PSICOTERAPIA BREVE DE ORIENTAÇÃO PSICANALÍTICA
Eduar do Alberto Braie Braier r
PSICOTERA PSICO TERAPIA PIA BREVE DE ORIENTAÇÃO ORIENTAÇÃ O PSICANALÍTICA .
Trad aduuç ã oIPEPL I PEPLAN AN
Esta Es ta ob ra foi fo i publica pub licada da origina o riginalmen lmente te em espanho esp anho l co m o titulo PSIC PSI C OTER AP I A B RE VE D E O RIENTACI RIEN TACIÓN ÓN PS/CO PS/ CO ANALÍT ANALÍT ICA po r Ed iciones icion es Nuev N uevaa Visiõn, Bu enos Aires, Air es, rm I9&4. I9&4. Copyright © © Edicio nes Nue va Vision SAIC, Buenos Buen os Aife A ife s. 1984 Copyright © © 1986. Livraria Martins Fontes Editora Ltda.. São Paulo, Paulo, p aia a presente edição I* edição 1986 4* edição -TO Coordenação da tradução Man M an a Risoleta Riso leta d e Oliveira M arcondes arco ndes Revisão da tradução Maria Mari a E steia H eider eide r Cavalheiro Cavalh eiro Revisões gráficas Eloisa da Silva Si lva Aragão Aragã o Ivete Batista Ba tista d iu Santos Sant os IHnarte IHnart e Zor zane lh da Silv a Produção gráfica Geraldo Alves Pagirmçáo/Fotolitos Studio 3 Desenvolvimento Editorial
Dados Internacionais de Catalogação na Puhlicaçao (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP. Brasil) lírnicr, Eduardo Alberto Psiwterapia breve de orientação psican.il itica / Eduardo Alberto Britiet Britiet : iraduçAn iraduçAn IPEPLAN. - S3o Paulo : Martins Fontes. 2008. (Psicologia (Psicologia c pedagogia) pedagogia) Titulo original: Psicoterapia breve de orienlación psicoanalítica. Bibliografia. ISBN *J7K-85-336-2407'8 I INicnntilisc 2. 2. Psicote rapia breve I. Titulo. Titu lo. II. Série. 07 UHM
_______ __________ ______ ______ ______ ______ ______ ______ _______ _______ ____ _ CDD-618.8917
Indices para catálogo sistemático: I Psicanálise : Medicina 618.8917
Indice
|
Prefácio à edição brasileira X V por Maurício Knobel Prefácio 1 1. Introdução 3 Referências bibliográficas
7
2. Resenha histórico-bibliográfica 9 A psicoterapia breve na A rgentina 12 Referências bibliográficas 13 3. Fundamentos teóricos 15 Introdução 15 Pelos caminhos da psicanálise 16 A psicoterapia individual breve de orientação psicanalitica
TÉCNICA
4. Entrevistas preliminares
Introduç ã o 63
63
0 estabelecimento da relação terapêutica 63 A história clínica 65 Avaliação diagnostica e prognostica 65 » Avaliação diagnostica 65 Papel do psicodiagnóstico 69 Avaliação prognostica 70 A devolução diagnóstico-prognóstica 71 Contrato sobre as metas terapêuticas e a duração do tratamento 73 Explicitação do método de trabalho. Fixação das demais normas contratuais 76 Referências bibliográficas 77 5. Planejamento do tratamento 79 Referências bibliográficas 81 6. O tratamento 83 Introdução 83 A relação paciente-terapeuta no tratamento breve 84 1Ima regra básica de funcionamento em psicoterapia breve de orientação psicanalitica 89 O emprego constante do método da associação livre ( "regrafundamental ” da psicanálise) nos tratamentos breves 90 Adoção de uma regra básica de funcionamento para psicoterapias breves 93 t lso operativo do método da associação livre nos tratamentos breves 93 ( 'onformação definitiva de uma regra de
As interpretações na psicoterapia breve de orientação psicanalitica 100 Outras intervenções verbais 117 Sobre as sessões 118 Outros recursos terapêuticos 119 O emprego depsicofármacos 120 A participação de familiares e/ou pessoas próximas do paciente no tratamento 121 Referências bibliográficas 125 7. Uma sessão de psicoterapia breve 129 A sessão 136 Comentários sobre a sessão 141 Referências bibliográficas 148
*
,
8. Dificuldades do terapeuta para a formação prática e investigação em psicoterapias breves 149 Introdução 149 A dificuldade de adaptação ao enquadramento da psicoterapia breve 151 'Psicoterapiabreve 'versus'psicanálise” 151 Na intimidade da relação terapeuta-paciente 152 Dificuldades ante o término do tratamento psicoterapêutico breve 159 Dificuldades na avaliação dos resultados obtidos em psicoterapia breve 159 Desprestígio da psicoterapia breve enquanto indicação terapêutica 160 Outras dificuldades do terapeuta ante as terapias breves Conclusões 162 Referências bibliográficas 163
Conclusões 174 Referências bibliográficas
175
10. Alguns problemas técnicos característicos e riscos em psicoterapia breve 177 Referências bibliográficas 182 11. A avaliação dos resultados terapêuticos em psicoterapia breve 185 Introdução 185 Um método de avaliação 186 A avaliação imediata 187 Alternativas do paciente ao terminar o tratamento 194 A avaliação mediata 196 Problemas na avaliação dos resultados terapêuticos 200 Referências bibliográficas 204 12. Indicações da psicoterapia breve 207 Referências bibliográficas 211 13. Dos tratamentos breves 213 Exemplificação do método psicoterapêutico de objetivos limitados 213 Dados biográficos de interesse (resumo) 214 Avaliação diagnostica 215 A hipótese psicodinámica inicial 216 As metas terapêuticas 219 Prognóstico 220 Planificação do tratamento 220 Evolução durante o tratamento 223 Avaliação dos resultados terapêuticos 225
Hipótesepsicodinâmica inicial. Conflitiva focal 232 Metas terapêuticas 233 Prognóstico 233 Planificação do tratamento 234 Evolução durante o tratamento 235 Avaliação dos resultados terapêuticos 241 Considerações finais 245 Referências bibliográficas 249 14. Formação de terapeutas em psicoterapia breve 251 Introdução 251 Aprendizagem teórica 252 < Treinamento psicoterapêutico 253 Supervisão clínica 254 Algumas condições necessárias para um terapeuta em psicoterapias breves 254 Referências bibliográficas 263 Notas 265
“Defrontamo-nos então com o trabalho de adaptar nossa técnica às novas condições.” Sigmund Freud, Os caminhos da terapia psican alitic a (1919).
Prefá cioàediç ã obrasileira
í Apresentar ao leitor a edição brasileira do livro de Braier é uma honra e um prazer. É também sentir que estamos contribuin do para o esforço atual para tomar a psicoterapia acessível a uma ampla camada da população que necessita desta modalidade de atendimento. Eduardo A. Braier é um psicanalista argentino, que recebeu a formação rigorosa do Instituto de Psicanálise da Associação Psicanalítica Argentina. São poucos, infelizmente, os que conseguem associar o rigor da prática psicanalítica a uma consciência social e comunitária. E isso não apenas no devaneio intelectual, mas na confrontação do dia-a-dia com o paciente que procura ajuda nos hospitais e centros de saúde. Braier procurou oferecer uma contribuição concreta para aqueles que buscam ajuda para os problemas emocionais, sem te rem acesso a uma técnica complexa, demorada e elitista. Conhece e reconhece a Psicoterapia Breve e resolve elaborar, através do próprio exercício clínico, uma teoria da técnica para a
XV I
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Os fundamentos teóricos de Braier têm origem na psicanáli se. Como bom discípulo de Freud, aceita o desafio do mestre e procura “adaptar nossa técnica às nossas condições”. De aluno fiel converte-se em mestre generoso e nos oferece esta contribui ção, esta modalidade de terapia que resulta de uma cuidadosa ava liação da técnica psicanalitica. hstuda minuciosa e cuidadosamente os princípios clássicos e a prática da psicanálise c compara-os com a sua prqpria experiên cia neste campo relativamente novo da psicoterapia. Braier é o psicanalista cauteloso unido ao terapeuta audacioso, com os pés no chão e voltado para o futuro. A linguagem é, por momentos, rigidamente psicanalitica, mas reflete sempre uma compreensão dinâmica do processo terapêutico, veículo de uma proposta con creta e acessível. Aceita a possível utilização de recursos terapêuticos múlti plos e afirma que ninguém é dono da verdade, privilegiando di versas e diferentes hipóteses, principalmente dentro da área psicanalítica. A sua técnica criteriosamente elaborada é apresentada com metodologia, depois de uma revisão minuciosa dos conceitos de Malan c da terapia focal. Inicia com o estudo das entrevistas preli minares e, a meu ver, merece especial destaque a afirmação de que é necessária uma ampla e minuciosa avaliação diagnostica, sem a qual será difícil iniciar um processo psicoterapêutico. O capítulo cinco, sobre “Planejamento do tratamento”, é extremamente rico pelos conceitos que traz. No estudo sobre “O Tratamento”, o autor parece não ter esquecido nenhum daqueles detalhes que respondem às muitas perguntas que constantemente nos fazem os alunos e os estudiosos da técnica. O livro traz muitas respostas e sua contribuição didática é inquestionável. A apresentação detalhada de um caso clínico é uma ilustra
Prefácio à edição brasileira _ ____
_____________________ _____________________________
Os exemplos clínicos ajudam o leitor a entender e a familiarizar-se com esta técnica tão concisa, aqui apresentada de modo abrangente. O modelo de “ficha clínica para psicoterapias breves” que encerra o livro é um guia útil para quem procura sistematizar estes estudos. O país e os leitores de língua portuguesa vão se beneficiar com esta obra, que, além de seu valor didático, teórico, prático e de pesquisa, é um importante auxiliar clínico. Considero necessário parabenizar a.empresa editora pela seleçào desta obra. Não se trata de um “transplante artificial”, só válido na sua microcultura de origem, e sim de uma ampla e imparcial obra teórico-técnica, perfeitamente aplicável em nossa cultura, em nossa sociedade. j Braier consegue aqui abrir nossos olhos a uma realidade, ofe recer a teoria de uma técnica compreensível dentro do campo psicanalítico e mostrar que a psicoterapia não é necessariamente o privilégio de uma classe social, mas deve ser uma possibilidade aberta para muitos; mostra também que este mundo conflitante necessita cada vez mais de especialistas com conhecimentos sérios e profunda sensibilidade áocial. A polêmica sobre “investigação” da personalidade ou seu “tratamento” é estéril, academicista e, do ponto de vista psicanalítico, uma atitude resistencial. Não existe pesquisa em psicanálise sem assistência a quem procura este contato único e absolutamen te singular. Este trabalho é uma mostra do quanto se pode fazer quando existe compreensão humana do ser humano e não uma escondida fobia ao contato interpessoal criativo e enriquecedor da alma. Campinas, junho de 1986. PROE DR. MAURÍCIO KNOBEL Professor Titular de Psiquiatria Clínica da FCM da UN1CAMP Professor Titular de Processos Psicoterápicos do Dept? de
*
Prefá cio
|9«> Meu interesse pela psieoterapia breve nasceu em meus anos de residente em Psiquiatria (1968-71), primeiro no Serviço de Psicopatologia do Hospital Pinero e, depois, no serviço de mesmo nome no Hospital Ramos Mejía. No trabalho hospitalar, defron tei-me com o problema ocasionado pela necessidade de propor cionar assistência psiquiátrica a grandes massas da população. Isso motivou minha apresentaçãb a concurso para obter uma bolsa municipal que era oferecida pela Secretaria de Saúde Pública de Buenos Aires, que me proporcionou uma experiência clínica de um ano na investigação de terapias breves, no segundo dos servi ços citados (1971-72). Desde então, e concomitantemente à mi nha dedicação a terapias prolongadas, não abandonaria mais o estudo e a investigação das técnicas de objetivos e tempos limita dos, sempre partindo do corpo teórico-psicanalítico. Minha práti ca em tais técnicas, além da exercida em consultório particular, inclui uma passagem de aproximadamente 2 anos pelo CEMEP (Centro dc Psicologia Médica), como terapeuta da instituição (1972-73). A isto se somou o poderoso estímulo que significou o intercâmbio científico com colegas, o trabalho docente que venho exercendo sobre o assunto em hospitais, instituições e em nível privado e, mais recentemente, o enorme enriquecimento que me
2
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
com clareza principalmente as experiências e idéias pessoais que venho acumulando até o momento, complementadas por uma revisão crítica, que de nenhum modo pretende ser completa, da bibliografia existente sobre o tema. Como sempre ocorre, certos pontos despertaram em mim um interesse maior que outros, motivando alguns desenvolvimentos. Entre eles se encontram: os fundamentos teóricos, a regra de fun cionamento do paciente, os tipos de atenção do terapeuta, as difi culdades do terapeuta para a formação, a prática e a investigação em psicoterapias breves, o término do tratamento, alguns incon venientes técnicos e riscos a eles relacionados e os problemas concernentes à avaliação dos resultados terapêuticos. Quero expressar meus mais sinceros agradecimentos a todos aqueles que de uma maneira ou de outra me ajudaram nesse em preendimento, especialmente: Ao Dr. Luiz Allegro, que realizou um leitura crítica dos ori ginais e, além disso, me incentivou constantemente, assim como ao Dr. Marcos Guites, que leu o capítulo 13. Ao Dr. Iléctor J. Fiorini, pelo generoso estímulo e pelas su gestões que pessoalmente me ofereceu durante anos de frutíferas discussões sobre as psicoterapias. Boa parte de meu entusiasmo pelo tema deve-se à leitura de seus excelentes trabalhos. Ao Sr. Ifim Kantor, a quem coube a enorme tarefa, realizada com carinho e esmero, de transcrever meus ilegíveis manuscritos. À Dra. Blanca R. Montevecchio, que supervisionou os trata mentos breves que efetuei durante minha investigação no Serviço de Psicopatologia do Hospital Municipal J. M. Ramos Mejía. Ao Dr. Moisés Kijak e a Elisabeth G. De Garma, que foram meus analistas. Aos colegas membros dos diferentes grupos de estudo por mim coordenados, principalmente os seguintes: doutores Víctor Feder, Alejandro Puente, Alba Brengio, Delia Saffoires, Mónica Noseda, Isaías Finkelstein, Ricardo Frigerio; licenciados Jorge A.
1. Introduç ã o
l
*»
As chamadas psicoterapias breves surgiram essencialmente como uma resposta ao problema assistencial colocado pela massa cada vez maior de população consultante. Em nosso meio, os inci pientes serviços de psicopatologia hospitalar, os centros de saúde mental, as instituições privadas e os hospitais psiquiátricos tive ram, em determinado momento, e de forma similar a outros paí ses, de implementar técnicas breves. Da mesma maneira, a seu tempo, tinham incorporado, com idêntica finalidade, o uso de modernos psicofármacos e da psicoterapia grupai, já que os tera peutas, em quantidade insuficiente, não conseguiam cobrir a demanda de pacientes. As terapias de curto prazo, individuais e grupais, permitiram ampliar a assistência psiquiátrica, propósito este que, por outro lado, não era compatível com o emprego de tratamentos longos. As limitações econômicas de muitos que acorrem em busca de ajuda terapêutica foram e são, sem dúvida, um fator que vem exercendo uma influência decisiva no desenvol vimento e na difusão das terapias breves, naturalmente mais acessiveis às pessoas de poucos recursos. Os objetivos terapêuticos deveriam, então, centrar-se na superação de sintomas e incidentes agudos ou situações perturbadoras atuais, que se apresentam
4
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
recebem revelam as tentativas de tornar precisas algumas daquelas que se consideram suas principais características (embora indu zam, em definitivo, a aumentar a confusão reinante), as quais, é conveniente citar para poder, desde já, deixar claro a que situações e métodos psicoterápicos vou referir-me ao longo desta obra. Em primeiro lugar cabe examinar a denominação psicotera pia breve, que por ser, sem dúvida, a mais difundida e imposta pelo uso, empregamos aqui com muita freqüência1,. Apesar disso, há que se admitir que não é a mais adequada: em princípio porque essas terapias sâo breves do ponto de vista do terapeuta, e quando sua duração é comparada com a do tratamento psicanalítico, em geral mais prolongado (1), mas podem não parecer breves por exemplo para o paciente. Acima de tudo, tal denominação é dis cutível, já que uma psicoterapia pode ser de duração certamente prolongada - um ano ou mais - mas ter as metas limitadas e as características técnicas próprias e essenciais desses procedimen tos (focalização, planejamento, etc.), que as distinguem da psica nálise corrente e de outras psicoterapias. As terapias a que fazemos referência também são conhecidas como psicoterapias de tempo limitado, denominação essa que novamente alude à sua temporalidade, mas que denota não só bre vidade, como também a fixação de um limite de tempo para o tra tamento, em virtude do qual este passa a ter, geralmente e de ante mão, uma data de finalização preestabelecida. Tampouco este é um fato necessariamente constante nesses tratamentos. Outra denominação a que se costuma recorrer, a de psicote rapias de objetivos limitados, é, a meu ver, muito apropriada, já que se refere a um elemento importante e que, diferentemente de outros elementos, sempre se faz presente em tais terapias, que por conseguinte poderão ser concomitantemente de tempo limitado ou não.
Introdução
_______
____ ____
________
________
_________
________
________
________
Alguns autores preferem designá-las com nomes que servem para destacar algumas de suas peculiaridades técnicas e que suge rem diferenças com relação às da psicanálise clássica: terapias planejadas (3) ou focais (4), por exemplo. Entre nós Szpilka e Knobel propuseram denominá-las psicoterapias não-regressivas, para acentuar outro aspecto importante delas (5). A chamada psicoterapia de emergência concerne, no meu entender, .à forma de psicoterapia rápida ou breve que partilha apenas algumas das características e dos métodos de que nos ocu pamos. Refere-se, particularmente, a uma terapia de urgência em “situações especiais de crise e exigência” (2), tais edmo episódios de natureza psicótica (tentativas de suicídio, delírios agudos, etc.). Em tais situações, com freqüência prevalece a necessidade de estancar a crise, obtendo-se um alívio sintomático, de modo que na maioria dos casos deve-se postergar a busca de insight no paciente até um segundo momento terapêutico, já que de imediato suas condições egóicas não costumam permiti-lo. Nesta obra referir-me-ei, sobretudo, a uma psicoterapia de objetivos limitados, basicamente’ interpretativa ou de insight, que deve ser empregada em indivíduos com capacidade egóica sufi ciente para serem tratados por meio dela. É necessário afastar a absurda antinomia que alguns preten dem criar entre a psicanálise e a RB.. Ambos os métodos constam de objetivos terapêuticos, indicações clínicas e técnicas diferen tes. É perigoso incorrer no erro de pensar que a psicanálise é o único tratamento válido realizável, como também no de supervalorizar os alcances da RB., atribuindo-lhes resultados espetacula res. (De minha parte, longe de querer apresentar o tratamento breve como uma panacéia, tratarei aqui não só de suas possibili dades, mas também, e com certo detalhe, de suas limitações e ris cos.) É melhor dizer que é possível instrumentar uma terapêutica breve baseada no esquema conceituai da psicanálise, o que signi ficará uma proveitosa aplicação de suas teorias em situações nas
"
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
podem, por motivos diversos (econômicos, mas também de resis tência, ou por sua idade avançada, etc.) ser abordados através de um tratamento psicanalítico, exigindo que adaptemos nossos recursos técnicos às possibilidades e necessidades do paciente, sem esperar que sejam eles quem devam amoldar-se a um único método terapêutico. Caso isso ocorresse, correríamos o risco de tomar por intratáveis indivíduos que simplesmente - c freqüente mente só em caráter transitório - não estão em condições de ser analisados. Cabe acrescentar que em muitas ocasioes uma terapia de objetivos e tempo limitados pode ser o passo inicial em direção a um posterior tratamento analítico, convertendo-se, num primei ro momento, na mais conveniente, ou ainda, na única abordagem terapêutica viável, que poderá trazer, como resultado, uma mudança nas condições do paciente que o torne apto para efetuar, em seguida, uma psicoterapia prolongada. A superação das diversas dificuldades dos profissionais para encarar a formação, a prática e a investigação em P.B. surge clara mente como premissa. De um tempo para cá, já são muitos os que falam na importância do emprego deste método terapêutico, mas são poucos os que preconizam e aplicam procedimentos técnicos apropriados ao contexto em que tal método cabe. Também chama a atenção a escassa participação dos analistas de maior experiência na investigação dessas terapias. Pessoalmente, interessei-me em obter uma compreensão profunda de algumas das motivações inconscientes do terapeuta que subjazem a suas dificuldades para ajustar-se ao enquadramento requerido pela P.B. Constitui uma necessidade premente contar com uma teo ria da técnica da P.B. estruturada com mais solidez, que possibilite um ensino adequado de seus princípios básicos (sem que tal afirmação desmereça o reconhecimento da existência de contri buições de decisiva importância sobre o tema, que enriqueceram profundamente nossa visão dele). Oriento meu trabalho cm direção
Introdução
______________________________________________________________________________________________ _
Também serão bem-vindas a realização e a transmissão de novas experiências clinicas organizadas em P.B., que possibilitem validar ou questionar as concepções teóricas sustentadas atual mente. Por último, desejo esclarecer que nesta obra irei ocupar-me especialmente do que tange à psicoterapia individual breve em pacientes adultos e adolescentes, ainda que muitos dos conceitos apresentados sejam extensivos ao tratamento de crianças c aos procedimentos grupais (psicoterapia breve de casal, grupo fami liar, etc.)?
Referências bibliográficas
j
•» 1. Alexander F., “Eficacia dei contacto breve”, em Alexander, F e Frcnch, T., Terapêutica psicoanalítica, Paidós, Buenos Aires, 1965, cap. IX. 2. Bellar, L. e Swall, L., Psicoterapia breve y de emergencia, PaxMcxico, México, 1969. 3. French, T., “Planificación de la psicoterapia”, cm Alexander, F. e French, T., ob. cit., em I, cap. V it 4. Malan, D. H., A Study o f Br ie f Psychotherapy, Tavistock., Londres; Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 5. Szpilka, J. e Knobel, M., “Acerca de la psicoterapia breve”, Coloquio Acta 1967: Psicoterapia breve. Acta psiq. psicol. Amér. Lat., vol. XIV, n? 2, Buenos Aires, junho de 1968.
.
2. Resenhahistórico-bibliográ fica
I Passaremos cm revista os principais acontecimentos e obras que marcaram a evolução da terapêutica breve de orientação psicanalítica. Devo começar tal revisão assinalando que os primeiros tra tamentos efetuados pelo próprio Freud na etapa pré-analítica e no começo da analítica eram, de cfcrto modo, terapias breves, pois duravam só alguns meses. O fundador da psicanálise se achava empenhado, inicialmente, em buscar curas rápidas, a princípio dirigidas para a solução de determinados conflitos e sintomas'. Freud atendeu a Gustav Mahler, com resultados satisfatórios, durante algo mais de... quatro horas, a maior parte das quais trans correram enquanto ambos passeavam por Leyden (9). Outro trata mento célebre, o do Homem dos ratos, que conseguiu bons resul tados, e cujo histórico clínico foi publicado em 1909 (5), durou tão-somente 11 meses. Gradualmente e com os progressos da psicanálise, o trata mento foi-se tornando mais prolongado. Incidem fatores como a resistência, a sobredeterminação dos sintomas, a necessidade de elaboração, os fenômenos transferenciais, etc. (12). O desenvolvimento dos acontecimentos mais relevantes pode ser resumido como se segue:
W
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
vez uma data para o término da análise, numa tentativa de acelerar o desenvolvimento do processo terapêutico2. 1916: Ferenczi menciona, pela primeira vez, a necessidade de uma psicoterapia breve, sendo repreendido por Freud ( 13)\ 1918: em uma conferência pronunciada em Budapeste e edi tada no ano seguinte (“Os caminhos da terapia psicanalítica” [8]), Freud propõe uma psicoterapia de base psicanalítica para respon der à necessidade assistencial da população, e sugere que se com binem os recursos terapêuticos da análise com. outros métodos. Tal proposta é de importância decisiva para fundamentar, poste riormente, a configuração de uma terapia breve de orientação psi canalítica. 1920-1925: S. Ferenczi e O. Rank realizam tentativas para abreviar a cura psicanalítica. Escrevem conjuntamente um livro, no qual abordam o tema (3), recebendo duras críticas de Freud. Ferenczi propõe o chamado “método ativo”, que logo aban donará. Rank, por sua vez, defende a possibilidade de um trata mento analítico breve baseado na tentativa de superar, em poucos meses dc análise, o trauma do nascimento, que considera o nódulo da neurose. 1937: em “Análise terminável e interminável”, Freud assina la que as tentativas de abreviar a duração da análise que consome muito tempo não requerem justificação “e se baseiam em impera tivas considerações de razão e dc conveniência”. Em várias passa gens desse artigo sublinhará que o encurtamento da duração da análise é uin fato desejável. Mas também fustigará as tentativas que Rank efetuara nessa direção desde 1924, baseadas em sua concepção a respeito do trauma de nascimento. O mesmo fará em relação a Ferenczi. Neste, ura de seus últimos trabalhos, Freud recorda que, para acelerar o tratamento analítico no caso do Homem dos lobos, re correu ao expediente de fixar-lhe um limite de tempo. Acrescenta que posteriormente também tomou essa medida em outros casos,
f
FAG
IFACULDADE GUAIRACÁ [ GiBLIQTECA _____,
11
perdida para nossos esforços terapêuticos. Porque, uma vez que o analista tenha fixado o limite de tempo, não pode prolongá-lo; de outro modo, o paciente perderia a fé que nele deposita” (6). 1941: o Instituto de Psicanálise de Chicago organiza um con gresso nacional sobre psicoterapia breve. Aumenta o interesse pelo tema nos Estados Unidos. 1946: aparece Psychoanatytic Therapy (Ronald Press, Nova York), de F. Alexander e T. French e colaboradores do Instituto de Psicanálise de Chicago, obra que inicia uma nova e decisiva etapa no campo das técnicas breves. Os autores recolocam a necessida de de abreviar o tratamento analítico e de efetuar terapias breves com uma compreensão psicanalítica. Incluem conceitos sobre planejamento da psicoterapia, flexibilidade do terapeuta, manejo da relação transferencial e do ambiente, utilidacfê de ressaltar a realidade externa e eficácia do contato breve. Tomam como ponto dc partida uma experiência clínica na qual intervém um número importante de terapeutas experientes. O livro descreve numerosos históricos clínicos (1). 1963: publica-se A Study o f Brief Psychotherapy, de D. H. Malan (Tavistock Publications Limited, Londres). A obra descreve uma experiência clínica de investigação baseada em tratamentos de curto prazo, realizada por terapeutas da Clínica Tavistock, de orientação kleiniana. Nela se detalha a técnica focal. O autor acen tua a conveniência de interpretar a transferência de maneira exaus tiva dentro da terapia breve (em acentuada dissidência com muitos outros), assim como a necessidade de trabalhar a separação entre paciente e terapeuta, causada pelo término do tratamento. Além disso desenvolve, brilhantemente, um método psicodinâmico para avaliar os resultados terapêuticos. O livro oferece uma detalhada apresentação de 19 casos tratados com psicoterapia individual bre ve, que inclui os acompanhamentos efetuados. A supervisão dos tratamentos esteve a cargo de M. Balint ( 12). 1965: aparece Short-Term Psychotherapy, obra compilada por L Wolberg (Grune and Stratton, Inc., Nova York), que contém
12
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Também nesse ano L. Beliak e L. Swall publicam Emergency Psychotherapy and Brie f Psychotherapy (Grune and Stratton, No va York). Os autores incluem diversos temas, entre os quais se destacam: o enfoque do tratamento à luz da psicologia psicanaliti ca do ego, a aplicação da teoria da aprendizagem, o insight e a ela boração (2). 1971: em The Briefer Psychotherapies (Brunner Mazel, Inc., Nova York), Small realiza uma extensa compilação das idéias de numerosos autores sobre o tema (14).
A psicoterapia breve na Argentina 1967: tem lugar o Colóquio Acta 1967: Investigações sobre psicoterapia breve , que apresenta valiosas contribuições. Partici pam, entre outros, R. J. Usandivaras, J. I. Szpilka, M. Knobel, A. E. Fontana, G. S. de Dellarossa, H. Ferrari, A. G. Marticorena e A. Dellarossa (15). Esse colóquio é um testemunho do crescente interesse que começa a se manifestar, em nosso meio, pelo proble ma das psicoterapias (individuais ou grupais) em serviços psi quiátricos - de recente criação - de hospitais gerais, hospitais psiquiátricos e instituições privadas, que oferecem tratamentos a honorários reduzidos em razão da demanda cada vez maior de assistência psicológica por parte da população. Empregam-se tra tamentos de duração limitada com base psicanalitica, mas a ativi dade é desorganizada e confusa e não se apresentam, ainda, maio res perspectivas de instrumentalizar técnicas suficientemente sis tematizadas e coerentes. 1970: aparece o primeiro livro de autor argentino, exclusiva mente consagrado ao tema: Psicoterapia breve, de H. Kesselman, com prólogo de J. Bleger. O autor, utilizando o esquema referen cial de Pichon-Rivière aborda, entre outros aspectos, o planeja
Resenh Resenhaa histórico-b histórico-bibliog ibliográfic ráficaa
_____ ___ ______________________________
___ ___ ___ _____ ___
terapia breve e o que oferece um modelo teórico do foco terapêu tico (4). 1975: Psico Ps icoan anális álisisy isy psicoterapia psicoterap ia breve en la adolescencia*, de J. C. Kusnetzoff, aborda, em sua segunda parte, o tema da psico terapia individual e grupai breve do adolescente. É de especial interesse o capítulo destinado à teoria da comunicação e à psicote rapia breve, assim como a inclusão da família no tratamento (11). 1980: 198 0: em nosso meio atualmen atualmente te é indiscutível a necessidade de se recorrer a psicoterapias menos custosas que a análise, tanto em temjío como em dinheiro, a fim de responder à demanda de um número cada vez maior dc indivíduos. A aplicação das chama das psicoterapias breves se difunde ostensivamente, mas ainda não se lhes reconhece um status teórico, que, no entanto, começa a se delinear, sendo relativamente escassas as investigações que têm suscitado.
Referên Ref erências cias bibliográficas bibliogr áficas 1. Alexa A lexande nder, r, F. e French, Frenc h, T., Terapêutica Terapêutica psicoanalitica, psicoan alitica, Paidós, Paidós, Bue nos Aires, 196 1965. 5. 2. Beliak, L. e Small, L., Psic L., Psicoter oterapia apia br ev ey de d e emergencia, emergen cia, Pax Pax- Mé xico, México, 1969. 3. Ferenczi, S. e Rank, O., The The Development Development o f Psychoan Psyc hoanalysis alysis,, Zurich International Press, Leipzig e Viena, 1924. 4. Fiorini, H. J., Teoria Teoria y técnica técnica de psicoterapias, psicoterapias , Nueva Vision, Vision, Bue nos Aires, 1973. 5. Freud, S., “Análisis de un caso caso de neurosis obsesiva”, obse siva”, era O.C., Bi blioteca Nueva, Nu eva, Madri, M adri, 194 1948, 8, t. II. II. 6 . “Análisis “Análisis terminable terminable y interminable”, interminable”, em O.C., O.C., Biblioteca Nue va, Madri, 1968, t. III. 7 . “Historia “Historia de uma neurosis infantil”, infantil”, em O.C., ob. O.C., ob. cit. em 5, t. II. 8 . “Los caminos de la terapia psicoanalitica”, psicoanalitica”, em O.C., ob. O.C., ob. cit., em
5,t. n.
9. Jones, E., “Vida y obra de Sigmund Freud”, Nova, Buenos Aires, 1960,, t. n. 1960 n.
1+
Psicoterapia breve de orientação psieanalitica psieanalitica
10. Kcssclman, H., Psicoterapia H., Psicoterapia breve br eve,, Kargieman. Buenos Aires, 1970. 11. Kusnetzoff, J. C., Psicoanális Psico análisis is y psicoter psic oterapia apia breve bre ve en la adolescencia, Kargieman, cencia, Kargieman, Buenos Aires, 1975. 12. Malan, D. H„ A H„ A Study Stud y o f B r ief ie f Psychotherap Psycho therapy, y, Tavistock, Tavistock, Londres, Charles Thomas, Springfield, Illinois. 1963 (Versão castelhana: La psicoter psic oterapia apia breve, Centro breve, Centro Editor de America Latina, Buenos Aires, 1974). 13. Rey Ardid, Ardid, R., Prólogo al tomo m de S. Freud, O.C., ob. O.C., ob. cit. em 6, 1968. 14. Small, L., Psico L., Psicoterapia terapiass breves, Granica, breves, Granica, Buenos Aires, 1972. 15. Usandivaras, R. J. c outros, Coloquio Acta 1967: Psicoterapia bre ve, ve, Actapsiq Ac tapsiq.. psicol. psicol. Amêr. Lai., vol. Lai., vol. XIV, ní* 2, Buenos Aires, junho de 1968. 16. Wolbcrg, Wolbcr g, L. L. e col., Psicot col., Psicoterap erapia ia breve, Gredos, breve, Gredos, Madri, 1968.
3. Fun unda dam ment ntos osteóricos1 cos1
! Introdu Intr odução ção Os problemas de teoria em terapias breves são numerosos e comprometem o seu reconhecimento dentro do panorama psicoterapêutico. Atualmente crcio que podeifios encontrar contribuições mui to valiosas ao tema, mas, se há pontos de coincidência entre os diversos autores no que concerne a uma teoria do processo, tam bém é certo que paralelamente ainda reina muita confusão entre os leitores, talvez provocada por uma verdadeira miscelânea de conceitos teóricos que nem sempre podem articular-se entre si. Como assinala Fiorini, falta uma estrutura unitária que suste esses procedimentos (13). É para sua obtenção que devemos diri gir nossos esforços. Gostaria de assinalar uma carência particularmente notória, que é a de uma concepção mais ou menos definida e aceita quanto aos mecanismos terapêuticos atuantes nessas terapias. Neste capitulo mc proponho a discorrer sobre alguns temas cuja recolocação considero de importância decisiva dentro da ten tativa de configurar um marco conceituai para as psicotcrapias de objetivos e tempo limitados. Além disso, procurarei, ao longo
16
Psico Psicoter terap apia ia breve breve de orien orientaç tação ão psican psicanalí alítica tica
to de partida, como o de muitos investigadores, são as teorias psicanalíticas. Na verdade, não encontro motivos para prescindir de teorias tão valiosas como a do inconsciente, do conflito psíquico, da sobredetemiinação, dos mecanismos defensivos, da gênese dos sonhos, das séries complementares, da estrutura do aparelho psí quico, da transferência, das resistências e de tantas outras que nos permitem compreender a problemática do paciente e do processo terapêutico2. Porém, o que realmente terá de ser modificado é a técnica, que por múltiplas razões não poderá continuar sendo a mesma que a empregada em psicanálise, devendo ajustar-se ao contexto próprio desses procedimentos. Incluo-me assim entre aqueles que propõem uma psicoterapia breve de orientação psica nalítica, mas entendendo que deve ser algo tecnicamente muito diferente de uma “psicanálise breve”.
Pelos camin cam inho hoss da psican psic análi álise se Minha concepção da terapêutica breve é fiel aos princípios básicos formulados por Freud num trabalho que adquire signifi cação especial dentro do tema que nos ocupa e que talvez não tenha sido suficientemente valorizado. Refiro-me à conferência pronunciada em Budapeste em 1918, e publicada um ano depois sob o título de “Os caminhos da terapia psicanalítica” (26). Já naquela época, Freud adiantou-se a fatos que sobreviriam poste riormente, entre os quais hoje podemos incluir o aparecimento dos tratamentos breves como uma tentativa de possibilitar a assis tência psicológica a um número maior de pessoas. Muitos dos pensamentos expressos naquela ocasião vigoram ainda hoje. Na parte final do trabalho, Freud assinala a necessidade de no futuro os psicanalist psic analistas as adotarem adotarem medidas me didas para para estender o tratamento tratamento psicoterapêutico a grandes massas da população. Reconhece que se tropeça em inconvenientes para consegui-lo, derivados de carac
Funda Fundame mento ntoss teóric teóricos os
17
que que acostumemos acostu memos a ela nosso nos so pensamento. Sabem muito bem bem que que nossa ação terapêutica é bastante restrita. Somos poucos, e cada um de nós não pode tratar mais do que um número limitado de doentes por ano, por maior que seja nossa capacidade ca pacidade dc trabalh trabalho. o. Diante da magnitude da miséria neurótica de que padece o mundo mundo e de que quiçá pudesse não padecer, nosso rendimento terapêutico é quantitativamente insignificante. Além disso, nossas condições de existência humana limitam nossa ação às classes abastadas da sociedade.” Mais adiante antecipa a criação de estabelecimentos assistenciais estatais, nos quais os psicanalistas tratem gratuita mente dos pacientes por meio da psicoteràpia: “Por outro lado, é possível prever que algum dia chegará a vez de despertar a cons ciência da sociedade, e adverti-la de que os pobres têm tanto direito ao auxílio do psicoterapeuta como ao do cíirurgiào, e de que as neuroses ameaçam tão gravemente a saúde dt povo como a tuberculose, não podendo ser seu tratamen tratamento to tampouco abandona abandona do à iniciativa individual. Criar-se-ão, então, instituições médicas para as quais serão designados analistas encarregados de conser var a resistência e o rendimento de homens que, abandonados a si mesmos, se entregariam à bebida, de mulheres prestes a sucumbir sob o peso das privações e de crianças cujo único porvir é a delin qüência ou a neurose. O tratamento seria, naturalmente, gratuito.’’ Assinala logo a seguir a necessidade de se modificar, nessas cir cunstâncias, a técnica psicanalítica, o que me parece da maior importância, pois hoje em dia muitos analistas resistem a fazê-lo, mostrando-se “mais realistas que o rei”. “Caberá a nós, então, o trabalho trabalho de adaptar nossa técnica às novas condições condiçõe s” (o grifo é meu). Em seguida expõe, ao contrário do que alguns poderiam supor, seu ponto de vista a respeito do uso de diferentes recursos terapêuticos em tais casos, em lugar de preconizar, de modo exclusivo, o método psicanalítico (o que endossaria o critério que hoje sustenta a multiplicidade de elementos terapêuticos nas tera pias breves, especialmente nas que ocorrem em instituições assisiciK iais): “Na aplicação popular de nossos métodos talvez tenha mos de misturar ao ouro puro da análise o cobre da sugestão direu . também a influên inf luência cia hipnóti hi pnótica ca poderia aqui aqui voltar a ter lugar
18
Psico Psicoter terap apia ia brev brevee de orie orienta ntaçã çãoo psica psicana nalític líticaa
deverão provir da psicanálise (isso, como tudo o que disse ante riormente, também se converteu em realidade, já que atualmente se conta com a P.B. de orientação psicanalítica): “Mas, quaisquer que sejam a estrutura e a composição dessa psicoterapia para o povo, povo, seus elementos elemen tos mais importantes importa ntes e ejicazes ejic azes continuarã conti nuarãoo sendo. send o. desde já, já , os tomados tomad os da psican psic análi álise se propria pro priame mente nte dita, ri gorosa e livre de toda tendencio tend enciosidad sidadee” (o grifo é meu).
A psicoterap psic oterapia ia indivi ind ividu dual al breve de orientaçã orie ntaçãpp psican psi canalít alítica ica Ante a perspectiva de se adotar uma técnica breve de base psicanalítica, faz-se neceásário, para definir melhor seus elemen tos principais, estabelecer uma comparação com nosso modelo original, o tratamento psicanalítico. Desse modo, tentarei clarifi car os pontos de contato entre os dois métodos terapêuticos e, muito especialmente, suas diferenças4. Dentro dos procedimentos breves, referir-me-ei, fundamentalmente, à técnica dirigida ao insight , sobre a qual podem apresentar-se mais dúvidas a respeito de suas relações com a técnica analítica, contrariamente ao que acontece com uma terapia essencialmente de apoio, cuja caracte rização é mais simples e mais conhecida. Juntando-me à iniciativa de alguns setores, como Bellak (6), Small (6), (48) e Malan (40) e com um propósito principalmente didático, considerarei três aspectos aspec tos essenciais: essenc iais: 1) os fins terapêu ticos, 2) a temporalidade, 3) a técnica. Os fins terapêuticos A psicanálise reconhece como meta fundamental o tomar consciente o inconsciente. Mas a experiência clínica nos permite comprovar que essa finalidade traz, além disso, a perspectiva simultânea de uma reconstrução da estrutura da personalidade
Fundamentos teóricos
19
Na terapia de objetivos limitados, como o próprio nome indi ca, as metas são reduzidas e mais modestas que as do tratamento psicanalítico. A limitação dos objetivos terapêuticos é caracterís tica do procedimento de que nos ocupamos, e aparece em função das necessidades mais ou menos imediatas do indivíduo. Os obje tivos podem colocar-se em termos da superação dos sintomas e problemas atuais da realidade do paciente, o que implica, antes de tudo, o propósito de que este possa enfrentar mais adequadamente determinadas situações conflitivas e recuperar sua capacidade de autodesçnvolvimento, de modo que na prática se ache em condi ções de adotar certas determinações quando isso se revele neces sário. Exemplo: uma jovem professora, com francas alterações de caráter, apresentava recentemente sintomas de cjepressào e de conversão histérica (paralisia dos membros inferiores e des maios), ligados a situações conflitivas surgidas em sua relação com a diretoria de sua escola, tudo isso lhe ocasionando sérias dificuldades adaptativas no plano profissional. Fixaram-se os seguintes objetivos para uma terapia de curta duração: conseguir que a jovem obtivesse um alívio de seus sintomas e sobretudo que pudesse compreender e manejar, melhor os conflitos subjacentes a seu problema atual a fim de poder reintegrar-se no trabalho e de senvolver-se mais saudavelmente em seu meio profissional. De preferência, e na medida do possível, a solução dos pro blemas imediatos e o alívio sintomático deverão, em um sentido psieodinâmico, corresponder à obtenção de um principio de insight do paciente a respeito dos conflitos subjacentes (o que supõe que cm certa medida também nos propomos a tomar conscientes aspectos inconscientes, ainda que a meta central, em si, não seja a exploração do inconsciente como ocorre na psicanálise). Além disso, o trabalho pode ser encarado a partir do lugar do terapeuta e com uma visão dinâmica, como tendo o propósito de clarificar e resolver, ainda que de modo parcial, parte da patologia do pacien te. Malan fala precisamente em “elaborar brevemente um dado aspecto da psicopatologia” (40). No exemplo há pouco citado, isto consistia essencialmente em conseguir que a paciente se
20
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
de rebelião, do que derivavam dificuldades em sua relação com representantes da autoridade materna, como sucedia com a direto ra. Segundo Malan, sua proposta ofereceria a vantagem de nos permitir incluir expectativas de resultados terapêuticos maiores do que se concebêssemos as metas meramente circunscritas à re missão de um determinado sintoma ou à resolução de uma situa ção crítica (40). Assim, no tratamento da professora, por detrás do intento de resolver aspectos do conflito primário com a figura materna, poder-se-ia aspirar não só a obter a remissão ou a dimi nuição da intensidade dos sintomas atuais, além de conseguir que a jovem pudesse solucionar seus problemas de relação com a dire tora, mas também a conseguir mudanças favoráveis em suas rela ções patológicas com outras mulheres que representassem sua mãe (uma companheira mais velha, a dona da pensão, etc.), uma maior iniciativa e a superação de inibições, não só na área profis sional como também em outras (sexual, social, etc.). Considero então que toda formulação, nos termos correntes, de objetivos terapêuticos limitados, deve pressupor, no terapeuta, uma refor mulação dc tais objetivos num sentido psicodinâmico que os abar que e que quase sempre haverá de transcendê-los em alguma me dida. Explica-se, assim, a aparição posterior de certas mudanças no paciente no que concerne a problemas em outras áreas de sua vida que, inclusive, não chegam a ser mais tratados de maneira explícita ou direta durante a terapia, mas que se acham ligados, dc certo modo, às perturbações que tenham sido objeto de nossa abordagem terapêutica. Numa ordem de importância geralmente secundária, figu ram diversas formas de oferecer ajuda ao paciente no que se refere às situações perturbadoras, seja procurando aliviar sua ansiedade através de meios como por exemplo os psicofármacos, seja inter vindo diretamente nessas situações de sua realidade, como no caso da assistência social, etc. Ao aprofundar mais o tema dos objetivos terapêuticos, ve
Fundamentos teóricos
21
auto-estima (6) e da aquisição de consciência da enfermidade. (Tratarei mais detidamente desses aspectos no capítulo 11.) A temporalidade Enquanto que num tratamento psicanalítico a duração não é determinada de antemão, prolongando-se durante anos, nas cha madas terapias breves é comum que a fixemos previamente, e que seja mai£ curta, em geral, de uns meses. Essas peculiaridades, das quais derivam as denominações talvez mais difundidas desses procedimentos (psicoterapias breves, psicoterapias de tempo li mitado, etc.), configuram um traço diferenciado náiito destacado dos mesmos, ainda que, como já assinalei, não èsteja presente necessariamente em todos os casos. Stekel, entre outros, apontou a incidência favorável que, no processo terapêutico, poderia ter a limitação temporal estabelecida de antemão, a qual estimularia o progresso da terapia (50)\ De ime diato, cabe assinalar que quando se fixa um prazo de encerramento, este cria invariavelmente uma situação bastante diferente na situa ção psicanalítica, influenciando’’de modo decisivo os diferentes aspectos do vínculo terapêutico, em especial a finalização do trata mento, tema que mais adiante analiso detidamente (ver os capítulos 8 e 9). Mas, acima de tudo, deve-se levar em conta que a limitação temporal confere à terapia uma estrutura mais definida em termos de “princípio, meio e fim” (43), introduzindo definitivamente na relação terapêutica um novo e necessário elemento de realidade, que esmorece no paciente a produção de fantasias regressivas oni potentes de união permanente com o terapeuta. Tais fantasias se desenvolvem e sc manejam com mais facilidade no contexto do tra tamento psicanalítico do que no da terapia da qual nos ocupamos. A técnica O método breve pode ser tecnicamente diferenciado da psi
22
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
distintos fenômenos psicoterapêuticos - transferência, regressão, resistências, etc. , enquanto se confirmam alguns princípios dinâmicos operativos, cuja validade é corroborada pela experiên cia clínica. Desenvolverei aqui os seguintes aspectos: O trabalho com os conflitos. - Regressão. Dependência. Transferência. Neurose de trans ferência. - O problema da resistência. * - lnsight e elaboração. - Fortalecimento e ativação das funções egóicas. Focalização. - Multiplicidade de recursos terapêuticos. - Planejamento. - Quadro comparativo entre algumas características teóricotécnicas da psicanálise e da psicoterapia breve de orienta ção psicanalitica. Outros conceitos de especial aplicação em psicoterapia breve (situação-problema, foco, ponto de urgência e hipó tese psicodinâmica inicial).
O trabalho com os conflitos 6 Podem-se estabelecer claras diferenças entre uma psicotera pia de objetivos limitados e um tratamento psicanalítico no que diz respeito à abordagem dos conflitos psíquicos do paciente. Recordemos, primeiramente, como se tratam os conflitos em psicanálise. A investigação psicanalitica demonstra-nos que as si tuações conflitivas atuais do indivíduo estão relacionadas a con flitos infantis, dos quais, em realidade, decorrem. São exemplos de conflitos derivados os que a professora antes mencionada apre
Fundamentos teóricos
23
Os conflitos infantis genéticos se produzem, como sabemos, em relação com os objetos primários do sujeito, sendo sua nature za edípica ou pré-edípica. Durante o tratamento analítico, o pa ciente revive tais conflitos (sobretudo no seio da relação transfe rencial com o terapeuta), que são analisados profundamente a fim de se conseguir sua resolução (e a de seus derivados) por meio do trabalho elaborativo (elaboração dos conflitos). Na P.B. orientada em direção ao insight há, como primeiro fator distintivo digno de nota, uma eleição dos conflitos (deriva dos) a serem tratados, que recairá nos que prevalecem por sua urgência*e/ou, por sua importância, quer dizer, que subjazem ao problema atual, motivo do tratamento (ver “Focalização”, p. 37, e uO foco”, pp. 40 ss.)7. É habitual, além disso, que q trabalho tera pêutico se circunscreva, a priori, a encarar exclusivamente esses derivados do conflito primitivo infantil, sem se aprofundar mais nele, por princípios elementares de prudência, evitando-se que se produza uma excessiva mobilização afetiva e, sobretudo, que se favoreça no paciente a regressão. O terapeuta deverá centrar-se, de preferência, nos atuais fatores determinantes desses conflitos subjacentes focais; freqüentemente isso bastará para se obterem bons resultados terapêuticos e, principalmente, para serem alcan çados os objetivos propostos8. Mas também considero que em alguns tratamentos breves é necessário e possível confrontar o paciente com o conflito origi nal. Isso ocorre quando, seja no começo seja mais freqüentemente no transcurso do tratamento, tem-se a impressão de que de outro modo não se obterão maiores progressos no transcorrer deste, c/ou quando aspectos desse conflito básico se acham muito próxi mos à superfície psíquica do paciente. Em algumas ocasiões é o próprio paciente, se tem capacidade de insight , quem menciona o conflito infantil, relacionando-o com sua situação conflitiva. Em todas essas circunstâncias, o terapeuta pode empreender um tra balho interpretativo cauteloso de certos componentes do conflito básico, cm especial dos que estejam imediatamente vinculados à problemática focal e que adquiram relevância para a finalidade de se alcançar a clarificação e a superação de tal problemática. Não
^
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
____
siva do paciente, pondo a descoberto conteúdos que, sem dúvida, não se terá oportunidade de analisar suficiente e convenientemen te nessa terapia. Freqüentemente colocar-se-á, para nós, o problema de saber até onde poderemos nos aprofundar, mediante interpretações, com vistas a nos aproximarmos das metas terapêuticas propostas, o que terá de ser avaliado em cada caso particular (ver pp. 101, 102 e 111 ss.). Trata-se de um ponto que requer tato e experiência por parte do terapeuta. Quando se trata de uma psicoterapia de breve duração, o terapeuta pode sentir-se pressionado pelo tempo, devendo evitar sobretudo cair em interpretações prematuras sobre os conflitos infantis. Já sabemos com quanta insistência Freud preveniu a respeito dos riscos de tal procedimento no tratamento psicanalítico (24). Como se pode perceber a esta altura de minha exposição, em P.B., diferentemente do que ocorre na psicanálise, realiza-se uma tarefa interpretativa parcial dos conflitos do paciente, circunscrita àqueles que tenham sido escolhidos, os quais, por sua vez, são abordados de um modo também parcial. Incursione-se ou não na interpretação das raízes infantis da conflitiva focal, sempre se faz uma tentativa de solucionar interpretativamente os conflitos deri vados, ainda que esta não seja idêntica à que se possa obter atra vés da psicanálise. Trata-se de uma resolução parcial ou incom pleta (1), que consiste na produção de certas mudanças dinâmicas nos conflitos, muitas vezes suficientes para se obterem benefícios terapêuticos nada desdenháveis. (Quanto às prováveis modifica ções no estado dos conflitos, ver p. 53.)
Regressão. Dependência. Transferência. Neurose de transferência
Fundamentos teóricos
25
ceitos de maneira conjunta, dentro de um mesmo subtítulo deste capítulo, numa tentativa de esclarecer as diferenças que nesses as pectos apresenta o tratamento breve de insight com relaçào à psi canálise. A regressão pode ser entendida como o processo pelo qual readquirem vigência estados ou modos de funcionamento psíqui co pertencentes a etapas anteriores do desenvolvimento do indiví duo. Na realidade, Freud ocupou-se do conceito de regressão em diferentes contextos - a enfermidade mental, a transferência com o analista, os sonhos e a classificou em três tipos: tópica, tempo ral e formal (18) (25). Aqui vou referir-me em especial à regres são temporal na transferência com o terapeuta. No processo analítico trata-se de favorecer, |por diferentes meios (posição deitada do paciente, associação livre, silêncio do analista, freqüência às sessões, etc.), uma regressão vivencial útil , a qual representa um meio essencial para se alcançar o objetivo terapêutico. A regressão é necessária para a revivescência dos conflitos originais infantis do analisando cm sua relação com o analista (neurose de transferência) e sua conseqüente elaboração. Isso implica, além disso, que a..regressão produzida gere um in cremento da dependência do analisando em relaçào ao analista, que costuma representar basicamente figuras parentais. Esperase, é claro, que o processo regressivo se reverta ao longo do cami nho terapêutico, dando lugar a um crescimento psicológico paula tino, que tornará possível que o paciente assuma realmente uma conduta mais adulta na vida. Para compreender as diferentes peculiaridades ao vínculo terapêutico em terapias breves de insight , é preciso além disso levar em conta os conceitos de transferência e de neurose de transferência9. Laplanche e Pontalis descrevem a transferência como “o pro cesso em virtude do qual os desejos inconscientes se atualizam sobre certos objetos, dentro de um determinado tipo de relação estabelecida com eles, e, de um modo especial, dentro da relação analítica”. Acrescentam: “Trata-se de uma repetição de protótipos
26
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Quanto à neurose transferencial , diremos que é a reprodução da neurose infantil na relação com o analista. Pressupõe a reedi ção seletiva de determinadas situações e mecanismos infantis na relação terapêutica, ou seja, citando novamente Laplanche e Pontalis (38), a neurose transferencial consiste em uma “neurose arti ficial em que tendem a se organizar as manifestações de transfe rência” (p. 258). Esses autores estabelecem, com base nos escritos de Freud, a diferença entre as reações de transferência propria mente dita. Em relação a esta última expressam-se: “de um lado, coordena as relações de transferência a princípib difusas ( “trans ferência flutuante’, segundo Glover) e, de outro, permite ao con junto de sintomas e condutas patológicas do paciente adotar uma nova função ao referir-se à situação analítica” (p. 259). Mesmo assim, Freud faz referência à neurose transferencial como a uma “massa de pautas culturais neuróticas estereotipadas, expostas na situação analítica” (15). (Os grifos são meus.) A transferência, inicialmente considerada por Freud como um obstáculo no tratamento psicanalítico, logo passou a ocupar, tanto para ele como para a maior parte dos psicanalistas, um papel de decisiva importância na cura (22), até converter-se sua análise na tarefa central. Deste fato se depreende que é conveniente per mitir - e inclusive promover - durante a terapia psicanalítica, o desenvolvimento da neurose transferencial, cuja resolução, por meio da elaboração, será fundamental se aspira à cura do anali sando. É oportuno recordar aqui a definição que dá Rangell da psicanálise como método terapêutico: “A psicanálise é um méto do de terapia pelo qual se estabelecem condições favoráveis para o desenvolvimento de uma neurose transferenciai, na qual o pas sado se restaura no presente com o propósito de , mediante um ata que interpretativo sistemático às resistências que se opõem a isso, obter uma resolução dessa neurose (transferenciai e infantil), com o fim de provocar mudanças estruturais no aparelho mental do paciente para que este seja capaz de uma adaptação ótima à vida”
Fundamentos teóricos
27
transferencial. Os mecanismos terapêuticos não se sustentam, em geral, no desenvolvimento, na análise e na resolução da neurose transferencial, dado que as condições do paciente e/ou do enqua dramento não são apropriadas para tais fins; por outro lado, como as metas terapêuticas não estão dirigidas para a reestruturação da personalidade nem para resolver conflitos básicos do indivíduo, mas sim para mitigar alguns sofrimentos atuais, não seria coeren te que o insight de aspectos da relação transferenciai neurótica, regressivo-dependcnte, continuasse sendo o recurso terapêutico fundamental nesse novo contexto; o que adquire importância agora é a busca de insight do paciente a respeito de situações confiitivas atuais de sua vida cotidiana (que são as queihabitualmente dão origem à consulta), razão pela qual o trabalh«} interpretativo recai mais em suas relações com os objetos de sua realidade exter na do que na relação com o terapeuta. Segundo Szpilka e Knobel, nesses procedimentos é preciso precaver-se de estimular tanto a regressão como a neurose de transferência (51) (37). Bellak e Small (6), do mesmo modo que Wolberg (54), entre outros, também aconselham que se evite, den tro do possível, o desenvolvimento da neurose transferencial. Seu desencadeamento, junto ao de uma regressão vivencial, pode considerar-se uma complicação (às vezes inevitável) nas psicoterapias breves, já que, ao deixar truncada sua elaboração, tendo em vista as limitações inerentes a esses tratamentos, deixaria - iatrogenicamente - o paciente em um estado regressivo-dependente, expondo-o a diversas reações transferenciais nocivas em virtude da mobilização afetiva produzida e, em particular, a dificuldades para aceitar sua separação com relação ao terapeuta, ante a pers pectiva de terminar sua terapia10. Por meio de diferentes recursos, aos quais mais adiante me referirei em detalhes (ver capítulo 6), deve-se procurar que o paciente não concentre muita libido na relação com o terapeuta. Se bem que os fenômenos transferenciais também ocorram, às vezes inexoravelmente, na psicoterapia breve, podemos esperar
28
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
rência". A terapia deve sustentar-se no predomínio de uma trans ferência sublimada (6). A regressão só deveria ser permitida em pequeno grau, não indo além dos níveis requeridos para possibilitar a exploração e experiências iniciais de insight de situações conflitivas atuais. O tratamento, em lugar de fomentar a dependência do paciente, deve inclinar-se para a estimulação e o reforçamento de sua iniciativa pessoal, ou seja, de suas capacidades autônomas. Os critérios apresentados até aqui definem as características que terá de assumir a relação terapêutica em P.B. (ver capítulo 6, especialmente “A relação paciente-terapeuta*no tratamento bre ve”, pp. 84 ss.).
O problema da resistência12 No tratamento psicanalítico, chamamos resistência aos diversos obstáculos que o analisando opõe ao acesso ao seu pró prio inconsciente, isto é, ao trabalho terapêutico e à cura. Em 1925, Freud distinguiu e sistematizou cinco formas de resistência de um ponto de vista estrutural, em seu trabalho “Ini bição, sintoma e angústia” (21). Três delas procedem do ego e são: as resistências da repressão, as da transferência e as do ganho secundário da doença. As outras são as resistências do id, também chamadas por Freud de resistências do inconsciente, e as resistên cias do superego13. A análise exaustiva das resistências constitui uma parte im prescindível de todo tratamento psicanalítico. O prolongamento deste deve-se, em grande parte, á necessidade de elaboração daquelas (27). Na terapia breve interpretativa, também surgem resistências no paciente, que podem ser consideradas, por acréscimo, como obstáculos que este interpõe ao avanço do processo psicoterapêutico especificamente do insight. Habitualmente, a análise das resistências em P.B. não apre
Fund Fundam amen entos tos teóri teórico coss
29
O tratamento das resistências que dependem dos mecanis mos defensivos do ego, em P.B., pode apresentar as seguintes características: a) algumas defesas são combatidas, quer dizer, analisadas; b) outras, em troca, são respeitadas ou ainda reforça das pelo trabalho terapêutico, de acordo com o que pareça indica do em cada cada caso, com base b ase nas condições condiç ões do paciente e do enqua dramento. Como exemplo do mencionado no item a, podemos citar a necessidade de trabalhar as defesas maníacas (negaçào, onipotência, etc.), perigosamente incrementa incrementadas, das, ou, o que é mais comum, ter de atacar parcialmente as barreiras repressivas de conteúdos inerentes ao sofrimento atual, além dos mecanismos de isolamento, intelectualizaçâo, projeção, etc. Pelo contrário, e a propósito do expresso no item b, com freqüênciajjoptamos por não pertu erturb rbar ar certos certos mecanismo mec anismoss defensivos defen sivos caractefplógicos, permi tindo ao paciente que os conserve, seja porque queremos evitar uma mobilização afetiva excessiva e difícil de manejar no trata mento, seja por tratar-se de defesas relativamente úteis, as quais ainda ainda que só ocasionalmen ocasiona lmente te - poderia poderia ser conveniente conven iente refor reforça çar. r. O tema da resistência da transferência em P.B. também mere ce alguns comentários. Ao menos nas terapias desse tipo, tal resis tência não costuma ser muiter intensa. Isso se deve ao seguinte: sabemos que esse tipo de resistência obedece em parte ao ressen timento despertado no paciente, por sentir-se frustrado em sua relação transferencial com o terapeuta, terapeuta, razão razão pela qual Menninger propõe chamá-la de resistência de frustração ou de vingança (41). Na medida cm que, em P.B., a relação terapêutica é menos frustrante para o paciente, já que existe um vínculo mais “real” e uma maior proximidade afetiva da parte do terapeuta, conseqüen temente a hostilidade hostilid ade que desperta naquele pode p ode ser menor do que a que o tratamento tratamento psicanalític psicana líticoo desperta; desperta; portanto portanto,, as resistências resist ências transferenciais também serão menores (35). Mas o terapeuta de verá lutar sempre para que se obtenha esse resultado, procurando lazer com que predomine uma transferência positiva. Quando es sas resistências se exacerbam, achamo-nos ante um dos motivos fundamentais, para cuja dissolução, a meu ver, se justifica o em
30
Psico Psicoter terap apia ia brev brevee de orient orientaçã açãoo psicana psicanalitic liticaa
“Insi In sigh ght” t” e elaboraçã elab oraçãoo14 Entre os problemas ainda não resolvidos no terreno da psico terapia breve de base psicanalitica, acham-se os que concernem ao papel do insight e e da elaboração e sua relação com as mudan ças que se obtêm nos pacientes. Começaremos por lemb lembrar rar sucintamente sucintamente os signi si gnifica ficados dos es senciais de ambos os termos. Com o insight queremos queremos dizer, como L. Grinberg, “a aquisi ção do conhecimento da própria realidade psíquica” (31). Tal par ticipaçã açãoo afetiva: não se trata conhecimento pressupõe uma particip simplesmente de compreender no sentido intelectual, mas tam bém de poder experimentar emocionalmente o contato com os aspectos inconscientes do mesmo. A elaboração ou trabalho elaborativo (working through) é um conceito de significado significad o complexo comp lexo e não suficientemente suficientemente defi de fi nido na bibliografia psicanalitica. Uma definição simples a des creve como “o processo pelo qual um paciente em análise desco bre, gradualmente, através de um lapso de tempo prolongado, as conotações totais de alguma interpretação ou insight ” (47). (“Elaboração”, p. p. 49, grifos grif os do d o auto autor.) r.) É conhecida a importância do insight e e da elaboração no tra tamento analítico. A finalidade das interpretações do analista, que são, por excelência, seu instrumento terapêutico, é promover o insight dos dos conflitos no paciente. É oportuno citar aqui Rycroft: “O objetivo do tratamento psicanalítico é definido, algumas ve zes, em termos da aquisição de insight, ainda que mesmo Freud nunca tenha utilizado essa formulação, preferindo a idéia de que Ins ight t ”, seu objetivo é fazer consciente o inconsciente,'>(47). (“ Insigh ”, p. 68, grifos do autor.) Com relação a esse ponto, Grinberg diz: “Freud havia assinalado que o objetivo básico do analista é conhecer; por conseguinte, não deve estar preocupado com o objetivo terapêutico. Esse objetivo de conhecer, em realidade,
Fundam Fundamen entos tos teóricos____
_____
__
lista, condição essencial para o êxito terapêutico (39). A respeito do princípio da elaboração, cabe lem lembrar brar:: a) Requer dois fatores elementares: tempo (é por isso que a necessidade de elaboração constitui uma causa importante do prolongamento do tratamento psicanalítico) e trabalho (o labor analítico) (27). Do último se depreende que tem lugar no paciente fundamentalmente na presença do analista e com a participação deste. b) Em seu desenvolvimento intervém a regressão do anali sando (31). c) Inclui a tarefa de superar as resistências e a análise exaus tiva dos conflitos, na qual tem especial importância o que trans corre dentro dos limites da neurose transferencial |27). terapia breve de orientação psicanalítica, psican alítica, a concepção da Na terapia existência de insight e e de elaboração apresenta numerosos pontos obscuros. Sendo assim, é válido falar-se em insight nesses tratamen tos? Creio que sim, ainda que com certas ressalvas, como vere mos em seguida. Propiciar ao paciente a aquisição de insight por por meio de in terpretações terpretações especialmente especialm ente dos psicodinamismos psicodinam ismos relacionados relacionados com o transtorno transtorno atual, atual, motivo do tratamento tratamento - deve constituir, constituir, a meu ver, nosso principal propósito na terapia dinâmica breve, sempre que as condições psíquicas do paciente o permitirem. Es sa atitude terapêutica nos permitirá abrigar maiores esperanças de conseguir um progresso mais sólido e estável no paciente, ao aumentar aumentar sua capacidade egói e góica ca para para enfrent enfrentar ar e resolver r esolver as situa ções conflitivas. A busca de insight no no tratamento breve é preco nizada por numerosos autores, entre eles, Bellak e Small, os quais assinalam, clara e repetidamente, seu valor, em diferentes passa gens de sua obra (6). Mas a técnica breve requer restrições pecu liares para o insight do do paciente, que é necessário consignar: Com respeito à sua extensão entendo que em geral dadas as
32
Psico Psicoter terap apia ia breve breve de orien orientaçã taçãoo psicuna psicunalitica litica
pode dar conta de todos os aspectos do conflito subjacente ao pro blema vital focal, mas, unicamente, dos mais próximos e aces síveis à compreensão psicológica do paciente dentro desse enqua drame dramento). nto). Isso poderá poderá servir, servir, ser suficiente suficien te - ou não - para os pa cientes, para obter mudanças dinâmicas favoráveis, pôr em mar cha um processo progressivo que continue ainda depois de finali zado o tratamento e estimular sua auto-observação e motivação para as experiências psicoterapêuticas de índole interpretativa. Em suma, numa numa terapia terapia de objetivos objet ivos e, eventualmente, eventualment e, de tempo - limitados, limitados, também também o insight estará naturalmente limitado em sua extensão, diferentemente daquele mais amplo, decorrente de um tratamento intensivo e prolongado como o psicanalítico; tratase de uma verdade óbvia, mas que é necessário ter presente para estudar tudo aquilo que se relacione com mecanismos terapêuti cos e grau de eficácia efic ácia dos procedimentos breves. breves. Quanto ao tipo e profundid profu ndidade ade , cabe assinalar que enquanto o insight psicanalítico psicanalítico tem lugar em meio a uma atmosfera regres siva que o favorece, dependendo principalmente da atividade inter inter pretativa a respeito das diversas reações próprias da neurose de transferência, em P.B. a busca de insight está está dirigida, com mais freqüência, para as relações do sujeito com os objetos externos de sua vida cotidiana e presente, pres ente, ainda que não despreze os fenôme nos transferenciais mais notórios, que trabalham como obstáculo (resistências transferenciais), e/ou ilustram a problemática do paciente paci ente,, como se verá mais mais adiante (pp. (pp. 106 s.). Mais abrangente, o insight psicanalítico também o é na medida em que oferece maiores possibilidades de alcance de situações infantis reprimidas que serão revividas na situação transferenciai, permitindo, permitindo, em e m sín s ín tese, uma uma conexão mais completa do que que sucede no mundo externo extra-analítico e na relação transferencial analítica do paciente com sua vida passada. São tipos e graus de profundidade diferen tes de insight , mas nem por isso devem ser-lhes negadas totalmen te a validade e a eficá ef icácia cia que se obtêm o btêm no tratam tratamento ento brev breve. e. (“Não
Funda Fundame mento ntoss teóric teóricos os
33
fenômeno de compreensão psicológica no paciente, e também obedece à necessidade de controlar a intensidade dos fenômenos regressivos e transferenciais: Szpilka e Knobel sugerem que em terapias breves o insight possua possua umaf‘ um af‘maior maior participaç participação ão cogniti va que afetiva”/(51), levando o paciente, como medida prudente e mediante um determinado determinado estilo esti lo interpretativo interpretativo (ver pp. pp. 110 ss.) na relação transferencial, antes à compreensão que à revivescência das situações infantis determinantes de seu problema atual (51). Expressa dessa maneira, essa proposição corre o risco de ser dis torcida. Bntendo que não implica, como alguns poderiam supor, um mero insight intelectual (que (que configuraria uma nova forma de resistência), pois não deixa de ter certa ressonância afetiva. Mas a diferença entre o insight psicanalitico, psicanalitico, que é mais p|eno e vívido, em suma, dotado de uma maior e às vezes diferente repercussão emocional, e o insight do do tratamento breve tem de ser, nesse senti do, um fenômeno na medida medida do possível possív el mais controlado pela ati vidade terapêutica, em especial se explora circunstancialmente aspectos da transferência com o terapeuta correspondentes ao infantil-genético. (Será menos necessário controlá-lo se atender aos componentes mais atuais da t/ansferência com o terapeuta ou com outros objetos da realidade externa do paciente.) Examinemos agora o problema da elaboração na terapia dinâmica breve, cuja bibliografia, como se poderia supor, é suma mente escassa. Bellak e Small citam, como .princípios gerais da “psicoterapia rápida”, a comunicação, o insight (do (do terapeuta e do paciente) e a elaboração elaboração (6). Como não se s e estimula o desenvolvim d esenvolvimento ento da regres regressão são nem o da neurose transferencial, e não se realiza uma análise intensiva desta nem das resistências, considero que em PB. não podemos falar em elaboração no mesmo sentido que em psicanálise. Em todo caso, o trabalho de elaboração real será escasso, principal mente se existe limitação de tempo. tempo. Este, Este, como vimos, vim os, é um fator fator fundamental para que a elaboração tenha lugar15. Estaríamos, então, então, diante de um dos pontos mais discutíveis discu tíveis no que diz respei
34
Psicoter Psicoterapi apiaa breve breve de orient orientaç ação ão psicana psicanalític líticaa
focal. Um processo imperfeito e incompleto, mas enfim de mu dança , que em circunstâncias em que o tratamento esteja limitado em sua duração, também o estará, mas que em alguns pacientes, com capacidades egóicas suficientes, poderá talvez ainda conti nuar, depois de concluído o tratamento breve. Nesse último caso seria uma espécie de “auto-elaboração”, a qual se teria iniciado, a princípio, com o trabalho terapêutico, para seguir um caminho pro gressivo gress ivo até a consol con solida idação ção dos d os resultados1 result ados166. Os mecanis meca nismos mos ínti mos desse fenômeno, que apresentaria, talvez, grande importância terapêutica em alguns casos, ficam difíceis de precisar no momen to1 to 17. Talvez as as modif mo difica icaçõe çõess significat s ignificativas ivas que às vezes veze s se eviden eviden ciam, inclusive na estrutura de personalidade de pacientes tratados com o procedimento breve, em testes projetivos efetuados anos depois de finalizado o tratamento (32), se relacionem a mecanis mos desse tipo. Mais adiante, considerando os resultados e meca nismos terapêuticos, retornare retornaremos mos à discussão desses des ses fatos. Finalmente, cabe acrescentar que numa terapia de objetivos e e a tempo limitados talvez seja necessário concluir que o insight e elaboração terão de ser em boa parte parte estimulados, estimul ados, quer quer dizer, dizer, faci faci litados e agilizados mediante o pape pa pell ativo do terapeuta, dadas as condições de focalização e de curta duração do tratamento.
