PERCEPÇÃO A mão de borracha que é capaz de enganar o cérebro
CRIANÇA Cobrança em excesso pode causar quadro de ansiedade no futuro
Por que cachorros gostam tanto de seres humanos?
PSICANÁLISE As cidades onde vivemos são extensões do espaço psíquico
psicologia • psicanálise • neurociência
N O S
M
U
P
A
A
O q u e f u n c i o n a na p r á t i c a ? C â m e r a s r a s t r e i a m m o v i m e n t o s dos olhos para detectar para onde alunos direcionam a atenção e sensores revelam se os estudantes estão interessados. Cientistas já s a b e m que esperar pelas respostas, conversar c o m c o l e g a s e m e x e r o c o r p o a j u d a m a fixar i n f o r m a ç õ e s
E S P E C I A L EPIGENÉTICA ESTRESSE Q U E V O C Ê VIVE P O D E A L T E R A R O DNA DE SEUS FILHOS E NETO!
BIBLIOTECA DO PROFESSOR
Editora S e g m e n t o
Da psicanálise à filosofia e da
0 desejo de saber
sociologia à política, as opiniões e o legado de alguns dos maiores pensadores dos últimos séculos são analisados sob as mais distintas óticas nas publicações da Biblioteca A docência e a filosofia da diferen
do Professor da Segmento.
A formação de quem ensina a pensar tem passagem obrigatória por estas páginas.
À V E N D A N A S LOJAS:
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segmento
carta da e d i t o r a Desejo de saber
A
prender nos transforma. U m a criança que descobre
mente há interesse na proximidade entre q u e m ensina e
a " m a g i a " de juntar letras e, por meio dessa junção,
quem estuda sobre c o m o ensinar de m o d o m a i s eficiente. E
inclui e m seu universo palavras e seus significados,
parece inegável que conhecimentos sobre os m e c a n i s m o s
apropriando-se de informações que servem de base a ou-
psicológicos e cerebrais interessem à ciência, bem c o m o a
tras mais sofisticadas, enriquece a própria subjetividade.
prática do ensino diga respeito direto à ciência. Precisamos
U m engenheiro que define, por meio de cálculos, o peso
de troca - de conteúdo, experiência, teoria e prática. M a s ,
e a pressão que determinada superfície suporta é capaz de
antes de tudo, é indispensável que haja desejo de saber. E
construir cidades. H á , porém, aprendizados menos óbvios,
isso, felizmente, t a m b é m se aprende. Boa leitura!
mais sutis. A l g u n s deles se consolidam permeados por reflexões e vivências, modificam perspectivas, nos permitindo olhar outras coisas - o u , talvez, as m e s m a s , m a s sob novas perspectivas. H á nesse movimento, porém, u m apa-
GLÁUCIA L E A L
editora-chefe
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rente paradoxo: quanto mais s a b e m o s sobre nós m e s m o s e a respeito do m u n d o que nos cerca, mais nos d a m o s conta do quanto falta nos apropriarmos. Tanto do ponto de vista do indivíduo quanto do coletivo, a a p r e n d i z a g e m pode ser entendida c o m o a m u dança de c o m p o r t a m e n t o decorrente da experiência obtida pela intervenção de fatores neurológicos, relacionais e a m b i e n t a i s . Seguindo esse raciocínio, o aprender seria definido c o m o resultado da interação entre as estruturas m e n t a i s e o meio. É, portanto, algo vivo - e, a s s i m c o m o n o s s o cérebro, e m constante m u d a n ç a . N e s t a edição de Mente e Cérebro, a proposta é a p r o x i m a r descobertas da psicologia e da neurociência d a s s a l a s de aula. E m v á r i a s partes do m u n d o , cientistas t ê m se e m p e n h a d o e m c o m p r e e n d e r os m e c a n i s m o s que c o n c o r r e m para e s s e p r o c e s s o , o que o acelera e facilita ou o dificulta. E já que o a s s u n t o é aprend i z a g e m , a v e r d a d e é que s a b e m o s pouco a e s s e respeito - o u , pelo m e n o s , não tanto quanto gostar í a m o s . Pior: a p e s a r de os p r o f e s s o r e s s e r e m grandes i n t e r e s s a d o s no t e m a , i n f e l i z m e n t e não é nada raro que não t e n h a m a c e s s o a d e s c o b e r t a s que pod e r i a m facilitar m u i t o s e u trabalho - e t a m b é m a vida dos e s t u d a n t e s (e não a p e n a s de e s c o l a s conv e n c i o n a i s ou de u n i v e r s i d a d e s , m a s de qualquer área, i n c l u s i v e a t é c n i c a ) . E m b o r a seja impossível deixar de lado as dificuldades práticas entre educadores e cientistas, certa3
1
sumário | março 2016
ãÊÊk
4
CAPA: SHUTTERSTOCK
CAPA 16 Psicologia n a sala de aula
26 A ciência d a aprendizagem
por D a n i e l T. W i l l i n g h a m
por B a r b a r a K a n t r o w i t z
Nos últimos anos, a pesquisa neurocientífica
A maioria do que tem sido descoberto nos
trouxe muitas contribuições para a
laboratórios ainda não tem aplicação prática
compreensão dos processos de aquisição e
nas escolas. Mas já é possível se beneficiar do
apropriação de informações. Ainda a s s i m ,
que cientistas têm constatado
poucos professores sabem como orientar seus alunos a usar técnicas comprovadamente mais eficazes na hora de estudar
14 Velhas drogas, novos usos por Daisy Y u h a s
Alguns medicamentos podem ter "efeitos colaterais" sobre o cérebro, prevenindo sintomas e comportamentos indesejáveis
32 Pais exigentes demais, filhos ansiosos por M o r g e n E . P e c k
Criação excessivamente rígida pode colaborar para que crianças tenham dificuldade de lidar com os próprios
42 Espaço urbano, espaço psíquico
erros e sofram profundamente diante do mínimo sinal
por Maria C o n s u e l o
de fracasso
Estabelecemos relações de afeto com os espaços que
Passos
habitamos ou visitamos; os lugares assumem o papel de
36 Por que os cães gostam tanto de nós?
extensões do próprio eu
por Julie H e c h t
A genética e a oxitocina, conhecida como "hormônio do amor", ajudam a explicar o fato de cachorros preferirem
60 Trabalho de u m lado, vida pessoal do outro por S h a n n o n Hall
os humanos aos de sua própria espécie - algo raro no
Para lidar com cobranças e evitar conflitos, profissionais
mundo animal
com alta remuneração "negam" identidade profissional v
fe>
e s p e c i a l - emgenética M %
At
m
50 Q que você vive m u d a o DNA de seus filhos e netos pclÍMichael K. S k i n n e r poriv\|chael
Experiências, estresse, substâncias químicas e alimentos podem alterar genes; algumas variações celulares são repassadas e influenciar não só a saúde de gerações futuras, como também as características físicas, mentais e até interferir na personalidade de nossos descendentes 4
seçoes CARTA DA EDITORA
PALAVRA DO LEITOR
8 ASSOCIAÇÃO LIVRE Notas sobre atualidades, psicologia e psicanálise
11 NA REDE O que há para ver e ler na internet
46 GRANDES EXPERIMENTOS DA PSICOLOGIA A ilusão da mão de borracha
nas bancas O que você n e m sabe que p e n s a Nem sempre nos damos conta, mas estamos sujeiEDIÇÃOESPECI tos a sensações, percepções, sentimentos, anseios, J vconflitos e sintomas que escapam do âmbito da consciência. É bastante provável que várias vezes você tenha sido surpreendido por seus próprios pensamentos, desejos, emoções, reações e palavras - e os estranhado, quase como se não fossem seus. Ou mesmo tenha constatado o quanto suas percepUM ESTRANHO ções cognitivas, visuais, auditivas ou mesmo suas NA S U A C A B E Ç A memórias podem enganá-lo. A mente humana é tão complexa que é inevitável deparamos com diferentes aspectos psíquicos, por vezes contraditórios. No especial Mente e Cérebro 54, Inconsciente - Um estranho na sua cabeça, psicólogos, neurocientistas e psicanalistas exploram aspectos desse tema misterioso sob diversas abordagens. Para a teoria freudiana, o Inconsciente é compreendido como instância psíquica, mas também há conteúdos que estão abaixo do nível da consciência e em muitos momentos se fazem presentes. Atualmente, pesquisadores estudam, em laboratório, temas como intuição e alucinações auditivas. A neurociência investiga até que ponto somos realmente livres para tomar decisões e o efeito das mensagens subliminares em nosso cérebro - e chega a conclusões surpreendentes. Não perca!
1NC0NSCIEN
por D a n i e l a O v a d i a
62 LIVRO A inutilidade do inútil por Gláucia L e a l
64 LANÇAMENTOS
colunas 12 PSICANÁLISE Que fim levaram os maníacos? por C h r i s t i a n I n g o L e n z D u n k e r
66 LIMIAR A hora e vez de Marcus Matraga p o r Sidarta Ribeiro
no site Pesquisa, ética e informação Imagine que você fosse convidado para fazer parte de um projeto científico, participando como voluntário em uma pesquisa sobre a doença de Parkinson. A ideia seria "emprestar" seu cérebro para ser escaneado. Com o estudo, os neurocientistas esperavam comprovar que exames de neuroimagem em adultos poderiam revelar os primeiros sinais de perda de dopamina. E após a realização dos exames os cientistas não encontrassem nenhum indício desse problema, mas detectassem a "presença de algo desconhecido em sua cabeça". Foi isso que viveu o jornalista Jamie Talan, especializado em divulgação científica. Ele conta sua experiência, faz questionamentos sobre o quanto importa a leigos ter informações sobre prognósticos (que nem sempre se confirmam) de doenças sem cura e discute os impasses éticos enfrentados por cientistas. Leia no site www.mentecerebro.com.br
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www.mentecerebro.com.br NOTÍCIAS Notas sobre fatos relevantes nas áreas de psicologia, psicanálise e neurociência. AGENDA Programação de cursos, congressos e eventos.
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março 2016 • mentecérebro
5
mente cérebro
palavra do leitor
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uso da m a c o n h a na i m p r e n s a e m geral, m a s é raro encontrar u m a reportagem que traga inf o r m a ç ã o clara e de qualidade,
Maconha
b a s e a d a e m e s t u d o s (o q u e não quer dizer, logicamente, que sejam verdades absolutas, m a s pelo m e n o s são d a d o s c o m respaldo científico). Por i s s o , fiquei e m dúvida se valeria a pena investir t e m p o e dinheiro na edição 277 de Mente e Cérebro, que traz o t e m a e s t a m p a d o na c a p a . Terminei por comprar e tive u m a gratíssima s u r p r e s a c o m a reportagem "Efeito da m a c o n h a no cérebro", u m a verdadeira " a u l a " sobre o t e m a , s e m parcialidade, a c u s a ç õ e s ou defesas (em m i n h a opinião, algo difícil de fazer q u a n d o se trata de u m t e m a que e v o c a t a n t a s p a i x õ e s ) . N ã o s o u de escrever para redações, m a s o que é b o m deve ser exaltado, por isso c u m p r i m e n t o a autora, Fernanda Teixeira Ribeiro, e toda a equipe pelo trabalho. Antônio
F. Lima - São Paulo,
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São Paulo (11) 3039-5666 De segunda a sexta das 8h30 às 18h, atendi mento @ed itorasegmento.com. br www.editorasegmento.com.br
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Gostei muito do título "A linguagem da pele" e da carta da editora-chefe G l á u c i a Leal, bem c o m o da matéria de capa de n o v e m b r o 2 0 1 5 , " O poder do t o q u e " , e t a m b é m de outros artigos apresentados pela revista Mente e Cérebro. O s textos são muito oportunos e bem-vindos esses t e m a s neste t e m p o de individualismo exacerbado e, paradoxal-
Edição n° 278, março de 2016, ISSN 1807156-2.
mente, de tanta carência de afeto e c o m u n i c a ç ã o face a
Distribuição nacional: DINAP S.A. Rua Dr. Kenkiti Shimomoto, 1678.
face. Aproveito para sugerir que publiquem u m artigo sobre o s i s t e m a biodanza, que t e m u m modelo teórico baseado no princípio biocêntrico e trabalha a reeducação afetiva,
ANER
Cl anatec
atuando no s i s t e m a límbico-hipotalâmico. G r a t a , Leda Lage - Belo Horizonte,
MG
c o m a intuição", do psicólogo T h o m a s
A vida é c o m o café: se deixar esfriar,
G o s c h k e . A l i á s , g o s t a r i a de s u g e r i r
perde a graça. O b o m é s a b o r e a r
que a Mente e Cérebro p u b l i c a s s e
ainda quente e c o m p a r c i m ô n i a para
entrevistas com mais frequência;
aproveitar bem o prazer de
todas as vezes que publicam é muito
1NC0MSC1ENTE
bom:
perguntas
entrevistados
inteligentes,
interessantes.
cada gole. Susana - via
Souza Facebook
Quero mais! Maria Eduarda C. - Recife, PE
MAIS BONITA Mente e C é -
FELICIDADE E CAFÉ
rebro
Planejar e pensar e m ter u m
cada
Incons-
bom futuro é importante,
mais
na sua cabeça. A
desde que não se sacrifique
e consistente.
s e l e ç ã o de a r t i g o s e s t á p r i m o r o s a .
demais o presente...afinal
Parabéns!
Não dá v o n t a d e de parar de ler. Gostei
a tal felicidade é a c i m a de
e s p e c i a l m e n t e da entrevista " P e?ns£ nsar
t u d o viver b e m c a d a d i a .
SOBRE A INTUIÇÃO Muito boa a edição especial ciente - Um estranho
Olívia - via
está dia bonita
Lobato Facebook
CONCURSO CULTURAL: E S C R E V A E G A N H E U M L I V R O ! Mande sua opinião sobre um dos artigos desta edição para o e-mail
[email protected] ou uma sugestão e concorra a um livro. Por limitação de espaço, tomamos a liberdade de selecionar e editar as cartas recebidas. O premiado deste mês é Antônio F. Limo - São Paulo, SP.
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EXPOSIÇÃO
As cores primárias de Mondrian ARTISTAS DO N EOPLASTICISMO G A N H A M HORIZONTE BUSCOU ##
/V
s
''
BELO
E R I O D E J A N E I R O ; O D E S T A Q U E S Ã O 3 0 T E L A S D E PI E T M O N D R I A N , Q U E
REPRESENTAR n n a s
MOSTRA EM SÃO PAULO, BRASÍLIA,
r e t a s
n
o
s
UMA "REALIDADE
PURA" COM SUA ARTE
d i z e m a v e r d a d e " , escreveu Piet
ABSTRATA
todas as doutrinas religiosas - questão importante para
Mondrian (1872-1944). Filho de u m pastor, o artista
M o n d r i a n , considerando-se s u a rígida f o r m a ç ã o f a m i l i a r - ,
holandês cresceu e m u m a m b i e n t e que condenava a car-
buscando representar u m a espécie de verdade essencial.
J \
reira artística e tentou ser professor antes de dedicar-se à
O crítico de arte Donald Kuspit, que escreveu sobre a obra
arte e, posteriormente, criar os primeiros trabalhos que
de Mondrian da perspectiva psicanalítica, define sua arte
i n a u g u r a r a m o m o v i m e n t o c o n h e c i d o c o m o neoplasti-
limpa e abstrata c o m o u m a s u b l i m a ç ã o da visão caótica
c i s m o , m a r c a d o pela b u s c a por u m a "realidade p u r a " ,
que o pintor tinha do m u n d o .
representada por linhas retas e cores primárias. Trabalhos
De acordo c o m o curador da m o s t r a , Pieter Tjabbes,
do artista, realizados e m diferentes fases de s u a trajetória,
a seleção das obras e a f o r m a c o m o são organizadas têm
ficam expostos no Centro Cultural Banco do Brasil ( C C B B )
o objetivo de m o s t r a r ao visitante todo o percurso que
e m São Paulo até abril e depois s e g u e m para Brasília, Belo
Mondrian percorreu antes de chegar ao seu inconfundível
Horizonte e Rio de Janeiro, na mostra Mondrian
estilo de " o r d e n a m e n t o do c a o s " - ele produziu trabalhos
e o movi-
mento De Stijl.
c o m influências pós-impressionistas e c u b i s t a s , por exem-
A exposição traz cerca de 70 obras de artistas neoplás-
plo. "Aqueles retângulos coloridos que p o v o a m até hoje o
ticos, sendo 30 delas de M o n d r i a n . De Stijl é o título da
imaginário do moderno, e são tão facilmente reconhecíveis,
revista na qual Mondrian e outros n o m e s publicavam textos
não n a s c e r a m de u m a hora para outra, n e m por a c a s o " , diz
explicando
Tjabbes. G r a n d e parte do acervo é procedente do M u s e u
e defendendo seu estilo. A estética abstrata e
objetiva do artista reflete, s e g u n d o estudiosos de sua bio-
Municipal de H a i a , na H o l a n d a , que reúne a maior coleção
grafia e s u a s o b r a s , u m a tentativa de alinhar princípios de
do m u n d o de obras de M o n d r i a n .
8
^*
associação livre
Considerada u m distúrbio distinto do a u t i s m o até o D S M - 4 , a síndrome de Asperger atualmente é definida c o m o transtorno do espectro autista ( T E A ) na quinta e atual versão do m a n u a l . Caracteriza-se, entre outros aspectos, por dificuldades e m interagir socialmente e o interesse por áreas específicas de c o n h e c i m e n t o . Não raro, pessoas c o m os s i n t o m a s c h e g a m à vida adulta s e m diagnóstico e enfrentam muitos problemas e m relacionamentos e na vida profissional. Desordem
que não anda só, e m cartaz e m
São Paulo, retrata u m pouco d e s s a realidade ao m e r g u l h a r no universo do adolescente aspie Stevie. Filho de u m pai ausente, Stevie t e m problemas para expressar o que sente e entender linguagem não literal. A o sair à rua para procurar a i r m ã que saiu às e s c o n d i d a s para namorar, Stevie torna-se obcecado pela ideia de que provocou u m grave acidente. De acordo c o m o diretor da peça, Carlos B a l d i m , o protagonista representa de maneira exacerbada o que de certa forma todos nós Mondrian e o movimento De Stijl. Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de São Paulo. Rua Álvares Penteado, 112, Centro, São Paulo. De quarta a segunda, das gh às 2ih. Informações: (11) 3113-3651. Grátis. Até 4 de abril. Tempo-
radas em outras capitais: Brasília, com início em 21 de abril; Belo Horizonte, em 20 de julho, e Rio de Janeiro, a partir de 12 de outubro.
s e n t i m o s e m algum m o m e n t o - d e s l o c a m e n t o , i n c o m p r e e n s ã o dos próprios s e n t i m e n t o s e dificuldade de c o m u n i c a ç ã o . Desordem que não anda só. Viga Espaço Cénico. Rua Capote Valente, 1323, Pinheiros, São Paulo. Sábados, às 2ih; domingos, às içjh, e segundas, às 2ih. R$20. Até 28 de março.
março 2016 • mentecérebro
9
associação livre P R O T Ó T I P O permite que
•
pacientes usem talheres
TECNOLOGIA
Startup cria luva capaz
e escrevam, por exemplo; previsão é que entre no
de controlar tremores do Parkinson
mercado ainda em 2016
Tudo c o m e ç o u quando o estudante de medicina Faii O n g visitou u m a paciente de 103 anos c o m sintomas avançados de Parkinson que havia perdido muito peso. "Ela demorava m a i s de u m a hora para t o m a r u m a sopa por causa dos tremores nas m ã o s " , diz O n g . C o m outros colegas do Imperial College de Londres, pensou e m u m a maneira inovadora de melhorar a qualidade de vida de p e s s o a s c o m a doença. Criou u m a startup para captar financiamento e desenvolveu a GyroGlove, u m protótipo de luva inteligente que usa a tecnologia de giroscópios - m e c a n i s m o s semelhantes aos que m a n t ê m a estabilidade de satélites no espaço. Testes iniciais m o s t r a m que o dispositivo pode reduzir os tremores e m até 8 0 % , permitindo que pacientes consigam usar talheres e escrever, por exemplo. O protótipo está e m aperfeiçoamento e a previsão é que entre no mercado ainda e m 2016.
•
DANÇA
Sintonia entre o corpo e a mente
N
a primeira quinzena de m a r ç o , a M o s t r a Internacional de
Teatro de São Paulo ( M I T s p ) traz dez espetáculos inter-
nacionais para os palcos paulistanos. U m dos destaques é a m o n t a g e m belga An old Monk,
e m curta temporada no Sesc
B o m Retiro. O ator Josse De Pauw, t a m b é m autor do texto, interpreta u m velho monge que d a n ç a , medita e pratica o silêncio para abordar a sintonia entre mente e corpo. Q u a n d o ela ocorre? Q u a n d o nos deixamos levar pela m ú s i c a ? O u quando, s ó s , nos silenciamos? O u ela é impossível? Eleito portrês vezes o melhor ator da Bélgica, De Pauw faz jus à complexidade da proposta. O título e m inglês do espetáculo é u m a referência ao c o m p o s i t o r de jazz T h e l o n i o u s Monk. An old Monk. Sesc Bom Retiro. Alameda Nothmann, 185, Bom Retiro, São Paulo. De 9 a 13 de março, às 18h. R$ 20. Informações: (11) 3332-3600.
10
o que há para ver e ler | flâ
rede
O dicionário de sentimentos inomináveis a melancólica sensjação de que não haverá
n o m e a r ? E s s e s são alguns dos verbetes criados pelo de-
futuro suficiente para fazer tildo que se pretende; lu-
signer gráfico John Koenig para buscar definir o que c h a m a
talica: o insight de que rótulos são criações da sociedade
de "tristezas o b s c u r a s " . Cada palavra inventada é definida
TSudoclasm: l \ <
í e não são suficientes para definir a identidade; zenosyne:
a
c o m u m vídeo narrado pelo artista. O s videoverbetes, c o m
I incómoda i m p r e s s ã o de que os dias estão passando rápido
legendas e m português, estão reunidos no site do projeto:
s d e m a i s . Você já sentiu algo parecido que não conseguiu
wvvw.dictionaryofobscuresorrows.com.
O D E S I G N E R G R Á F I C O John Koenig cria v deoverbetes para definir o que c h a m a de "tristezas o b s c u r a s "
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I
Desenho Dirigido no Atendimento à Criança e o Adolescente Elaboração de Laudos, Re/atórios e Pareceres Abordagem Familiar na Drogadependência Serviço Social em Hospital Público e Privado
V
psicanálise
i n c o n s c i e n t e a céu aberto
Que fim levaram os maníacos? HOJE A MANIA
PERDEU TODA
ESTRANHO TÍTULO TORNOU
Q
MODELO
DIGNIDADE,
RESTANDO-LHE
D E BI P O L A R I D A D E , A P E N A S E RAZÃO
DE NOSSA
PORQUE
ESTE
ELA
SE
CHRISTIAN INGO LENZ DUNKER
NORMALOPATIA
uando a loucura se tornou objeto
m e s m o tempo muito focal e periférica,
da consciência médica, e m mea-
e sua confiança e m si, inabalável. Ela
dos do século 18, ela era reconhecida,
adquire u m a alta estima invencível, u m
sobretudo, como u m a forma de mania.
senso de produtividade aumentado e
Hoje, quando falamos que alguém tem
u m a elevadíssima proatividade sentindo
u m a mania, é apenas u m modo de dizer
que a vida e o mundo lhe reservam c o m
que está apegado demais a u m t e m a ,
u m destino grandioso.
assunto ou ideia. E m u m a época na qual
M u d a n d o u m pouco os termos, é
nossa liberdade se define cada vez mais
tudo o que u m empregador gostaria de
como uso desimpedido de nossos gos-
ouvir na entrevista de seleção de pesso-
tos, a mania quase se despatologizou.
al, c o m u m bónus: é tudo verdade. O u
Por outro lado, o termo está reservado
c o m o loucura maníaco-depressiva.
pelo m e n o s o sujeito acredita e pratica
para um grau mais grave e elevado de
A s s i m como a depressão, só que c o m o
o que diz, apesar das consequências
inconveniência e periculosidade, presen-
seu contrário estrutural a mania acelera,
d e s a s t r o s a s que u m a atitude a s s i m
te na expressão " m a n í a c o " .
intensifica ou a d e n s a u m a f o r m a de
pode trazer. É o que se espera de nossos
A melancolia-mania tem u m a origem
vida que já estava lá, tornando-a mais
alunos, s e m nos darmos conta de quan-
grega, assim como a esquizofrenia-pa-
vibrante. Ela não transporta o sujeito
to isso é opressivo. O modelo redivivo
ranoia vem do universo judaico-cristão.
para outro m u n d o , m a s faz c o m que
e feliz do indivíduo empreendedor, e de
Ela implica, de certa forma, alguém estar
esse mundo seja retinto de cores e bri-
seus ideais devastadores. A máscara
possuído pelos deuses s e m perder sua
lhos, como que animado pelos deuses.
mais desejável para vestir em nossos
médico
U m a d e s c r i ç ã o p a r c i m o n i o s a de
a m o r e s e a m i g o s que nos c o l o c a m
filosófico, de 1801, Pinel distinguia entre
u m a crise maníaca poderia ser a se-
"para c i m a " . O m a n d a m e n t o laico que
os alienados que perderam a razão e os
guinte: a pessoa adquire u m senso de
se encontrará e m todos os manuais
maníacos intermitentes, ou seja, aqueles
ligação ou conexidade entre c o i s a s ,
de autoajuda e gestão organizacional.
para os quais não há nenhuma anomalia
pensamentos e afetos. Isso a torna des-
Todos estes que nada querem saber
na qualidade no pensamento, na ima-
temida e decidida habilitando-a a correr
do terrível " a m a n h ã " depressivo que
ginação, na percepção ou na memória,
riscos e empreender desafios imprová-
espreita a m a n i a . O u seja, hoje a mania
m a s apenas alterações quantitativas.
veis. Ao m e s m o tempo, ela sente u m a
perdeu toda dignidade, restando-lhe
Seu discípulo Esquirol acentuou essa
disposição inexaurível para o trabalho e
e s s e estranho título de bipolaridade,
diferença ao postular a distinção entre a
uma implicação extremamente pessoal e
apenas porque ela se tornou modelo e
lipemania (depressão) e as
monomanias
envolvente em tudo que está fazendo. O
razão de nossa normalopatia.
