CienteFico. Ano I, v. I, Salvador, janeiro-julho 2002
Totem e Tabu Sigmund Freud
Vida Sigmund Freud nasceu em 6 de maio de 1856 em Freiberg, na Morávia (antiga Tchecoslováquia). Mudou-se com a família para Leipzig e mais tarde, aos 4 anos, para Viena, onde permaneceu por quase oitenta anos. O núcleo familiar era incomum, pois, dois meio-irmãos de Freud, Emmanuel e Philipp, tinham praticamente a mesma idade de sua mãe. Freud era ligeiramente mais novo que seu sobrinho John, filho de Emmanuel. Esta situação peculiar pode ter estimulado o interesse de Freud em dinâmica familiar, levando-o às suas posteriores formulações sobre o Complexo de Édipo. Aos oito anos de idade Freud lia Shakespeare e, na adolescência, ouviu uma conferência, cujo tema era o ensaio de Goethe sobre a natureza, ficando profundamente impressionado. Durante sua infância foi um excelente aluno. Apesar da limitação financeira de sua família, o que obrigou os seus oito membros a viverem em um apartamento pequeno, Freud, o primogênito, tinha seu próprio quarto e até mesmo uma lâmpada de óleo para estudar. O restante da família arranjava-se com velas. No ginásio continuou seu excelente desempenho acadêmico. Visto ser judeu, todas as carreiras profissionais, fora a Medicina e o Direito, foram-lhe vedadas, tal era o clima anti-semita prevalecente na época.
Influenciado pelos trabalhos de Darwin e Goethe, ele decidiu entrar na Faculdade de Medicina da Universidade de Viena Viena em 1873. No início, Freud se concentrou na biologia; dissecou mais de quatrocentas enguias macho para determinar a estrutura dos testículos. Suas descobertas foram inconclusivas, mas é digno de nota que o seu primeiro esforço de pesquisa se relacionasse com sexo. Suas experiências na Universidade de Viena, onde foi tratado como "inferior e estranho" por ser judeu, fortaleceram sua capacidade de suportar críticas. Permaneceu como estudante de Medicina durante oito anos, três a mais do que o habitual. No decorrer desses anos, trabalhou no laboratório fisiológico do Dr. Ernst Brücke. Um pouco da crença de Freud nas origens biológicas da consciência pode ser devida às próprias posições de Brücke. Freud fez pesquisas independentes sobre histologia e publicou artigos sobre anatomia e neurologia. Aos 26 anos recebeu seu diploma de médico. Freud queria prosseguir com o estudo científico num ambiente acadêmico, mas Brucke o desestimulou devido às circunstâncias financeiras. Com relutância, concordou com Brucke, decidindo fazer exames e praticar a Medicina. Apesar de se dirigir relutantemente para a clínica particular, seus interesses principais permaneciam na área da observação e exploração científicas. Trabalhando primeiro como cirurgião, depois em clínica geral, tornou-se médico interno do principal hospital de Viena. Fez um curso de Psiquiatria, o que aumentou seu interesse pelas relações entre sintomas mentais e distúrbios físicos. Em 1885, tinha se estabelecido na posição prestigiosa de conferencista da Universidade de Viena. Sua carreira começava a parecer promissora. Entre 1884 a 1887, Freud fez suas primeiras pesquisas com cocaína. De início, ficou impressionado com suas propriedades. Ele escreveu a respeito dos possíveis usos para os distúrbios tanto físicos quanto mentais. Por pouco tempo foi seu defensor para o uso Medicinal, mas aos poucos tornou-se apreensivo em relação às suas propriedades viciantes e interrompeu a pesquisa. Com o apoio de Brücke, Freud obteve uma bolsa e foi para Paris trabalhar com Charcot. Este demonstrou que era possível induzir ou aliviar sintomas histéricos com a sugestão
Influenciado pelos trabalhos de Darwin e Goethe, ele decidiu entrar na Faculdade de Medicina da Universidade de Viena Viena em 1873. No início, Freud se concentrou na biologia; dissecou mais de quatrocentas enguias macho para determinar a estrutura dos testículos. Suas descobertas foram inconclusivas, mas é digno de nota que o seu primeiro esforço de pesquisa se relacionasse com sexo. Suas experiências na Universidade de Viena, onde foi tratado como "inferior e estranho" por ser judeu, fortaleceram sua capacidade de suportar críticas. Permaneceu como estudante de Medicina durante oito anos, três a mais do que o habitual. No decorrer desses anos, trabalhou no laboratório fisiológico do Dr. Ernst Brücke. Um pouco da crença de Freud nas origens biológicas da consciência pode ser devida às próprias posições de Brücke. Freud fez pesquisas independentes sobre histologia e publicou artigos sobre anatomia e neurologia. Aos 26 anos recebeu seu diploma de médico. Freud queria prosseguir com o estudo científico num ambiente acadêmico, mas Brucke o desestimulou devido às circunstâncias financeiras. Com relutância, concordou com Brucke, decidindo fazer exames e praticar a Medicina. Apesar de se dirigir relutantemente para a clínica particular, seus interesses principais permaneciam na área da observação e exploração científicas. Trabalhando primeiro como cirurgião, depois em clínica geral, tornou-se médico interno do principal hospital de Viena. Fez um curso de Psiquiatria, o que aumentou seu interesse pelas relações entre sintomas mentais e distúrbios físicos. Em 1885, tinha se estabelecido na posição prestigiosa de conferencista da Universidade de Viena. Sua carreira começava a parecer promissora. Entre 1884 a 1887, Freud fez suas primeiras pesquisas com cocaína. De início, ficou impressionado com suas propriedades. Ele escreveu a respeito dos possíveis usos para os distúrbios tanto físicos quanto mentais. Por pouco tempo foi seu defensor para o uso Medicinal, mas aos poucos tornou-se apreensivo em relação às suas propriedades viciantes e interrompeu a pesquisa. Com o apoio de Brücke, Freud obteve uma bolsa e foi para Paris trabalhar com Charcot. Este demonstrou que era possível induzir ou aliviar sintomas histéricos com a sugestão
hipnótica. Freud percebeu que, na histeria, os pacientes exibem sintomas que são anatomicamente inviáveis. Tornou-se claro para Freud que a histeria era uma doença psíquica, cuja gênese requeria uma explicação psicológica. Charcot, percebendo o interesse de Freud, permitiu-lhe traduzir seus escritos para o alemão quando voltou para Viena. Certa noite, numa recepção, Freud ouviu Charcot asseverar que as dificuldades de um paciente tinham base sexual. Para Freud esta avaliação foi uma percepção iluminadora e estimulante. A partir disso, ele ficou alerta para os problemas sexuais de seus clientes. O trabalho na França aumentou seu interesse pela hipnose como instrumento terapêutico. Com a cooperação do célebre e experimentado médico Josef Breuer, Freud explorou a dinâmica da histeria. Suas descobertas foram resumidas por Freud: "Os sintomas de pacientes histéricos baseiam-se em cenas do seu passado que lhes causaram grande impressão mas foram esquecidas (traumas); a terapêutica, nisto apoiada, consistia em fazêlos lembrar e reproduzir essas experiências em um estado de hipnose (catarse)". Durante anos, Freud desenvolveu uma importante amizade com o médico Breuer, que alcançara fama pelo seu estudo da respiração e pela descoberta do funcionamento dos canais auditivos e semicirculares. Eles discutiam sobre os pacientes de Breuer incluindo Ana O., cujo caso seria vital para o desenvolvimento da psicanálise. Ela apresentava uma ampla gama de graves sintomas histéricos, incluindo a paralisia, a perda de memória, a deterioração mental, náuseas, e distúrbios da visão e da fala. Breuer tratou-a inicialmente usando a hipnose e posteriormente, em suas consultas, Ana contava os incidentes perturbadores do dia. Ela se referia às conversas com Breuer pelos termos “limpeza de chaminé” e “cura falada”. O relato desse caso por Breuer foi importante para o desenvolvimento da psicanálise, pois introduziu Freud no uso do método da catarse, a cura falada, que viria a merecer tanto destaque em sua obra. Freud adotava os métodos de Breuer, a hipnose e a catarse, no tratamento de seus pacientes, mas pouco a pouco foi ficando insatisfeito com a hipnose. Embora aparentemente pudesse
aliviar e eliminar sintomas, ela não parecia capaz de curar. Esses e outros problemas o levaram a abandonar a técnica, mas ele manteve a catarse como método de tratamento, tendo desenvolvido a partir dela o que tem sido considerado a técnica mais significativa na evolução da psicanálise: a livre associação. Em 1895, Freud e Breuer publicaram o clássico Estudo Sobre a Histeria, considerado por muitos como o marco do início formal da psicanálise. Breuer, no entanto, relutara em publicar o livro, pois discordava sobre a idéia de que o sexo era a única causa para a neurose. A decisão de publicar o livro considerando os resultados obtidos levou ao estremecimento da amizade, e dentro de poucos anos o rompimento entre eles era completo. Em 1896, Freud usou pela primeira vez o termo "psicanálise" para descrever seus métodos. Sua auto-análise começou em 1897. Em 1900, ele publicou A Interpretação de Sonhos, considerada por muitos como seu mais importante trabalho, apesar de, na época, não ter recebido quase nenhuma atenção. Seguiu-se, no ano seguinte, outro livro importante: Psicopatologia da Vida Cotidiana. Gradualmente, formou-se à volta de Freud um círculo de médicos interessados, incluindo Alfred Adler, Sandor Ferenczi, Carl Jung, Otto Rank, Karl Abraham e Ernest Jones. O grupo fundou uma sociedade. Vários documentos foram escritos, uma revista foi publicada e o movimento psicanalítico começou a expandir-se. Em 1910, Freud foi convidado para ir à América pronunciar conferências na Universidade de Clark. Seus trabalhos estavam sendo traduzidos para o inglês. As pessoas foram se interessando pelas teorias do Dr. Sigmund Freud. Inicialmente, Freud trabalhou com a psicologia individual, tratando das neuroses (1888), construiu as teorias da fantasia (1897), dos sonhos (1900), e da sexualidade (1905). Os resultados alcançados com o estudo da psicologia individual forneceram dados para a sua visão de uma psicologia da coletividade, possibilitando possibilitando a Freud formular em 1913 a teoria
da cultura, tendo nesta época escrito Totem e Tabu, texto instigante e, diríamos hoje, interdisciplinar. Freud alcançou o auge da fama entre 1919 e 1939. Por volta da década de vinte, a psicanálise tinha evoluído como sistema teórico que propunha uma compreensão de toda motivação e personalidade humanas, e não apenas como método de tratamento de pessoas perturbadas. Freud passou sua vida desenvolvendo, ampliando e elucidando a psicanálise. Tentou controlar o movimento psicanalítico, expulsando os membros que discordavam de suas opiniões e exigindo um grau incomum de lealdade à sua própria posição. Jung, Adler e Rank, entre outros, abandonaram o grupo após repetidas divergências com Freud a respeito de problemas teóricos. Mais tarde, cada um fundou sua própria escola de pensamento. Freud escreveu extensivamente. Suas obras completas compõem-se de 24 volumes e incluem ensaios relativos aos aspectos delicados da prática clínica, uma série de conferências que delineiam toda a teoria e monografias especializadas sobre questões religiosas e culturais. Tentou construir uma estrutura que sobrevivesse a ele, e que eventualmente pudesse reorientar toda a psiquiatria para sua posição. Temia que os analistas que se desviavam dos procedimentos estabelecidos por ele pudessem diluir o poder e as possibilidades da psicanálise. Queria, sobretudo, impedir a distorção e o uso incorreto da teoria psicanalítica. Freud descobriu que sofria de câncer da boca em 1923 e, mesmo assim, manteve-se produtivo durante dezesseis anos, tolerando tratamentos constantes e dolorosos e resistindo a 33 cirurgias bucais. Hitler tornou-se o chanceler do Reich em 1933. A Gestapo investigou a casa de Freud; prendeu e interrogou Anna Freud durante um dia inteiro. Ameaçado pela ocupação nazista da Áustria (1938), Freud emigrou para a Inglaterra com sua família e, por um curto espaço de tempo, residiu em 20 Maresfield Gardens, local que, 48 anos mais tarde, veio a se tornar o Freud Museum London.