Fortalecimento e ativação das funções egóicas Considero que a aquisição de insight por por parte do paciente, através de interpretações do terapeuta, seja a forma mais aprecia da de se conseguir o fortalecimento de seu ego. No entanto, de vem ser levadas em conta outras formas, cuja significação tera pêutica não é muito menor, era meio às terapias breves, e que não são, necessariamente, incompatíveis com co m a busca de insight. Muitas vezes, as diversas medidas terapêuticas destinadas ao rcasseguramento e à ativação de funções egóicas são englobadas
Fundamentos teóricos
_
______
____ , ____
_______
____________________________ ________
_
gado em alguns casos de um sentimento francamente pejorativo, porquanto costuma implicar basicamente o fomento e a utilização de uma relação regressivo-dependente não analisada, e por isso mesmo não-progressiva, e sem que se intente colocar o paciente em contato com as motivações profundas de seu sofrimento. Por conse guinte, ante a possibilidade de que suijam mal-entendidos, é con veniente estabelecer algumas distinções sobre o tema. Começaremos por reconhecer, também em P.B., a necessida de de apelar, às vezes exclusivamente, quando não há uma alter nativa melhor, para técnicas de apoio emocional; é o caso de pacientes que por debilidades egóicas não cónsèguem tolerar uma terapia interpretativa, e para os quais o único resultado que se pro cura obter é uma supressão de sintomas. Mas defemos discrimi nar com clareza esta posição terapêutica de outra,'que se caracte riza pelo emprego de certo tipo de intervenção verbal que busca conseguir reforçamento e ativação do ego, de distinta - e mesmo oposta - natureza, e que pode ser alternada, coerentemente, com as interpretações. “Todos os nossos pacientes, em graus variáveis, duvidam de seu discernimento, de suas percepções e de seu valor. Se só inter pretamos ou só analisamos, deixamos sem querer a impressão de que suas reações são meras repetições de seu passado infantil, e que sua conduta é imatura, errônea ou insana. Se parte de nossa meta terapêutica consiste em aumentar as funções egóicas sãs do paciente e sua capacidade para as relações objetais, é importante confirmar aqueles aspectos de sua conduta que indicam um fun cionamento sadio.” Esta frase pertence a um artigo de Greenson e Wexler (30) e se refere ao tratamento analítico, mas pode resultar extremamente significativa e útil se, com ligeiras alterações, a aplicarmos também à técnica breve. Mais adiante, os autores con tinuam: “(...) muitos de nossos pacientes necessitam ter a experiên cia de sentir que estão no caminho certo. Necessitam da expe
36
Psicoterapia breve de orientação psicanalílica
Dessa maneira observamos que na psicoterapia de apoio pro priamente dita ou “pura” as medidas de apoio promovem a depen dência regressiva no paciente, e ao mesmo tempo se valem desta para exercer seu efeito, na medida em que o terapeuta assume um papel protetor-autoritário (empregando, por exemplo, interven ções diretivas), que costuma fomentar a idealização de sua figura. Nesta outra forma de reasseguramento egóico, pelo contrário, a atividade do terapeuta orienta-se, em troca, em direção à estimu lação das capacidades autônomas do paciente, assinalando seus rendimentos egóicos adequados, cm lugar de incentivar uma rela ção dependente. Quer dizer, se partimos dos retursos que o pa ciente verdadeiramente possui, e ao assinalar-lhe esse fato, pro movemos nele um sentimento de reafirmação ou reasseguramen to que pode funcionar, não só para fortalecer, mas também para ativar diversos funcionamentos egóicos1*. Assim mesmo, esta ati tude terapêutica não impede, como se depreende do que assina lam Greerson e Wexler, a análise de aspectos inconscientes do pa ciente, incluindo os mecanismos de defesa neuróticos do ego. As psicoterapias dinâmicas, incluindo as de objetivos e tem po limitados, são, em sua maioria, o resultado de uma reunião de elementos próprios de uma técnica de insight com estes outros elementos reforçadores e estimuladores de determinadas funções do ego'\ Mas é mister que tais psicoterapias se traduzam numa combinação antes de tudo coerente de intervenções, que deverá fundar-se numa compreensão psicodinâmica adequada do proces so terapêutico20. / Diremos entào, que as terapias breves são, em seu enfoque e na prática, com muito mais freqüência, “mistas”, em vez de serem puramente interpretativas, ou reforçadoras do ego não-interpretativas, ou ainda exclusivamente de apoio no sentido antes descrito, sendo essa natureza “mista” uma característica relevante de tais terapias (podemos, sim, falar de tratamentos breves em que pre domina o insight e de tratamentos breves em que predomina o re fo ^ /o ^( iccu.segundo o lado para o qual se incli
Fundamentos teóricos
37
mentos está representado por uma tarefa em “frente dupla”, na qual se têm sempre presentes “as partes sãs” do paciente, e portanto não só são feitas menções a seus aspectos infantis, regressivos e patoló gicos, mas também a seus aspectos adultos, progressivos e sadios, mantendo certo equilíbrio nas referências a uns e outros (12) (13)22.
Focalização O trabalho terapêutico em P.B. está “enfocado” para determi nada problemática do paciente, que adquire prioridade, dada a sua urgência e/ou importância, enquanto se deixam de lado as demais dificuldades. Trata-se de outra característica substancial desse tipo de terapia, por isso também chamada de focal j(40), que per mite distingui-la da técnica psicanalítica corrente a qual não opera com um módulo conceituai de foco (ver “O foco”, pp. 40 ss.).
Multiplicidade de recursos terapêuticos Eis aqui outro aspecto distintivo da P.B. (14) (48) (55). Estes procedimentos admitem e com'freqüência requerem - a associa ção dc diversos elementos terapêuticos, o que os afasta ainda mais do enquadramento e dos cânones psicanalíticos. Todo recurso que tenha demonstrado ser útil no campo da terapêutica psiquiátrica poderá eventualmente ser incorporado ao tratamento, em virtude da necessidade de se alcançarem os objeti vos terapêuticos; assim, além dos distintos tipos de intervenção verbal não-interpretativa (assinalamentos, sugestões, fornecimen to de informações, intervenções de reasseguramento, etc.), poderse-ão anexar à psicoterapia individual outros elementos, tais como psicodrogas, técnicas grupais, comunitárias, etc., cujas perspecti vas de inclusão correm em paralelo com os progressos que, no tra balho científico, se registram no emprego de distintos recursos psicoterapêuticos. É sumamente valiosa a participação de outros profissionais da saúde mental (psicólogos, psicopedagogos, assis
38
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
Os diferentes instrumentos psieoterapêuticos devem ser im plementados coerentemente, sempre com adequada compreensão e fundamentação psicodinâmica. A inclusão de tais instrumentos depende, além disso, da maior ou menor flexibilidade do terapeu ta e de sua capacidade para tentar criativamente combinações te rapêuticas harmônicas e eficazes.
Planejamento
,
É outro traço da P.B., que a distingue nitidamente da psicaná lise. Junto às metas e à duração do tratamento fixam-se os pontos fundamentais do processo terapêutico, que compreende um plano de tratamento prévio ao desenvolvimento do mesmo, e que chega a cobrir até a etapa final de avaliação de resultados ( ver capítulo 5).
Quadro comparativo de algumas características teórico-técnicas da psicanálise e da psicoterapia breve de orientação psicanalítica Em forma de síntese e considerando-se as limitações que supõe todo esquema, será útil a esta altura expor em um quadro as caracte rísticas de um e de outro procedimento, a fim de se obter uma visão que nos facilite a discriminação entre ambos (ver página seguinte).
Outros conceitos de especial aplicação em psicoterapia breve (situação-problema.foco, ponto de urgência e hipótese psicodinâmica inicial) Uma prova a mais da confusão reinante no terreno teórico da
Fundamentos teóricos
________
________
________
_________
_________
______
_
Descreverei sucessivamente: a) a situação-problema; b) o foco\ c) o ponto de urgência e d) a hipótese psicodinâmica ini cial. Explicitarei, sobretudo, o que quero dizer pessoalmente com cada um desses termos, e estabelecerei tanto as diferenças funda mentais como as relações que existem entre eles.
Psicaná lise Fins terapê uticos Duraçã o
A exploração do incons Limitados. Superação dc sin ciente. Resolução de con tomas c problemas atuais flitos básicos e seus deri vados. Reestruturação da personalidade t «» Limita, habitualmente a con Prolongada flitos derivados Indeterminada
1
Trabalho comos Refere-se especialmente a conflitos conflitos básicos Regressã o. São favorecidas Dependê ncia / Desenvolvimentoe aná lisedaneurose Sim detransferê ncia Aná lisede Intensiva resistê ncia A C I N C h T
Psicoterapiabrevede orientaç ã opsicanalitica
Limita-se habitualmente a conflitos derivados Não são favorecidas Não Limitada
Insight
Sim
Sim. Limitado. Referido so bretudo ao “de fora”. Mais cognitivo que afetivo
Elaboraçã o
Sim
Não. Processos geradores de mudanças
Não (ou muito pouco)
Sim
Não
Sim
Não
Sim
Fortalecimento e ativaçã odas Junçõesegóicas Focalizaçã o Multiplicidade dosrecursos
40
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
a) Asituaçã o-problema Com essa denominação tento indicar que se trata de uma situa ção que se torna presente na vida do indivíduo, diante da qual e por motivo de cuja ação descompensadora surgem ou podem surgir nele dificuldades de índole psíquica que operam como obstáculo para alcançar um desenvolvimento adequado. A situação-proble ma - ou situação critica, situação-obstáculo, situação desencadeante, etc. - pode ser provocada por ocorrências tais como um exame, uma viagem ou uma intervenção cirúçgica próximas, a perda de um ser querido, um acidente, uma crise evolutiva como a da adolescência, uma gravidez, o nascimento de um filho, uma mu dança de trabalho, etc. Implica, então, referência a fatos que são manifestos e objetiváveis. Com relação a eles, e como conseqüência de uma falta de resolução favorável, aparecem no sujeito inibições e sintomas diversos (ansiedade, medo, depressão, distúrbios corpo rais, etc.), que costumam constituir o motivo (manifesto) da consul ta e que poderão ou não ser ligados pelo paciente e pelo terapeuta às situações-problema que na realidade os provocam24. A existência de uma ou mais situações atuais dessa natureza pode ser detectada com freqüência em grande parte dos pacientes que solicitam assistência psiquiátrica, e que são passíveis de se rem tratados por meio da técnica breve.
b) Ofoco Constitui talvez um dos elementos mais característicos e dis tintivos da atual P.B. Muitos autores, entre os quais se destacam Stekel (50), F. Deutsch (8), Alexander (5), French (5), Wolberg (55), Bellak (6), Small (6) e Malan (40), assinalaram a conveniên cia de focalizar, quer dizer, de concentrar a tarefa terapêutica em determinado sintoma, problemática ou setor da psicopatologia do paciente. Mas foi sobretudo Malan, junto com Balint, quem se 'Ocupou mais exaustivamente do foco terapêutico e promoveu a
Fundamentos teóricos
41
das metas selecionadas e em uma terapia de duração limitada; mas não só uma limitação temporal a justifica: a técnica focal também é adequada àqueles pacientes que podem realizar psicoterapias sem prazo fixo de duração, e inclusive prolongadas, nas quais, por diversos motivos (idade avançada, por exemplo), o tra tamento psicanalítico é contra-indicado. O terapeuta pode, então, circunscrever-se a certos problemas do paciente, realizando uma abordagem interpretativa setorial e respeitar o resto de sua organi zação patológica e das áreas de sua vida. Trabalhar com uma técnica de “enfoque” implica, entre outras coísas (40): a) manter a coerência e a operatividade a res peito da fixação de objetivos terapêuticos prioritários, b) planejar o tratamento, c) combater a passividade e o perfeccionismo do terapeuta, d) contrapor-se ao desenvolvimento d | neurose de transferência (há uma orientação constante em direção à realida de e ao atual do paciente). Contudo, a noção de foco ainda é, como assinala Fiorini (11) (13), sumamente ambígua e se confunde com a situação de crise (situação-problema), com os sintomas que motivam a consulta, com os pontos de urgência, com as metas do tratamento, etc. É evidente que não resultou fácil kchar e adotar majoritariamente uma definição que expresse de modo pleno a natureza e o signifi cado do foco. A que formulou Malan, no sentido de ser “a inter pretação essencial, sobre a qual se funda toda a terapia” (40), tam pouco é, no meu entender, totalmente esclarecedora, já que, ao se revestir de um caráter técnico, não explica em que consiste ou como está constituído o foco. Comenta Fiorini: “A diversidade de significados que possam ser atribuídos à noção de foco ilustra o estado atual da teoria.” E acrescenta: “Sem um esforço de preci são e delimitação rigoroso de seus conceitos básicos não é possí vel construir uma teoria com certo grau de verificabilidade” (13). O que devemos entender realmente por foco? Como surge, como se configura e como se delimita, na prática psicoterapêutica? Procurarei encontrar minhas próprias respostas a essas perguntas. O foco deve ser concebido, primordial e essencialmente, a partir de uma perspectiva psicopatológica. Nesse sentido será
42
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
ca central do tratamento (uma determinada situação-problenioji as manifestações sintomatolósicas^u. ela Usadas).^constituindo, ao mesmo tempo, uma hipótese ou um conjuniade hipóteses do terapeuta a respeito dos mecanismos operantes dentro de taljvoblemàtica, ou seja, da complexa interação existente entre osfatores^Podemos considerar que atua como um artifício teórico-técnico, especialmente válido para esses procedimentos, por meio do qual se tenta basicamente delimitar zonas da problemática geral do paciente e/ou dos episódios de sua vida, dirigindo preferente mente para aí, a partir desse momento, a exploAção terapêutica, enquanto esta corresponde a uma finalidade também limitada e preestabelecida. O modelo teórico de foco que Fiorini desenvolveu é de gran de utilidade prática. Sucintamente recordaremos a estrutura do foco proposta por este autor: na prática terapêutica, todo foco tem um eixo central, que geralmente é definido pelo motivo da con sulta (sintomas, situações de crise). Subjacente e ligado ao motivo da consulta, existe um conflito nuclear exacerbado, o qual se inse re em uma situação grupai específica. Motivo da consulta, confli to nuclear subjacente e situação grupai são aspectos “de uma situação que condensa um conjunto de determinações”, e na qual um exame analítico nos permite distinguir zonas com diversos componentes: aspectos caracterológicos do paciente, aspectos histórico-genéticos individuais e grupais reativados , além de uma zona relativa ao momento evolutivo individual e grupai e outra de determinantes do contexto social mais amplo , à qual também se vinculam todos os componentes citados. Esses diver sos componentes se encontram atualizados e totalizados pela situação (11). Vejamos um exemplo a partir do caso da professo ra, citado anteriormente. Essa mulher, de 31 anos, solteira, professora rural de uma escola primária localizada no sul da Argentina, que se encontrava de passagem em Buenos Aires, consultou um serviço psiquiátrico
Fundamentos teóricos
___________
lado, manifestou que tinha problemas de adaptação ao trabalho, ocasionados pela má relação que mantinha com a diretora da cscola, a qual estava passando por um período de extrema tensão e a fazia sentir-se muito exigida e mesmo perseguida. Os sintomas, claramente vinculados a tal situação, tinham aparecido após áspe ras discussões com a diretora. A mãe desta última, por outro lado, havia sofrido de uma enfermidade crônica, com paralisia dos membros inferiores, tendo falecido há um ano. Descobriu-se que os sintomas e a situação desencadeante que constituíam o motivo da consulta correspondiam a um conflito da paciente com figuras femininas de autoridade, evidenciável através de diferentes experiências de sua vida. Esse é o conflito nuclear. A paciente residia em um lugar muito distantes de seu meio familiar. Tempos atrás havia-se afastado de sua mãq - com quem vivia no norte do país, e a quem descreveu como uma mulher sumamente autoritária e depreciativa para com ela - e radicou-se no sul, onde assumiu o trabalho docente. Seus irmãos (três mulhe res e dois homens) moravam por sua vez em diferentes locais do país. Seu pai, alcoólatra crônico, tinha-se ausentado do lar quatro anos atrás e se ignorava seu destino. Tratava-se, então, dc uma família que correspondia ao tipo*'esquizóide (7), com seus mem bros distantes e dispersos ou ainda desaparecidos, como no caso do pai. Tudo isso faz parte da situação grupai. Se procurarmos precisar os componentes dessa situação, veremos que: a) Entre os aspectos caracterológicos em jogo destacavase o conflito suscitado por uma instância superegóica muito severa, junto a uma busca oral regressiva de afeto através de conversões (identificação com a mãe da diretora - carinhosa mente cuidada por esta última até a morte - movida pelo desejo de ser tratada de modo semelhante; obtenção de benefícios secun dários de seus sintomas, ao ser assistida pelos demais professores, representantes dos irmãos, os quais também eram professores)25. Os principais mecanismos defensivos empregados nessas cir cunstâncias foram a repressão, a regressão, a projeção e a conver são. Apresentava traços histéricos de caráter sobre uma estrutu
44
Psicoterapia breve de orientação psicunalitica
em seu trabalho e revelasse suficiente tolerância à dor para enfrentar uma psicoterapia de insight. Sua auto-estima se achava muito diminuída. b) Dentro do momento evolutivo individual e grupai cabe des tacar que sua migração, realizada com o objetivo de conseguir um desprendimento em relação à mãe e libcrtar-se de sua opressão, acarretou de imediato o incremento de suas carências afetivas e de seu sentimento de solidão e insegurança no novo meio, no qual custava a fazer amigos justamente quando se achava mais necessi tada para reafirmar-se em sua tentativa de emancipação. Aos 31 anos, sua falta de parceiro e seus fracassos ardorosos anteriores pesavam, aumentando especialmente sua angústia e favorecendo o desenvolvimento de mecanismos regressivos, numa busca neuróti ca de afeto. A desconexão existente entre quase todos os membros do grupo familiar e sobretudo o desaparecimento do pai contri buíam para fazer deste um momento muito difícil para a paciente. c) Suas precárias condições econômicas eram outro fator pre mente que a obrigavam a um rápido restabelecimento para poder reintegrar-se ao trabalho (achava-se em gozo de licença), o qual era seu único meio de vida, ao mesmo tempo em que era fundamental para manter sua auto-estima (o magistério era altamente valorizado em seu meio social). Por outro lado experimentava um sentimento de inferioridade diante dos demais professores, já que se sentia víti ma dos preconceitos existentes contra os denominados cabecitas negras*. Estes são os determinantes do contexto social. De minha parte, e tentando uma síntese, entendo basicamen te que o foco, organizado sempre em torno de uma situação-problema e dos sintomas provenientes desta, compreende em sua conformação uma conflitiva subjacente mais ou menos ampla e complexa, que podemos chamar conflitiva focal, com um conflito infantil e primário , edípico ou pré-edipico, ao qual se remete em última instância tal conflitiva, e que vem a constituir o nó da estrutura focal (ver O trabalho com os conjlitos, pp. 22 a 24. No exemplo antes citado, a conflitiva focal é representada fiindamen-
Fundamentos teóricos
45
talmente por conflitos derivados, que encontram sua expressão no ambiente de trabalho, no qual a paciente repete aspectos de suas relações familiares (em especial com a diretora), e que se origina ram a partir de um conflito primário com a figura materna, enrai zado em fixações edípicas c pré-edípicas a ela. A escolha por parte do terapeuta, de uma situação-problema e do conseqüente foco para sua abordagem preferencial num tra tamento breve depende, entre vários fatores, de seus critérios pes soais e de sua experiência prévia. Esses gravitarão em tomo de suas impressões quanto à patologia do paciente, sobretudo no que diz respeito à determinação das perturbações que privilegiará, e que poderão ser tratadas com possibilidades de êxito terapêutico nas condições de que disponha para levar adiante o tratamento. Eventualmente, diante de um mesmo caso e num mejsmo momen to, dois ou mais terapeutas poderão chegar a diferir na escolha’*. Ao começar uma terapia focal, dever-se-á contar pelo menos com um esboço inicial de foco terapêutico, configurado a partir das descobertas obtidas nas entrevistas clínicas e no psicodiagnóstico^Numa terapiajireve. quanto mais precoce e mais claramente demarcáveEÍor o foco, melhor será^prognós tico do tratamento, pois permitirá um trabalho, mais efetivo/ No começo, muitas vezes, os limites focais são imprecisos27. Durante o processo terapêutico costuma-se assistir a uma “evolução” desse mesmo foco, através da qual, em virtude da técnica de “enfoque” empregada, tal foco não só vai-se deli mitando melhor, quer dizer, se cristalizando, mas também o terapeuta obtém um aprofundamento na compreensão de seus psicodinamismos28. Um critério psicanalítico para a investiga ção do foco deverá privilegiar o reconhecimento das raízes in fantis da conflitiva focal, ainda que nem por isso tenha de de sembocar forçosamente na tentativa de proporcionar insight ao paciente acerca dos mesmos, o qual dependerá, como já vimos em parte (p. 23), de diversos fatores. A evolução habitual do foco com o trabalho terapêutico pode ser observada no esquema desta página. Às vezes teremos de mudar o foco e as metas terapêuticas em ple tratamento. Isso pode ocorrer: a) surgindo situações novas,
46
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Diagnóstico
Processo terapêutico
k
1. Limites confusos no começo
2 e 3- O foco vai-se delimitando mais claramente na superfície (pode ser relativamente isolado de outras conflitivas) e crescendo em profundidade
b) ante revelações do paciente, durante a terapia, de certos fatos ou sofrimentos de importância, que omitiu deliberada ou involu ntariamente no começo, que tornam aconselhável modificar tanto o foco como os objetivos29; c) como circunstância habitual nos estágios finais dos tratamentos, diante da iminente separação paciente-terapeuta. Em torno do término se vai perfilando um novo foco - diante da significação singular que este possa alcançar em cada paciente, dadas sua história e características pessoais - que se superpõe primeiro ao anterior no processo terapêutico, poden do, depois, ocupar exclusivamente o primeiro plano.
c) 0pontodeurgê ncia Esse conceito, já conhecido dentro da técnica psicanalitica, também se reveste de grande importância prática na P.B.. No meu entender, o ponto de urgência corresponde à situação psí quica inconsciente de conflito que, pela ação de fatores atuais,
Fundamentos teóricos
47
Freqüentemente a detecção do ponto de urgência conduz, co mo a própria denominação sugere, ao trabalho terapêutico imedia to do mesmo; daí seu valor clínico. Sua busca parte de uma inter rogação que o terapeuta se formula: a que obedece a ansiedade do paciente neste momento? Pressupõe, então, a indagação a respeito de um ponto crítico, que adquire de imediato prioridade no traba lho terapêutico, pois mobiliza ansiedades e produz descompensa ção no paciente. Para esse ponto deverão orientar-se, em conse qüência, as distintas medidas terapêuticas. Interessam sobretudo as interpretações: o fato de que estas obtenham uma repercussão emocional efetiva no paciente dependerá fundamentalmente de que estejam ou não dirigidas para o ponto de urgência, O ponto de urgência pode ser inerente ao foco {tyocal) - sub jazindo diretamente à situação-problema ou ligando-se a fatos que correspondem de algum modo à conflitiva focal - ou ser rela tivamente estranho a ele (exlrafocal ). Este último acontece com freqüência, sendo, por exemplo, o caso de situações de emergên cia inesperadas (a morte de um ser querido, um roubo, etc.) que costumam apresentar-se durante o tratamento, afetando o pacien te, e que “saem do foco”. Também, nessas ocasiões é imprescindí vel atender ao ponto de urgência, auxiliando o paciente; pretender continuar nesse momento o trabalho com a conflitiva focal, for çando o paciente, apesar e por cima da ansiedade que essa situa ção imprevista nele provoca, é uma obstinação que, além de reve lar falta de senso comum, resulta ineficaz. Precisamente para po dermos voltar a nos ocupar produtivamente da problemática prin cipal do tratamento, precisaremos antes desembaraçar o campo dos estímulos traumáticos que impedem circunstancialmente que o paciente concentre seu interesse naquela problemática, pertur bando assim a focalização do trabalho terapêutico. Somente quan do a calma tiver sido restabelecida, o paciente poderá recuperar a capacidade de concentração focal necessária. Enquanto um tratamento breve costuma se desenvolver sobre a base de uma estrutura focal (11) apenas ou no máximo de dois focos (toda vez que se leve em conta o que se relaciona à sepa
48
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
/ dem, desde as entrevistas iniciais51 até as etapas finais do trata mento. Tais pontos são diferentes entre si, ainda que em sua maior parte se incluam numa mesma conflitiva focal32. Tal variabilidade -se deve à influência de diversos estímulos procedentes dos mundos interno e externo do paciente. Entre estes últimos distinguimos: a) os que são próprios de sua vida cotidiana e b) os que provêm da atividade terapêutica. Com relação aos estímulos citados em b é desejável, em certa medida, que o ponto de urgência vá-sc modi ficando, já que isso pode ser indício de uma mobilização afetiva útil, produzida pela atividade terapêutica.
d)A hipótesepsicodinâmicainicial Também é chamada de hipótese psicodinâmica mínima (40), formulação psicodinâmica (55), formulação psicodinâmica pre coce (17), etc. Em meu conceito, a hipótese psicodinâmica inicial pode ser entendida como um esboço reeonstrutivo da história dinâmica do paciente, uma tentativa de compreensão global de sua psicopatologia que tende a incluir todas as perturbações do paciente que nos sejam conhecidas (40) (entre as quais se destacam as corres pondentes ao foco), e que se constitui a partir dos dados que aflo ram nas primeiras entrevistas e no psicodiagnóstico. A concepção dessa hipótese psicodinâmica inicial está regi da pelas teorias psicanalíticas (determinismo psíquico, sobredeterminação, séries complementares, etc.). Tem caráter provisório, pois é susceptível de ser confirmada, ampliada ou retificada, com base nas descobertas obtidas durante o tratamento. Enquanto a estrutura do foco se organiza, única e exclusiva mente em torno de uma determinada situação-problema da vida atual do paciente, envolvendo apenas certos setores de sua psicopatologia, a hipótese psicodinâmica inicial, tal como a concebo, é mais abrangente, englobando inclusive a hipótese foca P\ Pode
Fundamentos teóricos
__________
______________
mos compreender e inferir acerca deste, e que nâo necessariamen te tentaremos modificar. A elaboração de uma hipótese psicodinâmica inicial por parte do terapeuta ou da equipe terapêutica permitirá: a) extrair elementos suficientes para uma de\>olução diagnostica (D.D. ) ao paciente (ver capitulo 4, p. 67), que por sua vez aciona a busca de acordo com o paciente sobre as metas terapêuticas (M.T.), b) desenvolver um plano (P.) de tratamento (ver capítulo 5), coerente com a hipótese formulada e com os objetivos selecionados. Tentarei esquematizar resumidamente as seqüências que ocor rem na prática psicoterapeutica, nas quais se integram as várias noções expostas até aqui14.
I
Resultados e mecanismos terapêuticos
A experiência clínica tem demonstrado que com o método breve é possível obter efeitos terapêuticos altamente benéficos e duradouros, que podem ser verificados por meio de acompanha mentos. Malan sustenta que podem ser alcançados bons resulta dos em uma ampla variedade de casos, os quais não se reduzem aos pacientes cuja psicopatologia seja leve e de sintomas recen tes (40). Os resultados positivos, que abarcam desde o puro alívio ou a eliminação da ansiedade e de outros sintomas até modificações na estrutura da personalidade, devem ser investigados a partir de critérios dinâmicos. Diante de tais mudanças indagamo-nos acer ca de sua natureza íntima, seu alcance e sua estabilidade. Mas neste ponto desejo formular uma advertência: não devemos per der de vista que os resultados, em cada caso, devem ser avaliados, inicial c primordialmente, em relação ao que acontece com a situação-problema e seus sintomas; de outro modo, e com a finaIidade de investigar o grau de eficácia desses tratamentos, nossa atitude não seria coerente com suas finalidades terapêuticas, na medida em que buscássemos o que não corresponde diretamente
50
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Fundamentos teóricos
Entre os resultados favoráveis que se registram, podemos mencionar: 1. Alivio ou supressão dos sintomas. 2. Mudanças com relação a perturbações próprias da situação-problema (superação de inibições, desenvolvimento mais ade quado e eficaz, aquisição ou recuperação da capacidade de tomar decisões). 3. Aquisição de consciência da enfermidade psíquica. 4. Elevação, recuperação ou auto-regulação da auto-estima. 5. Outras modificações favoráveis (referentes a dificuldades em diversas áreas da vida do sujeito, tais como sexualidade, rela ções familiares, de amizade ou trabalho, estudo, etc., principal mente as que não foram abordadas de maneira direta durante a psicoterapia). j 6. Consideração de projetos para o futuro (esboço de planos a respeito de diferentes atividades da experiência de vida do su jeito). 7. Modificações na estrutura da personalidade. A P.B. pode resultar também absolutamente ineficaz em al gumas situações, sobretudo quando se trata de pacientes cuja patologia é grave; não são raras <\s recaídas. (O tema dos resulta dos desfavoráveis e os riscos do tratamento breve se desenvolvem no capítulo 10.) Voltando aos resultados positivos da terapia breve, cabe per guntarmos: A que mecanismos respondem? E possível definir o processo de mudança existente? Eis aqui uma questão que ainda não está totalmente elucidada e que entra no terreno da investiga ção, estando estritamente ligada ao problema da estabilidade das mudanças, ou seja, ao tempo em que estas se mantêm, e ao alcan ce das mesmas, isto é, a maior ou menor extensão que registram em relação às áreas de conduta35e/ou da vida do paciente (sexuali dade, trabalho, estudo, etc.). É evidente a participação de diversos mecanismos terapêuti cos nesses procedimentos, em virtude dos distintos recursos e estratégias operantes (13) (14); sem dúvida resulta particularmen te difícil precisar, do ponto de vista metapsicológico, certos pro
52
Psicoterupia breve de orientação psicanalítica
Como nào pretendo oferecer aqui um panorama amplo sobre o tema, centrar-me-ei em mecanismos que, além de importantes na gênese de modificações dinâmicas e duradouras, configuram atrativos pontos de investigação. São eles: o insight e a elabora ção, temas que já abordei antes (pp. 30 ss.), mas que é necessário voltar a considerar. Deixarei de lado o fortalecimento e a ativação das fiinçòes egóicas, processos dignos de se considerar, mas que já foram muito bem descritos por Fiorini (10) (12). Direi unicamente que não só costumam conduzir à consolidação dos gànhos obtidos pelo paciente através da terapia, em particular das condutas adaptativas, mas também a outras modificações favoráveis , que costu mam ser traduzidas num desempenho eficaz em distintas áreas de sua vida, permitindo ampliar o alcance ou a extensão das mudan ças a partir de uma elevação da auto-estima, e num maior desen volvimento de sua iniciativa pessoal e das diferentes capacidades egóicas. O paciente agora ousa ensaiar outras atitudes e levar adiante ações que antes se via impedido de realizar por sentimen tos de insegurança e desvalorização. Tampouco me ocuparei aqui dos mecanismos somente volta dos para produzir alívio dos sintomas (catarse, sugestão, adminis tração de psicodrogas, etc.), nem da cura transferencial (à qual Alexander e French conferem valor terapêutico [2] [4] [16]36) nem, por último, de certo tipo de falsa solução do conflito, assina lado por Malan (40), que logo citarei37. / O insight em P.B. relaciona-se fundamentalmente com os conflitosfocais do paciente. A eficácia de tal insight seria discutí vel porque, como temos visto (pp. 31 ss.), provém principalmente da análise das situações da realidade externa do paciente. A ques tão centra-se em saber se confiamos ou não no valor terapêutico de um insight que em geral não se baseia na análise exaustiva da
Fundamentos teóricos
_______
________
________
________
_______
_______
_______
qüência pode conseguir uma resolução, também parcial , prove niente da obtenção de certas modificações dinâmicas no conflito, pelo qual este costuma ao menos diminuir de intensidade, eviden ciando-se clinicamente uma melhora nas dificuldades concernen tes ã situação conflitiva. A eficácia terapêutica resultante da ação destes procedimentos é satisfatória para um grande número de situações ou quadros clínicos, ainda se contarmos com a possibi lidade de ocorrerem recaídas em virtude da multidcterminaçâo dos sintomas; contudo, como diz Wolberg, “uma solução parcial é melhor do que*nenhuma" (55) //Dè todo mõSõTolnsight é o mecanismo graças ao qual a melhora conseguida terá mais possibilidade de se manter. For nece, além disso, consciência da enfermidade, o que jfacilitará futuras consultas, caso sejam necessárias, ajudando a conceber projetos de vida com base no autoconhecimento obtido com o tra tamento, de possibilidades e limitações pessoais. Finalmente, a extensão e a aplicação do insight do conflito no paciente a dife rentes contextos (elaboração) explicaria a amplitude das mudan ças, refletidas em outras modificações favoráveis que às vezes se produzem.^ “Na prática (...), (a) elaboração das resistências pode constituir-sc num penoso trabalho para o analisado e numa dura prova para a paciência do médico. Mas também constitui parte do traba lho que efetua as maiores mudanças no paciente e que distingue o tratamento analítico de qualquer tipo de tratamento por sugestão” (27). A frase de Freud (1914) seria lapidar para aqueles que pre tendessem conceber um processo terapêutico de tempo e objeti vos limitados, capaz de promover alguma mudança dinâmica na conduta ou na personalidade do paciente/Chega-se então às se guintes conclusões: não é possível conseguir modificações pro fundas, e toda psicoterapia que não cumpra a citada condição de elaboração das resistências é um trabalho só de sugestão? Que os analistas mantenham hoje taxativa e estritamente tais princípios é compreensível, mas acontece que alguns vão mais longe e rejei tam a opção da terapêutica breve por considerá-la totalmente ine ficaz. Com a mera interpretação do conteúdo, não acompanhada
54
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
uma verdadeira ou suficiente conscientização (45)-<1. Apenas con seguiria um insight “intelectual”, insuficiente para que se produ zam nele modificações em um nível mais profundo. Isso parece acontecer com a P.B., do ponto de vista da teoria, mas talvez a prá tica da mesma nos demonstre outros fatos. Não creio que na tera pêutica breve as coisas devam ser situadas de modo inapelável num extremo: se considerarmos as resistências, vemos que de fato não podem ser interpretadas rigorosamente como na psicanálise, mas o terapeuta ocupa-se delas em certa medida a fim de reduzir sua intensidade, principalmente no que respeita à oposição do pa ciente ao insight da problemática focal40; e não pode ser outro o caminho para se conseguir que o paciente tome consciência real de suas tendências inconscientes. Já no terreno da experiência clínica, encontramos vários in vestigadores que reconhecem a existência de importantes mudan ças dinâmicas em pacientes que foram tratados com o método breve. Apesar de, ao empregarmos tal método, não nos propor mos a obter, por exemplo, modificações profundas na estrutura da personalidade, em certas ocasiões é possível observar, sobretudo pelas entrevistas de acompanhamento e no psicodiagnóstico (32), a presença de mudanças favoráveis, que chamam a atenção da personalidade, cujos mecanismos não têm sido explicados satisfa toriamente. Com respeito ao psicodiagnóstico, é significativo que os estudos efetuados pouco depois dc finalizado o tratamento bre ve não registrem um progresso maior, o que pode acontecer quan do se realizam vários anos depois, e sem que haja mediado outro tratamento psicotcrapêutico (32). Isto nos remete a um processo ativo de mudança que ocorre no paciente durante esse período. Wolberg, um dos autores mais entusiastas das mudanças que se podem esperar nas terapias breves, talvez peque por um exces so de otimismo. Afirma este autor (55) que um tratamento curto
Fundamentos teóricos
55
não há por que deter o processo de transformação do paciente, que pode perdurar pelo resto de sua vida. Essa circunstância não é fortuita: é um acerto do psiquiatra, que com sua intervenção con segue liberar as forças construtivas latentes42na pessoa do enfer mo Assinala, além disso: “£ difícil, retrospectivamente, de finir o ocorrido, e ainda mais difícil deduzir dessa experiência regras precisas aplicáveis a outros casos.” Pouco mais adiante continua: “Às vezes se produz uma reação em cadeia, sem que intervenha, ao que parece, nenhuma deliberação consciente, e em virtude dê forças que escapam ao nosso conhecimento. A obser vação pós-clinica pode revelar amplas mudanças que apenas se adivinhavam ao terminar o tratamento.” (Os grifos são meus.) Wolberg às vezes reitera essas opiniões e esses/resultados de sua própria experiência. Também Alexander sustenta idéias simi lares a algumas das que propõe Wolberg: “O importante é que a cura nunca se realiza totalmente durante o tratamento. Neste co locamos o paciente sobre a pista, e então o ego assume a direção. Às vezes basta eliminar um bloqueio emocional para que o ego comece a atuar (...), etc.”(2). Noutro lugar expressa Alexander: “Também na psicanálise confiamos nas faculdades regenerado ras do ego. Referimo-nos a elas de uma maneira bem mais vaga, como o desejo, a vontade do paciente de se curar, ou ainda, mais vagamente, como sua capacidade de cooperação” (4). (Os grifos são meus.) Logicamente, as possibilidades de progresso são variáveis em cada caso e dependem não só de suas próprias potencialida des, mas também de outros fatores, como por exemplo as condi ções de seu meio ambiente. Diz Alexander: “Até onde chegará o impulso do tratamento é sempre uma interrogação sem resposta ao finalizar uma análise43, pois o tratamento carece de qualquer medida exata para se verificar a mudança psíquica ou se preverem os acontecimentos futuros” (3). Ainda que aceitemos que mudanças profundas ocasional mente ocorram, inclusive na estrutura da personalidade, deve mos convir que não há respostas que revelem a natureza íntima do processo que gera essas mudanças, e do qual falam Wolberg e
56
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalílica
momento, ao termo elaboração, quando se mencionam esses me canismos autônomos (2) (4) (55). De minha parte penso que tais mecanismos poderiam estar ligados ao menos parcialmente a uma espécie de processo “elaborativo”, que, ainda que só em pe quena escala, desenvolver-se-ia nos tratamentos breves, contan do com uma etapa pós-terapêutica provavelmente muito impor tante (ver pp. 32 ss.)44. No processo de investigação há ainda, nesse campo, muito trabalho pela frente.
Referências bibliográficas 1. Adler, Garma, Gumbcl, Joseph, Luquct, Main, Morra, Orcmland, Rangell, Thiel. Wallerstein, Zetzel, “ Mesa redonda sobre psicoanálisis y psicoterapia”. Rev. de Psicoa., t. XXVIII, n? 1, Buenos Aires, 1971. 2. Alexander, F., “Contribuciones psicoanalíticas a la psicoterapia bre ve”, em L. Wolberg e col.. Psicoterapia breve, Gredos, Madrid, 1968,cap. V. 3 . , “El principio de la flexibilidad”. em F. Alexander e T. French, Terapêuticapsicoanalitica , Paidós, Buenos Aires, 1965, cap. III. 4 . , Psicoanàlisis y psicoterapia. Psique, Buenos Aires, 1960. 5 . , e French T., ob. cit. em 3. 6. Bcllak, L. c Small, L., Psicoterapia breve y de emergencia, Pax-México, Mexico, 1969. 7. Bleger, L. S. de e J., “Grupo familiar: psicologia y psicopatologia”, em L. Grinberg, M. Langer e E. Rodrigue. El grupo psicológico. No va, Buenos Aires, 1959. 8. Deutsch, F., Applied Psychoanalysis: Selected Lectures on Psycho therapy, Grune and Stratton, Nova York, 1949, ob. cit. em L. Small, Psicoterapias breves. Granica, Buenos Aires, 1972.
Fundamentos teóricos 13 . , “Problemática actual de las psicotcrapias breves”, em W. R. Grimson (comp.), Nuevas perspectivas en salud mental. Institucionesyproblemas, Nueva Vision, Buenos Aires, 1973. 14 . , “Psicoterapia dinâmica breve. Aportes para una teoria de la téc nica”, cm H. Fiorini, ob. cit. em 9, cap. 2. 15. French, M. T., “El fenómeno de la transferencia”, em F. Alexander e T. French, ob. cit. em 3, cap. V. 16. “La dinâmica del proceso terapêutico”, em F. Alexander e T. French, ob. cit. em 3, cap. VIII. 17 . , “Planificación de la psicoterapia”, em F. Alexander c T. French, ob. cit. em 3, ©ap. VII. 18. Freud, S., “Adición metapsicológica a la teoria de los suenos”, em S. Freud. O.C., Biblioteca Nueva, Madrid, 1948, tomo I. 19 . , “Análisis terminable e interminable”, em S. Freud, ob ícit. em 18,1968, tomo I. !, 20 . , “Historia de una neurosis infantil”, em S. Freud, ob. cit. cm 18,
tomo II. 21 . , “Inhibición, sintoma y angustia”, Apêndice A. Modificaciones de opiniones anteriormente expuestas. a) Resistencias y contracarga, em S. Freud, ob. cit. em 18, tomo T. 22 . ,“La dinâmica de la transferencia”, em S. Freud, ob. cit. em 18,
tomo II. 23 . , “La histeria. 2) Historiales clínicos: Isabel de R.”, em S. Freud, ob. cit. em 18, tomo 1. 24 . ,“ La iniciación dei tratamiento”, em S. Freud, ob. cit. em 18, tomo II. 25 . , “La interpretación de los suenos”, cm S. Freud, ob. cit. em 18, tomo I. 26 . , “Los caminos de la terapia psieoanalítica”, em S. Freud, ob. cit. em 18, tomo 11. 27 . , “Recuerdo, repetición y elaboración”, em S. Freud. ob. cit. em 18, tomo II. 28. Gillman, R. D., “Brief psychotherapy: a psychoanalytic view”, Amer. J. Psychiat., 1965. 29. Greenson, R. R., “La alianza de trabajo y la neurosis transferencial”, Apostila Asoc. Psicoa. Arg. Traduzido de The Psychoanalytic Quar terly,V, XXXIV, 1965. 30. Greenson, R. R. e Wexler, M., “La relación no transferencial en la situación analítica”, Apostila Asoc. Psicoa. Arg. Traduzido do International Journal o f Psycho-Analysis, vol. 50, parte 1,1969. 3 1. Grinbcrg, L., “Psicoanálisis”, em G. Vidal, H. Bleichmar e R. J. Usandivaras, Enciclopédia de Psiquiatria, El Ateneo, Buenos Aires, 1977.
58
Psicoterapia hreve de orientaçãopsicanalitica
32. Harrower, M., “Cómo ve el tratamiento breve un psicólogo clinico”, em L. Wolberg e col., ob. cit. cm 2, cap. X. 33. Hartmann, H., Ensayos sobre la psicologia del vo, Fondo de Cultura Económica, México, 1969. 34 . , Lu psicologia dei yo y el problema de la adaptación, PaxMéxico, México, 1961. 35. Hoch, P. H., “Psicoterapia breve lrente a psicoterapia prolongada”, emL. Wolberg e col., ob. cit. cm 2, cap. III. 36. Kamo, M., “ Communication, Reinforcement and Insight. The Problem of Psychotherapy Effect”, Am. J. Psychother., 1965, 19, cilado por Fiorini, ob. cit. em 9, cap. 2. 37. Knobel, M., “Psicoterapia breve en la infancia”, Cuaderno de la SAPPIA, n? 2, Psicoanàlisis y psicoterapia breve en ninosy adoles centes, Kargieman, Buenos Aires, 1971. 38. Laplanche, J. e Pontalis, JL Diccionario de psicoanàlisis, Labor, Barcelona, 1971. 39. Lcwin, B. D., The Psychoanalysis o f Elation, Norton, Nova York, 1950. Citado por S. Novey, “El principio de la ‘elaboración’ en psicoanálisis” Apostila Asoc. Psicoa. Arg. Tirada do Journal o f the American Psychoanalytic Association, vol. 10, n" 4, out. 1962. 40. Malan. D. H., A Study o f Br ie f Psychotherapy, Tavistock, Londres; Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão Castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 41. Mcnninger, K. A., Teoria de la técnica psicoanalítica, Pax-México, México, 1960. 42. Novey, S., ob. cit. em 39. 43. Philips, E. L. e Johnston, M. H. S., “Theoretical and clinical aspects of short-term parent-child psychotcrapy”, Psychiatry, 1 ,1954. 44. Pichon-Rivière, E., citado por J. Bleger, Psicologia de la conducta, ELDEBA, Buenos Aires, 1964, cap II. 45. Racker, H., “Introducción a la técnica psicoanalítica”, em H. Raeker. Estúdios sobre técnica psicoanalítica, Paidós, Buenos Aires, 1969, Estúdio 1. 46. Rangell, L.. “Psicoanàlisis y psicoterapia dinâmica: similitudes y di-
Fundamentos teóricos
___________________________________________ :--------------------------------—
49. Soifer, R., “Ansiedades específicas dei cmbarazo”, em R. Soifer, Psicologia dei embarazo, parto y puerperio, Kargieman, Buenos Aires, 1971, cap. 1. 50. Stekcl, W., Technique of Analytical Psychotherapy, Bodley Head, Londres, 1950, citado por L. Small, ob. cit. cm 48. 51. Szpilka, J. e Knobel, M., “Accrca de la psicoterapia brcve”, ColoquioActa 1967: Psicoterapia breve, Actapsiq. psicol. Amér. Lat., junho, 1968, vol. XIV, n? 2, Buenos Aires. 52. Wallerstcin, R. S., “lntroducción a la mesa redonda sobre psicoanálisis y psicoterapia. La relación entre el psicoanálisis y la psicoterapia. Probtemas actuales”, Rev. de Psicoa., tomo XXV1LI, n? I, Buenos Aires, 1971. 53. White R., El yo y la realidad en la teoria psicoanalítica, Paidós, Buenos Aires, 1973. f 54. Wolberg, L., “La hipnosis en la terapêutica breve”, «m L. Wolberg e col., ob. cit. em nota 2, cap. IX. 55 . , “La técnica de la psicoterapia breve”, em L. Wolberg e col., ob. cit. em 2, cap. VI.
*
TÉCNICA
4. Entrevistaspreliminares
f T Introdução É sabido que as entrevistas iniciais têm importância decisiva para o futuro do processo terapêutico a ser desenvolvido. No campo da P.B., as principais finalidades de tais entrevis tas são: • O estabelecimento da relação tefapêutica. • A elaboração da história clínica. • A avaliação diagnostica e prognostica. • A devolução diagnóstico-prognóstica. • O contrato sobre metas terapêuticas e duração do tratamento. • A explicitação do método de trabalho e a fixação das demais normas contratuais. O número de entrevistas a se realizar, variável em cada caso, será o que se revele necessário para atingir os fins enunciados. Veremos a seguir cada um destes pontos.
64
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
(que poderá ser ou nâo aquele que o tenha entrevistado). Trata=se então de poder criar condições favoráveis para a instauração de um vínculo terapêutico, em relação ao qual importa muito a con duta que assuma o entrevistador, quer dizer, sua contribuição para o estabelecimento de uma relação de trabalho. Será benéfico que possa mostrar-sc interessado pelos problemas do paciente, dis posto a oferecer-lhe sua ajuda e confiante em seu método terapêu tico, além de claro e explícito, desde o primeiro momento, em sua comunicação com o paciente. Para isso convém que lhe comuni que previamente a finalidade das primeiras entrevistas (conhece rem-se mutuamente, realizar um estudo o mais completo possível de seu caso para poder decidir a conduta terapêutica a ser seguida, etc.) e que, no decorrer das mesmas, informe-o detalhadamente a respeito dos diferentes aspectos do tratamento que seguirá. A experiência clínica demonstra que tais atitudes ajudam bastante no estabelecimento de uma relação terapêutica. Tenta-se, desse modo, diminuir as resistências produzidas por preconceitos, mal entendidos ou temores a respeito do tratamento, tudo o que pode facilmente conduzir à deserção (4). Em essência, terá que comba ter a ambigüidade, fomentadora de condutas resistenciais e fenô menos regressivos. O entrevistador deverá, além disso, assumir um papel ativo, dirigindo os diversos momentos das entrevistas em função dos objetivos desta fase do procedimento, essencialmente diagnostica e contratual. Formulará perguntas, fornecerá informação, etc., e ízes poderá recorrer a assinalamentos e interpretações. Considero que o emprego de interpretações nas entrevistas ais deva limitar-se principalmente aos seguintes fins: a) esclarecer e orientar a relação transferencial quando sur jam obstáculos a ela que ameaçam inclusive provocar a deserção do paciente; . b) efetuar uma devolução diagnóstico-prognóstica, na qual
65
Entrevistas preliminares
A história clinica Em P.B. é necessário realizar uma indagação exaustiva dos dados do paciente. Uma história clínica em que se leva em conta esta indicação poderá oferecer-nos elementos valiosos para com preender melhor a natureza dos problemas atuais do paciente, em relação à sua história de vida, mediante a descoberta de situações traumáticas, modos patológicos e repetitivos de conduta, etc. A respeito da metodologia a ser empregada, cabe recomen dar a adoção de um modelo de anamnese cromo ponto de referên cia, embora isso não implique que se tenha de seguir uma ordem rígida para interrogar o paciente. Convém assinalar o interesse particular de quese reveste em P.B. a indagação do motivo da consulta. O habituaf é que este se ache ligado à situação-problema que dará lugar ao tratamento. Será conveniente obter amplas informações sobre os antecedentes dessa situação-problema, os sintomas que a acompanham, os fatores desencadeantes, etc. Essas averiguações podem ser reali zadas deixando-se em primeiro lugar que o paciente exponha li vremente suas dificuldades atuais, ou seja, através dos momentos livres da entrevista, que logo poderá ser dirigida ou semidirigida quando for necessário obter determinados dados do paciente (antecedentes familiares e pessoais).
Avaliação diagnostica e prognostica Avaliação diag nostica
É preciso efetuar uma ampla e minuciosa avaliação diagnos tica do paciente, que não deve permanecer circunscrita ao diag nóstico clínico, insuficiente para efetuar a formulação prognosti ca e a indicação terapêutica (psicoterapia breve, psicoterapia em que predomine o insight ou de apoio, psicoterapia prolongada, de grupo, etc.), a escolha de objetivos e o planejamento do tratamen to-. Se se decide pela realização de uma terapia de duração limita
66
Psicoterapia breve de orientação psicanalíticu
prévio do paciente o mais profundo possível (hipótese psicodinâmica inicial) para organizar o plano terapêutico correspondente. Os elementos necessários para os distintos diagnósticos devem ser obtidos basicamente por meio de entrevistas clínicas e de testes psicológicos, aos quais podem somar-se outros exames, que as circunstâncias requeiram (exame médico geral, neurológi co, eletroencefalográfico, etc.). Consideramos aqui: 1) O diagnóstico nosográfico-dinâmico, que inclui as condições egóicas; 2) A avaliação do grau de moti vação para o tratamento e de atitudes para o “insigfit”; 3) A deter minação do foco.
O diagnóstico nosográfico-dinâmico Implica o diagnóstico atual da enfermidade do paciente (neu rose, caracteropatia, psicopatia, psicose) e de personalidade. Exem plo: depressão reativa num neurótico obsessivo, cuja personalida de apresenta um predomínio de traços paranóide-obsessivos. Devem incluir-se também: O diagnóstico do tipo de grupo familiar de origem , sua inci dência na problemática atuãlT ãíém da influência que possa exer cer o meio ambiente, compondo na realidade um diagnóstico psicossociopatológico. Uma avaliação das condições egóicas, para a qual se investi gam os recursos de que dispõe o ego do paciente, quer dizer, seus aspectos adultos ou sadios, que serão os aliados do terapeuta, e suas debilidades. Este último fato permitirá que se tomem os cui dados necessários diante das prováveis dificuldades que pode riam sobrevir durante o tratamento, o qual, além disso, procurará contribuir, por meio do trabalho terapêutico, para que o paciente
Entrevistas preliminares
67
aspectos manifestos e latentes (2), a partir da conduta evidenciada pelo paciente durante as entrevistas clínicas, da história de suas relações interpessoais, de suas fantasias, sonhos, recordações, de nossa contratransferência e dos dados fornecidos pelos testes psi cológicos. Essas indagações são de grande valor para efetuar um prognóstico e uma estratégia terapêutica, porque nos permitem prever, em certa medida, as características da relaçào transferen cial durante a terapia, a maior ou menor capacidade do paciente para estabelecer uma boa relaçào terapêutica, os inconvenientes que nesse sentido podem surgir durante o tratamento, e muito especialmente o momento do término da terapia e do desligamen to do terapeuta. 2 4 c) O controle de impulsos. Pode ser excessivo ouí pelo con trário, estar diminuído. Em ambos os casos, será necesfário tomar certas medidas terapêuticas (emprego de técnicas dramáticas em um. aumento do número de sessões em outro, etc.). {I d) A tolerância à ansiedade e àfrustração. Trata-se de detec tar as condições do paciente para tolerar uma psicoterapia interpretativa, em virtude da mobilização afetiva que esta costuma produzir (para isso, pode-se apelar para diversos recursos, entre cies as interpretações de ensaio [í], nas primeiras entrevistas, para comprovar sua reação às mesmas), assim como sua capacida de para superar sem maiores conseqüências o luto causado por sua separação do terapeuta no fim da terapia (convirá averiguar a existência dc lutos na história do paciente, e que repercussão tive ram nele). K- e) Os mecanismos defensivos. Será necessário precisar as principais defesas empregadas pelo paciente, determinação que é de grande importância para a indicação terapêutica, para o plane jamento e para o prognóstico. Exemplo: um repertório reduzido de defesas estereotipadas será um elemento prognóstico desfavo rável para uma psicoterapia de insight ; em contrapartida, a varie dade de mecanismos defensivos tornará favoráveis as perspecti vas prognosticas. f) A regulação da auto-estima. Em geral, os que procuram terapia apresentam uma diminuição da auto-estima, devendo o trabalho terapêutico resultar numa elevação da mesma.
6H
Psicoterapia hreve de orientação psicanalitica
Finalmente chegaremos à avaliação da potência e plasticida de do ego.
Avaliação do grau de motivação para o tratamento e das atitudes para o "insight” Diversos indicadores, provenientes das entrevistas diagnosti cas e da realização dos testes psicológicos, nos dão uma idéia acerca do grau de motivação do paciente para receber ajuda tera pêutica, isto é, para assistir às sessões de tratamento, e em espe cial sobre sua motivação e condições para o insight (8). Suas res postas às interpretações de ensaio (1) e assinalamentos nos darão a medida de sua capacidade de auto-observação, sua resistência ou sua permeabilidade ante as intervenções do terapeuta. Diretamente ligado à capacidade de insight do paciente achase seu grau de consciência da enfermidade, que também terá de ser detectado. A motivação para o trabalho terapêutico é susceptível de ser estimulada durante as primeiras entrevistas e no decorrer do trata mento. A esse respeito cabe assinalar o papel fundamental que de sempenha a forma pela qual o entrevistador faz a devolução diagnóstico-prognóstica para o paciente no começo da relação.
Determinação do foco Trata-se da possibilidade de precisar e delimitar um foco, passo tecnicamente essencial para nosso trabalho terapêutico pos terior. Quando se trata de quadros agudos (neuroses traumáticas,
Entrevistas preliminares
69
de urgência que predomine; em outras palavras, nâo encontramos “a ponta do novelo” para abordar o caso através de uma terapia setorial (trata-se de indivíduos com sérias alterações de personali dade, cuja enfermidade data de muitos anos, em geral caracteropatas, boderline ou neuróticos crônicos). A determinação do foco e o aprofundamento em sua conflitiva engloba o diagnóstico do ponto de urgência e acha-se por sua vez compreendida dentro da formulação psicodinâmica antecipa da , já que esta última não é outra coisa senão uma hipótese diag nostica integral, enquanto os diferentes diagnósticos e avaliações citados até «qui constituem as versões interpretativas parciais de tal formulação.
I Papel do psicodiagnóstico
Embora este não seja meu campo específico de atividade, desejo fazer algumas considerações a respeito3. A aplicação de testes psicológicos é muito útil para o diag nóstico, prognóstico e para as indicações e contra-indicaçôes da terapia breve. Quando se recomendà esse tipo de tratamento, essa aplicação adquire suma importância no planejamento terapêutico. Tenho dito e o repito: em P.B. coloca-se a necessidade de se obter, de antemão, um conhecimento amplo e profundo acerca do paciente, que facilite a formulação da hipótese psicodinâmica ini cial e conseqüentemente nossa tarefa terapêutica, com a base num plano de trabalho determinado, pelo menos em seus traços princi pais. Sobretudo se a terapia é de duração limitada, não haverá tempo para esperar a emergência de certos conteúdos, como num tratamento analítico. Daí que a aplicação de testes deveria efetuarse de maneira sistemática em pacientes para os quais se prevê a realização de um tratamento breve e planejado, ou pelo menos nos casos em que se esbarre com dificuldades diagnosticas e/ou tera pêuticas4. Sou dos que pensam que o tempo investido no processo psicodiagnóstico, ainda que considerável, às vezes fica ampla mente compensado, quando se deve empreender uma psicoterapia de duração limitada5.
