E.SELLIN G. FOHRER
INTRODUÇAO AO ANTIGO TESTAMENTO Volumes 1 e 2 Tradução: D. Mateus Rocha
2007
ACADEMIA
CRISTÃ
~
PAULUS
© Editora Academia Cristã © Quelle & Meyer, Heidelberg
Título original: Einleitung in das Alte Testament
Supervisão Editorial: Luiz Henrique A. Silva Paulo Cappelletti
Layout,e artefinal: Regina da Silva Nogueira Regina de Moura Nogueira
Tradução: D. Mateus Rocha
Revisão: H. Dalbosco
Capa: [ames Valdana VaI. 1 A origem dos livros históricos e dos códigos legais, Pentateuro e Livros Históricos VaI. 2 Livro de Cânticos, Livros Sapienciais, Livros Proféticos, Livro Apocalíptico (Dn), Compilação e Tradição do AT
Assessoria para assuntos relacionados a Biblioteconomia: Claudio Antônio Gomes S 467
Sellin, Ernest Introdução ao Antigo Testamento./E. Sellin; G. Fohrer; trad. O. Mateus Rocha - São Paulo: Ed. Academia Cristã Ltda, 2007. Título original: Einleitung in das Alte Testament 16x23 em: 840 páginas ISBN 978-85-98481-18-0 Bibliografia Conteúdo: v. 1 A origem dos livros históricos e dos códigos legais, Pentateuco e livros históricos. v. 2 Livro de cânticos, livros sapienciais, livros proféticos, livro apocalíptico (Dn), compilação e tradição do AT - Publicação em um volume. 1- Bíblia - A. T. - Introdução. I. Título
COU-221.01
Índice para catálogo sistemático: 1. Antigo Testamento: Introdução
221.01
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer forma ou meio eletrônico e mecânico, inclusive através de processos xerográficos, sem permissão expressa da editora (Lei nº 9.610 de 19.2.1998). Todos os direitos reservados à EDITORA ACADEMIA CRISTÃ LIDA. Rua Marina, 333 - Santo André Cep 09070-510 - São Paulo, SP - Brasil Fonefax (l1) 4424-1204/4421-8170 Email:
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PAULUS
EDITORA Rua Francisco Cruz, 229 Cep 04117-091 - São Paulo, SP - Brasil Tel.: (l1) 5084-3066 e Fax: (011) 5579-3627
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SUMÁRIO SUMÁRIO
5
ABREVIATURAS
21
APRESENTAÇÃO
27
PREFÁCIO À
EDIÇÃO ALEMÃ
29
PREFÁCIO À 11il EDIÇÃO ALEMÃ
31
INTRODUÇÃO: - LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO ANTIGO TESTAMENTO
33
lOil
§ 1. FUNÇÃO, HISTÓRIA E MÉTODOS DA CIÊNCIA INTRODUTÓRIA33 1. O AT e os estudos introdutórios 34 2. Os inícios 35 3. O desenvolvimento da pesquisa histórico-crítica 38 4. Novos métodos 39 5. A função da introdução 44 § 2. PRESSUPOSTOS DA LITERATURA ISRAELÍTICA 1. Pressupostos históricos e geográficos 2. Pressupostos culturais 3. Pressupostos literários 4. O significado da fé javista
44 46 47 50 51
§ 3. TRADIÇÃO ORAL E LITERATURA 1. O problema 2. Tradição oral e escrita 3. Tradição oral e escrita em Israel
51 52 53 56
§ 4. A PROSA 1. Forma atual 2. Características de linguagem 3. Peculiaridades estilísticas
58 58 59 60
6
SUMÁRIO
§ 5. A POESIA
1. 2. 3. 4. 5.
O uso da poesia O verso longo O verso breve O metro e o ritmo Recursos poéticos
§ 6. LITERATURA ISRAELÍTICA E ANTIGO TESTAMENTO 1. O AT como resto da literatura israelítica
2. A problemática da história da literatura
60 62 64 65 67 69 70 70 71
Primeira Parte A Origem dos Livros Históricos e dos Códigos Legais CAPÍTULO I - CONDIÇÕES GERAIS
75
§ 7. O DIREITO, A INTRODUÇÃO, A NARRATIVA E O RELATO NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL 1. Visão panorâmica 2. O direito no Antigo Oriente 3. A instrução no Antigo Oriente 4. A narrativa no Antigo Oriente 5. O relato no Antigo Oriente 6. As cartas no Antigo Oriente 7. Em Israel
75 76 77 81 83 87 91 92
§ 8. OS GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES 1. As máximas de vida 2. Normas de vida e de comportamento em estilo apodítico 3. Axiomas legais e princípios jurídicos 4. Formas retóricas ligadas à fase processual 5. Acordos e contratos
92 94 97 100 102 103
§ 9. OS GÊNEROS LITERÁRIOS IMPETRATIVOS E DESIDERATIVOS E SUAS TRADIÇÕES 1. A súplica e o desejo 2. Fórmulas de saudação 3. Bênçãos e maldições 4. Juramentos
106 107 108 109 110
SUMÁRIO
7
§ 10. OS GÊNEROS QUERIGMÁTICOS E DOUTRINAIS E SUAS
TRADIÇÕES 1. Oráculos 2. Ordálio 3. Torá 4. Normas cultuais e o saber sacerdotal.. 5. Aprovação, rejeição, censura § 11. OS GÊNEROS LITERÁRIOS DE TRANSMISSÃO E COMUNICAÇÃO E SUAS TRADIÇÕES 1. Diálogos 2. Discursos 3. Pregação 4. Orações 5. Cartas 6. Epístolas
110 111 112 113 114 115
115 116 117 119 120 121 122
§ 12. OS GÊNEROS LITERÁRIOS NARRATIVOS E SUAS
TRADIÇÕES 1. Suas relações em comum 2. Mito 3. Conto 4. Novela 5. Anedota 6. Saga e lenda 7. Significação histórica e teológica
122 123 125 128 129 129 129 134
§ 13. OS GÊNEROS LITERÁRIOS INFORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES 1. Listas 2. Anais e crônicas 3. A narrativa histórica e a historiografia 4. Biografia 5. Notícias sobre sonhos
136 137 139 140 141 142
§ 14. OUTROS GÊNEROS LITERÁRIOS E SUA INFLUÊNCIA SOBRE OUTROS LIVROS 1. Outros gêneros literários 2. Influência em outros livros
142 142 143
8
SUMÁRIO
§ 15. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
1. Códigos legais 2. Partes da narrativa e da história 3. Livros históricos e jurídicos posteriores
143 143 145 146
CAPÍTULO II - O PENTATEUCO
147
§ 16. NOMES E CONTEÚDO 1. Terminologia 2. Conteúdo
147 147 148
§ 17. A PESQUISA DO PENTATEUCO ATÉ OS NOSSOS DIAS 1. Tradição 2. Tentativas de resolver o problema 3. Novas abordagens
151 151 153 158
§ 18. MÉTODOS, RESULTADOS E PROBLEMAS 1. Resultados das pesquisas 2. O método das adições 3. O método complementar 4. O método das composições 5. Os motivos e as forças
161 161 162 164 165 165
§ 19. A ORIGEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS 1. Os patriarcas 2. Moisés 3. Outras narrativas sobre a conquista do país 4. O desenvolvimento das narrativas fundamentais 5. As duas narrativas fundamentais
170 171 176 178 179 182
§ 20. A ORIGEM DAS COLEÇÕES E CÓDIGOS JURÍDICOS NÃOAUTÔNOMOS 1. Conspecto geral 2. O Código da Aliança 3. A Lei da Santidade 4. Outras coleções de leis
186 187 187 193 199
§ 21. A ORIGEM DOS "ESTRATOS FONTES"
1. Redação posterior dos "estratos fontes" 2. Inclusão de coleções de leis e códigos 3. Caráter e natureza dos "estratos fontes"
201 201 202 203
SUMÁRIO
9
§ 22. O "ESTRATO FONTE" J 1. Terminologia e conteúdo 2. A tradição anterior e o contributo de J 3. Características de conteúdo 4. Teologia de J 5. Origem de J
204 205 207 209 210 211
§ 23. O "ESTRATO FONTE" E 1. Terminologia e conteúdo 2. Outros pontos de vista e variantes 3. A tradição anterior e o contributo de E 4. Características de conteúdo e teologia de E 5. Origem de E
212 213 215 216 218 220
§ 24. O PROBLEMA DE UM TERCEIRO ANTIGO "ESTRATO FONTE" (Jl, L, N) 1. A suposição de um terceiro "estrato" 2. Terminologia e conteúdo 3. A tradição anterior e o contributo de N 4. Características de conteúdo e teologia de N 5. Origem de N
221 221 223 225 227 229
§ 25. O "ESTRATO FONTE" D 1. Terminologia, extensão, estrutura e estilo 2. Relação com a reforma de [osias 3. Extensão e conteúdo do Deuteronômio original (ProtoDeuteronômio) 4. Origem do código de leis do "Deuteronômio original" 5. O caminho percorrido desde o código original até o livro atual 6. O Deuteronômio no Pentateuco 7. Teologia do Deuteronômio
229 231 232
§ 26. O "ESTRATO FONTE" P 1. Terminologia e conteúdo 2. A tradição anterior e o contributo de P 3. O problema da unidade literária 4. Características de conteúdo de P 5. A teologia de P 6. Origem de P
247 247 250 251 253 255 256
235 238 242 245 245
10
SUMÁRIO
§ 27. FRAGMENTOS ISOLADOS FORA DOS "ESTRATOS FONTES" 1. Gênesis 14 2. Êxodo 15.1-19 3. Êxodo 19.3b-8 4. Deuteronômio 32.1-43
257 258 259 261 261
§ 28. A ORIGEM DO PENTATEUCO
262
TRANSIÇÃO
265
§ 29. HIPÓTESES SOBRE A EXISTÊNCIA DE OBRAS GLOBAIS 1. Hipóteses 2. Crítica 3. O processo de formação dos livros históricos
265 ,. 265 266 268
CAPÍTULO UI - OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (OS PRIMEIROS PROFETAS)
271
§ 30. O LIVRO DE JOSUÉ, MAIS JZ 1.1-2.5 1. Terminologia, conteúdo, "estratos fontes" 2. O "estrato fonte" N 3. O "estrato fonte" G2 4. Os "estratos fontes" J e E 5. Redação deuteronomista 6. O "estrato fonte" P 7. Separação do Pentateuco
271 272 273 275 278 280 281 283
§ 31. O LIVRO DOS JUÍZES 1. Terminologia e conteúdo 2. Os "Juízes" 3. As tradições sobre as figuras dos heróis 4. O livro pré-deuteronomista dos Juízes 5. O livro deuteronomista dos Juízes 6. Acréscimos posteriores 7. Resumo 8. Valor histórico e características teológicas
284 284 285 287 292 293 294 295 296
§ 32. OS LIVROS DE SAMUEL 1. Terminologia e conteúdo 2. Fontes contínuas ou fragmentos isolados? 3. A camada fundamental
296 297 299 301
SUMÁRIO
4. 5. 6. 7. 8.
A formação da camada fundamental e seus acréscimos A camada suplementar A redação deuteronomista Conclusão Valor histórico e características teológicas
11
306 307 310 310 311
§ 33. OS LIVROS DOS REIS 1. Terminologia e conteúdo 2. A formação dos livros 3. A moldura 4. As fontes históricas 5. Os complexos narrativos 6. Os livros deuteronomistas dos Reis 7. Acréscimos posteriores 8. Valor histórico e objetivos teológicos
312 312 313 315 317 319 323 324 324
CAPÍTULO IV - A OBRA HISTÓRiCA CRONÍSTICA
327
§ 34. A OBRA CRONÍSnCA (1-2 CRÔNICAS, ESDRAS, NEEMIAS) 1. Unidade, inversão e divisão 2. Terminologia 3. Conteúdo e objetivos 4. Origem
327 327 328 328 329
§ 35. ORIGEM E PECULIARIDADE DA OBRA CRONÍSTICA 1. Fontes para o período anterior ao exílio 2. Fontes para o período posterior ao exílio 3. Ampliações e acréscimos 4. O emprego das fontes 5. Elementos exclusivos do Cronista 6. Valor histórico 7. Características teológicas
329 330 332 335 336 337 338 339
Capítulo V - OUTROS LIVROS HISTÓRICOS
341
§ 36. O LIVRO DE RUTE 1. Terminologia e conteúdo 2. Gênero literário e contexto histórico 3. Relação com Davi 4. Interpretação 5. Origem
341 341 342 343 344 345
12
SUMÁRIO
§ 37. O LIVRO DE ESTER 1. Terminologia e conteúdo 2. Gênero literário 3. Origem dos materiais narrativos e sua relação com a história 4. Origem 5. Apêndice e acréscimos posteriores 6. Valor
345 346 346 347 349 349 350
Segunda Parte A Origem dos Livros de Cânticos
CAPÍTULO VI - CONSIDERAÇÕES GERAIS
353
§ 38. A POESIA LÍRICA NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL 1. Mesopotâmia 2. Egito 3. O resto do Antigo Oriente 4. A poesia israelítica
353 354 356 357 358
§ 39. OS GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS 1. Distinguir os gêneros literários 2. Cânticos hínicos 3. Cânticos de lamentação 4. Cânticos de ação de graças 5. Cânticos reais 6. Outras formas 7. Salmos em outros livros do AT
359 360 363 367 370 372 373 375
§ 40. OS GÊNEROS LITERÁRIOS LÍRICOS REFERENTES À VIDA QUOTIDIANA 1. Cântico do labor, cântico da colheita e do lagar, cântico da guarda 2. Cântico do vinho 3. Cântico de escárnio 4. Cânticos de amor e cânticos nupciais 5. Cântico guerreiro e cântico de vitória 6. Cântico fúnebre 7. Relação com acontecimentos históricos
376 377 377 378 379 380 382
§ 41. AS CARACTERÍSTICAS DOS GÊNEROS LITERÁRIOS DOS CÂNTICOS NO ANTIGO TESTAMENTO 1. Adaptação de materiais estrangeiros
383 383
375
SUMÁRIO
2. Adaptação de formas estrangeiras 3. Desenvolvimento em Israel
13
383 384
§ 42. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO 1. Compilação e transmissão 2. Cânticos e coleções de cânticos posteriores
385 385 386
CAPÍTULO VII - OS LIVROS DE CÂNTICOS
387
§ 43. O SALTÉRIO 1. Terminologia e numeração 2. Significado dos títulos 3. Autores e idade 4. Visão de conjunto dos gêneros literários, da origem e das relações dos salmos com o culto 5. Compilação e formação do Saltério 6. Concepções teológicas
387 388 389 392 393 406 408
§ 44. AS LAMENTAÇÕES 1. Terminologia 2. Gênero literário e estilo 3. Ocasião e objeto 4. Origem 5. Autor 6. Significado
409 410 410 412 413 414 414
§ 45. O 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.
415 416 416 418 419 420 420 421
CÂNTICO DOS CÂNTICOS Terminologia História da interpretação Cânticos de amor e cânticos nupciais Forma literária Poesia artística Origem Importância
Terceira Parte Origem dos Livros Sapienciais CAPÍTULO VIII - ASPECTOS GERAIS
425
§ 46. A DOUTRINA SAPIENCIAL NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL
425
14
SUMÁRIO
1. 2. 3. 4. 5. 6.
O conceito Mesopotâmia Egito No restante do Antigo Oriente Israel Importância da doutrina sapiencial
426 427 428 430 430 433
§ 47. OS GÊNEROS LITERÁRIOS DA DOUTRINA SAPIENCIAL E SUAS TRADIÇÕES 1. Mashal 2. Provérbio 3. O provérbio enigmático e o provérbio numérico 4. A sentença 5. A poesia sapiencial e didática 6. A parábola, a fábula e a alegoria 7. A ciência das listas 8. Em outros livros do AT
434 434 435 435 437 438 439 440 440
§ 48. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO 1. Compilação e transmissão 2. A formação dos livros sapienciais 3. Livros sapienciais posteriores
442 442 443 444
CAPÍTULO IX - OS LIVROS SAPIENCIAIS
445
§ 49. OS PROVÉRBIOS DE SALOMÃO 1. Terminologia e estrutura 2. Coleção A 3. Coleção B 4. Coleção C 5. Coleção D 6. Coleção E 7. Coleção F 8. Coleção G 9. "A mulher virtuosa" 10. Redação
445 445 446 448 449 450 450 451 452 452 452
§ 50. O LIVRO DE JÓ
453 454 455 457
1. Estrutura 2. A narrativa de moldura 3. O poema
SUMÁRIO
4. 5. 6. 7. 8. 9.
Acréscimos posteriores O livro original e sua origem Relação com a tradição História dos materiais e dos motivos História das formas O problema do livro
§ 51. O ECLESIASTES (COÉLET) 1. Valor canônico, terminologia, autor 2. Origem e estrutura 3. As sentenças 4. Época e lugar 5. História das formas 6. Caráter peculiar de Coélet
15
461 462 463 465 466 468 469 470 471 473 474 475 476
Quarta Parte A Origem dos Livros Proféticos e do Livro Apocalíptico CAPÍTULO X - ASPECTOS GERAIS
483
§ 52. A profecia no Antigo Oriente e em Israel 1. O Antigo Oriente 2. Antigo Israel 3. A época da chamada profecia escrita 4. Profetismo escatológico 5. Apocalíptica
483 484 487 487 489 490
§ 53. A PREGAÇÃO PROFÉTICA E SEUS GÊNEROS LITERÁRIOS 1. A função dos profetas 2. Gênese do oráculo profético 3. Estilo do oráculo profético 4. Gêneros literários 5. Relação com a tradição
491 492 493 494 495 504
§ 54. Compilação e transmissão 1. A origem da tradição 2. A origem dos escritos proféticos 3. Estrutura das coleções e livros 4. Livros proféticos apocalípticos posteriores
506 506 508 509 511
16
SUMÁRIO
CAPÍTULO XI - OS LIVROS PROFÉTICOS
513
§ 55. VISÃO DE CONJUNTO
513
§ 56. ISAÍAS I (ls 1-39) 1. Isaías 2.' Atividade de Isaías 3. Oráculos e relatos 4. Ditos posteriores 5. Origem do livro 6. Pregação
514 514 515 516 520 524 525
§ 57. DÊUTERO-ISAÍAS (ls 40-55) 1. Dêutero-Isaías 2. Época e lugar 3. Gêneros literários 4. Oráculos sobre o Servo de Javé 5. Composição e estrutura 6. Pregação
527 528 529 532 532 538 540
§ 58. TRITO-ISAÍAS (Is 56-66) 1. Trito-Isaías 2. Autor e época 3. Oráculos ou seções independentes 4. Grupos de temas
542 542 543 544 548
§ 59. JEREMIAS 1. Jeremias 2. Atividade de Jeremias 3. Transmissão escrita 4. O escrito de Baruc 5. Ditos posteriores 6. Origem do livro 7. Pregação
548 549 550 553 561 563 564 565
§ 60. EZEQUIEL 1. As informações do livro 2. Os problemas históricos 3. Atividade de Ezequiel 4. O exercício da pregação de Ezequiel 5. Ditos posteriores
568 569 570 575 576 578
SUMÁRIO
6. Tradição dos oráculos e dos relatos 7. Personalidade de Ezequiel 8. A pregação de Ezequiel e seus problemas
17
579 584 585
§ 61. OSÉIAS 1. Relações pessoais de Oséias 2. Mulher e filhos de Oséias 3. Oráculos 4. Tradição 5. Pregação
589 590 591 594 595 597
§ 62. JOEL 1. Joel 2. Significação dos capítulos 1-2 3. Unidade do livro 4. Época da atividade de [oel 5. Pregação
599 600 600 602 604 605
§ 63. AMÓS 1. Amós e sua profissão 2. Época da atividade de Amós 3. Oráculos e relatos coleções parciais 4. Palavras de época posterior 5. Origem do livro 6. Pregação
606 607 610 611 614 616 616
§ 64. ABDIAS 1. Os oráculos isolados 2. Época 3. Pregação
618 618 619 620
§ 65. JONAS 1. Narrativa 2. Historicidade e origem do material narrativo 3. Gênero literário 4. Época 5. Cântico de ação de graças 6. Intenção
621 621 622 623 623 624 624
§ 66. MIQUÉIAS 1. Miquéias
625 625
18
SUMÁRIO
2. 3. 4. 5. 6. 7.
Primeira coleção de oráculos Segunda coleção de oráculos Terceira coleção de oráculos Quarta seção Estrutura do livro Pregação
626 628 629 630 630 630
§ 67. NAUM 1. Naum 2. Época 3. O hino 4. Os oráculos 5. O livro em seu conjunto 6. Pregação
631 632 632 633 634 635 636
§ 68. HABACUC 1. Habacuc 2. Tradição 3. O conjunto da profecia 4. A questão central: o "ímpio" e os caldeus 5. Época 6. O caráter de Habacuc
637 637 637 639 641 642 642
§ 69. SOFONIAS 1. Lista de antepassados e época 2. Oráculos 3. Redação 4. Pregação
643 643 644 645 645
§ 70. AGEU 1. Ageu 2. Oráculos 3. O livro 4. Pregação
646 646 647 648 649
§ 71. ZACARIAS (Zc 1-8) 1. Zacarias e sua época 2. Oráculos e relatos 3. Origem do escrito 4. Pregação
649 650 650 654 654
SUMÁRIO
19
§ 72. ZACARIAS 9-14 1. Questões principais 2. Dêutero-Zacarias 3. Trito-Zacarias 4. Resumo
655 655 658 659 660
§ 73. MALAQUIAS 1. Malaquias 2. Oráculos 3. Época 4. Pregação
661 661 662 663 663
CAPÍTULO XII - O LIVRO APOCALÍPTICO
665
§ 74. DANIEL 1. A pretensão do livro Daniel 2. Questões literárias 3. Narrativas 4. Relatos 5. Origem do livro 6. Época 7. Bilingüismo 8. Apocalipse
665 666 668 669 671 673 674 675 676
Quinta Parte Compilação e Transmissão do Antigo Testamento CAPÍTULO XIII - ORIGEM E HISTÓRIA DO CÂNON HEBRAICO
681
§ 75. NOME E CONCEITO TRADICIONAL 1. O cânon; livros deuterocanônicos e não-canônicos 2. Conceito tradicional
681 681 684
§ 76. ORIGEM 00 CÂNON HEBRAICO 1. Pressuposto 2. Pré-história 3. Formação do cânon hebraico 4. Divisão
685 685 687 689 690
§ 77. OUTRAS FORMAS DO CÂNON 1. Samaritanos
691 691
20
SUMÁRIO
2. Judaísmo helenístico 3. Cristianismo
692 692
CAPÍTULO XIV - HISTÓRIA DO TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO ..... 695 § 78. O TEXTO MASSORÉTICO 1. O texto tem a sua história 2. Conceito tradicional 3. Rolo manuscrito e escrita 4. Preocupação por uma transmissão exata 5. Forma básica do texto massorético 6. A atividade dos "escribas" 7. Os massoretas 8. Desenvolvimento até o "textus receptus" 9. Divisão do texto
695 696 697 699 701 706 707 708 710 711
§ 79. FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS 1. Visão geral 2. O Pentateuco samaritano 3. Os targuns 4. A Peshita 5. A Septuaginta 6. As traduções dependentes da LXX 7. As traduções gregas independentes 8. A Vulgata 9. Poliglotas
712 715 716 717 718 719 724 725 725 726
§ 80. CORRUPÇÃO DO TEXTO E CRÍTICA TEXTUAL
727
SUPLEMENTOS
731
BIBLIOGRAFIA
759
ÍNDICE DE AUTORES
761
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
805
ABREVIATURAS 1. Obras de comentários a) Comentários citados nas referências bibliográficas ATO BK BOT COT EH HAT HK HS IB ICC KAT
KAF KeH KHC SAT SB SZ
Das Alte Testament Deutsch, Cõttingen. Biblischer Kommentar, Neukirchen. De Boeken van het Oude Testament, Roermond en Maaseik. Commentar op het Oude Testament, Kampen. Exegetisches Handbuch zum Alten Testament, Münster. Handbuch zum Alten Testament, Tübingen. Handkommentar zum Alten Testament, Cõttingen. Die Heilige Schrift des Alten Testaments, Bonn. The Interpreter's Bible, Nova York/Nashville. The InternationaI Critical Commentary, Edinburgh. Kommentar zum Alten Testament, Leipzig. Kommentar zum Alten Testament, Gütersloh. Kurzgefasstes exegetisches Handbuch zum Alten Testament, Leipzig. Kurzer Hand-Commentar zum Alten Testament, (Friburgo i. Br., Leipzig) Tübingen. Die Schriften des Alten Testaments, Cõttingen. Sources Bibliques, Paris. Kurzgefasster Kommentar zu den Heiligen Schriften Alten und Neuen Testaments (editado por Strack-Zõckler), (Nõrdlingen) Munique.
b) Outros comentários e explicações The Anchor Bible, Garden City, Nova York. La Bíblia, Montserrat. Biblischer Kommentar ürber das Alte Testament (Keil-Delitzsch), Leipzig. Die Botschaft des Alten Testaments, Stuttgart. Commentaire de l' Ancien Testament, Neuchâtel.
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ABREVIATURAS
Echter-Bibel. Die Heilige Schrift in deutscher Übersetzung, Würzburg. Det Gamle Testamente, Oslo. Harper's Annotated Bible, Nova York. Die Heilige Schrift des Alten Testaments (E. Kautzsch), Tübingen. Herders Bibelkommentar, Friburgo. Korte Verklaring der Heilige Schrift, Kampen. Peake's Commentary on the Bible, Edimburgo. Pismo Swiete Starego Testamentu, Posen. La Sacra Bibbia, Turim. La Sainte Bible, (L. Pirot - A. Clamer), Paris. La Sainte Bible, traduite em français sous la direction de l'École Biblique de Jerusalém, Paris. The Soncino Books of the Bible, Bornemouth. Sources Bibliques, Paris. Tekst en Uitleg, den Haag/Groningen. Torch Bible Commentaries, Londres. The Westminter Commentaries, Londres. Zürcher Bibelkommentare, Zurique.
2. Revistas e obras coletivas A. Alt, Kleine Schriften AASOR ABR AcOR AfK AfO AIPhHOS
AJSL ANET AnSt AOT ArOr ARM ARW ASTI AThR BA
A. Alt, Kleine Schriften zur Geschichte des Volkes Israel Annual of the American Schools of Oriental Research Australian Biblical Review Acta Orientalia Archiv für Kulturgeschichte Archiv für Orientforschung Annuaire de l'Institut de Philologie et d'Histoire Orientales et Slaves American Journal of Semitic Languages and Literatures J. B. Pritchard (ed.) Ancien Near Eastern Texts relating to the Old Testament, z- ed., 1955. Anatolian Studies H. Gressmann (ed.), Altorientalische Texte zum AT, 2il ed., 1926. Archiv Orientální A. Parrot-G. Dossin (ed.), Archives Royales de Mari Archiv für Religionswissenschaft Annual of the Swedish Theological Institute in Jerusalem Anglican Theological Review The Biblical Archaelogist
ABREVIATURAS
BASOR BEThL BHET BibI BiOr BJRL BMB BS BSOAS BWAT BZ BZAW Canadian JTh CBQ ChQR ColBG CRAI CuW CV DTT EstBíbI ET EThL EThR EvTh FF GThT HThR HTSt HUCA HZ
IEJ Interpr Irish ThQ JAOS JBL JBR JCSt JDTh JEA JEOL
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Bulletin of the American SchooIs of Oriental Research Bibliotheca Ephemeridum TheoIgicarum Lovaniensium Bulletin d'Histoire et d'Exégêse de l' Ancien Testament Biblica Bibliotheca Orientalis Bulletin of the [ohn Rylands Library Bulletin du Musée de Beyrouth Bibliotheca Sacra Bulletin of the SchooI of Oriental and African Studies Beitrãge zur Wissenschaft vom Alten (und Neuen) Testament Biblische Zeitschrift Beihefte zur Zeitschrift für die Alttestamentliche Wissenschaft Canadian [oumal of Theology Catholic BiblicaI Quarterly Church Quarterly Review Collationes Brugenses et Gandavenses Comptes Rendus de I'Académie des Inscriptions et Belles-Lettres Christentum und Wissenschaft Communio Viatorum Dansk Teologisk Tidsskrift Estudios Bíblicos The Expository Times Ephemerides Theologicae Lovanienses Études Théologiques et Religieuses Evangelische Theologie Foschungen und Fortschritte Gereformeerd Theologisch Tijdschrift Harvard TheologicaI Review Hervormde Teologiese Studies Hebrew Union College AnnuaI Historische Zeitschrift Israel Exploration [ournal Interpretation Irish TheologicaI Quarterly JournaI of the American Oriental Society [ournal of BiblicaI Literature [ournal of Bible and Religion [oumal of Cuneiform Studies [ahrbücher für Deutsche Theologie [ournal of Egyptian Archaeology Jaarbericht van het Vooraziatisch-Egyptisch GezeIschap (Genootschap) Ex Oriente Lux
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JJS
ABREVIATURAS
[ournal of [ewish Studies Journal of N ear Eastern Studies JNES Journal of the Palestine Oriental Society JPOS Jewish Quarterly Review JQR [ournal of Religion JR Journal of the Royal Asiatic Society of Great Britain and JRAS Ireland Journal of the Society of Oriental Research JSOR [ournal of Semitic Studies JSS [ournal of Theological Studies JThSt MAA Mededeelingen der Konninklijke Akademie van Wetenschappen te Amsterdam MOAI Mitteilungen des Deutschen Archãologischen Instituts Abt. Kairo MGWJ Monatsschrift für Geschichte und Wissenschafat des Jundentums Mitteilungen des Instituts für Orientforschung MIOF Münchner ThZ Münchner Theologische Zeitschrift MV(À)G Miteilungen der Vorderasiatisch (-Agyptisch) en Gesellschaft NC La Nouvelle Clio NedThT Nederlands Theologisch Tjidschrift NkZ Neue Kirchliche Zeitschrift NRTh Neue Zeitschrift für Systematische Theologie NThSt Nieuve Theologische Studien NThT Nieuw Theologisch Tijdschrift Norks Teoligisk Tidsskrift NTT NZSTh Nouvelle Revue Théologique OLZ Orientalistische Literaturzeitung Or Orientalia OrBiblLov Orientalia et Biblica Lovaniensia OrChr Oriens Christianus OTS Oudtestamentische Studien OuTWP Oie Ou Testamentiese Werkgemeenskap in Suid-Afrika PAAJR Proceedings of the American Academy for [ewish Research PBA Proceedings of the British Academy PEFQSt Palestine Exploration Fund, Quarterly Statement PEQ Palestine Exploration Quarterly PJ Preussische Jahrbücher PJB Palãstinajahrbuch PRU Le Palais Royal d'Ugarit PSBA Proceedings of the Society of Biblical Archaeology RA Revue d' Assyriologie et d' Archéologie Orientale RB Revue Biblique
ABREVIATURAS
RdQ REJ RES RevBibl RGG RHA RHPhR RHR RIDA RivBibl RSR RSO RThPh SEA SJTh StC STKv St. Th ThB1 ThGI ThLBL ThLZ ThQ ThR ThRev ThSt ThStKr ThT ThW ThZ Trierer ThZ TTKi VD VT VTSuppl WdO WuD WZ WZKM ZA
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Revue de Qumran Revue des Études [uives Revue des Études Sémitiques Revista Bíblica Die Religion in Geschichte und Gegenwart Revue Hittite et Asianique Revue d'Histoire et de Philosophie Religieuses Revue de l'Histoire des Religions Revue Internationale des Droits de l' Antiquité Rivista Biblica Recherches de Scíence Religieuse Rivista degli Studi Orientali Revue de Théologie et de Philosophie Svensk Exegetisk Arsbok Scottish [ournal of Theology Studia Catholica Svensk Teologisk Kvartalskrift Studia Thelogica, cura ordinum thelogorum Scandinavicorum edita Theologische Blãtter Theologie und Glaube Theologisches Literaturblatt Theologische Literaturzeitung Theologische Quartalschrift Theologische Revue Theologische Rundschau Theological Studies Theologische Studien und Kritiken Theologisch Tijdschrift Theologisches Wõrterbuch zum Neuen Testament Theologische Zeitschrift Trierer Theologische Zeitschrift Tiddskrift for Teologi og Kirke Verbum Domini Vetus Testametum Supplements to Vetus Testamentum Die Welt des Orients Wort und Dienst, Jahrbuch der Theologischen Schule Bethel Wissenschaftliche Zeitschrift Wiener Zeitschrift ror die Kunde des Morgenlandes Zeitschrift für Assyriologie
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ZÁS ZAW ZDMG ZDPV ZKTh ZKWL ZLThK ZMR ZNW ZRGG ZS ZSTh ZThK ZWTh
ABREVIATURAS
Zeitschrift für Agyptísche Sprache und Altertumskunde Zeitschrift für die Alttestamentliche Wissenschaft Zeitschrift der Deutschen Morgenlãndischen Gesellschaft Zeitschrift des Deutschen Palãstina-Vereins Zetischrift für Katholische Theologie Zeitschrift für Kirchliche Wissenschaft und Kirchliches Leben Zeitschrift für die gesamte Lutherische THeologie und Kirche Zeitschrift für Missionskunde und Religionswissenschaft Zeitschrift für die Neutestamentliche Wissenschaft Zeitschrift für Relgions- und Geitesgeschichte Zeitschrift für Semitistik und verwandte Gebiete Zeitschrift für Systematische Theologie Zeitschrift für Theologie und Kirche Zeitschrift für Wissenschaftliche Theologie 3. Observações sobre as referências bibliográficas
Nas referências bibliográficas, demos, no início de cada parágrafo (§), primeiramente os comentários, na medida em que isto se faz necessário, e em seguida a bibliografia de caráter geral ou abrangente, segundo a ordem alfabética dos autores e, havendo várias obras de um mesmo autor, na ordem em que apareceram. A bibliografia especializada a respeito de temas ou de textos em particular vem indicada em as notas de pé de página. No corpo da exposição, os nomes dos autores referem-se às "Introduções do AT" mencionadas anteriormente - quando estiverem marcados com um asterisco (*) - ou à bibliografia colocada antes de cada parágrafo, com inclusão dos comentários. Só raramente esses nomes se referem às notas de pé de página das proximidades. É-nos impossível oferecer, da extensa bibliografia científica, a não ser uma amostra representativa. Aqueles que se interessam por uma bibliografia mais detalhada, encontram à sua disposição numerosos recursos, principalmente os índices bibliográficos que se podem ler nos comentários bíblicos, os informes bibliográficos de ThR, as resenhas de revistas e de livros, em ZAW, o Elenchus bibliographicus biblicus de "Biblica" (a partir de 1968 como publicação independente), e também a "Internationale Zeitschriftenschau für Bibelwissenschaft und Grenzgebiete".
(No corpo da obra, os nomes dos autores que vierem acompanhados de um asterisco (*) se referem às respectivas publicações que se seguem).
APRESENTAÇÃO Vale a pena ler uma Introdução ao Antigo Testamento publicada originalmente em 1969? Podemos responder negativamente a esta pergunta, se considerarmos exclusivamente as mudanças amplas na maneira como a datação e a análise dos textos vétero-testamentários têm sido elaboradas nas últimas três décadas. Várias das conclusões e hipóteses formuladas por FOHRER não são mais consideradas como válidas para a compreensão da história da escrita do Antigo Testamento. Entretanto, uma Introdução ao Antigo Testamento apresenta muito mais do que apenas discussões sobre crítica literária e datação de livros bíblicos - especialmente esta Introdução de CEORG FOHRER. Em um certo sentido, este livro é uma obra única na bibliografia vétero-testamentária em língua portuguesa, de modo que a resposta à pergunta acima só pode ser positiva. Sim! Vale a pena ler uma Introdução ao Antigo Testamento com quase quarenta anos de idade. O autor, C. FOHRER, já é conhecido em terras brasileiras. A recente reedição de sua História da Religião de Israel e da obra Estruturas Teológicas do Antigo Testamento indica a importância do seu pensamento para a pesquisa vétero-testamentária. Uma das características da obra de FOHRER é a sua independência em relação às principais correntes da pesquisa bíblica de seu tempo. Independência esta que, por vezes, se manifesta em hipóteses ricas e instigantes mas, por vezes, em hipóteses arriscadas, com pouca aceitação na academia bíblica. Esta Introdução ao Antigo Testamento apresenta várias características dessa independência e criatividade de FOHRER, dentre as quais destaco: 1) a integração dos métodos da crítica literária, da crítica das formas e da história das tradições é singular e foi reconhecida por estudiosos e críticos de sua obra; 2) a estrutura do livro também é peculiar, resultado de seu esforço em fazer da crítica das formas muito mais do que um mero alistar de características literárias, erro que não poucos estudiosos cometeram; 3) sua hipótese sobre as fontes e a história literária do Pentateuco merece atenção (conclui a favor da existência, ainda que por pouco tempo, de um Hexateuco), embora tenha acrescentado valor à fragmentação de fontes na pesquisa e não tenha recebido grande aceitação nos círculos de estudiosos; e 4) sua recusa em aceitar a hipótese quase unânime de uma redação deuteronomista para os livros históricos no cânon profético da Bíblia Hebraica - a chamada
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APRESENTAÇÃO
Obra Histórica Deuteronomista (com base teológica em Deuteronômio, e expressa nos livros de [osué, Juízes, 1 e 2 Samuel e 1 e 2 Reis). Segundo ele, nesses livros, "os métodos de trabalho e de reflexão são tão diversos, de parte a parte, que não se podem atribuir esses livros a um só autor ou redator". A maior contribuição desta Introdução, porém, e a principal justificativa para sua reedição neste início do século XXI, é a detalhada atenção que FOHRER dedica às formas literárias presentes no Antigo Testamento. Ele oferece uma cuidadosa discussão das formas literárias em seu ambiente véterooriental e seu desenvolvimento específico em Israel. Não só procura descrevê-las em perspectiva histórica, mas também se ocupa em analisar detidamente as características estruturais e estilísticas que possibilitam a definição da forma e a distinção entre elas. Não temos, em português, outros textos que apresentem tamanha riqueza de informação e detalhes sobre as formas literárias do Antigo Testamento. A maioria das Introduções em português dedica pequena atenção ao tema, remetendo à literatura especializada em língua estrangeira. Tal riqueza de detalhes, porém, não deixa de apresentar algumas dificuldades. Nem sempre se pode concordar com as distinções altamente elaboradas entre formas específicas. Algumas vezes percebe-se a falta de evidências mais claras para certas conclusões, por exemplo, a de que a origem das proposições apodíticas "situa-se no âmbito do nomadismo pré-javístico". Independentemente das discordâncias com relação a detalhes e conclusões históricas, a obra de FOHRER nos brinda com informações significativas e fundamentais para o estudo literário do Antigo Testamento. É claro que, quarenta anos depois, possuímos melhores condições para estudar literariamente os textos vétero-testamentários, graças aos avanços já realizados no campo da crítica das formas e estilística bíblicas. Todavia, mesmo em autores mais recentes, encontramos uma característica também presente na pesquisa de FOHRER: a escassa atenção dedicada à pesquisa lingüística e semiótica sobre a literatura. Vale a pena reler e rever a discussão de FOHRER a partir da discussão sobre os gêneros textuais realizada no âmbito da lingüística, da nova crítica literária, da semiótica e da análise do discurso. É com prazer que escrevo esta apresentação à já conhecida Introdução ao Antigo Testamento de G. FOHRER. Sua reedição contribui para o aperfeiçoamento e o enriquecimento da pesquisa bíblica em nosso país e, ao completar a trilogia dos manuais escritos por FOHRER, nos dá também um presente adicional: o de poder discutir e analisar criticamente o pensamento de um dos autores mais criativos e independentes da pesquisa vétero-testamentária européia.
Dr. Julio P. Tavares Zabatiero Prof. de Exegese e Teologia Bíblica na Escola Superior de Teologia (RS)
PREFÁCIO À lO!! EDIÇÃO ALEMÃ Ao aparecer, em 1910, a primeira edição da presente "Introdução ao Antigo Testamento", seu autor, ERNEsT SELLIN, expunha no prefácio as razões que o determinaram a escrever um pequeno manual em linguagem sucinta, bem como as vantagens que via nisso. Pequeno manual continuou a obra nas sete edições que apareceram em vida de E. SELLIN, e nas duas seguintes, refundidas por LEONHARD ROST. O livro passa, no entanto, por notáveis modificações, quanto ao conteúdo, tanto devidas ao próprio E. SELLIN, cuja vivacidade e sensibilidade às necessárias mudanças ficaram registradas em teses sucessivas, como também graças ao trabalho de refundição empreendido por L. Rosr, dos quais o último "nos apresenta um texto que somente em poucas passagens corresponde à última edição saída das mãos de E. SELLIN, e que é a sétima". Uma décima edição, sob os cuidados de L. Rosr, deveria, segundo intenção deste, passar por novas e radicais transformações. Mas para poder se dedicar, com todas as forças, a outros projetos, propôs-me ele que eu elaborasse a nova edição. Juntamente com os agradecimentos pela confiança que ele e a Editora depositaram sobre mim, dando-me esta incumbência, deveria eu também, propriamente falando, prestar contas detalhadas das profundas mudanças introduzidas na presente obra, com relação às edições anteriores. Espero que as explicações resultem, em grande parte, da própria exposição. Neste ponto talvez seja suficiente observar que nos foi impossível evitar o aumento sensível da obra quanto ao volume, bem como à nova disposição da matéria - para só mencionarmos as modificações mais notáveis tendo em vista que nosso trabalho devia levar em conta a atual situação da ciência veterotestamentária, como também oferecer uma contribuição à pesquisa, para além dos limites da simples atividade didática. Ademais, tivemos de apresentar muita coisa de forma bastante sucinta - para muitos dos leitores talvez demasiado sucinta - ou simplesmente mencioná-la, para evitar o dobro do atual volume.
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PREFÁCIO À
lOa EDIÇÃO
ALEMÃ
Nossa exposição se restringe apenas aos livros canônicos do Antigo Testamento e deixa de lado os escritos não-canônicos - independentemente da menção que deles venhamos a fazer no devido lugar. É intenção de L. ROST tratar desses escritos em um volume complementar à parte. Devo agradecer em primeiro lugar à Sra. HILDEGARDA HIERSEMANN que, com incansável paciência, tomou a si a incumbência e a datilografia do manuscrito. Meu agradecimento se dirige também ao Dr. GUNTHER W ANKE, meu assistente, e ao Sr. HANS WERNER HOFFMANN, estudante de teologia, pelo trabalho de revisão do manuscrito, pela elaboração do catálogo bibliográfico e de abreviações bem como do índice de assuntos, e pela colaboração na revisão das provas e ainda por inúmeras outras ajudas que me prestaram. CEORG FOHRER
PREFÁCIO À 11 il EDIÇÃO ALEMÃ Como a 1üll edição se esgotou mais depressa do que esperávamos, na 1111 edição deixei de incorporar, quanto ao conteúdo, a bibliografia aparecida desde a sua elaboração, para não desvalorizar a décima edição e manter o preço baixo do livro, graças a uma ampla reprodução por meios foto-mecânicos. É por isso que na undécima edição foram corrigidos apenas alguns pequenos erros e no texto foram feitas várias alterações que nos pareceram indispensáveis. Na presente edição, a exemplo do que se fez na tradução inglesa, aparecida recentemente e feita a partir da décima edição, a nova bibliografia foi acrescentada em forma de "suplementos". Sobre o conteúdo da mesma, na maioria dos casos, o leitor poderá informar-se nas recensões dos periódicos e livros que se encontram na ZAW. Erlangen, novembro de 1968. CEORG fOHRER
INTRODUÇÃO
LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO ANTIGO TESTAMENTO § 1. FUNÇÃO, HISTÓRIA E MÉTODOS DA CIÊNCIA INTRODUTÓRIA L. ALONSO ScHÓKEL, Estudios dePoética Hebrea, 1963. - W. BAUMGARTNER, "Alttestamentliche Einleitung und Literaturgeschichte", ThR NF 8 (1936), 179-222. - lo., "Eine alttestamentliche Forschungsgeschichte", ibid. 25 (1959), 93-110. - lo., "Zum 100. Geburtstag von Hermann Gunkel", VTSupp19, 1963, 1-18. - A. BENTZEN, "Skandinavische Literatur zum Alten Testament 1939-1948", ThR NF 17 (1948/49), 273-328. - K-H. BERNHAROT, Die Gattungsgeschichtliche Forschung em Alten Testament ais exegetische Methode, 1959. - J. BRIGHT, "Modem Study of Old Testament Literature", em: Essays Albright, 1961, 13-31. - L. DIESTEL, Geschichte des Alten Testaments in der Kirche, 1869. - O. EISSFELDT, "The Literature of Israel: Modem Criticism", em: Record and Revelation, 1938,74-109. - I. ENGNELL, "Methodological Aspects of Old Testament Study", VTSuppl 7, 1960, 13-30. - G. FOHRER, "Tradition und Interpretation im Alten Testament", ZAW 73 (1961), 1-30. - D. N. FREEOMAN, "On Method in Biblical Studies: The Old Testament", Interpr 17 (1963), 308-318. C. H. GOROON, New Horizons in Old Testament Literature, 1960. H. GUNKEL, "Die Grundprobleme der israelitischen Literaturgeschichte", em: Reden und Aufsiitze, 1913,29-38. - H. F. HAHN, TheOld Testament in Modern Research, 1954 (1956). - G. HORNIG, Die Anfiinge der historisch-kritischen Theologie:
Johann Salomo Semler's Schriftverstiindnis undseine Stellungzu Luther, 1961. - H. HUPFELD, über Begrift und Method der sogenannten biblischen Einleitung, 1844; ThStKr 1861, 3ss. - R. KITTEL, "Die Zukunft der alttestamentlichen Wissenschaft", ZAW 39 (1921), 84-99. - K KOCH, Was ist Formgeschichte?, 1964. - E. G. H. KRAELING, The Old Testament since the Reformation, 1955. - H.-J. KRAUS, Geschichte der historisch-kritischen Erforschung des Alten Testaments von der Reformation bis zur Gegenwart, 1956. - J. LINDBLOM,
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LITERATURA I5RAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA 00
AT
Einige Grundfragen der alttestamentlichen Wissenschaft, em: BertholetFestschrift, 1950,325-337. - J. MUILENBURG, "Modem Issues in Biblical Studies", ET71 (1959/60),229-233. -PERLITI, Vatke und Wellhausen, 1965. - H. H. ROWLEY, "Trends in Old Testament Study", em: The Old Testament and Modem Study, 1951 XV-XXXI. - H. H. ScHREY, "Die alttestamentliche Forschung der sogenannten Uppsala-Schule", ThZ 7 (1951), 321-341. - S. SCHULZ, "Die rõmisch-katholische Exegese zwischen historischkritischer Methode und lehramtlichem Machtspruch", EvTh 22 (1962), 141-156. - ST. SEGERT, "Zur Methode der alttestamentlichen Literarkritik", Arar 24 (1956), 610-621. - S. J. DE VRIES, "The Hexateuchal Criticism of Abraham Kuenen", JBL 82 (1963),31-57. - G. E. WRIGHT, "Archeology and Old Testament Studies", ibid., 77 (1958), 39-51. - W. ZIMMERLI, "Die historisch-kritische Bibelwissenschaft und die Verkündigungsaufgabe der Kirche", EvTh 23 (1963), 17-31. - Cf. G. FOHRER em ThR NF 28 (1962),326-335.
1. O AT e os estudos introdutórios A coleção de livros que a teologia e a Igreja cristã costumam chamar de (AT) remonta, quanto à seleção e composição ao longo de inúmeros estágios preparatórios, ao judaísmo dos tempos anteriores e posteriores ao nascimento de Cristo. Ela se formou graças às exigências do judaísmo que, reagindo a correntes teologicamente perigosas, surgidas dentro das próprias fileiras ou no confronto com o cristianismo primitivo, começou a se cristalizar sobre certas bases e numa determinada tomada de posição. Esta coleção de livros, porém, tornou-se Sagrada Escritura não apenas para o judaísmo, mas também para o cristianismo e para o islamismo. A denominação AT remonta, em última análise, ao próprio modo de falar da Bíblia. A expressão "testamento" deriva do latim, testamentum, que é a tradução do hebraico b'rii e do grego diaihêkê, "pacto", "acordo", "contrato", "aliança" (em grego também = "disposições testamentárias") e se liga à idéia da "aliança" que Javé contraiu com Israel, por intermédio de Moisés. À nova expressão desta fé na profecia veterotestamentária corresponde aquilo que [r 31.31-34 anuncia como sendo a nova "aliança" que Javé concluirá. Em o Novo Testamento, e principalmente em 2Co 3.5-18, usa-se esta palavra para exprimir um novo futuro a se realizar plenamente em Jesus Cristo. Tendo-se realizado nele a "Nova Aliança", a expressão "Antigo Testamento" passou a designar os tempos anteriores a Cristo. As duas expressões foram, em seguida, estendidas às Sagradas Escrituras que tratam destas duas alianças, a nova e a antiga, e, conseqüentemente,
§ 1. FUNÇÃO,
HISTÓRIA E MÉTODOS DA CIÊNCIA INTRODUTÓRIA
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também aos livros da nova e da antiga"Aliança". E assim o Antigo Testamento tornou-se igualmente Sagrada Escritura para o cristianismo, como livro da antiga"Aliança". Aliás, originariamente representava simplesmente a Sagrada Escritura para os cristãos, pois aos poucos é que foi surgindo o Novo Testamento. O próprio Jesus Cristo, em Mt 5.17-19; Lc 10.2528; 16.1 9- 31, o assume como autoridade inconteste, a despeito de qualquer diferenciação que a crítica faça, tarefa esta que incumbe, como sempre, à teologia do Antigo Testamento. Considerando-se que o Antigo Testamento continua sendo Sagrada Escritura para a teologia e para a Igreja cristã, apesar das restrições de MARCIÃO e de HARNACKl, para não falarmos daqueles outros que o rejeitam por ignorância política e por partidarismo racial, temos, a partir daí, a necessidade de o entender corretamente, no todo e em suas partes, e de o pesquisarmos de maneira científica. É a esta tarefa que se dedica a ciência introdutória da Escritura, ao lado de outros processos de investigação e de interpretação. A ciência introdutória tem por objeto estudar e expor todas as fases do desenvolvimento do AT, desde suas origens até sua conclusão. Ou mais precisamente: essa tarefa consiste em seguir esse desenvolvimento e as tradições do AT no contexto do Antigo Oriente, reconstituído tanto a partir da arqueologia como da formação das tradições orais, passando pela fixação por escrito de cada um dos seus textos e pela reunião dos mesmos em livros, até sua consolidação no cânon do AT e à fixação do texto em sua forma definitiva. 2. Os inícios Em si, toda Escritura pode ser objeto de uma "introdução", mediante um estudo de iniciação ao seu vocabulário, à sua gramática e às condições históricas, aos fatos reais, ao seu universo conceitual e ao conteúdo de suas afirmações. Uma Escritura deve ser objeto de uma introdução, se pretende reconduzir os leitores a uma época e a um ambiente inteiramente diversos e que exigem um conhecimento preliminar correspondente. O próprio AT já contém observações desta natureza, sobretudo nos títulos e nas glosas que escritores ou leitores inseriram posteriormente, pouco importando se correspondiam ou não à realidade. Incluem-se aí os títulos da maioria dos livros proféticos e dos treze salmos que derivam de uma situação especial da vida de Davi; cf., p.ex., SI 18[17]; 51[50]; 52[51]; 1
A.
VON HARNACK,
Marcion, 1924, 2'1 ed.
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LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO
AT
54[53]; 56[55]; 57[56]; 59[58]; 60[59], e ainda a glosa de uma palavra-chave, como em Ez 1.2, que se destina a explicar a data de LI, e uma observação, como em Zc 1.7, que tem por fim esclarecer o sentido do undécimo mês, através da indicação do nome. Evidentemente, uma ciência propedêutica nesses termos não existiu durante séculos. De início, os rabinos transmitiam suas opiniões sobre os autores, sobre a época e o local de origem dos livros do AT, opiniões que a Igreja antiga e medieval fez suas e complementou com outras. Este estudo se efetuava, juntamente com o de outros aspectos particulares, sob a forma específica de introdução aos livros do AT, como o fez JERÔNIMO, ou no corpo de outras obras, como AGOSTINHO, em De doctrina christiana, e JUNÍLIO AFRICANO, em Instituta regularia divinae legis. O termo "introdução" foi usado pela primeira vez, enquanto se sabe, pelo monge ADRIANO (t cerca de 440) em seu escrito eisagôgê eis tás theías grafás, "Introdução às divinas Escrituras", Daí, com base em Isagoge e Introductio, é que surgiu o termo [alemão] Einleitung na obra de J. D. MICHAELIS (1750). Dos estudiosos judeus da Idade Média, devemos mencionar, sobretudo, RASCHI (morto em 1105) e IBN ESRA (morto em 1167), Este último aventura-se ocasionalmente a fazer observações críticas, embora apenas alusivamente, por respeito à doutrina da inspiração verbal, e partindo da expressão "do outro lado do [ordão", que ocorre em Dt LI, designando a região situada a leste do [ordão, e também de Dt 3.10-12 e 27.1-8; 31.9, ele conclui que Moisés não poderia ter sido o autor desse livro: "'Do outro lado do [ordão': se entenderes o segredo dos Doze, e ainda: 'E Moisés escreveu a Lei', e mais: 'O cananeu habitava então a terra', e também: 'Sobre o monte de Deus ele se revelará', e por fim: 'Eis que seu leito era um leito de ferro', conhecerás então a verdade"; quem não a tiver conhecido, "cale-se!" Do lado cristão, houve a atuação de ISIOORO DE SEVILHA (t cerca de 636), que resumiu em um compêndio, o Prooemiorum liber, todo o saber de seu tempo, e de NICOLAU DE LYRA (t cerca de 1340) que, graças aos seus conhecimentos de hebraico, pôde transmitir as obras dos sábios judeus e manter-se em contato com os textos originais. O humanismo e a reforma protestante criaram os pressupostos para o surgimento da ciência propedêutica da Escritura. Os humanistas remontavam à língua hebraica (J. REUCHLIN) e ao texto original, enquanto, por seu lado, os reformadores protestantes se apoiavam nesse dado e não na Vulgata, e exigiam sua interpretação com base na filologia. Dentro deste quadro, as tradições referentes aos autores e à época em que surgiram os
§ 1. FUNÇÃO,
HISTÓRIA E MÉTODOS DA CIÊNCIA INTRODUTÓRIA
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livros do AT foram submetidas à análise mediante a crítica textual. Logo depois de LUTERo, com seus reparos sobre a canonicidade do livro de Ester, deve-se mencionar principalmente KARLSTADT que, em sua obra De canonicis scripturis libellus (1520), observa, através da análise críticoestilística, que entre as seções narrativas do Pentateuco e [osué não existe nenhuma diferença de estilo, mas que ambas foram trabalhadas por uma mesma mão, e que - também por razões estilísticas - seu autor não poderia ter sido Esdras. No entanto, os primeiros trabalhos de introdução às Escrituras, da autoria de SIXTO SENENSE (católico, 1566), de RIVETO (calvinista, 1627) e de WALTHER (luterano, 1636) não foram além das concepções tradicionais e procuraram enquadrar nas mesmas as observações críticas individuais que se tornavam conhecidas. Os passos decisivos para a ciência propedêutica da Escritura foram dados na época do iluminismo [Aufkliirungl e do racionalismo. THOMAS HOBBES propunha em sua obra Leviathan (1Il 1651), que a época do aparecimento dos livros do AT fosse deduzida a partir destes próprios livros, independentemente da tradição. Por outro lado, B. SPINOZA, em seu Tractatus Theolcgico-Potiiicus (1670), acrescentava à crítica feita até então com base nas contradições isoladas, e à crítica estilística, o princípio metodológico segundo o qual o indicador correto para a pesquisa do AT era "a razão natural, patrimônio comum de todos os homens, e não, conseqüentemente, uma iluminação sobrenatural nem uma autoridade externa". Além disto, SPINOZA tratava de problemas que mais tarde se tornaram objeto da propedêutica à Escritura: a origem de cada livro, a história do cânon e dos textos. Um quarto impulso foi dado pela análise lingüística dos textos que, em relação ao Pentateuco - e já sob o estímulo de R. SIMON - levou a uma primeira distinção entre as fontes, por sugestão de H. B. WITTER (1711) e J. ASTRUC (1753). Depois deles, J. S. SEMLER, com sua obra Abhandlung von freier Untersuchung des Canon (1771-1775) e seu Apparatus ad liberalem Veteris Testamenti interpretationem (1773), pede para o AT uma pesquisa liberta de dogmas e da tradição, e que se adotem os mesmos princípios que se aplicam a outras obras literárias. Depois de J. HERDER e R. LOWTH, com sua nova consideração estética e artística, J. G. EICHHORN* resumiu todas as observações e sugestões precedentes em sua Einleitung in das AT, à qual deu a forma de manual e onde trata, como SPINOZA, dos três problemas referentes à origem de cada livro, à história do cânon e à história dos textos. Foi ele o fundador da ciência propedêutica da Escritura, em seu sentido formal.
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LITERATURA I5RAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO
AT
3. O desenvolvimento da pesquisa histórico-crítica A história posterior situa-se primeiramente sob o influxo do método histórico e da história das religiões. Assim, na opinião de W. M. L. DE WETIE (1806s, 1817),os livros do AT mostram-nos a evolução de suas idéias e ao mesmo tempo nos oferecem a possibilidade de estabelecer a data de origem desses livros. A contribuição básica de DE WETTE consistiu em ter feito a identificação entre o código de [osias e o Deuteronômio. Ao lado de H. G. A. EWALD (1835ss, 1840s, 1843ss), devemos mencionar ainda W. VATKE (1835), o qual, sob o influxo de HEGEL, descreve a evolução da literatura do AT, tendo por pano de fundo a história de sua religião. Em contraposição, emerge a tentativa de uma renovação da tradição da sinagoga e da Igreja primitiva, por parte de E. W. HENGSTENBERG (1831ss) e K. F. KEIL (1833). Este último se empenhou em provar, p.ex., a autenticidade do Pentateuco e do livro de Daniel, ou a unidade do livro de Zacarias. Decisiva, porém, foi a pesquisa histórico-crítica, a qual - não obstante os conhecimentos fundamentais adquiridos anteriormente por A. KUENEN* (18618s) e K. H. GRAF (1866 - está ligada sobretudo ao nome de J. WELLHAUSEN* (1876ss). F. BLEEK (1878), B. STADE (1881ss), W. ROBERTSON SMITH* (1881), C. H. CORNILL* (1891), S. R. DRIVER (1891) e, como que rematando, C. STEUERNAGEL* (1912), prosseguiram com os trabalhos de pesquisa, dentro da linha de WELLHAUSEN. Se, de um lado, DE WETTE havia chegado a um sólido ponto de apoio cronológico, identificando o código de [osias com o Deuteronômio, do outro lado, KUENEN e GRAF situaram a data do estrato sacerdotal das fontes do Pentateuco no período pós-exílico, enquanto WELLHAUSEN traçava a grande sinopse dentro da qual as fontes, estudadas do ponto de vista literário, formavam um quadro bem definido da história de Israel, no qual, por sua vez, as próprias fontes encontram seus respectivos lugares. Como este quadro simplesmente não concordava com os pontos de vista tradicionais, concentraram-se sobre WELLHAUSEN ataques que perduram até os nossos dias. Inculpam-no de hegelianismo e de evolucionismo, quando não o apresentam, mesmo, como uma encarnação do demônio. PERLITT, no entanto, demonstrou recentemente, com a máxima clareza possível, que tais críticas carecem de fundamento. Na realidade, os próprios adversários de WELLHAUSEN muito aprenderam dele e utilizaram-se de suas verificações e de seu método, mesmo que se tenham empenhado, como H. L. STRACK (1883), E. K. A. RrnHM (1889s), E. KbNIG (1893), W. GRAF BAUDISSIN (1901) e E. SELLIN* (1910, 1935), por
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estabelecer, em suas conclusões, uma síntese conservadora que estivesse em consonância com a perspectiva da sinagoga e da Igreja antiga. Ainda assim, o método puramente analítico e dissecativo provocou mal-estar, expresso no seguinte trocadilho: "Is the Pentateuch Mosaic or a mosaic?" Daí haver autores que, como G. WILDEBüER* (1893), E. KAUTZSCH (1897), K. BUDDE* (1906), J. MEINHOLD* (1919,3il. ed., 1932), J. A. BEWER* (1922) e, tardiamente, A. LODS* (1950), tentaram chegar a uma exposição sintética da história da origem do AT, exposição na qual cada livro era isolado da ordem em que se encontram no cânon e estudado em um contexto cronológico. Mas, antes que isto pudesse plenamente se concretizar, surgiu em cena um outro ponto de vista que deu origem a numerosos métodos novos.
4. Novos métodos A metodologia que se liga aos nomes de H. GUNKEL e H. GRESSMANN, parte, por um lado, dos resultados obtidos pela arqueologia do Antigo Oriente e pela orientalística, cuja importância até hoje crescente tem sido plenamente reconhecida, enquanto, por outro lado, aplica ao AT os dados da pesquisa histórica e comparativa das literaturas. A literatura veterotestamentária é vista no âmbito de toda a literatura do Antigo Oriente, ao passo que se investigam as relações entre as duas. Por isso, o interesse dos estudiosos se volta primeiramente para a história das formas do discurso e para os gêneros literários, como igualmente para a história do material e seus motivos. Tanto a forma atual como a história primordial dos textos veterotestamentários passaram a ser objeto de pesquisa. a) A obra de GUNKEL, realizada sob o influxo da filologia clássica e da germanística, exerceu papel pioneiro com relação à pesquisa dos gêneros literários. Ele parte do pressuposto de que as formas de expressão e os gêneros literários tinham, na antiguidade, uma fisionomia muito mais precisa do que em nossos dias, obedeciam a um certo esquema de construção, apresentavam motivos mais ou menos fixos e possuíam determinado Sítz im Leben ["situação histórica e existencial"] como lugar de origem. O narrador ou o poeta escolhiam o gênero conforme a ocasião e o motivo, prendendo-se, porém, ao esquema básico deste gênero, de sorte que as possibilidades de variações pessoais eram limitadas, ao passo que os aspectos convencionais e típicos eram determinantes. À luz desta constatação, GUNKEL* pretendeu substituir o estilo de introdução até então em uso, por uma história da literatura [udaico-israelítica, entendida como
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história dos gêneros e formas literários correntes em Israel, tanto mais que, por este procedimento, se tornava possível, para além dos limites daquilo que fora transmitido por via literária, extrair conclusões, levar em conta o falar e cantares vivos do povo e acompanhar a história primitiva das formas de expressão, recuando até épocas remotíssimas e, de novo, a partir daí, explicar as particularidades dos textos veterotestamentários. É esta maneira de expor que encontramos em HEMPEL *. No entretempo, a pesquisa dos gêneros literários apurou-se e evoluiu no sentido do estudo da história das formas, de modo a poder investigar o processo de elaboração e as variações das formas e das fórmulas. Havia aí, também, evidentemente, a tendência de situar o método em primeiro plano ou de lhe atribuir uma posição absoluta, como também a tendência de se ficar limitado apenas a esse método e o erigir em princípio exclusivo ou, quando menos, fundamental, de compreensão, colocação esta a que nos devemos opor firmemente. O estudo da história das formas deve ser realizado com base na diferenciação crítica e literária, e como seu ulterior desenvolvimento, depois de escolhido um de seus numerosos aspectos. Exageros ocasionais da pesquisa dos gêneros literários devem ser corrigidos: 1) O método em si pode ser aplicado ao estudo das unidades lingüísticas ou literárias primitivas. O que se discute, porém, é sua aplicação a todos os componentes do discurso, que poderia degenerar numa espécie de "história das formas:". e a textos mais extensos e mesmo a obras inteiras, cuja estrutura em geral não depende de princípios formais. 2) Discute-se também a superestima que se tem pelos aspectos convencionais e típicos, com prejuízo dos aspectos pessoais e individuais, atitude esta que vai de encontro à estrutura pessoal da fé javista e à sua maneira individual de exprimir esta fé. Esta superestima se baseia menos na mentalidade e nas concepções dos israelitas do que na influência moderna, antipsicológica e anti-subjetiva da Sociologia e das Ciências naturais. 3) Um dos erros desta pesquisa consiste em vincular a instituição às respectivas funções. Parte-se muitas vezes do pressuposto de que as formas do discurso se vinculam a uma determinada instituição permanente, de que sua estrutura reflete e deixa entrever a existência de
2
M.
NOTH,
Developing Lines of Theological Thought in Germany, 1963.
§ 1. FUNÇÃO,
HISTÓRIA E MÉTODOS DA CIÊNCIA INTRODUTÓRIA
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um acontecimento real (ou cultural), de que se pode identificar o local e a data deste acontecimento, e de que aquele, portanto, que utilizou essas formas do discurso teria exercido um papel dentro da instituição e no decurso do acontecimento (cultual). Assim, enquanto a expressão 5itz im Leben ["situação existencial"] indica em si um determinado motivo - o 5itz im Leben dos funerais de uma pessoa, p.ex., é a sua morte - este mesmo conceito se transforma, aqui, inesperadamente em vinculação com uma instituição geralmente de natureza cultual ou jurídica. Não é difícil de mostrar que esta concepção não leva na devida conta a realidade das situações. 4) Não é exato afirmar que a forma e o conteúdo do discurso estão sempre de acordo. Como prova deste asserto, baste-nos recordar que os profetas usaram a lamentação fúnebre como ameaça ou como ameaça sarcástica. Por conseguinte, é preciso distinguir entre o modo de falar e sua função, entre o 5itz im Leben ["contexto existencial"] original e o 5itz in der Rede ["contexto no discurso"]. b) Também GUNKEL, e GRESSMANN logo depois dele, puseram em mo-
vimento e incentivaram principalmente a pesquisa da história dos materiais e seus motivos. Evidentemente que esta pesquisa, levada a efeito sob o impacto dos resultados da arqueologia e da orientalística, estava e ainda está exposta de modo particular ao perigo - ao qual chegou mesmo a sucumbir com o panbabilonismo, na controvérsia do "Babel-Bíblia" - de atribuir os materiais e os motivos do AT o mais amplamente possível ao seu mundo ambiente, deixando de considerar o caráter peculiar da fé javista. Contudo, esta pesquisa continua um instrumento indispensável para investigar a origem e as transformações dos materiais e motivos no mundo ambiente de Israel e no seio do AT, de novo aqui com base na diferenciação crítico-literária e seu ulterior desenvolvimento e sob um aspecto diferente. A pesquisa, no entretempo, se expandiu e se transformou em estudo da história das tradições que procura reconstituir, ao longo do AT, não apenas os motivos em particular, mas as correntes da tradição resultantes da concentração de inúmeros motivos. Observa-se, no entanto, como na pesquisa da história das formas, uma tendência ao unilateralismo e à absolutização, qual seja a de colocar a pesquisa das tradições como único critério e de considerar todas as manifestações do AT como dependentes de umas poucas tradições, as quais, segundo esta perspectiva, percorrem toda a história, depois de haverem passado por diferentes transformações. Assim, na realidade, "não há nada de novo debaixo do sol" (Ec11.9),
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e aquilo que é especifico de determinado enunciado consiste, em última instância, na forma peculiar da mudança sofrida por uma determinada tradição. Aqui, mais uma vez, é necessário proceder a algumas retificações em benefício das idéias fundamentais e corretas: 1) Muitas vezes, parece que se confunde o aparecimento simultâneo de vários motivos com uma determinada tradição. É preciso, contudo, distinguir entre essa tradição e os motivos que podem simplesmente constituir elementos individuais de uma tradição. A transmissão da história da libertação de Israel da terra do Egito é uma tradição; os elementos da teologia posterior de Sião (p.ex., nos salmos dos filhos de Coré), pelo contrário, não remontam a uma tradição cultual de Jerusalém, de origem pré-israelita, mas constituem um conjunto de motivos individuais", É preciso por isto muita prudência para não confundir teologúmenos de origem recente com correntes de tradição. 2) Ao binômio forma e função corresponde o binômio tradição e interpretação, podendo este último aparecer sob formas diversas, e não devendo ser reduzido à unidade. Este binômio pode mesmo chegar ao ponto de reduzir a tradição a seu contrário e a revesti-la de nova forma. 3) Em outros casos se deve perguntar se a pesquisa das origens do material utilizado é metodologicamente relevante para a compreensão de seu emprego dentro do texto. Muitas vezes os autores de um texto já não tinham certamente consciência da antiga significação do material e introduziram nele seu próprio significado, que é preciso então captar. 4) Talvez não se possa considerar nenhuma parte do AT, e muito menos os profetas, principal ou exclusivamente sob o ponto de vista da sua vinculação com a tradição ou do binômio tradição e interpretação. Além disto, ocorre, como sempre, uma série mais ou menos considerável de idéias e de afirmações espontâneas ou deliberadas, que não existiam na tradição. Os profetas em particular são, antes do mais, carismáticos que pretendem anunciar a palavra viva de Javé dirigida a eles e não uma tradição.
c) Um outro método que devemos mencionar é o da pesquisa da história da tradição, adotado pelos escandinavos e que não podemos considerar como o oposto ou como uma alternativa para a crítica literária (con3
Quanto aos detalhes, cf. G.
WANKE, Die Zionstheologie der Korachiten in ihrem traditionsgeschichtlichen Zusammenhang, 1966.
§ 1. FUNÇÃO,
HISTÓRIA E MÉTODOS DA CIÊNCIA INTRODUTÓRIA
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forme pensa L ENGNELL *, sobretudo), ou como tendo a primazia sobre esta. Pelo contrário, devemos entendê-lo como mais um passo no sentido de uma diferenciação crítica e literária (como o fazem, p.ex., M. NOTH, W. BEYERLIN, G. FOHRER). Esta pesquisa se ocupa com o passado dos livros do AT e estuda o desenvolvimento progressivo da tradição, desde as camadas pré-literárias, até seu surgimento por escrito. Estes livros, em sua maioria, não constituem "literatura", no sentido de terem sido planejados, formulados e escritos por determinados autores, num processo que não volta a se repetir. Pelo contrário, a fixação por escrito representa quase sempre a etapa derradeira do processo de transmissão de um determinado conteúdo, num estágio mais ou menos longo de sua tradição, durante o qual esse conteúdo alcançou afinal sua forma atual. O estudo da história da tradição não considera as unidades do texto apenas do ponto de vista de como sua forma definitiva se concretizou, mas procura seguir todo o processo através do qual as unidades surgiram. Neste método é preciso ter-se em conta a variedade dos materiais do AT, de tal ordem, que não nos permitem reduzi-los a um esquema unitário. Compreende-se que esta pesquisa nem sempre conduz a uma solução segura, pois a tradição não o permite. d) Recentemente a análise estilística tem sido praticada em escala progressiva, lamentavelmente porém com certa tendência ao unilateralismo e ao exclusivismo, em vez de se procurar a complementação dos métodos até agora existentes. Para a apreciação da musicalidade e da estrutura dos versos, emprego das imagens e processo de composição, aplicam-se aí os princípios da "nova estilística" sugeridos pela ciência da literatura. Assim o faz, p.ex., ALONso-ScHÓKEL. Evidentemente, existe, por trás disto, o perigo latente de um esteticismo estéril. e) O quadro se amplia, ainda mais, quando se consideram os numerosos outros aspectos enriquecidos por novos conhecimentos e novas perspectivas. Assim, devemos mencionar os resultados da arqueologia e do estudo da topografia, das pesquisas da história dos territórios, e do esforço de esclarecimento dos diversos contextos históricos do Antigo Oriente. As descobertas de textos no deserto de [udá, principalmente nas cavernas de Qumran, fizeram com que muitas questões aparecessem sob uma outra luz, mas ao mesmo tempo colocaram, no mínimo, outros tantos problemas. A pesquisa referente à história da piedade acompanha as idéias e as manifestações da piedade, no que respeita a suas origens, evolução e variações, ao passo que o estudo da história do culto e das funções dentro deste procura identificar as relações existentes
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entre grandes setores da literatura do Antigo Testamento e o culto, a formação das lendas em torno do culto dos santuários e das festas, a origem e a transmissão das tradições em sua vinculação com o culto em sentido mais amplo. Por fim, O estudo dos problemas da história das redações se volta para a intenção dos compiladores e dos que reelaboraram complexos de extensão maior.
5. A função da introdução A multiplicidade dos métodos atuais de pesquisa e dos processos de compreensão pode-nos parecer desconcertante. Daí é que se explica talvez a facilidade com que os estudiosos se dedicam a um determinado método, com exclusão dos demais. Justamente cabe à ciência introdutória uma função toda especial nas circunstâncias atuais: ela se deve empenhar por organizar o processo de exposição, de modo diverso daqueles que se observam em obras recentes de introdução à Escritura (EISSFELDT*, WEISER*, SELLN-RoST*), e deve agrupar entre si aqueles livros que apresentem características comuns, independentemente da ordem em que eles aparecem dentro do cânon hebraico do AT. A respeito destes grupos, devem ser destacados primeiramente os seus elementos comuns, desde o pano de fundo histórico do Antigo Oriente, até aos problemas da história das formas e da tradição, e aos fatores que dizem respeito à compilação e à transmissão dos textos e, a seguir, os problemas que se referem à formação e à origem de cada livro do AT, pertencente ao respectivo grupo, tudo isto através de um processo conjunto de análise e de síntese. Por último, o estudo da história do cânon e dos textos deve levar em conta o desenvolvimento posterior do AT (v. gráfico na página segunte).
§ 2. PRESSUPOSTOS DA LITERATURA ISRAELÍTICA
J. AIsTLETINER, Diemythologischen und kultischen Texteaus Ras Schamra, 2lJ. ed. 1964. - W. F. ALBRIGHT, Archiiologie in Paliistina, 1962 (Archaeology of Palestine, 1949, 4lJ. ed., 1960). - A. ALT, Die Landnahme der Israeliten in Paliistina, 1925 (= Kleine Schriften, I 1953, 89-125). - In., Wolker und Staaten Syriens im frühen Altertum, 1936 (= ibid. 1959,20-48). - lo., "Erwãgungen über die Landnahme der Israeliten in Palãstina", PJB 35 (1939), 8-63 (= ibid. I 1953, 126-175). - W. BAUMGARTNER, "Ras Schamra und das Alte Testament", ThR NF 13 (1941), 1-20,85-102,157-183. - K.-H. BERNHAROT, Das Problem der altorientalischen Kõnigsideoiogie, 1961.
A tradição em sua forma atual
1
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Análise literária (Crítica literária)
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Forma
Conteúdo
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Pesquisa História História dos gêneros das formas das formas literários (de(história de expresterminação de cada são (histódas formas de forma em ria literáexpressão) particular) ria)
História História História dos motivos da transda tradição e dos mate- missão oral ( determinação e pes( estágio riais (cada um dos mo- pré-li teráquisa das tivos e sua rio da tra- correntes da dição ) tradição) história)
Tradição e interpretação
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até a forma atual
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LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON ECIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO AT - I. ENGNELL, Studies in Divine Kingship in the Ancient Near Easi, 1943. - G. FOHRER, "Die wiederentdeckte kanaanâische Relígion", ThLZ 78 (1953), 193-200. - H. FRANKFORT, Kingship and the Coâs, 1948. - In., The Problem of Similarity in Ancient Near Eastern Religion, 1951. - J. DE FRAINE, L'aspeci religieux de la royauté israélite, 1954. - K. GALLING, Textbuch zur Geschichte Israels, 1950. - C. H. GOROON, Ugaritic Literaiure, 1949. - ID., Ugaritic Manual, 1955. - ID., Geschichtliche Grundlagen des Alten Testaments, 2il ed., 1961. J. GRAY, The Legacy of Canaan, 1957. - S. H. HOOKE (ed.), Myth and Ritual, 1933. - ID., The Labyrinth, 1935. - ID., Myth, Ritual, and Kingship, 1958. - A. JIRKU, DieAusgrabungen in Paliistina und Syrien, 1956. - ID., Kanaaniiische Mythen und Epen aus Ras Schamra-Ugarii, 1962. - A. R. JOHNSON, Sacral Kingship in Ancient Israel, 1955. - C. R. NORTH, "The Religious Aspects of Hebrew Kingship", ZAW 50 (1932), 8-38. - M. NOTH, Die Welt des Alten Testaments, 4il ed., 1962. - ID., "Cott, Kõnig, Volk im Alten Testament", ZThK 47 (1950), 157-191 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1957, 188-229). - H. WH. ROBlNSON, The History of Israel, its facts and [acior, 1941. - H. SCHMÓKEL e outros, Kulturgeschichte des Alten Orieni, 1961, - P. THOMSEN, Palãstina und seine Kultur in fünf [ahriausenden, 3il ed., 1931. - G. E. WRIGHT, Biblische Archãologie, 1957. - Vejam-se também as exposições sobre a história de Israel.
1. Pressupostos históricos e geográficosi A Palestina, em virtude da natureza de seu terreno, não constitui uma região de povoamento homogênea e fechada, mas, por estar dividida em estrias longitudinais no sentido norte-sul- planície costeira, regiões montanhosas a oeste do [ordão, depressão jordânica e região a leste do [ordão - e por estar recortada de planícies, vales e patamares, no sentido oesteleste, favoreceu a tensão sociológica entre os diversos setores de sua população, o desenvolvimento em separado das regiões em que se divide o país, como conseqüência da diversidade de situações na qual o trânsito se verificava, e a fragmentação em uma multiplicidade de unidades políticas autônomas. Ao mesmo tempo, por causa das vias de trânsito abertas ao longo de suas planícies, ela se constituiu o país de ligação entre a África e a Ásia, entre o Egito, a Mesopotâmia e a Ásia menor e, por isso mesmo, se viu constantemente envolvida nas disputas entre as forças que aí dominavam e esteve, durante a maior parte de sua história, sob domínio estrangeiro. Divisão e diversidades territoriais e políticas, históricas e 4
De acordo com a exposição de HEMPEL*, assumidas também por WEISER*.
§ 2.
PRESSUPOSTOS DA LITERATURA ISRAELÍTICA
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étnicas estiveram sempre umas ao lado das outras. A fragmentação do país em numerosos reinos-cidades e feudos, devida à presença das famílias dos dominadores hicsos, nos sécs. XVIII-XVI a.c., sobreviveu à hegemonia egípcia que se seguiu, e só terminou sob os reinados de Davi e Salomão. A existência de grupos étnicos paralelos, sobretudo dos grupos cananeus - não falando da camada dos dominadores filisteus - e israelitas, que se instalaram, antes do mais, nas regiões montanhosas de fraca densidade populacional, ainda se fazia sentir ao tempo em que Salomão realizou a divisão do norte de Israel em regiões administrativas, conservando, porém, os antigos limites. Os dois grupos mencionados, porém, fundiram-se aos poucos, sendo que a influência dos cananeus levou os israelitas a cindir-se étnica, social e culturalmente. O fato determinante, além do mais, foi a progressiva assimilação dos antigos seminômades às novas condições da vida agrícola e, conseqüentemente, às formas de existência urbana e econômica do país. Tudo isto devia tornar difícil para o povo hebreu, quando não impossível, uma existência política, cultural e espiritual própria e, conseqüentemente, deve colocar hoje o problema da origem de uma literatura israelítica como um todo específico. Mas o fato de ela ter surgido e apresentar-se com bastante homogeneidade - abstraindo-se de certas diferenças que resultaram de evoluções realizadas separadamente nos reinos do norte e do sul, depois da cisão do reino de Davi e Salomão - contraria seus próprios pressupostos geográfico-históricos. Este fenômeno só se explica - mais uma vez abstraindo-se de uma seleção de elementos literários, que se praticou ao longo de séculos e foi a única a se preservar - quando visto, de um lado, à luz da consciência nacional e étnica de Israel, que foi preparada no período dos Juízes, desabrochou no reinado de Saul e atingiu seu amadurecimento na época de Davi e Salomão, e, do outro lado, quando se considera o vínculo de união constituído pela fé javista, que, através do povo de Moisés, chegou às tribos e grupos israelitas na Palestina e, por sua vez, influiu de modo de terminante na formação da consciência de Israel como povo e como nação. O fator religioso agiu mais fortemente do que as forças que opunham obstáculo.
2. Pressupostos culturais No curso do seu processo de sedentarização, os israelitas não somente levaram para a Palestina os elementos de sua própria cultura, juntamente com influências mais ou menos de origem mesopotâmica e egípcia, mas
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penetraram, por sua vez, na esfera de influência da alta cultura cananéia. À proporção que as escavações arqueológicas vão trazendo à luz o conteúdo desta cultura, que não se caracteriza somente pelo culto sexual e mágico da fecundidade, tanto mais clara vai aparecendo a herança vigorosa de formas e conteúdos materiais e espirituais que os israelitas assu. miram. Sua rejeição por parte dos nazireus e recabitas constitui, para a época, uma reação estéril e fora de tempo, e teria acarretado a ruína de Israel, caso saísse vitoriosa. O povo vivia ao mesmo tempo numa região onde atuavam tribos não-cananéias e não-israelitas, principalmente aquelas oriundas da estepe situada ao sul de [udá. Na mesma região se sentia a influência da cultura dos hititas da Ásia menor, após a ruína do reino hitita, em cerca de 1200 a.c., ou daquela cultura que se desenvolveu no âmbito do Mediterrâneo oriental, a partir do período egeu que precedeu o dos gregos, ao longo da rota que passa pelas cidades portuárias da Fenícia. Acrescenta-se a isto o fato de Israel ter-se mantido permanentemente vinculado ao Egito a cuja esfera de influência cultural e por vezes também política pertencia a Palestina. Dificilmente se pode conceber a literatura sapiencial de Israel, se não se admite esta vinculação. Por fim, as potências do Oriente deixaram aí também os seus vestígios, desde os sumérios, babilônios e assírios até os persas, seja por intermédio das primeiras migrações dos israelitas ainda seminômades, seja através do cananeu, ou mais tarde por um contato direto. De todos os lados se dirigem para Israel correntes de influências estranhas. Por isto sua literatura deve ser considerada principalmente como parte integrante e como um dos elementos da literatura geral do Antigo Oriente. O que se discute é saber se ela nada mais é do que isto, ou se constitui realmente uma literatura com seu cunho inteiramente próprio. O problema se torna mais agudo, quando se toma em consideração a tese dos estudiosos ingleses e suecos segundo a qual existe uma unidade cultural do Antigo Oriente, sobretudo no domínio do culto, e se deve admitir um esquema cultual (cultic paitern), tendo o rei-deus por figura central, e que seria patrimônio comum de toda aquela região. Neste esquema enquadra-se necessariamente também Israel, cuja cultura, religião e culto devem revelar seus traços, como se tem procurado provar, com base em sua literatura. Esta não é, por conseguinte, senão um pequeno segmento da literatura cultual e religiosa do Antigo Oriente, e tanto é assim, que A. HALDAR no seu estudo sobre o livro de Naum só encontrou quatro versículos onde não aparecem os motivos míticos do referido esquema (com referência a outros dois versículos, não há clareza em sua exposição).
§ 2. PRESSUPOSTOS
DA LITERATURA ISRAELÍTlCA
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Embora o contributo positivo desta maneira de pensar esteja em nos advertir que, para a reta compreensão dos gêneros literários do Antigo Oriente, é necessário que os textos sejam citados em toda a sua extensão, e embora se deva concordar que há um certo grau de homogeneidade e de concordância no seio da cultura do Antigo Oriente, contudo, a hipótese do esquema de homogeneidade do culto tem contra si uma série de argumentos: 1) Considerada do nosso ponto de vista, a cultura do Antigo Oriente pode dar a impressão de constituir uma unidade, como o seria a cultura européia hodierna para os observadores futuros. Mas, do mesmo modo que esta é, na realidade, bastante diferenciada e até certo ponto contraditória, assim também as culturas do Antigo Oriente apresentavam cada uma suas características, suas diferenças e também seus contrastes. 2) Discute-se cada vez mais a opinião segundo a qual o Antigo Oriente constituía um bloco monolítico e fechado. Os próprios hititas não se enquadram inteiramente neste contexto. Mas é sobretudo uma análise das escavações de Ugarit que nos indica que o Antigo Oriente estava aberto para o espaço do Mediterrâneo oriental. O mesmo se deduz a respeito das relações que existiam entre o mundo oriental e a índia. 3) Em nenhuma das culturas do Antigo Oriente pode-se comprovar inteiramente a existência do referido esquema. Em todas elas, encontramos apenas indícios que se devem coligir de toda parte, para que se possa ter uma visão de conjunto. 4) Tem havido muita precipitação quando se pretende descobrir aspectos paralelos entre os textos comparados. Cumpre notar, pois, que a mesma palavra pode ter sentido diferente entre povos e línguas diversos. 5) Supõe-se que um simples israelita tenha tido conhecimentos religiosos e culturais em proporção inacreditável, quando se pretende identificar em textos mais recentes do AT uma infinidade de tons e sobretons do referido esquema.
Mas embora não se possa sustentar a tese do esquema cultuaI, contudo, é assombroso o fato de que, apesar de todas as influências externas, se tenha formado uma literatura hebraica com índole própria e bastante homogeneidade. Como causa para isto devemos mencionar também a fé javista que se impôs de maneira decisiva e a tal ponto, que as tradições das tribos israelitas nela se incorporaram, e ela rejeitou ou assimilou os materiais de origem cananéia ou estrangeira. Sua energia criadora
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impregnou de sentido religioso a herança do passado do próprio Israel e do mundo ambiente vétero-orienta1.
3. Pressupostos literários À época da sedentarização dos israelitas na Palestina, já se conheciam no país a escrita e a arte de escrever que se ensinavam nas escolas de escribas. Nas comunicações escritas oficiais e diplomáticas utilizava-se em geral a escrita cuneiforme, recebida da Babilônia, e que os hieróglifos do Egito não conseguiram suplantar, nem mesmo durante a hegemonia egípcia na Palestina. Mas foi sobretudo por volta dos meados do segundo milênio que se desenvolveu em âmbito fenício uma escrita consonantal, que inicialmente utilizava caracteres cuneiformes, passando mais tarde a caracteres próprios. É desse alfabeto que deriva o alfabeto hebraico antigo como também, por último, o nosso alfabeto, pois os gregos adotaram e modificaram a escrita consonantal dos fenícios, por volta do séc. IX. Também se conhecia, na Palestina, uma parte considerável das literaturas mesopotâmica e egípcia, em particular através de textos que se utilizavam como exercício nas escolas dos escribas. Tratava-se sobretudo de cânticos, poemas épicos, mitos e textos sapienciais. Eram apenas fragmentos isolados e não grandes exposições coerentes. Também se pode desmembrar a narrativa atual do Pentateuco em suas narrativas parciais autônomas ou grupos de narrativas que foram reunidas pouco a pouco sob o domínio de uma idéia fundamental, ao passo que a narrativa de José surgiu ao longo de um período maior de tempo, depois da sedentarização, Também as narrativas da sucessão no trono de Davi foram construídas segundo um plano definido e através da reflexão. No que respeita aos pressupostos literários, observa-se que os israelitas levaram consigo e também encontraram na Palestina um modo muito simples de narrar, mas que, posteriormente, reuniram em grandes conjuntos as narrativas isoladas ou ciclos de narrativas, sob o domínio de idéias mestras, e produziram depois outras exposições dentro de planos bem definidos. Semelhante fenômeno não encontramos nas demais literaturas do Antigo Oriente. Se procurarmos a causa desta evolução singular, poderíamos encontrar, formalmente falando, um caminho que, partindo da épica cananéia e passando pela epopéia israelita, teria levado à exposição histórica. O fator decisivo, porém, foi a fé javista, a qual, com seu caráter nacional-religioso e sob o impulso das aspirações de um grande Israel, proporcionou as idéias e as linhas mestras que levariam os
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narradores mais antigos a agrupar em uma certa unidade os materiais do Pentateuco. A crença de que Javé conduz os destinos dos povos tornou possível, ao contrário dos pressupostos literários, o aparecimento de uma literatura com características únicas. O mesmo acontece com os oráculos proféticos, com os Salmos e outras formas de expressão que se diferenciam notavelmente de fenômenos comparáveis do Antigo Oriente.
4. O significado da fé javista É a fé javista que constitui permanentemente a força determinante que, ao contrário dos pressupostos desfavoráveis, possibilitou a formação de uma literatura israelítica autônoma, que se distingue fundamentalmente das demais literaturas do Antigo Oriente pelo seu pensamento religioso. Trata-se, na realidade, de um processo que se prolonga por vários séculos e seria por demais simplificar as coisas, se quiséssemos limitá-lo à época que vai até os reis. Nesse período, encontram-se apenas as raízes de onde, pouco a pouco, se desenvolveu a árvore. Este fenômeno continua ainda na época da profecia escrita, sendo que se torna cada vez mais claro que as forças propulsoras da fé javista são as idéias da soberania divina e da união com Deus.
§ 3. TRADIÇÃO ORAL E LITERATURA H. BIRKELANO, Zum hebrâischen Traditionswesen, 1938. - R. C. CULLEY, "An Approach to the Problem of Oral Tradition", VT 13 (1963), 113-125. - O. EISSFELDT, "Zur Überlielerungsgeschichte der Prophetenbücher des Alten Testaments", ThLZ 73 (1948), 529-534. - I. ENGNELL, Gamla Testamentet, en traditionshistorisk inledning, I 1945. - lo., "Profetia och tradition", SEA 12 (1947), 110-139. - B. GERHAROSSON, Memory and Manuscript, 1961. - lo., "Mündliche und schriltliche Tradition der Prophetenbücher", ThZ 17 (1961), 216-220. - A. H. J. GUNNEWEG, Mündliche
und schriltliche Tradition dervorexilischen Prophetembúcher aIsProblem der neuren Prophetenforschung, 1959. - J. HEMPEL, "The Literature of Israel: The Forms of Oral Tradition", em: Record and Revelation, 1938,28-44. - A. S. HERBERT, Literary criticism and oral tradition, London Quarterly and Holborn Review 1959,9-12. - J. LAESSOE, "Literary and Oral Tradition in Ancient Mesopotamia", em: Studia Orientalia Pedersen, 1953,205-218. - A. Loos, "Le rôle de la tradition orale dans la formation des récits de l'Ancien Testament", RHR 88 (1923), 51-64. - S. MOWINCKEL, "Opkomsten av profetlitteraturen", NTT 43 (1942),65-111. - lo., Prophecy and Tradition,
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1. O problema Até aqui falamos da literatura israelita. Agora se coloca o problema de saber de que modo e em que tempo ela surgiu. Foi ela fixada imediatamente por escrito, como se tem admitido freqüentemente e com muita naturalidade, ou existiram estágios que conduziram até ela? Em caso afirmativo, quando surgiu essa literatura e o que aconteceu antes dela? Estas questões têm sido calorosamente debatidas nos últimos decênios. O primeiro impulso neste sentido foi dado por NYBERG. Na sua opinião, o processo de transmissão literária no Oriente se realizou sobretudo por via oral e muito raramente por escrito. A fixação de uma obra literária por escrito foi precedida durante algum tempo por uma tradição oral, a qual continuou, mesmo depois da fixação por escrito, como a forma normal de utilização e de perpetuação da obra. Isto vale também para o AT, que até o exílio tinha uma pré-história fundamentalmente oral, cultivada nos círculos ou centros tradicionais, que conservavam e transmitiam o material, sendo esse mesmo AT, em sua forma escrita, um produto somente da comunidade judaica posterior ao exílio. Por conseguinte, é somente esta tradição escrita posterior ao exílio que se pode recuperar e ser estudada criticamente, tornando-se supérfluas a crítica textual e a crítica literária. ENGNELL estendeu estas teses até o extremo limite: as narrativas do AT não somente foram transmitidas exclusivamente por via oral ao longo de séculos, mas existiram também "literaturas" orais e completas,
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E LITERATURA
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exercendo a tradição oral o papel principal, mesmo depois da fixação por escrito, e sem esta tradição oral a literatura israelita em formação não teria sobrevivido ao exílio. É precisamente esta forma oral no seio dos elementos fixados por escrito que a pesquisa atinge como último substrato. ENGNELL e BIRKELAND aplicaram, em seguida, este modo de conceituar a tradição sobretudo aos livros proféticos, sendo que ENGNELL distingue também um tipo litúrgico (que desde o início se destinava a ser fixado por escrito) e um "tipo-divã" (Diwan-Typ) (coleções de palavras e de relatos onde predomina a tradição oral). NIELSEN retomou estas teses e as expôs à sua maneira. A essas teses se contrapõem as pesquisas de WIDENGRENS, que tem em muito pouca estima a significação e a credibilidade da tradição oral, e só a admite em casos excepcionais. Ele admite um cuidadoso processo de fixação por escrito e de transmissão dos textos, que remontaria à mais alta antiguidade. Para essas duas posições, a pesquisa crítica e literária não tem sentido. Para a primeira, a crítica literária já não é mais possível, porque a pesquisa não pode ir além da tradição da comunidade pós-exílíca, e para a segunda hipótese, essa crítica é desnecessária, porque tudo foi fixado por escrito desde o início, tal qual o temos hoje. Essas duas posições nos parecem unilaterais. Por isso MOWINCKEL escolheu desde logo um caminho intermediário, onde se abstém de exaltar a tradição tal como se apresenta hoje, e coloca a ênfase na evolução histórica, a fim de, a partir da tradição, chegar à sua base histórica. Ele procura distinguir entre camadas primitivas e camadas posteriores da tradição, e indica a via oral que vai da unidade isolada à compilação e o texto fixado por escrito e revestido de autoridade canônica como pressupostos para uma tradição oral firme. Desde então tem-se admitido muitas vezes e de modo também diverso a coexistência dos dois tipos de tradições. Assim, GUNNEWEG, HEMPEL e STUHLMUELLER. Ao estudar esta questão, devemos distinguir entre dois grupos de problemas: as referências a uma tradição oral e escrita no Antigo Oriente e no ATem geral, e a aplicação desses resultados aos diversos tipos de literatura de Israel.
2. Tradição oral e escrita O que se aduz para a solução do problema da tradição oral e escrita? Em primeiro lugar, e em favor da possibilidade de uma tradição oral,
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observa-se que o oriental possui uma memória extraordinária, podendo mesmo guardar de cor trechos enormes e reproduzi-los mesmo muitos anos mais tarde. Chama-se evidentemente a atenção para a exatidão com que se faz esta transmissão e de que aí não há a preocupação com reelaborações constantes nem com modificações, como o afirmam NYBERG e outros. Entre uma narrativa transmitida oralmente e sua fixação posterior por escrito não deve ter havido quase nenhuma diferença essencial, a menos que um determinado autor as tenha introduzido em função de seus próprios objetivos. Acresce que tanto em Israel como no Antigo Oriente em geral havia narradores e cantores que propagavam as tradições orais. Assim, encontravam-se os cantores de sátira (Nm 21.27) e homens e mulheres que recitavam cânticos fúnebres e transmitiam a outros seus conhecimentos (Ir 9.16; Am 5.16). As inúmeras histórias do Pentateuco nos revelam a existência de uma longa prática da narrativa, para a qual GUNKEL já chamava a atenção com respeito ao livro do Gênesis. Os oráculos proféticos em sua maioria destinavam-se a ser proferidos oralmente e de modo geral somente depois é que foram lançados por escrito. O mesmo se diga das máximas sapienciais e das normas de vida e dos axiomas jurídicos que foram reunidos em séries. Embora tudo isto deponha em favor de uma tradição oral, sua duração e sua importância, contudo, ficam limitadas pela observação de que no Antigo Oriente e simultaneamente em Israel desde muito cedo existiu uma tradição escrita. Na Mesopotâmia e no Egito as tradições literárias remontam a antigas eras. A documentação arqueológica é bastante clara neste sentido. Certamente que muita coisa se aprendia de cor, mas isto acontece inclusive em nossos dias e outrora se vinculava ao processo de gravar os textos e aprender certas orações que se queria saber de cor para os casos de necessidade. Nos exemplos apresentados por NIELSEN não se trata de processo de transmissão, mas de apropriação de tradições que já existiam por escrito, de onde se supõe precisamente que se fazia a transmissão por escrito. Tiram-se conclusões improcedentes, quando não se distingue entre a tradição oral de fragmentos isolados ainda não fixados por escrito, e a apropriação de textos escritos para fins de exposição oraL As antigas bibliotecas e os arquivos nos indicam também a existência de uma tradição oral primitivas. Além dos numerosos arquivos localizáveis na Palestina, nas residências privadas e nos templos mesopotâ5
Cf. as informações particularizadas em H. Alten Orient, 1966, 204, 402-408, 411.
ScHMÓKEL,
e outros, Kultur geschichte des
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micos e da Ásia menor, nos quais as tabuinhas contendo os textos eram arrumadas por seções e por séries, em estantes de madeira ou conservadas em jarros de barro e outros recipientes, existiam, também desde tempos remotos, bibliotecas onde as tabuinhas, feitas para durar, eram distribuídas segundo determinados princípios e registradas em catálogos. Muitos destes catálogos datavam já do segundo milênio e o mais antigo conhecido até agora, um catálogo neo-sumério de hinos, contendo o início de quarenta e dois hinos, data da época da III dinastia de Ur 6 • Deste mesmo milênio são os arquivos e bibliotecas hititas (com seus catálogos) sobre cujas instalações se pode ter uma idéia pelos resultados das escavações. Também a maior parte dos textos religiosos de Ugarit pertence a coleções privadas da segunda metade do segundo milênio. A mais antiga biblioteca assíria parece ter sido organizada por TeglatFalasar [Tiglatpileser]. A mais célebre de todas é a biblioteca de Assurbanípal, que data do séc. VII e que deve ter reunido o maior número possível de antigas obras literárias. Data dos mesmos séculos uma biblioteca de seiscentas tabuinhas encontradas na casa de um sacerdote em 5ultantepe, perto de Harã. Neste período da época tardia da realeza israelítica se situa, para o Antigo Oriente, uma das idades felizes da escrita. Neste sentido, temos o fato de que no AT se fala com freqüência do escrever, de rolos manuscritos e de leituras em voz alta, e por isso também não se pode senão pensar que Moisés tenha recebido de Javé o decálogo sob a forma escrita. Em [z 8.14 já se supõe o conhecimento da leitura e da escrita entre os jovens, e para a época anterior ao exílio temse o testemunho relativo a obras literárias que se perderam posteriormente (§ 13; 42). Também se deve mencionar a classe dos escribas profissionais que contribuíram de modo particular para a fixação e para a conservação das tradições". Assim, embora se deva contar com a existência de documentos escritos e de uma literatura, já desde épocas remotas, contudo é necessário fazer algumas restrições com referência à opinião de WIDENGRENS, segundo a qual tudo foi registrado por escrito logo de início e desde então transmitido sem alteração. Não devemos perder de vista o fato de que os textos sofreram intervenções e mudanças de toda espécie. Uma comparação 6 7
W. W. HALLO, "On the Antiquity of Sumerian Literature", JAOS 83 (1963), 167-176. O conhecimento das línguas dos povos vizinhos, que E. ULLENDORF, "The Knowledge of Languages in the Old Testament", BJRL 44 (1961/1962), 455-465, demonstrou existir, indica um certo nível de formação.
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entre o texto massorético e a LXX nos mostra que essas deformações dos textos foram produzidas pelo menos até o séc. III a.c. Em resumo, deve-se dizer que desde a descoberta da escrita as duas coisas sempre existiram: de um lado, a tradição oral em determinados casos e até um determinado momento, a partir do qual ela foi fixada por escrito, e do outro lado, já desde época muito remota, uma tradição escrita cujas produções estavam naturalmente expostas a mudanças.
3. Tradição oral e escrita em Israel Que relações podemos admitir, em Israel, entre a tradição oral e o aparecimento da literatura? Em muitos casos houve seguramente um estágio mais longo da tradição oral, antes da fixação por escrito. Isto vale para uma parte considerável das histórias que se encontram nos livros mais antigos de narração (Gênesis-juizes) e para antigos cânticos e provérbios. Inicialmente elas foram transmitidas oralmente, de lugar para lugar, de tribo para tribo e de geração para geração. Daí ser possível explicar todas as espécies de variantes das narrativas das fontes que estão na base do Pentateuco ou a transferência de um mesmo motivo para diferentes personagens. De conformidade com os pressupostos literários encontrados por Israel (§ 2,3), nas tradições orais tratava-se predominantemente de fragmentos isolados, ao passo que as fontes de que se compõem o Pentateuco tinham sido sem dúvida fixadas por escrito. Cronologicamente considerando, o que houve na época de Israel, na fase anterior ou dos primeiros tempos palestinenses, foi em primeira linha uma tradição oral. Embora em épocas posteriores ela seja ainda encontrada esporadicamente, como nas lendas em torno de Elias e Eliseu, transmitidas inicialmente por via oral, contudo, a partir do período salomônico, ela vai aos poucos desaparecendo, do mesmo modo que o florescimento cultural. Assim devemos, de imediato, classificar a história da sucessão dinástica de Davi como obra literária. Entretanto, já desde tempos mais remotos, além da tradição oral havia concomitantemente uma tradição escrita que era a forma de tradição existente para textos jurídicos, listas e documentos. Além disso não se exclui que complexos ou séries mais amplas de narrativas tenham sido, cada uma de per si, fixadas por escrito, antes de serem introduzidas nos atuais livros históricos, depois de reelaboradas. Muitas expressões poéticas nos mostram não ser impossível que tenha havido outrora composições épicas em Israel como as de Ugarit, que se ocupavam com os grandes
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vultos das épocas primitivas. Com certeza, foram elas então registradas por escrito como em Ugarit. Da época mais recente devemos mencionar em primeiro lugar os oráculos proféticos transmitidos. Muitos indícios depõem no sentido de que eles foram fixados por escrito, não muito depois de sua proclamação oral. Onde isto não se deu, não possuímos tradição de nenhuma espécie, e nem sequer conhecemos os nomes de tantos que atuaram como profetas. Onde isto ocorreu, exclui-se uma tradição oral mais prolongada. Não subsistiram os círculos de discípulos alegados em tal sentido e que são postulados com base apenas em uma glosa corrompida que se lê em Is 8.16 8 . Os oráculos pertencem, pelo contrário, aos ditos que foram elaborados em forma poética e que, segundo os defensores da hipótese de uma tradição oral, teriam sido fixados provavelmente por escrito. Esses oráculos nos revelam também a índole pessoal de seus autores e não foram polidos nem nivelados no decurso de um processo de transmissão bastante longo. Assim como Ezequiel tinha diante de si suas próprias palavras lançadas por escrito, pois que ele (como posteriormente seus discípulos e outros leitores) introduziu acréscimos no final de algumas delas, assim também Jeremias ditou a Baruc pelo menos uma parte de seus oráculos. Deduz-se, a partir daí, quanto ao mais, que o motivo principal deste procedimento de fixação por escrito era a preocupação de reter ou intensificar o poder de ação da palavra falada. Foi este fato que levou a uma fixação imediata dos textos por escrito (§ 54,1). De tudo isto se conclui que não se deve contar, nem com uma longa tradição apenas oral ou exclusivamente escrita, nem com uma tradição paralela ao mesmo tempo oral e escrita do mesmo texto. Pelo contrário, diversa será a situação, dependendo da natureza dos modos de falar e dos gêneros literários. Alguns deles florescem e prosperam de modo particular na tradição oral e se destinam precisamente a ela. Outros são de uma espécie que leva forçosamente à fixação escrita. Acrescem ainda, em se tratando de obras volumosas ou artísticas e de oráculos proféticos, outros motivos e circunstâncias que favorecem ou suscitam uma tradição oral, de modo que esta predomina, quanto mais avançamos na história.
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Cf. G. FOHRER, "The Origin, Composition and Tradition of Isaiah. I-XXXIX", Annual of Leeds University Oriental Society, 3 (1961/1962),29-32.
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§4.APROSA L. AWNso-ScHÓKEL, Laformación del estilo: Libra del alumno, 1961.- lo., "Erzãhlkunst im Buche der Richter", Bíbl 42 (1961), 143-172. - ERICH AUERBACH, Mímesís, 1946. - B. BUBER - F. ROSENZWEIG, Díe Schríft und íhre Verdeutschung, 1936. - J. HEMPEL, Geschíchten und Geschíchte im Alten Testament bis zur persíschen Zeit, 1964, 152-173. J. MUILENBURG,"A Study in Hebrew Rhetoric: Repetition and Style", VTSupp11 (1953),97-111. - A. ScHULZ, Erziihlkunst in den Samuei-Büchem, 1923.- M. WEISS, "Einiges über die Bauformen des Erzãhlens in der Bibel", VT 13 (1963),456-475.
1. Forma atual
As particularidades lingüísticas e estilísticas da prosa são, muitas vezes, em sua forma atual, o resultado de um longo processo de transmissão e reelaboração, cujos estágios individuais deixaram seus vestígios, desde a fase de gestação, na tradição oral- caso a mesma exista ao princípio - até à fase de redação, e mesmo até aos acréscimos posteriores e às glosas. Por isso, as características dos fragmentos individuais, originariamente independentes, permanecem ocultas e dificilmente se podem captar depois de incorporadas às grandes linhas conexas da narração, nas fontes ou na literatura. Mas também as peculiaridades dessas últimas continuam até agora muito pouco ou quase nada exploradas. Não há dúvidas de que os recursos estilísticos, p.ex., das fontes eloística e sacerdotal do Pentateuco, bem como os da escola deuteronomística se diferenciam uns dos outros. Contudo, ainda se espera uma investigação meticulosa, com novos métodos, como aquela de outros livros. Somente depois que se captar todas as formas de prosa é que se poderá investigar os recursos estilísticos comuns e fundamentais. E aqui nos aguardam ingentes tarefas na busca de uma solução. A tentativa de determinar os recursos estilísticos empregados na prosa? deve levar em conta o modo como as obras maiores incorporaram o material mais antigo, para fazer uma distinção entre ambos. Muitas vezes, como acontece nos livros dos Reis, o fato de se remeter aos livros de crônicas dos reis, para consulta de mais amplo material, faznos ver que o texto atual representa em geral um extrato dessas mes-
9
HEMPEL * esboçou algumas linhas fundamentais que adotamos preferentemente na exposição a seguir.
§ 4. A
PROSA
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mas fontes, determinado pelas tendências teológicas do autor. Com referência às épocas mais antigas, pelo contrário, os narradores permanecem mais fielmente ligados à tradição, nela interferindo em muito menor escala. O mesmo vale para os redatores que no processo narrativo, de Gênesis até Samuel, acolheram e conservaram, de modo constante, sempre mais de uma tradição referente a um mesmo tema, mas levando em consideração as contradições internas que daí resultavam. Por este modo, se pode também apreender a natureza da prosa israelita mais antiga.
2. Características de linguagem Além dás características gerais da prosa, é preciso mencionar suas características de linguagem. Em consonância com o traço voluntarista e passional do gênio israelita, a linguagem impele para a frente, de modo que o seu progresso se reflete em frases amplas e curtas, indo da palavra ao fato, e de um fato a outro. Seu encadeamento por meio da conjunção e pode-nos parecer monótono, mas à releitura ou à narração em voz alta, para a qual os textos se destinavam, ele se transforma em vivo impulso que desemboca numa conclusão súbita. Verifica-se um certo afrouxamento com o emprego dos infinitivos: do infinitivus absolutus nas enumerações e convites, e do infinitivus constructus como substituto de orações subordinadas conjuncionais. Há também afrouxamento nas frases circunstanciais inseridas sem conjunção, como em Nm 22.24, e nos imperativos correspondentes, como em 2Sm 1.15. Ao caráter realista e concreto do temperamento israelita corresponde a maneira viva, imaginosa e impressionista de descrever as coisas, e que trabalha de preferência com comparações, vendo os fatos que se passam no interior do homem como que refletidos no seu comportamento exterior, e fixando cada uma das cenas de um determinado acontecimento como em quadros parciais que figuram uns ao lado dos outros. Precisamente por isso é que se consegue introduzir, numa alternância inesperada, a mudança completa nas disposições internas, passando da cólera súbita para o auto-apaziguamento, ou da magnanimidade ao desejo de morte, que brota da alma apaixonada do israelita"'.
10
Cf. L.
KOHLER,
Der hebriiísche Mensch, 1953.
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3. Peculiaridades estilísticas Uma das peculiaridades estilísticas consiste na inversão, num desvio da seqüência verbal: predicado-sujeito da oração verbal". Este processo de inversão pode servir para dividir o texto em seções, conduzindo, assim, a atenção para um determinado inciso, e pode constituir um suporte mnemônico para a aquisição oral, ao passo que, como processo de pura enfatização, deve ser considerada,. de preferência, como um recurso literário-artístico. Dentro da narração, a frase nominal tem por função descrever estados, informar sobre situações importantes ou constatar resultados. Seu lugar apropriado é o discurso, onde é utilizada para os mais variados fins. Um outro recurso estilístico é a repetição de palavras ou de partes importantes da frase, para descrever uma situação, como em Gn 22.6,8, ou para realçar o significado de um acontecimento, como em 2Sm 11.17,21,24. De natureza semelhante são as repetições na sucessão de ordens dadas e sua execução, como em 2Rs 13.15s, ou aquela de cenas inteiras, como em Est 5.3,6; 7.2. Também se usa intencionalmente o estilo repetitivo, que omite primeiramente certos traços esclarecedores isolados, e posteriormente os reintroduz, para indicar o que há de notável ou de misterioso em um determinado acontecimento, como em Gn 20.4,18, ou o cumprimento das palavras proféticas, como em [r 39.15-18; 45. Por fim deve-se mencionar a introdução de discursos na narrativa, que pode suscitar a ação, impulsioná-la, acalmá-la ou protelá-la. Indiretamente ela pode caracterizar o interlocutor, como o faz habilidosamente o poeta de [ó, Tais discursos são constituídos de monólogos ou diálogos, mesmo quando a narrativa faz estarem presentes várias pessoas. Só excepcionalmente mais de duas participam do colóquio, como em 1Rs 3.16ss.
§ 5. A POESIA E. BALLA, Ezechiel8, 1-9,11;11,24-25, em: Bultmann-Festschrift, 1949, 1-11. - J. BEGRICH, "Zur hebrãischen Metrik", ThR NF 4 (1932), 67-89. - lo., "Der Satzstil im Fünfer", ZS 9 (1934), 169-209 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964, 132-167).- G. W. H. BrCKELL, Carmina
11
Sobre isto, cf. W. RrCHTER, Traditionsgeschichtliche Untersuchungen zum Richterbuch, 1963, 354-361.
§ 5. A POESIA
Veteris Testamenti metrice, 1882. - lo., Dichtungen der Hebriier zum ersten Male nach den Versmassen des Urtextes übersetzt, 1882-83. A. BRUNO, Rhythmische (und textkritische) Untersuchungen von Gen, Ex, fos, Ri, I-lI Sam, I-lI Kon, fes, fer, Ez, Zwolf Propheten, Ps, Hi, Prov, Ruth, Cant, Qoh, Thr, Esth, Dan, 1953-59. - K. BUODE, "Das hebrãische Klagelied", ZAW 2 (1882), 1-52 (Suplementos em 3, 1883; 11, 1891; 12, 1892; ZDPV 6, 1883). - A. CONOAMIN, Poêmes de la Bible. Avec une introduction sur la strophique hébraique, 1933. - G. FOHRER, Die Hauptprobleme des Buches Ezechiel, 1952,60-66. - lo., "Über den Kurzvers", ZAW 66 (1954), 199236. - D. N. FREEOMAN, "Archaic Forms in Early Hebrew Poetry", ZAW 72 (1960), 101-107. - I. GÁBOR, Der hebriiische Urrhythmus, 1929. - ST. GEVIRTZ, Patterns in the Early Poetry of Israel, 1963. - G. B. GRAY, The Forms of Hebrew Poetry, 1915. - G. HaLscHER, "Elemente arabischer, syrischer und hebrãischer Metrik", em: BZAW 34, 1920,93.101. - F. HORST, "Die Kennzeichen der hebrâischen Poesie", ThR NF 21 (1953), 97.121. - E. KaNIG, Hebriiische Rhythmik, 1914. - CH.F. KRAFT, The Strophic Structure of Hebrew Poetry as illustrated in the First Book of the Psalter, 1938. - J. LEY, Grundzüge des Rhythmus, des Vers- und Strophenbaues in der hebriiischen Poesie, 1875. - lo., Leitfaden der Metrik der hebriiischen Poesie, 1887. - R. LOWTH, De sacra poêsi Hebraeorum, 1753, 2ª ed., 1763. - E. Z. MELAMEO, "Break-Up of Stereotype Phrases as an Artistic Device in Biblical Poetry", em: Scripta Hierosolymitana 8, 1961, 115-153. - H. MaLLER, "Der Strophenbau der Psalmen", ZAW 50 (1932),240-256. - J. A. MONTGOMERY, "Stanza-Formation in Hebrew Poetry", fBL 64 (1945), 379-384. - S. MOWINCKEL, "Zum Problem der hebrâischen Metrik", em: Bertholet-Festschrift, 1950, 379-394. - lo., "Metrischer Aufbau und Texkritik au Ps. 8 illustriert", em: Studia Orientalia Pedersen, 1953,250262. - lo., "Der metrische Aufbau von [es 62,1-12 und die neuen sog. 'Kurzverse"', ZAW 65 (1953), 167-187. - lo., "Zur hebrâischen Metrik 11", StTh 7 (1954), 54-85, 166. - lo., "Die Metrik bei Jesus Sirach", ibid. 9 (1956), 137-165. - lo., "Marginalien zur hebrâischen Metrik", ZAW 68 (1956), 97-123. - lo., Real and Apparent Tricola in Hebrew Psalm Poetry, 1957. - J. MUILENBURG, "A Study in Hebrew Rhetoric: Repetition and Style", VTSuppl I, 1953, 97-111. - T. PIATTI, "I carmi alfabetici della Bibbia chiave della metrica ebraica?", Bib131 (1950) 281-315,427-458.L. PRIjS, "Der Urspung des Reimes im Neuhebrãischen". BZ NF 7 (1963), 33-42. - TH. H. ROBINSON, "Some PrincipIes of Hebrew Metrics", ZAW 54 (1936), 28-43. - lo., "Basic Principies of Hebrew Poetic Form", em: Bertholet-Festschrift, 1950, 438-450. - lo., "Hebrew Poetic Form: the English Tradition", VTSuppll, 1953, 128-149.- J. W. ROTHSTEIN, Grundzüge des hebriiischen Rhythmus, 1909.- SR. SEGERT, "Vorarbeiten zur hebrãischen Metrik", ArOr 21 (1953),481-542; 25 (1957), 190-200. - lo., "Problems of Hebrew Prosody", VTSuppl 7, 1960,283-291. - E. SIEVERS, Metrische Studien, I-I1I 1901-07. - W. STAERK, "Ein Hauptproblem der hebrãischen Metrik", em: Kittel-Festschrift, 1913, 193-203.
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62
LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO
AI
1. O uso da poesia Os livros históricos do AT nos atestam, a cada passo, que Israel, em ocasiões inúmeras de sua história, executou cânticos adequados a esses momentos e é por eles que podemos reconhecer os resíduos, muitas vezes bastante tênues, de gêneros literários líricos. Somente os cânticos de Maria e Débora, em Ex 15.20 e [z 5, respectivamente, indicam-nos a ocorrência de uma arte poética e da poesia na mais remota antiguidade. Além da lírica propriamente dita, na qual a forma poética pode servir de expressão a determinados sentimentos e a disposições especiais, há os oráculos e ditos mais extensos ou poesias dos profetas e dos mestres sapienciais, articulados segundo a métrica e o ritmo, em correspondência, portanto, com as afirmações importantes que eles fazem. Poesia, com efeito, não é apenas uma determinada forma de arte, mas é considerada originariamente como distintivo da inspiração, do trato com o mundo sobrenaturaL A forma poética confere, por sua vez, à palavra falada uma autoridade e uma virtude, como aquela que se acredita residir, p.ex., na maldição e na bênção. É como se um profeta, afirmando pregar em nome de Javé, ou um mestre de sabedoria, pretendendo transmitir um conhecimento ou uma regra de vida que Deus ou os pais lhe comunicaram, só pudessem encontrar audiência, se revestissem suas palavras com roupagem métrica e rítmica". Ao utilizar uma determinada forma poética, Israel se situa dentro de uma tradição generalizada em todo o Antigo Oriente. Por toda parte se encontraram textos métrica e ritmicamente construídos, a respeito dos quais falaremos nas seções seguintes ou nos parágrafos que tratam dos gêneros literários poéticos, nas partes 2-4. De modo particular é preciso pressupor, como nos ensinam os textos ugaríticos, uma tradição poética firme na Sírio-Palestina, durante o segundo e primeiro milênios, de modo que as poesias cananéia e israelítica mutuamente se elucidam. Isto é tanto mais importante, quando falta quase de todo uma tradição judaico-israelítica própria sobre as regras básicas da poesia e os recursos estilísticos, e quando somente uma parte dos textos de Qumran nos oferecem umas poucas indicações". De qualquer modo, elas parecem confirmar as con12 13
Cf. A. GUILLAUME, Prophecy and Divination, 1938. Com o verbo tqn, "colocar em linha reta", no sentido de "dar forma métrica", Ec1 12.9 e Ec10 47.9, como também Ec10 45.5, quando se refere ao compositor de cânticos segundo as regras, indicam apenas a existência de regras poéticas. Não se tem certeza se 1 QH I, 285, com os termos fio de medir e medida alude a estas regras.
§ 5. A
POESIA
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jeturas estilísticas que a pesquisa extraiu dos textos veterotestamentários. Os problemas de métrica e de ritmo continuam até agora sem solução, ou talvez sejam simplesmente insolúveis. Obscura é, afinal, a questão de saber se, via de regra, deve-se admitir a existência de uma construção estrófica para textos mais extensos. Apesar de todas as dificuldades que, com referência aos problemas de métrica e ritmo, residem sobretudo na transposição do acento da primeira para a última sílaba da palavra e na correlativa mudança de enunciado, a pesquisa não pode parar, mas antes deve procurar novos caminhos, e nesta busca os textos ugaríticos poderão vir a ser, mais uma vez, de não menor valia. Em primeiro lugar trata-se de examinar as bases das hipóteses estilísticas, a partir do momento em que passaram a ser consideradas quase imutáveis, desde que LOWTH (753) as apresentou. Elas podem se resumir nos dois seguintes princípios: 1) os versos compõem-se de dois (ou às vezes de dois ou três)" membros ou séries, e 2) os versos são construídos segundo o paralelismo dos membros (parallelismus membrorum). Contudo, esta maneira esquemática e demasiado estreita não consegue apreender e explicar o estado da questão. Em vez disso - e independente da solução dos problemas referentes à métrica e ao ritmo - é preciso antes partir de dois outros conhecimentos fundamentais adquiridos no tocante ao estilo: 1) O verso pode constar de um ou mais membros (partes 1-3). Não deve constar de vários membros, ainda que a maioria dos versos recebidos ou sejam, na realidade; só se pode dizer que é possível existir mais de um membro. - 2) O conteúdo dos membros do verso nem sempre é determinado pelo parallelismus membrorum. Daí ser mais exato falar de um estilo repetitivo e muitas vezes paralelizante. Como não existe uma terminologia homogênea a este respeito, mister se faz observar que as seguintes denominações são respectivamente sinônimas: Membro Verso longo
série período
estíquio cólon bícolon ou trícolon.
Devemos distinguir também entre 1) a construção estilística e 2) o metro
(Rhythmus), 3) a construção estrófica e 4) os recursos poéticos. 14
Antes de tudo, MOWINCKEL pretende identificar apenas uma lei dos dois estíquios em cada verso e procura eliminar de modo geral os versos de três membros.
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LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON ECIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO AT
2. O verso longo A primeira espécie é constituída pelo verso longo. Sua construção estilística, que o distingue nitidamente da prosa, representa uma das suas características externas inconfundíveis e resulta da junção de dois ou três membros que, reunidos, constituem uma unidade superior. São encontrados aí com mais freqüência os versos de dois membros, do que os de três, como, p.ex., no SI 45[ 44] ( todo), em uma secção de determinado texto, construída sob a forma de estrofe, como em Is 28.7s, ou em um único verso, como o de Is 8.8a. Muitas vezes uma secção se encerra com um único membro. do verso, como, p.ex., em Is 3.24; Os 4.14. O conhecimento desta forma de construção do verso nos tem sido atestado várias vezes por antigos documentos. Ele está presente em toda a poesia do Antigo Oriente, como no-lo confirmam as pesquisas sobre os textos egípcios" ou ugaríticos". Nas tabuinhas de argila da Acádia é pela escrita que se pode conhecer a divisão do verso em membros'". Numa inscrição aramaica sepulcral do séc. V, no Egito, os membros do verso se encontram nitidamente separados uns dos outros por um claro deixado entre eles". Procederam também assim os autores de certos manuscritos hebraicos com referência aos livros poéticos (Salmos, Jó, Provérbios) e em certos trechos poéticos dos livros em prosa, como, p.ex., Ex 15.1-18; Dt 32.1-43. Um rolo fragmentário dos Salmos" e um fragmento de Dt 32 20 da quarta gruta de Qumran nos atestam, agora, quanto ao período final anterior ao cristianismo, a existência deste modo de escrever os membros de um verso, separando-os por um espaço em claro. A. ERMANN - H. RANKE, Agypten, 1923,468-474. - W. 5. GOLÉNISCHEFF, "Parallélisme symétrique en ancien égyptien", em: Studies Griftith, 1932, 86-96. - H. GRAPOW, "5tilistische Kunst", em: Handbuch der Orientalistik, I, 2 1952,21-29. 16 W. F. ALBRICHT, "The Old Testament and Canaanite Language and Literature", CBQ 7 (1945), 5-31. - C. H. GORDON, Ugaritic Textbook, 1965, 131-144. R. DE LANCHE, "La Bible et la litérature ugaritique", OrBiblLov 1, 1957, 65-87. - J. H. PATTON, Canaanite ParaI/eis in the BookofPsalms, 1944. -G. D. YOUNC, "Ugaritic Prosody", JNES 9 (1950), 124-133. 17 B. MEISSNER, Babylonien und Assyrien, II 1925. - lo., Die babylonisch-assyrische Literatur, 1928, 25-27. 18 G. HbLSCHER, Syrische Verskunst, 1932, 3s. 19 P. W. 5KEHAN, RB 63 (1956),59. 20 W. H. BROWNLEE, The Meaning of the Qumran Scrol/s for the Bible, 1964,9. 15
§ 5. A
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A relação entre os membros do verso, que já IBN ESRA parece ter conhecido, é designada, de ordinário, como parallelismus membrorum (LoWTH). Em vez disto, falamos genericamente de estilo repetitivo e por vezes paralelizante. Encontramos um estilo realmente paralelizante nas duas primeiras formas do chamado paralIelismus membrorum, a saber: 1) um "paralelismo sinônimo", onde o segundo membro repete, com outras palavras, o sentido do primeiro, p.ex., SI 1.2: mas encontra o seu prazer na lei de Javé e/repete a sua lei dia e noite; 2) um "paralelismo antitético", onde o segundo membro elucida o conteúdo do primeiro, por meio de uma idéia de sentido contrário; p.ex., SI 1.6: Porque Javé conhece o caminho dos justos,/mas o caminho dos ímpios conduz à perdição. Existem também versos longos, cujos membros não estão ligados por nenhum paralelismo, e aqueles com três membros, dos quais nenhum é paralelo aos outros dois. A terceira espécie é chamada, em geral, de "paralelismo sintético", quando na realidade não o é, pois o segundo membro desenvolve e completa o primeiro, p.ex., 511.3: É como uma árvore/plantada à beira das águas correntes. O verso longo constitui a unidade poética e estilística fundamental, podendo subsistir por si só. Naturalmente encontram-se unidos quase sempre pelo menos dois versos longos, como em Gn 9.6, surgindo daí unidades maiores. Estas, por sua vez, podem-se agrupar em estrofes, que abrangem vários versos longos. Neste caso é preciso distinguir entre estrofes enquanto unidades métricas, e estrofes enquanto unidades estilísticas. As primeiras, que devem apresentar sempre o mesmo número de versos, com a mesma metrificação, parecem ter sido muito raras na poesia israelítica. As outras, que constituem simplesmente seções menores de um texto, em geral com o mesmo número de versos, parecem ter sido de uso corrente. Indícios claros a respeito dessas estrofes nos são oferecidos pela ocorrência regular de refrões, como p.ex., nos 5142-43 [41-42]; 46 [45]; 80 [79]; 107 [106], e pelos salmos alfabéticos contendo igual número de versos para cada letra, como, p.ex., nos 519-10; 119 [118], e em Lm 1-4. A partir daqui, e principalmente por razões de conteúdo, temos de admitir muitas vezes a presença de estrofes, mesmo quando faltam indícios exteriores.
3. O verso breve A segunda espécie de verso, que se deve admitir mesmo contra a opinião dos que limitam o verso longo a dois ou três membros, e apesar de contestada por MOWINCKEL, é constituída pelo verso breve, constante
LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO AT
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de um único membro. BALLA e FOHRER ocuparam-se com esta espécie de verso, depois de SIEVERS, que posteriormente não se manifestou por escrito a este respeito. Semelhantes observações foram feitas por KbHLER2I (o verso hebraico era originariamente um verso não subdividido, com quatro acentos), J. SCHMIDT22 (o verso axiomático, de um único membro, a mais antiga forma de expressão sapiencial) e PIATTI (o verso original é o membro do verso, isto é, do verso longo, constituído destes membros). A respeito da presença do verso breve, demos aqui as seguintes referências: 1) Em árabe, além da poesia, regulada por uma métrica cuidadosa, e além da prosa, existe ainda uma terceira forma de composição, que GRAY chama de "u n metrical poetry". - 2) Na poesia não-israelítica do Antigo Oriente encontram-se às vezes versos de um só membro juntamente com versos longos, tratando-se aí, portanto, de seções mistas, nas quais as duas espécies de versos são empregadas uma ao lado da outra". Um novo exame dos textos vétero-orientais provavelmente nos revelaria a existência de seções também em versos breves. - 3) No mesmo sentido, existem, igualmente, no AT vários oráculos proféticos formulados em versos longos e que terminam por um verso breve como remate". - 4) Os salmos alfabéticos (111 [110] e 112 [111]) constam de versos breves, cada um dos quais começa com uma letra do alfabeto. - 5) Sobremodo estranha é a construção poética de Is 62, cujo texto apresenta cinco estrofes, de cinco versos longos cada uma e nas quais o metro varia de uma estrofe para outra. No versículo décimo existem cinco membros distintos, que formam uma estrofe única de cinco versos breves: vv. 1-3: vV.4-5: vV.6-7:
5 versos longos
vv.8-9:
5 versos longos 5 versos longos
v.lO: vv.
11-12:
5 versos longos
5 versos longos
5 versos longos
3+3 3+2 2+2 3+2 3 (uma
vez 2)
3+2
Ao contrário do verso longo, o verso breve não constitui a unidade poética e estilística fundamental, mas um membro dependente e auxiliar 21
(L. GLAHN-) L. KOHLER, Der Prophet der Heimkehr, 1934,251.
22
J. SCHMIDT, Studien zur Stilistik der alttestamentlichen
23 24
Spruchliteratur, 1936. G. FOHRER, "Uber den Kurzvers", ZAW 66 (1954), 205-207. FOHRER, op. cit., 210.
§ 5. A
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dentro da estrofe construída de forma seqüencial e constituída de um número, quase sempre ímpar, de versos breves (de preferência, cinco ou sete) e contém uma idéia ou um grupo de idéias. Poética e estilisticamente ela representa uma unidade fundamental, à semelhança do verso longo. É nesta particularidade estrófica que reside também sua diferença em relação à prosa. É impossível compor com este processo um verdadeiro texto em prosa. Muitas vezes, diversas estrofes compostas de versos breves devem ser agrupadas em seções entre as quais há um corte de sentido mais profundo e que cor respondem às estrofes de versos longos. Ao contrário dos versos longos, os versos breves têm sido considerados, evidentemente, como uma espécie de verso que deve ficar limitada o mais possível a um determinado número de casos". Os espécimes mais antigos são seqüências de normas de vida e de comportamento, formuladas em estilo apodítico e máximas jurídicas, como, p.ex., a série 'arvã de Lv 18.7-17a e a série arúr de Dt 27.15-26, em seu conteúdo original. Posteriormente o verso breve foi em pregado como uma "espécie de verso de informação" (para a qual o verso longo não se prestava), para transmitir dados sobre a vocação dos profetas (Jr 1.4-10), suas visões e audições (Am 7.1-3; Zc 1.7-6.8), ações simbólicas (Jr 8.1-4) e entradas em cena Os 7.1-9; Am 7.10-17), e mais tarde também sobre as palavras pronunciadas por profetas, como nas lendas de Elias e no escrito de Baruc, no livro de Jeremias. Também os profetas posteriores, desde Jeremias e Ezequiel, transmitiram seus oráculos muitas vezes sob a forma de versos breves ou em versos longos e breves, combinados em um único texto. Exemplo disto temos em Is 62 e também em [r 14.2-15.2; Ez 17.1-21. Por fim, encontramos igualmente versos breves na lírica tardia". Resta perguntar se os rituais sacerdotais, uniformemente redigidos, e as composições históricas de estilo épico não conservadas não continham igualmente este tipo de verso.
4. O metro e o ritmo São o metro e o ritmo, enquanto construção estilística e formação estrófica, que determinam de modo mais acentuado a natureza da poesia. 25 26
Exemplos mais detalhados em FOHRER, op. cit., 213-233. Assim, W. RUDOLPH, que nega sua existência no livro de Jeremias, admite-os, em seu comentário, para o Cântico dos Cânticos: 1.2ss,5s, 7s; 3.1-5; 4.9-11; 6.8,9a; 7.7-11.
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LITERATURA ISRAELÍTICA, CÂNON ECIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO AT
Que a poesia israelita tenha possuído um movimento rítmico deduz-se do fato de que se executavam coralmente cânticos com acompanhamento de música e de danças (Ex 15.20s; 1Sm 18.6s). Como, porém, nos falta de todo qualquer tradição sobre os detalhes, resta-nos unicamente a possibilidade de encontrar uma teoria, em conexão com uma análise dos textos, que nos esclareça o máximo possível sobre o estado da questão. Cientificamente quase não se justifica uma renúncia, em linha de princípio, a este intento, tanto mais que é possível constatar, com certa segurança, a existência de leis métricas nas literaturas egipcia e acádica". Numa tabuinha de argila acádica, mencionada acima em 2, os membros do verso aparecem de novo separados, pretendendo-se com isto muito provavelmente marcar os pés do verso. Das quatro teorias que a seguir consideraremos, aquela mencionada em último lugar é a que parece mais satisfazer: a) Segundo opinião unânime e geral, para a língua hebraica exclui-se de antemão a existência de um sistema quantitativo, ou seja aquele em que a contagem das sílabas se faz por longas e breves, como no sistema greco-romano. Quando JOSEFO, em suas Ant. II 16,4 § 346 e IV 8,44 § 303, nos fala do verso hexâmetro em poesias veterotestamentárias, ele procura apenas torná-las compreensíveis a seus leitores helenistas. b) Para a poesia israelítica mais antiga, SEGERT admite a métrica verbal, ou aquela em que o elemento fundamental é a palavra como tal, independentemente do número e da espécie de sílabas, e também do acento verbal. Pergunta-se se ainda é possível, de algum modo, constatar este fato com certeza, após longo processo secular de transmissão. c) Mais bem representado é o sistema alternativo, no qual o verso é composto de pés dissilábicos, com alternância das sílabas tônicas e átonas, e que BICKELL aplica do siríaco na poesia hebraica e HÓLSCHER corrige, colocando o acento sempre na segunda sílaba e admitindo ainda pés monossilábicos cuja sílaba átona estaria contida na sílaba tônica anterior (sín-
27
Além de ERMAN-RANKE e GRAPOW (cf. nota 15) e de MEISSNER (cf. nota 17), também G. FECHT, "Mitteilung über Untersuchungen zur altãgyptischen Metrik", em: Akten des xxv. Internationalen Orientalisten-Kongress (russo), I 1962, 161-166. - F. M. TH. DE LIAGRE BOHL, "Bijbelse en Babylonische dichtkunst, een metrisch onderzoek", IEOL 15 (1957/1958), 133-153. - ID., "La métrique de l'épopée Babylonienne", em: Cahiers du Groupe F. THUREAU-DANGIN, 1, 1960, 145-152.
§ 5. A
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cope). Este sistema está em contradição aberta com a índole da língua hebraica e a construção de sua frase, pois obriga à introdução de mudanças no texto e ao estabelecimento de duvidosas regras de prosódia, como, p.ex., no caso em que uma consoante com shevá mobile deva ser lida como sílaba tônica". d) Diverso é o caso do sistema acentual, desenvolvido por LEVY, BUDDE e SIEVERS, no qual as sílabas tônicas alternam com várias sílabas átonas correspondentes. Este sistema tem a vantagem de poder ser aplicado tanto ao hebraico antigo, quanto ao massorético, sem necessidade de passar, com SEGERT, de uma alternância da métrica verbal para o sistema alternativo, através do sistema acentuaI. Enquanto para LEY o verso é determinado naturalmente apenas pelo número regulamentar de sílabas tônicas, sendo indiferente o número de sílabas átonas, para SIEVERS este número obedece também à lei das duas sílabas. Contudo, no problema relativo ao número de sílabas átonas tanto é duvidosa a opinião de LEY, que o tem por indiferente, quanto a de SIEVERS, que o considera regido por lei. Seja como for, o número de sílabas era variável. Em casos excepcionais pode acontecer que duas sílabas tônicas se sucedam imediatamente uma à outra. De modo geral, deve-se admitir a presença de uma a três sílabas átonas entre duas tônicas. Em concordância com isto, temos um cântico babilônico sobre a criação, em que existem sinais ou notações relativas ao canto e no qual, de ordinário, se encontram duas, e raramente uma ou três sílabas átonas entre as sílabas tônicas. O sistema acentual, caso não se caia numa rigidez normativa, é o que faz justiça a todos os textos poéticos do Antigo Testamento.
5. Recursos poéticos Como recursos poéticos usam-se a rima (Ex 29.35; Is 7.11; 31.9; SI 55[54].7; 75[74].7s, et passim), o motivo (Gn 32.21 [pãním]: Is 42.15 ['ôbiSl), a rima interna, a aliteração (Ir 4.30), a assonância vocal ou consonantal (eco, meia rima)", a anacruse (arse, apojatura)" e a antifonia (canto alternado):".
FOHRER, op. cii., 211s. G. BOSTROM, Paranomasi i den iildre Hebreiska Mascha/literaturen, 1928. 30 IH. H. ROBINSON, "Anacrusis in Hebrew Poetry", em: BZAW 66,1936,37-40. 31 L W. SLOTKI, "Antiphony in Ancient Poetry", fQR 26 (1935/1936), 199-219. 28 29
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LITERATURA I5RAELÍTICA, CÂNON E CIÊNCIA INTRODUTÓRIA DO
AT
§ 6. LITERATURA ISRAELÍTICA E ANTIGO TESTAMENTO
1. O A T como resto da literatura israelítica. Não é a literatura israelítica em sua totalidade e da qual falamos com freqüência até agora, nem um determinado setor da mesma, que vamos encontrar no AT e cujo aparecimento estudaremos nos parágrafos seguintes. Na verdade, o AT é um resto que ficou da literatura israelítica e depois se continuou na literatura judaica, existente em proporção maior. Trata-se, no caso do AT, de uma coleção sacra de escritos que representam relíquias fragmentárias de um complexo literário muito mais amplo. Por seu lado, esta coleção é constituída freqüentemente de diferentes e, por vezes, pequenas unidades literárias provenientes, cronologicamente, de um período que recobre cerca de um milênio, e, geograficamente, de diversas regiões dialetais, e que foram trabalhadas e redigidas por pessoas conhecedoras da língua aramaica, tendo sido seu texto consonantal fixado de modo definitivo somente no período que vai do séc. I a.C, ao séc. I d.C. e sua prosódia estabelecida por normas fixas somente em época muito mais tardia ainda. É precisamente neste ponto que se encerram dificuldades, por vezes intransponíveis, de oferecer uma resposta ao problema da origem de cada uma das Escrituras. As numerosas obras da literatura judaica, sobretudo os chamados apócrifos e pseudo-epígrafos do ATe os textos recém-descobertos de Qumran, nos permitem imaginar quantos escritos da época mais antiga se perderam, mesmo supondo-se uma atividade literária restrita. O próprio AT menciona estes escritos; assim, por ex., os livros das Guerras de Javé, dos valentes (§ 42), da História de Salomão e da História dos Reis de [udá e de Israel (§ 13). Esses livros pereceram na confusão dos séculos. Se considerarmos, além disso, que existem várias formas de cânones (§ 76-77) e que não foi possível fixar e delimitar sua extensão, de um ponto de vista sistemático, nem determinar sua natureza com certo grau de precisão", veremos que este cânon se apresenta como um complexo mais ou menos casual, mutável e sem caráter sacraL Se a exposição subseqüente se limita a este cânon, não é por se basear em considerações de princípio, mas por razões de ordem prática, qual seja a de usar o AT como um cânon da Sagrada Escritura e de traçar um limite bem determinado em relação à literatura judaica. 32 F. HE55E,
"Das Alte Testament aIs Kanon", NZSTh 3 (1961),315-327.
§ 6. LITERATURA
ISRAELÍTICA E ANTIGO TESTAMENTO
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2. A problemática da história da literatura
o estado da questão que acabamos de traçar nos autoriza a abordar, além dos problemas sobre a origem do AT, também, a problemática da história de sua literatura. Assim, com relação à prosa e à poesia antigas, em geral, é preciso contar com a tradição oral antes da tradição escrita (§ 3) e, por conseguinte, ter presente que a forma escrita atual não é a mais antiga, mas tem atrás de si a história de uma evolução. Devem-se procurar os vestígios e os restos de uma variedade de obras, originariamente muito mais ampla, que foi sacrificada pelo processo posterior de simplificação. É mister captar e identificar, tanto quanto possível, o material préjavístico e também as formas de expressão e literárias, de origem paleoisraelítica ou estrangeira e, a seguir, reconhecer e avaliar o processo de penetração e reelaboração desse material pelas forças criadoras da fé javística. De modo geral é preciso não esquecer que a literatura israelítica e, por conseguinte, também os livros do AT não são obras escritas em razão de si mesmas, mas quase sempre perseguem um fim prático de natureza religiosa. Este procedimento pode acentuar seja o elemento nacional, seja o elemento cúltico ou ético. O fator determinante consiste em que essa literatura se acha intimamente vinculada à existência humana e destinase a tornar possível e a garantir um amplo ordenamento para a vida por força da vontade divina. Este fato se reflete nas leis, narrações, poesias, ditos sapienciais e oráculos proféticos, cada um respectivamente segundo o próprio modo. Complexivamente, daí resulta que é quase impossível distinguir entre as formas de expressão religiosas e profanas e os gêneros literários e dividi-los segundo um critério desta natureza. Nem mesmo se consegue com relação aos gêneros líricos da vida quotidiana, impregnados de elementos religiosos (§ 40). A vida, com efeito, não era dividida em duas esferas, uma profana e outra religiosa, mas constituía em toda a sua extensão uma unidade que se achava sob o signo do religioso. Isto não quer dizer que existam textos exclusivamente religiosos. Cada texto deve ser interrogado neste sentido. E mesmo que não se possa distinguir entre gênero literário religioso e gênero literário profano, ainda assim pode acontecer que certos trechos predominantemente religiosos ou profanos pertençam a um determinado gênero literário. Como ocorre com muitos outros problemas, também aqui é de prudência não fazer generalizações apressadas nem proceder unilateralmente.
Primeira Parte A Origem dos Livros Históricos e dos Códigos Legais
CAPÍTULO
I
CONDIÇÕES GERAIS § 7. O DIREITO, A INTRODUÇÃO, A NARRATIVA E O RELATO NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL A. BOISSIER, Mantique babylonienne et mantique hittite, 1935. - S. G. F. BRANDON, Creation Legends of the Ancient Near East, 1963. - G. CARDASCIA, "Les droits cunéiformes", em: Histoire des institutions et des faits sociaux des origines à l'auhe du moyen âge, ed. MONIER-CARDASCIA-IMBERT, 1957,5371. - G. CONTENAU, La magie chez les Assyriens et les Babyloniens, 1947. - R. C. DENTAN (ed.), The Idea of History in the Ancient Near East, 1955. - H. e H. A. FRANKFORT - J. A. WILSON - IH. JACOBSEN, Frühlicht des Geistes, 1954 (The Intellectual Adventure of Ancient Man, 1946). - IH. GASTER, Thespis, Ritual,Myth and Drama in the Ancient Near East, 1950. - H. GESE, "Geschichtliches Denken im Alten Orient und im Alten Testament", ZThK 55 (1958), 127-145. - H. GOEDICKE, "Untersuchungen zur altãgyptischen Rechtsprechung", MIOF 8 (1963), 333-367. - H. W. HAUSSIG, Worterbuch der Mythologie, L Abteilung: Die alten Kulturvõlker, Teil I: Vorderer Oriente, 1961/63. - E. O. JAMES, Myth and Ritual in theAncient Near East, 1958. - A. JOLLES, Einfache Formen, 2d ed., 1956. - S. N. KRAMER, Sumerian Mythology, 1944. - ID., History begins at Sumer, 1958. - ID., The Sumerians, 1963. - F. R. KRAus (ed.), Altbabylonische Briefin Umschrift und Übersetzung, I 1964. - S. MOSCATI, Historical Art in the Ancient Near East. 1963. - A. L. OPPENHEIM, "MesopotamianMythology", Or 16 (1947),207-238; 17 (1948), 17-58; 19 (1950), 129-158. - ID., The Interpretation of Dreams in theAncient Near East, 1956. - Orientalisches Recht, Handbuch der Orientalistik I, Erg. Bd. I1I, 1964 (E. SEIDL, Altiigyptisches Recht. - V. KOROSEC, Keilschriftrecht). - J. PIRENNE, Histoire des institutions e du droit privé de l'ancienne Égypte, 1932/35. - ID., "Lois et décrets royaux en Égypte sous l' Ancien Empire", RIDA 3d ed. série 4 (1957), 17-31. - H. SCHMOKEL - H. OTTEN - V. MAAGIH. BERAN, Kulturgeschichte des Alten Orient, 1961. - E. SEIDL, Einführung in die iigyptische Rechtsgeschichte bis zum Ende des Neuen Reiches, 2d ed., 1951. - ID., Agyptische Rechtsgeschichte der Saiten- und Perserzeit, 1956. - B. SPULER (ed.), Handbuch der Orientalistik, I: Agypten, 2. Abschnit: Literatur, 1952. - W. WOLF, Kulturgeschichte des alten Agypten, 1962.
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CONDIÇÕES GERAIS
1. Visão panorâmica Os escritos designados pelos termos de livros históricos e códigos legais constituem parte considerável do AT. Em volume e em número (segundo a divisão atual) são os que compõem o grupo maior. Aos mesmos pertencem o Pentateuco e seguidamente os livros de [osué, dos Juízes, de Samuel e dos Reis, além das obras históricas cronísticas, como os livros das Crônicas, de Esdras e Neemias, e mais adiante os livros de Rute e Ester, que constituem obras à parte. Conseqüentemente, existe uma grande variedade de modos de falar e de gêneros literários empregados nesses livros, cujas raízes se encontram em geral nas antigas tradições do Antigo Oriente e cuja multiplicidade de formas decorre, em parte, das formas vétero-orientais e paleoisraelíticas, e, em parte, das concepções que surgiram na Palestina sob o influxo da fé javista. Por isso, antes de descrevermos os gêneros literários, é preciso considerar mais de perto sua presença no Antigo Oriente, porque é sobre este pano de fundo que se projetam tanto o entrelaçamento dos gêneros literários israelíticos com os gêneros literários vétero-orientais, como a multiplicidade de suas características próprias em relação a estes últimos. Esta multiplicidade de formas obriga, sem dúvida, a limitar nosso estudo aos pontos mais importantes. Uma exposição mais detalhada forçosamente nos levaria além de qualquer limite. Para apresentarmos os gêneros literários em uma visão panorâmica a mais completa possível, devemos ordená-los em seis grupos, embora isto não signifique que a inclusão de certos gêneros literários em determinado grupo implique sejam eles da mesma origem nem tenham tido a mesma finalidade. O primeiro grupo, o dos "gêneros literários normativos", compreende aquelas formas que se referem à vida e ao comportamento e também a toda a esfera do direito. O segundo grupo, o dos "gêneros impetrativos e desiderativos", contém aquelas formas e fórmulas que, sob os mais variados aspectos, exprimem um pedido ou um desejo. O terceiro grupo, o dos "gêneros querigmáticos e doutrinários ou didáticos", é constituído por aquelas formas nas quais, em virtude de uma autoridade especial, se anuncia alguma coisa, se dá uma instrução ou se transmite um conhecimento. Os "gêneros narrativos", que formam o quarto grupo, descrevem situações ou acontecimentos de caráter inverossímil ou duvidoso, enquanto fIOS gêneros ditos de informação", que constituem o quinto grupo, abrangem enumerações ou descrições que, pelo menos quanto à forma, pretendem reproduzir as coisas tais como se apresentam na
§ 7. O DIREITO, AINTRODUÇÃO, ANARRATIVA EORELATO NO ANTIGO ORIENTE EEM ISRAEL
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realidade. Ao sexto grupo pertencem os "gêneros literários de comunicação", constituídos por formas de comunicação imediata com Deus ou com os demais homens. Com o fim de simplificar e de concentrar, no quadro geral que a seguir traçaremos sobre o Antigo Oriente, estudaremos o direito, a instrução, a narrativa e o relato somente em seus aspectos essenciais.
2. O direito no Antigo Oriente Os trabalhos de escavações nos trouxeram, como um de seus mais fecundos resultados, com respeito às regiões do Antigo Oriente e às épocas mais recuadas, a comprovação documentada por textos ou deduzível a partir de outros indícios, de que naquelas regiões existiam princípios jurídicos e leis, códigos judiciais, ordenamentos processuais e de contratos privados ou oficiais. Na Mesopotâmia já se torna possível distinguir diversos tipos de direito através dos escritos cuneiformes, depois que se passou a destacar entre si as formas sumérias, vétero e neobabilônicas e assírias'. O "direito antigo" dura aproximadamente um milênio, até o fim do período de Hamurábi-. A favor dele podemos citar, além dos textos de caráter administrativo, provenientes de Shurupak e de Lagash (meados do terceiro milênio a.c.), em primeiro lugar, o relato da "reforma judiciária" de Urucagina (séc. XXIV a.C)" e o código de Urnammu (cerca de 2000 a.C.)4, conservado fragmentariamente; em segundo lugar, além de outras leis sumérias dispersas, de documentos judiciais neo-sumérios da terceira dinastia de Ur 5, e de umas poucas informações sobre as relações jurídicas nas colônias comerciais da Ásia Menor, também os numerosos documentos jurídicos do reino de Mári, na região do médio Eufrates', e AOT 380-422. - ANET 159-188. De acordo com H. SCHMOKEL, Kulturgeschichte des Alten Orieni, 1961, a quem seguimos no resumo subseqüente. 3 M. LAMBERT, "Les réformes" dUrukagina", RA 50 (1956), 169-184. 4 J. KUMA, "Zu den neuentdeckten Gesetzesfragmenten von Ur Nammu", Arar 21 (1953), 442-447. - S. N. KRAMER - A. FALKENSTEIN, "Ur-Nammu Law Code", ar 23 (1954),40-51. - E. SZLECHTER, "Le code dUr-Nammu", RA 49 (1955), 169-177. 5 M. ÇIG - H. KIZILYAY - A. FALKENSTEIN, "Neue Rechts- und Gerichtsurkunden der Ur III-Zeit aus Lagas", ZA 53 (1959), 51-92. - A. FALKENSTEIN, Die neusummerische Gerichtsurkunden, 1956. 6 G. BOYER, "Textes juridiques", ARM VIII, 1958. 1
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outros de Elam, mas principalmente, para o primeiro terço do segundo milênio, os códigos de Lípit-Ishtar de Isin (cerca de 1870)7, do país de Eshnunna (séc, XVIII)8, e de Hamurábi (cerca de 1710)9. O "direito médio" é caracterizado pelos documentos administrativos e jurídicos provenientes de Núzi e Arrapha (meados do segundo milênio), pelos instrumentos de doação territorial dos cassitas (segunda metade do segundo milênio), pelas chamadas leis da média Assíria e decretos severos relativos à corte e ao harém (sécs. XIII-XII)lO. O "direito novo", da primeira metade do primeiro milênio, é abonado por escritos da chancelaria estatal dos Sargônidas, por casos oriundos da praxe judicial neo-assíria e pelos numerosos contratos neobabilônicos e babilônicos tardios, por instrumentos legais, parágrafos de leis, cartas judiciais da administração dos templos, e por muitos outros documentos"; Em princípio, todo o direito era considerado como um dom dos deuses, como no AT, e o poder de legislar era tido como de origem divina, enquanto que as concepções relativas aos deuses das respectivas cidades se concentraram aos poucos sobre Shamash, o deus-sol, através de determinados deuses. O rei era o representante, o lugar-tenente da divindade. Ele delegava seu poder judicativo aos príncipes das cidades e aos governadores e, por meio destes, aos juízes profissionais e aos juízes leigos. Os reis de Israel não possuíam tal poder. A evolução histórica do direito, apesar das rupturas e dos reveses que se podem constatar, caminha para um refinamento das noções jurídicas, embora as regras processuais e os formulários permaneçam idênticos e durante vários séculos não tenham sofrido mudanças essenciais.
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A. FALKENSTEIN - M. SAN NICOLà, "Das Gesetzbuc Lipit-Istars von Isin", Or 19 (1950),
103ss. GOETZE, The Laws of Eshnunna, 1956. - J. C. MILLES - O. R. GURNEY, "The Laws of Eshnunna", ArOr 17, 11 (1949), 174-188. - E. SZLECHTER, Les loís d'Esnunna, 1954. 9 M. DAVID, "The Codex Hammurabi and its Relation to the Provisions of Laws in Exodus", OTS 7/8, 1950, 149-178. - W. EILERS, Díe Gesetze Chammurabi, 1932. - J. KOHLER - P. KOSCHAKER - F. E. PEISER - A. UNGNAO, Hmammurabis Gesetz, 6 vols., 1904/1923. 10 E. WEIDNER, "Das Alter der mittelassyrischen Cesetzestexte", AfO 12 (1937), 46-54. - Io., "Hof- und Haremserlasse assyrischer Kõníge", íbíd. 17 (1955/1956), 257-293. 11 G. R. DRIVER - J. C. MrLLES, The Assyrían Laws, 1935. Io., The Babylonían Laias, 1952/1955. - H. PETSCHOW, Neubabylonisches Pfandrecht, 1956. - In, Babylonísche Rechtsurkunden aus dem 6. [ahrh. v. Chr., 1960. - A. UNGNAO - M. SANNICOLà, Neubabylonísche Rechtsund Verwaltungsurkunden, 1929/1937.
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§ 7. O DIREITO, A IN1RODUÇÃO, A NARRATIVA E O RELATO NO
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Dois pontos devem ser destacados de modo particular: 1) Os acordos políticos entre estados, que existem em número crescente desde o segundo milênio, são formulados de acordo com uma determinada norma internacionaL Por esta norma, os juramentos devem ser prestados, p.ex., junto aos deuses dos dois participantes do acordo. Na celebração deste, devem-se executar sacrifícios, ritos e ações simbólicas". 2) A praxe jurídica parece apoiar-se, não nos códigos legais, mas no direito fixado e transmitido consuetudinariamente, e para isto possivelmente existiam coleções de diversos tipos de sentenças à disposição em cada cidade. Os códigos legais que se conhecem evidentemente não representavam todo o direito então vigente, mas serviam para fundamentar certas reformas legislativas nas quais novas sentenças de caráter normativo, emitidas pelo rei sob a forma de leis, modificavam decisões mais antigas. Este fato deve ser levado em conta, para uma melhor compreensão dos códigos jurídicos do AT. Muito poucos são os textos jurídicos oriundos do Egito. De modo geral, é somente a partir de textos literários e religiosos que se pode deduzir a existência de determinadas concepções jurídicas. Sobretudo não se conservou nenhum resto de código legal, embora já nas Exortações de um Sábio Egípcio, oriundas do terceiro milênio, se diga que, naqueles tempos de convulsões, os códigos da corte de justiça eram atirados à rua. Tratavase presumivelmente de coleções de sentenças judiciais, como as da Mesopotâmia. Em época posterior, Bakhóris (séc. VIII) aparecerá como importante legislador. Amásis (séc. VI) reformará antes de tudo o direito administrativo, e Dario I recolherá as leis egípcias. Mas de tudo isto nenhum vestígio chegou até nós. O direito se baseava praticamente e sobretudo na tradição, e era ao mesmo tempo um direito do rei, pois o rei, em virtude de sua origem divina, pronunciava sentenças para situações particulares, sentenças que depois seriam aplicadas nos casos semelhantes. A administração da justiça, via de regra, era delegada às autoridades subalternas. O rei só funcionava como juiz em casos especiais, ou seja, em relação aos membros de sua casa. Conhece-se com bastante precisão o ordenamento dos processos judiciais. Uma particularidade incomum do 12
R. BORGER, "Zu den Asarhaddon-Vertrãgen aus Nimrud", ZA 54 (1961), 173-196.V. KOROSEC, "Quelques traités de l'époque néo-assyrienne", Romanitas 3 (1961), 261277. - E. WEIDNER, "Der Staatsvertrag Assumirâris VI. von Assyrien mit mati'ilu von Bit-Agusi", AtO 8 (1932/1933) 17-34. - D. J. WISEMAN, "The Vassal-Treaties of Esarhaddon", lraq 20 (1958), 1-90.
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Egito são, a este respeito, as acusações e as respostas às acusações que eram apresentadas por escrito. Os documentos judiciais, mais abundantes em relação à época posterior do que em relação aos períodos mais antigos, tratam, o mais das vezes, de transações concernentes aos valores de bens e propriedades. O direito hitita", consolidado numa coleção de leis contendo apenas duzentos parágrafos, era considerado também como de origem divina e o deus-sol era tido como seu autor (como também na Mesopotâmia). As três versões deste documento, redigidas em épocas diferentes, nos mostram uma certa evolução no direito hitita, sobretudo no que se refere à diminuição das ameaças de pena capital. Paralelamente, outros documentos atestam a multiplicidade de direitos consuetudinários locais, de modo que a coleção de leis reais talvez deva ser entendida no mesmo sentido daquelas da Mesopotâmia, destinando-se a impor as novas sentenças e a uniformizá-las. Os documentos jurídicos privados e outros, que nos permitem deduzir retrospectivamente a existência do processo judicial, são escassamente representados. É de se notar que o direito penal hitita não aplica o princípio de talião em casos de assassinato, homicídio não-premeditado e ferimentos corporais, mas procura, em primeiro lugar, o ressarcimento da vítima. Também se devem mencionar, e não por último, os numerosos tratados políticos dos reis hititas, que caracterizam a atividade diplomática de sua política exterior e com a qual eles punham sob sua dependência os estados menores como vassalos, ficando politicamente de mãos livres para agir". Somente Shuppiluliuma celebrou desses tratados com Huqqana e os habitantes
J. FRIEDRICH, Die hethitischen Geseize, 1959. -
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de Hasaia (nordeste da Ásia Menor) e também os reis de Kizzavatna, Hurri, Nuhashe, Ugarit, Amurru e Mittani. Normalmente esses tratados seguiam um determinado esquema, que ultimamente foi aplicado para explicar os textos da Aliança" no AT. Encontram-se igualmente tratados dos cananeus" e arameus", ao passo que, para o direito restante da Sírio-Palestina conservaram-se apenas uns poucos documentos. Quanto ao essencial, é idêntico ao direito mesopotâmico e hitita 17, e passou, em grande parte, para o direito israelítico-palestinense, de modo a constituir o elo de união entre este último e o direito mais antigo das terras de cultura do Antigo Oriente. 11
3. A instrução no Antigo Oriente Por toda a parte no Antigo Oriente se recebiam oráculos, pronunciavam-se bênçãos e maldições, davam-se instruções e ministravam-se ensinamentos sobre questões de ordem religiosa e cultual, e se exercia o culto segundo determinadas normas e certos rituais. Sem dúvida, havia, para além do que nos atesta a praxe do AT, práticas e prescrições que eram proibidas em Israel pela fé [avista, como, p.ex., a doutrina sobre os presságios, elaborada especialmente na Mesopotâmia", e utilizavam a astronomia, os omina tanto do reino animal quanto do âmbito humano, o exame do fígado das vítimas, os omina produzidos artificialmente (como a fumaça, o óleo), a hemerologia para determinar os dias favoráveis'", e, no vasto
V. KOROSEC, "Quelques remarques juridiques sur deux traités internationaux dAlahah", em: Mélanges Lévy-Bruhl, 1959, 171-178. - J. NOUGAYROL, "Les nouvelles tablettes accadiennes de Ras-Shamra", CRAI 1953, 40-51. - In., "Les archives internationales dUgarit", CRAI 1954, 30-41, 239-253. - Io., Textes accadiens et hourrites des archives est, ouest et centrales (PRU IlI), 1955. - Io., Textes accadiens des archives sud (PRU IV), 1956. - S. SMITH, The Statue of Idri-mi, 1949. - D. J. WISEMAN, The Alalakh Tablets, 1953. 16 Última edição e comentário de H. DONNER - W. ROLLIG, Kanaanaische und arãmaische Inschriften, I (1962), 41-45; II (1964), 238-274, com indicação da bibliografia aparecida até à época. 17 A. ALT, "Eine neue Provinz des Keilschriftrechtes", WdO I, 2 (1947), 78-82 (= Kleine Schriften, III 1959, 141-157). - G. BOYER, "La place des textes d'Ugarit dans l'histoire de l'ancien droit oriental", em PRU I1I, 1955,281-308. 18 TH. BAUER, "Eine Sammlung von Himmelsvorzeichen", ZA 43 (1936),308-314. - L. DENNEFELD, Babylonisch-assyrische Geburtsomina, 1914. 19 R. LA13AT, Hémérologies et ménologies d'Assur, 1939. 15
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domínio das práticas mágicas, particularmente os esconjuras", para cujos rituais se encontram séries inteiras, originárias da Babilônia, como Os maus Utukke (16tabuinhas), os perversos Asakke (12tabuinhas), usados como proteção contra os demônios, e a Queima (Shurpu, 9 tabuinhas) e a Consumpsão (Maqlü, 8 tabuinhas), contra as feiticeiras. Independentemente disto, o culto mesopotâmico era regulado por normas cultuais precisas, que muito se assemelham umas às outras nos numerosos templos", O culto quotidiano acompanhava a vida diária da divindade, no santuário, e a do rei, desde o despertar até o deitar. Existiam também rituais para os diversos tipos de oferendas, ritos de toda espécie para as orações, para as penitências e purificações, bem como para as inúmeras festas, durante as quais se celebravam liturgias apropriadas à respectiva ação cultual ou mágico-sacramental. Era sobretudo nas festas que o mito se tornava expresso. Nos rituais egípcios" para tais festas dedicadas à divindade e que repetem a história do deus por meio da representação festiva, o culto e o mito acham-se claramente associados. Esses rituais conduzem para a representação teatral dos mistérios, quando as ações rituais estão relacionadas com a história do mito, como no-lo mostram os rituais do culto de Osíris, provenientes de fontes relativamente novas". Encontra-se, também, como na Mesopotâmia, o culto diário às divindades e as demais ações cultuais", para o que se utilizam os traços do mito, a fim de interpretar a ação cultual como analogia. Em tais situações, o que mais importa não é o desenvolvimento do mito, mas o desenrolar da ação cúltica, de modo que os pormenores da formação do mito parecem como que sugeri-
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dos pelo culto. Devemos aludir também ao expressivo ritual do sepultamento, especialmente o do sepultamento do rei. Os hititas" também conheciam um ritual funerário para o rei, e que se prolongava por duas semanas". Além disso, devemos mencionar principalmente os rituais mágicos para a magia de proteção e para a purificação ritual, que se encontravam nos arquivos reais de então, e também os rituais que se destinavam a provocar danos e enfeitiçamento. O exemplo da rainha Puduhepa, mandando copiar os textos rituais de sua pátria hurrita, nos mostra que, ao se assumirem novas divindades, também se introduziam os seus rituais. Também se recebiam oráculos, seja observando o fígado dos animais e o vôo dos pássaros, seja por intermédio de mulheres videntes e sacerdotes adivinhos, que não desdenhavam de empregar um ritual esconjuratório. Não resta dúvida de que os cananeus conheciam também alguma coisa de semelhante. Certos textos encontrados em Ugarit e provenientes de meados do segundo milênio, provavelmente são rituais e agendas para os sacerdotes". Também as prescrições cartaginesas, muito mais recentes, a respeito de oferendas a se fazer por ocasião de uma festa, são um testemunho quanto à existência de normas cultuais cananéias e fenícias". Estas formas e usos foram assumidos do culto cananeu em larga escala por Israel".
4. A narrativa no Antigo Oriente Desde há muito se sabe que o mito e a epopéia gozavam de extraordinária importância no Oriente Antigo e desempenhavam o papel que em Israel competia à saga e à lenda. Indubitavelmente é exagerada a opinião segundo a qual o mito estaria sempre em ligação com o rito e, como uma
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espécie de "celebração pela palavra", constituiria, juntamente com o rito, um poderoso acontecimento. O mito e o rito aparecem freqüentemente associados, sobretudo nas festas dos deuses, mas nem sempre, nem de forma regular". Assim o mito do dilúvio nunca foi recitado no culto. Outros mitos serviam para fazer propaganda religiosa de um determinado santuário ou de uma determinada concepção", ou ainda para a propaganda política, como, p.ex., o mito babilônico de Erra, o deus da peste". Dentro do complexo de mitos e epopéias da Mesopotâmia", a herança suméria do terceiro milênio é a mais extensa, ainda que reelaborada por mão semítica. Com KRAMER, podemos dividir os mitos em mitos relativos à origem e ao ordenamento do cosmos e ao mundo inferior, e outros mitos; ou com ScHMÓKEL, em três ciclos principais de narrativas acerca dos deuses: Enki, de Eridu, Enlil, de Nippur, e Inanni, de Uruk. Realmente, a maioria dos mitos, nos quais Enki e Enlil desempenham papel de relevo, giram principalmente em torno da criação e do ordenamento do mundo, de cada coisa no mundo e de suas instituições, ao passo que os mitos relativos à deusa Inanna falam sobretudo de lutas, ódios, astúcias, e até mesmo da entrega de seu parceiro, Dumuzi-Tammuz, o "deus pastor" e rei de Uruk, às potências do mundo inferior". Dos demais mitos, um já se refere ao dilúvio e seu herói Ziusudra (posteriormente Atrahásis ou Utnapishtim). No centro das epopéias sumérias encontram-se semideuses e heróis. Dentre estes se destacam Enmercar", Lugalbanda e Gilgamesh, em torno do qual já se conhecem cinco poemas sumérios, que a poesia épica da Acádia - a primeira poesia semítica e obra autônoma bastante admirada - utilizou então". Esta obra surgiu na antiga Babilônia e alcan-
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§ 7. O DIREITO, AINTRODUÇÃO, ANARRATIVA E RELATO NO ANTIGO ORIENTE EEM ISRAEL
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çou sua forma definitiva em fins do segundo milênio. Foi conhecida até entre os hurritas, os hititas e na Palestina (Megído)", enquanto que os textos mais bem conservados de outros mitos provêm inclusive do Egito. O mito semita mais importante é o da epopéia da criação do mundo, conhecido por suas primeiras palavras: Enüma ellsh, "Como lá em cima'r", Acrescentam-se ainda outros mitos ligados a Adapa, Atrahásis, Nergal e Ereshigal, Etana e muitos outros deuses". Em torno dos dois dominadores de Acádia, Sargão e Naramsinn, desenvolveu-se uma coroa de sagas". Na tradição egípcia" quase que só encontramos traços isolados de mitos, disseminados nos rituais, hinos e ditos mágicos. Neste sentido podemos mencionar, como exemplo, o papiro dramático do Ramesseum, os discursos dirigidos nos deuses por ocasião de rituais executados nas câmaras funerárias das pirâmides do final do antigo Império, assim como outros rituais e hinos, em louvor aos deuses. Fragmentos de mitos antigos pertencentes a um contexto narrativo se encontram no Monumento da Teologia Menfítica, no Livro da Vaca Sagrada) num texto escrito sobre a campa do pseudo-sepulcro do rei Sethos I, em Ábidos, e em partes de um ritual que devia ser pronunciado diante de Set. Tematicamente os mitos procuram, de um lado, encher o mundo atual e o que está para além dele, e, do outro lado, procuram captar a origem, o ordenamento e a história primordial do universo. Além disso, percebe-se na mitologia heliopolitana ou menfítica uma tendência à propaganda religiosa ou política. Na verdade a relação com os acontecimentos e situações políticas
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Lebens im Zuklus und Epos des Cilgamesch", em: Opera Minora, 1953, 234-262. - A. SCHOTT - W. VON SOOEN, Das Cilgamesch-Epos, 1958. A. GOETZE - S. LEVY, "The New Megiddo Fragment of the Gilgamesh Epic", 'Atiqot 2 (1959), 121-128. R. LABAT, Le poéme babylonien de la créaiion, 1953. - ST. LANGOON, Babylonian Epic of Creaiion, 1923. J. LAESSOE, "The Atrachasis Epic", BiOr 13 (1956),90-102. - W. G. LAMBERT, "New Light on the Babylonian Flood", JSS 5 (1960), 113-123. - F. M. TH. DE LIAGRE-BoHL, "Die Mythe vom weisen Adapa", WdO 2 (1959), 416-431. O. R. GURNEY, "The Sultantepe Tablets: The Cuthaean Legend of Naramsin", AnSt 5 (1955), 93-103. AOT 1-8. - ANET 3-36. - A. ERMAN, Die Literatur der Agypter, 1923. - M. PIEPER, Das iigyptische Miirchen, 1935. - G. ROOER, Die iigyptische religion in Texten und Bildern, Il, 1960. - S. SCHOTT, Mythe und Mythenbildung im AIten Agypten, 1945. - Io., "Die âlteren Cõttermythen", em: Handbuch der Orientalistik, r, 2 1952, 67-75. - J. SPIEGEL, "Cõttergeschichten, Erzâhlungen, Mârchen, Fabeln", ibid. 119-139.
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imediatas do momento presente tem sido considerada como o traço essencial que determina a estrutura da história da maioria das divindades conhecidas do Egito". Com o decorrer do tempo foram surgindo sistemas mitológicos em torno, p.ex., do sistema divino do mito de Osíris ou do sistema cósmico dos deuses primordiais, sistemas estes que mais tarde voltaram a se fundir. O desenvolvimento posterior destes mitos se caracteriza pela mistura de realismo e de fantasia, pela utilização dos motivos da astúcia e da magia, pela formação de mitos etiológicos e, formalmente, pelo emprego de todas as componentes da arte narrativa que então começava a se desenvolver. Dentre as sobras deste gênero, de caráter muitas vezes didático, devemos mencionar sobretudo a História dos Náufragos 43; o Nascimento dos Reis da Quinta Dinastia, obra de natureza lendária e introduzida mediante contos mágicos e fantásticos; a História de Sinuhe", testemunho de um certo sentimento nacional dos egípcios; os contos fantásticos da História dos dois Irmãos e da história do Príncipe Encantado, e a Odisséia de Unamun. Bem diferente é a situação entre os hititas. De um lado, eles assumiram certos poemas mesopotâmicos, como, p.ex., a epopéia de Gilgamesch, sob uma forma reelaborada e abreviada". Por outro lado, outros mitos, sobretudo aqueles referentes ao deus Cumárbi, remontam aos hurritas. Estes últimos, por sua vez, incorporaram temas babilônicos em suas narrativas". Existem, por fim, narrativas míticas e originárias da Ásia Menor e quiçá de época pré-hitita, como o mito de Il1uianca, que funciona como etiologia de uma festa, e o mito do deus desaparecido (mito de Telípinur".
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J. SPIEGEL em: Handbuch der Orientalistik, I, 1952, 122. W. GOLÉNISCHEFF, Le contedu naufragé, 1912. - G. LANCZKOWSKI, "Die Geschichte des Schiffbrüchigen", ZDMG 103 (1953), 360-371. A. ALT, "Die ãlteste Schilderung Palestinas im Lichte neuer Funde", PJB 37 (1941), 19-50. - A. H. GARDINER, Die Erziihlungdes Sinuhe und dieHirtengeschichte, 1909. - H. GOEDICKE, "The Route of Sinuhe's Fligt", JEA 43 (1957), 77-85. - H. GRAPOW, Die
stilistische Bau der Geschichte des Sinuhe, 1952. H. ÜITEN, "Die erste Tafel des hethitischen Gilgamesch-Epos", Istanbuler Mitteilungen 8 (1959), 915s. - lo., "Zur Überlieferung des Cilgames-Epos nach den BogazkõyTexten", Cahiers du Groupe François-Thureau-Dangin, 1 (1960), 139ss. 46 M. VIEYRA, "Le dieu Kumarbi et le syncrétisme religieux dans le Proche-Orient au second Millénaire avo J. c.", RHR 155 (1959), 138s. 47 J. G. MACQUEEN, "Hattian Mythology and Hittite Monarchy", AnSt 9 (1959), 171188.
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§ 7. O DIREITO, AINTRODUÇÃO, ANARRATIVA EO RELAID NO ANTIGO ORIENTE EEM ISRAEL
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Graças aos textos ugaríticos, e depois das meras referências ou das breves citações de antigamente, temos agora, pela primeira vez, ao nosso alcance os primeiros mitos e epopéias da terra de Canaã". Além do grande ciclo dos deuses Baal, Anat e Mot, que é o mais importante'", pertencem também a esse contexto os mitos do casamento do deus da Lua com a deusa Niccal e do nascimento dos deuses Shahar e Shalim. Acrescentam-se ainda as epopéias do rei Keret" e de Aqhat, filho do rei DaneI. Muitas das concepções e motivos do universo desses mitos e epopéias se reencontram no AT.
5. O relato no Antigo Oriente
o primeiro ponto de partida para apreendermos os acontecimentos históricos" nos é oferecido pela cronologia", que na Mesopotâmia, e já antes, na época acádica, se apresenta sob a forma de lista de reis. Esta cronologia se conservou através dos séculos, sob diversas formas (primeiramente como indicação dos anos pela ordem dos acontecimentos, e depois como simples enumeração. Na Assíria, a designação era feita pela ordem de sucessão dos dignitários)". Um grande resumo desta cronologia é constituído pela lista dos deuses sumérios (cerca de 1760)54, a qual, por 48
J. AlSTLElTNER, Die mythologischen und kultischen Texte aus Ras Schamra, 1964, 2ª ed. G. R. DRIVER, Canaanite Myths and Legends, 1956. - O. EI55FELDT, El im ugaritischen Pantheon, 1951. - C. H. GORDON, Ugaritic Literature, 1949. - J. GRAY, The Legacy of Canaan, 1957. - E. JACüB, Ras-Shamra-Ugarit et l'Ancien Testament, 1960. - A. JIRKU, Kanaaniiische Mythen und Epen aus Ras Schamra-Ugarit, 1962. - A. S. KAPELRUD, Ba'al in the Ras Shamra Texts, 1952. - R. DE LANCHE, Les textes de Ras Shamra-Ugarit et leurs rapports avec le milieu biblique de l'Ancien Testament, 2 vaIs., 1945. - M. H. PaPE, El in
the Ugaritic Texts, 1955. J. OBERMANN, Ugaritic Mythology, 1948. 50 H. L. GINSBERC, The Legendof King Keret, 1946. - J. GRAY, The Krt Text in the Literature of Ras Shamra, 1964,2" ed. - K.-H. BERNHARDT, "Anmerkungen zur Interpretation de KRT-Textes von Ras Schamra-Ugarit", WZ Greifswald 5 (1955/1956), 101-121. 51 AüT 80-107, 331-380. - ANET 227-322. - Cf. também D. o. EDZARD, "Neue Inschriften zur Geschichte von Ur III unter Süsuen", AfO 19 (1959/1960), 1-82. - F. R. KRAU5, "Altbabylonische Quellensammlungen zur altmesopotamischen Ceschichte", ibid. 20 (1963), 153-155. 52 F. SCHMIDTKE, Der Aufbau der babylonischen Chronologie, 1952. 53 S. MOWINCKEL, "Die vorderasiatischen Kõnigs- und Fürsteninschriften", em: GunkelFestschrift, I 1932, 278-322. 54 TH. JACüB5EN, The Sumerian King List, 1939.
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sua vez, se tornou o modelo de muitas outras listas mais recentes. Dentre estas, a mais importante é aquela que se encontra na grande lista de reis assírios (até 722)55. As inscrições dos edifícios e das lápides consecratórias, conhecidas a partir de 2600 a.c., são consideradas como o verdadeiro início da historiografia. A estela do abutre de Eannatum é o primeiro documento histórico autêntico. As inscrições, pelo fato de mencionar os feitos dos respectivos soberanos, constituem noticiário mais ou menos pormenorizado da época. Ao passo que os soberanos acádicos relatavam seus feitos de guerras em documentos bilíngües, a renascença da terceira fase de Ur e até o tempo de Hamurábi evita este procedimento e só expõe feitos pacíficos, dentro da linha da tradição mais antiga". A forma acádica será retomada pelos assírios. Eles transmitem em seus anais toda espécie de detalhes sobre suas campanhas militares. Em inscrições pomposas citam em ordem geográfica os povos submetidos e nos relatos de guerra resumem, em parte sob a forma de carta dirigida por uma divindade ao deus Assur, suas campanhas guerreiras, sem se preocuparem com a ordem histórica 57. Deste procedimento diverge, na Babilônia posterior, o gênero literário das crônicas (de Assur só existe a chamada história sincrônica em torno de 1420-1160), que são dissertações sistemáticas sobre os acontecimentos históricos de um período mais extenso, vazadas em estilo acentuadamente impessoal, e remontam a cerca de 2.000 anos. Entre estes escritos se incluem as crônicas ditas de Nabopolasar, as crônicas caldaicas e a crônica de Nabonide e Ciro"'. Dificilmente se consegue identificar nestas crônicas um objetivo determinado e homogêneo ou uma idéia básica e dominante. De qualquer modo, enquanto os sumérios simplesmente observam a ordem cronológica dos acontecimentos, parece que os babilônios entendiam a história como um acompanhar dos atos humanos por parte dos deuses, com recompensas e castigos. As inscrições reais fictícias da época suméria posterior devem ter tido como base uma finalidade didática na apresentação dos fatos
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E. WEIDNER, "Die grosse Konigsliste aus Assur", AfO 3 (1926), 66-77. L. W. KING, Chronicles concerning Ear/y Baby/onian Kings, 1907. TH. BAUER, Das Inschriftenwerk Assurbanipa/s, 1933. - R. BORGER, Die Inschriften Asarhaddons, Kõnig« von Assyrien, 1956. - E. WEIDNER, "Die neue Konigsliste aus Assur", AfO 4 (1927), 11-17. - lo., "Die Konigslisten aus Chorsabad", ibid. 14 (1944), 362-369. - lo., Die Inschriften Tukulti-Ninurtas 1. und seiner Nachfo/ger, 1959. D. J. WISEMAN, Chronicles of Cha/dean Kings, 1956.
§ 7. O DIREITO, A INTRODUÇÃO,
A NARRATIVA E O RELATO NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL
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históricos. Formalmente, predominam os relatos dos reis, na primeira pessoa do singular. Também no Egito se iniciaram as chamadas tábuas anuais da primeira dinastia, onde os anos do governo real eram indicados segundo a ordem dos acontecimentos. Esta maneira de indicar as datas foi substituída, a partir da segunda dinastia, pela simples numeração. A maneira de elaborar as tábuas anuais é como que uma decorrência da analística como primeira forma principal da historiografia egípcia, que entende a história não no sentido de uma evolução ou de um conjunto orgânico, mas como a soma ilimitada de fatos singulares. Podemos falar de uma repetição do tempo, repetição na qual os governos dos reis se sucedem como manifestações do ato criador do mundo'". Extratos dos anais aparecem nas listas reais (Papiro real de Turiml'", nos anais de guerra de Tutmose III61 e numa compilação maior, a da Pedra de Palermo", Uma sobrevivência da analística se encontra nos elencos dos reis, escritos em grego (Maneta, Eratóstenes). A segunda forma básica da historiografia egípcia é constituída pela chamada "novela real"63, que pretende narrar um acontecimento concreto, descrevendo-o como ação do rei divino que, por isso mesmo, executa a vontade de Deus. Esta forma de historiografia aparece desde o relato sobre a construção do templo de Atum, por Sesostre I em Heliópolis (XII dinastia), até épocas mais avançadas, quando se liberta dos laços religiosos. O esquema narrativo parte do motivo que provoca o ato do rei tp.ex., subida ao trono ou um sonho) e passa pela comunicação do plano aos cortesões e aos dignitários, até à apresentação do ato em si, ato predominantemente cúltico e cultural. Outras formas são as inscrições de conteúdo histórico que se encontram nos templos e em estelas, as poesias em forma de hino, relativas a um feito do rei, como o poema sobre a batalha de Cades, no reinado de Ramsés II, e narrativas históricas sobre acontecimentos passados, ornamentadas com dados fantásticos, como as narrativas dos reis Apófis e Seqenenre e da conquista de [ope, conservadas ape-
E. OfTO em: Handbuch der Orientalistik, I, (1952), 140. G. FARlNA, Il papiro dei Re resiauraio, 1938. - Cf. também A. H. GARDINER, "Regnal Years and Civil Calendar in Pharaonic Egypt", JEA 31 (1945), 11-28. - E. MEYER, Agyptische Chronoiogie, 1904. - R. A. PARKER, The Calendars of Ancient Egypt, 1951. 61 H. GRAPOW, Studien zu den Annalen Tnumosis, III, 1949. 62 H. SCHÃFER, Ein Bruchstück altiigyptischer Annalen, 1902. 63 A. HERMANN, Die iigyptische Kanigsnovelle, 1938. - S. HERRMANN, "Die Kônigsnovelle in Âgypten und in Israel", WZ Leipzig 3 (1953/1954), 51-62.
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nas parcialmente. Devemos mencionar ainda as inscrições biográficas nãoreais, sobretudo as biografias de dignitários e funcionários, encontradas nas sepulturas, nas estelas e por fim nos templos, biografias que são colocadas na boca do morto, via de regra na primeira pessoa do singular, cuja vida devem sempre lembrar. Estas inscrições contêm, de um lado, as chamadas "biografias ideais" (regras de vida que o morto diz ter observado) e, do outro lado, as narrativas biográficas completas. É particularmente em épocas posteriores, quando a ética é apresentada também como critério absoluto da vida, que essas biografias assumem feição didática'". Do Egito provém a arte narrativa plástica, que representa um acontecimento de modo vívido, em uma ou mais cenas, e aparece ao lado da arte monumental histórica e da descrição de pessoas históricas. Só se encontra, porém, em épocas de governos absolutistas e centralizadores de política internacional e imperialista e de idéia secularizada da realeza. No Egito, esta forma se limita à época de 1317-1165, e na Mesopotâmia, à época de 883-626 (MoSCATI). É no campo da historiografia que os hititas levaram a cabo um de seus mais notáveis feitos". As suas descrições mais vivas provêm da época do antigo reinado. Embora os dois séculos da idade áurea da monarquia tenham na analística e na autobiografia os exemplos mais conspícuos, contudo, já desde cedo criaram-se formas fixas de relato, onde os acontecimentos aparecem ordenados sob um ponto de vista homogêne0 66 • Isto vale tanto para o documento bilíngüe de Hattushilish I, descoberto em 1957 e contendo uma descrição analística de expedições militares, mas ainda em fase de gestação literária", quanto para a introdução do edito de Telipinu, onde se encontra a idéia fundamental relativa à concórdia no seio da casa imperial e das famílias principais e que é formulada em função da história do país. A autobiografia de Hattushilish I nos permite, ainda, lançar um olhar no interior do narrador, enquanto
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§ 7. O DIREITO, AINTRODUÇÃO, ANARRATIVA EORELATO NO ANTIGO ORIENTE EEM ISRAEL
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este entende a história pessoal como escolha e como um comando da parte do deus protetor'", Se, em essência, a historiografia significa, de um lado, também entre os hititas, a exposição do próprio presente e o relato pessoal do rei, por outro lado, c ao contrário do restante do Antigo Oriente, por trás dela se descobre uma consciência histórica muito viva, uma visão dos acontecimentos em seu contexto e uma força plástico.literária acentuada. Da Síria, podemos citar, pelo menos, o relato pessoal do rei Idrimi de Alalah sobre sua fuga, sua vida no exílio e sua volta ao trono'".
6. As cartas no Antigo Oriente Baste-nos mencionar rapidamente a existência das numerosas cartas acádicas, provenientes de Nimrud'", Mári", Alalah", Amarna'"; das cartas, em parte acádicas e em parte cananéias, encontradas em Ugarit", e das cartas hititas", às quais se acrescentam, mais tarde, as cartas da época neobabilônica e persa", escritas em grande parte em aramaico, e as cartas gregas, da fase helenística". O estilo epistolar israelítico é quase idêntico ao da respectiva época.
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7. Em Israel De incalculável significação é o fato de que as formas usuais do direito e da instrução das narrativas e dos relatos existentes em Israel são fundamentalmente idênticas ou semelhantes às demais formas do Oriente Antigo. Muitos gêneros literários dos livros históricos ou jurídicos não são tipicamente veterotestamentários mas antes vétero-orientais, Por isso, trata-se tanto mais de observar quais os pontos em que houve mudanças ou criação de novas formas, e de perguntar se elas surgiram por influência da fé javista ou também por outros motivos. Isto diz respeito principalmente às formas de narrar e de escrever a história que, ao contrário dos relatos em que o rei fala na primeira pessoa e eram as que predominavam no Antigo Oriente, de há muito seguiam seus próprios caminhos. Haverá por trás delas também uma outra concepção da história? Mais estranha ainda é a ausência de numerosas formas vinculadas à doutrina dos presságios, aos esconjuras e à magia. Isto se deve, sem dúvida, ao fato de que tais práticas foram rejeitadas pela fé javista. Assim, a investigação dos gêneros literários falados e escritos nos leva imediatamente ao problema das características próprias do ATem seu âmbito vétero-oriental.
§ 8. OS GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES A. ALT, DieUrsprünge des israelitischen Rechts, 1934 (= Kleine Schriften, I 1953,278-332). - R. BACH, Die Aufforderungen zur Flucht und zum Kampf im alttestamentlichen Prophetenspruch, 1962. - K. BALTZER, Das Bundesformular, 1960. - J. BEGRICH, "Berit", ZAW 60 (1944),1-11 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964, 55-66). - H. J. BOECKER, Redeformen des Rechtslebens im Alten Testament, 1964. - H. A. BRONGERS, Oud-Oosters en Bijbels Recht, 1960. - D. DAuBE, Studies in Biblical Law, 1947. - lo., "Rechtsgedanken in den Erzãhlungen des Pentateuchs", em: Von Ugarit nach Qumran, Eissfeldt-Festschrift, 1958,32-41. - lo., The Exodus Patiern in the Bible, 1963. - A. EBERHARTER, Der Dekalog, 1929. - K. ELLIGER, "Das Gesetz Leviticus 18", ZA W 67 (1955), 1-25. - L ENGNELL, Israel and the Lato, 2il ed. 1954. - Z. W. FALK, Hebrew Law in Biblical Times, 1964. - F. CH. FENSHAM, "The Possibility of the Presence of Casuistic Legal Material at the Making of the Covenant at Sinai", PEQ 93 (1961), 143-146. - In., "Clauses of Protection in Hittite Vassal-Treaties and the Old Testament", VT 13 (1963), 133-143. - CH. FEUCHT, Untersuchungen zum Heiligkeitsgesetz, 1964. - G. FOHRER, "Der Vertrage zwischen Kõnig und Volk in Israel",
§ 8. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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CONDIÇÕES GERAIS
(= Men of God, 1963, 1-36). - R. SAUBER, Die Abstraktíon im ieraeliiischen Recht, 1950 (Microfilme) - H. SCHMIDT, "Mose und der Dekalog", em: Gunkel-Festschríft, I 1923, 78-119. - H. SCHMOKEL, Das angewandte Recht im Alten Testament, 1930. - lo., "Biblische 'Du sollst-Gebote und ihr historischer Ort"', Zeítschríft der Savígny-Stífung für Rechtsgeschíchte 36 (1950),365-390. - R. SMENO, [ahtoekrieg und Stiimmebund, 1963. - lo., Die Bundesformel, 1963. - J. M. P. SMITH, The Origin and Hístory of Hebrew Law, 1931. - J. J. STAMM, Der Dekalog im Líchte der neueren Forschung, 1958, 2ª ed., 1962. - lo., "Dreissig [abre Dekalogforschung", ThR NF 27
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1. As máximas de vida Como introdução aos gêneros literários de que trataremos a seguir devemos primeiramente apresentar um resumo daquelas máximas de vida relativas aos indivíduos e à coletividade que não aparecem em forma optativa. Em sua maior parte, estas máximas, que acompanharam a vida inteira do israelita, só foram transmitidas porque se enquadravam perfeitamente em determinados contextos das narrativas e dos livros do AT. Este fato talvez tenha influído muitas vezes sobre sua formulação. Certamente, existiram muito mais máximas de vida do que aquelas que nos foram conservadas. Já o nascimento de uma criança, sobretudo quando do sexo masculino, oferecia ocasião para composição de tais sentenças por parte dos pais ou de parentes próximos. Embora não se encontrem máximas ligadas a situações pessoais, conhecemos, no entanto, certas expressões cristalizadas em fórmulas, como o encorajamento da mãe: Não temas, tu tens um filho (Cn 35.17, e semelhantemente em 15m 4.20), e a exclamação da mãe: Possuí um homem (Cn 4.1). A determinação que criava o direito não visava à adoção mas à legitimação da criança (p.ex., da criança nascida de escravar": És meu filho, eu hoje te gerei (512.7), da qual possivelmente deriva Is 9.5. 78
Sobre este ponto, cf. G. FOHRER, "huiôe", ThW VIII, 340-354. - A respeito da chamada adoção: M. DAVID, "Adoptie in het oude Israel", MAA 18,4 (1955), 85-103.
§ 8. Os GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS ESUAS TRADIÇÕES
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Um eco das máximas referentes aos esponsais ou ao casamento se encontra já na fórmula expressiva de parentesco com a qual o primeiro homem recebeu a mulher formada de sua costela (Gn 2.23). A sentença ordenativa com a qual, em épocas posteriores, o pai entregava a filha como esposa ao noivo, parece que podia ter a seguinte formulação: Ei-la; recebe-a segundo a lei de Moisés (Tb 7.13[14]). Para o divórcio, porém, havia a fórmula introduzida em Os 2.4 sob a forma de glosa: Ela já não é minha mulher, e eu Já não sou seu marido". E por ocasião de morte podia ser usada uma fórmula, como aquela de [ó 1,21b, na base da qual está o princípio do direito de posse (da vida), sob forma de arrendamento ou de concessão: Javé deu, Javé tirou; bendito seja o nome de Javé! Outras máximas de vida se referem a comunidades israelitas ou a seus representantes. Assim, nas chamadas bênçãos de Jacó e de Moisés (Gn 49; Dt 33) existem duas séries de sentenças relativas às tribos, originariamente independentes e mais tarde reunidas e dotadas de uma moldura. Elas foram pesquisadas recentemente por KITIEL e GUNNEWEG, sob o ponto de vista da história das formas e da tradição, e por ZOBEL, principalmente quanto à sua importância histórica. Outras fórmulas foram utilizadas também no cântico de Débora (Jz 5) e relacionadas com a situação do cântico. Uma outra sentença referente a determinado tronco patriarcal se encontra em Gn 16.11s, em ligação com a história do nascimento de Ismael, ao passo que os cânticos de Balaão, mais antigos, apresentam sentenças redigidas em forma de poesia. Uma rápida olhada sobre as sentenças destas duas séries principais nos mostram que na base das mesmas se encontram tanto comparações do reino animal, quanto jogos de palavras. Assim em Gn 49.14s Issacar é comparado primeiramente com um jumento, ao passo que as afirmações seguintes sobre o seu trabalho de escravo empregam um jogo de palavras, com os termos 'zs sakar, "escravo do pesado". Neste caso, a comparação com um animal é, em verdade, uma identificação: Issacar é um jumento preguiçoso. O jogo de palavras deve indicar o ser ou o destino figurado sob o nome. Por força de seu nome, Issacar está destinado à escravidão. O mesmo vale para as outras sentenças nas quais a comparação com animais ou os jogos de palavras têm força determinante ou normativa. 79
L. DÜRR, "Altorientalisches Recht bei den Propheten Amos und Hosea", BZ 23 (1935), 150-157. - C. H. GORDON, "Hos 2,4-5 in the Light of New Semitic Inscriptions", ZAW 54 (1936), 277-280. C. KUHL, "Neue Dokumente zum Verstândnis von Hosea 2,4-15", Ibid. 52 (1934), 102-109.
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CONDIÇÕES GERAIS
As comparações com animais estão a indicar uma época muito próxima do tipo de vida (semi) nômade das tribos israelitas, de sorte que elas surgiram, em parte, talvez ainda nesse período, e com certeza logo depois da tomada da Terra prometida. De data pouco mais recente são os jogos de palavras. Muito mais recentes ainda são as ampliações de sentenças, que vão mais além do que as duas mencionadas formas e em Gn 49 correspondem de longe à intenção do contexto em conferir a preeminência a [udá, e que em Dt 33 está em consonância com o caráter de "bênção" que foi atribuído à coleção numa etapa posterior. As fórmulas ligadas às tribos constituem, portanto, um conjunto de antigos elementos, cujo contexto vital [Sitz im LebenJ não foi a celebração do culto javista de uma determinada federação de tribos", mas o temperamento zombeteiro ou inclinado ao reconhecimento, de grupos ou tribos apresentados, no âmbito da vida (semi) nômade. E nas sentenças antigas falta mesmo uma referência à fé javista, referência que só vamos encontrar na versão mais recente de Dt 33. A primeira compilação: Gn 49, teve lugar sob o impulso da idéia do grande Israel, onde se acentuava o papel da liderança de [udá, Esta compilação foi depois inserida na fonte javista do Pentateuco. O comando da guerra, sobretudo na época anterior aos reis e quando não havia nenhum exército profissional permanente, podia aparecer associado a concepções e costumes religiosos onde se nota a preocupação em obter vitória ou evitar derrotas por meios divinos. Em tais situações, formavam-se sentenças mais ou menos duradouras. Quando se dava um oráculo positivo, proferia-se uma sentença, na primeira ou na terceira pessoa, como sendo comunicação de Javé: Vê: entreguei [ericô em vossas mãos (Js 6.2), ou: Javé vos entregou a cidade Os 6.16). Daí a exortação: Não temais (Ex 14,13), e as sentenças referentes às ações de levantar e depositar a arca, respectivamente, antes e depois da batalha (Nm 10,35s), sentenças estas que são, na realidade, fórmulas litúrgicas mais recentes; ou a exortação à bravura: 25m 10.12, como nas formas estereotipadas mais comuns de incitamento ao combate ou mesmo à fuga, e que se podem destacar dentre os oráculos do livro de Jeremias onde se fala dos povos estrangeiros (BACH). Assim como se anunciava a vitória mediante uma sentença: Javé colocou os inimigos debaixo de nossos pés (cf. 1Rs 5.17; 5118 [17], 39; 110 [109], 1), assim também se dava a ordem: Cada um para a sua tenda, á Israel, quando se despedia o exército que fora convocado, quando ocorria uma
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Assim
WEISER*
e em seu seguimento também
GUNNEWEG.
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derrota, ou quando se afastavam de um chefe odiado (cf. 2Sm 18.17; 19.9; 20.22; 1Rs 12.16). É do tempo dos reis que provém o grito de aclamação: Tornou-se rei..., proferido a respeito do representante da coletividade, depois de sua instalação como novo soberano (2Sm 15.10). Por fim, a fórmula que já mencionamos: Não temas!, que muitas vezes devia servir apenas para apaziguar ou para sossegar os ânimos (l Sm 28.12s), possuía caráter de exortação ou de ordem. Isto valia sobretudo quando se dava a aparição de Javé ou de seu anjo (Jz 6.23). Era usada também na guerra ou como promessa de proteção da parte de um poderoso (lSm 22.23).
2. Normas de vida e de comportamento em estilo apodítico Todas as sentenças deste grupo foram classificadas por ALT como princípios jurídicos formulados em estilo apodítico e transmitidos principalmente em séries mais ou menos extensas de proposições, que apresentam estrutura igual e são especificamente javistas e israelitas. As ordens categóricas contidas nestas sentenças estão em relação íntima com a vontade divina. Muitos têm falado pura e simplesmente de um direito divino. No entretempo, porém, surgiram vozes em sentido contrário". É principalmente contra a tese segundo a qual se trata de um direito especificamente javista e israelita, que se opõem os que julgam dever se admitir uma origem não-israelita para os acordos hititas de vassalagem e para a mediação de Siquém (HEINEMANN), ou uma origem semítica geral para a confederação das tribos, confederação baseada nas prescrições autoritativas dos anciãos do clã ou das famílias (FEUCHT, GERSTENBERGER). Ora, o estilo apodítico - "faze isto", "não faças aquilo" - é uma antiqüíssima maneira humana de dar ordens que encontramos por toda a parte. Até agora o Antigo Oriente nos oferece indícios bastante prováveis, com relação ao âmbito da vida (semi) nômade, de que tenham existido séries de preceitos e de proibições, de estrutura uniforme, contendo, para fins de memorização, dez (e muitas vezes doze) membros. Na base de Lv 18 está uma dessas séries, como ELLIGER bem o demonstrou". As pro-
B. LANDSBERGER, "Die Babylonischen Termini für Gesetz und Recht", em: Symbolae Paulo Koschaker, 1939,223. - TH. J. MEEK em ANET, 183 nota 24. - Também GESE, FENSHAM, FOHRER, GERSTENBERGER, GEVIRTZ e KIUAN. 82 Cf. os recentes comentários e monografias sobre a Lei da Santidade.
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posições deste decálogo primitivo, nos versículos 7-12,14-16, de onde, a julgar pelo v. 9, desapareceu uma frase, possuíam a forma primitiva: Não descobrirás a nudez de (nome da pessoa). Estas fórmulas se originaram das condições de vida da grande família (semi) nômade, cuja existência em comum devia ser cercada e protegida pelas normas éticas referentes à atividade sexual'". As séries de proposições apodíticas, portanto, de início não encerravam sentenças jurídicas", mas antes regras de vida e comportamento. Sua origem situa-se no âmbito do nomadismo pré-javístíco". Também a coleção de proibições e de preceitos contida em Ex 20.1-17 e chamada "decálogo" em sentido mais estrito, é uma dessas séries de disposições que medraram no solo da fé javista e se originaram lateralmente de várias séries primitivas. As tentativas de identificar um decálogo primitivo, composto de dez proposições de estrutura igual, admitindo-se a presença de proposições breves constituídas, cada uma, de duas palavras", ou a ampliação de proibições breves e a reelaboração total dos preceitos", devem ser rejeitadas como arbitrárias, por causa das transformações drásticas que introduzem no texto. As proposições do decálogo, pelo contrário, devem ter sido tiradas de outras séries, como se segue: a) Cinco proibições provêm de uma série de proposições, com quatro sílabas tônicas em cada uma, relativas aos deveres para com Javé e com o próximo: I 11 III IX X
Não Não Não Não Não
terás "outros deuses'?". farás para ti imagem de Deus. pronunciarás o nome de Javé em vão. levantarás falso testemunho contra teu próximo cobiçarás a casa de teu próximo.
Posteriormente a série foi ampliada para um do decálogo, relacionada com Javé e por fim interpretada como "direito". 84 Por isso é que falta uma designação específica para as sentenças apodíticas, pois o termo hoq, "estatuto", não se aplica a ela (HENTSCHKE). 85 É impossível admitir e dificilmente se pode imaginar uma recitação cultual do direito, principalmente porque Dt 27, a passagem que se alega, é um texto recente, que apenas finge um ato cultuaI. 86 B. COUROYER, L'Exode, 1952,97. 87 Além de ALT e RABAST, cf. também E. SELLIN, Geschichte des Israelitisch-jüdischen Volkes, I, 1935, 2i1 ed., 83s. 88 As palavras: diante de mim ou contra mim que encerram a frase, são um acréscimo posterior. 83
§ 8. Os GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS ESUAS TRADIÇÕES
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b) Três proibições provêm de uma série de proposições, contendo cada uma duas sílabas tônicas (cf. também [r 7.9; Os 4.2 e [s 7.11; Lv 19.11): VI VII VIII
Não matarás. Não cometerás adultério. Não roubarás.
c) Duas ordens, provenientes de uma série de proposições contendo três sílabas tônicas cada uma: IV V
Lembra-te do dia do sábado. Honra teu pai e tua mãe.
Embora as proibições de I-1Il possam datar do tempo de Moisés e seja possível tenham existido outras normas também na época pré-javística'", exclui-se, contudo, a autoria de Moisés, em vista do caráter secundário da série. Devemos, pelo contrário, admitir que o decálogo foi composto para o documento eloísta do Pentateuco e, mediante a palavra introdutória do v. 1, proclamado como um conjunto de disposições divinas. Não se pode pensar tenha havido uma finalidade ou uma origem cultual, nem tampouco trata-se aí de um estatuto jurídico. O próprio autor eloísta proclama o decálogo como uma espécie de norma de vida e de comportamento para Israel, ao mostrar que o povo se comprometeu a observar todas as palavras que Javé havia pronunciou e confirmou esta decisão por um ato de compromisso (Ex 24.3ss). Uma outra série secundária de normas de vida e comportamento é constituída pelo chamado decálogo cultual do documento javista: Ex 34.142690, que apresenta, de um lado, quatro determinações apodíticas, com formulação positiva e concernentes a certos dias do ano (vv, 18aa. 21a. 22aa. 26a) e, por outro lado, compreende seis determinações apodíticas de formulação negativa, das quais quatro se ocupam com problemas referentes ao sacrifício (vv. 2übp. 25a. 25b. 26b), ao passo que as duas prescrições restantes (vv, 14a. 17) correspondem às duas primeiras proibições de
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Para os estudos sobre cada artigo em particular, pela maior parte consagrados às questões exegéticas, remetemos às informações e exposições de STAMM. H. KOSMALA, "The so-called Ritual Decalogue", A5TI 1 (1962),31-61. - R. H. PFEIFFER, "The Oldest Decalogue", JBL 43 (1924),294-310. - J. G. TORRALBA, "Decálogo ritual,
Ex 34.10-26", Est Bibl20 (1961),407-421.
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Ex 20. Os dois primeiros grupos podem ter-se originado de determinadas regras do santuário judaíta, principalmente porque pressupõem a situação cananeu-palestinense (vv, 18aa. 22aa. 26). É provável que o autor javista tenha sido o primeiro a compilar este decálogo, pois é muito difícil tenha este podido existir como um bloco independente e, mais ainda, tenha sido destinado exclusivamente à proclamação no culto. Séries terciárias são o decálogo de Lv 19.3-12, na forma do plural e inspirado em Ex 20 (MOWINCKEL), e o decálogo de Ex 23.10-19, dependente de Ex 34. A maioria das séries breves, com menos de dez sentenças'", via de regra devem ser julgadas como as referidas séries secundárias e terciárias. Num quarto estágio, por fim, e em épocas posteriores, surgiram artificialmente outras séries, calcadas em modelos mais antigos, como, p.ex., o decálogo de Lv 19.13-18, na forma do singular (MOWINCKEL); a torá sacerdotal, utilizada em Ez 18.5-9; os "modelos de confissão'<", que regulavam a admissão ao culto, e que encontramos em Is 33.14-16; 5115 [14]; 24 [23].36; a doutrina sobre a sabedoria de vida, utilizada em [ó 31, e as imitações das mais variadas espécies e procedências, assumidas por Ex 22.6-19; Ne 10.31-40. Na próxima seção falaremos de sua utilização com referência às normas do direito.
3. Axiomas legais e princípios jurídicos A. O domínio da administração da justiça nos oferece grande variedade de usos e de axiomas jurídicos. Estes últimos se relacionavam sobretudo, ao que parece, com o assassinato e com a pena capital, e se fazem sentir muitas vezes, de maneira solene e penetrante, com sua construção métrica e mediante o recurso a reminiscências. Assim a sentença da pena de talião de Gn 9.6: Todo aquele que derramar o sangue humano,jterá o seu próprio sangue derramado pelo homem. Se o criminoso permanecesse incógnito, os anciãos da localidade deviam dizer, segundo Dt 21.7s: Nossas mãos não derramaram este sangue/e nossos olhos nada viram. Uma fórmula de acusação parece estar contida em 1Rs 21.13: Ele blasfemou contra Deus e contra o rei. Havia também axiomas jurídicos no direito privado. Assim, p.ex.,
91 92
Quanto aos detalhes, cf. ALT, ELLIGER e RABAST. K. GALLING, "Der Beichtspiegel, eine gattungsgeschichtliche Studie", ZA W 47 (1929), 125-130.
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aquele que se refere à viúva que devia tirar o sapato do cunhado, quando este se recusava a casar com ela, e lhe cuspir no rosto, dizendo: Assim se fará a todo aquele que não quer construira casa de seu irmão (Dt 25.9). B. Criaram-se também certos princípios jurídicos calcados respectivamente nos modelos das séries de normas apodíticas de vida e comportamento, princípios estes que estabeleciam, em fórmulas breves e concisas, a natureza do delito, e que, por isso, se distinguem nitidamente das proposições casuísticas que adiante mencionaremos. Dois exemplos desses princípios nos foram transmitidos: a) na chamada série dos mot-iumai (seja punido de morte) que se acha espalhada em Ex 21.22,15-17; 22.18s; Lv 20.2,9-13, 15-16, 27; 24.16, e cujas sentenças foram conservadas em estilo participial: Aquelequeamaldiçoar seu paie sua mãe seja punidode morte; b) na série de maldições de Dt 27.15-26, onde precede a ameaça de castigo: Maldito seja, seguida da indicação do delito em forma participial e que, por sua dependência em relação a Lv 18, a chamada série dos mot-iumat e em relação às idéias ético-sociais da teologia deuteronomista, deve ter surgido na época desta última. C. Devemos ainda mencionar os princípios da casuística jurídica que obedecem em tudo ao estilo usual do Antigo Oriente e elucidam os diferentes casos jurídicos em seus pormenores, com o fim de ordenar a vida quotidiana bem como a maneira de proceder no culto. Neles foi assumido também o conteúdo de amplos setores do direito do Antigo Oriente, e particularmente do direito de Canaã. Este conteúdo, porém, foi transformado não raramente, sob o influxo da fé javista. Havendo este processo começado logo após a conquista do país, numerosos outros princípios jurídicos da mesma espécie foram surgindo no correr do tempo, em virtude das mudanças ocorridas nas condições de vida. O processo de assimilação e de formação de novas leis teve lugar em épocas mais antigas, pela ação dos anciãos, dos chefes de clãs e de tribos, como também, e em ampla escala, graças aos sacerdotes e, mais tarde, aos tô'psê hattôrâ, isto é, aqueles que aplicavam a Lei a uma determinada situação (tal como fariam os "escribas" do judaísmo posterior) e também graças à ação dos reis. A composição das leis casuísticas se fez pelo processo de interpolação ou pelo processo de combinação (HEMPEL). Interpolação houve quando, como em Ex 21.12-17, sentenças apodíticas da série dos mot-iumat foram interpoladas pela regulamentação do direito de asilo, regulamentação esta que se refere à primeira proposição que trata de um ferimento mortal:
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CONDIÇÕES GERAIS
Se ele não o fez premeditadamente... eu lhedestinarei um lugarondese possa refugiar, mas se ele, por maldade, armar ciladas a outro e o matar, arrancá-lo-ás de meu altar, para que morra.
Na combinação, consideram-se todas as possibilidades de um determinado caso. Somente a mudança da segunda para a terceira pessoa é que nos permite reconhecer a presença deste procedimento, como em Ex 21.2ss: Quando comprares um escravo hebreu, ele te servirá seis anos; no sétimo sairá livre, sem pagar nada. Se entrarsozinho, sairá sozinho; sefor casado, sua mulherpartirá comele. Mas se foi o seu senhor que lhedeu uma mulher, e esta deu-lhe à luz filhos e filhas, a mulhere seusfilhos serão propriedade do senhor, e o escravo partirá sozinho.
D. Por fim, estreitamente conexa com as leis encontra-se a narrativa etiológica correspondente, que deriva os costumes jurídicos das ações dos antepassados. Como tal, a narrativa etiológica servia, certamente, e em primeiro lugar, para organizar a vida, possuindo por isso caráter normativo. Ela podia fixar determinados usos cultuais, como o costume da Passah [Páscoa] (Ex 12.27) e o costume de oferecer os primogênitos (Ex 13.14s). Em segundo lugar, com este processo se expõem casos e decisões judiciais onde aparece claramente a verdadeira finalidade da pretensa narrativa. Isto acontece quando se estabelecem, p.ex., as normas para as celebrações futuras da páscoa por parte dos impuros e dos que estão em viagem (Nm 9), para o apedrejamento do profanador do sábado (Nm 15.32s), e para garantir o direito das filhas herdeiras (Nm 27; 36).
4. Formas retóricas ligadas à fase processual Numerosos modos de falar, usados freqüentemente na pregação dos profetas, estão vinculados à fase processual das audiências. BOECKER cita: a) os modos de falar utilizados no decorrer da demanda e anteriormente às negociações: intimação a entregar o acusado; fórmulas de incriminação e de acomodamento, na fase pré-judicial do litígio; modos de falar com o intento de estorvar o processo; alegações de apelação por parte do acusado e do acusador, e modos de falar como introdução de um processo de verificação. b) Seguem-se os modos de falar utilizados em um processo penal: as alegações da acusação, as razões da defesa em causa própria e alheia; as formulações da confissão judicial, e as propostas de conciliação.
§ 8. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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c) Acrescentam-se os modos de falar para quando o processo se encerra: as diversas formas de sentenças judiciais e a determinação das conseqüências do delito. d) Além disso, podem-se encontrar também modos de falar utilizados durante um processo civil concernente à família e aos bens de propriedade, principalmente porque o fórum judicial exercia funções notariais, como via de regra acontecia em todo o Antigo Oriente. Trata-se sobretudo de intimação à compra de um determinado bem e do processo que, em termos jurídico-formais, se designa como a compra da noiva". Em tudo isto se percebe claramente como a existência do israelita era fortemente marcada pelo direito.
5. Acordos e contratos Os contratos exerceram em Israel, como em todo o Antigo Oriente, um papel de grande importância. Na realidade, o AT muitas vezes só nos fala em celebrações de contratos, sem nada dizer a respeito dos contratos em si. Formalmente podem-se distinguir quatro espécies de contratos (HEMPEL): a) acordo bilateral celebrado entre parceiros de iguais condições e que exprimia, principalmente em épocas mais antigas, as relações recíprocas de pertinência, com todos os direitos e deveres que esta situação acarretava, de modo que os parceiros ficavam como que ligados por uma espécie de vínculo comunitário (PEDERSEN); b) acordo em que um poderoso se comprometia com um mais fraco, colocando este último numa situação em relação à sua pessoa, situação em que ele assumiu determinadas condições, enquanto o parceiro mais fraco, aquele que recebia, não possuía nenhuma significação ativa (BEGRICH); c) acordo de suserania ou de vassalagem, no qual os compromissos ficavam a cargo do parceiro mais fraco, ao passo que o mais poderoso se limitava a promessas gerais de fidelidade, como nos contratos que os hititas impunham quais senhores feudais aos seus vassalos (MENDENHALL); d) acordo que um terceiro firmava com dois outros, como se deduz de uma carta de Mári (NoTH) onde nada se diz dos compromissos dos quais dependeria aquilo que se tinha em vista com a celebração do acordo. Nas celebrações de tais acordos não somente se fixavam as suas condições, mas também se praticavam ritos das mais diversas espécies", como o rito de misturar o sangue dos parceiros 93
94
W. PLAUTZ, "Die Form der Eheschliessung im AIten Testament", ZAW 76 (1964). 298-318. Cf. D. J. MCCARTHY, "Three Covenants in Genesis", CBQ 26 (1964), 179-189.
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CONDIÇÕES GERAIS
ou O da aspersão do sangue (Ex 24.8), do aperto de mão (Ez 17.18), da troca de um bem particular (lSm 18.3s), da ereção de uma estela Os 24.26), de um juramento (Gn 21.22ss), de uma refeição (Ex 24.11), ou o ritual descrito em Gn 15.9ss, em virtude do qual aqueles que violassem o pacto ficariam sujeitos à maldição (Ir 34.18). Com relação às categorias de pessoas ou dos círculos entre os quais se celebravam tais acordos no AT, estes podem ser de três espécies: A. Acordos celebrados entre comunidades políticas ou seus representantes como, p.ex., a aliança celebrada entre Salomão e o rei de Tiro (lRs 5.6ss; sua formulação talvez se tenha inspirado em documentos de outras alianças). No mesmo sentido, devem entender-se as alianças celebradas por Abraão e Isaac com Abimelec de Gerara (Gn 21.22ss; 26.26ss), os acordos de Jacó com Labão (Gn 31.44ss) e os de [osué com os habitantes de Gabaon Os 9.15). Em 1Mc 8.22ss encontra-se o documento de uma dessas alianças. B. Acordos celebrados por ocasião da escolha ou da investidura de um rei, entre o futuro soberano e a assembléia do povo ou seus representantes", como no caso de Davi (2Sm 5.3), de [oás (2Rs 11.17) e de Josias (2Rs 23.1-3). A narrativa de 1Rs 12 nos permite ver um pouco por dentro as negociações então em curso, mas que acabaram em fracasso. Também as passagens de lSm 10.11; 10.21b-27a; Os 6.7-11a; 10.3-4 pressupõem ou mencionam expressamente alianças por parte do soberano. C. Muito freqüentemente se fala de alianças contraídas entre indivíduos. Assim, p.ex., as alianças em que se trata da compra de uma propriedade por parte, respectivamente, de Abraão (Gn 23), de Jeremias (jr 32) e de Booz (Rt 4). As negociações são descritas aí com minúcias. [r 32 fala de um documento lavrado em duas vias, sem nada dizer do seu conteúdo (isto talvez ocorra também em Gn 23.16s). Tb 7.16 menciona um contrato de casamento e [r 3.8 fala da carta de divórcio. É comum admitir-se que a forma do contrato como "aliança" foi aplicada às relações que existem entre Deus e o homem (Abraão), ou entre Deus e IsraeL Não se tem levado, porém, suficientemente na devida conta a maioria dos profetas, os quais preferem as categorias individuais e utilizam uma terminologia de parentesco. Recentemente se tem menciona95
Nesses acordos não há oposição entre a escolha e o princípio carismático. A escolha não é feita em sentido democrático; pelo contrário: ela significa o reconhecimento do carisma comprovado.
§ 8. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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do muito os acordos hititas de vassalagem, destacando-se o suposto paralelismo que existe entre os formulários destes acordos e uma espécie de gênero literário dos documentos de aliança, ou seja o "formulário da aliança" (BALTZER), e isto sobretudo no decálogo de Ex 20 e 34 e também em Dt 4.29s e [s 24: fórmula de abertura, preliminares da celebração do acordo, declaração de princípios, condições em particular, lista das testemunhas do acordo, bênçãos e maldições. Deste modo, a fórmula da "aliança" parece ter permanecido imutável, das épocas mais remotas até as épocas mais recentes. A ligação entre a tradição do Sinai e a tradição do Êxodo, tantas vezes posta em dúvida, estaria comprovada por um formulário de contrato considerado original em termos de história das formas. Mas contra estas hipóteses se levantam inúmeras objeções: a) O termo hebraico b'ri! tem sido traduzido erroneamente por "aliança" (contrato). Na realidade, significa "compromisso" e pode designar tanto o compromisso que Deus assume por uma promessa que Ele faz, ou uma garantia dada por Ele, como o compromisso que Ele impõe a uma pessoa ou a Israel. Com isto caem por terra as bases de todas as hipóteses que defendem a existência de uma"aliança" e de um "formulário da aliança". b) MCCARTHY, em suas pesquisas, não se utilizou apenas dos acordos hititas de vassalagem, mas também do material mais antigo do Antigo Oriente, como os contratos provenientes da Síria e da Assíria e os acordos hititas de paridade. De todo esse material ele deduz uma forma comum de contrato, que era usada em acordos internacionais ao longo de toda a história do Antigo Oriente, na época pré-helenística, sendo que as formas siro-assíria e hitita apresentam diferenças de detalhes. Da simples ocorrência de uma forma de contrato não se pode, portanto, deduzir nenhum ponto de apoio para a fixação de uma data precisa, de modo que, embora os textos veterotestamentários correspondentes à mencionada forma de contrato não se baseiem na existência do gênero literário em questão (existente no reino hitita), podiam, no entanto, estar vinculados às condições históricas e concretas do tempo. c) O pacto do Sinai não foi elaborado segundo o modelo acima referido. A própria questão de saber como tal coisa tenha acontecido na região do deserto não é tão fácil de responder, principalmente quando não se quer ficar limitado aos acordos hititas de vassalagem. Antes, deve-se pensar em reelaborações e retoques das narrativas de textos paralelos que talvez possam existir. Contudo, os supostos paralelos são bastante duvidosos, como no-lo mostram alguns exemplos: A autoapresentação: Eu sou Javé (Ex 20.2) literariamente não corresponde a:
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CONDIÇÕES GERAIS
Assim (fala) o filho de Murshlish. O paralelismo está antes em: Assim fala Javé. Nem tampouco se deve identificar a referência ao episódio da retirada do Egito, base da profissão de fé de Israel, com a história vétero-oriental anterior à conclusão do referido pacto (p.ex.: Embora estivesses doente, eu, o Sol, te estabelecí em lugar de teu pai); também as relações de Israel para Javé não correspondem à ligação do vassalo com o suserano. Além disso, a passagem de Ex 20.2 não pertence absolutamente à situação primitiva do texto, mas constitui uma ampliação deuteronomista (ScHMIDT, FOHRER). d) Na realidade, com relação ao período anterior ao Deuteronômio, são também muito poucos os documentos que depõem em favor de uma b'rit ("aliança") divina com Israel e da qual somente a teologia deuteronomista, a fonte sacerdotal do Pentateuco e outros textos tardios falam mais freqüentemente (JEPSEN). Entre o pacto do Sinai, da era mosaica, e a teologia da berft propriamente dita, medeia, a partir do final do séc. VII, uma lacuna cronológica de vários séculos. Os textos que se aduzem em favor de um "formulário da aliança" não são deuteronomistas, nem foram refundidos em sentido deuteronomista. No começo, portanto, não existe uma concepção jurídica em senso estrito e que posteriormente se teria transformado e atenuado por considerações de natureza teológica. Pelo contrário, é a partir de uma teologia deuteronomista e no momento em que ela é assumida como conceituação de b'rit, que esta se reveste, até certo ponto, de uma formulação jurídica. O "formulário da aliança" nunca existiu em sua forma plena. Mesmo no Deuteronômio e no documento sacerdotal só se pode estabelecer unicamente uma certa aproximação com a concepção véterooriental de pacto.
§ 9. OS GÊNEROS LITERÁRIOS IMPETRATIVOS E DESIDERATIVOS E SUAS TRADIÇÕES H. CH. BRICHTo, The Problem of "Curse" in the Hebrew Bible, 1963. - F. CH. FENSHAM, "Malediction and Benediction in Ancient Near Eastem Vassal Treaties and the Old Testament", ZAW74 (1962),1-9. - J. HEMPEL, "Die israelitischen Anschauungen von Segen und Fluch im Lichte altorientalischer Parallelen", ZDMG 79 (1925),20-110 (= Apoxysmata, 1961,30-113). - F. HORST, "Segen und Segenhandlungen in der Bibel", EvTh 7 (1947/48),23-37 (= Gottes Recht, 1961, 188-202). - ID., "Der Eid im Alten Testament", ibid. 17 (1957), 366-384 (= ibid 292-314). - I. LANDE, Formelhafte Wendungen der Umgangssprache im Alten Testament, 1949. - S. MOWINCKEL, Psalmenstudien V: Segen und Fluch in Israels Kuli- und Psalmdichtung, 1924. - ID., The Psalms in Israel's Worship, 11 1962,44-52.
§ 9. Os GÊNEROS
LITERÁRIOS IMPETRATIVOS E DESIDERATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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- M. NOTH, "Die mit des Gesetzes Werken umgehen, die sind unter dem Fluch", em: von Bulmerincq-Gedenkschrift, 1938, 127-145 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1957, 155-171). - J. PEDERSEN, Der Eid bei den Semiien, 1914.- H. Sc:HMIDT, "Grusse und Glückwünsche im Psalter", ThStKr 103 (1931), 141-150.
1. A súplica e o desejo A súplica ou o pedido não eram menos raros na vida do israelita do que entre outros povos, mesmos se deixarmos de considerar sobretudo aquele tipo de súplica que se fazia a Javé e encontramos expresso particularmente nos cânticos de Lamentação (§ 39,3). Na vida quotidiana faziamse pedidos até para as coisas corriqueiras como o pão (Gn 47.15) ou a água (l Rs 17.10), do mesmo modo como se pedia uma mulher para casar (Jz 14.3) ou um obséquio de interesse vital (Gn 12.13). Até ao próprio rei se podia dirigir um grito de súplica: Socorre-me, ó rei (2Sm 14.4), porque era de sua obrigação prestar tal socorro". Usualmente o imperativo do verbo da atividade esperada devia exprimir um pedido (p.ex.: Ajuda-me!). É a partir do texto que se vê tratar-se de um pedido e não de uma ordem, e no ato de pedir isto se percebia naturalmente pelo tom da voz. Um pedido é tanto mais côrtes e ao mesmo tempo tanto mais eficaz, quando precedido de um "por favor" (Jz 19.6; 2Rs 6.3). Como expressão de cortesia, funcionava também a locução: encontrargraça diante dos olhos de alguém, que muitas vezes equivalia simplesmente ao "por favor", acrescentado a um desejo (Gn 18.3; 47.29). Esta expressão pode conter igualmente, e sem que encerre um pedido expresso, um desejo de que se conceda aquilo que se pede do fundo do coração (l Sm 15.25). Também pode caracterizar o pedido de um subalterno ou de alguém mais fraco, no sentido de que se cumpra a promessa que lhe foi feita (2Sm 16.4) ou se lhe conceda uma determinada permissão (Rute 2.2,10). Como o pedido, como a súplica, também o voto, o desejo estão presentes em toda a vida do israelita, assumindo em certas ocasiões o caráter de votos de bênçãos e felicidade. Assim, os votos de felicidade acompanham a mulher recém-casada ao despedir-se da casa de seus pais (Gn 24.60). Também se podem ouvir votos de felicidade em Rute 4.11. Quando o rei sobe ao trono, ressoam os votos de longa vida: Viva o rei! (lSm 10.24).
96
Sobre o significado do verbo, cf. G.
FOHRER
em ThW VII, 970-981.
