, essas 30 pesadas páginas tiveram muitas consequências importantes. Primeiro, Chomsky se tornou repentinamente uma estrela entre os psicólogos, que buscavam no seu trabalho, do tipo mais técnico em linguística formal, uma fonte de inspiração. Embora ele tenha também publicado dois capítulos altamente técnicos no H andbook o f mathematical psychology ,197 em coautoria com G. Miller — definitivamen te um de scobridor excepcional de novas ideias e talentos - não pode haver dúvida de que tal material forte e pouco lido não poderia possivelmente ex plicar o crescimento rápido de sua popularidade nos departamentos de psicologia. Segundo, Chomsky persuadiu seus leitores de que eles poderiam dispensar a leitura do livro de Skinner. Afinal de contas, as 30 páginas de sua revisão eram menos que as 600 páginas do Verbal behavior e foram escritas no estilo tipicamente assertivo que o caracteriza, dando a suas afirmações uma aparência de verdade irrefu tável. O julgamento de Chomsky foi absorvido pela maior parte dos psicolinguistas importantes, como exemplificado pela seguinte afirmação de Sinclair-De Zwart: “Como para as interpretações de Skinner (1957), baseadas em tais noções de for ça de resposta e esquema de reforçamento, Chomsky (1959) demonstrou definitivamente a falta de sentido dessas noções quan do aplicadas ao com portam ento verbal” .198 Nã o é algo raro que críticas obscureçam completamente o trabalho daqueles sobre os quais comenta: algumas obras-primas literárias ou filosóficas tiveram que ser recuperadas de tal esquecimento. O resultado foi que as questões levantadas por Skinner, que são cruciais na psicologia da linguagem, embora possivelmente não linguísticas, foram totalmente ignoradas por mais de uma década, enquanto as visões formalísticas de Ch om sky dom inaram a área. Em bora C ho m sky deva ser reconhecido por seu papel estimulador, é difícil avaliar em que medida e por quanto tempo sua influência impediu os psicólogos de estudarem o comportamento verbal do ponto de vista das questões genuinamente psicológicas. Se eles tivessem üdo a contribuição de Skinner, poderiam ter se poupado de devaneios sobre estruturas profundas. Terceiro, a revisão de Chomsky foi destrutiva não apenas em relação à visão de Skinner sobre o comportamento verbal, mas ao behaviorismo como um todo. 195 Cho ms ky (1957). 196 Id. (1959). 197 Chom sky & M iller (1963) e Miller & Chom sky (1963). 198 Zw art (1967).
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Isso foi afirmado, entre outros, por Mehler, na publicação da tradução francesa da já famosa revisão: “D e fato,” diz Mehler, 'o declínio do behaviorismo parece rela cionado ao crescim ento da mo dern a psicoling uística” .'9y Até certo pon to, isso soa como ilusão: para um observador neutro, o behaviorismo está longe de ser extinto se considerarmos como sinais de vitalidade os usos variados e bem-sucedidos de seus métodos, o alcance extenso e diversificado de suas aplicações e, por fim, a persistên cia de um grande número de índices tradicionais de atividade científica, tais como revistas, sociedades e reuniões, todos envolvendo pessoas. E verdade, entretanto, que Chomsky teve importante papel no crescimento do cognitivismo e especialmente na retomada do status de respeito dos estados mentais, como veremos ao analisar suas críticas mais de perto. Dada a tripla importância das críticas de Chomsky, e apesar do fato de que os psicolinguistas se libertaram por alguns anos da influência de Chomsky, é necessário resumir os principais pontos de seu ataque a Skinner. Eles podem ser classificados grosseiramente em duas categorias. Por um lado, Chomsky se opõe à extrapolação de Skinner: do comportamento animal, de natureza supostamente mais simples, para a linguagem, uma atividade altamente complexa e especificamente humana; do laboratório, onde ele forjou seus conceitos, para a vida real, em que aqueles con ceitos não explicam a riqueza da conduta humana, especialmente em suas formas linguísticas; do determinismo estreito, possivelmente aplicável a dados animais sim ples, para um campo marcado por imprevisibilidade, produtividade e criatividade individual, que escapam à análise causal tradicional. Estas são críticas clássicas à abordagem científica, experimental, da atividade humana. Por outro lado, ele argumenta contra a posição behaviorista, como inadequa da para explicar a linguagem, e, ao fazer isso, ele aponta para características do behaviorismo que podem descrever outros behaviorismos, mas certamente não a posição de Skinner. Por exemplo, Ch om sky argumenta em detalhes sobre o modelo Estímulo-Resposta, obviamente não um dos princípios de Skinner, e sobre redu ção de impulso,200 um conceito completamente ausente na análise de Skinner. Ao fazer tais confusões entre a visão de Skinner e as outras, e estando de outro modo exclusivamente inclinado a uma explicação puramente formal da linguagem, não é de se estranhar que Chomsky tenha falhado em compreender o tipo de abordagem funcional do comportamento verbal que Skinner defendia; uma abordagem em li nhas totalmente diferentes das tentativas anteriores dentro da tradição da psicologia científica americana. Quando examinado com algum cuidado sério, o texto de Chomsky levanta algumas questões embaraçosas, dado que o autor é, presumivelmente, uma pessoa 199 Mehler (1969). 200 N. T.: “drive reducntm ".
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excepcionalmente inteligente. Ele leu o livro todo, como se poderia esperar de um revisor que escreve u m comentário táo longo? Se a resposta for sim, como poderia ser possível ele interpretar equivocadamente ou distorcer as ideias de Skinner de tal forma? C om o ele poderia discutir em detalhes alguns pontos fundamentais - por exemp lo, falar de coisas ou pessoas nunca vistas - como se Skinn er os tivesse igno rado, quando qualquer leitor do Verbal behavior irá se deparar com discussões deta lhadas precisamente sobre esses pontos? Deveria Chomsky ser ignorado ou culpado por permitir de forma mais ou menos consciente a velha estratégia de construir um espantalho de Skinner de m odo a promover suas próprias ideias, ou mesmo por ter tido alguma falha em relação à honestidade intelectual?
0 silêncio de Skinner
De fato, Skinner não se preocupou em responder: isto foi algumas vezes in terpretado com o confissão ou d errota,201 e provavelm ente co ntribu iu para a difusão do hábito, entre psicólogos e psicolinguistas, de confiar no texto de Chomsky sem retomar o próprio livro de Skinner. Afinal de contas, Chomsky tivera a última palavra e, presumivelmente, esta era a verdade. O silêncio de Skinner, todavia, não significou a aceitação dos argumentos do linguista. Pelo contrário, refletiu sua crença de que C ho m sky n ão estava falando da mesma coisa e, em m inha visão, um sentimento de que sua abordagem seria por fim adotada. Talvez ele tenha sentido intuitivamente que um debate aberto com Chomsky era inútil, com pouca chance de influenciá-lo e mudar sua mente. Skinner raramente comentava sobre sua atitude, mas, em uma ocasião, ele ex plicitou seus motivos com humor. A passagem é necessariamente extensa. Skinner falava a uma audiência de poetas e escritores na cidade de Nova York, em 1971:201 Deixem-me falar a vocês sobre Chomsky. Eu publiquei Verbal behavior em 1957. Em 1958, eu recebi uma revisão datilogra fada de 55 páginas de alguém de quem nunca tinha ouvido falar chamado Noam Chomsky. Li metade de uma dúzia de páginas, percebi que não tinha entendido meu livro e não fui além. Em 1959, recebi uma reimpressão da revista Language. Era a revisão que eu já tinha lido, agora reduzida a 32 pági nas e novamente a descartei. Mas então, é claro, Chomsky 20 1 Procto r & W eeks (1990) argum entam que 2 ignorâ ncia de Skin ner aos seus oponen tes refletia sua pobreza intelectual., bem como a cegueira de um líder de seita a qualquer contradição. Discuti tal interpretação em Richelle (1991). 1 0 2 Verbal behavior (1957) c frequentemente citado nas memories de Skinner, especialmente em A matter o f consequences (Skin ner, 1983); a revisão de Chomsky é discutida no livro de i‘j8j, p. [53-154.
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começou a crescer. A gramática generativa se tornou a coisa - e parecia ser uma coisa muito grande. Os linguistas sempre tentaram tornar suas descobertas impactantes. Em uma déca da, tudo parecia depender da semântica; em outra década, da análise do fonema. Nos anos 1960, era a gramática e a sintaxe, e a revisão de Chomsky começou a ser amplamente citada e reimpressa e se tornou, de fato, muito mais bem conhecida que meu livro. Finalmente, se fez a questão, por que não respondi a Chomsky? Minhas razões, temo que mostrem uma falta de caráter. Em primeiro lugar, eu também deveria ter que estudar profunda mente gramática generativa, que não era minha área [...]. Há alguns anos, a revista Newsweek levou a discordância além, ultrapassando a linguística e o estruturalismo e chegando à filosofia do século XVII. Fui considerado um discípulo mo derno de John Locke, para quem a mente começava como um quadro limpo ou uma tabula rasa e que pensava que o conhe cimento era adquirido apenas pela experiência, enquanto se dizia que Chomsky representava Descartes, o racionalista, que não estava certo que existia até pensar sobre isso. A Newsweek sugeriu que a batalha estava indo para o meu lado e a reação dos gramáticos generativos foi tão violenta que a revista achou necessário publicar quatro cartas pró-Chomsky. Cada uma re petia o equívoco comum a respeito de minha posição. Uma implicava que eu era um psicólogo estímulo-resposta (o que não sou) e outra que eu pensava que as pessoas eram muito parecidas com os pombos (o que não penso). Uma outra ti nha ao menos um toque de inteligência. Voltando aos nossos supostos progenitores do século XVII, o escritor advertiu a Newsweek para “ Locke up Skinner and give Chomsky Descartes blanche” .“ 3Mas Chomsky não pode usar uma carte blanche,i04 é claro; é muito semelhante a uma tabula rasa
20} N. T.: Trocadilho com os nomes de Locke e Descartes rei acionando-os aos de Skinne r e Chom sky: "crancafiar Skinner e dar carta branca a Cho msky” . 104 N. T.: Carta branca. 105 Retirado de “A lecture on ‘havin g’ a poem” , conforme reimpressão em Cumulative record ( S k i n n e r , 1972, p. 345-347).
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A nálise fu ncio n al
v er s u s
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análise form al do comportamento v erbal
Que Chomsky não entendeu direito é óbvio para qualquer leitor, mesmo sc pensarmos apenas no primeiro capítulo do Verbal behavior. E um capítulo intro dutório, significativamente intitulado “Uma análise funcional do comportamento verbal” . Este título segue imediatamente o título da seção da primeira parte do livro, que é “Um programa”. Skinner afirma claramente aquilo com que está lidando: não linguagem, como geralmente estudada pelos linguistas, mas comportamento ver bal, que é uma atividade do indivíduo ao falar e/ou ouvir. Convencido da validade heurística dos princípios do comportamento descobertos na pesquisa animal e espe cialmente da abordagem funcion al, que visa a descrever as variáveis que contribue m para a produção do comportamento, Skinner busca aplicá-los ao comportamento verbal. Ele não reivindica que está propon do uma teoria, nem reivindica delinear ar gumentos empíricos da evidência experimental. C om o inequivocamente sustentado no final do capítulo: “A presente extensão ao com portam ento verbal é, portanto, um exercício de interpretação ao invés de uma extrapolação quantitativa de resultados experimentais rigorosos".“ 6 Chomsky não estava pronto para considerar tais visões, já tendo escolhido a abordagem estritamente formal da linguagem e permaneceu definitivamente (deli beradamente?) cego à natureza da tentativa de Skinner ao se opor a qualquer estudo científico do comportamento verbal que fosse baseado na experimentação animal e enquadrado em um conceito determinista da conduta humana. Ele também rejeitou fortemente, ao longo de toda sua carreira, qualquer teoria do uso ou da aquisição da linguagem que recorresse a variáveis ambientais e defendia, ao contrário, uma concepção internalista, apelando para algum Dispositivo de Aquisição de Lingua gem interno, uma suposta estrutura ou maquinaria cerebral preparada de forma inata para adquirir e utilizar qualquer linguagem natural. Ele desenvolveu a curiosa ideia de que a linguagem pode ser comparada, ou melhor, assimilada, a um órgão anatômico, tal como o estômago ou o fígado, que não precisam de interação com o ambiente para serem formados durante a embriogênese.207 Sob a domina nte influência de Cho msk y, por quase duas décadas, i.e., nos anos 1960 e 1970, a psicolinguística foi a arena para os debates sobre a questão formal versus funcional e sobre a questão do internalismo radical. Não discutiremos este último aqui, porque já conhecemos a posição geral de Skinner em relação à questão inato versus adquirido. Em bora ele enfatizasse as variáveis amb ientais, ele nunca ne gou o aparato genético dos animais ou humanos e teria acolhido, por isso, qualquer evidência produzida pela moderna psicogenética. Mas ele sabia, como todo psicólo 20 6 ld. (1957, p. 11).
207 O caso foi levan tado de uma forma especi aimente nã o metafórica 110 debate com P iagei (P i a t e l l i -P a l m a r i n i , 1980).
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go bem informado de hoje, que a controvérsia clássica entre ambientalismo radical e inatismo radical havia perdido seu significado no contexto da moderna genética. Chomsky parece ter obstinadamente ignorado isso. A questão form al versus funcional é um tema m uito com plicado na linguística e na psicologia da linguagem e é de fato difícil tratá-la de um modo não técnico sem cair em supersimplificaçóes; nem é fácil compreender o centro do proble ma sem um pouco da história das ciências envolvidas, que são vários campos da linguística e alguns campos da psicologia. Tal explicação nos levaria muito além do escopo do presente capítulo. Limitar-me-ei a fornecer uma visão intuitiva do debate, mas o leitor, se desinformado, deveria ter em mente que as coisas são muito mais complexas; por exemplo, quando eu oponho linguística e psicologia como os campos típicos da análise formal e da análise funcional, respectivamente, isso é, de certa forma, uma supersimplificação, dado que nem todos os linguistas se limitam a explicações formais e alguns psicólogos se tornaram muito formais! Os linguistas, embora utilizem a produção dos falantes nativos como sua ma téria-prima, estão essencialmente interessados em explicar as propriedades de uma determinada linguagem, como o chinês ou o inglês, ou de qualquer linguagem na tural, que é a ambição da linguística geral. Particularmente desde as propostas fun damentais de Saussure no início do século X X ,2,08eles adotaram o que se cham ou de abordagem sincrônica, baseada na ideia de que as linguagens naturais funcionam, em qualquer momento de sua história, como sistemas totais, cujas partes são todas inter dependentes e devem, portanto, ser descritas ou explicadas umas em relação às ou tras, ao invés de em relação a um estágio anterior de sua evolução, como sustentado na abordagem tradicional da linguística histórica ou diacrõnica. Ao coletar exemplos representativos de declarações verbais, os linguistas buscam descrever, do modo mais adequado possível, as propriedades do material linguístico, e, se trabalham na linha da linguística geral, abstrair propriedades comuns a todas as linguagens. Para esse fim, eles geralmente se engajam em explicações formais de gramática (vistas como conjuntos de regras vigentes no sistema de linguagem, não como prescrições norma tivas para a boa fala). Vários tipos de explicações como estas, com vários níveis de ge neralidade, foram propostos ao longo da história da ciência linguística. Eles diferem, entre outras coisas, em seu grau de abstração com relação às sequências de quaisquer que fossem os elementos —sons, palavras, frases, etc. —componentes das declarações: alguns se mantêm o mais próximo possível da estrutura superficial; outros, argu mentando que tal estratégia não permite que muitas dificuldades importantes sejam resolvidas, apelam para níveis inferidos, ou para estruturas mais profundas, depois do conceito popularizado por Chomsky. Estruturas profundas devem ser evocadas, argumentou Chomsky, caso se busque explicar sentenças com a mesma estrutura
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superficial, com valores obviamente diferentes, como em seus famosos exemplos: “John is easy to please” versus “Joh n is eager to please” .109 As teorias também diferem na ênfase em um ou outro aspecto do material linguístico: a fonologia focou nos sons básicos; a gramática generativa de Chomsky era centrada na sintaxe; outras teorias priorizaram a semântica. Tudo isso é importante, mas não nos conta toda a história sobre o que acontece quando as pessoas falam, o que, na maior pane dos casos, significa falar uns aos outros. A linguagem é normalmente implemen tada na fala, na “ parole” como oposta à “ langue”, como enfatizado por Saussure, usando a palavra francesa que poderia ser apropriadamente expressa por “comportamento verbal”. O estudo da “ parole” ou comportamento verbal obviamente requer uma abor dagem funcional, ou seja, uma análise das variáveis que levam à produção ou à recepção de uma certa declaração em uma certa ocasião. Embora as coisas sejam muito mais sutis que isso, é fácil representar do que trata uma análise funcional imagin and o sob quais circunstâncias a mesma sentença simples, como po r exemplo, “eu gostaria de uma xícara de chá”, pode ser pronunciada. No caso mais provável, o falante estará fazendo um pedido numa cafétéria, ou respondendo ao seu anfitrião. Ele pode também interromper repentinamente seu trabalho, porque sente sede, e simplesmente dizer isso a si mesmo, ou a seus colegas, se tiver, enquanto se levanta da cadeira e vai preparar algum chá. Mas também poderia ser pronunciada como um exercício de um estudante estrangeiro em uma aula de português, que a repete depois do professor, ou pelo leitor desta página que a lê em voz alta para seu próprio deleite. A declaração, formalmente definida, não foi modificada; o que mudou foi o contexto e a função do que é dito naquele contexto particular. O contexto envolve aspectos físicos e sociais, variáveis internas do sujeito (no caso de sentir sede) ou ex ternas (a presença da solicitação do anfitrião; o professor pedindo que o aluno repita; o texto escrito). O que faz a diferença entre os quatro casos são aqueles eventos que ocorrem antes, durante e depois de a sentença ser pronunciada. De forma oposta, a escolha de uma dada ocorrência pelo falante não é, como defende Chomsky, uma questão de capricho, além das restrições impostas pelas re gras linguísticas; ela é obviamente determinada, mais uma vez, por fatores relacio nados ao contexto, à história do sujeito e da audiência, ao status social, ao sucesso prévio ou antecipado em situações semelhantes, etc. Uma explicação gramatical formal, linguística, não é suficiente para explicá-la. Por exemplo, um falante di zendo “Sua Excelência seja abençoada por ter ouvido minha humilde súplica” está evidentemente de acordo com as regras do português, mas a seleção do estilo real em terceira pessoa depend e do contexto, uma variável extralinguística. Uma diferença essencial entre a abordagem formal e funcional é que, na pri meira, todas as possibilidades podem ser consideradas, não há limite para o número 209 N . T.: 'fo ãü é fácil de agradar’’ versus “João quer sempre agradar”.
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ou a complexidade das declarações teoricamente possíveis, exceto que elas devem ser aceitáveis na linguagem que está sendo considerada, enquanto na segunda apenas o que realmente ocorre deve ser explicado. A abordagem formal opera no nível das po tencialidades; a abordagem funcional, no nível das realidades. Essa distinção básica foi completamente ignorada por Chomsky quando ele argumentou que os estímulos náo sáo importantes no que o falante decide dizer. Para citar um exemplo, que agora é clássico no debate, pouco importa para os psicólogos que uma infinidade de declarações verbais (se choca com o papel de parede, eu pensei que você gostasse de obras abstratas, nunca tinha visto isso, torto, pendurado muito baixo, bonito, horrível, etc.) sáo possíveis na presença de um quadro pendurado em um salão; o que importa, e precisa ser explicado, é que o falante real disse “ Holandês” , reagindo com sua própria história a uma situação particular. Que outras declarações eram teoricamente possí veis não modifica as causas da resposta que fo i de fato pronunciada.
E nsaio
de
S kinner
em in t e r pr e t a ç ã o
Comportamento verbal era aquilo em que Skinner estava interessado. Ele cer tamente não negou que o trabalho dos linguistas e gramáticos fosse importante (por razões cronológicas óbvias, ele não mencionou o trabalho de Chomsky em seu livro), mas apontou para o fato de que eles tinham pouco a dizer sobre o que ele pensava ser o domínio do psicólogo. Tampouco estava satisfeito com as tentativas anteriores de seus colegas psicólogos e tentou seu próprio caminho. Ele primeira mente enfatizou o “episódio verbal total”, que tipicamente entende a linguagem como produzida e recebida em um contexto. Depo is ele tenta construir sua própria classificação funcional dos comportamentos verbais, utilizando novos rótulos total mente diferentes dos termos linguísticos: mando, para designar todo comportamen to verbal que lida com as ações do ouvinte em favor do falante (colocando de forma mais concisa, “reforçado pelo ouvinte’ ); tato, definido como comportamento verbal que descreve parte do universo do sujeito; autoclítico, que se refere parcialmente às unidades verbais que ocorrem por causa das ligações intraverbais (parte do conceito de autoclítico recobre dependências gramaticais); e o comportamento ecoico, que é a simples reprodução do comportamento verbal ouvido. Estas categorias náo se apresentam sem nenhuma dificuldade própria, mas elas são dadas, vamos relembrar, como resultado de um “ ensaio em interpretação” , náo como u ma invenção decisiva. Verem os que elas estavam direcionadas a uma questão central, com a qual outros investigadores lidaram, incluindo alguns linguistas. Neste estágio, vamos enfatizar um aspecto crucial dessas categorias, enquanto opostas às categorias formais: sua estrutura não é rigorosamente definida, nem em detalhe, nem em padrão. Um mando pode ser uma forma verbal curta e imperativa, dando uma ordem, ou pode ser
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uma prolongada arenga política, engajando a audiência em um determinado curso de ação. E claro, como os próprios sistemas linguísticos não foram inventados por causa da linguística formal, mas emergiram de alguma evolução funcional no comporta mento dos organismos vivos, não é surpresa que eles contenham muitos elementos (pode-se argumentar, de fato, que eles contêm apenas elementos) dotados de valor funcion al, q ualquer que seja a descrição formal dada a eles. Formas verbais imp era tivas, por exemplo, geralmente têm o valor funcional de mandos nas categorias de Skinner. Mas outras formas verbais apresentam função similar e são mais prováveis em algumas situações: um freguês educado pode afirmar “Este Bordeaux é excep cional”, levando a atenção do anfitrião para uma taça vazia, ao invés de ordenar: “Você poderia encher a min ha taça?”. A análise funcional não pode ser mapeada de nenhum modo simples sobre a análise formal.
A QUESTÃO DA COMPETÊNCIA VERSUS A QUESTÃO DA PERFORMANCE Poderia parecer, à primeira vista, para um observador direto, que a distinção entre análise funcional e formal soa como correta e, um a vez reconhecida, não de ve ria resultar em tensões conflitantes. Contudo, muita confusão surgiu na linguística contemp orânea e na psicolinguística e, mais especificamente, no debate em torno de Ch om sky e Skinner, por causa dos conceitos opostos de Ch om sky de competência e de performance. Estes não são conceitos estritamente linguísticos, que pudessem ser tomados, mais ou menos, como sinônimos das noções de Saussure de langue como oposta à parole.ll° Eles possuem implicações (ou, talvez, pretensões) psicológicas muito mais profundas. Diz-se que os falantes possuem uma réplica internalizada de suas regras de linguagem, definindo sua competência (linguística), que eles irão implementar nas produções ou performances discursivas reais. Estas últimas são frequentemente pobres testemunhas das primeiras, porque a competência do sujeito é dificultada pelas limitações das funções psicológicas envolvidas na performance, tais como memória, atenção, habilidades motoras vocais e articulatórias, emoção, etc. Um a comp etência pessoal supostamente fornece uma capacidade cognitiva que, em princípio, permite que o material linguístico seja utilizado ao aplicar as regras, como os linguistas fariam; isso implica, entre outras coisas, a capacidade de produzir declarações de tamanho ilimitado, consistindo em uma infinidade de proposições incrustadas. A gramática autoriza sentenças do tipo ‘‘O gato que pegou o rato que com eu o que ijo que foi deixado na mesa do café na cozinha morreu” . Elas sáo raras, se alguma vez ditas, não (ou não apenas) porque sáo deselegantes em estilo, mas
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principalmente porque colocam uma carga excessiva na memória e na decodificaçáo. Essa lacuna entre o aparato cognitivo, dotado de competência, e o comporta mento real, é de fato uma questão crucial que divide a abordagem formal típica de C ho m sky e a análise funcional proposta por Skinner. Competê ncia se refere, com o vimos , a um con junto internalizado de regras que o indivíduo irá aplicar mais ou menos perfeitamente. Para Skinner, o sujeito que se comporta não aplica regras, não mais que as células fazem em suas reações imunológicas: o que é feito, ou dito, pode ser descrito por meio de regras, no sentido de que pode ser explicado por meio de leis —isto é, na verdade, tudo sobre o que trata a ciência —, mas o sujeito não está extraindo da mente algum conjunto de regras de modo a transformá-las, com mais ou menos sucesso, em comportamento. Uma linguagem é certamente um sistema organizado que pode ser descrito consistentemente, e é isso que fazem os linguistas. Considerando que o comportamento verbal individual é controlado por hábitos vigentes em uma comunidade verbal, as regras definem as contingências linguísticas, não um maquinário internalizado distinto de seus su bprodu tos verbais. O debate nos traz de volta, é claro, à questão do mentalismo. As objeções de Skinner às visões de Chomsky foram as mesmas que ele direcionou anteriormente a todos os tipos de teorias mentalistas: qual é o status da entidade mental chamada de “competência linguística”? De que material ela é feita e onde ela reside? Mais importante, quem é o sujeito que a explora? De onde ele opera? Ele escapa à análise científica? Como podemos explicar esse sujeito e o que ele faz sem cair na regressáo ao infinito do homúnculo? Saussure foi esperto o bastante para se limitar, enquanto um linguista, ao es tudo da linguagem, da “ langue”, embora assumindo que ela é, de um modo ou de outro, armazenada no cérebro do sujeito falante. Ele deixou em aberto o estudo da “ parole”, ou comportamento verbal, admitindo que uma ciência completa da linguagem - ele a chamou de sêméiologie - abrangen do am bos os aspectos, estaria completa apenas depois que os psicólogos, ou outros especialistas, implementassem o estudo do comportam ento verbal. Ele não forneceu nenhum status neurobiológico ou psicológico à “ langue”, nem defendeu que a contribuição do linguista tivesse qualquer prioridade na explicação da “parole”. Chomsky tomou uma postura to talmente diferente: dizia que a análise linguística formal era não apenas um pré-requisito para qualquer investigação psicológica do comportamento verbal, mas um conceito, i.e., competência, tipicamente derivada de tal análise, tinha também status psicológico e mesmo neurobiológico. Investigadores entusiasmados pertencentes à primeira geraçáo de psicolinguistas da era pós-Chomsky gastaram muito de seu tempo tentando demonstrar a realidade psicológica das estruturas profundas e das transformações gram aticais con sideradas na gramática generativa. Suas tentativas foram, em geral, malsucedidas.
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Isso não descartou a validade da gramática generativa - questão deixada aos pró prios linguistas. Entretanto, demonstrou que uma explicação formal aparentemente adequada do sistema linguístico, como essa, não precisaria ser útil na descrição do funcionamento do sujeito quando fala ou ouve. Embora eles mantivessem alguma distância de Chomsky, a maioria dos psicolinguistas permanecia dentro do movi mento cognitivo e realmente não adotou o tipo de abordagem funcional defendida por Skinner. Algun s deles, todavia, se depararam com problemas similares e por fim se voltaram para uma abordagem muito similar, embora ignorassem o parentesco resultante.
A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM NA INFÂNCIA! A PEDRA DE TOQUE Skinner rejeitou o conceito de competência linguística por causa de seu status mentalista.
A objeção estava logicamente na linha de sua posição teórica mais
constante. A inadequação do conceito para uso psicológico foi log o evidenciada, ademais, no contexto empírico. Estudantes de aquisição de linguagem, apesar de especialmente receptivos à mensagem de Chomsky, descobriram que não poderiam chegar a lugar nenhum, metodologicamente, com a distinção entre competência e performance. Competência, como vimos, é inferida da afirmação de que o falante de uma dada linguagem internalizou a gramática daquela linguagem, que é apenas uma entre as várias concretizações de algo mais abstrato, i.e., uma gramática geral comum a todas as linguagens (que, por sua vez, supostamente possui sua contraparte física correspondente no cérebro, tornando a linguagem literalmente comparável a um órgão físico). A ligação entre a noção de gramática, enquant o uma descrição linguística, e a noção de competência , com suas conotaçoes psicológicas, é provavel mente devida à metodologia tradicional utilizada pelos linguistas ao coletar dados relevantes. De forma geral, ao trabalhar com linguagens bem conhecidas, os linguis tas coletam declarações de sujeitos adultos normais e, quando há qualquer hesitação, eles forjam uma sentença que prop õem aos seus sujeitos, perguntando-lhes somente se ela seria aceitável ou inaceitável em sua linguagem. Quando os linguistas traba lham em sua própria linguagem ,21' co mo Chomsky, sobretudo, fez, por todos os propósitos práticos, eles podem encurtar o processo ao utilizar a si mesmos como
2.n
Seja para descrever sua gramática particiliar, ou para construir um a tir.irnalk.i geral, como o Icz Ch om sky . A legitimidade de
se utilizar apenas uma linguagem para capturar os chamados universais da linguagem e tormuLir uma gr.imarica geral foi questio ■ nada, c claro, por linguistas com inclinarão comparativa, que acreditam, com importantes argumentos, que uma gramática geta! pode a|>enas ser derivada de esrudos comparativos cuidadosos. Podemos notar que uma questão similar existiu por muitos anos na psicologia, em rekçio à possibilidade de extra.t xis gerais a parrirdo estudo de uma única espécie ou, conscqucntcmentc, de def inir a psicologia específica de uma especie, digamo s, os humanos, sem uma investigação comparativa prévia. A ps icologia cognitiva, possivelmente após o modelo questionável de Ch om sky , neg ligenciou, muito treqkictu emente. a dimensão comparativa.
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sujeitos e simplesm ente se referir a sua própria “ intuiçáo linguística” . Dessa forma, eles podem dizer o que é parte da linguagem e o que não é. Por razões óbvias, o método náo funciona com crianças novas no estágio da aquisição da linguagem. Elas não podem responder à pergunta de praxe “Isso é aceitável em sua linguagem?”. Sua linguagem não é estável, mas está em processo de aquisição: sua forma irá se modificar dia a dia. As crianças produzem todos os tipos de declarações que seriam rejeitadas por adultos, mas que são, àquela ocasião ao menos, parte de sua linguagem. Não há nenhum critério pelo qual uma escolha po deria ser feita entre aquelas declarações que presumivelmente refletem competência, que deveriam ser retidas, e aquelas que pertencem à performance imperfeita e que deveriam ser rejeitadas. A única solução consiste em reter tudo com o componente legítimo da linguagem da criança e ignorar a distinção entre competência e perfor mance, porque lhe falta valor operacional. A contribuição da psicolinguística do desenvolvimento para a abordagem do “episódio total” do comportamento verbal foi mais importante. Aqueles que re gistram e tentam analisar as produções vocais dos bebês são confrontados com o difícil problema de decodificar o que elas significam. Não é possível pedir a crianças jovens, como se faria com adultos normais, que parafraseiem, deem outra versão ou comentem o que foi dito. O que as crianças dizem não é suficiente para explicar suas produções, mesmo em termos puramente formais. Deve-se escutar e olhar para o que lhes é dito, a quem elas falam, em que ocasião, em qual situação particular física e social, com quais gestos ou mímicas, qual expressão emocional ou ação motora e com qual resultado. Considerar tais variáveis significa, é claro, voltar-se para uma análise funcio nal, retirando a ênfase de um sistema linguístico abstrato e enfatizando o sujeito que se comporta. Esta foi uma mudança muito importante na psicolinguística do desenvolvi mento nos anos 1970, com quase todos os pesquisadores compartilhando, sem animosidades, a visão que havia sido defendida poucos anos antes por apenas alguns precursores. Investigadores que adotaram essa nova linha, porque ela foi imposta inexoravelmente pela matéria em estudo, vieram, em grande parte, dos círculos chomskyanos mais radicais e não admitiriam nada em comum com os investiga dores de orientação behaviorista. Eles simplesmente foram confrontados com a realidade, que os tornou behavioristas inconscientes de seu estilo behaviorista, as sim como M. Jourdain na comédia de Molière não tinha consciência de que estava falando em prosa. Este não é o lugar para detalhar a psicolinguística do desenvolvimen to.112 Iremos apontar três tópicos, característicos da evolução descrita anteriormente, por sua es pecial relevância para as questões básicas na análise funcional de Skinner: o conceito 212
Para uma abordagem mais técnica, ver Richelle (1971, 1976b) e Moreau & Richelle (1981).
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de episódio (social) total; a definição de categorias funcionais do comportamento verbal; e a variável estím ulo como uma estratégia de pesquisa para avaliar o sistema linguístico da criança. Sob a influência de Chomsky, fazia-se referência ao ambiente verbal de uma criança vagamente como a comunidade linguística, responsável pelo fato de que ele ou ela falaria, por fim, o inglês, ao invés do finlandês ou holandês. Suas características não eram detalhadas além disso, pois era assumido que esse ambiente fornecia um input geral que colocaria em atividade aquela parte da mente e do cérebro da criança inatamente preparada para produzir linguagem. Era mesmo sugerido que o input era mais frequentemente de boa qualidade —comparável na proporção das sentenças mal formadas que geralmente podem ser observadas nas discussões entre linguistas! mas que nada melhor era necessário, dada a importância relativamente secundária dos fatores ambientais na aquisição da linguagem. Nem todos os psicólogos esta vam satisfeitos com aquela visão e observavam o ambiente linguístico em detalhes. Eles identificaram cada um dos protagonistas geralmente em interação com a criança (mãe, pai, outras crianças, etc.) e registraram sua fala juntamente com as produções da criança. Descobriram características muito interessantes para a psicologia da apren dizagem. Adultos, ou outras crianças, se dirigindo a bebês, geralmente utilizam um modo específico de fala, que foi cham ada algumas vezes de babytalk. Contrário a uma intuição popular anterior, essa não é, de forma alguma, uma imitação da linguagem da criança pelos adultos. E uma sublinguagem especial, universalmente utilizada pelos adultos na situação de falar com bebês. O maternês, com o foi chamado por Ne wport, exibe propriedades formais peculiares: as declarações são mais lentas, com pausas mais frequentes e longas; são pronunciadas em frequências mais altas, com mais ênfase em contornos prosódicos; a sintaxe é melhor (isto é, com menos interrupções, sentenças não finalizadas, etc.) e mais simples (com frases mais curtas e poucas subordinadas, simplificação do sistema pronominal, etc.); é semanticamente muito redundante e contém um número limitado de itens léxicos, cuja seleção é obviamente ajustada ao nível da criança; há o uso extensivo de formas diminutivas, marcadas com um valor afetivo. Desconsiderando pequenas variações e traços ocasionais restritos a cada lin guagem natural particular, essa sublinguagem apresenta propriedades muito constan tes em todo o mundo, em ambos os sexos, em genitores e não genitores, em adultos e outras crianças (a partir dos quatro anos de idade) que se dirigem a crianças mais novas. Essas propriedades refletem procedimentos de ensino implícitos, que poderiam ser tomados como exemplos de aplicação de princípios da psicologia da aprendiza' gem à vida real. Todas as características formais citadas aqui (redundância, sintaxe clara e simplificada, vocabulário limitado e assim por diante) podem ser analisadas dessa forma. Nas mesmas linhas, é notável que tal sublinguagem seja constantemente ajustada ao progresso da criança, sempre estando um pouco à frente, que é a própria natureza de qualquer bom procedimento educacional, como corretamente observado
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por Vygotsky; e, nesse sentido, um instrumento muito mais adequado que os proce dimentos educacionais, nos quais se oferece às crianças um comportamento modelo exatamente equiparável ao seu nível atual, ou, no outro extremo, já equiparável ao seu nível final desejado, mas claramente muito distante do estágio presente. Assim como analisaram as propriedades formais das falas dos adultos co m as crianças, os psicólogos também observaram vários aspectos das interações verbais que ocorrem entre um a criança e um adu lto, apenas para descobrir outros procedi mentos de ensino explícitos. Por exemplo, aprovações e desaprovações são frequen tes na fala dos adultos a crianças. Elas obviamente possuem uma função reforçadora no comportamento da criança. Elas parecem ser dadas mais de acordo com a relevância semântica das declarações da criança do que de acordo com a correção gramatical - uma indicação de que a prioridade dada por Ch om sky à sintaxe não se justifica, ao menos neste contexto. Na maioria dos casos, entretanto, a resposta dos adultos à criança não se limita a sim ou não, certo ou errado. O diálogo inclui várias interações da parte do adulto que estendem a declaração imediatamente anterior da criança, reformulando o que ela disse, enquanto completam ou corrigem a sintaxe ou a morfologia, ou colocam algum novo componente semântico. De uma forma mais ampla, o sistema reforçador sutil envolvido nas comunicações verbais iniciais é baseado em reforçadores afetivos. Manter a conversação (significativa) é também um ponto essencial. O comportamento verbal aceitável em uma determinada comuni dade linguística seria modelado não por aprovação explícita ou p or correção de cada trecho da produção gramatical da criança, mas induz indo m uita conversa, forn ecen do à criança uma ferramenta mais e mais eficiente para aumentar sua comunicação com os outros. Uma análise refinada do episódio verbal total, para usar a expressão de Skinner, revelou aspectos básicos da aquisição da linguagem e mostrou claramen te que qualquer que seja a natureza da disposição humana específica para dominar a linguagem natural e qualquer que seja sua parte na aquisição da linguagem, não se segue que os processos de aprendizagem não estejam atuando, em um importante sentido, no desenvolvimento do comportamento mais típico de nossa espécie. Estudantes da linguagem infantil se depararam com aspectos funcionais da comunicação verbal e levaram à identificação de comportamentos pré-verbais que preparam o uso da linguagem adequada para lidar com o ambiente social. Várias tentativas foram feitas para ordenar esses comportamentos pré-verbais e verbais, ao se construírem classificações funcionais. Contribuições bem conhecidas nessa linha são aquelas de Halliday e de Bates.113 Nenhum deles, não mais que autores de outras empreitadas paralelas, se referem a Skinner, embora tenham inspiração de Austin, o famoso filósofo da linguagem, cujo trabalho sobre os atos de fala foram, sem dúvida, seminais, mas possivelmente mais limitados em amplitude que o de Skinner. Por
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exemplo, Bates aplicou a classificação de Austin à evolução das sentenças impera tivas e declarativas, mostrando uma progressão de desenvolvimento da perlocução para a ilocução e então para a locução. Atos perlocutórios e ilocutórios cobrem, na terminologia de Austin, parte do que Skinner colocou junto sob o rótulo de mandos-214 Em sua muito detalhada análise do comportamento pré-verbal e verbal inicial, Hallid ay identifica o que cham a de funções instrumentais, regulatórias e interativas, que têm muito em comum, para dizer o mínimo, com a categoria de mandos de Skinner, enquanto as chamadas funções pessoais e informativas têm algo em com um com o tato de Skinner. A similaridade entre as primeiras três funções e os man dos se torna ainda mais impressionante no curso do desenvolvimento, em que Halliday admite as dificuldades de estabelecer distinções exatas e agrupá-las sob o termo geral de função pragmática. A sobreposição não é, é claro, argumen to para defender que essas classificações sáo de fato úteis. Elas se sobrepõem talvez apenas porque sejam pouco refinadas. Na verdade, nenhuma das classificações disponíveis do comportamen to verbal parece totalmente satisfatória e pode-se questionar se tentativas recentes realmente acres centaram algo de importante às categorias mais tradicionais, como as de Jakobson. O famos o linguista costuma va opor três funções primárias (i.e., conativa, referencial e expressiva) e três secundárias (i.e., poética, fatica e metalinguística), com a função conativa abrangendo as mesmas coisas que os mandos de Skinner e a função prag mática de Halliday. Se quisermos colocar as coisas na perspectiva adequada, temos que estar cons cientes da preocupação persistente com os aspectos fu ncionais da linguagem dentro do campo da linguística, muito antes que o estruturalismo, e por último Chomsky, tentasse reduzir o estudo da linguagem a seus aspectos puramente formais. Muitos linguistas antes e depois, mesmo aqueles que contribuíram para a análise formal de um modo ou de outro, mantiveram um interesse no outro lado, o lado funcional. An tes de Ja kobso n, o próprio Saussure era sem dúvida um deles, qu an do visualizou uma ciência mais geral da langue e da parole , como o foi o antropólogo-linguista americano Sapir. O linguista francês Benveniste trabalhou o mesmo tema em sua teoria da enunciação e, por fim, a pragmática moderna se desenvolveu com uma ênfase de que a linguagem não pode ser explicada a menos que o contexto prático de seu uso seja considerado. Tal evolução está vinculada, sem dúvida, às caracterís ticas intrínsecas das coisas estudadas, que, mais cedo ou mais tarde, a despeito de afirmações teóricas opostas, impõem uma diferente e apropriada linha de ataque. Não faria sentido dar crédito exclusivo a Skinner por ter previsto essa importante virada; ele merece crédito, porém, por ter iden tificado insuficiências no trato do
2(4 Nó s omitimos aqui o importante e difícil problema da intencionalidad e, cuja solução é muito d iferente em Skinn er e em Au stin .