(delírios temáticos). Logo e m seguida,
ritmo de vida se acelera. O sono se torna
humanidade. E m seu Tratado
Jean-Pierre Falret mostra que depressão
quase desnecessário. Caminhos e rela-
e mania f o r m a m u m m e s m o quadro,
ções que não deram certo rapidamente
c h e g a n d o à ideia de loucura
circular,
são abandonados, s e m custo, pois o
c o n s a g r a d a por K r a e p l i n , e m 1889,
importante é o futuro. Sua atenção é ao
12
CHRISTIAN INGO LENZ DUNKER, psicanalista, professor titular do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP).
NISE DA SILVEIRA /H G U E R R E I R A
D A
P A Z
A história da brasileira, discípula de Jung, que revolucionou a psiquiatria com Meto e Arte! Teatro, música e dança em um espetáculo multimídia. Dramaturgia, Direção | Performance D a n i e l Lobo | Monja C o e n como 'A Voz do Inconsciente' Coreografa Ana Botafogo | Trilha original Joáo Carlos Assis Brasil Diretora-assistente Cilianf Bedin | Participações em vídeo Ferreira Gullar e José Celso Martinez Corrêa "Texto belíssimo! Impregnado
de humor,
humanidade
de um
furor
e eventualmente
semelhante
tempestades.
ao das
0 diretor
uma encenação
grandes
Daniel
fascinante."
Lobo
"Cerimónia Surpreendentemente
bem
da vida! humorado.
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Louvação das teses, experiências e criou
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Nise."
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JORNAL 0 ESTADO DE S. PAULO
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briginal / 2012;
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fármacos
/
9
> 9
Velhas drogas, novos usos RECENTEMENTE MEDICAMENTOS
FOI
DESCOBERTO QUE
COMPORTAMENTOS
por Daisy Yuhas,
DETERMINADOS
PODEM TER "EFEITOS COLATERAIS"
O CÉREBRO, PREVENINDO
9
NÃO SÓ SINTOMAS, MAS
INDESEJÁVEIS
jornalista
SOBRE TAMBÉM
t ,
>
D
esenvolver u m f á r m a c o não é tarefa fácil. Algo
em torno de 9 5 % dos novos c o m p o s t o s é repro-
vado antes de eles se tornarem disponíveis para o uso clínico. O s gastos são especialmente altos
quando o assunto é m e d i c a m e n t o para tratar problemas relacionados ao s i s t e m a nervoso central. Remédios que
c h e g a m a ser c o m e r c i a l i z a d o s c o m s u c e s s o s o m a m u m custo médio de U S $ 1,8 bilhão. A g o r a , os pesquisadores recorrem cada vez m a i s aos produtos já existentes no
9
m e r c a d o . C o m p r o v a d a m e n t e s e g u r a s para o c o n s u m o h u m a n o e não raro c o m p r e e n d i d a s e m nível molecular, as já conhecidas pílulas de hoje podem ser a novidade médica g de a m a n h ã . O s efeitos colaterais e m u m h o m e m podem | ser a cura de outro. 14
f
DROGAS REINVENTADAS
COMO FUNCIONA
BEXAROTENO: de quimioterapia de linfomas cutâneos para tratamento de Alzheimer
No corpo, o bexaroteno ativa um receptor químico que afeta a forma como as células se desenvolvem. Ao ativar esse receptor no cérebro, o agente estimula a destruição de placas características do Alzheimer e ajuda a bloquear a ação de proteínas que causam a morte de neurónios.
MIFEPRISTONE: de abortivo para antidepressivo
A mifepristona foi originalmente desenvolvida para bloquear o neurotransmissor glucocorticoide para tratar depressão. No entanto, cientistas descobriram um interessante efeito colateral: o fármaco interrompe a ação da progesterona, um neurotransmissor necessário durante a gravidez. Controvérsias sobre o aborto interromperam pesquisas sobre a substância por décadas. Agora, a droga tem sido novamente estudada para ser utilizada como antidepressivo.
Pesquisas de grande porte não constataram a eficácia do fármaco até o momento. Entretanto, algumas evidências sugerem que mais pacientes poderão responder ao medicamento se receberem a dosagem apropriada. Pesquisadores investigam também novas drogas com ação similar à da mifepristona, mas sem inibir a progesterona.
GABAPENTINA: de prevenção da epilepsia para alívio de abstinência
A ação da gabapentina é parecida com a de alguns neurotransmissores. Uma de suas funções é normalizar a atividade da amígdala, o que pode aliviar os sintomas de abstinência de dependentes químicos. A sonolência, um dos principais efeitos colaterais, pode ser uma grande aliada no tratamento de adictos, que não raro têm problemas para dormir.
Um estudo com 150 usuários de maconha pretende repetir os resultados de uma pesquisa anterior menos abrangente. O objetivo é reduzir os sirtomas de abstinência. Outros ensaios em andamento focam variados tipos de dependência.
MINOCICLINA: de medicação contra acne e redutor de artrite para estabilizador de esquizofrenia
A minociclina é uma droga anti-inflamatória capaz de atravessar facilmente a barreira hematoencefálica. Por isso, cientistas se perguntavam se o agente químico poderia ajudar também a proteger as células cerebrais. Eles descobriram que o fármaco diminui alguns sintomas da esquizofrenia, incluindo o retraimento social e a apatia. A hipótese é que a substância bloqueia o glutamato, um neurotransmissor relacionado à psicose.
Uma pesquisa com 175 pessoas procura replicar descobertas anteriores e incorporara neuroimagem para compreender melhor as mudanças no cérebro associadas ao tratamento.
AMANTADINA: de remédio contra a gripe para provocar reações em pacientes em estado vegetativo
A amantadina pode atravessar a barreira hematoencefálica e provocar alterações nos neurotransmissores. Há muito tempo pesquisadores vêm tentando encontrar uma maneira de utilizar a substância no tratamento de doenças do cérebro. A novidade é que eles descobriram que a droga ajuda pacientes com baixa consciência ou em estado vegetativo a recuperar a consciência. Eles acreditam que o fármaco eleve gradualmente a atividade da dopamina, o que favorece a excitação cerebral e sua unidade.
A eficácia da amantadina no tratamento de distúrbios da consciência levou cientistas a estudar sua ação em outras lesões cerebrais traumáticas.
PROPRANOLOL: de alívio de ansiedade para diminuir o racismo
O propranolol reduz a pressão arterial e a ansiedade bloqueando a noradrenalina, responsável por uma parte das respostas do organismo ao estresse. Seu efeito calmante também diminui o juízo preconcebido relacionado à etnia.
Pesquisadores desenvolvem um grande estudo sobre o tema. Eles estão interessados na neurobiologia relacionada ao preconceito, e não na "cura" do racismo. O trabalho também levanta questões éticas sobre como os efeitos colaterais da medicação podem influenciar atitudes pessoais.
1
EVIDÊNCIAS
t ) 4) t )
PRÓXIMOS PASSOS Estudos com humanos em andamento.
março 2016 • mentecérebro
^ ^ ^ %
I
0
15
C I E N T I S T A S JÁ S A B E M : M A R C A R O S
TRECHOS
MAIS SIGNIFICATIVOS DOS TEXTOS C O M
CANETAS
COLORIDAS O U M E S M O RELER VÁRIAS VEZES A MESMA LIÇÃO NÃO AJUDA TANTO PROCESSO DE APRENDIZADO Q U A N T O
NO RETOMAR
O ASSUNTO ESTUDADO ALGUMAS VEZES DINÂMICAS DE G R U P O E CONVERSAS C O M COLEGAS. AINDA ASSIM, POUCOS
EM OS
PROFESSORES
ENCORAJAM OS A L U N O S A OPTAR POR TÉCNICAS COMPROVADAMENTE
MAIS
EFICAZES
por Daniel T. Willingham
O AUTOR D A N I E L T. W I L L I N G H A M , doutor em psicologia, professor da Universidade da Virgínia.
março 2016 • mentecérebro
17
capa maioria dos professores c o n c o r d a
Vendedores de panaceias caras e supostamente
que é importante que os alunos se
baseadas e m pesquisas científicas fazem lo-
lembrem do que lêem. No entanto,
bby de produtos que podem até ter validade,
u m a das coisas m a i s c o m u n s e m
mas ainda não foram profundamente testados.
escolas e cursos universitários é vê-
Teorias de aprendizagem matemática, por exem-
-los debruçados sobre livros ou foto-
plo, sugerem que jogos de tabuleiro lineares
cópias, c o m canetas marca-texto na
(mas não circulares) aumentam a prontidão para
m ã o , destacando passagens pertinentes - que
a área de exatas e m pré-escolares, mas a ideia
muitas vezes incluem a maior parte da página.
precisa de estudos e m grande escala.
No final do semestre os estudantes se preparam
C o m o os educadores devem saber quais
para as provas, voltando aos textos e relendo
práticas adotar? U m a instituição que consul-
os parágrafos coloridos.
te pesquisas e as r e s u m a poderia resolver o
Várias p e s q u i s a s t ê m m o s t r a d o , p o r é m ,
problema. A medicina fornece u m precedente:
que destacar trechos e relê-los está entre as
médicos praticantes não t ê m tempo para se
m a n e i r a s m e n o s eficazes de as p e s s o a s se
manter atualizados c o m as dezenas de milhares
l e m b r a r e m do conteúdo que l e r a m . U m a téc-
de artigos de pesquisa publicados anualmente,
nica muito m a i s eficaz é a d i n â m i c a de grupo.
que podem sugerir u m a m u d a n ç a de tratamen-
U m estudo já replicado mostra que alunos que
to. E m vez d i s s o , eles confiam em sumários
lêem determinado texto u m a vez e tentam lem-
respeitáveis de pesquisas, publicados todo ano,
brá-lo e m três ocasiões obtêm notas e m torno
que c o n c l u e m se as evidências acumuladas
de 5 0 % maiores nas provas, e m c o m p a r a ç ã o
apoiam mudanças na prática médica. Professo-
aos colegas que leram o m e s m o texto e depois
res não têm nada semelhante a essas revisões
o releram três v e z e s . E ainda a s s i m muitos
competentes: estão por conta própria.
professores i n s i s t e m e m e n c o r a j a r - o u pelo
O Departamento de Educação dos Estados
m e n o s e m não desencorajar - as técnicas que
U n i d o s ( D O E , e m inglês) tentou, no passado,
a ciência provou serem ineficazes (veja na pág.
levar rigor científico ao e n s i n o . A câmara What
21 artigo do professor Carl Wíeman, ganhador do
Works, criada e m 2002 pelo Instituto de Ciên-
Nobel de Física de 2001).
cias Educacionais do D O E , avalia currículos,
E s s e é a p e n a s u m s i n t o m a do f r a c a s s o
programas e materiais de sala de aula, m a s
geral de integrar o c o n h e c i m e n t o científico na
seus padrões são estritos e professores não
e s c o l a . Muitas ideias c o m u n s sobre educação
t ê m participação no processo de verificação,
d e s a f i a m princípios de cognição e aprendi-
t a m p o u c o na a v a l i a ç ã o - e i s s o é c r u c i a l .
z a g e m . U m equívoco c o m u m em algumas
Cientistas podem analisar pesquisas, mas
e s c o l a s é pensar que o ensino de conteúdo
professores e n t e n d e m de educação. O pro-
é m e n o s importante que o de habilidades de
pósito d e s s a instituição seria o de produzir
p e n s a m e n t o crítico ou estratégias de resolu-
informações que p u d e s s e m ser usadas para
ção de p r o b l e m a s . Pesquisadores s a b e m que
modelar o e n s i n o e a a p r e n d i z a g e m .
Um equívoco c o m u m das escolas é pensar que o ensino de conteúdo é menos importante que o de habilidades de p e n s a m e n t o crítico ou estratégias de resolução de problemas 18
c r i a n ç a s d e v e m aprender
M u i t o s p r o f e s s o r e s p r e c i s a m perder as
as conexões entre letras e
noções de que o cérebro dos meninos é mais
s o n s e que se beneficiam
apto a atividades espaciais que o das meninas,
m a i s quando e s s a instru-
por exemplo. Pode-se dizer que o trabalho de
ção é planejada e explícita.
levar i n f o r m a ç õ e s científicas precisas sobre
É fácil dizer que os pro-
cognição e aprendizagem a professores seja
fessores devem se esforçar
responsabilidade de faculdades de educação,
m a i s para a c o m p a n h a r a
do governo e de organizações profissionais de
c i ê n c i a , m a s e n s i n a r já é
professores, m a s essas instituições e m geral
u m a profissão muito traba-
não colocam esse objetivo c o m o prioridade.
lhosa. E é difícil para um não
Talvez u m c o n s e l h o nacional de revisão de
especialista separar pesqui-
estudos sobre aprendizagem fosse a maneira
sas científicas da avalanche
mais simples e rápida para transpor u m grande
de falação e pseudociência.
obstáculo para a melhoria e m muitas escolas.
ISSO FUNCIONA NA PRÁTICA! V e m crescendo o n ú m e r o de estudos sobre c o m o a b s o r v e m o s conteúdo. Resultados consistentes sugerem que d e t e r m i n a d a s estratégias, c o m o lembrar aos alunos que a inteligência não é algo fixo e " p r o n t o " , p o d e m ser determinantes para aprimorar a a p r e n d i z a g e m e o d e s e m p e n h o . E s s e c a m p o de pesquisa pode oferecer indicações s i m ples e preciosas que a j u d a m a trazer muitos g a n h o s . Confira alguns dos m a i s recentes estudos que exploram esses c a m p o s .
Tenha paciência e mantenha a curiosidade E m t e m p o s de internet, q u a n d o
c o m intervalos imprevisíveis de
q u a l q u e r i n f o r m a ç ã o está ao 1I-
dois, quatro ou oito s e g u n d o s . E m
c a n c e de a l g u n s t o q u e s , p o d e m o s
seguida, os voluntários participa-
ter a i m p r e s s ã o de que a c e s s a r os
ram de u m a tarefa não relacionada,
r e s u l t a d o s na hora favorece a ab-
c o m o objetivo de distraí-los e,
s o r ç ã o de i n f o r m a ç ã o . Vários estu-
só então, f o r a m testados sobre o
d o s , p o r é m , c h a m a m atenção para
quanto absorveram das questões a
os benefícios de não receber u m a
que h a v i a m respondido.
r e s p o s t a às n o s s a s perguntas tão rapidamente. Quando fazemos
O s resultados d e s s e experim e n t o , publicados e m n o v e m b r o
u m t e s t e , t e m o s m a i o r c h a n c e de
2014 na Memory
m e m o r i z a r a alternativa correta
f i r m a m os benefícios d e s s a estra-
se a o u v i m o s depois de a l g u r s
tégia de a p r e n d i z a d o , m a s m o s -
s e g u n d o s , e m v e z de acessá-la
t r a m que ela d e p e n d e da curiosi-
instantaneamente.
d a d e : e m testes de a c o m p a n h a -
G£ Cognition,
con-
m e n t o , os participantes a c e r t a r a m
vele a informação c o r r e t a s o m e n t e
ajuda a apurar a a p r e n d i z a g e m ,
m a i s v e z e s q u a n d o receberam as
depois de alguns s e g u n d o s , s e m
p e s q u i s a d o r e s da U n i v e r s i d a c e
r e s p o s t a s depois de u m t e m p o ,
que você saiba q u a n t o s . M a s , se
Estadual de lowa pediram a estu-
p o r é m , a p e n a s e m relação a ques-
preferir fazer isso s o z i n h o , tente
dantes universitários que d e s s e m
tões de s e u interesse. O s pesqui-
resistir ao desejo de p e s q u i s a r no
seu m e l h o r palpite para perguntas
s a d o r e s s u g e r e m que e s s e atraso
G o o g l e ou procurar u m a r e s p o s t a
triviais c o m o " Q u e m inventou a
incentiva os a l u n o s a antecipar a
i m e d i a t a : dê palpites a n t e s .
Para c o m p r e e n d e r por que isso
palavra nerd?" e " Q u a l é a cor do
i n f o r m a ç ã o , o que a u m e n t a o nível
sangue dos g a f a n h o t o s ? " e avalias-
de atenção q u a n d o a r e c e b e m .
s e m seu grau de curiosidade ?m
O efeito foi m a i s forte q u a n d o a
americano Theodor Seuss Geisel,
relação ao a s s u n t o . Para metade
resposta era dada e m intervalos
c o n h e c i d o por Dr. S e u s s , m o r t o
das perguntas, os participantes
i m p r e v i s í v e i s , o que está de acor-
e m 1 9 9 1 . E o s a n g u e dos gafanho-
tiveram acesso à i n f o r m a ç ã o cor-
do c o m e s t u d o s anteriores que
tos é b r a n c o . Se v o c ê estava pen-
reta i m e d i a t a m e n t e depois de ter
m o s t r a m que a atenção é reforça-
s a n d o sobre i s s o , a d e m o r a pode
respondido às perguntas. Para as
da q u a n d o a s e q u ê n c i a de eventos
ter a j u d a d o a gravar e s s a i n f o r m a -
d e m a i s , t i v e r a m de esperar q jatro
é incerta. E n t ã o , q u a n d o e s t u d a r
ção e m s u a m e m ó r i a .
s e g u n d o s ou escutar a resposta
c o m u m a m i g o , peça a ele que re-
(Por Tori Rodriguez,
A l i á s , q u e m c u n h o u a palavra nerd foi o escritor e c a r t u n i s t a
jornalista)
março 2016 • mentecérebro 19
Salve um arquivo para lembrar o conteúdo de outro
a p o n t a d o que g u a r d a r i n f o r m a ç õ e s ness e s locais n o s t o r n a m e n o s propensos a recordá-las, p r o v a v e l m e n t e porque entend e m o s que n ã o p r e c i s a m o s m e m o r i z a r algo q u e já está s a l v o . " M a s isso t a m b é m pode liberar r e c u r s o s m e n t a i s e m e m ó r i a para o u t r o s c o n t e ú d o s " , a r g u m e n t a m os cientistas cognitivos Benjamin Storm e S e a n S t o n e , a m b o s d a U n i v e r s i d a d e da Califórnia e m S a n t a C r u z . O s dois c o n d u z i r a m u m a série de expe-
O a r m a z e n a m e n t o digital de d a d o s se tor-
rimentos e m que pediram aos voluntários
n o u parte d o c o t i d i a n o , seja na f o r m a de
que e s t u d a s s e m u m a lista de oito palavras.
listas de c o n t a t o s e eventos do s m a r t p h o -
Para u m grupo, os pesquisadores disseram
ne, seja no a c e s s o c o n s t a n t e a o s e n o r m e s
que deveriam salvar o arquivo e para o outro,
e s t o q u e s de c o n h e c i m e n t o g u a r d a d o s na
que apenas f e c h a s s e m o d o c u m e n t o . E m
n u v e m . P e s q u i s a s anteriores já h a v i a m
seguida, os participantes estudaram u m a
Mexa o corpo logo depois de estudar De f o r m a geral, m a n t e r o corpo e m m o v i m e n t o colabora para a saúde do cérebro, o que ajuda a a p r i m o r a r a capacidade de raciocinar e fixar o que aprend e m o s . A g o r a , novos e s t u d o s revelam outras c o n s t a t a ç õ e s i m p o r t a n t e s relac i o n a d a s à prática de exercícios f í s i c o s : m a r c a r o horário do treino logo após adquirir a l g u m a p r e n d i z a d o ajuda a reter m e l h o r as i n f o r m a ç õ e s . E m diversos e x p e r i m e n t o s , c o n s t a t o u - s e que pess o a s que p a r t i c i p a r a m de exercícios de m u s c u l a ç ã o u m p o u c o antes de estudar se s a í r a m m e l h o r e m testes de recordação a p ó s h o r a s , d i a s o u s e m a n a s . Especialistas acreditam que a excitação física é a chave para a fixação. Exercícios podem estimular o corpo de maneira similar a experiências emocionais - e sabemos que m e m ó r i a s afetivas são as que mais d u r a m . O s pesquisadores advertem, porém, que a atividade física produz, no m á x i m o , u m efeito de suporte - o m a i s importante, obviamente, é se dedicar aos estudos antes de qualquer coisa. (T. R.)
segunda lista. M a i s tarde, u m teste de m e m ó r i a avaliou o quanto os participantes se lembravam dos vocábulos. O s p e s q u i s a d o r e s o b s e r v a r a m que aqueles que salvar a m o p r i m e i r o arquivo se r e c o r d a r a m m a i s da lista do s e g u n d o , de a c o r d o c o m artigo publicado e m fevereiro do a n o p a s s a d o na revista Psychological
Science.
E s s e efeito n ã o foi o b s e r v a d o q u a n d o o p r o c e s s o de g r a v a ç ã o n ã o era c o m p r o v a d a m e n t e confiável ou se o documento acessado primeiramente mostrava apenas d u a s p a l a v r a s . O s p e s q u i s a d o r e s c o g i t a m que é c o m o se os v o l u n t á r i o s t i v e s s e m u s a d o o a r m a z e n a m e n t o digital c o m o u m a c a p a c i d a d e externa para " t r a n s f e r i r " as d e m a n d a s da m e m ó r i a . Eles s u g e r e m que p o d e m o s aproveitar e s s a p e c u l i a r i d a d e , s a l v a n d o i m e d i a t a m e n t e as i n f o r m a ç õ e s de que não p r e c i s a m o s para c o n s u l t a posterior. A s s i m , r e a l o c a m o s r e c u r s o s para aprender. (Simon
Makin,
jornalista)
Distrações úteis E m certas c i r c u n s t â n c i a s , a distração pode c o l a b o r a r para o aprendiz a d o . A raiz d e s s a a r g u m e n t a ç ã o está no fato de que a m e m ó r i a tende a f u n c i o n a r por m e i o de a s s o c i a ç õ e s e o que a p r e n d e m o s
4
em uma situação nem sempre pode ser l e m b r a d o e m o u t r a . De m a n e i r a n o t á v e l , p e s q u i s a d o r e s já d e m o n s t r a r a m que palavras decoradas d u r a n t e u m m e r g u l h o s ã o m a i s fáceis de s e r e m r e c o r d a d a s
rante e s s a s e t a p a s , os v o l u n t á r i o s
s e g u n d o artigo p u b l i c a d o e m feve-
n u m a m b i e n t e s u b a q u á t i c o do que
foram selecionados aleatoriamente
reiro na Psychological
e m terra s e c a . A g o r a , p s i c ó l o g o s
para fazer u m a s e g u n d a tarefa rela-
da U n i v e r s i d a d e B r o w n s u g e r e m
c i o n a d a à c a p a c i d a d e de m a n t e r a
consenso entre muitos especialistas
algo s e m e l h a n t e e m relação à dis-
a t e n ç ã o : c o n t a r letras e m u m a tela.
é que a distração é algo negativo
t r a ç ã o . Para chegar a e s s a c o n c l u -
O s que f o r a m d i s t r a í d o s d u r a n t e
para o aprendizado. N o entanto,
s ã o , os p e s q u i s a d o r e s t r e i n a r a m
a p e n a s u m a fase d e m o n s t r a r a m
se você souber de a n t e m ã o que vai
48 v o l u n t á r i o s para atingir u m alvo
baixo d e s e m p e n h o na hora do tes-
passar por u m teste que interfere
na tela de u m c o m p u t a d o r utilizan-
te, m a s aqueles que p a r t i c i p a r a m
na atenção ou que terá de enfrentar
do u m touchpad
da tarefa de calcular letras tanto
u m ambiente perturbador, u m a boa
d e r i a , por e x e m p l o , m o v e r o c u r s o r
durante o treinamento quanto
alternativa para evitar ser pego de
na d i a g o n a l ) . D e p o i s , a v a l i a r a m a
d u r a n t e a avaliação se s a í r a m tão
surpresa é tentar s i m u l a r as distra-
c a p a c i d a d e d o s participantes de
b e m q u a n t o os que f i z e r a m o m e s -
ções enquanto estuda ou treina.
atingir r a p i d a m e n t e a m a r c a . Du-
m o , m a s s e m sofrer interferência,
(Nathan Collins,
instável (que po-
Science.