Embora bem recebido na Inglaterra, Freud não pôde aproveitar o último ano de sua vida por causa da doença. “É trágico”, disse ele, “quando o homem sobrevive ao seu corpo”. Ele permaneceu lúcido e trabalhou quase até o fim. Alguns anos antes, quando escolhera Max Schur como médico pessoal, Freud fizera que ele lhe prometesse que não o deixaria sofrer desnecessariamente. Schur deu a Freud três injeções de morfina num período de vinte quatro horas, encerrando, aos 83 anos de idade, no dia 23 de setembro de 1939, os muitos anos de sofrimento pelos quais ele passara. O trabalho de Freud, nascido das disciplinas especializadas de Neurologia e Psiquiatria, propõe uma concepção de personalidade que surtiu efeitos importantes na cultura ocidental. Sua visão da condição humana, atacando violentamente as opiniões prevalecentes de sua época, oferece um modo complexo e atraente de perceber o desenvolvimento normal e anormal. Freud explorou áreas da psique que eram discretamente obscurecidas pela moral e filosofia vitorianas. Descobriu novas abordagens para o tratamento da doença mental. Seu trabalho contestou tabus culturais, religiosos, sociais e científicos. Seus escritos, sua personalidade e sua determinação em ampliar os limites de seu trabalho fizeram dele o centro de um círculo de amigos e críticos em constante mudança. Sigmund Freud, pelo poder de sua obra, pela amplitude e audácia de suas especulações, revolucionou o pensamento, as vidas e a imaginação de uma era. Seria difícil encontrar na história das idéias, alguém cuja influência fosse tão imediata, tão vasta e tão profunda. Sempre envolvido em debates a respeito da validade ou utilidade de seu trabalho, ele continuou a escrever. O sucesso de Freud pode ser julgado não só pelo interesse e debate contínuos sobre aspectos da teoria psicanalítica, mas principalmente por suas idéias que se tornaram parte da herança comum da cultura ocidental. Todos nós devemos a Freud a revelação do mundo que repousa sob a nossa consciência.
Em 1912 as relações pessoais entre Freud e Jung começaram a ser menos cordiais, mas passariam dois anos mais antes que esta separação também se efetivasse. Freud considerava 1912 como um dos seus anos mais produtivos; isso por causa do aparecimento do seu grande livro Totem e Tabu[1]. Em geral, foi um ano infeliz e cheio de angústia e também um período em que ele padeceu muito com complicações de saúde. É possível que todos esses elementos se encontrem obscuramente interligados. “Somente a nova geração é que colherá o prêmio do reconhecimento. Mas a nós terá cabido a incomparável alegria da primeira visão da descoberta.” Nesse mesmo ano a psicanálise estava sendo violentamente atacada. Freud sempre acreditou que essa campanha difamatória era uma das causas motivadoras da mudança de posição que logo ocorreu depois entre os seguidores suíços. É sempre difícil para os suíços colocarem-se em posição contrária à de seu compatriota. Estamos nos referindo a Jung, claro. Não houve muitos momentos brilhantes em sua vida por essa época e, indubitavelmente, a perda de antigos colegas fez com que ele valorizasse ainda mais aqueles que permaneciam. Freud publicou certo número de pequenos artigos em 1912, mas houve dois tópicos que dominaram seu pensamento durante o ano: a exposição de sua técnica e a psicologia da religião[2]. Podemos vislumbrar uma vinculação entre esses tópicos aparentemente disparatados. Ambos tinham a ver com a progressiva dissensão da escola suíça. Freud acreditava que muito dessa dissensão, da mesma maneira que acontecia com Adler e Stekel, provinha de um conhecimento imperfeito da técnica da psicanálise[3], e que, portanto, era uma imperativa obrigação de sua parte expor essa técnica mais detalhadamente do que o fizera até então. O seu interesse pela religião, revivido por essa época, era em parte considerável ligado à ampla incursão de Jung no terreno da mitologia e do misticismo. Esses estudos traziam conclusões opostas: Freud mostrava-se mais convicto do que nunca sobre os seus
pontos de vista acerca dos impulsos incestuosos e do complexo de Édipo, o que gerou discrepância entre a teoria psicanalítica e a psicologia analítica. Enquanto isso, Jung[4] tendia, cada vez mais, a olhar esses fatos como não tendo a significação literal que aparentavam, mas como simbolizadores de tendências da mente. O principal acontecimento na vida de Freud em 1913 foi a sua ruptura final com Jung, que se verificou durante o congresso de Munique, em setembro. Nunca mais se encontraram embora umas poucas expressões formais de cordialidade continuassem até o ano seguinte. Foi esse um ano completamente ansioso e dilacerante, e Freud o descreveu: “Mal posso recordar-me de uma época tão cheia de mesquinhas injúrias e de fatos aborrecidos como esta. É como se fosse uma chuvarada de mau tempo, que precisamos aguardar que termine para ver quem levou a melhor, a gente mesmo ou o gênio diabólico do tempo”.No mesmo mês havia descrito a si mesmo para Pfister como um “alegre pessimista”. Nesse mesmo mês, em 14 de janeiro, um empolgante acontecimento teve lugar na casa de Freud. Foi o casamento de sua segunda filha, Sofia, com Max Halbersbadt, de Hamburgo, um genro que era tão bem-vindo aos sogros como o primeiro havia sido. A primeira metade do ano foi inteiramente ocupada em redigir Totem e Tabu[5]. Freud colocava essa obra como a melhor que jamais havia escrito. Durante os dois anos anteriores, Jung andou mergulhado fundamente na literatura da mitologia e da religião comparada, e os dois amigos tiveram conversações à respeito do assunto. Freud já começava a sentir-se desgostoso com a direção tomada pelas pesquisas de Jung. Este principiava a derivar conclusões antes imprecisas, retiradas desse longínquo terreno, para transferi-las para as explicações concernentes aos dados clínicos, enquanto o método de Freud consistia em ver até que ponto as conclusões derivadas da sua direta experiência analítica podiam jogar alguma luz nos problemas mais distantes relativos à história primitiva do homem. Desde o caso do pequeno Hans, com a sua fobia a cavalos, Freud estava alerta quanto à significação inconsciente dos animais e quanto à equação totemística entre eles e a imagem
do pai. Abraham e Ferenczi também haviam relatado casos similares, mesmo quando o Totem dos neuróticos era um objeto inanimado como uma árvore. Eis que em 1910 apareceu o livro de Frazer, obra maciça em quatro volumes, sobre “Totemismo e Exogamia”, que deu a Freud muito o que pensar. Em 1911, Freud mergulhou num vasto material que teria de dominar, antes que pudesse expor suas idéias, relativamente às semelhanças entre as crenças e os costumes primitivos e as fantasias inconscientes de seus pacientes neuróticos. Ele estava iniciando, evidentemente, um de seus grandes períodos produtivos. Tudo foi bem durante a redação propriamente dita no livro. “Estou escrevendo o Totem, neste instante, com a sensação de que será a minha maior, melhor e talvez a minha última obra. A confiança interior me segreda que estou certo. Infelizmente tenho muito pouco tempo para consagrar à obra, e assim tenho de me forçar continuadamente rumo a este estado de espírito, e isso prejudica o estilo.” E uns poucos dias mais tarde: “estou trabalhando na última seção do Totem, o que vem no momento preciso para aprofundar a brecha (entre ele e Jung) através de fantasmas... Não escrevi nada com tamanha convicção desde a Interpretação dos Sonhos... Não trabalhei nada com tanta certeza e euforia”. McClellan, que primeiramente descreveu essa religião primitiva em 1865, considerava que estava ela ligada à exogamia, prática que proíbe quaisquer relações sexuais entre os membros do mesmo clã, isto é, entre aqueles que compartilham o mesmo totem e o mesmo nome totêmico. Freud foi amparado por uma sugestão de Darwin: a de que a humanidade primitiva deve ter-se assemelhado aos símios superiores, por viver em pequenas hordas que consistiam em um macho todo-poderoso e em muitas fêmeas. Atkinson era de opinião que esse estado de coisas levaria, inevitavelmente, como entre tantos animais superiores, a que o macho possessivo proibisse o incesto entre os seus rivais mais jovens. A contribuição específica de Freud a esse ponto foi de levantar a hipótese de que, periodicamente, os filhos machos, já meio crescidos, formavam-se em bandos compactos e atacavam e devoravam o pai.