comportamento verbal na sua época, especialmente da parte dos psicólogos, e por ter afirmado, em seus próprios termos (que admitidamente não foram muito ampla mente recebidos), suas propostas, convergindo, nas questões essenciais, com outras abordagens no m oderno estudo da linguagem. Importante apontar aqui que a linguística e a psicolinguística náo são os únicos campos em que tal tipo de evolução ocorreu. Peia mesma época, a lógica experimen tou um movimento semelhante. Após ter sido negligenciada por um bom tempo, a retórica, como era chamada pelos gregos antigos, recebeu atenção renovada sob o nome de teoria da argumentação, como desenvolvida, entre outros, por Pereiman.1'5 Na tentativa de explicar as propriedades do discurso que o tornam eficiente, isto é, persuasivo, ao invés de verdadeiro ou falso, a teoria da argumentação considera não apenas o discurso em si mesmo, mas também a interação com a audiência, se aproxi mando de uma análise funcional e de uma interpretação substancialmente psicológica. Um último exemplo retirado da psicolinguística do desenvolvimento mostrará, ironicamen te, com o a pesquisa cognitiva sobre as regras da linguagem infantil lança mão precisamente do tipo de manipulação de estímulo que Chomsky havia decla rado irrelevante para as produções do sujeito falante. A linguagem de uma criança, em qualquer nível de seu desenvolvimento, pode ser vista como uma aproximação tempo rária e imperfeita do estágio final a ser alcançado, representado pela linguagem adulta - um sistema sempre em mu dança, se observado com cuidado. Esse era o modo típico com que o comportamento de uma criança era visto antes de os espe cialistas em desenvolvimento imporem uma abordagem alternativa, na qual o com portamento da criança é visto, em cada estágio de desenvolvimento, como exibindo sua própria consistência, em bora possa ser temporário no organ ismo em muda nça.116 Como pode um investigador descrever ou inferir as regras vigentes em estágios sucessivos da linguagem de uma criança? Um exemplo simples irá nos dizer. O uso de tempos e modos verbais em inglês, francês e na maioria das línguas indo-europeias obedece a certas regras, entre as quais relações temporais adequadas geral men te têm prioridade: a form a verbal é primeiramen te selecionada de acordo com o temp o - presente, passado ou futuro - da ação ou estado descrito. O utros fatores são considerados na explicação, mas são sentidos como secundários ao próprio tempo, tais como duração, repetição (iteração), status da ação real ou potencial, etc. Esses são chamados aspectos pelos gramáticos e podem ser marcados pelos modos gra maticais, pelos tempos específicos ou formas verbais (e.g. em português: ele andou 215 Ver, entre oucras fontes. Pertlman & O ibrechts-Ty teca (1958). 2j6 A dificuldad e crucial criada pela abordagem do de senvolvime nto sempre foi, é claro, reconciliar a noção de consistência estrutural em qualquer estágio do desenvolvimento e o fato de que o desenvolvimento é, por definição, um fluxo ininterrupto. Uma solução, identificada por Piaget entre muitos outros, foi caracterizar um número limitado de estágios consistentes Ç‘itíiAes") separados por períodos de transição sem consistência estrutural; por outro lado, enxergar o desenvolvimento como um processo continuamente em mudança (embora náo necessariamente uniformemente) torna extremamente difícil explicar consistência estru tural em qualquer mom ento. A psicologia do desen volvimento aind a está em busca de sua própria cécnica de cálculo infinitesimal.
pela rua versus ele estava andando pela rua). Os métodos utilizados para descobrir o que as regras vigentes são na linguagem da criança envolvem uma análise do* aspectos não linguísticos dos atos de fala. O procedimento experimental é baseado em um princípio muito simples: é apresentada à criança uma cena com objetos d ou personagens e pede-se que ela a descreva em palavras (teste de produção), ou é solicitada a interpretar, com os objetos e/ou personagens disponíveis, uma cena que corresponda o má ximo possível a uma sentença proposta pelo experimentado r (teste de compreensão). Ao explorar o valor das formas verbais, um experimentador pode apresentar à criança ações desempenhadas por pequenas bonecas ou animais, tais como ir para casa, pular cercas, derrubar algo ou alguém, etc. e convidar a criança a descrever a cena, imediatamente após ou após um intervalo (por exemplo, i, 7 ou 25 segundos). As ações apresentadas podem diferir em duração, em seu aspecto con tínuo ou repetitivo, quanto ao resultado, quanto ao espaço abrangido, ou qualquer outra propriedade hipoteticamente importante na determinação da forma verbal selecionada. Os resultados de tal experimento com crianças francesas revelaram que elas utilizam formas verbais principalmente de acordo com fatores relacionados ao aspecto ao invés de fatores referentes ao tempo.117 As formas verbais são selecionadas de acordo com o caráter da ação a ser descrita - completa versus incompleta, bem-sucedida versus malsucedida, pontual versus duradoura ou repetitiva, etc. Como se pode ver, a investigação está relacionada a mudanças que ocorrem nas declarações verbais quando aspectos específicos do estímulo são modificados. O experimentador obtém material relevante do qual infere o sistema gramatical típico do estágio de desenvolvimento da criança ao induzir pequenas mudanças no estímulo; isto é, ao fazer o tipo de coisa que Chomsky, tão assertivamente, ridicula rizou em suas críticas ao Verbal behavior, descartando as características do estímulo como irrelevantes para a decisão do falante de produzir uma determinada declara ção. Tomando como garantia que o que um falante diria em frente de uma pintura seria determinado exclusivamente pela própria vontade do falante, ele questionou ironicamente a interpretação de Skinner de que propriedades sutis da pintura ou a situação como um todo podem induzir à resposta verbal “escola holandesa”. De acordo com Chomsky, como já citado, o falante poderia muito bem ter dito “pen durado torto” , “ horrível” ou “não combina com o papel de parede”. Infelizmente, nenhum psicólogo de viés comportamental implementou, à épo ca, um experimento em que os fatores situacionais pudessem ter sido muito bem manipulados, de modo que as variáveis importantes na determinação da seleção das respostas verbais pudessem ser identificadas. Quão obliquamente deveria estar posicionado o quadro da pintura para induzir um visitante educado à resposta “tor to” ao invés de “maravilhoso”? Isto foi exatamente o que fez o experimentador na
investigação resumida no parágrafo anterior, em uma tradição de pesquisa que foi, desde o início, vista claramente como parte da abordagem cognitiva.
P o r que o
V e r b a l b e h a v i o r ainda
é ignorado?
Como é que as ideias antecipatórias de Skinner não foram reconhecidas, nem mesmo retrospectivamente, como um reconhecimento histórico, quando sabemos quáo convergentes elas foram em relação às principais abordagens no campo do estudo da linguagem? Referências a autoridades do passado se tornaram moda depois do apelo de Chomsky à Gramática de Port-Royal —e, mais tarde, o uso de Fodor da frenologia de Gall. Skinner ainda estava vivo, náo antigo o bastante na história para servir como referência de prestígio. Pior ainda, ele havia sido eliminado da cena dos sérios estudantes da linguagem. Poucos especialistas esta vam pronto s para arriscar, entre seus pares, uma alusão a Skin ner e ainda menos para sugerir que ele previu alguns dos desenvolvimentos atuais da psicolinguística. Exceções possivelmente podem ser contadas nos dedos de uma máo. Uma delas foi o psicolinguista austríaco Moerk, cujo livro Pr agmatic an d semantic aspects o f early language developmenf 1 3 é uma das explicações mais equilibradas e completas do desenvo lvimento publicadas pelos psicolinguistas nas últimas duas décadas. Ele se atreve a notar que as conceitualizações de Skinner foram novamente aceitas em (então) recente trabalho sobre linguagem, “enquanto o sistema de Skinner e sua terminologia são ainda refutados na maioria dos casos”. O ataque de Chomsky, contudo, não é a história completa. Outros fatores, relacionados a Skinner ou a seus estudantes, poderiam, penso eu, ser mencionados como tendo contribuído para a negligência quase geral do importante conteúdo do Verbal behavior. Em primeiro lugar, o livro não gerou pesquisa empírica significativa entre os seguidores de Skinner. A maioria deles estava ocupada explorando escalas de reforçamento em an imais e não estavam prontos para mu dar para atividades verbais em humanos. Aqueles que o fizeram, o fizeram de forma ingênua e simplificada, se limitando a experimentos nos quais elementos do comportamento verbal eram re forçados por um “Hum!” de aprovação do experimentador. O próprio Skinner não se engajou em trabalho empírico e seus estudantes foram quase totalmente ausentes no rápido crescimento da área, marcado por um florescer repentino de criativos procedimentos experimentais. Um segundo fator foi a negligência, de Skinner e seus seguidores, em relação à dimensão do desenvolvimento, como discutido no capítulo 7. Conforme vimos, as teses de Chomsky, embora recepcionadas com entusiasmo pelo psicolinguistas
do desenvolvimento, rapidamente se revelaram especialmente inadequadas em sua. área, na qual métodos de investigação, bem como questões teóricas, rapidamente convergiram para o que Skinner havia sugerido anteriormente. Novamente, a negli gência em relação ao desenvolvimento aparece nesse contexto como a maior falha, do pensamento de Skinner, dados os temas nos quais estava interessado e o tipo de contribuição original que ele tinha a oferecer. Em terceiro lugar, Skinner (e seus seguidores) foram ignorados pela maioria dos psicolinguistas porque não deram muita atenção à fertilização cruzada entre a psicolog ia e a linguística que ocorreu nos anos 1950 e 196 0 e que sem dúvida recebeu um impulso decisivo de C hom sky, qualquer que seja o valor intrínseco de sua teoria. Partindo do que ele conhecia de linguística (mas é difícil avaliar com alguma preci são o quanto era isso),ZJ9 Skin ner não estava satisfeito com o modo dela de resolver problemas que ele visava como psicólogo. Ele não questionava a importância ou a legitimidade de seu trabalho (não mais do que ele fez em relação ao trabalho dos neurofisiologistas). Ele o bservou explicitam ente, ao discutir os autoclíticos, que estes (ou ao menos a categoria que ele rotulou com o autoclíticos relacionais) eram o objeto de estudo tradicional da gramática e da sintaxe. Mas ele estava interessado em algo diferente e, do que ele conhecia, de pouca relevância para elas. Talvez um olhar mais próximo à sua obra poderia ter revelado a Skinner a preocupação com as questões que o próprio Skinner considerava cruciais. Este teria sido 0 caso com os linguistas “clássicos” e mais ainda com alguns daqueles cuja obra levou, por fim, à pragmática moderna na época em que ele escreveu o Verbal behavior ou nos anos seguintes. Para resumir, eu sustentaria que a contribuição de Skinner ao estudo da lingua gem foi importante, no sentido de que abriu novos caminhos para abordar aspectos da psicologia da linguagem previamente inexplorados e pouco entendidos, e que ela merece ser reabilitada. Ele estava correto quando afirmou que a revisão crítica de Chomsky “não acertou”. Mas ele perdeu a chance de influenciar os psicolinguistas contem porâneos ao se manter distante do diálogo interdisciplinar que se estabeleceu entre os linguistas e os psicólogos, que, por fim, chegaram perto de suas próprias visões por caminho s diferentes. Isso, é claro, é o qu e de fato co nta no progresso do conhecimento.
119 M uito poucos linguistas sáo citados no Verbal behavior e, quando o são, as citações são geri)mente anedóricas, ao invés dc focalizarem em pontos substanciais de sua teoria. Encontramos ocasiona]mente Jespersen ou Sapir, nunca Saussure, Bloomfield ou Jakobson.
11 PROCESSOS DO PENSAMENTO E CRIATIVIDADE
U ma
a b o r d a g e m c o m po r t a me n t a l d a c o g n i ç ã o
Skinner não é usualmente visto como um expert na resolução de problemas e outros processos cognitivos de ordem superior. Sente-se que sua contribuição para a psicologia termina no ponto onde começa a inteligência. Se seu trabalho com apren dizagem elementar em animais é reconhecido, de forma geral não lhe é dado mérito por nenhum avanço significativo no campo do pensamento humano. Este juízo é frequentem ente expresso, é claro, por cognitivistas que descartam sua abordagem não mentalista como irrelevante para o entendimento das atividades intelectuais, hoje em dia rotuladas mais de acordo com a moda, como cognição. Mas é mais amplamente compartilhado por muitos psicólogos que simplesmente notam que Skinner não oferece muito trabalho empírico naquela área. E verdade que Skinner não se engajou em pesquisa experimental sobre resolução de problemas e questões similares. Sua contribuição permaneceu, na mesma linha como para o comportamento verbal, no nível da interpretação. Ela foi igualmente não reconhecida, embora não tenha sido tão fortemente atacada como o Verbal behavior foi por C hom sky; ela foi simplesmen te deixada de lado po r especialistas da área, possivelmente porq ue eles já tinham uma quantidade impressionante de dados experimentais para trabalhar e para incorporar aos construtos teóricos, e também porque - conform e observação muito correta de Hun t210 ao comentar, em 1984, o artigo publica do em 1965 - Skinner não usou a metáfora correta para pensamento. Ele extrapolou, a partir de estudos com animais, o que implicitamente significa utilizar organismo animal com o modelo, n um tempo em que a metáfora computacional já era a referência unanimemente adotada. Como para a linguagem, o interesse em relação aos processos de pensamento não era novo em Skinner; não era simplesmente uma resposta ao crescente interesse na resolução de problemas na psicologia. O último capítulo de Verbal behavior era dedicado ao Pensamento, bem como um capítulo, em 1953, do Science and human 22.0 “U m estudo de caso de como um artigo contend o boas ideias, apresentado pot um distinto cientisca, para uma audiência apropriada, tivera quase n enhuma influência'' (H u n t , 1984). O artigo de Hunt é um comentário a convite de pares sobre “An opcrant analysis o f problem -solvin g', reimpresso cm Behavioral and Brain Sciences t, antes, em Contingencies o f reinforcement (S k j n n e r , 1969b).
behavior. Estes eram certamente produtos de uma reflexão iniciada no capítulo de conclusão de The behavior o fo rg a n is m s Nessas páginas m uito esclarecedoras - es clarecedoras também para o projeto intelectual de Skinner —ele se refere a "cogni ção” (sim, a palavra já estava lá, sob a pena de Skinner) como um daqueles conceitos que precisam ser abordados com o tipo de análise que ele utilizou em seu livro para explicar alguns aspectos do com portam ento do rato - isto é, um daqueles conceitos que devem ser tratados de um modo não mentalista se quisermos fornecer uma descrição científica e uma explicação científica da realidade a qual se referem. A descrição e a organização tradicionais do comportamento representadas pelos conceitos de “vontade” , “cognição” , “ inte lecto” e assim por diante não podem ser aceitas na medida em que fingem estar lidando com o mundo mental, mas o com portamento ao qual se aplicam esses termos é naturalmente parte do objeto de estudo de uma ciência do comportamento. O que se busca em tal ciência é um conjunto alternativo de termos derivado de uma análise do comportamento e capaz de fazer o mesmo trabalho. Nenhum esforço foi feito aqui para traduzir conceitos mentalistas ou filosóficos para os termos do presente sistema. O único valor da tradução seria pedagógico.111 A m aior parte de seus textos posteriores sobre o assunto foram , na verdade, tentativas de tal tradução, e sem dúvidas foram feitas com intenção pedagógica. Elas não devem ser avaliadas com referência à explosão de estudos empíricos e teóricos no campo da resolução de problemas do final dos anos 1950 até agora, mas como resposta ao desafio de estender a abordagem behaviorista radical (como oposta à metodológica) aos níveis mais complexos das atividades humanas. Se o desafio foi resolvido, é uma questão em aberto; como veremos adiante, aqui, como no cam po da linguagem, observar à distância, de um modo não passional, pode revelar prenúncios inesperados de, e convergências com, o trabalho atual implementado dentro da abordagem cognitivista.
0 STATUS DO PENSAMENTO Vam os caracterizar primeiro as p rincipais características da “tradução” de Skinner. Ao discutir as convergências com Piaget, em um capítulo anterior, já apontamos para a epistemologia geral enfatizada por Skinner, ancorada na ação, ao invés de derivada das sensações, como pode ria ser esperado de um emp irista - o que ele não era, ao menos no sentido clássico. Este é o centro de sua análise do pensamento. E, entretanto, fundamentalmente distinto do conceito de pensamento como proposto em outras explicações behavioristas, especialmente na de Watson. O fundador do behaviorismo, desconcertado com a aparência mental do pensamento, resolveu a dificuldade assimilando o pensamento à fala subvocal. Fala pode ser tratada como um comportamento, se claramente de um tipo particular; e, caso se assuma que o pensamento pode ser equiparado com a fala, podemos ir um passo adiante e tratar todo pensamento encoberto —e pensamento é mais frequentemente encoberto que explícito —como subvocal, fala encoberta e, portanto, como comportamento. Skinner inequivocamente rejeitou essa visão. Numa análise sensata do com portamento verbal direcionado a si mesmo, o falante e o ouvinte estando dentro da mesma pele, ele discute o status da fala audível (aos outros) versus inaudível, apontando para o valor econômico da fala subvocal, mas também para sua função de evitar punição. Estas e outras variáveis explicam a distinção entre os dois níveis, aberto e encoberto, mas, como ele conclui, elas náo afetam muito outras propriedades (da fala). Elas não sugerem que haja qualquer distinção importante entre os dois níveis ou formas. Náo se ganha nada, portanto, ao identificar pensamento com conversa inaudível. Isto foi feito em certa aná lise behaviorista inicial, aparentemente como um esforço para encontrar substitutos para os chamados processos mentais.12’ O pensamento não é mais o precursor do comportamento que a fala encoberta é da fala aberta: Não há um ponto em que seja útil traçar uma linha que distingue pensamento de ação nesse contínuo (partindo do comportamento aberto, verbal e não verbal, para o compor tamento encoberto, possivelmente inconsciente, novamente verbal ou não verbal).214
223 Id. (1957 , p. 457)224 Id. ibid., p. 438; parênteses sáo meus e resumem o conteúdo d o parágrafo precedente.
A seguinte citação gu arda a essência das visões de Sk in ner sobre o pen samen to, enquanto mostra claramente sua consciência a respeito dos diferentes níveis a serem diferenciados ao lidar com processos humanos superiores. As sentenças finais ilus tram, mais uma vez, as convergências com Piaget: A visão mais simples e mais satisfatória é que o pensamento é simplesmente comportamento — verbal ou não verbal, aberto ou encoberto. Ele não é nenhum processo misterioso responsável pelo próprio comportamento em toda a complexidade de suas relações de controle, em relação ao homem que se comporta e ao ambiente em que ele vive. Os conceitos e métodos que emergiram da análise do comportamento, verbal ou não, são mais apropriados ao estudo do que foi tradicionalmente cha mado de mente humana. Tradição e conveniência parecem concordar em confinar a análise do pensamento humano ao comportamento operante (como oposto aos reflexos, condi cionados ou não). Considerado dessa forma, o pensamento não é uma causa mística ou um precursor de ação, ou um ritual inacessível, mas a própria ação, sujeita à análise com os conceitos e técnicas das ciências naturais, e a ser explicada, por fim, em termos de variáveis de controle.125 E esta afirmação verdadeiramente “sistêmica”: Podemos desconsiderar a incômoda dissecação do pensamen to humano no padrão familiar de (i) um homem que possui (2) conhecimento do (3) mundo. Os homens são parte do mun do e eles interagem com outras partes dele, incluindo outros homens. À medida que seu comportamento muda, eles po dem interagir mais efetivamente, ganhando controle e poder. Seu “conhecimento” é seu comportamento em relação a si mesmo e ao resto do mundo e pode ser estudado como tal.116
215 Id. ibid.. p. 449, parênteses são meus. 126 Id. ibid., p. 451.
0 OPERANTE COMO RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS Em certo sentido, qualquer operante, no processo de sua emergência, pode ser visto como um caso simples de resolução de problemas; um organismo é con frontado com uma situação arranjada de tal modo que um dado comportamento produzirá comida, que é o que o sujeito está procurando no momento. O que ele pode fazer é modificar a situação ou modificar seu próprio modo de se comportar na situação, em outras palavras, sua interação com o ambiente. Ele irá emitir, por fim, um comportamento adequado que será reforçado. Se a resposta não tiver sido modelada, i.e., ensinada, ela pode ter sido prod uzida ‘ ao acaso” , um a das variações comportamentais exibidas pelo sujeito que, com alegria, atinge o objetivo, i.e., re solve o problema. Um a vez emitida, a resposta será produzida novam ente em situa ção semelhante e se tornará uma solução rapidamente disponível, automática, para o mesmo problema. Isto não é tudo o que geralmente se leva em conta quando os psicólogos estu dam resolução de problemas em humanos. Achar a solução ao acaso pode ser visto como um bo m resultado em tentativas randômicas - o fato de que o sujeito tenta, ao invés de permanecer sem ação, já é uma parte impo rtante da maio r parte do com portamento adaptativo operante, e essencial quando nenhum outro procedimento está disponível - mas os humano s desenvolveram form as muito m ais sofisticadas e eficientes de resolver problemas. Skinner enfatizou duas dessas formas, que podem ser chamadas de estratégias, estando a palavra livre de conotação mentalista. Uma é a construção de estímulos discriminativos que modificam a situação ou o tipo de interação que o sujeito tem com ela; a segunda é o recurso a descrições verbais e instruções que Skinner chamou de regras. Regras estão frequentemente envolvidas na construção dos estímulos discriminativos, tanto que desembaraçar essas duas es tratégias nem sempre é fácil, mas as manteremos separadas para uma maior clareza. Na resolução de um problema, o sujeito geralmente irá organizar, ao invés de deixar ao acaso, as atividades exploratórias que farão a descoberta da solução mais provável. S upo nha que os sujeitos tenham de resolver um problem a mecânico, reparar um motor, por exemplo, ou montar as peças de um dispositivo. Manipular o material aleatoriamente torna pouco provável encontrar a solução. Os sujeitos observarão o material sistematicamente, talvez checando aquelas partes já obser vadas cuidadosamente; irão separar itens e os marcar enqu anto tentam encaixá-los no dispositivo; eles operarão sucessivas manipulações, das quais deixarão traços e assim por diante. Ao longo de toda a história individual, “comportamentos precorrentes” mais ou menos generalizáveis se desenvolvem e podem ser satisfatoriamente aplicados em uma ampla gama de problemas. Por exemplo, olhar para as coisas de uma maneira nova —na linguagem de Piaget, estabelecendo uma descentração — geralmente ajuda a encontrar a soluçáo; repartir o problema em componentes mais
simples algumas vezes prova ser efetivo, e assim em diante. A linguagem geralmente estará envolvida no processo: descrevendo o que é observado, o que já foi feito, o que poderia ser feito, são modos de mudar, na realidade ou em pensamento, aspec tos da situação até que a solução finalmente emerja. Tudo isso equivale a descrever as contingências e descrever o próprio comportamento em relação a elas. Tal descrição pode ser utilizada para controlar o próprio comportamento futuro, dessa forma assumindo a função de regras. Regras, na terminologia de Skinner, são declarações verbais (o que inclui qual quer das linguagens especializadas da ciência, conforme elaborado pela lógica e pela matemática) que descrevem aspectos do mundo ou da relação do sujeito com o mundo e que podem ser usadas eficientemente na ação. Elas têm papel fundamen tal na adaptação humana. Muitas delas são parte do contexto cultural, outras são construídas pelo indivíduo ao lidar com o ambiente. O ensino é, em grande parte, a transmissão das regras para lidar com os vários tipos de domínios.
C o mpo r t a m e n t o g o v e r n a d o p o r r e g r a s
A diferença entre o comportamento resultante da exposição direta às condições físicas e sociais e o comportamento resultante do seguimento de regras é muito importante. Skinner descreveu uma distinção básica entre o que ele chamou de comportamento modelado pelas contingências e o comportamento governado por regras. O primeiro se refere ao processo observado em animais e também em huma nos quando o comportamento é adquirido e mantido pela interação direta com o mundo. Todos adquirimos vários tipos de habilidades dessa forma, tais como subir uma escada ou guiar uma bicicleta. Mas esse processo muito natural tem o seu limite quando ele vem a se adaptar a situações mais sofisticadas criadas pelos homens, tais como dirigir um carro ou pilotar uma espaçonave, ou de atuar em situações de alto risco. Tais adaptações são possíveis apenas recorrendo a instruções verbais geralmente fornecidas por pessoas com conhecimento apropriado. Elas são típicas do comportamento governado por regras. As vantagens das regras, consideradas dessa forma, são numerosas e fáceis de identificar. Como acabamos de ver no exemplo dado, elas permitem uma aquisição segura de habilidades que exporiam o aprendiz a um risco alto e possivelmente fatal se em contato direto com as contingências. Elas são econômicas, no sentido de que elas poupam o indivíduo dos esforços (que consomem tempo e energia) de passar sozinho pelos estágios que outros já desbravaram: elas encurtam uma importante parte da aprendizagem individual. Elas são obviamente a base do caráter cumulativo da cultura humana: nenhum de nós é capaz de reconstruir sozinho a matemática ou a marcenaria; podemos, entretanto, assumir, a partir do atual estado da arte, uma
síntese do passado em um conjunto finito de regras. Existem vantagens quando as regras sáo construídas pelo sujeito ao lidar com uma dada situação ou resolver um problema. Elas são, é claro, a chave para a antecipação hipotética da ação, que torna possível prever os resultados das várias estratégias, até que uma seja finalmente selecionada como a solução mais apropriada. Elas tornam possível colocar o com portamento atual sob controle de consequências remotas. Um exemplo típico na vida cotidiana é assinar apólices de seguro para se proteger dos riscos aos quais a maioria daqueles que contratam seguro têm pouca probabilidade de serem expostos ao longo de sua vida. Essas apólices seguem regras estabelecidas pelas companhias de seguro, que baseiam suas estimativas em inferências estatísticas que se referem a eventos raros, que um indivíduo geralmente não experiencia direta e frequentemen te o bastante para ficar sob controle das consequências concretas. Este é um caso em que os humanos podem adotar um comportamento controlado por eventos de muito pouca probabilidade. Riscos ecológicos apresentam as mesmas propriedades e a segurança será alcançada apenas quando as sociedades modernas genuinamente tomarem decisóes baseadas nas estimativas das consequências remotas no futuro, e portanto inefetivas no controle direto do comportamento. O conceito de comportamento governado por regras está relacionado a um problema fundamental clássico na psicologia, o problema de articular comporta mento verbal e não verbal. A medida que é dado ao comportamento verbal um status superior na hierarquia dos comportamentos, o problema é geralmente colo cado em termos de controle da ação motora pela linguagem, ou, para usar a frase de Luria, em termos de regulação do comportamento motor pela linguagem. No sistema da psicologia cognitiva contemporânea, é um caso de causação descendente. A importância dada a ele por Skinner reflete seu profundo interesse em uma das características mais distintivas da psicologia humana e seria suficiente para descartar a ideia de que ele pegou o rato como modelo para os seres humanos. As regras oferecem uma alternativa para as contingências, mas o comportamen to emergente do controle pelas regras não é idêntico ao comportamento modelado pelas contingências. O último mantém suas propriedades genuínas, que Skinner caracterizou ao traçar um paralelo entre comportamento modelado pelas contin gências e comportamento governado por regras por um lado, e outras dicotomias clássicas por outro. Comportamento governado por regras está mais do lado do intelecto como oposto à emoção, do argumento lógico como oposto à intuição, da deliberação como oposta ao impulso, do conhecimento como oposto à experiência, da palavra como oposta à ação, da razão como oposta à fé, da verdade como oposta à crença, da racionalidade como oposta à paixão, da consciência como oposta à in consciência, da cultura como oposta à natureza. Cada um desses contrastes captura alguns dos aspectos da diferença que permanece mesmo quando o comportamento derivado dos dois tipos de controle for idêntico à primeira vista. Sua origem e sua
história são diferentes e, portanto, eles possuem status funcionalmente diferentes. O contraste se torna impressionante nos casos em que as regras podem facilmente ser enunciadas, mas que náo conseguem controlar o comportamento. Skinner cita o famoso exemplo de Pascal: O maior filósofo do mundo, de pé em uma tábua maior que o necessário para o sustentar, mas acima de um precipício, será controlado por sua imaginação mesmo que sua razão o convença de que está seguro. [Skinner comenta:] Não é sua imaginação, mas contingências anteriores que evocam o com portamento de estar com medo (e algumas dessas contingên cias podem ser filogenéticas).127
Todos experimentamos situações semelhantes, mesmo que menos dramáticas. A descrição de um passo de dança, ou uma performance esportiva, não é necessaria mente tudo o que é necessário para reproduzi-los corretamente. Enunciar as regras para a resolução de um problema matemático nem sempre é suficiente para que o estudante o resolva. A relação entre as regras e a ação é complexa, e falar sobre com portamento governado por regras implica que o sujeito se comporta. A ação ainda é uma parte essencial do processo.
T e n d ê n c i a s a t u a i s n a r e s o l u ç ã o d e pr o b l e ma s
Essas formulações sobre o pensamento e a resolução de problemas são relevan tes para as tendências atuais nessa área? Considerando que a área é agora parte da psicologia cognitiva e que o cognitivismo definiu, em certa medida, sua identidade por meio do contraste com o behaviorismo, não se pode esperar que estudantes da resolução de problemas, ou, falando de forma mais geral, da inteligência, hoje dessem algum mérito a Skinner por ele ter desenvolvido ideias fundamentais. Muito frequentemente, eles simplesmente ignoram a sua contribuição - como ignoram muitas outras contribuições, não behavioristas, que poderiam parecer surpreen dentemente modernas em muitos aspectos - ou, quando fazem referência a ela, a descartam como irrelevante, por não ter dado o devido lugar aos estados e processos mentais, tais como pensamento, intençáo, vontade e similares. Portanto, eles mos tram que o antigo debate não teve seu fim e também revelam que náo leram Skinner cuidadosamente, se de alguma forma o leram. Se o tivessem feito, teriam descoberto 21 7 Isto. corno sumário de pares de opostos que o precede, í retirado das notas estendidas ao artigo “An operant analysis of ptoblem solvircg” , reimpresso em Skinne r (1969b, p. 17 1). Parte do material dessas notas foi incluída de um a forma mais concisa no artigo reimpresso no Behavtoraland Brain Sciences (S t e r n b e r g , 1984).
que Skinner nào nega a realidade por trás de termos como pensamento, intenção ou vontade, mas que ele se recusa a tomá-los como entidades autoexplicativas e como explicativas para os comportamentos os quais elas causariam. A posição deles frequentemente pertence ao que eu chamei de cognitivismo epistemológico em um capítulo anterior. Nesse contexto, é interessante apontar exatamente a opinião de alguns comen tadores das ideias de Skinner sobre essa questão em particular. Farei referência a dois deles, autoridades de prestígio no campo da inteligência. Para Robert J. Sternberg, a explicação de Skinner para a resolução de problemas lhe pareceu, quando inicial mente a leu como estudante de graduação, como uma análise a ser refutada, àquela época, pelo que eu acre ditava ser o cavaleiro branco da psicologia do processamen to de informação. Ao fazer uma releitura, minha reação foi muito diferente. Acredito que Skinner forneceu uma análise genial da resolução de problemas que se direcionou apenas a relativamente poucas das questões que eu c muitos outros vemos como nossa principal preocupação hoje. Isto não quer dizer que as nossos interesses estão certos e os de Skinner es tão errados - mas simplesmente que eles se direcionam a di ferentes aspectos do fenômeno da resolução de problemas.“ 8 A s questões nas quais Sternberg está interessado não são, de fato, questões re
cusadas por Skinner, mas redefinidas por ele, “de um modo”, acrescenta Sternberg, que assume como verdadeiras respostas sem provas a certas questões que eu quero ver respondidas. Assim, por exemplo, ele afirma que “falar do propósito de uma ação é simplesmente se referir a suas consequências características” (...). Eu não creio que as intenções possam ser englobadas pelas consequên cias particulares (...). As objeções de Sternberg se fundamentam no status dos eventos mentais, na legitimidade de se ter uma categoria para pensamento ou intenção enquanto entida des ou processos mentais, distintos do comportamento. Ele retoma, como a maioria dos cognitivistas, o vago uso mentalista dos termos que Skinner acreditava neces sário esclarecer ao propor uma análise funcional das realidades às quais se referem. Sternberg compartilha a crença vigente, de novo cientificamente conceituada no
cognitivismo, de que essas realidades são de uma natureza diferente do comporta mento, mas a crença não é muito bem embasada contra as razões de Skinner para não a compartilhar. Muitos biólogos e filósofos não acreditavam que a vida poderia ter emergido de processos físico-químicos; ou não acreditavam que as espécies pu dessem ter evoluído através de um processo de seleção natural ao invés de terem sido criadas pela vontade de um Deus. A ciência abalou muitas de nossas crenças, e aquelas relacionadas à nossa autoimagem são mais persistentes que outras. Não se admira que elas reapareçam em qualquer ocasião possível antes de desaparecerem para sempre. Apesar das divergências básicas —que ele cham a de “este senso de irrelevância” Sternberg admite que Skinner enfatizara aspetos da resolução de problemas lamen tavelmente ignorados pela psicologia do processamento de informação. O seguinte parágrafo de seu comentário vale a pena ser citado integralmente: (...) realmente achei que Skinner lidou com questões que eu penso terem sido frequentemente deixadas de lado muito rapidamente na primeira descarga de entusiasmo com a pes quisa do processamento de informação. Por exemplo, Skinner mostra sensibilidade perfeita aos efeitos da situação sobre o comportamento; os psicólogos do processamento de informa ção muitas vezes trataram as tarefas como se elas ocorressem isoladamente, sem referência a uma variedade de restrições da situação. Além disso, Skinner mostra um interesse pelas ques tões da aprendizagem que foram frequentemente ignoradas ou justificadas pelos psicólogos do processamento de infor mação, mais recentemente, por meio de alegações de que os experts diferem dos novatos em, ao que parece, pouco além do conhecimento que eles utilizam para resolver os problemas. Certamente foram as suas estratégias superiores de aprendiza gem que os ajudaram a adquirir seu enorme conhecimento; suspeito que Skinner teria mais a dizer sobre como essa apren dizagem ocorre do que aqueles que iniciam sua análise apenas depois que a aprendizagem ocorre.119 Sternberg sem dúvida reflete o movimento do pêndulo em direção a uma posi ção mais equilibrada a respeito da resolução de problemas. Hunt, já citado anteriormente, vai um passo além ao traçar paralelos entre o tratamentode Skinner à resolução de problemas e as formu lações adotadas por
aJguns dos líderes influentes da área da psicologia cogn itiva. Ele não hesita em usar a expressão “representação interna” como equivalente a “estímulo discriminativo”, especialmente para designar a nomeação do objetivo a ser atingido quando um su jeito se engaja na resolução de um problema e está apto a descrever a muda nça qu e ocorreria na situação com a solução. A imp ortância desse passo é claramente exem plificada em simulações de resolução de problemas, nas quais os estudantes de cog nição recorrem aos conceitos da regra padrão-ação: um “padrão” P, nesse contexto, é um a afirmação sim bólica do estado final almejado, cuja presença na representação interna do problema produz ação A. H un t observa: Sistemas de produção podem parecer teíeologicamente dire cionados a um objetivo. De fato, eles são evocados por nossas afirmações sobre o problema e seu objetivo. Os teóricos da aprendizagem dos anos 1940 e 1950 (e Skinner) tinham a no ção muito pobre de que a resolução de problemas poderia ser descrita em termos de uma notação S =■> R. Psicólogos cog nitivos modernos acreditam que P => A é mais apropriado. Skinner poderia reivindicar com razão que seu artigo tinha os fundamentos da ideia moderna!250 Outra analogia se dá entre comportamentos precorrentes, construindo novos estímulos discriminativos, e a manipulação de um sistema simbólico físico pelo moderno solucionador de problemas, Hunt também aponta para uma semelhança próxima entre a ênfase de Skinner em nomear respostas e os aspectos da situação e o papel da nomeação na forma como os experts resolvem os problemas, em con traste com os novatos. Ele sugere que “não há razão para que Chi, Larkin e seus colegas não tenham utilizado a linguagem de Skinner ao invés dos termos empres tados da ciência computacional!”.131 Por fim, Hunt sublinha as similaridades entre a distinção entre com portamento modelado pelas contingências e compo rtamento governado por regras e a distinção de Schneider e Shiffrin entre processamento automático e controlado. Essas observações são muito relevantes porque seu autor trabalha dentro do paradigma cognitivista e não tem nada a ganhar por se aventurar em uma reabi litação de Skinner. Elas simplesmente provêm de uma leitura lúcida e honesta da obra de Skinner e da consciência de Hunt de que profundas continuidades ligam mesm o tendên cias sucessivas e aparentemente opostas na ciência psicológica —uma
230 Hu nt (1984, p. 597). 231
Id. ibid.
consciência de que grande pane dos conflitos dentro da psicologia contemporânea, j não passa de debates sobre metáforas. ' j
C omportamento criativo
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Embora a resolução de problemas, no sentido clássico, por definiçáo sempre envolva algum a novidade, é amplam ente aceito que ela pode ser submetida à análise científica e poderia mesmo se admitir que ela pode ser adequadamente analisada em termos comportamentais, como proposto por Skinner. Uma área da atividade hum ana superior, entretanto, certam ente irá escapar para sempre a qualquer tentativa de explicação causal; é o domínio da criatividade. Não pareceria especialmente paradoxal sugerir que obras de arte, literatura ou música pudessem ser explicadas dentro de uma teoria psicológica determinista principalmen te interessada em condicionamento? Desde os anos 1950, observa-se um amplo interesse em criatividade, nos círcu los educacionais, industriais e mesmo políticos. Isso náo foi exatam ente uma súbica preocupação de uma sociedade opulenta com extrair o me lhor dos seres humanos ao promover criação artística e intelectual. Foi, em grande medida, uma resposta da sociedade americana à descoberta desconcertante de que uma potência rival, a União Soviética, a havia precedido na corrida espacial. A educação e a indústria foram culpadas por negligenciar a criatividade, que se tornou um tema importante nas conversas, como ocorrera com o petróleo vinte anos antes; ninguém fala sobre o assunto até que haja escassez. Apesar desse im pulso, a pesquisa psicológ ica em criatividade dific ilm ente nos levou além das ideias tradicionais que definem a criatividade como um tipo de facul dade mental, por fim a ser mensurável por meio de testes apropriados, ou com o o fe liz resultado de atitudes mentais com binadas co m circunstâncias favoráveis. Outros preferiram considerá-la uma característica inata igualmente compartilhada por to dos os seres humanos, que floresceria melhor se intocada pelo controle educacional. Nos anos 1960, o mito da criatividade estava vinculado ao movimento da antiescola na educação e com as abordagens náo diretivas na psicologia. Nessa perspectiva, vo cê não educa a criatividade, mas deve apenas deixá-la livre de qualquer controle. Náo é necessário dizer que tais visões, essencialmente mentalistas, eram es tranhas a Skinner. Isso não significa que ele não estava interessado na questão da criatividade. Mas, como se pode esperar, ele assumiu uma abordagem totalmente diferente, que será facilmente entendida porque a influência da analogia evolucio nária foi bastante elucidada anteriormente. Ao invés de tentar entender alguma fa culdade mental misteriosa que seria a fonte das produções criativas, Skin ner preferiu falar de comportamento criativo, identificar as propriedades do comportamento
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que concordamos em classificar dessa forma e procurar as variáveis que permitem a sua emergência em alguns indivíduos ou grupos, em alguns momentos da história, em algumas culturas, etc. Ele não via razão para que tais comportamentos fossem abordados de uma forma diferente daquela utilizada em relação a outros tipos de comportamento. Uma característica comum óbvia de todos os comportamentos criativos é que eles imp licam alguma novidade, um conceito que precisa ser definido, é claro, em rela ção a algum conjunto previamente definido: um comportamento observado em uma criança pode ser novo se comparado com comportamento anterior —isto é novidade de desenvolvimento, mas não comportamento criativo no sentido usual —e criação artística geralmente implica novidade em relação a produções anteriores de uma dada cultura (obras de arte inspiradas em outras culturas podem parecer criativas apenas para os membros da cultura que foi influenciada e não para os membros da cultura que influenciou). Em algumas culturas humanas, produções criativas, sob condições de aceitação, são altamente prezadas pela comunidade. Isso pode induzir indivíduos a produzir objetos, textos, ou músicas, marcados pela novidade, pela qual eles serão recompensados, não necessariamente com dinheiro, mas socialmente; não necessa riamente de forma imediata, mas num futuro remoto, algumas vezes póstumo; não necessariamente de fora, mas por uma satisfação intrínseca por fazer uma nova parte da obra. A seleção cultural age nesse caso para encorajar a diversidade. Isso parece ser simplesmente um caso especial do processo geral inerente ao comportamento operante. O paralelo com a evolução biológica se aplica de uma forma peculiarmente surpreendente ao comportamento criativo, que resulta em produções quase tão diversas e fascinantes quanto as espécies vivas. Longe de criar uma dificuldade para uma teoria do comportamento, a criatividade, ao contrário, fornece um a ilustração excep cionalmen te clara do que é tudo isso. A seguinte cita ção de Skinner resume o ponto: Novidade e criatividade podem ocorrer num sistema comple tamente determinista. Um exemplo conveniente e arquetípico é a teoria da evolução. As formas de vida na terra apresentam uma variedade muito além daquela das obras de arte. A diver sidade já foi atribuída aos caprichos e extravagâncias de uma mente criativa, mas Darwin propôs uma explicação alternati va. A palavra “origem” em The origin of species é importante, porque o livro é essencialmente um estudo da originalidade. A multiplicidade das formas vivas é explicada em termos de mutação e seleção, sem apelo a qualquer plano anterior. Há
elementos semelhantes no comportamento do artista que produz obras originais/32 Estamos longe da imagem de Skinner como um defensor do conformismo. Ele era, ao contrário, muito consciente de que a seleção de uma obra de arte, literatura, ou ciência não necessariamente advém da maioria, nem dos contemporâneos: os mecanismos culturais evoluíram de tal forma que tamb ém parecem operar a seleção por meio do julgamento de alguns poucos indivíduos, cuja opinião é, entretanto, decisiva, ou com um atraso que pode se estender além de um a geração. Ele próprio foi exposto a tantos e tão violentos ataques de seus pares, ou de pessoas leigas, que teria saído de cena se não estivesse convicto de que estava certo, e que isso seria, um dia, reconhecido. Ele pertencia àquela categoria de pessoas que, mesmo no campo da ciência, em que o rigor é geralmente prezado às custas da fantasia, tomam como evidência de seu próprio va lor o fato de que outros o tratam como tolo. Importante citar um artigo anedótico nesse contexto. Ele foi publicado em 1960 sob o título de “Pigeons in a pelican”. Ele conta a história do Pigeon project, um programa de pesquisa aplicada que visava a explorar a possibilidade técnica de detectar ou guiar mísseis utilizando organismos vivos (pombos). Skinner, então na Universidade de Minnesota (no início dos anos 1940), testou a capacidade do pombo de responder de tal m odo a man ter um m íssil (o candidato era cham ado de Pelicano) se moven do em direção ao alvo. Foi realizado trabalho experimental, é claro, em um simulador. Incidentalmente, essa pesquisa foi frequentemente mencionada mais tarde como evidência do envolvimento de Skinner em assuntos militares, uma consequência alegadamente lógica de sua postura teórica. A acusação parece ridícula quando se pensa na época em que o projeto foi implementado, de envolvimento muito maior de muitos cientistas americanos em projetos de pesquisa de defesa, e nos resultados. Embora os resultados fossem encorajadores, eles nunca alcançaram aplicações prá ticas nas operações militares por causa das soluções eletrônicas concorrentes encon tradas pelos engenheiros. O parágrafo de conclusão do artigo é revelador do caráter de Skinner enquanto um cientista e de sua concepção sobre a pesquisa criativa. Lê-se o que segue: Se eu tivesse que concluir que as ideias malucas devem ser en corajadas, provavelmente diriam que a psicologia já teve mais que sua parte delas. Se o teve, elas foram consideradas pelas pessoas erradas. Reagindo contra os excessos de desonestidades psicológicas, os psicólogos desenvolveram uma preocupa ção enorme com a respeitabilidade científica. Eles constante 232 De “C reating the creative artist", reimpresso no Cumu lative record (S k i n n e r , 1972. p. 339).
mente advertem seus estudantes contra fatos questionáveis e teorias sem sustentação. Como um resultado disso, uma tese comum de Ph.D. é um modelo de prudência compulsiva, avançando apenas as conclusões mais tímidas rigorosamente cercadas por qualificações. Mas é exatamente o homem capaz de tal cautela admirável que precisa de um toque de especu lação descontrolada. Possivelmente uma exposição generosa à ficção científica psicológica ajudaria. Pode-se dizer que o Project Pigeon fundamenta essa visão. Exceto em relação ao seu objetivo confesso, ele foi, como eu vejo, muito produtivo; e assim o foi porque, em larga medida, meus colegas e eu sabíamos que, aos olhos do mundo, éramos loucos.2” Apontei na introdução deste livro que, em minha longa experiência co mo es tudante, Skinner foi o professor menos autoritário que eu já tive. Ele também era o pesquisador m ais criativo e ousado e ocasionalmente o mais inclina do à especulação descontrolada. Provavelmente por isso devemos a ele tantos dados bem estabele cidos, propostas teóricas bem argumentadas e fontes estimulantes de especulação.