O s cientistas c o n c o r d a m que o
jornalista)
março 2016 • mentecérebro
21
5
>
r f -
Chega de aulas expositivas! NO
NÍVEL
ESPERA
UNIVERSITÁRIO,
Q U E OUÇAM
A EVIDÊNCIA
É
CLARA! A L U N O S
DE CIÊNCIAS
APRENDEM
M E N O S
Q U A N D O
SE
PASSIVAMENTE
A maioria dos p r o f e s s o r e s de c i ê n c i a s , e m especial o s
National
Academy
of Sciences
USA, e s s a a b o r d a g e m
universitários, prega a ideia de q u e é preciso buscar a
m e l h o r a a a p r e n d i z a g e m e m t o d a s a s d i s c i p l i n a s de
verdade por meio de d a d o s e e x p e r i m e n t a ç ã o cuida-
c i ê n c i a s e de e n g e n h a r i a t a n t o e m c u r s o s introdutó-
d o s a . N o entanto, q u a n d o e n t r a m e m sala de aula, e m
rios q u a n t o n o s a v a n ç a d o s .
geral u s a m m é t o d o s u l t r a p a s s a d o s e i n e f i c a z e s . A f r a -
H á m u i t a s m a n e i r a s diferentes de introduzir a
ção e s m a g a d o r a de c u r s o s de g r a d u a ç ã o de ciências é
aprendizagem ativa. E m t u r m a s m e n o r e s , muitas vezes
m i n i s t r a d a por u m p r o f e s s o r q u e dá a u l a s expositivas
estudantes trabalham e m grupos para completar u m a
a a l u n o s , m e s m o diante de v á r i a s c e n t e n a s de estu-
série de etapas que c o m p õ e m u m problema maior. N a s
dos que m o s t r a m q u e m é t o d o s de e n s i n o alternativos
t u r m a s de 100 a 300 a l u n o s , instrutores c o s t u m a m
d e m o n s t r a m muito m a i o r a p r e n d i z a g e m d o s alunos e
usar dispositivos que p e r m i t e m a o s j o v e n s transmitir
índices m a i s baixos de i n s u c e s s o .
respostas ao professor instantaneamente pressionando
E s s e s d i v e r s o s m é t o d o s t ê m v á r i o s n o m e s , inclusive a p r e n d i z a g e m a t i v a . S u a c a r a c t e r í s t i c a c o m u m é
u m botão de s e u a s s e n t o . A s s i m , u m professor logo vê qual o índice de estudantes que c o m p r e e n d e m o
q u e , e m v e z de o u v i r p a s s i v a m e n t e , a l u n o s p a s s a m
material. A s melhores perguntas s ã o desafiadoras e
o t e m p o de a u l a e n v o l v i d o s e m r e s p o n d e r p e r g u n -
envolvem a c o m p r e e n s ã o e o u s o de conceitos b á s i c o s ,
t a s , resolver p r o b l e m a s , d i s c u t i n d o s o l u ç õ e s c o m o s
e m vez de m e m o r i z a ç ã o s i m p l e s . Q u a n d o a maioria da
c o l e g a s e r a c i o c i n a n d o s o b r e o m a t e r i a l de e s t u d o ,
classe erra a resposta, o professor faz o s j o v e n s discu-
e n q u a n t o o b t ê m retorno regular de s e u professor.
tirem c o m os v i z i n h o s e responderem n o v a m e n t e . En-
C o m o r e l a t a d o e m u m e s t u d o de 2 0 1 2 pela N a t i o n a l
quanto i s s o , ele escuta e s s a s c o n v e r s a s e proporciona
Academy o f Sciences e e m u m a análise detalhada pu-
ajuda direcionada aos a l u n o s . C o m qualquer u m a des-
b l i c a d a on-line e m m a i o na r e v i s t a Proceedings
s a s técnicas, o professor ainda p a s s a u m b o m t e m p o
ofthe
falando, m a s os ouvintes são alunos que f o r a m prepa-
p e s s o a s ( i n c l u i n d o professores e a d m i n i s t r a d o r e s de
rados para aprender. Eles entendem por que o conteú-
instituições de e n s i n o ) acredita que o a p r e n d i z a d o
do vale a pena e c o m o ele pode ser usado para resolver
ocorre c o m u m a p e s s o a s i m p l e s m e n t e o u v i n d o u m
p r o b l e m a s . A t u a l m e n t e o material está e m u m contexto
professor. I s s o é verdade se a l g u é m e s t á a p r e n d e n d o
que faz s e n t i d o , e m vez de ser dado c o m o u m conjunto
algo m u i t o s i m p l e s , c o m o " c o m a o fruto v e r m e l h o ,
de fatos e p r o c e d i m e n t o s s e m sentido que os alunos só
não o v e r d e " , m a s do ponto de v i s t a n e u r o l ó g i c o o
podem memorizar sem entendimento.
a p r e n d i z a d o c o m p l e x o , inclusive o p e n s a m e n t o cien-
A pesquisa educacional sobre aulas para o jardim até o
tífico, exige a interação para possibilitar ao cérebro
fim do e n s i n o médio oferece u m a imagem m e n o s clara a
assumir novas capacidades.
favor da aprendizagem ativa. Isso porque a pesquisa c o m alunos é difícil, c o m muito mais (loisas fora do controle
O motivo mais importante para o ensino superior não alterar metodologias, no entanto, é que não existe
dos pesquisadores. Talvez a variável mais importante
incentivo. O fato é que não há n e n h u m incentivo para
seja o nível desigual e muitas vezes o baixo domínio do
o uso de técnicas de ensino eficazes baseadas e m pes-
assunto pelos professores. C o m o a aprendizagem ativa
quisa, além de superstição pedagógica e do hábito; na
requer prática e feedback
verdade, poucas, ou n e n h u m a , universidades m o n i t o r a m
sobre pensar c o m o u m cien-
tista, exige especialização consideravelmente maior do docente no assunto.
o tipo de técnicas de ensino usadas e m suas salas de aula. Enquanto isso for verdade, futuros alunos não terão
A p e s a r d a s e v i d ê n c i a s científicas que a p o i a m a
c o m o comparar a qualidade da educação que receberão
a p r e n d i z a g e m a t i v a , por que o uso d e s s a s t é c n i c a s é
e m diferentes instituições, e a s s i m n e n h u m a instituição
tão raro? U m d o s m o t i v o s parece ser a c o m p r e e n s ã o
precisa melhorar. (Por Carl Wieman, ganhador do Nobel de
b a s i c a m e n t e falha da a p r e n d i z a g e m . A m a i o r i a d a s
Física de 2001)
capa
E inusitado, mas pode aumentar a criatividade e o foco
Sorrir m e s m o quando estamos trisVista-se para a ocasião. Se vai es-
tes pode ajudar a aumentar a criati-
tudar, prepare-se: prefira roupas
vidade. P e s s o a s que apresentaram
Deite-se por alguns minutos para
l i m p a s e confortáveis, m a s evite
estados m e n t a i s e físicos contradi-
estimular insights. P e s s o a s nes-
p i j a m a s . U m e s t u d o publicado na
tórios (se recordaram de algo triste
sa posição c o n s e g u e m resolver
Psychological
mostrou que,
enquanto d a v a m risada ou ouviam
a n a g r a m a s de f o r m a significativa-
c u r i o s a m e n t e , e s t u d a n t e s d a área
u m a m ú s i c a feliz c o m a expressão
mente m a i s rápida d o q u e o s q u e
de b i o m e d i c i n a q u e u s a v a m jaleco
aborrecida) d e m o n s t r a r a m mais fa-
p e r m a n e c e m e m pé
branco d e m o n s t r a r a m m a i o r foco
cilidade para " p e n s a r fora da caixa"
Science
Tonificação da linguagem, educação precoce no berço Cientistas da U n i v e r s i d a d e de Rutgers d e s e n v o l v e r a m testes para d e t e r m i n a r se o s bebés c o m a u d i ç ã o normal p r o c e s s a m os s o n s de m o d o p r o f u n d o dentro d o cérebro (gráfico do por eles (gráfico
ao lado)
abaixo).
Eles estão a n a l i s a n d o s e u m jogo cria-
pode preparar c r i a n ç a s m a i s novas a falar, ouvir, ler e escrever.
À espera de "Ahá!" O Laboratório de Estudos sobre a Infância da Rutgers coloca u m a touca de eletrodos e m bebés para registrar a atividade cerebral enquanto eles o u v e m sons variados. Primeiro, as crianças escutam tons de alta frequência (ao lado), que estimulam determinado padrão de ondas cerebrais (à esquerda).
Padrão auditivo 1
Padrão auditivo 2
Tons A
Tons A
1 Tempo
Silêncio
1
i •
Tempo
Tons B
•
•
i
•
Tons
de alturas diferentes (B) s e intercalam com os tons iniciais e provocam u m a
Padrão de ondas cerebrais 1
Padrão de ondas cerebrais 2
Tempo-
Tempo
m u d a n ç a temporária na onda cerebral (a resposta ahá!) conforme a m u d a n ç a (à direita).
o cérebro detecta U m a resposta
mais lenta ou mais fraca a esta alteração súbita na altura pode predizer problemas posteriores de linguagem.
24
Resposta ahá!
Direção preferencial C o m a t o m o g r a f i a por r e s s o n â n c i a m a g n é t i c a por d i f u s ã o os p e s q u i s a d o r e s t o r n a m v i s í v e i s as fibras da s u b s t â n c i a cerebral b r a n c a . A s regiões claras c o r r e s p o n d e m às áreas nas q u a i s a água só pode se m o v e r de f o r m a limitada (anisot r ó p i c a ) , por e x e m p l o , ao longo dos
filamentos
n e u r a i s . Por
outro lado, e s t ã o e s c u r a s as regiões do cérebro c o m d i f u s ã o i l i m i t a d a (isotrópica) da á g u a , por e x e m p l o , nos v e n t r í c u l o s . A s i m a g e n s p e q u e n a s as m o s t r a m e m detalhe: a n i s o t r ó p i c a (no alto) e isotrópica
(embaixo).
Tente isto: coloque u m a i n f o r m a ç ã o f u n d a m e n t a l e m u m tipo de letra difícil de a c o m p a n h a r . E m u m e s t u d o de 2 0 1 1 , voluntários que l e r a m algo n u m a fonte d e s c o n h e c i d a ou p o u c o legível se recordaram m a i s da i n f o r m a ção do que aqueles que t i v e r a m a leitura fácil. O t a m a n h o da letra, p o r é m , não fez diferença.
Brincadeiras para os pequenos O s bebés na R u t g e r s p o d e m a p r e n d e r a p r o c e s s a r a altura ( f r e q u ê n c i a do s o m ) de f o r m a m a i s eficiente e n q u a n t o t a m b é m se d i v e r t e m . A c r i a n ç a a p r e n d e a v i r a r a c a b e ç a e m r e s p o s t a a o s t o n s B (à direita), esquerda),
m a s não aos t o n s A (à
e é r e c o m p e n s a d a c o m u m t r e c h o de u m v í d e o na r e s p o s t a c o r r e t a . O r i t m o de s e q u ê n c i a s de t o n s se
* Se estiver difícil de ler, coloque a revista na horizontal, pouco abaixo da altura dos olhos e a incline para frente.
acelera, e a criança aprende a responder cada vez mais c o m maior precisão, nesse ritmo acelerado. Tons A
Tons B
II Recompensa visual para uma resposta correta de virada de cabeça
1 -
março 2016 • mentecérebro 25
CÂMERAS
DE V Í D E O
PARA O N D E A L U N O S SE OS E S T U D A N T E S NÃO C H E G A R A M
RASTREIAM
DOS O L H O S
PARA
Dl R E C I O N A M S U A A T E N Ç Ã O , E S E N S O R E S
ESTÃO INTERESSADOS OU
DE PELE
É PRIMORDIAL
MOTIVADOS SE FIZEREM COM
ESFORÇOS
PROFESSORES
NÃO PODEM
E QUE ALUNOS
PODERÃO
E JUNTO COM OS
AINDA
CRENÇAS
SER AVALIADOS DA SALA
REALMENTE
PARA C O M P L E T A R AS TAREFAS
SUPERVISÃO
REVELAM
ENTEDIADOS. OS RESULTADOS
EM SUAS CREDENCIAIS ACADÉMICAS, Q U E O T A M A N H O
AULA NEM SEMPRE
DETECTOR
À S E S C O L A S , M A S A N O V A M E T O D O L O G I A JÁ D E S A F I A
ESTABELECIDAS AO MOSTRAR QUE BASE APENAS
MOVIMENTOS
FICAR
COM DE MAIS
D U R A N T E AS A U L A S ,
COLEGAS
por Barbara Kantrowitz
MyL
nna Fisher apresentava u m seminário para uni-
MgJÊL W %
W
versitários sobre atenção edistração de crianças pequenas q u a n d o notou que as paredes da sala
H e s t a v a m n u a s . Isso a fez refletir sobre as salas
de aula da pré-escola, que c o s t u m a m ser decoradas c o m cartazes alegres, m a p a s coloridos, gráficos e trabalhos de arte. Ela se questionou, então, sobre que efeito todo aquele e s t í m u l o visual exerce sobre c r i a n ç a s , que são muito mais suscetíveis à distração que s e u s a l u n o s da Universidade Carnegie Mellon. Esse tipo de decoração afeta a capacidade de aprendizado das crianças? Para verificar isso, a estudante de pós-graduação Karrie
26
A AUTORA
G o d w i n , o r i e n t a n d a de Fisher, d e s e n v o l v e u u m experi-
BARBARA K A N T R O W I T Z é editora sénior da Hechinger Report, empresa de notícias s e m fins lucrativos focada e m jornalismo educativo. Ela leciona na Columbia Journalism School e foi editora e jornalista da Newsweek por mais de 20 anos, cobrindo educação, saúde e questões sociais.
mento c o m crianças do j a r d i m de infância da Carnegie Mellon's Children's S c h o o l , u m a instituição experimental que funciona no c a m p u s . Dois grupos de 12 alunos cada u m sentaram-se e m u m a sala alternadamente decorada ou totalmente vazia e o u v i r a m três histórias sobre ciências e m
cada a m b i e n t e . O s pequenos voluntários f o r a m
filmados
pelos p e s q u i s a d o r e s , que m a i s tarde o b s e r v a r a m o quanto cada criança prestou atenção aos relatos. A o fim da leitura,
comentários sobre currículos específicos até técnicas de ensino baseadas e m evidências. Agora, pesquisadores americanos estão usando a tecno-
perguntas sobre o que o u v i r a m . A s da sala de pa-
logia emergente e novos métodos de análise de dados para
redes n u a s e r a m m a i s propensas a prestar atenção e apre-
criar experiências que teriam sido impossíveis há dez anos.
fizeram
s e n t a r a m m e l h o r e s resultados e m testes de c o m p r e e n s ã o .
Economistas descobriram c o m o compactar os dados para
Centenas de experiências c o m o e s s a f a z e m parte de
simularestudos r a n d o m i z a d o s - q u e muitas vezes sãodifíceis
u m a iniciativa para trazer c o n h e c i m e n t o s científicos sobre
e caros de adequar a escolas. Câmeras de vídeo rastreiam
aprendizagem para as salas de aula. N o s Estados U n i d o s ,
movimentos dos olhos para ver para onde alunos direcionam
e s s e m o v i m e n t o c o m e ç o u c o m a lei No child left
behind
sua atenção; sensores de pele m o s t r a m se os estudantes
( N e n h u m a criança deixada para t r á s ) , e m 2002. N a oca-
estão interessados ou entediados. Grande parte das novas
sião, foi fundado o Instituto de Ciência da Educação ( I E S ,
pesquisas supera a simples métrica de testes padronizados
na sigla e m inglês) para incentivar cientistas a buscar o
para avaliar a aprendizagem e m andamento. " E s t o u inte-
que foi descrito c o m o " p e s q u i s a cientificamente v á l i d a " , e m especial estudos controlados r a n d o m i z a d o s , que defensores do I E S c o n s i d e r a m bastante confiáveis. T a m b é m foi criado o What Works Clearinghouse,
espécie de banco de
dados c o m i n f o r m a ç õ e s variadas para e d u c a d o r e s : desde
ressado e m medir o que realmente importa", afirma Paulo Blikstein, professor assistente da Faculdade de Educação da Universidade Stanford, que participa do desenvolvimento de novas tecnologias e técnicas de coleta de dados para capturar o processo de aprendizagem. Conhecer o bom d e s e m p e n h o março 2016 • mentecérebro 27
de tentativa e erro que e s p e r a m o s captar c o m e s s a s novas f e r r a m e n t a s : levamos as crianças ao laboratório e p a s s a m o s tarefas que envolv e m algum tipo de projeto de engenharia ou de c i ê n c i a s " , conta Blikstein. Pesquisadores coloc a m s e n s o r e s no laboratório e, às vezes, nas próprias c r i a n ç a s . D e p o i s , coletam os dados e os a n a l i s a m b u s c a n d o padrões. " H á muitas coisas na f o r m a c o m o as pessoas aprendem que são contrárias à intuição; gostamos de d e s v e n d a r e s s e s m e c a n i s m o s m e n t a i s , por vezes e q u i v o c a d o s , para entender o que de fato é eficiente." A a p r e n d i z a g e m b a s e a d a e m "descobert a s " que o c o r r e m q u a n d o a l u n o s d e s v e n d a m s o z i n h o s o s f a t o s , e m v e z de recebê-los p r o n t o s , e s t á e m v o g a u l t i m a m e n t e . Blikstein e s e u s c o l e g a s no F a b l _ a b @ S c h o o l , u m a rede de oficinas e d u c a t i v a s criada por ele e m 2 0 0 9 , t e n t a m atingir a e s s ê n c i a da quantid a d e de i n s t r u ç õ e s de que os a l u n o s realm e n t e p r e c i s a m . Pais p o d e m não gostar de dos alunos ao completarem u m a tarefa é apenas
ver s e u s f i l h o s f r u s t r a d o s na e s c o l a , m a s
parte da experiência. Cientistas também gravam
B l i k s t e i n g a r a n t e que " h á níveis de frustra-
a expressão dos alunos, a resposta galvânica
ção e de f r a c a s s o que s ã o m u i t o p r o d u t i v o s ,
da pele e as interações no grupo, entre outras
s ã o ó t i m a s m a n e i r a s de a p r e n d e r " . E m u m a
coisas. Blikstein denomina essa abordagem de
série de e s t u d o s , ele e s e u s colegas tentaram
"análise multimodal da aprendizagem".
d e s c o b r i r se a l u n o s a p r e n d i a m m a i s sobre
A nova metodologia já desafia crenças am-
u m t ó p i c o de c i ê n c i a se a s s i s t i s s e m primei-
plamente estabelecidas ao revelar que professo-
r a m e n t e a u m a a u l a o u se f i z e s s e m
res não podem ser avaliados c o m base apenas
a t i v i d a d e e x p l o r a t ó r i a . Ele c h a m o u a aula
uma
e m suas credenciais académicas, que o tamanho
de " o u v i r d i z e r e p r a t i c a r " . O s a l u n o s f o r a m
da sala de aula nem sempre é primordial e que
divididos em dois grupos. U m
alunos poderão realmente ficar mais motivados
c o m a a t i v i d a d e e x p o s i t i v a e o outro, c o m
começou
se fizerem esforços para completar u m a tarefa
a e x p l o r a t ó r i a . P e s q u i s a d o r e s repetiram o
e m sala de aula. Embora ainda haja muito a ser
experimento em várias ocasiões e encon-
compreendido nesse campo, as constatações
t r a r a m r e s u l t a d o s c o n s i s t e n t e s : j o v e n s que
já c o m e ç a m a p r e e n c h e r a l g u m a s l a c u n a s
i n i c i a r a m c o m a t i v i d a d e prática se s a í r a m
nesse quebra-cabeça extremamente complexo
2 5 % m e l h o r que a q u e l e s que p a r t i c i p a r a m
c h a m a d o educação.
a n t e s da aula e x p o s i t i v a . O professor de a d m i n i s t r a ç ã o e política
EM BUSCA DE PADRÕES
Jordan M a t s u d a i r a , da Universidade Cornell,
Perguntas provocativas deflagram os resulta-
ajudou a ressuscitar u m a antiga ferramenta de
dos m a i s surpreendentes. E m u m a série de
pesquisa económica e a empregou para obser-
experiências c o m estudantes do ensino funda-
var a utilidade de aulas de reforço. O método,
mental II e m é d i o , Blikstein tenta c o m p r e e n -
estruturado nos moldes de acompanhamentos
der a melhor f o r m a de ensinar m a t e m á t i c a e
clínicos controlados e conhecido c o m o análise
ciências indo a l é m , por exemplo, dos testes de
de r e g r e s s ã o - d e s c o n t i n u i d a d e , c o m p a r a o
múltipla escolha para avaliar o c o n h e c i m e n t o
rendimento de estudantes. No estudo sobre as
dos a l u n o s . " M u i t o do que acontece e m ciên-
aulas complementares, por exemplo, Matsudaira
cias exatas resulta e m f r a c a s s o ; é o processo
c o m p a r o u alunos cujos resultados de testes
ficaram pouco acima do nível que os tornava
PROFESSOR DE ALTA QUALIDADE
candidatos para as atividades de reforço c o m
N o v o s estudos a j u d a m a construir u m a base
aqueles que estavam logo abaixo para verificar
de evidências inexistente no e n s i n o . Grover
se as aulas adicionais melhoravam os resultados
W h i t e h u r s t , diretor-fundador do l E S - e atual-
dos testes dos alunos. Conclusão: aulas a mais
mente diretor do Brown Center on Education
podem ser u m a forma mais eficaz para melhorar
Policy e m e m b r o sénior da Brookings Institu-
o aprendizado que a redução do tamanho das
tion - , lembra que quando começou a trabalhar
t u r m a s , por exemplo.
no projeto e m 2002, logo após o programa No
O u t r o s p e s q u i s a d o r e s prospectam dados
child left behind entrar e m vigor, o superinten-
para m o n i t o r a r o progresso de vários alunos
dente de u m distrito predominantemente de
ao longo do t e m p o . O professor Ryan Baker, da
minorias pediu-lhe que sugerisse u m currículo
Universidade C o l u m b i a , presidente da Interna-
de m a t e m á t i c a c o m p r o v a d a m e n t e eficaz para
tional Educational Data MiningSociety, lembra
os seus alunos. " Q u a n d o respondi que não ha-
que, q u a n d o t r a b a l h a v a e m seu d o u t o r a d o
via n e n h u m , ele não pôde acreditar estar sendo
no início dos a n o s 2000, acordava todas as
obrigado por lei a basear tudo o que fazia na
m a n h ã s às 6 horas para dirigir até u m a escola
pesquisa científica e não haver n e n h u m a na
onde p a s s a v a o dia todo e m pé, fazendo anota-
qual pudesse se fiar." E s s e superintendente
ções e m u m a prancheta. Avance rapidamente
não estava s o z i n h o . " H a v i a muito pouca pes-
u m a d é c a d a , e a rotina de trabalho de Baker
quisa que realmente atendesse às necessida-
parece m u i t o diferente. Recentemente, ele e
des dos educadores. A maioria dos trabalhos
seus colegas c o n c l u í r a m u m a pesquisa longi-
era escrita por a c a d é m i c o s para serem lidos
tudinal de sete anos para estudar os registros
por a c a d é m i c o s . "
digitais sobre c o m o milhares de estudantes do
Muitos pesquisadores discordam dessa
e n s i n o f u n d a m e n t a l II u s a r a m u m programa
avaliação dura, m a s a crítica forçou a c o m u -
de tutoria e m m a t e m á t i c a pela internet de-
nidade a examinar e explicar seus métodos e
nominado A S S I S T m e n t s . O s pesquisadores
m i s s ã o . Nos primeiros anos do IES, Whitehurst
rastrearam se os alunos entraram na faculdade
e outros frequentemente comparavam a ciência
e, se o f i z e r a m , para que tipo de faculdade e m
da educação c o m os estudos sobre drogas,
t e r m o s de exigência e e m qual graduação para
que indicavam que pessoas que estudam as
verificar se p o d e r i a m fazer conexões entre o
escolas deveriam testar currículos ou práticas
uso do software e as conquistas a c a d é m i c a s
pedagógicas da m e s m a forma que u m pesqui-
posteriores.
sador farmacêutico testaria u m novo fármaco.
" O Big Data nos permite observar durante p e r í o d o s l o n g o s e olhar detalhes m u i t o p r e c i s o s " , a f i r m a Baker. Ele e s e u s colegas
Estratégias e currículos que passassem no teste iriam para o What Works
Clearinghouse.
John Easton, atual diretor do IES eex-pesqui-
e s t a v a m e s p e c i a l m e n t e interessados e m ver
sador educacional na Universidade de Chicago,
o que a c o n t e c i a c o m a l u n o s que e s t a v a m
acredita que o Clearinghouse é especialmente útil
" b u r l a n d o " o s i s t e m a - tentando passar por
como forma de o governo vetar produtos que os
u m conjunto particular de problemas s e m se-
distritos escolares podem se sentir pressionados
guir todos os p a s s o s . Acontece que burlar os
a comprar. "Acho que é u m a fonte muito valiosa
problemas m a i s fáceis não foi tão prejudicial
e confiável a que se pode recorrer e descobrir se
quanto ludibriar nos m a i s difíceis. A l u n o s que
há alguma evidência de que esse produto comer-
resolveram as questões m a i s fáceis poderiam
cial funciona", declara. O Clearinghouse
s i m p l e s m e n t e estar entediados, enquanto os
abriga m a i s de 500 relatórios que r e s u m e m
que trapacearam nas realmente c o m p l i c a d a s
descobertas atuais sobre temas c o m o o ensino
podem não ter entendido o material. Baker
de matemática para crianças pequenas, a escrita
acredita que esse tipo de informação talvez aju-
no ensino fundamental e auxílio a alunos no
agora
de professores e orientadores a descobrir não
processo de candidatura à faculdade. T a m b é m
só quais a l u n o s correm risco de ter problemas
revisou centenas de milhares de relatórios para
a c a d é m i c o s , m a s t a m b é m por que eles estão
auxiliar no discernimento entre a pesquisa de
e m risco e o que pode ser feito para ajudá-los.
melhor qualidade e o trabalho mais fraco, inmarço 2016 • mentecérebro 29
capa Pais p o d e m não gostar d e ver seus filhos enfrentando problemas na escola, mas cientista garante que há níveis d e frustração e d e fracasso que s ã o muito produtivos e favorecem o aprendizado
clusive estudos sobre temas
l o n g a s t r a j e t ó r i a s de t r a b a l h o " , c o n s i d e r a
c o m o a eficácia das escolas
Joan Ferrini-Mundy, diretora adjunta da Direc-
conveniadas e pagamento
torate for E d u c a t i o n and H u m a n R e s o u r c e s .
por mérito para professo-
" É m u i t o i m p r o v á v e l que u m único estudo,
res, que informavam sobre
em período curto, produza impacto." Há
o debate e m c u r s o sobre
t a m b é m u m a barreira de longa data entre
essas questões.
o laboratório e a s a l a de a u l a . No p a s s a d o ,
Segundo Whitehurst, uma das
m u i t o s p e s q u i s a d o r e s s e n t i a m que não era
contribuições
s u a f u n ç ã o e n c o n t r a r a p l i c a ç õ e s para seu tra-
m a i s importantes da ênfa-
balho no m u n d o real. E e d u c a d o r e s , na maior
se na ciência rigorosa foi
parte d a s v e z e s , a c r e d i t a m que a experiência
u m a m u d a n ç a drástica na
a c u m u l a d a na sala de aula superava qualquer
d e f i n i ç ã o de u m profes-
coisa que p e s q u i s a d o r e s poderiam lhes dizer.
sor de alta qualidade. No
O What Works Clearinghouse
deveria ajudar
p a s s a d o , a qualidade era
a cobrir e s s a l a c u n a , m a s e m 2010 o General
definida pelas credenciais, c o m o u m d i p l o m a
Accountability O f f i c e ( G A O ) constatou que
ou certificação específica. "Agora, trata-se de
apenas 4 2 % dos distritos escolares pesquisa-
eficácia na sala de aula, medida por observa-
dos t i n h a m ouvido falar dele. O levantamento
ções e pela capacidade de u m professor me-
do G A O verificou t a m b é m que apenas 3 4 %
lhorar os resultados das avaliações", a f i r m a .
dos distritos a c e s s a r a m o site do Clearinghouse
E m b o r a ainda haja controvérsia significativa
pelo m e n o s u m a vez e que m e n o s ainda o
sobre c o m o m e n s u r a r a eficácia de u m pro-
utilizava c o m f r e q u ê n c i a . U m relatório atu-
fessor, W h i t e h u r s t acredita que a m u d a n ç a na
alizado e m d e z e m b r o de 2013 mostrou que
abordagem foi impulsionada pela comunidade
a disseminação permanecia problemática.
de p e s q u i s a , especialmente por e c o n o m i s t a s .
Easton e outros reconhecem a necessidade de
Muitos pesquisadores se queixam de que a
u m melhor d i r e c i o n a m e n t o para as escolas.