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CONDIÇÕES GERAIS
A fórmula mi iitten, "quem me dera!", no sentido de "quem poderia dar?", "quem daria?" serve principalmente de introdução a um desejo irreal. A fórmula é dirigida a uma determinada pessoa ou a uma autoridade da qual se pode receber aquilo que se deseja; portanto, dirige-se antes e acima de tudo a Deus. LANDE demonstrou a evolução da fórmula, baseado em um número suficiente de exemplos que vão desde a simples pergunta (Jó 31.31), passando pelas perguntas desiderativas (Iz 9.29; 51 55[54].7) e pela transição para a partícula optativa, com a junção de um verbo (Ex 16.3; Jó 6.8), até a partícula optativa pura (Dt 5.26[29]; Jó 19.23).
2. Fórmulas de saudação As fórmulas de saudação em geral são construídas sob a forma de desejo, de voto. Na sua origem, elas se fundamentam na idéia de que a palavra falada possui certo poder de eficácia, de modo que as fórmulas comunicam e conferem à pessoa cumprimentada aquilo mesmo que elas exprimem. Trata-se, principalmente, do salõm, da "prosperidade", da "salvação", que se deseja a outrem, com a antiga fórmula de saudação: sãlôm l'ka, "que a prosperidade esteja contigo!" Estas palavras estabelecem uma situação de incolumidade e de paz com aquele que é interpelado e que para o futuro pode sentir-se em segurança. O voto pode ser extensivo aos bens que se possuem e à família da pessoa que se cumprimenta (l Sm 25.6) ou pode se transformar numa simples fórmula de saudação (25m 20.9), ao passo que as felicitações de 25m 8.10 parecem constituir uma fórmula políticojurídica de reconhecimento da soberania de alguém. A expressão é empregada igualmente como fórmula de despedida: Vá em paz! (Ex 4.18), como fórmula oficial de despedida (25m 15.9), ou como encerramento de uma conversa, que interrompe a palavra no sentido de um "Está bem! Basta!" (2Rs 4.23). O verbo abençoar também serve para indicar uma saudação, sobretudo na fórmula: Javé te abençoe (ou: No que se refere a Javé), com a qual se deseja e se confere à pessoa um poder de bênçãos (LSm15.13). Assim abençoa-se de preferência alguém ao qual aquele que saúda tem alguma coisa a agradecer ou ao qual deseja louvar. Trata-se de uma bênção que expressa um reconhecimento especial, ou deve significar mais do que uma simples cortesia. Por fim, encontra-se a saudação: Javé esteja contigo (Jz 6.12; Rt 2.4), que tem a dupla significação de promessa ou de constatação ("Javé está contigo"), e de votos de felicidade.
§ 9. Os GÊNEROS LITERÁRIOS
IMPETRATIVOS E DESIDERATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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3. Bênçãos e maldições Grau ainda maior de eficácia possuem aquelas sentenças e fórmulas que exprimem ou manifestam um voto de bênçãos ou de maldições, principalmente quando procedem da esfera da magia, juntamente com a fé no poder de ação e na irrevogabilidade da palavra, e quando são reforçadas em sua operação por fórmulas metrificadas, por repetições e por ações concomitantes. Pronuncia-se a maldição contra um país (Dt 11.29). Ela se prende à vida de uma cidade (Jo 6.26), devora casas (Zc 5.4) e determina os destinos de povos inteiros (Gn 9.25), a menos que Deus transforme esse seu poder em bênçãos (Nm 22-24), ou o faça voltar-se contra aquele que amaldiçoa (Gn 12.3). A fórmula de bênção é introduzida geralmente pelo termo barúk, "abençoado, bendito", e a fórmula de maldição pelo termo arúr, "amaldiçoado, maldito". A sentença de maldição contém uma justificativa, uma fórmula de maldição propriamente dita e um desdobramento (p.ex.: Gn 3.14). Na vida jurídica ela se encontra sob a forma de maldição condicional, no sentido de uma ação única ou repetida (Js 6.26; Dt 27.15ss), sob a forma de juramento (Jó 31), ou atenuada como pedido contra os inimigos (51 109[108].6s). A bênção contém muitas vezes um imperativo. Na forma condicional, ela aparece ligada a uma ação de abençoar (Gn 27.27ss), ou como bênção cultual (Nm 6.24ss) e como saudação durante uma refeição e em outras ocasiões. a) Em princípio, cada pessoa pode proferir bênçãos e maldições, e isto com o máximo de eficácia, quando em sua hora derradeira. Lança-se a bênção ou a maldição sobre boas ou más ações (Rt 2.20; Pr 11.26), animais (Gn 3.14s) e pessoas (Gn 4.11; 9.25ss ), e com a bênção procura,se também neutralizar uma maldição proferida anteriormente (Jz 17.2). Existem igualmente votos genéricos de bênçãos, como por ocasião das colheitas (51 129[128].8; Rt 2.4), por ocasião de uma despedida (l5m 20.42), ou como manifestação de benevolência (Gn 43.29). Muitas vezes se procura evitar a maldição como tal, modificando-lhe a expressão, p.ex., com a frase: Que Deus (te) faça este mal e (te) acrescente ainda este outro (l5m 3.17), ou em lugar do verbo amaldiçoar se usa o verbo abençoar (Jó 1.5). A palavra amém serve para reforçar a maldição ou a bênção (Jr 11.5). b) Acreditava-se que as expressões de bênção ou maldição dirigidas aos patriarcas (Gn 12.11ss; 14.19; 22.16ss; 28.13ss) ou aquelas que se lhes colocavam na boca (Gn 27.27ss,39s; 48.15s,20) eram dotadas de força especial. Também as bênçãos de Moisés de Dt 33, em sua forma atual, são constituídas de sentenças referentes às tribos (§ 8,1), como, de certo modo,
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CONDIÇÕES GERAIS
Gn 49 e 2Sm 23 também o são. Estas sentenças se referem, antes de tudo, aos ancestrais do povo, abençoados por Deus, ou aos grupos ou tribos que eram considerados seus descendentes e cujo destino posterior se julgava, por esta forma, derivar de épocas antigas. c) É o sacerdote quem possui, em particular, o poder de abençoar e de amaldiçoar. Quando ele invoca o nome de Javé sobre os israelitas, a bênção divina se torna eficaz (Nm 6.27). Por este modo de agir as fórmulas originariamente mágicas "abençoado" e "amaldiçoado" se tornam a expressão de um voto referido a Javé: Abençoado (ou amaldiçoado) seja por (ou perante) Javé, voto este do qual resultava, por seu lado, a função intercessora do sacerdote. Por vezes, a bênção e a maldição assumem também o caráter de lição cultual, onde a comunidade expressa seu assentimento, por meio do amém e dá sua adesão ao que foi proclamado (Dt 27.13ss). Uma das funções do sacerdote consiste sobretudo em ministrar a bênção, talvez sob a modalidade da bênção dita aaronítica (Nm 6.24-26). d) A fórmula: Bendito (louvado) seja Javé assume o aspecto de agradecimento ao qual, na frase que vem logo a seguir, se acrescenta a indicação do motivo, isto é, o benefício de Javé pelo qual se regozija e se louva a Deus. Assim, aquele que fala, expressa seu agradecimento por um benefício que lhe foi conferido (1Sm 25.32), por um benefício concedido à pessoa com a qual se fala (Rt 4.14) ou pelos benefícios prestados a um terceiro (2Rs 5.21).
4. Juramentos A fórmula de juramento significa, de algum modo, uma maldição. Assume-se o compromisso de fazer ou deixar de fazer uma coisa, ou se afirma que se fez ou deixou de fazer uma coisa, e para comprovar a justeza de sua afirmação, empenha-se a própria vida (Nm 14.21), a vida da pessoa com que se fala (1 Sm 1.26), ou a vida de Javé (1Sm 14.39); a vida do Rei (Gn 42.15). O juramento não cumprido passa a agir de imediato como maldição. A expressão: "Por minha vida" equivale a: "Que eu morra se eu (não) fizer, ou se (não) tiver feito isto".
§ 10. OS GÊNEROS QUERIGMÁTICOS E DOUTRINAIS E SUAS TRADIÇÕES
J. BEGRICH, "Das priesterlicbe Heilsorakel", ZAW 52 (1934), 81-92 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964, 217-231). - lo., "Die priesterliche Tora", em: BZAW 66, 1936,63-88 (= ibid. 232-260).
§ 10. Os
GÊNEROS QUERIGMÁTICOS E DOUTRINAIS E SUAS TRADIÇÕES
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SH. H. BLANK, "The Curse, the Blasphemy, the Spell, and the Oath", HUCA 23,1 (1950/51), 73-95. - K. ELLIGER, "Zur Analyse des Sündopfergesetzes", em: Rudolph-Festschrift, 1961,39-50. - K. GALLING, "Der Beichtspiegel", ZAW 47 (1929), 125-130. - E. GRANT, "Orade in the Old Testament", AT5L 39 (1922/23), 257-281. - K. KOCH, "Tempeleinlasslitmgien und Dekaloge", em: von Rad-Festschrift, 1961, 45-60. - F. KÜCHLER. "Das priesterliche Orakel in Israel und [uda", em: BZAW 33, 1918, 285-301. - J. LANOE, Formelhafte Wendungen der Umgangssprache im Alten Testament, 1949. - J. LINOBLOM, "Lot-casting in the Old Testament", VT 12 (1962), 164-178. - A. Loos, "Le rôle des orades dans la nomination des rois, des prêtres et des magistrats chez les Israélites, les Égyptiens et les Grecs", em: Mélanges Maspéro, 11934, 91-100. - G. OSTBORN, Tora in the Old Testament, 1945. - R. PRESS, "Das Ordal im alten Israel", ZAW 51 (1933), 121-140,227-255. - R. RENOTORFF, Die Gesetze in der Priesterschrift, 1954. - E. ROBERTSON, "The Urim and Tummim", VT 14 (1964), 67-74.
1. Oráculos Embora se tenha descoberto que, nos santuários, além dos sacerdotes, havia também profetas do culto (§ 52), deve-se, contudo, fazer uma distinção entre oráculo sacerdotal e oráculo dos profetas do culto. O oráculo sacerdotal não se origina de acontecimentos especiais, porventura de natureza estática, mas se caracteriza pelo emprego de - técnicas oraculares e fórmulas litúrgicas. Na época posterior ao exílio, a função do sacerdote consistia muito menos em oferecer sacrifícios do que em responder aos pedidos e perguntas dos que visitavam o santuário, em dar a resposta divina que marcava seus destinos e em ministrar a divina doutrina que lhes orientava a vida. Além destes, muitos outros oráculos eram obtidos junto a leigos, e dos quais adiante falaremos. a) Quanto à técnica dos oráculos, encontramos ocasionalmente indícios ou alusões a certas práticas do Antigo Oriente: a obtenção dos omina [presságios] mediante a observação do vôo dos pássaros (Gn 15.11) ou a inspeção da água numa taça (Gn 44.5); o processo de alcançar uma comunicação divina pelo germinar e pelo florir de plantas ou de: bastões no santuário (Nm 17.16ss), pela mudança do ruído do vento nas árvores (25m 5.22s), por meio do bastão dos oráculos (Os 4.12), ou passando a noite no santuário (incubatio; Gn 28.10ss; 15m 3; 1Rs 3.5ss). Também era exercida e defendida a invocação dos espíritos dos mortos, apesar de proibida (ISm 28.7ss; Is 8.19). Igualmente eram conhecidas as técnicas estrangeiras de
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CONDIÇÕES GERAIS
obtenção de oráculos, como o exame do fígado das vítimas [hepatoscopia] ou o oráculo das flechas (Ez 21.26). A forma mais importante de oráculo em Israel era a dos oráculos pela sorte, dita dos urim e tummim, onde se propunha à divindade uma questão que devia ser respondida com um "sim" ou com um "não". A manifestação do primeiro tipo de oráculo significava uma resposta negativa (urim, "maldito"); a do segundo significava uma resposta positiva (tummim, talvez "inocente"). O sentido original dessas duas expressões permite-nos supor que este oráculo era usado principalmente para esclarecer certos casos judiciais. b) A forma da sentença oracular, no caso do oráculo pela sorte, consistia simplesmente em dizer sim ou não à pergunta feita, e isto principalmente na época de Saul e Davi (TSm 23.2,11). Ou então se empregava uma fórmula litúrgica já existente, a qual não entrava nos pormenores de uma determinada situação: Vai em paz! O Deus de Israel te conceda o quelhe pediste (I Sm 1.17). Muitas vezes esta forma simples era insuficiente e se tornava necessária uma explicação mais detalhada, como aquela que encontramos em 25m 5.23s. Em tais casos, o oráculo pode assumir uma forma metrificada, como, p.ex., no oráculo pronunciado em relação a Rebeca (Gn 25.23), imitação de uma sentença sacerdotal. A fórmula plena do oráculo positivo, de épocas posteriores, o chamado oráculo sacerdotal, mensageiro de salvação, deve ter abrangido, à semelhança das palavras salvíficas, utilizadas pelo Dêutero-Isaías (§ 53,4), a promessa da intervenção divina em benefício daquele que busca a salvação e o anúncio dos resultados dessa intervenção e do objetivo que se visava, com o atendimento da parte de Javé. Esta espécie de oráculo deve estar subentendida em certos salmos, como fundamento da subitânea transformação de uma queixa em agradecimento (§ 39,3). c) As fórmulas oraculares apresentadas como palavras de Javé ocorrem freqüentemente na primeira pessoa, entendidas como palavras unicamente divinas. Ocasionalmente fala-se de Javé na terceira pessoa (5120[19].7; 85 [86].9ss). Além disso, ocorrem certas alusões a aparições de Deus, a teofanias (Gn 17.1; 26.24; 28.13; 46.3) às quais, por se supor que elas sempre provocam o medo e o espanto, logo se acrescenta a exortação: Não temais.
2.0rdálio Uma das funções do sacerdote era, sobretudo, a de submeter à prova certas ações suspeitas. Isto se fazia por intermédio do ordálio. Em tais
§ 10. Os
GÊNEROS QUERIGMÁTICOS E DOUTRINAIS E SUAS TRADIÇÕES
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ocasiões, e com o auxílio do oráculo da sorte, podia-se identificar um transgressor não conhecido (Js 7.14ss). Além disso, constatava-se a culpa imputada a alguém, por um procedimento técnico, qual era o do ordálio da poção, como ocorria nos casos de suspeita de infidelidade matrimonial (Nm 5.11ss). Quando tivesse havido verdadeira transgressão, faziam-se sentir logo os efeitos da maldição e, por este modo, a culpabilidade ou inocência se tornavam patentes no julgamento divino. Por fim, também se podia provar a inocência pelo juramento de inculpabilidade ou pela maldição de si próprio, desta vez também em virtude de se acreditar na eficácia da maldição (51 7.4ss; [ó 31). Usavam-se, para isto, a fórmula de juramento que em si representa uma auto-maldição abreviada.
3. Torá A torá é um ensinamento ministrado oralmente, uma informação e uma instrução dadas pelos sacerdotes aos leigos, sobre questões ou situações concretas, com o fim de evitar ações portadoras de maldição e alcançar ações portadoras de bênçãos. A atuação sacerdotal, neste domínio, era da máxima importância. a) A torá cultual versava sobre questões que diziam respeito ao procedimento cultual, como, p.ex. sobre a diferença entre o puro e o impuro, o sagrado e o profano. Assim, o profeta Ageu recorre à iorâ dos sacerdotes, evidentemente para fins próprios, a respeito da força de contaminação da pureza e impureza cultuais (Ag 2.10-14). Semelhantemente é a pergunta dirigida em Zc 7.1-3; 8-18s aos sacerdotes e aos profetas do culto, no sentido de saber se se devia continuar a observar o jejum em memória da tomada de Jerusalém, e cuja resposta Zacarias evoca a si. Imitações proféticas da iorá encontram-se, p.ex., em Is 1.10-17; 33.14-16; Mq 6.6-8, sendo que a introdução de Is 1.10 deve ter-se baseado em uma formula tradicional, em que, evidentemente, o nome de Israel foi substituído pelo de Sodoma e Comorra: Ouvi a palavra de [aoé.lprincipee de Sodoma! Escuta a lição de nosso Deus,/povode Camorra! b) A torá de ingresso ou liturgia da terá examinava se as condições para a admissão ao santuário tinham sido preenchidas e para isto podia usar um "modelo de confissão", como aquele que se percebe claramente no 51 15 e no 51 24 [23].3-6, com suas condições predominantemente
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CONDIÇÕES GERAIS
éticas". O SI 15[14] talvez contenha o esquema característico desta torá: pergunta daquele que se apresenta, resposta do sacerdote (forá), promessa do sacerdote. Com base neste modelo é que se elaboram as instruções ministradas dentro de um contexto litúrgico a respeito das relações entre Javé e Israel (5150[49]; 81[80]; 95[94]). Desta modalidade literária deriva também o quadro de avisos que em épocas posteriores proibia aos nãojudeus a entrada no templo de Jerusalém. c) Sem dúvida os sacerdotes deviam também instruir e informar a respeito de questões gerais de direito, de modo que se pode falar de uma torâ do direito. Assim, ensinavam-se aos ignorantes ou se resolviam casos difíceis e obscuros de direito, propostos aos sacerdotes. Deste modo, por meio de novos pronunciamentos pôde inclusive surgir um novo direito, como sucedia em todo o Antigo Oriente.
4. Normas cultuais e o saber sacerdotal As normas cultuais e o saber sacerdotal constituíam os instrumentos de que dispunham os ministros sagrados em sua atividade específica e que lhes serviam não menos para a formação dos jovens sacerdotes. a) As normas cultuais, do modo como foram utilizadas nos livros do Levítico e dos Números, oferecem instruções atinentes à atividade dos sacerdotes ou estabelecem os critérios segundo os quais os sacerdotes devem emitir seus julgamentos. Entre outros pontos, elas contêm prescrições sobre as espécies de sacrifícios, sobre a maneira de reconhecer e de tratar as doenças da pele, e determinações sobre os animais e os estados puros e impuros. Sem muita dificuldade se pode perceber que, por trás de sua roupagem, elas aparecem como palavras dirigidas por Javé a Moisés. Se abstrairmos da fórmula introdutória correspondente e se mudarmos a invocação ou a segunda pessoa para a terceira, então temos freqüentemente a forma original. Além disso, em diversos casos foram acrescentados títulos ou subtítulos para facilitar a separação entre os blocos de instruções, como em Lv 6.2,7,18. Assim se tem toda uma série de instruções sobre o ministério sacerdotal, que nasceram da celebração viva do culto. Quanto ao seu núcleo elas datam, pelo menos em parte, da época anterior do exílio.
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Sobre a série decimal, cf. § 8,3.
§ 11. Os GÊNEROS
LITERÁRIOS DE TRANSMISSÃO E COMUNICAÇÃO E SUAS TRADIÇÕES
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b) Existem também outros ensinamentos e instruções que se distin-
guem das normas cultuais pelo fato de constituírem pequenos fragmentos que foram reunidos em coleções, sem que entre eles houvesse, entretanto, qualquer relação de conteúdo ou de forma. Eram destinadas também aos sacerdotes, e representam elementos de seus conhecimentos profissionais. Destas coleções forma parte, p.ex., a perícope de Lv 11-15.
5. Aprovação, rejeição, censura Para concluirmos, devemos mencionar ainda as máximas da vida quotidiana, que anunciam a aprovação, a rejeição ou a censura, ou transmitem um ensinamento a respeito das mesmas. A constatação aprobativa de que uma coisa é útil e oportuna se faz por meio de um simples (é) bom, (é) boa (Gn 1.31; Is 41.7), e a aprovação, por meio da frase: É uma coisa boa (Dt 1.14). Isto pode ser expresso simplesmente no sentido do resultado que se aguarda (25m 15.3). Mas, ao lado destas expressões, encontra-se também um julgamento de valor, quando se expressa a reprovação, utilizando-se de fórmulas negativas: Não está certo o quefizeste (15m 26.16); isto são coisas que não se devem fazer (Gn 34.7), também mediante o acréscimo: em Israel (25m 13.12), ou sob uma forma ampliada (Gn 20.9). Por meio de perguntas formuladas de diversos modos e que supõem resposta negativa não expressa, pode-se comunicar uma recusa, particularmente com a pergunta: Que tenho eu a haver contigo? (Jz 11.12; 1Rs 17.18). A rejeição de alguém ou de alguma coisa por parte da comunidade se processa da mesma forma (25m 16.10; 2Rs 9.18s). As perguntas: Que fazes tu? ou Que fizeste? exprimem uma censura. Originariamente possuíam um sentido didático. Fazia-se a pergunta, mencionando-se talvez, ao mesmo tempo, uma obra mal executada, com o fim de chamar a atenção do interpelado para o seu erro e obrigá-lo a prestar satisfação a respeito da mesma. Daí a expressão evolveu para a censura (Nm 23.11; [z 8.1).
§ 11. OS GÊNEROS LITERÁRIOS DE TRANSMISSÃO E COMUNICAÇÃO E SUAS TRADIÇÕES D. R. Ap-THOMAS, "Some Notes on Old Testament Attitude to Prayer", 5JTh 9 (1956),422-429. - G. BEER, "Zur israelitisch-jüdischen Briefliteratur", em: BWAT 13, 1913, 20-41. - SH. H. BLANK, "Some Observations concerning Biblical Prayer", HUCA 32 (1961), 75-90.
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CONDIÇÕES GERAIS
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1. Diálogos Os diálogos, que desempenham um papel significativo na literatura veterotestamentária, na proporção de sua presença no antigo Israel, começam por uma série de locuções de temas bastante cristalizados. Entre os diálogos podemos incluir, em primeiro lugar, a saudação que os interlocutores trocavam quando se encontravam pela primeira vez (§ 9,2). Chama-se ou interpela-se uma pessoa que não percebeu a presença de outra ou com a qual se deseja falar. Grita-se para alguém que está afastado, sendo que aquele de posição superior usa o simples nome do inferior (Gn 21.17). Na interpelação empregam-se as denominações tradicionais de parentesco, acrescidas do sufixo pessoal, como, p.ex.: meu pai (Gn 48.18), o simples nome do inferior (1 Sm 17.55), a designação honrosa de caráter genérico: meu senhor (Gn 23.6), os nomes dos títulos, profissões e categorias sociais (2Rs 6.26; 9.5). Depois segue-se o diálogo, freqüentemente introduzido por um eis-me aqui, como resposta. As partículas demonstrativas eis, vede (entretanto) e a expressão bi, "meu senhor", que equivale a "sobre mim, meu senhor, (recaia tudo o que de inconveniente nossa conversa possa trazer)", constituem outras tantas introduções de diálogos, que aparecem com freqüência e por isso guardam uma fórmula fixa. Da abertura
§ 11. Os
GENEROS LITERÁRIOS DE TRANSMISSÃO E COMUNICAÇÃO E SUAS TRADIÇÕES
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do diálogo formam parte também as perguntas sobre o lugar de onde vem e para onde se dirige o interlocutor. De um estranho procurava-se saber como se chamava, de que família era e de qual região procedia, o que viera fazer ou para onde pretendia ir, para em seguida convidá-lo talvez a uma refeição ou mesmo para pernoitar. No mesmo sentido está a apresentação do próprio desconhecido, que se aplicava também a Javé. A um conhecido se perguntava igualmente de onde vinha, para onde ia e o que pretendia fazer. Independentemente do conteúdo, existia também uma moldura bastante estável dentro da qual o diálogo se desenvolvia. Assim, depois da abertura, a conversa prosseguia, mediante expressões como e agora, e eis que, ou simplesmente por meio de um e, e era sustentada por meio das palavras vê, ouve, estímulos verbais com o sentido de "eia", "pois bem", ou por meio da locução tu bem sabes. Para realçar algum aspecto ou intensificar o diálogo, costumava-se antepor o sujeito, os pronomes independentes, mencionava-se o órgão de onde procedia uma ação (Ir 26.11), ou se repetia uma idéia em forma negativa, ao lado ou em lugar de uma idéia positiva (2Rs 20.1). Aquele que falava podia declarar-se - e isto principalmente no estilo da corte - escravo (25m 11.21) ou filho (l5m 25.8) do interlocutor (l5m 24.15) ou, com expressão solene, falar de si mesmo, empregando seu próprio nome ou usando a terceira pessoa (25m 24.23). Partes isoladas do diálogo podiam encerrar-se com a repetição de uma frase importante (lRs 18.11-14). Muitas vezes o próprio diálogo terminava - aprobativamente ou a contragosto - com um está bem (§ 9,2) ou basta (Gn 45.28) e, conforme as circunstâncias, também com uma saudação de despedida.
2. Discursos É de supor que em Israel tenha havido uma certa técnica do discurso e que para o mesmo se possuísem formas fixas. Assim o orador, convocando o povo a se reunir, impunha silêncio e pedia a atenção dos presentes, mencionava aqueles a quem se dirigia e indicava as partes mais importantes de seu tema, para, em seguida, passar às exposições propriamente ditas. Nesta exposição perseguia ele evidentemente objetivos que, em geral, diferiam daqueles dos oradores modernos. O que ele procurava não era convencer seus ouvintes mediante uma fundamentação teórica e racional, mas impor-se a eles, influenciando-lhes diretamente as vontades. Por isso, sua argumentação consistia em repetições e em
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oferecer certas garantias. Ao mesmo tempo fazia com que agisse a força de sugestão da sua palavra, na qual depunha toda a sua energia e o seu entusiasmo, até que se esgotasse alguma possível resistência dos ouvintes e estes desistissem do próprio ponto de vista, como no caso de [ó, que chegou quase a sucumbir aos discursos de seus amigos (Jó 19.2). Assim, vencia na disputa aquele que pudesse comunicar o máximo de força às suas palavras - pouco importando se as razões por ele alegadas eram boas ou más. Contudo, não se deve esquecer que, por trás dessa retórica propagandista, estava a certeza de que a verdade proposta tinha o poder de convencer os ouvintes. Isto vale não menos para os discursos pronunciados na fase das audiências de um processo (§ 8,4) e para as discussões, em forma dialogal, entre os mestres de sabedoria (§ 50,9). a) Assim o discurso político era o que mais se usava para subtrair partidários aos adversários políticos e para enfraquecer o inimigo externo, abalando a confiança em sua liderança. Foi deste modo que agiram [oatão em relação aos siquemitas, propondo a conhecida fábula (Jz 9.7ss; cf. § 47,6), e o enviado do rei da Assíria em relação a Jerusalém colocada sob sítio (2Rs 18.17ss). De acordo com os seus objetivos, tais discursos condenavam o mau procedimento dos chefes anteriores e lhes descreviam as conseqüências perniciosas, para, em seguida, poder exaltar a "nova dominação como sendo a pura felicidade e como um raio de sol" (EISSFELDT). b) O discurso do chefe antes da batalha explicava as razões de sua necessidade, fazendo uma referência a Javé e à herança paterna, que devia ser preservada. Ele expunha aos comandados a certeza do êxito e os exortava à coragem e a que preferissem a morte à derrota. Parece, portanto, que o provérbio: "é preferível um cão vivo a um leão morto" (Ec19.4) era atentamente considerado em suas conseqüências práticas. Discursos, em geral de menor extensão, encontram-se nas palavras de [oab, proferidas antes das duas batalhas contra os amonitas e arameus (25m 10.12), e nas palavras de [osafá, na guerra contra os amonitas e moabitas (2er 20.20), e mais tarde também nos discursos dos Macabeus (lMc 9; 13). Ao inimigo se convida, pelo contrário, a desistir da batalha que lhe é descrita como não tendo possibilidade de êxito (25m 2.25s; 2Cr 13.4ss). De natureza inteiramente diversa é a exortação que, segundo Dt 20.58, se devia dirigir ao exército, explicando que determinados tipos de pessoas deviam voltar para suas casas, a saber: os que houvessem construído uma casa e não a tivessem ainda inaugurado; os que tivessem plantado uma vinha e não tivessem ainda colhido os seus frutos, os que houvessem
§ 11. Os GÊNEROS LITERÁRIOS DE TRANSMISSÃO E COMLNICAÇÃO E SUAS TRADIÇÕES
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desposado uma mulher e não a tivessem ainda recebido, e bem assim os medrosos e os de coração tímido. Esta dispensa se baseava, em última análise, sobre concepções demonisticas, segundo as quais determinadas pessoas-tabus deviam ser excluídas do exército regular". c) O discurso em que um chefe político ou espiritual à hora da morte ou para assumir nova missão, se despedia de seus partidários ou de seu povo, incitava-os, de um lado, com base em referências históricas, a se manterem fiéis à herança dos pais, enquanto, por outro lado, aludia ao dever que haviam cumprido ou tarefas ainda por cumprir. Esta espécie de discurso encontra-se a partir de [osué (Js 23.24), passando por Samuel (lSm 12) e Davi (lRs 2), até os Macabeus (lMc 2). Nenhum desses discursos aparece sob sua forma primitiva, mas sim numa reelaboração teológica posterior ou numa versão não histórica, realizada sob a influência da pregação. Refletem, portanto, o estilo oratório da época em que foram reelaborados ou redigidos.
3. Pregação A pregação dos sacerdotes e levitas, à maneira de discurso religioso, constitui uma mistura de gêneros literários. Foi influenciada pela torá litúrgica e sacerdotal. Mediante considerações históricas, como as que ocorrem nos SI 78 [77] e 106 [l05], transformou-se em sermão de advertência, em face do pano de fundo histórico dessas mesmas considerações. O discurso religioso sofreu também a influência do discurso político, dos oráculos proféticos e do ensinamento sapiencial. Por conseguinte, só em época tardia é que surgiu, evidentemente, o gênero literário correspondente. Este gênero literário aparece pela primeira vez nos fragmentos que servem de moldura ao Deuteronômio e nas seções deuteronomistas dos livros de [osué-Reis. Um de seus aspectos característicos é a maneira de considerar a história no quadro de uma exortação, onde o passado é apresentado como uma cadeia de demonstrações da graça divina, demonstrações que obrigam Israel a uma gratidão constante (ErssFELDT). Em contrapartida não existe nenhuma prédica propriamente profética, nem mesmo de Jeremias e Ezequiel, pois suas palavras foram construídas
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Sobre este tema, cf. W. 215-220.
HERRMANN,
"Das Aufgebot aller Krãfte", ZAW 70 (1958),
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em forma métrica, enquanto a prédica foi formulada em prosa. Mas essa prédica influiu no anúncio profético, visto que muitos dos ditos de Jeremias e de Ezequiel possuem considerável extensão e imitam o estilo do discurso livre.
4. Orações Independentemente do gênero lírico dos salmos que na sua maioria são, como se sabe, propriamente orações, encontra-se também a oração em prosa, que evoluiu do pedido de formulação breve e se aparentava ao provérbio, para composições mais prolixas. Com ErssFELDT, mencionaremos as formas mais importantes, que são a oração de súplica, a oração penitencial e a oração de ação de graças. a) Os elementos principais da oração de súplica, que podemos extrair de [z 16.28, são: a invocação a Javé (na qual se acrescenta o título de Deus); o pedido e a justificativa ou a indicação da finalidade pela qual se suplica. Um outro elemento é também a recordação que se faz a Deus das antigas maravilhas da sua graça (lRs 3.6-9). É sobretudo nas orações posteriores que esta recordação vem expressa e de maneira muito mais difusa e, como a oração toda, também vocabularmente mais rica (cf. 3Mc 6.2ss). Semelhante à oração de súplica é a oração de intercessão, na qual o suplicante apresenta a Deus os desejos e preocupações de outrem e implora as bênçãos para ele, ou na qual o suplicante intervém em nome e em favor de alguém que se tornou culpado (HESSE). Este tipo de oração intercessora já era atribuído a Abraão, qualificado então como profeta (Gn 20.7), e se encontra muitas vezes nos profetas (Am 7.1ss), desde que não tivesse sido proibida (Jr 11.14). b) A oração penitencial, uma forma particular de oração de súplica, é a que implora o perdão da culpa e o afastamento do castigo merecido ou imposto em conseqüência da culpa. Isto se faz mediante a simples confissão da falta (Jz 10.10), logo seguida do pedido de salvação (Jz 10.15) e, por fim, do voto de ação de graças (lSm 12.10). As orações penitenciais se tornam bastante longas em épocas posteriores onde, de novo, se podem acrescentar considerações históricas (Esd 9; Dn 9). c) Não nos foram transmitidos exemplos de orações de ação de graças em sua forma pura, mas o início de oração de Jacó (Gn 32.10-13) e da oração de ação de graças de Davi (2Sm 7.18-29) talvez representem formas de orações de ação de graças. Seus elementos principais são: a invocação a Javé e a insistência sobre a própria indignidade em face da graça
§ 11. Os GÊNEROS
LITERÁRIOS DE TRANSMISSÃO E COMUNICAÇÃO E SUAS TRADIÇÕES
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divina (ação de graças indireta). A oração completa certamente encerrava uma ação de graças direta. A oração pode ser de caráter cultual e apresentar uma formulação fixa, ou pode ser não-cultual e não ter forma específica. Como postura durante a oração mencionam-se o prostrar-se em terra, o ajoelhar-se e o estar em pé ou de braços estendidos, com as palmas das mãos voltadas para Deus ou para o santuário, como gesto de quem procura proteção. Em Dn 6.11,14 menciona-se pela primeira vez a existência de uma oração regular.
5. Cartas É possível saber de que modo surgiu o gênero literário da missiva, através de 2Rs 19.9-14. Fala-se aí de mensageiros do rei da Assíria, que levavam a seguinte incumbência: Assim falareis a Ezequias. Segundo o v. 14, esta mensagem estava contida também numa missiva que foi entregue na mesma ocasião. A missiva surgiu, portanto, da comunicação oral da mensagem. A forma escrita servia para confirmá-la, para comprová-la e para conservá-la. Das missivas israelíticas mais antigas se conservam as frases ou as seções mais importantes. Assim da carta de Davi, dita de Urias, tem-se 2Sm 11.15; das cartas do rei arameu ao rei israelita conserva-se 2Rs 5.5s; da carta de [eú aos magistrados da cidade de Samaria resta 10.2s, e da carta de Jezabel aos anciãos de Jezrael tem-se 1Rs 21.8-10. Existe uma carta completa de Jeremias dirigida aos deportados de Babilônia, numa forma ampliada posteriormente (Jr 29.1-14), e mais as partes de duas outras cartas, em [r 29.24-32. O estilo epistolar depende do babilônico e é totalmente idêntico a ele. A introdução da missiva contém o nome do remetente e do destinatário, bem como uma fórmula de saudação ou uma expressão de afeto. Seguem-se a parte principal, introduzida por um ur'ãitã, "e agora", talvez como na referida carta de [eú (2Rs 10.2s), e por uma fórmula de conclusão. Da época dos persas provêm as cartas dirigidas ao soberano persa, com as respectivas respostas (Esd 4-6). Outros tipos de cartas da época helenística e romana se encontram na literatura judaica fora do âmbito do AI. Embora historicamente estas cartas não mereçam crédito, oferecem, contudo, a forma epistolar da época de seus autores. Encerram, portanto, fórmulas pérsicas e helenísticas que refletem o estilo das chancelarias imperiais, pois se trata principalmente de cartas diplomáticas. Há alguns
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anos encontraram-se nas grutas do deserto de [udá cartas que datam da época de Barcoqueba, das quais algumas mesmo de sua autoria, e que, com razão, provocaram viva sensação.
6. Epístolas A epístola não deriva de uma determinada situação nem possui remetente e destinatário históricos como a carta. Era mais um tratado, que de uma carta tinha apenas a aparência, sem as fórmulas de introdução e de conclusão, e se destinava à publicidade. Do AT podemos citar, como únicos exemplos de epístolas, o pretenso edito de Nebucadenezar (Nabucodonosor; Dn 3.31[98]-4.34), que é uma narrativa permeada de motivos hinológicos a respeito da soberania transitória e terrena, eterna e divina do monarca, e a carta festiva de Est 9.20ss, recomendando que se celebrasse a festa dos Purim. Trata-se, portanto, de um gênero literário bastante recente. Sua origem situa-se no mundo grego, onde, segundo Heródoto (séc, V a.C) e Górgias (cerca de 480-375), já se achava plenamente desenvolvido em Isócrates (436-338). Seu emprego no AT é sinal da influência greco-helenística".
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§ 12. Os GÊNEROS
LITERÁRIOS NARRATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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1. Suas relações em comum As relações mútuas entre os gêneros literários narrativos são determinadas, de um lado, pelo fato de que o mito e o conto, a saga e a lenda constituem formas originais de narração. Por outro lado, porém, o mito se situa, antes de tudo, em eras remotas e imemoriais, ao passo que o conto paira no tempo e no espaço, e a saga brota do caráter peculiar e da importância de certos fatos ou acontecimentos singulares, ocorridos no tempo e no espaço. Embora se encontre por vezes a tendência a estabelecer, em linha de princípio, uma distinção entre estas formas de narrativas, contudo não é possível traçar rigorosamente os seus limites. Não há dúvidas de que a saga, com seu conteúdo vinculado ao espaço e ao tempo, e repor-
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tando-se principalmente a determinados personagens, acontecimentos e lugares históricos, distingue-se, com bastante clareza, tanto do mito, que representa um acontecimento divino, fundamental para a existência humana, como do conto, que se movimenta no mundo da fantasia. Na prática, porém, as fronteiras entre esses gêneros literários são Imprecisas'?', Isto vale de modo particular para as relações entre a saga e a lenda, pois essa última propriamente nada mais é do que uma forma singular da primeira, que se refere a pessoas, lugares, épocas e instituições de significado religioso ou sagrado. Por isso, a saga e a lenda são consideradas em conjunto. Além disso, é preciso ter presente que no Antigo Oriente e em Israel não existia, em absoluto, ou pelo menos rigorosamente falando, diferença entre as diversas formas de narrativas em particular, e mesmo entre essas formas e os gêneros literários informativos (§ 13). De todos os modos possíveis narravam-se ou se relatavam acontecimentos do passado, dos quais se admitia que teriam ocorrido desta ou daquela forma. Por isso existem sagas de conteúdo mítico, como sejam as narrativas do casamento de seres celestes com mulheres humanas (Gn 6.1-4), as narrativas do dilúvio (ô.ôss), da construção da torre e da cidade de Babel (11.1-9), bem como outros fragmentos da história dita dos primórdios. De colorido mítico são as narrativas nas quais Deus aparece sobre a terra e trava relações com os homens - sob forma humana, com sentimentos humanos e necessidades humanas, e praticando ações humanas-'". Pensa-se miticamente quando se apresenta Javé falando com seres celestiais, com animais (como a serpente, no jardim de Deus) e com seres humanos, e, mais particularmente, quando ele se deixa hospedar por Abraão, ocasião em que come e bebe com ele. Também as sagas e lendas contêm, não raro, elementos do conto fabuloso, como nos casos da vara milagrosa de Moisés (Ex 4.1-9) e do manto com que Elias dividiu as águas (2Rs 2.8). Assim dificilmente se pode sustentar a opinião de que o mito foi historicizado no AT (WEISER), do mesmo modo como, inversamente, a história não foi mitologízada!". Ao contrário dessas colocações "modernizantes", Israel não fazia, evidentemente, nenhuma distinção fundamental entre as diversas formas em: RGG V, 1961, 32 ed., 1300. 101 J. LINOBLOM, "Die Vorstellung vom Sprechen [ahwes zu den Menschen im Alten Testament", ZAW 75 (1963),263-288. 102 H. RINGGREN, Israelitische Religion, 1963, 102. 100
C-Mo
EOSMAN
§ 12. Os GÊNEROS
LITERÁRIOS NARRATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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narrativas, mas se utilizava indiferentemente de motivos míticos e fabulosos, como a saga, a lenda e os relatos de acontecimentosl".
2. Mito
o mito se passa no mundo dos deuses, que têm, no mínimo, uma participação decisiva no acontecimento narrado. Este acontecimento não é único, mas exemplar, típico, e sempre se repete, sendo, porém apresentado como acontecimento irrepetível e original. Torna-se visível e captável mediante a personificação e a descrição dos destinos dos deuses e heróis, na medida em que esta descrição e personificação são vividas como origem de determinadas experiências e fenômenos existenciais. Pressupostos do mito são o politeísmo, e até certo ponto, e na medida em que este está ligado ao rito, também o pensamento mágico-cultual, segundo o qual os fatos tipológicos são provocados e se tornam presentes com a celebração dos ritos e com a narração dos mitos. Não existe em Israel nenhum mito que seja conhecido em sua totalidade ou por referência a ele. Parece que Israel não produziu nenhum mito, embora tivesse condições para isto, e não menos que os outros povos do Antigo Oriente. As descrições das teofanias, das aparições de Deus nos permitem, de algum modo, reconhecer a existência destas predisposições (Ex 19; 33.19ss; [z 5.4s; 51 18[17].8ss). Na fé javista faltavam os pressupostos para a formação do mito: o politeísmo e a magia. Visto que Javé era o único a reivindicar e a ter o direito exclusivo à veneração, e que, em épocas mais antigas, fora dele só se admitiam uns poucos deuses subalternos, dotados de algum poder, e ainda: visto que, a partir de Isaías e Jeremias, não se admitia nenhum outro deus além de Javé, era de todo impossível surgisse qualquer mito em Israel. O que há de mítico no patrimônio do AT foi assumido de fora, por Israel, principalmente da Mesopotâmia e de Canaã. A este respeito é preciso distinguir entre a ocorrência do mito nas narrativas e nas profecias escatológicas, de um lado, e nos salmos, do outro. a) Nas narrativas, a existência do elemento mítico se limita praticamente à história dos primórdios (Gn 1-11), história que constitui uma com103
Cf. K.-H. BERNHARDT, "Elemente mythischen Stils in der alttestamentlichen Ceschichtsschreibung", WZ Rostock 12 (1963), 295-297. R. A. F. MACKENZIE, Faith and History in the Old Tesiameni, 1963, mostra detalhadamente o entrelaçamento entre mito e história.
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CONDIÇÕES GERAIS
pilação de sagas de conteúdo mítico na qual se pretende tratar de acontecimentos de natureza fundamental. Na primeira narrativa da criação (1.12.4a), as trevas e as águas, entendidas como características do estado caótico primitivo, o aparecimento do cosmos pela divisão das águas primordiais, a construção do mundo ordenado, e a obra dos sete dias nos revelam o seu parentesco com os mitos. Na segunda narrativa da criação e do paraíso, (2.4b-3.24), temos, no mesmo sentido, o homem formado da terra, a vinculação singular da formação da mulher a partir da costela do homem, com seu título de mãedos viventes; os alimentos destinados à vida; a sedução do homem pela mulher; o bosque sagrado, defendido por seres celestes, e a não-consecução da desejada igualdade com Deus. Enquanto para a narrativa dos gigantes nascidos da união de seres celestiais com as filhas dos homens (6.1-4) não existe nenhum paralelo, embora se perceba que no fundo há um mito, para a narrativa do dilúvio (6.5-9.17), há mais de nove decênios, está comprovada a origem mesopotâmica. Nessa narrativa, as semelhanças chegam até aos detalhes. Também o relato da construção da torre e da cidade de Babel muito provavelmente se baseou em um mito. O grandioso complexo destas narrativas, que se costuma considerar como a obra propriamente dita dos narradores bíblicos, inspirou-se na epopéia de Atrahásis, o "sumamente sábio", epopéia esta que constitui, ao mesmo tempo, a sede da narrativa do dilúvio. A biblioteca de Assurbanípal conservava certamente mais de um poema épico, que se pode remontar, através de uma versão veterobabilônica (1550), a uma versão suméria mais antiga (cerca de 1700) e mais breve'?', A epopéia começa com a criação do homem, proposta pelos grandes deuses Anu, Enlil e Ea, e é realizada pela deusa-mãe com a ajuda de Ea. A cultura começa com a fundação de cinco cidades (cf, Gn 4.17), as quais, segundo a lista sumérica dos reis, foram governadas por oito monarcas antes da inundação (cf. Gn 5). Mas, crescendo a humanidade, seu rumor incomodou o deus Enlil, e lhe perturbou o sono. Para fazer seu número diminuir, os deuses decretaram um período de seis anos de fome. Mas como essa medida não bastasse, eles enviaram o dilúvio, para extirpar a raça odiada. Antes, porém, que isto acontecesse Ea revelou o plano a seu protegido, que construiu
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Cf. J. LAESSOE, "The Atrachasis Epic: a Babylonian History of Mankind", BíOr 13 (1956),90-102. - W. G. LAMBERT, "New Lighton the BabylonianFlood",JSS 5 (1960), 113-123.
§ 12. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS NARRATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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um barco e conseguiu salvar-se com a família. É fácil de observar que esta epopéia, na qual devia haver ainda a descrição de outras cenas, apresenta o mesmo roteiro dos acontecimentos bíblicos, desde a criação até o dilúvio, e isto na mesma seqüência de Gn 1-9. Deste modo, ao modelo babilônico correspondem não apenas cada uma das narrativas da história bíblica dos primórdios, como também sua seqüência e sua estruturação. Contudo, os motivos e narrativas míticos não foram assumidos por Israel sem alterações. Pelo contrário, foram incorporados à fé javista, e desvinculados do politeísmo e postos em relação com o Deus uno de Israel, de modo que o mito cosmogônico passou a estar subordinado evidentemente à fé no Criador. Esta fé, porém, encontra-se vinculada, por sua vez, às relações existentes entre Deus e o homem, entendidas como o agir de Deus na vida e nos destinos da humanidade e dos povos. O mito, portanto, não foi" historicizado», mas transferido da relação politeísta para a relação pessoal entre Deus e o homem. b) Fora da história dita dos primórdios, é somente a partir de Ezequiel que se utilizam novamente motivos míticos, sobretudo nas profecias escatológicas e nos salmos da época exílica e pós-exílica. A existência dessas tradições pode ser considerada, portanto, simplesmente como um dos indícios da origem posterior desses textos, principalmente porque esta presença parece apoiar-se em um estado de consciência alterado e influenciado, para não dizer provocado, pela deportação e pela situação de diáspora. Assim, é possível que o Dêutero-Isaías aluda, em uma determinada setença, primeiramente à luta mítica e, na conclusão, ao milagre do Mar Vermelho, por ocasião do êxodo; portanto, a um fato histórico, ao passo que o versículo intermediário estabelece a ligação entre os dois Os 51.9s). Aí não se faz nenhuma distinção entre os dois motivos. Para os detalhes, usam-se motivos míticos, quando se descrevem os feitos de Javé, à semelhança dos deuses, como, p.ex., a luta de Javé contra os monstros do caos Os 27.1; [ó 3.8) ou quando se descrevem poeticamente os fenômenos da natureza. (SI 19.5ss). Tais motivos míticos possuem importância apenas secundária e auxiliar. Eles apresentam motivos paralelos cuja finalidade é visibilizar e elucidar os motivos escatológicos, pois nos acontecimentos futuros se desenrolará algo de inteiramente desconhecido e quase inimaginável. Pode-se, no entanto, colocá-lo em relação com os acontecimentos míticos de épocas remotas, porque o agir de Javé em determinada época haverá de se repetir e seu agir futuro tornar-se-á compreensível à luz do que aconteceu no passado.
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3. Conto A terra e o universo dos homens são o palco onde o conto se desenrola. No conto só aparecem seres divinos inferiores, que estão para com o homem numa relação imediata de amizade ou inimizade. O conto não está ligado nem ao espaço nem ao tempo nem às leis da causalidade. No conto, se confundem realidade e fantasia. Quase se poderia dizer que o conto é um mito que se passa no âmbito terreno e humano, com desfecho favorável. Como para o mito, parece que Israel também não criou um conto, embora tenha assimilado muitos elementos do conto e da fábula. De origem egípcia é o tema da mulher impudica que procura corromper um jovem e, em seguida, o odeia, desejando aniquilá-lo, quando ele, por gratidão ao marido dessa mulher, resiste à tentação (Gn 39.7ss). De origem índica é a sentença proferida por Salomão a respeito da criança disputada por duas mulheres (lRs 3.16ss). A história apócrifa!" de Tobias utilizou um conto muito difundido na época, cujo tema era o do morto agradecido. Devemos, no entanto, observar que nenhum dos contos foi assumido em sua forma pura. Ou se acham incorporados no conjunto de uma grande exposição histórica ou lendária, como os que acima indicamos, ou a respeito de seus elementos nada mais se pode constatar senão uma certa influência e sua sobrevivência no seio de outros gêneros literários. De modo particular foram utilizadas as seguintes espécies de temas do conto (HEMPEL): temas mágicos, como a vara miraculosa de Moisés (Ex -l.Iss), o manto de Elias, a cujo toque as águas se separam (2Rs 2.8), a panela de farinha e a ânfora de óleo que jamais se esgotavam nem se esvaziavam (lRs 17.16; 2Rs 4.15s); temas de metamorfoses fabulosas, de que se tem uma ilustração no caso da mulher de Ló transformada numa coluna de sal (Gn 19.26); temas fabulosos, concernentes à distinção entre certas categorias sociais, como o das narrativas de Caim e Abel (agricultor e pastor) ou de Jacó e Esaú (pastor e caçador), onde se fala de amizade e de astúcia (Gn 4.15s; 25.27ss; 27). Tal qual nos contos de desfecho feliz, Saul, filho de um camponês, além de recuperar as jumentas extraviadas do pai, encontra também uma coroa de rei (lSm 9), e um outro jovem, também camponês, golpeia um gigante, em troca de uma bolsa cheia de ouro, ou da mão da filhinha do rei (lSm 17). É do conto, cujo tema são animais, que provém a
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Veja-se nota do editor sobre os Deuterocanônicos, na p. 685 (N. do T.).
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narrativa da jumenta falante de Balaão (Nm 22.28ss). Aparentadas com este gênero são as fábulas de plantas e animais, de que mais adiante falaremos, quando tratarmos dos gêneros sapienciais (§ 47,6).
4. Novela A novela tem de comum com o conto o fato de que ambos descrevem o destino do indivíduo dentro de um acontecimento de caráter universal, e da maneira como o mesmo possa vir sempre a ocorrer; portanto, não como um acontecimento que sobreviverá como memória histórica, mas como um fato que se verifica no aqui e no agora, mas de forma universalmente válida. Diferentemente, porém, do conto fabuloso, a novela não olha o mundo e o homem através das lentes do desejo e do maravilhoso, mas os apresenta realisticamente, tais como surgem diante do narrador. Assim é sobretudo o acontecimento e seus efeitos sobre o homem que a novela descreve, sendo este último representado de maneira bastante passiva e reagindo em face do destino. O melhor exemplo neste sentido se encontra na série de narrativas em torno de José e seus irmãos (Gn 37; 3948; 50). Podemos mencionar ainda o livro de Rute e a narrativa que serve de moldura ao livro de [ó,
5. Anedota A estória (a anedota), ao contrário dos demais gêneros literários até agora mencionados, fixa-se em torno de determinados fatos e pessoas. À diferença da novela, a estória faz o homem intervir pessoalmente nos acontecimentos e dominar as situações. Ela caracteriza o homem que age com decisão ou fala com precisão e brilhantismo. Como exemplo de tais estórias, podemos citar algumas das narrativas ligadas à pessoa de Sansão, a saber: de como ele largou no campo dos filisteus diversas raposas com fachos acesos amarrados às caudas, e de como arrancou os batentes da porta de Gaza (Jz 15.1ss); e, além destas, também as narrativas a respeito do comportamento magnânimo de Davi para com 5aul (TSm 24; 26) e sua atitude com relação aos feitos de seus heróis (25m 23.8ss).
6. Saga e lenda As sagas e as lendas constituem a parte principal dos gêneros narrativos do A T. Podemos dividí-las em seis categorias principais.
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A. Entre as sagas referentes aos lugares e à natureza, podemos já incluir a narrativa que se constituiu a partir do mito da construção da cidade e da torre de Babel (Gn 11.1-9), narrativa esta que se destinava a explicar a origem da grande cidade com a gigantesca torre de seu templo e o sentido de seu nome. A narrativa de Sodoma tinha por fim esclarecer a origem do Mar Morto, a esterilidade e o abandono da região ao redor, as particularidades e a origem de uma coluna de sal com traços humanos, existente na região montanhosa a sudoeste do país (Gn 19). Encontram-se ainda duas referências ao nome da cidade de Bersabéia, na narração do pacto de Abraão com Abimelec de Gerara (Gn 21.22-31). A primeira parte desse nome se refere, sem dúvida, a um poço (be'er), cuja posse era disputada. A segunda parte, porém, vem explicada, por um lado, com base em um juramento solene (Sb') que selava o pacto e marcava o fim da contenda, encontrando-se, por outro lado, estreitamente ligada ao número sete (seba'), isto é, o número dos cordeiros que Abraão pôs de parte. Deste modo, o nome Bersabéia deve ser entendido como o "poço do juramento" ou o "poço dos sete". B. As lendas referentes ao santuário tratam igualmente de um determinado lugar e deviam explicar por que o santuário era tido como sagrado. A esta categoria pertencem as narrativas da manifestação do EI-Roí a Agar em Laai-Roí (Gn 16.7ss), da manifestação a jacó em Betel (Gn 28.10ss), da luta noturna de Jacó em Fanuel (Gn 32.25ss), e da construção do altar por ele, em Siquém e em Betel (Gn 33.18ss; 35.1ss). Em geral a descrição trata da manifestação de uma divindade que habita em determinado sítio, manifestação pela qual o interessado toma consciência, ao mesmo tempo, da santidade do local e do desejo da divindade de que este lugar seja venerado no futuro. Nos tempos de então eram correntes as lendas desta espécie (hieroi lógoi) a respeito de todos os antigos santuários. Contudo, a concepção posterior que procurava justificar a razão da exclusividade do templo de Jerusalém fez com que muitas destas lendas fossem eliminadas ou recebessem uma nova interpretação. Assim, se transferiu a construção do altar em Garizim, o monte das bênçãos, para Ebal, o monte das maldições (Dt 27.5-7), e se fez remontar a um roubo a origem dos símbolos do culto do santuário oficial de Dan, no norte de Israel (Jz 17s). C. As lendas a respeito do culto deviam justificar a existência de um determinado culto ou de um rito: assim, explicava-se a presença da imagem de uma serpente, no templo de Jerusalém até cerca de 700 a.c., como sendo de certo demônio da cura, partindo de um acontecimento da época de Moisés (Nm 21.4ss), ou o costume da circuncisão, partindo de certos
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atos de Abraão (Gn 17), da mulher de Moisés (Ex 4.24-26) e dos israelitas, ao fazerem sua entrada na região ocidental do [ordão Os 5.2-9). A importância singular de que se revestia o templo de Jerusalém se percebe no fato de o fogo de seu altar ter sido acompanhado durante séculos: desde o fogo que desceu sobre a tenda da revelação (Lv 9.24), passando pelo momento em que foi conduzido ao templo de Salomão (lRs 8.4) e pela ocasião em que foi salvo numa cisterna pelos sacerdotes, após a destruição da cidade pelos babilônios, até a ocasião em que Neemias o mandou acender de novo (2Mc 1.19ss), para continuar a arder até à destruição definitiva do templo. D. A saga das tribos e do povo é de particular importância para Israel. Ela deriva da concepção de que cada tribo e cada povo possuíam um chefe ancestral cujos traços essenciais e cujo destino se representam, se fundam e se refletem naqueles da comunidade. Por isso, a saga aparece ligada a um personagem histórico ou fictício. Isto vale sobretudo para aquelas narrativas a respeito da época dos patriarcas. Aí se pode ver claramente que o que se tem em vista são, na realidade, tribos e povos, como nos casos da bênção e da maldição dos filhos de Noé (Gn 9.25ss), da geração e do nascimento de Amon e Moab (Gn 19.30ss), da adoção de Efraim e Manassés por Jacó (Gn 48), e nas séries mais extensas de sagas, bem como nas narrativas em torno de Agar e Ismael, de Jacó e Esaú, e de Jacó e Labão. E. A saga dos heróis constitui a segunda espécie mais importante, ao lado da saga relativa às tribos e povos e começa com a época mosaica. Aqui devemos mencionar a vitória sobre os amalecitas (Ex 17.8ss) e o despedaçamento das tábuas do decálogo (Ex 32). A grande época deste tipo de saga é aquela da conquista da Palestina e da afirmação de Israel em face dos cananeus, filisteus e outros inimigos; a época, portanto, que vai de [osué a Davi (cf. [s 10; [z 3-16; 1Sm 11; 13-14; 1Rs 22.34s). Muitas das coisas narradas desta época trazem, enquanto gênero narrativo, as características da saga, com o que, porém, não se emite um juízo negativo a respeito da historicidade daquilo que elas narram. F. As lendas de caráter pessoal giram em torno de sacerdotes, profetas e mártires enquanto figuras religiosas. As poucas lendas sacerdotais, ou não são favoráveis à instituição sacerdotal, como a narrativa a respeito do ateísmo dos filhos de Eli (lSm 1-3), ou provêm de círculos sacerdotais e têm por fim provar a existência de certos direitos, como as narrativas da sublevação de Coré contra Moisés e Aarão, e também demonstrar o direito sacerdotal de Aarão, mediante o florescimento de uma
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vara (Nm 16s). Nos livros de Samuel, dos Reis e das Crônicas encontram-se numerosas lendas a respeito dos profetas. Ao lado dos profeta. que são mencionados apenas uma vez, as figuras clássicas são Elias, Eliseu e Isaías, descritos, ora como forças propulsoras dos acontecimentos políticos, ora como auxiliadores e como taumaturgos. A lenda dos mártires surgiu em época tardia, principalmente a partir da opressão e da perseguição à religião judaica, movida pelos soberanos selêucidas. Algumas lendas desse tipo, aliás de feliz desfecho, estão na base de diversas narrativas do livro de Daniel, que surgiu nessa mesma época. Mas não poucas sagas e lendas (excetuando-se em princípio as sagas dos heróis) têm por finalidade explicar a origem ou a causa de alguma coisa, de um fato. Elas apresentam características etiológicas. Em particular, devem esclarecer: a) a existência de certos fenômenos da natureza, como, por exemplo, a mudez da paisagem do Mar Morto; b) o significado de certos nomes de lugares e pessoas, como o nome de Bersabéia ou o nome de Moisés (Ex 2.10; com o verbo masã) "eu te retirei [das águas]"); c) a existência de certos lugares, usos e objetos do culto, como, por exemplo, a imagem da serpente de bronze; d) certas particularidades de uma tribo ou de um povo, como, por exemplo, o habitat dos ismaelitas, pela fuga de Agar. Que grande parte das tradições referentes à história antiga de Israel seja de natureza etiológica pode-se considerar como fato provado desde há muito (GREssMANN, GUNKEL). O que se discute, porém, é quanto à possibilidade de uma força geradora da saga por parte da etiologia, e se é possível captar um acontecimento "real", subjacente, eliminando-se os traços etiológicos'?". Foram somente etiologias que criaram e formaram as sagas que se ocupam das mesmas, de modo que devemos considerá-las de antemão como historicamente inverossímeis, ou se podem, pelo contrário, eliminar os traços etiológicos, de sorte a se encontrar sob eles uma narrativa histórica? Ora, é preciso distinguir claramente entre aquilo que nas narrações são apêndices etiológicos, e aquilo que constitui as narrativas etiológicas em seu todo. O primeiro exemplo neste sentido encontramos na explicação do nome de Moisés, na narrativa de seu nascimento e de sua descoberta, à beira do rio. A explicação
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Cf., p.ex., J. BRIGHT, Altisrae/ in der neuren Geschichtsschreibung, 1961 (inglês: 1956). - M. NOTH, "Der Beitrag der Archãologie zur Geschichte Israels", VT5upp/7, 1960, 262-282. - Sobre o problema: S. MOWINCKEL, Tetrateuch-Pentateuch-Hexateuch, 1964, 78-86.
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não produziu a narrativa; antes, foi adicionada a ela. O segundo exemplo se acha em Gn 21.22ss que desde o início está orientado para a explicação do nome de Bersabéia, e desenvolve a etiologia no decorrer da narração, de sorte que a narração brota da intenção e se dirige para o objetivo. Resulta, em princípio, que as etiologias que foram acrescentadas não provocaram uma determinada narrativa, mas lhe foram adicionadas quando a mesma já existia. As narrativas que se originaram de etiologias são etiológicas em seu todo, e desenvolvem uma explicação no correr da exposição. Se prosseguirmos com a nossa pesquisa a respeito dos contextos históricos da tradição, veremos que numerosas sagas e lendas têm origem não-iraelítica. A narrativa da exposição e da salvação do menino Moisés segue um esquema bastante difundido e cujos traços fundamentais já se encontram na história do nascimento do rei Sargão da Acádia (cerca de 2350). Israel assumiu dos cananeus algumas sagas referentes a lugares e à natureza, como, por exemplo, a narrativa de Sodoma e sobretudo as lendas dos santuários e do culto. Toda uma série de santuários, como Betel e Siquém, Bersabéia e Hebron-Mambré tinham sido locais sagrados para os cananeus, antes que o viessem a ser para os israelitas, como no-lo demonstram repetidamente as descobertas arqueológicas. Juntamente com os santuários, também suas lendas passaram aos novos donos e em lugar das antigas divindades de Canaã os conquistadores introduziram seu Deus Javé como o Deus que se revela, e reportaram a revelação às figuras dos primórdios da própria história, principalmente dos patriarcas enquanto recebedores da revelação e fundadores do culto. Ademais, no seio do próprio Israel formaram-se numerosas sagas e lendas, principalmente em grupos israelitas, sagas em torno de tribos, do povo e de heróis. As sagas e as lendas, assumidas ou próprias, foram reelaboradas de diversos modos num longo e progressivo processo histórico-tradicional. Neste processo, porém, quatro foram os princípios que desempenharam papel de relevo: a) As sagas e lendas foram adaptadas aos aspectos pessoais da fé javista e "personalizadas". A lenda do santuário de Betel aparece, por conseguinte, como uma experiência vital de Jacó. Na narrativa do defloramento de Dina e da vingança que se segue (Gn 34), Siquém, o apaixonado pela jovem; os irmãos enraivecidos pelo ultraje cometido; Jacó, o pai que pressente o mal iminente são descritos de modo tão vivo, como pessoas individuais, que já quase não se tem mais a impressão de que aí se trata de grupos tribais ou de povos.
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b) As sagas e as lendas foram colocadas em relação com Israel, com seus antepassados, suas tribos; foram, portanto, "nacionalizadas", precisamente na medida em que isto se fazia necessário. A novela de José descreve a situação egípcia com grande realismo, se é que não a desenvolveu propriamente a partir de uma narrativa egípcia. Mas tudo isso foi posto a serviço da apresentação da história de Israel e de seus antepassados. c) As sagas e lendas foram "javistizadas", na medida em que isto era necessário, isto é, foram relacionadas com Javé, o Deus de Israel. Assim o explica Jacó, em Betel, depois da experiência do sonho: Verdadeiramente, Javé está presente neste lugar, e eu não sabia. Segue-se então a explicação do nome do lugar: Então ele deu àquele lugar o nome de Betel ("Casa de EI"). A julgar por aqui, aquele santuário fora consagrado em outros tempos ao deus EI e dele recebeu o seu nome. Quando se fez a transposição da narrativa para Jacó, permaneceu o nome do lugar, mas Javé substituiu El. d) As sagas e lendas foram entendidas, em escala crescente, em sentido religioso, e mesmo "teologizadas". Quase sempre Deus desempenha um determinado papel, ou mesmo o papel essencial, e a exposição se torna mais profunda. Enquanto a epopéia de Atrahásis nos diz que os deuses decretaram o dilúvio porque o sono de Enlil fora perturbado pelo barulho dos homens, o javista aponta como motivo do mesmo a ira sagrada de Deus contra os pecados dos homens, nos quais todos os pensamentos do coração estão continuamente voltados para o mal (Gn 6.5ss).
7. Significação histórica e teológica Por fim colocam-se, para os gêneros literários narrativos os problemas de saber quais são as suas relações com a história e qual a sua significação teológica. a) A primeira destas questões se responde por si mesma e em sentido negativo, na parte em que tratamos do mito, do conto fabuloso e da novela. Mas também as sagas de lugares e fenômenos da natureza, as lendas concernentes a santuários e ao culto, nascidas de fatos que existiram historicamente e que reclamavam explicações, não podem, como sempre, reivindicar uma credibilidade histórica. As sagas ligadas a tribos e povos, bem como a saga histórica e a lenda pessoal giram, ao contrário, muitas vezes em torno de uma história real. Quando existem, estão a indicar uma história, e onde aconteceu uma história, surgiram histórias que depois foram repetidas. Portanto, nestas sagas pode-se seguramente ouvir o eco de um acontecimento histórico. Se e até onde este acontecimento pode ser
§ 12. Os GÊNEROS
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captado é um problema a ser elucidado em cada caso. O valor histórico de complexos narrativos semelhantes entre si como também o quadro histórico que dos mesmos resulta, podem ser bem diversos daquilo que se esperava 107. Não se consegue determinar se durante o longo processo de desenvolvimento e de elaboração, desde a narrativa individual primitiva até os livros históricos atuais, os narradores e os redatores estavam cônscios da credibilidade histórica daquilo que narravam. Trata-se, em última instância, de uma questão moderna que não os atingia, pois eles não in tencionavam expor ou escrever "história". Para os primeiros narradores, suas exposições tinham por finalidade, antes do mais, justificar as pretensões israelíticas a respeito da terra de cultura e de seus santuários, e também legitimar essa posse e a prática de determinados usos cultuais. Para os últimos narradores, como, por exemplo, os redatores dos "estratos fontes" do Pentateuco, tudo se concentra sob o ponto de vista de uma determinada concepção teológica global predominante, que se diversifica nos detalhes. Era nessa teologia, e não na história, que eles estavam interessados. b) A significação teológica dos gêneros narrativos está em conexão com o seu enquadramento no contexto da fé [avista, Independentemente de sua situação na vida (Sitz im Leben), ela consiste no fato de que se elaboraram enunciados religiosos a respeito de Javé e de Israel, de Deus e do homem, para os quais as narrações forneceram o material. Aquilo que constitui sua força de repercussão não são lembranças de fatos do passado, mas a convicção de que existe uma relação contínua entre Deus e o homem. Por terem sido eles colocados em relação com Israel ou com figuras individuais israelitas, a narração destes fatos têm como finalidade descrever as relações que existem entre Javé e Israel, tanto no "bem como no mal, o agir de Javé para com Israel no âmbito das nações, e a obediência ou a defecção de Israel ou de cada israelita em face de Deus. Surge aqui ainda um outro ponto de vista, especialmente com relação às sagas das tribos e dos povos (ErssFELDT): em sua utilização foram realçados os elementos universalmente humanos, com o que as narrativas adquiriram uma validade que vai muito além de Israel. Elas aparecem, não apenas como reflexo dos destinos de Israel, em uma determinada fase do seu passado histórico, mas como a descrição de destinos e de 107
Cf. G. FOHRER, Elia, 1957. - lo., Das Buch Jesaja, 11 1962. (sobre Is 36-39). - lo., Überlieferung und Geschichte des Exodus, 1964.
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qualidades que se repetem sempre, e que nos mostram o homem em suas vinculações familiares. Por fim, no seguimento da elaboração teológica, as figuras dos patriarcas se tornam simplesmente modelos de comportamento existencial para o homem. Abraão é descrito como o modelo de fé, mesmo que alguma vez tenha fracassado como tal. Isaac é apresentado como modelo do homem paciente e acolhedor e Jacó como o modelo do homem que espera com perseverança e que procura realizar suas esperanças primeiramente de modo muito humano, para depois colocar sua esperança e sua persistência, em Deus. E de forma muito mais clara ainda, a novela de José traça a sua evolução interior, indo do homem arrogante ao homem humilde. É por este processo que as narrativas adquirem uma importância que vai muito além de seu significado original, passando assim a valer para os homens de todas as épocas.
§ 13. OS GÊNEROS LITERÁRIOS INFORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES M. ADINOLFI, "Storiografia biblica e storiografia classica", Riv Bibl 9 (1961),42-58. - W. F. ALBRIGHT, "The List of Levitic Cities", em: Ginzberg [ubilee, VaI. I, 1945,49-73. - A. ALT, "Israels Gaue unter Salomo", em: BWAT 13, 1913, 1-19 (= Kleine Schriften, I 1953,76-89). - lo., "Judas Gaue unter Josia", PJB 21 (1925), 100-116 (= ibid. 11 1953, 276-288). lo., "Eine galilãische Ortsliste in [os 19", ZAW 45 (1927), 59-81. - lo., "Bemerkungen zu einigen judãischen Ortslisten des Alten Testaments", ZDPV 68 (1959), 193-210 (= Kleine Schriften, 11 1953, 289-305). lo., "Festungen und Levitenorte im Lande [uda", em: Kleine Schriften, 11 1953, 306-315. - lo., "Die Deutung der Weltgeschichte im Alten Testament", ZThK 56 (1959),129-137. - W. BRANDENSTEIN, "Bemerkungen zur Võlkertafel der Genesis", em: Debrunner-Festschrift, 1954,57-83. - A. CAQUOT, "Les songes et leur interprétation selon Canaan et Israel", em: Les songes et leurinterprétation, 1959,99-124. - B. DINUR, "The Biblical Historiography of the Period of the Kingdom", em: A. MALAMAT (ed), The Kingdoms of Israel and Judah (hebr.), 1961, 9-23. - H. DUHM, "Zur Geschichte der alttestamentlichen Geschitsschreibung", em: Pluss-Festschrift, 1905, 118163. - E. L. EHRLICH, Der Traum im Alten Testament, 1953. - O. EISSFELDT, Geschichtsschreibung im Alten Testament, 1948. - lo., Die Genesis der Genesis, 2il ed., 1961. - K. ELLIGER, "Die dreissig Helden Davids", PJB 31 (1935),29-75. - H. GESE, "Geschichtliches Denken im Alten Orient und im Alten Testament", ZThK 55 (1958), 127-145. - M. HARAN, "Studies in the Accout of the Levitical Cities", JBL 80 (1961), 45-54, 156-165.
§ 13. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS INFORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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- G. HÓLSCHER, Die Anfiinge der hebriiischen Geschichtsschreibung, 1942. - E. JACOB, La tradition historique en Israel, 1946. - lo., "Histoire et historiens dans l'Ancien Testament", RHPhR 35 (1955), 26-35. - lo., "L' Ancien Testament et la vision de l'histoire", RThPh 7 (1957), 254-265. - A. JEPSEN, Die Quellen des Konigsbuches, 2a ed., 1956. - R. KITTEL, Die
Anfiinge der hebrãischen Geschichtsschreibung im Alten Testament, 1896. - B. MAISLER, "Ancient Israelite Historiography", IEJ 2 (1952), 82-88. - G. MISCH, Geschichte der Autobiographie, I: Das Altertum, 3i1 ed., 1950. - S. MOWINCKEL, "Die vorderasiatischen Kõnigs- und Fürsteninschriften", em: Gunkel-Festschrift, I 1923, 278-322. - lo., "Hat es ein iraelitisches Nationalepos gegebens", ZAW 53 (1935), 130-152. - lo., Studien zu dem Buche Ezra-Nehemia, 1-11 1964; III 1965. - M. NOTH, - Das System der zwolf Stiimme lsraels, 1930. - lo., "Studien zu den historisch-geographischen Dokumenten des [osuabuches", ZDPV 58 (1935), 185-255. - lo., "Der Wallfahrtsweg zum Sinai", PJB 36 (1940), 5-28. - G. VON RAO, "Der Anfang der Geschichtsschreibung im alten Israel", AfK 32 (1944); 1-42 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1958, 148-188). - lo., "Die Nehemia-Denkschrift", ZAW 76 (1964), 176-187. - R. RENOTORFF, "Ceschichte und Überlieferung", em: von Rad-Festschrift, 1961, 81-94. - lo., "Geschichte und Wort im Alten-Testament", EvTh 22 (1962),621-649. - A. RESCH, Der Traum im Heilsplan Gottes, 1964. - W. RICHTER, "Traum und Traumdeutung im Alten Testament", BZ NF 7 (1963),202-220. N. H. RIDDERBOS, "Het Oude Testament, en de Geschiedenis", GThT 57 (1957),112-120; 58 (1958), 1-9. - H. SCHMIDT, Die Geschichtsschreibung im Alten Testament, 1911. - I. L. SEELIGMANN, "Menschliches Heldentum und gottliche Hilfe", ThZ 19 (1963),385-411. - J. SIMONS, "The "Table of Nations' (Gen 10)", OTS 10, 1954, 155-184. - In., The Geographical and Topographical Texts of the Old Tesiameni, 1959. - C. A. SIMPSON, "Old Testament Historiography and Revelation", Hibbert Journal 56 (1957/ 58),319-332. - J. A. SOGGIN,"Alttestamentliche Glaubenszeugnisse und geschichtliche Wirklichkeit", ThZ 17 (1961), 385-398. - In., "Geschichte. Histoire und Heilsgeschichte im Alten Testament", ThLZ 89 (1964),721736. - E. A. SPEISER, "The Biblical Idea of History in its Common Near Eastern Setting", IEJ 7 (1957), 201-216. - E. TAuBLER, "Die Anfãnge der Geschichtsschreibung", em: Tyche, Historische Siudien, 1926, 17-74,213223. - A. WEISER, Glaube und Geschichte im Alten Tesiameni, 1931 (= Coletânea com o mesmo título, 1961 99-182). - G. E. WRIGHT, "Cult and Historv", lnterpr 16 (1962), 3-20.
1. Listas
o AT contém inúmeras listas das mais diversas espécies, que podem ser divididas em três grupos.
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CONDIÇÕES GERAIS
a) Listas de pessoas e povos entre as quais se contam em primeiro lugar as listas genealógicas. Podemos citar como exemplos: duas listas de povos, reunidas em Gn 10; a relação dos descendentes de Nacor (Gn 22.2024); dos descendentes de Cetura (25.1-4 ) ; dos descendentes de Ismael (25.12-16), de Esaú-Seir-Edom (36); a parte principal de lCr 1-9 e, não por último, as listas múltiplas dos filhos de Jacó, considerados em sua qualidade de ancestrais de Israel, listas que divergem entre si quanto aos detalhes (Gn 49; Nm 1.5-15; 26). Estas últimas têm suas raízes - do mesmo modo que as listas de tribos não-israelitas - na concepção nômade, de feição genealógica acentuada e, ao contrário do que afirma a teoria segundo a qual se trata de alianças sacrais entre tribos, à semelhança das anfíctionias greco-itálicas (NoTH), para as quais não se encontra nenhuma documentação referente ao Antigo Oriente, representam redações populares abreviadas de genealogias mais extensas. Encontramos ainda listas de funcionários e de heróis (2Sm 8.16-18; 20.23-26; 23.8-39) e, de modo particular, a lista dos governadores distritais de Salomão (lRs 4.7-19; 5.7s). As listas de Esdras e Neemias provêm de época consideravelmente posterior: a lista do recenseamento do povo (Esd 2), a lista dos que participaram na reconstrução das muralhas da cidade (Ne 3), a dos companheiros de Esdras (Esd 8.1-14), a dos casamentos mistos (Esd 10.18,20-44a), a da população de Jerusalém e de [udá (Ne 11.3-36), e a dos sacerdotes e levitas (Ne 12.1-26). b) As listas histórico-geográficas contêm os nomes de povoações (daquelas, p.ex., próximas das fronteiras), de fortificações e das cidades dos levitas. Muitas destas listas talvez tenham sido utilizadas em [s 15-19. Nm 33 contém uma lista dos sítios dos acampamentos de Israel. Outra lista mais antiga e da mesma espécie ocorre em Ex 13.20; 14.1s; 15.22s, e parece ter sido largamente usada. c) Exemplos de listas de objetos e de coisas são as listas de donativos sagrados (Ex 35.21-29; Esd 2.68s), e as listas de gado e de escravas capturados na guerra (Nm 31.32-47). A inserção das listas em um determinado lugar ainda não diz nada sobre a idade e a origem das mesmas. Algumas delas são indubitavelmente antigas e provêm da época indicada pela posição que ocupam no AT, assim, p.ex., as listas dos governadores distritais de Salomão e dos que participaram da construção dos muros sob a direção de Neemias. Outras, particularmente as listas histórico-geográficas, refletem situações de épocas mais recentes do que aquelas às quais foram atribuídas. Outras ainda são criações artificiais e foram elaboradas segundo o
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modelo de listas para determinados fins, mesmo que elas tenham utilizado, talvez, alguns dados individuais mais antigos e reais como, por exemplo, em Nm 33.
2. Anais e crônicas Devemos qualificar como anais os apontamentos distribuídos segundo os anos e, na sua maioria, de natureza oficial, sobre determinados acontecimentos de importância. Estes anais se destinavam a fixar a memória dos referidos acontecimentos, e por isso eram guardados em arquivos, constituindo, portanto, um gênero literário informativo. Tais apontamentos eram feitos desde épocas muito antigas, sobretudo nas cortes reais, e raramente nos santuários. Evidentemente que não foram conservados. Apenas algumas informações a respeito deles podem ser colhidas com maior probabilidade nos livros do AT; assim, por exemplo, com referência aos governadores distritais e às fortalezas de Salomão (1Rs 9.15ss), e aos santuários construídos por ele para as suas mulheres estrangeiras (11.7), ou à invasão do faraó Sisak (Sesac) em [udá, ao tempo de Roboão (14.25ss). Estas informações nos chegaram, em sua forma atual, através dos livros de história utilizados pelos autores dos livros dos Reis, que a eles remetem, e dos quais voltaremos a falar. As informações relativas ao templo de Jerusalém, que era um templo particular do rei, talvez provenham dos anais da corte real, como, por exemplo, os dados sobre a construção do templo de Salomão (1Rs 6-8), a instalação de um cofre pelo sumo sacerdote [oiada, para recolhimento do dinheiro do templo (2Rs 12.10ss), e sobre a reforma do rei [osias (22st principalmente esta, que foi, ao mesmo tempo, uma empresa de caráter político. Isto não exclui a possibilidade de ter havido anais do templo de [udá e Israel- embora seja escassa a documentação, neste sentido, para o Oriente Antigo. Com relação aos dois estados de [udá e Israel, devemos admitir também a existência de crônicas que, como suas similares do Antigo Oriente, encerravam as datas dos diversos reis e curtas observações sobre seus feitos e seus destinos. Talvez se possa deduzir dos livros dos Reis a existência deste gênero literário, o qual, do mesmo modo que os anais, não se acha documentado por nenhuma descoberta. Um ponto que permanece discutível é o de saber se se pode admitir, com JESPEN, a existência de uma crônica sincrônica para [udá e Israel- apesar dos paralelos da Babilônia, que partem de outros pressupostos políticos. Talvez se deva, antes, admitir tenha existido uma crônica para [udá e uma outra para Israel- as quais os redatores
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dos livros dos Reis fizeram combinar entre si. Daí é que se poderiam explicar muitos dos erros cometidos nas indicações dos anos, erros estes que tornam difícil estabelecer uma cronologia definida da época dos reis.
3. A narrativa histórica e a historiografia A historiografia israelítica serve menos para fins oficiais do que, em geral, para fins públicos e privados, e tanto é assim que em Israel faltam os relatos dos reis na primeira pessoa, os quais no Antigo Oriente desempenham papel primordial na transmissão da história. Este fato, junto ao caráter peculiar dos salmos reais (§ 39,5) nos mostram que outra era a concepção corrente em Israel a respeito da realeza, ao contrário daquela que se tinha em seu mundo ambiente. Apenas a novela real do Egito parece ter sido imitada em lRs 3.4ss. Dentro do grupo constituído por este gênero literário deve figurar em primeiro lugar aquela espécie de narrativa, completa em si, em que se descreve um acontecimento de modo mais ou menos detalhado e tal qual se deu. Temos um exemplo disto na narrativa do reinado de Abimelec (Jz 9) e da libertação de [abes de Galaad por Saul (1Sm 11). Podemos deduzir a existência de um outro tipo de relato histórico pelas referências dos redatores dos livros dos Reis a certas coletâneas mais amplas de materiais, como sejam o Livro dos Atos de Salomão (1Rs 11.41) e o Livro dos Anais dos Reis de Israel ou de [udá (14.19,29). Estes três livros continham certamente extratos dos anais da corte real, mas deviam estar ao alcance de todos, pois só assim teriam sentido as referências feitas a eles. Ao que parece, não constituíam obras literárias elaboradas segundo um determinado plano, mas eram antes compilações de fatos isolados, provenientes de um período mais ou menos longo. Elas continham, p.ex., relatos das guerras e do reinado de [eroboão I (1Rs 14.19), os relatos sobre Asa e sobre a vitória de Baasa (15.23; 16.5), sobre a conspiração de Zimri (16.20), sobre a construção das grandes cidades e do palácio de marfim por Acab (22.39), sobre a guerra de [oás, rei de Israel, contra Amasias de [udá (2Rs 13.12; 14.15), sobre as campanhas de Jeroboão 11 (14.28), sobre a conspiração de Selum (15.15), sobre a vitória de Ezequias e suas providências para abastecer Jerusalém de água (20.20), sobre os pecados de Manassés (21.17). Muitas vezes, a respeito de certos reis se diz apenas que os livros históricos mencionados contêm tudo o que eles fizeram, incluindo, por conseguinte, também aquelas notícias que os atuais livros dos Reis nos transmitem.
§ 13. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS INFORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES
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Paralelamente às narrativas e às compilações que formam os livros mencionados, surgiu a historiografia propriamente dita, a qual consiste em composições literárias que abrangem um determinado período e unem os diversos materiais tanto internamente quanto do ponto de vista dos temas tratados. Graças a uma estruturação melhorada, estas composições formam um todo completo, que vai da época do despertar da consciência nacional de Israel para os fundamentos de sua fé javista, até depois do reinado de Davi (WEISER). Já o primeiro trabalho desse tipo, a chamada história da sucessão dinástica de Davi (§ 32), é uma composição magistral. Outros passos no caminho para a elaboração de conjuntos mais amplos são constituídos pelos "estratos fontes" que entram na composição do Pentateuco, ou Hexateuco, e que recolheram toda a história, numa visão global que vai desde a criação do mundo até à conquista da terra na Palestina por Israel. Neste processo as fontes estão menos interessadas em fazer "história" do que em expor suas concepções históricas gerais, que elas fundamentam e elucidam com base em material histórico (§ 12,7). A etapa subseqüente é, com diferentes colocações de acento, a da historiografia deuteronomista, como se pode observar sobretudo na configuração da época dos juízes e dos reis. Na época que se segue ao exílio, reforçam-se as tendências suscitadas por esta historiografia no sentido de rejeitar ao máximo todo material profano e de se operar uma concentração sobre os aspectos religiosos da história ou sobre uma espécie de "história da Igreja", como a que se verifica na maneira como as crônicas ou documento sacerdotal apresentam os fatos.
4. Biografia Na biografia o indivíduo procura fixar seus próprios feitos ou os de outrem, para que se guarde a memória dos acontecimentos descritos, para justificar-se perante os seus contemporâneos e perante a posteridade, ou ainda como oferta votiva que se faz a Deus. Na exposição da história de Israel encontram-se menos traços biográficos do que nos relatos dos profetas, como aquele em que se narra como o profeta Amós foi expulso de Betel (Am 7.10-17). Contudo, mesmo entre os profetas, o interesse pela biografia não é fundamental, como se pode ver no livro de Baruc a respeito de Jeremias, obra esta que pretende apresentá-lo como o verdadeiro profeta de Javé (§ 59,4). Outros relatos proféticos contêm traços autobiográficos, como o relato de Oséias sobre a ação simbólica do seu segundo matrimônio (Os 3).
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Contudo, estes relatos não são autobiografias propriamente ditas, como também não o são as memórias de Neemias, que apresentam muita semelhança com o estilo votivo das"autobiografias" autênticas ou fictícias dos dignitários ou das autoridades egípcias (§ 7,5). Foram, antes, concebidos como relatos destinados a perpertuar a memória do "herói", como monumentos em sua honra e como uma oferta votiva que deviam ser conservadas no templo.
5. Notícias sobre sonhos As notícias sobre sonhos, dado o seu caráter autobiográfico, fictício ou real, foram escritas e conservadas na primeira pessoa do singular, como nas narrativas inseridas no quadro de novela de José (Gn 37.5ss; 40s), e na história de Gedeão (jz 7.13). Que os sonhos tenham desempenhado papel de relevo como veículo da revelação em determinados círculos dos profetas cultuais comprovam-no a polêmica de Jeremias 23.25ss) e as drásticas disposições de Dt 13.2-6, as quais, ao que parece, têm em vista um determinado costume recebido dos cananeus. A interpretação, que quase sempre se segue imediatamente à narrativa do sonho, não foi fixada na primeira pessoa, porque era praticada por terceiros. Pode ter a forma de colóquio com o narrador ou apresentar-se simplesmente como relato (Iz 7.14).
ar
§ 14. OUTROS GÊNEROS LITERÁRIOS E SUA INFLUÊNCIA SOBRE OUTROS LIVROS
1. Outros gêneros literários Além das formas literárias e da maneira de exprimir de que temos falado até agora, existem outros gêneros literários nos livros históricos e jurídicos que derivam de outros domínios da vida e da literatura, e são tratados nas referidas obras. Assim, determinados tipos de poesia lírica, que se referem à vida quotidiana (§ 40), estão representados numa variedade de exemplos: cânticos referentes ao trabalho (Nm 21.17-18; Ne 4.4), cânticos sarcásticos (Nm 21.14s,27-30; cf. [z 5.15-17,28-30); cânticos de guerra e de triunfo (Ex 17.16; Js 10.12s; Nm 22-24; Ex 15.21; 16.23ss; 15m 18.7; [z 5), e cânticos fúnebres (25m 1.19-27; 3.33s). Muitas vezes também intercalaramse salmos (Ex 15.1-18; Dt 32; 15m 2.1-10; cf. § 39,7). Do gênero sapiencial (§ 47)
§ 15. COMPILAÇÃO
E TRANSMISSÃO
143
encontram-se o provérbio (l5m 16.7; 24.14; 25m 5.8; 1Rs 20.11), o enigma (Jz 14.14), a parábola (25m 12) e a fábula (Jz 9.8-15; 2Rs 14.9).
2. Influência em outros livros Alguns dos gêneros literários estudados acima aparecem, ao invés, também em outros livros do ATou serviram de estímulo a determinadas imitações. Nos 51 15[14].24[23].3-6; 133[132]; 134[133].3, encontramos certos traços da iorâ e das bênçãos do sacerdote. Os relatos proféticos contêm, muitas vezes, elementos biográficos ou autobiográficos. É sobretudo na pregação dos profetas que muitos gêneros literários foram copiados ou imitados, particularmente a torá, a linguagem jurídica e a maneira de abordar temas históricos.
§ 15. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
o. EISSFEWr, "Die ldeinste literarische Einheit in den Erzãhlungsbüchern des Alten Testaments", ThB 16 (1927), 333-337 (= Kleine Schriften, 1 1962, 123-149). - H. GRESSMANN, "Ursprung und Entwicldung der IosephSage", em: Gunkel-Festschrijt, 11923,1-55. - GUNKEL, "Die Komposition der Joseph-Geschichten", ZDMG 76 (1922),55-71. - J. HEMPEL, Geschichten und Geschichte im Alten Testament biszur persischen Zeit, 1964. - C. KUHL, "Die Wiederaufnahme - ein literarkritisches Prinzip?", ZAW 64 (1952), 1-11. - R. H. PFEIFFER - W. G. POLLARD, The Hebrew Iliad, 1957. - I. L. SEELIGMANN, "Hebrâische Erzãhlung und biblische Geschichtsschreibung", ThZ 18 (1962),305-325. 1. Códigos legais A compilação e a transmissão das leis até o estágio dos códigos atuais, seja como códigos subordinados, seja como códigos autônomos, constituiu-se longo processo, demorado e complexo. Originariamente, essas leis foram transmitidas, em grande parte, isoladamente e por via oral, como instrumento de consulta para as sentenças judiciais. O mesmo se diga das normas de vida e de comportamento, cujo número decenário era particularmente estimado, pelo menos até certo ponto, como meio auxiliar de aprendizagem (contagem pelos dedos). Pelo processo de interpolação e de combinação das leis surgiram as primeiras coleções menores (§ 8,3) a partir das quais, e mediante novos
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CONDIÇÕES GERAIS
acréscimos, se formaram coleções de extensão média, como aquelas, p.ex., que parecem existir na perícope de Ex 21.1-22.16, e são conhecidas pelo título de mispaiim, "determinações legais", e bem assim as de Lv 11-15; 20-21, Dt 21-25. Se para estas coleções, como aliás para todo o Antigo Oriente, devemos admitir já a existência de uma tradição escrita, isto vale tanto mais para a composição dos grandes códigos de leis, dentre os quais o chamado Código da Aliança (Ex 20.22-23.9) e a Lei da Santidade (Lv 17.23) não podem ser considerados como códigos autônomos, pois foram incorporados em obras literárias de extensão maior, ao passo que o código legal do Deuteronômio, juntamente com as partes que lhe servem de moldura, constitui obra autônoma e o "estrato fonte" sacerdotal do Pentateuco e as perícopes legais que ele contém formam uma certa unidade. É preciso não perder de vista que os códigos legais não apresentam de forma sistemática todo o direito então vigente, mas, como acontece em outras obras do mesmo gênero, no Antigo Oriente, contêm novas determinações, novas decisões e novas sentenças judiciais, que se destinavam a modificar e a substituir o direito consuetudinário recebido, que, em geral, não chegou até nós. Esta maneira de agir se faz sentir até mesmo no processo de transmissão da tradição, deixando seus vestígios nas mudanças, reelaborações ou substituições do texto então existente, feitas com o objetivo de adaptá-lo a uma nova situação ou a uma ordenação em vigor numa determinada época. Assim, a parte fundamental de Lv 23 foi retocada, mesmo depois de sua inserção no "estrato fonte" sacerdotal, dentro da linha deste último, enquanto os vv. 18al3-19aforam completados a partir de Nm 28.27-30 (ErssFELDT). Em Lv 18, que apresenta, antes do mais, um conjunto de 10 normas de vida e de comportamento (§ 8,2), podemos distinguir diversas etapas de remanejamento: 1) uma ampliação no sentido de um dodecálogo, mediante os vv. 13.17a e, simultaneamente, uma elevação à dignidade de lei javista, mediante o v. 6, a fim de proibir determinados graus de parentesco, em defesa da estabilidade do vínculo matrimonial; 2) o enquadramento, mediante os vv. 17b-23, em uma lei geral contra a fornicação, para garantir a santidade cultual da comunidade javista; 3) o emolduramento do conjunto, mediante certas admoestações (vv.2b-5,24-30)lOs. Nestes casos, como também em muitos outros, percebe-se claramente a presença de um processo constante de reinterpretação e de adaptação a situações em mudança, fato este que, por sua vez, em
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Cf. K.
ELLIGER,
"Das Gesetz Leviticus 18", ZAW (1965), 1-25.
§ 15. COMPILAÇÃO
E TRANSMISSÃO
145
geral nos permite identificar qual o objetivo original do processo de codificação: estabelecer um novo direito, alterando o direito consuetudinário até então em vigor.
2. Partes da narrativa e da história Na base dos processos de compilação, de transmissão e de reelaboração das partes da narrativa ou da história dos livros em questão, encontramos, com poucas exceções, narrações ou exposições isoladas, qualquer que seja o gênero literário a que pertençam. Em inúmeros casos ainda hoje podemos identificá-las como tais. Primeiramente, elas foram transmitidas por via oral. A forma mais simples de composição a partir de várias histórias consiste em alinhá-las umas depois das outras, ligando-as por uma locução conjuntiva, como: Aconteceu depois disto, ou: Depois destes fatos etc. As, indeterminações e as contradições que daí resultavam só em parte foram resolvidas. Dando a este processo o nome de combinação, teremos, paralelamente, o processo de interpolação, que é a inserção de narrativas ou de notícias em determinado contexto já existente. Podemos identificar este processo muitas vezes, porque, depois da interpolação, repete-se a frase que a precede, com as mesmas palavras ou com uma. variante, assim, p.ex., Gn 37.36 e 39.1; 25m 3.1 e 3.6a. Um outro processo consiste em formar cadeias mais ou menos longas de narrativas, como aquelas em torno de Jacó e Esaú, de Jacó e Labão, de Elias ou de Eliseu. Mesmo a história da sucessão no trono de Davi, que aparece como uma obra construída segundo um determinado plano, pode ser considerada sob este ponto de vista, pois utiliza uma série de narrativas isoladas. Mesmo para tais cadeias de narrativas, devemos muitas vezes admitir a existência de uma tradição escrita. Paralelamente a este processo paulatino de crescimento, levado a efeito sob o impulso de uma reelaboração concomitante, na qual as narrações avulsas são principalmente "personalizadas", "nacionalizadas", "javistizadas" e "teologizadas" (§ 12,6), é preciso levar em conta o aparecimento da tradição em que se utilizam fontes literárias. Enquanto este processo apenas pode ser deduzido para a história dos primórdios (Gn 1-11; cf. § 12,2), a menção do Livro das Guerras de Javé e do Livro do Justo (§ 42), e principalmente a dos livros históricos citados pelos redatores dos livros dos Reis, e também a menção das fontes indicadas para a obra das Crônicas (§ 34), apontam expressamente em tal direção. Trata-se, portanto, de
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CONDIÇÕES GERAIS
um processo de compilação e de uma tradição na escolha do material já existente. Ambos estes processos: o de compilação das narrativas ou de conjuntos de narrativas e o processo de avaliação das fontes levaram, depois de outros estágios intermediários, à constituição de obra de certa extensão. Entre estas obras conta-se, em primeiro lugar, a narrativa fundamental do Pentateuco, ou Hexateuco, que em seguida foi retrabalhada e recebeu características finais diversas em cada "estrato fonte". Devemos mencionar ainda a redação pré-deuteronornista dos livros dos Juízes e de Samuel, os livros dos Reis e a obra histórica das Crônicas. No final do longo caminho que se iniciou com as crônicas individuais e com a fixação das fontes por escrito, encontramos, portanto, amplas exposições.
3. Livros históricos e jurídicos posteriores Os livros históricos e jurídicos posteriores que não foram recebidos no AT são 3 Esdras (tradução do final das Crônicas, de algumas partes de Esdras e de um pequeno fragmento de Neemias, acrescida de outros três fragmentos), os três livros dos Macabeus (l e 2 Macabeus: narrativas históricas, tendo o segundo livro caráter nitidamente edificante; 3 Macabeus: lenda), Tobias (entre a fábula e a novela), [udite (romance histórico), as narrativas de Susana, de Bel e do dragão (motivos fabulosos e ligados à saga, em parte de origem estrangeira) que se contam entre os acréscimos feitos ao livro de Daniel, a carta de Jeremias (polêmica contra o culto dos ídolos, à semelhança de [r 29), a carta de Aristéias (acerca da origem da tradução dos LXX), o livro dos Jubileus (recomposição lendária de Gn l-Ex 12), o Martírio e Ascensão de Isaías (lenda profética, com dois apêndices de conteúdo cristão), os Testamentos dos Doze Patriarcas (escrito parenético), e, entre as obras de Qumran, o Rolo da Seita (lQS, contendo a Regra da Seita, com os apêndices LQs" e lQSb), o Documento de Damasco, muito semelhante a certos manuscritos de Qumran, a Regra de Guerra (lQM, contendo normas militares), o Gênesis Apócrifo (lQGnAp, uma reelaboração lendária de partes de Gênesis), fragmentos de outros documentos, e talvez também o muito discutido rolo de cobre.
CAPÍTULO
o
II
PENTATEUCO
§ 16. NOMES E CONTEÚDO ATD: G. VON RAO, Gn, 5i! ed., 1958, Dt 1964; M. NOTH, Ex, 2"' ed., 1959, Lv 1962. - COT: W. H. GISPEN, Lv 1950, Nrn I 1959, II 1964. - HAT: G. BEER - K. GALLING, Ex 1939; K. ELLIGER, Lv 1965. - HK: H. GUNKEL, Gn, 3"' ed., 1910,6"' ed., 1964; B. BAENTSCH, Ex-Nrn 1903; C. STEUERNAGEL, Dt, 6i! ed., 1923. - HS: P. HEINISCH, Gn 1930, Ex 1934, Lv 1935, Nrn 1936; H. JUNKER, Dt 1933. - IB: C. A. SIMPSON, Gn 1952; J. C. RYLAARSOAM, Ex 1952; N. MICKLEM, Lv 1953; J. MARSH, Nrn 1953; G. E. WRIGHT, Dt 1953. - ICC: J. SKINNER, Gn, 2"' ed., 1930 (1951); G. B. GRAY, Nrn 1903 (1955); S. R. DRIVER, Dt, 3"' ed., 1902 (1952). - KAT: O. PROCKSCH, Gn, 2i! e 3"' ed., 1924; E. KONIG, Dt 1917. - K e H: A. DILLMANN, Gn, 6"' ed., 1892, Nrn, 2i! ed., 1886, Dt, 2"' ed., 1886; lo., - V. RYSSEL, Ex-Lv, 3"' ed., 1897. - KHC: H. HOLZINGER, Gn 1898, Ex 1900, Nrn 1903; A. BERTHOLET, Lv 1901, Dt 1899. - SAT: H. GUNKEL, Gn, 2"' ed., 1921; GRESSMANN, Ex-Dt, 2"' ed., 1922. - SZ: H. STRACK, Gn, 2"' ed., 1905, Ex-Nrn 1894; S. OETTLI, Dt 1893. - ZBK: W. ZIMMERLI, Gn 1-11, 2"' ed., 1957. - Especiais: FRZ. DELITZSCH, Gn 1887. E. KONIG, Gn, 2"' e 3"' ed., 1925.
1. Terminologia Os cinco primeiros livros do AT, por causa da "instrução" ou da "Lei" neles contida, como fundamento obrigatório da vida e do comportamento, receberam no judaísmo o nome complexivo de Torá, a Lei, que aparece também sob formas compostas como: hattôrâ, "A Lei"; tõrai-moseh, "A Lei de Moisés"; sepêr hattôrâ, "O Livro da Lei", e sepêr tôrat moseh, "O Livro da Lei de Moisés". Se originariamente estes nomes foram empregados, ao que parece, para designar apenas os livros jurídicos ou o conjunto de leis dentro destes cinco livros, como podem sugerir as referências do AT, que encontramos em 2Rs 14.6; 2Cr 25.4; 30.16; 35.12; Esd 6.18; 10.3; Ne 8.3;13.1,seja como for, em Mc 12.26; Mt 5.17é todo o conjunto dos cinco livros que se designa com este nome.
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A divisão qüinqüepartita dos livros, feita com a finalidade, talvez, de se obter seções que pudessem ter a mesma extensão dos rolos de cada um dos demais livros, teve lugar o mais tardar no séc. IV a.C, e já era conhecida dos LXX. O título mais antigo até agora conhecido e que exprime esta divisão, é de origem grega e já se encontra em TERTULIANO, no séc. II d.C: he pentáteuchos [biblos], "O [livro] composto de cinco rolos". Esta designação bem cedo aparecerá sob a forma latina masculinizada: pentatheucus, da qual deriva o nome de "Pentateuco", mas a expressão hebraica: "Os cinco quintos da Torá" parece que é de origem mais recente. À semelhança do termo Pentateuco, foram criadas outras denominações, de natureza científica e usadas na literatura: Gênesis Gênesis Gênesis Gênesis Gênesis
Números: [osué: Juízes: Samuel: Reis:
Tetrateuco, Hexateuco, Heptateuco, Octateuco, Eneateuco.
Os nomes de cada um dos livros do Pentateuco foram tomados, respectivamente, no hebraico, das palavras iniciais, ao contrário do grego, em que as denominações foram tomadas de acordo com o conteúdo básico de cada livro, e é delas que derivam, por sua vez, as formas científicas, latinas ou latinizadas. Tais são as designações nas três línguas: 1. irresit - génesis: Genesis ("Começo") 2. ur'ellen semôt - éxodos: Exodus ("Êxodo, Saída") 3. wayyqra' - leuitikón: Leviticus ("Lei Levítica") 4. way(y)Cdabber ou irmidbar - arithmoí: Numeri ("Números, Recenseamentos do povo") 5. 'elleh hadd'barim - deuteronómion: Deuteronomium ("Deuteronômio, Segunda Lei")1.
2. Conteúdo O conteúdo do Pentateuco pode ser sintetizado em poucas palavras, apesar de sua grande extensão. A exposição começa, em escala universal, 1
Isto em virtude de uma interpretação errônea de Dt 17.18, onde o hebraico não fala de uma repetição, mas de uma cópia da Lei.
§ 16. NOMES
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E CONTEÚDO
com a criação e a subseqüente história dos primórdios até à divisão da humanidade e o aparecimento das nações. Neste ponto, o olhar se concentra sobre Abraão e, a seguir, exclusão feita de outros membros, sobre Isaac e Jacó. Depois, a partir dos filhos deste, descreve-se a história de Israel, desde sua estadia no Egito e desde o Êxodo, passando pela estação em Cades e ao pé do monte de Deus e por sua peregrinação através do deserto, até à morte de Moisés na região a leste do [ordão, antes da entrada do povo na terra de cultura, ao ocidente do [ordão. Nesta altura, contudo, é preciso logo observar que a entrada de [osué em ação, como sucessor de Moisés, lança a ponte para o livro de [osué, sendo que se pode ter a tentação de pensar que a descrição do Pentateuco continua até o início do livro dos Juízes. No interior das narrativas foram inseridos os códigos legais ou conjuntos análogos de leis, nos diversos pontos onde se acreditava que eles teriam surgido com o desenrolar dos fatos.
Gn 1-11 História primeva 12-50 História dos patriarcas? 12-23 24
25.1-10,12-18 25.11-19s 25.21-34
26.1-33 26.34s; 27-33 34
35.27-29 35.1-4,6-20 35.5,21-26
36 37-50
Abraão Isaac, Jacó, José.
Ex 1.1-15.21 Opressão no Egito e Êxodo 1.1-2.10 Opressão dos israelitas e nascimento de Moisés, 2.11-4.31; 6.2-7.7 Vocação de Moisés 5.1-6.1; 7.8-13 Negociações de Moisés com o faraó, 7.14-13.16 Pragas e despedida dos israelitas, 13.17-14.31 Perseguição e salvamento 15.1-21 Canto triunfal 15.22-40.38 Marcha até o Monte de Deus e pacto, 15.22-18.17 Peregrinação 19-24 Revelação do Sinai, decálogo, o chamado Livro da Aliança e pacto, 25-31 Normas sobre a instituição do culto ("Tabernáculo"), 32-34 Quebra do pacto e novo pacto, 35-40 Execução das normas dadas em 25-31. 2
As diferentes coroas de narrativas foram interligadas em Gn 25 e 35; as passagens colocadas em quadrados, acima, têm por finalidade indicar este fato.
o PENTATEUCO
150 Lv
1-7 8-10 11-15 16 17-26 27
Instruções sobre os sacrifícios Os primeiros sacerdotes e os primeiros sacrifícios Prescrições sobre a pureza Ritual de purificação para o grande dia das expiações Lei da santidade Normas sobre as ofertas votivas
Nm 1.1-10.10 Normas sobre os levitas e a disposição no acampamento 10.11-20.13 Do Sinai até Cades 10.11-12.16 Partida e resistência do povo, 13-14 Reconhecimento da terra de Canaã, 15 Diversas prescrições, 16-17 Sublevação de Coré, Datã e Abiram, 18 Deveres e direitos dos sacerdotes e levitas, 19 Prescrições sobre as purificações 20.1-13 Murmuração do povo e defecção de Moisés. 20.14-36.13 Entrada nas terras a oriente do [ordão 20.14-21.35 Marcha e combates, 22-24 Balaão, 25 Idolatria e expiação 26 Divisão e recenseamento do povo 27 Lei sobre a herança; investidura de [osué, 28-30 Leis sobre os sacrifícios e os votos, 31 Campanha contra os madianitas, 32 Distribuição de possessões ao oriente do [ordão, 33.1-49 Lista das etapas dos acampamentos, 33.50-34.29 Instruções sobre a ocupação de Canaã, 35 Cidades dos levitas e cidades de refúgio, Complemento à lei da herança. 36 Dt
1-11 Discursos de introdução 1-3 Acontecimentos desde a partida do Horeb, 4.1-43 Exortações e advertências, 4.44-5.33 Acontecimentos ao pé do Horeb e decálogo, 6 Exortação ao culto de Javé 7 As futuras relações com os cananeus, 8.1-9.6 Exortação à obediência, 9.7-10.11 O "bezerro de ouro", 10.12-11.32 Exortações à obediência, 12-26 Código deuteronômico 12.1-16.17 Prescrições principalmente a respeito do culto, 16.18-21.9 Prescrições principalmente a respeito das obrigações legais,
§ 17. A
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21.10-26.19 Determinações principalmente a respeito do direito civil. 27-30 Discursos de conclusão 31-34 Encerramento da época de Moisés 31 Investidura de [osué, guarda e leitura da Lei, 32 Cântico de Moisés, 33 Bênçãos de Moisés, 34 Morte de Moisés.
§ 17. A PESQUISA DO PENTATEUCO ATÉ OS NOSSOS DIAS H. BAROTKE, "Henning Bernhard Witter", ZAW 66 (1954),153-181. - A. BEA, "Der heutige Stand der Pentateuchfrage", Bibl16 (1935), 175200. - A. BENTZEN, "Bemerkungen über neuere Entwicklungen in der Pentateuchfrage", Arar 19 (1951),226-232. - J. P. BOUHOT - H. CAZELLES, "Pentateuque", em: Supplément au Dictionnaire de la Bible, VII 687-858, 1964. - O. EISSFELDT, Die iiltesten Traditionen Israels, 1950. - lo., "Die neueste Phase in der Entwicklung der Pentateuchkritik", ThR NF 18 (1950),91-112, 179,215,267-287. - lo., Die Genesis der Genesis, 2a ed., 1961. - H. HOLZINGER, Einleitung in den Pentateuch, 1893. - P. HUMBERT, "Die neure Genesis-Forschung", ThR NF 6 (1934), 147-160, 207-228. E. KONIG, lsi die moderne Pentateuchkritik auf Tatsachen begründet?, 1933. - A. Loos, Jean Astruc et la critique biblique au XVIIIe siêcle, 1924. - C. R. NORTH, "Pentateuchal Cristicism", em: The Old Testament and Modern Study, 1951, 48-83. - J. DE SAVIGNAC, "L'oeuvre et la personnalité de Jean Astruc", NC 5 (1953), 138-147. - D. C. SIMPSON, Pentateuchal Criticism, 2a ed., 1924. - R. SMENO [r., w. M. L. De Wettes Arbeit am Alten und Neuen Testament, 1958. - lo., "De Wette und das Verhãltnis zwischen historischer Bibelkritik und philosophischem System im 19. Jahrhundert", Thz 14 (1958), 107-119. - J. STEINMANN, Richard Simon et les origines de l'exégese biblique, 1960. - F. STUMMER, Die Bedeutung Richard Simons für die Pentateuchkritik, 1912. R. DE VAUX, "A propos du secund centenaire d' Astruc, Réflexions sur I' état actuel de la critique du Pentateuque", VTSuppl I, 1953, 182-198.
1. Tradição Na época posterior ao exílio, Moisés passou a ser considerado o mediador ou o redator da lei do Pentateuco, recebida de Deus, e isto ocorreu particularmente depois que a lei deuteronômica já havia dado um passo neste sentido. Esta opinião é documentada a partir do séc. V a.c. (MI3.22;
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o PENTATEUCO
Esd 3.2; 7.6; 2Cr 25.4; 35.12). O Novo Testamento pressupõe que Moisés tenha redigido todo o Pentateuco (Mt 19.7s; Me 12.26; [o 5.46s; At 15.21; Rm 10.5). Referências expressas se encontram, a seguir, em JOSEFO, em FILO e no Talmude. A Igreja assumiu a tradição judaica de Moisés como autor do Pentateuco. Até o séc. XVII só raramente foi contestada esta teoria. Evidentemente que surgiram sempre dúvidas expressas contra ela, mas não se pode falar que tenham sido uma investigação de sentido histórico. ORÍGENES se defrontou com as críticas de CELSO contra a unidade e a origem mosaica do Pentateuco, enquanto outros pais da igreja rebatiam dúvidas semelhantes da parte dos gnósticos. Na Idade Média, ISAAc BEN JESUS (Gn 36.31 pressupõe a existência do reino de Israel), IBN ESRA (§ 1,2) e outros, e mais tarde KARLSTADT, MASIUS, PEREIRA, BONFRERE e HOBBES, e no período subseqüente também PEYRERE 3 , SPINOZA4, SIMONs e CLERICUS6 , sobretudo, acrescentaram objeções isoladas de toda espécie, contra a autoria de Moisés. Não fizeram observações construtivas e que trouxessem real progresso. Deparava-se apenas com detalhes estranhos, sem que se buscasse um ponto de referência fundamentaL Constata-se, nesta altura, que o Pentateuco se apresenta na realidade como uma obra anônima sem indicação de autor e sem informação direta sobre a origem mosaica para todo o conteúdo. Deste modo, a tradição afirma, mais do que o próprio Pentateuco, sobre a proveniência deste. Somente algumas perícopes são atribuídas expressamente à autoria de Moisés, sem que isto, no entanto, corresponda necessariamente à realidade. Estas perícopes são: o relato da batalha contra os amalecitas (Ex 17.14), aquilo que se costuma chamar de Código da Aliança, (Ex 24.4), o decálogo cultual (Ex 34.27), 3
L DE LA PEYRERE em seu livro, publicado anonimamente: Praeadamitae (1651), opina
que Moisés se utilizou de determinadas fontes e que certas partes do Pentateuco provêm dele. 4 B. SPINOZA, em seu Tractatus Theologieo-Politieus (1670), admite a existência de vários fios de uma mesma tradição e uma redação final executada por Esdras, a partir de vários fragmentos. 5 R. SIMON, em sua Histoire critique du Vieux Testament (1678), só as leis considera como mosaicas e tudo o mais ele atribui a escribas analistas inspirados. 6 J. CLERlCUS (J. DE CLERC), em Sentiments de quelques théologiens de Hollande etc. (1685), admite que muitas partes surgiram posteriormente e que a redação final foi executada pelo sacerdote mencionado em 2Rs 17.27s, na época que se seguiu à queda do Reino do Norte de Israel.
§ 17. A
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a lista dos sítios dos acampamentos (Nm 33.2), o "Deuteronômio" (Dt 1.5; 4.45; 31.9,24), o cântico de Moisés (Dt 31.30).
A parte principal do Pentateuco, pelo contrário, não pretende ter sido redigida por Moisés, nem transmitida oralmente desde sua época. A partir do séc. XVIII uma série de pesquisas e argumentos decisivos e dos mais variados tipos vieram provar que esta constatação negativa corresponde à realidade. Para o momento, indicamos algumas das inúmeras passagens que sugerem uma época posterior a Moisés: a) Estas passagens subentendem a instalação de Israel na Palestina: os cananeus estavam então naquela terra (Gn 12.6; 13.7). Canaã é chamada terra dos hebreus (Gn 40.15). A região a leste do [ordão é designada a partir da posição de quem se acha a oeste do [ordão, isto é, estando além do fardão (Gn 50.lOs; Nm 22.1; Dt 1.1,5). b) Mostram-nos o autor distanciado em relação à época de Moisés: a fórmula: até o dia de hoje (Dt 3.14; 34.6 et passim): e não se levantou mais em Israel profeta semelhante a Moisés (Dt 34.10). c) Pressupõem condições políticas de época posterior: o emprego do topônimo Dan, que data, no máximo, do estabelecimento de Israel na época dos Juízes (Gn 14.14; Dt 34.1); antes que os filhos de Israel tivessem rei (Gn 36.31); a lei relativa ao rei (Dt 17.14ss).
2. Tentativas de resolver o problema Se o Pentateuco não provém de Moisés, então se põe a questão de saber como teria surgido. Foi a partir das tentativas de dar uma resposta a estes problemas que se desenvolveram a pesquisa e a crítica do Pentateuco, que constituiu e constitui ainda hoje a parte mais considerável da ciência do AT. Devemos observar ainda que se trata de uma questão justa e necessária, e que são inevitáveis as tentativas de resolvê-la de modo o mais exato possível. A própria Exegese e a Teologia não podem prescindir delas. O empenho em discernir cada uma das partes que entram na composição do Pentateuco e em determinar a época em que ele apareceu, bem como o de saber sua finalidade, deu origem a uma série de hipóteses, que funcionam como tentativas de solução. A pesquisa crítica teve dois precursores que logo foram esquecidos e não tiveram influência: o pastor
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o PENTATEUCO
B. WrTTER, de Hildesheim/, que utilizou como critério de distinção sobretudo a alternância dos nomes divinos Javé e Eloim no Gênesis e reconheceu a existência de duas narrativas distintas da criação, mas que não estendeu sua pesquisa a todo o Gênesis, e J. ASTRUC 8, que partiu igualmente da diferença dos dois nomes divinos, para distinguir no Gênesis a presença de duas fontes principais e de dez fontes secundárias que teriam sido usadas por Moisés. a) A primeira hipótese dos documentos (ErcHHoRN*, ILGEN) afirmava que o Pentateuco, do qual, quase sempre, só se pesquisava o Gênesis, se originara de várias fontes". Segundo tal hipótese, o Pentateuco é composto de uma série de narrativas correlatas, que o último redator ou revisor utilizou como "documentos" formulados definitivamente, mas submetendo-os a uma revisão de conjunto. Contudo, esta hipótese se depara com dificuldades, quando passa ao estudo dos códigos legais (§ 18,3). b) A hipótese dos fragmentos (GEDDES, VATER, e DE WETTE até certo ponto) parte do estudo dos códigos legais do Pentateuco. Estes códigos dão a impressão de serem fragmentos mais ou menos extensos, autônomos e independentes entre si, e de terem sido colocados uns ao lado dos outros no Pentateuco, sem uma vinculação interna. Com base nesta descoberta, procurou-se captar o processo de formação de todo o Pentateuco, partindo-se da elaboração redacional desses fragmentos legislativos e narrativos. Contudo, logo que se procure aplicar esta hipótese às seções narrativas, torna-se quase impossível entender a existência da construção planificada e da cuidadosa ordenação de todo o conjunto, bem como a cronologia que lhe é correlata 10. c) A hipótese complementar (EWALDll, até certo ponto; BLEEK, TUCH, FRZ. DELITZSCH) procurou resolver o problema, admitindo que uma só fonte consB. WnTER, Jura Israelitorum in Palaestinam terram Chananaeam commentatione etc. (1711). J. ASTRUC, Conjectures sur les mémoires dont il paroit que Moyses'est servi etc. (1753). 9 EICHHORN: duas fontes principais, eloísta e javista; ILGEN: dois eloistas e um javista (chamado de jeovista, durante muito tempo, por causa de leitura errada do nome de Javé). 10 Enquanto o sacerdote inglês A. GEDDES (1792, 1800) admite a existência de numerosos fragmentos da época de Salomão e provenientes de dois círculos de autores (reconhecíveis pelo uso dos nomes de Javé e Eloim). J. S. VATER desenvolve a teoria segundo a qual o Pentateuco surgiu a partir de trinta e nove peças autônomas, tendo o Deuteronômio como núcleo. 11 Defendida por H. G. A. EWALD pela primeira vez em uma recensão em Th5tKr 4 (1851), 595-606. 7
8
§ 17. A
titui
O
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núcleo central do Pentateuco, ou seja, o chamado documento básico
{Grundschrift}, eloísta e de composição unitária, que foi completado depois por elementos javistas. EWALD, cuja opinião se identificava essencialmente com a da primeira hipótese dos documentos, bem cedo se afastou da hipótese complementar e, como outros, passou a admitir duas fontes eloístas que teriam sido reescritas, fundidas e completadas por um autor javista. EWALD estabelece, assim, uma certa ligação entre a primeira hipótese dos documentos e a hipótese complementar (e semelhantemente ScHRADER). d) A segunda hipótese dos documentos (HUPFELD, RIEHM, DILLMANN, FRZ. DELITzscH) admite a existência de três fontes preexistentes e originariamente autônomas: duas eloístas e uma javista, que um redator final refundiu e combinou. Depois que RIEHM fez valer, mais tarde e quase universalmente, a tese defendida por DE WETTE, segundo a qual o Deuteronômio é obra autônoma e distinta dos demais livros do Pentateuco, passouse a ter uma base crítico-literária, na qual se admitiam quatro componentes primitivos e se determinava a ordem de sucessão das partes. Utilizando as abreviaturas hoje universalmente aceitas, teremos a seqüência: P (Priesterschrift) "Documento Sacerdotal") - E (Eloísta) - J (Iavista) - D (Deuteronomista):". e) As pesquisas posteriores provocaram, em breve, forte mudança na opinião relativa à ordem cronológica das fontes. Depois que REUSS e VATKE deixaram de considerar o documento conhecido pela abreviatura P como o mais antigo, e lhe atribuíram uma data bastante tardia, sua posição foi amplamente aceita, sob a influência das pesquisas de GRAF, KEUNEN* e WELLHAUSEN*. Este novo ponto de vista pode ser expresso como segue: J é o documento mais antigo do Pentateuco; P não se situa no começo da história da fé javista, mas pertence a um estádio bastante posterior. Deste modo, teremos a ordem de seqüência: J-E-D-P. Desde então, esta seqüência foi admitida quase universalmente na pesquisa posterior, como também sua datação, embora com certas hesitações, e recentemente também com a tendência a admitir-se uma época mais antiga: para J o séc. IX, para E o séc. VIII, para D o séc. VII e para P o séc. V. Desta opinião divergem sobretudo KONIG, ORELLI e STRACK, entre outros, que consideram E como a fonte mais antiga e admitem uma data mais recuada: E teria surgido por volta de 1200, J por volta de 1000, D por volta de 700-650, e P por volta de 500 a.C: DILLMANN, GRAF BAUDISSIN pro-
12 Desde HUPFELD
admite-se também um redator particular.
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o PENTATEUCO
põem a seqüência E-J-P-D e também uma data um pouco mais antiga: E, 900-850; J,800-750; P, 800-700, e D, 650-623 a.Ci: e KAUFMANN, com a tese segundo a qual P seria a fonte mais antiga 13. f) Além de muitos estudiosos do AT, que a partir de então têm adotado a opinião de GRAF, KUENEN e WELLHAUSEN, não faltam aqueles que a rejeitam, modificam ou pretendem substituir a segunda hipótese dos documentos. Devemos mencionar, sobretudo, as seguintes tomadas de posição: muitas vezes procurou-se defender a unidade literária do Pentateuco e sua autenticidade mosaica. Assim, entre outros, MÓLLER14, MAcDoNALD 15 , JACOB 16, AALDERS 17, YOUNG* e RABAST 18 • Também LEvy 19 e WrsEMAN 20procuram argumentos que sirvam de apoio à tradição". Apesar da validade de suas considerações e observações no que diz respeito aos pormenores, tais opiniões em nada contribuíram para resolver o problema da origem do Pentateuco. Representam, em verdade, os inevitáveis movimentos de defesa contra a investigação crítica. KLOSTERMANN22 e ROBERTsoN23 propugnam uma espécie de teoria da cristalização (ErsSFELDT), segundo a qual as demais partes do Pentateuco foram-se agrupando paulatinamente em torno da lei mosaica, durante sua recitação em público. ERDMANN24 e DAHSE25 reprovam a opinião dos que admitem a preexistência de fontes circulantes, recusando-se a tomar como critério" para isto
13
Y. KAUFMANN, The Religion of Israel from the Beginnings to the Babylonian Exile, 1960
(tradução resumida de M. GREENBERG da obra hebraica em oito volumes). W. MÜLLER, Die Einheit und Echtheit der fünf Bücher Mosis, 1931. 15 D. B. MACDONALD, The Hebrew Literary Genius, 1933. 16 B. JACOB, Das erste Buch der Tora, 1934. 17 G. CH. AALDERs, A Short Introduction to the Peniaieuch, 1949. 18 K. RABAST, Die Genesis, 1951. 19 L LEWY, The Growth of the Peniaieuch, 1955. 20 J. WISEMAN, Die Entstehung der Genesis, 1957. 21 Cf. também M. H. SEGAL, Scripta Hierosolymitana 8 (1961),68-114. - J. LIVER, ibid. 14
22
23 24
25
26
189-217. A. KLOSTERMANN, Der Peniaieuch, 1893. E. ROBERTSON, The Old Testament Problem, 1950. B. D. EERDMANS, Alttestamentliche Studien, I-IV 1908/1912. - ID., "The Composition of Numbers", aTS 61949,101-216. Hipótese de quatro camadas: um livro politeísta de Adão, anterior a 700 a.c. (recensão de Jacó); uma obra histórica politeísta anterior a 620 (recensão de Israel); uma revisão monoteísta dessas duas obras em torno de 620, e partes indubitavelmente monoteístas, da época posterior ao cativeiro. J. DAHSE, Textkritische Materialien zur Hexateuchlrage, 1912, divididos em materiais narrativos, uma revisão profética e uma revisão sacerdotal. Contra: J. SKINNER, The Divine Names in Genesis, 1914, e DRIVER*.
§ 17. A PESQUISA DO PENTATEUCO ATÉ OS NOSSOS DIAS
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a diversidade dos nomes divinos, e defendem uma espécie de hipótese complementar". LOHR 28 admite que Esdras tenha compilado um material que remontaria a Moisés. Seria, assim, o redator do Pentateuco. Deste modo renova, até certo ponto, a hipótese dos fragmentos. Baseados nos estudos feitos por J. PEDERSEN29 para o conhecimento da mentalidade israelítica e ao mesmo tempo admitindo a hipótese de uma tradição oral que teria persistido até depois do exílio, ENGNELL30 e outros consideram como inconsistente e mesmo impossível a distinção entre as fontes. Também nesta maneira de abordar a história das tradições, e mesmo abstraindo das concepções arbitrárias conexas, a respeito da história religiosa, é indisfarçável a preocupação em se manter dentro da tradição em face da critica". VOLZ 32 e RUDOLPH rejeitam a teoria de uma fonte E. Enquanto VOLZ considera E e P apenas como produtos de uma reelaboração de J, RUDOLPH considera como independentes não somente P, mas também certos trechos de E, que ele, no entanto, interpreta como interpolações introduzidas em p3. Também MOWINCKEL34 se voltou ultimamente contra a hipótese de E como fonte autônoma. Em vez disto, considera o material como sendo ampliações e reformulações posteriores de J, feitas com base no material das variantes surgidas no decorrer do tempo. Deste modo, o Javista se transforma de invariatus em [avista variatus. Para WINNET 35 , os livros de Êxodo e Números contêm uma tradição continuada que teria surgido no norte de Israel, sem a presença de outras fontes isoladas, e teria sofrido uma revisão antes do exílio (deuteronomista) e outra depois do exílio (P). Em Cxsstrro" encontramos uma espécie de hipótese dos fragmentos. Segundo ele, o Pentateuco seria uma obra homogênea e originária da época Sobre este tema, cf. O. EISSFELDT, ZDMG 85 (1931), 172-195, e ThR 10 (1938),225-291. M. LOHR, Untersuchungen zum Hexateuchproblem, 1, 1924. 29 J. PEDERSEN, Israel, 1926/1940. 30 I. ENGNELL, particularmente em: Bibliskt Uppslagsverk, 1962/1963, 2ª ed. 31 Contra: sobretudo BENTZEN* e NORTH. 32 P. VOLZ - W. RUDOLPH, Der Elohist ais Erzâhler, ein Irrweg der Pentateuchkritik?, 1933. - W. RUOOLPH, Der "Elohisi'' von Exodus bis iosua, 1938. 33 Contra: O. EISSFELDT, "Die Komposition von Exodus 1-12", ThBl18 (1939), 224-233. 34 S. MOWINCKEL, Tetrateuch-Pentateuch-Hexateuch, 1964. 35 F. V. WINNETT, The Mosaic Tradition, 1949. 36 U. CASSUTO, La questionedelta Cenesi, 1934. - Io., The Documentary Hypothesis and ihe 27
28
Composition of the Peniaieuch, 1961.
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dos profetas. Na construção dessa obra teria sido utilizada uma parte do material das numerosas tradições correntes em Israel, tendo sido ela reelaborada tantas vezes, que na multiplicidade e da multiplicidade resultou uma obra unitária. Todas essas opiniões nada mais indicam do que uma advertência a nos convencermos cada vez mais da solidez e da credibilidade dos fundamentos lançados pela segunda hipótese dos documentos no que respeita à divisão das fontes do Pentateuco.
3. Novas abordagens No entretempo, as pesquisas sobre o Pentateuco tiveram prosseguimento por formas muito diversas. Sem negar a validade das bases ou dos princípios relativos à divisão das fontes, elas conduziram, por um lado, à tentativa de aperfeiçoar esse método e, por outro lado, trouxeram novos conhecimentos e nova percepção, que levaram a uma reformulação dos conceitos de "hipótese" e de "documento". a) Na pesquisa crítico-literária observou-se o empenho por aperfeiçoar a análise. As fontes aparecem sem homogeneidade e compostas de várias camadas ou filões. Tendo em vista que as diversas opiniões relativas a D serão estudadas no § 25, trataremos aqui apenas da análise de J, EeP. Depois que SCHRADER37 , BUDDE38 e BRUSTON39 deram inicio ao processo de distinguir em J diversos fios de narrativas, isto aliás no sentido de um afrouxamento da hipótese dos documentos, uma vez que se abandonou a tese de um único autor a trabalhar segundo um plano premeditado, SMEND4Ü deu um passo decisivo no sentido de se admitir que a conhecida fonte J não era um documento unitário nem fora ampliado com acréscimos, mas, antes, constava de duas fontes onde aparece de ambos os lados o nome divino de Javé. A estas duas fontes ele deu, respectivamente, o nome de p e F, contando a partir de então com cinco fontes do Pentateuco, ao mesmo tempo em que as apresentava na seguinte ordem cronológica: p - F- E - D - P. Esta tese foi aceita, embora com ligeiras modificações, 37 38 39
40
Studien zur Kritik und Erkliirung der biblischen Urgeschichte, 1883. Urgeschichte, 1883. CH. BRUSTON, "Les quatre sources des lois de l'Exode", RThPh 16 (1883), 329-269. - lo., "Les deux [éhovistes", ibid., 18 (1885), 5-34, 429-528, 602-637. R. SMENO, Die Erzãhlung des Hexateuch aul ihre Quellen untersucht, 1912. E. K.
SCHRAOER, BUOOE,
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entre outros por EICHROOT 41, HOLZINGER42, MEINHOL0 43, EISSFELOT 44, SIMPSON45 e FOHRER46 • EISSFELDT, por sua vez, substitui a designação P pela de L (Laienquelle, "fonte leiga"), para indicar a diferença desta fonte em confronto com o interesse sacerdotal e cultual que se observa em P, ao passo que FOHRER prefere designá-la com a sigla N, em vista de seu pronunciado sabor nômade. Independentemente de SMENO, MORGENSTERN 47 admite a existência de uma fonte quenita [K, abrev. de Keniter-Quelle], surgida por volta de 900 a.c., no sul da Palestina, e PFEIFFER48, uma fonte mais antiga (S), surgida em Seir ou no sul da Palestina, no séc. X a.c. Em contraposição com estas teses, HbLSCHER49 pretendeu, mais do que ninguém, demonstrar a unidade de J, mas teve de reconhecer como pertencendo ao seu J, dado tratar-se de duplicatas, uma série de trechos que, no entanto, parecem bem antigos e quadram perfeitamente com o referido J. Por outro lado, ele atribuiu a J certas passagens que perturbam visivelmente o ritmo da narrativa e destoam do contexto de seu J. PROCKSCH50 propôs uma divisão para E, supondo a existência de uma fonte E', escrita no reino do Norte, e uma variante E2, produto de ampliações e que teria surgido em [udá, depois da ruína do reino setentrional. Mas nesta tese seria preferível falar em ampliações no sentido da hipótese complementar. O caráter compósito de P já era reconhecido de longa data, principalmente no que se refere ao surgimento paulatino dos conjuntos jurídicos (WELLHAUSEN). Segundo VON RAo 51, P é constituído de duas correntes paralelas (PA e PB), a mais nova das quais apresenta caráter predominantemente cúltico e sacerdotal e é a que mais se estende em informações sobre pessoas e datas. Esta tese vai muito além da hipótese de um conjunto
W. EICHRODT, Die Quellen der Genesis von neuem untersucht, 1916. H. HOLZINGER, em: E. KAUTZSCH - A. BERTHOLET (ed.), Die Heilige Schríft des Alten Testaments, I, 1922, 4ª ed. 43 J. MEINHOLD, "Die jahwistischen Berichte in Gn 12-50", ZAW 39 (1921),42-57. 44 o. EISSFELDT, Hexateuch-Synopse, 1922. 45 C. A. SIMPSON The Early Traditions Df Israel, 1948. 46 G. FOHRER, Überlieferung und Geschichte des Exodus, 1964; cf. § 24. 47 J. MORGENSTERN, "The Oldest Document of the Hexateuch", HUCA 4 (1927), 1-138. 48 R. H. PFEIFFER, "A Non-Israelitic Source of the Book of Cênesis", ZAW 48 (1930), 66-73. 49 G. HbLSCHER, Die Anfiinge der heoraischen Geschichtsschreibung, 1942. - lo., Geschichts41
42
50 51
schreibung in Israel, 1952. O. PROCKSCH, Das nordhebriiische Sagenbuch. Die Elohimquelle, 1906. G. VON RAO, Die Priesterschrift im Hexateuch, 1934.
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básico, ampliado posteriormente por diversos acréscimos. E aqui poderíamos perguntar se, precisamente no que se refere ao material legislativo, a aplicação da hipótese complementar e da hipótese dos fragmentos não nos ofereceria uma explicação mais satisfatória. b) A pesquisa sobre a história das formas e dos motivos, praticada em larga escala primeiramente por GUNKEL e GRESSMANN, modificou até certo ponto a conceituação referente aos "documentos". A atenção se voltou do aspecto qualitativo e específico das fontes para as narrações e para os materiais em particular, a fim de captar a fase pré-literária, o nascimento e o desenvolver da tradição oral, sua situação histórico-vital (Sitz im Leben) e a natureza da religião do povo. A partir daí, as fontes se revelam, não como obras literárias de grandes personalidades e compostas segundo um plano bem determinado, mas como compilações de elementos populares, transmitidos desde tempos imemoriais e recolhidas, não por indivíduos mas por escolas. Daí resulta claramente que todas as fontes, mesmo as mais recentes, contêm material antigo e constituem, por isso mesmo, conjuntos de natureza muito mais complexa do que se supunha antigamente. Isso é tanto mais válido a partir do momento em que se redescobre, em proporção cada vez maior, a tradição do Antigo Oriente em seus aspectos comparativos. A pesquisa, principalmente a pesquisa das condições legais e da arte de narrar, conduziu a resultados notáveis, ainda que não indiscutíveis, e haverá de trazer ainda novos conhecimentos. A isto se acrescenta o estudo da história das tradições, que, ao contrário do conceito de história da tradição, proposto por ENGNELL, se atém à distinção das fontes, mas procurando recuar para além desta etapa e investigando o paulatino desenvolver-se da tradição atual, no decurso de sua longa história. Para isto, é preciso acompanhar os diversos ciclos de tradições e determinar sua idade, suas relações mútuas e sua recíproca influência. Baseado nestes dados, NOTH52 identifica, aliás de modo muito esquemático, cinco temas básicos da tradição em estudo: o Êxodo, a conquista da terra, a promessa feita aos patriarcas, a condução do povo através do deserto e a revelação do Sinai. A moldura temática que já existia foi preenchida com materiais narrativos, como o das pragas do Egito, da celebração da Páscoa, do Baal Peor (Baal-fegor) e de Balaão, e da história de Jacó a leste do [ordão, Com outros enquadramentos e com a utilização
52
M.
NOTH,
Uberlieferungsgeschichte des Pentateuch, 1948.
§ 18. MÉTODOS,
RESULTADOS E PROBLEMAS
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de tradições isoladas, como a novela de José e as genealogias, os temas foram pouco a pouco se desenvolvendo. Se, depois de tudo isto, voltarmos o olhar para os primórdios das fontes e considerarmos o seu desabrochar ao longo de vários estágios, de modo cada vez mais crescente, veremos que a pesquisa do Pentateuco se torna de tal modo complexa, que as datas propostas pelas "hipóteses" podem valer apenas como seu começo. Naturalmente é um começo necessário, de onde devem partir, de novo, todos os que se dedicam ao estudo do Pentateuco, para poder então recolocar a questão da origem das fontes do Pentateuco.
§ 18. MÉTODOS, RESULTADOS E PROBLEMAS C. H. W. BREKELMANS, "Het 'historische Credo' van Israel", Tijdschrift voor Theologie 3 (1963), 1-10. - G. FOHRER, "Tradition und Interpretation im Alten Testament", ZAW73 (1961), 1-30. - S. MOWINCKEL, Le Décalogue, 1927. - lo., "Die vermeintliche 'Passahlegende' Ex 1-15 in Bezug auf die Frage: Literarkritik und Traditionskritik", StTh 5 (1951), 66-88. M. NOTH, Überlieferungsgeschichte des Peniateuch, 1948. - J. PEDERSEN, " Passahfest und Passablegende", ZAW 52 (1934), 161-175. - lo., Israel, I1I-IV 1940,384-415,728-737. - G. VON RAo, Das formgeschichtliche Problem desHexateuch, 1938 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1958, 9-86). - L. ROST, "Das kleine geschichtliche Credo", em: Das kleine Credo und andere Studien zum Alten Testament, 1965, 11-25. - J. A. SOCGIN, "Kultãtiologische Sagen und Katechese im Hexateuch", VT 10 (1960), 341-347. - A. S. VAN DER WOUDE, "Uittocht en Sinai", o. J. (1961).
1. Resultados das pesquisas Para explicar o caráter heterogêneo do Pentateuco, resultante do emprego de materiais os mais dispares, propuseram-se a hipótese dos documentos, a hipótese complementar e a hipótese dos fragmentos. Até o presente a pesquisa nos tem ensinado que: a) não se pode conferir a nenhuma destas hipóteses o caráter de exclusividade, do mesmo modo que na prática nenhuma delas foi empregada isoladamente; pelo contrário, apenas uma ou outra teve a preferência, servindo as outras hipóteses paralelamente para explicar problemas isolados. Na situação atual já não se pode, com maior razão, proceder de modo unilateral. .
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b) As aludidas hipóteses indicam, na realidade, métodos que presidiram o surgimento do Pentateuco. Assim, é razoável que, em vez de hipótese, falemos, a partir de agora, de métodos ou processos que foram aplicados no seu devido lugar: o método das adições (por hipótese dos documentos), o método complementar (por hipótese complementar), e o método das composições (por hipótese dos fragmentos). c) As fontes ou fios de narrativas que percorrem todo o Pentateuco não podem ser considerados como "documentos". Além disso, essas fontes contêm um número maior de camadas; são mais complexas; e, de modo geral, seu conteúdo se apreende com menor segurança, como também, em vista do material antigo que foi empregado, elas são menos exclusivamente obra de uma única personalidade literária do que nos permitiria supor o termo "documento". Mesmo a expressão "fonte" não indica com suficiente clareza a realidade dos fatos, enquanto a expressão "fios de narrativas" não leva em conta o emprego do material jurídico. Daí é que falaremos, com freqüência, de "estratos fontes". d) Além da simples demarcação dos"estratos fontes", devemos abordar também o problema colocado pelo método da história das formas e da tradição com referência à sua origem e à sua situação vital na história [5itz im Leben]. Devemos considerar outrossim a questão levantada pelo método da história das redações com respeito ao processo de composição do qual resultou o Pentateuco.
2. O método das adições
o método das adições desempenhou papel fundamental no surgimento do Pentateuco. Isto se aplica principalmente à obra em seu conjunto, onde três ou mais "estratos fontes" de conteúdo paralelo foram unidos por um processo de adição e de combinação de vários estágios. Assim, p.ex., a narrativa do dilúvio em sua forma atual (Gn 6.5-9.17) surgiu de duas versões originariamente autônomas, cada uma das quais narrava toda a história do dilúvio, com notáveis diferenças de uma para outra, de modo que podemos separá-las facilmente de novo. Se as compararmos, então, com outras narrativas, verificaremos que elas não se apresentam como fragmentos isolados, mas que são o prosseguimento de narrativas anteriores e que, ademais, continuam nas narrativas subseqüentes. Por este modo, uma análise mais detalhada nos permite identificar a presença de dois "estratos fontes" coerentes em si e que foram combinados posteriormente.
§ 18. MÉTODOS,
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Como critérios para reconhecer e separar os "estratos fontes" queremos lembrar sobretudo os que se seguem: a) Um determinado número de textos ou de fragmentos aparecem duas ou mais vezes com certas alterações. Passagens inteiras, paralelas mas separadas por longos intervalos, relatam os perigos a que esteve exposta a mulher do patriarca (Gn 12; 20; 26), ou reproduzem o decálogo do tempo de Moisés (Ex 20; 34). Em outros casos, as versões paralelas se apresentam não separadamente mas entrelaçadas, formando uma única perícope como no exemplo clássico da história do dilúvio (Gn 6.5-9.17), da novela de José (Gn 37; 39-48; 50) e do episódio de Balaão (Nm 22-24). b) Os fragmentos paralelos apresentam diferenças e contradições que nos indicam tratar-se de textos independentes. Nas duas histórias da criação (Gn 1.1-2.4a e 2.4b-25) observam-se, as seguintes diferenças: Estado primitivo descrito como um mar caótico - descrito como uma estepe, Ordem de criação: plantas - animais - homem - homem-plantas-animais, Criação simultânea do homem e da mulher - criação sucessiva. Na história do dilúvio logo nos chamam a atenção as seguintes diferenças: Dilúvio provocado por uma chuva de 40 dias - provocado por um segundo caos, Duração de 40 + 21 dias - duração de 12 meses + 21 dias, Preservação de sete casais de animais impuros - de um casal de animais de um casal de animais puros de cada espécie. de cada espécie.
c) Semelhantes divergências encontramos nas determinações legais. Ex 20.24 exige a ereção de altares nos lugares onde ocorreu alguma revelação, ao passo que Dt 12.14 a restringe a um único lugar. Ex 28.1 restringe a função de oferecer sacrifícios aos descendentes de Aarão, enquanto Dt 18.7 a estende a todos os levitas. Dt 16.13 fixa em 7 dias a festa dos tabernáculos e Lv 23.36 em 8 dias. d) A diversidade dos nomes divinos, de onde partiram WITTER e ASTRuc, não deixa de ter sua importância, porque a diversidade do seu emprego, apesar de sofrer reelaborações posteriores, foi bem preservada. J e outros "estratos fontes" (]l, L, N), até certo ponto diferentes dele, empregam o nome de Javé desde o começo, ao passo que E e P usam o nome de Eloim (P também o de Shadai). Somente com a revelação de Deus a Moisés (Ex 3.15; 6.6) é que introduziu o nome de Javé.
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e) O tipo de linguagem é diferente em cada um dos "estratos fontes".
U ma análise mais detalhada nos permite ver que a troca dos nomes de
lugares, pessoas, objetos etc., não é casual, mas ocorre juntamente com outros aspectos de diferenciação. Em DRIVER e STEUERNAGEL encontramos tabelas explicativas a este respeito. São sobretudo as diferenças entre J e E que nos levam a concluir que as antigas tradições passaram por um processo separado de aperfeiçoamento nas diversas regiões do país. f) Por fim, desperta-nos a atenção a diversidade das maneiras de considerar os fatos. Assim, p.ex., a lista de povos utilizada em Gn 9.20-27 se limita à região da Síria e da Palestina, enquanto as duas listas unidas em Gn 10 cobrem um espaço muito mais amplo, o qual, por sua vez, apresenta graduações no que respeita aos detalhes. Também a distância entre Deus e o homem é concebida de modo diverso. Na história de Agar (Gn 16), o anjo de Javé se encontra na terra, ao passo que em Gn 21 ele a chama do céu. Na história da vocação de Moisés (Ex 3), segundo uma das narrativas, ele se mostra impertinente quando Deus lhe aparece. Segundo outra narrativa, porém, ele aparece cheio de temor. Observam-se também diferenças na conceituação ética. A passagem de Gn 12.10ss simplesmente expõe a mentira de Abraão segundo o qual Sara era sua irmã. Já em Gn 20 esta mentira é mitigada com a explicação de que Sara era meia irmã de Abraão. É sobretudo nos "estratos fontes" D e P que encontramos concepções teológicas bem definidas que os diferenciam tanto entre si como das camadas mais antigas. A pesquisa do Pentateuco até nossos dias permite-nos, portanto, concluir com segurança que outrora havia vários "estratos fontes", surgidos uns depois dos outros e recobrindo um período que vai dos primórdios até aos tempos antigos e destes até à morte de Moisés e à conquista da Palestina por Israel. Estes "estratos fontes" foram reunidos, mais tarde, provavelmente em diversas etapas ou combinados entre si. 3. O método complementar
o método das adições falha em parte ou no todo, ao procurar solucionar o problema da origem dos códigos legais, e falha porque estes códigos não são constituídos de dois ou mais "estratos fontes" que correm ao longo da referida obra. É neste caso que o método complementar faz valer seus direitos. Do mesmo modo como as inexatidões que se encontram no código deuteronômico (Dt 12-16)melhor se explicam supondo-se nele uma coleção básica, que foi ampliada por acréscimos, assim também a maior
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parte do Deuteronômio é constituída por um bloco autônomo, encaixado numa moldura da qual se destaca nitidamente. E isto corresponde justamente à índole do método complementar. Também as outras partes do Pentateuco receberam elementos narrativos que foram incorporados, ora aos "estratos fontes" quando ainda autônomos, ora durante o processo de adição, ou mesmo posteriormente.
4. O método das composições Por fim, devemos considerar o método das composições, que se ocupa com o processo de composição à maneira de mosaico, onde de fragmentos isolados resulta um todo maior. Embora não se possa dizer, em termos da hipótese dos fragmentos, que o Pentateuco tenha sido composto por um único autor, a partir de um grande número de fragmentos isolados e desconexos, ou mesmo de coleções de extensão mediana, pois estes fragmentos, como também as coleções, muitas vezes se acham unidos e entrelaçados, contudo, com este método o pesquisador se aproxima bastante da origem dos "estratos fontes". Nesses "estratos" encontramos simultaneamente antigos elementos de origem popular, material registrado por escrito, numerosos fragmentos isolados extraídos da tradição oral e amplos conjuntos de sagas. As coleções jurídicas foram formadas muitas vezes também por este processo.
5. Os motivos e as forças Resta ainda considerarmos a questão referente aos motivos e às forças que atuaram na origem da tradição do Pentateuco. Sem dúvida que este não constitui uma obra histórica no sentido moderno, quer dizer, não é uma obra que tivesse surgido do interesse de um grupo de eruditos por acontecimentos e figuras do passado (WEISER). Evidentemente que não devemos menosprezar de todo este ponto de vista, principalmente depois que, com relação ao mundo ambiente de Israel, no Antigo Oriente, se comprovou, em escala mais ampla do que em outra época, a existência de uma consciência histórica e de diversas modalidades de literatura histórica (§ 7,5). Também encontramos aí o ponto de vista didático que desempenhou igualmente papel de relevo no surgimento da tradição do Pentateuco, tanto mais se considerarmos que certas passagens de origem ainda mais recente mencionam ou supõem perguntas dos filhos feitas aos pais, à maneira
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de catecismo, e que se referem a ensinamentos caseiros de semelhante conteúdo. Não devemos esquecer, ainda, o pronunciado gosto dos orientais pela arte de narrar e de ouvir como um dos motivos que presidiram ao surgimento e à transmissão de narrativas. Estes três pontos devem ser contrapostos de imediato à concepção cultual unilateral, que vê as raízes da tradição do Pentateuco exclusivamente em um antigo culto festivo de Israel. É verdade que o culto desempenhou papel de relevo em tal sentido, e um indício deste fato pode-se encontrar na utilização de lendas ligadas aos santuários e ao culto, mas o culto por si só não constitui o único critério de explicação. Pode-se admitir que narrações isoladas e mesmo grupos de narrativas tenham sido utilizados durante o culto. Pode-se, talvez, constatar que determinada narrativa tenha sido elaborada à luz de uma ação cultuaI, como a história do Sinai, que MOWINCKEL qualifica de "descrição" ou reprodução de uma festa cultuaI, embora esse tipo de explicação necessite de um exame mais acurado, considerando-se que o culto anterior ao exílio consistia sobretudo no ministério do sacrifício e não no ministério da palavra. Mas a partir do momento em que se procure interpretar a tradição do Pentateuco, em parte ou em seu todo, como o resultado ou o produto do culto, ou, viceversa, se procure considerá-la como norma e legitimação do culto, sob a forma de lenda festiva de uma celebração cultual, tal posição deve ser rejeitada por não poder ser demonstrada à base dos textos existentes. PEDERSEN, p.ex., interpretou Ex 1-15, com base em 12s, como sendo uma lenda festiva da páscoa, e foi seguido por NOTH nos pontos que dizem respeito aos caps. 1-13. Em face desta questão, é preciso sobretudo não esquecer'" que as prescrições específicas sobre a páscoa, a solenidade dos mazzot ("ázimos") e a consagração dos primogênitos (12.1-20, 24-27a; 13.3-16) pertencem aos "estratos fontes" mais recentes das fontes D e P, originários de uma época em que a narrativa básica já existia desde há muito tempo. Além disso, não é exato dizer que pela páscoa se ofereciam primogênitos de animais. A idéia de proteção aos primogênitos de Israel e do abandono dos primogênitos dos egípcios não deriva, portanto, da páscoa, nem esta pode ser considerada como embrião cultual da história das pragas. Em conclusão, é improvável que antes de Dt 16.1-8 a páscoa tenha sido colocada numa
53
Quanto aos particulares, cf. G. FOHRER, Überliejemng und Geschichte des Exodus, 1964, 79-97.
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relação de sentido "historicizante" com a narração do Êxodo. Isto só vale para o caso da festividade dos mazzot ("ázimos") em terras de Canaã (Ex 23.15; 34.18), originariamente independente da narrativa anterior. Existe, certamente, em Ex 12.21, uma vinculação com a páscoa, pois o substrato narrativo desta fonte precisou de recorrer a um rito sangrento de origem nômade para justificar o fato de os primogênitos israelitas terem sido poupados perante o "devastador", e neste sentido terá escolhido o rito da páscoa. Mas se o fez, foi porque a circunstância exigia sangue, e não por se interessar pela páscoa em si, como 12.21-23 nos faz ver claramente. Deste modo deixa de ter sentido a distinção que se faz entre a tradição do Êxodo e a tradição do Sina i, distinção esta cujas raízes estariam no fato de elas derivarem da páscoa, mas que se revela errônea, quando examinada à base dos motivos do método da história das tradições?". Somente o cântico de Moisés (Ex 15.1-19), incorporado posteriormente, nos dá a impressão de ter havido um corte profundo entre o Êxodo e os acontecimentos posteriores, quando, na realidade, não se trata de dois "temas" (NoTH), mas de um complexo único. VON RAD também apossou-se da tese de MOWINCKEL sobre a história do Sinai, mas modificou-a, afirmando que a narrativa em questão se refere à festa da renovação da aliança por ocasião da festa do outono, celebrada em Siquém. Deste bloco de separa a tradição referente à conquista da terra e cuja versão mais antiga deve encontrar-se no chamado pequeno credo histórico (Dt 26.5ss), considerado como a lenda da festa dos sete dias, celebrada no santuário de Guilgal. Contra a primeira afirmação temos o fato de que a tradição do Êxodo se acha ligada à do Sina i, pouco importando se a fé aí postulada não esteja documentada em parte alguma nem possa ser deduzida a partir de Ex 19; [s 8.34; Dt 27, textos estes em parte mais recentes (Dt 27) ou revistos em época mais próxima (js 24). Quanto à segunda hipótese, não resta dúvida de que é válido afirmar que a tradição da conquista da terra prometida, pelo menos a do livro de [osué, originariamente não estava ligada à narrativa de Moisés e do Sina i, mas constituía um bloco independente. Este bloco, porém, para não falar de todo o Hexateuco, não se desenvolveu a partir de um credo do culto, como foi demonstrado pormenorizadamente em uma nova pesquisa de Dt 26.5ss e, em parte, das passagens análogas, realizada, entre outros, por BREKELMANS, ROST, WEISER e VAN DER WOUDE. Em Dt 26.15s, com relação à entrega de todos os primeiros frutos do campo, por ocasião da qual se pronunciava o chamado credo, não se fala de uma determinada festa, nem se pode
54
Para a narrativa do Êxodo cf. FOHRER, op. cii., para a narrativa do Sinai veja-se W. BEYERLIN, Herkunft und Geschichte der iiliesien Sinaitraditionen, 1961.
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o PENTATEUCO falar, por causa da mutabilidade dos dias de colheita. Além disso, o texto é mais uma oração ou uma espécie de catecismo que devia, evidentemente, enquadrar o rito campestre nas tradições históricas da fé javista, procedimento este que não data absolutamente da época mais antiga. O texto supõe, aliás, como bem conhecidas as tradições históricas e não é o seu embrião. Pelo contrário, constitui um resumo dessas tradições, sendo destinado ao exercício do magistério e da aprendizagem. Que ele cite o episódio do Êxodo e da conquista da terra prometida, mas deixe de lado o acontecimento do Sinai, é tanto menos de admirar quanto a ausência da tradição do Sinai em outras passagens. A referência à libertação do Egito constituía para Israel a confissão fundamental de fé, que naturalmente não cessará de ser recordada. O acontecimento do Êxodo teve várias conseqüências, uma das quais foi o episódio do Sinai e outra a conquista da terra prometida, considerada como a última e a mais importante, ou seja, aquela que representa a consecução do objetivo estabelecido com o episódio do Êxodo. O fato de a tradição do Sinai não ser mencionada não significa que os textos não a conheciam, mas que, para eles, a aliança então concluída não exerceu o papel que na atualidade se atribui ao conceito de "aliança". Por último, WEISER parte da constatação de que a ligação entre a revelação do Sinai e a tradição (originariamente autônomar" da conquista da terra não é propriamente obra do J, mas surgiu antes dele e era uma tradição que ele encontrou. Mas WEISER entende este complexo - revelação da vontade divina e revelação da natureza de Javé como constituído de elementos básicos de uma festa cultual que seria a festa da aliança, realizada provavelmente no outono, em torno do santuário central da confederação sagrada das tribos, cujas instituições deviam ainda continuar na época dos reis. O Pentateuco e suas fontes devem ser entendidos, portanto, como fixação de tradições que provêm diretamente do culto e se mantêm ainda em relação viva com ele e se destinam à recitação no culto, aliás como uma espécie de lecionário para uso de uma determinada pessoa do culto. Nesta hipótese, quase tudo se interliga e se vincula à festa da aliança aí postulada: a tradição histórica sagrada, o direito e as leis da Aliança, o processo de "historização" de outras festas, a idéia do grande Israel, indo até à leitura da Torá da Sinagoga. O fato, porém, de um único ato cultual ter sido elevado à categoria de princípio exclusivo de explicação de uma história, no mínimo milenar, torna este princípio suspeito de antemão, em face do grande número e da variedade de fenômenos. Pressupõe também outras hipóteses sobre as quais se baseia e que consistem em
55
Isto se deve acrescentar, para distinguir de
WEISER.
§ 18. MÉTODOS, RESULTADOS EPROBLEMAS
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admitir a existência de uma tradição da aliança sagrada contraída com Javé, cultivada no santuário comum e que tinha por objeto a revelação e a realização da salvação na representação da história salvífica e na renovação da Aliança (WEISER). Nesta sentença existem apenas meras suposições, como sejam: 1) a hipótese de uma confederação sagrada das tribos, que nunca é mencionada, principalmente porque as listas dos filhos de Jacó representam antes genealogias (§ 13,1), e porque a existência desta confederação é contraditada pelo que se observa no desenrolar da história dos [uizes'"; 2) a hipótese de um santuário central e comum, cuja existência não se pode deduzir a partir do costume de se guardar a arca da Aliança'": 3) a hipótese de uma festa comemorativa da Aliança, ligada a uma determinada tradição cultual, da qual, porém, não se fala em parte alguma": 4) a hipótese de um tipo particular de culto, ao qual se liga o tema da revelação e da realização da salvação, hipótese que contradiz tudo o que o AT afirma diretamente sobre as ações cultuais; 5) a hipótese de uma representação e da realização de uma presença no culto, com o que se alude numa teofania de natureza cultual, cuja suposta ocorrência nos salmos nada tem a ver, do ponto de vista da história da tradição, com a teofania primordial do Sinai'". Todas estas hipóteses foram apresentadas como tentativas de explicar a origem dos "estratos fontes" do Pentateuco. Mas na realidade elas nada explicam; antes, atribuem um papel decisivo a um processo que não se pode absolutamente apreender.
Com a exposição, até aqui, dos motivos que deram origem à tradição do Pentateuco ainda não esgotamos o seu número. Devemos ainda mencionar um outro ponto de vista, determinante talvez para a época mais antiga: os complexos originais de tradições são as tradições da conquista da terra prometida ou das pretensões relativas a ela, e serviam para justificar as pretensões legais e religiosas das tribos israelitas a respeito da terra de cultura e de seus santuários. Isto se aplica, antes de tudo, à primeira série de narrativas composta pelo menos de três grupos de tradições que nos mostram as pretensões dos grupos de Abraão, de Isaac e de Jacó, fundamentadas na promessa divina, e também os inícios de sua realização. Em segundo lugar, aplica-se à série de narrativas que contêm as tradições do povo de Moisés, com referência à sua caminhada desde que Cf. as restrições de S. HERRMANN, "Das Werden Israels", TIzLZ 87 (1962), 561-574.R. SMEND, Jalzwekrieg und Stiimmebund, 1963. 57 J. MAIER, Das altiraelitisclze Ladelzeiligtum, 1965. 58 Mais detalhadamente cf. E. KUTSClI, Das Herbsfest in Israel, Diss. Mogúncia, 1955. 59 C. WESTERMANN, Das Loben Gottes in den Psalmen, 1953,69-72.
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saíram do Egito e percorreram o deserto até o monte de Deus, e deste até ao limiar de Canaã. Aplica-se, por fim, à série de narrativas relacionadas com a pessoa de [osué e que foram transmitidas fora do âmbito do Pentateuco, numa das partes do livro de [osué, Observamos em tudo isto uma correspondência entre a apresentação de um fundamento divino para as pretensões israelitas a respeito da terra prometida, simultaneamente com a promessa de que lhe seria dada uma descendência, e as pretensões de Javé a respeito dos israelitas. Deste modo podem aparecer intimamente unidos desde o início não só o acontecimento e o mandamento, mas a história e a Lei. Com a união das tradições e a combinação das fontes entre si, de um lado, por meio da novela de José, e do outro, por meio do relato da escolha de [osué para sucessor de Moisés, não se devia esperar outro resultado senão que cada uma das partes isoladas do grande conjunto em processo de formação fossem colocadas sob uma nova luz. Esta combinação se realizou principalmente no seio da tradição oral e viva, em todos os setores da vida quotidiana, durante vários decênios, e mesmo durante vários séculos.
§ 19. A ORIGEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS A. ALT, Der Gott der Viiter, 1929 (= Kleine Schriften, I 1953, 1-78). - W. BEYERLIN, Herkunft und Geschichte deriiltesten Sinaitraditionen, 1961. - D. O. EDZARD, "Mari und Aramãer?", ZA NF 22 (56) (1964), 142-149. - H. EISING, Formgeschichtliche Untersuchung zur Jakobserziihlung der Genesis, 1940. - G. FOHRER, "Tradition und Interpretation im Alten Testament", ZAW 73 (1961), 1-30. - ID., Überlieferung und Geschichte des Exodus, 1964. - H. GRESSMANN, "Ursprung und Entwicklung der [osephSage", em: Gunkel-Festschrijt, I 1923, 1-55. - H. GUNKEL, "Die Komposition der [oseph-Ceschichten", ZDMG 76 (1922), 55-71. - J. HOFTIJZER, Die Verheissungen an die drei Erzviiter, 1956. - A. JEPSEN, "Zur Überlieferungsgeschichte der Vâter gestalten", WZ Leipzig 3 (1953/54),265-281. O. KAISER, "Stammesgeschichtliche Hintergründe der Josephsgeschichte", VT 10 (1960), 1-15. - C. A. KELLER, "Grundsãtzliches zur Auslegung der Abraham-Überlieferung in der Genesis", ThZ 12 (1956),425-445.S. MOWINCKEL, "Hat es ein israelitisches Nationalepos gegeben?", ZAW 53 (1935), 130-152. - ID., '''Rachelstãmme' und 'Leastãme"', em: Von Ugarit nach Qumran, Eissfeldt-Festschrift, 1958, 129-150. - M. NOTH, Überlieferungsgeschichte desPentateuch, 1948. - ID., Die Ursprünge desalten Israel im Lichte neuer Quellen, 1961. G. VON RAD, "Verheissenes Land und Jahwes Land im Hexateuch", ZDPV 66 (1943), 191-204 (= Gesammelte
§ 19. A
ORIGEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS
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Studien zum Alten Testament, 1958,87-100). - lo., "Josephsgeschichte und altere Chokma", VTSuppl I, 1953, 120-127 (= ibid. 272.280).- L. ROST, "Die Gottesverehrung der Patriarchen im Licht der Pentateuchquellen", VTSupp17, 1960,346-359. - H. SEEBASS, Moseund Aaron, Sinaiund Gottesberg, 1962. - lo., Der Erzvater Israel und die Eínführung der Jahweverehrung in Kanaan, 1966. - J. STEINMANN, Les plus ancíennes tradítíons du Pentateuque, 1954. - R. DE VAUX, "Les Patriarches Hébreux et l'Histoire", Siudii Biblici Franciscani LiberAnnuus 13 (1962/63), 287-297. - A. VERGOTH, Joseph en Égypte, 1959. - A. S. VAN DER WOUOE, Uíttocht en Sinai, s.d. (1961).
1. Os patriarcas As narrações históricas do Pentateuco, antes de encontrar sua forma definitiva dentro dos "estratos", passaram por um longo processo de formação e de transmissão, cujas linhas fundamentais é possível identificar passo a passo. Isto se aplica em primeiro lugar às tradições referentes aos patriarcas ou "pais principais" [arquipais] do Gênesis. Não podemos perder de vista que, precisamente em sua forma atual, essas tradições encerram uma multidão de elementos de origem estrangeira que lhes foram acrescentados ao longo de séculos. Se excluirmos as ampliações que resultam do pórtico que é a história dos primórdios (Gn 1-11), e da novela de José (esta como ponto de transição para as tradições mosaicas), e se eliminarmos da tradição atual os elementos de origem estrangeira, ela ficará reduzida a umas poucas notícias e a umas poucas histórias. Pergunta-se se por detrás desses e, mesmo, de outros elementos não se deva procurar um núcleo antigo de tradições. A este núcleo pertenceriam sobretudo os nomes de pessoas que correspondem à forma típica dos nomes não-acádicos e são conhecidos através dos textos mesopotâmicos da primeira metade do 11 milênio a.c. Trata-se principalmente de nomes fraseológicos, compostos do imperfeito de um verbo e do apelativo de um deus, como o nome de Israel, ou de nomes abreviados, sem o apelativo divino, como Isaac. Nomes como o de Abraão e Jacó são testemunhados para a referida época, mas somente para ela. NOTH, por sua vez, baseado nos textos de Mári, do médio Eufrates, cuja residência real com seus titulares pertencem à camada dos dominadores que trazem nomes não-acádicos e que teriam emigrado nos sécs. XX-XVIII a.c., acredita poder extrair vocábulos e modos de falar provenientes das camadas dos pastores errantes (nômades), com sua organização tribal, suas instituições peculiares, suas concepções jurídicas, que encontram similares no antigo Israel. Sob este aspecto, e mesmo que se deva admitir uma outra posição, em face da refutação apresentada por EDzARD,
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a tradição do Antigo Testamento atesta a origem de grupos israelitas primitivos, originários da Mesopotâmia, e designa sua terra natal (Gn 24.4,10) como Aram-Naaaraim, o país dos arameus, situado entre dois rios, isto é, entre o Eufrates e um de seus afluentes. É a esta região que se refere o nome da cidade de Harã, de onde Abraão teria partido para a Palestina e a qual Jacó visitou, quando fugiu da face de Esaú. É a esta mesma região que se reportam igualmente os nomes dos supostos parentes de Abraão: Nacor, que corresponde ao nome da cidade de Nahur, região administrativa de Harã; Sarug, que corresponde ao nome da cidade de Sarug, entre Harã e o Eufrates, e Terah, que corresponde ao nome de Til Turahi, na bacia do Balihu. Outros pontos de apoio vamos encontrá-los nos textos de Nuzi, a leste do médio Tigre, que datam de uma época um pouco mais recente, ou seja, de cerca de 1500 a.C." Através deles, podemos captar as condições jurídicas de origem hurrita, as quais, ao que se supõe, eram as que existiam entre os hurritas da região do Eufrates. Uma série de narrativas em torno dos patriarcas refletem seus usos e costumes legais. Dado que elas não se encontram nem nas leis ou narrativas palestinenses nem fora do âmbito das tradições referentes aos patriarcas, é sinal de que encerram antigas recordações da vida das regiões do médio Eufrates, durante o séc. XVI a.c. Entre elas se inclui a preocupação de estabelecer um escravo como herdeiro de seus bens; a anulação desta medida, após o nascimento de um filho carnal (Gn 15)61; o papel representativo de uma escrava na concepção de um filho (16 e 30)62; a recusa temporária de lançar fora a escrava com o filho (21.8ss); a autoridade fratriarcal no seio da família patriarcal (24.50s e 34.5-18); a venda do direito de primogenitura (25.29ss), e a função que a propriedade da casa de Deus desempenha (31.19)63. Evidentemente, isto não significa que as narrativas onde se encontram estes 60
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C. H. GORDON, "Biblical Costums and the Nuzi Tablets", BA 3 (1940), 1-12. - R. DE VAUX, Die hebraischen Patriarchen und die modernen Entdeckungen, 1960 (francês: em RB 53; 55; 56). A. CAQUOT, "L'alliance avec Abram (Cenêse 15)", Semitica 12 (1962), 51-66. - O. KAISER, "Traditionsgeschichtliche Untersuchung von Genesis 15", ZAW 70 (1958), 107-126. - H. SEEBASS, "Zu Genesis 15", WuD 7 (1963), 132-149. - L. A. SNIDJERS, "Genesis XV", OTS 12 1958,261-279. S. KARDIMON, "Adoption as a Remedy for Infertility in the Period of the patriarchs", JSS 3 (1958), 123-126. A. E. DRAFFKORN, Ilani/Elohim, JBL 76 (1957), 216-224. - M. GREENBERG, "Another Look at Rachel's Theft of Teraphim", ibid. 81 (1962),239-248.
§ 19. A ORIGEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS
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elementos do direito familiar constituam verdadeiros relatos históricos. Mas os elementos em si são traços de tradições primitivas. De época mais recente (sécs, XV-XIV a.C) é, sobretudo, o termo hapiru ou 'apiru'", conhecido através das cartas de Amarna, as quais formam a correspondência dos reis das cidades palestinenses com os faraós. Este termo se acha agora documentado para todo o âmbito do Antigo Oriente. Originariamente designava, talvez em sentido sociológico, certas "pessoas que não pertenciam a uma família", e posteriormente os estrangeiros de categoria jurídica inferior em determinado setor do Estado. A expressão 'ibri. que deve provir do termo anterior, caracteriza os israelitas do período patriarcal, como grupos formados por estrangeiros de categoria social inferior. Na realidade, porém, devemos considerá-los como nômades criadores de gado miúdo, ligados aos itinerários ao longo dos quais se sucediam aguadas e pastagens bastante férteis, pastores estes que alternavam a estepe com as terras de cultura, e se mantinham em ativa relação com ela. Não é por acaso, certamente, que os patriarcas são descritos quase sempre como donos de rebanhos de ovelhas e cabras, deslocando-se para cima e para baixo, preocupados com o direito sobre poços e ocasionalmente já garantindo para si a posse de bens de raiz e começando mesmo a aliar a criação de animais com um certo cultivo da terra. Também isto corresponde a um estágio antigo e determinado e, diríamos mesmo, à situação dos chamados patriarcas. Se a tradição os descreve, não como beduínos criadores de carnelos'" (apesar de os supor possuidores de 64
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R. BORGER, "Das Problem der 'apiru ("Habiru")", ZDPV 74 (1958), 121-132. - J. BOTTÉRO, Le probleme des Habiru à la Aéme rencontre assyriologique internationale, 1954. - A. DE BUCK, "De Hebreeén in Egypte", em: Varia Historica, 1954. - M. GREENBERG, The Hab] piru, 1955. B. BRENTJES, "Das Kamel im Alten Orient", Klio 38 (1960),23-52. - W. DOSTAL, "The Evolution of Bedouin LHe", em: L'aniica società beduina, 1959, 11-34. - J. P. FREE, "Abrabam's Camels", JNES 3 (1944), 187-193. - H. KLENGEL, "Zu einigen Problemen des altvorderasiatischen Nomadentums", ArOr 30 (1962), 585-596. - W. G. LAMBERT, "The Domesticated Camel in the Second Millenium, Evidence from Alalakh and Ugarít", BASOR 160 (1960), 42s. - A. POHL, "Das Kamel in Mesopotamien", Or, 19 (1950),251-253, Io.. "Nochmals das Kamel in Mesopotamien", ibid. 21 (1952), 373sIo.. "Zur Zâhmung des Kamels", ibid. 23 (1954), 453s. - R. WALZ, "Zum Problem der Domestikation der altweltlichen Cameliden", ZDMG 101 (1951), 29-51. - In., "Neue Untersuchungen zum Domestikationproblem der altweltlichen Cameliden", ibid. 104 (1954), 48-87. - In.. "Beitrãge zur altesten Geschichte der altweltlichen Cameliden unter besonderer Berücksichtigung des Problems des Domestikationszeitpunktes", em: Actes IVe Congrês Anthropologique, Il1, 1956, 190-204.
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camelos) ou como condutores de caravana no Negeb", nem como agricultores fixamente. estabelecidos, mas simplesmente sob o influxo da vida sedentária e como seminômades em vias de sedentarização, então poderemos identificar aí um dos traços de antiga tradição. ALI identificou o núcleo da tradição patriarcal. Neste núcleo as figuras dos "pais" são apresentadas como fenômenos históricos em função do "Deus dos pais" ou dos deuses-pais, divindades às quais se prestava culto permanente numa série de santuários espalhados na terra de cultura", e isto precisamente depois da conquista do país. Trata-se de deuses dos clãs, seja que os considerem como deuses dos pais ou como uma forma nômade da religião de El. Esses deuses foram assumidos e venerados, posteriormente, graças a uma revelação recebida pelo fundador ou chefe do clã. O que esses deuses ofereciam aos clãs eram as promessas de que eles haveriam um dia de possuir a terra e teriam uma descendência, promessas estas que faziam parte do núcleo fundamental da tradição. Paralela à promessa de transformar o grupo baseado nos laços de sangue Cam) em uma grande nação, territorial e politicamente constituída (gõi), surge aquela outra que se refere à posse da terra (Gn 12.2,7; 17.5,8). O núcleo fundamental é constituído pela denominação dos patriarcas enquanto destinatários da revelação e das promessas, enquanto fundadores do culto e chefes carismáticos de seus clãs, no seio de uma cultura ainda intocada e não especializada - chefes, porém, de clãs diferentes, porque as relações de parentesco entre os patriarcas só se estabeleciam de forma secundária. Por isso é que voltam sempre as descrições dos aparecimentos de Deus trazendo bênçãos e prometendo que possuirão uma terra de cultura e terão descendentes; mas também se repetem as descrições das disputas com aqueles que até então eram os donos do país. É provável que tenha havido antigamente muitas dessas tradições a respeito dos pais,
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W. F. ALBRIGHT, "Abram the Hebrew: A New Archaeological Interpretation", BASOR 163 (1961),36-54. - lo., "Some Remarks on the Meaning of the Word SBR in Genesis", ibid. 164 (1961),28. - E. A. SPEISER, "The Word SBR in Genesis and Early Hebrew Movements", ibid., 23-28. - De novo diferentemente: C. H. GORoüN, "Abraham and the Merchants of Ura", JNES 17 (1958), 28-31. Cf. também O. EISSFELDT, "EI and Yahweh", JSS 1 (1956),25-370 - B. GEMSER, Vragen rondam de Patriachenreligie, 1958. - V. MAAG, "Der Hirte Israels", Schweiz. Theol. Umschau 28 (1958),2-28. - L. RüST, "Die Gottesverehrung der Patriarchen im Lichte der Pentateuchquellen", VTSuppl 7, 1960,346-359. - C. STEUERNAGEL, "[ahwe und die Vatergõtter", em: Beer-Festschrift, 1935,62-71.
§ 19. A
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pois é claro que se deve supor um número muito maior de clãs ou de grupos de israelitas que se infiltraram pouco a pouco na Palestina. Contudo, somente algumas dessas tradições se tornaram patrimônio comum de Israel ou foram incorporadas a esse patrimônio. As tradições do clã de Abraão, de Isaac e de Jacó como, para simplificar, devemos chamá-las, e que foram utilizadas no Gênesis, representam, por contágio de elementos mesopotâmicos e hurritas mais antigos, as aspirações religiosas e legais desses clãs a respeito da terra de cultura. Como as descrições os apresentam em vários estágios de relação com a terra de cultura, desde os contatos fortuitos até ao começo da sedentarização, é evidente que aí se trata igualmente de tradições ligadas aos primeiros grupos israelitas dentro da Palestina. O núcleo original das narrativas referentes aos patriarcas é constituído, na forma e no conteúdo, pelas narrativas que têm como objeto, de uma parte, as pretensões de vários grupos de israelitas acerca do país e, por outra parte, a conquista da mesma por estes grupos ligados a fundadores ou a chefes carismáticos de clãs que se encontram vinculados às promessas dos deuses do clã. Desse modo tem-se delineado também o seu pano de fundo histórico. Em seus aspectos particulares, as tradições de Abraão e Isaac se prendem a lugares situados nas regiões das montanhas da Judéia e do Negeb, onde as tribos tinham o seu domicílio. É aí que essas tradições surgiram e inicialmente foram retocadas, onde Gn 15 e 26.2s talvez representassem o ponto de partida, enquanto a tradição de Isaac, num processo subseqüente, foi transferida em grande parte para Abraão e se atrofiou. A tradição de Jacó, por seu lado, se prende a lugares situados na região das tribos da média Palestina (Siquém e Betel), onde foram inicialmente revistas. Não podemos dizer com certeza se a figura de Jacó foi levada pelos colonos para a região transjordânica de Galaad e modificada dentro do ciclo JacóEsaú e [acó-Labão, segundo as necessidades da nova situação (NoTH), ou se, pelo contrário, deve-se distinguir entre duas figuras de Jacó, uma a leste e outra a oeste do Jordão, e independentes entre si (EISSFELDT). Antes, pode-se mesmo supor que a tradição transjordânica provém de um clã israelita que havia muito defendia suas pretensões sobre uma região bem determinada do país, situada a leste do [ordão e cujo ancestral (Gn 32.29; 35.10) é identificado com Jacó. Devemos ter sempre presente que nenhuma narrativa ou informação a respeito dos patriarcas subsistiu em sua forma original, mas, via de regra, em uma forma que foi elaborada e retocada repetidas vezes.
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2. Moisés Em linha de princípio, o que se passa com a tradição de Moisés não é diferente daquilo que ocorre com a tradição dos patriarcas. Há um paralelo entre a conexão dos elementos teofania, oráculo salvífico, culto, função de chefia, e o núcleo das narrativas em torno dos patriarcas. Semelhantemente aos pais, Moisés aparece como o destinatário de uma revelação, como chefe e fundador carismático de um grupo que vive em condições primitivas e que, para simplificarmos, chamaremos de grupo de Moisés. Neste chefe e fundador se encontram ainda unidas todas aquelas funções, mesmo as sacerdotais e proféticas. Enquanto, de um lado, o motivo do aumento do povo israelita no Egito não é seguramente um elemento original, mas serve para estabelecer a ligação posterior com as tradições dos patriarcas, por outro lado, a promessa feita ao povo mosaico de que haveria de possuir a terra (Ex 3.8; 13.17), constitui um elemento original da tradição histórica. Tal como as promessas do Gênesis, relativas à posse da terra e ao advento de uma posteridade, também a referida promessa faz parte do núcleo fundamental da tradição. Este fato corresponde, ao mesmo tempo, à situação histórica da época, com a sedentarização paulatina dos grupos (semi) nômades na terra de cultura da Palestina durante os sécs. XIV-XIIa.c., como corresponde também a outras tradições do grupo mosaico, concentradas em torno do acontecimento da penetração do povo nessa mesma terra. Que se trata de uma promessa a respeito da posse da terra e que deve ser distinguida da promessa do Gênesis, é o que nos mostra a descrição que se faz, pela primeira vez, em Ex 3.8, da terra, de onde manam o leite e o mel. Talvez se encontre aí uma expressão antiga dos israelitas que moravam no Egito e imaginavam uma terra rica, de condições semelhantes àquelas do país em que estavam. Deste modo é que se pode entender a sua decepção posterior, ao tempo em que viviam nas estepes e no deserto, depois da sua fuga do Egito. A partir desta constatação, as tradições em torno do povo mosaico aparecem, de imediato, e semelhantemente às tradições ligadas aos patriarcas, como uma narrativa histórica das pretensões desse povo a respeito da terra e da sua conquista por ele. Como naquelas, também aqui as pretensões levantadas por um bando de israelitas a respeito da terra de cultura na Palestina devem receber sua justificação do ponto de vista religioso. Como nelas, também aqui se verifica a mesma coisa, mediante a evocação de uma promessa feita pela divindade à qual o povo se havia dedicado por instigação de seu chefe, e que desta promessa faz a base de
§ 19. A
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seu relacionamento com o referido povo. A tradição referente a Moisés devia ser apresentada de tal modo, que ao povo por ele conduzido desde o Egito até o limiar da Palestina correspondesse uma partilha da terra a leste do [ordão, exatamente como aos clãs e grupos de Abraão, de Isaac, de Jacó, e outros. Era somente à luz dessa futura posse da terra que tinha sentido a fuga do Egito. Esta fuga agora acontece, por sua vez, como no-lo mostra o Cântico de Míriam (Ex 15.20s), em nome de Javé, da mesma maneira como é dela que deriva a promessa da posse da terra. O resultado do empreendimento, atribuído a este nome, constitui um dos motivos essenciais para que a fé em Javé não permanecesse uma das tantas variantes da religião dos deuses dos clãs. A tradição do Êxodo não constitui um bloco isolado, que tivesse surgido de sagas individuais e desconexas (GRESSMANN), ou a partir de um elemento único da confissão primitiva de fé na libertação realizada por Javé, ou devesse ser incluído entre as lendas de uma celebração festiva do culto (§ 18,5). Na realidade, ao longo da exposição encontramos também elementos da tradição primitiva, que se ligam estreitamente àqueles do Êxodo. Esta vinculação aparece claramente, desde o começo, na relação que existe entre a vocação de Moisés e o Sinai/Monte de Deus'", no estabelecimento dos objetivos do Êxodo, mediante a promessa da posse da terra, e na lista dos sítios dos acampamentos, lista que começa com a história da fuga do Egito e continua depois do Cântico de Míriam. Esta vinculação é reforçada, em sentido inverso, a partir do episódio do Sinai. Isto não significa que as tradições do Êxodo e do Sinai tenham existido separadamente. Pelo contrário, elas constituíram desde o início um todo único (BEYERLIN, FOHRER, VAN DER WOUDE).
Como a narrativa da introdução de um ordenamento na administração da justiça, graças ao sogro de Moisés (Ex 18)69, assim também a tradição do Sina i, reformulada e ampliada diversas vezes, contém um núcleo, considerado antigo em termos de história da tradição, e a partir do qual a figura de Moisés não pode continuar a ser repensada, como também não o pode a partir do núcleo da tradição do Êxodo. Em Ex 19 e 24 parece que
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o. EISSFELDT, "Lade und Cesetzestafeln", ThZ 16 (1960),281-284. - M. HAELVOET, "La théophanie du Sinai", EThL 29 (1953), 374-397. - W. RUDOLPH, "Der Aufbau von Ex 19-34", em: BZAW 66, 1936,41-48. CHR. H. W. BREKELMANS, "Exodus XVIII and the Origins of Yahwism in Israel", OT5 10, 1954,215-224. - R. KNIERIM, "Exodus 18 und die Neuordnung der mosaischen Cerichtsbarkeit", ZAW 73 (1961), 146-171.
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foram utilizados os elementos fundamentais da narrativa daquilo que aconteceu entre Javé e o grupo de Moisés, no Sinai. Nesta perícope, se percebe claramente que o acontecimento em si não tinha tanta importância, mas era considerado, enquanto consolidação da comunidade incipiente, como uma das muitas conseqüências da libertação do Egito. A narração que continua, sem interrupção, no livro dos Números, contém possivelmente outros elementos da tradição, pelos quais podemos deduzir que houve uma penetração em direção à Palestina, através ela Transjordânia somente havia pouco recolonizada por grupos arameus, ao passo que não se sabe claramente a que grupo pertence a tradição de Cades. Em suma, podemos deduzir a existência de um conjunto primitivo que consiste nas narrações referentes às pretensões do grupo de Moisés a respeito da terra e daquelas que tratam de sua conquista. Essas narrativas incluem os elementos da antiga tradição que vão desde a situação do povo no Egito, incluindo o Êxodo, o seu encontro e sua adesão a Javé no Sinai, a sua caminhada pelo deserto, até à entrada na Transjordânia e à morte do chefe carismático, aí ocorrida, e talvez até à integração do povo na terra de cultura, a ocidente do [ordão, Destas narrativas encontram-se similares nas tradições de outros clãs e outros grupos israelitas. Elas deviam servir para fundamentar as pretensões jurídicas e religiosas do grupo de Moisés a respeito da terra de cultura na Palestina. E isto se faz de um modo que é característico do AT, pelo menos até certo ponto, qual seja o de unir a fé em Deus com a narrativa de seu agir em relação aos povos e aos homens, no passado, no presente e no futuro.
3. Outras narrativas sobre a conquista do país Não foi conservada a tradição relativa ao período de sedentarização do grupo de Moisés nas terras de cultura a ocidente do Jordão. Essa tradição foi substituída, no contexto atual, pela tradição de [osué, que encontramos no livro do mesmo nome, principalmente porque o contexto de [osué originariamente era somente a narrativa da conquista do país a ocidente do [ordão. Sua menção no Pentateuco é, historicamente falando em termos da história das tradições, de origem secundária. De qualquer modo, percebe-se claramente, a partir daí, que existe na tradição de [osué uma outra narrativa a respeito da conquista do país. Mas nem por isso mesmo todas as tradições originariamente autônomas se encontram já identificadas. Também Nm 13-14 é uma história ligada à conquista da terra e descreve a ocupação da cidade cananéia de Hebron pela família de Caleb,
§ 19. A
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nas montanhas de [udá. A história de Seon (Nm 21.21-31) tem suas origens na memória de uma conquista daquela região pela tribo de Gad. Nm 32.1ss trata da partilha de terras da Transjordânia entre Gad e Rúben, ao passo que Nm 32.39-42 contém informações sobre outros grupos. Resta saber se as tradições ligadas ao oásis de Cades não provêm de uma outra narrativa a respeito de uma conquista territorial na qual o Aarão de Ex 17.10, ainda não revestido de traços sacerdotais, desempenha papel de relevo. Uma análise detalhada do Pentateuco descobrirá outros traços e alusões.
4. O desenvolvimento das narrativas fundamentais
o núcleo do Pentateuco e aquele das tradições a respeito de [osué são constituídos pelas narrativas das reivindicações e das conquistas territoriais por parte de diversos clãs, grupos e tribos israelitas, narrativas estas que contêm, pelo menos de algum modo, a seguinte constatação explícita: Javé entregou a terra em nossas mãos": Sua reelaboração posterior, realizada certamente a partir de uma tradição oral, não conduziu de imediato à formação dos "estratos fontes" do Pentateuco, mas, antes, como bem o demonstrou NOTH, e mesmo em razão dos pontos de contato entre J e E, certamente independentes um do outro, levou à formação de uma base comum, a que podemos dar o nome de "narrativa fundamental" (Grunderziihlung, abrev.: G). Se admitirmos uma terceira fonte mais antiga, então devemos distinguir entre uma primeira e uma segunda narrativa fundamental. Não podemos determinar a trajetória percorrida desde as tradições originais autônomas até a narrativa ou narrativas fundamentais complexas, mas apenas alguns de seus aspectos característicos. Foi particularmente neste estágio que certas forças cultuais e didáticas, como também o gosto de retrabalhar os elementos da narrativa exerceram sua influência no processo de formação das tradições. Em contrapartida, passam para segundo plano os temas relativos às pretensões territoriais que já se tinham concretizado em seus pontos principais. Contudo, ainda não predomina o interesse por apresentar a história em seu conjunto. a) Um passo importante dado em direção a G consistiu na vinculação que se estabeleceu entre as tradições patriarcais apresentadas sob a forma 70
s.
WAGNER,
225-269.
"Die Kundschaftergeschichten im Alten Testament", ZAW 76 (1964),
180
o PENTATEUCO
de genealogias. Podemos explicar que este fato se deu do seguinte modo: primeiramente se reconheceu, de modo geral, a narrativa de Jacó, que foi introduzida na tradição do Pentateuco ainda em estágio de formação, de sorte que a expansão da série genealógica se fez quase espontaneamente em sentido retrospectivo, com o alargamento do preâmbulo, através de Isaac e de Abraão enquanto antepassados de Jacó (Norn). Isto implica naturalmente que essa tradição procede de certo modo das tradições do Pentateuco. Mas como este ponto permanece obscuro, discute-se em saber se não é, pelo contrário, a história de Abraão que constitui o ponto de partida ao qual se seguiu, primeiramente, a história de Isaac, formada conseqüentemente de elementos extraídos dela, e, depois, a história de Jacó (Israel). Seja como for, as narrativas mencionadas e o conjunto que delas se originou tornaram-se bem cedo patrimônio comum dos israelitas. A conexão com as narrativas que daí surgiram deu como resultado que o acento se deslocasse para o tema da promessa de uma terra e de uma descendência, enquanto o motivo da realização dessa promessa passou a segundo plano. Acresce ainda que se faz a ligação entre as tradições dos patriarcas e Moisés, sem primeiramente passar pela novela de José. Tem-se a impressão de que a narrativa tinha por objeto imediato a descida de Jacó e de sua família ao Egito, como ainda o supõe Dt 26.5 que com o termo "arameu" provavelmente designa a Jacó (cf. Gn 24.4ss; 31.24). Por último, deve ter havido, em épocas remotas, a anexão de uma variante simples e antiga da tradição de [osué. Concomitantemente, a figura de [osué foi introduzida no Pentateuco. Efetivamente, sua investidura como sucessor de Moisés (Nm 27.15-23; Dt 34.9 em P, que não se enquadra na narrativa subseqüente da conquista da terra, contida neste "estrato fonte") nos conduz a uma tradição mais antiga que,. pelo fato de mencionar a pessoa de [osué, e esporadicamente sua investidura como sucessor de Moisés, pressupõe também a existência de outros "estratos fontes" (Ex 17.8ss; 24.13-15; 32.17s; 33.11; Nm 11.28-29; Dt 31.14, 23). Devemos admitir, por conseguinte, que já na primeira versão da fonte G se estabelecera a conexão entre a tradição de Abraão, de Isaac e de Jacó, de um lado, e a tradição antiga de [osué, do outro, conexão esta de onde resultou uma narração contínua. Enquanto a tradição dos patriarcas acentuava, neste novo conjunto, o tema da promessa da terra, a tradição de [osué servia para mostrar em primeira linha que a promessa se tinha realizado. A conexão da tradição de Moisés com o episódio do Êxodo e com o acontecimento do Sinai passou a ter como finalidade justificar as pretensões de Javé a respeito de Israel e a indicar as obrigações deste para com Javé.
§ 19. A ORIGEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS
181
b) No processo da formação de G foram assumidas inúmeras outras tradições antigas. Entre elas se contam as listas, como sejam o elenco dos reis de Edom (Gn 36.31-39), listas genealógicas (22.20-24; 25.1-6) ou narrativas (16.4-14; 19.30ss; 21.8-21; 25.21-26a, 29-34; 29-3071; 38.27-30) que trazem a marca da história do povo e da tribo, marca que é visível também na descrição do defloramento de Dina (34)72. Encontram-se, além disso, oráculos e cânticos, como o axioma legal (Gn 9.6), o oráculo a respeito de Rebeca (25.23), e as bênçãos pronunciadas por Isaac (27.27-29.9s). São raras as sagas da natureza, como aquelas que se referem à ruína de Sodoma (Gn 19)73, ao maná e às codornizes (Ex 16; Nm Tl), ou aos milagres das fontes (Ex 17; Nm 20)74. Em contrapartida, encontram-se numerosas lendas de santuários e de cultos, não raro de origem cananéia. Estas lendas tratam da revelação de EI-Roi (Gn 16); da substituição dos sacrifícios humanos pelos sacrifícios de animais, em um determinado santuário cujo nome já não se menciona (22.1ss); da descoberta dos sítios sagrados de Betel (28.10ss) e de Fanuel, junto ao [aboc (32.25ss)75; de ereção de altares em Siquém e Betel (33.18ss; 35.1ss), ao lado dos quais os cultos de Bersabéia e Hebron com seus arredores muitas vezes desempenham também papel de relevo; da sarsa ardente (Sinai; Ex 3); da serpente de bronze (Nm 21.4ss), e da instituição da circuncisão (Gn 17; Ex 4.24sS76; [s 5.2ss). Acrescenta-se ainda o material de tipo novelístico, como as narrações das
71 72 73
S. LEHMING, "Die Erzahlung von der Geburt der [akobsõhne". VT 13 (1963), 74-81. S. LEHMING, "Zur Überlieferungsgeschichte von Gn 34", ZAW 70 (1958),228-250. M. HALLER, "Die Blüemlialpsage religionsgeschichtlich gesehen", em: BertholetFestschrift, 1950, 208-221. - J. P. HARLAND, "Sodom and Comorrah", BA 5 (1942),
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76
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182
o PENTATEUCO
situações de perigo por que passa a mulher do patriarca (Cn 12.10ss; 20; 26), ou da aquisição de uma esposa (24). c) Esta última pode ser incluída também entre aquelas novas narrações que foram surgindo durante o processo de formação de C, a partir do material já existente, ou foram ampliadas e acrescentadas à maneira de midrash. Entre estas se enumeram as descrições das condições de trabalho dos israelitas no Egito (Ex 5.5-21), a história das nove primeiras pragas do Egito (7.14-10.29)77, as narrativas do culto à imagem do bezerro de ouro (32)78, do esplendor que saía da face de Moisés (34.29ss)79, da inspiração dos setenta anciãos (Nm 11.14ss), ou da revolta de Coré, de Datã e Abiram (16S)80, para só mencionarmos alguns exemplos característicos.
5. As duas narrativas fundamentais Entre os "estratos fontes" JE, de um lado, e N(JJ, L), de outro, existem inúmeros pontos de convergência como também diferenças essenciais. Estas diferenças se devem, em primeiro lugar, talvez ao fato de que o documento C foi elaborado em um processo diferente, no qual os fios de narrativas que desembocaram em JE e em N percorreram muitas vezes caminhos diversos, da mesma forma como as tradições diferentes do norte e do sul de Israel provocaram evidentemente as diferenças que observamos entre J e E. Em segundo lugar, as diferenças provêm do fato de 77
78
79
80
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§ 19. A
ORIGEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS
183
que N se formou a partir de um determinado estágio de G, durante o qual se deu a inclusão de elementos da tradição nômade, ao passo que JE é originário de um estágio recente, durante o qual lhe foram adicionados aqueles aspectos específicos que ele possui a mais em relação a N. O "estrato fonte" P pode permanecer fora de consideração neste contexto, do mesmo modo que D. Em qualquer caso, um cotejo entre os três mais antigos" estratos fontes" nos mostra que devemos admitir a existência de duas narrativas fundamentais: uma mais antiga (O), e uma mais recente (G2). Primeira narrativa fundamental
Segunda narrativa fundamental
.>.
J
E
N
Talvez devamos admitir que Gl circulava somente em uma tradição oral, ao passo que G2 existia provavelmente em urna versão escrita, ao tempo em que se deu a divisão do reino, após a morte de Salomão. Esta versão talvez se tenha formado em Jerusalém, onde sua posterior reelaboração e primeira fixação por escrito corresponderia à consciência nacional de Israel na época davídico-salomônica, juntamente com a crescente consciência a respeito de sua história. Depois da divisão do reino, G2 se teria bifurcado em duas versões: urna meridional e outra setentrional. a) Uma análise do Pentateuco nos permite constatar que G' narrava, em grandes traços, os pontos seguintes, onde nem sempre se percebe claramente qual teria sido a ordem original: Partida de Abraão (e Ló) de sua terra natal, Promessa de que possuirá a terra e terá uma descendência, Ruína de Sodoma e Comorra, salvação de Ló, Anúncio do nascimento de Isaac, Sara em situação de perigo, Expulsão de Agar, Nascimento de Isaac, Promessa feita a Isaac, Jacó-Esaú, [acó-Labão,
184
o PENTATEUCO Regresso de Jacó, sua estadia em Siquém ou Betel, Mulheres e descendência de Esaú, Descida de Jacó ao Egito, Opressão dos israelitas no Egito até o plano para exterminá-los, Introdução de Moisés, Estada de Moisés em Madiã e seu casamento, Vocação de Moisés em Madiã e sua volta ao Egito, Morte dos primogênitos egípcios e partida dos israelitas, Perseguição e libertação junto ao mar, Caminhada até o Monte de Deus (Sinai/Horeb), Episódio do Sinai (descida de Javé ou subida até Javé), Incidente e ordem de partida, Continuação da travessia, Aprovisionamento de água (em geral sob a forma do milagre de uma fonte), Maná e codornizes, Revolta de Aarão e Míriam ou de Datã e Abiram, Reconhecimento do país (Caleb) e suas conseqüências, Edom recusa passagem, Prosseguimento da caminhada e vitória sobre os amorreus, Várias murmurações e apostasia do povo, Morte de Moisés. É neste ponto que se encaixa a antiga e simples narrativa fundamental correspondente de [osué (§ 30,2). b) Em G2 foram incorporadas principalmente as seguintes narrativas:
Casamento de Isaac com Rebeca, Reconciliação de Jacó com Esaú, Novela de José, Primeiro encontro de Moisés com o faraó, Pragas precursoras do Egito, Introdução de uma organização judiciária, a conselho do sogro de Moisés, História de Balaão, Partilha de terra entre Gad e Rúben, Instalação de [osué como sucessor de Moisés.
Destes pontos, é de particular importância a inclusão da novela de José e da história de Balaão. A primeira delas é um adendo, tomado do âmbito médio-palestinense da "Casa de José" (Gn 37; 39-48; 50), e constitui uma composição global, formada de narrativas originariamente autônomas, construída segundo um plano definido, com um objetivo deter-
§ 19. A ORIGEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS
185
minado desde o início e colocada em função de um todo. Não há, entretanto, nenhuma probabilidade de que a novela remonte a uma antiga narrativa israelítica da época de Ramsés (VERGOTE). Existe estreita vinculação entre esta narrativa e a explicação dos motivos da emigração de israelitas para o Egito, a ascensão da "Casa de José" e a suplantação de Manassés por Efraim. Se, com base nisto, é possível situá-la por volta de 1100 a.c., talvez se possa admitir que, dada a presença de material egípcio, ela constitui a reformulação de uma história egípcia que data de época mais recente. É a partir daí que se explicam talvez os inegáveis elementos de natureza sapiencial que nela se encontram. Bastante complicado é o problema das origens da história de Balaão (Nm 22-24)81. É preciso distinguir aí entre os cânticos e a narrativa propriamente dita. Devemos concordar com MOWINCKEL em que originariamente os dois cânticos de Nm 24 eram autônomos, ao passo que os cânticos de Nm 23 dependem deles, e que os mesmos em nenhuma passagem pressupõem o conhecimento da narrativa em sua forma atual. Contudo, a narrativa de E não depende de J. Pelo contrário, as duas se desenvolveram a partir de G2, onde foi acrescentada uma tradição de Balac em que se trata de uma contenda entre israelitas e moabitas. Os cânticos de Nm 24 e, mais adiante, Nm 31.8ss; [s 13.22, também supõem a existência de uma saga de Balaão. Parece que esse Balaão era apresentado como um carismático, dono de uma palavra que operava prodígios à sombra do santuário de Baal-fegor, na Transjordânia. As representações sobre ele vão desde sua imagem como inimigo mau, até à vitória divina sobre seus poderes malignos e ao momento em que! é forçado por Deus a pronunciar uma bênção eficaz sobre Israel, em vez de maldições. É desta bênção que provêm os cânticos de Nm 24, que J foi o primeiro a incluir em sua exposição (§ 22,2). A história primeva de Gn 1-11, pelo contrário, ainda não faz parte de G2. Somente J acrescentou este pórtico, cuja forma imita a epopéia de 81
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186
o PENTATEUCO
Atrahásis (§ 12,2). Neste ponto, Jfoi seguido, primeiramente, por N, que, no entanto, se utiliza largamente de outras narrativas ou de outros temas. Mais tarde também foi utilizado por P, que o imita sob muitos aspectos.
§ 20. A ORIGEM DAS COLEÇÕES E CÓDIGOS JURÍDICOS NÃO-AUTÔNOMOS
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§ 20. A
ORIGEM DAS COLEÇÕES E CÓDIGOS JURÍDICOS NÃO-AUTÕNOMOS
187
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1. Conspecto geral Além das tradições históricas, algumas fontes do Pentateuco compreendem também outro material que se costuma designar pelo nome de "leis". Contudo, o AT não contém nenhuma obra legal sistematicamente estruturada, mas somente coletâneas e códigos legais onde a seleção do material dá a impressão, à primeira vista, de ter sido feita ao acaso, quando, no entanto, foi condicionada provavelmente, como ocorria em todo o Antigo Oriente, pela finalidade e pelos objetivos visados com as coleções. Estas coleções, porém, não nos oferecem um quadro completo, por aproximado que seja, das condições legais de Israel, porque o direito consuetudinário até então em vigor era transmitido sobretudo por via oral. A maior parte das coleções de leis e dos códigos jurídicos, originariamente autônomos em sua totalidade, foram incorporados aos "estratos fontes" do Pentateuco e a partir daí devem ser considerados como não-autônomos. Antes de serem utilizadas como material para a formação dos "estratos fontes", essas coleções tiveram sua pré-história, que deve ser estudada em separado. Nesse estudo, as coleções do direito quotidiano ("profano" ou "civil" e "social") e do direito religioso devem receber igual tratamento. Embora existam diferenças fundamentais entre os conteúdos desses dois tipos de direito, os mesmos se acham interligados e se completam. Formam parte das coleções de leis e dos códigos jurídicos não-autônomos sobretudo o chamado Código da Aliança e a denominada Lei da Santidade, além de outras coleções ou conjuntos de normas que se integraram em P. A lei deuteronômica pode ser considerada, pelo contrário, como um código autônomo, como se tem feito até agora (§ 25).
2. O Código da Aliança O chamado Código da Aliança (abrev. C. da A.) recebeu este nome por causa de sua atual vinculação com Ex 24.7, de acordo com o qual Moisés tomou o livro e o leu diante do povo. Visto que era o próprio decálogo (20.2-17) que o povo escutava, como se supõe, esta expressão e a frase: "todas as palavras de Javé e todas as leis" (24.3) só podem se referir a 20.22-23.19. No entanto, esta vinculação literária só foi estabelecida num
o PENTATEUCO
188
estágio avançado da formação do Pentateuco. Na realidade o C. da A. é um bloco de origem secundária, inserido na narrativa do Sinai, na qual a expressão "Código da Aliança" significava primitivamente o decálogo (20.2-17) entendido como fundamento das relações a existir entre Javé e Israel. Em geral, costuma-se afirmar que os limites do C. da A coincidem com Ex 20.22-23.23. Contudo, desde logo devemos fazer três restrições. Primeiramente, 20.22s se caracteriza pelo tratamento no plural, à diferença do "tu" que é usado quase exclusivamente no restante da exposição, e constitui uma introdução secundária, da autoria daquele que incorporou o C. da A à narrativa do Sinai, pretendendo, por esta forma, estabelecer uma ligação com essa mesma narrativa. Em segundo lugar, a série terciária de frases apodíticas de 23.10-19 se acha em íntima relação com o chamado decálogo cultual de J (Ex 34; cf. § 8,2). Dela pode-se extrair também um decálogo que foi ampliado posteriormente com prescrições relativas ao ano sabático (v. lOs) e à festa que se devia celebrar três vezes por ano. As proposições de número 4 a 10 deste decálogo correspondem precisamente à ordem do decálogo de J, que contém igualmente as proposições de número 1 a 3. Deduz-se que 23.10-19 depende do decálogo de J pelo fato de que a série em questão não se inspira no conteúdo primitivo de J, mas em sua versão já ampliada, e supõe pelo menos o seu cumprimento, em 34.22s. Trata-se, portanto, de um acréscimo recente, feito ao C. da A Por último, 23.20-23 nada tem a ver com o C. da A; pelo contrário, contém partes de um discurso de despedida de Javé, que foram divididas entre os "estratos fontes" J e E, tendo o seu lugar primitivo antes de Ex 33 ou 34. Conseqüentemente, para o C. da A sobra o complexo de Ex 20.2423.9, que tem a seguinte distribuição: (20.22s 20.24-26 21.1-22.16
22.17-30 23.1-9 (23.10-19
introdução secundária), lei dos altares, "disposições legais" (21.1: mispaiim) 21.2-11 lei sobre os escravos 21.12-17 delitos puníveis de morte, 21.18-36 lesões corporais, 21.37-22.16 crimes contra a propriedade, delitos e deveres de religião administração da justiça, apêndice).
§ 20. A ORICEM DAS COLEÇÕES ECÓDICOS JURÍDICOS NÃO-AUTÔNOMOS
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Primeiramente devemos procurar saber a origem de cada uma destas partes, que inicialmente não estavam inter-relacionadas, como se pode deduzir do título introdutório (21.1) que vem em seguida à lei sobre os altares, como também das diferentes versões das fórmulas jurídicas. A. A prescrição da lei dos altares (20.24-26), segundo a qual deverá ser construído um altar de terra ou de pedras não trabalhadas, no momento em que Javé proporcionar ocasião de ser invocado cultuamente em um determinado lugar'", data, pelo menos quanto ao conteúdo, da fase mais antiga dos israelitas nômades na terra de cultura. Isto, contudo, não exclui que esta prescrição tenha sido usada posteriormente, em um determinado momento, numa polêmica contra a construção refinada e luxuosa de um altar (ErssFELDT), criticada por Os 10.1. B. A coletânea 21.1-22.16, chamada de "disposições legais", não constitui um código jurídico homogêneo. Pelo contrário: ela se formou a partir de várias coleções isoladas. a) A lei sobre os escravos (21.2-11) é um estatuto de natureza casuístíca'". Embora o dispositivo de mandar furar a orelha do escravo como sinal de sua servidão, após ter sido conduzido perante Deus ou até à porta da casa, seja muito antigo e se refira a uma divindade doméstica, as prescrições desta lei pressupõem a vida sedentária em país de cultura e já limitam o costume de tratar o escravo como propriedade material. b) A lista das transgressões passíveis de pena capital (21.12-17) contém uma parte da série dos mot-iumat ("seja punido de morte"; § 8,3). Trata-se de fórmulas jurídicas que estabelecem a natureza do delito e a pena correspondente, e que foram elaboradas segundo o modelo das normas apodíticas de bem viver e de bem comportar-se. O aspecto tardio da série, do ponto de vista da história das formas, e o fato de estar dividida ao longo de vários livros nos levam a supor que a perícope estudada é mais nova do que as anteriores. Não se trata de uma lei divina, anunciada por ocasião de celebrações cultuais. Pelo contrário, e mesmo independentemente de que o direito casuístico normativo era considerado também como tendo sido comunicado diretamente por Deus, sua forma, bastante próxima das séries apodíticas, nos indica um conjunto de normas de caráter popular que se destinavam à aprendizagem. 82
83
E. ROBERTSON, . The Altar af Earth (Exodus XX 24-26)", JJS 1 (1948), 12-21. - J. J. STAMM, "Zum Altargesetz im Bundesbuch", ThZ 1 (1945), 304s. P. HEINISCH, "Das Sklavenrecht in Israel und im Alten Orient", StC 11 (1934/1935), 201-218.
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c) As determinações sobre as lesões corporais das quais tivesse resultado ou não a morte (21.18-36) são, em sua maior parte, axiomas jurídicos e seguem, de modo geral, o ponto de vista de que os danos provocados devem ser compensados. Existe, no entanto, também material antiqüíssimo, como o princípio da retribuição exata, expresso em termos de talião (vv. 23-25)84, o tabu do touro corneador (v. 28)85 e a concepção do escravo como propriedade material (v. 32). De modo geral, pressupõe-se a vida sedentária em terra de cultura. d) A perícope sobre os crimes contra a propriedade (21.37-22.16) é um conjunto de normas casuísticas. Trata sobretudo de questões ligadas ao furto de animais (e não somente da substituição, mas também do castigo correspondente) e ao furto em geral (21.37-22.3), a um bem confiado à guarda de alguém (22.6-12; o v. 8 contém uma concepção antiqüíssima), à guarda de animais confiados a alguém (22.9-12), ao empréstimo de animais (22.13s; talvez de origem israelítica), e à violação de uma jovem ainda não prometida em casamento (22.15s). Estas determinações provêm igualmente da vida em país de cultura, no qual a posse do gado representava papel de importância para os israelitas. C. As determinações sobre os delitos e os deveres de religião (22.1730) contêm, na sua maior parte, fórmulas elaboradas segundo o modelo das normas apodíticas de bem viver. Acrescentam-se outros tipos de formulação. Isto, e mais a diferença de tratamento no singular e no plural, revelam-nos um processo gradual de composição e de elaboração da perícope. De modo particular, os vv. 17-19 tratam de crimes contra a religião; os vv. 20-26, da proteção para aqueles que são social e juridicamente fra86 COS , e os vv. 27-29, dos deveres para com Deus e para com o chefe da tribo, e da obrigação moral de contribuir com donativos para a celebração do culto, ao passo que o v. 30, com sua exigência de santidade, é uma conclusão acrescentada posteriormente. A perícope está fortemente impregnada do espírito da fé javista. Sobre este ponto, cf. A. ALT, "Z ur Talionsformel", ZAW 52 (1934),303-305 (= Kleine Schriften, I [1953], 341-344). - A. S. DIAMüNO, 11 An Eye for an Eye", lraq 19 (1957), 151-155. 85 A. VAN SELMS, "The Goring Ox in Babylonian and Biblical Law", ArOr 18, IV (1950), 321-330. 86 F. CH. FENSHAM, "Widow, Orphan, and the Poor in Ancient Near Eastern Legal and Wisdom Literature", INES 21 (1962), 129-139. - I. LEWY, "Dating of Covenant Code Sections on Humaneness and Righteousness (Ex XXII 20-26; XXIII 1-9)", VT 7 (1957), 322-326. 84
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D. A base das determinações sobre a administração da justiça (23.19) era constituída de fórmulas apodíticas, a fim de que os israelitas, que formavam a comunidade jurídica local, as pudessem reter na memória. Foram reelaboradas posteriormente e completadas na linha da fé javista. Quanto ao mais, elas dimanam da vida sedentária em localidades de país de cultura. No conjunto, observa-se que as coleções individuais que entram na composição do C. da A, com exceção da lei dos altares, pressupõem a vida sedentária em país de cultura. O seu manifesto parentesco com os outros códigos legais do Antigo Oriente, precipuamente com o Código de Hamurábi, explica-se, não por dependência literária, mas por assimilação das concepções jurídicas dos estados-cidades cananeus da Palestina, por parte dos israelitas já sedentarizados (PFEIFFER). Assim como essas concepções foram influenciadas particularmente pela legislação mesopotâmica, embora na dependência, pelo menos até certo ponto, de um desenvolvimento posterior em Canaã, assim também Israel apropriou-se do conjunto de normas referentes à vida sedentária, impregnando-as muitas vezes do espírito da fé javista. Que representa o C. da A como um todo? É o resultado de um processo aleatório e sem um plano determinado, ou constitui um conjunto literário homogêneo, de categoria superior? Esta última hipótese, defendida sobretudo por MERX, é aquela que corresponde à realidade, quanto aos pontos básicos, como no-lo mostra um cotejo com outros códigos jurídicos. Também a Lei da Santidade e o Deuteronômio seguem disposição semelhante, de modo que uma determinação cultual, colocada antes, é seguida por várias normas de natureza jurídica, social, religiosa e moral. Deste modo, o processo de escolha e de composição das coleções menores deve ter obedecido a um plano predeterminado, e o C. da A deve constituir uma obra elaborada de modo intencional, embora não corresponda à realidade a hipótese de uma composição artificial, em grupo de dez e de cinco unidades, hipótese esta defendida por MORGENSTERN e WATERMAN. O objetivo e a intenção dos compiladores deduzem-se do contexto social do Antigo Oriente. Foram utilizadas pequenas coleções de sentenças ou de prescrições isoladas, existentes nas diversas comunidades; acrescentaram-se outras perícopes com proposições em estilo apodítico, e ao conjunto foi conferido um tom polêmico, graças à colocação da lei dos Altares como sua introdução. Surgiu assim um código de leis que não representa o direito consuetudinário vigente, mas que devia, pelo contrário, justificar uma reforma legal em que novas determinações ou
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novas sentenças, apresentadas em forma de axiomas, modificavam o teor de decisões mais antigas. Em linha de princípio, BEER tem razão quando vê no C. da A. um conjunto de instruções para a reforma do direito (Exodus, 125). É inegável que nesse código, apesar da incorporação de elementos do direito cananeu, se observam traços de uma polêmica com a cultura cananéia e a impregnação da mesma pelo espírito da fé javista (VEISER). Quanto à época da origem do C. da A., que talvez se deva distinguir daquela das coleções individuais de leis, é preciso levar em conta que ele não tem a pretensão de ter sido comunicado diretamente a Moisés no Sinai, e que pode também não provir de Moisés, como admitem CASPARI, CAZELLES, SELLIN e WELCH (Cades). Grande parte de suas determinações supõe um país de cultura, ao passo que a lei dos altares, de época mais antiga, serve para novos objetivos. Tampouco deve ter surgido já logo depois da conquista do país pelos israelitas, no período que antecede aos reis (JEPSEN, NOTH, SELLIN-RosT), porque o fato de mencionar os chefes das tribos (22.27) não nos permite senão concluir que existiu uma coleção isolada mais antiga. Em geral se pensa em um estágio avançado do processo de sedentarização, ao passo que a polêmica contra a cultura cananéia de então só aos poucos se desenvolveu. O limite inferior nos é dado, em todo caso, pelo fato de que o C. da A. foi incorporado à fonte E (ao contrário do que pensa Norn) e é mais antigo do que o Deuteronômio. A hipótese mais plausível é a que pensa que seu aparecimento se deu nos primeiros anos do séc. IX, à época dos reis. Neste sentido, MENEs, que vê no C. da A. a sedimentação da revolução de [eú, e MORGENSTERN, que pretende estabelecer a ligação entre o referido Código e o círculo dos recabitas ou o círculo em torno de Elias, baseando-se na lei dos altares, não estão de todo sem razão, e não o estão, se considerarmos também que o C. da A. dificilmente teria surgido em [udá (REUSS), mas, antes, no reino setentrional de Israel como pátria de E (STEUERNAGEL, entre outros). Entretanto, o C. da A. talvez tenha sido concebido, conforme os costumes do Antigo Oriente, como um código régio de reforma das leis, quando não precisamente como lei do próprio Estado (CASPARI). Com relação à história da origem e da redação do C. da A. podemos, portanto, indicar os três estágios seguintes: 1) aparecimento de coleções individuais; 2) reunião das coleções isoladas (21.2-22.16) sob o título introdutório (21.1a); 3) formação do código régio 00.24-23.9); incorporação à fonte E, em lugar diferente do atual (§ 21,2); 5) transposição para a narrativa do Sinai.
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3. A Lei da Santidade A Lei da Santidade (Heiligkeitsgesetz; abrev. H ou L. S.) foi assim denominada por KLOSTERMANN, devido à fórmula que ocorre com freqüência: Sede santos, porque eu, Javé, vosso Deus, sou santo, ou semelhantes (19.2; 20.7). De fato, sua característica essencial consiste em exigir que o povo seja santo no sentido de uma pureza cultual e ética. É precisamente neste ponto que ela aparece como um conjunto originariamente autônomo, que foi incorporado a P, sendo então adaptado a esse "estrato fonte" (§ 21,2). Ela não traz nenhum título. É somente pelo contexto geral que podemos deduzir que ela começa com o capo 17. Em compensação, os vv. 26.3-45 formam, juntamente com o título formal do v. 46, uma conclusão bem definida desta coleção. À primeira vista, a L. S. parece não oferecer uma divisão lógica e uma construção planificada, como nos mostra um rápido olhar sobre o seu conteúdo: 17 18 19
20 21
22 23 24.1-9 24.10-23 25.1-26.2 26.3-46
imolação de animais e uso da carne de animais, relações sexuais, leis religiosas e morais, pena de morte para os delitos sexuais e de outras espécies, santidade dos sacerdotes, santidade das ofertas cultuais e dos sacrifícios, calendário das festas, detalhes quanto ao ministério do templo, valor do direito israelítico também em relação aos estrangeiros, ano sabático e ano jubilar, promessa de recompensas e castigos.
A L. S. não constitui um conjunto homogêneo original e completo. Mesmo excluindo-se os acréscimos e as modificações de conteúdo, destinadas a harmonizar a L. S. com P, aparece ainda uma série de repetições (17.12 = 19.26a; 19.3b = 19.30a e 26.2a; 19.27s = 21.5; 19.31 = 20.6; 19.34 = 24.22 etc). Isto nos leva a admitir que a L. S., exatamente como o C. da A., formou-se a partir de várias coleções individuais que um dia foram independentes. Evidentemente que não há certeza no que se refere ao número e aos limites de cada uma destas coleções. Por isso, muitos expositores se contentam em explicar que a L. S. foi redigida, tomando-se como base várias unidades e coleções autônomas (ELLIOT-BINNS), cujo número, porém, não é possível determinar (SELLIN-RoST).,
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o PENTATEUCO Enquanto BAENTSCH admite que existem três camadas, a saber: 1820+23-25; 21-22; 17, que o último dos revisores que elaborou o capo 26 juntou às duas primeiras camadas já formadas, por sua vez, a partir de coleções menores, BERTHOLET supõe identificar doze fragmentos autônomos, que se uniram depois à L. S., e ErssFELDT cinco coleções, que terminam, cada uma, com exortações gerais para que sejam observados os mandamentos (17-18; 19; 20; 21-22; 23+25; o capítulo 24 é, em grande parte, um acréscimo posterior). ELLIGER supõe, pelo contrário, um processo de formação mais complexo: a camada mais antiga do ponto de vista literário, uma espécie de lei fundamental da comunidade, teria sido conservada no núcleo de 17-19 + 25-26 (Ph I), ampliada posteriormente por um redator mais recente e completada com 21.115; 20 (Ph 2), onde este mesmo redator queria empenhar o indivíduo em si e não apenas a comunidade como tal. A este conjunto se acrescentaram, em duas operações complementares, as passagens 21.16-24; 22.17-22; 23 (Ph 3) e 22.1-16,26-33; 24, e certas ampliações no capo 23 (Ph 4). KrLIAN pretende ver uma lei primitiva da santidade em certos passos de 18-25, onde foram reunidas (antes de 586 a.c.) diversas fontes (18-20), em parte independentes entre si e em parte já agrupadas em conjuntos maiores, ao passo que um segundo redator teria formado uma lei da santidade anterior ao documento sacerdotal, ao lado de 26, e segundo isto se deveria supor um redator para P e mais outros acréscimos (17). FUCHT também admite uma L. S. primitiva, formada de 18-23A e de alguns versículos de Nm (do período anterior ao Deuteronômio) e de 25 (625-609 a.c.), juntamente com 26 (da época do exílio), na base dos quais se achava, igualmente, um grande número de fontes e de fragmentos. Se estas tentativas complicadas de explicação parecem muito pouco convincentes, menos ainda, e de modo particular, a análise de REVENTLOW, feita em termos do método da história das formas. Segundo a mesma, a base de 17-20 é constituída por aquilo que se chama de direito apodítico, onde se contém a célula original de um decálogo no capo 19. Esta base deve ter chegado à sua forma atual, depois de passar por um longo e ininterrupto processo de evolução, através de várias etapas e camadas, processo este durante o qual se juntaram, além de outras ampliações e alterações de conteúdo, ricos materiais da torá e da pregação. Nos caps. 21-25 juntou-se a legislação sacerdotal. Com relação aos caps. 21-26, admite-se, em princípio, que se deu uma evolução semelhante. Neste caso, porém, a base é constituída - para o capo 21, p.ex. - pelos conhecimentos especializados e profissionais da classe sacerdotal. O núcleo de todo o conjunto (o decálogo do capo 19) provém do Sinai. Outras partes também se ligam à situação do Sinai e do deserto. A L. S. se acha relacionada, desde a origem, com o culto, ou seja, com a antiga festa israelita da Aliança e constitui um documento do culto divino.
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o mais certo é dizer que a L. S. se formou pela justaposição bastante livre de vários grupos de determinações legais, feita ao longo de vários estágios (NoTH), e isto principalmente porque os seus capítulos constituem de per si perícopes bastante homogêneas, onde se trata dos mais variados assuntos. a) A determinação sobre a imolação dos animais (17.1,7) supõe, como valendo, a exigência deuteronômica da unidade do lugar de culto, de modo que o núcleo (vv. 3s) e principalmente as outras elaborações datam da época deuteronomista, embora incluam tradições cultuais muito antigas. O apêndice (17.8-16), introduzido por um novo título, contém a proibição do uso do sangue e de cadáveres de animais, em seguida à qual se fizeram algumas ampliações. Trata-se de concepções mais ou menos antigas, que só existem em uma versão recente e reelaborada. b) A base do capo 18 é constituída por um decálogo de regras morais provenientes da época do nomadismo. Esse decálogo devia orientar a atividade sexual no seio da grande família (§ 8,2). Elaborado através de vários estágios (ELLIGER), foi primeiramente ampliado para um dodecálogo e proclamado como um conjunto de normas emanadas do próprio Javé e colocado em relação com o matrimônio. Logo em seguida, esse dodecálogo foi incorporado a uma lei geral contra a fornicação, destinada a garantir a santidade e a aptidão para o culto, não já da família, mas da comunidade. Esta lei pertence a uma época recente. Depois se lhe acrescentou também uma moldura parenética. c) Em 19.3-12 é possível identificar ou supor, depois da introdução, um decálogo redigido no plural (MOWINCKEL). Podem-se reconhecer sem dificuldade os quatro primeiros e os quatro últimos artigos desse decálogo, o que não acontece tão facilmente com os artigos intermediários, que se encontram nos vv. 5-8,9s. As diversas formas apodíticas aí contidas nos indicam que se trata de uma série de normas de bem viver e de bem comportar-se, mas que não é uma série original. Pelo contrário, as frases desta série foram calcadas sobre o decálogo de Ex 20 (série terciária) e influenciadas ao mesmo tempo pelas exigências ético-sociais do Deuteronômio, sendo, portanto, mais recentes do que este. Podemos classificar esse decálogo como um "catecismo" caseiro. Segue-se em 19.13-18 um decálogo formulado no singular, que, embora novo, em termos de história das formas, foi calcado simplesmente sobre o modelo de séries mais antigas e constitui uma espécie de "catecismo" redigido livremente, onde se trata da maneira correta de bem viver e de bem comportar-se. Suas exigências de proteção para os fracos e para o "próximo" contra os abusos da vida
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diária e perante os tribunais baseiam-se na teologia dos profetas e do Deuteronômio. Uma série tripartida de proibições contra o costume de se unir entre si coisas de diferentes espécies acha-se em 19.19, passagem esta que, a julgar pelo conteúdo, data da época anterior ao exílio. Seguem-se um caso especial de direito matrimonial, sob forma casuística (vv. 20-22), uma prescrição relativa à colheita dos frutos de árvores novas (vv, 23-25), talvez de época pré-israelita, várias determinações contra práticas idolátricas e supersticiosas (vv. 26-31), a exigência de respeito para com as pessoas idosas (v. 32), a proibição de se aproveitar de um hóspede (vv, 33s), e a exigência de honestidade nos atos de compra e de venda (vv, 35s). Todo o conjunto, apesar da presença de concepções antigas, é uma mistura variegada, datando de época mais recente, e compreende mais regras de bem viver e de bem comportar-se, do que normas jurídicas. d) Do ponto de vista do conteúdo, o capo 20 se identifica em geral com o capo 18, exceto que a descrição dos delitos vem logo seguida da ameaça da pena de morte. Seu núcleo é constituído por uma lista de crimes sexuais puníveis de morte (vv. 7-21), lista que, por sua vez, é formada de proposições da série mot-iumat (vv, 9-13,15s; cf. § 8,3; 20,2), vale dizer: de casos formulados no sentido do direito casuístico e que sofreram ampliações de toda espécie. Antes deste conjunto lê-se uma determinação que surgiu depois dele, sendo dirigida contra o culto de Moloc", juntamente com ampliações (vv. 1-6) das quais forma parte a frase suplementar do V. 27, que lhes corresponde quanto ao aspecto formal e vem logo em seguida a uma exortação em forma de conclusão (vv. 22-26). O núcleo em referência provém, como aquele do C. da A., de uma época mais antiga, anterior ao exílio. e) No capo 21, encontram-se, precedidas dos respectivos títulos, primeiramente uma série de proibições relativas nos sacerdotes, ordenandolhes a se precaverem do perigo de contrair determinadas impurezas (vv, 1-15), e, em seguida, um elenco das deformidades que excluíam do ministério sacerdotal (vv. 16-24). Considerando-se que tudo isto faz parte dos conhecimentos específicos ligados à profissão sacerdotal, é de excluir-se
87
E. DHoRME, "Le dieu Baal et le dieu Moloch dans la tradition biblique", AnSt 6 (1956), 57-62. - K. DRONKERT, De Molochdienst in het Oude Tesiameni, 1953. - O. EI55FELDT, Molk aIs Opferbegrifl im Punischen und Hebrãischen und das Ende des Gottes Moloch, 1935. - J. G. FÉVRIER, "Molchomor", RHR 143 (1953), 8-18. - J. HOFTI]ZER, "Eine Notiz zum punischen Kinderopfer", Vt 8 (1958), 288-292. - W. KORNFELD, "Der Moloch", WZKM 51 (1952),287-313.