133
De “Pig eon in a pelican” , reimpresso no Cumulative record (id. ibid., p. 590).
PARTE IV 0 IN T E R E S S E P EL A V ID A R E A L : U M A A V E N T U R A E M D IR E Ç Ã O À U T O P IA
12 SAÚDE MENTAL
P s i c o l o g i a c i e n t í f i c a no c o n t e x t o c l í n i c o
A psicologia provavelmente se tornou mais bem conhecida pelas pessoas leigas através de suas aplicações no tratamento de desordens psicológicas. Esse é o campo profissional dos psicólogos clínicos e psicoterapeutas (duas categorias que tendem a se fundir na m esma pessoa). A área é frequentemente con fund ida, na opinião pública, com a psicanálise e a tradição de Freud, mas, ao longo de todo o século X X , muitas outras práticas se desenvolveram, algumas delas de origem freudiana, outras de naturezas diferentes. Elas apresentam uma ampla gama de variações, em relação aos procedim entos utilizados, quanto aos tipos de pacientes ou cliente aten didos, à filosofia subjacente e à referência feita (ou não) ao critério científico que define a lógica para a estratégia terapêutica e avalia o resultado do tratamento. A terapia comportamental é uma das principais variedades, com um número de sub variedades, incluindo as terapias então denom inadas comportam ental-cogniciva ou cognitivo-comportamental, à primeira vista uma fusão de certo modo inesperada. A terapia comportamen tal surgiu antes da contribuição de Sk inner: suas ori gens podem ser traçadas a Pavlov e a Watson.134 Porém, a influência de Skinner foi decisiva, nos anos 1950, na rápida ampliaçáo daquilo que era visto como uma alternativa à psicodinâmica e à psicanálise. Seus principais textos sobre o assunto são, mais u ma vez, Science and human behavior e meia dúzia de artigos publicados na mesm a década. Sua contribu ição foi dupla: p or um lado, ele criticou alguns aspectos da teoria de Freud; por outro, promoveu a análise experimental do comportamento como uma p ossível ferramenta para se compreender e se modificar o compo rtamen to anormal. Vim os, no capítulo 5, o lugar de Freud nos textos de Skinner, que dá o devido crédito ao fun dad or da psicanálise por sua pesquisa a respeito dos determinantes do comportamento humano, bem como o culpa por sua teoria mentalista. Ao recorrer ao aparato psíquico, Freud reificou, enquanto entidades mentais, o que deveria,
13 4 Para um levantamen to Histórico da terapia comp ortam ental, ver Kazdin {1978) e Scho rr (1984).
na visão de Skinner, ser analisado em termos funcionais para um resultado mais frutífero. Ele teve um efeito prejudicial em seu estudo sobre o comportamento enquanto uma variável dependente. Inevitavelmente, ele rou bou a cena. Pouca atenção foi dispensada ao comportamen to per se. O comportamento foi relegado à posição de mero modo de expressão das atividades do aparato mental ou dos sintomas de um distúrbio subjacente.w Skinner argum enta, com o o fizeram outros críticos de Freud, que, ao recorrer a estruturas psíquicas internas ao invés de manter o foco na sequência de eventos que produziram o comportamento neurótico, corre-se o risco de que parte da relação entre o comportamento real e seus antecedentes na história individual seja perdida, e, consequentemente, os esforços do terapeuta serão mais difíceis. Embora os distúr bios psicológicos sejam vistos como tendo sua origem nos detalhes da interação ini cial do indivíduo com o mundo social ao seu redor, eles são rapidamente, na teoria, atribuídos a construtos, tais como complexos, mecanismos de defesa, ou conflitos entre os componentes da personalidade, o Id, o Ego e o Superego. E importante enfatizar que Skinner nunca expressou qualquer objeçáo à ideia de Freud de que problemas atuais derivam de eventos anteriores, mesmo sendo a terapia comportamental acusada frequentemente de ser a-histórica, no sentido de que algumas vezes negligenciou o fato de que disfunções psicológicas frequen temente têm suas raízes numa parte (remota) da vida da pessoa. Essa nunca foi a posição de Skinner e, em qualquer caso, é completamente estranha à psicologia da aprendizagem, que está, por definição, interessada em como um organismo é mo dificado através do temp o.236 Entretanto , não há nenhu ma razão para procurar as causas dos distúrbios psicológicos exclusivamente nos estágios iniciais da vida. Há muitos problemas psicológicos relacionados essencialmente a causas atuais ou recentes na vida do indivíduo e muitos daqueles problemas que tiveram origem em um passado remoto permaneceriam de importância secundária e possivelmente não seriam detectados se não fosse pelas condições presentes que contribuem para amplificá-los e exacerbá-los. Uma consequência da abordagem psicodinâmica foi que o tratamento focalizava na mudança do funcionamento psíquico do paciente; não se questionou se remover algumas das condições atuais ajudaria numa melhora
Skinner (1972, p. 243). 236 Esforços iniciais na terapia comporramental já reconheceram os determinantes históricos do compo rtamento a normal, por exemplo, ao desenvolver procedimentos para extinguir comportamento indesejado há muito estabelecido, tal como observado nas fobias. A dessensibilização ainda é um dos p rocedimentos mais eficientes e amplamente utilizados nos tratamentos comportamencais aplicados a um tipo de desordem que provou ser especialmente resistente à abordagem psicanalitica.
mais rápida e efetiva. Foi assumido que se, no início, o mundo ao redor pode ter sido responsável pelo problema do paciente, na época do tratamento o paciente náo teria outra alternativa a não ser se ajustar ao mundo como ele é. Ao pro por aplicar a pessoas psicologicamente doentes o mesmo tip o de análise funcional do comportamento que fora aplicada com sucesso a organismos normais, Skinner estava sugerindo que a condição delas poderia ser mais bem entendida e que elas poderiam ser finalmente ajudadas de forma mais eficiente que nunca. Deve-se recordar que, na época em que Skinn er entrou no campo da doença psicológica e do tratamento, a psicologia clínica era domin ada pela tradição psicanalítica, que apre sentava elaborações teóricas extraordinariamente ricas, porém indicações e sucessos terapêuticos muito limitados, se comparados com o número e a variedade dos casos que demandavam auxílio. Por outro lado, a psiquiatria estava apenas começando a se beneficiar da recente descoberta das primeiras drogas psicotrópicas. Embora seus ataques teóricos a Freud fossem claros o bastante, Skinner era muito cauteloso em se aventurar no território dos psiquiatras e dos psicólogos clíni cos. Na introdução de um de seus artigos, ele honestamente enfatizou sua falta de credenciais, se avaliado em termos de experiência clínica. Ele não tinha nenhuma nova classificação das doenças mentais para oferecer e não questionaria a importân cia da pesquisa em busca de correlatos ou causas biológicas da disfunção psicológica. Mas ele contribuiu para abalar algumas das confortáveis crenças na psiquiatria e na psicopatologia ao apontar a possível importância dos fatores ambientais que deve riam ser cuidadosamente explorados antes de se atribuir ao paciente uma categoria nosológica com um dado grau de severidade e prognósticos mais ou menos pessi mistas de melhora.
U ma
a b o r d a g e m pr a g m á t ic a d o s s in t o m a s
Adm itidam ente, a abordagem de Skinner pode parecer teoricamente pobre, se comparada com as especulações sobre as origens e estruturas da doença men tal nas várias orientações da psiquiatria e da psicopatologia. Era uma abordagem essencialmente pragmática, principalmente em relação ao tratamento, com pouco impacto direto sobre questões de classificação no sológica ou de etiologia. A hipótese fundamental era muito simples, até mesmo simplista, como vista por profissionais de algumas escolas de pensamento: conhecendo pouco a respeito da verdadeira na tureza e das causas das chamadas desordens mentais, não deveríamos focar muito na definição das várias condições patológicas, mas nos concentrar na modificação daqueles comportamentos que levam o indivíduo a ser rotulado como um caso psiquiátrico ou psicológico. Se aqueles comportamentos podem ser modificados fa voravelmente, por que se im po rtar com classificação ou teoria? Por que insistir que
a desordem persiste, como se ela fosse distinta dos comportamentos desordenados, que são tomados como meros sintomas de um distúrbio subjacente? Ao aplicar a análise funcion al ao co m po rtam ento an ormal, co locando a classi ficação nosológica entre parênteses, Skinner sugere que, em alguns casos, ele pode ser explicado por meio de mecanismos simples em atuação no controle do com portamento em geral, mas levados ao extremo, ou envolvidos em contingências não usuais. Por exemplo, subprodutos emocionais de contingências aversivas, pos sivelmente adaptativos se não tivessem ultrapassado um certo nível, podem gerar condições realmente anormais quando o controle aversivo é excessivo. O medo é uma reação normal saudável, que ajuda a nos manter longe de situações perigosas, mas se torna anormal quando os estímulos são tão ameaçadores, ou quando outros fatores aumentam seu poder ameaçador a tal ponto, que é gerada uma fobia. Mui tos comportamentos “anormais” podem ser explicados por meio de mecanismos comportamentais “normais”, se evitarmos catalogá-los patologicamente e, ao invés disso, analisarmos as condições que explicam sua origem e sua manutenção. Por exemplo, adição à droga pode aparecer como fiiga ou esquiva de condições sociais ou afetivas de outro modo intoleráveis; alguns estados depressivos podem ser en tendidos como uma redução drástica do comportamento em situações em que os sujeitos perderam a chance de serem positivamente reforçados pelo que quer que façam, eles param de interagir com o mundo ao seu redor porque nunca são bem-sucedidos; comportamento agressivo em relação aos outros ou a si mesmo às vezes tem como única função atrair atenção social não obtida de outra forma. Este tipo de análise retira a ênfase da categoria patológica e a coloca no contexto em que o indivíduo viveu e está vivendo. Ela desloca a responsabilidade da personalidade do sujeito ou da estrutura psicológica para o ambiente, geralmente o ambiente social. Se a importância de tais fatores ambientais é confirmada, modifica radicalmente a concepção total da desordem psicológica a ser considerada. Concluir-se-á, por fim, que ela é um subproduto da sociedade ao invés de um distúrbio interno e, naturalmente, se farão esforços para identificar e modificar fatores sociais, ao invés de se multiplicar o tratamento psicológico individual. A prevenção, m uito n atural mente, tomará o lugar de prioridade sobre o tratamento. Se for muito tarde para mudar o comportamento anormal gerado pela exposição a contingências anteriores anorm ais, ou se for impossível m odificá-lo alterando a situação presente, tudo o que resta é prevenir danos psicológicos semelhantes para as pessoas no futuro. Apesar do bom desenvolvimento dos procedimentos de tratamento na terapia do comporta mento nos anos 1950 e 1960, Skinner não se engajou muito na contribuição prática para as técnicas de remediação. Ele estava mais atraído pelos efeitos de longo prazo na saúde mental de um planejamento cultural novo. Com eçan do com um a contribuição aparentemente modesta para a dificuldade da área da psiquiatria e psicopatologia, Skinner defendeu posições muito simila
res, embora por razões muito diferentes, àquelas defendidas na mesma época pelos antipsiquiatras. Os antipsiquiatras sustentam que a psiquiatria é, em grande me dida, um instrumento social para isolar aqueles indivíduos com comportamentos supostamente desviantes que tumultuariam a ordem social ou para evitar a respon sabilidade de mudar as condições sociais que geraram as desordens psicológicas, colocando um rótulo médico naqueles indivíduos que sáo vítimas delas. Essa é uma visão extrema, que fornece um papel causal exclusivo aos fatores sociais nas doen ças mentais. Skinner não foi tão longe e nunca negou a possível importância dos fatores biológicos, incluindo os genéticos, nas desordens psicopatológicas. Mas ele certamente contribuiu para apontar a inutilidade de se aumentar o cuidado médico e psicológico para um número crescente de pacientes se sabemos, a partir de uma análise comportamental, que a fonte de suas desordens está principalmente no am biente social. Todos os esforços deveriam ser colocados na m uda nça desse am biente ao invés de no treino de um número crescente de terapeutas.
T ratamento
c o m p o r t a m e n t a l d a s d e s o r d e n s b i o l o g i c a m e n t e d e t e r min a d a s
Mesmo nos casos em que fatores genéticos ou outros fatores biológicos são prováveis ou certamente a causa da desordem psicológica, a abordagem comporta mental no tratamento permanece importante, caso um tratamento biológico não tenha sido descoberto ou mesmo após esse tratamento ter sido disponibilizado. A engenharia genética era ainda uma criança quando Skinner tratou desses problemas e, apesar do incrível progresso feito desde então, ela ainda não tem a solução para a maior parte das doenças mentais geneticamente determinadas. O tratamento por meio de medicam entos progrediu de forma similar desde o início dos anos 1950, mas raramente é por si mesmo uma solução satisfatória se outros procedimentos, de na tureza psicológica, náo estiverem em combinação com o tratamento. E bem se sabe que, algumas vezes, o tratamento medicamentoso pode contribuir para mascarar 0 problema real ao dar um status médico e biológico mais radical àquilo que é essen cialmente u m pro blem a sodo cultu ral. Prescrever pílulas pode ser mais fácil e menos custoso do que mudar as condições de habitação e de trabalho e tem a vantagem de deixar a desordem dentro do paciente. Ao contrário do que se pensa geralmente, uma abordagem comportam en tal (ou, para essa questão, qualquer abordagem psicológica) náo exclui uma aborda gem biológica, inclusive genética, da doença mental. Se o estado psicológico de um indivíduo é anormal, ou se suas potencialidades sáo limitadas por causa de fatores genéticos cujos efeitos não podem ser revertidos (um milagre talvez não impossível no futuro, mas não atualmente acessível), não temos outro modo de ajudá-lo a não ser colocando para funcionar todas as estratégias comportamentais possíveis. Este
princípio é fócil de entender no caso da deficiência mental. O retardo mental pod ser relacionado, em uma limitada proporção de casos, aos seus fatores genética e, em uma maior proporção, com variados graus de certeza, aos fatores biológica relacionados às várias doenças orgânicas, condições de crescimento, nutrição, etc. C único modo de compensar, infelizmente não perfeitamente, aqueles determinante consiste em aplicar procedimentos comportamentais mais intensivamente e mai deliberadamente do que se faz usualmente com sujeitos normais - que acabarãc por se ajustar ao seu ambiente mesmo com um mínimo de intervenção externa (educacional).
Técnicas
operantes na terapia
Se os tratamentos comportamentais já existiam antes de Skinner, ele lhes deu um novo impulso, não apenas adentrando no debate teórico, mas os enriquecendo com técnicas operantes. Um trabalho pioneiro de Fuller, em 1949, havia mostrado a efetividade das técnicas operantes no caso de retardo severo. O próprio Skinner supervisionou os estudos implementados por Lindsley com pacientes psicóticos crônicos, demonstrando que eles eram sensíveis ao reforçamento positivo. Pouco depois, uma abordagem operante foi aplicada por Ayllon Òc Azrin em um a enferma ria psiquiátric a, sob o rótulo de “engenharia com por tamental” .237 Ap ós uma análise detalhada dos comportamentos apresentados por um grupo de pacientes crônicos e um estudo dos possíveis reforçadores positivos, os investigadores organizaram uma “econ om ia de fichas” . Ap licand o os princípios do laboratório, eles reforçavam - com fichas cambiáveis po r itens atrativos ou pe la oportun idade de se engajar em alguma atividade muito apreciada - comp ortamen tos desejáveis que eram presumivelmente bons para os pacientes, para outros internos e para os funcionários responsáveis por eles. A organização geral da vida diária melhorou, a dependência dos pacientes em relação ao corpo de funcionários diminuiu e atividades construtivas e autônomas aumentaram de acordo. Nenhuma contingência aversiva foi utilizada, nem foram impostas restrições. Comportamentos adequados foram modelados, tais como se apresentar para as refeições de acordo com uma escala regular, ou alimentar a si mes mo ao invés de depender de uma enfermeira; comportamentos indesejáveis foram eliminados por meio de procedimentos de extinção, pela modelagem de comporta mentos concorrentes ou por saciação, como no caso de um paciente que colecionou todas as revistas da enfermaria e as guardou embaixo do colchão: um grande núm ero de revistas foi tornado disponível e ele colecionou até que seu quarto estivesse cheio delas e, por fim, abandonou sua mania. Enquanto o projeto era posto em prática
em um grupo, os princípios operantes eram aplicados individualmente: os com portamentos eram primeiro analisados, então modificados com base na observação individual e na manipulação de contingências individuais. Desde então, os terapeutas comportamentais elaboraram procedimentos cada vez mais sofisticados, aplicados a indivíduos ou grupos, algum as vezes visando a alterar o comportamento alvo, por exemplo, automutilação ou atividades agressivas» algumas vezes construindo repertório até então ausente, cuja presença eliminaria ou ofereceria uma alternativa à condição anormal. Procedimentos verbais, utilizando instruções ou auto instruções, foram desenvolvidos. O campo de aplicação, inicial mente limitado ao campo clássico das desordens mentais, foi estendido para incluir muitos problemas de saúde em pessoas normais, tais como obesidade, fum o, adição e dificuldades familiares ou conjugais. As primeiras tentativas práticas ensejaram objeções e críticas que ainda são ou vidas hoje, apesar da evidência empírica acum ulada e dos argumentos repetidamen te elucidativos. A maior parte dessas objeções e críticas já tinham sido direcionadas às propostas de Skinner.
O b je ç õ
es
Uma primeira objeção, principalmente daqueles que seguem a tradição psicodinâm ica, é que, mesm o que as melhoras superficiais no co mportamen to possam ser observadas, a própria desordem não fo i de fato curada. A objeção é baseada na teoria de que comportamentos explícitos são apenas sintomas de condições internas mais profundas, que devem ser removidas primeiro para que os sintomas desapareçam. Se eles desaparecem primeiro, por causa da ação direta sobre eles, deve-se supor que estão apenas mascarados e que a desordem subjacente ainda está presente, pronta para se manifestar de novo, por exemplo, no deslocamento —alguma outra expres são sintomática que toma o lugar do sintoma suprimido. O debate sobre a questão geralmente segue para um diálogo de surdos, a menos que o oponente possa de monstrar a existência da condição interna inferida após o sinto ma ter sido removido. A objeção, entretanto, po de ser respondida em um estilo mais pragmático. As desordens psicológicas geralmente não são uma questão de tudo ou nada. Elas não podem ser comparadas a doenças infecciosas, que pode m ser totalmente eliminadas com antibióticos, ou a tumores bem localizados, que podem ser completamente re movidos cirurgicamente. Elas podem ser aliviadas em vários graus, alguns compor tamentos pod em ser modificados, outros, não, e há frequentemente um alto risco de reincidência. Portanto, à questão: “você realmente curou o paciente?”, o terapeuta comportamental (como qualquer terapeuta honesto) responderá: “não tenho certe za, mas o que sei é que o paciente melhorou”. Esta afirmação não está baseada no
julgam en to intu itivo do pró prio terapeuta, mas na evidência em pírica de que o ob jetivo do tratam ento, ou de uma parte do tratam ento, explicitam ente de finido antes de o tratamento começar, foi de fato alcançado. Essa é uma diferença importante entre a terapia com portam ental e outros tipos de psico terapias: os objetivo s pod em ser menos ambiciosos, menos globais, mas são colocados claramente, então se pode facilmente checar se o tratamento foi um sucesso ou um fracasso. Um a segunda objeção tem a ver com a noção de controle. A palavra é familiar na prosa de Skinner e é frequentemente utilizada no vocabulário dos terapeutas com portam entals. A objeção não vem tanto da psicanálise quanto dos terapeutas da tradição não diretiva rogeriana. Embora se admita que apenas recompensas positivas são utilizadas (alguns críticos obstinadamente se recusam a admitir isso, persistin do em comparar Skinner e os terapeutas comportamentais que trabalham na sua linha com punidores perigosos, recorrendo a estimulações antiéticas como choques elétricos!), a abordagem como um todo é rejeitada como tipicamente baseada no controle deliberado pelo terapeuta do comportamento do cliente. Primeiramente, a objeção soa muito forte, porque apela para nosso senso de respeito à liberdade do paciente. Parece ainda mais forte quando também se argumenta que há formas al ternativas de tratamento disponíveis. Podemos defender procedimentos coercitivos quando atingimos o mesmo fim com procedimentos permissivos? O fato de que o controle é baseado em reforçamento positivo é geralmente visto como ainda mais suspeito: a liberdade é ainda mais ameaçada quando o controle sobre ela é agradável. Enquadrado nas questões éticas gerais das profissões médica e psicológica, o deba te é difícil e complexo. Alguns pacientes são simplesmente incapazes de expressar seus próprios desejos em relação ao tratamento de que gostam: retardados severos, alguns psicóticos ou idosos demenciados não podem ser deixados sem cuidados por não poderem negociar seu tratamento. Nesses e em outros casos, terapeutas comportamentais não prestam menos atenção a problemas éticos que outros; pelo contrário, pode-se argumentar que eles aplicam padrões mais rigorosos, ao especifi car seus objetivos mais explicitamente e avaliar seus sucessos terapêuticos de acordo com critério experimental. Mas daremos crédito a terapeutas de todas as linhas com a mesma preocupação ética. Àquela objeção, Skinner retruca de forma diferente: aqueles que se opõem a técnicas de controle em prol de abordagens não diretivas estão simplesmente trapaceando, porque não há nenhum tipo de intervenção psi cológica que possa reivindicar que não exerce influência sobre o comportamento do paciente. Aparentemente, técnicas não diretivas de fato recorrem a mecanismos para o controle do comportamento do outro, que podem ser detectados e descritos, com o aqueles utilizados na análise com portam ental e nas terapias derivadas. O divã psicanalítico, onde o paciente é convidado a dizer o que quer que venha à mente, é tipicamente uma situação da qual todos os estímulos associados com a repressão são provisoriamente rem ovidos, co m a consequência de que o pacienre será por fim
liberto das inibições perturbadoras. O diálogo face a face da terapia rogeriana, com o terapeuta intervindo m uito p ouco, e exclusivamente com sinais sutis de aprovação e encorajamento, também cria condições favoráveis para aliviar inibições, aumentar produções verbais e, através de reforçamento social ameno, restabelecer um senso de autoestima, geralmente vinculado, entre outras coisas, à oportunidade de ser ouv ido. E claro que náo há nada de errado com esse tipo de controle, mas seria justo afirmar claramente o que está acontecendo, ao invés de enganar o paciente com a ilusão de liberdade. Afinal de contas, o paciente ou o cliente tem o direito de saber sobre os processos envolvidos no tratamento. Eles podem escolher um determinado processo, com o decidiriam a respeito de um a operação cirúrgica, porqu e é mais pro vavelm ente efetivo, com duração racional e náo excessivamente caro, se com parad o a outros terapeutas em que os objetivos não são previamente definidos, a duração não é limitada e o custo, portanto, incerto. Práticas éticas atuais na terapia comportamentaJ geralmente incluem um contrato claro e justo com os pacientes: eles são informados a respeito de até onde deveriam ir com o terapeuta, quais serão os mecanismos envolvidos e qual é sua parte do processo terapêutico. Isso pode explicar o sucesso das terapias comportamentais por todo o mundo: os clientes utilizaram sua liberdade para escolher o que consideraram ser o tratamento mais promissor. A essa altura, deve-se esclarecer que os méritos dos outros tratamentos náo são, de forma alguma, rejeitados. As opiniões diferem em relação à real natureza das desordens psicológicas b em co mo em relação aos melhores m étodos para reduzi-las. Nenhuma teoria ou prática proposta até agora pode reivindicar validade universal. Devemos nos recordar que, como frequentemente ocorreu na história da medicina para as doenças orgânicas, um tratamento pode ser efetivo por outras razões além daquelas imaginadas por seus usuários; pode-se provar o equívoco de algumas teo rias, mas também a eficiência do tratamento derivado delas e, pelo contrário, algu mas teorias podem estar corretas, mas o tratamento derivado delas, sem qualquer efeito. Hoje em dia, os clínicos tendem a adotar uma abordagem eclética, reconhe cendo que alguns casos se beneficiam mais com um tipo de tratamento, outros, com outro tipo. Isso não é inconsistência; pelo contrário, é a posição mais ética e mais pragmática, dadas as limitações do nosso entendimento atual. Tal ecletismo não é estranho à própria posição “mente aberta” de Skinner, conforme expresso nas se guintes sentenças, apontan do para algumas sim ilaridades básicas entre a abordagem comp ortamental e a psicodinâmica: Fatores causais importantes no entendimento da doença mental devem, todavia, ser encontrados entre as variáveis in dependentes para as quais o psicólogo caracteristicamente se volta. Uma condição emocional excessiva, um modo perigoso de fuga da ansiedade, uma preocupação perturbadora com
sexo, ou um entusiasmo excessivo com jogos de azar podem ser nada mais que casos extremos dos efeitos das condições ambientais. Esses aspectos da história pessoal e do ambien te atual do indivíduo são comumente considerados como pertencentes ao reino da psicologia e dentro do campo de atuação das técnicas psicológicas. Modos de comportamento característicos da doença mental podem ser simplesmente o resultado de uma história de reforçamento, de uma condição não usual de privação ou saciação, ou de uma circunstância emocionalmente excitante. Exceto pelo fato de que eles são perturbadores ou perigosos, eles não podem ser diferenciados do resto do comportamento do indivíduo. Considerando que é este o caso, a etiologia da doença mental e a possibilidade de análise e terapia residem no campo próprio da psicologia. (Nesse ponto, uma intersecção com a psicodinâmica é óbvia. A distinção entre a visão psicológica e a psicodinâmica não é basicamente uma distinção a respeito do objeto de estudo ou do alcance dos fatores estudados. A distinção é principalmen te de método e é possível que esses dois campos venham a se fundir por fim, ou que se tornem ao menos muito proxima mente associados.)138
PsiCOTERAPIA E CONTROLES SOCIAIS Em sua análise do processo psicoterapêutico, Skinner insiste em seu papel de corrigir no indivíduo as consequências danosas dos vários controles sociais, políticos, econômicos, religiosos e muito frequentemente de natureza punitiva. As psicoterapias estão compensando os controles negativos exercidos por outras agências. Num certo sentido, implicam, quase que necessariamente, um questionamento daqueles controles. Elas são, de certa forma, inevitavelmente subversivas e podem, contudo, preencher essa função de formas diferentes. A mesma sociedade, isto é, o mesmo conjunto de agências de controle, gera os pacientes e os terapeutas, e há o risco de que os últimos sintam que seu papel é adequar os primeiros às normas sociais. O lado subversivo inerente a todos os projetos psicoterapêuticos, então, abre espaço para o conformismo. A história dos principais métodos de intervenção psicológica
!}& De “Psychology in the understanding of mental disease", em Cumulative Kruse (1957).
record ( S k i n n e r , 197Z,
p.
252).
Reimpresso de
mostra que eles alimentaram duas tendências divergentes, uma favorecendo o ajus tamento e a reinserçáo do indivíduo e outra promov endo a sua libertação. O que é paradoxal é que essas escolas de psicoterapia que se fundamentam nos recursos internos do sujeito e que não tornam os controles explícitos são espe cialmente expostas a serem sustentadas pelas agências de controle, cujos excessos as tornaram necessárias. Ao enfatizar a autonomia do indivíduo, elas estão, na verdade, apoiando os próprios controles que elas deveriam, ao contrário, expor, se estão com prom etidas com corrigir seus efeitos. A principal tarefa da psicoterapia, assim como a principal tarefa da medicina, consiste idealmente em tornar a si mesmo inútil, ao provocar as mudanças necessárias para evitar os problemas que ela tenta remediar. Está na natureza das psicoterapias mentalistas manter o que deveriam eliminar, com o benefício de que, ao fazer isso, perpetuam a si mesmas. Os excessos dos vários poderes na sociedade são a origem dos problemas psicológicos e indiretamente das práticas psicoterapêuticas que tentam resolvê-los nos indivíduos, e elas próprias se tornam um poder entre outros.
A b o r d a g e m
e x pe r i me n t a l d a s t e r a pi a s
A contribuição de Skinner para a psicoterapia certam ente foi um meio de se introduzir uma orientaçáo experimental num campo que era deixado, tradicio nalmente, à intuição e empatia dos clínicos. Essa foi a ênfase comum em todas as ramificações das terapias comportamentais, mas o impulso dado por Skinner em relação a isso foi decisivo. Primeiramente, ele ampliou o escopo dos conceitos e procedimentos relevantes transferidos do laboratório para as situações clínicas. Isso não se deve unicamente à influência de Skinner, mas ele fez muitas complementações às contribuições já feitas por outros, de Pavlov a Liddell, Harlow, Miller ou Seligman. Em segundo lugar, forneceu suas credenciais à abordagem experimental do comportamento individual e Skinner contribuiu amplamente para os estu dos com sujeito único como parte dos reconhecidos delineamentos experimentais, aplicáveis no tratamento comportamental. Esse aspecto pode parecer secundário às questões centrais dos tratamentos psicológicos, mas foi de uma importância fundamental. A psicologia experimental foi d om inada pela obsessão m etodológica de traçar leis gerais a partir de estudos de grupos, desenvolvendo, para esse fim, sofisticados delineamento s experimentais e procedimentos estatísticos apropriados. O fato de que o comportamento ocorre em organismos individuais e que suas variáveis controladoras devem ser procuradas foi am plam ente negligenciado pelo ensino e pela pesquisa ortodoxa. Os experimentadores concediam aos profissionais clínicos a exclusividade dos indivíduos, admitidamente não receptivos a uma aná lise rigorosa. Essa oposição não favoreceu a interação m útua entre o laboratório e a
clínica. Como vimos anteriormente, Skinner adotou uma postura completamente diferente ao levar a cabo, em seu laboratório, trabalho experimental com organis mos individuais, um risco acadêmico na época em que todos os psicólogos reco nhecidos que trabalhavam nos laboratórios animais estavam estudando grupos de sujeitos. Seus procedimentos experimentais eram fortes o bastante para demonstrar que o comp ortamen to pode ser mod ificado por uma determ inada variável, retomar seu estado inicial com a retirada da variável, modificado mais uma vez e assim por diante. O delineamento A-B-A, simples, mas muito convincente, se fundamenta na alternância de uma linha de base A para um estado modificado B, seguido por um retorno a A. Isso foi amplamente utilizado no estudo experimental dos efeitos das drogas sobre o comportamento, e é fácil perceber como pode ser facilmente utilizado no tratamento, incluindo tratamento psicológico (com a condição im portante e óbvia de que os efeitos da variável em estudo são reversíveis). Outros delineam entos ap licáveis a sujeitos únicos — que é a regra no trabalho clínico estão disponíveis, mas náo precisam ser detalhados aqui. O ponto importante é que o próprio tratamento comportamental é entendido como um experimento, no qual os terapeutas devem demonstrar que eles de fato estão fazendo o que afirmam estar fazendo. Em terceiro lugar, na mesma linha, a definição clara dos objetivos finais ou parciais do tratamento é rambém um aspecto muito importante da abordagem ex perimental da psicoterapia. Definir os objetivos toma possível avaliar os resultados. Essa foi uma preocupação crucial do movimento da terapia do comportamento. A avaliação da ação terapêutica pode ser feita apenas se os objetivos estiverem clara mente enunciados de início. Isso implica mais que a mera empatia pelo sofrimento do paciente; não é nada menos que a enunciação das mudanças desejadas. Grande progresso foi feito no tratamento psicológico desde que os estudos de validação pas saram a ser implementados sistematicamente. A avaliação dos resultados, entretanto, não se tornou um controle de rotina na maior parte das práticas psicoterapêuticas, uma negligência que seria considerada antiétíca na medicina. Todavia, é inerente aos métodos da terapia comportamental, ao menos conforme Skinner os imagina.
13 EDUCAÇÃO
Um
precursor
A educação é um outro campo em que a contribuição de Skinner talvez tenha ocorrido à frente de seu rempo. Ele foi mais bem conhecido nos anos i960 e, desde então, foi atacado de forma ampla e forte, por sua proposta de utilização de máqui nas de ensino. Ele teve a ideia de construir dispositivos eletromecânicos não caros, que foram rejeitados, porque se dizia que desumanizavam as escolas. Poucos anos depois, o computador pessoal barato foi popularizado e as companhias investiram tempo e esforço em todos os tipos de ensino ou aprendizagem auxiliados por com putador, que receberam aceitação ampla e não crítica, com muito poucas objeções éticas. O trabalho pioneiro de Skinner é raramente reconhecido nesse contexto. Os princípios aplicados são aqueles que ele durame nte se esforçou para im plementar em engenhocas caseiras e testou com seus próprios estudantes. As máquinas de ensino, porém, foram apenas uma parte de um interesse mais amplo e persistente por problemas educacionais. Em seu último livro de coletânea de artigos publicad o em v id a/ 39 ele abriu o capítulo intitulado “A escola do futu ro’’ sustentando o direito de repetir a si mesmo a citação de Borges: “O que posso fazer aos 71, além de plagiar a mim mesmo?” e se referindo a seus textos sobre educação nos 30 anos anteriores. Sua cronologia tinha uma falha, pois subestimava aproxima damente 10 anos, quando, pela primeira vez, expressou suas visões sobre educação em partes importantes de seu romance Walden Two,240 e discutiu posteriormente a questão no Science and human behavior}41 Muitos artigos publicados ou lidos em conferências desde 1954 estão incluídos, juntamente com material novo, no livro The technology ofteaching*1 e ele continuou a se engajar em debates educacionais até o fim de sua carreira. E necessário distinguir dois níveis ao caracterizar as visões de Skinner em rela ção à educação. Muitas de suas reflexões são parte de suas visões mais amplas sobre 239 Skin ner {1989b). 240 Id. (194S) - v er capítulo [4 desse mesmo livro, especialmente páginas 187-189. 241 Id. (1953). 242 Id. (1968).
sociedade e cultura e, como tais, estão relacionadas à função das agências sociais, o tipo de controle vigente para alcançar seus objetivos, sucessos ou falhas medidos com referência a seus objetivos explícitos, ou com referência a consequências de ordem superior, incluindo a sobrevivência da cultura ou da espécie; a questão do contracontrole. Tudo isso num nível geral e de fato muito ambicioso. As máquinas de ensino estão em um nível diferente, mais técnico, intimamente relacionado à psicologia da aprendizagem propriamente. A questão de Skinner é: dada a escolha dos objetivos educacionais, especialmente no sistema escolar, estamos aplicando o que sabemos a respeito de processos de aprendizagem de modo a maximizar os resultados? Devemos lidar primeiro com esse aspecto mais técnico.