ênfase do IES e m estudos controlados rando-
C o m o parte da s o l u ç ã o , o Clearinghouse
m i z a d o s ignorou outras metodologias poten-
publicou 18 "guias práticos", que estabelecem
já
cialmente úteis. Estudos de caso de distritos
o que se sabe sobre t e m a s c o m o ensinar in-
e s c o l a r e s , por exemplo, poderiam descrever
glês ou m a t e m á t i c a para crianças pequenas.
práticas de aprendizado em ação da m e s m a for-
Cada u m é c o m p i l a d o por u m a c o m i s s ã o que
m a c o m o escolas de administração empregam
reúne p e s q u i s a d o r e s , professores e adminis-
estudos de caso de empresas. " O quadro atual
tradores escolares. " O s guias de boas práticas
é realmente u m ecossistema de metodologias,
t a m b é m p o d e m orientar pesquisas f u t u r a s " ,
o que faz sentido, porque a educação é u m
afirma a professora de psicologia Sharon Car-
f e n ó m e n o c o m p l e x o " , afirma o professor de
ver, m e m b r o do c o m i t é de matemática para
psicologia da educação Anthony Kelly, da Uni-
principiantes e diretora da Carnegie Mellon's
versidade George M a s o n . Para Easton, porém,
Children's S c h o o l . Ela pede a seus alunos de
estudos controlados randomizados t o m a m
pós-graduação que leiam os guias relaciona-
parte i m p o r t a n t e n e s s e p r o c e s s o , m a s não
dos c o m seu c a m p o e b u s q u e m áreas que
necessariamente c o m o "evento culminante".
precisam de m a i s exploração.
Para ele, os estudos t a m b é m podem ser úteis
Cada pergunta da pesquisa é uma tentativa
no início do processo de desenvolvimento de
de encaixar mais u m a peça de u m enorme que-
u m a intervenção educativa para ver se algo está
bra-cabeça. " N ã o acho que seja possível olhar
funcionando e se vale a pena investigar mais.
para a educação pensando simplesmente se ela funciona ou não, c o m o se fosse u m a lâmpada",
30
NO MUNDO REAL
ressalta Joseph Merlino, presidente da 21st
Conseguir e s s a nova ciência e m escolas ainda
Century Partnership for S T E M Education, u m a
é um desafio. " O problema com a pesquisa
organização s e m fins lucrativos dos subúrbios
e m e d u c a ç ã o , c o m o e m m u i t o s outros c a m -
da Filadélfia. " N ã o acredito que o conhecimento
p o s , é que ela n o r m a l m e n t e se t r a d u z e m
h u m a n o seja a s s i m . . . E m u m a era m e c â n i c a ,
estamos acostumados a pensarjnas coisas m e c a n i c a m e n t e . Será que funciona? Você pode consertar? N ã o acredito que se possa corrigir a
Primeiro a prática
educação m a i s do que u m pé de tomate. Você o cultiva. Você o nutre. E ele dá frutos."
Estudo publicado on-line,
A organização de Merlino administrou u m
na revista Proceedings of
estudo controlado randomizado de cinco anos
the National Academy of
financiado pelo I ES sobre a eficácia da aplicação
Sciences USA, revela que
dos quatro princípios da ciência cognitiva para
estudantes de ciências ma-
o ensino de ciências no ensino fundamental
triculados e m aulas exposi-
II. A t r i b u í r a m aleatoriamente currículos mo-
tivas tradicionais eram mais
dificados ou não a u m total de 180 escolas na
propensos à reprovação
Cada linha representa a comparação e m u m único e s t u d o (67 e s t u d o s n o total) 59 e s t u d o s t i v e r a m í n d i c e s de reprovação mais baixos e m situações de a p r e n d i z a g e m a t i v a (laranja)
Pensilvânia e no A r i z o n a . U m a parte do expe-
que os colegas que usavam
rimento foi baseada e m pesquisa de ciência
técnicas de aprendizagem
cognitiva sobre c o m o as pessoas a p r e n d e m
ativa, c o m resolução de pro-
por d i a g r a m a s . P e s q u i s a d o r e s d e s c o b r i r a m
blemas e m grupo e feedback
que a l g u m a s das coisas que artistas gráficos
regular do instrutor
c o l o c a m e m u m diagrama para incrementá-lo, c o m o muitas cores, na verdade distraem o aprendizado. Verificaram ainda que estudantes precisam de instruções para ler diagramas. Esse é o tipo de resultado que poderia ser integrado no projeto de adoção de u m novo livro. O s professores t a m b é m poderiam ter tempo para
Aula expositiva
Aprendizagem ativa
explicar o significado de símbolos diferentes e m u m d i a g r a m a , c o m o setas ou cortes. Fazer de educadores u m a parte importante
c a c i o n a i s , as m e t o d o l o g i a s de p e s q u i s a e a
do processo de pesquisa t a m b é m gera resulta-
prática s ã o partes i m p o r t a n t e s da f o r m a ç ã o
dos significativos e m sala de aula. Professores
de p r o f e s s o r e s , s e g u n d o Pasi S a h l b e r g , que
m u i t a s v e z e s s e n t e m que a experiência que
e m 2 0 1 1 e s c r e v e u Finnish
adquiriram c o m a prática é ignorada e que e m
de c o m o o país r e c o n s t r u i u s e u s i s t e m a de
lessons,
u m relato
vez disso obtêm u m novo currículo, suposta-
e n s i n o e s u b i u para o t o p o do r a n k i n g inter-
mente baseado e m evidências periódicas, s e m
n a c i o n a l de m a t e m á t i c a e a l f a b e t i z a ç ã o . De
muita explicação de por que o novo é muito
certa f o r m a , a c o m p a r a ç ã o c o m as e s c o l a s
melhor que o antigo. No passado, pesquisa-
a m e r i c a n a s é i n j u s t a porque a F i n l â n d i a é
dores geralmente não sentiram que era seu
u m país m a i s h o m o g é n e o , m a s N o r a acre-
papel explicar seu trabalho a professores. O
dita que o t r e i n a m e n t o de p r o f e s s o r e s de
c o m p a r t i l h a m e n t o de conhecimento, p o r é m ,
o u t r o s p a í s e s d e v a i n c l u i r os m a i s recentes
PARA SABER MAIS
tem dois lados. No estudo sobre o currículo de
d e s e n v o l v i m e n t o s da c i ê n c i a c o g n i t i v a . E m
Active learning increases s t u d e n t p e r f o r m a n c e in science, engineering and m a t h . S c o t t F r e e m a n et al., e m Proceedings ofthe National Academy of Sciences USA. P u b l i c a d o on-line e m 12 de m a i o de 2 0 1 4 .
ciências na Pensilvânia e no Arizona, professo-
m u i t o s p r o g r a m a s de f o r m a ç ã o de profes-
res foram envolvidos na concepção inicial dos
sores, alunos "aprendem uma
experimentos. "Eles e r a m mais c o m o mestres,
que está não apenas dez, m a s 40 anos
ensinavam e nos deram retorno; c o m o o estudo
a t r a s a d a " , d i z . E s s a f o r m a ç ã o b á s i c a pode
foi realizado e m escolas de verdade, e m vez de
ajudar p r o f e s s o r e s a avaliar a i m p o r t â n c i a de
laboratório, pesquisadores treinaram os profes-
n o v a s p e s q u i s a s e e n c o n t r a r f o r m a s de in-
sores enquanto o trabalho prosseguia", comen-
c o r p o r á - l a s nas s a l a s de a u l a . " N ã o se pode
psicologia
ta Nora Newcombe, professora de psicologia da
r e a l m e n t e e s c r e v e r u m roteiro para t u d o que
Universidade Temple e principal pesquisadora
a c o n t e c e na s a l a de a u l a " , d e c l a r a e l a . " S e
do Spatial Intelligence and Learning Center.
tiver a l g u n s p r i n c í p i o s e m s u a m e n t e para o
O u t r o s p e s q u i s a d o r e s a p o n t a m para o m o d e l o d a F i n l â n d i a , onde as t e o r i a s e d u -
que v o c ê faz n e s s e s m o m e n t o s a l e a t ó r i o s , poderá e x e c u t a r u m t r a b a l h o m e l h o r . "
®
Visual environment, attention allocation, and l e a r n i n g in y o u n g c h i l d r e n : w h e n too m u c h o f a good t h i n g m a y be b a d . A n n a V. F i s h e r et ai, e m Psychological Science. P u b l i c a d o on-line e m 21 de m a i o de 2014.
março 2016 • mentecérebro
31
desenvolvimento infantil
Pais exigentes demais,
filhos ansiosos CRIAÇÃO
EXCESSIVAMENTE
RÍGIDA
SOFRAM
PROFUNDAMENTE
DIANTE
POR O U T R O
PODE COLABORAR
DO M Í N I M O SINAL DE
LADO, O INCENTIVO CONSTANTE
E AS
por Morgen E. Peck,
O GRANDE
DESAFIO
É FUGIR
CRIANÇAS
FRACASSO;
GRATIFICAÇÕES
FORA DE H O R A C O S T U M A M T R A Z E R AOS P E Q U E N O S PARA SE R E L A C I O N A R .
PARA Q U E
DIFICULDADES DE
EXAGEROS
jornalista
N
uma época e m que se acredita que a fórmula
seus acertos; não devem elogiar os filhos e m público. Além
para o sucesso esteja bastante ligada ao histórico
disso, os pequenos não devem ter espaço para escolher as
de cada u m (por exemplo: ter u m a carreira pro-
próprias atividades e qualquer nota abaixo de 10 é conside-
missora requer ter frequentado u m a faculdade
rada desprezível.
renomada, que, por sua vez, exige ter tido bom desempenho
U m a pesquisa publicada no periódico científico Asian
no ensino médio e, e m muitos c a s o s , até na pré-escola),
American Journal ofPhysiology
grande parte da responsabilidade sobre o sucesso c o s t u m a
método contribui para o bem-estar e o sucesso das crianças
se propôs a medir o quanto o
recair sobre os pais, que, n e s s a perspectiva, " d e v e r i a m "
na escola. Segundo a coordenadora do estudo, a psicóloga
pressionar os pequenos cada vez m a i s . E, de fato, e m nome
Su Yeong K i m , doutora e m desenvolvimento humano,
de u m futuro promissor, as exigências e m relação aos filhos
professora da Universidade do Texas, a inflexibilidade dos
muitas vezes não são poucas. Afinal, será que devemos
adultos não traz, necessariamente, melhorias no rendimen-
incentivá-los com elogios ou abraçar a estratégia "mãe-tigre",
to académico e ainda pode provocar depressão infantil. A
c o m críticas e punições? A expressão se tornou conhecida
pesquisadora trabalhou c o m informações de 444 famílias
no Brasil, entre educadores, quando a sino-americana A m y
que m o r a v a m nos Estados Unidos e pelo m e n o s u m dos
C h u a lançou o livro Grito de guerra da mãe-tigre (Intrínseca,
pais era de origem asiática. O objetivo era traçar o perfil de
2011), onde apresenta seu rígido método de educação. Se-
educação adotado por essas famílias e entender os efeitos
gundo o modelo que a autora usou c o m suas duas filhas, os
que isso tinha sobre os filhos adolescentes. A s famílias
pais devem focar a atenção nos erros da criança e j a m a i s e m
foram a c o m p a n h a d a s durante oito anos e periodicamente
32
março 2016 • mentecérebro 33
desenvolvimento infantil
Excesso de elogios pode ser prejudicial U m a regra que c o s t u m a valer na
e de i n t e n s o s s e n t i m e n t o s de
maioria absoluta d o s c a s o s : pais
superioridade (que c o s t u m a m
e m ã e s d e s e j a m que s e u s filhos
esconder a insegurança, o medo
t í f i c o Proceedings
sejam p e s s o a s felizes e realiza-
da inferioridade e da rejeição).
Academy
d a s - o que m u d a é a ideia que
D u a s e s c o l a s de p e n s a m e n t o
of the
of Sciences
National
(PNAS)
que
f i l h o s de p a i s q u e e l o g i a m ex-
cada u m t e m d e s s e s c o n c e i t o s .
de l i n h a s f i l o s ó f i c a s q u a s e o p o s -
Muitas v e z e s , na â n s i a de de-
tas a b o r d a r a m c o m o a a u t o e s -
s o s a a c u m u l a r p o n t u a ç ã o alta
m o n s t r a r a m o r pelos p e q u e n o s e
t i m a se d e s e n v o l v e . A p r i m e i r a
em autoestima, mostravam-se
c e s s i v a m e n t e não eram propen-
até de c o m p e n s a r a falta de aten-
atribui e g o c e n t r i s m o e x t r e m o
e m geral p o u c o t o l e r a n t e s c o n -
ção e c a r i n h o recebidos na pró-
à falta de afeto d a s f i g u r a s pa-
s i g o m e s m o s e c o m os o u t r o s e
pria infância, os a d u l t o s exage-
rentais; a outra remete a mães
a n s i o s o s por f a z e r valer a pró-
ram nas d e m o n s t r a ç õ e s de afeto
e pais que c o l o c a m s e u s f i l h o s
pria v o n t a d e . " E s s a c o r r e l a ç ã o
e nos i n c e n t i v o s , o que pode ser
e m u m pedestal, cobrindo-os
s u g e r e q u e u m e l o g i o deve ser
p é s s i m o para o d e s e n v o l v i m e n t o
de elogios e l o u v o r e s . A o longo
associado a bom comportamen-
das c r i a n ç a s . E s s a foi a c o n c l u -
de 18 m e s e s , 565 c r i a n ç a s c o m
to e m u m a c r i a n ç a , e não ser
são a que c h e g a r a m p s i c ó l o g o s
i d a d e s de 7 a 11 a n o s f o r a m
oferecido indiscriminadamente,
das u n i v e r s i d a d e s de A m s t e r d ã
s u b m e t i d a s a m ú l t i p l o s questio-
de f o r m a i n d e p e n d e n t e do que
e de Utrecht, na H o l a n d a , a p ó s
n á r i o s d e s t i n a d o s a avaliar s u a
ela f a ç a " , a v a l i a o p s i c ó l o g o
realizarem o p r i m e i r o e s t u d o
autoestima, levando em conta
L u c a s H y d e , d a U n i v e r s i d a d e de
longitudinal c o m c r i a n ç a s sobre
a relação familiar. O s pais t a m -
M i c h i g a n , que não participou
as origens da d i f i c u l d a d e de acei-
bém preencheram questionários
do t r a b a l h o . " E m 2 0 0 8 , u m a
tar a f r u s t r a ç ã o , falta de e m p a t i a
sobre a e d u c a ç ã o dos f i l h o s .
m e t a - a n á l i s e de 85 e s t u d o s
respondiam a u m a bateria de perguntas, além
têm maior tendência a desenvolver ansiedade e
de informar dados sobre o desenvolvimento
que esse quadro pode persistir na idade adulta.
e rendimento escolar dos filhos. Apesar de o
O s p e s q u i s a d o r e s c o l e t a r a m m e m ó r i a s da
estudo ter c o m e ç a d o antes do lançamento do
infância de mais de 4 mil h o m e n s e mulheres
livro de A m y C h u a , no momento de analisar
de d i v e r s a s idades e c o r r e l a c i o n a r a m s u a s
os dados a equipe de pesquisadores dividiu os
lembranças c o m a qualidade de sua saúde men-
pais e m quatro tipos principais: apoiador, tigre,
tal, c o m base no que os próprios voluntários
autoritário e descontraído.
consideravam saudável ou não. O s resultados
Crianças expostas a críticas muito duras aprendem a interiorizar os comentários negativos dos pais, a ponto de se tornarem excessivamente estressadas e exigentes consigo mesmas 34
O s pesquisadores holandes e s r e l a t a r a m no p e r i ó d i c o c i e n -
O s cientistas consta-
indicam claramente que crianças com pais au-
t a r a m que a m a i o r i a d a s
toritários podem ter maior dificuldade de lidar
f a m í l i a s a d o t a v a o estilo
c o m as adversidades quando crescem.
apoiador (ou democrático),
" D o ponto de vista neurológico, uma criação
associado c o m os melhores
punitiva pode provocar efeitos poderosos e per-
índices de desenvolvimento
sistentes porque treina o cérebro a enfatizar ex-
das crianças. Já os filhos de
cessivamente os erros", afirma o psicólogo Greg
"pais-tigre" tinham médias
Hajcak Proudfit, da Universidade Stony Brook,
mais baixas na escola, mais
e m Nova York. Q u a n d o cometemos deslizes, o
sintomas depressivos e
córtex pré-frontal medial (logo atrás do centro
menor grau de responsabi-
da testa) produz u m padrão elétrico previsível,
lização social.
que pesquisadores c h a m a m de negatividade
recentemente,
relacionada ao erro ( N R E ) . O s cientistas acre-
outro estudo sugeriu que
Mais
ditam que esse mecanismo cerebral nos ajuda
filhos de pais muito rígidos
a "voltar para os trilhos" para não cometermos
m o s t r o u que a atitude egocen rada parece e s t a r e m a s c e n s ã o e n t r e jovei
a d u l t o s no
O c i d e n t e , o q u e p o d e r i a resul
r, e m p a r t e ,
da ê n f a s e c u l t u r a l e m e l o g i o s
o m o obje-
tivo de r e f o r ç a r u m a e l e v a d a ;
toestima",
sugere Eddie B r u m m e l m a n , p incipal autor do a r t i g o no
PNAS.
S e g u n d o ele, v i v e m o s sob a eégide "elogioc ê n t r i c a " , o que pode ser muitc prejudicial - não s ó para os i n d i v í d u o s , já
ue b u s c a r
c o n s t a n t e m e n t e o reconhecime nto externo é e s t r e s s a n t e e predispõe as pes o a s a q u a d r o s de d e p r e s s ã o e a n s i e d a d e , mas t a m b é m para a s o c i e d a d e de f o r m a geral. "'Ai r d a que bem- i n t e n c i o n a d o s , os elogios feitc
indiscrimina-
d a m e n t e , a t o d o m o m e n t o , po e m f u n c i o n a r c o m o u m tiro que sai pela culat ra; para s e r e m c o n s t r u t i v o s é preciso que sej a m a d e q u a d o s e e s t e j a m de fato a serviço da j d u c a ç ã o da c r i a n ç a e não d a s c a r ê n c i a s e i s e g u r a n ç a s dos p a i s " , alerta. (Por Andrea Afóano,
jornalista)
falhas ainda maiores. Evidências sugerem que a
apontaram u m grupo específico de pais: alta-
genética ajuda a explicar algumas variações na
mente controladores e pouco afetivos, c o m u m
intensidade do N R E de uma pessoa para outra,
estilo crítico e hostil.
mas o trabalho de Proudfit indica que a exposição
Tanto o autorrelato c o m o a observação de
a duras críticas t a m b é m tem papel importante.
u m a educação marcada pela censura e agressi-
O psicólogo e sua equipe mediram a negati-
vidade ajudaram a prever maior N R E três anos
vidade relacionada ao erro de aproximadamente
mais tarde. Além disso, os filhos de genitores
300 crianças de 3 anos e, novamente, aos 6,
muito punitivos que apresentavam mais nega-
enquanto m o n t a v a m quebra-cabeças na c o m -
tividade relacionada ao erro se mostraram mais
panhia do casal parental. A s interações que os
propensos a demonstrar sinais de transtornos
cientistas observaram variavam bastante n u m a
de ansiedade na segunda visita.
PARA SABER MAIS
escala que a maioria de nós consideraria ade-
Segundo o psicólogo, crianças expostas a
quada, ou seja, os pais não foram abusivos. Eles
críticas muito duras aprendem a interiorizar os
foram classificados de acordo c o m o grau de
comentários negativos dos pais até o ponto e m
controle que exerciam (por exemplo, se interfe-
que a N R E , u m sinal conveniente de cuidado,
riam imediatamente quando a criança falhava)
se torna u m gatilho de estresse. " É claro que
e a qualidade do afeto que d e m o n s t r a v a m na
t o d o s c o m e t e m o s e r r o s , é até s a u d á v e l ter
hora de fazer algum comentário.
algum s e n s o crítico e m relação a eles; m a s ,
Proudfit t a m b é m solicitou] aos genitores que d e s c r e v e s s e m s u a s estratégias
para
se a pessoa c o s t u m a ser excessivamente dura consigo m e s m a , independentemente da idade,
abordar os filhos, se eram mais propensos a
pode estar no c a m i n h o de desenvolver u m
oferecer incentivo quando cometiam deslizes
transtorno de ansiedade e m algum m o m e n t o
ou desaprová-los d u r a m e n t e . O s resultados
da v i d a " , alerta Proudfit.
C r i a n ç a s felizes. D u e t t o . B i b l i o t e c a M e n t e e Cérebro. 2013. O grito de guerra da mãe tigre. A m y C h u a . I n t r í n s e ca, 2011 Transtorno da ansiedade na infância. R o n a l d M. Rapee, Susan H. Spence, Vanessa Cobham, Ann Wignall. M.Books, 2010. O tormento da ansiedade. Robert. Leahy. M e n t e e C é r e b r o n.° 2 1 9 . p á g s . 2433. Abril, 2 0 1 1 .
março 2016 • mentecérebro 35
comportamento animal
Por que os cães gostam tanto de nós? A RESPOSTA P O D E ESTAR, PELO M E N O S EM
PARTE,
EM MECANISMOS GENÉTICOS E CELULARES
DESSES
ANIMAIS E TAMBÉM
NA OXITOCINA, O " H O R M Ô N I O
DO
AMOR",
A S S O C I A D O A PROCESSOS DE INTERAÇÃO SOCIAL E F O R M A Ç Ã O DE V Í N C U L O S
AFETIVOS
por Julie Hecht
>ocê se a p r o x i m a e eles a b a n a m o rabo, pedem c a r i n h o , se d e l i c i a m c o m o m e n o r dos afagos. N e m todos são a s s i m ; há os m a i s arredios, m a s grande parte dos peludos de quatro patas adora u m dengo. Alguns c h e g a m a ganir e a chorar e m o c i o n a d o s c o m a a p r o x i m a ç ã o dos d o n o s e, às v e z e s , é t a m a n h a a alegria que até f a z e m xixi ao vê-los a p ó s u m período de s e p a r a ç ã o , ainda que breve. E, para a m a i o r i a dos c ã e s , A AUTORA JULIE H E C H T é doutora em comportamento canino, pesquisadora da Universidade de Nova York.
o m e l h o r lugar do m u n d o parece ser m e s m o ao lado dos " s e u s " h u m a n o s . Q u a l a razão de tanto afeto? A resposta pode estar no cérebro d e s s e s a n i m a i s . U m e s t u d o coord e n a d o pelas p e s q u i s a d o r a s A n n a Kis e M e l i n d a B e n c e ,
comportamento animal Passe algum tempo acariciando s e u bichinho de estimação, afagando s e u c o r p o e orelhas, e vocês dois provavelmente experimentarão u m aumento dos níveis h o r m o n a i s n o sangue, o que trará u m a experiência agradável para a m b o s
do Projeto Cão de F a m í l i a , da U n i v e r s i d a d e Loránd, em
Eõtvõs
Budapeste,
recentemente
publicado
pela PLoS ONE,
empregou
u m m é t o d o inédito para explorar o papel que a oxitocina d e s e m p e n h a na
Será que seu cachorro ama mesmo você? Você a m a seu cão. M a s pense bem... ele real-
sociabilidade canina em
mente sente o m e s m o a seu respeito? Levan-
relação às p e s s o a s .
do e m conta que os cães são altamente sin-
M u i t a s v e z e s , a oxi-
tonizados c o m seres h u m a n o s , um grupo de
tocina é descrita c o m o o
pesquisadores suecos e dinamarqueses sus-
" h o r m ô n i o do a m o r " por
peitou que os a n i m a i s pertencentes a donos
contribuir para proces-
que sentiam ter u m ótimo relacionamento
s o s de i n t e r a ç ã o s o c i a l ,
c o m seus pets t a m b é m e r a m mais próximos
para o alívio do estres-
dos donos - talvez porque a atitude carinhosa
se e o a p a r e c i m e n t o de
dos proprietários levasse a maior frequência
s e n t i m e n t o s de v í n c u l o
de interações positivas entre os dois.
c o m outras pessoas. Passe algum tempo
Para entender m e l h o r e s s a relação entre
acariciando seu cão, afagando seu corpo
espécies, a p e s q u i s a d o r a Therese Rehn,
e o r e l h a s , e v o c ê s d o i s p r o v a v e l m e n t e ex-
da Universidade de C i ê n c i a s Agrícolas da
p e r i m e n t a r ã o u m a u m e n t o d o s n í v e i s de
S u é c i a , selecionou 20 pares de donos e
o x i t o c i n a no s a n g u e , i n d i c a n d o u m a expe-
s e u s cães para participar do estudo, poste-
r i ê n c i a p o s i t i v a , a g r a d á v e l para a m b o s . N o
riormente publicado no periódico científico
e n t a n t o , o f u n c i o n a m e n t o da o x i t o c i n a não
Applied Animal
é tão s i m p l e s , menos ainda " m á g i c o " , c o m o
r e s p o n d e r a m ao questionário Escala Mo-
se pode s u p o r à p r i m e i r a v i s t a . O " h o r m ô n i o
nash de R e l a c i o n a m e n t o Cão-Proprietário
do a m o r " p r o m o v e confiança e generosidade
( M D O R S , na sigla e m inglês), desenvolvido
Behaviour
Science. As pessoas
e m a l g u m a s s i t u a ç õ e s , m a s deflagra inveja
para avaliar a intensidade da convivência
e tendenciosidade em outras,
entre a pessoa e seu bicho de estimação.
podendo
p r o d u z i r efeitos d i v e r s o s e m c a d a p e s s o a .