70
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Embora pareça contraditório destinar um número apreciável de horas à realização do psicodiagnóstico quando se trata de pou par tempo (como ocorre no caso das terapias hospitalares de curto prazo), não o é, na realidade, pois a riqueza dos dados que podem ser obtidos não só pode contribuir para a consecução de bons resultados, mas também para agilizar o processo terapêutico, cuja duração poderá eventualmente abreviar-se no alcance dos objeti vos propostos. A bateria de testes a ser empregada pode constar do Teste de Rorscharch (5) (7) (10), do Teste das Relações Objetais de Phillipson (5) (10) ou do Teste de Apercepção Temática de Murray (5), e completar-se com o de Bender, desenho livre, figura huma na, casal, desiderativo, etc. Quando as circunstâncias o aconse lhem, acrescentem-se os testes de inteligência. Os dados que se extraem são muitos e valiosos: diagnóstico da personalidade c do quadro psicopatológico; psicodinamismos; capacidade de insight, condições egóicas. Dentro destas últimas, o psicodiagnóstico descreve as características das relações objetais (por diversos indícios dos testes projetivos, como, por exemplo, o Phillipson ou o T.A.T. [5]), os mecanismos defensivos, a tolerância à ansiedade e à frustração, especialmente quanto à capacidade de suportar a separação do terapeuta6, a força do ego, etc. Também poderão efetuar-se recomendações terapêuticas, a partir dos dados obtidos (sobre o tipo de tratamento, sexo do tera peuta, etc.)7, e apreciações prognósticas. Avaliação prognostica
Em geral é possível realizar uma avaliação prognostica, so bretudo do momento ou quadro atual que motiva o tratamento. Os resultados deste dependerão de fatores provenientes do paciente, do terapeuta e do âmbito assistencial em que tenha lugar (hospi tal, clínica, consultório particular). Tais fatores devem ser consi derados sempre em conjunto, e não de maneira isolada. Com relação ao paciente, influirão especialmente as diversas condições diagnosticas a respeito dos aspectos já citados. São_ele-
Entrevistas preliminares___
______
______
______
_______
_______
_______ _____
• Início recente e agudo do sofrimento ou problema atual a ser abordado ou, como assinala Courtenay (3), que se trate de um “momento propício” numa enfermidade relativamente crônica. • Leveza e limitação da patologia (3). • Condições favoráveis do meio familiar e social para o desenvolvimento da tarefa terapêutica e aceitação das mudanças do paciente. • Egoforte, com funções básicas em bom estado, capacidade de estabelecer boas relações objetais e de tolerar adequadamente a separação que sobrevirá ao finalizar-se a terapia (relação transferencial com grau leve de ambivalência e dependência), plasticidade de defesas , etc. • Alto grau de motivação para o tratamento. Incide conside ravelmente na produção de bons resultados terapêuficos, mesmo nos casos que apresentem certa gravidade (8). • Capacidade de insight. • Possibilidade de determinar ofoco antecipadamente (antes de iniciado o tratamento ou em suas primeiras sessões)*. Com relação ao terapeuta, as perspectivas prognosticas são favoráveis quando, além de este reunir as condições necessárias para o exercício da P.B. (ver capítulo L4), existe uma contratransferência positiva que facilita a instauração dc um bom vínculo com o paciente. Com relação ao contexto assistência! interessam as possibi lidades terapêuticas que oferece em seus aspectos temporais, es paciais, equipe de profissionais, etc. É claro que o prognóstico terapêutico, além disso, deve ser feito em fimção das metas combinadas, segundo estas pareçam ou não alcançáveis dentro das condições gerais que regerão o traba lho terapêutico.
72
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
lução da parte deste último, a qual naturalmente será baseada nas conclusões a que chegou, nào só depois das entrevistas, mas tam bém como conseqüência do emprego dos diferentes meios auxi liares de diagnóstico. Esta segunda devolução é resultante da tare fa desenvolvida em equipe e deve antes de tudo manter coerência com relação à devolução psicodiagnóstica. O entrevistador transmitirá oralmente ao paciente, numa lin guagem simples e clara, impressões gerais a respeito de sua pro blemática. Mencionarei, a seguir, alguns dos objetivos de tal con duta: » a) Fazer o paciente sentir que se presta atenção nele e se pensa em suas dificuldades, procurando compreendê-las. Trata-se de uma nova contribuição em busca de uma aliança de trabalho. b) Fornecer-lhe certo esclarecimento preliminar a respeito de sua problemática. c) Reforçar sua motivação para entender e resolver suas difi culdades por meio da psicoterapia. d) Facilitar o passo seguinte, que será a escolha de metas te rapêuticas, ao lhe apresentar, e em parte sugerir, o conflito do qual julgamos poderiam surgir tais metas. (Em outras palavras, a devo lução será centrada naquilo que em nossa opinião deve converterse na problemática central do tratamento, com o que além disso se irá delineando o provável foco terapêutico.) Como foi dito, serão transmitidas ao paciente apenas algu mas apreciações acerca dc sua problemática, sem se estender nem aprofundar em demasia, já que não é proveitoso fazê-lo nesta etapa. Para isso pode-se recorrer às interpretações denominadas panorâmicas (4), que permitem esboçar, de maneira global, psicodinamismos subjacentes à situação-problema. A devolução, além dos aspectos diagnósticos, deve abranger referências ao prognóstico capazes de tranqüilizar e reanimar o paciente. Isto lhe dará a idéia de que podemos oferecer-lhe nossa ajuda e de que tem possibilidade de resolver seus sofrimentos ou pelo menos de ali
Entrevistaspreliminares __
_____
______ ______ ______ ______
_
Contrato sobre as metas terapêuticas e a duração do tratamento Depois de efetuada a devolução diagnostica, paciente e entrevistador trocarão opiniões acerca dos possíveis objetivos da terapia a ser realizada, até chegar a estabelecê-los claramente e de comum acordo. Devem-se em princípio conhecer e levar em conta os pontos de vista do paciente acerca das metas do tratamento, equivocados ou não segundo nosso julgamento. Com essa finalidade, já se terá formulado ao paciente perguntas, como: Que expectativas tem acerca do tratamento? Em que problemas você crê necessitar de ajuda? Em que supõe que tem de consistir essa ajuda?, etc. As respostas correspondentes nos darão além disso alguma idéia de suas fantasias a respeito de enfermidade e de cura, dasjquais pro vêm os objetivos que ele se coloca, assim como de suajrnotivação e capacidade de insight. Isso não exclui que por meio de devolu ção efetuada se tente chamar sua atenção sobre determinada “conflitiva” e acrescentar sua motivação para enfrentá-la. O terapeuta se referirá aos objetivos do modo mais claro e simples possível. Por exemplo, dirá ao paciente que entre ambos poderiam tratar de esclarecer por que ele sente tanto temor quan do lhe solicitam qualquer tarefa em' seu emprego e de conseguir que enfrente essas situações de forma mais adequada. Também dirá que se procurará melhorar seu estado de ânimo e esclarecer também o que sucede com sua família, etc. Paralelamente, o tera peuta deve formular os fins terapêuticos de um ponto de vista psicodinâmico: em um caso pensará sobretudo em elevar a auto-estima; em outro, em atenuar as exigências superegóicas; num tercei ro, em revelar o significado inconsciente de tal conduta e atacar determinados mecanismos defensivos, etc. É preciso que os objetivos a que se proponham sejam presu mivelmente alcançáveis, isto é, que se ajustem às possibilidades que oferecem paciente e terapeuta e às condições gerais em que terá lugar a terapia. Poder-se-ão classificar como primordiais e secundários, segundo sua importância; em imediatos e mediatos, de acordo com a ordem cronológica em que se procure alcançá-
4
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
_____
binados cora o paciente. (Toda terapia breve de insight pressupõe a existência de fins terapêuticos inerentes à natureza mesma do processo, por exemplo, que o paciente alcance maior consciência da enfermidade ou eleve sua auto-estima. Esses fins, quase cons tantemente presentes, também constituem por conseguinte objeti vos terapêuticos gerais, diferenciados dos particulares , que sur gem em cada caso.) Quando não se chega a um acordo real sobre as metas da te rapia (pode tratar-se, inclusive, de um pseudo-acordo por submis são do paciente às sugestões do terapeuta, que atuam naquele como ordens), cabem várias alternativas: / a) aceitar o que propõe o paciente, caso em que o terapeuta deverá renunciar aos propósitos terapêuticos que tinha previa mente, ou postergá-los para uma segunda etapa, b) realizar uma tarefa de esclarecimento que tenda a motivar o paciente a em j preender uma terapia com base nas metas que consideram conve nientes, c) se as dissidências forem muito grandes, não efetuar V nenhum tratamento9. A duração de um tratamento breve varia segundo as circuns tâncias: • Pode estar predeterminada por modalidades institucionais, que estabelecem prazos para os tratamentos geralmente de modo convencional e que correspondem a necessidades organizacionais dentro do planejamento assistencial que tais instituições adotam (de 3,6,1 2 meses, etc.). • Em muitas oportunidades, situações próprias do paciente, que inclusive podem ter motivado o tratamento, colocam, por sua vez, uma limitação temporal espontânea ao mesmo: acontecimen tos como uma viagem, por exemplo, poderão determinar uma finalização obrigatória, por acaso também adequada. • Em outras ocasiões, que se apresentam especialmente no consultório particular, a duração do tratamento depende do que o terapeuta e o paciente resolvam. Assim, poderá contar ou não com um final prefixado.
Entrevistas preliminares
75
tratamento fatores alheios à situação mesma do paciente, ou que este tenha a impressão de que é imposta pelo terapeuta, seria pre ferível que se pudesse obter uma vez mais a opinião do paciente sobre essa questão, a fim de a elaborarem conjuntamente. O que é pouco - ou muito - tempo para um pode não ser para o outro. “A fixação do tempo - assinala Ulloa - faz-se com a participação explícita do paciente no nível em que ele esteja capacitado para tal elaboração” (13). Isso não implica que aceitaremos ingenuamente as idéias do paciente, mas que buscaremos soluções depois de uma revisão adequada da situação. Quando a duração do tratamento for determinada de antemão, o terapeuta deve procurar, como condição primordial, que a mesma guarde relação direta com os objetivos terapêuticos pro postos, quer dizer, com o tempo que empiricamente estime neces sário para cada paciente alcançar esses objetivos (sem que isso seja um impedimento para efetuar uma recontratação do tratamento, sg, uma vez chegado o seu término, seus fins não se cumprirem)10. Fixar previamente uma data para o término da terapia supõe vantagens e desvantagens. Com freqüência, o melhor será não limitá-la, mas às vezes ocorre o contrário: para antepacientes que apresentem uma atitude receosa e. de desconfiança (habitualmen te com marcados traços fóbicos ou paranóicos), pode ser conve niente determinar uma data exata - não muito longínqua - para a finalização, com o objetivo de evitar fantasias de ser preso numa armadilha pelo terapeuta; tranqüiliza-os saber, desde o começo, que existe uma data em que o tratamento será concluído/Dessa maneira aceitam com menos dificuldades serem tratados, do que quando se acham ante uma terapia de duração indeterminada. Esta situação se apresenta mais comumente em pacientes de es trato socioeconômico baixo, os quais em princípio não concebem que a psicoterapia deva estender-se demasiadamente no tempo para solucionar seus padecimentos. Se não apelarmos com flexi bilidade para este recurso estratégico, o mais comum é que a abandonem em algum momento ou que simplesmente não a ini ciem. Em contrapartida, se se fixa um prazo, seus receios diante do tratamento são menores, sendo até possível que depois dese
76
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
Além disso, é mister explicar ao paciente, que uma vez ter minada a terapia, realizará, junto com o terapeuta, um balanço dos resultados obtidos, para o que ambos levarão em conta seu estado nesse momento, e que a partir daí se resolverá a conduta mais ade quada a assumir (separação final, fixação de entrevistas de con trole, recontrato, indicação de outro tratamento, etc.).
Explicitação do método de trabalho. Fixação das demais normas contratuais É útil oferecer ao paciente uma idéia acerca das característi cas do tratamento que terá de seguir, ou seja, quais serão, respecti vamente, suas funções, as do terapeuta e eventualmente as da equipe terapêutica. O benefício dessa tarefa informativa reside em que o paciente, em vez de resistir, à intolerância das ansieda des provocadas pelo desconhecido, poderá pelo contrário coope rar com o terapeuta, tomando conhecimento da técnica que orien tará o trabalho de ambos. No que diz respeito às funções do paciente, dever-se-á fazer empenho em explicar-lhe cuidadosa e detalhadamente o que será sua regra básica de funcionamento no decorrer da psicoterapia. (Da regra básica de funcionamento ocupo-me no capítulo 6, pp. 89 ss.) Convém que o paciente tenha uma noção prévia do papel do terapeuta. Quando se pensa em efetuar uma psicoterapia interpretativa, poder-se-á explicar-lhe que se trata fundamentalmente de ajudá-lo a compreender melhor sua situação, tentando trazer-lhe um ponto de vista diferente, que vá mais além do que lhe permite seu senso comum; que será baseado sobretudo em revelar-lhe aspectos obscuros ou desconhecidos para ele, que podem estar provocando e/ou incrementandq seus sofrimentos, e que isso será efetuado através de interpretações, das quais se dará alguma idéia elementar. Desse modo, procuraremos fazer com que se familiari
Entrevistas preliminares
77
cicnte que é possível que minhas intervenções, particularmente no início do tratamento, lhe pareçam apesar de tudo um pouco es tranhas, e que na realidade notará alguma diferença em relação às conversas que mantém habitualmente com as pessoas. A todos esses esclarecimentos podem agregar-se outros, não menos benéficos para o desenvolvimento do tratamento: cabe as sinalar ao paciente que nossa tentativa de fazê-lo entender suas dificuldades a partir de uma nova perspectiva, que lhe permita en frentá-las melhor, corresponde ao fato de que tais dificuldades superam suas^possibilidades de solucioná-las jíor sua conta; mas, acrescento ante uma sugestão de Montevechio (9) é de se esperar que ao protagonista de uma situação perturbadora resulte difícil compreender com clareza o que está acontecenjio ao seu redor e que, para o terapeuta, do lado de fora, pode tornar-se pos sível entendê-lo e ajudá-lo, graças a seus conhecimentos e expe riência. Com isto tende-se a contrabalançar sua sensação de fra casso ao ter de ir à consulta, como também a fantasia de onipotên cia do terapeuta, sendo conveniente que se ajuste desde o primeiro momento a uma relação mais “real” com este (9). Também convém informar o paciente se se pretende empre gar outros recursos terapêuticos (psicofármacos, entrevistas com familiares, etc.), comunicando, ainda que minimamente, seu sen tido e alcance. Por último, devem fixar-se as diferentes condições do conta to terapêutico, em especial as correspondentes aos aspectos espaço-temporais do enquadramento: posição espacial do terapeuta e paciente (geralmente devem sentar-se frente a frente), horários, freqüência e duração das sessões; eventualmente, datas do térmi no do tratamento, das entrevistas de avaliação e do novo psicodiagnóstico. Os demais detalhes não diferem do que já se conhece (férias do terapeuta, feriados, honorários, etc.).
Referências bibliográficas
78
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
2. Beliak, L. e Small, L., Psicoterapia breve y de emergencia, PaxMéxico, México, 1969. 3. Courtenay, M., Sexual Discord in Marriage, Tavistock, Londres, 1968. Citado por L. Small, Psicoterapias breves , Granica, Buenos Aires, 1972. 4. Fiorini, H. J., “La primera entrevista era psicoterapia breve", em FI. J. Fiorini, Teoria y técnica de psicoterapias, Nueva Vision, Buenos Aires, 1973, cap. 4. 5. Friedcnthal, H., “La recomendación de psicoterapia a partir dei diag nóstico psicológico”, Acta psiq. psicol. Âmér. Lat., Buenos Aires, 1968, vol. XIV, n‘.’2. 6. García Arzcno, M. E., Comunicación personal. 7. Harrower, M., “Cómo ve cl tratamiento breve un psicólogo clinico”, em L. Wolberg, Psicoterapia breve, Gredos, Madrid, 1968. 8. Malan, D. H., A Study of Brief Psychotherapy, Tavistock, Londres, Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 9. Montevechio. B. R., Comunicación personal. 10. Ocampo. M. L. S. e García Arzeno, M. E. “El proceso psicodiagnóstico”, em M. L. S. Ocampo e M. E. Garcia Arzeno, Las técnicas proyectivasy el proceso psicodiagnóstico, Nueva Vision, Buenos Aires, 1.1, cap. I. 11 . , “Indicadores para la recomendación de terapia breve extraídos de la entrevista devolutiva”, em M. L. S. Ocampo e M. E. García Arzeno, ob. cit. em 10, t. 11, cap. XI. 12 . , “La entrevista de devolución de información”, em M. L. S. Ocampo e M. E. García Arzeno, ob. cit. em 10, t. 11, cap. IX. 13. Ulloa, F. O., “Comentário al artículo de Hector Juan Fiorini”, em W. R. Grimson (comp.) e outros, Nuevas perspectivas en salud mental. Instituciones y problemas. Nueva Vision, Buenos Aires, 1973.
5. Planejamentodotratamento
I
f A elaboração de um plano terapêutico é uma das característi cas que distinguem as psicoterapias breves. Diversos autores têmse referido à necessidade de planejamento, entre eles French (3) e Alexander (1), que em algumas passagens da Terapêutica psicanalítica chamam ao tratamento breve terapia planejada (2) (3), o que demonstra a importância que tais autores outorgam ao plane jamento. Este consiste no projeto de rima estratégia terapêutica, efetuado com o fim de alcançar os objetivos propostos. Para conceber a estratégia, dever-se-ão ter presentes diversos elementos provenientes do paciente, do terapeuta e eventualmente da instituição. Com relação ao paciente, será essencial partir dos vários dados obtidos pela avaliação diagnóstico-prognóstica (ver capítulo 4), que terá culminado no desenvolvimento de uma fo r mulação psicodinâmica antecipada (3). Planejaremos nossa ação terapêutica com base numa estrutura de foco terapêutico inicial. Com relação ao terapeuta e à instituição, dever-se-ão considerar fatores como a experiência prévia daquele e sua habilidade no manejo dos distintos recursos (fatores que deverão ser levados em conta em relação a toda a equipe terapêutica), assim como as pos sibilidades que oferece a instituição.
HO
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
cada caso particular. Inclui a determinação do tipo de psicoterapia a ser aplicada (em que predomine o insight, de fortalecimento egóico ou de apoio), os conflitos que vamos abordar, aqueles que serão deixados de lado e a provável seqüência de tal abordagem; cstabelecer-se-á muito especialmente a atitude terapêutica a ser assumida diante dos distintos mecanismos defensivos do paciente (incisiva ou pelo contrário de abstenção, ou inclusive de reforçamento desses); organizar-se-á tudo o que se refere às condições temporais (duração, número e periodicidade'das sessões sema nais, duração total do tratamento, etc.) e espaciais do enquadra mento. Outros aspectos relevantes a serem considerados serão: as regras de funcionamento do paciente durante o tratamento (ver capítulo 6), a atitude geral do terapeuta ante o paciente (cálida, muito ativa, diretiva, cautelosa, etc.) que, logicamente, irá sendo regulada pelos indicadores que aparecerem no decorrer das ses sões, os diversos tipos de intervenção do terapeuta (interpretações em suas distintas variantes, assinalamentos, perguntas, informa ções, sugestões, etc.) e o uso de outros recursos terapêuticos (psicofármacos, inclusão de familiares e/ou pessoas que lhe são pró ximas, técnicas dramáticas, serviço social, etc.). Também é útil pensar em possíveis inconvenientes terapêuti cos que possam surgir durante o tratamento e na melhor forma de enfrentá-los (3), e ainda em tarefas a realizar se a evolução do paciente o permitir (a abordagem de determinado conflito subja cente, por exemplo). O planejamento deve, além disso, tender para a previsão dos possíveis rumos e das características que pode tomar o processo terapêutico em seus aspectos mais gerais. A experiência demons tra que é conveniente contar desde o começo com uma idéia ante cipada, ainda que elementar e provisória, do princípio do desen volvimento e do final da terapia. Recomendo sobretudo não omi tir tudo o que se refira à conclusão do tratamento, que em certa
Planejamento do tratamento
81
mento da situação de perda, envolvendo detalhes, tais como o nú mero de sessões semanais a se estabelecerem nas últimas etapas do tratamento (ver capítulo 9). Trata-se em suma que a terapia não fique entregue exclusiva mente à intuição e à improvisação sobre o seu andamento (2). Mas essas alternativas só podem ser previstas até certo ponto, por que de nenhum modo dever-se-á entender que todas essas medi das possuem um caráter rígido c inalterável, já que, pelo contrá rio, o terapeuta deverá ser dotado de uma flexibilidade tal que lhe permita itiodificar seus planos quando as circunstâncias o exijam, para poder enfrentar com eficácia as situações mutáveis e inespe radas que podem apresentar-se no decorrer do tratamento. Finalmente, recordemos que o planejamento cpstuma ser fa cilitado e enriquecido pela participação nele, ao ladb do terapeuta, dos demais profissionais que eventualmente intervenham no tra tamento. O intercâmbio de dados e idéias freqüentemente possibilita uma elaboração mais minuciosa, profunda e definitivamente mais adequada do projeto terapêutico, que além disso será comparti lhado precisamente por aqueles.que devem colocá-lo em prática em seguida, o que resulta essencial para se obter eficácia terapêu tica. Por isso, em síntese, considero que quando numa terapia está envolvida uma equipe de especialistas (dois ou mais profissio nais), deve ser sempre esta, em conjunto, a encarregada de elabo rar o programa terapêutico.
Referências bibliográficas 1. Alexander, F., “Alcance dc la psicoterapia”, cm F. Alexander e T. French, Terapêuticapsicoanalítica, Paidós, Buenos Aires, 1965. 2 . , “Eficacia dei contacto breve”, em F. Alexander e T. French, ob. cit. em 1, cap. IX. 3. French, T., “Planificación dc la psicoterapia”, em F. Alexander e T. French, ob. cit. em 1, cap. VII.
6. Otratamento
[ Introdução Uma vez cumpridas as etapas diagnostica e contratual, assim como a de planejamento, inicia-se o tratamento, que se apoiará dentro do possível em hipóteses, psicopatológicas e terapêuticas consistentes e ao mesmo tempo "em objetivos e enquadramento definidos. Com relaçào aos diferentes aspectos de técnica concernen tes ao tratamento propriamente dito, considerar-se-á em primeiro lugar a relaçào paciente-terapeuta, cujo estudo é ponto de parti da obrigatório para a compreensão dos temas subseqüentes; em seguida referir-me-ei à regra de funcionamento para o paciente, que terá de ser adotada no decorrer da terapia, e ao papel que nesta última poderia caber ao método psicanalítico de associação livre; depois abordarei o problema da atenção do terapeuta em relação à tarefa de focalização; de imediato, examinarei os ele
84
Psico Psicoíer íerap apia ia brev brevee de orienta orientação çãopsic psicana analitic liticaa
A relação pa paci cien entete-ter terap apeu euta ta no trata tr atamen mento to breve Referir-me-ei à relação terapêutica na psicoterapia dinâmica breve e às diferenças existentes entre ela e sua correspondente no tratamento psicanalítico. Tomarei como base um resumo que in clui a opinião de alguns autores acerca do tema. Para compreender o porquê das particularidades do vínculo terapêutico em P.B., convcm considerar primordialmente o que acontece em relação à transferência e à neurose transferencial re gressi gre ssiva1 va1.. Antes Ant es de passar a ver como com o podem po dem ser manejadas manejadas em uma terapia breve de orientação psicanalitica, efetuaremos uma rápida revisão das características da relação terapêutica no trata mento psicanalítico, que servirá portanto para apontar diferenças significativas. contexto psicanalítico psica nalítico , condições que facilitam o esta Há, no contexto belecimento, o desenvolvimento e a análise da neurose transferen cial regressiva, a qual, como disse antes (ver capítulo 3, p. 26), é fundamental no processo terapêutico. Assim observamos que: O analista procura manter o anonimato - o que por por sua vez contribui para criar um clima de ambigüidade a fim de não en torpecer a produção dos fenômenos transferenciais; além disso, trata de adotar uma atitude neutra e relativamente distante , o que também implica promover no paciente uma situação de frus fr ustr traa çãoo; o vínculo é marcadamente assimétrico, fato acentuado, entre çã outras coisas, pelo uso do divã. Também no aspecto temporal, o enquadramento favorece a dependência regressiva, constando de várias sessões semanais e de uma duração do tratamento, em princípio, não limitada. Com relação à situação espacial, a posição do paciente, dei tado no divã, encontra-se ligada a fenômenos regressivos, tais co mo o dormir e o meditar, e fomenta, além disso, o desenvolvimen to da neurose transferencial, dado que, ao estar o paciente privado
0 tratam tratament entoo
85
superação das resistências que por isso se vão produzindo, a regra fundamental incide na transferência na situação analítica, confe rindo-lhe uma intensidade particular, pois se produz, em conse qüência, a projeção dos objetos internos no analista, especialmen te do superego. O analista, por sua vez, emprega a atenção flutuante, tenden inconsciente do assim a uma comunicação dc inconsciente para inconsciente (17). Intervém verbalmente, partindo do material que o paciente traz dc maneira espontânea, e sobretudo mediante a interpretação; ante os silêncios, costuma manter uma atitude de espera, permi tindo que se prolonguem. As interpretações transferenciais são muito valorizadas, cons tituindo, para a maioria dos analistas, o instrumenti técnico es sencial, e para alguns inclusive o único com efeitos‘modificado res (4). Penso que tais interpretações encorajam o paciente à revi são minuciosa e profunda de suas fantasias transferenciais e pro movem a revivescência de situações infantis, infantis, favorecendo assim o desenvolvimento da neurose de transferência. psico terapia breve, em troca, devem desencorajar-se tan Na psicoterapia to o desenvolvimento da regressão como o da neurose transferen cial (ver capítulo 3, pp. 27 s.), e inclusive faz-se necessário con trolar dentro do possível a intensidade dos fenômenos regressivotransferenciais. Disso deriva uma série de medidas técnicas que conferem confer em perfis próprios próprios à terapêutica terapêutica breve. breve. O vínculo que se estabelece com o paciente é mais realista e definido, já que a ambigüidade aqui é inconveniente (11), pois promove situações persecutórias e por isso regressivas. Uma rela ção mais baseada na realidade contrabalança as tendências ao es tabelecimento de uma relação transferencial neurótica. Fiorini qualificou o papel que o terapeuta deve assumir na psicoterapia de esclarecimento (em boa medida equiparável, de acordo com a descrição deste autor, à terapia dinâmica breve) como papel pa pel real de docente experiente, sublinhando assim o que seria, a seu ver, um dos aspectos mais importantes (7). Por parte do terapeuta, e ao contrário do que ocorre no trata
86
Psicot Psicotera erapia pia brev brevee de orienta orientação çãopsicanalí psicanalítica tica
rapport , sobretudo se se trata de uma terapia cujo tempo será limi tado; tado; dever-se-á fom f omentar entar o rápido desenvolvime desenv olvimento nto de uma alian ça terapêutica , condição básica para aspirar ao êxito. O terapeuta
deverá então, na medida do possível, mostrar-sc moderadamente cálido, oferecer uma uma imagem confiáve co nfiávell e demonstrar demonstrar interesse pe los problemas do paciente. A relação terapêutica exige a manutenção de um delicado equilíbrio entre gratificações e privações do paciente. Deve-sc per mitir-lhe certo grau de gratificação de necessidades emocionais (por exemplo, respondendo às perguntas formuladas por ele [42]); do contrár contrário io corre-se corre -se o perigo perig o de despertar despertar ou incrementar incrementar - por por causa do ressentimento ressenti mento provocado pela frustração frustração - a produção produção de reações hostis passíveis de determinar um aumento das resistên cias, às quais não teremos tempo suficiente para nos dedicar. Gra tificá-lo em demasia pressupõe, do mesmo modo, certos riscos, tais como dificultar a integração da agressividade e favorecer a dependência dependência (33). (33) . Dever-se-á, em suma, tender à manutenção de uma relação transferen transferencial cial po sitiva sublimad a ao longo de toda a terapia (2). Só assim poderemos esperar que o paciente assuma uma atitude de colaboração e possa aceitar e utilizar com proveito as interpre tações2. Sentimentos transferenciais de idealização muito intensos podem complicar e prolongar o tratamento; quando juirgejrn, é preciso prec iso diss d issol olvê vê-lo -loss prontamente mediante a tarefa tarefa interp interpre retat tativa ivaT T Cabe dizer o mesmo a respeito da hostilidade e do erotismo trans ferenciais. Finalmente, a relação será menos assimétrica que no trata mento psicanalítico. psicanalítico.
O número reduzido de sessões semanais e a duração limitada e geralmente prefixada do tratamento breve desencorajam a re gressão. A posição frente a frente, que é habitual em terapias breves,
0 tratam tratamento ento
87
intercâmbio verbal fluido, mais próximo de um diálogo corrente queopsicanalítico. Temos recordado que a regra fundamental da psicanálise é um dos fatores que explicam a intensidade particular que a transferên cia adquire no tratamento psicanalítico. Como em P.B. se trata de evitar um efeito dessa natureza, considero que tal regra não deve ser empregada do mesmo modo que no tratamento psicanalitico. Mais adiante abordarei exaustivamente esse ponto (pp. 89 ss.). Voltando ao tema da comunicação em.P.B., é preciso assina lar a funç fu nção ão ativa que o terapeuta tem de exercer, e que será deci siva para o alcance de bons resultados. Isto se deve em primeiro lugar à sua possível incidência no vínculo, coadjuvando na manu tenção tençã o de uma uma transferência transferênci a positiva positi va - cm con contrast trast«? «? com os e fei fe i tos que teria uma atitude menos participante, que pudesse gerar descontentamento ou hostilidade. Deve-se também ao fato dc que foc aliza izaçã çãoo da um papel ativo tem importância para a gestão da focal tarefa terapêutica (14), dado que comumente é necessário alcan çar determinadas determinadas metas e se dispõe dispõ e de tempo limitado l imitado para para isso. A situação requer certa ativação egóica no paciente, que se consegue precisamente através desse funcionamento ativo, pois nâo pode mos esperar demasiado tempo para que vença, por si mesmo, suas dificuldades para se manter numa comunicação terapêutica pro dutiva e poder aprofundar-se no conflito em questão. O terapeuta simplesmente tenta agilizar o intercâmbio, procurando produzir um efeito catalisador no processo terapêutico. Ao mesmo tempo deve dedicar-se desde o começo e plenamente a ajudar o paciente a resolver situações perturbadoras de sua vida diária. Com tal fim, recorrerá com freqüência a intervenções não-interpretativas. For mulará perguntas, assinalamentos, efetuará sugestões, oferecerá informações. Às vezes terá de tomar a iniciativa na comunicação (12), propondo o tema a ser tratado. (Exemplo: “Vejamos aquilo que você mencionou de passagem na última sessão.” Ou por meio de perguntas: “Como passou este fim de semana? Aconteceu al guma coisa especial?”.) E quanto às interpretações, têm de estar dirigidas fundamentalmente ao esclarecimento da conflitiva fo
Psico Psicoter terap apia ia brev brevee de orien orientaç tação ão psican psicanalí alítica tica
terminada direção, escolhendo entre o material aqwek-ídativQJiQ. foca fo ca e descartando o extrafocal4 foc al4.. Em certas ocasiões, pode caber ao terapeuta uma participa ção decididamente ativa e direta nos problemas atuais do pacien te. Por meio de sugestões, poderá incidir em alguma medida sobre eles. Assim, por exemplo, ante uma situação fobígena talvez con sidere necessário, depois que o paciente alcançou certa com preensão psicológica do conflito, estimulá-lo a enfrentá-la (27) (49), atitude avalizada já desde 1918 por Freud, com suas reco mendações acerca do tratamen tratamento to das das fobias (21), (21) , e posteriormente adotada por muitos profissionais na terapia psicanalítica. A res peito disso, expressa Ilaley: “A psicanálise dos tempos de Freud não era somente mais breve , mas também mais ativa. Freud esco lhia lhia o tema sobre o qual um pa ciente tinha tinha de associar e quando este obtinha algum insight do problema su s u g e ria ri a - lhe lh e q u e s e m o s trasse ativo em sua vida pessoal , agora que já dispunha de tal conhecimento” (26)3. (Os grifos são meus.) Em geral evita-se o prolongamento excessivo dos silêncios, não só porque incrementa a ansiedade e a conseqüente regressão (42), mas também porque se trata de utilizar operativamente o tempo disponível. Em particular, os silêncios prolongados do te rapeuta podem provocar hostilidade transferencial devido à frus tração ocasionada. Ante a posição frente a frente entre terapeuta e paciente, tam bém adquirem significação as manifestações pré-verbais do pri meiro. E necessário levar em conta a repercussão dos seus gestos e de sua atitude corporal no paciente se se pretende propiciar a produção de uma aliança terapêutica. Wolberg recomenda que o terapeuta dê “livre expressão à sua mímica facial” (48). É claro então que essas contribuições ao processo de tratamento, que po deríamos chamar de expressões terapêuticas do terapeuta , como o olhar atento e os gestos que revelam interesse pelo relato do paciente, serão benéficas, desde que sejam espontâneas e não-estudadas.
0 tratame tratamento nto
89
terapêutica, já que introduzem diversas variantes no campo dos fenômenos transferenciais e contratransferenciais, marcando no vas e substanciais diferenças com o que acontece na psicanálise individual individual (7) (14).
Uma regra regra básica básica de funcio fun ciona nam m en ento to em psicotera psicoterapia pia breve de orientação orientação psicanalítica psicanalít ica Na técnica psicanalítica, Freud instituiu o método da associa ção livre? pelo qual o paciente deve comunicar ao analista o que lhe ocorrer, quer dizer, todos os pensamentos que assomem à sua mente, sem nenhuma restrição. A livre associação é* junto com os sonhos e os atos falhos, uma via facilitadora de acesso ao incons ciente. e ao reger de modo praticamente ininterrupto no decorrer do tratamento psicanalítico, configura o que Freud chamou de “regra “regra fundamental”. f undamental”. No terreno das terapias de tempo e objetivos limitados sur gem várias interrogações relacionadas com este tema: 1) Qual deve ser a regra de funcionamento para o paciente? 2) Que papel há de lhe caber no procedimerUo da livre associação? Deve-se deixá-la completamente de lado ou, pelo contrário, é necessário empregá-la? Neste último caso, como, do mesmo modo que no tratamento psicanalítico ou diferentemente? Revisando as obras mais destacadas da bibliografia corres pondente à psicoterapia breve de orientação psicanalítica, desco brimos que, apesar de se tratar de um aspecto técnico de decisiva importância, ou se tem omitido toda a referência à regra da asso ciação livre (abundando em troca as considerações sobre outros temas, tais como o papel da transferência, o das interpretações, etc.) ou no máximo registram-se alguns pontos de vista em tomo da mesma - em geral no sentido de não utilizá-la - na maioria maioria das das vezes formulados “de passagem” e com certo caráter dogmático. Vejamos alguns deles: “(...) é desacertada essa atitude passiva e abst absten enci cion onis ista ta,, como tamb também ém o c a associação livre (...)”; “Em geral, a falta material de tempo não nos permite empregar os
90
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
tratamentos difusos, em que o paciente se senta para discutir a seu bel-prazer qualquer tema que se apresente e a falar praticamente de tudo o que aconteceu e vai acontecer, sem uma idéia diretriz, sobretudo em se tratando de uma psicoterapia breve” (Hoch [28]). “Na psicoterapia rápida, a associação livre, enquanto tal, não é um instrumento essencial” (Bellak e Small [2]). Também Malan, em sua obra sobre psicoterapia breve, sus tenta que a indicação que se dá ao paciente de “dizer o que lhe venha à mente” raramente parece ser necessária. Em outra parte do livro, fala em desencorajar a associação livre (34)t No meu entender, não se explicitam claramente os funda mentos em que se sustentam esses critérios7. De minha parte, da rei minha opinião acerca dos problemas que aqui se colocam e que considero que requerem um estudo mais minucioso. O emprego constante do m étodo da associação livre (“regra fundamentar’ da psicanálise) nos tratamentos breves
Começarei por examinar as vantagens e as desvantagens que acarretaria o uso constante (desde o começo do tratamento e de modo praticamente continuo, durante o mesmo, tal como se faz no tratamento psicanalítico) da associação livre em terapias breves. Analisaremos primeiro as desvantagens. Já recordei os con ceitos de Racker (p. 84) no sentido de que a abolição do rechaço às associações e à sua comunicação por parte do paciente, pelo emprego da associação livre, determina uma maior intensidade de transferência no tratamento psicanalítico, ao dar lugar à ime diata projeção dos objetos internos no analista, em especial do su perego (37). Esse fato é conveniente para o tratamento psicanalíti co, mas não para a P.B., já que no caso desta última nosso propósi to é o de proteger o paciente tanto da regressão como da neurose de transferência.
0 tratamento
91
superego sobre o analista e o temor ao próprio e desconhecido que poderá emergir), situação que, imagino, além de certo nível pode perturbar consideravelmente um tratamento de duração breve, b) Gerar uma atmosfera de ambigüidade, inadequada a essas tera pias. c) Conduzir o pac iente à d ispersão , quer dizer, levado pelo curso de suas associações, ele se desvia excessivamente das situa ções conflitivas a serem tratadas (sem maior aproveitamento do tempo em função do problema central do tratamento). Desse mo do, também abre brechas no paciente, pois permite que aflore material vinculado a outros conflitos relativamente alheios ao foco, inclusive os uierentes a situações ou etapas arcaicas, que ficam então a descoberto. Finalmente isso leva a acentuar a dependên cia regressiva em relação ao terapeuta, a qual, em terapia breve, -reitero, deverá ser desencorajada8. f Em suma, o emprego constante do método da associação livre no tratamento intensificaria os fenômenos transferenciai sregressivos até um ponto indesejável, pelo que, a meu ver, na I maioria dos casos não me parece recomendável. Mas cabe agora examinar as vantagens de se adotar a “regra fundamental”. Seriam definidas desde já, pela facilitação do aces so aos conteúdos inconscientes. Sua aplicação pode ser especial mente útil quando se trata de pacientés com excessiva tendência à intelectualização, pois nesse caso a defesa pode ser incrementada se têm de se referir a um tema determinado (à situaçào-problema), fato que pode resultar propício no tratamento para ser utilizado como o “argumento” ou “libreto” conhecido de antemão. Talvez seja essa uma das poucas situações de exceção em que se poderia apelar para o uso da “regra fundamental”9. Em grupos de discussão, alguns colegas me assinalaram a possibilidade - e suposta conveniência - de que em terapias bre ves todo paciente se ajustasse permanentemente à livre associa ção sempre que o terapeuta recorresse a intervenções focalizadas, mostrando-lhe a relação - ou, pelo contrário, a desconexão - do material com a problemática principal do tratamento, com o que se respeitaria a essência do procedimento em seu caráter de tera pêutica focal. Sem dúvida, embora não duvide de que antes de mais nada é preciso que seja o terapeuta quem não perca de vista
92
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
o paciente “saia do foco”, mas sim que o terapeuta se descuide de relocalizá-lo nele; acrescento a este requisito os benefícios que comumente oferece o fato de que também o paciente concentre sua atenção desde o princípio nos problemas a resolver, e não creio que as vantagens provenientes do uso da associação livre, por exemplo, a eventual conexão entre as associações espontâneas e os elementos focais, sejam argumento suficiente para seu em prego sistemático e constante, dados os inconvenientes que o mesmo pode acarretar e que já foram assinalados"'. Por outro la do, até agora, ainda que seja possível que no caso de uma situação traumática de reconhecida eficácia patogênica as associações livres do paciente girem em sua grande maioria em tomo dela, como o atesta a experiência clínica psicanalítica (com as denomi nadas neuroses traumáticas, por exemplo), o certo é que nem todos os casos tratáveis por meio da PB. pressupõem a presença de tal situação claramente definida e dc suficiente intensidade traumática, razão pela qual a utili/ação da “regra fundamental” psicanalítica poderia dar lugar em alguns momentos ao aprofun damento na estrutura focal, como em outros - e insisto neste aspecto - ao afastamento dela, quer dizer, a “enveredar por outros Raminhos”, com as conhecidas conseqüências. Assim sendo, o que pode ocorrer na prática das terapias bre ves? Que o papel ativo e focalizador desempenhado pelo terapeu ta, característica dominante dessas terapias, se interponha reduzin do ou até deixando sem efeito a associação livre espontânea do paciente, quer dizer, entrando em aberta contradição com esta como método de trabalho. O terapeuta, com suas freqüentes inter venções, graças às quais promove a ativação egóica no paciente (não só através de assinalamentos e interpretações, mas também sugerindo temas ou fazendo perguntas, isto é, atuando de modo mais diretivo no que diz respeito à orientação que deverá imprimir ao pensamento do paciente em direção a uma problemática deter minada), estimulará, sim, neste, o que Fiorini chamou de “associa ções intencionalmente dirigidas”. (“Operativamente, a focalização
0 tratamento
propiciando antes o estabelecimento de uma comunicação em que predomina o processo secundário e portanto mais aproximada do que seria um diálogo corrente. Adoção de um a regra básica de funcionam ento para psicoterapias breves
F. Fromm Reichman (22) escreveu^ “Muitos psicanalistas consideram que uma quantidade suficiente de material dissociado reconhecível chega à superfície e pode ter acesso à consciência no intercâmbio psicoterapêutico mais dirigido.” Isso significa que, por mais que a associação livre favoreça a explora|ào do incons ciente, isso não implica que sem sua ajuda esta não Seja exeqüível. Além disso, o natural e lógico para o paciente é ter que falar ante o terapeuta fundamentalmente de seus sintomas e situações conflitivas. Se a norma de funcionamento se baseia nessa premis sa, a comunicação se verá em geral facilitada, gerando-se um menor montante de ansiedade paranóide. Podemos assim dedicarnos de maneira seletiva a seus sofrimentos atuais, os quais terão de se converter em tema primordial da terapia (focalizaçâo). Por esses motivos, costumo formular uma prescrição de trabalho para os pacientes antes de começar o tratamento breve que consiste no seguinte: esclareço-lhes que poderão falar do que desejem, mas que em princípio convirá q ue se refiram preferencialmente a tudo aquilo que suponham ter alguma relação com os problemas que combinamos abordar (poderá tratar-se tanto de relatos acerca de
fatos atuais da vida deles, como de recordações, pensamentos variados, fantasias, vivências e sonhos). Uso operativo do métod o da associação livre nos tratam entos breves
94
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Em minha experiência pessoal, venho ensaiando isso de maneira isolada nos tratamentos - tendo-me resultado de suma utilidade perante a emergência de certo material que impressionava como significativo e sobretudo podia supor-se ou inclusive compro var-se - estar ligado à estrutura focal (podendo relacionar-se a um sonho, ao aparecimento de um determinado sintoma, sentimento, fantasia, ato falho, etc.)12. Nesse momento, convidava o paciente a me comunicar as associações que iam surgindo a partir desse material. Essa instrumentalização seletiva do método da associa ção livre permite seu aproveitamento, já que é possível exercer certo controle sobre os efeitos regressivos que seu emprego pode ria provocar, diferentemente do que resultaria se utilizado cons tantemente13. A flexibilidade de que o terapeuta deverá fazer uso há de pos sibilitar-lhe a opção de utilizar este recurso técnico quando o con sidere oportuno e ante pacientes capazes de responder positiva mente ao mesmo14. A manobra em questão tem naturalmente a in tenção de aprofundar-se no material correspondente ao foco tera pêutico e freqüentemente permite ratificar, ampliar ou corrigir as hipóteses psicodinâmicas em jogo, com base no obtido. Dessa maneira, também seríamos conseqüentes a respeito desse ponto com o que Freud propunha em 1918, quer dizer, a aplicação nas psicoterapias de elementos tomados da psicanálise, mas mediando uma tarefa de “adaptar nossa técnica às novas con dições” (21). Em resu mo e com respeito ao destino do método da associa ção livre como recurso técnico no campo das terapias breves, não considero adequado o emprego sistemático do mesmo - salvo es cassas exceções - e creio necessário alertar a respeito de tal emprego quando corresponde a uma simples transposição da téc nica psicanalítica corrente e carece de fundamentos válidos. £>estaco, sim, os benefícios de um uso limitado e seletivo do proce di
0 tratamento
95
Conform ação definitiva de um a regra de funcionam ento para psicoterap ias breves
Finalmente, à norma ou prescrição de trabalho antes propos ta (p. 93), segundo a qual a principal contribuição do paciente será fornecer todo tipo de material que chegue a relacionar com seu sofrimento atual, poderia então agregar-se a explicitação do even tual emprego do método da associação livre em alguns momentos da terapia - ainda que, repito, só em caso de pacientes que reve lem atitudes^egóicas suficientes para que tal emprego traga bene fícios informando-se em detalhe em que consiste o mesmo antes de começar o tratamento. A citada norma de funcionamento se ajustaria à» condições próprias da terapia breve. Considero que em grande {pedida, as sim como a “regra fundamental”, no dizer de Laplanche e Pontalis, “estrutura a situação analítica” (32) (“Regra fundamen tal”, p. 370), esta norma poderia selar as características essenciais da relação terapêutica na terapia breve psicanaliticamente orienta da, definindo muito especialmente seu próprio focalizador.
Digressões sobre a focalização e a atenção do terapeuta Tem-se dito que na terapia focal o terapeuta deve empregar uma atenção seletiva, em virtude da qual tende a conservar men talmente um foco (na descrição de Malan, a interpretação central em torno da qual deve girar todo o tratamento). Ao mesmo tempo, o terapeuta se concentra de preferência no material que aparece mais diretamente ligado à problemática focal, conduz o paciente ao foco através do trabalho interpretativo e descarta o material distanciado dele (34)/al estado de atenção seletiva parece certa mente o oposto da atenção flutuante recomendada por Freud, de acordo com o qual o analista deve escutar o analisando, evitando na medida do possível privilegiar algum aspecto do material, quer dizer, sem focalizar sua atenção, sendo sua finalidade poder des cobrir neste as conexões inconscientes (17)/Sem dúvida, conside
96
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
terapeuta. Resulta bastante útil em muitos momentos recuperar justamente a atenção flutuante, que ao ver-se inevitavelmente dificultada de maneira parcial pela necessidade estratégica de focalização, dc planejamento e de um papel ativo do terapeuta (antes de tudo, o estar cara a cara, o que torna muito mais difícil mantê-la, já que devemos controlar nossa mímica, às vezes não muito apropriada para a ocasião quando nos abandonamos à aten ção flutuante), não deve por isso ficar anulada no decorrer do pro cesso terapêutico toda vez que desejamos preservar em alguma medida um método mais depurado de exploração do inconsciente, o qual requer seu concurso. Sustento que é possível, pois, valer-se dela, justamente para facilitar o aprofundamento na mesma conflitiva focal, e ainda para a produção de interpretações focalizadas a partir da contribuição que oferecem as associações espontâneas do terapeuta diante do material fo c a l do paciente. Não se empregando a atenção flutuante, o tratamento breve, no meu entender, corre o risco de se reduzir automática e exclusi vamente a uma terapia do prê-consciente, podendo estereotiparse consideravelmente o intercâmbio verbal terapeuta paciente e empobrecer-se o procedimento em suas possibilidades terapêuti cas. Se se prescindir por completo da atenção flutuante, assim como da associação livre, a comunicação terapêutica não seria em momento algum aceitemo-lo ou não a partir dc um ponto dc vista terapêutico, mas antes de mais nada coloquemo-lo clara mente - de inconsciente pa ra inconsciente, como em troca se pro cura que seja no tratamento psicanalítico, o qual se sustenta, para isso, na associação livre do paciente e, em contrapartida, na aten ção flutuante do analista (17). Penso que nessas circunstâncias poder-se-ia questionar muito mais severamente que em outras - e com direito - a existência de algum grau de insight e dc elabora ção do paciente nessas terapias, obstacularizados ou impedidos ambos pelo tipo de comunicação estabelecida.
0 tratamento
97
Sob essa perspectiva chegamos à proposta do que seria no terapeuta uma combinação sucessiva, operativa e flexível de~momentos de atenção flutuante, seguidos de momentos dc atenção mais seletiva, que se alternam de acordo com as vicissitudes cia comunicação terapêutica, ainda que sempre se dê no final um retomo ao estado de atenção se letiva focal. Como norma elemen tar, poderíamos estabelecer que toda vez que se solicitem associa ções livres ao paciente, tem-se de escutá-lo em estado de atenção flutuante (qualquer outra atitude implicaria rieste caso uma incoe rência técnica, pois se nos decidirmos a procurar que circunstan cialmente o paciente vença a censura existente entre seu conscien te e seu pré-consciente, não vamos incorrer no erro jtte substituíla, antepondo nossa própria censura às suas comunicações, efe tuando uma seleção à qual o paciente tenha renunciado [17]). No entanto, isso não significa que o emprego da atenção flutuante em P.B. tenha de reduzir-se somente a tais circunstâncias. Creio que de maneira geral o que poderia embasá-la como requisito básico seria o surgimento de material presumível ou - melhor ainda claramente relacionado (pelo terapeuta) com o focal, tenha sido tal material trazido de modo espontâneo pelo paciente, tenha apa recido como conseqüência de intervenções foealizadoras do tera peuta (perguntas, assinalamentos, interpretações, pedidos de as sociação livre a partir de um elemento, etc.). Uma possível se qüência ilustrativa da combinação dos tipos de atenção que pro ponho para o trabalho focalizador é a seguinte: em virtude de sua atenção seletiva, o terapeuta distingue um elemento focal signifi cativo no material do paciente (relativo a um sonho, por exemplo). Em seguida, solicita-lhe associações livres partindo de tal ele mento e se dispõe então a escutá-las com atenção flutuante. Em seguida se dá, por exemplo, o passo na direção da gestação de uma interpretação, como conseqüência da atividade pensante do terapeuta que tem lugar nesse momento (associações, conexões, sínteses, etc.), com retomo final à focalização (atenção seletiva focal) para a conseqüente seleção interna voluntária entre as
°
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
rial focal (associações dirigidas) (8), ante o que o terapeuta tem de abandonar-se igualmente à atenção flutuante e reiniciar o ciclo, ou, então, b) resistencialmente, o distanciamento do foco, o qual, ao transcorrer certo tempo c ser corroborado pelo tera peuta, que voltou a focalizar automaticamente - sua atenção, o levará a reencaminhar o paciente ao foco, por exemplo, com ura assinalamento. Em síntese, material do paciente —» focal ização baseada na atenção selcTiva do terapeuta ^ jp edíHrTda associa ção livre ao paciente —>atenção flutuante do terapeuta —» gesta ção da interpretação; atividade pensante com trabalho fmàT de seleção interna do terapeuta (atenção seletiva focal) —» interpre tação focalizada —> material focal —>atenção flutuante do tera- ^ peuta, etc. Mas não podemos extrair algo mais dessa exemplificação? De fato, ela mostra que a atenção seletiva serve basicamente para efetuar uma seleção do material do paciente (em razão de nosso interesse seletivo na problemática focal daquele), mas que na rea lidade a dita seleção segue uma recepção, em estado de atenção flu tuante , por parte do terapeuta, do material focal que sobrevem em continuação, e que é em pregando essencialmente esta form a de atenção, a flutuante, que o terapeuta desenvolverá seu trabalho interpretativo. Desse modo, a noção de atenção seletiva na ps ico terapia fo ca l também encerra no fu nd o a presença de estados d e atenção flutu an te do terapeuta (no conceito antes mencionado, de
que a atenção seletiva pressupõe a concentração preferencial do terapeuta no material ligado á problemática focaÇestaria irapficüõ o emprego da atenção flutuante para a recepção de tal material). Esta é a forma pela qual pessoalmente concebo o que sucede - ou deveria suceder - com a atenção do terapeuta na psicoterapia focal, c que me parece sumamente necessário explicitar, já que os diver sos autores que vêm se referindo a essa técnica se ocuparam pouco ou nada de aclarar esse tema - da mesma maneira que o relativo à associação livre - apesar da sua indubitável importância. Os pacientes que têm certa capacidade para centrar-se na conflitiva focal nos eximem de maiores preocupações e esforços para
0 tratamento _
____ ______ ____________________ ______
____ _________________________________
maior parte do material trazido está vinculada mais ou menos diretamente à situação traumática, inerente ao foco terapêutico). Em suma, a atenção flutuante em P.B. pode ser empregada em diferentes momentos terapeuticamente significativos de nosso trabalho15. A combinação que sugiro tem seu correlato no que foi pro posto para o paciente, quer dizer, colocação seletiva consciente de material focal e associações livres a partir de um elemento focal. A combinação atenção flutuante/atenção seletiva, que pare ceria difícil de êoncretizar na prática, pode dar-se em grau satisfa tório e de modo quase espontâneo em terapeutas convenientemen te treinados. Há uma regulação , que com o tempo se toma auto mática., da atenção, segundo as formas em que se vão cjiando as seqüências. Vale a pena preservar nesses procedimentos certo grau de atenção flutuante, capitalizada, como vimos, para os fins de aprofundar a elucidação dos psicodinamismos focais e de dar lugar à produção de intervenções focalizadas, tudo isso possibili tando o progresso terapêutico.
Elementos psicoterapêuticos verbais Generalidades
Em P.B., as intervenções verbais do terapeuta devem reunir três condições básicas: X 1“) Manter certa coerência interna (7) (13). Isso quer dizer que de um ponto de vista dinâmico não é admissível que haja con tradições no emprego das diferentes intervenções do terapeuta, as quais devem responder a uma estratégia terapêutica elaborada de
100
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
que estimulam o intercâmbio verbal têm de ser empregados com uma freqüência maior do que na psicanálise tradicional, a fim de contrabalançar os efeitos da estimulação da dependência que um uso quase exclusivo de interpretações poderia trazer associado. Considera-se desse modo que se deva reafirmar uma relação terapeuta-paciente em termos de realidade e de uma menor assime tria. Por outro lado, apelar com freqüência para intervenções nãointerpretativas constitui uma clara expressão do papel ativo e focalizador do psicoterapeuta nesse tipo de terapia. ^ 3?) Estar focalizadas. As intervenções, interpretativas ou não, deverão estar de preferência focalizadas, quer dizer, dirigidas seletivamente à problemática focal16. Dessa maneira serão tam bém focalizadoras em seus efeitos, já que estimulam a colocação por parte do paciente de material relacionado com o foco. Tratase de uma premissa essencial dessas terapias, mediante a qual se procura centralizar o trabalho terapêutico nos problemas vitais e atuais do paciente e não abrir nele outras brechas, como acontece quando se segue uma direção definida e previamente incluída nu ma estratégia terapêutica determinada. Dentre as diferentes intervenções do terapeuta, me ocuparei detalhadamente das interpretações, mencionando sucintamente as restantes. As interpretações na psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Ainda é objeto de viva discussão tudo o que concerne às interpretações em P.B. Examinarei aqui as contribuições de di versos autores e exporei, além disso, meus pontos de vista a res peito. A apresentação do tema será feita na seguinte ordem:
0 tratamento
101
a) Introduçã o
Em primeiro lugar pode-se colocar a que lugar, em ordem de importância, corresponde a interpretação como instrumento terapêutico na P.B. de orientação psicanalítica. A meu ver deve ser a ferramenta fund am ental, pois o objetivo principal continua sen do a busca de insight no paciente (sem que por isso se desconheça a incidência de outros mecanismos terapêuticos, que em minha opinião têm um papel secundário). Não obstante, caberia insistir em algumas considerações a respeito. Se aceitamos, partindo das idéias de Rogers (40), que toda interpretação, seja ou nào “trans ferencial”, favorece o estabelecimento de uma rel£y;ão acentuadamente dependente do paciente em relação ao terapeuta, parece conveniente que em P.B. as interpretações, sem’deixar de ser, como na psicanálise, o elemento terapêutico essencial, se alter nem em maior medida com outros tipos de intervenção verbal (assinalamentos, perguntas, sugestões, etc.), capazes de relocalizar o paciente uma vez ou outra em sua condição de adulto e nu ma relação menos assimétrica com o terapeuta. Numa palavra, é desejável que o tratamento nãd/se reduza a um empregoExclusi vamente sustentado ou baseado enTInterpretacões. por serem es tas indutorãTdã^dependencia regressiva. Quanto à sua profu ndid ade !7, minha impressão é de que habitualmente é limitada pelas próprias características do enqua dramento. Existem, por exemplo, dificuldades para se exercer controle sobre as ansiedades que o paciente sofre por efeito das interpretações, dado o número relativamente reduzido de sessões semanais e, comumentc, o curto prazo do tratamento. Além dis so, interpretações “profundas” podem, em certas ocasiões, indu zir a estados regressivos de certa consideração; será preciso tam bém contar com a possibilidade de que se produzam reações des favoráveis pelo incremento das resistências. Pois bem, em algu mas oportunidades, um tratamento coloca a necessidade de se atingirem certos níveis de profundidade para que os objetivos terapêuticos propostos possam ser alcançados. E conveniente então avaliar antes a capacidade do paciente para assimilar inter
102
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
O trabalho terapêutico na P.B. de insight é limitado em com paração com o que tem lugar na análise. Poderíamos dizer que o é tanto na superfície (ao ser focalizado) como em profundidade (não abarcando certos aspectos dos conflitos centrais do trata mento, sobretudo os que se acham ligados a conteúdos muito re primidos). Além disso, ignora a maior parte das manifestações inerentes à neurose de transferência, a qual, como sabemos, al cança pouco ou nenhum desenvolvimento no tratamento breve. b) Interpretaçõe s e transferências
Um dos aspectos mais importantes e polêmicos da teoria da técnica da PB. diz respeito aos tipos de interpretação que devem ser utilizados no que se refere à transferência ou, melhor dizendo, às transferências19. Examinaremos, agora, os pormenores do uso das denomina das interpretações “transferenciais” e “extratransferenciais”-,n.
Interpretações "extratransferenciais" Em primeiro lugar, vamos analisar o papel das interpretações “extratransferenciais” na terapêutica breve, as que na técnica psi canalítica não costumam ser levadas muito em conta ou são dire tamente desestimuladas. A meu ver podem configurar sem dúvi da um recurso válido, usual e importante no trabalho interpretativo, e não carecem de valor para o tratamento psicanalítico. Isso obedece ao fato de que, em matéria de terapias breves, devemos nos dedicar à tarefa de resolver problemas atuais da realidade externa do paciente mediante a análise e a conseqüente busca de a respeito da natureza das situações conflitivas que apre
0 tratamento
103
lhes um valor muito secundário na cura, em comparação com as “transferências”. Um claro exemplo disso é a posição adotada por Strachey (41). Entre nós, Guiter, partindo da revisão de pontos essenciais do pensamento freudiano, expõe conceitos que permi tem reivindicar as interpretações “extratransferenciais” em sua significação terapêutica dentro do tratamento psicanalítico (25). Esse autor resgata seus fundamentos teórico-técnicos, o que se reveste de singular importância, já que disso dependerão em gran de parte a validade e o alcance terapêutico que adjudiquemos à técnica breve que apele freqüentemente para as interpretações mencionada». Dos pensamentos de Guiter acerca das interpretações não relacionadas com o analista, tenho selecionado aqueles que me parecem mais eloqüentes e ilustrativos (25). Em que p<|sc sua ex tensão, quero transcrevê-los, pois sua menção resulta‘/mais que oportuna ao abordar este tema: “A análise é uma investigação do inconsciente. Não da trans ferência. nem das recordações, nem de nenhuma circunstância em paiJjcliJã*3*—~ , Depois começa a expor seus pontos de vista cm torno das interpretações que operam “centrando o ponto de urgência fora da transferência ao psicanalista”, as que fazem alusão a “transferên cias” a outras pessoas em relação atual, passada ou futura com o paciente (ainda vou enfatizar - esclarece - as interpretações que se referem à vida atual do paciente, contemporâneas à situação analítica, por serem as mais descuidadas pela psicanálise em seu esquema teórico). Ao dizer isto - continua Guiter vou afastarme da maneira tradicional de trabalhar (talvez melhor do que tra balhar, devesse dizer teorizar acerca de técnica, dado que as necessidades da prática psicoterapêutica obrigam o analista a sair e ampliar sua estreita margem conceituai) de muitos psicanalistas de nosso país, nesse momento (1973) em que trabalham partindo da hipótese de que tudo o que o paciente diz se refere ao analista, e que a meta da análise é a busca do objeto transferido para este em suas múltiplas variantes e em seu interjogo com o analisado. Não estou de acordo com essa maneira de trabalhar. Freud confe ria grande valor à transferência, mas, a meu ver, como elemento incluído dentro de uma totalidade englobada pela reconstrução,
104
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
que inclui também o histórico próximo e distante da vida do paciente. OJ^aqui, agora e comigo” é, para mim, somente uma pade do processo analítica ----------- — “O paciente vem a sessão estimulado pela angústia ocasiona da por um determinado problema com raízes no passado e estimu lado a partir do presente. Esse presente pode estar constituído pelo próprio analista ou por qualquer estímulo do dia ou dias ante riores (equiparando-o a um sonho, o elemento estimulador pode ser comparado a um resíduo diurno).” “(...) De modo que, quando um paciente vem à sessão pode chegar estimulado por excitações que ultrapassam sua capacidade de elaboração (e que traz para elaborar na sessão), e essas excita ções podem então ter-se originado na relação com processos reais ou transferenciais, alheios ao analista. Penso então que a missão do analista é interpretar esses fatos sem incluir-se, pois o nível do conflito nesse momento não se relaciona com cie” (grifos do autor). Continuando, Guiter refuta as críticas que se formulam contra essa modalidade de trabalho (no que concerne ao favorecimento de “atuações”, ao grau de veracidade acerca do que o paciente nos relata ou à circunstância de que se trate de “um fato que já passou”, enquanto “na sessão, a situação é presente”). Por razões de espaço abstenho-me de transcrever a passagem correspondente. Mais adiante expressa: “A transferência pode acontecer em qualquer parte; não é forçoso que seja com o analista. Mais ainda, quanto mais se interprete o paciente em relação ao analista, tanto mais se pode tomar essa técnica como defesa, sem ver as transfe rências em outra parte.” (Assinala antes, que mesmo Freud “inter pretava transferências em outros contextos”.) Prossegue dizendo: “Outro problema que se coloca é este: se tudo o que o paciente diz se relaciona com seu analista, e quase tudo o que ocorre na sessão é transferência, reduz-se ao mínimo a
105
Assim sendo, nós, os analistas, podemos ser paradoxalmente reforçadores de neuroses” (grifos do autor). A clareza expositiva de Guiter me exime de maiores comen tários e, na minha opinião, avaliza com acréscimos o emprego das interpretações “extratransferenciais”. Concordo com o critério de Guiter e entendo que nenhuma terapia interpretativa deva descuidar-se das diferentes transferên cias extraterapêuticas, muito menos reduzir a tarefa à analise da transferência ao terapeuta. Mas, tio terreno de P.B., devemos reconhecer a existência de um inconveniente em nosso trabalho de análise das relações do paciente com os diferentes objetos transferenciais de sua realida de externa: o terapeuta conhece pouco o paciente cif sua relação terapêutica, em virtude do limitado contato que propbrciona o tra tamento. Disso poderiam derivar apreciações e interpretações errôneas da realidade externa do paciente (ainda quando a com preensão da transferência, já evidenciada com o terapeuta, seja de todo o modo um elemento valioso para diagnosticar as caracterís ticas das relações objetais do paciente, do mesmo modo que a compreensão da contratransferêricia, cabe recordar precisamente que, em psicanálise, o conhecimento que o analista adquire no decorrer do tempo sobre as características da transferência desen volvida pelo paciente para com ele, geralmente, lhe resulta de grande ajuda para inferir e interpretar as demais transferências do paciente. Em P.B. devemo-nos desenvolver praticamente sem essa ajuda desde o começo). Mas considero que esse obstáculo pode ser - e é - vencido na maioria das vezes mediante um prévio estu do clínico e psicodiagnóstico o mais amplo possível do paciente, que se impõe em P.B. quase como imprescindível para oferecer sustentação adequada ao nosso trabalho terapêutico posterior. Por outro lado, em função do enquadramento da P.B. e como venho repetindo, os mecanismos terapêuticos não consistem do desenvolvimento e da elaboração da neurose transferencial; o tra balho não tem por que concentrar-se então na análise exaustiva da relação terapêutica poderia propiciar o desenvolvim da
106
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
das circunstâncias que assim o aconselhem e que citarei em se guida. Com o propósito de evitar fenômenos transferenciais inten sos, Pumpian-Mindlin (36) sugere “desviar a transferência”, quer dizer, os problemas a tratar, em direção a uma figura importante para o paciente, em vez de concentrar a atividade na relação paciente-terapeuta. Eu não chamaria a isto “desviar a transferên cia” - em que desviar poderia ser entendido como desviar de maneira forçada , senão melhor, de acordo com o que quase sem pre ocorre na prática, hierarquizar outras transferências preexis tentes do paciente, em função, primeiramente, da real significa ção em sua vida (ou seja, de relações objetais dotadas de um importante montante de libido), e, em segundo lugar, do enqua dramento e das finalidades do procedimento terapêutico breve. Em conseqüência, como numa terapia breve costumam pre dominar as impropriamente chamadas interpretações “extratransferenciais” cm relação às “transferenciais”, a tarefa interpretativa se diferencia claramente da do tratamento psicanalítico, no qual prevalecem as segundas ou pelo menos em que se manifesta uma maior proporção delas com relação às que geralmente averigua mos num tratamento breve (as diferenças se acentuam muito mais na análise kleiniana que na análise que mantém uma modalidade técnica freudiana).