A essa altura, Freud levou em conta os importantes escritos de Robertson Smith sobre o sacrifício e as festas sacrificiais. Nestas o totem é cerimonialmente morto e comido, repetindo-se o fato original. As cerimônias são, a princípio, seguidas de clima de luto e, mais tarde, de júbilo triunfante e de selvagens excessos. Tratando-se de uma palavra que tem suas raízes na Polinésia, este detalhe de ordem etimológica está muito longe de significar que os habitantes daquela paradisíaca e misteriosa terra perdida na imensidão do Pacífico sejam os donos do tabu, um dos símbolos sagrados de sua comunidade, o tabu, um tanto quanto sagrado, sobrenatural, indefinível e inexplicável como verdade, já foi e continua sendo estudado à luz das ciências modernas. O brasileiro Josué de Castro (A Fisiologia dos Tabus, 1940), Wundt (Psicologia dos Povos trabalho no qual chega à conclusão de que "o tabu é anterior aos deuses e precede a qualquer religião"), Gonçalves Fernandes (O Folclore Mágico do Nordeste, 1938), Frazer (Taboo and the Perils of the Soul, 1911), Freud (Totem and Tabu, 1922) e muitos outros cientistas de renome já procuraram penetrar no mundo misterioso do tabu, do faz-mal, cada qual esposando uma idéia nova, num fulcro científico digno das mais sérias reflexões. Apesar da complexidade dos estudos sobre o tabu, o assunto ainda não foi de todo esclarecido, elucidado, talvez por envolver culturas e povos diferenciados numa vasta área geográfica que envolve continentes e povos de desiguais níveis culturais, cada qual com seus costumes e tradições que se impactuam.
-------------------------------------------------------------------------------[1] - Primeiro momento da teoria da cultura: a cultura funda-se na culpa resultante do assassinato do pai primitivo e na conseqüente instauração dos dois tabus a ele associados, a saber, a submissão à autoridade do pai (com a instauração da lei), e a proibição do incesto. [2] - A fuga da realidade através da loucura cria um mundo interior do delírio coletivo representado pela religião, que também cria um outro mundo que embotam nossa
capacidade de sentir o sofrimento, tanto físico como espiritual. Segundo Freud, todos nós usamos ao longo de nossa vida, algumas dessas soluções. A religião infantiliza permanentemente o crente. [3] - Procedimento para investigação de processos mentais, praticamente inacessíveis de outra forma, especialmente vivências internas e profundas como pensamentos, sentimentos, emoções, fantasias e sonhos; método (baseado nessa investigação) para o tratamento das neuroses; acúmulo sistemático de conhecimentos sobre a mente, obtidos através desse procedimento, que gradualmente está se tornando uma nova ciência. [4] - O psicólogo Carl Gustav Jung afirmou que habita no espírito inconsciente de todos nós o potencial para termos certas idéias elementares ou "Arquétipos", e sermos transformados por elas. Este "inconsciente coletivo" expressa-se por mitos que vêm sendo repetidos sob diversas formas. E as lendas são uma das formas, pois nas lendas há sempre algo de profundamente simbólico. [5] - Discorre sobre a existência da mente coletiva na reflexão de que nenhuma geração pode ocultar da geração sucessora os processos mentais já vivenciados. A formação do inconsciente é então concebida como configurada, em parte, graças à transmissão dos processos psíquicos no transcorrer das gerações. Segundo o autor, tal formação se efetua através de um apparatus que habilita o inconsciente a significar, interpretar e corrigir deformações impostas à expressão de suas manifestações afetivas.
Meio O século XIX foi marcado por diversas guerras entre as nações européias, tendo destaque as que envolveram a França, a Prússia, a Alemanha e a Áustria. O florescimento das idéias liberais e seu crescimento nas grandes cidades entraram em conflito com os ideais absolutistas e imperialistas vigentes. Este fato, entre outros, criou um clima de inquietação
social que permitiu o surgimento do socialismo científico de Marx, cujas bases estavam fincadas na luta de classes (patrão x proletariado). Nessa época consolidou-se a Segunda Revolução Industrial, que trouxe a eletricidade, o motor movido a combustão e outras inovações tecnológicas, as quais influenciaram novas descobertas em outros campos científicos, como na medicina, química, física, biologia, sociologia, etc. Essas descobertas eram estimuladas pelo cientificismo, que propunha a experimentação e comprovação de hipóteses levantadas para serem aceitas como teorias. O cientificismo se baseava no mecanicismo de Newton e no determinismo. O primeiro entendia o universo como uma grande máquina onde todos os processos naturais podiam ser explicados mediante as leis da física, já o segundo dizia que estes acontecimentos tinham uma causa, e que a estudando seria possível prever ações futuras. Estas inovações tecnológicas fizeram fluir o ideal de progresso na população, além de pensamentos e teorias futuristas. O próprio Freud queria que “sua grande descoberta” fosse associada ao início de um novo século. No entanto, apesar de todo este clima de avanços e de novas descobertas, a sociedade, em sua estrutura familiar, ainda permanecia conservadora. Os homens eram os provedores da casa e responsáveis pelo desenvolvimento da sociedade, possuindo um papel ativo. Para as mulheres, cabia cuidar da casa, dos filhos e servir ao homem. É nesse contexto que surgem as idéias de Freud. O “germe” da psicanálise começa a nascer na última década do século XIX. Juntamente com Charcot e Breuer, Freud inicia seus estudos pela psicopatologia mais comum da época: a histeria. Porém, esta “tri-aliança” é quebrada quando Freud discorda da teoria de Breuer acerca da origem da histeria. Esta, originalmente concebida como uma doença feminina, exibia causas psíquicas que revelavam “como” a opressão da vida cotidiana influenciava no anímico das pessoas. Nessa época, as mulheres eram, particularmente, as mais prejudicadas, pois todos os sistemas de leis e da moral colocavam-nas como seres passivos, sem ambições e desejos pessoais. Assim, esta doença refletia o modo de vida e a visão de mundo do final do século XIX.
Atualmente, a doença mais comum registrada entre a população é o stress, que se origina exatamente na vida agitada e massificante na qual o homem do século XXI está inserido. O stress, juntamente com outros problemas típicos do mundo moderno, como a pobreza e a violência, são colocados como principais causas para a depressão. Segundo a divulgação da Organização Mundial de Saúde (OMS), a depressão será a segunda maior causa de morte e incapacidade da população neste novo século, e hoje é uma das doenças mais estudadas pelos especialistas. A mudança na época e, conseqüentemente, na visão de mundo (exemplificada a cima), demonstra o desvio no foco de atenção dos médicos e as doenças mais estudadas. Por isso, para se entender as idéias de Freud e muitas das suas conclusões e métodos utilizados devese compreender o seu momento histórico, além da sua própria história de vida e personalidade. Outro ponto importante no estudo da teoria freudiana está no conhecimento de seus precursores e dos pensamentos que o influenciaram: Leibniz já estudava o inconsciente e os graus de consciência. Herbart retomou e elaborou o conflito de idéias quando estas se esforçavam por tornar-se conscientes. Schopenhauer precedeu Freud na idéia da repressão do inconsciente e de resistência ao reconhecimento do material reprimido. Freud teve sua educação formal no modelo mecanicista de Helmholtz. Durante esses estudos ele se associou a Ermst Brücke. O contato de Freud com essa tradição o ajudou a formular sua própria versão sobre o comportamento humano e a assimilar a importância dos processos do inconsciente. O determinismo de Freud foi reforçado com a leitura e discussão da tese evolutiva de Darwin. As especulações sobre o instinto de morte basearam-se na perspectiva biológica do homem.
A relação mente-corpo estudada por Freud está relacionada com a obra de Gustav Fechner (o interesse pela intensidade de estimulação, a energia mental e o conceito topográfico de mente). Todos estes médicos, intelectuais e filósofos marcaram o trabalho de Freud, seja no começo de seus estudos ou do meio para o final destes. Estas idéias, se não serviram de espelho e suporte para as suas próprias teorias, pelo menos foram argumentos utilizados na “comprovação” de suas teses. No mais, Freud era exatamente um homem de seu tempo e, por mais que sua teoria fosse tida como avançada, a estruturação de seu raciocínio estava presa ao pensamento vigente.
Experiência O ensaio de Freud Totem e Tabu foi dividido em quatro partes. A cada grupo coube uma parte para expor na sala as idéias principais do texto, bem como as críticas deste. Os grupos selecionaram as idéias consideradas mais importantes. Apesar de muitos deles terem se responsabilizado por partes iguais, novas informações foram acrescentadas à sala, pois cada um se aprofundou em uma parte específica do texto. O texto, sendo complexo, dificultou um melhor aprofundamento. Vemos que, por isso, algumas idéias podem não ter sido percebidas ou exploradas devidamente. Alguns grupos utilizaram recursos como computadores, transparências, cartazes, outros utilizaram apenas da retórica para capturar a atenção da sala. Aos grupos coube formular perguntas dirigidas aos demais. Desta forma, enriqueceram e testaram o aprendizado de cada um deles.