O M D O R S c o n t é m 28 itens divididos e m
C i e n t i s t a s a c r e d i t a m que parte d e s s e efeito
três escalas s e c u n d á r i a s . A primeira avalia
r e s u l t e do fato de que v a r i a ç õ e s no gene que
a natureza das interações cão-proprietário
c o d i f i c a o receptor de o x i t o c i n a r e s p o n d e m
( " Q u a n t a s vezes você abraça seu c a c h o r r o ? " ,
pelas diferenças em comportamento social. Para investigar se a exuberância afetiva dos
por e x e m p l o ) ; a s e g u n d a reflete a proximidade e m o c i o n a l que o d o n o sente e m relação
cachorros às pessoas e m geral é de alguma for-
ao seu a n i m a l ("Eu gostaria que m e u cão e
m a a s s o c i a d a a seus genes, Kis e seus colegas
eu n u n c a t i v é s s e m o s de estar s e p a r a d o s " ) ; e
s e g u i r a m a seguinte abordagem:
a terceira diz respeito ao investimento percebido necessário para cuidar de u m cachorro
1- p a s s o : C o n h e c e r a m o gene r e c e p t o r de o x i t o c i n a ( O X T R ) do c ã o . P a r a e s s e e s t u d o , os pesquisadores selecionaram
animais
O s a n i m a i s , por s u a vez, foram submetidos a u m a versão modificada do procedi-
de d u a s r a ç a s , p a s t o r e s - a l e m ã e s e b o r d e r
m e n t o A i n s w o r t h de "situação e s t r a n h a " ,
c o l l i e s , e e x t r a í r a m s e u D N A ao
u m experimento projetado originalmente
uma haste especial
passar
(parecida com
um
para medir a intensidade de relacionamen-
c o t o n e t e ) no i n t e r i o r de s u a s b o c h e c h a s .
tos h u m a n o s entre pais e filhos. Ele se cen-
E s s e p r o c e s s o p e r m i t i u a i d e n t i f i c a ç ã o de
tra na situação de u m a c r i a n ç a , o u , no c a s o ,
t r ê s v a r i a ç õ e s do g e n e O X T R q u e v ê m e m
u m c ã o , deixado s o z i n h o c o m u m estranho.
d u a s f o r m a s que a p a r e n t e m e n t e t ê m efeitos
A versão canina c o m e ç a c o m o proprietário
distintos sobre o c o m p o r t a m e n t o . As três 38
( " G a s t o muito dinheiro c o m e l e " ) .
sentado e m u m a cadeira, ignorando o cão. A p ó s alguns m i n u t o s , um estranho entra na sala e, t a m b é m gnorando o c a c h o r r o , fala c o m seu
suas
cachorros foram reunidos c o m seus
condutas e m b u s c a de conforto c o m
donos após ficarem sozinhos, aque-
tativas de investigar a conexão entre a percepção canina de s e u s v í n c u l o s
seus c o m p o r t a m e n t o s exploratórios
les cujos proprietários relataram ter
c o m seus donos e as percepções que
m a i s independentes, pesquisadores
muitas interações c o m os animais
proprietários t ê m dos v í n c u l o s c o m
p o d e m determinar se eles têm DU
procuraram essas aproximações mais
seus cachorros. " N ã o houve corre-
não laços e m o c i o n a i s seguros i :om
afoitamente, o que pode parecer u m
lação entre a escala s e c u n d á r i a de
seus pais. Crianças que sentem u m
vínculo forte, m a s t a m b é m poderia
'proximidade e m o c i o n a l percebida'
apego m a i s firme são mais propen-
ter sido u m reflexo de recompensas
no questionário M D O R S e o c o m -
sas a buscar proximidade c o m la mãe
recebidas por buscar o contato físico.
portamento dos cães na situação
ou o pai q u a n d o estão estressa das,
E, ao contrário de crianças c o m apego
estranha, a s s i m c o m o não constata-
m a s t a m b é m t e n d e m a brincar de
seguro, os cães desses proprietários
m o s n e n h u m a evidência para apoiar
f o r m a independente a s s i m que se
se m o s t r a r a m menos propensos que
a noção de que, s ó porque u m a pes-
s e n t e m novamente confortáve s.
outros a brincar de modo indepen-
soa t e m forte ligação e m o c i o n a l c o m
dente na situação estranha. D e s s a
seu cão, e s s e a n i m a l está apegado a
no teste, cães cujos proprietários per-
f o r m a , eles pareceram crianças c o m
e l a . " O u seja: é possível que, diante
cebiam o relacionamento c o m seus
apego inseguro. Mas cães não são
da d e m a n d a h u m a n a de amor, o
pets c o m o intenso se comport iriam
crianças e, c o m o tal, não exibiram
cão se sinta " c o n v i d a d o " a a m a r
de maneira semelhante à de cr an-
a ansiedade de crianças c o m apego
de volta - ainda que e s s a não fosse
cas c o m vínculos emocionais fortes
inseguro; portanto, essa última cons-
sua primeira e s c o l h a . (Porjason
C.
c o m figuras parentais. E m vez d i s s o ,
tatação é difícil de interpretar.
Goldman, jornalista
em
O s pesquisadores previram que,
porém, eles só encontraram duas correlações significativas. Q u a n d o
A importância d e s s e estudo está e m m a r c a r u m a das primeiras ten-
especializado
divulgação científica e em ciências
especialização
cognitivas)
março 2016 • mentecérebro 39
comportamento animal
Exames de neuroimagem revelam o que eles pensam ponder a s i n a i s - m ã o e s q u e r d a a p o n t a n d o para baixo signific a v a receber u m a r e c o m p e n s a ; a m b a s as m ã o s d i r e c i o n a d a s para a h o r i z o n t a l i n d i c a v a m t r a t a m e n t o n e u t r o . Berns e s u a e q u i p e d e s c o b r i r a m que, no m o m e n t o e m que os c a c h o r r o s v i s u a l i z a v a m o sinal de grat i f i c a ç ã o , a região do núcleo caudado (associada a recompensas em seres humanos) mostrava atividade. A m e s m a área n ã o m o s t r o u alterações q u a n d o o s c ã e s não v i a m o s i n a l do t r a t a m e n t o e s p e c i a l . " Q u a n d o o b s e r v a m o s os p r i m e i r o s resultados, notamos A q u e l a c a r i n h a e x p r e s s i v a e u m par de
que as i m a g e n s e r a m diferentes de qualquer
o l h i n h o s que p a r e c e m s e m p r e querer di-
outra obtida e m e s t u d o s anteriores. Nin-
z e r algo f a z e m c o m que d o n o s de cães se
g u é m , até onde s a b e m o s , já havia capturado
p e r g u n t e m o que seu bicho de e s t i m a ç ã o
fotos do cérebro de u m c a c h o r r o que não
" i m a g i n a " q u a n d o e s c u t a s u a v o z , ou que
estivesse s e d a d o " , diz B e r n s . O s resultados
e s t á " f a l a n d o " ao inclinar a c a b e ç a . A g o r a ,
i n d i c a m t a m b é m que os bichos prestam
cientistas interessados em compreender
m u i t a atenção aos s i n a i s h u m a n o s . O s pes-
a relação entre o h o m e m e e s s e s a n i m a i s
q u i s a d o r e s a c r e d i t a m que a descoberta abre
p a r t e m da perspectiva dos c a c h o r r o s para
portas para futuros e s t u d o s sobre a cogni-
t e n t a r d e s c o b r i r o que se p a s s a na cabeça
ção c a n i n a e r e s p o n d e a perguntas sobre a
de n o s s o s a m i g o s cães utilizando t é c n i c a s
profunda ligação afetiva dos seres h u m a n o s
de e s c a n e a m e n t o cerebral.
c o m os c ã e s . O u t r o objetivo do estudo é
C o n s i d e r a n d o que o a d e s t r a m e n t o
c o m p r e e n d e r c o m o os a n i m a i s p r o c e s s a m a
d e s s e s a n i m a i s pelo exército para d e s e m -
linguagem e de que m a n e i r a as expressões
p e n h a r f u n ç õ e s c o m p l e x a s c o m o saltar de
faciais são representadas e m s u a mente. O
h e l i c ó p t e r o s e aviões é u m a prática c o m u m ,
a m o r por e s s a s criaturas de quatro patas
o n e u r o c i e n t i s t a Gregory B e r n s , do Centro
t e m raízes profundas nos primórdios da
de N e u r o p o l í t i c a da U n i v e r s i d a d e Emory,
evolução h u m a n a , e B e r n s acredita que isso
i m a g i n o u que não seria difícil treinar e s s e s
pode ter m o l d a d o c o m o os n o s s o s ances-
a n i m a i s para entrar a c o r d a d o s e m u m tubo
trais d e s e n v o l v e r a m a linguagem e outras
de r e s s o n â n c i a m a g n é t i c a para que pesqui-
f e r r a m e n t a s da civilização. " O cérebro do
s a d o r e s t e n t a s s e m d e s c o b r i r o que pensa-
cão revela algo especial sobre c o m o h o m e n s
v a m . B e r n s e s e u s colegas e n s i n a r a m dois
e a n i m a i s se r e u n i r a m , e a história evolutiva
cães a ficar c o m p l e t a m e n t e i m ó v e i s dentro
entre a m b a s as espécies pode fornecer u m
do a p a r e l h o : Callie, u m a fox terrier de 2
espelho único da mente h u m a n a " , a r g u m e n -
a n o s , e M c K e n z i e , u m border collie de 3. O s
ta o neurocientista. O artigo sobre o e s t u d o
c i e n t i s t a s os t r e i n a r a m t a m b é m para res-
foi divulgado na PLoS
ONE.
ESTUDO FEITO C O M C Ã E S d a s raças pastor-alemão e border collies i n d i c a r a m que a sociabilidade c a n i n a c o m h u m a n o s está relacionada a variações do gene O X T R , e m b o r a a oxitocina seja parte importante desse processo
variações, ou "polimorfismos'!, têm n o m e s
c o m o os border collies portadores do alelo
" i n c r i v e l m e n t e f á c e i s " de l e m b r a r : - 2 1 2 A G ,
( u m a f o r m a v a r i a n t e de u m m e s m o gene)
19131AG e rs8679684.
conhecido como G demonstraram
menos
interesse e m estar ao redor de pessoas que os 2 passo: E s t u d a r a m c o m o cães das raças es-
portadores do alelo A, sugerindo que o efeito
colhidas interagem c o m pessoas. Mais de 200
era o m e s m o nas duas raças.
o
pastores-alemães e border collies que vivem
No entanto, as análises dos genes 19131AG
c o m o a n i m a i s de c o m p a n h i a participaram de
e r s 8 6 7 9 6 8 4 revelaram t e n d ê n c i a s o p o s t a s
u m a série de interações específicas c o m huma-
nas d u a s raças. No p o l i m o r f i s m o 19131 A G ,
nos. O s testes e x a m i n a r a m c o m o os cachorros
por e x e m p l o , os p e s q u i s a d o r e s
c u m p r i m e n t a v a m pessoas conhecidas e desco-
que "a presença do alelo A, e m vez do alelo
nhecidas, c o m o respondiam a u m estranho que
G , foi associada a pontuações m a i s altas de
se aproximava de maneira ameaçadora e c o m o
s i m p a t i a e afabilidade e m pastores-alemães
reagiam q u a n d o s e u s d o n o s se e s c o n d i a m
e pontuações m a i s baixas e m border collies".
atrás de u m a árvore de grande porte.
E s s e efeito contrário sugere que outros me-
relataram
c a n i s m o s genéticos e celulares (inexplorados 3 passo: A s s o c i a r a m simultaneamente genes o
nesse estudo) talvez d e s e m p e n h e m u m papei
e c o m p o r t a m e n t o s caninos. O s pesquisadores
na regulagem desse c o m p o r t a m e n t o , além do
avaliaram se havia relação entre os polimorfis-
gene estudado.
m o s O X T R e o m o d o c o m o os cães interagiam
E m t e r m o s gerais, a p e s q u i s a indica que
c o m h u m a n o s durante os testes sociais, m a s
a sociabilidade c a n i n a e m relação a p e s s o a s
estavam particularmente interessados em
está relacionada às variedades no gene O X T R ,
verificar c o m que rapidez ou d i s p o s i ç ã o os
m a s que a oxitocina é "parte de u m s i s t e m a
a n i m a i s se a p r o x i m a v a m das p e s s o a s , bem
m a i o r " que contribui para o que os cães sen-
c o m o seus níveis de afabilidade.
t e m por h u m a n o s .
" O m o d o c o m o cães se c o m p o r t a m e m
O próximo passo n e s s a linha de pesquisa
relação a h u m a n o s , pelo m e n o s os pastores
é a replicação e exploração de possíveis inte-
alemães e border collies, é influenciado pelo
rações moleculares responsáveis pelos efeitos
gene receptor de oxitocina", concluiu a pes-
que v a r i a n t e s e s p e c í f i c a s de receptores de
q u i s a d o r a . Q u a n d o se tratava, por exemplo,
oxitocina t ê m sobre o c o m p o r t a m e n t o de cães
do gene - 2 1 2 A G , tanto os pastores-alemães
e m relação a p e s s o a s .
PARA SABER MAIS G e n o m e s e q u e n c i n g highlights the dynamic early history o f dogs. A d a m H . F r e e d m a n et al. e m PLOS Genetics, v o l . 10, n° 1; 16 de j a n e i r o de 2 0 1 4 . Rethinking dog domestication by integrating genetics, archeology, and biogeography. G r e g e r Lars o n et al. e m Proceedings of the National Academy of Sciences USA, v o l . 109, n° 2 3 , p á g s . 8 8 7 8 - 8 8 8 3 ; 5 de j u n h o de 2 0 1 2 . Palaeolithic dog skulls at the Gravettian Pfedmostí site, the C z e c h Republic. Mietje G e r m o n p r é et al. e m Journal of Archaeological Science, v o l . 39, n° 1, p á g s . 1 8 4 - 2 0 2 ; j a n e i r o de 2 0 1 2 . Cão s e n s o : c o m o a nova ciência do comportamento canino pode fazer de você um verdadeiro amigo do seu cachorro. J o h n Bradshaw. Record, 2012. O grande livro dos retratos de a n i m a i s . Svjetlan Junakovic. Positivo, 2010
® março 2016 • mentecérebro
41
psicanálise
Espaço urbano, espaço psíquico HÁ UM CARÁTER
DE IDEALIZAÇÃO
C O M AS C I D A D E S Q U E A M A M O S EXTENSÕES TORNARMOS
DO PRÓPRIO
E CRIAÇÃO
IMAGINÁRIA
NA RELAÇÃO Q U E
E HABITAMOS; OS LUGARES A S S U M E M
O PAPEL
EU, INVESTIMOS AFETIVAM ENTE NELES A PONTO
PARTE DELES
MANTEMOS
DE
DE
NOS
E ELES, PARTE DE N O S S A SUBJ ETIVI DADE
por Maria Consuelo Passos
R
ecentemente, conversando com um motorista de táxi que não parava de r e c l a m a r dos problem a s de Recife, o s u r p r e e n d i c o m u m a pergunta: " D i a n t e de tanta dificuldade, o s e n h o r gosta de
m o r a r a q u i ? " . Ele m e r e s p o n d e u : " C l a r o , não há cidade m e l h o r para v i v e r " . De novo i n d a g u e i : " P o r que gostam o s de m o r a r e m lugares que m a l t r a t a m tanto n o s s a
d i g n i d a d e ? " . Ele a p e n a s c o m e n t o u p e n s a t i v o : " É u m a boa p e r g u n t a " . Q u a n d o f a l a m o s de n o s s a s c i d a d e s , f a l a m o s de nós m e s m o s . U s a m o s a l i n g u a g e m do afeto, que nos faz negar parte da experiência, para s u s t e n t a r u m a p o s i ç ã o A AUTORA MARIA C O N S U E L O P A S S O S é psicóloga, psicanalista, pós-doutora e m psicanálise da família e professora de pós-graduação em psicologia clínica da Universidade Católica de Pernambuco. 42
subjetiva que nos favorece; s e m tal negação s e r í a m o s obrigados a reconhecer n o s s a s p r e c a r i e d a d e s . I s s o fica bem claro q u a n d o i n d a g a m o s a respeito do u f a n i s m o de certas p e s s o a s q u a n d o t r a t a m s u a s cidades c o m o extensões do próprio e u .
De m o d o geral, o espaço que o c u p a m o s e no qual tran-
com nossas singularidades e d e m a n d a s , embora nem
s i t a m o s n o s p r o p o r c i o n a a s e n s a ç ã o de p e r t e n c i m e n t o e
s e m p r e e s s a s i n t o n i a se revele c o n c r e t a m e n t e . H á u m
a c i r c u l a ç ã o . Fazer parte de u m lugar é adquirir a possi-
a s p e c t o de idealização, de criação i m a g i n á r i a , na relação
bilidade de t r a n s i t a r e, c o n s e q u e n t e m e n t e , de estender o
que m a n t e m o s c o m n o s s a s c i d a d e s .
n o s s o e s p a ç o vital. A cidade t e m caráter t r a n s i c i o n a l , na m e d i d a e m que se situa entre o indivíduo e a s o c i e d a d e ,
A MÃE-AMBIENTE
p o s s i b i l i t a n d o o t r â n s i t o entre o público e o privado, o
E m u m a acepção m a i s geral, o a m b i e n t e nos envolve e nos
fora e o dentro.
t r a n s m i t e as bases de u m a d a d a c u l t u r a , a s s i m c o m o a
C o m base n e s s a d i n â m i c a interior/exterior, nos inse-
m ã e , p r i m a r i a m e n t e , nos oferece, por m e i o da linguagem
r i m o s e m vários l u g a r e s , p a s s a m o s a fazer parte d e l e s ,
e de s u a postura subjetiva, os valores p r i m á r i o s do lar e
a s s i m c o m o t a m b é m os i n t e r n a l i z a m o s . E s s a v i n c u l a ç ã o
da f a m í l i a . E s s a s bases p e r m i t e m a a m p l i a ç ã o do m u n d o
se dá por m e i o de u m trabalho psíquico e d e p e n d e do
por m e i o da c o n s t i t u i ç ã o p s í q u i c a e d o s p r o c e s s o s de
tipo de i n v e s t i m e n t o que f a z e m o s e m relação ao local
socialização em curso desde nosso nascimento.
que h a b i t a m o s , à s c'\dades que a m a m o s ou a p e n a s a d m i -
N a concepção do psicanalista inglês Donald Winnicott,
r a m o s . Investir afetivamente e m u m lugar d e p e n d e d a s
o espaço simbólico é representado pela m ã e (ou substituta)
i d e n t i f i c a ç õ e s - significa que a cidade nos r e p r e s e n t a ,
que acolhe o bebé quando nasce, que deflagra seu processo
c o n f i g u r a n d o - s e c o m o u m a e x t e n s ã o de n ó s , se afina
de a m a d u r e c i m e n t o . Desde e s s a origem o bebé desenvolve março 2016 • mentecérebro 43
^
psicanálise
'Detalhes" esquecidos
condições de a u t o n o m i a para construir e transitar por diferentes lugares ao longo da vida. O m o d o c o m o a criança é inserida nesse ambiente primário m a r c a s u a s relações c o m o outro singular, m a s t a m b é m c o m u m a coletividade que se organiza e se sustenta no espaço m a i s a m p l o da cidade. N o s primeiros m o m e n t o s de vida do bebé, ele e a mãe-ambiente estão fusionados, m a s , paradoxalmente, iniciam t a m b é m , nos primeiros m e s e s , o processo de separação, que vai marcar as singularidades de cada m e m b r o da díade. O ambiente "recepciona" o bebé por meio 'das trocas sensoriais, permitindo a fusão c o m a mãe. Paulatinamente, o m u n d o do bebé se amplia e ele consegue se diferenciar. É, portanto, a experiência de estar colado à mãe que enseja outra, f u n d a m e n t a l , que é a progressiva separação, indicando que o processo de amadurecimento está e m curso. Se a criança é bem recebida e reconhecida por um "ambiente m ã e " , essa experiência vai possibilitar a criação de novos laços, base para a criação de novos ambientes, nos quais a criança se diferencia a partir do olhar do outro e dá continuidade a u m processo contínuo de busca da autonomia no
H á u m caráter n a r c í s i c o na m a n e i r a c o m o nos s i t u a m o s no pró-
qual ela cria o próprio lugar no m u n d o .
prio habitat. Se ele é parte de n ó s , e v i d e n t e m e n t e , seu reflexo
N a c o n c e p ç ã o de W i n n i c o t t , o a m b i e n t e
aparece e m n o s s a s a ç õ e s , e m n o s s a e s t é t i c a , na f o r m a c o m o
é, a n t e s de t u d o , a m ã e . Ela é não só u m a
t r a n s i t a m o s , no prazer q u e s e n t i m o s e m desbravá-lo e no tipo de
metáfora c o m o o a m b i e n t e e m s i , na medida
interpretação que f a z e m o s de s u a geografia e de s u a s e x p r e s s õ e s
e m que a m p a r a , s u s t e n t a e acolhe o bebé,
c u l t u r a i s . N e s s e s e n t i d o , t a n t o o sujeito quanto o e s p a ç o se refa-
levando-o a r e c o n h e c e r
z e m no dia a d i a , à m e d i d a que a cidade se t r a n s f o r m a e s u r g e m
u m e s p a ç o que vai a l é m dela e que se t o r n a
progressivamente
novas construções, c o m o equipamentos culturais, educacionais e
a m a t r i z de t o d o s o s d e m a i s lugares que
de s a ú d e ; ou a d e s t r u i ç ã o se i m p õ e não só nos edifícios, m a s sob
o c u p a r á na v i d a . P o d e r í a m o s s u p o r que a
a f o r m a de diferentes t i p o s de v i o l ê n c i a .
c i d a d e r e p r e s e n t a , na v i d a a d u l t a , parte des-
Se a relação que m a n t e m o s c o m a cidade é narcísica, é preciso considerar os conflitos que a d v ê m daí. Não raro, parece haver certa irracionalidade nas avaliações que f a z e m o s dos lugares onde vive-
se e s p a ç o de a c o l h i m e n t o , p e r t e n c i m e n t o e reconhecimento. Para W i n n i c o t t , a constituição do psiquis-
m o s . H á , com frequência, falta de dissintonia entre o que d i z e m o s ,
m o e seu a m a d u r e c i m e n t o dependem de u m a
a forma como expressamos o viver na cidade, e o que ela concreta-
provisão ambiental na qual estão contidos os
mente nos oferece. Se cada u m pensar nos desconfortos cotidianos
investimentos de afeto, base para que o sujeito
causados pela precariedade dos espaços e equipamentos públicos,
siga criando u m a espacialização da v i d a . Nes-
dos maus-tratos das ruas e vias públicas das cidades brasileiras, cer-
se sentido é que sujeito-espaço-cultura f a z e m
tamente elas seriam muito mal avaliadas. Entretanto, quando as des-
parte de u m m e s m o encaixe que é ressignifi-
c r e v e m o s , frequentemente nos e s q u e c e m o s de "detalhes", c o m o o
cado nas diferentes etapas da vida. A s s i m , à
trânsito infernal que nos faz perder boa parte de nossa vida, ameaça
medida que a criança vai se separando da m ã e ,
de violência e m cada esquina, precariedade nos sistemas de saúde,
o ambiente vai sendo ampliado e o c u p a d o por
educação, escassez de opções de lazer e de ofertas culturais e m gran-
outros personagens significativos, c o m o pai,
de parte das grandes cidades brasileiras.
i r m ã o s , família etc. Prosseguirá, d e s s e m o d o , c o m o e s t e i o de o u t r o s \aços óe afeto que
44
não se restringem a u m a d i m e n s ã o singular,
e m q u e ele a c r e d i t a q u e
m a s se estende ao coletivo, d i m e n s i o n a n d o
criou tudo que está ao seu
s i m u l t a n e a m e n t e u m voltar-se para si e para o
a l c a n c e . M a i s adiante ele
outro, que e v i d e n c i a , de certo m o d o , a função
p a s s a a d i m e n s i o n a r me-
ambiente exercida pela m ã e .
lhor a si m e s m o e o outro,
N o s p r i m e i r o s t e m p o s de vida, é funda-
podendo então a s s u m i r os
mental q u e o a m b i e n t e seja a p r e s e n t a d o à
gestos compartilhados c o m
criança de f o r m a s e g u r a , de m o d o que no fu-
o outro, m a s originado e m
turo o externo p o s s a parecer confiável. A partir
si m e s m o . I s s o s i g n i f i c a
d e s s a c o n d i ç ã o , o sujeito poderá enfrentar
que adquirimos por meio
os conflitos e paradoxos da vida relacional. A
da c r i a t i v i d a d e o s m e i o s
confiança no a m b i e n t e se constitui c o m base
para c r i a r n o s s a p r ó p r i a
em algumas condições importantes: além
existência e nos vincular
do a c o l h i m e n t o , é preciso destacar a f o r m a
a pessoas e lugares, q u e ,
c o m o o c u i d a d o é oferecido e a c o n s t â n c i a da
embora t e n h a m realidades
presença d a m ã e . A partir d e s s a experiência
próprias, podem ser subje-
s e g u i m o s enfrentando n o s s a s vulnerabilida-
tivamente percebidos.
Fronteiras geográficas simbolizam a saida para o mundo, para outras experiências afetivas e culturais; pertencer é, e m última instância, construir u m a morada c o m limites permeáveis e criar outras posições subjetivas
des c o m m a i s s e g u r a n ç a , e m direção a certa
Tendo, a s s i m , experimentado esse espaço,
autonomia e m relação ao lugar que habitamos.
a criança terá condições de prosseguir em dire-
A confiabilidade inicial enseja outra expe-
ção a u m a a u t o n o m i a que implica a aproxima-
riência i m p o r t a n t e , que é a circulação e m u m
ção do outro, s e m perder a si m e s m a , de con-
lugar que W i n n i c o t t d e n o m i n o u de espaço po-
ceber relações intersubjetivas e coletivas que
tencial. A í , s i m , trata-se de u m a metáfora que
lhe p e r m i t e m ampliar seu universo relacional
e x p r e s s a o m o v i m e n t o da criança que transita
e constituir u m a ética da aproximação c o m o
entre o m u n d o interno e o m u n d o externo,
condição indispensável à vida nas cidades.
e m u m p r o c e s s o que pode lhe assegurar u m f u n c i o n a m e n t o entre esses dois universos. Por
PORTAS PARA O MUNDO
meio d a c o n c e p ç ã o de "espaço potencial", é
O s v í n c u l o s estão diretamente a s s o c i a d o s ao
possível verificar c o m o a criança, desde muito
pertencer a u m lugar, à criação de u m habitat.
cedo, é levada a se m o v i m e n t a r e m u m lugar
C o n s t i t u í m o s laços p r i m á r i o s q u a n d o s o m o s
intermediário entre seu m u n d o interno e exter-
acolhidos e há o reconhecimento c o m o possi-
no, entre ela e s u a m ã e , de m o d o a criar u m a
bilidade de habitar d e t e r m i n a d o lugar. A s s i m ,
vida na qual o s o p o s t o s não se e x c l u e m , m a s
nos i n s e r i m o s s i m b o l i c a m e n t e n u m a cadeia
são t e n s i o n a d o s , incitando-a a desenvolver u m
geracional a partir da qual r e s p o n d e m o s às
espaço psíquico entre e s s e s dois elementos e
diferentes d e m a n d a s de relação c o m indiví-
ter c o n d i ç õ e s de viver criativamente.
d u o s , grupos, coletividades etc. E s s a inserção
E n t e n d e m o s q u e e s s e e s p a ç o intermediá-
t e m caráter d i n â m i c o e m u d a permanente-
rio n o s p e r m i t e c o m p r e e n d e r a relação que o
m e n t e . Talvez seja i s s o que p r e c i s a m o s para
i n d i v í d u o d e s e n v o l v e c o m a s o c i e d a d e e, de
nos reinventar a n ó s m e s m o s e, ao m e s m o
Falta W i n n i c o t t
m o d o m a i s e s p e c í f i c o , c o m a c a s a que habita
t e m p o , n o s s o habitat, n o s s a s c i d a d e s .