Interpretações “transferenciais" Em P.B. existem critérios díspares quanto ao uso das inter pretações “transferenciais”. Malan assinala que parece haver acordo geral acerca da necessidade de não fomentar o desenvolvi mento da neurose de transferência21. A questão esbarra em como fazê-lo. Ali começam as divergências. Malan não vê nenhum inconveniente em empregar precoce e intensivamente interpreta ções “transferenciais”. Sustenta que os perigos que se corre (de aumentar a dependência, por exemplo) são escassos, que é preci samente através dessas interpretações que se pode resistir ao de senvolvimento de uma neurose transferencial e lhes assinala um
0 tratamento
107
à dependência, propõe suprimi-las por completo (40). Mas talvez a maioria se incline a um uso prudente e limitado (2) (14) (48), pois considera que utilizadas de modo sistemático como em psi canálise podem fomentar a neurose de transferência (7) (14). Compartilho plenamente essa posição. Além disso, entendo que comumente o paciente tarda em aceitar como algo próprio os ele mentos da transferência para o terapeuta, e que não temos tempo suficiente para insistir demasiado neles (não é conveniente fazêlo em P.B. por múltiplas razões), e muito menos para incluir reve lações acerca das raízes genéticas infantis do conflito transferen cial. A fim de resolver problemas vitais atuais que o afetam, o paciente se apresenta para tratar-se só uma ou duas vezes por semana; se apesar de tal situação instarmos para que se concentre em sua relação conosco, poderemos gerar consideráveis resistên cias à tarefa, que reduzirão nossas possibilidades, fuhdadas no insight, de alcançar o êxito terapêutico desejado*2. Por isso creio que devemos nos conformar em prover o paciente de elementos para a conscientização de suas transferên cias para com pessoas significativas, geralmente envolvidas na situação conflitiva em questão, e incluir o vínculo com o terapeuta na maioria dos casos só como uma rieva relação transferencial - e não como o eixo do tratamento - na qual podem, isso sim, aflorar talvez mais seletivamente e apreciar-se com maior clareza as pau tas repetitivas e neuróticas de sua conduta. Assim, sem deixar de “seguir o fio” dos fenômenos transferenciais relacionados àquele a que sua compreensão se refere, o terapeuta geralmente tratará de não estimular com suas intervenções (refiro-me às de qualquer tipo, quer dizer, não só às interpretações, senão também aos assi nalamentos, perguntas, etc.) o surgimento excessivo desse tipo de material. Mas, paralelamente, ocorre o fato incontestável de que se em certos momentos não se apela para a interpretação “transferen cial” poderão aparecer ou acentuar-se diversas dificuldades. Quase sempre trata-se da interpretação da transferência negativa.
108
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Com este último concordam autores como Bellak e Small (2) e Malan (34). Vejamos então quais são as principais situações em que será necessário recorrer às interpretações “transferenciais”: xT a) Quando surgem resistências transferenciais. Tratar-se-á de vencer através da tarefa interpretativa os obstáculos resistenciais provenientes da transferência assim que aparecerem (28)2\ Ausências, atrasos e outras dificuldades do paciente essencial mente para trazer material focal (intervalos de silêncio reiterados, afastamento do foco) quase sempre podem ser interpretados ao menos cm parte com relação a situações transferenciais. A título de ilustração, darei um exemplo6simples: uma mu lher jovem, num momento do tratamento breve, se negava a fala r durante as sessões , durante as quais manifestava uma expressão de nojo para comigo, sem que ela mesma encontrasse motivos ra zoáveis que pudessem justificar tal estado. Ao cabo de algumas sessões, pude apreciar com clareza que repetia em seu vínculo comigo o lipo de relação que mantinha com seu pai, a quem desde tempos atrás não dirigia a palavra. Revelei esta situação transfe rencial à paciente, o que permitiu remover o obstáculo e facilitar o curso posterior do tratamento, ao dissipar de imediato e em gran de parte a resistência surgida, o que se alcançou mediante uma mensagem interpretativa denunciadora do “falso vínculo”, mas que por sua vez desalentava a revivescência de situações infantis na relação com o terapeuta24. ^ b ) Quando podem constituir para o paciente um elemento demonstrativo de determinados aspectos de sua problemática focal. Em qualquer momento, a relação com o terapeuta poderá funcionar como um modelo experimental esclarecedor dos pro blemas do paciente com suas relações interpessoais. Mas será conveniente que a interpretação da transferência se realize em circunstâncias em que o fenômeno transferencial possa ser cla ramente reconhecido pelo paciente. Desse modo, um fragmento de transferência converte-se prontamente em ponto de partida para propiciar insight no paciente acerca dos conflitos com outros seres de sua vida atual - e eventualmente do passado
0 tratamento
109
Recorrerei novamente a um exemplo clínico: Trata-se de uma paciente de 32 anos, de caráter histérico, com marcados tra ços fálicos. A situação conflitiva principal na terapia era a relação intensamente competitiva e sadomasoquista que havia estabeleci do com seu cônjuge: descobri que conseguia com freqüência irri tá-lo até colocá-lo fora de si, provocando nele reações violentas contra ela que chegavam ao ataque físico. A relação ia sofrendo uma progressiva deterioração, motivo principal de sua consulta25. Foi necessário mostrar-lhe através de uma revisão parcial do vín culo transferencial como tratava insistentemente e de modo incons ciente de atacar-me e denegrir-me, sobretudo com comentários hostis acerca dos psiquiatras, provocando assim sentimentos de rejeição, raiva e frustração. (Resultava claro que queria despertar minha raiva até conseguir alterar-me, do mesmo mo<|o que a seu marido. Desejava “triunfar” sobre mim e, procurancfo tomar-me “cego de raiva”, anular-me em minha capacidade terapêutica pen sante. No fundo, sua conduta correspondia uma vez mais a um intenso masoquismo, que a levava a buscar que a maltratassem e também a atentar contra a relação terapêutica.) Com esta inter venção busquei provocar um insight na paciente a respeito do que lhe ocorria com seu marido, partindo da comprovação da situação que experimentava repetitivamenté comigo. Além disso, tratei de chamar sua atenção para o fato de que esses aspectos doentes de sua personalidade conspiravam também na terapia, colocando-a seriamente em perigo. (Poder-se-á notar, neste último exemplo, que na verdade a intenção de relacionar o fenômeno transferen cial com algumas perturbações nas relações interpessoais da rea lidade atual da paciente era acompanhada pela tentativa de dissol ver obstáculos resistenciais, o que é freqüente na prática psicoterapêutica. Também no exemplo anterior, ambos os aspectos coe xistiam em certa medida, mas predominava o objetivo de supera ção das resistências.) Todavia, cabe fazer referência ao uso das interpretações “transferenciais” segundo as fases que o tratamento está atraves sando. Nesse aspecto considero que tanto nas etapas iniciais como nas finais do processo terapêutico costuma produzir-se em geral
110
Psicoterapia bre\>e de orientação psicanalitica
resistências transferenciais dadas pelo natural surgimento de ansiedades paranóides, que se traduz em temores e desconfiança (se estão efetuando então os já conhecidos ajustes à relação de trabalho e fomentando os sentimentos transferenciais positivos) - e nos estágios finais - porque o término da terapia e a eventual separação requerem certo trabalho interpretativo, que contemple, em alguma medida, as situações peculiares de luto que se repro duzem em cada paciente no seio da relação transferenciai. Ainda que no melhor dos casos não seja possível aspirar a níveis muito elevados de elaboração, pelo menos a situação final d? trata mento e de ^eparacão—deverá ser sempre assinalada para o paciente, com o intento de evitar 011 atenuar as reações desfavoráveis que este pudesse apresentar diante de tal situação e de afian çar assim os êxitos terapêuticos obtidos. (Este tema é examinado no capítulo 9.)
c) Variantes qualitativas nas interpretações. Atenuação dos efeitos regressivos Já disse que, a meu ver, o emprego sobretudo fundamenta do - de interpretações “transferenciais” é na psicanálise um fator favorável ao desenvolvimento da neurose transferencial regressi va, pois leva o paciente a concentrar seu interesse no vínculo tera pêutico e o estimula a reviver nele mesmo situações passadas (ainda que em última instância, ao fazer consciente o inconscien te, mostrando-lhe assim a conexão equivocada, serão em grande medida no curso do processo psicanalítico, o instrumento funda mental, por antonomásia, precisamente para a resolução da neuro se de transferência). Partindo dessa postura poder-se-á compreen der a preocupação de alguns autores, e a minha própria, no terreno da P.B., por debilitar seu efeito indutor da regressão. A idéia é não
FAG
0 tratamento
FACULDADE GUAIRACÁ BIBLIOTECA
111
da mensagem interpretativa, já que, como sabemos, o tom de voz, por exemplo, assim como a expressão corporal do terapeuta, ao formular a interpretação, não são indiferentes em sua repercussão no paciente e no que se refere a suas tendências regressivas. Podemos afirmar que, muito pelo contrário, interferem considera velmente. Na realidade, ante qualquer interpretação , transferen cial ou não, esta questão se colocará em maior ou menor medida na P.B.. Disse Weiss: “O uso adequado das interpretações (quanto à escolha, momento e forma de apresentá-las) é o meio mais eficaz de» ci ue dispõe o terapeuta para regular o tipo e a intensidade da relação" (45). (Os grifos são meus.) Trata-se de controlar na medida do possível a intensidade de regressão transferencial. Para tanto é necessário <|ue as interpreta ções possuam certas condições, sobretudo que é'stabeleçam uma ligação de maneira praticamente constante entre o que sucede ao paciente, cm sua relação com o terapeuta, e nas relações daquele com os objetos transferenciais de “fora”. A intenção c incluir sempre a realidade que está mais além do consultório, em direção à qual se há de orientar continuamente o paciente, diminuindo dessa maneira a concentração excessiva de exploração psicológica no vínculo com o terapeuta. Descobrimos que Szpilka e Knobel (42) sugerem algo similar como uma maneira de usar a transfe rência sem os perigos de uma neurose transferencial, isto é: “(...) acompanhar cada interpretação do que ocorre com o terapeuta.de um 'õssinãlaménto doque acontece, al ém disso com seus amigos, parentes ou demãís ohjeim sipnifiçativos de seu mundo externo” (grifos dos autores). ^ Também a Knobel e Szpilka corresponde uma das observa ções mais interessantes e claras que tenho encontrado a propósito do problema que estamos considerando: “Uma boa utilização da transferência nas psicoterapias breves é aquela que permite a alu são ao terapeuta, mas para desfazer em seguida a confusão que surge dessa alusão. Desfazer significa dizer à parte adulta da per sonalidade do paciente que ele se porta com o terapeuta como se este fosse seu pai, sua mãe ou qualquer outro objeto significativo
112
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
trazidos e pelo terapeuta representados. /Entre a emergência do bloco de transferência e sua resolução deve transcorrer por outro lado o menor tempo possível e quase diríamos tão logo venha à tona é necessário desfazê-la” (42). (Grifos dos autores.) Em um traba lho de Córdoba, Andrés Rascovsky e Wencelblat observa-se um nítido paralelismo com essas idéias (3). No meu entender estamos diante de um ponto-chave dentro do trabalho interpretativo. Con sidero que implica que a mensagem, ora manifesta, quer dizer, explicitada na interpretação, ora eventualmente implícita em seu conteúdo, deve ser tal que desalente o prosseguimento da revives cência de situações infantis no seio da relação transferencial, o que significa renunciar a explorar a maior parte do “como se” metafórico da tccnica psicanalítica’\ À importância do conteúdo c da forma de interpretação dever-se-á agregar, reitero, a influên cia de outros fatores, como. por exemplo, o tom de voz emprega do. (O modo como se faz a interpretação, a acentuação que o tera peuta confere a certas palavras ou frases que a integram também podem “convidar” o paciente a estabelecer uma relação regressivo-dependente com o terapeuta ou, pelo contrário, desalentá-la.) Para controlar a regressão, e no que diz respeito às interpre' tações em geral, registramos algumas coincidências relativas à conveniência de que as intervenções do terapeuta incluam sempre dois aspectos opostos e coexistentes do paciente e não apenas um. Por exemplo: o infantil acompanhado do adulto, o agressivo do construtivo (Szpilka e Knobel [42], Fiorini [ 13])27. Trata-se de não polarizar na direção que fomente a regressão, a dependência e a insegurança, e ao mesmo tempo de chamar a atenção do paciente para seus aspectos adultos ou mais bem integrados e para suas possibilidades evolutivas e autônomas. O outro recurso a ser considerado para se evitar que o pacien te estabeleça uma relação excessivamente regressivo-dependente é apresentar as interpretações sob a forma de perguntas ou suges
0 tratamento
113
eventual inclusão nas interpretações que se formulam para o paciente é um ponto que cm parte já foi tratado na “Introdução” (pp. 101 s.), a propósito da profundidade das interpretações em P.B., pelo que lhe cabem as considerações ali expostas2*. Não obs tante, queria insistir em alguns aspectos fundamentais c particula rizar outros a fim de aprofundar a visão do tema. Diante dc tudo isso, não devemos deixar dc reconhecer que colocar ênfase excessiva nos aspectos infantis do paciente pode promover ã regressão. Por isso, uma posição extrema consistiria em evitar tflda incursão por esses níveis do conflito. Não compar tilho desse critério, por mais que nos tratamentos breves pareça aconselhável abster-se de interpretar em primeira instância e de maneira sistemática tais aspectos, c partir em troca cia referência aos fatores atuais em jogo. (Em P.B., por conseguinte, diferentemente do que ocorre no tratamento psicanalítico, nâo haveria uina intenção prioritária de se remeter às experiências prematuras da vida do paciente.) Mas o certo é que na prática apresentam-se situações em que selem a impressão, a priori ou no curso de um tratamento breve, dc que. enquanto não se incorporarem às inter pretações elementos do passado infantil - os quais certamente sempre se levam em conta para compreender o conflito poderá produzir-se um estancamento no processo 3e conscientização e mudança do paciente. Em tais circunstâncias, o terapeuta podérâ estimar que é necessário efetuar uma revisão e um trabalho interpretativo mais profundo das perturbações do paciente. Reconhecida a necessidade de que a tarefa ínterpretativa abarque conflitos genéricos infantis, estudaremos em cada caso a possibilidade de colocar isso em prática, com probabilidades de que seja terapeuticamcnte eficaz. Convirá tomar algumas precau ções (sobretudo se se trata de interpretar a transferência para com o terapeuta), as quais, reiterando o já assinalado em outras oportu nidades, serão as seguintes: 1. Que o paciente demonstre estar capacitado para receber e aproveitar essas interpretações sem experimentar reações desfa voráveis (isto significa em essência respeitar o timing). V 2. Que condições d uad principalmen
114
Psicolerapia breve de orientação psicanalítica
X 3. Que os componentes histórico-genéticos a incluir nas in terpretações sejam pertinentes à estrutura focal®. A isto terá de se agregar que: )*■4. Poder-se-á trabalhar um conflito infantil derivado (por exemplo, com relação a um(a) irmão(ã)30, mas o terapeuta não deve ter por aspiração principal eliminar a amnésia infantil (Devald [5]), ainda que, quando se considere necessário fazê-lo, tenha de fazer alusão de maneira direta a componentes do conflito original. Neste último caso, realizo um trabalho interpretativo sempre parcial, limitado ao que é imediatamente relacionado à situação-problema, ou seja, ao necessário para obter certa mobili zação e progresso no paciente, descartando outros aspectos do conflito, pois não é possível abarcá-lo em sua totalidade e propen der para a sua elaboração, carecendo de sentido “abrir feridas” nas defesas. Assim, dificilmente uma terapia breve chega a con frontar o paciente com seu conflito edípico, mostrando-lhe direta mente, por exemplo, o significado incestuoso ou parricida de suas fantasias11. K5. O modo de formular as interpretações tenderá a facilitar que o paciente, mais do que tudo, compreenda os determinantes históricos do conflito atual, cm vez de fazê-lo reviver emocional mente os conflitos infantis no seio da relação transferencial. Este ponto corresponde ao critério sustentado por Szpilka e Knobcl, no sentido de que o insight em P.B. tem de ter “maior participação cognitiva que afetiva” (42). A propósito deste aspecto da técnica, têm dito esses autores: “Devemos reconhecer que isto, para al guns indivíduos, pode servir perfeitamente para mobilizar situa ções internas, para as quais ainda não temos métodos de avaliação e que podem ser úteis para alcançar uma adaptação produtiva à ^realidade” (42). Como corolário da revisão das distintas modificações e agre gados realizáveis nas interpretações, podemos afirmar: de acordo com a conformação da interpretação e a modalidade que assume
115 d) Interpretação dos sonhos
Em P.B. não há tampouco uma unidade de critério com res peito a se devem ou não ser formuladas interpretações acerca do material onírico dos pacientes. A interpretação dos sonhos, praticada do mesmo modo que na psicanálise, conteria um risco básico, em função da possibili dade de estimular excessivamente a produção de fenômenos re gressivos no paciente. Apesar disso, crçio que não convem rejei tar de imediato um material tão apropriado, já que a interpretação onírica é “a via régia para o conhecimento do inconsciente” (Freud [20]) c por conseguinte constitui uma ajuda valiosíssima para detectar o ponto de urgência. Mas uma vezf mais certos cui dados terão de ser tomados para tratar de conttolar a regressão que poderá ser gerada. Como responder a este problema técnico? Creio que diante dos sonhos o terapeuta deve assumir a mesma atitude que ante qualquer outro produto da atividade psíquica (atos falhos, fantasias, etc.), quer dizer, interpretar na medida em que o considere útil, ainda que tendo presente quando, o que e como interpretar. Mas vejamos a que me refiro com o que acabo de mencionar.
Quando interpretar A interpretação dos sonhos deverá reger-se pelos mesmos princípios gerais que presidem toda interpretação em P.B., ou seja, se considerará o material onírico interpotável sobremdo desde seu conteúdo' manifesto e por sua relação com o contexto, sugerem apriori sua vinculaçào com o foco. (De qualquer manei ra, não vejo nenhum inconveniente em tentar, no geral, certa aná lise dos sonhos trazidos pelo paciente. Do que surgir da análise se verá se a formulação de interpretações é indicada ou se pelo çarb>
116
Psicoterapia breve de orientaçào psicanalitica
derive na formulação de uma interpretação, a análise do sonho, embora limitada em seu alcance, constitui - assim como acontece por exemplo com os fenômenos transferenciais em geral um recurso de apreciável utilidade para enriquecer nossa compreen são dinâmica do paciente.)
Oqueinterpretar Desde logo será preciso hierarquizar aqueles aspectos do sonho inerentes ao focal-atual, o que implicft conduzir uma vez mais o paciente ao contato com o conflito central do tratamento, e recolocá-lo assim na realidade de sua vida cotidiana, reduzindo ao mínimo a indução de fenômenos regressivos. Geralmente deve-se evitar referir as interpretações a desejos infantis inconscientes, remetendo-nos em troca só às idéias latentes pré-conscientes. Por outro lado, sempre dentro do que se refere ao conflito a resolver, devem-se interpretar-se mais que tudo aqueles conteúdos que parecem mais claros para o paciente, pois a limitação de tempo permite introduzi-lo só até certo ponto nos significados dos mecanismos oníricos (Hoch [28]). Como interpretar
Consideraremos duas questões: uma referente ao método de análise dos sonhos e outra ao conteúdo das interpretações formu ladas para o paciente. Os recursos para analisar os sonhos são em essência os da psicanálise, incluindo o auxílio oferecido pelas associações livres do paciente, a quem se podem pedir associações a partir dos dife rentes elementos, tal como se faz na técnica psicanalitica. A tarefa interpretativa se efetuará segundo as normas já assi naladas para a interpretação na PB. psicanaliticamente orientada, | especialmente no que concerne à focalização e à transferência.
117
sos erros gerados pela transposição de elementos técnicos da psi canálise sem nenhuma modificação à técnica breve. Entre eles encontramos muito correntemente o abuso da referência a situa ções transferenciais. Recordo com relação a isto um acertado comentário: “Ocorre-me que toda terapia breve apela para a mais primorosa sensibilidade do terapeuta, ao mesmo tempo em que significa justamente cavalgar permanentemente entre a transfe rência e extratransferência.” Fiorini apontou do mesmo modo a necessidade de que o terapeuta se autocontrole na utilização das interpretações “transferenciais” (14). Certas dificuldades próprias do terapeuta determinam que este, além de empregar reiterada e excessivamente interpretações da transferência, com os perigos decorrentes, hão resista a seus efeitos regressivos. (Os motivos subjacentes a esta atitude do tera peuta serão considerados no capítulo 8.) Ou tras intervenções verbais
Além das interpretações, o terapeuta conta com diversos ins trumentos na psicologia verbal. Dentre os mais relevantes, pode mos citar: 1. Os assinalamentos, instrumento terapêutico necessário em toda terapia de insight para facilitar o trabalho interpretativo. % 2. As perguntas. Cabem não só na etapa diagnostica, mas também durante o tratamento propriamente dito, a fim de se obte rem diversos e necessários dados acerca do paciente sobre o anda mento. Também nesse ponto pode-se apreciar o papel ativo que desempenha o terapeuta. Em outro contexto, as perguntas revelam um terapeuta não-onipotente e interessado no paciente (16). ^ 3. O fornecimento de informações. Em certas ocasiões pode ser benéfico oferecer informações ao paciente acerca de certos temas, tais como os vinculados à sexualidade. ^ 4. As sugestões. São de diversas tendências. Exemplo: desde Freud, leva-se em conta a possibilidade de estimular o paciente
1JS
Psicolerapia breve de orientação psicanalítica
“é 5. Os comentários. Realizam-se essencialmente com o pro pósito de fomentar o intercâmbio verbal. £ 6. As intervenções de reasseguramento ou de reforço. Já fiz alusão às mesmas ao referir-me ao tema “Fortalecimento e ativa ção das funções egóicas” no capítulo 3, pp. 34 ss. â 7. As indicações. Exemplo: a prescrição de uma psicodroga. ^ 8. Os conselhos. De uso muito esporádico, exceto quando se trata de apoio emocional. t
Sobre as sessões Em primeiro lugar referir-me-ei à freqüência das sessões. Em geral é conveniente adequar-se às necessidades de cada caso particular. Sem dúvida posso dizer que, na maioria dos casos, duas sessões semanais é um número apropriado para uma psicoterapia breve de insight , uma vez que possibilita uma tarefa de certo aprofundamento e restringe as perspectivas de regressão e depen dência que poderiam ser incrementadas com um maior número de sessões. Em certas ocasiões, pode bastar uma sessão por semana. Além disso, para facilitar a separação ao terminar o trata mento, às vezes pode ser útil ir reduzindo gradualmente a fre qüência das sessões (sempre que o estado do paciente o permita). Uma maior freqüência pode ser conveniente, ao menos no começo, em casos tais, como: X a) Situações de crises muito intensas , que transcorrem com grande angústia, depressão, excitação psicomotríz, etc.; em de pressões intensas e agudas, por exemplo, com grande necessida de dc provimentos narcísicos, dada a diminuição da auto-estima. Tentar-se-á assim alcançar um rápido alívio sintomático, que es timule por sua vez a. confiança do paciente em suas possibilida des de melhoria (a posteriori poder-se-á reduzir o número de ses sões). ^ b) Pacientes com marcadas tendências ao acting out. Para
119
0 tratamento
as fantasias transferenciais que possam estar presentes (mais co mentários sobre esse ponto poderão ser achados no capítulo 10). Quanto à duração das sessões, supõe-se que também pode variar dc acordo com as circunstâncias. Pessoalmente penso que uma duração de 40 minutos por sessão resulta adequada, já que geralmente basta para efetuar uma tarefa proveitosa. À medida que a sessão se estende por mais tempo, aumentam as possibili dades de fadiga do terapeuta (não esqueçamos que em P.B. se trabalha comumente frente a IVentc. exercendo o profissional um papel ativo e buscando obter determinados resultados em um prazo limitado, para o que deve agilizar o processo terapêutico, geralmente o que implica na realização de um esforço significa tivo). F "
Outros recursos terapêuticos Em muitas ocasiões resulta benéfico agregar outros instru mentos terapêuticos à psicoterapia individual verbal e breve. É sobretudo no âmbito institucional que ocorrem as oportunidades mais promissoras para efetuar tratamentos combinando instru mentos terapêuticos que incluem eventualmente uma tarefa em equipe com outros profissionais da saúde mental, o que pode ser altamente positivo. Supostamente, quando se apela para outros elementos, o ponto de partida deve ser sempre uma fundamenta ção psicodinâmica acerca de sua incorporação ao tratamento e dos efeitos esperados com ela. Um dos tantos propósitos válidos e usuais na aplicação de diversos recursos em P.B. é o de procurar agilizar o processo tera pêutico. As alternativas com que contamos no momento sâo realmen te numerosas: psicodrogas, intervenção de familiares e/ou pes
120
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
eles: o emprego de psicofármacos e a participação de familiares e/ou figuras próximas do paciente em tratamento. O emprego de psicofárm acos
A combinação de psicoterapia com psicodrogas pode ser muito útil em diversas circunstâncias, sempre que se tenham pre sentes certas precauções. Não insistirei nas reconhecidas vanta gens provenientes dos efeitos da medicação (alívio sintomático; melhoria na comunicação, permitindo o acesso à psicoterapia de pacientes que de outro modo seriam muito difíceis de tratar; facilitaçào do insight , etc.). Em troca, especificarei alguns aspectos de sua aplicação, assim como certas dificuldades que podem sur gir se os psicofármacos não forem manejados adequadamente. Em primeiro lugar, opino que a medicação deve ser forneci da na medida do possível pelo mesmo terapeuta encarregado da psicoterapia (sempre e quando, é claro, se trate de um profissional capacitado para o manejo dos psicofármacos). Sem dúvida é ele quem, conhecendo o paciente melhor que seus colegas, parece o mais indicado para poder realizar uma escolha adequada do medi camento, graduar a dose, controlar seus efeitos e ir efetuando as modificações que julgar convenientes, sem que se necessite da participação dc um terceiro. Em segundo lugar, e particularmente naquelas ocasiões em que se efetua uma terapia breve de insight, deverá evitar-se um emprego indiscriminado e rotineiro de medicações, já que isto pode conduzir o paciente a escamotear seus conflitos, anulando-o em suas possibilidades de esclarecê-los e de encontrar uma solu ção mais satisfatória para eles. Ministrar-se-á medicação só na quelas situações em que seu uso seja requerido como coadjuvante da psicoterapia e durante o tempo que se considere estritamente
0 tratamento
121
fármacos (35), posição com a qual concordo e segundo a qual costumo explicar ao paciente, por exemplo, que a medicação é destinada a tornar possível (ou facilitar) sua comunicação comi go, no caso em que esta esteja muito difícil. Também é convenien te esclarecer os objetivos do uso das psicodrogas associadas à P.B. quando se tenha um alívio sintomático, explicando o caráter pa liativo de sua administração. Dever-se-á insistir junto ao paciente que ele deve aspirar a algo mais, isto é, à compreensão c à resolu ção do conflito por meio da psicoterapia. Com essas explicações tende-se a evitar a eventual interferência do efeito da medicação no pfocesso psicoterapêutico (o alívio fácil, sem os esforços e a participação ativa que a psicoterapia supõe), ou seja, a procurar que a melhoria sintomática não seja acompanhada de uma desva lorização da psicoterapia ou, diretamente, da f>erda de interesse pela mesma. Para esclarecer a questão aos pacientes, costumo recorrer a exemplos simples: freqüentemente refiro-me ao que ocorre quan do a uma pessoa se ministra um analgésico (droga) para acalmar uma dor de dente (representante do sintoma psíquico). A dor pode ceder, mas passado o efeito da medicação, e se não se recorre novamente a ela, ela voltará, pois sua origem, por exemplo, é uma cárie (assimilável ao conflito psíquico), que é a que no fimdo deve ser tratada/Em síntese, se não tentamos “curar” a infecção “pela raiz” por meio da psicoterapia, ela persistirá/ A participação d e familiares e/ou pessoas próximas do paciente no tratamento
Freqüentemente é necessário incluir no processo terapêutico breve pessoas vinculadas ao paciente, o que poderá acontecer ou na fase diagnóstico-prognóstica ou na busca de objetivos comuns, na terapêutica e/ou na avaliação de resultados. As metas que mais comumente se buscam com essa conduta são: 1. Obter informações. Resulta em geral sumamente benéfico ter a oportunidade de entrevistar familiares e/ou pessoas próxi
lzz_
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
e/ou da família, determinar o papel que nela ocupa o paciente, so bretudo quando a problemática está principalmente relacionada com seu meio familiar, partindo da concepção de que aquele é, na realidade, o emergente de um grupo enfermo. £ 2. Informar sobre o estado do paciente para conseguir que seus familiares ou as pessoas próximas assumam a responsabili dade do tratamento nos casos em que isso seja necessário. 3. Atuar terapeuticamente sobre o meio que rodeia o enfer mo. Isto poderá realizar-se através de entrevistas jie orientação c além disso, se for preciso, dc uma psicoterapia a cargo do mesmo terapeuta que efetua o tratamento do paciente, ou de outro, com ou sem a inclusão do paciente no tratamento grupai, tudo isso de acordo com os critérios predominantes em cada caso. Hm algu mas ocasiões, a indicação poderá ser uma psicoterapia breve ex clusivamente grupai (casal, família) desde o começo. Quisera efetuar agora algumas considerações acerca da P.B. de pacientes adolescentes no que diz respeito ao papel dos pais. Tem-se enfatizado, na P.B. de adolescentes, a necessidade de incluir os pais no tratamento, já que se acham profundamente im plicados na crise do filho (31). E não poderia ser de outra maneira quando se trata de buscar modificações em um prazo geralmente limitado, paia o que resulta até imperioso trabalhar sobre os pro genitores e ter constantemente presente a unidade grupai de pato logia. Atualmente, o tratamento pode ser concebido, já não como uma psicoterapia do adolescente, senão do grupo familiar, fato que deverá configurar a regra e não a exceção na P.B. de adoles centes. A participação dos pais (ou tutores) do adolescente no pro cesso terapêutico deverá estender-se desde o início até o final do mesmo. Além dos fins anteriormente mencionados, pelos quais se dá espaço a familiares e/ou pessoas próximas do paciente no tratamento, apresenta-se especialmente aqui a necessidade de fazer intervirem os pais em função dc outros fins que se acrescen
123
> a) Os pais, por serem responsáveis pela terapia, e por ter sido requerida sua colaboração, necessitam ter uma noçào real do esta do de saúde do filho e de suas perspectivas prognosticas. Quando não recebem informações, ficam mais facilmente sujeitos a suas próprias fantasias acerca da enfermidade de que o filho padece, o que pode produzir efeitos perturbadores de natureza diversa, seja considerando-a mais grave do que o é na realidade seja pelo con trário diminuindo sua importância. / b) É imprescindível combinar, junto com o adolescente e seus pais,*os objetivos terapêuticos e o contrato. No que concerne especificamente aos objetivos, a situação mais desejável para enfrentar nosso trabalho terapêutico consistirá em alcançar um acordo unânime acerca dos mesmos, quer dizer, efitre paciente, pais e terapeuta. Mas com freqüência as coisas nãó' são tão sim ples. Os pais costumam chegar à consulta com determinadas ex pectativas e intenções a respeito do tratamento do filho, que não coincidem com as do paciente e/ou as do terapeuta. Não é possí vel passar por alto desacordos ou mal-entendidos de início e dei xá-los à mercê, por exemplo, da ação retificadora que sobre os pais - no caso em que sejam cltís os que interferem inicialmente em nossas finalidades terapêuticas - poderia mais adiante exercer a psicoterapia do grupo familiar a ser efetuada, ainda admitindo que depende substancialmente desta que eles aceitem as modifi cações que possam produzir-sc na dinâmica familiar. Uma míni ma concordância inicial acerca dos objetivos terapêuticos consti tui um requisito fundamental porque permite começar a tarefa em melhores condições, e que os pais, ante as possíveis mudanças que o filho experimente, não se sintam inteiramente tomados de surpresa ou “atraiçoados” com relação ao planejamento previsto no começo do tratamento a respeito dos fins deste. Trataremos então de que colaborem desde o princípio e de ir preparando-os para que aceitem essas mudanças, objetivo que será facilitado por meio da psicoterapia familiar que virá em continuação. Caso con
124
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
sos do paciente ou, o que é muito comum, que retirem diretamen te o filho do tratamento. Por outro lado, é indubitável que os pais têm direito a um esclarecimento sobre o sentido e o alcance do tratamento que o filho venha a empreender. No caso de se apresentarem dificuldades para chegar a um acordo inicial sobre os objetivos, será de utilidade efetuar, logo após obtido um diagnóstico psicodinâmico do grupo familiar e da situação-problema, entrevistas operativas (44) especialmente destinadas a este fim, as quais poderiam ser conjuntas (29) com os pais e o adolescente ou realizar-se em separado. Essas entre vistas adquirem na realidade grande valor terapêutico, pois nelas devem-se encarar já alguns problemas cruciais da conflitiva famjliar. título de exemplo do exposto até aqui, descreverei uma sií \ tuaçao -A muito freqüente na psicoterapia de adolescentes: a do jovem que tem uma atitude de rebeldia em relação aos pais. Antes de tudo, devemos fazer compreender a estes pais que nossa finali dade terapêutica não consiste simplesmente em converter o pa ciente, de repente, num filho submisso e obediente, mas em tratar / de entender juntos a problemática familiar global que pode estar originando sua rebeldia e o significado profundo da mesma como expressão da crise adolescente e da conseqüente crise deles mes mos. Procurar-se-á que os pais cheguem a reconhecer que tam bém eles estão imersos no problema e que, para obterem certas mudanças em sua relação com o paciente, será preciso que se comprometam firmemente no esforço terapêutico, pois será ne cessário revisar o que acontece não só com o paciente, mas tam bém com eles. y c) Tampouco, os pais devem ficar excluídos da avaliação dos resultados obtidos33. Apelando uma vez mais para entrevistas con juntas ou em separado, solicitar-se-á que tragam suas impressões sobre o estado atual do paciente, o deles mesmos (quando tenham sido tratados) e sobre o tratamento, sendo também eles objeto de
125
0 tratamento Refe rência s bib liográficas
1. Alexander, F. e French, T., Terapêuticapsicoanalitica, Paidós, Bue nos Aires. 1965. 2. Bellak, L. e Small, L., Psicoterapia breve y de emergencia, Pax-México, México, 1969. 3. Córdoba, L., Rascovsky, A. e Wcncelblat, J. C., “Psicoterapia breve en adolescentes”, em Cuadernos de la SAPPIA, n° 2, Psicoanálisis y psicoterapia breve en ninos y adolescentes, Kargieman, Buenos .Aires, 1971. 4. Deutsch, F., Applied Psychoanalysis: Selected Lectures on Psycho therapy, Grune and Stratton, Nova York, 1949. Citado por L. Small Psicoterapias breves, Granica, Buenos Aires, *972. 5. Dewald, P., Psychotherapy: a Dynamic Appm ach, Basic Book, No va York, 1964. (Versão castelhana: Psicoterapia: un enfoque dinâ mico, Toray, Barcelona, 1972.) 6. Fcrenczi, S., Citado por D. H. Malan, A Study o f Brief Psychothe rapy, Tavistock, Londres, Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de Ame rica Latina, Buenos Aires, 1974.) 7. Fiorini, H. J., “Delimit^eión técnica de psicoterapias”, em H. J. Fiorini, Teoria y técnica de psicoterapias, Nueva Vision, Buenos Ai res, 1973,cap. 3. 8 . , “El concepto de foco”, em H. J. Fiorini, ob. cit. em 7, cap. 6. 9 . , “El papel de la acción en las psicoterapias”, em H. J. Fiorini, ob. cit. em 7, cap. 12. 10 . , “Estratcgias y articulation de recursos terapêuticos”, em H. J. Fiorini, ob. cit. em 7, cap. 13. 11 . , “La primera entrevista en psicoterapia breve”, em H. J. Fiorini. ob. cit. em 7, cap. 4. 12 . , “La relation de trabajo”, em H. J. Fiorini, ob. cit. cm 7, cap. 7. 13 . , “Problemática actual de las psicoterapias breves”, em W. R. Grimson, (compil.), Naevus perspectivas en salud mental , Nueva Vision, Buenos Aires, 1973. 14 “Psicoterapia dinâmica b Aportes para teoria de la téc
126
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalílica
17. Freud. S., “Consejos al médico en el tratamiento psicoanalítico”, em S. Freud, Ö.C., Biblioteca Nueva, Madri, 1948,1.11. 18 . , “La dinâmica de la transferencia”, em S. Freud, ob. cit. em 17, 1.11. 19 . , “La iniciación dei tratamiento”, cm S. Freud, ob. cit. cm 17, t. 11. 20 . , “La interpretación de los suenos”, em S. Freud, ob. cit. em 17, t.I. 21 . , “Los caminos de la terapia psicoanalitica’*’, em S. Freud, ob. cit. em 17,t. II. 22. Fromm-Rcichmann, F., Psychoanalysis and Psychotherapy: Selec ted Papers of Frieda Frornm-Reichmann, University Press of Chi cago, Chicago, 1959. Citada por R. S. Wallerstein, Las nuevas direcciones de la psicoterapia, Paidós, Buenos Aires, 1972. 23. Gcrard. M., “Morigeración de las normas rígidas”, cm F. Alexander e T. French, ob. cit. em 1, cap XIII. 24. Gillman, R., “Brief Psychotherapy: a Psychoanalytic View”, Ame rican J. Psychiat., 122,601, 1965. Citado por L. Small, ob. cit. cm 4. 25. Guitcr, M., “Problemas de técnica psicoanalitica”, Rev. Arg. de PsicoL, ano IV, n.° 15. Nucva Vision, Buenos Aires, junho de 1973. 26. Haley, J., “Estratégia del psicoanálisis y otras psicoterapias profun das'’, em J. Haley, Estratégias en psicoterapia, Toray, Barcelona, 1966, cap TV. 27 . , “Técnicas de psicoterapia directiva”, em J. Haley, ob. cit. cm 26, cap. III. 28. Hoch. P., “Psicoterapia breve frenie a psicoterapia prolongada”, cm L. Wolberg e col., Psicoterapia breve, Gredos, Madrid, 1968, cap. III. 29. Kaplan, A., “Entrevistas conjuntas de padres como parâmetro cn el psicoanálisis dc los adolescentes”, ob. cit. em 3. 30. Knobel, M., “Psicofarmaeologia cn ninõs y adolescentes”, en Orien tation Médica, nr 871, Buenos Aires, setembro de 1969 (ler. Congreso Arg. dc Psicopatología Infanto-Juvenil).
0 tratamento
127
34. Malan, D. H., ob. cit. em 6. 35. Picdimonte, R. C., “Problemas técnicos cn la psicoterapia de los pa cientes medicados”. Clase dei curso: Psicqfàrmacologiay psicotera pia , organizado por medicados”. Clase dei curso: Psicofarmacologia v psicoterapia, organizado por la Soc. Arg. de Psicologia Médica, Psicoanálisis y Medicina Psicosomática (Asoc. Méd. Arg.), Buenos Aires, maio de 1972. 36. Pumpian-Mindlin, E., “Considerations in the Selction of Patients for Short-Term Therapy”, Amer. J. Psychother ., 7, 641, 1953, citado por D*H. Malan, ob. cit. em 6. 37. Racker, H., “Consideraciones sobre la teoria de la transferencia”, em H. Racker, Estmlios sobre técnica psicoanalitica, Paidós, Buenos Aires, 1969, Estudio 111. 38 . , “Sobre técnica clásica y técnicas actuales dsl psicoanálisis”, em H. Racker. ob. cit. em 37, Estudio II. 39. Rado, S., “Relation entre la psicoterapia breve y las fases de los proccsos de maduración y de conducta clínica”, em L. Wolberg, e col., ob. cit. em 28, cap. IV. 40. Rogers, C. R., citado por D. H. Malan, ob. cit. cm 6. 41. Strachey, J., “Naturaleza de la acción terapêutica dei psicoanálisis”. Apostila da Asoc. Psicoa. Arg., traduzido de The International Jour nal o f Psychoanalysis, vol. XV, 1934. 42. Szpilka, J. e Knobel. M. “Acerca de la psicoterapia breve”, Coloquio Acta 1967: psicoterapia breve, acta psiq. psicol. Amèr. Lat., junho de 1968, vol. XIV, n" 2, Buenos Aires. 43. Tarachow, S., Introduction a la psicoterapia, Centro Editor de Amé rica Latina, Buenos Aires, 1969. 44. Ulloa, F., “A entrevista operativa”, Apostila da Facultad de Filoso fia y Letras, U. B. A., Buenos Aires, 1964. 45. Wciss, E., “Manejo de la relación transferencial”, cm “El principio de la flcxibilidad”, em F. Alexander e T. French, ob. cit. em 1, cap. III. 46. Wolberg, A., “Contribution de la asistencia social individual a la psicoterapia breve”, em L. Wolberg e col., ob. cit. em 28, cap. XI. 47. Wolberg, L., “La hipnosis en la terapêutica breve”, cm L. Wolberg e col., ob. cit. em 28, cap. IX. 48 . , “La técnica de la psicoterapia breve”, em L. Wolberg e col., ob. cit. em 28, cap. VI. 49. Zysman, S., “Aspectos de las psicoterapias de objetivos limitados en ninos”, ob. cit. em 3.
7. Umasessã odepsicoterapiabreve
j
Apresentarei aqui o material de uma sessão cie psicoterapia focal, que espero possa ser útil para ilustrar aspectos inerentes à relação paciente-terapeuta, às intervenções do terapeuta, à tarefa de focalizaçào e a outros temas de interesse. Antes de mais nada, e para permitir uma melhor compreensão do que aconteceu na ses são, exporei os dados principais da história clinica e um esboço da estrutura focal da maneira como/o i concebida inicialmente1. A paciente, a quem chamarei Rita, é uma jovem que na época da consulta tinha 23 anos. Estava casada há 14 meses, trabalhava como empregada numa oficina e pertencia à classe média baixa. Tinha completado o curso secundário (efetuou algumas matérias no curso de psicologia, mas abandonou-o logo em seguida). Veio à consulta apresentando uma gravidez - cujo diagnósti co foi confirmado - de aproximadamente 50 dias, e por não poder tQmar uma decisão diante da mesma, isto é, prosseguir com a gra videz ou submeter-se a um aborto. A princípio queria ajuda para compreender melhor suas qualidades a esse respeito e em conse qüência tomar uma resolução. Consultou-me às escondidas de seu marido, de 27 anos, tam
130
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
A gravidez não foi planejada conscientemente pelo casal. Haviam começado a manter relações sexuais antes do casa mento. As mesmas eram pouco satisfatórias, seja porque eram vividas por ambos com muita culpa (em Rita, chocavam-se com seu desejo de chegar virgem ao casamento, simbolizado pelo “casar-se de branco”), seja porque eram constantemente acompa nhadas pelo medo de uma gravidez. Até esse momento não ha viam empregado nenhum método anticonceptivo, a não ser o coitus interruptus, assim mesmo em poucas ocasiões. A paciente não encontrava explicações razoáveis para esse descuido, alegando apenas que assim “era mais cômodo”, que não tinha interesse em submeter-se aos procedimentos habituais de contracepção e que ultimamente, ao verificar que não ficava grávida, havia se desin teressado do assunto. Na realidade, há dois anos ficara grávida ç de comum acordo com seu atual marido praticara um aborto. Para tanto, submeteu-se a uma anestesia geral e, segundo lhe contaram, enquanto voltava a si, chorara muito, gritando, de vez em quando, angustiadamente: “tiraram ele de mim!”. A partir do aborto foi sobretudo seu marido quem pareceu ficar preocupado. Temia que tivessem produzido lesões importan tes nos genitais da paciente, que ocasionassem sua esterilidade. Mas, uma vez passado o momento crítico, quase não voltaram a falar no assunto. Ainda que Rita insistisse na dúvida acerca do que queria com relação à gravidez, por momentos parecia inclinar-se ao aborto. Alegava, antes de mais nada, razões econômicas, mas dizia tam bém que se sentia insegura de si mesma e incapacitada para ter um filho. Seu marido adotava uma posição oposta, mostrando-se muito entusiasmado com a idéia de ser pai e confiava em que iriam poder superar os diversos inconvenientes que se apresentas sem. A jovem temia em conseqüência que um aborto afetasse a relação do casal, já que seu marido desejava um filho, enquanto, dizia ela, “deve ser feio tê-lo sem sentir muito desejo”. Um dia, antes de vir à primeira entrevista em meu consultório, havia esta do a ponto de visitar um médico residente para praticar o aborto,
Uma sessão de psicoterapia breve
131
Dosjmtecedentes familiares importa assinalar que a paciente cra proveniente de uma família de educacão e costumes tradicio nais. com os conhecidos tabus sexuaisA relaçào com seus pais era de marcada dependência. Vi sitava-os diariamente com seu marido “para bater papo e jantar”. A mãe. segundo ela, era uma pessoa muito severa e domina dora. Qualificou-a também de “muito nervosa”, com reações anormais de violência, que experimentava ocasionalmente. (“É como se ela não hesitasse em matar alguém nesse momento. Logo sejirrepende, se domina...”) Teve dois 'abortos, um antes e outro depois do nascimento de Rita. Segundo a descrição da paciente, o pai impressionava por ser uma pessoa muito controlada ein seus afetos: FEu sempre digo que é muito diplomático. Nunca se pode saber olque está sentindo c nunca discute com ninguém.” Padecia de hipertensão arterial. Sua relação com ele - disse - era^cordial”. T inha um irmao. cinco anos mais velho que ela. casado, com uma filha de 4 anos, que após ter vivido um tempo separado dos pais voltara à casa paterna acompanhado da esposa e. filha. Segundo Rita, não podia “separar-se deles”i /"NTlido o que foi mencionado, além de muitos outros indícios, } fazia supor que o grupo familiar correspondia ao tipo dos çj^omij \ nados aglutinados (F. e L. Bleger [2]). Sobressaíam as característi cas matriarcais, ante as quais, todavia, a paciente se encontrava em plena luta para alcançar sua individualização. (“Não vivemos ali porque não dormimos. Mas é só o que falta”, dizia com ironia.) A família de Rita se opusera tenazmente a seu casamento, e só ultimamente parecia dar mostras de começar a aceitar ou tole rar seu marido. Diante da notícia da gravidez, o irmão reagiu com aparente indiferença; cm troca, o pai adotou uma atitude de franco desagrado, que tratou de explicar à jovem com argumentos, como: “A mulher não deveria sofrer na gravidez, como sofreu sua
132
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Logo lhe levaram a notícia da confirmação da gravidez, à qual, a princípio, não deu crédito. Em seguida pareceu emocionar-se e começou a chorar. “Mas não sei até que ponto se alegrou - co mentou Rita - porque depois me disse que tomasse algo para tirálo. Não, você acha? respondi. ‘Olha que é muito cedo para você perder tempo com uma criança’, me disse ela”. Cabe dizer, também, que os pais ^do marido, que era. ÜJUxo único, se alegraram muitíssimo com a novidade. Dos antecedentes pessoais de Rita, assinalarei alguns dados •' significativos: ela acreditava ter sido produto de uma gravidez não desejada por seus pais ( já em sua primeira gestação, a mãe havia sofrido diversas moléstias, o que supostamente levou o casal a não desejar outra gravidez). Por outro lado seu. pai preferia. Ujnjnenino. Interessa em especial destacar que a inãe de Rita, estando grávida de três meses, teve de se submeter a uma inter venção cirúrgica de urgência, devido a um quadro de apendicite aguda. Essa intervenção foi realizada com anestesia local, corren do as duas, ao que parece, grande risco de vida. Além do mais, sua mãe, segundo lhe contou, havia tido outras moléstias durante essa gravidez (anemia profunda, flebite, e episódios diarréicos). O par to foi normal. Até se casar, Rita sempre dormiu na casa dos pais (a casa em que ainda vivem c que conta apenas com uin quarto, sala, cozinha e banheiro). Até os seis anos, dormiu na mesma cama que seu ir mão, instalada ao lado da de seus pais (alegava, para justificar, dificuldades econômicas familiares), depois passou a dormir com sua mãe na cama de casal (enquanto o pai dormia em seu local de trabalho, e o irmão, na sala) até que, com seu casamento, foi viver com o marido em um apartamento alugado. Nesses momentos a preocupava o fato de ver-se obrigada a deixar o bebê aos cuidados da mãe, diariamente, para ir trabalhar. Dizia-me: “Essa casà é um desastre. Não tem lugar para nada.” (Não descartava a possibilidade de recorrer a uma creche, ainda que lhe parecesse que sua mãe cuidaria do filho com mais carinho.)
Uma sessão de psicoterapia breve w, W, \lguns diagnósticos considerados foram: personalidade hi ------ ---pomaniaca^ com conflitos de natureza neurótica, nao chegando a configurar um quadro característico de neurose; funcionamento egóico adequado, com atitudes para o insight, ainda que manifes tando resistências que poderiam accntuar-se4; foco definido, ba seado nos conflitos ante a maternidade. Assinalarei agora os componentes do foco iniciahe alguns dos principais psicodinamismos em jogo. Pensei em questões que se vinculavam ao motivo da consulta, tais como: Quais foram os fatores*dcterminantes da busca inconsciente da gravidez atual? O que ela representava para a paciente e para o seu marido? Que fatos motivavam sua ambivalência afetiva e seu» temores ante a gestação? Por que se inclinava conscientemente a&aborto?, etc. Creio que podemos partir da^dificuldades sexuaj^ de Rita, e dali ir retrocedendo em sua história até chegar a considerar a pro vável incidência de fatos a elas concernentes, inclusive as primei ras etapas de sua vida. Suas relações sexuais pareciam despertar nela intensos sentimentos de culpa, que sem dúvida tinham muito a ver com suas experiências de coabitação e de partilha de cama, e as conseqüentes fantasias incestuosas. Ein conseqüência do men cionado, seu aborto podia ser considerado, em parte, como um mecanismo de autocastigo por infringir a proibição, principalmen te por tratar-se de relações sexuais pré-conjugais. Mas o aborto também era gerador de culpa pela destruição do filho, diante dà qual a paciente - e ao que parece, ainda que em grau menor, tam bém seu esposo reagia com típicas defesas maníacas, negando a dor e a perseguição provocadas por essa perda. A gravidez atual continha então um desejo inconsciente de reparar o dano produzi do^ associado à ngcgssidade de comprovar a preservação de seus genitais diante do temor de que tivessem sofrido danos. Mas Rita parecia sentir novamente e de modo imperativo a necessidade de pagar por suas “faltas” com um novo aborto. Além do mais, consU ____________
^
'
J' " " "
^
llh _
*'
í
.
^
C
-
"
j
' -
134
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
secutória, em função do luto patológico nâo-elaborado (aborto), também para ela a imagem materna continha características filiei^ das (5 ), em relação à qual teria lugar o conflito básico da problemâtica. (Rita havia nascido entre dois abonos, de uma gravide/, ao que parece, não desejada e muito acidentada, e na qual correu peri go de ser abortada. Inclusive sua mãe a incentivava em certos momentos a abortar, e a jovem, temerosa, só acumulava dúvidas sobre o que desejava fazer. A conduta materna reproduzia, assim, a de um superego ambíguo, já que primeiro incentivava o casal à gravidez por meio de troças a seu genro, para cm seguida dizer que abortasse.) Deduz-sc que Rita não se sfiüúa cqmjLijreito de_sCT mãe, adquirindo a gravidez o caráter de algo pecaminoso, através da quãTse^oãõHrígadíTa abandonar seus desejos maternais5. Havia muito mais elementos em jogo, correspondentes à conflitiva focal. Os relativos à relação de casal da paciente não pareciam relevantes num primeiro momento. Mas sim, por outro lado, os provenientes do meio familiar; a rejeição ante o marido e à gravidez, no que, em uma observação mais profunda, poderse-ia descobrir a persistente resistência familiar à sua individuali zação e desprendimento. A família parecia exercer grande influência sobre a paciente. atraves~dê~seír s levado montantejteagressão, da severa educação religiosa, dos tabus sexuais e .da. crcnça quase mítica de que a gravidez era uma espécie de enfermidade^lesgraça ou maldição, pela qual é preferível não passar, bssa crença era fundamentada nos problemas sofridos por sua mãe e sua cunhada, e expressa verbalmente pelo pai, como emer gente. Por sua vez, a paciente sem dúvida não havia conseguido, até esse momento, superar sua dependência patológica do gru po. Recordando o conceito de foco enunciado por Fiorini (3), interessava além do mais considerar o momento evolutivo que este caso estava atravessando: pudera começar a separar-se fís i - / lfV'*^tr ca e gradualmente de seu grupo familiar ao contrair matrimônio j cerca de um ano atrás. Nessa etapa dc doloroso e difícil despren dimento, a perspectiva de ter um filho repercutia curiosamente na jovem, incrementando-se seus temores de experimentar uni retrocesso nesse sentido: deixar o bebê aos cuidados de sua mãe
135
Uma sessão de psicolerapia breve
em particular a mãe, a despojassem de seu filho, o qual, no caso de nãcTabortar, teria de oferecer a ela, renunciando à sua condi ção dc tnãe. Estas seriam as regras do jogo que deveria cumprir para não perder o carinho dos seus, sobretudo o materno. Rita tomava como referência o que ocorria com sua pequena sobrinha, que se achava sob o domínio da avó e exposta a uma educação retrógrada. r'Mas seus temores se baseavam, antes de mais nada, em sua pró.pria experiência, que se reativava ao identificar-se com o filho monopolizado em sua fantasia por sua mãe.- no sentido de não poder liberar-se da ligação com a figura materna. ^ Tratarei dc reproduzir, com as limitações próprias de todo esquema, o desenvolvido até aqui: ^
FOCO
Relações sexuais pré-conjugais (culpa pela sexualidade) I A bo rt o |----- 1 Defesas maníacas
t s[ Momento evo lutivo] -----
\ , M oo familiar |
Casamento Deves abonar"
136
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
A paciente nào se achava motivada para realizar um trata mento prolongado. Recorria à consulta por uma necessidade que era, para ela, perfeitamente localizada c circunscrita, motivo pelo qual lhe propus uma psicoterapia de objetivos limitados e de final “aberto”, dependendo da evolução do seu estado e das vicissitu des que poderiam acompanhar sua gravidez. As metas terapêuticas imediatas consistiam em ajudá-la a en tender melhor as causas determinantes de suas dúvidas a respeito de sua gravidez, assim como as fantasias subjacentes que haviam acompanhado a sua busca. Caso decidisse prosseguir com a gravi dez, o objetivo do tratamento seria a revisão das ansiedades por ela produzidas durante a gestação, assim como das dificuldades de diversos tipos que eventualmente pudessem aparecer. Caso se decidisse pelo aborto, a situação seria reestudada, levando-se em conta seu estado e motivação para o tratamento, ainda que nesse caso tenha-se adiantado que uma assistência psicológica seria tanto ou mais necessária6. O tratamento foi planejado com base na técnica de insight , com duas sessões semanais de 40 minutos cada, considerando-se útil em algum momento a possibilidade de inclusão do esposo e de outros familiares da paciente no processo terapêutico, por meio de entrevistas de orientação.
A sessão A seguir é transcrita quase que literalmente a sétima sessão do tratamento de Rita, que estava próxima de completar o terceiro mês de gestação. Chega com 20 minutos de atraso. P 1: (Sorri, um pouco perturbada ): Não me diga nada... T1: (Respondo com um sorriso. Há um silêncio de alguns segun
Uma sessão de psicoterapia breve
T3: Assim é. Então, metade da sessão não vem e a outra metade, sim. Creio que isso tem a ver com seus sentimentos ante a sua gravidez. Quer dizer, você parece se sentir como que dividida em duas partes: uma quer prosseguir a gravidez e ter o bebê, a que vem, e outra não, a que não vem na primei ra metade da sessão... Porque vir aqui adquiriu o significado de ocupar-se de você e de sua gravidez com a idéia de pre servá-la. Um dia, antes de me consultar pela primeira vez, você ia procurar um aborteiro, pelo que eu me converti em algo assim como a contrapartida dele. • P4: ( Adota uma expressão meditativa): Pode ser, não sei... (A seguir ocorre uma nova pausa, mais prolongada. Mas Rita começa a mostrar-se tensa. Volta a sorrir-me, com si nais visíveis de ansiedade. De novo interrompo à silêncio.) T4: Parece que lhe custa prosseguir, não? P5: ( Com expressão de alivio ): Sim. E não sei por onde co meçar... T5: Pelo que sente necessidade de trazer hoje e que lhe parece possa ser útil para entender seu problema. P6: Sim, estive pensando, recordando algumas coisas relaciona das com o que você me perguntou nas entrevistas, e que naquela ocasião eu não pude lembrar, sobre alguma coisa ruim de minha infância. Lembrei-me que quando tinha sete anos mataram meu cachorro... T6: ( Acompanho seu relato, externando através de um olhar atento e movimentos de cabeça em sinal de aprovação, o in teresse que me desperta sua abordagem)1. Como foi isso? Contc-me por favor. P7: Você já notou os cachorros, quando estão no cio? Bem. Tí nhamos um cachorro que “andava” com uma cachorra que estava no cio. Como incomodavam e o cachorro estava mui to agitado, meu irmão bateu-lhe com uma cadeira que o “descadeirou”. No dia seguinte, celebrávamos minha pri meira comunhão. Lembro-me de que meus pais e meu irmão comentavam: “Não vamos deixar que as pessoas vejam um cachorro assim maltratado.” O cachorro desapareceu. Logo soube que meu pai e meu irmão o tinham atirado no rio, num Sofri muito isso Depois, meu outro cachorro foi
138
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
atropelado por um caminhão, despedaçando a boca. Tudo isso eu não recordava, e ontem me perguntava se era por não serem coisas tão feias, ou se justamente por serem feias pre feri deixá-las de lado... Estive também me lembrando de outras coisas: de quando minha mãe, que sempre foi muito nervosa, brigava com meu pai e pegava uma faca, ameaçan do se matar... T7: Ela tentou alguma vez? P8: Não, pelo menos que eu saiba... T8: Bem, tratemos de ver o que significaram para você esses fatos de sua vida e por que foram recordados agora. Com certeza, você poderia ter recordado outras coisas desagradá veis de sua infância, mas por algum motivo surgem essas recordações, o que não é casual. Parecem estar em parte re lacionadas com os problemas que tem agora. Sua gravidez é sua principal preocupação, e por isso surgem essas lembran ças. Vejamos um pouco por quê: você sofria pelo que acon tecia aos cachorros. Em sessões passadas e nas entrevistas, abaixar um pouco, vimos que para você os cachorros repre sentam os filhos7. Quer dizer, essas recordações, quem sabe, expressam uma grande preocupação que agora tem por sua gravidez, seu carinho maternal e seus desejos de proteção para com seu filho, dos quais não se dá conta, não reconhe cendo em você. Creio que no fundo teme muito perdê-lo, abortar outra vez, que o arranquem como o seu cachorro, que atiraram dentro do rio, num saco. P9: Talvez, mas eu não me dou conta de que isso aconteça com minha gravidez. Não sinto isso tudo... (pausa um pouco pro longada). T9: E no que diz respeito à gravidez de sua mãe, o que viria? Com o que poderia relacionar? PIO: Não sei, não sei se tenho medo por mim mesma... Quem sabe seja isso... TIO: Medo de que lhe suceda algo por estar grávida? PI 1: Sim...
Uma sessão depsicoterapia breve
139
PI2: (Aprova com um movimento de cabeça). T l2: Se bem que um médico lhe haja dito que tem apendicite crô nica, não fica claro o porque desse temor. Quero dizer, se não haveria mais coisas nisso tudo. P 13: Pode ser, na verdade não sei por que me atormenta tanto esse medo de que algo de ruim mc aconteça... (pausa). Quero lhe dizer também que estive pensando sobre o que disse na últi ma sessão, de que nada me atraía. Na verdade antes de mc casar havia muitas coisas de que eu gostava. Não só viajar, ser uma dama, mas também modelo, estudar. Podia tê-lo feito antes de me casar, mas não qúis. T l3: Não quis ou não pôde? Porque talvez algo lhe acontecesse, já que vontade não lhe faltava. PI4: Sim... (sorri, como se tivesse sido descobkrta ): Eu gostava de muitas coisas... Tl 4: É certo que, próximo do casamento, teria de pensar em con seguir um emprego com urgência para poder enfrentar todas as despesas que viriam... PI5: (Interrompendo-me)... Sim, mas antes disso não existia esse problema, e no entanto não pude fazer coisas... Tl 5: Sim, parece que é assim. PI6: Com a psicologia, quê eu gostava, minha família e meu marido, cheios de preconceitos, se opunham e me diziam: “Para essa faculdade é que você vai? É psicologia que você quer estudar? Ali são todas umas sem-vergonha, umas ‘lou cas’. Depois cheguei a pensar que me invejava por ele não ter podido seguir uma carreira nos estudos. Por fim, sentime cansada da faculdade e a deixei. Tl 6: O cansaço é, então, uma desculpa, como a de não ter querido fazer coisas que na realidade você gostava. São explicações que procuram esconder quanto você dependia da opinião dos outros e quanto estava submetida a eles. Assim acabou por se submeter a seu marido, abandonando os estudos quando estudar era algo muito desejado por você. Perguntome sc tudo isso não está relacionado ainda com suas dificul
140
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
mais, lcmbre-se de que você não comentou com seu marido que está se tratando. Você o faz às escondidas. PI7: Tem razão. Creio que é como você diz. Enquanto você fala va, eu pensava: parece que sempre necessitei que alguém me desse um empurrãozinho, que me apóie para eu poder fazer coisas... T l7: Talvez esteja buscando isso em mim. Hoje, você se permite falar aqui de seus interesses, mostra-se com mais iniciativa, quem sabe espera que a ajude, assinalando. Esse problema de suas dificuldades para empreender algumas atividades muito desejadas é muito importante, e creio que é parecido com o que acontece com suas dificuldades ante sua gravi dez. Tem desejos muito encobertos de ser mãe, deles dando mostras hoje, com o caso dos cachorros. Mas quem sabe, também nisso se sinta sem permissão para seguir adiante. Uma permissão que estava esperando sobretudo de sua mãe, mas também de mim. Queria sentir-se autorizada por mim a prosseguir com sua gravidez. Seria o empurrãozinho de que necessita para preservá-la, defendê-la. Pelo visto, se preocu pa muito com o que pensa sua família sobre sua gravidez, em especial sua mãe. Recorde como sua disposição sobre sua gravidez se modificou quando ela mudou de opinião e a aprovou. Recentemente então se sentiu com permissão, ainda que, como sente que ela não a aceita de todo, não se sinta muito tranqüila, segundo parece. P18: É que eu sempre tive medo de minha mãe. Meu irmão a con testava, se rebelava e entào “levava”. Eu me salvava por ficar caladinha. Tl 8: Isso explica por que quando ela lhe disse “tire-o”, você ensaiou uma defesa muito tímida: “Não, você acha?”, disse você. Foi entào, não só por suas próprias dúvidas, mas também por seus temores em contradizê-la. Seria desobedecer-lhe, rebe lar-se e expor-se a ser castigada por ela. Por isso tem medo de manter a gravidez, a qual teria, como castigo,
Uma sessão de psicoterapia breve
141
P19: (.Protestando em tom amável)'. Bem, doutor, mas meus pais nào aceitavam meu marido, opunham-se a que eu me casas se, e no entanto eu o fiz! Tl 9: Está certo, então se entende que é com muita razão que você se sinta tão inquieta. Além de se atrever a casar sem a apro vação de seus pais, agora quer ter um filho dele... (brincan do ): É o fim! P20: Ah!... (surpresa). Não havia pensado nisso... Acho que é assim. T20: Então, acho que se coloca na posição do cachorrinho, te mendo ser duramente castigada por “esquentar” e ter rela ções sexuais. Seu sentimento de culpa por ter-se casado, apesar da oposição de seus pais, e por ter relações sexuais antes e depois do casamento, parece que não (fesapareceu, e agora é maior com a gravidez. Se bem que deva haver mui tas outras coisas para se ver com respeito aos problemas ante sua gravidez, creio que hoje vimos algumas que parccem ser muito importantes e que devem estar pesando muito em você. O que acha? P21: Acho que sim, que tem razão. T21: Temos que encerrar por hojç.