O ensaio de Freud é muito rico e denso. Seria necessário uma maior disponibilidade de tempo para um melhor aproveitamento das idéias do autor. Procurando se integrar mais com alguns grupos, evidenciamos algumas de suas experiências com o trabalho. Afirmaram que novos conceitos foram assimilados aumentando os conhecimentos sobre Freud, povos primitivos e culturas diferentes. Começaram a estabelecer uma comparação entre os povos primitivos e o homem civilizado, tirando conclusões acerca da origem do desejo e sua importância para a humanidade, inferindo que para Freud esse desejo está presente em todas as ações humanas. Relacionaram as neuroses presentes no mundo de hoje com o totemismo. Os tabus presentes existiam desde os tempos primitivos e o homem tornou-se civilizado levando consigo esses tabus.
Críticas Em Totem e Tabu Freud estabelece as condições psicológicas mediante as quais o homem fez sociedade e se construiu no curso da história. Todos os seres humanos, independentemente do tempo e da cultura na qual se encontram, têm uma estrutura psicológica equivalente àquela que os primitivos realizaram. O que caracteriza as nossas ações é o inconsciente. Partindo para um ponto de vista de um outro autor renomado, Claude Lévi-Strauss, podemos observar falhas cometidas por Freud no campo metodológico dos seus estudos. O primeiro erro está na intenção de Freud em estudar todas os clãs de um só ponto de vista, o inconsciente. Ele pretendia utilizar uma única ferramenta para aplicar a todos os clãs, sem considerar as diferenças existentes entre eles. Como respeitar as diferenças culturais quando se usa ferramentas uniformizadoras? As culturas são invariáveis, mesmo na perspectiva psicológica?
O segundo erro está relacionado com o fato de que Freud poderia estar utilizando códigos impróprios para os seus estudos. Strauss queria dizer que, por estarmos tão distantes no tempo dos alvos de estudo de Freud, talvez os conhecimentos que temos hoje atrapalhassem nossa visão, ou seja, não poderíamos compreender os pensamentos que os primitivos possuíam. Todas essas críticas parecem ter fundamento, pois falam em sua totalidade da visão focalizadora de Freud rumo ao seu objetivo e, em conseqüência, das limitações inerentes à sua própria pesquisa. A civilização humana, tal como descrita em Totem e Tabu, origina-se, vale lembrar, no mito darwiniano de uma horda primitiva na qual seus membros eram submissos à vontade sem limites de um pai selvagem que lhes interditava as mulheres, castrava-os e os baniam. O Tabu cumpre uma função de controle social, no que diz respeito à ética da sociedade que começa a se firmar quando os povos primitivos abandonam o nomadismo. Vê-se a necessidade de criar mecanismos de defesa psíquica, sexual, ou melhor, barreiras que controlam, que freiam esses impulsos que condicionam o indivíduo. Freud, em Totem e Tabu, nos mostra as primeiras bases da construção de uma ética repressora dos desejos do indivíduo (em função dos tabus) e da religião (através das práticas da magia e da feitiçaria).
E a Psi com isso? A psicologia tem como interesse principal o comportamento humano, e Freud, no texto Totem e Tabu, faz uma análise reflexiva, auxiliado por dados de pesquisas antropológicas, a respeito do comportamento de povos primitivos e dos conceitos intrínsecos nestes
comportamentos expressos por eles, comparando estes aspectos com a conduta dos neuróticos obsessivos[1]. Os conceitos relacionados abaixo, foram abordados por Freud e se relacionam intimamente com a Psicologia (definições retiradas do Dicionário de psicologia – Volumes I, II e III): Tabu: em Psicologia Social o termo é aplicado a certas normas, o mais das vezes não oficiais, mas altamente eficazes no grupo ou sociedade. De natureza irracional com ameaça de castigo se for violado. Exemplo particular de normas brutais com que uma comunidade pode controlar o comportamento do indivíduo. Medo: emoção primitiva e muitas vezes intensa caracterizada por um modelo sistemático de mudanças físicas e por certas formas de comportamento particular, fuga ou escondimento. Fora da proporção com o perigo real inerente, são denominados fobias. Em Psicanálise distinguem-se medo real e medo neurótico, ocorre este quando se sente impulsos instintivos, inaceitáveis à consciência. Obsessão: sob o aspecto psicológico, um estado de necessidade de um indivíduo, que lhe é interno ou é provocado por circunstâncias externas e insólitas e que ele julga não poder adiar ou suportar por mais tempo. Trata-se quase sempre de estados de necessidade no contexto de neuroses obsessivas. (W. Toman). Tipo de imaginação persistente, incontrolável indesejável, que está associada com uma emoção desagradável, geralmente ansiedade ou medo, e que pode conduzir a uma forma de pensar, um ritual ou ação aberta, numa tentativa de reduzir o nível de ansiedade. Apesar da resistência à idéia, o indivíduo não consegue livrar-se dela. Mas reconhece-a como parte do próprio pensamento. A obsessão é tradicionalmente considerada sintoma neurótico mais do que psicótico. (R. Hetherington) Desejo: segundo Freud, é a forma concreta (enriquecida por experiência individual) de um impulso ou motivo. Os desejos podem ser reprimidos e podem ser inconscientes. Um “sonho de desejo”, segundo a concepção originária de Freud (1900), pode ser qualquer
sonho. Mais tarde ele excluiu (teoricamente parece que sem razão) os sonhos de ansiedades (em cujo início os desejos positivos do sonhador cumprem uma função definida embora breve). A função do sonho vem a ser a manutenção e a proteção do sono contra estímulos externos e internos de distúrbios. Transferência: fenômeno geral da percepção ou interpretação de situações atuais, à luz de experiências passadas, ou situações semelhantes passadas. É praticamente idêntica ao conceito de generalização em teoria de aprendizagem. Em terminologia psicanalítica o termo indica primariamente o fenômeno de ajustamento emocional do paciente ao psicoterapeuta, em analogia com o ajustamento emocional do paciente com as primeiras e mais antigas pessoas de referência (intrafamiliares). As neuroses de transferência são bastante acessíveis à terapia; sua interpretação põe a descoberto os fatores infantis de desenvolvimento perturbado. Punição: punição é a apresentação de um fato aversivo dependente de uma resposta, ou reação, dada. Na prática, muitos estudos sobre punição referem-se ao fato de que são inquestionavelmente aversivos. O choque elétrico foi usado em grande maioria de estudos sobre punição de animais, porque se medem e controlam com facilidade suas características físicas. Usou-se também como fato aversivo a privação de um reforço positivo dependente de uma resposta dada. Os usos técnicos do termo “punição” em psicologia são estreitamente relacionados com o uso geral da palavra, mas devem-se observar algumas diferenças. Não é preciso que o fato aversivo seja produzido por um agente animado, e não está implícito que se trate de represália. A primitividade e suas peculiaridades sociais e religiosas foram de grande valia no estudo das sociedades modernas. Freud, na tentativa de compreender o funcionamento da organização totêmica, elaborou ensaio comparativo entre o totemismo e a gênese das neuroses e com o complexo-pai na criança[2]. Embora o totemismo seja um sistema extinto, substituído por outras formas de organização societária, os tabus possuem uma contigüidade, permanecendo até hoje presentes na conduta humana. Os tabus, que significam 'intocáveis', “são tidos como coisas sagradas, simbólicas, que não podem ser violadas. Diante disso os tabus foram de imensa importância
na construção simbólica na primitividade, e posteriormente possuindo também influência moral nas regras de convívio modernas”. A psicanálise proporcionara uma ampliação da visão antropológica diante das organizações primitivas. Freud elabora as similitudes e diferenças entre os tabus no contexto primitivo e na contemporaneidade, focalizando sua atenção na evolução do tabu. O sistema totêmico caracterizava-se pela relação dual entre o amor e o ódio ao pai, representado pelo totem aos olhos dos primitivos, representação máxima do poder dentro do clã. Portanto, existiam dois pólos emotivos na relação entre os filhos e o pai: no pólo negativo havia o ódio do pai por reprimir seus desejos. E, no positivo, a admiração pelo pai, graças à sua força e proteção. O pólo negativo irá prevalecer, culminando com o parricídio. A refeição totêmica evidenciará a ambivalência emocional existente na relação pai e filhos na primitividade. Nesse momento os instintos são liberados e a vontade, anteriormente reprimida no inconsciente, surge acarretando o ato em si. Essa elevação do pai irá caracterizá-lo como figura divina. Então, o desejo de possuir as mulheres do pai e conseqüentemente matá-lo constituem os dois tabus primitivos, correspondentes aos dois desejos reprimidos no Complexo de Édipo. Na contemporaneidade, Freud faz uma analogia com os dois tabus presentes no complexo de Édipo, na criança. Esta experiência, de certa forma, porta os mesmos sintomas que dos tabus totêmicos. Ou seja: o complexo de Édipo evidencia o desejo da criança em matar o pai, a fim de desfrutar os desejos sexuais pela mãe, evidenciando o caráter incestuoso também observado nos primitivos. Indiferentemente, essas características foram sancionadas tanto na primitividade, com a exogamia, quanto na contemporaneidade, com as restrições de cunho moral. Essa analogia pode se estender também para os neuróticos, que vivem esses tabus de forma extremada, com uma moralidade excessiva. A grande diferença existente entre os tabus, nos diversos contextos citados, foi justamente sua evolução. O tabu da primitividade não funciona da mesma forma que hoje. Atualmente eles têm o poder de inibir comportamentos e desejos, atuando no universo simbólico,
diversamente dos primitivos que atuavam na realidade. O processo civilizatório não permite que o homem vivencie seus desejos, acarretando em expressões como a histeria. Os primitivos possuíam a forma mais primária do tabu, que os impulsionava a praticar o desejo em sua íntegra, que era o ato de matar o pai. Freud, no seu texto Totem e Tabu reforça sempre a necessidade da eticidade na conduta humana, devido à impossibilidade de se criar um sistema social organizado, tendo como ameaça a voracidade dos desejos latentes. O próprio sistema totêmico se organizou a partir do momento em que a prática exogâmica foi extinta da instituição totêmica, como forma de prevenir o incesto e as rivalidades filiais. A promiscuidade sexual conduzia uma imoralidade das práticas humanas, já que era isenta de qualquer caráter ético. A visão freudiana do desejo humano vincula-se sempre ao dever. A existência humana é conflituosa por envolver essas duas vertentes opostas: o desejo e a moral. Quando estes se chocam, percebemos o nascimento das neuroses. Os desejos sexuais entram em choque com o que é permitido moralmente fazer. Por isso a repressão é um mecanismo necessário para delimitar os desejos, humanizando e diferenciando a conduta humana da conduta animal. No texto, Freud explicita sobre as práticas incestuosas, contrapondo-se à idéia de Westermarck, que explica o horror inato ao incesto. Freud pontua que o homem possui na infância desejos de caráter incestuoso. Entretanto, esses desejos serão delimitados pelos regulamentos morais e religiosos da sociedade, visto que ferem a moral e a normalidade construída pela sociedade. As explanações freudianas exaltam os desejos sexuais como os impulsos de maior significado na vida humana. A partir do conhecimento da sexualidade, pode-se inferir muito sobre as condutas individuais, as formas de comportamento, instituições geridas
pelos indivíduos e etc. Portanto, se o homem é feito de desejos e vontades, anulá-los seria destruir toda a complexidade e beleza da alma humana. Os valores morais servirão como controle diante dos desejos e não como mecanismo de anulação e extinção dos mesmos. O processo de socialização exige do homem uma conduta mais racionalizada, portanto atitudes incontroláveis tornaram-se insustentáveis na organização que a sociedade impôs. Os principais conceitos do texto Totem e Tabu, de Freud, estão presentes na ampla nomenclatura que abraça todos os domínios da psicologia e já foram totalmente incorporados, pois tornaram-se termos familiares, consagrados pelo uso e revestidos da importância de expressões técnicas.