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que tenha sido utilizado na recitação cultuaI. Nenhuma destas prescrições é anterior aos primeiros tempos do exílio, como NOTH o demonstrou detalhadamente. t> Embora as prescrições cultuais a respeito das ofertas e dos sacrifícios (cap, 22) estejam divididas em subseções (vv. 1-9,10-16,17-25,26-33), estas, todavia, não constituem unidades homogêneas, como tampouco o próprio conjunto que daí resulta. Do mesmo modo que se sucedem aí múltiplas e variadas formas de estilo, também é de supor que determinações de toda espécie e de diferentes procedências foram reunidas, interpretadas, novamente explanadas, completadas e colocadas em relação com outras partes da L. S. (especialmente com os caps. 17 e 21). Se admitirmos a existência de várias etapas no processo de composição da L. S., o capo 22 foi acrescentado em uma das últimas etapas. g) Também o calendário das festas (cap. 23) não constitui uma unidade real, mas foi formado a partir de duas tradições. Uma delas apresenta, de forma sucinta, como Ex 45.21-25, a festa da primavera e a festa do outono, que correspondiam talvez à tradição do templo de Jerusalém. A outra tradição acrescenta, de modo mais detalhado, as determinações referentes às três festas agrícolas e da colheita dos frutos, que Israel assumira do culto cananeu. A opinião segundo a qual a L. S. procura combinar as duas séries de festas (NoTH) tem muitos dados a seu favor. Ela nos leva a situar o calendário das festas na época do exílio. h) As determinações a respeito das luminárias e dos pães da proposição a serem guardados no interior do templo (24.1-9) talvez constituam um acréscimo à L. S., como também a narrativa etiológica da lei (24.10-23, onde se acham incluídos certos axiomas jurídicos). i) As prescrições a respeito do ano sabático que se devia celebrar a cada sete anos, e sobre o ano jubileu'", celebrado a cada cinqüenta anos (25.1-55; apêndice: 26.1-2) chegaram à sua forma atual também através de um processo de desenvolvimento bastante longo. É provável que as determinações referentes ao ano sabático (vv, 1-7,17-25,35-40a,32s,4749,53,55) tenham constituído a base do conjunto, mas a existência paralela de tratamento no singular e no plural revela também sua falta de homogeneidade. j) Por fim, o capo 26, com a promessa de recompensa para aqueles que obedecerem (vv. 3-13) ou de castigo para os desobedientes (vv. 14-39), e HK
Cf., a respeito de ambos: E. 799s (com bibliografia).
KUTSCH
em RGG lI, 3d ed., 1958,5685; III, 3d ed., 1959,
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com a promessa de misericórdia para com aqueles que, depois do castigo, reconhecerem as próprias faltas (vv, 40-45), tem uma história própria. Isto precisamente é o que nos revelam a presença de Javé falando na primeira pessoa gramatical, como também as formulações impessoais dos vv. 3-39 e a mudança de tratamento de Israel, passando da segunda para a terceira pessoa (vv. 40-45). Considerada em termos da história das tradições, a promessa de recompensa e de castigo, formulada no fim de um código legal, tem seus antecedentes em casos antigos. Já o Código de Hamurábi traz no seu final um breve voto de bênçãos para aqueles que bem procederem no futuro e minuciosas promessas de castigo para os futuros transgressores do código. Também a forma esquemática em que são enumerados os flagelos que Deus enviará é calcada em modelos do Antigo Oriente. É evidente que a última parte do capo 26 supõe de modo particular a ruína do reino de [udá e as deportações para a Babilônia. Quando se processou a composição da L. S. a partir de coleções e de complexos isolados e inicialmente autônomos, o capo 17, contendo as determinações cultuais e sobretudo aquelas que se referem à imolação de animais (17.1-17),foi propositalmente transferido para o início, como aconteceu com a elaboração do C. da A É daí que se explica sua posição isolada. Em contrapartida, a ordem em que se sucedem as prescrições sobre a santidade da comunidade (cap. 18), dos sacerdotes (cap. 21), das oferendas e do sacrifício (cap, 22), do calendário das festas (cap. 23), do ano sabático e do ano jubilar (cap, 25) e das promessas finais (cap. 26), pode ser interpretada como intencionalmente planejada e executada. Somente a inclusão das determinações legais das mais variadas espécies (cap, 19) e dos delitos puníveis com a pena de morte (cap. 20) parece destoar, mas isto se explica pelo fato de que foram reunidas nos caps. 18-20 todas as determinações referentes à vida quotidiana da comunidade. Desta forma, e apesar da variedade dos temas, tem-se uma articulação muito mais clara do que no C. da A A L. S. é, por sua natureza, como o é o C. da A, um código jurídico, apesar de incluir regras não-jurídicas (cap. 19) e informações a respeito da profissão sacerdotal (cap, 21). Como um todo, e ao mesmo tempo em que assume, desenvolve e modifica antigas e introduz novas determinações que correspondem inteiramente às linhas dos códigos jurídicos do Antigo Oriente, ela deve estabelecer o direito que vigorará no futuro e que se achará sob o signo da idéia mestra da pureza cultual e ética ("Lei da Santidade"). Ela deve servir de lei básica para uma comunidade cuja capacidade política e administrativa era muito limitada.
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ORIGEM DAS COLEÇÕES E CÓDIGOS JURÍDICOS NÃO-AUTÔNOMOS
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Se admitirmos a época posterior ao Deuteronômio ou à época do exílio como data de origem de algumas das coleções ou dos complexos isolados, teremos, ao mesmo tempo, o limite superior para a época da origem da L. S. Exclui-se, assim, uma datação de época anterior ao Deuteronômio (ELLIOT-BINNS). Mas tudo indica que a L. S. foi codificada durante o cativeiro da Babilônia (séc. VI). Qualquer tentativa de fixar uma data exata deverá levar em conta que entre a L. S. e o profeta do exílio Ezequiel existem pontos de convergências por demais gerais para serem fruto do acaso. A solução apresentada por REVENTLOW, de que a L. S. seria o código ritual da celebração do culto, de cujo material Ezequiel se teria utilizado, não procede, porque a L. S. é um código jurídico e uma parte de suas coleções individuais é de época muito recente. Também a hipótese segundo a qual a L. S. é mais antiga do que Ezequiel e de que este depende dela, ou de que, pelo contrário, Ezequiel ou um de seus discípulos é o autor ou redator da L. S., têm contra si objeções de bastante peso. Estas objeções valem também com relação à tese modificada de KILIAN, segundo a qual Ezequiel depende de uma L. S. "primitiva", ao passo que o redator da L. S., anterior ao documento sacerdotal, depende de Ezequiel. O mais provável, contudo, é que Ezequiel e o redator da L. S. tenham partido, cada um por seu lado, no mínimo de coleções ou blocos isolados já existentes ou ainda em formação, quando não de um primeiro conjunto já formado. Este conjunto poderia ter surgido no final do exílio e já era conhecido, aí, pelos profetas originários do círculo sacerdotal de Jerusalém, mas foi só no exílio que recebeu sua elaboração posterior e sua codificação definitiva como L. S. Podemos, por conseguinte, estabelecer para a história das origens e da redação da L. S. os seguintes estágios: 1) aparecimento das coleções e complexos isolados, num processo mais ou menos longo, com várias ampliações e reelaborações; 2) primeira compilação em Jerusalém, na época imediatamente anterior ao exílio; 3) elaboração final da L. S. como código, durante o exílio; 4) incorporação à fonte P, com acréscimos e modificações.
4. Outras coleções de leis Façamos apenas uma ligeira referência a outras coleções não-autônomas, principalmente porque, em geral, não se trata de direito em sentido próprio, mas de ordenações referentes ao culto e de conhecimentos ligados à profissão sacerdotal (§ 10,4).
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As instruções referentes aos sacrifícios (Lv 1-7) compreendem, de um lado, disposições a respeito do culto (1-5), onde a ênfase é colocada, ora sobre a execução do código ritual (1-3), ora sobre os motivos e os efeitos dos sacrifícios (4-5). Os elementos constitutivos fundamentais dos caps. 1-3 parecem provir da Jerusalém da época imediatamente anterior ao exílio, ao passo que os elementos dos caps. 4-5 datam, pelo contrário, do tempo do exílio e posterior ao exílio. Por outro lado, conservaram-se os conhecimentos relativos à profissão sacerdotal, que eram necessários para o bom desempenho da ação sacrifical, e que ultrapassam os limites dos rituais, conhecimentos estes transmitidos certamente por via oral e só fixados por escrito talvez depois da destruição do templo em 587 a.C. Toda a coleção surgiu durante o exílio e depois dele, e posteriormente foi incorporada a P. As prescrições sobre a pureza (Lv 11-15) são, na maior parte, uma coleção de ensinamentos ligados à profissão sacerdotal e concernentes à pureza e impureza cultuais. Esta coleção, por sua vez, é composta de várias perícopes que tratam das determinações sobre o que sejam animais puros impuros (11), e cuja regulação mais ou menos antiga foi completada depois da era deuteronomista (cf. Dt 14.3-21); das determinações a respeito da impureza contraída pelo pacto (12); das determinações a respeito da impureza decorrente de doenças da pele (13-14), onde encontramos o estilo ritual para as ocasiões em que se dão instruções sobre as medidas a serem tomadas; das determinações (formuladas em estilo casuístico) sobre a impureza ocasionada pelos corrimentos corporais (15). A coleção anterior ao código sacerdotal foi assumida em P. O mesmo acontece com a aquelas determinações legais bastante diversas, que agora formam parte de P (Nm 4-6; 15; 18.8-32; 19 e 28-30)89, embora muito dificilmente se possa admitir que a fonte P só tenha empregado quase exclusivamente material antigo e que para Ex 25-Lv 16, p.ex., tenha usado como modelo uma coleção de rituais (KOCH). A série de maldições (Dt 27.15-26), contendo o direito casuístico em formulação apodítica, surgiu na época deuteronomista (§ 8,3), não constituindo, portanto, a série mais antiga de proibições do AT90, e bem depressa perdeu sua autonomia. Ela servia para a apresentação de uma ação cultual imaginária no contexto do Deuteronômio. 89
L.
ROST,
"Zu den Festopfervorschriften von Numeri 28 und 29", ThLZ 83 (1958),
329-334. 90 G. VON RAD
(ATO), 119.
§ 21. A
ORIGEM DOS "ESTRATOS FONTES"
201
No presente estudo não mencionamos os dois decálogos de Ex 20 e 34, porque constituem séries de normas de bem viver e bem comportarse, e foram compostos, respectivamente, pelos redatores eloísta e javista.
§ 21. A ORIGEM DOS "ESTRATOS FONTES"
1. Redação posterior dos "estratos fontes" Os "estratos fontes" mais antigos do Pentateuco surgiram da redação posterior de G. Neste processo J e E se utilizaram da versão mais recente G2. N, pelo contrário, dada a sua índole conservadora, serviu-se de O, enquanto P supõe o conjunto JEN, embora muitas vezes recorra intencional ou casualmente à versão mais antiga, C'. Em qualquer dos casos, os "estratos fontes" resultam da atividade dos respectivos autores, que apresentam formas lingüísticas e estilísticas diversas. A hipótese segundo a qual se trata de obras de "escolas" de narradores parece sem fundamento, precisamente em vista do que nos diz a pesquisa da história das tradições a respeito da tão discutida falta de homogeneidade dos "estratos", como resultado da dependência dos autores em relação à longa e complexa história das tradições. As forças e os motivos que presidiram ao surgimento dos "estratos fontes" não devem ser procurados no domínio do culto da atividade didática ou do gosto popular pela arte de narrar. Pelo contrário, há dois outros motivos que se destacam: a intenção de oferecer o quadro geral de um determinado período da história, que é de importância para o próprio povo, e a preocupação de imprimir a esta exposição um sentido religioso e de interpretar os acontecimentos a partir de uma perspectiva teológica. A despeito de suas características individuais, os autores dos "estratos fontes" mais antigos se mantiverem fiéis, no todo ou em parte, à tradição por eles utilizada. O processo de formação desta tradição já estava tão adiantado, que muito pouco foi possível mudar quanto à ordem e ao conteúdo, ao passo que a estrutura literária definitiva recebeu apenas alguns retoques de linguagem e de estilo. Talvez isto valha também para aquilo que os "estratos fontes" têm de especificamente próprio, para além de G, e que, de modo geral, não constitui uma nova criação literária, mas foi extraído de outros ramos da tradição. No caso de P, a situação é diferente, pois este "estrato" é o que mais selecionou, o que mais resumiu dentre os elementos da exposição
202
o PENTATEUCO
global que tinha diante de si (JEN), ou o que mais dados de outras tradições acrescentou. Seu autor planejou e repensou todo o conjunto de um modo inteiramente novo e independente, e lhe deu, enquanto obra literária, aquela formulação lingüística e estilística que lhe é peculiar. O fato, porém, de ter assumido muitos dados da tradição só pela tradição em si priva também sua obra de uma perfeição em sentido estrito. Isto vale de modo particular, tendo-se em vista que ele empregou também em sua obra, como se fossem especificamente seus, certos elementos de outras tradições que já tinham sua história, como, p.ex., a narrativa da criação e a narrativa de Gn 23, que não quadra Absolutamente com o resto da exposição.
2. Inclusão de coleções de leis e códigos Enquanto J e N se limitaram à tradição histórica, E e P assumiram também coleções de leis ou códigos jurídicos. O Deuteronômio, apesar de sua moldura histórica, deve ser considerado como um código jurídico independente. Não se sabe ao certo em que lugar da fonte E se localizava originalmente o C. da A agora incorporado a ela. A colocação atual, em todo caso, não é primitiva (§ 20,2). WEISER acredita que vinha antes de Js 24 e constituíra outrora o instrumento jurídico da aliança de Siquém. SELLIN-RoST*, pelo contrário, admitem que se encontrava antes de Dt 27.2,8,5-7 a (atribuído a E), como lei dada por Moisés antes da travessia do [ordão e depois gravada em pedra perto de Siquém. Posteriormente teria sido substituído por Dt 12-16, em lugar do qual outros autores pensam que estivera o Código da Aliança, que seria a lei dada no país de Moab. Tudo isto, porém, são meras suposições. Na realidade, é difícil saber qual o lugar original do C. da A em E. Seja como for, aquele que elaborou a narrativa do Sinai incluiu nela o C. da A, sendo também de sua autoria as referências à lei dos altares do C. da A em Dt 27.1-8 e [s 8.30-35, referências estas mediante as quais o C. da A foi enfeixado na narrativa do Hexateuco (primitivamente os dois se achavam em lugares diversos e foram posteriormente utilizados do lado deuteronomista; cf. § 23,3; § 30,5). O autor, antes de inserir o C. da. A, transpôs também para antes do decálogo, a título de introdução ao C. da A, a nota a respeito do pavor que o povo sentiu perante Javé e segundo a qual Moisés foi o único a comparecer diante dele (Ex 20.18-21). Esta nota originariamente se achava relacionada com o decálogo (20.1-17). Foi assim que o C. da A. encontrou seu lugar definitivo no Pentateuco.
§ 21. A
ORIGEM DOS "ESTRATOS FONTES"
203
Em P foi assumida toda uma série de códigos ou de coleções de leis originariamente autônomas, das quais devemos mencionar em primeiro lugar a L. S. (§ 20,3-4). Todas estas coleções sofreram acréscimos e alterações que deviam harmonizá-las com as perspectivas e com as outras determinações de P. Para os detalhes, podem-se consultar os comentários.
3. Caráter e natureza dos "estretos fontes" Deste modo, se admitirmos também D, surgiram quatro ou talvez cinco "estratos", dos quais alguns continham apenas material narrativo e outros também narrativo e jurídico, misturados em proporções diversas. Esses "estratos fontes" continham, cada um, seus próprios livros históricos ou também históricos e jurídicos. É possível determinar sua ordem cronológica, com boa margem de probabilidade. Diversas podem ser as opiniões a respeito das relações entre J e E. Assim é que muitas vezes se chegou a colocar E antes de J, mas todas as observações nos levam a admitir uma idade mais antiga para J. O mais difícil é saber qual a colocação precisa do outro "estrato fonte" (}l, L, N), separado posteriormente da fonte primitiva J. Embora seja considerada como a fonte mais antiga, no entanto, há muitos elementos que depõem no sentido de que ela teve como base uma variante da tradição (G I ) , mais antiga do que J, mas que só foi elaborada como resposta à perspectiva teológica de J. Por isso pode ser colocada entre J e E, resultando assim a seguinte ordem de colocação: J - N - E - D - P. O Pentateuco contém, além disso, outros materiais que não pertencem a nenhuma das referidas fontes, mas que lhe foram acrescentados independentemente das mesmas (§ 27). O caráter e a natureza dos "estratos fontes" são determinados, em primeiro lugar, pelo fato de não terem sido planejados nem fixados por escrito de um só lance, mas se desenvolveram no decurso de uma longa e acidentada história. Nessa história, a elaboração e a fixação literária definitivas, levadas a efeito por um determinado autor, constituem um estágio que deve ser considerado de modo especial, apesar de não representar senão de forma passageira o último dentre muitos estágios. O aparecimento dos "estratos fontes" não é nem exclusiva nem primeiramente um processo de criação literária, mas um fenômeno que recobre diversos estágios e se verificou num domínio bastante amplo da vida humana. Em segundo lugar, os "estratos fontes" são determinados até certo ponto pelo material narrativo que eles contêm e utilizam, material que inicialmente foi transmitido por via oral. As narrativas antigas, apesar de
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o PENTATEUCO
todas as reformulações que passaram, conservaram elementos específicos em tal proporção, que parecem não poder se enquadrar em um determinado "estrato fonte". Nestes casos, é preciso verificar se isto se deve à presença dos elementos próprios que se conservaram, ou se não são essas narrativas mesmas que não se harmonizam com os "estratos fontes". Para isto, nem sempre bastam os critérios puramente literários. Os "estratos fontes" são coleções de materiais narrativos e jurídicos antigos e constituem, ao mesmo tempo, o resultado de uma elaboração artística. Esses "estratos fontes" surgiram e se desenvolveram no seio de uma tradição oral e são igualmente obras literárias fixadas por escrito. Seus autores são também compiladores e escritores. Se este fato explica muitas das diferenças e contradições no interior dos "estratos fontes", por outro lado, o processo de reuni-los para formar o Pentateuco foi levado a tal ponto, que nem sempre é mais possível separá-las de novo até à última palavra. Muitas vezes se consegue fazê-la com muita precisão, outras vezes, porém, a respeito de uma passagem só se pode afirmar que ela contém elementos de dois ou mais "estratos fontes".
§ 22. O IJE5TRATO FONTE" J L. ALONSO-ScHÓKEL, "Motivos sapienciales y de alianza en Gn 2-3",
Bibl43 (1962),295-316. - K. BUDDE, Diebiblische Urgeschichte, 1883. - G. H. DAVIES, "The Yahwistic Tradition in the Eighth-Century Prophets", em: Th. H. Robinson-Festschrift, 1950,37-51. - O. EISSFELDT, "Stammessage und Novelle in den Geschichten von [akob und seinen Sõhnen", em: Gunkel-Festschrift, I 1923,56-77 (= Kleine Schriften, I 1962,84-104). ID., Geschichtsschreibung im Alten Testament, 1948. - ID., "Sinai-Erzâhlung und Bileam-Sprüche", HUCA 32 (1961), 179-190. - B. L. GOFF, "The lost [ahwistic Account of the Conquest of Canaan", JBL 53 (1934),241-249. - H. HELLBARDT, Der [ahunsi und die biblische Urgeschichte, Diss. 1935. M. L. HENRY, [ahioist und Priesterschrift, 1960. - G. HÓLSCHER, Die Anfiinge der hebrãischen Geschichieschreihung, 1942. - ID., Geschichtsschreibung in Israel, 1952. - A. JEPSEN, "Zur Überlieferungsgeschichte der Vãtergestalten", WZ Leipzig 3 (1953/54), 265ss. - B. LUTHER, "Die Persônlichkeit des Jahwisten", em: E. MEYER, Die Israeliten und ihre Nachbarstiimme, 1906, 105-173. - V. MAAG, "[akob-Esau-Edorn", ThZ 13 (1957), 418-429. - J. MEINHOLD, "Die jahwistischen Berichte in Gen 12-50", ZAW 39 (1921),42-57. - S. MOWINCKEL, The Two Sources of ihe predeuteronomic Primeval History qE) in Gen 1-11, 1937. - ID., Erwiigungen zur Pentaieuch Quellenfrage, 1964. - ID., Tetrateuch-Pentateuch-Hexateuch, 1964.
§ 22. O
"ESTRATO FONTE"
J
205
- M. NOTH, Überliejerungsgeschichte des Pentateuch, 1948. - G. VON RAO, Das jormgeschichtliche Problem des Hexateuch, 1938 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament. 1958,9-86). - H. ScHMOKEL, "Zur Datierung der Pentateuchquelle J.", ZAW 62 (1950),319-321. - H. SCHULTZE, "Die Grossreichsidee Davids, wie sie sich im Werk des Jahwisten spiegelt", ThLZ 81 (1956), 752s. - H. W. WOLFF, "Heilsgeschichte - Weltgeschichte im Alten Testament", Der evangelischer Erzieher 14 (1962), 129-136. - lo., "Das Kerygma des Jahwisten", EvTH 24 (1964), 73-98 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964, 345-373).
1. Terminologia e conteúdo
o nome de "javista" (abrev.: J) tanto para o autor como para o "estrato fonte" se prende ao fato de que, ao contrário de outras exposições, ele usam o nome divino de Javé desde o começo e não somente a partir do momento em que Deus aparece a Moisés". Evidentemente que esta antiga constatação se constitui em obstáculo para um desenvolvimento maior da análise do Pentateuco, e isto na medida em que ela parece oferecer argumento contra a pretensão de dividir em duas a camada J, primitivamente admitida, embora, tanto E quanto P comecem ambos também pelo nome divino de Eloim. Por isso, deve-se dizer com mais precisão que J é um dos dois "estratos fontes" que usam o nome de Javé para a época prémosaica. Em grandes linhas podemos atribuir a J as perícopes que se seguem e que nos permitem individualizar as etapas da exposição e seu conteúdo essencial. (O asterisco indica que há uma mistura, mais ou menos acentuada, com os elementos das fontes assinaladas entre parênteses, quando a indicação individual dos versículos ou de partes dos versículos resultaria por demais extensa): Gn 2.4b-3.24 (N) 4.1-16 4.25s 6.5-8; 7.1-8.22 (P) 9.18-20,28s 10.8-19,21,24-30 11.28-30 15.1b~-2,7-12-17s
91
Criação, paraíso, queda e maldição, Caim e Abel, Set, Dilúvio, Sem, Cam e Jafet, Tabelas etnográficas, Árvore genealógica de Abraão, Promessa sobre a posse da terra e descendentes,
F. HORST, "Die Notiz vom Anfang des [ahwekultes in Genesis 4.26", em: Beiirage zur EvTh 26, 1957,66-74.
o PENTATEUCO
206 16.1b-2,4-14
Fuga de Agar e anúncio do nascimento de Ismael, 18.1-15 (N) Anúncio do nascimento de Isaac, 18.17-19.28 (N) Sodoma e Gomorra, 21.1a,2a,7 Nascimento de Isaac, 22.20-24 Descendentes de Nacor (Rebeca), 24 (E) Isaac e Rebeca, Ismaelitas, 25.18 (E)Jacó e Esaú, 25.17s Bênçãos de Isaac, Rebeca em situação de perigo 26.1-3a,6-11,24s em Gerara, 27.1-45 Jacó engana Esaú, 28.13-16,19 Sonho de Jacó em Betel, 29.1-14 (NE) Chegada de Jacó à casa de Labão, 29.31-30.24 (EP) Filhos de Jacó, 30.25-43 (NE) Contrato de trabalho e riqueza de Jacó, 31.17-43 (NEP) Fuga de Jacó, Acordo de Jacó com Labão, 31.44-32.1 (NE) Antes do encontro com Esaú, 32.2-22 (NE) 32.23-24a; 33.1-16 (E) Encontro de Jacó com Esaú, 33.17 Jacó em Sucot, 36.2b.9-39 (NE) Descendentes de Esaú, de Seir e edomitas, 37.3-36; 39.1-46.5; 46.28-48.2 (menos 47.5b-6a,7-1l), 48.8-22; 50.1-11 14-26 (E) Novela de José, 49.1b-28bá Bênçãos de Jacó, Êx
1.6,8,10b,12a 1.22; 2.1-10 (E) 2.11-14 2.15b~-22 (N) 2.23aa; 3.1-20 (E); 4.18,29,31b 5.1-6.1 (E) 7.14-10.29 (EP) 11.4-8; 28-30,32 13.17-14.31 (NE) 16 (NP) 17.1-7 (NE) 18 (E) 19.2-25 (NE)
Opressão no Egito, Nascimento de Moisés, exposição e resgate, Homicídio e fuga para Madiã, Casamento de Moisés em Madiã, Vocação de Moisés, Negociações com o faraó, Pragas do Egito, Morte dosprimogênitos, permissão a Israel para partir, Perseguição contra Israel, sua libertação, Maná, Milagres da fonte em Massa e Meriba, Introdução de um ordenamento na administração da justiça, Sinai e descida de Javé,
§ 22. O "ESTRATO FONTE" J
207
Impressão causada sobre o povo, 20.18-21 (NE) 23.20-33 (E) 33.1-3a Despedida do povo, 34.1-28 Decálogo, Nm 10.29-36 (N) Partida, 11.4-35 (NE) Codornizes, 13.17-14.45* (NEP) Exploração do país (Caleb), 16 (P) Revolta de Datã e Abiram, 20.14-20 (E) Edom recusa passagem, 21.19s (E) Prosseguimento da marcha até Moab, 21.21-35 (NE) Vitória sobre o rei dos amorreus, 22.2-24.35 (E) Balaão, 25.1-5 (N) Relações com mulheres moabitas, 32.1-38 (E) Partilha de terras a Gad e a Rúben na Transjordânia, Dt
31.14,16,23 (E) 34.1 (EP)-6
Anúncio da morte de Moisés e instalação de [osué, Morte de Moisés.
2. A tradição anterior e o contributo de J A exposição de J se baseia, quanto ao essencial, em G2, e foi realizada a partir desta base. Sua concordância ocasional apenas com N se deve ao fato de utilizar elementos especificamente judaítas (Gn 19) ou à omissão posterior de uma narrativa correspondente de E (Ex 2.15-22). Em face disto, coloca-se a questão de saber quais as relações que existem entre a tradição anterior e o contributo específico de J, problema este para cuja solução é necessário levar em conta a estrutura do conjunto. O "estrato fonte" J começa com a criação e com a vida do homem no jardim divino, mas pouco demora em dirigir o seu caminho para baixo, rumo ao pecado e ao juízo": da queda e da maldição, passando por Caim, O assassino, e pela 92
J. BEGRICH, "Die Paradieserzãhlung", ZAW 50 (1932),93-116 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964, 11-38). - J. Dus, "Zwei Schichten der biblischen Paradiesgeschichte", ZAW 71 (1959),97-113. - P. HUMBERT; Études sur le récit du paradis et de la chute dans la Cenêse, 1940. - FL. HVIDBERG, "The Canaanite Background of Gn I-III", VT 10 (1960), 285-294. - J. L. MCKENZIE, "The Literary Characteristics of Gn 2-3", ThSt 15 (1954),541-572. - M. METZGER, Die Paradieserziihlung (Gn 2.4-3.24), die Geschichte ihrerAuslegung von J. Clericus bis W. M. L. de Wette, Diss, Bonn 1957 (1959). - H. SCHMIDT, Die Erziihlung von Paradies und Sünderfall, 1931.- H. J. STOEBE, "Gur und Base in der Jahwistischen Quelle des Pentateuch", ZAW 65 (1953), 188-204.
208
o PENTATEUCO
punição de seu crime", até ao extermínio quase completo da humanidade pecadora pelo dilúvio, depois do qual ela volta a crescer e a se expandir, sem perspectiva alguma de se corrigir". Deste obscuro pano de fundo se destaca claramente o novo começo da história dos patriarcas. O caminho, que antes se estreitava desde a criação até Abraão, se dilata pouco a pouco - com alguns relances de olhos aqui e ali sobre os descendentes dos "pais" - partindo dos três patriarcas e passando pelos filhos de Jacó, até aos inícios do povo na época de Moisés. Isto, evidentemente, não constitui a rigor uma história salvífica. As promessas de Deus sobre a posse da terra junto com a de uma descendência, e sua intervenção salvadora encontram sempre a resistência dos erros e das ameaças humanas". Foi isto precisamente o que aconteceu no tempo de Moisés, desde a sua infância e vocação, desde a opressão e a libertação do povo, desde a revelação do Sinai e a comunhão que aí foi fundada, passando pela caminhada do povo através do deserto, até o momento em que se toca o limiar da terra prometida. Mas ao longo desse processo se vai tornando cada vez mais clara a idéia fundamental de que a soberania de Deus se impõe em face dos inimigos do povo e mesmo em face do próprio Israel, e de que a vida de comunhão com Deus é estabelecida e preservada, apesar de todas as rebeliões de Israel. De modo geral, J segue aqui a tradição anterior de G2 na qual, afora a unidade existente desde o início entre a tradição do Êxodo e a tradição do Sinai, já se fizera a vinculação entre essa tradição e a história dos patriarcas, por meio da novela de José. Além disso, J assumiu também elementos mais antigos, principalmente as bênçãos de Jacó (Gn 49), sob o signo da idéia do grande Israel (§ 8,1). Incorporou ainda as determinações litúrgicas sobre a arca (Nm 10.35; cf. § 8,1), além do cântico de Balaão de Nm 24 (§ 19,5). O decálogo cultual (Ex 34.14ss) talvez represente uma história da criação, exclusiva de J e extraída de um fundo antigo (§ 8,2). Evidentemente, J elaborou e interpretou, segundo sua própria perspectiva, a tradição recebida e eventualmente ampliada. A colocação do 93
94
95
L ENGNELL, "Kain och Abel", Svenska Jerusalems Fôreningens Tidsskrifr 46 (1947), 92102. - S. H. HOOKE, "Cain and Abel", Folklore 50 (1939), 58-65 (= The Siege Perilous, 1956, 66-73). R. RENDTORFF, "Genesis 8.21 und die Urgeschichre des [ahwisten", Kerygma und Dogma 7 (1961). 69-78. C. A. KELLER, "Die Cefãhrdung der Ahnfrau", ZAW 66 (1955),181-191. - E. H. MALY, "Genesis 12.10-20; 20.1-18; 26.7-11 and the Pentateuchal Question", CBQ 18 (1956), 255-262.
§ 22. O
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J
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acento sobre a apresentação dos aspectos históricos, que acima mencionamos e que o distingue de E, talvez deva ser considerada como sua contribuição própria, contribuição esta que analisaremos com mais detalhes nas seções seguintes. O chamado pórtico da história primeva deriva particularmente de J. Pelo fato de, ao construir essa história, basear-se também em um modelo mesopotâmico (§ 12,2), ele faz a história remontar até os primórdios e coloca todo o acontecimento sob a perspectiva do pecado enquanto ruptura da comunhão com Deus e do juízo enquanto imposição da soberania divina com relação ao pecador.
3. Características de conteúdo Entre as características de conteúdo especificamente de J devemos mencionar, em primeiro lugar, a aprovação da sociedade da cultura agrária e do culto javista correspondente (EISSFELDT). A nota característica pela qual se reconhece esta unidade indivisível é o chamado decálogo cultuaI, com suas determinações, particularmente aquelas referentes às festas da colheita. Há uma estreita relação entre esse aspecto e a aprovação do poderio nacional, do Estado e da realeza (EISSFELDT), tal como vem expressa nos cânticos de Balaão de Nm 24 (não incluindo certos ditos como os de Gn 27.29), inseridos por J - não sem um determinado intuito - em sua exposição: os vv. 3-9 constituem a exaltação da fertilidade da terra e da invencibilidade de Israel sob o governo de Saul, ao passo que os vv. 15-19 são uma visão retrospectiva de louvor a Davi (uns e outros sob forma de anúncio). É precisamente J que usa, a partir de Ex 3.8, a expressão, talvez bastante antiga: de mana o leite e o mel, para indicar a Palestina. É compreensível, portanto, que, para J, o povo abandone prazerosamente o Sinai e marche contente para um país de cultura, e que Javé o acompanhe, a fim de morar com ele nesse país. Além disso, é preciso considerar em que medida o acontecimento isolado é inserido dentro de grandes contextos e sob pontos de vista dominantes, e de que modo, a partir de histórias individuais, se forma a "história" dentro de amplas perspectivas (WEISER). É isto precisamente o que nos mostram tanto a estrutura de todo o conjunto, ampliada pela história dos primórdios, quanto a acentuação específica de J. Um fato que aí nos chama a atenção é a mistura de idéias nacionais e universais, que já mencionamos. Se toda humanidade devia, em si, estar em uma relação especial com Deus, tal situação é destruída pelo julgamento do dilúvio e pela resignação final de Javé (Gn 8.21). É neste ponto que se fundamenta
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o PENTATEUCO
a escolha de Israel, escolha a partir da qual deverão fluir as bênçãos também para outros povos. O próprio Israel é aquele povo antes de todos abençoado, cabendo-lhe uma posição determinante neste mundo. Os outros povos podem e devem partilhar das bênçãos de Israel, de modo que seu próprio destino depende da sua atitude com relação a ele. Trata-se daquele entrelaçamento indissociável que caracteriza a fé javista, uma fé determinada pelo seu caráter nacional e alimentada pela idéia de que existe para Israel uma situação fundamentalmente salvífica. Enquanto a chamada profecia escrita, de época posterior, diverge basicamente desta concepção, o javista parece ter sido influenciado pelas profecias mais antigas, como quando descreve, p.ex., a vocação de Moisés à maneira de uma vocação profética.
4. Teologia de J Com isto já tocamos nos aspectos essenciais da teologia de J. Um ponto de partida nos é oferecido pela introvisão da natureza do homem, que vem descrita no proêmio da história dos primórdios: visão do homem que vive como alguém que pretende "ser como Deus" e por isso não lhe obedece e se subtrai à sua soberania e à comunhão com ele; visão do homem em que todos os pensamentos que lhe vêem ao coração estão sempre voltados para o mal, como diz J na introdução à narrativa do dilúvio, talvez com palavras próprias (Gn 6.5). O homem, porém, é conservado para que se reproduza e trabalhe (Gn 3.16s). A vida do próprio fratricida é resguardada da vingança do sangue (4.15)96, e a sobrevivência do mundo é garantida após o dilúvio, pois a punição não promete corrigir os homens (8.21). Mas a humanidade é preservada da ruína, para que Israel, primeiramente, e depois, por seu intermédio, a humanidade toda possa participar das bênçãos divinas; para que, apesar de todas as resistências da parte do homem - e do próprio Israel - se concretizem a soberania divina e a comunhão com Deus. Tudo isto pode depender inteiramente da resposta individual do homem, como nos mostra o "regateio" aparente de Abraão junto a Deus, a respeito da sorte de Sodoma (Gn 18.22b-33). É evidente que o destino do indivíduo continua ainda inteiramente vinculado ao destino da comunidade; Sodoma perecerá toda inteira ou se salvará toda inteira. 96
O. SAUER, "Bemerkungen zum Kainszeichen", Antonianum 33 (1958), 45-56. - B. STADE, "Beitrãge zur Pentateuchkritik 1", ZAW 14 (1894),250-318.
§ 22. O
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J
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Mas to precisamente isto o que se faz depender da resposta de um reduzido número de indivíduos, de modo que J se situa na fase de transição entre a responsabilidade e a obrigação corporativas, de um lado, e a responsabilidade e a obrigação individuais, de outro, como as vemos formuladas em Ez 18. O segundo ponto de partida nos é oferecido - completando a visão que o homem do Antigo Oriente tinha de que sua existência era dominada e dirigida por forças divinas - pela indicação de qual seja a divindade que verdadeiramente tudo determina. O [avista quer mostrar, sem dúvida também em tom polemizante contra as tentações oferecidas por outras concepções religiosas, que Deus, a partir do instante da criação, determinou e continua a determinar o destino da humanidade e de Israel. Do mesmo modo como ele pretende exercer seu domínio sobre todas as coisas, assim também quer estabelecer uma comunhão de vida com o homem, por sua divina presença dentro do mundo e nos acontecimentos terrenos. Ele jamais abandona a humanidade pecadora. As próprias representações antropomórficas nos indicam que o Deus transcendente está perto do homem e fala com ele. Mas o homem, colocado nesta situação e quando se decide pelo bem, torna-se crente como Abraão, paciente e conformado como Isaac, perseverante e esperançoso como Jacó, ou humilde como José.
5. Origem de J É difícil de saber em que época surgiu J, pois falta toda e qualquer referência explícita aos acontecimentos contemporâneos. Sua data tem sido colocada muito freqüentemente, ora na época de Davi e Salomão (NoTH, SELLIN-RosT, WEISER), ora no séc. IX (HbLscHER). Ocasionalmente se tem pensado em um período por volta de 800 ou um pouco mais tarde (JEPSEN, MOWINCKEL). Para o limite inferior é preciso ter presente o gosto do [avista pela cultura da terra e pelo culto, mencionado em 3., o gosto pelo poder nacional e pela realeza, que depois da catástrofe do Reino do Norte, que afetou profundamente [udá, já não se pode esperar na mesma escala em que aparece em J. Há, porém, unanimidade quanto ao fato de que J não deve ser datado depois de 722 a.c. Mas qual seria o limite superior? Em face da longa pré-história de J, sérias dúvidas se levantam contra sua colocação na época de Davi e Salomão, apesar de essa data ter gozado ultimamente da preferência. As tradições anteriores a J só puderam ser assumidas e utilizadas em escala maior no sul, depois que aí surgiu, no
212
o PENTATEUCO
reinado de Davi, uma tribo "israelita" de [udá composta de elementos oriundos de grupos diversos. Somente a fonte G2pode ser datada da época de Davi e Salomão. Além disso, o fato de E não depender de J, mas provir, como este, também de G 2, nos permite concluir, com relação à obra de E, surgida provavelmente no reino setentrional de Israel, que, ao se dar a cisão do reino depois da morte de Salomão, só existia a versão mais nova de G, e a de J ainda não, e que G2continuou a se desenvolver separadamente, antes de sua fixação definitiva em J e E, no sul e no norte, respectivamente. Foi precisamente no período posterior a Salomão que a idéia do grande Israel, alimentada por J, adquiriu sua verdadeira significação. Depois do cisma político, J coloca o acento na unidade espiritual e religiosa de Israel, esteando-a na história. Por conseguinte, devemos considerar como época de origem de J os decênios de 850-800 a.c., depois da política anticananéia de Asa e [osafá, quando voltavam a ressurgir as aspirações nacionais, religiosas e políticas de um grande Israel sob o reinado de Amasias. Com certa unanimidade admite-se que o território de [udá foi o lugar de origem de J. Mais precisamente: deve-se pensar em Jerusalém e na corte real, principalmente porque J julga muito favoravelmente a realeza davídica. MOWINCKEL talvez tenha razão quando considera o autor javista como um historiógrafo, um "sábio" oriundo da escola dos escribas da corte, perito na arte de escrever e possuidor de alguma erudição. Vestígios desta erudição são, p.ex., suas tabelas etnográfícas" e as listas das cidades fundadas por Nemrod (Gn 1O.8ss) ou a notícia da fundação de Hebron, sete anos antes de Zoan no Egito. A obra de J é, portanto, depois da versão G 2, que não foi conservada, a exposição mais antiga da história primitiva de Israel.
§ 23. O "ESTRATO FONTE" E Cf. a bibliografia referente ao § 22. - K. BUDDE, Deuteronomium 33, 1922. - O. EISSFELDT, "Die Komposition von Ex 1-12", ThB118 (1939), 224-233. - J. MORGENSTERN, "The Elohist Narrative in Exodus 3.1-15",
97
W. BRANDENSTEIN, "Bemerkungen zur Võlkertafel der Genesis", em: DebrunnerFestschrift, 1954,57-83.- J. SIMÜNS, The "Table of Nations" (Gen X): its general Structure and Meaning, OT5 10,1954,155-184. - D. J. WISEMAN, "Gênesis 10: Some Archaelogical Considerations", Journal of the Transactions of the Victoria Institute London 87 (1955), 14-24.
§ 23. O
"ESTRATO FONTE"
E
213
AJSL 37 (1920/21) 242-262. - O. PROCKSCH, Das nordhebriiische Sagenbuch, Die Elohimquelle, 1906. - W. RUDOLPH, Der "Eiohiet" von Exodus bis [oeua, 1938. - P. VOLZ - W. RUDOLPH, Der Elohist ais Erziihler ein Irrweg der Pentateuchkritik?, 1933.
1. Terminologia e conteúdo
o nome
de "eloísta" (abrev.: E), tanto para o autor como para a fonte, se deve ao fato de que, ao contrário de J, o autor no começo usa apenas o nome divino de Eloim, evitando o nome divino de Javé. Somente a partir de Ex 3.14s, quando o nome de Javé é revelado a Moisés, E passa a usar o nome de Javé, ao lado de Eloim, nas exposições posteriores. Como a denominação de J, a de E também não é de todo feliz, principalmente porque P no início usa também a denominação de Eloim, de modo que, no passado, se falava algumas vezes da existência de duas fontes E (§ 17,2). Por isso é preferível, e é mais exato, dizer que E é uma das duas fontes que usam o nome divino de Eloim no início de sua exposição. Enquanto J é reconhecido quase sem discussão, a questão com relação a E se torna mais difícil. Ora se nega simplesmente que tal fonte exista, ora se admite a versão de um documento fundamental, ora se pensa simplesmente em uma situação fragmentária da tradição. Antes de entrar no estudo desta questão, indicaremos aquelas seções em que provavelmente a fonte E se divide e que nos permitem identificar o plano da exposição global e seu conteúdo básico. (O asterisco * indica que há uma mistura mais ou menos acentuada com elementos dos "estratos" assinalados entre parênteses, quando a indicação dos versículos seria por demais extensa): Gn
15*
(J) Promessa feita a Abraão sobre a posse do país e de descendentes. 20 Sara em situação de perigo em Gerara, Nascimento de Isaac, 21.1b,6 Expulsão de Agar e Ismael, 21.8-21 21.22-34 Aliança de Abraão com Abimelec, Caminhada de Abraão para o sacrifício, 22.1-19 Isaac e Rebeca, 24* (J) 25.11a; 26.3b-5 Bênção de Isaac, 25.27*; 27.1-45 Jacó engana Esaú, 28.10-12.17s.20-22 Sonho de Jacó em Betel, Chegada de Jacó à casa de Labão, 29.1-14* (JN)
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29.31-30.24* (JP) Filhos de Jacó, 30.25-43 Contrato de trabalho de Jacó com Labão, 31.1-16* (N) Riqueza de Jacó; ordem de regresso, Fuga de Jacó, 31.17-43 31.44-32.1* (JN) Acordo de Jacó com Labão, 32.2-22* (J) Antes do encontro com Esaú, 32.24a; 33.1-16* (J) Encontro com Esaú, 33.18-20* (NP) Jacó junto a Siquém, 34* (N) Assassinato de Siquém, 35.1-4,6s* (P) Construção do altar em Betel, 35.8,14 Morte de Débora, 35.16-20 Nascimento de Benjamim; morte de Raquel, 36.2b,9-39* (JN) Descendentes de Esaú, de Seir e edomitas, 37.3-36*; 39.1-46.5*; 46.28-48.2 (menos 47.5b-6a,7-11)*; 48.8-22*; 50.1-11,14-26* (J) Novela de José, Ex
1.12b 1.22*; 2.1-10* (J)
Opressão no Egito, Nascimento de Moisés que, a seguir, é exposto e depois salvo,
2.15* (N) 3.1-15* (J); 4.10-31* (JN) 5.1-6.1* (J) Fuga de Moisés para Madiã, 7.14-25* (JP); Vocação de Moisés, 9.13-35* (J) Negociações com o faraó, 10.12-27* (J) Pragas do Egito, 11.1; 12.31,39b Morte dos primogênitos, permissão dada a Israel para partir, 13.17-14.31* (JN) Perseguição e libertação de Israel, 17.1-17* (JN) Milagre da fonte no Horeb, 18* (J) Introdução de um ordenamento na administração da justiça, 19.2-20* (JN) Chegada ao monte de Deus, encontro com Deus, 20.1-17 (O) Decálogo, 20.18-21* (JN) Impressão causada sobre o povo, 20.22-23.19 O Código da Aliança, 23.20-33* (J) Despedida do povo, 24.3-8 Compromisso do povo, 24.12-18* (NP); Moisés recebe as Tábuas de Pedra, 31.18b
§ 23. O
32* (N) 33.5-11 Nm 11.4-35* (JN) 12* (N) 13.17-14.25* (JNP) 20.1b 20.14-21* (JN) 21.4-9 21.10-19,20* (J) 21.21-35* (IN) 22.2-24,25* (J)
32.1-38* (J)
Dt
31.14-17,23* (I) 33 34.1* (IP)
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E
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Culto ao bezerro de ouro, Tenda da revelação, Maná, inspiração dos anciães, Revolta de Aarão e Míriam contra Moisés, Exploração do país (Caleb), Morte de Míriam, Edom recusa passagem, A serpente de bronze, Continuação da caminhada até Fasga, Vitória sobre Seon, Balaão, Partilha de terras a Gad e Rúben, na Transjordânia, Preparativos para a instalação de [osué, Bênçãos de Moisés, Morte de Moisés.
2. Outros pontos de vista e variantes A opinião de que seja possível identificar um "estrato fonte" E no Pentateuco, com a extensão acima indicada, tem contra si outros pontos de vista diferentes ou variantes. a) Pelo fato de E aparecer freqüentemente entrelaçado com trechos de J, dos quais, no entanto, E nem sempre pode ser considerado como paralelo, mas apenas como complemento, compreende-se que VOLZ e RUDOLPH tenham dado um passo avante, ao negar simplesmente a existência de E. Para eles, trata-se, ao invés, de tradições paralelas a J, oriundas de épocas diversas e devidas a diversos autores. Foi sobretudo EISSFELDT quem rejeitou, e com razão, esta tese, baseando-se em um reexame de Ex 1-12. Os trechos atribuídos a E muitas vezes são realmente duplicatas de J e não raro contradizem este "estrato fonte". Os fragmentos também se entrecruzam não só quanto ao conteúdo e às particularidades de linguagem e de estilo, como também pela semelhança de idéias e de concepção. Juntos, eles formam um grande complexo, com uma estrutura externa e interna bem definida. Também não se pode excluir a existência do "estrato fonte" E, como o faz MOWINCKEL, admitindo-se, ao lado de um Javista invariatus, também um [avista variatus, que representaria um estágio mais recente da tradição e ao qual pertenceriam aqueles trechos que se costumam atribuir a E. Com
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o PENTATEUCO
efeito, E não se pode resolver no material de uma variante que teria surgido no decurso do tempo. A presença de duplicatas e de fios paralelos de muitos complexos narrativos, que se costumam dividir entre J e E, é por demais clara, para que possamos nos contentar com a hipótese de uma evolução da tradição, como nos mostram, p.ex., os paralelos de Gn 20 e 26.1-3a,6-11 ou o cruzamento de várias exposições em Gn 37 e Ex 3. b) Pretendeu-se identificar tensões de conteúdos no interior de E, e para explicá-las, procurou-se demonstrar que, além de um escrito eloísta básico (E), haveria uma redação mais recente (E') (KUENEN) ou uma variante, surgida no sul, e que teria sido ampliada no norte (PROCKSCH). Mas esta hipótese foi combatida, e com razão. Em parte alguma se encontra uma prova segundo a qual E tenha sido reelaborado ou completado. Pelo contrário: o documento nos revela claramente uma unidade interior bastante nítida. Não existe, como se pretendeu, nenhuma contradição entre a lenda dos santuários, com a inclusão do oráculo da incubatio (ou seja, o oráculo que se obtinha, passando-se a noite num santuário) que aí era praticada (Gn 28.lOss) e com a investida contra o culto do bezerro de ouro, que aí também se exercia (Ex 32), pois se trata de fatos cultuais diversos, dos quais um é aprovado e o outro é rejeitado. c) Tampouco procede a opinião de que E teria sido conservado sob uma forma muito mais fragmentária do que J (NOTH, WEISER), caso se tome esta opinião como uma apreciação global. Por certo, ao se unirem as narrativas de E com J, elas só foram utilizadas na medida em que divergiam dele, ou se reduziram a breves anotações, como em Ex 1.12b. Também falta o começo de E, como haveremos de mostrar. Encontra-se, porém, um sem número de exemplos em que E foi utilizado tanto quanto J. E foi integralmente conservado principalmente naqueles pontos onde tinha assumido a narrativa da tradição oral, p.ex., em Gn 21.22-34; 22-1-19; Nm 21.4-9, ou onde mais diverge de J, p.ex., em Gn 20. Em resumo, tem-se considerado E como um "estrato fonte" autônomo em sua origem e conservado quase integralmente.
3. A tradição anterior e o contributo de E Em sua maneira de expor, E baseia-se, como J, sobretudo em G2, e sua formulação se fez a partir desta fonte, havendo utilizado mais elementos próprios do que J. Para o problema das relações entre a tradição anterior e o contributo específico de E, o primeiro fator a considerar é sobretudo a estrutura do conjunto.
§ 23. O
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E
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o que mais nos chama a atenção é o fato de que na sua forma atual E começa abruptamente com as palavras: Depois destes acontecimentos (Gn 15.1). Este modo de expressar-se deixa a entender que a passagem original era precedida de outras anotações ou narrativas. É claro que dificilmente se pode admitir que E tenha narrado uma história primitiva, que talvez se houvesse conservado, mesmo parcialmente (DILLMANN, HOLSCHER). Seu proêmio era constituído, evidentemente, pela obra de J, que E não segue neste ponto. Ele se manteve dentro da linha da tradição e começa com a história de Abraão. A partir de [s 24.2ss pode-se concluir que antes de Gn 15 estava a narrativa da saída de Abraão de um ambiente pagão, na Mesopotâmia, para a Palestina. Depois da promessa divina feita a Abraão, vêm apenas mais umas poucas narrativas que, aliás, em sua maioria, tratam mais propriamente da herança da promessa, sobretudo da de Isaac. Bastante detalhadas são as narrativas em torno de Jacó e seus filhos, na segunda parte do Gênesis. O mesmo se passa com a tradição referente a Moisés, que, além do decálogo, conservou também como exclusividade sua sobretudo a narrativa do culto ao bezerro de ouro (Ex 32), o chamado Código da Aliança, cuja posição dentro da obra já não é possível determinar (§ 21,2), e as bênçãos de Moisés (Dt 33). Se lançarmos um rápido olhar sobre o esquema e a ordem de sucessão dos fatos narrados, veremos claramente que E corre paralelo com a fonte de J, a partir da história de Abraão. Este fato se explica pela dependência de ambos os lados em relação a G2. Além disso, E contém outros elementos bem caracterizados, dos quais devemos mencionar, em particular, a citação extraída do Livro das Guerras de Javé (Nm 21.14s), o cântico dito do poço (21.17s), a canção satírica a respeito de Seon, rei dos amorreus (21.27-30; cf. § 40), o Código da Aliança, de que já falamos, e as bênçãos de Moisés (Dt 33), paralelas às bênçãos de Jacó em J (Gn 49). Estas bênçãos constituem uma coleção de sentenças relativas às tribos israelitas, apresentadas sob a forma de bênçãos (§ S,l). Também é patente a nova interpretação que E dá à tradição. De modo geral chama-nos a atenção um certo tipo de reflexão teológica. Ao estilo realista, vivo e plástico das narrativas de J, se contrapõe certa racionalidade um tanto pesada da parte de E (WEISER). É a esta reflexão que se deve o processo, que então se inicia, de dividir a história em etapas. P desenvolverá este processo. O uso de nomes divinos diferentes, para indicar as épocas anterior e posterior a Moisés, divide a história teologicamente, a despeito da identificação do Deus dos patriarcas com Javé (Ex 3.14), em dois grandes blocos. Estes blocos, segundo [s 24.2, eram precedidos
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o PENTATEUCO
também pela narrativa do período dos ancestrais que serviram a deuses estran-geiros. A este procedimento corresponde uma certa nota "erudita" que se manifesta no fato de reproduzir certas minúcias como as de Gn 35.8,19; Ex 13.18, ou de citar fontes mais antigas, como Nm em 21.14,17,27. As peculiaridades de E aparecem de modo particular numa série de traços típicos de sua exposição (WEISER). Faltam, em primeiro lugar, muitas das tradições judaítas particulares em torno de Ló e Sodoma e em torno de Abraão, cuja figura passa a segundo plano, surgindo em seu lugar a figura de Jacó. Daí resulta que Jacó e José se tornam os principais personagens da era dos patriarcas. Em segundo lugar, e paralelo a esta linha, temos o fato da adesão aos santuários de Betel e de Siquém, no norte de IsraeL A inclusão de Bersabéia, ao sul, não contradiz este fato, pois Am 5.5; 8.14 pressupõe estreita relação do reino setentrional com este centro de peregrinação. Em terceiro lugar, a importância de Moisés é muito mais destacada do que em J (e isto é continuado em D e P), p.ex., mediante o relato da revelação que lhe faz Javé e pelo fato de lhe ser atribuída a autoria do Código da Aliança e dos ditos a respeito das tribos israelitas, ditos estes que se encontram nas chamadas bênçãos de Moisés. Observe-se, por último, que E se encontra em mais estreita relação com a profecia do que J. Depois de Abraão (Gn 20.7), é Moisés aquele que recebe de modo particular a qualificação de profeta - profeta inspirado por Javé, anunciador de sua vontade, dotado por ele de poderes e exercendo a função de intercessor. Em Nm 11.29 chega-se mesmo a lhe atribuir o desejo de que todo ó povo de Javé seja um povo de profetas, aos quais Deus conceda o seu espírito.
4. Características de conteúdo e teologia de E As características de conteúdo e as linhas teológicas fundamentais de E devem ser estudadas conjuntamente (EISSFELDT, WEISER). Das mesmas fazem parte, em primeiro lugar, a preocupação de acentuar a distância de Deus em relação ao mundo e ao homem. Deus não anda pelo mundo: Ele habita no céu. É daí que se dirige aos homens, por intermédio de seus mensageiros (Gn 21.17; 28.12), e se manifesta em sonhos, em visões, durante a noite (Gn 20.3,6; 28.12; 31.11). A idéia de Deus é, assim, despojada de seus aspectos sensíveis e espiritualizada, desaparecendo ao mesmo tempo suas representações antropomórficas. Em face do Deus transcendente, o homem não se comporta com arrogância, mas antes com temor e tremor (Ex 3.6).
§ 23. O
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A este quadro corresponde a, visão de uma ética mais refinada. A mentira de Abraão, que em J afirmava que Sara era sua irmã, foi suavizada por E, com a explicação de que Sara era meia irmã de Abraão. Os rebanhos de Jacó não foram aumentados por um artifício fraudulento do pastor, mas sim por intervenção do próprio Deus, e pertencem a Jacó, porque lhe estão reservados como herança de sua mulher. É de E sobretudo que provém a tendência de apresentar os patriarcas (em estilo parenético e edificante), como modelos para os homens, descrevendo seus sentimentos humanos, como a piedade de Abraão para com a sua escrava (Gn 21.11) ou seu sofrimento em face do sacrifício de seu filho que lhe era exigido (22.1ss). Também a autocompreensão de Israel em E é diferente daquela de J. O aspecto religioso e teológico sobreleva o aspecto nacional. É nesta linha precisamente que se situa a idéia de Javé como rei (Nm 23.21s; em contraposição com 24.7,18s em J). As bênçãos de Abraão, transferidas para Isaac (Gn 22.17s), são interpretadas de tal modo, a acentuar o aspecto religioso da escolha de Israel, não possuindo ela já para os outros povos nenhuma significação positiva: Israel possuirá as portas de seus inimigos e as nações só utilizarão o seu nome quando pronunciarem votos de bênçãos. O cunho universal de J é sacrificado à tendência a uma concentração sobre os aspectos nacionais e religiosos. No fundo, a soberania divina e a comunhão com Deus ficam limitadas a Israel (e este procedimento continuado em D e P). Conseqüentemente, a separação de Israel, como decorrência de sua escolha por Deus, transforma-se em segregação, e o universo das nações se converte em o mundo dos pagãos, como vemos expresso no cântico de Balaão: Eis um povo que habita só, um povo que não é contado entre as nações "pagãs" (Nm 23.9b). Deriva daí que os outros deuses devem ser eliminados (Gn 35.2), seu culto deve ser punido como apostasia contra Javé (Ex 32) e os sacrifícios humanos devem ser banidos (Gn 22.1-19), enquanto que as massebas (estelas) dos cananeus recebem um novo significado, sendo utilizadas como lápides comemorativas ou como monumentos funerários e semelhantes (Gn 28.18ss; 35.20). O acontecimento histórico é considerado em E muito mais intensamente sob o aspecto do julgamento divino a respeito do pecado humano do que em J. Isto vale tanto para os amorreus como para o próprio Israel (Gn 15.16). Israel rompeu o pacto que fizera com Deus, fabricando um bezerro de ouro e prestando-lhe culto junto ao monte de Deus, enquanto Moisés permanecia junto a Deus. Este acontecimento se conclui de forma
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o PENTATEUCO
dissonante e ameaçadora: Deus repele a intercessão de Moisés e lhe ordena que conduza o povo para longe dali, daquele lugar que é a própria morada de Deus, o monte de Deus: conduze o povo para onde te disse (Ex 32.34). Estas "palavras pronunciadas quase em tom de repulsa" (ErssFELDT) designam Canaã, para onde Israel partiu cheio de contentamento, conforme J. Anuncia-se, em transição, o acontecimento que há de vir: No dia da minha visite eu punirei o pecado deles. A apostasia contra Deus não é perdoada com a intercessão de Moisés; pelo contrário, será castigada no tempo oportuno. Isto, porém não deve ser identificado com as ameaças de Amós ou Oséias, apesar das relações de E com a profecia mais antiga. Com efeito, não se trata do povo em sua totalidade, nem também do seu fim, mas da necessária expiação pela apostasia, expiação que a geração do deserto devia executar. Em seguida se restabelece a situação de salvação na qual E também vê Israel. Depois de ser castigado por causa da rejeição da soberania divina, Israel pode prosseguir com sua vida de comunhão com Deus.
5. Origem de E Em geral se admite que o reino setentrional de Israel foi o lugar de origem de E. Depois de SMEND e HOLSCHER, NOTH se pronuncia, pelo contrário, por uma origem judaíta, e ErssFELDT contesta que o reino setentrional tenha sido a pátria de origem de E. Tendo em vista que J e E provêm de uma base comum, formada com tradições provindas de todo o Israel, não é fácil encontrar uma resposta definitiva. Contudo, dado que E deriva de G 2, os traços de E que mais nos chamam a atenção são precisamente aqueles que, à diferença dos de J, nos apontam para o reino setentrional, e esses traços são: a preeminência de Jacó e de José, a preferência que se dá a este último nas bênçãos de Moisés, à custa de Abraão e Isaac, a insistência na tradição de Moisés, com base na qual já [eroboão I procurava justificar as medidas por ele adotadas em relação ao culto divino (lRs 12.28ss), medidas estas as quais, naturalmente são também criticadas (Ex 32). Além disso, E alimenta interesse pelos santuários de Betel e de Siquém, vinculados ao norte de Israel, ao lado do santuário de Bersabéia, ao sul, e menciona as sepulturas dos antepassados no reino setentrional (Gn 33.8,19s; talvez também [s 24.30ss). É preciso, ademais, levar em conta a influência que E exerceu sobre Oséias, residente em Israel, como também sobre o Deuteronômio em sua forma primitiva, surgida provavelmente no reino do norte. Todos estes indícios nos levam a concluir que E surgiu no reino setentrional
§ 24. O
PROBLEMA DE UM TERCEIRO ANTIGO "ESTRATO FONTE"
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de Israel, como concorrente de J. Enquanto as semelhanças se explicam a partir de uma base comum, as diferenças se devem à existência de uma versão de G2, que se desenvolveu separadamente, por algum tempo, no norte de Israel, e também ao antagonismo político, espiritual e cultural existente entre o norte e o suL Se esta opinião é verdadeira, a época da origem de E situa-se entre a cisão do reino depois da morte de Salomão e a ruína do reino setentrional em 722 a.c., ou mais precisamente talvez depois do aparecimento de J. Evidentemente não se pode pensar no período do exílio (HOLSCHER). Considerando-se as relações de E com a profecia e a situação de tranqüilidade durante a realeza (Nm 23.21; Dt 33.13ss), é possível, com WEISER, situar E na época de [eroboão Il, antes do meado do séc. VIII.
§ 24. O PROBLEMA DE UM TERCEIRO ANTIGO "ESTRATO FONTE" 01, L, N) Cf. a bibliografia indicada para o § 17,3 (notas 37-46) e o § 22.
1. A suposição de um terceiro "estrato" Ainda mais difícil e problemática do que a questão referente à existência e ao estado de conservação do "estrato fonte" E é a posição concernente à existência de um terceiro "estrato fonte" além de J e E, que teria surgido no período anterior no exílio. Depois da análise de SMEND, fizeram-se não poucas tentativas para provar a existência de um tal "estrato" (§ 17,3). O fato de estas tentativas divergirem quanto aos detalhes em nada depõe contra o seu valor. Pelo contrário, estas divergências se baseiam na tradição dos textos, tradição que, mais de dois milênios depois da fusão e da reelaboração redacional de várias obras primitivamente autônomas, causa sérias dificuldades ao trabalho de análise. Por outro lado, isto explica evidentemente por que a hipótese de um terceiro antigo "estrato fonte" foi muitas vezes rejeitada. Esta colocação se baseia no fato de que J - pois é somente este "estrato fonte" que vem ao caso, por causa do uso do nome divino de Javé (Gn 2.4b) - assumiu tradições bastante heterogêneas, transmitiu-as com grande fidelidade, alterou-as somente em alguns pontos, e não as ajustou umas às outras (SELLIN-RoST, WEISER). Se, porém, adotarmos a teoria de NOTH, segundo a qual existiu uma base comum para J e E teoria esta sumamente provável, quando considerada à luz da análise dos
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o PENTATEUCO
referidos"estratos" - chama-nos a atenção a circunstância de que somente J, e não E, tenha utilizado, como se supõe, uma série de materiais antiqüíssimos, que, ademais, pouco se ajustam ao restante de sua exposição, paralela à do "estrato" E. De fato, uma série de razões depõem em favor da hipótese de uma terceira fonte surgida na época anterior ao exílio. Já as narrativas da história dos primórdios nos revelam, depois de excluídos os trechos pertencentes a P, duas tendências inteiramente distintas. De acordo com uma das séries, que foi atribuída a J no § 22, o caminho da humanidade, depois da criação, segue como que em linha reta e para baixo, em direção ao pecado e ao juízo. A outra série, pelo contrário, nos apresenta um ritmo regular de acontecimentos positivos, de avanços tempestuosos ou arrojados, e de recusas por parte do homem. Trata-se não somente de materiais que não foram harmonizados, mas de duas concepções que se excluem mutuamente. Além disso - de novo abstraindo dos fragmentos que pertencem a P - ocorrem, por três vezes, determinadas narrativas ou motivos: a promessa de um país e de descendentes, feita a Abraão (Gn 15 [JE],além de 13.1418), o risco por que passou a mulher do Patriarca (20 e 26 [JE], além de 12.10-20); a venda do direito de primogenitura por Esaú (25.29-34) com a fraude de Jacó (27.1-40 [JE]); a indicação de Javé como o Deus dos pais (Ex 3.15,16 [JE], e também 4.5); a ordem dada por Javé a Moisés, mandando-o voltar ao Egito (3.10,16 [JE], e também 4.19), depois da qual ele leva a mulher e o filho (4.20), quando, segundo JE, somente mais tarde é que a mulher foi levada pelo pai a Moisés (18.5s); a ordem de imolar a páscoa e com o sangue das vítimas untar os batentes e os umbrais das portas, ordem esta que está em conflito com JE98. Em outros casos entremearam-se, evidentemente, várias narrativas sem que se consiga distinguir exatamente as partes que cabem a J e as que pertencem a E. Assim, foram acrescentadas em Gn 18-19, onde E não entra, duas narrativas. Na primeira dessas narrativas, é o próprio Javé quem visita Abraão e Sodoma, ao passo que na segunda são três dos seus mensageiros. Também a narrativa do maná (Ex 16) deve ser dividida em duas camadas, às quais se junta a narrativa de Nm 11.4ss que forma parte de E. Freqüentemente encontramos três narrativas reunidas e fundidas, como,
98
Quanto aos detalhes, cf. G. 82s.
FOHRER,
Überlieferung und Geschichte des Exodus, 1964,
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PROBLEMA DE UM TERCEIRO ANTIGO "ESTRATO FONTE"
223
por exemplo, nas histórias de Jacó (Gn 29.1-14; 30.25-43; 31.17-43; 31.4432.1) e na história do Sinai", Nestes, como em outros casos, existem elementos narrativos que não se podem enquadrar nas exposições de J ou de E, mas que, por outro lado, não é possível considerar como fragmentos autônomos antigos ou recentes, nem também como acréscimos, pois formam um conjunto homogêneo. Por último, existem certas peculiaridades de linguagem que sugerem a existência de um terceiro "estrato fonte", peculiaridades de que damos pelo menos um exemplo: O sogro de Moisés é designado simplesmente como tal em E, sem o nome (Ex 18.8), ao passo que J o qualifica de sacerdote de Madiã, com o nome de [itro (forma errônea ou secundária de [etro) (3.1), também chamado Hobab filho de Ragüel, o madianita (2.18; Nm 10.29; [z 1.16)100.
2. Terminologia e conteúdo Tudo isto nos aconselha a admitir um terceiro "estrato fonte" da época anterior ao exílio e que, como J, usa o nome divino de Javé já para o período anterior a Moisés. Até agora não há unanimidade quanto à designação deste "estrato fonte". A sigla P, usada inicialmente, pode dar margem a que se pense erroneamente que existe estreito paralelismo com a fonte javista (F). A designação de Laienquelle ("Fonte Leiga"; abrev.: U, proposta por EI55FELDT, não procede, precisamente porque apresenta, como J ou E, uma teologia fortemente caracterizada e porque nada tem de leiga. Tendo em vista que sua posição fundamental, ao contrário de J e E, que aprovam a vida em país de cultura, foi determinada pelas representações dos círculos israelitas (semi) nômades, propomos para ela a denominação" estrato de fonte nômade" (abrev.: N).
Em linhas gerais, podemos atribuir a N as seguintes perícopes que nos permitem identificar o plano da exposição e seu conteúdo essencial. (O asterisco * indica que há uma mistura mais ou menos acentuada com elementos das fontes assinaladas entre parênteses, quando a indicação individual dos versículos ou das partes do versículos resultaria por demais extensa);
99 100
O. EISSFELDT, "Die alteste Erzahlung vom Sinaibund", ZAW 73 (1961), 137-146. Cf. a demonstração de O. EISSFELDT, Hexateuch-Synopse, 1922, 59-61.
o PENTATEUCO
224
Gn 2.8s* (J)
o homem no Éden, a árvore da vida e a expulsão do paraíso,
3.18-19aa.21,22b,24 4.17-24 6.1-4 9.21-27 11.1-9 12.1,2,4a 12.6-9 12.10-20 13.1-5,7-11a.12b-13 13.14-18 18.1-15* (J) 16.16,22a 19.1-28* (J) 19.30-38 25.1-6 25.11b 25.21-26 25.29-34 26.12-23,26-33 29.1-14* (JE) 29.15-28a.30 30.25-43* (JE) 31.1,3 31.17-43* (JEP) 31.44-32.1* (JE) 32.24b-33 33.18-20* (EP) 34* (E); 35.5 35.21-22a 36.2b,9-39* (JE) 38 Ex
101
Os cainitas e a cultura, Origem dos gigantes, Noé e a videira, A construção da torre e a dispersão, Partida de Abraão e de Ló; bênçãos, Construções de altares em Siquém e Betel, Situação de perigo para Sara em Gerara, Separação de Abraão e Ló, Promessa da posse do país e de descendentes, Promessa do nascimento de Isaac, Partida dos visitantes para Sodoma, Sodoma e Gomorra, Origem dos moabitas e amonitas, Descendentes de Abraão com Cetura, Residência de Isaac, Nascimento de Esaú e de Jacó, Esaú compra o direito de primogenitura, Riquezas de Isaac, disputa e acordo com Abimelec, Chegada de Jacó à residência de Labão, Casamento de Jacó com Lia e Raquel, Contrato de trabalho de Jacó com Labão, Ordem de voltar, Fuga de Jacó, Acordo de Jacó com Labão, Luta de Jacó em Fanuel, Jacó em Siquém, Violação de Dina e matança de Siquém, Infâmia praticada por Rúben, Descendentes de Esaú, de Seir e edomitas, [udá e Tamar,
1.7*.9,10a,11,14a* (P) Opressão no Egito 101, 2.15bj322* (J) Casamento de Moisés em Madiã, 3.21s; 4.1-9,19,20a, Vocação de Moisés, 24-26,30b-31a 11,2s.12.21-23,27b Preparativos para a morte dos primogênitos, 12.33-37a,38-39a Partida de Israel,
A ordem de matar referida em Ex 1.15-21 talvez tenha sido elaborada a partir de uma notícia de N.
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13.17-14.31* (JE) 15.20s 15.22-27 16* (JP) 17.1ba 17.8-16 19.2-25* (JE) 20.18-21* (JE) 24.1-2,9-11 24.13a,14-15a 32.17s,25-29 33.3b-4 Nm 10.29-36* (J) 11.1-3 11.4-35* (JE) 12* (E) 13.17-14,45* (JEP) 20.1a,2-13* (P) 20.21 21.1-3 21.21-35* (JE) 25.1-5* (J) 32.39-42
225
Perseguição e libertação de Israel, Cântico de Míriam, Marcha em direção a Mara e a Elim, Maná, Chegada a Rafidim, Vitória sobre os amalecitas, Sina i e descida de Javé, Impressão causada sobre o povo, Refeição junto a Javé, Moisés e Iosué no monte, Desregramento do povo e castigo, Ordem de partida, Partida, Revolta em Tabera, Codornizes, Revolta de Aarão e Míriam contra Moisés Exploração do país (Caleb), Milagre da fonte em Meriba, Edom recusa passagem, Derrota dos cananeus, Vitória sobre o rei dos amorreus, Culto de Baal-fegor e castigo, Conquistas dos filhos de Maquir, e de Nobe na Transjordânia.
3. A tradição anterior e o contributo de N Em confronto com J e E, N reflete um estágio mais antigo da tradição. A história dos primórdios diverge a tal ponto de J, que deve ser considerada como uma obra própria de N, calcada no proêmio de J, ao passo que lhe faltam sobretudo a novela de José, que bem corresponde a um estágio mais recente da tradição, e a narrativa das pragas do Egito que precederam a morte dos primogênitos. Além disso, as narrativas referentes a Jacó e Esaú ou Jacó e Labão apresentam-se isoladas. Depois da compra do direito de primogenitura, Esaú se retira para Edom e não mais volta à cena, assim Jacó, que também não foge dele, já não se encontra mais com ele, ao voltar de junto de Labão. As duas séries de narrativas, portanto, ainda não se achavam inteiramente fundidas. Contudo, as linhas gerais e a maneira como o conjunto se desenvolve são de tal modo paralelos às exposições de J e E, e as divergências mencionadas indicam com tal clareza um estágio primitivo da tradição, que N
o PENTATEUCO
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não pode depender de J ou de E, nem também utilizou uma tradição inteiramente diversa desses dois "estratos fontes". Pelo contrário, a descrição de N se baseia numa versão mais antiga da base comum de J e E, que é a fonte CI. O contributo próprio de N muito provavelmente terá consistido sobretudo em haver assumido certos elementos narrativos antigos de âmbito nômade, além de uma maneira toda particular de conceber a história dos primórdios. Esses aspectos podem ser divididos em três categorias: a) Um grupo de caráter mais geral, ao qual pertencem os ditos de Noé (Cn 9.25-27)102 a respeito de Sem, [afé e Canaã, aos quais se acrescentou Cam em 19.18,22. Esses ditos se relacionam evidentemente com uma determinada situação histórica. CUNKEL supõe que eles datam de meados do segundo milênio a.c., ao passo que se deve pensar na época de Davi, o qual tal como aí se anuncia, subjugou os cananeus. Como estes são os representantes da terra de cultura, N pude também concordar com esta medida. Por [afé se deveriam entender então certas raças indo-arianas ou hititas, ou, de modo geral, aqueles diversos grupos que compunham a população palestinense, oriundos do norte, entre os quais se incluem talvez os filisteus, principalmente porque [apeto, o personagem da saga grega, parece ser originário da Ásia Menor. Por Sem se entenderiam as tribos israelitas errantes, além de outras mais. O cântico de Míriam (Ex 15.20s) é um cântico triunfal, o qual convida os ouvintes a glorificar os feitos do vencedor e abrange também a justificação genérica deste convite, além de uma descrição da vitória. O cântico surgiu talvez logo depois do acontecimento festejado, de modo que muito provavelmente deve ter-se originado do grupo chefiado por Moisés, constituindo assim um dos textos mais antigos do AT. O cântico dito do estandarte (Ex 17.16) é um antigo Juramento que se pronunciava ao pé do estandarte e anunciava uma guerra eterna contra os amalecitas, proclamada em nome de Javé. A narrativa de Ex 24.15,9-11 reflete o antigo costume de organizar refeições em comum para contrair uma comunhão ou reforçar um acordo, refeições estas cujos comensais eram as partes contraentes. Este costume, de caráter prevalentemente nômade, tinha seu equivalente em terra de cultura, qual seja o costume da refeição para celebrar a vitória sobre os inimigos da divindade, como início de uma nova era de paz (e na mitologia cana-
lO2
L.
ROST,
"Noah der Weinbauer", em: Alt-Pestschrift, 1953, 169-178.
§ 24. O
PROBLEMA DE UM TERCEIRO ANTIGO "ESTRATO FONTE"
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néia, uma era de salvação), ou o da refeição com que se festejava a coroação do rei do país, ao ensejo de sua proclamação ou subida ao trono. Além disso, existia também o costume comum das refeições cultuais. b) Das narrativas ou notícias referentes à história das tribos ou do povo formam parte principalmente a história chocante das origens dos moabitas e dos amonitas (Gn 19.30ss), talvez interpretada originariamente em sentido positivo, como caracterizando a pureza de linhagem; a lista dos grupos nômades que descendiam de Abraão e Cetura (25.1-6); e as narrativas sobre os atos de infâmia praticados pelos filhos de Jacó: Simeão, Levi, Rúben e [udá (34; 35.21s; 38). c) Dos elementos de natureza arcaica ou nômade formam parte principalmente o cântico de Lamec (Gn 4.23s), cântico de fanfarronada, onde se exalta a vingança do sangue ao excesso. Talvez seja de origem não israelítica e provenha do círculo nômade dos quenitas que se estabeleceram no sul de [udá, onde depois foram absorvidos. De origem antiga são as sagas cultuais, utilizadas na história do combate noturno de Jacó (Gn 32.25ss) e a sucinta narrativa da investida noturna de Javé contra Moisés (Ex 4.24-26), que serve para fundamentar a introdução da circuncisão das crianças, em substituição à circuncisão dos adultos'?'. Características de mentalidade nômade são também as notícias a respeito da espoliação dos egípcios (Ex 3.21s; 11.2s; 12.35s) e a constatação de que os israelitas sucumbiram à tentação, logo ao primeiro contato com a terra de cultura, apostataram de Javé e passaram-se a Baal (Nm 25.1-5).
4. Características de conteúdo e teologia de N Com isto, já tocamos nas características de conteúdo e nas linhas teológicas fundamentais. N começa com a história dos primórdios, imprimindo nela logo a sua marca e a sua orientação. O homem está sempre recaindo na situação de terra de cultura ou logrando sempre as conquistas que lhe correspondem, como sejam: ele vive no jardim de Deus; funda o nomadismo, com seus musicistas e ferreiros; descobre a viticultura e constrói torres e cidades. Ele, a criatura rebelde, está sempre ousando ou se vê sempre em condição de ultrapassar os próprios limites,
103
Para OS detalhes, cf. FOHRER, op. cito (veja acima, nota 98), com ampla bibliografia sobre o assunto.
228
o PENTATEUCO
de se apropriar dos poderes divinos e de tomar o céu de assalto: com a árvore da vida no Éden, com o casamento das mulheres deste mundo com seres divinos, com a construção de cidades e torres. Por isso Deus deve estar sempre intervindo e dominando sua criatura, expulsando-a do paraíso, reduzindo os limites de sua idade ou dispersando os homens que se tornaram numerosos. São acima de tudo as conquistas da terra de cultura que tornam o homem arrogante e atraem sobre ele o castigo. Ao contrário de J e E, é perceptível em N a hostilidade com relação a este setor. O verdadeiro homem, o verdadeiro crente, é o nômade. Já os primeiros homens devem ter sido nômades, tanto é assim que a árvore genealógica de Caim parece não conhecer outro tipo de homens senão este, enquanto a narrativa da construção da cidade e da torre imagina a humanidade, ainda coesa, como um grupo de nômades errantes. O trabalho do campo, no Egito, ao lado da fabricação de tijolos, aparece como dura opressão. Os nômades, em sua pobreza, reconhecem a superioridade da cultura egípcia, mas se gloriam de terem espoliado o egípcio, com sua manha e suas espertezas. Este e muitos outros aspectos das narrativas só se podem compreender a partir do ponto de vista do nômade. É a partir daí que se explica o julgamento a respeito da partida do monte de Deus. A estada dos israelitas junto a este monte encerra-se por causa de seus desregramentos. A continuação da caminhada através do deserto não é uma marcha alegre em direção à prometida terra de cultura, como em J, nem a espera do castigo prometido por causa da apostasia do povo, como em E; pelo contrário, é a conseqüência de ele ter sido despedido, sem contemplação, da presença de Javé, o qual permanece em seu próprio monte. A rigor, Israel deveria ter permanecido lá, junto a ele. A terra de cultura com seus santuários é um substitutivo imperfeito da verdadeira pátria de Javé e de Israel, o deserto, com o monte de Deus (ErssFELDT). Em tudo isto ouve-se o eco da crítica contra a fé javista contaminada na Palestina pela religião de Canaã. A figura do Deus do deserto, que só pode ser cultuada verdadeiramente em vinculação com o estilo de vida nômade, ainda está fortemente marcada por traços antropomórficos. Javé ainda está preocupado com o próprio prestígio; por esta razão é que ele expulsa o homem do jardim divino e dispersa a humanidade. Também as narrativas sobre a luta de Jacó, transferidas para Javé, e a investida contra Moisés são inconcebíveis em qualquer outro "estrato fonte".
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D
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5. Origem de N É difícil fixar com precisão a época de origem de N. ErssFELDT o considera como a camada narrativa mais antiga e o coloca no período que vai de 950 a 850. Mas somente com base no uso de antigo material e nos indícios de alta antiguidade não se pode concluir que N seja o "estrato fonte" mais antigo. Este "estrato" certamente se apóia na versão mais antiga da narrativa fundamental. Mas apenas se pode deduzir que ela ainda estava viva no ambiente em que N surgiu, talvez na tradição oral. Este ambiente, porém, era determinado pelo sentimento de vida nômade, tal como é conhecido ou se deve admitir para o sul de [udá, juntamente com o Negeb, ou para os recabitas que viveram desde a época de [eú até os dias de Jeremias. Uma possibilidade de datação talvez nos seja oferecida pelas relações existentes entre N e J. É verdade que N se utilizou de uma versão de G, mais antiga que J. Contudo, no proêmio da história dos primórdios, N parece inspirar-se basicamente no modelo de J, embora o autor manifeste desdém pela tradição da cultura mesopotâmica que J adota, e siga seus próprios caminhos. E de fato, toda a exposição de N entende-se melhor como uma reação e como resposta dos círculos nômades conservadores ao entusiasmo de J pela terra de cultura. Por própria iniciativa, a bem dizer, nada de bom proveio destes círculos. Se J surgiu nos decênios que vão de 850 a 800, então N deveria ser colocado em época um pouco mais recente, por volta talvez de 800 ou logo depois, e seria, portanto, um pouco mais antigo do que E. Como lugar de origem, o modo de pensar de N, enquanto reação contra J, indica o sul de [udá, onde o nomadismo se conservou mais fortemente e onde a criação de gado prevaleceu sobre a vida agrícola. O autor do "estrato" provém dos círculos das sociedades de criadores de gado que se mantêm fiéis a Javé e assumem uma atitude de crítica ou de repulsa em face da cultura de Canaã e, conseqüentemente, contra a cultura palestinense de Israel, contaminada de elementos cananeus.
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1. Terminologia, extensão, estrutura e estilo A denominação do "estrato fonte" D ("Deuteronomista") e do livro do Deuteronômio se deve a um equívoco de interpretação de Dt 17.18, onde os LXX traduziram o termo hebraico copia da lei como repetição da lei (deuteronámion). A própria fonte é escassamente representada nos livros de Gênesis até Números. Podemos lhe atribuir as prescrições referentes à páscoa, aos mazzot ("pães ázimos") e aos primogênitos (Ex 12.24-27a; 13.316), além de algumas observações complementares ou reformulativas, como no decálogo (Ex 20.1-17). Estas poucas passagens ficarão excluídas das considerações que se seguem. Quanto ao resto, trata-se principalmente do livro do Deuteronômio, cuja maior parte pertence a D. Isto se aplica, pelo menos, a Dt 1-30 e a alguns versículos de 31-32, ao passo que na parte principal de 31-34 se encontram ampliações dos elementos fundamentais ou a continuação de outras fontes que entram na composição de GênesisNÚmeros. Isto indica que a parte deuteronômica do livro do Deuteronômio formava outrora um conjunto autônomo que poderia conter uma espécie de apêndice resultante de ampliações e que, a seguir, foi incorporado à tradição já existente do Pentateuco. Se deixarmos de lado as perícopes de Dt que pertencem a outros "estratos fontes" (31.14-17,23; 33-34), o livro aparece, de um lado, como o testamento e discurso de despedida de um Moisés que está prestes a morrer, e, do outro lado, como a base de uma aliança imposta então de novo por Javé, depois da ruptura da primeira aliança celebrada ao pé do monte de Deus, ou seja, do chamado pacto do país de Moab (28.29). Os discursos
o PENTATEUCO
232
introdutórios (1-11) preparam a legislação, mediante considerações retrospectivas sobre a história, e com exortações à obediência. O núcleo central (12-26) contém os estatutos e leis do chamado pacto do país de Moab. Os discursos conclusivos (27-30; e alguns versículos de 31s) exortam mais uma vez ao cumprimento dessas leis, anunciam bênçãos ou maldições e acrescentam o cântico de Moisés (32). Enquanto este complexo se destaca exteriormente do restante do Pentateuco, como unidade completa, o estilo no-lo mostra como uma obra literária que deve ser diferenciada das demais fontes. A parte a amplidão do discurso, abundante e enfático, em íntima correspondência com o seu escopo exortativo, a linguagem se caracteriza por locuções típicas: a palavra (o mandamento) que eu hoje vos prescrevo, e semelhantes (4.2; 12.28; 15.5 etc.): de todo o teu coração e de todo a tua alma (4.29; 6.5; 10.12 etc.): o lugarque Javé tiver escolhido para fazer habitar aí o seu nome (12.11; 14.23; 16.2 etc.). Podemos simplesmente falar de um estilo deuteronomista que apelava para os sentimentos da alma, com o seu pathos brando e envolvente (SELLIN-RosT), possuía grande poder de penetração. É um estilo que, se abstrairmos da atividade dos reelaboradores e escritores deuteronomistas nos livros de [osué até Reis, faz-se notar em Jeremias e Ezequiel, e até mesmo nos profetas posteriores no exílio: Ageu, Zacarias, Malaquias.
2. Relação com a reforma de josias O ponto de partida da questão em torno de D está em sua relação com a chamada reforma do rei Josias, reforma esta que tinha começado talvez com a morte do último rei importante da Assíria, Assurbanípal, em 626 a.c., e terminou em 622. O relato de 2Rs 22s sobre esta reforma menciona um livro da lei de Javé que CRISÓSTOMO, JERÔNIMO e ATANÁSI0 1ü4, e mais recentemente HOBBES e LESSING 105 identificam com o Deuteronômio. De importância fundamental é a tese de DEWETTE, segundo a qual o Deuteronômio é uma obra que se diferencia dos livros anteriores do Pentateuco e provém de um autor de época mais recente, tendo surgido não muito antes da sua descoberta na época de [osias'?". Esta opinião se impôs de maneira quase universal, principalmente depois de ter sido sustentada 104 105 106
"Das Deuteronomium und 2 Kõnige 22", ZAW 22 (1902), 1705,2125. ZAW 51 (1953),299, nota 1. W. M. L. DE WETIE, Dissertatio critico-exegetica, quaDeuteronomium a prioribus Pentateuchi E.
J.
NESTLE,
HEMPEL,
libris diversum, alius cuiusdam recentioris auctoris opus esse monstratur, 1805.
§ 25. O
"ESTRATO FONTE"
D
233
por RIEHM 107, e só foi modificada quando se constatou que a fonte P deve ter sua colocação cronológica, não adiante, mas atrás de D, e que P pressupõe D. Evidentemente não faltam opiniões contrárias, do mesmo modo como para as outras partes do AT. Tem-se afirmado, vez por outra, que D provém diretamente de Moisés (KUNE, ROBINSON) ou, pelo menos, do tempo de Moisés (LÓHR), embora contra esta opinião haja os mesmos argumentos que se contrapõem a uma origem mosaica de todo o Pentateuco, ao que se acrescenta o fato de que as determinações legais de D pertencem a uma época mais recente do que aquela do C. da A. Outros autores supuseram pelo menos uma idade mais antiga do que a época de [osias. Assim, OESTREICHER nega ao Deuteronômio e à reforma de Josias a idéia de uma centralização do culto em Jerusalém, e, conseqüentemente, coloca o Deuteronômio em época mais antiga do que a anterior. BUDDE e KÓNIG rejeitaram, e com razão, esta hipótese. Também nada existe que venha abonar a tese de WELCH, que situa o Deuteronômio original nos primeiros anos dos reis ou na época dos juizes, nem em abono daquela de BRINKER, segundo a qual o Deuteronômio teria sido escrito por Samuel para o santuário de Siquém. Outros exegetas, por fim, datam o Deuteronômio da época do exílio ou pós-exílica, de sorte que seria posterior à reforma de [osias. É principalmente HÓLSCHER quem defende esta posição, chamando a atenção para o caráter utopista do Deuteronômio e para o fato de que na época de Jeremias e Ezequiel continuam os desregramentos por ele proibidos. Mas isto não constitui argumento suficiente para uma datação tardia, como bem demonstraram, p.ex., BUDDE, GRESSMANN e NOTH.
As razões apresentadas no sentido de que há uma vinculação do Deuteronômio com o código da reforma de [osias são convincentes. Por certo, a "reforma" não foi desencadeada pelo Deuteronômio. Trata-se, na realidade, de um empreendimento de grande envergadura, por parte do rei, para se libertar da vassalagem dos assírios depois da ruína do seu império, e para restabelecer a própria soberania e também renovar o reino davídico. Deste empreendimento fazia parte, como medida de natureza cultual, a abolição do culto dos deuses assírios no templo de Jerusalém. Tudo isto fora planejado ou posto em execução, mesmo antes de se conhecer o Deuteronômio. Contudo, este código legal deu ocasião a que se adotassem outras medidas, que apenas ele exige, e que são mencionadas
107
E. K. A. RIEHM, Die Gesetzgebung Mosis im Lande Moab, 1854.
o PENTATEUCO
234
no relato da reforma, como sejam: a destruição de todos os santuários existentes fora do recinto central do templo de Jerusalém; a purificação desse recinto de todos os cultos estrangeiros, e a celebração da páscoa no templo. Existem, assim, os seguintes pontos de concordância entre as duas obras: Centralização do culto Abolição do culto dos astros Afastamento das gedeshen ("prostitutas sagradas") Extermínio dos necromantes Proibição de imolar crianças Celebração da páscoa no templo
2Rs23.8s,19 23,l1s 23.7 23.24 23.10 23.21ss
-
Dt 12.33ss 17.3 23.13 18.11ss 18.10 16.1ss
Entre as duas obras, há apenas uma divergência: os sacerdotes originários dos santuários regionais supressos eram subordinados (2Rs 23.8s) e não equiparados aos sacerdotes de Jerusalém (Dt 18.6s). Tal fato se explica pela preocupação, em si mesma compreensível, da corporação sacerdotal de Jerusalém em não executar certas determinações que lhes eram desfavoráveis. Se o Deuteronômio causou, ou pelo menos influenciou, determinadas reformas de Josias, então, no que respeita ao problema de sua autoria, é preciso ter presente a informação contida no relato sobre a reforma, de que o sumo sacerdote Helcias o encontrou no templo. Esta notícia nos dá a possibilidade para diferentes explicações. Por certo não se pode pensar numa fraude sacerdotal (CORNILL *, H. SCHMIDT). Antes, seria preferível supor que houve uma "descoberta", no sentido que se dá às informações lendárias a respeito de certas escrituras sagradas, informações que deviam legitimar o caráter divino de certos livros recentemente aparecidos, tendo sido este o caminho pelo qual se atribuíram certas obras egípcias à autoria de Tot e de Osíris'?', Naturalmente seria forçoso admitir então que o Deuteronômio teria sido composto precisamente naquela época. Ora, não sendo isto provável, como haveremos de mostrar, só nos resta admitir que houve verdadeiramente a descoberta de um livro depositado e guardado no templo havia muito tempo. Na base deste acontecimento poderia estar o costume de depositar no templo, enquanto tais, documentos de certa lOS
Cf. J. HERRMANN, Ágyptische Analogien zum Funde des Deuteronomiums", ZA W 28 (1908),291-302,em último lugar o proêmio do Papiro Carlsberg n VII, editado por E. IVERSEN, 1958. 11
Q
§ 25. O "ESTRATO FONTE" D
235
importância (lSm 10.25; Dt 31.26; 2Rs 19.14), ou a título de oferta votiva, como no caso das memórias de Neemias. Se se admite, porém, que o Deuteronômio surgiu no reino setentrional de Israel, então foi salvo, com outros escritos, depois da ruína do reino, levado para Jerusalém, e conservado no Templo, tendo sido redescoberto, mais ou menos casualmente, talvez no contexto das primeiras medidas de reforma. De todas estas considerações se levantam as questões de saber: 1) como e quando surgiu o código jurídico da reforma de [osias, reforma que está em relação estreita com o Deuteronômio; 2) e se é idêntico à versão do livro atual, ou qual o caminho que levou a esta versão.
3. Extensão e conteúdo do Deuteronômio original (Proto-Deuteronômio)
o problema de saber qual a extensão e o conteúdo do código legal da reforma de [osias, código que se costuma chamar simplesmente de "Deuteronômio original", reside no fato de que o atual livro não deve ser, sem mais nem menos, identificado com o código. Com relação a este problema, convém ter presente as seguintes observações: a) Do relato de 2Rs 22.8,10, segundo o qual o livro foi lido ou recitado várias vezes em um só dia, não nos permite deduzir que era uma obra volumosa. - b) O fato de ser chamado de livro da lei (22.8) indica que ele continha menos material narrativo do que Dt 1-11; 27ss. - c) Nos discursos de introdução e de conclusão encontram-se repetições e duplicatas, como sejam: dois discursos introdutórios, depois dos títulos (1.1-4.43 109 e 4.44-11.32); várias cerimônias de bênçãos e de maldições, na conclusão (27.11ss,14ss; 28)110, e várias exortações'!'. Muitas perícopes foram revistas posteriormente, sobretudo durante o exílio. Podem-se identificar até mesmo elementos originários do código sacerdotal (1.3;4.41-43). - d) Coisa semelhante ocorre com a parte jurídica.
109
110
N. LOHFINK, "Darstellungskunst und Theologie in Dt 1.6-3.29", Bibl. 41 (1960), 105134. - E. MORSTAO, "Deuteronomium 4.25-28 og 29-40", NTT 60 (1959), 34-45. L. LEVY, "The Puzzle of Dt XXVII: Blessings announced, but Curses Noted", VT 12 (1962), 207-211. - E. MORSTAO, "Overveielser til Dt 28", NTT 60 (1959), 224-232. - lo., Wenn du der Stimme des Herrn, deines Gottes, gehorchen wirst. Die primãren Einführungen zu Df 28.3-6 und 16-19, 1960.-M. NOTH, "DiemitdesGesetzes Werken umgehen, die sind unter dem Fluch", em: von Bulmerincq-Gedenkschrift, 1938, 127145 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1957, 155-171).
111
N. LOHFINK, "Der Bundesschluss im Land Moab", BZ NF 6 (1962), 32-54.
o PENTATEUCO
236
A exigência da centralização do culto aparece em três versões: 12.27,8-12,13-19. As determinações sobre o culto: 16.21-17.7 transcendem o contexto de 16.20 e 17.8. Algumas perícopes nada mais são do que acréscimos provenientes da época do exílio e, como tais, são fáceis de reconhecer, como, p.ex., a lista de animais puros: 14.1-21, e as disposições a respeito do profetismo: 18.15-22.- e) A ocorrência de perícopes e de frases paralelas ou misturadas com o tratamento de "tu" e de "vós", permite-nos concluir que houve um processo gradual de acréscimo, qualquer que seja a sua explicação.
É difícil, contudo, determinar com precisão onde começa e onde termina o "Deuteronômio original". Seria esquematismo exagerado querer excluir do atual Deuteronômio tudo aquilo que não pode ser explicado senão partindo da época de [osias (BERTHOLET), e só atribuir ao "Deuteronômio original" aquilo que é mencionado em 2Rs 22s (PUUKKO), ou admitir apenas uma camada primitiva, formulada no singular (STEUERNAGEL). Também não satisfaz a opinião, defendida sob o respaldo do C. da A. e da L. S., de que o "Deuteronômio original" só continha a parte jurídica, sem a abertura e sem a conclusão (ErssFELDT*: sem introdução histórica), pois, se não se admitem sua origem expressamente mosaica e as exortações finais, com as bênçãos e as maldições, não se compreende por que o rei se assustou. A extensão e o conteúdo do "Deuteronômio original" só podem ser determinados em suas grandes linhas, e de maneira alguma em seu conteúdo, pois sua reelaboração foi profunda. a) A parte jurídica compreendia no mínimo os seguintes grupos de determinações que apresentam entre si semelhança de conteúdo ou de forma: as determinações referentes à centralização do culto, e que são características de D: 12; 14.22-29; 15.19-23; 16.1-17, e talvez também 17.8-13; 26.1-15; b) as determinações sobre o direito civil, redigidas em estilo casuístico, no núcleo de 21-25; c) as leis sobre as abominações, e cuja fórmula conclusiva explica quando tal ou tal modo de agir é uma abominação para Javé: 16.2117.1; 18.9-14; 22.5; 23.19; 25.13-16, e talvez também 22.9-12; d) as chamadas "leis humanitárias": 22.1-4; 23.16s.20s; 24.6-25.4, às quais talvez se acrescentem as "leis de guerra": 20; 21.10-14; 23.1015, todas inseridas no grupo b; e) por fim, as determinações que se desenvolveram a partir do C. da A., quando não contidas nos grupos mencionados: 15.1-11,12-18; 16.1820; 19.1-13,16-21. a)
§
25. O "ESTRATO FONTE" D
237
Provavelmente não formam parte dos elementos constitutivos do "Deuteronômio antigo. as passagens seguintes: os ditos sobre o aliciamento e a deserção para a idolatria (13); as explanações, em estilo de pregação (17.2-7); a "lei real" (17.14-20)112; a lei sacerdotal (18.1-8); as determinações concernentes à remoção dos limites e ao modo de dar testemunho (19.14s); a conclusão, a modo de discurso (26.16-19), e os acréscimos posteriores (14.1-21; 18.15-22). Existe uma certa ordem no interior da parte jurídica, dado que as determinações sobre o culto, os deveres jurídicos e o direito "civil" de modo geral se sucedem nesta mesma ordem. Por isso o código deuteronômico se situa, não apenas cronologicamente, mas também quanto à articulação, entre o C. da A. (sem articulação clara) e a L. S. (estrutura identificável). O mais importante, porém, é que aqui, como nos referidos códigos jurídicos, as exigências básicas a respeito do culto venham logo no começo. b) Ao contrário do C. da A. e da L. S., o antigo Deuteronômio josiano talvez compreendesse uma moldura, composta de discursos de introdução e de encerramento. Procurou-se muitas vezes estabelecer uma distinção entre as perícopes, de acordo com o tratamento de "tu" ou de "vós", e STEUERNAGEL acredita mesmo ter identificado três camadas em 1-11, duas das quais com o tratamento no plural e uma terceira com o tratamento no singular, enquanto só para a terceira camada é que se observa um discurso final bastante detalhado. Essa análise, contudo, é por demais imprecisa para lograr aceitação geral. Também não é possível saber quais as perícopes com o tratamento no plural que se podem atribuir ao redator da história chamada deuteronomista (MINETTE DE TILESSE), porque as diferenças de tratamento se estendem até mesmo ao interior de cada perícope, e a "mistura de singular e plural" não pode ser explicada como recurso estilístico (LOHFINK), principalmente porque este procedimento pode dar margem a uma interpretação rebuscada. Muito provavelmente a alternância e a mistura de tratamentos são o resultado das sucessivas reelaborações do "Deuteronômio original". Em todo caso, este fato não constitui uma base suficiente para identificar a parte introdutória e a parte final de que se compõe sua moldura!". 112
113
CAQUOT, "Remarques sur la 'Ioi royale' du Deutéronome (17.14-20)", Semitica 9 (1959), 21-33. - K. GALLING, "Das Kõnígsgesetz im Deuteronomium", ThLZ 76 (1951), 133-138. Inclusive Ex 12.24-27a; 13.3-16 contêm frase no singular e no plural.
A.
238
o PENTATEUCO
Na realidade, porém, Dt 1-11 é constituído de duas introduções facilmente distinguíveis. A primeira introdução contém, além dos títulos (1.1-5), também a narrativa do culto do bezerro de ouro, que agora está em outro lugar (9.7-10.11), e mais outras sete pequenas narrativas, que datam da época de Moisés, contendo segmentos de ligação com o verbo na primeira pessoa do plural (1.6-3.29), e ainda o núcleo da introdução referente à parte jurídica propriamente dita (4.1-43). A segunda introdução começa com os títulos (4.4449), aos quais se seguem as sanções do código legal, apresentadas como sendo a vontade de Javé e comunicadas a Moisés no monte de Deus (5.1-6.3), além das explicações em estilo de prédica (6.4-9.6), e das insistentes exortações à observância dos preceitos (10.12-11.32). Não resta dúvida de que esta segunda introdução (4.44-11.32) constitui a introdução original do "Deuteronômio original", enquanto o legitima e lhe confere autoridade. A esta introdução corresponde, nos capítulos finais, a promessa de bênçãos ou de maldições para aqueles que observarem ou não observarem os preceitos de Javé (27.9s; 28.1-68). As perícopes que dividem em três partes os acontecimentos finais (27.11-13,14-26), foram, como se vê, inseridas posteriormente, sobretudo porque elas rompem o contexto das promessas das bênçãos e maldições. A introdução que aparece em primeiro lugar correspondem os discursos que tratam do pacto celebrado no país de Moab (29-30),juntamente com a respectiva introdução (28.69). Todo o resto são acréscimos posteriores, a saber: a ordem de escrever a lei em grandes pedras, sobre o monte Garizim, e de construir ali um altar (27.18), ordem esta utilizada secundariamente para ligar D com o Hexateuco (cf. § 21.2; 30.5); a instalação de Josué e a ordem de escrever a lei e de a fazer ler todos os sete anos (31.1-13); a guarda da lei (31.24-30); a exortação (32.45-47), e o anúncio da morte de Moisés (32.48-52). De tudo isto se conclui que o "Deuteronômio original" apresentava a seguinte estrutura (embora sob uma forma reelaborada): Introdução: 4.44-11.32 (com exclusão de 9.7-10.11); Código de leis: 12; 14,22-29; 15,1-11.12-18.19-23; 16,1-17.18-20.21-22 + 17,1; 17,8-13; 18,9-14; 19,1-13.16-21; 20; 21-25; 26,1-15; Conclusão: 27,9-10 + 28,1-68.
4. Origem do código de leis do "Deuteronômio original" A origem do código de leis do "Deuteronômio original" constitui mais uma vez um processo bastante complicado, como se pode ver principalmente a partir de suas relações com outras tradições.
§ 25. O
"ESTRATO FONTE"
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D
a) HEMPEL, que estudou a fundo os problemas referentes à história do material e das tradições, pretende ver no código legal de [osias a antiga regra do templo de Jerusalém, a qual foi elaborada na época de Ezequias ou de Manassés, na linha da centralização do culto, tendo sido completada por prescrições de caráter social e por uma introdução histórica, e ampliada, mais tarde, também por uma fonte que tratava dos casos de abominação. HOR5T, ao invés, supõe como base pré-deuteronômica para 12-18 um decálogo onde estavam contidas as "leis referentes aos privilégios" de Javé, e que foi reelaborado e completado, em três ocasiões, sendo que, na última, também na linha da centralização do culto. Com relação a estes pontos é preciso sobretudo levar em conta as relações que desde há muito se observam entre o Deuteronômio e o C. da A, e que podem ser analisadas sob três ângulos distintos. Primeiramente, o código jurídico do "Deuteronômio original" tem inúmeros pontos de contato com a última versão do C. da A, como nos mostra a seguinte lista:
Dt 15.1-11 15.12-18 15-19-23 16.1-17 16.18,20 19.1-13 19.16-21 22.1-4
-
Ex 23.105 21.2-11 22.285 23.14-17 23.25.6-8 21.12-14 23.1 23.45
Dt 22.285 23.205 24.7 24.10-13 24.175 24.17-22 26.2-10
Ex 22.155 22.24 21.16 22.255 23.9 22.20-23 23.19a
Uma comparação mais precisa nos faz ver que a composição deuteronômica é mais nova, e que aquela do C. da A foi "modernizada". Assim Dt 15.1ss liga as determinações sobre o ano da remissão do campo (Ex 23.lOs) ao direito que trata das dívidas. No plano da história da evolução econômica, este fato corresponde à importância crescente da economia financeira. Enquanto Ex 21.2ss supõe a compra de um escravo e regulamenta a duração da prestação de serviço, Dt 15.12ss trata dos casos de escravização aceita, por razões financeiras, pelo homem até então livre, e pela mulher que, no entretempo, se tornara apta a herdar. As determinações sobre as cidades de refúgio (Dt 19.1ss) devia ampliar e "modernizar" as determinações mais antigas de Ex 21.12ss. Devemos também observar que há uma oposição entre o código do "Deuteronômio original" e o C. da A, a qual se manifesta principalmente no fato de o Código rejeitar a multiplicidade de lugares do culto e de exigir sua centralização. Deste fato resulta, mais uma vez, a necessidade de alterar
240
o PENTATEUCO
várias das prescrições, referentes ao culto. Por fim, verifica-se que foi omitida cerca da metade dos dispositivos contidos no C. da A. Mas daí não se pode deduzir que o referido código deuteronômico se baseie numa coleção jurídica desconhecida, e não no C. da A. Pelo contrário: isto significa, como de resto em todo o Antigo Oriente, que as determinações omitidas continuavam em vigor. De tudo isto, e de conformidade com os modelos vétero-orientais de tais códigos, resulta que o código legal do "Deuteronômio primitivo" não tinha por finalidade eliminar ou substituir o Código da Aliança, mais antigo (EISSFELDT*), e sim corrigi-lo e completá-lo. Além do mais, o referido código utilizou-se de materiais que datam de épocas diferentes e foram transmitidos provavelmente por via oral. Assim, as determinações a respeito do procedimento que se devia seguir por ocasião de um assassinato cujo autor fosse desconhecido (Dt 21.1-9), como também a lei da comunidade (23.2-9)114, que data, pelo menos quanto ao seu núcleo, de época bastante antiga. Mais recentes são as "leis de guerra" (20 e 23.10-15), que só podem ter surgido na época dos reis, embora as determinações referentes à dispensa do serviço das armas se baseiem em concepções bastante antigas!". O fato de terem sido incorporadas também certas normas internacionais está em consonância com a origem de muitas outras leis israelitas. Por isso não é de admirar que haja paralelos com o livro egípcio da sabedoria de Amenemope, e que as determinações de Dt 25.13-16 sobre as medidas fraudulentas correspondam a Amenemope16, ou que as determinações de Dt 19.14, sobre remoção dos limites, correspondam a Amenemope 6. Encontram-se também paralelos de outros textos do Antigo Oriente!". O código do "Deuteronômio original" foi influenciado também pela tradição eloísta com sua repulsa aos deuses estrangeiros e aos costumes pagãos, como se vê no fato de assumir o decálogo (ô.ôss), de pôr em realce 114
115
116
K. GALLING, "Das Gemeindegesetz in Deuteronomium 23", em: Bertholet-Festschrift, 1950, 176-191. M. OU BUIT, "Quelques contacts bibliques dans les archives royales de Mari", RB 66 (1959),576-581. - S. B. GUREWICZ, "The Deuteronomic Provisions for Exemption from Military Service", ABR 6 (1958), 111-121. - W. HERRMANN, "Das Aufgebot aller Krafte", ZAW 70 (1958), 215-220. C. H. GOROON, "A New Akkadian Parallel to Deuteronomy 25.11-12", /POS 15 (1935),29-34. - lo., "An Akkadian Parallel to Deuteronomy 21,1ff.", RA 33 (1936), 1-6. - Sobre um paralelo ugarítico, cf. H. CAZELLES, VT 8 (1958), 105.
§ 25. O
"ESTRATO FONTE"
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a figura de Moisés enquanto legislador, e no modo de falar parenético e exortativo. Foi influenciado, enfim, pela profecia com sua ética social, e pelas concepções do sacerdócio rural, menos contaminado pelo sincretismo religioso do que os santuários do Estado. b) Em termos de história das formas, grande parte do código do "Deuteronômio original" pertence ao domínio do direito casuístico, cujas leis casuísticas introduzem os casos através da conjunção subordinativa "se" e talvez os restrinja ainda mais, fixam uma decisão judicial bem precisa, à luz da qual se deverá proceder, e freqüentemente estabelecem a medida da punição (§ 8,3). É precisamente o que acontece em 15.12ss; 21.15ss; 22.13ss; 24.1ss; 25.1ss. Além dessas leis, ocorrem ocasionalmente fórmulas apodíticas (15.1; 16.19; 16.21-17.1; 23.2-8), integrando séries de várias proposições; elas exprimem normas de bem viver e de comportamento que originariamente não pertenciam ao direito (§ 8,2), ao passo que aparecem como proposições isoladas no direito do Antigo Oriente e de IsraeL Num estágio secundário da história das formas surgiram também séries apodíticas de natureza jurídica. Se tudo isto é o que se observa no Antigo Oriente e no AT, o código de [osias apresenta pelo menos tendências a explanações parenéticas e exortativas. Assim, na perícope sobre o ano da remissão (15.1-11), uma destas explanações didáticas e parenéticas, que se dirige de forma pessoal aos leigos, segue-se a uma frase apodítica e a uma interpretação jurídica, e na perícope sobre os primogênitos (15.1923) segue-se a uma proposição apodítica. Encontra-se aí uma maneira de falar que foi reforçada nas elaborações posteriores e que aparecem, inclusive, sem uma cláusula jurídica introdutória, nos acréscimos que se fizeram depois (13.1-6; 17.14-20; 18.15-22). É a partir do capítulo 23 que se encontra mais provavelmente o estado mais antigo. Esses capítulos apresentam menor número de formas parenéticas do que os capítulos precedentes e não foram revistos na mesma escala que estes. Semelhantes a estas são as explanações, em linguagem de prédica, que se encontram nos discursos introdutórios, principalmente em 6.4-9.6, onde o estilo deuteronômico se expande. VON RAo observou, e com razão, que além de se dirigir diretamente aos indivíduos, o Deuteronômio mostra propensão para os aspectos racionais e didáticos, cuja função é ajudar a extrair das tradições, que possuem validez quase canônica, soluções para novos problemas.
242
o PENTATEUCO
5. O caminho percorrido desde o código original até o livro atual
o chamado código do "Deuteronômio original" da reforma de Josias constitui um ponto de apoio seguro a partir do qual se pode reconstituir a história do Deuteronômio, tanto para diante quanto para trás, e é possível identificar vários estágios no caminho percorrido desde o código original até o livro atual. a) A questão de saber qual o primeiro estágio está na dependência daquela que se refere à época e ao lugar de origem. É muito difícil que o Deuteronômio só tenha sido composto, talvez pelo sumo sacerdote Helcias, pouco antes da sua descoberta, como pensavam REUSS* e, a seu exemplo, muitos pesquisadores da segunda metade do séc. XIX. Talvez se deva excluir também a região de [udá ao tempo de Ezequias ou de Manassés. Mais precisas são as indicações dadas por WELCH, ALT e outros, no sentido de que parte das leis desse código provém do norte de Israel. Contudo, pode-se e deve-se discutir se o núcleo do livro surgiu somente depois da ruína do reino setentrional de Israel (722), nos círculos locais fiéis a Javé, como programa de restauração (ALT), ou em [udá, na época de Ezequias, como obra coletiva dos fugitivos do norte de Israel e dos círculos levíticos e proféticos (SELLN-RoST*). Suas relações com o Código da Aliança permitem-nos constatar que ele foi concebido como obra de correção e de complementação do Código da Aliança. Sendo assim, o código deuteronômico original deve ter surgido na pátria de origem do Código da Aliança, ou seja, no reino setentrional de Israel; portanto muito provavelmente não depois da primeira metade do séc. VIII. A grande prosperidade do país sob o governo de Jeroboão II pode ter proporcionado ocasião para isto. Do mesmo modo que para o Código da Aliança, e como EISSFELDT* o fez com relação ao "Deuteronômio original" em geral, devemos admitir que o código do norte de Israel só continha leis novas e de conteúdo "modernizante". Este código começava, portanto, como o Código da Aliança (e mais tarde também como a Lei da Santidade), com as exigências do culto. Também não apresentava nenhum colorido parenético, e isto precisamente em consonância com sua finalidade. Tratava-se de um código semelhante aos códigos legais que conhecemos suficientemente do Antigo Oriente. b) Ele chegou a Jerusalém juntamente com outras obras literárias de Israel, depois da ruína do reino israelita do norte. Em Jerusalém deve ter havido logo uma primeira revisão. Neste caso, pode-se pensar, com
§ 25. O
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SELuN-Rosr*, em uma obra realizada comunitariamente, sob o reinado de Ezequias, e depositada, a seguir, no templo, em conseqüência do fracasso da política do rei, depois de 701. A situação existente sob o reinado de Manassés pode ter levado o movimento reformista, que se iniciava, a tomar esta medida. Foi nesse estágio que surgiu a versão do livro que Helcias descobriu no templo. Isto significa que a parte jurídica foi revista em sentido parenético e exortativo, e recebeu uma primeira moldura que consta de uma introdução (4.44-9.6;10.12-11.32)e de uma conclusão (27.9s; 28.1-68). Manteve-se o caráter dos códigos jurídicos, pois existem outros códigos jurídicos do Antigo Oriente que, além do corpo de leis, compreendem também uma introdução e uma conclusão, como o código de Lipit-Ishtar e o código de Hamurábi. É nestas circunstâncias que se deve pensar, quando se trata da questão do Sitz im Leben (contexto vital), e não no modelo de uma celebração cultual como aquela de uma suposta solenidade de renovação da Aliança (VON RAD), nem outrossim num formulário dos pactos de vassalagem. c) E sob esta forma que o livro foi encontrado por He1cias e utilizado para apoiar as medidas posteriormente tomadas por [osias. De qualquer modo, isto só pôde acontecer, por ter sido ele elevado à categoria de lei oficial do Estado. Realmente, segundo se lê em 2Rs 23.1-3, o rei concluiu com o povo, por intermédio de seus representantes convocados a Jerusalém, um pacto mediante o qual as duas partes se comprometiam, por igual, a cumprir a nova lei. A julgarmos pelo seu conteúdo, não se trata de um compromisso celebrado entre [osias e o povo, perante Javé, nem de um pacto entre Javé e o povo, por intermédio de [osias: pelo contrário, tratase evidentemente de um fato que ocorreu entre o rei e o pov0 117• Como as relações entre o rei e o povo, ou seja, entre o rei e a nação, tinham como base o código deuteronômico, isto vem a significar que o código foi elevado à categoria de lei do Estado (GALUNC). Naturalmente os sucessores de [osias não se sentiram obrigados a observá-lo, tanto que Joaquim simplesmente pôde ignorá-lo. d) A reelaboração posterior talvez tenha começado na época de [osias. Ela reforçou os traços perenéticos do código. Ademais, ao que tudo indica, é desta fase que provém o estilo belicista que permeia a introdução e a parte legislativa, estilo este que VON RAD põe em relação, talvez acertadamente, com os sacerdotes e levitas da época de [osias enquanto respon117
G. FOHRER, "Der Vertrag zwischen Kõnig und Volk in Israel", ZAW 71 (1959), 1-22,13s.
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sáveis por um movimento belicista e por uma piedade militarista. Este espírito está intimamente ligado à renovação do exército, quando se voltou a convocar cidadãos livres e de pleno gozo de seus direitos!", para o serviço das armas, depois da dissolução geral do exército mercenário por ocasião do fracasso de 701. A esse estado de coisas corresponde o renascimento do espírito guerreiro. e) Um pouco mais tarde - ao que se presume, na época do exílio foi acrescentada a segunda moldura que se compõe da introdução (1.14.43; 9.7-10.11) e da conclusão (28.69; 29-30). Esta moldura tinha por finalidade inserir o Deuteronômio na tradição do Pentateuco, partindo da ruptura do compromisso imposto por Javé junto ao monte de Deus, ruptura esta provocada pelo culto do bezerro de ouro (9.7ss), e estabelecer uma nova relação mediante a suposta aliança do país de Moab (28.69), cuja base deve ser precisamente o Deuteronômio. Com isto, o livro se reveste também do caráter de legado ou de discurso de despedida de um Moisés que está bem próximo da morte, e do qual os estágios mais antigos não falam. Posteriormente foram acrescentados os apêndices: 27.1-8; 31.1-13; 31.24-30; 32.45-47; 32.48-52, à conclusão, que data de época mais recente. Um outro acréscimo, que pressupõe a inserção do Deuteronômio no Pentateuco, além da narrativa subseqüente a respeito da morte de Moisés e que se encontra nos outros "estratos fontes", é o cântico de Moisés (32.143), juntamente com a narrativa que o enfeixa (31.19-22; 32.44). Como este cântico não faz parte de nenhum "estrato fonte", mas constitui um fragmento independente, será estudado no § 27,4 Tendo em vista a história da origem deste "estrato fonte" que, na realidade, deve ter sido ainda mais complexa, não procedem as tentativas bastante simplistas de solução, feitas até o presente nesse sentido. De um lado, pensou-se que o livro na sua forma atual seria o resultado de sucessivas complementações do código de [osias ou de outro modelo (afora HEMPEL e HORST, sobretudo HÓLSCHER), e do outro lado, que teriam sido reunidas duas ou mais edições do "Deuteronômio primitivo" de [osias (WELLHAUSEN, STAERK STEUERNAGEL). Assim formuladas estas duas hipóteses não procedem. A parte jurídica do livro não oferece nenhuma base para que se admita a existência de várias partes ou edições paralelas. Pelo contrário, existiu sempre e apenas uma parte jurídica que foi completada por elaborações e acréscimos. Em con118
E. JUNGE, Der Wiederaufbau des Heerwesens des Reiches [uda unter [osia, 1937.
§ 25. O
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trapartida, foram elaboradas sucessivamente duas obras de emolduramento que, depois de adicionada a mais nova à mais antiga, foram "engrenadas" na perícope 9.7-10.11, mediante a transposição da mesma. Assim se explica por que é que a parte jurídica cresceu pelo processo complementar e a moldura, pelo processo de adição
6. O Deuteronômio no Pentateuco
o Deuteronômio não se acha situado no Pentateuco apenas exteriormente, nem está inserido no seu interior apenas porque outros "estratos fontes" aparecem nos seus capítulos finais. Pelo contrário, é pela narrativa da moldura mais recente que o Deuteronômio se liga ao Pentateuco. Esta moldura é constituída por um conjunto de elementos interdependentes, de modo que os caps. 1-3 não podem ser dissociados deles, e é mesmo possível considerá-los como o começo da chamada história do Deuteronômio (NoTH). Este conjunto enquadra o Deuteronômio na tradição do Pentateuco, precisamente por assumir o pacto do país de Moab, celebrado depois da ruptura do compromisso imposto a Israel junto ao monte de Deus. Era por isso que se considerava o Deuteronômio como fazendo parte do conjunto básico do Pentateuco, e isto principalmente na época do exílio. Encontram-se, além disso, certos enxertos introduzidos pelos sacerdotes (1.3; 4.41-43). Estes enxertos nos indicam que o Deuteronômio posteriormente continuava no Pentateuco. Estes dois fatos se contrapõem a que o Deuteronômio seja desligado do Pentateuco e vinculado aos livros subseqüentes. 7. Teologia do Deuteronômio A teologia do Deuteronômio pode ser resumida em três círculos de idéias, a saber: 1) a idéia da unicidade do lugar de culto, que é uma conseqüência da unicidade de Deus e devia servir de defesa contra a tendência ao pluralismo que se introduziu no conceito de Deus em conseqüência da multiplicidade dos santuários; 2) a idéia do ciúme de Javé, ciúme que se dirige contra o culto prestado por Israel a outros deuses, mas que se volta principalmente contra as influências cananéias; 3) a idéia do amor de Deus, ao qual Israel se dedicou por uma graça inescrutável, desde a época dos pais, amor que exige dele em contrapartida o amor para com Deus e para com o próximo, de forma que Israel vive, assim, tal como no tempo de Moisés, no hoje de sua própria decisão. Toda a vida se acha submetida à vontade amorosa de Deus, e este fato é uma resposta contra a secularização
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do Estado e de toda a existência, resultado do desenvolvimento cultural. Nesse sentido, a teologia do Deuteronômio constitui uma revisão da atitude cultual, religiosa e nacional mais antiga, mas, ao mesmo tempo, combate implicitamente a filosofia prática, racionalista e "mundana" de vida. A soberania de Deus, que passa a ser novamente objeto de aspirações, é simbolizada materialmente pelo santuário central, com as ações cultuais em massa. O ordenamento da vida, querido por Deus, passa a estar ligado a uma base fixa, como vinculação à vontade divina, que é registrada por escrito, para afastar a culpa e o julgamento divino anunciado pelos profetas justamente como conseqüência do pecado. Efetivamente, também se assume a crítica dos profetas contra a concepção de que Israel ge acha fundamentalmente em uma situação salvífica. Ao contrário dos profetas, que de modo geral julgavam mui negativamente as possibilidades do futuro de Israel, a teologia do Deuteronômio procura salvar o povo, como um todo, da sentença de aniquilamento que pesa sobre ele, mas sem dissimular em nada a gravidade da situação. Esta tentativa de estabelecer uma síntese entre a teologia religiosa e nacional, de um lado, e a teologia profética, do outro, eliminando o secularismo, é um feito teológico de grande significação. Como idéia diretriz, funciona o conceito de eleição'>, para o qual a teologia deuteronomista emprega como termo técnico o verbo bahar, conceito este que essa teologia situa em seu próprio centro, a fim de poder convocar todo o povo para uma nova forma de existir. O fato de apelar para a idéia de eleição significa que a comunhão de Israel com Deus é proclamada e exigida como fundamento prático da fé e da vida. Esta comunhão se concretiza no compromisso de Israel com Deus, compromisso que começa a assumir uma posição central. A teologia deuteronômica se dirige também ao indivíduo reconhecido como pecador. É pela decisão pessoal de todos e de cada um com Deus e por Deus, que todo o povo deve ser salvo. Mesmo que haja uma mudança profunda, a promessa continua de pé; a rejeição prometida como contrapartida não se concretizará; a promessa profética de um julgamento divino será como se não existisse. Naturalmente é preciso não esquecer que o Deuteronômio, com seu interesse pela vontade codificada de Javé, abriu o caminho para um cânon com valor de autoridade, e mesmo nos acréscimos recentes o pró119
TH. C. VRIEZEN, Die Erwiihlung Israels nach dem Alten Testament, 1953. - P. ALTMANN,
Die Erwiihlungstheologie und Universalismus im Alten Testament, 1964.
§ 26. O
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P
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prio Deuteronômio já é considerado como "escritura" (17.18; 28.58,61; 29.19s) e marca o começo da evolução para uma "religião do livro", para uma fé que ensina e que é ensinada (cf. 7.6ss; 30.11ss).
§ 26. O JlE5TRATO FONTE" P Cf. a bibliografia relativa ao § 22. - E. AUERBACH, "Die babylonische Datierung im Pentateuch und das Alter Priester-Kodex", VT 2 (1952), 334-342. - ID., "Der Wechsel des Iahres-Anfangs in [uda", ibid. 9 (1959) 113-121. - K. ELLIGER, "Sinn und Ursprung der priesterlichen Ceschichtserzãhlung", ZThK 49 (1952), 121-143. - P. GRELOT, "La derniêre étape de la rédaction sacerdotale", VT 6 (1956), 174-189. - S. GRILL, "Die religionsgeschichtliche Bedeutung der vormosaischen Bündnisse (Cn 9.9-17; 17.9-14)", Kairos 2 (1960), 17-22. - M. HARAN, "Shilo and [erusalem: The Origin of the Priestly Tradition in the Pentateuch", JBL 81 (1962), 14-24. - J. HEMPEL, "Priesterkodex", em: Pauly-Wissowa, Realencyclopiidie der classischen Altertumswissenschaft 22, 1954, 1943-1967. - P. HUMBERT, "Die literarische Zweiheit des Priester-Codex in der Cenesís", ZAW 58 (1940/41). 30-57. - Y. KAUFMANN, "Der Kalender und das Alter des Priesterkodex", VT 4 (1954), 307-313. - K. KOCH, "Die Eigenart der priesterschriftlichen Sinaigesetzgebung", ZThK 55 (1958), 36-51 - ID., DiePriesterschrift von Exodus 25 bis Leviticus 16, 1959. - S. R. KÜLLING, Zur Datierung der "Genesis-P-Stücke", namentlich des Kapitels Genesis XVII, 1964. - M. LOHR, Untersuchungen zum Hexateuchproblem I: DerPriesterkodex in derGenesis, 1924, - B. LUTHER, "Kabal und 'edah als Hilfsmittel der Quellenscheidung im Priesterkodex und in der Cenesís", ZAW 56 (1938),44-63. - G. VON RAD, Die Priesterschrift im Hexateuch, 1934. - R. RENDTORFF, Die Gesetze in der Priesterschrift, 1954. - J. ROTH, "Tbêmes majeurs de la tradition sacerdotale dans le Pentateuque", NRTh 90 (1958), 696-721. - E. A. SPEISER, "Leviticus and the Critics", em: Kaufmann Jubilee Vol., 1960,29-45. - L. WATERMAN, "Some Repercussions from Late Levitical Genealogical Accretions in P and the Chronicler", AJSL 58 (1941), 49-56. - W. ZIMMERLI, "Sinaibund und Abrahambund", ThZ 16 (1960), 268-288.
1. Tenninologia e conteúdo A denominação de "documento sacerdotal" (PriesterschrifO ou de "código sacerdotal" (Priesterkodex; abrev.: P), baseia-se no interesse desta fonte pelas instituições cultuais e pelas prescrições sacerdotais que são fundamentadas nas narrativas, ou transmitidas em grandes e pequenas coleções ou complexos. Como obra à parte, P se destaca da sua moldura, pelo menos tanto quanto D, pelo estilo rico em fórmulas (influência de D e Ezequiel),
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pela linguagem característica, pelo emprego de listas genealógicas e pelos números, pelo interesse com o culto, pelo relevo que atribui à pureza e à santidade cultuais, pelo modo como evita os antropomorfismos, pela ausência dos lugares de culto, do sacerdócio e do culto na época anterior a Moisés, época na qual o nome de Javé não é usado, como em E. Por isso P foi o primeiro a ser identificado e destacado como "estrato fonte" especial. Por muito tempo foi considerado como a exposição mais antiga e mais fidedigna, tendo sido, porém, corretamente situado somente no séc. XIX. Existe ampla concordância em atribuir a P as perícopes seguintes, que nos dão uma idéia geral da estrutura deste "estrato fonte" e do seu conteúdo básico. (O asterisco * significa que há uma mistura mais ou menos acentuada com elementos dos estratos assinalados entre parênteses, quando a indicação individual dos versículos seria por demais extensa): Gn
1.1-2.4a 5 6.9-8.22* (J) 9.1-17 10.1-7,20,22s,31s 11.10-27,31s 12.4b-5 13.6,11b-12a 16.1a-3,15s 17 19.29 21.1b-5 23 25.7-10 25.12-17 25.19-20 26.34s,27.46-28.9 29.28b-29 30.4b,9b 31.18b; 33.18al3 35.6a,9-13,15 35.22b-25 35.27-29 36.1-2a.4-8 36.40-43 37.1-2; 46.6s. (8-27) 45.5b-6a,7-11; 48.3-7; 49.1a 28bl3-33; 50.12s
Criação, Primeiros pais (árvore genealógica de Set), Dilúvio, Promessa feita a Noé e pacto de Noé, Tábuas etnográficas, Arvore genealógica de Sem, de Terá e Abraão, Partida de Abraão e de Ló, Abraão e Ló se separam Nascimento de Ismael, Promessa a Abraão e pacto de Abraão, anúncio do nascimento de Isaac Destruição das cidades, Nascimento e circuncisão de Isaac Morte e sepultamento de Sara, Morte e sepultamento de Abraão, Arvore genealógica de Ismael, Arvore genealógica de Isaac, Jacó é mandado a Padan-Harã, Casamento de Jacó com Raquel, Bala e Zelfa, Volta de Jacó e sua chegada a Siquém, Bênção e mudança do nome de Jacó, Filhos de Jacó, Chegada de Jacó a Hebron, morte e sepultamento de Isaac, Esaú emigra para Seir, Chefes que saíram de Esaú, Jacó e José, Jacó parte para o Egito, Jacó e seus filhos no Egito,
§ 26. O
Ex
1.7,135* (N) 2.23a(3-25; 6.2-7.7 7.8-13 7.14-9.12* (JE); 11.9s 12.1-20,28,40-51; 13.1-2 16* (JN) 19.1 24.15b-18a; 31.18a 25.1-31.17 34.29-35 35-40
Lv
1-7 8-10 11-15 16 17-26 27
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P
Opressão no Egito, Vocação de Moisés, Negociações com o faraó, Pragas do Egito, Celebração e saída dos israelitas, Codornizes emaná, Chegada ao Sinai, Descida de Javé e subida de Moisés, Determinações sobre a instituição do culto ("Tabernáculo"), Moisés desce do Sinai, Execução das determinações (25ss), Prescrições sobre os sacrifícios, Os primeiros sacerdotes e os primeiros sacrifícios, Prescrições sobre a pureza, Ritual do grande dia da expiação, Lei da Santidade, Prescrições sobre as ofertas votivas,
Determinações sobre os levitas e sobre a ordem no acampamento, 10.11-28 Partida do Sinai e ordem observada durante a caminhada, 13.1-14.45* (JNE) Exploração do país, Diversas prescrições, 15 16* (J); 17 Revolta de Coré e seus sequazes. Deveres e direito dos sacerdotes e dos levitas, 18 19 Prescrições sobre a pureza, 20.1a.2-13* (N) Milagre da fonte, punição de Moisés e Aarão, Morte de Aarão, investidura de seu sucessor, 20.22-29 Prosseguimento da caminhada até o vale do 21.1 [ordão, Divisão e recenseamento do povo, 25.19; 26 27 Determinações sobre a herança: investidura de [osué, Determinações sobre os sacrifícios e os votos 28-30 Campanha contra os madianitas, 31 Lista dos locais dos acampamentos, 33.1-49 33.50-34.29 Instruções a respeito da ocupação de Canaã, Cidades dos levitas e cidades de refúgio, 35 Apêndice às determinações sobre a herança 36
Nm 1.1-10.10
Dt
34.1* (JE), 7-9(10-12)
Morte de Moisés (afora as passagens pertencentes a P: 1.3; 4.41-43).
249
250
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2. A tradição anterior e o contributo de P No que respeita à questão de saber quais as relações entre a tradição anterior e o contributo específico de P, convém lembrar que este "estrato fonte" pressupõe o complexo JNE já formado como base do Pentateuco. É isto, precisamente, o que se observa, p.ex., na narrativa da vocação de Moisés. Também já se conhecia o "estrato fonte" D, como podemos ver pela influência do estilo deuteronômico, pelo desenvolvimento subseqüente do complexo produzido por D em Ex 12s, e pelas passagens de Dt 1.3; 4.41-43, pertencentes a P. Se é verdade que P corre paralelo com "estratos fontes" mais antigos, também não é menos verdade que ele jogou livremente com o material, e que, sobretudo, o abreviou acentuadamente. A narrativa de Sodoma se reduz a apenas uma frase, enquanto a série de narrativas em torno de Jacó e Labão, de Jacó e Esaú desapareceu quase inteiramente, e de José quase já não se fala. A narrativa se torna mais rica, quando está em função de interesses cultuais (Gn 17), quando antecipa a visão da partilha da terra (Gn 23), ou quando serve para apresentar os períodos históricos. Assim, a estrutura da obra recebe desde o início determinados acentos. P começa, em verdade, com uma história dos primórdios que trata principalmente da criação'", do dílúvío'" e de Noé. Quanto a outros pontos, porém, como, p.ex., na própria história dos patriarcas, ela se limita muitas vezes a simples listas genealógicas, que servem para ligar narrativas ou notícias isoladas. Depois de haver registrado a humanidade res-
120
121
J. B. BAUER, "Die literarische Form des Heptaemeron", BZ NF
1 (1957),273-277. ID., "Der priesterliche Schopfungshymnus in Cn 1", ThZ 20 (1964), 1-9. - H. CUNKEL, SchOpfung und Chaos in Urzeit und Endzeit, 1921, 2a ed. - S. HERRMANN, "Die Naturlehre des Schõpfungsberichtes", ThZ 86 (1961),413-424. - P. HUMBERT, "La relation de Cenese 1 et du Psaume 104 avec la liturgie du Nouvel-An israelite", RHPhR 15 (1935), 1-27 (= Opuscules dun Hébraisant, 1958, 60-82). - FL. HVIDBERG, " The Canaanite Background of Cn I-III", VT 10 (1960), 285-294. - C. A. KELLER, "Existentielle" und "heilsgeschichtliche" Deutung der Schõpfungsgeschichte (Cn 1.1-2.4)", ThZ 12 (1956), 10-27. - J. MORGENSTERN, "The Sources of the Creation Story Cenesis 1.1-2.4", AJSL 36 (1919/1920), 169-212. E. W. NIEBOER, Opmerkingen ooer Gen. 1, 1955. - N. H. RIDDERBOS, Beschauwingen aver Genesis I, 1954. - L. ROST, "Der Schõpfungsbericht der Priesterschrift", CuW 10 (1934), 172-178. - W. H. SCHMIDT, Die Schôpiungsgeschichie der Priesterschrift, 1964. - C. F. WHITLEY, "The Pattern of Creation in Cenesis, Chapter 1", JNES 17 (1958), 32-40. A. R. HULST, "Kol basar in der priesterlichen Fluterzãhlung", OTS 12, 1958,28-68.
§ 26. O
"ESTRATO FONTE"
P
251
tante na tabela etnográfíca'", ela se concentra na história dos primórdios de Israel e, excluindo de sua visão histórica o máximo de pecadores, volta toda a sua atenção para a tradição de Moisés, onde está o peso principal da obra. Assim, a história dos primórdios, a história dos patriarcas e a própria narrativa da saída do Egito simplesmente se reduzem a uma introdução à revelação do Sinai, enquanto quase todo o material importante está ligado a esta revelação. Com exceção do sabbat, dos preceitos sobre os alimentos, da circuncisão e da páscoa, todas as outras determinações se reportam a ela ou à época subseqüente, e também a Moisés como mediador da revelação. Daí resulta uma visão que diverge profundamente daquela dos "estratos fontes" antigos e que leva ao auge o processo de concentração sobre a época mosaica, processo este que já se iniciara em E, em D e na Lei da Santidade. Em função disto, P assumiu uma série de elementos ora mais ora menos antigos, e inicialmente autônomos. Entre estes elementos se contam principalmente as chamadas bênçãos aaroníticas (Nm 6.24-26), que datam seguramente da época anterior ao exílio; as listas dos chefes das tribos ou dos clãs israelitas (Nm 1.4-16; 7.12-83; 13.4-16), cuja divisão, calcada sobre o pressuposto número de doze tribos, talvez se deva ao próprio P, enquanto os nomes aí utilizados datam, em grande parte, das épocas mais remotas de Israel; o elenco das famílias (Nm 26.1-51) e dos sítios dos Acampamentos (33) que P dificilmente terá inventado, mas Antes o reelaborou. P assumiu também o C. da A. e as coletâneas ou complexos seguintes: Lv 1-7; 11-15; Nm 4-6; 15; 18.8-32; 19; 28-30 (§ 20,3-4). Por fim, P dispunha também de outras tradições. A história da criação e mais ainda a lista dos primeiros pais e a história do dilúvio se relacionam com certas tradições míticas, principalmente com aquelas originárias de âmbito mesopotâmico. De origem exclusivamente palestinense é a narrativa da compra da caverna de Macpela (Gn 23)123. Mas tudo isto foi incorporado e subordinado às perspectivas de P. 3. O problema da unidade literária Embora P constitua um complexo homogêneo e autônomo sob o ponto de vista espiritual, contudo, não deixa de suscitar o problema de 122
Cf. bibliografia relativa ao § 22, nota 97. R. LEHMANN, "Abraharri's Purchase of Machpelah and Hittite - Law", BASOR 129 (1953), 15-18.
123 M.
252
o PENTATEUCO
sua unidade literária. Se o problema já se coloca em face da amplitude do material usado, o qual não raras vezes quebra a unidade do contexto e aparece como exclusivo de P, tanto mais ele se coloca em face das repetições e contradições que existem. Certamente que aqui não entra em consideração a redução do sabbat à história da criação, nem a redução de certos preceitos sobre alimentos à época de Noé, e a redução da circuncisão à época de Abraão. Também não entra em consideração a narrativa da compra da caverna. Esta situação se acha ligada, de uma parte, ao sistema de dividir a história em períodos (cf. 4.), e de outra parte, à promessa de que possuirão a terra. Com as leis se passa de modo diferentes: Ex
27-29; Lv 8s: altar dos holocaustos Ex 28.41; 30.30 et passim: unção de todos os sacerdotes Lv 4.14: novilho oferecido em sacrifício Nm 4.3ss,23ss: obrigação dos levitas de prestar serviço a partir dos 30 anos de idade
-
-
Ex 30.1-10; 35-40: também altar dos perfumes; Ex 29.7,29; Lv 4.35,16 et passim: unção somente de Aarão; Lv 9.3; Nm 15.24: cabrito;
-
Nm 8.23ss: a partir dos 25 anos
-
Para explicar essas divergências, WELLHAUSEN já distinguia três camadas em P, no que foi seguido por outros. Semelhantemente VON RAD identifica em P a união de duas fontes paralelas, além de um "livro das gerações". Afora EISSFELDT, que se ocupou detalhadamente com este livro!", outros também se voltam contra esta hipótese, principalmente HUMBERT e WEISER*, quer do ponto de vista da crítica dos textos, quer por causa das dificuldades cronológicas que surgem a partir daí, e também por causa da sua unidade interna bastante acentuada. NOTH tenta uma outra explicação. Segundo ele, P constitui uma obra que, em sua origem, era puramente narrativa e tinha como ponto central a fundação da comunidade do povo e da comunhão do culto junto ao Sinai. As partes legislativas devem ter sido inseridas posteriormente. Mais exata é a posição de ELLIGER que vê na obra narrativa um escrito de consolação surgido durante o exílio. Contra esta hipótese, porém, há o fato de que se verifica estreita 124
toledoth", ZAW 34 (1914), 241-253; 36 (1916), 1-7. - O. EI55FELDT, "Biblos geneseôs", em: Fascher-Festschrift, 1958, 31-40. - ID., "Toledot", em: Kfostermann-Festschrift, 1961, 1-8. BUDDE, "EUa
§ 26. O
"ESTRATO FONTE"
P
253
relação entre narrativa histórica e lei na vinculação do esquema dos períodos históricos com a lei do Sinai (cf. 4.). Percorrendo outro caminho, HEMPEL, que, no mais, procura a origem das tradições antigas nas cenas do drama do culto, supõe ter havido um processo de formação da tradição oral em várias etapas, processo este cujas fases não se podem identificar sob o ponto de vista literário, mas apenas no que se refere ao material utilizado. Em qualquer caso, não se pode considerar P como um conjunto literário homogêneo, mas sim como obra literária de estrutura compósita. Antes do mais, deve-se admitir a existência de um conjunto literário básico, resultante da reelaboração do material do Pentateuco e no qual foram empregadas, logo de início, as antigas tradições históricas. As partes legislativas, originariamente autônomas, foram inseridas pouco a pouco, sendo, contudo, ao que parece, revistas posteriormente, até que se completou a redação final do Pentateuco. Mas não se procurou harmonizar as diversas tradições, nem nessa etapa nem quando se fizeram outras ampliações. Tais ampliações foram, p.ex.: Ex 6.13-30; 12.42b,4351; 13.1s; 27.20s; 30.1-38; 31.1-11; 35-40*; Lv 27; Nm 7.1-88. Em resumo, o processo de crescimento de P se realizou no sentido do método complementar.
4. Características de conteúdo de P Entre as características de conteúdo de P está, em primeiro lugar, a conexão estreita entre narrativa histórica e lei. Esses dois aspectos aparecem indissoluvelmente unidos. É no contexto da narrativa que Javé promulga as leis associadas aos fatos, leis que devem valer, antes de tudo, para a situação presente, mas também posteriormente, para além dela, como decreto de eternidade. A narrativa fundamenta a lei eterna, e a lei eterna justifica a apresentação dos fatos. Por este motivo, o material narrativo é muito desigual. Quando não está em relação com determinações legais, raramente vai além de árvores genealógicas ou de simples informações. Em contrapartida, P se torna verboso quando procura derivar as instituições cultuais a partir da história (Cn 1.1-2.4a; 6.9-9, 17; 17). Há estreita correlação entre a extensão do material narrativo e a lei. Uma segunda característica de P é constituída pela cronologia que é imposta a todo o conjunto!". A contagem dos anos começa com a 125
A.
JEPSEN,
"Zur Chronologie des Priesterkodex", ZAW 47 (1929),251-255.
254
o PENTATEUCO
criação e é levada avante com precisão. Este processo se inspira em modelos do Antigo Oriente. Com pequena diferença em relação às inscrições régias da Mesopotâmia, P indica as datas segundo os anos de vida (e não pelos anos de governo) dos representantes de uma determinada geração. A divisão da história se faz pelas árvores genealógicas, além da fórmula: Esta é a descendência de (nome), que, afora Gn 2.4a, aparece como título (6.9; 10.1; 11.10,27; 25.12,19; 36.1,9; 37.2; Nm 3.1), com a variante: Este é o livro da descendência de, que se encontra antes da lista dos primeiros pais (Gn 5.1). Esta fórmula é usada onde a exposição dos fatos se limita a um conjunto menor, e especifica a passagem progressiva da história do mundo e da humanidade para a história de Israel e seu núcleo mais central (EI55FELDT*). Que exista uma divisão da história em grandes períodos, já introduzida por E, deduz-se do fato de que P distingue vários estágios na revelação de Deus e nas promessas juntamente com as respectivas alianças. O primeiro estágio começa com a criação: por uma primeira promessa, primeira e fundamental, Deus confere ao homem o domínio sobre o universo, impõe-lhe a observância de uma alimentação vegetariana e estabelece o sabbat como sinal destes dois acontecimentos. O segundo estágio começa logo depois do dilúvio, com a promessa feita a Noé, acompanhada da respectiva aliança. Esta aliança consiste nos preceitos que Deus impõe a Noé e cujo sinal é o arco-íris. O terceiro estágio se concretiza em Abraão, com o preceito e o sinal da circuncisão. O quarto e último estágio compreende a aliança do Sinai e todo o seu programa cultural. P tenta caracterizar estes estágios, pelo menos até certo ponto, mediante as diferentes denominações de Deus: Eloim (I-II), EI Shadai (I1I), Javé (IV). Se em tudo isto aparece já uma certa erudição sacerdotal, ela se exprime ainda mais nas diversas maneiras de indicar os números e em outras informações que, entretanto, em sua maior parte, não correspondem à verdade. É impossível que mais de seiscentos mil homens se tenham reunido na entrada do Tabernáculo, ou que dois milhões e meio de pessoas tenham vivido tanto tempo no deserto do Sinai e, ainda por cima, tenham levado tantos carneiros quantos os que foram utilizados na celebração da Páscoa. Na verdade, o número de guerreiros foi calculado pelo processo de gematria, ou seja, a partir do valor numérico das letras: Somam-se primeiramente os valores numéricos das letras b n y y s r ' I, multiplica-se o resultado por 1000, e de novo se adiciona
§ 26. O
"ESTRATO FONTE"
P
255
o valor numérico simples das palavras k 1 r ' s, resultando 603.551 que, arredondado para 603.550, fornece o número dos combatentes de Nm 1.46; 2.32.
5. A teologia de P Com isto já tocamos em alguns pontos da teologia de P. Dessa teologia faz parte também a nova finalidade da obra. As narrações e as determinações que P transmite não tiveram valor apenas no passado, mas valem também, e sobretudo, para o presente e para o futuro. P contém um programa de reconstrução da comunidade, determinada por Deus, ou de reforma da comunidade para os tempos que se seguirão ao exílio. A retroprojeção desse programa sobre o passado deve legitimá-lo e revesti-lo de autoridade: Deus promulgou suas determinações como leis eternas, desde tempos antiqüíssimos, sobretudo no Sinai. Por isso, essas leis devem valer sem contestação de espécie alguma também no presente. Segundo P, este Deus, é absolutamente transcendental. Não se revela em sua própria forma, seja na realidade concreta, seja em sonhos. O que se manifesta é somente o kabõd, é a sua "santidade", mas mesmo assim velada, para que somente Moisés a possa contemplar. Neste sentido, e em contraposição com a antiga concepção da terra de cultura segundo a qual Deus habita e está presente no templo, P insiste na idéia do santuáriotabernáculo!" onde o Deus transcendental não habita, mas apenas aparece ocasionalmente em seu kabõd, sobre as nuvens. Isto implica um outro tipo de relação entre Deus e os homens, relação indicada pela ordem guardada no acampamento (Nm 2)127: os sacerdotes e levitas acampavam como que formando um muro de separação e de proteção entre o santuário e o povo. Já não havia um acesso imediato até Deus. O caminho até ele devia passar pelo clero na sua função mediadora. Também Deus já não fala diretamente ao povo, mas por intermédio 126
127
M. HARAN, "The Ark and the Cherubim", lEJ 9 (1956),30-38,89-98. - lo., "The Nature of the 'Ohel Mô'dh' in Pentateuchal Sources", TSS 5 (1959). 50-65. - lo., "Shilo and Jerusalém: The Origin of the Priestlv Tradition in the Pentateuch", JBL 81 (1962), 14-24. - L. ROST, "Die Wohnstãtte des Zeugnisses", em: BaumgãrteiFestschrift, 1959, 158-165. - R. DE VAUX. "Arche dalliance et Tente de réunion", em: Mémorial Gelin, 1961,55-70. A. KUSCHKE, "Die Lagervorstellung der priesterlichen Erzãhlung". ZAW 63 (1951), 74-105.
256
o PENTATEUCO
de Moisés e de Aarão. A existência do povo se acha envolvida pela lei ritual e pela expiação, como meta suprema do culto.
6. Origem de P No que diz respeito ao problema da época da origem de P, digamos de modo geral que se trata do "estrato fonte" mais recente do Pentateuco, apesar do material muito antigo que é utilizado. Contra a opinião daqueles que o datavam da época anterior ao exílio, WELLHAUSEN objetava, e com razão: UNa verdade, se o Código Sacerdotal é assim tão antigo, então necessariamente o rei nada teria a dizer no culto e constituiria uma figura inteiramente supérflua no seio da comunidade, e Israel seria, já nessa época, uma Igreja e não um estado. Mas é precisamente o contrário que se observa, de modo geral.;"!" P é mais novo do que D e supõe, como norma inteiramente aceita, a centralização do culto exigida em D. As prescrições cultuais de P são de época mais recente. O caráter das festas agrícolas, que ainda se podem reconhecer em D (e na L. S.), é eliminado pela fixação das mesmas no quadro de um calendário. O pavor sentido por [osias logo em seguida à descoberta do código deuteronomista, bem como o relato das reformas que vieram logo depois não se compreenderiam, se P, que é muito mais estrito, já estivesse vigorando como lei. P é também mais recente do que a 1.5., que já existia e já fora incorporada, e também mais recente do que Ezequiel, que ainda conhece um sumo sacerdote e é o primeiro que anuncia a degradação dos levitas à condição de servidores do templo (Ez 44), fato este que P pressupõe. Por fim, os profetas Dêutero-Isaías, Ageu, Zacarias e Malaquias conhecem, evidentemente, o Deuteronômio, mas não P. Somente as Crônicas, redigidas não antes de meados do séc. IV, é que foram influenciadas por P. De tudo isto se conclui que P surgiu no séc. V. A diáspora babilônica deve ser considerada como o lugar de origem de P. É isto o que se deduz sobretudo do fato de que P era a lei que Esdras levara para Jerusalém, depois de autorizado pelo rei dos persas (Esd 7.1ss), e que está na base de sua reforma. Embora Esdras não seja o autor de P, apesar do seu título de "escriba da lei de Deus", contudo, empenhou a comunidade de Jerusalém a que o observasse (Ne Ss), como no-lo mostram as relações entre Ne 8.13ss e Lv 23.40; entre Ne 8.18 e Lv 23.36. Para além de tudo isto resta a indagar se o livro da lei que Esdras levou não era mesmo o Pentateuco inteiro, ampliado com P (§ 28,1). 128
J. WELLHAUSEN, Prolegomena zur Geschichte Israels, IV, 1883, 2a ed.
§ 27.
FRAGMENTOS ISOLADOS FORA DOS "ESTRATOS FONTES"
§ 27. FRAGMENTOS ISOLADOS FORA DOS "ESTRATOS FONTES" W. F. ALBRIGHT, "Shinar-Sangãr and its Monarch Amraphel", AJSL 40 (1923/24), 125-133. - lo., "The Historical Background of Genesis XIV", JSOR 10 (1926), 231-269. - lo., "Abram the Hebrew: A New Archaeological Interpretation", BASOR 163 (1961), 36-54. - I. BENZINGER, "Zur Quellenscheidung in Gen 14", em: BZAW 41,1925,21-27. - F. M. TH. BÓHL, "Die Kõnige von Genesis 14", ZAW 36 (1916). 65-73. - lo., "Tud'alia I, Zeitgenosse Abrahams, um 1650 v. Chr.", ibid. 42 (1924), 148-153. - F. CORNELIUS, "Genesis XIV", ibid. 72 (1960), 1-7. - H. DEL MEDICO, "Melchisédech", ibid. 69 (1957), 160-170. - L. R. FISCHER, "Abraham and his Priest-King", JBL 81 (1962),264-270. - H. W. HERTZBERG, "Die Melchisedek-Traditionen", JPOS 8 (1928), 169-179 (= Beitrãge zur Traditionsgeschichte und Theologie des Alten Testaments, 1962, 3644). - K. JARITZ, "Wer ist Amraphel in Genesis 14?", ZAW 70 (1958); 255s. - R. LACK, "Les origines de'Elyôn, le Trés-Haut, dans la tradition cuItuelle d'Israel", CBQ 24 (1962),44-64. -G. LEVI DELLA VIDA, "EI 'Elyon in Genesis, 14, 18-20", JBL 63 (1944), 1-9. - J. MEINHOLD, I. Mose 14, 1911. - H. H. ROWLEY, "Melchizedek and Zadok (Gen 14 and Ps 110)", em: Bertholet-Festschrift, 1950,461-472. - N. A. VAN UCHELEN, Abraham de Hebreeêr, 1964. - L. H. VINCENT, "Abraham à [érusalem", RB 58 (1951), 360-371. A. BENDER, "Das Lied Exodus 15", ZAW 23 (1903), 1-48. - F. M. CROSS, [r, - D. N. FREEOMAN, "The Song of Miriam", JNES 14 (1955), 237250. - N. LOHFINK, "De Moysis epinicio (Ex 15.1-18)", VD 41 (1963), 277-289. - K. G. RENDTORFF, "Sejrshymnen i Exodus 15 og dens forhold til Tronbestigelssalmema", DTT 22 (1959), 65-81, 156-171. - M. ROZELAAR, "The Song of the Sea", VT 2 (1952),221-228. - H. ScHMIDT, "Das Meerlied", ZAW 49 (1931),59-66. - R. TOURNAY, "Recherches sur la chronologie des psaumes", RB 65 (1958),321-358. - J. D. W. WATIS, "The Song of the Sea, - Ex XV", VT 7 (1957) 371-380. L. B. BAUER, "Kõnige und Priester, ein heilliges Volk (Ex 19.6)", BZ NF 2 (1958),283-286. - W. CASPARI, "Das priesterliche Kõnigreich", ThBl 8 (1929), 105-110. - R. J. FALEY, The Kingdom of Priests, 1960. - G. FOHRER, "'Priesterliches K6nigtum", Ex 19.6", ThZ 19 (1963), 359-362. - R. KLOPFER, "Zur Quellenscheidung in Exod 19", ZAW 18 (1898), 197-235. - R. MARTIN-AcHARD, "Israel, peuple sacerdotal", Verbum Caro 18 (1964), 11-28. - W. L. MORAN, "A Kingdom of Priests", em: The Bible in Current Catholic Thought, 1962, 7-20. - H. WILDBERGER, [ahioes
Eigentumsvolk, 1960. W. F. ALBRIGHT, "Some Remarks on the Song of Moses in Deuteronomy XXXII", VT 9 (1959), 339-346. - E. BAUMANN, "Das Lied Mose's (Dt XXXII 1-43) auf seine gedankliche Geschlossenheit untersucht", ibiâ. 6 (1956),414-424. - K. BUOOE, Das Lied Moses, 1920. - O. EISSFELDT, Das Lied
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Moses Deuteronomium 32.1-43 und das Lehrgedicht Psalm 78 Samteiner Analyse derUmgebung des Moseliedes, 1958.- A. KLOSTERMANN, DerPentateuch, 1893, 223-367. - R. MEYER, "Die Bedeutung von Deuteronomium 32.8s,43 (4Q) fürdie Auslegung des Moseliedes", em: Rudolph-Festschrift, 1961, 197-209). - W. MORAN, "Some Remarks on the Song of Moses", Bibl. 43 (1962),317327. - E. SELLIN, "Wann wurde das Moselied Dtn 32 gedichtet?", ZAW 43 (1925) 161-173. - P. W. SKEHAH, "The Structure of the Song of Moses in Deuteronomy (Dt 32.1-43)", CBQ 13 (1951), 153-163. - G. E. WRIGHf, "The Lawsuit of God: a Form-Crítical Study of Deuteronomy 32", em: Essays Muilenburg, 1962,26-67.
1. Gênesis 14 Gn 14 não pertence a nenhum dos "estratos fontes". Surgiu, pelo contrário, como fragmento isolado e foi depois incorporado ao Pentateuco. De acordo com sua narração, quatro grandes reis invadiram a Palestina, derrotaram os reis das cidades de Sodoma e Gomorra, entre outros, e levaram prisioneiro a Ló, residente em Sodoma. Abraão foi com seus trezentos e dezoito servos ao alcance do exército vitorioso, derrotou-o e libertou Ló. Ao retornar, consagrou a décima parte da presa a Melquisedec, rei-sacerdote de Salém, e tratou com magnanimidade o rei de Sodoma. Esta era a narrativa que se citava preferentemente para situar Abraão em uma época antiqüíssima, identificando Amrafel, um dos reis invasores, com Hamurábi, rei da Babilônia. Deste modo Abraão teria vivido por volta de 1900 a.c., segundo os cálculos da antiga cronologia. Esta opinião, porém, perdeu a preferência depois que Hamurábi foi situado por volta de 1700, em conseqüência da mudança de cronologia, ocasionada pelos textos de Mári. Recentemente, conclui-se, a partir da mesma narrativa, que Abraão teria sido um mercador principesco, originário da cidade de Ur, na Ásia Menor do séc. XIV. Todas as tentativas de extrair conclusões históricas retrospectivas, a partir de Gn 14, têm contra si o fato de que o referido texto é reconhecidamente de época mais recente e já pressupõe o Pentateuco. Também depende das narrativas onde Ló desempenha certo papel (Gn 12s; 18s: pertencentes a N) e apresenta certos pontos de contato com E e linguagem semelhante à de P. Com P ele tem em comum o fato de utilizar a gematria, pois o número dos servos de Abraão foi calculado a partir do nome do servo Eliezer (Gn 15.2: J). O emprego do pseudônimo (ou abreviação) de Salém por Jerusalém, atestado igualmente por SI 76 [75],3 e pela col. 23.13
§ 27.
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do chamado "Gênesis Apócrifo", descoberto na primeira gruta de Qumran, nos levará também a uma época mais recente. Por conseguinte, concordando com STEUERNAGEL*, PROCKSCH e muitos outros, e discordando de SELLIN, devemos considerar Gn 14 como um midrash de época mais recente. Tem seus lugares paralelos nas lendas de Daniel e no livro de [udite. Sua finalidade era exaltar Abraão e fazer com que fosse reconhecida a autoridade do sumo sacerdote jerosolimitano. Esse texto não nos oferece esclarecimento algum a respeito da pessoa de Abraão, pois só posteriormente sua figura foi vinculada a outros elementos da narrativa. Mas o erudito autor deste fragmento tinha evidentemente ao seu alcance também antigos relatos ou informações. Duas dessas informações remontam ao segundo milênio. Dificilmente, porém, elas derivam de um documento cuneiforme do arquivo do templo (STEUERNAGEL*); o mais provável é que venham da tradição oraL a) Uma certa tradição fala de uma expedição predatória vitoriosa e traz o nome de quatro reis que não estão ligados a pessoas históricas de uma única época. Um destes reis, Amrafel de Senaar (Mesopotâmia), já não pode ser identificado com Hamurábi. Das sugestões modernas, nas quais se pensa inclusive em um rei sírio, talvez mereça atenção aquela que deriva o seu nome de Amar-pi-el. O segundo nome: Arioc de Elasar, poderia vir da forma Arrivuk, e nesse caso apresentaria um cunho hurrita. Encontra-se como nome de um filho de Zimrilim, rei de Mári. O terceiro nome: Tadal de Goim, corresponde à forma Todhaliash, nome de vários reis hititas. O quarto nome: Codorlaomor de Elam, corresponde ao nome elamita de Cuter-Lagamar, embora a lista dos reis elamitas não o contenha. Em vista da longa história dessa tradição, não nos é possível identificar a situação histórica que ela supõe. b) Uma antiga memória está ligada ao nome de Melquisedec, no qual se deve ver o rei cananeu da cidade de Jerusalém. O fato de suas funções sacerdotais terem passado, conforme SI 110 [109],4, para os titulares da casa de Davi, como reis posteriores da cidade de Jerusalém, nos permite supor que Davi conquistou a cidade durante o seu reinado. 2. Êxodo 15.1-19
Em Ex 15.1-19 acha-se um cântico (nos vv. Ib-Iê), que o próprio título (v. la) coloca na boca de Moisés e dos israelitas, depois de terem sido salvos junto ao mar, e que foi introduzido no contexto, mediante uma nota explicativa (no v. 19). Começa como o texto do cântico de Míriam,
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irmã de Moisés (15.21), ligeiramente modificado, e inclui referências a outros acontecimentos da caminhada pelo deserto e da conquista do país, acontecimentos estes que pertencem aos "gloriosos feitos" de Javé. É a partir da disposição fundamental expressa nos vv. 2-3 que se explica a escolha dos temas, de sorte que a falta de referência aos acontecimentos do Sinai não autoriza nenhuma conclusão. Existe ampla divergência de opiniões sobre o gênero literário e sobre a finalidade deste cântico. É considerado freqüentemente como um hino ou como salmo pascal (assim pensam, p.ex., BEER, ROZELAAR, SELLIN-RosT*), embora não se refira à solenidade nem mencione algum acontecimento importante em que ela esteja subentendida (morte dos primogênitos egípcios e preservação dos primogênitos israelitas). Outros autores pensam em um cântico ligado à festa do outono e do Ano Novo, à chamada festa da ascensão de Javé ao trono (cf. § 39,2), ou à suposta festa da Aliança tp.ex., B. BENTZEN*, H. SCHMIDT, WEISER*), embora no texto não haja nenhuma alusão a uma situação de festa. Outros ainda pensam em um complicado processo de evolução do culto que estaria em paralelo com a história da formação do cântico (WATTS), em uma espécie de harmonização de elementos hinológicos com uma "balada histórica" (RYLAARSDAM), ou numa paráfrase homilética e piedosa do cântico de Míriam (PFEIFFER). À luz da história das formas, o cântico parece um hino ampliado por elementos formais de um cântico de triunfo ou de ação de graças, e onde o "eu" daquele que fala encarna toda a comunidade. O cântico é uma poesia de louvor a Javé, por haver libertado os israelitas junto do mar e por causa dos acontecimentos salvíficos que logo se seguiram. É um louvor que data de uma época em que o motivo da libertação dos israelitas perto do mar estava em voga 129. Também as divergências a respeito do lugar de origem deste cântico são as mais amplas possíveis. Elas se estendem desde a época mosaica 130, e através do período dos Juízes (SELLIN, CRoss-FREEDMAN: substancialmente seria do séc. XII, e textualmente do séc. X)!", através da época dos reis (ROZELAAR), e do Deuteronômio (BEER, TOURNAY), até o tempo depois do exílio. Os vv. 17s nos oferecem seguro ponto de apoio. A idéia de que Javé preparou uma morada para si em Jerusalém, isto é, no templo, para aí poder exercer o seu império como rei para sempre, data, no máximo, do 129 130
131
A. LAUHA, "Das Schilfmeermotiv im Alten Testament", VTSupp19, 1963,32-46. W. F. ALBRIGHT, The Archaeology of Palestine, 1949,233 (alemão: 1962,226). Contra a data mais antiga, proposta por S. MOWINCKEL, VT 5 (1955), 27s.
§ 27.
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último período que precede o exílío'". Ademais, as palavras introdutórias: Javé é rei agora e eternamente (v. lS), que o proêmio de alguns salmos passam do perfeito para o imperfeito, por influência do Dêutero-Isaías (§ 39,2), indicam, juntamente com o motivo da libertação junto ao mar, a época que se seguiu ao exílio.
3. Êxodo 19.3b-S Ex 19.3b-S é uma pequena perícope autônoma no interior da narrativa do Sinai e não pertence a nenhum dos "estratos fontes". Nela se exige obediência aos preceitos de Javé, que fará de Israel sua propriedade particular. Israel deve tornar-se um reino sacerdotal, uma nação santa. Estas últimas expressões têm sido interpretadas de maneiras diversas. Em todo caso, depois das recentes pesquisas, parece certo que a palavra gôy designa a "nação" politicamente constituída e governada por um rei, e que mãmlakã, além de "reino", pode significar, também "realeza" ou "rei", e de fato o significa, quando em ligação com "nação", a partir de 1Rs lS.10; [r lS.7; 27.S. Por conseguinte, a proposição nuclear da perícope indica que Javé quer formar uma nação santa, com uma realeza e um rei sacerdotal. Tendo em vista tanto a vinculação posterior entre realeza e nação, como a influência da linguagem deuteronômica de há muito observada, e também a semelhança lingüística e conceitual com a L. S., que remonta a tradições anteriores ao exílio (§ 20,3), conclui-se que Ex 19.3b-S provém de círculos sacerdotais da Jerusalém do final da época dos reis de [udá.
4. Deuteronômio 32.1-43 Dt 32.1-43, ou seja, o cântico de Moisés, com a narrativa que a enquadra no contexto e que se refere à leitura do cântico por Moisés (31.19-22; 32.44), dificilmente fazia parte do "estrato fonte" E, nem provocou a colocação do código deuteronômico no devido lugar. Pelo contrário, ele constitui um enxerto forçado, que o contexto mal consegue encobrir, uma espécie de paralelo das bênçãos de Moisés (Dt 33) (BUDDE). Ao contrário do que admite WEISER*, esse cântico não supõe uma situação cultual, pois os vv. 3,7,15,43 não aludem absolutamente a uma tal situação, nem o cântico se baseia em um determinado esquema da pregação, principalmente porque é composto de uma variada gama de elementos formais: no começo ]32
Cf. G.
FOHRER,
"Zion-Ierusalem im Alten Testament", ThW VII, 307s.
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o PENTATEUCO
e no fim aparecem elementos hinológicos, e no meio, elementos da reflexão histórica, da pregação profética e da doutrina sapiencial. O cântico de Moisés, que continuou a circular como unidade autônoma no seio da literatura de Qumran, mesmo depois de sua inserção no Pentateuco, constitui uma espécie de "testamento" ou "última palavra de Moisés" (MEYER). Este tipo de literatura formou-se em grande escala, principalmente na época posterior ao exílio. E com isto já temos colocada a difícil questão relativa à época de origem do texto. Exclui-se que ele tenha sido redigido por Moisés - mesmo independentemente da linguagem e do universo de suas idéias -, em vista dos vv. 7,1O,13ss, segundo os quais Israel já tinha passado por uma longa história na Palestina. EISSFELDT acha que as reflexões históricas só vão até à conquista do país e à apostasia provocada por esta conquista, e ao aparecimento dos filisteus como instrumento do castigo divino, razão pela qual ele data o cântico de Moisés de meados do séc. XI, sendo possivelmente da autoria de Samuel. Outros, porém, referem o não-povo do v. 21 aos arameus no séc. IX ou aos assírios no séc. VIII (SELLIN-RosT*), nos sécs. VII-VI (BUDDE), ou aos samaritanos, no séc. V (SELLIN). Toda a descrição que envolve o v. 21 indica, no entanto, com tanta clareza a ruína do reino de [udá, provocada pela invasão dos assírios, enquanto os vv. 32ss anunciam a ruína desses mesmos inimigos e, ao mesmo tempo, uma nova salvação para Israel, que se deve perguntar por que alguma vez se duvidou de que o cântico. de Moisés surgiu no exílio. Também os ecos da perícope de Is 63.7-64.11, do mesmo período, e sobretudo a influência visível das idéias de Ezequiel nos levam a supor que esse cântico foi elaborado durante ou depois da primeira metade do séc. VI. Por certo que não se pode pensar em uma época mais recente, embora MEYER, baseado em sua própria interpretação dada ao novo texto dos vv. 8s, 43, deduzido de importante fragmento da quarta gruta de Qumran, admita a época da monarquia universal dos persas, por volta de 400 a.c.
§ 28. A ORIGEM DO PENTATEUCO O Pentateuco (ou Hexateuco) como um todo não surgiu como se todos os "estratos fontes" tivessem sido agrupados em uma só grande operação, depois de terem tido cada um existência autônoma. Pelo contrário: sua composição se fez paulatinamente. Aliás, O pressupõe o bloco JNE, e P, além deste conjunto, também a presença de D. As fases desta
§ 28. A
ORIGEM DO PENTATEUCO
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composição chamam-se redações e os que as realizaram recebem o nome de redatores. Por isso, usa-se a sigla R, acompanhada da sigla menor do "estrato" utilizado, de modo que a redação, p.ex., que acrescentou o "estrato fonte" P ao complexo já existente, chama-se RP. Estas denominações dão a impressão de que o aparecimento progressivo do Pentateuco a partir de "estratos fontes" isolados foi um processo essencialmente literário. Esta impressão é de todo procedente. O Pentateuco como um todo não tem uma história das formas, mas uma história das redações. O trabalho de compilação dos "estratos fontes" também não foi um processo cultual (WEISER*), mas um processo literário (NOTH), cuja finalidade era reunir todas as tradições históricas. No caso de um processo cultual dificilmente se entenderia por que uma tradição antiga foi conservada ao lado de uma tradição mais nova, que deveria tê-la substituído na proclamação cultuaI. A tendência de recolher obras literárias, que se observa no Oriente na época mais recente da monarquia israelita, faz-se sentir igualmente em Israel. O aparecimento do Pentateuco também se deu neste contexto vétero-oriental. Dificilmente se pode duvidar que uma obra deste tipo não tenha tido seus leitores e seus usuários. Em primeiro lugar se deve pensar nas escolas de escribas e mestres sapienciais. O interesse pelas obras históricas é atestado, aliás, também pelas histórias de Salomão, e dos reis de [udá e de Israel que foram utilizadas como fontes para a elaboração dos livros dos Reis. Somente a partir do momento em que surgiu a tendência da teologia deuteronômica, para uma "religião do livro", e quando se introduziu o ministério da palavra divina, durante o exílio babilônico, numa situação cultual mudada, é que o Pentateuco, que já existia em grande parte, deve ter começado a ser usado no culto. Evidentemente que não é possível, por enquanto, expor em detalhes a história das redações do Pentateuco. Nem sequer se pode responder com segurança à questão de saber em que ordem os "estratos fontes" se juntaram. É provável que primeiramente se tenham combinado J e E. Todavia, visto que o 5178[77], o qual na enumeração das pragas do Egito (vv. 44-51) segue exclusivamente J e só utiliza a exposição mais grosseira de E para a primeira praga, data da época anterior ao exílio, parece que nesta fase J e E ainda estavam separados. É possível apresentar muitos argumentos em favor de uma combinação anterior de J e N. Por ex.: os acréscimos deuteronômicos de Ex 12s nos permitem concluir que o seu autor já tinha ao seu alcance a combinação JN. Por enquanto restam ainda muitos pontos a esclarecer.
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o ponto que melhor se determina são os métodos seguidos nas redações. Primeiramente, o redator manteve as exposições paralelas, combinando entre si, p.ex., as diversas narrações a respeito da criação, as narrativas sobre o risco por que passou a mulher do patriarca, ou a maior parte das narrativas referentes às pragas do Egito. Em outros casos o redator entremeou e encaixou as exposições umas nas outras; assim, p.ex., as narrativas referentes ao dilúvio ou as duas versões da novela de José, onde os "estratos fontes" se alternam. Diferente também é o processo utilizado nas narrativas do nascimento de Moisés e da libertação dos israelitas junto ao mar. A exposição de um ou mais "estratos fontes" serve de fundamento e é apenas completada com elementos de um outro"estrato fonte". Por último, a utilização de um determinado "estrato fonte" pode levar à fusão completa de outros "estratos fontes", a ponto de já não se poder separá-los uns dos outros (como, p.ex., em Ex 2.15-22), ou pode consistir na transformação redacional de uma breve notícia em uma descrição mais ampla (como, p.ex., em Ex 1.15-21). O "estrato fonte" P, de idade mais recente, é colocado muitas vezes como moldura de um conjunto já existente; assim, p.ex., na narrativa do dilúvio (na verdade, depois das considerações gerais de J), na tabela etnográfica, e também nas descrições da opressão do povo no Egito (Ex 1.7-14) e da vocação de Moisés. Este, talvez, pareça ser o processo mais simples, dada a combinação já bastante sólida dos "estratos fontes" mais antigos, nos quais P só raramente foi inserido. Muitas vezes, durante a atividade redacional, as partes isoladas de um "estrato fonte" foram inseridas em lugar errado, dentro do novo contexto. Em Ex 4, p.ex., qualquer que seja a ordem que se adote na combinação, caíram em lugar inadequado tanto os vv. 19-20a,24-26,30b quanto os VV. 27s,30a. Também houve transposição de fragmentos mais extensos. O melhor exemplo neste sentido talvez seja o C. da A. De modo geral a atividade redacional tornou a exposição mais complexa e mais confusa, mas conferiu maior profundidade ao conteúdo do Pentateuco como um todo. No que diz respeito à questão de saber em que época o Pentateuco (ou Hexateuco) já existia como combinação de JNEDP, devemos, mais uma vez, reportar-nos à reforma de Esdras (§ 26,6). Chamou-se a atenção para a circunstância de que algumas das medidas então adotadas não se baseiam em P; pelo contrário, Ne 10.31; 13.1ss dependem de Ex 34.16; Dt 7.2ss; 23.4ss, enquanto Ne 10.32 se relaciona com Dt 15.2. Deste modo é todo o Pentateuco que está na base da reforma de Esdras, e, por conse-
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HIPÓTESES SOBRE A EXISTÊNCIA DE OBRAS GLOBAIS
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guinte, talvez tivesse sido levado da Babilônia por Esdras. O Pentateuco deve ter surgido depois de P, quando este "estrato fonte" foi conhecido e utilizado. Esta colocação cronológica tem a seu favor a circunstância de que os samaritanos adotaram o Pentateuco, no séc. IV, como base reconhecida oficialmente de sua religião. A situação se complica, pelo fato de que os "estratos fontes" se encerravam com a narrativa da conquista da terra pelos israelitas, sob o comando de [osué, sendo por isso necessário considerar se eles não continuam no livro de [osué, Neste caso, teria surgido na Babilônia primeiramente o complexo Cênesis-josué, conhecido como Hexateuco. Depois o livro de [osué se separou desse complexo, para que o Pentateuco, despojado do grande programa de ocupação do país, pudesse ser aprovado pelas autoridades persas como lei religiosa. Mais tarde se fizeram ainda alguns acréscimos de maior ou menor extensão, como, p.ex., Gn 14, e se processou a divisão do Pentateuco em cinco livros.
TRANSIÇÃO § 29. HIPÓTESES SOBRE A EXISTÊNCIA DE OBRAS GLOBAIS
1. Hipóteses Por várias vezes ouvimos o eco da questão de saber até onde se estendem os "estratos fontes", sem que, no entanto, tenhamos encontrado uma resposta definitiva: os "estratos fontes" terminavam com a narrativa da morte de Moisés, considerando a promessa da conquista da terra, mas não falando da sua realização? E que relação existe entre o conteúdo do livro de Josué e esses "estratos"? Existem talvez conexões literárias que se prolongam inclusive até os livros dos Reis? As hipóteses que exporemos a seguir divergem da opinião mais simples de que os "estratos fontes" se limitam ao Pentateuco - sem tocarmos na opinião extremamente simplificante de que só se chegou a uma fixação por escrito de toda a tradição histórica em duas obras distintas, P e D, na época depois do exílio, e isto após uma longa fase de tradição oral: a) Os antigos "estratos fontes" do Pentateuco (ou Hexateuco) continuam nos livros de [uízes-Samuel ou nos livros de Juízes-Reis. Esta
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hipótese, fundamentada sobretudo por BUDDE (§ 31) e por CORNILL (§ 32), depois das primeiras suposições, foi defendida por BENZINGER e HÓLSCHER (§ 33) para os "estratos fontes" J e E, e por SMEND, EISSFELDT e SIMPSON (§ 31), também para o terceiro "estrato fonte" antigo aI, L). Assim, em última análise, dever-se-ia admitir apenas uma única obra histórica global. b) Os "estratos fontes" só vão até o final de Números, de modo que não houve um Pentateuco como obra literária, mas um Tetrateuco. Os livros do Deuteronômio a Reis constituem uma segunda obra, que NOTH chama de história deuteronomista (§ 30). Independentemente daí, JEPSEN defendeu uma hipótese semelhante (§ 33). Segundo NOTH, o autor desta obra teria reunido pela primeira vez, durante o exílio, as perícopes até então autônomas, acrescentando ainda algumas passagens de sua autoria. A esse conjunto fizeram-se depois outras adições de certa extensão. Em conseqüência, dever-se-ia admitir a existência de duas grandes obras históricas: o Tetrateuco e a história deuteronomista. Evidentemente que poderá haver outras opiniões. Assim, para HEMPEL [z 2.6ss é o começo mais antigo e [s 23 o começo mais recente da história deuteronomista a qual, com sua maneira de tratar as fontes utilizadas na elaboração dos livros dos Reis, interrompeu o desenvolvimento "orgânico" que estava em curso de um quadro global e, por isso, não somente não produziu, mas impediu precisamente uma exposição da história onde se incluiriam as tradições escritas e orais. c) Os "estratos fontes" do Pentateuco continuam no livro de [osué e vão até o começo do livro dos Juízes, de modo que se deve falar do Hexateuco como obra histórica global, constituída a partir desses "estratos fontes". Os livros subseqüentes, pelo contrário, não podem ser considerados como uma obra formada de fontes contínuas, nem como obra unitária. São, antes, obras que surgiram, cada uma independentemente e na linha do processo das adições (§ 18,4), a partir de fragmentos ou de blocos isolados (KITTEL: cf. bibliografia referente ao § 31).
2. Crítica As hipóteses mencionadas em a) e b), e que admitem uma ou duas obras históricas globais são, com certeza, tentativas impressionantes de solucionar os dificílimos problemas da história da origem e da composição dos livros de [osué a Reis. Nossa exposição em § 30-33, porém, não as adota, e isto por razões graves que depõem contra elas.
§ 29.
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a) Não se conseguiu chegar de modo sequer satisfatório e aproximativo a uma divisão do material dos livros de Juizes a Reis em dois ou três fios narrativos, nem identificá-los com os "estratos fontes" do Pentateuco. Apesar das duplicatas eventuais, cuja existência se explica por outro modo que não o de atribuí-las a fontes contínuas, os fios narrativos estariam parcamente representados e possuiriam um estilo indeciso. Ao contrário da força criativa de JNE, os autores da referida obra terse-iam limitado, a partir do livro dos Juizes, ao mero trabalho de compilação e de ordenação das diferentes tradições, sem procurarem e sem atingirem uma disposição clara e uma impregnação conceitual. Maior é o número de questões que permanecem em aberto, do que as que são respondidas. b) Várias são as observações que depõem contra a hipótese de uma história deuteronomista. Em primeiro lugar, o Deuteronômio, depois de ter existido por certo tempo como obra autônoma, como nos mostram os acréscimos que foram feitos, foi incorporado ao Pentateuco. É isto o que se deduz da continuação dos "estratos fontes" J, E e P no final da obra (Dt 31.14-17,23; 33-34), como também da incorporação dos versículos Dt 1.3; 4.41-43, que provêm de P, e da inserção do livro no lugar atual (§ 25,6). Em segundo lugar, existem relações claras entre o Pentateuco e o livro de [osué, que não provêm da atividade redacional, mas já existiam nos "estratos fontes" anteriores ao exílio, quais sejam: as referências ao sepultamento dos restos mortais de José (Ex 13.19) (E) e à sua execução (Js 24.32), e a introdução da figura de [osué (Ex 17.18ss[N]; 24.13-15[N]; 32.17s[N]; 33.11[E]; Nm 11.28s[E]; Dt 31.14,23 [JE] ). Em terceiro lugar, e ainda na mesma linha, observa-se que os "estratos fontes" do Pentateuco continuam no livro de Josué e no começo do livro dos Juízes, como no-lo mostra um exame mais atento. A análise de NOTH, que no livro de [osué deixa E, principalmente, sempre de lado, por considerá-lo como uma revisão, e sem levar em conta as relações que tais "elaborações" das histórias individuais possuem entre si e com a camada E do Pentateuco, simplifica por demais a questão. Além disso, a situação se tornaria incompreensível, se os "estratos fontes" não contivessem uma narrativa definitiva da conquista da terra prometida, ou se essa narrativa tivesse sido deixada de lado posteriormente, quando, precisamente ao contrário, tanto os antigos núcleos narrativos quanto a exposição global resultante têm por objeto a conquista da terra. Por fim, não se pode considerar os livros dos Juizes, Samuel e Reis como partes de uma obra elaborada por um único autor ou redator deuteronomista. O livro dos Juízes foi elaborado certa-
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mente dentro de uma linha deuteronomista, como nos mostram as considerações com que ele enquadra as narrações. O desdobramento da história tal como aí aparece: com a repetição constante de apostasias, castigos, conversão e libertação, é de caráter cíclico. Os livros dos Reis, pelo contrário, que não foram elaborados, mas sim redigidos por mão deuteronomista, apresentam o desenrolar dos acontecimentos dentro de uma linha que aponta diretamente para baixo, para a ruína. Os livros de Samuel, por sua vez, revelam apenas um mínimo de influência deuteronomista. Os métodos de trabalho e de reflexão são tão diversos, de parte a parte, que não se podem atribuir esses livros a um só autor ou redator.
3. O processo de formação dos livros históricos Nossa exposição em § 30-33 adota em substância a hipótese do Hexateuco, mencionada em c). Em linhas gerais, o processo de formação dos livros históricos apresenta as seguintes fases: a) Da junção paulatina dos "estratos fontes" JNE surgiu um Heptateuco primitivo que abrangia as partes das camadas que entram tanto em Gênesis-Números, como no final do Deuteronômio, no livro de [osué e no começo do livro dos Juizes. b) Logo a seguir juntou-se D a esse Hexateuco, e imediatamente depois foi elaborado o livro de [osué, numa linha deuteronomista, para assegurar sua ligação com o Deuteronômio. c) Posteriormente foi acrescentado P, surgindo dai o Hexateuco completo, do qual, no entanto, logo se separou o livro de [osué, por razões de ordem política. d) Na época que corresponde ao estágio b) foram elaborados os livros dos Juizes, Samuel e Reis, no que se refere ao essencial de sua forma presente. Sua redação foi feita numa linha deuteronomista. Neste ponto, devemos observar que mãos diferentes dispuseram esses livros de modos diferentes. O deslocamento da parte final do Hexateuco para o começo dos livros dos Juizes, como também o da parte final da história de Davi para o começo dos livros dos Reis são devidos a intervenções de época posterior. Em resumo podemos dizer: 1. que existiu um Hexateuco como bloco literário, embora só conservasse sua forma plena (com P) por breve espaço de tempo;
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HIPÓTESES SOBRE A EXISTÊNCIA DE OBRAS GLOBAIS
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2. que depois da separação do livro de [osué surgiu um Pentateuco como obra literária mutilada, tornando-se esse Pentateuco a base da comunidade judaica desde o tempo de Esdras; 3. que não existiu um Tetrateuco, nem um Heptateuco, nem um Octateuco, nem um Eneateuco; 4. que não existiu uma história deuteronomista como obra literária completa e homogênea, mas sim os livros de Deuteronômio a Reis, redigidos ou elaborados de modos diferentes; 5. que por fim, reina certo acordo quanto ao fato de que, cronologicamente falando, surgiu em último lugar uma obra histórica de moldes cronísticos, na qual tradicionalmente se incluem os livros das Crônicas, de Esdras e de Neemias.
CAPÍTULO
III
OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (OS PRIMEIROS PROFETAS) § 30. O LIVRO DE JOSUÉ, MAIS JZ 1.1-2.5 ATD: H. W. HERTZBERG, 2i.l ed., 1959. - BOT: B. J. ALFRINK, 1952. HAT: M. NOTH, 2i.l ed., 1953. - HK: C. STEUERNAGEL, 2i.l ed., 1923. - HS: A. SCHULZ, 1924. - IB: J. BRIGHT, 1953. - KeH: A. DILLMANN, 2i.l ed., 1886. - KHO: K. HOLZINGER, 1901. - SAT: H. GRESSMANN, 2i.l ed., 1922. - SZ: S. OETILI, 1893. - Especial: L. ROUSSEL (chap. 1-12). 1955. Y. AHARONI, "The Province-List ofJudah", VT9 (1959),225-246. - W. F. ALBRIGHT, "The List of Levitic Cities", em: Ginzberg [ubilee Vol., I 1945, 49-73. - A. ALT, "Judas Gaue unter [osia", PfB 21 (1925),100-116 (= Kleine Schriften,l1 1953,276-288). - ID., "Das System der Stammesgrenzen im Buche [osua", em: Sellin-Festschrift, 1927, 13-24 (= ibid. I 1953, 193-202). - ID., "Eine galilãísche Ortsliste in [os 19", ZAW 45 (1927),59-81. - ID., "[osua", em: BZAW 66, 1936, 13-29 (= Kleine Schriften, I 1953, 176192). - ID., "Bemerkungen zu einigen [udâischen Ortslisten des Alten Testaments", Beitriige zur biblischen Landes- und Altertumskunde 68 (1951), 193-210 (= ibid. 11 1953, 289-305). - ID., "Festungen und Levitenorte im Lande [uda", em: Kleine Schriften, 11 1953, 306-315. - K. BUDDE, "Richter und [osua", ZAW 7 (1887), 93-166. - F. M. CROSS, [r, - G. E. WRIGHT, "The Boundary and Province Lists of the Kingdom of [udah", fBL 75 (1956),202-226. - o. EISSFELDT, "Die Eroberung Palãstinas durch Altisrael", WdO 2,2 (1955), 158-171. - M. HARAN, "Studies in the Account of Levitical Cities", fBL 80 (1961), 45-54, 156-165. - E. JENNI, "Zwei [ahrzehnte Forschung an den Büchern [osua bis Kõnige", ThR NF 27 (1961), 1-32, 97-146. - Z. KALLAI-KLEINMANN, "The Town Lists of [udah, Simeon, Benjamin and Dan", VT 8 (1958), 134-160. - ID., "Note on the Town List of [udah, Simeon, Benjamin and Dan", ibid. 11 (1961), 223-227. - Y. KAUFMANN, The Biblical Account of the Conquest of Palestine, 1953. - C. A. KELLER, "Über einige altestamentliche Heiligtumslegenden Il", ZA W 68 (1956), 85-97. - J. MAIER, Das altisraelitische Ladeheiligtum, 1965. - A. MALAMAT, "Traditions concerning Early Israelite History in Canaan",
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Os LIVROS DE JOSUÉ
ATÉ REIS (os PRIMEIROS PROFETAS)
em: Scripta Hierosolymitana 8, 1961, 303-334. - K. MOHLENBRINK, "Die Landnahmesagen des Buches [osua", ZAW 56 (1938),238-268. - S. MOWINCKEL, Zur Frage nach dokumentarischen Quellen in [osua 13-19, 1946. - ID., Tetrateuch-Peniaieuch-Hexaieuch, 1964. - M. Norn, "Studien zu den historisch-geographischen Dokumenten des [osuabuches", ZDPV 58 (1935), 185-255. - ID., Überlieferungsgeschichtliche Siudien, I 1943. - ID., "Überlieferungsgeschichtliches zur zweiten Hãlfte des [osuabuches", em: NOtscher-Festschrift, 1950, 152-167. - G. ScHMm, Der Landtag von Sichem, 1964. - K.-D. SCHUNCK, Benjamin, 1963. - G. E. WRIGHT, "The Literary and Historical Problems of [oshua 10 and Judges I", JNES 5 (1946), 105-114.
1. Terminologia, conteúdo, "estretos fontes"
o nome do livro foi tomado do seu personagem principaL Contra a tradição talmúdica, de que o livro foi composto pelo próprio [osué, estão o seu caráter anônimo e as mesmas observações que se fazem contra a origem mosaica do Pentateuco. O conteúdo do livro é a narração de como a promessa da possessão da terra feita aos pais se cumpriu em seus descendentes, que se tornaram numerosos. Depois de o Pentateuco falar na divisão das terras a leste do Jordão entre certas tribos israelitas, o tema é retomado em [s 13.15ss. O livro de [osué descreve principalmente a conquista e a divisão das terras a ocidente do [ordão por Israel, no período que vai desde Moisés até à morte de [osué. A conclusão deste livro é constituída pela perícope de [z 1.2-2.5, situada, mediante [z LI, depois da morte de [osué, perícope esta que foi atribuída posteriormente ao começo do livro dos Juízes, embora surja como um corpo estranho dentro do conjunto e está estreitamente ligada à primeira parte do livro de [osué. 1-12 Conquista do país situado a leste do [ordão, levada a cabo sob o comando de [osué 1 Preparativos, 2 Reconhecimento de [ericó, 3-4 Travessias do [ordão, 5 Israel em Guilgal, 6 Conquista de [ericó, 7 Furto de Acã, 8 Tomada de Hai, construção de um altar sobre o monte Ebal, 9 Estratagema dos gabaonitas, 10 Batalha nas proximidades de Gabaon; conquistas das cidades do sul, 11 Batalha junto a Merom; conquistas no norte, 12 Lista dos reis vencidos,
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1.1-2.5
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13-22 Divisão do país 13 Ordem; divisão da Transjordânia, 14-19 Divisão da Cisjordânia, 20 Cidades de asilo, 21 Cidades dos sacerdotes e levitas, 22 Construção de um altar na Transjordânia, 23-24 Dois discursos de despedida de [osué [z 1.1-2.5 Combates e conquistas incompletas. Se queremos conhecer a história da origem do livro de [osué, devemos partir da antiga constatação de que os "estratos fontes" do Pentateuco continuam até [z 2.5, precisamente ao contrário da análise simplificante de NOTH, que elimina em [s 2-6, p.ex., os versículos que se devem atribuir a E, bem como as duplicatas por ele consideradas como elaborações posteriores. As opiniões a respeito da divisão do livro de [osué divergem, evidentemente, de modo muito mais profundo, do que em relação ao Pentateuco, como no-lo mostram as análises de ElSSFELDT, HOLSCHER, MowncCKEL, SMEND e WElSER*. As razões para isto residem, em primeiro lugar, na revisão marcante dos deuteronomistas, que se interessavam de modo particular pela história da época posterior a Moisés. Em segundo lugar, residem na história da tradição de 1-11, que elaborou uma narrativa própria e bem caracterizada da terra prometida. É possível atingir o seu núcleo, mediante uma análise como aquela levada a cabo por Dus e MElR. A exposição primitivíssima e que corresponde à narrativa fundamental Gl se encontra em [z 1.1-2.5 e pertence a N. Foi substituída por G2, dentro do mesmo esquema, e executada por JE no conjunto pré-deuteronomista de [s 1-11 e em outras passagens. De P provêm sobretudo os elementos principais de 12; 13.15-21.42. A isto se acrescentam as perícopes que surgiram em sua maior parte independentemente das anteriores e devem ser incluídas na revisão deuteronomista.
2. O "estrato fonte" N A estranha notícia de Nm 32.39-42 (onde o v. 40 serve apenas de ligação com o contexto) sobre as conquistas na Transjordânia foi atribuída ao "estrato fonte" N. Não se combina com a narrativa que a cerca e que já supõe a conquista da Transjordânia por Moisés, e parte, ao invés da constatação de que os grupos mencionados se dirigiam da Cisjordânia para a conquista de seus territórios. Outras perícopes breves, de semelhante natureza, que se destacam do contexto pelo estilo, pela matéria tratada e
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OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (os PRIMEIROS PROFETAS)
pela maneira arcaica, ética e religiosamente falando, de julgar as pessoas, encontram-se no livro de [osué, quais sejam: 11.13, sobre o norte da Palestina; 15.13-19, sobre o sul; 15.63, sobre a sobrevivência dos jebuseus em Jerusalém; 16.10, sobre a não-conquista de Gazer; 17.11-13, sobre a planície de [ezrael: e 19.47, sobre a transmigração dos danitas. A narrativa anedótica de 17.14-18 sobre a partilha de Galaad pertence a esse contexto. Todas essas perícopes se acham desde o começo fora de seus devidos lugares. Sua fonte é, antes, constituída por [z 1, onde se encontram partes de um complexo mais amplo. Js 15.13-19 15.63 16.10 17.11-13 19.47
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Jz 1.10-15 1.21 1.29 1.27s 1.34s
É desse contexto original que foram tomadas as perícopes isoladas e que se acham disseminadas através do livro de [osué, onde se encontram localizadas uma segunda vez. Isto deve ter acontecido conseqüentemente depois que [z 1.2-2.5 foi separado do Hexateuco e colocado no começo do livro dos Juízes. Já WELLHAUSEN havia reconhecido em Jz 1, ao qual pertence o núcleo de 2.1-5, a narrativa da conquista da terra e como paralelo da narrativa principal do livro de [osué. MEYER1 fundamentou com mais precisão estas considerações e atribuiu o relato a J. BUDDE corrigiu essa teoria no sentido de que o relato começa com a conquista de [ericó, enquanto SMEND o atribui ao "estrato fonte" P (N). Recentemente MOWINCKEL fez sua essa opinião, ainda que, em princípio, com uma divisão diferente, e rejeitou as teses segundo as quais [z 1 constitui um documento autônomo com relação às fontes do Pentateuco ou uma lista das reivindicações territoriais das tribos, ou ainda um conglomerado de fragmentos de tradições (NoTH). De fato, a perícope em questão é uma narrativa forçada, contendo pequenos episódios o mais das vezes de cunho etiológico. Tem uma certa semelhança com as inscrições régias do Antigo Oriente, seja na maneira sucinta e esquemática de enumerar os fatos e acontecimentos históricos, seja na apresentação anedótica ocasional e mais ampla dos acontecimentos individuais. Mesmo acrescentando-se Nm 32.39-42, que lhe pertence, o relato 1
E.
MEYER,
"Kritik der Berichte uber die Eroberung Palastinas", ZAW 1 (1881), 135.
§ 30. O
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1.1-2.5
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não está completo, mas representa um fragmento extraído de um contexto mais amplo. Depois de sua situação inicial, os israelitas se encontram no vale do [ordão ainda em vida de [osué e daí eles "sobem", divididos por tribos, para a conquista da Transjordânia e Cisjordânia. Tem-se, deste modo, uma visão panorâmica das regiões ocupadas pelas tribos, com menção expressa daquelas cidades que não puderam ser tomadas. O autor não descreve uma história do processo de conquista do país, mas dá uma visão global, sob a forma de narrativa, da ocupação da terra prometida. O relato não segue a ordem cronológica, mas a ordem geográfica, isto, porém, não a modo de um mapa, e sim de acordo com a situação histórica pressuposta. A narrativa começa com a incursão às montanhas de Efraim, às quais se chegava melhor partindo-se do vale do [ordão, e a seguir dá a volta para o sul e logo depois se dirige para o centro e para o norte da Palestina. Nesta descrição, a conquista do país é apresentada como tendo-se desenvolvido do sul para o norte. É este o esquema que está na base também das narrativas de JE e constitui como que o elo de ligação entre a narrativa fundamental mais breve G' e a narrativa fundamental mais pormenorizada G2. O interesse positivo se volta particularmente para as tribos do sul, porquanto também [udá deve ter sido a primeira tribo que deu início à marcha da conquista. Isso talvez nos lembre a região judaíta na qual o "estrato fonte" N surgiu. Que a exposição suponha os fatos ocorridos na época de Davi e Salomão (sujeição e escravização dos cananeus), e que também a obra tenha sido escrita muito tempo depois de Salomão (MOWINCKEL), tudo isto se acha em consonância com aquilo que se deduz da análise do Pentateuco. O "estrato fonte" N descreve a conquista da Palestina não como um processo completo, concluído sob a chefia de [osué, mas como uma série de expedições separadas, só parcialmente bem sucedidas e levadas a efeito pelas tribos isoladas ou por grupos de tribos. Esse "estrato fonte" se aproxima, assim, muito mais da situação histórica concreta, do que os "estratos fontes" mais antigos.
3. O "estrato Ionte" G2 A narrativa de J e E sobre a conquista do país está baseada sobre G2. Embora a versão em pauta tenha G' como ponto de partida, contudo, foi ordenada através de uma série de narrativas originárias autônomas. A ligação com G' se faz primeiramente por meio de 14.6-15 (E), que
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consiste em uma reformulação lendária e edificante de 15.13-19 (N). Ademais, MOWINCKEL chamou a atenção, e com razão, para a circunstância de que a exposição em estudo (que ele chama de história deuteronomista, o "compilador" de Norn) segue o esquema geográfico de GI (N), e que a Palestina foi conquistada em três batalhas: primeiramente a Palestina central; a seguir, a Palestina meridional; e por último, a Palestina setentrional. Embora isto nos mostre a continuidade entre GI e G2, contudo a última versão introduziu dois grupos de narrativas. Deste modo, a apresentação de um quadro global dos resultados da conquista do país, distribuídos em ordem geográfica, converte-se em uma seqüência cronológica de acontecimentos históricos. a) Trata-se fundamentalmente de sagas etiológicas, onde a figura de [osué faltava originariamente. Eram sagas isoladas, talvez em parte oriundas de Canaã, e que pretendiam derivar uma determinada situação individual dos acontecimentos do passado a saber: 2
juntamente com a conclusão de 6: tolerância, em território israelita, do clã de Raab de [ericó, ligado talvez à prostituição sagrada à sombra de algum santuário cananeu-. 3.1-5.1: o círculo de pedras colocadas no monte Guilgal, e, em segunda fase, as doze pedras lançadas no [ordão, fatos estes ligados à travessia do [ordão que é descrita a modo de procissão, segundo o modelo da libertação junto ao "Mar dos caniços" (Mar Vermelho)". 5.2-9: o topônimo "Monte do prepúcio" que designa o sítio onde antigamente a comunidade local executava o antigo rito da circuncisão. 5.13-15: a santidade de um local não mencionado e que deve ser procurado nas proximidades de [ericó e Guilgal (lenda dos san-
tua-rios)". F. M. ABEL, "L'anathême de [éricho et la maison de Rahab", RB 57 (1950), 321330. - G. HÓLSCHER, "Zum Ursprung der Rahabsage", ZAW 38 (1919/1920),5457. - J. A. SOGGIN, "Giosué 2 alla luce di un testo di Mari", RSO 39 (1964), 7-14. 3 B. J. ALFRINK, "De litteraire compositie van [s 3 en 4", StC 18 (1942), 185-202. - J. Dus, "Die Analyse zweier Ladeerzãhlungen des Josuabuches (Js 3-4 und 6)", ZA W 72 (1960), 107-134. - H.-J. KRAUS, "Gilgal - ein Beitrag zur Kultusgeschichte Israels", VT 1 (1951),181-199. P.-P. SAYOON, "The Crossing of the Jordan; [os chaps. 3 and 4", CBQ 12 (1950), 194-207. 4 A. GEORGE, "Les récites de Gilgal en [osué 5.2-15", em: Mémorial Chaine, 1950, 169-186.
2
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6:
a colina da cidade de [ericó, entendida como local de maldição (conquistado por meio de um círculo de demarcação mágica), talvez ainda antes dos israelitas, principalmente porque até agora nãb foi comprovado que a cidade tenha sido conquistada durante a tomada do país pelos israelitas. 7: grande amontoado de pedras no vale de Acor, perto de [ericó, para cuja explicação cita-se o nome de Acan (mais precisamente: Acã). 8.1-29: a colina das ruínas de Hai, com um amontoado de pedras no local da porta da cidade, onde as escavações arqueológicas mostraram que a última conquista teve lugar muitos séculos antes da tomada do pais pelos israelitas. 9: relações contratuais entre Gabaon, juntamente com as localidades próximas, e seus circunvizinhos israelitas".
A metade dessas sagas etiológicas tinham sua pátria de origem no santuário de GuilgaL Os pontos de aglutinação das outras sagas talvez se situassem ao longo do caminho por onde passavam os peregrinos que desciam das montanhas em direção ao santuário de GuilgaL Por isso parece-nos provável que as sagas foram reunidas nesse santuário, resultando daí uma coroa de sagas. É preciso considerar que as sagas de 2 + 3,1-55,1 + 6 formam também um conjunto completo, ao qual outras sagas se ligaram frouxamente. Como Guilgal estava no território de Benjamim, e Benjamim pertencia ao grupo de tribos da Palestina central, e como [osué era originário desse grupo, é de todo compreensível que sua figura tenha sido introduzida nas sagas. Graças à pessoa de [osué, as sagas etiológicas se transformaram em narrativas da conquista do país pelo grupo de tribos da Palestina central, e, em decorrência de seu significado político e militar, logo se tornaram patrimônio comum de todo o IsraeL b) A razão de a figura de [osué ter sido introduzida nas sagas etiológicas deve ser procurada nas sagas heróicas, vinculadas às anteriores: A perícope 11.1-9, sobre a batalha das águas de Merom, originariamente vinculada às localidades da Palestina setentrional, é oriunda dessa região; a perícope 10.1-11,15, juntamente com os fragmentos de um cântico 00.1214) sobre a batalha travada entre Gabaon e Ajalon, é inseparável da figura
5
J. M. GRINTZ, "The Treaty with the Gibeonites", Zion 26 (1961), 69-84. - F. CH. FENSHAM, "The Treaty between Israel and the Gibeonites", BA 27 (1964), 96-100. - M. HARAN, "The Gibeonites, The Nethinim and the Sons of Salomon's Servants", VT 11 (1961), 159-169. - J. LIVER, "The Literary History of [oshua IX", JSS 8 (1963), 227-243.
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de [osué e o descreve como um belicoso chefe de tribos. Também as observações da perícope 17.14-18, que se deve, antes, atribuir a N (O) e segundo a qual os grupos de tribos da Palestina central se voltam para [osué, a fim de ampliar os limites de sua possessão, parece supô-lo como chefe de tribos e como guerreiro. O capo 24 parece conter um núcleo de sagas. Na sua forma atual, a narrativa é deuteronomista, como bem o viu a crítica mais antiga e como MOWINCKEL de novo o acentuou. Esse capítulo tem como base de sua redação uma fonte mais antiga, e esta, como as outras sagas, supõe um Israel unido como povo sob o comando unitário de [osué. Em sua forma mais antiga, essa fonte remonta a uma narrativa das tribos, a qual deixa entrever um pano de fundo histórico com a figura de [osué: não se trata de uma festa da Aliança, celebrada regularmente em Siquém, mas do pacto concluído por [osué uma única vez com Javé, em cujo nome ele conquistou suas vitórias. Esta é a razão final para a introdução da figura de [osué nas sagas etiológicas e para a origem da história da conquista do país apresentada por G2.
4. Os "estratos fontes" J e E Em virtude da base fundamental G2, os dois "estratos fontes" J e E apresentavam, com abundância de paralelismos, o seguinte quadro narrativo - com exclusão das frases introdutórias 1.1s,10s de E: 2 3.1-5.1 6
7 8.1-29 9 10.1-5 11.1-9 18.2-10
Reconhecimento de [ericó, Travessia do Jordão, Tomada de [ericó, Derrota diante de Hai (furto de Acã), Tomada de Hai, Pacto com os gabaonitas, Batalha travada entre Gabaon e Ajalon, Batalha junto às águas de Merom, Distribuição de terras entre sete tribos (em prosseguimento da divisão da Transjordânia, omitindo-se a entrega das par tes que tocam a [udá e José).
Neste ponto, devemos observar que certos membros isolados dos versículos, certos versículos inteiros ou grupos de versículos em 2-6 e 811 pertencem às elaborações deuteronomistas ou a P. Indicá-los-emos, enquanto possível, nos números 5 e 6.
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Todas as narrativas apresentam numerosas duplicatas que nos permitem, evidentemente, deduzir a existência de dois fios narrativos. Torna-se difícil uma divisão detalhada, pelo fato de que a exposição foi bastante retocada depois da combinação de J com E. Além dessas duplicatas, os estratos contêm elementos que só foram utilizados uma vez: J
5.2-9
Circuncisão em Guilgal (Os vv. 4-7 foram revistos em sentido deuteronomista), 5.13-15 Aparecimento do chefe do exército de Javé, 19.51b; 21.43-45 Nota final (21,44 foi revisto em sentido deuteronomista).
Foi excluída uma observação a respeito da morte de [osué.
E
14.6-15 Entrega de Hebron a Caleb, 24.1-27* Discurso de despedida de [osué (revisto em sentido deuteronomista). 24.28-30 Morte de [osué, 24.32 Sepultamento dos ossos de José, Morte de Eleazar. 24.33
Fundamentalmente, e em vinculação com a tradição já solidamente estabelecida, os "estratos fontes" apresentam as mesmas concepções a respeito do processo de conquista do país. Depois do reconhecimento de [ericó, depois da travessia do [ordão e da tomada de [ericó, todo o Israel se dirige unido, sob o comando de [osué, para a Palestina central e a conquista na batalha de Hai, depois de uma tentativa inicial infrutífera. A seguir [osué vence os cananeus do sul e do norte em duas outras batalhas, enquanto o território em volta de Gabaon se submete voluntariamente, mediante a celebração de um pacto. A divisão da Transjordânia já se fizera havia bastante tempo (Nm 32.1-38), por isso [osué não precisava senão dividir a Cisjordânia. Depois de [udá e José haverem recebido sua parte, segundo um relato que foi omitido, o restante do país é sorteado entre as sete tribos restantes. Depois disto, não se fala mais de outros combates nem da conquista deixada incompleta. Pelo contrário, J explica que [osué distribuiu aos israelitas toda a terra onde eles se estabeleceram, cumprindo-se assim todas as promessas divinas. O "estrato fonte" E documenta a posse definitiva do país, citando as sepulturas onde jazem José, [osué e Eleazar.
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5. Redação deuteronomista
o livro primitivo de [osué, composto a partir de JNE, sofreu duas revisões deuteronomistas sucessivas, nas quais não se consegue distinguir as partes que cabem a cada uma delas. Observa-se que existe uma diferença, partindo-se do fato de que se encontram perícopes deuteronomistas inteiras, ao lado de frases isoladas ou pequenos fragmentos. Em segundo lugar, deduz-se que tal diferença existe, partindo-se da circunstância de que se acrescentaram ao fragmento deuteronomista 1.7-8 também outras anotações que provêm do Deuteronômio (1.3-6,9,12-18)6. Entre as revisões deuteronomistas se incluem de modo particular as seguintes passagens: 1.3-9 1.12-18 8.30-35 10.16-43 11.10-20 22.1-8 23 24* (E)
Ordem de Javé para atravessar o [ordão, As tribos transjordanianas se comprometem a obedecer, Construção de um altar no monte Ebal (cf. 21.2), Reis vencidos e cidades conquistadas no sul, Cidades conquistadas no norte; visão retrospectiva da conquista do país, Despedida das tribos transjordanianas, Discurso de despedida de [osué, Versão deuteronomista do discurso de despedida de [osué de acordo com F.
Nesse ponto, [z 2.6-10 se liga a [s 23 para formar uma introdução ao livro dos Juízes, elaborado numa linha deuteronomista e que ainda existia sem a narrativa da conquista da terra segundo NOz 1-2.5).
Além das perícopes mencionadas encontram-se também, no texto, pequenas observações que provêm das elaborações deuteronomistas, como, p.ex.: 2.lOs; 5.4-7; 8.1a,2a,13a; 9.27b; 10.1*,3*,5*; 11.1 *,8*,21-23; 21.44. Essas observações, em geral, não tocam na substância das narrativas mais antigas. Os autores deuteronomistas nada encontraram a objetar contra a descrição pré-existente tanto da conquista rápida e completa do país, levada a cabo sob o impulso dos milagres divinos, como do aniquilamento dos cananeus. N. LOHFINK, "Die deuteronomistische Darstellung des Übergangs der Führung Israels von Moses auf [osue", Scholastik 37 (1962). 32-44. 7 CH. H. GIBLIN, "Structrural Patterns in Js 24.1-25", CBQ 26 (1964), 50-69; J. L'HauR, "L'Alliance de Sichem", RB 69 (1962),5-36; 161-184;350-368.
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A julgar pelas revisões deuteronomistas, o livro de Josué constava, portanto, das seguintes passagens: 1-11 (com exclusão de algumas observações e perícopes posteriores); 14.6-15; 8.2-10; 19.51b; 21.43-45; 22.1-8; 23-24; [z 1.1-2.5.
6. O "estrato fonte" P Não se pode decidir com certeza se o "estrato fonte" P está representado na primeira parte do livro. Deve-se, contudo, admitir que P continha uma narrativa, ainda que breve e sumária, da conquista da terra prometida, e não se contentava apenas com as listas dos caps. 12ss. Embora a entrega da lei no Sinai constitua o quarto e último estágio da história da revelação, todavia, deve ter contido a narração da tomada do país, onde se pôde concretizar uma vida de acordo com as determinações divinas. De fato, Nm 13.2; 20.12; 22.1; 27.12-23 e as instruções sobre o sorteio das terras, sobre as cidades dos levitas e de refúgio (Nm 34s), sugerem a posse futura da terra. Tudo isso não está suspenso no ar, nem foi construído posteriormente a partir de eventuais acréscimos ao livro de [osué e inserido no livro do Pentateuco. No livro de [osué podem-se encontrar vestígios de P em algumas narrativas, contendo três espécies de temas, a saber: na narrativa da travessia do [ordão (3-4), pois a colocação das doze pedras ocorre também no meio do [ordão (4.9), além do lugar do repouso (4.8) ou em Guilgal (4.20); na narrativa da tomada de [ericó (6), que, além dos dois fios narrativos contendo as ordens de salvar Raab (6.17,22), apresenta também um terceiro fio narrativo, onde esta mulher não vem mencionada e segundo o qual a conquista do país foi realizada de fato, e descreve a travessia do [ordão, à maneira de uma procissão sacerdotal; e por fim, nas passagens 9.15b,17-21, características de P. O relato da partilha do país segundo P se encontra em 12; 13.15ss; 14-19*; 21.1ss; 22.9ss. O elenco dos reis vencidos por Israel (12) ainda não faz parte, certamente, do livro deuteronomista de [osué, porque enumera reis e Estados que não foram mencionados e contém uma conceituação da conquista do país que não corresponde à descrição de 1-11, ou seja, que a Palestina era dominada por trinta reis que [osué derrotou na ordem em que vêm enumerados. É esta a "erudita" história da conquista de P. A partilha do país começa com a Transjordânia (13.15-33; JNE já em Nm 32), à qual se segue a da Cisjordânia (na parte principal de 14-19, sem
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as notícias de [z 1 e as perícopes 14.6-15; 18.2-10; 19.51b, pertencentes a JE). Imediatamente se seguem a fixação das cidades de refúgio e dos levitas (20 e 21.1-42), como execução das determinações de Nm 358• NOTH toma o mesmo caminho de ALT, admitindo a existência de três listas como fundamento dos caps. 13-19; 21, que ele exclui de P e considera como tendo sido inseridos por um revisor posterior da história deuteronomista, cuja existência ele afirma. Essas três listas seriam: 1) para o capo 15, uma relação de lugares pertencentes ao país de [udá, segundo a divisão em doze distritos administrativos por ele proposta, e que teria sido feita na época do rei [osias, ao passo que KALLAI-KLEINMANN pensa na época de Ezequias; 2) para o capo 19, um "sistema de fronteiras entre as tribos", contendo a enumeração dos pontos fixos dos limites territoriais de cada uma das tribos na época dos Juízes; 3) para o capo 21, uma lista das cidades dos levitas, que refletiria a centralização do culto e seria originária do tempo de Josias (ALT) ou de época mais recente (NOTH), enquanto ALBRIGHT a coloca no reinado de Davi. Contra essa teoria, MOWINCKEL levantou sérias objeções com as quais concordamos em essência. a) Sem dúvida que as informações sobre [udá correspondem à época de sua maior extensão, ao passo que só se põe em questão a situação histórica sob o reinado de Josias. Se algum dia existiu uma lista oficial neste sentido, ela se achava guardada no arquivo do templo e foi destruída, com todo o acervo deste, por ocasião da tomada de Jerusalém pelos babilônios. As informações de [s 15 só podem basear-se em uma recordação idealizada do período áureo do governo de Josias. b) As informações relativas aos limites das tribos são uma construção teórica e não provêm absolutamente da época dos Juízes, como MOWINCKEL o demonstrou exaustivamente. Essa construção teórica é proposta tambémem Ez 48. c) As informações sobre as cidades dos levitas são igualmente pura teoria. Também HARAN concorda a respeito da presença de elementos teóricos. O número de quarenta e oito cidades foi deduzido esquematicamente, partindo-se do princípio de que em cada um dos territórios das doze tribos devia haver quatro cidades, ao passo que a perspectiva pósexílica do autor se infere da ausência de preocupação com o norte, que 8
M. DAVID, "Die Bestimmungen über die Asylstãdte in [s 20", OT5 9, 1951,30-48. SIMONS, "The Structure and Interpretation of [osh XVI-XVII", Orientalia Neerlandica, 1948, 190-215.
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desde longo tempo se havia separado de [udá, Devemos concordar com NOTH em que a referida teoria surgiu muitíssimo depois. A conclusão de P é constituída pela perícope 22.9-34, sobre a despedida das tribos da Transjordânia que tomaram parte na conquista da Cisjordânia, e a respeito do altar que elas erigiram à beira do [ordão. A exortação que aí se lê contra os cultos e contra os lugares ilegítimos do culto constitui uma palavra-chave, característica de P. P se distingue das outras composições mais antigas pelo fato de conter menos elementos narrativos sobre a conquista incompleta (N) ou completa (JE) do país, do que sobre a sua divisão, e vir acrescida da descrição dos limites dos territórios individuais das tribos e de um elenco das cidades a que já nos referimos. Ela nos oferece, portanto, uma história da tomada de posse da Palestina, que é menos uma narrativa do que uma enumeração e uma "literatura erudita" (MOWINCKEL). Em correspondência, porém, com o seu escopo, o plano de partilha do país é, como em Ez 48, um programa para o futuro, tal como se esperava na diáspora da Babilônia.
7. Separação do Pentateuco
o processo de formação do livro de [osué é semelhante ao do Pentateuco, não contando com a revisão deuteronomista mais acentuada. Da combinação dos "estratos fontes" de todos os seis livros atuais surgiu, ao longo do tempo, primeiramente um Hexateuco. Contudo, em breve se rompeu a ligação entre a parte correspondente a [osué e o Pentateuco. O corte se fez no final do relato sobre a morte de Moisés, o mediador da Lei. Do livro de [osué, tornado assim autônomo, destacou-se, por sua vez, uma parte, para que o livro pudesse terminar com o relato sobre a morte de [osué. A parte separada foi colocada no começo do livro dos Juízes. Posteriormente, foram inseridas no livro de [osué as passagens 5.10-12 e 13.1-14, além das notícias provenientes de [z 1. A separação do livro de [osué do Pentateuco se fez depois que já se havia utilizado P, e é colocada, talvez com razão, em relação com a reforma de Esdras. A aprovação da Lei pelo rei dos persas como base da comunidade exigia que se renunciasse ao programa, politicamente inadmissível, da conquista do país, proposto por P. A mencionada separação se deu, o mais tardar, por ocasião da incumbência recebida por Esdras, provavelmente em cerca do ano 400 a.c.
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§ 31. O LIVRO DOS JUÍZES ATD: H. W. HERTZBERG, 2a ed., 1959. - BOT: J. DE FRAINE, 1956.EH: V. ZAPLETAL. 1923. - HK: W. NOWACK. 1902. - HS: A. SCHULZ, 1926. - IB: J. M. MYERS, 1953. - ICC: G. F. MOORE, 2a ed., 1898 (1949). - KeH: E. BERTHEAU, 2a ed., 1883. - KHC: K. BUOOE, - SAT: H. GRESSMANN, 2a ed., 1922. - SZ: S. OETTLI, 1893. - Especial: CH. F. BURNEY, 2a ed., 1920. L. ALONSO-SCHÓKEL, "Erzãhlkunst im Buche der Riehter", Bibl 42 (1961), 143-172. - E. AUERBACH, "Untersuchungen zum Richterbuch", ZAW 48 (1903), 286-295; 51 (1933),47-51. - W. BÓHME, "Die âlteste Darstellung in Rieht 6.11-24 und 13.2-24 und ihre Verwandtschaft mit der Jahveurkunde des Pentateuch", ZAW 5 (1885), 251-274. - K. BUOOE, Die Bücher Richterund Samuel, 1890. - F. DORNESEIFF, "Das Buch Riehter", AFO 14 (1941/44), 319-328 (= Kleine Schriften, I, 2 a ed., 1959,340-363). - O. EISSFELDT, Die Quellen des Richterbuches, 1925. - G. HÓLSCHER, Geschichtsschreibung in Israel, 1952. - E. JENNI, "Vom Zeugnis des Richterbuches", ThZ 12 (1956), 257-274. - lo., "Zwei Jahrzehnte Forschung an den Büchern [osua bis Kõnige", ThR NF 27 (1961),1-32,97-146. - R. KrTTEL, "Die pentateuchischen Urkunden in den Büchern Richter und Samuel", ThStKr 65 (1892), 44-71. - E. C. B. MACLAURIN, The Hebrew Theocracy in the Tenth to the Sixth Centuries B. C. An Analysis of the Books of Judges, Samuel and Kings, 1959. - M. NOTH. Überlieferungsgeschichtliche Studien, I 1943. - W. RrCHTER, Traditionsgeschichtliche Untersuchungen zum Richterbuch, 1963. - E. ROBERTSON, "The Period of the Judges", BJRL 30 (1946),91-114. - K. D. ScHUNCK, Benjamin, 1963. - C. A. SIMPSON, Composition of the Book of [udges, 1957. - R. SMEND, JE in den geschichtlichen Büchern des AT, ed. por H. HOLZINGER, ZAW 39 (1921), 181-217. - B. STAOE, "Zur Entstehungsgeschichte des vordeuteronomischen Richterbuches", ZAW 1 (1881),339-343. - E. TAUBLER, Biblische Studien I: Die Epoche der Richter, ed. por H.-J. ZOBEL, 1958. - W. VOLLBORN, "Die Chronologie des Riehterbuches", em: Baumgãrtel-Feetschriit, 1959, 192-196. - K. WIESE, Zur Literarkritik des Buches der Richter, 1926. - H. WINCKLER, "Der Bericht über die ehud-sage", em: Alttestamentliche Untersuchungen, 1892. ID., "Quellenzusammensetzungen der Cideonerzãhlungen", em: Altorientalische Forschungen I, 1893. - A. H. VAN ZYL, "The Relationship of Israelite Tribes to the Indigenous Population of Canaan according to the Book of Judges", em: Ou TWP 1959,51-60. - lo., "The Message Formula in the Book of Judges", ibid. 61-64.
1. Terminologia e conteúdo
o nome deste livro se refere àqueles homens em torno dos quais giram as narrativas, embora se acrescentem, no começo e no fim das mesmas, determinadas outras narrativas que servem para preencher o espaço de
§ 31. O
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tempo situado entre a morte de [osué e o aparecimento de SamueL O livro dos Juízes é anônimo. Contra a tradição talmúdica que atribui sua autoria a Samuel, está a circunstância do processo paulatino de formação da obra, que se pode acompanhar desde as narrativas originais isoladas, passando por uma primeira composição, até à revisão deuteronomista e aos acréscimos posteriores. De acordo com o seu conteúdo, o livro se divide em quatro grandes partes distintas. Destas, a primeira: 1.1-2.5, já foi estudada no § 30,2, como narrativa da conquista da terra prometida, na versão do "estrato fonte" N do Hexateuco, por isto aqui a deixaremos de lado. 1.1-2.5 2.6-3.6
3.7-16.31
17-21
Proêmio: conquista inacabada do pais. Introdução 2.6-10 Ligação com o livro de [osué, 2.11-3.6 Características da época dos Juizes, Narrativas sobre os Juizes 3.7-11 OtonieI, do território meridional de [udá, 3.12-30 Aod, da tribo de Benjamim, Samgar, de Bet-Anat na Galiléia (1.33?), 3.31 4-5 Débora, da tribo de Efraim, e Barac, da tribo de Neftali, 6-8 Gedeão, da tribo de Manassés, 9 Abimelec, de Siquém, 10.1-2 Tola, de Samir, 10.3-5 Jair, em Galaad, 10.6-12.7 Jefté, de Galaad, 12.8-10 Abesã, em Belém, 12.11-12 Elon, em Aialon, 12.13-15 Abdon, em Faraton, 13-16 Sansão, da tribo de Dan. Apêndices 17-18 Fundação do santuário de Dan, 19-21 Crime abominável cometido pelos benjaminítas de Gabaá e sua punição.
2. Os "[uizes" Por causa do tamanho diferente das narrativas dos Juízes, tornaramse comuns duas designações para os "Juízes". Chamam-se "Juízes maiores" os protagonistas das narrativas mais extensas, ou sejam: Otoniel, Aod, Débora (e Barac), Gedeão (e Abimelec), Jefté Sansão. Os Juízes contemplados apenas com breves notícias são chamados de "Juízes menores": Samgar, Tola, Jair, Abesã, Elon e Abdon. No quadro da exposição todos I
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eles aparecem como empenhados em favor do povo inteiro, como regentes de Israel e como precursores dos reis. Que esta concepção não seja de todo exata é o que nos mostrarão as próprias narrativas. Como no Hexateuco, trata-se de figuras ou de acontecimentos que surgiram ou se verificaram em uma determinada pequena porção de Israel, mas colocados em relação com todo o povo. Mais precisamente: podemos distinguir duas espécies de personagens cuja caracterização se compendia na expressão hebraica "juízes", aqueles queadministram ajustiça, auxilíadores. A primeira compreende aqueles que podem ter sido chefes guerreiros de certas tribos, heróis tribais ou figuras isoladas que muito mal se conhecem: Otoniel Aod Samgar Débora
Gedeão Abimelec
[efté Sansão
o segundo grupo, que vem acompanhado das informações sobre a duração da judicatura, sobre as relações familiares e sobre a sua sepultura, compreende evidentemente um tipo diferente". Pretendeu-se ver nesse tipo a autoridade anfictiônica central de um "Juiz de Israel", empenhado em favor da confederação de todas as tribos, uma autoridade que velava por um direito apodítico de origem "divina". Esta concepção, mesmo abstraindo-se da hipótese da anfictionia, é colocada em dúvida, porque as séries de proposições com formulação apodítica originariamente não constituíam leis propriamente ditas, mas normas de vida e de comportamento (§ 8,2). Pelo contrário: deve-se admitir que foi com o fato de eles se ocuparem com a administração da justiça, que o direito cananeu se introduziu em Israel. Foi sobretudo a pesquisa de RrcHTER que nos veio mostrar que a 9
A. ALT, Die Ursprünge des israelitischen Rechts, 1934 (= Kleine Schriften, I [1953], 278-332, especialmente 300-302). - F. CH. FENSHAM, "The Judges and Ancient Israelite Jurisprudence", OuTWP 1959, 15-22. - O. GRETHER, "Die Bezeichnung "Richter" für die charismatischen Helden der vorstaatlichen Zeit", ZAW 57 (1939), 110-121. - H. W. HERTZBERG, "Die Kleinen Richter", ThLZ 79 (1954),285-290. - H.-J. KRAUS, Die prophetische Verkündigung des Rechts in Israel, 1957. - M. NOTH, "Das Amt des 'Richters Israels"', em: Bertholet-Festschrift, 1950, 404-417. - A. VAN SELMS, "The Title 'Judge''', OuTWP 1959, 41-50. - W. VOLLBORN, "Der Richter Israels", em: Rendtorft-Festschrift, 1958,21-31. - W. RICHTER, "Zu den 'Richtern Israels"', ZAW 77 (1965), 40-72.
§ 31. O
LIVRO DOS JUÍZES
287
função do Juiz não era obviamente guerreira, mas também não compreendia apenas a praxe da judicatura; antes, esta última deve ser entendida como parte de .um poder dominativo. O esquema das notícias sobre esses "Juízes" inspirou-se na versão mais antiga de lSm 13.1 e naquela dos livros dos Reis, em lRs 11.41s etc. Os Juízes do segundo grupo não têm vinculação com determinadas tribos isoladas. Sua sucessão é de origem secundária e eles podem ter exercido o seu domínio contemporaneamente em diversas cidades ou em determinadas circunscrições do país. Por isso, eles representam a passagem da constituição tribal para a constituição citadina. Talvez a tendência a se formarem pequenas cidades-estados, que se observa desde a época dos hicsos, também se tenha feito sentir em Israel. De acordo com as informações do livro dos Juízes, entre os chefes de cidades ou de circunscrições contam-se os seguintes: Gedeão
Abesã
Tola Jair Jefté
Elon Abdon
Os dois grupos mencionados se entrecruzam nas figuras de Gedeão e de [efté. Esses dois constituem os pontos focais das narrativas dos heróis. Encontram-se ainda informações isoladas sobre eles, correspondendo ao esquema de dominação. Os dois grupos podem se compendiar na expressão hebraica: "Juízes", pois se acreditava que o carisma divino atuava, seja durante a atividade guerreira, seja no exercício da soberania. Contudo, os grupos devem ser distinguidos um do outro, para melhor se compreender as tradições do livro dos Juízes. A sua parte principal é constituída pelas narrativas sobre as figuras dos heróis. Foi dessas narrativas que surgiu o núcleo do livro dos Juízes, enquanto que as notícias sobre os chefes de cidades e de circunscrições foram acrescentadas posteriormente.