Comentários sobre a sessão A paciente chega tarde, coisa que já havia ocorrido em algu mas sessões anteriores. Em primeiro lugar, trato de concentrar sua atenção sobre este fato, já que ele interfere sensivelmente em nosso trabalho. Faço-o de modo a ser o menos persecutório possí vel, não permitindo que ocorra um silêncio prolongado, que cor reria o risco de ser vivenciado como muito inquisidor ou direta mente acusador (Intervenções Tl e T2). Por mais que o fato de
142
também o papel de defensor e protetor desta, no qual parece que rer me situar (T3). Além do mais, trata-se fundamentalmente de uma interpretação “transferenciar, destinada a superar o obstácu lo resistencial, uma vez que já nos momentos iniciais da sessão uma intenção focalizadora se manifesta através desta intervenção. Em T4, volto a interromper seu silêncio com uma interven ção que tende a tranqíiilizá-la, atenuando assim sua perseguição, visto que quero fazê-la sentir que compreendo - e tolero suas dificuldades de trabalhar na sessão. Em T6, através da expressão corporal eque manifesto, de monstro à paciente também verbalmente atenção e interesse diante do material que me traz, numa tentativa de propiciar boa relação terapêutica e particularmente de estimular sua atividade egóica (recordar, raciocinar, etc.), a serviço da tarefa terapêutica. Em P6 mencionou algo que lhe aconteceu com um cachorro. Como em sessões anteriores havia ficado evidenciado que este animal sim bolizava para ela os filhos, deduzo então que se trata de material pertinente ao foco. Reforço, portanto, a canalização nessa direção, dispondo-me a escutá-la fazendo uso da atenção flutuante. No transcorrer do tratamento, a tarefa interpretativa estimula o aparecimento de um rico material associativo, como o de P7. Rita relata ali recordações que impressionam pelo vínculo à repressão sexual e à violência de seu meio familiar. A esse respei to, esboça levemente uma atitude crítica, na verdade pouco desen volvida em conseqüência de sua submissão, quando admite a pos sibilidade de tratar-se de coisas “feias”. Estamos sem dúvida diante de um material focal que convém abordar. Parece estar do tado de uma grande carga emocional que me impressiona muito, dando-me a sensação, além do mais, por indícios que a seguir veremos, de estar diante de algo de decisiva importância para compreender a problemática da paciente. As recordações de Rita provocam em mim ocorrências que, segundo vislumbro,, podem ajudar-me a detectar o ponto de urgên cia. Tudo isso acontece rapidamente. Trata-se agora de decidir o que interpretar e de eleger uma determinada linha interpretativa
Uma sessão ciepsicoterapia breve
143
poderiam ter essas recordações surgidas em tais circunstâncias, e prestarei especial atenção à primeira das ditas recordações. 1. Estariam relacionadas com sentimentos infantis de culpa e fantasias de castigo pela sexualidade incestuosa. (É sobretudo a recordação descrita pela paciente no primeiro momento que suge re tal conteúdo.) 2. Penso a seguir que poderiam estar encobrindo situações tanto anteriores quanto posteriores à época de que datam. A esse respeito me ocorre que a primeira comunhão poderia então repre sentar seu casamento (as meninas trajando longos vestidos bran cos s&assemelham a pequenas noivas); as atividades sexuais dos animais na véspera dessa comunhão, suas próprias relações préconjugais; o cachorro machucado, sua genitalidade culposa e rejeitada que ela sente que a destrói, pois a faz pírder sua pureza e que por isso, por tratar-se de um pecado, deve ofcultar, casando-se “de branco”. (“Não vamos mostrar um cachorro assim maltratado aos outros”.) Também o cachorro jogado ao rio dentro de um saco e o sofrimento experimentado encobririam outro fragmento de sua história: o aborto, a dor que lhe causa, a preocupação pelo feto perdido e seu destino, tudo isso que é necessário negar ou subesti mar e ao qual se soma o fato de que o aborto é por sua vez o casti go por haver realizado algo proibido. 3. A cadela no cio me faz pensar na atual gravidez de Rita, já que o cio é o período em que ocorre a fecundação. Este pensa mento é o ponto de partida para as duas suposições que figuram a seguir. 4. Poderia haver, além do mais, fantasias subjacentes referi das ao parto, nas quais prevaleceria o temor de dar à luz um filho deficiente ou talvez monstruoso (cachorro “descadeirado”). que teria de ocultar ou eliminar, o que se relacionaria com sua culpa por desejos sexuais incestuosos e pelo aborto. 5. Expressariam sua atual preocupação e seus temores pelo que poderia acontecer a seu filho e em especial pela perspectiva de ser vítima de um violento ataque familiar à sua gravidez, ata
*44
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
mular uma interpretação que possa conectá-la com as prováveis fantasias subjacentes enunciadas no item 5. É que este último enfoque se ajusta melhor ao que tem sido evidenciado nas ses sões. Por outro lado, seu medo de abortar é próprio da etapa de gestação que está atravessando, na qual existe um risco de aborto espontâneo (6). Nessas circunstâncias poderia ser menos difícil que compreenda e aceite uma interpretação referente a esses temores, do que se a opção tivesse sido por outras interpretações. Isto porque parto de fatores já conhecidos de Rita, como o dos cachorros que para ela têm o significado de bebês, e a oposição familiar à sua gestação. Um objetivo importante aqui é que ela possa tomar consciência de seus sentimentos de proteção para com o filho, assim como o faz com os sentimentos de rejeição ante a gravidez. Também é necessário que reconheça que foram os sentimentos de proteção projetados no esposo e cm mim que possibilitaram sua consulta*. Em T8 configura-se então uma abertura para uma linha interpretativa a ser seguida no transcorrer dessa sessão. Começo ali tra tando de comunicar à jovem que a aparição dessas recordações se deve ao determinismo psíquico. Mostro suas tendências maternais ocultas, o medo de perder o filho outra vez através de novo aborto, fantasiado como se fosse a família que lhe arrebata violentamente o filho e o destrói, como aconteceu com seu cachorro. (A evocação de um cachorro atropelado por um caminhão parece expressar também sua preocupação pelo destino do filho.) Em P9, a paciente aparentemente rejeita a interpretação, uti lizando-se essencialmente da negação. Em T9, procuro indagar mediante uma pergunta - o que significa o ressurgimento da recordação dos acessos de violência de sua mãe9. Pode-se observar aqui, além do mais, e no seguimen to da sessão, a assunção de iun papel decididamente ativo por parte do terapeuta, que não se limita a esperar o material da pa ciente e interpretar a partir de sua apresentação, mas que participa intensamente e de diversas maneiras, incluindo a formulação fre qüente de perguntas (Tl, T2, T4,T6, T7, T9) e de explicações que recordam sinteticamente a ordem de trabalho (T5). Junto à ativa ção egóica da paciente, isso se vai traduzindo numa gradual de
Uma sessão de psieoterapiabreve _____ A partir de PIO, vai-se confirmando a existência de uma imago materna muito persecutória, pela qual inconscientemente se sente ameaçada e condenada a abortar, o que configuraria o conflito básico. TIO e Tl 1 são na realidade interpretações que es boçam e apontam para esse conflito (ainda que sem revelá-lo dire tamente no momento), formuladas como interrogações, quer dizer, como suposições, e também destinadas a comprovar sua resposta a elas a fim de verificar sua tolerância para enfrentar os referidos conflitos. Seu medo de ter de se submeter a uma inter venção cirúrgica de apendicite, comq o fora sua mãe, está sem dúvida muito mais próximo da consciência que seu medo do aborto - daí sua rápida resposta de aceitação da interpretação em PI 2, o que não ocorre em P9 configurando o ponto de emergên cia , dado pelos temores particulares correspof dentes à etapa de gestação que está atravessando10e que o mito‘familiar acerca da gravidez fomenta sobremaneira". Em T12 trato de incrementar sua motivação para compreen der melhor as causas de seus temores, formulando uma nova interrogação. Em PI3, inicialmente não aborda de modo direto elementos de interesses como resposta. Logo sobrevêm uma pausa, através da qual parece querer fugir ao tema, quem sabe muito ansiógeno (o que sugere que devo ter cuidado em não for mular interpretações prematuras dentro do conflito em questão), ainda que aquilo a que faz referência guarde igualmente estreita relação com o evitado. Isso porque alude à sua submissão ao grupo familiar, assim como ao seu parceiro - como se pode com provar mais adiante na sessão que a levou a abandonar diversas atividades, censuradas essencialmente pelas conotações sexuais que teriam para eles. Em T l3, assinalo a negação maníaca da realidade, isto é, a submissão às normas grupais. (Nesta paciente torna-se necessário assinalar constantemente o empobrecimento a que conduz a exa
146
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Em T16 aludo às suas racionalizações diante das dificulda des causadas pela submissão, às quais acrescento as que registra para vir às sessões por sua vinculação com o proibido (a psicolo gia). Insisto assim em deter-me nos obstáculos resistenciais. Por outro lado, observa-se também a extensão que nessa oportunidade como em outras, dentro dessa sessão, pode alcançar a formulação de uma interpretação ou de qualquer outra intervenção verbal nes ses tratamentos. Isso se harmoniza com o tipo de vínculo e por tanto de comunicação que se instala, cujas características são uma mútua participação ativa, numa atmosfera de ágil intercâmbio, na qual não preocupa muito que em certos momentos o terapeuta possa chegar a falar tanto ou mais que o paciente. Em PI7, pode-se dizer que Rita está próxima de um insight. O material que fornece se apresenta extremamente produtivo e revela, além do mais, um bom funcionamento egóico a serviço da tarefa. Em T17 faz-se necessário interpretar a transferência. Por meio dessa interpretação espera-se que Rita compreenda um aspecto importantíssimo de sua problemática atual e o motivo latente da consulta, que seria a busca de uma figura parental sobretudo materna permissiva e protetora para sua maternida de12. Incluo-me nessa interpretação, sem que isso no entanto implique concentrar todo o interesse da paciente na relação tera pêutica. Assim sendo, procuro de imediato orientar sua atenção para as figuras de sua realidade externa e cotidiana, característica fundamental dessas terapias. Para a paciente, a interpretação “transferencial” cumpre aqui uma função claramente ilustrativa de seus problemas atuais (dependência patológica), sem no entan to ser utilizada como um instrumento para promover a dependên cia regressiva transferencial, não constituindo necessariamente o tipo principal de interpretação e conectando o que sucede com outros objetos da realidade externa. Em T l7 pode-se observar também a intenção de recolocar a paciente na situaçào-problema, trazendo novamente para o pri meiro plano sua gestação, o que configura um aspecto do trabalho de focal ização.
Uma sessão depsicoterapia breve
147
volve o conflito básico. Esse momento é resultado da lenta pene tração no foco durante a sessão e de que pouco a pouco foram cedendo as defesas maníacas, permitindo assim que venha à tona a situação persecutória subjacente. T l8 é uma nova interpretação “extratransferencial”, por meio da qual se tenta promover um insight inicial de um aspecto decisivo de seus conflitos, dado por sua submissão à figura mater na e por extensão a outras figuras superegóicas. A perspectiva é conseguir, em sessões posteriores - até onde seja possível e indi cado c com base nessa revelação um maior aprofundamento, que contemple entre outras coisas o pfoblema da culpa, num sen tido mais amplo, pelo fato de crescer e desprender-se do grupo familiar. Em PI9, a paciente traz elementos para qye em T l9 se con firme e complemente o expresso em Tl 8, favotecendo assim que se clarifique ainda mais sua visão do problema atual à luz de seus sentimentos de culpa por ter-se “rebelado”. A intervenção em T l9, em tom de brincadeira - sempre com base numa atitude cordial para com a paciente -, responde ao mo do expressivo assumido por Rita em P19 e encerra um momento de insight obtido, como parece atestar sua reação em P20, demonstrativa do efeito emocional produzido pelas descobertas. (Este momento da sessão é por sua vez um dos que melhor exem plificam a afabilidade e a fluidez de diálogo que a comunicação pode assumir.) Em T20, por fim, creio ser possível e oportuno confrontar a paciente, contando com certas perspectivas de que consiga um insight , com conteúdos reprimidos que possam emergir das recor dações do cachorro maltratado, de tal modo que quase toda a ses são pode ser considerada sob esse ponto de vista como um traba lho preparatório para a receptividade de interpretações similares, de importância crucial no processo terapêutico, posto que abor dam, ainda que parcialmente, o conflito básico dentro do foco, o que nem sempre é possível. Também tento, em T20, reafirmar o já
14S
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
sua curiosidade e suas expectativas a respeito desta (“...deve haver muitas outras coisas para serem vistas...”, etc.) e propiciar nela uma atitude reflexiva, de introspecção, dificultando eventuais ten dências ao acting out (na forma de uma “pseudo-independência”, por exemplo). P21 é uma nova resposta afirmativa de aceitação às minhas intervenções. Respostas como esta vão-se fazendo mais freqüen tes no decorrer da sessão (o que se confirma a partir de P 11 e especialmente em P17 e P20) e me sugerem, pelo clima afetivo que impera, tratar-se de uma atenuação dos mecanismos manía cos e de um ascendente predomínio da transferência positiva, em vez de respostas vazias ou de submissão ao terapeuta. Rita decidiu prosseguir com sua gravidez. Nos estágios fi nais da mesma, padeceu de uma afecção renal, motivo pelo qual teve de guardar repouso na cama por aproximadamente um mês e meio, tendo-se recuperado por completo. Deu à luz uma robusta menina, em parto normal. Pouco tempo depois, demos por encer rado o tratamento.
Referências bibliográficas 1. Allegro, L., Comunicaciónpersonal. 2. Bleger, L. e J., “Grupo familiar. Psicologia y psycopatología”, em L. Grinberg, M. Langer c E. Rodrigué, El grupo psicológico, Nova, Bue nos Aires, 1959. 3. Fiorini, H. J., “El concepto de foco”, cm H. J. Fiorini, Teoria y técnica depsicoterapias, Nueva Vision, Buenos Aires, 1973, cap. 6. 4. Garma, A. c E. G. De, “Reacciones maníacas: alegria masoquista dei yo por el triunfo, mediante enganos, dei superyó”, em A. Rascovsky c D. Libcrman, Psicoanálisis de la mania y la psicopatia, Paidós, Bue nos Aires, 1966. 5. Rascovsky, A., “La matanza de los hijos”, em A. Rascovsky, La maza de los hijos , Kargieman, Buenos Aires, 1970.
8 . Dificuldadesdoterapeutaparaa formaçã o , prá ticaeinvestigaç ã o empsicoterapiasbreves'
Introdução
\
Vou referir-me a alguns dos problemas que em nosso meio apresentam-se aos terapeutas ante a psicoterapia individual breve de orientação psieanalítica. Poderíamos considerar a questão como uma conseqüência das dificuldades dos terapeutas para se ajustarem ao seu enquadraníento e finalidade, o que por sua vez se traduz inevitavelmente em dificuldades no exercício desse mctodo terapêutico, na avaliação dos resultados obtidos e, o que é ainda mais grave, ameaça desacreditá-lo cada vez mais. Antes de tudo, não devemos nos enganar: por mais que desde alguns anos se fale bastante em terapias breves, de cuja utilidade para avaliar o problema que a assistência psiquiátrica maciça da população suscita muito poucos duvidam, mesmo assim observa mos uma considerável resistência por parte dos profissionais para o seu emprego ou, no caso de praticá-las, para adequar-se ao en quadramento que as mesmas exigem e que as diferencia de outras técnicas psicoterapêuticas. Assim sendo, na prática assistencial, seja nos serviços psi quiátricos hospitalares ou nos ccntros de saúde mental, seja nos hospitais psiquiátricos ou nas instituições privadas, à medida que os anos passam, ainda permanece a impressão de que os terapeu
150
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
põem a tarefa. Não podemos deixar de supor que tal situação diminui a eficácia terapêutica do procedimento e que é necessá rio portanto vencer os empecilhos que existem para instrumentar com êxito os diferentes recursos que podem fazer parte da terapia breve. Esses fatos têm-me chamado muito a atenção e também tenho me formulado as perguntas obrigatórias: Por que isso ocorre? Que motivos existem para que o processo de aprendiza gem dos terapeutas do emprego das terapias breves se atrase e se veja freqüentemente entorpecido? Diversos investigadores já assinalaram algumas das causas. Pela importância que têm a re lação com o que colocarei em seguida, vou citá-las aqui. De mi nha parte quero referir-me à incidência que em minha opinião certos fenômenos próprios da relação paciente-terapeuta, em sua maior parte inconscientes têm sobre esses fatos, e que, jus tamente por essa condição, influem sobremaneira na mesma, sendo mais difíceis de controlar. Convém esclarecer que essas opiniões são basicamente resultado de minhas reflexões a res peito das próprias vivências experimentadas ao longo de minha tarefa em psicoterapia de tempo limitado e do conhecimento das idéias de H. Searles (15) (16) (17) sobre a inter-relação pa ciente-terapeuta, que me despertaram um profundo interesse, esclarecendo-me aspectos de decisiva importância no processo terapêutico. Ao longo deste capítulo, abordarei os seguintes pontos: • A dificuldade de adaptação ao enquadramento da psicote rapia breve. • Dificuldades diante do término do tratamento psicoterapêutico breve. • Dificuldades na avaliação dos resultados obtidos em psico terapia breve. • Desprestígio da psicoterapia breve enquanto indicação tera pêutica. • Outras dificuldades do terapeuta diante das terapias breves. • Conclusões.
Dificuldades do terapeuta
151
A dificuldade de adaptação ao enquadramento da psicoterapia breve “Psicoterapia breve ‘versus’ psicanálise” A P.B. de orientação psicanalítica constitui, como se de preende desta denominação, um procedimento terapêutico basea do em certos elementos fundamentais da teoria psicanalítica. Já em 1918 Freud antecipou que os novos métodos que seriam utili zados com o correr do tempo para efetuar tratamentos psicoterapêuticos em grandes massas da população deveriam, em sua opi nião, partir da psicanálise; mas acrescentava due esta teria de sofrer um processo de adaptação às novas condições (11). Não obstante, na prática, para muitos é difícil aceitar a coexistência da psicanálise e da psicoterapia breve e reconhecer que se trata de métodos que têm utilidade, alcance e indicações determinados. É habitual a tendência a desvalorizar a P.B. e a difundir a idéia de que só um tratamento psicanalítico tem reais propriedades curativas, capazes de produzir autênticas mudanças nos pacientes. Muitas vezes tal idéia se relacfona com a necessidade que os tera peutas jovens sentem de idealizar a psicanálise, o que por sua vez se acha ligado a seus desejos de se converterem em psicanalistas (20). Como é de se supor, têm de maneira geral extremo interesse em exercitar-se na técnica psicanalítica. Que acontece então quando as circunstâncias impedem de se efetuar um tratamento psicanalítico? Cai-se freqüentemente na realização de uma psicanálise “curta”, portanto interrompida, pouco eficaz e, como logo veremos, até perturbadora para o pa ciente. Comumente é nos estabelecimentos assistenciais, onde se deve oferecer atenção psicológica a um número elevado de pacientes, que sê la/ sentir com mais intensidade a necessidade de
‘ *2
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
conhecem (o novo é menos seguro e gera ansiedades paranóides), quer dizer, a técnica psicanalítica. Além disso, as modificações técnicas que necessitam introduzir são sentidas com freqüência como uma “heresia” ante o modelo psicanalítico, originando-se situações persecutórias, que se costuma chamar de “superego ana lítico”, que podem intensificar-se diante de supervisores aferrados cm demasia à técnica da psicanálise ortodoxa e que não aceitam facilmente essas modificações. Toda essa situação toma difícil a aplicação dos novos métodos, pois c vivida como uma falta de garantia interna e externa para o trabalho a sèr desenvolvido. Também como conseqüência dessas pressões, as terapias breves podem traduzir-se na prática em uma psicanálise “breve” (19), a qual, como bem disse Usandivaras, leva a uma “desvalori zação da nova técnica” (20). Apesar do relativo interesse que a P.B. tem despertado, esses problemas lamentavelmente ainda existem, e para muitos a P.B. continua sendo um parente pobre da psicanálise, como assmalam Szpilka e Knobel, os quais sublinham o estado de desprestígio e de confusão que se observa em torno dela. Concordo com ambos os autores quando atribuem tal situação ao fato de que se trans põem "as vivências, os conhecimentos e as técnicas psicanalíticas para essa psicoterapia” (19). (O grifo é meu.) Na intimidade da relação terapeuta-paciente Pessoalmente perguntei-me o porquê de tal transposição. Creio que sua persistência obedece não só aos motivos até aqui enunciados, nem somente à carência de possibilidades de infor mação a respeito da teoria c da técnica da P.B., quanto à qual, na atualidade, felizmente contamos com um valioso, embora não abundante, material bibliográfico; tampouco considero que sejam as discrepâncias entre os diversos autores qúe provoquem confu são, já que, no final das contas, tais discrepâncias não são tão grandes nem tão abundantes. Essa pergunta se impôs a mim com
Dificuldades do terapeuta
153
a maneira segundo a qual me havia proposto a trabalhar, diferen ciando com certa precisão a técnica a ser empregada da técnica analítica, comecei a notar em mim uma forte e às vezes irresistí vel tendência de criar ou favorecer o estabelecimento da “atmos fera” psicanalítica nas sessões, sobretudo através de insistentes interpretações transferenciais (afortunadamente reduziram-se, em geral, a ocorrências que não foram postas em prática e que pode riam facilitar o desenvolvimento da neurose de transferência e estimular a conseqüente regressão e dependência do paciente). Corria-se o risco de que isso sucedesse a contragosto, contraria mente à minha ideologia terapêutica em matéria de terapias de tempo limitado e respondendo a uma tendência que não conse guia controlar e que nem poderia explicar unicamente através das razões aqui expostas (preconceitos com relagão a qualquer técni ca que não fosse a do tratamento psicanalítico, etc.). Cheguei a pensar então que uma força interior me conduzia insensivelmente a tal atitude, a respeito do que me indicava a realidade (objetivos limitados, poucos meses de tratamento, inconveniência do estabe lecimento de uma neurose transferencial e de estimular a regres são, etc.). Mas tampouco tinha eu dúvidas de que, em vários de meus pacientes, manifestaVa-se uma notória inclinação para cons tituir comigo imi vínculo emocionalmente intenso e regressivo. Foi o conceito proposto por H. Searles sobre a simbiose terapêuti ca (15) (16) (17) que me permitiu entender o fenômeno e formu lar minha hipótese sobre o que acontece no tratamento breve. Sus tenta Searles que o vínculo terapeuta-pacicnte atravessa um mo mento de simbiose e que tanto o paciente como o terapeuta contri buem para que ele seja assim. Esse vínculo simbiótico tem suas raízes na relação mãe-filho c tende a se estabelecer e consolidar cedo ou tarde durante o tratamento psicanalítico, devendo final mente se atingir sua resolução. Com base num insight progressivo em seus pacientes e nele próprio, Searles desenvolveu suas impressões referentes ao papel
154
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Para Searles, a simbiose terapêutica se apresenta tanto em pacientes psicóticos quarta n^irótims F ainda quêln icialmcnte a tenha detectado e descrito na psicoterapia de esquizofrê nicos crônicos (15), logo teve que reconhecê-la na evolução trans ferencial de pacientes neuróticos. Searles descreveu, além disso, como a inter-relaçào simbióti ca atravessa distintas “fases”, na psicoterapia de esquizofrênicos crônicos, até chegar finalmente à de individualização do paciente. Hm tais fases, a simbiose terapêutica experimenta mudanças de significado qualitativas e quantitativas. Assim, em determinado momento, durante meses ou anos, constitui fon te de intensa gra ti ficação para pacie nte e terapeuta , com freqüência negada por este último, mas profundamente valorizada (15). Diz esse autor: “(...) atualmente tenho me dado conta - mesmo quando isso me provoca muita ansiedade dos profundos, embora inconscientes, processos gratificantes da relação simbiótica que tanto o paciente quanto o terapeuta se mostram renitentes em abandonar” (16). Sustenta também que a relação de transferência simbiótica “(...) apesar de seus tormentos (...) constitui uma fase necessária na psi canálise ou psicoterapia tanto de pac ientes neuróticos como de psicóticos ” e que “tanto o paciente quanto o terapeuta (...) se vêem submersos e arrastados em direção à corrente, ao processo de tra tamento (...). Não só o paciente, mas também ele está agarrado a um processo, o processo terapêutico, o qual, por sua força, é com parável ao processo de maturação na criança (...), o qual (...) tam bém é poderoso tanto para o paciente quanto para ele mesmo, demasiadamente poderoso para serem capazes de desviá-lo com facilidade (.7.) para fora do canal confluente, o qual tende a fo r mar-se p õ rs i mesmo” (16). (Os grifos são meus.)
a) A relação terapeuta-paciente no tratamentopsican alítico
A análise das emoções transferenciais e contratransferen-
Dificuldades do terapeuta
155
permitindo uma tarefa reparatória, e nesses momentos o próprio paciente vive o terapeuta transferencialmente como uma màe (ou pai) ideal, o que estimula no terapeuta o sentimento de onipotên cia'. Essas emoções aparecem em parte como conseqüência da situação regressiva do paciente, que o leva a situar o analista no lugar de uma figura parental. Vai-se configurando uma estreita relação, na qual o analista, ao fomentar por sua vez a regressão do paciente, sente-se cada vez mais objeto de todos os sentimentos deste e protagonista decisivo em sua vida, o que é altamente gratificante. Pode “converter-se” então na muito amada (ou inclusive muito odiada) mãe, nesse “mundo dos dois”, do paciente e do analista, que se prolongará por anos e no qual o “como se” da rela ção não o impede de experimentar intensos e prazerosos senti mentos1. Esclareçamos desde já que tudo isso também ocorre cm me nor magnitude na psicanálise de neuróticos, especialmente nas etapas de maior regressão dos pacientes; sabemos além disso que o tratamento costuma centrar-se na elaboração da relação transfe rencial. Em resumo: o estabelecimento do vinculo simbiótico na re lação paciente-terapeuta parece ser um fenômeno que tende a se produzir espontan eamente. No tratamento psicanalítico, essa interrelação simbiótica pode ser fomentada em beneficio do processo terapêutico. b) A relação tera peuta-pa ciente na psicoterapia breve
Qual é a situação que se apresenta em P.B.? Que acontece com o fenômeno que acabamos de descrever e que se anuncia desde que começam a interatuar paciente e terapeuta? Penso que o enquadramento que requer a P.B. resulta frustrante nesse aspecto, pois oferece um campo menos propício para as citadas gratifica ções do terapeuta. Sabemos que temos que nos propor objetivos
156
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
paciente-terapeuta demasiado intenso emocionalmente; mas não ignoramos que em certas circunstâncias os sentimentos transfe renciais e contratransferenciais são muito fortes, e que além disso encontramos pacientes que de um modo quase espontâneo desen volvem uma intensa regressão desde o início do tratamento. Con sidero que, numa terapia breve, esse fato geralmente constitui uma complicação (ver capítulo 10, pp. 178 ss.). Na opinião de numerosos autores, (1) (3) (8) (10) (19) (22), nos quais me incluo, cm P.B. convém em termos gerais recorrer à interpretação da transferência som ente em determina das circuns tancias , quer dizer, que não se deve empregá-la com a assiduidade
e com a finalidade com que se utiliza em psicanálise5, já que se deverá evitar a regressão transferencial, parece conveniente, pelo contrário, recorrer às interpretações denominadas “extratransferenciais”, que na realidade tendem a tomar conscientes outras transferências do paciente, aquelas que estabelece com as pessoas com as quais se relaciona em sua vida cotidiana, já que desde um primeiro momento procura-se que concentre seu interesse nela, em lugar de fazê-lo na relação com o terapeuta. Isso naturalmente é coerente com o propósito de conseguir a resolução de seus con flitos atuais. É de supor então que aJ^.B. não se presta a que o terapeuta satisfaça suficientemente certas expectativas latentes, na relação com o paciente, diferentemente do que acontece na práti ca da psicanálise. A experiência do terapeuta que realiza uma terapia breve pode diferir bastante da que vivência com um paciente em tratamento psicanalítico. Neste último caso pode “atrair” o paciente para uma intensa neurose dç transferência, na qual o terapeuta .se sentirá um p ro ta g o n is ta importante. Mas numa terapia breve, devendo ater-se ao “de fora", e levar o paciente a se interessar pela revisão de seus vínculos com seu verdadeiro pai. mãe, çônjnge_ cheferetc.. o terapeuta pode experimentar um sentimento de exclusão. Quer dizer, já não será um terapeuta-mãe e deverá, em troca, conformar-se com sua condição real de docente experimentado (8) no tratamento, procurando manter uma trans
Dificuld ades do te ra p e u ta
____
____
de resolução do conflito. Se este alcança certa intensidade e não é controlado adequadamente, pode dificultar era alto grau a tarefa do terapeuta, que chegará a adquirir ou não consciência da situa ção. É possível, por exemplo, que reaja com intervenções agressi vas, que poderão por sua vez ser racionalizadas. Se os motivos estiverem reprimidos, pode erroneamente atribuir essa sensação de insatisfação e desilusão a uma suposta ineficácia ou fracasso do método psicoterapêutico breve, tendendo além disso a conven cer-se de que só a análise exaustiva e sistemática da transferencia pode ajudar o paciente, e que de outro modo a terapia é “superfi cial''. Em suma sustentará que é preciso insistir em interpretar o “aqui c agora eomigo”\ na busca inconsciente .de^ratificação através do fomento da neurose transferencial, f
c) Qua ndo a psicoterap ia breve converte-se em “psica ná lise breve ”
Dessa maneira pode pôr-se em marcha o que há de ser uma espécic de “psicanálise breve” (19), induzindo o paciente, cons ciente ou inconscientemente, a estabelecer um vínculo simbióti£ 0, caracterizada noriuma regressão a nm tipo de dependência infantil com relação ao terapeuta. Creio ser p or isso qu e lhe resulta difícil renunc iar a tal tipo de relação p ara ace itar o outro, m ais ajustado às condições da realidnde - p o rtanto mais frustra nte que a P.B. exige, e que é por esta razão que a transposição da téc nica psicanalítica para as te m pia s bre ve s se pro duz co m tanta freqüência ^ Com o paciente como criança-filho, o terapeuta pode-
rá ter acesso em certa medida às gratificações comumentc nega das, mas profundamente valorizadas, que uma tal relação promete proporcionar-lhe. Para estimular a regressão, o terapeuta pode apelar para o uso reiterado e até sistemático dc interpretações transferenciais, au
‘
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
ferência. A esse respeito assinalam vários terapeutas: “Não se fomentou a regressão, respeitando-se a lógica e adequada pro gressão dada pela mesma relação terapêutica. Freqüentemente houve necessidade d afirma r-se nessa postura ante o material que trazia o paciente, que se apresentava como seduto r para a análise da transferência (...); a análise sistemática da transferência é uma tentação permanente para o terapeuta ” (5). (Os grifos são
meus.) Eu acrescentaria que se trata de uma tentação que não só corresponde ao desejo dc investigação do terapeuta e de extrapo lar o sistema psicanalítico, pelas diversas razões assinaladas no começo deste capítulo, mas também e muito especialmente à busca das gratificações que lhe daria uma relação mais profunda com o paciente. Outros autores fazem referência a uma necessidade de auto controle do terapeuta para regular as interpretações transferen ciais e com isso a regressão do paciente (1) (10). Diz acertadamente Fiorini: “Haveria além disso uma contra dição entre um enquadramento de tempo limitado e um processo no qual as intervenções do terapeuta ‘propusessem’ a regressão e a concentração de afetos do paciente nessa relação bipessoal (a situação se expressaria nesta proposição: ‘a relação que o senhor mantém comigo é muito importante para entender e tratar sua enfermidade; volte para ela todas as suas emoções e expectativas. Mas prepare-se para cortá-la de repente’)” (8). Mensagem e ação resultariam aqui do tipo estímulo-irustraçào, o que costuma per turbar o paciente. Tapibcm tentainterpxetar_conflitos alheios ao foco terapêutico1 ainda que saibamos que em P.B. não é aconselhável ábrir demasiadas feridas no paciente. Além do mais, não descõrftl&eemos, pelo exercício da psicanálise, que isso conduz a um incre mento da regressão. Pessoalmente, e em especial em minhas pri meiras experiências em P.B., demandou-me um grande esforço “deixar passar” sem interpretar o material não relacionado com o foco. Assim mesmo podemos compreender a resistência que às
Dificuldades do terapeuta
159
muito concretas e imediatas com um critério prospectivo, procu rando estimular nele a confiança em si próprio, assim como seu de senvolvimento independente, e conseguir desse modo que possa obter alta.
Dificuldades ante o término do tratamento psicoterapêutico breve Em geral a tendência para fomentar a.dependência no paciente complitfa a separação ao terminar o tratamento. Mas desse ponto me ocupo em mais detalhes no capítulo seguinte. Só acrescentarei a respeito que, como conseqüçncia da dificul dade do paciente e do terapeuta para aceitarem a séjjãraçao, chegam a ajustar reconfrafÕs que permitem prolongar a relação...
Dificuldades na avaliação dos resultados obtidos em psicoterapia breve Em função da frustração jque podem experimentar os tera peutas ao comprovar que o enquadramento da P.B. não lhes faci lita o acesso às negadas, ainda que muito desejadas, gratificações próprias de uma relação mais estreita e emocionalmente mais intensa com os pacientes, não é difícil supor que isso interfere na possibilidade do terapeuta de efetuar uma avaliação realista e justa dos resultados obtidos com o método, os quais por sua vez podem ser certamente pouco alentadores, se é que se insistiu em fomentar nos pacientes a dependência regressiva em lugar do autodesenvolvimento. Por isso, as mudanças de atitude que estes puderam apresentar em sua vida real são com muita freqüência rapidamente subestimadas e qualificadas como atuações, “fuga em direção à saúde”, etc. (Com isso não quero desconhecer a presença, nada rara por ccrto, de tais eventualidades nas terapias
160
Psicoíerapia breve de orientaçãopsicanalitica
dependência, nào deseja que se produza a separação (a alta defini tiva significaria a ruptura do vínculo e a perda absoluta das possi bilidades de gratificação ligadas a ela). Atua como aquelas mães que, como não podem aceitar o crescimento e desprendimento de seus filhos, continuam a tratá-los como crianças, f ' Searles assinala que o terapeuta, na fase de resolução da sim biose, pode experimentar os sentimentos de desvalorização e perda, por tudo aquilo que para ele o paciente significa, com o qual mantém “uma relação muito mais profundado que a que crê capaz de perceber em si mesmo” (15). Tende-se assim a desvalorizar a terapia breve, ante a necessi dade inconsciente de manter o uso excludente do método psicanalítico como fonte de gratificação a partir do estabelecimento de um vínculo simbiótico com o paciente (neurose ou psicose trans ferencial). A passividade que ainda observamos para resistir a este “movim en teifaz-me pensãrêm uma espécie de acordo tácito entre os terapeutas, numa cumplicidade inconscientemente conso li dada. cujos motivos subjacentes mantêm-se ocultos._~
Desprestigio da psicoíerapia breve enquanto indicação terapêutica Pode-se deduzir que os motivos expostos, ainda que de modo geral nào reconhecidos, diminuem o entusiasmo dos terapeutas para optar pela indicação e utilização da P.B. em determinadas situações em que a mesma poderia ser um recurso terapêutico nada depreciável. Desanima-os principalmente a perspectiva de estabelecer uma relação fugaz, com um objeto que logo perderão. O luto pela separação predeterminada desempenha um importante papel cm P.B. tanto pam.QJ3aciejn.te como para o terapeuta e, çom freqüência, parece repercutir mais no terapeuta que no paciente ((>). O tratamento ps.icanalítieo, pelo contrário, oferece a possibilidade de um vínculo, mais duradouro e portanto menos" frustrante.
Dificuldades do terapeuta
161
Outras dificuldades do terapeuta ante as terapias breves Recapitulando até aqui, consideramos que os terapeutas, es pecialmente os novatos, tropeçam, para o estudo e emprego eficaz da RB., em obstáculos que remetem: *&a) à idealização da psicanálise, junto ao desejo de desempe nhar o papel de psicanalistas nos tratamentos que empreendem e ao temor de utilizar outros procedimentos que são desvalorizados, apresentando-se como muito duvidosas guas possibilidades de eficácia.*As terapias breves aparecem como o novo e incerto diante de técnicas mais conhecidas e seguras; b) às dificuldades para adaptar-se ao enquadramento que exi ge a P.B., por tratar-se de uma relação terapeuta-pa|iente que ofe rece menos gratificações que a psicanalítica; c) às resistências do ambiente profissional circundante. Os supervisores adquirem aqui especial importância. A fim de oferecer uma visão mais completa do problema, acrescentaremos os seguintes fatores: ~->d) uma experiência prévia insuficiente em tratamentos pro longados, como o psicanalítico;. experiência que, ainda que não seja imprescindível, é muito conveniente para a formação psicoterapêutica em terapias breves; —> e) necessidades econômicas do terapeuta (em parte em virtu de dos gastos que lhe demanda sua formação profissional), que o levam a preferir os tratamentos prolongados, já que geralmente lhe possibilitam uma remuneração mais estável. Por último quero mencionar a influência de outros fatos de particular importância que me foram apontados: O f) em P.B., a ênfase recai na melhoria clínica do paciente e em grau muito menor na investigação exaustiva de sua psicopatologia ou de qualquer outro aspecto, como o permite a psicanálise,
162
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Em comparação com a prática da psicoterapia prolongada, ocorre agora que deve atender mais pacientes num mesmo espaço de tempo, com certa exigência de conseguir mudanças a curto prazo, o que em termos de economia psíquica significa “um mau negó cio” (uma nova responsabilidade e em suma um maior stress) (7). Nesse sentido, é significativo o que se costuma observar nos ser viços psiquiátricos: freqüentemente os terapeutas pareccm tender inconscientemente a prolongar os tratamentos, postergando o mo mento da alta e com isso a troca de paciente; -> h) Fiorini destaca também a incidência que tem nos terapeu tas o desconhecimento de uma teoria da mudança em P.B.. Como não têm interiorizados os dinamismos da mudança e só conhecem e aceitam os fenômenos inerentes às modificações que se produ zem nos tratamentos prolongados, não chegam a ter a necessária convicção de que os pacientes tratados com psicotcrapias breves podem experimentar mudanças favoráveis. Tal situação além disso se acresce de suas dúvidas a respeito da decisão a tomar quanto à alta do paciente (7). Todas essas dificuldades se esclare ceriam em parte se houvessem incorporado a seus conhecimentos uma teoria da mudança. Nesse sentido contamos hoje com impor tantes descobertas no campo da P.B., que somam a noção de insight e estão fundamentadas essencialmente na concepção da existência de partes autônomas do ego, quer dizer, de forças “cons trutivas latentes” (21), que permitiriam, a partir de uma experiên cia terapêutica corretiva, e uma vez finalizado o tratamento do paciente, a continuação ininterrupta do progresso nas mudanças. Desse modo, o processo de transformação, ainda que lento, pros seguiria com uma reação em cadeia e seria verificável nos acom panhamentos ao longo de anos em pacientes tratados com tal método (9) (14) (18) (21).
Dificuldades do terapeuta
163
sua influência no processo terapêutico. Tal reconhecimento pode ria favorecer um exercício bem-sucedido da P.B., através de uma mais ajustada e eficaz adaptação do terapeuta ao seu enquadra mento, e aumentar o interesse pela investigação sobre esse méto do. A ninguém escapa que cm nosso meio só uma pequena mino ria de psicanalistas se ocupa da investigação em P.B. A maioria, em troca, interessa-se por outras técnicas, como por exemplo as psicoterapias grupais prolongadas (possivelmente mais gratificantes no sentido considerado neste trabalho). As experiências clínicas em P.B. adequadamente supervisio nadas são, no momento atual, muito necessárias para afastar pre conceitos e permitir a comprovação direta da real utilidade desse recurso terapêutico. . Se tudo isso se concretizasse, provavelmente fse conseguiria também uma valorização mais objetiva e favorável das terapias breves dentro do panorama da terapêutica psiquiátrica. Creio que é necessário um estudo mais exaustivo do proble ma. Aspiro a que estas minhas impressões funcionem como um estímulo e que finalmente consigamos obter descobertas que lan cem mais luz sobre o controvertido campo das terapias breves.
Referências bibliográficas 1. Alexander, F. e French, T., Terapêutica psicoanalítica, Paidós, Bue nos Aires, 1965. 2. Barten, H. H., “The Corning of Age of Brief Psychotherapies”, em L. Beliak e H. H. Barten (compils.), Progress in Community Mental Health, Grüne and Stratton, Nova York, 1969. Citado por L. Small em Psicoterapias breves, Granica, Buenos Aires, 1972. 3. Bellak, L. e Small, L., Psicoterapia brevey de emergencia. Pax-México, México, 1969. 4. Bleger. J., Simbiosisy ambigüedad . Paidós, Buenos Aires, 1967. 5. Devries, O. c col., “Ejemplos clínicos”, em H. Kesselman, Psicote rapia hreve, Kargieman, Buenos Aires, 1970, cap. VI. 6. Ferrari, H. c Marticorena, A., “Una experiencia en psicoterapia de tiempo limitado”, Coloquio Acta 1967: Psicoterapia Breve, Acta psiq.psicol. Amèr. Lai., junho de 1968, vol. XIX, n? 2, Buenos Aires. 7. Fiorini H. J., Comunicación personal.
lf}4
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
8 . , “Delimitation técnica dc psicoterapias”, Acta psiq. psicol. Amér. Lat., junho 1970, vol. XVI, n? 2, Buenos Aires. 9 . , “Dinamismos y niveles de cambio en psicoterapias”, em H. J. Fiorini, Teoria y técnica de psicoterapias, Nueva Vision, Buenos Aires, 1973, cap. 9. 10 . , “Psicoterapia dinâmica breve. Aportes para una teoria dc la téc nica”, Coloquio Acta 1967: Psicoterapia Bre\>e, Acta psiq. psicol. Amér. Lat., junho 1968, vol. XIX, n?2, Buenos Aires. 11. Freud S., “Los caminos de la terapia psicoanalitica”, cm S. Freud, O.C., Biblioteca Nueva. Madrid, 1948, t. II. 12. Malan, D. H., A Study o f Brie f Psychotherapy, Tavistock, Londres; Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Lditor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 13. Montevechio, B. R., Comunicación personal. 14. Rangcll, L., “Psicoanálisis y psicoterapia dinâmica: similitudes y diferencias”, Rev. de Psicoanálisis, t. XXV, III, 1,1971. 15. Searles, H., “Fases de la interacción paciente-terapeuta en la psico terapia de la esquizofrenia crônica”, Brit. Journal Med. Psychol., 1961. Apostila inédita. 16 . , “Introducción”, em Collected Papers on Schizophrenia and Related Subjects, Hogarth Press, Londres, 1965. Apostila inédita. 17 . , “Formas de inducir a la loucura”, em Elementos de la etiologia y la psicoterapia de la esquizofrenia, cap. VIII, B. J. o f Med. Psy chology, 1959. Apostila inédita. 18. Small, L.. ob. cit. em 2. 19. Szpilka, J. e Knobel, M., “Acerca de la psicoterapia breve”, Colo quio Acta 1967: Psicoterapia Breve, Acta psiq. psicol. Amér. Lat., junho 1968, vol. XIX, n? 2, Buenos Aires. 20. Usandivaras R., “Problemas que plantea la investigación sobre psicotcrapia breve”, em Coloquio Acta 1967: Psicoterapia Breve, Acta psiq. psicol. Amér. Lai., junho 1968, vol. XIX, n? 2, Buenos Aires. 21. Wolbcrg, L., “La técnica dc la psicoterapia breve”, em L. Wolberg e col., Psicoterapia breve, Gredos, Madrid, 1968, cap. VI. 22 . , e colaboradores, ob. cit. em 21.
9. Arespeitodoté rminodotratamento empsicoterapiabreve
t
<$»
Introdução Proponho-me neste capítulo a analisar algumas das vicissi tudes que se apresentam nas terapias breves psic analiticam ente orientadas , em razão do término do tratamento, partindo do reconhecimento de que tanto o paciente quanto o terapeuta de vem enfrentar o luto ocasionado pela finalização do vínculo tera pêutico. Quero expor de que maneira e até onde os resultados do tra tamento estarão de forma indefectível relacionados com as possi bilidades de ambos tolerarem suficientemente a separação. No que concerne ao terapeuta, sua capacidade de enfrentar o luto ade quadamente será uma condição fundamental para o manejo eficaz da situação. Com a finalidade de poder mostrar com mais clareza o que sucede com o binômio paciente-terapeuta ante a finalização de uma terapia de tempo limitado, dividirei minha apresentação nos
166
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Reações causadas no paciente pela separação A separação de seu terapeuta afetará o paciente com uma intensidade variável em cada caso, o que estará em parte relacio nado com uma estrutura psíquica correspondente. Certos pacientes, que possuem um ego relativamente forte, aceitam a separação melhor do que outros, e podem chegar a vivêla como uma oportunidade de comprovar e pôr cm prática o aprendido até entào durante o tratamento. Outros pacientes se conformam com o alívio sintomático, e uma vez conseguido este, desejam de bom grado o término do tra tamento. Em geral preferem, seguindo o modelo da clínica médi ca, que a terapia seja o mais curta possível. Diante da perda, em muitas ocasiões aparecem em troca an siedades intensas, e chegam a mobilizar-se inclusive o temor à morte e à loucura. Supõe-se que o fato repercuta mais em quem tem tendência a estabelecer espontaneamente vínculos de caracte rísticas simbióticas, regressivas e altamente dependentes, assim como naqueles cuja dependência regressiva tenha sido fomentada pelo terapeuta ao longo do tratamento. A repercussão da perda no paciente pode traduzir-se em manifestações diretas de pesar e/ou preocupação, ou evidenciarse de maneira mais velada, por exemplo, no material onírico. Este último foi o que aconteceu no caso de um paciente a quem atendi numa terapia breve. Perto da finalização da mesma, rclatou-me numa sessão vários sonhos, os quais mostravam, como denominador comum, suas ansiedades e hostilidade diante da separação, vivida inconscientemente como um abandono de minha parte1. Os sonhos eram semelhantes entre si (sobretudo os três primeiros a que me referirei), sendo talvez o primeiro deles o mais demonstrativo.
Primeiro sonho: O paciente aparece num depósito em que tempos atrás “tinha havido um ‘barulho’ ” - segundo sua expressão - porque continha mercadorias, e que agora está muito limpo e em ordem, ainda que se tenha “a impressão de
A respeito do término do tratamento em psicoterapia breve
167
to é negro. Por último, disse que no sonho lhe deviam di nheiro, o qual tinha de reclamar. Associou o depósito com aquele que, na realidade, havia tido um ano atrás em sociedade com um amigo. O depósito representava ele mesmo, particularmente sua cabeça, na qual havia ocorrido um “barulho” (confusão) quando chegou ao tratamento. Sentia agora que tinha as coisas (idéias) mais claras, sua mente mais “limpa” e seus pensamentos (no so nho, mercadorias), mais ordenados; mas ao mesmo tempo con densava no depósito sua sensação de abandono, de vazio pela separação. Disse-lhe que a menção a seu amigo parecia referir-se à minha pessoa; a sociedade era uma referência ao nosso contrato terapêutico, através do qual nos ocupávamos de jsua cabeça-depósito. Ele sentia, além disso, que ficava “separado no meio” como o depósito, e que eu interrompia sua reconstrução; seu acanhado protesto e reprovação contra mim, ao sentir-se abandonado, apa reciam no sonho como o dinheiro que lhe deviam e que tinha que reclamar. Também o teto simbolizava sua cabeça. A cor negra do mes mo foi associada pelo pacienttf como “mau augúrio, mau destino”; e era uma referência a seus temores pelos perigos aos quais se sen tia exposto por causa da separação. Este detalhe do sonho era, pois, especificamente, uma representação de seu medo à loucura2.
Segundo sonho: Um amigo seu trabalha como ajudante num teatro. Por sete horas de jornadas, pagam-lhe uma escassa so ma em dinheiro. Sente uma grande indignação. O amigo era por certo ele mesmo, que se encontrava muito enraivecido contra mim porque sentia que eu lhe dava pouco e que estava em dívida para com ele, abandonando-o, tal como aparecia no sonho anterior.
If)íi
Psicolerapia breve de orientação psicanalitica
abandono, sob a aparente satisfação de ter um aposento só para ele. Tinha que conservá-la (trabalhar) sozinho e não confiava em seus próprios recursos (as ferramentas negras. De novo figurava a cor negra como símbolo de mau augúrio). Quarto sonho: Vê um menino descer por um tobogã em
grande velocidade. Ao associar, expressou em tom risonho que o menino deveria ser ele, com muito medo de escorregar “ladeira abaixo”. Aparecer como menino tinha a ver alem disso com a relação de dependência infantil que cm parte havia estabelecido comigo. Depois, na mesma sessão, contou-me que em matéria de traba lho ele sentia que precisava de alguém que o guiasse e que não podia fazer nada p o r conta própria. Sua esposa lhe assegurava que isso não era certo e que devia animar-se a “navegar sozinho”. Novamente aludia a seus temores pela finalização do vínculo tera pêutico. Nesses pacientes, que por diferentes motivos não toleram suficientemente a separação, interessa ver qual é o destino da transferência, sobretudo cm circunstâncias nas quais o terapeuta pode perder o controle da situação. É possível que se produzam no paciente diferentes reações, que vão desde o afloramento de novos conflitos, ao aproximar-se o Tinal do tratamento, até a reação terapêutica negativa3, passando por retrocessos e pioras por simples manifestações de hostilidade transferencial e pelo acting out. Essas reações, como é óbvio supor, acham-se intimamente vinculadas entre si (são diferenciáveis só até certo ponto), superando-sè ou apresentando-se em forma sucessiva, freqüentemen te acompanhadas de defesas maníacas (negação da perda, des prezo pelo terapeuta, etc.). Por outro lado, pode resultar conveniente que o paciente tenha ocasião dc desenvolver essas reações enquanto se encontra sob tratamento pan< pa rm itif
g^j^-n
mais bem-examinadas, compreendidas e resolvidas no seio da relação terapêutica. a) A rcferência a novos conflitos nas partes finais do trata
A respeito do término do tratamento empsicoterapia breve
169
inconscientemente por um desejo de permanecer ligado ao tera peuta, tratando de despertar neste interesse por outros padecimen tos (numa tentativa de sedução por meio do material), ou ainda preocupação e - eventualmente - culpa por deixá-lo nessas condi ções, quer dizer, exposto aos perigos de conflito não resolvidos para conseguir deste modo que o tratamento seja prolongado. Deve-se procurar que o paciente tome consciência das motivações de sua atitude. E) Os retrocessos e pioras no estado do paciente são algumas das reações que se observam com maior assiduidade nas etapas terminais do tratamento psicoterapêutico breve, tal como em ou tras formas de psicoterapia, c freqüentemente constituem uma tentativa de evitar que lhe seja dada alta, e dom isso a dolorosa separação do terapeuta (ganhos secundários)J.O paciente, que até esse momento vinha inclusive evidenciando claros progressos e uma apreciável melhora sintomática, pode apresentar uma reapa rição de sua sintomatologia inicial, acusar um incremento de an siedade, de depressão, dos diversos transtornos somáticos, etc. Será conveniente assinalar ao paciente sua intenção incons ciente de õbter ganhos secundários através de suas recaídas nos últimos períodos do tratamento, tal como sugere Bellak (2). c) As manifestações de hostilidade transferencial podem co locar em sério perigo os resultados do tratamento. Quando tal hostilidade alcança certa intensidade, toma-se necessário inter pretá-la, como destaca Malan (6). Tal situação de separação, ao ser vivida consciente ou inconscientemente pelo paciente como um abandono, pode trazer como conseqüência algumas das de mais complicações que mencionei, ou sua raiva pode jogar por terra o obtido durante a terapia, posto que a manutenção da me lhora certamente dependerá em grande parte de suas possibilida des de introjectar e conservar uma boa imagem do terapeuta (2). Isso só será possível se prevalecer uma transferência positiva ao terminar o tratamento.
170
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
por outro objeto, etc.). Quando o terapeuta detecta essa tendência, deve inclinar-se à compreensão psicológica do conflito no pacien te, sobretudo por meio de interpretações “transferenciais”, evitan do assim as atuações. c) A reação terapêutica negativa se manifesta com freqüência através da interrupção brusca do tratamento por parte do paciente. Tal interrupção significa principalmente que o paciente quer abandonar - ativamente - o terapeuta para não sofrer de maneira passiva o que vivência como um abandono por parte deste.
Reações causadas no terapeuta pela separação Com freqüência, a separação repercute mais no terapeuta que no paciente. Ferrari e Marticorena comentam acerca da experiên cia em psicoterapia breve: “O mais notável (...) foi observar as dificuldades de desprendimento dos próprios terapeutas (...). Comumente, as dificuldades para separar-se apareceram mais do lado do médico que do paciente” (3). Já me ocupei em parte no capítulo anterior dos problemas do terapeuta para aceitar a separação do paciente ao chegar ao fim o vínculo terapêutico. O terapeuta pode apresentar resistência em reconhecer os eventuais progressos dõ paciente e atuar fomentando nêsferdiirantê"õ tràtarrrentoTãneurosê^transferencial e a regres são, em seu afa inconsciente de perpetuar sua dependência, evitando a ruptura de um vínculo que lhe oferece profundas gratifi cações, comumente negadas". A separação significa, para ele, vêrse privado de gratificações simbióticas; o luto provoca sentimen tos de desvalorização e perda (7)4. Üm mecãnísmõ defensivo do terapeuta ante as ansiedades pela separação é a negação do conflito e sua projeção maciça no paciente . o que às vezes adquire características de inoculação no civa, mesmo naqueles pacientes que inicialmente não se veriam demasiadamente afetados pela separação. O terapeuta “atua” nes sas circunstâncias através de suas intervenções (interpretações),
A respeito do término do tratamento em psicoterapia breve
171
mais um problema do terapeuta aue do paciente. Este, com efeito, não tem que vivê-la necessariamente como aígo penoso e angus tiante, sobretudo no caso de sentir-se seguro de sua própria capa cidade para enfrentar seus problemas, daí para a frente, por sua própria conta, com base no que adquiriu durante o tratamento. Adverte-se o terapeuta de que, ao fomentar a natural tendên cia regressiva do paciente com base numa extrapolação da técnica psicanalítica (uso reiterado ou sistemático de interpretações trans ferenciais, interpretação de material alheio ao foco, aumento da freqüência e/ou periodicidade das sessões, uso do divã, atuação pouco -ativa do terapeuta, etc.), o processo se complicará ainda mais (nenhum dos dois componentes do par aceitará facilmente a separação) desembocando com freqüência na Já mencionada recontratação, como expressão de uma necessidade mútua de pro longar a relação.
Aspectos técnicos Tenho mencionado até aqui a conduta que deve assumir o terapeuta diante da insinuaçào.ou franca aparição das diferentes reações do paciente, conduta que em síntese consiste em abordar o problema ocasionado pela iminente separação. Para isso será preciso interpretar a transferência; deixá-la de lado significaria correr o risco de expor o paciente a algumas das conseqüências às quais já fiz referência. Mas agora desejo examinar mais detida mente o problema da repercussão, perturbadora, do final do vín culo terapêutico sobre o paciente. Compreender melhor por que chega a produzir-se ou a incrementar-se, em certas ocasiões, e particularizar a conduta que, a meu ver, resultará mais convenien te em P.B., para tentar preveni-la, enfrentá-la e atenuá-la. 1. Considero que devemos nos remontar aos primeiros contatos com o paciente, já que o problema se coloca, de certo modo, desde j^momento em aue se efetua uma indicação de P.B. Como disse antes, haverá pacientes que superam melhor que outros a
172
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
(2) sublinha a importância de se efetuar previamente uma avalia ção das funções do ego, que servirá para o diagnóstico, prognósti co e tratamento, e que poderá ser realizada por meio de dados clí nicos e de testes psicológicos. Mas é sobretudo Malan (6) quem assinala especificamente a utilidade de detectar, antes do trata mento propriamente dito, a capacidade do paciente para suportar suficientemente o luto pela separação do terapeuta. Os testes pro jetivos poderiam oferecer-nos regularmente elementos para essa apreciação. Se, além de existir essa condição de tolerância diante da separação, trata-se de um paciente que atravessa um problema atual e se encontra motivado para efetuar uma psicoterapia, esta remos diante da situação menos discutível para indicar uma tera pia breve. Poderemos, pelo contrário, considerar que pode ser tec nicamente objetável indicá-la para um paciente que revele pouca capacidade para suportar e elaborar lutos e uma modalidade sim biótica, muito regressiva e dependente em suas relações de objeto, portanto mais propenso a reações como as já assinaladas c com menores probabilidades de êxito terapêutico5. Creio que em al guns casos as complicações que logo aparecem no tratamento breve, principalmente por ocasião da separação definitiva entre paciente e terapeuta, são em parte conseqüência dessa atitude ini cial, mas o que acontece c que em nossa prática assistencial com freqüência não temos outro remédio senão efetuar um tratamento de tempo limitado em muitos dos pacientes que apresentam essas características. Realizaremos uma eleição dos casos na medida do possível, pois sem dúvida será o mais conveniente; mas quando, por diferentes motivos, essa seleção não puder ser feita, não pode remos fazer outra coisa senão embarcar com o paciente num pro cesso que terá muito de uma difícil aventura e que requererá ao máximo nossa perícia terapêutica para poder atingir um bom final. 2. O passo seguinte será a contratação que temos de realizar, em especial com aqueles pacientes que apresentam uma franca
A respeito do término do tratamento empsicoterapia breve
173
mento; quanto às sessÕes, ter-se-á esp_eciiü cuidado em evitar que a freqüência das mesmas possa chegar a favorecer a tendência regressiva6. Üm aspecto que merece especial atenção dentro da contrata ção é a duração que fixaremos para o tratamento. Em algumas destas situações será preferível outorgar um tempo suficiente, de modo a permitir que uma parte do mesmo se destine à análise do luto pela separação1, sem que isto nos prive do tempo necessário para abordar a situação crítica em si, verdadeiro objetivo do trata mento8.* 3. Se seguirmos adiante no processo terapêutico, defrontaremo-nos com as complicações às quais aludimos, que poderão ser evitadas ou ao menos - freqüentemente bastanta atenuadas, se o terapeuta se desempenhar adequadamente ao lcfngo da terapia, conseguindo ajustar-se ao enquadramento da P.B. Vale dizer, se estimular no paciente sua iniciativa pessoal com um critério pros pectivo, em lugar de fomentar a neurose transferencial e a depen dência regressiva. Como procurei demonstrar no capítulo ante rior, isso dependerá de vários fatores: de sua familiaridade com a técnica da P.B., de que haja vencido os preconceitos contra todo procedimento que não seja o p'sicanalítico, além da tendência de extrapolar esse modelo técnico para a terapia breve por crer que só assim poderá obter bons resultados, mas também e fundamen talmente de que possa renunciar às gratificações que oferece o tipo de relação analista paciente e aceitar as condições, nesse sentido mais frustrantes, que a P.B. impõe. Em síntese, requer-se que o terapeuta tenha um insight dessa problemática e um auto controle de suas tendências naturais a estabelecer uma modalida de simbiótica de relação com o paciente que, segundo minha hipótese, é o que com freqüência costuma conduzi-lo - incons cientemente - a realizar consideráveis e decisivas modificações no enquadramento, favorecedoras da simbiose terapêutica. Considero que o manejo da relação transferenciai por parte do terapeuta, juntamente com sua capacidade para superar os pró
174
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
essa situação e não toma as precauções correspondentes, costu ma-se chegar a uma fase final do tratamento em que a separação se toma mais difícil para ele e para seu paciente, mais perturbado ra e mais frustrante: este se encontra no final numa atitude regres siva e dependente, e aquele, privado de seu objeto gratificante, com uma sensação de desilusão por haver efetuado um tratamento curto e pouco eficaz. Já ine referi à conveniência de abordar, geralmente na fase final do tratamento, o problema da separação. 4. Bellak e Small (2 ) também assinalaram a importância de manter algum contato com o paciente logo após haver-se encerra do o tratamento, a fim de que este não se sinta abandonado e de conservar uma transferência positiva. Para isso sugerem que se solicite ao paciente que informe o terapeuta de seu estado me diante cartas ou chamadas telefônicas. Considero que esse propó sito pode ser cumprido tanto ou mais satisfatoriamente por meio de entrevistas de acompanhamento.
Conclusões As maiores possibilidades de êxito, e por sua vez de se evita rem certas complicações ao longo de uma terapia breve em geral e, em razão do término do tratamento em particular, estão relacio nadas: 1. À capacidade do paciente de tolerar suficientemente o luto pela separação. Será conveniente tratar de detectar o grau de tal capacidade a partir dos primeiros contatos. -> 2. Às condições do contrato terapêutico: procurar-se-á dimi nuir a intensidade das regressões; em pacientes com tendência a estabelecer relações simbióticas terá que se oferecer um tempo suficiente de tratamento, que inclua a possibilidade de analisar o luto pela separação. 3. À capacidade do terapeuta para ajustar-se ao enquadra mento que a P.B. exige, evitando a extrapolação da técnica psica-
A respeito do término do tratamento em psicoterapia breve
175
transferencial, acting out, reação terapêutica negativa), recorrendo-se especialmente a interpretações transferenciais. Em essência dever-se-á ao menos assinalar a situação de luto, já que não conta mos com melhores possibilidades para a sua elaboração. 4. À manutenção de uma transferência positiva a posteriori da realização do tratamento, para o que poderão contribuir as en trevistas periódicas de seguimento. Em P.B. deve-se tratar de chegar à finalização do tratamento de modo tal que a alta coloque o paciente em condições de viver uma experiência estimulante e reasseguradora a partir da compro vação*de que seu aulodesenvolvimcnto agora é possível. No que se refere ao terapeuta, é de se esperar que encontre gratificações nos resultados terapêuticos, quer dizer, na obtenção dc uma atitu de relativamente independente e nos demais jlrogress.os do pa ciente, c portanto que encontre no método psicotcrapêutico breve um recurso útil, sem precisar em troca fomentar a gratificante simbiose terapêutica, radicalmente oposta aos propósitos ineren tes a esse procedimento.