M á q u i n a s d e ensino
Skinner certa vez observou uma aula de aritmética na escola de uma de suas filhas e ficou chocado com o fato de que quase todas as leis da aprendizagem de rivadas do laboratório experimental estavam sendo constantemente violadas. Ele não culpou a professora; ela estava de fato entre as mais bem treinadas e devotadas. Ela simplesmente realizava seu trabalho em um contexto que náo tinha nenhum poder para mudar, aplicando métodos que se acreditava serem adequados, mas que eram obviam ente ineficientes. De mo do que as potencialidades de 20 jovens valiosos organismos estavam perdidas. Skinner pensou sobre o problema e o resultado foi o delineamento das máquinas de ensino e da instrução programada. A pesquisa por soluções práticas, concretas, precisa ser enfatizada. Sk in ner di verg iu muito de seu tempo por seu trabalho em laboratório e por suas reflexões teóricas para se engajar na construção de mecanismos de ensino mecânicos eficien tes, embo ra primitivos. A maio ria dos psicólogos famosos se envolveu, em alguma época de sua carreira, com problemas educacionais; eles escreveram e discutiram a respeito das melhorias esperadas na educação considerando o conhecimento psico lógico, especialmente suas próprias contribuições; frequentemente foram chamados de experts, pois sabiam mais a respeito da criança, dos processos de aprendizagem, dos mecanismos cognitivos, do crescimento da mente e assim por diante que os professores comuns que faziam o seu melhor aplicando as regras do senso comum. Contudo, raramente se engajaram de fato no trabalho prático. O que estava errado com a situação de sala de auia, analisada do p onto de vista de um psicólogo da aprendizagem? (Há, claramente, outros pontos de vista que também poderiam ajudar na identificação dos problemas e na sugestão de soluções, por exemplo, os pontos de vista dos psicólogos do desenvolvimento, psicólogos so ciais, de especialistas em resolução de problemas; mas dado que as escolas são locais onde os pupilos ou estudantes aprendem, todos esses pontos de vista diferentes são
relevantes apenas na medida em que trazem uma contribuição para uma aprendi zagem melhor.) Os problemas identificados por Skinner devem ser entendidos, é claro, considerando o seu conceito de processo de aprendizagem, como caracteriza do nos capítulos precedentes. Se relembramos a importância de um organismo ser ativo para poder aprender qualquer coisa, o principal defeito da classe tradicional é que os alunos têm poucas ocasiões para produzir ativa e explicitamente respostas que possam ser seguidas de avaliação clara. Essa é simplesmente uma consequência da razão entre professor e alunos, do lugar atribuído ao ensino monólogo (o estilo excathedra das universidades). Não apenas o número total de oportunidades para toda a classe é excessivamente pequeno, mas é proporcionalmente ainda menor, e próx im o a zero, para alguns alunos da classe - para aqueles que, p or várias razões, se esquivam das questões do professor. Não ser ativo nas respostas dá poucas chances para ser recompensado, ou re forçado. Reforçamento no contexto escolar pode significar receber aprovação social do professor, ou o reconhecimento dos pares, conseguir boas notas, atingir o sucesso final, ter acesso ao próximo passo no treinamento em direção a uma profissão, etc. Recompensas remotas no tempo podem ser mediadas por sinais mais imediatos, como nos reforçadores secundários utilizados no laboratório. Nas atividades inte lectuais, conhecer os resultados, algumas vezes chamados feedback, é em si mesmo reforçador e o próprio sucesso parece funcionar como um reforçador intrínseco, como já mostrado em macacos que trabalham com problemas de manipulação sem qualquer outra recompensa além do acesso ao problema seguinte.143 Infelizmente, os reforçadores escolares são escassos e são disponibilizados de forma inconsistente. Esse é um segundo defeito importante. Um terceiro defeito está no nivelamento das diferenças individuais. Um pro fessor confrontado com duas dúzias de alunos não consegue ajustar os métodos de ensino ao nível particular de cada um deles. O professor pode adotar uma postura média, adaptada à média, os melhores alunos permanecendo entediados e os piores ficando perdidos; ou se ajustar aos melhores ou aos piores, causando mais aborre cimentos por razões opostas. Skinner, que se posicionou contra experimentos de grupo e estudou aprendizagem em indivíduos, nos quais ela de fato ocorre, não poderia estar satisfeito com o desperdício inerente ao ensino não individualizado. Finalmente, Skinner sentiu que o sistema escolar não aproveita os avanços tecnológicos que poderiam ser utilizados para aliviar o trabalho dos professores e liberá-los para os aspectos mais atraentes do trabalho. Uma boa parte do tempo do professor na escola é gasta com a transmissão de informação básica que poderia ser fornecida tão eficientemente, ou mesmo mais eficientemente, com a utilização de
243 Esse é apenas um exemplo clássico, de Harlow (1959), de manutenção de atividade apenas pela oportunidade de o organismo dar continuidade a ela, ou de ser estimulado, ou de explorar.
outras técnicas. Escolas não conseguem desenvolver ricos intercâmbios entre pro fessores e alunos» do tipo que só pode acontecer entre pessoas, pois muito tempo < gasto com o ensino de tabuada em aritmética, ou com o nome e o lugar dos o s s o j na anatomia. Essas são informações importantes, mas poderiam ser transmitidas sem mobilizar o professor durante horas. O resultado é que professores e alunos são facilmente frustrados, tendo poucas ocasiões para discutir problemas encontrados nas várias áreas de ensino.244 Parte da solução foram as máquinas de ensino. A ideia já havia sido elaborada nos anos 1920 por Pressey, um educador americano. Eía não possuía, porém, todas as características que Skinner considerava importantes para colocar em seu próprio projeto. Muitas versões experimentais foram delineadas, uma das quais foi utilizada para ensinar a graduandos de H arvard parte do pró prio curso de Skinner. O assunto em questão estava dividido em um grande número de pequenos itens ou quadros (um uso anterior da palavra que viria a se tornar parte do léxico cognitivista), organizados de um modo progressivo —de acordo com a suposta lógica do aprendiz, ao invés da lógica do material. Cada passo consistia em uma ou várias proposições e uma questão a que o estudante deveria responder escrevendo no espa ço acessível de uma tira de papel. Os itens eram dispostos radialmente em um disco e apresentados um por vez através de uma janela. Os alunos não poderiam passar ao próximo quadro sem antes terem respondido àquele apresentado. Eles poderiam comparar suas respostas à correta, dando notas a si mesmos, as quais eram regis tradas automaticamente. A máquina mantinha o registro dos quadros respondidos erroneamente, que seriam apresentados novamente em uma nova aprendizagem do mesmo material até que o domínio completo fosse alcançado. A máq uina remediava vários dos defeitos observados em sala de aula. Os alunos trabalhavam em seu próprio ritmo e eram livres para repetir —e, na verdade, enco rajados a repetir - seções do material que ainda não tivessem dom inad o. Eles per maneciam ativos durante todo o processo, suas próprias respostas sendo a condição para se mover ao próximo passo. Eles recebiam reforçamento imediato por terem a chance de checar suas respostas. Além do mais, eles poderiam trabalhar no tempo mais conveniente para eles e tanto quanto gostassem. O professor, liberado da tarefa de ensinar aquele material em particular, estava livre para formas de intercâmbio mais estimulantes. Skinner tinha sua própria concepção sobre o que um bom programa deve ria ser. Por exemplo, ele insistiu em construir o comportamento requerido com o mínimo possível de erros, o ideal sendo a aprendizagem sem erros. Isso era objeto de debate entre os especialistas da primeira geração, alguns deles argumentando, 244 Algun s professores, seguindo filosofias da educaçã o que dão pou co peso para a transmissão de habilidades básicas, esco lheram se concentrar naqueles aspectos mais motivadores da tarefi, tais como discussão com os estudantes, deixando ao acaso a aquisição das habilidades básicas.
pelo contrário, que os erros tinham algumas virtudes e que em nenhum caso eles poderiam ser completamente eliminados na prática. Deve-se admitir que o am biente da vida natural não fornece muitas ocasiões para a aprendizagem sem erros e que a educação deveria preparar para a vida real, que implica alguma tolerância à falha ou à frustração. Poderia ser aconselhável manter um certo grau de tensão em atividades como a resolução de problemas, para que o indivíduo não desista por causa do tédio quando as coisas são fáceis e não desafiadoras o bastante. Em termos práticos, delinear programas sem erro para todos os estudantes individuais não é viável; um a estratégia melhor consiste em ter um programa que exija um a média alta, com retornos para correção em vários pontos para aqueles que encontrarem dificuldades. Essa importante questão é uma daquelas que, em princípio, podem ser decididas empiricamente. Skinner também enfatizou a importância de uma progressão muito gradual no programa, passando o estudante, passo a passo, de uma dificuldade para a próxima. Como regra geral, é pedagogia conhecida, à qual muito poucas pessoas se oporiam. Quando se trata de casos práticos, entretanto, nem sempre é fácil definir quão pe queno ou quão grande o passo deveria ser. Fragmentação excessiva poderia ser tão contraproducente quanto quadros excessivamente longos. Alguns se opuseram às máquinas de ensino porque elas deixam pouco espaço para uma visão sintética do material a ser assimilado. Skinner teria concordado que o tamanho dos passos po deria variar de acordo com o objetivo a ser alcançado e que, novamente, soluções deveriam ser encontradas através de investigação experimental. Máquinas de ensino não possuíam qualquer poder mágico na mente de Skin ner. Ele falava de tecnologia do ensino não tanto porque máquinas estavam envol vidas, mas porque ele visualizava aquela contribuição para a educação enquanto ciência aplicada, a ser comparada com o campo da engenharia em sua relação com a física ou a química básicas. Ele via a máquina como uma simples exploração do progresso tecnológico moderno, paralela às mudanças que se seguiram à invenção de Gutenberg da imprensa móvel. Ele desenvolveu por fim, como muitos outros fize ram depois dele, versões sem máquina da instrução programada, na forma de textos programados. Seu próprio curso, implementado sobre suas máquinas de ensino, foi mais tarde publicado nessa forma.145 Mas, quando as máquinas estão disponíveis a um custo razoável, elas fornecem a possibilidade de programar o material e de autoavaliação que as tornam altamente preferíveis aos livros.
O b je ç õ e s e o b s t á c u l o s
Máquinas de ensino e instrução programada tiveram seus defensores entusias mados. Vários projetos de pesquisa foram implem entados e vários tipos de dispo siti vos foram prop ostos nos anos seguintes às publicações iniciais de Skinner. O desen vo lvim ento dos compu tadores, que levaria por fim à presente era de compu tadores pessoais baratos para todos, rapidamente tornou as empreitadas tecnológicas iniciais obsoletas. Porém houve um período intermediário em que a nova tecnologia com putacional era muito pesada e muito cara para suprir as demandas das aplicações educacionais. As poucas tentativas de comercializar versões não computacionais fa lharam, provavelmente p or causa dos investimentos excessivos exigidos com retorno incerto. E os retornos foram incertos porque o sistema educacional como um todo não estava receptivo à nova proposta. A am eaça à p osição do professor era ob viam en te um a ob jeção im portante. M á quinas realizando trabalhos humanos são prontamente aceitas quando são vistas com o aliviadoras do aborrecim ento do trabalho despraze roso e desde que não resul tem na supressão dos empregos. Este último risco é geralmente a fonte das reações corporativistas, que, no caso das máquinas de ensino, não eram expressas como tais, mas disfarçadas sob argumentos mais nobres, como repelir o perigo da educação desumanizada. O utra importante ob jeção era que a aprendizagem na escola é mais do que acu mulação passo a passo de níveis de performance relacionados a temas específicos. Há uma crença antiga e persistente nos círculos educacionais de que o ensino significa desenvolver ou construir faculdades mentais de alguma natureza geral que serão mais tarde utilizadas na vida ou nas atividades profissionais. A abordagem cognitiva, dan do uma nova aparência aos construtos mentais, assumiu essa concepção tradicional da educação escolar preocupada em treinar a mente, incu lcar julgam ento, prover ao estudante competência matemática ou literária, desenvolver a criatividade, etc. Todas essas finalidades são distintas da performance objetivamente definida; elas parecem mais ambiciosas e nobres, mas são essencialmente mais vagas. Apesar da insistência de muitos educadores em finalidades do ensino objetivamente definidas, de modo que possa ser claramente decidido se elas foram ou não alcançadas, o sistema escolar se mantém funcionando com a suposição de que a educação intelectual é garantida quando atividades mentais gerais são supostamente desenvolvidas nos alunos. O sistema educacional é paradoxal, no sentido em que é, em alguns aspectos, excessivamente inerte e não receptivo a novidades ou reformas e, ainda, algumas ve zes, muito pronto a adotar as práticas mais infundadas, que rapidamente se tornam moda. Fascinação por novos métodos ou ideias é geralmente o resultado de influên cia econôm ica ou política, ao invés de consequência da pesquisa objetiva. As m áqui nas de ensino não eram populares não apenas por causa das objeções já citadas, mas
porque seu sucesso iria requerer pesquisa extensiva e uma abordagem experimental que nem o sistema escolar nem as agências econômicas estavam dispostos a adotar naquela época. Programar material para ser aprendido não é simplesmente dividi-lo e organizá-lo de modo que pareça apropriado ao programador; significa ajustá-lo ao estudante e aos processos e ritmo da aprendizagem individuais. Isso apenas pode ser feito ao se testar o program a nos estudantes e ao corrigi-lo con form e necessário. Nã o é uma tarefa fácil, nem pode ser implementada rapidamente, e foi um obstáculo para o uso extensivo das primeiras má quinas de ensino. Pode-se imagin ar o trabalho e o tempo necessários para se modificar uma dúzia de itens na apresentação radial na máquina de Holland e Skinner.
C o m p u t a d o r e s: “ máquinas
d e ensino ideais”
Esses problemas técnicos foram resolvidos pelo computador, a “máquina de ensino ideal” , como o próprio Skinner chamou em 1989. Ele invad iu a vida m oderna e a escola não é uma exceção. Entretanto, a atenção aos aspectos psicológicos do seu uso para o ensino nem sempre se equipara ao seu potencial técnico. Skinner corretamente observou, no mesmo artigo recente, que (...) [o computador] ainda tende a ser utilizado como um substituto para um conferencista e para ensinar como pro fessores de classes grandes fazem. Ele pode trazer a “vida real” para dentro da sala de aula, ao menos na forma esquemática. Essa é uma forma em que ele é utilizado na indústria. Em pregados não podem ser ensinados a agir apropriadamente durante um derretimento numa usina nuclear criando-se derretimentos reais, mas derretimentos podem ser simulados em computadores. Computadores podem ensinar melhor, con tudo, levando o estudante através de programas instrucionais cuidadosamente preparados. Eles podem dar dicas ou deixas para comportamentos e reforçá-los imediatamente. Além dis so, computadores podem mover o estudante para o próximo passo apropriado. Esses aspectos são essenciais para um bom ensino. São o que um tutor com um ou dois estudantes pode ria fazer e o que professores de classes maiores simplesmente não conseguem.1415
246 Skinn er (1989b, p. 94).
Skinner aponta a diferença entre o uso efetivo do treinamento assistido por computador na indústria e seu uso frequentemente ineficiente nas escolas. O con traste é evidente e é devido à diferença nas consequências de um manejo bom ou ruim entre os dois ambientes. Fatores econômicos levam a indústria a esperar retor no dos investimentos com treinamento e, portanto, séria pesquisa preliminar, bem como testes contínuos de validação, são implementados com muita disposição. As agências responsáveis pelo ensino escolar tradicionalmente não despendem muitos esforços ou dinheiro a estudos de validação de método, embora frequentemente finjam apoiar avaliação objetiva de práticas de ensino. A maioria das escolas de hoje dispõe de computadores. N em todos os pro fessores sabem o que fazer com eles, além de ajudar seus colegas de matemática. Como ferramentas de ensino potenciais, eles estão, obviamente, subempregados. Especialmente nas séries iniciais, eles ainda são amplamente utilizados com material comum, não com programas de ensino de fato. O custo financeiro do equipamento foi aceito (as companhias de informática tiveram mais influência sobre os elabora do res da política educacional do q ue o teve Skinn er!), mas a pesquisa psicológ ica e didática necessária para justificar o investimento foi ignorada. Olhando para trás, ao final de sua vida, para o que aconteceu com sua ideia seminal de delegar parte do ensino a máquinas, Skinner pôde apenas lamentar que ela ainda não tinha sido generalizada, enquanto a m áquina disponível, o computador , oferecia possibilidades incomensuráveis, A última sentença do trecho citado reflete, mais um a vez, o interesse de Skinner com o indivíduo: máquinas de ensino, ao contrário de uma das mais fortes objeções iniciais, não é uma forma de rebaixar a educação; elas são uma forma de ajustar o ensino ao indivíduo, que se beneficiará da melhor educação possível; uma ambição perfeitamente compatível com o ideal de não deixar ninguém fora da escola. O respeito às diferenças individuais, além de ser alcançado pelas máquinas de ensino, é parte da filosofia geral da educação de Skinner. Trataremos agora de alguns prin cípios fundamentais dela.
0 SISTEMA ESCOLAR QUESTIONADO Skinner era muito crítico do sistema escolar na sociedade ocidental. Enquanto cientista, ele não poderia aceitar que certos defeitos fossem perpetuados, quando sabemos como remediá-los aplicando o conhecimento científico. Como psicólogo da aprendizagem, ele não conseguia entender por que mesmo princípios básicos da aprendizagem eram negligenciados, enquanto princípios de higiene elementar são aplicados rotineiramente nos cuidados médicos. Enquanto uma mente pragmatica mente orientada, ele não poderia se satisfazer com a ineficiência geral do sistema,
como evidenciado pela taxa de falhas e pelo baixo nível generalizado de habilidades científicas ou outras depois de completar a educação escolar. Como um oponente dos controles aversivos e da punição, ele estava chocado com a frequência com que as escolas ainda recorrem a controles punitivos. Como um pensador interessado no futuro do mundo, estava preocupado com o nivelamento inferiorizante das dife renças individuais e com a resultante perda dos talentos e potencialidades originais. Como um individualista, ele estava infeliz com as restrições do regime educacional, que não deixam espaço para conquistas pessoais. As críticas que Skinner direcionou ao sistem a escolar têm alguns pontos em comum com aquelas expressas por outros pensadores na mesma época. Alguns deles concluíram que, se as escolas não são boas, devemos nos livrar delas.247 Essa posi ção estava baseada na crença de que o ser humano, se deixado sem restrições, se desenvolveria naturalmente em direção à autorrealização, mostrando curiosidade pelo conhecimento, amor pela beleza e altruísmo. Se a escola não apenas falhou em construir essas características, mas impediu seu crescimento normal, devemos dispensá-la. O movimento antiescola, como ilustrado por Illich, chegou a proclamar a natureza ditatorial do sistema escolar, visto como uma forma de opressão. A filosofia subjacente dá crédito aos homens pelo que são e pelo que podem se tornar. Skinner criticava muito o movimento, especialmente quando ele era apoiado de dentro das escolas por alguns professores no final dos anos 1960, início dos anos 1970: “A escola livre não é escola. Sua filosofia sinaliza a abdicação do professor” .248 Skinner, confiante como era na ação do ambiente, e descrente nas fontes autô nomas da autorrealização, adotou uma postura diametralmente oposta: u ma cultura humana, sendo caracterizada pela transmissão de comportamentos adquiridos, in clui, por definição, agências educacionais de um outro tipo; não faz sentido negar isso, mas em algum ponto é útil avaliar como essas agências realmente cumprem as promessas feitas. Escolas, ou instituições educacionais, não devem ser suprimidas; elas devem ser mudadas de acordo com objetivos mais bem definidos e com o recur so a métodos mais adequados para alcançá-los. Isso não significa consentir procedimentos mais autoritários. Pelo contrário, recursos punitivos, físicos ou morais, devem, de fato, ser eliminados. Skinner sem pre foi contra o controle punitivo e defendeu o uso exclusivo de incentivos posi tivos. Ele argumentou que as punições podem reduzir ou abolir comportamento indesejável enquanto estão atuando, mas ele reaparece quando são descontinuadas. Além disso, a educação não está interessada essencialmente em su primir comporta mentos existentes, mas sim em modelar ou construir novos comportamentos: para
24 7 Essa foi a posição radical defendida por Ivan Illich (1970). 248 Retirado de um artigo intitulado "The free and h a p p y student” ( S k i n n e r , 1973), reimpresso em 1978, que contém uma discussão irônica d a ideologia d a desistência.
esse fim, reforçadores positivos são muito mais poderosos e eles não geram, como as punições, respostas emocionais que geralmente são inimigas das aquisições ricas e refinadas em qualquer campo de conhecimento ou de habilidades. Escola e apren dizagem deveriam ser tornadas atraentes. Con siderando o que sabemos da teoria psicológica de Skinner, podem os con siderar que ele não poderia conceber uma boa aprendizagem escolar a menos que o estudante seja ativo. Essa era uma das características das máquinas de ensino, mas o conceito deveria invadir todos os aspectos da educação. E verdade qu e, antes e paralelamente a Skinner, m uitos educadores defenderam a ideia de que as escolas deveriam ser atrativas e ativas. Em muitos casos, porém, eles enfatizaram aspectos de certa forma superficiais na tentativa de implementar essas características. Instalações agradáveis (embora plausivelmente um importante fator, prontamente aceito por bancos e lojas, mas não muito considerados em relação às construções escolares) podem atrair estudantes para a escola, como as animadas atividades em grupo podem manter as crianças ativas ao longo dos dias de escola. Skinner não se opõe, mas ele insiste que esses não deveriam ser tomados como sinais suficientes de sucesso. Devemos ter certeza de que a atratividade, ressaltada com as pectos irrelevantes, puramente contextuais, não se sobrepôs aos principais objetivos das escolas - isto é, dotar os alunos de conhecim ento e habilidade específicos, que pod em ser aplicados na vida real. A principal diferença, se é que ela existe, entre Skin ner e os principais defensores das escolas ativas é que ele manteve a ênfase na de finição inequívoca dos objetivos e na busca por técnicas eficientes para alcançá-los. Ele não tinha qualqu er objeção à ideia de que aulas de matem ática poderiam ser um acontecimento social divertido, propiciando que os estudantes, por fim, resolvam adequadamente os problemas matemáticos. Isso não necessariamente é alcançado porque a aula foi uma festa memorável. Skinner sempre esteve consciente do perigo de se confundir aspectos da vida escolar acessórios, embora positivos, com a verda deira realização dos objetivos. É por isso que, para Skinner, um ingrediente essencial para um ensino efetivo é deixar o estudante encontrar seu próprio prazer e satisfação na própria atividade de aprendizagem. O progresso na aquisição do conhecimento deveria rapidamente se tornar reforçamehto intrínseco, como ele o chamou. Isso pode ser feito apenas através do domínio do que é aprendido, por meio da efetiva resolução de problemas, que, por sua vez, implica progressiva e cuidadosa instrução adequada ao ritmo do aluno. Skinn er frequentemen te foi cu lpado po r sua suposta intenção de se ver livre do professor, mas ele esclareceu, em mu itas ocasiões, que isso não era, de form a algum a, parte de sua abordagem. Pelo contrário, ele estava especialmente lúcido ao diagnos ticar os problemas dos professores nas escolas modernas. Espera-se que eles produ zam resultados perfeitos, em número e em qualidade, mas não lhes são fornecidas as mínimas condições para isso. Eles são mal pagos, têm um trabalho subvalorizado
socialmente e, mesmo supondo que esses fatores não lhes sejam importantes, eles não dispõem das condições técnicas para o sucesso: têm de lidar com um grande número de alunos em sala de aula, não recebem recursos adequados para garantir um bom ensino, recebem pouco apoio para tentar novos métodos e, ainda mais desencorajador, não lhes é dito exatamente qual tipo de resultado será considerado bom. Pagar aos professores salários muito mais altos ou contratar muitos outros não é uma solução: Skinner, de forma bastante realista, estava consciente de que o orça mento educacional das nações modernas não pode se expandir indefinidamente. Se há alguma chance de os professores receberem melhores salários, é demonstrando melhor produtividade: gostem ou não, a educação tem seus aspectos econômicos que não podem ser evitados ou ignorados. Até lá, devemos fazer melhor com os mesm os recursos, essencialmente os utilizando de form a diferente. Para que os estudantes aprendam mais no mesmo tempo gasto na escola, Skin ner enfatizou, obstinadamente, regras simples, contrastando-as com as propostas sofisticadas da psicologia cognitiva, que podem ser reduzidas a afirmações triviais. Em um artigo intitulado “T he shame of Am erican education” , inicialmente publi cado em 1984, ele criticou fortemente o vazio da proposta educacional cognitiva e, então, formulou, mais uma vez, seus próprios princípios simples, abrangidos pelos quatro pontos seguintes: 1. Seja claro a respeito do que deverá ser ensinado .l4 9 Significa enfatizar, mais uma vez, uma pedagogia baseada na definição de objetivos, uma linha que fora desenvolvida por muitos educadores proeminentes dos anos 1960, mas que perdeu espaço para o retomo de objetivos frouxa mente definidos, na linha da tradição mentalista. 2. Ensine primeiro as coisas básicas... Isso soa muíto trivial, mas algumas abordagens do ensino, principalmente de ciências e de matemática, ten taram, como Skinner comenta, passar rapidamente para o que é con siderado o estado mais geral alcançado naquela área. Um exemplo é a “nova matemática” : nova matemática não foi introduzida depois de uma demonstração empírica de que as crianças aprendiam melhor matemáti ca daquela forma, mas por causa dos argumentos de alguns matemáticos de que, tendo aprendido os aspectos mais gerais da matemática, os alu nos não teriam problemas ao adentrar qualqu er ramo especializado. Isso, entretanto, nunca fora estabelecido. O que está em questão aqui, admitidamente muito difícil, é como decidir quais são essas “coisas básicas” que devem ser ensinadas primeiro. Novamente, a lógica do objeto de
149 Grifos nos pontos de 1 a 4 são reproduções de Skinner (1987b, p. 112 -11 4) .
estudo, como entendida por um expert na área, pod e ser completamente alienada da lógica da aprendizagem individual. 3. Programe a matéria. Isso foi explicado em detalhes anteriormente, com relação às máquinas de ensino. 4. Pare de fazer todos os estudantes avançarem na mesma proporção. O último ponto nos traz de volta à consideração das diferenças individuais. Ele merece os comentários finais deste capítulo.
D if e r en ç a s
i n t e r jn d i v i d u a i s , d i v er s id a d e e a t i v i d a d e s c r ia t i v a s
Por causa das conotações errôneas da palavra condicionamento e por causa das persistentes interpretações equivocadas do pensamento de Skinner; por causa da con fusão entre o termo máquinas de ensino e princípios educacionais mecanicistas, ge ralmente não se aceita que Skinner foi um defensor do indivíduo. Contudo, ele o foi, e com convicção, como abundantemente testemunhado em seus textos ao longo de muitos anos. Seu respeito pelas diferenças individuais tinha muitas facetas. O foco no indivíduo fora uma de suas atitudes mais características no laboratório, o separando da tradição da psicologia experimental americana de seu tempo, que perdurou, de pois dele, na maior parte das investigações dentro da escola de psicologia cognitiva, implementadas, via de regra, em grupos de sujeitos ao invés de em indivíduos. Mui tos estudantes que estão sujeitos ao mesmo sistema ao longo de seus anos escolares experimentam os mesmos sentimentos negativos de não lhes ser permitido alcançar o que seus próprios talentos permitiriam ou de serem deixados para trás porque não puderam se manter na média. Como já dito, o controle negativo foi rejeitado pela ética de Skinner, com base em argumentos científicos. A felicidade individual converge aqui com o futuro da espécie: a educação, como interessada no futuro da sociedade, deveria ter como objetivo a preservação da diversidade, que é reconhecida como um fator essencial para a sobrevivência, no sentido darwiniano. A im portância dada por Skinner às diferenças individuais é bem exem plificada nas discussões detalhadas em Technology o f teaching anteriormente citado e, entre muitas outras, na seguinte passagem: A falha em estabelecer diferenças entre os estudantes é talvez a maior fonte de ineficiência na educação. Apesar dos expe rimentos heroicos em sistemas com múltiplas possibilidades de trajerória e em escolas sem divisão por séries, ainda é prá tica padrão para grandes grupos de estudantes progredir na mesma velocidade, utilizando o mesmo material e atingin
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do o mesmo padrão para passar de uma série à próxima. A velocidade é apropriada ao estudante mediano ou medíocre. Aqueles que poderiam progredir mais rápido perdem o in teresse e o tempo: aqueles que deveriam progredir mais len tamente ficam para trás e perdem o interesse por uma razão diferente (...). As consequências infelizes desse sistema foram agravadas pelo uso dos meios de comunicação de massa. A televisão alcança um grande número de estudantes, mas o ganho aparente é mais do que compensado pelo fato de que todos eles progridem na mesma velocidade. Não são apenas as diferenças entre os estudantes que estão em questão. Um estudante pode progredir na mesma velocidade em muitas áreas, embora consiga ir mais rápido em uma e devesse ir mais devagar em outra. Pouco ou nenhum espaço é deixado para talentos ou interesses idiossincráticos, apesar do fato dc que muitos homens distintos mostraram uma singularidade não muito distante daquela do idiot savant. Problemas desse tipo são, sem dúvida, enormes, mas podem ser solucionados. {...) Ao suplementar as histórias ambientais defeituosas e ao ter certeza de que contingências instrucionais são completas e efetivas, uma tecnologia do ensino solucionará muitos dos problemas criados pelas diferenças entre os estudantes. En tretanto, ela não reduzirá todos os estudantes a um único padrão. Pelo contrário, descobrirá e enfatizará diferença gené tica genuína. Se estiver baseada em uma política inteligente, também planejará contingências ambientais de modo a gerar a diversidade mais promissora.250 O tema da diversidade na educação, em sua relação com a dinâmica d a cultura, é extensivamente elaborado em outros trechos no mesmo livro: Uma política planejada para maximizar a força de uma cultura deve encorajar novidade e diversidade. E verdade que muitas culturas, como muitas espécies, sobreviveram sem mudanças apreciáveis por longos períodos de tempo, mas as culturas e as espécies aumentam a sua força com relação a um espectro mais amplo de contingências quando sujeitas a variação e seleção
(...) aqueles que encorajam o estudante a investigar, a desco brir por si mesmo e a serem originais de outras formas estão ampliando o suprimento de mutações que contribuem para a evolução de uma cultura. Embora algumas mutações sejam inúteis, ou mesmo prejudiciais, a diversidade é essencial. O mesmo princípio se aplica à política educacional. Uma ampla gama de objetivos, derivados de uma ampla gama de condi ções que determinam o que deve ser ensinado, é particular mente uma provável fonte de diversidade entre os estudantes. A diversidade não é, contudo, contu do, um forte aspecto na política atual. A uniformização parece ser uma consequência mais pro vável dos currículos, cu rrículos, programas, requisitos e padrões impostos sobre os sistemas educacionais pelos governos, pais, emprega dos e outras agências mantenedoras. Nós não nos preocupa mos com uniformização, conforme notamos, à medida que sa bemos que tais especificações não serão atingidas, mas ensino ineficaz é apenas uma solução temporária. Como também o são as fontes não planejadas de diversidade. Diferentes escolas ensinam coisas diferentes de formas diferentes, os professores são diferentes e os alunos possuem histórias genéticas e am bientais diferentes. A diversidade resultante tem, sem dúvida, valor de sobrevivência, sobrevivênci a, mas, a íongo prazo, uma diversidade efetiva deve ser planejada. Não há qualquer virtude no acaso enquanto tal, nem podemos confiar nele. As vantagens de uma diversidade planejada foram abundantemente demonstradas na ciência. Os homens primeiro aprenderam sobre o mundo através de contatos acidentais, sob condições acidentais e, por tanto, apenas dentro do escopo do acaso. Os métodos científi cos estão amplamente interessados no aumento da diversidade das condições sob as quais as coisas são conhecidas/51 Encorajar a diversidade é a chave para educar estudantes para serem criativos. Por definição, náo podemos ensinar o próprio comportamento criativo, porque não o conhecemos antes de ver sua ocorrência ou seu produto. A solução náo é detec tar supostas “personalidades criativas” utilizando testes de criatividade; há pouca evidência de que a criatividade seja uma característica dos indivíduos que possa ser inferida de forma válida das respostas a tais instrumentos. Se há quaisquer talentos individuais que preparam para a criatividade na arte, literatura ou ciência, quanto
mais as pessoas são ensinadas a desempenhar essas atividades, mais chances existem para tais talentos emergirem. Skinner cita Diderot, um de seus autores favoritos: As outras coisas sendo iguais, uma cultura terá mais chances de descobrir um artista original se ela induz muitas pessoas a pintar quadros, ou de conhecer um grande compositor se induz muitas pessoas a compor. Grandes jogadores de xadrez tendem a se originar em culturas que encorajam o jogo de xa drez, como grandes matemáticos vêm de culturas que encora jam a matemática. As A s contingências de reforçamento positivo e negativo que encoraj am atividade em uma determinada área área sem dúvida permitem muito comportamento medíocre, mas a mediocridade, como disse Diderot, é valiosa valiosa apenas porque dá uma chance para que o gênio se descubra.151 Em contraste com a pedagogia da criatividade que prevaleceu nos anos 1960 e 1970, de acordo com a qual a criatividade não é algo que possa ser ensinado, mas apenas liberado,153 Skinner enfatizou a necessidade de domínio técnico em uma dada área antes que o comportamento criativo possa emergir. Ele criticou a crença ingênua de que brincadeiras livres com tintas, com argila ou outro material, com notas, etc. eventualmente dariam origem a grandes pintores, escultores ou músicos. Ele via a criação artística e musical como muito semelhante à transmissão das habi lidades artesanais, um domínio em que as leis da aprendizagem foram por séculos muito habilidosa e eficientemente aplicadas pela intuição. Ele afirmou sua visão mais uma vez em um de seus últimos textos sobre educação: A origem de milhões de espécies espécies devia ser encontrada encontrada não em um ato de criação, mas na seleção de variações de outro modo náo relacionadas. Indivíduos verdadeiramente criativos, se é que algum existe, se comportam de formas que são seleciona das pelo reforçamento, mas as variações devem ocorrer para serem selecionadas. Algumas variações podem ser acidentais, mas os estudantes podem aprender a aumentar a quantidade delas, e, nesse sentido, a serem mais criativos. Como todas as
252 ld. ibid., p. 182-183 ; a referência a Did erot é de Le neveu de ramcau. 253 Essa ideia foi implicitam ente a base para várias práticas na educação artística e musical, bem como foi explicitamente proposta pelos especi especiali alistas stas mais famosos em educação; um caso importante é o influente pensador educacional francês Bertrand Schwartz (1973).
pessoas criativas do passado, entretanto, eles primeiro devem aprender algo com que possam ser criativos.154 Isso está longe do conceito de estudante robotizado que Skinner teria promo vido vi do..
254 Em “ Programm ed instruction instruction revisited” revisited” , reimpresso reimpresso em Recent issues ( S k i n n e r , 1989b, p. 97-103). Para outros detalhes a respeito respeito da visáo d e Skinner sobre a educação, e mais especificamente sobre a questão da diversidade, ver Richelle (1979 , 1986b).
14 SOCIEDADE E UTOPIA
U ma AVENTURA AVENTURA PELA FILOSOFIA FILOSOFIA SOCIAL
Vol V olta tarr-no noss-em em os ago ag o ra para pa ra o que qu e foi fo i cham ch amad adoo de ideologia de Skinner. Ela é, com razão, o aspecto da obra de Skinner no qual o leitor leigo está mais interessado, mas a essência essência da ideologia de Skinner Skin ner pode p ode ser difícil de alcançar, alcançar, se deixada sozinha à avaliação e à crítica, sem um conhecimento prévio claro dos conceitos metodológi cos e teóricos dos quais é derivada, ou dos quais se afirma ser derivada. Por essa ra zão, eu devotei grand e parte dos capítulos anteriores para a discussão discussão da consciência, do comp co mp ortam ento verbal, da criatividade, da educação, da psicoterapia, etc. - isso, isso, espero, será suficiente para descartar o argumento clássico contra a filosofia social de Skinner, i.e., que o homem não é um rato nem um pombo. Porém, uma série de questões ainda são feitas em relação aos textos sociopolíticos de Skinner. Eles derivam de dados e conceitos científicos de forma tão lógica quanto o autor reivindica? Eles não são, pelo contrário, extrapolações vagas e perigosas, ou, menos visivelmente, um produto da infiltração de uma ideologia sem nenhuma relação com qualquer evidência científica? Recorreu-se à ciência como uma máscara para a ideologia? Num outro nível, menos fundamental, pode-se questionar: Skinner não está simplesmente ignorando várias dimensões essenciais da realidade social, de modo que qualquer tentativa de mudar a sociedade de acordo com suas visões seria com pletamen te inútil e fadada ao fracasso? fracasso? Esse é outro m odo od o de pergun tar se a passagem passagem da análise análise experimental do co mp mportamen ortamen to h um ano para a ação ação política é possív possível. el. Se quisermos responder a essas questões, devemos primeiro olhar de perto aqueles textos de Skinner que refletem sua visão sobre essas questões. Quaisquer que sejam as respostas dadas dali em diante, teremos que admitir que os “textos ideológicos” de um cientista merecem atenção. Quando um homem da ciência ex pressa desse modo as preocupações com o mundo ao seu redor, não deveríamos ficar indiferentes. Os cientistas são frequentemente acusados de se isolar em uma torre de marfim; quando um deles se esforça para sair, isso pode merecer atenção. Em 1930, Freud escreveu um pequeno livro intitulado O malestar na civilização. Sem dúvida, Freud tinha a convicção de que suas ideias, como expressas no livro, estavam
intimamente relacionadas à sua experiência clínica e à sua teoria psicanalítica. Se cal convicção tinha fundamento ou não, se a relação era tão óbvia para o leitor quanoo o era para ele, podem não ser questões cruciais se comparadas com a mensagem do livro em si. Ele m erece leitura e reflexão reflexão cuidado sas. O mesm o se sustenta em relação a Beyond freedom and an d dignity,í55 de Skinner: mesmo se os argumentos e propostas expostos no livro têm pouco fundamento na análise científica, lá estão eles, e são provocadores o bastante para não deixar ninguém indiferente. Eles obviamente abalaram várias personalidades importantes, como exemplifi cado pelas citações selecionadas reproduzidas no início do capítulo i, às quais muitas outras devem ser acrescentadas. As reações em geral eram fortem ente negativas. neg ativas. Eram condenações indiscriminadas, e convidavam futuros leitores a aderirem ao mesmo e forte argumento e, dessa forma, protegerem a si mesmos da infecção por uma praga tão perigosa. Críticos e comentadores disputavam para dissuadir as pessoas de an d dignity, como Chomsky havia conseguido anteriormente 1er o Beyond freedom and em relação ao Verbal behavior. Mais do que isso, a suspeita foi por fim transferida para o uso dos métodos operantes na pesquisa de laboratório. Por exemplo, um revisor da revista mensal de prestígio Le Monde de l'Education, publicada em Paris, dedicou um artigo longo e essencialmente elogioso a um estudo sobre desenvolvi mento cognitivo no qual questões levantadas pela teoria de Piaget eram abordadas por meio de métodos derivados dos procedimentos do laboratório operante. Ao final da sua revisão, achou necessário insistir: “Qualquer psicólogo ou educador interessado em desenvolvimento cognitivo deveria 1er esse estudo (...) mesmo que,
por po r razóe azóess éticas éticas ou ou políticas políticas,, não não pos possa sa deixar deixa r de ter ter alguma algumass suspe uspeit itaas em rela relaçã çãoo aos princípios skinnerianos\ skinn erianos\^é ^é Ela sem dúvida tinha em mente aqueles princípios sobre os quais as visões sociais de Skinn er estão estão baseadas, não os prin cípios cípio s subjacentes aos procedimentos experimentais científicos científicos aplicados pelos autores autores - que dificilmente dificilmente poderiam provocar qualquer suspeita de natureza ética ou política. Vejamos quais são esses princípios perturbadores. Duas principais obras, conforme já mencionamos, estão disponíveis para nos ajudar a construir nosso próprio julgamento. A primeira, Beyondfreedom freedom and dignity, é um ensaio. Foi publicada em 1971, traduzida rapidamente para várias línguas e amplamente divulgada. E uma discussão crítica de uma série de noções que têm papel central no nosso sistema social. Skinner desenvolve uma visão dos seres huma nos e dos agent agentes es causais causais que determ inam a conduta humana que abala muitos dos princípios aceitos e que fundamentam a sociedade moderna. Ele também denuncia algumas ilusões em que a vida social e política estão atualmente baseadas. Nenhum
*55 Skinn er (1971a). 256 Artigo assinado por Evelyne Laurent (1976) (1976) sobre o livro de Botson Sc Deliège (1975). Grifos são meus. Para um exemplo da abordagem e do material apresentados nesse livro publicado apenas em francês, ver Richelle (1977a).
plano de ação prática é oferecido; o livro não é, de forma alguma, uma plataforma política. Também não se trata de um manifesto revolucionário, nem de uma pro clamação reformista. O leitor bem-disposto que não está familiarizado com a obra de Skinner provavelmente questionará: “O que podemos fazer com isso no mundo real real?? Q ue tipo de sociedade Skin ner construiria de fato se se lhe fosse fosse dada um a chance de modelar a human idade com o modelou ratos e pomb os no laboratório?”. Aqueles Aqueles que depreciam as ideias do autor reivindicam que têm a resposta e que ela é apavo rante: o mundo de Skinner seria semelhante a um vasto campo de concentração ou a algum algum a form a ainda não vista de totalitarismo. totalitarismo. A um prospecto tão horrível, eles eles opóem a felicidade inegável (para eles) de nossa sociedade, ou, como uma alternati va, seu p ró p rio ri o so n h o u tópi tó pico co,, qu e gera ge ralm lmen ente te náo ná o se preo pr eocu cupp am em qu alif al ific icar ar em termos termos práticos. práticos. Assim , C hom sky prevê prevê que numa sociedade decente, trabalho socialmente necessário e desprazeroso seria dividido igualmente e, além disso, as pes soas teriam, como um direito inalienável, a oportunidade mais ampla possível para trabalhar naquilo que as interessa. Elas podem ser “reforçadas” por autorrespeito se elas fize rem seu trabalho da melhor forma possível em relação à sua habilidade, ou se seu trabalho beneficia aqueles aos quais se relacionam relacionam por po r vínculos de amizade, amizade, simpatia sim patia e solidariedade. solidariedade. Tais noções são são comumente objeto de zombaria - como era comum, num período anterior, ridicularizar a ideia absurda de que um camponês tem os mesmos direitos inalienáveis que um nobre. Sempre houve, e sem dúvida sempre haverá, pes soas que náo podem conceber a possibilidade de que as coisas poderiam ser diferentes daquilo que elas são.257 M as Skinner tamb ém, m uito antes antes de Chom sky, formu lou seu sonho. E ele ele foi foi longe o suficiente para nos mostrar como aquele sonho poderia ser posto posto em prática, prática, não escrevendo um programa político, mas compondo um romance utópico. O gênero é admitidamente menos prático, embora possa ser de maior significância.