O direito à cidade ( 2 0 0 1 ) . H. Lefebvre. Centauro, 2015.
e c o m s u a cidade. Dessa forma, o indivíduo
A s s i m c o m o o e s p a ç o entre o corpo m a -
e o e s p a ç o v i v i d o s e refletem m u t u a m e n t e ,
terno e o da c r i a n ç a é vivido c o m o e s p a ç o
e nele há c o m p a r t i l h a m e n t o s tanto c o m
t r a n s i c i o n a l , outros e s p a ç o s a d q u i r e m e s s a
uma coletividade mais ampla como c o m
q u a l i d a d e e n o s p e r m i t e m recriar s e m p r e
distintos grupos.
os d i v e r s o s tipos de e s p a ç o s existentes no
A c o n f i a n ç a na m ã e - a m b i e n t e pode ser
m u n d o . É e s s a flexibilidade que abre a porta
a s s i m considerada a matriz para a confiança
de entrada para o e s p a ç o p e s s o a l e, ao mes-
nos d e m a i s ambientes a serem conquistados e
m o t e m p o , n o s c o n d u z às experiências que
é a base para u m viver criativo. De acordo c o m
t e m o s c o m cidades e p a í s e s . A f i n a l , percorrer
Winnicott, a criatividade está relacionada às
os territórios do m u n d o é desconstruí-los - e
primeiras experiências do bebé, no m o m e n t o
apropriar-se deles.
PARA SABER MAIS
Onde coisas e homens se encontram - Cidade, arquitetura e subjetividade. L. L e i t ã o . A n n a b l u m e , 2014. A psicanálise nas tramas da cidade. M . G . K h o u r i e Bernardo Tanis. Casa do Psicólogo, 2009. Confiança e medo na cidade. Z . B a u m a n . Z a h a r , 2009.
® março 2016 • mentecérebro 45
1
grandes experimentos.da
,
p s i c o l o g i a
A ilusão d a mão de borracha C O N S I D E R A D A U M M A R C O N A H I S T Ó R I A DAS N EU ROCI Ê N C I A S , A E X P E R I Ê N C I A Q U E " E N G A N A" O C É R E B R O D E M O N S T R O U PELA P R I M E I R A V E Z Q U E É P O S S Í V E L R O M P E R A B A R R E I R A ENTRE A C O N S C I Ê N C I A Q U E T E M O S DE NÓS MESMOS E OS OBJETOS Q U E NOS C I R C U N D A M
por Daniela Ovadia,
jornalista
O
nde estão os seus pés? A pergunta pode parecer
c o r p o e, s o b r e t u d o , de que não era p o s s í v e l e n g a n a r o
absurda, m a s , se você está lendo este artigo, é
s i s t e m a . N o e n t a n t o , d e p o i s v e i o a m ã o de b o r r a c h a e
provável que não os t e n h a exatamente diante
tudo m u d o u .
dos olhos. M e s m o a s s i m , é bem provável que
O ano é 1998, quando saiu na Nature,
u m a das m a i s
saiba exatamente o n d e eles e s t ã o . Pode " s e n t i r " a s u a
prestigiadas revistas de ciência, a descrição de u m experi-
posição, perceber s u a p o s t u r a : e s s a habilidade, a proprio-
mento aparentemente s i m p l e s , para o qual u m a pequena
cepção, ou percepção de s i , é u m a das capacidades m e n o s
página de texto é suficiente. O s autores são dois neuro-
evidentes, porém m a i s surpreendentes do n o s s o s i s t e m a
cientistas do D e p a r t a m e n t o de Psiquiatria e Psicologia da
n e r v o s o . N a r e a l i d a d e , r e c o n h e c e r as partes do c o r p o
Carnegie M e l l o n , a f a m o s a U n i v e r s i d a d e de Pittsburgh,
c o m o " p r ó p r i a s " é resultado de u m s i s t e m a complexo que
na Pensilvânia. C h a m a m - s e Matthew Botvinick e Jonathan
integra informações v i s u a i s , proprioceptivas (os i m p u l s o s
Cohen e e r a m , na é p o c a , muito j o v e n s , m a s tiveram u m a
provenientes de fibras nervosas destinadas exatamente a
grande ideia: utilizar a capacidade do n o s s o cérebro de
e s s a tarefa) e sensitivas (por e x e m p l o , a pressão do sapato
deixar-se enganar para entender u m pouco m a i s a fundo
sobre o seu p é ) .
c o m o isso f u n c i o n a . " N o p a s s a d o , as ilusões f o r a m m u i t o
Até m a i s o u m e n o s 2 0 a n o s a t r á s , os n e u r o l o g i s t a s e s t a v a m certos de que t o d o s e s s e s e l e m e n t o s
usadas e m psicologia, por isso podem revelar c o i s a s sobre
eram
os processos perceptivos", escrevem no trabalho. " C o m
necessários para c o n s t r u i r a c o n s c i ê n c i a do próprio
base n i s s o , d e s e n v o l v e m o s u m a ilusão na qual a sensação
46
M A T T H E W BOTVINICK durante experimento, em 1998
tátil é d e s t i n a d a a u m a m ã o que não pertence ao sujeito,
duos submetidos ao experimento que r e s p o n d e s s e m a u m
u m a m ã o e s t r a n h a . O efeito gerado revela que existe u m a
questionário sobre a sua experiência e sobre as sensações
interação e m três vias entre visão, propriocepção e tato e
que experimentaram. O resultado foi surpreendente: quase
nos d á , portanto, u m a d e m o n s t r a ç ã o das bases da identi-
todos os voluntários afirmaram tertido a percepção da ilusão
ficação
do braço de borracha c o m o u m a continuidade de seu corpo.
do próprio c o r p o . "
Botvinick e Cohen selecionaram inicialmente dez voluntá-
U m número de indivíduos estatisticamente não significati-
rios que foram colocados sentados de frente para u m a m e s a .
vo na época - m a s sucessivamente ampliado c o m outros
O braço esquerdo da pessoa era escondido por u m a tela,
experimentos idênticos ou similares - afirmou t a m b é m ter
enquanto à sua frente era colocado u m braço de borracha
provado sensações estranhas, c o m o u m a perda do sentido
de dimensões semelhantesàs do braço real. O s experimenta-
de posse do próprio braço real e até m e s m o a percepção de
dores pediram aos participantes que m a n t i v e s s e m os olhos
que a própria m ã o estivesse ficando " e m b o r r a c h a d a " .
fixos no braço de borracha, enquanto, c o m dois pequenos pincéis, e m perfeita sincronia, tocavam simultaneamente o
"A n o s s a hipótese é que e s s a ilusão seja fruto de
uma
conciliação operada pelo nosso cérebro entre e s t í m u l o s
braço real e o falso. Importante: as pessoas sentiram o pincel
aparentemente discordantes, nos quais e s t í m u l o s v i s u a i s e
sobre a pele do braço que não v i a m , m a s v i a m o pincel que
táteis sejam integrados à custa da propriocepção verdadeira
se m o v i a , c o m o m e s m o ritmo, no braço de borracha.
e própria, levando a u m a distorção do s e n s o da posição do
A p ó s dez m i n u t o s de estimulação, foi pedido aos indiví-
c o r p o " , escreveram ainda Botvinick e C o h e n . março 2016 • mentecérebro 47
grandes experimentos.da
i
,
psicologia Para confirmar e s s a interpretação, os dois
cipalmente dos neurofisiologistas, porque pa-
pesquisadores realizaram então u m segundo
recia d e m o n s t r a r u m a prevalência do sentido
e x p e r i m e n t o : p r o l o n g a r a m o s t e m p o s da
da v i s ã o sobre todos os outros na construção
estimulação e pediram aos participantes que
da identidade corporal, c o m o t e m p o tornou-
f e c h a s s e m os olhos e t o c a s s e m , c o m a m ã o
-se u m paradigma importante para estudar a
d i r e i t a , a própria m ã o e s q u e r d a . T a m b é m
c o n s c i ê n c i a do e u , os seus limites e, sobretu-
nesse c a s o , os indivíduos agarraram a m ã o
do, os m e c a n i s m o s pelos quais ela se constrói.
de borracha o u , de qualquer f o r m a , erraram ao tentar alcançar a própria m ã o , ficando no
FUGINDO DE ERROS
meio do c a m i n h o entre a verdadeira e a falsa.
O m e s m o p r o t o c o l o da m ã o de b o r r a c h a
Tratou-se, nesse ponto, de avaliar quão precisa
foi e m p r e g a d o p a r a e x a m i n a r g r u p o s de
deveria ser a e s t i m u l a ç ã o para produzir efeito:
p a c i e n t e s c o m p e r c e p ç õ e s d i s t o r c i d a s do
u m grupo de controle foi " p i n c e l a d o " de m o d o
próprio c o r p o por c a u s a de patologias c o m o
assíncrono, e a ilusão apareceu s o m e n t e e m
a e s q u i z o f r e n i a ou a a n o r e x i a . O s e s t u d o s
7 % dos c a s o s , contra os 4 2 % dos indivíduos
n e s s a s p e s s o a s d e m o n s t r a r a m que existe
cujos estímulos na m ã o verdadeira e na falsa
p r o v a v e l m e n t e u m " d e f e i t o " de integração
foram s i n c r o n i z a d o s .
m u l t i s s e n s o r i a l que as t o r n a m a i s suscetíveis a erros de a v a l i a ç ã o . Foi a s s i m que a rubber
JOGO DE ESPELHOS
hand illusion t o r n o u - s e u m i n s t r u m e n t o para
O trabalho de B o t v i n i c k e C o h e n n ã o n a s c e u
m e d i r a m a l e a b i l i d a d e da representação cor-
do n a d a : p o u c o s a n o s a n t e s , o n e u r o c i e n -
poral: quanto m a i s instável é a representação
t i s t a de o r i g e m i n d i a n a , e s t a b e l e c i d o n o s
do eu no cérebro, m a i s fácil é para a doença
Estados Unidos, Vilayanur
Ramachandran
jogar c o m todos os m e c a n i s m o s de correções
h a v i a p u b l i c a d o u m e s t u d o no q u a l t i n h a
interiores, e m parte c o n s c i e n t e s e e m parte
c o n s e g u i d o gerar, n u m g r u p o de p e s s o a s
inconscientes, que nos p e r m i t e m não incorrer
a m p u t a d a s de u m m e m b r o , a s e n s a ç ã o de
e m erros o t e m p o t o d o .
que o braço havia r e a p a r e c i d o , p r o j e t a n d o ,
T a m b é m o conceito de maleabilidade da
g r a ç a s a u m s i m p l e s j o g o de e s p e l h o s , o
i m a g e m do eu ainda é objeto de d i s c u s s ã o ,
braço íntegro no lugar o n d e d e v e r i a e s t a r
porque n e m todos os estudos convergem en-
aquele que f a l t a v a . E m u i t o s d o s s e u s pa-
tre si - c o m o é c o m p r e e n s í v e l se p e n s a r m o s
c i e n t e s d i z i a m ter t i d o a s e n s a ç ã o de s e r e m
que se trata de f e n ó m e n o s estudados há me-
t o c a d o s no " b r a ç o f a n t a s m a " q u a n d o o
nos de duas décadas - m a s , para o m o m e n t o ,
braço existente era t o c a d o .
se sustenta e parece ser o m a i s plausível.
T a m b é m havia alguns e s t u d o s , conduzidos
E x i s t e m , de fato, p e s q u i s a s que comple-
e m m a c a c o s , que d e m o n s t r a v a m a existência,
t a r a m o q u a d r o d e s c r i t o pela primeira vez
no nível do córtex pré-motor, de áreas e m con-
e m 1998. Por e x e m p l o , G . Lorimer Mosely e
dições de integrar estímulos táteis e visuais e m
Charles Spencer, da Universidade de Oxford,
relação ao mapa corporal.
d e m o n s t r a r a m e m 2008 que o braço verdadei-
O efeito d e s s a i n t e g r a ç ã o é tão i n t e n s o
ro de q u e m vive a ilusão se torna meio grau
no experimento dos dois psicólogos da
mais frio durante o experimento: uma resposta
Carnegie Mellon, oito e m cada dez voluntários,
fisiológica à s u a " a l i e n a ç ã o " do e s q u e m a cor-
ainda antes de serem s u b m e t i d o s ao questio-
poral a favor do seu substituto artificial.
que,
nário, relataram que o l h a r a m para o braço de
Outros experimentos demonstraram quão
borracha pensando "é o m e u braço", m e s m o
real é a integração submetendo a m ã o de bor-
sabendo não ser. A ilusão da m ã o de b o r r a c h a , ou hand illusion,
racha a u m a série de manifestações dolorosas: rubber
representa a primeira d e m o n s -
ao dobrá-la de forma não natural. E m todos os
tração neurocientífica, feita c o m u m experi-
c a s o s , o indivíduo submetido ao experimento
mento claro, de que é possível romper a barrei-
sentiu-se m a l , começou a suar e manifestou
ra entre o eu e os objetos que nos c i r c u n d a m .
todos os sintomas do medo.
E se, no início, despertou o interesse prin48
alguns a tiveram apunhalada, outros " l u x a d a "
No entanto, os limites entre o eu e os ou-
O q u e é a inte jração multissensorial? O m e c a n i s m o de integração mult i
n odal, c
ou sensorial, é
simulação no computador do fenómeno completo) que
usado pelo n o s s o cérebro para ju n t rr as informações sobre u m m e s m o objeto que provên de diferentes canais,
demonstrou c o m o o cérebro h u m a n o usa a inferência
c o m o a visão, a audição, o tato, o novimento, o paladar, e a s s i m por diante. Para represent i r de maneira coerente
bilidade de u m evento. Nesse caso, para avaliar a possi-
a natureza de u m objeto, o cérebn junta aquilo que v e m da periferia de m o d o atento e prec so. Basta imaginar o
e s t a m o s experimentando se refiram ao m e s m o objeto.
que acontece quando colocamos
bayesiana, u m método estatístico, para calcular a probabilidade de que aquilo que estamos vendo e aquilo que
a boca u m a garfada
de c o m i d a : v e m o s o que temos n< prato e depois, quando introduzimos o bocado, temos con dições de distinguir a diferente consistência e o s Dor da c o m i d a daquele garfo e de seu eventual sabor met \ lico. A visão parece ter u m a predominância sobre os; outr< s sentidos, ainda que sobre esse ponto a discussão ain- a permaneça aberta, É exatamente a complexidade a integração multimodal que leva, às vezes, a "erros
na sobreposição das
informações que estão na origem de diversas curiosas ilusões corpóreas, m a s t a m b é m
sintomas c o m o as
alucinações nas psicoses. Essa hii )ótese foi confirmada t a m b é m por u m modelo comput cional (ou seja, u m a
tros p o d e m ser ainda mais instáveis do que
S E N T I D O S C O N F U S O S : a cor de uma bebida ou alimento pode influir na percepção do sabor
3 D , todo tipo de objeto, de bastões a e s p a d a s .
acreditamos: e m 2010, Maria Paola Paladino e
Conseguiu fazer h o m e n s grandes e gordos
seus colaboradores da Universidade de Trento,
acreditarem ser pequenos c o m o crianças, ou
inspirados pela rubber hand illusion, desenvolve-
então que tinham u m corpo f e m i n i n o ou até
ram u m experimento semelhante c o m rostos.
possuir u m terceiro braço, invisível. " D e u m a
Pediram aos voluntários que olhassem para u m
simples ilusão perceptiva nasceu u m filão intei-
vídeo no qual estava enquadrado o rosto de u m
ro de pesquisa que nos permitiu compreender
desconhecido que era tocado c o m u m pincel,
c o m o construímos a nossa identidade corporal,
no m e s m o ponto e na m e s m a frequência c o m
que é u m a parte importante na consciência do
que eles m e s m o s eram tocados, na realidade.
e u " , explica Patrick Haggard, neurocientista do
O s voluntários submetidos ao teste declararam
InstituteforCognitive Neurosciencede Londres,
que e x p e r i m e n t a r a m u m senso crescente de
que contribuiu c o m m u i t o s e s t u d o s para o
familiaridade c o m relação ao rosto do vídeo:
desenvolvimento desse c a m p o de p e s q u i s a .
"Foi ficando cada vez mais parecido comigo
"Agora que c o m p r e e n d e m o s c o m o funciona a
m e s m a " , declarou u m a das voluntárias.
integração multissensorial e, principalmente, agora que t e m o s t a m b é m u m a hipótese sólida
COISAS DE LOUCO
sobre as estruturas anatómicas que, no cérebro,
inska Institut, de H e n r i k E h r o s s o n , do Karolinska
m a n t ê m ativo esse s i s t e m a , p o d e m o s nos con-
E s t o c o l m o , foi a l é m e, partindo s e m p r e do
centrar sobre os detalhes finos e avançar a l é m ,
m e s m o paradigma experimental, usou a reali-
para elaborar hipóteses sobre as conexões entre
dade virtual para criar diversas ilusões relativas
o corpo e a mente. O certo é que compreen-
à percepção de si m e s m o . " P o d e m o s fazer
d e m o s que a consciência não é u m fenómeno
coisas m a l u c a s " , declarou, de forma divertida.
exclusivamente centrai, fígado ao encéfalo e ao
E realmente c o n s e g u i u integrar no e s q u e m a
córtex, mas que depende t a m b é m do corpo e
corporal das p e s s o a s , graças ao seu vídeo e m
daquilo que vem da periferia."
S
especial - epigenética
O que você vive muda o DNA de seus filhos e netos SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS, DETERMINADOS ALIMENTOS, ESTRESSE E OUTRAS I N F L U Ê N C I A S SÃO CAPAZES DE ALTERAR G E N E S ATIVADOS S E M SEUS CÓDIGOS
MUDAR
DE FORMA P E R M A N E N T E . A P A R E N T E M E N T E ,
ALGUMAS
VARIAÇÕES CELULARES PODEM C O M P R O M E T E R A SAÚDE DE
GERAÇÕES
FUTURAS, I N F L U E N C I A R CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E MENTAIS E ATÉ I N T E R F E R I R NA P E R S O N A L I D A D E DE N O S S O S
DESCENDENTES
por Michael K. Skinner
Q
u a n d o m e u s f i l h o s n a s c e r a m , há u n s 30 a n o s , eu sabia que eles h a v i a m herdado de m i m cerca de m e t a d e do D N A . Na é p o c a , acreditava-se que a transferência de genética
de u m e s p e r m a t o z ó i d e ou óvulo para u m embrião era a única maneira c o m o informações podiam passar de pais para filhos - pelo m e n o s , e m h u m a n o s e outros mamíferos. Claro que eu entendia que hereditariedade não é destino e que muitas características de u m a criança p o d e m estar inscritas e m seus genes. Mas educação e cuidados t a m b é m
O AUTOR M I C H A E L K. S K I N N E R é doutor em biologia, professor da Universidade do Estado de Washington. Publicou mais de 250 artigos científicos sobre epigenética.
50
importam. E muito. Inúmeras contingências, c o m o alimentação, poluição ou a frequência c o m que ficamos estressados, afetam o modo g c o m o os genes o p e r a m . Influências socioambientais, por | exemplo, são invocadas frequentemente para explicar por i
que gémeos idênticos podem apresentar doenças diferentes,
aviação e até alguns plásticos c o m u n s , p o d e m induzir mo-
apesar de terem complementos gênicos muito similares.
dificações epigenéticas que provocam d o e n ç a s , alterações
M a s há três décadas não s a b í a m o s que o legado bio-
de c o m p o r t a m e n t o e problemas reprodutivos s e m alterar
lógico de n o s s o s filhos inclui nfiais que apenas n o s s a s
a sequência de D N A dos a n i m a i s . Mais surpreendente é
s e q u ê n c i a s de D N A ; n e m que t a m b é m n o s s o s netos e
que, quando e s s a s e p i m u t a ç õ e s o c o r r e m nas células que
bisnetos p o d e m herdar o que é conhecido c o m o informa-
originam óvulos e espermatozóides, aparentemente podem
ção epigenética. C o m o o D N A , a informação epigenética
se fixar para depois s e r e m t r a n s m i t i d a s , j u n t a m e n t e c o m
reside e m n o s s o s c r o m o s s o m o s (que abrigam os genes)
quaisquer riscos para a saúde de gerações futuras.
e regula funções celulares, m a s ela difere da sequência
A ciência nessa área está evoluindo rapidamente e estu-
de genética e reage ao a m b i e n t e i Ela pode a s s u m i r várias
dos de longo prazo e m h u m a n o s sugerem que epimutações
f o r m a s , inclusive a de p e q u e n a s moléculas que se ligam
t a m b é m podem passar de u m a geração a outra. E m vista
q u i m i c a m e n t e ao D N A e às proteínas nos c r o m o s s o m o s .
dos m u i t o s aspectos biológicos que c o m p a r t i l h a m o s c o m
P e s q u i s a s realizadas e m m e u laboratório e e m outros,
outros m a m í f e r o s , parece razoável esperar que e s s a heran-
principalmente e m ratos e c a m u n d o n g o s , constataram que
ça epigenética transgeracional de fato ocorra e m p e s s o a s .
certos p o l u e n t e s , entre eles agrotóxicos, c o m b u s t í v e l de
Se for a s s i m , as implicações para a saúde pública podem ser março 2016 • mentecérebro
51
especial - epigenética
AGROTÓXICOS SÃO DESRECULADORES ENDÓCRINOS: interferem c o m os sinais hormonais que ajudam a direcionar a formação e o funcionamento do sistema reprodutivo
p r o f u n d a s . U m a parte do crescente n ú m e r o
t a m b é m ajuda a regular a atividade de genes
de c a s o s de obesidade, diabetes e outras do-
n o r m a i s e que ela fica desregulada e m muitos
e n ç a s de rápida a s c e n s ã o entre os c h a m a d o s ,
tipos de cânceres e outras disfunções.
e s p e c i a l m e n t e nos Estados U n i d i o s , de baby boomers
( p e s s o a s que n a s c e r a m durante a
Na década de 90, pesquisadores começaram a desvendar outros tipos de marcas epige-
explosão demográfica após a Segunda G u e r r a
néticas. Descobriram que metil, acetil e várias
M u n d i a l , especialmente entre 1946 e 1964),
outras modificações químicas podem marcar
e e m gerações m a i s recentes, pode ter s u a
pequenas estruturas esféricas compostas de
o r i g e m na exposição de s e u s pais e avós a
u m grupo de proteínas c h a m a d a s histonas.
poluentes c o m o o D D T e a dioxina.
O D N A dos c r o m o s s o m o s se enrola ao redor de cada esfera de histona. Ao controlar c o m
MATÉRIA ESCURA DO GENOMA
que i n t e n s i d a d e o D N A envolve os grupos
Efeitos epigenéticos nas células são reconhe-
de histonas, e dependendo do fato de esferas
cidos há a l g u m t e m p o , m a s a extensão de seu
adjacentes se afastarem ou se agruparem, as
envolvimento só foi esclarecida recentemente.
marcas de histonas podem efetivamente ativar
H á a l g u m a s décadas biólogos notaram que
ou desativar conjuntos inteiros de genes. Genes
m u i t o s lugares no D N A de mamíferos t ê m u m
e m áreas firmemente enroladas, por exemplo,
radical metil ( C H ) ligado a eles (veja
ficam escondidos de proteínas que impulsio-
3
ilustração
nas páginas 58e 59). E m h u m a n o s , e s s a m a r c a
52
n a m a atividade gênica.
epigenética frequentemente ocorre onde u m a
Desde então, e m e r g i r a m outros agentes
c i t o s i n a (C) (letra codificante do "alfabeto" do
epigenéticos, inclusive a estrutura tridimensio-
D N A ) precede u m a guanina ( G ) na sequência
nal d i n â m i c a de D N A e c r o m o s s o m o s , e d/ver-
do D N A , o que ocorre e m cerca de 28 milhões
sos tipos de R N A conhecidos c o m o R N A s não
de pontos ao longo dos c r o m o s s o m o s . De
codificantes. A l g u n s d e s s e s R N A s interagem
i n í c i o , c i e n t i s t a s p e n s a r a m que a principal
c o m m a r c a s e p i g e n é t i c a s i m p r e g n a d a s no
f u n ç ã o da metilação do D N A era neutralizar
D N A e nas histonas. (Eles são c h a m a d o s não
(silenciar) t r a n s p o s o n s , s e g m e n t o s perigosos
codificantes para distingui-los das c a d e i a s , ou
de D N A que podem se mover de suas posições
fitas, de R N A que são copiadas do D N A para
originais nos c r o m o s s o m o s para outras partes
servir de modelos para produzir as proteínas
do g e n o m a , às vezes de m a n e i r a que provo-
codificadas por genes.)
c a m d o e n ç a s . Agora s a b e m o s que a metilação
J u n t o s , e s s e s atores epigenéticos influen-
(ligação q u í m i c a de u m grupo metil) do D N A
c i a m a atividade gênica de f o r m a c o m p l e x a ,
i n d e p e n d e n t e m e n t e da sequência de D N A . A
dos e m b r i õ e s (estruturas
interação entre os genes e o e p i g e n o m a é di-
que precedem a definição
nâmica e ainda u m tanto misteriosa. S a b e m o s ,
do s e x o ) , e o b s e r v a m o s
porém, que toda vez que u m a célula se replica,
que quase todos os descen-
as m a r c a s epigenéticas e m s e u s c r o m o s s o -
dentes machos cresceram e
m o s são c o p i a d a s para os c r o m o s s o m o s das
desenvolveram testículos
células-fílhas. Portanto, eventos epigenéticos
anormais e produziam es-
no início da vida p o d e m alterar o m o d o c o m o
permatozóides fracos e e m
células se c o m p o r t a m posteriormente.
número insuficiente.