Referências bibliográ ficas 1. Allegro, L., Comunicación personal. 2. Beliak, L. c Small, L., Psicoterapia breveyde entergencia, Pax-Mexico, México, 1969. 3. Ferrari, H., c Marticorcna, A., “Una cxperiencia en psicoterapia dc tiempo limitado”, cm Coloquio Acta 1967: Psicoterapia Breve, Acta psiq. psicol. Amér. Ia/. , junho 1968, vol. XIV, n" 2, Buenos Aires. 4. Fiorini, H. J., “Psicoterapia dinâmica breve. Aportes para una teoria dc la técnica”, cm Coloquio Acta 1967: Psicoterapia Breve, Acta Psiq. psic. Amér. Lat., junho 1968, vol. XIV, nf 2, Buenos Aires. 5. Laplanche, J. e Pontalis, J. B., “Reacción terapêutica negativa”, em Diccionario depsicoanálisis, Labor, Barcelona, 1971. 6. Malan, D. H., A Study o f Brie f Psychotherapy, Tavistock. Londres, Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina. Buenos Aires,
10. Algunsproblemasté cnicoscaracterí sticos eriscosempsicoterapiabreve
I
«»
Mencionarei aqui alguns inconvenientes técnicos de que so fre o exercício das terapias de tempo e objetivos limitados, assim como certos perigos que com elas se corre. Tanto os inconvenien tes como os riscos, acham-se relacionados com as peculiaridades desses tratamentos e com os eventuais erros dos terapeutas, e se apresentam com mais facilidade diante de pacientes que por de terminada patologia não resultam suficientemente aptos para obter maiores benefícios terapêuticos com o emprego desses pro cedimentos. 1. Os pacientes que recorrem excessivamente à intelectuali zaçâo podem criar sérias dificuldades, que aumentam nos casos cm que o terapeuta compreende a psicoterapia focal como um processo individual, reduzido a “explicar” ao paciente o significa do de suas manifestações patológicas, esperando que mediante a compreensão intelectual possa conseguir-se a cura. Ainda que nessas terapias se aspire a conseguir um insight que possa ser mais cognitivo que afetivo (Szpilka e Knobel [7]), este deve diferenciar-se do pseudo-insight com reforçamento da intelectualizaçào que, como vemos, é um risco que devemos ter em conta, entendendo além do mais que nessas terapias se realiza uma análise apenas parcial das resistências, que às vezes não é
178
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
terapia verbal de tempo e objetivos limitados, segundo o método que descrevi até aqui, já que diante de certos pacientes poderemos nos ver na necessidade de nos voltar - e reduzir - a um intenso trabalho interpretativo de suas resistências ao insighl , de modo que tenhamos que dedicar boa parte do tratamento ou inclusive todo o tempo que dure o mesmo a tal trabalho, sem que nos seja possível pretender outra coisa. Se bem que fazer ver ao paciente suas defesas patológicas possa ser importante, tais alterações caracteropáticas atuam como um freio que chega às vezes a difi cultar em grau máximo o trabalho relativo a seus problemas atuais, obrigando a uma recolocação estratégica1dos objetivos ou diretamente do tipo de tratamento recomendável. 2. Outro problema, originado no terapeuta e em estreita rela ção com o descrito em 1, que pode se apresentar com bastante facilidade é o de não exercer aquele um autocontrole adequado diante de certas vivências que possivelmente experimente na prá tica dessas terapias. Quando a duração estabelecida para as mes mas foi limitada, é habitual que se sinta um tanto pressionado em seu afa por obter determinados resultados, sensação que se incre menta ante a proximidade da finalização do tratamento. Se a impaciência o domina, corre o perigo de depreciar o timing e de “bombardear” o paciente com interpretações prematuras em seu desejo de oferecer-lhe muito mais do que este, nesse momento pelo menos, está em condições de assimilar, o que pode trazer paralelamente um aumento de suas resistências e de sua angústia ou ainda ocasionar sua deserção. Vinculadas com essa questão se acham as advertências formu ladas por T. French a respeito das “complicações resultantes das tentativas de forçar o conhecimento” (4). Esse autor assinala parti cularmente o efeito perturbador de certas interpretações em psico terapia breve, em razão do número relativamente reduzido de ses sões semanais com que se costuma trabalhar nela: “Devemos destacar aqui a grande diferença no uso da interpretação quando se vê o paciente todos os dias ou quase todos os dias, e quando se o vê uma
Alguns problemas técnicos característicos
179
angústia. Formulada essa mesma interpretação numa psicoterapia mais breve, a angústia poderia acumular-se em tal medida que o paciente cairia em pânico (...). Requer-se portanto maior atenção e inclusive maior agilidade por paflecíõ terapéutã^T3X 3. A partir da necessária circunscrição que a abordagem de uma terapêutica setorial requer, em que se deve atender preferen cialmente àquilo que concerne à conflitiva focal do paciente, exis te a possibilidade de que a dinâmica do tratamento sofra uma limi tação esquemática , com o conseqüente estancamcnto. Mas todo terapeuta disposto a manter-se suficientemente receptivo às comu nicações 4o paciente e a extrair sempre novos significados poderá contribuir na obtenção de um processo terapêutico rico, possibili tando reajustes e descobertas que o conduzam a readequar-se à estratégia, evitando assim ficar reduzido a um plar£> rígido que, em virtude de o ser, limite seus alcances. *> 4. O manejo técnico deficiente por parte do terapeuta - por transposição da técnica psicanalítica - pode fo m enta r iatro genicam ente a regressão vivencial e a neurose de transferência no pa ciente e acarretar diversas complicações, dada a fugacidade da relação paciente-terapeuta e, diante da separação, levar às com plicações que já mencionei nos capítulos 8 e 9, assim como as me didas preventivas e terapêuticas a 'serem tomadas. 5. Mas a regressão, indesejada, alcança inevitavelmente e de modo espontâneo grande intensidade em algumas ocasiões. Em nosso meio se observou a ocorrência desse fato especialmente em tratamentos de pacientes de baixo nível sociocultural, que recorrem a estabelecimentos assistenciais por contar com uma oportunidade única de confiar seus problemas a um profissional, quer dizer, uma pessoa qualificada que possa escutá-los sem julgá-los (5 ). 6. O trabalho do terapeuta pode ver-se dificultado, compro metendo-se, com isso, a eficácia do procedimento toda vez que não seja possível delimitar com facilidade o fo c o e, em conse qüência, tampouco os objetivos do tratamento, diferentemente do que acontece quando uns e outros surgem de maneira clara e pre cisa, como por exemplo nos quadros reativos. Não contando com
180
Psicoterapia breve de orientação psicanaiítica
7. Diante de pacientes com sentimentos de perda patológicos e/ou recentes de importância, submetidos a tratamentos cuja dura ção, limitada, resulta curta, isto é, insuficiente para abordar com possibilidades de benefícios terapêuticos apreciáveis a dita proble mática, existe a alternativa de que sofram uma reativação traumáti ca desses sentimentos, precisamente em função da limitação tem poral e da separação com respeito ao terapeuta, que reaviva a per da, com os perigos conseqüentes (acentuação da angústia e da dor. depressão, acting out , etc.). Portanto e antes de mais nada, há de se rever nesses casos na medida do possível - a indicação terapêuti ca, em particular o que corresponde à duração do tratamento, pro curando dotar o processo terapêutico do tempo necessário para evitar esses efeitos indesejáveis. (Pode ser adequado instituir uma técnica de enfoque com final “aberto”, por exemplo.) 8. É sabido que em P.B. o terapeuta deve de modo iieral dedicar o trabalho terapêutico à resolução de problemas da realidade externa atual do paciente (comumente representados por conflitos em determinadas relações interpessoais), apelando freqüentemente para isso para as interpretações, chamadas “extratransTerenciais”. Devemos então reconhecer uma limitação própria des'sãTtênípias, que às vezes adquire grande importância, à qual já mc referi no capítulo 6 (ver “Interpretações extratransferenciais”, p. 102) e que aqui menciono novamente. Trata-se do fato de o terapeuta não contar com conhecimento suficiente do paciente em particular de suas relações de objeto - além de ter pouco tempo para adquiri-lo durante o tratamento, em função da curta duração deste e de serem as sessões relativamente pouco freqüen tes. Assim sendo, encontra dificultado seu acesso a uma adequa da compreensão em interpretação dos sucessos do mundo externo do paciente , o que pode acarretar diversas conseqüências negati vas se não trabalha com cautela suficiente. Esse inconveniente pode acentuar-se no caso de pacientes que, por deficiências egóicas, registrem uma marcante distorção
Alguns problemas técnicos característicos
1H1
terapeuta na apreciação da natureza dos conflitos da realidade exrema do paciente. Na terapêutica breve, a limitação mencionada deve compen sar-se com um estudo prévio exaustivo e o mais profundo possível do paciente no começo do tratamento (uma razão poderosa para realizar várias entrevistas diagnosticas quando o caso o requer, confeccionar uma história clínica minuciosa, e muito especial mente detectar as principais características das relações objetais do paciente, sobretudo através de testes projetivos). Esse estudo prévio deverá então prover-nos de elementos diagnósticos nos quais possamos apoiar nossas hipóteses explicativas e nossas in tervenções terapêuticas. 9. Os pacientes que evidenciam tendências ao acting o ut in troduzem um novo problema técnico. Uma mediqa poderá ser contratar um número necessário talvez maior que o habitual nessas terapias - de sessões semanais - três, por exemplo - para garantir uma tarefa interpretativa mínima da transferência desen volvida que permita diminuir as possibilidades de apresentação da conduta de acting out. Se bem que elevar a freqüência das ses sões traz consigo por sua vez outro risco, o de favorecer a depen dência regressiva do paciente; é o preço que se há de pagar para evitar uma complicação maior, e às vezes sumamente perigosa - a do acting out. 10. Por outro lado, o risco do acting out aumenta quando o caminho se vê possibilitado ou facilitado porque o terapeuta, leva do pelo critério de orientar o paciente na direção dos problemas atuais de sua realidade externa, prescin de em demasia da análise da transferência. Fantasias transferenciais negligenciadas podem então ser atuadas por parte do paciente. > Em seu afã de conseguir “resultados práticos” em pouco tempo, o terapeuta pode induzir a atuação2. 11. Entre outros resultados que se podem produzir em rela ção ao assinalado em último lugar no item 10, figuram as meras condutas adaptativas , promovidas pelo fervor terapêutico, que implicam modificações só em nível superficial. Também se des
182
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
detratores dessas terapias não vacilam em rotular pejorativamente como fuga à saúde ou cura transferencial todo sucesso do pac iente obtido através das mesmas3. As recaídas, ainda que se produzam na ausência dos fatos que acabo de citar, conjuntam ente ou em co ntinuação a eles, con figuram em troca uma eventualidade mais ou menos freqüente nessas terapias. Teremos de contar com essa possibilidade, pois são a expressão de uma reativação dos conflitos que tinham sido objeto de uma resolução em essência incompleta, o que é regra nessas terapias, ou correspondem diretamente a uma resolução falsa' Nessas ocasiões costumamos detefctar a persistência dos conflitos transferenciais subjacentes, incrementados pela separa ção devida ao término da terapia, a qual pod e ser vivida como um abandono e con dicionar diversas reações prejud iciais ao paciente, durante e depois do tratamento (ver capítulo 9). Os agravamentos constituem uma complicação que por sua vez também pode estar relacionada com a separação, em função do final do tratam ento ( ver capítu lo 9, pp. 168 s j . Em todos esses casos, o acompanham ento prolongado possihilitará a comprovação desses resultados e a adoção das medidas terapêuticas mais indicadas.
Referências bibliográficas 1. Alexander, F., “Contribuciones psicoanalíticas a la psicotcrapia bre ve”, em L. Wolberg e col., Psicoterapia breve, Grcdos, Madrid, 1968, cap. V. 2 . , “Psicoanálisis y psicoterapia”, em F. Alexander, Psico anâlisisy psicolerapia, Psique, Buenos Aires, 1960, cap. Vlli. 3. French, T., “La dinâmica dei proceso terapêutico”, cm F. Alexander e T. French, Terapêutica psicoanalitica, Paidós, Buenos Aires, 1965, cap. VIU. 4 . , “Planificación de la psicoterapia”. em F. Alexander e T. French, ob. cit. em 3, cap. VII. 5. Kaplan, C., Síntesis y debate. Curso para graduados de Técnicas en Psicotcrapia Breve. Organizado pela Soe. Arg. De Psicologia Médica, Psicoanálisis y Medic. Psicosomática (Asoc. Méd. Arg.) Buenos
Alguns problemas técnicos característicos
183
6. Racker, H., “Técnica analítica y la mania inconsciente dei analista”, em H. Rackcr, Estúdios sobre técnica psicoanalitica , Paidós, Buenos Aires, 1969 (Estúdio Víll). 7. Szpilka, J. e Knobel, M., “Acerca de la psicoterapia breve”, Coloquio Acta 1967: Psicoterapia Breve, Acta psiq. psicol. Amér. Lat., junho 1968, vol. XIV, n? 2, Buenos Aires.
11. Aavaliaçã odosresultadosterapê uticos empsicoterapiabreve
í Introdução A avaliação dos resultados terapêuticos nas terapias breves tem por finalidade primordial verificar se estão sendo cumpridos os objetivos fixados. Paralelamente se poderá indagar outros as pectos que resultem de interesses, como logo veremos. Com base na avaliação dos resultados obtidos, será possível recolocar a situação do paciente e determinar os passos a serem seguidos a partir desse momento. Quero destacar a conveniência de que a tarefa avaliatória não fique exclusivamente a cargo do terapeuta, mas que haja partici pação ativa do paciente. Considero que isso permitirá que a apre ciação dos resultados seja enriquecida e possa na maioria das vezes aproximar-se mais da realidade, o que não costuma aconte cer quando é efetuada de forma isolada por ambos os protagonis tas do processo terapêutico. Desse modo, a avaliação conjunta deixa no paciente a impressão de que se levou a caso uma tarefa em comum, a qual tem assim um encerramento cuidadoso, plane jado, no qual se aprecia sua opinião, requerida num intercâmbio cordial e franco com o terapeuta. Este último passo do processo
186
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
No que se refere ao terapeuta, o emprego de um procedimen to metódico de avaliação dos resultados terapêuticos, de base psicodinâmica, costuma estimulá-lo a efetuar um estudo mais exaus tivo dos mesmos, permitindo um registro que facilite a elaboração estatística e ulteriores investigações quanto aos alcances e limita ções do procedimento que nos ocupa1.
Um método de avaliação A partir das considerações expostas por Usandivaras em nos so meio, recordarei uma questão básica. Nada melhor do que transcrever suas próprias palavras: “Para que uma avaliação de terapia seja realmente válida deve ser não apenas imediata, ao ter mino da cura, mas também mediata. É necessário o follow-up ou acompanhamento do paciente em alta para poder saber se os resultados alcançados se mantêm e durante quanto tempo”(6). (Grifos do autor.) A avaliação é, dentro do possível, anunciada e ajustada de antemão com o paciente ao efetuar-se o contrato terapêutico; explica-se quais são seus motivos, como se fará e quais serão as datas de realização das entrevistas de avaliação imediata, já que as de avaliação mediata costumam ser combinadas a partir da finali zação do tratamento, variando sua periodicidade em função de diversos fatores, em parte relacionados com as necessidades e possibilidades de cada caso (entrevistas a cada seis meses, um ano, etc.). O procedimento que descreverei é o que adotei pessoalmen te2. Como qualquer outro, é suscetível de ser objetado e/ou aper feiçoado a fim de se conseguir uma maior precisão. Não obstante, sem chegar a constituir um rigoroso instrumento de medição, con sidero que possui um valor prático, na medida em que provém de uma técnica suficientemente fundamentada. Para levar a cabo a avaliação tanto imediata como mediata, recorro a dois recursos fundamentais: a) entrevistas com o pacien te (eventualmente estendidas a familiares e/ou figuras próximas
A avaliação dos resultados terapêuticos
187
A avaliação imediata Efetuam-se duas entrevistas. A primeira, de uns 40 minutos de duração c que se realiza pouco depois de finalizada a terapia, está destinada a recolher as apreciações e informações que o paciente fo rnece (auto-avaliação). Na segunda, um pouco mais breve, tem lugar uma devolução por parte do terapeu ta, que inclui a avaliação dele. A técnica qu e utilizo na prim eira entrevista de avaliação ime diata» é a seguinte: para c omeça r, indico ao pacie nte que p oderá expressar amplamente suas opiniões acerca do tratamento que acaba de concluir e de seus resultados e que ein seguida lhe for mularei algum as perguntas a respeito. N a primeira parte da entre vista, o paciente op ina sobre distintos pontos: ás mudanças n ota das, como havia imaginado que seria seu tratamento, que críticas sugere, as vivências que teve, de que forma foi ajudado, etc., im pressões que haverão de ser úteis para o terapeuta. A seguir efetua-se um a indagaç ão sistemá tica da auto-avalia ção do paciente, a propósito dos pontos que exponh o mais abaixo, com base em pergun tas, se possível claras c simples. Na segunda entrevista, geralmente realizada poucos dias depois da primeira, comunico ao paciente minha própria avalia ção estudo prévio de todo o ma terial recolhido na primeira entrevista - que confronto com minhas observações. Depois de haver revisado a evolução do caso, já estou em condições de transmitir-lhe minhas impressões sobre cada um dos pontos conside ra dos, tratando ao final de precisar fundamentalmente: l ) o que se aclamou e se resolveu e o que ficou pend ente; 2) minha opinião a respeito dos próximos passos a serem seguidos. P Para avaliar cada caso levo em conta os seguintes pontos: In sig ht da problem ática focal (LP.E) Reso lução da prob lemática focal (R.P.F.)
188
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
"Insight ” da problem ática fo ca l (l.P.F)
Incluo esse ponto, pois me parece de decisiva importância. As expectativas do terapeuta no sentido de que se produzam modificações significativas e medianamente perduráveis no pa ciente devem assentar-se principalmente no insight que este possa adquirir a respeito dos dinamismos psíquicos subjacentes à situaçào-problema. Para o paciente, trata-se de saber concretamente se chegou a compreender seus problemas de um modo diferente e mais profundo. Na realidade, a avaliação, neste ponto, mais do que em qualquer outro, depende do terapeuta, a quem diferentes indicadores clínicos, ao seu alcance ao longo do próprio tratamen to, já lhe terão dado indicações sobre o grau de insight obtido (quando a uma interpretação se segue um silêncio reflexivo do paciente, ou a associação por parte deste com situações análogas à que foi objeto de interpretação, ou uma mudança do clima emo cional da sessão, com uma sensação contratransferencial de desa parecimento das resistências, ou uma exclamação do paciente que revela surpresa diante de uma descoberta, etc.). Resoluçã o da problemática fo c a l (R.P.F.)
Além de excluir conclusões acerca da existência ou não de insight sobre a problemática focal de cada caso, levo em conside ração este item, que se refere à resolução propriamente dita dessa mesma problemática e sobre cuja denominação cabem alguns esclarecimentos. Veremos o que implica o termo resolução tanto dinâmica quanto clinicamente. Em relação ao primeiro, significa que as mudanças produzidas mediante o tratamento deverão basear-se essencialmente no insight para que sc possa considerar tal resolução como real. ou seja, que, neste caso, o item precedente, I.P.F., registre invariavelmente um resultado positivo." quer dizer, a existência de insight'. Mas aqui me refiro apenas a expe
A avaliação dos resultados terapêuticos
como poderia esperar-se - ainda com certas reservas num tratamento psicanalítico. Trata-se então, como já foi assinalado anteriormente (ver capítulo 3, p. 24yde uma resolução dinamicamente incompleta ou parcial , t> que explica que possam produzir-se recaídas circunstanciais. Cm suma, podemos esperar na melhor das hipóteses que o conflito se torne inativo, deixando assim de ter um caráter perturbador por um período cuja duração é impre visível. Clinicamente, a resolução pode traduzir-se com freqüência na superação de um episódio (com aquisição de certo grau de insight e retorno ao equilíbrio psicológico). De um modo mais preciso, e seguindo Malan, o termo resolução é uma forma sinté tica de fazer referência à substituição de uma reação imprópria por outra, apropriada (4). Malan acrescenta que isâo não confunde necessariamente a resolução do processo patológico subjacente, fato que por outro lado não seria possível distinguir. Aclarado o significado do termo do ponto de vista clínico, veremos que neste sentido, sempre baseando-nos em Malan, a resolução poderá ser total ou parcial. A primeira corresponde à definição do termo já assinalada e se apresenta quando um paciente, depois do trata mento e ante situações ligadas-'à conflitiva focal, não só deixa de registrar as dificuldades e sintomas do início, mas em troca enfrenta tais situações de uma forma mais adequada. O mesmo autor dá um exemplo muito claro, referindo-se ao caso de um homem que tinha uma relação conflitiva com seu patrão, cuja resolução clinicamente total seria dada pela desaparição de seu medo do patrão e de seus temores obsessivos de cometer erros em seu trabalho, ao qual devia somar-se o fato de que começara a ter confiança em seu próprio desempenho e que se estabelecera uma relação satisfatória com seu patrão, sem excessiva submissão ou hostilidade. Por outro lado, a resolução clínica parcial consistirá no desaparecimento de uma reação inadequada (por exemplo, irritabilidade, ansiedade, etc.), que não venha acompanhada da reação apropriada (4).
190
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
expensas da evitação das situações conflitivas. Denomina dq f alsa situação valiosa àquela na qual as mudanças se vinculam com alguma determinação do paciente ou com algum outro fato signi ficativo gerado a partir do tratamento, que serve para romper um circulo vicioso e instalar em seu lugar um ganho benigno e modi ficações vitais (4)4. Bem, Malan assinala que na prática se colo cam interrogações decisivas: Como reconhecer a melhoria “bási ca” ou “específica”? Como diferenciar uma “resolução” real de várias categorias de “soluções falsas”? (£). Sem dúvida, efe tuar tais distinções pode ser às vezes uma tarefa difícil, cuja reali zação costuma ser faciütada mediante um estudo realizado ao longo do acompanhamento, em realidade imprescindível se se pretende valorizar adequadamente o item R.P.F., ao qual deverão agregar-se os elementos fornecidos pelo psicodiagnóstico. As apreciações contudo continuarão tendo caráter empírico. Não obstante, é possível mencionar, com fins de orientação, algumas das distintas possibilidades que podem ocorrer em maté ria de resultados terapêuticos, partindo-se da idéia de aceitar como real toda resolução da problemática central do tratamento que, assentando-se no insight, perdure sem que se produzam re caídas ao longo de um determinado período, que podemos fixar arbitrariamente, por exemplo, em 24 meses a partir da finalização da terapia, desde que o paciente não se submeta a outro tratamen to psicoterápico nesse intervalo. Desse modo podem apresentarse alternativas como as seguintes: 1. Resolução (clinicamente) total da problemática focal [R.P.F.: Sim (total)]. 2. Resolução (clinicamente) parcial da problemática focal [R.P.F.: Sim (parcial)]. 3. Resultado duvidoso [R.P.F.: ?] 4. Sem modificações na problemática focal [R.P.F.: Não]. 5. Aparente resolução da problemática focal, total ou parcial (clinicamente), instável, com recaída [R.P.F.: Não]. 6. Falsa solução valiosa [R.P.F.: Não].
A avaliação dos resultados terapêuticos
191
A avaliação deste ponto (R.P.F.) também é patrimônio do terapeuta, embora este deva conhecer, como sempre, as impres sões do paciente sobre o caso, ou seja. se, na opinião deste, se solucionaram ou não seus problemas através do tratamento.
Melhoria sintomática (M.S.) A observação da evolução dos sintomas adquire particular impoftância nessas terapias. A melhoria sintomática pode che gar a ser o principal objetivo terapêutico, como no caso de pacientes que apresentam uma grande debilidade egóica, per manente ou transitória (esta última é típica dg episódios agu dos), nos quais se procura às vezes - ao menos inicialmente uma remissão sintomática. Além disso, é de se desejar, quando possível, que o alívio ou o desaparecimento dos sintomas seja o corolário de mudanças internas (melhoria pelo insight), que por sua vez resultem de havermos penetrado com o paciente na psicogênese de seus sintomas. Cabe advertir quanto à falsa solução por evitação (4), em (unção da qual o paciente, “assintomático”, encontra-se na reali dade pior que no começo.
Consciência da enfermidade Compreende a indagação sobre se houve ou não uma tomada de consciência por parte do paciente a respeito da existência de uma enfermidade “de base”, tomada de consciência que, portan to, deve transcender o mero reconhecimento da natureza patológi ca do transtorno atual. Para isto poder-se-á inquirir, por exemplo, se considera que persistem nele outras dificuldades que requei ram resolução.
192
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Auto-estim a
Como acontece com o item anterior, também a elevação da auto-estima e as possibilidades de uma auto-regulação adequada dela, configuram uma finalidade que convém ter presente. A maior parte das pessoas que procuram uma consulta psiquiátrica registram uma diminuição de sua auto-estima. Seu incremento (conseqüência natural de um tratamento caloroso por parte do terapeuta e também do efeito particular de determinadas interven ções do mesmo) constitui um ganho terapêutico nada desdenhável, não só porque por si só significa para o paciente maior bemestar, mas também por sua influência direta no funcionamento egóico, através da qual pode promover modificações positivas*. O estado atual da auto-estima detecta-se por meio de diver sos dados, recolhidos tanto nas entrevistas como no psicodiagnóstico. Pode servir de simples exemplo, sem entrar aqui em con siderações profundas, o fato de se notar num indivíduo, que no começo do tratamento impressionava pelo descuido consigo mesmo, uma maior preocupação com seu aspecto pessoal, permitindo-se expandir-se, etc. Outras mod ificações favorá veis
Já que se trata de um procedimento terapêutico orientado para a realidade cotidiana do paciente, interessa averiguar se se têm eventualmente produzido mudanças em aspectos como sua vida sexual, suas relações de casal, outras relações interpessoais, especialmente as familiares - com pais, irmãos, etc. - mas tam bém as de amizade, profissionais, etc.; nos estudos, no trabalho e na recreação, atendendo ao uso que faz de seu tempo livre (o que permitirá explorar sua capacidade de gozo, sua iniciativa pessoal, sua criatividade, etc.).
193
A avaliação dos resultados terapêuticos
ção no que se refere a realizações futuras em aspectos tais como estudos, trabalho, possíveis migrações, etc. 2) A partir daí, contase com a possibilidade de adotar certas determinações. Tudo isso implica por sua vez certo autoconhecimento e a aceitação de algu mas perspectivas e limitações. Quando as metas terapêuticas não guardam maior vinculação com o que concerne aos planos pessoais do paciente, esta questão configura por si um objetivo à parte, pois nem sempre é possível abordá-la num tratamento breve. Em geral, a exploração dos distintos pontos citados pode ser vista como uma reavaliação do estado das funções egóicas do paciente depois de efetuado o tratamento. i»
Psicodiagnóstico É conveniente efetuar o reteste não antes de que tenham trans corrido pelo menos seis meses desde a realização do psicodiag nóstico inicial, já que do contrário é menos provável que possam registrar-se mudanças significativas no material. O novo psico diagnóstico, comparado com ó anterior, permite ampliar a obser vação das modificações obtidas. Harrower, que realizou uma investigação com numerosos pacientes tratados com o método terapêutico breve, refere que na maioria dos casos os testes exploratórios não revelavam diferen ças destacáveis quando se efetuavam imediatamente depois de finalizado o tratamento. Mas as provas realizadas ao cabo de vários anos com estes mesmos pacientes, sem que no ínterim mediasse qualquer tratamento psicológico, registravam uma notá vel melhora, o que parece indicar também que a posteriori desses tratamentos se desenvolve um processo ativo e gerador de mudan ças (2). Comprova-se freqüentemente, entre outras descobertas, a
194
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
te ao paciente. Só desse modo, evitando que haja variáveis, a com paração dos resultados de um e de outro estudo terá validade. Alternativas do paciente ao terminar o tratamento
Este tema já foi considerada por outros autores. Comentarei aqui apenas algumas questões que me parecem de interesse. As distintas possibilidades que devem ser levadas em conta ao concluir o prazo terapêutico são: * 1. A se paraçã o de pacie nte e terapeuta, sem programação de futuros encontros. 2. A combinação de entrevistas perió dic as de acompanha mento. 3. O estabelec imento de um recontrato. 4. A indicação d e outro tipo de tratamento. 1. A separação de pa cie nte e terapeu ta será decidida sempre
e quando aquele estiver em condições de enfrentá-la. Ser-lhe-á comunicado, como é natural, que poderá consultar-se novamente toda vez que sinta necessidade de fazê-lo. 2. Do acompanhamento me ocupo em “A avaliação media ta”, pp. 196 ss. 3. O estabelecimento de um recontrato pode realizar-se cm várias circunstâncias: a) se nào se cumprirem os objetivos; b) havendo sido cumpridos, se se colocam novos objetivos limita dos. No primeiro caso trata-se de um prolongamento necessário do tratamento, em que o prazo inicial pode ter sido insuficiente para alcançar as metas estabelecidas. Quando, durante o tratamento, o terapeuta considera neces sário prolongá-lo (recontrato), convém que proponha isso ao paciente sem esperar que se cumpra o prazo inicialmente fixado, quer dizer, no momento da avaliação. Atuar de modo contrário suporia expor o paciente a uma falsa situação de separação ime diata, com conhecimento do terapeuta, que se veria, além disso, compelido a trabalhá-la, o que, como é óbvio, carece de sentido.
A avaliação dos resultados terapêuticos
195
nuação de uma terapia de tempo e objetivos limitados desperte no paciente o interesse de efetuar uma psieoterapia prolongada. Há, além disso, terapeutas que sugerem completar a experiência cor retiva de terapia individual com um tratamento grupai posterior. Quero destacar que a passagem de um paciente de um trata mento breve que está por finalizar para um tratamento prolongado (por exemplo, psicanálise), quer se realize de imediato quer depois de haver transcorrido algum tempo entre um c outro, não constitui por si só nenhum indício de fracasso ou êxito do trata mento efetuado, questão sobre a qual ’outros se têm pronunciado de maneira similar. Na realidade, tanto pode responder ao primei ro como ao segundo. Ocorre no caso em que se decida realizar um tratamento prolongado ao ficar comprovado qfie a técnica focal resultou ineficaz e que na oportunidade se requêr outro enquadra mento. Pode tratar-se também de um paciente que o tratamento breve haja motivado para uma exploração mais profunda, ampla e prolongada de seus conflitos, com vistas a modificar aspectos de seu caráter, modelos repetitivos de conduta, etc., quer dizer, com outros e mais ambiciosos objetivos, e que tenha adquirido além disso maior consciência da enfermidade e maior confiança na psicoterapia, ao confirmar que*'a melhoria é possível, tudo o que o toma agora mais apto para realizar ura tratamento dessa natureza. Na prática o tratamento poderá ser solicitado pelo próprio pacien te ou ser recomendado pelo terapeuta. Aqui o passo para a psicoterapia prolongada é uma conquista importante da terapia breve. Se o novo tratamento deve ou não ser feito pelo mesmo tera peuta pode constituir um tema polêmico que merece alguns co mentários. As opiniões a respeito parecem bastante divididas. De minha parte, creio que não se pode generalizar afirmando que tal ou qual posição será mais adequada em todos os casos. Penso que tanto uma alternativa como outra oferecem vantagens e desvanta gens. Se se considera a possibilidade de que seja o mesmo tera peuta quem efetue o novo tratamento, pode-se contar a seu favor
196
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
luto da separação, que fica reduzido ao ocasionado pela eventual mudança do tipo de relação paciente-terapeuta7. Mas é precisa mente no que concerne a tal mudança que residem as desvanta gens. O paciente pode experimentar dificuldades para aceitar as modificações da relação com seu terapeuta devido às característi cas do novo enquadramento. Paralelamente, essa situação pode trazer complicações transferenciais, provocadas pela hostilidade gerada ao passar - de um modo contraditório para ele, tal como se vê a transformação de seu vínculo com o teçapeuta - de uma rela ção mais definida e calorosa do diálogo fluido e mantido “frente a frente” para outra, mais ambígua, na qual o terapeuta estabelece maior distância afetiva, e que propõe outra disposição espacial, sendo em suma mais frustrante. Toda essa situação pode confun dir e desconcertar o paciente. Por isso, às vezes, diante de um novo tratamento, o mais conveniente pode ser recorrer a um novo terapeuta. Em cada situação, haverá de se pesar cuidadosamente distintos fatores, correspondentes não só ao paciente mas também ao terapeuta. Talvez algo que possa ser feito, diante de um paciente sub metido a um tratamento breve, seja considerar firmemente a pos sibilidade de aceitar a continuação de tal tratamento, uma psica nálise, com o mesmo terapeuta, e que este, sem chegar à atitude de ambigüidade psicanalítica, seja menos demonstrativo com o paciente, desempenhe um papel um pouco menos ativo que o habitual nas psicoterapias focais e regule mais determinado tipo de intervenção que possa contrastar com as da técnica psicanalíti ca que depois terá de adotar, para que a passagem à nova forma de relação terapêutica seja mais gradual e que a situação criada possa ser manejada sem que se produzam reações transferenciais inde sejáveis, preservando-se ao mesmo tempo o setting necessário. A avaliação mediata
A avaliação dos resultados terapêuticos
197
procedimentos e formular hipóteses sobre os prováveis mecanis mos terapêuticos atuantes. É nessas circunstâncias que são postos à prova os ganhos obtidos, já que com o passar do tempo estes podem consolidar-se ou seguramente descaracterizar-se, dando lugar também a recaídas. Pode ser efetuado, então, um estudo mais preciso que na avaliação imediata e por conseguinte uma avaliação mais correta das mudanças produzidas. Às vezes o acompanhamento torna possível distinguir melhor, por exemplo, uma cura transferenciai de efeitos fugazes, ou melhor, uma “fiiga para a*saúde”, de autênticas melhorias causadas pelo insight. Além disso teremos oportunidade de comprovar se depois da remoção do obstáculo continuam ou não evidenaiando-se novos progressos, quer dizer, certas mudanças prospectivas ligadas ao tratamento, verificáveis tanto clinicamente como por meio de psicodiagnóstico. Às vezes, as mudanças esperadas só se manifestam no acom panhamento, ou seja, depois de transcorrido um certo período, desde a finalização do tratamento, que pode ser prolongado. Também podem ser explorados em detalhes determinados aspectos do processo terapêutico, tais como a conduta do paciente diante do terapeuta no acompanhamento, isto é, a evolução da rela ção transferencial e sua conseqüente vinculação com o estado do paciente (como o realizou o grupo de Malan [4], que estudou esses fatos com relação ao grau de interpretações da transferência exis tente ao longo dos tratamentos efetuados). Conhecemos sobeja mente, por exemplo, os perigos que derivam de certos aspectos transferenciais não-resolvidos, que poderão então ser pesquisados através de entrevistas periódicas de controle. Assim, nos encontra remos tanto com pacientes que vêm entusiasmados, mostrando-se colaboradores e agradecidos, como com outros que se apresentam queixosos ou ainda não compareçam, evitando o encontro. Mas os alcances do acompanhamento não se reduzem a uma só face, a investigação, mas este representa por sua vez um recur
m
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
figurar uma continuação espaçada do tratamento, no qual a insti tuição c um continente para o paciente, que desenvolve assim certa pertinência à mesma (3). Além disso, mantendo-se contato com o paciente, este tem uma possibilidade de reasseguramento e tranqüilização, já que pode objetivar a permanência das melhorias alcançadas. Por último, quando existe um controle periódico da avaliação do caso, é factível detectar novas manifestações sintomatológicas ou a reaparição das já conhecidas e com isso a indi cação psicoprofilática ou psicoterapêutica necessária, antes que o processo patológico alcance maior desenvolvimento. A técnica das entrevistas , em essência similar à descrita a propósito da avaliação imediata, leva em conta os mesmos itens, aos quais se deverá agregar a indagação acerca de possíveis novos ganhos e/ou problemas que possa apresentar o paciente. Além disso haverá uma “devolução” do terapeuta, que transmitirá suas impressões, assim como suas sugestões para o futuro. Tudo isso deverá efetuar-se em uma ou mais entrevistas, de acordo com as necessidades. O reteste será realizado conforme as condições enunciadas anteriormente (ver p. 194). Também já fiz menção de que é nessas circunstâncias que o psicodiagnóstico pode registrar as mudanças significativas produzidas por essas terapias. Aprofundando-nos no que podemos explorar por meio do controle periódico do paciente, assinalarei alguns pontos de ma neira sucinta. Se considerarmos concretamente as mudanças e melhorias sintomáticas , é mister indagar ao menos, já que nem sempre tere mos respostas concludentes a essas interrogações, a que mecanis mos respondem e qual é o alcance e a estabilidade de tais mudan ças, temas aos quais me referi em parte no capítulo 3 (ver pp. 49 ss.). A respeito dos mecanismos das mudanças e melhorias sinto máticas, recordemos que esses resultados podem ser produto do insight, assim como também de outros meios de fortalecimento egóico, como o incremento da auto-estima (quero dizer, quando este é alcançado por mecanismos distintos do insight), que pode
A avaliação dos resultados terapêuticos
199
aparentes e superficiais (reações adaptativas), de duvidosa per manência, podendo tratar-se de uma “fuga à saúde”, uma “falsa solução valiosa”, etc. A resolução real (ou seja, alcançada através de insight) da problemática focal poderá expressar-se na manutenção das mu danças registradas ao concluir-se o tratamento. Mas também é possível que constitua descoberta evidenciada durante o acompa nhamento. Isso acontece quando as mudanças e melhorias sinto máticas sobrevêm só depois de um certo período de tempo. O paciente teria adquirido certo insight, fato registrado na avaliação imediata, mas este não se faria acompanhar de modificações visí veis. Nesse caso parece resultar necessário que transcorra algum tempo, ao longo do qual teria lugar um proce|so “elaborativo” pós-terapêutico, que o paciente realizaria espontaneamente, cata lisado pelas suas experiências vitais. O aprendido na terapia é confrontado e interatua com tais experiências, as quais costumam realimentar o processo, permitindo às vezes a remoção de obstá culos e a consecução de ganhos. Já vimos que tudo isto pode refletir-se nos resultados do psicodiagnóstico realizado nesta etapa. O alcance ou a extensão das modificações clínicas favorá veis pode referir-se às distintas áreas de conduta em que se regis tram8 e/ou simplesmente aos diferentes aspectos da vida do paciente, tais como sexualidade, trabalho, estudo, lazer, etc. Mo dificações internas de distinta natureza, reveladas nos psicodiagnósticos, podem dar lugar, por exemplo, a mudanças prospectivas em uma ou mais áreas ou atividades. Interessará, ainda, se as mudanças registradas se mantêm ou não e, em caso afirmativo, durante quanto tempo, ou seja, seu grau de estabilidade. Este é um índice muito válido para avaliar a eficácia desses procedimen tos, ainda que a durabilidade das mudanças, como sabemos, não dependa só do tratamento realizado, mas também, entre outros fatores, da maior ou menor influência de situações traumáticas
200
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
As recaídas, traduzidas na reaparição dos sintomas ou na presença de novas manifestações sintomatológicas, podem dcverse à reativação do conflito subjacente pela ação de fatores traumá ticos. Esses fatos também podem ser investigados, por meio do acompanhamento9, da mesma forma que a presença de novas si tuações conflitivas, diante das quais o terapeuta estará em condi ções de prevenir ou auxiliar o paciente. Por último, é possível encontrar novos ganhos e mudanças, de certo modo alheios às metas terapêuticas propostas, e diante dos quais cabe indagar também acerca de seus mecanismos, alcance e estabilidade. Essas mudanças podem ser inerentes não só às con dições de vida, mas também à estrutura da personalidade, fato mais bem detectado através do psicodiagnóstico.
Problemas na avaliação dos resultados terapêuticos As dificuldades para avaliar os resultados terapêuticos dos distintos procedimentos utilizados em psicoterapia são sobeja mente conhecidas. A avaliação constitui uma tarefa complexa, sobretudo porque não contamos até o momento com a possibili dade de realizar medições mais objetivas. Em parte devemos con fiar em informações e apreciações subjetivas do paciente ou de seus familiares, que por diversos motivos podem distorcer os fatos. Geralmente, ainda que em grau menor, também as impres sões do terapeuta estão sujeitas às mesmas vicissitudes. Contudo, este deverá tentar sempre uma avaliação. Disse Dewald: “Em que pesem as dificuldades, imprecisões e limitações, o desenvolvi mento fundamental do terapeuta requer que seja feita uma avalia ção sincera, um auto-exame e uma autocrítica de seus resultados terapêuticos em cada paciente. Isso deveria incluir não só o julga mento, grosso modo, a respeito de como se produziu o êxito ou
A avaliação dos resultados terapêuticos
201
sistematização metodológica, e mais do que tudo fundamentar um procedimento de medição bastante preciso. Levantam-se muitas polêmicas em torno dos critérios de me lhoria que deveriam imperar quanto às terapias breves: Que deve mos entender por “melhoria” ou por “resultado favorável” nessas terapias? Darei minha opinião a respeito: em psicoterapia breve de insight , a melhoria do paciente pode ser definida, no meu entender, pelo alcance de uma maior compreensão psicológica [insight), e. em algum momento, um enfrentamento mais adequado de alguns dos obstáculos corresponde ntes à sua situação-problerna, (Tinda que per sistam certos sinto mas ou dificuldade s m en o res. Bastará isto para considerar um resultado como favorável.
Mas isso não significa desdenhar a melhoria ou ciura sintomática, muito menos nesse tipo de tratamento, embora, como vimos, por si só não nos sirva de parâmetro, já que pode ser o produto de fal sas soluções (4), pelo que não é sinônimo de êxito terapêutico. Difundem-se numerosos e diferentes esquemas para a avalia ção dos resultados terapêuticos em psicoterapia breve, o que tal vez contribua para criar maior desconcordância nesse campo. Na realidade é uma tarefa difícil, ainda se está longe de poder unifi car critérios e adotar um sistema único. Mas na prática e sobretu do com fins estatísticos, surge a necessidade de apelar para um código que sirva para qualificar os resultados terapêuticos “fi nais” de cada tratamento, fornecendo assim, sinteticamente, uma idéia global dos mesmos. Por esse motivo exporei a seguir o esquema que idealizei e que utilizo, o qual, como é lógico supor, parte dos itens aos quais anteriormente fiz referência. O que im porta no final das contas é o julgamento que o terapeuta desenvol ve com respeito aos resultados obtidos no que concerne a cada um desses itens, ainda quando diferir do julgamento do paciente. Quando se trata de uma terapia breve em que pre domina o insight , levaremos fundamentalmente em conta, na sua avaliação, os três primeiros pontos da lista já conhecida, a saber: insight da problemática focal (I.P.F.). resolução da problemática focal (R.P.F.) e melhoria sintomática (M.S.). Os pontos restantes têm importân cia secundária. Esse procedimento terá maior validade se for apli
202
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
de o término da terapia, que de um modo convencional podemos fixar em no mínimo dois anos. Em conseqüência, só se considera rão resultados positivos em R.P.F., M.S. e nos demais itens se as mudanças e melhorias se mantiverem ao longo de pelo menos 24 meses, sem que se tenham registrado recaídas nem sido efetuados outros tratamentos psicoterapêuticos durante tal período. Cumpridas as condições descritas, qualificaremos os resulta dos alcançados do seguinte modo: a) Naqueles casos em que se registre um resultado positivo em I.P.F., acompanhado de uma resolução clinicamente completa ou total da problemática focal e do desaparecimento ou demarca da atenuação da sintomatologia, o resultado final será considera do muito favorável. Paralelamente poderão existir ou não modifi cações favoráveis em outros itens e eventualmente na estrutura da personalidade. b) Quando, diferentemente do descrito em a, a R.P.F. é clini camente incompleta ou parcial, ou apenas dois dos três itens prin cipais acusam resultados positivos (I.P.F. e R.P.F., clinicamente parcial, ainda com persistência ou intensificação de certos sinto mas, ou ainda por último I.P.F. e M.S.)10, o resultado final será considerado favorável. O registrado nos restantes pontos, uma vez mais, não modificará a qualificação. c) Quando, dos três pontos, só I.P.F. é avaliado como positivo e enquanto não se tenham exacerbado mais intensamente as mani festações sintomatológicas, a essa situação corresponderá um re sultado discreto , independentemente dos resultados concernentes aos demais pontos. d) A categoria de regular significará que só se alcançaram alguns benefícios no concernente a M.S., por meio de distintos mecanismos não-bascados no insight, como a sugestão, a catarse, o efeito psicofarmacológico, etc. (excetuando-se o de evitar as si tuações conflitivas), e/ou mudanças favoráveis nos outros itens de importância secundária. e) Quando não se registra nenhuma variação favorável ou
A avaliação dos resultados terapêuticos
203
R.P.F., além do observado nos demais pontos, o resultado final será rotulado como desfavorável. Definitivamente, o significado de cada uma das categorias mencionadas pode ser resumido esquematicamente assim: PSICOTERAPIA BREVE EM QUE PREDOMINA O “INSIGHT” Resultado final Muito favorável: I.P.E 0 “ R.P.F. (total) ® + M.S. ® Favorável: I.PF. © + R.P.F. (parcial) © + M.S. © ou I.P.F. © + R.P.F. (parcial) © ou I.P.F. © + M.S. © Discreto: I.P.F. © Regular: M.S. © e/ou resultados positivos em outros itens de importância secundária Nulo: Sçm variações Desfavorável: Piora sintomatológica ou falsa solução por evitaçào, sem variações em I.P.F. e R.P.F. Seria interessante estudar uma forma de incorporação siste mática do psicodiagnóstico ao procedimento descrito. No caso de uma psicoterapia breve baseada numa técnica de apoio, a M.S. terá importância, enquanto que I.P.F. e R.P.F. não serão levados diretamente em conta. Os itens restantes desempe nharão uma vez mais um papel menor na determinação do resul tado final. Como requisitos para considerar válidas a melhoria sintomática e as mudanças, também deverão manter-se pelo menos por dois anos a partir da data de conclusão do tratamento, sem que o paciente haja realizado durante esse tempo novos trata
204
Psicolerapia breve de orientaçãopsicanalítica
/a) Muito favorável: Um resultado será muito favorável quan do se produza a cura sintomática, acompanhada de modificações benéficas cm um ou mais aspectos restantes considerados. / b) Favorável: Difere do resultado muito favorável em que existe uma atenuação dos sintomas em vez de seu desaparecimen to. Também pode ser definido unicamente pela cura sintomática, não acompanhada dc outras variações nos demais itens. ~7’c) Discreto: Só há atenuação dos sintomas. -7 d) Regular: Registram-se somente alguns benefícios em pon tos de importância secundária. « e) Nulo: Sem variações. f) Desfavorável: Piora sintomática, qualquer que seja o esultado nos outros pontos. Um último esclarecimento, válido para a avaliação em ambas as formas de psicoterapia breve: quando um resultado é duvidoso em um item (exemplo: R.P.F.: Resultado: ?) considerar-se-á a fim de estabelecer um resultado final - que não se obteve uma resposta positiva no que diz respeito ao mesmo.
Referências bibliográficas 1. Dewald, P. A., “Evaluation de la terapia", em P. A. Dewald, Psi coterapia: m enfoque dinâmico, Toray, Barcelona, 1973, cap. XX. 2 Harrower, M., “Cómo vc cl tratamiento breve un psicólogo clinico”, em L. Wolberg y col., Psicoterapia breve, Grcdos, Madrid, 1968, cap. X. 3. Kaplan, C., Curso para Graduados de Técnicas em Psicoterapia Bre ve, Organizado pela Soc. Arg. de Psicologia Médica, Psicoanálisis y Medic. Psicossomática (Assoc. Med. Arg.), Buenos Aires, 16 de junho de 1972. 4. Malan, D. H., A Study o f Brief Psychotherapy, Tavistock, Londres, Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 5. Pichon-Riviere, E., citado por J. Bleger em Psicologia de la conducta, EUDEBA, Buenos Aires, 1964, cap. II
A avaliação dos resultados terapêuticos
205
7. White, R., E ly o y la realidaden la teoriapsicoanalitica, Paidós, Bue nos Aires, 1973. 8. Wolf, L., Supervisiones de psicoterapias breves hospitalares en pa cientes adolescentes, para residentes municipales de tercer ano de Psiquiatria. Servicio de Psicopatología c Higiene Mental del Hospital Municipal “J. M. Ramos Mejia”, Buenos Aires, 1970-71.
*
^ .V
12. Indicaçõesdapsicoterapiabreve'
i
*>
Por mais grave que seja sua enfermidade, praticamente quase todas as pessoas poderão receber certa ajuda terapêutica com o tra tamento focal, mesmo de duração limitada, desde que se recorra, com critério e segundo cada caso, à técnica interpretativa e à de fortalecimento do ego. Essa posição, compartilhada por muitos, justifica sua aplicação generalizada quando dificuldades econômi cas, distância ou falta de tempo não possibilitem um tratamento mais intensivo e prolongado. A terapia de objetivos e tempo limita dos satisfaz assim uma necessidade assistencial, ainda que esteja longe de ser em muitos casos a indicação mais adequada. É evidente que se pode determinar em que circunstâncias e com que tipo de pacientes se poderão esperar os melhores resulta dos, inclusive quando o método breve apresenta suas indicações clínicas, tanto no meio institucional como no consultório privado. Estabelecerei a seguir alguns critérios de seleção de pacien tes para o tratamento focal em que predomina o insight , que é, nesse sentido, o que costuma originar maiores dúvidas. A indica ção ou contra-indicação clínica dessa terapia decorre da avaliação diagnostica e prognostica do paciente, dentro da qual são elemen
208
Psicolerapia breve de orientaçãopsicanalitica
indivíduo esteja afetado por problemas que digam respeito à sua realidade atual (acidente de trabalho, ruptura de casamento, etc.), dando lugar a um quadro psicopatológico agudo (neurose traumá tica, depressão reativa, ataque histérico, etc.), ou não necessaria mente patológico como pode ser o caso de uma crise vital (ingres so na universidade, casamento, etc.). Essas situações costumam pelo menos transitoriamente impedir a realização de um trata mento analítico. Disse Freud a respeito: “(...) o trabalho de análise progride melhor se as experiências patológicas do paciente per tencem ao passado, de modo que seu ego possa situar-se a uma certa distância delas. Nos estados de crise aguda, a psicanálise não pode ser utilizada de nenhum modo. Todo o interesse do ego está absorvido pela penosa realidade e se retira da análise - cujo propósito é o de penetrar por debaixo da superfície e descobrir as influências do passado” (4). Mas, ao mesmo tempo, essas situa ções distintas demandam muitas vezes ajuda psicológica urgente, razão pela qual, como terapeutas, não devemos desentender-nos a respeito disso2. A terapêutica breve pode converter-se num auxílio eficaz, que permita ao paciente superar melhor a situação sem graves conseqüências, ou até mesmo sair garbosamente dela, exercendo ao mesmo tempo uma função preventiva. Também podem incluir-se aqui os casos em que o indivíduo deve preparar-se para passar por tensões, tais como uma interven ção cirúrgica, um parto, uma migração, etc., que representam importantes campos de aplicação das técnicas breves (a psicoprofilaxia cirúrgica [5] ou a assistência psicológica durante a gravi dez, para a elaboração das ansiedades surgidas ao longo dela [8]), às quais podem adequar-se facilmente, dada a lógica limitação de tempo e os objetivos terapêuticos que a natureza idêntica das situações coloca, adquirindo além do mais um caráter essencial mente preventivo. ^ b) Patologia de caráter leve (exemplo: neurose). Afirma Main: “Os problemas principais devem situar-se predominante mente no nível genital, de pessoa total, e deve haver uma ausência
Indicações da psicoterapia breve
209
que é preferível um indivíduo com necessidades edípicas, isto é, de três pessoas, a outro com problemas orais de dois, ou depressi vos sérios (2). c) Força e plasticidade do ego, com funções em bom estado. d) Alto grau de motivação para o tratamento. e) Capacidade de insight. f) Determinação e boa delimitaçãofocal desde o inicio (7). Considerar isoladamente o diagnóstico nosológico (neurose obsessiva, histérica, caracteropatia esquizóide, etc.) - ou qual quer otitro fator é em suma insuficiente para indicar ou contraindicar uma terapia breve, devendo-se atender em cada caso ao todo da situação apresentada pelo paciente, quando devem ser considerados também fatores como idade, condições socioeconômicas, suas resistências a tratamentos intensivos e prolonga dos, etc. Szpilka e Knobel advertem sobre o erro de guiar-se quase que exclusivamente por um diagnóstico nosológico para a indicação terapêutica, e de que esta recaia sobre o tratamento psicanalítico quando não são fornecidas ao paciente determinadas condições elementares. Diante desses fatos, dizem: “Entendemos que não se está prescrevendo &terapia de escolha para cada caso, como se faz em geral em medicina, mas sim que se pretende esta belecer uma generalização que não considera realmente o diag nóstico nem leva em conta a realidade atual e circunstancial de cada paciente, mas que idealiza o método terapêutico, o qual é sempre prejudicial para qualquer paciente, tanto em psiquiatria como em medicina geral.” Sintetizam essa posição dizendo: “A psicoterapia breve pode então aplicar-se não como uma terapia substitutiva da psicanálise, mas como uma indicação precisa, surgida do diagnóstico, não de um quadro nosológico, mas de uma personalidade enferma num determinado quadro socioeconômico e cultural.” O tratamento breve pode erigir-se como a única experiência terapêut sível para numerosos pacientes reíratários á psica
210
Psicolerapia breve de orientaçãopsicanalitica
taçòes por vezes têm que ser respeitadas, sem forçá-los a um trata mento analítico, pois a tentativa estará geralmente condenada ao fracasso, com grandes possibilidades de terminar em deserção. Trata-se então de adaptar sempre nossa técnica psicoterapêutica ao paciente, c não o contrário, antes de rotulá-lo como intratável. Pode ser tratável, mas com método, enfoque e objetivos terapêuti cos determinados, que ele possa tolerar. Outras vezes a PB. é indicada como prim eir o - e pre parató rio - passo para a realização de um tratamento psican alitico1.
Esta técnica pode cumprir idêntica finalidade no que diz respeito a outros tratamentos, como a psicoterapia de grupo prolongada. Uma nova circunstância que cabe citar é a da aplicação pós psicanalítica da P.B. Está destinada a pacientes que puderam inclusive obter alta de uma análise com êxito e que consultam pela aparição - ou reaparição de uma situação conflitiva ou dc um sintoma, não se justificando que se submetam a uma reanálise. Um tratamento focal pode ser suficiente para solucionar o pro blema atual surgido, bastando às vezes umas poucas entrevistas com seu próprio analista4. Em pessoas de id ade avançada, para as quais se acha contraindicado o tratamento psicanalitico, a terapia focal pode encontrar uma aplicação muito adequada, porque permite trabalhar setorialmente, inclusive através de uma técnica interpretativa, respeitar a estrutura caracterológica do paciente, a par de seus conflitos difi cilmente modificáveis, e evitar desse modo mobilizações afetivas desnecessárias, excessivas e também arriscadas. Abarca assim outra área importante da assistência psiquiátrica. A P.B. de insight é menos eficaz : em casos crônicos de psico se, enfermidade psicossomática, psicopatias, perversões, toxicomanias, estados fronteiriços e caracteropatias graves (sobretudo se o que se pretende é tratar estas patologias e não um conflito cir cunscrito); em geral quando existem grandes debilidades egóicas, com relações objetais muito ambivalentes, dependentes ou sim bólicas, tendências marcadas ao acting out ou escassa tolerância à ansiedade c à frustração (ver os capítulos 4, 8, 9 e 10); quando há pouca motivação para o tratamento; quando resulta dificultoso determinar e delimitar um foco, circunstâncias nas quais a indica
FAG
Indicações da psicoterapia breve
FACULDADE GÜAIRACÁ BIBLIOTECA
211
mente intensiva e prolongada (nesses casos é comum existirem transtornos graves de personalidade, os conflitos estarem pouco circunscritos e afetarem quase todos os aspectos da vida do sujei to) (veroscapítulos4, p. 68, e 10, p. 179). Por outro lado, consideramos o problema que para a indica ção de uma terapia de tempo limitado estabelecem os pacientes que registram lutos patológicos e/ou recentes de importância, como, por exemplo, os produzidos por falecimentos de pessoas queridas (ver capítulo 10, p. 179), apeSar de que quando tais lutos são ôs que motivam a consulta, situamo-nos diante de uma condi ção aparentemente favorável para a indicação do tratamento bre ve, isto é, de um transtorno atual de começo rccénte e agudo. Acontece que nos encontramos ante um lego momentanea mente debilitado, com uma diminuição de sua capacidade para suportar a dor e a frustração e poder enfrentar o novo luto gerado pela separação do terapeuta ao terminar a terapia, o que pode rea vivar traumaticamente a perda anterior. Um trágico exemplo des sas situações poderia ser o prescrever descuidadamente a alguém, com antecedentes de um aborto recente, uma terapia de três meses de duração (período que se fixa, amiúde, para esses tratamentos), o que pode provocar uma reativação iatrogênica da perda. Deverse-á cuidar então ao máximo para que nesses casos a duração da psicoterapia não predisponha a estas reações, sendo em princípio conveniente que o prazo não fique estabelecido de antemão.
Referências bibliográficas 1. Beliak, L. e Small, L.. Psicoterapia breve y de emergencia, PaxMexico, Mcxico, 1969.
212
Psicoterapia breve de orientação psicanalilica
5. Glasserman, M. R., “La psicoprofílaxis quirúrgica: una técnica de prevención”, Acta psiq. psicol. Amér. Lat., Buenos Aires, set. 1969, vol. XV, n°3. 6. Main, T. e col., “Mesa redonda sobre psicoanálisis y psicoterapia”, Rev. de Psicoanálisis, Buenos Aires, 1971, t. XXV1I1, n° 1. 7. Malan, D. H., “A Study of Brief Psychotherapy”, Tavistock, Londres, Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 8. Soifer, R., Psicologia del emharazo, paro dy pueperio, Kargieman, Buenos Aires, 1971. 9. Szpilka, J. L. c Knobel, M., “Accrca de la psicoterapia breve”, era Coloquio Acta 1967: Psicoterapia Breve, Acta psic. psicol. Amér. Lat., Buenos Aires, jnnho 1968, vol. XIV, n? 2.
13, Dostratamentosbreves
I «>
Apresentarei aqui dois casos que foram tratados por meio dc psicoterapia de objetivos e tempo limitados. Ambos os tratamen tos foram efetuados por mim, no Serviço de Psicopatologia do Hospital Municipal “J. M. Ramos Mejía”, no ano de 1972, e fa zem parte de uma investigação que ali realizei durante 12 meses. O caso descrito em primeirá'lugar ilustra com certo detalhe dis tintos aspectos e momentos do procedimento focal. O segundo constitui, essencialmente, um exemplo do trabalho de aprofunda mento no foco1.
Exemplificação do método psicoterapêutico de objetivos limitados A., um homem de 28 anos, argentino, casado, eletricista, com instrução primária completa, pertencente à classe média baixa, consultou o Serviço por experimentar um incremento na ansiedade e depressão de que sofria há muitos anos, de um modo
214
Psicoterapia breve de orientação psicanalílica
Ocasionalmente havia pensado que nào valia a pena conti nuar vivendo, ainda que, com relação à idéia dc suicídio, acredi tasse que nunca chegaria a “cometer uma loucura”. Mostrou-se além disso preocupado pelas dificuldades que tinha em seu trabalho. Ganhava uma soma de dinheiro insuficien te para enfrentar os gastos correspondentes aos cuidados do bebê c tinha uma má relação com seu patrào, com quem protagonizava freqüentes discussões. Seu desejo era conseguir outro emprego. Por último, manifestou-se muito frustrado intelectualmente. Grandes temores e inibições ao cursar os esttidos primários pare ciam havê-lo impedido de continuar estudando. Sentia um “medo pavoroso” de uma professora, a quem atribuiu um papel impor tante nessa questão. Tinha desejado ser um “grande intelectual, capaz de analisar problemas sociais, políticos ou psicológicos. Enfim, uma pessoa com muitos conhecimentos”. Autodefiniu-se como inseguro e indeciso. Dados biográficos de interesse (resumo)
Único filho de um matrimônio com grandes desavenças. Seus pais dormiam no mesmo quarto, mas em camas separadas, enquanto A. dormia junto com a mãe no mesmo leito desde muito pequeno até os 11 anos, época em que esta morreu, vítima de uma enfermidade infecciosa. Havia sido um menino tímido c um pouco triste. Vivia muito apegado à màe e nào se recorda de ter tido amigos. Seu pai, empregado bancário, voltou a se casar um ano depois de ter enviu vado e não teve filhos do segundo matrimônio. Logo A. se sentiria muito prejudicado por sua madrasta, a princípio aparentemente bondosa para com ele, mas logo, segundo afirmou, mostrando-se abertamente hostil, em contraste com a recordação que tinha de sua màe, carinhosa e solícita. A relação com seu pai foi descrita como sumamente confliti-
Dos tratamentos breves
215
seu pai havia contraído uma grave enfermidade, ainda que seu estado geral fosse bom. Visitavam-se muito esporadicamente. Quando A. contava 18 anos, decidiu afastar-se da casa pater na, indo viver numa pensão. Ali permaneceu até os 25 anos, quan do se casou com uma jovem que havia conhecido um ano antes e que descreveu como “muito sensível e inteligente”, levando com ela, no seu parecer, uma vida sexual medianamente satisfatória (embora logo admita que sobretudo no começo tivesse tido gran des dificuldades, que consistiram em episódios de impotência e de ereçctes dificultosas c mais adiante em fantasias uxoricidas em pleno coito, as quais haviam reaparecido ultimamente). A atividade social do casal era intensa e gratifkante. Voltando à sua adolescência, cabe assinalar rfela sua grande adesão à religião católica. Nesses anos, tudo o qúe se referia a sexo adquiria para ele caráter pecaminoso. Assim sendo havia sérias dificuldades para vincular-se com mulheres, e foi sua espo sa a única com a qual conseguiu fazê-lo. Suas primeiras relações sexuais datam de seu matrimônio. Nos últimos tempos, em duas ocasiões, tinha seguido trata mentos psicotcrapêuticos, aparentemente de orientação dinâmica, com terapeutas homens e que abandonou alegando inconvenien tes econômicos. Considerava que os tratamentos tinham tido um saldo positivo. No abandono do segundo deles, admitiu a influên cia do tipo de relação que chegou a ter com seu terapeuta: “notava grande afinidade com o médico. Sentia-me respaldado. Isso me fez temer mais a dependência em relação a ele e decidi deixar”. Revelava assim evidentes problemas, não só no referente a situa ções de dependência, mas também ante a existência de profundos temores a uma aproximação afetiva. Avaliação diag nostica
O diagnóstico psiquiátrico-dinâmico foi o de uma
216
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
Quanto às suas condições egóicas , puderam ser apreciadas: deficiências marcadas no teste de realidade , isto é, uma distorção da realidade produzida por intensas projeções, fato confirmado pelo psicodiagnóstico (Rorschach, Bender, casal)2. Essa perturba ção gerava nele dificuldades nas diferentes relações interpes soais, em especial com pessoas de autoridade, relações que eram muito ambivalentes e oscilavam entre a tendência à submissão extrema e a rebelião patológica. Assim mesmo, o diagnóstico re velou com clareza uma grande disposição a estabelecer vínculos de natureza simbiótica. Também apresentava alterações no controle de seus impulsos, que se evidenciavam tanto num exagerado controle da agressão atra vés de formação reativa (psicodiagnóstico), como em ocasionais, ainda que violentas, descargas de raiva; a regulação de sua autoestima resultava inadequada, achando-se esta última francamente diminuída. Por último, cabe mencionar que as funç ões básicas (per cepção, atenção, memória, etc.) estavam menos alteradas. Não obstante todo o mencionado, pensou-se que o paciente possuía um ego suficientemente forte para suportar os sentimen tos dolorosos provocados pela revelação de seus aspectos incons cientes, ainda que se duvidasse do grau de tolerância que teria à frustração que poderia ocasionar-lhe sua separação do terapeuta ao finalizar a terapia. O gra u de motivação para a psicoterapia e suas capacidades para o insight foram considerodos elevados. Tinha consciência da enfermidade , e seu nível de inteligência poderia ser considerado médio. O foco pôde ser delimitado desde o começo, optando-se por centrar o trabalho terapêutico na situação crítica criada em tomo do nascimento do filho. (Os detalhes sobre a estrutura do foco serão descritos mais adiante.) A hipótese psicodinâm ica inicial
Dos tratamentos breves
217
seqüência, vítima de uma prematura e intensa estimulação sexual. É particularmente importante o antecedente da partilha do leito. Os efeitos deletérios dessa situação, pela qual foram responsáveis ambos os progenitores, traduziram-se ao que parece no caráter assustadiço do menino, muito apegado à mãe, e de escasso e difi cultoso contato social, constituindo um sério impedimento para uma resolução adequada do complexo edípico ao incrementar os desejos incestuosos e parricidas c a angústia da castração conse qüente. Os mecanismos de repressão e sublimação sofreram mui ta interferência (os graves conflitos eícolares, com terror à figura da professora, pareceram atestá-lo). Apelou então regressivamente para defesas mais primitivas, próprias da etapa sádico-anal (isolamento, anulação, deslocamento, formáção reativa), que foram plasmando sua estrutura de personalidade. Por sua vez car regou consigo desejos insatisfeitos de dependência oral, que au mentaram com a morte da mãe. A rivalidade edípica, muito intensificada em sua adolescên cia, tomava cada vez mais tensa a relação com o pai, o que o levou a abandonar o lar paterno. É a etapa em que surge sua religiosida de, que ein parte pode ser concebida como uma defesa ante a ameaça de castração por mefo da submissão ao superego paterno, representado pela figura de Deus; além disso, constituiria uma forma de controle de seus impulsos sexuais e agressivos, vividos como proibidos e perigosos por seu significado incestuoso e par ricida. Por último, a religião lhe permitia satisfazer desejos infan tis de dependência e proteção e a necessidade de castigo por seus intensos sentimentos de culpa. Acompanhava-o um sentimento de inferioridade, provenien te do fato de perceber-se pouco potente sexual3, intelectual e eco nomicamente. O psicodiagnóstico refletiu isto através da presen ça da fantasia de haver sido castrado. Como Édipo, sentir-se-ia culpado pelos grandes delitos de humanidade consumados em sua fantasia4, em nome dos quais deveria sofrer severos castigos, que simbolicamente representavam a castração: renunciar ao prazer
218
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
ta muito dc ler e consegue todos os livros do mundo, mas é ce ga...”. (Recorde-se a cegueira de Édipo.) Com base no exposto, resulta clara a influência em sua pro blemática do conflito com a imago paterna; a intensa situação per secutória intervinha na gênese de sua angústia, depressão e insô nia, e de suas distintas limitações vitais, dadas as dificuldades na relação com seu pai real e com representantes paternos, como seu patrão c mais recentemente com o próprio filho. A enfermidade de seu pai e o nascimento do filho provocaram um incremento pa ranóico em seus desejos parricidas mal reprimidos5e em suas fan tasias dc haver consumado o incesto, burlando a proibição supercgóica6. Formularam-se as seguintes hipóteses prognosticas a respei to das vicissitudes transferenciais durante o tratamento: buscava no terapeuta um pai bom, mas era possível esperar a repetição de uma relação fortemente ambivalente. Existia além disso o risco de que seu temor inconsciente a uma aproximação afetiva - muito necessitada por ele com o terapeuta, através do qual também procuraria satisfazer seus desejos de dependência, poderia condu zi-lo a repetir a conduta de deserção do tratamento7. Tal conduta tinha do mesmo modo antecedentes no abandono do lar paterno quando contava 18 anos. O foco terapêutico inicial ficava configurado em tomo dos sintomas que apareciam como o motivo manifesto da consulta : ansiedade, depressão e insônia exacerbados. Isso se ligava com o que fora considerado como o principal motivo latente , isto é: o nascimento de seu filho (que diga-se de passagem antecipou-se aos planos do casal), a busca de uma contenção que o pusesse a salvo de suas tendências hetero e auto-agressivas. Aprofundando-se na compreensão do momento crítico que A. atravessava, deduziuse, também, que as ansiedades provocadas por essa crise vital estavam vinculadas essencialmente à sua vivência dolorosa de exclusão8, seu temor de que o filho lhe “roubasse” a esposa-mãe, assim como havia feito cm sua fantasia com seu próprio pai. Ligavam-se também aos impulsos filicidas, provocados por sua
Dos tratamentos breves
219
temor à retaliação. Tudo isso constituía os pontos de urgência a serem levados em conta no início do tratamento. Vemos então que essa conflitiva focal também podia remeter parcialmente ao con flito com a imago paterna (conflito básico), a qual, transferida agora para o filho, gerava uma situação persecutória, que se agre gava a tudo o já mencionado a respeito da significação incons ciente da enfermidade do pai e de outras conseqüências a que dera lugar o nascimento do descendente. Por último, caberia conside rar sua constrangedora posição econômica, que era um novo fator * de incremento de sua angústia e que o defrontava mais drastica mente com a realidade dolorosa das limitações produzidas por sua neurose. Era, também, o fato de ser consciente disso que o subme tia a uma grande depressão9. É de se destacar a influência favorável que tinha sua esposa, que o incentivava a tratar-se. Sentimentos de inveja com relação à sua mulher, pela mater nidade, também foram detectados, ainda que considerados de menor relevância dentro do conjunto de problemas. As metas terapêuticas
Cheguei a um contrato mínimo com o paciente sobre os obje tivos do tratamento depois de haver-lhc exposto meu pareccr sobre a natureza de seus transtornos (devolução diagnóstico-prognóstica). Tais objetivos foram: 1. Conseguir uma maior compreensão dos conflitos reativa dos com o nascimento de seu filho, ajudando-o a adequar-sc melhor à nova situação, em especial para assumir melhor sua paternidade. 2. Obter também um alívio sintomático. 3. Em seguida, tratar de alcançar esclarecimento e alguma
220
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Prognóstico De todos os fatos considerados, o que permitiu arriscar um bom prognóstico para o tratamento foi talvez o alto grau de moti vação do paciente para a psicoterapia (disposição para o esforço da tarefa), unido à sua capacidade de auto-observação, sua idade, o fato de tratar-se de um “momento propício'’ para a abordagem psicoterapêutica numa enfermidade crônica (2), a imediata deter minação focal, o contar com uma esposa cooperativa, uma contratransferência positiva (interesse em ajudá-lo, curiosidade ante sua conflitiva) e suficiente e relativamente fácil compreensão dos psicodinamismos básicos de sua problemática. Entre os elementos prognósticos desfavoráveis se assinala vam: a gravidade da patologia, que afetava quase todas as áreas de sua vida, e muito especialmente o tipo de relações objetais que apresentava, o qual fazia temer a aparição de complicações duran te a terapia (cm particular a respeito da finalização desta), que poderiam comprometer os resultados terapêuticos. Planificação do tratamento
Decidiu-se utilizar uma técnica em que predomina o insight. As chamadas interpretações “extratransferenciais ”, que es tariam dirigidas de preferência para suas relações com represen tantes paternos (filho, patrão) e com o próprio pai, seriam um ins trumento importante na terapia. De particular utilidade poderiam ser aquelas interpretações destinadas a mostrar as vicissitudes intrapsiquicas do conflito a fim de que tomasse consciência da vigência de uma imago paterna superegóica muito severa, partindo da percepção, que ele já tinha, de uma luta interna que o angustiava e agoniava (“como se estives se sempre lutando, discutindo com alguém dentro de mim, que me diz que não vou ser capaz disto ou daquilo”, havia dito A.). Se fosse possível e conveniente, as interpretações chegariam a incluir parte das raízes infantis do conflito, devido a um certo training de A. e ao critério predominante neste caso acerca da necessi
Dos tratamentos breves _j_
_____
As chamadas interpretações "transferenciais ” teriam de ser empregadas com mais assiduidade do que o habitual em P.B., cumprindo um papel decisivo para a demonstração emocional de certos problemas com a figura paterna (em razão da qual se torna va oportuno que fosse tratado por um terapeuta homem), mas pro curar-se-ia não fomentar com isso a neurose transferencial. Também eram previstas ante a possível aparição de fenômenos transferen ciais que chegassem a obstaculizar abertamente o processo tera pêutico (tais fenômenos, com efeito, apresentaram-se durante o tratamento). Por último, se incluiriam durante a etapa final dele, na tarefa de ajudar o paciente a aceitar a separação, diante da qual se esperava que pudessem além disso aflorar aspectos da transfe rência materna, em virtude da reativação do lutcípela perda de sua progenitora. Apelar-se-ia para o uso flexível e seletivo da regra de asso ciação livre. Em princípio, não se administrariam psicofármacos. Fixou-se uma duração de quatro meses para a terapia, com duas sessões semanais de 30 minutos cada uma; e quando o esta do do paciente o permitisse, seriam reduzidas para uma por sema na durante o último mês, como meio de ir facilitando a separação. Estabeleceram-se também as datas para as entrevistas de avalia ção imediata e para a realização do reteste. Com referência à estratégia terapêutica, dispôs-sc a encarar inicialmente a situação-problema criada por sua paternidade, atendendo aos pontos de urgência detectados. Efetivar-sc-ia um trabalho interpretativo com as devidas precauções, considerando a todo momento a receptividade do paciente, utilizando no inicio interpretações “de ensaio” (1) e observando sua resposta a elas. Se A. demonstrasse ter um timing rápido, seria possível aprofun dar progressivamente a situação genética da conflitiva focal. As
222
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
tinham sido conscientizadas nos tratamentos anteriores. Procurar-se-ia então revelar parcialmente o complexo edípico para o paciente, sem desenvolver todos os seus componentes, conside rando-se que o fato de que se tratava de uma revelação incompleta não despojaria a tarefa da qualidade dc ser operativa em grau su ficiente para alcançar os fins terapêuticos propostos. Não resul tava possível indicar outra opção, dadas as condições do enqua dramento e em se tratando de algo que poderia ser demasiado ansiógeno e despertar resistências insolúveis no curto lapso que duraria o tratamento, de modo que a possibilidade dc uma elabo ração mais profiinda, e efetivamente mais completa, ficaria re servada para outra ocasião, se fosse exeqüível um tratamento pro longado. Uma vez alcançado certo insight e alívio a respeito da situa ção crítica derivada do nascimento do filho, a tarefa se centraria nas dificuldades encontradas em seu trabalho, a qual continuaria tratando dos problemas que se apresentassem em suas relações interpessoais, nesse caso com seu patrão, como derivados do con flito com a ünago paterna. Ou seja, pensou-se em mostrar-lhe esse conflito básico, que se evidenciava ante representantes paternos (incluindo o terapeuta), c que o fazia sentir-se desvalorizado e ameaçado por eles, surgindo assim a “interpretação central sobre a qual teria de se basear todo o tratamento”, como diria Malan (8), que é característica da técnica de “enfoque”, c que mostra ao pa ciente a repetição, em diferentes contextos, de uma situação conflitiva nuclear. Considerou-se que se ante suas necessidades econômicas conseguisse melhorar seus rendimentos, além do natural alívio poderia elevar sua auto-estima, já que se sentiria menos débil e mais capaz de exercer um papel de pai protetor. Dessa forma diminuiria seu sentimento de culpa provocado por sua hostilidade cm relação ao filho. A conseqüência final seria o alívio de sua de pressão. Por último, se possível, seriam considerados seus problemas
Dos tratamentos breves
223
prospectivo que o paciente pudesse continuar por sua conta de pois de terminado o tratamento. Prestar-se-ia particular atenção, dedicando-lhe pelo menos um terço da duração total da terapia, à abordagem do problema da separação consecutiva à finalização do tratamento, dadas as caracte rísticas e a história do paciente, e além disso levando-se em conta o incremento dos vínculos regressivos de dependência ante o nas cimento de seu filho. • Por força deveria ficar intocada a perda patológica pela mor te de sua mãe, em razão da qual, de maneira deliberada, evitar-seia interpretar o material relacionado com tal luto, ainda que se es perasse que em certa medida a situação-probfema implicasse que A. revivesse inconscientemente a perda de sua progenitora, repre sentada agora por sua esposa. (Se bem que o considerasse em con dições de enfrentar certos aspectos do complexo edípico, como seus desejos parricidas e por extensão a hostilidade em relação a seu filho. Tudo isto se achava mais próximo da superfície cons ciente e parecia possível de ser manejado com êxito num enqua dramento de terapia breve.' Mão ocorria o mesmo com o que se referia ao mencionado luto, diante do qual se percebia o paciente mais defendido, apesar de sua importância decisiva na psicopatologia do paciente; sua abordagem profunda não parecia impres cindível para os fins imediatos do tratamento e teria resultado talvez imprudente. Mas isso tampouco significava que teria de ser deixada totalmente de lado.) Evolução durante o tratamento
Ao menos nessa ocasião, a terapia transcorreu em grande parte de acordo com o plano terapêutico concebido.