W a l d e n T w o O título título desse desse romance romance u tópico se se refer referee ao ao nom e de um lago - Walden perto de Concord, Massachusetts, onde o escritor americano do século XIX Henry
David Thoreau se retirou por um ano para experimentar a vida solitária, algo entn Robinson Crusoé e um ecologista moderno. Sem discorrer sobre a afiliação literária entre Thoreau e Skinner, é necessário notar que Thoreau é também o autor de uma pequena peça em prosa intitulada On civil disobedience, em que argumenta contn o direito do estado de aumentar taxas excessivamente (não é necessário dizer que o que era excessivo para ele pareceria muito tolerável para nós). Walden Two foi escrito quase um quarto de século antes de Beyondfreedom and digníty . Quando foi inicialmente publicado em 1948, fez um sucesso moderado. Levou alguns anos até se cornar um bestseller, mas, desde então, vendeu mais dc um milháo de cópias em inglês e foi traduzido para muitas línguas. O francês, lín gua mãe do presente autor, infelizmente não está entre elas; por algumas razóes, as editoras estavam relutantes, sendo o argumento oficialmente colocado de que náo se trata de uma obra-prima literária. Dificilmente isso pode ser considerado uma boa razão, pois a excelência literária certamente não é um critério para decidir quais livros deveriam ser traduzidos, mas estou pronto a admitir que Walden Two não é a melhor obra de Skinner em relação ao estilo. Daria preferência, sem hesitação, a alguns capítulos de seus textos estritamente científicos. Mas essa não é a questão. O que é de interesse aqui é o planejamento utópico de Skinner de uma sociedade ideal, o tipo de sociedade que ele teria proposto, ou imposto, se lhe fosse concedida total autoridade. Seria ela próxima a um campo de concentração ou à sociedade decente almejada por Chomsky? O enredo que fornece o pano de fundo para a descrição das regras sociais em Walden Two náo tem muita importância e precisa apenas ser esboçado aqui: ele prepara o terreno para um tour guiado. Os visitantes: dois jovens homens com suas namoradas; Burris, um professor de psicologia que deixou suas obrigações acadêmi cas para acompanhá-los; um colega de Burris chamado Castle, historiador e cético. O guia: Frazier, fundador da comunidade. O lugar: um grande vilarejo, chamado W alden T wo, on de 2.0 00 pessoas de todas as idades vivem juntas de acordo co m os princípios desenvolvidos por Frazier. A época: a visita ocorre ao final da Segunda Guerra. Os dois jovens acabaram de ser dispensados do exército. Estão há pouco tempo de volta da Europa em uma sociedade americana com a forte esperança da queles que estiveram lutando —esperança de que encontrarão na paz a justificação dos pesados sacrifícios dos tempos de guerra. Pouco após seu retorno, a fé no futuro deu lugar a uma amarga frustração: a sociedade americana do pós-guerra está uma bagunça. Esse é o estado de coisas que os induz a ter contato novamente com o antigo professor Burris e de pedir sua ajuda para localizar a comunidade de Frazier. E claro que o seu descontentamento é 0 de Skinner: nessa época, ele já estava insa tisfeito com as ilusões de liberdade e de justiça social que eram oferecidas ao povo americano como frutos a vitória. Se Skinner, em 1945, escreveu uma utopia ao invés de um programa de ação política, é porque, em sua visáo, as abordagens clássicas
da política condenavam ao fracasso qualquer tentativa de mudar realmente as coisas num sentido positivo: Vo V o cê n ã o p o de p ro g re d ir em dire di re çã o à B o a V id a atra at ravé véss da ação política! política! Nem sob qualquer forma atual de governo! governo! ( ...) O que você precisa é de um tipo de Comitê de Ação Não Política: Política: manter distância da política e do go verno exceto para propósitos práticos e temporários. Não é lugar para homens de boa vontade e visão. C om o uso atual do termo, governo significa significa poder — prin cipalmente o poder de forçar a obediência. As práticas de governo sáo as que eram de se esperar —eles usam a força e a ameaça de força. Mas isso é incompatível com a felicidade permanente - conhecemos o bastante bastante da nature natureza za humana para ter certeza disso. Não se pode forçar alguém a ser feliz. [Isso foi Frazier falando.] Mas certamente houve muitos homens felizes sob governos de um ou outro tipo. [Essa é a objeção de Burris.] N ã o por do governo governo - apesar dele. Algumas filosofias po r cama cama do de vida fizeram os homens felizes, sim, porque estabeleceram princípios que eu quero considerar seriamente como prin cípios de governo. Mas essas filosofias surgiram de rebeldes. Governos que utilizam a força se baseiam em princípios ruins de engenharia humana. Ne m estão estão aptos a melhorar com base base em tais princípios, ou descobrir suas inadequações, porque não estáo aptos a acumular qualquer corpo de conhecimen to próximo à ciência. Tudo o que pode ser feito como “me lhoria” é tirar o poder de um grupo e transferir para outro. N un ca é possível possível planejar planejar ou implem entar experimentos para investigar o melhor uso do poder ou como dispensá-lo. Isso seria seria fatal. fatal. O s governos devem sem pre estar certos - eles eles não podem experimentar porque não podem admitir dúvidas ou question am entos/58 entos/58
Isso Isso tem um sabor de anarquia, não? não? —com o o p róprio C astle observou depois depois de algum tempo de conversa. Mas vamos deixar a ideologia por enquanto e seguir nossos visitantes em seu passeio passeio po r Walden Two.
T r a b a l h o : 2 4 horas por semana e uma e scala flexíve l Wald W alden en T w o é um a co m un idad id ad e agrí ag ríco cola. la. Sobr So brev eviv ivee com co m um a eco ec o no m ia sem se m i* fechada. E necessário encontrar, entre seus próprios membros, a força de trabalho para levar a cabo a variedade de tarefas que devem ser feitas em qualquer grupo social. Todos os membros da comunidade que estão fisicamente aptos são convoca dos a trabalhar poucas horas por dia pela comunidade. Três ou quatro horas serão suficientes, como se esclarecerá. Eles recebem em troca todos os bens e benefícicn conseguidos com a organização social na qual vivem: moradia, comida, vestuário, educação, cuidados médicos, acesso livre a todos os tipos de atividades livres dc lazer; em resumo, eles desfrutam de um estilo de vida que se compara ao padrão dos cidadãos americanos, embora muito diferente em vários aspectos e muito mais gratificante. Como isso pode acontecer, se o tempo total de trabalho, no sentido usual da palavra, palavra, é reduzido para aproximad amen te quarenta p or cento? cento? D e fato, essa essass quatro horas diárias diárias po r pessoa pessoa se tornam mu ito mais produtivas na escala da população como um todo do que as oito horas exigidas em nossa socie dade. Primeiramente, como se sabe, a produtividade é mais alta no início do dia de trabalho; as tarefas são desempenhadas com mais rapidez quando não há obrigação de se manter trabalhando além de um certo limite de tempo com o objetivo de se adequar a uma escala preestabelecida. Em segundo lugar, as pessoas que trabalham para si mesmas, ao invés de para outra pessoa ou companhia, trabalham melhor e são mais velozes. Isso é o que ocorre em Walden Two: a propriedade privada não existe existe na com unidad e e não há espaço para se explorar o trabalho do outro. Terceiro, se todos os indivíduos trabalham em média quatro horas por dia, o montante total de tempo utilizado para o trabalho na população total excede metade do tempo total dedicado ao trabalho numa população equivalente trabalhando oito horas por dia em nossa nossa sociedade. sociedade. A razão razão para isso isso é muito simples: todos trabalham em Wal W alde den n Tw o. N ã o h á classe cla sse priv pr ivile ilegi giad ada; a; não nã o há apo ap o sen se n tado ta do ria ri a prem pr em atur at ura; a; não há alcoolistas, nem delinquentes, muito poucos doentes; por último, mas não me nos importante, não há desemprego, subproduto de um planejamento defeituoso. “Ninguém é pago para ficar à toa a fim de manter padrões de trabalho. Nossas crianças começa m a trabalhar trabalhar cedo - mo deradam ente, m as felize felizes” s” .15 .159 Outro ganho no tempo de trabalho é obtido pela racionalização das tarefas, recorrendo a habilidades e competências apropriadas e melhorando permanente mente as capacidades e as habilidades de todos. Walden Two também dispensa vári vá rioo s em preg pr egos os que qu e sim si m ples pl esm m ente en te não nã o têm tê m lugar lug ar,, po is não nã o há nece ne cess ssid idad adee para pa ra eles eles:: não há bancos, nem empresas empresas de propaganda, nem com panhias de seguro seguro seguro não é necessário porque a comunidade protege seus membros contra todos
os riscos graves, tais como doenças, debilidades, a velhice, e assim por diante. Ela também dispensa os excessos de facilidades de todos os tipos, restaurantes, lojas, bares, teatros, transporte, atualmente encontradas nas cidades modernas. Por fim — e est estee não é o último m érito de Walden Two - as mulheres têm uma condição completamente diferente se comparada com a sociedade mais ampla (lembre-se, estamos em meados dos anos 1940). O trabalho doméstico tradicional foi drasticamente modificado, racionalizado e automatizado, de modo que mais da metade do tempo das mulheres é livre para outras atividades mais gratificantes. Esse é apenas um aspecto da vida feminina em Walden Two. Retomaremos outros aspectos mais à frente. Wal W alde den n Tw o é cara ca ract cter eriz izad adaa p o r ob rigaç rig açõe õess de traba tra balho lho m oder od erad adas as e p o r um padráo de vida viável. Para essas duas características andarem juntas, uma terceira é necessár necessária, ia, um a drástica drástica elimin ação do desperdício. A consciência de e a luta contra os hábitos de desperdício de nossa sociedad sociedadee de consum o - que desde então então se tor tor naram as premissas premissas dos dos mo vimen tos ecológicos - eram centrais para a mensagem de Skinner desde 1945. Os habitantes de Walden Two (...) praticam o princípio de Thoreau de evitar possessões desnecessárias. Thoreau apontou que um trabalhador médio de C on co rd trabalhava trabalhava dez ou quinze anos de sua vida apenas apenas paia ter um teto sobre sua cabeça. Nós poderíamos dizer, com segurança, dez semanas. semanas. A com ida [des [deste tes] s]
é farta e saudável,
mas não cara. Há pouca ou nenhuma inutilização ou desper dício na distribuição distribuição ou no armazenamento e nenhum devido a cálculos equivocados das necessidades. O mesmo é verdade para outros produtos. [Eles] náo sentem a pressão de promo ções que estim ulam con sum o desnecessário.1 desnecessário.1660
Bo ns program as de rádio são realiz realizados ados e transmitidos livremente para todos os membros, mesmo após terem sido limpos dos anúncios comerciais! A redu re duçã çãoo do tem te m p o de trab tr abal alho ho não nã o é a ú n ica ic a ino vaçã va çãoo da orga or gani niza zaçã çãoo labor lab orai ai de Walden Two. Além dessa diferença qualitativa, o trabalho é também qualitativa mente melhor, por causa de duas outras características: a cada membro é oferecida um a am pla variedade de tarefas tarefas e uma form a engenh osa de escala escala flexível flexível é praticada. praticada. Os membros não são escalados para trabalhar um número definido de horas, mas para cumprir um número definido de créditos. Cada tarefa a ser desempenhada recebe um determinado valor de crédito, que é função, entre outras coisas, de quão atrativa ela é e, consequentemente, da frequência com que é escolhida. Uma tarefa
que é geralmente geralmente considerada desagradável, desagradável, tal como limp ar o chão o u lavar a louça, louça, tem maior valor de crédito do que uma tarefa agradável e, portanto, muito concor rida, como a manutenção das flores do jardim. Aqueles que querem preencher suas obrigações rapidamente e desfrutar mais tempo de lazer podem escolher trabalhar não mais que duas horas em uma tarefa com alto valor de crédito. Esse valor, é claro, não é fixado de forma definitiva, mas é ajustado de acordo com as escolhas feitas com base na oferta/procura. As tarefas são, com poucas exceções, oferecidas a todos e são são intercambiáveis, o que não significa que as pesso pessoas as espontaneam ente não desenvolverão muita habilidade no campo de sua escolha e tenderão a desenvolver tarefas tarefas apropriadas à sua com petência. Sempre que possível, o trabalho pode ser feito a qualquer hora do dia. O con ceito “das 9 às 17 horas” é desconhecido em Walden Two. Isso proporciona outro modo de evitar a monotonia. Todos são livres para adequar sua tarefa a escalas mais flexíveis. O trabalho, bem como as refeições e as atividades de lazer, ocorre ao longo de todo o dia. Romper as escalas desse modo traz duas importantes consequências. As A s faci fa cilid lidad ades es com co m un s são s ão co m plet pl etam am ente en te expl ex plor orad adas as:: não nã o há neces ne cessid sidad adee de d e se cons con s truírem amplas sala salass de jantar, jantar, ou um grande núm ero de banheiros ou de quadras quadras de tênis, de modo que todos os usuários possam ser acomodados simultaneamente nas horas de pico. Pequenas salas de jantar, um número limitado de banheiros, quadras de tênis, etc. serão suficientes. Há ainda outra vantagem com isso: ao contrário do que acontece quando os restaurantes coletivos esperam servir 2 mil refeições entre 12 e 14 horas, ou quando os cinemas ficam abertos apenas das 19 às 23 horas, as pes soas não formam multidões em Walden Two. Multidões são caras, ocasionalmente perigosas, e, mais importante, não são propícias às mais valiosas formas de relações sociais (Skinner era, vamos relembrar, um individualista). Há ainda outra regra na organização do trabalho que precisa ser observada. Cada membro deve cumprir parte de seus créditos na forma de trabalho físico, quaisquer que sejam suas inclinações e competências específicas. Essa regra garante um equilíbrio, no nível individual e comunitário, entre os dois aspectos da produ tividade. Também evita o risco de ter uma casta de “trabalhadores intelectuais” que decidem como organizar os trabalhos dos “trabalhadores braçais” sem conhecerem de perto esses trabalhos. Todas essas regulamentações resultam em redução, alívio e simplificação do tra balho exigido para a sobrevivência da comunidade; a intenção delas não é suprimir o trabalho. A filosofia filosofia geral geral subjacente ao sistema sistema é claramente resum ida na seguinte declaração de Frazier: Náo há nada de errado com o trabalho pesado e não estamos interessados em evitá-lo. Apenas evitamos trabalho não cria tivo e desinteressante. Se pudéssemos satisfazer nossas neces
sidades sem precisar trabalhar pesado, o faríamos, mas isso nunca foi possível, a não ser por meio de alguma forma de escravidão e não vejo como isso pode ser feito se todos temos que trabalhar e dividir da mesma forma. O que questionamos é que o trabalho de um homem não pode exigir demais de sua força ou ameaçar sua felicidade. Nossas energias podem então se voltar para a arte, a ciência, os jogos, o exercício das habili dades, a satisfação das curiosidades, a conquista da natureza, a conquista do homem - do próprio homem, nunca do outro. outro. Criamos lazer sem escravidão (...).iÉI Poderíamo s estar estar mais perto da sociedade sociedade decente almejada almejad a p or C Ch h om sky? Isso Isso se tornará ai nd a mais convincente quando observarmos as formas como as pessoas gastam seu temp o de lazer la zer em W aalden lden Tw o.
A r t e
e c i ê n c i a em
W a l d e n T w o
W a ld e n T w o p r o p o r c i o n a a se u s m e m b r o s as m e lh o r e s fa c ilid il id a d e s p a r a p r a t ic a r e desfrutar as artes. artes. Os prédios são decorado s com qua dros e desenhos de artistas artistas lo cais, cais, que pod em m uito bem ser ser com pparados arados a obras exibidas exibidas em galeri ga ler ias de arte a rte com boa reputação. Fitas e instrumentos ficam disponíveis para os músicos amadores e, de quartetos de cordas a orquestras orquestr as sinfônicas ou co rais, rais, há um a variedade de grupo s musicais de alta qualidade. Essa proliferação de atividades criativas é subproduto de condições favoráveis à sua emergência: tempo de lazer ampliado, competição sem rivalidade, disponibilidade de facilidades técnicas e, sobretudo, um contexto social no qual artistas e músicos encontram público. Essas condições são de fato muito mais efetivas do que honrarias ocasionais e prêmios oferecidos a poucos indivíduos criativ cri ativos os em um a soci sociedade ed ade com petitiva. petitiva.
Prêmios apenas atingem a superfície. Não é possível incenti var arte apenas apenas com dinheiro. O que você precisa é de uma cultura. Você precisa de uma oportunidade real para jovens artistas. A carreira precisa ser economicamente atraente e so cialmente aceitável e prêmios não farão isso. E você precisa de apreciação —deve haver audiências, não para pagar as contas, mas para o próprio prazer, Considerando tudo isso, realmente sabemos muito sobre o que é necessário. Devemos chegar ao
artist artistaa antes de ele ele provar seu seu mérito. U m a cultura m uito pro dutiva deve estim ular um g rande núm ero de jovens e novat novatos» os» A fila fi la n tr o p ia nã o é cap ca p az diss di sso. o. E la p o d e p ro d u z ir p o u c a s grandes obras de arte, mas é apenas u m com eço .26 .261 A l é m d a a r t e e d a m ú s i c a e , é c la r o , d o s e s p o r t e s e d o s jo g o s , o s m e m b r o s
de
W a ld e n T w o d i s p õ e m d e u m a o u t r a a t iv id a d e d e la z e r: a p e s q u is a c ie n t íf ic a . S e vávár io io s t ip i p o s d e p e s q u i s a t e c n o l ó g i c a - e s s e n c ia ia l m e n t e p e s q u i s a a p l ic ic a d a p a r a m e l h o r a r as práticas agrícolas, a educação, a saúde, a transformação industrial de algumas m atérias-prim atérias-prim as - estão listadas listadas entre entre as ativi atividad dad es necessárias necessárias e, enqu anto tais, tais, for necem créditos de trabalho, a pesquisa básica é considerada atividade de tempo d e la la ze ze r. r. E s s a n ã o é , d e m o d o a l g u m , u m m e i o d e n e g li l i g e n c iá i á - la la . C o m o n a s ar ar te te s, s, condições adequadas prevalecem: as pessoas têm muito tempo e suas mentes estão notavelmente livres; como resultado, a criatividade científica é muito maior do que em muitos lugares onde a pesquisa básica está organizada de forma profissional. Pode-se questionar se as instituições realmente existem em nossa sociedade, onde a pesquisa pura é implementada sem que os cientistas tenham que pagar por seu di reito de pesquisar livremente na medida em que aceitam também tarefas utilitárias. N a é p o c a e m q u e W a l d e n T w o f o i e s cr c r it it o , e ss ss e ti ti p o d e q u e s t ã o p o d e r i a te te r p a r e ci ci d o m u i t o c r í t i c a e m r e l a ç ã o à o r g a n i z a ç ã o d a c i ê n c i a no s E s t a d o s U n i d o s . E r a u m a p r e m o n i ç ã o d o r u m o q u e d e s d e e n t ã o t o m a r ia i a m a s p o l í t ic ic a s p a r a a c i ê n c ia ia e m t o d o s o s p a ís ís e s o c i d e n t a is is c o n t e m p o r â n e o s . Existe, à primeira vista, algo de surpreendente no fato de que a criatividade i n d i v i d u a l é e n c o r a j a d a , n ã o p o r m e r a e x o r t a ç ã o , m as a r r a n j a n d o u m a m b i e n t e a l tamente favorável em uma comunidade planejada por um behaviorista com base nas leis do condicionamento. Se as conotações usuais da palavra estiverem corretas, pode-se esperar um conjunto de seres idênticos, todos se comportando exatamente da mesma forma totalmente previsível, cujas vidas se desenrolariam por um cami n h o e s t r i t a m e n t e p r é - p r o g r a m a d o , c o m o f i g u r a d o e m a l g u m a f i c ç ã o f u t u r i s t a . Mas, ao c on trário, a ênfase está está na diversidade , n a tolerância às idiossincrasi idiossincrasias, as, n a recepti v i d a d e à m u d a n ç a . N ã o d e v e m o s e s q u e c e r q u e W a ld e n T w o n ã o é a im p le m e n t a ç ã o de alguma teoria de governo imposta sobre sujeitos mais ou menos benevolentes, mas um experimento de planejamento cultural no qual a satisfação do indivíduo é o fundamento do equilíbrio social, e a diversidade é vista como a melhor garantia de vitalidad vitalidad e. E s s a d iv i v e r s id i d a d e i n e s p e r a d a im im p r e s s i o n a o v i s it it a n t e d e W a l d e n T w o c o m r el e l aaçç ã o a o v e s t u á r io io f e m i n i n o . A o i n v é s d e s e a d a p t a r à s m o d a s d a e st s t a çã çã o , q u e m u d a q u a t r o ve v e z e s p o r a n o , m a s q u e t o r n a a s m u lh e r e s t o d a s s e m e lh a n t e s , as m u lh e r e s se v e s t e m
da forma como se sentem melhor. Não há uma compulsão sem fim para modificar os guarda-roupas apenas para estar na mod a. N ão é necessári necessárioo dizer que a vantagem financeira é importante. Porém, mais importante, isso não impede que as mulheres cuidem de seu charme e de sua beleza: como elas não estão limitadas à moda que mu ito frequenteme nte não lhes cai cai bem , evitam o rid ículo que é geralmente geralmente o resul resul tado de seguir a m oda a qualque r custo; elas podem se dedicar a característ características icas mais pessoais pessoais de suas suas personalidades. personalidades. Por conseguinte, a pequ ena com unida de de Walden Two oferece o espetáculo mais prazeroso de uma sociedade cosmopolita, na qual a varie va rie dade da de de vest ve stuá uári rioo é tole to lera rada da e adm ad m irad ir ada: a: Aqui Aq ui não estamos tanto à mercê de planejadores planejadore s comerciais e muitas de nossas mulheres conseguem ficar muito bonitas simplesmente porque não se lhes exige que fiquem dentro de limites estreitos (...). Seguir a moda não é um processo natural, mas uma mudança manipulada que destrói a beleza do vestido do último ano de modo a torná-lo desnecessário. Opomo-nos a isso ao ampliar nossos gostos. Mas a mudança necessária ainda não aconteceu em você. Um dia você enten derá o que estou dizendo. Alguns detalhes que agora parecem fora de moda e que, apesar do que você diz, devem prejudicar sua apreciação, tenderão a parecer naturais e agradáveis. Você descobrirá que uma linha lin ha ou característ característica ica nunca é datada em si mesma, da mesma forma como você acaba por considerar belo um vestido de outro país que inicialmente havia conside rado brega ou feio.2é3
Educação
v er s u s
seleção
As A s crian cri ança çass em W ald al d en T w o de m on stra st ram m felic fe licid idad ade, e, ativ at ivid idad ad e e curi cu rios osid idad ad e. Não há necessidade de lhes impor o conteúdo de um currículo escolar. E suficiente ensinar-lhes técnicas de aprendizagem e pensamento e, além disso, fornecer a elas oportunidades de aprender e com aconselhamentos ocasionais, quando solicitado por elas. São necessários menos professores, mas a educação é melhor. Não há um currículo definido, com passos preestabelecidos; não há turmas por idade, nenhum tipo de escola compartimentalizada. Cada criança tem a opor tunidade de se desenvolver em seu próprio ritmo, de cultivar suas aptidões e inte ress resses. es. Encon trará na co m unid ade a ajuda necessária. necessária. A educação é parte da vida
de cada um. Os membros de Walden Two nunca param de aprender, como nunca se recusam a ensinar seus colegas. Aqui a educação é permanente por toda a vida, m uito antes antes de a ideia —a prática é outra história —tornar-se popu lar com o o é hoje. Gra nde parte parte do que um a criança ou adolescente adolescente acaba acaba por ap render é adquiri do ao longo de suas atividades da vida real. Oficinas, laboratórios, salas de estudo, li vraria vra riass com co m espaço esp aço p ara ar a leitu lei tura ra,, ao invés inv és de salas de aula au la,, estão estã o disp di spon onív ívei eis. s. A s porta po rtass e janelas dessas construções construçõ es são abertas, de mo do que as crianças possam entrar e sair livremente, sem sem tensão, de uma form a autodisciplinada. autodisciplinada. Elas vivem em grupos, cada um a delas delas sendo estimulada por crianças crianças m ais velhas. velhas. E las tom am conta de seus seus pró prios quartos. Essa autonomia é introduzida progressivamente: depois da completa dependência da amamentação, o controle educacional é esvanecido gradualmente até os 13 anos, ou então, quando o adolescente está praticamente integrado à vida adulta, com responsabilidades de adulto. A p u n ição iç ão está b an ida id a da educ ed ucaç ação ão e do tre inam in am en to m oral or al.. U m a cria cr ianç nçaa nu n ca experimenta situações desprazerosas ou adversidades como resultado de uma in tervenção deliberada de um professor ou de alguma outra autoridade adulta. Como a adversidade é, de qualquer modo, um fato da vida, as crianças precisam estar preparadas para ela, mas com recurso a métodos que progressivamente as permitam lidar com isso. Na maioria das culturas, as crianças se deparam com abor recimentos e infortúnios de magnitude sem controle (...). Todos sabemos o que acontece. Poucas crianças conseguem sair disso, particularmente aquelas que tiveram a infelicidade em doses que poderiam ser digeridas. Elas se tornam bravos homens. Outros se tornam sádicos ou masoquistas com graus variados de patologia. Não Nã o tendo conquistad conqu istadoo um ambiente ambient e que provoca dor, se tornam preocupadas com a dor e fazem uma arte indireta disso. disso. Outros Outro s se submetem submet em - e esperam esperam her dar a terra. As práticas tradicionais são admitidamente me lhores lhores do que nada nada (...) (. ..).. Espartanos ou puritanos - ninguém pode questionar o feliz resultado final. Mas o sistema total permanece apoiado no princípio não econômico da seleção. A escola públi p ública ca inglesa do século X I X produziu produz iu bravos ho ho mens —ao estabelecer barreiras quase insustentáveis e fazer o máximo dos poucos que conseguiram superá-las. Mas se leção não é educação. Seu cultivo de homens bravos sempre será pequeno e o gasto, enorme. Como todos os princípios primitivos, a seleção substitui a educação apenas através de um uso esbanjador do do material. Multiplique Multip lique excessivame excessivamente nte e
selecione selecione com rigor (... ( ...). ). Em Walden Two temos um objetivo objetivo diferente. Fazemos de cada homem um bravo homem. Todos eles superam as barreiras. Alguns exigem mais preparação que outros, mas todos eles superam. O uso tradicional da adversi dade é selecionar o forte. Nós controlamos a adversidade para construir a força.164 Prefere-se a cooperação à competição, e essa escolha é crucial para os métodos educacionais. Nós cuidadosamente evitamos qualquer alegria em um triun fo pessoal que signifique a falha pessoal de alguma outra pes soa. Não temos prazer no sofisma, na disputa, na dialética. Não usamos o motivo da dominação, porque estamos sempre pensando no grupo como um todo. Triunfo sobre a natureza e sobre si mesmo, sim. Mas, sobre os outros, jamais.165 Opomo-nos à competição pessoal. Não encorajamos jogos competitivos, por exemplo, com a exceção de tênis ou xadrez, onde o exercício da habilidade é tão importante quanto o re sultado do jogo: e, mesmo assim, nunca temos campeonatos. Nunca marcamos qualquer membro por aprovação especial. Deve haver uma outra fonte de satisfação no trabalho ou no jogo jog o e consideramos uma conquista conquis ta como muito muit o trivial. Um triunfo sobre o outro nunca é um fato louvável .166 O sistema sistema educacional em Walden Two é, evidentemente, evidentemente, planejado de acordo com o descontentamento de Skinner em relação ao sistema educacional vigente em seu país. Sendo professor e parte do próprio sistema, ele questiona, uma clara visão náo muito comum, a utilidade das provas e das notas, a eficiência da aprendizagem por meio de aulas expositivas, a premissa de um currículo universal imposto a todas as crianças, igualmente limitadas a estudar matérias e ler livros nos quais não têm qualquer interesse. Na narrativa, Burris não reflete espontaneamente sobre todos esses problemas: de fato, ele responde às questões postas por um grupo de garotas, bem preparadas pela educação de Walden Two para fazer questões relevantes e de certo mod o embaraçosas. embaraçosas.
264 26 4
Id.ibid., Id.ibid., p. [13-114.
265
id.ibid., id.ibid., p. 112.
266
Id.ibid., Id.ibid., p. 169.
De fato, as práticas educacionais as quais Skinner critica e que ele conserta na sociedade imaginária de sua Utopia foram repetidamente denunciadas, desde então, em outroscontextos, outros contextos, incluindo o movimento estudantil de 1968 e por uma série de reformas (econtrarreformas) (e contrarreformas) na maioria dos países ocidentais. Como vimos no capítulo 13, Sk inn er mais tarde tarde elaborou suas suas visões visões críticas críticas sobre educação escolar e desenvolveu sua abordagem alternativa em termos de tecnologia do ensino.
L i b er er a ç ã o d a m u l h e r
A orga or gani niza zaçã çãoo d a com co m u n id a d e m od ific if icaa dras dr asti tica cam m ente en te o pape pa pell da fam fa m ília. íli a. Aq A q u i, nova no vam m ente en te,, S k inn in n e r é g u iad ia d o p o r sua su a perce pe rcepç pção ão de um a evol ev olu u ção çã o socia so ciall que qu e ocorre sob seus olhos: A história hist ória significante signi ficante de nosso tempo é a história da fraqueza crescente da família. O declínio do lar como meio de perpe tuar uma cultura, a luta pela igualdade feminina, incluindo seu direito de escolher profissões além de dona de casa ou babá, a extraordinária consequência do controle de natalidade e a separação prática entre sexo e parentalidade, o reconheci mento social do divórcio, a questão crítica da relação de san gue ou raça - tudo isso é parte parte da mesma mesma área. área. E dificilmente você pode considerá-la consid erá-la estagnada.26 estagnada.267 Esse aspecto aspecto da organização social é, sem dúvid a, um dos mais difíceis e delica dos. E aqui, ainda mais que em qualquer outro dom ínio, Walden Two é um campo de experimentos sempre aberto para melhoria e mudança. Ele não oferece qualquer solução definitiva ou rigidamente fixada. A importância tradicional da família en quanto unidade econômica, socioafetiva e educacional é completamente reconheci da; mas também se reconhece que a família náo é mais capaz de desempenhar essas funções. Algo deve ser feito no nível da comunidade. O casamento é mantido e náo é menos permanente que em qualquer outro lugar (lembre-se de que o divórcio estava se tornando mais frequente e mais aceito na sociedade sociedade americana logo após a segunda guerra mu ndial). D e fato, os vínculos vínculos conjugais são mais resistentes nas condições particulares de vida de Walden Two. Um detalhe interessante é o direito de todos os membros, casados ou não casados, de viver em quarto individual. É claro que náo há nenhuma obrigação e, de fato, al-
guns casais preferem viver sob o m esmo teto, m as geralmente os indivíduo s casados continuam a viver mais ou menos permanentemente em seu próprio quarto. Muitos de nossos visitantes supõem que uma comunidade significa o sacrifício da privacidade. Pelo contrário, possibi litamos cuidadosamente muito mais privacidade pessoal do que provavelmente se encontra no resto do mundo. Pode-se ficar sozinho aqui sempre que se deseja. O quarto de um ho mem é seu castelo. E o de uma mulher também,168 Isso se assemelha à preocupação de Virg inia Woo lf, simbolicam ente apreendida no título de seu ensaio feminista A roorn ofones ow n.^ O direito à residência indivi dual» talvez de form a paradoxal, co ntribui pa ra fidelidade e afeição duradouras. N ão elimina a atração possível em relação a outros parceiros sexuais, com os problemas resultantes para o parceiro abandonado. Entretanto, outros aspectos da vida diária ajudam a resolver esses problemas e a reduzir as consequências indesejáveis. Rela cionamentos amigáveis e afetuosos entre pessoas de sexos opostos são amplamente encorajados e ninguém espera que eles levem, via de regra, à intimidade sexual. (De novo, lembre-se que estamos em 1945!) É claro que algumas vezes isso acontece, mas, neste caso, o parceiro abando nado não corre o risco de repentinamente se encontrar completamente isolado e perdido no mundo. Normalmente, a pessoa estabeleceu muitos laços afetivos altamente satisfatórios com os membros da comunidade, que compensam a perda da pessoa amada. Além disso, a pessoa está protegida de qual quer tipo de fofoca: fofocar sobre assuntos da vida privada é algo totalmente desco nhecido em WaldenTwo (uma proposição tipicamente utópica!). Por outro lado, a educação no campo da afetividade objetivou reduzir senti mentos de ciúme, de falha irreparável, de perda de autoestima. Atenuar algumas formas de reações emocionais tem vantagens além do domínio do amor. Contribui para minimizar as tensões interindividuais bem como os conflitos internos. Como a maior parte dos psicólogos modernos, Skinner reconhece o valor estimulante de um certo nível ideal de despertar de emoções positivas, como alegria ou amor; mas ele também enfatiza insistentemente as consequências geralmente negativas da raiva, do ódio, da dor e do medo. Tais emoções sem dúvida tiveram uma função na evolução remota dos seres humanos, ou de seus ancestrais biológicos, mas não são mais úteis na vida moderna. Como podem tais emoções e sentimentos relacionados ser redu zidos? Exortar as pessoas a não se entregar a eles não funcionará e puni-las também não será muito efetivo. Devem-se arranjar condições nas quais esses sentimentos e 268 ld. íbid., p. 139. 269 W oo lf(1929).
emoções não ocorrerão. Por exemplo, para cada escolha crucial da vida, como esco lher uma profissão ou um parceiro afetivo, a cada indivíduo deveriam ser oferecida* várias possibilidades atrativas: O fato é que é muito improvável que qualquer um em Waiden Two coloque seu coração tão firmemente em uma dire ção que o torne infeliz se não for bem-sucedido. Isso é válida para a escolha de uma garota ou de uma profissão. O ciúme é quase desconhecido entre nós e por uma simples razão: nós possibilitamos uma ampla experiência e muitas alternativa» atraentes. O sentimento terno de “único” tem menos a vei com a constância do coração do que com a singularidade de oportunidade.170 Isso não implica que conseguimos tudo o que queremos. Claro que não. Mas o ciúme não ajudaria. Em um mundo competitivo, há alguma vantagem nele. Ele dá energia para se enfrentar uma condição de frustração. O impulso e a energia adicional são uma vantagem. De fato, em um mundo com petitivo, as emoções trabalham muito bem. Veja a singular falta de sucesso do homem acomodado. Ele desfruta de uma vida mais serena, mas é menos provável que seja frutífera. O mundo não está pronto para simples pacifismo ou humildade crista, para citar dois casos relevantes. Antes que você possa, com segurança, dispensar as emoções destrutivas e desneces sárias, deve estar certo de que elas não são mais necessárias. “Como teremos certeza de que o ciúme náo é necessário em Walden Two?” , eu disse. “ Em Walden Two, os problemas náo podem ser resolvidos por meio de ataques aos outros”, disse Frazier em caráter definitivo.171 Voltemos à família. O casamento em Walden Two geralmente ocorre muito mais cedo que em nossa sociedade, mas deve ser relembrado que a educação leva os adolescentes muito mais cedo à idade adulta. Os planejadores de Walden Two não estão muito preocupados com as possíveis consequências do casamento precoce no crescimento populacion al (na época em que a contracepção não era tão simples nem tão difundida com o atualmente). 17 0 Skin ner (1948, p. 54). 271 Id. ibid., p. 102-103.
Não é soluçáo para o problema malthusiano diminuir a taxa de natalidade daqueles que o entendem. Pelo contrário, preci samos expandir a cultura que reconhece a necessidade do con trole de natalidade. Se você argumentar que nós deveríamos dar um exemplo, você deve provar para mim que nós todos náo seremos extintos antes de o exemplo ser seguido. Não, nosso programa genético é vital. Não nos preocupamos com a taxa de natalidade, ou suas consequências,1’ 1 A estrutura co m un itária de Walden Two certam ente enfra quece as relações entre pais e filhos. Mas esse não é, de forma alguma, um subproduto indesejável: as relações familiares são tradicionalmente muito fechadas e muito restritivas para garantir uma educação adequada para todas as crianças. O lar familiar, com os pais exaustos de seus trabalhos e com frequência completamente despreparados para suas responsabilidades educacionais, não é lugar ideal para se educarem as crianças. Laços afetivos, quando são muito próximos e muito complexos, são fre quentem ente fonte de conflitos e, po r fim, de problem as persistentes. Apesar dessas dificuldades, a exclusividade da célula familiar é causa de frustração para aqueles que estão privados dela: crianças sem pais e adultos sem crianças. Em Walden Two, os tipos de laços afetivos que são típicos das relações entre pais e filhos se estendem a todo o grupo e são típicos das relações entre adultos e crianças. Ser órfão ou filho de pais separados não é mais um trauma. D e fo rma similar, a esterilidade não é uma maldição: ela não impede que as pessoas se relacionem com as crianças, de forma tão variada e gratificante como o fariam os pais naturais. Nesse contexto, a esterili dade deliberada, estritamente voluntária, da parte dos indivíduos que apresentam riscos genéticos, não aparece como uma renúncia dramática. Dá-se menos ênfase aos laços sanguíneos, em favor dos laços afetivos de natureza mais psicocultural. A filiação biológica pode, por fim, ser ignorada. E sobre o perigo de as relações frouxas, distanciadas, entre crianças e seus pais, terem efeitos adversos sobre o desenvolvimento da personalidade, sobre os processos de identificação, sobre os sentimentos de segurança, sobre todos aqueles aspectos do bem -estar psicológico geralmen te considerados como derivados da qualidade do cuidado parental? Frazier corretamente observa: Sabemos muito pouco sobre o que acontece na identificação. Ninguém nunca fez uma análise científica cuidadosa. A evi dência não é verdadeiramente experimental. Vimos os proces sos em funcionamento apenas em nosso padrão de estrutura 17 2 ld. ibid., p. 136-137.
familiar. O modelo freudiano pode se dever às peculiaridadi daquela estrutura ou mesmo às excentricidades dos membio da família. Tudo o que realmente sabemos é que as criança tendem a imitar os adultos em gestos e maneirismos e em atitudes e relações pessoais, Elas fazem isso aqui, mas se a a trutura familiar for modificada, o efeito será muito diferente Nossas crianças são cuidadas por diferentes pessoas. Não i cuidado institucional, mas afeição genuína. Nossos membrai não trabalham exageradamente e não são forçados a trabalhai em algo em que não têm qualquer talento ou inclinação. O que a criança imita é um tipo de adulto feliz essencial.273 O leitor familiarizado com a psicologia terá notado a ênfase na distinção entre “cuidado institucional”, que é o tipo de cuidado que uma criança provavelmente receberia na melhor creche possível, num hospital infantil, etc. e “afeto genuíno". Com poucas exceções, especialistas em cuidados infantis e psicólogos do desenvol vimento não estavam realmente conscientes da distinção até o famoso relato de Bowlby sobre cuidados maternos e saúde mental, publicado em 1951. Walden Two foi escrito, lembre-se, em 1945. E o autor não tinha qu alquer qualificação acadêmica em cuidado e desenvolvimento infantil, sendo conhecido como “psicólogo de rato”. Skinner também antecipou a evolução posterior das práticas educacionais na sociedade americana em relação ao papel dos adultos homens. Em Walden Two, os adultos especificamente encarregados das jovens crianças pertencem a ambos os sexos e o equilíbrio entre eles foi cuidadosamente observado na creche, bem como na escola. Desse modo, problemas resultantes da relação assimétrica com a mãe estão eliminados. Para as crianças nascidas e criadas na comunidade de Walden Two, os senti mentos de insegurança são desconhecidos, tão comuns entre as crianças criadas por uma “mãe estressada ou passional, ou que vivem com pais briguentos, ou que são mandadas para a escola sem estarem preparadas para os ajustes necessários, ou que são deixadas para se arranjar com crianças de diferentes níveis culturais”.174 Substituir a comunidade pela família mudou drasticamente as condições das vidas das mulheres. Ou, mais precisam ente, a preocupação co m o status das mu lheres na sociedade levou o fundador de Walden Two a modelar um novo estilo de relacionamento conjugal e parental. Essa preocupação era a preocupação de Fred Skinner e pode ter sido sua principal motivação para escrever Walden Two. De fato, está listada em primeiro entre as “insatisfações pessoais” que o levaram a se voltar
273 Id. ibid., p. J44-145. 274 ld. ibid., p. 145.
para esse gênero literário não usual. Estas são suas próprias palavras no prefácio da nova impressão de Walden Two, publicada em 1976: Eu tinha visto minha esposa e suas amigas lutando para se livrar da vida doméstica, fazendo caretas de aversão quando imprimiam “dona de casa” nos espaços das fichas para pedido de emprego.175 Sem consentir interpretações psicológicas que não têm lugar neste livro, acredi to ser impo rtante m encionar um detalhe, para mostrar quão persistente foi essa pre ocupação para Skinner. O prefácio de 197 6 foi reimpresso em uma coleção de artigos publicada em 1978 com o título de Reflections on behaviorism and society; o livro é dedicado à sua esposa, Eve, em uma pequena dedicatória, metade em francês, “Para Eve, renée” - “renée”, um adjetivo e um nome próprio, que significa “renascida(o) A im portância do tema do status das mulheres em Walden Two, poucos anos antes de Kate Millet e o Movimento de Liberação Feminina, foi amplamente ignorado e isso faz a citação de alguns parágrafos das palavras de Frazier apropriada: O mundo teve algum progresso quanto à emancipação das mulheres, mas a igualdade ainda está muito distante. Há pou cas culturas atualmente nas quais os direitos das mulheres são respeitados. A América é um dos talvez três ou quatro países nos quais algum progresso foi feito. Mesmo assim, muito poucas mulheres americanas têm a independência econômica e a liberdade cultural dos homens americanos. O que o casa mento comum de classe média acrescenta? Bem, concorda-se com que o marido irá fornecer proteção, vestuário, alimenta ção, e talvez algum divertimento, enquanto a esposa trabalha rá como cozinheira e faxineira e dará à luz e criará as crianças. O homem é racionalmente livre para escolher ou mudar de trabalho; a mulher não tem escolha, a náo ser aceitar ou negli genciar seu destino. Ela tem uma reivindicação legítima para apoio, ele tem uma reivindicação legítima para um certo tipo de trabalho. Para tornar a questão pior, educamos nossas mulheres como se elas fossem iguais e lhes prometemos igualdade. Não é de se espantar que elas sejam rapidamente desiludidas? A solução atual é reviver os slogans e sentimentos que fizeram 175 Retirado do texto reimpresso em Reflections on behaviorism and society (id., 1978, p. $6).
o sistema funcionar no passado, A boa esposa deve conside rar uma honra e um privilégio trabalhar na cozinha, fazer as camas todo dia, dar banho nas crianças. Eia é levada a acredirar que ela é necessária, que ela tem a responsabilidade pelo cuidado da felicidade e da saúde de seu marido e tam bém das crianças. Esse é o tratamento antiquado da dona de casa neurótica: reconciliá-la com o seu destino! Mas a mu lher inteligente vê além disso, não importa quão dificilmente ela queira acreditar. Ela sabe muito bem que outra pessoa poderia fazer as camas, fazer a comida e lavar a roupa, e sua família não veria diferença. O papel de mãe ela quer desem penhar por si mesma, mas isso não tem mais ligação com seu trabalho diário do que o papel do pai com seu crabalho no escritório, na fábrica, ou no campo. Aqui, não há razão para sentir que ninguém depende de ninguém. Cada um de nós é necessário na mesma medida, que é muito pequena. A comunidade permanecerá tão tran quila amanhã, mesmo que um de nós morra hoje à noite. Não podemos, portanto, obter muita satisfação por se sentir importante. Mas há satisfações que compensam. Cada um de nós é necessário enquanto pessoa à medida que somos amados como pessoas. Nenhuma mulher sente satisfação de sentir que fará falta tanto quanto uma cozinheira que partiu ou uma lavadeira. Em um mundo de completa igualdade econômica, você obtém e mantém os afetos que você merece. Você não pode comprar o amor com presentes ou favores, não pode manter um amor criando uma criança inadequada e não pode estar seguro no amor servindo como uma boa lavadeira ou um bom provedor.276 As dificuldades encontradas para tran sformar profu ndam en te o status da mu lher não foram ignoradas pelo fundador da comunidade: Aqueles que afirmam ganhar mais são mais difíceis de con vencer. Isso também é verdade para o trabalhador explorado e pela mesma razão. Ambos foram mantidos em seus lugares,
náo por força externa, mas muito mais sutilmente por um sistema de crenças implantado dentro de suas peles.277
Incidentalmente, o leitor terá notado a referência behaviorista à internalização...