3. As tradições sobre as figuras dos heróis As tradições sobre as figuras dos heróis surgiram independentemente umas das outras e durante um tempo considerável subsistiram como anedotas autônomas no interior das respectivas tribos. Dado que circulavam várias narrativas a respeito de determinados heróis como Gedeão ou Sansão, talvez se deva admitir que desde muito cedo se formaram coroas de narrativas no seio da tradição oral, para onde confluíam vários modos
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OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (os PRIMEIROS PROFETAS)
de falar. O passo seguinte foi a relação que se estabeleceu entre os heróis, com seus feitos, e todo o Israel, relação esta que se verificou, muito provavelmente, na época de Davi e Salomão, principalmente porque "Israel" representa uma unidade política. As narrativas ou coroas. de narrativas de cada herói ainda não tinham sido unidas nesse estágio. a) A base da narrativa de Otoniel, 3.7-11 10, é e continua obscura. Enquanto 1.12-15 (N) apresenta a fundamentação de posse de seu clã em Cariat-Sefer, na perícope 3.7-11 apenas o seu nome e o de seu adversário, Cusã-Rasataim, provêm de uma tradição mais antiga que não se pode identificar, A narrativa, pelo contrário, é esquemática e puramente deuteronomista. Por isso, é com reserva que ela deve ser incluída entre as narrativas dos heróis. b) A narrativa de Aod e do assassinato de Eglon, rei de Moab, por ele perpetrado!', abrangia originariamente a perícope 3,15a~-26, à qual se acrescentou mais tarde a ampliação referente a todo o Israel (3.27-29). c) A breve nota sobre Samgar, 3.3112, no qual, em razão de 1.33, talvez se deva identificar um não-israelita, oriundo da Galiléia e cujas batalhas contra os grupos afins dos filisteus, estabelecidos à borda da planície de Jesrael se narravam, só foi acrescentada tardiamente, por causa da referência que se faz a Aod em 4.1b. d) Em 4,4a,5*,6-10,12-16 se encontra a antiga narrativa sobre a carismática (profetisa) Débora e sobre Barac. Seu adversário, Sísara, foi colocado em relação com [abin de Asor em etapa posterior, embora [s l1.10ss já mencione a ruína da cidade. Uma tradição originariamente autônoma é constituída pela anedota do crime de [ael, que matou o inimigo, violando as leis da hospitalidade. e) O cântico de Débora, transmitido no cap, 5 13, deve ter surgido provavelmente logo depois do acontecimento descrito, sendo desta forma
11
A. MALAMAT, "Cushan Rishathaim and the Decline of the Near East around 1200 B.C",JNES 13 (1954), 231-242,-E. TAUBLER, "Cushan-Rishathaim", HUCA 20 (1947), 137-142. O. GLASER, "Zm Erzãhlung von Ehud und Eglon (Ri 3.15-26)", ZDPV 55 (1932), 81s.
12
- E. G. H. KRAELING, "Difficulties in the Story of Ehud", JBL 54 (1935), 205-210. E. DANELIUS, "Shamgar ben 'Anath", JNES 22 (1963), 191-193. - F. CH. FENSHAM,
10
"Shamgar ben 'Anath", ibid. 20 (1961), 197s. - A. VAN SELMS, "[udge Shamgar", VT 14 (1964), 294-309. 13 P. R. ACKROYD, "The Composition of the Song of Deborah", VT 2 (1952), 160-162,W. F. ALBRlGHT, "The Song of Deborah in the Light of Archaeology", BASOR 62
§ 31. O LIVRO DOS JUÍZES
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um dos cânticos mais antigos de Israel que nos foram conservados (cerca de 1200 a.C). Consoante o gênero literário, trata-se de um cântico triunfal (§ 40,5). Embora não deva ser classificado como salmo, contudo não é simplesmente um cântico profano, mas um cântico religioso triunfal. Abrange um começo e uma conclusão, a modo de hino. A descrição da época de calamidade, antes da guerra de libertação, pode ser comparada à narrativa de um cântico de ação de graças. A acusação de covardia, a maldição invocada contra o aliado infiel, o escárnio dirigido ao inimigo. tudo isto tem conotações de fundo mágico-religioso. Pode-se admitir que o cântico foi executado em um santuário por ocasião de uma festa triunfal depois de uma batalha (OETTU), ou sua composição foi inspirada numa celebração do mesmo gênero (RrCHTER). À diferença de BENTZEN*, que, como. muitos outros, considera o cântico de Débora como um salmo de ação de graças, SEALE chama a atenção para a sua semelhança com os cânticos guerreiros nômades, aos quais [z 5 sobrepujou em sentimento religioso. O mesmo se aplica com relação à tese de WEISER, para o qual se trata de uma composição litúrgica destinada à celebração cultual da anfictionia, com representação dramática durante o culto. RICHTER, depois de excluídos os VV. 15.31, o classifica como um cântico de recrutamento.
f) À figura de Gedeão, propriamente chamado de Jerobaal, está ligada uma série de narrativas, de tradições etiológicas e de anedotas, bem como uma notícia". Em 7.11b,13-21 (ampliado pelos vv. 9-11a,12,22) (1936),26-31. - J. BLENKINsorr, "Ballad Style and PsaIm StyIe in the Song of Deborah", Bibl42 (1961),61-76. - G. GERLEMAN, "The Song of Deborah in the Light of Stylistics", VT 1 (1951), 168-180. - O. GRETHER, Das Deboralied, 1941. - T. PIATTI, "Una nuova interpretazione metrica, testuale, esegetiea deI Cantieo di Debora Giudiei 5.2-31", Bibl 27 (1946), 65-106, 161-209. - M. S. SEALE, "Deborahs Ode and the Aneient Arabian Qasida", JBL 81 (1962),343-347. - E. SELLIN, "Das Deboralied", em: ProckschFestschritf, 1934, 149-166. - L W. SLOTKI, "The Song of Deborah", JThSt 33 (1932). 341-354. - A. WEISER, "Das Deboralied", ZAW 71 (1959),67-97. 14 L. ALONSO-SCHOKEL, "Heros Gedeon. De genere litterario et historieitate Ide 6-8", VD 32 (1954), 3-20, 65-76. - W. BEYERLIN, "Gesehiehte und heilsgesehiehtliehe Traditionsbildung im Alten Testament" (Riehter VI-VIII), VT 13 (1963). }-25. - ST. A. COOK, "The Theophanies of Gideon and Manoah", JThSt 28 (1926/1927), 368383. - D. DAuBE, "Gideon's Few", JJS 7 (1956), 155-161. - Y. KAUFMANN, "The Gideon Stories", Tarbiz 30 (1960/1961). 139-147. - E. KUTSCH, "Gideons Berufung und Altarbau [de 6.11-24", ThLZ 81 (1956), 75-84. - A. MALAMAT, "The War of Gideon and Midian: A Military Approach", PEQ 85 (1953), 61-65. - E. NESTLE, "Das
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se encontra uma saga heróica sobre o ataque feito de surpresa contra um acampamento madianita; a perícope 8.5-9,13-21a contém uma coroa de sagas em torno dos feitos de Gedeão na Transjordânia, tendo como ponto central (ampliado pelos vv. 4,10-12) a vingança de sangue praticada por Gedeão contra dois chefes madianitas. Uma outra saga sobre a morte de mais dois chefes madianitas, contendo as etiologias dos topônímos Penhasco do Corvo [Oreb] e Lagar do Lobo [Zeb], está ligada a considerações a respeito da inimizade entre Efraim e Galaad (7.25-8.3). Acrescentem-se mais três lendas cultuais, parcialmente etiológicas, a saber: uma sobre a legitimação do altar de Ofra (6.11-24), relacionada com uma narrativa de vocação, à maneira de Ex 3.10ss; [r 1.5ss; outra sobre a destruição do altar de Baal e a passagem do culto prestado a esse deus para o culto de Javé (em Ofra?), com uma notícia etiológica sobre o nome de Jerobaal (6.25- 31aa), e a última, sobre a confecção de um efod em Ofra, (8.21b,24-27a). Na exposição também se entremearam as anedotas sobre o oráculo do orvalho (6.33s,*36-40), e sobre a escolha dos trezentos guerreiros (7.2-8). Dessas anedotas, a última serve para estender a tradição a todo o Israel. O conjunto se conclui com a notícia de 8.30-32, onde aparecem traços das notícias sobre os chefes (ampliado com o v. 31, para estabelecer a vinculação com o capo 9). g) Conservou-se a tradição sobre Abimelec, porque seu pai Jerobaal foi identificado como Gedeão. Essa tradição é constituída por uma coroa de narrativas, a primeira das quais (9,1-7,16a,19b-21,23s) trata da história do reinado de Abimelec, em Siquém", e da rebelião dos habitantes contra ele; a segunda (9.26-40) fala do ataque e da derrota de Gaal; a terceira (9.41-45) e a quarta (9.46-49) descrevem, em duas tradições paralelas, a vingança de Abimelec contra Siquém; e a última (9.50-54) trata do seu fim, provocado por uma mulher. Na história de Abimelec foi inserido o
Vlies des Gideon", ARW 12 (1909), 154-156. - W. SCHULTZ, "Das Flies des Gideon", OLZ 13 (1910), 241-251. - S. TOLKOWSKY, "Gideon's 300" (Judges VII and VIm, JPOS 5 (1925), 69-74. - V. L. TRUMPER, "The Choosing of Gideon's 300 Judges 7.5,6", ibid. 6 (1926), 108s. - C. F. WHITLEY, "The Sources of the Gideon Stories", VT 7 (1957), 157-164. 15 E. F. CAMPBELL [r., "Excavation at Shechem, 1960", BA 23 (1960), 102-110. - A. D. CROWN, "A Reinterpretation of Judges IX in the Light of its Humour", Abr-Nahrain 3 (1961/1962),90-98. - E. NIELSEN, Shechem, 1955. E. SELLIN, Wie wurde Sichem eine israelitische Stadt?, 1922.
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apólogo de [oatão" (9.8-15 § 47,6). As observações finais (9.55-57) são anteriores à revisão deuteronomista. h) A tradição sobre Jefté, introduzida por 1O.17s, contém uma grande narrativa da luta de [efté contra os amonitas (1l.1-11,29,32b-33a), bem como uma notícia sobre o final de sua judicatura (12.7), correspondente à introdução antes mencionada. Esta base foi completada por três fragmentos, a saber: pela narrativa a respeito da preocupação pela passagem através do território moabita, 11.12-28 (inserido posteriormente), e que, em seu núcleo, é independente de Nm 20s; pela lenda etiológica, destinada a explicar a existência de um costume cultual a partir do pranto da filha de [efté (11.30s,[32al34-40), e pela combinação de uma nota sobre a inimizade existente entre efraimitas e galaaditas, com a cena do "sibolet", passada entre efraimitas e galaaditas (12.1-6), combinação esta paralela a 7.25-8.3. i) A tradição sobre Sansão" consta de uma série de narrativas e anedotas isoladas e autônomas, que foram unidas frouxamente umas às outras e depois assumidas no livro dos Juízes. O primeiro grupo é constituído pelas seguintes perícopes: 13.2-25: nascimento de Sansão; 14: casamento e enigma de Sansão; 15.1-8: Sansão queima as searas dos filisteus; 15.9-19: Sansão os abate com uma queixada de jumento (parcialmente etiológica). A forma Deuteronomista da conclusão: 15.20, sucede o segundo grupo: 16.1-3: Sansão em Gaza; 16.4-22: Sansão e Dalila; 16.23-31a: fim de Sansão, com a nova fórmula conclusiva: 16.31b. Se se considera que as tradições dos Juízes são, em parte, constituídas de fragmentos isolados, e em parte são complementações de uma narrativa fundamental, tem-se a razão por que existem paralelos ou tensões eventuais. A hipótese, porém, de dois ou três fios contínuos de narrativas e principalmente da sua identificação com os "estratos fontes" do Hexateuco é bastante improvável, como de novo o confirmou a análise circunstanciada de RrCHTER. Assim no capo 4, a tradição sobre [abin só foi acrescentada de modo superficial e não pertence à antiga narrativa. Na tradição de Gedeão, a expedição contra os chefes madianitas Zebé e
E. H. MALY, "The [otham Fable - Anti-Monarchial?", CBQ 22 (1960), 299-305. - U. SIMON, "The Parable of Jotham (Judges IX, 8-15): The Parable, its application and their Narrative Framework", Tarbiz 34 (1964/1965), 1-34. 17 J. BLENKINSOPP. "Structure and Style in Judges 13-16", JBL 82 (1963), 65-76. - H. GUNKEL, "Simson", em: Reden und Aufsiitze, 1913,38-64.
16
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Salmana, por motivo de vingança de sangue, é um elemento narrativo original, ao passo que a menção de outros dois chefes madianitas se baseia apenas em um motivo etiológico. Também a narrativa fundamental de [efté, que combate contra os madianitas como um chefe de tribo chamado de volta do desterro, foi completada por uma lenda cultual e pela perícope recente de 11.12-28. KITTEL e PFEIFFER* admitem duas fontes contínuas, mas guardam reserva em relação ao Hexateuco: enquanto KITTEL concede que existe um parentesco bastante amplo com J e E, sem contudo identificar suas fontes com os mesmos, PFEIFFER tem como provável que essas fontes nada têm a ver com as fontes do Hexateuco. BUDDE, CORNILL*,EISSFELDT*, SELLIN, SIMPSON e SMEND, pelo contrário, vêem no livro dos Juizes não apenas duas ou três tradições paralelas, mas a continuação das fontes do Hexateuco. Contudo, não é possível identificar duas e muito menos três fontes. Feita a divisão entre as tradições isoladas reunidas e os complementos de uma narrativa fundamental, não resta nenhuma variante de valor.
4. O livro pré-deuteronomista dos Juízes As tradições a respeito das figuras dos heróis e que constavam de narrativas isoladas ou de coroas de narrativas foram reunidas em um livro pré-deuteronomista dos Juízes, numa época que não se pode determinar; em todo caso, isto se deu num período mais antigo: pela metade da época dos reis. Sem colocar a ênfase no nome, podemos chamá-lo de "livro dos heróis" ou "livro dos salvadores". Era constituído por uma compilação solta, onde as narrativas se seguiam sem uma vinculação externa ou interna. Caso ainda não tivessem ocorrido no decurso da tradição oral, as coroas de narrativas se formaram com a incorporação de histórias paralelas e complementares. As tradições foram reformuladas, sobretudo em sentido literário. Não se pode reconhecer uma distribuição geográfica (SELLIN-RoST*). Também os acontecimentos ainda não tinham sido colocados em relação com todo o Israel nem ainda se verificara uma nova reformulação religiosa. Talvez seja possível identificar dois estágios no processo de formação do livro dos heróis ou salvadores. De um lado, observa-se que o discurso de despedida de Samuel (1Sm 12), em seguida ao qual começa, com o título: 13.1, a indicação da idade dos reis, apresenta, no v. 11, [erobaal (verdadeiro nome de Gedeão), Jefté, Samuel e um desconhe-
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cido Bedã (não confundir com Barac) como "Juizes". Do outro lado, parece que as narrativas sobre Sansão - abstração feita dos apêndices posteriores do livro dos Juizes - foram acrescentadas à tradição em duas etapas distintas, sendo que 15m 1-6 também não pertencem à antiga tradição de Samuel. Por isso, é possível que tenha havido primeiramente uma versão do livro pré-deuteronomista dos heróis ou salvadores, que compreendia as narrativas de Jerobaal (Cedeão), Bedã e Samuel. Num segundo estágio foram recolhidas as narrativas de Jerobaal (Cedeão) e [efté, juntamente com outras narrativas sobre os libertadores, deixando-se inteiramente de lado as narrativas sobre Bedã e quase inteiramente aquelas sobre Samuel, cuja figura foi associada à tradição de Saul,
5. O livro deuteronomista dos Juízes A compilação frouxa do livro pré-deuteronomista sofreu uma revisão - talvez na época do exílio - da qual resultou o livro deuteronomista dos juizes". Mais precisamente: pode-se supor uma dupla revisão e um acréscimo posterior, executados por uma terceira mão. a) Da primeira revisão fundamental provêm as perícopes de enquadramento, colocadas em volta dos complexos Individuais e agrupando-os em um grande conjunto, mediante várias repetições. Dificilmente se pode considerar estas perícopes de enquadramento como pré-deuteronomistas (BEYERLIN). Excluída que seja a narrativa sobre Otoniel, 3.7-11, construída de modo geral segundo esse esquema, são as seguintes as perícopes de moldura: 3.12-15au,30; 4.1a,2,3a,23s+5.31b; 6.1,6b+8.27b,28,33-35*; 10.6lOa,16+ 11.33b; 13.1+15.20. A caracterização da época dos Juízes começa freqüentemente com a afirmação de que Israel apostatou de Javé, provocando assim sua ira, a qual se manifesta no fato de ele permitir que o inimigo invada o território de Israel e o oprima, como castigo. Com o grito de socorro que se levanta então, acompanhado da conversão de Israel, Javé se deixa mover à compaixão e suscita um juiz que vence o inimigo, depois do que Israel pode viver em paz até a morte do libertador. Neste esquema sucedem-se continuamente a apostasia, o castigo, a conversão e o socorro, de onde se deduz que na base do mesmo está uma concepção cíclica da história. Talvez seja dessa revisão que provêm as ampliações de 18
W. BEYERLIN, "Gattung und Herkunft des Rahmens im Richterbuch", em: WeiserFestschrift, 1963, 1-29. - W. FRANKENBERG, Die Composition des deuteronomischen Richterbuches (Richter II,6-XVI), nebst einer Kritik von Richter XVII-XXI, 1895. - E. O'DOHERTY, "The Literary Problem of Judges 1.1-3.6", CBQ 18 (1956), 1-7.
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caráter exortativo, quais sejam: 6.7-10; 1O.lOb,15, e a narrativa da recusa da realeza por parte de Gedeão: 8.22s. Com o acréscimo das indicações dos anos, as narrativas foram também enquadradas em um esquema cronológico, que ainda faltava no livro pré-deuteronomista. Esse esquema se baseia no cômputo deuteronomista dos anos que decorrem entre a saída do Egito e a construção do templo por Salomão e que somam 480 anos (1Rs 6.1). Como nem as notícias sobre os chefes de cidades nem os caps. 17-21 para não falarmos da perícope 1.1-2.5, que pertence ao Hexateuco - foram relacionados nesse esquema, eles ainda faltavam no livro deuteronomista dos Juízes. b) Um segundo autor deuteronomista acrescentou sobretudo uma introdução (2.11-19) que se distingue das perícopes de enquadramento, pelo fato de não mencionar o grito de socorro e a conversão de Israel, e apresentar a intervenção salvadora de Javé como um puro ato de sua graça. A ampliação constituída por 6.2-6a parece perseguir essa mesma idéia fundamental. É desta segunda revisão que provém igualmente o acréscimo de outras narrativas a respeito de Sansão (16), juntamente com a fórmula conclusiva: 16.31b. c) Uma terceira mão, por fim, acrescentou as perícopes 2.6-10 e 2.203.6 como moldura em torno da introdução (2.11-19), para fazer a ligação com a época de [osué e caracterizar o período dos Juízes como tempo de provação para Israel. Terminada a revisão geral dos deuteronomistas, o livro dos Juízesexcluída a perícope 1.1-2.5 - compreendia o complexo 2.6-16.31, sem as notícias a respeito dos chefes de cidades.
6. Acréscimos posteriores Na época posterior ao exílio, presumivelmente, fizeram-se três acréscimos, que até então haviam sido transmitidos de forma autônoma. Esses acréscimos não pertenciam ao livro deuteronomista dos Juízes, porque não foram contemplados no esquema cronológico. É pouco provável que tenham pertencido ao livro pré-deuteronomista dos Juízes e tenham sido excluídos dele pelos revisores deuteronomistas e posteriormente reincorporados. a) O primeiro acréscimo é constituído pelas notícias sobre os chefes de cidade ou de circunscrições (10.1-5; 12.8-15), que não provêm de uma "lista", mas se inspiraram nas notícias paralelas sobre os reis (cf. 2). Provavelmente só os nomes das pessoas e das cidades derivam de uma tradição antiga. A inclusão destas notícias foi feita para conservar
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o número de 12 "Juízes", em correspondência com o número canônico das tribos. b) O segundo acréscimo é constituído pela narrativa, originalmente autônoma, sobre a origem do santuário de Dã (caps. 17-18), onde a presença de duplicatas está a indicar uma história da tradição e um processo de revisão que se prolongaram por bastante tempo" . Sua função como acréscimo é estabelecer uma ponte entre a época anterior à monarquia, quando ainda não havia rei em Israel e cada um fazia o que lhe parecia reto a seus olhos (17.6), e o aparecimento da realeza. Antes disto, no final da época dos reis, ela sofreu uma reformulação na qual devia descrever as circunstâncias inglórias - um duplo furto - às quais o santuário de Dã devia a sua origem. Esta versão talvez tenha partido da pretensão de Jerusalém em ser considerada como o único santuário de Israel. Como narrativa original deve-se admitir uma tradição danita, onde se narrava a migração dessa tribo no interior da Palestina, tradição em que, naturalmente, não se falava, de um roubo. c) O terceiro acréscimo narra o crime horrendo cometido pelos benjaminitas de Gabaá contra a mulher de um levita e de como eles foram castigados por Israel (caps. 19-21 )20. A forma primitiva dessa narrativa surgiu igualmente na época anterior à monarquia de Israel. Ela deve ter sido menos uma tradição da confederação das tribos (Nora) do que uma história da tribo benjaminita, tendo sido depois estendida a todo o Israel, como tantas outras narrativas (EISSFELDT). Na tradição posterior ela se revestiu de um tom fortemente hostil contra a realeza de Saul, tom este oriundo de Gabaá. Por isso, essa versão deve ter surgido em [udá, domínio da dinastia davídica, e na época anterior ao exílio. Por fim, a narrativa foi ampliada posteriormente, em estilo midráxico, por um redator influenciado por P.
7. Resumo Em conclusão, o atual livro dos Juízes parece ter surgido do seguinte modo: no começo havia as narrativas autônomas dos heróis, juntamente com o cântico de Débora. Em breve, algumas delas formaram, juntamente J. A. BEWER, "The Composition of Judges, Chaps. 17,18", AJSL 29 (1912/1913), 261283. - CH. HAURET, "Aux origines du sacerdoce danite, à propos de [ud 18.30-31", em: Mélanges Robert, 1957, 105-113. - M. NOTH, "The Background ofJudges 17-18", em: Essays Muilenburg, 1962,68-85. 20 J. A. BEWER, "The Composition of Judges, Chaps. 20, 21", AJSL 30 (1913/1914), 149165. - O. ElSSFELDT, "Der geschichtliche Hintergrund der Erzãhlung von Gibeas Schandtat", em: Beer-Festschrift, 1935, 19-40
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com outras, certas coroas de narrativas e todas foram colocadas em relação com todo o povo de Israel, na época de Davi e Salomão. Da tradição oral surgiu, talvez em dois estágios, um livro dos heróis ou salvadores, redigido em estilo pré-deuteronomista e como compilação solta, que depois recebeu uma forma fixa e um contexto cronológico e temático, por obra dos revisores deuteronomistas. Depois do exílio, acrescentaram-selhe as notícias sobre os chefes de cidades e de distritos, bem como os apêndices e a conclusão do Hexateuco. A última revisão dos caps. 19-21 talvez deva situar-se no séc. V. Com ela o livro dos Juízes alcança sua forma definitiva.
8. Valor histórico e características teológicas É considerável o valor histórico do livro dos Juízes, mesmo que só se possam tirar dele informações de detalhes. Mas neste ponto ele constitui uma fonte preciosa que nos permite ver por dentro as condições políticas e religiosas da primeira fase do processo de sedentarização de Israel. Assim que começam a se consolidar em distritos e aldeias e a entrar em choque com os cananeus, as tribos israelitas devem se defender, como estes, de novos vizinhos e intrusos. Teologicamente falando, o livro é de imenso valor, porque, ao longo dos vários estágios de sua formação, oferece características para a interpretação sempre nova da tradição histórica e mostra a interpenetração da maneira de expor a história com a exegese teológica.
§ 32. OS LIVROS DE SAMUEL ATD: H. W. HERTZBERG, 2ª ed., 1960. - BOT: A. VAN OEN BORN, 1956. - COT: C. J. GOSLINGA, I, 1948. - EH: A. SCHULZ, 1919/20. - HK: W. NOWACK, 1902. - HS: H. A. LEIMBACH, 1936. - IB: G. B. CAIRO, 1953. ICe: H. P. SMITH, 1912 (1953). - KAT: W. CASPARI, 1926. - KeH: O. THENIUS-M. LOEHR, 3ª ed., 1898. - KHC: K. BUOOE, 1902. - SAT: H. GRESSMANN, 2<1 ed., 1921. - SZ: A. KLOSTERMANN, 1887. K. BUOOE, Die Bücher Richter und Samuel, 1890. - R. A. CARLSON, David thechosen King, 1964.- W. CASPARI, "Literarische Art und historicher Wert von II Sam 15-20", ThStKr 82 (1909), 317-348. - C. H. CORNILL, "Ein elohistischer Bericht über die Entstehung des israelitischen Kõnigthums in I Samuelis 1-15 aufgezeigt", ZKWL 6 (1885), 113-141. lo., "Zur Quel1enkritik der Bücher Samuelis", em: Kônigsberger Studien, I 1187,25-89. - lo., "Noch einmal Sauls Kõnigswahl und Verwerfung", ZA W 10 (1890),96-109. - O. EISSFELDT, DieKomposition derSamuelisbücher, 1931. - C. J. GOSLINGA, "De paral1ele teksten in de boeken Samuel en
§ 32.
OS LIVROS DE SAMUEL
297
Kronieken", GThT 61 (1961), 108-116. - G. HOLSCHER, Geschichtsschreibung in Israel, 1952. - I. HYLANDER, Der Literarische Samuel-Saul-Komplex (1Sm 1-15), 1932. - E. JENNI, "Zwei [ahrzehnte Forschung an den Büchern [osua bis Kõníge", ThR NF 27 (1961), 1-32,97-146. - R. KITTEL, "Die pentateuchischen Urkunden in den Büchern Richter und Samuel", ThStKr 65 (1892),44-71. - TH. KLAEHN, Die sprachliche Verwandtschaft der Quelle K der Samuelisbücher mit derQuelle J des Heptateuch, Diss. Rostock, 1914. - E. C. B. MAcLAURIN, The Hebrew Theocracy in the tenth to the sixth centuries B. c., 1959. - J. MAIER, Dasaltisraelitische Ladeheiligtum, 1965.F. MILDENBERGER, Die vordeuteronomische Saul-Davidüberlieferung, Diss. Tübingen, 1962. - M. NOTH, Überlieferungsgeschtliche Studien, I 1943. H-V. NÜBEL, Davids Aufstiegin der Frühe israelitischer Geschichtsschreibung, Diss. Bonn, 1959.- R. H PFEIFFER, "Midrash in the Books of Samuel", em: Quantulacumque Lake, 1937,303-316. - O. PLOGER, DieProphetengeschichten der Samuei- und Konigsbücher, Diss. Greifswald, 1937. - R. PRESS, "Der Prophet Sarnuel", ZAW 56 (1938), 177-225. - L. ROST, Die Überlieferung von der Thronnachfolge Davids, 1926. - K. D. SCHUNCK, Benjamin, 1963.R. SMEND, JE in dengeschichtlichen Büchern desAT, ed. por H. HOLZINGER, ZAW 39 (1921), 181-217. - H. TIKTIN, Kritische Untersuchungen zu den Büchern Samuelis, 1922. - TH. C. VRIEZEN, De Compositie van de SamuelBoeken, Orientalia Neerlandica, 1948, 167-189. - G. WALLIS, "Die Anfãnge des Kônigtums in Israel", WZ Halle-Wittenberg 12 (1963), 239-247. - A. WEISER, Samuel, 1962.
1. Terminologia e conteúdo
o nome desses dois livros poderia estar ligado à tradição judaica, segundo a qual eles foram redigidos por Samuel ou por Natã e Gad, como já lCr 29.29 manifestamente o supõe. Como nada existe em abono desta opinião, será mais exato dizer que eles receberam o nome do primeiro personagem que neles desempenha o papel principal, embora seja verdade que Saul e Davi - particularmente segundo 2 Samuel- também viriam a propósito, pelo menos com igualdade de direitos. Contudo, no cânon, os dois livros constituíam originariamente uma unidade que só se desfez nos manuscritos e nas impressões hebraicas executadas a partir de 1448. Já a versão dos LXX, seguida neste ponto pela Vulgata, havia feito a divisão, mas conservou a unidade superior. Ela reuniu os livros de Samuel e Reis num grande conjunto, chamado de Reinos, e o subdividiu em quatro livros numerados seguidamente, dos quais os dois primeiros correspondem a 1 e 2 Samuel e os dois últimos a 1 e 2 Reis. Enquanto a divisão entre 1 e 2 Samuel, depois da morte de Saul, segue um princípio que se pode observar também em outros livros (Gênesis: morte de Jacó e José; Deuteronômio: morte de Moisés; [osué: morte de [osué), a conclusão da história
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de Davi (lRs 1-2) foi transposta de maneira menos hábil para o começo do livro seguinte. Quanto ao conteúdo, os livros de Samuel seguem as linhas do livro dos Juízes. Talvez tenha existido mesmo um contexto formal para a primeira seção desses livros, se alguma vez houve um antigo livro dos Juízes que tivesse incluído a figura de Samuel (§ 31,4). Os livros de Samuel narram a história das origens da realeza israelita e dos seus dois primeiros reis: Saul e Davi. lSm 1-7
Samuel 1-3 História de sua juventude, 4-6 História da arca na época dos filisteus, 7 Vitória de Samuel sobre os filisteus. lSm 8-15 SamueI e SauI 8-11 Origem da realeza, 12 Discurso de despedida de Samuel, 13-14 Guerras de Saul, 15 Rejeição de Saul. lSm 16-31 Saul e Davi 16 Unção de Davi e serviço na corte, 17 Davi e Golias, 18-20 Relações de Davi com Saul, [ônatas e Micol; sua fuga, 21-27 Vida de Davi como fugitivo, aventureiro e vassalo dos filisteus, 28 Saul na casa da feiticeira de Endor, 29-30 Davi na Palestina meridional, 31 Morte de Saul depois da batalha de Gelboé. 2Sm 1-8 Ascensão de Davi 1 Cântico fúnebre sobre Saul e [ônatas, 2-4 Davi como rei de [udá, 5 Davi como rei sobre todo o Israel; conquista de Jerusalém, 6 Trasladação da arca para Jerusalém, 7 Vaticínio de Natã, 8 Sucessos guerreiros de Davi; seus oficiais. 2Sm 9-20
Época subseqüente do governo de Davi e sucessão no trono 9 Magnanimidade de Davi para com o filho de [ônatas, 10-12 Guerra contra os amonitas; adultério com Betsabéia, 13-18 Revolta de Absalão e fuga de Davi, Regresso de Davi para Jerusalém; dissensões 19 entre [udá e Israel, 20 Revolta do benjaminita Seba.
§ 32.
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2Sm 21-24 Apêndices 21.1-14 Época de fome e vingança dos gabaonitas, 21.15-22 Heróis de Davi nas guerras contra os filisteus, 22 Salmo de Davi (SI 18[17]), 23.1-7 Últimas palavras de Davi, 23.8-39 Heróis de Davi, 24 Recenseamento e epidemia.
2. Fontes contínuas ou fragmentos isolados? Da mesma forma que para os outros livros, também aqui se põe a questão de saber se os livros de Samuel surgiram a partir de fontes contínuas ou de fragmentos isolados. Ora, um exame do seu conteúdo nos mostra que eles não formam uma obra literária homogênea. Em tal sentido, são por demais evidentes as tensões, as repetições, os paralelos e os encaixes de diversas narrativas e as diferenças entre pontos de vista ou tendências manifestas. Assim existem várias apresentações da origem da realeza: de um lado, a unção de Saul por Samuel, a mandado de Javé (lSm 9.1-10.16), e do outro lado, o desejo de Israel de ter um rei, desejo ao qual Samuel cede a contragosto, porque tal fato significa uma revolta contra a única realeza de Javé (lSm 8; 10.17ss). Saul é rejeitado duas vezes (lSm 13.8ss e 15.lOss). Davi aparece duas vezes privando da companhia de Saul: como tocador de harpa (lSm 16) e como combatente contra Golias (ISm 17);Davi entra duas vezes a serviço dos filisteus (ISm 21.11ss e 27) e duas vezes exerce sua magnanimidade para com o seu perseguidor (lSm 24 e 26). Estes são alguns exemplos aos quais se podem acrescentar muitos outros. Estas observações levaram, de um lado, à hipótese de que os livros de Samuel surgiram a partir de duas ou três fontes contínuas e que estas fontes devem ser identificadas com as fontes do Hexateuco. Foi sobretudo BUDDE quem desenvolveu esta tese, depois de várias tentativas de explicações anteriores (ErcHHoRN*, THENIUS [Comentário 1842], WELLHAU5EN*), e repartiu o material narrativo entre os "estratos fontes" J e E. Esses "estratos fontes" devem ter sido associados entre si, mas o livro que daí resultou foi bastante abreviado por uma revisão deuteronomista e de novo completado por uma outra mão. Esta opinião foi adotada, entre outros, por CORNrLL e HOL5CHER, ao passo que STEUERNAGEL* só identificou a presença dos dois "estratos fontes" até 2Sm 8. SMEND e Er55FELDT adotam a teoria das três fontes e consideram os livros de Samuel como a soma de três correntes narrativas paralelas que seriam provavelmente continuações de L, J e E.
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Por outro lado, GRESSMANN pretendeu explicar os livros de Samuel como sendo o resultado de uma justaposição frouxa de narrativas isoladas mais ou menos extensas. NOTH, SELLIN-RosT*, WEISER*, entre outros, admitem, de modo semelhante, que certos complexos de narrativas mais ou menos extensos foram unidos entre si, isto é, foram em parte inseridos uns nos outros e em parte justapostos, de maneira muitas vezes bastante frouxa. WEISER* supõe um processo mais longo de utilização e de aperfeiçoamento da tradição, levado a cabo sob o signo de reflexão profética da história, ao passo que NOTH (e semelhantemente SELLIN-RosT), de conformidade com sua tese de uma obra histórica deuteronomista, afirma que a escola deuteronomista foi a primeira a recolher os fragmentos autônomos (isto na medida em que eles não provenham dos próprios deuteronomistas). Se assim é, torna-se certamente difícil saber por que os pontos de vista e as tendências contraditórias não foram subordinados a uma tendência fundamental, pelo menos até um certo grau, por intermédio de perícopes de enquadramento, como se fez no caso do livro dos Juízes e dos Reis. Contra essas duas tentativas de explicação levantam-se certas dúvidas. Contra a divisão em "estratos fontes" apresentam-se os mesmos argumentos que para o livro dos Juízes, e talvez com força muito maior do que nesse caso (WEISER*), vale dizer: os autores dos "estratos fontes" devem ter-se limitado quase sempre ao processo de compilação e de justaposição apenas superficial das tradições, ao passo que no Hexateuco eles modelaram de maneira bastante autônoma, e a seu modo, os materiais pelo menos também já solidificados e já formados. Os fios de narrativas, que se julga poder identificar, não constituem, efetivamente, exposições acabadas, mas contêm narrativas tão diversas pelo estilo, pela estrutura e pelo conteúdo, que se distanciam inteiramente entre si e não constituem uma unidade. Por isto está com a razão a outra tentativa de explicação, quando admite que nos livros de Samuel foram justapostas tradições inteiramente diversas e procedentes de círculos diversos, sem que houvesse a preocupação de equilibrar as diferenças. Esta concepção atomística, contudo, não pode explicar todos os fenômenos. Assim, alguns complementos talvez já suponham uma primeira composição dos complexos de narrativas e é possível mesmo conceber também outras narrativas como constituindo uma camada suplementar. De modo geral, são cinco os estágios que se podem distinguir no processo de formação dos livros de Samuel: a) justaposição de narrativas ori-
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ginais autônomas e de complexos mais ou menos extensos, em parte de cunho popular e em parte de natureza palaciana, resultando uma camada narrativa fundamental, que proporcionava uma descrição imperfeita e desconexa da origem da realeza e do reino, a partir de uma base religiosa e nacional; b) inserção de alguns complementos na camada fundamental; c) introdução de uma camada narrativa com base em elementos proféticos e que nos oferece paralelos e passagens contraditórias de sumo interesse; d) uma redação deuteronomista; e) alguns complementos posteriores.
3. A camada fundamental Da camada fundamental, de cunho nacional e religioso, fazem parte quatro narrativas ou complexos de narrativas. Nesta camada ainda não existia nenhuma vinculação com a época dos Juízes (e formalmente com o livro dos Juízes). Também a figura de Samuel, cuja caracterização como "juiz", como profeta ou segundo certos fragmentos de Qumran - como nazireu, é imprecisa, ainda não desempenhava quase nenhum papel. A descrição parte da ameaça dos filisteus (sorte da arca) e logo se volta para Saul e para Davi, que pouco a pouco afastaram este e outros perigos, e, através da vida acidentada de Davi, conduz à instalação do seu sucessor no trono. A. A chamada narrativa da arca: 15m 4.1-7; 25m 6; 7, parece constituir, pelo estilo, pelo vocabulário e pelos pontos de vista, uma tradição completa em si, onde se narram as vicissitudes da arca desde o momento em que caiu em poder dos filisteus, passando pelos acontecimentos em território filisteu, até ser trasladada por Davi para jerusalém" Samuel não desempenha aí nenhum papel. Não se pode retirar 25m 6 do complexo narrativo em questão, nem transferi-lo para a história de Davi (como fizeram NÜBEL, 5CHUNCK e VRIEZEN). Antes, na base do conjunto existem três antigas narrações que literariamente não têm nenhuma relação entre si.
21
A. BENTZEN, "The Cultic Use of the Story of the Ark in Samuel", JBL 67 (1948), 3753. - G. R. DRIVER, "The Plague of the Philistines (1 Samuel V, 6-VI,16)", JRAS 1950, 50-52. - J. Dus, "Der Brauch der Ladewanderung im alten Israel", ThZ 17 (1961), 1-16. - E. NIELSEN, "Some Reflections on the History of the Ark", VTSupp/ 7, 1960, 61-74. - J. R. PORTER, "The Interpretation of 2 Samuel VI and Psalm CXXXII", JThSt NS 5 (1954), 161-173.
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Na base de ISm 4.1-7,1 existe um antigo relato, anterior à época de Davi e que narra em poucas palavras o destino da arca que, levada pelos israelitas para o seu acampamento militar (4.1b-4a), com a derrota destes caiu nas mãos dos filisteus (4.1O-11a) que a levaram através das suas cidades como presa de guerra (5.15,10), entrando depois pouco a pouco em esquecimento. A este relato juntaram-se depois extensas complementações, inclusive de notícias deuteronomistas. b) Na base de 2Sm 6.1-12,14,20-23 existe um outro relato, da época davídica ou dos primeiros tempos de Salomão. As particularidades, porém, da trasladação da arca, cuja historicidade é garantida pelo papel desempenhado por Obed-Edom de Cat, foram depois encobertas parcialmente, como no-lo mostra a etiologia do topônimo Farés-Oza [6.8]. c) Por fim, 2Sm 7.1-7,17 narra como Davi foi impedido de edificar o templo, como havia planejado. Esta perícope, na revisão posterior, formou por algum tempo a conclusão da narrativa da arca. Posteriormente ela sofreu uma nova revisão, que a desalojou da narrativa da arca a)
(cf. D).
As narrativas em questão foram reunidas, revistas e ampliadas com lendas, especialmente em ISm 5-6 (cortejo triunfal da arca), por um sacerdote de Jerusalém, de modo que na época de Salomão, ou logo depois, surgiu um complexo literário homogêneo. Este complexo tinha por finalidade justificar a legitimidade de Jerusalém como lugar de permanência da arca, e neste contexto acentua-se enfaticamente o poder da arca. B. A narrativa da ascensão e do fim de Saul OSm 9.1-10.16; 11; 13-14; 31) consta de narrativas autônomas que foram reunidas em um complexo isolado. Trata-se das narrativas seguintes (WEISER*): a) encontro de Saul com Samuel e sua unção como rei (9.1-10.16), uma saga popular, contendo motivos do conto e da fábula": b) vitória de Saul sobre os amonitas e sua elevação à realeza OI), uma saga heróica que os caps. 9s não supõem", c) guerra de Saul contra os filisteus 03.1-14.46), uma narrativa da saga, que surgiu em um círculo guerreiro ou militar e da qual não fazia parte a rejeição de Saul 03.7b-15ba); d) visão global e recapitulativa das guerras de Saul 04.47s,52), que devia formar a conclusão do conjunto; e) narrativa do fim trágico de Saul (31), que é um suplemento da coleção e estava 22
23
M. BIC, "Saul sueht die Eselinnen (1 Sam IX)", VT 7 (1957), 92-97. - H.-J. STOEBE, "Noch einmal die Eselinnen des KiS", ibid. 362-370. K. MÓHLENBRINK, "Sauls Ammoniterfeldzug und Samuels Beitrag zum Kõnigtum des Saul", ZAW 58 (1940/1941), 57-70.
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303
impregnada do mesmo espírito que as outras narrativas": isto é, impregnada do espírito de veneração pelo rei, da consciência das dificuldades de sua condição e da estima pelos êxitos que, apesar de tudo, ele alcançara. É possível imaginar que o conjunto em questão surgiu em Benjamim, a pátria de Saul. C. A narrativa da ascensão de Davi (lSm 16.14; 2Sm 5*; 8.1-15) é de outro tipo (WEISER*): uma exposição bastante homogênea e sem lacunas. Enquanto, por um lado, ela apresenta Saul sob uma luz bastante negativa, ao contrário da narrativa benjaminita, e justifica essa atitude, mostrando que o Espírito de Javé se afastou dele, por outro lado, com relação a Davi, ela é isenta de exageros. Ela acompanha seu destino desde o momento em que foi recebido junto a Saul, desde sua vida na corte e passando pela perseguição que sofreu da parte do rei, pela sua vida de aventuras e pelas relações de vassalagem, quando a serviço dos filisteus, até à morte de Saul e Isboset, que abriu a Davi o caminho para reinar sobre [udá e sobre Israel". Com razão chamou-se a atenção para o modo realista com que o autor observava as coisas, como possuía um senso agudo para as conexões históricas e religiosas, como estava familiarizado com os acontecimentos e como se achava habilitado literariamente para escrever, Assim talvez tenha sido ele quem extraiu de uma tradição fidedigna os cânticos fúnebres sobre Saul, [ônatas (2Sm 1.17ss)26 e Abner (2Sm 3.33s). É muito provável que tenha pertencido aos círculos cultos da corte de Davi e Salomão. Sua exposição termina com 2Sm 5.10,12, ou seja, com a constatação de que o fim tinha sido alcançado: a 24
J. ScHELHAAS, "De ondergang van Israéls verworpen Koning en de handhaving van
het koníngschap", GThT 58 (1958). 143-152, 161-170. A. ALT, "jerusalems Aufstieg", ZDMG 79 (1925), 1-19 (= Kleine Schriften, III, 1959, 243-257). - M. BIC. "La folie de David", RHPhR 37 (1957), 156-162. - O. EISSFELDT, "Ein gescheiterter Versuch der Wiedervereinigung Israels (2 Sam 2.12-3.1)", NC 3 (1951),110-127.- Io., "Noch einmal: Ein gescheiterter Versuch der Wiedervereinigung Israels", ibíd. 4 (1952), 55-59. - G. FOHRER, "Zion-Ierusalem im Alten Testament", ThW VII, 1961, 291-318. - G. LANCZKOWSKI, "Die Geschichte vom Riesem Goliath und der Kampf Sinuhes mit dem Starken von Retenu", MDA! Kaíro 16 (1959),214218. - J. MORGENSTERN, "David and [onathan", JBL 78 (1959),322-325. - M. NOTH, "[erusalem und die israelitische Tradition", OTS 8, 1950,28-46 (= Gesammelte Studien zum Altem Testament, 1960, 2a ed., 172-187). - H.-J. STOEBE, "Díe Goliathperikope 1 Sam XVII l-XVIII 5 und die Textform der Septuaginta", VT 6 (1956), 397-413. - R. DE VAUX, "Les combats singuliers dans l' Ancien Testament", Bíbl 40 (1959), 495-508. 26 C. J. GOSLINGA, "Davids klaaglied over Saul en [onathan", GThT 50.
25
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confirmacão do reinado de Davi por Javé. Enquanto a perícope 25m 5.1316 deve ser considerada como suplemento, a perícope 5.17-25 (vitória de Davi sobre os filisteus) devia estar originariamente antes de 5.3, constituindo a perícope 8.1-15 (feitos guerreiros de Davi) uma espécie de arremate final. Em sua forma atual, a narrativa não é homogênea, mas indica a existência de várias redações paralelas. Afora a ampliação de lSm 17, extraída da camada profética suplementar, trata-se sobretudo de versões diferentes sobre a fulga de Davi (lSm 20), sobre a sua passagem para o lado dos filisteus (21.11ss; 27) e sobre sua magnanimidade para com Saul (24;26). É difícil emitir um julgamento a respeito de sua origem talvez uma das versões provenha também da camada suplementar. Uma explicação que deve ser levada em conta é aquela que nos é proposta por NÜBEL, que atribuiu 2Sm 9; 10-12 ao conjunto. Esse autor admite duas camadas pré-deuteronomistas: a) um documento fundamental, cujo texto foi sobreposto e freqüentemente mudado de lugar, e que começa com lSm 16.1ss e termina com 2Sm 8-9 e com o conjunto elementar primitivo de 2Sm 7, documento este que pretende mostrar de maneira plástica a incompreensível ajuda de Javé em favor de Davi; b) um documento de revisão, composto por um sacerdote, por volta de 800 a.C; e que faz ver em cada uma das narrativas a respeito do feliz resultado dos empreendimentos de Davi uma prova por ele superada. Uma revisão deuteronomista quase só se encontra em 2Sm 7. Em verdade, as deduções históricas, como, p.ex., o entrecruzamento do governo de Davi, em Hebron, com o reinado de Saul, nos permitem duvidar da exatidão dessa análise.
o. O
chamado vaticínio de Natã (25m 7)27 é considerado por não poucos como uma perícope homogênea e completa em si, e data do tem-
27
G. AHLSTROM, "Der Prophet Nathan und der Tempelbau", VT 11 (1961), 113-127. - H.
VAN DEN BUSSCHE, "Le texte de la prophétie de Nathan sur la dynastie Davidique", EThL 24 (1948), 354-394. - A. CAQUOT, "La prophétie de Nathan et ses échos lyriques", VTSuppl 9, 1963, 213-224. - H. GESE, "Der Davidsbund und die Zionserwahlung", ZThK 61 (1964), 10-26. - E. KUTSCH, "Die Dynastie von Gottes Gnaden", ibid. 58 (1961),137-153. - J. L. McKENZIE, "The Dynastic Orade: II Sam 7", TsSt 8 (1947), 187-218. - S. MOWINCKEL, "Natanforjettelsen 2 Sam Kap. 7", SEA 12 (1947),220-229. - M. NOTH, "David und Israel in 2 Sam 7", em: Mélanges Robert, 1957, 122-130 = Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1960, 2a ed., 334-345). - M. SIMON, "La prophétie de Nathan et le temple", RHPhR 32 (1952), 41-58. - M. TSEVAT, "Studies in the Book of Samuel I1I", HUCA 34 (1963), 71-82.
§ 32.
OS LIVROS DE SAMUEL
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po dos próprios acontecimentos descritos ou da época deuteronomista. A este respeito é preciso que se considere como certo que o vaticínio foi composto e formado a partir de um dos conjuntos elementares mais antigo, bem como de ampliações posteriores. Originariamente 7.1-7,17, como conclusão da narrativa da arca apenas dizia de que modo Davi foi impedido de construir o templo por ele planejado. Esta narrativa foi ampliada pelo conjunto fundamental de 7.8-16,18-29, enquanto o complexo resultante foi revisto mais uma vez em sentido deuteronomista. A fórmula de introdução (7.8) indica a nova colocação. Segundo esta nova perspectiva, não é mais a arca que se acha no centro das atenções, mas exclusivamente a figura de Davi. Sua introdução foi possível, graças à ambigüidade da palavra casa cujo significado passa de "casa" enquanto morada de Javé para"casa" enquanto realeza ou dinastia. Quando se fala de casa, no último sentido, já não se menciona a arca. Para sua inserção também contribuiu o conhecimento da novela real do Egito (§ 7,5), que Salomão utilizou para legitimar o seu reinado (lRs 3.4-15) e cujos temas principais eram a construção do templo e a teologia do rei. Aquilo que em 1Rs 3 só diz respeito à pessoa de Salomão, é estendido a toda a dinastia, graças à menção da "aliança de Davi" (as promessas divinas dirigidas a Davi: 2Sm 7.816.18-29).Sua legitimação divina deve ser mais recente do que 1Rs 3, que, de outro modo, estaria sobrando, e deve ter ocorrido muito provavelmente na época de Roboão, o primeiro sucessor de Salomão. E. A narrativa sobre a sucessão no trono de Davi (2Sm 9-20; 1Rs 1-2) constitui por sua vez um conjunto completo. Este ponto deve ser considerado como certo, depois da pesquisa de ROST, que aponta como característica individual dessa narrativa o fato de que ela coloca os diálogos no centro da atenção e os transforma em pequenas cenas, ao passo que raramente designa a Deus como causa verdadeira dos acontecimentos e rejeita, em geral, para segundo plano tanto os sacerdotes como o culto. Quem discorda desta interpretação é sobretudo CARLSON, que entende 2 Samuel como uma obra deuteronomista construída sobre o fundamento de uma epopéia de Davi e cujos caps. 2-7 o descrevem sob as bênçãos, e os caps. 9-24 sob as maldições. Rejeitando-se, em princípio, a hipótese de uma narrativa da sucessão no trono, os caps. 9-24 aparecem como um comentário da segunda parte da época davidica, no qual a figura de Davi e os acontecimentos são interpretados com base na ideologia deuteronomista. Em detalhes, os caps. 10-12 originariamente eram apresentados segundo o esquema da epopéia ugarítica de Keret, enquanto a perícope 13-21.14 (em dois ciclos de sete anos:
306
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ATÉ REIS (OS PRIMEIROS PROFETAS)
13-14 e 15-21.14) era colocada em ordem de correspondência com a série de sentenças de Dt 22.13ss 00-12 = Dt 22.22; 13-14 = Dt22.28s; 1520 = Dt 23.1) e os caps. 21-24 constituem um apêndice deuteronomista, construído artificialmente (segundo a técnica de composição de Dt 32s). Não se pode, contudo, admitir que esta análise tenha conseguido demonstrar a existência de uma redação e de uma ideologia deuteronomistas.
A exposição da história da família e da corte de Davi, que constitui uma fonte histórica da mesma importância que a da narrativa da ascensão de Davi, foi considerada, e com razão, como uma obra-prima insuperável da historiografia do Antigo Oriente. Para isto contribuiu, de modo essencial, a sua construção artística e dramática, além da descrição realista e vivencial. O redator foi certamente testemunha ocular dos acontecimentos e membro da corte real, tendo escrito sua obra na época de Salomão, cuja realeza é defendida na conclusão (lRs 2.46) - escreveu talvez no terceiro ano (lRs 2.39), ou, como faltam referências à futura construção do templo, no quarto do seu reinado (lRs 6.1) - para justificar sua sucessão no trono. Não se pode saber quem foi sua pessoa. Pensou-se em Aquimaaz, genro de Salomão (KLOSTERMANN, BUDDE) ou em Abiatar, sacerdote de Davi (DuHM).
4. A formação da camada fundamental e seus acréscimos No processo de compilação e de complementação da camada fundamental, as narrativas que acabamos de mencionar foram colocadas livremente umas ao lado das outras. Com base na fé nacional e religiosa e na consciência histórica, formada depois dos êxitos da época de Davi, surgiu na época pós-salomôníca um certo modo de apresentar a trajetória que vai do período filisteu até ao reinado unido sob Davi e Salomão. Neste mesmo sentido, alguns fragmentos foram transpostos para novos lugares, aos quais pertencem sob o ponto de vista cronológico, a saber: a conclusão da narrativa da arca (2Sm 6; 7.1-7,17) passou para antes da narrativa da conquista de Jerusalém por Davi, e a narrativa da morte de Samuel para o lugar atual (l Sm 31). Além disso, foram incluídos certos acréscimos para completar o quadro. Trata-se principalmente de listas e de anedotas que talvez provenham da época de Saul e de Davi:
§ 32. OSLIVROS DE SAMUEL
15m 25m 25m 25m
14.49-51 8.16-18 21.15-22 23.8-39
307
Família de Saul e casa real, Casa real de Davi, Anedotas sobre os heróis de Davi, Anedotas e listas dos três e dos trinta heróis".
Acrescentem-se ainda as duas narrativas sobre a vingança de sangue dos gabaonitas contra os saulitas, durante um período de fome (25m 21.114)29, e sobre o recenseamento ordenado por Davi, com a epidemia subseqüente (25m 24)30, narrativas estas que foram inter-relacionadas pelo autor que introduziu os complementos ou por um revisor posterior, através de 24.1. A primeira narrativa liga evidentemente recordações de acontecimentos históricos com a etiologia de um costume cananeu ligado à colheita. A segunda narrativa liga um relato etiológico sacerdotal sobre a ereção de um altar dos sacrifícios da eira de Arauna [Ornan] depois do recenseamento e da epidemia a uma narrativa etiológica Cananéia sobre a santificação da eira de Arauna [Ornan] como lugar do santuário (montanha do templo).
5. A camada suplementar À camada fundamental acrescentou-se uma camada complementar, que influenciou profundamente a feição dos livros de 5amuel. A maneira como ela foi composta não indica que tenha formado um no contínuo de narrativa, e pode-se reconhecer, menos pelos aspectos formais e literários, do que pelos assuntos e pelo conteúdo. Em suas narrativas, das quais pelo menos uma parte se baseia numa antiga tradição primordial", o pensamento profético se confronta com a história primitiva dos reis e com sua tradição, de modo que as narrativas figuram ao lado ou mesmo em contraposição com a tradição religiosa e nacional do povo e da corte. Elas se ocupam de modo especial com 5amuel e 5aul.
28 29
K. ELLIGER, "Die dreissig Helden Davids", PJB 31 (1935),29-75. H. CAZELLES, "David's Monarchy and the Gibeonite Claim", PEQ 87 (1955), 165-
175. - J. Dus, "Gibeon - eine Kultstâtte des Sms und die Stadt des benjaminitischen Schicksals", VT 10 (1960),353-374. - A. S. KAPELRUD, "King and Fertility", NTT 56 (1955), 113-122. - A. MALAMAT, "Doctrines of Causality in Hittite and Biblical Historiography: a Parallel", VT 5 (1955), 1-12. 30 W. Fuss, -n SamueI24", ZAW 74 (1962), 145-164. 31 Cf. a análise, a título de ensaio, feita por H. SEEBASS, "Traditionsgeschichte von I Sam 8; 1O.17ss. und 12", ZAW 77 (1965).
308
OSLIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (os PRIMEIROS PROFETAS)
a) A chamada história da infância e juventude de Samuel (lSm 1.1-3) é, sem dúvida, um complexo à parte de narrativas, mas, como tal, teve uma pré-história assaz longa". Nela podemos distinguir os seguintes elementos: a) a narrativa sobre o nascimento de Samuel e sua consagração ao serviço de Javé em Silo (ponto este onde quiçá se incluam também duas tradições: uma relativa à sua destinação ao nazireato e outra relativa à sua destinação ao sacerdócio), narrativa esta talvez não-histórica nem relacionada com Samuel (HYLANDER) e tendo sua parte principal no capo 1 e se prolongando em 2.11,18,21; b) um salmo que foi acrescentado à parte principal e fala da vitória dos piedosos e da ruína dos perversos (2.1-10), e que, pelo fato de mencionar o rei (v. Iü), data da época anterior ao exílio e foi utilizado no contexto por causa do v. 5b 33; c) as duas anedotas sobre os filhos de Heli (2.12-17,22-25), que dificilmente formam com os vv. 27-36 uma narrativa homogênea contra o santuário de Silo (NoTH), mas destinam-se, pelo contrário, a realçar o contraste com Samuel; d) a ameaça proferida por um desconhecido homem de Deus contra a casa de Eli (2.27-36) e redigida numa linha deuteronomista; pressupõe o templo de Salomão e o legitima em face do santuário de Silo'": e) a narrativa da revelação de Deus feita a Samuel (cap. 3) e que pressupõe as tradições de A, C e D e a elas se vincula, para fundamentar a função profética de Samuel; seu autor reuniu as referidas tradições em uma história da juventude de Samuel. b) A narrativa da conversão de Israel e da vitória de Samuel sobre os filisteus (lSm 7.2-17) foi elaborada, sobretudo na primeira parte, dentro do esquema deuteronomista do livro dos Juízes. Ela descreve Samuel à maneira de um "Juiz", ou mais precisamente: em ligação com a sua função de chefe guerreiro das tribos e com sua qualidade de príncipe de uma cidade, como no caso de [efté. É possível que aí tenham sido utilizadas certas informações de um livro mais antigo dos Juízes. No seu todo, a narrativa não é histórica. Que Israel tenha gozado de paz perante os filisteus ainda em vida de Samuel (v. 13) é contraditado pela narrativa de Saul. c) Em lSm 8; 10.17-27 encontra-se uma narrativa da elevação de Saul à dignidade real". Segundo esta narrativa, o povo exige um rei de Samuel,
32 33
34 35
M. NOTH, "Samuel und Silo", VT 13 (1963),390-400. G. BRESSAN, "11 cantico di Anna", Bibl 32 (1951), 503-521; 33 (1952), 67-89. M. TSEVAT, "Studies in the Book of Samuel I", HUCA 32 (1961), 191-216. L. MENDELSOHN, "Samuel's Denunciation of Kingship in the Light of Akkadian Documents from Ugarit", BASOR 143 (1956), 17-22.
§ 32. OS LIVROS
DE
SAMUEL
309
e este rei é identificado por um sorteio. Esta versão reveste-se de um tom de crítica contra a realeza, embora em 1O.21bl3-27a tenha utilizado o fragmento de uma narrativa mais antiga, de acordo com a qual 5aul foi designado rei, por um oráculo, como sendo aquele que se distinguia do resto do povo pela sua grande estatura. É deste fragmento que deriva o tema dos"direitos da realeza" que o narrador trata, por antecipação, em 8.11ss como sendo o anúncio dos "direitos do rei". d) Em íntima relação com C. encontra-se o discurso de despedida de 5amuel (l Sm 12: revisto posteriormente numa linha deuteronomista), o qual, depois da escolha do rei, retira-se de seu ofício, ofício este que não é explicitado mais de perto. e) Em 15m 13.7b-15b u existe a versão mais recente da rejeição de 5aul por 5amuel, versão que já defende interesses sacerdotais e fundamenta essa rejeição com o sacrifício ilegalmente oferecido. j) Em 15m 15 encontra-se a versão mais antiga da rejeição de 5aul e apresenta como seu fundamento a circunstância de que 5aul observou de modo incompleto o interdito relativo ao tempo de guerra. Esta versão se baseia em uma antiga tradição relativa à campanha de 5aul contra os amalecitas. g) Uma narrativa de colorido profético, mas isenta de crítica ou de hostilidade contra a realeza, é aquela em que se descreve de que modo Davi foi ungido rei por 5amuel (l5m 16.1-13) e que, como 25m 7, legitima a realeza davídica em face de outras pretensões". h) Talvez se deva atribuir também à camada profética fundamental a ampliação da narrativa da vitória de Davi sobre Golias (LSm 17), à qual aludem de modo particular as considerações teológicas dos vv. 45ss. i) A narrativa da visita de 5aul à feiticeira de Endor (l Sm 28), inserida no contexto por meio dos vv. Is, manifesta uma atitude de rejeição com respeito a Saul, que pecou contra Javé. Contudo, não se exclui que ela provenha de uma tradição antiga". Via de regra, as narrativas se baseiam em uma consideração da história que é aquela que se pode esperar de ciclos proféticos. Esta reflexão foi despertada pela oposição à realeza, que seguia seus próprios interesses 36
37
C. J. GOSLINGA, "Het geheim der verwachting van Davids konígschap", GThT 57 (1957),6-21. L. TRENCSÉNYI-W ALDAPFEL, "Die Hexe von Endor und die griechisch-rômische Welt", AcOr Budapest 12 (1961), 201-222. - F. VATTIONI, "La necromanzia nell'Antico Testamento,1 Sam 28.3-25", Augustinianum 3 (1963),461-481.
310
OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (OS PRIMEIROS PROFETAS)
nacionais de dominação política, e transferiu para segundo plano o conflito entre o poder deste mundo e o poder divino, como no-lo mostram de maneira ainda mais dramática as narrativas de Elias.
6. A redação deuteronomista Nos livros de Samuel são menores os vestígios de uma revisão deuteronomista que nos livros de [osué e dos Juízes. Abstraindo das notícias cronológicas de 15m 4.18b; 25m 5.4s, só se pode mencionar a revisão da ameaça pronunciada contra a casa de Eli (l5m 2.22-36), da narrativa sobre a conversão de Israel e sobre a vitória de Samuel contra os filisteus (l5m 7), bem como a revisão do discurso de despedida de Samuel (15m 12) e do vaticínio de Natan (25m 7). Nestes fragmentos podia-se tratar de uma ideologia deuteronomista da história.
7. Conclusão A conclusão do processo de formação dos livros de Samuel é assinalada por três acréscimos, dos quais já indicamos o salmo de 15m 2.1-10 (5A). O salmo de 25m 22 é idêntico ao 5118: trata-se da combinação de um cântico de ação de graças do indivíduo com um cântico real que rende graças pela vitória alcançada. As chamadas últimas palavras de Davi (25m 23.1-7) são o reflexo de uma dominação, onde se misturam oráculos proféticos e máximas sapienciais". Os dois acréscimos finais transformaram os apêndices 25m 21-24, com uma variedade multicolorida que favoreceu a separação dos livros de Samuel e a transferência da conclusão da narrativa da sucessão no trono para 1Rs 1-2.
o texto dos livros de Samuel, portanto, durante muito tempo permaneceu instável e circulou em diferentes versões. Divergem do texto massorético não só o texto utilizado pela história cronística, quanto a versão LXX,cuja forma textual foi confirmada pela descoberta de fragmentos hebraicos da quarta gruta de Qumran como sendo uma versão própria". Ela talvez represente a forma palestinense, ao passo que o texto massorético representa a forma babilônica. S. MOWINCKEL, "'Die letzten Worte Davids' II Sam 23.1-7", ZAW 45 (1927),30-58. - O. PROCKSCH, "Die letzten Worte Davids", em: Kittel-Festschrift, 1913, 113ss. 39 Exemplos de 15m 15;23, em W. H. BROWNLEE, The Meaning Df the Qumrân Scrolls for the Bible, 1964, 12-18. 38
§ 32. OS LIVROS DE SAMUEL
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8. Valor histórico e características teológicas
o valor histórico dos livros de Samuel é bastante diferente nas suas diversas partes. Aquelas que mais merecem crédito são as narrativas sobre Davi, pois se baseiam em um conhecimento exato dos acontecimentos. O mesmo se deve dizer dos fragmentos que compõem os apêndices. As que mais contêm elementos da saga são as narrativas provenientes da época de Saul, embora se possa extrair delas um quadro convincente em suas linhas fundamentais. Contraditórias e por vezes desprovidas de valor histórico são as tradições a respeito de Samuel, que nelas é caracterizado como nazireu, como sacerdote e como juiz, e igualmente aquelas que falam da sua contribuição para o aparecimento da realeza". As opiniões de WEISER e WILILS nos mostram quantos aspectos permanecem duvidosos. Para WEISER, a perícope 15m 7.2-6,15-17, a respeito do juiz 5amuel, é originária de Masfa; o capo 8 se baseia em recordações de seus familiares em Ramá, e os caps. 9-12 contêm quatro tradições diferentes sobre a origem da realeza, quais sejam: 9.1-10.16, de formação mais ou menos recente, sobre a unção de Saul: 10.17-26, sobre a descrição da escolha por sorteio, de acordo com a tradição sacral da confederação das tribos, e provém de Masfa; 10.27-11.15, uma tradição paralela sobre o santuário de Guilgal e que muito se aproxima dos acontecimentos históricos; 12, também de Guilgal, e cuja redação tem como pano de fundo a tradição da Aliança. Todas essas tradições podem ser caracterizadas como sendo três séries de narrativas não ligadas por uma unidade literária, com quase as mesmas tendências, e onde aparece a influência determinante de Samuel na transição para a realeza. WALLIS admite, pelo contrário, três relatos sobre a origem da realeza de Saul, como sejam: 15m 11: aclamação de Saul como rei em Guilgal; 9.1-10.16: sua unção como nagid ("príncipe") em Efraim; e 8+10.17-27*: sua indicação por meio do oráculo da sorte em Masfa. Trata-se aí de relatos autônomos, de onde se deduz que Saul não se tornou rei de repente, mas foi elevado à dignidade real por diversas tribos (Benjamim, Efraim, Galaad), por livre escolha. 40
W. BEYERLIN, "Das Kõnigscharisma bei Saul", ZAW 73 (1961), 186-201. - M. BUBER, "Das Volksbegehren", em: Lohmever-Gedenkschrift, 1951,53-66. - G. FOHRER, "Der Vertrag zwischen Konig und Volk in Israel", ZAW 71 (1959), 1-22. - W. A. IRWIN, "Samuel and the Rise of the Monarchy", AJSL 58 (1941), 113-134. - M. NEWMAN, "The Prophetic Call of Samuel", em: Essays Muilenburg, 1962,86-97. - E. ROBERTSON, "Samuel and Saul", BJRL 28 (1944), 175-206. - J. A. 50GGIN, "Charisma und Institution im Kõnigtum Sauls", ZAW 75 (1963), 54-65. - H. WILDBERGER, "Samuel und die Entstehung des israelitischen Kõnigtum", ThZ 13 (1957),442-469.
312
OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS
(os PRIMEIROS PROFETAS)
Quanto aos aspecto teológico, em determinada parte das narrativas se reflete, viva, a mentalidade religiosa e nacional, tal qual fora representada na corte real de Jerusalém e mais tarde consignada no "estrato fonte" J do Hexateuco. Nesse mesmo sentido, a legitimação religiosa da dinastia de Davi desempenhou papel importante. Outras narrativas testemunham a existência de um confronto interior com a mencionada consideração da história, no plano da teologia profética, confronto este que leva a uma concepção mais aprofundada.
§ 33. OS LIVROS DOS REIS BK: M. NOTH, 1964ss. - BOT: A. VAN OEN BORN, 1958. - EH: A. SANOA, 1911/12. - HK: R. KITTEL, 1902. - HS: S. LANOERSOORFER, 1927. - IB: N. H. SNAITH, 1954. - KeH: O. THENIUS - M. LÓHR, 3 a ed., 1898. - KHC: I. BENZINGER, 1899. - SAT: H. GRESSMANN, 2 a ed., 1921. - SZ: A. KLOSTERMANN, 1887. I. BENZINGER, [ahoisi und Elohist in den Kõnigebuchern, 1921. - G. HÓLSCHER, "Das Buch der Kõnige, seine Quellen und seine Redaktion", em: Gunkel-Festschrift, I 1923, 158-213. - lo., Geschichtsschreibung in Israel, 1952. - E. JENNI, "Zwei [ahrzehnte Forschung an den Büchern [osua bis Kõnige", ThT NF 27 (1961), 1-32, 97-146. - A. JEPSEN, Die Quellen des Kõnigeouchee, 2 a ed., 1956. - E. C. B. MACLAURIN, The Hebrew Theocracy in the tenth to the sixth centuries B. c., 1959. - J. A. MONTGOMERY, "Archival Data in the Book of Kings", JBL 53 (1934),46-52. - M. NOTH, Überlieferungsgeschichtliche Studien, I 1943. - O. PLÓGER, Die Prophetengeschichten der Samuel- und Kõnigsoucher, Diss. Greifswald, 1937. - R. SMENO, JE in den geschichtlichen Büchern des AT, ed. por H. HOLZINGER, ZAW 39 (1921), 181-217. - H. WINCKLER, "Beitrãge zur Quellenscheidung", em: Alttestamentliche Untersuchungen, 1892, 1-54.
1. Terminologia e conteúdo O nome de "livros dos Reis" provém do fato de que eles contêm a história dos reis de [udá e Israel. Originariamente eles constituíam um único livro, como os livros de Samuel, e na versão dos LXX formavam, com estes, um conjunto a que se dava o nome de Reinos. A divisão dos livros dos Reis em dois, feita pela versão grega e adotada pela Vulgata, foi introduzida nos manuscritos e nas impressões hebraicas, desde 1448 d.e. Que esta divisão se tenha verificado efetivamente vê-se nitidamente no fato de que ela partiu em dois blocos a história de Ocozias. A conclusão da narrativa da sucessão no trono de Davi foi transposta do final dos livros de Samuel para o início da história de Salomão.
§ 33. OS
LIVROS DOS REIS
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o seu conteúdo só pode ser dado em grandes traços, como segue: 1Rs 1-11
História de Salomão 1-2 investidura como rei e garantia do trono, 3-100 esplendor de seu reinado, 11 os lados sombrios de seu governo, 1Rs 12, 2Rs 17 História dos reis de [udá e de Israel, desde a cisão do reino até a queda do reino setentrional de Israel, 2 Rs 18-25 História dos reis de [udá até à destruição de Jerusalém e o indulto concedido a Joaquim. Na segunda e terceira parte, a exposição é feita em ordem cronológica, de modo que as informações sobre cada um dos reis seguem a ordem de acesso ao governo.
2. A formação dos livros A questão da origem dos livros dos Reis tem sido resolvida de diversas maneiras. Descartada a opinião talmúdica, segundo a qual Jeremias seria o seu autor, três são as opiniões que se podem considerar: a) Admite-se que tenha havido um livro pré-deuteronomista dos Reis, formado principalmente pela adição de dois ou três "estratos fontes" que já se podem constatar no Hexateuco. O que se discute é saber quantos destes blocos de narrativas devem ser admitidos e até onde se estendem, o mesmo se dando, conseqüentemente, também com o livro pré-deuteronomista dos Reis. BENZINGER acredita poder seguir o "estrato fonte" J até 2Rs 17.3s (última forma alcançada na época de Ezequias) e o "estrato fonte" E até 2Rs 22s
O estado atual das tradições, no entanto, indica menos ainda a existência de fios contínuos de narrativas do que com relação aos livros dos
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Os LIVROS DE JOSUÉ
ATÉ REIS (OS PRIMEIROS PROFETAS)
Juizes e Samuel, e muito menos ainda a ligação dos mesmos com os "estratos fontes" do Hexateuco. Não se encontram tradições de tal natureza que exijam uma divisão em duas ou mesmo três fontes, nem há indícios característicos contínuos de conteúdo ou de ordem teológica que sugiram tal divisão. b) Seguindo um outro ponto de vista, JEPSEN supõe a existência de um livro pré-deuteronomista dos Reis e de um paulatino processo de formação do conjunto, cuja base seria constituída primeiramente por uma crônica sincronística, contida em 1Rs 2.10-2Rs 18.8, e que foi redigida no final do séc. VIII, segundo um modelo babilônico, e a partir de documentos do arquivo da corte, para contrapor, sem recorrer à reflexão teológica, o exemplo da continuidade da dinastia davídica às constantes mudanças do reino do norte. Além disso, nesta base, em vez da multiplicidade de fontes históricas, existe também uma obra analística unitária que oferecia uma visão global, desde Salomão até Manassés, e deve ter surgido na primeira metade do séc. VII a.c., nos círculos sacerdotais de Jerusalém. Logo depois, por volta de 580, uma primeira redação sacerdotal feita em Jerusalém veio juntar-se às duas bases mencionadas e as ampliou com alguns complementos, como, p.ex., 2Rs 23.4-15. Uma segunda redação, de linha nebiista, inseriu principalmente as lendas proféticas e julgou a história sob o ponto de vista das categorias "deuteronomistas". Esta redação foi realizada em Masfa, depois de 561 (cf. 2Rs 25.27ss), por um discípulo de Jeremias. Entretanto, apesar da existência do modelo vétero-oriental, levantam-se dúvidas contra a hipótese de uma crônica sincronistica abrangente de [udá e de Israel, principalmente porque as observações correspondentes sobre os reis posteriores de [udá não podem ser consideradas simplesmente como trabalho redacional. As profundas diferenças cronológicas que ressaltam das informações dos livros dos Reis se explicam a partir da utilização de duas crônicas independentes. Contra a presença de uma única crônica analística homogênea está o fato das diversas denominações que se dão às fontes e as referências expressas a uma delas também com relação aos reis posteriores de [udá. Em vez das duas mencionadas redações admitiu-se, por fim, e com muito maior razão, o trabalho de duas mãos deuteronomistas. c) Pode haver a tentação de se concordar com a tese de NOTH relativa à existência de uma história deuteronomista, pelo menos para os livros dos Reis, a saber: em meados do séc. VI um autor deuteronomista teria
§ 33.
OS LIVROS DOS REIS
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reunido o antigo material, selecionando-o e ordenando-o segundo determinados princípios históricos e teológicos. Ao mesmo tempo em que esta opinião não procede para o Deuteronômio nem para o livro de [osué, e ao mesmo tempo também em que se constata no livro dos Juizes a presença de uma profunda revisão deuteronomista, principalmente em virtude da moldura que foi acrescentada, sendo esta revisão muito reduzida nos livros de Samuel, não se pode admitir igualmente um livro pré-deuteronomista dos Reis. Os livros dos Reis são antes obra de um redator deuteronomista (WEISER*) e por isso se diferenciam dos "estratos fontes" do Hexateuco tanto quanto dos livros que se seguem a este. Fundamentalmente, a obra de moldura das diversas seções não foi colocada em torno do material narrativo já existente, como no livro dos Juizes, mas sim elaborado ao mesmo tempo em que se manipulava e se utilizava o material das fontes e das narrativas, de modo que o seu redator é simplesmente o mesmo dos livros dos Reis. Encontramos nesses livros uma obra planejada e redigida por mão deuteronomista, obra esta de cujas partes componentes trataremos a seguir.
3. A moldura Os relatos sobre cada um dos reis são envolvidos por uma moldura que imprime à obra uma característica própria. Essa moldura consta de frases introdutórias e conclusivas que são sempre as mesmas. A introdução contém os seguintes pontos: a) a data sincrônica do acesso ao poder; b) uma informação sobre a residência real; c) informação sobre a duração do reinado; d) julgamento sobre a piedade do rei; e) idade do soberano por ocasião de sua subida ao trono (só para os reis de [udá): e j) informação sobre o nome e, incidentalmente, sobre a pátria de origem da mãe do monarca'". A conclusão contém as seguintes indicações: a) referência a determinadas fontes históricas, freqüentemente com uma observação sobre o seu conteúdo, e das quais abaixo falaremos; b) informação sobre a morte e lugar de sepultura do rei; c) informação sobre o seu sucessor. Enquanto para Davi, Salomão e Jeroboão I só ocorre a fórmula conclusiva - para Salomão também alguma coisa da introdução - para os 41
H. DONNER, "Art und Herkunft des Amtes der Koniginmutter im Alten Testament", em: J. Friedrich-Festschrift, 1959, 105-145. - G. MOLIN, "Die Stellung der Gebira im Staate Juda", ThZ 10 (1954), 161-175.
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OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (OS PRIMEIROS PROFETAS)
outros monarcas se tem a moldura completa a partir de lRs 14, embora para Roboão ainda sem o sincronismo: lRs 14.21s,29-31: Roboão tinha quarenta e um anos quando se tornou rei, e reinou dezesseteanos em Jerusalém ... O nomedesua mãeera Naama, a amonita. "Ele" fez o que desagrada a Javé, e o provocou à ira, mais do que haviam feito "seus" pais com os seus pecados que eles cometeram", O resto da história de Roboão e tudo o que ele fez, está consignado no livro da História dos Reis de [udá... Roboão adormeceu com seus pais e foi... sepultado na cidade de Davi... Seu Filho Abiam tornou-se rei em seu lugar.
A ausência parcial ou total de moldura para certos reis posteriores se fundamenta em seu destino especial. A fórmula conclusiva falta em [orão e Ocozias, por terem sido mortos por [eú (2Rs 9.22ss). A fórmula de introdução falta em [eú, o revolucionário (2Rs 10.34ss). Faltam ambas em Atalia, porque é diferente o modo como 2Rs 11 fala a respeito dela. A fórmula conclusiva falta igualmente para os reis destronados pelo inimigo, isto é, Oséias, de Israel, e [oás, Joaquim e Sedecias, de [udá.
Além das informações sobre a duração do reinado, são de particular importância os sincronismos e o julgamento a respeito dos reis. a) Enquanto subsistem simultaneamente os dois reinos de [udá e Israel, a subida de um dos reis ao trono é datada sincronicamente de acordo com os anos de reinado da outra parte; assim, p.ex., em lRs 15.1: No décimo oitavo ano do reinado de Jeroboão, filho de Nabat, Abiam tornou-se rei de [udâ. Evidentemente que estas informações nem sempre concordam com os anos do reinado, e tanto estes como aquelas muitas vezes colidem coma cronologia real extraída de fontes extrabíblicas. A pesquisa tem procurado achar uma explicação para este estado de coisas, mas até agora nenhum sistema desenvolvido a partir destas bases alcançou aceitação geral 43 • b) Para o julgamento a respeito dos reis o critério que vale é se eles toleraram ou fomentaram outros cultos fora do templo de Jerusalém. Se 42 43
A frase foi colocada posteriormente em relação com todo o Iudá. W. F. ALBRIGHT, "The Chronology of the Divided Monarchy of Israel", BASOR 100 (945),16-22. - ID., "Further Light on the Synchronisms between Egypt and Asia in the Period 935-685 B. c.", ibid. 141 (956), 23-27. - J. BEGRICH, Die Chronologie der Kimige vonIsrael und [uda, 1929. - A. CARLIER, La chronologie des rois de [uda et d'Israêl,
§ 33. OS LIVROS DOS REIS
317
o fizeram, são julgados severamente; do contrário, o são favoravelmente. Só Ezequias e [osias, portanto, são aprovados sem restrições, por causa das reformas fundamentais que lhes são atribuídas", ao passo que os reis Asa, [osafá, [oás, Azarias e [oatão o são em menor escala. Os demais reis de [udá, e com maior razão os reis de Israel, são reprovados. Na base deste modo de proceder existe manifestamente a lei deuteronômica da centralização do culto em Jerusalém, bem como a reforma de [osias, que valem retrospectivamente como norma para toda a história dos reis.
4. As fontes históricas Nas fórmulas conclusivas o redator menciona expressamente as fontes históricas que utiliza. Essas fontes são os três livros da História de Salomão (lRs 11.41), da História dos Reis de Israel (lRs 14.19-2Rs 15.31) e da História dos Reis de [udá (lRs 14.29-2Rs 24.5). O que se pode dizer destes livros acha-se exposto no § 13,3. Para a história de Salomão", o autor - ao qual se deve também a parte principal de 1Rs 8 e 11.1-13 - não apenas selecionou o material da 1953. - J. FINEGAN, Handbook of Biblical Chronology, 1964. - D. N. FREEDMAN - E. F. CAMPBELL, [r., "The Chronology of Israel and the Ancient Near East", em: Essays Albright, 1961, 203-228. - A. JEPSEN - R. HANHART, Untersuchungen zur ieraelitisch-jüdischen Chronologie, 1964. - J. LEWY, Die Chronologie der Kônige von Israel und [uda, 1927. - P. VAN DER MEER, The Chronology of Ancient Western Asia and Egypt, 1963, 3" ed. - S. Mowinckel, "Die Chronologie der israelitischen und jüdischen Kõnige", AcOr Kopenhagen 10 (1932), 161-277. - C. SCHEDL, "Textkritische Bemerkungen zu den Synchronismen der Kônige von Israel und [uda", VT 12 (1962), 88-116. - E. R. THIELE, The Mysterious Numbers of the Hebrew Kings, 1951. - Id., "The Synchronisms of the Hebrew Kings - a Re-Evaluation", Andrews University Siudies 1 (1963), 121138; 2 (1964), 120-136. - Para o último período de [udá: D. J. WISEMAN, Chronicles of Chaldaean Kings (626-556 B.C.) in the British Museum, 1956, e a blibliografia aí apresentada. 44 P. BUIS, [osias, 1958. - F. HORST, "Die Kultusreform des Kõnígs [osia", ZDMG 77 (1923),220-238. A. JEPSEN, "Die Reform des [osia", em: Baumgãrtel-Festschriit, 1959, 97-108. - o. PROCKSCH, "Kõnig [osia", em: Zahn-Fesigabe, 1928, 19-53. - H. H. ROWLEY, "Hezekiahs Reform and Rebellion", BJRL 44 (1961/1962), 395-431 (= Men of God, 1963,98-132). - E. W. TODO, "The Reforms of Hezekiah and [osiah", SJTh 9 (1956), 288-293. 45 F. CH. FENSHAM. "The Treaty between Solomon and Hiram and the Alalakh Tablets", JBL 79 (1960), 59s. - A. W. HEATHCüTE, Israel to the time of Solomon, 1960. - B. ROTHENBERG. "Ancient Copper Industries in the Western Arabah", PEQ 94 (1962),
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OS LIVROS
DE
JOSUÉ ATÉ REIS (os PRIMEIROS PROFETAS)
fonte histórica, mas o ordenou de uma maneira bem definida: legitimação da figura de Salomão, com a novela real (3.4-15); seu sábio julgamento (3.16-28); seu governo (4.1-5.8); sua sabedoria (5.9-14); a construção do palácio e do templo (5.15-9.14); construções de fortalezas (9.15-24); riqueza e sabedoria de Salomão (9.25-10.29); a apostasia; por influência de suas mulheres, e o castigo conseqüente 01.1-40). Um dos aspectos característicos consiste em que, dentre as construções, é a do templo que aparece em primeiro plano", embora constituísse apenas a capela do palácio real, e em que os casamentos diplomáticos com mulheres e a construção de lugares de culto para elas fossem considerados como pecado e como causa dos insucessos de Salomão. Determinadas informações paralelas, como, p.ex., 4.20 + 5.1 e 5.4s; 5.6-30 e 10.23-26 + 9.10-23, bem como uma comparação com as formas textuais dos massoretas e dos LXX nos mostram que o texto permaneceu instável por longo tempo, e que tanto o texto massorético como o Codex Vaticanus e a recensão luciana da versão dos LXX talvez devam ser consideradas como combinação de diversas formas textuais. Para a história dos reis da época pós-salomônica em geral, o autor deuteronomista só extraiu breves notícias das duas fontes históricas, e quanto ao restante, faz apenas referências a elas. Só as utiliza mais pormenorizadamente para Atalia e [oas (2Rs 11SS)47 e para a reforma de [osias (2Rs 22s)48.
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5-71. - J. SCHREIDEN. "Les entreorises navales du roi Salomon", AIPhOS 13 (1955), 587-590. - F. THIEBERGER, Le roi Salomon et son temps, 1957. - G. E. WRIGHT, "More on King Solomon's Mines", BA 24 (1961), 59-62. - S. YEIVIN, "Did the Kingdom of Israel have a Maritime Policy?", JQR 50 (1959/1960), 193-228. P. L. GARBER, "Reconstructing Solomon's Temple", BA 14 (1951), 2-24. - H. W. HERTZBERG, "Der heilige Fels und das Alte Testament", JPOS 12 (1932), 32-42 (= Beitriige zur Traditionsgeschichte und Theologie des Alten Testament, 1962,45-53). - W. KORNFELD, "Der Symbolismus der Tempelsãulen", ZAW 74 (1962),50-57. - J. L. MYREs, "King Solomon's Temple and other Buildings and Works of Art", PEQ 80 (1948), 14-41. A. PARROT, Le Temple de [érusalem, 1954 (alemão: 1956). - H. SCHMIDT, Der heilige Fels in Jerusalém, 1933. - H. SCHULT", "Der Debir im salomonischen Tempel", ZDPV 80 (1964),46-54. - L.-H. VINCENT, Jérusalem de l'Ancien Testament, I-III 1956. W. RUOOLPH, "Díe Einheitlichkeit der Erzãhlung vom Sturz der Atalja", em: BertholetFestschrift, 1950,473-478. R. MEYER, "Auffallender Erziihlungsstil in einem angeblichen Auszug aus der 'Chronik der Konige von [uda'", em: Baumgiirtel-Festschrift, 1959, 114-123.
§ 33. OS LIVROS DOS REIS
319
5. Os complexos narrativos Afora algumas tradições relativas aos reis, os complexos narrativos utilizados compreendem ainda uma série de lendas mais ou menos extensas sobre os profetas. A. Formam parte das tradições sobre os reis primeiramente as narrativas da cisão do reino (lRs 12.1-19), cuja responsabilidade maior toca a Roboão, e as narrativas sobre a revolução de [eú (2Rs 9*-10). Em segundo lugar, as perícopes lRs 20-1-34 e 22, contendo as narrativas das guerras e da morte de Acab, representam os restos de uma tradição própria de Acab e estão muito próximas dos acontecimentos descritos, e muito provavelmente datam do séc. IX.49 No capo 22 essa tradição vem unida a uma lenda profética em tomo da pessoa de Miquéias filho de [emla. Nela se aprecia a grandeza do circunspecto, leal, magnânimo e corajoso rei (20.4,7-9,33; 22.35) que, no entanto, se fechou à palavra do profeta de Javé. Por causa de seu julgamento negativo sobre Acab, o redator deuteronomista só se utilizou de uma parte dessa tradição. B. A tradição de Elias (lRs 17-19; 21; 2Rs1.1-17)50 contém sobretudo seis narrativas originais e autônomas: 1. 2. 3. 4. 5. 6.
sobre sobre sobre sobre sobre sobre
a o a a o a
sede e a dádiva da chuva: lRs 17.1; 18.1a~-2a,16s,41-46, juízo de Deus no Carmelo: 18.19-4051, teofania no Horeb: 19.3b,8b* 9-12,13*, vocação de Eliseu: 19.19-2152, assassínio de Nabot: 21.1-9,11-20, consulta de Ocozias ao oráculo: 2Rs 1.2-8,17a.
E. HALLER, Charísma und Ekstasís, 1960. A. ALT, Der Stadtstaat Samaría, 1954 (= Kleíne Schríften, III 1959, 258-302). - Élíe le prophêie, 1956/57. - G. FOHRER, Elia, 1957. - H. GUNKEL, Elias, Jahwe und Baal, 1906. C. A. KELLER, "Wer war Elia?", ThZ 16 (1960), 298-313. - B. D. NAPIER, "The Omrides of [ezreel", VT 9 (1959), 366-378. 51 A. ALT, "Das Gottesurteil auf dem Karmel", em: Beer-Festschríft, 1935, 1-18 (= Kleíne Schríften, II 1953, 135-149).D. R. AP-THOMAS, "Elijah on Mount Carmel", PEQ 92 (1960), 146-155. O. EISSFELDT, Der Gott KarmeI, 1953. - K. GALLING, "Der Gott Karmel und die Áchtung der fremden Gõtter", em: AIt-Festschríft, 1953, 105-125. - H. JUNKER, "Der Graben um den Altar des Elias", Tríerer ThZ 69 (1960),65-74.- H. H. ROWLEY, "Elijah on Mount Carmel", BJRL 43 (1960/1961), 190-219 (= Men ofGod, 1963,37-65). - R. DE V AUX, "Les prophetes de Baal sur le Mont Carmel", BMB 5 (1941), 7-20. E. WüRTHWEIN, "Die Erzãhlung vom Gottesurteil auf dem Karmel", ZThK 59 (1962), 131-144. 52 A. ALT, "Die literarische Herkunft von I Reg 19.19-21", ZAW 32 (1912), 123-125. 49
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OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (OS PRIMEIROS PROFETAS)
Com exceção da terceira narrativa, todas as outras possuem um núcleo histórico. A primeira, a segunda e a quinta narrativas se desenrolam sobre o pano de fundo, tanto da política neutra e paritária, introduzida por Acab com relação às partes israelita e cananéia da população, quanto da tentativa de introduzir uma realeza absolutista. A segunda narrativa nos mostra que Elias não conseguiu impor seus pontos de vista à casa real. Às narrativas assinaladas acima acrescentaram-se seis anedotas, ao longo de diferentes estágios: 1. 2. 3. 4. 5. 6.
sobre o aprovisionamento de Elias junto à torrente de Carit: 1Rs 17.2-6, sobre o aprovisionamento de Elias em Sarepta: 17.7-16, sobre a ressurreição de um morto: 17.17-24; 18.1aa, sobre o encontro com Abdias: 18.2b-15*, sobre o reconfortamento por parte de um anjo: 19.4a,5-8*, sobre a tentativa de prisão de Elias: 2Rs 1.9-16.
o processo de formação e de aperfeiçoamento da tradição, ao longo do qual se juntaram os versículos não mencionados, começou logo depois dos acontecimentos históricos e teve uma primeira conclusão no final do séc. IX. Não muito depois de sua fixação por escrito, a tradição se dividiu em dois grupos, a saber: a) O primeiro grupo é constituído pela novela de lRs 17-19, na qual se fundiram narrativas e anedotas (menos aquelas indicadas em c), em virtude dos temas historicamente inexatos a respeito da idolatria de Acab e da perseguição dos profetas de Javé. Este grupo introduz Elias, nominalmente, chamando-o, vez por outra, de profeta, e ligando sua intervenção positiva a acontecimentos miraculosos, caracterizando-o como um novo, como um segundo Moisés. Foi influenciado pela tradição de Eliseu e sintonizado com ela. b) O segundo grupo se encontra em lRs 21 e 2Rs 1.2-S,17a. Nesse grupo, o profeta se chama Elias, o tesbita, e seu opositor é o rei da Samaria. Elias nada mais é do que o mensageiro da palavra de Javé. c) Acrescentam-se como terceiro elemento as duas anedotas de lRs 17.17-24; IS.laa e 2Rs 1.9-16, que introduzem Elias na qualidade de homem de Deus e transforma o acontecimento miraculoso em algo de sobre-humano. Essas anedotas supõem os dois grupos anteriores de narrativas e constituem um elo de ligação entre eles.
§ 33. OS
LIVROS DOS REIS
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C. A tradição de Eliseu acha-se bastante bem representada em 2Rs 2; 3.4-27; 4.1-8.15; 9.1-10; 13.14-2153 • Trata-se de uma tradição que se constituiu independentemente e se distingue da tradição de Elias, tanto sob o aspecto formal como pelo conteúdo, embora tivesse havido influência e harmonização recíprocas. a) O primeiro conjunto é de narrativas cujo objetivo são constituído por um ciclo histórias populares a respeito de milagres e que se mantiveram unidas por causa de sua vinculação com GuilgaL Originariamente, este conjunto continha anedotas autônomas, onde se refletem os resultados de poder real de Eliseu, ou se aplicam a ele certos temas que eram muito difundidos. Depois da narrativa introdutória: 2.1-18, que descreve o começo da atividade de Eliseu, pertencem a este conjunto as perícopes seguintes: 2.19-22,23-25;4.1-7,8-17,18-37,38-41,42-44; 6.1-7. A narrativa 8.16, que supõe a morte de Elias, foi composta como conclusão, por um compilador de histórias miraculosas. A narrativa isolada de 13.20s só pertence a esse grupo pelo conteúdo. b) Um segundo conjunto de tradições é constituído por uma série de narrativas isoladas que conservaram sua autonomia até que foram associadas ao primeiro grupo. Grosso modo, elas se aproximam da narrativa histórica, mas quanto aos detalhes, apresentam aspectos que muito se diferenciam entre si. Em 5; 6.8-23; 8.7-15 se encontram elementos típicos da esfera do miraculoso, da lenda e da saga. As narrativas 3.4-27; 6.24-7.20 se assemelham à forma específica de narração da tradição de Acab. A perícope 9.1-10 foi integrada no relato da revolta de [eú. A passagem 13.14-19 relata uma ação simbólica. Todas essas narrativas têm em comum o fato de apontarem a importância política e histórica de Elias em sua época. Em algumas dessas narrativas ele aparece animado de sentimentos hostis para com a dinastia reinante, a ponto de, para provocar a queda dessa dinastia, chegar a se colocar ao lado dos arameus (3.4-27; 8.7-15). Esta circunstância nos traz à lembrança a época de [orão, último rei da dinastia de Amri. Seu momento crítico é a revolução de [eú, da qual um dos autores foi também Eliseu. Nas outras narrativas, que datam da época da dinastia de [eú, Eliseu aparece animado de sentimentos favoráveis à dinastia reinante e como inimigo dos arameus (5;6.8-23; 6.24-7.20; 13.14-19). 53
K. GALLING, "Der Ehrenname Elisas und die Entrückung Elias", ZThK 53 (1956), 129-148. - H. GUNKEL, Geschichten von Elisa, 1922. - J. HELLER, "Orei Wundertaten Elisas", CV 1 (1958/1959), 61-70. - W. REISER, "Eschatologische Gottessprüche in den Elisa-Legenden", ThZ 9 (1953), 327-338.
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Os LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (os PRIMEIROS PROFETAS)
D. A tradição de Isaías (2Rs 18.13; 18.17-20.19, vinculada à notícia de 18.14-16, originária da fonte histórica) foi assumida também no livro de Isaías (= Is 36-39). Essa tradição compreende quatro narrativas, das quais as duas primeiras se fundiram entre si: a) Em 18.13,17-19.37 se encontram duas narrativas da ameaça de Jerusalém pelos assírios, durante o reinado de Ezequias, e da sua libertação miraculosa". A primeira dessas narrativas compreende, além da introdução: 18.13, principalmente o conjunto 18.17-19.9a. Ela se interrompe neste ponto, para que a segunda narrativa possa ser incluída, e volta em 19.36s sob a forma de conclusão. A segunda narrativa: 19.9b-35, foi inserida, portanto, na primeira. Ambas apresentam a mesma estrutura e se dividem em quatro seções: Intimação de Senaquerib à capitulação Reação de Ezequias Promessa de Isaías Retirada dos assírios
18.13,17-37 19.1-5 19.6s 19.8-9a,36s
19.9b-13 19.14-19 19.20-34 19.35
A segunda narrativa contém, na primeira, na segunda e na quarta perícope, a exposição mais simples e mais breve, mas também a mais bem caracterizada do ponto de vista teológico. Desde que, segundo esta narrativa, o ataque assírio se dirigia contra o próprio Deus, a palavra de Javé foi completada por três grandes oráculos na terceira perícope (vv. 21-28,2931,32-34). Nas duas primeiras perícopes da primeira narrativa, a descrição foi dividida em duas partes e é mais circunstanciada. Embora se ouçam aí os ecos de recordações históricas, não se trata de narrativas históricas, mas de lendas que servem para edificação do leitor. Que os acontecimentos históricos tenham seguido outro rumo é o que se deduz da notícia de 18.14-16 e do que se diz no relato de Senaquerib. Além disso, os oráculos proféticos dependem de Is 14.4ss e do Dêutero-Isaías, de modo que terão surgido, o mais tardar, na época posterior ao exílio. As referidas lendas nenhuma contribuição oferecem para a compreensão de Isaías. b) A narrativa da doença e da cura miraculosa de Ezequias (20.1-11) originariamente não estava ligada a nenhum período de seu reinado. Ela foi encaixada no mês em que se deu a ameaça assíria, por meio da introdução e do v. 6, que é um acréscimo posterior. 54
Estas narrativas não se referem a duas campanhas militares distintas; assim recentemente também J. BRIGHT, A History of Israel, 1959 (trad, port. História de Israel, São Paulo, Paulus, 7a ed., 2004).
§ 33.
OS LIVROS DOS REIS
323
c) A narrativa da embaixada do babilônio Merodac-Baladã (2 Rs 20.1912) originariamente refletia um episódio dos preparativos para a revolta de Ezequias contra os assírios. Posteriormente ela foi reinterpretada no sentido do exílio babilônio e dentro do contexto dos oráculos proféticos que se acrescentaram. E. Além da narrativa sobre Miquéias filho de [emla, utilizada em 1Rs 22, podem-se mencionar ainda outras lendas proféticas, como sejam: 1Rs 11.29-39; 12.15; 14.1-18; 15.29: sobre Aías de Silá, colocadas posteriormente em função das idéias deuteronomistas, 1Rs 12.2124: sobre Seméias, 1Rs 12.32-13.32: sobre o aparecimento de um profeta desconhecido contra o altar de Betel e acompanhado da narrativa subseqüente de sua desobediência e seu castigo, narrativa em que se tem identificado muitas vezes a tradição popular em torno de Amós", 2Rs 21.7-15: uma profecia anônima contra o rei Manassés.
6. Os livros deuteronomistas dos Reis
o
autor ou os autores do livro deuteronomista dos Reis criaram a moldura para a apresentação dos diversos reis e escolheram o material histórico e narrativo da tradição já existente. Evidentemente que eles não tinham em vista nenhuma apresentação circunstanciada da história e por isso não levaram em conta a significação objetiva da realeza e de seus titulares. O que eles planejaram foi uma reflexão religiosa da história, na qual o templo de Jerusalém e o relacionamento dos reis para com ele, como também os profetas, deviam aparecer em primeiro plano. Sobre aqueles reis cujo governo nada ofereciam nesse sentido, foram dadas apenas as informações mais indispensáveis. Assim, p.ex., o rei Omri, importantíssimo do ponto de vista da história, não recebeu mais do que seis versículos". Para o restante, os interessados podiam consultar as fontes que ainda se achavam à disposição. Dado que a moldura de cada relato, onde está contido o julgamento sobre os reis, supõe a lei deuteronômica da centralização, além Em último lugar O. ErssFELDT, "Amos und [ona volkstümlicher Überlieferung", em: Barnikol-Festschrift, 1964, 9-13. 56 H. PARZEN, "The Prophets and the Omri Dynasty", HThR 33 (1940), 69-96. - C. F. WHITLEY, "The Deuteronomic Presentation of the House of Omri", VT 2 (1952), 137-152.
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OS LIVROS DE JOSUÉ ATÉ REIS (os PRIMEIROS PROFETAS)
da reforma de [osias, os livros deuteronomistas dos Reis só foram redigidos depois de 622 a.c. A primeira data de que se dispõe é o ano de 561 (2Rs 25.27), e deveria, por conseguinte, representar o limite superior da época de sua origem. No entanto, freqüentemente se pode comprovar a presença de duas mãos deuteronomistas, de modo que se deve admitir dois redatores, ou um redator e um complementádor. O "redator" escreveu a parte principal dos livros, logo depois de 622, e é o autor propriamente dito de toda a obra. Visto como ele não conhece o exílio babilônico nem a morte de [osias no campo de batalha (2Rs 22.20), conclui-se que terminou seu trabalho antes de 609. O "complementador" continuou a obra e concluiu-a durante o exílio. É a ele que se devem as referências ao exílio, além de outras complementações e da conclusão dos livros, a partir de 2Rs 23.25b. Ele termina com o indulto concedido a [oaquim'", mas nada sabe sobre o fim do exílio (538 a.Ci).
7. Acréscimos posteriores Os livros deuteronomistas dos Reis, como outros livros, receberam também alguns acréscimos posteriores. Sem falar das observações ou das glosas, devemos mencionar a ampliação da oração pronunciada durante a dedicação do templo (lRs 8.23-26,41-51) e a aparição de Deus na mesma ocasião (9.1-9), a lenda do profeta anônimo (lRs 20.35-43) e a ampliação dos motivos da queda do reino setentrional (2Rs 17.7-20,29-40). Quanto ao mais, o texto dos livros, mesmo fora da história de Salomão, permaneceu por muito tempo instável e em constante mutação, e somente mais tarde é que foi fixado canonicamente.
8. Valor histórico e objetivos teológicos O valor histórico dos livros dos Reis se acha determinado pelo fato de que os seus redatores utilizaram-se de fontes históricas fidedignas, como também de tradições proféticas que têm um pano de fundo pelo menos parcialmente histórico. Embora com isto tenham sido conservadas preciosas notícias, posto que selecionadas segundo determinados fins e intro57
W. F. ALBRIGHT, "King Joiachin in Exile", BA 5 (1942),49-55. - E. WEIDNER, "[ojachin, Kõnig von [uda, in babylonischen Keilschrifttexten", em: Mélanges Syriens Dussaud, II 1939,923-935.
§ 33.
OS LIVROS DOS REIS
325
duzidas na história de Salomão, em meio a uma seqüência de acontecimentos não-históricos, contudo, uma parte ainda maior da revisão deuteronomista da história estudada foi sacrificada e se perdeu de modo irreparável, juntamente com as antigas fontes históricas. Os objetivos teológicos dos redatores dos livros dos Reis se deduzem a partir da situação histórica da época dos mesmos. O "redator", que vivia na época de [osias, julga a história à luz das relações dos reis para com o templo de Jerusalém, considerado como o único e verdadeiro santuário, e para com os mensageiros da palavra de Javé. Em tudo ele procura os paralelos com a situação de seu tempo. Trata-se da luta contra os abusos de inspiração pagã e sincretista; trata-se de impor a fé javista pura, como última possibilidade de libertação da desagregação interior, de que a história nos fala. O "complementador", que trabalhou no exílio, reconhece na situação dos deportados a conseqüência da antiga culpa, e vê na ruína de Israel e [udá o julgamento anunciado pelos profetas. O que aconteceu no passado deve constituir-se em ensinamento e advertência para a geração presente que vive uma nova hora de decisão e deve reencontrar o caminho das fontes de sua fé, para que esta mesma geração e sua fé javista não sejam levadas à ruína.
CAPÍTULO
IV
A OBRA HISTÓRICA CRONÍSTICA § 34. A OBRA CRONÍSTICA (1-2 CRÔNICAS, ESDRAS, NEEMIAS) ATO: K. GALLING, 1954 (1958). - BOT: A. VAN DEN BORN, 1960; J. DE FRAINE, 1961. - HAT: W. RUDOLPH, 1955; Id., 1949. - HK: R. KITTEL, 1902; K. SIEGFRIED, 1901. - HS: J. GOETTSBERGER, 1939; H. SCHNEIDER, 4a ed., 1959. - 18: W. A. L. ELMSLIE, 1954; R. A. BoWMAN, 1954. - ICC: E. L. CURTIS - A. A. MADSEN, 1910 (1952); L. W. BATIEN, 1913 (1949). - KAT: J. W. ROTHSTEIN - J. HÂNEL, I 1927. - KeH: E. BERTHEAU, 2a ed., 1873; In., - V. RYSSEL, 2a ed., 1887. - KHC: I. BENZINGER, 1901; A. BERTHOLET, 1902. - SAT: M. HALLER, ed., 1925. SZ: S. OETTLI, 1889.
z-
1. Unidade, inversão e divisão É universalmente reconhecido que os livros de 1 e 2 Crônicas, Esdras e Neemias foram elaborados como uma unidade literária a que se deu o nome de história cronística. Esta obra nos oferece uma visão global de toda a história de Israel, com suas etapas iniciais, desde a criação do mundo até à época de Esdras e Neemias. Seu redator, o Cronista, aparece como o autor do conjunto justamente pela unidade da linguagem, do estilo e do método de trabalho, como também pelo universo de suas idéias sempre iguais e que gravitam em torno do templo, do culto, da lei do instituto dos levitas e da dinastia davídica. Além disso, esta conexão original também se percebe a partir do fato de que a conclusão dos livros das Crônicas, ou seja 2Cr 36.22s, coincide quase literalmente com Esd 1.1-3. Isto vem confirmar a suposição, aliás evidente em si mesma, de que a seqüência correta dos livros deve ser Crônicas-Esdras-Neemias, ao contrário do cânon hebraico (Esdras-Neemias-Crônicas). A inversão e a divisão atuais se fundamentam em dois fatos:
328
A
OBRA HISTÓRICA CRONÍSTICA
a) A razão para dividir em 1 e 2 Crônicas, de um lado, e Esdras-Neemias, do outro, reside na circunstância de que os dois últimos livros foram os primeiros do grupo a serem investidos da validade canônica, porque, ao contrário das Crônicas, cujo conteúdo corre paralelo ao dos livros de Cênesis-Reis, relatavam acontecimentos até então não narrados e que eram de particular importância para o judaísmo. Quando, em época posterior, as Crônicas foram reconhecidas canonicamente, encontraram seu lugar antes de Esdras-Neemias. b) Originariamente, no cânon hebraico as Crônicas e Esdras-Neemias formavam respectivamente dois tomos separados. Esses tomos foram, por sua vez, divididos, cada um, em dois livros, como nos livros de Samuel e Reis, divisão esta adotada pela versão dos LXX. Para Esdras-Neemias ela aparece documentada pela primeira vez em ORÍGENES, na segunda metade do séc. III d.e. Ela entrou nas traduções latinas, bem como nos manuscritos e impressões hebraicos a partir de 1448.
2. Terminologia As Crônicas, cuja denominação é da autoria de JERÔNIMO (chronicon totius divinae bisioriae), no original se chama [seper] dibrê bãyyamfm, "[Livro dos] Fatos Cotidianos", isto é, "Anais", que na versão dos LXX recebe o nome de paraleipómena, "0 que foi omitido, deixado de lado". O conjunto dos livros de Esdras-Neemias chama-se de Esdras também na versão dos LXX. Depois de sua divisão, a tradição hebraica passou a designá-las pelo nome das suas duas figuras principais. Dado que a versão dos LXX numera o livro apócrifo de Esdras como sendo o primeiro do mesmo nome, o resultado foi a seguinte confusão de nomes no texto massorético, na versão dos LXX e na Vulgata: Esdras Neemias 3 Esdras (Esdras apócrifo) 4 Esdras (Apocalipse de Esdras)
- Esdras b - Esdras g - Esdras a
- Esdras I - Esdras 11 - Esdras III
- Esdras ho profétes - Esdras IV (Esdra apokálupsis)
3. Conteúdo e objetivos O conteúdo dos livros, que só se pode indicar em suas grandes linhas, revela os objetivos da obra. Ao contrário do reino apóstata do norte, o reino de [udá, com a dinastia davídica e o templo de Jerusalém, é o
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verdadeiro Israel e o depositário da soberania divina, que se realizou no reino davídico. Sua herdeira legítima não é a comunidade samaritana que estava então se formando, mas a comunidade cultual de Jerusalém, depois de sua volta do exílio, a comunidade que preserva e continua essa tradição. 1Cr 1-9 10-29 2Cr 1-9 10-36
De Adão até Saul (listas genealógicas), Morte de Saul e Davi, Salomão, Da cisão do reino ("apostasia das dez tribos") até o fim do exílio, Da fundação da nova comunidade até e construção do Esd 1-6 templo, Esd 7-Ne 13 Restabelecimento e consolidação por obra de Esdras e Neemias.
4. Origem Para se determinar a época de origem da obra cronística é preciso ter em conta, em primeiro lugar, que essa obra conhece todo o Pentateuco, inclusive o documento sacerdotal já então utilizado. Em segundo lugar, a obra pressupõe a atividade de Esdras e Neemias, a qual deve mesmo ter ficado para trás desde há muito, porque o Cronista pôde agir arbitrariamente com a tradição referente aos mesmos. Evidentemente que a atuação desses dois homens é datada de maneira muito diferente. Se o trabalho de Neemias se desenvolveu nos anos 445-432 e o de Esdras a partir de 398 - como parece muitíssimo provável (§ 35,6) - o Cronista deve situarse, quando menos, na segunda metade do séc. IV a.c. Tendo em vista que, apesar do antagonismo mais antigo entre a comunidade jerosolimitana e Samaria, a atenção do Cronista está voltada concretamente para a comunidade samaritana que surgiu depois de 350, a redação de sua obra deve ter sido executada por volta do ano 300 a.c. Que ela tenha surgido em Jerusalém deduz-se por si mesmo, a partir da própria exposição.
§ 35. ORIGEM E PECULIARIDADE DA OBRA CRONÍSTICA F. AHLEMANN, "Zur Esra-Quelle", ZAW 59 (1942/43), 77-98. - W. F. ALBRIGHT, "The Date and Personality of the Chronicler", fBL 40 (1921), 104-124. - J. P. AsMUSSEN, "Priesterkodex und Chronik in ihrem Verhâltnis zueinander", ThStKr 79 (1906), 165-179. - A. BEA, "Neuere Arbeiten zum Problem der biblischen Chronikbücher", Bibl (1941), 46-58. - A.
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1. Fontes para o período anterior ao exílio
o Cronista não realizou uma exposição inteiramente nova e independente, mas extraiu os fatos, em linhas gerais, das fontes que ele já encontrara, e selecionou de cada uma delas aquilo que servia aos seus
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intuitos. Neste sentido, ele deu continuidade ao procedimento dos redatores deuteronomistas dos livros dos Reis. Como fontes para o período anterior ao exílio (I e 2 Crônicas) ele utilizou, em todo caso, os livros de Gênesis-Reis, com os quais sua exposição em geral corre paralela. Isto resulta da semelhança dos contornos e de uma concordância às vezes até literal. Enquanto para a árvore genealógica dos pais, de Adão e Jacó e dos descendentes de Esaú (edomitas) (lCr 1) foi utilizado Cênesis, na base da lista dos filhos de Jacó que, no Cronista, só ocupava alguns versículos de 1Cr 2-9 (Nora), estão as notícias de Nm 26, assim como uma genealogia davídica e uma genealogia dos sumos sacerdotes. Para todo o período dos reis, no qual, depois da divisão do reino, só se consideram os reis de [udá e se ignoram por completo os reis de Israel, o redator se serviu, pelo menos, em primeira linha, dos livros de Samuel e dos Reis. Além disso, na conclusão da história de cada um dos reis, o Cronista menciona, como o faz o redator dos livros dos Reis, determinadas fontes em que se deveria encontrar material mais abundante a respeito dos reis. Pergunta-se, conseqüentemente, se essas fontes estavam a seu dispor e se lhe forneceram parte de seu material (ErssFELDT*, entre outros), ou se se trata apenas de uma imitação literária das informações contidas nos livros dos Reis (GALLING, NOTH, TORREY, entre outros). As indicações das fontes se dividem em dois grupos: a)
A respeito de algumas fontes se diz que elas tratavam de reis, mas não há informações sobre o seu redator: Livro dos Reis de Israel e [udá (2Cr 27.7; 35.27; 36.8), Livro dos Reis de [udá e Israel (2Cr 16.11; 25.26; 28.26; 32.32), Livro dos Reis de Israel (2Cr 20.34), Palavras dos reis de Israel (2Cr 33.18), Midráshe (comentário) do Livro dos Reis (2Cr 24.27).
b)
Outras fontes são designadas como palavras, profecias, visão ou midrash de determinados profetas: Samuel, Natã e Gad para a história de Davi (lCr 29.29), Natã, Aías e Ido, para Salomão (2Cr 9.29), Seméias e Ido, para Roboão (2Cr 12.15), Ido, para Abias (2Cr 13.22), Jeú, para Josafá (2Cr 20.34), Isaías, para Ozias (2Cr 26.22) e Ezequias (2Cr 32.32), Seus videntes, [Hozai], para Manassés (2Cr 33.19).
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Somente o número e a variedade dessas fontes já nos levam a duvidar de que se tratava de obras propriamente ditas, que o Cronista teria tido ao seu alcance. Provavelmente os diversos nomes das fontes relativas aos reis indicam globalmente os livros deuteronomistas dos Reis. O mesmo vale para as fontes dos profetas cujos "redatores" são indicados complexivamente nos livros de Samuel e dos Reis. Deste modo, pelas fontes que lhes são atribuídas se devem entender aquelas passagens que em época muito posterior se acreditava terem sido redigi das por determinados profetas. Na realidade, as Crônicas contêm uma série de notícias que, sem dúvida nenhuma, são antigas e fidedignas, mas não se encontram nos livros dos Reis. Em todo caso, entre estas notícias se contam as seguintes perícopes: 2Cr 11.5b-10a 26.6-8a 26.9,15a 27.5 28.18 32.30 33.14a 35.20-24
Lista das fortalezas de Roboão, Guerras de Ozias, Fortificações de Ozias em Jerusalém, Campanha de [oatão contra os amonitas, Cidades perdidas por Acaz para os filisteus, Construção do túnel por ordem de Ezequias, Fortificações de Manassés, Morte de [osias no campo de batalha.
Em 2Cr 14.5-7; 17.2a,12b-19; 25.5; 27.3s talvez tenham sido utilizadas mais outras notícias sobre fortificações e armamentos. O mesmo parece ter acontecido nos dois relatos de guerra: 2Cr 13.3-20 e 14.8-14. Todas estas informações sobre construções de defesas (das quais fazia parte o túnel de Siloé) e sobre guerras travadas, o Cronista deve tê-las extraído de uma fonte suplementar, a respeito da qual nada mais se sabe a não ser que ela continha informações relativas aos mencionados temas. Muito dificilmente se pode pensar em tradições orais (BENZER*, ENGNELL*).
2. Fontes para o período posterior ao exílio Nos livros de Esdras e Neemias faltam referências às fontes que foram utilizadas, a não ser que se pretenda tomar nesse sentido aquelas informações, de natureza diferente, que se lêem em Ne 1.1; 7.5 e 12.23. O Cronista, contudo, já encontrou e utilizou várias fontes para a época posterior ao exílio.
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a) Em Esd 1.1-4.5, que relata o repatriamento dos deportados, o começo da reconstrução do templo e a oposição de seus adversários', pelo menos as passagens 1.2-4,8-11a; 2 provêm de fontes antigas. Não se pode dizer com certeza se toda a perícope constitui uma dessas fontes (EISSFELDT*), ou se é uma narrativa própria do Cronista (NOTH, RUDOLPH, SCHAEDER), não só por causa dos fragmentos isolados que indicamos, como também por causa dos livros de Ageu e Zacarias. b) Na base de Esd 4.6-6.18 encontra-se uma fonte aramaica, ou seja: uma exposição documentada das dificuldades encontradas por ocasião da construção do templo e dos muros da cidade, nos reinados de Dario I, Xerxes e Artaxerxes F. Cronologicamente, essa exposição é incoerente, pois narra acontecimentos passados sob Dario (4.24-6.18), depois daqueles que, na ordem do tempo, se deram mais tarde, nos reinados de Xerxes e Artaxerxes (4.6-23). Procurou-se explicar isto, afirmandose que se trata de um documento apologético, dirigido a Artaxerxes, para provar a fidelidade dos judeus para com o estado persa (KITTEL, KLOSTERMANN, SCHAEDER), embora em lugar nenhum o texto faça alusão a uma tal finalidade. Por outro lado, tem-se admitido que se trata de uma descrição da reconstrução da cidade e do templo, surgida por volta do ano 300 a.c., e na qual a referida reconstrução, dada a sua distância cronológica em relação aos acontecimentos descritos, era considerada como um empreendimento unitário e parecia ter-se encerrado com a reconstrução do templo (4.24ss) (NoTH). Pode-se supor, pelo contrário, que foi o próprio Cronista quem realizou a transposição, no intuito de documentar, com a perícope 4.6ss e em continuação a 4.1-5, a hostilidade demonstrada pelas classes superiores de Samaria com respeito à reconstrução (RUDOLPH). c) Uma terceira fonte é aquela constituída pelas chamadas memórias de Esdras. Dificilmente podemos considerar sua forma na primeira pessoa gramatical como simples ficção e fazê-la remontar a uma desconhe-
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E. J. BrCKERMAN, "The Edict of Cyrus in Ezra 1", JBL 65 (1946), 249-275. - K. GALLING. "Der Tempelschatz nach Berichten und Urkunden im Buche Ezra", ZDPV 60 (1937), 177-183 (= "Das Protokol über die Rückgabe der Tempelgerãte, em: Studien zur Geschichte Israels im persischen Zeitalter, 1964,78-88). - H. L. GINSBERG, "Ezra 1.4", JBL 79 (1960),167-169 - L. ROST, "Erwãgungen zum Kyroserlass", em: Rudolph-Festschrift, 1961, 301-307. K. GALLING, "Kyrosedikt und Tempelbau", OLZ 40 (1937), 473-478. - R. DE VAUX, "Les décrets de Cyrus et de Darius sur la reconstruction du Temple", RB 46 (1937), 29-57.
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cida testemunha ocular dos acontecimentos (MOWINCKEL), nem igualmente atribuir toda a descrição ao Cronista (HOLSCHER, KAPELRUD, NOTH, TORREY). Embora se trate, muito provavelmente, de uma revisão cronística, a base, contudo, talvez remonte a Esdras. A esta base pertence certamente o conjunto de Esd 7.11-9.5 (com exclusão da lista, de origem recente, que se lê em 8.1-14, a oração contida em 9.6-15 deve ser considerada como acréscimo, contrariamente ao que afirma SCHAEDER). Discutese, porém, se Esd lO, que conservou o estilo de Esdras, também pertence às memórias de Esdras, e se, mais tarde, se fez a transposição da primeira para a terceira pessoa (BUDDE, RUDOLPH), principalmente porque o capítulo em sua maior parte é um acréscimo posterior. O mesmo problema se coloca a respeito da proveniência de Ne 8.1-9.5 onde Esdras é também a figura principal (a menção de Neemias em 8.9 é uma glosa). Cronologicamente e do ponto de vista dos temas, o assunto narrado caberia entre Esd 8.32-36 e 9.1. Os capítulos, contudo, conservaram também o estilo de Esdras. Em face desse estado de coisas, podemos dizer que a perícope Esd 7.11-9.5 constitui parte das memórias de Esdras, mas foi revista sob o ponto de vista cronológico, ao passo que Esd 10* e Ne 8.1-9.5 foram, pelo contrário, reescritos pelo Cronista com base nas referidas memórias (a oração que se lê em Ne 9.6-37 deve ser igualmente considerada como acréscimo, contra SCHAEDER)3. d) Em Ne 1.1-7.5 (sem a lista de 3.1-32); l1.1s; 12.27-13.31* se encontram as memórias de Neemias, uma obra homogênea, de cunho todo próprio, e vazada em estilo vivo, tendo sido concebida como oferenda votiva dedicada a Deus (§ 7,5; 13,4)4. Estas memórias tratam sobretudo da reconstrução dos muros da cidade, levada a cabo apesar de todas as resistências, como tratam, também, das medidas de ordem social e cultual que foram tomadas por L. J. LIEBREICH, "The Impact of Nehemiah 9.5-37 on the Liturgy of the Synagogue", HUCA 32 (1961),227-237. - M. REHM, "Nehemias 9", BZ NF 1 (1957),59-69. - A. C. WELCH, "The Source of Nehemiah" 9, ZAW 47 (1929).130-137. 4 A. ALT, "Judas Nachbarn zur Zeit Nehemias", PfB 27 (1931), 66-74 (= Kleine Schriften, 11 1953,338-345. - Io., "Die Rolle of Samarias bei de Entstehung des [udentums", em: Procksch-Pestschrift, 1934,5-28 (= ibid. 316-337). - M. Avr-YONAH, "The Walls of Nehemiah", lEf 4 (1954), 239-248. - M. BURROWS, "The Topography of Nehemiah 12.31-43", fBL 54 (1935), 29-39. - Io., "Nehemiah's Tour of Inspection", BASOR 64 (1936),11-21. - F. M. CROSS, [r., "Ceshem the Arebian, Enemy of Nehemiah", BA 18 (1955), 46s. - H. H. ROWLEY, "Sanballat and the Samaritan Temple", BfRL 38 (1955/ 1956),166-198 (= Men Df God, 1963,246-276. - CH. C. TORREY, "Sanballat 'The Horonite'", fBL 47 (1928), 380-389. 3
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Neemias. Pode-se, evidentemente, discutir se essas memórias faziam parte, originariamente, da obra cronística e se foram incorporadas um século mais tarde por um complementador, ao qual se tem dado o nome de "segundo Cronista" (BRICHT, GALLINC), ou se foram unidas à história de Esdras, por obra de um redator pós-cronístíco, na época dos Macabeus (HOLSCHER, MOWINCKEL). A utilização destas memórias e a vinculação estabelecida entre a atividade de Esdras e a de Neemias podem ser consideradas, no entanto, simplesmente como obra do próprio Cronista. O núcleo de Ne 105, que foi também ampliado posteriormente, pode constituir um acréscimo. e) Por fim, o Cronista utilizou, ou elaborou ele próprio algumas listas, a saber: a lista do recenseamento do povo (Esd 2)6, que reflete o estado da comunidade de [udá por volta do ano 400 a.C, e talvez tenha constituído parte de uma possível fonte (1.1-4.5); a lista dos companheiros de Esdras (Esd 8.1-14), que foi composta artificialmente pelo Cronista a partir de Esd 2; a lista das construções (Ne 3.1-32)7, que talvez não pertencesse às memórias de Neemias, mas que o Cronista pode ter extraído de um outro documento.
3. Ampliações e acréscimos A obra cronística sofreu ampliações e acréscimos consideráveis que, para sermos completos, mencionaremos logo a seguir. Sem falar de anotações menores, trata-se sobretudo de listas. A genealogia de lCr 2-9 foi completada com as seguintes perícopes: 2.18-4.23; 4.25-43; 5.1s,4-1O,11-26,27-41; 6.5-33,39-66; 7.2-11,15-19*,21-40; 8.5-9.448• A. JEPSEN, "Nehemia 10", ZAW 66 (1954), 87-106. A. L. ALLRIK, "The Lists af Zerubbabel (Nehemiah 7 and Ezra 2) and the Hebrew Numeral Natation", BASOR 136 (1954), 21-27.- K. GALLING, "The 'QJla-List' according to Ezra 2/ Nehemia 7", JBL 70 (1951), 149-158 (= "Die Liste der aus dem Exil Heimgekehrten", em: Studien zur Geschichte Israels im persischen Zeitalter, 1964, 89-108). - lo., "Von Naboned zu Darius", ZDPV 69 (1953),42-64; 70 (1954), 4-32 (= "Politische Wandlungen in der Zeit zwischen Nabonid und Darius", ibid. 1-60). 7 M. BURROWS, "Nehemiah 3.1-32 as a Source for the Topography of Ancient jerusalém", AASOR 14, 1934, 115-140. 8 A. ALT, "Bemerkungen zu einigen judãischen Ortslisten des Alten Testaments", ZDPV 68 (1951), 193-210 (=Kleine Schriften, n. 1953, 289-305). - H. J. KATZENSTEIN, "Some Remarks on the Lists of the Chief Priests of the Temple of Solomon", JBL 81 (1962), 377-384. - A. LEFEVRE, "Note d'exégese sur les généalogies des Qehatites", 5 6
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Acréscimos são também as listas dos heróis e das guerras de Davi (lCr 12); a lista dos sacerdotes e levitas (l Cr 15.4-10,16-24; 16.5-38,41s, juntamente com o salmo); a lista do pessoal do templo etc. (lCr 23.3-27.34); a lista artificial dos casamentos mistos (Esd 10.18,20-44); a lista de Esd 2, repetida em Ne 7.6-72; a lista das pessoas em Ne 1O.2-28,38b-40 (composta de nomes que se encontram em outras partes de Esdras-Neemias): as listas das populações de Jerusalém e Judá (Ne 11.3-36), e a lista dos sacerdotes e levitas (Ne 12.1-26, formada com base nos elementos extraídos do arquivo do templo). Além disso, orações extensas que se lêem em Esd 9.6-15 e Ne 9.6-37 constituem ampliações introduzidas posteriormente. Diante disto, se conclui que a obra cronística foi muito mais ampliada do que os demais livros históricos. Por isso, chegou-se a pensar que houve um processo contínuo de formação. ROTHSTEIN pretendeu distinguir duas redações, a primeira das quais se teria inspirado no documento sacerdotal e no material mais antigo da história dos reis, e a segunda em todo o Pentateuco. Mas esta divisão é incorreta, porque demonstra completa dependência em relação a todo o Pentateuco (VON RAo). De outro modo, GALLlNG admite dois redatores distintos e situa o chamado "segundo Cronista" no começo do séc. 11 a.c. Discute-se, no entanto, se as ampliações e os acréscimos não indicam uma revisão unitária, executada por uma única mão, ou se, pelo contrário, não se deve a vários complementadores (RUOOLPH).
4. O emprego das fontes À primeira vista, o Cronista parece ter sido muito fiel no emprego de suas fontes. Deixou intacto, o quanto pôde, o conteúdo das mesmas. As divergências formais, que aliás são mínimas, se devem ao fato de que ele adaptou as fontes à linguagem e ao estilo de sua época, modificando ou omitindo certas passagens incompreensíveis, e acrescentando ocasionalmente certas observações explicativas e complementares". Mas fez uma RSR 37 (1950), 287-292. - B. MAZAR, "Gath and Gittaim", IEf 4 (1954),227-238. - K. MÓHLENBRINK, "Die levitischen überlieferungen des Alten Testaments", ZAW 52
(1934), 184-231. - M. NOTH, "Eine siedlungsgeographische Liste in 1. Chr 2 und 4", ZDPV 55 (1932), 97-124. - L. WATERMAN, "Some Repercussions form Late Levitical 9
Genealogical Accretions in P and the Chronicler", AfSL 58 (1941), 49-56. Segundo J. T. MILIK, Dix ans de découvertes dans le Désert de[uda, 1957,25, o cronista, para 1.2 Sm, seguiu uma forma textual documentada em 4QSma •
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escolha bastante livre, condicionada pela finalidade de sua exposição (§ 34,3). Este procedimento o levou a deixar quase inteiramente de lado a história anterior a Davi (afora a morte de Saul) e a história extra-judaíta, e a cancelar nos reis de [udá de vida menos exemplar tudo aquilo que poderia fazê-los aparecer sob uma luz desabonadora, substituindo-o por informações favoráveis. Neste sentido, ele colocou uma parte das narrativas das fontes em outra ordem, de modo que os acontecimentos aparecessem sob uma nova luz. Este procedimento pode ser constatado de imediato pela maneira como ele apresenta a figura de Davi. O Cronista escolheu das fontes aqueles pontos que levam a atenção a se fixar sobre os preparativos para a construção do templo, como também aquilo que nos mostra Davi como um rei triunfante e poderoso. Suas ações decisivas são também concentradas cronologicamente para reunir o mais estreitamente possível os diversos acontecimentos também sob o ponto de vista dos temas. O Cronista, porém, não levou em conta a história da sucessão no trono, nem tampouco a da construção do palácio por Salomão. Na história desse monarca chegou-se ao inverso de transformar em presente feito a Salomão (2Cr 8.1s), a doação que este fizera de certas cidades galiléias a Tiro. Semelhante modo de proceder nos leva a desconfiar da maneira como são utilizadas as fontes para a época posterior do exílio. O Cronista, de fato, não apenas fez uma transposição distorcida, do ponto de vista cronológico, em Esd 4.66.18, como também interrompeu o curso das memórias de Neemias e introduziu um fragmento das memórias de Esdras, a fim de fazer com que estes dois personagens participassem juntos dos grandes acontecimentos da construção dos muros da cidade e da introdução da Lei.
5. Elementos exclusivos do Cronista A utilização das fontes, como acima descrita, não teria alterado por si só, e na proporção em que se deu, o quadro da história dos reis em relação àquele que é apresentado nos livros de Samuel e dos Reis. Isto se deve aos elementos que são exclusivos do Cronista e compõem quase a metade da exposição (ToRREY). Algumas vezes estes elementos são utilizados para corrigir as fontes. Isto vale sobretudo quando ele atribui a Davi todos os preparativos para a construção do templo e deixa a Salomão apenas a sua execução. O mesmo acontece quando se atribui antecipadamente a Esdras as medidas cultuais citadas nas memórias de Neemias (Ne 13.431). Algumas vezes o Cronista se deixa levar pela situação histórica da
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espiritualidade de seu tempo. Assim, ele atribui aos reis as medidas de reforma cultuaI, não no momento conhecido da história, mas o mais cedo possível: a [osafá, ele as atribui, em verdade, ainda no terceiro ano do seu reinado (2Cr 17.7), mas a Ezequias isto ele o faz já no primeiro mês do primeiro ano de governo (2Cr 29.3) e [osias aos vinte anos de idade, depois das considerações que se iniciam aos dezesseis anos do mesmo (2Cr 34.3). É à luz da existência das instituições de sua época que o Cronista descreve detalhadamente as medidas tomadas por Ezequias (2Cr 29.331.21) e a celebração da páscoa por Josias (2Cr 35.1-19), como também é segundo as próprias concepções que ele expõe como deveria transcorrer uma guerra movida em nome de Javé (2Cr 20.1-30)10. Muitas vezes o Cronista insere no meio da narrativa discursos vazados no estilo da pregação levítica de seu tempo (von &\0). Os exemplos mais dignos de nota são os discursos que Davi dirigiu a Salomão, aos "chefes de Israel" e ao povo reunido, a respeito do significado do templo de Jerusalém (lCr 22.7-16; 28.2-10; 29.1-5); o discurso de Abias a [eroboão e aos israelitas, como também a oração de [osafá feita antes da batalha, elementos estes característicos da reflexão histórica do Cronista (2Cr 13.4-12; 20.512), Além disso, o Cronista freqüentemente põe em cena determinados profetas que pregam a penitência e aplicam a doutrina da retribuição a determinadas situações (2Cr 12.5-8; 15.1-7; 16.7-10; 19.2s; 20.37; 28.9-11). O Cronista aparece também, e não por último, como um narrador que tem a pretensão de oferecer ao leitor um quadro vivo dos personagens e dos acontecimentos da história. Em maior proporção do que o redator deuteronomista dos livros dos Reis, ele se esmera em descrever os detalhes, como, p.ex., na narrativa da lepra de azias (2Cr 26.16-21).
6. Valor histórico Depois de tudo isto, já se pode estabelecer o valor histórico da obra cronística. Aquelas informações que se encontram nos livros das Crônicas a respeito de construções de defesas e de realizações de guerras e ultrapassam o respectivo quadro dos livros dos Reis, provêm de uma fonte desconhecida e devem ser consideradas como verídicas e fidedignas. Também não há dúvidas quanto à importância das memórias de Esdras e Neemias, principalmente porque, a par da caracterização involuntária das duas figuras principais, contêm informações importantes a respeito da
10
M. NOTH, "Eine palãstinische Lokalüberlieferung in 2 Chr 20", ZDPV 67 (1945), 45-71.
§ 35.
ORIGEM E PECULIARIDADE DA OBRA CRONÍ5nCA
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época do pós-exílio, geralmente obscura do ponto de vista histórico. E muitíssimo provável que na fonte aramaica (Esd 4.6ss) e no decreto real (Esd 7.12-26) se encontrem documentos autênticos. Em Esd 1.1-4.5 foi utilizado pelo menos o material de um documento antigo. De grande valor é também a exposição para conhecimento da época do próprio Cronista. Sua descrição nos permite ver por dentro a vida religiosa e as instituições cultuais, a concepção do mundo e da história de seu meio ambiente, fatos estes a respeito dos quais não se dispõe senão de umas poucas informações em outras fontes. Quanto ao mais, porém, o perfil da história dos reis acha-se inteiramente alterado, por causa do modo como são utilizadas as fontes e por causa dos dados próprios introduzidos pelo Cronista. Com relação à época posterior ao exílio, tem-se o problema da ordem cronológica em que aparecem as duas figuras principais, problema este criado pelo entrelaçamento das memórias de Esdras e Neemias, e que até hoje não foi resolvido de maneira universalmente aceita. Se considerarmos esse problema partindo da suposição de que somente Neemias é um personagem histórico, sendo Esdras, pelo contrário, um seu substituto lendário, em correspondência com a concepção da época posterior, teremos três hipóteses a estudar e que só coincidem entre si quanto ao ponto de partida, qual seja o de que a atividade de Neemias deve ser situada nos anos 445-432 (ou um pouco mais tarde), durante o reinado de Artaxerxes I: Esdras e Neemias teriam exercido sua atividade na época de Artaxerxes I, na ordem indicada pelo Cronista: primeiro Esdras, a partir de 458, e depois Neemias; b) Esdras e Neemias teriam atuado também na época de Artaxerxes I: primeiramente ter-se-ia feito a construção dos muros da cidade sob a chefia de Neemias que, a seguir, se teria ausentado, por reconhecer a necessidade de uma reforma interior. Esta reforma teria sido empreendida por Esdras, mas teria sido suspensa, por causa da agitação provocada pela lei dos casamentos mistos. Depois disto, Neemias teria regressado e teria posto em execução a lei de Esdras; c) Neemias teria atuado na época de Artaxerxes I, na cidade de Jerusalém; Esdras, pelo contrário, sob Artaxerxes 11, de 398 em diante. Ponderados todos os argumentos, esta hipótese é a que oferece maior probabilidade.
a)
7. Características teológicas Entre as características teológicas da obra do Cronista, estudadas sobretudo por VON RAo, se conta em primeiro lugar a apresentação dos
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A
OBRA HISTÓRICA CRONÍSTICA
acontecimentos segundo o esquema da sua doutrina da retribuição, que ele aplica mais aos indivíduos, como tais, do que ao povo em seu conjunto. As desgraças de toda sorte que se abateram sobre os reis, ele as explica como sendo castigos merecidos pelos seus pecados, entre os quais os crimes contra os sacerdotes e profetas são, para ele, especialmente graves. Esta concepção, no caso de Manassés, cujo longo reinado contradiz a doutrina da retribuição, devido à acumulação de atos pecaminosos, levou o Cronista a fazer a estranha correção na história (2Cr 33), segundo a qual Manassés se teria convertido a Javé, depois de ter sido levado cativo pelos assírios para a Babilônia, quando, na realidade, se tratava de uma intimação a comparecer perante os conquistadores assírios, que terminaria em tudo, menos em uma conversão. O Cronista faz também com que a história apareça determinada por intervenções imediatas e miraculosas de Javé, e isto em muito maior proporção do que nos "estratos fontes" E, D e P do Hexateuco. O melhor exemplo neste sentido é a descrição da vitória de [osafá (2Cr 20.1-30): depois de celebrado o culto no dia anterior e disposto o exército para o combate, os cantores marcham à frente, revestidos dos seus ornamentos sagrados e entoando um cântico de ação de graças. Em conseqüência, os inimigos se voltam uns contra os outros, graças à intervenção de Deus, e quando os habitantes de [udá chegam, já os encontram todos mortos e nada lhes resta a fazer, senão recolher os despojos durante três dias. Este procedimento faz-nos ver igualmente a alta estima que o Cronista devotava ao culto realizado no único santuário do templo de Jerusalém. O seu interesse se concentra na execução do culto como tal, ao mesmo tempo em que descreve amplamente as celebrações cultuais. Uma das suas peculiaridades consiste em que, segundo ele, o acesso aos lugares e às ações sagradas se achava reservado exclusivamente ao pessoal do culto que para isto era destinado, como também era exclusivamente reservada aos levitas a execução do canto nas celebrações do culto divino. Por fim, chama-nos a atenção a glorificação religiosa de Davi, em estreita conexão com o templo e com o culto, para os quais ele fizera todos os preparativos. Sua época aparece como a situação ambicionada, a situação ideal. As promessas de Javé em favor de sua casa e de sua inabalável aliança com Javé serão continuamente relembradas. Por isso, em época tardia, se fará sentir vivamente a nostalgia pela dinastia davídica. Provavelmente o Cronista terá acalentado ele próprio a esperança de uma futura restauração da realeza davídica.
CAPÍTULO
V
OUTROS LIVROS HISTÓRICOS § 36. O LIVRO DE RUTE ATD: H. W. HERTZBERG, 2ª ed., 1959. - BK: G. GERLEMAN, 1960. BOT:J. DE FRAINE, 1956. - HAT: M. HALLER, 1940. - HK: W. NOWACK, 1902. -HS: A. ScHULZ, 1926. -IB: L. P. SMITH, 1953. -KAT: W. RUDOLPH, 1939.KAT, 2ª ed.: ID., 1962. - KeH: E. BERTHEAU, 2ª ed., 1883. - KHC: A. BERTHOLET, 1898. - SAT: H. GRESSMANN, 2ª ed., 1922. - SZ: S. OETTLI, 1889. M. BURROWS, "The Marriage of Boaz and Ruth", JBL 59 (1940),445454. - M. B. CROüK, "The Book of Ruth - a New Solution", JBR 16 (1948), 155-160. - M. DAVID, "The Date of the Book of Ruth", OTS 1, 1942,5563. - G. S. GLANZMAN, "The Origin and Date of the Book of Ruth", CBQ 21 (1959),201-207. - H. GUNKEL, "Ruth", em: Reden und Aufsiitze, 1913, 65-92. - P. HUMBERT, "Art et leçon de L'histoire de Ruth", RThPh 26 (1938),257-286 (= Opuscules d'un Hébraisant, 1958,83-110). - A. JEPSEN, "Das Buch Ruth", ThStKr 108 (1937/38), 416-428. - O. LORETZ, "The Theme of the Ruth Story", CBQ 22 (1960), 391-399. - J. MYERS, The Linguistic and Literary Form of the Book of Ruth, 1955. - H. H. ROWLEY, "The Marriage of Ruth", HThR 40 (1947), 77-99 (= The Servant of the Lord, 1952, 161-186). - J. SCHONEVELD, De betekenis van de lossing in het book Ruth, 1956. - ST. SEGERT, "Vorarbeiten zm hebrãischen Metrik III", ArOr 25 (1957), 190-200. - W. E. STAPLES, "The Book of Ruth", AJSL 53 (1936/37), 145-157.
1. Terminologia e conteúdo
o
nome deste livrinho foi tirado de uma das três personagens que nele desempenham os papéis principais. Desde o início, ele figurava na terceira parte do cânon hebraico, ou seja, na seção dos "Hagiógrafos", embora se tenha colocado então o problema de sua canonicidade, como se pode deduzir do Talmude babilônico Megilla 7a. Em época posterior foi incluído entre os rolos das festas, e destinado a ser lido na festa dos semanas, ou seja, na festa da colheita do trigo. Como o intenção do autor
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OUTROS LIVROS HISTÓRICOS
é narrar uma história da época dos Juízes, a versão dos LXX e outras traduções o colocaram em seguida ao livro dos Juízes. Quanto ao conteúdo, ele constitui uma exposição contínua. 1.1-6
Introdução. Emigração de uma família judaíta de Belém para Moab. Morte do pai da família, Elimelec. Casamento dos filhos com moças moabitas. Morte dos filhos e desejo expresso pela mãe Noemi, de voltar para seu país natal. 1.7-22 Volta de Noemi com sua nora Rute (aonde tu fores eu irei também, dito em relação à sogra), enquanto Orfa, a outra nora, retoma para junto dos seus. 2 A dedicada e virtuosa Rute agrada a Booz, rico parente de seu marido, quando ela fazia a respiga. 3 A sogra aconselha a Rute a ir se deitar aos pés de Booz, durante a noite, a fim de que este se lembre de sua obrigação de casar com ela e de pagar o resgate na sua condição de parente. Rute executa o conselho. 4.1-17 Renúncia do outro parente sobre Rute. Casamento de Booz com ela. Nascimento do filho Obed. 4.18-22 Genealogia de Davi.
2. Gênero literário e contexto histórico A proximidade desse livro com a saga nos sugere que a narrativa surgiu a partir de uma dessas sagas, à semelhança da narrativa que en-
quadra o livro de Jó. Talvez ela tenha tido inclusive uma forma poética (MEYERs). Pelo estilo em que se acha vazada e segundo o gênero literário, ela se classifica como novela, à qual um desconhecido redator deu uma forma literária. A pintura dos personagens principais remonta a este redator. Desde o início, a narrativa constituía uma unidade em seus traços fundamentais. Não se pode demonstrar que Noemi tenha constituído originalmente a única mulher, ou a figura mais importante (GUNKEL, HALLER, JEPSEN). Discutível é apenas a procedência de 4.17b,18-22. A antiga saga estava ligada a fatos históricos reais, sobretudo no que se refere ao contexto histórico e locaL Etimologicamente, também os nomes de Booz e Elimelec se enquadram na época dos Juízes. Noemi é um nome comum de mulher. Mas como ele significa encantadora, parece que foi usado intencionalmente como tema simbólico de contraste com a longa duração do amargo destino da sua portadora. Embora não se possa
§ 36. O
LIVRO DE RUTE
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provar com certeza, contudo, na base dos nomes das duas moabitas existe uma conotação simbólica: arfa significa a rebelde, e Rute a companheira. Isto aparece com toda clareza nos nomes dos filhos mortos prematuramente: Maalon significa fraqueza, e Quelion desfalecimento. Não se pode dizer se todos estes nomes já se encontravam na saga popular ou se provêm, em parte, do redator da novela. Em todo caso, não possuem nenhuma relação com um culto da fertilidade de Belém, cujo mito a narrativa expunha (STAPLES).
3. Relação com Davi
o problema básico para a compreensão da novela é a sua relação com Davi, como vem indicada em 4.17b,18-22. É quase universalmente reconhecido que a árvore genealógica de Davi, transcrita em 1 Cr 2.4-15 ou originária da mesma tradição, deve ser considerada como um acréscimo posterior. Infere-se o acréscimo da genealogia, que começa com Farés (4.18-22), não só a partir dos votos nupciais dirigidos a Booz (4.12), onde Farés é mencionado expressamente, como igualmente da inclusão de Booz e Obed entre os antepassados de Davi. Controvertida é, pelo contrário, a origem das duas frases 4.17b: Elas o chamaram Obed. Este é o pai de [essé, que foi o pai de Davi. EISSFELDT* fez reparos, e com razão, sob o ponto de vista formal e do conteúdo, contra a explicação de sua origem. Formalmente, o nome do filho de Rute devia encontrar-se no v. 17a, onde agora se assinala que as vizinhas lhe deram um nome, ou devia ser introduzido no v. 17b com um por isso, como ocorre em outros casos. Do ponto de vista do conteúdo, não existe qualquer relação entre a explicação do nome: Nasceu um filho a Noêmi (a Encantadora) e o nome de Obed (Servidor, Venerador). Ou mais precisamente, como se percebeu antigamente: este filho deveria chamar-se Jibleão (GUNKEL) ou Ben Noam (EISSFELDT*). Isto quer dizer que 4.1-7 não mantém a forma original, mas foi ampliado pelo menos com o v. 17b, tendo sido talvez remanejado no v. 17a. O nome primitivo foi cancelado e em seu lugar foi introduzido o nome de Obed, para transformá-lo em avô de Davi, em função do qual o referido nome foi transmitido. A narrativa do livro, portanto, não estava originariamente em nenhuma relação com Davi. Não se pode dizer que ela suponha uma tradição sobre sua origem moabita e procure encobri-la e atenuála, judaizando os antepassados de Davi e a possessão da herança de sua família (GERLEMAN). Pelo contrário, é somente mais tarde que é trans-
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OUTROS LIVROS HISTÓRICOS
formada em uma história da família de Davi. Isto está em consonância com o interesse das épocas posteriores pela pessoa de Davi, interesse este que nem sempre foi formulado do modo como o fez a história cronística. Que se trate de uma intervenção secundária, deduz-se de que a narrativa não liga a procedência de Elimelec ou de Booz aos antepassados de Davi.
4. Interpretação Não se pode ver o sentido da novela no fato de que ela narra a história primitiva da casa de Davi (OETTLI, entre outros). Tampouco consiste em protestar contra o rigor da praxe de Esdras e Neemias no problema dos casamentos mistos (WEISER*, entre outros). Uma tendência desse tipo não se deduz a partir de nenhuma frase. Antes, desde o início, a narrativa tinha uma finalidade edificante, à semelhança da lenda de [ó. Do mesmo modo como [ó aparece como aquele que permanece inabalável na felicidade e no sofrimento, assim também Noemi e Rute suportam o peso das provações que lhes são impostas, a primeira preocupada antes de tudo com o bem-estar da nora e não com o seu, mas permanecendo ao mesmo tempo fiel ao clã de seu marido, e a segunda colocando seus deveres para com sua sogra acima dos laços étnicos e religiosos e acima das perspectivas de felicidade pessoal (EISSFELDT*). Booz, porém, ao cumprir, por sua vez, as obrigações tradicionais, conduz a um novo caminho, a partir das provações. Cumprir os deveres da tradição através das provações da vida, porque daí resultará uma mudança de destino: eis o ensinamento já contido na antiga saga. O redator da novela deu-lhe um profundo sentido religioso, vinculando-a à fé na providência misericordiosa de Javé, que é aquele que dirige o destino de todos. Que Rute tenha ido ao campo certo, é porque foi guiada por Javé; que o plano de Noemi tenha sido bem sucedido, é por efeito da graça de Javé, que o casamento de Booz tenha sido abençoado com um filho, é uma dádiva de Javé (RuDoLPH). Aquilo que Booz diz a Rute no seu primeiro encontro, toca no conteúdo religioso do livro: Que Javé te retribua poraquilo quefizeste, e queJavé, o Deus de Israel, sob cujas asas vieste te abrigar, te recompense plenamente (2.12). Aqui se expressa também uma grande abertura de coração para com aqueles que pertencem a um outro povo, abertura esta semelhante àquela que aparece no livro de Jonas.
§ 37. O
LIVRO DE ESTER
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5. Origem Na questão sobre a época da origem é preciso distinguir entre os diversos estágios do livro. Não foi a novela que surgiu no final da época dos reis (HALLER, RUOOLPH), e menos ainda no período do "iluminismo" salomônico (GERLEMAN), mas sim a saga popular. O redator da novela deve ser colocado na época do pós-exílio. Em abono disto estão o ideário, as particularidades lingüísticas e sua agregação à terceira parte do cânon hebraico. Talvez se deva pensar no fim do séc. V, ou melhor, no séc. IV a.c. Depois disto, estabeleceu-se a relação com a pessoa de Davi, através de modificações e acréscimos.
§ 37. O LIVRO DE ESTER ATD: H. RINGGREN, 2il ed., 1962. - HAT: M. HALLER, 1940. - HK: K. SIEGFRIED, 1901. - HS: J. SCHILDENBERGER, 1941. - IB: B. W. ANDERSON, 1954. - ICe: L. B. PATON, 1908. - KAF: H. BARDTKE, 1963. - KeH: E. BERTHEAU - V. RYSSEL, 2il ed., 1887. - KHC: G. WILDEBOER, 1898. - SAT: M. HALLER, 2il ed., 1925. - SZ: S. OETTLI. 1889. A. BEA, "De origine voeis 'pür'", Bibl21 (1940), 198s. - H. CAZELLES, "Note sur la composition de rouleau d'Esther", em: Junker-Festschrift, 1961, 17-29. - V. CHRISTIAN, Zur Herkunft des Purimfestes, em NõischerFestschrift, 1950, 33-37. - N. S. DONIACH, Purim ar the Feast of Esther, 1933. - W. ERBT, DiePurimsage in der Bibel, 1900. - M. GAN, "The Book of Esther in the Light of the Story of Joseph in Egypt", Tarbiz 31 (1961/2), 144-149. - TH. H. GASTER, Purim and Hanukkah in Custam and Tradition, 1950. - H. GUNKEL, Esther, 1916. - P. HAUPT, Purim, 1906. - J. HOSCHANDER, The Book of Esther in the Light of History, 1923. - S. JAMPEL, Das Buch Esther auf seine Geschichtlichkeit kritisch untersucht, 1907. - P. JENSEN, "Elamitische Eigennamen", WZKM 6 (1892), 47-70, 209-226. - P. DE LAGARDE, Purim, 1887. - J. LEWY, "The Feast of the 14th Day of Adar", HUCA 14 (1939), 127-151. - lo., "Old Assyrian puru'um and pürum", RHA 5 (1939), 116-124. - A. E. MORRIS, "The Purpose of the Book of Esther", I ET 42 (1930/31), 124-128. - H. RrNGGREN, "Esther and Purim", SEA 20 (1956),5-24. - B. SCHNEIDER, "Esther revised according to the Maccabees", Studii Biblici Pranciscani Liber Annuus 13 (1962/63), 190218. - R. STIEHL, "Das Buch Esther", WZKM 53 (1956), 4-22. - S. TALMON, '"Wisdom'in the Book of Esther", VT 13 (1963),419-455. - CH. C. TORREY, "The Older Book of Esther", HThR 37 (1944), 1-40. H. ZIMMERN, "Zur Frage nach dem Ursprunge des Purimfestes", ZAW 11 (1891), 157-169.
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OUTROS LIVROS HISTÓRICOS
1. Terminologia e conteúdo
o livro, que traz o nome de sua verdadeira figura principal, contém uma narrativa contínua da corte do rei persa Assuero-Xerxes (485-465) em dez capítulos. Segundo diz o seu conteúdo, Ester, filha adotiva de Mardoqueu, é elevada à categoria de rainha, em lugar de Vasti, enquanto quase ao mesmo tempo Mardoqueu salva a vida do monarca, descobrindo uma conspiração (1-2). Diante disto, o grão-vizir Amã, adversário dos judeus, obtém um decreto para os aniquilar, e fixa a data para isto, no décimo terceiro dia do décimo segundo mês, o mês de Adar (fevereiromarço), por meio da sorte tpúr). Contudo, a pedido de Mardoqueu, e apesar do perigo que isto representava para a sua vida, Ester obtém do rei que retire a ordem. Surpreendido em atitude ambígua, Amã é suspenso numa forca que ele destinara para Mardoqueu. Ester herda os bens de Amã, e Mardoqueu o seu cargo (4.1-8.2). A um novo pedido de Ester, o monarca permite aos judeus, por um decreto, exterminarem os seus adversários. Mas isto acontece precisamente no décimo terceiro dia de Adar, em todo o país, e também no décimo quarto, na própria Susa. Por isso, o décimo quarto dia de Adar é declarado dia festivo (festa dos purim) para os judeus da província, e o décimo quinto, para os judeus da capital, sendo sua celebração inculcada pelas cartas de Mardoqueu e de Ester (8.39.32). O livro se encerra com uma referência à existência de outras notícias sobre o rei e Mardoqueu e que se encontrariam em uma determinada obra histórica (cap. 10). Segundo o Talmude babilônico Megilla 7a, o livro, que figura na terceira parte do cânon hebraico, foi contestado durante algum tempo. Prevaleceu, contudo, sua popularidade, de modo a ser incluído entre os rolos festivos, e destinado à leitura na festa dos purim. 2. Gênero literário De conformidade com o seu gênero literário, o livro procura descrever a lenda da festa dos purim e as circunstâncias históricas que lhe deram origem. Isto ele o faz de maneira tão hábil, como se os próprios acontecimentos narrados tivessem conduzido à celebração e à instituição da festa, constituindo-se em motivo obrigatório para sua fiel celebração todos os anos. De acordo com o caráter universal da festa, a narrativa se desenrola em âmbito ao mesmo tempo universal e étnico, onde explodiam os conflitos entre outros povos e os judeus.
§ 37. O
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Embora o narrador se preocupe em conferir à sua exposição o caráter de uma narrativa histórica, citando especialmente certas datas e outras circunstâncias pretensamente históricas, o livro contém uma série de inexatidões e de erros históricos. A própria história da origem da festa dos purim não corresponde à realidade dos fatos. Não há dúvidas de que o narrador não só conhecia alguns aspectos da administração do reino pérsico e das instalações do palácio de Susa, como também se baseou em um dado histórico para descrever o perigo que ameaçava os judeus. Contudo, ele imagina Xerxes como o sucessor imediato ou um dos sucessores mais próximos de Nabucodonosor, portanto, aproximadamente um século mais cedo. Exceto o rei, os personagens da ação não são conhecidos pelas fontes de que se dispõe sobre a história dos persas. Da mesma forma que o decreto de represália e a matança de dezenas de milhares de persas são historicamente improváveis, assim também muitos aspectos da narração revelam a marca de materiais novelísticos ou fabulosos. Se aliarmos a isto o pano de fundo histórico geral, a melhor caracterização para o livro é a de que se trata de um romance histórico (GUNKEL). Nesta linha está o seu parentesco, de há muito afirmado e recentemente demonstrado, com o romance helenístico (STIEHL).
3. Origem dos materiais narrativos e sua relação com a história Ao se tratar do problema da origem dos materiais narrativos e de sua relação com a história, o chamado Livro da História dos Reis da Média e da Pérsia, citado em 10.1-3 como fonte, deve permanecer fora de consideração. Esta referência dificilmente estaria indicando a existência real de uma crônica, do gênero midráshico, da diáspora judaica na Pérsia. Trata-se, antes, de uma imitação daquelas indicações de fontes que encontramos nos livros deuteronomistas dos Reis e constitui provavelmente um acréscimo posterior'. É em uma perseguição e libertação dos judeus da diáspora oriental durante a época dos persas que se deve procurar o núcleo histórico, sem o qual o livro não teria estabelecido a ligação da festa dos purim com o "progrom" planejado. A tentativa de derivar o aparecimento do livro da perseguição de Antíoco IV Epífanes e das lutas dos Macabeus (HAUPT, PFEIFFER*) não encontra nenhum ponto de apoio no texto.
10. OAUBE,
"The Last Chapter af Esther", JQR 37 (1946/1947), 139-147.
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OUTROS LIVROS HISTÓRICOS
A festa dos purim, cujo nome deriva do fato de Aman haver determinado a data de extermínio dos judeus por meio do pür, data que se converteu, porém, em dia de destruição para os inimigos dos judeus, constitui um fato de natureza histórica. O termo "pür" é traduzido em 3.7; 9.24,26, como palavra estrangeira, pelo termo hebraico "gõral", "sorte", sentido este que é confirmado pelo assírio "puru um" e "purum". Este nome nos permite supor que, na origem, se tratava de uma festa não-judaica, assumida pelo judaísmo sob sua forma mesopotâmica. Como a fixação do destino mediante sorteio está ligada à passagem de ano (Adar = décimo segundo mês), os purim podem ter sido uma festa de Ano Novo. Houve mesmo quem ponderasse se a festa não devia ser seguida até mais longe, e se não seria de origem pérsica. Pensou-se no farvardigan, a festa pérsica dos mortos (DE LAGARDE), na festa dos sacas (MEISSNER)2 e na festa do Mitrakana (RINGGREN), particularmente depois que GASTER tentou reconstituir os principais elementos dessa festa, a partir do livro de Ester. Talvez se possa falar em elementos desintegrados de um esquema festivo. Menos provável, porém, é interpretar a festa dos purim, concebida como luta entre as divindades babilônicas Mardoqueu = Marduk e Ester = Ishtar, de um lado, e os deuses elamitas Amã = Uman e Vasti = Masht, de outro, como luta dos deuses da luz contra os deuses das trevas (JENSEN, ZIMMERN)3; ou também reduzir a tradição de uma perseguição às divergências surgidas entre os cultores de Marduk e de Mitra, situação à qual uma outra tradição teria ligado o lançamento e o nome da festa dos purim (LEVY).
Até agora os problemas levantados pela festa dos purim ainda não foram resolvidos de maneira satisfatória. Apenas se pode dizer que essa festa talvez seja de origem pérsica, passando posteriormente por uma evolução em ambiente babilônico, de onde lhe veio o nome, e que foi, por fim, assumida pelo judaísmo - primeiramente na diáspora - e legitimada por uma lenda festiva. Além dos dados históricos, parece que o narrador se utilizou também de três tradições narrativas. A primeira delas seria a história de Vasti, 2 3
B. MEISSNER, ZDMG 50 (1896), 296ss. Houve quem derivasse o nome Mardoqueu (Mordekaí) de um nome babilônico Marduka (A. UNGNAD, ZAW 58, 1940/1941,243). O nome Ester provavelmente não é de origem pérsica ("estrela") ou proveniente da antiga índia ("mulher jovem"), mas provém do acádico Ishtar.
§ 37. O
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uma narrativa de origem pérsica, ligada ao harém e que se prestava a descrever o mundo ambiente e o poderio do monarca. Esta narrativa está relacionada apenas de maneira muito tênue com a parte principal do livro. A segunda tradição, originária da diáspora oriental, narra a história do judeu Mardoqueu e do nobre persa Amã, que eram inimigos, sem que Aman lograsse aniquilar Mardoqueu. Aman foi encarregado de pôr em execução a recompensa decretada pelo rei, em paga dos serviços prestados ao monarca por Mardoqueu, tendo, assim, de se humilhar, porque planejara maltratar os judeus, e foi Mardoqueu quem herdou seu posto. A terceira tradição, também de origem judaica, narra a história da judia Ester que conquistou as boas graças do rei e pôde se aproveitar delas para se dirigir ao rei na ocasião em que seus companheiros de fé eram perseguidos e interceder em favor deles. A capacidade inventiva ao narrador reuniu todos estes fatos em uma história palpitante e contínua.
4. Origem A ausência dos personagens do livro de Ester no elogio dos antepassados de Eclo 44-49, e a do próprio livro em Qumran, não nos permitem tirar qualquer conclusão a respeito da época de sua origem, mas se explica pelo caráter secular da festa e do livro. Mais importante é saber que os primeiros vestígios da festa dos purim aparecem em 2Mc 15.36s (cerca de 50 a.C), e que a festa, por conseguinte; já havia encontrado, naquela época, o caminho que a levara da diáspora oriental para a Palestina. O livro devia ter surgido, portanto, no Oriente, já desde muito antes. Sua linguagem indica como limite superior, neste sentido, o período que vai até o ano 300 a.c. Para uma determinação mais precisa dentro do período de 300-50 a.c. não se pode mencionar a ligação que PFEIFFER* estabelece com a época dos Macabeus, nem tampouco aquela que STEUERNAGEL* faz com o chamado dia de Nicanor [cfr. 1Mc 7.49], mas antes certas semelhanças com os livros de Daniel e [udite e sobretudo o parentesco com o romance helenístico. Diante disto, parece mais provável que o livro tenha surgido na segunda metade do séc. II a.c.
5. Apêndice e acréscimos posteriores É um apêndice o que se lê na perícope 9.20-32, que não se distingue do resto do livro somente pelo estilo bastante lento, como também pelo conteúdo, quando prescreve a celebração da festa dos purim nos dias
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OUTROS LIVROS HISTÓRICOS
décimo quarto e décimo quinto de Adar, ao mesmo tempo para todos os judeus, sem fazer distinção entre a província e a cidade (BERTHEAU, PFEIFFER*, STEUERNAGEL*, entre outros). A perícope 10.1-3, com a referência à História dos Reis da Média e da Pérsia, parece constituir um apêndice. A versão dos LXX contém ainda outros acréscimos, a maioria dos quais explicitam o texto já existente. Estes acréscimos são: depois de 1.1, o sonho de Mardoqueu e a descoberta, por ele, de uma conjuração tramada contra Artaxerxes; depois de 3.13, o edito de Artaxerxes, ordenando o extermínio dos judeus; depois de 4.17, as orações de Mardoqueu e de Ester; depois de 5.1,2, a recepção de Ester junto ao rei; depois de 8.12, o edito de Artaxerxes a favor dos judeus; depois de 10.3, a interpretação do sonho de Mardoqueu e a data em que a versão grega do livro foi levada para o Egito.
6. Valor Ao mesmo tempo em que o livro contém uma narrativa palpitante e caracteriza seus personagens principais com perfeição artística, seu valor teológico é posto em dúvida. LUTERO o julgava sobretudo de maneira positiva, até 1542, e foi somente como decorrência de sua atitude para com os judeus de sua época que ele o criticou severamente. Independentemente disto, o livro constitui mais uma obra secular do que Escritura Sagrada, e nela não se menciona explicitamente o nome de Deus, ao passo que a única referência a ele é a que se encontra em 4.14, mas, assim mesmo, de modo indireto e circunloquial. O livro é o testemunho de um espírito nacional que desejava a vingança contra seus perseguidores e, ainda por cima, havia perdido o sentido das exigências e da missão de sua fé javista, particularmente em sua expressão profética. Deste modo, o livro é ao mesmo tempo uma acusação e uma advertência, na medida em que nos faz ver quais as conseqüências que a perseguição aos judeus provoca no seio do próprio judaísmo.
Segunda Parte A Origem dos Livros de Cânticos
CAPÍTULO
VI
CONSIDERAÇÕES GERAIS § 38. A POESIA LÍRICA NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL J. BEGRICH, "Die Vertrauensãusserungen im Israelitischen Klageliede des Einzelnen und in seinem babylonischen Gegenstück", ZA W 46 (1928), 221-260 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964, 168-216). - A. M. BLACKMAN, "The Psalms in the Light of aEgyptian Research", em: D. C. SIMPSON, The Psalmists, 1926, 177-197. - F. M. TH. BOHL, "Hymisches und Rhythmisches in den Amarna-Briefen aus Kanaan", ThLBl 35 (1914), 337-340 (= Opera Minora, 1953, 375-379, 516s. - G. CASTELLINO, Le lamentazioni individuali e gli inni in Babilonia e in Israele, 1939. - A. CAUSSE, "Les origins de la poésie hébraique", RHPhR 4 (1924), 393-419; 5 (1925), 1-28. - J. COPPENS, "Les paralleles du Psautier avec les texts de Ras-Shamra-Ougarit", BHET 1946,113-142. - CH. G. CUMMING, The Assyrian and Hebrew Hymns of Praise, 1934. - E. R. DALGLISH, PsalmFifty-One in the Light of Ancient Near Eastern Patternism, 1962. - J. J. A. VAN DIJK, Sumerische Gõiterlieder II, 1960. - F. DORNSEIFF, "Àgyptische Liebeslieder, Hoheslied, Sappho, Theokrit", ZDMG 90 (1936),589-601 (= Kleine Schriften, I, 2a ed., 1959, 189-202). G. R. DRIVER, "The Psalms in the Light of Babylonian Research", em: D. C. SIMPSON, The Psalmists, 1926, 190-175. A. ERMAN, Die Literatur der Agypter, 1923. - A. FALKENSTEIN, Sumerische Gõiterlieâer I, 1959. - lo., W. VON SOOEN, Sumerische und akkadische Hymnen und Gebete, 1953. - CH. L. FEINBERG, "Paralellels to the Psalms in near Eastern Literature", BS 104 (1947), 290-321. - K. GRZEGORZEWSKI, Elemente vorderorientalischen Hofstils auf kanaanãischem Boden, Diss. K6nigsberg, 1937. - A. HERMANN, Altiigyptische Liebesdichtung, 1959. - H. P. HURO, World's Oldest LovePoem. Hieroglyphic Text (Louvre C 100), 1954. - A. JIRKU, "Kana'anãische Psalmenfragmente in der vorisraelitischen Zeit Palastinas und Syriens", JBL 52 (1933), 108120. - S. N. KRAMER, Lamentation over the Destruction of Ur, 1940. - lo., "Sumerian Literature, a General Survey", em: Essays Albright, 1961, 249-266. - lo., The Sumerians, 1963. - W. G. LAMBERT, "Divine Love Lyrics frorn Babylon", JSS 4 (1959), 1-15. - V. MAAG, "Syrien-Palãstina", em:
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
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Documents, 1936.
1. Mesopotâmia A existência do cântico em Israel, apesar de suas características próprias, constitui apenas um setor de imensa poesia lírica do Antigo Oriente. Na Mesopotâmia o tipo sumério-babilônico dessa poesia começa o menos tardar em meados do terceiro milênio e se estende até 1600 a.c. Segue-se, mais ou menos a partir de 1300 a.c., um tipo "purificado" e estruturado em cânones, cujas reminiscências vão até a época dos Selêucidas. Só foram conservados quase que exclusivamente textos sacrais e religiosos, e em particular hinos, cânticos penitenciais e lamentações, e mais raramente poesias ligadas à vida quotidiana, por cuja transmissão parece ter havido pouco interesse.' Os hinos podem ser divididos em quatro grupos, como sejam: hinos de glorificação dos deuses (entre os quais aqueles formulados na primeira pessoa do singular e particularmente colocados na boca da deusa Ishtar): hinos de louvor ao rei (o mais das vezes um exaltado louvor de si mesmo); cânticos de louvor às divindades, pontilhados de expressões de bênçãos e de orações em favor dos reis; e glorificações de templos sumerianos. Os cânticos penitenciais e de lamentações - sem falar das lamentações pela ruína das cidades e dos estados-cidades sumerianos - constituem, na sua maioria, liturgias sacramentais ligadas a ritos de expiação e contêm lamentações contra a doença e o sofrimento
1
AOT 241-281. - ANET 382-392, 455-463, 496.
§ 38. A
POESIA LÍRICA NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL
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e por vezes também uma confissão de pecados, logo seguida de um pedido de cura e de libertação dos pecados. Em sentido mais amplo, deste grupo formam parte as orações pronunciadas por ocasião do exame das vítimas sacrificiais, bem como as orações na intenção do rei e os encantamentos em tom de súplica, acompanhados de um pedido pessoal que, depois de uma invocação em forma de hino, dirigida à divindade, e de um louvor, apresentam a queixa, o pedido propriamente dito e as palavras de agradecimento ou de bênçãos. Além desse tipo, desenvolveu-se também um gênero literário de cântico de amor ligado ao culto, que só foi conservado fragmentariamente, e muitas vezes quase não se entende, ou somente com dificuldade. Este gênero pode estar relacionado com o amor entre os deuses ou com as núpcias sagradas; pode glorificar a beleza e os encantos do ser bem-amado, ou lamentar sua perda. Descobriram-se recentemente cânticos fúnebres nos quais um homem lamenta a morte do pai ou da esposa. Particularmente os hinos e as lamentações apresentam uma estrutura bastante semelhante. A quase cada uma das inúmeras divindades foram consagrados os mesmos adjetivos laudatórios e dirigidos os mesmos pedidos e agradecimentos, sem diferenças notáveis de uns para os outros. A poesia babilônica de época mais recente parece menos formal, mas tende a se esparramar e a cair no preciosíssimo, e para isto contribuiu o acróstico, que compõe um dito religioso ou o nome de um rei, mediante adjetivos laudatórios. Mas se encontram igualmente versos de profunda beleza poética, que são como o eco de uma piedade pessoal e da profunda consciência da sua própria culpa, acompanhada de igual arrependimento. Os próprios sumerianos já haviam classificado os seus cânticos, com base em determinada execução musical, em: Cânticos para a lira (cânticos de louvor); cânticos para os címbalos (cânticos às divindades); cânticos longos, e cânticos aos heróis etc. Em épocas mais recentes se fala de outros gêneros literários de cânticos, como os cânticos de elevação das mãos, acompanhados de ensalmos para a libertação da doença e de um infortúnio, e o cântico de tranqüilização do coração, para apaziguar a divindade enfurecida. Da poesia lírica talvez fizessem parte também o poema composto por encomenda do rei sumeriano Tukultininurta I sobre as relações existentes entre Assur e a Babilônia cassita nos sécs. XIV-XIII a.c.; o cântico de exaltação da batalha de um rei assírio (talvez Teglat-Falasar I) contra Murattash, composto sob a forma de um cântico de caçada, e ainda o poema insultuoso contra Nabonide, o último soberano babilônico.
356
CONSIDERAÇÕES GERAIS
2. Egito Muito pouco também se conservou da poesia lírica mais antiga do Egito. Suas características permanecem veladas para nós, porque a maneira de pronunciá-la bem como o seu ritmo não foram conservados; mas a poesia era construída precisamente com base na sonoridade das palavras e sua forma interior repousava na sintonização das palavras entre si. Em todo o caso, pode-se dizer que originariamente se procurava para cada objeto da experiência uma forma de expressão que fixava o seu conteúdo essencial, e que foi nesta forma que se inspirou pouco a pouco a maneira de expressar as idéias, os sentimentos da alma e as disposições íntimas. Foi somente no Reino Novo que apareceu um novo tipo de poesia, que já não parte do objeto, mas do sujeito da experiência (principalmente a poesia amorosal.! a gênero literário mais importante é o do hino dirigido às divindades ou aos reis. a hino referente às divindades deriva evidentemente da esfera cultuaI e começa, sob forma litânica, por atribuir à divindade os lugares, os sítios sagrados e os objetos cultuais que foram palco de determinado acontecimento mítico, de modo que esse tipo de hino na origem constava apenas de enumerações. Progressivamente foram-se acrescentando, como na Mesopotâmia, adjetivos de louvor. Também as invocações ás coroas reais se acham ligadas ao culto, e de modo muito particular o cântico matinal com o qual se saudava a divindade quando se entrava pela manhã no templo, como também o rei, no palácio, ao seu despertar. a hino litânico, composto de nomes, continuou a ser cultivado até períodos mais recentes. Além desse, surgiram outros hinos, onde se relatam os mitos inter-relacionados, ou se encontram aqueles tons que chegam até ao coração, como no hino a Amon, o qual descreve o deus como criador do mundo e de todos os viventes, com sua figura resplandescente e seus feitos míticos. São sobretudo os hinos dedicados ao sol, entre os quais o hino de Amenófis IV, que se contam entre os textos poeticamente mais preciosos da literatura egípcia. a hino a respeito do rei era calcado, quanto ao conteúdo e à forma, diretamente sobre os hinos aos deuses, principalmente porque os costumes da corte exigiam que ao rei só se podia dirigir por meio de um hino. Também os numerosos adjetivos laudatórios foram tirados dos hinos consagrados às divindades. Além dos louvores dos poetas cortesãos que na 2
AüI 12-32. - ANEI 365-381, 567-571.
§ 38. A
POESIA LÍRICA NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL
357
época dos Ramsés porfiavam em se sobrepujar uns aos outros na glorificação das vitórias e dos feitos dos soberanos, encontram-se também louvações ao poder real sob a forma de louvor de si próprio ou da troca de discursos entre a divindade e o rei. Ao lado disso, havia também o cântico de lamentação e as lamentações fúnebres, durante as quais o cântico de lamentação prescrito para o ritual funerário do culto de Osíris dava ocasião, por sua vez, para a narração do mito, e ainda certos cânticos que têm pontos de contato com os gêneros mencionados, na medida em que eram cantados ou recitados durante os banquetes que se celebravam sobre os túmulos. Acrescente-se aí uma série de cânticos do trabalho, referentes a diversas profissões, e originários de antiga época, como ainda numerosos cânticos de amor, do Reino Novo, o mais das vezes encontrados em coleções. Estes últimos se utilizavam de números ou de nomes de flores para fazer a ligação de jogos de palavras; faziam as plantas do jardim falarem, ou escolhiam pássaros e sua captura nos canaviais como temas principais. Ao contrário da poesia antiga, nesses cânticos a escolha do tema fundamental substitui a formulação do dado da experiência por uma ligação jocosa com um acontecimento do momento, servindo-se da descrição de circunstâncias externas para caracterizar as disposições internas do sujeito da experiência. Deste modo um pronunciado subjetivismo se contrapõe à objetividade da poesia antiga.
3. O resto do Antigo Oriente Para o resto do Antigo Oriente se deve supor uma poesia lírica nos mesmos moldes, embora conservada em proporção menor. Para a poesia popular hitita postulou-se a chamada pequena canção do soldado que se lê em um texto hitita antigo. Além desse tipo, encontram-se hinos e orações que podem ser considerados, em parte, como criações literárias propriamente ditas e que muitas vezes se destacam pela interioridade e pela profundeza das idéias. Em um de seus hinos dedicado ao deus-sol percebe-se a presença de um modelo babilônico. Entre os cananeus existiram também cânticos cultuais e de outros gêneros, embora muito pouco tenha sido encontrado até agora entre os textos ugaríticos. Provavelmente os hinos, os cânticos de lamentações e os cânticos sacrificiais deviam figurar em primeira linha. Que esses cânticos tenham sido utilizados é o que nos mostra o ritual estabelecido para um dia de sacrifícios penitenciais e de expiação a serem celebrados por ocasião
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
de infortúnio político. Nesse ritual se encontra o texto completo dos cânticos de lamentação compostos para esta finalidade. Tal formulário pode limitar-se apenas a indicar certos cânticos cultuais já conhecidos que devem ser cantados, citando suas linhas iniciais, como se sabe, p.ex., a partir de antigos catálogos mesopotâmicos. De modo geral pode-se admitir que existe seguramente uma linha poética comum para todo o âmbito cananeu ou sírio-palestinense, havendo apenas pequenas diferenças, em razão da situação geográfica, da diversidade de épocas e das várias influências estrangeiras.
4. A poesia israelítica A poesia israelítica cresceu no rico solo da poesia lírica do Antigo Oriente e, o que não é menos significativo, no solo da poesia cananéia. Chamou-se particularmente a atenção para o estreito paralelismo que existe entre os cânticos de lamentação mesopotâmicos e os salmos de lamentação hebraicos, entre o hino de Amenófis IV em louvor do sol e o SI 104 [105], bem como entre a poesia cananéia e o SI 29 [28]. Para além dos paralelismos formais, é provável ter havido uma influência pelo menos da religião cananéia sobre o conteúdo da poesia dos salmos do Antigo Testamento, embora tenham prevalecido a fé javista e a concepção tipicamente israelita de Deus e da existência. Podemos resumir do melhor modo possível as características próprias dos cânticos do Antigo Testamento, e particularmente dos gêneros literários dos salmos, afimando com HEMPEL* que elas refletem três momentos como sejam:" a progressiva interiorização religiosa, que substitui os bens deste mundo por bens puramente religiosos, e sobretudo pelo perdão dos pecados; a superação do ritual mágico e da destinação mágica dos próprios cânticos dedicados a Deus, superação que vê Javé agindo no sofrimento humano, e não mais um exército de demônios e de feiticeiros, e por fim a concentração religiosa de todas as afirmações acerca do mundo ultraterreno exclusivamente sobre a figura de Javé enquanto Deus do povo e Deus do indivíduo. Depois que tratarmos dos gêneros literários dos cânticos, examinaremos as particularidades em § 41. É quase impossível fazer uma distinção entre cânticos profanos e cânticos religiosos (cultuais). Certos cânticos que se relacionam com os aspectos da vida diária podem estar tão impregnados de espírito religioso 3
HEMPEL *,38.
§ 39. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS
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quanto aqueles que se destinam ao culto. O que mais interessa é conhecer a diferença entre os cânticos que se relacionam com os acontecimentos da vida da comunidade ou dos indivíduos, e que brotaram desses acontecimentos ou se destinavam a eles, em virtude de sua função, e os cânticos que foram concebidos como poesia culta para determinados ouvintes, e cuja função se esgota no "concerto". Este último tipo é incomparavelmente mais raro do que o primeiro.
§ 39. OS GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS G. W. AHLSTRÓM, Psalm 89, 1959. - E. BALLA, Das Ich der Psalmen, 1912. - CHR. BARTH, Die Errettung vom Tode in den individuellen Klageund Dankliedern des Alten Testaments, 1947. - E. BAUMANN, "StrukturUntersuchungen im Psalter", ZAW 61 (1949), 114-176; 62 (1950), 115152. - J. BEGRICH, "Die Vertrauensãunsserungen im israelitischen Klageliede des Einzelnen und in seinem babylonischen Gegenstück", ZAW 46 (1928),221-260 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964,168-216). - A. BENTZEN, "Der Tod des Beters in den Psalmen", em: Eissfeldt-Festschrift, 1947, 57-60. - K. H. BERNHAROT, Das Problem der altorientalischen Konigsideologie im Alten Testament, 1961. - H. A. BRONGERS, "Die Rache-und Fluchpsalmen im Alten Testament", OTS 13, 1963, 21-42. - A. BÜCHLER, "Zur Geschichte der Tempelmusick und der Tempelpsalmen", ZAW 19 (1899), 96-133, 329-344; 20 (1900),97-135. - A. CAUSSE, "L'ancienne poésie cultuelle d'Israel et les origins du Psautier", RHPhR 6 (1926), 1-37. - K. R. CRIM, The RoyalPsalms, 1962. - P. DESCAMPS, "Pour un classement littéraire des Psaumes", em: Mélanges Robert, 1957, 187-204. - A. FEUILLET, "Les psaumes eschatologiques du rêgne de Yahweh", NRTh 73 (1951), 244-260, 352-363. - SR. B. FROST, "Asseveration by Thanksgiving", VT 8 (1958), 380-390. - B. GEMSER, "Gesinnungsethikim Psalter", OTS 13, 1963, 1-20. - H. GRESSMANN, "The Development of Hebrew Psalmody", em D. C. SIMPSON, The Psalmists, 1926,1-21. - H. GUNKEL - J. BEGRICH, Einleitung in die Psalmen, 1933. - M. HALLER, "Ein Jahrzehnt Psalmformschung", ThR NF 1 (1929),377-402. - A. R. JOHNSON, "The Psalms", em: The Old Testament and Modern Study, 1951, 162-209. - H. J. KRAUS, Die Konigsherrschaft Gottes im Alten Testament, 1951. - A. LAUHA, DieGeschichtsmotive in den alttestamentlichen Psalmen, 1945. - F. MANO, "Die Eigenstãndigkeit der Danklieder des Psalters als Bekenntnislieder", ZAW 70 (1958),185-199. - S. MOWINCKEL, Psalmenstudien, I-VI 1971/24 (1961). - lo., "Traditionalism and Personality in the Psalms", HUCA 23,1 (1950/51),205-231. - lo., Offersang ogsangoffer, 1951 (em ingles: The Psalms in Israel's Worship, 1-11 19762). - lo., Zum
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
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1. Distinguir os gêneros literários A diferenciação estabelecida entre os diversos gêneros dos salmos teve como ponto de partida as pesquisas de GUNKEL. Elas substituíram as antigas tentativas de dividir os salmos sob o ponto de vista do conteúdo, agrupando-os de acordo com as características formais comuns. Com poucas exceções, este modo de conceber se impôs universalmente, embora, no que se refere aos detalhes, tenham surgido críticas contra certos julgamentos estéticos e histórico-literários, como também contra certas interpretações da piedade dos salmistas e certas incertezas no que respeita às relações entre os salmos e o culto, e tenha sido corrigido e modificado o método de GUNKEL (MOWINCKEL; comentários: KISSANE e KRAUS). Antes de tudo, discutiu-se muitas vezes, e apaixonadamente, a questão acerca das
§ 39. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS
361
relações dos gêneros literários dos salmos e cada um dos salmos que foram transmitidos, com o culto. Nesta discussão admitiu-se muitas vezes a existência de uma ação cultual abrangente, à qual se atribuem os salmos em sua totalidade. Deste modo, deixou-se de lado a interpretação histórica ou escatológica, que antigamente gozava da preferência. Esta evolução começou com a tese de MOWINCKEL a respeito da festa da entronização de Javé (Psalmenstudien II), amplamente seguida por H. ScHMIDT e continuada pelos pesquisadores escandinavos, que colocam decisivamente o princípio cultual em primeiro plano (p.ex.: ENGNELL, AHL5TRoM). WEI5ER também se aproxima desta concepção com a tese do "culto da festa da Aliança" por ele postulado. Antes de tudo, a explicação introduzida por MOWINCKEL, a respeito da função do salmo no interior do culto, parte da constatação de que, do ponto de vista da história das formas, os salmos não somente não derivam da antiga poesia cultual, como também, com raras exceções, são verdadeiros salmos cultuais que foram compostos para o culto e utilizados no culto. Isto significa que eles não foram compostos a partir de uma determinada ocasião ou em função dela, mas para uso regular; implica que os cânticos de lamentação individuais, p.ex., constituem simplesmente formulários cultuais, ou também que outros salmos tornam presentes para o culto as chamadas tradições da história da salvação. Pode-se, pois, ter como garantido que todos os gêneros literários dos salmos tiveram seu Sitz im Leben ("contexto vital") no culto. Entretanto, não se pode admitir para todos os gêneros um ato cultual abrangente, mas antes diversos tipos de celebrações cultuais. Também não se pode pensar em uma vinculação permanente, mas antes que, em alguns casos, certos gêneros possivelmente se desligaram do culto e se tornaram autônomos. A utilização da tese cultual como critério único de explicação é unilateral e exorbitante porque equipara falsamente religião e culto." Ao lado dela, justificam-se também outras possibilidades, como sejam: a hipótese que faz certos salmos derivarem de determinados acontecimentos históricos ocorridos uma única vez, como o 51 137[136], que lembra acontecimentos do exílio; a concepção escatológica que, com referência à conclusão do 5146[45], onde se anuncia o fim de todas as guerras, deve-se preferir de modo decisivo à hipótese de uma ação dramática cultual: e ainda a interpretação como poesia pessoal, que surge espontaneamente como no caso dos 5151[50] e 73[72]. Os salmos 4
Sobre a crítica, cf. principalmente K-H.
Ktinigsideologie im Alten Testament, 1961.
BERNHARDT,
Das Problem der altorientalischen
362
CONSIDERAÇÕES GERAIS
também refletem os múltiplos aspectos assumidos pela vida religiosa de Israel no volver dos séculos. Para a divisão dos gêneros literários importam, em primeira linha, as características literárias e estilísticas, e somente de modo complementar o conteúdo dos salmos. Certos pontos de vista de conteúdo ocupam erradamente o primeiro plano, quando se focalizam determinados princípios particulares dos cânticos de Sião ou dos cânticos de entronização de Javé. Esses dois grupos pertencem antes ao gênero dos cânticos hínicos. Também a relação de determinados cânticos com um indivíduo ou com o povo só pode ser utilizada como característica secundária. Do ponto de vista das formas, são três os grandes gêneros literários dos salmos que se destacam, juntamente com as respectivas subc1asses: a) b)
c)
cânticos hínicos, cânticos de lamentação, cânticos de ação de graças.
Os gêneros abaixo indicados, embora possam ser divididos entre os já mencionados, devem ser considerados separadamente como um quarto grupo: a) b)
cânticos reais, poesias sapienciais e didáticas, que são modalidades da doutrina sapiencial e não podem ser consideradas como gênero sálmico.
Nesse ponto, devemos considerar quem seja o "eu" dos salmos. e BALLA foram os primeiros a substituir a interpretação coletiva pela individual, até que de novo se voltasse a chamar a atenção, em favor da primeira, para as numerosas personificações de coletividades, mediante uma pessoa coletiva ou ideal ou através do rei como "encarnação" da comunidade, chegando-se mesmo a atribuir todos os salmos ao ritual real e a considerá-los como salmos reais primitivos. Embora isto pareça também exagerado," deve-se ter presente que os limites entre o "coletivo" e o "individual" no Antigo Oriente eram menos precisos do que hoje (cf. 51129[128],1: Eles meoprimiram frequentemente... Israel queo diga). Por isso o sentido do "eu" deve ser determinado em cada caso a partir do contexto do salmo, embora na maioria dos salmos a interpretação individual seja aquela que nos surge mais espontaneamente.
GUNKEL
5
Cf. agrupamento e crítica de
BERNHARDT
(nota 1).
§ 39. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS
363
Levantam-se também objeções contra outros critérios de divisão: WESTERMANN distingue entre salmo descritivo delouvor (hino) e salmo narrativo de louvor, coletivo ou individual (cântico de ação de graças). Mas esses dois tipos apresentam diferentes raízes histórico-formais, como se verá; e é nos salmos que aparece claramente a diferença entre o louvor e o agradecimento. KRAus reúne os cânticos de lamentação, de ação de graças e de confiança sob a designação de cânticos coletivos e cânticos individuais, os quais, embora formalmente diferentes, se reportam todavia a um 5itz im Leben ("contexto vital") comum. Do ponto de vista do método da história das formas este procedimento é correto, mas os gêneros literários já desde muito se haviam tornado autônomos no Antigo Testamento, e devem ser estudados separadamente. AHLSTROM pretende dividir os gêneros literários a partir das designações que se encontram nos títulos dos salmos (p.ex.: lam'nasseah, l'daund), como acontece na poesia mesopotâmica. Mas nessa poesia não se indicam os gêneros literários; pelo contrário: os cânticos são reunidos segundo um determinado tipo de execução musical ou ainda segundo o seu conteúdo (§ 39,1). Além disso, no Antigo Testamento as mesmas designações servem para introduzir cânticos de natureza totalmente diversa, de sorte que elas não funcionam como critério de divisão.
2. Cânticos hínicos
o hino, em Israel, é o cântico que louva a grandeza e a majestade de Javé revelada na natureza e na condução dos destinos das nações e dos homens. A denominação hebraica mais importante é a tehilla, o "louvor", o "cântico de louvor". Originariamente ela se referia apenas a cânticos hínicos, mas posteriormente sua significação foi ampliada e empregada no plural para designar todo o saltério. O Sitz im Leben ("contexto vital") desses cânticos é o culto e seu embrião é a exclamação halleZU-yah. Assim, primariamente são eles cânticos cultuais, e desde o início foram compostos para serem utilizados no culto. É nesse sentido que o SI 98[97] e 150 enumeram os instrumentos musicais que acompanhavam os cânticos. A recitação era executada pelos cantores do templo, distribuídos, segundo as circunstâncias, em solistas e coro, e pela comunidade, dividida, de acordo com as circunstâncias, por tribos ou por grupos. Além do hino, conservaram-se outros tipos de cânticos que originariamente eram poesias de pessoas piedosas, compostas para expressar sua experiência religiosa e que foram usadas secundariamente no culto. Podemos chama-los de cânticos espirituais. Enfim, o estilo hínico impregnou também outros gêneros de cânticos e outros modos de falar.
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
Na estrutura do cântico hínico podem-se distinguir uma introdução, uma parte principal e uma conclusão. a) A introdução é constituída sobretudo de ordens imperativas ou de convites jussivos ou coortativos para louvar a Javé, e que foram formulados sobretudo no plural, em conformidade com a situação cultuaI. Nessa introdução interpelam-se ou mencionam-se as pessoas ou grupos convidados ao louvor e se indica a maneira como se deve executar o cântico. Os chamados cânticos de entronização de Javé e os cânticos de Sião contêm temas especiais da introdução. b) A parte principal se une à introdução por meio de um "porque" [hebr.: Ki] explicativo, por meio de um aposto ou por uma proposição relativa. A parte principal é caracterizada sobretudo pelo estilo participial, O seu conteúdo é constituído da enumeração dos atributos e dos altos feitos de Javé, muitas vezes apresentados de forma antropomórfica, e onde se mencionam os membros de seu corpo e se descreve seu poder criador e seu desempenho na direção de Israel no passado e no presente. Este modo de "narrar" (sippêr) pode-se aproximar de uma confissão. Tem-se um tipo especial de parte principal, quando a introdução recobre todo o cântico e se transforma no próprio hino, ao enumerar as criaturas convidadas ao louvor ou os instrumentos musicais de acompanhamento. c) A conclusão, em geral, emprega os mesmos elementos que a introdução. Além destes, podem-se encontrar também uma oração, no sentido de que o cântico seja favoravelmente aceito ("apropriação"), uma intercessão, uma maldição ou uma expressão de bênção. Os cânticos hínicos podem dividir-se em quatro sub-classes: 1. A primeira é constituída, na maior parte, pelos hinos propriamente ditos. Eles se destinavam às várias ocasiões em que a comunidade ou a família desejavam louvar o seu Deus: nas grandes festas do ano, nas celebrações sacrificiais, nas procissões e em outras solenidades cultuais. Trata-se principalmente de louvar a Deus por causa de sua atuação na vida das nações e dos homens, louvor que se pode ampliar e se transformar em poesia histórica e didática (não-cultual), como, p.ex., nos 5178[77]; 105[104]106[105]; ao que se acrescentou, pouco a pouco, na época pós-exílica, a glorificação do Criador, que resultou no desenvolvimento dos salmos de louvor à criação, como os 518; 104[103], e na adoção de cânticos cananeus paralelos como os SI 19[18]A; 29[28]. 2. Os chamados cânticos de entronização ou cânticos da realeza de Javé se caracterizam pela fórmula: yhwh malak. Desse grupo fazem parte os
§ 39. Os GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS
365
SI 47[46]; 93[92]; 96[95]-99[98]. Tem-se discutido muito a respeito de seu signfiicado." Segundo MOWINCKEL, H. SCHMIDT e VOLZ, devem ser considerados como cânticos que eram executados por ocasião da festa da entronização de Javé, celebrada anualmente no templo, ou por ocasião da festa do Ano Novo quando se celebrava a entronização. Esses cânticos, portanto, se acham ligados de maneira muito particular a concepções babilônicos ou cananéias. Assim em Israel ter-se-ia celebrado constantemente a renovação da primeira entronização de Javé, realizada depois de sua vitória sobre os monstros do caos, e ter-se-ia repetido, numa representação dramática, no dia do Ano Novo, a criação do mundo como a grande ação salvífica de Javé: ano após ano Javé luta de novo com seus inimigos, subjuga-os, e garante, assim, mais uma vez, a sobrevivência do mundo. Ao contrário desta tese, não somente se chamou a atenção para o caráter aparentemente escatológico desses cânticos (GUNKEL) e para a existência de uma festa babilônica paralela, documentada primeiramente a partir de 604 (SNAITH), como também se pesquisou exaustivamente a mencionada fórmula. KOHLER observou a ordem de colocação: sujeito-predicado, que diverge da ordem comum da frase e põe o sujeito em realce. MICHEL determinou mais precisamente o sentido do verbo na mesma fórmula, mostrando que não significa tornar-se rei, mas ser rei, e sobretudo dominar como rei.
Segundo o que resulta destas pesquisas, a fórmula acima indicada deve ser traduzida como segue: É Javé (e não outro deus) quem domina como rei. Acontece que o título de rei", atestado literariamente pela primeira vez em Is 6, talvez tenha sido aplicado a Javé a partir da construção do templo por Salomão. Por essa época esse título teria sido acrescentado à designação de Javé Sabaot, no sentido de Deus da arca, para expressar seu domínio sobre Israel. A posição ímpar de Javé no mundo é parafraseada ainda em 5147[46],3.8 com o título de (grande) rei de toda a terra. Foram utilizados aí os dois títulos vétero-orientais: grande rei Cf. ainda L. KOHLER, "Jahwiih malak", VT .3 (1953), 188s. - D. MICHEL, "Studien zu den sogennanten Thronbesteigungspsalmen", ibid. 6 (1956), 40-68. - J. MORGENSTERN, "The Cultic Setting of the "Enthronement Psalms", HUCA 35 (1964), 1-42. - L. I. PAP, Das israelitische Neujahrsfest, 1933. - J. RIDDERBOS, "[ahwãh malak", VT 4 (1954), 7-89. - N. H. SNAITH, The Jewish New Year Festival, 1947. 7 Sobre o título real de Javé cf. principalmente A. ALT, "Gendanken über das Kõnígtum Jahwes", em: Kleine Schriften, I (1953, 345-357. - O. EISSFELDT, "Jahwe als Kõnig", ZAW 46 (1928), 81-105. - W. SCHMIDT, Kõnigtum Gottes in Ugarit und Israel, 1961.
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
(assírio: sãrru rabu) e rei do universo (assírio: sãrru kissaii), Assim como só existe um rei desta espécie no Antigo Oriente, e este é precisamente o rei assírio, e na época do aparecimento desses salmos o soberano persa, assim também: semelhante Deus só há um. Essa insistência na exclusividade de Javé aparece, no AI, expressamente pela primeira vez no Dêutero-Isaías (cf. Is 44.6; 45.5), depois de alguns ensaios em Jeremias. É da pregação do Dêutero-Isaías que dependem em larga medida também os salmos, a despeito do antigo uso do título de rei conferido a Javé. É dele que procedem todas as coisas e é por ele que tudo é arrebatado ao poder dos outros deuses: a criação e a conservação do mundo, seu domínio universal sobre todas as nações, o estabelecimento de uma ordem ética e a proteção para aqueles que lhe permanecem fiéis. Os cânticos sobre a realeza de Javé não se vinculam à idéia da entronização de Javé ou a uma festa, mas proclamam sua soberania absoluta. Por isso, o melhor título que se lhes possa dar é o de hinos monoteístas, que talvez tenham tido seus antecedentes em certos cânticos, como SI 82[81), que imita uma determinada forma de pronunciamento judicial de Javé contra os outros deuses. 3. Uma terceira subclasse é constituída pelos cânticos de Sião: S146[45]; 48[47]; 76[75]; 84[83]; 87[86]; 122[121]. Estes cânticos louvam a glória de Sião e de seu santuário, muitas vezes em conexão com a exaltação da grandeza de [avé." Como eles utilizam não poucos temas míticos antigos, estes temas foram atribuídos de preferência a uma tradição cultual de Jerusalém, e os cânticos de Sião a uma época remota do pré-exílio, mas isto é sem fundamento. É somente a partir do exílio que começa uma certa liberalização a respeito de tais temas, que subsistiram subliminarmente durante muito tempo. O tema da luta contra as nações não pertence a esses cânticos, mas surgiu mui tardiamente. Os cânticos de Sião, portanto, só podem ter sido compostos na época do pós-exílio, talvez pela corporação dos cantores de Coré.? 4. Os cânticos de romaria, dos quais fazem parte os SI 15[14] e 24[23] foram compostos para uma determinada situação cultual, como seja a
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G. WANKE, Die Zionstheologie der Korachiten in ihrem traditionsgeschichtlichen Zusammenhang, 1966. Outros cânticos, como os SI 122[121] e 134[1331, nos quais o templo de Jerusalém desempenha grande papel, são difíceis de datar. Não se exclui que o SI 134[133] tenha surgido nos últimos tempos anteriores ao exílio. No exílio também se compuseram cânticos de saudades de Sião, como o mostra o SI 137[1361,3.
§ 39. Os GÊNEROS
LITERÁRIOS DOS SALMOS
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visita ao santuário, o cortejo em torno de Jerusalém, a entrada no templo ou a volta que se dava ao redor do altar. Em diversas passagens surgem em primeiro plano, nesses cânticos, a comum vivência do culto divino, que se manifesta no anseio pelo santuário e na felicidade de haver sentido aí a presença de Deus. Deste modo esses cânticos podem refletir uma piedade de cunho inteiramente pessoal.
3. Cânticos de lamentação No saltério, o cântico de lamentação aparece freqüentemente ao lado dos hinos. Sua designação original provavelmente era rhinnã. Seu 5itz im Leben ("contexto vital") é também o culto e seu embrião uma invocação cultual, talvez honneni yhwh: "Sede benigno para comigo, ó Javé". Por conseguinte, trata-se primeiramente de uma lamentação cultual, como se pode ver sobretudo nas lamentações coletivas. As lamentações e os pedidos da comunidade desempenharam um determinado papel, tanto nas celebrações de pesar, convocadas em situações calamitosas especiais (cf. 1Rs 8.33ss; 21.9ss; [r 36.1ss), de cujo desenrolar o livro de [oel, em particular, nos oferece uma idéia, 10 como também por ocasião de certas festas anuais celebradas regularmente (dia de expiação; festa do Ano Novo; dias de celebração penitenciaI em recordação de certas catástrofes). Podem-se identificar também as raízes cultuais de certos cânticos de lamentação individuais. Certamente que não se pode considerar esses cânticos geralmente como cânticos puramente cultuais, que seriam recitados por ocasião do ritual (MOWINCKEL, H. SCHMIDT). Com efeito, muitos modos de falar parecem ter um sentido antes figurativo do que real. Mas mesmo nesses casos - como, p.ex., em 5151[50],9: Purifica-me de meus pecados com o hissopo - eles supõem uma cerimônia original. Finalmente, os cânticos de lamentação se reportam a um uso cultual, quando tem por objetivo a recepção de um oráculo por meio da sorte, do sacerdote, ou do profeta cultual (conservado em SI 60[59],8-10). Além desses, também muitos cânticos de lamentação individuais parecem não possuir nenhuma relação com o culto e terem sido compostos com base em um modelo fixo do mesmo gênero, mesmo cânticos espirituais ou como cânticos de súplica de indivíduos piedosos, principalmente se se pressupõe um leito doméstico de enfermo. EISSFELDT* explica,
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Cf. também H. W. WOLFF, "Der Aufruf zur Volksklage", ZAW (1964), 48-56.
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
e com razão, que certos cânticos, como os 5139[38]; 51[50] e 130[129], são tão pessoais e possuem tal profundidade de conteúdo, que dificilmente podem ter sido simples textos secundários de ações cultuais. O mesmo se diga do 5125[24]. Ao tratar-se desse gênero, contudo, deve-se excluir qualquer tendência à evolução: a poesia espiritual surgiu desde muito cedo e subsistiu ao lado da poesia cultuaI. Por fim, encontra-se também a imitação da forma dos cânticos de lamentação, sobretudo nos profetas: cânticos de lamentação coletivos, como, p.ex., em [r 3.21-25; 14.7-9.19-22; Os 6.1-3; 14.3b-4, e cânticos de lamentação individuais nas lamentações biográficas de Jeremias e no livro de Já. Não poucas dessas imitações contêm, logo em seguida à lamentação, uma palavra de Javé, na qual se promete ou se recusa, sob alguma condição ou não, o perdão e a ajuda. Isto corresponde ao oráculo que aparecia em seguida às lamentações cultuais, de modo que a forma primitiva é confirmada igualmente pelas imitações. A estrutura dos cânticos de lamentação nos permite identificar uma série de características especiais: a) A introdução começa em geral com uma invocação dirigida a Deus, adornada muitas vezes de epítetos e seguida de um grito de socorro, de um pedido ou de uma pergunta em tom de censura. Muitas vezes o cântico exprime diretamente sua confiança em Javé (5125[24],2), elemento este que pôde tornar-se autônomo como cântico de confiança. b) A parte principal pode conter, depois de uma transição, os elementos seguintes: a narrativa do infortúnio, em forma de queixa (enfermidade, acusação em juízo, abandono por parte de Deus etc.) e entremeada de perguntas a respeito do porque e do porquanto tempo, e de acusações contra os inimigos reais ou supostos; os pedidos dirigidos a Deus para que se volte, propício, e preste socorro, talvez ligados a desejos ou a maldições; a indicação dos motivos que devem levar Javé a intervir (recordação de ajudas antigas: apelo à honra de Javé, perigo de perder um adorador por morte deste), e também protestos de inocência e o tema da confiança; a promessa de um sacrifício ou de um cântico de ação de graças, que aparece às vezes inclusive no fim da lamentação. c) A conclusão contém em geral a expressão da certeza de que se será atendido, ou o agradecimento dirigido a Javé. A transição da dúvida para a certeza, do medo para o agradecimento se faz com tanta rapidez e de forma tão estranha que muitas vezes os versículos foram considerados como acréscimos ou como um salmo autônomo, adicionado posteriormente. A situação nem sempre é idêntica em todos os casos. Antes, a introdu-
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GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS
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culo postivo, como se pode ver claramente no cântico de lamentação, também existe uma outra no oferecimento do sacrifício de ação de graças em cumprimento de um voto depois de uma mudança real para melhor. Além do cântico sacrifical de ação de graças e do cântico de graças cultual, existe um cântico de ação de graças espiritual, desvinculado do culto e no qual a própria ação de graças substitui o sacrifício oferecido em ação de graças. Quanto à estrutura dos cânticos de ação de graças convém observar o seguinte: a) É na introdução que aquele que agradece comunica o seu propósito; para isto, usam-se frequentemente motivos hínicos. b) Na parte principal, depois de indicados o lugar e a finalidade do cântico (instruir todas as nações na grande assembléia), vem principalmente a narrativa, emoldurada de expressões de confiança e de confissão das culpas e na qual aparece claramente a conexão com o cântico de lamentação individual, ou seja, a descrição do passado infortunado, o apelo dirigido a Deus e a salvação operada por Deus, na base da qual o suplicante se declara seu seguidor. À semelhança dos cânticos de lamentação, o infortúnio pode ser descrito de dois modos: como causado pelos pecados individuais e perdoados por Deus ("confissão positiva"), ou causado pela maldade dos inimigos, da qual, porém, Deus libertou o inocente ("confissão negativa"). Ligados à narrativa aparecem frequentemente certos elementos didáticos que têm suas raízes na experiência da ajuda concedida por Javé: o suplicante deseja exprimir o seu agradecimento, procurando fazer com que os outros tenham a mesma experiência. Introduziram-se, neste ponto, certos elementos da doutrina sapiencial, de sorte que muitos dos cânticos de ação de graças se transformaram puramente em poesia didática (p.ex.: SI 32[31); 73[72]). c) A conclusão contém, como no hino, os mesmos tons de louvor que se encontram na introdução. A forma e o estilo do cântico de ação de graças são muitas vezes mais livres e menos convencionais do que nos outros gêneros. Sua linguagem nem sempre é a de uma lírica superior. Estes cânticos certamente não foram compostos por poetas ou cantores profissionais do templo, nem podem ser considerados como formulários cultuais. Antes, talvez provenham de pessoas que compunham um cântico como um ato bom e agradável a Deus, para acompanhar com ele seu sacrifício de ação de graças.
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
Podemos distinguir duas subclasses do cântico de ação de graças: a) O cântico de ação de graças coletivo é bastante raro, porque a comunidade podia externar seu agradecimento através do hino, do canto de louvor dirigido a Javé em glorificação de seus grandes feitos em benefício de Israel. Assim no 51 136[135], a primeira parte de cada versículo é um convite ao louvor ou a menção de um feito de Javé, seguindo-se, na segunda parte, como ma espécie de responsório, a frase: Porque sua miseri-
córdia dura para sempre. b) O cântico de ação de graças individual aparece, como tal, sob a
forma de confissão positiva ou negativa. O 51107[106] é um desses cânticos, destinado a uma celebração de ação de graças de quatro grupos de pessoas que são convidadas a render graças por terem sido salvas nos respectivos infortúnios (do fato de haver-se perdido no deserto; da prisão; da doença; do perigo em alto mar), e isto elas o fazem também apenas em um versículo.
5. Cânticos reais Os cânticos reais, que se conservaram, são de natureza religiosa e cultual, e podem se enquadrar nos diversos gêneros literários já mencionados. Devemos, contudo, mencioná-los separadamente, porque apresentam elementos especificamente veterotestamentários. Uma parte desses cânticos, dos quais muitos devem ter pertencido a um ritual de entronização do rei, tem como ponto de referência o poder de Javé, exaltado nos hinos e do qual deriva o poder subordinado do rei. A forma oracular desempenha um papel significativo nesses cânticos. Assim, o 51 2, que é a palavra de um rei, pronunciada por ocasião de sua entronização, lembra um oráculo recebido de Javé. O 51110[109] contém um ou três oráculos de um profeta cultual, destinados ao rei. O 5145[44] é um oráculo de bênçãos por ocasião das núpcias reais. No 51 101[100] o rei propõe os princípios que nortearão o seu governo. 05172[71] contém o pedido de bênção em favor do rei. O 5121[20] pode ter sido recitado por ocasião de uma festa anual de comemoração, e o 51132[131], deve tê-lo sido no dia da fundação do santuário real de Jerusalém, para ressaltar as relações da dinastia com o templo. Uma outra parte dos cânticos são, pela sua forma, cânticos de lamentação ou de ação de graças. O 5144[43] implora a ajuda divina na iminência de uma guerra. Os 5120[19] e 144[143] contêm pedidos semelhantes. 05189[88] B faz reclamações contra Deus por causa de uma guerra perdida. 05118[17] B agradece a obtenção de uma vitória.
§ 39. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS DOS SALMOS
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Numericamente falando, esses cânticos são muito poucos, no quadro da poesia que se conservou, apesar de quatro séculos de monarquia ininterrupta. Embora isto tenha sido condicionado, em parte, pela seleção posterior, que excluiu muitos deles na época que se seguiu aos reis e indique uma tendência à uniformização e ao empobrecimento, todavia, também possui suas raízes na fé do Antigo Testamento, na qual Javé ocupa a posição suprema e em cujo culto é menos o soberano sacral que age perante Javé, do que o povo ou a comunidade. Além disso, e apesar de sua dependência em relação ao estilo áulico do Antigo Oriente, cujas vistas estão voltadas para o domínio universal (adoção, escolha, legitimação e direção do rei pela divindade, proclamação de uma era de salvação e de bênçãos, duração eterna, justiça e vitórias), os cânticos reais hebraicos se acham profundamente ancorados na fé javista. É Deus e não o rei quem surge em primeiro plano. Do mesmo modo com parece não ter havido cânticos de glorificação ao rei nem cânticos reais de auto-exaltação, assim também nos cânticos reais referentes ao culto fala-se menos do poderio do rei e de seus feitos, do que daquilo que Deus lhe promete, daquilo que ele implora a Deus e daquelas coisas pelas quais ele agradece.
6. Outras lonnas Outras formas que na maioria dos casos aparecem isoladas no interior dos salmos, são aquelas de cunho sacerdotal e ligadas à atividade dos profetas cultuais. As liturgias de entrada, como nos 5115[14] e 24[23] contêm uma torá sacerdotal expressa nas exigências que os visitantes do santuário deviam preencher. O 51132[131] anuncia as exigências divinas com relação à casa real. Para uma fórmula de bênção sacerdotal, indicamos o SI 134[133],3. No caso dos oráculos muitas vezes fica-se indeciso se eles provêm da esfera sacerdotal ou dos profetas cultuais. Os oráculos dos SI 2 e 110[109] provavelmente se ligam aos profetas cultuais. No SI 81[80] parece que é também um profeta cultual quem fala. As formas da literatura sapiencial também exerceram sua influência, resultando daí poesias sapienciais e didáticas que estudaremos no § 47,5. Essas poesias não nasceram do culto nem eram destinadas a eles. Eram, antes, composições piedosas, de caráter estritamente pessoal e oriundas da época pós-exílica. Nelas muitas vezes se confundem doutrina sapiencial e piedade para com a Lei. Não se sabe se a forma alfabética de alguns dos cânticos se deve também à influência da literatura sapiencial, forma esta que até agora não foi comprovada no restante do Antigo
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
Oriente, mas sim na poesia grega, helenística e romana, podendo acontecer que os mestres de sabedoria talvez se tenham inspirado nessa poesia." Esses cânticos devem mostrar a habilidade do autor, como o SI 119[118], e constituir uma ajuda mnemônica para quem os aprendia, devendo também exprimir talvez a idéia de perfeição ("de A a Z"), embora por causa do impulso da forma o curso do pensamento se afrouxe e a exposição se faça aos saltos. Nestes cânticos, as letras iniciais dos versos ou das estrofes seguem a ordem do alfabeto hebraico. O método varia quanto aos detalhes: cada verso pode começar por uma nova letra, como, p.ex., nos SI 25[24]; 34[33]; 111[110]; 112[111], e a este seguir-se um ou mais versos, sem observância do esquema; assim, p.ex., no SI 9/10[9]; 37[36]; em Lm 1; 2; 4; ou então vários versos começam com a mesma letra: SI 119[118]; Lm 3. Certos cânticos alfabéticos contêm tantos versos quantas são as letras que o alfabeto possui, ex.: 5133[32]; 103[102]; Lm 5. Devemos, por fim, mencionar a mistura de gêneros literários e a formação de liturgias. Tem-se a primeira, quando um determinado gênero de cântico é ampliado por elementos isolados de um outro, como, p.ex., quando a introdução de um cântico de lamentação assume um caráter hínico ou o elemento do voto já se acha incluído no agradecimento, ou quando ela é inteiramente transformada por influência da literatura sapiencial. Tem-se, pelo contrário, uma liturgia, quando se unem vários gêneros de cânticos em uma composição mais extensa, que talvez tinha sido recitada também por vários locutores ou cantores em uma determinada situação cultual particular. Em tais casos, cada gênero é empregado em correspondência com o seu Sitz im Leben ["contexto vital"]. Exemplos disto temos nas liturgias de entrada (SI 15[14] e 24[23] e nos cânticos de ação de graças (5166[65] e 107[106]). Parece que os profetas cultuais também compuseram esse tipo de liturgia, para ser executado por eles próprios no culto ou fazê-lo executar por outrem. Exemplos que foram conservados são Is 24-27; 33; Mq 7.8-20; Habacuc e [oel. Outros profetas também imitaram essas liturgias, em função de seus objetivos, assim: Jr 14.2-15.2; Os 5.15-6.6; 14.2-9. No 51136[135] encontra-se a ladainha que aparece freqüentemente nos salmos babilônicos, com várias repetições da mesma frase com resposta coletiva da comunidade. 14
13
14
M. LÕHER, "Alphabetische und alphabetisierende Lieder im Alten Testament", ZA W 25 (1905), 173-198. - R. MARCUS, "Alphabetic Acrostics in the Hellenistic and Roman Periods", JNES 6 (1947), 109-115. - P. A. MUNcH, "Die alphabetische Akrostichie in der jüdischen Psalmendichtung", ZOMG 90 (1936), 703-710. Cf. também ], ÜBERMANN,"An antiphonalPsalrnfromRas Sharnra",JBL 55 (1936), 21-44.
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7. Salmos em outros livros do AT Em outros livros do AT foram inseridos certos salmos isolados que já existiam como cânticos acabados e foram utilizados nos lugares adequados. Assim, p.ex.: Ex 15.1-19;Dt 32; 1Sm 2.1-10; Is 38.10-20. Evidentemente que não se levou na devida conta o sentido original, quando se atribuiu a Jonas um cântico de ação de graças pronunciado no ventre do monstro marinho, antes de sua liberação (In 2.3-10). Verdadeiras criações novas são, porém, as liturgias dos círculos dos profetas cultuais. Também em época muito posterior permaneceu a arte da composição de salmos e apareceram outros cânticos, havendo, inclusive uma evolução posterior dos gêneros." É isto precisamente o que nos mostram, entre outros, os cânticos de louvor encontrados em Qumran (lQH), bem como o livro dos Salmos de Salomão. Quando tratarmos dos gêneros literários dos salmos, mostraremos particu1arizadamente a influência essencial exercida por eles nas imitações proféticas dos gêneros literários dos cânticos ou de suas partes isoladamente. Em outras passagens, enfim, percebe-se também a influência estilística desses cânticos. Do mesmo modo como eles influíram nas orações da prosa literária, p.ex., na oração proferida por Salomão, ao inaugurar o templo (lRs 8), e ainda nas confissões dos pecados (Esd 9 e Ne 9) ou na oração penitenciaI (Dn 9), assim também é sensível a presença dos elementos formais, sobretudo do hino e do cântico de lamentação, na literatura sapiencial, p.ex., em Pv 8, no livro de Já e Eclo 24.
§ 40. OS GÊNEROS LITERÁRIOS LÍRICOS REFERENTES À VIDA QUOTIDIANA K. BUODE, "Das Volkslied Israel sim Munde der Propheten", PJ 73 (893),460-483. - A. CAUSSE, "Les origines de la poésie hébraique", RHPhR 4 (924),393-419; 5 (925), 1-28. - M. E. CHASE, Life and Language in the Old Testameni, 1956.- M. CRAMER, DieTotenklage bei denKopten, 1941. - G. GERLEMAN, "Die Bildsprache des Hohenliedes und die altâgyptische Kunst", A5TI 1 (962),24-30. - W. HERRMANN, "Gedanken zur Geschichte des altorientalischen Beschreibungsliedes", ZAW 75 (963), 176-197.
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G. MORAWE, "Vergleich des Aufbaus der Danklieder und hyrnnischen Beckenntnislieder OQH) von Qumran mit dem Aufbau der Psalmen im Alten Testament und im Spãtjudentum", RdQ 40963/1964),323-336.
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- F. HORST, "Die Formen des althebrâischen Liebesliedes", em: LittmannFestschrift, 1935,43-54 (= Gottes Recht, 1961, 176-187). - H. JAHNOW, Das hebrdische Leichenlied im Rahmen derVOlkerdichtung, 1923. - P. KAHLE, "Die Totenklage im heutigen Ãgypten", em: Gunkel-Festschrift, I 1923, 346399. - E. LITTMANN, Abessinische Klagelieder, 1949. - P. LOHMANN, Die anonymenProphetien gegen Babel ausderZeit des Exils, Diss. Rostock, 1910. -lo., "Das Wãchterlíed Ies 21,11.12", ZAW33 (1913), 20,29. -E. LÜDOECKENS,
Untersuchungen über religiõeen Gehalt, Sprache und Form der iigyptischen Totenklagen, 1943. - H. WH. ROBINSON, The Poetry of the Old Testament, 1947. - G. A. SMITH, The Early Poetry of Israel in its Physical and Social Origine, 4i! ed., 1913 (1927).
1. Cântico do labor, cântico da colheita e do lagar, cântico da guarda Um cântico do labor, que já existia no antigo Egito, é o que parece ser o cântico do poço de Nm 21.17s, cântico este executado por ocasião da abertura de um poço na estepe ou no deserto, com a participação do chefe tribal. Como, porém, seu bastão e seu cetro constituíam o símbolo do poder, resulta que o cântico nasceu de uma concepção segundo a qual a palavra poética estava simplesmente cheia de um poder mágico. Trata-se propriamente de um ensalmo pronunciado por um homem de Deus. Existe em Ne 4.4 um cântico de lamentação do trabalho, que é quase um cântico de discussão e se assemelha ao grito dos oprimidos, um grito que sobe até Javé. Apesar de não terem sido conservados, os cânticos do trabalho eram cantados com freqüência. Jesus de Sirac ainda ouvia o canto do camponês enquanto arava o campo, mas se sentia superior a esse tipo de comportamento insensato (Eclo 38.25). Existiam também cânticos da colheita e cânticos do lugar. O grito de júbilo hêdad, que se proferia quando se colhiam e se esmagavam as primeiras uvas da estação, pode ter conservado a denominação desses cânticos, mas pode ter sido também uma espécie de ensalmo (cf. 5165[64],14). Mesmo não considerando a alegria que reinava - a expressão: como na alegria da colheita é um modo de falar quase proverbial (Is 9.2) - celebravam-se festas da colheita que eram fortemente marcadas pelas concepções e usos cananeus (cf. [z 9.27). A exclamação hêdad indica, portanto, aquela religião da fertilidade. É por isso justamente que não se conservou nenhum dos antigos cânticos da colheita e do lagar. Esses cânticos traziam por demais a marca de sua origem cananéia e muito pouco se impregnaram da fé javista. Em lugar deles existem alguns cânticos de ação de graças que foram consagrados a Javé como o doador de todas as coisas (SI 65[64]; 67[66]).
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É ao gênero do cântico da guarda cantado pelos guardas noturnos, supostos nas povoações israelitas (Ct 3.3; 5.7), a que se refere Is 21.12. Na realidade, neste caso não se trata de um cântico que se cantava regularmente, mas de uma resposta promissora de esperança para a pergunta: Que horas são?
2. Cântico do vinho
o cântico do vinho (báquico), que se executava por ocasião dos banquetes, pode também se relacionar com a esfera religiosa, como no-lo mostra a polêmica profética (Is 5.11-13; Am 6.4-6), que reprova a despreocupada falta de fé e a opressão dos pobres. É desses cânticos, ou melhor desses ditos, que se fala em Is 22.13 e 56.12. Em ambos os casos ressalta claramente a relação negativa para com as exigências da fé.
3. Cântico de escárnio
o cântico de escárnio é designado frequentemente como masal, dito mágico que era utilizado no mundo antigo como uma espécie de esconjuro ou maldição e podia produzir um efeito extraordinário. Este cântico aparece sob várias modalidades: a) Refere-se a uma única pessoa; o exemplo que se conservou desta espécie, em Is 23,15s, escarnece da meretriz abandonada. b) Mas refere-se principalmente a outras tribos, estados e nações. Por trás desse cântico ouvem-se o escárnio, o desprezo e a maldição contra os inimigos, em conexão com a defesa dos próprios interesses. Pode-se considerá-lo como arma política, pode-se compará-lo à propaganda política (EISSFELDT)*, mas não se pode deixar de considerar nele também os subtons de uma maldição mágica e religiosa. Nm 21.14s constitui talvez o fragmento de um cântico de escárnio onde devia constar a enumeração das regiões conquistadas aos inimigos. Nm 21.27-30 se refere, na forma atual, à vitória de Seon, rei dos amorreus, contra o rei de Moab, mas talvez provenha de uma vitória de Israel contra Moab. O cântico de vitória também assumiu os temas de escárnio, como no-lo mostra o cântico de Débora, ao zombar das tribos que ficaram longe do combate e ao descrever o contraste entre a expectação da mãe de Sísara, o capitão de guerra cananeu, e a morte miserável deste chefe (Jz 5.15-17,28-30). A literatura sapiencial também procedeu de igual modo; p.ex., ao escarnecer os ídolos, juntamente com aqueles que os fabricavam e os adoravam (Is 44.12-20).
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c) Os profetas usam o cântico de escárnio com uma nova função, ao referi-lo a um acontecimento futuro, que eles cantam como se já tivesse ocorrido. Característico neste sentido é o cântico a respeito de Babilônia Os 47). A poesia de escárnio, contudo, foi substituída pelas ameaças proféticas contra as nações estrangeiras - ora segundo o método dos profetas da salvação, como em Naum, onde se incluía o anúncio da salvação para Israel e onde a ameaça aos a inimigos funcionava como recurso da política nacional externa, ora envolvendo Israel também na ameaça, como em Amós, quando o profeta atesta a majestade universal de Deus.
4. Cânticos de amor e cânticos nupciais Os cânticos de amor e os cânticos nupciais eram ouvidos em Israel, sobretudo nos meses do outono, quando, depois da colheita, costumavam-se celebrar as núpcias e se faziam ouvir a voz do noivo e da noiva, os gritos estrídulos das mulheres em dança e o ritmo monótono dos tambores. Esses cânticos eram ou simples poesias populares ou composições artisticamente elaboradas. O Cântico dos Cânticos conservou toda uma coleção desta espécie. Não se pode classificar apressadamente esses cânticos como de natureza profana. Em 5145[44], a introdução profética, o estilo profético, a maneira religiosa de descrever o rei e a expressão de bênçãos indicam claramente que se trata de um cântico cultual, recitado por um profeta cultual, por ocasião das núpcias de um soberano. Chamou-se também muitas vezes a atenção para as dos cânticos de amor e cânticos nupciais com aqueles que devem ter ressoado no ritual de celebração das núpcias dos deuses ou das núpcias santas do rei sacral." Estas reminiscências se explicam, de um lado, pelo fato de que os cânticos cultuais dependiam, quanto ao estilo e ao vocabulário, dos outros cânticos de amor e cânticos nupciais, embora estes, por sua vez, pudessem ser influenciados por aqueles, e, do outro lado, pelo fato de que os dois tipos de cânticos brotaram de uma mesma situação. Contudo, toda vez que Israel assumiu materiais religiosos estrangeiros, estes passaram por um processo de dessacralização. ló
H.