224
Psicoierapia breve de orientação psicanalítica
A focalização do trabalho terapêutico na crise registrou o surgimento de fantasias filicidas conscientes, acompanhadas de intensos sentimentos de culpa. Pôde compreender que seu filho era vivido por ele como se se tratasse do pai rival. O reatamento das relações sexuais cotn sua mulher pareceu haver atenuado sua hostilidade, ainda que só transitoriamente, já que em pouco tempo começou a discutir com ela por amenidades. Apresentou logo típicas dúvidas obsessivas acerca de seu amor por ela. Em relação a toda a problemática mencionada, surgiram ein A. fantasias suicidas que o angustiariam muito. Tampouco dessa vez se recorreu às psicodrogas, e em poucos dias o momento críti co pôde ser relativamente superado por meio de um intenso traba lho interpretativo. Ao fim do segundo mês de tratamento, foi conseguido por fim certo alívio sintomático, o qual por sua vez ajudava a colocar seu ego em melhores condições de rendimento. Planejava agora continuar seus estudos e conseguir um novo emprego. As relações com sua mulher melhoraram. Mostrava-se agradecido para comi go e mais otimista. Durante o terceiro mês foi possível trabalhar sobre o proble ma profissional. A. pôde dar-se conta de que reproduzia com o patrão a relação com seu pai. Necessitava rebelar-se contra sua autoridade, ainda que também esperasse dele inconsciente e neuroticamente carinho paternal. A relação, muito conflitiva, parecia pouco menos que insustentável, mas A. temia buscar outro traba lho, pois imaginava que o ludibriariam e, segundo sua “voz inte rior”, o despediriam “a patadas”. Surgiram obstáculos transferenciais na tarefa, por colocar em mim, com hostilidade, a imago paterna, os quais foram con templados com interpretações “transferenciais”, progredindo a terapia em bom ritmo. Não obstante, foi inevitável certo grau de desenvolvimento da neurose de transferência. As maiores dificuldades se apresentaram na etapa final razão pela qual o número de sessões semanais não pôde ser redu zido. Originaram-se precisamente na separação iminente, vivida
Dos tratamentos breves
225
até limites perigosos para o futuro do tratamento, demandando uma árdua tarefa interpretativa sobre o novo foco10. Isso permitiu evitar outras reações desfavoráveis (recaídas, acting out , etc.). Apesar deste trabalho, que pretendeu ajudar o paciente a aceitar a separação, aspectos transferenciais não resolvidos, de caráter hos til, parecem ter influído em certa medida nos resultados terapêuti cos e na auto-avaliação dos mesmos, a julgar por algumas impres sões de A. ao efetuar-se esta, como logo veremos. Sobre o tema cabe acrescentar que é provável que nãu se tenha insistido o suficientê em assinalar sua rivalidade e inveja com relação ao tera peuta, principalmente no aspecto intelectual e científico. Nas últimas sessões começou a manifestar|inesperadamcnte preocupações que provocavam nele certos pensamentos sujos relacionados com fantasias homossexuais. Não se tentou apro fundar no material, considerando-se impróprio fazê-lo nessa tera pia, principalmente no final, nem se referiu às fantasias homos sexuais em relação ao terapeuta, as quais foram em troca inter pretadas como uma resistência a aceitar o desprendimento, que obedecia a diversos motivos, entre os quais se achavam grandes ansiedades fóbicas ante ele, rôzão pela qual, num intento de con seguir que se adiasse o término do tratamento, mostrava agora um novo e interessante problema para conseguir de mim que con tinuasse tratando dele. Avaliação dos resultados terapêuticos
Alguns comentários de A. sobre o tratamento, logo depois de finalizado, foram: “As vezes me sinto um pouco desiludido... ner voso... Descobri que isso se deve a que o tratamento terminou...
226
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
liado como resolução clinicamente parcial de tal problemática, com caráter temporário, já que deveria verificar-se novamente numa avaliação mediata. Concretamente: cessaram as disputas com sua mulher e conseguiu aceitar melhor o filho, o que lhe permitiu desfrutar melhor sua relação com ele. Mas com respeito a seu trabalho A. não apresentou nenhuma mudança a partir do trata mento. Sem dúvida, cm que pese não se haverem produzido mo dificações substanciais em sua situação, considerei que tinha po dido compreender melhor seus problemas com o patrão; sua maior autovalorizaçao atual, por outro la*do, o ajudaria a encontrar outro emprego, o que parecia sem dúvida o mais indicado, dada a deterioração que havia alcançado sua relação com o patrão esse era um objetivo importante do ponto de vista prático, não sendo tomado como a busca de uma falsa solução (8) do problema, pelas razões expostas 1. A melhoria sintomática foi muito acentuada. Sua auto-estima, como já disse, se havia elevado. Adquiriu, ainda, maior consciência da enfermidade, o que significou um importante estímulo para que efetuasse, quando pudesse, uma psicoterapia prolongada, indicada diante de seu crescente interesse por achar uma solução para suas perturbações caracterológicas. No concernente a seus estudos, interessou-se pela idéia de reatá-los, o que implicava por sua vez contar com certo projeto pessoal. Sua atividade sexual resultava bastante adequada e satisfató ria no dizer do paciente. Em suas relações com as demais pessoas, esperava-se que o fortalecimento de seu ego - pelo insight - trouxesse paralelamen te mudanças no teste de realidade, já que ele havia notado sua ten dência dominante, isto é, a projeção de aspectos superegóicos (sobretudo nas pessoas com autoridade), em parte responsável por estas dificuldades.
_______ Dostratamentosbreves
_________
Ao fim de uns três anos, voltamos a nos ver para uma entre vista de acompanhamento. Meses depois de haver terminado o tratamento hospitalar, o paciente havia começado a psicanalisar se com uma mulher, a qual lhe havia permitido, segundo afirmou, ver como e quanto o havia afetado a morte da mãe. Tratou-se du rante dois anos e abandonou o tratamento, alegando novamente dificuldades econômicas. A existência deste último tratamento invalidou, como é de se supor, toda tentativa de avaliação imedia ta dos resultados da terapia hospitalar. Por isso, a seguir só tenho de consignar alguns fatos e comentários do paciente que, para os fins dessa apresentação, podem resultar de interesse. 1. Exceto alguns progressos em suas relações com sua mu lher, seu pequeno filho e seu pai, assim com$ ein seus estudos e no estado de sua auto-estima (aos quais carecé de sentido referirme aqui, pois diante da indubitável influência do tratamento psicanalitico, de nenhum modo pude atribui-los ao tratamento hospi talar), revelou-me que, semanas depois de haver terminado o tra tamento comigo, pôde conseguir outro emprego, com melhor re muneração do que o anterior. Esse sucesso poderia, eventualmen te, vincular-se à psicoterapía hospitalar. 2. Freqüentemente assaltavam-no certas dúvidas, que teve de me confessar: até que ponto o alcançado se devia ao fato de se ter tratado? Com o correr do tempo, não teria alcançado, de todo modo, tais sucessos, sem mediar tratamento algum? Em suma: os tratamentos são realmente eficazes? (Em outros momentos de entrevista, em troca, abundaram expressões de agradecünento para comigo, pelo que eu o havia ajudado.) Em minha opinião, tudo fazia supor que ambos os tratamen tos haviam resultado benéficos e que, graças a eles, A. pôde supe rar em parte certas perturbações neuróticas crônicas e ativar um processo prospectivo que lhe permitiu desenvolver suas potencia lidades. Inclinava-me então a considerar essas dúvidas como ob sessivas, produto de sua ambivalência afetiva c que ao menos em
228
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
3. Havia também claras indicações da persistência de mani festações neuróticas e de seus transtornos de caráter. “Continuo com certa tensão nervosa - comentou. Caramba, se tudo vai bem... Sei que devem ser coisas profundas.” Recentemente apre sentava, segundo expressou, “alguma dificuldade” para conseguir orgasmo, a qual era previsível, tendo em conta que havia sofrido vários episódios de impotência; naturalmente, eu não podia espe cificar se seu transtorno era “alguma dificuldade”, como ele dizia, ou algo mais do que isso. Por último havia comparecido à entrevista com uma longa lista de temas escritos por ele, argu mentando que temia se esquecer de muitas das coisas que queria me dizer. Considerações finais
Este caso ilustra particularmente os seguintes pontos: 1 .A importância da indagação exaustiva dos dados biográ ficos e do psicodiasnóstico em psicoterapia breve, a fim de se elaborar uma ampla hipótese psicodinâmica inicial, que fúndamentará o planejamento terapêutico. Neste caso. foram de especiafinte resse as averiguações concernentes à constelação familiar, que permitiram prever certas peculiaridades das transferências pater na e materna durante a terapia. Levou-se em conta o antecedente de partilha de leito existente ao longo de toda a infância do paciente. O psicodiagnóstico trouxe elementos de grande utilida de para o manejo terapêutico. 2. A possibilidade de trabalhar com boas perspectivas prognósticas em terapias breves, ainda com pacientes que apresentam marcantes transtornos de personalidade e que são portadores de
Dos tratamentos breves
229
ser bom ainda nesses casos. Se a isso acrescentarmos que a terapia^TOTTfnbui para aumentar a consciência da enlermidade e a motivação no pacientc. o que o motivou para um novo tratamento prolongado, ao qual acorreu depois, devemos concluir que o benefício não foi pequeno, em que pese a possibilidade de que por momentos a tarefa terapêutica tenha sucumbido às defesas (intelectuafixação, etc.) do paciente, dando lugar em parte a um pseu do-insight. 3. A oportunidade e o sentido da utilização de interpretações “transferenciais ” em terapias breves, isto é, para diluir obstáculos transferenciais e também como mostra vívida dç aspectos da problemática principal do tratamento, sem centrar côm isso o tra balho na análise da relação paciente-terapeuta. 4 . A necessidade - em certas ocasiões - de abordar conflitos básicos parajjbter os resultados terapêuticos esperados - ainda que a abordagem se realize de um modo incompleto, deixando de lado determinados aspectos e níveis desses conflitos a partir de uma avaliação cuidadosa não só do que convirá, mas também do que não convirá trazer à consciêrfcia do paciente, por não poder ser suficientemente retomado e elaborado no tratamento. - 5 . A necessidade de trabalhar o problema da separação que se coloca ante o término do tratamento, problema que chega, por si só, a configurar um novo foco terapêutico. — 6. A eventual aparição, nos estágios finais de terapia fo cai de material alheio aofoco, concernente a outros sintomas ou con flitos do paciente e trazidos por este com a intenção, geralmente inconsciente, de obter o prolongamento do tratamento e de con servar assim o terapeuta.
O caso da jovem que vomitava às segundas-feiras12. Aprofundamento no foco J., do sexo feminino, 21 anos, argentina, solteira, empregada numa butique, com estudos secundários completos e pertencente
230
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
Motivos da co nsulta
Trata-se de uma bonita jovem, que consultou o Serviço acom panhada de sua mãe, tendo sido encaminhada por um mcdico clí nico do hospital em razão de apresentar vômitos todas as segun das-feiras de manhã, tendo sido descartado previamente - por meio de exaustivos estudos - que tivesse alguma afecção orgâni ca. Em certas ocasiões se irritava e chegava a apresentar “crises de nervos”. Na realidade padecia de náuseas e vômitos desde os 12 anos, idade em que teve a primeira menstruação. Nos últimos tempos se produziam especialmente nas segundas-feiras pela manhã. Demonstrava certo interesse em conhecer o porque da exis tência desses sintomas, mas não parecia muito preocupada em melhorar. Uma averiguação cuidadosa permitiu comprovar que a paciente obtinha claros ganhos secundários por meio dc seu sofri mento: às segundas-feiras, por causa de seu mal-estar, não com parecia ao emprego, sendo sua ausência justificada; nesses dias recebia cuidados e atenção, em especial de sua mãe, assumindo por sua vez uma conduta francamente regressiva. Uns meses atrás, os vômitos haviam sido muito abundantes. Por causa deles, desidratou-se e foi necessário administrar-lhe soro. Cabe destacar que esses sintomas apareciam também ao ver se diante de jovens que pudessem exercer certa atração sexual sobre ela. Em mais de uma ocasião vomitou na presença deles e inclusive sobre eles. '‘Vomito em cima deles... É como se tivesse medo deles”, expressou. J. tinha então a impressão de que isso lhe sucedia “por ser covarde, por temor a levar alguma coisa adiante com eles e sobretudo por temor ao sexo...”, revelando a respeito certa preocupação, dadas suas dificuldades para estabelecer uma relação de casal. Um antecedente recente e importante era a ruptura de uma relação de casal ( situação-problema). Esse fato derivou numa exacerbação de suas náuseas e vômitos e lhe causou certo grau de depressão. Havia mantido relações sexuais com o rapaz.
Dos tratamentos breves
231
Dados b iográfico s de interesse
Com referência aos antecedentes familiares, mencione-se que J. provinha de uma família modesta, integrada por seu pai, dc 61 anos, que ela descrevia como sereno, e por sua mãe, de 55; viviam os três juntos, unidos por um grande carinho. Quanto à mãe, oriunda de um país europeu, estava casada em segundas núpcias com seu pai. De seu primeiro matrimônio, no qual enviu vara, havia tido uma filha, que residia em Buenos Aires c era casada, e um filho que morrera tragicamente na Segunda Guerra Mundial. Dc seu segundo matrimônio nasceram -na Argentina J. e um filho varão, o qual também falecera com a idade de 15 anos, quando a paciente contava 8 anos. Segando o relato desta, em parte proveniente de certas versões que‘Yecolhera, o rapaz havia ido numa sexta-feira a um balneário com um casal de ado lescentes. Ali morreu afogado. J. assinalou que seu irmão havia lançado gritos desesperados pedindo auxílio, mas que o jovem e a rapariga que o acompanhavam nào quiseram socorrê-lo, pois estavam entretidos em jogos sexuais. Neste aspecto resultava difícil verificar o que havia sucedido realmente, pois dava a im pressão de que J., além de não ter presenciado o trágico aconteci mento, podia estar distorcendo bastante os fatos com suas pró prias fantasias. Com base nesses antecedentes podia-se compreender como a conduta regressiva da paciente, “carente dc afeto”, se via favo recida pela atitude da mãe, que havia sofrido três grandes perdas e que cm conseqüência disso tornara-se ansiosa e superprotetora13. Dos antecedentes pessoais interessa consignar aqui alguns outros, referentes à sua sexualidade. J. nunca havia experimenta
232
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
Avaliação diagno stica
Através dos dados obtidos nas entrevistas e dos testes psico lógicos, chegou-se ao diagnóstico de histeria de conversão , numa personalidade que mostrava os traços típicos do caráter corres pondente (necessidade de ser o centro das atenções, sedução, ten dência à teatralização, fantasias, etc.). O psicodiagnóstico mostrou principalmente elementos da série histérica. Além disso, revelou transtornos na identidade sexual e marcadas tendências homossexuais latentes. Outros dados diagnósticos se mencionam ao fazer referência ao prognóstico do tratamento. Hipótese psicodin âniica inicial. Conflitiva focal
As descobertas recolhidas permitiram esboçar uma formula ção psicodinâmica prematura , que seria ratificada e ampliada durante o tratamento e que incluía uma hipótese acerca da confli tiva focal, à qual me remeterei em seguida. Sem dúvida, a ruptura de sua relação de casal - por decisão de seu companheiro - havia operado em J. como um fator traumá tico, que incrementou sua sintomatologia como expressão da rea tivação de antigos conflitos. Os vômitos podiam estar vinculados a seus frustrantes desejos de engravidar se levarmos em conta: a) que sào comuns nas gestantes; b) seu obsessivo temor de ser esté ril e sua gravidez psicogênica. Por sua vez, relacionar-se-iam com desejos orais reprimidos , sobretudo áe fellatio, a julgar por seus comentários acerca dessas práticas sexuais por parte de amigas suas que lhe contavam suas experiências, com as quais estava energicamente - reativameníe - em desacordo, e por seus pró prios sonhos, nos quais aparecia ela mesma sendo objeto de cunnilineuae: os vômitos poderiam significar basicamente rejeição
Dos tratamentos breves
_ _________
______
Era muito ostensiva uma fixação oral da libido (existia, além disso, o antecedente de haver sido amamentada com mamadeira até os 6 anos). Considerando a repercussão dos vômitos sobre seu ambien te, resultava claro que os mesmos se associavam a uma acentuada tendência regressiva. Mantinha com a mãe um vínculo simbióti co. Isso se revelava na presença constante de sua progenitora, que a acompanhava desde as primeiras entrevistas. A paciente negava seus víncu[os regressivos e sustentava que éra sua mãe quem se empenhava em não deixá-la só, temerosa do que lhe pudesse su ceder. Os vômitos lhe permitiam além disso faltar £o trabalho, esquivando-se da responsabilidade e refugiando-se nâ. fantasia re gressiva. Por outro lado, detectaram-se fantasias homossexuais rela cionadas à figura materna. Em síntese: a perda de seu companheiro havia exacerbado ainda mais seus desejos insatisfeitos e com isso seus vômitos; ante a frustração, a paciente buscou consolo e refugio em sua mãe através de uma regressão oral. Metas terapêuticas
Por ordem de prioridade, e de comum acordo com a paciente, estabeleceram-se os seguintes objetivos terapêuticos: 1. Obter o alívio ou a cura sintomática. 2. Clarificar o conflito atual (significação da ruptura da rela ção de casal e dos sintomas a ela relacionados). 3. Conseguir uma melhoria em seus vínculos interpessoais (considerando especialmente seus desejos de formar um par).
234
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
çòes em grande parte conservadas. A isso se acrescentava que nos encontrávamos ante uma pessoa jovem, medianamente inteligen te, motivada, graças ao “momento propício” que atravessava ( 2), para realizar uma psicoterapia, com certa capacidade de autoobscrvação11. Por último, a possibilidade de determinar um foco e objetivos claros foi outro elemento que permitiu formular um bom prognóstico. *
Planificação do tratamento
Considerou-se conveniente apelar para assinalamentos e interpretações - sobretudo “extratransferenciais” - ao operar sobre a conflitiva central do tratamento. De início efetuar-se-iam interpretações “de ensaio” ( 1), para ver em que grau a paciente as aceitaria. Logo, se possível, realizar-se-ia um trabalho de inter pretação ativa, embora cautelosa, do conflito. Levou-se cm conta a possibilidade de apelar para a utilização seletiva do método da associação livre. A duração do tratamento foi fixada em três meses, à razão de duas sessões semanais de 30 minutos cada uma. Quanto à estratégia terapêutica, pensou-se que um primeiro avanço dar-se-ia ao se conseguir que J. pudesse reconhecer a conexão entre seus sintomas conversivos e sua vida emocional. Posteriormente talvez fosse possível aprofimdar-se mais nos psicodinamismos subjacentes aos sintomas, quer dizer, aprofundar-se no foco. Considerou-se que não era conveniente intentar a aborda gem e a interpretação de suas fantasias homossexuais latentes numa psicoterapia de tempo limitado. A tarefa terapêutica centrar-se-ia em investigar a relação entre os sintomas mencionados e suas inibições sexuais (dificul dades para formar um par; frigidez). A parte final do tratamento deveria incluir, como sempre, um trabalho relacionado com as ansiedades provocadas pela se paração.
Dos tratamentos breves
________
_________
Evolução durante o tratam ento
Logo nas primeiras sessões, nas quais evidenciou uma inten sa resistência, J. se tomou mais receptiva e começou a mostrar certa capacidade de insight. Revclou-se decisiva influência da morte do irmào em seu so frimento. Freqüentemente tinha pesadelos cujo conteúdo se vin culava ao acontecimento no qual aquele havia perdido a vida (eram freqüentes sonhos sobre inundações). Cabia inferir, em es pecial da análise de seus sonhos, que a repulsa de sua sexualidade correspondia em parte à identificação com a jovem que, segundo ela, não havia auxiliado seu irmão, entregando-se em tfoca a jogos sexuais. A união sexual ficava assim muito intensanfpnte ligada, em seu inconsciente, à morte de um terceiro - como evidenciou com clareza outro sonho seu adquirindo, para a paciente, uma significação agressiva intensa c em conseqüência muito persecu tória, razão pela qual se via obrigada a rejeitar seus impulsos sexuais, e por isso seus eventuais pares, sobretudo mediante vômitos. Na realidade, a cena da morte de seu irmão encobria o complexo edípico, com predomínio do negativo, isto é, seus dese jos homossexuais e simultaneamente seus desejos parricidas. O terceiro, seu irmão, representava por sua vez seu pai. Mas além disso, para seu amor homossexual possessivo pela mãe, a morte de seu irmão vinha somar-se ao relato feito por esta de que haviam falecido seu primeiro marido e seu primeiro filho, o qual reforça va as fantasias onipotentes de J. de aniquilar todo homem rival. A respeito, J. recordou algo muito importante que relatou como se segue: “Eu estava no cinema com mamãe, desfrutávamos'* juntas a sessão, quando nos vieram avisar que meu irmão havia morrido.” Compreendi que essa situação revelada por J., eroticamente carre
236
Psicolcrapia breve de orientação psicanaiítica
dia; mortificava-se pensando que devia ter feito algo para salválo. Na realidade tinha tido uma relação muito ambivalente com ele, dada sua rivalidade por conquistar a preferência de seus pais, em especial de sua progenitora. Agora tinha-a quase que só para si. Esses aspectos de seu conflito foram mostrados à paciente. Existia uma intensa idealização da figura do irmão, com o intuito de aplacar o perseguidor, no qual havia projetado seu pró prio sadismo. Dizia, por exemplo: “Ele era melhor como pessoa e como filho e podia ter dado mais satisfações que eu.” Durante o tratamento pôde manifestar que os desejos de ter um filho se relacionavam com um desejo reparatório inconsciente em direção a seu irmão. Comentava, entre outras coisas, que só desejava ter um varãozinho c que não podia explicar por quê. Essa descoberta significou um novo aprofundamento na compreensão focal. A perda de seu par, supervalorizada, implicava ao mesmo tempo a perda de suas possibilidades de reparação, ao ver-se impedida de procriar. A esta altura, em síntese, pôde-se precisar e interpretar-se que seus vômitos se relacionavam principalmente com: a) Fantasias inconscientes de gravidez, nas quais ao desejo de possuir um menino como substituto do pênis se agregava um intento reparador em relação à morte de seu irmão. Seu filho constituiria, além disso, uma oferenda a sua mãe, como se com ela quisesse expressar-lhe: “Aqui tens um varão em troca daquele que eu matei...” A aparição dos vômitos coincidentes com a primeira menstruação poderia ser explicada provavelmente pela influência desta última como estímulo, ao significar a possibilidade biológi ca de procriar. b) Fortes desejos oral-sádicos (fantasias de fellatio ) reprimi dos. Os vômitos significavam, por sua vez, a repulsa desses dese jos e o castigo por eles16. c) A busca da satisfação de desejos ligados a outras pulsões parciais. A paciente havia conseguido que toda vez que tivesse vômitos lhe aplicassem injeções de um tranqüilizante nas náde gas. Os vômitos cediam quase instantaneamente ao receber a
Dos tratamentos breves
237
A esse respeito existia o antecedente de ter sofrido uma ope ração cirúrgica, anos atrás, por causa de uma suposta apendicite, que não houve, já que os cirurgiões, durante a operação, não en contraram nenhuma alteração no apêndice e cm nenhum outro lu gar. Havia assim satisfeito seu masoquismo erógeno. d) A obtenção de evidentes ganhos secundários, o que refor çava ainda mais seus sintomas. e) A necessidade de provocar repulsa em seus pretendentes, enquanto experimentava seus próprios desejos sexuais como proibidos*e perigosos. J. relatou fantasias e sonhos durante o tratamento, o que re sultou muito útil para a compreensão de sua problemática, da qual foi conseguindo um insight progressivo. Começou tomando consciência da relação entre seus vômi tos e suas fantasias, aceitando que estas influíam na produção dos sintomas (havia dito que com freqüência vivia em parte como reais suas próprias fantasias diurnas: “Quando minto, eu mesma creio em minhas mentiras. Por exemplo, imagino que saio com um rapaz e o conto como certo... Tenho muita imaginação”). Re conheceu então seus desejos .de gravidez (havia além disso outra prova suficiente para demonstrar a J. o poder de suas fantasias: a gravidez psicogênica). Dali vimos que deveria refugiar-se na fan tasia onipotente de gravidez ante a perda de sua relação de casal e das ilusões a ela ligadas. Também nessa fase da terapia assinala ram-se suas tendências opostas de dependência e independência com respeito à figura materna. Às vezes, um tanto intempestivamente, J. se tornava resisten te e até hostil. Para vencer essas resistências foi necessário utilizar interpretações “transferenciais”, a fim de que pudesse reconhecer a existência de uma situação persecutória na relação terapêutica. A transferência hostil estava ligada a seus sentimentos de inveja fálica, tal como o atestavam os testes projetivos, sentimentos in crementados pela existência de uma imagem supervalorizada de
23H
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
depois de iniciado o tratamento e praticamente ao completar-se o primeiro mês. Esses sintomas, diante do assombro da paciente, cederam, o que me fez pensar que pudesse ser um efeito da suges tão (cura transferencial). Não foi necessário recorrer a nenhuma medicação. No segundo mês de tratamento, o fato mais notável foi o desaparecimento das náuseas e dos vômitos histéricos, presumidamente substituídos pela aparição - numa segunda-feira - de um terçol17, Ao lhe pedir associações sobre fcstc, respondeu-me que devia ser conseqüência de ter introduzido “os dedos sujos ou uma lapiseira no olho”. Acrescentou que lhe parecia muito estranho que em troca dc seus vômitos tivesse que sofrer nessa segundafeira de um doloroso terçol. Pudemos ver que a significação in consciente desses pensamentos era a seguinte: o terçol se achava associado a fantasias de coito, sobretudo anais, de caráter proibi do para a paciente (alusão do sexual como algo “sujo”, particular mente à analidade, através de sua referência a dedos sujos; os dedos c a lapiseira eram símbolos fálicos e penetravam em um orifício representado pelo orifício orbital; o olho tinha aqui, es sencialmente, um significado anal inconsciente). O terçol apare cia, então, por deslocamento e como sintoma substitutivo de suas náuseas e vômitos, com significado idêntico ao desses sintomas, isto é, como uma nova expressão na área do corpo de suas fanta sias dc gravidez. Isto é, a fantasia da paciente da gênese do terçol representava a união sexual, c o terçol, proeminente, a própria gravidez, conseqüência do anterior. Na sessão, J. associou a subs tituição das náuseas e dos vômitos por um terçol com as manifes tações de uma gravidez (o terçol como volume, comprovando assim sua tendência a expressar suas fantasias através de transtor nos corporais"*). Só em duas ocasiões ambas em segundas-feiras - reapare ceu, durante o tratamento, sua sintomatologia habitual, ainda que muito atenuada, pois se reduziu a um estado de náusea. Isso suce deu: IP) quando no dia anterior (sempre lhe perguntava, exercen
Dos tratamentos breves
239
sagem com sua mãe; esse fato ficava associado à morte de seu irmào pelo já visto anteriormente. Contou-me depois a forte impressão que lhe haviam produzido certas cenas do filme. Neste, “Los perros de paja”, tal o título em castelhano um filme que inclui cenas de muita violência - uma jovem, de traços histéricos, provoca sexualmente um grupo de homens, que finalmente a fazem objeto de um brutal estupro por via anal. Já durante a proje ção do filme J. havia começado a sofrer de um estado de náusea. Esses, fatos foram muito úteis para mostrar-lhe novamente como suas náuseas e vômitos se relacionavam com seus desejos sexuais reprimidos, estimulados, nessas circunstâncias. Pôde accitar que seus sintomas expressavam seu sentimento reafivo de repugnân cia por tais desejos e ao mesmo tempo a busca inconsciente de sua satisfação (injeções). Desde a metade do segundo mês até o final do tratamento abordaram-se especialmente: A relação entre seus desejos de gravidez e a dor patológi 1. ca pela morte de seu irmão, ao longo de sessões que tiveram nela e cm mim profunda repercussão emocional. Em seus pesadelos freqüentemente aparecia sua irmã afbgando-se. Ela presenciava a cena sem poder evitá-la. Na realida de, a innà representava ela mesma, temerosa de sofrer retaliação, o castigo pelos desejos de morte em relação ao irmão19. A delicada e difícil tarefa de encarar esse problema da pa ciente se efetuou, tratando de assinalar, no breve tempo disponí vel, não só seus impulsos agressivos e sua inveja fálica para com seu irmão, mas também de modo paralelo e constante a existência de sentimentos carinhosos e de autênticos desejos reparatórios. Convencido de que a elaboração de luto permaneceria inconcluída, procurei atenuar as ansiedades persecutórias e a regressão conseqüente, derivadas da mobilização afetiva ocasionada, cui mencionar sempre o componente do amor
240
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
geral progressos no trato com eles. Mostrava-se muito grata a mim, pois seus vômitos a haviam feito sofrer durante muitos anos. A esta altura fez-se ainda mais notória a incidência do luto pela perda do irmão em sua problemática sexual: trazia sonhos cujo denominador comum era o desejo de dar à luz um varào. Por outro lado, em certa oportunidade mencionou que sua mãe lhe havia con fiado que desde a trágica morte de seu irmão apresentava uma mar cada inibição de sua atividade sexual. “Não sei disse-me a pacien t e - s e foi ela quem ‘me passou’ ou nào alguns traumas...”. Existia ao que parece certo grau de identificação melancólica com sua pro genitora, o que co-determinava suas próprias inibições sexuais. J. trazia com menos temor seus problemas sexuais. Isso era conseqüência de uma confiança na relação comigo, com uma diminuição de suas ansiedades paranóicas. Mostrei-lhe como os ganhos secundários de seus sintomas podiam interferir na sua cura (cabe mencionar aqui que a partir do segundo mês de tratamento a paciente já comparecia sozinha às sessões). Realizei certo trabalho interpretativo em torno da separação, ao qual não se associaram maiores dificuldades (penso que isso foi possível porque desde o primeiro momento tratei de estimular em J. sua iniciativa pessoal, com critério prospectivo), salvo que J. registrou suas únicas ausências nas duas sessões finais do trata mento, racionalizadas com argumentos pouco consistentes e cujo provável significado seria o de tentar inverter os papéis e aparecer como ela abandonando o tratamento antes de se sentir abandona da; Depois compareceu às entrevistas de avaliação. Em suma, chegou-se a obter uma certa clarificação de sua problemática e do significado de seus sintomas com relação ao luto pela morte de seu irmão. As interpretações foram centrandose nesse ponto (a rivalidade com seu irmão, seus sentimentos de culpa e seus desejos de reparação, o sexual como algo detestável, etc.) e assim foi-se aprofundando o foco. Não se encarou a fundo o complexo de Édipo positivo e negativo, o que parecia mais com plicado ainda neste tratamento de tempo limitado (se bem que o luto patológico não ficasse atrás em extremo nesse sentido; por isso foi essário “deixar passar” material que era tentador int
Dos tratamentos breves
_____________
1
Avaliação dos resultados terapêuticos
Avaliação imediata Nas entrevistas de avaliação imediata, a paciente opinou acerca do tratamento: “Foi bastante positivo. Superei muitas coi sas, os vômitos das segundas-feiras... certamente podem ficar muitas coisas que eu mesma posso superar pouco a pouco, já sabend© quais são meus problemas. Claro que voltarei a consultar-me se necessário.” Concordamos que havia alcançado em boa medida com preensão - insight - dos motivos determinantes de seus proble mas atuais e que dia após dia podia manejá-los melhor. A melhora sintomática era muito ostensiva no que se referia aos sintomas positivos de sua neurose. As náuseas e os vômitos haviam desaparecido, da mesma maneira que a depressão. No to cante a suas inibições, a melhora foi menos notável. Ainda que tenham desaparecido reações impróprias (os vômitos), persistiam dificuldades em suas relaçõ.es com os homens, que no entanto pareciam já estar a caminho de serem superadas. Nesse sentido, J. manifestou confiança em poder formar um novo par e gozar se xualmente. Havia-se elevado sua auto-estima. A terapia produziu além disso outras modificações favoráveis em suas relações interpes soais. Via-se menos ligada à mãe e com desejos de aproveitar seu tempo livre integrando-se a grupos de ambos os sexos. Outras modificações geradas pela terapia em torno de questões tais como o trabalho foram de importância secundária ou não ocorre ram, como no concernente a uma eventual elaboração de projetos pessoais.
242
Psico Psicoter terap apia ia breve reve de orien orientaç tação ão psican psicanalí alítica tica
Avaliação mediata Cerca de três anos depois e após grandes esforços para locali zá-la, pois se havia mudado com seus pais, consegui encontrá-la. Desloquei-me até seu domicílio, já que J. nào tinha telefone. Recebeu-me sua mãe (J. nào se encontrava ali no momento), que se alegrou de me ver. Pcdi-lhe que dissesse a J. que tratasse de se comunicar comigo e aproveitei a ocasião, além disso, para obter sua impressão sobre o estado da jovem. Contou-me que a seu ver havia mudado notoriamente a partir do tratamento efetuado; mos trava-se otimista e ativa de modo estável, havia conseguido um novo emprego, mais bem remunerado, e um companheiro, e nunca mais havia apresentado episó ep isódio dio de vômitos. vômit os. Par araa ela prosseguiu pross eguiu comentando - “o problema” de J. J. fora sempre sempre o de seu irmão fale fa le cido. Finalmente acrescentou que desde algumas semanas J. pen sava em falar comigo comi go para para que que atendesse ate ndesse uma amiga ami ga sua. A paciente me ligou quando recebeu meu recado e pudemos marcar uma entrevista de acompanhamento. A maior parte das declarações de J. e das conclusões que se podem extrair de tal en trevista sào dignas de serem expostas com certo detalhe, pois con sidero que ilustram adequadamente a eficácia e o alcance que o procedimento terapêutico aplicado a plicado pare p arece ce ter atingido. Encontrei J. sorridente e de excelente aspecto. Seus gestos me pareceram mais sóbrios, menos teatrais. Não havia recebido nenhum outro tratamento psicológico após ter terminado terminado o efetuado efet uado comigo. com igo. Com grande satisfação, expressou: “Desapareceu uma série de problemas que eu tinha. Nào tive mais problemas de vômitos e tive uma mudança radical em tudo: estou noiva, vou muito bem com ele, mudei de trabalho, me sinto bem. O tratamento foi difí
Dos Dos tratam tratament entos os breves breves
243
mais alegre, brinco, gosto não só da companhia do meu noivo, mas também de sair em grupo. Antes tratava de ficar só, não tinha desejos de sair e nem de me arrumar.” No que se refere à atividade sexual, J. assegurou que tinha relações sexuais satisfatórias com seu parceiro e que quase sempre conseguia o orgasmo. “Antes continuou - não era era feliz sexualmente, sentia-me usada, usada, o sexo era algo asqueroso para mim... Não rejeitei meu noivo em nenhum momento. E não comentei nada de minha outra relação (alude a seu parceiro anterior). Não acho necessário .”20Mais adiante conti nuou se referindo à sua sexualidade: “Creio que tenho mudado muito minhas idéias sobre sexo... Com ele temos bastante liberda de sexual, conseguida pouco a pouco... Eu antes não tinha podido mostrar-me desnuda diante de um homem, com a luz acesa. Ago ra, ra, pelo contrário, contrário, considero conside ro normal.” Toma-se indubitável que ao longo do tempo depois do trata mento, J. havia vencido em grande parte suas inibições sexuais, havendo formado um par, com o qual aparentemente se achava muito ajustada, e superado sua frigidez. Foi, isso sim, necessário que passasse certo tempo para que pudessem cumprir-se esse objetivos terapêuticos e comprovàr-se assim os frutos do trabalho desenvolvido, segundo o relato da paciente e o de sua mãe. Manifestou desejos de casar-se logo para poder ter filhos. Enquanto isso recorria a anticonceptivos orais. “Apesar de meus desejos de ter filhos, não me esqueço de tomá-los”, comentou sorrindo. J. queria sem dúvida fazer-me notar que tinha presente aquilo que havíamos explorado durante sua terapia e que além disso estava muito atenta no que se referia a tomar as precauções devidas, a part partir ir da da profunda profunda convicção convicç ão - obtida mediante mediante o trata trata mento - que tinha a respeito da força de de seus dese d esejos jos incons i nconscien cien tes. Não havia tido abortos. Quanto às relações com seus familiares, contou-mc que se sentia muito bem com seus pais, e ao mesmo tempo muito mais independente. Como havia comparecido à entrevista com sua mãe, iinportou-lhe esclarecer-me que esta havia insistido tanto cm acompanhá-la que lhe parecera absurdo negá-lo, mas que na ver dade sentia que isso não era necessário em nada, diferentemente
244
Psico Psicoter terapi apiaa breve breve de orienta orientação çãopsicana psicanalitic liticaa
cuidados de sua progenitora, chamando de algum modo a atenção para para isso. “A relação com c om minha mi nha mamãe - continuou continuou a me contar J. mudou muito, ao menos de minha parte. Agora compro sozinha minha minha roupa... roupa... Antes, Antes , tenho certeza, não teria podido casar e viver longe dela. Agora tenho propostas para viver com meu futuro marido na província e não vejo inconvenientes.” A paciente atri buiu ao ao tratame tratamento nto efetuado uma decisiva influência inf luência nas modific mod ifica a ções que a relação com sua mãe apresentava21. Do mesmo modo, J. havia sido antes muito dependente em relação à irmã, com a qual agora - segundo ela - se vinculava mais, “de “de igual para para igual”, igual ”, sem ajustar-se incondicionalmente às opiniões dela, aceitando-as como tais, mas desenvolvendo pontos de vista. Havia interrompido seus estudos de modelo publicitário, devido ao fato de que os encarregados de dar-lhe trabalho tacita mente lhe impunham como condiçào que mantivesse relações se xuais com eles. Isso se repetiu em duas ou três oportunidades, razão pela qual decidiu abandonar definitivamente esse campo. Referiu-me que sempre se sentira atraída pela arte cênica, mas que no momento não pensava em estudar teatro, já que o que lhe interessava era concretizar com brevidade seus planos de contrair matrimônio e nesse sentido voltava-se com afinco para seu traba lho numa empresa distribuidora de peças para automóveis, onde obtinha um salário superior ao de seu emprego anterior e ainda tinha possibilidade de melhorar seus ganhos muito mais. Espontaneamente comentou que, em função de uma bron quite que contraíra, deixara de fumar. Pôde consegui-lo contro lando a ansiedade derivada de tal abstinência, fato que a seu ver cra um efeito efei to da terapi terapia, a, ainda que não pudesse pu desse precisar pr ecisar melhor de que maneira maneira esta e sta a havia ajudado nesse problema. Depois referiu-se a seus estados depressivos, que já haviam deixado de acontecer. Dc imediato aludiu à recordação de seu ir mão falecido: “Não penso tanto nele. Inclusive, antes desejava ter um varã varãoo ruivo como com o meu irmão. irmão. Agora não. Quero que se s e pareça com meu noivo e comigo... Quando nos mudarmos, não quero
Dos Dos tra tratam tamen entos tos breves bre ves ___
_________
_____________ _____ ,____
Queria enviar-me uma companheira de trabalho, para que tratasse dela, o que constituía uma manifestação a mais de sua confiança em mim. Quase no final da entrevista, após haver-lhe transmitido minhas impressões ao longo da mesma, expressei-lhe minha sa tisfação de encontrá-la bem e com tão gratas novidades, reiteran do que contasse comigo para qualquer necessidade, depois do que nos despedimos, não sem que J. tivesse palavras de emocionado agradecimento para comigo. Desde esse momento não voltei a ter notícias dela. Finalmente, ao se registrarem nessa oportunidade resultados positivos em I.P.F. ( insight da da problemática focal), R.P.F. (resolu ção - clínica clínic a total da problemática problemática focal, foca l, pof substituição substituição das das reações imprópria imprópriass pelas apropr apropriad iadas, as, em suas rèlações hetero h eterosse sse resultado final, fina l, de acordo xuais) e M.S. (melhoria sintomática), o resultado com o sistema de avaliação proposto no capítulo 1 1 , considera-se muito muitofavorável. favoráv el. Considerações finais
Este caso convida à reflexão em torno de vários pontos. Sem dúvida é polêmico e penso que constitui uma mostra fiel das múl tiplas interrogações que se apresentam na prática dessas terapias a respeito da teoria da técnica. Tais questões devem servir de estí mulo para discutirmos e investigarmos propostas que resultem úteis e que conduzam a linhas de trabalho fundamentadas dinami camente. Também é interessante o problema que levanta com relação aos resultados terapêuticos. terapêuticos. y 1 . O uso flexível e seletivo do método da associação livre rende seu fruto fru toss ao aplicar-se a plicar-se em quem conta com possibilidades reais reais de responder de um modo favoráv favo rável el (aqui (aqui pôde-se utilizá-lo com êxito, por exemplo, a propósito dos sonhos da paciente e da aparição do terçol).
246
Psico Psicoiera ierapia pia breve breve de orien orientaç tação ãopsicanalit psicanalitica ica
de inter-relações entre os diversos fatores. O aprofundamento no foc fo c o revela a sobredcterminaçào dos sintomas e é facilitado pelas condições da paciente para se remeter ao material focal e obter insight desses desses conflitos22. 3. Se bem que aqui tenha-me tenh a-me aventurado de novo num traba traba lho interpretativo de certo modo profundo, com incursão em aspectos históricos infantis - já que penetrar na relação que a paciente mantinha com o irmão e no luto patológico que sobre vêm a essa perda, ocorrida em plena infância dela, não supõe ou tra tra coisa não me afastei da da conflitiva focal. As interpretações interpretações que incluíam aspectos históricos infantis eram, repito, sempre focalizadas, possibilitando assim o aprofundamento do foco. Se tivessem estado ‘‘fora de foco”, isso teria implicado o risco de “abrir feridas” desnecessárias, provocando uma maior mobiliza ção na paciente, relacionada com conflitos que não poderíamos abarcar o suficiente durante o tratamento. — 7 4. No que se refere aos problemas prob lemas suscita sus citados dos pel p elaa presen pre sença ça de lutospatológico luto spatológicoss de importânc importância ia em tratamento tratamentoss de curto pra zo, cabem aqui as considerações efetuadas em capítulos anterio res (ver os capítulos 10 e 12). Mas quero formular uma interroga a inda necessário, ção que surge em seguida: se é conveniente, ou ainda incluir um luto dessa natureza, entre os aspectos a serem tratados com o paciente, no programa terapêutico terapêutico de uma terapia de dura ção limitada (o qual coincide, nessa oportunidade, com o proble ma da atitude a ser assumida ante o histórico infantil). Neste caso particular, minha resposta é afirmativa. Incluir 0 luto era de certo modo algo inevitável, como fui compreendendo ao longo do pro cesso terapêutico, pois a meu ver constituía um problema de importância fundamental, que estava no próprio núcleo do sinto ma como conflito subjacente c que requeria abordagem, ainda que só pudesse ser efetuada de modo parcial. Cabe perguntar se o fato de não haver trabalhado desse modo teria produzido resultados similares aos obtidos quanto à remissão da sintomatologia, baseda em certo grau de insight a a respeito do conflito central do trata
Dos Dos trata tratame mento ntoss brev breves es
247 24 7
de técnica ante esses problemas, adaptando-a ao enquadramento existente nesse tipo de terapia para evitar que elas se convertam numa psicanálise incompleta, com conseqüências previsíveis. Ao descrever este histórico expus a posição que adoto, partindo das propostas de Szpilka e Knobel (10). Esta inquietude leva não só a ajud ajudar ar o paciente ao máximo, dentro dentro das possibilidades possibilid ades institucionais. mas também a não preíudi preíudicá-lo cá-lo com técnic t écnicas as inadequ i nadequadas. adas. Até aqui refiro-me somente às necessidades e vantagens de incursionar na problemática do luto, mas desde já com a ressalva de cju cjue tal tal atitude contém os riscos ris cos próprios de uma tarefa tarefa terapêu terapêu tica escabrosa, que em termos ideais deveria ser tão prolongada quanto intensiva, e que em virtude da limitação temporal ficará forçosamente incompleta. A elaboração insuficiente do luto poderá acarretar o reaparecimento dos sintomas ou novas manifes tações do conflito (fato não comprovado nesta paciente após transcorridos cerca dc três anos do término do tratamento). Mas trata-se de um risco previsto, calculado. Para isso existem os acompanhamentos, que oferecerão oportunidade de detectar re caídas e de assinalar, quando a situação o requeira, a necessidade de retomo à psicoterapia. psicoterapia. , - -Em TtPSsã TtPSsã~p ~pãc ãcien iente, te, pênso pên so que os resultados result ados obtido obt idoss com re lação à abordagem do luto enquistado não devem ser subestima dos. Creio que, na prática, ainda em terapias de objetivos limitados, nos problemat problematizamos izamos - e equivocamos - em demasia, demasia, quand quando, o, furo r curandis, pretendemos conseguir uma elabora com nosso furor ção de conflitos fundamentais ou solucionar perturbações caracteropáticas que costumam levar muito mais tempo, habitualmente anos de trabalho esforçado. Nesta Nest a oportunidade oportunidade poder-se-ia questionar questionar e creio que com certa razão - a abordagem de um conflito ocasionado por um luto patológico num tratamento de três meses apenas. Colocando-nos sempre a alternativa de ter de fornecer uma terapia de tempo limi tado, como ocorre no contexto hospitalar, o que corresponde ao caso de que nos ocupamos (paciente de escassos recursos econô
248
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
prolongado), penso agora que o que talvez pudesse ter sido feito e resultasse conveniente seria fixar, desde o começo, um tempo maior para a terapia23. Que essas terapias sejam indefectivelmente “superficiais” constitui por certo um preconceito, já que, diante de pacientes muito cooperativos e capacitados para o insight, o grau possível de aprofundamento interpretativo e de “insight ” alcançado concomitantemente pode - em certas ocasiões - ser significativo.^ isso o que ocorreu com esta inteligente e flexívçl paciente (apesar de apresentar por momentos intensas manifestações resistenciais), razão pela qual foi possível interpretar, por exemplo, fanta sias pré-genitais inconscientes (em especial as de caráter oral e anal), numa magnitude a princípio inusual em minha experiência em psicoterapias de tempo limitado24. Naturalmente faço referên cia a uma profundidade que se alcança somente em aspectos par ciais da conflitiva, permanecendo diversos conflitos sem serem desenvolvidos, como se pôde apreciar ao longo deste histórico. Por último, algo mais sobre os resultados obtidos. Também em matéria de resultados terapêuticos das terapias breves existe um preconceito muito arraigado, que consiste em crer que as mudanças produzidas são sempre “superficiais” e/ou transitórias. A natureza da melhoria, sua estabilidade e os novos progressos ao longo de quase três anos de evolução, nos dão neste caso a medida de que isso não é exato. Vemos que em nossa paciente, apesar de ter-se efetuado um tratamento apenas de três meses, os resultados ultrapassaram a mera cura ou alívio de um, é bom recordar, incô modo e antigo sintoma. O acompanhamento permitiu descartar as temidas recaídas, e pareceu haver-se chegado a uma resolução dinamicamente parcial, ainda que bastante firme do conflito, e que é de se destacar haver-se instaurado um ciclo prospectivo e uma adaptação produtiva à realidade, concretizados nos êxitos obtidos pela paciente nos anos que se seguiram ao tratamento. As mudanças impressionam como tendo tido um alcance que cm alguns aspectos transcende os objetivos terapêuticos propostos.
249
Dos tratamentos breves
A experiência de investigadores como Dewald também pare ce demonstrar que é possível obter resultados terapêuticos muito bons. Assinala este autor que “em alguns enfermos, bem ‘prepa rados’ sensível e psicologicamente, pode desenvolver-se um insight importante dos conflitos num contato terapêutico relativamente curto e que exerça um efeito terapêutico duradouro” (3). Apesar de esses resultados não serem habituais em psicoterapias breves, podem bem produzir-se, como vimos nesta ocasião, a propósito do tratamento de J.
Referências bibliográficas
.
1. Alexander, F., “Indicaciones para la terapia”, cm'F. Alexander e T. French, Terapêutica psicoanalitica, Paidós, Buenos Aires, 1965, cap. VI. 2. Courtenay, M., Sexual Discord in Marriage, Tavistock, Londres, 1968, citado por L. Small em Psicoterapias breves, Granica, Buenos Aires, 1972. 3. Dewald, P. A., “Psicoanálisis y psicoterapia por ‘insight’ dirigido”, cm P. A. Dewald, Psicoterapia: un enfoque dinâmico. Toray, Barce lona, 1972, cap. XVI11. 4. Freud, S., “Análisis fragmentario de una histeria”, em S. Freud, O.C., Biblioteca Nueva, Madrid, 1948, tomo ü. 5 . , “La histeria: Historiales cínicos”, em S. Freud, ob. cit. em 4, tomol. 6. Guiter, M., Comunicación personal. 7. Jones, E., “The Phallic Phase”, 1932, em Papers on Psychoanalysis, Baillière, Londres, 1950, citado por J. Laplanche e J. B. Pontalis, em Diccionario de psicoanálisis, Labor, Barcelona, 1971, p. 119. 8. Malan, D. H., A Study o f Brief Psychotherapy, Tavistock, Londres; Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 9. Picdimonte, R. C., Comunicación personal.
4
14. Formaçã odeterapeutas * empsicoterapiabreve
Introdução Está fora de qualquer dúvida que uma preparação psicanalítica prévia adquire importância decisiva na formação em P.B. Wolberg (5), entre outros, reafirma isso de maneira concludente. É que, entre outras coisas, é necessária uma rápida captação da problemática do paciente e cr conhecimento c manejo dos fenô menos transferenciais e contratransferenciais que abranjam as variações que no campo criam fatos tais como a conduta ativa do terapeuta ou a combinação dos diferentes recursos terapêuticos. Por esse motivo, será de grande utilidade contar com suficiente experiência de análise pessoal. Conhecimentos teóricos e prática psicanalíticos. No que diz respeito às emoções contratransferenciais, cabe assinalar a necessidade de que o terapeuta exerça um controle adequado sobre elas, especialmente em circunstâncias que para ele reproduzam a situação triangular, nas quais pode chegar a colocar-se como o excluído, o que, como vimos, acontece com
252
Psicoterapiu breve de orientaçãopsicanalitica
acompanhem, pois do contrário corre o risco de atuar nocivamen te, o que também já foi assinalado (capítulo 8, pp. 155 ss.). A partir daí deduz-se que são os psicanalistas experientes que estão em melhores condições de exercer a P.B., já que podem contar, dentre as muitas vantagens em comparação com um tera peuta principiante, com uma boa elaboração de seus próprios con flitos básicos. Mas sabemos que na prática a realização dos trata mentos breves se assenta em boa parte em terapeutas novatos, e que o treinamento deles em tais tratamentos não costuma ser pre cedido de uma sólida formação psicanalitica, © que seria ideal, mas que no máximo coincide com o desenvolvimento dela. De qualquer forma, cumprida previamente ou não a etapa psicanalitica, a formação do terapeuta em P.B. consistirá na apren dizagem da teoria de sua técnica e no treinamento psieoterapêutico adequadamente supervisionado. A seguir me ocuparei desses aspectos, para em seguida descrever alguns dos requisitos ou con dições que me parecem importantes para ser um bom terapeuta em P.B. Finalmente, exporei um modelo de registro clínico que acredito pode servir de guia na prática e favorecer uma sistemati zação operativa da tarefa.
Aprendizagem teórica Ainda aceitando que na verdade seja difícil “fazer e aprender simultaneamente psicoterapia e psicanálise” (Joseph [2]) e em virtude de apresentar-se na maioria das vezes essa necessidade nas fases iniciais do caminho a ser percorrido por todo terapeuta iniciante, considero que será melhor, como primeira medida, que este se fixe no objetivo de conhecer com clareza as características principais que distinguem uma terapêutica da outra, para não se abandonar a uma situação que o condene a transformar o trata mento breve numa “psicanálise breve’\/Para isso será mister estu
Formação de terapeutas empsicoterapia breve
253
identidade teórica por parte da P.B. (1) exerce na formação dos terapeutas. É possível que assim seja, e que em grande parte essa carcncia, a meu ver, constitua mais que tudo o produto da falta de coerência nas contribuições - à qual também se refere acertadamente Fiorini (1) que com freqüência colocam hipóteses incon ciliáveis entre si e que também freqüentemente se fundamentam em esquemas referenciais diferentes^Mguns requisitos a se levar especialmente em conta no ensino da P.B. seriam então: partir de embasamentos teóricos sólidos (por exemplo e fundamentalmen te os fofnecidos pela psicanálise) e expor um método que apresen te coerência suficiente, propósitos cuja concretização encerra uma árdua tarefa que ainda não terminou de se cristalizar, e que é a que pode fornecer a orientação e o respaldo necessáriq para evitar que os jovens profissionais caiam no desânimo e na descrença. Além disso, ao longo de meu trabalho como docente em P.B., tenho experimentado quase sempre a necessidade dc incluir ini cialmente nos grupos um trabalho que chamaria de/“abrandamento" dos colegas, no sentido de conseguir deles uma boa disposição para a aprendizagem do tema, já que sobre o mesmo abundam preconceitos de todo tipo, que convém, entào, rever de início, so bretudo porque se continua insistindo equivocadamente em de frontar a P.B. com a psicanálise, como se se tratasse de dois proce dimentos antagônicos./
Treinamento psicoterapêutico As necessidades atuais de recorrer a esses procedimentos pa ra oferecer atenção psiquiátrica à numerosa população que recorra aos diversos estabelecimentos assistenciais (serviços psiquiátricos hospitalares, centros de saúde mental, instituições privadas), assim como o reconhecimento da terapia focal como técnica, cuja aplica ção é factível e/ou recomendável cm não poucos casos que se apre sentam nos consultórios privados, são fatos que provocam exigên cias nos profissionais, posto que ainda significa para muitos o
_ Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
Supervisão clínica / Preferencialmente, deverá estar a cargo de profissionais ex perientes tanto em terapias prolongadas como em terapias focais.,/ Todavia comprovam-sc comumente dificuldades dos superviso res nos tratamentos hospitalares que, por carecerem de experiên cia de campo e partirem exclusivamente da experiência obtida no âmbito de seus consultórios particulares, mostram-se rigidamente vinculados à técnica analítica ortodoxa. Costumam apresentar problemas de adequação ao contexto institucional e reforçam, nos supervisionados, a tendência à extrapolação da técnica psicanalítica. com deficiências tais como não corrigir - e ainda fomentar o emprego exagerado de interpretações transferenciais, atitudes “passivas” do terapeuta, etc/Quer dizer, uma função elementar do supervisor, além das que correntemente se lhe apresentam, será a de assinalar, para os terapeutas, as contradições técnicas em que possam incorrer. / / Por outro lado, a supervisão deverá enfatizar a elaboração de uma história clínica minuciosa, a delimitação de um foco, o estabe lecimento de objetivos terapêuticos e o planejamento. Do mesmo modo deverá ajudar a detectar o ponto de urgência nas sessões e estimular a assunção de um papel ativo por parte do terapeuta; pres tará especial atenção aos problemas imediatos da realidade externa do paciente e aos que poderão derivar da dissolução do vínculo terapêutico, incluindo-os como tema que é necessário tratar. Fi nalmente deverá propor a realização sistemática de avaliações.^ Algumas condições necessárias para um terapeuta em psicoterapias breves Mencionarei apenas aquelas que me parecem fundamentais (supõe-se que tanto uma boa análise pessoal como o conhecimen
Formação de lerapeiitas em psicoterapia breve
255
2. Capacidade para compreender a natureza dos problemas centrais do tratamento em breve espaço de tempo. X 3. Capacidade para desempenhar um papel ativo no processo terapêutico. yC 4. Flexibilidade livre de preconceitos, e criatividade para exa minar e combinar os diferentes recursos terapêuticos que domine e dos quais disponha quando as circunstâncias o requeiram. No que diz respeito a seus conflitos pessoais: X 5. Certa elaboração da conílítiva cdípica que lhe permita um manejo «das situações triangulares, nas quais possa sentir-se en volvido durante o tratamento. X 6. Suficiente tolerância à frustração para: < / a) Conformar-se com o ganho de objetivos |erapêuticos li| mitados. J b) Renunciar às gratificações especiais proporcionadas 1 pela relação analista-paciente (ver capítulo 8). / c) Resignar-se a não alcançar graus profUndos de investigaçào dos psicodi namismos de cada paciente. I I d) Suportar sem excessivas dificuldades a separação dos pacientes.