A DEMOCRACIA É DEMOCRACIA? Esses sáo apenas alguns poucos aspectos da vida em Walden Two, naquela pe quena fração da humanidade que afastou com sucesso a maldição do trabalho e utilizou o tempo ganho dessa forma com atividades criativas. Eu náo revisei todos os detalhes da visita, durante a qual, fortuitamente, nunca encontramos bêbados, ou delinquentes, ou depressivos. Não vimos nenhuma prisão ou hospital psiquiátrico, náo porque a visita guiada estaria restrita aos lugares de interesse oficialmente defi nidos como tais para os visitantes, mas porque simplesmente não há nenhum. De onde vem essa harmonia ideal? Quem governa, e como? Contrário à maioria dos sonhos sociais, a Utopia de Skinner não se fundamenta em virtudes inatas da natureza humana, até então inutilizadas ou reprimidas. Skin ner não acredita em tais virtudes, náo mais que nos vícios incuráveis. As virtudes, bem como a felicidade, emergem das condições nas quais as pessoas vivem. Essas condições favoráveis não podem ser definidas de antemão e de uma vez por todas na fórmula absoluta de uma ideologia. Elas devem ser buscadas posteriormente e de forma empírica e permanentemente reajustadas, Walden Two não é governada com base em uma doutrina política, mas em uma atitude experimental. Por causa disso, enquanto organização comunitária, ela nunca para de mudar e de ser mudada, pois seus membros nunca param de mudar seus hábitos comportamentais. Qualquer problema que surja é solucionado por meio de tentativas e a solução dada está sempre aberta à correção, de acordo com os resultados observados. Se ela se mostra inapropriada —isto é, se as pessoas interessadas não estão satisfeitas com ela - outra solução será buscada e experimentada. C omo no laboratório, os sujeitos estão sempre certos: se eles não se comportam como esperado ou desejado, não po dem levar a culpa; os administradores - ou experimentadores - são os responsáveis por suas predições ruins. A pesquisa por condições ótimas, favoráveis ao equilíbrio de toda a comuni dade por meio da satisfação de cada um de seus membros, está na mão de um time de planejadores ou gerentes. Seu cargo especial lhes é imposto apenas por sua com petência. Eles não são expostos às tentações comuns dos políticos obcecados pelas 277 Id. ibid-, p. 148.
próximas eleições: seu trabalho é estritamente limitado no tempo, a um máximo de io anos. Em qualquer caso, que tipo de privilégios eles poderiam pensar em manter? Dinheiro está fora de uso em Walden Two; propriedades individuais não existem; obras de arte estáo disponíveis a todos; cada m emb ro tem bastante tempo livre para o lazer; e os indivíduos com o papel de gerenciar as responsabilidades não recebera qualquer atenção especial ou honraria. E se há qualqu er satisfação verdadeira em do min ar outras pessoas, não há lugar para isso, porqu e força e coerção foram excluídas dos princípios sóbre os quais Walden Two é administrada. Os administradores, cujas qualidades pessoais e virtudes foram modeladas pela educação e são mantidas pelas circunstâncias atuais, não foram escolhidos pelo voto popular. Walden Two não é um regime democrático, no sentido em que os estados modernos, e especialmente os Estados Unidos, são chamados de democráticos. Frazier (ou Skinner) denuncia vigorosamente a ilusão democrática, a “fraude sagrada”, um “arremedo”, no qual votar se tornou um “instrumento para culpar as pessoas pelas condições” ; no qual a única garantia é que a maioria não será despoticamente governada”; no qual “a maioria resolve o problema de acordo com sua satisfação e a min oriapod e se dana r” ; no qual as pessoas não são convidadas a votar ‘ por um dadoestado decoisas, mas por um homem que afirma estar apto a alcançar aquele estado” / 78 C om certeza, se os países democráticos aparecessem como regimes democráticos reais, nos quais os representantes fossem realmente eleitos por sua competência e estivessem de fato sob controle dos eleitores, poderíamos estar perto da sociedade ideal. Mas a maioria dos estados modernos oferece apenas a caricatura daquele ideal: O governo de Walden Two possui as virtudes da democracia, mas nenhum dos defeitos. Está mais próximo da teoria ou da intenção da democracia do que a prática real na América atual. A vontade das pessoas é cuidadosamente averiguada. Não temos campanhas eleitorais para falsificar questões ou obscurecê-las com apelos emocionais, mas um estudo cuida doso da satisfação com a vida comunitária é realizado. Cada membro tem um canal direto através do qual ele pode pro testar com os Gerentes ou mesmo com os Planejadores. E esses protestos são levados táo a sério quanto o piloto de um avião o faz quando o motor faz um barulho sinalizando que há algo de errado. Não precisamos de leis ou de força policial que nos levem a prestar atenção em um motor defeituoso. Também não precisamos de leis para que o gerente de uma
fábrica de laticínios preste atenção em uma epidemia ocor rendo entre as vacas. De forma semelhante, nossos Gerentes Comportamentais e Culturais náo precisam ser levados a considerar as queixas. Uma queixa é uma roda a ser lubrifica da ou um cano quebrado a ser consertado.179 A democracia, com o a vivemos no mundo ocidental, demon strou suas vanta gens sobre sistemas políticos baseados na força e na exploração. Mas ela teve o seu tempo, ao menos na forma que tomou, e devemos estar conscientes de suas limitações atuais e estar prontos para irmos além delas se de fato quisermos enfrentar os proble mas que mesmo a coerçáo pode não ser capaz de resolver. O que está errado com a atual democracia é que ela é baseada em uma concepção errônea da natureza hum ana; A filosofia do laissezfaire, que confia na bondade inerente e na sabedoria do homem comum, é incompatível com o fato ob servado de que os homens se tornam bons ou maus, espertos ou insensatos de acordo com o ambiente em que cresceram.1®0 Inevitavelmente surge a questão, e ela aparece na conversa entre o fundador da comunidade e seus visitantes: isso não é Fascismo? Se adotarmos a liberdade semântica tão comum no discurso político atual e utilizarmos a palavra de forma não crítica para nomear qualquer tipo de organização social que diverge da pseudodemocracia ocidental ou dos sistemas pseudoigualitários de obediência Marxis ta que colapsaram recentemente, como uma “forma conveniente de acabar com qualquer tentativa de melhorar uma democracia laissezfaire” , então, talvez, Walden Two devesse ser rotulada de “fascista”. Se, entretanto, sentirmos ser mais apropriado reservar o termo para designar regimes totalitários, geralmente baseados no poder individual ou oligárquico, recorrendo à força ou exploração de um grupo sobre os outros como princípios fundamentais de governo, então ele náo pode seriamente ser aplicado a uma pequena comunidade onde uma porção de homens e mulhe res tem o cargo, por um período limitado, e sem qualquer benefício pessoal, de administrar a vida pública pela satisfação de todos recorrendo exclusivamente ao uso de consequências positivas. Quando um estágio é alcançado em que os regimes democráticos não estão mais aptos a resolver efetivamente os problemas dos quais depende a sobrevivência da sociedade, a melhor estratégia para o totalitarismo é manter a ilusão de democracia.
279 Id. ibid., p. 269. 280 Id. ibid., p. 273.
Algun s irão insistir que é fascismo apesar do fato de que não há déspotas, nem exploração, todos os membros são iguais e recebem sua parte na riqueza comum, os direitos do indivíduo são respeitados, as pessoas são felizes; fascismo porque todas essas características da organização social são consequência de um arranjo delibera do, ao invés de ser produto de livre escolha. Liberdade: aqui está a palavra mágica, a principal objeção. O conceito está claro o bastante para se recusar a entrar em Waiden Two? Em que medida os sistemas sociais que estamos mantendo realmente se baseiam na liberdade? E o que exatamente queremos dizer com liberdade? Não é necessário ler pesados tratados de filosofia para entender que a palavra não abrange um conceito único, consistente. E necessário apenas ouvir as declarações dos candidatos no dia anterior à eleição presidencial. Skinner não elaborou uma análise da liberdade em Waiden Two. Ele dedicaria a isso, um quarto de século mais tarde, seu ensaio Beyondfreedom and dignity . De vemos voltar a este livro no próxim o capítulo para ap rofundar sua visão sobre esse problema central. Contudo, ele já modelou as premissas nas palavras de Frazier. Tao Jogo se aceite observar a cond uta hum an a de maneira científica, espera-se que ela obedeça a leis. Então, a questão é: que leis regem aqueles comportamentos, aquelas situações, aqueles sentimentos e ideias aos quais, com vários sentidos de acordo com o tempo e o lugar, o termo liberdade se aplica?
15 LIBERDADE, FINALMENTE...
Psicologia: a ciência ambivalente Skinner tinha 75 anos quando publicou um ensaio que tornou seu nome am plamente conhecido entre os leitores leigos. O título era provocativo e pode ter estimulado reações negativas ao livro: Beyondjreedom and dignitf*' soou como uma negação de dois valores básicos de nossa sociedade. Liberdade é um termo mágico, com um sabor de absolutismo; nós preferimos pensar que nada pode estar, que ninguém pode ir além da liberdade. “Além” não estava originalmente no título. Enquanto estava preparando o li vro, Skinner se referia a ele simplesmente como “ Liberdade e Dignid ad e” . Ele o menciona frequentemente, com esse título em suas anotações entre 1965 e 1970. A mudança veio, e isso ocorre com frequência, após uma discussão com a editora. Skinner sugeriu, como um título mais apropriado, o que acabou aparecendo na capa. Como ele diz em sua autobiografia, ele estava consciente de que estava pegando emprestado do Além do bem e do mal , de Nietzche, e do Além do princípio do prazer, de Freud. Parecia certo, Gotdieb [o editor] gostou, e deixamos ficar. Provavelmente foi responsável por grande parte da con trovérsia sobre o livro e muito possivelmente por seu sucesso. Contudo, é ilusório. Enquanto cientista, eu não penso nas pessoas como agentes iniciadores livres a serem honradas por suas conquistas. Mas eu estava propondo mudanças nas prá ticas sociais que as fariam se sentir mais livres como nunca e conquistar ainda mais.282 De um ponto de vista científico, interessado na busca de determinantes para o que ocorre na natureza, o conceito de liberdade sempre foi um enigma. Muitos 281 N . T.: “Além da liberdade e da dignidade” , cuja versão foi publicada em português sob o tículo de O mico da Uberdade. 282 Skinner (1983, p. 310-3 11).
cientistas nos campos das ciências n aturais, tais com o a física e a quím ica, deixaram a questão para os filósofos ou teólogos, admitindo que eles não possuem, a partir da informação em seu próprio domínio, o conhecimento necessário para decidir; eles não descartam a ideia de que os humanos são feitos de uma matéria diferente e escapam das restrições das leis naturais. Muitos outros, ao mesmo tempo em que não entram em aspectos técnicos do debate, assumiriam que os seres humanos, sendo parte da natureza, obedecem a leis naturais. O problema se torna crucial, é claro, na ciência psicológica, p orque um cam po dificilme nte pode ser uma ciência se seu objeto de estudo não é abordado com a hipótese de que pode ser descrito e ex plicado com base em regular idades. Desse mo do, poderia parecer que qualquer um que se defina como um p sicólogo científico deveria pertencer à segunda categoria de cientistas - aqueles que assum em qu e as ações hum anas podem ser explicadas causalmente. Na verdade, muitos psicólogos estão mais próximos da primeira categoria, e enquanto eles usam discurso aparentemente científico, paradoxalmente mantêm a crença de que as ações humanas provêm das decisões autônomas do self, do agente interno ou de algum núcleo irredutível do sujeito, não passível à explicação cientí fica. O debate foi intenso ao longo da história da psicologia, mas talvez esteja mais intenso que nunca. De fato, ele reapareceu, explicitamente ou não, na maioria das discussões filosóficas sobre inteligência artificial versus natural. Skinner, é claro, está, sem dúvida, entre aqueles para quem a ciência psicológica não pode ter outro objetivo senão a busca das relações causais no com portam ento (ou, em relação àquele assunto, na cognição). Para dtá-lo novamente: “Enquanto cientista, eu não imagino as pessoas como agentes iniciadores livres” .28’ Abordar a psicologia como uma ciência implica um a postura determinista, quaisquer que sejam as mud an ças por que passou o conceito de determinismo n o século X IX . Tal posição de Skinner não deveria nos incomodar mais do que a de qualquer outro psicólogo científico. Se incomoda, é porque ele a levou explicitamente às úl timas consequências lógicas, algo que poucos fizeram. Não é incomum para psicó logos aplicar sua crença científica dentro de seu laboratório, ao estudar problemas bem definidos e limitados, mas ignorar as implicações de sua escolha no nível de uma teoria geral da conduta humana; se questionados, provavelmente não se com prom eteriam a apostar na afirmação da ciência, ao contrário, estariam prontos a dar crédito a visões alternativas, como aquelas filosoficamente orientadas propostas sob o título de fenomenologia ou psicologia humanista. Como Konrad Lorez afirmou: Provavelmente a razão pela qual as pessoas temem tanto as considerações causais é que elas estão aterrorizadas com medo
2^3 N . T.: não há citação desta no originaJ.
de que a percepção das causas dos fenômenos materiais possa expor o livre arbítrio como uma ilusão/84
Um
conceito flex íve l
A palavra liberdade é utilizada atualm ente e foi usada no passado recente com significados diferentes e igualmente mal definidos. Ela é parte dos slogans políti cos nos mais diversos e opostos lados e é utilizada como argumento comercial na propaganda de todos os tipos de produto, sejam carros, roupas ou cigarros, com várias, mas igualm ente atrativas, cono tações. Em no me da liberdade, nações e gr u pos lutaram para se emancipar ou para impedir que outros se emancipassem. A mesma palavra se aplica a questões de privacidade individual, de direitos humanos, de economia de mercado, de possibilidades de escolha ao comprar bens, ao escolher uma companhia ou uma residência, ao utilizar o próprio dinheiro, se engajar em esportes de risco, dirigir em alta velocidade nas autoestradas, etc. E óbvio que ela não se refere a nenhuma propriedade unificadora comum a contextos e situações táo díspares. Ao se deparar com tal estado de coisas, um linguista legitimamente se engajaria em uma investigação semântica, a fim de caracterizar todos esses diferentes usos da mesma palavra, para traçar a origem de cada uso particular na história pas sada de nossas linguagens e de nossa cultura. U m psicólogo é igualmente habilitado para conduzir uma investigação sim ilar e para buscar a história natural e cultural da liberdade. Foi exatamente isso que Skinner tentou, com a consequência de que ele veio a de nu nc iar muitos dos mitos vinculados ao co nceito em nossa autoim agem e em nossos sistemas políticos e sociais. Beyondfreedom and dignity não é uma des truição, nem uma negação de algumas coisas importantes às quais essas palavras se referem, é um ensaio que visa a analisar lucidamente do que trata a liberdade, ao identificar algumas das contradições em nossa paixão pela liberdade, ao alertar a humanidade sobre a possibilidade de consequências autodestrutivas de nossa vene ração acrítica pela liberdade e ao ajudar os seres humanos a se sentirem mais livres, enquanto perm anecem conscientes da importância de perpetuar tal sentimento para as gerações futuras.
L ib er d a d e pa r a g a n h a r . .. ou p e r d e r
Essa é, em resumo, a mensagem de Beyond freedom and dignity. Ela será retoma da com alguma profundidade mais à frente, mas, antes de extrair a essência daquele
controverso livro, é necessário mencionar um texto mais simples sobre liberdade, porque ele compreende, em um estilo irônico e na forma de parábola, parte da análise encontrada em Beyond freedom and dignity. O artigo de duas páginas foi publicado no New York Times em 1977 com o título de “Freedom, at last, from the burden o f taxation” .185 E sobre algo familiar a muitas pessoas que vivem na Europa, tanto quanto, senão mais, para aquelas que vivem na América, i.e., as loterias. Feitas pelo estado, com o bem se sabe, sáo outra form a de arrecadar dinheiro dos cidadáos, que parecem aceitá-las mais prontam ente que aos impostos. Sk inner argumen ta ironicamente que o recurso às loterias poderia muito bem ser desenvolvido a tal ponto que permitiria nos livrarmos dos impostos e que as loterias poderiam ser utilizadas extensivamente pelas agências, como o Pentágono, que precisam de muito dinheiro, mas que não gostam de ser controladas de perto sobre a finalidade do dinheiro. Apontando para o fato de que as pessoas não nascem jogadores, mas se tornam jogadores se expostas a contingências apropriadas, ele sugere que nós deveríamos treiná-las desde cedo a participar “voluntariamente”, financiando o estado e todas as possíveis agências. Esse é um caso extremo de uma ilusão de liberdade nos indivíduos de fato fortemente induzidos a dar “livremente” —ao menos até onde vão seus sentimentos —muito mais dinheiro do que dariam através de um a obrigação (aversiva) para o pagam ento de taxas. Para um observador, as condições responsáveis pelo comportamento de jogo estão claras o suficiente e paradoxalmente o comportam en to é man tido apesar do fato de que, no total, as perdas excedem de longe os ganhos. Isso aponta para a força do reforçamento intermitente, esticada ad infinitum nos seres humanos graças à sua capacidade mental de antecipar possíveis recompensas que, na realidade, nun ca acontecem. O jogo pode evoluir para algo próximo ao vício, outro caso que ilustra a ambiguidade das relações entre os conceitos de causação, reforçamento negativo ou positivo, controle e liberdade. Uma diferença fundamental entre as loterias e os impostos é que comprar bi lhetes é sentido como uma ação espontânea iniciada pela decisão do indivíduo, en quanto o imposto de renda é estabelecido exteriormente e deve ser pago, gostemos ou não. Os organizadores dos jogos e das loterias populares estimaram corretamente quão importante é para as pessoas sentir que controlam suas próprias ações. O su cesso das loterias numéricas ou bingos é provavelmente devido ao fato de que, ao escrever os números de sua escolha, os jogadores sentem que estão controlando a sorte com mais certeza do que se comprassem um bilhete no qual o número já está impresso. De forma parecida, sentimo-nos livres quando vamos fazer compras e levamos todos os tipos de bens de luxo, embora seja do conhecimento de todos, talvez do nosso próprio conhecimento, que nosso comportamento de consumir é 285 O artigo foi reimpresso e m Reflections on behaviorism and society, capítulo 18 ( S k i n n e r , 1978}.
em parte determinado pelas campanhas publicitárias. O mesmo é verdade quando elegemos líderes políticos: quaisquer que sejam os fatores, em alguma medida bem identificados, que controlam externamente nossa decisão, o simples fato de que escrevemos nossa escolha e a colocamos na urna é subjetivamente suficiente para preservar a sustentação da liberdade.
A QUESTÃO DA UBERDADE E 0
FUTURO DO MUNDO
Para Skinner, o que está em questão em uma análise crítica do conceito de liber dade não é apenas um velho problema filosófico ainda debatido entre os psicólogos modernos. É nada menos que o futuro do mun do. O livro Beyondjreedom and dignity não começa com uma apresentação acadêmica das várias visões sobre os conceitos mencionados no título. Ele é aberto com uma evocação dos “terríveis problemas” com os quais a humanidade se depara, i.e., explosão populacional, holocausto nu clear, fome mundial, poluição do meio ambiente, esgotamento dos recursos. Os seres humanos não parecem estar realmente prontos para lidar com isso de forma eficiente e consistente. Mesmo assim, eles possuem as ferramentas tecnológicas que permiti riam a solução, ao menos em parte, desses problemas. O crescimento demográfico pode ser diminuído com o controle de natalidade, a fome pode ser aliviada com a melhor distribuição da comida disponível e as lavouras podem ser melhoradas com uma política agrícola adequada, a poluição ambiental pode ser reduzida com solu ções alternativas na indústria, transporte e produção de energia. São feitos esforços na direção correta, mas eles parecem irremediavelmente fora de proporção em re lação aos crescentes problemas que tentam enfrentar. Tal incapacidade, argumenta Skinner, não é devida à nossa falta de possibilidades técnicas; ela decorre de nossa relutância a nos colocarmos nas perspectivas corretas. Insistimos em nos enxergar como criaturas privilegiadas dotadas de poder ilimitado sobre o mundo à nossa volta e em traçar linhas de ação a partir de nossas mentes, por meio de processos de livre arbítrio. Embora esteja claro que todos os problemas dramáticos que enfrentamos hoje não podem ser resolvidos a menos que os seres humanos mudem drasticamente seus comportam entos, ainda recorremos à boa vontade e à mudança de mentalidade como se fossem pré-requisitos para alcançar as soluções. Somos cegos ao fato de que tal recurso à “mudança de m entalidade” tem sido a estratégia tradicional, mas que ela falhou com pletamente e ela falhou porque os comportamen tos não são subprodutos da vontade ou da mente humana: eles são os resultados da interação dos seres huma nos com o seu ambiente. A consciência a respeito dessa interdependência básica é a condição inicial para resolvermos os problemas contemporâneos, antes que seja tarde demais. Considerando que os seres humanos não aceitarão que eles não são seres perfeitamente autônomos, agindo a partir de uma iniciativa interna soberana, eles
estarão expostos a tornar seu próprio mundo gradativamente mais perigoso para si mesmos enqu anto creem que ainda o estão controlando em benefício próprio. O próprio Skinner apo ntou que essa visão dos seres hum anos é responsável por mais um ferimento à autoestima, depois daqueles feitos por Copérnico, Darwin e Freud. Não foi fácil aceitar que a Terra não é o centro do universo, ou que a huma nidade não nasceu diretamente das mãos de Deus, mas que evoluiu depois de um longo processo, com formas simples de vida evoluindo para formas complexas, e nenhuma delas com direito à eternidade. Ao menos Copérnico e Darwin não aba laram nosso orgulho de sermos seres verdadeiramente racionais, até que Freud nos mostrou que o que fazemos, sentimos e até mesmo pensamos se deve à confusão de forças emocionais obscuras ao invés de sermos governado pelo exercício consciente da razão. Mas a autonomia, em certo sentido, foi preservada: tudo o que vem de dentro, das profundezas de nosso ser, todo o restante do nosso “self ” se mantendo indomado pela racionalidade. Skinner dá o próximo golpe: razão ou paixão, somos o resultado comportam ental das interações entre nosso organism o físico, com o dado no n ascimento, e o am biente físico e social no qual nossa história individ ual ocorre. De forma alguma nossos comportamentos emergem de alguma liberdade individual toda poderosa e misteriosa. Tal mudança não é facilmente admitida, especialmente porque a liberdade se tornou um conceito mágico. Ela tem sido usada na história recente da humani dade para eliminar restrições óbvias, mas ela pode se revelar, por sua persistência fetichista, o obstáculo verdadeiro para nos libertarmos dos perigos que ameaçam a sociedade moderna e possivelmente a própria espécie humana. É preciso tentar descrever, depois de Skinner, a que tipos de “situações comportamentais” se refere o conceito d e liberdade.
A LUTA PELA UBERDADE.' UMA HISTÓRIA NATURAL E CULTURAL Em um nível muito simples, os animais obviamente agem para escapar de al gumas situações, que lhes são presumivelmente aversivas. Por exemplo, eles se esqui vam dos estím ulos de dor. Dessa form a, eles se “libertam” da dor; de form a sim ilar, de restrições físicas não usuais, que os tornam vulneráveis ao perigo. Eles também agem para evitar situações que podem causar dor. Se, por alguma razão, as respostas adaptativas chamadas de fuga ou esquiva são evitadas, pode-se dizer que o animal tem sua liberdade limitada. Mas deveríamos colocar isso ao contrário e dizer que o conceito de liberdade tem suas raízes biológicas no comportamento primitivo de fuga ou esquiva. A espécie hum ana teve sua parcela de situações aversivas e uma grande parte de seu desenvolvimento cultural consistiu em uma fuga progressiva delas. As tecnolo
gias humanas mais antigas foram delineadas para enfrentar predadores, proteger do mau tempo, seja o frio ou o calor extremo, ou para curar doenças e assim por diante. O ambiente cultural, por sua vez, implicou, provavelmente desde muito cedo, vários controles aversivos de natureza social e não física. Investigadores da história e da pré-história podem, algumas vezes, traçar sua origem de forma plausível. Na maioria das estruturas políticas, alguns grupos ou indivíduos sofrem controles aver sivos de outros: uma casta ou classe explora a outra como força de trabalho com a ameaça de castigos, privação de comida ou salário, ou de exclusão da felicidade após a morte. O poder político fortalece a lei aplicando multas, colocando na cadeia, suprimindo bens ou privilégios. Não há dúvida de que esses controles aversivos de origem cultural levam a respostas de fuga ou esquiva similares àquelas provocadas por estimulação aversiva física. Os movimentos pela liberdade que emergiram em muitos lugares ao longo da história são, em essência, comportamentos de fuga. Eles sáo apenas muito mais complexos que as respostas animais, envolvendo complexas estruturas sociais e representações simbólicas. Eles tiveram, por fim, formulações em filosofias da liberdade ou da liberação, como aquelas elaboradas no século XVIII e depois nas sociedades ocidentais. Essas filosofias, entretanto, não limitaram seu conceito de liberdade à eliminação dos controles aversivos. Elas defendiam o direito individual de desfrutar da liberdade. Indo um passo adiante, elas definiram a liber dade não simplesmente como um direito, que implica que pode ser relacionada a situações reais —liberdade para votar, para expressar publicamente a própria opinião, para praticar uma religião, etc. mas como um tipo de característica inerente ao indivíduo que só poderia florescer completamente por meio da supressão de todos os controles. Tal exaltação de um conceito abstrato, quase metafísico, de liberdade, embora tenha contribuído positivamente para libertar as pessoas das várias restrições, teve duas consequências peculiares. Por um lado, em alguns sistemas sociais ou ideo logias políticas, contribuiu para a afirmação dos direitos ilimitados do indivíduo como um princípio fundamental que inevitavelmente gera, mais cedo ou mais tar de, novas restrições para os outros: este é o caso no direito individual ilimitado de ganho financeiro em economias de mercado completamente livres (nas quais leis e regulamentações tendem a não definir ou garantir direitos positivos, mas a limitá-los de modo a minimizar os efeitos perversos da liberdade individual). Por outro lado, o conceito passou de uma ideia perfeitamente sensata de que deveríamos nos livrar dos controles aversivos para a discutível ideia de que qualquer controle deve ser banido, ou, em outras palavras, de que todos os tipos de controle são aversivos por definição: são felizes aqueles cujas ações e pensamentos advêm livremente de si mesmos, não devendo nada a ninguém. Agora se admitimos, com base em uma análise científica, que tal autonomia é ilu sória, que a ação humana não pode ser concebida independentemente de suas origens
e consequências em um complexo ambiente social e físico, sugerir que qualquer con trole possa ser descartado como estranho à liberdade é negar aqueles fatores que de feto controlam os indivíduos quando se imagina que eles estáo livres de todos os controles. A defesa da liberdade, portanto, não significa nada além de passar para um estágio em que os controles estejam menos visíveis, entre os quais os controles aversivos se mo vem de forma sub-reptícia. Paradoxalmente, a liberdade acaba por gerar a escravidão. Os mecanismos utilizados para nos induzir ao consumo em nossa sociedade são um exemplo típico. O vício, qualquer que seja seu objeto, droga, trabalho, dinheiro, etc., refere-se exatamente a esse tipo de processo.
M é r it o
e dignidade
Voltemo-nos para a dignidade. Os seres humanos autônomos são dotados de outra propriedade: eles são louvados por suas próprias ações e pensamentos. É-lhes dado mérito se são bons e responsabilidade se são maus. Quanto mais misteriosas as proezas e mais difíceis de entender, mais ganham mérito. Contudo, ao analisar as causas, inevitavelmente retiramos o mérito e a respon sabilidade. Isso é bem visível na evolução da lei criminal. A medida que nosso conhe cimento a respeito dos fatores que contribuem para gerar os delitos se desenvolveu, a noção de responsabilidade limitada ou atenuada emergiu e alguns criminosos foram reconhecidos como não responsáveis. A responsabilidade individual foi substituída ou por fatores biológicos, como a hereditariedade ou as condições patológicas, ou por causas sociais, sejam elas o ambiente social imediato no qual o indivíduo foi criado, ou a sociedade como um todo, que permitiu que um determinado contexto social se desenvolvesse. Quando olhamos para as causas e identificamos algumas delas, não podemos mais sustentar que o indivíduo é completa e exclusivamente responsável por suas ações, cuja origem deve, obviamente, ser encontrada em outro lugar. Daí a ideia de que a repressão não traz nenhuma solução real para a crimina lidade e é, na melhor das hipóteses, um meio legítimo de autoproteção para a socie dade. Em longo prazo, a única solução real é a prevenção: ela consiste em organizar a sociedade de algum outro modo, a fim de evitar os fatores geradores do crime. Enquanto a busca por fatores causais se tornou mais ou menos aceita quando se lida com comportamento desviante, de modo que aqueles que agem assim são vistos como vítimas ao invés de culpados, não tomamos a mesma atitude quando comportamentos positivos estão em questão. Gostamos de ter o mérito total por eles. Preferimos atribuir a um bom trabalhador um senso de dever e zelo e a vontade de desempenhar bem as tarefas, ao invés de explicar a excelente performance pelo salário ou pelo status que ele proporciona, ou mesmo pelo tipo de satisfação derivada de fazer um produto de qualidade. Preferimos dizer de uma pessoa honesta que suas
boas ações surgem da virtude ao invés de relacioná-las à história educacional que construiu a pessoa ou de identificar os tipos de reforçadores que a mantêm se com portando bem. Pessoas autônomas resistem a todas as tentativas de analisar as causas de seu comportamento, de modo que podem preservar seus méritos, do mesmo modo que resistem a todos os esforços de desmistificar a liberdade, com medo de perder essa qualidade valiosa. Em suas críticas da liberdade e da dignidade, Skinner usa argumentos paralelos à sua crítica ao mentalismo na psicologia científica. A esse respeito, as visões expres sas em Beyond freedom and dignity aparecem com o u ma versão aplicada à vida diária, uma versão po lítica e social de um a das premissas centrais de seu behaviorismo. As sim como o mentalismo é o principal obstáculo para o progresso da análise científi ca, ela [a liberdade em sua forma tradicional] impede qualquer solução eficiente para os problemas que a humanidade precisa enfrentar atualmente. Ambos os aspectos são, para Skinner, fortemente relacionados.
Li b e r d a d e c o n t r a si mesma Por que a ideia de seres humanos autônomos e as noções de liberdade e dig nidade que a fundamentam são tão difíceis de erradicar? Talvez a razáo seja, como muitas filosofias e ideologias afirmam, que ela realmente define a grandeza dos seres humanos contra o reducionismo das abordagens científicas. Este argumento, para Skinner, é um disfarce para a verdade. A próp ria razão para sua persistência é o fato de ser uma ficção útil para aqueles que estão no poder. E um instrumento dos mais sutis, pois engana com a ilusão de escapar do poder. Ao longo da história humana, como já observado, recorreu-se am plam ente a controles aversivos explícitos: punições físicas e torturas sancionaram o sujeito que não se mostrava tão produtivo quanto o esperado, o culpado que se recusava a confessar o crime, o crente que passava direto da ortodoxia para a heresia, as pessoas conquistadas que se recusavam a se submeter. Os efeitos geralmente foram rápidos e evidentes, mas eles não mudaram em profundidade o comportamento dos indivíduos na direção desejada. O herege trazido de volta ao dogmatismo à força nunca será o mais confiável dos crentes, nem o escravo que trabalha sob o açoite será um colaborador confiável. Além do mais, punições são muito visíveis e produzem reações de fuga ou esquiva. Elas contêm, por assim dizer, as sementes de seu próprio fim. Seus resultados, impostos externamente à força, são alheios ao sujeito, que não é responsável por eles e não reivindica qualquer mérito. Ao contrário, o sujeito sente que sua revolta é justificada. Uma solução muito melhor consiste em tornar o controle menos evidente, menos decifrável e menos obviamente externo ao sujeito. Se, tirando vantagem das
possibilidades oferecidas pelas atividades simbólicas, os mecanismos punitivos sãoj transferidos par a dentro do sujeito, o objetivo será alcançado: o controle não ser£ menos eficiente, mas será atribuído à pessoa autônoma, que terá todo mérito ou responsabilidade por ele. Corretamente internalizada, a ameaça do inferno eterno não é menos eficiente do que a tortura imposta pelo inquisidor, e o Superego de forma vantajosa, ao menos do ponto de vista da autoridade que foi transferida para dentro do sujeito, substitui a punição física dos pais. Aqueles que realmente detêm o poder tem um duplo benefício com a mudança: a carga e os riscos são aliviados (os tiranos ameaçam ser destronados se seus sujeitos se insurgem contra eles, mas não se lutam contra sua própria consciência); em segundo lugar, aqueles que estão no poder mantêm a crença na liberdade e responsabilidade dos próprios sujeitos (se eles conseguem ser vitoriosos por sua própria força de vontade, serão honrados por isso; se foram derrotados, serão culpados por sua própria fraqueza). Pode-se perceber aqui como a pessoa autônoma, de fato, contribui para manter formas não explícitas de controles aversivos. Freud nos ensinou a identificar a origem e os mecanismos da internalização dos controles punitivos, mas parece que nem suas próprias lições nem as várias interpretações sociopolíticas que foram feitas desde então por seus discípulos conseguiram destronar a pessoa autônoma. Isso deveria ser tomado como evidência de que nós não funcionamos sem esse ser? Aqueles no poder têm ainda outra vantagem com a ideia da pessoa autônoma: eles a utilizam para sua própria absolvição. O controlador pode fugir da responsabilidade se ele mantém a posição de que o próprio indivíduo está no controle. O professor que confere mérito ao estudante por sua aprendiza gem pode também culpá-lo por não aprender. O pai que dá mérito à criança por suas conquistas pode também culpá-la por seus erros. Nem o professor nem o pai podem ser respon sabilizados.286
O mesmo é válido para os governos. Se eles descartam a pessoa autônoma, têm que assumir completa responsabilidade em caso de falha em sua política. Skinner nos lembra, nesse contexto, a evolução da União Soviética, conforme análise de Bauer: Imediatamente após a revolução, o governo poderia argumen tar que, se muitos russos eram mal-educados, improdutivos, se comportavam mal e eram infelizes, era porque o ambiente
havia levado a isso. O novo governo modificaria o ambien te fazendo uso dos reflexos condicionados de Pavlov e tudo ficaria bem. Mas, no início dos anos 1930, o governo teve a sua chance e muitos russos ainda náo estavam explicitamente mais bem informados, mais produtivos, com melhor comportamento ou mais felizes. A íinha oficial foi então modificada e Pavlov não era mais apoiado. Uma psicologia fortemente teleológica a substituiu: caberia ao cidadão russo conseguir a educação, trabalhar de forma produtiva, se comportar bem e ser feliz. O educador russo deveria ter certeza de que ele acei taria essa responsabilidade, mas sem condicioná-ío. Os suces sos da Segunda Guerra Mundial recuperaram a confiança no princípio anterior, entretanto; o governo teve sucesso afinal de contas. Poderia não ser ainda completamente efetivo, mas estava se movendo na direção correta. Pavlov voltou à cena.187 Talvez pudesse ser aplicado 0 mesmo tipo de análise ao atual ressurgimento do mentalismo na psicologia cognitiva, estabelecendo um paralelo com a incapacidade dos governos de realmente resolver os problemas pendentes e com sua crescente tendência a esconder seu controle sob a suposta delegação do poder aos cidadãos nas estruturas democráticas. Está claro que nossas sociedades não estão isentas de tais formas de absolvição. Essas últimas têm um papel dos n\ais importantes à medida que se beneficiam das doutrinas oficiais da liberdade e da responsabilidade política. Se a crise do petróleo não fosse resolvida por uma redução geral do consumo de energia, os governos poderiam sempre culpar seus cidadãos por sua falta de respon sabilidade cívica, sua inclinação ao desperdício, sua falta de previdência. E, se os cidadãos acusam o governo de descuido, o governo pode argumentar que ganhou o mandato por meio do voto dos cidadãos; então, de qualquer forma, os cidadãos podem apenas culpar a si mesmos. A pessoa autôn oma aparece como o álibi indis pensável da irresponsabilidade d o poder. Ao exacerbar a crença das pessoas em sua autonom ia, consolida-se, na verdade, a sua escravidão. A esse respeito, as doutrinas não diretivas popu larizadas po r várias escolas psicológicas e sociológicas podem dever seu sucesso ao fato de que, apesar das aparências, elas serviram extrem amen te bem aos poderes vigentes. Permissividade, náo é, entretanto, uma política; é o abandono da política e suas vantagens aparentes são ilusórias. Recusar-se
a controlar é deixar o controle náo para a própria pessoa, mas para as outras partes dos ambientes sociais e náo sociais.288
M e NTALISMO COMO UMA FERRAMENTA DE PODER
Aqueles que governam confiando nas pessoas autônomas não precisam se pre ocupar com mudar as condições nas quais as pessoas vivem. O que conta é mudar as mentalidades, como apontado pelo famoso texto que afirma que as guerras se originam nas mentes das pessoas’69- bem como todas as outras coisas incômodas de que gostam de reclamar. Paradoxalmente, esforços para mudar as mentes parecem ser legítimos, enquanto esforços para mudar as ações e sentimentos por meio da modificação do ambiente parecem uma violação de sua liberdade: E um fato surpreendente que aqueles que se opõem mais vio lentamente à manipulação do comportamento fazem, porém, os esforços mais vigorosos para manipular mentes. Evidente mente, liberdade e dignidade sáo ameaçadas apenas quando o comportamento é modificado pela modificação física do ambiente. Não Há nenhuma ameaça quando os estados men tais considerados responsáveis pelo comportamento sáo mo dificados, possivelmente porque o homem autônomo possui poderes miraculosos que o habilitam a se entregar ou a resistir. Ainda bem que aqueles que se opõem à manipulação do com portamento se sentem livres para manipular mentes, pois caso contrário teriam que permanecer calados/90
Dessa forma, aqueles que se restringem a modificar mentes estão fadados a mudar nada, talvez porque lhes seja vantajoso não mudar nada. Apelando para a “confiança renovada na democracia” como um remédio para a crise dos sistemas democráticos, é provável que as coisas sejam deixadas como estão; o que precisa ser mudado são as condições da prática da democracia, uma questão de contingências políticas, não de estados mentais.