"Hohes Lied und hieros gamos", ZAW 65 (1953), 300-302. - H. "Zur kultischen Deutung des Hohenliedes", ibid. 64 (1952), 148-155. - lo., Heilige Hochzeit und Hoheslied, 1956. - W. WITTEKINDT, Das Hohe Lied und seine Beziehungen zum Istarkult, 1927. RINGGREN,
SCHMOKEL,
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Em detalhes, podem-se reconhecer diversos pequenos gêneros literários, os quais, depois da análise de HORST, e com apenas uma exceção, basta enumerarmos, como segue: o cântico de admiração (p.ex., Ct 1.9-11); comparações e alegorias tp.ex., 1.13s; 6.2); o cântico descritivo tp.ex., 4.1-7); a autodescrição tp.ex., 1.5s); o cântico jatancioso (p.ex., 6.8s); o diálogo chistoso (p.ex., 1.7s); a descrição de uma experiência pessoal (cf. 2.8s); e o cântico de anseio (cf. 2.4). O cântico descritivo tem uma longa história cujos contornos HERMANN levantou, desde a época sumeriana até à descrição de Sara no "Gênesis Apócrifo" descoberto em Qumran, e que se prolonga até à época dos árabes. GERLEMAN demonstrou, além disto, que o cântico descritivo tem sua origem nas descrições de panoramas e, em primeira linha, nas descrições dos ídolos, na arte representativa do Egito. As descrições do Cântico dos Cânticos apresentam vestígios claros deste procedimento.
o pólo oposto desses cânticos são as descrições da infelicidade amorosa e que se encontram, como imitações, na parábola de acusação do marido traído, como se lê em Is 5.1-7, e nas alegorias drásticas de Ez 16 e 23. 5. Cântico guerreiro e cântico de vitória
o cântico guerreiro e o cântico de vitória constituem uma parte não desprezível da poesia lírica de IsraeL Além do cântico de vitória propriamente dito, também se conhecem outras formas que se referem ao combate. a) Em [s 10.12 encontra-se um resto de cântico de ensalmo. Segundo este cântico, o chefe do exército ordenou ao sol e à lua, de maneira quase mágica, que se detivessem, para que o povo pudesse levar a batalha até ao completo extermínio do inimigo. É no mesmo sentido que se devem entender a invocação dirigida ao estandarte de Javé (Ex 17.16), cujo poderio bélico é invocado contra os amalecitas, como também a exclamação de Eliseu, depois que o rei [oás foi ferido por uma flecha (2Rs 13.17). b) São as narrativas respeito de Balaão (Nm 22-24) que melhor nos fazem ver o Sitz im Leben [" 0 contexto vital"] dos cânticos de bênçãos e de maldição: um homem de Deus, possuído de uma força divina, devia abençoar o próprio partido e amaldiçoar os inimigos, a fim de assegurar o êxito da batalha. Sentido semelhante têm os cânticos de maldição ou as maldições com que um determinado guerreiro, como Golias, cobria o inimigo antes de entrar em combate, e ainda o alarido da tropa que atacava, o qual devia, como grito mágico que era, aumentar o próprio
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poderio e diminuir o poderio do inimigo. O emprego de uma ordem dada em tom de sarcasmo pertence a esta linha. c) O puro cântico de estímulo ao combate tinha a mesma função que a música marcial de épocas posteriores. É a um desses cânticos que alude [z 5,12, ao passo que em Is 51.9s se encontra uma imitação profética. d) O cântico de vitória era cantado frequentemente por mulheres, com acompanhamento de músicas e danças, quando o exército vitorioso voltava da batalha ou quando se comemorava uma vitória em particular. É isto o que se infere de Ex 15.20s; [z 11.34; 15m 18.6s. Esses cânticos são bastante curtos e constam de um ou dois versos longos, que as mulheres repetiam alternadamente em dois grupos. Também quando os filisteus celebraram sua vitória com a prisão de Sansão, cantavam um cântico correspondente, onde apareciam aliterações sob a forma rimada (Iz 16.23ss). O mais grandioso de todos, em sua viva dramaticidade, é o cântico de Débora (Iz 5), que não é simplesmente um cântico profano, apesar de seu objeto (§ 31,3).
6. Cântico fúnebre O cântico fúnebre traz a designação de qinã ou nehi, e seu Sitz im Leben ["contexto vital"] é a casa enlutada, onde o executavam parentes do morto ou carpideiras profissionais, ao som de flautas. Na maioria das vezes pode-se reconhecê-lo pela expressão introdutória: 'êk ou 'êkâ, "Ah, como!" A lamentação por um morto faz parte dos costumes fúnebres obrigatórios, de modo que se expunha às más-línguas quem a omitisse. Por isso o convite dirigido aos profetas nesse sentido (Ir 16.5; Ez 24.15ss) é uma ordem severa, e o anúncio feito a um vivente, de que nenhuma lamentação fúnebre lhe será consagrada (Ir 22.18s) constitui uma ameaça terrível. É no cântico fúnebre que o elemento religioso e cultual se encontra mais uma vez com o quotidiano. Originariamente a lamentação fúnebre era parte integrante do culto aos mortos, de onde surgiu a profissão das carpideiras, mulheres que aprendiam e ensinavam os cânticos (em [r 9.19-21 é o próprio profeta quem assume este encargo). No sarcófago do rei Airão de Biblos (cerca de 1200 a.C}, elas aparecem representadas batendo nos peitos e arrancando os cabelos. Acrescentem-se aqui muitos outros costumes, entre os quais as danças mortuárias, o costume de sepultar ao lado de um outro túmulo já existente e o de levar comida para os túmulos. No que respeita às raízes cultuais,
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convém igualmente lembrar as lamentações sobre o deus da vegetação que morre ou que desce ao mundo subterrâneo. A ameaça dirigida por Jeremias a Joaquim (Ir 22.18), com a exclamação: Ai, minha irmã, que pouco tem a ver com o rei, e também a informação de que o filho de [eroboão foi pranteado, segundo a versão dos LXX, com os termos: Ai, Senhor! (lRs 12.24s) contêm fórmulas que nos lembram também a lamentação proferida pela irmã e bem-amada a respeito do soberano divino. Existiam também exclamações e lamentações por esta irmã, a qual descia igualmente ao mundo subterrâneo. Como se lamentava um homem, assim também se lamentavam os deuses nos cultos vegetais. LÜDDEcKENs mostrou, com referência aos reinos Médio e Novo do Egito, e I
As formas estilísticas e as expressões do cântico fúnebre israelita têm, portanto, suas raízes muitas vezes, embora não exclusivamente, no cântico fúnebre e no culto mortuário do Antigo Oriente. É evidente que nem um nem outro encontraram lugar na fé javista. Por isso, ao ser assumido, o cântico fúnebre foi dessacralizado amplamente quanto à forma e à matéria, e desvinculado do culto. Daí por diante passou a exprimir sentimentos humanos: amor e ódio, veneração e zombaria. a) A modalidade mais conforme com o sentido primitivo é o cântico fúnebre pessoal sobre a morte de uma determinada pessoa. Dois desses cânticos, atribuídos, com razão, a Davi, são aqueles referentes a Saul e a [ônatas (25m 1.19-27), e a Abner (3.33s). O primeiro é uma obra-prima de poesia, impregnada ao mesmo tempo de profunda sensibilidade. A maldição pronunciada contra o campo de batalha (v. 21) possui caráter religioso, ao passo que a invocação: meu irmão, dirigida a [ônatas, corresponde verdadeiramente à amizade existente entre Davi e [ônatas, não obstante o seu aspecto formal. De natureza convencional é o v. 23, que serve como dissimulante. b) O cântico fúnebre coletivo se refere a tribos, estados, povos, sobre cuja ruína é entoado. Esta modalidade se encontra, ainda que não em sua forma pura, em determinadas passagens do livro das Lamentações, onde se chora a destruição da cidade de Jerusalém, apresentada sob a figura de mulher. c) O cântico fúnebre profético se refere, em geral, também à comunidade. Contudo, ele não deplora a morte e a ruína concreta, histórica, mas a morte e a ruína futuras, que ele representa como já tendo acontecido. É isto o que se passa com a lamentação de Amós a respeito da virgem de
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Israel (Am 5.1-3). Com este procedimento o profeta torna maior a ameaça dos infortúnios. Ele está tão certo de que a desgraça acontecerá, que desde já pode lamentá-la. Uma modalidade do cântico fúnebre frequentemente usada é a do cântico fúnebre profético sarcástico, que o mais das vezes se refere a uma potência estrangeira, a respeito de cuja ruína, anunciada como iminente, não reina a alegria nem a tristeza, mas o escárnio, a satisfação, a alegria. Nesta modalidade unem-se o cântico fúnebre e o cântico de escárnio, de modo que Is 14.4ss - sem dúvida o cântico mais impressionante deste gênero dirigido contra um soberano estrangeiro" - é chamado simplesmente de mashal, um cântico de escárnio. Além de Na 3.18s, dirigido contra os assírios, no livro de Ezequiel também se encontram numerosos cânticos deste gênero: 26.15-18; 27 e 28.11-19, contra Tiro; 31; 32.1-8,17-32, contra o Egito, e 19.19,10-14, contra Sedecias, rei de [udá. O estilo do cântico fúnebre exerceu também sua influência sobre a formação dos oráculos do Servo de Javé (Is 52.13-53.12), mas modifica o conteúdo, quando a desgraça e a morte são descritas como fundamento da salvação conquistada pelo Servo de Javé.
7. Relação com acontecimentos históricos Uma parte dos referidos cânticos, como, p.ex., o cântico de Débora e os cânticos de lamentação sobre a queda de Jerusalém, se achava vinculada desde o início a determinados acontecimentos históricos. Esses cânticos foram conservados por causa do significado de tais acontecimentos. Outros cânticos, porém, só foram relacionados a esses acontecimentos posteriormente, e assim reinterpretados, como, p.ex., Ex 17.16; Nm 21.14s,17s,27-30. Isto dificulta, em verdade, sua compreensão, mas eles foram conservados justamente por causa dessa ligação, ou proporcionaram uma ocasião a que se transmitisse uma narrativa que podia estar vinculada a eles. Grande parte do tesouro dos cânticos israelitas mais antigos perdeu-se irremediavelmente. Pode-se deduzir a existência de outros cânticos a partir de alguns títulos dos salmos ou da análise de seu conteúdo. Assim, Ez 16.1-43 supõe um cântico (ou uma fábula) da criança exposta e resgatada; 17.1-10 supõe um cântico da águia e do rebento do cedro; 19.19 supõe um cântico do leão e 19-10-14, um cântico da vinha." 17 18
G. QUELL, "[esaia 14,1-23", em: Baumgiirtel-Festschrift, 1959, 131-157. C. KUHL, "Altere Materialien im Buche Hesekiel", Habil.-schrift, Berlin, 1939.
§ 41. As CARACTERÍSTICAS
DOS GÊNEROS LITERÁRIOS DOS CÂNTICOS NO
AT
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§ 41. AS CARACTERÍSTICAS DOS GÊNEROS LITERÁRIOS DOS CÂNTICOS NO ANTIGO TESTAMENTO
1. Adaptação de materiais estrangeiros Depois de termos uma visão geral sobre os gêneros literários dos cânticos, podemos agora ver de que modo os materiais e as formas estrangeiras foram tratados neles e o que é que se pode deduzir de sua história para o conhecimento das características específicas do cântico no Antigo Testamento. Quanto á maneira de tratar os materiais estrangeiros devemos indicar três pontos de vista. Primeiro: rejeitou-se o material estrangeiro quando não podia coadunar-se com a fé javista. Isto vale de modo particular para o cântico da colheita e para o cântico do lagar, vinculados aos cultos cananeus, como também para aos cânticos de louvor ao rei, que estavam em contradição com o significado de Javé. - Segundo: certos cânticos cultuais foram dessacralizados: o cântico de amor e o cântico de núpcias, na medida em que seus materiais provinham das ações cultuais dos cultos da vegetação, e o cântico fúnebre, na proporção em que tinha suas raízes no cântico fúnebre dos deuses e no culto dos mortos. - Terceiro: a fé javista assumiu certos cânticos puramente profanos, sobretudo o cântico de vitória que devia proclamar os atos de justiça de Javé (Jz 5.11). - Quarto: certos materiais de proveniência estrangeira, principalmente aqueles de caráter mágico foram modificados e adaptados à fé javista. Tais são: o hino, que devia verdadeiramente assegurar e tornar presentes o poder e a vitória da divindade, e que desde então passou a atestar a veneração e a adoração a Deus; o cântico de lamentação, que de encantamento e de contramagia se transformou em submissão suplicante a Deus, indicando que a comunhão com Deus é a única possibilidade de uma existência humana plena de sentido; o cântico real, que de parte integrante do ritual do rei divino se converteu em reconhecimento da soberania de Deus.
2. Adaptação de formas estrangeiras Quanto à utilização das formas estrangeiras, convém mencionar aqui dois pontos de vista: Primeiro: manifestam-se certas tensões, como resultado de sua inaptidão como meio de expressão, como se vê do melhor modo no hino. No Antigo Oriente, o hino louva uma divindade, acumulando os adjetivos ornamentais e comparando-a com outros deuses.
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
o estilo do
hino hebraico contém reminiscências de comparações entre divindades, como, p.ex., na pergunta: Quem é como Javé? Mas resulta daí uma tensão com outras formas de estilo, que melhor atendem às características específicas de Javé, como, p.ex., em SI 96[95],4s. - Segundo: introduziram-se certas mudanças e novidades. Os cânticos de lamentação babilônicos estão voltados para a obtenção de um oráculo favorável, e por isso procuram lisonjear a divindade, descrevendo sua majestade. No Antigo Testamento, pelo contrário, aparece o motivo da confiança como base da certeza. Esse tema também se tornou autônomo, surgindo então o cântico de confiança.
3. Desenvolvimento em Israel Quanto à sua história interna em Israel, quatro são as observações importantes a fazer: 1) Não se manteve uniformemente a vinculação com a forma. Como resultado do desligamento parcial em relação ao culto e da tomada de consciência pessoal cada vez mais acentuada, começou um afrouxamento que levou ao abrandamento e à dissolução da estreita vinculação com a forma. Observa-se este afrouxamento na mistura de estilos e de gêneros literários, como, p.ex., no livro das Lamentações e nos cânticos alfabéticos. - 2) A maneira de tratar o metro oscila. A tendência é no sentido de restringir a grande liberdade da poesia mais antiga e de uniformizar o metro no interior de uma determinada passagem. O ponto culminante deste processo foi alcançado no final da época que precedeu o exílio. Exemplos neste sentido são Naum e Habacuc. Na época posterior ao exílio começa uma mudança radical que leva ao empobrecimento. - 3) Desde cedo havia começado a tendência de compor, além de cânticos cultuais de um determinado gênero, também cânticos não-cultuais, de modo que os dois tipos aparecem e continuam a existir um ao lado do outro, como, p.ex., em certos hinos e cânticos, tanto de lamentação com de ação de graças. Diferente é o que acontece com os cânticos de escárnio e cânticos fúnebres, onde, ao lado do cântico de tipo pessoal, surge também o cântico de tipo coletivo. - 4) Na maioria dos gêneros literários dos cânticos é de importância verificar que a profecia os assimilou, modificandoos e imitando-os. Isto acontece paralelamente ao desligamento em relação ao culto, ou à formação de cânticos coletivos, de sorte que as causas deste processo residem principalmente na pregação dos profetas, com sua crítica ao culto dominante e com o seu voltar-se para o povo e para as nações. A questão de saber quais são as características próprias da poesia
§ 42.
COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
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lírica de Israel com relação ao restante da lírica do Antigo Oriente nos conduz à fé dos profetas como força motora do fato de colocar todos os enunciados religiosos em relação com o Deus que dirige os destinos de todos os povos e de todos os homens; força motora também do reconhecimento de seu poder superior a toda magia, a todo culto e toda autoglorificação, e que a tudo impregna, e ainda: da exigência de confiança obediente e irrestrita a Deus, a quem se submete à sua soberania e procura a sua comunhão. É por isso que a história da poesia lírica de Israel está profundamente ligada à fé dos profetas e é somente a partir desta fé que ela pode ser compreendida satisfatoriamente. A liturgia sinagogal, que se inicia a partir do exílio e de onde a palavra substitui a ação cultual, exigiu a interiorização e a espiritualização. Paralelamente à piedade cultual do templo, depois do exílio, permaneceu aberto o caminho para uma piedade pessoaL
§ 42. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
1. Compilação e transmissão É de natureza do cântico que ele surja isoladamente e seja utilizado também por este mesmo processo. Os cânticos podem ser aprendidos e transmitidos, cada um separadamente, pelos canais de tradição oraL Mas, bem cedo, razões de ordem prática fizeram com que eles fossem reunidos em coleções e consignados por escrito. Isto se aplica sobretudo aos cânticos cultuais que foram reunidos em livros de cânticos, como aqueles das corporações dos cantores de Asaf e de Coré, e que se encontram no Saltério. As coleções, muito apropriadamente chamadas de antologias, parecem ter assumido, cada uma, cânticos de conteúdo igualou semelhantes. É bem isto o que nos indicam os títulos das coleções mais antigas, que se perderam: o Livro das Guerras de Javé, citado em Nm 21.14, certamente uma coleção de cânticos referentes às vitórias de Javé e às derrotas dos inimigos, e o Livro do Justo, mencionado em [s 10.13 e 25m 1.18, evidentemente uma coleção de cânticos referentes a determinados heróis guerreiroS.19 2Cr 35.25 menciona uma coleção de cânticos de lamentação, prove-
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Talvez seja este o mesmo livro a que se refere lRs 8.53 da LXX, quando fala do Livro do Cântico (ysr corrompido ou lido erradamente como Sir).
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CONSIDERAÇÕES GERAIS
niente de época posterior, e que, entre outros, contém cânticos sobre a morte de [osias, e não pode ser idêntica ao livro das Lamentações; coleção esta, portanto, que também se perdeu. Nos livros do Cântico dos Cânticos e das Lamentações, todavia, está suficientemente documentado o critério que presidiu ao processo de compilação dos cânticos que tinham conteúdo igualou semelhante. A repetição parcial ou total de um mesmo cântico no Cântico dos Cânticos nos leva a observar que originariamente foram organizadas coleções menores e que estes foram depois reunidas em uma coleção maior. Isto se aplica de modo particular ao Saltério que se formou a partir de uma série completa de coleções menores, das quais muitas ainda podem ser reconhecidas. Que a coleção final tenha recebido posteriormente um sentido e uma finalidade diferentes do sentido e da finalidade das coleções parciais é o que nos indica a anteposição de 511 a todo o conjunto (Cf. § 43,5).
2. Cânticos e coleções de cânticos posteriores Os cânticos ou coleções de cânticos posteriores que não foram mais incorporados ao AT são os seguintes: a oração de Manassés (lamentação individual); entre os acréscimos do livro de Daniel, a oração de Azarias (lamentação coletiva) e o cântico dos três jovens na fornalha ardente (mistura de cântico de ação de graças e de hino); o livro de Baruc (oração penitencial formulada no estilo do cântico; poesia didática; coroa de poesias); os Salmos de Salomão (18 salmos: hino; cântico de lamentação; cântico de ação de graças; poesia didática), e ainda o rolo de cânticos de ação de graças (lQH) e as coleções semelhantes de cânticos e orações descobertos em Qumran.
CAPÍTULO
VII
OS LIVROS DE CÂNTICOS § 43. O SALTÉRIO ATD: A. WEISER, 6i1 ed., 1963. - BK: H.-J. KRAUS, 2i1 ed., 1962. - COT: J. RiDDERBOS, 1955/58. - HAT: H. ScHMIDT, 1934. - HF: F. BAETHGEN, 3i1 ed., 1904; H. GUNKEL, 4i1 ed., 1926. - HS. H. HERKENNE, 1936. - IB: W. ST. MCCULLOUGH - W. R. TAYLOR, 1955. - ICC: CH. A. e E. G. BRIGGs, 1906/07 (1951/52). - KAT: R. Krrra, 5i1 e 6i1 ed., 1929. - KeH: J. OLSHAUSEN, 1853.KHC: B. DUHM, 2i1 ed., 1922. - SAT: W. STAERK, 2i1 ed., 1920. - SZ: H. KESSLER, 2i1 ed., 1899. - Estudos particulares: B. BoNKAMP, 2i1 ed., 1956. J. CALES, 6i1 ed., 1936. - B. D. EERDMANS, 1947. - E. J. KiSSANE, 1953/54. - E. KONIG, 1927. - E. A. LESLIE, 1949. - W. O. E. OESTERLEY, 4i1 ed., 1953. - N. PETERS, 1930. - E. PODECHARD, 1949/54. - F. WUTZ, 1925. A. ARENS, Die Psalmen im Gottesdienst des Alten Bundes, 1961. - E. BAUMANN, "Struktur-Untersuchungen im Psalter", ZAW 61 (1949), 114-176; 62 (1950), 115-152. - M. BIC, "Das erste Buch des Psalters, eine Thronbesteigungsfestliturgie", Suppl. Zu Numen 4 (1958), 316-332. - P. E. BONNARD, LePsautier selon iérémie. 1960. - A. BÜCHLER, "Zur Geschichte der Tempelmusik und der Tempelpsalmen", ZA W 19 (1899),96-133,329344; 20 (1900),97-135. - M. J. Buss, "The Psalms of Asaph and Korah", fBL 82 (1963), 382-392. - M. BUTTENWIESER, The Psalms, chronologically treated, 1938. A. G. CLARKE, Analytical Studies in the Psalms, 1949. - L. DELEKAT, Asylie und Schutzorakel am Zionheiligtum, 1967. - P. DRI}VERS, Les Psaumes: genres littéraires et thêmes doctrinaux, 1958. - B. D. EERDMANS, "Essays on Masoretic Psalms", OTS 1, 1942, 105-300. - W. E. FARNDALE, The Psalms in New Light, 1956. - H. J. FRANKEN, The Mystical Communion with fHWH in the Book of Psalms, 1954. - A. GELLIN, Les Psaumes de Yahvé, 1953. - F. GIESEBRECHT, "Über die Abfassungszeit der Psalmen", ZAW 1 (1881),276-332. - CH. HAURET, "L'interpretation des Psaumes selon I' école 'Myth and Ritual"', RSR 33 (1959),321-342; 34 (1960), 1-34. - S. HOLMNIELSEN, "Den gammeltestamentige salmetradition", DTT 18 (1955), 135148, 193-215. - D. MICHEL, Tempora und Satzstellung in den Psalmen, 1960. - H. MOLLER, "Strophenbau der Psalmen", ZAW 50 (1932),240-256. - W. O. E. OESTERLEY, A Fresh Approach to the Psalms, 1937. - J. PATERSON, The Praises ofIsrael, 1950. - H. RiNGGREN, TheFaith of the Psalmists, 1963. - P. J. N. SMAL, Die Universalisme in die Psalms, 1956. - N. H. SNAITH, "The triennial Cycle and the Psalter", ZAW 51 (1933),302-307. - W. STAERK, "Zur Kritik
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OS LIVROS DE CÂNTICOS
der Psalmenüberschriften", ZAW 12 (1892), 91-151. - A. SZÓRÉNYI, Psalmen und Kult im Alten Tesiameni, 1961. - R. J. TOURNAY, "Les Psaumes complexes", RB 54 (1947), 521-542; 56 (1949),37-60. - In., "Sur quelques rubriques des Psaumes", em: Mélanges Roberi, 1957, 197-204. - Io., "Recherches sur la chronologie des Psaumes", RB 65 (1958),321-357; 66 (1959), 161-190. - M. TSEVAT, A Study of the Language of the Biblical Psalms, 1955. - J. E. VIANA, "Como se formó la primera parte dellibro de los Salmos?", Bibl44 (1963), 129-158.- A. C. WELCH, ThePsalter in Life, Worship andHistory, 1926.- C. WESTERMANN, "Zur Sammlung des Psalters", Thelogia Viatorum 8 (1961/62),278-284 (= Forschung am Alten Testament, 1964, 336-343). - Io., "Vergegenwartigung der Geschichte in den Psalmen", Kupisch-Festschrift, 1963,253-280 tibid., 306--335). - Cf. também a bibliografia referente ao § 39.
1. Terminologia e numeração Enquanto para a primeira parte do Saltério escolheu-se a designação de rpillõt, "oração" (5172[71],20) que pela sua maior parte se referia aos cânticos de lamentação, para todo o livro prefere-se como nome a insólita forma do plural rhiliim, "hinos", no sentido de "coleção de hinos, livro de canto". A antiqüíssima denominação psalmoí da versão dos LXX (Lc 20.42; At 1.20: bíblos psalmôn) se refere ao termo mizmor, "cântico", ao passo que uma parte dos manuscritos com a expressão psaltérion designam o instrumento de corda denominado nebel, "alaúde". Daí é que derivam os nossos termos de "salmos" e "saltério". De acordo com a atual divisão, o Saltério contém cento e cinqüenta salmos, de cuja numeração, todavia, divergem o texto massorético e a versão dos LXX. Os LXXreúnem os 519 e 10 e 51114 e 115, respectivamente, em dois cânticos e dividem os 51116 (1-9.10-19) e 51147 0-11.12-20), respectivamente, em dois salmos. A Vulgata segue a numeração dos LXX, numeração esta que LUTERO adotou em suas citações. Ao se fazer a leitura de um salmo na versão dos LXX é preciso levar em conta a sua numeração. Neste sentido, apresenta-se a seguinte sinopse:
Massorético SI 1-8 9-10 11-113 114-115 116.1-9
LXX 1-8 9 10-112 113 114
Massorético SI 116.10-19 117-146 147.1-11 147.12-20 148-150
LXX 115 116-145 146 147 148-150
§ 43. O SALTÉRIO
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A versão dos LXX contém, além disso, ainda um SI 151 que é também o número 1 de cinco salmos siríacos não-canônicos, originários do escrito de um bispo nestoriano do séc. X. Que estes salmos provenham de um original hebraico é o que nos mostra o texto, na mesma língua, do SI 151 (siríaco: número 1) e dos salmos siríacos I1-I1I de 11 Q5l [Salmos da gruta 11 de Qumran].'
Embora a união dos 519/10 dos LXX seja exata, ao contrário do texto massorético, porque os dois salmos, na realidade, constituem um único cântico, as divergências, todavia, nos levam a supor que, mesmo nos casos em que os textos das versões concordem, os salmos nem sempre foram partidos corretamente. Assim, os 5142[41]/43[42], a julgar pelo teor dos versículos que se repetem (42[41],6.12; 43[42],5), constituem um único cântico, ao passo que o 5119[18] foi formado pela reunião de um fragmento e de um elogio da Lei (5119[18],2-7.8-15). É de supor que existam vários outros casos de igual natureza.
2. Significado dos títulos Parte considerável dos salmos ostenta determinados títulos que têm relação com o seu modo de composição ou com seu uso no culto.' Algumas vezes e num primeiro ensaio de apreciação literária, cujo precursor é um catálogo de textos e de atores, proveniente da biblioteca de Assurbanípal e datando do começo do primeiro milênio," eles atribuem os salmos a determinadas pessoas ou oferecem indicações a respeito das circunstâncias de sua origem. Outras vezes trazem informações mais precisas sobre a natureza dos cânticos, além de observações de ordem litúrgica e musical, e ainda referências à finalidade dos salmos. J. A. SANOERS, "Ps 151 in 11 QPss", ZAW 75 (1963), 73-86. - lo., "Two Non-Canonical Psalms in 11 Ql's-", ibid. 76,(1964),57-75. 2 L. DELEKAT, "Probleme der Psalmenüberschriften", ZAW 76 (1964), 280-297. - A. GUILDING, "Some Obscured Rubrics and Lectionary Allusiossin the Psalter", JThSt NS 3 (1952),41-55. - R. GYLLENBERG, "Die Bedeutung des Wortes Sela", ZAW 58 (1940/1941), 153-156. - A. JIRKU, ibid. 56 (1953), 85s (sobre SI 22(21),1). - H. G. MAY, "AI... in the Superscriptions of the Psalms", AJSL 58 (1941), 70-83. - H. D. PREUSS, "Die Psalmenüberschriften in Targum und Midrasch", ZAW 71 (1959),4454. - N. H. RIDOERBOS, "Het bindend karakter van he I' Dâwid in de opschriften der Psalmen", GThT 52 (1952), 184-192. - R. B. Y. SCOTT, "The Meaning and Use of Selah in the Psalter", Bull. Canad. Soe. Bibl. Stud. 5 (1939), 17-24. - N. H. SNAITH, "Selah", VT 2 (1952),43-56. - J. W. THIRTLE, The TitIes of the Psalms, 1905, 2a ed. 3 W. G. LAMBERT, "A Catalogue of Textes and Authors", JCSt 16 (1952), 59-77. 1
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OS LIVROS DE CÂNTICOS
a) Dos nomes contidos nos títulos, os de Moisés, Davi e Salomão,
evidentemente, devem ser considerados como nomes de autores, ao passo que as indicações as corporações de cantores do templo, com as de Asaf e Coré, devem ser consideradas mais como notas de registro, análogas às notícias seriadas dos salmos mesopotâmicos.' Fruto de uma teoria cultual preconcebida é a opinião segundo a qual os referidos salmos originariamente se chamariam de l'daioid e sua execução no culto do templo competiria ao rei, ou sejam destinados a um rei da dinastia de Davi. Com ligeiras diferenças, é esta a opinião também de ENGNELL, MOWINCKEL e WEISER. Esta concepção pressupõe, ainda, mas sem a demonstrar, uma idade elevada para a notícia, idade que, vista a estreita afinidade dos títulos dos salmos com as tradições da história cronística em geral (KRAUS), nos parece improvável. Embora a partícula introdutória le seja ambígua, e nos textos ugaríticos designe, não o autor, mas o personagem principal, de um poema (Baal, Aqhat, Keret), contudo, a concepção de que, no caso dos salmos, se trate de um lamed auctoris, é reforçada pelo fato de que em várias passagens se indica a ocasião em que Davi deve ter composto um salmo, e de que dificilmente se trataria de um comentário posterior. Esta concepção corresponde à antiga representação de Davi como poeta e cantor. Também SI 72[71],20 e Ct 1.1 atestam essa concepção.
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1) O grupo de cantores do templo chefiados por Asaf, que deriva da época de Davi, já estava formado como tal pelo menos quando voltaram do exílio (Esd 2.41; Ne 7.44). Como os salmos ligados ao seu nome são de natureza muito diversa, talvez não provenham dele, mas tenham constituído apenas um livro de cântico do mesmo. - 2) Não é sem fundamento que Etã, um artista cananeu nativo (ezraíta e sábio), segundo 1Rs 5.11 [Vulgata: 4,31], é qualificado de compositor do 5189/88), porque este salmo está ligado ao grupo posterior de cantores de Etã do templo (lCr 15.17ss), que provavelmente deve ter recitado e composto salmos. - 3) Segundo 1Rs 5.11 [Vulgata: 4,31], também Emã é considerado como artista (e talvez integrante de uma corporação de músicos de Maol), e de acordo com o SI 88,1 também como nativo (ezraíta) e autor do cântico adotado pelos coreítas; um dos grupos de cantores do templo posteriores ao exílio é designado pelo seu nome. - 4) Iditun é tido como poeta (5139[38],1; 62[61],1), cantor (SI 77[76],1) e vidente (lCr 35.15). Vários grupos de cantores posteriores ao exílio foram reunidos sob o seu nome. - 5) Para o grupo de Coré necessário se faz procurar saber qual foi o seu processo histórico de formação: ou inicialmente se ocupavam apenas com ofícios humildes no templo, até que uma parte deles conseguiu chegar à posição de cantores, ou o grupo coreíta de cantores do templo, constituído depois do exílio, assumiu sobre si a tão ambiciosa função de porteiros do templo. A última revisão de Nm 16 se volta contra posteriores pretensões desse grupo a direitos sacerdotais.
§ 43. O SALTÉRIO
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b) Há treze casos em que, à maneira do que ocorre também muitas vezes nos divans ["coleções de poemas"] de poetas árabes, certos acontecimentos da vida de Davi são dados como constituindo as situações em que surgiram os respectivos salmos: 3; 7; 18[17]; 34[33]; 51[50]; 52[51]; 54[53]; 56[55]; 57[56]; 59[58]; 60[59]; 63[62]; 142[141]. c) As designações dos gêneros de cânticos nem sempre são compreensíveis. Claros propriamente são mizmor e sir, "cântico"; rhillã, "hino"; rpiilã, "oração de lamentação ou de súplica", e talvez também mãskil. "cântico composto com arte, poesia didática", e Slr hamma 'alôt, "cântico de romaria" (outras interpretações: "cântico seriado", "cântico dos degraus" ou "cântico de viagem")." Outras designações como miktam (LUTERO: "jóia de ouro"; MOWINCKEL: "salmo de expiação") ou siggeyôti (do acádico: "cântico de lamentação"?) quase já não se podem decifrar. d) Certas referências à forma de execução musical, como, p.ex., binghinõi, "com instrumentos de corda", e ao tipo de melodia a utilizar, como o da Corça da aurora (22[21],1) e o de uma pomba nos "longínquos" terebintos (56[55],1), pertencem às anotações musicais e litúrgicas, ao passo que 'ol hassemfnlt, "na oitava", pode referir-se à tonalidade da voz ou ás cordas de um instrumento musical. Discute-se a respeito do significado das expressões lãmnasseah, "para o mestre do canto", ou "para o modo de execução musical"," e eêlã, cujas significações principais podem ser: "interlúdio musical", "repetição (da capo)" e "inclinação para orar". O aleluia ("Halleluia") é um responsório cultuaI. Dado que era possível um canto acompanhado de música ou recitado pelo coro, sobretudo nos grandes santuários como o de Jerusalém, daí talvez tenham surgido todas as anotações concernentes, se é que não foram acrescentadas somente na época posterior ao exílio, quando o templo de Jerusalém passou a ser considerado como o único santuário legítimo. e) Como destinação dos salmos, o 5130[29] nos indica a festa da dedicação do templo, os SI 38[37] e 70[69] o rito da incensação, e 100[99] o sacrifício em ação de graças. Determinados salmos passaram posteriormente a ser cantados durante o holocausto regular da manhã (tamfd) e por isso se chamam os salmos do tamid. Das versões dos textos se deduz que a
Ao contrário, p.ex.: DELEKAT: mizmor = "poesia" (recitada por uma só pessoa); Sir = "cântico" geralmente conhecido; mãskil = "cântico bem sucedido, canção da moda". 6 Ao contrário, p.ex.: DELEKAT: (la-)menase"h ="0 Exímio, o Insigne" (Davi); juntamente com binginôt = "daquele que é exímio, insigne nos cantares" (daquele que é o maior na arte poética).
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Os LIVROS DE CÂNTICOS
sucessão desses salmos para os dias da semana era a seguinte, a começar do domingo [primeiro da semana]: 24[23] (LXX); 48[47]; 82[81] (Talmude): 94[93] (LXX); 81[80] (Ítala e versão armênia): 93[92] (LXX) e 92[91]. Por ocasião da Páscoa e de outras festas, recitavam-se os salmos 113[112]118[117]. Por fim, a cada dia e a cada oração foi associada a recitação de salmos e de versículos dos salmos.
3. Autores e idade Os títulos, quase sempre de origem secundária, objetivamente nada significam quanto aos verdadeiros autores e à idade real dos salmos. No caso de alguns salmos ligados às corporações de cantores, o máximo que se pode pensar é que alguns cânticos foram compostos por elas. Fora disto, os títulos não fornecem nenhum ponto de apoio que tenha credibilidade, principalmente porque as tradições oscilam tanto no texto massorético quanto nas traduções. Antes do mais, exclui-se que Davi tenha sido o compositor ou pelo menos o depositário daqueles salmos que trazem a informação l'daund, porque muitos deles pressupõem o templo de Jerusalém e mesmo o exílio naBabilônia, enquanto outros conhecem um grau de desenvolvimento histórico da fé javista diverso daquele que é atestado em fontes fidedignas, naquilo que se refere à época davídica. Seja como for, nas informações dos compiladores se reflete uma consciência exata de que a comunidade do pós-exílio não apenas compôs seus próprios cânticos, como também conservou e utilizou cânticos da tradição. No Saltério, do mesmo modo como em nossos livros de canto, existe uma seleção de cânticos, que é fruto de vários séculos. Embora se possam fixar os começos da poesia cultual de Israel já em uma época em que havia certamente israelitas com um culto, contudo, os textos mais antigos do Saltério, que foram assumidos de fora e colocados em relação com Javé, são os seguintes: 19[18] A (fragmento de um hino da criação, com referências ao deus-sol); 29[28] (cananeu) e 104[103] (cananeu e inspirado no hino de Amenófis IV à glória do sol), relativo ao poder e à grandeza de Deus na natureza. A incorporação destes salmos se deu, mais provavelmente, na época pós-exílica, quando a fé na criação passa a desempenhar um papel muito mais significativo do que anteriormente. Ma parte dos salmos provém seguramente da época anterior ao exílio. Isto vale principalmente para os salmos reais e para os outros salmos que supõem um rei israelita como personagem presente, e vale também para os cânticos não-reais, cuja determinação particularizada é tarefa da Exegese. Não se pode dar como excluído que um outro cântico provenha da
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SALTÉRIO
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época de Davi, cujos dotes poéticos são atestados pelo cântico que ele compôs em memória de Saul e Jônatas. Uma parte bastante considerável provém da época do exílio (reminiscências sobretudo no SI 137[136]) e posterior ao exílio, quando - segundo nos mostra a obra cronística - o canto dos salmos desempenha papel particularmente importante. Em face das descobertas de Qumran, já não se pode pensar que eles datem da época dos Macabeus, no séc. II a.C,", Como nos salmos muitas vezes não se encontram, a não ser veladamente, pontos de apoio históricos e concretos, todas as tentativas para uma datação não podem passar de um certo grau de probabilidade. Uma pesquisa comparativa dos materiais e dos motivos, até agora realizada somente em pequena escala, e que abrangesse todos os aspectos do AT, poderia ser de grande ajuda. Assim, o SI 8 parece supor a narrativa da criação de P (Gn 1.1-2.4a); o SI 103[102], o Dêutero e o Trito-Isaías: o 5151[50], as considerações Is 1 e Ez 36, e o SI 119[118], o Trito-Isaías, Malaquias, Lamentações, Provérbios e [ó. Semelhantes determinações dos pontos de contatos nos permitem fixar freqüentemente um limite superior para as respectivas datas. Quanto ao mais é preciso precaver-se contra uma tendência que se vai fixando no sentido de atribuir globalmente todos os salmos, ou pelo menos sua maior parte, ao período inicial dos reis ou à época pré-exílíca em geraL O fato de ser muito antiga a arte do cântico no Antigo Oriente e em Israel nada significa para a determinação da idade de cada um dos cânticos que nos foram transmitidos.
4. Visão de conjunto dos gêneros literários, da origem e das relações dos salmos com o culto É impossível fazermos aqui uma análise detalhada de cada um dos salmos. Contudo, parece-nos que se deva apresentar uma visão de conjunto dos gêneros literários dos salmos, sobre a época aproximada de sua origem e sobre suas relações com o culto. Por isso daremos muito sucintamente pelo menos os resultados de uma análise, embora eles tragam necessariamente um cunho de subjetividade. a) Indicaremos em primeiro lugar o gênero literário dos salmos mediante as seguintes abreviações: 7
P. R. ACKROYD, "Criteria for the Maccabean Dating of Old Testament Literature", VT 3 (1953), 113-132. - E. GOOSSENS, Die Frage nach makkabiiischen Psalmen, 1914. - C. D. HASSLER, Commentationes criticae de Psalmis Maccabaicis quos ferunt, 1827/1832.
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Os LIVROS DE CÂNTICOS
H
H(m) H(S) H(r) L(c) L(i) C(c) C(i) A(c) A (i)
R SD
hino, hino monoteísta, cântico de Sião, cântico de romaria, cântico de lamentação coletivo, cântico de lamentação individual, cântico de confiança coletivo, cântico de confiança individual, cântico de agradecimento (ação de graças) coletivo, cântico de agradecimento (ação de graças) individual, cântico real, poema sapiencial e didático.
b) Indicaremos, em segundo lugar, a época presumível da origem
dos salmos, numa divisão aproximada e na medida em que isto for possível; na maioria dos casos apontaremos, em estilo telegráfico, as razões da gradação. Um sinal de interrogação mostrará que falta qualquer indicador para uma ordenação cronológica. c) Quanto às relações com o culto, apenas fazemos a distinção entre cânticos não-cultuais e cânticos cultuais. Neste último caso, no entanto, não se distingue entre uma possível procedência cultual e o mero emprego no culto. Além disso, certos cânticos que atestam a existência de uma ligação de seus autores com o culto não assinalados como cânticos cultuais. Distinções precisas, em geral, são totalmente impossíveis, ou só se introduzem com muita reserva. Do contrário, o número de cânticos exclusivamente cultuais que se originaram do culto ou desde o início eram a ele destinados, seria menor do que está indicado. 1 2
SD, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), poesia erudita não-cultual." C (r), anterior ao exílio(§ 39,5), cântico cultual (entronização)."
Nas notas a seguir citaremos a bibliografia referente a cada salmo, sem indicar os respectivos títulos: E. P. ARBEZ, CBQ 7 (1945), 38-404. P. AUVRAY, RB 53 (1946), 365371. - G. J. BOTIERWECK, ThQ 138 (1958), 129-151. - I. ENGNELL, em: Studia Orientalia Pedersen, 1953,85-96. - P. HAUPT, AJSL 19 (1903/1904), 129-142. - P. JOÜON, RSR 27 (1937),440-456. - H.-I. KRAUS, EvTh 10 (1950/1951), 337/351. - H. W. WOLFF, ibid. 9 (1949/1950),385-394. 9 G. E. CLOSEN, Bib121 (1940),288-309. - F. HESSE, Luther-iahrbuch 25 (1958), 23-41. - R. ROBERT, Bibl 21 (1940),426-428. - R. PRESS, ThZ 13 (1957), 321-334. - A. ROBERT, RSR 39 (1951),88-98. - H. H. ROWLEY, JThSt 42 (1941), 143-154. - I. SONNE, HUCA 19 (1945/1946), 43-55.
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§ 43. O SALTÉRIO
3 4 5 6 7 8 9/10
11[10] 12[11] 13[12] 14[13]
15[14] 16[15] 17[16]
395
L(i), anterior ao exílio?, cântico cultuai." L(i), ?, cântico cultual." L(i), ?, cântico cultual." L(i), do período pré-exílio tardio ou posterior ao exílio (parentesco com 41[40] e 88[87], cântico cultual." L(i), ?, cântico cultual." H, posterior ao exílio (supõe Gn 1.1-2.4a), cântico não-cultual de características humanas universais." AO) e L(i), do exílio e posterior ao exílio (parentesco com Lm 3; tendência ao didático, forma alfabética); é possível que se trate de um cântico cultual." Cíi), anterior ao exílio?, cântico pessoal de alguém que procura proteção. 17 L(c), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual." ?, raízes cultuais, não unívocas; passível também de ser interpretado como cântico espiritual pessoal. L(l), posterior ao exílio (do ponto de vista dos temas; influência da profecia e da soberania), cântico cultual, talvez para a liturgia da sinagoga." Hír), anterior ao exílio?, cântico cultual (liturgia de entrada)." C(i), posterior ao exílio (aproxima-se da situação descrita no Trito-Isaías), cântico cultual." L(i),?, cântico cultual."
R J. TOURNAY, RB 52 (1945),214-216. L. DÜRR, Bibl16 (1935), 330-338. - R-J. TOURNAY, RB 52 (1945),216-219. 12 L. KRINETZKI, ThQ 142 (1962), 23-46. 13 J. COPPEN5, HUCA 32 (1961),217-226. 14 J. LEVEEN, JRAS 1946,81-83. - M. LOHR, ZAW 36 (1916),225-237. 15 P. A. H. DE BOER, OTS 2, 1943, 171-193. - J. HEMPEL, FF 35 (1961), 119-123. - J. J. KOOPMAN5, ThT 3 (1948), 1-10. - H. KRU5E, JSS 5 (1960), 343-347. - C. J. LOUI5, 1946. - J. MORGEN5TERN, HUCA 19 (1945/1946), 491-523. - S. MOWINCKEL, em: Studia Orientalia Pedersen, 1953,250-262. - C. ScHEDL, FF 38 (1964), 183-185. - J. J. STAMM, ThZ 13 (1957), 470-478. 16 H. JUNKER, RB 60 (1953), 161-169. - M. LOHR, ZAW 36 (1916),225-237. 17 J. MORGEN5TERN, JBL 69 (1950),221-231. - I. SONNE, ibid. 68 (1949), 241-245. 18 P. WERNBERG-MOLLER, ZAW 69 (157), 67-71. 19 K. BUDDE, JBL 47 (1928), 160-183. - CH. C. TORREY, ibid. 46 (1927), 186-192. 20 J. L. KOOLE, OTS 13, 1963,98-111. 21 C. SCHEDL, ZAW 76 (1964), 171-175. - E. ZOLLI, ThZ 6 (1950), 1495. 22 D. GUALANDI, Bib137 (1956),199-208. - J. LEVEEN, VT 11 (1961),48-54. - R PAUTREL, RSR 46 (1958), 78-84. - C. ScHEDL, BZ NF 6 (1962), 100-102. lO
11
396
Os LIVROS DE CÂNTICOS
18[17],1-31 Aíi), posterior ao exílio (do ponto de vista da linguagem e das idéias)." 18[17],32-51 R, anterior ao exílio (§ 39,5), cântico cultual (ação de graças por uma vitória). 19[18],1-7 H, origianriamente não-israelítico e muito antigo, usado depois do exílio, juntamente com: 19[18],8-15 50, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico não-cultual, 24 20[19] R, do final do pré-exílio (fase derradeira da época dos reis; influência deuteronomista: teologia do sem ["nome"]), cântico cultual (súplica). 21[20] R, anterior ao exílio (§ 39,5), cântico cultual (comemoração anual)." 22[21] L(i) e Aíi), posterior ao exílio? (parentesco com 41[40] e 88[87], A(i) supõe o Dêutero-Isaías, expressões lingüisticamente recentes), L(i) exteriormente não vinculado ao culto; A(i), pelo contrário, é cântico cultual." 23[22] Cíi), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teolo-gia), ligação com o templo." 24[23] Hír), do final do pré-exílio? (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual (liturgia de entrada)."
F. AsENSIO, Gregorianum 33 (1952),219-260, 566-611. -F. M. Csoss.Ir, - D. N. FREEDMAN, JBL 72 (1953), 15-34. 24 K. BUDDE, OLZ 22 (1919), 257-266. - L. DÜRR, em: Sellin-Festschrift, 1927, 37-48. - R EISLER, MVG 22, 1917,21-70. - H.-J. KRAUS, EvTh 10 (1950/1951), 337-351. - J. MORGENSTERN, HUCA 19 (1945/1946),491-523. - J. VAN DER PLOEG, JEOL 17 ( 1963), 193-201. - O. SCHRÓDER, ZAW 34 (1914), 69s. - R-J. TOURNAY, em: NõtscherFestschrift, 1950,271-284. - N. H. TUR-SIANI, Arar 17 (1949), 419-433. - M. WEIPPERT, ZAW 73 (1961),97-99. 25 G. R DRIVER, AfO 18 (1957), 129. - F. CH. FENSHAM, ZAW 77 (1965), 193-202. 26 F. ASENSIO, Gregorianum 33 (1952), 219-260, 566-611. - G. BEER, em: BZAW 41,1925, 12-20. - E. COURT, 1932. - A. FEUILLET, NRTh 70 (1948), 137-149. - ST. B. FROST, Canadian JTh 8 (1962), 102-115. - J. MAGNE, Semitica 11 (1961), 29-41. - R. MARTINACHARD, Verbum Caro 65 (1963), 78-87. - N. H. RIDDERBOS, OTS 13, 1963, 43-76. - C. WESTERMANN, 1955. 27 F. ASENSIO, Bibl 40 (1959), 237-247. - J. BÓHMER, BZ 23 (1935/1936), 166-170. - P. HAUPT, AJSL 21 (1905/1906), 133-152. - L. KÓHLER, ZAW 68 (1957),227-234. - J. MORGENSTERN, JBL 65 (1946), 13-24. - D. MÜLLER, zAs 86 (1961), 126-144. - E. VOGT, Bibl (1953), 195-211. - A. H. VAN ZYL, OuTWP 1963, 64-83. 28 O. EISSFELDT, WdO 2 (1954/1959),480-483. - G. R DEAVER, Diss. Dallas, 1953. - V. V. HUESO, EstBibl 22 (1963), 243-253. - R RENDTORFF, em: Rendtorft-Festschrift, 1958, 121-129. - I. W. SLOTKI, JBL 51 (1932),214-226. - J. D. SMART, ibid. 52 (1933), 175-180. - M. TREVES, VT 10 (1960),428-434. 23
§ 43. O SALTÉRIO
397
Ui), posterior ao exílio (dos pontos de vista formal e lingüístico), cântico não-cultual." 26[25] Ui), ? (por causa do v. 11 talvez depois do Dêutero-Isaías), cântico cultual. 30 27[26],1-6 Cíi), anterior ao exílio? cântico não-cultual. 27[26],7-14 Ui), anterior ao exílio? cântico cultual." 28[27] anterior ao exílio (cf. v. Ss), cântico cultual. 29[28] H, originariamente cananeu e muito antigo; depois do exílio, aplicado a Javé (ligação com a teologia do kabôd ["glória"] e do sem ["nome"]), cântico cultual." 30[29] A(i) com formas hínicas, anterior ao exílio (do ponto de vista do conteúdo), cântico cultuai." 31[30],1-9 Ui) e Aíi), do final do pré-exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual. 31[30],10-25 Ui) e A(i), do final do pré-exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual. 32[31] A(i), posterior ao exílio (influência da poesia sapiencíal), cântico cultual. 33[32] H, posterior ao exílio (forma alfabetizante), cântico cultual." 34[33] 50, mistura de A(i) e de poesia didática, posterior ao exílio (dependente de 51[50]), cântico cultual, mais para a liturgia da sinagoga do que para o culto sacrificial. 35 35[34] Ui), ?, cântico cultual." 36[35] Mistura de Ui), H e 50, posterior ao exílio (influência da poesia sapiencial reflexiva), cântico cultual." 37[36] 50, posterior ao exílio (dos pontos de vista dos temas e da história da teologia), poesia erudita não-cultual." 25[24]
StTh 14 (1960), 45-48. - N. H. RIDDERBOS, OTS 13, 1963,43-76. OTS 13, 1963, 112-130. - E. VOGT, Bibl43 (1962),328-337. 31 H. BIRKELAND, ZAW 51 (1933),216-221. - I. W. SLOTKI, JThSt 31 (1929/1930),387-395. 32 A. CAQUOT, Syria 33 (1956),46-41. - H. CAZELLES, em: Memória Gelin, 1961, 119-128. - G. COOKE, ZAW 76 (24-26. - F. M. CROSS, [r., BASOR 117 (1950), 19-21. - F. CH. FENSHAM, OuTWP 1963, 84-99. - K. FULLERTON, JBL 48 (1929), 274-290. - E. PAX, BZ NF 6 (1962),93-100. - N. H. RIDDERBOS, GThT 60 (1960),64-69. - L. F. RIVERA, RevBibl 233 (1961),9-14. - E. VOGT, Bibl41 (1960),17-24. 33 L. KRINETZKI, ZKTh 83 (1961), 345-360. 34 A. DEISSLER, em: Mélanges Robert, 157,225-233. 35 B. COUROYER, RB 57 (1950),174-179. - S. HOLM-NIELSEN, StTh 14 (1960),495. - L. J. LIEBREICH, HUCA 27 (1956), 181-192. 36 G. R. DRIVER, ThZ 9 (1953),4685. - J. MAGNE, RB 54 (1947),42-53. 37 L. A. F. LE MAT, 1957. 38 J. ALLEGRO, PEQ 86 (1954), 69-75. - P. A. MUNCH, ZAW (1937), 36-46. 29
S. HOLM-NIELSEN,
30
L. A.
SNUDERS,
398
OS LIVROS DE CÂNTICOS
38[37]
L(i), posterior ao exílio? (parentesco com 41[40] e 88[87]), talvez cântico cultual." 39[38] L(i), ?, cântico espiritual pessoal. 40[39],1-12 Aíi), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultuaI. 40[39],14-18 L(i), ?, cântico cultual'? (o v. 13 é um acréscimo). 41[40] A(i), posterior ao exílio (momento didático), cântico cultual," 42/43[41/42] L(i), anterior ao exílio? (adotado pelos coreítas depois do exílio), cântico cultuaI. 42 44[43] R, anterior ao exílio (§ 39,5), cântico cultual (pedido de ajuda divina na guerra). 45[44] R, anterior ao exílio (§ 39,5), oráculo da esfera dos profetas cultuais por ocasião das núpcias de um rei." 46[45] H(S), posterior ao exílio (§ 39,2 C), cântico cultual com desfecho escatológico." 47[46] Hün), posterior ao exílio (§ 39,2 B), cântico cultual." 48[47] H(S), posterior ao exílio (§ 39,2 C), cântico cultual." 49[48] SD, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), poesia erudita não-cultual." 50[49] Liturgia judicial do círculo dos profetas cultuais, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual." 51[50] L(i), do exílio e pós-exílio (supõe Ez 36.25ss, entre outros; acréscimo dos vv. 20s antes de 515), cântico espiritual-pessoal não-cultual."
VD 10 (1930), 48-56,107-116. RSO 32 (1957),293-299. 41 J. COPPENS, HUCA 32 (1961), 217-226. 42 H. KRUSE, JSS 5 (1960),333-343. - H. H. ROWLEY, Bibl 21 (1940),45-50. 43 N. H. RroDERBOS, OTS 13, 1963,43-76. - C. ScHEDL, VT 14 (1964),310-318.- R. TOURNAY, VTSuppl 9, 1963, 168-212. 44 O. EISSFELDT, ThBl1 (1922),54-59. - H. JUNKER, Bib143 (1962), 197-201. - L. KRINETZKY, Münchner ThZ 12 (1961), 52-71. - A. F. PUUKKO, StTh 1 (1935), 29-33. - H. SCHMIDT, Luther-Iahrbudi 1926,98-119. - M. WEISS, Bib142 (1961), 255-302. 45 A. CAQUOT, RHR 39 (1959),311-337. - J. MUILENBURG, fBL 63 (1944),235-256. - K-H. RATSCHOW, ZAW 53 (1935), 171-180. 46 M. OAHOOD, CBQ 16 (1954), 15-19. - L. KRINETZKI, BZ NF 4 (1960), 70-97. - J. MORGENSTERN, HUCA 16 (1941), 1-95. 47 J. LINDBLOM, em: Horae Soederblomiane, 11944,21-27. - P. A. MUNCH, ZAW 55 (1937), 36-46. - J. VAN DER PLOEG, OTS 13, 1963, 137-172. - M. STENZEL, ThZ 10 (1954), 152154. - P. VOLZ, ZAW 55 (1937), 325-364. 48 P. AUVRAY, Rb 53 (1946), 365-371. - W. CASPARI, ZAW 45 (1927),254-266. 49 R. ARCüNADA, VD 11 (1931), 197-206. - E. R. DALGLISH, 1962. - R. GALDOS, VD 10 (1930), 67-79. - R. PRESS, ThZ 11 (1955), 241-249. - C. STEUERNAGEL, em: SellinFestschrift, 1927, 151-156. - H.-J. STOEBE, 1958. 39
R.
40
S. CAVALETIl,
ARCüNADA,
§ 43. O SALTÉRIO
52[51]
53[52] 54[53] 55[54]
56[55] 57[56] 58[57] 59[58] 60[59] 61[60] 62[61] 63[62] 64[63] 65[64] 66[65]
67[66] 68[67]
50 51
52
53 54 55
399
L(i) com modificação de invectivas proféticas; posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia),cântico cultuai (v. 11).50 = 14[13]. L(i), do final do pré-exílio ou mais recente (teologia do sem), cântico cultuaI. L(i), posterior ao exílio (do ponto de vista da linguagem e do estilo), talvez cântico cultual, todavia sem forte vinculação cultuaI. Líi) e A(i), anterior ao exílio (imagens do âmbito da realeza), cântico cultual (v. 13). L(i), anterior ao exílio? (elementos dos cânticos reais) cântico cultual." L(?), posterior ao exílio (semelhante a 14[13]), mais cântico não-cultual, do que cultual." L(i), anterior ao exílio?, cântico cultuaI. Líc), da época do exílio? (depois da ruína de [udá: 587?), cântico cultuaI. Líi), anterior ao exílio (súplica em favor do rei), cântico cultuaI. Cíí), posterior ao exílio (elementos da doutrina sapiencial), cântico cultual." A(i), do final do pré-exílio? (caso se trate de intercessão em favor do rei, o v. 12a é original), cântico cultuaI. L(i), ?, ligação com a comunidade cultuaI. 54 Aíc), com estrutura hínica acentuada, posterior ao exílio? cântico cultuaI. liturgia de ação de graças, inspirada em H, Ate) e Aíi), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual (oferecimento de uma sacrifício em cumprimento de um voto). Ate), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual (líturgiaj/" mistura de várias formas e gêneros, principalmente hínicos; utilização de partes de cânticos cananeus e israelíticos
A. M. SCHARF, VD 38 (1960), 213-222. - C. ScHEDL, BZ NF 5 (1961), 2598. R. PAUTREL, RSR 44 (1956), 566-572. - I. W. SLOTKI, Joumal Manehester Eg. Or. Soe. 18 (1933), 61-65. M. J. DAHOüD, CBQ 17 (1955), 300-303. A. M. HONEYMAN, VT 11 (1961),348-350. E. C. DELL'ÜCA, RevBil22 (1960), 89-92. -A. STROBEL, RB 57 (1950),161-173. H. G. JEFFERSON, VT 12 (1962), 201-205.
400
Os LIVROS
DE
CÂNTICOS
mais antigos, formando um cântico jerosolimitano pósexílio, com ligações cultuais. 56 69[68] L(i), posterior ao exílio (vv. 36s), cântico cultual.F 40[39]B. 70[69] 71[70] L(i), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual.ê" 72[71] R, anterior ao exílio (§ 39,5), cântico cultual (pedido de bênção)." 73[72] 50, posterior ao exílio (do ponto de vista temático e teológico), cântico espiritual e pessoal de alguém com vida inteiramente própria, utilizando expressões cultuais com novo sentido.t" 74[73] Líc), da época do exílio ou do início do pós-exílio (depois da destruição do templo), cântico cultual." 75[74] A, com um oráculo de Javé e palavras de exortação; posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico com bases cultuais.F 76[75] H(S), posterior ao exílio (§ 39,2 C), elementos cultuais no estilo e nos convites/" 77[76],1-16 L(i), da época do exílio (tempo de calamidades para Israe1), cântico pessoal de reflexão. 77[76],17-21 H, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual.f 78[77] 50, do final do pré-exílio (proveniente do âmbito da escola deuteronomista), poesia não-cultual para instrução da
comunidade." J. AISTLEITNER, BZ 19 (1931), 29-41. - W. F. ALBRIGHT, HUCA 23,1 (1931), 1-39. - F. CH. FENSHAM, iNES 19 (1960), 292s. - S. GRILL, ThZ 17 (1961), 432-434. - P. HAUPT, AiSL 23 (1906/1907),220-240. - S. IWRI, JBL 71 (1952), 161-165. - S. MOWINCKEL, 1953. - E. PODECHARD, RB 54 (1947), 502-520. - R.-J. TOURNAY, íbíd. (1942),227-245. 57 E. VOGT, Bibl43 (1962), 79-82. 58 R.-J. TOURNAY, em: Nõtscher-Festschrift, 1950,274-280. 59 P. GRELOT, VT7 (1957), 319-321. - P. E. MURPHY, 1948. - R. PAUTREL, em: Mémorial Gelin, 1961,157-164. - P. W. SKEHAN, Bibl40 (1959),302-308. 60 H. BIRKELAND, ZAW 67 (1955), 99-103. - G. KUHN, ibid. 55 (1937), 307s. - P. A. MUNCH, ibid., 36-46. - H. RINGGREN, VT 3 (1953), 265-272. - E. WÜRTHWEIN, em: BertholetFestschrift, 1950, 532-549. 61 N. LIEBSCHÜTZ, AiSL 40 (1923-1924), 284-287; 41 (1924/1925),279. - F. WILLESEN, VT 2 (1952), 289-306. 62 A. GONZÁLEZ, EstBibl21 (1962),5-22. 63 o. EISSFELDT, ThZ 82 (1957), 801-808. - S. TALMON, lEi 10 (1960), 174-180. 64 E. C. DELL'OCA, RevBibl22 (1960),89-92. - H. H. JEFFERSON, VT 13 (1963), 87-91. - A. WEISER, ThZ72 (1947),133-140. 65 O. EISSFELDT, 1958. - H. JUNKER, Bibl 34 (1953), 487-500. - J. W. ROTHSTEIN, ZWTh 43 (1900),532-585. - J. SCHILDENBERGER, em: Junker-Festschrift, 1961,231-256. 56
§ 43. O SALTÉRIO
401
79[78]
Líc), posterior ao exílio (supõe os livros de Jeremias, Ezequiel e Lm S), cântico cultual." 80[79] Líc), do final do pré-exílio (possivelmente da época de Iosias), cântico cultual." 81[80] liturgia judicial no estilo dos profetas do culto, do final do pré-exílio até o pós-exílio (aproxima-se da pregação deuteronomista), poesia cultuaI. 82[81] oráculo judicial de Javé, no estilo dos profetas do culto, acompanhada de palavras de censura, admoestações e ameaças; pré-exílico (polêmica com o mundo dos deuses cananeus), poesia cultual." 83[82] Líc), posterior ao exílio (tema da irrupção das nações; "Assur" como símbolo da grande potência dominante), cântico cultuaI. 84[83] H(S), posterior ao exílio (§ 39,2 C); a piedade do cântico é inteiramente alimentada do culto do templo." 8S[84] L(c) e oráculo de Javé, posterior ao exílio (relacionado com a libertação do exílio, supõe o Dêutero-Isaías), cântico cultual (liturgia)." 86[8S] Líi), posterior ao exílio (forte presença de empréstimos), cântico cultuaI. 87[86] H(S), posterior ao exílio (§ 39,2 C), cântico cultual." 88[87] Lü), posterior ao exílio (semelhança de linguagem com o livro de [ó), lamentação não-cultual." 89[88] 1-19: H, anterior ao exílio (do ponto de vista do conteúdo e da linguagem), cântico cultuaI. 89[88],20-S R, anterior ao exílio (§ 39,S), cântico (depois de uma guerra perdida)." NThT 14 (1960),329-349. em: Alt-Festschrift, 1953, 65-78. - ID., WdO 3, 1/2 (1964), 27-31. - H. HEINEMANN, fQR 40 (1949/1950),297-302. - A. ROIFFER, Tarbiz 239(1959/1960), 113-124. 68 G. COOKE, ZAW76 (1964),29-34. -A. GONZÁLEZ, VT13 (1963), 293-309. -c. H. GORDON, JBL54 (1935),139-154. -J. MORGENSTERN, HUCA 14 (1939), 29-126. -R. T. O'CALLAGHAN, CBQ 15 (1953), 311-314. - E. PODECHARD, em: Mémorial Chaine, 1950,291-296. 69 L. GROLLENBERG, VT9 (1959), 311s. - R.-J. TOURNAY, RB 54 (1947), 521-533. 70 M. J. DAHOOD, Bibl37 (1956), 338-340. - P. NOBER, VD 38 (1960), 34s. 71 E. BEAUCAMP, Studii Biblici Franciscani Liber Annuus 13 (196211963), 53-75. - R. G. CASTELLINO, VD 12 (1932), 232-236. - G. E. CLOSEN, ibid. 14 (1934), 231-240. - A. KAMINKA, REJ 55 (1908),146-148. 72 J. HOFBAUER, BEThL 12, 1959,504-510. - P. JOÜON, RSR 27 (1937),440-456. 73 G. AHLsTROM, 1959. - G. COOKE, ZA W76 (1964), 26-29. - O. EISSFELDT, em: Essays Muilenberg, 1962,196-207. - ID., WdO 3,1/2 (1964), 27-31. - W. B. WARD, VT 11 (1961),321-339. 66
O. GLOMBITZA,
67
O.
EISSFELDT,
402
OS LIVROS DE CÂNTICOS
90[89]
Líc), posterior ao exílio (sabedoria reflexiva na lamentação coletiva), cântico cultual." 91[90] SO, posterior ao exílio? (do ponto de vista da história da teologia), cântico didático, talvez destinado ao culto." 92[91] mistura de H e de Aíi), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual." 93[92] Hím), posterior ao exílio (§ 39,2 B), pouca ligação com o culto." 94[93],1-11 Líc), posterior ao exílio (universo imagístico e conceitua1), cântico cultuaI. 94[93],12-23: Afi), posterior ao exílio (universo imagístico e conceitua1), cântico não-cultual." 95[94] H e admoestação profética, posterior ao exílio (do ponto de vista tanto do conteúdo como da história da teologia), poesia cultual (liturgia)." 96[95] Hím), posterior ao exílio (§ 39,2 B), cântico cultual." 97[96] Hím), posterior ao exílio (§ 39,2 B), (dependente de inúmeros outros salmos), vinculação cultual duvidosa, teologia escatológica. 98[97] Hím), posterior ao exílio (§ 39,2 B), cântico cultuaI. 99[98] Hím), posterior ao exílio (§ 39,2 B), cântico cultuaI. 100[99] H, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual destinado a celebrações sacrificiais de ação de graças. 101[100] R, anterior ao exílio (§ 39,S), cântico cultual (exposição dos princípios que nortearão o governo)." 102[101] Líi), da época do exílio e posterior ao exílio (supõe talvez o Oêutero-Isaías), cântico não-cultual pessoal. 103[102] H, posterior ao exílio (supõe o Dêutero-Isaías, características lingüísticas), estilo e linguagem cultuais, mas imitação quanto à maneira pessoal de considerar os fatos, cântico espiritual de composição não destinada ao culto." 74
J.
75
A.
CAQUOT,
77 78 79
80 81
82
J.
Bibl 40 (1959), 372-383. N. M. SARNA, JBL 81 (1962), 155-168. H. G. JEFFERSON, JBL 71 (1952), 155-160. O. GLOMBITZA, NThT 14 (1960), 329-349. J. FINKEL, AJSL 50(193311934), 32-40. A. CAQUOT, Syria 33 (1956), 36-41. - R.-J. TOURNAY, RB 54 (1947), 533-542. 0 . KAISER, ZAW74 (1962),195-205. A. JEPSEN, Kerygma undDogma 7 (1961), 261-271. -N. H. PARKER, Canadian JTh 1 (1955), DE FRAINE,
76
em: Schmitz-Festschrift, 1953, 57-70. Semitica 8 (1958),21-37. - O. EISSFELDT, WdO 2 (1954/1959),343-348. -
HERRMANN,
191-196.
§ 43. O
104[103]
105[104]
106[105]
107[106] 108[107]
109[108] 110[109] 111[110] 112[111] 113[112]
113[113A]
SALTÉRIO
403
H, posterior ao exílio (do ponto de vista dos temas e das idéias, mas com inclusão de temas do hino de Amenófis IV em louvor ao 501), cântico espiritual não-cultual, embora o seu autor tenha raízes na vida cultuaI.83 50, posterior ao exílio (supõe a forma definitiva do Pentateuco), cântico cultual destinado à instrução da comunidade (salmo histórico). 50 com exclamações de penitência e de súplica; posterior ao exílio (pós-deuteronomista, supõe a forma definitiva do Pentateuco), cântico cultual (salmo histórico). Liturgia de ação de graças, posterior ao exílio (supõe a diáspora), cântico cultuaI. = 57[56],8-12 e 60[59],7-14, composição posterior ao exílio, constituída de lamentações, ação de graças e de oráculo, com finalidade litúrgica? Ui), anterior ao exílio? (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual." R (três fragmentos), anterior ao exílio (§ 39,5), oráculo do âmbito dos profetas cultuais para o rei (vv. 1-3.4.5-7).85 A(i), posterior ao exílio (quanto à forma e ao conteúdo), cântico didático não-cultual." 50, posterior ao exílio (teologia pós-exílica), não-cultual." H, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia; espiritualidade dos pobres de Javé), cântico cultual. H, posterior ao exílio (pós-deuteronomista), cântico cultual."
RevBibl 22 (1960), 89-92. - G. R. DRIVER, J55 7 (1962), 12-22. - O. FF 22 (1959), 113-117. - P. HUMBERT, RHPhR 15 (1935), 1-27. - H. KRu5E, VD (1951), 31-43. - G. NAGEL, em: Bertholet-Festschrift, 1950,395-403. - A. VAN DER VOORT, RB 58 (1951),321-347. - M. WEISS, 1964. 84 H. L. CREAGER, iNES 6 (1947),121-123. - E. J. KISSANE, Irish ThQ 18 (1951),1-8. 85 A. CAQUOT, Semitica 6 (1956), 33-52. - J. COPPENS, 1955. - In., Suppl. to Numen 4, 1958, 333-348. - H. E. DEL MEDICO, Z4W69 (1957),160-170. E. R. HARDY, fBL 64 (1945), 385390. - H. G. JEFFERSON, ibid. 73 (1954), 152-156. - E. 1. KISSANE, Irish ThQ 21 (1954), 103114. - L. KRINEnKI, ThGl51 (1961), 110-121. - 1. MORGENSTERN, iQR 32 (1941/1942), 371385. - H. H. ROWLEY, em: Bertholet-Festschrift, 1950, 461-472. - J. DE SAVIGNAC, OTS 9, 1951, 107-135. - C. SCHEOL, Z4W 73 (1961), 290-297. - H. J. STOEBE, em: BaumgiirtelFestschrift, 1959,175-191. - R. J. TOURNAY, RB 52 (1945), 220-237. - G. WINDENGREN, 1941. 86 S. HOLM-NIELSEN, StTh 14 (1960), 35-37. 87 S. HOLM-NIELSEN, StTh 14 (1960),37-39. 88 H. VAN OEN BUSSCHE, ColBG 3,1 (1957), 77-83.
83
E.
C.
OELL'OCA,
EI55FELDT,
OS LIVROS DE CÂNTICOS
404
H/C(c), posterior ao exílio ("Os que temem Javé" = prosélitos), cântico cultual (liturgia). 116[114-115] A(i), posterior ao exílio (aramaísmos), cântico cultual." 117[116] H, posterior ao exílio (depois do Dêutero-Isaías), cântico cultuaI. 118[117] Aíc), posterior ao exílio? (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual (liturgia de ação de graças)." 119[118] 50, posterior ao exílio (espiritualidade legalista tardia, com influência da teologia deuteronomista e da doutrina sapiencial), poema erudito não cultual (antologia)." 120[119] Líi), ?, cântico pessoal não-cultual. 121[120] H(r), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual (liturgia de despedida)." 122[121] H(5), posterior ao exílio (§ 39,2 C), cântico cultual." 123[122] LCc), da época do exílio e posterior ao exílio (condições de vida da época), cântico cultuaI. 124[123] A(c), posterior ao exílio (linguagem aramaizante), cântico cultual." 125[124] Cíc), posterior ao exílio (estilo e universo conceitual), cântico cultuaI. 126[125] Líc), posterior ao exílio (relação com a libertação do exílio), talvez cântico cultual, mas relação cultual apenas exterior." 127[126] 50, posterior ao exílio? dois ditos sapienciais não-cultuais. 128[127] 50, posterior ao exilo (quanto à linguagem e à forma), instrução não-cultual e bênção. 129[128] C(c), posterior ao exílio (pressupostos históricos), cântico cultuaI. 130[129] LCi), posterior ao exílio (do ponto de vista lingüístico e formal), cântico espiritual pessoal sem relação cultual."
115[113B]
89 S. OAICHES, em: Gaster Anniversary VoI., 1936, 64-67. - L LOHR, em: van der LeeuuiFestschrift, 1950, 317-321.
90 J. MEYS1NG, VT 10 (1960),130-137. - H. SCHMIDT, ZAW 40 (1922),1-14. 91 A. OEISSLER, 1955. - H. J. KRAus, EvTh 10 (1950/1951), 337-351. - A. ROBERT, RB 48 (1939), 5-20. O. EISSFELDT, em: Lilje-Festschrift, 1959,9-14. - J. MORGENSTERN, fBL 58 (1939), 311-323. - P. H. POLLOCK, ibid. 59 (1940), 411 S. 93 F. HORST, EvTh 16 (1956), 53. 94 L W. SLOTKI, fBL 51 (1932),214-226. 9S 1. STRUGNEL, fThSt NS 7 (1956), 239-243. 96 R. ARCüNADA, VD 12 (1932), 213-219. - C. H. CORNILL, em: BZAW 34, 1920,38-42. - ST. PORÚBCAN, VT9 (1959), 322s. - P. VOLZ, em: BZAW 41 (1925),287-296. 92
§ 43. O SALTÉRIO
405
131[130]
Cíi), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico espiritual pessoal (v. 3: relação cultual). 132[131) R, anterior ao exílio (§ 39,5), cântico cultual (no dia da fundação do santuário)." 133[132] SD, posterior ao exílio, ditos sapienciais não-cultuais, contendo comparações para a vida quotidiana." 134[133] H e expressão de bênçãos, ?, vinculado ao culto." 135[134] H, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da tradição e do ponto de vista da teologia), cântico cultuaI. 136[135] Ate), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da tradição), cântico cultual (ladainha). 137[136] Líc), posterior ao exílio (supõe o fim do exílio), cântico nãocultual como expressão de sentimentos pessoais.l'" 138[137] Afi), posterior ao exílio (supõe a diáspora), cântico espiritual. 139[138] Ui), ?, cântico cultual.''" 140[139] Ui), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultuaI. 141[140] Ui), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico pessoal não-cultual de um autor ligado ao culto. 102 142[141] Ui), ?, cântico pessoal em estilo cultuaI. 143[142] Ui), posterior ao exílio (do ponto de vista da história da teologia), cântico cultual.l'" 144[143] R, anterior ao exílio (§ 39,5), cântico cultual (súplica). 145[144] H, posterior ao exílio (dos pontos de vista da forma, da história da tradição e da linguagem), cântico cultual.P' 146[145] H, posterior ao exílio (do ponto de vista formal e lingüístico), cântico cultuaI. 147[146-147] H, posterior ao exílio (depois do Dêutero e do Trito-Isaías), cântico cultuaI. H, posterior ao exílio. 148 H, posterior ao exílio (do ponto de vista da história da tra149 dição), cântico cultual.l'" H, posterior ao exílio, cântico cultual para a liturgia festiva. 150
O. Er55FELDT, WdO 2 (1954/1959),480-483. - J. R. PORTER, JThSt NS 5 (1954), 161-713. GUNKEL, em: BZ4W 34, 1920,69-74. 99 W. F. ALBRIGHT, NTT 56 (1955),1-12. 100 O. GLOMBITZA, NThT 14 (1960), 329-349. lOl E. BAUMANN, EvTh 11 (1951/1952),187-190. - G A. DANELL, 1951. - H. HOMMEL, Z4W47 (1929),110-124. - E. WÜRTHWEIN, VF7 (1957),165-182. lO2 R. PAUTREL, RSR 44 (1956), 219-228. - R. J. TOURNAY, VF9 (1959), 58-64. lO3 R. ARCüNADA, VD 13 (1933),240-246. 104 S. HOLM-NIELSEN, StTh 14 (1960),35-37. - L. J. LIEBREICH, HUCA 27 (1956), 181-192. lOS H. GUNKEL, em: Oriento Stud. Haupt, 1926,47-57.
97 98
H.
406
OS LIVROS DE CÂNTICOS
Desta visão geral resulta o seguinte quadro estatístico: a) Época de origem dos salmos: 1. anteriores ao exílio anteriores ao exílio? do final do pré-exílio 2. da época do exílio da época do exílio-posteriores ao exílio 3. posteriores ao exílio posteriores ao exílio? 4. ? 5. casos eSpeCIaIS b) Relações dos salmos com o culto: 1. cânticos cultuais 2. cânticos não-cultuais 3. duvidosos ou em posição intermediária
23%
1 } }
4,5% 62%
8,5% 2%
73,5% 18% 8,5%
5. Compilação e formação do Saltério Na sua forma definitiva que é a atual, o Saltério foi dividido em cinco livros, terminando cada um por uma doxologia: SI 1-41[1-40]; 42-72[4171]; 73-89[72-88]; 90-106; 89-[105]; 107-150[106-150]. Tem-se a impressão de que se trata de uma obra composta de um só lance, mas é ilusão. A divisão atual constitui apenas o estágio final de um longo e complicado desenvolvimento e foi calcada no modelo do Pentateuco ou vista posteriormente como imitação do mesmo, ao passo que não existe uma correspondência de conteúdo com os livros do Pentateuco. 106 O Saltério, na realidade, se desenvolveu a partir de várias coleções. Indício disto são o subtítulo em 5172[71],20: Fim das orações de Davi,filho de[eseé, os títulos, a mudança ocasional dos nomes de Deus, e as duplicatas de tradições (14[13] = 53[52];18[17] = 25m 22; 40[39],14-18 = 70[69]; 57[56],8-12 + 60[59],7-14 = 108[107]. Pode-se ver aí, às vezes, o caminho que vai das coleções menores até às coleções maiores e destas ao Saltério, que em sua totalidade ainda não estava completo antes do séc. IV. A. 513-41[40]: o saltério de Davi é a coleção primitiva mais extensa. Com exceção do SI 33[32], que não apresenta nenhum título, os demais cânticos desta coleção trazem a nota: l'daund. Em alguns casos chega-se a indicar a circunstância dentro da vida de Davi, com a qual o cântico tem
106
Ao contrário: J. OAHSE, Das Riitsel des Psalters geWst, 1927, e ARENS.
§ 43. O
SALTÉRlü
407
uma certa relação. O 512 foi colocado no início da coleção, evidentemente com referência a Davi. Em quase uma terça parte dos cânticos falta qualquer nota que se retira a um determinado uso cultual, tanto que a coleção é composta de cânticos cultuais e não-cultuais e foi idealizada como livro de piedade e de orações para uso privado, bem como para edificação pessoal. A isto corresponde o fato de que ela contém acentuadamente cânticos individuais, e particularmente lamentações individuais. B. 5142[41]-83[82]: saltério eloísta, acrescido de um apêndice: 5184[83]89[88]. Nesse saltério, o nome divino de Javé foi regularmente substituído pela denominação divina de Eloim. Que se trata de uma redação intencional é o que nos mostra o 5114[13], paralelo do 5153[52] e que traz o nome de Javé. As razões para isto consistem no receio crescente que o judaísmo nascente tinha de pronunciar o nome de Deus, como também no fato de acentuar a unicididade de Deus mediante a denominação de Eloim. O saltério eloísta consta de várias coleções parciais que apresentam indícios de sua origem ou de seu emprego dentro do culto: a) SI 42[41]-49[48], juntamente com o apêndice constituído pelos SI
84[83]-85[84]; 87[86]-88[87]: salmos dos filhos de Coré, ordenados segundo o gênero dos cânticos. Constituíam o livro de coro desta corporação de cantores, formada depois do exílio. Talvez tenha sido composto, em parte, também por esta corporação, como nos permite supor a específica teologia de Sião, que encontramos em alguns cânticos. O salmo davídico 86[85] também faz parte do mencionado apêndice. b) SI 50[49]; 73[72]-83[82]: salmos dos filhos de Asaf, e livro de coro também de uma corporação de cantores que voltou constituída, como tal, já do exílio. c) 5151[50]-72[71]: um segundo saltério davídico, no qual somente os 5166[65]-67[66] não trazem o "l'dsuoid" e o SI 72[71] é atribuído a Salomão. O subtítulo em 72[71],20 indica que se trata mesmo de uma coleção própria. Os salmos (como 3-41(40), em grande parte cânticos individuais e particularmente cânticos de lamentação individuais) são ordenados de acordo com o gênero literário dos cânticos e quase sem exceção trazem anotações litúrgicas e musicais. Foram compostos para fins cultuais, oportunidade em que se incluíram também alguns salmos não-cultuais.
c. Os 5190[89]-149[148] constituíam uma terceira grande coleção, na qual, ao contrário das outras coleções, faltam quase inteiramente as notas litúrgicas e musicais, e estranhamente muitas vezes também os nomes
408
Os LIVROS DE CÂNTICOS
dos autores. Esta coleção se compõe artificialmente de quatro coleções menores: 5190[89]-104[103]: não possui nenhuma nota especial, mas é caracterizada pela reunião da maior parte dos hinos monoteístas; b) SI 108[109]-110[109]; 138[137]-145[144]: resto de uma terceira coleção de salmos davídicos; c) SI 120[119]-134[133]: livro dos cânticos de romaria (cf. Zc): d) 51105[104]-107[106];111[110]-114[113A; 116[115]-118[117];135[134]136[135]; 146[145]-149: salmos "aleluiáticos", que atualmente encerram as três primeiras coleções ou suas partes:
a)
a)
b)
c) d)
SI 90[89]-104[103] SI 108[107]-110[109]
+ +
SI 120[119]-134[133] SI 138[137]-145[144]
+
+
105[104]-107[106]; 111[110]-114[113A]; 116[115]-118[117]; 135[134]-136[135]; 146[145]-149.
Posteriormente foram incluídos os Salmos 115[114]; 119[118] e 137[136].
As coleções individuais foram compostas às vezes para uso privado (A), mas eram destinadas sobretudo para fins cultuais (a maior parte das coleções parciais de B e C). Também a mais antiga designação geral, associada a determinada coleção (72[71],20), talvez devesse caracterizálas com a expressão rpiiiõt, como conjunto de cânticos de súplica - quiçá destinados ao culto divino na sinagoga. O mesmo vale para o termo plural: t'hillim, que caracteriza o Saltério como livro de canto da comunidade pós-exílica. A esta situação corresponde o SI 150, acrescentado sem conclusão e contendo o elenco dos instrumentos musicais utilizados no louvor a Deus. Também não se deve esquecer que o SI 1, colocado no início de todo o conjunto, representa um cântico sapiencial. Por intermédio dele, o Saltério foi retirado do âmbito da vida do culto divino, alienado do seu 5itz im Leben ["contexto vital"] original próprio, como o de muitos cânticos neles recolhidos, e destinado a ser livro de edificação da teologia sapiencial.
6. Concepções teológicas No que se refere às concepções teológicas, é preciso ter presente que os salmos mais antigos representam uma seleção unilateral do tesouro do cântico de Israel; conseqüentemente, da época anterior ao exílio só se
§ 44. As
LAMENTAÇÕES
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conservaram cânticos cultuais procedentes de Jerusalém ou relacionados com ela, e em sua totalidade os cânticos que surgiram depois da reforma de [osias só consideram como único e legítimo santuário o templo de Jerusalém. Existe aí, desde o início, a tendência a limitar-se apenas a determinadas correntes de âmbito palaciano e sacral, posteriormente de caráter mais ou menos conventicular, desta sorte os salmos cujo conteúdo não se projeta para além desses estreitos limites, não podem ser considerados como representativos da fé javista em toda as suas dimensões. Por conseguinte, a excessiva estima de Sião deve-se tomar com restrições. Feitas estas ressalvas, a cidade de Jerusalém com seu culto pode ser considerada como um dos pontos centrais da fé dos salmos. De conformidade com esta fé, o templo fora escolhido por Deus para ser o lugar da presença de sua revelação, lugar de onde brotavam torrentes de bênçãos, e no qual todos os que integravam o povo de Israel possuíam o seu direito de cidadania. Viver em Jerusalém, a cidade do templo, era viver em ação de graças e na exultação. Entrar no templo e poder demorar-se nele constituía uma graça especial, de sorte que em muitos salmos ressoa o anelo por esta hora. O culto sacrificial, contudo, pode ser substituído pela oração e pela ação de graças (5150[49],14; 141[140],2), ou rejeitado, com preferência pela confiança em Deus, confiança a qual se exprime no louvor à sua grandeza e na humildade de quem nele confia (SI 40[39],7ss; 51[50],17ss). O outro ponto central da fé dos salmos é a Lei, na qual estão consignadas as exigências divinas em relação ao homem, porque a obediência atrai a graça de Deus, ao passo que a desobediência traz como recompensa o castigo. Daí é que provém a diferença, que se repete constantemente, entre os justos ou piedosos, e os perversos ou ímpios. Esta concepção, evidentemente, conduziu a grandes dificuldades, que os 5149[48] e 73[72] procuram eliminar, cada um à sua maneira, sendo que o último vê a solução do enigma, como o livro de [ó, na experiência da comunhão com Deus. Efetivamente, os conceitos de soberania e de comunhão divinas constituem os pólos específicos da piedade cultual e legalista.
§ 44. AS LAMENTAÇÕES ATO: A. WEISER, 2a ed., 1962. - BK: H.-J. KRAus, 2a ed., 1960. BOT: B. N. WAMBACQ, 1957. - HAT: M. HALLER, 1940. - HK: M. LOHR, 2a ed., 1906. - HS: TH. PAFFRATH, 1932. - IB: TH. J. MEEK, 1956. - KAT / KAP: W. RUDOLPH, 1939/1962. - KeH: O. THENIUS, 1855. - KHC: K.
410
OS
LIVROS DE CÂNTICOS
BUDDE, 1898. - SAT: H. SCHMIDT, 2i! ed., 1923; W. STAERK, 2il ed., 1920. - SZ: S. OETTLI, 1889. Especiais: H. G. A. EWALD, Die Dichter des Alten Bundes, I, 2, 3il ed., 1866. - C. F. KEIL, 1872 (Biblischer Commentar). - G. RICCIOTTI, 1924. - G. M. RINALDI, 1953. - H. WIESMANN, 1954. B. ALBREKTSON, Studies in the Text and Theology of ther Book of Lamentations, 1963. - J. BOHMER, "Ein alphabetisch-akrostichsches Rãtsel und ein Versuch, es zu lõsen", ZAW 28 (1908),53-57. - C. FLÓCKNER, "Über den Verfasser der Klagelieder", ThQ 59 (187), 187-280. - N. K. GOTTWALD, Studies in the Book of Lamentations, 1954. - M. LOHER, "Der Sprachgebrauch des Buches der Klagelieder", ZAW 14 (1894),31-50.ID., "Sind Thr IV und V makkabãisch?", ibid. 51-59. - ID., "Threni III und die jeremianische Autorschaft des Buches der Klagelieder", ibid. 24 (1904), 1-16. - H. MERKEL, Über das alttestamentliche Buch der Klagelieder, Diss. Halle, 1889.- C. VAN DER STRAETEN, "La métrique des Lamentations", em: Mélanges de Philologie Orientale, 1932, 193-201. - M. TREVES, "Conjectures sur les dates et les sujets des Lamentations", Bulletin Renan 95 (1963), 1-3. - H. WIESMANN, "Die literarische Art der Klagelieder des Jeremias", ThQ 110 (1929), 381-428. - ID., "Der geschichtliche Hintergrund des Büchleins der Klagelieder", BZ 23 (1935/36), 20-43. - ID., "Der Verfasser der Klagelieder ein Augenzeuge?", Bibl17 (1936), 71-84. - J. K. ZENNER, Beitriige zur Erkliirung der Klagelieder, 1905.
1. Terminologia
o livro, nos manuscritos e nas edições impressas da Bíblia hebraica, tem o nome de' êkã, "Ai, como!", segunda a primeira palavra dos cânticos 1,2 e 4, nos quais essa introdução corresponde ao conteúdo dos cânticos. O nome mais antigo, segundo o Talmude babilônico Baba bathra 15a, era qinõi, "cânticos fúnebres" ao qual correspondem as designações de thrênoi, lamentationes, "lamentações" nas traduções. Essas, muitas vezes, no título, atribuem o livro a Jeremias e o colocam logo em seguida ao livro deste. Elas talvez se apóiem em 2Cr 35.25, embora as lamentações de que aí se fala, referentes a [osias e das quais uma teria sido composta por Jeremias, não podem ser as mesmas do livro das Lamentações, apesar de 4.20. O livro constitui um dos rolos das festas, e é lido no dia 9 do mês de Abdias, aniversário da destruição de Jerusalém. 2. Gênero literário e estilo A obra consta de cinco lamentações autônomas que correspondem a cinco capítulos. Não se pode determinar com precisão o seu gênero literário, desde que se tem diante dos olhos uma multiplicidade de gêneros
§ 44. As LAMENTAÇÕES
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literários. Ao poeta não interessava apresentar seus cânticos segundo determinados padrões, mas propor um conjunto de idéias às quais a forma devia se adaptar. As lamentações 1; 2 e 4 são cânticos fúnebres, consoante a primeira palavra de cada uma delas. Mais precisamente: são cânticos fúnebres coletivos que deploram a sorte de Jerusalém como se ela já estivesse morta. O poeta, no entanto, também transita por outros gêneros literários. Em 1, é a própria Jerusalém que se volta para Javé, na oração e na confissão de seus pecados, ao contrário do que se dá nas lamentações pelos mortos. Os vv. 12-16,18-22 foram compostos no estilo dos cânticos de lamentação individuais. Em 2 também vai-se além da forma do cântico fúnebre, pelo fato de Javé situar-se no centro das atenções e o poeta, depois de lamentar a sorte de Jerusalém, assume, ele próprio, a palavra e, por fim, coloca expressões de súplica na boca da cidade devastada. Na lamentação 4, que começa como um cântico fúnebre, introduz-se, nos vv. 17-20, um plural no estilo dos cânticos de lamentação coletivos, e nos vv. 21s o poeta interpela Edom e Sião. A lamentação 3 é, antes de tudo, um cântico de lamentação individual que, nos vv. 40-47, passa para o estilo do cântico de lamentação coletivo, voltando, depois, à forma inicial. Nos vv. 25-39 encontramos uma reflexão sobre o sentido do sofrimento. A conclusão traz, juntamente com a narrativa da salvação, a característica do cântico de ação de graças (vv. 55-62), e com o pedido de maldição para o inimigo (vv. 6366), também o tema da certeza de ser atendido. O "eu" do cântico, ao lado do qual surge um "nós" que também fala, foi relacionado, ora com Jerusalém personificada, que estaria falando com alguém que sofre (EISSFELDT*, GOTTWALD), ora com um representante da comunidade, em cujo nome estaria falando (KEIL, EWALD, RICCIOTTI, RINALD), ora com um determinado indivíduo que estaria falando somente de seu próprio destino e não do da comunidade (BUDDE). Mais correto é pensar, com RUDOLPH, em um indivíduo que se sentiria atingido de modo especial pela ira divina e se apresentaria como exemplo a seu povo, em que se possa, evidentemente admitir, para além disso, que o poeta pretenda colocar essas palavras na boca de Jeremias. Pelo contrário, ele pode falar inteiramente por experiência própria. A lamentação 5 é puro cântico de lamentação coletivo, que começa com a invocação a Javé e acrescenta a seguir minuciosa lamentação sobre a calamidade de momento, terminando com um breve pedido de ajuda.
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Os LIVROS DE CÂNTICOS
Divergindo desse modo quase universalmente defendido de definir os gêneros literários e tomando como ponto de referência as lamentações babilônicas sobre a destruição de certos templos, principalmente a do templo sumeriano de Ur, KRAus postula a "lamentação do santuário destruído" como novo gênero cujo Sitz im Leben ["contexto vital"] seria a celebração cultuaI. Contudo, na Mesopotâmia essas lamentações não constituem um gênero literário próprio que tenha sido realmente digno de nota como criação de tipo ritualista, mas se enquadra no gênero literário geral dos cânticos de lamentação. Além de sua semelhança com o livro das Lamentações, semelhança que se explica suficientemente a partir de uma situação análoga, não devem ser esquecidas também as diferenças consideráveis. Por fim, a forte mistura de gêneros literários do Antigo Testamento e a particularidade da sua forma estilística, que, a seguir, mencionaremos, contradizem a hipótese de KRAus. Do ponto de vista do estilo, os quatro primeiros cânticos são cânticos de estrutura alfabética. Em 1-3, cada estrofe contém três versos e em 4, dois. Em 1,2 e 4, cada primeiro verso começa respectivamente com uma letra do alfabeto hebraico. No cântico 3, cada letra se repete no início dos três versos das respectivas estrofes. Nos cânticos 2-4, o pê vem antes do 'ayn', de sorte que a ordem alfabética talvez então ainda não estivesse fixada definitivamente. O quinto cântico é alfabetizante: o número de versos nele contidos corresponde às vinte e duas letras do alfabeto hebraico. O resultado da forma estilística é uma estrutura lógica fraca e uma exposição cheia de altos e baixos.
3. Ocasião e objeto A ocasião e o objeto dos cânticos são constituídos pela desolação e pela queda de Jerusalém, como resultado da conquista pelos babilônicos. Os cânticos foram compostos a partir da reflexão acerca dos motivos que levaram a tão profunda queda. Nesses cânticos trata-se sobretudo de manifestações inteiramente pessoais, e deste modo elas deviam certamente repercutir espiritualmente sobre outras pessoas atingidas pela desgraça. Dificilmente se pode admitir que eles se destinavam, desde o início, à recitação nas celebrações cultuais de lamentação, das quais só se faz menção pela primeira vez em Zc 7.1ss; 8.18s e só foram introduzidas talvez alguns anos, ou mesmo dezenas de anos depois dos eventos. lO? A forma 107
A peregrinação a Jerusalém relatada em [r 41.5 não indica que tais solenidades continuavam a ser praticadas, mas que existiam possibilidades de celebrações cultuais. Ademais, esta peregrinação teve lugar antes da Festa dos Tabernáculos.
§ 44. As
LAMENTAÇOES
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estilística alfabética contradiz a hipótese da composição dos cânticos para fins cultuais, e caracteriza os cânticos como elegias de um autor erudito, destinadas primariamente à leitura em particular e não à recitação em público. lOS
4. Origem Infere-se a época de origem a partir da ocasião e do objeto dos cânticos: eles pressupõem a conquista de Jerusalém. RUDOLPH pretendeu derivar o primeiro cântico da época da primeira ocupação do país e da primeira deportação (597) e os demais cânticos somente dos anos posteriores à catástrofe definitiva (587). Mas, embora o primeiro cântico não mencione expressamente a destruição da cidade e do templo, todavia, os vv. 10,17,19s, indicam a mesma situação que os cânticos 25. Todos os cânticos devem ter surgido, por conseguinte, depois do ano de 587, não se podendo fixar um termo mais preciso para cada um deles. Em verdade, o fato de os cânticos 2 e 4, e às vezes também o cântico 5, apresentarem traços concretos individuais, e de os cânticos 1 e 3, pelo contrário, terem recebido um caráter mais geral, deve-se mais às idéias do poeta do que a uma distância cronológica nítida em relação aos acontecimentos. O único ponto que se pode dizer como certo é que eles foram compostos por uma testemunha ocular, e antes da mudança da situação causada pela libertação concedida por Ciro no ano de 338. Não se pode pensar em uma origem para 1 e 3-5 na época de 170-166 a.c. (TREvEs). Não é possível determinar com clareza o lugar de origem das Lamentações. Enquanto GOTTWALD pensa numa redação durante o exílio babilônico e SELLIN* relaciona pelo menos os cânticos 1; 2 e 4 com este cativeiro, e os cânticos 3 e 5, pelo contrário, com Jerusalém ou com a Palestina, RUDOLPH e WEISER* consideram a Palestina como a pátria de todos os cânticos. Faltam, no entanto, indícios seguros para todas estas hipóteses. Dado que a pregação de Ezequiel certamente se tornara conhecida desde cedo na Palestina, é possível que os cânticos 2 e 4 tenham sofrido aí também sua influência. Ou inversamente: um deportado pode ter reconstituído todas as impressões da catástrofe à qual ele teria assistido em Jerusalém. Por isso, a questão a respeito do lugar de origem permanece necessariamente em aberto. lOS
Cf. JAHNüW, 169.
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OS LIVROS DE CÂNTICOS
A compilação dos cânticos deve ter tido lugar em Jerusalém, logo depois do exílio e o mais tardar no séc. V a.C.; com a finalidade prática de agrupar em um só escrito os cânticos que a partir dessa época eram utilizados na solenidade anual comemorativa da destruição de Jerusalém.
5. Autor Jeremias não vem ao caso como autor dos cânticos, embora esta opinião tenha sido de novo defendida recentemente, e de modo enérgico, por WIESMANN. O profeta não pronunciou nenhuma lamentação depois da catástrofe, mas exortou o povo a se conformar com a sorte decretada por Deus e a obedecer aos babilônios; talvez tenha prometido também uma salvação futura, ao passo que algumas afirmações das Lamentações o contradizem (cf, 1.10; 4.17,20b). Também não se devem procurar o autor ou os autores dessa obra nos círculos dos profetas ligados oficialmente ao culto (KRAus) e cuja culpa é julgada em 2.14 e 4.13 por alguém que está de fora. WIESMANN e RUDOLPH mostraram de maneira bastante plausível que todos os cânticos têm um único autor (diversamente, p.ex., EISSFELDT*). Neste sentido, e apesar da ordem diferente das letras 'ayin e pê nos cânticos 1 e 2-4, podem-se aduzir os pontos de contato lingüísticos e temáticos, a forma estilística, a preocupação pastoral e a atitude teológica fundamental dos cânticos, que os aglutinam em uma unidade. Caso 4.1720 reflita as experiências e as idéias pessoais do poeta, este teria pertencido aos círculos que até ao último momento esperavam a salvação de Jerusalém, e parece ter fugido dessa cidade no séquito do rei Sedecias. A forma do estilo também sugere que ele pertencia a essa camada superior de eruditos. Por isso não se pode admitir sem mais que ele tenha sido deportado depois da catástrofe. Ele poderia ter sido incorporado ao círculo de Godolias.
6. Significado Em qualquer dos casos, foi somente a ruína do Estado e da capital que lhe abriu os olhos para as correlações mais profundas, levando-o a um confronto mais íntimo com os acontecimentos, a um abrir-se para a pregação profética e a uma tentativa de auxiliar os seus companheiros de infortúnio, que haviam mergulhado numa crise de fé (WEISER*). Ele vê a causa imediata da infelicidade na ira de Deus, cuja razão era, novamente,
§ 45. O
CÂNTICO DOS CÂNTICOS
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o pecado do povo, tendo os sacerdotes e os profetas cultuais como os principais culpados, e considera como único remédio para sair da desgraça e do desespero a oração a Deus, o qual saberá ser misericordioso e benigno para com um povo que faça penitência.
§ 45. O CÂNTICO DOS CÂNTICOS A TD: H. RrNGGREN, 2 a ed., 1962. - BK: G. GERLEMAN, 1963ss. - BOT: M. A. VAN OEN OUDENRIJN, 1962. - COT: G. CH. AALDERS, 1952. - HAT: M. HALLER, 1940. - HK: K. SIEGFRIEO, 1898. - HS: A. MILLER, 1927. - IB: J. MEEK, 1956. - KAT, 2 a ed., W. RUOOLPH, 1962. - KeH: F. HITZIG, 1855. KHC: K. BUOOE, 1898. - SAT: W. STAERK, 2a ed., 1920. - SZ: S. OETTLI, 1889. - Comentários especiais: - H. H. G. A. EWALD, 1826. - R. GORDIS, 1954. -L. KRINETzKI, 1964. - G. S. POUGET. - J. Currron, 1934. - G. RrCCIOTTI, 1928. - A. ROBERT - R. TOURNAY (-A. FEUILLET), 1963. W. F. ALBRIGHT, "Archaic Survivals in the Text of Cantic1es", em: Driver-Festschrift, 1963, 1-7. - D. BROAORIBB, "Thoughts on the Song of Solomon", Abr-Nahrain 3 (1961/62), 11-36. - A. BRUNO, Das Hohe Lied, Das BuchHiob, 1956. - K. BUOOE, "Was ist das Hohelied?", PJ 78 (1894), 92-117. - D. Buzv, "Un-chef-d'oeuvre de poésie pure: le Cantique des Cantiques", em; Mémorial Lagrange, 1940, 147-162. - A. FEUILLET, "Le Cantique des Cantiques et la tradition biblique", NRTh 74 (1952), 706733. - lo., Le Cantique des Caniiques, 1953. - C. GEBHAROT, Das Lied der Liede, 1931. - P. HAUPT, Biblische Liebeslieder, 1907. - J. G. HEROER, Lieder der Liebe, 1778. - C. KUHL, "Das Hohelied und seine Deutung", ThR NF 9 (1937), 137-167. - G. KUHN, Erklarung des Hohen Liedes, 1926. - A. LACOCQUE, "L'insertion du Cantique des Cantiques dans le Canon", RHPhR 42 (1962), 38-44. - F. LANOSBERGER, "Poetic Units within the Song of Songs", JBL 73 (1954), 203-216. - TH. J. MEEK, "Canticles and the Tammuz Cult", AJSL 39 (1922/23), 1-14. - R. E. MURPHY, "The Structure of the Canticles", CBQ 11 (1949),381-391. - H. RrNGGREN, "Hohes Lied und meros gamos", ZAW 65 (1953), 300-302. - A. ROBERT, "Le geme littéraire du Cantique des Cantiques", RB 52 (1945), 192-213. - H. H. RoWLEY, "The Interpretation of the Song of Songs", JThSt 38 (1937), 337-367 (= The Servant of the Lord, 1952, 187-234). - Io., "The Song of Songs: an Examination of Recent Theory", JRAS 1938, 251-276. - H. ScHMÓKEL, "Zur kultischen Deutung des Hohenliedes", ZAW 64 (1952), 148-155. - lo., Heilige Hochzeit und Hoheslied, 1956. - M. H. SEGAL, "The Song of Songs", VT 12 (1962), 470-490. - M. THlLO, Das Hohelied, 1921. - L. WATERMAN, The Song of Songs, 1948. - J. G. WETZSTEIN, "Die syrische Dreschtafel", Zeitschr. f. Ethnologie 5 (1873),270-302. - W. WITTEKINOT,
Das Hohe Lied und seine Beziehungen zum Istarkult, 1927.
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OS LIVROS DE CÂNTICOS
1. Terminologia
o livro traz o nome de slr hassirún, (LXX: ásma asmóton, Vulgata: cantica caniicorum), correspondente às duas primeiras palavras. Este circunlóquio superlativo considera o livro como o mais belo (ou o melhor) dos cânticos de Salomão que, segundo lRs 5.12 [Vg =4,32], compôs mil e cinco cânticos. A atribuição do Cântico dos Cânticos a Salomão foi talvez a razão determinante para sua aceitação no cânon, aceitação que não se verificou nem foi propugnada somente no chamado Sínodo de [âmnia em cerca de 100 d.C. No séc. II d.C. surgiram apenas dúvidas esporádicas no sentido de saber se sua aceitação era legítima. Estas dúvidas foram desfeitas com a explicação da Mishná [adaim 3,5. A partir do séc., VIII d.e. têm-se testemunhos do emprego do Cântico dos Cânticos como rolo da festa da Páscoa.
2. História da interpretação A história da interpretação do Cântico dos Cânticos não constitui uma página luminosa da exegese bíblica.l" O conhecimento preciso de que esta obra descreve e celebra o amor entre o homem e a mulher teve de ceder lugar, já no séc. I d.C., à interpretação alegórica e típica que ia então se impondo e à qual, em época mais recente, se acrescentou como segunda hipótese a interpretação mítico-cultuaI. a) A compreensão naturalista do livro como expressão do amor erótico é a mais antiga e original. Do mesmo modo que JOSEFO, ao descrever, em Ant VIII 7,3, a pompa de Salomão, pressupõe esta interpretação como sendo a mais evidente, assim também era ao pé da letra que o povo entendia o livro, segundo o que diz a Mishná Taanit 4,8. O mesmo se verifica para o séc. II d.C., quando Rabbi AQIBA amaldiçoa aqueles que cantarolavam o Cântico dos Cânticos na casa onde se celebravam as núpcias. Esta interpretação, contudo, foi posteriormente rejeitada, e TEOOORO DE MOPSUÉSTIA foi condenado no V Concílio de Constantinopla, em 553, por defendê-la, e CASTELLIO (CHÂTEILLON) banido de Genebra, em 1545, por causa desta
109
"Das Hohelied und seine Deutung", ThR NF 9 (1937), 137-167. - D. "Zur Geschichte der Auslegung des Hohenliedes", ZThK 54 (1957), 257277. - F. OHLY, Hohelied-Studien, 1958. - P. P. PARENTE, "The Canticle of Canticles in Mystical Theology", CBQ 6 (1944), 142-158. - P. VULLIAUD, Le Cantique aprês la C.
KUHL,
LERCH,
tradition juive, 1925.
§ 45. O
CÂNTICO OOS CÂNTICOS
417
interpretação e de outras heresias. HERDER, que às demais interpretações preferia a "compreensão literal clara, por todos combatida" e que para ele era" a intérprete de todos os intérpretes", ajudou a essas vozes e outras semelhantes, posto que mais circunspectas, a romper as barreiras. WETZSTEIN veio em apoio da tese naturalista, ao descrever os costumes nupciais siropalestinenses em sua pesquisa sobre a debulhadeira (Dreschtafel) síria em 1873: na véspera do casamento, a noiva executa a dança da espada, ao ritmo de um cântico que celebra sua beleza e seus ornamentos. Na primeira semana após as núpcias, a chamada "Semana do rei", os jovens esposos figuram como rei e rainha. Entre os cânticos executados nesses dias se encontra, mais uma vez, um cântico descritivo. Como as condições de vida pouco mudaram no correr dos séculos e até recentemente, e como o costume é pertinaz, certamente aí está presente um uso antigo. Além do mais, o fato de designar o par de noivos como rei e rainha era mais difundido que o próprio WETZSTEIN supunha, de modo que agora se possui uma base bastante ampla para a referida interpretação (RUDOLPH).lIü b) Durante séculos, a interpretação principal foi a alegórica ou típica, que perdura até o presente. Ela atribui um sentido espiritual mais profundo ao livro, inicialmente com a finalidade de justificar, para o futuro, a presença do livro no cânon, contestada de vez em quando. No judaísmo, ela coloca as afirmações do livro em relação direta com Javé e Israel, e na Igreja cristã, com Cristo, com a alma individual ou com Maria. Enquanto essa concepção desapareceu na exegese protestante, a partir do final do séc. XVIII, ela continua a prevalecer, como dantes, na ortodoxia judaica e na exegese católica tp.ex., em RICCIOTTI, Buzv, ROBERT, BEA, TOURNAY, FEUILLET, KRINETZKI). Esta última utilizou recentemente o simbolismo profético do casamento como explicação. RUDOLPH ofereceu uma refutação minuciosa contra esta concepção, enquanto HERDER consagrou uma imitação irônica à alegoria.'!'
c) A interpretação mitológica ou mítico-cultual relaciona o livro com a celebração nupcial entre as divindades da vegetação ou com as núpcias 110
111
Coleções de poesia oriental moderna: G. DALMAN, Paliistinischer Diwan, 1901. - S. LINDER, Paliistinische Volksgesange, 1952/1955. - E. LIT1MANN, Neuarabische Volkspoesie, 1902. - G. JACOB, Das Hohelied, auf arabische und andere Parallelen untersucht, 1902.G. MUSIL, Arabia Petraea, III 1908. - ST. H. STEPHAN, "Modem Palestinian Parallels to the Songs", JPOS 2 (1922), 199-278. J. G. HERDER em: Herders Sammtliche Werke, ed. B. SUPHAN, VIlI 1892, 553s.
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OS LIVROS DE CÂNTICOS
sagradas do rei sacral do Antigo Oriente. Dando continuidade às idéias de ERBT, que pensava nas núpcias do deus solar (Dôd) com sua irmã Ishtar, a deusa lunar (Shalmítl.l" MEEK, HALLER, WITTEKINDT (ciclo dos cânticos cultuais, executados por ocasião de uma festa em Jerusalém), e mais recentemente SCHMOKEL, defenderam também esta hipótese. ScHMÓKEL pretende reconstituir o texto do livro, reagrupando os versos, à feição de um mosaico, em um drama cultual original de três cenas com trinta e oito cânticos, que constituía a liturgia que se celebrava por ocasião das núpcias sagradas de um casal de deuses palestinenses. Independentemente da questão discutida das núpcias dos deuses, que não é absolutamente esclarecida, pergunta-se em vão o que deve ter levado os antigos teólogos judeus a assumir uma tal liturgia, apesar da antiga aversão da fé javista pelos cultos da vegetação e da fecundidade, e depois, a sujeitar-se ao trabalho de refundição radical, para deste modo se chegar, em verdade, a cânticos de amor e a cânticos nupciais, mas ao mesmo tempo a deparar-se com necessidade de uma interpretação alegórica. O único resultado positivo dessa hipótese é o conhecimento de que a linguagem mítico-cultual se inspirou naturalmente na linguagem usual da poesia dos cânticos e de que o modo de se expressar mítico-cultual, por sua vez, talvez tenha influído também a linguagem dos enamorados. d) Acidentalmente, pode-se mencionar ainda a interpretação de caráter historicizante, como, p.ex., a de WATERMAN, para quem se trata de Abisag, a sunamita que, morto Davi, se recusa às solicitações de Salomão, por fidelidade ao seu bem-amado camponês, e que depois foi celebrada no reino setentrional de Israel.
3. Cânticos de amor e cânticos nupciais O Cântico dos Cânticos é uma mistura de cânticos de amor e de cânticos nupciais. Não se pode negar totalmente sua relação com as núpcias (ROWLEY, Buzv), nem fazer o livro depender inteiramente delas e considerá-lo como o livro de determinadas núpcias israelíticas (BUDOE). O fato de mencionar a noiva e o casamento indica que as perícopes 3.6-11; 4.8,9-11; 4.12-5.1 são cânticos nupciais, aos quais se devem também juntar pelo menos 1.2-4,9-17; 7.1-6 e 8.5-7. Os outros cânticos são puramente poemas 112
W.
REBT,
Die Hebriier, 1906, 196-202.
§ 45. O
CÂNTICO DOS CÂNTICOS
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amorosos como os que se conhecem da poesia egípcia antiga e da poesia oriental mais recente. Freqüentemente os cânticos exaltam o encanto do amor, O anelo recíproco dos que se amam, sua paixão, sua mútua entrega à alegria por causa da união dos dois. Os cânticos celebram em termos efusivos e sensuais o amor que atrai o homem e a mulher para os braços um do outro, com força tão poderosa, que eles não podem resistir. Os cânticos não apenas respiram a vida em pulsação, como também estão impregnados da linguagem imaginosa da poesia amorosa que, sob a capa dos simbolismos, utiliza as imagens da vinha, do jardim e da fonte para indicar os atrativos da mulher, e as imagens da comida, da bebida, dos prados para significar o prazer amoroso. A "sensualidade em busca da felicidade" (GERLEMAN) pressupõe a natureza, cuja descrição emoldura as cenas de amor e, pelo seu caráter idílico e mundano, se destaca daquela concepção da natureza que se encontra tanto no cântico hínico como na doutrina sapienciaL Além disso, enquanto o cântico descritivo retrata as pessoas à maneira de uma estátua (§ 40,4), o poema faz o casal de namorados ou de noivos aparecer veladamente ou sob disfarce literário, inspirado, também este, na poesia egípcia. GERLEMAN chama sobretudo a descrição feita sob a figura do "rei" e da "rainha", de disfarce "para cima", e o disfarce de "pastores" e "jardins", que pertencem a uma outra esfera, de disfarce "para baixo". O primeiro desses disfarces aparece ainda nos costumes populares descritos por WETZSTEIN.
4. Forma literária Para explicar a forma literária do Cântico dos Cânticos defendeu-se muitas vezes a teoria de que ele seria um drama amoroso (POUGET-GurrTON, WATERMAN, BRuNo, e outros), ou a imitação judaica do mimo grego (GEBHARDT). Se esta hipótese já é falha pelo fato de ignorar a existência dos disfarces literários; se já encontra dificuldade ao escolher o personagem masculino principal ("rei" ou "pastor"), e se é forçada a deixar de lado outras caracterizações da mulher, como, p.ex., as de aldeã e de habitante da cidade, ela fracassa ainda mais, pelo fato de não poder comprovar a existência de uma ação lógica e coerente, nem também um progresso ou uma finalidade para o acontecimento. O mesmo vale no que respeita à hipótese segundo a qual o livro contém uma descrição homogênea e completa, que vai do primeiro amor até ao noivado e ao casamento, e deste até à vida matrimonial (THILO), ou percorre, através de vários diálogos e monólogos, o caminho que vai da
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OS LIVROS DE CÂNTICOS
admiração pela amada ou pelo amado, até à união íntima dos dois (Buzv). Mas não só não se pode determinar se existem tais progressos nas idéias, como também é impossível, desta forma, encontrar uma unidade para a mudança constante dos personagens e das disposições íntimas. O Cântico dos Cânticos surgiu, pelo contrário, como uma coleção formada por cânticos originariamente autônomos como aqueles cânticos egípcios que se encontram em coleções do mesmo gênero. Sob este aspecto, o livro se assemelha às demais coleções de cânticos do AT, como igualmente a uma grande parte dos livros sapienciais e proféticos. Muitas das repetições nos levam a supor, também, que o Cântico dos Cânticos surgiu a partir, pelo menos, de duas coleções parciais (1.15 = 4.1; 2.6s = 8.3s; 2.17a = 4. 6a; 2.17b = 8.14). A ordem em que os cânticos se sucedem foi determinada, muitas vezes, pela semelhança de conteúdo. Na maior parte dos casos, esta colocação foi executada, tomando-se as palavras-chaves como princípio condutor.
5. Poesia artística O Cântico dos Cânticos tem sido considerado freqüentemente como poesia popular (HERDER, BUDDE, RUDOLPH e outros). Contra esta opinião, porém, estão o caráter eminentemente literário da obra, a habilidade artística que dificilmente corresponderia ao feitio camponês e aldeão, o domínio da língua, a tessitura do poema, e, o que não é menos importante, as relações estreitas com a poesia egípcia. Os cânticos, pelo contrário, são poesia artística no verdadeiro sentido do termo, isto é, são produções de cunho marcadamente pessoais de poetas criativos, executadas de forma intencional, mediante o emprego de recursos estilísticos, e determinadas pelo sentimento lírico, até mesmo no interior da estrutura fraseológica. Mas mesmo nesses aspectos, esta poesia não constitui uma unidade nem se vincula a um único e determinado autor. Antes, considerada a semelhança do vocabulário, da linguagem figurativa, da forma exterior e do conteúdo, ela provém de um círculo de autores animados das mesmas disposições e familiarizados com a poesia egípcia.
6. Origem Como época de origem para os cânticos exclui-se não apenas a época de Salomão, que não vem ao caso como autor da obra, mas também toda a época do exílio. É sobretudo o colorido aramaico da linguagem que apon-
§ 45. O CÂNTICO DOS CÂNTICOS
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ta claramente no sentido da época pós-exílica, em prova da qual deparamos o iranismo [parsismo] pardes (4.13) e o grecismo 'appiryôn (3.9), sob forma aramaica.'!' O conceito de amor e a relação com a literatura egípcia são possíveis nessa época, exatamente como o eram na época do humanismo salomônico (GERLEMAN), ou no séc. IX.1I4 A hipótese conciliatória segundo a qual os cânticos seriam antigos, tendo sido aramaicizados na época pós-exílica (GORDIS, RUDOLPH), nos deixa a suspeita de ter sido formulada para garantir a idade superior dos cânticos. Ao contrário disto, preferimos pensar no período dos sécs. V-IV a.c. como época do aparecimento dos cânticos e da coleção, que veio logo em seguida. Como lugar de origem dos cânticos e da coleção, deve-se admitir a Palestina: as numerosas indicações referentes a lugares e a construções revelam um bom conhecimento tanto de Jerusalém como do restante da região siro-palestinense.
7. Importância A importância do Cântico dos Cânticos deve ser vista não só no fato de que ele evita, de um lado, uma divinização sacral do elemento sexual, de que estavam impregnados os cultos míticos da fecundidade do Antigo Oriente, mas de que, por outro lado, contradiz também aquela atitude de desdém e de repulsa pelo sexo, que partiu sobretudo do judeu-cristianismo de cunho essênio e da mística platônico-helenística. O Cântico dos Cânticos indica que, desde o momento em que o matrimônio está de acordo com a vontade de Deus, o amor sexual vale igualmente como seu pressuposto e como seu fundamento.
Cf. A. JEPSEN, "Pardes", ZDPV 74 (1958), 65-68. - F. RUNDGREN, 'appiryôn "Tragsessel, Sãnfte" ZAW 74 (1962), 70-72. 11 114 W. F. ALBRIGHT, Archaeology and the Religion of Israel, 1946, 2 ed., 182, nota 35.
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Terceira Parte Origem dos Livros Sapienciais
CAPÍTULO
VIII
ASPECTOS GERAIS § 46. A DOUTRINA SAPIENCIAL NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL A. ALT, "Die Weisheit Salomos", ThLZ 76 (1951), 139-144 (= Kleine Schriften, I 1953,90-99). - R. ANTHES, Lebensregeln und Lebensweisheit der alten Agypter, 1933. - W. BAUMGARTNER, Israelitische und altorientalische Weisheit, 1933. - lo., "Die israelitische Weisheitsliteratur", ThR NF 5 (1933),259-288. - lo., "The Wisdom Literature", em: The Old Testament and Modern Study, 1951, 210-237. - F. W. VON BISSING, Altiigyptische Lebensweisheit, 1955. - P. A. H. DE BOER, "The Counsellor", VTSuppl 3, 1955, 42-71. - H. BRUNNER, "Die Weisheitsliteratur", em: Handbuch der Orientalistik, I, 21952,90-110. - A. DE BUCK, "Het religious karakter der oudste egyptische wijsheid", NThT 21 (1932), 322-349. - A. CAUSSE, "Sagesse égyptienne et sagesse juive", RHPhR 9 (1929), 149-169. - J. J. A. VAN DIJK, La Sagesse suméro-acadienne, 1953.- L. DüRR, Das Erziehungswesen
im Alten Testament und im Antiken Orient, 1932. - A. ERMAN, Die Literatur der Agypter, 1923, 86-121, 238-302. - J. FICHTNER, Die altorientalische Weisheit in ihrer israelitisch-jüdischen Auspriigung, 1933. - lo., "Zum Problem Glaube und Geschichte in der israelitisch-jüdischen Weisheitsliteratur", ThLZ 76 (1951), 145-150. - G. FOHRER, "sophia ktl.; B Altes Testament", ThW VII, 476-496. - TH. H. GASTER, "Samaritan Proverbs", em: Studies Neuman, 1962, 228-242. - H. GESE, Lehre und Wirklichkeit in der alten Weisheit, 1958. - R. GoRDIS, "The Social Background of Wisdom Literature", HUCA 18 (1943/44), 77-118. - E. I. GOROON, "A New Look at the Wisdom Literature of Sumer and Akkad", BiOr 17 (1960), 122-152. H. GRESSMANN, Israels Spruchweisheit im Zusammenhang der Weltliteratur, 1925. - P. HUMBERT, Recherches sur les sources égyptiennes de la literature sapientiale d'Israêl, 1929. - J. KÁZMÉR, Wesen und Entwicklung des
Weisheitsbegriffes in den Weisheitsbüchern des Alten Testaments, 1950. - S. N. KRAMER, "Sumerian Wisdom Literature", BASOR 122 (1951),28-31. - W. G. LAMBERT, Babylonian Wisdom Literature, 1960. - J. LINOBLOM, "Wisdom in the Old Testament Prophets", VTSupp13, 1955, 192-204.J. MEINHOLD, Die Weisheit lsraels, 1908. - R. E. MURPHY, "The Concept of Wisdom Literature", em: The Bible in Current Catholic Thought, 1962, 46-54. - M. NOTH, "Die Bewãhrung von SaIomos 'Gõttlicher Weisheit"', VTSupp13, 1955, 225-237. - W. O. E. OESTERLEY, TheWisdom of Egyptand
ASPECTOS GERAIS
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~~e Old Tesiameni, 1927. - E. ÜTIO, "Bildung und Ausbildung im alten Agypten", ZAS 81 (1956), 41-48. - J. PATERSON, The Wisdom of Israel, 1960. - G. VON RAO, "Die altere Weisheit Israels", Kerygma und Dogma 2 (1956),54-72. - O. S. RANKIN, lsrael's Wisdom Literaiure, 2il ed., 1954. - H. RrNGGREN, WordandWisdom, 1947. - J. C. RYLAARSOAM, Revelation inJewish Wisdom Literature, 1946. - Les Sagesses du Proche-Orient ancien, 1963. G. SAUER, DieSprüche Agurs, 1963.- W.VON SOOEN, "Leistungund Grenze sumerischer und babylonischer Wissenschaft", Die Welt als Geschichte 2 (1936),411-464,509-557. - lo., Zweisprachigkeit in der geistigen Kultur Babyloniens, 1960. - W. ZIMMERLI, "Zur Struktur der alttestamentlichen Weisheit", ZAW 51 (1933), 177-204.
1. O conceito Quando interpreta o sentido da raiz hebraica hakam (LXX: sophía, sophós), a ciência do Antigo Testamento fala de uma doutrina e de uma literatura sapienciais, mas com isto não atenta satisfatoriamente para a amplitude e o significado da expressão hebraica, nem para o seu verdadeiro sentido. Com efeito, esse termo significa, de um lado, habilidade manual e artística (Ex 31.3 etc.), a arte de governar (Jr 50.35; Is 10.13), a arte da magia e da adivinhação [mantikê] (Gn 41.8; Is 44.25 etc.), a velhacaria astuta e manhosa (25m 13.3; [ó 5.13). Por outro lado, no conhecimento, que aí se pressupõe, não se trata de um modo teórico de resolver os problemas da vida e do mundo, mas de achar soluções de ordem prática, a partir de exigências concretas, diante das quais Deus ou o homem se vêem colocados. A "sabedoria" é um modo de proceder e de agir com prudência e reflexão, com conhecimento de causa e com habilidade. É através dele que a pessoa se integra na ordem universal para se apoderar do mundo e para dominar as tarefas que a vida impõe, e, por fim, para dominar a vida também. A sabedoria se ocupa com a vida em toda a sua extensão e atua em todos os domínios da existência, de modo que, por sabedoria, se entende a prudência e a capacitação para um desempenho de ordem prática. O termo leb, "coração", que aparece freqüentemente, exprime esta prudência e esta capacitação, que podem brotar da consciência de como se deve agir corretamente e em conformidade com a ordem universal, e podem ser desenvolvidas pelo conhecimento da tradição, pela edução ou pela própria experiência. O contrário de tudo isto é uma desordem correspondente, implantada no centro vital do homem e que se faz sentir, antes de tudo, em seu comportamento e também nos seus desatinos e em suas atitudes arrogantes.' 1
Cf,
também W. CASPARI, "Über den biblischen Begriff der Torheit", NkZ 39 (1928),
668-695.
§ 46. A DOUTRINA SAPIENCIAL NO ANTIGO ORIENTE EEM ISRAEL
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2. Mesopotâmia Na Mesopotâmia falta um termo correspondente ao hebraico': mas, apesar disso, desenvolveu-se uma vasta literatura sapiencial que, embora existindo sob uma forma principalmente acádica, remonta, todavia, até longe, nas tradições sumérias. Conservou-se sobretudo grande número de coleções de provérbios, algumas vezes como textos escolares, e ordenados geralmente segundo o primeiro sinal gráfico das frases." Textos mais recentes se ocupam com questões éticas e transmitem conselhos práticos para se levar uma vida de conformidade com a ordem universal e, conseqüentemente, uma vida que será bem sucedida.' ou abordam os problemas que decorrem precisamente desta ordem universal," de sorte que alguns desses provérbios foram considerados muitas vezes como precursores do livro de Já. Na literatura sapiencial também costuma incluir-se as fábulas, as disputas e outros textos mesopotâmicos, cujo gênero literário algumas vezes é difícil de determinar.s O papel de ME em sumérico, como conceito central, suposto por VAN DIJK 17-21, torna-se duvidoso, em face da crítica de T. FISH em JSS 1 (1956), 286-288. O termo babilônico nemequ, sabedoria, e vários adjetivos são utilizados para indicar habilidade e destreza no culto e na magia, de sorte que o texto: Eu quero louvar o Senhor da Sabedoria, designa o deus Marduk, enquanto conhecedor profundo dos ritos; cf. LAMBERT 1. É provável que o termo acádio hakãmu, compreender, entender, seja um empréstimo de origem semítico-oriental, tendo sido adotado como expressão técnica. 3 E. I. GOROON, "The Sumerian Proverb Collections", JAOS 74 (1954), 82-85. - Io., "Sumerian Proverbs: 'Collection Four'", ibid. 77 (1957), 67-79. - Io., "Sumerian Proverbs and Fables ('Coll. Five")", JCSt 12 (1958), 1-21, 43-75. - In., Sumerian Prooerbs, 1959. - S. N. KRAMER, "Forty-eight Proverbs and their Translation", em: Troisiême Rencontre Assyriologique, 1954, 75-84. - LAMBERT, 275-282. A respeito da colocação dos textos pela ordem dos caracteres escritos, cf. Pr 11.9-12 e os critérios dos salmos alfabéticos (§ 39,6), que, entretanto, não constituem coleções. 4 Entre estes se enumeram os textos transcritos por LAMBERT nos capítulos 4-5: Ensina2
mentos de suruppak; Conselhos da Sabedoria; Conselhos de um Pessimista; Conselho a um Príncipe; Hino a Ninurta; Hino de Shamash. 5 Entre estes se contam os textos transcritos por LAMBERT nos capítulos 2-3: o Poema do Justo sofredor (ludlul bel nêmeqi) e a Teodicéia babilônica, e talvez também o Diálogo sobre o Pessimismo. 6 Cf., p.ex., as fábulas e textos provenientes de discussões, transcritos por VAN DIJK 2985 e por LAMBERT no capítulo 7. Além destes, também: E. EBERLING, die babylonische Fabel und ihreBedeutung für die Literaturgeschichte, 1929. - J. JOHNSTON, "Assyrian and Babylonian Beast Fables", AJSL 28 (1912), 81-100. - J. NOUGAYROL, "Une fable
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ASPECTOS GERAIS
Os mesmos círculos de colecionadores aos quais devemos os provérbios, criaram também a ciência suméria das listas com suas coleções de termos, ciência esta que pretendia chegar a uma sistematização de todo o mundo objetivo e empírico. Esta sistematização não era exposta de modo racional, mediante o emprego prático das listas, em salas de aula etc., mas descrita plasticamente, através das narrativas de mitos e outras poesias, que falavam da criação ou da restauração da ordem criada, partindo de uma situação de caos, de sorte que as referidas listas substituíam sistematicamente as poesias paradigmáticas e pretendiam apossar-se do mundo por meio da ordenação dos nomes. Os babilônios e assírios deram continuidade a estas listas e fundaram um ramo da doutrina sapiencial, a saber, o da sabedoria educacional, que recebeu sua forma definitiva particularmente na série HAR-ra ihubullu}, com vinte e quatro tabuletas e milhares de anotações."
3. Egito No Egito, a norma de comportamento que a doutrina sapiencial deve proporcionar é indicada pelo termo maat, cuja melhor tradução é "direito, retidão, ordem primordial, ordem universal"." A finalidade da doutrina sapiencial é preparar o caminho para esta ordem, que emana da divindade e vale para todo o mundo, transmitindo-a e aplicando-a a cada nova situação. Sem abstrair da própria experiência, que desempenhava um grande papel também na doutrina sapiencial do Antigo Testamento, os sábios egípcios se consideravam como fiéis transmissores de uma retidão que sempre foi válida e sempre existiu (cf, Is 19.11: discípulos dos sábios e dos reis de outrora). Desde que a maat é uma realidade imutável e vale na hittite", RHA 18 (1961), 117-119. - E. WEIDNER, "Z ur Tierfabel-Sammlung aus Assur",
AfO 16 (1952/1953), 80. - Para o Egito: E. BRUNNER-TRUAT, "Der Katzenmãusekrieg im Alten und Neuen Orient", ZDMG 104 (1954), 347-351. - Io., Âgyptische 11
Tiermârchen", zAs 80 (1955), 5-11. - Io., "Altãgyptísche Tiergeschichte und Fabel", Saeculum 10 (1959), 124-185. - R. WÜRFEL, "Die âgyptische Fabel in Bildkunst und Literatur", WZ Leipzig 2 (1952/1953), 63-77. 7 E. CHIERA, Sumerian Lexical from the Temple School of Nippur, 1929. - F. CH. JEAN, Lexicologie sumérienne, 1931. - L. MATOUS, Die lexikalilischen Tafelserien der Babiloneir und Assyrier in de Berliner Museen, I 1933. - B. MEISSNER, "Ein Vokabularfragment aus Assur", Archiv für Keilschriftforschung 1 (1923),51ss. 8 Cf. R. ANTHES, Die Maat des Echnaton von Amarna, 1952. - Também BRUNNER 93-96 e GESE 11-21.
§ 46. A DOUTRINA SAPIENCIAL NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL
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mesma proporção e imutavelmente para cada pessoa dentro de um determinado grupo social, a tarefa do homem consiste em se integrar nela e a ela se submeter. O ideal deste homem é o "silencioso" ou "o silencioso justo", que se orienta pela maat, que se domina e se contém em todas as situações e evita toda agitação - ao contrário do "inflamado", do homem que não se domina e vive entregue às suas concupiscências. A cada comportamento corresponde um resultado preciso, em que o fruto da ação e sua verdade" intrínseca" são considerados como constituindo uma única realidade, ou em que as normas comportamentais se justificam à luz do útil e do prejudicial ou se mencionam a sua vinculação com a vontade divina e, concomitantemente, a recompensa ou o castigo merecidos. Considerando-se que o termo maat abrange os domínios da ordem do cosmos e da ordem existencial do homem, bem distintos no pensamento moderno, a literatura sapiencial é constituída principalmente de dois gêneros literários: a ciência das listas onomásticas," que foi influenciada provavelmente pela ciência suméria das listas, e os "ensinamentos" ou "instruções", sob forma fixa,'? das quais sete se conservaram inteiras, ou quase inteiras, cinco foram transmitidas através de fragmentos e seis ou sete são conhecidas apenas pelos títulos.'! Além destes, existem também alguns escritos que podem ser considerados como de tipo reflexivo ou como literatura polêmica."
9
A. H. GARD1NER, Ancient Egyptian Onomastica, 1947. - H. GRAPOW, "Wõterbücher, Repertorien, Schülerhandschriten", em: Handbuch der Orientalistik, I, 2 1952, 187-
193. 10
11
O termo egípcio tem também o significado de "educação", "instrução" e doutrina teológica. O título, via de regra, tem a seguinte formulação: "Começo da Doutrina, que A escreveu para seu filho (discípulo) B". Cf. a descrição em BRUNNER 96-110 (com bibliografia): Ensinamento de Imhotep; Ensi-
namento do Príncipe Diedefhor; Ensinamento para Kagemmi; Ensinamento de Ptahhotep; Ensinamento para o Rei Merikare; Ensinamento para o Rei Amenemhêt; Ensinamento de Kheti - filho de Duauf; Ensinamento de Anii; Ensinamento de Amenemope; Ensinamento doPapiro Insinger. - Também: B. GEMSER, "The Instructions of "Onchsheshonqy and Biblical Wisdom Literature", VTSuppl7, 1960, 102-128. -G. POSENER = J. 5AINTE FARE GARNOT, "Sur une 5agesse égyptienne de basse époque", em: Les Sagesses du ProcheOriente ancien, 1963, 153-157. 12 E. OITo, "Weltanschauliche und politische Tendenzschriften", em: Handbuch der Orientalistik, I, 2 (1952, 111-119, inclui entre eles os seguintes: as Exortações de um Sábio; Diálogo do Desesperado daVida com suaAlma;Ensinamento para o ReiMerikar«; as Profecias de Nefer-rehu; as Queixas de Kha-kheper-Re-seneb; as Queixas do Camponês; o Ensinamento para o Rei Amenemhêt, o Papiro Harris I e a chamada Crônica demótica.
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ASPECTOS GERAIS
4. No restante do Antigo Oriente Do restante do Antigo Oriente não existem tradições sapienciais, e se existem, são de menos importância." Mas em Israel sabia-se da existência de uma" sabedoria" entre outros povos: entre os edomitas" (Ir 49.7; Ab 8), os "habitantes do Oriente", na região de Safá, situada na Transjordânia setentrional (lRs 5.10 [Vulgata: 4,31], e, não por último, entre os cananeus, que devem ter exercido sua influência sobre Israel também neste domínio." Se Ez 28.3,17 se refere genericamente aos fenícios, Ez 27.8 se refere diretamente a semer, que provavelmente seria Sumra (ao norte de Trípolis, e não muito distante de Arvad) e Zc 9.2 a Sídon. A dependência da doutrina sapiencial de Israel com relação àquela do Antigo Oriente vai além do simples conhecimento e da simples influência: atinge os próprios textos transmitidos do AT. Do mesmo modo como Pr 22.17-23.11 foi extraído da doutrina egípcia de Amenemope e 23.13s da doutrina de Aicar, assim também 30 e 31.1-9 provêm de pessoas que pertenciam a determinadas nações ou tribos sírio-palestinenses (§ 49,4.7.8).
5. Israel Embora a doutrina sapiencial cultivada em Israel tenha suas raízes em diversos setores do Antigo Oriente, contudo, o seu caráter peculiar é ainda verificável, podendo ser captado nos vários estágios de sua evolução histórica. 13
A sabedoria de Aicar, apesar de sua versão siríaca e aramaica, deve remontar a uma forma assíria original, AOT 454-462. - ANET 427-430. - B. MEISSNER, Das
Miirchen vom weisen Achiqar, 1917. R. H. PFEIFFER, "Edomitic Wisdom", ZAW 44 (1926), 13-25, superestima a sua influência sobre Israel. - lo., "Wisdom and Vision in the OId Testament", ibid. 52 (1934), 93-101. 15 Os autores seguintes procuram demonstrar, às vezes exageradamente, o fato dessa influência, ainda que apenas no campo da linguagem: W. F. ALBRIGHT, "Some Canaanite-Phoenician Sources of Hebrew Wisdom", VT5upp 3,1955,1-15. - M. J. Dxnooo, "Canaanite-Phoenician Influence in QoheIeth", Bib133 (1952), 30-52, 191221. - lo., "Some Northwest-Semitic Words in Job", ibid. 38 (1957), 306-320. - lo., "QoheIeth and Northwest Semitic PhiloIogy", ibid. 43 (1962). - lo., "Northwest Semitic PhiloIogy and [ob", em: The Bible in Current Catholic Thought, 1962,33-74.CH. L. FEINBERG, Ugaritic Literature and the Book of Job, Diss., Baltimore, 1954. - G. SAUER, Die 5prüche Agurs, 1963. - C. 1. K. STORY, "The Book of Proverbs and Northwest-Semitic Literature", JBL 64 (1945), 319-337. 14
§ 46. A
DOUTRINA SAPIENCIAL NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL
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Sempre existiu um conhecimento empírico e prático de determinadas leis que regem a ordem universal e as atividades da vida. A tarefa que se impõe ao homem, no sentido de dominar o seu meio ambiente e de dirigir a própria vida do seio do mesmo, traz consigo a necessidade de procurar descobrir uma certa ordem e uma certa regularidade nos fenômenos e acontecimentos, para poder se integrar nelas. Isto se verifica sobretudo nos provérbios, que simplesmente registram conhecimentos e experiências da vida e deixam ao homem o encargo de extrair deles as conseqüências para o seu comportamento (lSm 24.14; Pr l1.2a; 16.18; 18.12), sendo que a constatação pode ser também de natureza paradoxal (Pr 11.24; 20.17; 25.15; 27.7). Deste modo procura-se determinar o quadro e os limites dessa ordem, sem, contudo, reduzi-la a um princípio universal, nem criar um sistema. O significado de tais provérbios aparece no fato de que muitos deles foram ampliados posteriormente com uma segunda linha na qual se registra uma situação de correspondência que atinge o homem (Pr 25.23; 26.20; 27.20), como aparece também no fato de que o Eclesiastes (Coélet) se serviu deles, para, com eles, corroborar seus pontos de vista (§ 51,5). A doutrina sapiencial propriamente dita nasceu durante o reinado de Salomão, contemporaneamente à fase de aperfeiçoamento do Estado, na corte real e nos círculos dos funcionários que se tornavam numerosos, e foi cultivada na escola sapiencial, cuja existência se deve presumir, pelo menos em jerusalém." Daí ser preciso distinguir entre uma sabedoria da corte e uma sabedoria popular ("sabedoria dos clãs"). A notícia de 1Rs 5.12-13 [Vulgata: 4,32-33] a respeito de Salomão nos permite ter uma visão retrospectiva mais aproximada acerca da sabedoria cultivada - no palácio real: Ele pronunciou três mil provérbios, eseus cânticos foram em número de mil e cinco. Ele falou das árvores, desde o cedro que está no Líbano, até o hissopo que cresce nos muros; falou também dos animais, das aves, dos répteis e dos peixes. Se Salomão, a partir daí, aparece para a posteridade como o sábio por excelência, é porque, evidentemente, a notícia lhe atribui pessoalmente aquilo que se refere ao período de seu reinado e liga erroneamente provérbios e cânticos com os números elevados. Se bem considerarmos o que acabamos de expor, teremos diante de nós os dois tipos de doutrina sapiencial, que também se verifica na Mesopotâmia e no Egito, a saber:
16
Dúvidas levantadas por R. B. Y. ScOTI, "Solomon and the Beginning of Wisdom in Israel", VT5uppl 3, 1955, 262-279.
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ASPECTOS GERAIS
1) uma ciência das listas, contendo, respectivamente, listas de mil e cinco e de três mil palavras-chaves, e deduzível a partir do fato de que aí se mencionam os reinos vegetal e animal, uma ciência que melhor se chamaria de sabedoria didática e, ao mesmo tempo, de sabedoria da natureza, porque se ocupa com simples fenômenos da natureza; 2) uma sabedoria existencial, que se pode deduzir da distinção que se faz entre provérbio e cântico; sabedoria, portanto, que ensina as normas de comportamento. Também no séc. VIII é a "sabedoria" que constitui a formação e a doutrina moral do corpo de funcionários em sentido mais amplo. Em Jerusalém vivia-se e se governava de acordo com os seus princípios, como se deduz da polêmica de Isaías contra os "sapientes", que apresentavam uma conduta prudente apenas na aparência, mas perniciosa na realidade Os 5.20s; 29.14; 31.1-3). Que esta doutrina fosse da maior importância para a vida pública mostra-no-lo também o título de Pr 25.1. A partir do final do séc. VII os conceitos são tomados em sentido mais amplo: ao lado dos "sábios" propriamente ditos (Jr 18.18), também os sacerdotes (Ir 8.8s), as autoridades menores (Dt 1.13,15) e responsáveis pela administração da Justiça (Dt 16.19) recebem esta denominação. Começa assim a evolução que na época pós-exílica iria transformar aquilo que era a formação cultural e moral de funcionários, em um assunto que interessaria a círculos mais vastos, e que faria surgir uma classe de mestres de sabedoria (Eliú, em [ó 32-37; Eclesiastes [Coéletl). Desde a época de Salomão, esta doutrina tem por base um ideal de formação cultural e moral do homem todo, para o qual ela procura educar, partindo do conhecimento da ordem e da regularidade que determinam o mundo e a existência, ou seja: o ideal do homem calmo de espírito (ou que se domina), (Pr 17.27), magnânimo (14.29), de coração tranqüilo) que não cede à paixão devoradora (14.30), como o homem iracundo (15.18) e irascível (14.29). Por fim, deu-se um último passo, na época pós-exílica, quando o conceito de sabedoria foi submetido a uma reflexão teológica e inserido num sistema teológico mais amplo. A sabedoria foi entendida como apelo de Deus ao homem, como mediadora da revelação, como educadora de Israel e dos povos, e mesmo como o princípio implantado no coração do mundo, no momento da criação. O pensamento teológico foi unificado e concentrado no conceito genérico de sabedoria, como se vê especialmente em Pr 1-9 e [ó 28, provavelmente com base "em um mito gnóstico,17 e alusi17
Cf. FOHRER 490-492, com ampla bibliografia sobre o problema de uma personificação ou hipostasiação da Sabedoria.
§ 46. A
DOUTRINA SAPIENCIAL NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL
433
vamente também nos discursos de Eliú, no livro de Jó, e de todo claramente na ligação ou identificação que se faz entre sabedoria e Lei, como acontece nas poesias didáticas (§ 47,5) e em Eclo (Sir.)24. Este sistema evidentemente devia também provocar críticas, não por causa da ausência de uma teologia da história, cuja significação para Israel é antes superestimada, mas por causa da doutrina da retribuição e, afinal, pura e simplesmente por causa da presença do sistema. Testemunhas destas críticas são os livros de [ó e do Coélet (Eclesiastes). O que distingue a doutrina sapiencial de Israel daquela do Antigo Oriente é, em primeiro lugar, sua nacionalização e sua incorporação ao caráter étnico de Israel, de modo que ela perde sua vinculação classista e se volta para o que há de universal no homem, para além de todas as barreiras sociais, e se adapta, até nas particularidades, à situação de Israel na Palestina. Em segundo lugar, ela se subordina, de forma ascendente, à fé javista e, por este modo, transforma um bom senso universal e supra-religioso em uma espécie de suma de instruções ético-religiosas, e mesmo em moldura de um determinado sistema teológico. Correspondentemente, usa-se muitas vezes o nome de Javé em vez da denominação genérica de Deus, divindade, e se considera a atitude religiosa do temor deJavé como o começo da sabedoria.
6. Importância da doutrina sapiencial A despeito das críticas levantadas contra a teologia sapiencial da fase tardia, a importância da doutrina sapiencial está no fato de que ela contrapõe a dignidade do aspecto moral à superioridade dos punhos cerrados ou das inteligências ladinas e habilidosas, e que sua crença na retribuição faz valer a dignidade do direito contra a superioridade de uma dissimulação consumada ou de um aparelho manobrado pela desconfiança. Ela é religião prática presente em todos domínios da atividade quotidiana, isto é, no comportamento ético correto, onde o culto desempenha papel diminuto." A ordem universal e a ordem existencial, nas quais o homem deve inseriropinião de G. VON RAo, Theologie des Alten Testaments, I, 1957 W ed., 1952),431 [em port.: Teologia do Antigo Testamento, São Paulo, 2006, ASTE/Targumim), de que o indivíduo instruído era, sem mais, membro da comunidade cultual, e de que a sabedoria era o que pautava sua vida fora do culto, parte do pressuposto não demonstrado de que o sábio estava incorporado à comunidade cultual e envolvido pelos compromissos referentes ao culto. Além disso, a doutrina sapiencial, cada vez que menciona o culto, em geral assume para com ele uma atitude crítica
18 A
434
ASPECTOS GERAIS
se e segundo as quais deve orientar-se, foram estabelecidas e são mantidas por Deus. Por isso é que ele concede a felicidade e o bom êxito aos "sábios", como frutos de bênção e de salvação, enquanto aos estultos e aos malfeitores ele confere a infelicidade, não em virtude de um mecanismo que age por si mesmo, mas segundo sua justiça retributiva. Esta concepção encerra, evidentemente, um aspecto utilitarista e eudemonista. Não é sem uma razão qualquer que muitas vezes se ponderam as vantagens de ser justo (Já 22.2s; 35.6-8). O bom senso e a habilidade inculcados pela doutrina sapiencial não brotam somente de uma atitude fundamental, isto é, do conhecimento da existência de determinadas ordens e regularidades, mas aspiram também a um fim e a um resultado bem determinados: assenhorear-se do mundo e dominar a existência, ao mesmo tempo em que se submete à ordem e nela se integra. É para assumir esta espécie de comportamento que os amigos de Já repetidamente o convidam. Mas, ao contrário do que acontece com o puro utilitarismo, não existe nenhuma diferença ou contradição essencial entre o valor "intrínseco" da ação, que se encontra no seio do agir ou do comportamento em si, e o êxito "exterior": os dois são uma só e mesma coisa. Por isso, o sábio que teme a Deus pode esperar obter o êxito em plenitude (Já 26.3).
§ 47. OS GÊNEROS LITERÁRIOS DA DOUTRINA SAPIENCIAL E SUAS TRADIÇÕES G. BOSTROM, Paronomasi I dendlder Hebreiska Maschalliteraturen, 1928. - ID., Proverbiastudien, 1935. - O. EISSFELDT, DerMaschal im Alten Testament, 1913. - A. H. GODBEY, "The Hebrew masal", AJSL 39 (1922/23), 89-108.A. S. HERBERT, "The 'Parable' (mãSãD in theOld Testament", SJTh 7 (1954), 180-196. - A. R. JOHNSON, "Mãsãl", VTSuppl 3,1955, 162-169. - J. PIROT, "Le 'Mãsãl' dans l' Ancient Testament", RSR 37 (1950), 565-580. - J. ScHMIDT,
Studien zur Stilistik deralttestamentlichen Spruchliteratur, 1936.
1. Mashal A unidade elementar do modo de falar ou da forma literária da doutrina sapiencial é o aforismo enquanto provérbio ou sentença. Ambos são (cf. Pr 15.9,29; 20.25; 21.3,27; 28.9; 30.1), colocando o acento mais na qualidade daquele que pratica o culto, do que na ação cultual, e afirmando, por fim, que o que importa é a oração e não o sacrifício. Cf. também FITCHTNER 41s.
§ 47. Os GÊNEROS LITERÁRIOS DA DOUTRINA SAPIENCIAL E SUAS TRADIÇÕES
435
designados pelo termo mãsãl, empregado em sentido muito amplo e que pode ir do provérbio à poesia didática, das expressões populares aos discursos didáticos dos sábios, e das admoestações mais sérias ao cântico satírico. Inicialmente talvez significasse dito mágico ou palavra de ordem. Daí vem que nem toda sentença é um mashal, mas somente aquela que tem o poder de produzir uma realidade nova, ou o poder de fazer reconhecer uma experiência vital do povo ou dos sábios, e de impô-la como realidade válida."
2. Provérbio Como acontecia em todo o Antigo Oriente, também Israel conheceu e utilizou o provérbio que se formulava para fixar as experiências e os conhecimentos a respeito de uma ordem e das leis que regulam o universo e a existência. Esse tipo de provérbio não é propriamente israelítico; a única particularidade que ocorre é ele ter sido inserido na fé javista. Numerosos provérbios, facilmente identificáveis pelo tom, exprimem experiências humanas de caráter universal (lSm24.14; 1Rs 2ü.11;Jr 23.28;Ecl9.4). Muitas vezes o provérbio deriva de uma determinada situação histórica, e foi incorporado, depois de ser revestido em uma fórmula (2Sm 5.8). Muitos provérbios foram redigidos em prosa, mas com o correr do tempo, a forma rítmica prevaleceu (Ez 18.2). Do ponto de vista do conteúdo, deu-se um passo avante, com sua incorporação à fé javista. O provérbio assume um caráter religioso, elucida determinadas vinculações religiosas da existência (Pr 10.6,11),e pode relacionar-se expressamente com Javé (lSm 16.7). A recusa à fé em Javé pode, evidentemente, servir-se dessa forma literária, para exprimir suas idéias (Sf 1.12).
3. O provérbio enigmático e o provérbio numérico O provérbio enigmático ou o enigma propriamente dito, designado pelo termo hidã, está relacionado com o provérbio popular, mas foi assumido pela doutrina sapiencial. Em Pr 1.6 foi pura e simplesmente identificado com a sentença." Originariamente o enigma exprime, com 19
HEMPEL*
20
O.
44.
EISSFELDT, "Die Rãtsel in jdc 14", ZAW30
(1910), 132-135. - J. R. PORTER, "Samson's XIV, 18", JThSt NS 13 (1962),106-109. - H. ScHMIDT, "ZuJdc 14", ZAW 39 (1921),316. - N. H. TORCZI'NER, "The Riddle in the Bible", HUCA 1 (1924), 125-149. Riddle: Judges
436
ASPECTOS GERAIS
freqüência, o segredo de uma comunidade, como também a sua solução; justifica o segredo da existência de um ser sobre-humano (como, p.ex., o da esfinge), ou, em geral, indica a presença de um poder oculto, cuja essência penetra aquele que resolve o enigma. Por isso organizamse torneios acerca de enigmas em que se decide da vida e da morte, ou como demonstração de poderio, sendo este último tipo pronunciado por ocasião de iniciações, da procura de uma noiva, ou durante uma festa de casamento. Um desses enigmas, segundo [z 14.14, é proposto por Sansão na celebração de suas núpcias. O fato de a rainha de Sabá ter submetido Salomão a uma prova de força com enigmas (lRs 10.5) corresponde ao antigo significado do enigma. Em épocas posteriores, a solução de enigmas tornou-se apenas uma espécie de brincadeira (cf. 3 Esd 3s; Carta de Aristéias § 178-300). Apesar disso, Daniel ainda é descrito, por este método, como alguém dotado de poder especial (Dn 5.12), que adivinha inclusive o conteúdo do sonho esquecido pelo rei. Uma maneira de falar semelhante é o provérbio numérico, que talvez tenha surgido em âmbito cananeu, como o fazem supor o texto ugarítico 51 III, 17-21 e a sua ausência no restante do Antigo Oriente, provérbio este que foi assumido e aperfeiçoado por Israel." No primeiro membro do verso indica-se um número e no segundo membro, o número imediatamente superior, ao qual se segue a enumeração de uma série de objetos, correspondendo ao último número indicado. Pensa-se naturalmente que este tipo de provérbio tenha surgido da pergunta enigmática e que a pergunta originariamente colocada em forma de enigma servia principalmente como recurso didático da sabedoria educacional. Posteriormente a sabedoria existencial se utilizou desta modalidade de provérbio, unindo aí o enigma e a doutrina. No AT encontram-se exemplos deste provérbio, como em Pr 6.16-19; 30; SI 62[61],12; Já 5.19-22 etc.). Expressões em forma de provérbios numéricos são Am 1.3ss; Já 33.14s. 22
21
22
A. BEA, "Der Zahlenspruch im Hebrãischen und Ugaritischen", Bib121 (1940), 196198. - D. Buzv, "Les machals numériques de la sangsue et de I' 'almah", RB 42 (1933),5-13.- W. M. W. ROlH, "lhe Numerical Sequence X/X + 1 in the OId Testament", VT 12 (1962), 300-311. - G. SAUER, Die Sprüche Agurs, 1963. - W. B. STEVENSON, "A Mnemonic Use of Numbers in Proand Ben Sira", Transact. Glasgow Univ. ar. Soe. 9 (1938/1939), 26-38. - F. STUMMER, Der kritische Wert der aliamarãischen Ahikartexte aus Elephantine, 1914. Cf. também Ec10 23.16; 25.7-11;26.5,28;50.25s, e o tratado da mishná Pirqê Abôt 5,1-15.
§
47. Os GÊNEROS LITERÁRIOS DA DOUTRINA
SAPIENCIAL E SUAS TRADIÇÕES
437
4. A sentença A sentença ou máxima sapiencial artística já não é mais um falar popular, embora nela certos elementos de fundo popular tenham sido utilizados depois de revestidos de uma forma ritmada, mas sim uma produção artística, quando não artificiaL A sentença aparece freqüentemente em forma metrificada, tal como correspondia ao significado original do mashal enquanto palavra poderosa e eficaz, como correspondia também à finalidade de facilitar a aprendizagem por parte do aluno, e foi elaborada pelo menos desde a época de Salomão. A existência de provérbios que falam dos reis (Pr 16.10; 22.29; 25.2s, et passim) e a compilação de provérbios ao tempo de Ezequias (Pr 25.1) indicam a época da monarquia. Se o sábio desse período era, por assim dizer, o funcionário da corte, possuidor de uma formação acadêmica, é porque posteriormente havia surgido uma classe de mestres de sabedoria, ao lado da classe dos sacerdotes e profetas (Ir 18.18), depositários da sabedoria da vida que encontramos expressa nas sentenças. Naturalmente, muitos elementos estrangeiros entraram nelas, tendo contribuído para isto, de modo considerável, os forasteiros que se achavam a serviço do rei e também os israelitas que haviam estado fora, em outros países, e depois voltavam à pátria.
A sentença pode ter sido construída sob a forma de afirmação direta (Pr 10.Iss) e sob a forma de máxima impírica (24.30ss), ou como exortação (3.9) e como pergunta (6.27). O verso longo de dois membros se sobrepõe à estrutura unilinear do provérbio (§ 5),e quando isto acontece, prevalece a forma antitética (10.2).23 Na forma sinônima, o segundo membro muitas vezes sublinha a "moral" do primeiro membro, quando este é figurativo (Belo 13.1). Na forma sintética, o segundo membro tende a explicitar a imagem empregada no primeiro (Pr 10.26). O segundo membro, às vezes, é tão inexpressivo e tão pouco adequado, que parece ter sido acrescentado apenas por razões de ordem estilística (12.11). Além disso, uma sentença pode ser ampliada mediante uma justificação que se acrescenta (25.21s) ou mediante várias frases parecidas, que pouco ou nada de novo acrescentam sob o ponto de vista do conteúdo (6.20-21,23). O Eclesiastes (Coélet) desenvolveu uma forma própria de sentenças (§ 51,5). O uso dos sinônimos (17.21), juntamente com o processo da enumeração (24.25) e da repetição (3.11); a paranomásia, juntamente com a assonância (11.2), com a aliteração
23 Cf. o quadro sinótico em SKLANY (§ 49) 67s.
438
ASPECTOS GERAIS
(8.27) e com o jogo de palavras (6.25); o exemplo (24.30ss) e a comparação (15.11), bem como a rima (11.2; 12.25) funcionam como explanação no interior da sentença.
5. A poesia sapiencial e didática Nos 5149[48],5; 78[77],2 os poetas classificam esses dois salmos como mashal. Com este termo, eles designam a existência de mais um gênero literário, que é a poesia sapiencial e didática, na qual os mestres de sabedoria exprimiam ao mesmo tempo suas reflexões e suas exortações. Para a problemática da história das formas é de importância estabelecer uma comparação entre as poesias de [ó 18.5-21 e 20.4-29, que tratam, ambas, do destino dos maus. Enquanto na primeira deparamos com uma composição completa em si, a segunda nos mostra como surgiu uma poesia através da justaposição de sentenças isoladas ou de grupos de sentenças, resultando daí uma impressão global ainda sem homogeneidade. Muitas vezes incorporaram-se sentenças originariamente autônomas, sem, entretanto, se fundirem no contexto (20.lO,16,24s). Também o SI 37[36],16 é uma destas sentenças no interior de um poema. Neste salmo e no SI 112[111], a forma alfabética (§ 39,6) favorece a colocação. Além de [ó 18, encontramos também outros poemas que desde o início formavam um conjunto completo: Pr 8.1-36: apresentação que a Sabedoria faz de si mesma como mestra de doutrina; 9.1-18: convites dirigidos pela Senhora Sabedoria e pela Senhora Loucura para o seu banquete; [ó 28: inacessibilidade da sabedoria. Em todos estes casos se trata de textos recentes da época pós-exílica. A isto se acrescentam alguns salmos que representam poesias sapienciais ou didáticas." Os Salmos 37[36]; 49[48]; 73[72], e 91[90] têm isto em comum, que eles foram suscitados pelo problema da felicidade dos maus e da infelicidade dos justos, precisamente em razão da crença na retribuição, que é o suporte da sabedoria a respeito da vida, e que, em resposta à questão lançada pela doutrina, lembram que o mau afinal perecerá e o justo será salvo por Deus, ou apelam com um "não obstante" de sua fé para a comunhão com Deus, que se sobrepõe a todas desgraças. No SI 78[77] o poeta interpreta o sentido da história de Israel para a orientação da existência de seus leitores (cf. também SI 105[104]; 106[105]). Nos Salmos 1 e 128[127] a expressão introdutória 'asrê, "feliz o homem", que 24
S. MOWINCKEL, "Psalms and Wisdom", VTSupp13, 1955,205-224.
§ 47. Os
GÊNEROS LITERÁRIOS DA DOUTRINA SAPIENCIAL E SUAS TRADIÇÕES
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encontramos em 51127[126],5, lembra a literatura sapiencial. Essa expressão ocorre exclusivamente nesta literatura e constitui a contrapartida do voto de felicidade barük, que se pronunciava no culto. Estes poemas surgiram de fórmulas salvíficas da doutrina sapiencial (p.ex., [ó 5.17). A introdução do 51133[132]: Vede como é bom e agradável é característica da literatura sapiencial. Os salmos alfabéticos 34[33]; 111[110] e 112[111] foram influenciados, no mínimo, pela sabedoria, e talvez se incluam entre os poemas sapienciais. Certos salmos de exaltação à Lei, como 19[18],8ss e 119[118], revelam uma influência da teologia sapiencial posterior.
6. A parábola, a fábula e a alegoria Um dos gêneros literários em prosa é a parábola, que surgiu da comparação, muito freqüente nas sentenças." Aquela que melhor ilustra o seu caráter peculiar é a parábola da ovelha do pobre, narrada por Natã a Davi depois do crime deste com Betsabéia (25m 12). Além disso, ela aparece, não poucas vezes, também nos ditos proféticos tp.ex., em Is 28.4b). A fábula é uma poesia ou uma narrativa de caráter didático, que extrai seu material da vida dos animais e das plantas e exprime uma verdade ou uma crítica real, de forma velada, em vez de uma discussão aberta, ou invectiva, pelo mesmo processo, também pessoas malquistas, classes e instituições." Afora as fábulas sumérias e assírio-babilônicas existem também representações figurativas de animais no Egito e na Mesopotâmia setentrional do segundo milênio, as quais supõem as fábulas de animais. No AT encontramos a fábula de [oatão (Jz 9.8-15), que escarnece da realeza inútil, nociva mesmo, e em [z 9.16-20 é utilizada com nova função, como advertência contra Abimelec. Existe também a fábula do rei [oás (2Rs 14.9) que adverte o povo como um todo contra a soberba, e em 14.10 é aplicada ao rei Amasias. Como prova de sua popularidade está o fato de sua influência sobre outros gêneros literários, como, p.ex., a parábola, em que aparecem juntos o homem e a natureza Os 5.1-7; 10.15; 29.16; 45.9; Jr 18.1-11), a lenda (Jn 2.1,11; 4.5ss) e a alegoria (Ez 17.1-10; 19.1-9; 31.1-18). 25
C. E. MACARTNEY, The Parables Df the Old Testament, 2il ed., 1955.
Israels Spruchweisheit im Zusammenhang der Weltliteratur, 1925. - H. Das Miirchen im Alten Testament, 1921. - K. MEULI, Herkunft und Wesen der Fabel, 1954. - R. J. WILLIAMS, "The Fable in the Ancient Near East", em: IrwinFestschrift, 1956,3-26. - A. WüNSCHE, Die Pflanzen-Fabel in der Weltliteratur, 1905.
26 H. GRE55MANN, GUNKEL,
440
ASPECTOS GERAIS
A alegoria consta de uma série de metáforas, cada uma das quais é importante e deve ser interpretada em si mesma, e onde freqüentemente são personificados seres inorgânicos ou idéias abstratas, como, p.ex., a Sabedoria e a Loucura. Uma alegoria mais extensa é a descrição das idades do homem, que lemos em Ecl 11.9-12,8. Foi principalmente Ezequiel quem se serviu desse modo de falar, contudo, numa forma bastante trabalhada, e sob este aspecto ele foi influenciado pela doutrina sapiencial (cf. também Ez 15; 16; 23).
7. A ciência das listas Israel conheceu, por fim, a ciência das listas da sabedoria didática. Evidentemente que só se encontram restos, os quais, além disto, foram posteriormente reelaborados. Nos provérbios numéricos (ver acima, n Q 3) foram utilizadas destas listas enciclopédicas (Gn 1; SI 104[103] e 148), para tratar dos fenômenos da natureza, que, embora diversos quanto à essência, são, contudo, ordenados de forma coerente. O livro de [ó contém numerosas poesias baseadas em listas: 24.58,14-16a; 28; 30.2-8; 36.27-37.13; 40.15-24; 40.25-41.26; 38.4-39.30. 27 Digno de nota é o discurso de Deus, que apresenta exemplos sucessivos, tirados da natureza orgânica e inorgânica, os quais devem ter sido extraídos de um onomasticon ["índice de nomes"]. Com efeito, a enumeração dos fenômenos naturais não obedece ao esquema egípcio, mas foi determinada pela visão do mundo e pelos dados concretos, oferecidos pela paisagem, pelo clima e pela Zoologia da Palestina, e nos permite deduzir a existência de onomástica ["índices de nomes"] israelíticos próprios.
8. Em outros livros do AT Esta visão panorâmica dos diversos gêneros literários nos mostra que eles não se restringem apenas aos livros sapienciais propriamente ditos, mas aparecem também em outros livros do AT. A doutrina sapiencial, com efeito, não era um domínio especializado, estreitamente delimitado. Pelo contrário, em seus portadores palpitavam idéias oriundas de todos os outros círculos possíveis do pensamento, do mesmo modo
27
Mais detalhadamente, cf. G.
FOHRER,
Das Buch Hiob, 1963.
§ 47. Os GÊNEROS LITERÁRIOS DA DOUTRINA SAPIENCIAL ESUAS TRADIÇÕES
441
como, inversamente, os antigos alunos das escolas sapienciais atuavam em diversos setores da vida (cf. a sua relação com o templo em [r 36.10). Além disso, é necessário admitir tenha existido desde tempos imemoriais uma sabedoria popular, de caráter elementar (a "sabedoria dos clãs"). A doutrina sapiencial ilumina toda a vida de Israel, em medida muito mais profunda do que nos permitem supor os restos que nos ficaram de sua literatura. Os livros narrativos do AT, sobretudo, contêm não apenas numerosos provérbios, como também exemplos valiosos de outros gêneros literários (enigmas, parábolas, fábulas). No Saltério foi assumida toda uma série de poemas didáticos de caráter sapienciaL Também determinados livros proféticos contêm palavras dos mestres de sabedoria (p.ex.: Is 3.lOs; 32.6-8; 40.18-20+41.7; 44.9-20; 46.5-8). Baruc, o escriba [secretário] e biógrafo de Jeremias, foi formado pelo menos na escola de sabedoria. Embora atacando violentamente os "sábios" políticos, cuja situação era por ele bem conhecida, Isaías, e também outros profetas, empregam não raras vezes certos modos de falar que foram extraídos da sabedoria tp.ex.: Is 28.23-29; Am 3.3-6).28 Seria, contudo, ir longe demais, se os considerássemos inclusive como uma raiz dos gêneros literários proféticos propriamente ditos." Por fim, os modos de falar da doutrina sapiencial ocupam um lugar não insignificante na apocalítica. Esta doutrina contém, por assim dizer, setores científicos que tratam de problemas da astronomia, pois precisava desta ciência para determinar as datas dos últimos tempos, como igualmente contém elementos da historiografia, ao lado da teoria da periodicidade do mundo. Quanto a isso, é preciso, contudo, não esquecer que a apocalítica enquanto tal se originou da profecia escatológica. 30 28
29
30
Em detalhes, cf. J. LINDBLOM, "Wisdom in the Old Testament Prophetes", VT5upp 3, 1955, 192-204. - S. TEERIEN, "Amos and Wisdom", em: Essays Muilenberg, 1962, 108115. - H. W. WOLFF, Amos geistige Heimai, 1964. Assim H. W. WOLFF, "Der Aufruf zur Volksklage", ZAW 76 (1964), 48-56, para a exortação profética. Que o solo nativo da apocalítica tenha sido a sabedoria e não a profecia decorre, para G. VON RAD, Theologie des Alten Testament, Il, 1960 (411 ed., 1965), 314-321 [em port.: Teologia do Antigo Testamento, São Paulo, 2006, ASTE/Targumim], do pressuposto - em si duvidoso e contestável- de que a profecia, considerada do ponto de vista da história da salvação, tem suas raízes em determinadas tradições referentes à escolha do povo de Israel, o que não existe na apocalítica.
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ASPECTOS GERAIS
§ 48. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
1. Compilação e transmissão Decorre da natureza da doutrina sapiencial que seus conhecimentos e suas admoestações sejam compilados e transmitidos: eles não se destinam apenas a um dia, mas a muitas gerações. Embora a opinião dos egípcios, segundo a qual é pela tradição que se abre o caminho para a ordem universal, não haja desempenhado evidentemente um grande papel em Israel, existe, no entanto, a preocupação em garantir a transmissão da sabedoria recebida de Deus ou dos pais. Assim a tarefa do mestre de sabedoria consiste primeiramente em recolher, em ensinar e em transmitir por escrito as sentenças conhecidas. Uma outra fonte de conhecimento é a própria experiência, de sorte que os mestres de sabedoria exerceram também uma atividade criativa, reformulando o material já conhecido e cunhando novas sentenças. Muitas das obras da literatura sapiencial trazem a marca de uma personalidade poética e literária de alto valor (Jó, Eclesiastes, Eclesiástico). No final da época de Israel, alguém já podia se queixar de que nunca se parava de escrever livros (Ec112.12).
A tudo isto acrescentava-se também um motivo de ordem prática: a instrução que se ministrava nas escolas sapienciais." As sentenças constituem pelo menos uma parte do material com que se aprendia a ler e a escrever. Portanto, do mesmo modo como certas doutrinas sapienciais tinham sido consignadas por escrito já desde muito cedo, assim também numerosos escritos nada mais são do que exercícios escritos. Nas escavações encontraram-se muitas vezes trabalhos escolares de origem não-israelítica. Além disso, era nas aulas, como nos mostra a fórmula: Ouve, filho meu! - que se transmitiam de viva voz as sentenças que os alunos deviam memorizar. Para facilitar essa tarefa, proporcionaram-se meios didáticos auxiliares, reunindo-se em grupo determinadas sentenças: não só os provérbios numéricos, p.ex., como também as sentenças, em número de quatro, que começam com a letra bêi:
31
H. BRUNNER, Altiigyptische Erziehung, 1957. - L. DÜRR, Das Erziehungswesen im Alten Testament und im Antiken Orient, 1932. - J. HEMPEL, "Pathos und Humor in der israelitischen Erziehung", em: Von Ugarit nach Qumran, Eissfeldt-Festschrift, 1958, 63-81. - S. N. KRAMER, "Die sumerische Schule", WZ Halle 5 (1955/1956),695-704.E. OITO, "Bildung und Ausbildung im alten Âgypten", zAs 81 (1956),41-48.
§ 48. COMPILAÇÃO
E TRANSMISSÃO
443
Pr 11.9-1232; outras quatro sentenças, das quais duas começam com a palavra coração e outras duas com (é) bom (Pr 15.13s.16s), e ainda poesias menores, como aquelas que falam sobre o perigo de prestar fiança (6.15), o perigo da preguiça (6.6-11) e da falsidade (6.12-15). Existem também casos em que as sentenças são justapostas por palavraschaves ou por afinidade de conteúdo (Pr 16: a respeito dos reis) ou pelos aspectos contrastantes (Pr 26.4s: responder e não responder ao estulto).
2. A formação dos livros sapienciais A compilação de sentenças constitui, portanto, um método de grande importância para a formação dos escritos sapienciais. Ao lado deste, existem outros métodos e princípios, de onde resultam várias formas literárias: a) O tipo mais simples é a formação de um livro a partir de coleções. Através do livro dos Provérbios pode-se ver, sem dificuldade, que ele consta de várias coleções originariamente autônomas. Estas coleções foram colocadas umas ao lado das outras, em sua forma primitiva, e ainda conservam os seus títulos. Entretanto, elas nem sempre representam a última forma atingível. Pelo contrário: grande parte delas são adições, feitas a partir de coleções menores. Assim, o caminho percorrido vai das coleções menores, utilizadas como meios auxiliares de aprendizagem, até às unidades cada vez mais amplas, constituídas pelo processo de adição. b) Coleções desta espécie podem formar um corpo de "doutrina", na base do modelo egípcio. Neste caso, certas idéias fundamentais se evidenciam, mediante as justaposições de várias sentenças. Exemplo disto são Pr 1-9 e o livro do Eclesiastes. c) Outra forma é a "doutrina" concebida em termos literários e que trata de um tema completo em si. É a forma que encontramos no "louvor da mulher virtuosa" (Pr 31.lOss). d) O passo final é constituído pela composição montada segundo um determinado plano literário e que, apesar de utilizar ocasionalmente elementos já existentes, deve ser considerada como criação própria de seu autor. O exemplo clássico neste sentido é o livro de [ó, 32
Isto corresponde ao modo sumeriano de ordenar as coleções de provérbios de acordo com o primeiro sinal gráfico das frases.
444
ASPECTOS GERAIS
3. Livros sapienciais posteriores Os livros sapienciais posteriores que não foram aceitos no AT são: o livro do Eclesiástico (composto de coleções de sentenças ordenadas segundo as características do conteúdo; de poesias a respeito da sabedoria; de cânticos sob a forma de salmos, e de uma visão retrospectiva sobre as grandes figuras de Israel, no louvor dos pais); a Sabedoria de Salomão (poemas e dissertações), e o quarto livro dos Macabeus (tratado filosófico).
CAPÍTULO
IX
OS LIVROS SAPIENCIAIS § 49. OS PROVÉRBIOS DE SALOMÃO ATD: H. RrNGGREN, 1962. - BüT: J. VAN DER PLOEG, 1952. - HAT: B. GEMSER, 201 ed., 1963. - HK: W. FRANKENBERG, 1898. - HS: H. WIESMANN, 1923. - IB: CH. TH. FRITSCH, 1955. - ICC: C. H. Tov, 1899 (1948). - KeH: W. NOWACK, 201 ed., 1883. - KHC: G. WILDEBOER, 1897. - SAT: P. VOLZ, 201 ed., 1921. - SZ: H. L. STRACK, 201 ed., 1899. - Especial: A. BARUQ, 1964 (Sources Bibliques). E. G. BAUCKMANN, "Die Proverbien und ie Sprüche des Jesus Sirach", ZA W72 (1960),33-63.- G. BOSTRÓM, Proverbiastudien, 1935.- M. DAHOOD, Proverbs and Northwest Semitic Philology, 1963. - A. DRUBBEL, "Le conflit entre la Sagesse profane et la Sagesse religieuse", Bibl17 (1936), 45-70, 407-428.- ID., Les Livres sapientiaux d'Israêl dans leurs sources préexiliques, 1936. - J. W. GASPAR, Social Ideas in the Wisdom Literature of the Old Testament, 1947. - H. GESE, Lehre und Wirklichkeit in der alten Weisheit, 1958.- K. KOCH, "Gibt es ein Vergeltungsdogma im Altem Testament?", ZThK 52 (1955), 1-42. - G. KUHN, Beitriige zur Erkliirung des salomonischen Spruchbuches, 1931. - A. D. POWER, The Proverbs of Solomon, 1949. - ID., Side Lights on the Book of Proverbs, 1950. - H. RANSTON, The Old Testament Wisdom Books and their Teaching, 1930. - H. RrNGGREN, Word and Wisdom, 1947. - G. SAUER, Die Sprüche Agurs, 1963. - E. SCHMITT, Leben in den Weisheitsbüchern Job, Sprüche und Jesus Sirach, 1954. - P. W. SKEHAN, "A Single Editor for the Whole Book of Proverbs", CBQ 10 (1948), 115-130. - U. SKLADNY, Die ãltesten Spruchsammlungen in Israel, 1962. - C. I. K. STORY, "The Book of Proverbs and Northwest Semitic Literature", JBL 64 (1945),319-337. - G. WALLIS, "Zu den Spruchsammlungen Prov 10,122,16 und 25-29", ThLZ 85 (1960), 147s.
1. Terminologia e estrutura
o
nome do livro corresponde ao título inicial (1.1): "Provérbios" (paroimíai, proverbia) de Salomão, filho de Davi, rei de Israel. Embora se atribua
446
OS LIVROS SAPIENCIAIS
a sua autoria a Salomão, que era considerado o sábio por antonomásia, o que o livro realmente oferece é um apanhado da doutrina sapiencial israelítica ou não-israelítica, recobrindo um espaço de vários séculos. Que este livro não provenha de Salomão ou de sua época, mas que se tenha formado através de um processo bastante longo é o que nos mostram: a) os diversos títulos (1.1; 10.1; 22.17; 24.23; 25.1; 30.1; 31.1), introduzindo cada um deles uma determinada coleção de provérbios; b) a colocação divergente da quarta e quinta coleção nos LXX (24.23-34 precedidos de 30.14, e 25-29, de 31.9, que revela uma certa autonomia das coleções ainda em época posterior; c) a incorporação de elementos não-israelíticos, como o indicam os títulos 30.1 e 31.1; d) certas diferenças de forma e conteúdo entre as coleções.
Nos detalhes, podemos identificar oito coleções ou seções, entre as quais três coleções principais, e cinco coleções ou seções menores, que foram acrescentadas como apêndices à segunda e terceira partes principais: A B C D E
F G
H
1-9 Provérbios de Salomão 10-22.16 Provérbios de Salomão, 22.17-24.22 Palavras de sábios, 24.23-34 Palavras também de sábios, 25-29 Ainda provérbios de Salomão, recolhidos pelos homens de Ezequias, rei de [udá, 30 Palavras de Agur, filho de [aces, de Massa,' 31.1-9 Palavras de Lemuel, rei de Massa, as quais lhe ensinou sua mãe, 31.10-31 Elogio da mulher de valor (sem título).
2. Coleção A Do ponto de vista formal, a coleção A(l-9)2 contém, ao lado de alguns provérbios isolados, como, p.ex., 1.7-9; 3.1-12, sobretudo poemas 1 2
Em vez de "o oráculo", deve-se ler hammassa'i. Além de BOSTRÓM: A. HULSBOSCH, "5agese créatrice et éducatrice", Augustinianum 1 (1961),217-235,433-451; 2(1962), 5-39; 3 (1963),5-27. - P. HUMBERT, "La 'femme étrangêre' du livre des Proverbs", RES 1937,49-64. - A. ROBERT, "Les attaches littéraires bibliques de Proverbes" I-IV, RB 43 (1934), 42-68, 172-204, 374-384; 44 (1935), 344-
§ 49. Os PROVÉRBIOS l.JE SALOMÃO
447
sapienciais, muitas vezes de extensão menor, como, p.ex., 3.13-18,21-26; 6.1-5,6-11, mas, freqüentemente, de extensão maior, como, p.ex., 2,1-22;
4,1-28; 8; 9. Nelas é muitas vezes um pai quem exorta o filho, advertindoo a guardar-se da mulher alheia e de prestar fiança, a guardar-se da preguiça, da falsidade e de outras abominações, e lhe recomenda o valor e as bênçãos que brotam da sabedoria e do temor de Deus. Outras vezes é a Sabedoria e a Loucura personificadas que falam nos provérbios. Que a coleção não se tenha formado de um só lance, mas progressivamente, deduz-se, não só da presença de poemas isolados, mas, também do fato de que a advertência a se resguardar da mulher alheia (5.1-23; 6.20-35) está dividida em duas partes, pelas poesias que nela se intercalam (6.1-19). Quanto à época de sua origem, muitos elementos indicam o período pósexílico posterior, com um acentuado influxo greco-helenístico, de modo que 1-9 devem ser situados no final do séc. IV a.c. Esses capítulos foram colocados no começo do livro, por se tratar de uma seção mais recente (cf. Gn 1; Sll).
o que nos chama a atenção são os longos períodos não-hebraicos. O capo 2 forma propriamente uma única frase. Do ponto de vista da história das formas, é possível determinar a influência das invectivas e ameaças proféticas, e do estilo hínico. Em 7.16, o termo' etun é um grecismo (othônê). A advertência contra a mulher alheia e estrangeira substituiu a advertência contra a passagem para uma religião diferente. O conceito de sabedoria foi determinado, não só pelo impulso da pregação profética e do mito do homem primordial (8.2231), mas sobretudo por um mito gnóstico segundo o qual a Sabedoria procura um lugar, para morar entre os homens e tornar-se uma só coisa com eles.' Por fim, observa-se uma semelhança muito próxima com o Eclesiástico.
3
365,502-525. - P. W. SKEHAN, "The Seven Columns of Wisdom's House in Prov 9,1", CBQ 9 (1947), 190-198. - W. STAERK, "Die sieben Sâulen der Welt und des Hauses der Weisheit", ZNW 35 (1936),232-261. Para os detalhes, cf. FOHRER, in ThW VII, 491s. A hipótese de uma influência cananeu-fenícia, proposta por W. F. ALBRIGHT, Von de Steinzeit zum Christentum, 1949, 365s, dificilmente quadra. Com isto deixaria de existir qualquer motivo para considerar Pr 1-9 como a parte mais antiga do livro e remontando a Salomão (FRITSCH). H. DONNER, "Die religionsgeschichtlichen Ursprünge von Prov Sal 8", zAs 82 (1957), 8-18. - W. A. IRWIN, "Where shall Wisdom be Found?", JBL 80 (1961), 133-148. - R-J. Kraus, Die Verkündingung der Weisheit, 1951. - J. DE SAVIGNAC, "La sagesse en Proverbes VIII, 22-31", VT 12 (1962), 211-215.- R. B. Y. SeOTI, "Wisdom in Creation:
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Os LIVROS SAPIENClAIS
3. Coleção B A coleção B (10-22.16) consta de trezentos e setenta e cinco provérbios individuais, que foram colocados sem obedecer a uma ordem ou um determinado esquema de composição (forma mais antiga da coleção). Somente para facilitar a aprendizagem, freqüentemente agruparam-se várias sentenças com base na semelhança dos sons ou nas palavras-chaves (p.ex.: 1O.1lb,12b; 1O.14s), ou no conteúdo p.ex., 10.18-21: sobre o falar, e 16.10-15: sobre o rei). Esta coleção é constituída de duas coleções parciais: 10-15 e 16,22.16, que surgiram, por sua vez, de outras coleções menores, que já não se podem identificar, como o estão a indicar as duplicatas de versos e serniversos (10.1 = 15.20; 1O.2b = 11.4b; 1O.6b = 10.1lb; 1O.8b = 1O.lOb; 1O.13b = 19.29b).4 As duas coleções parciais, tratam, ora variando ora repetindo, do comportamento e das atitudes dos sábios e dos tolos, dos justos e dos maus, mas com diferenças características. A primeira coleção parcial consiste em afirmações quase todas construídas na base do paralelismo antitético. O caráter religioso é menos acentuado do que na segunda coleção parcial, onde o número de admoestações é um pouco maior e predomina o paralelismo sintético. As sentenças manifestam uma alta estima pelo rei, tratam inúmeras vezes da maneira de ministrar a justiça, e se referem à existência de um povo de agricultores, onde o contraste entre o rico e o pobre nos chama a atenção. Muitos provérbios dizem respeito às relações entre pais e filhos e mostram um alto conceito em relação à mulher. Abstraindo de seu aspecto religioso, a coleção se caracteriza de modo particular pelo fato de julgar o con:rortamento humano pelo critério do que agrada ou desagrada a Javé. E unicamente Javé quem dispõe da justa medida, e é por esta medida que ele examinará os corações (16.2; 17.3; 20.27; 21.2), socorrerá o justo e castigará o perverso (10.29).5
4 5
The 'Amõn of Proverbes VIII 30", ibid. 10 (1960), 213-223. - R. STECHER, "Die persõnliche Weisheit in den Proverbien Kap. 8", ZKTh 75 (1953/1954), 411-45l. - R. A. WASER, "A Brief Study of the Relationship between the Eighth Chapter of Proverbs and the Prologue St. [ohn's Gospel", em: MacDonald Presentation Vol., 1933, 425-454. Cf. também GEMSER 55-57. Não existe uma vinculação imediata, automática, entre o comportamento e o destino da pessoa, entre a ação e o seu efeito (KOCH), nem Javé garante meramente a relação entre a ação e o efeito, em vez de provocar tal relação (SKLADNY).
§ 49. Os PROVÉRBIOS
DE
SALOMÃO
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Quanto à idade da presente coleção e de suas sentenças, é preciso considerar, de um lado, a existência de uma realeza (p.ex., 14.28,35; 16.10,12-15; 19.12; 20.2,8,26,28; 21.1; 22.11), o que pode indicar a época pré-exílica - conquanto não o indique necessariamente, pois também o livro do Ec1esiastes, obra seguramente posterior ao exílio, fala freqüentemente do rei -, e do outro lado, a presença de palavras aramaicas (14.34: besed, "vergonha"; 17.10: nhi) "descer"; 18.24 r' " "despedaçar"; 19.20: qbl, "aceitar") cuja penetração só se deu, provavelmente, a partir do exílio." Daí se deduz que uma parte das sentenças ou das coleções menores, e talvez mesmo já o grosso das duas coleções parciais, provêm, presumivelmente, da época anterior ao exílio, ao passo que todo o conjunto só se encerrou na época que se seguiu ao exílio.
4. Coleção C A coleção C (22.17-24.22), que forma o primeiro apêndice de B, divide-se em duas partes inteiramente distintas. Como já se sabe desde há muito tempo." a primeira coleção parcial (22.17-23.11) está em estreita relação com a doutrina egípcia de Amenemope, a qual deve ter surgido entre os sécs. X e VI a.C,". A poesia introdutória (22.17-21) e os dez temas aí tratados (22.22-23.11) correspondem - às vezes mesmo literalmente - à fonte egípcia. Também a sua divisão em trinta capítulos ("casas") parece que o redator israelita a aplicou a toda a coleção (22.17-24.22; cf. 22.20: em lugar de anteontem ou de ajudante, deve-se ler trinta). Evidentemente ele não foi um simples tradutor, mas organizou uma antologia com um terço da doutrina egípcia, antologia onde ele trata os temas em uma ordem diferente, e onde, em 22.26s, introduz um provérbio próprio. A incorporação dos elementos egípcios pode ter ocorrido no final do período da monarquia israelita (22.29).
EISSFELDT*, 641, contra G. R. DRIVER, "Hebrew Poetic Diction", VTSuppll, 1953, 26ss. A. ERMAN, "Das Weisheitbuch des Amen-em-ope", OLZ 27 (1924), 241-252. - H. GRESSMANN, "Die neugefundene Lehre des Amen-em-ope und die vorexilische Spruchdichtung Israels", ZAW 42 (1924), 272-206. 8 Assim H. BRUNNER, em: Handbuch der Oríentalístík, I, 2, 1952, 106 (XXII-XXVI dinastias). Diferentemente e com uma data talvez demasiado alta do ponto de vista da finalidade da obra: W. F. ALBRIGHT em: GEMSER 83 e VTSuppl3, 1955,6: sécs. XII-XI.
6
7
450
OS LIVROS SAPIENCIAIS Depois de OSTERLEY e KEVIN, foi naturalmente DRIOTON quem defendeu de modo particular a opinião segundo a qual é a doutrina de Amenemope que depende de Pr 22.17ss, ou segundo a qual foi o autor desta perícope quem traduziu para o egípcio o livro sapiencial de uma colônia judaico-egípcia, e ainda, que também o autor de Pr 22.17ss se utilizou desse livro traduzido, que já não existe." Essa tese, contudo, foi refutada várias vezes, e ultimamente por MONTET e COUROYER, de forma tão fundamental, que já não pode ser sustentada. 10
Na segunda coleção parcial (23.12-24.22), as sentenças 23.13s foram tomadas da doutrina de Aicar VI, 82. Os provérbios restantes não apresentam nenhuma marca estrangeira; algumas afirmações foram determinadas fortemente pelo espírito religioso (23.17; 24.12,18,21). É possível que em 24.1,3:5(7.10) se encontrem indícios de uma coleção alfabética."
5. Coleção D A coleção D (24.23-34), que constitui o segundo apêndice de B, encerra provérbios contra a parcialidade no julgamento e contra a preguiça. Dado o caráter intemporal de suas afirmações, não é possível determinar a data de sua origem.
6. Coleção E A coleção E (25-29) que, segundo o título, provém dos homens de Ezequias, contém sobretudo sentenças de um só verso, embora haja algumas com mais de um verso (25.4-5; 26.18-19), e também encerra mais afirmações do que exortações. Ela se divide, igualmente, em duas coleções parciais: 25-27 e 28-29. A primeira delas é constituída sobretudo de paralelismos sintéticos e contém inúmeros provérbios sob a forma de verda-
W. o. E. OESTERLEY, "The 'Teaching of Amen-em-ope' and the Old Testament", ZAW 45 (1927), 9-24. - R. O. KEVIN, "The Wisdom of Amen-em-apt and its possible Depence upon the Hebrew Book of Proverbs", JSOR 14 (1930), 115-157. -O. DRIOTON, "Sur la 5agesse d' Aménémope", em: Mélanges Robert, 1957,254-280. - Io., "Le Livre des Proverbes et la 5agesse d'Amén-ém-opé", em: BEThL 12, 1959,229-241. 10 GEMSER, 85. - P. MONTET, L'Égypte et la Bibie, 1959, 111-128.- B. COUROYER, "L'origine égyptienne de la 5agesse d'Amenemopé", RB 70 (1963),208-224. 11 GEMSER, 85, 87. - G. BOSTROM, Paronomasi i den ãldre Hebreiska Maschalliteraturen, 1928, 197 chama a atenção para os paralelos de 24.1, 19.14 com 51 37.1,37b.
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§ 49. Os PROVÉRBIOS
DE SALOMÃO
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deiras comparações, e também regras de conteúdo prudencial, baseadas na experiência da vida. A segunda coleção parcial é composta principalmente de paralelismos antitéticos e encerra muitos provérbios de colorido ético-religioso. A temática se assemelha em muito àquela da coleção B, tanto é assim que as seções 16-22.16 e 25-29 têm em comum um número extraordinariamente grande de sentenças iguais ou semelhantes. Os círculos de compiladores mostram, assim, muita semelhança entre si. Embora a primeira coleção parcial suponha de modo particular a situação de um povo de agricultores e utilize imagens tiradas da vida da natureza, e na segunda coleção parcial se encontrem fortes reflexos de uma situação política, contudo, não se deve restringir seu papel, ao ponto de considerá-la, com SKLADNY, como um espelho do camponês e do artesão, e também como um espelho do governante. O título, segundo o qual a coleção teria surgido durante o governo de restauração nacional de Ezequias (ca, de 700 a.C), é em tudo digno de crédito. Conseqüentemente, pelo menos a maioria das sentenças, como tal, provém do período médio da monarquia."
7. Coleção F A coleção F (30)13 constitui o primeiro apêndice de E. Entre os versículos introdutórios e finais: 1-6.32-33, ela apresenta sobretudo provérbios numéricos: vv. 7-9,11-14,15-16,18-19,21-23,(24-28).,9-31 (os vv. 7 e 11 devem ser completados). Como a informação do título concernente à procedência do autor e a ser corrigida para o massaíta [de Massa], indica uma tribo norte-árabe da Transjordânia setentrional, e como também existem fortes pontos de contato com o mundo cananeu (SAUER), conhecidos através da literatura ugarítica, o texto deve ser originário de uma região limítrofe israelítico-cananéia. Faltam indicações a respeito de uma época precisa de sua origem. Contudo, os versículos iniciais e finais apresentam uma relação de conteúdo com o livro de [ó, Desde o começo, o sábio adota uma atitude, para se chegar à qual [ó deve primeiramente se impor. Por conseguinte, enquanto os provérbios numéricos represenH. CAZELLES, VT5uppl3, 1955, 29 vê no conjunto fundamental de 25-29 a sabedoria norte-israelítica. 13 Além de SAUER, também: E. F. SUTCLIFFE, "The Meaning of Proverbs 30.18-20", Irish ThQ 27 (1960), 125-131. - CH. C. TORREY, "Proverbs, Chapter 30", lBL 73 (1954), 93-96. 12
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OS LIVROS SAPIENCIAIS
tam um fundo mais antigo, de origem estrangeira, os versículos do começo e do fim da coleção foram acrescentados na dependência do livro de Jó.
8. Coleção G A coleção G (31.1-9), que constitui o segundo apêndice de E, encerra advertências contra a relação com mulheres (vv, 2-3) e contra o uso do vinho (vv. 4-7). Encerra também uma exortação a prestar socorro aos que se acharem em aflição (vv. 8-9). Esta coleção provém da mesma região que a das palavras de Agur.
9. A mulher virtuosa" /I
A contrapartida da advertência contra as mulheres, em 31.2-3, é representada pelo "elogio da mulher virtuosa", em 31.10-31 (H),14 que constitui o terceiro apêndice de E. Trata-se de um cântico alfabético, que oferece esclarecimentos a respeito da posição, da estima e do reconhecimento da mulher de um homem conceituado, descrevendo-a com uma personalidade autônoma, no sentido de Gn 2.18. Muito provavelmente essa perícope provém da época pós-exílica.
10. Redação A redação do livro dos Provérbios se fez; incorporando-se novas coleções, ora adiante ora atrás. O núcleo é constituído pela coleção 25-29, surgida na época de Ezequias, e da qual muitos elementos podem remontar realmente à época de Salomão. Não somente se acrescentaram os dois apêndices, em 30 e 31.1-9 - sendo 31.1-9 e o núcleo de 30 talvez ainda anteriores ao exílio - como também colocou-se no início da obra, depois do exílio, uma outra coleção de provérbios que remontam igualmente à época de Salomão, além de se juntarem apêndices de própria autoria (1024). A este conjunto se adicionaram as partes seguintes: 31.10-31 como contrapartida de 31.2-3, mas sobretudo a coleção 1-9, surgida no séc. IV. Com a indicação da idade desta última, tem-se igualmente a idade máxima
14
M. B. CROOK, "The Marriageable Maiden of Prov 31,10-31", JNES 13 (1954), 137-140.
§ 50. O
LIVRO DE
Já
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para a origem de todo o livro. É possível, portanto, que não se tenha completado antes do final do séc. IV. Com a colocação da coleção mais nova no começo do conjunto, o livro foi posto sob uma luz que se distingue da finalidade e do escopo das coleções mais antigas: ser ensinamento da sabedoria de vida para a educação do funcionalismo real. Primeiramente ele quer ser, daí, por diante, a doutrina de um pai para seu filho e com isto situa-se em um plano humano universal. Em segundo lugar, ele aparece sob o signo do sistema da teologia sapiencial, para o qual o temor de Deus é a sabedoria suprema, ao passo que a estultícia se identifica com a rejeição da Lei.
§ 50. O LIVRO DE JÓ ATO: A. WEISER, 3<1 ed., 959. - BK: F. HORST, 1960ss. - COT: J. H. KROEZE, 1961. - EH: N. PETERS, 1928. - HAT: G. HÓLSCHER, 2<1 ed., 1952.HK: K. BUDDE, 2<1 ed., 1913. - HS: P. SZCZYGIEL, 1931. - IB: S. L. TERRIEN, 1954. - ICe: S. R. DRIVER - G. B. GRAY, 1921 (1951). KAT, 2<1 ed.: G. FOHRER, 1963. - KeH: A. DILLMANN, 4<1 ed., 1891. - KHC: B. DUHM, 1897. - SAT: P. VOLZ, 2ª ed., 1921. - SZ: W. VOLCK, 1889. Estudos especiais: E. J. KISSANE, (1939), 1946. - E. KÓNIG, 1929. - F. STIER, 1954. - N. H. TORCZYNER (N. H. TUR-SIANI), 1941; 1957. F. BAUMGARTEL, Der Hiobdialog, 1933. - G. W. H. BICKELL, "Kritische Bearbeitung des Job-Dialogs", WZKM 6 (1892), 137-147,241-257,327334; 7 (1893), 1-20, 153-168. - ID., Das Buch Job nach Anleitung der Strophik und der Septuaginta, 1894. - F. BUHL, "Zur Vorgeschichte des Buches Hiob", em: BZAW 41, 1925,52-61. - M. BUTTENWIESER, The Book of [ob, 1922. - M. DAHOOD, "Some Northwest-Semitic Words in [ob", Bibl 38 (1957),306-320. - B. D. EERDMANS, Studies in Job, 1939. - CH. L. FEINBERG, "The Poetic Structure of the Book of [ob and the Ugaritic Literature", BS 103 (1946),283-292. - G. FOHRER, Studien zum Buche Hiob, 1963. - K. FULLERTON, "The Original Conclusion to the Book of Iob", ZAW 42 (1924), 116-135. - H. GESE, Lehre und Wirklichkeit in der alten Weisheit, 1958. - J. HEMPEL, "Das theologische problem des Hiob", ZSTh 6 (1929), 621-689 (= Apoxysmata, 1961, 114-173). - J. HERZ, "Formgeschichtliche Untersuchungen zum Problem des Hiobbuches", WZ Leipzig 3 (1953/54), 175-162. - W. A. IRWIN, "Poetic Structure in the Dialogue of [ob", JNES 5 (1946), 26-39. - ID., "[ob's Redeemer", JBL 81 (1962), 217-229. - M. JASTROW [r., The Book of Iob, 1920. - A. JEPSEN, Das Buch Hiob und seine Deutung, 1963. - C. G. JUNG, Antwort auf Hiob, 1952. - E. G. KRAELING, The Book of the Ways of God, 1938. - C. KUHL, "Neuere Literarkritik des Buches Hiob", ThR NF 211953),163-205,257-317. - ID.,"Vom Hiobbuche
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OS LIVROS SAPIENCIAIS
und seine Problemen", ibid. 22 (954), 261-316. - J. LINOBLOM, Boken om Job og hans lidande, 1940. - lo., La composition du Livre de [ob, 1945. - H. MOLLER, Sinn und Aufbau des Buches Hiob, 1955. - N. RHOOOKANAKIS, "Das Buch Hiob", WZKM 45 (938), 169-190. - H. RICHTER, "Erwâgungen zum Hiobproblem", EvTh 18 (958), 302-324. - lo., Die "Naturweisheit des Alten Testaments im Buche Hiob", ZAW 70 (958), 1-20. - lo., Studien zu Hiob, 1959. - H. H. ROWLEY, "The Book of [ob and its Meaning", BJRL 410958/59), 167-207 (= From Moses to Qumran, 1963, 141-183). - N. M. SARNA, "Epic Substratum in the Prose of [ob", JBL 76 (957), 13-25. - E. SCHMITT, Leben in den Weisheitsbüchern [ob, Sprüch und Jesus Sirach, 1954. - M. SEKINE, "Schópfung und Erlõsung im Buche Hiob", em: Von Uragit nach Qumran, Eissfeldt-Festschrift, 1958,213-223. - P. W. SKEHAN, "Strophic Patterns in the Book of Iob", CBQ 23 (961), 125-143. - SH. SPIEGEL, "Noah, Danel and [ob", em: Ginzberg Jubilee Vol., I 1945, 305-355. - W. B. STEVENSON, The Poem ofJob, 2<1 ed., 1948. - N. H. TORC2YNER, Das Buch Hiob, 1920. - lo., "Hiobdichtung und Hiobsage", MGWJ 69 (925),234-248. - A. WEISER, "Das Problem der sittlichen Weltordnung im Buche Hiob", ThBI 2 (923), 154-164 (= Glaube und Geschichte im Alten Testament, 1961,9-19). - C. WESTERMANN, Der Aufbau des Buches Hiob, 1956. - E. WÜRTHWEIN, Gott und Mensch in Dialog und Gottesreden des Buches Hiob, Habil. Schrift Tübingen, 1938.
1. Estrutura
o livro de Já pertence aos livros mais excitantes e mais emocionantes da Bíblia e é, ao mesmo tempo, uma obra de arte poética de alta categoria. Trata-se de uma obra anônima que tem o nome, não de seu autor, mas de sua figura central: Já, que é apresentado pela narrativa da moldura e por Ez 14.14.20 como uma figura de época remota e envolta em lendas. Na sua forma atual, o livro apresenta a seguinte divisão: I)
1-2: prólogo, com seis cenas, que descrevem a piedade e a felicidade de [ó (1.1-5), a decisão de submeter sua piedade à prova, num primeiro diálogo no céu 0.6-12); a execução dessa medida, com a conseqüente perda de seus bens e a de seus filhos ("mensagens de [ó") e sua preservação (1.13-22); a decisão de o submeter a uma segunda prova (2.1-6), a execução desta prova, com a enfermidade de [ó (2.7-10), e, por fim, a visita dos três amigos de [ó: Elifaz, Baldad e Safar (2.11-13).
lI)
3-42.6: discursos em forma poética: primeiramente a extensa troca de discursos entre [ó e seus amigos, em três ciclos de discursos (3-11; 12-20; 21-28), dos quais o último termina com o cântico
§ 50. O LIVRO
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Já
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sobre a Sabedoria (28), depois de vários pequenos cânticos ou poemas (em 26 e 27). Seguem-se outros discursos de [ó, com referências à situação de outrora e do momento, o juramento de pureza, o desafio lançado a Deus (29-31), e o discurso de Eliú, um amigo até então não mencionado (32-37). A conclusão é constituída de dois discursos de Deus (38-40.2; 40.6-41.26) e de duas respostas de [ó (40.3-5; 42.1-6), respostas nas quais [ó se humilha e se submete. 111) 42.7-17: epílogo, com duas cenas a respeito do julgamento de Deus sobre os amigos (42.7-9) e restauração da fortuna de [ó (42.10-17).
o estilo do livro nos mostra que seu autor é um mestre da palavra raramente superado, um mestre dotado de poder de criatividade barroca e possuidor de elevada cultura, como nos indicam não só as imagens, numerosas e multiformes, que exprimem os sentimentos mais variados em um só e mesmo discurso, como também as expressões raras, ou que já nem mesmo se usavam. 2. A narrativa de moldura A narrativa de moldura, dividida em prólogo e epílogo 0-2; 42.7-17), é, segundo a opinião quase geral, uma narrativa originalmente autônoma, uma lenda com finalidade didática e parenética e que se passa no estrangeiro, fora de IsraeL15 O que se discute é a questão de saber de que modo a lenda se relaciona com o poema de [ó: se e de que modo foi ligada a este poema, ou se foi acrescentada posteriormente, qual a sua forma original e quais as modificações que ela sofreu, talvez, no decurso do processo de transmissão. BAITEN, ALT, KRAELING e LINDBLOM atribuíram determinadas seções da lenda a estágios distintos. PFEIFFER* pensa ter havido uma reelaboração israelítica da narrativa, que em tudo seria estrangeira, ao passo que CASSUTO, SPIEGEL e SARNA a consideram como a forma em 15
Recentemente, contudo, ROWLEY 184 defendeu novamente a tese de que foi o próprio autor do poema de Já quem compôs a narrativa de abertura e de conclusão da obra. Cf. principalmente: A. ALT, "Zur Vorgeschichte des Buches Hiob", ZAW 55 (1937),265-268. - L. W. BATIEN, "The Epilogue of the Book of [ob", AThR 15 (1933), 125-128. - G. FOHRER, "Zur Vorgeschichte und Komposition des Buches Hiob", VT (1956),249-267 (= Studien zum Buche Hiob, 1963,26-43). - ID., "Überlieferund und Wandlung der Hioblegende", em: Baumgiirtel-Festschrijt, 1959,41-62 (= ibid.44-67). - ID., "4QOrNab, llQThJob und die Híoblegende", ZAW 75 (1963),93-97. - K. K. KAUTZSCH, Das sogenannte Volksbuch von Hiob, 1900.
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OS LIVROS SAPIENCIAIS
prosa de um antigo poema épico, talvez cananeu. Estas e outras observações podem ser determinadas melhor, considerando-se: a) que a lenda de Já contém certos elementos da tradição que nos permitem deduzir pelo menos a existência de quatro épocas e quatro círculos, e b) que, por causa da sua fusão com o poema de Já, ela foi reelaborada e parcialmente modificada. a) Os nomes de Já, dos sabeus e caldeus, e provavelmente também os dos amigos; a descrição de Já como meio-agricultor, e - de acordo com os textos ugaríticos paralelos - a posição das filhas de Já; a introdução dos criados; a reunião do conselho celeste, e os seres celestes, tudo isto provém da versão pré-exílica e mais antiga da lenda." - A versão israelítica da lenda de Já formou-se no período pré-exílico mais antigo e segundo o modelo da arte narrativa dos "estratos fontes" mais antigos do Hexateuco. Reflexos desse modelo são, sobretudo, a maneira de estimar as riquezas de Já pela quantidade de gado e de escravos; os sacrifícios oferecidos para aplacar a ira de Deus; a descrição do poder que Deus possui de produzir frutos de bênção; a inclusão na fé javista, e ainda a construção e a explanação estilísticas. - O contato com a lenda de Já, no período do exílio, e que podemos deduzir a partir de Ez 14.12-13, deixou apenas alguns vestígios no vocabulário. - Esses vestígios provêm também da época pásexílica (influência do código sacerdotal sobre 42.16s), na qual se deve supor também a a atuação da doutrina sapiencial (1.1,21a; 2.3,10) e em que as cenas celestes assumem nova fisionomia com a introdução da figura de Satanás. b) A intervenção mais importante do poeta de Já foi a introdução dos três amigos, talvez com a utilização de nomes já conhecidos através da tradição e que em 2.11-13 e 42.7-9 substituem os parentes e conhecidos de Já, cuja visita de condolências é narrada ainda em 42.11, em lugar inadequado." Quanto ao mais, o poeta adaptou a lenda, formal e estilísticamente, a seu poema, mantendo não só a prosa para os textos narrativos e colocando, pelo contrário, em versos, os discursos diretos, como também - excluídas as locuções usuais - introduzindo o nome divino de Javé nas narrativas em prosa e a denominação de Eloim e demais qualificações de Deus nas seções poéticas. 16 17
Sobre cada um de seus estágios ou fases, d. FOHRER em: Baumgiirtel-Festschrift. As passagens 38.1 e 42.7 se referem a esta circunstância. Elas pressupõem que Já foi tentado pelos seus parentes e conhecidos e que Deus lhe dirigiu breves palavras de reconhecimento, depois de ele ter sido preservado.
§ 50. O
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3. O poema
o poema de Já compreende: a) a disputa de Já com os três amigos, distribuída em três ciclos de discursos, e Deus.
b)
a discussão de Já com
Encontramos não raramente opiniões em que se admite ter havido uma ampliação ou uma reelaboração radical de um livro primitivo de [ó. Muitas vezes consideraram-se como de origem secundária não somente os discursos de Eliú, como também os discursos de Deus e as respostas de [ó, reconhecendo-se como autêntica apenas a discussão de Jó com os três amigos. Além disso, tem-se intervindo na ordem da composição desses discursos. Assim se pretendeu conservar apenas uma parte dos mesmos (FULLERTON: 3-19; RHODOKANAKIS: 3-17.1 e 38-40.5), ou reduzi-los a um único ciclo de discursos ou a um monólogo de [ó, com exclusão de numerosos fragmentos avulsos (BAUMGARTEL, KRAELING). TORCZYNER (TUR-SINAI) fez, inclusive, a tentativa de dividir o texto atual em fragmentos pequenos e pequeníssimos, e a partir deles construir um novo texto (1941), tendo, porém, renunciado a essa tentativa mais recentemente (1957), porque, segundo ele, não se pode estabelecer uma nova ordem dentro do texto, por faltar, como se presume, grande parte do texto primitivo. Em todas essas opiniões, o critério fundamental é ficar restrito apenas ao caso pessoal de [ó. Por isso, afasta-se de seus discursos tudo o que parece não quadrar com a imagem do sofredor que se levanta contra Deus e, não obstante, conserva-se aferrado a ele, e exclui-se dos discursos dos amigos tudo aquilo que parece não servir a suas investidas contra [ó e à sua atuação sobre ele. O julgamento literário se acha bastante influenciado, portanto, por uma interpretação antecedente do livro.
Os ciclos dos discursos foram, evidentemente, organizados de tal sorte, que cada um deles abrangesse três discursos de Já, com as respectivas respostas dos amigos. Importa aqui observar que, a partir do momento em que se rompe o silêncio de sete dias (2.13-3.1), a iniciativa e os impulsos principais partem sempre de [ó que é quem "fala" e a quem os amigos, reagindo, "respondem". É isto precisamente o que se passa na primeira série de discursos. Ela começa, portanto, com o capo 3, que deve ser considerado como o primeiro discurso de [ó e não pode ser colocado no início, como um monólogo. A primeira e segunda séries de discursos (3-11; 12-20) foram conservadas na íntegra. a)
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OS LIVROS SAPIENCIAIS
Apenas os hinos: 9.5-10; 12.12-25, e bem assim a instrução: 12.7-11 são acréscimos." Diferente é o que se passa com a terceira série de discursos (21ss).19 O oitavo discurso de Já (23.1-17) e a resposta de Baldad (25.1-6) são muito breves, e do nono discurso de Já só existe a introdução (26.1-4) e talvez um resto, em alguns versículos do capo 27. Falta inteiramente a resposta de Sofar. KALT2D e PETERS pretenderam, de um lado, explicar este estado de coisas corno sendo intencionalmente ocasionado pelo poeta que exprimiria, assim, um afrouxamento nos amigos. Mas os discursos de Já também se tornam mais breves e menos tensos. Por outro lado, propuseram-se soluções radicais: BAUMGÀRTEL reduz o fundo original da série de discursos a 23.2-17; BUHL e FULLERTON consideram 24-28 corno um conglomerado de peças de procedências diversas. VOLZ e WESTERMANN pretendem decompor a série dos discursos a partir de 23 ou 24 e atribuir os fragmentos considerados corno originais a outras partes do livro. Diante desta situação, são corretas as tentativas que se têm feito com relação aos discursos completos: 21 e 22, e aos restos de discursos que existem nos capítulos seguintes, no sentido de reconstruir, enquanto possível, a terceira série de discursos. Não se podia senão esperar que dessas tentativas surgissem muitas recomposições improváveis. Pode-se, contudo, dizer que em 23.1-17 se encontra, incompleto, o oitavo discurso de Já, e em 25.1-6, o resto da resposta de Baldad. Uma parte do capítulo 27 (em primeiro lugar os vv. 1-6.11-12), pertence seguramente ao nono discurso de Já, introduzido em 26.1-4. Já não se consegue identificar nenhum elemento da resposta de Sofar. A série dos discursos é complementada por quatro cânticos no capo 24 (vv. 1-4,1O-12,22s; vv. 5-8; vv. 13-17; vv. 18-21), por um hino sobre o poder e a vontade criadora de Deus (26.5-14) e por 18
K. FULLERTON, "OnJob, Chapters 9 and 10", JBL 53 (1934),321-349. - W. IRWIN, "The
First Speech of Bildad", ZAW 51 (1933),205-216. - M. LOHR, "Die drei BildadReden im Buche Hiob", em: BZAW 34,1920,107-112. 19 G. A. BARTON, "The Composition of [ob 24-30", JBL (1911),66-77. - P. OHORME, "Les c. 25-28 du livre de [ob", RB 33 (1924), 343-356. - F. GIESEBRECm, Der Wendenpunkt des BuchesHiob: Capitel 27 und 28, 1879. - M. A. RÉGNIER, "La distribution des c. 2528 du livre de [ob", RB 33 (1924), 186-200. - R.-J. TOURNAY, "L'ordre primitif des chapitres XXIV-XXVIII du Livre de Job", ibid. 64 (1957), 321-334. 20 E. KALT, Das Buch Job, 1924.
§ 50. O LIVRO DE Já
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um cântico sobre o fim dos maus (27.7-10,13-23). A isto se acrescenta o cântico da Sabedoria (28). b) A segunda parte da poesia de Já começa com os discursos de 2931, que falsamente se tem considerado muito freqüentemente como "discursos finais" de Já. Esses discursos, contudo, não encerram a discussão de [ó com os amigos, mas provocam o aparecimento de Deus. Entre eles, os discursos de Deus e as palavras de Já existe a mais estreita conexão, tanto do ponto de vista da história das formas e do conteúdo, como do ponto de vista teológico. Por isso eles devem ser considerados como desafios de Já. O cântico 30.2-8 constitui um acréscimo. Muito discutidos são os discursos de Deus e as respectivas respostas de [ó, Desde que sua autenticidade foi posta em dúvida pela primeira vez por VERNES e STUDER,21 ela tem sido negada freqüentemente ao poema de Já, entre outros por VOLZ e BAUMGÁRTEL, e mais recentemente por KUHL que a combate. Algumas vezes só se tem considerado como conclusão original a aparição de Deus. Entretanto, uma tal aparição no AT só alcança sua verdadeira significação mediante a palavra divina. Assim também é absolutamente indispensável a presença da palavra de Deus no contexto de todo o livro de [ó. A antiga lenda de Já já continha uma dessas palavras, à qual 42.7 se refere e cuja introdução é utilizada em 38.1. Se a considerarmos como necessária para o poema de [ó, então se nos coloca o difícil problema de saber sua extensão e seus limites, porque nos textos recebidos existem dois discursos de Deus (38.1-40.2; 40.6-41.26) e duas respostas de [ó (40.3-5; 42.1-6).22 Tem-se insistido muitas vezes na presença desses dois discursos e dessas duas respostas e tem-se procurado explicá-los de modo mais ou menos artificial (DILLMANN, WEISER),23 Mas as duas seções referentes ao hipopótamo e ao crocodilo (40.15-41.26) provavelmente são acréscimos posteriores. Neste caso, coloca-se imediatamente em dúvida o segundo discurso de Deus, porque dele só resta 40.8-14,24 Além disso, 21 G. L. STUDER, Das Buch Hiob, 1881. - M. VERNES, "Bulletín critique de la religion juive", RHR 1 (1880),206-238. 22 G. FOHRER, "Gottes Antwort aus dem Sturmwind, Hi 38-42", ThZ 18 (1962), 1-24 (= Studien zum Buche Hiob, 1963, 108-129). - L. J. KUYPER, "The Repentance of [ob", VT9 (1950), 91-94. - R A. MAcKENzrn, "The Purpose of the Yahweh Speeches in the book of [ob", Bibl40 (1959),435-445. - G. VON RAo, "Hiob XXXVIII und die altãgyptische Weisheit", VTSuppl 3, 1955, 293-301 (= Gesammelte Studien zum Alten Tesiameni, 1958, 262-271). 23 Sobre este ponto, cf. KUHL em ThR NF 21 (1953), 268s e FOHRER, KAT, 2a ed., 37. 24 40.6-7 foi tomado de 38.1,3.
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OS LIVROS SAPIENCIAIS [ó renuncia à sua causa (40.3-5) e declara que a partir de agora preten-
de se calar. Depois disto, um novo discurso de Deus seria apenas crítica mesquinha e uma segunda resposta de [ó uma contradição em si mesma. É somente o fato de se ter separado o versículo 40.2 do conjunto 40.8-14, ao qual ele pertence, que levou consigo os títulos e a introdução: 40.1,6-7, que nos deixa a impressão de que são dois os discursos de Deus. Em face disto, outros autores só consideram como original um dos discursos - para SIEGFRIED,25 FULLERTON e LINDBLOM é o primeiro, e para EISSFELDT* é o segundo. Este último autor pondera também se não teriam existido diferentes versões do livro de [ó, cada uma das quais com um único discurso, e se depois elas não teriam sido reunidas e combinadas. Mas como versões tão díspares de um mesmo poema são muito pouco prováveis, as seções 38-39 e 40.6-14 consideradas em si não constituem discursos completos. A solução adequada consiste em admitir, de um lado, um único discurso de Deus, formado a partir de um fundo já existente, com exclusão dos títulos e da introdução que foram acrescentados em 40.1,6-7, e, do outro lado, uma única resposta subseqüente de [ó (BICKELL, BUDDE, DUHM, HOLSCHER e outros). Neste caso, o discurso de Deus abrange 38-39; 40.2,8-14, onde 40.2,8-14 corresponde à introdução (38,2s) como parte conclusiva, existindo, assim, a mesma estrutura dos discursos de desafio (um desejo como introdução - um desafio como conclusão). A resposta de [ó está contida em 40.3-5; 42.2-3,5-6 (42.1 é um título secundário; e 42.4 repete 38.3). Os cânticos sobre o hipopótamo (40.15-24) e o crocodilo (40.25-41.26) são acréscimos que contribuíram para a atual divisão." Essas descrições zoológicas - pois, naturalmente, não se trata de monstros míticos das eras primitivas - situam-se em um plano diferente e utilizam vocabulário diferente daquele dos discursos de Deus, cuja forma interrogativa elas apresentam poucas vezes, e cuja impertinência falta nas mesmas. Os animais têm muito pouca relação com a Palestina, enquanto os exemplos dos discursos de Deus correspondem às particularidades do país.
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C. SIEGFRIED, The Book Df [ob, 1893 ("The Sacred Books of Old Testament"). G. R. DRIVER, "Mythical Monsters in the Old Testament", em: Studi ar. Levi della Vida, I 1956, 234-249. J. BÓHMER, "Was ist der Sinn von Hiob 39,13-18 an seiner gegenwãrtigen Stelle?", ZAW 53 (1953), 289-291.
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Apesar das muitas objeções, outra deve ser a situação da seção sobre o avestruz (39.13-18)27 que estilisticamente não se choca com o restante do discurso de Deus e que, depois de duas vezes quatro estrofes sobre a natureza inorgânica, apresenta igualmente duas vezes quatro estrofes sobre o mundo animal. Em verdade, originariamente talvez só se falasse da rapidez do avestruz. Os vv. 15 e 17, relativos à sua falta de prudência, são acréscimos.
4. Acréscimos posteriores O cântico que nos fala da inacessibilidade da Sabedoria para o homem (cap. 28)28 representa um grande acréscimo feito ao poema de Já. Contra a opinião de KONIG e outros, devemos considerá-lo como inteiramente impossível nos lábios de Já, a quem é atribuído (KRAELING, KISSANE, HOLSCHER e outros). Com efeito, no restante do livro, trata-se sempre de uma outra espécie de sabedoria que não é indicada no cântico. O fato de ela ser inacessível ao homem, torna propriamente supérfluos os argumentos do discurso de Deus, do mesmo modo como o tom irônico deste parece incompreensível depois da sábia modéstia do autor do cântico. O caráter reflexivo do cântico está em oposição com todos os discursos do poema de Já como um todo. Por razões de ordem formal e material, o cântico não deve ser atribuído ao poeta de Já, mas a um representante do sistema da teologia sapiencial, que o poeta de Já rejeitou. Desde EICHHORN* e STUHLMANN,29 os discursos de Eliú (32-37) têm sido considerados muitas vezes como um acréscimo posterior de grande proporção - e isto com razão, embora não poucos autores se tenham pronunciado por sua autenticidade (antigamente BUDDE, CORNILL* e outros, e recentemente RIDDERBOS, DENNEFELD e outros)." Em abono da
M. LÚHR, "[ob c. 28", em: Haupt-Festschrift, 1926, 67-70. M. M. STUHLMANN, Hiob, 1804. 30 L. DENNEFELD, "Les discours d'Élihou", RB 48 (1939), 163-180. - G. FOHRER, "Die Weisheit des Elihu (Hi 32-37)", AfO 19 (1959/1960), 83-94 (Studien zum BucheHiob, 1963,87-107). - W. A. IRWIN, "The Elihu Speeches in the Criticism of the Book of Job", JR 17 (1937), 37-47. - J. H. KROEZE, "Die Elihureden im Buche Hiob", OTS 2, 1943, 156-170. - H. NICHOLS, "The Composition of the Elihu Speeches", AJSL 27 (1910/1911),97-186. - W. POSSELT, Der Verfasser der Elihu-Reden (Job Kap, 32-37), 1909. - N. H. RIDDERBOS, "De redevoeringen van Elihu", GThT 38 (1937), 353-382. - W. E. STAPLES, The Speeches of Elihu, 1924. 28 29
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OS LIVROS SAPIENCIAIS
opinião segundo a qual se trata de um acréscimo, existem três grupos de argumentos. Em primeiro lugar, falta qualquer ligação com o restante do livro. Eliú é introduzido sem preparação e desaparece também repentinamente, depois de seus discursos, sem que [ó ou Deus responda a seus argumentos (nem mesmo em 42.7). Seus discursos foram encaixados inclusive em lugar errado, e rompem a ligação entre os discursos de desafio de [ó e o discurso de Deus." - Em segundo lugar, o conceito de sabedoria se distingue fundamentalmente, em termos de conteúdo, daquele da poesia específica de [ó (como também daquele do capo 28). O seu modo de argumentar é diferente, quando desenvolve conceitos teológicos já existentes. Ambos pressupõem um modo de raciocinar e de conceber diferente daquele do poeta de [ó. A contribuição, porém, que os discursos oferecem para a solução do problema de [ó é neutralizada, de antemão, no diálogo, pelos discursos de [ó. - Por último, a forma do discurso se diferencia daquela do poema de [ó. Além das numerosas diferenças de linguagem e de estilo, e apesar dos muitos convites ao debate, o autor utiliza como modo de falar o processo expositivo dos mestres de sabedoria, mas com um colorido polêmico.
5. O livro original e sua origem Tendo-se em vista as alterações sofridas pela obra e depois de excluídos os acréscimos, o livro original apresenta a seguinte divisão: Introdução mediante o prólogo. I: 1-2 II: 3.1-27.12 Primeira parte: confronto direto de [ó com seus amigos e confronto indireto com Deus: 3-11 primeiro ciclo de discursos, 12-20 segundo ciclo de discursos, 21-23; 25; 26.1-4; 27.1-6,11-12 terceiro ciclo de discursos (incompleto). III: 29-31; 38-42.6 Segunda parte: confronto direto de [ó com Deus: 29-31 discursos de desafio de [ó, 38-39; 40.2,8-14 discurso de Deus, 40.3-5; 42.2-3,5-6 resposta de [ó. IV: 42.7-17 Conclusão com o epílogo.
31
Muitas vezes parece que o autor dos discursos já conhecia acréscimos posteriores ao poema de [ó ou que se utilizou de um texto corrompido. Quanto aos detalhes, cf. a explicação de FOHRER.
§ 50. O LIVRO DE Já
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Não se pode fixar com precisão a época de origem desse livro. Determina-se o limite superior de sua idade, sabendo-se que o poeta se utilizou da lenda de [ó numa forma posterior ao exílio e que se inspirou em Jeremias e no livro das Lamentações.P A citação de reis, de conselheiros e de funcionários em 3.14s corresponde à administração do Estado pérsico (cf. Esd 7.28; 8.25), ao passo que 19.23s supõe o conhecimento da inscrição mandada gravar por Dario I no rochedo [de Behistum]. O vocabulário sugere também o mesmo período. Se, além disso, considerarmos as circunstâncias históricas e espirituais daqueles tempos, então podemos pensar nos sécs. V-IV a.c. como época em que o livro apareceu. Os acréscimos foram feitos, o mais tardar, no séc. IH. Como lugar de origem tem-se admitido ocasionalmente o Egito, Edom ou a Arábia." Mas é sumamente provável que o poeta tenha vivido na Palestina, para a qual apontam detalhes de todos os tipos. Antes do mais, ele assumiu a lenda de Já com uma localização do cenário compreensível apenas a partir da Palestina (habitantes do Oriente = região de Safa, ao norte da Transjordânia), e para os discursos de Deus utilizou um modelo que corresponde aos dados palestinenses.
6. Relação com a tradição Quanto às relações do poeta de Já com a tradição, primeiramente é preciso resolver o problema de sua ligação com possíveis modelos extrabíblicos. Evidentemente tem-se admitido freqüentemente, sem que se possa provar, que o poeta conhecia a poesia e a filosofia gregas. Em contraposição aos supostos paralelos da poesia grega (FRIES)34 e aos vestígios do pensamento grego em Já (JASTRüW [r.), como também à interpretação do livro de Já como sendo uma imitação das tragédias de Eurípides (KALLEN 35 ) ou como tendo sido influenciado pelo "Prometeu Acorrentado" de Ésquilo (SLOTKI),36 tem-se chamado a atenção, e com 32
33
Em 3.3 se inspira em [r 20.14-18; em 6.15-21 em 15.18; em 6.23 em 15.21, e em 19.912 em Lamentações. Egito: HUMBERT, Recherches sur les sources égyptiennes de la littérature d'lsraêl, 1929, 75-106. - Edom: fuIFFER*. - Arábia: F. H. FOSTER, "Is The Book of [ob a Translation from an Arabic Original?", AJSL 49 (1932/1933),21-45. - D. S. MARGOLIOUTH, The
Relations between Arabs and Israelites prior to the Rise of Islam, 1924. FRIES, Das philosophische Gespriich von Hiob bis Plaion, 1904. 35 H. M. KALLEN, The Book of Job as a Greek Tragedy Resiored, 1918. 36 J. J. SLOTI
K.