-------------------------------------------------------------------------------[1] - A “onipotência de pensamentos” é abordada na dimensão psicológica do texto Totem e Tabu de Freud. Ele utiliza, como exemplo para esta expressão, as neuroses porque, neste caso, o que determina a formação dos sintomas é a realidade do pensamento. Os neuróticos vivem num mundo particular, somente deles e apenas o pensamento intenso, imaginado com emoção, é capaz de afetá-lo; o mundo externo não tem esse poder. Mesmo que seu mundo à parte não tenha a mínima concordância com a realidade externa, não tem importância; é este mundo que tem validade para o neurótico. A onipotência de pensamentos, a grande valorização dos processos mentais em detrimento dos acontecimentos reais, possuem uma importância singular na vida emocional dos neuróticos. Submetidos a um tratamento terapêutico, os neuróticos temem expressar seus desejos e pensamentos íntimos porque pensam que com o simples fato de expressá-los os pensamentos podem se tornar reais. Esta atitude é semelhante aos primitivos/selvagens que acreditam ser possível modificar o meio externo pela força do pensamento.
[2] - Os temas tratados acima, retirados das idéias expostas por Freud (tabu, medo, obsessão, transferência e punição), são comumente trabalhados nas sessões terapêuticas. Percebe-se, inclusive, o inter-relacionamento entre esses termos. O tabu, por exemplo, embora pareça ser uma temática ultrapassada, integra o próprio sujeito, já que este, para constituir a sua memória, depende das influências socioculturais. Então, comprometido com certas proibições e reprimindo os seus desejos (como exemplo a questão do incesto), sabe-se que problemas se instalam. O medo e a culpa desencadeiam um processo obsessivo e auto-solicitam punição. Neuroses e paranóias são filhas desses sentimentos, desses sintomas. As intervenções terapêuticas/psicológicas trazem o paciente/cliente para o hoje, através do processo de meta-cognição, ou seja, refletir sobre os próprios pensamentos e idéias acerca desses temas, além de remetê-los ao passado, buscando as causas que desencadearam tudo, nunca dissociando o presente. O vínculo terapêutico, formado através da transferência, é fundamental ao progresso e evolução desse processo.
Linha do Tempo Platão
Leibnitz
Benjamim Rush
(V a.C.) (1646-1716) (1745-1813) Cantares (XXXa.C.)
Herbart (1776-1841)
Descartes (XVII)
Fechner (1801-1887)
Goethe (1789)
Hartman (1869)
Kant (XIX)*
*XIX
Darwin
Charcot
(1809-1882)
(1825-1893)
Janet (1859-1947)
O estudo freudiano da personalidade humana e de seus distúrbios estava bem afastado da psicologia de laboratório universitário. Porém, pode-se considerar algumas fontes principais de influência sob as obras de Freud, como as primeiras especulações filosóficas acerca da natureza de fenômenos psicológicos inconscientes e os primeiros trabalhos no campo das psicopatologias. Teorias sobre o inconsciente: Apesar de, na maior parte de sua história inicial, a psicologia científica e a filosofia empirista (que forneceu uma base para a nova psicologia) só se ocuparem com a experiência mental consciente, havia também quem admitisse importância para os processos não conscientes. Na verdade, o interesse pela influência do inconsciente pode remontar até Cantares do Séc. XXX a.C., ou Platão do Séc. V a.C., além dos pensamentos mais recentes de Descartes, no Séc. XVII. No começo do Séc. XVIII, o filósofo e matemático alemão Leibnitz criou uma teoria ("teoria da monadologia"), onde os eventos mentais tinham diferentes graus de clareza ou consciência, que podiam variar do completamente inconsciente ao mais nítido e definitivamente consciente. Um século mais tarde, o filósofo e educador alemão Herbart desenvolveu essa noção de inconsciente, criando o conceito de limiar da consciência. Segundo ele, há um conflito de idéias coerentes e incoerentes no consciente, e as consideradas irrelevantes para o consciente são inibidas, existindo abaixo do limiar de consciência ou no inconsciente. Seu trabalho revela influências do espírito mecanicista, quando propõe fórmulas e equações matemáticas para dar conta dos mecanismos das idéias em suas entrada ou expulsão da consciência. Gustav Fechner também contribui para o desenvolvimento de teorias sobre o inconsciente. Ele usou também a noção de limiar, mas foi a sugestão de que a mente equivale a um iceberg, onde a parte visível é apenas uma pequena parcela dele e a maior está oculta sob a superfície (onde é influenciada por forças não
observáveis), que teve um maior impacto sobre Freud. A noção de inconsciente era parte integrante do contexto europeu da década de 1880, época em que Freud iniciava sua prática clínica. E não era só assunto dos profissionais da área, mas também de conversas em geral. Assim como outros sobre esse mesmo tema na época,
em 1869 foi publicado Filosofia do
Inconsciente de Hartmann, que atingiu grande popularidade.
Teorias sobre as psicopatologias: Já no campo das psicopatologias, as primeiras idéias de Freud se opunham à compreensão e ao tratamento dos distúrbios mentais. A história do tratamento de doentes mentais é fascinante e depressiva, apresentando um chocante quadro de desumanidade. Na Idade Média, os indivíduos perturbados não obtinham nenhuma compreensão ou tratamento, o que consistia principalmente em incriminação ou punição, pois se acreditava que as causas dos distúrbios emocionais eram a perversidade, a possessão demoníaca e a feitiçaria. Na Renascença, a situação continuaria a mesma, com ainda mais métodos de torturas para as "bruxas". Somente no séc. XVIII começa a surgir uma atitude mais humana e racional em relação aos doentes mentais. Iniciou-se, então, o declínio da influência da superstição religiosa e o caminho para a investigação científica das causas das doenças mentais. Mas, os tratamentos ainda eram muito primitivos, causando, às vezes, mais sofrimento do que as próprias perturbações. Benjamin Rush (1745 - 1813) foi o primeiro psiquiatra a clinicar nos EUA e fundou o primeiro hospital norte-americano para distúrbios emocionais. Nos primórdios havia duas principais escolas de pensamento em psiquiatria - a somática e a psíquica. A somática afirmava que o comportamento anormal tem causas físicas e a psíquica recorria a explicações mentais ou psicológicas. De modo geral, a psiquiatria foi dominada pela escola somática, que recebeu apoio considerável de Kant, cujos comentários eram conhecidos por zombar da idéia de que emoções pudessem causar doenças mentais. A psicanálise desenvolveu-se como um aspecto da revolta contra essa orientação somática e, à medida que os trabalhos com doentes mentais progredia, a importância dos fatores emocionais ficava mais clara. A hipnose teve um importante papel na promoção do interesse pelas causas psíquicas do comportamento anormal. E as obras de Charcot e Janet (Séc. XIX e XX) no tratamento dos mentalmente doentes, ajudou a mudar as crenças da psiquiatria, cujos médicos começaram a pensar na cura dos distúrbios emocionais
tratando a mente e não o corpo. Certamente, Freud pôde aproveitar muito dessas descobertas nos seus trabalhos, sendo que, quando ele começa a publicar suas idéias, termos como psicoterapia já existiam. A influência de Darwin:
Sabe-se que Freud lera todos os livros de Darwin, escrevendo sempre comentários ao lado dos textos. Ele mesmo admitiu que a obra de Darwin, ao lado de um ensaio Sobre a Natureza do poeta alemão Goethe, tinha influenciado sua escolha da Medicina como profissão. Sulloway, um historiador da ciência, chega a dizer que Darwin "provavelmente fez mais do que qualquer outra pessoa para abrir o caminho para Sigmund Freud e a revolução psicanalítica" (Sulloway, 1979, p. 238). Várias idéias que Freud transforma em questões centrais da psicanálise foram anteriormente discutidas por Darwin, entre as quais se incluem as idéias de processos e conflitos mentais inconscientes, a significação dos sonhos, o simbolismo oculto em sintomas estranhos do comportamento e a importância da excitação sexual. De modo geral, Darwin se concentrou, como Freud, mais tarde, em aspectos não racionais do pensamento e comportamento. Há vários outros pontos importantes de semelhança entre as obras deles, como a noção da continuidade do comportamento emocional da infância à idade adulta e teorias sobre o impulso sexual em bebês, autopreservação e gratificação sexual. A ênfase freudiana no conflito interior é conceitualmente idêntica ao tema darwiniano da luta pela existência. Influências gerais do contexto histórico:
O clima intelectual dos séculos XVIII e XIX, com a doutrina do hedonismo, dá devido sustento à teoria freudiana do princípio do prazer. A idéia do mecanicismo, apresentada por fisiologistas de sua época, também o ajudou a fundamentar o que, mais tarde, denominou de determinismo psíquico. E, apesar da sociedade em que Freud estava inserido ser muito repressiva e puritana, a atitude diante do sexo na Viena do final do Séc. XIX era aberta e permissiva, e essa aceitação generalizada da sensualidade não era acompanhada por sentimentos de culpa. Inclusive, era visível o interesse por assuntos sexuais na vida cotidiana vienense e na literatura científica. O conceito de catarse também era popular antes de Freud publicar qualquer obra. Por volta de 1890, havia mais de 140 publicações sobre esse tópico, em alemão. E, por fim, muitas idéias de Freud acerca dos sonhos
tinham sido antecipadas na literatura filosófica e fisiológica, já no Séc. XVII. Em 1913 Freud escreveu Totem e Tabu, atendendo ao apelo de realizar uma leitura cronológica do tratamento que a psicanálise dispensa à religião. Pareceu também ser esta a resposta de Freud à tentativa de solucionar a querela com Jung a respeito da subordinação da psicanálise à mitologia. Nesta obra, Freud abrange o arcabouço psicanalítico e se propõe investigar as raízes da religião. No contexto referente a 1913, esse trabalho tem também como objetivo o questionamento sobre a criação da religião e o papel que esta cumpriu na instauração da cultura. A problemática da culpa em confronto com a religião é explorada posteriormente por Freud em outros textos de sua autoria como: O Futuro de uma Ilusão, 35a. Conferência..., O Mal-estar na Civilização e Moisés e o Monoteísmo.