S a b e m o s t a m b é m que, embora células
Na época, não pensáva-
trabalhem arduamente para proteger a sequ-
m o s e m epigenética e nun-
ência de D N A nos c r o m o s s o m o s de quaisquer
ca nos ocorreu que e s s a s
A ação dos genes está sujeita à ação de substâncias químicas que a d e r e m ao DNA e a proteínas e m cromossomos, codificando informações de forma alterada
alterações, elas revisam os padrões de marcas
deficiências poderiam ser
epigenéticas durante o desenvolvimento e
hereditárias; portanto, não t í n h a m o s u m plano
envelhecimento de u m organismo. E s s a s m u -
para criar os ratos que haviam sido expostos a
danças a j u d a m a determinar c o m o células se
metoxicloro ou vinclozolina enquanto estavam
especializam para se tornar, por exemplo, u m a
no útero. Certo dia, porém, Cupp entrou em
epitelial ou cerebral; m u d a n ç a s sutis na infor-
meu escritório para se desculpar: por engano,
mação epigenética modificam genes ativos e m
ela havia cruzado filhotes machos e fêmeas não
cada parte do corpo. Substâncias químicas no-
aparentados daquele experimento.
civas, deficiências nutricionais e outros fatores
Eu lhe d i s s e que c h e c a s s e os netos das
estressantes t a m b é m podem fazer as marcas
fêmeas expostas e verificasse se exibiam defei-
epigenéticas sejam adicionadas ou removidas,
tos, embora não esperasse que ela encontrasse
de maneira que afetam a atividade gênica.
a l g u m . Para n o s s a s u r p r e s a , m a i s de 9 0 %
A t u a l m e n t e ninguém duvida de que efeitos
dos m a c h o s d e s s a s ninhadas apresentaram
epigenéticos d e s e m p e n h a m papel importante
as m e s m a s a n o m a l i a s testiculares que seus
no d e s e n v o l v i m e n t o , envelhecimento e até e m
pais, e m b o r a seus progenitores f o s s e m ape-
câncer, m a s biólogos debatem se epimutações,
nas fetos do t a m a n h o de cabeças de alfinetes
m u d a n ç a s epigenéticas a n o r m a i s , podem ser
quando eles e s u a s avós foram expostos bre-
r e p a s s a d a s a outras gerações, e m m a m í f e r o s .
v e m e n t e às s u b s t â n c i a s .
Evidências de u m n ú m e r o rapidamente cres-
E s s e resultado foi surpreendente porque
cente de e x p e r i m e n t o s realizados por m e u
muitos estudos toxicológicos h a v i a m procu-
grupo e por m u i t o s outros me c o n v e n c e r a m
rado evidências de que produtos q u í m i c o s
de que elas p o d e m fazer isso.
a m b i e n t a i s , c o m o a v i n c l o z o l i n a , provocam m u t a ç õ e s de D N A , m a s s e m encontrar esses
UM ENGANO, UM ACERTO
indícios. C o n f i r m a m o s , por nós m e s m o s , que
M e u p r i m e i r o v i s l u m b r e de e p i m u t a ç õ e s
a frequência de m u t a ç õ e s genéticas não era
multigeracionais foi fruto do a c a s o . H á uns
elevada nos ratos expostos aos agentes. A l é m
13 a n o s , A n d r e a C u p p e e u , c o m alguns de
d i s s o , a genética clássica não conseguia expli-
n o s s o s colegas da U n i v e r s i d a d e do E s t a d o
car u m a nova característica que aparece c o m
de Washington, e s t á v a m o s usando ratos para
u m a frequência de 9 0 % e m famílias diferentes.
estudar os efeitos reprodutivos de duas subs-
No entanto, eu sabia que o minúsculo feto
tâncias químicas amplamente aplicadas na agri-
c o n t é m células germinativas primordiais, as
cultura - o pesticida metoxicloro e o fungicida
células progenitoras que originam espermato-
vinclozolina. C o m o m u i t o s agrotóxicos, eles
zóides e óvulos. O mais provável, pensei, era
são desreguladores endócrinos: interferem c o m
que a substância química havia influenciado di-
os sinais hormonais que ajudam a direcionar
retamente essas células progenitoras e que esse
a formação e o funcionamento do sistema re-
efeito simplesmente persistiu quando as células
produtivo. H a v í a m o s injetado os produtos e m
se dividiram e m espermatozóides ou óvulos e,
ratas prenhes durante a segunda s e m a n a de
futuramente, e m netos. Se esse fosse o caso,
gestação, quando se desenvolvem as gônadas
então a breve exposição a substâncias químicas março 2016 • mentecérebro 53
especial - epigenética É possível q u e s u a saúde, c o m o a de s u a família, seja afetada por fatores a q u e s u a bisavó foi exposta durante a gestação, predispondo todos a obesidade o u diabetes
teria provocado problemas
a a n i m a i s de u m a linhagem de controle não
testiculares nos filhotes
exposta, prática que inibe substancialmente as
n e t o s d i r e t a m e n t e , e as
características e m gerações posteriores.
gerações futuras deveriam
Nos últimos anos, porém, houve
ser perfeitamente normais.
um
a c ú m u l o de evidências de que epimutações
H a v i a u m teste seguro
p o d e m persistir por várias gerações. Estudos
para descobrir se a influ-
de a c o m p a n h a m e n t o e m m e u laboratório
ê n c i a direta era c u l p a d a .
m o s t r a r a m que os bisnetos de ratos tratados
Criamos
uma quarta e
c o m fungicidas t ê m padrões alterados de me-
d e p o i s u m a q u i n t a gera-
tilação e m seus e s p e r m a t o z ó i d e s , testículos e
ção, cruzando cada vez
ovários, além de u m a atividade gênica anormal
d e s c e n d e n t e s não apa-
e m s u a s células germinativas primordiais de
rentados dos ratos expos-
modo consistente. Constatamos
também
t o s o r i g i n a l m e n t e para evitar incertezas no
que os descendentes de quarta geração são
r a s t r e a m e n t o das m o d i f i c a ç õ e s . Q u a n d o os
propensos a ganhar peso e a sofrer de ansie-
bisnetos e, m a i s tarde, os tataranetos a m a d u -
dade; eles até e s c o l h e m s e u s companheiros
r e c e r a m , os m a c h o s de cada geração s o f r i a m
de acasalamento de f o r m a diferente. Enquanto
p r o b l e m a s s i m i l a r e s aos de s e u s a n c e s t r a i s .
i s s o , nós e outros cientistas acrescentamos
T o d a s e s s a s m u d a n ç a s r e s u l t a r a m de u m a
m a i s poluentes e estressores à lista de fatores
d o s e f u g a z ( m a s e l e v a d a ) de a g r o t ó x i c o s
que i n d u z e m o efeito; e a herança transgera-
pulverizados durante décadas em frutas,
cional de características adquiridas t e m sido
v e g e t a i s , v i n h e d o s e c a m p o s de golfe.
observada e m u m a a m p l a gama de espécies,
Fiquei chocado c o m os resultados. Durante vários anos repetimos os experimentos múltiplas vezes para confirmá-los e reunir evidências
inclusive e m plantas, m o s c a s , v e r m e s , peixes, roedores e porcos. E m 2012 m i n h a equipe relatou que a ex-
adicionais. Concluímos que a explicação mais
posição de ratas prenhes a poluentes c o m o
plausível era que a exposição provoca u m a epi-
dioxina, querosene de aviação, repelente de
m u t a ç ã o que interfere no desenvolvimento das
i n s e t o s , ou u m a c o m b i n a ç ã o de bisfenol A
gônadas e m embriões m a c h o s e que ela passa
(BPA) e ftalatos - c o m p o n e n t e s químicos
do espermatozóide às células de u m embrião
de plásticos e m e m b a l a g e n s de alimentos e
e m desenvolvimento, inclusive para as células
obturações dentárias - induz diversos distúr-
germinativas primordiais, e a s s i m por diante,
bios hereditários e m descendentes de quarta
por g e r a ç õ e s . E m 2 0 0 5 , d i v u l g a m o s e s s e s
g e r a ç ã o , c o m o a n o r m a l i d a d e s pubertárias,
resultados no periódico científico Science, jun-
obesidade e d o e n ç a s dos ovários, rins e da
t a m e n t e c o m nossa hipótese de epimutação e
próstata. O b s e r v a m o s c e n t e n a s de m u d a n -
evidências tentadoras, mas ainda preliminares,
ças específicas, decorrentes de exposição e m
sustentando que a exposição ao fungicida havia
padrões de metilação do D N A em e s p e r m a .
alterado a metilação e m vários pontos impor-
C o m o os efeitos não s e g u e m os padrões here-
tantes no D N A do esperma dos descendentes.
ditários da genética c l á s s i c a , acreditamos que e p i m u t a ç õ e s , e não m u t a ç õ e s na sequência
QUARTA GERAÇÃO U m intenso debate se seguiu. U m a das razões
54
do D N A , estão provocando e s s e s distúrbios. Kaylon B r u n e r - T r a n e Kevin O s t e e n , da
para isso foi que pesquisadores de e m p r e s a s
F a c u l d a d e de M e d i c i n a da
que v e n d e m v i n c l o z o l i n a e u m e s t u d o não
de Vanderbilt, e m N a s h v i l l e , no T e n n e s s e e ,
Universidade
vinculado à indústria relataram dificuldades
t a m b é m e s t u d a r a m os efeitos da dioxina e m
para reproduzir alguns de n o s s o s resultados;
c a m u n d o n g o s e d e s c o b r i r a m que cerca da
provavelmente porque eles u s a r a m diferentes
metade das filhas de f ê m e a s expostas era in-
métodos experimentais, como ministrar o
fértil; entre as que podiam emprenhar, muitas
produto químico por via oral, utilizar linhagens
tiveram partos prematuros. E s s e s problemas
de ratos e n d o g â m i c o s (de c r u z a m e n t o s con-
de concepção e gestação persistiram durante
sanguíneos) ou criar os m a c h o s afetados junto
pelo m e n o s m a i s d u a s gerações.
EXPLOSÃO EM UMA INDÚSTRIA QUÍMICA e m S e v e s o , na Itália, expôs moradores próximos às concentrações ambientais mais elevadas de dioxina já registradas; mulheres c o m m e n o s de 13 anos na ocasião do acidente exibiam, quando adulta, o dobro do risco normal de desenvolver s í n d r o m e metabólica, u m conjunto de condições, c o m o pressão arterial elevada e níveis de glicose no sangue, que, juntas, predispõem p e s s o a s a diabetes e d o e n ç a s cardíacas
A s doses de substâncias químicas nesses
expôs moradores próximos às concentrações
estudos são muito maiores que as que pode-
ambientais m a i s elevadas de dioxina já regis-
ríamos receber normalmente de i|m ambiente
tradas. Cientistas m e d i r a m a quantidade de
c o n t a m i n a d o , m a s pesquisas realizadas por
dioxina circulante no s a n g u e de quase mil
JenniferWolstenholmee outros, na Universidade
mulheres afetadas e as a c o m p a n h a r a m para
da Virgínia, relataram efeitos transgeracionais de
observar sua saúde.
doses mais comparáveis à experiência h u m a n a .
E m 2010 os pesquisadores relataram que,
O s pesquisadores descobriram ^ue, quando
para cada a u m e n t o decuplicado na exposição
os c a m u n d o n g o s recebiam, via alimentação,
de u m a mulher à dioxina durante o acidente,
a quantidade de BPA suficiente para produzir
o t e m p o médio n e c e s s á r i o para engravidar
níveis sanguíneos similares aos medidos e m
a u m e n t o u e m 2 5 % e o risco de infertilidade
mulheres americanas gestantes, seus descen-
dobrou. H á dois a n o s , a equipe observou tam-
dentes até a quinta geração passavam menos
bém que mulheres c o m m e n o s de 13 anos na
tempo explorando suas gaiolas e mais tempo
ocasião do acidente e x i b i a m , c o m o adultas, o
i n t e r a g i n d o c o m outros c a m u n d o n g o s . O s
dobro do risco normal de desenvolver síndro-
cientistas suspeitam que a mudança de perso-
m e metabólica, u m conjunto de c o n d i ç õ e s ,
nalidade tenha sido provocada pela atividade
c o m o p r e s s ã o arterial e l e v a d a e níveis de
alterada dos genes para oxitocina evasopressina,
glicose no s a n g u e , que, j u n t a s , predispõem
ambos conhecidos por afetar o comportamento
pessoas a diabetes e doenças cardíacas. Eles
social. Embora pareça provável que, como e m
c o n s t a t a r a m t a m b é m que m u i t a s netas de
nosso estudo sobre BPA, os efeitos coincidam
mulheres expostas t ê m resultados a n o r m a i s
c o m padrões alterados de metilação do D N A , a
e m testes de tireóide.
evidência para essa associação ainda é indireta.
C o n s i d e r a n d o que distúrbios reprodutivos
Outros tipos de alterações epigenéticas também
e m e t a b ó l i c o s p a r e c e m ser os t i p o s m a i s
poderiam estar envolvidos.
c o m u n s de doenças t r a n s m i t i d a s através do
Atualmente estão sendo realizados estudos
e p i g e n o m a e m a n i m a i s de laboratório, esses
que talvez p o s s a m determinar se epimutações
resultados s u g e r e m que dioxinas podem pro-
afetam t a m b é m múltiplas gerações de pesso-
mover e p i m u t a ç õ e s e m h u m a n o s . A suspeita
a s , c o m o ocorre c o m roedores. U m a d e s s a s
será reforçada se, nos próximos a n o s , os filhos
de u m
e netos das mulheres expostas apresentarem
lamentável desastre que se tornou u m expe-
taxas m a i s altas de infertilidade, obesidade e
rimento natural. E m 1976, u m a explosão e m
outras c o n d i ç õ e s relacionadas - e exibirem
u m a indústria q u í m i c a e m Seveso, na Itália,
padrões a n o r m a i s de metilação.
pesquisas está f a z e n d o u m follow-up
março 2016 • mentecérebro 55
especial - epigenética
Herança extragênica Biólogos d e s c o b r i r a m que as experiências de vida de a n i m a i s e p l a n t a s , c o m o a e x p o s i ç ã o a certos poluentes ou eventos e s t r e s s a n t e s , p o d e m afetar a s a ú d e de s e u s d e s c e n d e n t e s s e m m o d i f i c a r s e u D N A . E s s a s exposições p o d e m ter efeitos m u l t i g e r a c i o n a i s e m filhos e netos através de s u a s ações diretas e m e s p e r m a t o z ó i d e s , ó v u l o s e outras células reprodutoras. M a s a herança epigenética transgeracional, através de alterações hereditárias a
Epigenética sucinta A informação genética é codificada por segmentos de D N A no interior dos cromossomos de cada célula. Mas outra camada de informação está codificada e m marcas epigenéticas que incluem moléculas como metil (CH ) que se ligam ao D N A e aos grupos de histonas que o D N A circunda. Quando essas marcas epigenéticas aderem ao D N A dentro ou junto a genes, muitas vezes alteram a quantidade de RNA ou proteína produzida por esses genes. 3
G r u p o de histonas
substâncias químicas ligadas ao D N A , pode afetar descendentes ainda mais distantes.
C o m o marcas epigenéticas podem persistir por múltiplas gerações os efeitos diretos de exposição a um poluente ou estressor podem originar características multigeracionais, mas não hereditárias, em duas gerações se o macho e seu esperma forem expostos; ou em até três gerações se ela ocorrer com uma fêmea em determinado estágio de gestação (destaques em azul na página ao lado). Para que uma característica epigenética seja herdada por gerações posteriores (vermelho), a marcação alterada deve sobreviver a duas ondas distintas de reprogramação (abaixo) após a concepção. As duas ondas removem a maioria das "etiquetas" epigenéticas dos cromossomos e, posteriormente, os reescrevem. Estudos com roedores indicam que essa persistência é possível.
M a c h o exposto a estresse ou poluente A primeira onda de reprogramação epigenética ocorre poucos dias após a concepção, quando o embrião é u m a m i n ú s c u l a bola de células. No feto, células germinativas primordiais,
Estresse
precursoras de óvulos e espermatozóides, podem
ou poluente
sofrer exposição direta. U m segundo evento de reprogramação redefine a maior parte das marcas epigenéticas n e s s a s células para garantir que apenas genes apropriados ao género do feto sejam ativados.
HÊÈ
Filhotes Novas características nos filhotes poderiam ser explicadas pela exposição direta do esperma de seu pai, ou à sua mãe enquanto estavam no útero. Se as células germinativas primordiais dos filhotes foram expostas, seus óvulos ou espermatozóides também podem estar impregnados desses efeitos diretos e poderiam ser transmitidos aos netos. Estritamente falando, esses efeitos diretos não são hereditários. Efeito direto multigeracional s e a exposição ocorreu quando u m a avó estava prenhe
Filhotes netos A verdadeira herança transgeracional pode aparecer na terceira geração se a exposição ocorreu com um avô macho. Até agora, estudos observaram esse fenómeno para vários tipos de exposições. EXPOSIÇÃO A N C E S T R A L condicionamento de medo de um odor estranho CARACTERÍSTICA HERDADA: resposta intensificada de sobressalto quando o odor está presente E X P O S I Ç Ã O A N C E S T R A L dieta rica em gordura e uma droga que causa pré-di abetes CARACTERÍSTICA HERDADA: intolerância à glicose e resistência à insulina
Filhotes bisnetos Na maioria dos estudos desse fenómeno pesquisadores expõem fêmeas prenhes a um composto tóxico ou a uma condição estressante. Depois disso, precisam criar pelo menos descendentes de quarta geração para provar que novas características são de fato hereditárias. E X P O S I Ç Ã O A N C E S T R A L metoxicloro; vinclozolina CARACTERÍSTICA HERDADA: contagem reduzida de espermatozóides e motilidade; ansiedade acentuada em fêmeas E X P O S I Ç Ã O A N C E S T R A L dioxina CARACTERÍSTICA H E R D A D A : baixos níveis de testosterona em machos; infertilidade ou parto prematuro em fêmeas E X P O S I Ç Ã O A N C E S T R A L bisfênol A (BPA) CARACTERÍSTICA H E R D A D A : baixos níveis de testosterona em machos; ovários anormais ou puberdade precoce em fêmeas EXPOSIÇÃO ANCESTRAL querosene de aviação; D D T CARACTERÍSTICA H E R D A D A : altas taxas de obesidade; síndrome do ovário policístico
Filhotes tataranetos Estudos avançaram até quinta geração e constataram que alguns efeitos persistiram. E X P O S I Ç Ã O A N C E S T R A L vinclozolina; D D T CARACTERÍSTICA HERDADA: doenças da próstata, dos rins e testículos, e obesidade em machos; doença de ovários em fêmeas
março 2016 • mentecérebro 57
especial - epigenética fome durante a Segunda Guerra Mundial. Apesar das crescentes evidências, muitos biólogos ainda recuam diante da ideia de que epimutações ambientalmente induzidas podem se acomodar na linha germinal. A hipótese parece contradizer a crença há muito estabelecida de que quase todas as marcas epigenéticas são apagadas do D N A e depois reescritas durante o processo reprodutivo, não apenas u m a , mas duas vezes. E s s e s processos, de acordo c o m o raciocínio, deveriam eliminar quaisquer epimutações adquiridas antes que elas pudessem provocar problemas na geração seguinte. Essa m e s m a lógica é outra razão por que nossas conclusões de 2005 geraram tamanha tempestade. A s eliminações o c o r r e m , mas c o m que intensidade é u m a questão e m aberto. A primeira onda de remoção ocorre poucos dias após a c o n c e p ç ã o . O s radicais metil são removidos dos c r o m o s s o m o s e m u m processo que confere às células-tronco embrionárias a capacidade de originar todos os tipos de células. Depois d i s s o , as m a r c a s são adicionadas n o v a m e n t e , e n q u a n t o o feto c o m e ç a ESCULTURAS EM DUBLIN lembram
Aproveitando outro experimento natural, os
a se desenvolver. À medida que as células se
pesquisadores Marcus Pembrey, da Universida-
dividem e se e s p e c i a l i z a m , padrões distintos
Europa (1845-1852):
de College London; Lars Olov Bygren, do Insti-
de metilação do D N A aparecem em cada tipo
estudos r e v e l a r a m q u e
tuto Karolinska, e m Estocolmo, coordenaram
celular e a j u d a m a moldar as células para que
u m a série intrigante de estudos utilizando da-
sejam adequadas às s u a s funções específicas.
a Grande Fome na
m u l h e r e s cujas a v ó s paternas passaram por
dos de cerca de 300 pessoas nascidas e m 1890,
N o e n t a n t o , algo protege alguns genes
fartura e p r i v a ç ã o d e
1905 e 1920, e m Õverkalix, na Suécia, incluindo
d e s s a primeira o n d a de apagamento epige-
alimentos, q u a n d o e r a m
seus pais e avós. O s cientistas c o m p a r a r a m os
n é t i c o . B i ó l o g o s se r e f e r e m a e s s e s genes
registros de óbito dos grupos estudados c o m
c o m o " i m p r e s s o s " materna ou paternamente,
u m a d e s s a s fases d e
crianças, t i v e r a m í n d i c e s sig nif icativa m e n t e mais altos d e d o e n ç a s
estimativas reconstituídas de estoques de ali-
porque as m a r c a s epigenéticas são preserva-
cardiovasculares graves
m e n t o s na cidade, que, no século 19, passou
das e garantem que só a cópia materna ou
por vários períodos bienais de colheitas fartas
a paterna do gene seja usada para produzir
seguidas por quebras de safras. Parece que mu-
u m a proteína. N o s m e u s filhos, por exemplo,
lheres cujas avós paternas p a s s a r a m por u m a
o gene I G F 2 , que codifica u m hormônio im-
d e s s a s fases de fartura e f o m e , quando eram
portante para o c r e s c i m e n t o fetal, só está ativo
c r i a n ç a s , t i v e r a m índices significativamente
no c r o m o s s o m o que eles herdaram de m i m .
m a i s altos de doenças cardiovasculares fatais.
A cópia do gene da m ã e está desativada pela
U m fato interessante: o maior risco não
ação c o m b i n a d a da metilação do D N A e de
foi observado e m h o m e n s nem e m mulheres
u m a f o r m a de R N A não codificante.
cujas avós ou avôs maternos enfrentaram u m
A segunda onda de apagamento epigenético
período de e s c a s s e z de alimentos. Por várias
e reprogramação c o m e ç a mais tarde, quando
razões, esse estranho padrão de hereditarieda-
u m feto de rato tem o t a m a n h o de u m a cabeça
de sugere fortemente que a epigenética está e m
de alfinete e u m feto h u m a n o equivale ao porte
ação e, e m particular, u m fenómeno conhecido
de u m a ervilha. O período coincide c o m o início
como imprinting
do aparecimento de células germinativas pri-
(impressão) genômica. Obser-
vações similares foram feitas e m descendentes
mordiais dentro das gônadas recém-formadas
de u m a p o p u l a ç ã o h o l a n d e s a que p a s s o u
do embrião, quando m i n i s t r a m o s vinclozolina
ou outros poluentes aos animais e m nossos
e seus colegas da Universidade da Califórnia
experimentos sobre hereditariedade epigenéti-
e m Irvine m o s t r a r a m que c a m u n d o n g o s pre-
ca. E m ratos, e s s e período dura cerca de u m a
nhes que beberam água contendo o biocida
s e m a n a ; e m h u m a n o s , ele se estende da sexta
tributilteno, a m p l a m e n t e utilizado para eli-
à 18- s e m a n a de gestação.
m i n a r cracas (pequenos crustáceos da classe dos cirrípedes) de c a s c o s de navios, geraram
CRACA DE CASCO DE NAVIO
filhotes propensos a desenvolver células de
A c r e d i t a - s e q u e e s s a s e g u n d a o n d a esteja
gordura extras e gordura no fígado (esteatose
e s s e n c i a l m e n t e c o m p l e t a - radicais metil
hepática). A s m u d a n ç a s persistiram por mais
são r e m o v i d o s até dos genes i m p r e s s o s nas
d u a s gerações, efeito m a i s facilmente explica-
células precursoras de óvulos e espermatozói-
do por u m a epimutação. Desse m o d o , embora
des. M a i s tarde, p o r é m , elas são adicionadas
m u d a n ç a s de estilo de vida e disponibilidade
n o v a m e n t e para estabelecer o padrão apro-
de alimentos s e m dúvida respondam por gran-
priado ao sexo: e m f ê m e a s , os c r o m o s s o m o s
de parte do a u m e n t o de obesidade, diabetes e
destinados aos óvulos recebem u m padrão de
outras doenças de "países r i c o s " nos últimos
metilação m a t e r n o , enquanto, e m m a c h o s , os
50 a n o s , é possível que exposições ancestrais
c r o m o s s o m o s que acabarão em espermatozói-
t e n h a m a u m e n t a d o n o s s a susceptibilidade a
des g a n h a m u m padrão paterno. O processo
essas doenças.
evita que qualquer descendente receba d u a s
E m países c o m o os Estados U n i d o s , onde
cópias inativadas ou duas ativadas de genes
crianças f o r a m expostas a D D T nas décadas
i m p r e s s o s , q u a n d o o que ele precisa é de u m a
de 40 e 50, por exemplo, pode ser significativo
cópia ativa e outra inativa.
que, q u a n d o i n j e t a m o s a n i m a i s c o m D D T ,
O m e s m o m e c a n i s m o que restabelece mar-
constatamos que mais da metade dos bisnetos
cas e m genes i m p r e s s o s pode ser influenciado
de quarta geração desenvolveram obesidade,
por e s t r e s s o r e s ambientais para fixar novas
m e s m o que os d e s c e n d e n t e s de s e g u n d a
e p i m u t a ç õ e s na linha germinal. Se a exposição
geração t i v e s s e m t a m a n h o s n o r m a i s e que
a u m poluente, u m desequilíbrio h o r m o n a l
a epigenética parecia ser a c a u s a . E m três
provocado por estresse ou ainda u m a defici-
gerações, desde a década de 50, o índice de
ência nutricional que afete a metilação atinge
obesidade entre a m e r i c a n o s adultos a u m e n -
o e m b r i ã o q u a n d o e s s a segunda " v a r r e d u r a "
tou drasticamente e agora excede 3 5 % .
está prestes a começar, pode alterar m a r c a s
Se o a m b i e n t e às v e z e s pode p r o d u z i r
e p i g e n é t i c a s e l i m i n a d a s para s e m p r e e as
d i r e t a m e n t e m u d a n ç a s t r a n s g e r a c i o n a i s de
C e n o m i c imprinting in
p o u p a d a s da e l i m i n a ç ã o ou reorganizadas no
longo prazo na atividade genética s e m antes
m a m m a l s . D e n i s e P.
final da fase de reprogramação.
alterar a sequência codificadora do D N A , então
t o l o m e i , e m Cold
A maioria das epimutações provavelmente
a concepção clássica de evolução, c o m o u m
t e m poucas c o n s e q u ê n c i a s ou são corrigidas
PARA SABER MAIS
B a r l o w e M a r i s a S. BarSpring
Harbor
Perspectives
produto lento de m u t a ç õ e s aleatórias que são
Biology,
v o l . 6, n° 2, artigo
na geração seguinte, m a s toda regra t e m ex-
"selecionadas" devido às vantagens reproduti-
ro de 2 0 1 4 .
ceção. Se u m a e p i m u t a ç ã o e m u m a célula da
vas ou de sobrevivência que oferecem, terá de
linha germinal é protegida da reprogramação
ser expandida. É até concebível que a herança
do e p i g e n o m a , m a i s ou m e n o s Como ocorre
epigenética possa explicar por que novas espé-
c o m u m gene i m p r e s s o , ela pode perdurar
cies s u r g e m c o m m a i s frequência que seria de
para afetar a geração seguinte e, talvez, muitas
esperar, dada a raridade de mutações genéticas
gerações posteriores.
v a n t a j o s a s . M u d a n ç a s epigenéticas parecem
Se e s s a ideia estiver correta, a herança epi-
ocorrer c o m frequência mil v e z e s maior. O
genética pode ter c o n s e q u ê n c i a s importantes
efeito mais importante de marcas epigenéticas
para a m e d i c i n a . A l g u n s cientistas estão estu-
- talvez a razão de s u a existência - pode ser
d a n d o se os c h a m a d o s " o b e s o g e n e s " , subs-
expandir a m p l a m e n t e o n ú m e r o de indivíduos
tâncias q u í m i c a s ambientais que interferem no
variantes e m u m a população. N e s s e c a s o , a
m e t a b o l i s m o h u m a n o ao i n d u z i r ã o ganho de
seleção natural escolheria os m a i s aptos entre
peso, p o d e m a u m e n t a r o risco de obesidade
eles para p r o s p e r a r e se multiplicar - c o m
hereditária. N o ano p a s s a d o , Bruce B l u m b e r g
g e n o m a , e p i g e n o m a e tudo o m a i s .
n° a 0 1 8 3 8 2 ; I
o
in
de feverei-
U n d e r s t a n d i n g transgenerational epigenetic inheritance via the gametes in mammals. Lúcia Daxinger e E m m a Whitelaw, em Nature Reviews Genetics, v o l . 13, n ° 3 , p á g s . 153162; m a r ç o de 2 0 1 2 . Epigenetic transgenerational actions o f environmental factors in disease etiology. M i c h a e l K. S k i n ner, M o h a n M a n i k k a m e Carlos Guerrero-Bosagna, e m Trenas in Endocrinology and Metabolism, vol. 2 1 , n ° 4 , p á g s . 2 1 4 - 2 2 2 ; abril de 2 0 1 0 .