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muita razão, para as diferenças, às vezes fundamentais, entre [ó e a poesia grega. O mesmo vale para o poema indiano do infeliz rei Iudishthira (HOLSTIJN).37 No âmbito do Oriente Antigo, talvez seja de excluir uma dependência do poeta de [ó em relação à literatura cananéia. A semelhança com os textos ugaríticos no que se refere à estrutura poética (FEINBERG) não é tão grande. Também não muito diferente é sua relação com a literatura polêmica do Egito, que em época de crise e de dúvidas traz explanações redigidas em forma de diálogos. A mencionar são: a "Disputa do Desesperado da Vida com sua Alma", as "Queixas do Camponês", a "Profecia de Nefer-rehu (Neferti)", as "Admoestações de Ipu-ver" e a doutrina de Amenemope." Trata-se, contudo, dos problemas das situações injustas, presentes neste mundo, e do destino do além, depois da morte, problemas estes que surgem apenas marginalmente no livro de [ó. Os paralelos formais do diálogo, vinculado em parte a uma narrativa de enquadramento, bem como da maneira de expor retórica e por vezes didática não vão, contudo, além das formas de falar de uso geral na literatura sapienciaL Acima de tudo, chamou-se a atenção para certos textos sumériobabilônicos": o "Diálogo de um Sofredor com seu Amigo Piedoso"," "Eu Quero Louvar o Senhor da Sabedoria" (ludlul bel nêmeqii," "Do Justo Sofredor"? e "O Homem e seu Deus",43 para só mencionarmos os mais importantes." GESE supôs, para uma grande parte desses textos, o gênero literário do "paradigma de atendimento das queixas, (Klageerhõrungsparadigma)". Mas eles apresentam diferenças tão notáveis (monólogo - diálogo; orações de ação de graças, acompanhadas da descrição da antiga desgraça - queixa, acompanhada de uma promessa divina), que devem W. HOLSTIJN, "Een 'arische' [obeíde", NThSt 22 (1939),52-60. Cf. particularmente H. JUNKER, Pyramidenzeit, 1949. - E. OTTO, Der Vorwurf an Goii, 1951. 39 GESE 51-62. - S. N. KRAMER, "Sumerian Literature and the Bible", em: Studia Biblica and Orientalia, II11959, 185-204. - A. KUSCHKE, "Altbabylonische Texte zum Thema 'Der leidende Gerechte", ThLZ 81 (1956), 69-76. - W. G. LAMBERT, Babylonian Wisdom Literature, 1960. - J. J. STAMM, Das Leiden des Unschuldigen in Babylon und Israel, 1946. 40 ANET 438-440. - LAMBERT 63-91. 41 AOT 273-281. - ANET 434-437. - LAMBERT 21-62; 42 J. NOUGAYROL, "Une version ancienne du '[uste souffrant'", RB 59 (1952),239-250. 43 J. J. A. VAN DIJK, La Sagesse suméro-accadienne, 1953, 122-127. 44 Cf. também VAN DIJK 1215, 128-133. 37
38
§ 50. O
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Já
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constituir gêneros literários distintos. Além disso, do ponto de vista da história das formas, eles se aparentam mais com os salmos do que com o livro de [ó, com o qual, aliás, apresentam muito poucos pontos de contato em termos de conteúdo, principalmente porque descrevem precisamente aquele comportamento que Jó rejeita no confronto com seus amigos. E muito mais ainda: seria ir longe demais partir de pretensos salmos babilônicos de declaração de inocência do rei, que contêm uma confissão negativa, e tomar os referidos textos sumério-babilônicos como forma de transição de um "tipo de [ó", para, a partir daí, traçar a linha que leva até ao livro de [ó e, de novo, refazendo o caminho em sentido contrário, seguir a figura de [ó até à ideologia do rei com seus ritos de paixão." O único resultado que se colhe é que a forma dialogal utilizada como debate já pertence à literatura sapiencial sumeriana, onde o julgamento da divindade e a reconciliação dos litigantes se seguem à disputa, que vem acompanhada de uma introdução. É somente sob esta forma que o poeta de Jó depende dos modelos antigos, correntes havia desde muito tempo na literatura sapiencial de sua época. Fora disto, porém, sua obra não depende de nenhum outro modelo literário, e em seu conjunto ela aparece no Oriente Antigo como algo de inteiramente único.
7. História dos materiais e dos motivos Quanto às particularidades da história dos materiais e dos motivos, verifica-se que o poeta de [ó utilizou uma ampla gama de elementos. Assim, ele se serve do patrimônio internacional da doutrina sapiencial formativa; supõe o conhecimento de antigos mitos tp.ex. 3.8; 15.7s), e inicia algumas tentativas de sistematização científica (p.ex., 10.8-11; 38s). Ele escreve como erudito para eruditos. Antes do mais, ele se acha profundamente enraizado na fé do ATe baseado nos materiais e motivos tradicionais da literatura veterotestamentária. Em todo o livro só se encontram uns poucos versículos em que faltam os aspectos idênticos e as semelhanças com outros livros do AT. De modo particular, entre os pressupostos do poeta está a sabedoria da vida, com sua crença bilateral a respeito da retribuição e baseada na ordem universal estabelecida e implantada por Deus. Evidentemente que o poeta vive em meio a uma crise profunda do sistema da teologia sapiencial, 45
I.
ENGNELL,
Gamla Testamentet, I (1945), 68.
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Os
LIVROS SAPIENCIAIS
sistema que soçobra em face da realidade da vida e da irrupção do numinoso, cuja presença é experimentada agora como sempre. Portanto, do mesmo modo como o poeta teve de elaborar um plano próprio para o conjunto de sua obra, sem quaisquer modelos, embora estivesse em contato com a literatura internacional, assim também se utilizou de certos esboços científicos e sistemáticos, embora somente para descrever certas conexões em que se tratava da irrupção do irracional e de determinados problemas, não teóricos mas vitais. Embora estivesse vinculado aos materiais do AT, contudo, em meio ao abalo sofrido pela fé tradicional de seu tempo, teve de procurar um caminho próprio que da crise o levasse a bases sólidas e resistentes. No particular, isto se verifica constantemente na duplicidade de tradições, bem como em uma nova interpretação e na utilização de materiais e das concepções tradicionais como recursos através dos quais ele, o poeta, procurou exprimir suas próprias idéias.
8. História das formas Os problemas referentes à história das formas (Formgeschichte) foram estudados a fundo recentemente a partir de dois ângulos bastante distintos. Depois de VOLZ e BENTZEN*, WESTERMANN entende o livro de [ó como uma queixa apresentada sob a forma de drama, e que, como todas as queixas do AT, se divide em uma queixa dirigida a Deus, em uma queixa pessoal e em uma denúncia contra os inimigos (no caso, os amigos de [ó). RICI-ITER, pelo contrário e em seguimento a KOHLER, parte simplesmente dos gêneros literários correntes na vida judiciária, e interpreta o livro como um processo judicial, no qual têm lugar, sucessivamente, a fase preliminar e não jurídica, de conciliação (4-14), o processo judicial de conciliação entre os amigos e [ó (15-31),a retomada do litígio por Eliú e a sessão de julgamento de Deus, na forma de um processo profano, entre Deus e [ó, com a declaração final deste, de que renuncia à questão. As duas pesquisas, porém, são unilaterais, apesar dos importantes resultados que trazem. O problema é muito mais complexo.
Os elementos formais da disputa travada entre [ó e os amigos provêm quase todos de três domínios": da doutrina sapiencial utilizam-se as
46
Não entram em consideração a maldição de 3, as formas originariamente proféticas de 22 e o juramento de 27.
§ 50. O LIVRO DE Já
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formas isoladas, como as "disputas dos sábios", pressupostas em lRs 1O.1ss e documentadas na literatura egípcia; da vida judiciária, se utilizam tanto as formas isoladas do processo judicial como os "discursos das partes perante a comunidade judicial", posto que muitas vezes os juízes provinham das escolas de sabedoria; e da lírica cultual utilizam-se, em primeira linha, as formas lingüísticas e estilísticas dos cânticos de lamentação e dos hinos. Na disputa de Já com Deus, os discursos de desafio de Já seguem, antes de tudo, o modelo dos salmos de lamentação ("narrativa" dos infortúnios e protestação de inocência), onde a prova de inocência se inspira numa série apodítica de regras de vida e de comportamento, e no juramento prestado ante a comunidade judiciária. Os discursos não visam a um oráculo cultual de Javé, subseqüente à queixa, mas propõe a Deus um desafio judicial que, por sua vez, não tem em vista um julgamento de Deus no processo judicial, mas se destina a provocar o encontro pessoal com Deus. Aparentemente, o discurso de Deus corresponde ao oráculo de Javé, que se emitia depois da queixa ou do julgamento divino no processo judicial; contudo, não foi formulado de modo claramente positivo ou negativo, mas constitui realmente um discurso polêmico e, dada a sua função, também uma pergunta decisiva, apresentada a Já. Na parte central, que é a mais extensa, utilizam-se elementos da ciência das listas, cultivada pela sabedoria educacional. A resposta de Já corresponde à ação de graças ou à certeza de pronto atendimento para o suplicante, em seguida ao oráculo de Javé, ou à apropriação da sentença no processo judicial. Além das formas sálmicas e jurídicas, o discurso de Deus encerra também formas sapienciais e, do ponto de vista do conteúdo, apresenta a conversão radical de Já como resposta à pergunta decisiva, colocada por Deus. Para além disso tudo, é preciso considerar ainda a duplicidade de formas e de funções. Acontece não raras vezes que os modos de falar recebem, dentro do novo contexto, funções novas que se diferenciam mais ou menos acentuadamente de sua significação original, e podem inclusive transformar-se no inverso, como acontece de modo particular nas formas de lamentação (3; 6-7) e nos hinos (3.17-19; 7.17s; 9.12s; 10.8-17; 23.13). Cabe à Exegese examiná-las em seus particulares."
47
Cf. também os exemplos reunidos por G. FOHRER, "From und Funktion in der Hiobdichtung", ZDMG 109 (1959),31-49 (= Studien zum Buche Hiob, 1963,68-86).
468
OS LIVROS SAPIENCIAIS
A diferença entre forma e função nos mostra que a forma utilizada não corresponde necessariamente ao conteúdo, nem permite deduzi-lo sem mais nem menos. Este é um dos aspectos que devem ser levados em conta para uma compreensão global e formal do livro de Já. Pode-se muito bem classificá-lo como obra poética, emoldurada por uma narrativa dentro da qual se desenrola, no plano da vida e da doutrina, um debate em torno do "problema de Já".
9. O problema do livro
o poeta de Já não aborda o problema da Teodicéia, sob a forma do sofrimento merecido do justo, ou sob a forma da justiça de Deus, em contraposição com a experiência humana. Isto estaria em contradição com o pensamento concreto e subjetivo do israelita. Também ele não apresenta pura e simplesmente um acontecimento. Pelo contrário: trata-se aí de um problema vital: o problema da existência humana vivida no sofrimento; trata-se da questão sobre o modo de proceder corretamente dentro dessa existência. Já vive o comportamento que lhe parece possível e correto. Os amigos querem ensinar-lhe um comportamento que, no seu parecer, é o melhor, e Deus o coloca diante do problema decisivo no que respeita a seu comportamento. Se as respostas dadas a esse problema, no Antigo Oriente, foram determinadas sobretudo pela atuação da magia ou do culto sobre os demônios ou sobre os deuses causadores do sofrimento, o livro de Já apresenta sobretudo algumas respostas diferentes, que o poeta de Já evidentemente não admitiu. A narrativa que enquadra o poema interpreta o sofrimento como provação do homem que deve, por este meio, confirmar a sua piedade que alimentara até então. Os amigos de Já atribuem a infelicidade às culpas do homem, e o convidam a se desviar do mal, a se voltar humildemente para Deus e a se converter radicalmente. Apenas Eliú modifica e diferencia estas colocações. Contra tudo, levanta-se a obstinação prometeico-titânica de Já, que se sabe plenamente inocente. Passando por cima de todas estas opiniões - as ortodoxas e as heréticas -, o poeta de Já, que faz Deus condenar, inclusive, os amigos de Já, apesar de sua fé imaculada, e recomendá-los à intercessão daquele Já que antes parecia tão herético, parte em busca de sua própria solução, a qual atesta a profunda influência da fé profética": a atitude correta do homem no sofri48
Cf. também 15 51.7s; SI 73.25-28.
§ 51. O
ECLE5IA5TE5 (COÉLET)
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mento é o silêncio humilde, na plena entrega de si mesmo, brotando da paz em Deus, e baseada não somente na intuição de que o sofrimento decorre de uma intervenção misteriosa, impenetrável, mas inteiramente lógica de Deus, mas também na certeza da comunhão com Deus, a qual faz com que tudo o mais seja secundário.
§ 51. O ECLESIASTES (COÉLET) ATD: W. ZIMMERLI, 1962. - BOT: J. VAN DER PLOEG, 1953. - COT: G. CH. AALDER5, 1948. - HAT: K. GALLING, 1940. - HK: K. SIEGFRIED, 1898.HS: A. ALLGEIER, 1925. - IB: O. S. RANKIN, 1956. - ICC: G. A. BARTON, 1908, (1948). - KAT: H. W. HERTZBERG, 1932. - KAT2. - ID., 1962. - KEH: F. HITZIG - W. NOWACK, 2a ed., 1883. - KHC: G. WILDEBOER, 1898. - SAT: P. VOLZ, 2a ed., 1922. - SZ: W. VOLCK, 1889. - Estudos especiais: A. BEA, 1950. - R. GORDIS, 2a ed., 1955. - R. KROEBER, 1963. - G. KUHN, 1926. - E. PODECHARD, 1912 (Études Bibliques). - J. STEINMANN, 1955. - M. THILO, 1923. - V. ZAPLETAL, 2a ed., 1911. - G. W. H. BICKELL, Der Prediger über den Wert der Daseins, 1884. - H. J. BLIEFFERT, Weltanschauung und Gottesglaube im Buch Kohelet, Diss. Rostock, 1938. - M. J. DAHOOD, "Qoheleth and Recent Discoveries", Bibl39 (1958),302-318. - K. GALLING, "Kohelet-Studien", ZAW 50 (1932), 276-299. - ID., "Stand und Aufgabe der Kohelet-Forschung", ThR NF 6 (1934), 355-373. - ID., Die Krise der Aufkliirung in Israel, 1952. - ID., "Das Râtsel der Zeit im Urteil Kohelets (Koh 3,1-15)", ZThK 58 (1961), 1-15. - H. L. GINSBERG, Studies in Koheleth, 1950. - ID., "Supplementary Studies in Koheleth", PAAJR 21 (1952), 35-62. - ID., "The Structure and Contents of the Book of Koheleth", VTSupp13, 1955, 138-149.- R. GoRDIS, "Quotations in Wisdom Literature", JQR 30 (1930/40), 123-147. - ID., "Qoheleth and Qumran - a Study of Style", Bibl 41 (1960), 395-410. - H. W. HERTZBERG, "Palâstinische Bezüge im Buche Kobelet", ZDPV 73 (1957), 113-124, e em: BaumgiirtelFestschrift, 1959, 63-73. - P. KLEINERT, "Sind im Buche Koheleth ausserhebrãische Einflüsse anzuerkennen", ThStKt 56 (1883), 661-682. - ID., "Zur religions- und kulturgeschichtlichen Stellung des Buches Koheleth", ibid. 82 (1909), 493-529. - L. LEVY, Das Buch Qoheleth, ein Beitrag zur Geschichte desfSadduziiismus, 1912. - A. H. MACNEILE, An Introduction to Ecclesiastes, 1904. - A. MILLER, "Aufbau und Grundprobleme des Predigers", em: Miscellanea Biblica, 11 934, 104-122. - J. PEDERSEN, "Scepticisme israélite", RHPhR 10 (1930),317-370. - H. RANSTON, Ecclesiastes and the Early Greek Wisdom Literature, 1925. - H. H. ROWLEY, "The Problems of Ecclesiastes", JQR 42 (1951/52), 87-90. - W. E. STAPLES, "The 'Vanity' of Ecclesiastes", JNES 2 (1943), 95-104. - W. ZIMMERLI, Die Weisheit des Predigers Salomo, 1936.
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1. Valor canônico, terminologia, autor
o livro que agora estudamos pertence aos cinco Megillôt e era destinado à Festa dos Tabernáculos. Assim, logo depois de seu aparecimento ele conquistou não pequena reputação e passou a pertencer aos escritos com os quais aos poucos foi-se formando a terceira parte do cânon hebraico. Dos fragmentos encontrados na gruta 4 de Qumran e que datam de cerca da metade do séc. 11 a.c., pode-se concluir que na época ele já possuía um certo valor canônico. Esta obra, contudo, não permaneceu sem contestação. Já o seu epílogo (12.9-14) parece ter-se defrontado com ela, enquanto os vv. 9-11 elogiam o livro, por causa de suas palavras agradáveis e verídicas. No v. 12 o autor previne, pelo contrário, contra semelhante atividade literária, enquanto nos vv. 13-14 procura salvá-la como sendo de utilidade prática, mediante uma explanação no sentido do judaísmo fiel à Lei. Particularmente em épocas posteriores levantaram-se também outras objeções contra sua inclusão no cânon, nas quais se apontavam as contradições internas do livro e as contradições com o restante do AT. Na Mishná [adaiim 3,5 se encontra a mais importante coletânea das diferentes opiniões neste sentido, originárias do séc. 11 d.C. Não se verificou, porém, nenhuma alteração no que respeita à sua posição no cânon. O nome do livro deriva do próprio título 1.1: Palavras de Coélet, filho de Davi, rei emJerusalém. De fato, a palavra Coélet foi traduzida por ekklesiástes, concionator; "pregador", às vezes explicitada com o acréscimo do nome de Salomão, em substituição a Filho de Davi. A palavra Coélet é o particípio feminino de qahãi - cujo substantivo nos livros de Esdras e Neemias designa as grandes reuniões da comunidade - e não um erro de tradução de um particípio aramaico masculino (GINSBERC). Que o termo, equivalente mais ou menos a aquela que reúne, seja usado para designar um homem, se explica pelo fato de que originariamente servia para descrever uma atividade ou um ofício, sendo depois aplicado ao respectivo depositário. Em Esd 2.55.57 encontram-se paralelos, onde as denominações de determinados ofícios - como os deescriba ou de capturador degazelas - se transformaram nos nomes dos seus portadores e por fim se tomaram simplesmente nomes de pessoas. De modo semelhante, Coélet primeiramente se refere ao ofício de dirigir ou de falar na assembléia e, depois, à pessoa do dirigente ou do orador da assembléia. Assim o termo em questão atribui ao filho de Davi, mencionado no título, uma capacidade oratória especial como atributo do sábio.
§ 51. O
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Várias vezes, de acordo com o título, o autor aparece como rei 0.12,16; 2.7,9), precisamente porque uma nova interpretação no sentido de "chefe de escola" (LEVY) ou uma transvocalização para "homem abastado, grande proprietário" (GINSBERG) seria improváveL Embora a frase: Todos os que me precederam em Jerusalém (1.16) pareça supor uma série de reis," contudo, por rei se deve entender Salomão, que, além de Davi, foi o único rei que governou sobre todo o Israel (1.12). Na realidade, Salomão era considerado como o sábio por excelência, e por isso podia-se-lhe atribuir um livro deste gênero. Evidentemente não se pode dizer que Salomão tenha sido o seu autor. O fato de lhe ter sido atribuído, não passa de uma ficção literária fracamente dissimulada e logicamente mal executada. Independentemente de tudo aquilo que indica um aparecimento tardio do livro, já a partir do capo 3 não se fala mais de Salomão e as sentenças posteriores a respeito do rei nos mostram o autor na sua qualidade de súdito. Ele não se preocupa mais em aparecer como Salomão ao longo do livro. Que ele surja como tal no começo da obra, talvez seja por imitação de um costume egípcio, que fazia os mestres de sabedoria descenderem de antigos reis. Salomão, a quem já na época do autor se atribuía uma parte do livro dos Provérbios, era a figura mais indicada, por causa de sua sabedoria e da saga que envolvia seu reinado. O autor, segundo indica o seu nome, era um desconhecido mestre de sabedoria, como também o explica claramente o epílogo 02.9). De acordo com o estilo e o conteúdo, seu livro pertence inequivocamente à literatura sapienciaL
2. Origem e estrutura As opiniões a respeito da origem e da estrutura do livro se movimentam - como sempre - nos extremos opostos. De um lado, THILO e BEA julgam ter demonstrado a existência de uma disposição, executada segundo um plano bem definido e dentro de uma progressão lógica das idéias, hipótese esta que dificilmente se pode aceitar, pois certas idéias repetem-se algumas vezes e o resultado das reflexões aparece tão claro já em 1-2/ como depois em 11-12. Também não se pode suprimir as dificuldades de uma ordenação lógica, fazendo transposições e eliminações no texto, como 49
Assim, o Tamulde babilônico Baba Bathra 15a pensa inclusive que o livro foi composto por Ezequias e seus homens.
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BICKELL, sobretudo, o fez, partindo da suposição de que as folhas do manuscrito original foram trocadas por engano e de que seu conteúdo foi deturpado, também, por acréscimos e transposições. O próprio pressuposto de que se tratava de um códex e não de um rolo, já é duvidoso em si. Por outro lado, SIEGFRIED decompõe o livro em toda uma série de fontes e de revisões, quais sejam: um escrito pessimista fundamental; um saduceu epicurista; um mestre de sabedoria; um ortodoxo, que coloca o acento na ordem justa do universo. A estes se acrescentam ainda outros glosadores, redatores e epilogistas. Esta opinião encontra-se, sob sua forma intermediária, em PODECHARD (além de MAcNEILE, BARTON), o qual vê em ação, não apenas Coélet, mas dois de seus discípulos e um sábio que escreve poeticamente, os quais acrescentaram também algumas perícopes avulsas. Das repetições, contradições e irregularidades ocasionais de estilo não se podem, porém, tirar conclusões tão amplas. Entre esses extremos, encontramos uma opinião que se aproxima da primeira indicada acima e segundo a qual o livro apresenta plena homogeneidade no conjunto das idéias e uma determinada concatenação de pensamento (HERTZBERG), embora em sua maior parte as perícopes pudessem ter sido trocadas umas pelas outras. Uma segunda opinião é aquela que,com base nos métodos de trabalho utilizados na literatura sapiencial, admite uma colocação das sentenças e de grupos de sentenças em que as sentenças teriam sido formuladas primeiramente em separado e depois agrupadas em séries (GALLING).
o livro não apresenta uma construção coerente, nem também uma progressão nas idéias. E só com dificuldade é que se pode estabelecer uma certa concatenação de pensamento. O que há de original são as sentenças em si, as quais dificilmente surgiram de um só lance. As inegáveis repetições, contradições e desigualdades de estilo nos permitem deduzir que as sentenças foram formuladas no decurso de um longo período de tempo. O passo seguinte consistiu, como de costume, na justaposição de sentenças por grupos, com base nas palavras-chaves ou nas idéias afins. Assim os ditos de 1.12-2.26 indagam a respeito do papel da Sabedoria e da Loucura. Em 5.9-6.9 Coélet se ocupa com a vacuidade das riquezas; em 7.1-8.1, com a verdadeira sabedoria; em 8.2-9.12, com a impenetrabilidade dos acontecimentos injustos, e em 9.13-10.11, com a inutilidade da sabedoria. Além disso, pode-se discernir ainda um terceiro elemento, qual seja o de uma certa organização do conjunto. As sentenças em 1-3 expõem as idéias críticas fundamentais do sábio, às quais se seguem, a partir do capo 4, a aplicação aos diversos problemas individuais a respeito da exis-
§ 51. O
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tência, Na conclusão (11.1-8 e 11.9-12.8), elas recapitulam, mais uma vez, as idéias básicas e o conselho positivo de Coélet.
3. As sentenças Excluindo-se o epílogo (12.9-14) e alguns acréscimos menores, todas as sentenças, como nos mostram, em particular, o vocabulário e o estilo, derivam de um único autor, ao qual chamamos de Coélet. Evidentemente nem sempre é possível delimitá-las com segurança, porque faltam quase sempre as fórmulas introdutórias e conclusivas, e muitas vezes não são suficientes os critérios adotados pelo método da história das formas. Daí é que se explica a divergência dos números de sentenças entre os exegetas. Quanto à questão, de não menor importância para um livro sapiencial, de saber se se trata de uma obra em prosa ou em poesia, de novo as opiniões são muito diversas: prosa (KÚNIG,50 PODECHARD), alternância de prosa e poesia (OELITZ5CH, RENAN, NÚTSCHER51), poesia com métrica regular (GRIMME, HAUPT,52 BICKELL), ou com métrica irregular (ZAPLETAL,53 HERTZBERG). Ora, o próprio epílogo já supõe que se trata de sentenças metrificadas, e a isto não se pode contradizer. Mas não há um ritmo elegante e sempre igual. As idéias difíceis e insólitas do autor não se deixam facilmente enquadrar em esquemas. Entretanto, em toda parte é possível discernir um metro irregular e sempre cambiante, muito fácil de confundir com a prosa. Coélet se exprime em um estilo inteiramente independente e singular, que imediatamente chama a atenção do leitor. 54 Sua linguagem é também caracterizada por uma série de palavras-núcleos que se repetem freqüentemente, e das quais basta-nos enumerar as seguintes: vaidade, proveito, pariicipacão." Sua linguagem é a linguagem da época tardia, como nos mostram, de modo impressionante, os exemplos recolhidos por DELITZSCH, SIEGFRIED e PODECHARD, e se acha impregnada de aramaísmos. "Poesie und Prosa in der altherbrãischen Literatur abggrenzt", ZA W 37 (1917/1918), 152-157. 51 FRZ. DELITZSCH, 1875 ("Biblischer Commentar über das AT", IV, 4). - F. NÓTSCHER, 1948 ("Echter-Bibel"). - E. RENAN, 1882. 52 H. GRIMM em ZDMG 51 (1897), 689. -P. HAUPT, Koheleth oder Weltschmerz in der Bibel, 1905. 53 V. ZAPLETAL, Qohelet, Líber Ecclesiasticus, Textum hebr. critice et metrice ed., 1906. 54 Cf. p.ex., a exposição detalhada de GORDIS, 87-111. 55 Cf. também HERTZBERG 30-32. 50
E. KÓNIG,
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OSLIVROS SAPIENCIAIS Por isso é que foram defendidas, inclusive, teses segundo as quais o livro teria sido escrito originariamente em aramaico e traduzido, a seguir, para o hebraico (especialmente ZIMMERMANN, TORREy56, GINSBERG). Mas então os aramaísmos propriamente ditos deviam ter sido traduzidos igualmente e os casos de assonância remontariam ao tradutor. A dependência de Coélet em relação aos livros do ATe a dependência de Sirac (Eclesiástico) em relação a Coélet, como igualmente a ficção de um documento salomônico pressupõem um texto hebraico. Excluise uma tradução feita pela primeira vez na época dos Macabeus, pois que o livro já possuía um status canônico em meados do séc. 11 a.c. (Qumran). GORDIS foi o que mais rigorosamente se pronunciou contra a referida tese." Em contraposição, OAHOüO supõe urna forte influência da linguagem fenícia, concluindo daí, inclusive, que Coélet viveu em uma cidade fenícia da costa." Mas o seu vocabulário, com base no qual OAHOüO pretende provar a existência de um ambiente comercial, contém, até quase à metade, um fundo vocabular comum, enquanto o modo de escrever sem matres lectionis certamente era desconhecido no hebraico da época de Coélet. Esta tese, portanto, deve ser recebida também com bastante reserva.
4. Época e lugar Com base na pesquisa da linguagem, que é mais nova do que a linguagem dos livros de Esdras, Neemias e Malaquias, é possível fixar a época de origem do livro de Coélet no máximo até ao séc. IV a.c. Acrescente-se a isto o fato de que 5.3-5 depende, sem dúvida, de Dt 23.22-24, e 5.14; 6.3b-5,lOs; 8.4, do livro de [ó. Exclui-se, porém, a hipótese ocasional de um aparecimento em cerca de 125 a.c. (RENAN), 100 a.c.
CH. C. TORREY, "The Question of the Original Language of Kohelet", JQR 39 (1948/ 1949), 151-160. - F. ZIMMERMANN, "The Aramaic Provenance of Qohelet", ibid. 1745. - lo., "The Question of Hebrew in Qohelet", ibid. 40 (1949/1950), 79-102. 57 R. GORDIS, "The Original Language of Qohelet", JQR 37 (1946/1947), 67-84. - Io., "The Translation theory of Qohelet Re-Examined", ibid. 40 (1949/1950), 103-116. lo., "Koheleth - Hebrew or Aramaic?", JBL 71 (1952),93-109. - lo., "Was Kohelet a Phoenician?, ibid. 74 (1955),103-114. 58 M. J. OAHOOO, "Canaanite-Phoenician Influence in Qohelet", Bibl 33 (1952),30-52, 191-221. - lo., "The Language of Qohelet", eBQ 14 (1952),277-232. - Semelhantemente C. H. GORDON, Ugaritic Litterature, 1949, 133, que em outra parte pretende demonstrar a presença de particularidades norte-israelíticas: "North Israelite Influence on Postexilic Hebrew", lEJ 5 (1955), 85-88.
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(LEIMDORFER,59 KONIG, HAUPT), ou na época de Herodes (GRAETZ),60 precisamente tendo-se em vista as descobertas de Qumran. Além disso, Sirac (Eclesiástico) em 180 a.c. conhecia e utilizou o livro de Coélet." Se considerarmos, ademais, as coordenadas da história do pensamento, então não resta senão aceitar sua datação no séc. III a.c., como freqüentemente se propôs. Evidentemente no livro de Coélet não se devem procurar alusões à história da época que correspondam a esta posição. Os vv. 4,13-16; 9,13-16; 10,16, que são citados de preferência neste sentido, ocupam-se mais com casos típicos do que com casos históricos e concretos. Mesmo as referências ao "rei", nas quais HERZBERG acredita ver alusões a uma atitude filoegípcia do Coélet, em meio às contendas dos Selêucidas e Ptolomeus, são igualmente imprecisas em suas concepções, e seus conselhos correspondem à doutrina sapiencial em geral.
Para o lugar de origem tem-se pensado sobretudo no Egito ou na Palestina." Com efeito, na Alexandria do Egito do séc. III a.c. floresceram a vida intelectual e o mundo das letras, e, não menos, também no seio da população judaica. Em contrapartida, no livro de Coélet encontram-se referências claras à Palestina, para as quais GALLING e HERTZBERG chamaram a atenção: muros divisórios e quebra de pedras (10.8s), fontes e cisternas (12.6), a casa palestinense (10.18), o vento, as nuvens e a chuva (14.4; 12.2). É sobretudo por isso que se deve pensar em Coélet na Palestina e mais, precisamente, em Jerusalém (santuário: 4.17; 5.5; 8.10).
5. História das formas A pesquisa das sentenças de Coélet pelo método da história das formas leva diretamente ao conhecimento das características específicas do seu pensamento. Excluídas certas considerações de ordem genérica (1.211; 3.1-9), bem como determinadas máximas sapienciais que refletem a sabedoria tradicional (10), são especificamente de Coélet as sentenças em "eu" e em "tu" (p.ex., eu: 1.12-15,16-18; tu: 4.17-5.6; 5.7s). Ambos os tipos são formas estilísticas do discurso sapiencial. No primeiro caso, o sábio D. LEIMOORFER, 1892, 2i1 ed. 60 H. GRAETZ, 1871. 61 Quanto aos particulares, cf. HERTZBERG 46-49. 62 DAHOüO (ver acima, nota 58): costa fenícia; GORDON (nota 58): diáspora oriental.
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expõe as experiências extraídas da vida, que não devem ser necessariamente experiências pessoaís.f As sentenças do segundo tipo correspondem aos objetivos da doutrina sapiencial, sem que tenha sido sempre preciso supor um discípulo especiaL O aspecto mais importante é a mudança da forma simples da sentença, de estrutura mais ou menos desenvolvida, para uma composição de vários planos. Nas formas mais concisas, como em 1.16-18, o mestre executa três passos: parte da própria observação ou de um repertório de experiências, verifica a seguir o resultado, e acrescenta um provérbio ou algo de semelhante, para corroborar seu pensamento. Em casos particulares, a forma pode ser repetida ou ampliada dentro de uma sentença (2.111,12b). Semelhante a esta é a forma construída em três planos, como se pode ver, p.ex., em 3.1-15: tema, deduções, e um provérbio para confirmar. Em primeiro lugar, pode-se observar uma mudança de estrutura da doutrina sapiencial, em decorrência de uma mudança na estrutura da consciência. A pessoa, o eu, se distancia do acontecimento ou da situação com os quais parecia estar ligada. O sujeito que contempla se contrapõe ao objeto contemplado, como se fosse uma pessoa desligada dele." Em segundo lugar, Coélet recorre a provérbios para confirmar ou justificar suas opiniões. Ao criticar a sabedoria de seu tempo, como adiante veremos, ele apela para o fundo tradicional que, por causa de suas constatações e regras pragmáticas, foi desdenhado pela teologia sapiencial que ambicionava um sistema abrangente. Este é um dos traços conservadores do observador e pensador crítico, com sua personalidade particular.
6. Caráter peculiar de Coélet No que respeita ao caráter peculiar da sabedoria de Coélet tem-se partido freqüentemente de uma dependência mais ou menos pronunciada com relação à literatura estrangeira/" Do mesmo modo como antes de se estabelecer uma comparação entre o AT e a literatura vétero-oriental, admitia-se quase exclusivaCf. a este respeito. O. LORETZ, "Zur Darbietungsform de 'Ich-Erzãhlung: in Buche Qohelet", CBQ 25 (1963),46-59. 64 H. GESE, "Die Krisis der Weisheit bei Koheleth", em: Les Sagesses du Proche-Orient ancient, 1963, 139-151. 65 Sobre o que se segue, cf, a discussão detalhada de KROEBER 47-59, e LORETZ. 63
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mente a influência grega (especialmente PFLEIDERER)66 e se redescobriam em Coélet as idéias de inúmeros filósofos gregos, assim também esta tese foi defendida até à época moderna sob uma forma modificada, e entre outras coisas se pensou na dependência com relação a Teógonis (RANSTON). Supõe-se naturalmente também a influência do pensamento da época helenística que era aquela em que Coélet vivia. Poder-se-ia inclusive considerar determinadas expressões, como 'asã tôb, "procurar o bem-estar para si" (3.12) e miqreh, "destino" (2.14; 3.19; 9.2s), como grecismos. Entretanto, no máximo pode-se pensar em contatos ocasionais e numa influência genérica do pensamento grego (EISSFELDT)*, o qual poderia ter chegado a Coélet através do convívio com círculos helenísticos. Uma série de fatos concretos para os quais HUMBERT67 e GALLING, sobretudo, chamaram a atenção, indicam, pelo contrário, relações com o Egito. Sob este aspecto, a conexão com o papiro de Insinger - evidentemente ainda não esclarecida - pode ter desempenhado um determinado papel. Alguns trechos paralelos parecem supor relações literárias; assim, p.ex., os textos da sabedoria de Ani com 2.4ss; o texto da introdução à doutrina de Ptah-hotep com 11.9-12.8, e o discurso de conclusão da mesma com 9,1. Desde que Coélet dificilmente deve ter lido textos egípcios, talvez seja preciso supor a existência de uma obra literária traduzida para o aramaico, existência esta confirmada para o séc. V a.c. pelo fragmento de Aicar, originário de Elefantina, e por mais seis fragmentos de uma narrativa egípcia. Existem, entretanto, relações muito mais numerosas, e mesmo, sob vários aspectos, inclusive talvez uma certa dependência no tocante à literatura sapiencial e contestatória da Mesopotâmia. LORETZ, que vê Coélet exclusivamente no contexto desta tradição, chamou a atenção para o paralelismo estrutural surpreendentemente abundante entre as duas sabedorias, e em particular para as semelhanças notáveis com a epopéia de Gilgamesh.
Entretanto, nem sempre é possível deduzir uma dependência literária ou ideológica, particularmente no caso da doutrina sapiencial que, em estágios análogos da evolução, pode tirar conclusões semelhantes da idêntica experiência da vida. No caso de Coélet, isto vale, p.ex., para suas afirmações a respeito da situação político-social e para suas exortações à discrição nas coisas referentes ao culto.
66 E. PLEIDERER, DiePhilosophie des Heraclit von Ephesus im Lichte derMysterienidee, 1886. 67 P. HUMBERT, Recherches sur les sources égyptiennes de la littérature sapientiale d'lsraêl, 1929.
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OS LIVROS SAPIENCIAIS
Não se pode, contudo, entender a sabedoria de Coélet exclusivamente a partir deste ângulo. Ela deve ser vista na sua relação com aquela hokma, "sabedoria", com a qual ele se defronta. Trata-se, como no poeta de [ó, da sabedoria escolástica do sistema teológico cuja doutrina fundamental - a crença na retribuição -, que para ele perdeu a credibilidade. Levanta-se, portanto, a questão de saber se a doutrina sapiencial com isto perdeu a sua validade, de modo que já não pode servir como fundamento para a vida. Isto seria tanto pior, quando não se podem resolver os problemas da existência, gozando da vida a plenos haustos. É verdade que Coélet atribui um valor relativo à teologia sapiencial (2.3,14,16;4.13; 10.12); mas em última análise ela não traz nenhum proveito (2.15; 9.11), nem é melhor do que a loucura (1.16s; 6.8). Coélet, portanto, se volta contra a auto-suficiência com que o sistema procura abarcar o mundo e a vida em sua totalidade, e chama a atenção para os limites que excluem toda segurança para a vida e, conseqüentemente, todo e qualquer proveito - e estes limites são a morte e a mulher (2.15s,21; 7.26). Em suma, o destino do homem não depende de seu comportamento piedoso e justo, como o afirma a doutrina tradicional, mas está de modo arcano e inescrutável nas mãos de Deus (8.17; 9.1). Se o sistema da teologia sapiencial para nada presta, que resta então a fazer? Não resta senão, em vez do lucro geral, gozar plenamente, numa existência ativa, daquela parcela de vida que ao homem é concedida (9.710). A primeira parte do conselho de Coélet no sentido de viver na alegria e gozar da existência tem estreito paralelo no cântico do harpista da literatura sapiencial egípcia e nos conselhos da taberneira da epopéia de Gilgamesh, onde igualmente se acha indicada uma limitação negativa (a morte). A segunda parte do conselho de Coélet - ou seja o de gozar plenamente da vida, através de uma existência ativa - corresponde à consolação que Gilgamesh encontra em sua obra: a construção das muralhas de Uruk, só que neste caso a obra é considerada como o resultado da atividade, ao passo que em Coélet trata-se da própria atividade. Estes paralelos dificilmente seriam casuais, mesmo que idéias semelhantes tenham sido expressas alhures. Elas se acham tão intimamente ligadas ao caráter conservador de Coélet, que é possível determiná-las inclusive pelo método da história das formas. Coélet apropriou-se de uma concepção antiga e a contrapôs ao sistema criticado da teologia sapiencial. Este sistema, com efeito, tem semelhanças com a procura da imortalidade por parte de Gilgamesh, porque deve tornar realidade o único, o permanente e o definitivo. Em vez disto, Coélet chama a atenção para as limitadas possibili-
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ECLE5IA5TE5 (COÉLET)
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dades do homem, e procura reconduzir as idéias ao antigo estágio pragmático da doutrina sapiencial. Por esta razão ele não é um cético propriamente resignado, como em geral se tem admitido, mas somente naquilo que diz respeito às possibilidades de um sistema teológico que era considerado como a panacéia de todos os males, e naturalmente também no que respeita à loucura. Resta a possibilidade, já apontada na epopéia de Gilgamesh - mas reinterpretada como possibilidade oferecida por Deus e que o homem recebe de suas mãos como parcela que lhe é destinada (2.24s; 3.13; 5.17s).
Quarta Parte A Origem dos Livros Proféticos e do Livro Apocalíptico
CAPÍTULO
X
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ASPECTOS GERAIS
484
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1. O Antigo Oriente A história das religiões e as informações até agora colhidas do Antigo Oriente nos mostraram que o profetismo como tal, do mesmo modo como, por exemplo, o sacerdócio, não era uma exclusividade de Israel e do Antigo Testamento. O profetismo, de acordo com os exemplos recolhidos por LINDBLOM e HALLER, não está limitado a uma determinada época ou a uma região, nem a determinados povos, raças ou religiões. Profetas de ambos os sexos ou figuras dotadas de características proféticas podem aparecer em forma mais ou menos pronunciadas onde quer que exista o homem. O elemento comum a todas essas figuras situa-se na linha da estrutura geral e da psicologia, enquanto as diferenças são fortes em consonância com o conteúdo das revelações anunciadas. O profeta ou a profetisa são pessoas dotadas carismaticamente e estão conscientes de terem sido chamados e escolhidos de um modo particular e se sentem impelidos a anunciar as palavras e a executar as ações que lhes foram inspiradas sob a forma de revelações divinas durante um estado psicológico de inspiração, possivelmente acompanhado de êxtase mais ou menos forte. Na esfera do Antigo Oriente este fenômeno não pôde ainda, entretanto, ser comprovado até agora com a clareza desejada, com relação ao Egito. As tentativas nesse sentido! têm sempre encontrado pela frente as 1
F. DAuMAS, "Littérature prophétique et éxegétique égyptienne et commentaires esséniens", em: Mémorial Gélin, 1961,203-222. - A. ERMAN. - R. RANKE, Agypten, 1923. 325s. - G. LANCZKOWSKI, Âgyptischer Prophetismus im Lichte des alttestamentlichen", ZAW 70 (1958), 31-38. - lo., Agyptischer Prophetismus, 1960.
§ 52. A PROFECIA NO ANTIGO ORIENTE EEM ISRAEL
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reservas ou mesmo a rejeição dos estudiosos.' Entretanto, abstraindo das pesquisas ainda não concluídas dos textos até agora conhecidos, a notícia de PLÍNIO, Historia naturalis, VIII 185, de acordo com a qual certos jovens, durante as cerimônias cultuais em honra do boi Ápis, eram tomados de fúria e prediziam o futuro, atesta um certo comportamento profético. A presença de profetas, pelo contrário, é atestada muitas vezes no âmbito das terras de cultura da Ásia ocidental: ocasionalmente para os hititas," mas principalmente para a Síria e Palestina, e também para a Mesopotâmia. O próprio Antigo Testamento menciona os profetas do deus cananeu Baal (lRs 18.19ss; 2Rs 10.19) ou supõe a existência dos profetas como um fenômeno internacional (Jr 27.9). O documento clássico extrabíblico encontrava-se até há pouco no relato de Wen-Amon (Un-Amon), o egípcio, a respeito de sua viagem marítima ao longo da costa síria, a partir de Biblos (ca. de 1100 a.C), durante a qual um dos acompanhantes do rei local cai em êxtase e transmite uma instrução divina.' Entretanto, já desde a época suméria existe uma denominação para esta espécie de extático, que provavelmente significa" o homem que penetra no céu"." Ao âmbito do séc. XVIII nos leva o ãpilum, "aquele que responde", mencionado numa carta do embaixador do rei Zimri-Lim de Mári em Alepo, do qual existe um correspondente feminino e cuja esfera normal de ação era o santuário." Para a época em torno de 1700 existem nove cartas, descobertas em Mári, no médio Eufrates, que atestam a presença de profetas'? chamados quase sempre de muhhílm ou ãpilum ("aqueles que respondem"), e mais uma carta que fala do aparecimento de uma profetisa," denominada H. BONNET, Reallexikon deriigyptischen Religionsgeschichte, 1952, 608s. - S. HERRMANN, "Prophetie in Israel und Agypten", VTSupp19, 1963,47-65. 3 A. GOETZE, Kleinasien, 1933, 139. - EISSFELDT* 103. 4 AOT 71-77. - ANET 25-29. 5 V. CHRISTIAN, "Suru.Iú-an-ná-ba-tu = akkad. mahhü 'Ekstatiker'", WZKM 54 (1957), 9s. 6 A. MALAMAT, "History and Prophetic Vision in a Mari Letter", Ereiz-Israel 5 (1958), 67-73. 7 A. LODS, "Une tablette inédite de Mari, intéressante pour l'histoire ancienne du prophétisme sémitique", em: TH. H. Roemeon-Feetschrijt, 1950, 103-110. - A. MALAMAT, "T'rophecy' in the Mari Documents", Ereiz-Israel 4, 1956, 74-84. - W. VON SODEN, "Verkündigung des Gotteswillens durch prophetisches Wort in den altbabylonischen Brifen aus Mâri", WdO 1 (1947/1952),397-403. - C. WESTERMANN, "Die Mari-Briefe und die Prophetie in Israel", em: Forschung am Alten Testament, 1964, 171-188. 8 ARM VI, Brief 45, ed. J. R. KUPPER, - M. NOTH, "Remarks on the Sixth Volume of Mari Texts", JSS 1 (1956),322-333. 2
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ASPECTOS GERAIS
muhhütum. Pertencem eles a uma classe de homens e mulheres que recebiam incumbências da divindade a cujo templo pertenciam, através de omina, de sonhos e experiências extáticas, e as transmitiam sob a forma de oráculos. Em épocas posteriores," também se conheceram na Babilônia sacerdotes e sacerdotisas que confirmavam o rei com um "sonho falado". Para a Assíria existe documentação que comprova a existência de outra espécie de profecia extática, transmitida por sacerdotisas isoladas, cujo nome se conhece, em particular, junto ao templo de Ishtar de Arbela. No séc. XV, uma carta de Revashsha de Taanak menciona um ummânu de Astarte, conhecedor da magia e da visão do futuro. lO Por fim, uma inscrição do rei Zaquir de Hamat (ca. de 800 a.C) talvez se refira a videntes." Mesmo que não se possa traçar uma história continuada, constata-se que o profetismo extático das terras de cultura é muito antigo, e que a presença simultânea de sacerdotes e de profetas é um fenômeno bastante normal. Este profetismo já era conhecido dos antigos israelitas que vieram da Mesopotâmia setentrional, e se apresentou sob sua forma cananéia aos grupos e tribos israelitas que se instalaram na Palestina. Dado que os israelitas levaram uma vida nômade ou seminômade antes de conquistarem o país, é de relevância saber que neste domínio parece ter existido uma outra espécie de profetismo para o qual foi sobretudo PEDERSEN quem chamou a atenção," isto é, a categoria dos videntes. É bem verdade que só se pode conhecê-los sob sua modalidade mais recente que é a da figura do kahin árabe; mas a continuidade das formas de existência no Oriente torna provável que este tenha sido o tipo nômade de profecia. Como diz o próprio termo, o vidente se achava vinculado ao mundo divino, primariamente através da visão, e secundariamente pelo ouvir, de modo que ele comunicava suas instruções sobretudo com base em suas visões e em sonhos premonitórios. Também pode-se constatar através de Balaão que o vidente quase sempre tirava seu oráculo daquele sobre o qual o seu olhar recaía em primeiro lugar.
AOT 281-284. W. F. ALBRIGHT, "A prince of Taanach in the Fiteennth Century B. C", BASOR 94 (1944), 12-27. a 11 AOT 443s. - ANET, 1955, 2 ed., 501s. 12 J. PEDERSEN, "The Role played by Inspired Persons among the Israelites and the Arabs", em: Th. Robinson-Festschrijt, 1950, 127=142.
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§ 52. A
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2. Antigo Israel No antigo Israel encontram-se sociologicamente condicionadas as duas formas de profetismo: a figura do extático, que se acha ligado aos cultos excitantes da fecundidade dos países de cultura, ou seja, a figura do nabi (nabi', "aquele que foi chamado"), e a figura do vidente (rõ'eh) hõzeh), associado ao âmbito da vida nômade. Evidentemente, o profetismo vidente bem cedo desapareceu, do mesmo modo que a herança nômade. Um de seus últimos representantes foi Natã. Seja como for, a ele estão ligados os aparecimentos, no profetismo posterior, de profetas como figuras individuais, com seu conhecimento misterioso de coisas desconhecidas, e o papel, muitas vezes sem significação do êxtase. O profetismo extático ocupa mais o primeiro plano, onde o êxtase se faz sentir de maneira muito acentuada e persistente, e pode se apossar de uma multidão inteira, de sorte que os nebiim primitivos aparecem o mais das vezes em grupos e se acham mais estreitamente vinculados ao santuário ou ao culto do que os videntes (lSm lO.5ss). A existência paralela dos exaltados e dos alienados (Jr 29.26) nos mostra como a evolução exterior foi determinada por este fenômeno. Os videntes e os nebiim, aos quais alude ISm 9.9, fundiram-se no profetismo israelita propriamente dito, sob o influxo da fé javista. Daí é que resulta a grande variedade de formas: ao lado dos grupos que são mencionados com freqüência, surgem figuras isoladas como Aías de Silo (lRs 11.29ss; 12.15; 14.1ss; 15.29), Semeías (lRs 12.21ss), Sedecias (lRs 22.11) e Miquéias filho de [emla (lRs 22.13ss). Entretanto, é somente a partir de Elias (lRs 17-19; 21; 2Rs 1) e de Eliseu (2Rs 2-13) que se pode ter um quadro mais eu menos claro do fenômeno.
3. A época da chamada profecia escrita Na época da chamada profecia escrita formou-se uma classe bastante numerosa de profetas, partindo de formas mais ou menos antigas, que se dividem em diversos tipos, mas que podemos compreender sob o título geral de "profetas profissionais do culto". Além dos profetas desvinculados, que circulavam pelo país, contam-se entre eles os profetas que ajudavam junto aos santuários, ao lado dos sacerdotes, e cujas palavras foram conservadas, em parte, nos salmos, em
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seções isoladas dos livros proféticos ou em livros inteiros, como também se contam profetas áulicos, ligados aos santuários reais e empregados pelos soberanos como seus conselheiros. A classe dos profetas profissionais do culto existiu até à época posterior ao exílio, embora, dado o seu caráter carismático, não se possa falar de uma instituição permanente e de um "ofício" de profeta. Era nos santuários, aos quais não estavam tão vinculados como os sacerdotes, que esses profetas transmitiam os oráculos divinos ou exerciam o papel de intercessores junto a Deus. Quase sempre eles representam a linha oficial cultual e nacional da fé javista, que é fundamentalmente determinada pelo fato de ver Israel, por força de sua íntima relação com Javé, numa situação preexistente de salvação. Israel pode modificar esta situação com os crimes individuais, mas pode também restabelecê-la sempre de novo, com as adequadas medidas de expiação. Ou também os indivíduos podem abandonar esta situação, mas serão . chamados a prestar contas. É por isso que os profetas profissionais anunciam que todo inimigo de Israel e de Javé será aniquilado, ao passo que o povo de Israel receberá, pelo contrário, uma salvação constante (Ir 14.13). Ao lado desses, surge também o grupo, numericamente pequeno, dos grandes profetas individuais da época anterior ao exílio. São eles: Amós e Oséias, Isaías, Miquéias, Sofonias, Jeremias e Ezequiel, nos quais a profecia do Antigo Testamento alcança o seu apogeu. Eles exercem a sua atividade, não por um título profissional, mas graças a uma vocação especial que os arrancou de uma profissão que eles haviam aprendido. Eles atuam na vida de seu povo, não como membros de uma corporação ou de uma classe; não como representantes de um clã ou de uma tribo; não como funcionários de um santuário ou de um rei; pelo contrário: eles se sabem exclusivamente representantes e mensageiros de seu Deus, para além de todas as vinculações de parentesco, sociais, nacionais e cultuais. Ao contrário dos profetas profissionais, eles vêem a criatura humana numa situação fundamental de perdição na qual caiu por se recusar a confiar em Deus, por se recusar a se entregar a ele, por haverse revoltado contra ele e por afastar-se dele, e tudo isto como manifestação e fruto de uma atitude fundamental e global que se encontra por trás de cada um dos delitos censurados. Por isso, eles esperam que, depois dos reveses admonitórios que já precederam, venha uma punição aniquiladora, embora isso não seja o que Deus propriamente quer. Como esse castigo não é necessariamente inevitável, nem a atitude falsa do
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homem é insuportável, os profetas acenam com a possibilidade do perdão e de uma nova salvação. Por isso o seu tema central é o da alternativa da ruína ou da salvação do homem, sem terem sido, no entanto, meros pregadores de penitência. É à possibilidade de salvação que se refere o apelo à conversão, sobre o qual insistiram Amós, Isaías e Miquéias, ao passo que esse apelo foi substituído em Oséias, Jeremias e Ezequias, numa fase posterior de sua atividade, pela oferta de salvação da parte de Deus, como segunda possibilidade de salvação. Tanto num caso como no outro, trata-se de uma transformação radical, interior e exterior, de onde resulta um homem novo que vive em comunhão com Deus e cumpre sua vontade, a fim de que Deus possa reinar sobre o mundo. Estes profetas pregam, no mínimo, não a partir de uma ideologia petrificada, mas a partir de uma vida de fé pessoal. Outrora, em Israel, quando se falava de profetas, pensava-se sobretudo nos profetas profissionais, como constituindo uma classe representativa, ao lado da qual outros surgiram apenas esporadicamente. Os grandes profetas individuais constituíam fenômenos isolados. Esta concepção só começou a se modificar na época do exílio, sob a influência deuteronomista, quando se foi percebendo que eram poucos aqueles que tinham razão e os profetas profissionais estavam errados. Por isso, depois do exílio, a classe dos profetas profissionais foi aos poucos perdendo prestígio e acabou por se integrar nas corporações de cantores do templo, ao passo que os oráculos dos grandes profetas individuais foram recolhidos cada vez mais e tidos como sagrados.
4. Profetismo escatológico Com o Dêutero-Isaías, pelos fins do exílio, tem início a fase do profetismo escatológico que assume as tradições anunciadoras de salvação tanto dos grandes profetas individuais como dos profetas profissionais. Exceto o Dêutero-Isaías e alguns desconhecidos que ainda encontravam palavras ousadas e profundas, trata-se, na maior parte, de epígonos aos quais faltam a clareza e o vigor da profecia mais antiga, como as de Is 24-27; 33; 34-35; 56-66; [oel, Ageu, Zacarias e Malaquias, e ainda as palavras individuais espalhadas em outros livros. Por isso compreende-se que seu número e seu conceito tenham decrescido e que a teologia rabínica se tenha preocupado em limitar o aparecimento dos profetas legítimos a um passado ideal. A profecia escatológica reinterpreta a alternativa dos grandes profetas individuais, no sentido de um "antes" e de um "depois" na
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ordem do tempo. Sente-se aí o eco da mensagem de salvação dos profetas profissionais do culto, com base na qual a vontade salvífica de Deus é acentuada de modo unilateral. Simultaneamente, a ruína de Jerusalém e o exílio são considerados como a execução do julgamento outrora anunciado. Ora, como este julgamento não é mais visto como uma possibilidade sempre ameaçadora, mas antes como um acontecimento histórico que se deu uma única vez, a ele só se pode seguir uma era nova e definitiva de salvação. Assim os profetas escatológicos distinguem entre duas eras, em cujo limite eles acreditam estarem e pintam de modo variado e freqüentemente com cores luminosas a fase de transição de uma para outra idade, como também a idade ideal em que o próprio Deus dominará sobre todas as coisas por intermédio de seu "Messias" enquanto seu representante. Entretanto, ao lado de tais expectativas, muitas vezes bastante materiais, outras também se fazem sentir: a conversão de todos os homens para o único Deus e a paz eterna sob seu senhorio.
5. Apocalíptica Depois que a expectativa da próxima realização da escatologia do período final do exílio e da época posterior falhou, porque, apesar das promessas cheias de esperança dos profetas, tudo permanecia como dantes, e vastos círculos da comunidade abandonavam a escatologia, esta evoluiu para a apocalíptica, sob a influência das idéias da teologia sapiencial e das concepções vindas de fora, principalmente da cosmovisão iraniana dualista. Dos escritos desta apocalíptica só o livro de Daniel foi recebido no AT, abrindo, deste modo, a série dos livros apocalípticos. Estes escritos pretendem desvendar os mistérios dos tempos finais e oferecem revelações sobre o evoluir e o passar das idades do mundo, para, a partir daí, determinar não apenas o momento preciso do fim de toda história, mas também a posição exata do seu próprio presente. Nesses apocalipses se contrapõem reciprocamente a história como um todo e o reino de Deus que começará depois de um futuro juízo final. Assim, a concepção dualista de Deus e do mundo se associa às concepções de uma substituição do mundo presente por uma nova criação e do estabelecimento de uma nova teocracia da qual farão parte, imediatamente ou depois da própria ressurreição, todos aqueles que viverem na expectativa apocalíptica. A profecia mais antiga foi, assim, substituída definitivamente por um novo pensamento e uma nova fé.
§ 53. A
PREGAÇÃO PROFÉTICA E SEUS GÊNEROS LITERÃRIOS
§ 53. A PREGAÇÃO PROFÉTICA E SEUS GÊNEROS LITERÁRIOS L. ALONSO SCHÓKEL, Estudios de Poética Hebrea, 1963. - R. BACH, Die Aufforderungen zur Flucht und zum Kampf im alttestamentlichen Prophetenspruch, 1962. - F. BAUMGÂRTEL, "Die Formel rr''um jahwe", ZA W 73 (1961), 277-290. - K. BEYER, Spruch und Predigt bei den vorexilischen Schriftpropheten, Dis. Erlangen, 1933. - H. J. BOECKER, Redeformen des Rechtslebens im Alten Testament, 1964.- H. A. BRONGERS, Descheppingtradities bijdeprofeten, 1945. - I. ENGNELL, "Profetia och tradition", SEA 12 (1947), 110-139. - G. FOHRER, "Die Gattung der Bericht über symbolische Handlungen der Propheten", ZAW 64 (1952), 101-120. - lo., Die symbolischen Handlungen der Propheten, 1953. - lo., "Prophetie und Geschichte", ThLZ 89 (1964),481-500.- B. GEMSER, "The rib- or ControversyPattern in Hebrew Mentality", VTSuppl3, 1955, 120-137. - E. GERSTENBERGER, "The Woe-Oracles of the Prophets", JBL 81 (1962),249-263. - H. GRESSMANN, Der Messias, 1929,65-148. - K. lliRMs, Die Falschen Propheten, 1947. - J. HARVEY, "Le 'Ríb-Pattern', réquisitoire prophétique sur la rupture de l'alliance", Bibl43 (1962), 172-196. - J. HEMPEL, "Jahwegleichnisse der israelitischen Propheten", ZAW 42 (1924), 74-104 (= Apoxymata, 1961, 1-29). - lo., "Prophet and Poet", JThSt. 40 (1939), 113-132 (= ibid. 287307: alemão). H. W. HERTZBERG, "Die prophetische Kritik am Kult", ThLZ 75 (1950), 219-226 (= Beítrâge zur Traditionsgeschichte und Theologie des Alten Testaments, 1962,81-90). - F. HESSE, "Wurzelt die prophetische Gerichtsrede irn israelitischen Ku1t?", ZAW 65 (1953),45-53. - G. HÓLSCHER, Die Profeten, 1914. - F. HORST, "Die Visionsschilderungen der alttestamentlichen Propheten", EvTh 20 (1960), 193-205. - E. JENNI, Die politischen Voraussagen der Propheten, 1956. - A. S. KAPELRUD, "Cult and Prophetic Words", StTh 4 (1950), 5-12. - KÓHLER, Deutero-jesaja (Jesaja 40-55) stilkritisch untersucht, 1923. - H.-J. KRAus, Die prophetische Verkündigung des Rechts in Israel, 1957. - J. LINOBLOM, Die literarische Gattung der prophetischen Literatur, 1924. - lo., "Einige Grundfragen der alttestamentlichen Wissenschaft", em: Bertholet-Festschrift, 1950,325-337. - W; F. LOFfHousE, "Thus Hath [ahveh Said", AJSL 40 (1923/24),231-251. F. MAAss, "Zur psychologischen Sonderung der Ekstase", WZ Leipzig 3 (1953/54),297-301. - S. MOWINCKEL, "'The Spirit' and the 'Word' in the Pre-Exilic Reforming Prophets", JBL 53 (1934), 199-227. - lo., "Ecstatic Experience and Rational Elaboration in the Old Testament Prophecy", AcOr Leiden 10 (1935),264-291. - lo., "La connaissance de Dieu chez les prophêtes de l'Ancien Testament", RHPhR 22 (1942), 69-105. - lo., "Ekstatiske innslag i profetenes oplevelser", NTT 49 (1948), 129-143, 193-221. - E. OSSWALD, Falsche Prophetie im Alten Testament, 1962. - G. QUELL, Wahre und falsche Propheten, 1952. - G. VON RAo, Theologie des AltenTestaments, TI, 4il 00.,1965. - R. RENoToRFF, "Priesterliche Ku1ttheologie
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1. A função dos profetas A atividade profética começa a partir do momento em que o profeta se sente chamado por Deus e pode se desenvolver sem interrupção, a despeito da recusa (Os 9.7b) ou da contestação dos ouvintes (Ez 12.21ss); pode ser suspensa em conseqüência de uma pressão exterior (Am 7.10ss), ou interrompida temporariamente pelo profeta, porque a profecia não obtém êxito Os 8.16-18) ou porque o profeta se adapta a uma nova mensagem (Ez 3.22-27; 24.25-27; 33.21s). É da essência do profetismo que a pregação em geral seja feita diretamente àqueles aos quais a mensagem se destina. Por isso, em primeira linha os profetas anunciam os seus oráculos, mais ou menos longos, de forma direta, ou seja, oraL Neste sentido, a expressão "profetas escritores" é equívoca quando tomada ao pé da letra e só deve ser recebida com reservas no que respeita aos profetas cujos oráculos, ao contrário dos de outros profetas, foram consignados por escrito e transmitidos em um determinado estágio. Os profetas, além disso, freqüentemente executavam ações simbólicas. Paralelamente à palavra profética, essas ações constituem uma segunda modalidade de pregação através de um ato concreto, e indicam, muito mais fortemente do que
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a palavra oral, que a mensagem profética pretende ser eficaz. Com efeito, originariamente, na base das referidas ações havia outras através das quais se acreditava poder alcançar aquilo que elas representavam. Os profetas evidentemente tinham consciência de que o acontecimento anunciado se haveria de concretizar, não em virtude de uma força mágica da ação, mas pela vontade e pelo poder que Deus tem de realizar aquilo que se anuncia mediante a ação simbólica (FOHRER).
2. Gênese do oráculo profético A gênese do oráculo profético - e correspondentemente a experiência íntima ou a realização daquilo sobre o qual nos falam os relatos proféticos - se desenvolve normalmente no curso de um processo mais ou menos prolongado, que se desdobra, pelo menos, através de quatro estágios (HEMPEL*), a saber: O primeiro estágio é aquele em que Deus se apossa interiormente da pessoa do profeta, ou seja: é o momento em que o "Espírito" ou a "palavra" de Deus vêm sobre o profeta - no caso dos nabis e dos profetas ligados ao culto o papel principal é exercido pelo "Espírito", e nos grandes profetas individuais, ao contrário, pela "palavra" - ou em que o profeta é arrebatado para outra esfera. Nesse momento, ele tem uma" experiência íntima" (GUNKEL). Situam-se dentro desta experiência a visão, como em Is 6; a audição, como em [r 4.5ss a inspiração súbita, como em Is 7.13ss, ao que se acrescenta um conhecimento miraculoso, como em [r 4-6 a respeito do inimigo que vem do norte. Essa experiência profunda é um processo da consciência psicológica em estado de vigília, mas pode vir acompanhada de uma experiência extática. Ao contrário do que pensa uma apreciação exagerada segundo a qual o êxtase se acha na base de toda as experiências e constitui a fonte do conhecimento profético em geral (HÓLSCHER), ele pode ser considerado apenas como um epifenômeno das experiências profundas; pode, no entanto, alcançar uma intensidade que leva à experiência do enlevo ou do arrebatamento, como em EzequieL Além do mais, é preciso distinguir esta experiência do êxtase místico de fusão, porque o profeta continua percebendo-se a si mesmo como pessoa diante de Deus. Por isso, o mais correto é chamá-lo, com LINDBLOM, de êxtase de concentração, durante o qual a vida psicológica se concentra em um determinado sentimento ou em uma determinada representação ou grupo de representações, quando então cessa a influência da consciência e os sentimentos exteriores deixam mais ou menos de funcionar. Em tudo isto vem sobre o profeta uma força à qual ele não pode subtrair-se. O que
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quer que ele experimente ou perceba, exerce sobre ele uma pressão que o obriga a traduzi-lo em palavras e a anunciá-lo (Ir 20.9: Am 3.8). É por isso que, em seguida à experiência íntima e profunda, o profeta começa logo seu trabalho de assimilação. No segundo estágio, o profeta procede à interpretação e à explanação de sua experiência pessoal, de acordo com a fé em que ele vive. A nova experiência é interpretada de tal modo, que cada acontecimento particularmente vivido se enquadra na visão geral anterior da natureza e da vontade de Deus, reforçando-a e tornando-a mais presente. É esta interpretação que decide, o mais das vezes, quem seja o falso e quem seja o verdadeiro profeta. No terceiro estágio procede-se a uma revisão intelectual. Como o objeto da experiência deve ser anunciado, não pode simplesmente permanecer no plano do balbucio oral, mas deve ser traduzido em palavras inteligíveis e racionais. Isto acontece de modo tão espontâneo, que o profeta muitas vezes acrescenta uma fundamentação oportuna ou insere na palavra de Javé uma conclusão daí decorrente. Além disso, nesta "fase surgem conscientemente palavras próprias do" profeta que ele formula à margem de uma experiência anterior, na certeza de estar falando como mensageiro de Deus. Pode-se dizer que quanto menos reflexão e quanto menos revisão intelectual uma palavra profética revelar; quanto mais sucinta e fielmente ela anunciar a palavra de Deus; quanto mais fortemente ela deixar transparecer um complexo de vozes primitivas tp.ex.: Is 8.1), tanto mais próximos nós nos acharemos de sua origem (HEMPEL*). Corre paralelo ao terceiro estágio, como quarto elemento, o processo de aperfeiçoamento artístico em que as idéias são revestidas de determinados modos de falar, alguns deles já fixados desde tempos imemoriais, e também colocadas em formas métricas e poéticas. Este processo de aperfeiçoamento pode formar e empregar artisticamente uma imagem ou uma representação, como a imagem do fogo que provém de Javé (Am l.3ss), ou como a imagem de sua mão estendida Os 9.7ss).
3. Estilo do oráculo profético No estilo dos oráculos proféticos" muitas vezes ainda é perceptível a experiência profética, de sorte que as imagens se repelem umas às outras, a linguagem parece descuidada e se observam transições repenti13
Para o que segue, cf. H.
GUNI
Die Propheten, 1917.
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nas. Um bom exemplo desse agitado estilo poético encontramos na descrição de [r 4.5-8,13,22,de uma vivacidade dramática. Também nos deparamos freqüentemente com um certo modo misterioso de expressar-se, como, p.ex., nos nomes dos filhos de Isaías (Is 7.3; 8.1-4). Uma outra particularidade são as circunlocuções poéticas, como aquela de Jeremias: inimigo do norte, que é como ele denominou mais tarde os babilônios, e também cidade sangüinária (Na 3.1). Por fim, convém mencionar o modo bastante concreto e superlativo de expressar-se que se tornou mais agudo ainda no confronto com o modo israelítico habituaL O estilo profético é caracterizado também pelas fórmulas introdutórias e conclusivas mediante as quais uma palavra profética é qualificada como palavra de Javé: assim fala Javé, que serve de introdução, quando se emprega a fórmula vulgar de mensagem, e palavra deJavé, que é utilizada o mais das vezes como conclusão. Estas fórmulas podem variar poeticamente de inúmeras maneiras. A isto se acrescentam ainda muitas outras fórmulas introdutórias, criadas pelo próprio profeta. Elas indicam quem é o "eu" divino que envia, a quem é que a mensagem se dirige ou quem é convidado a escutar (Is 1.2). Podem igualmente descrever a situação do profeta no momento em que teve a experiência secreta (Is 8.11). Na maioria das introduções e dos relatos das vocações e das visões servem para legitimar o profeta e para fundamentar sua autoridade. Por fim, o profeta pode ampliar a introdução de uma palavra com uma justificativa que nos faz compreender a decisão divina que vem logo a seguir (Am 4.1). As peculiaridades sintático-gramaticais consistem nas questões e nos imperativos que se acumulam, e também no chamado perfeito profético enquanto expressão de acontecimentos futuros que para o profeta parecem tão certos e tão reais, como se já tivessem acontecido.
4. Gêneros literários Os gêneros literários da pregação profética podem dividir-se em três grandes grupos: os oráculos proféticos, os relatos proféticos e os modos de falar copiados de outros domínios. A pesquisa desses gêneros não apresenta uma linha de continuidade mas uma grande diversidade de colocações, limitando-se o mais das vezes a um determinado aspecto do conjunto, ou seja: os oráculos que acusam os pecados e anunciam o castigo divino por causa deles, ao passo que os oráculos de promessas, os relatos proféticos e as formas copiadas de outros setores foram deixados de lado, e só recentemente foram focalizados, em numerosos estudos individuais.
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Depois que se constatou, sobretudo, que os livros proféticos foram compostos a partir de numerosos oráculos e relatos individuais (BAUDISSIN*), STEUERNAGEL* mostrou que a forma básica dos oráculos é constituída pelas acusações dirigidas contra o povo, e que se identificam com o convite a fazer penitência, e pelo anúncio do julgamento que tem por finalidade provocar a conversão do povo. Enquanto HOLSCHER constatava a proximidade do oráculo profético com a fórmula mágica e identificava sua estrutura rítmica, GUNKEL 14 punha em relevo a variedade dos modos proféticos de falar que foram tomados de empréstimo, em grande parte, de outros domínios, e via a fórmula profética primordial nos oráculos que descrevem o futuro das nações. GRESSMANN, pelo contrário, vê esta forma primitiva na combinação do anúncio da desgraça com o anúncio de salvação (vindo a ameaça muitas vezes associada a uma recriminação), que só se desfaz quando a profecia de desgraça se separa da profecia da salvação. Certas pesquisas a respeito de determinados escritos proféticos - BALLA sobre Amós, ScOTI sobre Isaías, WILDBERGER sobre jeremias" - se baseiam, quanto à substância, nas descobertas de GUNKEL, que HEMPEL* compendiou e modificou a partir do material recentemente obtido. Com LINDBLOM e KOHLER, ao invés, tem início um novo caminho que toma como ponto de partida a fórmula de mensagem: assim falou Javé, e acentua o caráter de mensagem do oráculo profético. Este mesmo caminho é trilhado por WOLF, segundo o qual o profeta é um mensageiro que deve anunciar o julgamento e a salvação que virá de Javé, e que só deve justificar sua missão apenas como "intermediário". Deste modo renuncia-se à possibilidade de entender a palavra profética a partir de uma experiência profética, em favor de uma aparente objetivação do oráculo profético enquanto palavra divina. Em minuciosa pesquisa sobre os anúncios de perdição, e inteiramente dentro de uma linha de princípio, WESTERMANN considera os oráculos proféticos como palavra de mensagem. Ele destaca como forma fundamental do discurso profético a palavra de julgamento em que figuram os elementos da justificativa e do anúncio (em vez da recriminação e da ameaça), correspondendo, na estrutura, ao processo judicial ordinário, e que o profeta transmite. Mas com isto ainda não se pode dizer a palavra definitiva. A objetivação aparente da palavra divina custou um preço muito alto, sacrificando-se os elementos pessoais que indubitavelmente existiram e são o que distingue claramente um oráculo de Isaías de um
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Jahwewort und prophetische Rede bei[eremia, 1942.
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oráculo de Oséias ou de Jeremias. Se não se quer retomar a uma teoria da inspiração global, é preciso conceder que o profeta participa, como homem, da formulação estrutural e do conteúdo de seus oráculos. Desde que ele tem, enquanto homem, uma psiqué, não se pode evitar uma investigação psicológica em que seja tomada em consideração a experiência profética. Além do mais, é improcedente, do ponto de vista do método da história das formas, considerar o oráculo profético como palavra de mensagem, apenas porque o profeta usa com freqüência a fórmula de mensagem, como RENDTORFF o demonstrou. Se é verdade, por outro lado, que o próprio profeta formulou, pelo menos em grande parte, a palavra de Javé que ele anuncia, e se é verdade que sua opinião pessoal se manifesta na fundamentação da ameaça de infortúnios e em numerosos oráculos não considerados como palavra de Javé, então é problemático contrapor ao extremo da teoria da experiência o extremo da teoria da mensagem. Na realidade, trata-se apenas de dois, dentre os muitos aspectos da pesquisa de uma situação sumamente complicada. A. O oráculo profético quer comunicar a vontade de Javé tal qual se faz sentir em ordem à preparação do futuro, como decorrência da presente situação existencial do homem. Seria de todo inexato, quando não equívoco, usar neste sentido o termo" vaticínio" (Weissagung), que LUTERO limitou, também, sobretudo aos falsos profetas de Israel e aos profetas pagãos. O essencial não é a predição miraculosa de acontecimentos de um próximo futuro, com os quais os profetas, evidentemente, se enganaram. O elemento decisivo consiste em que as coisas anunciadas estejam em vias de se realizar e que o profeta tenha precisamente tempo suficiente de chamar a atenção para o fato ocorrido e de convidar os interessados a tirar daí as devidas conclusões para o presente. O profeta fala do futuro, para determinar e criar o próprio presente sobre o qual ele deve e pretende anunciar. a) A fórmula primitiva da palavra profética e o oráculo propriamente dito, originariamente recebido no santuário por intermédio do profeta ligado ao culto, como resposta a uma pergunta feita a uma divindade por parte dele ou através de uma consulta dirigida a ele. Este oráculo profético aparecia ao lado do oráculo sacerdotal (§ 10,1), e o encontramos ainda numa série de salmos (como, p.ex., SI 20[19],7ss; 60[59],8ss; 85[84],9ss; 95[94],7ss), onde foi dado como resposta ao cântico de lamentação (§ 39,3), e numa série de ditos proféticos (como, p.ex., lRs 14.5ss; 2Rs 20.1; [r 37.17). O oráculo, de modo geral, tem por introdução a expressão: kõ 'amar yhwh (s'ba'õt), "assim disse Javé (dos exércitos)", como fórmula litúrgico-
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cultuaI. 16 O oráculo sempre anuncia o futuro imediato, em termos de salvação ou de desgraça, a partir da situação presente, garantindo, portanto, ao interessado a possibilidade de, já agora, no momento presente e pelo seu comportamento, assegurar para si a salvação e evitar a desgraça. Foi nesse sentido aliás que tudo correu bem para Ezequias (2Rs 20.2ss). Ao lado disso, o profeta pode também exercer a intercessão junto a Javé. A passagem do oráculo propriamente dito para o oráculo profético anunciador de salvação ou de desgraça verifica-se quando o oráculo é dado sem ter havido uma consulta, como em 2Rs 20.1. b) O oráculo anunciador de desgraça é a ameaça que anuncia uma desgraça, imediatamente acompanhada de justificativa ou sem ela, por causa do pecado dos homens. É a ameaça que predomina nos grandes profetas individuais. [r 28.8s a considera como um dos critérios da mensagem do verdadeiro profeta, ao passo que nos profetas de salvação é somente a realização de seu anúncio de salvação que indica se Javé os enviou. WESTERMANN, que dedicou uma pesquisa aprofundada a este tipo de oráculo, apresentando resultados isolados convincentes, pretende qualifica-lo como palavra judicial, e tenta igualmente mostrar que seus elementos constitutivos são a justificativa (acusação) e o anúncio (sentença judicial), em vez dos gêneros literários da invectiva e da ameaça, que ele admite alhures, separadamente. Ele distingue entre a palavra de julgamento, dirigida contra os indivíduos, como o tipo mais antigo, e o anúncio do juízo dirigido contra o povo na profecia escrita. É desta última forma que ele faz derivar todos os gêneros literários proféticos importantes. Talvez seja, porém, de importância chamar o referido oráculo profético de "ameaça", "anúncio de julgamento" ou "anúncio de desgraça". Seja como for, a segunda expressão aponta de novo na direção da objetivação da experiência, ao passo que a expressão"ameaça" significa que a promessa de castigo não está vinculada necessariamente a um gesto ou sinal correspondente. Que o conceito deixe, porém, em aberto a realização do que foi ameaçado, não constitui vantagem, mas toca precisamente no problema, porque muitas ameaças foram retiradas tp.ex., Am 7.1-6), ou mais freqüentemente não se concretizaram (p.ex., Is 22.14). Por isso, a referida expressão pode ser mantida. Levantam-se dúvidas também contra a definição jurídica unilateral deste tipo de oráculo profético, como igualmente contra o
16
Cf. F. BAUMGÀRTEL, "Zu den Gottesnamen in den Büchern [eremia und Ezechiel", em: Rudolph-Festschrift, 1961, 1-29.
§ 53. A PREGAÇÃO
PROFÉTICA E SEUS GÊNEROS LITERÁRIOS
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fato de se derivar a partir daí muitos dos modos de falar, e, não menos, contra a opinião de que a chamada invectiva não é um gênero literário autônomo, mas a fundamentação - pertencente à mesma, em termos de gênero literário - do anúncio de desgraça. Em contraposição, é preciso distinguir cuidadosamente entre a justificativa de uma ameaça e a invectiva autônoma.
A ameaça ocorre sob três formas distintas: como pura ameaça, sem fundamentação": como ameaça acompanhada de justificação": e como uma combinação de ameaça e de invectiva.'? Em particular, a ameaça deve ser dividida em três tipos: ameaça contra os indivíduos, contra o povo e contra as nações. A ameaça contra os indivíduos" tp.ex., Am 7.16s; incompleta, p.ex. em 1Rs 21.17-19; 2Rs 1.3s) compreende, em ordem de sucessão, o convite a escutar, a fundamentação, e o anúncio da desgraça, acompanhado da fórmula introdutória da mensagem. A ameaça pressupõe, na origem, uma situação de salvação que subsiste para a coletividade e da qual um determinado indivíduo é excluído por causa de seus pecados, sem que toda a coletividade se veja atingida por isso. Dos grandes profetas, Amós, Isaías e Jeremias foram os que a usaram amplamente como complementação e suas promessas de castigo. A ameaça dirigida contra o próprio povo tem início com Amós e parte da transmutação das coisas na perspectiva dos grandes profetas individuais, que já não vêem o seu povo numa situação de salvação, mas numa situação de desgraça. Ela contém, não de modo regular, mas com freqüência, uma justificativa que pode apresentar uma forma ampliada ou ser substituída por uma invectiva; o anúncio da desgraça, introduzido pela fórmula de mensagem ou por um simples por isso, que deve realizar-se pela intervenção de Javé, e uma descrição das conseqüências dessa intervenção. A ameaça contra outros povos é constituída, em geral, como aquela dirigida contra IsraeL Na origem talvez tenha sido semelhante à ameaça dirigida contra os indivíduos, pois teve sua origem no âmbito da pregação de salvação dos profetas profissionais do culto que anunciavam a 17Limitando-nos a dois livros proféticos: Is 3.25-4,1; 7.18s,20,21s; 10.24-27; 17.1s,3,4,5a,5b,6; 18; 29.9-11; 30.27-33; 32.9-14; Am 3.13b-15; 4.16s; 8.9s,11-14. 18 Is 3.1-9,16-24; 8.5-8; 28.1-4,14-22; 29.13s; 30.6s,8-14,15-17; Am 1.3ss; 4.1-3. 19 15 5.8-10,11-13; 22.1-14,15-19; 30.1-4; 31.1-3; Am 3.9-11; 4.7-11; 6.1-7,135; 8.4-7. 20 Cf. também a enumeração em WESTERMANN 98.
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desgraça do inimigo e conseqüentemente a salvação para o próprio povo (já na carta ARM XIII, 23 de Mári; em Naum, Habacuc), A ameaça pode vir também ligada ao cântico de zombaria (Is 37.22ss), ou seguir o esquema dos textos de proscrição egípcios, como se pode ver na justaposição que se lê, p.ex., em Am 1,33ss. Os próprios grandes profetas individuais a associaram à ameaça de calamidade pronunciada contra Israel, de modo que ela passa a atestar, com uma nova significação, a majestade transcendental de Deus. c) O oráculo profético promissor de salvação é a palavra de salvação que, numa determinada situação concreta de calamidade, anuncia a mudança do destino portadora de salvação. Indiretamente, a ameaça dos profetas de salvação dirigida contra outros povos era, ao mesmo tempo, palavra de salvação para Israel. Também devemos mencionar a intercessão profética, que pode ter como finalidade a obtenção de um oráculo positivo. Especificamente existiam igualmente palavras de salvação para os indivíduos (às quais se acrescentam a exortação: Is 7.1-9), para o próprio povo, e para outros povos. Enquanto as duas primeiras já faziam parte da profecia de salvação, a última aparecerá pela primeira vez na profecia escatológica. Contrariamente, as palavras de salvação são raras nos grandes profetas individuais, e só se encontram em Oséias, Jeremias e Ezequiel. A forma da palavra de salvação plenamente desenvolvida, e que BEGRICH qualifica de oráculo salvífico sacerdotal," se encontra nas profecias do Dêutero-Isaías. Essa forma contém a promessa de intervenção divina em favor daquele ou daqueles que procuram a salvação; contém a indicação das conseqüências da intervenção divina e a indicação do objetivo que Javé tem em vista com o seu atendimento. d) Um gênero literário às vezes de época secundária é a invectiva, cuja grande importância se deduz a partir das circunstâncias da pregação profética. Nela o profeta repreende o indivíduo ou o povo todo por causa do seu pecado e de sua culpa. A invectiva pode derivar de duas raízes. Em primeiro lugar, trata-se, em termos da história das formas, do resultado da autonomização da justificação da ameaça, que pode existir sozinha (Is 1.4-9; Am 5.12; 6.12) ou combinar-se, de novo, com a ameaça. Em segundo lugar, as invectivas introduzidas pela palavra hôy, "ai!" constituem um grupo à parte (p.ex., Is 5.8ss; 10.5-15; 29.15). Elas foram formula21
J.
BEGRICH, "Das priesterliche Heilsorakel", ZAW 52 (1934), 81-92 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1964, 217-231).
§ 53. A
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das também pelo profeta e têm suas raízes, não na maldição mágica, nem na maldição sapiencial, mas no grito de lamentação fúnebre. Elas indicam, por isso, que em um determinado comportamento humano reside um germe de morte," de tal sorte que o ai! introdutório da invectiva é o eco da ameaça de calamidade. e) Encontramos exortações e advertências já em épocas antigas, como mostram as cartas de Mári. Elas podem ter-se originado também no âmbito da profecia de salvação ligado ao culto, tendo recebido, a seguir, uma nova função com o advento dos grandes profetas individuais. As admoestações e exortações fazem parte dos modos proféticos originais de falar e podem derivar do oráculo. Seu objetivo, evidentemente, era incitar o consulente a assumir um comportamento que tivesse conseqüências favoráveis para o futuro. Nos grandes profetas individuais, que quase sempre foram eles próprios a formular as exortações, dando-lhes uma forma métrica, elas constituem em geral um convite a se afastar do caminho do pecado para uma nova existência vivida na obediência e na entrega a Deus. Jeremias pode até mesmo resumir sua atividade sob este ponto de vista (Jr 25.3-7). Não é só nas invectivas e nas promessas que se fala da conversão (este último aspecto ocorre pela primeira vez na profecia escatológica: cf. Is 44.21s), mas o é igualmente na advertência contra a desgraça que pesa ameaçadoramente, e como condição para dela ser poupado (p.ex. Is 1.18-20; Am 5.14). Apesar do anúncio do julgamento, que aparentemente é inexorável, indica-se que é possível escapar dele. B. Nos relatos proféticos surgem, às vezes, formas originais antigas que desapareceram em épocas posteriores. a) A palavra do vidente constitui a antiga forma do relato profético de visões e audições. Um exemplo característico neste sentido o encontramos em 1Rs 22.17: o vidente expõe ao interlocutor aquilo que viu e aquilo que Javé lhe disse, juntamente com uma interpretação. É precisamente desta maneira que Balaão deve ver, quando está incumbido de pronunciar um oráculo (Nm 24.41): Javé coloca então uma palavra em seus lábios (Nm 23.5). Quando se reproduz o oráculo, este é introduzido evidentemente pela expressão na 'um) "sentença", que no oráculo profético apare22
Em contrário, dificilmente se poderá acompanhar GERSTENBERGER no derivar a invectiva da ética popular, e tanto menos ainda quando conclui que, a partir das críticas dos profetas nada se pode deduzir a respeito das circunstâncias concretas de sua época.
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ce como fórmula intermediária ou como fórmula conclusiva (Nm 24.3) (BAUMGÀRTEL).
A interpretação objetivante do oráculo profético também não é válida para o oráculo do vidente. A pesquisa de VETTER nos mostra que não se trata de uma palavra divina narrada ou desenvolvida literalmente, mas sempre de um discurso próprio do vidente, que as fórmulas de introdução e as fórmulas de ligação indicam como sendo o sujeito da palavra, embora não a pronuncie por uma autoridade pessoal, mas em virtude de uma autorização recebida de Javé. b) No relato a respeito de uma visão (que em 2Cr 9.29 é designada por trzõi), o profeta descreve aquilo que sentiu em uma experiência íntima. Talvez como um reflexo longínquo do profetismo vidente, a visão pode ligar-se a coisas habituais: a uma cesta carregada de frutos maduros (Am 8.1-3), a uma panela fervente (Jr 1.13) e um ramo de amendoeira (Jr 1.11). Pode tratar-se igualmente de uma visão de acontecimentos e de conexões sublimes ou misteriosas, de sorte que, para cada caso, torna-se preciso uma interpretação, a qual o profeta pode revestir com a forma de uma palavra de Javé. É precisamente nestes casos que se observa o caráter particular do modo de representar, de pensar e de falar dos diversos profetas (comparar entre si Is 6; [r 1.4-10; Ez 1.1-3.15). Especificamente podemos distinguir, com HORST, três tipos de visões: visões de presença (presença de Javé), visões simbólico-verbais, ou visões de assonâncias verbais, e visões de acontecimentos históricos. c) O relato a respeito de uma audição se distingue do oráculo profético, pelo fato de se dizer expressamente que o profeta ouviu a palavra de Javé que lhe falava tp.ex. Is 5.9). Pode também ouvir outras vozes, que ele reproduz, como, p.ex., ordens dadas no país ameaçado de ruína [r 4.5bss), ou o lamento do povo votado à ruína [r 4.31). d) A visão, a audição e os relatos correspondentes aparecem, mui freqüentemente, vinculados entre si, e, não por último, na primeira experiência desta espécie, que devemos mencionar como um caso particular, a saber: a experiência do chamamento, mediante a qual o profeta é convocado para o serviço de Javé. As narrativas têm como raiz comum com os relatos da vocação de Moisés segundo a apresentação do javista, com as narrativas dos patriarcas no Gênesis, onde estão relatados as teofanias e os oráculos de salvação, com o culto subseqüente, o fato de conterem o relato da experiência íntima da vocação, da concessão de dons e da incumbência confiada a um carismático.
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e) Os relatos a respeito de ações simbólicas, que os profetas executa-
vam com freqüência, baseiam-se em uma forma mais antiga do relato de ações mágicas, como se pode ver através das narrativas do javista a respeito das pragas do Egito." Quando o relato é completo, encerra três elementos principais: a ordem dada por Javé para executar a ação; o relato a respeito da execução (o qual muitas vezes falta, porque a execução é considerada como normal), e a explicação do sentido da ação (assim: Ez 12.111; 24.15-24). A isto podem acrescentar-se três elementos colaterais, como sejam: informações sobre a presença de testemunhas oculares, expressões da promessa de Javé de que se realizará aquilo que é simbolizado, e expressões da relação que a ação executada tem com o acontecimento simbolizado. C. Os profetas se apropriaram, numa proporção espantosa, dos modos de falar de outros setores da existência, copiando-os e utilizando-os com uma nova função. Os gêneros literários proféticos e tradicionais eram absolutamente insuficientes, particularmente no que respeita aos grandes profetas individuais e aos profetas escatológicos, para transmitirem sua mensagem. Da mesma forma como eles aperfeiçoaram, para este fim, muitos gêneros literários que já existiam (cânticos de zombaria e cânticos fúnebres), assim também outros gêneros só são conhecidos através das imitações dos profetas. Em muitos casos, contudo, pode-se duvidar se se trata realmente de gêneros literários ou se são apenas formas estilísticas criadas paralelamente. Do âmbito da vida comum foram assimilados e imitados, p.ex.: o cântico de amor, o cântico de escárnio e o cântico fúnebre, desenvolvidos pelos profetas (§ 40), e também as palavras surgidas da discussão." a qual começa, de preferência, com uma pergunta feita ao interlocutor, sob a forma afirmativa, visando a obter dele um assentamento, e tende para a afirmação definitiva ou passa de uma afirmação indiscutível para uma afirmação discutida, ou cita ainda uma objeção e dá uma resposta pronta (Am 3.2). Por fim, foram também assumidos os convites a lutar ou a fugir. Do âmbito cultual foram assumidos e copiados: o estilo hínico e os hinos, o cântico de lamentação (§ 39), a convocação a celebrar as lamentações, a torá sacerdotal (§ 10,3), o oráculo cultual, e ainda a liturgia dos profetas do culto, ou liturgia propriamente cultuai, e a "cantata" enquanto 23 24
Cf. G. FOHRER, Überlieferung und Geschichte des Exodus, 1954,60-79. Cf. BEGRICH, Studien zu Deuterojesaja, 1938 (1963),42-47.
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composição feita de várias peças e executada sem a alternância de locuteres." Do âmbito da doutrina sapiencial derivam os modos correspondentes de falar (§ 47); do âmbito da narrativa histórica provém o modo profético de considerar a história (p.ex. Am 4.-12; Is 9.7-20+5.25-29); e do âmbito da vida jurídica procede o oráculo profético de julgamento," entre cujos elementos principais podemos mencionar, sobretudo, a convocação para o processo, comportando a indicação das testemunhas, a introdução do processo pelo juiz divino e seu discurso de acusação (Is 1.2-3; 3.12-15), ou ainda o debate entre as partes litigantes no Dêutero-Isaías, e em determinados casos, a prolação da sentença. Precisamente em face dessa variedade, é de máxima importância não apenas constatar a existência de um dado modo de falar, mas indagar a respeito da função que lhe corresponde na intenção do profeta. A duplícídade de forma e de função, como também a do Sitz im Leben (" contexto vital") original e do uso modificado no interior do discurso, em parte nenhuma se destaca com tanta clareza como nas palavras proféticas.
5. Relação com a tradição Recentemente tem sido bastante considerada a relação dos profetas, e de modo particular a relação dos grandes profetas individuais com a tradição. É bem verdade que os profetas nunca estiveram desvinculados da tradição; mas antigamente acentuava-se antes do mais a sua oposição às tradições de Israel, como também o aspecto totalmente novo de sua mensagem, enquanto, na atualidade, muitas vezes se inverte simplesmente a relação, e os profetas passam a ser vistos numa vinculação quase absoluta com as antigas tradições que eles"atualizam", sendo que nesta perspectiva a relação com a Lei revalorizada desempenha papel não menos importante: "Moisés", isto é, aquele que anuncia o antigo direito, se transforma em evangelista, e os profetas se convertem, pelo contrário, em tantos Moisés paulinos, anunciadores da "Lei" .27
25 26
27
J.
LINDBLOM, Die Jesaja-Apokalypse, Jes 24-27/ 1938. Derivamos da vida juridica comum, com BOECKER e HESSE, contra WÜRTHWEIN (origem cultual) e HARVEY (originárias do direito contratual internacional); posição intermediária; VON W ALDOW. W. ZrMMERLI, Das Gesetz und die Propheten, 1963/77. Assim, a imagem hodierna dos profetas corresponde, muitas vezes, àquela, sem dúvida inexata, apresentada pela
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Nos detalhes, resulta um quadro colorido e variado. Assim, uma determinada concepção insere todos os profetas do AT na profecia cultual do Antigo Oriente e na forma cultual específica vétero-oriental, com sua ideologia do rei. Outras concepções os vêem como portadores das tradições históricas, jurídicas ou cultuais, que eles" atualizam", radicalizam ou interpretam numa perspectiva escatológica, podendo ser considerados, enfim, até mesmo como oficiais do culto que não possuem quase nada de próprio para dizer, mas apenas recitam a liturgia sacralizada. Além disso, chamou-se também a atenção para as relações que os profetas têm com a doutrina sapiencial, e inclusive com a magia, da qual se origina o conceito de eficácia da pregação profética. Não há dúvidas de que os grandes profetas individuais - não incluindo os profetas cultuais, que já por si viviam na esfera da piedade cultual - não apenas assimilaram conceitos e tradições vétero-orientais, principalmente israelíticas veterotestamentárias, como também se utilizaram da forma tradicional da pregação profética. Evidentemente que os profetas cresceram em meio a tudo isto, conheciam tudo isto e de tudo isto se utilizaram. Por isso, se recolheu acertadamente, embora muitas vezes de modo demasiado unilateral, o material das mais diversas espécies a respeito da realidade de sua tradição, que foi exposto em toda sua multiplicidade." Certamente os profetas não eram revolucionários que pretendiam varrer tudo o que encontravam pela frente, para recomeçá-lo de novo, como também não são o produto de uma longa evolução que, com eles, teria chegado a um monoteísmo ético, nem tampouco são reformadores e reformuladores das antigas tradições. Sua atitude em face da tradição é totalmente outra. O decisivo de sua mensagem não é vinculação com essas tradições, com as tradições culturais gerais de seu povo, nem, por intermédio delas, com a tradição global do Antigo Oriente. O decisivo é a própria experiência da presença ao mesmo tempo terrível e misericordiosa de Deus, partindo dos impulsos da religião mosaico-javista, que com eles se revigora sob uma forma purificada e dinâmica. É por isso precisahistória cronística e que J. WELLHAUSEN, Geschichte Israels, I, 1878, 211, resume, ironizando: "Eles não anunciam nada de novo nem de livre, mas simplesmente aplicam, como o próprio Javé, a Torá de Moisés, prometendo a felicidade ou a desgraça, de acordo com o padrão traçado, a depender de que a Lei seja cumprida fielmente ou de que seja postergada". 28 Compilação de uma parte da bibliografia em G. FOHRER, "Tradition und Interpretation im Alten TEstament", ZAW 73 (1961), 25, nota 59.
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mente que os grandes profetas individuais representam algo de próprio. Eles abandonam as formas que muitas vezes surgiram do compromisso com outras concepções e usos, e falam baseados em uma verdade que eles experimentaram como verdade existencial. Assim procedendo, eles não excluíram a tradição, embora ela não fosse fundamental para a sua fé, mas se serviram dela para pregar a sua mensagem. Em função disto, eles a reformularam e a reinterpretaram, como nos mostra, entre outros exemplos, a nova interpretação do dia de Javé (Am 5.18-20; Is 2.12-17), a fim de que, por meio dela, pudessem exprimir aquilo que deviam dizer.
§ 54. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO H. BIRKELANO, Zum. hebriiischen Tradionswesen, 1938. - K. BUOOE, "Eine folgenschwere Redaktion des Zwõlfprophetenbuchs", ZA W 39 (1921),218-229. - A. H. J. GUNNEWEG, Mündliche und schrijtliche Tradition
der vorexlischen Prophetenbücher aisProblem derneueren Prophetenforschung, 1959. - S. MOWINCKEL, Jesaja-disiplene, 1926. - lo., Prophecy and Tradition, 1946. - TH. H. ROBINSON, "Die prophetischen Bücher im Lichte neuer Entdeckungen", ZAW 45 (1927),3-9.
1. A origem da tradição Se outrora os livros proféticos eram tidos quase naturalmente como unidades fechadas e como palavra integral de Javé, a partir do séc. XVIII a pesquisa passou a distinguir, de forma crescente, entre o que constitui a palavra divina e o que constitui a palavra profética, e voltou seu interesse sobretudo para a palavra do homem conservada no livro profético, sem contudo estudar o processo de sua transmissão. Isto foi empreendido, num terceiro estágio, por pesquisas modernas da tradição das palavras proféticas, nas quais se confere àqueles que transmitiram as palavras proféticas, ou mesmo as aperfeiçoaram, segundo certas opiniões, urna parte importante no processo de origem da tradição que se encontra nos escritos proféticos. De acordo com as observações de princípio no § 3, devemos admitir que os oráculos e relatos proféticos foram fixados por escrito imediatamente e logo transmitidos. A maioria desses oráculos e relatos foram consignados por escrito em vida dos profetas logo depois da pregação oral ou em seguida à execução da ação simbólica, em época posterior e talvez mesmo antes. Sobre isto existem poucas informações, embora seja possível tirar algumas conclusões.
§ 54.
COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
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Em Is 8.16, onde se fala de um ato de atar o testemunho e de selar a instrução, como a significar o encerramento da atividade profética, a autenticidade da expressão: em meus discípulos é posta em dúvida, por causa das divergências entre as variantes das versões. Além disso, ela altera o ritmo do metro, que é regular quanto ao mais, e deve ser considerada, portanto, como um acréscimo posterior." Em Is 30.8 não se trata de um registro de oráculos proféticos, mas da gravação de uma inscrição indicada no v. 9.30 Com isto, cai por terra a hipótese segundo a qual o registro dos oráculos por escrito, para tempos futuros, se fez tendo-se em vista uma posterior legitimação dos profetas. Também não se podem mencionar razões de ordem cultual pelo menos para aqueles que atacaram violentamente a sua época.
Que a pregação profética tenha sido fixada por escrito desde muito cedo é o que nos mostram a influência que sobre Ezequiel exerceram a palavra de jeremias," pregada antes da deportação de Ezequiel, e a influência de Amós sobre Isaías." Se para o primeiro caso pode-se admitir uma influência pessoal, e ainda em Jerusalém, ela fica excluída para Amós, oriundo de Técua e aparecido no reino setentrional de Israel, e para Isaías, estabelecido em Jerusalém. Como, porém, Isaías foi influenciado por Amós, as palavras deste último devem ter sido conhecidas em Jerusalém, cerca de quinze anos após a sua pregação. É de notar ainda que Jeremias fez escrever suas palavras e mandou que Baruc as lesse no templo, onde o profeta não podia entrar pessoalmente (Jr 36). Se, neste caso, se trata de um expediente de emergência, ditado pela situação e graças ao qual se devia, naturalmente, conseguir que a força viva das palavras reunidas provocasse o efeito que a palavra isolada não produziria (v. 3), a motivação muda de eixo quando o rei Joaquim queima o rolo e Jeremias manda escrever um outro, embora este não pudesse ser mais lido e a finalidade do primeiro rolo já tivesse sido atingida. [r 36.29b indica o verdadeiro sentido: o rei quer tornar sem efeito a ameaça de castigos, destruindo o manuscrito e procurando apoderar-se dos seus autores, Jeremias e Baruc, ao passo que o novo manuscrito deve garantir a força da pregação de Jeremias: suas ameaças continuam inalteradas. Vejam-se os detalhes em G. FOHRER, "The Origin, Composition and Tradition of Isaiah I-XXXIX", Annual of Leeds University Oriental Society 3 (1961/1963), 29-32. 30 Ibid. 32s. 31 G. FüHRER, Die Hauptprobleme des Buches Ezechiel, 1952,135-140. 32 R. FEY, Amos und Jesaja, 1963.
29
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o principal motivo de escrever, de reunir e de transmitir os oráculos proféticos, ao qual naturalmente podem juntar-se também finalidades de natureza pessoal e secundária, reside, por conseguinte, em que, ao fixar a palavra depois de pronunciada, se conserva, e até mesmo se intensifica, a sua virtude. A cada leitura ou a cada recitação, sua força é liberada de novo e se torna eficaz." Isto implica que os oráculos proféticos foram consignados por escrito logo depois de terem sido proclamados oralmente. A palavra oral deve ser fixada em tempo, para conservar a eficácia. A compilação dos textos isolados, praticada em data posterior, bem como sua reunião em livros podem ter sido feitas, em grande parte, sob o ponto de vista da eficácia. Foram, contudo, as razões teológicas que pouco a pouco e cada vez mais se tornaram decisivas para a transmissão ulterior dos escritos proféticos, à medida que estes iam sendo considerados cada vez mais como escrituras sagradas. Mas mesmo assim continuava presente a idéia de que a palavra profética se torna viva, quando lida durante o culto divino. 2. A origem dos escritos proféticos A origem dos escritos proféticos se processou, na maioria dos casos, do mesmo modo como, p.ex., nos cânticos e nos livros sapienciais. A partir de pequenas coleções parciais de oráculos e de relatos sob forma escrita constituíram-se coleções maiores, e destas, por sua vez, surgiu um determinado livro. O mesmo acontece com a maioria dos livros proféticos: apenas alguns poucos deles constituem composições homogêneas. Este princípio aparece claramente no livro de Isaías, que é composto de três livros originais autônomos, bem como no livro dos Doze Profetas, que é constituído de doze escritos menores. Mas neste caso já se trata de um produto final. Algumas vezes, se bem que não de modo regular, se podem identificar as coleções parciais primitivas que constituem a primeira etapa da formação de um livro. Algumas delas possuem seus próprios títulos, como [r 23.9: Sobre os profetas; 30.1-4, contendo a ordem de escrever determinadas palavras, juntamente com a introdução: Estas são as palavras; 46,1: Palavras de Javé, dirigidas ao profeta Jeremias a respeito das nações; 50.1: Palavra que Javé pronunciou contra Babel. Outras vezes a
33
Cf. também
FOHRER
(acima, nota 29), 33-37.
§ 54. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
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coleção foi feita de acordo com certas palavras-chaves, como "ídolos" (Ez 6) e "espada" (21); ou de acordo com um conteúdo semelhante ou idêntico (12.21-13.23: sobre determinados profetas e pessoas dotadas de certos poderes; e 34: sobre pastores e ovelhas); de acordo com fatos de natureza igual, como nas coleções de relatos de ações simbólicas (45;12.lss; 24), ou como reunião de oráculos pronunciados num mesmo período (como, p.ex., Is 7-8). Sob uma outra perspectiva, desde TH. H. ROBINSON tem-se distinguido três tipos de textos: oráculos poéticos, apresentados como palavras de Javé na primeira pessoa gramatical, ou como palavras do profeta, e relatos do profeta, apresentados em prosa, na primeira pessoa, e relatos em prosa, na terceira pessoa singular, a respeito do próprio profeta. Os livros proféticos "simples" constam, em geral, de uma única coleção formada de textos do mesmo tipo; os livros "compostos" contêm vários tipos de textos. Contudo, independentemente de que o segundo tipo não foi redigido em prosa, mas poeticamente, em versos breves, muitas vezes se exclui também o terceiro tipo, porque um relato pessoal no Antigo Oriente pode ser feito igualmente na terceira pessoa e porque esse mesmo tipo de relato pode conter grupos de oráculos vazados em versos breves. Por isso, deveremos nos contentar apenas em constatar a existência de coleções parciais.
A segunda etapa da formação de um livro profético é constituída, no caso de escritos mais extensos, pela reunião de várias coleções parciais em coleções maiores, como Is 1-12 e Ez 1-24. O agrupamento de tais coleções pode ser chamado, então, de terceira etapa. Em casos particulares encontramos variações do processo cujo esquema acabamos de esboçar.
3. Estrutura das coleções e livros Para a estrutura das coleções e livros proféticos, vários critérios foram determinantes. Destes critérios o mais antigo e o mais importante foi o cronológico, ou seja, aquele segundo o qual os oráculos ou as coleções eram dispostos de acordo com a época de seu aparecimento. Esse é o critério que se observa no fato de se anteporem os relatos das vocações (Ir 1.4ss; Ez 1.1-3,15) e a seção correspondente Os 40.1-8), como também na maneira como se ordenam as coleções de Isaías em Is 5-10 (§ 56,5), as palavras de Jeremias em [r 1-25.14, provenientes de épocas diversas (§ 59,6), e na maneira como se inserem as palavras datadas de Ezequiel
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ASPECTOS GERAIS
em seu livro. Também a disposição de Os 1-3, contendo os relatos de seu casamento, talvez tenha sido determinada cronologicamente. A inserção dos oráculos sobre o Servidor de Javé em Is 40-55 possivelmente nos permite fazer semelhante suposição para o Dêutero-Isaías. Ao lado desse critério, observa-se ocasionalmente o emprego de um princípio de ordem qualitativa e que consiste em transferir para o início de um livro profético uma seção que seja considerada de particular importância. Isto vale de modo particular para Is 1, enquanto seção transversal da mensagem do profeta, como vale para Os 1-3, que deve ser julgado de igual modo, e ainda para o complexo homogêneo de Am 1.3-2.16. Com o transcurso do processo, a ordenação feita de acordo com um esquema escatológico tornou-se a mais importante. Este esquema aparece sob a forma de dois membros: "desgraça-salvação", nas coleções parciais de Is 1-35, onde uma promessa escatológica quase sempre foi acrescentada à parte principal, de modo que a alternativa de punição e de salvação, pregada por Isaías, foi reinterpretada, tornando-se, pela conversão, em um "antes" de desgraça passageira e um "depois" de salvação eterna. É este mesmo esquema que se acha na base dos agrupamentos de Is 1-39 e 40-66, de Am 1.2-9.7 e 9.8-15, bem como de Mq 1-3 e 4-5; 6-7.7 e 7.8-20. A coleção de Os 1-3 é, pelo contrário, de natureza préescatológica, ao passo que o livro se encerra, de igual modo, com a promessa de 14,2-9. A composição da primeira parte do livro de Isaías, com a sua divisão em dois blocos: 1-12 e 13-23, continua fundamentalmente também dentro do esquema de dois membros, embora com o acréscimo das duas coleções 24-35 tenha sido aberto o caminho para o esquema de três membros. É este último esquema que encontramos na base dos livros de Ezequiel e de Sofonias, e também na forma mais antiga do livro de Jeremias, conservada pelos LXX. Neste esquema, entre as ameaças dirigidas contra o próprio povo e a promessa pronunciada em seu favor (talvez também em favor de outros povos), inserem-se as ameaças contra outros povos, porque o julgamento a respeito destes é considerado um estágio intermediário destinado à concessão da salvação a Israel: Ez 1-24; 25-32; 33-48; Sf 1-2.3; 2.4-3.8; 3.9-20; Jr 1-25.14; 25.15ss e 46-51; 26-35*. Esta forma de composição confere à pregação profética o esquema escatológico de dois ou três membros, e literariamente a apresenta como escritura escatológica, embora isto esteja em contradição com a mensagem profética anterior ao exílio.
§ 54. COMPILAÇÃO
E TRANSMISSÃO
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4. Livros proféticos apocalípticos posteriores Os livros proféticos apocalípticos posteriores que não foram aceitos no AT são o livro etíope e eslavo de Henoc (uma coletânea de vários apocalipses), a Assunção de Moisés (apocalipse com seções que a enquadram), 4Esd (relatos a respeito de sete visões), o apocalipse sírio e grego de Baruc (relatos de visões), e, de algum modo, os Livros Sibilinos (mistura de vaticínios pagãos, judaicos e cristãos), e por fim, os fragmentos de diversos escritos apocalípticos de Qumran.
CAPÍTULO
XI
OS LIVROS PROFÉTICOS § 55. VISÃO DE CONJUNTO Tradicionalmente, os livros proféticos se dividem em "Profetas Maiores" e "Profetas Menores". Entre os Profetas Maiores se contam os livros de maior volume que são Isaías, Jeremias e Ezequiel, dos quais, no entanto, o primeiro é constituído propriamente de três escritos proféticos distintos, que devemos estudar em separado. Desde AGOSTINHO, comprovadamente (Cidade de Deus 18.29), tem-se considerado como Profetas Menores, por causa de seu tamanho reduzido, os livros que vêm sucessivamente sob o nome de Oséias até Miquéias, e dentre os quais o livro de Zacarias é composto, por sua vez, de vários escritos. Ec10 49.19 chama estes livros de os "Doze Profetas", segundo o seu número, e os supõe reunidos em um único livro global no cânon judaico, conhecidos como o Dodekapropheton ou o livro dos Doze Profetas. O cânon hebraico agrupou estes livros de acordo com a ordem real, ou suposta, de seu aparecimento, que a nossa exposição observará. A versão dos LXX, pelo contrário, distribui cinco dos seis primeiros desses livros de acordo com a ordem de seu tamanho (Oséias, Amós, Miquéias, [oel, Obdias), e atribui o sexto lugar à narrativa de Jonas. Seria possível considerar os livros proféticos dentro da seqüência histórica dos profetas, para, deste modo, obter-se ao mesmo tempo uma visão global da história da profecia escrita. Mas daí resultariam dificuldades externas insuperáveis, porque muitos dos livros não contêm somente oráculos isolados, mas também perícopes mais amplas que provêm de época inteiramente diversa daquela do século em que viveram os respectivos profetas. Ou se deve antecipá-las historicamente, ou se deve fragmentar os livros em benefício da exposição. Para evitar estes inconvenientes, os livros serão estudados dentro da seqüência em que estão no cânon hebraico.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
§ 56. ISAÍAS I (Is 1-39) ATD: O. KAIsER, 2il ed ., 1963 (1-12). -EH: F. FELDMANN, 1925/26. -HK: B. DUHM, 4il ed., 1922. - HS: J. FiSCHER, 1937/39. - IB: R. B. Y. ScOTI, 1956. - ICC: G. B. GRAY, 1912 (1947) (1-27). - KAT: O. PROCKSCH, 1930. - KeH: A. DILLMANN - R. KITIEL, 2il ed., 1898. - KHC: K. MARTI, 1900. - SAT: H. SCHMIDT, 2il ed., 1923. - SZ: C. VON ORELLI, 3il ed., 1904. - Especiais: A. BENTZEN, 1943. - G. FOHRER, 1960/62 (Zürcher Bibelkommentare). - E. J. KISSANE, 1941 (1960)/43. - E. KÓNIG, 1926. SH. H. BLANK, Prophetic Faith in Isaiah, 1958. - K. BUOOE, "Über die Schranken, die [esajas prophetischer Botschaft zu setzen sind", ZAW 41 (1923), 154-203. - TH. K. CHEINE, Introduction to the Book of Isaiah, 1895 (alemão: 1897). - C. H. CORNILL, "Die Komposition des Buches Jesaja", ZAW 4 (1884), 83-105. - H. DONNER, Israel unter den Volkern, 1964 - H. J. EATON, "The Origin of the Book os Isaiah", VT9 (1959), 138157. -I. EITAN,"A Contribution to Isaiah Exegesis",HUCA 12/13 (1937/ 38),55-88. - G. FOHRER, "The Origin, Composition and Tradition of Isaiah l-XXXIX", Annual of Leeds University Oriental Society 3 (1961/62), 3-38. K. FULLERTON, "Viewpoints in the Discussion of Isaiah's Hopes for the Future", JBL 41 (1922), 1-101. - F. GIESEBRECHT, Beitriige zur Jesajakritik, 1890. - G. HÓLSCHER, "Jesaja", ThLZ 77 (1952), 683-694. - F. CH.JENNINGS, Studies in Isaiah, 1935. - D. JONES, "The Tradition of the Orades of Isaiah of Ierusalem", ZAW 67 (1955), 226-246. - L. J. LIEBREICH, "The Compilation of the Book of Isaiah", JQR 46 (1955/56), 259-277; 47 (1956/57), 114138. - O. LORETZ, "Der Glaube des Propheten Isaias an das Gottesreich", ZKTh 82 (1960), 40-73, 159-181. - S. MOWINCKEL, Profeten Jesaja, 1925. - lo., "Die Komposition des Jesajahuches Kap. 1-39", AcOr Leiden 11 (1933),267-292. - lo., "Komposisjonen av Jesajaboken Kap, 1-39", NTT 44 (1943), 159-171. - lo., Jesaja, 1949. - R. B. Y. SCOTI, "The Literary Structure of Isaiah's Orades", em: Th. H. Robinson-Festschrift, 1950, 175-186. - J. STEINMANN, Le prophêie Isaie, 2 il ed., 1955. - O. ST. VIRGULIN, La "Fede" nella Profezia d'Isaia, 1961. - TH. C. VRIEZEN, "Essentials of the Theology of Isaiah", em: Essays Muilenburg, 1962, 128-146. - lo., [ahtue en zijn stad, 1962. - J. ZIEGLER, "Zum literarischen Aufbau verschiedener Stücke im Buche des Propheten Isaias", BZ 21 (1933), 131-149,237-254. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Isaías Isaías era filho de um certo Amós, desconhecido de outras fontes, e, ao que parece, de origem nobre (7.3; 8.2) e criado em Jerusalém (7.3;22.15s).
§ 56. ISAÍAS I (Is 1-39)
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Que ele antes tivesse sido mestre de sabedoria] não se pode deduzir das expressões e modos de falar sapienciais usados por ele, nem também da sua hostilidade aos políticos "sapientes", mas é provável que tenha recebido uma formação escolar correspondente. Era casado com uma mulher chamada expressamente de profetisa (8.3).2 Seus filhos Sear-Iasub, um resto voltará, e Maer-Salal-Has-Baz, toma depressa os despojos, faze velozmente a presa (7.3; 8.3), foram associados a seu ministério profético, por causa de seus nomes simbólicos. De acordo com 6,1, Isaías foi chamado ao ministério profético no ano da morte do rei Ozias (Azarias)," em 746 ou 740, e exerceu a sua atividade durante os reinados de [oatão, Acaz e Ezequias, numa época de grande agitação política, quando os reis assírios Teglat-Falasar III (745-727), Salmanasar V (726-722), Sargão II (721-705) e Senaquerib (704-681) procuravam conquistar os estados siro-palestinenses e avançar até o Egito. As últimas palavras de Isaías datam do ano 701. De acordo com uma lenda apócrifa, ele teria sofrido o martírio sob o rei Manassés.
2. Atividade de Isaías Pode-se dividir a atividade de Isaías em quatro períodos. No primeiro período, que vai da sua vocação até antes do começo da guerra síroefraimita (746/740-736), ele se defrontou principalmente com a situação interna de [udá, que fora precedida de uma época de considerável prosperidade política e econômica. As palavras deste período se encontram sobretudo em 1-3 e 5. - O segundo período compreende a época da guerra siro-efraimita, durante a qual Damasco e o reino setentrional de Israel tentam forçar [udá a entrar para a sua aliança antiassíria (736-735). Isaías se opõe não apenas a esta aliança, mas também à política do rei Acaz, no sentido de se declarar vassalo do rei da Assíria e de chamá-lo em seu socorro, contra os agressores. Não tendo conseguido o seu intento, ele se
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R. T. ANDERSON, "Was Isaiah a Scribe?", fBL 79 (1960), 57s. - J. FICHTNER, "[esaja unter den Weisen", ThLZ 74 (1949), 75-80. A. JEPSEN, "Die Nebiah in Ies 8,3", ZAW 72 (1960), 267s. Não é possível determinar com precisão o ano da morte do rei Ozias. Contudo, nenhuma dúvida pode haver de que Is 6 trata da vocação do profeta, e não da continuação ou de uma mudança do tema de sua pregação, como presume J. MILGROM, "Did Isaiah Prophesy during the Reign of Uzziah?", VT 14 (1964), 164182, datando 1.10-6.13 da época de Ozias.
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Os
LIVROS PROFÉTICOS
retira da cena por longos anos (8.16-18). As palavras deste período se acham em 7-8; 9.7-20+5.25-29; 17.1-6; 28.1-4. - É somente depois da derrota dos dois estados agressores e por ocasião da primeira tentativa feita por Ezequias, no sentido de se libertar da vassalagem, em aliança com outros estados (716-711), que Isaías surge, no terceiro período, para de novo se calar, depois do fracasso da revolta, com a conquista de Azoto pelos assírios. As palavras deste período se encontram em 14.28-32; 18; 20; 28.7-22; 29.1-14; 30.8-17. - O quarto período cai nos anos da segunda tentativa feita por Ezequias para conquistar a independência por meio de uma revolta geral da Palestina, com o apoio do Egito. Essa tentativa, no entanto, resultou na devastação de [udá, no desmembramento de grande parte do país, na ameaça contra Jerusalém e na total submissão de Ezequias. As palavras deste período, no qual Isaías começa a julgar os assírios diferentemente do que fizera até então, se encontram em 1.4-9;10.5-15,27b-32;14.24-27,e nas partes de 28-32 que não pertencem a períodos mais antigos.
3. Oráculos e relatos Os oráculos e os relatos da pregação de Isaías se acham em sete coleções parciais, com base nas quais e juntamente com outras coleções de oráculos, com oráculos isolados e com outras narrativas, todo o escrito profético foi aos poucos se formando. Externamente percebe-se isto nos títulos 1.1 e 2.1, que datam, no mínimo, do exílio, por causa da seqüência [udá-Ierusalém, habitual somente a partir desta época, como se percebe também em 13.1, que é calcado em 2.1. As coleções constam quase sempre de três elementos: o corpo da coleção, um ou mais fragmentos dos discursos de Isaías, e uma promessa, como remate. Quando colocadas em apêndice aos fragmentos, as promessas devem ser consideradas, já de antemão, como acréscimos posteriores. Corpo
Fragmentos
Promessas
A. 1.2-26(27-28) B. 2.6-4,1 C. 5.1-23*; 10,1-3 (4) D. 6.1-8.18 E. 9.7-20; 5.25-29 (30); 10.5-15 F. 13-23*; 28.1-4 G. 28.7-32.14
1.29-31 (3.25-4.1 ?) 5.14-17,24 8.19,21-22 10.27b-32(33-34)
2.2-4(5) 4.2-6 -
-
28.5-6(23.17-18) 32.15-20
(8.23b)9.1-6 11.1-900.11-16)
§ 56. ISAÍAS I (Is 1-39)
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As palavras posteriores inseridas nas coleções serão indicadas em 4N. Admite-se com freqüência que existem várias coleções autônomas de oráculos. Para DuHM, tais coleções seriam 1-12; 13-23; 24-27 e 28-33, juntamente com a conclusão: 34-35. PROCKSCH considera 1; 2-6; 9.7-10.4;28-31(32)como coleções de Isaías, e 7-9.6;11;10.5sse 14-24ss;1523 como coleções de seus discípulos. BUDDE e MOWINcKEL,ao invés, supõem que tenha existido um antigo livro de Isaías, revisto anteriormente, ampliado e transposto. MOWINKEL se aproxima da primeira hipótese, ao pensar que o livro foi formado a partir de três coleções de oráculos de Isaías e de três coleções alheias. Recentemente tem-se admitido um maior número de coleções menores que, na opinião de LIEBREICH, teriam sido agrupadas de modo sumamente artístico por um redator. Também se tem admitido maior influência da parte dos discípulos do profeta, na formação da tradição, de sorte que, segundo JONES, eles teriam reinterpretado a tradição, depois da queda de Jerusalém, sendo que o Dêutero-Isaías, como o maior dos discípulos, representaria o estágio final. Para EATON eles adaptaram a tradição, ampliando-a, a cada nova situação; mas, mesmo os caps. 40-66 ainda estão próximos das idéias de Isaías. De acordo com isto, o livro de Isaías não constituiria uma antologia de oráculos de alguns ou de vários profetas, mas apresentaria uma unidade de pensamento, onde se refletiria a linha de desenvolvimento de suas idéias no meio de seus discípulos.
O corpo da primeira coleção" compreende os cinco oráculos 1.23,4-9,10-17,18-20,21-26: Desses oráculos, os vv. 4-9 datam do ano 701, a julgar pela situação aí descrita. Não se sabe com certeza onde se encaixar os vv. 2-3, ao passo que os restantes se enquadram perfeitamente no começo do primeiro período da atividade de Isaías. Eles constituem uma composição executada segundo um plano bem definido e numa concatenação progressiva de idéias sobre os temas do pecado, da ameaça do juízo por causa dele, da possibilidade de libertação do juízo, e uma possível concretização dessa libertação. A coleção apresenta as características de um compêndio da mensagem de Isaías ou de um corte transversal da mesma, e, por isso, foi colocada no começo do livro. a)
4
G. FOHRER, "Jesaja 1 als Zusammenfassung der Verkündigung Jesajas", ZAW 74 (1962),251-268 (cf., sobre isto, P. R. ACKROYD, ibid., 75, 1963, 320s). - L. G. RIGNELL, "Isaiah Chapter I", StTh 11 (157),140-158. - E. ROBERTSoN, "Isaiah ChapterI", ZAW 52 (134), 231-236.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
b) O corpo da segunda coleção" compreende os oráculos 2.6-22; 3.19,12-15,16-24 e 3.25-4.1, isto no caso em que a segunda perícope não seja constituída de dois fragmentos. Todo o conjunto aparece sob o ponto de vista de que a soberba e a altivez das classes dirigentes de [udá, censuradas em 3.1-24, serão humilhadas e abatidas no dia de Javé. c) Na terceira coleção, o chamado cântico da vinha: 5.1-7, constitui a palavra fundamental," cuja queixa tem por finalidade explicar, nos detalhes, os oráculos que vêm em seguida e que foram colocados juntos, por causa da mesma palavra inicial hôy, "ai!", para mostrar em que consiste, para Isaías, a violação do direito e o grito de socorro (5.7). Evidentemente, no início só foram acrescentados dois destes oráculos: 5.8-13, e completados com os fragmentos 5.14-17, aos quais mais tarde se juntaram os oráculos 5.18-23, com o fragmento 5.24. O oráculo deslocado 10.1-3 também pertence a este conjunto. d) O corpo da quarta coleção" compreende, em primeiro lugar, os oráculos e relatos da época da guerra sírio-efraimita, dispostos quase todos em ordem cronológica: 7.1-98,10-179,18-22; 8.1-410,5-8,11-15, e logo K. BUOOE, "Zu [esaja 1-5", ZAW 49 (1931), 16-40, 182-211; 50 (1932), 38-72. - H. L. GINSBERG, "Gleanings in First Isaiah", em: Kaplan [ubilee Vai., 1952,245-259. - H. M. WEIL, "Exégese d'Isaie 3,1-15", RB 49 (1940), 76-85. 6 A. BENTZEN, "Zur Erlãuterung von [es 5,1-7", AfO 4 (1927),209s. - H. JUNKER, "Die Literarische Art von Is 5,1-7", Bibl40 (1959), 259-266. 7 K. BUOOE, Jesajas Erleben, 1928. - J. LINOBLOM, A Study af the Immanuel Sectian in Isaiah Isa VII, 1-IX,6, 1958. 8 SH. H. BLANK, "The Current Misinterpretation of Isaiah's She'ar Yashub", JBL 67 (1948), 211-215. - L. KOHLER, "She'ar Yashub und der nackte Relativsatz", VT 3 (1953), 84s.N. MÜLLER, Die Vorstellung vom Rest im Alten Testament, Diss. Leipzig, 1939. - E. WÜRTHWEIN, "Jesaja 7,1-9", em: Heim-Festschrift, 1954,47-63. 9 SH. H. BLANK, "Immanuel and which Isaiah?", JNES 13 (1954), 83-86. - K. BUOOE, "Das Imanuelzeichnen und die Ahaz-Begegnung [esaja 7", JBL 52 (1933), 22-54. - J. COPPENS, "La prophétie de la 'Almah", EThL 28 (1952), 648-678. - G. FOHRER, "Zu [es 7,14 im Zusammenhang von 7,10-22", ZAW 68 (1956),54-56. - C. H. GOROON, "'Almah in Isaiah 7,14", JBR 21 (1953), 106. - N. K. GOTTWALD, "Immanuel as Prophet's Son", VT 8 (1958), 36-47. - E. HAMMERSHAIMB, "Immanuelstegnet", DTT 8 (1945),223-244. - L. KOHLER, "Zum Verstandnis von [es 7,14", ZAW 67 (1955), 48-50. - E. G. H. KRAELING, "The Immanuel Prophecy", JBL 50 (1931), 227-297. - S. MOWINCKEL, "Immanuel prophetien [es 7", NTT 42 (1941), 129-157. - L. G. RIGNELL, "Das immanuelszeichen", StTh 11 (1957),99-119. - J. J. STAMM, "Die ImmanuelWeissagung", VT 4 (1954), 20-33. - lo., "Neuere Arbeiten zum ImmanuelProblem", ZAW 68 (1956),46-53. - H. W. WOLFF, Frieden ahne Ende, 1962. 10 S. MORENZ, "Eilebeute", ThLZ 74 (1949), 697-699. - L. G. RIGNELL, "Das Orakel 'Maher-salal Has-bas' ", StTH 10 (1956),40-52.
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§ 56. ISAÍAS I (Is 1-39)
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em seguida, como peças de enquadramento, o relato da vocação: 611, que mediante os vv. 9s indica o insucesso do profeta, bem como a decisão de suspender a atividade profética e de esperar pela realização das coisas que ele anunciara: 8.16-18. e) Uma quinta coleção própria de oráculos dirigidos contra outros povos e respectivos soberanos era constituída, antigamente, por 9.7-20 + 5,25-29, que, sob a forma de reflexão histórica e de ameaça, se ocupa com o reino setentrional de Israel, e por 10.5-15, a respeito do orgulhoso rei dos assírios. Também o texto de 10.27b-32, incompleto no começo, se refere aos assírios. Com a inserção da coleção O, o conjunto se desfez, e algumas das palavras (como 10.1-3 de C) se dispersaram." t> A sexta coleção formou-se com numerosos oráculos de outros profetas em 13-23. 13 Ela continha quase exclusivamente palavras contra nações e pessoas estrangeiras. A seqüência em que aparecem se explica pelos textos egípcios de proscrição nos quais os povos e as pessoas amaldiçoados são enumerados em último lugar, numa ordem geográfica fixa (norte, sul, oeste), tendo o Egito como centro. Para a outra situação geográfica de Isaías, apresenta-se a seguinte ordem de colocação: leste, oeste, norte, sul, centro: 14.24-27 14.28-32 17.1-6 18;20 21.1-14,15-19
contra a Assíria contra as cidades filistéias contra Damasco e o norte de Israel contra o Egito contra Jerusalém e um determinado oficial aí residente
= leste =oeste l 4 = norte = sul = centro
Talvez o oráculo dirigido contra a Samaria (28.1-14) tenha pertencido originariamente a esta coleção.
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I. ENGNELL, The Call of Isaiah, 1949. - E. JENNI, "[esajas Berufung in der neuren Forschung", ThZ 15 (1959), 321-339. - L. J. LIEBREICH, "The Position of Chapter Six in the Book of Isaiah", HUCA 25 (1954), 37-40. - C. F. WHITLEY, "The Call and
Mission of Isaiah", JNES 18 (1959),38-48. J. SCHELHAAS, "Het verband in Is 10,5-12,6", GThT 50 (1950), 105-120. 13 CH. C. TORREY, "Some important Editorial Operations in the Book of Isaiah", JBL57 (1938), 109-139. 14 J. BEGRICH, "[esaja 14,28-32", ZDMG 86 (1933), 66-79. - W. A. IRWIN, "The Exposition of Isaiah 14,28-32", AJSL 44 (1928), 73-87.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
g) A sétima coleção abrange quinze oráculos de Isaías," em geral facilmente destacáveis entre si e provenientes do terceiro e quarto períodos de sua atividade, ao tempo de Ezequias, tendo sido recolhidos evidentemente sob este ponto de vista cronológico. Talvez 32.9-14 constitua intencionalmente a conclusão; e, como mostra a conexão material e lingüística com 22.1-14, temos aí simplesmente as últimas palavras de Isaías.
4. Ditos posteriores
o escrito de Isaías contém numerosas palavras que certamente ou provavelmente não são de sua autoria, embora exegetas sérios o admitam ou o considerem como possível para uma série delas (p.ex., SELLIN*, PROCKSCH). Aos ditos posteriores pertencem outras quatro coleções ou complexos de tradições (H-U, como também as promessas que vêm como apêndice das coleções de Isaías (M), e ainda alguns oráculos inseridos nas coleções (N). a) Em 13-14.23; 15-16; 19; 21; 23 encontra-se uma grande coleção de oráculos anônimos a respeito de determinadas nações estrangeiras, juntamente com pequenos apêndices e fundida com a coleção F de Isaías. Ela se caracterizava pelo fato de que suas unidades componentes traziam a designação massa', "oráculo". As seções mais importantes são: 13-2-22, contra a Babilônia (do séc. VI)16; 14.4b-21, uma poesia satírica de origem cananéia, contra um soberano universal, I? posta igualmente em relação com a Babilônia, através da moldura constituída por 14.1-4a,22s; as perícopes 15.1-9 + 16.2; 16.1,3-5 e 16.6-12, sobre Moab (provavelmente posteriores ao exílio)": 19.1-15, contra o Egito (posterior ao exílio); 21.1-10, contra a Babilônia (experiência de visões e audições ocorridas durante o
A. GUILLAUME, "Isaiah's Orade against Assyria (Isaiah 30,27-33) in the Light of Archaeology". BSOAS 17,3 (1955),413-415. - W. W. HALLO, Isaiah 28,9-13 and the Ugaritic Abedecedaries", JBL 77 (1958), 324-328. - L. KOHLER, "Zwei Fachworter der Bausprache in Jes 28,16", ThZ 3 (1947),390-393. - A. KUSCHKE, "Zu [es 30,1-5", ZAW 64 (1952), 194s. - L. J. LIEBREICH, "The Parable taken from the Farmer's Labors in Isaiah 28,23-29", Tarbíz 24 (1954/1955), 126-128. - J. LINDBLOM, "Der Eckstein in [es 28,16", NTT 56 (1955), 123-132. - L. ROST, "Zu [esaja 28,lss", ZAW 53 (1935), 292. - S. C. THEXTON, "A Note on Isaiah XXVIII 25 and 28", NTT 2 (1952), 81-83. 16 K. BUDDE, "[esaja 13", em: BZAW 33, 1918,55-70. 17 G. QUELL, "[esaja 14,1-23; em: Baumgãriel-Feetschríit, 1959, 131-157. 18 Diversamente: E. POWER, "The Prophecy of Isaías against Moab (Is 1,1-16,5)", Bíbl 13 (1932),435-451. - W. RUDOLPH, "[esaja XV-XVI", Dríver-Festschríft, 1963, 130-143. - HITZIG, SELLIN e PROCKSCH consideram esta seção mais antiga do que Isaías.
15
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exílio)": 21.11-12, sobre Edom, e 21.13-15, sobre Dadã (provavelmente posterior ao exílio); 23.1-14, sobre os fenícios provavelmente do séc. IV).2ü b) Um segundo complexo de tradições encontra-se no chamado apocalipse de Isaías, em 24-27, colocado antes da coleção G de Isaías." Neste apocalipse, aparecem, lado a lado, oráculos e cânticos proféticos, muitas vezes em íntima relação mútua. Muitos deles parecem ter constituído outrora, conjuntamente, perícopes autônomas, que foram depois reunidas por adições e ampliações mediante novas perícopes. Foi deste modo que surgiu uma composição homogênea (LINDBLOM: cantata), que à primeira vista pode dar a impressão de constituir uma unidade literária, mas na realidade consta de três liturgias proféticas e de alguns fragmentos isolados. Para a determinação da época de sua origem, exclui-se o tempo de Isaías (defendido ultimamente por BEEK, VAN ZYL e outros), como também o séc. 11, no qual o livro de Isaías já estava completo em Qumran (DUHM, MARTl, PROCKSCH, LUDWIG). A parte principal do texto deve ter surgido no séc. V (LINDBLOM, ANDERSON). 24,1-20
24,21-25,12
Primeira liturgia profética: o juízo universal, com a dissolução das formas de vida urbana (vv, 1-3: anúncio; vv. 4,16aa: cântico; vv. 16al3-20: anúncio). Segunda liturgia profética: os inimigos de Javé serão despojados do seu poder, com a destruição de suas capitais; banquete universal, como começo da soberania divina (24.21-23: anúncio; 25.1-5: cântico de ação de graças; 25.6-8:
K. GALLING, "Jesaja 21 im Lichte der neuen Nabonidtexte", em: Weiser-Festschrift, 1963,49-62. - J. OBERMANN, "Yahweh's Victory over the Babylonian Pantheon, the Archetype ofIs 21,1-10", JBL 48 (1929), 307-328. - R. B. Y. SeOTI, "Isaiah 21,1-10; the Inside of a Prophet's Mind", VT 2 (1952),278-282. 20 Diversamente: W. RUDOLPH, "Jesaja 23,1-14", em: Baumgiirtel-Festschrift, 1959, 166-174. 21 B. W. ANDERSON, "Isaiah XXIV-XXVII reconsidered", VTSuppl9, 1963, 118-126. - M. A. BEEK, "Ein Erdbeden wird zum prophetischen Erleben (Jesaja 24-27)", Arar 17 (1949), 31-40. - G. FOHRER, "Der Aufbau der Apokalypse des Jesajabuchs (Is 2427)", CBQ 25 (1953), 34-45. - G. HYLMÚ, De s.k. profetíska liturgiernas rytm, stil och komposition, 1929. - W. KESSLER, Gott geht es un das Ganze, 1960. - J. LINDBLOM, Die Jesaja-Apokalypse, Jes 24-27, 1938. - P. LOHMANN, "Die selbstãndigen lyrischen Abschnitte in [es 24-27", ZAW 37 (1917/1918), 1-58. - O. LUDWIG, Die Stadt in der Jesaja-Apokalypse, Diss., Bonn, 1961. - E. S. MULDER, Die Theologie van die JesajaApokalypse, Jesaja 24-27, 1954. - O. PLúGER, Theokratie und Eschatologie, 1962,2'" ed.,W. RUDOLPH, Jesaja 24-27, 1933. - A. H. VAN ZYL, "Isaiah 24-27: Their Date of Origin", OuTWP 1962, 44-57.
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Os LIVROS PROFÉTICOS
anúncio; 25.9-lOa: cântico de ação de graças). Os oráculos 25.1üb-11,12 são acréscimos. 26,1-6.7-21 Textos de ligação: cântico de ação de graças e oração individual pela comunidade. 27,1-6.12-13 Terceira liturgia profética: luta escatológica de Javé, preservação de Israel e reunião de todos os israelitas (v. 1: anúncio; vv. 2-6: cântico; vv. 12-13: anúncio). 27,7-11 Reflexão teológica sobre as possibilidades e condições para o fim da época de calamidade pré-escatológica.
Mas muitas outras opiniões também são defendidas. Alguns autores consideram esses capítulos como constituindo uma unidade literária em si. Assim, para LINDBLOM, trata-se de uma cantata, composta de cinco cânticos escatológicos e quatro cânticos de ação de graças, depois da conquista de Babilônia por Xerxes I, enquanto MULDER os vê em relação com a cidade moabita de Dibon, por volta de 270 a.c. Outros pensam em uma compilação e num aparecimento progressivo, como seriam, p.ex., a reunião de vaticínios apocalípticos e de cânticos a respeito da destruição de Samaria por João Hircano, no ano 110 (DUHM); ou na reunião de cânticos e vaticínios mais antigos, depois de uma catástrofe que se teria abatido sobre Moab no séc. III (EISSFELDT*), ou pensam na ampliação, em várias etapas, de uma base que é vista, por um lado, em 24.1-23 (STEUERNAGEL*), e, por outro lado, em 24, com várias unidades agrupadas por temas (vv. 16,7-13,14-20) (PUJGER); ou pensam, por fim, na compilação de palavras autônomas, que teriam sido reunidas, por um lado, em dez grupos, dos quais sete seriam devidos a um autor posterior à conquista da Babilônia por Alexandre Magno (RUDOLPH), e, que por outro, teriam sido considerados, em 27, como constituindo uma unidade maior e colocadas em relação com diversas cidades (Babilônia, Samaria e uma cidade moabita) (KESSLER). Estas hipóteses focalizam cada uma apenas um determinado elemento do complicado processo de formação, e devem ceder lugar a uma visão de conjunto. c) Um terceiro complexo de tradições da época posterior ao exílio foi acrescentado à coleção G de Isaías. Este complexo compreende duas liturgias proféticas: 33.1-6,7-24,21 bem como considerações sobre os tempos finais: 34-35, que dependem do Dêutero-Isaías." 22 23
H. GUNKEL, "[esaja 33, eine prophetische Liturgia", ZAW 42 (1924), 177-208.
w. CASPARI, "Iesaja 34 und 35", ZAW 49 (1931),67-86. - A. MAILLAND, La "peiüe apocalypse" d'Isaie, Diss., Lyon, 1956. - J. MUILENBURG, "The Literary Character of
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d) A última parte assumida e acrescentada como apêndice foram às lendas de Isaías: 36-39, extraídas de 2Rs 18.13,17-20,19.24 As mudanças de menor importância introduzidas nos textos de Isaías nesta seção, principalmente as mudanças do capo 38 com relação a 2Rs 20, e ainda a introdução, feita pela primeira vez, do chamado salmo de Ezequias: 38.9-20,25 atestam que esta parte foi tomada da referida secção de 2 Reis. e) Entre as promessas se conta a perícope 2.2-4 sobre a peregrinação das nações, nos últimos tempos, até ao monte de Sião. Esta perícope foi transmitida igualmente em Mq 4.1-3(4), onde o texto dá mesmo a impressão de ser mais antigo. Embora recentemente tenha sido atribuída a Isaías por WILDBERGER e JUNKER,26 devemos considerá-la como uma profecia escatológica anônima." Que a promessa 4.2-6 não seja da autoria de Isaías prova-se, com inteira segurança, a partir do conteúdo e dos modos de expressar-se. A perícope 9.1-6 também pertence a uma época tardia, apesar das muitas vozes em contrário." É bem verdade que se procurou salvá-la para Isaías, dando-lhe uma interpretação não messiânica, particularmente a interpretação impressionante de ALT, segundo a qual se trataria de uma promessa em favor daquelas partes de Israel ocupadas pelos assírios no ano de 732. Contudo, o que se tem aí é um produto da profecia escatológico-messiânica pós-exílica. Que o oráculo 11.1-9, contendo o
Isaiah 34", JBL 59 (1940),339-365. - A. T. E. OLMSTEAD, "II Isaiah and Isaiah, Chapter 35", AJSL 53 (1936/1937), 251-253. - M. H. POPE, "Isaiah 34 in Relation to Isaiah 35,40-66", JBL 71 (1952),235-243. - R. B. Y. ScOTI, "The Relation of Isaiah, Chapter 35, to Deutero-Isaiah", AJSL 52 (1935/1936), 178-191. - CH. C. TORREY, "Some importante Editorial Operations in the Book of Isaiah", JBL 57 (1938), 109-139. 24 J. MEINHOLD, DieJesajaerziihlungen Jesaja, 36-39, 1898. - H. M. ORLINSKY, "The KingsIsaiah Recensions of the Hezekiah Story", JQR 30 (1939/1940), 33-49. 25 J. BEGRICH, Der Psalm des Hiskia, 1926. - P. A. H. DE BOER, "Notes on the Text and Meaning of Isaiah XXXVIII, 9-20", OTS 9, 1951, 170-186. 26 H. JUNKER, "Sancta Civitas, [erusalem Nova", Trierer ThZ 15 (1962), 17-33. - G. VON RAD, "Die Stadt auf dem Berge", EvTh 8 (1948/1949), 439-447 (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1958, 214-224). - H. WILDBERGER, "Die Võlkerwallfahrt zum Zion", VT 7 (1957), 62-81. 27 SH. H. BLANK, Prophetic Faith in Isaiah, 1958. - E. CANNAWURF, "The Authenticity of Micah IV 1-4", VT 13 (1963),26-33. - B. REANUD, Structure et attaches littéraires de Michée IV-V, 1964. - Cf. também os comentários de FOHRER e KAISER. 28 A. ALI, "Jesaja 8,23-9,6", em: Bertholet-Festschrift, 1950, 29-49 (= Kleine Schriften, II, 1953, 206-225). - J. COPPENS, "Le roi idéal d'Is, IX, 5-6 et XI, 1-5, est-il une figure messianique?", em: Mémorial Gelin, 1961,85-108. - M. B. CROOK, "A Suggested Occasion for Isaiah 9,2-7 and 11,1-9", JBL 68 (1940), 213-224. - H. P. MüLLER, "Uns ist Kind geboren", EvTh 21 (1961),408-419.
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anúncio do Messias e do reino da paz, apresente igualmente um cunho pós-exílico, a despeito da abundância e da profundidade de suas idéias, é o que nos mostram, entre outros, a idéia nova de uma posse permanente do Espírito (v. 2) e a dependência do v. 9 em relação a Is 65.25 e a Hab 2.14. De origem posterior, certamente, são as promessas 23.17s ou 28.5s, que se podem considerar como apêndice da sexta coleção, e ainda a promessa de 32.15-20, que forma o apêndice da sétima coleção e em termos de conteúdo, e mesmo de linguagem, se acha intimamente relacionada com 32.9-1429 e começa, além do mais, com um hemistíquio, de tal sorte que aquilo que se acha dito nos vv. 9-14 deve conservar-se em vigor, até que seja derramado sobre nós o Espírito do Alto. t> Enumeremos apenas as palavras posteriores que foram inseridas nas coleções de Isaías. Trata-se de oráculos de ameaças de profetas desconhecidos: 7.23-25; 10.20-23; 17.9-11; de promessas diretas, em favor de Israel: 8.23b; 11.10,11-16; 17.7s; 29.17-24; 30.18-26; 32.1-5; de promessas indiretas no mesmo sentido: 8.9s30 ; 10.16-19,24-27a,33s; 17.12-14; de máximas sapienciais: 3.lOs; 32.6-8; de um cântico de ação de graças e, ao mesmo tempo, de um hino: 12, e de um oráculo sobre Eliacim: 22.20-23,24s.
5. Origem do livro A origem desse livro a partir das coleções parciais só começou tardiamente. Primeiramente foram unidas entre si as coleções C e E de Isaías, cuja ordem original foi interrompida, a seguir, pela inserção da coleção D (separação forçada de 5.25-29, com a perda de vários versículos, e de 10.13). Esta inserção está relacionada com a disposição em ordem cronológica das coleções, porque C contém oráculos do primeiro período de Isaías, D do segundo, e E do segundo e do quarto. Esta colocação deve ter sido feita na época do exílio (séc, VI), quando começaram a se formar livros desta espécie em maior número. Foi neste mesmo período que se colocou a coleção B antes destas três, com o título 2.1, da época do exílio, como acontecia com bastante freqüência (Gn 1; 511; Pr 1-9). Um pouco mais tarde se acrescentou a coleção A, com o título 1.1. O livro permaneceu com esta forma por bastante tempo, e com o capo 12 recebeu uma espécie de conclusão litúrgica.
29 30
Cf. FOHRER sobre a passagem. M. SAEB0, "Z ur Traditionsgeschichte von [esaja 8,9-10", ZAW 76 (1964), 132-144.
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As últimas coleções foram acrescentadas provavelmente no séc. V, em três etapas, obedecendo ao esquema escatológico de dois e de três membros. Determina-se a data, partindo-se do fato de que a coleção F só foi incorporada depois de sua fusão com a coleção estranha dos massa', que contém oráculos dos sécs. VI e V, além da perícope 23.1-14, que foi acrescentada talvez ainda mais tarde. Chegando-se, assim, ao esquema escatológico de dois membros, estava aberto o caminho para o esquema de três membros, com a inclusão da coleção G, já enquadrada pela moldura escatológica de 24-27 e 33-35. Pouco depois, presumivelmente, foram acrescentadas as lendas de Isaías, extraídas do livro dos Reis. O conjunto de Is 1-39 chegou à sua forma atual, portanto, no séc. V, ou, o mais tardar, no séc. IV: 1-12 13-23 24-25 36-39
sobretudo ameaças contra [udá e Jerusalém, ameaças contra outros povos, promessas, como molduras em torno das ameaças contra [udá e Jerusalém, apêndice histórico.
6. Pregação Na pregação de Isaías se refletem as intervenções dos assírios no sistema político síro-palestinense do séc. VIII e as tentativas de defesa desses países. Conseqüentemente, os temas constantes de seus oráculos são o agir de Deus no universo das nações e dos homens e - depois da sua confrontação com a situação interna de [udá, durante o primeiro período de sua atividade - a relação entre a fé e a política. Esta relação deve ser determinada e orientada de tal sorte, que o homem não faça uma política autocrática de força, nem assista, alheio, à ação de Deus," mas persevere em meio às tensões e às incertezas, confiando no poder universal de Deus. Na sua pregação, Isaías considera o rei assírio como um servo e um instrumento incumbido por Deus, mas acaba por lhe anunciar a ruína, quando constata, depois da invasão assíria, na Palestina, que o assírio não se considera instrumento de Deus, mas procura executar seus próprios planos de dominação. De qualquer modo, esta forma de encarar a grande potência é um traço novo e saliente na pregação de Isaías.
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C. A. KELLER, "Das quietitische element in der Bortschaft des [esaja", ThZ 11 (1955), 81-97.
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Ele conhece, naturalmente, as tradições de seu povo - provavelmente conhece as tradições proféticas, principalmente porque, sob muitos aspectos, foi influenciado por Amós e nele se inspirou." - como certamente conhece as tradições cultuais, embora rejeite o culto como meio da salvação (1.10-17) e cite ironicamente as expressões e os modos de falar tomados do culto ou lhes dê um sentido negativo (Javé o rochedo sobre o qual se cairá [8.14], aquele que habita no monte Sião, mas como garantia da ruína de Jerusalém [8.181. Ele aparece, sobretudo, como conhecedor da tradição histórica." ao repassar a história do reino setentrional de Israel, desde as guerras filistéias e araméias, até o grande terremoto, depois do qual talvez date o aparecimento de Amós, e ao falar, muitas vezes, da época de Davi e Salomão, quando Javé interveio na luta em favor de Davi (28.21), no tempo em que este acampou em Jerusalém (29.1) e Javé lançou a pedra fundamental e os alicerces da nova sede do seu governo no monte Sião (14.32; 28.16), quando a cidade era fiel e cheia de retidão (1.21).34 As relações ideais, na época de Davi, entre Javé e Israel não se baseiam na ligação jurídica de um pacto - Isaías não fala de uma "aliança" mas em um intercâmbio pessoal e vital, no qual Javé é o amante e o noivo (S.Iss). Israel é a sua parentela ou sua família Cãm), e os israelitas são os seus filhos (1.2s,4; 30.9), os quais, no entanto, se perverteram, fazendo-se mentirosos e piores do que o gado do pai da família (1.2-4; 5.2; 30.9), e Israel simplesmente se tornou este povo que está aí, o qual, como bem ensina a história do reino do norte, não deu atenção às advertências dos flagelos enviados por Javé, nem a ele se converteu. Por isso, Deus vai executar sua grande "conjuração" contra [udá e desencadear o castigo em forma de destruição da existência pecadora que se opõe à vontade divina. O anúncio do fim da existência carregada de culpas percorre toda prega-
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R. FEY, Amos und [esa]a, 1963. G. FOHRER, "Prophetie und Geschichte", ThLZ 89 (1964),481-500. - H. "Jesajas Verstãndnis der Geschichte", VT5uppl9, 1963, 83-117.
WILDBERGER,
Com tudo isto, porém, Isaías não representa nenhuma das chamadas tradições da eleição, as quais só se podem reconstituir, quando se individualizam as palavras dos profetas escatológicos posteriores, que foram disseminadas no escrito do profeta. Antes, deve-se dizer que para Isaías deixa de existir a tradição da fé javista habitual, no momento em que é chamado, quando em resposta à sua pergunta: Até quando?, que supõe que Javé somente flagela e não destrói, lhe é anunciado a devastação total do país. Com isto, a convicção de que Israel vive precisamente numa situação de salvação transforma-se inversamente na certeza de que o que existe é uma situação de desgraça.
§ 57. Dêutero-Isxíxs (Is 40-55)
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ção de Isaías, com monotonia sublime e comovedora, desde a vocação até suas últimas palavras (22.1-14; 32.9-14). Salvar desta situação somente o podem a transformação total do homem e o cumprimento da vontade divina na vida de cada dia (1.16s), a obediência (1.18-20) e a conversão oferecida sob o nome simbólico do filho do profeta (7.3), Javé virá em socorro, quando os jerosolimitanos nele "crerem" e nele confiarem (7.9), quando silenciosamente e cheios de confiança nele repousarem (30.15) e em atitude de humildade sussurrarem em voz baixinha, como aquela do espectro a murmurar do pó da terra (29.4). Nesse momento, então, mesmo todo o [udá poderia ser o "resto" que persevera em meio às terríveis tempestades das guerras. Em tudo isto Isaías aparece como o profeta da exigência de conversão."
§ 57. DÊUTERO-ISAÍAS (Is 40-55) Cf. os comentários relativos ao § 56. - JB: J. MUILENBURG, 1956. - KA T: VOLZ. 1932. - SAT: M. HALLER, 2il ed., 1925. - Especiais: G. FOHRER, 1964 (Zürcher Bibelkommentare). - C. R. NORTH, 1964. B. W. ANDERSON, "Exodus Typology in Second Isaiah", em: Essays Muilenburg, 1962, 177-195. - J. BEGRICH, Studien zu Deuterojesaja, 1938 (1963). - T. W. BEHR, TheWritings oi Deuiero-Isaiah and theNeo-Babylonian Royal Inscriptions, 1937. - SH. H. BLANK, "Studies in Deutero-Isaiah", HUCA 15 (1940), 1-46. - P. A. H. DE BOER, Second-Isaiah's Message, 1956. - W. CASPARI, Lieder und Gottessprüche der Rückwaanderer, 1934. - F. M. CROSS, Jr., "The Council of Yahweh in Second Isaiah", JNES 12 (1953), 274-277. - O. EISSFELDT, "The Promises of Grace to David in Isaiah 55,15", em: Essays Muilenburg, 1962, 196-207. - K. ELLIGER, Deuterojesaja in seinem Verhiiltnis zu Tritojesaja, 1933. - G. FOHRER, "Zum Text von [es
35
É impossível encontrar em Isaías uma promessa incondicional de salvação (BLANK, VRIEZEN, WHITLEY). É somente a partir das palavras de salvação, introduzidas posteriormente no livro, que ela pode ser deduzida. O "resto" de que fala Isaías não é uma realidade salvífica em si, mas aquilo que restará da catástrofe; cf. E. W. HEATON, Die Propheten des Alten Testaments, 1958, 191-195, e G. VON RAD, Theologie des Alten Testaments, 11, 1960, (4il ed., 1965), 175s [em port.: Teologia do Antigo Testamento, São Paulo, ASTE/Targumim, 2006]. Isaías não conhece um "plano" eterno de Javé para o juízo e para a salvação, como pensa J. FICHTNER, "[ahves Plan in der Botschaft des Jesaja", ZAW 63 (1951), 16-33, principalmente porque as expressões ligadas a este tema não ocorrem absolutamente em suas promessas, enquanto o pretenso plano varia de tal modo, que mais se trata de decisões tomadas ao sabor de cada caso, podendo ser suspensas.
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1. Dêutero-Isaías Depois que EICHHORN* (1783) e DÓDERLEIN (1789)36 expressaram a opinião de que os caps. 40-66 provêm de um profeta do exílio, e DUHM defendeu energicamente o mesmo ponto de vista (1892), limitando-se, porém, a 40-55 e atribuindo 56-66 a uma época posterior, a última hipótese se 36
J. CHR. DOOERLEIN, Esaias, 1789, 3i1 ed., XII-XV.
§ 57. Dêutero-Isxíxs Os 40-55)
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impôs de modo geral e pode hoje ser considerada quase universalmente aceita. É verdade que a unidade do livro de Isaías vem sendo defendida, como sempre, pelo lado conservador (ALLIs, YOUNG)/7 mas isto em inteira contradição com as informações dos caps. 40-55, de acordo com as quais Jerusalém e o templo se acham destruídos (44.26-28; 51.3; 52.9), o povo vive no exílio, na Babilônia (42.22,24; 43.14, et passim), a Babilônia (e não Assur) é ameaçada de destruição (47; 48,14), e Ciro já se encontra em sua marcha triunfal (41.2s,25; 44.28; 45.1-3). Além disso, é preciso também levar em conta a diferença de vocabulário, o estilo superabundante e o universo conceitual teológico próprio, que se distanciam inteiramente daquele de Isaías. Como não se menciona o nome do profeta cujos oráculos foram conservados em 40-55, dá-se-lhe a denominação de Dêutero-Isaías (o Segundo Isaías). Poder-se-ia supor que ele também se chamava Isaías, como seu predecessor, e que por isso seus escritos teriam sido acrescentados aos escritos do Isaías mais antigo; contudo, não existe nenhum indício neste sentido. Muitas vezes explica-se a anexação, dizendo-se que os profetas que falam em 40-55 e 56-66 são «discípulos» de Isaías. Mas se a permanência de uma tal escola por mais de dois séculos já é improvável, a própria hipótese fracassa pelo fato de se apoiar somente no acréscimo posterior de Is 8,16, e também porque o Dêutero-Isaías não foi influenciado de modo particular por Isaías. Em vez disto, é preciso partir da constatação de que em Is 1-39 foram inseridos (em maior número do que em outros livros proféticos), oráculos de todos os tipos, de profetas mais recentes, com cuja posição escatológica fundamental o Dêutero-Isaías concorda, de modo que a incorporação de seu escrito se fez quase espontaneamente. Além disso, Isaías era considerado em épocas posteriores como o profeta por antonomásia, de sorte que a anexação a seu livro equivalia a um reconhecimento oficial da pregação tantas vezes contestada do Dêutero-Isaías.
2. Época e lugar
o Dêutero-Isaías exerceu sua atividade na época final do exílio babilônico (597/587-538), quando o reino babilônico estava prestes a ruir e Ciro, o rei dos persas, era esperado como o salvador dos povos 37
O. T. ALLIS, The Unity of Isaiah, 1951. - R. E. J. YOUNG, Studies in Isaiah, 1954.
MARGALIOTH,
The Indivisible Isaiah, 1964. -
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oprimidos." Dele o profeta espera também a libertação dos judeus deportados e o repatriamento para Jerusalém, e a reconstrução do templo, pois Javé, que havia chamado Ciro, o havia declarado seu ungido (45.1), e agora se servirá dele para socorrer Israel. Fora disto, é quase impossível determinar com precisão a data dos oráculos do DêuteroIsaías. A este respeito, os seus oráculos, altamente poéticos, são por demais ambíguos e cambiantes, pairam acima do espaço e do tempo, e lançam sobre as coisas um véu que impede de ver a sua realidade (EISSFELDT*). A única margem de aproximação permitida pelas indicações cronológicas é a de que os oráculos surgiram entre o começo da carreira vitoriosa de Ciro (550) e a conquista da Babilônia (558). Talvez se possa, deduzir também de 52.13-53.12 que o profeta morreu antes de 538. Entretanto, STEVENSON e S. SMITH acreditam terem encontrado referências históricas explícitas, de forma que o primeiro distingue cinco períodos de atividade do Dêutero-Isaías, entre 547 e 538/ enquanto o segundo o considera como o chefe de um movimento subterrâneo contra os babilônios, durante um período de cinco anos, até ser executado pelo próprio povo. Os fundamentos, porém, destas hipóteses se mostram insuficientes, quando submetidos a uma investigação mais rigorosa. Também não se pode chegar ao exagero de MORGENSTERN, que deixa para o Dêutero-Isaías apenas os caps. 40-48 (colocados em ordem cronológica inversa, de modo que o capo 48 seria o mais antigo e o capo 40 seria o mais novo), e liga, pelo contrário, os caps. 49-55 aos autores de 56-66, colocando estes últimos em relação com a catástrofe terrível que se teria abatido sobre o judaísmo em 485 a.c. Também não se pode ir tão longe como CASPARI, que nega a autoria dos capítulos a um único profeta e os interpreta como sendo uma cole-ção de oráculos proféticos e de cânticos provenientes dos exilados que retomavam à Palestina, e contendo, de preferência, cânticos marciais. Numerosas são as tentativas de identificar dois períodos na atividade do Dêutero-Isaías, a partir da divisão do documento em duas seções: 40-48 e 49-55. Assim, KUENEN* e KITTEL situam a primeira parte nos anos anteriores à conquista da Babilônia ou à publicação do edito de libertação de Ciro, e a segunda parte na época posterior ao regresso
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M. HALLER, "Die Kyros-Lieder Deuterojesajas", em: Gunkel-Festschrift, I 1923/ 261277. - E. JENNI, "Die Rolle des Kyros hei Deuterojesaja", ThZ 10 (1954)/ 241-256. - C. E. SIMCüX, "The Rôle of Cyros in Deutero-Isaja", JAOS 57 (1937)/ 158-171. - U. SIMON, "Kõnig Cyrus und die Typologie", Judaica 11 (1955)/83-89.
§ 57. Dêutero-Isxtxs Os 40-55)
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a Jerusalém, enquanto que BAUDISSIN* e VOLZ derivam a segunda parte do período decorrido ainda entre a conquista e a publicação do edito. De fato, em 40-48 se encontram oráculos relacionados com a conquista da Babilônia e também com Ciro, e em 46.1s; 47 exprimem-se expectativas que não se concretizaram no modo indicado, de forma que devem ter surgido antes de 538. Mas isto é mais uma decorrência do processo de composição do que de uma situação histórica em mudança, principalmente porque se obteria grande unidade de estilo e de pensamento nos caps. 40-55. Por outra parte, BEGRICH distingue entre uma pregação escatológica do profeta do período posterior, depois da revolta de Ciro contra Astíage da Média (553/2), e a transferência das esperanças para Ciro enquanto libertador enviado por Deus, depois da guerra lídica (547/6), situação esta de onde teria decorrido a mudança radical na pregação do Dêutero-Isaías. Mas os pontos de apoio para uma tal divisão são muito pobres e incertos; falta uma referência expressa a acontecimentos concretos, e os oráculos referentes a Ciro são tão escatológicos como os demais. HARAN aponta para uma outra data. Segundo ele, os caps. 40-46 e 48 - abstração feita do capo 40, talvez o mais antigo - provêm, de um lado, da época situada entre o edito da libertação (538) e a primeira leva de repatriados, à qual o DêuteroIsaías deve ter-se associado, enquanto os caps. 49-66 remontam, do outro lado, à sua atividade depois do regresso.
Se os oráculos do Dêutero-Isaías surgirem dentro de um espaço de tempo impossível de determinar com precisão, sem que se possam distinguir quantos tenham sido os períodos de sua atividade, resta, por outro lado, resolver o problema a respeito do lugar da atividade do profeta. É sobretudo na Babilônia que se deve pensar (VOLZ). O Dêutero-Isaías se mostra familiarizado com a situação local e influenciado, tanto pelo estilo dos hinos de Ishtar, compostos na primeira pessoa do singular, como pelas inscrições da Babilônia (BEHR), e já se defronta com o dualismo iraniano (45.7). A maioria de seus oráculos, que trazem a marca da pregação oral, volta-se para os deportados e se defronta às vezes com as objeções que eles devem ter-lhe lançado diretamente em rosto. Não se pode, porém, pensar em uma atividade nem na Fenícia (DuHM, por causa de 45.14; 49.12), nem no Egito (EwALD, MARTI, HÓLSCHER),
nem na Palestina (MOWINCKEL, depois de SEINECKE), como também não se pode pensar em uma atividade temporária na Babilônia, com base na divisão do escrito nas seções de 40-48 e 49-55 (KUENEN*, KITTEL, PROCKSCH e outros).
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3. Gêneros literários ENGNELL procurou explicar o caráter do escrito do Dêutero-Isaías como sendo a imitação de uma liturgia das festas anuais do ritual real, na qual se teriam utilizado os salmos veterotestamentários da paixão do rei e as liturgias babilônicas de Tammuz. Em oposição a isto, deve-se seguir, em essência, a acurada determinação dos gêneros literários de cerca de sessenta e três oráculos individuais, estabelecida por BEGRICH, embora sem deixar de se considerar a diferenciação mais recente, realizada por WESTERMANN. Observa-se que os modos típicos de falar dos profetas escritores, anteriores ao exílio - invectivas, ameaças, exortações - vão deixando de ser usados. Em seu lugar, surgem outras quatro formas: o oráculo de salvação, plenamente desenvolvido na linha de continuidade das promessas dos profetas de salvação ligados ao culto nacional; o hino por causa da salvação iminente (particularmente o hino de Deus na primeira pessoa gramatical, e até então não usado em (Israel); o oráculo profético de julgamento, para demonstrar que Javé é o único Deus; e as palavras utilizadas nas discussões para resolver as dúvidas e as objeções levantadas contra a mensagem profética. Estas últimas, precisamente, indicam o caráter oral da pregação e excluem a hipótese de que a atividade do profeta tenha sido exclusivamente literária (BEGRICH, EISSFELDT*). Determinadas características de estilo também depõem em favor da pregação oral: interpelações, convites, perguntas retóricas e explanações em estilo de prédica. As polêmicas, às vezes violentas, do Dêutero-Isaías nos mostram, por outro lado, que é impossível tenha ele exercido alguma função nas celebrações cultuais, como porta-voz oficial ou como profeta ligado ao culto (VüN WALDüW). Também a ocorrência das formas hínicas não nos permite tirar esta conclusão, porque a utilização ou a imitação de formas de um determinado âmbito da existência não implica que o profeta tenha exercido sua atividade dentro deste âmbito. Mas pode-se admitir que o Dêutero-Isaías, por razões práticas, se tenha servido das oportunidades das celebrações cultuais para transmitir sua mensagem aos numerosos participantes das mesmas.
4. Oráculos sobre o Servo de Javé Com a história da exegese, os oráculos sobre o Servo de Javé (Cânticos do Ebed-javé) passaram a ocupar uma posição especiaL Desde que DUHM pôs em realce as poesias de Is 42.1-4(5-7); 49.1-6; 50.4-9; 52.13-12
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como grupos de textos de natureza especial e negou sua autoria ao Dêutero-Isaías, começou uma viva polêmica e a bibliografia a respeito se tornou quase ilimitada. NORTH nos oferece uma visão global e completa sobre a evolução do problema e as diversas tentativas de solução." Uma questão ainda discutida é aquela a respeito do número e dos limites dos oráculos. Muitos, em seguimento a DUHM, alguns consideram 42.5-7 como um acréscimo, enquanto outros o juntam aos versículos precedentes para formar a unidade 42.1-7 (ou mesmo 42.1-9). Mas pela fórmula introdutória vê-se claramente que 42.5-7 constitui um oráculo próprio que deve ser alinhado entre as palavras a respeito do Servo de Javé, ao passo que 42.8-9 não provém do Dêutero-Isaías. Às vezes também se considera 58.4-11 como uma unidade, mas os vv. 10-11 se diferenciam tão radicalmente dos vv. 4-9, que se deve ver aí uma palavra própria. São seis, portanto, os oráculos, dos quais os quatro primeiros constituem oráculos propriamente ditos a respeito do Servo de Javé: 42.1-4,5-7; 49.1-640; 50.4-9,41 enquanto os dois últimos, porém, são palavras sobre ele: 50.1011; 52.13-53.12.42 Os oráculos não constituem um corpo separado, cujas partes teriam sido distribuídas ao longo do escrito do Dêutero-Isaías, nem estas partes também estão organicamente vinculadas ao seu contexto; antes, constituem um grupo que só se inter-relaciona por meio do tema. Por razões que já não se podem determinar claramente, eles foram encaixados, como as C. R. NORTH, The Sufferíng Servant in Deuiero-lsaiah, 1956,26 ed. - E ainda: O. EISSFELDT, Der Gottesknecht bei Deuterojesaja (Jes 40-55) im Lichte der israelitischen Anschauung von Gemeinschaft und Indioiduum, 1933. - In., "Neue Forschungen zum 'Ebed-jahweProblem", ThLZ 68 (1943), 273-280. - H. A. FISCHEL, "Die Deuterojesajanischen Gottesknechtslieder in der jüdischen Auslegung", HUCA 18 (1943/1944), 53-76. - G. FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52). - H. HAAG, "Ebed-jahwe-Forschung 19481958", BZ NF 3 (1959), 174-204. - C. LINOHAGEN, "The Servant of the Lord", ET 67 (1955/1956), 279-288, 300-302. 40 J. A. BEWER, "Two Notes on Isaiah 49,1-6", em: Kohut Memorial Vai., 1935, 86-90. CH. H. GIBLIN, "A Note on the Composition of Isaias 49,1-6(9a)", CBQ 21 (1959), 207-212. 41 L. G. RIGNELL, "[esaja kap. 50", STKv 29 (1953), 108-119. 42 H. L. GINSBERG, "The Arm of YHWH in Isaiah 51-63 and the Text of Isa 53,10-11", JBL 77 (1958), 152-156. - H. W. HERTZBERG, "Die 'Abtrünnigen' und die 'Vielen' ", em: Rudolph-Festschrift, 1961,97-1341. - R. KITTEL, [es 53 und der leidende Messias im Alten Tesiameni, 1899. - H. S. NYBERG, "Smãrtonas man", SEA 7 (1942), 5-82. - L. G. RIGNELL, Is 52.13-53.12, VT 3 (1953), 87-92. - H. WOLF, "Wer ist der Gottesknecht in [es 53?", EvTh 22 (1962), 338-342. - E. J. YOUNG, Isaiah 53, 1952. 39
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confissões de Jeremias (§ 59,3-B), em diversos lugares, entre outros oráculos do documento. Isto se fez tanto mais logicamente, quando se sabe que eles surgiram em épocas diferentes: 42.1-4,5-7 são indubitavelmente os mais antigos, ao passo que 49.1-6 e 50.4-9 se referem, em data posterior, a um insucesso conhecido no entretempo e a uma ameaça que se concretizara, ameaça esta que; segundo 50.10-11 e 52.13-53.12, atingiu então o seu máximo grau de intensidade. Uma comparação com os oráculos restantes do Dêutero-Isaías nos indica que ele é o autor pelo menos dos quatro primeiros oráculos. Do mesmo modo que eles, pela língua e pelo estilo, correspondem às suas características, também correspondem, pelo conteúdo teológico fundamental, com seu monoteísmo universal, à expectativa escatológica e à idéia de missão. Dependendo da interpretação que se dê aos oráculos, pode-se constatar, evidentemente, uma diferença em relação ao restante da pregação do Dêutero-Isaías, tanto no caráter pessoal e autobiográfico desses oráculos, como na aplicação do termo "servo" a uma determinada pessoa. Mas esta diferença, que é ditada pelo conteúdo, não excluiria o Dêutero-Isaías como o seu autor. Já MORGENSTERN,43 pelo contrário, atribui os referidos textos, juntamente com alguns outros versículos, a um autor desconhecido das vizinhanças da cidade costeira de Dor ou da Galiléia por volta de 450 a.c., e depois de toda espécie de transposição, vê neles um drama hebraico constituído nos moldes do drama grego e que representaria o escrito de uma seita judaica. O Servo seria um rei da casa de Davi. Seu tipo original poderia ser um certo Menahém que teria sido executado em 485 a.c., depois que os persas, ao que afirma MORGENSTERN, conquistaram Jerusalém.
A questão decisiva é aquela que diz respeito à significação do Servo. Um glosador resolveu-a em sentido coletivo, acrescentando o nome de Israel em 49.3. A mesma coisa foi feita em sentido individual pelo profeta que fala em 61.1, descrevendo sua própria atividade e inspirando-se nos oráculos do Servo de Javé. Estas duas importantes interpretações têm sido sustentadas até os nossos dias. Recentemente se lhes acrescentaram uma interpretação intermediária, complexiva ou integral, e a hipótese de que o Servo seja uma idéia. 43 J. MORGENSTERN, "The Suffering Servant - a New Solution", VT 11 (1961),292-320, 406-431.
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a) A interpretação coletiva, que foi defendida, entre outros, por BAUDISSIN*, BUDDE, SMEND, WELLHAUSEN e posteriormente por STEUERNAGEL*, HÓLSCHER, KÓNIG, EISSFELDT e LODS*,44 não faz distinção entre o Servo dos oráculos e o Servo da restante pregação do Dêutero-Isaías, considerando-o, seja como Israel individual ou ideal, seja como uma parte que sofre (DE BOER) ou que vive no exílio (KAISER). Em abono desta interpretação pode-se apelar para o costume corrente no AT de representar as nações por meio de figuras individuais (41.8ss,13; 42.19; 44.1s). Contra esta opinião pode-se objetar que os traços pessoais que encontramos nos oráculos sobre o Servo de Javé se destacam mais fortemente em sentido qualificativo, e são, pelo menos em parte, de natureza biográfica, como correspondendo a uma pessoa individual. Além disso, a hipótese de que, segundo os oráculos, é Israel quem se instrui a si próprio, quem se educa e sofre vicariamente por si mesmo, nos parece improvável. b) A interpretação individual vê no Servo uma pessoa singular. Na história da exegese, esta hipótese tem agravado o fato de que as opiniões a respeito da identidade do Servo divergem amplamente umas das outras." Assim, só SELLIN entendeu o Servo sucessivamente como sendo Zorobabel (1898), Joaquim (1901), Moisés (1922), até se filiar a mais uma interpretação. Outros o supõe como um mestre da torá da época posterior ao exílio (DUHM), ou como um mártir desconhecido do período do exílio, ou ainda como uma figura escatológica (KITTEL, e igualmente RUDOLPH), que teria sido contraposta a Ciro como figura divina do Salvador (HEMPEL), ou para a qual os discípulos do Dêutero-Isaías teriam dirigido suas esperanças (MOWINCKEL, 1931). Também se pensou numa figura messiânica de caráter genérico, esperada no futuro (GRESSMANN, ENGNELL), ou
K. BUDDE, Die sogenannte Ebed-Iahuie-Lieder, 1900. - O. EISSFELDT (ver acima, nota 4). - G. HÓLSCHER, Geschichte der israelitische und jüdischen Religion, 1922, 122-124. - O. KAISER, Der Konigliche Knecht, 1959. - R. SMEND, Lehrbuch der alttestamentliche Religionsgeschichte, 1899, 2 a ed., 352-360. - J. WELLHAUSEN, Israelitische und jüdische Geschichte, 1904, s- ed., 161s. 45 H. CAZELLES, "Les Poêmes du Serviteur", RSR 43 (155),5-55. - I. ENGNELL, "The 'Ebed Yahweh Songs and the Suffering Messiah in 'Deutero-Isaiah"', BJRL 31 (1948), 54-93. - J. FISCHER, Isaias 40-55 und die Perikopen von Gottesknecht, 1916. - H. GRESSMANN, DerMessias, 1929,285-323. - J. VAN DER PLOEG, LesChants du Serviteur deJahvé dans la seconde partie du Livred'Isaie, 1936. - W. RUOOLPH, "Der exilische Messias", ZAW 43 (1925),90-114. - E. SELLIN, Serubbabel, 1898. - ID., Der Knecht Gottes beiDeuterojesaja, 1901. - ID., Mose, 1922. 44
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expressamente no Messias como tal (DELITZSCH, FISCHER, CAZELLES e outros). A estas sugestões, muitas vezes vagas, se contrapõe a concepção individual mais importante, qual seja a de que se trata de uma referência direta ao próprio Dêutero-Isaías, que já está na base de Is 61,1.46 Esta concepção foi defendida inicialmente por MOWINCKEL (1921), que posteriormente a abandonou. Muitos outros também a adotaram (GUNKEL, HALLER, BEGRICH, WEI5ER* e outros) ou a modificaram (VOLZ: com exclusão de 52.13-53.12). Além disso, a opinião expressa por SELLIN (1930) e apoiada por ELLIGER, segundo a qual somente os primeiros oráculos teriam sido formulados pelo Dêutero-Isaías em relação a si mesmo, ao passo que o texto de 52.13-53.12 teria sido redigido, pelo contrário, por um dos seus discípulos, isto é, pelo Trito-Isaías, como lamentação fúnebre a respeito do mestre, deve ser mencionada, porque esclarece muitas dificuldades. c) A interpretação complexiva ou integral procura unir a concepção coletiva e a concepção individual." Segundo NYBERG, o Servo pertence ao passado, ao presente e ao futuro, e enfeixa em si a recordação de personagens históricos (os patriarcas, Moisés, Davi, os profetas) , figuras míticas (Tammuz, Baal); e traços individuais e coletivos, de modo a representar, como figura individual, o povo em sua totalidade. NORTH e ROWLEY supõem uma evolução no Dêutero-Isaías, a qual teria passado da interpretação do Servo como Israel para a transferência do sofrimento e da morte vicária do indivíduo. Já EISSFELDT*, recentemente, mantendo-se fiel ao princípio da interpretação coletiva, vê, ao mesmo tempo, no Servo o educador e o representante do povo, concebido como profeta que deve trabalhar em benefício do povo e sofrer pelo povo, de sorte que o Servo se identificaria e não se identificaria, ao mesmo tempo, com Israel. O que se põe em dúvida é se concepções assim tão complicadas podem ser consideradas como prováveis. d) Por fim, para LINDBLOM48 o Servo encarna a idéia da missão universal de Israel e, analogamente ao filho pródigo de Lc 15.11ss, não pode ser considerado como grupo ou como pessoa individual.
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S. MOWINCKEL, Der Knecht [ahuiãs, 1921. - H. GUNKEL, Ein Vorlaufer [esu, 1921. - E. SELLIN, "Tritojesaja, Deuterojesaja und das Gottesknechtsproblem", NkZ 41
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No que diz respeito ao conteúdo dos oráculos sobre o Servo de [avé." a relação do Servo com o próprio Dêutero-Isaías parece-nos ser a mais correta. Partindo daqui, esclarecem-se as diferenças com referência à restante pregação do profeta. Em 42.1-4.5-7 ele presta conta a si mesmo, e talvez a outros, de sua atividade, e desenvolve sua autocompreensão como profeta. Posteriormente, nos oráculos 49.1-6; 50. 4-9, formulados na primeira pessoa do singular, ele falou de suas dúvidas e de suas lutas interiores, à semelhança de Jeremias. A ocasião para isto lhe foi proporcionada pelos insucessos e pelas hostilidades que sofreu, como também pelas ameaças e pelas perseguições de que foi objeto. Talvez o ameaçassem igualmente a intervenção das autoridades babilônicas, como era de se esperar, por causa de sua pregação antibabilônica. Nesta situação, estava em jogo não só o trabalho de sua vida, como também sua fé. Por isso, ele procurou fixar nos dois oráculos, à maneira de testamento profético, o sentido de sua missão e de sua vida. Já as passagens de Is 50.10-11 e 52.13-53.12 não podem ser atribuídas ao Dêutero-Isaías. Estes oráculos lançam um olhar retrospectivo sobre a vida e a atividade já encerradas do profeta na sua qualidade de Servo de Javé, e supõem que ele tenha sido executado, depois de submetido a um processo judicial. Assim, as duas perícopes talvez derivem do círculo de seus seguidores, o qual teria chegado a uma interpretação da vida, do sofrimento e da morte ignominiosa do profeta, principalmente no último cântico. Uma das últimas características da pesquisa moderna consiste na indagação insistente a respeito das raízes da idéia que está ligada ao Servo de Javé. Nesta pesquisa chama-se a atenção, sobretudo, para os traços míticos e mitológico-cultuais e reais do Servo de Javé, supondo-se aí um influxo correspondente a estes aspectos. 49
J. COPPENS, Nieuw lichtover de Ebed-Jahwe-Liederen, 1950. - lo., "Les origines littêraires des Poemes du Serviteur de Yahvé", Bib140 (1959),248-258. - lo., "Le Serviteur de Yahvé", BEThL XII, 1959,434-454. - V. DE LEEUW, De Ebed Jahweh-profeteen, 1956. W. F. LOFTHOUSE, "Some Reflections on the 'Servant Songs' ", JThSt 48 (1947), 169176. - H. G. MAY, "The Righteous Servant in Second Isaiah's Songs", ZAW 66 (1954), 236-244. - R. PRESS, "Der Gottesknecht im Alten Testament", ibid. 67 (1955), 67-99.J. SCHARBERT, "Stellvertretendes Sühneleiden in den Ebed-Jahwe-Liedern und in altorientalischen Ritualtexten", BZ NF 2 (1958), 190-213. - lo., Heilsmittler im Alten Testament und im Alten Orient, 1964. - N. H. SNAITH, "The Servant of the Lord in Deutero-Isaiah", em: Th. H. Robinson-Festschrift, 1950, 187-20. - W. STAERK, DieEbedJahwe-Lieder in Jes 40ss, 1913. - R. J. TOURNAY, "Les Chants du Serviteur dans la Second Partie d'Isaie", RB 59 (1952),355-384.
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OS LIVROS PROFÉTICOS GRESSMANN, depois seguido por outros, já chamara a atenção para as concepções mitológico-cultuais relativas ao deus da vegetação que morre e ressuscita, e ENGNELL, além disso, também para a sua ligação com a ideologia da realeza sagrada e seu culto. LINDHAGEN50 também pretende demonstrar exaustivamente, partindo da ideologia real, que existe uma base cultuaI para a imagem do Servo e seus matizes. BÓHL51 chama atenção para o representante real babilônico-assírio, ao passo que KAISER numa reinterpretação ousada, vê os traços reais transferidos para o povo. HAYATI,52 ao invés, menciona quatro raízes para a referida concepção: a imagem da "corporate personality", de acordo com a qual a coletividade é beneficiária da retidão do indivíduo; as opiniões israelíticas relativas ao profeta perfeito; as concepções a respeito do sistema sacrificaI, de acordo com as quais o Servo constitui um todo único em sua pessoa e em sua obra; os cultos da vegetação, que forneceram as imagens e os conceitos. Além disso, poderíamos ainda chamar a atenção para o fato de que os profetas, quando executam ações simbólicas, já estão exercendo uma certa representatividade.
De maior importância são os dois pressupostos gerais do último cântico, a saber: 1) a concepção intimamente ligada à fé e à mentalidade antigas, e segundo a qual o sofrimento é uma punição imposta por Deus, por causa do pecado, razão por que o profeta deve sofrer também por causa do pecado; 2) a idéia de permuta e de transferência, segundo a qual o Servo deve assumir os motivos de punição, bem como o sofrimento pela culpa e as enfermidades dos outros, enquanto estes, pelo contrário, devem assumir a inocência, a impunibilidade e a salvação própria do Servo.
5. Composição e estrutura Não aparecem claramente a composição e a estrutura do escrito do Dêutero-Isaías, que é formado de cânticos isolados. Como defensores de opiniões contrárias entre si podemos mencionar, de um lado, BUDDE,53 HESSLER e MUILENBURG, e, do outro, MOWINCKEL. Os primeiros entendem o escrito como construído segundo um plano conscientemente elaborado e 50 C. L!NDHAGEN, The Servant Motif in the Old Testament, 1950. 51 F. M. TH. DE LIAGRE BÓHL, "Prophetentum und stellvertretendes Leiden in Assyrien und Israel", em: Opera Minora, 1953,63-80. 52 J. PH. HYATT, "The Sources of the Suffering Servant Idea", JNES 3 (1944), 79-86. 53 K. BUDDE em: E. KAUTZSCH, Die Heilige Schrift des Alten Testaments, I, 1922, 411 ed.
§ 57. Dêutero-IsAÍAs Os 40-55)
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dentro de uma progressiva concatenação das idéias. VOLZ pensa, igualmente, em uma ordem cronológica e específica dos oráculos, introduzida pelo próprio Dêutero-Isaías. MOWINCKEL vê no documento referido apenas uma seqüência de oráculos sem ligação, que foram reunidos por um discípulo do profeta, de acordo com certas palavras-chaves, mas sem outra ordem qualquer. Sob estas formas extremas as duas opiniões não correspondem à realidade. MOWINCKEL tem razão quando afirma que não se pode falar de uma divisão clara de todo o escrito, nem de um progresso efetivo das idéias, a menos que o exegeta caia em artificialismo, e também quando diz que freqüentemente se pode constatar que a distribuição das partes do escrito se fez com base em palavras-chaves, mas não se trata de uma mistura confusa. Abstraindo-se de 41.1-6, as palavras a respeito de Ciro e da queda da Babilônia, anteriormente predita, se encontram em 44.22-48.22. As palavras programáticas a respeito da reconstrução, na Palestina, se acham, sobretudo, em 49-55. Por fim, a perícope 55,8-13 relembra 40.3-5, de onde resulta uma espécie de moldura para todo o conjunto. Existe, portanto, uma certa ordem (EISSFELDT*). Ao que parece, o escrito não surgiu a partir de coleções parciais, cada uma com fisionomia própria, mas de um só lance, ora obedecendo aos princípios ordenadores mencionados, ora com base nas palavras-chaves. Por fim, não se pode excluir a hipótese de que um critério cronológico tenha também exercido um certo papel. Do mesmo modo que a perícope 40.1-8 introduziu o escrito em lugar do relato da vocação, assim também foram inseridos oráculos a respeito do Servo de Javé nos diversos lugares, evidentemente obedecendo à ordem cronológica de seu aparecimento. Talvez este princípio tenha sido determinante para a ordenação de outras passagens, embora não o possamos comprovar. Como compilador e redator, ELLIGER considera o Trito-Isaías, tido como discípulo do Dêutero-Isaías e que teria procedido segundo critérios materiais, refundindo e completando parcialmente os oráculos já existentes, e teria concluído o escrito ainda antes da conquista da Babilônia por Ciro. Esta tese supõe que Is 56-66 provenha de um só autor, discípulo do Dêutero-Isaías. Mas dado que isto não corresponde à verdade, como é muito provável (§ 58), a tese cai por terra. Além disso, a diferença que existe entre os dois escritos é tão grande, que não se pode admitir uma intervenção do Trito-Isaías no escrito do Dêutero-Isaías (WEISER*). É bem verdade que alguns acréscimos de época posterior se introduziram em 40-55. Entre eles se contam seis oráculos que tratam, de maneiras
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OS LIVROS PROFÉTICOS
diferentes, do tema da expectativa escatológica. Estes oráculos são: 42.8; 45.8,18s; 48.1-11; 51.11-16; 52.1-6. Três outros textos que provêm muito provavelmente de um mestre de sabedoria se ocupam com o tema da rejeição dos ídolos: 40.18-20+41.7; 44.9-20; 46.5-8.
6. Pregação A pregação do Dêutero-Isaías não pode ser dividida por períodos de sua atividade, que, no caso deste profeta, existiram no máximo com referência à sua autocompreensão, mas, antes, por temas e por conteúdo, de onde resulta imediatamente uma visão de toda sua mensagem. a) Introdução, em lugar de um relato da vocação: 40.1-2,3-5,6-8. b) Unicidade de Deus: 40.12-17,21-26; 41.21-29; 43.8-13; 44.6-8.
c) A salvação escatológica: Hinos: 40.27-31; 42.10-17; 44.23; 48.17-19; 49.13; 51.9-10. Exortações: 42.18-25; 44.21-22; 55.6-7,8-9. d) Salvação para Israel: Libertação: 41.8-13; 43.1-7,22-28; 46.3-4,12-13; 49.7,24-26; 50.1-3; 51.17-23; 54.4-6; 66.1-5. Ciro, o libertador: 41.1-6; 44.24-28; 45.1-3,4-7,9-10,11-13; 46.9-11; 48.12-16. Destruição da Babilônia e partida dos israelitas: 41.14-16; 43.14-15; 46.1-2; 47; 48.20-22; 52.11-12. Regresso (através do deserto): 41.17-20; 43.16-21; 44.1-5; 49.8-12; 55.12-13. Chegada e reconstrução: 40.9-11; 49.14-21; 52.7-10; 54.1-3,11-17. Promessas finais: 54.7-8,9-10; 55.10-11. e) A salvação e as nações: 45.14-17,20-25; 49.22-23; 51.1-8. f) O Servo de Javé: Palavras do próprio Servo: 42.1-4,5-7; 49.1-6; 50.4-9. Palavras a respeito do Servo: 50.10-11; 52.13-53.12.
Esta visão de conjunto nos mostra que a mensagem do Dêutero-Isaías se acha determinada por uma crença escatológica na salvação, sendo que o termo "escatológico" indica em que consiste a novidade. Com efeito, se em alguns dos antigos profetas já se encontra uma crença na redenção, o Dêutero-Isaías, depois de alguns ensaios anteriores, é o primeiro profeta escatológico que distingue entre as duas idades e - situado na fronteira entre as duas - se vê anunciando a transformação das circunstâncias históricas. Por isso, ele faz uma distinção entre o "outrora", o "passado", de
§ 57. Dêutero-Isxtxs Os 40-55)
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um lado, e, do outro/lado, o que é novo, o tempo da complacência e o dia da salvação (43.18s; 49.8).54 Sob a influência da profecia cultual, de caráter nacional, anterior ao exílio, com sua promessa de salvação para Israel, ele supõe uma situação salvífica fundamental que foi apenas interrompida, e acentua de modo unilateral a vontade salvífica de Deus. Ao exílio, concebido como punição outrora anunciada, segue-se uma era de salvação extra-histórica na qual todas as coisas durarão eternamente (45.17; 51.6,8; 54.8,9s). O anseio por esta era comporta o desejo de se libertar da história e das necessidades de cada dia. As expectativas do Dêutero-Isaías a respeito da era da salvação são altamente polarizadas e, por vezes, de colorido bastante material, e se fundamentam nas relações existentes entre Javé e Israel, que ele às vezes descreve como se fossem relações pessoais: Jerusalém é vista como mulher e mãe (49.14ss; 54.1-3,4-6), os israelitas como filhos de Javé (45.11) que ele "resgata" (ga' aI, expressão que significa libertação) como integrantes da família e do Clã. Da teologia deuteronomista o Dêutero-Isaías assume o conceito de eleição, mas sem o vincular à idéia de b'rii; pelo contrário: é a partir do fato da criação que ele fundamenta a salvação (43.1,15; 44.2; 45.11; 46.3; 54.5), como também é a partir dessa idéia que ele deriva a situação de Israel como servo de Javé (43.10; 44.2-21; 45.4; 48.20). O conceito de berit quase não se destaca (42.6; 54.9s; 55.3). No Dêutero-Isaías, o pensamento escatológico está ligado ao projeto de uma teologia global, cujo ponto de partida é a unicidade e a exclusividade de Deus. Se até ele só se pode falar em monoteísmo prático que não obstante a presença de outros deuses - comprometia Israel unicamente com Javé, agora, com ele, depois de alguns ensaios em Jeremias, se defende um monoteísmo teórico que nega expressadamente a existência de outros deuses. Todos os acontecimentos e fenômenos da natureza estão ligados, conseqüentemente, a um único Deus, por toda a eternidade. Deste modo, o Dêutero-Isaías liga, de um só lance, a história com os últimos tempos e com Deus. A garantia do futuro reside no fato de que Deus está agindo em tudo isto. Precisamente porque ele criou o mundo e a humanidade e desde então dirige sua história é que ele continuará a fazê-lo no momento em que tiver início o período final da história. Mas a 54 A. BENTZEN, "On the Ideas of 'the Old' and 'the New' in Deutero-Isaiah", StTh 1 (1948-1949),183-187. - K. ELLIGER, "Der Begriff 'Geschichte' bei Deuterojesaja", em: Schmitz-Festschrift, 1953,26-53. - C. R. NORTH, "The Former Things" and the "New Things" in Deutero-Isaiah", em: Th. H. Robinson-Festschrift, 1950, 11-126.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
pregação do Dêutero-Isaías, precisamente em decorrência de sua ligação com a mensagem de salvação dos antigos profetas profissionais, apresenta certas tendências duvidosas, de cunho nacional e material. Por esta razão, ele não é o ponto culminante da profecia veterotestamentária, mas marca o começo de sua decadência.
§ 58. TRITO-I5AÍA5 OS 56-66) Cf. os comentários relativos aos § 56-57. - W. KESSLER, Gott geht es um das Ganze. Jesaja 56-66 und 24-27, 1960. R. ABRAMOWSKY, "Zum literarischen Problem des Tritojesala", ThStKr 96/97 (1925), 90-143. - K. CRAMER, Der geschichtliche Hintergrund der Kap. 56-66 im Buch [esaja, 1905. - K. ELLIGER, Die Einheit des Tritojesaja, 1928. - lo., "Der Prophet Tritojesaja", ZAW 49 (1931), 112-141. - H. GRESSMANN, Über die Jes 56-66 vorausgesetzten zeitgeschichilichen Verhiiltnisse, 1898. - W. KESSLER, "Zur Auslegung von [esaja 50-66", ThLZ 81 (1956),
335-338. - In., "Studien zur religiõsen Situation im ersten nachexilischen Jahrhundert und zur Auslegung von [esaja 56-66", WZ Halle 6 (1956/ 57),41-73. - E. LmMANN, Über die Abfassungszeit des Tritojesaja, 1899. W. ST.MCCULLOUGH, "A. Re-Examination ofIsaiah 56-66", JBL 67 (1948), 27-36. - H. OOEBERG, Trito-Isaiah (Isaian 56-66), 1931. - A. ZILLESSEN, '"Tritojesaja' und Deuterojesaja", ZA W 26 (1906), 231-276. - W. ZIMMERLI, "Zur Sprache Tritojesajas", Schweiz. Theol. Umschau 20 (1950), 110-122. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (552).
1. Trilo-Isaías Fundamental para a separação de Is 56-66 enquanto escrito profético próprio foi o comentário de DUHM sobre Isaías (1892), no qual o autor atribui os referidos capítulos a um profeta que teria exercido sua atividade em Jerusalém no período imediatamente anterior a Neemias, e a quem denominou de Trito-Isaías (Terceiro Isaías). Esta denominação logo foi aceita, com raras exceções (KONIG, TORREY, GLAHN). Na verdade, as diferenças existentes entre 40-55 e 56-66 são consideráveis. De modo geral, além de uma perspectiva palestina em que se situa a obra, ela pressupõe a existência do novo templo, dedicado no ano de 515. A sua problemática gira em torno das diferenças religiosas, políticas, econômicas que se faziam sentir no seio da comunidade do templo, como em torno das dúvidas surgidas e da esperança escatológica, após decênios
§ 58. TRlTO-IsAÍAS
Os
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de inútil expectativa. A teologia global do Dêutero-Isaías foi abandonada, ampliando-se consideravelmente o caráter material e terreno das expectativas escatológicas. Existe um fosso profundo entre os dois escritos, apesar da dependência de algumas perícopes do nosso escrito com relação ao Dêutero-Isaías.
2. Autor e época Simultaneamente com a tese de OUHM foram indicados os dois pontos de apoio para as futuras discussões: a unidade do autor e a época do aparecimento. Ou mais precisamente: trata-se de saber se as perícopes que foram reunidas em 56-66 provêm de um único autor ou de vários autores, e em que época ou épocas o autor ou os autores devem ser situados. A tese de OUHM, segundo a qual se trata de um só autor do séc. V, foi seguida sobretudo por LITTMANN e ZILLESSEN, e em sentido mais amplo por HÓL5CHER e PFEIFFER. ELLIGER admite também um único autor, mas o situa em cerca de 520, e, baseando-se em características de linguagem e de estilo, procura demonstrar que se trata de um discípulo do Oêutero-Isaías que teria revisto e concluído a obra do mestre. As palavras de sua autoria estariam em 56-66. Em oposição a essa tese tem-se chamado a atenção, e com razão, para o fato de que, quando submetida a um exame crítico acurado, restam de pé muito poucos pontos de contato entre os dois escritos. Tem-se chamado também a atenção para o fato de que as diferenças são muito mais amplas, de modo que a demonstração pretendida malogrou (WEI5ER*). Antes do mais, as diferenças ou mesmo as divergências existentes entre determinadas seções de 56-66 às vezes são tão claras, que dificilmente se podem atribuir a um único autor. O mesmo se deve dizer contra a tese de MCCULLOUGH, segundo a qual o escrito provém de um determinado profeta do grupo isaiano do período entre 587 e 562, e ainda contra KE55LER, que admite igualmente um único autor, embora tenha surgido na época que medeia entre o regresso dos deportados e o aparecimento de Malaquias, com preocupações pastorais e relacionado com a pregação do Dêutero-Isaías. A maioria dos estudiosos se inclina a admitir a pluralidade de autores (BUDDE, VOLZ, EI55FELDT*, WEI5ER*, e outros) os quais teriam exercido sua atividade em épocas diferentes, embora o período, ocasionalmente suposto, dos sécs. VIII-I1I seja por demais extenso. Tudo depõe em favor de uma pluralidade de autores. Os capítulos referidos não possuem uma unidade interior, nem uma linha espiritual
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OS LIVROS PROFÉTICOS
uniforme, como a que se pode constatar no Dêutero-Isaías e em outros profetas. É verdade, também, que as seções apresentam semelhanças com o Dêutero-Isaías, e logo nos chamam a atenção, por exprimirem expectativas análogas de salvação, descrevendo-as com as mesmas cores que este último (particularmente em 60-62). Entretanto, o sentido dos termos e das expressões empregadas aparece mais ou menos modificado, de forma que muito provavelmente se deve admitir um dependência literária e uma imitação intencional do Dêutero-Isaías. Em outras seções falta, de todo, a influência do mesmo, quando não diverge inteiramente dele. Isto é indício de uma atitude fundamental bastante diferente, própria de cada um desses autores. É somente a seção 60-62 que se pode derivar de uma só e mesma mão. Quanto ao restante, a referida ligação com o Dêutero-Isaías deve ter feito com que a seção 5666 fosse anexada a seu escrito.
3. Oráculos ou seções independentes
o escrito do chamado Trito-Isaías compreende quatorze oráculos ou seções independentes. A seção 56.1-8 é uma torá profética na qual um determinado profeta transmite uma instrução divina a respeito da integração dos eunucos e estrangeiros na comunidade. Trata-se, portanto, de uma questão que se tornara candente depois da reconstrução do templo, mencionado no oráculo. Assim o trecho pode datar do começo do séc. V. Como o v. 5b lembra 55.13, a perícope foi colocada no início da obra, para estabelecer a ligação com o Dêutero-Isaías: mas, apesar de certas semelhanças, o profeta se diferencia de tal modo dele, não só por colocar o acento sobre o culto, o sabbat, e a Lei, como também por causa dos termos usados, que não o podemos considerar como seu discípulo. Em 56.9-57,13 encontramos uma liturgia profética, que abrange uma ameaça e uma invectiva (56.9-12), uma breve lamentação (57.1-2) e um oráculo profético de julgamento, que comporta uma intimação, uma acusação e um julgamento (57.3-13) e se dirige contra os chefes da comunidade, censurando-lhes o esquecimento dos deveres, sua cobiça, seu sibaritismo e a sua apostasia de Javé em troca de cultos sexuais. O profeta se distingue nitidamente do profeta ligado ao culto de 56.1-8. Ele depende sensivelmente de Jeremias e de Ezequiel (comparar especialmente 56.9 com [r 12.9b), mas apresenta pontos de contato também com o DêuteroIsaías, devendo ter vivido, portanto, depois do exílio, talvez no começo do séc. V.
§ 58. TRITO-IsAÍAS Os 56-66)
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A perícope 57.14-21, composta quase toda em tom de promessa e fundamentando a salvação escatológica prometida, não sobre a eleição de Israel, mas na natureza criada do homem, inspira-se no Dêutero-Isaías, como se pode ver principalmente no v. 14 que imita 40.3, mas, quanto ao resto, adota uma perspectiva nitidamente pós-exílíca, O trecho 58.1-1255 é uma combinação de admoestação e promessa e se inspira em profetas mais antigos (o v.la em Os 8.1; o v. lb em Mq 3.8; o v. 8b em Is 52.12), de modo que é indisfarçável um traço epigônico. Ele se manifesta também na maneira de julgar o jejum, que, embora seja por ele criticado como prática ritual externa, propondo em seu lugar o amor ao próximo, é considerado como ação piedosa aos olhos de Deus. O oráculo 58.13-14 a respeito da santificação do sabbat e cujo autor hesitamos em considerar como profeta, assemelha-se ao anterior no tom com que faz suas exortações pastorais e pronuncia suas promessas, e na dependência em relação a afirmações reconhecidamente mais antigas (o v. 14a depende de Dt 32.13, e o v. 14b, de Is 40.5b). O autor, no entanto, está fortemente ligado ao culto e não rejeita a instituição cultual, mas pretende purificá-la dos abusos. O capo 59 constitui uma liturgia profética que compreende sucessivamente duas invectivas (59.1-4.5-8), um cântico de lamentação coletivo (59.9-15a) e um oráculo de salvação (59.15b-20; o v. 21 é um acréscimo posterior). Nos primeiros versículos, o profeta se inspira em 50.1-3 e usa também alhures expressões ou conceitos do Dêutero-Isaías (cf. v. 19a), mas sua temática é aquela do séc. V: o problema do retardamento da salvação escatológica, tanto depois do exílio quanto em seguida à conclusão do novo templo, problema este que o profeta procura resolver, reportando-se ao pecado como causa impeditiva. Para a época do aparecimento desse capítulo deve-se pensar no começo do séc. V. Os três oráculos de salvação 6056; 61 e 62 se devem a um único profeta dos primeiros anos do pós-exílio, o qual se inspira bastante no DêuteroIsaías, do qual extrai frases inteiras e mais ou menos ao pé da letra (p.ex.: 60.4a de 49; 18a; 60.9b de 55.5b; 60.13a de 41.19b) e utilizou determinadas
J. MORGENSTERN, "Two Prohecies from the Fourth Century B. C. and Evolution of Yom Kippur", HUCA 24 (1952/1953), 1-74. 56 A. CAUSSE, "La vision de la nouvelle Jérusalem (Esaie LX)et la signification sociologique des assemblées de fête et des pelerinages dans l'orient sémitique", em: Mélanges Syriens Dussaud, 11 1939,739-750. - P. GRELOT, "Un parallele babylonien d'Isaíe LX et du Psaume LXXII", VT 7 (1957), 319-321. 55
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expressões tp.ex., 60.9a segundo 51.5b) ou expôs as mesmas idéias com termos semelhantes tp.ex., 60.10b segundo 54.7s). Muitas vezes, no entanto, ele coloca nas palavras um significado novo, reinterpretando no sentido de Jerusalém e de seus habitantes, certas frases que se referem a Deus (62.10s). O que nele falta, sobretudo, são a grande visão universal e a concepção teocêntrica do Dêutero-Isaías, enquanto a promessa escatológica coloca a felicidade terrena total de Jerusalém em primeiro plano. É esta cidade que ocupa o centro da atenção, e não Deus. A salvação fica limitada a ela, enquanto as outras nações são consideradas apenas como servidoras da comunidade de salvação. O profeta aparece, assim, como um continuador da antiga profecia da salvação nacional. Esta profecia aparece ainda mais claramente em 63.1-6, uma perícope que originariamente foi formulada como diálogo de saudação ao herói em seu regresso do campo de batalha, e à qual se segue a autoglorificação do herói. O profeta descreve, assim, não só de que modo Javé regressa como vencedor, com as vestes salpicadas do sangue de seus inimigos, como, igualmente, de que forma ele, resgata seu povo, com uma vingança escatológica, exercida contra as nações. Em 63.7-64,11 encontramos um cântico de lamentação coletivo, o qual se inicia com uma reflexão histórica e consta de quatro partes, a saber: uma reflexão histórica, em forma de hino narrativo (67.7-14)57; duas queixas e pedidos que se tornam passionalmente intensos (63.15-19a; 63.19b64.6), e mais um outro pedido (64.7-11). Como o seu conteúdo se inspira na teologia deuteronomista e não apresenta nenhuma relação com o Dêutero-Isaías, pressupondo, além disso, a situação posterior à queda de [udá e a destruição de Jerusalém e pede-se que ela mude, a perícope deve ter surgido nos primeiros decênios ou nos decênios intermediários do exílio babilônico. Ela representa, assim, o texto mais antigo de Is 40,66. Seu autor pode ter sido um profeta ligado ao culto. O capo 6558 é composto de três oráculos proféticos, ligados frouxamente entre si e destinados a formar uma unidade maior. Trata-se de uma invectiva e uma ameaça dirigidas contra aqueles que desertaram de Javé no seio da comunidade (65.1-7), e de uma combinação, em dois lugares, entre uma promessa em favor dos justos e uma ameaça dirigida contra os desertores (65.8-12,13-25). Todo o conjunto gira em torno de dois pólos: a 57 58
"Isaiah 63,7-14", HUCA 23,1 (1950/1952),185-203. H. G. JEFFERSON, "Notes on the Authorship of Isaiah 65 and 66", JBL 68 (1949), 225-230.
J. MORGENSTERN,
§ 58. TRITO-IsAÍAs Os 56-66)
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salvação e a perdição nos últimos tempos. A questão que se discute é a de saber se este conjunto, como as demais perícopes, derivam do começo do séc. V, tendo-se em vista as divindades mencionadas no V. 11: Gad, como deus da ''boa sorte" - aqui talvez não seja um apelido, mas se trate de um determinado deus, como entre os nabateus - e Meni, como deusa que encarna o "destino" ou o "destino mortal". Parece que os israelitas só conheceram seu culto em Jerusalém e cercanias, com o avanço dos nabateus por volta do séc. IV. Foi nesta época que a perícope deve ter surgido. O ousado oráculo profético de 66.1-4 rejeita como idolatria, e de uma forma racional que lembra a doutrina sapiencial, não apenas a construção do templo, que não se define precisamente qual seja, como também todo culto sacrificaI. Se o situarmos historicamente, este oráculo só pode visar à preocupação com a reconstrução do templo de Jerusalém, e, mais precisamente: só pode visar ao esforço desenvolvido neste sentido pelo circulo que se formara em tomo dos profetas Ageu e Zacarias, por volta de 520. A perícope 66.5-24 constitui, do mesmo modo que o capo 65, uma unidade maior, formada de três oráculos proféticos em que se anuncia, sobretudo através de promessas, mas também através de ameaças, a eminência da escatologia com todas as suas conseqüências. O primeiro oráculo de ameaça é dirigido contra os desertores (66.5-17); o segundo se ocupa principalmente com a felicidade da comunidade piedosa (66.6-16); o terceiro, também prometedor, se encerra com um olhar dirigido para as conseqüências do juízo final (66.18-24). Como a perícope parece ter sido influenciada pelo capo 65 e como a locução: todos os povos e todas as línguas (v. 18) pertence a uma época bastante recente, talvez só se possa atribuí-la ao séc. m. Para a época de aparecimento das perícopes contidas em 56-66 temse a seguinte distribuição: meados do séc. VI cerca de 520 primeiros tempos do pós-exílio
a) 63.7-64.11
b) 66.1-4 c)
60; 61; 62: 56.1-8 65.9-57.13 59
d) 57.14-21
58.1-12 58.13-14 63.1-6 e) 63
f) 66.5-24
}
início do séc. V
}
posteriores ao exílio, não se podendo determinar exatamente em que datas séc. IV séc. III
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4. Grupos de temas Os oráculos e perícopes giram quase sempre em torno de dois grupos de temas que são característicos da comunidade cultual de Jerusalém e arredores, depois do exílio. Primeiramente trata-se de todos os tipos de questões controvertidas na regulamentação da vida de comunidade, em decorrência das condições lamentáveis de vida e do confronto com os maus chefes do povo, com as tendências sincretistas e com a idolatria. Em segundo lugar aparece a problemática criada pela expectativa da realização iminente da era escatológica. Como desde há muito terminara o exílio, considerado como o juízo outrora anunciado, a era de salvação já devia ter começado ou pelo menos devia estar próxima. Como isto não acontecera, surgiu um problema sério e difícil, com o qual os profetas deste período têm de ocupar-se constantemente. Quanto ao mais, pode-se reconhecer a subseqüente decadência da profecia escatológica nas expectativas sumamente terrenas e materiais a respeito da era de salvação.
§ 59. JEREMIAS ATD: A. WEISER, 41961. - BOT: B. N. WAMBACQ, 1957. - HAT: W. RuooLPH, 21958. - HK: F. GIESEBRECHT, 2il ed., 1907.- HS: F. NóTSCHER, 1934.
- IB: J. PH. HYATI, 1956. - KAT: P. VOLZ, 2il ed., 1928.- KeH: F. HrrZIG, 2il ed., 1866. - KHC: B. DuHM, 1901. - SAT: H. 5cHMIDT, 2il ed., 1923. - SZ: C. VON ORELU, 3ª ed., 1905. - Especiais: C. H. CORNILL, 1905.- E. A. LESLIE, 1954. F. AUGUSTIN, "Baruch ind das Buch [eremia", ZAW 67 (1955), 5056. - F. BAUMGÁRTEL, "Zu den Gottesnamen in den Büchern [eremia und Ezechiel", em: Rudolph-Festschrift, 1961, 1-29. - W. BAUMGARTNER, Die Klagegedichte des[eremia, 1917. - A. BENTZEN, Helgen eller Hojeforraeder? Jeremias og hans folk, 1943. - H. BIRKELANO, [eremia, profet og dikter, 1950. - SH. H. BLANK, Jeremiah, Man and Prophet, 1961. - W. ERBT, [eremia und seine Zeit, 1902. - A. GELLIN, lérémie, 1952. - H. W. HERTZBERG, Prophet und Gott, 1923. - W. L. HOLLAOAY, "Prototype and Copies: A New Approach to the Poetry-Prose Problem in the Book of Jeremiah", JBL 79 (1960), 351-367. - lo., "The Background of Jeremiah's Self-Understanding", ibid. 83 (1964), 153-164. - F. HORST, "Die Anfãnge des Propheten [eremia", ZAW 41 (1923),94-153. - J. PH. HYATI, "The Deuteronomic Edition of Jeremiah", Vanderbilt Studies in the Humanities 1 (1951), 71-95. - lo., Jeremiah, Prophet of Courage and Hope, 1958. - H. G. MAY, "Towards an Objetive Approach to the Book of Jeremiah: the Biographer", JBL 61
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1. Jeremias Jeremias é originário de uma família sacerdotal de Anatot (ras el-harrube, perto de 'unãiã), ao nordeste de Jerusalém. Do nome de Anatot não se pode deduzir que se trata de um descendente daquele Abiatar exilado na mesma localidade (1Rs 2.26).59 Como Jeremias se considera jovem por ocasião de sua vocação, ele deve ter nascido por volta de 650. De 16.1s se conclui que ele permaneceu sempre celíbatário." No décimo terceiro ano do reinado de [osias (626 a.C) ele teve a experiência de sua vocação para profeta (1.2; 25.3) e exerceu sua atividade, sem interrupção, por mais de quatro décadas, até depois da catástrofe do reino de [udá, Sobre o seu destino a partir do segundo período de sua atividade, nos falam as extensas perícopes narrativas. Sobre sua personalidade, seu progresso e lutas Com isto ruem por terra as conclusões tiradas por NEHER a partir deste suposto parentesco. 60 M. D. GOLDMANN, "Was Jeremiah married?", ABR 2 (1952),42-47.
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interiores informam-nos, não somente os traços que transparecem em seus oráculos, como sobretudo os seus cânticos de lamentação, ou suas confissões (3B). Por esse motivo sabemos muito mais coisas a respeito de Jeremias, do que a respeito dos outros profetas. Em face das indicações explícitas a respeito da data da vocação do profeta, como da circunstância de que 3.6-13 provém da época de [osias, e ainda da existência do reino assírio, suposta em 2.18, mas já não existindo na época de [oaquim," fracassou não somente a hipótese defendida por HORST segundo a qual Jeremias só teria surgido sob o reinado de Joaquim, depois da morte de [osias, por não assumir nenhuma posição relativa à reforma cultual desse mesmo rei, como também as teses semelhantes de HYATT, MAY e WHITLEY. A opinião segundo a qual a vocação de Jeremias (l.4-10) se teria verificado de acordo com um ritual litúrgico, à maneira de um ato de ordenação, com ações significativas executadas por oficiais do culto (REVENTLOW), está em plena contradição com a sua apresentação como se tratando de audição e visão. A opinião, enfim, de que o profeta mencionado no óstracon 111,20 de Láquis seja jeremias" (CHAPlRA, DUSSAUD) foi refutada, depois de TUR-SINAI (que pensa em Urias, indicado em [r 26.20-23), sobretudo por THOMAS.
2. Atividade de Jeremias A atividade de Jeremias pode ser dividida em quatro períodos, cuja pregação reflete ao mesmo tempo a situação interna de [udá e os acontecimentos decisivos da política internacional daqueles decênios, que determinaram o curso da vida do profeta, como sejarn'ê: a situação de [udá antes e depois da reforma de [osias: sua morte no campo de batalha (609 a.C): a instalação dos reis [oacaz pelos judaítas e Joaquim pelos egípcios; o regime brutal deste último; sua revolta final contra a nova supremacia babilônica; a primeira deportação imposta como castigo a seu sucessor Joaquim (597); o governo do último rei Sedecias, juntamente com o cerco H. H. ROWLEY, "The Early prophecies of [eremiah in their Setting", BJRL 45 (1962/ 1963), 198-234. 62 R. DUSSAUD, "Le prophête [érémie et les lettres de Lakish", Syria 19 (1938),256-271. 63 F. M. CROSS, [r. - D. N. FREEDMAN, "Josiah's Revolt against Assyria", JNES 12 (1953), 56-58. - H. L. GINSBERG, "Judah and the Transjordan States from 734 to 582 B. C", em: Marx [ubilee Val., 1 1950, 347-368. - A. MALAMAT, "The Last Wars of the Kingdom of [udah", JNES 9 (1950), 218-227. - M. B. ROWTON, "Jeremiah and the Death of [osiah", ibid. 10 (1951),128-130. 61
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e a tomada de Jerusalém e a fuga de um grupo de judaítas para o Egito, por motivo do assassinato de Godolias. O primeiro período de atividade, cujos oráculos e relatos se encontram em 1-6,64 se estende do chamamento até pouco antes do fim da reforma de [osias (622 a.C). Logo depois de ter começado a anunciar em Anatot, ao que parece, o juízo ameaçador (DUHM), dirige-se a Jerusalém, mas somente para se ver obrigado a constatar que a situação ali ainda era muito pior. Assim ele acusa seu povo por ter apostatado de Javé; censura-lhe os pecados relativamente ao culto, à ética e à política, e anuncia o juízo ameaçador, por causa de tudo isto. Concomitantemente ele convida à conversão que salva. Mas quando constata o fracasso de sua pregação, Jeremias dá por encerrada a sua missão e a devolve às mãos de Javé (6.lOs,27-29), e se recolhe ao silêncio no qual permanece por longos anos. Como executor do juízo de Deus, Jeremias espera o misterioso "inimigo que vem do norte" (4.6,15s; 6.22),65 que a maioria dos autores, não obstante a refutação decisiva de WILKE, interpreta como sendo os citas (DUHM e outros), e raramente como sendo os medos (GUNKEL, GRESSMANN) e os caldeus, ou o considera à luz das idéias míticas. Mais correta talvez seja a opinião segundo a qual Jeremias inicialmente não pensava em um determinado povo (LAUHA, WAMBACQ, RUDOLPH), embora algumas informações a respeito dos citas se tenham introduzido na descrição do mencionado inimigo, e somente mais tarde é que teria visto nos babilônios o instrumento de castigo de Javé. Algumas vezes se admite que Jeremias interrompeu sua atividade depois da reforma de [osias." e que se calou por concordar com ela A hipótese de TORREY, de que [r 1-10 é uma obra pseudo-epígrafa unitária, proveniente do séc. I1I, é improvável. 65 B. S. CHILDS, "The Enemy from the North and the Chaos Tradition", JBL 78 (1959), 187198.- H. GRESSMANN (e N. GUNKEL) em: ZA W 42 (1924), 157s.- J. PH. HYATT, "The Peru from the North in [eremiah", JBL 59 (1940), 499-513. - A. LAUHA, Zaphon, 1943. - F. WILKE, "Das Skythenproblem im Jermiabuch", em: Kittel-Festschrift, 1913,222-254. 66 J. A. BEWER, The Book ofJeremiah, I, 1951.- H. CAZELLES, "[érémie et le Deutéronome", RSR 39 (1951),5-36.- S. GRANILD, "[eremia und das Deuteronomium", StTh 16 (1962), 135-154. - J. PH. HYATI, "[eremialt and Deuteronomy", JNES 1 (1942),156-173. - A. F. PUUKKO, "Jeremias Stellung zum Deuteronomium", em: BWAT 13, 1913, 126-153. - H. H. ROWLEY, "The Prophet Jeremiah and the Book of Deuteronomy", em: Th. H. Robinson-Festschrift, 1950, 157-174 (= From Moses to Qumran, 1963, 187-208). - J. N. SCHOFIELD, "The Significance of the Prophets for Dating Deuteronomy", em: Studies in History and Relígion, ed. E. A. PAYNE, 1942,44-60 (Deuteronômio surgido sob a influência de Jeremias). 64
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e com seus resultados (NoTScHER, e semelhantemente WEISER*), ou saudou e apoiou ativamente a reforma (ROBERT, BEWER) mas que, por outro lado, concordava pelo menos com as idéias básicas do Deuteronômio, rejeitando apenas aqueles círculos que se utilizavam da Lei em seu próprio benefício (GRANILD). A tudo isto, porém, se contrapõe a hipótese de que Jeremias, logo depois de haver inicialmente concordado, rejeitou a reforma (EISSFELDT*, RUDOLPH, ROWLEY), ou de que ele a repeliu imediatamente (HYATT, MAy). Excluído está que Jeremias tenha apoiado a reforma de [osias e em seguida tenha encerrado suas atividades em face dos bons resultados da mesma, pois neste caso não se compreenderia o seu julgamento final negativo a respeito de [udá (6.27-29). Este julgamento nos mostra que ele encerrou suas atividades não por causa, talvez, da reforma e de seus resultados, mas já antes da reforma. Ele pode ter concordado inteiramente com seu combate ao espírito pagão e com seu empenho por uma ação social. Mas não terá ele visto talvez, já desde o início, os seus aspectos duvidosos que o levariam mais tarde a rejeitá-la: a ênfase colocada nas leis cultuais e no templo? Neste caso, ele não teria mudado de posição, mas teria assumido desde o início uma atitude bilateral: uma com relação ao Deuteronômio e outra com relação à reforma. Depois de um longo silêncio, Jeremias retoma à sua atividade profética, sob o reinado de Joaquim. Este segundo período compreende os anos 608-597. Os oráculos e relatos provenientes desta época se encontram divididos em 7-20; 22 e 25.1-14; aos quais se acrescentam os oráculos a respeito das nações: 25.15ss; 46.3ss e as narrativas sobre a história de Jeremias. Nos primeiros anos, Jeremias se volta sobretudo contra o templo e o culto, e exorta à conversão, porque o juízo está próximo. Mas desta vez ele encontra adversários encarniçados: são o rei Joaquim e os sacerdotes aborrecidos com suas críticas. É por um triz que ele escapa de morrer condenado por crime de blasfêmia contra Deus (26). Ameaçam-no agentes secretos, pérfidos atentados e tentativas de assassinato, parece que mesmo no seio da própria família. Por isso ele será açoitado, colocado no tronco e proibido de visitar o templo (20.1ss). É desta época que provêm suas comovedoras elegias ou confissões, onde ele entra em luta consigo mesmo e com Deus (3 B). Como última advertência, e estando impedido de visitar o templo, o profeta manda Baruc escrever os oráculos que ele pronunciara até então, e lê-los no templo. Tudo nos indica que, com a ordem de prisão expedida por Joaquim, os dois ficaram escondidos até à morte dele. Foi nesta época que Jeremias deve ter executado as ações simbólicas, relatadas em 13.1-11. Somente com a
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chegada dos babilônios é que ele parece ter vivido de novo em Jerusalém (35). O terceiro período se estende da entronização de Sedecias até depois da queda de [udá e Jerusalém (anos 597-586). Como Jeremias parecia ter razão com suas ameaças, Sedecias gostaria de seguir os seus conselhos, mas não conseguiu se impor à corrente nacional antibabilônica. Jeremias também não consegue fazer-se valer junto aos profetas nacionais de salvação, durante o movimento de revolta de 594, nem também junto aos deportados (cap. 27-29). A partir do cerco de Jerusalém pelos babilônios (ano de 588), Jeremias é ameaçado e perseguido de novo. Escapa de morrer, no último momento, como está descrito em detalhes nos caps. 37s. Embora seja tratado com deferência pelos babilônios depois da queda de Jerusalém, e apesar das ofertas que eles lhe fazem, Jeremias permanece com o restante do povo na Palestina, a fim de tentar, com Godolias, a reconstrução, tentativa que se encerra com o assassinato de Godolias. Jeremias é obrigado a retirar-se para o Egito, juntamente com um grupo de fupitivos (caps. 42s). E aí que se deve localizar o seu quarto e breve período de atividade, de que nos falam as perícopes 43.8-13 e 44. Foi no Egito que ele desapareceu. Segundo a lenda, ele teria sofrido o martírio.
3. Transmissão escrita De importância fundamental para a atividade profética de Jeremias é a pregação oral de seus oráculos e a execução de ações simbólicas. Nessa sua atividade, Jeremias se utilizou dos modos de falar proféticos correntes e daqueles imitados pela profecia, que ele penetra, de novo, com habilidade e força de expressão poéticas. Talvez ele tenha fixado por escrito as palavras de seu primeiro período, logo depois de o ter encerrado. De qualquer modo, ele dá início à transmissão escrita no ano de 605. Foi nesta época que ditou a Baruc as palavras do período 626-605, para serem lidas imediatamente em público. Destruído este rolo por Joaquim, que julgava poder tornar sem efeito as ameaças de castigo, Jeremias mandou reescrevê-lo para conservar a eficácia de suas palavras. É provável que este segundo rolo tenha tido o mesmo tamanho e o mesmo conteúdo do primeiro, de sorte que não se pode fazer distinção entre um chamado rolo primitivo e um rolo ampliado. Com efeito, a formulação passiva de 36.32, segundo a qual foram acrescentadas ainda muitas outras palavras do mesmo gênero, se refere muito provavelmente à ampliação do rolo em época
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bastante posterior. Deste modo, coloca-se a questão a respeito da natureza e do conteúdo do rolo e a respeito de outros complexos possíveis da tradição. a) Primeiramente, a respeito do rolo manuscrito se pode dizer genericamente, com base nas informações proporcionadas pelo livro de Jeremias, que ele continha apenas oráculos e nenhum outro relato; que se tratava de palavras da época que ia até 605; que estas palavras eram exclusiva ou quase inteiramente de natureza cominatória e endereçadas a Jerusalém, a [udá e às nações, e que o rolo não pode ter sido de grande tamanho, dado que foi lido três vezes em um só dia. As opiniões, contudo, divergem a respeito do que ele continha em particular. EISSFELDT* o considera como uma espécie de memórias, redigidas sob a forma de diário e que continham trechos escritos na primeira pessoa gramatical e formulados no estilo da prosa oratória, semelhante ao falar deuteronômico. Além dos relatos sobre visões e audições contidos no capo 1,67 acrescenta a este conjunto, no chamado rolo primitivo, também as seguintes passagens: 3.6-13; 7.1-8.3; 11.6-14; 13.114; 16.1-13; 17.19-27; 18.1-12; 19.15,105; 22.1-5 e 25*. No suposto segundo rolo foram acrescentados os capítulos 24; 27; 32 e 35. Isto corresponde geralmente aos discursos de Jeremias na revisão deuteronomista, segundo supõe RUDOLPH, que para ele, por conseguinte, não podem ter constituído parte do rolo primitivo. Em vez disto, ele supõe, antes do mais, os oráculos dirigidos contra [udá e Jerusalém, da parte principal de 1.4-6.30; 8.4-9,13-17; 9.1-17; 13.1-11,20-22,25-27; 14.1-15.3; 23.9-12, e contra as nações: 25.15-38; 46-49.33 (até aqui são originais); e talvez ainda: 9.95,16-21,245; 11.155; 13.23s; 16.165; 17.1-4; 18.13-17. Estes últimos, de qualquer modo, pertencem ao segundo rolo, no qual se deve também incluir: 10.17-22; 12.7-14; 13.12-19; 15.5-9; 23.33; 24; 27; 49.34ss. Pondo de parte a questão exegética de saber se muitos dos referidos textos são realmente da autoria de Jeremias e se não representam, pelo contrário, ampliações posteriores, indaga-se se o rolo primitivo, suposto por RUOOLPH, não era demasiado extenso, e se a determinação de seu conteúdo efetuada por EISSFELDT* sob o ponto de vista formal, à luz do modelo do cap.; 25, não é demasiado unilateral. Assim se compreende a reserva manifestada por SELLIN-RosT* e por WEISER*, segundo os quais é impossível reunir de modo certo os fragmentos contidos nos rolos. 67 K. BUDDE, "Über das erste Kapitel des Buches [eremia", fBL 40 (1921), 23-37. - J. LINDBLOM, "Der Kessel in [er 1,13s.", ZAW 68 (1956),225-227. - H. MICHAUD, "La vocation du 'prophête des Nations", em: Hommage Víscher, 1960,157-164. -B. STADE, "Der 'Võlkerprophet' [eremia und der jetzige Text von [er Kap. 1", ZA W 26 (1906),
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Parece-nos esforço baldado pretender reconstituir um rolo primitivo. Não se podem dividir os oráculos de Jeremias, provenientes dos anos 625-605, em dois grupos: um primeiro grupo, que teria constituído um rolo primitivo, e um segundo grupo, composto de "palavras do mesmo gênero". O conteúdo do capo 36 nos proíbe de atribuir as ameaças, p.ex., a um rolo primitivo e a um segundo rolo também os oráculos de censura e de exortação. Se, pelo contrário, se admitir a existência de um rolo escrito duas vezes, mas de conteúdo igual, então talvez seja fácil identificá-lo. A este rolo teriam pertencido's: a) os oráculos do primeiro período de atividade do profeta, e sobretu-
do do primeiro período de sua atividade: 2.1-3 + 7-11,5s,12s,18,2325,26-28,31s; 3.1,6-13,19s; 3.21-4.2; 4.3s,5-8 + 13-22,29-31; 5.1-3 + 6.45,7-9,30s; 6.4s,13-15,20s,22-26; b) uma parte dos oráculos do segundo período: 7.1-15,16-20,21-23; 8.47,21-23; 9.1s,3-5,9,14s,16s,19-21; 11.1-14; 13.15s; 14.2-15.2; 18.1-11; 25.1-14; c) os oráculos contra as nações: 25.15ss*; 46.3-6,7-1O,l1s.