FICFIA CLÍNICA PARA PSICOTERAPIAS BREVES Local (serviço, centro de saúde mental, instituição ou consultório
privado):................................... .......................................................... Data de adm is são:.................................................................................... Nom e e so brenome: ............................................Sexo: ....................... Idade:.........................Residência: ........................................................ Telefone:............................... Nacionalidade:....................................
25"
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
História clínica (resumo):
Motivo da consulta (inclui descrição da situação-problema e dos fatores descncadeantes):....................................................................
Dados biográficos de interesse (inclui antecedentes familiares e pessoais): ............................................................................................
Avaliação diagnostica:
Diagnóstico nosográfico-dinâmico: a) Do episódio. b) Da enfermidade. c) Da personalidade. Inclui ainda: - Grupo familiar: Diagnóstico e incidência - incluindo a que exerce o meio social do paciente na problemática. - Avaliação das condições egóicas. Interessam especialmente: a) Funções egóicas básicas (percepção, atenção, memória, pensamento, etc.). b) Relações objetais. c) Controle de impulsos. d) Tolerância à ansiedade e à frustração. e) Mecanismos de defesa. f) Regulação da auto-estima.
Formação de terapeutas em psicoterapia breve
Isso nos conduzirá a uma avaliação da potência e plasticidade
do ego ............ ....... .............................................................................. Grau de motivação para o tratamento e atitudes para o insight:.... Determinação do foco: ................................................ ....................
Hipótesepsicodinâmica inicial:....................................
..... ............... í i
Foco terapêutico. Sua estrutura. Descrição: .................
Pontos de urgência ao começar o tratamento: .................................
informações psicológicas (Testes: Bender, Casal, Rorscharch, Phillipson, T.A.T., etc.). Elementos mais importantes:..................
M etas terapêuticas:
a) Primordiais:
25
____
#
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
Planificação do tratamento:
Psicoterapia: a) De insight (predominantemente). b) De reforçamento egóico (predominantemente). Tipo de relação paciente-terapeuta:
terapeuta (ativo, dirétivo, etc.) posição (frente a frente, etc.)
Recursos terapêuticos: Assinalamentos “Transferenciais” “ExtratransferenIntcrpretações ' ciais’ Intervenções
Psicoterapia individual verbal
Das raízes infantis [ do conflito Perguntas Informações Insinuações Comentários Intervenções de reasseguramento Indicações Conselhos
Uso optativo - do método da associação livre Psicofármacos Inclusão de familiares e/ou figuras próximas Outros
259
Formação de terapeutas empsicoíerapia breve
Sessões: duração, freqüência e periodicidade: Duração total do tratamento:
Estratégia terapêutica
^
Conflitos a abordar e possível seqüência de tal ‘âbordagem; con signar a utilização dos diferentes recursos terapêuticos; assinalar o tipo de material que deverá ser descartado; funções egóicas a serem reforçadas; eventuais modificações na freqüência das ses sões; a tarefa em torno da separação ante o final do tratamento:....
Contrato:
Detalhes do contrato sobre metas terapêuticas, duração do tratamen to, duração, freqüência e periodicidade das sessões; data do término do tratamento, das entrevistas de avaliação e do reteste (se houver):..
260
Psicoterapia breve de orientação psicanalílica
ção do estado do paciente, evolução da relação terapêutica (a transferência e a contratransferência); mençào ao uso e aos efeitos de outros recursos terapêuticos; o término:............................ .........
Avaliação dos resultados terapêuticos:
*
1) Avaliação imediata Impressões gerais do paciente acerca do tratamento
Insight da problemática focal (l.P.F.) Resolução da problemática focal (R.P.F.) Melhoria sintomática (M.S.) Consciência da enfermidade Auto-estima Modificações favoráveis cm: Vida sexual Relações de casal Outras relações interpessoais (familiares, de amizade, de traba
Formação de terapeutas em psicoterapia breve
261
Projetos para o futuro 1
Reteste. Resultados........................................ .................................... ................... .......................................................... I*> ..................... Considerações finais
Separação paciente - terapeuta Ajustamento do acompanhamento. Datas de entrevistas de avalia ção e do reteste. Recontrato (com objetivos limitados). Objetivos Passagem a outros tratamentos: a) Com o mesmo terapeuta b) Com outro terapeuta
Espe cificar o tipo de tratamen to (psicanálise, psicoterapia de gru po, e tc .).........................................................................................................
2 ) Avaliação mediata (acompanhamento)
Insight da problemática focal (I.P.F.).........
Resolução da problemática focal (R.P.F.)
262
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica
Duvidosa Nào-R.P.F.
Sem modificações Recaídas2 Falsa solução valiosa (4) Falsa solução (4), cura transferencial, fuga para a saúde, evitação com ou sem recaída Agravamento
Melhoria Sintomática (M.S.)
Mecanismos Alcance Estabilidade
Consciência da enfermidade: Auto-estima:
Modificações favoráveis cm: Vida sexual Relações de casal Outras relações interpessoais (familiares, de amizade, de traba lho, etc.) Estudos Trabalho Recreação
263
Formação de terapeutas em psicoterapia breve
Novas situações conflitivas: ....................
Mecanismos Alcance
{
Estabilidade
Outros tratamentos realizados: ....... Reteste. Resultados: ........... .......................... ..... ....... ............................................................................
Resultado Final 3 Muito favorável Favorável Discreto Regular Nulo Desfavorável Considerações finais:
Referências bibliográficas
!
264
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
3. Knobel, M., “Psicoterapia breve en la infancia”, em Psicoanàlisis y psicoterapia breve en niiîosy adolescentes. Cuardemos de la SAPP1A Kargieman, Buenos Aires, 1971. 4. Malan, D. H. A Study o f Brie f Psychotherapy, Tavistock, Londres; Charles Thomas, Springfield, Illinois, 1963. (Versão castelhana: La psicoterapia breve, Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1974.) 5. Wolberg, L., “La técnica de la psicoterapia breve”, em L. Wolbcrg e colab., Psicoterapia breve, Gredos, Madri, 1968, cap. VI.
Notas
I
«»
Capitulo 1 Apelarei para ela e para outras similares (tratamento ou técnica breve, etc.) convencionalmente para fazer menção a este tipo de tratamento ao longo dos sucessivos capítulos. Utilizarei, assim, a abreviatura P.B. Capítulo 2 1. Também cabe acrescentar que a focalização do trabalho terapêutico na direção de um aspecto da problemática ou sintomatologia do paciente é característica das atuais técnicas breves. 2. Um acréscimo de 1923 deixa implicito que, para Freud, tal medida foi, neste caso, equivocada. Ali descreve que deu alta ao paciente, crendo-o completamente curado, mas que depois da guerra este o visitou em Viena, ocasião em que Freud pôde comprovar que haviam permanecido sem resol ver aspectos da transferência, o que exigiu mais alguns meses de tratamento, depois dos quais o paciente - disse Freud - “se sentiu normal e se conduziu impecavelmente”. 3. Não obstante, o criador da psicanálise justificará, 20 anos depois, em “Análise terminável e interminável”, a busca de novas técnicas, mais breves, de psicoterapia (13).
266
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
2. Meu esquema referencial é fundamentalmente freudiano, mas não hesito em recorrer a conceitos próprios de escolas como a inglesa ou a ameri cana quando isso me parece necessário, já que me incluo entre os que pensam que, dentro de certos limites, c válido recorrer a distintos modelos tcóricos que possam ser úteis para compreender diferentes fenômenos ou pacientes. 3. A respeito da hipnose em particular, cabe mencionar que L. Wolberg propiciou seu emprego, combinado com outras técnicas, no método terapêu tico breve (54). 4. Esse critério comparativo será utilizado quase permanentemente ao longo desta obra. 5. Anteriormente, o próprio Freud já havia fixadoiim limite de tempo para o tratamento psicanalítico, ao atender o Homem dos lobos (20), como consignei no capítulo 2. 6. Incluído no trabalho “El labor con los conflictos y la resistencia en psicoterapia breve”, que apresentei no Primeiro Encontro Argentino de Psicologia Profunda (Buenos Aires, agosto de 1978). 7. Esses conflitos, como logo veremos, são próprios da estrutura do foco terapêutico, razão pela qual, dc agora em diante, denominá-los-ei con flitos focais ou conflito focal. Outras denominações às quais se recorrc comumente são conflito atual e conflito central ou principal , as quais, ainda que apropriadas, têm a desvantagem de prestar-se a confusões, pelo que requerem alguns esclarecimentos. Antes de mais nada. nem todo conflito atual terá dc ser focal e, portanto, objeto da abordagem terapêutica; por outro lado, atual não significa, forçosamente, dc aparecimento recente e/ou de começo sintomatológico agudo, já que também pode tratar-se de um conflito que se mantenha vigente, sendo suas manifestações bastante antigas e/ou de instalação gradual. Por último, quando se fala em conflito central ou princi pal, deve-se entender que o mesmo o é em relação ao tratamento, já que con centraremos nele nossa atenção e nossos esforços, mas isso não implica necessariamente que esse conflito seja sempre o central dentro da patologia do paciente. 8. Não obstante, cabe assinalar que Malan e sua equipe de terapeutas se dedicaram, em especial, a interpretar os problemas edípicos, dos quais deri vam as diversas dificuldades dos pacientes (40). 9 .0 estudo deve completar-se com o conjunto dos aspectos concernen tes à contratransferência em psicoterapias breves, à qual me refiro, muito especialmente, no capítulo 8 (ver também os capítulos 9 e 14). 10. Sem dúvida, em seu livro Terapêutica psicoanalitica, Alexander, French e colaboradores (5) sugerem propiciar - ainda que só em certas oca siões o desenvolvimento e a análise de determinados componentes da neu rose de transferência, em terapias de curto prazo. Esses autores supõem que é
Notas
267
para compreender, e por conseguinte solucionar, o conflito central do pa ciente. Essa manobra técnica parece-me interessante, ainda que de certa maneira arriscada, com base nas dificuldades que o terapeuta deverá enfren tar para manejar a relação, já que não conta com as possibilidades que o enquadramento psicanalítico oferece (considero que tal manobra poderia ser mais eficaz quando não se tenha fixado previamente uma data para o término do tratamento ou, no caso de tê-la fixado, se a duração prevista para ele não seja demasiado curta, isto é, se o prazo mínimo para a finalização do mesmo seja, por exemplo, de um ano). Em última instância penso que essa atitude deveria ser a exceção à regra, já que, realmente, exige do terapeuta muita destreza e, do paciente, a capacidade, por um lado, de desenvolver certos aspectos díf neurose de transferência e. por outro, de manter simultaneamen te uma relação “real" com o terapeuta e uma aliança de trabalho (29) (30), que garantam o bom andamento do tratamento, evitando derivações indese I jáveis. 11. Isso não implica que se deva descuidar do fenômen» da transferên cia. Pelo contrário, deve-se tê-lo em conta constantemente, como um meio de compreender o paciente (9) (51), e em determinadas circunstâncias (ver capítulo 6, pp. 106 ss.) será necessária sua interpretação. 12. Incluído no trabalho “El labor con los conflictos y la resistencia cn psicoterapia breve”, que apresentei no Primeiro Encontro Argentino de Psicologia Profunda (Buenos Aires, agosto de 1978). 13. Freud aborda novamente o tema dos distintos tipos de resistência em “Análise terminável e interminável”, onde se refere aos mecanismos de defe sa do ego em geral, c não só à repressão como resistência contra a cura (19). 14. Apresentado no Primeiro Encontro Argentino de Psicologia Profunda (Buenos Aires, agosto de 1978) sob o título de: “Insight y elaboración en psicoterapia breve”. 15. A incidência do fator tempo na elaboração é assinalada também por Bellak e Small: “Na psicoterapia rápida não há muito tempo para o processo de elaboração” (6). 16. Poder-se-ia fazer referência a esta última fase do processo com qualquer outra denominação, por exemplo, a de processo progressivo pósterapêutico. Devemos consignar aqui que, no que concerne à elaboração psicanalítica, esta, ao menos para Novey, também continuaria - e é necessário que
268
Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalítica
17. Tais mecanismos poderiam estar ligados ao seguinte: ante diferen tes experiências de vida, ocorreria uma aplicação dos núcleos de insight adquiridos durante o tratamento breve, concomitante ao reasseguramento e ampliação progressivos dos mesmos. Bellak e Small incluem a elaboração em P.B. dentro dos limites da teo ria da aprendizagem. Dessa maneira, concebem-na como o reforço da apren dizagem de uma conduta nova e a extinção de modos neuróticos de adapta ção. Os autores expressam que, neste terreno, a teoria da aprendizagem pode ria ter aplicações especiais: “(...) antes de tudo, o que nos diz respeito é o pro blema de fazer permanente a aprendizagem que se produz na situação psicoterapêutica. Clinicamente, falamos em impedir as recaídas”. Em seguida, esse conceito é ligado pelos autores à problemática da falta de tempo para levar a cabo o processo de elaboração. Seguem comentários que corroboram a idéia de um processo “elaborativo”, não só durante o tratamento, mas também, a meu ver, posterior ao mesmo. Assinalam que o paciente deve “aplicar o aprendizado a situações da vida real, ou dar-se conta de que tem outros pro blemas. Essas experiências - prosseguem podem ter o efeito de convencer o paciente de que aprendeu adequadamente um novo modo de conduta, ou de que sua aprendizagem foi inadequada. Em ambos os casos, o resultado é que a aprendizagem psicoterapêutica melhorou pela experiência de vida real” (6). 18. Compreende-se que o fortalecimento das funções egóicas durante o tratamento é dado, na realidade, não só pelas intervenções verbais do tera peuta, mas também, como expressa Fiorini, pela criação de todo umcontexto de verificação e estimulação dessas funções (12). 19. Devemos ativar muito especialmente as funções egóicas do paciente essenciais para o trabalho terapêutico, tais como a percepção, a atenção, a memória, etc., ativação que adquire muita importância porque acelera e facili ta o caminho em direção ao insight. O terapeuta que exerce uma participação ativa e nâo se limita a apelar para recursos verbais (sua expressão corporal, por exemplo, desempenha um papel fundamental na interação com o pacien te) pode conseguir tais efeitos, uma vez que reforça a aliança terapêutica. 20. Um planejamento estratégico coerente deve prestar atenção à atitu de a ser assumida ante as defesas do paciente. Aquelas que, em um dado momento, são “atacadas" interpretativãmente não devem passar, em segui da, a ser respeitadas ou ainda reforçadas pelo terapeuta, ou vice-versa. É necessário, além disso, não incorrer em contradições, tais como alternar intervenções que tendam a estimular o autodesenvolvimento com outras que favoreçam a dependência regressiva. Nesse aspecto cabe advertir que as mesmas intervenções empregadas com uma intenção confirmatória e reasse-
Notas
269
21. A combinação de recursos de base psicanalítica com outros, de ori gem distinta, na realidade já foi, como vimos anteriormente, concebida por Freud, em 1918. Referindo-se à composição de uma “psicoterapia para o povo”, propunha misturar “o ouro puro da análise” com “o cobre da sugestão direta” (26). 22. A esta altura é necessário assinalar que a moderna psicologia do ego fornece elementos sumamente úteis para a teoria e a prática das terapias breves. Insuficientemente arraigado em nosso pais, onde não conta ainda com uma verdadeira tradição investigatória, o enfoque egóico se emprega, contudo, amplamente entre os americanos, dos quais provêm seus principais progressos. Ocupar-nos aqui da psicologia do ego excede os limites desta apresentação. O leitor interessado poderá recorrer às principais lbntes, as obras de Hartmann, S. Freud, Kris, Loewenstein, Rappaport, White, etc. Aqui só diremos que Bellak e Small lhe atribuem grande valor na psicotera pia breve e de emergência: “Apresentar o ego como uma ^ntidade só dizem - nega a inter-relação entre o ego e as outras psicodinânucas. Apesar desses inconvenientes, a esquematização das funções do ego e de suas perturbações tem um valor prático porque oferece um marco de referência para o diagnós tico e para o tratamento” (6). Em nosso meio e no terreno das psicoterapias, Fiorini chamou nossa atenção sobre esse enfoque (10) (12) (13) (14), baseando-se sobretudo nos importantes desenvolvimentos de Hartmann (33) (34) e os mais recentes de Whitc (53). A utilidade de uma avaliação das funções cgóicas em P.B. vai sendo reconhecida em nossa prática assistencial, tanto com fins de diagnóstico, indicação e prognóstico, como para o planejamento estratégico e a condução do processo terapêutico. Pode, além disso, contribuir consideravelmente para o desenvolvimento e a sistematização de métodos de avaliação dos re sultados terapêuticos. Estes temas serão objeto de revisão nos capítulos que se seguem. Mas é especialmente no que diz respeito às hipóteses sobre os mecanis mos terapêuticos de mudança operantes nas técnicas breves, em que a psico logia do ego talvez possa prestar um novo e valioso auxilio (12) (13). Nesse sentido, as perspectivas atuais são muito promissoras. 23. Todas essas possibilidades ocorrem mais facilmente em institui ções assistenciais e serviços hospitalares, em que, por diversos motivos, nem sempre são devidamente aproveitadas. O trabalho realizado por uma equipe de profissionais abre perspectivas auspiciosas, por mais que - convém assi nalar - sejam mais complexas no que se refere à conceituação dos mecanis
270
Psicoterapia breve de orientação psicanalitica
origem (ver capitulo 7). Outra paciente notou que seus antigos vômitos se exacerbaram desde que ocorreu a ruptura de seu namoro (caso de J., capitulo 13). Um homem buscou consulta ao experimentar um incremento de sua an gústia, sem chegar a vincular, conscientemente, tal estado com o nascimento de seu primeiro filho, acontecido poucas semanas antes e que resultou ser o fator desencadeante principal (caso de A., capítulo 13). 25. Talvez a paciente, através de sua paresia, expressasse também que assim não podia continuar, nem dar ‘"um passo a mais, à maneira de Isabel dc R., a paciente de Kreud (23). 26. Creio que tão mais fácil e freqüente do que este c o fato de que, cm psicanálise, os analistas não coincidam diante de um*mesmo caso, e optem por diferentes linhas interpretativas, o que se pode comprovar nas supervi sões coletivas. 27. Num sentido estrito, sempre o são. A conflitiva focal tem. na reali dade, múltiplas conexões, evidentes ou não, com os conflitos "extrafocais”, não existindo nunca como fenômeno isolado e independente do contexto. 28. A técnica focal, com as seqüências na interação paciente terapeuta que possibilitam a evolução do foco, foi exposta com clareza por Malan (40). Não insistirei, portanto, nesse ponto. Um exemplo de trabalho sobre o loco na sessão psicoterapêutica poderá ser encontrado no capitulo 7. O caso de (capítulo 13) ilustra o aprofundamento no foco à medida que evolui o trata mento. Por último, no capítulo 6 (pp. 95 ss.) examina-se o trabalho de focalização cm relação aos tipos de atenção empregados pelo terapeuta para tal fim. 29. Cabe advertir que em certas ocasiões o paciente também se refere a problemas “extrafocais” com a intenção de elidir o problema central, o que pode ser assinalado pelo terapeuta como uma resistência. 30. O conceito de ponto de urgência foi muito empregado pela escola inglesa. Por isso, ao adotar aqui essa denominação, cabe esclarecer que se utiliza num sentido que não envolve um trahalho interpretativo que remete necessariamente às fantasias precoces infantis descritas por M. Klein. 31. Os primeiros pontos de urgência detectados por ocasião dos conta tos iniciais com o paciente correspondem aos motivos latentes da consulta. 32. Basta pensar numa terapia focal centrada nas ansiedades relativas à gravidez e na sucessão de distintos pontos de urgência “intrafocais” que apa recem paralelamente à evolução daquela, tais como: os que provêm do temor da perda do filho por aborto espontâneo nos primeiros meses; o temor ao filho como ser desconhecido, que se reaviva com a percepção dos movimen tos fetais, os quais, além disso, mobilizam mecanismos defensivos, princi
Notas
271
34. O caso de A. (capítulo 13) permite além disso apreciar, a partir de material clínico, a hipótese psicodinâmica inicial, além dos demais conceitos assinalados. 35. Área 1 da mente, 2 do corpo e 3 do mundo extemo, baseadas no esquema de Pichon-Rivière (44). 36. Ver capítulo 10. 37. Ver capitulo 11. 38. Existem diversas impressões favoráveis sobre as vicissitudes que, na psicoterapia dinâmica, os conflitos derivados sofrem; porém, carecemos de explicações metapsicológicas suficientes a respeito. Por*ocasião de uma mesa redonda sobre psicanálise e psicoterapia, Wallerstein formulou a seguinte questão: “E possível resolver substancialmen te os conflitos derivados ou qualquer outro conflito, por outro meio que não seja a psicanálise?” (52). Pelas respostas, pôde-se advertir qjue quase todos os presentes admitiram que através de uma psicoterapia de orientação psicanalítica conseguem-se modificações nos conflitos e certas mudanças dinâmicas benéficas, ainda que nâo se provoque uma reestruturação profunda. Segundo Oremland, por exemplo, na psicoterapia assistimos a uma resolução parcial ou incompleta, que ele atribui a uma modificação do confli to. Define a verdadeira resolução do conflito como “uma compreensão metapsicológica plena e elaboração das forças interatuahtes”, e acrescenta que só é possível consegui-la mediantp a psicanálise, sobretudo pela reexpericncia c pela compreensão genética ("l). Joseph considera que, ainda que se obtenham modificações, não sabe mos o que sucede em termos das conexões ou do fortalecimento da função integradora ou sintética, e das mudanças nos vínculos energéticos ou cargas. Para este autor, “os conflitos se resolvem no sentido de que se tomam inati vos, em função de se haverem modificado algumas das forças internas que levam a mudanças energéticas e catéticas, modificações e equilíbrios” (1). Gillman por sua vez sustenta que, ainda que não se alcance nessas tera pias uma resolução dos conflitos, sua força relativa pode diminuir (28). Mas também é necessário advertir que, ao não se obter uma resolução substancial dos conflitos derivados, já que o conflito básico não se resolve, em certo momento e por ocasião de fatores traumáticos tais conflitos podem ser reativados, dando lugar a recaídas. Naturalmente, nada - nem sequer um tratamento psieanalítico com êxito - garante que tais recaidas possam ser evitadas; por conseguinte, sua aparição não deve surpreender, ainda que não haja por que acreditar que devam fatalmente produzir-se.
272
Psicoterapia breve de orientação psicanalítica
mostram claramente que essa “elaboração” que o autor menciona também abrange certa análise das resistências. 41. Emprega também outros qualificativos similares, tais como “trans formação profunda da personalidade”, “reajustes profundos na estrutura intrapsíquica”, que não deixam margem a dúvidas acerca da posição do autor. 42. Em outro lugar, as chama de “recursos c elementos sadios”. 43. Sob essa denominação o autor se refere aqui a uma terapia psicanalitica breve. 44. Na realidade, as modificações na estrutura da personalidade pode riam ser explicadas em parte também por certos fatos - talvez menos miste riosos - do trabalho terapêutico. Um deles, muito elementar, mas não decisi vo, tem sido assinalado precisamente por Wolberg: na P.B., a necessidade de abordar os sintomas interpretativamente conduz nossa atenção, de modo ine vitável, até a estrutura da personalidade (55). Assim, uma depressão não será igual, nem terá o mesmo significado num caráter obsessivo e num cará ter histérico. Portanto, em certa medida e a partir do sintoma ou da situação problema, o terapeuta deve incursionar nas perturbações do caráter, com as sinalamentos e interpretações que estejam dirigidas às mesmas. Como resul tado dessa ação e da mobilização terapêutica conseqüente, às vezes são gera das algumas mudanças nos dinamismos intrapsiquicos, habitualmente incompletas e insuficientes, sem a solidez das obtidas no tratamento psicanalitico, e que só circunstancialmente adquirem uma grande magnitude. Con tudo, definitivamente, o paciente já não e o mesmo; não só os sintomas se atenuam ou o conflito focal se resolve parcialmente; também algo nele muda profundamente depois do tratamento. Talvez um elemento terapêutico de particular interesse em P.B., por sua provável influência nas modificações da estrutura de personalidade, constitua o emprego de interpretações do intrapsíquico, ou seja. as que se re ferem à relação com objetos internos, o que deveria ser motivo de uma inves tigação mais profunda, como a que a equipe da Tavistock Clinic levou a cabo para estudara relação existente entre a aplicação de interpretações “transfe renciais”, e os resultados terapêuticos obtidos (40). Capitulo 4
4. Os testes psicológico s também sào utilizados em P.B. para avaliar os resultados do tratamento, comparando-se os dados obtidos através da aplica ção pós-terap êutica com os do psicodiagnó stico inicial (ver capítulo 11). 5. Tive a satisfação de comprovar que Garcia Arzcno (6) compartilha dessa opinião. 6. A este respeito refere-se M alan, quando propõe , caso se opte por um tratame nto breve, que se investigue a capacidad e do paciente para enfrentar o luto, capacidade essa, sempre segundo esse autor, que pode ser avaliada por meio de testes pro jetivos (8). 7. Ocampo e Garcia Arzeno descrevem uma série de indicadores, no proc esso psicodiagn óstico, particu larm en te para a re comen dação ou contraindicaçâ o de uma terapia breve (11). 8. "Focalidadc", segundo a denom inação empregada por Malan (8). 9. Por último pode ser necessário revisar os objetivos tm pleno trata mento, como tem assinalado anteriormente (ver capítulo 3, pp. 46 s.). Nesse caso, são várias as atitudes a assu mir (mu danças de objetivos, cio tipo de tera pia , etc.), não sendo p ossível estabe lece r regras fixa s a respeito. 10. O perigo é de que aconteça o contrário, quer dizer, que tenham de se eleger metas terapêuticas de acordo com o tempo limitado de que se dis põe para efetuar um tra tam ento.
Capitulo 6
•
1. Sobre os aspectos da contratran slérênc ia em P.B., podem ser consul tados os capítulos 8,9 e 14. 2. Concomitantemente, será conveniente que exista uma contratransfe- rê nciapositiva, isto é, que o terapeuta não tenha de esforçar-se demasiado em vencer dificuldades para ocupar-se do paciente, sobretudo se se trata dc um tratam ento dc curto prazo, em cujo ca so se exigirá desde o início uma boa disposição de sua parte. 3. Um ponto de importância decisiva na evolução e manejo da relação terapêutica constitui a té cnica interpretativa pa rticu lar ex igida pela índole dessas terap ias, o que m erece uma espec ial revisão (ver pp. 100 ss. ). 4. A técnica focal supõe certas vicissitudes da atenção do terapeuta, que logo examinaremos detidamente (pp. 95 ss.), e que, somadas às modifi cações no emprego da associação livre, determinam um tipo de comunicação nitidamente diferenciável do psicanalítico. 5. Esta observação de Haley implica curiosamente o estabelecimento de certo paralelismo interessante entre a técnica psicanalítica de cunho freu diano e a técnica “ativa ”, que define a atual terapêutica breve.
274
Psicoterapiabrevedeorientaç ã opsicanalitica
7. Gabe pergun tar a razão pela qual os autores não se tenham estendido sobre esta questão, fato por demais sugestivo. Se a consideram algo óbvio, não se poderá pensar que existe em certa medida uma evitação do tema, ante a persistência de uma dificuldade para encará-la a fundo, talvez acompanha da da sensação de estar “atacando’*precisamente a regra básica da técnica psicanalitica? Porque se tr ata nada m enos daquilo que o criado r da psicanáli se também denominou “regra de ouro”. Ocorre-me que esse qualificativo continua pesando no ânimo dos investigadores, fazendo com que o tema seja deixado de lado ou apenas m encionado. 8. É certo que tais conflitos preexistem e que a livre associação não faz mais do que colocá-los em evidência, mas lambém é verdade que alé esse momento podem ter estado reprimidos, dissociados, negados, etc., e, por mais desconsideração que pareça, o melhor será que o paciente siga se ajus tando, por sua conta e como po ssa, a eles sem que provoquemos sua mobili zação; em troca, com nossa concentração seletiva só daremos prioridade a determinados problemas, àqueles que colocam uma necessidade de resolu ção mais ou menos imediata, já que se pretendêssemos intervir ein todos, pouco seria o que poderíam os íazer pelo paciente dentro do enquadramento que corresponde a essas terapias (especialmente se existe uma grande limita ção temporal). 9. Na prática teremos de considerar, além disso, outros fatores, tais como a duração total do tratamento e o número de sessões semanais. Não é o mesmo num tratamento de objetivos limitados com, por exemplo, uma a duas sessões sem anais e dois ou três meses de duração, e outro que conste de duas a três sessões por semana e se estenda durante um ou mais anos. Nesta última situação, ao contar com um enquadramento temporal m enos limitado, o emprego da “regra fundam ental” poderá, cm todo caso, scr mais levado cm conta, sc outros m otivos o tornarem aconsclhávcj. 10. Uma questão interessante e polêmica que pode surgir, por sua vez, vinculada ao tema que estamos tratando, é a relação existente entre associa ções livres (cadeias associativas) e foco terapêutico, ou seja, o problem a de saber quais são os limites dofoco. Recordemos que a estrutura focal corres po nde, como hipótese do terapeuta, apenas a um conjun to de idéias q ue este tem presente (ainda que para sua organização tenha de basear-se em cadeias associativas do paciente), que não operam, é bom reconhecê-lo, senão como um artifício técnico, pelo que de nenhum modo seus limites podem co nsid e
Notas
275
11. F. Deutsch, em 1949, ao fazer referência a uma “terapia setorial", havia proposto já centrar a tarefa nos sintomas, estimulando a produção asso ciativa sobre eles através das interpretaçõ es (4). 12. No capitulo 9 podem ser encontrados exemplos do uso de associa ções na terapia breve a partir de material o nírico, e no capítulo 13, de asso ciações surgidas em tom o do aparecimento de sintomas (caso dc J.). 13. Na realidade, o emprego do método da associação livre em técnica psicanalítica se efetua “ a p artir de um elemento dado (palavra, número, ima gem de um sonho, uma representação qualquer), de forma espontânea” (32), (“Associação livre”, p. 37). Na prática da terapia dinâmica breve proponho umífaplicação ocasional e reduzida na maioria dos casos - à forma como foi expressa em primeiro lugar (assim a utilizou Freud, na auto-análise de seus sonhos. Por outro lado, seus antecedentes devem rastrear-se nas expe riências deste com pacientes da época pré-an alítica). Quando se usa, de acor do com o mencionado em segundo lugar, constitui, cíomo sabemos, a regra básica da psicanálise, em troca da qual será necessário, conforme o que já foi desenvolvido, adotar no campo da psicoterapia breve uma regra básica pró pria, havend o exposto um a possível nas páginas anteriores. Encontrei algumas referências bibliográficas acerca da aplicação, res tringida, do procedimento da associação livre nos tratamentos breves: em suas tentativas de abreviar a psicanálise, Ferenczi, em seu método ativo, já empregava o recurso de pedir aq paciente que trouxesse fantasias acerca de certos temas selecionados (“fantasias forçadas”) (6). Bellak e Small falam, em relação à P.B., de limitar o aproveitam ento da associação livre aos “casos nos quais possa surgir como resposta a um d eterminado estimulo do terapeu ta, como por exemplo a fim de obter algum material pertinente e informati vo” (2). Por sua parte, Fiorini também co nsidera factível e benéfica a utiliza ção de associações livres em psicoterapias, ainda que não entre demasiada mente em d etalhes a respeito. Em certa parte de sua obra, propõe: “(...) com binar flexivelm ente os dois estilos dc associação livre e dirigida” (8), e em outra menciona a necessidade do “emprego discriminado” em psicoterapias de “(...) certos recursos técn icos próprios da psicanálise (o silêncio atento do õeslivres , o assinalamento ou a interpreta terapeuta, o empregodeassociaç ção transferencia l)” (15). (Os grifos são meus.) Por último, Gillman faz men ção, entre os procedimentos básicos da terapia breve, a um “(...) emprego saudável da associação livre” (24). 14. Na prática poderemos encontrar pessoas de grande capacidade para associar e transmitir suas associações, m as também outras que tenham um
2 76
Psicoterapiabrevedeorientaç ã opsicanalitica
como sabemos, de modo ab solutamente constante. Portanto, devemos con si derá -la como uma regra ideal ([32], p. 40). 16. As vezes, contudo, p roduz-se durante o tratamen to algum fato trau mático inesperado, alguma situação que perturba o paciente c que se acha “fora do foco” e que a terapia deve examinar. Em tais casos, certamente não cabe assumir uma rígida conduta diretiva, com a qual se pretenda realizar uma focalização forçada do trabalho terapêutico. 17. Neste contexto entenderemos por interpretações “profundas” as que fazem referência a elementos intensamente reprimidos, constituindo ou não parte do passado rem oto infantil do paciente. 18. Ante pacientes com boa capacidade de insight, rápido timinge sufi ciente tolerância à dor provocada pela revelação do inconsciente, às vezes é possivel, mesmo numa terapia breve, trabalhar com apreciável profundidade (ver o caso de J. no capítulo 13). 19. Sem dúvida, um ponto pouco discutido, mas de todo modo interes sante, é o papel das interpretações dirigidas ao intrapsíquico, quer dizer, o tomar o paciente consciente de aspectos acerca de sua relação com objetos internos. Creio que cm certa medida tais interpretações cabem na técnica breve c poderiam ter incidência na produção de modificações dinâmicas sig nificativas de personalidade, que às vezes se observam em alguns pacientes que foram submetidos a tratamento breve (ver também capítulo 3, p. 56). Mas não recomendo recorrer sistematicamente a seu uso, pois, repito uma vez mais, tal procedimento traz implícitos os sabidos riscos de mobilização emocional e indução regressiva. Recorro a esse tipo de intervenção só quan do percebo que é possivel aprofundar e promover no paciente um maior insight a respeito de seu vínculo com objetos internos; esse insight deve ser pertinente à tarefa de focalização e/ou estar vinculado a obstáculos resistenciais e, ainda quando se tratar de uma abordagem incompleta de conflito, tal abordagem deve afigurar-se francamente benéfica para o paciente. O trata mento de A. (ver capitulo 13), um paciente com boa capacidade de autoobservação, a quem se lhe interpretou sua submissão ao objeto supercgóico constituído pela figura paterna (pai interno), ilustra eloqüentemente a aplica ção dessas interpretações. 20. Se menciono essas características entre aspas é porque na realidade as interpretações nomeadas em segundo lugar também são transferenciais no sentido mais amplo do termo, pois as transferências se desenvolvem não só
Notas
27 7
enquanto Weiss, já no terreno da terapêutica breve analítica, fala em inter pretações transferenciais extra-analiticas [45]). (Os grifos sào me us.) 21. Citei antes um a exceção a este requisito: a centralização, precon iza da por Alexander e French, de alguns tratamentos de curto prazo na relação transferencial (ver capítulo 3, pp. 27 s.), pela qual se permite o desenvolvi mento de certos aspectos da neurose de transferência (aqueles inerentes ao conflito central de terapia), e se recorre, freqüentemente, ao emprego de interpretações transferenciais (1). 22. Nesse sentido, não deixam de me chamar fortemente a atenção algu mas interpre tações “'transferenciais” formula das por terapeutas da equipe que Malan integrou na experiê ncia clínica que ilustra seu livro, que me impressio nam com o prematuras (34). Por exemplo, em um dos casos (o biólogo), trans correndo a oitava sessão do tratamento, já haviam sido efetuadas para o paciente várias interpretações relativas a seus desejos d^ manter uma relação homossexual passiva com o terapeuta, o que produz surpresa, ainda tendo presente que isto ocorreu em Londres, onde existe urna maior tolerância à homossexualidade. É sabido que interpretações deste calibre, por se referirem a tendências, com freqüência, intensamente reprimidas, cuja revelação ao paciente resulta extremam ente angustiante, e, por seu caráter transferencial, exigem no mínimo um certo periodo durante o qual exista a consolidação de uma relação transferencial positiva sublimada com o terapeuta e o avanço do paciente na com preensão profunda lhe p ermitam aceitá-las, sempre respeitan do seu timing. Do contrário, como é óbvio, costumam produzir-se diversas respostas negativas no paciente. Permanece-me a dúvida se em poucas ses sões, como no exemplo citado, se cumpriram realmente esses requisitos ele mentares. (É claro que nas histórias clínicas que integram a obra de Malan se registram justamen te fortes reações resistenciais, sobretudo de caráter hostil.) 23. De qualque r maneira, as manifestações resistenciais costumam ser, como d issemos (ver capítulo 3, p. 29), de menor magnitude que no tratamen to psicanalitico, no qual, também cabe rcpcti-lo, o analista pode e deve dedi car muitos esforços à interpretação daquelas. Na P.B., dado o tipo de relação terapêutica existente, costuma gerar-se me nor montante de hostilidade trans ferencial no paciente, razão pela qual certas resistências de transferência se desenvolveriam menos (28). Quando já a priori do tratamento ou no decorrer do mesm o estas se apresentam m uito m arcadas, as perspectivas prognosticas se ensombrcccm numa terapia de curto prazo, pois o enquadramento dela não permitirá trabalhá-las suficientemente para m elhorar as condições tera pêuticas, que devem co ntar com um a transferênc ia positiva real e mais ou meno s estável e não só “superficialmente” positiva. Nesses casos de pacien tes que no fundo têm gran des resistências, é quando os resultados aparente
278
Psicoterapiabrevedeorientaç ã opsicanalí tica
24. O risco de cair cm acring out ou as manifestações concretas dc tal conduta também configuram um difícil e muito perturbador obstáculo resistencial (dadas suas conseqü ências para o paciente e cm particular para o futu ro do tratamento), que, com o tal, exige o emprego de interpretações “ transfe renciais”, da mesm a forma que o erotismo transferencial. 25. Seu marido se mostrava resistente à psicoterapia, pelo que não foi possível efetuar um tra tamento de casal. 26. Que Malan tenha realizado e recomende o uso energélico das inter pretações transferenciais nos tratamentos breves, afirm ando que não contri buem para fomentar a dependência, mas para resolvê -la melhor (34), encon traria explicação no estilo interpretativo empregado, que talvez pudesse par ticipar em certa medida das características que menciono, ainda que caiba esclarecer que estas não são reveladas nas exemplificações incluídas na obra do autor, e que pessoalmente ignoro se o estilo tem alguma relação com o aqui proposto. 27. Percebo que essa iniciativa guarda em parte relação com o que coloca R acker quando se refere às interpretações que ele chama de parciais e dc integrais. Nas primeiras “(...) os aspectos positivos do analisado não são adequadamente considerados" (frustra-se ao paciente “mais do que seria indicado para a manutenção da transferência positiva”). Nas segundas in cluem-se os aspectos positivos. A ssim por exemplo, junto à agressão, mostrase ao paciente o amor que também existe em relação ao objeto (38). 28. Ver também o capítulo 3 (p. 24). 29. Recordemos que Fiorini, em seu modelo teórico de foco, considera “os aspectos histórico-genéticos individuais c grupais reativados” dentro do pro blem a atual do paciente (8). 30. Ver o caso de J. (capítulo 13). 31. Na experiência descrita por Malan (34), pelo contrário, os terapeu tas costumam adotar uma atitude radical ao explorar c interpretar prematura e energicamente conflitos primários do paciente (problemas “edipicos ”) em muitos dos casos apresentados. Malan afirma que não houve provas de que os pacientes houvessem s ofrido algum dano nem tido necessidad e de prolon gar o tratamento. 32. Disse S. Rado: “Ao falar com o cônjuge de um paciente sei bem que vai me pintar um quadro parcial, mas me inteiro de muitas coisas sobre meu paciente que posso utilizar com proveito em meu tratamento. Opino que o nâo aproveitar este recurso é violar uma responsabilidade médica elemen tar” (39). 33. Incluir-se-iam, eventualmente, outros membros do grupo familiar,
Notas
279
Capitulo 7 1. O tratam ento a que se refere esta sessão se realizou em 1974. 2. Faz-se necessário destacar que sua cunhada havia sofrido vários abortos esp ontâneos, posteriores ao nasc imento de sua única filha. 3. Como se sabe, é discutida na medicina a existência de apendicite crônica como entidade nosológica. 4. Lamentavelmente, não foi possível efetuar um psicodiagnóstico nessa oportunidade. 5. Con vem esclarecer que boa parte das interferências até aqui propo s tas foram consideradas apenas para uma melh or compreensão psicopatológica, pois esse tipo dc terapia não pretend e prioritariamente alcançar uma gran de profundid ade interpretativa com base cm tais hipóteses, já que esta última pod eria indu zir estados regressivos muito ac entuados ou gerar outras resp os tas contraproducen tes no paciente (ver capítulo 10, p. 1f 8, ponto 2). 6. A paciente acreditava que um aborto poderia‘libcrá-la da situação pe rsecutória e igno rava que o mais prov ável era que contribuísse para ace n tuá-la, reforçando um circulo vicioso patológico. 7. Existem numerosos indicios a respeito. Mencionarei aqui somente alguns deles, por serem m uito eloqüentes. R ecorda que, quando criança, cui dou de várias crias de cachorro e sobretudo alimentou-os com mamadeira “como bebês”, segundo sua comparação, em razão de a mãe do cachorro estar enferma. AJém do mais, havia relatado um sonho recente, quando já se achava grávida, no qual tinha um filho que era na realidade um filhote de cachorro, por quem experimentava muita rejeição. (É comum a representa ção da gravidez em sonhos através de pequenos auimais, crianças, objetos continentes, etc. [6].) 8. Em uma sessão anterior tive a oportunid ade de m ostrar-lhe que fatos como sua criação de cachorros, suas exclama ções “tiraram ele de mim ” depois do aborto, lamentando e protestando o ocorrido, e sua negativa em abortar diante da imposição de sua mãe, eram uma evidencia inequivoca de sua disposição maternal. Qu anto à sua ho stilidade para com o filho, ela foi objeto dc trabalho te rapêutico em sessõ es posteriores. 9. A fantasia de um grupo familiar com grande carga de agressão, que ameaça com morte ou aborto parece completar-se aqui com uma imagem da
280
Psicoí erapiabrevedeorientaç ã opsicanalitica
esgrimindo a cureta (como representante da imago materna filicida) com sua própria figura, a ponto de atentar co ntra a gravidez (aborto). O surgimento de hipóteses acerca dc profundas situações persecutórias não deve culminar necessariamente, insisto, na interpretação imediata ou não das mesmas. A propósito, considero que tais elementos devem ser instrumentados com muito cuidado numa psicoterapia breve. Se bem que desta vez, na tarefa interpretativa. foi-se aprofundando progressivamente o trata mento, preferiu-se não abordar certos níveis, como os concernentes ao con flito edípico (as fantasias incestuosas, por exemplo), atentando sobretudo para o estado de grav idez da paciente e evitando, assim, um a grande mobili zação emocional com eventuais reações que pudessem ser perturbadoras e difíceis de controlar. 10. Recorde-se também que foi aproximadamente ao término do tercei ro mês dc gravidez que sua mãe precisou ser submetida à intervenção cirúr gica. 11. Transferencial mente, o ponto de urgência dessa sessão co mpreende o tem or de ser abortada expulsa - por mim, o que fica claramente eviden ciado sobretudo no início (Allcgro [1]). 12. Podem-se notar aqui, além do mais, fantasias transferenciais eróti cas que não foram interpretadas, ainda que detectadas (aparecem em PI 7, no fato de fazer o tratamento às e scond idas do marido).
Capitulo 8 1. Este capítulo tem com o base um trabalho que a presentei no Prim eiro Congresso Panam ericano de Medicina Psicossomática, realizado em Buenos Aires, em 1972, sob o título “Dificuldades dei terapeu ta para la práctica de la psicoterapia breve”. Considero que, ap esar do tem po transcorrido, as dificul dades a que me refiro neste capítulo persistem no mo mento atual sem maio res modificações. 2. Em nosso meio, J. Bleger, entre outros, considerou que a relação analítica é uma relação simbiótica c realizou importantes contribuições para o tem a (4). 3. Diz Searles que o analista chega a sentir por momentos que é o único terapeuta no mund o que pode c urar esse paciente, sentindo-se uma mãe oni potente, “o Deus criador na situação terap êutica” . Assinala também “(...) depois de tudo, esse sentimento não é outra coisa senão o que sente a mãe
Notas
281
análise pessoal, pois seus próprios conflitos poderiam ligá-lo emdemasia ao pacien te com o objeto gratificante, e a relaçào com ele pod eria tend er a adotar uma modalidade simbiótica tal, que dificultaria a individualização do pa ciente no processo terapêutico. Seria um exe mplo claro o caso do terapeuta que carece de descendência e que vê em seu paciente um filho. É de supor como e quanto essas circunstâncias podem complicar uma psicoterapia. especialm ente se é breve, e até fazê-la fracassar. 5. Malan é uma exceção, pois m antém uma posição oposta acerca deste problem a d ecisivo. Propõe que se interprete a transferência desde o com eço e com freqüên cia (12). 6. Isso se manifesta de uma mane ira maiá acentuad a quando o terapeuta possui um a orientação predo minantemente klein iana. 7. Disse Alexander: “Não se deve esquecer que as sessões diárias exer cem uma influência sedutora sobre a tendência regressiva (...) do paciente”( 1). (O grifo é meu.) * 8. Também acontece freqüentemente que o terapeífta divirja a respeito da melhoria produzida nos problemas atuais do paciente, se comprova que não vem acom panhad a do ganho de m udanças profundas na personalidade, o que revela que não pode renunciar aos desejos terapêuticos próprios de sua formação psicanalítica. O perfeccionismo terapêutico {furor curandis) pode constituir um sério inconv eniente, sobretudo q uando se trata de uma terapia breve, em q ue devem os nos conformar com ob jetiv os limitados.
Capí tulo9 1. Refiro-me ao caso de A. (ver capímlo 13, p. 195), que durante a ava liação mostrou-se francamente h ostil. Tratava-se de um paciente com m arca dos componentes obsessivos e um núcleo melancólico, com relações de objeto muito ambivalentes. O psicodiagnóstico inicial havia revelado, além disso, uma grande disposição para estabelecer vínculos de características regressivas e simbióticas, mas. tratando-se de uma psicoterapia hospitalar, não havia possibilidade de se efetuar outro tratamento que não fosse o de tempo limitado. 2. Provavelm ente a cor negra representava além disso o luto diante do luto ocasionado pela separação, que p or sua vez reativava o da perda de sua mãe, acontecida quando ainda era men ino (1). 3. Utilizo a denominação reação terapêutica negativa num sentido
282
Psicoterapiabrevedeorientaç ã opsicanalitica
ções que obtèm ou obtiveram , e quão profunda c a sensação de perda que tra rão consigo as mudanç as” (7). 5. A situação costuma complicar-se ainda mais quando se deve efetuar uma terapia de tempo limitado cm pacientes que já vêm suportando lutos sig nificativos, especialmente se forem r ecentes e/ou patológicos, como é o caso do paciente a quem pertencem os sonhos que figuram neste capitulo. 6. Em certas ocasiões, tal como as mencionadas no capítulo 6, pp. 117 s., pode ser conveniente ir reduzindo progressivamente o número de sessões semanais, sempre que exista, po r sua vez, uma evolução favorável no pacien te. Essa conduta pode facilitar, no paciente, a separação consecutiva ao tér mino da terapia através de um desprendimento gradual, cqndicionado pelo espaçam ento dos encontros. 7. Malan (6) diz que um terço da duração da terapia deve ser destinado, em todos os casos, ao trabalho interpretativo em tom o da terminação. 8. Concordo com Fiorini quando por sua vez assinala que em psicotera pia breve “poder-se-ia questionar a validade de uma linha interpretativa foca lizada nas vivências transferenciais diante do luto determinado pela alta” (4).
Capítulo 10 1. As técnicas dramáticas podem constituir um recurso útil para cons e guir a mobilização do paciente e combater a intelectualização. sobretudo se se dispõe de relativamente pouco tempo de tratamento. Outra possibilidade seria dada poruni eventual em prego do método da associação livre (ver capí tulo 6, p. 93). 2. Esse perigo pode ser maior se o terapeuta tem tendências maníacas inconscientes (6). Obstinado em alcançar o autodesenvolvímento do pacien te, poderia fomentar saídas maníacas pseudo-independentes. 3. Cabe acrescentar além disso que apesar de fenômenos com o as curas transferenciais constituírem uma falsa solução do conflito, segundo Alexander e French existem algumas bastante duradouras e até permanentes, pelo que esses autores não deixaram dc valorizar seus efeitos terapêuticos (1) (2) (3). De qualquer maneira, nossas expectativas deverão continuar centradas na obtenção do insight. 4. U m risco particularmente temivel dentro da perspectiva da reaparição de manifestações sintomatológicas constitui o fato dc que as mesmas tenham lugar em nível somático. Em alguns casos cabe pensar se o terapeuta, em seu entusiasmo, operando mais por sugestão e como um superego severo e exi
permanece ativo) no terren o corporal, p or exemp lo, através de um novo sinto ma e com os perigos que isso acarreta, o que além do mais equivale a supor que só conseguiu mudar a área de expressão do mencionado conflito.
Capitulo 11 1. Em m atéria de avaliação do s resultados terapêuticos em p sicoterapia breve é ob rigatório citar Malan. Seu livro (4) contém um excelente estudo, minucioso e dotado de sólidos funda mentos psicodinâmicos. 2. Ta[ proc edim ento é produto de uma elaboração pessoal que incorpo ra elementos de um m odelo tbrnecido pela lic. L. W olf (8) (a quem agradeço os valiosos ensinamentos que sobre este tema mc conferiu há alguns anos), assim como algumas idéias de Malan (4). | 3. Ainda que não possamos então admitir como real g resolução que não seja acompanhada de uma conscientização da problemática correspon dente, cabe esclarecer que o inverso é possível, isto é, que se tenha consegui do certo insight daque la e que sem dúv ida não derive, ao menos de imediato, uma mudança favorável e esperada, existindo às vezes uma desproporção entre o insight que parece haver-se obtido e as modificações comprováveis, modificações que poderão apresentar-se ou não tempos depois. Essas situa ções obedecem à existência de outros determinantes da problemática não elucidados durante o tratamento, à necessidade de desenvolvimento de pro cessos elaborativos pós-tcrapêuticos que demandarão mais tempo para dar seus frutos, ou por último a que tal desenvolvim ento poderia ver-se restringi do ou exaurido sem prod uzir nenhum efeito favorável. É que, ainda que fosse vencida, por exemp lo, certa resistência da repressão, podem persistir outras formas de resistência que obstaculizam todo progresso (resistências de ganho secun dário da enfermidade, do superego, etc.). 4. Espero que a descrição dos conceitos incluídos neste item haja alcan çado suficiente clareza expositiva, já que por razões de espaço nào posso estender-me mais a respeito. Para uma informação mais detalhada, sugiro que se consu lte a obra de Malan (4). 5. O agravamento apresenta-se habitualmente com a piora da sintoma tologia concom itante. 6. Recentemente, R. White distinguiu a influência reciproca existente entre auto-estima c experiênc ias de eficácia (7).
284
Psicoterapiabrevedeorientaç ã opsicanalí tica
mas acrescentando que, reaparecendo, estará mais bem preparado para en frentá-los e que terão provavelmen te m enor intensidade. 10. A combinação impossível é a de resultados positivos em R.P.F. e em M.S., com resultado negativo em I.P.F., posto que não admitiremos como real, de acordo com o dito anteriormente, uma resolução - clinicamen te total ou parcial - da problem ática central da terapia que não seja baseada no insight e em que as mudan ças não sejam, em conseqüência, com preensí veis dinamicamente. 1 1 .0 sinal © indica resultado positivo. 12. Geralmente a possibilidade de recidiva da sintomatologia é maior nessas terapias do que naquelas em que o insight não predorrfina.
Capitulo 12 1. Este trabalho foi apresentado no Primeiro Encontro de Psicologia Profund a (Buenos A ires, agosto de 1978 ). 2. Há pessoas que som ente em momentos de crise se decidem a recorre rá consulta (1). Em lugar de rechaçá-las e condená-las a que se ajustem como possam às dificuldades atuais para que retornem somente quando estejam em condições de efetuar uma análise, cabe oferecer-lhes assistência psiquiátrica. Paradoxalmente, considerarem os propícia a ocasião para que tenham acesso à psicoterapia. Fcnichcl sustenta: “(...) as dificuldades agudas da vida consti tuem o primeiro e principal cam po para a prescrição da psicoterapia breve” (3). 3. É o caso de pessoas que, enfrentando situações criticas, não estão nesse momento em con dições de enfrentar um processo de análise. Tam bcm é o caso de pacientes com resistência á análise, que como continuação do tra tamento breve, uma vez acrescentada sua motivação para o insight , sua con fiança na psicoterapia e tendo conseguido adquirir consciência da enfermi dade, podem aquiescer ao tratamento analítico. A P.B. tem combatido com eficácia as resistências. Mas quero advertir aqui sobre a possibilidade de ser utilizada pelo paciente como resistência ao tratamento analítico. Atualmen te, a população está cada vez mais informada da existência da P.B., interessan do-se por ela, talvez mais interessada porque a denominação p opular do pro cedimento faz alusão a uma curta duração do tratamento. Desse modo, o interesse do paciente pela terapia breve pode simplesmente en cobrir as resis
Notas -
285
Uma jovem, de aspecto agradável, foi-me enviada expressamente por seu interesse em efetuar um tratamento de breve duração. Chamava a aten ção a insistência com que desde o começo propunha-mc que a tratasse duran te um ano, no máximo. O motivo da consulta eram suas dificuldades para constituir um par estável. Aconteceu que os pares que havia conseguido for mar não conseguiam se manter mais de... um ano. Sua mãe havia se casado duas vezes, e havia-se separado de seus maridos antes de completarem 12 meses de casamento. O conflito que a paciente trazia para o tratamento a impedia de formar um par terapêutico com perspectivas de durar: esse era o motivo inconsciente de sua insistência na limitação temporal da terapia. O obstáculo itsistencial pôde ser vencido por meio de assinalamentos e inter pretações durante as entrevistas clínicas, e a paciente aceito u finalmente submeter-sc a um tratamento analitico, o qual lhe criava grandes temores e por outro lado parecia-me o mais indicado, por diversos motivqS, não havendo razões válidas para limitar a duraçã o da psicoterapia. (Próxiríla de cumprir o primeiro ano de análise, teve um a reação de “ fuga à saúde” , que pude logo elabora r e controlar.) Um paciente, vinculado ao meio psicanalitico, procurou meu consul tório solicitando uma lerapia de temp o limitado. A averiguação de seus ante cedentes revelou que tinha um irmão esquizofrênico, que, segundo o pacien te, havia se psicotizado durante tratamento psicanalitico. Na realidade, ele nào havia ligado esse fato ao seu pedido de realizar exclusivamente uma terapia de breve duração, o que era racionalizado por meio de diversos argu mentos. Ao tomar consciência de que rejeitava a análise porque temia ter a mesm a sorte do irmão, com quem mantinha uma relação muito ambivalente e ficar convencido de que necessitava de um tratamento analitico, pôde ini ciá-lo pouco depois. 4. Uma jov em de 21 anos, analisad a dos 12 aos 18 anos (quando lhe foi dada alta) por um pre stigioso colega que hav ia-se radicado no exterior há um ano, consultou-me por haver sofrido uma reação fóbica ante um exame que devia fazer em sua faculdade. D epois de estudar cuidadosam ente o caso. não achei necessário que voltasse à análise (o que parecia ter lançado, a julgar por outros indícios, resultados sumam ente satisfatório s). Tampouco pare ceu-me oportuno, do ponto de vista evolutivo, que retomasse nesse mom en to à situação de dependência analítica. Por sua vez, a paciente se sentia sufi cientemente motivada para isso. ao nào apresentar outras dificuldades, exce to as já en unciadas. Pensei que a jovem , possuidora de um ego forte, aptidão e training para o insighi , e ao mesmo tempo de um grande autoconhecimento, obtido com a experiência analítica, poderia superar sem demasiado esfor
286
Psicoterapiabrevedeorientaç ã opsicanalitica
Capitub 13 1. A licenciada Flora M. dc Frymer teve a seu cargo os psicodiagnósticos correspondentes. 2. Em todo caso, denotava contar com um ego observador, capaz de chegar a sc conscientizar de “uma falsa ligação". 3. Até antes de casar-se imaginava que seria impotente e pensava que seu pênis era extrema mente pequeno. 4. O sentimento de culpabilidade se exteriorizava no psicodiagnóstico através da sensação de estar “sujo". 5. A. mostrou-se angustiado nas entrevistas pelos sentimentos que lhe inspirava seu pai: “Se solto cm cima dele tudo o que tenho para censurá-lo, acabo matando-o... tenho medo d e ter um ataque de raiva e dizer-lhe tudo...” A isso se som ava a conduta de seu progenitor, inoculadora de culpa, através de repetidas frases, como a seguinte, freqüentemente recordadas pelo paciente: “C omo você é m au... você me mata desse jeito...'’ 6. Seu pai tinha ido conhe cer o bebê vá riassemanasdepois de seu nas cimento (o que motivou fortes reprovações de A. a seu progenitor). Esse fato havia sido vivido pelo paciento como uma expressão de desapro vação de sua paternidade por parte daquele. 7. O psicodiagnóstico reforçava essas pressuposições, ao colocar em evidência dificuldades para vincular-sc com pessoas, por temor ao surgimen to de certas fantasias, especialmente de caráter homossexual. Finalmente, pensou-se que tais dificuldades poderiam também relacionar-s e com o oco r rido com sua mãe, pelo que. ao ligar-se estreitamento a alguém, via-se per turbado pelo temor de se expor a uma nova frustração, como a que hav ia sig nificado a perda de sua mãe. 8. No psicodiagnóstico apresentavam-se fantasias de adultério de sua mulher, que foram atribuída s a esta situação. 9. Não obstante, o nascimento do bebê pode ser visto ao mesm o tempo como um fato mobilizador e estimulante, que poderia levá-lo a resgatar c desenvolver potencialidades egóicas, a partir precisamente do qual o pa ciente, necessitando melhorar sua situação econômica, solicitou ajuda tera pêutica. 10. A esse respeito, vários sonhos e referências trazidos pelo paciente nesta etapa ilustram acerca da situação, os quais figuram no capítulo 9 (pp. 165 e 168). Seus relatos de abunda nte material onírico quando se aproxima va o final do tratamento encerravam, do mesmo modo, uma intenção de seduzir-me a fim de que o retivesse, ao trazer-me um material que ele supu nha haveria de satisfazer-me e interessar-me muito. 11. Os fatos me dariam po uco depois razão: A. conse guiu, por iniciati
Notas
2S7
nuava trabalhando, sem ter lido grandes problemas em suas relações inter pessoais, c com melho r retrib uição eco nô mica. 12. Optei por denominar o caso desse modo, destacando assim seu principal sintoma. Resultou naquele mom ento um do s casos mais ilu strati vos e polêmicos de minha experiência hospitalar c talvez o que registrou os melhores resu ltados terapêuticos. 13. Recomendamos à mãe de J. que efetuasse uma psicoterapia, mas esta colocou m uitos obstáculos à sua realização. 14. D emonstraria logo um a grande facilidade para trazer material focal e adequado para a exploração profunda. 15. Pode considerar-se esta palav ra Comopalavra-sintoma, que expres sara um duplo jogo de sentimentos da paciente: não só se tratava de prazer que sentia por estar junto com sua mãe como também provavelmente do gozo sádico por haver se livrado definitivamente da um rival de toda a sua vida (6). 16. De acordo com o psicodiagnóstico, isto se‘Yelacionava com fanta sias de introjeção ambivalente do objeto perdido (irmão), especialmente de seu pênis, e se achava ligado igualmente com uma tentativa reparatória ma níaca diante da perda, querendo ela aparecer ante sua mãe como se fora seu irmão através de uma identificação com ele. Resultou justamente digno de nota que J. começasse a se vestir com uma ostentação masculina, seguindo uma mod a não demasiadame nte difundida. Assim vestida, compa receu a vá rias sessões. A interpretação ativa desses conteúdo s não foi seguida de uma reposta confirmatória imediata dela. Tanto os desejos de fellatio da paciente, como os de gravidez, reme tiam a seu complexo de castraç ã o (no qual não se aprofundou demasiado durante a terapia). É interessante reco rdar aqui um dos sentidos que E. Jones atribui à inveja do pênis. Para ela mesma, pode traduzir-se “no desejo de adquirir um pênis, habitualmente engolindo-o e remetendo-o dentro do corpo, freqüentemente transformando-o num menino" (7), o que nos sugere uma conexã o direta entre os desejos à sfellatio e a gravidez de J. Por outro lado, não cheguei a elucidar e interpretar os conflitos corres po nd en tes aos aspe ctos libidinosos d a relação com seu irmão. Nesse sentido, a perda de seu companheiro reativava a perda daquele. Além disso, subja cente aos vômitos, e devido também a um intenso desejo de recuperar o obje to perdido (pênis incestuoso), existiam ao que parece fantasias de coitos fra ternos (e mais profund amente pate mo s), com os qua is intentava satisfazer tal
288
Psicoterapiabrevedeorientaç ã opsicanalí tica
Além disso, sem dúvida, os transtornos e prejuízos que lhe acarretou esse novo padecimento eram em troca muito menores que os que lhe ocasio naram seus vômitos. Isso sugeria tamb ém qu e J. era capaz de evidenciar pro gressos e não necessariamente que o esforço terapêutico fosse infrutífero (9). 18. Cabe acrescentar que no dia anterior (domingo), J. tinha saído a passe io com um casal de noivos, o que havia agido como estím ulo. Ao que parecia, J. ta mbém ligava inconscientemente o terçol com desejos escatofílicos e seu caráter doloroso com o castigo diante de tais desejos, o que não foi interpretado. Isto não surpreendeu mais, já que nela estava muito acentuado o par voyeurismo-e xibicionism o (seguia estudos de modelo publicitário). 19. Uma interessante cond ensaç ão se deu num pesadelo em que via sua irmã, grávida, afogando-se no mar. 20. Pensei se isso não significaria, além do mais, que evitava co ntar-me algo que pudesse nos colocar e m desacordo. 21. Isso me pareceu uma r acionalização de um problema não totalmen te resolvido, dado por sua relação de dependência infantil com a mãe. Inclusive acreditei notar, novamente, nessa observação da paciente, que não só queria, em seu extenso relato, c ontar-m e tudo o que havia obtido de po siti vo da terapia, mas também pretendia ocultar-me conflitos não-resolvidos com seus sentimentos de gratidão. 22. Existe uma certa analogia entre a abordagem do foco terapêutico e o que praticava Freud com o sintoma em seus primeiros tratamentos (Isabel de R. e demais históricos incluidos em "Estudos sobre a histeria” [5], a qual pode-se considerar um antecedente técnico da terapia focal). A diferença reside em que atualmente contamos com a vantagem de possuir novos conhecimentos que ampliam nossa compreensão profunda, que o próprio criador da psicanálise se encarregou de nos trazer (a sexualidade infantil, por exemplo, especialmente o complexo de Édipo que nessa época naturalmente ainda não havia descoberto). 23. Na verdade, isso não se fez basicamente porque no princípio se ignorava que existisse um a vinculaçâo tão direta entre os sofrimen tos atuais da paciente e o luto, a qual constituiu uma descoberta registrada em pleno processo terapêutico. Eu lam bem não havia refletido até esse mom ento a res peito da necessidade de se levar em co nta a situação especial que se coloca, na aplicação de terapias de curto prazo, pela existência de lutos patológicos de grande envergadura, como podem ser os desencadeados por motivo de perda de seres queridos. Justa mente, a experiência que significou assistir a essa paciente contribuiu para que se prestasse atenção ao problema. A tudo isso contudo se somou o fato de se considerar o caso de J. como um dos de
lizmentc não houve conseqüências negativas a lamentar, pelo contrário, os benefícios foram apreciáveis, dando a impressão de que o tem po com binado para a terapia havia sido suficiente para o sucesso daqueles. Sabemos que cada pacien te necessita de seu pró prio tempo. .1. tinha pelo visto u m rápido timing, com considerável capacidade de insight , que a fez responder satisfa toriamente a uma terapia intensiva de curta duração. 24. Por sua vez tais interpretações não devem causar maior surpresa, se recordamos qu e Freud, já em 1900, no tratamento de Dora e num período de três meses apenas, que foi o que durou essa análise, chegou a interpretar as fantasias de fellatio q ue subjaziam à tosse nervosa da pacien te (4).
Capí tulo14
I
1
1. Em caso de se tratar dc uma p sicoterapia em que p redomina o reforçamento egóico, excluem-se dessa lista I.P.F. e R.P.F., tanto para a avaliação imediata como mediata. 2. Quer as recaídas se traduzam indistintamente na reaparição dos sin tomas quer na aparição de novas m anifestações sintomatológicas. 3. De acordo com as siglas utilizadas no capítulo 11 (pp. 202 ss.). N. do T. - Ver tabela que consta na pág. 203.