2S8 Id. ibid ., p. 84. 289 A afirmação original da U n e s c o é: “As guerras começam nas mentes dos hom em ". Skinne r comentou da seguinte maneira: “ (.. .) Portanto, é nas mentes dos homens que a defesa da paz deve ser construída” , apontando para o fato de que as guerras têm muitas causas identificáveis que poderiam ser modificadas mais facilmente do que as mentes dos homens, modeladas após aquelas condições. Ver Reflections on behaviorism and society (id., 1978, p. 91). 190 Id. (1971a, p. 91-32).
Na maioria dos casos, aqueles que mantêm os outros acreditando no mito da liberdade e da dignidade são especialistas no controle de seus comportamentos de um modo mais direto e eficiente, para sua própria vantagem. Líderes políticos e ne gociantes de armas cooperam na celebração de virtudes patrióticas, enquanto con di cionam obediên cia militar no estilo mais prático. Aqueles que detêm o poder econô mico fazem uso das campanhas publicitárias com slogans que evocam a liberdade, o direito do indivíduo de satisfazer seus desejos, de impor sua vontade, etc. enquanto estabelecem deliberadamente e recorrem com esperteza e de forma perversa a leis de controle do comportamento, práticas de consumo focadas em seus produtos. As grandes religiões espiritualistas nunca falharam em basear sua autoridade em regras altamente práticas de conduta da vida diária. Em todos esses casos, a arte do poder consiste em disfarçar para os indivíduos os verdadeiros determinantes de seus atos, fazendo com que acreditem que eles se originam em sua própria mente livre. Jamais os consumidores estão mais fortemente sob controle do que quando acreditam que sáo reis. Jamais uma d outrin a é mais firmem ente im posta do que q uando seus segui dores se sentem dotados de livre arbítrio. Ago ra, se as pessoas sáo felizes com a ilusão da autono mia, por que deveríam os nos preocupar? Por que insistir em torná-las conscientes dos controles existentes escondidos? A resposta para Skinner é direta: nada menos está em questáo que a so brevivência da cultura humana, ou, mais simplesmente, da humanidade. A mistura de uma ilusão de liberdade e de controles inteligentemente disfarçados, dando um ao outro suporte recíproco, não nos ajuda a resolver os problemas terríveis com os quais somos confrontados. Ao nos satisfazer com o atual estado de coisas, deixamos à hu manidade o tipo de controle realmente em uso e a expomos ao mais incerto futuro. Uma solução aparentemente simples seria nos livrarmos de todos os tipos de controle, de modo que a verdadeira liberdade possa florescer. Esta foi a proposta clássica dos movimentos anarquistas e dos vários tipos de idealistas. Isso funcionaria se os seres humanos fossem criaturas cujas ações pudessem não depender de nada nem de ninguém. Mas se eles não sáo menos dependentes do que outros organis mos daquelas condições que contribuíram para sua história, como espécie e como indivíduos, a solução é o mesmo que abandonar seu destino à sorte. Skinner não hesita aqui em usar uma fórmula que irritou muitos de seus leitores e que provocou a acusação de ser um profeta da ordem estabelecida: “O que precisamos não é de menos controle, mas de mais controle”. Mais controle, porém de um tipo totalmen te diferente. “Não podemos escolher um modo de vida em que não haja controle. Podemos apenas mud ar as condições do controle” / 91 Seria de fato absurdo não colocar em prática nosso conhecimento sobre como induzir os comportamentos humanos que resolveriam alguns de nossos problemas
mais sérios. Não culparíamos médicos se não aplicassem seu conhecimento a respei to das causas e da prevenção de uma doença para interromper sua propagação? Sc o conhecimento científico apresenta alguma vantagem para a humanidade, é preci samente a de nos habilitar a identificar fatores determinantes que controlam nossas vidas e daí nos fornecer o único modo de controlá-los. Esse é o único significado real da liberdade no atual estágio da evolução. Quando Skinner sugere “mais controle”, ele não quer dizer aumentar os con troles aversivos negativos. Consistentemente, ele denuncia estes últimos, ao longo de seus textos, a ponto de ser culpado, por fim, de ser mais um moralista que um experimentador. Ele quer dizer aumentar os controles explícitos, claramente iden tificados, planejados para alcançar objetivos claramente definidos e modificados conforme o necessário após os testes práticos; e, mais importante para ele, uma generalização de controles positivos. Reconhecemos aqui os princípios vigentes em Walden Two. Nada poderia ser mais distante de manter a ordem estabelecida. De fato, as propostas de Skinner são nada menos que subversivas em comparação com nossos hábitos atuais. Se implementadas, elas acabariam igualmente com: governos principalmente baseados em controles aversivos, apenas amenizados pela pressão, por sua vez aversiva, de grupos de cidadãos; sistemas educacionais, dos quais, apesar das pretensões de atratividade, a maioria dos alunos fugiria se não fossem obrigados a se submeter; sistemas econômicos que nos incitam a desperdiçar recursos com o argumento de que as necessidades devem ser satisfeitas, necessidades que foram criadas com o propósito de encorajar o consumo. O controle skinneriano começa ria com profundas mudanças, de fato. Certamente traria um tipo de ordem, mas drasticamente diferente, como enfatizado na comunidade utópica de Walden Two: a ordem de uma sociedade formada por pessoas felizes, contentes com a satisfação de suas necessidades vitais, produtora de arte e de ciência em suas horas de lazer e com um senso de responsabilidade com o futuro de seus descendentes. Se há qualquer objeção a esse tipo de controle, é apenas por causa de uma generalização a partir de uma ordem baseada na coerção para todos os tipos de ordem, apesar de positivos os controles envolvidos. Isso é esquecer que a vida, incluindo a vida social e histórica dos animais humanos, não é nada além de ordem e, possivelmente, uma ordem muito transitória no universo, cuja preservação pode agora estar nas mãos da humanidade.
S o b r e v i v ên c i a
c o m o u m v a l o r ú l t i m o
Skinner estava consciente de que não se pode planejar a ordem social sem algum critério e, embora os controles positivos devam normalmente gerar indivíduos feli zes, ele não era ingênuo o bastante para acreditar que a “busca da felicidade”, como
está na constituição americana, pudesse ser um valor seguro. Preocupado como era com os problemas vitais do nosso tempo, ele não poderia pensar em qualquer critério mais decisivo do que a sobrevivência da espécie, o que significa, sendo a hum anidade uma espécie essencialmente cultural, a sobrevivência da cultura. Ele não estava de fendendo a perpetuação de um a cultura em particular. Se ele foi acusado de trabalhar pelo triunfo do modo de vida americano, fo i apenas por um a leitura simplificada de suas palavras (Spiro Agnew, em sua época, náo se equivocou a respeito disso191). As culturas humanas, como espécies vivas, de um ponto de vista absoluto, não apresen tam diferenças de valor, ou seja, uma não tem mais valor que outra. Elas não podem ser julgadas por qualquer outro critério, exceto pela sobrevivência. E a sobrevivência nunca é eternamente garantida para nenhuma delas: o que aparece como vantagem hoje pode se tornar uma ameaça amanhá. A filosofia social de Skinner é claramente fundamentada na biologia. O fato de que uma determinada cultura perpetua a si mesma, ao se modi ficar ou ao manter a mesma estrutura, depende de várias condições, geralmen te impossíveis de diferenciar. Há pouca duvida de que qualquer sistema cultural contém mecanismos que induzem seus membros a se comportarem de modo a favorecer sua sobrevivência. Se tais mecanismos, como é frequentemente o caso, são principalmente baseados em controle aversivo, é provável que eles, mais cedo ou mais tarde, gerem oposição dos indivíduos ou grupos, que lutarão por seus próprios interesses às custas da cultura. Em algum sentido, recorrer a controles aversivos é provavelmente inevitável. A vida sociai talvez implique sempre algum ripo de compromisso entre as demandas da organização coletiva e os interesses do indivíduo. Ela implica alguma renúncia a reforçadores individuais positivos. Freud pensava que a cultura, que é a característica distintiva da human idade, não pode se desenvolver a menos que os impulsos individuais sejam reprimidos, a menos que o princípio de realidade se sobreponha ao princípio de prazer, com a consequên cia de que a cultura é, por definição, fonte de conflitos inter e intraindividuais. Skinner compartilha com Freud a ideia de que não há acordo entre os fins da sociedade e a satisfação do indivíduo . M as enq uanto para Freu d a repressão era a base da civilização, para Skinner ela é apenas uma das possíveis formas de acordo, embora seja a mais difundida, talvez por ser a mais simples e óbvia. Entretanto náo há nada de essencial nela, apenas é uma característica histórica. Outras formas podem ser descritas, nas quais objetivos coletivos seriam alcançados através de reforçamento positivo de comportamentos individuais. Enquanto Freud mostra um pessimismo absoluto, Skinner adota um otimismo condicional. Condicional porque não existe qualquer garantia de que a hum anidad e se engajará nesse curso de ação: o progresso, como sabemos, não é inerente à evolução, seja ela cultural ou biológica. Mas ao 292 Ver a cicação do então vice-presidente dos Estados Un idos no capitulo 1.
menos o que conhecemos a respeito do comportamento não exclui algum tipo de acordo equilibrado baseado no reforçamento positivo. Isso tem pouco a ver, é claro, com libertar os seres humanos das forças das pulsões - o conceito de natureza huma na não está vinculado, para Skinner, com o de libido - é essencialmente um ajuste recíproco entre o individual e o social. A repressão é substituída pela regulação.
Proteção
do indivíduo
Podemos esperar, de uma cultura planejada, mesmo que seja baseada exclusi vamente em controle positivo, algo além da robotização, de uma homogeneização geral dos indivíduos e finalmente da negação dos direitos individuais? Skinner, é cla ro, estava muito preocupado com essa importante questão. Não apenas porque ela é central em suas reflexões científicas e filosóficas, mas porque ele próprio era, muito profundamente, um individualista. Já sabemos, a partir de nossa visita a Walden Two, qual era sua resposta. E também sabemos que a resposta está de acordo com sua visão de uma ciência da humanidade, modelada segundo uma filosofia biológi ca. Qualquer planejamento cultural sensato deve estar direcionado para preservar e estimular a diversidade. O tema da diversidade é recorrente nos textos científicos de Skinner. Ele é claramente enunciado em Beyondfreedom and dig nity , como ilustrado na seguinte passagem: Se uma cultura planejada significa uniformidade ou dis ciplina, ela age contra a evolução. Se os homens são muito semelhantes, teriam menos chances de descobrir ou planejar novas práticas e uma cultura que tornasse as pessoas muito semelhantes, o máximo possível, pode se ver em um padrão do qual não haveria escapatória. Isso seria um mau planeja mento, mas, se buscamos variedade, não podemos recair no acidental. Muitas culturas acidentais estiveram marcadas por uniformidade e disciplina. As exigências da administração dos sistemas governamental, religioso e econômico alimentam a uniformidade, porque ela simplifica o problema do contro le. Os sistemas educacionais tradicionais especificam o que o estudanre deve aprender, em que idade e administram testes para se certificar de que as especificações são atingidas. As leis das religiões e dos governos são geralmente muito explícitas e dão pouco espaço para diversidade ou mudança. A única es perança é uma diversificação planejada, na qual a importância da variedade é reconhecida. A criação de plantas e animais vai
em direção à uniformidade quando a uniformidade é impor tante (como na simplificação d a agricultura e criação animal), mas tam bém requer um a diversidade p lanejada.193
Skinner é um crítico da civilização atual, que aparece como uma empreitada gigante em direção à padronização sob o disfarce da liberdade individual. Olhando para a evolução da cultura em termos similares à evolução biológica, ele vê a varie dade com o a m elhor “garantia de sobrevivência” . E claro que a diversidade planejada não significa programar cada indivíduo em detalhes, mas arranjar condições sob as quais a diversidade é favorecida, como ela obviamente o foi em alguns períodos privilegiados da história da humanidade, notadamente no campo das artes, com a emulação prevalecendo sobre a competição e com o contexto social propiciando amplas oportunidades à produção artística em todos os níveis de competência. Na cultura, como na biologia, a diversidade é a condição para a individualida de. Ela também é, desde os estágios mais elementares dos organismos vivos, a regra universal. A reprodução estrita do mesmo é a exceção (embora o homem tenha conseguido isso experimentalmente), mas ela tem pouco, se é que tem algum, valor de sobrevivência. Como Skinner aponta, a uniformidade pode ser recomendável em algumas situações, como na facilitação da agricultura ou na criação animal. Mas os engenheiros genéticos inteligentemente preservam as sementes das espécies não utilizadas atualmente, porque elas poderiam salvar o mundo se as espécies atuais, em uso por causa de suas vantagens presentes, fossem vítimas de algum desastre futuro. A diversidade co mo um projeto cultu ral deliberado se torn ou extremam ente importante num mundo onde as pessoas tendem a ser modeladas no mesmo molde, porque as distâncias foram abolidas e porque o poder econômico e político progres sivamente se concentrou nas mãos de uma única tradição cultural. Até o século XX, a diversidade cultural era tão notável quanto a diversidade biológica, e os antropó logos poderiam descrever uma ampla gama de padrões culturais. Eles conseguiram chamar a atenção para o interesse em tal variedade e mesmo para o conceito de relativismo cultural, mas paradoxalmente em uma época em que a variedade estava desaparecendo da superfície da terra e em que o relativismo cultural tinha perdido quase toda a sua relevância, com exceção da relevância turística.
A DIMENSÃO TEMPORAL Outra fonte importante de dificuldade no planejamento de uma cultura que alcançasse os requisitos para a sobrevivência da humanidade é o conflito entre o interesse imediato do indivíduo e a necessidade de considerar, em qualquer projeto cultural sensato, consequências de longo prazo. Recompensa imediata parece mais natural e mais eficiente que satisfação postergada. Claramente, os problemas que estamos enfrentando, na m aioria dos casos, não afetam os indivíduo s imediatamen te, talvez nem mesmo durante sua vida. Embora não haja problema em colocar o comportamento, seja humano ou animal, sob controle de reforçamento imediato, recompensa atrasada é muito mais difícil. As espécies animais são suscetíveis a ela apenas dentro de limites de tempo muito estritos e por meio de um a história de con tingências muito sistemática. Felizmente, os humanos desenvolveram, com o uso da linguagem e das representações simbólicas em geral, capacidades sem precedentes para avaliar recompensas de tal modo que a satisfação postergada será preferida em relação a uma satisfação mais imediata, se constatado que a primeira vale mais. Os seres humanos aprenderam a viver com as perspectivas de tempo que se estendem à toda a sua vida e até mesm o às gerações futuras. M uitos fatores determin am a anteci pação das ações humanas de longo prazo, incluindo a comparação dos benefícios de ambos os tipos de recompensa (imediata versus atrasada), a intensidade d a aprovação ou desaprovação social de ambas as condutas, a probabilidade de que a recompensa atrasada será obtida e será apreciada, etc. As ideologias religiosas e políticas tradi cionalmente recorreram à ameaça da punição eterna, ou à promessa de felicidade futura, para induzir as pessoas a se comportarem de determinado modo pela satis fação futura enquanto renunciam a recompensas imediatas. Em ambos os casos, a punição imediata ou sua ameaça foram acrescentadas para garantir o controle. Os hereges eram condenados ao fogo eterno, mas também eram, para tornar as coisas mais certas, sujeitos à tortura imediata. Aos cidadãos da União Soviética de Stalin era prometido o triunfo da feliz sociedade sem classes, mas eram enviados ao Gulag se demonstrassem pouco zelo na parte que lhes cabia da luta. Sabemos que os seres humanos tendem a se libertar de tais controles aversivos, como a história recente demonstrou mais uma vez. Os controles religiosos e políticos desse tipo colapsaram e poderiam ter sobrevivido apenas por meio do uso cego da força. Realmente não podemos esperar resolver os problemas do mundo de hoje recorrendo às mesmas práticas, mas ficamos com a tarefa terrivelmente difícil de fazer com que os seres humanos ajam em função de contingências de longo prazo, considerando que eles recentemente se libertaram de muitos dos controles similar mente direcionados a consequências muito atrasadas. A tarefa em si não é fácil. E é complicada ainda mais pelo fato de que a sociedade moderna, enquanto valoriza, em alguns contextos, a antecipação do futuro - investindo em vários esquemas de
segurança, por exem plo, ou na educação - encoraja, em mu itos aspectos, a satisfa ção imediata. Comprar à prestação se tornou prática geral, propiciando a aquisição imediata dos bens desejados sem a necessidade de se calcular como pagar por eles. A ação política está essencialmente sob controle das próximas eleições, gerando uma perspectiva de tempo que raramente se estende para além de três ou quatro anos, enquanto a maio ria das questões importantes requer antecipação e planejamen to de longo prazo. Levou anos até que os avisos dos ecologistas fossem, por fim, levados a sério, e ainda recebem, de alguns políticos, apenas apoio da boca pra fora. Há poucos sinais de que estamos indo em direção a uma sociedade que encontrará seu próprio equ ilíbrio ~ e, seus membros, a felicidade - ao funcionar sob controle de contingências de longo prazo. Skinner estava consciente de que essa é de fato uma das questões mais cruciais do mundo atual, e ele apontou insistentemente para isso; ele pode n ão ter formulado soluções práticas completam ente satisfatórias, mas quem as formulará, considerando os fatores que prevalecem atualmente?
CONTRACONTROLE As soluções inevitavelmente im plicam plan ejam en to de longo prazo, e a palavra planejamen to, po r sua vez, implica algum tipo de controle por aqueles que delineiam os planos sobre aqueles que serão expostos a eles. Quem irá controlar? Skinner de forma alguma sugeriu u ma fo rma de totalitarismo. Pelo con trário, sua análise visa a acabar com os abusos de poder por meio de um conhecimento claro dos processos comportamen tais. E le certamente nun ca propôs q ue um a nova classe de legisladores, tecnocratas do comportamento, deveria se apossar das responsabilidades políticas. Seu plane jamento cultural não deixa lugar para uma casta permanente de especialis tas intocados. Ele apenas propôs que toda política, por definição lidando com pes soas, deveria considerar o que a ciência nos diz sobre o com portam ento h um ano, ao invés de ignorá-la ou m esmo de ir à direção oposta, como é frequentemente o caso. Skinner nos avisa: enquanto estamos discutindo quem deveria controlar, ou enquanto fazemos oposição à ideia de controle, outros de fato controlam, sem de mora, e se beneficiam de nossa procrastinação. A escolha não é entre controle e liberdade, mas entre controle explícito e encoberto. Isso inevitavelmente íeva ao despotismo? Vam os relembrar que a organização social de Walden Two garantia um funcionamento harmonioso independentemente da personalidade do fundador, ou dos gerentes de qualquer época. Carreiras vitalícias de gerenciamento foram extintas ao se limitar o tempo no cargo; o abuso individual do poder foi evitado ao se dar uma estrutura colegiada a todas as agências de decisão e ao eliminar todas as possibi lidades de benefício pessoal ao ter um cargo público. Essas são medidas elementares de contracontrole.
Essa é, de fato, a parte mais importante da filosofia social de Skinner. Tornar os controles vigentes explícitos é o pré-requisito para qualquer organização social se ela deve corrigir a si mesma e exercer contracontrole: O planejador de uma cultura fica sob a mira, porque o plane jamento explícito implica controle (se apenas o controle exer cido pelo planejador). A questão é frequentemente formulada com a pergunta: Quem deve controlar? E a questão é colo cada como se a resposta fosse necessariamente ameaçadora. Para prevenir o mau uso do poder de controle, entretanto, não devemos olhar para o próprio controlador, mas para as contingências sob as quais ele se engaja no controle.194 O grande problema é arranjar contracontrole efetivo e, dessa forma, proporcionar importantes consequências relacionadas ao comportamento do controlador.295 Todo controle é recíproco e o intercâmbio entre controle e contracontrole é essencial na evolução de uma cultura/96 E claro que atacar práticas de controle é uma forma de con tracontrole. Pode ter benefícios incomensuráveis se práticas de controle melhores forem selecionadas. Mas a literatura da liberdade e da dignidade cometeu o erro de supor que elas estão suprimindo o controle ao invés de o estarem corrigin do. O controle recíproco através do qual uma cultura evolui é então abalado. Recusar-se a exercer o controle disponível porque, em algum sentido, qualquer forma de controle é errada é não permitir formas possivelmente importantes de contracontrole. Vimos algumas das consequências. Medidas punitivas, que a literatura da liberdade e da dignidade ajudou a eliminar, são, ao invés disso, promovidas. Uma preferência por métodos que tornam o controle náo explícito ou que o permitem ser disfarçado condenou aqueles que estão na po sição de exercer contracontrole positivo ao uso de medidas fracas. Essa poderia ser uma mutação cultural letal.197 294 Id. ibid., p. 168. 295 Id. ibid ., p. t7i. 296 Id. ibid., p. c8i. 297 Id. ibid ., p. r8i.
A história oferece m uitos exem plos de mecanismos e agentes de con tracon trole. Co nfron tado com o poder baseado em métodos aversivos, o próprio contracontro le frequen temen te assume características aversivas, com o insurreição, greve violenta ou fraude, o que ameaça o poder e acaba por conseguir limitá-lo, mas geralmente contribui para manter suas técnicas repressivas. Em regimes parlamentaristas, a oposição tem um papel mais decisivo no contracontrole. A liberdade de imprensa, ou, generalizando, de expressão e informação, tem uma função de contracontrole cada vez que revela abuso de poder. Associações de consumidores, quando boi cotam um produto, exercem contracontrole sobre produtores inescrupulosos. De um modo mais sutil, os alunos exercem contracontrole sobre seus professores, que (idealmente) ajustam seus métodos se os alunos não entendem o conteúdo. O rato de laboratório, de forma similar, modela o comportamento do experimentador! Tal regulação recíproca é possível apenas se as ações dos controladores continuam a depender das consequências que produzem sobre os controlados. Se o ensino depende mais de uma agência reguladora centralizada, ela própria distante da vida escolar diária e sem nenhum contato direto com os alunos, eles perderão toda a influência /io contracontrole: Controle e contracontrole tendem a se deslocar quando o controle é tomado por agências organizadas. Contingências informais são sujeitas a rápidos ajustes à medida que seus efei tos mudam, mas as contingências que as organizações deixam para os especialistas podem se manter intocadas por muitas das consequências.198 Aiguns grupos de pessoas perdem completam ente qu alqu er form a de contra controle. Medidas sociais supostamente em seu favor podem, por muito tempo, ir a uma direção aberrante sem qualque r correção. O contracontrole pode surgir apenas de uma terceira via: Alguns exemplos clássicos de falta de equilíbrio entre controle contracontrole se torna, desse modo, inefetivo. Hospitais para psicóticos e lares para retardados, órfãos e idosos são caracteri zados por um contracontrole fraco, porque aqueles que estáo preocupados com o bem-estar de tais pessoas frequentemente não sabem o que está acontecendo.2" 298 Id. ibid., p. 171 . 299 Id. ibid., p. 171.
Um governo exclusivamente baseado em métodos positivos não teria razão para temer que seus métodos de controle pudessem ser descobertos: ao contrário, ele se beneficiaria de sua revelação. Por sua vez, a enunciação do controle é um a con dição para o contracontrole. O contracontrole implica, por um lado, que as açóes daqueles que estão no governo permaneçam, tanto quanto possível, sob o controle das consequências que têm nas pessoas controladas. A responsabilidade política não é uma virtude; ela provém de um arranjo adequado das relações entre aqueles que gove rnam e aqueles que são governados. A busca por tal arranjo parece ser central na atual crise observada nas nações ocidentais. Skinner sugere que ele será alcançado apenas se aqueles que estão no poder pararem de entreter os cidadãos com a ilusão da liberdade e se os cidadãos pararem de sacrificar o controle real de suas vidas por essa ilusão.
POLÍTICA EXPERIMENTAL Após essa apresentação adm itidam ente incompleta das visões de Sk inner sobre a realidade social, ou Utopia social, como podemos concluir? Espero que aqueles que conheciam Skinner apenas de segunda mão tenham descoberto uma aborda gem dos assuntos humanos muito diferente da imagem transmitida por difamadores com o aqueles citados no capítulo i. Interpretações equivocadas foram especialmente numerosas e distorcidas com relação aos textos sociofilosóficos de Skinner. Talvez os críticos tenham sido algumas vezes sinceros, mas equivocados principalmente pela falta de preparação. Um deles reclama sobre o uso da expressão “contingên cias de reforçamento” em Beyondfreedom and dignity. E como reclamar do uso do termo “relatividade” em um ensaio de física, ou de “seleção” em um livro popular de biologia. Outros podem ter sido enviesados por uma apresentação incorreta do pensam ento científico de Skin ner retirada de manu ais de psicologia e não podem ser culpados por tom ar com o certo o que autoridades da área escreveram sobre Skinner. Todavia, as verdadeiras razoes de por que as ideias políticas de Skinner geraram tal oposição violenta devem ser procuradas em outra direção. É simplesmente porque elas são perturbadoras em relação a todas as ideologias ou práticas existentes. De fato, nenhum dos esquemas políticos atualmente no poder (ou no poder na época em que ele escreveu Walden Two ou Beyond freedom and dignity), ou os atuais candi datos ao poder, escapam de sua crítica. Suas críticas perturbam aqueles que man têm o controle, bem como aqueles que o buscam, ou aqueles que gostam de pensar que não são controlados, mas livres. Tudo isso é uma reação emocional e não deve interferir na questão principal.
Uma questão deve, entretanto, ser colocada: as visões de Skinner são baseadas cientificamente, como ele afirma? Se sim, essa base científica é séria? Se for o caso, ela leva necessariamente e de forma legítima a essa concepção? Não há dúvida de que os dados, os métodos e os conceitos referenciados por Skinn er são parte do dom ínio da ciência, como oposta à religião, arte ou magia. Os dados podem ser verificados ou rejeitados; os métodos, melhorados ou modificados; os conceitos, elaborados ou abandonados; tudo enquanto resultado da atividade científica normal e, é claro, sem relação com o que o próprio Skinner pensava. Qualqu er que seja a imp ortância das contribuições individuais, a ciência é desperso nalizada, e seu progresso não está diretamente vinculado ao respeito por aqueles que as fizeram. Skinner se referia à ciência séria, o que não significa, é claro, ciência de finitiva ou comp leta, sim plesmente porque não existe ciência definitiva e completa. O trabalho científico é sempre uma aproximação e os cientistas sabem que o que eles descobrem nada mais é do que uma maior aproximação ou uma correção de erros. A base científica séria é, neste caso, suficiente para se chegar às conclusões práticas que Skinner delineou a partir dela? As ideias sociopolíticas derivam legitimamente, se não necessariamente, dos dados empíricos e dos conceitos teóricos? Essa não é uma questão fácil, pois chega a nada menos que o julgamento da validade de uma proposta para aplicação científica em um caso específico. A única validação convincente consistiria em testar, mas alguém poderia querer uma validação antes do teste. Qualquer aplicação científica envolve risco, se comparada com sua referência experimental, porque sempre ocorre em um contexto que não foi, nem pode ser, purificado de todos os fatores que são eliminad os no laboratório. Uma estimativa do risco é certamente crucial, mas os riscos devem ser assumidos se a ação precisa ser implementada. Parece sensato adiar a aplicação se a distância entre o conhecimento básico e a aplicação parece muito grande. Pode-se pensar que esse é o caso do projeto de Skinner; pode-se argumentar que, apesar de sua sinceridade e boa vontade em ajudar a humanidade, seus fundamentos científicos são muito fragmentários, muito restritos aos animais de laboratório e muito pouco integrados ao conhecimento proveniente de outras fontes para legitimar qualquer aplicação. Pode-se sugerir que primeiro eles devam ser consolidados, que devam convergir com outros ramos das ciências humanas, para que uma teoria mais geral possa por fim emergir e que pudesse autorizar uma extrapolação para a cultura hum ana. Há pouco a dizer a respeito de tal posição pru dente, mode sta e respeitosa. Mas ela pode conter mais risco, de fato, que a visão oposta. Isso porque algumas situações não podem ser resolvidas se ninguém assume o risco de interferir com qualquer que seja a informação limitada disponível. Talvez as possibilidades de sucesso sejam mais limitadas, mas a certeza de desastre é total se nada for feito. Para quem opta por adiar a ação, pode-se perguntar: em que ponto, em qual ní vel de informação, você achará conveniente por em prática o conhecimento científico
sobre o comp ortamento nos assuntos humanos? D everiam os estudantes do comp or tamento seguir sua pesquisa básica indefinidamente e ver o que acontece? Nesse meio tempo, os problemas terão piorado e o mundo continuará a mudar sob a influência de outras ciências que náo têm a mesma preocupação com o mau uso de suas tecno logias. A medicina mod erna progrediu em passos curtos, reduzindo as infecções com hábitos triviais de higiene antes de os antibióticos serem descobertos. Seria m elhor ter esperado por Fleming antes de recomendar que os cirurgiões, obstetras e enfermeiras lavassem as suas máos? Para outros, a decisão de náo se engajar em aplicações da psicologia aos assun tos humanos náo é temporária, é definitiva. Eles sustentam que a distância entre o conhecimento científico e a complexidade da vida social nunca será preenchida. A ciência pode observar, descrever, talvez explicar, mas nada mais: a história humana escapa de toda predição ou controle, incluindo o controle cientificamente funda mentado. Essa posição contemplativa é amplamente difundida entre os psicólogos atuais. Ela tem múltiplas origens, que não irei comentar aqui. É suficiente apontar para uma de suas consequências. Ela alimenta um ramo que vem ganhando força nos últimos anos, que é oposto à aventura científica e, de forma mais geral, aos esforços humanos em direção à racionalidade. Nessas linhas, a oposição à aplicação do conh ecime nto científico à vida social não é que nosso conhecim ento atual é insu ficiente, mas que o conhecime nto científico é perigoso (e quanto mais desen volvido, mais perigoso). Nin guém negaria que o progresso na ciência indiretamente trouxe uma série de dificuldades imprevistas (embora nem sempre imprevisíveis). Mas não há qualquer indica ção de que elas serão resolvidas se dermos as costas para a ciência. A ciência poderia também ser o único caminho. De qualquer modo, ela teve um papel pe queno no direcionamento das questões humanas. Devemos nos satisfazer com esse estado de coisas? Devemos prosseguir, como fizemos no passado, com o que aprendemos a partir da experiência pessoal ou daquelas coleções de expe riências pessoais chamadas de história, ou com as destilações da experiência encontrada na sabedoria popular e nas leis prá ticas da experiência? Elas estiveram disponíveis por séculos e tudo o que temos para mostrar por elas é o estado do mundo de hoje.*50 Skinner não hesita entre escolher a ciência ou evitar sua aplicaçáo, como ex presso no seguinte texto, que é uma resposta à acusação de supersimplificação: 300 Id. ibid., p. 4.
A interpretação do complexo mundo das questões humanas em termos de uma análise experimental é, sem dúvida, com frequência supersimplificada. Pretensões foram exageradas e limitações negligenciadas. Mas a supersimplificação realmente grande é o tradicional apelo aos estados mentais, sentimentos e outros aspectos do homem autônomo que a análise do com portamento está substituindo. A facilidade com que explica ções mentalistas podem ser prontamente inventadas talvez seja o melhor indicador de quão pouca atenção deveríamos dar a elas. £ o mesmo pode ser dito das práticas tradicionais. A tecnologia que emergiu da análise experimental deveria ser avaliada apenas em comparação com o que é feito de outras maneiras. O que, afinal de contas, temos para mostrar para o bom senso pré-científico ou não científico, ou para o senso comum, ou para os insights obtidos na experiência pessoal? E a ciência ou nada, e a única solução para a simplificação é aprender a lidar com as complexidades. Uma ciência do comportamento ainda não está pronta para resolver todos os nossos problemas, mas é uma ciência em progresso e sua adequabilidade final não pode ser julgada nes te momento. Quando as críticas afirmam que ela náo pode explicar este ou aquele aspecto do comportamento humano, geralmente subentende-se que ela nunca estará pronta para isso, mas a análise continua a se desenvolver e está de fato muito mais avançada do que seus críticos em geral imaginam. O importante não é tanto como resolver um problema, mas sim como buscar a solução, Os cientistas que apresentaram ao presidente Roosevelt uma proposta de construir uma bomba tão poderosa que acabaria com a Segunda Guerra Mundial em poucos dias não poderiam afirmar que sabiam como construí-la. Tudo o que poderiam dizer era que sabiam como descobrir. Os problemas comportamentais a serem resolvidos no mundo atual são sem dúvida mais complexos do que o uso prático da fissão nuclear e a ciência básica, de forma alguma tão avança da, porém sabemos onde começar a buscar as soluções.30' Vam os supo r que falta seriedade nos fundam entos científicos defen dido s por Skinner ou que, na melhor das hipóteses, eles não autorizem de forma sensata as 301 Id. ibid., p. 160 -161 .
concepções de humanidade e sociedade provenientes deles. Como avaliaríamos, neste caso, seus textos sociofilosóficos? Vários críticos de Skinner propuseram vê-los como peças de uma argumentação pseudocientífica em favor do regime estabeleci do. Essa interpretação é dificilmente sustentada após uma leitura honesta dos textos. Quantos americanos, especialmente os intelectuais, logo após a Segunda Guerra, se aventurariam a questionar seu sistema político e sua sociedade como Skinner fez em Walden Twoí Que partido político assumiria o risco de propor a seus membros uma reflexão sobre Beyondfreedom and dignity sem expor a si mesmo a críticas in ternas insuportáveis? Não encontramos mais nenhum fundamento para a acusação contrária de corromper os valores básicos da sociedade americana —lembrem-se da opinião de Spiro Agnew, citada no capítulo i. As razões pelas quais as visões de Skinner foram tão fortemente atacadas ou tão obstinadamente ignoradas devem ser encontradas no fato de que elas não se encaixam facilmente nas categorias políticas e ideológicas comun s. A filosofia social de Sk inner estava, segundo sua próp ria visão, ancorada no conhecimento científico, com todo o relativismo que isso implica. Como tal, ela era discutida muito estritamente dentro da teoria psicológica que ele havia desen vo lvido e apresentada co m o um a tentativa, sujeita à revisão, co mo qualquer outra empreitada cientificamente baseada. Também foi a resposta para a ansiedade nas cida da observação de nossa sociedade, afluente como é, mas incapaz de lidar com problemas importantes, emb ora eles tenham sido claramente identificados. Skinner não era ingênuo o bastante para acreditar que suas ideias poderiam, algum dia, ser completamente implementadas na vida real. Todavia, de fato esperava que as pessoas fossem suficientemente inteligentes, numa época em que a ciência é aparentemente muito adorada, para aplicar parte de sua mensagem. Ele teria ficado muito feliz ao menos com alguns testes experimentais, na vida real, de algumas de suas sugestões. Um de seus últimos artigos revelou, ao invés disso, desencanto. Podemos apenas reproduzir a pergunta que ele usou como título: Por que não estamos agindo para salvar o mundo?
CONCLUSÃO
Este livro pretende ser uma introdução ao trabalho de Skinner. Agora é tem po de os leitores explorarem a rica produção do último behaviorista, como alguns insistem em chamá-lo. Espero que as apresentações simplistas das contribuições de Skinne r para a psicologia deem lugar a um a avaliação mais equilibrada. O argum en to, ao longo dos capítulos precedentes, foi abundantemente ilustrado com citações dos textos de Skinner, que transmitem pensamento rigoroso e sutil, frequentemente provocativo, e, quando se volta para questões sociais, francamente generoso. Isso está em contraste, é claro, com as afirmações depreciativas de críticos influentes que caracterizam a escrita de Skinner como destituída de conteúdo científico, obsoleta, ou socialmente perigosa. Não há nada a se ganhar com a condenação, com tais juízos simplificados, de um cientista cujo lugar na história da psicologia não pode ser negado. Se ele estava errado (e, em ciência, de certo modo ninguém afirmaria estar completamente ou definitivamente certo), isso pode ser discutido apenas ao examinar de perto o que ele escreveu e fez. Espero que o leitor esteja agora mais bem preparado para realizar uma análise não enviesada daquilo que Skinner tinha em mente e revelado em seu comportamento verbal explícito. Ach o mais im portante que psicólogos, especialmente jovens psicólogos, co loquem seu trabalho atual em perspectiva e desenvolvam a consciência das raízes históricas de sua área. Muito frequentemente, como observei anteriormente, os psicólogos estão inclinados a considerar o presente como uma época excepcional de avanço evolutivo. Talvez os psicólogos de todas as gerações tenham o mesmo sentimento, os discípulos de Skinner não sendo exceção. Sem dúvida, a psicologia atual é animadora e certamente eu náo desencorajaria aqueles que estão nessa ciência fascinante a aproveitá-la. Contudo, isso não pode impedir, mesmo que seja apenas pela exatidão científica, uma avaliação correta de seus vínculos com o passado. Com relação a Skinner, isso significa tomar sua contribuição como aquilo que ela foi —isto é, um importante passo na construção da psicologia moderna, ao invés de um obstáculo ao seu desenvolvimento. Como um membro do movimento behaviorista, Skinner participou da aus teridade metodológica que contribuiu para o novo exame das questões que a psi cologia introspectiva, na virada do século XX, havia levado para becos escuros.
Como principal representante do behaviorismo radical, que elaborou os princípios behavioristas básicos até suas consequências lógicas extremas, ele poderia levar o mérito de ter apresentado, às críticas de seus oponentes, posições bem claras contra as quais argumentar e sobre as quais eles poderiam talvez construir e lapidar sua própria contrateoria. A autoconfiança e o entusiasmo deles não deveriam, entretan to, esconder o fato de que muitas das questões às quais Skinner devotou seus textos teóricos e metodológicos não estão definitivamente solucionadas pelas tendências contemporâneas que adotaram uma postura oposta. O status dos eventos mentais, do propósito e da intencionalidade, das relações entre cérebro, comportamento e mente, ainda não foi elucidado de uma vez por todas: estas e muitas outras questões ainda permanecem entre nós, e podem permanecer ainda por algum tempo, mesmo que, adm itidamente, algum progresso tenha sido feito tecnicamente. As form ulações de Skinner permanecem como um material bom e firme para aqueles que preferem uma abordagem aprofundada de questões difíceis a afirmações autossatisfatórias de suas próprias crenças. Como um notável experimentador, Skinner proporcionou ao laboratório psi cológico procedimentos de múltiplos propósitos sem precedentes e foi um pioneiro na automatização do controle experimental, muito antes de os computadores pes soais se tornarem o aparelho popular de hoje. Como os avanços técnicos têm um papel crucial no progresso de uma ciência e como a “Caixa de Skinner” penetrou nos laboratórios em uma variedade de especialidades com portam entais e biológicas, o atual estado dos estudos comportamentais devem algo a Skinner. Embora se pudesse ter estendido o exercício para outros cientistas e outras es colas de pensamento, o paralelo que fizemos com Pavlov, Freud, Piaget e Lorenz esclareceu um pouco as relações entre a obra de Skinner e alguns dos maiores ra mos da psicologia europeia no século XX. Os comentários sobre as concepções de Skinner se reservaram, via de regra, de forma muito limitada, a mantê-lo dentro da constelação behaviorista, com pouca atenção às suas singularidades em comparação a outros behavioristas e negligenciaram completamente as convergências explícitas ou não com outras tradições. Encontramos um pensador menos próximo a Pavlov do que geralmente se imagina; u m adm irador de Freud, em bora radicalmente crítico de algumas das visões dos psicanalistas; surpreendentemente convergente com Piaget naquilo que poderia ser chamado de selecionismo interacionista; muito aberto às objeçóes de Lorenz à sua própria explicação do com portam ento. A pesar de, em certo sentido, ter seguido sua linha com uma obstinação sistemática, Skinner continuou a investigar territórios do conhecimento que outros estavam explorando ao mesmo tempo, em bora sob um ângulo diferente. Ao invés do pensador ultrapassado pintado por alguns de seus oponentes, encontramos um precursor cujo defeito, em algumas questões, era estar à frente de seu tempo. Isso é especialmente verdade em relação à sua contribuição para o estudo do comportamento verbal, que, paradoxalmente, foi
o mais violentamente atacado como irrelevante ou obsoleto e era, portanto, indire tamente, uma das causas de seu descrédito. Tendo feito esse balanço, poderia se questionar em que medida as contribui ções de Skinner para a psicologia sobreviverão. Ninguém, é claro, pode predizer isso. Se adotamos uma visão cumulativa de ciência, ao invés de enxergá-la como uma sucessão de revoluções destrutivas, podemos ter certeza de que suas contri buições técnicas permanecerão como parte das ferramentas metodológicas dos psicólogos. Esperaríamos também um adequado reconhecimento histórico de sua contribuição teórica para o progresso da ciência psicológica, após o triunfalismo de algumas escolas de pensamento contemporâneas ter se acalmado. Se os psicólogos do futuro retomarão algumas premissas da teoria de Skinn er como fonte de inspira ção - como Ch om sky recorreu à gramática de Port-Royal, ou como Fo dor recorreu a Ga ll - é uma outra questão; a resposta dependerá, entre outras coisas, da evolução dos debates atuais nas ciências cognitivas e nas neurociên cias e, mais especificam en te, da resolução das contradições persistentes na questão mente-cérebro. O futuro da filosofia social de Skinner é uma outra questão. Embora seus principais livros nessa linha tenham sido bestsellers por algum tempo e, como tais, produziram discussões animadas, principalmente em jornais e revistas, eles de fato nunca receberam atenção de especialistas em ciência política, social e econômica. Nem foram tomados, ao menos explicitamente, como fonte de inspiração por po líticos. Na visão de muitos, este é o destino que eles merecem. Lendo-os de forma honesta e cuidadosa, nosso sentimento foi muito diferente, e esperamos que o leitor compartilhe, se não as ideias de Skinner, nossa curiosidade pelo que elas realmente são. Admitidamente, os problemas do mundo de hoje são muito complexos para se esperar que sua solução esteja em algumas centenas de páginas escritas por um psicólogo. Mas a inadequação flagrante das ações tomadas e das soluções propostas nos convida m , mais do q ue nu nca, a olhar para elas de uma m aneira diferente, nova. Nessa busca, a abordagem de Skinner ainda precisa ser explorada. Não iremos resu m ir a apresentação que fizemos de Walden Two> Beyondfreedom and dígnity e outros textos nos últimos capítulos deste livro. E suficiente apontar u m imp ortante aspecto da mensagem de Skinner, que é metodológica ao invés de ideológica: se realmente quisermos solucionar os problemas sociais, devemos olhar para os próprios proble mas e não, com o os políticos fazem nas nossas sociedades modernas, com o parte do poder que eles podem ganhar ou perder ao tomar determinada atitude. Para a de mocracia sobreviver, ela deve se engajar em abordagens mais racionais —deveríamos dizer experimentais? - aos problemas que ela enfrenta, ela deveria se tornar definiti vamen te centrada no pro blema e não centrada em partidos ou personalidades. Isso certamente sim plificaria a tarefa. Afina l de contas, a visão de mu ndo de um cientista visa essencialmente a tornar as coisas mais simples para qu e po ssam os entendê-las melhor e agir mais eficientemente sobre elas. Isso pode ajudar algumas vezes.