Os relatos concernentes às ações simbólicas, provenientes igualmente do segundo período: 13.1-11;69 16.1-9, as elegias de Jeremias e oráculos sobre os reis, aliás posteriores, não vêm ao caso. A parte principal do rolo se encontra, portanto, em 2-9 e 11, ainda bastante completa, só interrompida por acréscimos e ordenada, em geral, cronologicamente." Só poucos oráculos, relativamente falando, foram transferidos posteriormente para 13-14; 18; 25 e 46. 97-123. - W. G. WILLIAMS, "[eremiah's Vision of the Almond Rod", in: Papers Irwin, 1956,90-99. - P. S. WOOD, "[eremiah's Figure of the Semond Rod", lBL 61 (1942), 99-103. 68 W. EICHROOT, "The Right Interpretation of the Old Testament: a Study of Jeremiah 7,1-15", Theology Today 7 (1950), 15-25. - G. FOHRER, "Jeremias Tempelwort 7,1-15", ThZ 5 (1940),401-417. - E. GERSTENBERGER, "Jeremiah's Complaints", lBL 82 (1963), 393-408. - J. MILGROM, "The Date of [eremiah, Chapter 2", INES 14 (1955), 65-69. - L. M. PÁKOZDY, "Der Tempelspruch des [eremia", Zeichen derZeit 12 (1958, 372-381. - P. F. STONE, "The Temple Sermons of Jeremiah", AISL 50, 1933/1934), 73-92. - A. STROBEL, "Jeremias, Priester ohne Gottesdinest?", BZ NF 1 (1957),214-224. 69 E. BALLA, "[eremia 13,1-11", em: Heiler-Festschrift, 1942,83-110. - E. BAUMANN, "Der linnene Schurz [er 13,1-11", ZAW 65 (1953), 77-81. - A. DE BONDT, "De linnen goldel uit [er 13,1-1", GThT 50 (1950), 17-39. 70 Todo o capítulo 10 não contém nenhuma palavra de Jeremias, de sorte que 11,1-14 originariamente se ligava imediatamente ao capítulo 9.
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Os oráculos do rolo em questão às vezes nos oferecem uma visão retrospectiva da fase do deserto, com a relação de tranqüila confiança entre Javé e Israel, à qual eles contrapõem a apostasia de Javé tanto no plano religioso como no político, ou atacam o templo e o culto. Às vezes eles anunciam a invasão do inimigo que vem do norte como executor do juízo de Deus. Outros, em forma de elegia ou de cântico fúnebre, se ocupam com o pavor da punição. Concluindo, devemos dizer uma palavra a respeito dos fragmentos redigidos em prosa, na primeira pessoa gramatical e atribuídos por EISSFELDT* aos rolos." DUHM negou-lhes a autoria a Jeremias, por causa do estilo, sendo seguido nesta posição, entre outros, por MOWINCKEL, que os deriva de um autor deuteronomista da época de Esdras, que teria utilizado expressões jeremianas, e os considera como a terceira fonte do livro de Jeremias (além dos oráculos de Jeremias e das narrativas). Enquanto EISSFELDT* e WEISER*, pelo contrário, os atribuem de novo a Jeremias, sendo que WEISER* admite (como igualmente MILLER) que se usou um modo de falar pré-deuteronômico, o qual, no entanto, não pode ser comprovado, nem por casos autênticos, nem por imitações proféticas. RUDOLPH segue o meio-termo. Trata-se, para ele, de textos em prosa que, a julgar pelas expressões neles utilizadas, teriam sofrido uma revisão deuteronomista, quais sejam: 7.1-8.3; 11.1-14; 16.1-13; 17.19-27; 18.1-12; 21.1-10; 22.1-5; 25.1-14; 34.8-22; 35. A este respeito devemos dizer o seguinte: 1) Uma atribuição genérica a Jeremias é impossível. Neste sentido DUHM não estava inteiramente sem razão. São seguramente de origem posterior os seguintes textos: 7.24-28; 7.29-8.3; 16.10-13; 17.19-27. - 2) Não é de estranhar, mas antes é de esperar que as perícopes restantes tenham sofrido influência do estilo e das idéias do Deuteronômio, encontrando-se esta influência mesmo alhures, como, p.ex., em 14.2-2,15.2. Do segundo período em diante, Jeremias depende da linguagem teológica de cunho deuteronômico, utilizada em sua época, do mesmo modo como no primeiro período se inspirava na forma e no conteúdo da pregação dos antigos profetas. - 3) Por fim, as seguintes palavras de Jeremias, que vêm a propósito: 7.1-15,1620,21-23; 11.1-14; 16.1-9; 18.1-11; 21.1-7,8-10; 22.1-5; 25.1-14; 34.8-22 e 35 não foram formuladas em prosa, mas em versos breves. Não se trata, portanto, de uma terceira fonte do livro de Jeremias, mas de palavras originais desse profeta, que pertenciam em parte ao mencionado rolo.
71
J. BRIGHT, "The Date of the Prose Sermons of [eremiah", fBL 70 (1951), 15-35.
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b) Entre os oráculos não assumidos no rolo, contam-se principalmente as elegias ou confissões de Jeremias: 11.18-23, 12.1-6; 15.10; 17.14-18; 18.18-23;20.7-13,14-18, e 15.15-20,sendo este último considerado do ponto de vista do assunto como o seu último oráculo (o v. 21 é um acréscimo posterior)." Originariamente esses oráculos formavam uma coleção separada, principalmente porque Jeremias sem dúvida não os destinava imediatamente ao público, e porque também ainda agora se situam no interior de 11-20, onde foram distribuídos por razões desconhecidas. Podemos chamá-los de diálogos" ou altercação com Deus." mas o seu paralelo mais próximo nós o encontramos nos cânticos de lamentações individuais, como os que nos oferecem o Saltério (BAUMGARTNER). Nesses oráculos percebe-se nitidamente uma crise que foi suscitada pelo abandono do profeta a Deus. Este abandono, com efeito, implica uma vida de insegurança e de tensão no confronto com o seu meio ambiente e consigo próprio, e que o profeta permaneça dividido entre o abandono nas mãos de Deus e a dedicação ao mundo. É precisamente isto que provoca em Jeremias a crise na qual a dedicação a Deus se transforma em crítica que, por sua vez, leva o profeta a abandonar a própria concepção da existência e, conseqüentemente, exige a conversão do próprio Jeremias, como também o abandono de suas próprias necessidades e do seu medo em face das exigências divinas (15.15-20). A hipótese defendida por REVENTLOW, de que o "eu" destas palavras deve ser entendido à luz da concepção da "corporate personality", figurando simplesmente de forma exemplar como integrante do povo, de sorte que não se devem procurar aí traços biográficos e pessoais, nem também uma sorte individual- esta hipótese é improvável, em face das particularidades autobiográficas presentes nas referidas palavras.
c) Em 21.11-23.8, sob o título: A respeito da casa real de [udâ, foi reunida uma série de oráculos concernentes à dinastia e sobretudo conG. M. BEHLER, Les confessions de ]érémie, 1959. - SH. H. BLANK, "The Confessions of [ererniah and the Meaning of Prayer", HUCA 21 (1948), 331-354. - J. L. MIHELIC, "Dialogue with God", Interpr. 14 (1960), 43-50. - G. VON RAo, "Die Konfessionen Jermias", EvTh 3 (1936), 265-276. 73 N. P. BRASTSIons, Eisagogê eis toús Monológous tou 'Ieremíou, 1959, considera-os como monólogos. 74 BLANK (ver acima, nota 72): acentua fortemente o caráter de conflito judicial; já W. L. HOLLAOAY, "[eremiah's Lawsuit with God", Interpr. 17 (1963),280-287, os vê mais como julgamento a respeito de Javé. 72
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cernentes a determinados reis, oráculos dos quais, além daqueles globais: 21.13s; 23.1-2, procedem também de Jeremias os seguintes: oráculos sobre Joacaz: 22.10; oráculos sobre Joaquim: 22.1-5,6s,13-19, e oráculos sobre Joaquim: 22.24-27,28,29s. Em 13.18s existe igualmente um oráculo régio. A mencionada coleção, diante da qual Sedecias se viu colocado ao ensejo da composição do livro (21.1-7,8-10), por causa das palavras que ela dirige ao rei, surgiu o menos tardar na época de Sedecias, e provavelmente mais tarde ainda, porque ela se conclui com uma promessa de caráter messiânico recente. (23.3-8), no sentido do esquema escatológico de dois membros, como as coleções parciais das palavras de Isaías. d) A seção 23.9-40 constitui uma outra coleção parcial com o título: A respeito dos profetas. 75 Os oráculos que provêm de Jeremias: 23.9-12,1315,16s,215,25-32,talvez se devam atribuir ao terceiro período, no qual teve choques violentos com os profetas ligados ao culto. e) Os caps. 30-31 compõem uma coleção parcial de oráculos de salvação. Além de título mais antigo: Estas são as palavras que Javé pronunciou sobre Israel e[udâ (30.4), encontra-se também um outro mais recente e mais abundante: 30.1-3, que fala inclusive do ato de escrever as palavras em um rolo." As opiniões a respeito desses dois capítulos divergem extremamente. Enquanto VOLZ e RUDOLPH acham que a parte principal desses capítulos constitui uma poesia homogênea, outros, em geral, vêem neles uma coleção de oráculos autônomos. Ao contrário de STADE e SMEND, que negam inteiramente uma origem jeremiana, CORNILL e GIESEBRECHT reconhecem um núcleo em 31, núcleo que para EISSFELDT*, PFEIFFER* e SELLIN-RoST* se situa em 30-31, enquanto VOLZ e RUDOLPH atribuem quase toda a seção a Jeremias. Como época de origem,
75
76
H.-J. KRAus, Prophetie in der Krisis, 1964. A. GELLIN, "Le sens du mot 'Israel' en [érémie XXX-XXXI", em: Mémorial Chaine, 1950, 161-168. - M. D. GOLDMANN, "The Authorship of [eremiah Chapter XXXI", ABR 2 (1952), 109s. - H. W. HERTZBERG, "Jeremia und das Nordreich Israel", ThLZ 77 (1952), 595-602 (= Beitrage zur Traditionsgeschichte und Theologie des Alten Testaments, 1962,91-100). - J. PH. HYATT, "Torah in the Book of [eremiah", JBL 60 (1941),381-396. - W. LEMP, "Bund und Bundeserneuerung bei [eremia", ThLZ 80 (1955), 238s. - R. MARTIN-AcHARD, "La nouvelle alliance, selon [érémie", RThPh 12 (1962), 81-92. - H. ORTMANN, Der Alte und der Neue Bund bei [eremia, Diss., Berlin, 1940. - M. SEKINE, "Davidsbund und Sinaibund bei [eremia", VT 9 (1959), 40-57.
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Er55FELDT* e WEI5ER* supõem os primeiros tempos da atividade de Jeremias, ao passo que SELLIN-RoST* e RUOOLPH admitem o tempo da anexação de certas regiões do norte de Israel por [osias, antes de 609.
Em um profeta que se dirige com severidade contra os profetas da felicidade, surpreende, embora não se exclua, a ocorrência de oráculos de salvação. Os capítulos 24 e 32 são também de natureza promissora. Se examinarmos, conseqüentemente, a fundo os capítulos 30-31, veremos que se trata de uma coleção de oráculos isolados, dos quais os seguintes devem ter Jeremias por autor: 30.5-7,12-15; 31, 2-6,15-17,1820,21s,31-34,35-37. A palavra do novo pacto ("aliança"), portanto, provém dele também. A crença de Jeremias a respeito da libertação, a qual se expressa nestes e em outros oráculos, como também outros motivos ligados ao conteúdo e à forma colocam estes oráculos no terceiro período da atividade do profeta (PFEIFFER* pensa de modo semelhante). Dificilmente eles terão sido determinados pelos acontecimentos ocorridos no reinado de [osias. f) Uma volumosa coleção é constituída pelos oráculos dirigidos contra outras nações nos capítulos 46-51.77 A introdução a este conjunto era formada originariamente pelas palavras a respeito do cálice da embriaguez, ministrado por Javé (25.15s,27-29), e pelo julgamento de Javé contra as nações (25.30s,34-38). Estas palavras, como os oráculos contra o Egito, foram tomadas do rolo manuscrito de Jeremias (cf, 3A). Os oráculos dirigidos contra o Egito (46), contra os filisteus (47), contra Moab, Amon e Edom (48.1-47; 49.1-6,7-22) e contra Damasco (49.23-27) apresentam uma ordem geográfica livre, onde Jerusalém figura como ponto central (sulleste-oeste-norte), e na qual os oráculos pronunciados contra determinadas tribos árabes (49.28-33) e o Elam (49.34-39) não se enquadram. A conclusão é formada pelos oráculos dirigidos contra Babilônia (50-51.58, juntamente com o relato a respeito de uma ação simbólica: 51.59-64, extraído do livro de Baruc). 77
H. BARDTKE, "[eremia der Fremdvõlkerprophet", ZAW 53 (1935),299-239; 54 (1936), 240-262. - K. BUDDE, "Über die Capitel 50 und 51 des Buches [eremia", JDTh 23 (1878),428-470,529-562. - O. EISSFELDT, "Jeremias Drohorakel gegen Âgypten und gegen Babel", em: Rudolph-Festschrift, 1961,31-37. - A. KUSCHKE, "[eremia 48,1-8", ibid. 181-196. - A. MALAMAT, "The Historical Setting of Two Biblical Prophecies on the Nations", lEJ 1 (1950), 149-159. - F. NORTH, "The Oracle against the Ammonites in [eremiah 49,1-6", JBL 65 (1946),37-43.
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As opiniões sobre esta coleção são também muito diferentes. Depois de SCHWALLY e STADE, foi sobretudo VOLZ quem negou a Jeremias a autoria destes capítulos, vendo neles uma coleção homogênea de dez poemas a respeito das nações e originários de meados do séc. VI. PFEIFFER* e SELLIN-RoST* pensam de modo semelhante, mas por motivos estilísticos. Pelo menos os oráculos pronunciados contra Babilônia têm sido atribuídos freqüentemente, como, p.ex., por WAMBACQ, ao final do exílio. EISSFELDT*, WEISER* e BENTzEN, pelo contrário, admitem um núcleo menor, e RUDOLPH um núcleo maior de palavras de Jeremias (EISSFELDT*, mais recentemente, além de um núcleo em 46, também o vê em 50-51). Também BARDTKE admite a autoria de Jeremias para um núcleo dos oráculos revistos e ampliados, como admite igualmente um livro original composto de palavras pronunciadas contra nações estrangeiras e que compreenderia 1.2,4-10; 25.15-17 e o núcleo de 46-49, além de 25.27-29. Ele atribui esse livro ao período inicial da pregação de Jeremias, que originariamente teria pertencido a uma ordem de nabis e teria desempenhado a missão de profeta contra as nações. Entretanto, 1.10 não constitui uma base suficiente para uma tese tão ampla, principalmente porque nada se pode observar a respeito de uma mudança que teria ocorrido posteriormente na pregação de Jeremias. Ao próprio Jeremias só se podem atribuir os oráculos pronunciados contra o Egito (46.3-6,7-10,11-12) e os oráculos genéricos do segundo período (25.15s,27-29; 25. 30s,34-38). Todos os demais textos, por razões de estilo e de conteúdo, devem ser atribuídos a outros autores, quase sempre de épocas posteriores, principalmente porque certas partes do capo 48 foram tomadas de Is 15s; certas partes do capo 49, de Os 110, e certas partes dos capítulos 50-51, de outras seleções do livro de Jeremias. g) Uma série de oráculos e de relatos, sobretudo certos oráculos do terceiro período, foram transmitidos isoladamente e não no contexto das coleções. Provenientes do primeiro período são o relato da vocação (1.410), os relatos das visões e audições que logo se seguiram à vocação (1,11s.13-19) e os oráculos sobre o término da atividade do profeta (6.10s,2729); do segundo período são os relatos a respeito das ações simbólicas (13.1-11; 16.1-9) e as palavras dirigidas por Jeremias aos recabitas (35.119). Do terceiro período são os seguintes textos: 8.18-20; 13.12-14,23; 15.59; 16.16-18; 17.1-4; 21.1-7,8-1O,13s; 22.20-23; 24; 32.1-15, e do quarto período: 2.14-17.
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4. O escrito de Baruc
o personagem Baruc filho de Neric, indicado em 36 como o escriba de Jeremias, é mencionado diversas vezes (32.12;43.3; 45). É evidente que ele viveu, no mínimo, a partir do ano 605, constantemente na presença de Jeremias, participando de sua vida e acompanhando-o, afinal, ao Egito. Apesar da posição contrária de MOWINCKEL, que imagina Baruc apenas tomando parte no trabalho de escrever o rolo de 605, continua-se firmemente a acreditar que ele participou no desenvolvimento da tradição a respeito de Jeremias. Por isso é freqüente atribuir-se a ele uma série de narrativas que, embora supondo um conhecimento particular sobre o profeta e seu destino, não pode, todavia, derivar do próprio Jeremias. Neste escrito de Baruc" podemos incluir as seguintes narrativas, divididas de acordo com as datas indicadas ou segundo outros critérios: I)
do começo da atividade até o quarto ano do reinado de Joaquim: 26 circunstâncias em torno do discurso pronunciado no templo (7.1-15); 19.1,2a*,1O-11a,14-15; 20.1-6: quebra do vaso e maus-tratos infligidos a Jeremias por Fassur": 36(37.1-2) rolo manuscrito de Jeremias; 45 palavras dirigidas a Baruc.
11)
do quarto ano do reinado de Sedecias: 27.1-3,12b; 28 Jeremias carrega o jugo; conflito com Ananías:" 29 carta de Jeremias aos exilados; 51.59-64 ordem de executar uma ação simbólica em Babilônia.
I1I) da época do cerco de Jerusalém, até a permanência no Egito: 34.1-7,8-22; 37.3-44.30. 81
Neste conjunto, os grupos I e II formam o prelúdio do grupo III, sobre o qual recai o acento, já por causa da extensão: as ameaças de Jeremias, 78
L. ROST, "Zur Problematik der Jeremiabiographie Baruchs", em: Meiser-Festschrift,
79
O chamado discurso de TOFET não pode ser incluído no escrito de Baruc (EISSFELDT*),
1951, 241-245. porque só existiu como ampliação do relato da ação simbólica, e nunca teve existência autônoma. 80 KAAus (ver acima, nota 75). - H. SCHMIDT, "Das Datum der Ereignisse von [er 27 und 28", ZAW 39 (1921), 138-144. 81 M. DAVID, "The Manumission of Slaves under Zedekiah", OTS 5, 1948,63-79.
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contidas no rolo manuscrito (cujo aparecimento deve ser visto como necessário, através das narrativas precedentes), ainda não se haviam realizado no ano de 594, graças à intervenção de Jeremias e à contemporização de Sedecias com os babilônios, e só se realizariam alguns anos depois, com a queda de [udá e Jerusalém e com a fuga, para o Egito, daqueles que tinham ficado na Palestina, de sorte que o futuro só estava com os que haviam sido deportados para a Babilônia, contanto que tomassem em consideração a carta enviada por Jeremias. As narrativas atribuídas a Baruc procuram demonstrar, portanto, que as ameaças pronunciadas pelo profeta, por causa das quais ele tanto sofrera, se haviam finalmente realizado. É isto, e não uma história dos sofrimentos (KREMERS, WEISER)82 ou uma biografia de Jeremias, nem evidentemente uma complementação do manuscrito (SELLIN*), que o livro de Baruc, freqüentemente postulado, deve constituir. A forma na qual o autor relata os acontecimentos pode ser deduzida a partir de um cotejo do oráculo de Jeremias pronunciado no templo (7.1-15) com a narrativa do capítulo 26. O autor descreveu os acontecimentos o mais exatamente possível, mas transcreveu, pelo contrário, o oráculo do profeta, abreviando-o nas idéias fundamentais e deslocando também um pouco os acentos. Ele procede de modo análogo com todas as palavras de Jeremias. De uma forma ou de outra, observa-se uma diferença entre a narrativa dos fatos e o modo como ele reproduz os oráculos, porque a narrativa foi formulada em prosa e os oráculos em versos breves. A seqüência original do livro de Baruc foi alterada. A transposição do capítulo 45 para a sua posição atual se explica pelo fato de que o mesmo devia excluir o Baruc que residia, por fim, no Egito, das ameaças proferidas contra os judeus egípcios, enquanto que a transposição da perícope 51.59-64 se explica pelo fato de que devia ser acrescentada aos oráculos contra Babilônia, contidos nos capítulos 50s. O capítulo 36 talvez devesse seu lugar atual ao propósito de atribuir ao rolo manuscrito todas as palavras de Jeremias contidas em 1-35, como também as promessas e deste modo legitimá-las.
82
H. KREMERS, "Leidensgemeinschaft mit Gott im Alten Testament", EvTh 13 (1953), 122-140. - A. WEISER, "Das Gotteswort für Baruc [er 45 und die sogennante Baruchbiographie", em: Heim-Fesischriit, 1954,35-46 (= Glaube und Geschichte im Alten Testament, 1961,321-329).
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5. Ditos posteriores A opinião dominante tende a admitir o menos possível, como autênticos, os ditos posteriores que foram acrescentados não só ao rolo de Jeremias como também às coleções parciais e ao livro de Baruc. Ao contrário disto, devemos defender insistentemente a tese segundo a qual é muito grande o número de acréscimos introduzidos no livro de Jeremias, como acontece em Is 1-39. É verdade que se pode perguntar, a respeito deste ou daquele oráculo, se não se trata de um oráculo, original ou revisto, de Jeremias. Mas só em raros casos se pode concordar com tal suposição. Um acréscimo evidente é, em qualquer caso, o apêndice histórico constituído pelo capítulo 52, que, no essencial, concorda com 2Rs 24.1825.30, sendo que 58.28-30 apresenta uma informação extraída de uma fonte que tratava dos judeus deportados nos anos de 597, 587 e 582. Ao contrário do que acontece com Is 36-39, o referido acréscimo não foi feito com o propósito de recolher todas as informações a respeito do profeta, pois não se faz menção de Jeremias. Pelo contrário, as notícias a respeito da queda de Jerusalém e do indulto concedido ao rei prisioneiro Joaquim devem indicar que se cumpriram as ameaças proferidas por Jeremias e que a sorte depois mudou, consoante as promessas anunciadas por ele. Abstração feita de certos acréscimos e glosas, todos de menor importância, os oráculos de outros autores introduzidos no livro de Jeremias foram os seguintes: a)
b)
c) d)
e)
j) g) h) i)
invectivas: 2.19-22,295; 3.2-5; 7.24-28; 9.65; ameaças: 2.33-37; 4.9-12,275; 5.10s,12-17,26-29; 6.1-3,6-9,12,16-19; 7.29-8.3; 8.8-17; 9.24s; 11.15-17; 13.20-22,24,25-27; 15.35,11-14; 18.1317; 22.11; 23.19s; lamentações: 9.18; 10.17-20; 12.7-13; 13.17; exortações: 5.18-25; 21.11s; promessas: 3.14-18;12.14-17;16.14s,19-21;23.3-8;30.8-11,16-24; 31.714,23-30,38-40; 32.16-44; 33.1-13,14-26; apocalípticos: 4.23-26; didáticos e de comentação: 9.10-13; 16.10-13; 17.19-27; 22.85; 23.23s,33-40; sapienciais: 9.22s; 10.1-16; 17.5-13; 23.18; oráculos contra as nações: 46.13-5.58.
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6. Origem do livro A origem do livro em estudo constituiu-se em um longo e bastante complicado processo, o qual não podemos acompanhar até aos pormenores. Parece ter começado na época do exílio. Que este processo se tenha estendido por um longo período de tempo, com a participação de vários revisores, ainda não estando o texto definitivamente fixado no séc. IH, é o que nos mostram primeiramente as freqüentes repetições de versículos ou grupos de versículos em um segundo lugar do livro.v e também o tamanho do texto reduzido em cerca de um oitavo na LXX, a qual, embora muitas vezes tenha abreviado esses textos, contudo já não encontrou outras perícopes no original, como, p.ex., 33.14-26. Os fragmentos de Jeremias, descobertos em Qumran e que representam, ora o texto massorético ou uma fase preliminar do mesmo, ora o texto mais breve do original, permitem-nos verificar que as duas formas do texto existiam uma ao lado da outra. Por isso não se pode admitir apenas um redator, que para VOLZ seria Baruc e para RUOOLPH seria o autor dos "discursos de Jeremias numa versão deuteronômica", nem igualmente apenas uma atividade correspondente de Jeremias (1-25) e de Baruc (26-36 e 37-45), como pretende SAYDON,84 nem ainda intervenções de Baruc nas proporções pressupostas por AUGUSTIN.
A base do livro era constituída pelos registros escritos dos oráculos e dos relatos de Jeremias, e particularmente pelo antigo rolo manuscrito no que diz respeito ao fundo de 2-6 (palavras do primeiro período e que se encontram em 2-6; palavras do segundo período, que vão até o ano de 605, e se encontram em 6-7 e espalhadas em alguns dos capítulos seguintes). A esta base se acrescentam as outras coleções parciais citadas, bem como determinados relatos e oráculos provenientes sobretudo do terceiro e quarto períodos, e que Baruc consignou ou resumiu imediatamente em seu livro, no quadro das narrativas. A partir do capítulo 11, eles foram 83 Assim, p.ex., [r 8.lOa-12 provém de 6.12-15; 8.15 de 14.19; 9.9 de 5.9; 10.12-16 de 51.15-19; 15.13s de 17.3s; 20.23 de 11.20; 25.4 de 7.25s; 30.23s de 23.19s; 38.2 de 21.9; 46.27s de 30.10s; 49.17 de 19.8; 49.19-21 de 50.44-46; 49.22 de 48.40s; 49.26 de 50.30. 84 P. P. SAYDON, "Il Iibro di Geremia. Struttura e composizione", RivBibl 5 (1957), 141-162.
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reunidos entre si, embora nem sempre se possam descobrir razões convincentes para esta colocação. De resto, o escrito de Baruc foi acrescentado ou inserido nos respectivos lugares, fazendo-se a transposição parcial acima indicada. Por último, foram sendo acrescentados aos poucos os numerosos oráculos posteriores. Se na utilização do rolo manuscrito e na inclusão de elementos do escrito de Baruc seguiram-se certos princípios, presumivelmente de ordem cronológica, é porque se procurou chegar, afinal, ao esquema escatológico de três membros. É este esquema precisamente que está na base da divisão do livro de Jeremias, e que se observa na versão dos LXX: 1-25.14 ameaças contra [udá e Jerusalém, 25.15ss; 46-51 ameaças contra outras nações (LXX: 25,14-32,38), 26-35 promessas em favor de Israel e [udá (LXX: 33-42),às quais se acrescentam, em razão de sua condição de fontes: 36-45 a parte principal do livro de Baruc (LXX: 43-51),
52
o apêndice.
Esta divisão foi alterada naquela componente da tradição que está na base do texto massorético, pela transposição da maior parte dos oráculos pronunciados contra as nações (46-51). Apenas a introdução: 25,15ss, permaneceu em seu lugar primitivo: 1-25 ameaças contra [udá e Jerusalém (juntamente com 25,15ss), 26-35 promessas em favor de Israel e [udá, 36-45 a parte principal do livro de Baruc, 46-51 ameaças contra outras nações 52 o apêndice.
7. Pregação A pregação de Jeremias não foi determinada por um contexto cultual, nem moldada, de forma determinante, por tradições já existentes. Não há indícios de que ele, ao iniciar suas atividades, tenha exercido primeiramente a função de nabi pregador de ameaças contra as nações (BARDTKE), ou que depois tenha atuado ocasionalmente como profeta cultual adorador e intercessor (ErssFELDT*, WErsER*), ou mesmo, permanentemente, como titular ordenado de um ofício litúrgico (REVENTLOW). As palavras pronunciadas por Jeremias contra as nações apontam numa direção totalmente diferente, enquanto a imitação eventual de um gênero
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litúrgico (liturgia profética: 14.2-15,2) antes exclui do que supõe uma recitação cultual, embora, por motivos práticos, Jeremias tenha pregado seus oráculos, de vez em quando, aos participantes de uma celebração do templo. Naturalmente as tradições da fé javista e seu posterior desenvolvimento na Palestina eram conhecidos de Jeremias, principalmente porque ele, do mesmo modo como os grandes profetas individuais, conduz a antiga fé a novas paragens. Muito mais fortemente do que a marca das tradições, o que nele se faz sentir é o seu "eu" humano: é isto o que o distingue de seus precursores (HERTZBERG, WILDBERGER). Assim como se apaga nele a diferença entre o que constitui o oráculo de Javé e o que é a palavra do próprio profeta, e assim como se faz ouvir um tom altamente lírico e pessoal em sua pregação, assim também, a partir do momento de sua vocação, ele se põe em guarda contra a pressão que vem de Deus, tem consciência de que pertence a seu povo e se empenha em interceder junto a Deus em favor desse povo, na medida em que lhe seja permitido, ao mesmo tempo em que, com seus rogos, procura arrancá-lo da perdição que o espera. Com esta sua dupla atitude, ele entra por fim naquela crise que transparece em suas elegias ou confissões, crise esta que não termina, porém, na escuridão e no abandono divino, mas na própria conversão e na livre obediência a Deus. A esta linha pessoal corresponde o fato de que Jeremias, embora se utilize do conceito de irri! aprofundado e legitimado pela reflexão da teologia deuteronômica, e também da fórmula de mútuo comprometiment0 85 (11.1ss; 24.7), servindo-se, por conseguinte, da linguagem teológica de sua época, permanece, contudo, fiel à maneira profética de descrever com termos tirados do âmbito familiar a relação Javé-Israel, como se fosse uma relação vital e pessoal, caracterizando esta mesma relação, tal como o faz Oséias, como uma relação matrimonial (2.2; 3.6ss), ou apresentando os israelitas como filhos de Javé (3.19,22; 4.22). Como Oséias, por quem foi influenciado precisamente no primeiro período de sua atividade." também ele fundamenta essa relação com a libertação do Egito (2.6), mas não atribui esta libertação, como o faz a teologia deuteronômica, ao fato da eleição, e sim ao amor de Deus. Como Oséias, também ele limita a época da tranqüila relação de Israel com Javé ao tempo de Moisés e à fase do 85 86
Cf. R. SMEND, Die Bundesformel, 1963. K. GROSS, Die literarische Verwandtschaft Jeremias mit Hosea, Diss. Berlin, 1930. - lo., "Hoseas Einfluss auf Jeremias Anschauungen", NkZ 42 (1931), 241-265, 327-343.
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deserto (2.2), na qual ainda não havia sacrifícios (7.22). Foi na terra de cultura que começou a apostasia com relação a Javé (2.7), apostasia esta que Jeremias se compraz em descrever com imagens tiradas da natureza, em vez de imagens históricas (8.4-7), apresentando-a, assim, de modo inteiramente clássico (3.19s). Porque esta apostasia continua até o presente, está próximo o julgamento destruidor - quando Javé já não atenderá sequer ao pedido de Moisés ou de Samuel em favor do povo (15.1). Ao contrário do que se pensa em geral, [udã e Jerusalém já não vivem em uma situação fundamental de salvação, cuja alteração ainda poderia ser facilmente corrigida, mas sim numa situação fundamental de perdição, como 6.14 o explica de modo determinante. Como seus predecessores, Jeremias vê a única possibilidade de salvação na conversão que ele exige insistentemente. No ano de 605 ele pode inclusive recapitular toda a sua pregação feita até ali como exigência de conversão (25.1ss). Mas quando esta conversão se mostrou impossível e quando o julgamento a respeito de [udá começou a se cumprir com a primeira deportação (15.59; 22.20-25), instalou-se nele a expectativa de uma intervenção de socorro e de salvação da parte de Javé em favor dos deportados já atingidos pela desgraça, tanto judaítas quanto antigos israelitas, como nos mostram o capítulo 24 e os oráculos de Jeremias contidos nos capítulos 3031. A esperança do futuro é demasiado pobre e está longe da descrição que dela fizeram os profetas escatológicos (31.6; 32.15; 35.18s). O fato decisivo é que Javé dê ao povo um coração que o conheça e que, depois da ruptura do pacto do Sinai, não o renove simplesmente, mas o complete com um novo pacto pelo qual a vontade divina é implantada então no interior do homem e escrita no seu coração, de modo que ele conheça Javé, como que naturalmente (31.31-34). Em suma, Jeremias desenvolve, a seu modo, a teologia de seus precursores, a saber: ele expõe uma relação inteiramente pessoal com Deus, a partir da situação de tensão entre Deus e o homem; uma comunhão de vida com Deus, num intercâmbio que encontra sua expressão principalmente na oração; uma entrega profunda do homem todo a Deus, que é purificada na crise; uma compreensão radical do que seja o pecado, não como delito individual, mas como atitude fundamental depravada da existência. Por isso, tanto mais urgente é o chamado à conversão e, conseqüentemente, porque Deus não é apenas justiça, mas sobretudo amor, também um voltar-se para a fé na salvação, fé que espera uma vida de comunhão com Deus, na qual o soberano domínio divino atinge a sua finalidade.
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1. As informações do livro De acordo com as informações do livro que tem o seu nome, Ezequiel, filho de um certo Buzi, fora primeiramente sacerdote. Foi levado para a Babilônia, por ocasião da primeira deportação, em 597, e instalado, em companhia de outros, em Tel-Abib, junto ao rio Cobar (1.1; 3.15), um canal que sai de Babilônia e leva a Uruk, passando por Nipur. Talvez se tratasse do atual shatt en-nil" Ezequiel era casado. Sua mulher morreu por volta de 587, antes ou durante o cerco de Jerusalém (24.18). No quinto ano da deportação ele foi chamado a ser profeta (593/592), e de acordo com a última data de seu livro (29.17), exerceu esta atividade até o ano de 571. Sua atuação, conseqüentemente, se estende por um período de um pouco mais de dois decênios, durante os quais ele exorta os seus companheiros de sofrimento, no exílio, adverte-os e consola-os, mas se ocupa, principal87
De acordo com E. VOGT, "Der Nehar Kebar: Ez I", Bibl 39 (1958), 211-216, trata-se de um pequeno canal existente nas imediações de Nipur.
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mente, com a sorte de [udá e Jerusalém distantes, às quais se dirigiram primeiramente suas ameaças (1-24) e mais tarde suas promessas (33-48). Muitas vezes foi arrebatado em visões e conduzido a Jerusalém (8-11;40ss). Na pesquisa moderna têm sido postas em dúvida as indicações do livro com tanta freqüência, e se têm desenvolvido opiniões tão diversas sobre a época e o lugar da atividade de Ezequiel, sobre sua figura e o conteúdo da sua pregação, sobre a formação do livro e a história do texto, que já não bastam apenas uma breve introdução à história de sua exegese, nem a apresentação de uma teoria própria. Pelo contrário: é preciso, em proporção muito mais ampla do que no caso dos outros livros proféticos, uma exposição da história do problema.
2. Os problemas históricos Os problemas históricos surgiram quando se começou a pôr em dúvida a opinião tradicional de que Ezequiel se limita apenas a falar a [udá e a Jerusalém e influir diretamente, de forma quase mágica, sobre seu destino; ou que, embora oponha sua mensagem anunciadora de calamidades às esperanças dos deportados acerca de Jerusalém, vive, contudo, em espírito, inteiramente na sua cidade nataL Ele aparece sempre em primeiro plano como profeta destinado a [udá e Jerusalém, embora viva entre os deportados na Babilônia. Como é quase impossível imaginar um profeta nestas condições, uma hora ou outra essa teoria haveria de provocar dúvidas. Os ataques dirigidos nos últimos decênios contra ela abalaram seus fundamentos e deram origem a teorias inteiramente divergentes a respeito da época e do lugar em que Ezequiel exerceu sua atividade. Não raras vezes se tem atribuído a concepção de Ezequiel enquanto profeta que viveu no séc. VI na Babilônia à redação do livro, que teria introduzido o pano de fundo histórico da época ou seja babilônico, e se tem admitido outra época ou outro lugar para a atividade verdadeira do profeta ou para a origem de seu livro. Evidentemente pouco se considerou como uma atividade redacional de tal amplitude teria sido impossível em Israel, nem quais as novas dificuldades com que as teorias propostas se acham ligadas, ou também em que medida essas teorias dificultam a compreensão da figura e da mensagem de EzequieL Se é verdade que falhou a tese tradicional segundo a qual se trataria de um profeta que vivia no exílio com a atenção voltada para [udá e Jerusalém, também não é menos verdade que não se pode admitir outra época ou outro lugar para a atividade de Ezequiel: ele exerceu esta atividade na época indicada pelas datas que
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se encontram em suas palavras" e viveu entre os exilados judaítas na Babilônia. O problema de suas relações com esses deportados e com Jerusalém, problema que provocou os ataques à hipótese tradicional, resolve-se de modo muito simples. a) As teorias mais incisivas são aquelas que transferem a atividade de Ezequiel e o aparecimento do livro que traz o seu nome para uma outra época que não a indicada e, conseqüentemente, em geral também para um outro lugar. Depois de tentativas esporádicas, feitas outrora no sentido de estabelecer uma data precisa, SMITH situou a atividade de Ezequiel na região do reino setentrional de Israel, à época de Manassés, no início do séc. VII. Entretanto, é somente em Ez 4.4s; 37.16 que o termo Israel designa indubitavelmente o reino de norte; fora disso, porém, quase sempre designa o reino do sul e os seus deportados. Para ToRREY, a base do livro é constituída por um pseudo-epígrafe surgido por volta do ano 230 a.c. e que se faz passar por um vaticínio surgido em 666 a respeito dos crimes e da punição do rei Manassés, documento este que um redator posterior teria atribuído ao profeta Ezequiel no exílio. O pressuposto, porém, não se coaduna com a tese segundo a qual o livro de Ezequiel constitui uma unidade literária, enquanto que a argumentação de TORREY, com a qual ele procura demonstrar que a tradição do exílio é uma ficção, foi anulada pela documentação arqueológica. Para MESSEL, o profeta teria exercido sua atividade por volta do ano 400, em meio aos exilados que haviam regressado à Palestina, e seu livro seria obra de um redator que viveu por volta de 350. MESSEL, contudo, não consegue explicar por que tanto um como outro fingem o exílio. Com efeito, para combater um partido idolátrico em Jerusalém não era necessário uma tal dissimulação." Segundo BRoWNE, o livro é um pseudo-epígrafe da época de Alexandre Magno e se ocupa com o seu aparecimento no Oriente. Mas para isto ele tem de admitir; entre outras coisas, no livro, dois sistemas simulativos diferentes de indicar as datas e uma concepção alegórica do pecado censurado por Ezequiel, embora só retenha um julgamento, em si mesmo contraditório, a respeito dos samaritanos e seu templo." Por último, VAN DEN BORN explica que o livro é uma autobiografia pseudo-epigráfica R. DUSSAUD, "Les dates des prophétes d'Ezéchiel", RHR 76 (1917), 145-164. Cf. também as críticas de J. J. STAMM, ThZ 3 (1947), 304-309. 90 M. VOGELSTEIN, HUCA 23,2 (1950/1951), 197-220 mostrou particularizadamente que não corresponde à realidade da exposição de Ezequiel datá-la da época de Alexandre Magno.
88 89
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escrita na época de Esdras e Neemias contendo uma teologia essencialmente sacerdotal, e cuja unidade de linguagem, de idéias e estrutura se baseia na revisão de uma determinada escola. Deixando de lado este aspecto improvável, o argumento mais importante de VAN DEN BORN, de que o livro é dependente de textos do pós-exílio - dependência esta que BURRows outrora procurou demonstrar - é de todo insustentável. Não existe argumento nenhum em favor de outra época de origem que não aquela mesma indicada pelo livro de Ezequiel. b) Além disto, as manifestações a respeito do lugar da atividade profética de Ezequiel não passam de hipóteses que se afastam das indicações contidas no livro. Assim, HERNTRICH pretendeu provar que a atividade do profeta se limitou exclusivamente à Palestina. Como outros estudiosos, também ele vê uma contradição na afirmação de que Ezequiel se teria dirigido aos habitantes de Jerusalém e lhes teria anunciado o fim da cidade, mas vivido entre os desterrados, com a sorte dos quais parece que ele não se preocupava. Ezequiel teria exercido suas atividades em Jerusalém e somente um redator teria forjado a situação babilônica. HARFORD e BERRY defenderam uma hipótese parecida. Também MATTHEws, IRWIN e TROST91 distinguem entre o profeta de Jerusalém e o redator babilônico. De igual modo MAy, segundo o qual Ezequiel teria voltado da Babilônia para Jerusalém em 591, pensa em uma atividade que teria tido começo exclusivamente em Jerusalém. Mas, como bem o mostram as alocuções paralelas dirigidas às nações nos oráculos do profeta, as alocuções dirigidas por Ezequiel aos habitantes de [udá e Jerusalém não pressupõem que ele tenha estado em Jerusalém. Além disso, já desde muito cedo ele havia dirigido palavras aos exilados (11.14-21; 14.1223). As preocupações e necessidades desses deportados, que giram todas em torno da sobrevivência de Jerusalém e de seu templo, bem como de seu retorno para lá, responde Ezequiel com seus oráculos, nos quais anuncia a tomada de Jerusalém, a deportação de seus habitantes e um longo exílio. Fora isto, a transferência da atividade de Ezequiel para a Palestina exige alterações profundas no texto e a suposição de que o redator teria executado uma revisão de tamanhas proporções. c) Uma outra teoria procura evitar as dificuldades, propondo que Ezequiel teria exercido suas atividades em dois lugares distintos, a saber: na Palestina e na Babilônia.
91
St.
FROST,
Old Testament Apocalyptic, 1952,84.
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Foi BERTHOLET sobretudo quem defendeu a hipótese de que Ezequiel teria sido chamado, uma primeira vez, com a "visão do rolo manuscrito" (2.3-3.9), a ser profeta em Jerusalém (593), onde teria permanecido até o cerco da cidade, para, após um curto intervalo de tempo em outra parte da Palestina, ser transferido para a Babilônia, onde, com a "visão do carro do trono" (1.4-2.2), teria sido chamado a ser profeta dos exilados (585). Opinião semelhante é adotada por SPIEGEL, KUHL, STEINMANN, AUGÉ e JOZAKI,92 mas com algumas modificações. Segundo FISCHER, Ezequiel teria sido deportado em 597, voltando porém para Jerusalém em virtude de sua vocação. Somente com a destruição da cidade é que ele teria ido, como profeta, viver entre os deportados. PFEIFFER* pensa de modo semelhante, mas com a alteração de que Ezequiel, já no começo ou durante o cerco da cidade, teria voltado para a Babilônia. Mas também esta hipótese exige mudanças nos textos e a reorganização de partes inteiras do livro, sem que elas se possam justificar de maneira convincente. O ponto de partida continua a ser representado por uma única passagem do texto, que deve ser interpretada forçosamente de modo unilateral ou com determinados pressupostos, ou que somente assume o sentido procurado através de uma alteração. Por isso a hipótese de uma dupla atividade de Ezequiel se manifesta igualmente inverossímiL Assim é que COOKE, M. SCHMIDT, HOWIE, ZIMMERLI, EICHRODT, ROWLEY e outros, apenas com diferenças de detalhes, se conservaram fiéis à hipótese de que Ezequiel teria exercido sua atividade exclusivamente entre os deportados, e de que aí sua pregação teria sido fixada por escrito e reunida em livro. d) As indicações cronológicas do livro, segundo as quais Ezequiel foi deportado em 597 e chamado ao ministério profético em 593/592, podem ser tidas como base segura. Em particular, as datas indicadas em diversas seções são originais e autênticas. Elas provêm do ano da deportação do rei Joaquim, que continuava sendo considerado por muitos como o soberano legítimo, enquanto Sedecias era visto apenas como seu regente."
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93
R. AUGÉ, Ezequiel, 1955. - S. JOZAKI, "A Study on Ezequiel 11.14-21", Kwansei Gakuin University Annual Studies 6 (1958),29-41. Parece que Joaquim continuou a possuir bens imóveis na Palestina, mesmo depois de sua deportação, como se pode deduzir das marcas de selos encontradas em iell bet mirsim e em er-rumele, provenientes da época posterior a 597 e contendo a inscrição: Eliacim, administrador de[aukin; cf. W. F. ALBRIGHT, "The Seal of Eliakim and the Latest Pre-Exilic History of [udah, with some Observations on Ezekiel", JBL 51 (1932),77-106.
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Tendo Ezequiel acompanhado ao exílio, ele pode falar, nos momentos cruciais da sua atividade, de nossa deportação (33.21; 40.1). Além disso, as particularidades lingüísticas se harmonizam com a época em volta do ano 600 a.C. As relações literárias com outros livros do Antigo Testamento e também os acontecimentos históricos e contemporâneos, supostos na obra, apontam para o período inicial do exílio." Fora disto, nada indica Jerusalém como o lugar ou um dos lugares da atividade de Ezequiel, enquanto, pelo contrário, tudo está a indicar que tenha sido a Babilônia. A familiaridade com a situação existente em Jerusalém não vai além daquilo que ele podia saber da época anterior à deportação e através de informações posteriores. De Jeremias, ele conhece, em essência, aquelas palavras da época anterior a 597. Nada indica que ele tenha passado seus anos decisivos sob Sedecias, em Jerusalém, e tenha partilhado das calamidades do cerco e da conquista de Jerusalém. A respeito dos detalhes da queda de Jerusalém ele só veio a saber muito tempo mais tarde, por intermédio de um refugiado. Se Ezequiel, portanto, viveu e exerceu sua atividade na Babilônia, não se pode mais afirmar que ele tenha sido incumbido de uma pregação destinada a Jerusalém e se tenha dirigido a ela, a partir da Babilônia, embora se tenha ocupado constantemente com sua sorte. Pelo contrário: ele tinha plena consciência de ter sido enviado exclusivamente aos deportados judaítas, para destruir suas esperanças de uma libertação de Jerusalém e pôr termo ao seu receio de que ela caísse. Era a eles que sua pregação se destinava e foi entre os mesmos que ele exerceu sua atividade de profeta. Isto aparece sobretudo na expressão: raça de recalcitrantes, que se refere exclusivamente aos exilados, como aparece também, seja na descrição que se faz em seções inteiras a respeito da situação babilônica, seja em indicações diretas, seja na mencionada especificação daqueles aos quais suas palavras se dirigem e alcançam," seja ainda nas relações da profecia de Ezequiel com certas tradições babilônicas. Por certo que sua pregação não se realizou sem qualquer vinculação com Jerusalém. Anunciando o julgamento sobre Jerusalém com palavras e ações simbólicas, ele já estava contribuindo de forma imediata para a sua realização, porque, de acordo com a compreensão da época, tal anúncio possuía um caráter eficaz. É possível que nisto precisamente tenha consistido para o círculo de suas relações o significado deste anúncio, significado que se estendia para além do momento presente. Hauptprobleme, 105-202. Ib. 203-259.
94 FOHRER, 95
§ 60.
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3. Atividade de Ezequiel A atividade de Ezequiel pode ser dividida em três períodos. No primeiro período, que vai do momento de sua vocação até à época da queda de Jerusalém (593/592-587), ele procura desfazer, com o anúncio incondicional de desgraças, as esperanças e os temores dos deportados a respeito da existência de Jerusalém, destruindo a crença na sua intocabilidade e a expectativa de breve mudança em seu destino. Para isto, servem os oráculos e as ações simbólicas contidos em 4-12; 16-17; 19; 21-24. Ezequiel desfaz a unidade existente entre Javé e Jerusalém, ao mesmo tempo em que exige que se aceite esta separação e que se tome uma decisão em favor de Javé. Crer implica que os exilados se desliguem da cidade do templo, compreendam e aceitem o julgamento pronunciado a respeito dela. Quando se esperavam notícias da queda de Jerusalém ou quando ela se tornou conhecida pelos boatos que chegavam, Ezequiel emudeceu até que o relato de uma testemunha ocular desatou a sua língua (3.22-27; 24.2527; 33. 21s). A partir de então modifica-se a atividade de Ezequiel, o qual se empenha em levantar os ânimos dos que desesperavam e em orientar as vontades no rumo certo da conversão. Este segundo período de transição (586-585) é o período de um anúncio condicional de salvação: para os justos, a salvação; para os pecadores, a morte. Por isso Ezequiel ajusta contas com as classes superiores até então existentes em [udá (34), e também com os profetas nacionais (13.3,6,9), e exorta os exilados a se converterem e a levarem uma vida de acordo com a vontade de Javé (3.16b21; 33.1-20). Para preparar a salvação serve também o anúncio do julgamento a respeito de outros povos que receberam com satisfação a notícia da queda de Jerusalém e dela se aproveitaram para se vingar, e que devem ser considerados como exemplos característicos de comportamento perverso (25ss). Naturalmente Ezequiel teve de reconhecer que suas exigências a respeito dos deportados ultrapassavam as forças humanas e que o futuro não podia consistir exclusivamente na sobrevivência de uns poucos justos. Ele via uma nova era de salvação no anúncio incondicional de salvação do terceiro período (depois de 585).96 Desta salvação estão excluídos 96
J. BÓHMER, "Die prophetische Heilspredigt Ezechiels", ThStKr 74 (1901), 173-228. - J. DELORME, "Conversion et pardon selon le prophête Ézéchiel", em: Mémoríal Chaine, 1950, 115-144.
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apenas aqueles que apostataram conscientemente e os inimigos externos que ameaçam Israel. Assim, ele espera o advento de um reino de Israel reunificado, numa Palestina florescente (36-37), e também a volta de Javé para um novo templo reconstruído, do qual jorrarão torrentes de bênçãos (40-48), enquanto os atacantes que ameaçam Jerusalém serão surpreendidos pela catástrofe (38s). Particularmente importante é a promessa de que Javé dará a seu povo um novo coração de carne e lhe concederá o Espírito divino, de sorte que os israelitas obedecerão como que espontaneamente à vontade divina e viverão em comunhão com Deus (36.26ss). Estes paralelos com o novo pacto pregado por Jeremias nos mostram que Ezequiel percorreu também o caminho que vai da exigência de conversão à promessa da redenção.
4. O exercício da pregação de Ezequiel A origem e o exercício da pregação profética de Ezequiel apresentam algumas características próprias, a saber: primeiro, para ele, como também para seus predecessores, é a palavra de Deus que ocupa o primeiro plano. Segundo, ele reivindica para si o "Espírito" de Javé, a força vivificante e impulsionadora dos antigos nebiim e dos profetas do culto e com isto ele lhes nega a fonte de sua inspiração. Terceiro, o êxtase, enquanto epifenômeno das visões." desempenha papel mais relevante do que anteriormente e aparece com mais freqüência. O êxtase pode incluir, como elemento parcial, o transporte ou arrebatamento até Jerusalém ou a uma das planícies do vale mesopotâmico, como tantas vezes se menciona no livro de Ezequiel. Por último, de todos os profetas, Ezequiel foi o que mais executou ações simbólicas. Os relatos a este respeito se encontram em 4-5; 12; 21; 24; 37 e nas passagens correlatas: 3.22-27; 24.25-27; 33.21s. Abstraindo dos relatos a respeito de certas experiências visionárias e extáticas e sobre as ações simbólicas, dentre os modos de falar o primeiro lugar é ocupado pelas formas de ameaças: dezesseis ameaças, dezenove ameaças com fundamentação, dez invectivas e ameaças, oito cânticos proféticos de lamentação e cânticos fúnebres, além de uma ameaça que apa97
E. BAUMANN, "Die Hauptisionen Ezechiels in ih rem zeitlichen und sachlichen Zusammenhang untersucht", ZAW 67 (1955), 56-67. - R. Dussxuo, "Les visions d'Ézéchiel", RHR 37 (1898), 301-313. - H. PaPE, "Ezekiel and his Vision", JThSt 24 (1935), 275-288.
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rece três vezes em ligação com outros gêneros literários. Além de alguns oráculos de invectiva e de exortação, encontra-se também uma grande quantidade de palavras de reflexão sobre a história, de palavras de discussão, didáticas e alegóricas, que atestam a presença do elemento racional e reflexivo no pensamento de Ezequiel. Por fim, não podemos perder de vista as promessas, notáveis pela sua extensão. Nelas pode-se verificar que, além de oráculos mais breves, encontram-se também poesias e tratados freqüentemente bastante amplos. VON RABENAU contribuiu com inúmeras e valiosas pesquisas para a solução do problema referente à história das formas, embora o seu empenho por alcançar, a partir também daí, um resultado conclusivo para a questão literária da origem do livro, se tenha chocado com as barreiras da análise da história das formas. Devemos mencionar sobretudo a divisão que ele faz das "palavras de futuro", ou seja, o fato de dividir os oráculos que tratam do futuro portador de salvação ou de desgraça (oráculos de salvação ou de ameaças) segundo os diversos temas da origem e do fato tanto da execução quanto das conseqüências externas e internas da intervenção divina. ZIMMERLI chama os oráculos que terminam com a frase: eles conhecerão queeu souJavé (passim) de "palavras de auto-apresentação divina" e procura derivar de 1Rs 20.13.2 esta forma, que ocorre freqüentemente em Ezequiel. Mas o fato de esta forma ocorrer duas vezes em oráculos de caráter anedótico nas profecias de Ezequiel constitui apenas uma base bastante restrita para supor que o profeta tenha empregado, vários séculos mais tarde, um gênero literário antigo. Ademais, 1Rs 20.28 não constitui, na realidade, um oráculo antigo, mas é um acréscimo secundário que interrompe o contexto. Um pouco mais complicada, embora fundamentalmente não diferente, é a situação em 1Rs 20.13s. Conseqüentemente, a impressão que se tem é, antes, a de que esses oráculos proféticos não serviram de modelo para Ezequiel, mas, pelo contrário, foram elaborados em sua forma atual pelo último dos revisores deuteronomistas dos livros dos Reis com base nas palavras de Ezequiel. Além disso, não se trata de um gênero literário propriamente dito, mas de uma fórmula interpretativa, que se integra em outros gêneros literários. Esta fórmula tem por finalidade fazer com que se compreenda corretamente o acontecimento anunciado, porque todo e qualquer acontecimento necessita de uma interpretação. É esta precisamente a função que têm as primeiras ocorrências da mencionada fórmula no javista, como, p.ex., Ex 7.17; 8.6,18; 9.29; 11.7. A fórmula tem por finalidade convidar o ouvinte à conclusão de que é Javé que interveio ou intervirá, com sua cólera ou com seu socorro.
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5. Ditos posteriores Algumas vezes tem-se negado a Ezequiel a autoria de grande parte das palavras e dos relatos transmitidos em seu nome. Depois da análise de HbLSCHER e IRWIN, de 1.273 versículos só restam para Ezequiel 170 ou 251. Os dois autores mencionados tomam a diferença entre a prosa e a poesia como critério de autenticidade e consideram como não pertencente a Ezequiel tudo o que não se enquadra no esquema do verso 10ngo.98 IRWIN distingue ainda entre os breves quadros ou as parábolas que provêm de Ezequiel, e aquilo que constitui a interpretação baseada nesses quadros e parábolas e provém de mão diferente. Se aplicarmos a medida tradicional da poesia israelítica, na realidade só encontraremos umas poucas passagens que constam de versos longos (antes do mais em 17;19;2628). A situação muda de aspecto, tão logo se utilize a teoria do verso breve. Embora seja de todos os livros proféticos o que mais alterações sofreu, observa-se que todas as palavras e relatos de Ezequiel foram divididos metricamente em versos longos ou em versos breves. Também não chegam a convencer-nos outros argumentos com base nos quais se tem negado a Ezequiel a autoria de várias perícopes isoladas, como, p.ex., os da hipótese de que a profecia de Ezequiel foi encoberta fortemente pela tradição oral (HEMPEL *) ou por um editor a quem MAy atribui cerca de 500 versículos, como não convencem nem as decisões mais ou menos arbitrárias em favor de uma teoria a respeito da época e do lugar da atividade de Ezequiel, nem determinadas considerações de caráter exegético. A despeito disto, as tradições que correm sob o nome de Ezequiel contêm um certo número de palavras posteriores, que quase sempre provêm de vários autores e de épocas diversas, diferindo entre si pelo conteúdo e tendo sido redigidas em prosa ou formuladas em poesia. Entre estas palavras contam-se, sobretudo, as seguintes passagens: 6.810; 16.30-34,44-63; 17.22-24; 21.33-37; 22.6-13.15s,23-31; 23.36-49; 27.9b,1l24; 28.20-26; 30.13-19; 32.9-16; 33.7-9, e um número bastante grande de perícopes da última parte do livro: 40.38-43; 41-15b-26; 43.1 0-27; 45.1820,21-46.15,16-24; 48.
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VAN SELMS, "Literary Criticism of Ezekiel as a Theological problem", OuTWP, 1961, 24-37, pensa, ao contrário, que os textos poéticos são divinamente inspirados, ao passo que os textos em prosa constituem apenas exortações, meditações e glosas sobre os mesmos. Em todo caso, este não é o pensamento de Ezequiel, que atribui suas palavras indistintamente a Javé.
A.
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6. Tradição dos oráculos e dos relatos A concepção outrora predominante a respeito da tradição dos oráculos e dos relatos de Ezequiel inclinava-se no sentido de considerar que as palavras do profeta representavam, no todo ou em quase sua totalidade, produções literárias, sem nenhuma ou com muito pouca pregação oral, e de que o livro seria uma obra homogênea, redigida de acordo com um plano bem determinado, concepção esta em favor da qual parecem depor, e não por último, as datas espalhadas ao longo dele. Assim SMEND enalteceu sobretudo a construção harmoniosa do livro do qual não se poderia retirar um fragmento sequer, sem prejuízo para o conjunto. Foi demonstrado, porém, que esta tese é errônea. Devemos admitir, em primeiro lugar, que há uma ligação estreita entre a pregação oral e a tradição escrita. À pregação oral se referem as seguintes passagens: 2.4-7; 3.4-7,16b-21; 8.1; 11.25; 14.1; 20.1; 21.5; 24.1924; 33.30-33. Ao contrário, porém, de outros profetas, é pouco provável que o próprio Ezequiel tenha sido o autor da tradição oral dos oráculos e relatos, sendo-o, porém, da sua fixação por escrito. Em abono desta tese temos a divisão métrica, por vezes complicada, os apêndices complementares ou modificativos de Ezequiel e os acréscimos de leitores posteriores, uns e outros em geral no final das seções. De ordinário, é a pregação oral ou a execução de ações simbólicas que parecem preceder, seguindo-se a fixação por escrito. Muitas vezes Ezequiel escreveu imediatamente as inspirações recebidas e somente mais tarde é que as anunciou, ou simplesmente não as comunicou a ninguém, de sorte que só posteriormente elas vieram a ser conhecidas, como, p.ex., 3.16b-21. Em segundo lugar, a unidade do livro foi posta em dúvida, quando se notou que as datas só valem para a seção que elas introduzem e não também para as subseqüentes, até a data mais próxima. Observam-se tensões, repetições e contradições, entre as quais a posição cronologicamente errada de muitas passagens, como a de 3.16b-21,22-27, e o encadeamento de seções que originariamente eram autônomas, principalmente em 8-11; 40-48. Para evitar as conseqüências que daí decorrem, procurou-se admitir, durante muito tempo, à imitação de KRAETZSCHMAR, a existência de várias recensões ou versões da tradição de Ezequiel, que um redator depois teria reunido. HERMANN, todavia, demonstrou de forma cabal que o livro é uma obra constituída pela reunião de coleções e de fragmentos isolados, que o próprio Ezequiel organizou no decurso de sua longa atividade - com o que, de antemão, ruíram por terra todas as teorias segundo
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as quais o livro teria surgido em época mais recente, sob a forma de um pseudo-epígrafo homogêneo. O passo final consistiu em constatar que a reunião das coleções e das palavras escritas pelo próprio profeta não foi efetuada por ele, mas por um ou por vários revisores em época posterior. Dos autores, uns admitem que foi bastante demorado o processo, tendo nele participado muitas mãos (FREEDMAN)99; outros atribuem esse trabalho a um "editor" (MAY) ou a um círculo especial de discípulos (VAN DEN BORN, ZIMMERU), cujas ampliações, enriquecimentos e a própria interpretação subseqüente encobriram de modo mais ou menos acentuado as palavras de Ezequiel. Outros, porém, partem da existência de uma espécie de rolo original de Ezequiel, no qual seus discípulos e ouvintes teriam inserido os oráculos e as seções guardadas de memória, provenientes da herança de Ezequiel. Depois disto, todo o conjunto teria sido completado intencionalmente, em época posterior (VON RABENAU). Estribados nessa base geral, EISSFELDT* e WEISER*, partem da suposição de que certas coleções de tipo especial constituiriam o elemento primitivo: teria havido primeiramente dois relatos escritos pelo próprio Ezequiel, na primeira pessoa e a modo de diário. Esses relatos conteriam datas ligadas a certos fatos concretos e importantes. Um dos seus conteúdos se referiria a Jerusalém e a [udá e o outro a Tiro e ao Egito. Quando de seu agrupamento, o último deles teria sido inserido entre as ameaças e as promessas contidas no primeiro. Além destes, Ezequiel teria deixado também outros discursos e poemas, escritos na primeira pessoa, mas de conteúdo mais geral e que teriam circulado como coleções ou peças isoladas, vindo a ser reunidos posteriormente aos mencionados relatos, mais por mão estranha do que por Ezequiel, antes ou depois de as memórias terem sido colecionadas. Contra esta tese, cujo ponto de partida são as datas, podemos objetar que existem também seções relacionadas com uma situação concreta e significativa, como, por ex., 21.2329; 24.15-24; 29.6b-9, e que de certas seções que tratam de uma mesma questão umas trazem datas e outras não. Assim, p.ex., 14.1-11 e 20.1-32; 30.20s e 30.22-26. 100 No processo de compilação e de tradição devemos distinguir vários passos. De qualquer modo, e ao contrário do que pensa a hipótese de uma obra literária homogênea ou de uma tradição exclusivamente oral, 99 100
D. N. FREEDMAN, "The Book of Ezekiel", Interpr 8 (1954),446-472. Cf. particularizadamente em FOHRER, Haupiproblem, 42-44.
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Ezequiel fixou por escrito suas palavras e seus relatos, antes ou depois da pregação oral ou da execução de ações simbólicas, e foi sob esta forma que os deixou isoladamente, como nos mostram seus próprios apêndices e os acréscimos posteriores, colocados precisamente no fim de muitas seções. Ezequiel não participou pessoalmente da colocação em ordem e da reunião dos oráculos e relatos, nem da distribuição de todo o material. O passo mais próximo consistiu em agrupar as anotações isoladas em coleções parciais. Algumas destas coleções compreendem relatos a respeito de suas experiências visionárias e extáticas e de seus atos simbólicos. Outras foram organizadas de acordo com certas palavras-chaves, e a maioria delas de acordo com a identidade ou a semelhança dos conteúdos. Às coleções que contêm anúncios de calamidades foram acrescentados, muitas vezes, oráculos de consolação e de salvação, de conformidade com o esquema escatológico de dois membros. É possível determinar as seguintes coleções (as palavras de época posterior que aí aparecem já foram mencionadas acima, no n Q 5): relato da vocação,'?' relato sobre ações simbólicas, oráculos contendo a palavra-chave "ídolos", oráculos a respeito da proximidade do juízo.l'" relatos sobre as experiências visionárias e extátícas.?" apêndice: 11.14-21: promessa em favor dos exilados, 12.1-20 relatos sobre ações simbólicas, 12.21-13.21 oráculos sobre a veracidade das palavras do profeta e a respeito de outros profetas, 14 dois oráculos ísolados.!"
1.1-3.15 3.16a; 4-5 6 7 8.1-11.13
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L. DÜRR, Ezechiels Vision von der Erscheinung Gottes (Ez C. 1 u. 3) im Lichte de
vorderasiatischen Altertumskunde, Diss., Würzburg, 1917.- E. HOHNE, Die Thronwagenvision Hesekiels, Diss., Erlangen, 1953. - O. PROCKSCH, "Die Berufungsvision Hesekiels", em: BZAW 34, 1920, 141-149. J. GOTISBERGER, "Ez 7,1-16 textkritisch und exegetisch untersucht", BZ 22 (1934), 195-223. E. BALLA, "Ezechiel 8,1-9,11; 11,24-25", em: Bultmann-Festschrift, 1940, 1-11. - TH. H. GASTER, "Ezekiel and the Mysteries", JBL 60 (1941), 289-310. - F. HORST, "Exilsgemeinde und [erusalem in Ez 8-11", VT 3 (1953), 337-360. - H. G. MAY, "The Departure of the Glory of Yahweh", JBL 56 (1937),309-321. - H. W. F. SAGGS, "The Branch to the Nose", JThSt NS 11 (1960),318-329. S. DAICHES, "Ezekiel and the Babylonian Account of the Deluge, Notes on Ez 14,1220", JQR 17 (1905),441-455. - M. NOTH, "Noah, Daniel und Hiob in Ezechiel14",
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oráculos sobre o pecado, o juízo e a responsabilidade, 15-16 pecado e julgamento de Israel/os 17 pecado e julgamento da realeza.l'" 18 responsabilidade e retribuição.!" 19 pecado e julgamento da realeza, 20 pecado e julgamento de Israel, oráculos contendo a palavra-chave "espada",108 oráculos sobre a culpa do sangue e os pecados individuais.!" 23 oráculos isolados sobre as duas irmãs Oola e Ooliba, relatos sobre ações simbólicas, oráculos sobre os países vizinhos de [udá, colocados em ordem, segundo o esquema dos textos de proscrição, tendo Iudá como ponto central: Amon Moab Edom Filisteus
26-28
nordíeste), leste, sudleste), oeste,
oráculos sobre Tiro (28.20-26: Sídonl."?
VT 1 (1951),251-260. - W. ZIMMERLI, "Die Eigenart der prophetischen Rede des Ezechiel", ZAW 66 (1955), 1-26. 105 E. BAUMANN, "Die Weinranke im Walde", ThLZ 80 (1955), 119s. - O. EISSFELDT, "Ezechiel als Zeuge für Sanheribs Eingriff in Palâstina", PJB 27 (1931), 58-66 (= Kleine Schriften, I, 1962,239-246). - ID., "Hesekiel Kap. 16 als Geschichtsquelle", JPOS 16 (1936),286-292 (= ibid. n. 1963, 101-106). 106 R. S. FOSTER, "A Note on Ezekiel XVII 1-10 and 22-24", VT 8 (1958),373-379. - M. GREENBERG, "Ezekiel17 and the Policy of Psametichus, lI", JBL 76 (1957), 304-309. - L. P. SMITH, The Eaglets) of Ezekiel17, ibid. 58 (1939),43-50. 107 H. JUNKER, "Ein Kernstück der Predigt Ezechiels", BZ NF 7 (1963),173-185. - K. KOCH, "Tempeleinlassliturgien und Dekalogue, em: Rad-Festschrift, 1961,45-60. 108 J. A. BEWER, "Beitrãge zur Exegese des Buches Ezechiel, 5. Hes 21,14-22", ZAW 63 (1951), 197-200. - F. DELITZSCH, "Das Schwertlied Ez 21,15-22", Zeitschr. f. Keilsschriftforschung 1885,385-398. - H. H. GUTHRIE,Jr., "Ezekiel 21", ZAW74 (1962), 268-281. 109 J. HEMPEL, "Eine Vermutung zu Hes 24,15ss.", ZAW 51 (1933), 312s. - J. L. KELSO, "Ezekiel's Parable of the Corroded Copper Caldron", JBL 64 (1945),391-393. 110 W. E. BARNES, "Ezekiel's Denunciation of Tyre", JThSt 35 (1934),50-54. - J. Ous, "Melek Sor Melqart?", ArOr 26 (1958), 179-185. - I. ENGNELL, "Die Urmenschvorstellung und das Alte Testament", SEA 22/23 (1957/1958), 265-289. - J. GARRETT, "A Geographical Commentary on Ezekiel XXVII", Geography 24 (1939), 240-249. - J. H. KROEZE, "The Tyre-Passages in the Book ofEzekiel", OuTWP 1961, 10-23.-C. MAcKAY, "The King of Tyre", ChQR 117 (1934), 239-258. - H. G. MAY, "The King in
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oráculos sobre o Egito'!', oráculos provenientes do segundo período de atividade.!" oráculo sobre os pastores e as ovelhas.!" oráculos sobre Edom, oráculos e relatos sobre a organização do novo Israel,'!' oráculos e relatos sobre a reconstrução externa de Israel.!"
Um outro passo consistiu em utilizar coleções contendo datas como base e arcabouço para a estruturação cronológica do livro, de sorte que sete coleções formam como que a linha mestra, vindas em seguida ao relato da vocação. Tais são: 3.16a+4-5; 8-11.13; 15-20; 24.1-24; 40-48; 2628.19; 22-32, As restantes coleções e perícopes isoladas que não têm data parece terem sido agrupadas com base na época de origem ou na interrelação dos assuntos, época e inter-relação estas que podemos deduzir a partir de seu conteúdo, de sorte que se entrecruzam pontos de vista cronológicos e pontos de vista de assuntos. Depois disto ocorreu uma série de intervenções no texto, entre as quais figura a revisão redacional do
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the Garden of Eden: A Study of EzekieI28,12-14", em: Essays Muilenburg, 1962, 166-176. - H. P. RÜGER, Das Tyrusorakel Ez 27, Diss., Tübingen, 1961. - W. H. ScHOFF, The Ship "Tyre", 1920. - S. SMITH, "The Ship Tyre", PEQ 85 (1953), 97-110. W. G. BALLANTINE, Ezekiel 32, 1892. - O. EISSFELDT, "Schwerterschlagene bei Hesekiel", em: Th. H. Robinson-Festschrift, 1950, 73-81. - J. PLEISSIS, Les prophéties d'Ézéchiel contre I'Égypte, 1912. W. EICHROOT, "Das prophetische Wãchteramt", em: Weiser-Festschrift, 1963,31-41. - P. AUVRAY, "Le prophête comme guetteuer" (Ez XXXIII, 1-20), RB 71 (1964), 191-205. W. H. BROWNLEE, "Ezekiel's Poetic indictment of the Shepherds", HThR 51 (1958), 191-203. - J. G. REMBOY, "Le thême du berger dans l'oeuvre d'Ézéchiel", Studii Biblici Franciscani Liber Annuus 11 (1960/1961), 113-144. J. G. AALDERS, Gog en Magog in Ezechiêl, 1951. - W. E. BARNES, "Two Trees Become One: Ezek XXXVII 16-17", JThSt 39 (1938),391-393. - J. A. BEWER, "Das Tal der Wanderer in Hesekiel39,ll", ZA W 56 (1938), 123-125; G. GERLEMAN, "Hesekielbokens Gog.", SEA 12 (1947), 148-162. - J. L. MYRES, "Gog and the Danger from the North in Ezekiel", PEFQSt 64 (1932), 213-219. - E. RIESENFELD, The Resurrection in Ezekiel XXXVII and the Dura-Europos Paintings, 1948. A. BERTHOLET, Hesekiels Verfassungsentwurf, 1896. - G. A. COOKE, "Sotne Considerations on the Text and Teaching of Ezequiel 40-48", ZA W 42 (1924), 105-115. - K. ELLIGER, "Die grossen Tempelsakristeien im Verfassungsentwurf des Ezechiel (42,lss.)", em: Alt-Festschrift, 1953, 79-103. - W. R. FARMER, "The Geography of Ezekiel's River of Life", BA 19 (1956), 17-22. - H. GESE, DerVerfassungsentwurf der Ezechiel (Kap. 40-48), 1957. - J. JEREMIAS, "Hesekieltempel und Serubbabeltempel", ZAW 52 (1934), 109-112.
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livro em estágio de formação. Dessas intervenções só uma, porém, altera o quadro histórico do profeta, a saber: a transposição de 3.16b-21,2227; 4.4-8; 24.25-27 para os seus lugares atuais. A impressão que tal fato nos suscita é a de que Ezequiel teria sido instalado desde o início como "pastor de almas", permanecendo silencioso durante a maior parte do tempo em que não estava pregando a palavra, ou ainda: é a de que ele teria indicado antecipadamente e por forma simbólica, ficando deitado por longo tempo, a duração do exílio, que ele apresenta como tendo um prazo prefixado. Por fim, o complexo dos oráculos a respeito das nações foi colocado em seguida aos oráculos de calamidades, pronunciados contra [udá e Jerusalém. Deste modo, a divisão tripartida do livro foi feita de acordo com o esquema escatológico de três membros, a saber: 1-24 25-32 33-48
ameaças contra [udá e Jerusalém, ameaças contra outras nações, promessas em favor de seu próprio povo.
Como se pode ver dos fragmentos descoláveis do rolo de Ezequiel, descoberto na gruta 11 de Qumran, o texto hebraico já estava fixado no mínimo em meados do séc. I a.c., numa recensão muito próxima daquela do texto massorético.!"
7. Personalidade de Ezequiel A partir das indicações de KLOSTERMANN,1I7 existe o problema da personalidade de Ezequiel. Pretendeu-se interpretar os diversos fenômenos da existência de Ezequiel, ligados em sua maior parte a experiências de arrebatamentos extáticos, a sua mudez (3.22ss) e o seu gesto simbólico de permanecer deitado (4.4-8), com sintomas de um distúrbio psíquico mais ou menos profundo, ou de uma enfermidade de Ezequiel, sintomas estes que iriam de traços patológicos até à esquizofrenia.!" Que esta hipótese
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W. H. BROWNLEE, "The Scroll of Ezekiel from the Eleventh Qumran Cave", RdQ 4 (1963/1964), 11-28. A. KLOSTERMANN, "Ezechiel", ThStKr 50 (1877),391-431. B. BAENTSCH, "Pathologische Zuge in Israels Prophetentum", ZWTh 50 (1907),52-81. - BERTHOLET. - F. GIESEBRECHT, Die Berufsbegabung der alttestamentlichen Propheten, 1897. - K. JASPERS, "Der Prophet Ezechiel", em: Kurt Schneider-Festschrift, 1947,7785. - KRATZCHMAR - PFEIFFER*. - STEUERNAGEL*.
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não seja exata, foi comprovado em mais de uma vez por argumentos sólidos e convincentes (HERRMANN, COOI
8. A pregação de Ezequiel e seus problemas Os problemas referentes à pregação de Ezequiel estão presentes desde há muito, juntamente com o costume de o chamarem, com certa freqüência, de "pai do judaísmo" e "pai da Apocalíptica" e, conseqüentemente, de o virem inserido na corrente da tradição sacerdotal e todo orientado para a Apocalíptica. Enquanto a segunda das referidas denominações se baseia numa interpretação errônea dos oráculos referentes a Gog (38s), faltando a Ezequiel qualquer uma das características do pensamento apocalíptico, a primeira parece que se pode apoiar em observações das mais diversas espécies. Por isso, alguns o designaram ao mesmo tempo como sacerdote e profeta (COOKE), enquanto outros vêem surgir, em primeiro plano, em muitas das suas perícopes, os interesses do homem de origem sacerdotal (HERRMANN), ou desaparecer inteiramente o profeta por trás do sacerdote (PROCKSCH)119. Outros, por outro lado, consideram sua teologia como a teologia do código sacerdotal (HAAc) ou do legislador no Pen119 O. PROCKSCH, Theologie des Alten Testaments, 1950, 305s8.
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tateuco (VAN DEN BORN), OU sua pregação como a radicalização e o enrijecimento proféticos do direito sacerdotal, juntamente com a invasão maciça de certas estruturas jurídicas e legais no discurso do profeta (ZIMMERU). Embora seja, antes de tudo, profeta, Ezequiel tem suas raízes, portanto, na tradição sacerdotal e sagrada (VON RAD).12O A esta tese se contrapõe a consideração de que ele depende, de modo geral, da teologia deuteronomista (BALLA),12l por cuja terminologia seu vocabulário foi em parte também influenciado. Uma opinião própria, expressa em forma extremada, foi defendida por REVENTWW, o qual, partindo da lei da Santidade, entendida como ritual de uma celebração cúltica (§ 20,3), com o qual o texto de Ezequiel tem freqüentes pontos de contato, e apoiando-se numa pesquisa feita exclusivamente na perspectiva da história das formas, interpreta os diversos modos de falar de Ezequiel como sendo reflexos dos diversos ângulos de um suposto ofício profético de Ezequiel. Este ofício é a continuação, em linha reta, do ofício do pregador que pronunciava bênçãos e maldições por ocasião das solenidades da festa da Aliança. A situação mudou, mas a forma permaneceu idêntica. O titular do ofício, isto é, o profeta, celebra a liturgia santificada. Todo o conteúdo e a forma de sua pregação foram determinados pelas tradições da festa da Aliança. Evidentemente, a base desta tese não é muito sólida. A lei da Santidade dificilmente pode ser entendida como um ritual que se recitava no culto, e as freqüentes glosas e revisões sacerdotais do texto de Ezequiel, admitidas quase universalmente, não podem ser consideradas como elementos originais das palavras do profeta. Além disso REVENTLOW não só absolutiza a "tradição da Aliança" de Israel, entendida como centro do AT, embora ela não represente senão um tema parcial e recente dentro de um complexo mais amplo, como também é levado a transcurar o elemento histórico e a negar a vinculação das palavras do profeta com a história de seu tempo.
Em face destas opiniões, a tarefa do estudioso consiste em captar toda a multiplicidade e variedade de aspectos das relações de Ezequiel com a tradição e com a teologia de sua época. Ezequiel é o primeiro profeta que mais utilizou tradições nãoisraelíticas, dentre as quais não poucas originariamente de natureza mítica. A partir de então, este fato se observa com maior freqüência, de sorte que o uso de tais tradições pode ser considerado, sem mais, como 120
]21
G. VON RAD, Theologie des Alten Testaments, 11, 1960 (1965, 4s ed.), 237s [em port.: Teologia do Antigo Testamento, ASTEjTargumim, São Paulo,2006. E. BALLA, Die Botschaft der Propheten, 1958,284s.
§ 60.
EZEQUIEL
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uma característica de origem tardia. O mesmo fato se baseia, evidentemente, em uma situação histórica, determinada pela mudança do estado de consciência que, por sua vez, foi influenciado, quando não provocado, pela deportação e pela situação de diáspora. No particular, além de um fundo cananeu-fenício (16; 23; 28; 29.1ss), pode-se observar, em Ezequiel, sobretudo o emprego de materiais e imagens, de usos cultuais etc., de origem mesopotâmica (1-3.9; 9.1ss; 14.21; 16.23s; 17.3s; 21.26s; 28; 29; 31; 32; 34; 44.1-3; 47). Ezequiel empregou também com freqüência um antigo fundo popular, constituído de representações, narrativas, cânticos e poesias (14.12ss; 16.17; 19; 21.13ss; 23; 26.19ss; 28; 31; 32.17ss) (KUHL). Uma outra característica peculiar de Ezequiel é uma severidade maior no julgamento da história, como se pode ver, p.ex., na reinterpretação das imagens de Israel como vinha (15), e do matrimônio entre Javé e Israel (16). Ele reinterpreta sobretudo a história de Israel como um todo (20.132), ao selecionar, ao omitir ou ao introduzir complementarmente determinados motivos, para mostrar que já no Egito o povo havia praticado a idolatria; para mostrar, portanto, que já desde então ele era pecador e que, apesar das ameaças e das intervenções cada vez mais severas de Javé, ele continuava rebelde e desobediente até o momento atuaL Na realidade, a influência das tradições narrativas é menor do que a influência das tradições míticas ou populares. Da história de Israel, Ezequiel extraiu principalmente os motivos provenientes da saga: 14.12ss;21.13ss; 26.19ss; 28.13; 31.9; 32.27, e das bênçãos de Jacó (Gn 49): 15; 17.1-10; 19.1-9,10-14; 21.32. Além disso, ele se relaciona freqüentemente também com Amós, Oséias, Isaías e Miquéias. A ligação profunda de Ezequiel com a teologia de sua época transparece nos seus freqüentes pontos de contato com Jeremias, do qual talvez até mesmo dependa (MILLER); com a teologia deuteronomista, em sua maneira de refletir sobre a história, de considerar a Lei, no seu voltar-se para o indivíduo, na sua exigência de unidade tanto cultual como do lugar do culto, e no seu modo de julgar a realeza; com a teologia sacerdotal da lei da Santidade, não obstante as diferenças colaterais de estilo e de temas, que talvez provenham de uma coleção jurídica de Jerusalém, anterior ao exílio (§ 20,3); e, por fim, com as concepções e usos cultuais, que Ezequiel evidentemente bem conhecia, como antigo sacerdote que era. Mas o ponto de partida decisivo para Ezequiel é a experiência de sua vocação, em que ele, ao contrário da concepção tradicional de que Deus e
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o país estão interligados e que é somente no país que se pode servir a Deus, toma consciência de que a presença divina não está ligada a um lugar, e que o fiel, pelo contrário, pode sentir esta presença onde quer que habite. Neste ponto verifica-se uma ruptura com a tradição. Não é só na pátria que o encontro com Deus é possível,' como se o permanecer no estrangeiro equivalesse à morte. Pelo contrário, é no comportamento interior e exterior do homem que estão encerradas a vida e a morte, em qualquer lugar que ele viva e em qualquer situação que esteja. Ezequiel não está preocupado com uma atestação objetiva do agir de Deus, mas com o reto comportamento do homem e com a respectiva reação da parte de Deus. Neste relacionamento, o homem é responsável por si próprio e é quem deve decidir a respeito de sua salvação ou de sua ruína (18.1-20; 33.1ss). O elemento determinante é o comportamento no momento decisivo no qual Deus examinará o indivíduo à luz desse mesmo comportamento. Deste modo, é o agir em cada um desses instantes que determina praticamente o julgamento de Deus, cabendo ao homem deixar-se exortar constantemente à conversão, e constantemente também se converter (3.16b-2l). É por isso que pesam tanto os pecados do presente, que correspondem aos pecados de toda a história: a abominação) isto é, as instituições e as ações da idolatria, e a culpa de sangue e o crime, isto é, os delitos éticos e sociais. Estes delitos devem conduzir, por necessidade interna, ao juízo anunciador de destruição, que Ezequiel via então posto em prática, com referência à Jerusalém, na queda da cidade. Do mesmo modo que Ezequiel, em face do pecado e do julgamento, se apropria da antiga exortação profética à conversão (18.30s) e deixa ocasionalmente entregue ao homem o encargo de executar a mudança que se lhe exige, assim também, e com mais freqüência, ele a espera como conseqüência do ato salvador de Deus, isto é, como perdão das culpas que o próprio homem não consegue pagar (36.25), como renovação do centro de sua vida, com um coração que já não será mais um coração frio, insensível e incapaz de se modificar (11.19s; 36.26), e como dom do Espírito divino, que impele o homem a fazer a vontade de Deus (11.19; 36.27). O homem redimido e renovado é capaz então, como por si mesmo, de querer e de realizar o que é reto, em harmonia com os mandamentos divinos. Deste modo, a vontade de Deus se cumpre sobre a terra e o homem forma juntamente com outros uma comunidade que vive em íntima união, não somente entre si, mas também, e principalmente, com Deus (11.20; 36.28).
§ 61. OSÉIAS
§ 61. OSÉIAS ATD: A. WEISER, 3i1 ed., 1959; K. ELLIGER, 4i1 ed., 1959. - BK: H. W. WOLFF, 1961. - BOT: D. DEoEN, 1953/56. - COT: C. VAN GELDEREN - W. H. GISPEN, 1953; G. CH. AALDERS, 1958. - HAT: TH. H. ROBINSON - F. HORST, 2i1 ed., 1954. - HK: W. NOWACK, 3i1 ed., 1922. - HS: J. LIPPL - J. THEIS, 1937; H. JUNKER, 1938. - IB: J. MAUCHLINE - J. A. THOMPSON - H. E. W. FOSBROKE - J. D. SMART - R. E. WOLFE - CH. L. TAYLOR, [r. - D. W. THOMAS-R. C. DENTAN, 1956. -ICC: W. R. HARPER-G. A. SMITH- W. H. WARO - J. A. BEWER - H. G. MITCHELL, 1905/12 (1948/53) - KAT: E. SELLIN, 2i1 e 8i1 ed., 1929/30. - KeH: F. HITZIG - H. STEINER, 4i1 ed., 1881. - KHC: K. MARTI, 1904. - SAT: H. GRESSMANN, 2i1 ed., 1921; H. ScHMIDT, 2i1 ed., 1923; M. HALLER, 2i1 ed., 1925. - SZ: C. VON ORELLI, 3i1 ed., 1908. - Especiais: B. DuHM, 1910 e ZAW 31 (1911),1-43,81-110,161-204. - HH. LAETSCH, 1956. - B. M. VELLAS, 1849/50. - J. WELLHAUSEN, 4i1 ed., 1963. A. ALLWOHN, Die Ehe der Propheten Hosea in psychoanalytischer Beleuchtung, 1926. - R. BACH, Die Erwiihlung IsraeIs in der Wüste, Diss. Bonn, 1952. - L. W. BATTEN, "Hosea's Message and Marriage", JBL 48 (1929), 257-273. - E. BAUMANN, '"Wissen um Gott' bei Hosea als Urform von Theologie?", EvTh 15 (1955),416-425. - W. BAUMGARTNER, Kennen Amos und Hosea eineHeilseschatologie?, 1913. - F. BUCK, Die Liebe Gottes beim Propheten Osee, 1953 - K. BuoDE, "Der Abschnitt Hosea 1-3", ThStKr 96/97 (1925), 1-89. - lo., "Zu Text und Auslegung der Buches Hosea", JBL 45 (1926), 280-297; JPOS 14 (1934), 1-41; JBL 53 (1934), 118133. - lo., "Hosea 1 und 3", ThBl13 (1934), 337-342. - M. J. Buss, A Form-Critical Study in the Book of Hosea with Special Attention to Method, Diss. yale University, 1958. - G. FARR, "The Concept of Grace in the Book of Hosea", ZA W 70 (1958),98-107. G. FOHRER, "Urnkehr und Erlõsung beim Propheten Hosea", ThZ 11 (1955),161-185. - H. FREY, "Der Aufbau der Gedichte Hoseas", WuD 5 (1957),9-103. - H. L. GINSBERG, "Studies in Hosea 1-3", em: Kaufmann [ubilec Vol, 1960, 50-69. - R. GORDIS, "Hosea's Marriage and Message: a New Approach", HUCA 25 (1954), 9-35. - A. HERMANN, "Ehe word Kinder des Propheten Hosea", ZA W 40 (1922), 287-312. - P. HUMBERT, "Le trois premiers chapitres d'Osée", RHR 77 (1918), 157-171. - lo., "Osée le prophête bedouin", RHPhR 1 (1921),97-118. - E. JACOB, "L'héritage tananéen dans le livre du prophete Osée", ibid. 43 (1963), 250-259. - J. LINDBWM, Hosea, literarisch untersucht, 1927. - J. L. MCKENZIE, "Knowledge of God in Hosea", JBL 74 (1955), 2227. - H. S. NYBERG, "Das textkritische Problem der Alten Testaments am Hoseabuche demonstriert", ZAW 52 (1934), 241-254. - lo., Studien zum Hoseabuch, 1935. - lo., Hoseaboken, 1941. - G. ÓSTBORN, Yahwe und Baal, 1956. - J. RrEGER, Die Bedeutung der Geschichte für die Verkündigung der Amos und Hosea, 1929. - TH. H. ROBINSON, "Die Ehe der Hosea", ThStKr 106 (1934/35),301-313. -H. H. ROWLEY, "The MarriageofHosea", BJRL,
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1. Relações pessoais de Oséias A respeito das relações pessoais de Oséias, além do nome do pai, que se chamava Beeri, sabemos apenas aquilo que nos informam os capítulos 1 e 3 com relação à sua vida conjugal e a seus filhos. Isto se explica, menos pelo fato de que o aspecto biográfico teria cedido o passo à palavra que lhe foi confiada, do que pela tradição judaíta posterior a respeito de suas palavras, tradição esta que não se interessava pelos detalhes da vida do profeta. Como quer que seja, foi no Reino do Norte, efetivamente, que ele exerceu sua atividade e talvez tenha nascido. Não se pode concluir que ele tenha sido camponês ou criador de gado, só pelo fato de usar imagens tiradas da natureza e da vida animal (SELLIN), nem que tenha sido sacerdote, pelo fato de conhecer a situação dos sacerdotes (4.1ss; 5.1ss) (DUHM) ou que tenha pertencido a uma corporação de nabis, pelo fato de usar palavras de escárnio (9.7) (EISSFELDT*, SELLIN-RosT*). Ele pertencia, no entanto, à classe dos eruditos, como nos mostram seu conhecimento a respeito do passado, sua maneira de julgar a história e o presente e seu modo de exprimir-se (TH. H. ROBINSON, WEISER). Se levarmos em conta a influência da doutrina sapiencial sobre sua linguagem, necessário se torna admitirmos que ele foi formado em uma escola correspondente, que servia para a educação sobretudo daqueles que se destinavam a exercer ofícios na corte. Já desde muito cedo Oséias se sentiu chamado ao ministério profético, porque o seu casamento (1.2s) deve ser antes colocado na idade viril, como aliás era habitual, e porque sua atividade profética se estende por quase três décadas. Esta atividade começou ainda na dinastia de [eú, como
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bem nos mostram, além das palavras de ameaça em 1,4, também o título de abertura 1.1, com a referência a Ieroboão Il (786/782 =753/746), a quem sucedeu o filho Zacarias, em breve assassinado. A menção adicional dos quatro reis judaítas, que foi acrescentada posteriormente tem por função mostrar que Oséias é contemporâneo de Isaías. Sua atividade se estendeu muito além do final da dinastia de [eú, Ele assistiu à confusão interna do país e ao assassinato do rei (7.7; 8.4), à guerra sirio-efraimita (5.8ss) e ao esforço da política externa do último rei, Oséias (7.11s; 12.2); mas evidentemente já não chegou a ver a queda de Samaria e a ruína do Reino do Norte. Como época de sua atuação devemos admitir, portanto, os anos de 755/750- 725. Como lugar de sua atividade devemos pensar sobretudo na Samaria, incluindo também eventualmente um santuário como o de Betel ou Guilgal.
2. Mulher e filhos de Oséias
o problema mais discutido e controvertido é aquele que diz respeito ao casamento e aos filhos de Oséias, de conformidade com os relatos 1 e 3. De acordo com o relato 1, redigido na terceira pessoa gramatical, Oséias deve casar-se com uma 'eset zmúnim, "uma mulher de prostituição", chamada Gomer filho de Deblaim e com ela ter filhos a quem logo dá os nomes simbólicos de "Jezrael", "Aquela de quem não se teve compaixão" e de "Não meu povo". Conforme o relato 3, formulado na primeira pessoa gramatical, o profeta deve casar-se uma segunda vez - com uma mulher dada ao adultério, que ele deve isolar do seu meio ambiente por um tempo prolongado, e nem sequer deve procurá-la. Só o caráter chocante dessas descrições levou às mais diversas tentativas de explicação. O profeta, entretanto, não podia casar-se com uma prostituta, como esclareceu JERÔNIMO: quia si fiat turpissimum est. As hipóteses podem ser agrupadas em diversos tipos fundamentais: a) O relato 1 é entendido das seguintes maneiras: 1) Deve ser interpretado em sentido alegórico (GRESSMANN, YOUNd 22 e outros). Assim, ele não narra a história de um casamento real, mas é a roupagem literária de um oráculo de ameaça. - 2) Ele narra um acontecimento histórico real, mas, o texto sofreu alguns cortes, para liberar Gomer de qualquer censura (Oséias se casou com uma mulher e teve filhos com ela: HOLSCHER)I23, ou 122
YOUNC*
123
G.
245s.
HOLSCHER,
Geschichte der israelitischen und jüdischen Religion, 1922, 106.
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não é entendido em sentido literal, de sorte que o profeta ter-se-ia casado com uma mulher irrepreensível e só mais tarde é que ela se lhe teria tornado infiel (WELLHAUSEN). - 3) o relato conta a história de um casamento real, que Oséias teria celebrado, de caso pensado e em plena consciência, com uma mulher de vida desregrada (HEERMANN, VAN DEN BORN124 e 2i1 ed., outros). Este ponto de vista foi exposto ocasionalmente de maneira notavelmente romântica (GUNKEL)125 ou explicado em sentido psicanalítico (ALLWOHN, SELLERS).126 b) O relato 3 é entendido das seguintes maneiras: 1) Deve ser interpretado em sentido alegórico, talvez como relato alegórico paralelo a 1 (HUMBERT, GRESSMANN, M Ay127 e outros). - 2) É paralelo a 1 e deve ser entendido em sentido real. Nesse relato é o próprio Oséias quem descreve aquilo que é narrado por um terceiro em 1 (LINDBLOM, MOWINCKEL,128 GORDIS: segunda revelação). - 3) É considerado como acréscimo posterior, porque tem caráter de promessa (HÚLSCHER, BATTEN, STINESPRING) . c) O processo mais freqüente consiste em reunir os relatos 1 e 3 e considerá-las, junto com 2, como uma exposição contínua (assim especialmente BUDDE, H. SCHMIDT), ou ver em 1 e 3 relatos concernentes a dois estágios de um processo mais longo (EISSFELDT*). De acordo com este ponto de vista, no "romance conjugal" de Oséias, como alguns o têm chamado, trata-se de uma e mesma mulher Gomer, que teria sido infiel ao profeta durante algum tempo após o casamento, caindo, em seguida, em mãos estranhas, seja por fuga, seja por expulsão, e tendo sido, por fim, resgatada por Oséias, a fim de que ela se corrigisse. Com base na hipótese de que se cultivavam ritos de iniciação nos santuários javistas de Canaã e de que a mulher de Oséias se teria submetido a eles, enquanto o profeta mesmo só com o decurso do tempo teria reconhecido o caráter idolátrico de tal procedimento (SELLIN-RosT*), é que WOLF, estendendo os ritos a todas as jovens israelitas em idade de casar, desenvolveu uma espécie de romance conjugal teológico, de sentido simbólico e comparativo. Contra esta hipótese pronunciou-se RUDOLPH. 129 124 125 126 127
128 129
A. VAN DEN BoRN, Desymbolische handelingen derOud-Testamentische profeten, 1935, 52s. H. GUNKEL, "Hosea", RGG IF, 1928, 2021ss. O. SELLERS, "Hosea's Motives", AJSL 41 (1924/1925),243-247. H. G. MAY, "An Interpretation of the Names of Hosea's Children", JBL 55 (1936), 285-291. S. MOWINCKEL, em: Det Gamle Testamentet, I1I, 1944, 576s. W. RUOOLPH, "Prãparierte Jungfrauen?", ZAW 75 (1963),65-73.
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Contra a interpretação alegórica do relato 1 depõem não apenas a impossibilidade de entender o nome de Gomer em sentido alegórico, como também os nomes simbólicos que são dados em Is 7.3; 8.1-4. Contra as atenuações introduzidas depõem não só o conteúdo explícito e inequívoco das palavras como também a interrupção do metro, com os cortes feitos arbitrariamente. Contra a interpretação alegórica de 3, falam não apenas o estilo autobiográfico, mas ainda a impossibilidade de entender a notícia do v. 2 sobre o preço de compra, em sentido alegórico. Contra a hipótese de que se trata de um relato paralelo ai, tem-se o fato de que foram introduzidas mudanças no texto, e de que as informações de 1.3 e 3.3 (geração de filhos e enclausuramento) são totalmente contraditórias entre si. Contra a exclusão do capítulo, como se se tratasse de um acréscimo posterior, existe a presença de outros oráculos de salvação em Oséias. Contra a reunião dos dois relatos em um romance conjugal mais ou menos detalhado apresenta-se não apenas o sentido claro das palavras de 1. 2, que desde o início classificam a mulher como de vida desregrada, como também a ausência de qualquer alusão, seja a uma experiência conjugal desoladora para Oséias, seja à fuga ou à expulsão de Gomer, e ainda a diferença de estilo dos relatos, e a introdução óbvia de uma segunda mulher (3.1). d) Por isso, forçoso é admitir que 1 e 3 narram a história de dois casamentos de Oséias com duas mulheres diferentes."? Ele se casou realmente, primeiro com uma prostituta, provavelmente uma daquelas prostitutas do templo (H. SCHMIDT, IH. H. ROBINSüN e outros) e com ela teve filhos, a quem deu nomes simbólicos, para anunciar assim o destino futuro de Israel, praticando destarte uma grandiosa ação simbólica. Em época posterior, ele celebrou um outro casamento com uma segunda mulher (DuHM, HEERMANN, VAN DEN BORN, VRIEZEN)l31 - desta vez também como ação simbólica que, em vez de um juízo de destruição, anuncia um outro modo de proceder de Javé. Enquanto o primeiro casamento, juntamente com a ação de dar nome aos filhos, introduz, como se infere de seu próprio significado e também de acordo com a introdução em 1. 2, a atividade profética de Oséias, o segundo casamento ocorreu dentro da moldura do início da pregação de salvação, já no final de sua atividade. O contraste entre esses dois casamentos nos mostra como o profeta do julgamento se tornou
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Mas não se trata de dois casamentos simultâneos (J. M. P. SMITH, The Prophets and their Times, 1942, 2il ed. 70-76, nem da reabilitação de uma prostituta ao lado do casamento (PFEIFFER*). VRIEZEN* (1948).
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profeta da esperança e da redenção. A partir daí não se pode deduzir um período bem preciso da atividade de Oséias, mas antes uma mudança paulatina em sua pregação.
3. Oráculos Além dos dois relatos 1 e 3, foram também conservados e transmitidos numerosos oráculos da pregação de Oséias, formulados mais freqüentemente na primeira pessoa de Javé do que como palavras do profeta, com a formulação na terceira pessoa gramatical de Javé. Percebe-se que elas derivam de Oséias, pelo emprego ocasional de formas e temas jurídicos e pela influência da sabedoria formativa, presente em grande número de imagens e de comparações aplicadas a Javé e a IsraeL Evidentemente, é muito difícil traçar os limites precisos entre os oráculos isolados, porque faltam muitas vezes as fórmulas introdutórias e conclusivas. Por isso, hesita-se entre aceitar oráculos pequenos em maior número (TH. H. ROBINSON), e admitir oráculos mais amplos (EISSFELDT*, FREY). WOLFF admitiu, recentemente, como constituindo "unidades querigmáticas", determinadas séries de oráculos, que provêm de um mesmo curso de pregação e foram estabelecidas logo em seguida ao ato de pregação, como "esboços de entrada em cena". Entre os oráculos, devem-se contar tanto os rascunhos dos ouvintes como a mudança de olhar do profeta para um outro grupo de presentes. Mas não aparece de todo claro o que se pretende dizer. Enquanto 4.4-19132 e 5.1_7133 são considerados como esboços de entrada em cena, as passagens 2.4-17, um aglomerado frouxo de oráculos, não obstante a homogeneidade da situação, e 2.18-25, uma seqüência livre de oráculos e fragmentos, devem formar também, apesar de tudo, uma verdadeira unidade. Em princípio, deve-se perguntar se é possível admitir, sem mais, a existência de esboços de entrada em cena de um profeta, ou se, pelo contrário, não foram reunidas coleções de oráculos isolados, provenientes de épocas e situações diversas, com base em palavras-chaves ou de acordo com o seu conteúdo. O exemplo de outros livros proféticos torna esta segunda hipótese mais provável.
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H. JUNKER, "Textkritische, formkritische und traditionkritische Untersuchung zu Os 4,1-10", BZ NF 4 (1960), 165-185. - N. LoHFINK, "Zu Text und Forro von Os 4,4-5", Bib142 (1961), 303-332. - L. ROST, "Erwãgungen zu Hosea 4,13s.", em: BertholetFestschrift, 1950,451-460. - I. ZOLLI, "Hosea 4,17-18", ZAW 56,1938),175. K. ELLIGER, "Eine verkannte Kunstform bei Hosea", ZAW 69 (1957), 151-160.
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A tese segundo a qual se deve negar a Oséias a autoria da maior parte dos oráculos de salvação (MARTI, STINESPRING), não pode sustentar-se sob esta forma. Enquanto 2.1-3 seguramente não provém dele,'!' a maioria dos oráculos, principalmente em 2.16ss, são oseianos, tanto pelo estilo como pelo conteúdo. Também não se pode negar a Oséias a autoria de todas as menções do nome de [udá (NOWACK, MARTI). É certo que o livro de Oséias sofreu uma revisão judaíta, que acrescentou a palavra [udá em maior número, mas para 5.8-14, ela deve ser considerada como original, por causa da referência à guerra siroefraimita. Como oráculos de Oséias, cujo texto foi muito maltratado, podemos assinalar as seguintes pequenas unidades - ordenadas de acordo com os gêneros literários: ameaça: 5.8s; 9.7a,11-13,14; 11.10; 13.9-11; 13.14,15; 14.1. ameaça, com fundamentação: 2.lOs,13 + 15; 4.4-6; 5.10; 7.1s,13a; 8.13,7-10; 1O.6b-8,9s,13b-15; 12.11s. invectiva e ameaça: 4.7-10,16-19; 5.1s,12-14; 7.11s; 8.4b-6,11-13; 9.16,9,15-17; 10.ls; 11.1-7; 13.1-3,5-8. invectiva: 4.12-14; 5.3s,6s; 6.7-11; 7.3-6,7,8s,15s; 8.4a; 9.8,10; 10.5-6a; 12.2,8s; 13.12s. exortação: 1O.12-13a; 13.4; com ameaça condicional: 2.4s. oráculo profético de julgamento: 4.1s. oráculos de reflexão histórica: 5.11; 10.11; 12.3-7,13-15. liturgia profética: 5.15-6.6; 14.2-9. palavras ocasionadas por uma discussão: 9.7b; 10.3s. promessa: 2.16s,18s + 21s,20,23-25; l1.8s; 12.10. Com exclusão de pequenas glosas, devem ser considerados como acréscimos posteriores: 2.1-3,6s,8s,12,14;4.15; 5.5; 7.13b-14; 11.11; 12.1; 14.10.
4. Tradição Como já vimos no capo 3, formulado na primeira pessoa gramatical, Oséias participou diretamente na fixação por escrito de seus oráculos e relatos. É de supor que eles tenham sido registrados logo em seguida à pregação e levados sãos e salvos para o reino meridional de [udá, depois da queda do Reino do Norte. Deste modo Oséias é o único profeta norteisraelita cuja tradição própria foi conservada.
134
Posição diferente: H. W. WOLFF, "Der grosse Jesreeltag", EvTh 12 (1952/1953), 78104 (= GesammeIte Studien zum AIten Testament, 1964, 151-181).
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OS LIVROS PROFÉTICOS
Os caps. 1-3 constituem uma coleção parcial de oráculos e relatos sobre ações simbólicas e por isso não formam uma exposição literária homogênea (BuODE) nem uma coleção de memoralia [coisas notáveis] (WOLF). O relato 1. 2-9, redigido na terceira pessoa gramatical e tratando do primeiro casamento e do nome dado aos filhos, e que apesar do estilo pode remontar a Oséias, cronologicamente falando constitui corretamente o começo. A ele corresponde o relato 3 que trata do segundo casamento e data do período final da atividade de Oséias. No capítulo 2135 foram introduzidas palavras que se encaixam no contexto; primeiro introduziram-se palavras de ameaças: 2.4-15* e a seguir palavras portadoras de promessas: 2.16-25. Deste modo, a coleção contrapõe um ao outro os dois estágios da pregação do profeta: ameaças no início; promessas de salvação no finaL Os capítulos 4-14 constituem na forma atual uma grande coleção de oráculos, onde predominam as invectivas e as ameaças e na qual os dois temas principais da polêmica de Oséias situam-se no ponto central: a crítica ao culto, em particular contra o culto cananeu ou o culto influenciado por aquele, a crítica à realeza e à sua política, que se apoiava em meios humanos de poder. O conjunto parece ser constituído, por sua vez, também de várias coleções, que foram organizadas por palavraschaves ou pela semelhança dos assuntos. Assim, p.ex., figuram lado a lado os oráculos que datam da guerra sirio-efraimita (5.8-14)136 e os oráculos que contêm referências à antiga história de Israel 12.137 Mas, em conseqüência da fusão, tais detalhes são mais de supor do que propriamente de captar com toda clareza. De qualquer modo, a coleção não remonta ao próprio Oséias.
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C. H. GOROON, "Hos 2,4-5 in the Light ofNew Semitic Inscriptíons", ZAW 54 (1936), 277-280. - P. HUMBERT, "La logique de la perspective nomade chez Osée et l'unité d'Osée 2,4-22", em: BZAW 41, 1925, 158-166. - C. KUHL, "Neue Dokumente zum Verstãndnis von Hosea 2,4-15", ZAW 52 (1934), 102-109. A. ALT, "Hosea 5,8-6,6, ein Krieg und seine Folgen in prophetischer Beleuchtung", NkZ 30 (1919), 537-568 (= Kleine Schriften, 11, 1953, 163-187). P. R. ACKROYD, "Hosea and [acob", VT 13 (1963),245-259. - M. GERTNER, "An Attempt at an Interpretation of Hosea XII", ibid. 10 (1960, 272-284. - H. L. GINSBERG, "Hosea's Ephraim, more Fool than Knave", JBL 80 (1961), 339-347. - E. JACOB, "La femme et le prophete", em: Hommage Vischer, 1960, 83-87. - TH. C. VRIEZEN, "Hosea 12", NThTt 24 (1941), 144-149. - ID., "La tradition de [acob dans Osée 12", OTS 1, 1942,64-78.
§ 61. OSÉIAS
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Enquanto EISSFELDT* vê reunidos em 4-9.9 oráculos proferidos contra o culto e contra os abusos políticos, e em 9.10-14.10 oráculos que, numa visão retrospectiva da história, atribuem ao passado a causa da pecaminosidade de Israel, WOLFF distingue os dois complexos seguintes da tradição: 4-11 e 12-44, cada um deles com vários "esboços de entrada em cena", dos quais o segundo data do período final do Reino do Norte sob Salmanasar V.
É possível que partidários ou amigos do profeta - pois não há motivos para se falar em alunos ou discípulos tenham-se preocupado em fazer com que a tradição, que talvez ainda constasse de coleções isoladas, chegasse a [udá, Aí, como nos permite supor o acréscimo: e Davi seu rei (3.5), ela foi coletada e revista numa perspectiva judaíta, ainda antes do exílio (cf. 1.7; 4.15; 5.5). O mais provável é que isto tenha sido feito na época deuteronomista, com seu gosto pelo livro, época na qual também surgiu o rolo manuscrito de Jeremias. Desta sorte, é partindo daí que se explica o tom às vezes deuteronomista, resultante da revisão. A redação definitiva teve lugar durante o exílio e no começo do pós-exílio. É desta redação que provém a cláusula conclusiva 14.10, que é uma sentença sapiencial e nos permite concluir que, embora tivesse desaparecido o interesse pelo reino setentrional de Israel, o livro foi conservado como manual de informação a respeito da atuação de Javé no destino dos piedosos e dos apóstatas.
5. Pregação Sob muitos aspectos, SNAITH caracterizou com precisão o profeta e sua pregação a saber: é da sua experiência de Deus que lhe provêm, de um lado, a idéia da religião como relação pessoal com Deus e, de outro lado, a condenação severa dos pecados e a ameaça de julgamento. Mas ele prega também uma esperança de salvação, cujo conteúdo é expresso nos vocábulos "direito", "justiça", "fidelidade" e "misericórdia" (2.21). No que se refere, porém, às raízes de Oséias, tanto na esfera espiritual quanto na esfera da tradição, existe uma variada gama de propostas. De um lado, alguns derivaram sua crítica ao presente, a partir de um ideal nômade (HUMBERT, entre outros), embora a época do deserto não seja para ele modelo, enquanto tal, mas somente enquanto época do primeiro amor entre Javé e Israel. Outros o vêem em atitude severamente anticananéia (OSTBORN), ou assumindo certos elementos
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OS LIVROS PROFÉTICOS
cananeus em doses "homeopáticas" e dando-lhes uma feição javista (JACOB), ou aproximando-se de certos círculos levíticos e protodeuteronomistas (WOLF). Já outros consideram Oséias, o profeta, ao mesmo tempo como político que inicialmente reclamava a submissão de Israel aos daviditas e que, por fim, esperava a reunificação de todo o Israel sob um único soberano (CAQUOT); ou como alguém inteiramente ligado ao culto e que não deseja senão acabar com as aberrações e abusos cultuais (VUILLEUMIER), ou que na concepção do amor de Javé, p.ex., se inspira em uma antiga tradição da Aliança (MORAN, LOHFINK.138 Também se acreditou ter encontrado em Oséias uma tradição, de resto desconhecida, a respeito da descoberta de Israel no deserto (BACH).
Mas, como os outros profetas anteriores a Jeremias, Oséias também não conhece uma teologia da Aliança. As poucas vezes em que o termo b'rit aparece, não toca na relação Javé- Israel.l" Da fórmula posterior de mútuo compromissov" encontra-se apenas um pré-estágio (1,9). Para caracterizar as relações entre Javé e Israel, Oséias se utiliza, como mais tarde também o jovem Jeremias, de imagens e de comparações tiradas da vida familiar, da flora e da fauna: os israelitas são filhos de Javé o qual, como pai, os chamou do Egito (11.1ss). As relações entre Javé e Israel são descritas como de tipo matrimonial em 1.2ss; 2.18,3, onde 1.2, em termos da natureza, chega mesmo a chamar o país, e não o povo que nele habita, de mulher de Javé. Estas relações, que são fundamentadas na libertação do Egito (12.10; 13.4) Oséias não as vincula à eleição do povo, mas, correspondentemente à relação pessoal pressuposta, ao amor de Deus (11.1). As relações tranqüilas da época de Moisés e do deserto (9.10) cessaram desde o momento em que se conheceu o culto de Baal e a vida de prazeres da terra de cultura (9.10; 11.1s; 13.5-8). Ao longo de sua história, e apesar das exortações por parte dos profetas e da palavra de Javé (6,5), o povo continua rebelde até o presente (1.4; 9.9; 10.9) - uma posteridade digna de Jacó que lhe é apresentado como seu modelo pérfido (12.3-7). Assim, em razão do pecado, Oséias vê primeiramente apenas o julgamento: a ruína como aquela de Adama e de Seboim (11.8) ou o anulamento do Êxodo e a nova escravidão (9.1-6; 11.1-7). 138
N. LOHF1NK, "Hate and Lave in Osée 9,15", CBQ 25 (1963), 417. - W. L. MORAN, "The Ancient Near Eastern Background of the Lave of God in Deuteronomy", ibid. 77-87.
139
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2.20: pacto com os animais; 6.7 e 10.5: acordo entre o rei e o povo; 12.2: aliança política externa; 8.1: de origem secundária. R. SMEND, Die Bundesformel, 1963.
§ 62. JOEL
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Como possibilidade de salvação Oséias vê primeiramente a conversão (5.15-6.6),141 que traz consigo a graça (lO.12-13a; 14.2-9). Mas ele é obrigado a dar-se conta de que o homem por si só não é capaz de se libertar da situação de perdição em que se envolveu (5.3s; 13.12s), e de que a própria culpa constitui uma barreira para se chegar até Deus (6.11b-7.2). Nesta altura, Oséias lança-se a um passo decisivo em direção à crença na redenção (FOHRER). A graça divina não age somente depois da conversão, que cabe ao homem realizar mas é, ao contrário, a primeira a entrar em ação, ao passo que só depois é que a decisão e o agir do homem se lhe seguem e lhe respondem. Esta crença na redenção se inicia em 12,10 e 3. É na volta às condições pré-palestinenses que Israel reencontrará em toda a concretude as fontes de sua fé, para começar uma nova era. Javé simplesmente cortejará Israel, para que este se deixe socorrer. Depois disto, voltará à Palestina, a fim de viver, como nos dias de sua juventude, em íntima e inviolável união com Deus142 (2.16-25). Se no começo da pregação de Oséias situa-se a maldição contra o povo apóstata, sobre quem pesa a ameaça de perdição, por causa de seus pecados (1.2-9), no fim está a mudança da maldição em bênçãos (2.23-25), por virtude da graça de Deus que tomou possível a transformação total de Israel.
§ 62. JOEL Cf. os comentários relativos ao § 61 - Especiais: M. Brc, 1960. KUTAL, 1932. - G. M. RINALDI, 1938. G. AMON, Die Ablassungszeit des Buches[oel, Diss. Würzburg, 1942. - J. BOURKE, "Le jour de Yahvé dans [oêl", RB 66 (1959), 5-31, 191-212. - W. CANNON, '''The Day of the Lord' in [oel", ChQR 103 (1927),32-63. - L. DENNEFELD, Les problêmes du livre de [oêl, 1926. - H. HOLZINGER, "Sprachcharakter und Ablassungszeit des Buches [oel", ZAW 9 (1889), 89-131. - K. JENSEN, "Inledningsspõrgmaal, i [oels bog", DTT 4 (1941), 98-112. - A. JEPSEN, "Kleine Beitrãge zum Zwõlfprophetenbuch L", ZAW 141
142
F. KÓNIG, "Die Auferstehungshoffnung hei Osea 6,1-3", ZKTh 70 (1948), 94-100.H. ScHMIDT, "Hosea 6,1-6", em: Sellin-Festschrift, 1927, 11-126. - J. J. STAMM, "Eine Erwiigung zu Hos 6,1-2", ZAW 57 (1939), 266-268. Para exprimi-lo, Oséias utiliza a expressão: daai'lohim; assim, com E. BAUMANN, " 'Wissen un Gott' bei Hosea als Unform der TheoIogie?", EvTh 15 (1955),416-425. - W. EICHRODT, "The Holy One in Your Midts", Interpr 15 (1961), 259-273. - De outra opinião: H. W. WOLFF, " 'Wissen um Gott' bei Hosea al Unform der Theologie", EvTh 1'2 (1952/1953),533-554; cf. também 15 (1955),426-431.
Os LIVROS
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56 (1938), 85-96. - A. S. KAPELRUD, Joel Studies, 1948. - H. J. KRITZINGER, Die profesie van JoeZ, 1935. - E. O. A. MERX, Die Prophetie des [oel und Ihre AusZeger von den iiltesten Zeiten bis zu den Reformatoren, 1879. - J. M. MYERS, "Some Considerations bearing on the Date of [oel", ZA W 74 (1962), 177-195. - O. PLOGER, Theokratie und EschatoZogie, 2a ed., 1962. - M. TREVES, "The Date of [oel", VT 7, (1957), 149-156. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Joel
o título (1.1) nada nos informa a respeito do profeta a não ser sobre o seu nome: [oel, filho de Fatuel. O gênero, o tempo e o lugar de sua atividade, bem como a forma como surgiu o livro devem ser deduzidos a partir deste. No texto massorético o livro é dividido corretamente em quatro capítulos, ao passo que a versão dos LXXe a Vulgata reúnem os capítulos 2-3 em um só, de número 2, e LUTERO junta os capítulos 3 e 4 em um único, de número 3.143 Do ponto de vista do conteúdo são três os temas com que o livro se ocupa: os capítulos 1 e 2 tratam da praga dos gafanhotos e da seca, sendo ambas interpretadas como prenúncio da aproximação do dia de Javé. Duas vezes [oel conc1ama a se publicar um dia de penitência geral, para colocar um paradeiro à catástrofe. Certos oráculos de Javé contêm a promessa de uma salvação futura para o povo. O capítulo 3 promete a efusão do Espírito de Javé sobre toda a população de [udá, incluindose os escravos. O capítulo 4 anuncia o juízo final para todas as nações que são convocadas para o vale de [osafá, e promete, pelo contrário, a proteção e a fecundidade para [udá e Jerusalém.
2. Significação dos capítulos 1-2 O primeiro problema da tradição de [oel é o da significação dos capítulos 1-2.144 Trata-se de uma visão apocalíptica e do anúncio de acontecimentos futuros, ou da descrição de um acontecimento passado ou presente?
143 144
E. NESTLE, "Miscel1en I. Zm Kapiteleinteinlung in JoeI", ZAW 24 (1904), 122-127. W. BAUMGARTNER, "JoeI1 und 2", em: BZAW34, 1920, 10-19. -K. BUDDE," 'Der von Norden' in JoeI2.20", OLZ 22 (1919), 1-5. - E. KUTSCH, "HeuschreckenpIage und Tag jahwes in joel l und2", ThZ 18 (1926), 81-94.-M. PLATH, "JoeI1,15-20",ZAW 47 (1929), 159s.
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No passado, enquanto predominava a primeira opinião (MERX e outros), a segunda ia-se impondo cada vez mais (WELLHAUSEN, Nowxcx, MARTI, SELLIN, ROBINSON, EISSFELDT*, WEISER e outros). Mas como as afirmações a respeito do dia de Javé 0.15; 2.1s,11) que seguramente anunciam algo de futuro, parecem contradizê-la, DUHM, ROBINSON e outros excluíram, com base nos capítulos 3-4, estes versículos ou partes de versículos como se tratando de acréscimos. Recentemente WOLFF adotou um meio-termo, pondo 1.4-20 em relação com uma catástrofe de ordem econômica que já havia acontecido, ao passo que reporta 2.1-17 a uma catástrofe futura e definitiva de Jerusalém. Os capítulos 1-2 tratam, evidentemente, não do futuro, mas de um acontecimento que acaba precisamente de se começar e está em curso. Isto também se aplica ao capítulo 2 cujos vv. 1-17 não podem ser considerados isoladamente e cujos imperfeitos hebraicos têm sentido de presente. O conjunto apresenta características nítidas de um acontecimento emocionante, como se percebe pela linguagem, pelas imagens e pelos sentimentos internos (WEISER*). Em contrapartida, destacam-se a moldura e estilo litúrgicos. São duas, principalmente, as características próprias que devemos observar: A calamidade atual é descrita em 1.5-20 como uma praga de gafanhotos!" e como uma seca, enquanto no capítulo 2 é apresentada somente como praga de gafanhotos, ao mesmo tempo em que se usam as imagens do dia de Javé. Daí resulta uma certa diferença entre 1 e 2, capítulos estes que parecem se referir a dois acontecimentos distintos, principalmente porque anunciam o convite a se proclamar um dia de penitência. Existe uma segunda diferença no tocante às relações com o dia de Javé e com a conseqüente interpretação escatológica dos acontecimentos. Enquanto 1.15, contendo a única menção do dia de Javé em todo o capítulo I, aparece como um acréscimo posterior, as menções do referido dia no capítulo 2 se vinculam estreitamente ao contexto e não podem, sem mais, ser excluídas. Isto vem reforçar a impressão de que os capítulos 1 e 2 se referem a dois acontecimentos diversos, dos quais a segunda praga foi interpretada e designada, já desde o início, como precursora ou como o início do dia de Javé.
145
o. R. SELLERS, "Stages ofLocust in [oel", AJSL 52 (1935/1936), 81-85.- J. A. THOMPSON, "[oel's Locusts in the Lightof Near EasternParallels", JNES 14 (1955), 52-55.
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Os
LIVROS PROFÉTICOS
3. Unidade do livro
o segundo problema da tradição de [oel é o que se refere à unidade do livro, a qual encontra sua expressão concreta na relação mútua entre os capítulos 1-2 e 3-4. A antiga interpretação, sem uma base reflexiva, de que se trata de uma obra homogênea, pelo fato de considerar todo o conjunto como um vaticínio a respeito do futuro, foi substituída, algumas vezes, por uma divisão em duas partes e, em outras ocasiões, foi retomada sobre uma nova base e em uma forma modificada. Acrescenta-se aqui, como variante intermediária, a hipótese da unidade do autor. a) Foi sobretudo DUHM 146 quem pôs em dúvida a unidade do livro, vendo em 1-2 a descrição de uma invasão de gafanhotos, da autoria de um poeta, e em 3-4, pelo contrário, a apresentação de uma escatologia, da autoria de um pregador da sinagoga do tempo dos Macabeus e que contém em 1-2 referências também ao dia de Javé. A hipótese da formação do conjunto em duas etapas foi acolhida por diversos autores, cada um de um modo diferente. Assim, p.ex., OESTERLEy-RoBINSON*: os capítulos 1-2 proviriam da época posterior ao exílio; 3-4 datariam de cerca de 200; ROBINSON: em 1-2 se encontrariam vários oráculos autônomos, surgidos a partir do séc. IV; em 3-4 estariam reunidas palavras, das quais algumas de época mais recente e não anteriores ao séc. III; JEPSEN: em 1-4 existiria um conjunto básico composto de três perícopes da época do exílio, completadas e ampliadas por um autor apocalíptico; SELLIN-RoST*: 1-2 proviriam do séc. V, e 3-4 de cerca de 380, em sua forma atual. PLóGER supõe a formação da obra em três etapas: os capítulos 1-2 seriam anotações posteriores e uma ampliação da pregação oral de [oel: o capítulo 4 se destinaria a garantir a interpretação escatológica do dia de Javé, ao passo que o capítulo 3 (surgido em círculo de características conventuais) se destinaria a garantir também a fé escatológica. b) Abstraindo da posição daqueles autores que, como BIC, p.ex., admitem, de maneira mais ou menos irreflexa, a unidade da obra, e deixando de lado as objeções, tantas vezes expressas, contra a divisão do livro em duas partes, devemos mencionar sobretudo duas tentativas que se fizeram no sentido de apresentar uma nova fundamentação em favor da unidade da obra. KAPELRUD entende o livro como a liturgia de um profeta cultual, executada no templo de Jerusalém, por motivo da praga dos 146
B. DUHM, "Anmerkungen zu den Zwõlf Propheten, X. Buch [oel", ZAW 31 (1911), 184-188.
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gafanhotos e cuja formulação se inspiraria no ritual da festa de entronização celebrada no dia de Ano Novo, com o livre emprego das imagens e da linguagem do culto da fertilidade. WOLFF o considera como uma obra literária construída artisticamente e de forma simétrica, onde a lamentação, em 1.4-20, corresponderia a promessa em 2.21-27; ao anúncio da catástrofe, em 2.1-11, a promessa de mudança da situação, em 4.1-3,9-17; e ao convite a conversão, em 2.12-17, a promessa da efusão do Espírito em 3. c) WEISER* defende a unidade de autor. Segundo ele, [oel teria consignado suas palavras por escrito logo em seguida ao acontecimento das pragas e teria acrescentado o vaticínio apocalíptico de 3-4. Semelhantemente BOURKE, para quem a primeira parte, de caráter cultual e litúrgico, teria sido unida, mediante 2.18-27, a segunda parte que teria sido acrescentada por [oel, o qual, deste modo, em 1-2 teria usado a imagem do dia de Javé em sentido histórico, e em 3-4, em sentido escatológico. Na realidade, tanto o estilo como a linguagem e a mesma dependência em relação a outros profetas, seja em 1-2 seja em 4, depõem em favor da unidade do autor. Neste ponto é preciso concordar com as objeções levantadas contra a divisão do livro em duas partes. Mas, assim como 1 e 2 se referem a acontecimentos distintos, assim também 3-4 tratam, por seu lado, de outros temas, todos eles ligados, em 2-4, pelas palavras-chaves "dia de Javé", pois que 1.15 fica excluído, por ser um acréscimo. Tudo isto depõe contra a unidade literária ou cultual do livro. Por fim, o capítulo 3 não constitui uma seção acabada, mas é composto de três fragmentos, a saber: vv. 1-2,3-4,5, que representam um acréscimo posterior à profecia de [oel (semelhantemente ROBINSON).147 Existe amplo acordo a respeito de que a invectiva e ameaça de 4.4-8 são um acréscimo mais recente. A tradição de [oel, por conseguinte, compreende três partes originais e independentes onde foram conservadas as palavras do profeta, pronunciadas em Jerusalém, por diversos motivos ou em diversas ocasiões, e devem ter sido colocadas em ordem cronológica. A primeira unidade, capo I, encerra os oráculos proferidos por [oel, por ocasião de uma praga de gafanhotos e de uma seca: 1.2-4 1.5-14 1.16-20
147
ROBINSON,
a praga até então inaudita, convite a se publicar um dia de penitência, cântico de lamentação e uma oração, que podem ter precedido o dia de penitência ou ter sido pronunciados pelo profeta nesse mesmo dia.
dois fragmentos: vv. 1-2.3-5.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
A segunda unidade, capo 2, contém os oráculos proferidos por ocasião de uma outra praga de gafanhotos, a qual, daí por diante, é interpretada como sinal do dia de Javé: 2.1-11 2.12-14 2.15-18 2.19-20 2.21-24 2.25-27
descrição da praga, convite à conversão, convite a se publicar um dia de penitência, oráculo em que Javé atende os clamores do povo, cântico de ação de graças, oráculo de promessas.
As três primeiras destas perícopes precedem, portanto, o dia de penitência, enquanto as três últimas foram proferidas nesse mesmo dia, como resposta às queixas do povo.
Em data posterior, [oel desenvolveu as imagens que se encontram no capítulo 2 e onde ressoa um tom escatológico. Podemos considerar esta terceira unidade como constituindo uma liturgia profética: 4.1-3 4.9-12 4.13-17 4.18-20
anúncio do julgamento a respeito das nações (ameaça acompanhada de justificativa), convite dirigido às nações para a reunião (ditos do mensageiro), anúncio do dia de Javé, promessa em favor de [udá e de Jerusalém.
4. Época da atividade de [oel A época em que [oel exerceu sua atividade deve ser determinada sobretudo em função de sua dependência com relação a uma série de outros profetas, particularmente com relação a Is 13; [r 4-6; 46.49-51; Ez 29-32; 35; 38s; Ab 17a; Sf ls; M13. Também sua linguagem deve ser incluída entre os estratos literários mais recentes do AT. Isto está em consonância com a pressuposta situação interna de Jerusalém, com a chefia entregue aos anciãos e aos sacerdotes, com a designação destes últimos como ministrosdeJavé e ministrosdo altar (1.9,13; 2,17), e com o sacrifício do tamid [holocausto perene], uma instituição cultual da comunidade do pós-exílio tardio (1.9,13;2.14). Tudo isto corresponde à situação da época posterior a Esdras e Neemias. Com isto concordam, por fim, também as escassas referências históricas: a ruína de Jerusalém e de [udá que de há muito
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ficara para trás (4.1-3), o templo reconstruído (1.9,14,16; 2.17; 4.18) e as muralhas da cidade (2.7,9), ao passo que o apêndice constituído por 4.4-8 deve datar de uma época anterior a 343 (destruição de Sídon por Artaxerxes III Oco) (WOLF). De tudo isto deduz-se, para [oel, a primeira metade do séc. IV a.c. Naturalmente outras datações, totalmente diversas, são igualmente defendidas: séc. IX (AMON, Biõ, LAETSCH) ou o séc. VIII (KUTAL e outros), datas estas, no entanto, que devem ser inteiramente excluídas. Outros autores pensam na época situada em torno de 600 (KAPELRUD), na época do exílio (JEPSEN) ou nos primeiros anos do pós-exílio (AUGÉ,l48 MYERS: por volta de 520). Demasiado tardia é a colocação do profeta por volta de 300 (TREVES) ou na época dos Macabeus (JENSEN). A colocação do livro, de data mais recente; entre Oséias e Amós, talvez tenha sido ocasionada pelas relações do conteúdo com Amós, particularmente devido à concordância de 4.16aa com Am 1.2a, e de 4.18a com Am 9.13b, concordância esta que se baseia na dependência de [oel em relação ao mesmo. Ao mesmo tempo, talvez Amós devesse ter sido entendido, ao contrário de sua própria mensagem, à luz da pregação fortemente escatológica de [oel,
5. Pregação [oel é um profeta cultual que exerceu sua atividade no templo de Jerusalém com sua pregação escatológica. Com esta mudança de orientação, ele dá prosseguimento, em época tardia, à pregação dos profetas cultuais anteriores ao exílio, com sua atenção voltada para a salvação de Israel e para a desgraça de seus inimigos. [oel se filia de preferência às profecias mais antigas, em busca de uma legitimação numa época em que já não se dava muita importância aos profetas novos. O fato de que, assim procedendo, ele tenha escolhido principalmente as tradições referentes ao dia de Javé, e também os oráculos proferidos contra outros povos, foi motivado pelo conteúdo de sua mensagem. A idéia do dia de Javé tem uma longa história. Assim não se deve supor um emprego quase ininterrupto e unilinear da mais antiga representação até a época tardia, nem igualmente se podem deixar de considerar as mudanças históricas que ocorreram. Originariamente esperava-se uma intervenção bélica de Javé na luta de Israel 148
R. AUGÉ, Projetes Menors, 1957.
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Os LIVROS PROFÉTICOS
contra Os inimigos. Esta expectativa se transformou, seguidamente, em dogma de fé, com a esperança de uma salvação global vinculada ao conceito de teofania, Am 5.18-20 e Is 2.12-17 assumiram e reinterpretaram a expectativa de salvação. O dia de Javé trará para Israel não a salvação mas a desgraça. Sf 1s filiá-se a esta perspectiva, adotada mais tarde pelos profetas escatológicos que, como Is 13 e Joel, procedem a uma reinterpretação escatológica. Depois de verem que o juízo que fora anunciado contra Israel tinha sido cumprido com a queda de Jerusalém e com o exílio, eles esperam para os últimos tempos uma nova salvação para Israel e uma nova perdição para a grande potência inimiga de Deus ou para as outras nações. E para descrever este acontecimento, eles utilizam a imagem do dia de Javé.
o nexo entre a profecia cultual e a escatologia é o que caracteriza a pregação de [oel e a distingue dos grandes profetas individuais anteriores ao exílio. [oel parte das situações de calamidade econômica da vida ordinária, provocadas pelas catástrofes naturais, ao mesmo tempo em que anuncia o dia de transformação escatológica. Consoante o caráter de sua missão, ele se empenha por afastar os prejuízos econômicos e conc1ama ao povo a voltar-se para Deus em meio ao infortúnio. Incita-o a convocar uma assembléia cultual de penitência, com jejuns e lamentações, mas ao mesmo tempo acentua a necessidade de conversão para Deus, sem, contudo, pressupor uma culpa. Fala a respeito do alcance universal do dia de Javé, mas isto só no julgamento contra as nações. A este alcance universal se contrapõe, no entanto, a limitação particularista da salvação apenas ao próprio povo. § 63. AMÓS Cf. os comentários relativos ao § 61. - Especiais: R. S. CRIPPS, 2il ed., 955. - E. HAMMERSHAIMB, 2il ed., 1958. - B. KUTAL, 1933. E. BALLA, Die Droh- und Scheltworte des Amos, 1926. - E. BAUMANN, Der Aufbau der Amosreden, 1903. - W. BAUMGARTNER (§ 61). - G. J. BOTTERWECK, "Zur Authentzitãt des Buches Amos", BZ NF 2 (1958), 161-176. - K. CRAMER, Amos, 1930. - H. GESE, "Kleine Beitrãge zum Verstãndnis des Amosbuches", VT 12 (1962), 417-438. - R. GORDIS, "The Composition and Structure of Amos", HThR 33 (1940), 239-251. - S. JOZAKI, "The Secondary Passages of the Book of Amos", Kwansei Gakuin University Annual Studies 4 (1956), 25-100. - A. S. KAPELRUD, "God as Destroyer in the Preaching of Amos and in the Ancient Near East",
§ 63. AMÓS
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JBL, 71 (1952),33-38. - ID., Central Ideas in Amos, 1956 (1961). - L. KÓHLER, Amos, 1917. - ID., "Amos-Forschungen von 1917-1932", ThR NF 4 (1932), 195-213. - S. LEHMING, "Erwãgungen zu Amos", ZThK 55 (1958), 145169. - V. MAAG, Text, Wortschatz und Begriffswelt des Buches Amos, 1951. - W. ST. MCCULLOUGH, "Some Suggestions About Amos", JBL 72 (1953), 247-254. - J. MORGENSTERN, "Amos Studies", HUCA 11 (1936), 19-140; 12/13 (1937/38),1-53; 15 (1940),59-305; 32 (1961), 295-350. - A. NEHER, Amos, 1950. - E. OSSWALD, Urform und Auslegung im masoretischen Amostext, Diss. Iena, 1951. - H. GRAF REVENTLow, DasAmt des Propheten bei Amos, 1962. - J. RrnGER (§ 61). - W. ScHMIDT, "Die deuteronomistische Redaktion des Amosbuches", ZAW 77 (1965),168-192. - I. P. SEIERSTAD, "Erlebnis und Gehorsam beim Propheten Amos", ibid. 52 (1934),2241. - S. SPEIER, "Bemerkungen zu Amos", VT 3, (1953), 305-310. - ID., "Bemerkungen zu Amos 11", em: Homenaje a Millás-Vallicrosa, 11 1956, 365-372. - S. L. TERRIEN, "Amos and Wisdom", em: Essays Muilenburg, 1962,108-115. - R. VUILLEUMIER (§ 61). - J. D. W. WATTS, "The Origin of the Book of Amos", ET 66 (1954/55), 109-112. - ID., Vision and Prophecy in Amos, 1958. - A. WEISER, Die Profetie des Amos, 1929. - H. W. WOLFF, Amos geistige Heimat, 1964. - E. WüRTHWEIN, "Amos-Studien", ZAW 62 (1950), 10-52. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19, 20 e 28 (§ 52).
1. Amós e sua profissão Amós é originário de técua (hibert teqü'a), situada a vinte quilômetros de Jerusalém, na região fronteiriça, já quase dentro da estepe.!" Aí viveu ele como noqed, "criador de gado miúdo" (1,1) ou como boqer, "criador de vacas" (7.14), ou antes, mais como proprietário autônomo de rebanhos do que como pastor não-autônomo (EISSFELDT*). De acordo com 7.14, ele também se ocupava com o cultivo de sicômoros. Talvez tivesse uma propriedade na região de colinas situada entre as montanhas e a planície costeira ou junto ao Mar Morto. Ele exercia, portanto, uma profissão inteiramente "civil" (STüEBE).15ü Por este motivo é que ele pode dizer, de um lado, que não é obrigado, pelo fato de ser nabi, a ganhar a vida exercendo uma atividade ligada à profissão do nabi e, de outro lado, pode insistir em que foi escolhido por Javé em pessoa, o qual o arrancou da profissão que exercia (7.15).
149
150
Não se trata de um lugar desconhecido, do mesmo nome, no Reino do Norte, como supôs H. SCI-IMIDT, "Die Herkunft des Propheten Amos", em: BZAW 34,1920,158-171. H. J. STOEBE, "Der Prophet Amos und sein bfugerlicher Beruf", WuD 5 (1957), 160-181.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
Embora as afirmações de tradição ligada a Amós pareçam inequívocas, contudo, recentemente tem-se procurado inserir Amós em um contexto diferente. Por isso, BiC,151 baseando-se no título ugarítico de nqd, que significa" servidor do culto", e no sentido original de "exame das vísceras", postulado para o termo bqr, pretendeu ver em Amós um daqueles funcionários do culto que se ocupavam com o exame do fígado e das vísceras das vítimas. Mas MURTONEN refutou esta opíniâo.!" A maioria dos autores começa pela declaração de 7.14a: lo'-nabi' 'anoki urlo' ben-nabi' 'anolâ. 153 Enquanto ROWLEY atribui a esta frase, ambígua unicamente do ponto de vista sintático, por faltar um verbo, apenas o sentido de que Amós não era nabi antes de receber o chamado, mas de que começou com ele a sua missão profética, não negando, portanto, ter sido chamado por Javé para ser profeta, WATIS vê expressa aí a afirmação da autoridade de Amós (não sou eu, mas é Javé quem me chamou!). Para VOGT, Amós teria afirmado que não era profeta por profissão, mas por livre escolha de Javé. Outros autores, porém, apoiados em 7.14, procuram demonstrar que Amós exerceu uma atividade profética em conexão com o culto. Assim WÜRTHWEIN, baseando-se na interpretação do versículo: "Eu não era nabi; agora é que o sou" - semelhantemente MACCORMACK - e também em outras hipóteses, opina que Amós inicialmente teria sido um nabi da salvação que proferia ameaças de castigo contra as outras nações (1.32.3) e teria exercido o papel de intercessor em favor de Israel (7.1-6), tornando-se mais tarde profeta anunciador de desgraças. Contra estas hipóteses, porém, está o fato de que não se deve decompor o conjunto 1.3-2.16, em que está a ameaça conclusiva contra o próprio Israel, como também não se deve minimizar o crime cometido por um povo estrangeiro contra outro (2.1-3), nem dividir por épocas totalmente diversas as quatro visões descritas em 7.1-9; 8.1-3, nem também restringir o papel de intercessão unicamente aos profetas que pregavam a salvação. GUNNEWEG vai ainda 151 152 153
M. BIC, "Der Prophet Amos - ein Haepatoskopos", VT 1 (1951),293-296. A. MURTONEN, "The Prophet Amos - a Hepatoscoper?, VT 2 (1952), 170s. P. R. ACKROYD, "Amos VII, 14", ET 68 (1956/1957), 94. - G. A. DANELL, "Var Amos verkligen en nabi?", 5EA 16 (1951), 7-20. - G. R. DRIVER, "Amos VII, 14", ET 67 (1955/1956), 91s. - A. H. J. GUNNEWEG, "Erwãgungen zu Amos 7,14", ZThK 57 (1960), 1-16. - A. S. KAPELRUD, "Amos og has yrke", NTT 59 (1958), 76-79. - J. MACCORMACK, "Amos VII, 14", ET 67 (1955/1956), 318. - H. H. ROWLEY, "Was Amos a Nabi?", em: Eissfeldt-Festschrift, 1947, 191-198. - E. VOGT, "Waw explicative in Amos VII, 14", ET 68 (1956/1957), 301s.
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mais longe e, além da função de pregar a salvação em favor de Israel e de interceder por ele, atribui também ao nabi a função de pronunciar o oráculo cultual de julgamento, com o anúncio de desgraças. DRIVER e ACKROYD consideram o versículo como uma pergunta feita ao mesmo tempo para irritar e para dar uma garantia: "Não devo ser profeta, porque sou criador de gado?". De acordo com esta hipótese, Amós teria sido também chamado de nabi, embora em 7.lOss Amasias não coloque absolutamente em dúvida sua condição de profeta. Já DANNEL pensa, com certas restrições, que Amós foi um nabi extraordinem, que não pertencia a nenhuma corporação, e que, na verdade, ganhava o próprio sustento, exercendo esta função. Para KAPELRUD, pelo contrário, Amós não foi criador de gado nem camponês, nem também profeta cultual, mas um funcionário encarregado de supervisionar grandes rebanhos e os respectivos pastores, pertencentes, p.ex., aos santuários, e, por isso ele provinha de uma classe social elevada e era homem de cultura. Se se toma o termo nqd neste sentido, então se deve perguntar como seria possível, de acordo com 1.1, haver vários inspetores desse tipo na pequena Técua. Indo além das referidas hipóteses, REVENTLOW procura demonstrar que a atividade e Amós deve ser entendida dentro da moldura de um "ofício" firmemente estruturado, como era' o ofício do nabi, que se nutria da "pregação da Aliança", isto é, do ritual de bênçãos e de maldições da chamada festa da Aliança. Para ele, isto se deduz tanto a partir de 7.10-17, cujo v. 14 deve ser traduzido com o sentido de pretérito, como também 3.3-8, cujo v. 8 se opõe à proibição de exercer a profissão. Os relatos das visões, em 7-8, são interpretados como sendo um ritual que corresponderia a determinadas funções ligadas ao ofício profético. A perícope 1.3-2.16 é considerada também como um ritual referente às nações, a perícope 4.6-11 como um ritual de maldições, e 9,13-15 como um ritual complementar de bênçãos. Da pesquisa da história das formas, tiram-se conclusões de longo alcance, contra as quais as únicas objeções que se podem levantar se devem antes à unilateralidade do método empregado. A primeira objeção é a de que Sítz ím Leben ["contexto vital"] original não é o mesmo que instituição, e que esta não é o mesmo que ofício. Pelo contrário, o Sítz ím Leben reside num determinado motivo, p.ex., no cântico fúnebre recitado por ocasião da morte de alguém. A segunda objeção é que do referido Sítz ím Leben se deve distinguir o Sítz ín der Rede ["a posição dentro do discurso"]. Amós, p.ex., emprega o cântico fúnebre profético como ameaça de castigo contra Israel (5.1-3), de modo que era inteiramente normal e livre a utilização, para outros fins, de uma forma já bem determinada.
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Os LIVROS PROFÉTICOS
Não se entende Amós, com a hipótese de um ofício profético. A argumentação de SMEND I54 contra esta opinião é justificada. Em vez disso, o mais correto, parece-nos, é ver em 7.14a, como BAuMANN, LEHMING, STOEBE e outros, ISS o profeta negando pertencer aos quadros dos profetas cultuais e contrapondo estes últimos ao profeta chamado por Javé. Na discussão agitada por tantos autores, trata-se, na realidade, de um pseudo-problema, porque o versículo em questão é visto fora do contexto de 7.10-17 e analisado isoladamente. Quando Amasias manda que ele vá procurar o seu sustento em [udá, Amós apenas lhe diz que dispõe do suficiente para viver, graças à profissão que exercera até então e da qual Javé o tirara para o enviar a Israel, e que não depende absolutamente do que lhe rende a sua atividade de profeta.
2. Época da atividade de Amós Como época da atividade de Amós, 1.1 e 7.9.10s mencionam o governo de Jeroboão II, no Reino do Norte de Israel (786/782-753/746), colocada em paralelo com os anos de Ozias, rei de [udá. Enquanto a menção do terremoto em 1.1 pouco contribui para determinar uma data precisa, o conteúdo das palavras do profeta nos indica que, na sua época, Israel passava por um período de prosperidade política, econômica e cultural, ostentando consideráveis êxitos (6.1,13). Isto nos leva aos meados ou ao período final do governo de [eroboão II (2Rs 14.23-29). Deste modo, a atividade de Amós deve situar-se entre 760 e 750.156 Por ocasião de sua vocação ao ministério profético, sua missão o ligara, a ele, um habitante de [udá, ao Reino do Norte de Israel. Provavelmente ele apareceu aí, primeiramente na capital Samaria (3.9ss; 4.1ss; ô.Iss), e logo a seguir junto ao santuário real de Betel, perante a multidão aí reunida para alguma festa. Precisamente porque suas palavras obtiveram bons resultados, esta atuação deve ter sido de curta duração. Foi denunciado junto ao rei pelo sumo sacerdote como subversivo e expulso do país (7.lOss). É evidente que depois disto ele voltou para a sua pátria.
154 155
156
R. SMEND, "Das Nein des Amos", EvTh 23 (1963), 404-423. E. BAUMANN, "Eine Einzelheit", ZAW 64 (1952), 62. - S. LEHMING, "Erwãgungen zu Amos", ZThK 55 (1958), 145-169. - STOEBE (ver acima,nota 150). -S. COHEN, "Amos Was a Navi", HUCA 32 (1962), 175-178. CRIPPS propõe outra data: 742/741, ou no máximo: 744/743.
§ 63. AMÓS
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Dificilmente se poderia falar em uma atividade posterior em [udá (WEISER*, 9.1-4).157
3. Oráculos e relatos coleções parciais Os oráculos e relatos de Amós trazem sobretudo o caráter da invectiva e da promessa. Isto vale igualmente para as visões nas quais, no começo, e em seguida à intercessão do profeta, Javé se declara pronto a desistir da punição. Na série de oráculos 1.3-2.16 e nos 27 oráculos menores quase só se encontram palavras de ameaça, ou ameaças acompanhadas de fundamentação, além de invectivas combinadas com ameaças, algumas das quais provêm de discussões (3.1s,12a; 5.18-20). Nas ameaças acompanhadas de fundamentação, esta pode preceder a ameaça (Lêss: 5.18-20,26s; 6.8-10), pode estar contida na ameaça (3.1s,12b15), ou pode vir em seguida à mesma (3.12a; 8.11-14). Raramente ocorrem outros gêneros literários, como, p.ex., a combinação de cântico fúnebre com ameaça (5.1-3), a combinação de ameaça e exortação (5.46), a invectiva (5.12; 6.12), a reflexão histórica (4. 6ss), a torá profética (5.21-25), a exortação (5.14s), a exortação irônica (4.4s) e as palavras provenientes da discussão (3.3-6,8; 9.7). Somente a parte de 1.3-2.16 que remonta a Amós, deve ser considerada como uma unidade maior da pregação oral. A hipótese de MORGENSTERN, segundo a qual Amós teria pronunciado uma grande alocução contínua e homogênea, durante uma festa do Ano Novo, em Betel, e da qual certos fragmentos isolados foram conservados no livro de Amós, é improvável. Fora l,3ss e o relato da expulsão de Betel, 7.1017, trata-se, como na maioria dos profetas, somente de oráculos e de relatos de visões que foram comunicados cada um separadamente. Estes relatos e oráculos nos apresentam Amós como um mestre da língua e da forma, que sabe formular o pensamento, ao mesmo tempo com concisão e plasticidade, com precisão e rigor (EISSFELDT*), e que talvez tenha aprendido muita coisa também da doutrina sapiencial de seus vizinhos nômades.
A julgar pelos relatos das visões e por 5.1, formulados na primeira pessoa gramatical, a fixação dos oráculos e relatos por escrito foi promo157
Em 6.1 Sião aparece como designação genérica da situação de uma capital, em paralelo com o monte da Samaria.
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vida por Amós e se realizou ainda em sua vida, mas dificilmente em Jerusalém, ou durante seu regresso de Betel para Técua (CASPARI),158 mas talvez em sua terra natal. Foi ai que Amós deve tê-los ditado. A partir apenas da formulação na primeira pessoa gramatical não se pode provar que Amós os tenha escrito de próprio punho. A esses oráculos e relatos se acrescenta o relato alheio de 7.10-17, o qual parece ter sido redigido por uma outra mão, com base na narrativa do profeta. Os oráculos e relatos que surgiram isoladamente foram recolhidos posteriormente por outra mão, em coleções parciais, das quais algumas se identificam pelas partes de hinos que foram acrescentadas aos mesmos. Seguindo o exemplo de ErssFELDT*, podemos distinguir nove grupos desses oráculos: a) A série de oráculos 1.3-2,16 forma uma grande composição, tendo sido planejada e recitada como tal desde o início. Nela Amós ataca primeiramente as nações circunvizinhas, às quais ele anuncia calamidades por causa de seus crimes, e em seguida volta-se subitamente contra Israel. Como bem o reconheceu BENTZEN,I59 em princípio, a ordem de colocação das nações ameaçadas foi influenciada pelo modelo egípcio dos textos de proscrição, embora esta ordem deva ser modificada pela exclusão de certos acréscimos posteriores. Afora isto, dificilmente Amós imitou o ritual egípcio. 1.3-5 1.6-8 1.13-15 2.1-3 2.6-16
contra Aram [Síria] contra os filisteus contra Amon contra Moab contra Israel
norte, oeste, leste centro.
b) Seguem-se três pequenas coleções de oráculos, a primeira das quais sempre começa com a frase: ouvi esta palavra. A primeira coleção: 3.1-15, contém seis oráculos, a saber: 3.1-2, dirigidos contra a crença na eleição; 3.3-6, para demonstrar, com apoio em exemplos que ilustram a relação
158
W. CASPARI, "Wer hat die Aussprüche des Propheten Amosgesammelt?", NkZ 25
159
A.
(1914), 701-715.
BENTZEN, "The Ritual Background of Amos 1,2-2,16", OT5 8, 1950,85-99. - Cf. também M. A. BEEK, "The Religious Background of Amos 2,6-8", OT5 5, 1948, 132-141. - B. K. SOPER, "For Three Transgressions and for Four", ET 71 (1959/ 1960), 86s.
§ 63. AMós
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entre causa e efeito, que toda calamidade é provocada por Javé;160 3.8, sobre a força que impele o profeta a falar; 3,9-11, contra os crimes de Samaria; 3.12a, sobre a destruição total, ilustrada a partir do direito dos pastores; 3.12b-15, sobre a destruição do santuário e das residências. c) Uma outra coleção: 4.1-13, que começa com a frase: ouvi esta palavra, é constituída de três oráculos: 4.1-3, um anúncio de desgraças contra as mulheres de Samaria; 4.4-5, um convite irônico a praticar o culto, e 4.612, uma invectiva, desenvolvida em forma de reflexão sobre a história, com a constatação, a modo de estribilho, de que os israelitas se recusaram sempre a se converter a Javé, enquanto da ameaça apenas se conservou a introdução: v. 12a. Essa coleção se encerra com o fragmento de um hino: 4.13. d) A terceira coleção que se inicia também com a frase: ouvi esta palavra: 5.1-6,8-9, compreende o cântico fúnebre de ameaças contra Israel: 5.13, e a exortação a procurar Javé e não os santuários: 5.4-6.161 A conclusão é constituída pelo fragmento de hino: 5.8s. e) As três coleções seguintes foram dispostas de tal maneira, que o primeiro oráculo de cada uma começasse com a palavra ai. A primeira delas: 5.7,10-17, abrange quatro oráculos: 5.7,10-11 (com alteração no começo do v. 7) e 5.12 sobre a injustiça cometida em juízo; 5.14-15, exortação a praticar o bem, e 5.16-17, sobre as lamentações que serão ouvidas por ocasião da futura desgraça. f) A segunda coleção que começa com a palavra ai: 5.18-27,162 traz em 5,18-20 a reinterpretação do significado do dia de Javé, em 5.21-25 a rejeição do culto por Javé, com a indicação de que na época de Moisés não havia sacrifícios, e em 5.26-27 uma condenação à idolatria, sendo que aí os dois últimos pronunciamentos devem ser destacados um do outro. g) A terceira coleção que começa também com ai: 6.1-14, compreende cinco oráculos: 6.1-7, contra as altas camadas de Samaria; 6.8-10, sobre a destruição total futura da cidade; 6.11, sobre a destruição das casas; 6.12, sobre a distorção do direito, e 6.13-14, sobre o orgulho político.
160
161 162
B. HOLWERDA, Die exegese van Amos 3,3-8, 1948. - H. JUNKER, "Leo rugiit, etc. Eine textkritische und exegetische Untersuchung über Amos 3,3-8", Trierer ThZ 59 (1950),4-13. F. HESSE, "Amos 5,4-6.14s", ZAW 68 (1956), 1-17. J. PH. HYAIT, "The Translation and Meaning of Amos 5,23-24", ZAW 68 (1956), 17-24. - H. JUNKER," Amos und die "opferlose Mosezeit", ThG127 (1935), 686-695. - E. WÜRTHWEIN, "Amos 5,21-27", ThLZ 72 (1947), 143-152.
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h) Em 8.4-9.6 encontramos uma coleção resultante da combinação de várias partes, que começam com as palavras: ouvi isto. Contém, em primeiro lugar, o oráculo dirigido contra os comerciantes: 8.4-7, que foi transmitido isoladamente durante muito tempo e depois recebeu o fragmento de hino: 8.8. Este oráculo foi posteriormente unido às ameaças de trevas: 8.9-10, e de fome: 8.11-14, agrupadas num bloco independente em 8.9-9.6; ao relato da visão a respeito da perseguição que Javé haveria de mover contra os israelitas: 9.1-4, e ao fragmento de hino: 9.5-6, concebido como conclusão. A este fragmento foram acrescentadas posteriormente as palavras dispersas de Amós: 9.7. i) Os relatos sobre as quatro visões constituem uma coleção separada: 7.1-9163; 8.1-3. Visto que Amós nos dois primeiros relatos intercede com êxito em favor de Israel, enquanto nos dois últimos, pelo contrário, omite essa intercessão, e visto que em todos os outros seus oráculos jamais ocorre a idéia de interceder em benefício de Israel junto a Javé, essas visões só podem pertencer ao período inicial da atividade profética, logo em seguida à sua vocação. Com certeza, elas nem precederam esta vocação (WEISER), nem são esta vocação (WELLHAUSEN, BUDDE), nem constituem o ponto final de sua obra (SELLIN). O compilador ou o redator inseriu o relato alheio sobre a expulsão de Betel: 7.10-17164 depois do relato da terceira visão, porque esse relato identifica a ameaça da espada expressa nele contra [eroboão (7.9), com a palavra de ameaça (7.lOs), mencionada na referida narrativa.
4. Palavras de época posterior
Aos oráculos e relatos de Amós acrescentaram-se algumas palavras de época posterior. Entre elas se encontram as partes de hinos já mencionadas: 4.13; 5.8s; 8.8; 9.5S/ 65 que não provêm de Amós (BoTIERWEcK), nem foram acrescentadas por ele (WATTS). Elas funcionam, não como conclusão de perícopes destinadas à leitura litúrgica (WEISER*), mas como con-
163
164 165
H. JUNKER, "Text und Bedeutung der Vision Amos 7,7-9", Bibl17 (1936), 359-364. - H. S. MACKENZIE, "The Plumb-Line (Amos 7,8)", ET 60 (1949), 159. L. ROST, "Zu Amos 7,10-17", em: Zahn-Festgabe, 1928,229-236. TH. H. GASTER, "An Ancient Hymn in the Prophecies of Amos", Journal Manchester Eg. Oro Soe. 19 (1935), 23-26. - F. HORST, "Die Doxologien im Amosbuch", ZAW 47 (1929),45-54 (= Gottes Recht, 1961, 155-166). - J. D. W. WATTS, "An Old Hymn preserved in the Book of Amos", JNES 15 (1956),33-39.
§ 63. Ajaós
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clusão de coleções particulares, à semelhança das promessas colocadas no final das coleções isaianas. Também é certo que as partes seguintes não provêm de Amós: o oráculo 1.2, colocado à guisa de mote no início do livro e que remonta à redação e, tal como JoeI4.16, interpreta o rugido de Javé vindo do céu, do qual se fala em [r 25.30, no sentido de [erusalém'<: as palavras pronunciadas contra Tiro (1.9), contra Edom (1.11s) e contra [udá (2.4s), que se diferenciam dos outros oráculos contra as nações e dentre as quais aquelas dirigidas contra Edom talvez tivessem por objeto o comportamento desta nação ao tempo da tomada de Jerusalém em 587, enquanto aquelas proferidas contra [udá apresentam estilo deuteronomista, de sorte que esses dois oráculos só devem ter sido formulados no exílio; e por fim, o oráculo a respeito da revelação dos intentos de Javé com relação aos profetas (3.7), oráculo este que constitui uma visão retrospectiva do pós-exílio a respeito dos anúncios proféticos. De origem secundária é, por fim, a conclusão do livro: 9.8-15,167 apesar do empenho de vários autores em atribuí-la a Amós,168 ou em admitir como autênticos pelo menos os vv. 8-10 e em restringir os acréscimos aos vv. 11-15 (EISSFELDT*, WEISER*, K.APELRUD). A ameaça frouxa e sem vigor, lançada contra o reino quepeca, logo se reduz a um julgamento de purificação (9.8-10): trata-se de uma promessa que surgiu no exílio."? A promessa em favor tenda desmoronada de Davi (9.11s) supõe a ruína da dinastia davídica e de Jerusalém, e talvez deva ser entendida em sentido escatológico. Os oráculos 9.13,14-15 com as promessas da miraculosa fecundidade e da restauração de Israel, nos últimos tempos, são nitidamente escatológicos e provavelmente foram formulados depois do exílio. CRIPPS expôs exaustivamente as razões essenciais que depõem contra a hipótese segundo a qual 9.8-15 derivam de Amós. 166
167
168
169
De opinião diferente é A. BERTHOLET, "Zu Amos 1,2", em: Bonwetsch-Festschrift, 1918, 1-12 (Ecos da experiência de sua vocação). SELLIN-RosT*, 125 (autêntico do ponto de vista da forma e do conteúdo). Assim corretamente WELLHAUSEN 96: "Rosas e alfazema, em vez de sangue e ferro ... Precisamente quando acaba de superar, de muito, as suas antigas ameaças, ele (Amós) não pode cortar de repente as suas asperezas, como não pode, ao concluir, fazer que jorrem leite e mel do cálice da ira de Javé". P. ex., BOTTERWECK, GORDIS, MAAG, NEHER, SELLIN. Em sentido contrário, WEISER* 216: expressão repelente, de ambigüidade maliciosa. ROBINSON 107: os vv. 9-10 são o fragmento de uma promessa da época do exílio, ligando-se à parte precedente por intermédio de 8d.
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Os LIVROS
PROFÉTICOS
5. Origem do livro A origem do livro se processou da seguinte maneira: primeiramente a série de oráculos A e as pequenas coleções B-G foram reunidas em uma grande coleção, onde A foi colocada no início do conjunto como uma espécie de visão geral impressionante a respeito da pregação de Amós, e onde B-D e E-C foram separadas em dois grupos, por causa das respectivas introduções contendo as mesmas palavras. A esta grande coleção assim formada, acrescentou-se a coleção I, já ampliada com o relato alheio (7.10-17), porque ela encerra os relatos a respeito do início e do final da atividade profética de Amós. A coleção H parece ter sido colocada de propósito no final de tudo, porque seus oráculos a respeito da visão de 9.1-14 anunciam, de forma definitiva, a destruição que virá. Esta compilação deve ter-se realizada ainda no último período anterior ao exílio. Outros autores só admitem duas grandes coleções, que foram agrupadas em um livro. Assim, segundo WEISER, trata-se apenas de um escrito sobre as visões, contendo os relatos de cinco visões, e mais uma coleção de oráculos com a conclusão 7.10-17; GORDIS acha que só existem a coleção 1-7.9, contendo palavras da época anterior à expulsão de Betel, e o apêndice 7.10-17, além de uma outra coleção: 8.1-9.15, contendo palavras da época posterior à expulsão; W AITS admite apenas um livro de oráculos: 1-6, escrito no norte de Israel, e mais um outro livro, contendo as visões e o relato alheio (7-9). Os autores destas hipóteses se esquecem, no entanto, de que o conjunto 1-6é formado de coleções parciais, e quando tratam de situar os oráculos 8.4ss, se defrontam com sérias dificuldades ou são obrigados a atribuir os relatos 7.7-9 e 8.1-3 sobre visões, que apresentam semelhança de formas, a dois períodos distintos.
Na época do exílio foi feita uma redação do livro num espírito deuteronomista (ScHMIDT), a qual, entre outras coisas, colocou o mote 1.2 no início da obra. Posteriormente, na época pós-exílica, talvez ainda pelo fim do séc. VI, acrescentou-se a conclusão cheia de promessas de salvação: 9.8-15, e desta forma foi imposto ao livro o esquema escatológico de dois membros.
6. Pregação A pregação de Amós não foi determinada, como se tem afirmado, nem pelo fato de ele se sentir ligado a certas tradições cultuais!" ou ao 170
KAPELRUD. - C. SANT, "Religious Worship in the Book of Amos", Melita Theologica 3 (1950), 75-93; 4 (1951), 34-48. - VUILLEUMIER.
§ 63. AMós
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chamado direito apodítíco.!" nem pelo fato de se haver limitado a uma atividade política e social."? Fundamental nesta pregação é, pelo contrário, o seu "não" ao comportamento social de Israel, à sua concepção da história, ao culto e à sua existência em geral. É verdade que entre Javé e o povo existe uma relação íntima (7.8; 8.2), que o verbo yadã' designa como sendo uma vida de comunhão íntima, uma espécie de matrimônio. Amós rejeita, contudo, ironicamente, a vocação baseada apenas na crença da eleição (3.2), e trata, em tom igualmente irônico, a pretensão alimentada por Israel de ser o primeiro dentre os povos (6.1-7). Ele também não deriva da libertação do Egito uma situação de privilégio para Israel, porque Javé conduziu também outros povos (9.7).173 Em vez de se comprometer à obediência, talvez com o despertar dos nazirenos e dos profetas (2.11), o que Israel fez foi apostatar de seu Deus, como o mostra Amós, em linhs gerais, apontando para os pecados sociais e cultuais, que são seus principais pontos de ataque. Assim como ele vê subvertida a prática das prescrições legais a respeito das festas e sacrifícios (4.4s; 5.4s,21-25) que ele duvida tenham surgido na época de Moisés (5.25), assim também ele considera os festins e bebedeiras celebrados em meio ao orgulho e à auto-suficiência, juntamente com o costume de se entoarem cânticos em tais ocasiões como os de Davi (6.1-6), como a manifestação de uma atitude de pecado por parte do povo. Mesmo para a convivência das nações ele pressupõe certas normas estabelecidas por Deus, cuja violação é castigada por Javé, embora Israel não seja atingido (2.1-3). A partir daí começa o caminho para uma teologia universal sem as barreiras nacionais. É da existência das relações vitais que deriva para Javé o direito de pedir contas em forma particular a Israel (3.2). É por isso que ele nem sempre deixou de enviar flagelos - aliás é dele que emanam todas as calamidades (3.3-6) - os quais, como exortações fáceis que eram de entender, deviam convidar o povo à conversão (4.6-11). Como tudo foi em vão, a partir daí só restará destruição que virá no "dia de [ave", cuja conceituação salvífica tradicional Amós modifica (5.18-20). Assim Israel perecerá totalmente, caso não se verifique, ainda que no último instante, 171
172
173
R. BACH, "Gottesrecht und weltliches Recht in der Verkündigung des Propheten
Amos", em: Dehn-Festschrift, 1957,23-34. A demonstração, contudo, é insuficiente; cf. SMEND (ver acima, nota 154),405-409. Além disso, L. DÜRR, "Altorientalisches Recht bei den Propheten Amos und Hoea", BZ 23 (1935/1936), 150-157, indica a presença de elementos do direito vétero-oriental com referência a 2,7. F. DlJKEMA, "Le fond des prophéties d'Amos", OTS 2, 1943, 18-34. - MORGENSTERN. A referência ao êxodo em 2.10 é de origem secundária.
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Os
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a conversão até então recusada - conversão que Amós interpreta como sendo a busca de Javé (5.4) e a prática do bem (5.14). Mesmo nesse caso, conserva-se intacta a liberdade de Deus, ao qual uma conversão de Israel não obriga ao perdão. É somente a um "talvez" de salvação que Amós se aventura (5.15). A tensão entre a ira de Deus e sua graça continuará sempre.
§ 64. ABDIAS Cf. os comentários relativos ao § 61. - Especial: B. KUTAL, 1933. H. BEKEL, "Ein vorexilischesOrakel über Edom", ThStKr 80 (1907), 315-343. - M. Brc, "Ein verkanntes Thronbesteigungsfestorakel im Alten Testament", Arar 19 (1951),568-578. - ID., "Zur Problematik des Buches Obadjah", VTSuppl1, 1953, 11-25. - A. H. EDELKOORT,"De profetie van Obadja", NedThT 1 (1946/47),276-293. - E. OLÁVARRI, "Cronologia y estructura literaria del oráculo escatológico de Abdias", EstBíbl 22 (1963),303-313. - TH. H. ROBINSON, "TheStructureofthe Book ofObadiah", JThSt 17 (1916), 402-408. - W. RUDOLPH, "Obadja", ZAW 49 (1931), 222231. - J. THErs, Die Weissagung des Abdias, 1917. - H. VELDCAMP, Het gezicht van Obadja, 1957. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Os oráculos isolados Sobre a pessoa do profeta a quem está ligado o menor escrito profético do AT só nos foi transmitido o nome: Abdias (v. 1), se é que este nome, que significa "Servo de Javé", não foi acrescentado senão posteriormente ao escrito anônimo, tendo-se por modelo a figura de lRs 18.3ss. De acordo com o título, a pregação do profeta, que é classificada de hazôn, "visão", um termo que se generalizou na época do exílio para designar o fenômeno profético do mesmo nome, é dirigida contra Edom, por causa de sua atitude hostil com relação a judá. A questão de saber quais os limites precisos dos oráculos isolados naturalmente tem sido resolvida de modos muito diferentes, ao passo que o problema de saber se os vv. 2-9, principalmente, devem ser considerados como tratando de uma visão retrospectiva a respeito do passado (como pensam WELLHAUSEN, NOWACK e outros), ou do anúncio de acontecimentos futuros (ORELLI, SELLIN e outros), no entretempo tem sido solucionado claramente no último sentido (EI55FELDT*, WEI5ER* e outros).
§ 64. ABDIA5
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Alguns exegetas admitem firmemente a unidade do livrinho todo, não podendo este, portanto, segundo eles, ser dividido em vários oráculos (AALDERS, EDELKOORT, Bié), sendo que Biõ o considera como um oráculo, ampliado em sentido litúrgico e destinado à festa da entronização, e o deriva do drama cultuaI. A maioria dos estudiosos, no entanto, admitem dois oráculos, que RUDOLPH, p.ex., identifica nos vv. 1-14,15b e 15a,16-18, além de uma conclusão, (19-21), e que WEI5ER* naturalmente junta ao oráculo precedente. EI55FELDT* vê igualmente apenas um oráculo nos vv. 1-14,15b (2-9: ameaça; 1O.14.15b: explicação), ao qual teriam sido acrescentados os vv. 15a,16-18 e 19-21 como complementações de dois autores. SELLIN-Ro5T* ampliam as distinções, vendo nos vv. 1-10 um oráculo original, nos vv. 11-14 um acréscimo mais recente e nos vv. 15a,16-18 e 19-21 dois apêndices. ROBIN50N decompõe o conjunto em oito oráculos ou fragmentos de oráculos. Se atentarmos para o conteúdo e os modos de falar ou fórmulas, surge-nos espontaneamente a idéia de dividir o conjunto em cinco oráculos com um apêndice de estrutura diversa: 1b-4 5-7
8-11
12-14.15b 15a.16-18
19-21
ameaça contra Edom, contendo a fórmula conclusiva: n''um yahweh. ameaça contra Edom, na qual o v. 7 deve ser colocado na seguinte ordem: 7ay+u7a l3 + b, antes do v. 6, que constitui evidentemente uma conclusão. ameaça contendo uma fundamentação e dirigida contra Edom, acompanhada da fórmula nr'um yahweh, que está ligada à pergunta introdutória, e de um hemistíquio isolado na conclusão. ameaça contra Edom, acompanhada de uma advertência, feita posteriormente. ameaça contra Edom, a se realizar no dia de Javé, que será contra todos os povos, e contendo evidentemente uma nova entrada em 15a e a fórmula conclusiva: lâ yahweh dibber. promessa em favor de Israel.'?'
2. Época As opiniões a respeito da época de origem do livro de Abdias se estendem desde o séc. IX até o séc, IV. A maioria dos autores, naturalmente, 174
J. GRAY, "The Diaspora of Israel and [udah in Obadiah v. 20", ZAW 65 (1953), 53-59. - W. KORNFELD, "Die jüdische Diaspora in Ab, 20", em: Mélanges Robert, 180-186.
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Os LIVROS PROFÉTICOS
supõe que o profeta floresceu na época que se seguiu à queda de Jerusalém em 587 (DEoEN, EOELKOORT, ErssFELDT* e outros). Com efeito, é somente este acontecimento que pode vir ao caso como motivo para as ameaças proferidas em 1b-18 contra Edom, principalmente porque as outras ameaças da mesma natureza, inclusive a de Am 1.11s, partem igualmente do fato de que, na época, Edom se achava do lado dos inimigos e se deleitou com a desgraça de [udá. As informações precisas de Abdias, que superam de muito as outras descrições, nos mostram também que ele foi testemunha ocular dos fatos narrados, os quais ele logo em seguida anunciou em seus oráculos. A utilização de passagens de Abdias em [r 49.7ss nada indica em sentido contrário, pois estas palavras não provêm de Jeremias, e além do mais, versículos idênticos aos de Abdias foram acrescentados posteriormente ao conjunto, que é próprio dele. O oráculo 19-21, que deve ser considerado como apêndice, anuncia a ocupação da região palestinense situada a ocidente do [ordão, fora de [udá, pelos israelitas e judaítas da diáspora, e uma guerra dos repatriados contra Edom. Este oráculo só pode datar da época posterior ao exílio. SELLIN, pelo contrário, pretendeu derivar os vv. 1-10da época posterior à rebelião de Edom contra [udá, por volta de 850 a.c. (2Rs 8.20s); 11-14 da época posterior a 586, e 15b,16-21 do séc. V, tendo sido sua opinião com respeito a 1-10 determinada pela utilização de versículos de Abdias em [r 49. Outros autores pensam no séc. VIII (KUTAL, Biõ), WELLHAUSEN admite o séc. V, por considerar 2-9 como uma descrição do avanço de certas tribos árabes contra Edom. ROBINSüN distribui os oráculos e fragmentos de oráculos ao longo do período que vai do final do séc. VI até meados do séc. IV.
3. Pregação A pregação de Abdias o apresenta como um dos representantes da profecia de salvação, combatida por Jeremias. Talvez fosse um profeta cultual no seio da população que permanecera na Palestina, depois da deportação para a Babilônia. De qualquer modo, para ele o elemento decisivo não foram razões de ordem nacional e religiosa, mas a seriedade ética da fé em Deus e a esperança na justiça eqüitativa de Deus. A expectativa de uma justa retribuição, claramente expressa no v. 15, está presente em todos os oráculos. Ela vem associada à idéia do dia de Javé enquanto dia de julgamento para as nações, julgamento no qual Edom, principalmente, terá a sorte que merece. A promessa acrescentada no
§ 65. JONAS
621
final, e segundo a qual o povo irmão [udá-Israel, vencido com a colaboração de Edom, ressurgirá, insere o livrinho na moldura escatológica (anúncios de calamidades para uma outra nação - promessa em favor do próprio povo).
§ 65. JüNA5 Cf. os comentários relativos ao § 61. G. CH. AALDERS, The Problem of the Book of[onah, 1948. - TH. E. BIRD, The Bookoflona, 1938. - W. BÓHME, "Die Composition des Buches [ona", ZAW 7 (887), 224.284. - TH. BOMAN, "[ahve og Elohim i [onaboken", NTT 37 (936), 159-164. - B. S. CHILDS, "Jonah", 51Th 11 (958),53-61. - A. FEUILLET, "Les sources du livre de Jonas", RB 54 (947), 161-186. - lo., "Le sens du livre de Jonas", ibid. 340-361. - S. D. GOITEIN, "Some Observations on [onah", lP05 17 (937), 63-77. - E. HALLER, Die Erziihlung von dem Propheten lona, 1958. - O. KOMLÓS, "[onah Legends", em: Études Oriento Hirschler, 1950,41-61. - O. LORETz, "Herkunft und Sinn der [ona-Erzãhlung", BZ NF 5 (961), 18-29. - H. ScHMIDT, lona, 1907. - L. STOLLBERG, lona, Diss. Hale, 1927. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Narrativa
a presente livro é uma narrativa a respeito de um profeta e não transmite nenhuma palavra dele, como o fazem quase sempre, ou exclusivamente, os outros livros proféticos. Por isso é que ele ocupa entre os mesmos uma posição particular, tendo sido incluído entre eles apenas por causa do conteúdo, embora não apresente nenhuma pretensão de haver sido escrito por um profeta. a que mais dele aproxima são as lendas dos profetas dos livros dos Reis. Seu herói negativista, Jonas, filho de Amati, talvez seja aquele profeta do mesmo nome, originário de Cat-Ofer (hirbet ez-zerrã, a nordeste de Nazaré), situada na região da tribo de Zabulon, e que transmitiu uma promessa a [eroboão 11 (2Rs 14.25). Se os autores dos livros dos Reis não se utilizaram da presente narrativa, é porque ela, evidentemente, ainda não existia por volta de 600 a.C; seja na tradição oral, seja na tradição escrita. É somente através da sua inclusão entre os livros do chamado Dodekapropheton ["Livro dos doze Profetas"], provenientes real ou supostamente do séc. VIII, que se manifesta a opinião dos redatores de que ele teria sido escrito nessa época ou de que, pelo menos, teria relação com o profeta de 2Rs 14.25.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
o livro narra que Jonas pretende furtar-se, com a fuga em um navio, à ordem que Javé lhe dera de convidar Nínive, a capital assíria, a fazer penitência, mas que ele, durante a tempestade desencadeada por Deus, faz-se lançar ao mar (cap, 1), tendo sido logo engolido por um peixe que o vomita na praia três dias depois (cap. 2). A seguir, ele obedece à ordem, que Javé lhe renova, e leva Nínive à penitência e à conversão. Javé, conseqüentemente, desiste do castigo que havia planejado (cap. 3). Através do exemplo da mamoneira, Javé mostra que a ira do profeta é infundada (cap.4). 2. Historicidade e origem do material narrativo A questão da historicidade e da origem do material narrativo do livro mais de uma vez agitou os ânímos.F' Com efeito, ainda hoje, depois que a interpretação tipológica do cristianismo antigo cedeu lugar à consideração literal, a partir de ACOSTINHO,176 há também quem às vezes considere a narrativa, inclusive a libertação de Jonas do ventre do peixe, como de natureza histórica ou a faça remontar a um relato mais antigo, que trataria daquele Jonas do séc. VIII, e a uma sua ameaça pronunciada contra Nínive, que não se conservou. Alguns pesquisadores admitem a possibilidade de que Jonas tenha recebido uma missão relacionada com Nínive, como Eliseu com referência a Damasco, existindo, por conseguinte, um núcleo histórico para a obra (SELLIN-RosT*). Neste caso, porém, devenos parecer tanto mais incompreensível o silêncio dos autores dos livros dos Reis vivamente interessados pela lenda. Trata-se, no entanto, de uma lenda que permaneceu viva primeiramente na tradição oral e que se apóia unicamente em um personagem histórico, mediante a utilização de seu nome, e vem entremeada de inúmeros e variados elementos, inclusive de natureza mítica e fabulosa. Esta lenda foi revista pelo seu redator, de maneira homogênea, não se podendo determinar, no particular, o que foi por ele acrescentado. Muitos temas, como o da atuação de Jonas em Nínive, são tipicamente israelíticoso Também a passagem súbita para o tédio de viver corresponde à maneira de pensar israelítica. Os motivos míticos e fabulosos, entre os quais se inclui principalmente a experiência com o peixe, conhecida talvez atra175
176
Cf. A. VACCARI, "H genere litterario deI libra di Giona in recenti publicazioni", Divinitas 5 (1961), 1-28. E. BISER, "Zum frühchristlichen Verstãndnis des Buches Jonas", Bibel und Kirche 17 (1962), 19-21.
§ 65. JONAS
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vés da saga grega de Hércules e de Perseu, eram largamente propagados, a ponto de KOMLÓS poder enumerar, inclusive, certos mitos assírios, babilônicos, índicos, e outros, cujos traços podemos reencontrar na narrativa de Jonas. Estes elementos podem ter influenciado a formação da narrativa, a partir das regiões de âmbito norte-palestinense e fenício. E como existia a ligação com uma viagem marítima, é possível mesmo que uma história surgida nessa região tenha sido vinculada ao nome de Jonas. É a partir da revisão israelítica de uma narrativa originariamente estrangeira que se poderia explicar a variação dos nomes divinos de Javé e Eloim, o último dos quais ocorre em 3,(3.)4-10; 4,(6.)7-9. São insatisfatórias as explicações apresentadas até agora e segundo as quais esses nomes se refeririam a duas fontes distintas do livro (BÓHME, H. SCHMIDT) e indicariam, enquanto expressões de uma determinada teologia, o Deus Javé, conhecido por sua benignidade, e o Deusabsconditus Eloim (BoMAN).
3. Gênero literário De acordo com o gênero literário, portanto, o livro não é uma narrativa profética histórico-biográfica, para a qual evidentemente faltam as necessárias indicações, mas um documento didático, de gênero midráshico e elaborado em estilo esquemático e didático-repetitivo, sob o influxo da literatura sapiencial. Recentemente chamou-se a atenção para o seu caráter didático e midráshico.!"
4. Época Para a época de origem do livro, que Eclo 49.10 e Tb 14.4,8 supõem como já conhecido no séc. 11 a.c., não se pode pensar no tempo anterior ao exílio. As formas verbais e estilísticas do hebraico tardio e os aramaísmos (1.4-6,12; 2.1; 3.7; 4.6,8) indicam uma época muito mais recente. Além disto, o reino assírio e sua capital, cuja queda se deu em 612, aparecem como realidades que pertencem a um passado longínquo (3.3). Tudo isto, e mais o objetivo do livro, sobre o qual voltaremos a falar, nos permitem admitir 177
Midráshe: LoRETZ. - J. ScHILDENBERGER, "Der Sinn des Buches Jonas", Erbe und Auftrag 38 (1962), 93-102. - J. SCHREINER, "Eigenart, Aufbau, lnhalt und Botschaft des Buches Jonas", Bibel und Kirche 17 (1962), 8-14. - Obra didática: R. AUGÉ, Projetes Menors, 1957. - WEISER*. - Parábola: FEUILLET.
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Os LIVROS
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que a obra surgiu, não antes do séc. V (DEDEN, WEISER*), mas sim no séc. IV (SELLIN-RosT*).178
5. Cântico de ação de graças
o cântico de ação de graças, proferido por Jonas durante sua permanência de três dias no ventre do peixe: 2.3-10,179 não faz parte do antigo fundo do livro de Jonas, mas foi acrescentado posteriormente. Ele corresponde aos cânticos de ação de graças do Saltério. Vê-se que se trata de um acréscimo, pelo fato de que, nos vv. 6s, não se pressupõe a permanência do profeta no ventre do peixe, e também pelo fato de que, como cântico destinado a celebrar uma libertação que já acontecera, não combina com a situação de Jonas, que primeiramente deveria pedir socorro. Não se encontram pontos de apoio para determinar a idade e a origem do cântico. Ele pode ser mais antigo ou mais novo do que o livro.
6. Intenção
o livro não é um gesto de expiação, com o qual o profeta estaria criticando o próprio comportamento (GaITEIN), nem uma profecia a respeito da misericórdia de Deus. Também não aparece, de modo claro e exclusivo, a influência das idéias dêutero-isaianas da salvação universal (CHILDS, WEISER*). Antes, o que se nota no livro é a concepção universal da teologia sapiencial posterior ao exílio, combinada com certas idéias surgidas a partir de Amós. De qualquer modo, ele tem uma intenção de cunho universalista: a misericórdia de Deus não se destina exclusivamente a Israel, mas pode descer sobre os homens e mesmo sobre os animais de uma cidade estrangeira e odiada, se aí houver verdadeira conversão. O livro se contrapõe à idéia da restrição da salvação apenas a Israel, que se torna particularista na figura de Jonas, e ao conceito da validade incondicional das ameaças expressas contra outras nações. Neste sentido, podemos chamar o livro de documento que exprime uma tendência contra certa intolerância e contra a arrogância particularista (WEISER*), e, por causa da misericórdia divina que transpõe todos os limites, considerá-lo como uma aplicação de Ez 18.23, incluindo a idéia de missão. Contudo, nele não se 178
179
A datação proposta por AUGÉ (ver acima, nota 177) em torno de 250 parece muito tardia. A. R. JOHNSON, "[onah 2,3-10", em: ThH. Robinson-Festschrift, 1950,82-102.
§ 66. MIQUÉIAS
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encontra uma afirmação expressa que aponte diretamente neste sentido, de modo que ele bem poderia ser a expressão, apresentada mediante um exemplo, da teologia universalista e humana de seu autor proféticosapienciaL
§ 66. MIQUÉIAS Cf. os comentários relativos ao § 61. W. BEYERLIN, Die Kulttraditionen Israels in der Verkündigung des Propheten Micha, 1959. - A. BRUNO, Micha und der Herrscher ausder Vorzeit, 1923. - B. A. COPPAS - E. L. CARLSON, A Study of the Prophet Micah, 1950. - K. ELLIGER, "Die Heimat des Propheten Micha", ZDPV 57 (1934), 81152. - E. HAMMERSHAIMB, "Einige Hauptgedanken in der Schrift des Propheten Micha", StTh 15 (1961), 11-34. - A. JEPSEN, "Kleine Beitrãge zum Zwõlfprophetenbuch 2.", ZAW 56 (1938),96-100. - J. JEREMIAS, "Moreseth-Gath, die Heimat des Propheten Micha", PJB 29 (1933),4253. - A. S. KAPELRUD, "Eschatology in the Book of Micah", VT 11 (1961), 392-405. - J. LINDBLOM, Micha, literarisch untersucht, 1929. - B. RENAUD, Structure et attaches littéraires de Michée IV-V, 1964. - L. P. SMITH, "The Book of Micah", Interpr 6 (1952), 210-227. - B. STADE, "Bemerkungen über das Buch Micha", ZAW 1 (1881), 161-172. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Miquéies Miquéias, que por certo deve ser distinguido daquele Miquéias filho de [emla de 1Rs 22, é, segundo o título, originário de Moreset-Get (ieil eddschudêde), pequena localidade situada na região montanhosa de [udá, a sudoeste de Jerusalém. Esta localidade pertencia àquela região que Senaquerib separou de [udá em 701, embora não pareça que Miquéias tenha assistido ainda a esse acontecimento. Ele era por certo um camponês que conhecia com exatidão os abusos que tinham seu ponto de partida na capital e sob os quais ele próprio talvez tivesse mesmo sofrido. Não é certo se exerceu o ministério profético já sob os reis [oatão e Acaz, como o indica 1.1. Sem dúvida, ele atuou durante o governo de Ezequias, como nos informa [r 26.18. Como 1.2-9 se volta contra Samaria, que ainda existia, a atuação de Miquéias deve ter começado já antes da queda da referida capital em 722, ao passo que ele desconhece a campanha assíria de 711 e ainda mais particularmente aquela posterior, do ano 701. Assim, sua atividade se desenrolou no período que vai da época posterior a 725 até
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PROFÉTICOS
antes de 711.Miquéias é, conseqüentemente, um contemporâneo mais novo de Isaías, cuja obra se segue, imediatamente, no tempo, àquela de Oséias, em Israel. Não é, pois, de admirar que ele tenha conhecido as palavras de Isaías, assim como este também conhecia as palavras de Amós, um pouco mais antigo do que ele. Pelo menos dois oráculos de Miquéias foram influenciados por Isaías: 1.10-15por Is 1O.27b-32, e 2.1-3 por Is 5.8-10. Não se exclui que Miquéias tenha exercido o seu ministério profético em sua terra natal. De qualquer modo, os oráculos de 1.10-15 foram pronunciados a partir de Morasti, pelo menos representada como lugar de sua permanência. Seus outros oráculos ele talvez os tenha pronunciado em Jerusalém. Naturalmente não é assim tão fácil resolver a questão de saber quais os oráculos que provêm de Miquéias, simplesmente apelando para o livro que traz o seu nome, porque a parte que aí lhe cabe é controvertida. Por isso, as quatro seções em que a obra se divide, devem ser analisadas cada uma por sua vez. 1-3 4-5 6.1-7,7 7.8-20
palavras de invectiva e de ameaça contra Israel e [udá, promessas, palavras de exortação, de invectiva e de ameaça, promessas.
LIPPL e COPASS-eARLSON atribuem quase todo o livro a Miquéias. O primeiro destes autores lhe nega apenas a autoria de 7.8-20 e vê em 4.1-5 um oráculo mais antigo, utilizado por Isaías e Miquéias, enquanto os dois outros oscilam entre Isaías e Miquéias como autores de 4.15. Por outro lado, ROBINSON situa alguns dos oráculos de 4-7 na época posterior ao exílio, mas nada atribui destes capítulos a Miquéias. O resultado geral da crítica é no sentido de que 1-3 e 6-7,7 provêm, na sua quase totalidade, de Miquéias, e que 4-5 e 7.8-20, pelo contrário, constituem promessas de época posterior, embora ocasionalmente se atribua um ou outro dos oráculos de 4-5 também aMiquéias.
2. Primeira coleção de oráculos Para a coleção de oráculos 1-3 a situação é de todo clara.!" Não resta dúvida de que ela contém quase todos os oráculos originais de Miquéias, 180
K. BUOOE, "Das Rãtsel von Micha 1", ZAW 37 (1917/1918),77-108. - lo., "Micha 2
und 3", ibid. 38 (1919/1920),2-22. - H.-M. WEIL, "Le chapitre 2 de Michée expliquée par le Premier des Rois, chapitres 20-22", RHR 121 (1940),146-161.
§ 66. MIQUÉIAS
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que receberam apenas alguns acréscimos, juntamente com a promessa 2.1213, que provém do exílio ou da época pós-exílica. A coleção foi organizada sob o ponto de vista dos assuntos. Começa no capítulo 1, com dois oráculos abrangentes, proferidos contra Israel e [udá: em 2.1-3.8 acrescenta oráculos contra as camadas dirigentes e contra os profetas do culto de Jerusalém, e termina com a ameaça recapitulativa de 3.9-12. A perícope 1.2-9 é um oráculo de julgamento profético contra Israel e [udá. Contém três partes: o anúncio do processo, o discurso de acusação, a sentença pronunciada por Javé e a queixa do profeta. Este oráculo não deve ser restringido apenas aos vv. 2-7 (EISSFELDT*, WEISER*), nem deve ser também dividido em outras pequenas unidades (ROBINSüN e outros). O trecho 1.10-15 é uma ameaça que, através de certos jogos de palavras, faz os nomes de algumas localidades da região montanhosa de [udá revelarem o que as esperará por ocasião da futura devastação do país. Esta ameaça certamente não descreve a marcha de aproximação de um exército inimigo, mas, por outro lado, também não é uma elegia com que Miquéias lamenta o estado da faixa de terra que Senaquerib separou de [udá em 701 (ELLIGER). De fato, à observação de que as fronteiras setentrionais, aparentemente arbitrárias, das localidades citadas, correspondem ao desmembramento levado a efeito por Senaquerib, ele contrapõe a constatação de que a fronteira meridional, para além da qual outras partes foram também separadas, está, na realidade, fixada arbitrariamente. O olhar de Miquéias vai na direção leste-oeste, enquanto a direção nortesul não desempenha nenhum papel. 1,16 é um acréscimo feito a este oráculo. As perícopes 2.1-3 (com um oráculo de zombaria e sua explicação nos vv. 4s como acréscimo)!" e 3.1-4 constituem, a um tempo, invectivas e ameaças; 2.6-9 (com o v. 10 como acréscimo) é uma invectiva dirigida contra as camadas dirigente e provém de uma discussão. Em 2.11 encontra-se uma invectiva e em 3.5-8 simultaneamente uma invectiva e uma ameaça proferidas contra os profetas do culto aos quais Miquéias contrapõe a própria autoridade. Por fim, 3.9-12 termina em uma ameaça fundamentada e acompanhada do anúncio da completa devastação de Jerusalém, anúncio este cuja recordação, segundo [r 26.18, ainda se conservava bem viva, mesmo depois de um século. 181
Opina diferentemente: A. ALT, "Micha 2,1-5", NTT 56 (1955),13-23 (= Kleine Schriften, III 1959,373-381).
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OS LIVROS PROFÉTICOS
3. Segunda coleção de oráculos
o fato de Miquéias ter sido conhecido posteriormente apenas através de sua ameaça já é um argumento contra a opinião daqueles que lhe atribuem as promessas que se encontram na coleção de oráculos 4_5. 182 Verdade é que se pretendeu considerar pelo menos 4.1-5,8 como de sua autoria (H. SCHMIDT, SELLIN e outros), ou se chegou a aventá-lo para 4.9,10,14 (WELLHAUSEN, Nowxcx, SELLIN-RoST* e outros), bem como para 5.1-4 (WEISER*, SELLIN-RoST* e outros) ou para a base de 5.9-14 (WELLHAUSEN, Nowxcx, EISSFELDT*, WEISER* e outros). Também se pretendeu identificar em 4.14; 5.1-5, de um lado, oráculos mais antigos, da época anterior a Miquéias (CROOK), e em 4-5, do outro, oráculos da época do exílio, ou posteriores ao mesmo, e originários do círculo de supostos discípulos de Miquéias (MARSH). Não existe, porém, nenhuma prova convincente em tal sentido. O fato de se pretender ver promessas messiânicas datando da época pré-exílica dos reis é conseqüência de uma hipótese errônea, já contraditada por Ageu e Zacarias. O fato de que estas idéias sejam semelhantes àquelas que se encontram no livro de Isaías nada está a significar, porque, neste caso, elas são pelo menos controvertidas. Na realidade, é quase impossível imaginar uma frase dos oráculos de 4-5 que seja originária da época anterior ao exílio. A maioria das idéias e expressões desta coleção se encontram alhures, principalmente ou exclusivamente em palavras que datam seguramente de época mais recente. Foi sobretudo RENAUD quem demonstrou, no particular, a existência destas relações e dependências e considerou os capítulos em questão como exegese midráshico-antológica de uma escola sacerdotal pósexílica do séc. V. Embora com isto se tenha ido além dos limites reais, contudo, a origem desses capítulos em época pós-exílica está claramente delineada. Por certo que o livro pressupõe também a queda de Jerusalém (4.8), o exílio e a dispersão (4.6s). A dinastia davídica já pertence ao passado (5.1-3). Em vista de tudo isto, trata-se de uma coleção de oráculos isolados, da autoria de profetas escatológicos desconhecidos da época posterior ao 182
M. B. CROOK, "The Promisse in Micah 5", JBL 70 (1951), 313-320. - J. MAR5H, Amos and Micah "Torch Bible Commentaries", 1959. - B. STAOE, "Bemerkungen über das Buch Micha", ZAW 1 (1881),161-172. - lo., "Weitere Bemerkungen zu Micha 4.5", ibid. 3 (1883), 1-16.
§ 66. MIQUÉIAS
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exílio. Eles prometem que Jerusalém será colocada como ponto central do reino divino de paz (4.1-5, assumido em Is 2.2-4);183 anunciam que os dispersos serão recolhidos e a cidade será restaurada (4.6s,8), que as nações inimigas serão aniquiladas (4.9-12,13s; 5.4s) e que se instaurará a soberania de um Messias davídico (5.1-3), simultaneamente com a superioridade de Israel (5.6-8) e a eliminação dos meios humanos de poder e do paganismo (5.9-14), de onde resulta que as perícopes 4.1-5 e 5.9-14 formam uma moldura harmoniosa de todo o conjunto.
4. Terceira coleção de oráculos A coleção de oráculos 6.1-7.7 contém um grande oráculo de julgamento, cujas partes são as seguintes: 6.1-8, proclamação do processo de acusação proferida por Javé; proposta de oferecimento de sacrifício pelo indivíduo; exigência feita por Deus, e compendiada pelo profeta, de que sejam praticados o direito e o amor e de que os homens andem ajuizadamente diante dele, como se diz numa expressão sapiencial.!" Seguem-se uma invectiva-ameaça dirigida contra a cidade pecadora (6.9-16) e uma queixa a respeito da corrupção do povo, acompanhada de breve ameaça: 7.1-6 (7), e que soa como Is 57.1s. As observações registradas em outra parte desta obra a respeito da gênese dos livros proféticos com base no esquema escatológico constante de dois (ou ampliado para três) membros (§ 54,3) já constituem argumento contra as tentativas de atribuir as referidas palavras a Miquéias (EI55FELDT*, WEI5ER*, SELLIN-Ro5T* e outros). Segundo estas mesmas observações, deve-se tratar de uma coleção de oráculos de origem mais recente, que foram acrescentados às duas coleções precedentes. Não se encontra aí nenhuma característica própria, que indique a autoria de Miquéias, pois o fato de se censurar o comportamento dos maus e de se exigir a justiça aplica-se a qualquer época. A teologia sapiencial, que aponta o papel do indivíduo (6.1-8) e a desintegração social (7.1-6), nos leva a pensar na época anterior a Neemias, no séc. V (PFEIFFER*). 185
183 184
185
Assim também E. CANNAWURF, "The Authenticity of Micah IV 1-4", VT (1963),26-33. Pr 11.2; Eclo 16.25. - G. W. ANDERSON, "A Study of Micah 6,1-8", 5JTh 4 (1951), 191-197. -A. DEISSLER, "Micha 6,1-8", rrierer rhZ 68 (1959), 229-234. - J. PH. HYATI, "On the Meaning and Origin of Micah 6,8", AThR 34 (1952), 232-239. - H. J. STOEBE, "Und demütig sein vor deinem Gott", WuD 6 (1959), 180-194. HYATI pensa, para 6.1-8, em um grupo hassideu dos sécs. IV-I1I a.C.
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5. Quarta seção A perícope 7.8-20, identificada por GUNKEL como uma liturgia profética,186 é composta de um cântico de confiança: vv. 8-10, de um oráculo de salvação: vv. 11-13, de uma oração a modo de um cântico de lamentação coletivo: vv. 14-17, e de uma declaração de firme certeza de que Deus haverá de atender: vv. 18-20, e onde Sião personificada ocupa o centro da atenção. Não se pode dizer que a perícope em questão constituiu, juntamente com 7.1-7, um texto litúrgico sobre o sofrimento e a reintegração do rei (REICKE), pois em 7.1-7 trata-se de um texto autônomo, como também não se pode considerá-la como um salmo norte-israelítico, proveniente da catástrofe de 732 ou 722 a.c., em vista da frase: aquele que aí habita solitário na floresta no meio do Carmelo (v. 14a) (EISSFELDT), pois a tradução no singular apóia-se apenas na vocalização massorética, enquanto o contexto exige uma forma no plural, de modo que não tem sentido pensar em Javé como habitante do Carmelo.l'" Como em geral se admite, a referida liturgia, que lembra o Trito-Isaías e contém a promessa da exaltação de Jerusalém, data da época posterior ao exílio.
6. Estrutura do livro Na construção do livro seguiu-se, por duas vezes, o esquema escatológico de dois membros. Primeiramente, acrescentaram-se as promessas escatológicas 4-5 aos oráculos de invectivas e ameaças, próprios de Miquéias: 1-3, resultando daí a seqüência: "desgraça-salvação". O mesmo"antes-depois" se repete nas perícopes 6.1-7.7 e 7.8-20, acrescentadas posteriormente.
7. Pregação O pequeno número de oráculos que se pode atribuir com certeza a Miquéias na coleção 1_3188 nos permite supor que, mesmo que se admita 186
187
188
H. GUNKEL, "Der Micha-5chluss", ZS 2 (1924),145-178. - O. EISSFELDT, "Ein Psalm aus Nord-Israel" (Micha 7,7-20)", ZDMG 112 (1963), 259-268. - B. REIKE, "Mik. 7 sasom 'Messiansk' text", SEA 12 (1947), 279-302. - B. 5TADE, "Micha 1,2-4 und 7,720, ein Psalm", ZAW 23 (1903), 163-171. Mesmo que se quisesse conservar o singular, Carmelo poderia indicar uma localidade situada na vertente oriental das montanhas de [udá, como o demonstrou A. JEPSEN, eine vergessene Landschaft?", ZDPV 75 (1959),74s, para 15m 25; 2Cr 26.10 (cf. Js 15.55). Com isto se põe em dúvida o estimulante mas hipotético estudo de BEYERLIN, pelo fato de extrair de 4.14; 5.1-5; 6.2 a interpretação anfictiônica de [udá considerado
§ 67. NAUM
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necessariamente um curto período de tempo para a atividade do profeta, apenas uma parte de sua pregação nos foi transmitida. Mas ainda assim, ele aparece como uma figura cheia de força e dotada de fisionomia própria e marcante. Do fato de ter visto pessoalmente os abusos sociais contra os quais ele se volta, particularmente a subversão do antigo direito do solo, praticada, a começar por Jerusalém, em favor dos grandes proprietários de terra, é que se explicam o tom severo de suas acusações e a acrimônia de suas ameaças, incomuns no seio da profecia, e que brotam da sua compaixão pelo sofrimento dos pequenos camponeses, como também do seu desprezo pelos profetas cultuais que falavam sempre ao gosto dos grandes, com o que garantiam o seu sustento. A razão mais profunda para isto ele a dá, ao caracterizar a sua missão (3.8): é com força, com justiça e fortaleza que ele deve denunciar a Israel os seus pecados. É por conhecer a justiça divina, que ele se volta contra a falsa segurança daqueles que se consideram colocados por Deus em situação de salvação, julgando-se, assim, protegidos contra toda desgraça. Aos que apelam para o fato de serem o povo de Deus, ele contrapõe, em 2.6-8, de maneira breve e drástica, a afirmação: Vós não sois absolutamente "meu povo!" Por isso, nada mais lhe resta, senão anunciar o aniquilamento inevitável.
§67.NAUM Cf. os comentários relativos ao § 61. - Especiais: O. HAPPEL, 1902. - W. A. MAIER, 1959. J. S. OXHRANE, "Literary Features of Nahum", Diss. Dallas Theol. Seminary, 1954. - A. HALDAR, Studies in the Book of Nahum, 1947. - P. HUMBERT, "Le problême du livre de Nahoum", RHPhR 12 (1932), 1-15. - P. KLEINERT, "Nahum und der Fall Ninives", ThStKr 83 (1910),501534. - A. Laos, "Trois études sur la littérature prophétique", RHPhR 11 (1931),211-219. - J. L. MIHELIC, "The Concept of God in the Book of Nahum", Interpr 2 (1948), 199-208. - G. SMIT, Het book van den profeet Nahum, 1934. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52). como Israel, e igualmente pelo fato de concluir, em essência somente a partir dos capítulos 4-7, que Miquéias se utilizou das tradições da saída do Egito, da conquista do país e da aliança de Davi. O mesmo se diga dos estudos de HAMMERSHAIMB e de KAPELRuD, que consideram Miquéias como profeta de desgraça e de salvação.
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1. Naum Sobre Naum o título de seu livro (1.1) nos diz apenas que ele provém de E1cós. Mas a situação deste lugar que a tradição situa, seja perto de Nínive, seja em [udá e na Galiléia, é inteiramente desconhecida. A pregação de Naum é caracterizada por 1.1, de um lado, como Oráculo sobre Nínive, mediante o termo massa', utilizado preferencialmente para designar oráculos referentes a nações estrangeiras, e, por outro lado, como Livro da visão, mediante o termo hazôn, empregado, nesta forma, somente em época mais recente.
2. Época A época em que Naum exerceu sua atividade profética pode ser deduzida, em seus grandes traços, a partir do título e do conteúdo dos seus oráculos, onde estão prenunciadas as desgraças da capital assíria, Nínive, que ainda existia. De um lado, 3.8ss supõe como conhecida a conquista da cidade egípcia de Tebas pelos assírios, em 663, embora não apareça claramente desde há quanto tempo este acontecimento se havia dado. Por outro lado, Nínive, que foi tomada em 612, ainda está de pé, pois vê-se claramente que Naum apenas lhe anuncia a queda (ELLIGER, ROBINSON). Não se pode entender o livro como sendo uma visão retrospectiva dos fatos, posterior à queda da cidade (HUMBERT, Loos, SELLIN), principalmente porque a mudança que se introduz no texto de 1.9 carece de toda base, ao passo que a ausência de qualquer acusação contra [udá não pressupõe absolutamente a reforma deuteronomista de [osias. Como moldura geral, portanto, podemos fixar os anos de 663-612. Quando se trata de chegar a uma determinação mais exata, as opiniões divergem. Enquanto MAIER pensa já nos anos anteriores a 654 e UNGERN-STERNBERG189 reparte os oráculos de Naum pelos anos 630587, a maioria dos autores supõe o período imediatamente anterior a 612, quando já se delineava o fim do reino assírio (H. SCHMIDT, HORST, PFEIFFER*, HALDAR e outros). ELLIGER e WEISER* também situam a maioria dos oráculos neste período; mas, enquanto o primeiro considera alguns oráculos como sendo acima de um decênio mais antigos (cântico triunfal: 2.1,3) e o segundo julga 1.2-9; 1.12s+2.1-3 e 3.18s como sendo complementações da profecia de Naum, acrescentadas depois da 189
R. VON UNGERN-STERNBERG - H. LAMPARTER, Der Tag des Gerichtes Gottes, 1960.
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queda de Nínive, BENTZEN considera como provável que os oráculos tenham surgido pouco depois de 626. Duas informações do livro nos levam mais longe. O indigno de 2.1 parece, pelo contexto, ser o rei assírio Assurbanípal, cuja morte, ocorrida em 626, seria então suposta. Além disso, a promessa de 2.3 nos mostra que o êxito alcançado por [osias por ocasião da reconquista de grande parte do antigo Reino do Norte de Israel ainda se situa no futuro. Trata-se apenas da esperança, ainda por se realizar, da reunificação de todo o Israel. Diante disto, pelo menos o oráculo que abrange 2.1,3 provém da época imediatamente posterior a 626 e anterior aos sucessos políticos de [osias.
3. O hino Os oráculos de Naum são introduzidos por um hino em forma alfa-
bética,"" o qual, excluídas as glosas 1,2b.3a, se reduz a 1.2-9. e, com uma transposição no v. 9, vai até a letra mêm. Este hino descreve o aparecimento de Javé, para o julgamento (vv, 2-9) durante o qual ele aniquilará seus inimigos para sempre, e salvará da desgraça os seus seguidores (vv. 6-9). A terceira parte, que é preciso admitir e na qual talvez viesse exposta mais detalhadamente a execução do julgamento de Javé, foi eliminada, pelo fato de que os oráculos subseqüentes de Naum tratavam desse mesmo tema. HUMBERT, pelo contrário, limita o salmo aos vv. 2-8, enquanto HORST acrescenta o v. 10 e OESTERLEy-RoBINSON* julgam poder estendê-lo até 2.4. GUNKEL e BICKELL, sobretudo, procuraram reconstituí-lo até à letra tau. Contudo, os vv. lOss são de natureza inteiramente diversa, tanto do ponto de vista estilístico como do ponto de vista temático. No que respeita às suas relações com Naum e seu livro, JUNKER o atribui à autoria de Naum e WEISER* acha que este ponto merece ser seriamente considerado. HORST, pelo contrário, supõe que Naum inicia seu escrito com um salmo que já existia, enquanto PFEIFFER*, por seu lado, o considera como um acréscimo de época mais recente.
190
W. R. ARNOLD, "The Composition of Nahum 1-2,3", ZAW 21 (1901),225-265. - H. GUNKEL, "Nahum I", ibid. 13 (1893),223-244. - O. HAPPEL, Der Psalm Nahum (Nahum 1),1900. - P. HUMBERT, "Essai d'analyse de Nahoum 1,2-2,3", ZAW 44 (1926),266280. - W. C. GRAHAM, "The Interpretation of Nah 1,9-2,3", Al5L 44 (1927/1928), 37-48. - P. HUMBERT, "La vision de Nahoum 2,4-11", AfO 5 (1928/1929), 14-19.
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Ora, o salmo em questão não se refere a nenhuma situação histórica precisa, mas fala, genericamente, da vingança que Javé exerce contra seus inimigos, como corresponde de modo geral à natureza do hino. Embora isto não constitua, necessariamente, como a forma estilística alfabética, um argumento contra a autoria de Naum, contudo, o salmo se distingue dos oráculos de Naum, tanto pelo estilo quanto pelo assunto. Estilísticamente, o salmo não apresenta particularidades ou sutilezas que vão além dos elementos tradicionais, mas é impregnado de verdadeiro espírito religioso. Nos oráculos de Naum passa-se justamente o contrário: uma vigorosa força poética e criativa preside a elaboração das idéias que são mais de caráter político e nacional do que de inspiração religiosa. Embora se deva, por isso, negar a autoria do salmo a Naum, contudo, é bem possível que ele mesmo o tenha colocado no início de suas palavras, principalmente porque o hino se interrompe justamente onde começam os temas dos oráculos do profeta.
4. Os oráculos Os começos dos dois primeiros oráculos de Naum se misturam durante o processo de transmissão do texto, mas se pode facilmente reconstituir o contexto original, à exceção do versículo 1.14, atribuído, pelos autores ora ao primeiro, ora ao segundo oráculo.!" A primeira palavra que surge é uma liturgia: 1.12-13; 2.1,3, composta de uma promessa em favor de [udá: 1.12s, da convocação de uma festa, à qual se acrescenta uma fundamentação: 2.1 (em função de uma promessa), e de uma explicação conclusiva: 2.3, que talvez deva ser entendida como responsório da comunidade. Segue-se, em 1.10-11,14;2.2,4-14, uma segunda liturgia profética, tendo Javé e o profeta como porta-vozes. Esta liturgia consta de uma ameaça, com fundamentação, que é dirigida contra Nínive: 1.10-11,14; de um relato sobre uma visão e audição: 2.2,4-11; de uma elegia sarcástica: 2.12-13, e de uma ameaça: 2.14. Uma terceira liturgia profética é constituída por 3.1-7 e se compõe de um relato sobre uma visão e audição, com duas fundamentações da ameaça contida no relato contra Nínive: 3.1-4; de uma ameaça proferida por Javé: 3.5-6, e de uma elegia de escárnio: 3.7. 191
melhor é, com WEISER* e contra NOWACK, SCHMIDT e SELLIN unir 1.14 com 1.10-11; 2.2,4-14 (ELLIGER: 1.12-14 são três fragmentos; HORST; 1.11,14 constituem dois fragmentos).
O
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NAUM
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Como oráculos finais, acrescentam-se uma ameaça sarcástica: 3.8-17, e uma elegia zombeteira: 3.18-19, ambas dirigidas contra Nínive.
5. O livro em seu conjunto A maioria dos autores admite que o livro de Naum em seu conjunto, como acontece na maior parte dos livros proféticos, constitui uma coleção de oráculos originariamente independentes, entre os quais, à exceção do tema tratado, não existe nenhuma ligação externa. Mas opiniões diferentes também se manifestaram. HUMBERT, e no seu seguimento também sobretudo SELLIN, consideram o livro de N aum como uma liturgia homogênea, destinada à solenidade de ação de graças por motivo da queda de Nínive e recitada no templo de Jerusalém, na próxima festa do Ano Novo, durante a qual o salmo 1.2ss e o último ai! sobre Nínive cabiam à comunidade. WEISER* também acredita que o conjunto tenha surgido em duas etapas (constando de autênticas ameaças e complementos) e foi recitado no culto festivo, em 612. SELLIN-RoST* pensam igualmente numa liturgia festiva, constante da profecia 2.2ss e do salmo introdutório, contendo a palavra de Deus: 1.12-21. Por fim BENTZEN* vê nele uma liturgia que teria sido copiada dos ritos de preparação, que se executavam antes de uma batalha, e que, ao contrário do que opinam seus predecessores, deve provir da época posterior a 626. HALDAR, pelo contrário, entende o livro como uma obra religiosa e política, que provém de um círculo cultual de Jerusalém, o qual, em sua propaganda política contra Nínive, equiparava os inimigos políticos aos inimigos cultuais-míticos, utilizando-se, para isto, dos temas comuns a todo o Oriente. Sob este ponto de vista, ele defende a unidade do livro.
Na realidade, os oráculos parece não estarem isolados entre si, mas se pressuporem e se continuarem reciprocamente, formando um todo cujos temas se inter-relacionam. Encontram-se também elementos litúrgicos: o salmo, como hino de introdução e que um coro ou a comunidade poderiam ter cantado, e 2.3 como uma espécie de responso a 2.1. Também se pode constatar em três lugares a forma da liturgia profética, ou seja, da liturgia copiada do culto. Em verdade, por esta razão precisamente e por faltar o diálogo alternado entre Deus e o homem, não se pode dizer que se trata
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OS LIVROS PROFÉTICOS
de uma liturgia destinada à recitação cultuaI. Existe, contudo, uma série de oráculos, pertencentes a diversos gêneros literários e artisticamente compostos, que se poderia chamar de "cantata" recitada por profetas durante o culto."? Também se poderia pensar no hino juntamente com a perícope seguinte: 1.12s; 2.1,3, como sendo uma verdadeira liturgia, que terminaria com o responso 2.3. Neste caso se deveria considerar as demais perícopes como oráculos autônomos.
6. Pregação A pregação de Naum contém certas intuições verdadeiramente proféticas, ao ver em Javé o senhor das nações, ao reconhecer na Assíria uma missão de castigo contra [udá, e ao invectivar o caráter antidivino da política assíria, razão pela qual lhe parecem iminentes certos acontecimentos revolucionários. Mas, ele é, antes do mais, um representante da profecia da salvação, onde uma forte preocupação nacionalista prevalece sobre o elemento cultuaI. Segundo ele, Javé age exclusivamente em [udá e a favor de [udá - inclusive através de outras nações -, para tornar realidade a esperança da reunificação de todo o Israel. O que nos chama a atenção é a zombaria maliciosa: 3.8-17 - um oráculo em que simplesmente não se menciona o nome de Deus - e que vai até à promessa de aniquilamento das crianças (3.10). A comunicação das visões devia provocar também comoção na sua época em tal sentido. Percebe-se esta atitude mesmo nos modos de falar utilizados: nas elegias sarcásticas, das quais 3.7 se segue imediatamente a uma palavra de Javé. É por isso que se pode falar, com HALDAR, simplesmente do caráter propagandístico do livro, mesmo que se considere errado derivar suas idéias e expressões a partir de mitos e cultos orientais. A "cantata" de Naum talvez tenha servido para fomentar o movimento de libertação de [udá em relação à Assíria, movimento este introduzido pelo rei [osias depois da morte de Assurbanípal. Apesar de tudo isto, ele pertence à corrente dos profetas cultuais, com a qual Jeremias teve de lutar, posteriormente, e que se aproximava perigosamente dos limites da falsa profecia. 193
192 193
O termo foi usado por J. LINDBLOM para Is 24-27. A supervalorização de Naum por HORST e MIHELIC esvazia o seu caráter de profeta da salvação nacional.
§ 68. HABACUC
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§ 68. HABACUC Cf. os comentários relativos ao § 61. W. H. BROWNLEE, The Text of Habakkuk in the Ancient Comentary Qumran, 1959. - K. BUOOE, "Habakuk", ZDMG 84 (1930), 139-147. lo., "Zum Text von Habakuk Kap, 1 und 2", OLZ 34 (1931),409-411. - W. W. CANNON, "The Integrity of Habakkuk cc. PSalmiste 1.2", ZAW 43 (1925), 62-90. - M. DELCOP, "La geste de Yahvé au temps de l'Exode et l' espérance du psalmiste en Habacuc III", em: Miscellanea Biblica Ubach, 1954,287302. - B. DUHM, Das Buch Habakuk, 1906. - P. HUMBERT, Problêmee du livre d'Habacuc, 1944. - J. LACHMANN, Das Buch Habbakuk, 1932. - E. NIELSEN, "The Righteous and the Wicked in Habaqquq", StTh 6 (1953),54-78. - J. W. ROrn5TEIN, "Über Habakuk, Kap. 1 und 2", ThStKr 67 (1894), 51-85.H. ScHMIDT, "Ein Psalm in Buche Habakuk", ZAW 62 (1950), 52-63. - B. STADE, "Habakuk", ibid. 4 (1884), 154-159. - W. STAERK, "Zu Habakuk 1,5-11. Geschichte oder Mythos?", ibid. 51 (1933), 1-28. - CH. C. TORREY, "The Prophecy of Habakkuk", em: KohutMemorial Vol., 1935,565-582.H. H. WALKER-N. W. LUNO, "The Literary Structure of the Book of Habakkuk", JBL, 53 (1934),355-370. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19, 20 e 28 (§ 52).
1. Habacuc Habacuc, cujo nome não está fixado com certeza (LXX: ambakoum) é designado pelo título (1.1) como profeta profissional (nabi), portador de uma mensagem contra outras nações (massa'). Ele por certo estava agregado ao templo de Jerusalém, onde se empenhava ativamente em receber visões (2.1), onde transmitia as instruções recebidas nessas ocasiões (2.4) e as escrevia em tabuinhas (2.2; cf. Is 8.1). Fora de seu livro, ele é mencionado também na lenda tardia e não-histórica de Bel e do dragão, um dos acréscimos do livro de Daniel.
2. Tradição A tradição de Habacuc começa, em 1.2-4, com um cântico de lamentação individual a respeito de um ímpio violento, mas se refere, como um gemido do representante da comunidade na oração, à calamidade em que o povo se acha. Em resposta, pronuncia-se um oráculo salvífico de Javé: 1.5-11, que anuncia uma mudança na sorte do povo, para cuja realização Javé convoca os caldeus. Em vez da ação de graças por este fato, ou em vez da expressão da certeza de que se será atendido, segue-se um novo
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PROFÉTICOS
cântico de lamentação: 1.12-17, composto de interrogações e de afirmações. Lamenta-se de que o ímpio possa continuar a devorar os justos e a destruir nações inteiras. Em seguida o profeta se empenha em obter uma visão e recebe de Javé a ordem de registrar por escrito o oráculo de salvação recebido nesta ocasião, bem como a exortação a esperar com confiança a sua realização: 2.1-4. A secção imediata é constituída de cinco "ais": 2.5-17194 (acrescida de 2.18s,20), censurando ao violento salteador os seus crimes e anunciando-lhe os castigos correspondentes. Algumas vezes tem-se considerado o anúncio da vinda dos caldeus: 1.5-11, como uma interrupção que quebra o ritmo da lamentação 1.2-4,12-17,compreendida como constituindo um conjunto homogêneo, e os versículos têm sido, ora cancelados (WELLHAUSEN e outros), ora transpostos para depois de 2.4 (BuODE) ou 2.5a (ROTHSTEIN), como resposta original de Javé. Trata-se, contudo, de duas lamentações originais, compostas em metros diferentes e das quais a segunda supõe o oráculo de Javé (1.5-11) e pergunta por que não se realizou desde há muito o julgamento ali anunciado contra o ímpio. Acresce ainda que a sucessão de duas lamentações e de dois oráculos não é fato incomum. - Além disso, 2.5(a) tem sido juntado freqüentemente ao segundo oráculo de Javé (2.14) (WEISER*, BROWNLEE195 e outros). Mas isto é contraditado pela forma como está construída a série dos"ais", cada um deles com quatro versos longos, de modo que o oráculo que começa em 2.6b deve ser precedido de um segundo: 2.5-6a. Em vista disto, 2.4 constitui o segundo oráculo propriamente dito de Javé (STENZEL e outrosl.!"
o capítulo 3 contém um título próprio: Oração do nabi Habacuc além de observações de caráter musical e Iitúrgtco.!" Descontando-se o acréscimo posterior, constituído pelos vv. 17-19, a parte principal: vv. 3-15, que descreve, à maneira de um hino, a aparição de Javé, sua luta, que se reflete na convulsão da natureza e na vitória sobre o ímpio e em favor do povo, é emoldurada, nos vv. 2 e 16, por descrições da experiência dolorosa do profeta ao receber a visão. Desde STADE, são muitos os autores que têm negado a Habacuc a autoria do capo3, considerando-o como um apêndice originário da época posterior ao exílio (lRWIN: não provém de Haba194
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Deve-se restabelecer o primeiro ai! no começo de 2.5, como também passar 2.17 para logo depois de 2,13. - M. STENZEL, "Habakkuk 11 15-16", VT 3 (1953), 97-99. W. H. BROWNLEE, "The Placarded Revelation of Habakkuk", fBL 82 (1963), 319-325. M. STENZEL, "Habakkuk 2,1-4.5a", Bibl 33 (1952), 506-510. J. H. EATON, "The Origin and Meaning of Habakkuk 3", ZAW 76 (1964), 144-171. - W. A. IRWIN, "The Psalm of Habakkuk", fNES 1 (1942),10-40.
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cuc, mas é anterior ao exílio). H. SCHMIDT, afora o hino processional (3.117) considera inclusive 1.2-4,12-13; 3.18-19, que constituem um cântico de lamentação individual, como acréscimo posterior. Para este julgamento a respeito do capo 3 não se pode, evidentemente, apelar para o comentário de Habacuc de Qumran (lQpHab), porque só se trata aí dos capítulos 1-2 e não se considera o capítulo 3. Isto, com efeito, deve ter muitas e variadas razões, e não significa que o livro de Habacuc não tinha ainda o terceiro capítulo naquela época. Que este mesmo capítulo não tenha outro autor senão o dos capítulos 1-2, deduz-se do mesmo tema geral, da semelhança de linguagem e de referência de 3.2 a 2.1-4. A experiência extático-visionária do profeta, suposta aí, é descrita em seus efeitos sobre ele.
3. O conjunto da profecia
o conjunto da profecia de Habacuc certamente não constitui uma unidade literária (WALKER-LuND), e tampouco uma simples coleção de oráculos (ErssFELDT*, WEISER*). Apesar da datação ou da interpretação errôneas da figura do ímpio, BALLA 198 e, respectivamente, SELLIN, HUMBERT e NIELSEN no fundo têm todos razão, quando afirmam que se trata de uma liturgia profética. Mais precisamente: deve-se dizer que 1-2 constituem a imitação profética de uma liturgia cultual, tendo Habacuc como seu único porta-voz. Da mesma forma que nas lamentações e nas orações ele se utiliza do vocabulário da lírica cultual, assim também ele usa certos gêneros literários cultuais (cântico de lamentação e hino) e aparece como porta-voz da comunidade na oração do templo onde provoca uma experiência extático-visionária e registra o seu oráculo por escrito. Os capítulos 1 e 2 são construídos sobretudo com base na seqüência de dois membros: cântico de lamentação - oráculo de Javé, que contém, numa versão própria, a perícope de [r 14.2-15.2. 199 A série de "ais" está intimamente relacionada com este fato: do mesmo modo que eles supõem os dois oráculos de Javé, assim também ocupam, dentro do conjunto, o lugar que, no cântico de lamentação, corresponde, depois da queixa e do oráculo afirmativo, à certeza de atendimento ou à ação de graças: 198 199
E. BALLA em: RGG IF, 1928, 1556s. O duplo caminho que leva da queixa ao pedido ocorre nos 5122.1-12,13-22; 59.26.7-15; 69.1-7,8-13; 88.2-10,11-13,14-19; 102.2-23,24-29; 109.1-20,21-31; 140.2-6,7-12, o duplo caminho que vai da invocação e da queixa à certeza de ser atendido ou ao voto se encontra nos 5135.1-10,11-27; 86.1-13,14-17; triplicadamente no SI 71.
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640 1.2-4 1.5-11 1.12-17 2.1-4 2.5-17
primeira queixa, primeiro oráculo de Javé, segunda queixa, recepção e proclamação do segundo oráculo de Javé, série de "ais" como certeza de atendimento.
Se Habacuc apresentou este conjunto no culto e se nessa ocasião ele consignou por escrito o oráculo central (2.4), resta então determinar a importância do capítulo 3, que se pretende derivar de tradições egípcias (ZOLLI)/oO babilônicas (IRWIN)2°1 ou ugaríticas (CASSUTO, GASTER, ALBRIGHT)/o2 esquecendo-se, a este respeito, a influência muito mais acentuada das descrições das teofanias do Antigo Testamento. Também dificilmente se pode classificá-lo como salmo de lamentação, que conteria representações oriundas do fundo de idéias das festas do outono e do Ano Novo (MOWINCKEL).203 Os versículos da moldura (3.2-16) o caracterizam como relato de uma visão e o colocam em ligação com 2.1-4. É por isso que WEISER* chega mesmo a supor nele a presença da visão que devia ser escrita nas tabuinhas do templo, e também a sua colocação original depois de 2.1-3. Entretanto, de conformidade com a estrutura litúrgica de 1-2, a série dos" ais" deve seguir-se imediatamente ao oráculo de salvação, que, em princípio, é breve, mas para o qual o capítulo é muito longo. Seguramente, em 3.2-16 encontra-se a descrição da visão que foi concedida a Habacuc (2.1ss). Esta visão foi escrita independentemente da liturgia profética, tendo-lhe sido acrescentada como conclusão complementar e confirmativa. Ao mesmo tempo ela explica por que é que o profeta se dá por satisfeito com o segundo oráculo de Javé, embora este oráculo não traga nada de novo com relação ao primeiro, e por que é que ele coloca em seguida a série de "ais" como "certeza de atendimento": é porque ficou plenamente convencido depois da visão.