® março 2016 • mentecérebro 59
| ^
comportamento
Trabalho de u m lado vida pessoal do outro #
PARA LIDAR C O M C O B R A N Ç A S
E EVITAR C O N F L I T O S , P R O F I S S I O N A I S C O M
REMUNERAÇÃO " N E G A M " IDENTIDADE
por Shannon H a l l
ALTA
PROFISSIONAL
jornalista
P
ara a m a i o r i a d a s p e s s o a s , a i d e n t i d a d e e s t á
s i m p l e s m e n t e e n c a r o i s s o c o m o m e u trabalho e não levo
i n e x t r i c a v e l m e n t e ligada ao t r a b a l h o . E m g e r a l ,
nada para o lado p e s s o a l " .
nos e s f o r ç a m o s p a r a b u s c a r u m significado e m
" E s s e tipo de estratégia mental pode ser u m a resposta
n o s s a s a t i v i d a d e s p r o f i s s i o n a i s e, m u i t a s v e z e s ,
ao a m b i e n t e e s t r e s s a n t e e explorador que p r e d o m i n a no
t o m a m o s as c r í t i c a s de n o s s o d e s e m p e n h o de f o r m a
setor b a n c á r i o " , sugere a professora de inovação e organi-
b a s t a n t e p e s s o a l . N o e n t a n t o , i s s o n ã o é a s s i m para
z a ç ã o na U n i v e r s i d a d e Q u e e n Mary, e m L o n d r e s , Maxine
e x e c u t i v o s de altos e s c a l õ e s de b a n c o s de i n v e s t i m e n t o ,
R o b e r t s o n , que t r a b a l h o u no e s t u d o . A m i n i m i z a ç ã o do
pelo m e n o s s e g u n d o o s r e s u l t a d o s de u m e s t u d o publi-
eu poderia f u n c i o n a r c o m o u m m e c a n i s m o de defesa.
c a d o s no periódico Organization
O s participantes da p e s q u i s a j u s t i f i c a r a m esse desapego
Studies.
Eles d i s s o c i a m
seu sentido do eu ( s e l f ) t ã o r a d i c a l m e n t e de seu trabalho
psicológico c o n s i d e r a n d o a excelente r e m u n e r a ç ã o que
que p e s q u i s a d o r e s c u n h a r a m u m n o v o t e r m o para o fe-
tinham em seus cargos.
n ó m e n o : teflonic identity
maneuvermg
que, em tradução
O p s i c ó l o g o c l í n i c o A l d e n C a s s , que não esteve
livre, quer d i z e r algo c o m o " e s t r a t é g i a de i d e n t i d a d e
e n v o l v i d o no e s t u d o , a l e r t a p a r a o ó n u s
teflônica", n u m a referência ao t e f l o n , material u s a d o para
de longo p r a z o p r e s e n t e no u s o d e s s e tipo de recurso
psicológico
revestimento porque não se altera e m contato c o m outro.
p s í q u i c o de p r o t e ç ã o . " Q u a n d o p e s s o a s c o l o c a m o
A i n s p i r a ç ã o para a n o m e n c l a t u r a v e i o de u m a série
d i n h e i r o a c i m a da p r ó p r i a s a ú d e e i s s o se estende no
de e n t r e v i s t a s e m p r o f u n d i d a d e c o n d u z i d a s ao longo
t e m p o , há r i s c o de e x a u s t ã o m e n t a l , a p a r e c i m e n t o de
de q u a s e dois a n o s c o m s e i s e x e c u t i v o s de i n s t i t u i ç õ e s
d o e n ç a s f í s i c a s , p r o b l e m a s de a b u s o de s u b s t â n c i a s e
financeiras
d i f i c u l d a d e s de r e l a c i o n a m e n t o " , o b s e r v a . E m r a z ã o de
que t r a b a l h a v a m c o m altos i n v e s t i m e n t o s
e m L o n d r e s . D u r a n t e os e n c o n t r o s , t o d o s eles d e s c r e -
s e u s p o u c o s p a r t i c i p a n t e s , o e s t u d o pode não se a p l i c a r
v e r a m s i t u a ç õ e s e m que c o n t o r n a r a m ou e v i t a r a m re-
a o u t r o s t i p o s de p r o f i s s i o n a i s c o m alta r e m u n e r a ç ã o ,
g u l a r m e n t e d e s e n v o l v e r e m a n t e r a i d e n t i f i c a ç ã o afetiva
m a s ele é n o t á v e l , d a d a a e s c a s s e z de p e s q u i s a s s o b r e
c o m o t r a b a l h o . E m u m a d a s e n t r e v i s t a s , por e x e m p l o ,
a falta de i d e n t i d a d e . A g o r a , os a u t o r e s se p e r g u n t a m se
u m d o s p r o f i s s i o n a i s fez o s e g u i n t e c o m e n t á r i o s o b r e
e s t r a t é g i a s de i d e n t i d a d e teflônica o c o r r e m t a m b é m e m
s e u chefe e x p l o s i v o : " A g o r a j á e s t o u m e i o a c o s t u m a d o ,
o u t r o s a m b i e n t e s de e l e v a d o nível de e s t r e s s e , c o m o no
as e x p l o s õ e s p a s s a m ao largo e j á n ã o m e a f e t a m . Eu
mundo académico.
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Conhecimento e informação a u m dique.
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livro | r e s e n h a
IUTILJ A UTILIDADE DO INÚTIL UM MANIFESTO Nuccio Ordine. Zahar, 2016.
DADIos INÚTIL «NUÍCIOORDINM
224 págs. I m p r e s s o : R$ 39,90.
UM MANIFESTO
Digital: R$ 2 4 , 9 0
E m defesa das inutilidades necessárias A
VIDA
INTELECTUAL
E
ESPIRITUAL,
BEM
COMO
O
A U T O C O N H ECI M E N T O
R A R A M E N T E T Ê M A P L I C A Ç Ã O IM EDIATA O U LUCRATIVA, Al N DA ASSI M, S Ã O ESSES DO SABER QUE
NOS
FAZEM
E A
ARTE
CAMPOS
HUMANOS
por Gláucia Leal
E
m 1985, a b a n d a b r a s i l e i r a de rock Ultraje a rigor lançou e m s e u primei-
ro á l b u m , Nós vamos invadir sua praia, a
m ú s i c a Agente somos inútil, que logo se t o r n a r i a s u c e s s o n a s r á d i o s de t o d o o país. P a s s a d a s três d é c a d a s , a letra c o m o erro proposital de g r a m á t i c a volta e m e i a reaparece e m v i n h e t a s de a l g u m p r o g r a m a de h u m o r ou na i n t e r n e t . Por trás da crítica rasa e b e m - h u m o r a d a à falta de objetivo e c o m p r o m e t i m e n t o s o c i a l da j u v e n t u d e - n u m a é p o c a e m que surgia a c a m p a n h a d a s D i r e t a s Já - , a canção remete a u m a
pergunta
f u n d a n t e da f i l o s o f i a : q u a l o s e n t i d o da existência?
E e s s a pode d e s d o b r a r - s e
A lógica do utilitarismo e o "culto à posse" p o d e m ser perigosos, pois colocam e m risco não só as manifestações culturais e a criatividade, m a s também os valores afetivos e morais
e m o u t r a : o que é r e a l m e n t e n e c e s s á -
O autor defende que, m e s m o e m períodos de c r i s e c o m o o que v i v e m o s , n e m só o que t e m f u n ç ã o clara, finalidade clara ou p r o d u z lucro pode ser considerado nec e s s á r i o . N ã o por a c a s o , nos m o m e n t o s m a i s s e n s í v e i s , o que parece dispensável é s a c r i f i c a d o , t a n t o na vida particular quanto na esfera p ú b l i c a . A d i s c u s s ã o parece pertinente, j u s t a m e n t e quando cortes no o r ç a m e n t o para a c u l t u r a , p r i v a t i z a ç ã o de p e s q u i s a s , f e c h a m e n t o de livrarias e b a n c a s de jornal s ã o u m f e n ó m e n o e m t a n t o s p a í s e s . O r d i n e c h a m a a atenção para a lógica do utilitarismo e para o que d e n o m i n a "culto à p o s s e " , m o v i m e n t o s que p o d e m ser p e r i g o s o s , pois c o l o c a m e m risco as manifestações culturais, a cria-
rio - ou útil? E m t e m p o s de c o n s u m i s m o d e s e n f r e a d o
tividade, instituições de ensino e até m e s m o valores afetivos
de u m lado e de i n i c i a t i v a s c a d a v e z m a i s f r e q u e n t e s de
e m o r a i s . R e c é m - l a n ç a d o no B r a s i l , o livro foi publicado na
c i d a d a n i a e c o n s c i e n t i z a ç ã o de o u t r o , o p r o f e s s o r de
Itália e m 2013 e já foi t r a d u z i d o e m m a i s de 15 i d i o m a s ,
l i t e r a t u r a i t a l i a n a N u c c i o O r d i n e , da U n i v e r s i d a d e da
Logo na i n t r o d u ç ã o O r d i n e cita Pierre H a d o t , a u t o r
C a l á b r i a , d e b r u ç a - s e s o b r e e s s a q u e s t ã o e m A utilidade
de Exercícios espirituais efilosofia antiga (2002, lançado no Brasil
do inútil - Um manifesto.
em 2014 pela É Realizações):
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" E a tarefa da filosofia é m e s m o
1
"Não é u m acaso que nas últimas décadas as disciplinas humanas tenham passado a ser consideradas inúteis e tenham sido marginalizadas não somente nos currículos escolares e universitários, mas sobretudo nos orçamentos governamentais e nos recursos das fundações e das entidades privadas. Por que empregar dinheiro n u m âmbito condenado a não produzir lucro? Por que destinar recursos a saberes que não trazem u m a vantagem rápida e tangível? Dentro desse contexto fundado exclusivamente n a necessidade de pesar e medir c o m base e m critérios que privilegiam a quantias, a literatura (mas o m e s m o discurso também poderia valer para outros saberes humanísticos e para aqueles saberes científicos livres de u m imediato objetivo utilitarista) pode, e m vez disso, assumir u m a função fundamental, importantíssima: exatamente por ser imune a qualquer aspiração a lucros poderia colocar-se, por si mesma, c o m o u m a forma de resistência aos egoísmos do presente, c o m o antídoto à barbárie da utilidade, que chega m e s m o a corromper as nossas relações sociais e os nossos afetos mais profundos. Sua própria existência, de fato, c h a m a a atenção para a gratuidade e para o desinteresse, valores considerados quase contracorrente e fora de moda."
a de d e s v e n d a r e de revelar aos h o m e n s a utilidade do inútil
Ao longo do livro, O r d i n e recorre a p e n s a d o r e s c o m o
o u , e m outras palavras, ensiná-los a distinguir entre os dois
Platão, O v í d i o , Aristóteles, S h a k e s p e a r e , M o n t a i g n e , Kant,
sentidos da palavra útil". E logo esclarece: " N u m a acepção
Locke, C e r v a n t e s , l o n e s c o , Bataile, G r a m s c i e t a n t o s outros
muito universal, coloco no centrojdas m i n h a s reflexões a
para c o n s t r u i r u m painel sobre o t e m a . A o f i n a l , o leitor é
ideia da utilidade daqueles saberes cujo valor essencial está
brindado c o m u m e n s a i o inédito e m p o r t u g u ê s , a s s i n a d o
completamente desvinculado de qualquer fim utilitarista. H á
pelo e d u c a d o r a m e r i c a n o A b r a h a m Flexner, que m o s t r a
saberes que t ê m u m fim e m si m e s m o s e que - exatamente
c o m o as c i ê n c i a s exatas t a m b é m nos e n s i n a m a utilidade
graças à s u a natureza gratuita e livre de interesses, distante
do inútil. A gente " s o m o s inútil"? Talvez não, d e p e n d e de
de qualquer vínculo prático e comercial - podem d e s e m -
nossas escolhas.
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penhar u m papel f u n d a m e n t a l no cultivo do espírito e no c r e s c i m e n t o civil e cultural da h u m a n i d a d e . N e s s e sentido, considero o que nos ajuda a nos t o r n a r m o s m e l h o r e s " .
GLÁUCIA LEAL é psicóloga, psicanalista, jornalista e editora-chefe de Mente e Cérebro. março 2016 • mentecérebro 63
livros | lançamentos I I I 1I ! I I I I 1I I I I I
ESTADO
CRISE
Além d a e c o n o m i a e d a política Ao comparar grandes colapsos socioeconómicos históricos, como a crise de 1929, é difícil dizer com exatidão qual foi o de maior impacto, sobretudo porque os critérios de avaliação são diferentes. Mais do que a desvalorização do dinheiro ou do poder aquisitivo, o que está em jogo é um sentimento generalizado de dificuldades, afirmam Zygmunt Bauman e Carlo Bordoni em Estado de crise. Para os autores, a atualidade é um reflexo de transformações mais profundas, enraizadas no rompimento de perspectivas e certezas. Bauman e Bordoni defendem que esse sentimento de desamparo, na verdade, não é passageiro, resultado de contextos momentâneos de instabilidade política e económica. E essa compreensão é essencial para entender a sociedade e cultura ocidental.
Estado de crise. Carlo Bordoni e Zygmunt B a u m a n . Z a h a r , 2 0 1 6 . 192 págs. R$ 49,90
LITERATURA
NEUROPSICOLOGIA
FOCO
PSICANÁLISE
Releitura do mito
Teoria e intervenção
Tecnologia e atenção
Conexões
A neuropsicologia é uma área multidisciplinar. Considerando essa diversidade de referências e campos de conhecimento, os psicólogos Flávia Heloísa dos Santos, Vivian Maria Andrade e Orlando F. A. Bueno reuniram em Neuropsicologia hoje artigos de profissionais da medicina, psicanálise, educação e biologia para abordar a amplitude da neuropsicologia. Dividida em cinco partes, a obra define a área e suas principais bases teóricas e discute as diferenças de abordagem e intervenção necessárias em cada etapa da vida.
Smartphones e computadores estão cada vez mais presentes no cotidiano de todas as gerações. Como essa interação diária com enormes quantidades de novas informações pode estar afetando nossas funções cerebrais, em especial a atenção? O psicólogo Daniel Goleman e o fundador da Society for Organizational Learning, Peter Senge, tratam do desafio de manter a concentração em O foco triplo. O conceito da obra se baseia na exploração de três variáveis do foco: interno, no outro (ligado à empatia) e externo.
Sigmund Freud fez referência ao personagem Édipo para ilustrar conceitos fundamentais de suas teorias sobre o inconsciente. Anos depois, Jacques Lacan retomou o mito, complementando e discutindo aspectos já abordados. Em Édipo ao pé da letra, o psiquiatra e psicanalista Antonio Quinet refaz o percurso dos dois psicanalistas sobre o tema. Nesse livro o autor revela pontos da história que merecem continuar presentes nos debates sobre o conceito formado a partir de Édipo, esclarecendo as particularidades interessantes para a psicanálise da peça Édipo rei, de Sófocles.
Em Litorais da psicanálise, a psicanalista Ana Costa discute as aproximações da psicanálise com a literatura, o cinema e as artes visuais. Fazendo referências a produções culturais de nomes como Homero, Joyce, Kafka e Proust, a autora se aprofunda em temas relevantes do universo psíquico, como memória, angústia, trauma e identificação. O livro se divide em três partes principais: letras e bordas dos discursos, o corpo no litoral da ciência e telas; bordas, objetos: elementos de escritas.
Neuropsicologia hoje.
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Flávia H e l o í s a dos S a n t o s , Vivian
Édipo ao pé da letra.
Maria A n d r a d e e O r l a n d o F. A.
Antonio Q u i n e t . Zahar, 2 0 1 5 .
O foco triplo.
Litorais da psicanálise.
Bueno (orgs.). A r t m e d , 2015. 336
184 págs. R$ 4 9 , 9 0
Daniel G o l e m a n e Peter Senge.
Ana Costa. Escuta, 2015.
págs. R$ 94,00
Objetiva, 2016. 128 págs. R$ 29,90
220 págs. R $ 63,00
COLI:TÂNEA
Relações entre arte e psicanálise Seja pela constante referência a produções artísticas em seus textos ou pela habilidade literária que mostrou ao relatar seus casos clínicos, Freud é considerado profundo conhecedor e amante da arte. Novo volume da série Obras incompletas de Sigmund Freud, Arte, literatura e os artistas reúne ensaios e artigos do psicanalista sobre o processo criativo e a repercussão e o efeitos de obras plásticas e literárias sobre o espectador e os próprios artistas. Freud discute, da perspectiva psicanalítica, o trabalho de ícones culturais como Leonardo da Vinci, Michelangelo e Dostoiévski. O autor faz um paralelo entre o trabalho do artista e o do psicanalista, tratando a arte como ferramenta para alívio do sofrimento psíquico. A coletânea traz também o discurso de agradecimento de Freud ao receber o prémio Goethe de literatura em 1930.
MH
Arte, literatura e os artistas. S i g m u n d Freud. Autêntica, 2 0 1 5 . 3 4 4 págs. R$ 4 9 , 0 0
C a iI xx a
L úd ic
O q u e e u faço c o m você' você? Tem hora que a gente cansa, quer coisas novas. E, às vezes, na ânsia de se reinventar, tentamos deixar de lado o que nos lembra fases que desejamos superar. Algumas vezes até amores ficam para trás. Com o menino do livro Adeus, Meião, do escritor e ilustrador francês Benjamin Chaud, foi assim. Um belo dia, o garoto decidiu que estava grande demais para ter um coelho gordo e bonachão, de enormes orelhas caídas (daí o nome). E, portanto, precisava livrar-se do bichinho que não pareceria ser lá muito esperto, já que nem futebol sabia jogar. O menino arquitetou seu plano. Claro, não diria nada sobre suas intenções ao coelho que havia sido seu melhor amigo: levaria Meião para passear no bosque onde costumavam brincar e simplesmente o abandonaria. Algo, porém, parecia diferente, havia mais sombra e nenhum dos dois parecia muito disposto a correr pela grama. "Vai, Meião. Você está livre." Mas o animal nem se mexia, apenas olhava para seu dono. O menino logo percebeu que descartar alguém que confia em nós não é algo tão simples. Aos poucos, ele foi ficando impaciente, até que finalmente decidiu tomar uma medida drástica: amarrou Meião numa árvore, usando um fio que escapava de sua blusa - e correu. Porém, assolado pelo remorso, logo voltou ao bosque. Mas Meião já não estava lá. De repente, o bosque parecia muito perigoso para um coelho e o menino, arrependido, só queria reencontrar o amigo e desculpar-se. O que ele não sabia é que as amizades an-
tigas, já construídas, não precisam ser destruídas para que possamos fazer novos laços. Além disso, relacionamentos podem se transformar, mas não é preciso destruir o afeto, a confiança, o amor. No reencontro com Meião o garoto se dá conta de que talvez o amigo não fosse assim tão pesado de se carregar e parecia ter ficado até mais esperto... Escrito na primeira pessoa, o livro deflagra reflexões sobre escolhas, empatia, relacionamento, amizade, respeito e comprometimento com o cuidado de animais pelos quais nos responsabilizamos. (Gláucia Leal, editora-chefe)
ADEUS, MEIÃO Benjamin Chaud S M , 2015 4 0 págs. R$ 4 4 , 0 0
março 2016 • mentecérebro 65
limiar neurociencias
A hora e vez de Marcus Matraga ASSASSINADO C O M U M TIRO NA CABEÇA, MARCUS V I N Í C I U S DE O L I V E I R A S I L V A E R A P S I C Ó L O G O , U M D O S F U N D A D O R E S DA LUTA
SIDARTA RIBEIRO
ANTI MAN I C O M I AL N O B R A S I L
N
o dia 4 de f e v e r e i r o , no m u n i c í -
defender í n d i o s , c r a c u d o s e l o u c o s .
Do alto da ribanceira os matadores
pio de J a g u a r i p e , d o i s h o m e n s
O que dá na cabeça d u m a pessoa ao
de A u g u s t o Matraga riram da morte
sequestraram e executaram Marcus
mandar fazer isso? Q u e titica de galinha
dele, m a s o G u i m a r ã e s Rosa fez outra
V i n í c i u s de O l i v e i r a S i l v a c o m
um
têm na cabeça as duas almas sebosas
chance. O M a r c u s Matraga foi herói da
Marcus
que tiraram a s s i m a vida de u m irmão?
vida real, saiu de casa para ajudar u m a amiga. C o m o disse o Edmar Oliveira,
tiro na c a b e ç a . O s a u d o s o
" M a t r a g a " era p s i c ó l o g o e p r o f e s s o r
Q u e doença é e s s a , pelamordedeus?
a p o s e n t a d o da U n i v e r s i d a d e Federal
Foi pra tomar terra de índio? Briga de
na sua hora e vez nosso Matraga estava
da B a h i a . Foi u m d o s
vizinho? Problema de arame farpado e
c o m o s e m p r e esteve: em ato de amor
mourão? Nada justifica.
ao próximo.
fundadores
da L u t a A n t i m a n i c o m i a l
brasileira
e diretor do C o n s e l h o R e g i o n a l de
G u e r r e i r ® do A m o r luta pela vida
M a s e r a a r m a d i l h a de m a c a c o
P s i c o l o g i a de S ã o P a u l o , o n d e co-
e o direito de ser do fraco. A s s a s s i n o
h o m e m . A barra p e s o u . O céu fechou.
o r d e n o u a C o m i s s ã o N a c i o n a l de
covarde tocaia e mata c o m bala ou
Muito axé pras filhas, companhei-
Direitos H u m a n o s . C o r a j o s o e lúcido
faca de t u c u m no m e s m o recôncavo
ra e a m i g o s v e n c e r e m a dor: força e
como poucos. Muito poucos.
sovaco reboco do Brasil arcaico que
união. Pra todos da tribo, atenção e
N i n g u é m p e r m i t a q u e i s s o seja
matou Besouro Mangangá. O convexo
cuidado. D o s i r m ã o s índios de S a m p a
feito a a l g u é m que v o c ê a m a . N ã o
do capacho do esculacho do jagunço do
o aprendizado da floresta: sananga no
m a t a r á s , não m a t a r á s , não m a t a r á s .
vão mais baixo. Sesmaria de matança
olho tira p a n e m a .
Isso três vezes pra não esquecer, ani-
e tortura de G a r c i a D Á v i l a e t a n t o s
m a l . H o m e m que m a n d a matar outro
outros criminosos da m e s m a cepa. Da
h o m e m e depois foge... A n i m a l bruto
m e s m a laia.
s e m razão, n e m j u s t i ç a , n e m amor.
U n s bons filhos da justa, injusta que
G u e r r e i r ® do A m o r é quem luta até
c u s p a j u s t i ç a . Q u e j u s t i ç a ? Ali n u n c a
o fim contra o desamor. Isso é que é.
teve justiça... Ali ou aqui? Ali c o m certe-
Até o fim ele lutou ferrenhamente para
z a não. H a j a v i s t o . . . O que a c o n t e c e u .
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Abre o olho, B e s o u r o . O m a c a c o está a r m a d o .
®
SIDARTA RIBEIRO, neurobiólogo, diretor do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e professor titular da UFRN.
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EVENTOS
Para ir além do que se vê, é preciso ir mais fundo.
Edição especial Inconsciente - um estranho na sua cabeça traz seleção de artigos com as mais recentes descobertas sobre o que se passa em nossa mente.
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