Deixemos as últimas palavras a Skinner. A primeira citação é de seu artigo sobre “Walden Two revisited” e enfatiza mais uma vez a preocupação com o futuro das gerações vindouras. A segunda é de um artigo intitulado “ Hum an behavior and democracy” e é sobre contracontrole, que sabemos ser a questão central em nossas atuais democracias. Agora se reconhece amplamente que mudanças maiores devem ser feitas no [nosso] modo de vida, Não apenas não podemos encarar o resto do mundo enquanto consumimos e poluímos dessa forma, não podemos por muito tempo enca rar a nós mesmos enquanto temos conhecimento da violência e do caos em que vivemos. A escolha é clara: ou não fazemos nada e permitimos que um futuro miserável e provavelmente catastrófico nos atinja ou usamos nosso conhecimento sobre comportamento humano para criar um ambiente social em que vivamos vidas produtivas e criativas e fazemos isso sem por em risco as chances de que aqueles que nos seguirem serão capazes de fazer o mesmo.3“ Sem dúvida continuarão a existir agências governamentais e econômicas, organizações e instituições, porque elas têm suas funções próprias, mas não lhes deveria ser dada concessão exclusiva. Um ambiente social funciona com mais sucesso, pelo indivíduo, pelo grupo e pela espécie se, na medida do possível, as pessoas controlam diretamente as pessoas.303
302 De Reflections on behaviorism an d society (id., 1978, p. 66). Reimpresso
ÍNDICE REMISSIVO
A Ação 28, 29, 47, 65, 67, 99, 100, 102, 103, 104, 105,119, 120, 12 1,12 5 ,12 7 , i3 2>^4. 142, 143, 144, 154, 157, 161, 162, 167, 168,169,170, 171,172, 173, 175, 189, 194, 203, 2ii, 213, 214, 215, 238, 239, 241, 249, 253, 257 Ação política 211, 214, 215, 253 Ação seletiva 10 0 ,10 3 ,10 4 ,12 0 ,12 1,12 7 Acomodação 101 Adição 51, 53, 92,186» 189 Adição à droga 186 Afetividade 225 Agente interno 236 Ambiçóes literárias 33 Ambientalismo 29, u i, 151 Ambiente social 31,140,1 59, 18 6,187, 242, 264 Análise experimental 15, 78, 79, 82, 134,183, 211, 259 Análise formal 150 Análise funcional 15 0 ,15 1,152 ,154 ,155,157 ,16 1,17 3,18 5,18 6 Analogia evolucionária 68,102, 106, 119 ,12 0 ,12 1,12 2 ,12 3 ,12 5 ,12 7 ,17 6 Antecipação 28, 171, 252, 253 Antimentalismo 28 Aparato mental 77, 81, 83, 84,184 Aparato psíquico 130,183 Aplicação 35, 36, 4 3 ,1 0 0 ,13 7,14 1,158 ,18 9 , 257, 258 Aprendizagem 25, 36, 37, 63, 6% 66, 68, 70, 72, 73, 75, 80, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 96, 98, 99,100, ioi, 106,107, u i, 115 ,122,124,125,126,127 ,133,134,135,142,158 ,159,165,170 , 174,175,184,195,196,197,198,199, 200, 201, 202, 204, 206, 209, 221, 223, 244 Aprendizagem instrumental 65 Aprendizagem sem erros 198,199 Aquisição de linguagem 150 Argumentação 97, 161, 260 Armas nucleares 41
Arte 3 3 ,12 1,17 0 ,17 6 ,17 7 ,17 8 , 208, 219, 220, 222, 232, 247, 248, 257 Artificial 45, 63, 236 Aspectos 12,1 5, 23, 24, 26 , 27, 28, 31, 34, 43, 44, 59, 75, 7 6, 77, 81, 92, 93, 96, 98,100,112, 115,116,122,123,125,129,132,133,137,140,152,155,159,160, 161, 162,164,166,170,171,172, 173,175, 183,192,197,198, 200, 2oi, 204, 205, 216, 217, 218, 225, 227, 231, 236, 243, 253, 259 Assimilação 101 Assuntos humanos 25, 84,144, 256, 258 Ataques pessoais 38 Autobiografia 31, 40, 7 6, 97, 235 Autoclítico 153 Autoconhecimento 140 Autoconsciência 14 0 ,1 4 1 Autocontrole 77,1 36 Autodescrição 80 Autoestima 191, 2 15 ,14 0 Autoestimulação (intracerebral) 53 Autoinstruçóes 189 Autonomia 118 ,1 36 ,1 4 4 ,1 9 3, 222, 240, 241, 245, 247
B Behaviorismo metodológico 131,135 Behaviorismo radical - Comportamentalismo radical 2 7 ,1 0 3 , 1 0 6 , 108,109,112,129,130, 131, 262 Berço 39 Biologia 89,102 , u i, 11 2 ,11 9 ,12 0 ,12 2 , 249, 251, 256
c Caixa-preta 112,113,115,118 Cam po de concentração 21, 213, 214 Carga genética 89 Casamento 224, 226, 229 Causaçào 34 ,10 7,1 34 ,136 ,14 1,17 1, 238 Cérebro 53> 64, 78, 84,109, m , 112,113,115, i i 6 , 117, i i 8 , 123, 125,126,136, 142,155,156, 158, 262, 263 Ciência n , 12 ,1 3 ,1 9 , 20, 22, 25, 26, 27, 28, 31, 33, 41, 43, 44, 67, 77, 89, 95, 97,100, 101, 1 1 2 , 1 1 4 , 1 1 6 , 1 1 7 , i i 8 > 120,122,123,128,129,130,131,132,133,134,136,137,138,139,141,143, 14 4 ,15 1,15 5, 16 0 ,16 6 ,17 0 ,17 4 ,17 5, 17 8 ,19 9 , 208, u i, 215, 219, 220, 236, 248, 250, 253, 257, 258, 259, 260, 261, 262, 263 Ciúme 225,226 Civilização 85, 89, 211, 249, 251
Classificação nosológica 185, 186 Cognição 54, 55, 8 3,1 0 9 ,12 5 ,13 7, 13 8,1 6 5, 16 6 ,17 5 , 236 Cognição animal 54, 55 Cognitivismo 11, 23, 27, 29, 82, 83, 8 4 ,112 ,118 ,12 9 ,130 ,131 ,132 ,133 ,134 ,13 5,1 36 ,137 ,13 8, 139,141,142, 143 , 144>147’ 172» 173»Í 74 Cognitivismo epistemológico 83, 8 4 ,118 ,13 4 ,13 5, 13 9 ,14 1,14 4 ,17 3 Cognitivismo ético 84 ,136 ,14 4 Cognitivismo institucional *37 Cognitivismo metodológico 133,138 Cognitivismo radical+A89 134,135 ,13 6 Cognocientistas 137 Competência 58, 59 ,13 1,1 54,15 5,15 6 ,15 7, 200, 218, 231, 232, 251 Competência linguística 155,156 Competição 219, 223, 251 Complexos 2 6 ,10 1,1 6 6 , 184, 227, 241, 259, 263 Comportamento 13, 15 ,19 , 20, 25, 26, 27, 28, 29, 33, 34, 35, 36, 37, 40, 41, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 58,59, 63, 65, 66, 67, 68, 73, 75, 76, 77, 78, 79, 8o, 81, 82, 83, 84, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 98, 99,100,101,102,103,104,105,106,107, ui, 112,113, 114,115, 116,117,118,119,120,121,123,125,126,127,128,129,130,131,132,133,134, 135,136, 137,138, 139,140, 141,143, 144, 145, 146, 147,150, 152, 153, 154,155, 157,158,159, 160, 161, 163, 165, 166,167 ,168,169 ,170,171,172,173,174,175,176,177,178 ,183 ,184,185,186,189 , 190,192, 193, 194, 198, 203, 208, 209, 211, 236, 238, 240, 242, 243, 245, 246, 247, 250, 252, 253, 254, 255, 258, 259, 261, 262, 264 Comportamento adjundvo 94 Comportamento agressivo 95,186 Comportamento animal 25, 27, 29, 84, 87, 89, 92, 96, 100, 115, 119,129, 147 Comportamento anormal 37, 183, 184, 186 Comportamento autodescritivo 141 Comportamento criativo 12 1,1 7 6 ,17 7 , 208, 209 Comportamento de consumir 238 Comportamento desviante 242 Comportamento ecoico 153 Comportamento específico da espécie 89, 92, 9 4,123,12 6 Comportamento espontâneo 45, 104 Comportamento estereotipado 68 Comportamento governado por regras 170, 17 1, 17 2, 175 Com portamento humano 25, 26, 33, 34, 35, 40, 41, 75, 76, 77, 99, 119, 183, 211, 253, 259, 264 Comportamento intencional 133 Comportamento interno 131
Comportamento modelado pelas contingências 170, 171, 175 Comportamento operante 44, 68, 73, 88, 107, 12 0,12 1, 127, 16 8,17 7 Comportamentos p recorrentes 169, 175 Comportamento verbal 13, 35, 80, 131, 141, 145, 146, 147, 150, 152, 153, 155, 157, 158, 159, 160, i 6 i > 163,165,167,171, 211, 261, 262 Comunicação 159,207 Comunidade linguística 158,159 Condicionamento 19, 20, 34, 39, 43, 45, 51, 53, 57, 63, 64, 65, 66, 68, 72, 73, 88, 90, 91, 93,101,104,113,119,176, 206, 220 Condicionamento operante 19, 20, 34, 43, 45, 51, 53, 63, 64, 65, 66, 72, 73, 93, 101, 104, 113,119 Condicionamento respondente 65, 72 Condicionamento tipo II 72 Conduta 27, 41, 77, 78, 80, 82, 84, 96 ,129, 136, 13 9,14 7,15 0, 212, 234, 236, 247 Conexionismo 143 Conflitos 37, 8 4, 13 4,17 6,18 4 , 225, 227, 249 Conhecimento 25, 33, 41, 79, 84, 9 8 ,10 1,10 4 ,10 5, 113 ,115 ,12 3,1 24 ,13 1,14 1,14 3 ,14 4 ,14 9 , 164, 168, 170, 171, 174,196, 202, 203, 204, 211, 215, 236, 238, 242, 247, 248, 253, 257, 258, 260, 262, 264 Conhecimento científico 41, 124, 131, 202, 248, 257, 258, 260 Consciência 22, 24, 77, 79, 84, 87, ioo, 115, 125, 135, 136, 140 ,15 7, 168, 17 1,17 5 ,1 7 6 , 211, 217, 239, 244, 261 Consequências 19, 40, 45, 63, 65, 121, 127,14 6, 17 1,17 3,19 2,19 6 , 202, 207, 218, 225, 226, 227, 233, 236, 237, 241, 242, 252, 254, 255, 256, 258, 262 Consequências de longo prazo 252 Consequências remotas 171 Consumo 92, 95, 217, 242, 245, 247, 248 Contexto 11 ,1 2 ,1 4 , 22, 32, 64, 66, 67, 83, 87, 91, 9 3,10 1,1 0 2, n 2, 118,12 0, 123, 125, 129, 131,143,151,152,153,156,159,160,164,170,173,175,178, 186,195,196,197, 219, 227, 242, 244, 251, 257 Contingências aversivas 186 Contingências de longo prazo 252, 253 Contingências de reforçamento 36, 46, 47, 67, 79, 209, 256 Contracontrole 196, 253, 254, 255, 256, 264 Contrato 191 Controle 9,19 , 20, 26, 38, 44, 45, 48, 49, 63, 67, 68, 80, 83, 91, 9 2,11 7 ,127 ,12 8 ,13 6 ,14 4 , 168,171, 176, 186, 190, 191,192,193,194,196, 203, 206, 222, 224, 227, 232, 238, 239, 241, 242, 243, 244, 245, 246, 247, 248, 249, 250, 252, 253, 254, 255, 256, 258, 262 Controle aversivo 186, 249 Controle experimental 26, 9 1,11 7 ,128 , 262
Controle pelas consequências 19, 45,127 Controles sociais 192 Cooperação 223 Cópia 99 ,104 ,142 , 144 Crença 20, 21, 41, 77 ,13 9, 148, 1 7 1 , 173, 174, 200, 203, 209, 236, 244, 245 Crescimento demográfico 41, 239 Criacionismo 132 Criatividade 68, 70 ,10 9, 147, 17 6,17 7, 200, 208, 209, 211, 220 Críticas 20, 22, 23, 24, 27,40 , 47, 68, 9 5,111,112,133,135 ,145,14 6,147 ,162,18 9, 203, 224, 243, 256, 259, 260, 262 Cronobiologia 57 Cronometria mental 43, 44 Cultura 20, 2i, 22, 2 6, 38, 80, 90, 122, 170, 171, 177, 196, 203, 207, 208, 209, 219, 220, 224, 22 y, 237, 247, 249, 250, 251, 252, 254, 257
D Darwinismo 119, 122 Deficiência mental 188 Déficits sensoriais 50 Definição de objetivos 205 Democracia 232, 233, 246, 263 Descentração 169 Desenvolvimento 13, 25, 36, 50, 51, 57,58, 59, 70, 72, 88, 89, 92, 95, 99,100,101,103,106, 107,112,114,116,123,124» 125,126,140,157,159,160, 161, i6z, 163,164 , 1 7 7 , 186,19(3, 200, 212, 227» 228> 24O, 26i Desenvolvimento cognitivo 59, 99 ,10 0,10 7, 212 Desordens 81, 183, 18 5,1 87 ,18 9,19 1 Desordens psicológicas/distúrbios psicológicos 183, 187, 189, 191 Despotismo 253 Determinismo 126,147, 236 Detratores 39 Diferenças individuais 197, 202, 203, 206 Dignidade 20, 21, 235, 242, 243, 24 6> 247, 254 Discriminação 49 Diversidade 64, 67, 88, 89, 123,125, 126, 177, 206, 207, 208, 210, 220, 250, 251 Doenças mentais 185, 187 Droga 50, 51, 53, 54,186, 242 Drogas psicotrópicas 50,185 Dualismo 118, 136
E Economia de fichas 188 Educação 13, 36, 37, 38, 40, 78 ,10 0,14 4 ,17 6 ,19 5 ,19 6 ,19 8 ,19 9 , zoo, 202, 203, 204, 205, 206, 207, 209, 210, 211, 216, 220, 221, 222, 223, 224, 225, Zl 6, 22J , 2} 2, 245, 253 Emancipação das mulheres 229 Emoção 35, 8 3,13 7,13 8,1 54 ,171 Empirismo 105, 126 Enação 143 Engenharia comportamental 188 Engenharia genética 187 Entidades mentais 78, 81,119, 183 Epistemologia 103,123,143,167 Escola (sistema escolar) 11 ,1 2 ,1 9 , 26, 29, 32, 37, 75, 81, 89 ,10 0,10 3,12 9 ,13 0,13 4 ,14 2,14 3, 162,195, 196,197, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 221, 222, 228 Esgotamento de recursos 41 Esquema de intervalo fixo 94 Esquema de razão 53 Esquemas/escalas de reforçamento 48, 88, 252, 256 Estabilização seletiva 125 Estados internos 50 ,5 2, 115 ,13 0 ,14 0 Estados mentais 26, 52 ,119 ,12 9, 130,14 0 ,14 7, 246, 259 Estável 39, 68,157 Estereotipia 66 Estímulo 24,30, 44, 4 6, 48,50, 51,55, 56, 63,64,65, 88 ,92 ,99 ,103 ,104 ,113,114 ,116,13 2, 133,134,149,158,161,162,175 Estímulos discriminativos 169, 175 Estrutura 29, 45, 47, 92, 9 9 ,15 0,151 ,15 3,186, 227, 228, 249, 253 Estruturalismo 99 Estruturas profundas 146,155 Estudos com sujeito único 193 Etologia 13, 27, 38, 47, 87, 90, 92, 93, 96, ioij 12 3,126,135 Eventos internos 2 8 ,11 6 ,13 1,1 4 0 Eventos mentais 28, 29, 135,139, 173, 262 Eventos observáveis 28 Eventos privados 140 Evitação 46 Evolução 12, 24, 38, 45, 67, 81, 87, 90, 92, 93, 94, 95, 96, 99, 101, 102, 106, 107 , 119, 120, 122,123,124,12 6 , 131,133,151,154,157,160,161,177, 208, 224, 225, 228, 242, 244, 248, 249, 250, 251, 254, 263 Evolução biológica 45, 67, 93, 94, 95, 96, 10 1,10 7 ,1 19 , 120 ,12 2, 177 , 251
Evolução cultural 122, 126 Expert 84 ,118 ,135 ,165 , 206 Exploração 9,5 0, 6 8,13 1,19 9 , 233, 234 Explosão populacional 239 Extrapolação 87,14 7,15 0 , 257
F Fala subvocal 98, 167 Família 32, 224, 226, 228, 230 Fascismo 233 Fatores biológicos 187,188, 242 Fenocópia 102,106 Fenomenologia 236 Ficções explicativas 29 ,13 0 Filogenia 93 Filosofia social 12 ,1 9 , 43, 211, 249, 254, 260, 263 Fisiologia 25, 8 7,113 ,114 ,115 ,116 ,117 ,118 ,129 ,131 Fome 28, 239 Frenologia 163 Fuga 46, 6 5,18 6 ,19 1, 240, 241, 243 Função 28, 37,5 3, 56, 57, 72,152,154,159,160,167,170,186,192» 196, 217, 225, 252, 255 Função conativa 160 Função pragmática 160 Funcionalismo 118 Futuro (da sociedade) 12 0 ,1 6 1,1 7 0 ,17 1,1 7 7 ,18 6 ,18 7 ,19 5 , 203, 206, 214, 239, 247, 248, 251, 252, 263, 264
G Generalidade entre espécies 88 Gênio 38,209 Geradores de diversidade 12 5,12 6 Governo 21, 215, 220, 232, 233, 244» 245, 256 Gramática generativa 149, 152,155 ,15 6 Grupo de Yale 75, 79, 81 Guerra 214, 245, 259, 260
H Habilidades motoras Heresia 243
14 3,154
História (do pensamento científico) 12, 29, 31, 32, 37, 39, 40, 43, 67, 80, 81, 82, 83, 94, 95, 96, 99,101, 102, 107, 112,113, 115, 117, 118,119,120,122,123,131,134,143, 144, 151, 152, 153, 163, 169, 172, 177, 178, 184, 191, 192, 222, 224, 236, 237, 240, 241, 243, 247, 251, 252, 255, 258, 261 Holocausto nuclear 239 Homúnculo 144
I Identificação 9 5,1 11,1 59 ,19 6 , 227 Ideologia 21, 203, 211, 215, 231 Uocução 160 Imagens mentais 55, 57 Individualidade 251 Infância 32 Inovação 217 Instrução programada z$, 196,199, 200 Inteligência 29, 101, 14 9 ,16 5, 17 2 ,17 3, 236 Intenção 12 ,115 ,119 ,12 0 ,13 6 ,13 9 ,16 6 ,17 2, 17 3, 204, 218, 232 Intencionalidade 160,262 Interacionista 29,262 Intemalização 131, 231, 244 Interpretações equivocadas 23, 68,103 ,145, 206 Introspecção 26, 79 ,12 9
J Jogadores (gamblers)
209, 238
L Lazer 33, 216, 218, 219, 220, 232, 248 Lei do efeito 65
Liberdade 20, 21, 22,41, 65 ,78 ,91 ,10 2,1 26 ,19 0 ,19 1, 214, 229,233,234 ,235,237, 238, 239, 240, 241, 242, 243, 244, 245, 246, 247, 248, 251, 253, 254, 255, 256 Libido 250 Limiares de vibração 50 Limiares diferenciais 49 Linguagem 47,55,59, 63, 6 4 ,10 1,10 2,10 9,1 20 ,136 ,14 0 ,14 1,14 3,14 5,14 6 ,14 7, 150,151, 152,153,154,155,156,157,158,159,160,161,162,163,164,165,166,169,170 ,171,175, 252 Linguística 77, 82 ,101,140 ,143,14 6, T49,151,152,154 ,155,156 ,157,158 ,159,16 0,16 1,164 Literatura 29, 33, 34, 35, 38, 81, 9 0 ,139 ,17 6 ,17 8 , 208, 254 Livro-texto programado 37
Locução 160 Loterias 238
M Mando 153 Manipulandum 44,45 Mapa cognitivo 28,133 Máquinas de ensino 36 ,19 5, 19 6 ,19 8, 19 9 , 200, 201, 202, 204, 206 Matemática 13 8, 17 0, 200, 202, 204, 205, 209 Maternês 158 Mau comportamento 90 Mecanismos de defesa 79,184 Memória 29,115,125,126,133,142,154,155 Mentalismo 29» 77, 99 ,112,1 19» 130 ,13 1,13 6 ,15 5, 243, 245 Mente 19, 26, 29, 38, 41, 55, 59, 78, 83, 99, 103, 105, 113, 114, 118,123, 129, 132, 136, 137, 139,140,141,142,144,148,149,151,155,158, 168,177,190,191,196,199, 200, 202, 212, 239, 247, 261, 262, 263 Mente e cérebro 78 Mérito 119 ,13 0 ,13 3, 16 5,1 7 2 , 217, 220, 242, 243, 244, 262 Metáfora 8o, 83, m , 12 4, 14 0 ,14 2, 16 5 Métodos introspectivos 129 Modelagem 45, 6 8,1 20 ,14 0,1 88 Modelagem do operante 45 Modelo Estímulo-Resposta 147 Modo de vida americano 249 Modular 144 Motivação 36, 39, 70 ,13 7,13 8, 228 Movimento antiescola 203 Mulheres 32, 217, 220, 221, 228, 229, 233
N Necessidade 28, 29, 4 1, 10 0 ,1 13 ,1 14 ,1 2 0 , 209, 216, 218, 221, 227, 252, 253 Neurobiologia 84 ,118,12 5,135 » 136,14 3 Neurociências 11 3 ,11 5 ,11 7 ,11 8 ,11 9 , 263 Neurofarmacologia 115 Neurofisiologia 2$, 112, 114,115, 116,117,118 Neuroquímica 112,115 Novidade 27 ,121,12 6 ,131,17 6 ,177 , 207
O Obesidade 189 Observação 33, 43, 67, 80, 91, 92, 94, 116, 133, 165, 189, 260 Operacionismo 135,140 Organização do trabalho 218 Orientação experimental 193 Originalidade 97, 177
P Pacientes psicóticos 188 Padrões Fixos de Ação 121 Pensamento 9, 11, 12, 19, 24, 26, 27, 28, 29, 32, 34, 35, 37, 38, 75, 89, 98, 102, 103, ui, 115, 120,122, 125,127, 129, 136,139, 141,142, 143, 145,164,165, 167,168,170, 172, 173, 185, 206, 221, 256, 261, 262, 263 Percepção 55, 84, 104, 115, 117, 125, 126, 132, 142, 224, 237 Percepção (como ação) 132 Performance 14 1,154, 156, 157, 172, 200, 242 Perlocução 160 Permissividade 245 Personalidade 24, 29, 37, 38 ,184 ,18 6, 227, 253 Perspectiva de tempo (temporal) 253 Pesquisa básica 81, 83, 137, 139, 220, 258 Pesquisa científica 9 Platonismo 131 Poesia 145 Política experimental 256 Poluição 41, 239 Pós-efeitos 55 Prática 12, 26, 41, 45, 53, 55, 83, 130, 139, 186, 188, 191, 199, 206, 213, 222, 224, 232, 246, 247, 253, 257 Prêmios 219 Pressões seletivas 119 Prevenção 1S6, 242, 248 Privacidade 225, 237 Problemas dos professores 204 Processamento de informação 112, 133, 142, 173, 174 Processos mentais 56, 79, 83, n8, 131, 135,167, 172,173 Programa (motor) 37, 90, ioo, 127, 134, 150, 178 ,19 8,19 9, 201, 213, 214, 227 Propósito 59, 92, 104, 119, 120, 121, 124,13 6, 173, 248, 262 Psicanálise 75, 76, 77, 78, 8\, 82, 83, 84 ,12 0, 129, 183,190
Psicodinãmica 183,184 , 189 ,191, 192 Psicofisica 26, 49 Psicolinguistica 77, 147, 150, 154, 157, 161, 163 Psicolinguistica do desenvolvimento 157, 161 Psicologia clínica 37,185 Psicologia cognitiva 28, 43, 44, 55, 77, 132, 133, 134, 136,139,141, 142,15 6 , 171, 172, 175, 205, 206, 245 Psicologia comparativa 57, 87,135 Psicologia do tempo 57 Psicologia europeia 26, 262 Psicologia experimental 25, 43, 137, 193, 206 Psicologia francesa 27 Psicologia geral 57, 87 Psicologia humanista 236 Psicologia introspectiva 261 Psicopatologia 37, 78 ,185,186 Psicoterapia 37, 78, 84 ,13 6,14 4, 193,19 4, 211 Psiquiatria 90,185, 186, 1S7 Pulsões 136, 250 Punição 11, 22, 47, 79, 80, 167, 203, 222, 244, 252 Puzzle box 65
Q Questóes éticas
190
R Racionalidade 84, 136, 171, 240, 258 Recompensa imediata 252 Recompensas 47,190, 238, 252 Recursos 35, 41, 58,193, 203, 205, 239, 248 Reforçador positivo 44 Reforçamento 29, 36, 45, 46, 47, 48, 49, 53, 54, 58, 67, 70, 79, 88, 92, 94, 114, 121, 127, 146, 163,188, 190, 191,192, 198, 204, 209, 238, 249, 250, 252, 256 Reforçamento intermitente 238 Reforçamento intrínseco 204 Refutação 123 Regra de padrão-ação 175 Regras 138,141, 151, 152, 154, 155, i6r>162, 169, 170, 171, 172, 175, 196, 205, 214, 247 Regulação 58, 171, 250, 255 Regulações temporais do comportamento 58
Relativismo cultural 251 Religiões 247,250 Relógios internos 57 Remediação 186 Repertório específico da espécie 90, 94 Representação 133,135,139,142,143,175 Representação interna 14 2,17 5 Repressáo 79, 8 0 ,11 6 ,19 0 , 242, 249, 250 Resolução de problemas 2 6, 68, 70, 72, 84,142,165,1 66,169,172,173,174,175,176,196, 199, 204 Respeitabilidade científica 128,178 Responsabilidade 95,18 6,18 7, 230, 242, 244, 245, 248, 256 Responsabilidade política 245, 256 Resposta 20, 23, 24, 30, 37, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 53, 57, 58, 60, 64, 65, 66 , 6 7 , 6 8 , 70, 76, 88, 91, 92, 99, 103,104,105, 107,113,114, H7> 118,119,126,133, 138, 139,146, 148,149, 153,159,162,165,166,169,176, 213, 247, 250, 254, 258, 260, 263 Resultados experimentais 150 Retórica 161 Revolução cognitiva 137 Ritmos biológicos 58,59 Robótica 143 Robotização 20,250 Romance utópico 25, 33, 35, 213 Rotação mental 56
S Sala de aula, 36 ,196,19 8, 201, 205 Saúde mental 18 6, 228 Seleção 13, 45, 67, 68, 93, 94,104,107,119» 120,121,123,124,125,126,127,136, 152, 158, 162, 174, 177, 178, 207, 209, 122, 256 Seleção cultural 177 Seleção natural 120, 123, 124, 174 Selecionismo 10 8,12 5,1 27 , 262 Self 125 ,132 , 236, 240 Sensação 49, 105 Sintaxe 149,15 2, i$ 8 ,159 ,164 Sintomas 77, 84 ,184 ,186 ,189 Sistema de Segundo Sinal 64 Skinnerianos 12, 22, 82, 212 Sobrevivência 20> 9 5,12 1,19 6, 206, 208, 218, 233, 247, 249, 251, 252
Sociedade americana Sociobiologia 96 Superego 184,244
22,17 6, 214, 224, 228, 260
T Tato 153,160 Taxa de natalidade 227 Taxa de respostas 48, 49, 66, 88 Técnicas de laboratório 113 Técnicas operantes 49» 57» 59, 90, 115, 188 Tecnologia do ensino 36 , 199, 207, 224 Tempo ii, 12 ,13, 23, 25, 27, 33, 34, 36, 37, 38, 43, 46, 47, 48, 4 9 ,5 5,5 6 , 57» 58,59, 60, 65, 6 6 68, 75, 79, 80, 81, 87, 89, 90, 91, 92, 94, 95,101,117,121,125,135,143,146,155,161,162, 165, 170, 184, 195, 196, 197, 198, 201, 205, 2o6, 207, 214, 215, 21 6, 217, 218, 219, 220, 224, 231, 232, 233, 234, 236, 24I, 249, 252, 253, 255, 258, 261, 262, 263, 264 Tempo de reação 43 Tendência instintiva 90, 91, 94 Teoria da enunciação 160 Teoria da evolução 177 Teoria da evolução (ver evolução) 11 9 ,17 7 Teorias 21, 22, 23, 73, 75, 9 7,1 0 0 ,10 1,10 3,1 0 6 ,10 7 ,13 6 ,14 3 ,14 4 ,15 2 , 155,179 ,191 Teorias inatistas 101 Terapia comportamental 37, 40, 80, 8 1,13 7,1 8 3,1 8 4 ,19 0 ,19 1,19 4 Terapia rogeriana 191 Terapias cognitivas 137 Terminologia 139,160,163,170 Termos 19, 37, 46, 72, 79, 82, 99, 105, 106, 107, n6, 125, 132,135 , 136, 137 ,138, 139, 140, 14 1,142 ,144 ,153 ,157 ,161,16 6 ,168 ,171,173,175 ,176,177,184 ,185,199 , 213, 224, 251, 259 Termos psicológicos 140 Topografia 45 Tortura 244,252 Totalitarismo 213, 233, 253 Trabalho 9 ,1 2 ,1 4 ,1 5 ,1 9 , 20, 22, 23, 24, 27, 29 ,31, 32, 33, 34, 35, 36 ,57, 58, 64, 65, 66, 67, 68, 73, 75, 76, 77, 79, 80, 8i, 82, 87, 88, 89, 90, 94, 97,100,101,104,113,114,115,117,118, 123, 125,127,129,134,138, 145, 146,152, 153,159, 163,164,165,166, 178, 187,188,194,195, 196, I97, 200, 201, 204, 213, 216, 217, 218, 219, 220, 223, 229, 23O, 23I, 232, 24I, 242, 257, 26l Transformações gramaticais 155 Tratamento 23, 39, 40, 47, 49, 5 1,12 0 ,12 7 , 144 ,17 4, 183, 184, 185,186, 187, 19 0,19 1, 193, ,
194
,230
Tratamento comportamental
19 3,194
Tratamento por meio de medicamentos Turno de trabalho 57
187
u Uniformização 208 Utopia 35, 181, 214
V Variabilidade 69, 70, 71, 72,1 0 7 Variação 68, 107, 119, 12 1,12 5, 127, 128, 207 Variação (comportamen tal) 68, 127 Variação-seleção 127 Variáveis intervenientes 133, 134 Variável 46 Variedade 43, 49, 67, 69, 88, 174, 177, 185, 216, 217, 219, 221, 250, 251, 262 Vida mental 12 9 ,1 30,13 1, 135 Vontade 29, 45, 63, 64, 84, n6, 119, 136, 141, (44, 162, 166, 172, 173, 174, 215, 232, 239, 242, 244, 247, 257 Vontade livre 45, 136, 144 w WaldenTwo 25, 35, 40, 75, 195, 214, 215, 216, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 223, 224, 225, 226, 227, 228, 229, 231, 232, 233, 234, 248, 250, 253, 256, 260, 263, 264
ÍNDICE REMISSIVO POR AUTOR
A Agnew, S. 21, 23, 249, 260 Alexander, F. 81,10 5 Allan, L. 59 Austin, J. L. 15 9,160 Ayllon, T. 188 Azrin, N. H. 188 B Bacon, F. 32, 76 Bates, E. 159 ,16 0 Bauer, R. 244 Bernard 50 Bernard, C. 50 Blackman, D. E. 15, 59 Bloomfield, L. 164 Blue, Y. 34 Boring, G. E. 34 Botson, C. 212 Boulanger, B. 69, 72 Bover, M. 100 Breland, K. 91 Bronckart, J. P. 162 Bruner, J. 14, 36 Bunge, M. 11
c Catania, A. C. 23 Cervantes, M. 7 6 Changeux, J. P. 10 8,113, 119, 125, 136 Chaplin, C. 32
Chi, M. T. H. 175 Chomsky, N. 13, 21, 22, 23, 24, 35, 76, 77, 143,145 , 146, 147, 14 8,14 9,150 , 151, 152, 153, 154, 155, 156, 158, 159, l6o, 161, 162, 163, 164, 165, 212, 213, 214, 219, 263 Colpaert, F. C. 51 Cooper, L. A. 56 Copérnico, N. 240 Croiier, W. J . 34 ,114
D Darwin, C. 22, 42, 76, 119 ,12 0 ,12 3, 12 4,1 77 , 240 Davis, H. 114 Delius, J. D. 56, 57 Dennis, W. 117 Descartes, R. 76 ,14 9 Dews, P. B. 32 Dickinson, A. 84, 135 Diderot, D. 38, 209 Dilthey, W. 26 Dollard, J. 37, 75 Donders, F. C. 43 Dreyfus, A. 132 Dupoux, E. 108
E Eccles, J. C. Edelman, G. Einstein, A. Eliot, T. S.
118, i2 j, 136 M. 12 5,12 6,12 7 12 3,12 4 76
F Ferster, C. 36,127 Fodor, J. A. 143 ,14 4,16 3, 263 Fontaine, O. 133 Forbes, A. 114 Fraisse, P. 38 Frankenheim, J. F. 51 Freud, S. 12 ,1 4, 28, 38, 42, 75, jé , 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 95,130,183,184,185, 211, 235, 240, 244, 249, 262 Friedman, W. 59
G Galanter, E. 134 Galileu, G. 22, 42 Gail, F, J. 163, 263 Galton, E 76 Gardner, H. 83 Gibbon, J. 59 Glennon, R. A. 51 Goethe, von, J. W. 103 Gottlieb, R. 235 Graulich, A. M. 14 Gray, J. A. 47 Gutenberg, J. 199
H Hager, J. L. 92 Hall, M. 35,113 Halliday, M. A. K. 159 ,160 Harlow, H. E 193 ,197 Hebb, D. O. 134 Hermstein, R. J. 13, 93 Hinde, R. A. 92 Hirschhorn, I. D. 51, 53 Holland, J. G . 37 ,199 , 201 Hollard, V. D. 56, 57 Hubei, D. H. 143 Hull, C. L. 27, 66, 75, 79, 81, 87, 98, 99 Hunt, E. 165,17 4,175 Huxley, A. 35
I Illich, I. 203 Inhelder, B. 13, 100
J Jackson, J. L. 59 Jakobson, R. i6o> 164 James, W. 35, 76,145 Janet, P. 14, 27, *8, 142 Järbe, T. U. C. 51
Jespersen, O. 164 Johnson-Laird, P. 118,139 Jones, E. 12
K Kazdin, A. E. 37,183 Konorski,J. 65 Kruse, H. D. 81, 192 L Lacan,J. 82 Lambercier, M. 13 Lancelot, M. 20 Larkin, J. H. 175 Lashley, K. S. 134 Laurent, E. 212 Lea, S. E. G. 92 Le Ny, J. E 129 Lejeune, H. 15, 58, 59, 6o> 92 Levin, H. 40 Liddell, H. 193 Lindsley, O. R. 188 Locke, J. 105, 149 Lorenz, K. 19, 27, 29, 38, 76, 77, 88, 89, 90, 93, 95, 11 9 ,1 13 ,1 2 6 ,1 2 7 , 135, 237, 262 Lowe, C. E 15 Luciano Soriano, M. 15 Luria, A. R. 14 0 ,17 !
M Macar, E 59 Macintosh, N. 126 MacLean, P. D. 84 Magnus, R. 113 Marr, D. 117, 118 Marx, K. 7 6 Maurissen, J. P. J. 50, 51 Mehler, J. 108 ,147 Michon, J. A. 59 Millet, K. 229 Milner, P. M. 53
Moerk, E. L. 163 Monod, J. 123,12 4 Moreau M. L. 157 Morse, H. 94 Moscovici, S, 21, 22
N Neisser, U. 76, 134, 143 Newton, I. 38 Nietzche, E 235 Nouchi, E 22
o Odling-Smee, E J. 123 Olbrechts-Tyteca, L. 161 Olds, J. 53
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Este livro foi impressa em setembro de 2014 pela Gráfica Compacta em São Carlos/SP.
0 livro trata de impor tantes qu estões
científicas e filosóficas que envolvem B. F. Skinner, um dos principais nomes da -"a lise do comportamento (experimental c aplicada) e fundador do behaviorismo radicai. 0 autor da obra, M arc Richelle, é um renomado estudioso dos tex tos skinnerianos e reconhecido por sua leitura não dogmática em razão do amplo conhecimento de filosofia e de ou tras abordagens da psicologia. Publicada originalmente em língua inglesa, sua tradução possibilitará que estudio sos e curiosos a respeito de sse polêmico cientista estadunidense tenham ace sso a e sta análise crítica, extremamente relevante, elaborada por Richelle, que foi aluno de Skinner e de Piaget. Além de desfazer m itos (bons e ruins) sobre Skinner, Richelle nos brinda com uma leitura fácil e prazerosa, ap esar da complexidade dos a ssun tos tratados. Leitura indispensável a quem queira falar Skinner, bem ou mal. Uma honesta e didática releitura dos principais aspe ctos de sua obra.
Marc N. Richelle nasceu em 1 9 3 0 na Bélgica. É mestre em Filosofia e Letras pela Universidade de Liège, 1952; mestre em Psicologia pela Universidade de Genebra, 1954, e PhD em Psicologia, Liège, 1 959. Foi membro honorário da Fundação Educacional Belgo-Americana em Harvard, no Departamento de Psicologia Experimental, entre 195Ô e 1959, onde Skinner estava lecionando. Professor emérito da Universidade de Liège, Bélgica, em Psicologia Experimental. É membro e presidente honorário da Real Academia de Ciências da Bélgica. Possui mais de 2 5 0 publicações, incluindo 21 livros (como autor, coautor ou editor), em francês, inglês, espanhol e hebraico. Ministrou palestras e cursos, a convite, em mais de 5 0 universidades na Europa e nas Américas. Recebeu o título de doutor honoris causa das Universidades de Lille (Charles de Gaulle), Genebra, Coimbra, Lerida e Lisboa. É membro estrangeiro da Academia das Ciências de Lisboa e da Real Academia de Ciências Morais e Políticas de Madri. Em 1 990, ganhou o Prêmio Quinquenal Ernest-John Solvay do Fundo Nacional da Pesquisa Científica (FNRS), maior prêmio científico da Bélgica.
edUFSCar Editora da Universidade Federal de São
Carlos
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