Datas de acontecimentos relevantes: 1901 - Nasce o psiquiatra e psicanalista francês Jacques Lacan, responsável por reformular a obra freudiana, dando-lhe um caráter mais filosófico e tirando-lhe o substrato biológico. Lacan elaborará inúmeros conceitos (imaginário, simbólico, real, significante, sujeito, psicologia dos povos) que enriquecerão as formulações clínicas. Será considerado o único verdadeiro mestre psicanalista da França. 1906 - Início das correspondências entre Freud e Jung. Amigo e discípulo de Freud até 1913, Jung estabelece com ele uma forte correspondência que chegou a 359 cartas. Jung já tinha uma concepção de inconsciente e do psiquismo quando decidiu se aproximar de Freud. O que o levou ao pai da psicanálise foi o fascínio por uma obra na qual acreditava encontrar a confirmação de suas hipóteses sobre as idéias fixas subconscientes, as associações verbais e os complexos.
Indução Construímos abaixo uma suposta “entrevista” com Freud. Buscando nos seus textos, sobretudo Totem e Tabu, as possíveis respostas ipsis litteris. Queremos, ou melhor, já que estamos falando de Freud, desejamos elucidar os temas que consideramos mais importantes e esclarecer algumas idéias básicas:
Aluno: Sigmund Freud, o senhor como pai da psicanálise ganhou respeito pelas suas idéias revolucionárias acerca do mecanismo psíquico. Na sua visão, o psiquismo divide-se em sistemas: Consciente e Inconsciente, prevalecendo nos processos anímicos a força do sistema inconsciente, sendo este um dos motivos da polêmica da sua teoria. Considerando sua análise do tabu, a consciência do tabu é a forma mais remota em que o fenômeno da consciência é encontrado? Freud: Sim, porque o que é consciência? Segundo as provas da linguagem, ela está relacionada com aquilo de que se está "consciente com mais certeza". Na verdade, em algumas línguas, as palavras para designar "consciência" (no sentido moral, conscience, N. do Trad.) e "consciência" (no sentido de percepção do que se passa em nós ou ao redor de nós, consciousness, N. do Trad.) mal podem ser distinguidas. A consciência (conscience, N. do Trad.) é a percepção interna da rejeição de um determinado desejo a influir dentro de nós. A ênfase, contudo, é dada ao fato de esta rejeição não precisar apelar para nada mais em busca de apoio, de achar-se inteiramente ‘certa de si própria’. Isto é ainda mais claro no caso da consciência de culpa – a percepção da condenação interna de um ato pelo qual realizamos um determinado desejo. Apresentar qualquer razão para isto pareceria supérfluo: quem quer que tenha uma consciência deve sentir dentro de si a justificação pela condenação, sentir a autocensura pelo ato que foi realizado. Essa mesma característica pode ser observada na atitude do selvagem para com o tabu. Trata-se de uma ordem emitida pela consciência; qualquer violação dela produz um temível senso de culpa que vem como coisa natural e do qual a origem é desconhecida.
Aluno: Então cada um, pelo que eu entendo, tem sua própria lógica interna para admitir a culpa. Mas a consciência de culpa tem uma justificativa? Freud: Tem uma justificativa se levarmos em consideração os pensamentos inconscientes e as justificativas conscientes.
Aluno: Trazendo essas idéias para a psicanálise, como essa consciência de culpa se manifesta nos pacientes neuróticos? Freud: Vê-se que a onipotência de pensamento, a supervalorização dos processos mentais em comparação com a realidade desempenha um papel irrestrito na vida emocional dos pacientes neuróticos e em tudo que dela deriva. Se um deles submeter-se ao tratamento psicanalítico, que torna consciente o que nele era inconsciente, será incapaz de acreditar que os pensamentos são livres e constantemente terá medo de expressar desejos malignos, como se sua expressão conduzisse inevitavelmente à sua realização. Aluno: Mas como se explica essa expressão do desejo em um ato? Freud: Todo e qualquer ato psíquico é a expressão final da realização do desejo. Aluno: A ambivalência parece ser um ato recorrente nos impulsos psíquicos. Segundo a leitura que fizemos do seu texto, o senhor até mesmo considerou que “os impulsos dos povos primitivos fossem caracterizados por uma quantidade maior de ambivalência que a que se pode encontrar no homem moderno”. Sendo assim, qual a relação entre ambivalência e consciência de culpa, tanto no tabu como na neurose obsessiva? Freud: Dessa maneira parece provável que também a consciência tenha surgido, numa base de ambivalência emocional, de relações humanas bastante específicas, às quais essa ambivalência estava ligada e que surgiu sob as condições que demonstramos se aplicarem ao caso do tabu e da neurose obsessiva, a saber: que um dos sentimentos opostos envolvidos seja inconsciente e mantido sob pressão pela dominação compulsiva do outro. Esta conclusão é apoiada por várias coisas que aprendemos da análise das neuroses. Aluno: O Senhor disse a pouco instante que o desejo é representado por qualquer ato psíquico. Nesse caso, o sonho é comparado ao pensamento, no sentido de que ambos constituem representações?
Freud: Fecham-se os olhos e se alucina, abrem-se e se pensa em palavras. Aluno: Os primitivos desenvolveram um sistema cujos espíritos são atribuídos da aparente relação com o comportamento a todos os seres animados e inanimados, e como técnica de controle utilizaram a magia e a feitiçaria. Qual a relação que podemos fazer com o desejo, já que todo ato psíquico é a expressão final da realização de um desejo? Freud: Não é de se supor que os homens foram inspirados a criar seu primeiro sistema do universo por pura curiosidade especulativa. A necessidade prática de controlar o mundo que os rodeava deve ter desempenhado seu papel. Assim, não ficamos surpresos em descobrir que, de mãos dadas com o sistema animista, existia um conjunto de instruções a respeito de como obter domínio sobre os homens, os animais e as coisas – ou melhor, sobre os seus espíritos. É fácil perceber os motivos que conduziram os homens a praticar a magia: são os desejos humanos. Tudo o que precisamos admitir é que o homem primitivo tinha uma crença imensa no poder de seus desejos. A razão básica por que o que ele começa a fazer por meios mágicos vem a acontecer é, em última análise, simplesmente o que ele deseja. De início portanto, a ênfase é colocada apenas no seu desejo. Aluno: Comente sobre a aparente relação com o comportamento infantil. Freud: As crianças se encontram numa situação psíquica análoga, embora sua eficiência motora não esteja ainda desenvolvida. Já expus em outra oportunidade a hipótese de que, primeiramente, elas satisfazem seu desejo de maneira alucinatória, isto é, criam uma situação satisfatória por meio de excitações centrífugas dos órgãos sensoriais. Um homem adulto primitivo tem à sua disposição um método alternativo. Seus desejos são acompanhados de um impulso motor, a vontade, que está destinado, mais tarde, a alterar toda a face da Terra para satisfazer seus desejos. Aluno: Transpondo a questão do totem e do tabu para a sociedade atual, como o senhor aborda a primazia do tabu na contemporaneidade?
Freud: Ver-se-á que os dois principais temas dos quais o título deste livro se origina – os totens e os tabus – não receberam o mesmo tratamento. A análise dos tabus é apresentada como um esforço seguro e exaustivo para a solução do problema. A investigação sobre o totemismo não faz mais que declarar que "isso é o que a psicanálise pode, no momento, oferecer para a elucidação do problema totem". A diferença está ligada ao fato de que os tabus ainda existem entre nós. Embora expressos sob uma forma negativa e dirigidos a um outro objeto, não diferem, em sua natureza psicológica, do "imperativo categórico" de Kant, que opera de uma maneira compulsiva e rejeita quaisquer motivos conscientes. O totemismo, pelo contrário, é algo estranho aos nossos sentimentos contemporâneos – uma instituição sócio-religiosa que foi há muito tempo relegada como realidade e substituída por formas mais novas. Deixou atrás de si apenas levíssimos vestígios nas religiões, maneiras e costumes dos povos civilizados da atualidade. Os progressos sociais e técnicos da história humana afetaram os tabus muito menos que os totens. Aluno: Professor Menezes, autor do livro Fábrica de Deuses: a Teoria Freudiana da Cultura, analisa e decompõe o seu texto Totem e Tabu, lançou a seguinte pergunta para um grupo de estudantes: O que o desejo individual possui de tão forte para receber um proibição tão severa? Repassamos essa pergunta para o Senhor. Freud: Os dois tabus do totemismo com que a moralidade humana teve o seu começo não estão psicologicamente no mesmo nível. O primeiro deles, a lei que protege o animal totêmico, fundamenta-se inteiramente em motivos emocionais: o pai fora realmente eliminado e, em nenhum sentido real, o ato podia ser desfeito. Mas a segunda norma, a proibição do incesto, tem também uma poderosa base prática. Os desejos sexuais (os individuais, sobretudo) não unem os homens, mas os dividem. Embora os irmãos se tivessem reunindo em grupo para derrotar o pai, todos eram rivais uns dos outros em relação às mulheres. Cada um quereria, como o pai, ter todas as mulheres para si. A nova organização terminaria numa luta de todos contra todos, pois nenhum deles tinha força tão predominante a ponto de ser capaz de assumir o lugar do pai com êxito. Assim, os irmãos não tiveram outra alternativa, se queriam viver juntos – talvez somente depois de terem passado por muitas crises perigosas –, do que instituir a lei contra o incesto, pelo qual
todos, de igual modo, renunciavam às mulheres que desejavam e que tinham sido o motivo principal para se livrarem do pai. Dessa maneira, salvaram a organização que os tornara fortes – e que pode ter-se baseado em sentimentos e atos homossexuais, originados durante o período da expulsão da horda. Aluno: Agradecemos sua paciência para conosco. Sei que muitas perguntas ainda faltam para ser respondidas e formuladas. Solicitamos aos leitores desta entrevista que recorram ao livro do estimado entrevistado para possíveis e recorrentes dúvidas.
Letra O termo que circunda e que se destaca no III ensaio do texto de Freud, Totem e Tabu, refere-se à magia, pois esta se faz presente em todas as ações do homem primitivo. Segundo Freud, a magia tem de servir aos mais variados propósitos: ela deve submeter os fenômenos naturais à vontade do homem, proteger o indivíduo e seus inimigos e do perigo, bem como conceder-lhe poderes para prejudicar os primeiros. Na verdade, o que Freud afirma ao falar da magia é que ela é uma forma de controle utilizada pelo homem primitivo. Esse controle se dá devido à necessidade de satisfazer seus desejos, representados pela onipotência de pensamento, sonhos, narcisismo e feitiçaria. Hoje, embora prevaleça o pensamento científico, ainda encontra-se a influência da magia, representada agora através das superstições e simpatias. Em meio ao grande individualismo e à solidão – grandes males do novo século – parece haver uma maior procura das pessoas por magias, terapias místicas que visam a uma maior aceitação de si mesmo (neste mundo capitalista selvagem que exclui e promove o “tentar ser melhor que o outro”).
Um aspecto interessante da magia, vista por outro ângulo, é a relação que se estabelece no capítulo IV, ao abordar a refeição sacrificatória, em que a magia do festim envolvida no sacrifício dos indivíduos fazia-os passar alegremente por cima de seus próprios interesses e acentuava a dependência mútua entre eles e o seu Deus. O totem, que era comparado ao animal totêmico, era adorado na forma de animal; mas no fundo havia um elo de ligação mais profundo, de natureza psíquica: o próprio pai por ser glorificado. Sendo assim, o totem implicaria um representante do pai; resultando disso no complexo de Édipo, que tem como tabu a proibição de matar o totem (o pai); bem como a proibição do incesto em que um homem não poderia ter relações com uma mulher do mesmo totem (o filho não poderia ter relações com a mãe).
Alvo Será que as observações de Freud em relação aos povos primitivos perdem um pouco de sua amplitude já que estão baseadas em idéias evolucionistas? A magia é uma forma de não recalcar certos desejos? E as mulheres? Eles não passam pelo complexo de Édipo? Se apenas o homem é considerado sujeito da cultura, já que ele deseja as fêmeas, qual é o papel da mulher na formação da sociedade humana? Uma vez que Totem e Tabu faz uma análise da religião e, portanto, discute também as relações de poder, poderíamos considerar este texto um documento político? Em Totem e Tabu é possível fazermos uma análise no sentido de a repressão sexual ser positiva pois impulsionaria a mente?
Como Freud convenceria Nietzsche da importância do tabu em contraposição à vontade de potência? Até que ponto o totem se torna um tabu? O perverso, ao contrário do neurótico, por não ter repressão do desejo, possui tabu? Se a instituição da liberdade de expressão protege a humanidade, como evitar que também seja matriz do mal-estar dessa mesma humanidade? Segundo Freud, os processos que descobrimos na vida de um povo são similares aos que chegamos a conhecer na psicopatologia. Assim, podemos inferir que Freud aproxima o primitivo do patológico?
Método Freud introduz na Psicologia Social componentes históricos, considerando a psicologia dos povos do ponto de vista da psicanálise. Nesse aspecto, irá contrastar com a posição de Wundt, que aplica a esta psicologia uma análise não analítica, bem como de Jung, que considera a análise dos povos como determinante para compreender a perspectiva individual. No seu texto de 1913, Totem e Tabu, Freud utiliza uma metodologia analítica descritiva, de abordagem psicanalítica, no qual apresenta informações da antropologia, a saber, estudos sobre as tribos selvagens da Austrália, e constrói os argumentos para a comprovação e validação de sua teoria psicanalítica. Em sua análise histórica, Freud surpreende-se com a sofisticação do sistema totêmico no rigor à proibição do incesto, chamando atenção para a severidade das punições, a fim de coibir o desejo, que vai além da consangüinidade. Ele
relaciona a psicologia dos povos primitivos com a psicologia dos neuróticos, identificando aspectos semelhantes entre as tribos primitivas e a sociedade de sua época. Freud não se contenta com as explicações antropológicas sobre a proibição do incesto e aprofunda a sua análise, sob a ótica psicanalítica, identificando aspectos que, em sua compreensão, a antropologia não tinha elementos para desenvolver. Isto fica claro pela maneira com a qual o autor se utiliza das citações dos textos originais, demonstrando o seu método comparativo,
partindo das definições dos autores, questionando-os e
desenvolvendo outros elementos que, sob o seu ponto de vista, não estão esclarecidos. Tomaremos como exemplo suas citações sobre as evitações em relação à sogra e o genro, com os quais Freud concorda com as explicações dadas por Fraser, que encara as evitações como uma forma adicional de proteção contra o incesto. Contudo, acrescenta a esta os elementos consciente, a possibilidade imediata de incesto entre os consangüíneos e o inconsciente, a tentação do incesto na fantasia, nas relações entre o genro e a sogra. Na realidade, Freud não quer ressaltar o horror ao incesto nas tribos aborígenes. Ao seu olhar, isto é um fato patenteado pela psicologia social e dispensa acréscimos. Através de seu método de abordagem psicanalítica, ele irá enfatizar a característica infantil do comportamento selvagem, no que se aproxima da vida mental dos pacientes neuróticos. Quando faz esta comparação, o autor fundamenta seu discurso com os ensinamentos da Psicanálise, identificando que os primeiros objetos a serem amados por um menino serão proibidos: a mãe e a irmã. À medida que vai crescendo, o mancebo se liberta da atração incestuosa. Em contrapartida, o neurótico apresenta dificuldades em libertar-se da fixação incestuosa da libido, continuando a desempenhar este papel em seu inconsciente. Em verdade, a busca de Freud está voltada para a origem dos desejos incestuosos, que é encarado como perigo real e imediato pelos povos selvagens, aplicando-se punições severas para coibi-lo, enquanto os seres humanos, aqui entendidos como os povos civilizados, sentem aversão por estes desejos primitivos, hoje dominados pela repressão e, portanto, destinados a se tornarem inconscientes. O autor não medirá esforços para estender aos selvagens a estrutura psicanalítica do desejo, incutindo elementos metapsicológicos ao
material fornecido pela antropologia, resultando, assim, na ordenação incestuosa do desejo, que é delimitada pela fixação do indivíduo em uma das fases da libido, traço semelhante encontrado no selvagem, na criança e no neurótico. Isso nos mostra que a organização do desejo tem uma estrutura invariável, a saber, o excesso de desejo. Criança, selvagem e neurótico desejam, incestuosamente, com a mesma intensidade.
Problema Há muitos anos e por muito tempo, o totemismo, ligado intimamente à religiosidade, representou peça fundamental na sociedade. Funcionou como um tipo de organização social e, de uma certa forma, manipulava os indivíduos que compunham esta realidade. Dessa maneira, trazia um embasamento religioso para a construção das regras que vigoravam naquela sociedade. Observa-se que esse conjunto de valores e normas frisadas, enfatizadas pelo totemismo, atualmente, representam o corpo jurídico que rege o comportamento das sociedades em sua diversidade. Os primitivos, assim como nos dias atuais, já se preocupavam e se ocupavam com a ética, pois ela é quem permite a sobrevivência do homem, não permitindo que os homens se matem, cometam o incesto, entre outras regras básicas que mantêm uma ordem na sociedade. Dessa necessidade imperativa da norma participaram as várias religiões, exercendo uma grande influência no comportamento e na conduta de seus seguidores, assim como o totemismo para com os primitivos. O homem é um ser agressivo, é preciso conter essa agressividade, necessário haver um refreio a essa agressividade. A exogamia é o meio de controlar esta, a docilização do
desejo, o controle dos impulsos. Em função disto é que as religiões construíram os arsenais que freiam os desejos humanos que são, por si, dissociadores. Um exemplo de um tabu vigente pode ser verificado na época colonial: a nudez, por motivos religiosos, culturais, conscientes e inconscientes, constituiu-se como espécie de tabu que participou da organização social em contraste com a vestimenta, propiciando a criação de um "habitus" social feito de restrições e liberdades. O par nu/vestido serviu às negociações do poder, marcando lugares de exclusão e inúmeras hierarquias simbólicas, dependendo da escolha de mínimos detalhes ligados à propriedade, à sobriedade, ao tipo de desvelamento. A religião para Freud era tida como um mecanismo de repressão dos instintos e impulsividades humanas; os cerimoniais, ritos e sacrifícios realizados constituíam uma maneira encontrada pelos primitivos para canalizar essa energia reprimida. O tabu é um dos componentes responsável pelo aparecimento das neuroses, pois ele foi o primeiro a reprimir os desejos dos primitivos, atuando, até hoje, em nossa sociedade. O tabu é um mecanismo regulador da sociedade. O desejo é uma realidade muito forte, até mesmo imperativa da parte do indivíduo, e essa força precisa ser controlada e vai ser controlada por uma contraforça (tabu), inventada pela sociedade e transformada pela religião em algo sagrado.
Glossário Alma: 1. É o veículo das atividades mentais e é até certo ponto independente dos seus corpos; 2. Originalmente era representada como o componente humano que fornece
identidade às pessoas. No decorrer do tempo tal conceito perdeu suas características materiais e se tornou “espiritualizado” em alto grau; 3. Segundo os povos primitivos, todos os homens são habitados por espíritos, ou seja, as almas. Ambivalência: 1. Presença simultânea, na relação com um mesmo objeto, de tendências, de atitudes e de sentimentos opostos, fundamentalmente o amor e o ódio. 2. Em Psicanálise, o termo é utilizado muitas vezes para designar ações e sentimentos resultantes de um conflito defensivo em que entram em jogo motivações incompatíveis; visto que aquilo que é agradável para um sistema psicológico é desagradável para outro, pode-se qualificar de ambivalente qualquer formação de compromisso. (LAPLANCHE e PONTALIS, Vocabulário de Psicanálise. Ed. Martins Fontes, São Paulo, 2000) 3. Valência dupla, significação dupla. Existência de dois (possivelmente contraditórios) valores, objetivos ou direções. (ARNOLD, EYSENCK e MEILI, Dicionário de Psicologia. Edições Loyola, São Paulo, 1994). Analogia: 1. O comportamento análogo e funcionalmente igual, mas geneticamente diferente. As estruturas morfológicas e comportamentais são provavelmente análogas quando ocorrem em espécies com a mesma forma de vida. (ARNOLD, EYSENCK e MEILI, Dicionário de Psicologia. Edições Loyola, São Paulo, 1994). 2. E, em termos muitos gerais, a correlação entre os termos de dois ou vários sistemas ou ordens, ou seja, a existência de uma relação entre cada um dos termos de um sistema e cada um dos termos de outro. (MORA, J. F. Dicionário de Filosofia. Ed. Martins Fontes, São Paulo, 1998). Biologismo: 1.Interpretação do mundo físico ou do mundo humano por analogia com o organismo. 2. O mesmo que vitalismo. (ABBAGNANO, Dicionário de Filosofia. Ed. Martins Fontes, São Paulo, 1998). Código: sistemas de signos ou especificação para uma coordenação inequívoca (“codificação”) dos signos de uma lista relativamente grande (repertório) com os de uma relativamente pequena (o imaginário). A organização não reversivelmente inequívoca.
Conduta: toda resposta do organismo vivo a um estímulo que seja objetivamente observável, ainda que não tenha caráter de uniformidade no sentido de que varia ou pode variar diante de determinada situação. Desejo: esse termo pode ter dois significados: o primeiro refere-se a apetite, princípio que impele um ser vivo para ação de tal significado. O segundo é mais restrito, de apetite sensível. Nesse sentido, segundo Aristóteles, desejo é o apetite do que é agradável. Analogamente, Descartes definiu como a agitação da alma causada pelos espíritos que a dispõem a querer no futuro as coisas que a ela se afiguram convenientes[1]. Exogamia: regra social, segundo a qual um parceiro (cônjuge) deve ser encontrado fora do grupo ao qual pertence o indivíduo. Esta regra é a versão positiva do tabu do incesto. Tem validade para quase todas as sociedades para os membros da família nuclear, e é geralmente considerada natural. Estende-se também aos grupos mais distantes, quanto mais estas têm importância funcional para a sociedade em questão. A função da regra da exogamia é, em primeiro lugar, assegurar papéis sociais mais ambíguos na família, e por isso estabilidade e continuidade da sociedade. Incesto: 1. Violação de um dos mais antigos tabus sexuais que se origina de fontes mágicas e religiosas; na maior parte das sociedades é considerado como ofensa sexual e severamente punido. 2. Até hoje a origem do tabu do incesto é desconhecida, segundo buscas históricas e antropológicas. Inconsciente: Leibniz foi quem introduziu essa noção em filosofia, frisando a importância das “percepções insensíveis” ou “pequenas percepções”, de que não se toma ciência e sobre as quais não se reflete. Essas percepções, para Leibniz, “formam o não-sei-o-quê, os gostos, as imagens, das qualidades sensíveis, claras no conjunto mas confusas nos detalhes, as impressões que os corpos que nos rodeiam exercem sobre nós e que envolvem o infinito, os vínculos que cada ser tem com o restante do universo".
Lei: uma regra dotada de necessidade, entendendo-se por necessidade: 1. Impossibilidade de que a coisa aconteça de outra forma ou 2. Uma força que garanta a realização de regras. A noção de Lei é distinta da noção de regra e de norma. Magia: 1. É o ramo mais primitivo e mais importante da técnica animista. 2. Despreza os espíritos e faz uso de procedimentos especiais e não dos métodos psicológicos do dia-a-dia. Com este recurso, os povos primitivos realizavam suas ações acreditando serem detentores dos poderes sobrenaturais nelas envolvidos. Narcisismo: 1. Característica do indivíduo que atribui indevidamente um alto valor a seus feitos e qualidades físicas. 2. Em psicanálise designa um comportamento pelo qual o indivíduo trata o próprio corpo da mesma maneira como se trata habitualmente o corpo de uma pessoa amada. 3. Para Freud, o narcisismo constitui um estágio do desenvolvimento da libido, antes que o sujeito se volte para um objeto sexual externo. Apenas a fixação nesse estágio ou suas formas excessivas pertenceriam à patologia. Neurose: afecção psicogênica em que os sintomas são a expressão simbólica de um conflito psíquico que tem raízes na história infantil do sujeito e constitui compromissos entre o desejo e a defesa. Objeto: termo de qualquer operação, ativa, passiva, prática, cognoscitiva, ou lingüística. O significado dessa palavra é generalíssimo e corresponde ao significado de coisa. Aquilo que atrai o movimento do sujeito. Obrigação: caráter coercitivo, conferido a uma relação interpessoal por lei jurídica ou por norma moral. Esse caráter é diferente da necessidade, segundo a qual é impossível que a coisa seja ou aconteça de modo diferente. Algumas vezes o caráter obrigatório da relação expressa-se com a noção de necessidade moral ou ideal, sem que com isto se pretenda reduzi-lo à necessidade propriamente dita.
Onipotência de pensamento: 1. Poder supremo do pensamento, o pensamento humano como dominador de toda a natureza; 2. Para o primitivo, através do pensamento eles acreditavam serem capazes de controlar ate mesmo a natureza; 3. Para os neuróticos, seu mundo era desligado do mundo externo e sua realidade era aquela criada por sua mente. Primitivo: tipo de reação. A experiência penetra na mente imediatamente, exterioriza-se em forma de reação. Pessoa de fácil impressão e expressão, mas sem uma boa memória. Punição: é a representação de um fato aversivo dependente de uma resposta, ou reação dada. Um fato punitivo tem efeitos variados, servindo de estímulo excitador de medo (no caso do totemismo). Projeção: mecanismo de defesa interno em que um motivo pessoal, proibido, ou não, mas em condição de ser satisfeito, é percebido pela pessoa como motivo de uma ou várias outras pessoas. Falsa percepção que serve para diminuir a ansiedade por possibilitar a satisfação de algo proibido. Ritualização: formalização de atos incisivos. No sentido antigo, ritualização corresponde à semantização filogenética da parte do emissor. Repressão: mecanismo interno de defesa, mediante o qual o motivo não pode mais ser satisfeito, ou só pode ser satisfeito mediante punição. É substituído por outros motivos semelhantes que podem ser satisfeitos. Religião: tem o seu papel como projeção e comportamento de desejos, racionalização dos interesses inconscientes, em que as necessidades individuais e coletivas motivam a comunidade, os mecanismos de defesa usados pela religião como o tabu, os dogmas, o preconceito, como formas de dominar a ansiedade. Tabu: designação de uma proibição solene, normal entre os chamados primitivos, de praticar certas ações. Crença mágico-religiosa de que uma violação do tabu traz danos à
comunidade. O castigo pela violação do tabu é freqüentemente a exclusão violenta do grupo (tribal) ou a morte. Totemismo: é um sistema que toma o lugar da religião em povos primitivos da Austrália, América e África; provê a base da sua organização social. Diz Wudnt em seu Elementos de Psicologia das Massas: “À luz de todos esses fatos, parece altamente provável a conclusão de que, em alguma ocasião, a cultura totêmica em toda parte preparou o caminho para a civilização mais adiantada e, assim, ela representa uma fase de transição entre a era dos homens primitivos e a era dos heróis e deuses”.
-------------------------------------------------------------------------------[1] - O direcionamento de pensamentos para um determinado objetivo levaria à efetivação deste. A onipotência de pensamentos explica a magia e tem na crença do poder de seus desejos uma de suas causas.
Sobre ANZIEU,D. A auto-análise de Freud e a descoberta da Psicanálise. Ed. Artes Médicas. PA, 1989. ARNOLD, EYSENCK e MEILI. Dicionário de Psicologia. Edições Loyola. São Paulo, 1994. GAY, P. Freud para historiadores. Ed. Paz e Terra. SP, 1989. GAY, P. Freud, uma vida para o nosso tempo. Companhia das Letras, 1989.