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203
L ZOLLI, "Una teofania biblica e la riforma religiosa di Amenofi IV Echenaton", em: Actes XXe Congr. Int. Orient., 1940, 278-285. W. A. IRWIN, "The Mythological Background of Habakkuk, Chapter 3", JNES 25 (1956),47-50. W. F. ALBRIGHT, "The Psalm of Habakkuk", em: Th. H. Robinson-Festschrift, 1950, 1-18. - U. CASSUTO, "H capitolo 3 di Habaquq e I testi di Ras Shamra", Annuario Studi Ebr., 1935/1937, 7-22. - TH. H. GASTER, "On Habakkuk 3,4", JBL 62 (1963), 345s. S. MOWINCKEL, "Zum Psalm des Habakuk", ThZ 9 (1953), 1-23.
§ 68.
HABACUC
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4. A questão central: o "impio" e os caldeus A questão central da profecia de Habacuc consiste em determinar quem seja o "ímpio" que é, ao mesmo tempo, acusado e ameaçado, e qual o papel dos caldeus (1.6). Talvez seja necessário distinguir, antes de tudo, o primeiro dos segundos, e não identificá-los entre si, cancelando ou não o trecho 1.5-11, como se Habacuc estivesse se lamentando dos maus-tratos infligidos pelos caldeus às nações e particularmente a Iudá (WELLHAUSEN, SELLN, N6TscHER e outros). Com efeito, Javé apenas acaba de suscitar os caldeus 0.6), ao passo que a opressão que vem do inimigo dura desde há muito tempo. Esses caldeus são os fundadores do reino neobabilônico, cujo aparecimento no cenário do Antigo Oriente acaba apenas de se iniciar. É sobre este ponto que nos devemos firmar, embora esta solução evidentemente tenha parecido muitas vezes demasiado simplista e tenha provocado dúvidas, mesmo fazendo-se a distinção entre o ímpio e caldeus. a) A identificação dos caldeus com os persas (LAUTERBURG),2°4 com os Selêucidas por volta de 170 a.c. (HAPPEL),2°S com uma potência demoníaco-mítica, portadora dos castigos de Javé (STAERK), ou com uma nação desconhecida de conquistadores (HORST) se choca com o texto de 1.6, inteiramente claro, tanto quanto a hipótese de que Habacuc teria introduzido secundariamente os caldeus (ELLIGER). Foi sobretudo a partir de DUHM que se pensou nos gregos, sob Alexandre Magno, mudando-se o nome de caldeus para ciieus, interpretação esta contra a qual BUDDE se voltou energicamente. Não existe nenhuma referência em favor de uma tal alteração no texto, que é introduzida, portanto, de modo arbitrário. É verdade que o comentário de Habacuc descoberto em Qumran interpreta 1.6 como se referindo aos ciieus) ou seja, aos Selêucidas ou romanos do séc. II ou I a.c., mas, apesar desta atualização cronológica introduzida no texto citado, o comentário conserva o termo caldeus) de sorte que esta antiga referência constitui precisamente um argumento contra qualquer mudança. b) Algumas vezes se pretendeu ver o ímpio, contra o qual os babilônios moverão combate, na pessoa do rei judaíta Joaquim, talvez como representante dos ateus judaítas (ROTHSTEIN, OESTERLEy-RoBINSON*, HUMBERT, NIELSEN). Mas, ainda que a idéia de que Javé envia um povo estrangeiro ThZ a.d. Schweiz 13 (1896), 74-102. Das Buch des Propheten Habakkuk, 1900.
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HAPPEL,
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como executor de seus juízos contra Israel seja em tudo profética, essa interpretação, no entanto, fica excluída, porque, em mais de um lugar, Habacuc pensa claramente em uma grande potência estrangeira (1.17; 2.5,8), e anuncia precisamente o socorro de Javé em favor de seu ungido, isto é, do rei judaíta (3.13). Também a circunstância de a profecia de Habacuc ser designada como massa' é indício de que ele se volta contra um outro povo. Como tal, na época do aparecimento dos babilônios, só os assírios é que podem vir ao caso. É a eles que se refere a conexão entre 2.17 e Is 37.24, como também as reminiscências de Na 1.11; 2.13; 3.1. Habacuc prediz, portanto, que a soberania assíria, sob a qual [udá padeceu, juntamente com outras nações, será abatida pelos babilônios, enquanto instrumentos de Javé. É este o sentido do oráculo central de sua visão (2.4), evidentemente escrito por ele pessoalmente: "Eis que o Arrogante (ou o Ímpio) não terá a vida em si, mas o justo viverá por causa da
sua fidelidade".
5. Época É com base nestes dados que se pode fixar a época da profecia de Habacuc. Ela deve ter surgido depois de 626, quando os caldeus, após a bem sucedida revolta de Nabopalasar, aparecem à margem do cenário da história universal, antes da queda do reino assírio em 612. Como o peso da soberania assíria ainda se fazia sentir e como já não se pode mais falar da mesma depois das medidas da reforma de [osias, em conseqüência da sua emancipação da Assíria, foi somente depois de 622 que Habacuc apareceu. A pesquisa de seu vocabulário levada a efeito por HUMBERT aponta para a mesma época. Talvez se deva situá-lo um pouco mais tarde do que Naum, que manifestamente nada conhece ainda a respeito dos caldeus. A novidade que Habacuc tem a anunciar é a de que eles provocarão a queda da Assíria.
6. O caráter de Habacuc Habacuc é, tal como Naum, um profeta ligado ao culto, para quem [udá é o "Justo" (2.4), ao qual ele promete ajuda, sem, no entanto, convidá-lo a curvar-se e a se converter, e vê a justiça de Deus não como exigência sobre o seu povo, mas em suas relações com a potência universal da impiedade. Há um certo número de anúncios da salvação nacional que não se pode perder de vista, particularmente em confronto com as
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palavras contemporâneas de [r 1-6. Entretanto, ao contrário do que se . verifica em Naum, não é o elemento nacionalista que constitui a base, mas é a consternação perante a injustiça da grande potência e o problema a respeito da retidão do agir de Deus no seio da história universal. Embora falte ainda a Habacuc a certeza da fé, depois do primeiro oráculo de Javé, contudo, ele comunica o verdadeiro conhecimento profético sobre a majestade de Deus, o qual toma a defesa daqueles que são violentados em seu direito de viver, é aquele que possui poder sobre todas as nações, que as exalta ou as abate, utilizando-se delas como instrumentos de sua vontade. A estas introvisões do poeta corresponde, afinal, a exigência de uma esperança plenamente confiante do fiel, mesmo contra todas as aparências.
§ 69. SOFONIAS Cf. os comentários relativos ao § 61. C. H. CORNILL, "Die Prophetie Zephanjas", ThStKr 89 (1916), 297.332. - G. GERLEMAN, Zephanja, 1942. - J. PH. HYATI, "The Date and Background of Zephaniah", JNES 7 (1948), 25-29. - F. SCHWALLY, "Das Buch Ssefanjâ", ZAW 10 (1890), 165-240. - L. P. SMITH - E. L. LACHEMAN, "The Authorship of the Book of Zephaniah", JNES 9 (1950), 137-142. D. L. WILLIAMS, "The Date of Zephaniah", JBL 82 (1963), 77-88. Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Lista de antepassados e época Insolitamente, o título traz uma lista de antepassados de Sofonias, que se estende até à quarta geração e cujo último membro tem o nome de Ezequias. Houve quem pensasse que Ezequias seria o rei judaíta do mesmo nome e que Sofonias proveria de sangue real; mas, neste caso, deveria ter sido mencionada também a dignidade régia de Ezequias, principalmente porque o nome em si era freqüente em [udá. Antes, com a indicação dos nomes dos antepassados, do avô em diante, procurava-se evitar o desagradável mal-entendido de que Cusi, pai de Sofonias, fosse etíope e não judaíta. O título indica também, de forma correta, o governo de [osias (639609) como a época em que Sofonias exerceu sua atividade. Do seu conteúdo pode-se deduzir com bastante precisão que a reforma deuteronomista não podia ter-se ainda realizado, porque ainda se veneravam deuses
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estranhos em Jerusalém (l.4s). Além disso, dado que em 1.8 só se mencionam os príncipes reais e não o próprio rei, no mínimo uma parte dos oráculos de Sofonias provém da época de menoridade do referido rei. Podemos situar a atividade de Sofonias por volta de 630 a.c. Por isso não é aconselhável, como o fazem HYATI e WILLIAMS, apesar do título do livro, situar a atividade de Sofonias pelo menos dois decênios mais tarde, sob Joaquim, ou então, com SMITH e LACHEMAN, entender o livro como sendo um pseudo-epígrafo, redigido por volta de 200
a.c.
2. Oráculos Parece que Sofonias deixou seus oráculos sob a forma de palavras isoladas, como era então usual. De modo geral, trata-se de pequenas unidades (ELLIGER, HORST). Com segurança, podem-se atribuir a Sofonias cinco oráculos a respeito de [udá e Jerusalém: 1.4-5,7-9,12-13,14-16; 2.1-3. Nestes oráculos, Sofonias se volta contra a idolatria, contra a imitação de determinados costumes religiosos de inspiração estrangeira, e contra aqueles que, em sua auto-suficiência, põem em dúvida a ira de Javé; e, utilizando-se do conceito do dia de Javé, tal como fora reformulado por Amós e Isaías, ameaça-os com o julgamento, fazendo-o de modo tão impressionante, que séculos mais tarde ouviremos seus ecos na imitação poética latina de 1.14-16: dies irae, dies illa. Do mesmo modo como Amós, é na conversão para a justiça e para a humildade, ainda em tempo oportuno, que ele também contempla um "talvez" de salvação (2.3). Das ameaças que se seguem, dirigidas contra outras nações, só se podem atribuir a Sofonias os oráculos contra as cidades filistéias: 2.4 e contra a Assíria: 2.13-14, e igualmente a ameaça recapitulativa de 3.6-8. - Dentre os oráculos da última parte dele só provém a perícope 3.11-13, contendo o anúncio de um juízo de purificação, que deixará um resto humilde e modesto em Israel, resto este que procurará humildemente sua felicidade no refúgio junto a Javé. É improvável que as ameaças de Sofonias, e especialmente o anúncio do dia de Javé, tenham sido ocasionados pela horda de citas que avançavam rugidoramente sobre a Palestina, entre 630 e 625, segundo nos informa HERÓDOTO (OESTERLEYROBINSON* e outros). Além do fato de a hipótese da incursão dos citas ser muito duvidosa, não se encontra em Sofonias nenhuma referência neste sentido.
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Aos mencionados oráculos de Sofonias acrescentaram-se primeiramente três ameaças não de todo radicais: 1.2-3,10-11,17, das quais a última anuncia, num estilo característico de época posterior, o juízo final para os habitantes da terra. Provêm igualmente de época posterior vários oráculos a respeito de certas nações: 2.5-7, contra a região filistéia costeira; 2.8-11, contra Moab e Amon; 2.12, contra os cushitas; 2.15, como acréscimo ao oráculo contra a Assíria, e 3.1-15, contra Jerusalém. A perícope 3.9-10, a respeito da conversão das nações, e os oráculos de inspiração dêutero-isaiana: 3.1415,16-18au,18aP-20 são promessas escatológicas posteriores.
3. Redação Dado o seu pequeno número, não se sabe com certeza se inicialmente os nove oráculos de Sofonias constituíam coleções parciais menores, principalmente porque entre eles foram inseridos oráculos de época posterior. Assim, o atual conjunto 1.2-3.13 foi reunido no decurso de uma grande redação e ampliado posteriormente com os oráculos 3.14-30. Foi sobretudo em conseqüência destes últimos oráculos, os quais acrescentaram as expectativas de pura salvação à modesta visão sofoniana do futuro que resultou uma estrutura do livro que corresponde ao esquema escatológico de três membros, a saber: 1.2-2,3 2.4-3.8 3.9-20
ameaças contra a própria nação, ameaças contra outras nações, promessas.
4. Pregação Segundo GERLEMAN, a pregação de Sofonias, um discípulo de Isaías, se volta contra determinados círculos de profetas cultuais de Jerusalém, dos quais procede o Deuteronômio; ele próprio, no entanto, foi influenciado pelo conjunto de idéias destes círculos, de sorte que, em sua obra, a profecia da desgraça, inspirada por Isaías, se aproxima da corrente religiosa e nacionalista, funcionando a idéia de um resto como ponto de convergência da síntese. Globalmente, devemos dizer que Sofonias se inspira em Isaías, em Amós e em Miquéias, havendo particularmente desenvolvido e dado mais densidade à interpretação do dia de Javé, defendida pelos dois primeiros. O terrível juízo de Javé atingirá as camadas superiores pecadoras de [udá e de Jerusalém, como também outras nações. Se, porém, se aproveitarem do
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tempo para se lembrarem dos mandamentos de Javé, se se converterem à justiça e à humildade, então uma parte de Israel sobreviverá, como o resto de um exército que escapa do aniquilamento de uma derrota, e se tomará humilde e modesta, como nos dias dos pais, e habitará, plena de fé, no monte Sião; agirá com retidão e viverá em paz.
§ 70. AGEU Cf. os comentários relativos ao § 61. P. R. ACKROYO, "Studies in the Book of Haggai", JIS 2 (1951), 163176; 3 (1952), 1-13. - lo., "The Book of Haggai and Zechariah 1-8", ibid. 151-156. - lo., "Some Interpretative Glosses in the Book of Haggai", ibid. 7 (1956), 163-167. - lo., "Two Old Testament Historical Problems of the Early Persian Period", JNES 17 (1958), 13-27.- A. BENTZEN, "Quelques remarques sur le mouvement messianique parmi les [uifs aux environs de l'an 520 avant [ésus-Christ", RHPhR 10 (1930), 493-503. - P. F. BLOüMHAROT, "The Poems of Haggai", HUCA 5 (1928), 153-195. - K. GALUNG, "Serubbabel und der Hohepriester beim Wiederaufbau des Tempels in Jerusalem", em: Studien zur Geschichte Israels im persischen Zeitalter, 1964, 127-148; redação posterior: "Serubbabel und der Wiederaufbau des Tempels in [erusalem", em: Rudolph-Festschrift, 1961, 67-96. - F. HESSE, "Haggai", ibid. 109-134. - F. JAMES, "Thoughts on Haggai and Zechariah", JBL 53 (1934), 229-235. - F. 5. NORTH, "Critical Analysis of lhe Book of Haggai", ZAW 68 (1956), 25-46. - J. W. ROTHSTEIN, [uden und Samaritaner, 1908. - L. WATERMAN, "The Camouflagel Purge of Three Messianic Conspirators", JNES 13 (1954), 73-78. - H. W. WOLFF, Haggai, 1951. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Ageu
o profeta Ageu, mencionado também em Esd 5.1; 6.14, parece ter pertencido ao grupo dos repatriados do cativeiro babilônico, pois ele se põe inteiramente em defesa de suas pretensões. É chamado de nabi (1.1), e talvez tenha sido um profeta ligado ao culto em Jerusalém. Não se pode deduzir de 2.3ss,10 que ele já fosse então muito idoso. A época de seu ministério profético aparece bem delimitada pelas datas de seus oráculos. Estas datas vão desde o primeiro dia do sexto mês (29 de agosto) até o vigésimo quarto do nono mês (18/19 de dezembro) do segundo ano do governo do rei persa Dario (520 a.C). Suas palavras são complementadas por Zc 1-8 e Esd 3-6.
§ 70.
AGEU
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2. Oráculos Os oráculos de Ageu não foram formulados em prosa, mas transmitidos na forma métrica do verso breve. Uma questão que permanece necessariamente em aberto é a de saber se Ageu os pregou sob esta modalidade ou se os colocou posteriormente na forma atual, por ser a forma do metro narrativo. Em 1.1-11 ele convoca o povo para a reconstrução do templo, que fora destruído pelos babilônios. Neste apelo, ele considera a calamidade reinante como um castigo de Javé, pelo fato de que todos só pensam nas próprias casas e não no templo. A posição dos vv. 7s. neste oráculo vem logo em seguida ao v. 11, de modo que o v. 6 deve ser unido ao v. 9a, como originariamente, para manter a linha de continuidade com as frases seguintes. O relato 1.12-14, que é um acréscimo, narra o resultado do convite de Ageu e o início dos trabalhos de construção. - A perícope 2.15-19 (ampliada com os vv. 17.18b), faz parte, como segundo oráculo, da data fragmentária de LISa, como bem o mostrou ROTHSTEIN. 206 Este oráculo promete, algumas semanas depois de começada a construção, provavelmente no dia do lançamento da nova pedra fundamental, a cessação da seca que provoca a calamidade e abundantes bênçãos para o futuro. - O terceiro oráculo compreende 1.15b; 2.1-9. Diante das queixas a respeito da nova construção que surge trabalhosamente, em confronto com o templo salomônico, queixas estas que resultam mais da falta de observação direta do que de um conservadorismo reacionãrio.?" Ageu promete que o esplendor da nova construção sobrepujará o do primeiro templo, porque para ele afluirão os tesouros de todas as nações, como resultado do abalo universal provocado pelo início da escatologia. - A perícope 2.10-14 relata o recebimento de uma torá por intermédio de Ageu, segundo a qual o que provoca a contaminação são talvez as coisas impuras e não aquilo que é sagrado. Daí, como bem o mostrou ROTHSTEIN, com apoio em Esd 4.1-5, Ageu tira a conclusão de que o pedido das camadas superiores de Samaria e dos judaítas que haviam permanecido no país em 587, no sentido de poderem participar da reconstrução do templo, deve ser rejeitada, porque, do contrário, o templo e o culto se "tomariam impuros. - O último 206 207
De opinião diversa é K. GALLING em: Rudolph-Festschrift, 1961,79, nota 52. Na opinião de GALLING (ver acima, nota 206) 80, Ageu não se refere à reconstrução, que estava sendo executada, mas ao caos da grande massa de escombros do templo destruído.
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oráculo: 2.20-23, é uma promessa em favor do comissário Zorobabel, da casa de Davi, investido pelos persas, segundo a qual Javé, depois da iminente destruição dos outros reinos, fará dele como que o seu "sinete", o rei messiânico dos últimos tempos. É aqui, como também em Zacarias, que se depara pela primeira vez com a expectativa messiânica, primeiramente relacionada com uma pessoa determinada e mais tarde relacionada genericamente com um descendente da dinastia davídica.
3. O livro
o livro é o resultado de uma compilação e de uma revisão dos oráculos de Ageu. O compilador foi quem lhes acrescentou as introduções redacionais, e nessas introduções ele fala de Ageu como sendo o profeta, e indica a palavra de Javé como tendo sido a ele dirigida Cel) ou transmitida por seu intermédio (beyad). Talvez tenha sido também esse compilador quem inseriu o relato 1.12-14. A estruturação do conjunto foi feita com base no princípio cronológico, tendo sido os oráculos colocados sucessivamente na ordem em que foram pronunciados. Esta ordem só foi interrompida com a transposição do oráculo pronunciado por ocasião do lançamento da pedra fundamental, da sua posição correta, que era depois de 1.15a, para o lugar atual: 2.15-19. Já não se pode saber se isto se deve a uma troca de datas, ou se tinha por finalidade encobrir o lançamento da pedra fundamental já executado uma vez por Sassabasar, em torno de 537. As hipóteses diferentes de ROTHSTEIN e SELLIN, segundo as quais o livro constitui o extrato de uma descrição mais ampla da construção do templo da qual faria parte também o relato acerca da atividade de Zacarias são improváveis. Embora no livro tudo esteja relacionado com a construção, ele não apresenta, contudo, o estilo de um relatório histórico. Mas também é muito difícil que o livro tenha podido surgir de duas coleções diferentes, de um memorial de Ageu e de uma coleção de seus oráculos, suposta por EISSFELDT*. O breve relato de 1.12-14 constitui uma base muito estreita para a hipótese de um memorial; para isto também não se pode aduzir o recebimento de uma torá, narrado em 2.10-14 e que não pode ser explicado senão neste sentido, nem as introduções redacionais dos oráculos. Também não se pode admitir, como NORTH, a existência de uma curta narrativa fundamental, composta de três oráculos extremamente curtos, e que teria sido acrescida de abundante material secundário.
§ 71.
ZACARIAS (Zc
1-8)
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4. Pregação A pregação de Ageu foi determinada externamente pelo fato de que ele apareceu numa época de crise para o jovem reino persa. Esta pregação devia incutir, em [udá, a esperança de que Javé haveria de provocar, afinal, a transformação, havia tanto tempo esperada, de todas as coisas, e trazer a era escatológica de salvação, a fim de nela exercer a supremacia mundial por intermédio de seu lugar-tenente da dinastia davídica. Em face da crise persa, a questão principal que se punha na época do póscativeiro: a de saber quando se implantaria o novo éon escatológico, estava a exigir uma resposta. Ageu vincula esta resposta à construção do templo, para a qual ele vê o próprio Javé a exortar, dentro da perspectiva da crença na retribuição (seca-bênçãos): o templo deve ser erigido sem mais evasivas! Ageu considera o dia do lançamento da pedra fundamental como o início da mudança - no futuro não haverá senão bênçãos! - e espera, para depois que estiver terminada a construção, um abalo universal que sacudirá a natureza e as nações, como conclusão da mudança operada e como começo pleno da era de salvação. Ageu apresenta evidentemente, ainda, certos elementos proféticos e se empenha em defender a glória de Deus. Nele se encontram, pelo menos na mesma proporção, traços proféticos cultuais e legais, combinados com concepções escatológico-messiânicas e com a pintura de caráter bastante materialista da era de salvação. Ageu não é senão um epígono profético, cuja significação consiste em ter colocado em andamento a construção do templo, mas que, rejeitando a ajuda de voluntários, naturalmente cheios de desdém para com o culto, introduziu a segregação, que iria caracterizar o judaísmo posterior. Pode-se dizer que o vigésimo quarto dia do nono mês do ano de 520 a.c., no qual isto aconteceu, é o dia natalício do judaísmo.
§ 71. ZACARIAS (ZC 1-8) Cf. os comentários relativos ao § 61. - Especiais: M. Brc, 1962. - M. F. UNGER, 1963. CH. L. FEINBERG, "Exegetical Studies in Zechariah", B5 97 (1940) 103 (1946). - K. GALLING, "Die Exilswende in der Sicht des Propheten Sacharja", VT 2 (1952), 18-36 (= Studien zur Geschichte Israels im persischen Zeitalter, 1964, 109-126). - A. JEPSEN, "Kleine Beitrãge zum Zwõlfprophetenbuch III", ZAW 61 (1945/48),95-104. - K. MARTI, Der
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Prophet Sacharia, der Zeitgenosse Serubbabels, 1892. - ID., "Zwei Studien zu Sacharja", ThStKr 65 (1892), 207-245, 716-734. - ID., "Die Zweifel an der prophetischen Sendung Sacharjas", em: Vellhausen-Festschrift, 1914, 279-297. - H. G. MAY, "A Key to the Interpretation of Zechariah's Visions", JBL 57 (1938), 173-184. - L. G. R1GNELL, Die Nachtgesichte des Sacharja, 1950. - J. W. ROTHSTEIN, Die Nachtgesichte des Sacharja, 1910. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NP 19,20 e 28 (§ 52).
1. Zacarias e sua época De acordo com as informações redacionais de 1.1,7b, Zacarias é filho de Baraquias e neto de Ado. Esd 5.1; 6.14, porém, o chama, corretamente, de filho de Ado, informações estas com as quais se misturaram aquelas que se referem a um outro Zacarias, talvez o filho de Jeberequias, mencionado em Is 8.2. Em Ne 12.16 ele é indicado como o chefe da família sacerdotal de Ado. Zacarias, por conseguinte, procede, como Jeremias e Ezequiel, de linhagem sacerdotal, embora isto não implique que ele deva ter exercido ao mesmo tempo as funções de sacerdote e de profeta. Mas é a partir daí que se explica o interesse de sua profecia pelas coisas do sacerdócio e também uma certa ligação com EzequieL A época de sua atividade profética se acha determinada, pelo menos parcialmente, pelas três datas indicadas em 1.1,7a; 7.1, e que vão do oitavo mês do segundo ano de Dario (520 a.Ci) até o nono mês do quarto ano do mesmo (518 a.C). Mas, como nos permite supor o oráculo 3.8s, pronunciado talvez por ocasião ou depois da dedicação do novo templo, em 515, ele deve ter exercido suas funções muito além destes limites. Em qualquer caso, ele é o contemporâneo mais novo de Ageu, e talvez tenha voltado do cativeiro em companhia de ZorobabeL Iniciou sua pregação profética um pouco depois da de Ageu, tendo-a exercido durante algum tempo paralelamente com a dele e continuando depois que ele silenciou. Zacarias também se empenhou em defesa do templo, mas usou da palavra para tratar dos temas referentes ao início da era escatológica final e à organização da comunidade escatológica, como também para tratar de questões práticas de 'sua época.
2. Oráculos e relatos É uma constatação exegética antiga que a tradição de Zacarias só se encontra nos capítulos 1-8 do livro que traz o seu nome, embora esta constatação seja explicada de diferentes modos. No particular, além dos oráculos propriamente ditos, podemos identificar dois tipos de relatos:
§ 71. ZACARIAS (Zc 1-8)
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a) O que mais nos chama a atenção no interior de 1.7-6,8 são as oito aparições noturnas", ou sejam as visões recebidas durante a noite. Quase sempre elas se acham interligadas e tratam do tema da era escatológica de salvação que estava na iminência de chegar ou que mesmo já estava prestes a se iniciar: /I
1.1/7-15
Visão dos "cavaleiros": imutável ardente amor de Deus, apesar das aparências em contrário.ê'" 2.2,1-4 [Vg.: 1,18-21] Visão dos "chifres": Deus abalará o universo das nações e as chamará à prestação de contas. 3.2/5-9[Vg.: 2/1-5] Visão do "cordel de medir": Jerusalém será colocada/ como capital do reino de Deus, sob a proteção divina, sem precisar de muralhas que lhe sirvam de barreira e que lhe seriam supérfluas. 4.3/1-7 Visão do "tribunal celeste": Josué é investido como sumo sacerdote, apesar dos ataques; o território do templo é subtraído ao poder secular.ê'" 5.4/1-6a u,lüb-14 Visão do "candelabro": o governo é dividido entre um representante político e um representante do culto (entre Zorobabel e JOSUé).21O 6.5,1-4 Visão do "rolo escrito": decisão a respeito das relações desonestas de posse em [udá, e a favor dos repatriados. 7.5/5-11 Visão do "efá": o pecado será extirpado do seio do povo da era de salvação."! 8.6/1-8 Visão dos "carros": o povo é fortalecido com a volta da diáspora, que é realizada pelo Espírito de Deus.
À exceção da quarta visão, os oráculos seguem um determinado esquema formal, que varia nos detalhes: descrição daquilo que se con208 H. W. HERTZBERG, " 'Grüne' Pferde", ZDPV 69 (1953), 177-180. - P. PRESS, "Das erste Nachtgesich des Propheten Sacharja", ZAW 54 (1936), 43-48. 209 K. GALLING, "Das vierte Nachtgesicht des Propheten Sacharja", ZMR 46 (1931), 193-208. - H. SCHMIDT, "Das vierte Nachtgesicht des Propheten Sacharja", ZAW 54 (1936)/46-60. 210 J. BÓHMER, "Was bedeute der goldene Leuchter Sach 4,2?", BZ 24 (1938/1939), 360-364. - H. FREY, "Der siebenarmige Leuchter und die Õlsõhme", em: von Bulmerincq-Gedenkschrift, 1938,20-63. - K. MÓHLENBRINK, "Der Leuchter im fünften Nachtgesicht des Sacharja", ZDPv 52 (1929), 257-286. - L. ROST, "Bemerkungen zu Sacharja 4", ZAW 63 (1952),216-221 (= Das Kleine Credo, 1965,64-70). 211 L. ROST, "Erwãgungen zu Sacharjas 7. Nachtgesicht", ZAW 58 (1940/1941), 223228 (= Das Kleine Credo, 1965, 70-76).
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templa em visão, pergunta do profeta a respeito do seu significado, e resposta explicativa do anjo mediador que lhe faz companhia. As imagens e as idéias provêm principalmente de três círculos, a saber: das concepções israelíticas (assembléia celeste para o julgamento); da mitologia e do conto de fadas (ingresso no céu, espião celeste e mensageiros montados em cavalos de cores diversas; ferreiros e chifres; rolos volantes; dá para encerrar a todos na escuridão; seres alados para transportar o efá), e do culto estrangeiro (candelabro, com duas oliveiras de cada lado). Existem estudos exegéticos a respeito dos vários relatos das visões. Nesta obra, porém, examinaremos apenas as hipóteses que dizem respeito ao quarto relato. Enquanto H. SCHMIDT divide 3.1-10 em dois relatos: um sobre a investidura de [osué como sumo sacerdote e outro sobre a vinda do Messias, JEPSEN, ELLIGER e HORST isolam 3.1-7 do conjunto e o consideram como um relato originariamente autônomo. De fato, um ponto que nos chama a atenção são a sua divergência com relação ao esquema formal e a ausência de um símbolo figurativo. O conteúdo da visão, porém, é imprescindível no contexto do conjunto e a própria visão constitui, além disto, a contrapartida daquela que vem logo a seguir, do mesmo modo que a primeira e a oitava, a segunda e a sétima, a terceira e a sexta visões se correspondem entre si. A data de 1.7a, à qual logo se segue a afirmativa: tive uma visão durante a noite (1.8), refere-se principalmente à primeira visão. Já não é possível saber se Zacarias recebeu as outras visões na mesma noite, como tudo indica, ou se os relatos das visões conferidas em várias noites foram simplesmente alinhados uns depois dos outros sem outras datas. Em qualquer caso, a informação dada em 1.7a não é falsa, de tal sorte que as visões deverão situar-se alguns meses antes, na época de Ageu (JEPSEN), mas enraizando-se profundamente no relato. Isto, que dissemos, vale também para a relação da data mencionada com 6.9ss, estabelecida por GALLING, o qual, além do mais, coloca as visões, juntamente com os outros oráculos, numa outra ordem cronológica correspondente ao seu suposto pano de fundo histórico - o regresso do grupo principal dos exilados, sob a chefia de Zorobabel por volta de 521-520 (ao passo que Biõ rejeita qualquer vinculação do texto com situações históricas, porque elas deveriam ser entendidas, segundo ele, puramente em sentido escatológico): as visões dos "cavaleiros", dos"chifres", do "cordel de medir" e dos"carros", ele as coloca depois de Babilônia e na época em que partiram daí (neste sentido: 2.10s);as visões, porém, do "candelabro", do "rolo manuscrito" e do "efá" situa-as no
§ 71. ZACARIAS (Zc 1-8)
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primeiro período da construção do templo (neste sentido: 2.14-16; 4.6al3lOa, e talvez 3.1ss; já antes: 1.16s, e talvez 6.15a).
b) Em 6.9-15 e 7.1-3 + 8.18-19 se encontram dois outros relatos a respeito de acontecimentos concretos. O texto de 6.9-15,212 refundido inúmeras vezes, relata a respeito da ordem dada por Javé para se executar uma ação simbólica, com a qual Zacarias devia coroar Zorobabel como soberano messiânico e político dos últimos tempos. Posteriormente esta coroação foi colocada em relação com o sumo sacerdote [osué, e o texto foi ampliado com vários acréscimos (vv, lOa, llb u, 12b, 14,15a13,b). No segundo relato.ê" à pergunta de saber se se deve continuar a celebrar o dia de jejum em memória da destruição do templo de Jerusalém, Zacarias responde que todos os quatro dias de jejum que recordam a catástrofe de Jerusalém devem cessar e transformar-se em festas piedosas. c) Dentre as profecias de Zacarias, aquela de 1.1-6, contendo a exortação a se converter a Javé, e que vem fundamentada com uma reflexão profética a respeito da história, precede os relatos das visões. Também 1.16,17; 2.12s,14,15s214; 3.8s215; 4.6a13-lOa foram agregados aos relatos das visões mediante palavras-chaves apropriadas (2.lOs,17; 3.10 são acréscimos posteriores), talvez para sublinhar as idéias nelas contidas, para explicá-las e para especificá-las. Podemos distinguir, com RIGNELL, de um lado, anúncios e, do outro, interpretações e frases explicativas. Outros oráculos foram reunidos em 7-8 e inscritos no relato a respeito da questão do jejum, que é usado aí à maneira de moldura. Estes oráculos são: 7.4-6, sobre a improcedência da prática do jejum ritual; 7.7-14, uma reflexão histórica sobre a merecida infelicidade de Jerusalém; 8.1-2,3,4-5,6,7-8,913,14-15, sobre a salvação escatológica iminente, e 8.16-17, uma exortação final a que se fale a verdade e a que se pratique o direito e, contrariamente, se evite a mentira e o mal. Os trechos 8.20-22,23 sobre a conversão das nações são acréscimos posteriores. 212
213
214 215
J.
LEY, "Zu Sacharja 6,9-15", ThStKr 66 (1893), 771-782. - L. WATERMAN, "The Camouflage Purge of Three Messianic Conspirators", JNES 13 (1954),83-87. F. S. NORTH, "Aaron's Rise in Prestige", ZAW 66 (1954), 191-199. - WATERMAN (ver acima nota 712). S. FEIGIN, "Some Notes on Zach 2,4-17", JBL 44 (1925),203-213. E. E. LE BAS, "Zechariah's Enigmatical Contribution to the Corner-Stone", PEQ 82 (1950),102-122. - lo., "Zecahriah's Clímax to the Careerof the Comer-Stone", ibid. 83 (1951), 139-155. - A. E. RÜTHY, "Sieben Augen auf einem Stein", ThZ 13 (1957), 523-529. - E. SELLIN, "Der Stein des Sacharja", JBL 50 (1931), 242-249. - lo., "Noch einmal der Stein des Sacharja", ZAW 59 (1942/1943), 59-77.
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3. Origem do escrito Ao tratarmos do problema da origem do escrito de Zacarias, devemos partir do dado exegético de que a parte principal de 1-6 apresenta uma estrutura interna que obedece a um plano determinado. Também sob o ponto de vista literário, esta parte principal nos deixa a impressão de constituir um conjunto homogêneo e completo. Emoldurados pelo oráculo 1.1-6 e pelo relato a respeito da ação simbólica: 6.9-15, os relatos das visões formam a parte central. Assim não existe apenas uma coleção, mas uma composição executada conscientemente, um pequeno livro, que Zacarias deve ter escrito de uma só vez. Os oráculos isolados foram introduzidos nesta obra em época posterior. Não se sabe com certeza se as inserções são da autoria do próprio Zacarias. Pelo menos com relação a 4.6aP-10a, que altera o ritmo do relato, tal fato é improvável. A segunda parte do escrito é constituída pela coleção de oráculos 78.19, que vem emoldurada pelo relato da questão do jejum. A divisão do relato e sua utilização como moldura nos revelam o caráter intencional da coleção, a qual dificilmente provém de Zacarias. De qualquer modo, a perícope 7.4-6 se liga à questão dos jejuns, mediante a palavra-chave" jejum". A referência à falta de justificativa para os jejuns nos conduz à reflexão histórica de caráter de censura, à qual logo se contrapõem as palavras de salvação, que a exortação a um comportamento correto encerra de forma apropriada.
4. Pregação Zacarias é um tipo de profeta visionário, que se apóia conscientemente na tradição profética e a ela se reporta (1.1-6; 7.7-14) - e é aí precisamente que sobressai o seu caráter de epígono - mas que também insiste na seriedade das suas exigências quanto ao direito e à verdade e também quanto à realidade de conversão a Deus. Por isso, o que importa não é a celebração dos dias de jejum, mas a guarda dos preceitos éticos de Deus, e foi por sua não-observância que a punição se abateu sobre [udá, De agora em diante, porém, isto é caso encerrado. Aproxima-se a nova era universal de salvação escatológica em que os dias de jejum se transformarão em dias de regozijo. Em tudo isto, a pregação de Zacarias se assemelha em muitos aspectos àquela de Ageu. Ao contrário dele; porém, não olha apenas para a construção do templo, mas para a extirpação do pecado e para a renovação interior, antes que se inicie a era de salvação, e é sobre a ética
§ 72. ZACARIAS 9-14
655
que ele alicerça o bem-estar material.ê" Ele põe em relevo o caráter supramundano e a transcendência de Deus, junto ao qual somente o anjo mediador tem acesso, para levar diante de seu trono os acontecimentos e também a adoração que se lhe presta na terra, por seu lado, para transmitir ao profeta as palavras da revelação que devem ser anunciadas ao povo. Por fim, levando em conta a condição de sumo sacerdote, ele divide a dignidade messiânica entre dois representantes, numa posição que, como se vê pelas indicações dos textos de Qumran, foi assumida pelos círculos do judaísmo primitivo, que estavam por trás desses dois representantes. É precisamente este ponto que nos revela a influência sacerdotal em Zacarias.
§ 72. ZACARIAS 9-14 Cf. os comentários relativos ao § 61. P. R. ACKROYD, "Criteria for the Maccabean Dating of Old Testament Literature", VT3 (1953), 113-132. -c. BROUWER, Wachteren Herder, 1949. - W. W. CANNON, "Some Notes on Zechariah c. 11", AfO 4 (1927),139146. - B. HELLER, "Die letzten Kapitel des Buches Sacharja im Lichte des spãteren [udentum", ZAW 45 (1927), 151-155. - T. JANSMA, "Inquiry into the Hebrew Text and the Ancient Versions of Zechariah IX-XIV", OTS 7, 1950, 1-142.- A. JEPSEN, "Kleine Beitrãge zum Zwõlfprophetenbuch 11", ZAW 57 (1939), 242-255. - D. JONES, "A Fresh Interpretation of Zechariah IX-XI", VT 12 (1962),241-259. - P. LAMARCHE, Zacharie IXXIV, 1961. - B. 0rzEN, Studien über Deuterosacharja, 1964. - O. PLOGER, Theokratie und Eschatologie, 2a ed., 1962. B.STADE, "Deuterozacharja", ZAW 1 (1881), 1-96; 2 (1882), 151-172,275-309. - W. STAERK, Untersuchungen über die Komposition und Abfassungszeit von Zach 9-14, 1891. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19,20 e 28 (§ 52).
1. Questões principais Zc 9-14 e o livro de Malaquias apresentam três títulos iguais no que respeita aos elementos essenciais: 9.1: Oráculo. Palavra deJavé; 12.1: Oráculo. Palavra deJavé contra Israel; e MI1.1: Oráculo. Palavra deJavé dirigida a Israel. Diante disto pode-se dizer, de antemão, que se trata de três escritos proféticos distintos, dos quais pelo menos os dois primeiros são anônimos:
216
F. JAMES, "Thoughts on Haggai and Secahriah", JBL 53 (1934),229-235.
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Dêutero-Zacarias Trito-Zacarias Malaquias.
Zc 9-11, Zc 12-14,
Um dos redatores do livro dos Doze Profetas juntou esses escritos àquele do último profeta conhecido nominalmente. Por este mesmo processo, os escritos de Isaías e Miquéias receberam apêndices mais amplos, de tipo semelhante (Is 40-66; Mq 4-7). Entretanto, o terceiro escrito voltou a ter existência autônoma sob o nome de Malaquias, provavelmente com o fim de manter o número redondo de doze livros. O Dêutero e o Trito-Zacarias colocam-nos diante de três questões principais e que se inter-relacionam, a saber: a questão dos limites precisos das unidades; a da hipótese de um ou mais autores para estes escritos, e a de época da origem de cada um deles. Estas questões devem ser tratadas conjuntamente, como se tem feito em geral até agora. Evidentemente é dificílimo resolver estas questões, porque os textos contêm, ao mesmo tempo, traços antiqüíssimos - anteriores ao exílio, ou de caráter arcaizante - e traços bastante recentes, como também, em muitos casos, aludem a acontecimentos ou a situações históricas de determinadas épocas, de maneira não suficientemente clara, ou de um modo que vai muito além dos conhecimentos que temos a respeito da história israelítico-judaica: por fim, seu fundo vocabular é muitas vezes incerto ou está corrompido, a ponto de deixar margem a várias possibilidades de interpretação. A explicação que se tem dado até hoje é a de que Zc 9-11 apresenta, conseqüentemente, um quadro muito variado. A solução mais simples é a que atribui os referidos capítulos ao próprio Zacarias e tem sido defendida até em nossos dias (BROUWER, FEINBERG, RIDERBOS).217 A primeira hipótese divergente partiu do fato de que 11.12s é citado em Mt 27.9s como palavra de Jeremias. Por este motivo atribuíram-se-lhe os caps. 9-11 ou 9-14. STADE e MARTI sustentaram a unidade do autor e situaram os caps. 9-14 no início da época dos Diádocos (300-280 a.C) ou, respectivamente, na época dos Macabeus (ca. de 160 a.C). LAMARCHE, que pretende demonstrar que o complexo possui uma estrutura elaborada de forma sumamente artística, admite igualmente um só autor, que ele situa por volta de 500-480 a.C. Desde o fim do séc. XVIII, porém, têm-se datado os caps. 9-11, que aparentemente se ocupam com Efraim e seus inimigos (a Assíria e o Egito); de uma época
217
FEINBERG (§ 71). - R. RIDDERBOS, De kleine profeten, I1I, 1935.
§ 72. ZACARIAS 9-14
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anterior a 722, e os caps. 12-14, que só mencionam [udá, de época anterior a 587, sendo que, de acordo com BERTHOLD,218 dever-se-ia ver no Zacarias, filho de [eberequias, mencionado em Is 8.2, o autor de 9-11. Com isto se desfez a unidade do autor e da época. Abstraindo-se de algumas hipóteses já referidas, esta é a solução que devemos adotar, embora a datação das perícopes atribuídas a vários autores oscile bastante quanto aos detalhes. Assim, muitos estudiosos têm admitido uma base pré-exílica para 9-11, que teria sido retrabalhada na época helenística (KUENEN*, BAUDISSIN*, STEUERNAGEL*), ou a têm suposto pelo menos para uma parte desses capítulos (HORST, TADMOR,219 JEPSEN). A maioria dos autores, evidentemente, permanece - no fundo, com razão - dentro da época posterior ao exílio: Biõ considera 9-14 como duas coleções de oráculos provenientes talvez da época de Zacarias. Para JONES, os caps. 9-11 constituem uma unidade literária, surgida no séc. V, a respeito da atividade de um certo profeta, em Damasco ou perto de Damasco. TSEVAT220 vê no capítulo 12 a descrição da revolta das elites jerosolimitanas em face da restauração da realeza davídica (486/485 a.c.). Já ELLIGER, DELCOR221 e outros pensam, pelo contrário, no período helenístico inicial, sendo que EISSFELDT* atribui 9-11 e 12-14 a dois autores diferentes, enquanto OESTERLEY-RoBINSON*, ao invés, admitem que se trata de coleções de oráculos provenientes de vários autores. Por fim, SELLIN data 9-13 (juntamente com 14, como apêndice mais recente), como apocalipse pseudo-epígrafo, da época dos Macabeus. É também nessa época que LASSALLE e TREVERS situam 9-14. 222 O segundo desses dois autores considera os referidos capítulos, pelo menos em parte, como tendo sido escritos por Judas Macabeus. Recentemente, OTZEN estabeleceu uma diferenciação mais detalhada, ao supor quatro complexos de tradições: 9-10 proviriam de um círculo judaíta da época do rei [osias: 11 derivaria da época imediatamente anterior à queda do Estado de [udá: 12-13 seriam originários de círculos judaítas da época inicial do exílio, e 14 proviria de uma época mais avançada do pós-cativeiro.
218 L. BERTHOLD, Historisch-kritische Einleitung in siimmtliche kanonische und apokryphische Schriften des Alten und Neuen Testaments, IV 1814, 1697-1728. 219 H. TADMOR, "Azriyau of Yaudi", Scripta Hierosolymitana 8, 1961,232-271 (266-271). 220 M. TSEVAT, "Sociological and Historical Observations on Zechariah XII", Tarbiz 25 (1955/1956), 11-117. 221 M. DELcOR, "Hinweise auf das samaritanische Schisma im Alten Testament", ZAW 74 (1962), 281-29l. 222 ST. LASSALLE, "Le Deutéro-Zacharie date du temps des Maccabées", Bulletin Renan 87 (1962), 1-4. - TREVES, "Conjectures concerning the Date and Authorship of Zechariah IX-XIV", VT 13 (1963), 196-207.
Os LIVROS PROFÉTICOS
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2. Dêuiero-Zeceries No escrito do Dêutero-Zacarias (Zc 9-11) é possível distinguir, como o faz ELLIGER, duas séries de oráculos. A primeira destas séries é composta de oráculos mais longos, os quais partem de uma determinada situação histórica; são eles: 9.1-8,11-17; 10.3-12; 11.4-16. A segunda série é composta de oráculos mais breves, de caráter geral, textualmente mais bem conservados e que se alternam regularmente com os oráculos da primeira série; são eles: 9.9-10; 10.1-2; 11.1-3,17. Podemos atribuir a primeira destas séries a um autor que se ocupava, à guisa de profeta, com os acontecimentos transcorridos desde o cerco da cidade de Tiro por Alexandre Magno (332 a.C) até os primeiros decênios dos Diádocos. Já a segunda série talvez contenha trechos isolados de vários autores de uma mesma época ou de época mais recente. a) A perícope 9.1-8 parece ter sido pronunciada depois do começo do cerco de Tiro e contém ameaças dirigidas contra Hadrac, Damasco, Emat, Tiro e Sídon e as cidades filistéias, anunciando a ruína do reino persa no Ocidente, mas prometendo, ao contrário, a assistência divina para Judá. 223 O trecho 9.11-17, em que se promete a [udá e a Efraim uma força que lhes assegurará a vitória, reflete a mudança de uma atitude que era de esperança, em relação a Alexandre, para uma atitude de hostilidade (como diz, com justeza, uma glosa introduzida no v. 13: contra teus filhos, [aoã [Grécia]). A passagem 10.3-12 promete a [udá e a José que eles voltarão para as suas terras, enquanto Assur e o Egito deverão sucumbir, e se relaciona com a situação dos primeiros decênios das lutas dos Diádocos. O trecho 11.4-16 é a imitação de um relato sobre uma ação símbólica-": o bom pastor perde a paciência com as suas ovelhas, e estas com ele, e depõe o seu ofício, quebra os cajados "Benevolência" e "União", toma as trinta moedas de prata que havia recebido como 223
224
M. OELCüR, "Les allusions à Alexandre le Grand dans Zach 9,1-8", VT (1951), 110, 124. - K. ELLIGER, "Ein Zeugnis aus der jüdischen Gemeinde im Alexanderjahr 332 v. C", ZAW 62 (1949/1950), 63-115. - E. G. H.I
§ 72. ZACARIAS 9-14
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salário e as atira ao fundidor no templo: Rompeu-se a fraternidade entre [udá e Israel- presumivelmente com o cisma definitivo entre Jerusalém e os samaritanos. Em todo caso, esta colocação é mais razoável do que a de identificar os três pastores mencionados no v. 8 como despedidos em um só mês (talvez se trate simplesmente de um acréscimo) com os reis israelitas Zacarias, Selum e Menahém (EwALD), com os tobíadas Simão, Menelau e Lisímaco (SELLIN), com os sumos sacerdotes sacrílegos Lisímaca, [asão e Menelau (MARTI), ou mesmo com Galba, Otão e Vitélio (CALMET). Todos os oráculos contêm elementos arcaizantes, talvez como forma estilística escatológica adotada propositalmente (WEISER*), mas talvez também para legitimar o autor. b) De permeio entre esses oráculos estão as perícopes 9.9-10: o anún-
cio do Messias humilde e pacificador, talvez influenciado pela "espiritualidade dos pobres", encontrável nos salmos; 10.1-2: exortação segundo a qual é diretamente de Javé, e não por intermédio de terafins e quiromantes, que se deve implorar a chuva, que nada mais era do que uma precipitação natural; 11.1-3: mistura de cânticos coletivos de entrada, de escárnio e elegíacos, proferidos contra uma grande potência; e por fim, 11.17: uma invectiva e uma ameaça dirigidas contra os maus pastores.
3. Trito-Zacarias
o escrito do Trito-Zacarias (Zc 12-14) é composto de cinco perícopes. À exceção de 12.9-14, estas perícopes estão orientadas num sentido puramente escatológico e não possuem nenhuma relação com acontecimentos históricos concretos. Aí já não se fala de Israel, a não ser na parte secundária do título. Em vez disso, fala-se de Jerusalém e de [udá. É sobretudo a sorte e a evolução interior de Jerusalém que se destacam em primeiro plano. No conjunto, a maioria das perícopes seguem a linha do DêuteroZacarias e constituem, antes, complementações introduzidas por um ou mais autores, do que uma composição global. A perícope 12.1-8 trata do modo miraculoso como Jerusalém será libertada da ameaça constituída pela avalancha de povos que o final dos tempos introduzirá. Parece que esse texto foi ampliado para incluir [udá, A passagem 12.9-14 alude manifestamente a um assassinato judicial e fala da mudança que se produziu nas disposições dos habitantes de Jerusalém, e também de uma purificação dos pecados relacionada com este fato.
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OS LIVROS PROFÉTICOS
Como dentre os famosos assassinados da história, Onias IH não vem ao caso (SELLIN), nem também Simão (DUHM), porque as datas das suas mortes são muito posteriores (respectivamente 170 e 134 a.Ci), e como também é improvável que se pense em um Messias-mártir (ELLIGER), porque esta concepção possivelmente era estranha ao judaísmo primevo, não se pode chegar a uma definição mais precisa, embora PLóGER veja aí nada mais do que um funeral celebrado nas formas em uso desde o assassinato de Jesus pelo seu irmão, o sumo sacerdote João (entre 411 e 408).
A perícope 13.1-6 anuncia a extirpação da impureza concebida sob a forma de ídolos e de falsos profetas. Serão rejeitados sobretudo os profetas visionários, por força da ligação da palavra com as tradições e as escrituras sagradas. É provável que 13.7-9, que dificilmente podemos ligar ao Dêutero-Zacarias, como o faz EWALD,225 provenha de outra mão. Com efeito, também, aqui, como em 12.1-8, trata-se, de maneira toda particular, da última ameaça pronunciada contra o povo e da salvação definitiva, ameaça e salvação entre as quais, porém, medeia um severo juízo de purificação ao qual sucumbirão duas terças partes do povo. a capítulo 14, que foi refundido diversas vezes e cujo desenvolvimento dificilmente pode ser explicado, descreve, em primeiro lugar, a terrível calamidade escatológica que se abaterá sobre Jerusalém, bem como a mudança dessa situação com o aparecimento de Javé (vv. 1-5), e, logo em seguida, os fenômenos produzidos na natureza e que acompanharão a entrada de Javé em Jerusalém (vv. 6-11) e os efeitos causados pelo aparecimento de Javé sobre os conquistadores de Jerusalém e sobre todo o universo das nações que reclamam sua participação na salvação dos últimos tempos (vv, 12-21).
4. Resumo Em resumo podemos dizer que o autor das perícopes 9-11, historicamente relacionadas, deve situar-se nos últimos decênios do séc. IV a.c. É da mesma época ou de época mais recente que provêm os oráculos isolados que foram intercalados no conjunto. a escrito do Dêutero-Zacarias deve ter surgido, como coleção constituída de oráculos de vários profetas desconhecidos, por volta do ano 300 a.c. a escrito do Trito-Zacarias
225
H. G. A.
EWALD,
Die Propheten des Alten Bundes, I, 1840, 308-324.
§ 73. MALAQUIAS
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(12-14), composto de palavras de vários autores, é mais novo do que o anterior e talvez deva ser colocado na primeira metade do séc. IH. Na medida em que os autores de 9-14 sejam profetas, e não imitadores de seu estilo, trata-se de epígonos da época tardia, que aguardam a realização da soberania divina sob a forma de um reino israelítico-judaico universal o qual terá como seu ponto central Jerusalém e seu culto, que aspira à santidade ritual, e consideram inevitável o combate decisivo com o universo das nações, por eles vistas como inimigas, combate, porém, que terá um desfecho vitorioso. Todos estes aspectos eles os vinculam ao início da era de salvação escatológica. Não é por acaso que o autor de 13.1-6 rejeita a profecia de sua época.
§ 73. MALAQUIAS Cf. os comentários relativos ao § 61. - Especial: A. VON BULMERINCQ,
1926/32. D. CAMERON, "A Study of Malachi", Transact. Glasgow ar. Soco 8 (1938), 9-12. - O. HOLTZMANN, "Der Prophet Maleachi und der Ursprung des Pharisãerbundes", ARW 29 (1931), 1-21. - E. PFEIFFER, "Die Disputationsworte im Buche Maleachi", EvTh 19 (1959), 546-568. - CH. C. TORREY, "The Prophecy of 'Malachi"', fBL 17 (1898), 1-15. - Cf. também as informações de FOHRER em ThR NF 19, 2Q e 28 (§ 52).
1. Malaquias Consoante Zc 9-11; 12-14, o livro dito de Malaquias é o terceiro pequeno escrito profético que foi acrescentado por um redator a Zc 1-8, mas que depois voltou a ter existência autônoma, e isto para se obter o número de doze livros dentro do Dodekapropheton. Embora o título (1.1): Oráculo. Palavra de Javé, dirigida a Israel, contenha também a observação: "por intermédio do mãl'aki", atualmente transformado no nome próprio Maleáqi [que através da Vulgata deu, em vernáculo, Malaquiasl, o escrito é anônimo. De fato, a palavra em questão não é nome próprio (LAETscH), mas significa: meu mensageiro, tomado de 3.1, pois confundiu-se o mensageiro de Javé, que deve preparar o caminho, com o autor do escrito. Esse é o estágio que ficou registrado na versão dos LXX (por intermédio de meu mensageiro), ao passo que o termo foi erroneamente interpretado posteriormente como nome próprio.
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Os LIVROS
PROFÉTICOS
2. Oráculos Ao contrário de Zc 9-14, onde falam vários autores, os oráculos do livro de Malaquias provêm de um único autor. Trata-se de seis unidades claramente delineáveis, e PFEIFFER mostrou que são palavras provenientes de discussões, nos moldes de Is 40.27-31 e Am 1.18-20, e que se desenvolvem em três fases: a) ocasião oferecida por uma afirmação que se faz; b) objeção levantada pelo interlocutor; c) explicação detalhada da afirmação, com uma conclusão obrigatória. 1.2-5
1.6-2,9 2.10-16 2,17-3,5 3.6-12
3.13-21
trata da demonstração do amor que Javé tem por Israel (Jacó), que foi preservado, ao passo que a nação irmã, Edom, teve de perecer. censura aos sacerdotes o costume de oferecer sacrifícios de pouco valor e os ameaça com a maldição, caso persistam com estaprática. vitupera a leviandade com que os maridos cometem adultério e repudiam suas mulheres. volta-se contra os que duvidam da justa retribuição divina, e para isto apela para o dia do juízo que está próximo. atribui o presente flagelo: uma má colheita resultante de uma seca e de uma praga de gafanhotos, ao pagamento incompleto do dizimo do templo e promete bênçãos copiosas para aqueles que se convertem. se volta mais uma vez contra os céticos, explicando-lhes que osjustos receberão a recompensa divina no dia do juízo, ao passo que os ímpios serão aniquilados.
o conjunto não apresenta propriamente nenhum problema literário particular. Nos oráculos, o povo é censurado por três vezes: 1.2-5; 2.10-16; 3.6-12; os sacerdotes uma vez: 1.6-2.9 e os céticos duas vezes: 2.17-3.5; 3.13-21. Isto, porém, não nos autoriza a unir 3.6-12, ou também 2.10-16, como o fazem, respectivamente, SELLIN e WEISER*, a 1.2-5, de modo a se ter uma grande prédica penitencial dirigida contra o povo. Trata-se, na realidade, de três oráculos autônomos. A conclusão: 3.22,23-24 [Vulg.: 4.4,5-6] evidentemente não provém do autor dos oráculos, mas é composta de dois acréscimos introduzidos posteriormente. O primeiro destes acréscimos identifica a pregação do profeta com a Lei de Moisés; o segundo acréscimo corrige o anúncio do mensageiro que precede o juízo (3.1); explica que Elias é esse mesmo mensageiro e adia a vinda do dia de Javé. 2.1-11b-13a é também um acréscimo posterior. Alguns exegetas admitem outros acréscimos, sobretudo 1.11-14.
§ 73.
MALAQUIAS
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3. Época Como época do profeta sempre se admite a primeira metade do séc. V - muito provavelmente por volta de 465 - depois de Ageu e de Zacarias, porque se supõem o templo e seu culto (1.10; 3.1,10), e antes de Neemias e de Esdras, porque reinam então precisamente os mesmos abusos que eles erradicaram (desleixo no cumprimento dos deveres cultuais, leviandade na prática do divórcio). A este aspecto corresponde a influência do estilo e das idéias do Deuteronômio, ao passo que não se encontram indícios de uma influência do documento sacerdotal. Em seu comentário, de uma meticulosidade insuperável, BULMERINcQ também admite os decênios 485-445 como época do profeta, mas considera Malaquias um auxiliar de Esdras, o qual, com o mensageiro de 3,1 indica o seu mestre que chega de Babilônia e cuja reforma acompanha com suas últimas palavras (3.6ss). Contudo, cronologicamente falando, talvez Esdras deva ser colocado em posição diferente (§ 35,6). Não há dúvida de que não procede a tese de HOLZMANN segundo a qual os tementes a Deus de 3.16 seriam a "sinagoga" dos assideus (IMc 2.42) e o livro teria surgido na primeira metade do séc. UI.
4. Pregação A pregação é dirigida à comunidade, cuja expectativa do próximo advento da escatologia, intensificada por Ageu e Zacarias, não se havia realizado e cuja profunda desilusão a este respeito se traduzia na indiferença e no desleixo em relação ao culto. Nesta situação, o profeta garante aos céticos que o juízo vindouro é inevitável. Deixando indeterminada a data do início dos tempos finais, justamente ao contrário de Ageu e de Zacarias, ele anuncia o juízo como uma possibilidade que poderá tornarse realidade a cada momento. O que importa é preparar-se bem para este evento, cumprindo fielmente os deveres cultuais e éticos, e manter a comunidade em estado de pureza. Se diante do fracasso da expectativa da próxima chegada da escatologia ele trilha o caminho da piedade legal, prescrita por Esdras, também apresenta intuições verdadeiramente proféticas. Ele exige humildade e respeito para com o Deus que é um grande rei e a quem as nações temem (1.14), cujo nome é grande sobre toda a terra e a quem por toda a parte se oferecem oblações puras (1.11). O que importa é converter-se sinceramente (3.7) e empenhar-se com todo o coração por cumprir a sua vontade.
CAPÍTULO
XII
,
O LIVRO APOCALIPTICO § 74. DANIEL ATD: N. W. PORTEOUS, 1963. - BOT: J. T. NELIs, 1954. - COT: G. CH. AALDERS. - HAT: A. BENTZEN, 211 ed., 1952. - HK: G. BEHRMANN, 1894.HS: J. GOETTSBERGER, 1928. - IB: A. JEFFERY, 1956. - ICC: J. A. MONTGOMERY, 21949. - KAT 2: O. PLÓGER, 1965. - KeH: F. HITZIG, 1850. - KHC: K. MARTI, 1901. - SAT: M. HALLER, 211 ed., 1925. - SZ: J. MEINHOLD, 1889. Especiais: A. A. BEVAN, 1892. - R. H. CHARLES, 1929. - J. LINOER, 1939. - E. J. YOUNG, 1949. W. BAUMGARTNER, Das Buch Daniel, 1926. - lo., "Neues keilschriftliches Material zum Buche Daniel?", ZAW 44 (1926), 38-56. - lo., "Das Aramãische im Buche Daniel", ZAW 45 (1927), 81-133 (= Zum Alten Testament und seiner Umwelt, 1959,68-123). - lo., "Ein Vierteljahrhunderi Danielforschung", ThR NF 11 (1939),59-83, 125-144,201-228. - M. A. BEEK, Das Daniel-Buch, 1935. - O. EISSFELDT, "Daniels und seiner drei Cefãhrten Laufbahn im babylonischen, medischen und persischen Dienst", ZAW 72 (1960), 134-148. - C. J. GADO, "The Harran Inscriptions of Nabonidus", AnSt 8 (1958), 35-92. - A. VON GALL, Die Einheitlischkeit des Buches Daniel, 1895. - H. L. GINSBERG, Studies in Daniel, 1948. - lo., "The Composition of the Book of Daniel", VT 4 (1954),246-275. - M. J. GRUENTHANER, "The Four Empires of Daniel", CBQ 8 (1946), 72-82,201212. - G. HÓLSCHER, "Die Entstehung des Buches Daniel", ThStKr 92 (1919), 113-138. - A. VAN HOONACKER, "L'historiographie du livre de Daniel", Muséon 44 (1931), 169-176. - A. JEPSEN, "Bemerkungen zum Danielbuch", VT 11 (1961), 386-391. - H. JUNKER, Untersuchungen über literarische und exegetische Probleme des Buches Daniel, 1932. - K. KOCH, "Die Weltreiche im Danielbuch", ThLZ 85 (1960), 829-832. - lo., "Spâtisraelitisches Geschichtsdenken am Beispiel des Buches Daniel", HZ 163 (1961), 1-32. - H. KRUSE, "Compositio libri Danielis et idea Filii Hominis", VD 37 (1959),147-161, 193-211. - J. MEINHOLD, Die Composition des Buches Daniel, 1888. - W. MÓLLER, Der Prophet Daniel, 1934. - M. NOTH, "Zur Komposition des Buches Daniel", ThStKr 98/99 (1926), 143163. - lo., Das Geschichtsverstiindnis der alttestamentlichen Apokalyptik,
o LIVRO ApOCALÍPTICO
666
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1. A pretensão do livro Daniel
o livro de Daniel contém: a) seis narrativas ou lendas das experiências de Daniel e de seus companheiros sob Nabucodonosor, Baltazar, Dario e Ciro, na Babilônia (1-6), e b) seis relatos de Daniel sobre um sonho e três visões, ocorridos sob Baltazar, Dario e Ciro, a respeito dos acontecimentos que se estendem desde o fim do exílio babilônico até a inauguração da soberania divina nos últimos tempos (7-12). Não é a primeira parte, redigida na terceira pessoa gramatical, que tem a pretensão de ter sido escrita por Daniel, deportado para a Babilônia em 605, mas sim a segunda parte, formulada na primeira pessoa. A tradição tanto da Sinagoga como da Igreja tem reconhecido, em grande parte, esta pretensão e considerado Daniel como o autor. Até hoje tem-se procurado demonstrar repetidamente que esta colocação é procedente (MÜLLER, LINDER, YOUNG). A isto se contrapõe a afirmação registrada por JERÔNIMO em seu comentário sobre Daniel (cerca de 400)e proferida pelo neoplatônico PORFÍRIo (morto em cerca de 304 d.C.)} o qual, ao combater outros "apocalipses", situa o livro de Daniel no séc. II a.c. e considera a maior parte de suas "predições" como vaticinia ex epentu. A escola antioquena (TEODORETO, POLICRÔNIO DE APAMÉIA) também defendeu uma explicação que se aproxima da hodierna. 1
A.
VON HARNACK,
Porphyrius, "Gegen die Chrisien", 1916,67-74.
§ 74.
DANIEL
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Uma questão discutida é a de saber se Daniel foi uma figura histórica. Seu nome e os de seus amigos eram comuns no séc. V (Esd 8.2; Ne 8.4; 10.3,7,24), mas não se limitam a esta época. Ez 14.14,20 menciona um Danel, ao lado de Noé e [ó, como um homem justo da antigüidade, e 28.3 o compara, como homem sábio, ao rei de Tiro. O livro dos Jubileus (4.20) cita um Daniel como tio e sogro de Henoc, de sorte que, pela genealogia bíblica, ele teria sido bisavô de Noé. É significativo que a forma do nome corresponda àquela do poema épico ugarítico de Aqat, proveniente de meados do segundo milênio e que fala de um certo rei Danel como defensor dos direitos das viúvas e dos órfãos. Assim, em última análise, a figura do sábio e justo Daniel parece ser originária de ambiente cananeu. O fato de o livro que traz o seu nome colocá-lo no séc. VI em nada contradiz esta opinião. Do mesmo modo que a figura de Daniel é transposta para a época de Ezequiel, que o menciona expressamente, assim também a figura mais antiga de [ó é transposta, no livro veterotestamentário do mesmo nome, para uma época mais recente, embora esta não seja determinada com maior precisão. No caso de Daniel isto corresponde também ao costume próprio dos autores apocalípticos, que era o de usar em seus livros nomes e personagens de épocas anteriores ou primitivas, sem, com isto, quererem enganar os seus leitores a respeito de suas idades. Não apenas no caso de Daniel, que vem situado no séc. VI, mas também na maioria dos outros casos, isto decorre mais do fato de que se admitia uma relação de correspondência entre os acontecimentos dos primórdios e os acontecimentos dos tempos finais, e por isso fazia-se os representantes dos primórdios anunciarem os acontecimentos finais, com base no conhecimento que eles tinham da própria época. Qualquer que seja o caso, o livro de Daniel é pseudônimo. Também se exclui a possibilidade de o livro ter surgido no séc. VI, depois do exílio, pelo seguinte: a) Só tardiamente é que se fala nele: Livros Sibilinos I1I, 338ss (cerca do ano 140) e 1Mc 2.59s (cerca de 100), mas nada se diz no "elogio dos pais" de Eclo 44-49 (cerca de 200). - b) Como nos mostram os fragmentos do referido livro, encontrados em Qumran e formulados em estilo não-canônico, no séc. I a.c. ele ainda não era considerado como canônico. Embora, em seguida, ele tenha sido incluído algumas vezes entre os profetas (Mt 24.15; JOSEFO, C. Ap. 1,40; Ant. X,267ss), contudo, no cânon hebraico ele foi colocado, não na parte profética, mas entre os chamados "Escritos" [Hagiógrafos]. c) A língua de 2.4b-7.28 é o arameu imperial e a de 1-2,4a; 8-12 é o hebreu tardio, estando ambas entremeadas de empréstimos persas e gregos. - d) O autor não conhece
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senão imperfeitamente a história da época do exílio: não houve uma deportação em 605 a.C; Baltazar é o filho do último rei babilônico Nabônide, e não de Nabucodonosor, e além disso nunca foi rei; Dario (erroneamente chamado o medo) foi um dos sucessores de Ciro e não seu predecessor. - e) As concepções religiosas: costume de evitar o nome de Javé, doutrina sobre os anjos, crença na ressurreição, não correspondem ao séc. VI, mas a uma época mais recente.
2. Questões literárias Em vez disto, a pesquisa moderna é quase unânime em admitir, com PORFÍRIO, que o livro de Daniel surgiu no séc. II a.C. Apenas num ponto as opiniões divergem, a saber: se se deve atribuí-lo a um autor que vivia na época e considerá-lo como uma unidade literária - apesar de fazer uso de material mais antigo - ou se este autor empregou um documento mais antigo em cerca de um século, para a primeira parte do livro, e só escreveu propriamente a segunda parte. Às vezes se tem admitido que foi utilizado um original mais antigo para a segunda metade ou para uma parte dela. a) Recentemente, depois de VON GALL, MARTI e CHARLES, certos estudiosos, e particularmente ROWLEY, têm defendido a unidade do livro. Ela é propugnada, sob uma forma atenuada, por BENTZEN, segundo o qual o autor teria utilizado para 1-6, uma série de lendas conservadas oralmente e por EISSFELDT*, segundo o qual o autor teria empregado narrativas mais antigas para 1-6 e elementos míticos e reflexões históricas para 7-12. b) Para 2.4b-6.29, e algumas vezes também para 1.1-2.4a e 7, admitese com mais freqüência um núcleo ou um conjunto fundamental mais antigo. Assim MEINHOLO atribui 2.4b-6.29 a uma época situada em torno de 300, tendo o capo 7 como apêndice um pouco mais recente. Semelhantemente HÓLSCHER e MONTGOMERY derivam 1-6 do séc. Ill. SELLIN-RoST* supõem um livro de Daniel mais antigo, que constaria de 2-6, juntamente com a introdução hebraica: capo 1, e talvez já contendo o apocalipse aramaico do capo 7. SELLIN* considera 1-7 como uma biografia de Daniel, escrita no séc. III. Também HALLER e NOTH consideram 1-7 como pré-macabaicos, sendo que HALLER deriva o capítulo 7, e NOTH os capítulos 2 e 7 como partes componentes mais antigas de um núcleo, já do séc. IV. GINSBER, pelo contrário, supõe cinco autores, a saber: para 1-6 (entre 292 e 261 a.C); para 7 (entre 175 e 167); para 8 e 10-12 (166 ou 165), e também para 9 (um pouco mais tarde).
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c) Os que mais se aproximam de concepção tradicional são JUNKER, que admite para 8-12 originais mais antigos, provenientes da época do exílio; EERDMANS,2 que deriva 2 e 7 da época do cativeiro; LÓWINGER, que considera a narrativa do sonho de Nabucodonosor (2) como histórica, e KRUSE, que postula uma base originária da época da deportação e que teria sido refundida por volta de 300 e 164 a.c.
3. Narrativas Dentre as narrativas ou lendas redigidas na terceira pessoa, o capítulo 1 descreve a deportação para a Babilônia no terceiro ano do reinado de Joaquim (ano de 605 a.C), a educação de Daniel e de seus companheiros na corte babilônica e sua fidelidade à lei dos alimentos. Segundo o capo 2,3 Daniel adivinha e interpreta um sonho de Nabucodonosor, demonstrando com isto sua eminente sabedoria, e é honrado pelo rei. A lenda dos mártires (3.1-30)4 narra como os três companheiros de Daniel foram atirados a uma fornalha ardente, por se haverem negado a adorar a imagem de um ídolo erigida pelo rei, tendo sido salvos, porém, por um anjo. A carta dirigida por Nabucodonosor a seus súditos (3.31-4.34) comunica de que modo se cumpriu o sonho do rei interpretado por Daniel e de que modo o rei sucumbiu à loucura durante sete anos. 5.1-6.1 5 fala a respeito do banquete de Baltazar e da misteriosa inscrição na parede, que Daniel interpreta como anúncio da queda do reino babilônico - imediatamente executada por Dario. O relato 6.2-29 6 descreve como Daniel foi lançado à cova dos leões por B. D. EEROMANS, De Godsdients van Israel, Il, 1930,49-55. - lo., The Religion of Israel, 1947, 222-227. 3 W. BAUMGARTNER, "Zum Traumerraten in Daniel 2", AfO 4 (1927), 17-19. - lo., "Zu den vier Reichen von Daniel 2", ThZ 1 (1954), 17-22. - L. DEQUEKER, Wereldrijk en Godsrijk in Dan 2 en 7, Diss., Lovânia, 1959. - S. LOWINGER, "Nebuchadnezzar's in the Book of Daniel", em: Goldziher Memorial Vol., I 1948,336-452. 4 J. B. ALEXANDER, "New Light on the Fiery Furnace", JBL 69 (1950), 375s. - G. B. SANDERS, "The Burning Fiery Furnace", Theology 58 (1955),340-345. 5 A. ALT, "Zur Menetekel-Inschrift", VT 4 (1954),303-305. - O. EISSFELDT, Die MenetekelInschrift und ihre Deutung", ZAW 63 91951), 105-114. - E. G. H. KRAELING, "The Handwriting on the Wall", JBL 63 (1944), 11-18. - J. MELKMAN, "Daniel 5", NThT 28 (1939), 143-150. - H. H. ROWLEY, "The Historicity of the Fifth Chapter of Daniel", JThSt 32 (1930/1931), 12-31. 6 A. BENTZEN, "Daniel 6", em: Bertholet-Festschrift, 1950, 58-64. - E. CASSIN, "Daniel dans la 'fosse' aux líons". RHR 139 (1951), 129-161. 2
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ter transgredido a proibição de orar, decretada por Dario, mas como, apesar de tudo, foi salvo. Pelo gênero literário se observa que as narrativas pertencem ora às lendas dos mártires, embora contendo desfecho feliz, ora às "histórias palacianas" orientais (BAUMGARTNER). Originariamente eram narrativas autônomas isoladas, como se pode deduzir do fato de que Daniel não aparece no capítulo 3; de que os capítulos 2 e 4, como também 3 e 6 tratam, respectivamente, de um mesmo tema, com variações, e de que a exposição nem sempre foi feita de modo coerente (comparem-se as indicações cronológicas de 2.1 com 1.3,5,18). Estas narrações não contêm um núcleo "histórico". Enquanto os conhecimentos da época estudada são inexatos, as informações aparentemente corretas a respeito dos nomes de pessoas e lugares, dos títulos dos ofícios e da organização política, dos costumes jurídicos e das particularidades cronológicas, correspondem ao chamado "estilo enumerativo'" e se destinam a dar plasticidade às narrativas e a apresentar o autor como merecedor de crédito. As narrativas, no entanto, não contêm senão vagas recordações da corte babilônica e pérsica e surgiram, evidentemente, na diáspora judaica oriental, durante a época helenística, como em geral se admite." Sem manifestar, no fundo, uma atitude de hostilidade para com o estado pagão e seu soberano, elas descrevem o retrato do justo que é perseguido e ameaçado, mas que se impõe como tal e por isso é salvo e recompensado. Logo depois de terem surgido, as narrativas foram reunidas em uma coroa de lendas e ajustadas umas às outras. Assim, o capítulo 2, onde somente Daniel é quem age, menciona de passagem os seus companheiros, e o capítulo 5 considera retrospectivamente o capítulo 4. Também o texto aramaico de 2.4b-6.29 constitui um bloco único, enquanto o capítulo 1, redigido em hebraico, funciona como introdução da coroa de lendas e supõe 2-6. Até à formação da coroa de lendas, deve-se admitir, como mais provável, uma tradição oral (BENTZEN) e não - como tem ocorrido muitas vezes - um livro de Daniel anterior aos Macabeus.
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Cf. A. S. KAPELRUD, The Questions of Authorship in the Ezra-Narrative, 1944,26. Sobre as suas relações com a Oração deNabonido 4Q OrNa, cf. W. DOMMERS - HAUSEN, Nabonid im Buche Daniel, 1964. - R. MEYER, Das Gebet des Nabonid, 1962. - J. T. MILIK, "Priere de Nabonide", RB 63 (1956),407-415. - Mais antigo, especialmente: W. VON SODEN, "Eine babylonische Volksüberlieferung von Nabonid in den Danielerzahlung", ZAW 53 (1935), 81-89.
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4. Relatos Dentre os relatos redigidos na primeira pessoa gramatical, o capítulo 79 narra um sonho a respeito da ruína dos quatro impérios simbolizados por animais, e a respeito da soberania do "Filho do homem". O capítulo 810 relata a visão do combate travado entre o carneiro e o bode ou cabrito montês, que simbolizam os reis medo-persas e Alexandre. Em lugar deste último, aparecem outros quatro chifres (quatro reis), dos quais, por sua vez, brota um chifre menor (um rei perverso). Na próxima visão (9),11 o anjo Gabriel instrui Daniel a respeito do significado dos setenta anos de exílio preditos em [r 25.11; 29.10 e que representam semanas de anos, ou seja, ao todo, 490 anos, e também a respeito dos acontecimentos desse período, em particular da supressão do culto javista em Jerusalém. Na extensa visão de 10-12,12 um outro anjo revela o desenrolar da história, desde Ciro, passando pelos outros reis persas, por Alexandre Magno, pelos quatro Estados que despontam e pela luta entre os Estados do sul e os Estados do norte, até o último rei do norte, que profana o santuário de Deus. Seguem-se as predições sobre a sua morte, sobre a libertação dos justos, sobre sua ressurreição para a vida eterna e a ressurreição dos maus para a ignomínia eterna, e por fim, a fixação do término - mediante dois acréscimos - respectivamente em 1290 (12.11) ou 1335 dias (12.12). O autor seguramente entendia de visões extáticas. Nenhuma dúvida, entretanto, pode haver de que não se trata de visões reais. Quanto a isto, elas encerram muitos elementos tradicionais e outros também provenientes da reflexão histórica. Trata-se de produções literárias, como os relatos semelhantes de visões que se encontram na literatura greco-
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COPPENS - L. DEQUEKER, Le Fils d'homme et les Saints du Três-Haui en Dan 7, 1961, 2i1 ed. - M. HALLER, "Das Alter von Daniel 7", ThStr 93 (1920/1921), 83-87. - M. NOTH, "Die Heiligen des Hochsten", NTT 56 (1955), 146-161 (= Gesammelte Studien zum Alten Tesiameni, 1960, 2i1 ed., 274-290). - A. B. RHODES, "The Kingdom of Men and the Kingdom of God", Interpr 15 (1961),411-430. 10 S. KRAUS, "Some Remarks, on Daniel 8,5", HUCA 15 (1940), 305-311. 11 A. LAGRANGE, "Les Prophéties messianiques de Daniel", RB 39 (1930), 179-198. - G. LAMBERT, "Une exégêse arithmétique du chapitre IX de Daniel", NRTh 74 (1952), 409-417. 12 B. J. ALFRINK, 'Tidée de Résurréction d'apres Dan, XII, 1-2", Bib140 (1959), 355-371. - H. B. KOSSEN, "De oorsprong van de voorstelling der opstangind uit de doden in Dan 12,2", NedThT 10 (1956), 296-301.
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romana." Estas visões de modo geral contêm considerações retrospectivas sobre a história, sob o ponto de vista apocalíptico, sendo, portanto, vaticinia ex eoeniu," ao mesmo tempo em que lançam olhares vaticinadores sobre o futuro, que logo aparecem como verdadeiras predições, pelo fato de não coincidirem com os acontecimentos reais posteriores. Independentemente disto, as expectativas de todos os relatos (inclusive de 2) estavam voltadas para uma única meta: o fim da situação opressiva causada pelo último rei ímpio e o começo da soberania definitiva de Deus. a destino do judaísmo palestinense situa-se constantemente no campo visuaL Daí concluir-se que os relatos surgiram na Palestina - e, como haveremos de mostrar, na primeira metade do séc. II a.c. Pode-se pensar então em um processo lento de formação, como já nos sugerem as diferenças que se observam, seja nos tipos de experiências, seja também na linguagem: o capítulo 7 é o relato de um sonho, redigido em aramaico; 812 são relatos de visões consignados em hebraico. Ao que parece, primeiramente redigiu-se o capítulo 7 como continuação dos capítulos 1-6, e depois o conjunto foi sendo aos poucos ampliado com os capítulos 8-12. a autor se serviu muitas vezes de materiais e de temas mais antigos. a quarto animal do capítulo 7 provém de uma figura mítica, que seria ou o monstro do caos primitivo (GUNKEL),15 ou, melhor, a figura de um Tifão sírio (EISSFELDT*),16 ou um dos monstros com que Baal tem de lutar." a Ancião de 7.9 corresponde melhor ao deus cananeu EI,18 do que se proviesse da religião iraniano-babilônica," embora adicionalmente seja possível ter havido uma influência iraniana sobre a representação tanto desta figura como da figura do Filho do homem. Este último se aplica a Israel (7.27), mas provém da expectativa de um Messias sobrenatural e extracósmico." a carneiro como símbolo da Pérsia e o bode como símbolo da A. J. FESTUGIERE, La Révelation d'Hermês Trimégisie, 1, 1944, particularmente 52ss. E. OSSWALD, "Zum Problem der vaticinia ex eventu", ZAW 75 (1963), 27-44. 15 H. GUNKEL, "SchOpfung und Chaos", 1921,2<1ed., 323-335. 16 O. EISSFELDT, Baal Zaphon, 1932,25-27. 17 A. S. KAPELRUD, Ball in the Ras Shamra Texis, 1952,98-109. - J. OBERMANN, Ugaritic Mythology, 1948,56-71. 18 O. EISSFELDT, EI im ugaritischen Pantheon, 1951. - M. H. POPE, EI in the Ugaritic Texis, 1955. 19 H. GRESSMANN, Der Messias, 1929,343-373. 20 J. A. EMERTON, "The Origin of the Son of Man lmagery", JThSt NS 9 (1958), 225-242. - A. FEUILLET, "Le Fils de l'homme de Daniel et la tradition biblique", RB 60 (1953), 170-202,321-346. - E. G. H. KRAELING, "Some Babylonian and lranian Mythology in 13 14
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Grécia e da Síria se explicam pelo costume de colocar os países em correspondência com as imagens do zodíaco, de conformidade com a geografia astronômica da época (CUMONT).21 Talvez se possa admitir a influência iraniana para a representação dos anjos protetores das nações (10.13s,20s).22 Além disso, o autor deve ter usado trabalhos históricos já escritos, para o capítulo 11.23
5. Origem do livro A origem do livro deve ter-se processado da maneira como segue: o autor - um judeu anônimo de Jerusalém - apropriou-se, de um lado, da coroa de lendas transmitida oralmente e acompanhada de uma introdução (1-6), atualizou-a e transformou-a em um conjunto homogêneo construído segundo um plano bem determinado, e, do outro lado, utilizouse de elementos míticos e de apontamentos históricos e - talvez estimulado também pelas lendas - redigiu, ele próprio, os relatos 7; 812, sobre os sonhos e as visões, e os uniu a 1-6, formando um livro. Nestes capítulos, a exposição se desenvolve quase paralelamente no plano cronológico, a saber: os capítulos 1-6 relatam as experiências que Daniel e seus companheiros viveram sob Nabucodonosor, Baltazar, Dario e Ciro (6.29), enquanto, do outro lado, os capítulos 7-12 narram o sonho e as visões de Daniel ocorridos sob Baltazar, Dario e Ciro. Além disso, o capítulo 7, que constitui o relato do sonho de Daniel, parece estar ligado tanto ao capo 2 como ao capo 12 e formar o centro de ligação do livro (PLóGER). Apesar das objeções de PORTEOUS, o conjunto é considerado como the Seventh Chapter of Daniel", em: ar. Stud. Pavry, 1933,228-231. - TH. W. MANSON, "The Son of Man in Daniel, Enoch, and the Cospel", BJRL 32 (1949/1950), 171-193. - O. MOE, "Der Menschensohn und der Urmensch", StTh 14,2 (1960), 119-129. - lo., "Menneskesonnen og Urmenesket", TTKi 32 (1961), 65-73. - J. MORGENSTERN, "The 'Son ofMan' of Daniel 7,13ff.", JBL 80 (1961), 65-77. - S. MOWINCKEL, He that Cometh, 1956,346-450 (em norueguês: 1951). - J. MUILENBURG, "The Son of Man in Daniel and the Ethiopic Apocalypse of Enoch", JBL 79 (1960), 197-209. - P. PARKER, "The Meaning of "Son of Man", ibid. 60 (1941), 151-157. - L. ROST, "Zur Deutung des Menschensohnes in Daniel 7", em: Fascher-Festschrift, 1958,41-43. - E. SJOBERG, "Mânniskosonen och Israel I Dan 7", Religion och Bibel 7 (1948), 1-16. - S. H. P. THOMPSON, "The Son of Man - Some further Considerations", JThSt NS 12 (1961), 203-209. - E. J. YOUNG, Daniel's Vision of the Son of Man, 1958. 21 F. CUMONT, "La plus ancienne géographie astrologique", Klio 9 (1909), 263-273. 22 A. BERTHOLET, "Der Schutzengel Persiens", em: ar. Stud. Pavry, 1933,34-40. 23 C. A. BARToN, "The Composition of the Book of Daniel", JBL 17 (1898), 62-86.
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um apocalipse, se bem que em uma forma primitiva e ainda não inteiramente definida, principalmente porque os empréstimos dos escritos proféticos, dos salmos e da literatura sapiencial não chegaram realmente a fundir-se. Tem-se um acréscimo posterior principalmente na oração de Daniel (9,4-20), que emprega o nome divino de Javé, evitado nas outras partes do livro." Um acréscimo talvez seja também 12.11ss, que constitui uma dupla correção do termo inicial do fim dos tempos. A versão dos LXX contém também outros"suplementos" ao livro de Daniel (que na recensão de TEODOCIÃO se acham em parte em outro lugar): depois de 3.23, a oração de Azarias e o cântico dos três jovens na fornalha ardente, unidos entre si por um breve trecho em prosa; depois do livro (proto) canônico, a história de Susana e as duas narrativas de Bel e do dragão. O texto da versão dos LXX, que diverge notavelmente da forma hebraica, foi em breve suplantado pela tradução de TEODOCIÃO e dele só se conhece um manuscrito, ao qual recentemente se acrescentaram as partes do texto dos Papiros Chester-Beatty.
6. Época A época de origem do livro pode ser determinada com bastante precisão. Todas as visões apontam para uma mesma situação histórica: a perseguição movida contra os judeus por Antíoco IV, Epífanes (175-164 a.C),2S soberano do reino dos Selêucidas surgido das lutas dos Diádocos depois da morte de Alexandre Magno. O autor conhece, de um lado, o regresso de Antíoco de sua expedição ao Egito (169 a.C) e a abominação da devastação (11.31), a profanação do templo de Jerusalém com a ereção, aí, de um altar dedicado a Júpiter Olimpo (167 a.C).26 Por outro lado, ele não sabe ainda da morte de Antíoco, ocorrida em dezembro de 164, na Pérsia, pois B. N. WAMBACQ, "Les priêrs de Baruch (1,15-2,19) et de Daniel (9.5-19)", Bibl 40 (1959), 463-475. 25 Datas segundo R. HANHART, "Zur Zeitrechnung des I und II Makkabãerbuches", em: BZAW 88,1964,49-96. 26 G. CH. AALDERS, "De 'Gruwel der Verwoesting' 0, GThT 60 (1960), 1-5. - M. A. BEEK, "De Gruwel der Verwoesting", NThT 29 (1940),237-252. - G. COTTER, "The Abomination of Desolation", Canadian JTh 4 (1957), 159-164. - H. H. ROWLEY, "Menelaus and the Abomination of Desolation", em: Studia Orientalia Pedersen, 1953, 303-315. 24
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a predição que começa em 11.40não concorda com os fatos reais. Assim, o livro se encerrou pelo menos antes de meados de dezembro de 164 a.c., principalmente porque não se sabe ao certo se 8,14 alude à nova dedicação do templo, celebrada em 14 de dezembro de 164. De qualquer modo, o autor trabalhou bastante tempo em sua obra, de sorte que se deve situálo, genericamente, entre os anos 167 e 164 a.c. A partir daí, vê-se claramente que não tem sentido a interpretação baseada nas concepções do NT (Me 13; 2Ts 2.4), tributárias da história da época, interpretação segundo a qual os quatro reinos dos capítulos 2 e 7 indicariam os impérios babilônico, persa, grego, e romano. O livro de Daniel indica, antes, os impérios babilônico, medo, persa e o império greco-helenístico de Alexandre Magno e dos Diádocos, cujo fim deve marcar o início da soberania de Deus.
7. Bilingüismo Uma das características do livro é o seu bilingüismo: 1.1-2,4a foi redigido em hebraico, 2.4b-7.28 em aramaico, e 8-12 de novo em hebraico. Não existe uma explicação universalmente aceita para este fenômeno. Pode ser que o autor, depois de ter refundido e fixado por escrito, em língua aramaica, a coroa de lendas, até então transmitida oralmente nesta língua, tenha dado prosseguimento ao seu trabalho e redigido também em aramaico o relato sobre o sonho (cap. 7), mas tenha mudado de língua, por razões desconhecidas, para os capítulos 8-12. Também é possível que tenha traduzido para o hebraico a introdução 1.1-2.4a. Com ErssFELDT*, podemos dividir as outras tentativas de explicação em quatro grupos: a) razões de ordem mecânica, segundo as quais o autor teria completado com uma tradução aramaica os trechos que se haviam perdido do original hebraico (BEVAN, GOETTSBERGER); b) hipótese de um original aramaico, do qual teriam sido traduzidos textos isolados para o hebraico (ZrMMERMANN, GrNsBERG); c) o próprio autor teria utilizado as duas línguas, mas no decurso do tempo teria reconhecido que a língua hebraica era mais apropriada do que o aramaico (ROWLEY) ou teria querido apresentar, a exemplo de Esdras e Neemias, trechos correspondentes na língua aramaica primitiva, a "língua dos documentos" (ErSSFELDT); d) utilização do livro 1-6 mais antigo e quiçá também do relato 7 em língua aramaica (com a introdução traduzida); e transcrição, em hebraico, dos trechos redigidos pelo próprio autor (SELLIN, HÓLSCHER, MONTGOMERY).
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8. Apocalipse
a livro nasceu da situação de
conflito provocada sob a dominação dos Selêucidas, por Antíoco, no seu empenho de fazer do seu reino uma grande unidade. Já as conquistas de Alexandre e a dominação dos Ptolomeus só haviam provocado ligeira reação em Jerusalém. A referida situação conduziu a uma cisão entre os judeus de [udá e de Jerusalém, uma parte dos quais desejava a helenização, enquanto a outra, dando continuidade à atitude propugnada por Neemias e por Esdras, se lhe opunha por todos os meios. Na época em que se levantou a perseguição religiosa, ou pelo menos no começo do conflito armado, havia vários grupos que estavam todos prontos a resistir ou se sentiam comprometidos a fazê-lo. Mas suas concepções teológicas divergiam de tal modo, que o movimento em breve se esfacelou. Dentre esses grupos, Daniel representa a corrente apocalíptica em seus inícios, cujo florescimento vem somente a seguir. a livro de Daniel é o único apocalipse do AT. Esse livro pretende revelar o surgir e o decorrer das idades do mundo e comunicar os mistérios do final dos tempos. Partindo daí, o apocalipse procura determinar, não apenas o prazo do término da história, como também a posição do tempo presente. Se, de acordo com 8.26, o fim parece estar situado em tempos longínquos, isto se deve ao fato de se apresentar a história retrospectivamente como um "vaticínio" valendo até os dias do autor. Aquilo que parecia distante ao pretenso Daniel do exílio, no entretempo tornarase próximo. Enquanto desenvolvimento da escatologia, a concepção apocalíptica da história contrapõe entre si a história universal em seu conjunto e a soberania divina. Esta concepção vê os acontecimentos da história universal como um todo homogêneo que tem um fim prefixado por Deus: o juízo final, ao qual sucederá, para os justos, uma era que não estará submetida à história. Até chegar a este ponto, a história se achará dividida pelas idades dos impérios que vão se sucedendo uns aos outros. A estátua feita de vários tipos de metais e que uma pedra despedaça (cap. 2) representa a história universal contemplada como um todo mas dividida, ao mesmo tempo, em diversas épocas. Até o final dos tempos ela será o único terreno em que o homem há de viver, carregado da herança do passado, rico em decisões em relação ao presente e pleno de responsabilidade a respeito do futuro. Partindo das conexões desses pontos de vista, o livro pretende fortalecer a paciência e o ânimo dos bons que sofrem sob a perseguição, incu-
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tindo-lhes esperança e exortando-os a permanecerem firmes na fé, como DanieL Pretende também dar-lhes a certeza de que o tempo do sofrimento haverá logo de passar, porque se aproxima o dia em que Deus porá um termo aos poderes deste mundo e dará início à sua eterna dominação. Dentro deste contexto, o livro responde à questão de saber se os que tombaram na luta pela fé poderão ter parte na salvação escatológica, e se todos os homens deverão comparecer perante o tribunal de Deus no juízo final, e responde anunciando a ressurreição - de uns para a vida eterna e de outros para a eterna infâmia (12.2). Os justos, neste caso, parece que são os que admitem as concepções do livro. Tem-se, assim, no pano de fundo a formação de uma comunidade de tipo conventicular, que se considera como o verdadeiro Israel e que espera a ressurreição, para então reinar com Deus e seus anjos (PLúGER). É talvez deste traço sectário que decorre não apenas o fato de o livro ter influenciado fortemente os escritos apocalípticos posteriores do judaísmo e do cristianismo, como também o de ter sido sempre considerado pelas seitas apocalípticas e quiliásticas como o ponto central de toda a Bíblia. Evidentemente que isto foi condicionado precisamente por uma investigação falha da Bíblia, e não se pode justificar. O significado permanente do livro está em que ele exorta a uma fidelidade inabalável na fé, ao mesmo tempo em que apresenta um conceito de história que estimula à tomada de decisão e à responsabilidade, acompanhado do desejo de uma vida vivida sob o domínio de Deus.
Quinta Parte Compilação e Transmissão do Antigo Testamento
CAPÍTULO
XIII
ORIGEM E HISTÓRIA DO CÂNON HEBRAICO K. BUDDE, Der Kanon des Alten Testaments, 1900. - F. BUHL, Kanon und Text des Alten Testaments, 1891. - A. EBERHARTER, Der Kanon des Alten Testaments zur Zeit des Ben Sira, 1911. - F. V. FILSON, Which Books belong in the Bible? A Study of the Canon, 1957. - F. HESSE, "Das Alte Testament als Kanon", NZSTh 3 (1961),315-327. - G. HÓLSCHER, Kanonisch und Apokryph, 1905. - F. HORST, "Das Alte Testament als HeiIige Schrift und als Kanon", ThBl11 (1932),161-173. - A. JEPSEN, "Kanon und Text des Alten Testaments", ThLZ 74 (1949),65-74. - ID., "Zur Kanongeschichte des Alten Testaments", ZAW 71 (1959), 114-136. - P. KATZ, The Old Testament Canon in Palestine and Alexandria, XNW 47 (1956),191-217; 49 (1958), 223. - E. KÓNIG, Kanon und Apokryphen, 1917. - J. LEIPOLDT - S. MORENZ, Heilige Schriften, 1953. - A. LODS, "Tradition et canon des Écritures", EThR 36 (1961),47-59. -G. MENSCHING, Das heilige Wort, 1937. - F. MICHAÉLI, "A propos du Canon de l'Ancien Testament", EThR 36 (1961),61-68. - G. OSTBORN, Cult and Canon, 1950. - H. WH. ROBINSON, "Canonicity and Inspiration", ET 47 (1935/36),119-123. - L. ROST,"Zur Geschichte des Kanons hei den Nestorianern", ZNW27 (1928) 103-106. - W. STAERK "Der Schrift- und Kanonbegriff der jüdischen Bibel", ZSTh 6 (1929), 101-119. - A. C. SUNDBERG, The Old Testament of the Early Church, 1964. - S. ZEITLIN, A Historical Study of the Canonization of the Hebrew Scriptures, 1933.
§ 75. NOME E CONCEITO TRADICIONAL
1. O cânon; livros deuterocanônicos e não-canônicos
o
ATé mais do que um simples ajuntamento dos livros isolados cujo processo de formação acabamos de discutir. Em seu conjunto, o AT deve ser caracterizado com o termo "cânon", Por isso é necessário seguir o
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desenrolar do processo de formação desse conjunto e indagar de que modo surgiu o cânon do AT enquanto Escritura Sagrada, tendo-se presente os fatos e os temas essenciais. A palavra "cânon", que se acha vinculada ao termo semítico qaneh, "cana" e tem no grego o sentido análogo de "vara de medir", foi empregada na filosofia grega com a significação transposta de " fio condutor, regra, norma" , conservando este mesmo sentido em FILO, no NT (GI6.16; 2Co 1O.13ss) e na Igreja do séc. Ill. Somente no séc. IV o conceito foi aplicado à Bíblia pelo Concílio de Laodicéia (360) e por ATANÁSIO (De decretis Nicaenae synodi 18.3) para indicar o seu caráter de portadora das verdades de fé para a pregação da Igreja. Foi a Igreja latina que fez a identificação entre cânon e Bíblia. Assim, do ponto de vista do conteúdo, o conceito se aplica à Bíblia em geral ou apenas ao AT, enquanto se fundamenta na revelação divina e oferece a regra e a norma de fé e de vida; do ponto de vista formal, esse mesmo conceito indica a lista ou o catálogo daqueles escritos que devem fazer parte da Bíblia. Antes, porém, de o conceito de cânon ter sido adotado, existiram outras expressões que correspondem pelo menos ao ponto de vista do conteúdo: Sagradats) Escriiurate), utilizada no NT, na Mishná, em FILO e JOSEFO, para indicar o AT; ou também as palavras: que tornam impuras as mãos que ocorrem na Mishná [adaiim 3.5, indicando o efeito que o material sagrado dos livros canônicos produzia sobre aqueles que os tocavam. Estritamente falando, o conceito de cânon exclui também a introdução de mudanças no texto. Contudo, ele foi usado, sob este aspecto, como também sob o ponto de vista do conteúdo, praticamente quase sempre de modo muito pouco consistente, de sorte que é de bom alvitre não urgir o conceito. O cânon do AT hebraico, que se impôs de modo geral, embora não totalmente, se compõe de três partes: a Lei, os Profetas e os Hagiógrafos. Desde o séc. VIII d.C., a segunda parte foi subdividida em "Primeiros profetas" (Josué-2 Reis) e "Profetas posteriores" (livros proféticos), não se sabendo ao certo se estas expressões indicam, em sentido temporal, a época de seu aparecimento ou, em sentido espacial, o lugar que os mesmos ocupam no cânon. Os livros religiosos mais antigos que não foram recebidos no cânon costumam ser designados, em parte, como apócrifos e, em parte, como pseudo-epígrafos. Mas estas expressões não são muito claras e foram superadas pelos escritos descobertos em Qumran, os quais na sua maioria não se enquadram nesse esquema. O mais correto seria chamar os referidos livros respectivamente de deuterocanônicos e nãocanônicos.
§ 75. NOME
E CONCEITO TRADICIONAL
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A expressão "apócrifos", que se tornou usual desde KARL5TADT (1520) para designar os livros deuterocanônicos, considera-os como "secretos, ocultos", como tendo sido escritos por outros autores que não os tradicionalmente admitidos, ou como sendo de conteúdo de tal modo difícil, a torná-las acessíveis apenas aos iniciados. Com relação aos apócrifos do Antigo Testamento a expressão significava originalmente que eles deviam ser excluídos do uso público, tal como se fazia também no judaísmo helenístico, sem que, por isso, devessem ser excluídos igualmente do cânon. De fato, na Bíblia grega e latina eles foram atribuídos ao AT em sentido mais amplo. Trata-se dos seguintes: 3 Esdras, 1-3, Macabeus, Tobias, [udite, a oração de Manassés, certos acréscimos ao livro de Daniel, acréscimos ao livro de Ester; Baruc, a carta de Jeremias; Eclesiástico (Jesus Sirac), Sabedoria de Salomão. Além dos 4 Macabeus (Codex Alexandrinus) e 4 Esdras (Vulgata), certas comunidades da Igreja oriental atribuíram esta dignidade também a outros livros. Contudo, a designação de "deuterocanônicos" se restringe praticamente ao grupo mencionado em primeiro lugar. Esses escritos foram assumidos do AT grego pelas Igrejas, no todo ou em parte, como livros de edificação e como uma espécie de apêndice ao cânon, e, segundo a definição de LUTERO, não podem ser equiparados aos livros canônicos, embora possam ser lidos com bastante proveito.' O nome de "pseudo-epígrafo" para designar os livros religiosos nãocanônicos também não é feliz porque significa que tais livros circulam sob o nome de um suposto e falso autor e que, portanto, são pseudônimos. Mas isto não se aplica a todos os pseudo-epígrafes, dos quais alguns são anônimos, aplicando-se, ao invés, a determinados livros canônicos e deuterocanônicos, como, p.ex., o Cântico dos Cânticos, Daniel, Baruc, a carta de Jeremias. Não é possível oferecer uma visão global dos livros não-canônicos, sobretudo porque uma parte deles só foi conservada em fragmentos ou só se conhece pelo título. Comumente entre os não-canônicos contam-se os seguintes: Carta de Aristéias, Livro dos Jubileus, Martírio 1
Sendo protestante, o Autor segue o costume das Igrejas evangélicas, que reconhecem como normativos somente os livros do cânon hebraico e consideram os deuterocanônicos apenas como escritos de edificação pessoal. Na Igreja católica, os livros deuterocanônicos passaram da versão grega do AT para a Vulgata Latina, e no Concílio de Trento (1546) foram proclamados canônicos. Razão por que os católicos, nas suas Bíblias, imprimem os livros deuterocanônicos sem distingui-los dos canônicos. Os protestantes não os imprimem, ou então os relegam ao apêndice. Cf. mais adiante, § 77,3, (N. da Ed.).
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e Ascensão de Isaías, Salmos de Salomão, Odes de Salomão, 4 Macabeus, Livros Sibilinos, versão etíope e eslava do Livro de Henoc, Assunção de Moisés, 4 Esdras, Apocalipse sírio e grego de Baruc, Testamentos dos Doze Patriarcas, Vida de Adão e Eva. Ao que se acrescentam os documentos de Qumran: Rolo da Seita, Escrito de Damasco, Rolo da Guerra, Rolo dos Cânticos de Ação de Graças e outros.
2. Conceito tradicional O conceito tradicional a respeito da origem do cânon, dominante até o séc. XVIII, surge pela primeira vez em JOSEFO, C.Ap. 1,8 (cerca de 95 d.e), onde ele diz que os judeus possuem vinte e dois livros fidedignos, em seu estado primitivo (o autor junta Rute com Juízes, e Lamentações com Jeremias), os quais apresentam as seguintes características: a) provêm de homens inspirados que viveram no período que se estende de Moisés até Artaxerxes 1(465-424); b) distinguem-se da literatura profana pelo caráter sagrado de seu material; c) são numericamente limitados; d) não se pode tocar no seu conteúdo. Segundo 4Esd 14.18-48 (cerca de 100 d.e) o cânon foi criado por Esdras, e é datado da época do exílio: durante quarenta dias ele ditou, de novo, a seus cinco auxiliares os livros sagrados que haviam sido destruídos por ocasião da queda de Jerusalém. Eles escreveram então vinte e quatro livros canônicos.ê e mais outros setenta (apocalipses) destinados apenas aos sábios. ELIAS LEVITA deu a esta opinião, aceita pelo cristianismo no séc. II, uma nova forma (1538), que foi decisiva para as épocas posteriores: os vinte e quatro livros do AT já existiam no tempo de Esdras, mas este e os homens da grande sinagoga" os reuniram e os dividiram nas três partes do cânon hebraico, pondo em ordem certos detalhes no interior de cada uma destas partes. Na realidade, esta e outras concepções semelhantes são inexatas e insustentáveis. Alguns livros do AT são posteriores à época de Esdras e por isso ele ainda não os podia conhecer (Crônicas, Eclesiastes, Daniel e outros). Também a colocação de Crônicas, Esdras e Neemias, como também a de Daniel na terceira parte e não na primeira ou na segunda seria inconcebível. Contra a tradição levantam-se também as variantes do cânon samaritano e da versão dos LXX. Por fim, também nunca existiu /I
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O número de vinte e quatro livros, em lugar dos tradicionais trinta e nove, provém do fato de que Samuel, Reis, o Dodekapropheton e a obra cronística eram contados como constituindo cada grupo um só livro em si.
§ 76.
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uma "grande sinagoga" no sentido que lhe dá o Talmude. O aparecimento do cânon constitui antes um longo processo histórico no qual se pode distinguir três estágios: a tradição oral, resultante da revelação como seu pressuposto; o trabalho de compilação dos escritos sagrados como uma espécie de pré-história; e a formação propriamente dita do cânon.
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1. Pressuposto O pressuposto para um cânon das Sagradas Escrituras consiste na antiga crença de que a revelação divina se expressa na palavra humana e por isso determinadas palavras humanas representam a palavra de Deus, podendo reivindicar para si uma autoridade divina e possuir valor normativo. Isto vale para a instrução ministrada pelo sacerdote (iõrã), a palavra de ordem ou de proibição da regra de vida (da bar), a determinação do legislador e do juiz (mispai), o oráculo do profeta (da bar), o cântico do cantor (Sir) e a sentença do sábio (masal). Todas estas palavras são atribuídas à inspiração divina, embora a eficácia desta se considere menos presente no cântico e na sentença. Trata-se sobretudo de palavras proclamadas oralmente, destinadas à própria época e que com freqüência caíam logo depois no esquecimento. Muitas delas, porém, adquiriram validez permanente e foram conservadas oralmente e por escrito, e, juntamente com outras, foram reunidas em coleções e em livros e consideradas como escritos de caráter sagrado e normativos para a vida. É deste modo que as três primeiras manifestações acima mencionadas - a instrução, a palavra e a decisão - começam paulatinamente a formar a Lei (tõrã) em sentido mais estrito. Através de anotações a respeito de sua origem e, por conseguinte, a respeito de sua santidade, recomenda-se que os elementos dessa Lei sejam cuidadosamente observados e transmitidos: os decálogos foram escritos sob o ditado de Javé ou por ele pessoalmente (Ex 24.12; 31.18; 32.15s; 34.28). As determinações legais (Ex 21.2-22.16) deviam ser propostas à aceitação do povo por intermédio de Moisés (21.1). A lei deuteronômica deve ser abreviada ou ampliada e depositada num lugar sagrado (Dt 4.2; 13.1; 31.26). Isto, porém, não significa ainda nenhuma compilação dos escritos sagrados e muito menos ainda uma canonização, porque novas coleções de leis entraram em vigor até à lei da Santidade e ao Documento Sacerdotal. É somente com a reforma de
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Esdras, a qual estabilizou a Lei, que se encerra o período do aparecimento de qualquer nova lei de autoridade divina. Os oráculos proféticos, cuja comunicação se faz, apelando-se, com muita freqüência, expressamente para a autoridade divina, valem em primeiro lugar, evidentemente, para o seu tempo. Como, porém, só raras vezes se cumpria, em vida de um profeta, aquilo que ele anunciara, esses oráculos foram consignados por escrito, a fim de que pudessem conservar-se em vigor - pouco importando que eles contenham muita coisa que pode valer para além do momento transitório, como palavra divina reguladora da vida. Os próprios profetas escatológicos já supõem semelhante valor, quando, conscientes de sua condição de epígonos, se reportam aos profetas mais antigos Os 48.3; Zc 1.4; 7.7). Finalmente, quando na época tardia do pós-exílio, começa a se duvidar da profecia contemporânea (Zc 13.1-6), a corrente apocalíptica erudita se utiliza dos oráculos dos profetas mais antigos para seus cálculos sobre o futuro. O cântico e a sentença podem também ser considerados muitas vezes como palavras possuidoras de um poder de eficácia, como nos mostra, sobretudo, a pesquisa dos gêneros literários. Além disso, os cânticos cultuais foram transmitidos e utilizados durante séculos, revestindo-se assim de uma áurea de respeitabilidade devida à sua antiga idade. O fato, porém, de se ficar limitado, afinal, às tradições de um determinado período e de não mais se reconhecerem manifestações mais recentes, se deve à adaptação da Lei e dos oráculos proféticos às circunstâncias do tempo. Os motivos para a transmissão e para a compilação das palavras humanas tidas como palavra divina foram, no particular, vários e mutáveis. Muitas vezes a razão se encontra no antigo conceito de força mágica atribuída à palavra escrita (Nm 5.11 ss). Sobretudo é deste modo que os oráculos proféticos foram transmitidos, para conservarem a força da palavra falada de Javé e talvez também para aumentar esta força, a fim de gue a vontade divina expressa nessas palavras se realizasse no futuro. E desta raiz que provém, por fim, a idéia de santidade material de tais escritos. Paralelamente a isto entra em ação uma idéia pessoal, quando se reproduzem ou se apreciam as palavras ditadas por Javé ou registradas pessoalmente. Um dos pontos de vista que teve também o seu papel no caso dos profetas foi o desejo de encontrar, ao menos junto à posteridade, depois da realização daquilo que eles predisseram, o reconhecimento que lhes fora negado em vida. Além disso, as narrativas que vão da época dos patriarcas até à conquista do país foram transmitidas porque serviam de
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fundamento à pretensão jurídica e religiosa a respeito da terra de cultura. Posteriormente os motivos cultuais exerceram um determinado papel, principalmente no que diz respeito aos cânticos cultuais, embora o culto em si não funcione nunca como o "Sitz im Leben" (contexto vital) propriamente dito para o AT enquanto Escritura Sagrada (WEISER*). De fato, na época anterior ao exílio, e depois do exílio também durante bastante tempo, o culto israelítico foi predominantemente um culto sacrifical e não um serviço da palavra de Deus, serviço este que só veio a existir em maior escala ao lado do culto sacrifical, depois que começou a funcionar o serviço divino da sinagoga durante o exílio. O verdadeiro motivo para a transmissão da palavra divina e para a formação progressiva do AT enquanto coleção de escritos sagrados e como cânon foi a preocupação em possibilitar e assegurar um amplo ordenamento para a vida com base na manifestação da vontade divina.
2. Pré-história A pré-história do cânon em sentido estrito é constituída pelo trabalho de compilação de escritos sagrados. Para o Pentateuco esta atividade começou com a colheita dos antigos "estratos fontes" que continham também as coleções de leis e de normas de vida. De importância maior foi o impulso dado pela reforma de [osias, com a introdução da lei deuteronõmica como norma obrigatória para a organização de toda a vida, de sorte que em época subseqüente o Deuteronômio veio simplesmente a se tornar a primeira Sagrada Escritura. O surgimento posterior de outros complexos de narrativas e de leis, até se chegar ao Código Sacerdotal teve seu coroamento com a introdução, feita por Esdras, do Pentateuco, acrescido do Código Sacerdotal, como base e norma para a comunidade de Jerusalém. O que decidiu, mais uma vez, não foram razões de ordem cultual mas o desejo de regular toda a vida. A partir de então, todo o Pentateuco - a tõrã, a "Lei" - foi considerado como Sagrada Escritura, que os samaritanos conservaram, por esta mesma razão, ao se separarem de Jerusalém, e que o judaísmo traduziu, inicialmente sozinho, para o grego, tendo sua designação como Lei sido utilizada, inclusive por Jó 10.34; 15.25, para indicar todo o AT. Evidentemente que isto não implicava, de imediato, a sua canonicidade, porque a extensão e o texto ainda não tinham sido definitivamente fixados; antes, ainda era possível introduzir ampliações e mudanças, como nos mostra uma comparação entre o texto massorético e a versão dos LXX.
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o
trabalho de compilação dos "Primeiros" Profetas e dos Profetas "Posteriores" se fez simultaneamente com o da "Lei", também, em última análise, pelos mesmos motivos. Mas os livros de Josué-2Rs, dos quais [osué chegou mesmo a formar originalmente uma unidade com o Pentateuco, dão prosseguimento à narrativa mais antiga sobre a história de Israel e de suas relações com Javé, enquanto os profetas interpretam tudo isto por meio da própria palavra. Através disso tudo, os livros proporcionam indícios diretos ou indiretos para a organização de uma vida em conformidade com a vontade de Deus. Entretanto, é somente o trabalho de compilação dos "Primeiros" Profetas que se deve aos mesmos círculos que recolheram a "Lei". A maneira como estão divididas as coleções e os livros proféticos, e também a consideração particularmente acentuada com respeito à profecia escatológica nos permitem presumir que os Profetas "Posteriores" foram compilados por círculos escatológicos, com a finalidade de contraporem à piedade legalista não-escatológica um conjunto de Escrituras Sagradas que harmonizassem a observância da Lei com expectativa escatológica. Como a obra cronística, e muito particularmente Daniel, já não tiveram acolhida nesse conjunto, eles eram considerados, em fins do séc. IV, como coleções autônomas quanto ao essenciaL Quando Jesus Sirac, por volta de 190 a.c., menciona os profetas Isaías, Jeremias, Ezequiel e os Doze Profetas (Eclo 48.22ss), tal fato corresponde à referida situação. Evidentemente a coleção ainda não tinha caráter canônico. Isto é o que se deduz, seja das diferenças, por vezes notáveis, que se observam entre o texto massorético e o texto grego dos LXX nos livros de Samuel-Reis, seja a partir do modo como as Crônicas consideram a história, seja ainda a partir do fato de novos textos terem sido incluídos nos livros proféticos já existentes (p.ex.: Zc 12-14). O trabalho de compilação dos livros do terceiro grupo, ou dos "Escritos" [Hagiógrafos] - no sentido de "os demais escritos" ou "os que foram somente escritos", não se destinando à leitura no serviço divino - estava apenas em andamento quando as outras duas coleções se completaram, e se protraiu por longo tempo. Afora a Lei e os Profetas, o neto de Sirac menciona, por volta de 117 a.c., somente os outros Escritos transmitidos pelos pais. Em De vita contemplativa § 25, em meados do séc. I, FILO fala em Salmos e outros escritos, e Lc 24.24 menciona simplesmente os Salmos. Segundo 2Mc 2.13ss (séc. I a.c.), Neemias teria compilado um saltério e a correspondência com os soberanos persas, além de certos livros históricos e dos profetas, e Judas Macabeu teria organizado, por seu lado, uma vasta coleção de escritos dos antepassados, subenten-
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dendo-se, com isto, os "Escritos" [Hagiógrafos]. Que este grupo de escritos já não tenha exercido nenhum papel de importância é o que nos mostra a expressão: a Leie os Profetas, utilizada em Mt 5.17; At 28.23 para designar todo o AT. Somente aos poucos é que o terceiro grupo foi encontrando aceitação, incluindo-se nele, inicialmente de forma pouco consistente, aqueles livros que mereciam tal distinção. Dentre estes escritos, parece que o Saltério foi o primeiro a ser considerado como Escritura Sagrada, fato este compreensível, em se tratando desta coleção de cânticos. Coisa semelhante se passa com as Lamentações, pelo fato de serem utilizadas nas solenidades comemorativas da destruição de Jerusalém, e por serem atribuídas a Jeremias, e também com o livro de Ester, utilizado como rolo festivo na solenidade dos Purim. A literatura sapiencial podia apelar para a inspiração divina. Além disso, os Provérbios e o Eclesiástico são atribuídos a Salomão, o mesmo acontecendo com o Cântico dos Cânticos, ao passo que Rute, em sua última recensão, fala dos antepassados de Davi, e sua história transcorre na época dos Juízes. Também para Daniel deve ter sido determinante o fato de ser atribuído a uma época situada no período da revelação, ou seja, na época do exílio. Da história cronística, Esdras e Neemias foram os primeiros a serem admitidos, por causa de sua ligação com a Lei e o culto; seguiram-se, mais tarde, os livros das Crônicas, inicialmente separados dos mesmos. De Mt 23.25, contudo, não se pode deduzir que isto era reconhecido na época do Novo Testamento. A seleção definitiva e mais ainda a distribuição dos livros do terceiro grupo só foram estabelecidas na época posterior ao aparecimento do cristianismo.
3. Formação do cânon hebraico Até à época de Sirac e de seu neto, respectivamente por volta de 190 e 117 a.c., ainda não se havia chegado à formação do cânon hebraico em sentido propriamente dito. Por volta de 117 existia somente uma série de escritos sagrados, uma parte dos quais fora reunida em duas coleções, mas continuava exposta ainda a possíveis alterações. Uma terceira coleção se achava em vias de formação, não estando ainda fixados o tamanho e a denominação. Mas em JOSEFO e em 4Esd, por volta de 100 d.C., o conceito de cânon já se encontra definido. Também o número dos escritos canônicos está definitivamente estabelecido. O encerramento do cânon se deu, portanto, entre os anos 100 a.c. e 100 d.C., e o chamado Sínodo de [âmnia (Iabne), cerca de 20 km ao sul de [afa, parece ter contribuído de
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algum modo para isto. Divergências posteriores a respeito de livros em particular em nada alteraram o cânon. A formação do cânon foi o resultado de uma decisão dogmática que fixou o conjunto das Sagradas Escrituras, determinando-lhe o número e os limites, razão pela qual se postulava um período bem definido da revelação (de Moisés até Artaxerxes 1). As razões para esta decisão se ligaram à situação histórica. Em uma determinada época floresceu o chamado movimento apocalíptico com a pretensão de possuir o dom da inspiração e por este modo misturava, de novo, idéias de crenças estranhas com as próprias, fazendo assim reviver, mais uma vez, o perigo do sincretismo religioso. Seus escritos deviam suplantar a própria Lei, sendo, por isso, atribuídos a personalidades que viveram antes de Moisés (Adão, Henoc, Noé, os patriarcas), de modo a parecerem mais antigos do que a Lei de Moisés. Igualmente perigosos devem. ter sido considerados os escritos de outros grupos e correntes, como os de Qumran, em cuja comunidade se utilizava inclusive a literatura deuterocanônica e não-canônica, não se limitando a um determinado cânon. Mas era sobretudo a força missionária do cristianismo primitivo que se fazia sentir ameaçadora, principalmente pelo fato de haver adotado a tradução grega dos LXX, pondo-a em concorrência com as Escrituras hebraicas. Em face do perigo de um esvaziamento interno e de uma desagregação no exterior para o judaísmo fiel à Lei, a corrente dos fariseus definiu e impôs o conceito de cânon, apesar da resistência dos saduceus que só reconheciam como livro normativo a Torá. Esta corrente distinguia rigorosamente entre literatura sagrada e literatura profana, incluindo na primeira os vinte e quatro escritos que pareciam corresponder às quatro notas apontadas por JOSEFO (§ 75,2). Podese considerar o cânon como terminado por volta do ano 100 d.C.
4. Divisão
o neto de
Jesus de Sirac encontrou a divisão do cânon hebraico já estabelecida no que respeita às duas primeiras partes, e encaminhada, com relação à terceira parte. O resultado final se apresenta como segue: a) A Lei compreende o Pentateuco com os nomes e a ordem de cada livro já prefixados. b) Os Profetas, subdivididos em duas partes somente no séc. VIII d.C., compreendem inicialmente os livros históricos, cuja ordem de colocação foi logo determinada em sentido cronológico: [osué, Juízes, livros de Samuel e Reis. Rute esteve temporariamente unido a Juízes. A ordem de
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colocação dos livros proféticos oscila, pois no texto massorético a distribuição é a seguinte: Isaías, Jeremias, Ezequiel e os Doze Profetas, enquanto o Talmude babilônico Baba Batra 14b ordena os três primeiros destes, com relação à diáspora oriental, desta maneira: Jeremias, Ezequias e Isaías. As Lamentações estiveram unidas durante algum tempo com Jeremias. c) Os Escritos [Hagiógrafos] foram distribuídos de muitas e variadas formas: no começo se encontram freqüentemente os Salmos, [ó e Provérbios, ou os Salmos, Provérbios e [ó, e no fim a obra cronística. Além disto, os cinco Megillot, ou rolos destinados a serem lidos nas principais festas do ano, foram agrupados desde o séc. VI d.e. e colocados na seguinte ordem, desde o séc. XII: Cântico dos Cânticos Rute Lamentações Eclesiastes Ester
para a Páscoa, para a festa das semanas ou festa da colheita, para a celebração do jejum, em memória da destruição de Jerusalém, para a festa dos Tabernáculos [festa das cabanas de folhagem], para a festa dos Purim.
§ 77. OUTRAS FORMAS DO CÂNON
1. Samaritanos Nos primeiros tempos do período helenístico, quando o centro de gravidade do judaísmo palestinense se situava na Judéia, e particularmente em Jerusalém, os seguidores da fé javista que residiam n região central do outrora Reino setentrional de Israel, chamado Samaria depois da divisão pelos assírios em províncias, separaram-se do judaísmo de Jerusalém formaram uma comunidade própria, a comunidade dos samaritanos, com o seu centro cultual no monte Garizim perto de Siquém. O cânon desta comunidade contém apenas os cinco livros da Torá. De caráter não canônico é uma exposição histórica, que vai de [osué até à Idade Média, passando pelo período dos imperadores romanos, e se encontra no Sefer ha-jamim, que, para o período bíblico, traz partes consideráveis dos livros históricos do AT em uma recensão própria. É sobre esta exposição, a qual em breve será publicada, que se baseia o chamado
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livro de [osué. Um outro livro não-canônico importante é a versão samaritana da história de Moisés, que se encontra na "Doutrina de Marqâ" (Memar Marqâ), que apareceu nos primeiros séculos do cristianismo."
2. Judaísmo helenístico
o
cânon do judaísmo helenístico, ou cânon alexandrino da versão dos LXX, teve formação semelhante ao dos samaritanos, e no fundo corresponde também à concepção dos saduceus, encarnando com certeza uma tradição judaica mais antiga. Neste cânon só a Torá possui valor canônico e assume um lugar diferente que transcende a tudo o mais. Os outros escritos não receberam nenhum valor canônico, mas eram estimados e lidos como livros de edificação. O resultado disto é que eles foram distribuídos segundo pontos de vista que diferem daqueles que se observam no cânon hebraico e que também outros escritos excluídos deste cânon puderam ser admitidos e equiparados aos demais. Observa-se aí a seguinte distribuição: a) b)
c) d)
Torá (Pentateuco); livros históricos: de [osué até Reis, incluindo-se Rute, Crônicas, Esdras, Neemias, Ester; livros poéticos e didáticos: Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, [ó: livros proféticos: Oséias, Amós, Miquéias, [oel, Abdias, Jonas e os seis livros seguintes corno no texto massorético, e depois: Isaías, Jeremias, Lamentações, Ezequiel, Daniel.
Nos grupos b-d foram inseridos outros escritos deuterocanônicos e não-canônicos, onde os manuscritos e as edições dos LXX divergem entre si.
3. Cristianismo O cristianismo mais antigo inicialmente não aceitou a nascente teoria dos fariseus a respeito do cânon e não se prendeu a nenhum cânon formalmente delimitado. É isto o que se deduz das passagens extraídas de livros não-canônicos e citadas com a mesma fórmula usada para os esc ri3
MACDoNALD,
Memar Marqah, 1963.
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OUTRAS FORMAS DO CÂNON
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tos canônicos OCo 2.9, e também Lc 11.49;Jo 7.38; Ef 5.14; Tg 4.5s; Jd 14s). A oposição face ao judaísmo e a disseminação do cristianismo no âmbito do Mediterrâneo fizeram com que fosse utilizada a versão grega do ATe se partisse menos do cânon hebraico do que da compilação alexandrina, que foi por isso abandonada pelo judaísmo e adotada pela Igreja. É evidente que, logo depois, a teoria dos fariseus a respeito do cânon também exerceu sua influência no cristianismo, de sorte que, no fim, surgiu uma mistura das duas concepções. A Igreja grega distingue teoricamente entre escritos canônicos e simples "livros de leitura", sem que isto, no entanto, tenha tido praticamente muita importância. O cânon hebraico foi ampliado, no Sínodo de Jerusalém em 1672, com a Sabedoria de Salomão, o Eclesiástico [Jesus Sirac], Tobias e [udite. A Igreja latina católica, pelo contrário, segue praticamente a versão dos LXX. Os esforços de JERÔNIMO e de outros escritores posteriores para que se reconhecesse o cânon hebraico não conseguiram impor-se. Pelo contrário: o Concílio de Trento em 1546 reconheceu a Vulgata como canônica e, concomitantemente, adotou definitivamente a compilação dos LXX. As Igrejas protestantes adotam estritamente o cânon hebraico e conferem pouco valor aos livros deuterocanônicos. LUTERO, no entanto, os considerou menos sob o ponto de vista formal do que do ponto de vista do conteúdo, tendo o Eclesiástico e a Sabedoria de Salomão sido altamente privilegiados por ele, ao passo que os livros canônicos foram envolvidos também em sua crítica. No confronto com o cânon hebraico, aceito em princípio, ele alterou a ordem de colocação dos livros, adaptando-a mais à ordem de colocação da Vulgata. A teoria judaica a respeito do cânon só foi adotada pela antiga dogmática protestante. A Igreja reformada mostra uma aversão crescente contra os livros deuterocanônicos.
CAPÍTULO
XIV
HISTÓRIA DO TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO § 78. O TEXTO MASSORÉTICO W. F. ALBRIGHT, "New Light on Early Recensions of the Hebrew Bíble", BASOR 140 (1955), 27-33. - V. ArTOWITZER, Das Schriftwort in der rabbinischen Literatur, 1906/15. - M. BAILLET - J. T. MIUK - R. DE VAUX, Les "Peiiies Grottes" de Qumran, 1962. - H. BAROTKE, "Der Traktat der Schreiber (Sopherim)", WZ Leipzig 3 (1953/54), 13-31. - D. BARTHÉLEMY - J. T. MILIK, Qumran Cave 1,1955. - H. BAUER, DerUrsprung des Alphabets, 1937. - Z. BEN-HAYYM, Studies in the Traditions of the Hebrew Language, 1954. - P. BENOIT - J. T. MIUK - R. DE VAUX, Les Grottes de Murubba'ât, 1960. - S. A. BIRNBAUM, The Qumrân tDead Sea) Scrolls and Palaeography, 1952. - L. BLAu, Studien zum althebriiischen Buchwesen, 1902. - F. F. BRUCE, The Books and the Parchments, 1950. - M. BURROWS, Thelsaiah Manuscript and the Habakkuk Commentary, 1950. - F. M. CROSS, Jr., "The Evolution of the Proto-Canaanite Alphabet", BASOR 134 (1954), 15-24. - lo., The Ancient Library of Qumrân, 1958. - lo., "A Ugaritic Abecedary and the Origins of the Proto-Canaanite Alphabet", BASOR 160 (1960), 21-26. - lo., "The Development of the [ewish Scripts", em: Essays Albright, 1961,133-202. - lo., - D. N. FREEOMAN, EarlyHebrew Orthography, 1952. - D. DIRINGER, "The Palestinian Inscriptions and the Origin of the Alphabet", JAOS 63 (1943),24-30, 176-178. - lo., The Alphabet, 3ã ed., 1952. - lo., The Story of the Aleph Beth, 1958, - lo., Writting, 1962. - H. DONNER - W. ROLUG, Kanaaniiische und aramiiische lnschriften, 1962/65. E. EHRENTREU, Untersuchungen überdie Massora, 1925. - I. J. GELB, Von der Keilschrift zum Alphabet, 1958. - M. GERTNER, "The Masorah and the Levites", VT 10 (1960),241-284. - CH. D. GINSBURG, TheMassorah compiled from Manuscripts, 1880/1905. - lo., lntroduction to theMassoretico-Critical Edition of the Hebrew Bible, 1897. - M. H. GOSHEN-GOTISTEIN, Text and Language in Bible and Qumran, 1960. - H. IBscHER, "Der Kodex", Jb, der Einbandkunst 4 (1937), 3-15. - P. KAHLE, Der masoretische Text des Alten Testaments nach der Überlieferung der babylonischen [uden, 1902. - lo.,
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HISTÓRIA DO TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO
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1. O texto tem a sua história Com o aparecimento dos livros do AT e a formação de seu cânon a história de sua origem ainda não está terminada, pois o texto, tanto na
§ 78. O
TEXTO MASSORÉTICO
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forma atual do AT como nas antigas traduções, tem também a sua história. Apesar da tradição escrita e, algumas vezes mesmo depois de iniciada a fixação definitiva, o texto consonantal ainda estava exposto a alterações, e a fixação da pronúncia, originalmente transmitida por via oral, se estendeu por vários séculos, após a formação do cânon. Por outro lado, na maior parte dos casos entre a primeira fixação escrita dos livros do AT e os mais antigos manuscritos, correu, muitas vezes, um largo espaço de tempo que - excluídos os escritos mais recentes - abrange pelo menos alguns séculos. Nesse espaço de tempo os livros foram transcritos, sempre de novo, em numerosos exemplares e seu texto foi alterado intencionalmente ou por engano, de modo mais ou menos acentuado. Daí ser indispensável um certo conhecimento da história do texto para se compreender o processo de formação do AT. Este conhecimento diz respeito sobretudo aos problemas da transmissão do texto, da origem e da cristalização de diferentes recensões desse mesmo texto; aos problemas relativos à preocupação por uma transcrição exata; à fixação de um texto consonantal universalmente válido; à colocação de sinais de vocalização para fixar a pronúncia, e, por fim, ao aparecimento do Textus receptus.
2. Conceito tradicional
o conceito tradicional afirmava que o texto hebraico atual tinha sido fixado em uma época bastante recuada e que fora transmitido desde então com fidelidade singular, através de séculos. Algumas vezes essa opinião se estendia não somente ao texto consonantal, como também aos sinais de vocalização. O judaísmo estava dividido na questão de saber se a vocalização constituía uma inovação, como o expunha SIMHA no Mahzor Vitry (séc. XII d.C.), ou se ela remontava ao Sinai, como explicavam os caraítas, p.ex., JUDA HADASSI (ca, de 1100). Mas, em sua maioria, o judaísmo segue este último ponto de vista, que se tornou também a opinião ortodoxa da Igreja. ELIAS LEVITA, 1 contudo, demonstrou, mais uma vez, em 1538, a origem tardia da vocalização, que ele atribui à Idade Média. O protestantismo primeiramente se filiou a esta opinião, para, em seguida - naturalmente sob a influência dos exegetas judeus, consultados em questões do AT, e também sob o influxo do dogma da inspiração - adotar a teoria tradicional tp.ex., RACIUS ILLYRICUS, J. BUXTOR sênior e júnior). Contra esta opinião levantaram-se sobretudo LUDWIG CAPELLUS e, do lado católico, 1
G. E.
WEIL,
Élie Lévita, 1963.
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RICHARD SIMON. No entretempo, a teoria por eles combatida não precisou mais de ser refutada. Ao contrário, ela tem sido defendida até época recente sob uma forma modificada. Pelo fim do séc. XVIII, KENNICOTT e DE ROSSI apresentaram suas compilações de variantes extraídas de numerosos manuscritos e das edições impressas do texto hebraico, para mostrar que as divergências entre o texto consonantal e o texto vocalizado são acidentais, insignificantes, não representando variantes diversas, e que os manuscritos e as edições impressas supõem um arquétipo universalmente reconhecido e válido. Eles e seus sucessores, como B. RosENMüLLER, OLSHAUSEN e DE LAGARDE situam este manuscrito-padrão, seja na primeira metade do séc. V, seja mesmo no séc. II d.C. Esta teoria, no entanto, deixa de ter valor, pelo fato de que os manuscritos sobre os quais ela se apóia surgiram, quando menos, no séc. XII, e, também, pelo fato de conterem maior número de variantes do que KENNICOTT e DE ROSSI supunham. Ao lado disso, a versão de ÁQUILA, que é a mais literal das antigas traduções, parte de um texto hebraico não conforme com o massorético e, que, portanto, não se identifica com um arquétipo. Por outro lado, o Talmude contém citações do AT que divergem do texto massorético ou foram adaptadas a ele posteriormente (APTOWITZER, STRACK). Ainda no séc. XII formas bastante divergentes do texto hebraico corriam por entre círculos rabínicos. Já não é possível sustentar a hipótese antiga. A ciência do Antigo Testamento vê-se diante de uma situação inteiramente mudada, que levou a conhecimentos fundamentalmente novos com relação à história do texto. Os documentos manuscritos de Qumran nos informam a respeito do estado do texto na época anterior ao cristianismo ou no começo do mesmo. O material procedente da genizah do Cairo antigo, conhecido e estudado desde o começo deste século, nos traz informações a respeito do texto entre os sécs. VI e IX d.C., caso não provenha de época mais recente. As pesquisas de KAHLE, feitas a partir deste material, e que identificaram numerosos outros manuscritos, lançaram as bases para uma nova apreciação da história do texto. Em face disto, deve-se, por certo, admitir que a transmissão dos livros do AT partia, outrora, de um escrito primitivo, mas que, a seguir, essa tradição se dividiu em várias recensões. É esta diversidade que está no início da longa história do texto, em cujo desenvolvimento posterior o judaísmo procurou chegar, partindo da multiplicidade, a uma unidade autorizada do texto - intento este que só foi atingido na Idade Média, depois de uma luta de vários séculos.
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3. Rolo manuscrito e escrita A transmissão dos textos se fez primariamente por escrito. Certamente eles eram também aprendidos de cor, mas com base na forma escrita. Talvez para isso não se utilizassem tabuinhas, como para os pequenos documentos, mas o rolo manuscrito que se menciona em [r 36.2; Ez 2.9s; Zc 5.2; Is 34.4, e era dividido em colunas e escrito a tinta. Este rolo era feito de papiro importado do Egito, ou era feito também de peles resistentes de animais. Mais tarde os rolos da Torá deviam ser confeccionados em couro ou pergaminho. Como o rolo de papiro só podia comportar um determinado comprimento, resultou daí o grande volume dos livros ou a reunião de vários escritos, originariamente autônomos, em um único rolo. A partir do séc. 11 d.C. confeccionavamse manuscritos de caráter privado do AT ou de seus livros, também em forma de livro (códex). Na genizah da sinagoga do antigo Cairo guardavam-se os manuscritos que não se utilizavam mais, sendo naturalmente enterrados depois, de tempos em tempos, para evitar sua profanação. É por esta razão que quase todos os manuscritos se perderam. O conteúdo da genizah do antigo Cairo, que caiu no esquecimento depois de fechada por uma parede, constitui assim uma exceção, como também o constituem os manuscritos de Qumran, que foram escondidos, evidentemente, em época de calamidade, e outras obras descobertas no deserto de [udá, deixadas para trás depois da morte violenta de seus donos. Durante muitos séculos, para a escrita se utilizava o antigo alfabeto hebraico, desenvolvido a partir dos caracteres cananeu-fenícios, depois da conquista da Palestina. A pesquisa arqueológica pode deduzir a transformação de seus caracteres, através das diversas épocas, a partir do número crescente de documentos descobertos, como sejam: o chamado calendário agrícola de Geser (geralmente situado em 1100-900 a.C.F; os óstracos da Samaria (primeira ou segunda metade do séc. VIII)3; o
2
3
AOr 44. - H. DONNER - W. ROLLIG, Kanaaniiische und aramiiische Inschriften, I, 1962, 34; 11 1964, 1815. A. JIRKU, "Das Inschriften-Material der amerikanischen Ausgrabungen in Samarien", OLZ 28 (1925), 273-281. - G. A. REIsNER - C. ST. FISHER - D. G. LYON, Harvard Excavations at Samaria, I, 1924,227-246; 11 1924, tabela 55. - Y. YADIN, "Recipient or owners. A Note on the Samaria Ostraca",IEJ9 (1959), 184-187. - ID., "A Further Note on the Samaria Ostraca", ibid. 12 (1962), 64-66.
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Papiro Murabba'ãt 17 (talvez do séc. V1I1)4; as legendas dos carimbos dos vasos de cerâmicas e dos sinetes (do séc. VIII até o séc. V1I)5; a inscrição do túnel de Siloé em jerusalém" (ca. de 700); a queixa gravada no óstraco de Mesad Haschabiahu (fim do séc. VII)/ e os óstracos que contêm os relatos enviados ao comandante de Láquis (588).8 Esta escrita foi usada até muito depois do exílio. Do mesmo modo que os samaritanos adotaram o Pentateuco sob esta forma, passando por uma evolução própria, e do mesmo modo, também, que os textos de Qumran contêm fragmentos dos livros do Pentateuco e do livro de [ó, escritos em caracteres hebraicos antigos," assim também esses caracteres aparecem sob uma forma arcaizante nas moedas da época dos Macabeus (séc. II a.c.) e da revolta de Bar Kochba (132-135 d.C.).lO Ao lado dessa escrita surgiu, depois do exílio, um outro tipo de escrita, que provém da escrita aramaica, sob a influência simultânea da antiga escrita hebraica, chamada de escrita quadrada, por causa do formato, ou de escrita assíria, por se originar no âmbito da língua siro-aramaica. O documento mais antigo até agora encontrado neste sentido é a breve inscrição de arãq el-emir, Transjordânia, e que provém, antes, da passaF. M. CROSS, [r., "Epigraphic Notes on Hebrew Documents of the Eighth-Sixth Centuries B. C, 11", BASOR 165 (1962),34-46. 5 Y. AHARONI, "Excavations at Ramat Rahel", BA 24 (1961), 98-118. - K. GALLING, Biblisches Reallexikon, 1937,337-340,481-490. - P. W. LAPP, "The Royal Seals from [udah", BASOR 158 (1960), 11-12. - J. B. PRITCHARO, Hebrew Inscriptions and Stamps from Gibeon, 1959. - lo., "More Inscribed [ar Handles from el-Jib", BASOR 160 (1960),2-6. 6 AOT 445. - H. DONNER -W. RÓLLIG, Kanaaniiische und aramiiische Inschriften, I, 1962, 34; 11 1964, 186-188. 7 J. NAVEH, "A Hebrew Letter from the Seventh Century B. C", lEI 10 (1960), 129-139. - S. YEIVIN, "The Judicial Petition from Mezad Hashavyahu", BiOr 19 (1962), 3-10.Em Tell'Arad foram descobertos outros ostracos juntamente com cartas do séc. VIII; cf. PEQ 94 (1962),99, e Y. AHARONI - R. AMIRAN, "Tel Arad", lEI 12 (1962), 144s. 8 ANET 321s. - U. CASSUTO, "Die Ostraka von Lakisch", MGWI 83 (1931/1963), 81-92. - D. DIRINGER, "Ostraca", em: Lachish, III 1953, 331-339. - H. DoNNER - W. RÓLLIG, Kanaaniiische und aramiiische Inschriften, 1,1962, 35s; II 1964, 189-199. - N. H. TORCzrNER, The Lachish Letters (Lachish 1), 1938. 9 M. BAILLET em RB 63 (1956),55. - J.-D. BARTHÉLEMY - J. T. MILIK, Qumran Cave I, 1955, 51-54. - P. W. SKEHAN, "Exodus in the Samaritan Recension from Qumran", IBL 74 (1955), 182-187. 10 L. KAOMAN, Corpus Nummorum Palaestinensium, I, 1956; 11 1957; III 1960. - L. Y. RAHMANI, "The Coins from Nahal Seelin and Nahal Hardor", lEI 11 (1961), 63s.-A. REIFENBERG, Ancient lewish Coins, 1947, 2 a ed. - W. WIRGIN - S. MANOEL, The History of
4
Coins and Symbols in Ancient Israel, 1958.
§ 78. O TEXTO MASSORÉTICO
701
gem do séc. IV para o séc. III, do que do séc. V ou mesmo do séc. VIY Não se pode estabelecer com precisão quando os livros do AT foram transladados nesta escrita. É muito improvável que isto tenha sido feito por Esdras, como lhe atribui a tradição rabínica. Como o Papiro Nash, contendo o decálogo, e Dt 6.4 apresentam esta forma de letra para o séc. II,12 e a maioria dos textos de Qumran para os sécs. II e I antes de Cristo, pode-se muito bem admitir que a passagem para a escrita quadrada se deu no início do período helenístico e deve ter terminado o mais tardar por volta de 200 d.C.
4. Preocupação por uma transmissão exata Já antes do cristianismo havia a preocupação por uma transmissão o mais exata possível do texto, como nos mostram a Carta de Aristéias, proveniente do séc. II a.c., e também muitas medidas tomadas para garantir a integridade do texto, medidas estas que se deduzem a partir dos escritos de Qumran. Mas isto ficava restrito a determinadas escolas ou correntes isoladas, de modo que existia uma série de recensões, umas ao lado das outras. Mesmo o texto massorético posterior revela em si a presença de várias recensões e é, como tal, uma das muitas recensões antigas. A existência dessas recensões se deduz a partir do Pentateuco samaritano, como igualmente do original hebraico da Peshita e da LXX, e também dos textos veterotestamentários de Qumran e de outras localidades do deserto de [udá, Precisamente os textos de Qumran são importantes para se determinar as recensões primitivas." Assim, muitos dos seus manuscritos se aproximam do samaritano, ao passo que um fragmento em que se contém parte considerável do texto de 15m 1.22-2.25 e provém do F. M. CROSS, [r., "The Development of the Jewish Scripts", em: Essays Albright, 1961, 191. - B. MAZAR, "The Tobiads", lEJ 7 (1957), 141s. 229. - CH. C. MACCOWN, "The 'Araq el-Emir and the Tobiads", BA 20 (1957), 63-76. - O. PLOGER, "Hyrkan im Ostjordanland", ZDPV 71 (1955),70-81. 12 W. F. ALBRIGHT, "A Biblical Fragment from the Maccabaean Age: The Nash Papyrus", JBL 56 (1937), 145-176; S. S. COOK, "A Pre-Massoretic Biblical Papyrus", PSBA 25, 1903,34-56. 13 Não é possível apresentar, nem mesmo resumidamente, a imensa bibliografia a respeito dos textos de Qumran e de descobertas semelhantes no deserto de [udá. Vistas de conjunto são oferecidas por CHR. BURCHARD, Bibliographie zu den Handschriften vom Toten Meer, 1957 (1959); 11 1965, e pela bibliografia continuada que aparece em RdQ.
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séc. I a.c., parece assemelhar-se mais ao original hebraico da LXX do que ao massorético, ao passo que os fragmentos do livro de Jeremias oferecem, além do massorético, também o texto mais curto do LXX. Com isto se comprova a existência de três recensões principais do texto hebraico para os sécs. 11-1 a.c. Destas recensões, a primeira constitui uma etapa preliminar do texto massorético, e a segunda o original hebraico da LXX. A terceira é semelhante à forma do texto samaritano. A isto se acrescentam ainda outras recensões vulgares, transmitidas em manuscritos e que se diferenciam das três formas principais. Apesar desta multiplicidade, que perdurou até os primeiros tempos do cristianismo, pelo menos no séc. I a.c. já estavam em curso tentativas de substituir as diversas formas do texto por um texto uniforme, como se pode ver claramente da existência do rolo incompleto de Isaías encontrado em Qumran, além do rolo completo, que diverge muito mais ainda do texto massorético. Uma visão de conjunto sobre as descobertas de textos do Antigo Testamento em língua hebraica, provenientes das Grutas de Qumran e de outras localidades do deserto de [udá e até agora dados à publicidade, nos mostram, ao mesmo tempo, a sua multiplicidade e o seu estado fragmentário de conservação (abreviaturas: 1Q = gruta 1 de Qumran etc.; Mur = wãdi Murabba'ãt [grutas de Murabbat]: Hev = Nahal Hever): MurGn-Nm 1QGn 2QGn 4QGn 4QpaleoGn 1 6QGn 8QGn 1QEx 2QEx· 2QEx b 2QEx c 4QEx 4QEx· 4QEx b 4QEx f 4QpaleoEx 1 4QpaleoExm 1QLv
fragmentos de Gn 32-35; Ex 4-6; Nm 34; 36. de Gn 1; 3; 22-24. de Gn 19; 36. vários manuscritos. de Gn 26, em páleo-hebraico. de Gn 6, em páleo-hebraico. de Gn 17-18. de Ex 16;19-21. de Ex 1; 7; 9; 11; 12; 21; 26; 30; 32. de Ex 4; 12; 18; 21-22; 27; 31; 19; 34. de Ex 5? vários manuscritos. de Ex 1 e outros.
de Ex 1-27, em páleo-hebraico. de Ex 6-37, em páleo-hebraico. fragmentos de vários rolos, em páleo-hebraico.
§ 78. O TEXTO MASSORÉTICO
2QLv 4QLv 6QLv 11QLv 2QNma 2QNmb 2QNmc 2QNmd 4QNm 4QNmb perg5/6HevNm 1QDta 1QDtb 2QDta 2QDtb 2QDtc 4QDt 4QDta j 4QDtn (?) 4QDTq 4QDt'(?) 4QpaleoDtr 4QpaleoDt 5QDt Pap6QDt 11QDt MurDt 4QJs 1QJz 4QJz 1Q5m 4Q5m 4Q5ma 4Q5mb 4QRs 5QRs pap6QRs 1QIsa 1QI sb 4QIs 4QI sa 4QIsc 4QI sh
de Lv 11 em páleo-hebraico. vários manuscritos. de Lv 8, em páleo-hebraico. fragmentos de vários rolos, em páleo-hebraico. de Nm 3-4. de Nm 33. de Nm 7? de Nm 18? vários manuscritos. texto misto, com influência samaritana. Nm 20,7s. de Dt 1; 4; 8; 9; 11; 13; 14; 16. de Dt 1; 8; 9; 11; 15; 17; 21; 24; 25; 28-33. de Dt L de Dt 17. de Dt 10. vários manuscritos.
.C.
S
de Dt 32. de Dt 32. de Dt 32. de Dt 7-34, em páleo-hebraico. de Dt 26, em páleo-hebraíco. de Dt 7-9. de Dt 26.19? fragmentos. de Dt 10-12; 14-15. vários manuscritos. de [z 6; 9. vários manuscritos. de 15m 18; 25m 20; 21; 23. vários manuscritos. de 15m 1-2; 25m 4; 24: forma do texto da LXX. de 15m 16; 19; 21; 23: forma do texto da LXX. de 1Rs L de 1Rs 3; 12; 22; 2Rs 5-10. rolo completo. rolo incompleto. 12-15 manuscritos. de Is 1-26. de Is 11 e outros. de Is 42.
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HISTÓRIA DO TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO
5QIs MurIs 2QJr 4QJr 4QJr a 4QJr b lQEz 3QEz 4QEz llQEz 4QXII 4QXIIa 4QXIIc 4QXIId 4Qxne 4Qxnr 4QXIIg MurXII 5QAm lQ51 a lQ51 b lQ51 c 2Q51 3Q51 4Q51a 4Q51b 4Q51c 4Q51d 4Q51e 4Q51f 4Q51g· h 4Q51i 4Q51k 4Q5P 4Q51m 4Q51n 4Q51° 4Q51P 4Q51q 5Q51 pap6Q51
de Is 40. de Is 1. de Jr 42-44; 46-49. vários manuscritos. de Ir 9-10, e mais a forma do texto da LXX. de Ez 4-5. de Ez 16? vários manuscritos. de Ez 4-5; 7; 10; 13, resto do rolo não desenrolável. vários manuscritos. de Os, [oel, Amós, Sofonias, Malaquias. de Oséias de Zacarias. de Jonas. de Oséias-Naum e outros. de [oel, Amos, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofronias, Ageu, Zacarias. de Am 1. de 51 86; 92; 94; 95; 96; 119. dos 51 126-128. do 5144. dos 51 103; 104. do 512. dos 515; 6; 25; 31; 33; 35; 36; 38; 71; 47; 53; 54; 56; 63; 66; 67; 69. dos 51 91-94; 98-100; 102; 103; 112-116; 118. dos 51 18; 16; 27; 28; 35; 37; 45; 49-53. dos 51 147; 104. dos 51 76-78; 81; 86; 88; 89; 104; 105; 109; 115; 116; 120; 125; 126; 129; 130. dos 51 22; 107; 109. do 51119. dos 5148; 49. dos 51 26; 27; 135. do 51104. dos 51 93; 95; 97; 98. dos 51 135; 136. dos 51 114-116. do 51143. dos 51 31; 33; 35. do 51119. do 5178.
§ 78. O
8Q5l 11Q5l a
11Q5lb 11Q5l c 5/6Hev5l 2QJá 4QJá ab 4QpaleoJác 4QPrab 2QRta 2QRtb 4QRt 4QCt 4QCtb 6QCt 3QLm 4QLm 5QLma 5QLmb 4QEcl 4QEcl a 1QDna 1QDnb 4QDn 4QDna 4QDnb 4QDnc pap6QDn 4QCr 4QEsd
TEXTO MASSORÉTICO
dos 51 17; 18. dos 51101-103; 105; 109; 146; 148; 121-132; 119; 135; 136; 118; 145; 139; 137; 138; 93; 141; 133; 144; 142; 143; 149; 140; 140; 134; e também de 25m 23,7; Eclo 51,13ss, e 7 cânticos não-canônicos. dos 512; 9; 12-14; 17; 18; 43; 59; 77; 78. dos 51 35-40; 68; 78; 8I. dos 51 15; 16. do Já 33. principalmente Já 36. de Já 13-14, em páleo-hebraico. de Pr 1-2; 14-15. de Rt 2-4. de Rt 3. vários manuscritos. vários manuscritos. de Ct I. de Lm 1; 3. um manuscrito. de Lm4-5. de Lm 4. vários manuscritos. de Ec1 5-7. de Dn 1-2. de Dn 3. vários manuscritos. de Dn 2; 7-8. de Dn 7-8 e outros. de Dn 8?; 10-12. de Esd 4-5.
Além disso, os comentários da comunidade de Qumran, designados pelo termo peser, citam os textos explicados: 3QpIs 4QpIsa 4QpIsb pap4QpIsc 4QpI sd 4QpOsa
Is 1,I. de Is lO-lI. de Is 5 e de alguns capítulos posteriores. de Is 30 e de outros capítulos. de Is 54 e outros. Os 5.14s?
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4QpOSb 1QpMq 4QpNa 1QpHab 1Qp5f 1Qp5l 4Qp5l 4Q5l
de Os 2. Mq 1;6. de Na 1-3. Hab 1-2. de 5fl-2. dos 51 57; 68. 37 45
Por fim, devemos mencionar as coleções de citações: 4Q 4Q 4Q 4Q
Eschatological Midrashim, Patriarcal Blessings, Testimonia, Tanhumim.
5. Forma básica do texto massorético
o passo decisivo no sentido de eliminar as dificuldades das inúmeras recensões do texto mediante a fixação de um texto uniforme e de se chegar, com isto, ao estabelecimento pelo menos da forma básica do texto massorético, foi dado simultaneamente com o encerramento do cânon, depois da queda de Jerusalém, no ano 70 d.C., e em decorrência da necessidade de defesa, face à polêmica nascente do cristianismo. A insatisfação dos rabinos com o estado do texto hebraico se aliava à renovada convicção a respeito do caráter inspirado e da santidade da Bíblia. Por isso, ao mesmo tempo em que se tentava, por um lado, estabelecer um texto "semi-oficial",com base no qual os rabinos pudessem enfrentar os ataques dos cristãos, também se procurava, por outro lado, fixar com a maior exatidão e a maior clareza possível, todas as particularidades do texto revelador da palavra divina. Isto se deu primeiramente na Palestina, onde as escavações dos restos das sinagogas da Galiléia atestam, de modo particular, a atividade religiosa e cultural do judaísmo, que se desenvolveu no séc. II d.C., inclusive sob a égide dos imperadores romanos. Mais tarde, naturalmente, e sobretudo depois que o cristianismo assumiu a posição de religião oficial, numerosos sábios judeus fugiram para a Babilônia e aí fundaram novos centros religiosos, como, p.ex., em Sura e Nehardea, e, depois da destruição dessa última, em 259 d.C. também em Pumbedita. Provavelmente a forma fundamental do texto consonantal massorético posterior, e não um pretenso arquétipo, já estava fixada, quanto ao
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essencial, na época do rabi AQIBA, no início do séc. II d.C., e foi desenvolvida posteriormente a partir desta base. O passo inicial neste sentido nos é indicado pelas traduções de ÁQUILA, TEODOCIÃO e SÍMACO, executadas nos II e III d.C., e que, em confronto com a multiplicidade das formas dos textos encontrados em Qumran, partem de um modelo hebraico quase igual ao massorético. Aqui, como em geral, encontra-se uma série de diferenças que naturalmente são constituídas sobretudo de variantes dialetais e ortográficas. As diversas escolas procuraram, enquanto possível, introduzir muitas das suas variantes preferidas, de modo que o texto uniforme final reflete suas lutas internas e representa uma espécie de ajuste entre os pontos de vista conflitantes.
6. A atividade dos "esctibes" O período seguinte da história do texto foi determinado pela atividade dos "escribas". Eles escreviam os novos rolos, com base nos antigos. Ao mesmo tempo em que transcreviam cada palavra e cada letra, com extremo cuidado, de um manuscrito para outro, principalmente porque era comum haver cópias em que os revisores cometiam mais de três erros de grafia, eles trabalhavam também na formação da futura versão do texto uniforme, comparando a cópia com o modelo e com outros manuscritos. Para esse trabalho, eles podiam se apoiar também na tradição oral a respeito das formas dos textos e da pronúncia das palavras. Paralelamente, preocupavam-se em compreender corretamente o texto. Começaram por fazer breves anotações na margem dos manuscritos, além de assinalar certas palavras que precisavam de explicação, e por meio de diversos sinais chamavam a atenção para as passagens do texto cujo conteúdo lhes parecia duvidoso. Os sinais a que nos referimos são: 1) os puncta extraordinaria, que aparecem em dez lugares do Pentateuco e em cinco de outros livros, provavelmente para indicar que o texto era duvidoso; 2) o paseq, cuja idade e sentido são discutidos; 3) o nun invertido, que ocorre em nove lugares e talvez servisse para indicar a transposição do texto; 4) as correções dos escribas, para corrigir sobretudo os textos chocantes do ponto de vista dogmático, como, p.ex., Gn 18.22; 5) as omissões dos escribas; 6) os sebirin, para assinalar certas palavras com forma ou significado incomuns. 7) A isto se acrescentavam ainda as abreviações não assinaladas de palavras no texto.
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7. Os massoretas Com a atividade dos massoretas, no fim do séc. Ve começo do séc. VI, se inicia um novo período da história do texto. A expressão, que serve para indicar o texto massorético como a forma fixada e garantida definitivamente, talvez derive do verbo neo-hebraico masar, "transmitir". O substantivo, com a pronúncia incerta de masorâ ou mãssorã, é empregado para significar a "transmissão" formal do texto. Aqueles que cuidavam dessa transmissão chamam-se massoretas (transmissores), conhecidos depois do séc. XI também como nakdanim (os pontuadores). Eles não constituem um grupo homogêneo, nem a Massora forma uma obra completa e única, com base em uma tradição também homogênea. Antes, é preciso distinguir dois grandes grupos de massoretas, cujas características específicas foram pesquisadas sobretudo por KAHLE: a) os massoretas do ocidente, na Palestina, cujos estudos se desenvolveram, em sua maior parte, sob a dominação árabe, nos sécs. VIII-IX, com sua sede principal em Tiberíades; b) os massoretas do oriente, na Babilônia, do séc. 111 ao IX, tendo os seus centros em Sura, Nehardea e Pumbedita. Os dois grupos se dividiam, por sua vez, em várias escolas ou "famílias". a) De acordo com as primeiras notícias e a tradição predominantemente oral, ao trabalhar no texto consonantal, o escriba começava por registrar globalmente, por escrito, as observações a respeito do texto. Daí resultaram: 1) a massara marginal (masora marginalis), constituída, de um lado, pela masora parva, constando esta de breves anotações feitas entre as linhas escritas, como era praticada na Babilônia, ou nas margens laterais, como se fazia na Palestina; e, do outro lado, pela masora magna, que constava de anotações mais amplas, feitas nas margens, ao lado, ou por baixo da escrita, como era -praticado na Babilônia, ou na margem superior e inferior, como se fazia na Palestina; 2) a massora final (masora [inalis), que reunia todo o material em ordem alfabética, no final de um determinado livro ou do AT. Embora todas as anotações só valessem sempre para a localidade de uma determinada escola, contudo, observa-se uma certa uniformidade quanto aos princípios e ao modo de executá-las. Desta forma, o texto, que a partir de então se revestia da autoridade de texto-padrão, foi protegido contra todas as intervenções e mudanças, fixando-se, então, e conservando-se, em primeira linha, as irregularidades da forma do texto. As regras referentes a essas medidas foram transmitidas em dois tratados: o Sefer Torá e os Soferim.
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b) Durante muitos séculos o texto foi conservado inteiramente sem vocalização, sendo a pronúncia indicada, em pouco casos, por meio das matres lectionis, que se acrescentaram, de modo que dificilmente se conhece a pronúncia mais antiga do hebraico. Não poucos eram os que queriam que se deixasse como estava e que se voltavam contra a pretensão de introduzir aqueles sinais de vocalização que encontramos primeiramente em manuscritos privados, sob a forma de pontos ou de traços horizontais. A vocalização começou aos poucos, e não-oficialmente, no séc. VI ou VII, para em seguida se impor. Neste processo, as escolas do oriente e do ocidente seguiram caminhos diversos. O sistema de vocalização babilônico, que KAHLE deduziu a partir dos fragmentos de genizah do Cairo antigo e de outros manuscritos, desenvolveu-se entre os sécs. VII e X. Nesse sistema, os textos conservados apresentam notáveis diferenças. A partir deles podem-se distinguir dois estágios principais: um sistema simples de vocalização, que tem muitos sinais em comum com o siríaco nestoriano, e uma vocalização mais complexa, presente a partir do séc. VIII, e que se desenvolveu sob a influência dos caraítas, seguidores fiéis da Bíblia. Mais tarde surgiram também formas mistas, sob o influxo do ocidente. A vocalização palestinense começou de igual modo por um sistema simples, que SIMHA chama, no Mahzor Vitry, de "pontuação do país de Israel". É, ao mesmo tempo, parecida com a vocalização do Pentateuco samaritano e com a forma babilônica simples, de sorte que, ou a forma palestinense e a forma samaritana provêm de uma forma babilônica simples, ou todas elas têm uma origem comum. Posteriormente o sistema palestinense simples se desenvolveu no sentido do sistema subseqüente de Tiberíades, devendo ser considerado, por conseguinte, como o precursor deste último. O sistema de Tiberíades surgiu também sob a influência dos caraítas, em fins do séc. VIII, chegando ao pleno desenvolvimento já por volta de 900, e sob as duas famosas famílias de massoretas, os BEN ASCHER e os BEN NAPHTALI, se impôs tão plenamente em relação a todos os outros sistemas, que estes só nos últimos decênios é que foram redescobertos. Apenas o sistema de Tiberíades vem sendo usado, desde então, para a vocalização de textos hebraicos. Segundo a opinião geral, foi na época acima indicada que surgiu a parte principal das leituras qere e ketib, que não constituem emendas aos textos, mas antes versões alternativas, provenientes de tradições mais antigas ou diferenças de pontuação nas recensões dos BEN ASCHER e BEN NAPHTALI, resultando, portanto, da evolução posterior do sistema de vocalização de Tiberíades.
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8. Desenvolvimento até o "textus receptus" A história do texto não termina com a criação do sistema de vocalização de Tiberíades. Até se chegar ao Textus receptus (M), percorreu-se um longo caminho, no qual foram eliminados primeiramente os demais sistemas, travando-se, em seguida, a luta interna entre as duas escolas ou "famílias" de Tiberíades. A atuação da família dos BEN ASCHER pode ser acompanhada através de cinco gerações. Os mais importantes de seus membros foram MOISÉS BEN ASCHER, ao qual se deve o códex completo dos Profetas, pertencente à sinagoga dos caraítas do Cairo, e seu filho ARON BEN ASCHER, que ornou um códex do AT com a vocalização e a massora, códex do qual cerca de três quartos puderam ser salvos da sinagoga de Alepo e levados para Israel." O fato de estes dois manuscritos não concordarem em todos os pontos com o texto oficial posterior mostra-nos claramente que a evolução ainda não estava encerrada, embora se tenha decidido no séc. XII em favor desta forma textual, graças à autoridade de MAIMÔNIDES. Não tendo a seu alcance o códex de Alepo, a terceira edição da Bíblia Hebraica (BH) utilizou-se de uma cópia que se encontra no Códex B 19a de Leningrado (008), e vai muito além do Textus receptus até então universalmente utilizado. O sistema de vocalização da família dos BEN NAPHTALI, e quiçá também o texto consonantal," contém ligeiras variantes com relação aos dos BEN ASCHER. A forma desse texto é a que se encontra na base do Códex reuchliniano de Karlsruhe (105). Logo depois da decisão de MAIMÔNIDES, MISHAEL BEN USSIEL organizou uma lista das diferenças de vocalização." A julgar por ela, o texto dos BEN NAPHTALI vai além, no estabelecer as regras sobre as particularidades, e também na colocação dos metegs.
L BEN-Zvr, "The Codex of Ben Asher", Textus, 1 (1960),1-16. - M. GOSHEN-GOTTSTEIN, "The Authenticity of the Aleppo Codex", ibid. 17-58. - D. S. LOW1NGER, "The Aleppo Codex and the Ben Asher Tradition", ibid. 59-111. - Uma apreciação diferente é proposta por A. DOTAN, "Was the Aleppo Codex actually Vocalized by Aharon ben Ahser?", Tarbiz 34 (1964/1965), 136-155. 15 Assim SH. H. BLANK, "A Hebrew Bible Manuscript in the Hebrew Union College Library", HUCA 8/91931/1932),229-255. 16 L. LIPSCHÜTZ, Ben-Ascher-Ben-Naphtali, derBibeItext dertiberiensischen Masoreten, 1937. - lo., "Mishael ben Uzziel's Treatise on the Differences between Ben Asher and Ben Naphtalí", Textus, 2 (1962), hebraico: l-58.
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Na verdade, porém, as duas formas textuais se interpenetraram, resultando, afinal, no séc. XIV, um texto misto uniforme, chamado Textus receptus. É esse texto que está na base das impressões da Bíblia, até o aparecimento da segunda edição da BH, não se incluindo a tentativa infeliz de BAER-DELITZSCH, o qual, utilizando-se arbitrariamente de insuficientes conhecimentos massoréticos, pretendeu chegar a um texto supostamente fidedigno. As primeiras edições impressas de partes do AT começaram no ano de 1477 (Saltério de Bolonha); as primeiras edições impressas completas apareceram em 1488, em Soncino; em 1491-1493, em Nápoles; em 1494, em Bréscia (utilizada por LUTERO). A primeira Bíblia rabínica contendo o texto massorético, acompanhada de targum e comentários marginais, foi editada em 1516-1517por FELIX PRATENSIS, na tipografia de DANIEL BOMBERG, em Veneza. I? A segunda, revista e impressa sob cuidados de JACOB BEN CHAJJIM, apareceu em 1524-1525, também em Veneza. Por muito tempo ela apresentou o texto-padrão para as demais edições. As edições poliglotas dos sécs. XVI-XVII, de que voltaremos ainda a falar, também apresentavam o Textus receptus.
9. Divisão do texto Desde muito cedo, começou o costume de dividir o texto dos livros do AT. Já os textos de Qumran apresentam uma divisão por seções, divisão a qual, no entanto, não concorda com o sistema posterior. Por volta de 200 d.e. a mishná pressupõe a Torá já dividida nas perícopes significativas das parashas. As parashas se distinguem em abertas (petílha), isto é, as maiores, e fechadas (setílma), ou menores. Originariamente, indicavam-se as primeiras, omitindo-se o resto da que principiava, ou mesmo uma linha inteira, e as segundas, deixando-se um pequeno espaço no interior da linha. Posteriormente, este foi o único processo usado para os dois tipos de divisão, colocando-se respectivamente um peh ou um samex antes de uma nova perícope. Ao lado disso, havia também um novo sistema de divisão para fins litúrgicos. Na Palestina, lia-se a Torá em um turno de três anos, e para isto ela era dividida em 154 sedarim; na Babilônia dividia-se em 53 ou 54 parashas, para o turno de um ano.
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P. KAHLE, "Felix Pratensis - à Prato, Felix, Der Herausgeber der Ersten Rabbinerbibel, Venedig 1516/17", WdO 1 (1947/1952),32-36.
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A divisão em capítulos foi introduzida por ESTÊVÃO LANGTON de Cantu ária, por volta de 1205, para a Vulgata. O rabi SALOMÃO BEN ISMAEL aplicou-a em um manuscrito hebraico. A divisão em versículos, porém, já era conhecida do Talmude, e talvez já remontasse aos "escribas". Mas esta divisão era muito diferente na Palestina e na Babilônia. A numeração dos versículos só teve início em 1563, em uma edição do Saltério, e em 1571, para todo o AT.
§ 79. FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS M. BAILLET, "Un nouveau fragment du Pentateuque samaritain",
RB 67 (1960),49-57. - A. VON GALL, Derhebriiische Pentateuch der Samaritaner, 1914/18. - J.HEMPEL, "Innermasoretische Bestâtingungen des Samaritanus", ZA W 52 (1934), 254-274. - P. I
§ 79.
FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS
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§ 79. FORMAS
TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS
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1. Visão geral É necessário distinguir as seguintes formas textuais: a) b)
a recensão samaritana do Pentateuco; as traduções semíticas do AT:
715
716
HISTÓRIA DO TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO 1. os targuns,
2. A Peshita; c)
d)
e)
a Septuaginta (LXX) e suas traduções derivadas: 1. a Septuaginta, 2. a Vetus Latina, 3. as traduções cópticas, 4. a tradução etiópica, 5. outras traduções; as traduções independentes da LXX: 1. ÁQUILA, 2. TEODOCIÃO, 3. SÍMACO, 4. Referências a outras traduções; a Vulgata.
2. O Pentateuco samaritano
o
Pentateuco samaritano não é uma versão, mas uma recensão do AT hebraico, correspondendo, na língua e na escrita, ao estado do Pentateuco hebraico da época em que os samaritanos se separaram de Jerusalém, e que, à parte modificações de menor importância, ditadas por razões dogmáticas, foi conservado, quanto ao essencial, no referido estado. Por isso mesmo, o Pentateuco samaritano constitui o testemunho de uma forma, textual anterior ao texto massorético e provém do séc. IV a.c. Mas nos sinais de leitura indicativos da pronúncia ele apresenta alguns traços que são próprios da época dos massoretas de Tiberíades. Não se sabe ao certo se esses traços derivam de um ajustamento posterior ao texto massorético (KAHLE), ou se refletem o dialeto do norte de Israel, de época posterior ao cativeiro (SPERBER).I8 Naturalmente a maior parte das quase 6000 diferenças com relação ao texto massorético são antes de natureza ortográfica. Cerca de 1600 destas divergências concordam com a LXX, comparativamente ao texto massorético e indicam que se trata de uma recensão ou de recensões que se distinguem da recensão que evoluiu no sentido do texto rnassorético. Uma tradução grega é o Samareitikon citado por ORÍGENES na HéxapIa e cujo autor partiu do texto samaritano, tendo-se utilizado igual-
18
P. KAHLE, "Untersuchungen zur Geschichte des Pentateuchtextes", ThStKr 88 (1915), 402. - lo., The Cairo Geniza, 1959, 2il ed., 49s. - A. SPERBER, "Hebrew based upon Greek and Latin Transliteration", HUCA 12/13, (1937/1938), 151ss.
§ 79. FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS
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mente da LXX.19 Existe também a tradução do respectivo targum no dialeto aramaico dos samaritanos/o cujos manuscritos divergem consideravelmente entre si, e também traduções árabes dos sécs. XI a XIIF1
3. Os targuns Os targuns se tornaram necessários quando, no pós-cativeiro, o hebraico cedeu lugar ao aramaico como língua corrente, sobrevivendo apenas como língua litúrgica. Por isso, o texto hebraico era traduzido para o aramaico, no momento da leitura, durante o ofício religioso. No início esta tradução (targum) era feita oralmente, sem a ajuda do texto escrito, por um tradutor (nriurg'man) nomeado especialmente para este fim. Mas já na época anterior ao cristianismo havia transposições escritas desse gênero para o aramaico. As citações do 5122.2 em Me 15.34; Mt 27.46 e do 5168.19 em Ef 4.8 nos conduzem à existência de antigos targuns. Além disso, em 4Q vieram à luz restos de um targum sobre Lv e em llQ um targum de Jó, cujo texto remonta provavelmente à segunda metade do séc. II a.c., sendo talvez idêntico ao targum condenado por GAMALIEL. 22 Os targuns em geral não oferecem uma versão padronizada, nem constituem obra de um único tradutor ou de um período delimitado. Também não se trata de traduções exatas ou de versões do texto hebraico, mas de traduções livres e paráfrases, freqüentemente entremeadas de narrativas e de explicações, apresentando, conseqüentemente, um caráter midráshico. Por esta razão, eles não podem ser citados, senão com prudência para questões relativas à crítica textuaL a) Targuns a respeito do Pentateuco: 1) Targum palestinense, deduzido a partir dos fragmentos encontrados na genizah do Cairo antigo, como também de outros testemunhos (Biblioteca Vaticana: MsNeofiti 1), e que, sob muitos aspectos, assemelha-se à Peshita, sendo usado ainda no séc. IX; 19 P. GLAUE - A. RAHLFS, Fragmente eíner gríechíschen Übersetzung des samarítaníschen 20
Peniaieuchs, 1911. L. GOLOBERG, Das samarítanísche Pentateuchtargum, Diss., Bonn, 1935. - P. KAHLE,
Textkrítísche und lexíkalísche Bemerkungen zum samarataníschen Pentateuchtargum, Diss., Halle, 1898. 21 A. E. COWLEY, The Samarítan Líturgy, I-lI, 1909.- P. KAHLE, Die arabíschen Bíbelübersetzungen, 1904, X-XIII. - Io., The Caíro Geníza, 1959, 2il 00.,53-55. - E. ROBERTSON, "The Relationship of the Arabic Translation of the Samaritan Pentateuch to that of Saadya", em: Saadya Studies, 1943, 166-176. 22 Cf. as indicações em G. FOHRER, "4Q OrNab, llQ Tglob und die Joblegende", ZAW 75 (1963), 93-97.
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HISTÓRIA 00 TEXTO 00 ANTIGO TESTAMENTO
2) Targum de Jerusalém I, proveniente do séc. VII, contendo quase todo o Pentateuco e considerado erroneamente como Targum de [ônatas, por causa da abreviatura aramaica de seu nome, sendo, por isso, chamado geralmente Targum do Pseudo-Iônatas: 3) Targum de Jerusalém 11 (-I1I), também chamado "Targum dos fragmentos", por causa do seu estado de conservação, tido em geral como mais antigo do que o Targum I; 4) Targum de Onkelos, uma adaptação aramaica oficial do texto massorético consonantal definitivo, e que talvez represente a revisão de um targum mais antigo feita com esta finalidade, tendo surgido na Palestina, mas revisto na Babilônia. Uma nova edição desse targum foi apresentada por SPERBER. A identidade de seu autor com o tradutor ÁQUILA permanece uma questão aberta. b) Targuns a respeito dos profetas: 1) Fragmentos como aqueles acrescentados, p.ex., ao Códex reuchliniano, como explicações, nos revelam a existência de várias adaptações aramaicas antigas não-oficiais; 2) Targum de [ônatas, versão semelhante à de Onkelos, reeditado por SPERBER. Às vezes se tem identificado o seu suposto autor com o tradutor TEOOOCIÃO, embora o Talmude veja nele um discípulo de HILLEL, do séc. I d.e. e) Targuns a respeito dos "Escritos" [Hagiógrafos]: provêm de épocas diferentes; são de origem diversa e se diferenciam notavelmente uns dos outros. Esses targuns vão desde o apego literal ao texto hebraico até a midrashes ampliados. Todos eles misturam material novo com material antigo.
4. A Peshita A Peshita (Peshitta), que significa a "simples" (tradução), dita assim para se diferenciar da Héxapla, é a versão siríaca do AT. Muitas questões a respeito da história e de seu valor devem necessariamente permanecer sem resposta, principalmente quando apenas está em preparo uma edição crítica global. De qualquer modo, ela é o trabalho de muitas mãos e provém de muitas épocas, tendo surgido, manifestamente, de versões targúmicas adaptadas à língua siríaca e, mais tarde, também às necessidades dos cristãos da Síria. Parece que o Pentateuco foi o primeiro a ser traduzido; mas, da mesma forma que existem nesta versão aramaica ocidental traços lingüísticas do targum aramaico ocidental palestinense, assim também existem ligações entre esta versão e os rolos de Qumran. Por enquanto ainda não é possível saber em que consistem estas relações.
§ 79.
FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS
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Tem-se admitido que o Pentateuco foi traduzido para o siríaco e, ao mesmo tempo, revisto em meados do séc. I d.C. para a família real judaica de Adiabene, a oriente do Tigre, a partir de um targum palestino (KAHLE), se é que antes não existiu um targum siríaco, depois reconduzido ao sentido literal. Outros autores, por outro lado, supõem uma origem cristã para a tradução do Pentateuco, que teria sido feita depois do ano 150 d.C., para atender às necessidades da Igreja (PFEIFFER e outros). Questões semelhantes se colocam a respeito da tradução dos demais livros do AT. As opiniões referentes à origem judaica ou cristã têm divergido, de modo que ainda não se chegou a uma solução precisa. A origem de cada livro talvez seja diversa, principalmente porque, ao que parece, eles foram traduzidos cada um separadamente. Variam tanto no estilo, quanto na dependência dos targuns e da LXX. [ó e o Cântico dos Cânticos são traduções literais; Isaías, os Profetas Menores e os Salmos são traduções livres; Ezequiel e Provérbios são mais targuns do que tradução, e as Crônicas, acrescentadas só posteriormente, são uma paráfrase. Mesmo admitindo-se que a Peshita seja de origem judaica, no todo ou em parte, de qualquer modo ela foi adotada pela Igreja e revista, sobretudo, com base na LXX. Após a cisão da Igreja síria, no séc. V, foram surgindo aos poucos quatro recensões básicas da Peshita cristã, a saber: 1) a forma sirooriental dos nestorianos (edição de Úrmia e Mossul): 2.) a forma siro-ocidental dos jacobitas (Codex Ambrosianus e edição de LEE); 3) a versão dos melquitas, e 4) a versão dos maronitas, que representam a forma siroocidental. Nos sécs. V-VII surgiram outras traduções siríacas, como sejam: uma tradução siro-palestinense ou jerosolimitana dos melquitas siropalestinenses, a cujos poucos fragmentos que restam se acrescentaram recentemente outros, provenientes de hirbert el-mird; a tradução de POLICARPO, executada ( em torno de 500), por ordem de FILÓXENO, bispo de Mabbug; a siro-hexaplar, uma tradução da quinta coluna da Héxapla de Orígenes, executada por PAULO, bispo de Tela (616/617). Todas essas traduções são misturas do texto da Peshita com o texto da LXX.
5. A Septuaginta De acordo com o que diz a Carta de Aristéias, da segunda metade do séc. 11 a.c., a Septuaginta (LXX) teria surgido do seguinte modo: por desejo
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HISTÓRIA DO TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO
de seu bibliotecário, Ptolomeu 11 Filadelfo (285-246) mandou traduzir a Torá para o grego, por meio de uma comissão de 72 sábios mandados pelo sumo sacerdote de Jerusalém. Estes sábios prepararam, em 72 dias, um texto que foi aprovado por todos." Por arredondamento do número, esta versão passou a chamar-se"A (tradução) dos Septuaginta" [Setenta], ou simplesmente a "Septuaginta". Na verdade, porém, a Carta de Aristéias é o trecho de uma apologética judaica da época tardia dos Ptolomeus e se destinava a elevar o conceito da LXX. Esta foi executada certamente por judeus que falavam, não o aramaico, mas o grego. O exato, na verdade, é que a primeira tradução a aparecer foi a da Torá, em Alexandria, em meados dos séc. 111 a.c., graças ao trabalho de vários tradutores, e que as traduções dos outros livros do AT se sucederam em um espaço bastante dilatado. O que deu ocasião, porém, a estas traduções foi o desejo do judaísmo de fala grega de poder ler e entender diretamente o AT, em grego, em vez de se limitar à incômoda situação da simples transcrição em grego, isto é, da reprodução do texto hebraico em letras gregas. Quanto ao mais, as opiniões divergem, naturalmente, entre si no que diz respeito à origem e à história da LXX. Devemos lembrar pelo menos quatro dessas teorias. A teoria inicialmente apresentada por DE LAGARDE e RAHLFS, que continua a ser defendida com freqüência (MARGOLIS, MONTGOMERY, ORLINSKY, ZIEGLER, ROBERTS), pressupõe uma LXX original, e para cada livro ou grupos de livros do AT imagina uma tradução original grega, como também a deterioração progressiva do texto e a sua eliminação ao longo das revisões. Em vez disto, KAHLE defende a teoria de que no início não havia um texto original, mas várias adaptações targúmicas do texto hebraico vulgarizado, e que a Carta de Aristéias fazia propaganda de uma tradução revista da Torá, introduzida pela mesma época e que suplantou, como texto-padrão, as traduções até então existentes, não havendo para os outros livros nenhum texto-padrão, mas traduções cada vez mais numerosas, representadas pelas diferentes recensões da LXX. De acordo com a terceira teoria, defendida por THACKERAY, a tradução da LXX foi executada em duas etapas, à exceção da Torá: primeiramente traduziram-se aquelas passagens necessárias à leitura no serviço religioso da sinagoga, e depois, aos poucos, as partes restantes. Por fim, WUTZ sustentou a teoria geralmente não aceita - de que a LXX foi traduzida a partir de transcrições para o grego. 23
A lenda posteriormente se ampliou, chegando a afirmar que eles teriam traduzido todo o AT, e cada um trabalhando independentemente uns dos outros.
§ 79.
FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS
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Podem-se aduzir argumentos de valor em favor ou contra as duas teorias mais importantes, a saber: a de LAGARDE - hipótese de uma LXX original - e a de KAHLE - segundo a qual se trataria de um targum grego. Mas uma solução definitiva, no estágio atual da questão, torna-se impossível. Para isto seria preciso primeiramente reunir e pesquisar meticulosamente a multidão imensa das variantes textuais. Somente a partir daí é que se poderia reconstituir provisoriamente a história da LXX. Os únicos pontos que se podem afirmar com certeza são os seguintes: que a tradução do Pentateuco - seja em sua forma original seja em forma targúmica existia em meados do séc. III a.c., a tradução dos "Profetas" da coleção hebraica, por volta de 200 a.c., e a tradução da maior parte dos demais livros, no séc. I a.c. Qualquer que seja o caso, a LXX é, em seu conjunto, uma coleção de traduções dos livros do AT, surgidas na diáspora egípcia e refletindo o espírito do judaísmo helenístico. Quando, no séc. I d.C., a Igreja primitiva adotou a LXX, esta logo perdeu a estima no seio do judaísmo. A aversão por ela se fortaleceu com o reconhecimento da autoridade do AT hebraico e com a constatação de numerosas e notáveis diferenças entre as duas formas textuais. No final, o judaísmo acabou por rejeitar a LXX, e o tratado Soferim I, 8 declara que o dia em que a Torá foi traduzida é tão infeliz quanto aquele em que foi fabricado o bezerro de ouro. As numerosas variantes existentes no interior das formas textuais da LXX- sejam elas interpretadas como deterioração de um texto primitivo, seja como targuns existindo uns ao lado dos outros - causou embaraço cada vez mais crescente à Igreja cristã. ORÍGENES procurou remediar este mal, com a sua Héxapla, executada em 240-245, em Cesaréia. Nesta obra, embora reconhecendo a LXX como forma textual da Igreja, ele parte da circunstância de que o de terminante para o texto do AT não é a LXX, mas a forma hebraica padronizada (§ 78,S). ORÍGENES colocou lado a lado, em seis colunas: 1) o texto hebraico, transcrito em caracteres hebraicos quadrados; 2) o texto hebraico transcrito em letras gregas; 3) a tradução de ÁQUILA; 4) a tradução de SÍMACO; 5) a LXX; 6) a tradução de TEODOCIÃO. Algumas vezes também se utilizou de outras três versões gregas anônimas, conhecidas como a Quinta, a Sexta e a Sétima. Das colunas, a mais importante era a quinta, evidentemente porque a finalidade da obra era explicar as relações que existiam entre a LXXe o texto hebraico. Isto ele o fez, mediante os sinais diacritos do óbelo (-:-), que indicava aquilo que a LXX tinha a mais do que o texto hebraico, ou do asterisco (*), que indicava o que ela tinha de menos. O final dos dois tipos de passagens era assinalado por um metóbelos (x). Contudo, os
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HISTÓRIA DO TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO
chamados Fragmentos de Mercati, que são os restos de uma transcrição das colunas 2-6 da Héxapla, existentes em um palimpsesto contendo 110 versículos dos Salmos, não trazem estes sinais, de modo que continua em aberto a questão de saber se a Héxapla constituía somente a base para uma edição crítica da LXX. - Uma segunda obra de ORÍGENES é a Tétrapla, que não contém as duas primeiras colunas da Héxapla. Apesar das opiniões em contrário, tantas vezes expressas, ela constitui muitíssimo provavelmente uma edição abreviada da Héxapla. A nova recensão de ORÍGENES não eliminou as outras formas textuais; pelo contrário: somente a quinta coluna, transmitida isoladamente, é que figurava ao lado das demais recensões, aumentando assim a sua variedade. Por intermédio de EUSÉBIO de Cesaréia e de PÂNFILO ela encontrou aceitação pelo menos na Palestina. Duas outras formas textuais importantes foram: 1) a recensão de HESÍQUIO, atribuída por EUSÉBIO ao bispo do mesmo nome e surgida no Egito, durante o séc. lII; 2) a recensão de LUCIANO (no dizer de JERÔNIMO, o mártir falecido em 312), divulgada na Síria e na Ásia Menor e considerada de modos diversos: ora como revisão não-hexaplar da LXX, ora como uma revisão que teria utilizado a recensão hexpIar, ou, ainda, como uma tradução nova do texto hebraico. Durante muito tempo, só se encontravam testemunhos textuais da LXX nas citações de FILO em JOSEFO, no NT e nos Pais apostólicos, nos escritores judeus helenísticos, tais como ARISTÉIAS e EUPÔLEMOS,24 - todos situados na era cristã - e, por fim, nas orações judias de maldição da ilha de Renéia, próxima a Delas, por volta de 100 a.C.", No meio tempo, encontram-se não poucos fragmentos da própria tradução da LXX26: provavelmente de meados do séc. II a.c. é um fragmento do Papiro Fuad 266, com Dt 31.36-32.7, e bem assim o Papiro Greek 458 da
24
25
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§ 79. FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTICAS
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[ohn Rylands Library de Manchester, contendo partes de Dt 23-28; do séc. I a.e. são os fragmentos de vários manuscritos de Qumran: 4Q LXX Lv", Lv" e Nm, bem como 7Q LXX Ex. Os fragmentos de um rolo do Dodekapropheton do Nahal Hever no deserto de [udá talvez provenham do final desse mesmo século. Do, séc. 11 d.e. é o Papiro n. 7 de Antinoópolis, contendo partes dos 5182-83, e também um fragmento de papiro da Bodleiana, contendo partes dos 51 49-50. Do séc. III d.e. provêm os Papiros ns. 8 e 9 de Antinoópolis, contendo principalmente partes de Provérbios, e também fragmentos de um manuscrito do Gênesis (Gênesis berlinense, contendo Gn 1.16-35,8) e de um manuscrito do Dodekapropheton (Freer Greek Ms em Washington, contendo Am 1.10 - Mal), e ainda um Papiro de Bodmer contendo os 51 33-34. Do séc. IV é o Papiro n. 10 de Antinoópolis, contendo partes de Ezequiel; dos sécs. lI-IV, os restos de 11 códices, publicados sob o nome de "Chester Beaty Papyri" e "John H. 5heide Papyri", contendo partes de Gênesis, Números, Deuteronômio, Isaías, Jeremias, Ezequiel, Ester, Daniel, Eclesiástico e Henoc. Restos da quinta coluna da Héxapla encontram-se, diretamente, sobretudo em manuscritos gregos do AT, nos comentários da Igreja antiga, no palimpsesto da Biblioteca Ambrosiana de Milão, descoberto por Mercati, e indiretamente na tradução siríaca de PAULO, bispo de Tela, no Códex Ambrosiano. Da época posterior a 300 encontram-se manuscritos completos ou quase completos da LXX, como sejam: o Códex Vaticanus,27 e o Códex Sinaiticus." do séc. IV; o Códex Alexanârinue" e o Códex Ephraemi Syri receptus/" do séc. V. Das edições recentes, devemos lembrar aquelas de SWETE (3 vols., 1887-1894, J4 1904, I1-I1P 1905,1907), de BROOKE-McLEANTHACKERAy-MANSON (4 vols., a partir de 1906), da Gõttinger Akademie der Wissenschaften (16 vols., a partir de 1931) e de VON RAHLFS (1 vol., 6i1 ed., 1959).
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HISTÓRIA 00 TEXTO 00 ANTIGO TESTAMENTO
o valor dos textos da LXX sob o ponto de vista da crítica é muito variável. Abstraindo-se das características históricas internas e dos erros textuais, que são comuns a todos os livros, a tradução que provém, não resta dúvida, de muitas mãos e de épocas diferentes, não apresenta igual valor em todas as suas partes, mas vai baixando à proporção que se afasta do Pentateuco. 6. As traduções dependentes da LXX Entre as traduções dependentes da LXX, figuram principalmente a Vetus Latina, uma versão latina antiga. Desde os sécs. II e III usavam-se na África, no sul da Gália e na Itália, versões latinas de livros do AT. AGOSTINHO certamente usou a última destas traduções, que ele chama de "Ítala". Naturalmente não se pode saber se se trata de três diferentes traduções ou coleções de traduções, isto é, versões, ou se se trata, pelo contrário, de diferentes recensões de uma mesma tradução ou coleção de traduções. Completo mesmo só se conservou o texto de alguns livros deuterocanônicos, incorporados à Vulgata, do "Psalterium Romanum" (talvez revisto por JERÔNIMO) e de algumas outras traduções do Saltério. Em outras fontes, além dos textos mistos, encontram-se também numerosas citações e outros restos, que a Abadia de Beuron vem publicando. Sua importância reside em que, muitas vezes, supõem um texto anterior ainda à Héxapla. Dependem da LXX, através da recensão de HESÍQUIO, as traduções feitas no idioma cóptico, isto é a língua dos cristãos egípcios, uma variação da língua egípcia que se formou em vários dialetos no séc. Ill. A LXX foi traduzida nesses dialetos, no séc. IV, e em parte talvez já no séc. Ill. Surgiram, assim, as seguintes versões: 1) a saídica, na região de Tebas, no Egito Superior; 2) a boáirica, no Egito Inferior. (Alexandria, delta do Nilo); 3) a acmímica, na região em torno de Panópolis, no Egito Superior; 4) a faiúmica, no Médio Egito, e 5) a tradução menfítica, próxima à anterior. A tradução etiópica foi iniciada no séc. IV - talvez por obra de missionários sírios - sendo executada a pouco e pouco. Parece que tem por base a recensão de LUCIANO. Não se podem resolver certas questões isoladas referentes a esta tradução, porque os manuscritos, dos quais o mais antigo só provém do séc. XIII, mostram indícios de alguma revisão posterior, e, além disso, falta também uma edição crítica.
§ 79.
FORMAS TEXTUAIS NÃO-MASSORÉTlCAS
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No séc. V foi iniciada uma tradução armênica. A julgar pelos fragmentos que se conservaram, ela se apoiava no texto da Héxapla. Mais recente, pelo menos em parte, é a tradução geórgica. No séc. IX surgiu uma versão eslávica, que se inspira na recensão de LUCIANO, e foi também a que serviu de base para a tradução gótica do bispo ÚLFILA, por volta de 350. Existem também traduções árabes.
7. As traduções gregas independentes As traduções gregas independentes surgiram quando o judaísmo rejeitou a LXX e se teve necessidade de substituí-la por novas versões feitas a partir do texto hebraico consonantal, uniformemente fixado. Trata-se, em primeiro lugar, das obras de ÁQUILA, TEODOCIÃO e SÍMACO. A tradução de ÁQUILA, feita por volta de 130 d.C., preocupa-se com a máxima exatidão, em correspondência com o espírito do judaísmo ortodoxo e com a sua teoria da inspiração, tentando reproduzir cada particularidade do texto hebraico. Dos fragmentos que se conservaram desta versão, os mais importantes são os que se encontraram na genizah do Cairo antigo. É também do séc. II que provém a obra de TEODOCIÃO, que se preocupa muito em tornar compreensível o texto grego, e provavelmente representa uma correção da LXX, feita a partir do sentido literal do texto hebraico, tendo encontrado muita aceitação em círculos cristãos. No início do séc. III, SÍMACü fez uma tradução própria, onde procura harmonizar as duas tendências: reprodução literal do texto hebraico e bom grego, tendo sido depois usada por LUCIANO e por JERÔNIMO. Existem ainda outras traduções do mesmo gênero, das quais restam fragmentos ou notícias. ORÍGENES se utilizou, p.ex., da chamada Quinta, Sexta e Sétima.
8. A Vulgata A Vulgata é a obra que JERÔNIMO executou depois que, a partir de 382, revisou a Vetus Latina, trabalho do qual só se conservaram o chamado."Psalterium Gallicanum" e o livro de Jó. Em 386, ele se transfere para Belém e entre 390 e 405 traduz o AT hebraico para o latim, servindo-se, para isto, não somente da Vetus Latina, como também de traduções gregas, além de consultar os rabinos judeus. Inicialmente a
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nova tradução foi rejeitada, mas acabou por se impor na Igreja latina, a partir do séc. VII (com exceção do Saltério, que foi substituído pelo Psalterium Gallicanum), a ponto de ser chamada, posteriormente, de "Vulgata", isto é, a versão largamente espalhada, divulgada. O Concílio de Trento declarou-a de autoridade incontestável para a Igreja Católica. As edições distintas de 1590 (Sixtina) e de 1592 (Clementina) contêm, no entanto, erros de diversos gêneros, e as de 1593 e 1598 apresentam erros que se justificam. A edição da "Comissão Pontifícia para a Revisão da Vulgata", já totalmente publicada, oferece um texto revisto, estabelecido a partir ele amplo material examinado. Pio XII introduziu nova tradução dos Salmos e dos cânticos utilizados igualmente no Ofício Divino, feita com base no texto primitivo e levando-se em conta também as antigas traduções.
9. Poliglotas Nas edições poliglotas aparecidas nos sécs. XVI-XVII, uma parte das formas textuais não-massoréticas é reproduzida com o textus receptus do texto massorético. A circunstância de esses textos constituírem as melhores edições, para não dizer as únicas: aparecidas até o presente, vem nos mostrar a necessidade de reedições críticas. Lembremos as seguintes edições poliglotas: A Poliglota Complutense, impressa em A1calá, em 15141517. Contém o texto massorético, o Targum de Onkelos, a LXX e a Vulgata. b) A Poliglota Antuerpiense, impressa em 1569-1572. Contém, além do texto da anterior, também um targum para quase todos os livros. c) A Poliglota Parisiense, impressa em 1629-1645. Contém, além da precedente, também o Pentateuco samaritano com targum, a Peshita e uma tradução árabe. d) A Poliglota Londrina, impressa em 1653-1657, acrescenta ainda fragmentos da Vetus Latina, os Targuns de Jerusalém I e 11, traduções etiópicas e pérsicas de partes do AT, além de coleções de variantes. Foi concluída em 1669, com a publicação do Lexicon heptaglottum. e) Desde 1957 vêm sendo publicadas as primeiras partes de uma nova Poliglota Madrilense.
a)
§ 80. CORRUPÇÃO
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§ 80. CORRUPÇÃO DO TEXTO E CRÍTICA TEXTUAL O. R. Ap-THOMAS, A Primer of Old Testament Text Criticism, 2il ed., 1965. - J. BEGRICH, "Zur Frage der alttestamentlichen Textkritik", aLZ (1939),473-483. J. COPPENS, La critique du texte hébreu del'Ancien Testament, 2iled., 1950. -M.J. OAHOOO, "The Value ofUgariticfor Textual Criticism", Bibl40 (1959), 160-170.- lo., "Ugaritic Studies and the Bible", Gregorianum 43 (1962), 55-79. - FRIEOR. OELlTZSCH, Die Lese- und Schreibfehler im Alten Testament, 1920. - G. R. DRIVER, "Glosses in the Hebrew Text of the Old Testament", arBiblLov 1, 1957, 123-161. - lo., "Abbreviations in the Masoretic Text", Textus 1 (1960), 112-131. - G. FOHRER, Die Glossen im Buche Ezechiel, ZA W 63 (1951), 33-53. - A. JEPSEN, "Von den Aufgaben deralttestamentlichen Textkritik", VTSuppl9, 1963,332-341. -H.JUNKER, "Konsonantenumstellung als Fehlerquelle und textkritisches Hilfsmittel im MT", em: BZAW 66,1936,162-174. - J. KENNEOY, An Aid to the Textual Criticism of the Old Testament, 1928. - F. S. NORTH, "Textual Variants in the Hebrew Bible significant for Critical Analysis", JQR 47 (1956/57), 77-80. - J. REIDER, "The Present State of Textual Criticism of the Old Testament", HUCA 7 (1930), 285-315. - E. ROBERTSON, The Text of the Old Testament and theMethods of Textual Criticiem, 1939. - J. SCHILDENBERGER, "Textumstellungen und ihre Begründung", em: Mélanges Robert, 1957, 241-253. - S. TALMON, "Oouble Readings in the Massoretic Text", Textus 1 (1960), 144--184. - lo., "Synonymous Readings in the Textual Traditions of the Old Testament", Scripta Hierosolymitana 8, 1961,335-383. - o. W. THOMAS, "The Textual Criticism of the Old Testament", em: The Old Testament and Modern Study, 1951,238-263. - P. VOLZ, "Ein Arbeitsplan für die Textkritik des Alten Testaments", ZAW 54 (1936), 110-113. - L. WATERMAN, "The Authentication of ConjecturaI Glosses", JBL 56 (1937), 253-259.
Apesar de todos os esforços para fixar o texto hebraico do AT com a maior exatidão e o maior cuidado possíveis, ele não ficou isento de erros e em muitos detalhes não transmite o conteúdo verbal inicialmente registrado. Antes do trabalho de fixação do texto pelos escribas e massoretas, já se haviam introduzido muitos erros e se fizeram alterações que desde então têm sido assumidos e retransmitidos. No próprio material de escrever e na escrita já se abrigavam fontes de erros. As formas dos rolos manuscritos davam margem a que o texto se estragasse ou se tornasse ilegível. Do papiro, muito delgado, podiam cair pedaços. O couro ou pergaminho podia ser roído por animais daninhos. A tinta também podia esmaecer, borrar ou desaparecer, principalmente em conseqüência do uso freqüente do rolo, em que a primeira e a
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última coluna eram particularmente afetadas. Daí é que talvez se expliquem os numerosos erros do texto de Na 1.2ss. Os rolos que continham todo o AT deviam ser escritos em letras bem miúdas, do que podiam resultar erros de transcrição. Os sinais de algumas letras da escrita do antigo hebraico e dos caracteres quadrados são tão semelhantes entre si, que alguém podia enganar-se facilmente, o que era também uma fonte de erros. Outros erros são os que surgiam - talvez ao se escrever sob ditado - da troca de consoantes cuja pronúncia era parecida. O emprego, no início, apenas da escrita consonantal, deu margem a que muitas palavras fossem lidas de dois ou de vários modos, e, com a crescente utilização das matres lectionis, essas mesmas palavras podiam, conseqüentemente, sei fixadas de modo errado. Às vezes dividiam-se erradamente certas palavras que, segundo parece - como se vê nos tratados aramaicos de Sefire (séc. VIII) - originariamente nem sempre se escreviam separadamente. Outra fonte de erro era a transposição dos livros escritos em hebraico antigo para a escrita quadrada. Outros erros são constituídos pela haplografia (" escrita simplificada"), isto é, a omissão de letras ou de palavras idênticas ou semelhantes, quando uma vinha imediatamente depois da outra; pela dittografia (" escrita duplicada"), que consistia em repetir letras ou palavras; pelo homoioteleuton, ou omissão de elementos, ocasionado pelo fato de se passar, por engano, do final de uma palavra para o final de uma outra igualou semelhante; pelo homoioarkton, quando as palavras têm começo igual; pela interpretação errônea de certas abreviações (como, p.ex., a de tomar o yod ou he' por "yahweh"); e, em épocas mais recentes, pela vocalização errada dos massoretas. Além disso, em épocas mais antigas fizeram-se mudanças propositadas no texto. Entre estas, enumeram-se a mudança do nome divino, p.ex., no Saltério eloísta, e a introdução de certas denominações divinas adicionais; a inserção de palavras breves e freqüentes; a substituição ou complementação de palavras usadas raramente ou em sentido incomum; a exclusão de expressões chocantes; além da inserção de numerosas glosas repetitivas, explicativas, complementares, modificativas e redacionais. Todos estes erros, e mais outros, encontrados nos textos, exigem o trabalho da crítica textual. Evidentemente, muitas formas postas em dúvida podem ser explicadas, não como erros, mas como indicações de textos vulgarizados divergentes, ou também como variantes dialetais, e a
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pesquisa do vocabulário hebraico, feita com base no conhecimento de outras línguas semíticas e nas novas descobertas arqueológicas, pode ajudar a entender uma palavra ininteligível ou tomada como corrompida. Contudo, mesmo nesses casos, ainda restará um sem número de verdadeiros erros ou de modificações textuais que nos obrigam a procurar a possível forma original ou não corrompida. Para isto, tem-se, de um lado, as tradições do texto hebraico, sobretudo aquelas anteriores aos massoretas, e, do outro lado, o samaritano e as traduções. Para considerá-las cuidadosamente, é preciso, naturalmente, examinar, não somente as coleções de variantes, mas também os textos em si mesmos, atendendo para as suas características próprias, e observar as inter-relações de cada texto. Muitas vezes, contudo, pode-se apenas constatar a existência de um texto pré-massorético já corrompido e que não tem mais sentido do que o texto massorético. Nesses casos, justamente, em que a corrupção do texto data de época antiqüíssima, nada mais resta do que fazer uma mudança livre que corresponde ao sentido lógico do texto. Com efeito, a finalidade de todo o trabalho crítico consiste, não em preservar o mais amplamente possível aquilo que é recebido, mas em chegar, por todos os meios ao alcance, à compreensão do texto (veja quadro na página seguinte).
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Recensões pré-massoréncas e textos vulgarizados Massorético-padrão
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SUPLEMENTOS Relação Bibliográfica e de Abreviaturas
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SUPLEMENTOS
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SUPLEMENTOS
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SUPLEMENTOS
Gilgamesch, 1966. - E. VON SCHULER, "Staatsvertrâge und Dokumente hethitischen Rechts", in: G. WALSER (edit.), Neuere Hethiterforschung, 1964. - E. WEIDNER, "Assyrische Itinerare", AfO 21 (1966),42-46. - IDEM, "Neuassyrische Rechtsurkunden aus Assur", ibid. 69. - R. WERNER, Hethitische Gerichtsprotokolle, 1967. - R. J. WILLIAMS, "Literature as a Medium of Political Propaganda in Ancient Egypt", in: Meek-Festschrift, 1964, 14-30. - H. M. WOLF, The Apology of flattusilis compared with other political Self-Justifications of the Ancient Near Easi, Diss. Brandeis, 1967.
§ 8. OS GÊNEROS LITERÁRIOS NORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES E. AUERBACH, "Das Zehngebot - allgemeine Gesetzesform in der Bibel", VT 16 (1966), 255-276. - K. BALTZER, DasBundesformular, 2il ed., 1966. - G. J. BOTIERWECK, "Form- und überlieferungsgeschichtliche Studien zum Dekalog", Concilium 1 (1965),392-401. - P. BOIS, "Les formulaires dalliance", VT 16 (1966), 396-411. - G. FOHRER, Altes Testament - "'Amphiktyonie' und 'Bund'?", ThLZ 91 (1966), 801816,893-904. - E. GERSTENBERGER, "Covenant and Commandment", JBL 84 (1965), 38-51. - IDEM, Wesen und Herkunft des "apodiktischen Rechis", 1965. - H. GESE, "Der Dekalog als Ganzheit betrachtet", ZThK 64 (1967), 121-138. - A. GONZÁLEZ NÚNEZ, "EI rito de la Alianza", EstBíbl 24 (1965), 217-238. - PH. B. HARNER, "Exodus, Sinai, and Hittite Prologues", JBL 85 (1966), 233-236. - R. HENTSCHKE, "Erwãgungen zur israelitischen Rechtsgeschichte", Theologia tnaiorum, 10 (1965/66), 108-133. A. JEPSEN, "Beitrãge zur Auslegung und Geschichte des Dekalogs", ZAW79 (1967), 277-304. - A. S. KAPELRUD, "Some Recent Points of View on the Time and Origin of the Decalogue", StTh 18 (1964), 81-90. - E. KUTSCH, "Gesetz und Cnade", ZAW 79 (1967), 18-35. - IDEM, "Der Begriff n"~ in vordeuteronomischer Zeít", in: Rost-Festschrift, 1967, 133-143. - R. MARTIN-AcHARD, "La signification de l'alliance dans l'Ancien Testament d'aprês quelques récents irauaux", RThPh 101 (1968),88-102. - D. J. MCCARTIN, "Covenant in the Old Testament: the Present State of the Inquíry", CBQ 27 (1965), 217-240. - IDEM, Der Gottesbund im Alten Testament, 1966. - J. MORGENSTERN, Ritesof Birth, Marriage, Death and Kindred Occasions among the Semiies, 1966. - E. NIELSEN, Die zehn Geboie, 1965. - F. NbTSCHER, "Bundesformular und 'Amtsschimmel'", BZ NF 9 (1965), 181-214. - A. I. PATRICK, Laformation littéraire et l'origine historique du Décalogue, 1964. - J. PRIEST, "The Covenant of Brothers", JBL 84 (1965), 200-206. - J. J. STAMM - M. E. ANDREW, The Ten Commandments in Recent Research, 1967. - G. M. TucKER, Contracts in the OT: a Form CriticaI Investigation, Diss, Yale, 1963. - IDEM, "Covenant Forms and Contract Forms", VT 15 (1965), 487-503. - M. WEINFELD, "Traces of Assryrian Treaty Formulas in Deuteronomy", Bibl 46 (1965), 417-427.
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§ 9. OS GÊNEROS LITERÁRIOS IMPERATIVOS E DESIDERATIVOS E SUAS TRADIÇÕES T. CANAAN, "Flüche unter den Arabern [ordaniens", Studii Biblici Franciscani Líber Annuus 13 (1962/63),110-135. - H.- J. KRAUS, "Der lebendige Gott", EvTh 27
(1967), 169-200. - W. RICHTER, "Das Gelübde aIs theologische Rahmung der Jakobsüberlieferungen", BZ NF 11 (1967),21-52. - C. WESTERMANN, Der Segen in
der Bibel und im Handeln der Kirche, 1968. § 10. OS GÊNEROS LITERÁRIOS QUERIGMÁTICOS E DOUTRINAIS E SUAS TRADIÇÕES H. M. DIoN, "The Patriarchal Traditions and the Literary Form of the 'Orade ofSalvation"', CBQ 29 (1967), 198-206. -F. VATTIONI, "La necromanzia nell'Antico Testamento, 1 Sam. 28,3-25", Augustinianum 3 (1963),461-481.
§ 11. OS GÊNEROS LITERÁRIOS DE TRANSMISSÃO E COMUNICAÇÃO E SUAS TRADIÇÕES
A. GONZÁLEZ, La oración en la Biblia, 1968. § 12. OS GÊNEROS LITERÁRIOS NARRATIVOS E SUAS TRADIÇÕES F. FESTORAZZI, Labibbia e il problema delle origine, 1966. - G. FOHRER, "Die Sage in der Bibel", in: Sagen und ihre Deutung, 1965,59-80. - W. G. LAMBERT, "A New Look at the Babylonian Background of Genesis", JThSt NS 16 (1965),287-300. - J. R. PORTER, "Pre-Islamic Historical Traditions and the Early Historical Narratives of the Old Testament", JBL 87 (1968), 17-26. - H. PRELLER, Geschichte der Historiographie unseres Kulturkreises, I 1967. - E. TEsTA, "11 genere letterario della disputa e il racconto di Caino ed Abele", Bibbia e Oriente 8 (1966), 157-166. - J. G. TRAPIELLO, "Mito Y culto en el Antiguo Testamento", Angelicum 44 (1967), 449-477. - Na nota 135: G. FOHRER, Das Buch Jesaja, 11 2a ed., 1967. - IDEM, Elia, 2a ed., 1968.
§ 13. OS GÊNEROS LITERÁRIOS INFORMATIVOS E SUAS TRADIÇÕES J. R. BARTLETT, "The Edomite King-list of Genesis 36,31-39 and I Chron. 1,4350", JThSt NS 16 (1965), 301-314. - A. F. JOHNS, "Did David Use Asryriantype Annals?", Andrews University Seminary Studies 3 (1965), 97-109. - J. LIvER, "The Book of the Acts of Solomon", Bibl48 (1967), 75-101. - G. MORAwE, "Studien zum Aufbau der neubabylonischen Chroniken in ihrer Beziehung zu den chronologichen
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Notizen der Kónigsbücher", EvTh 26 (1966),308-320. - A. PENNA, "Le parti narrative in Isaia e Geremia", RivBibl 13 (1965),321-346. - B. PORTEN, "The Structure and Theme of the Solomon Narrative (I Kings 3-11)", HUCA 38 (1967), 93-128. - H. PRELLER (§ 12).
§ 14. OUTROS GÊNEROS LITERÁRIOS E SEU INFLUXO SOBRE OUTROS LIVROS E. C. KINGSBURY, "The Theophany Topos and the Mountain of God", fBL 86 (1967), 205-210.
§ 15. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO Na nota 108: O artigo foi reproduzido em: K. ELLIGER, Kleine Schriften zum
Alten Testament, 1966,232-259. § 16. NOMES E CONTEÚDO ATD: M. NOTH, Num 1966. - BK: C. WESTERMANN, Gen 1966ss. - BOT: G. TE STROETE, Ex 1966. - Anchor Bible: E. A. SPEISER, Gen 1964. - De prediking van het Oude Testament: A. VAN SELMS, Gen I-lI 1967. - New Century Bible: N. H. SNAITH, Lei-Num 1967. - Zürcher Bibelkommentare: W. ZIMMERLI, Gen 1-11, 3<1 ed., 1967. - Especiais: U. CASSOTO, Gen 1961/64, Ex 1967. - W. H. GISPEN, Schepping en paradijs, 1966 (Gen 1-3). - A. LACOCQuE, La devenir de Dieu, 1967 (Ex 1-4). - Questões avulsas: E. A. SPEISER, Oriental and Biblical Studies, 1967.
§ 17. A PESQUISA DO PENTATEUCO ATÉ OS NOSSOS DIAS R. J. COGGIN, "A Century of Pentateuchal Criticism", ChQR 1965, 149-161, 413-425. - S. MOWINCKEL, Erwiigungen zur Pentateuch-Quellenfrage, 1964. - C. ScHEDL, "Worte und Zahlen, Neuer Zugang zu den Genesisquellen", ZAW 77 (1965), 259-267 (contra: H. W. HOFFMANN, "Kritische Anmerkungen zu einer neuen mathematischen Methode der Textscheidung", ZAW 78, 1966,219-224.). - M. H. SEGAL, The Pentateuch, its Composition and its Authorship, and Other Biblical Studies, 1967. - N. E. WAGNER, "Pentateuchal Criticism: No Clear Future", Canadian fTh 13 (1967),225-232. - F. V. WINNETT, "Re-Examining the Foundations", fBL 84 (1965), 1-19.
§ 18. MÉTODOS, RESULTADOS E PROBLEMAS H. B. HUFFMON, "The Exodus, Sinai and the Credo", CBQ 27 (1965),101-113. - W. RICHTER, "Beobachtungen zur theologischen Systembildung in der alttesta-
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mentlichen Literatur anhand des 'kleinen geschichtlichen Credo"', in: SchmausFestschrift, 1967, 175-212. - J. SCHARBERT, "Offenbarung, Tradition und Schrift im Pentateuch", Münchner ThZ 18 (1967),93-118. - TH. C. VRIEZEN, "The Credo in the Old Testament", OuTWP 1963, Studies on the Psalms, 5-17.
§ 19. A ORDEM DAS TRADIÇÕES HISTÓRICAS C. BARTH, "Zur Bedeutung der Wüstentradilion", VTSuppl15 (1966), 14-23. - W. BELTZ, Die Kaleb-Traditionen oder ein Beitrag zur theoretischen Diskussion in der Religionswissenschaft, 1966. - R. E. CLEMENTS, Abraham and David. Genesis XVand its Meaning for Israelite Tradition, 1967. - J. COPPENS, "Les orades de Biléam: leur origine littéraire et leur portée prophétique", in: Mélanges Tisserand, I 1964, 67-80. - P. DAcQUINo, "Le promesse di Dio ai Patriarchi secondo le tradizioni della Genesi", RivBibl15 (1967),449-469. - F. R. VAN DEVELDER, The Form and History of theAbrahamic Covenant Traditions, Diss. Drew, 1967. - H. M. DION, "The Patriarchal Traditions and the Literary Form of the 'Orade of Salvation''', CBQ 29 (1967), 198-206. - O. EISSFELDT, "Jakob-Lea und Jakob-Rahel", in: Hertzberg-Festschrift, 1965, 50-55. - IDEM, "Das Gesetz ist zwischeneingekommen. Ein Beitrag zur Analyse der Sinai-Erzâhlung Ex 19-34", ThLZ 91 (1966), 1-6. - IDEM, Die Komposition der Sinai-Erzãhiung Exodus 19-34, 1966. - G. FOHRER, "Die Vorgeschichte Israels im Lichte neuer Quellen", DasWort im evangelischen Religionsunterricht, 1965/66, Nr. 2,2-10. - M. GREENBERG, "The Thematic Unity of Exodus III-XI", in: Fourth World Congress ofJewish Studies, 11967,151-154. -A. H. J. GUNNEWEG, "Mose in Midian", ZThK 61 (1964),1-9. - M. HARAN, "The Religion of the Patriarchs", ASTI 4 (1965), 30-55. - L. S. HAY, "What Really Happened at the Sea of Reeds?", JBL 83 (1964), 397-403. - S. HERRMANN, "Israel in Ãgypten", zAs 91 (1964),63-79. - IDEM, "Mose", EvTh 28 (1968),301-328. - H. B. HUFFMoN,Amorite Personal Names in theMari Texts, 1965. - R. KILIAN, Die vorpriesterlichen Abrahamsüberlieferungen, literarkritisch und traditionsgeschichtlich untersucht, 1966. - R. LARGEMENT, "Les orades de Bile'am et la mantique suméro-accadienne", in: École des Langues Orientales Anciennes, 1964, 37-50. - F. M. TH. DE LIAGRE BÓHL, Babel und Bibel (lI): 7. Die Patriarchenzeit, JEOL 6,17 (1963), 125-140.- S. E. LoEWENSTAMM, The Tradition of theExodus in its Development, 1965. - N. LOHFINK, Die Landverhei13ung als Eid, 1967. - D. J. MCCARTHY, "Moses' Dealings with Pharaoh: Ex 7,8-10,27", CBQ 27 (1965), 336-347. - IDEM, "Plagues and the Sea of Reeds: Exodus 5-14", JBL 85 (1966), 137-158. - H. SCHMID, "Der Stand der Moseforschung", Judaica 21 (1965), 194-221. - R. ScHMID, "Meerwunderund Landnahmetraditionen", ThZ 21 (1965),260-268. - H. SEEBASS, Der Erzvater Israel und dieEinführungderJahweverehrung in Kanaan, 1966. - N. A. V AN UCHELEN, Abraham deHebreeêr, 1964. - R. DE VAUX, Die Pairiarchenerzãhlungen und die Geschichte, 1965. - G. WALLIS e o., "Die Geschichte der [akobtradition", WZ HalleWittenberg 13 (1964), 427-440. - H. WEIDMANN, Die Patriarchen und ihre Religion im Licht der Forschung seit[ulius Wellhausen, 1968. - M. WEIPPERT, DieLandnahme derisraelitischen
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Stiimme in der neueren wissenschaftlichen Diskssion, 1967. - H. C. WHITE, A FormCriticaI Analysis of the Patriarchal Cultic Legends, Diss. Drew, 1967. § 20. A ORIGEM DAS COLEÇÕES E DOS CÓDIGOS JURÍDICOS NÃO-AUTÔNOMOS W. BEYERLIN, "Die Parãnese im Bundesbuch und ihre Herkunft", in: HertzbergFestschrift, 1965,9-29. - A. VAN DEN BRANDEN, "Lévitique 1-7 et le tarif de Marseille", CIS I, 165, RSO 40 (1965), 107-130. - K. ELLIGER, Das Gesetz Leviticus 18 (= Kleine Schriften zum Alten Testament, 1966, 232-259).
§ 22. O "ESTRATO FONTE" J W. BRUEGGEMANN, "David and His Theologian", CBQ 30 (1968), 156-181. - B. S. CHILDS, "The Birth of Meses", JBL 84 (1965), 109-122. - G. W. COATS, Rebellion in the Wilderness, 1968. - O. EISSFELDT, "Goethes Beurteilung des kultischen Dekalogs von Ex 34 im Lichte der Pentateuchkritik", ZThK 62 (1965), 135-144. - W. Fuss, Die sogenannte Paradieserzdhlung, 1968. - H. HAAG, "Die Komposition der Sündenfall-Erzãhlung (Gn 2,4b-3,24)", Tübinger ThQ 146 (1966), 1-7. - H. HEYDE, Kain, der erste [ahuie-Yerehrer, 1965. - M. E. L. MALLOWAN, "Noah's Flood Reconsidered", Iraq 26 (1964), 62-82. - K. VON RABENAU, "Die beiden Erzãhlungen vom Schilfmeerwunder in Ex 13,17-14,31", in: Theologische Versuche, 1966, 7-29. - W. RICHTER, "Urgeschichte und Hoftheologie", BZ NF 10 (1966), 96-105. - E. TESTA, "lI genere letterario della disputa e il raconto di Caino ed Abele", Bibbia e Oriente 8 (1966), 157-166. - S. J. DE VRIES, "The Origin of the Murmuring Tradition", JBL 87 (1968), 51-58.
§ 23. O "ESTRATO FONTE" E M. ABERBACH - L. SMOLAR, "Aaron, [erobeam, and the Golden Calves", JBL 86 (1967), 129-140. - M. GORG, Das Zelt der Begegnung, 1967. - A. W. JENKS, The Elohist and North Israelite Tradiiion, Diss. Harvard, 1965. - R. KILIAN, "Der heilsgeschichtliche Aspekt in der elohistischen Geschichtstradition", ThGI 56 (1966), 369-384. - S. E. LOEwENsTAMM, "The Making and Destruction of the Golden Calf", Bibl 48 (1967),481-490. - H. GRAF REVENTLOW, Opfere deinen Sohn, 1968. - W. RICHTER, "Das Gelübde als theologische Rahmung der Jakobsüberlieferungen", BZ NF 11 (1967),21-52.
§ 24. O PROBLEMA DE UM TERCEIRO ANTIGO "ESTRATO FONTE" (Jl, L, N)
F. OExrNGER, Sturzder GOttersohne oder Engel vorder Sintflut?, 1966.- P. MIDDLEKOOP, "The Significance of the Story of the "Bloody Husband" (Ex 4,24-26)", South
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East Asia Journal of Theology 8 (1966/67), 34-38. - D. NEIMAN, "The Date and Circumstances of the Cursing of Canaan", in: A. ALTMANN (ed.), Biblical Motifs, 1966, 113-134. - L. F. RIvERA, "EI'esposo sangiento"', RevBib 125 (1963), 129-136. - J. SCHARBERT, "Traditions- und Redaktionsgeschichte von Gn 6,1-4", BZ NF 11 (1967),66-78. - H. ScHMID, "Mose, der Blutbrõuiigam. Eruiãgungen zu Ex 4,24-26", Judaica 22 (1966), 113-118. § 25. O "ESTRATO FONTE" D SB: P. BUIS - J. LECLERCQ, 1963. J. BLENKINSOPP, "Are There Traces of the Gibeonite Covenant in Deuteronomy?", CBQ 28 (1966), 207-219. - C. BREKELMANS, "Die sogenannten deuteronomischen Elemente in Gen. bis Num. Ein Beitrag zur Vorgeschichte des Deuteronorniums", VTSuppl15, 1966, 90-96. - M. CAWZ, "Exode, 3,3-16 et son rapport au Deutéronome", RB 75 (1968),5-62. - H. CAZELLES, "Passages in the Singular within Discourses in the Plural of Dtn 1-4", CBQ 29 (1967), 207-219. - B. S. CHILDS, "Deuteronomic Formulae of the Exodus Traditions", in: Baumgartner-Festschrift, 1967,30-39. - R. E. CLEMENTS, "Deuteronomy and the Jerusalem Cult-Tradition", VT 15 (1965), 300-312. - R. FRANKENA, "The Vassal-Treaties of Esarhaddon and the Dating of Deuteronomy", OTS 14, 1965, 122-154. - J. L'HoUR, "Les interdits to'eba dans le Deutéronome", RB 71 (1964),481-503. - S. LOERSCH, Das Deuteronomium und seine Deutungen, 1967. - J. L. MCKENZIE, "The Historical Prologue of Deuteronomy", in: Fourth World Congress of Jewish Studies, 11967,95-101. - E. W. NICHOLSON, Deuteronomy and Tradition, 1967. - IDEM, "[osiah's Reformation and Deuteronomy", Glasgow University Oriental Society Transactions 20 (1963/64), 77-84. - J. G. PLOGER, Líte-
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§ 27. FRAGMENTOS ISOLADOS FORA DOS "STRATOS FONTES" M. C. ASTOUR, "Political and Cosmic Symbolism in Genesis 14 and in its Babylonian Sources", in: A. ALTMANN (ed.), Biblical Motifs, 1966, 65-112. - J. R. BOSTON, The Song of Moses: Deuteronomy 32,1-43, Diss. Union, 1966. - IDEM, "The Wisdom Influence upon the Song of Meses", JBL 87 (1968), 198-202. - S. CARILLO ALDAY, "Género literario del Cántico de Moisés (Di. 32)", EstBíbl 26 (1967), 69-75, 143-185,227-248. -N. M. Loss, "11 signiftcato di Ex. 19,3b-6 come tema e preambolo della portata religiosa dei fatti del Sinai", Salesianum 29 (1967), 669-694. - R. MEYER, "Melchisedek von Jerusalem und Moresedek von Qumran", VTSuppl15, 1966, 228-239. - J. MUILENBURG, "A Liturgyon theTriumphs of Yahioeh", in: Vriezen-Festschrift, 1966, 233-251. - G. RrNALDI, 'IIUn Regno di Sacerdoti" (Esodo 19,1-6)", Bibbia e Oriente 7 (1965), 97-104. - R. H. SMITH, "Abram and Melchizedek (Gen 14,18-20)", ZAW 77 (1965), 129-153. - R. VANDE WALLE, "An Administrative Body of Priests and a Consecrated People - Exod. 19,6", Indian Journal of Theology 14 (1965), 57-72.
§ 29. AS HIPÓTESES SOBRE A EXISTÊNCIA DE OBRAS COMPLEXIVAS O. EISSFELDT, "Deuteronomium und Hexateuch", MIOF 12 (1966), 17-39. - G. SAUER, "Die chronologischen Angaben in den Büchern Deut. bis 2. Kõn.", ThZ 24 (1968), 1-14.
§ 30. O LIVRO DE JOSUÉ, MAIS JZ 1,1-2,5 C. H. J. DE GEUS, "Richteren 1,1-2,1", Vox theologica 36 (1966),32-53. - L M. GRINTZ, "The Treaty ofJoshua with the Gibeonites", JAOS 86 (1966), 113-126. - Z. KALLAI, The Tribes of Israel, 1967. - G. DEL OLMO LETE, "La conquista de [ericó la legenda ugaritica de KRT", Sefarad 25 (1965),3-15. - J. B. PRITCHARD, "Arkeologiens plats i studiet av Gamla Testamentet", SEA 30 (1965),5-20. - H. ScHMID, "Erwâgungen zur Gestalt [osuas in Überlieferung und Ceschíchte", Judaica 24 (1968),44-51. - J.
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§ 50. O LIVRO DE JÓ Anchor Bible: M. H. POPE, 1965. M. BIC, "Lê juste et l'impie dans le livre de Job", VT5uppl15, (1966), 33-43.H. BARDTKE, "Prophetische Züge im Buche Hiob", in: Rost-Festschrift, 1967, 1-10.C. BRANDWEIN, "The Legend of [ob According to its Various Stages", Tarbiz 35 (1965/66),1-17. - D. N. FREEDMAN, "The Elihu Speeches in the Book ofJob", HThR 61 (1968),51-59. - H. L. GINSBERG, "[ob the Patient and [ob the Impatient", Conservative [udaism 21 (1966/67), 12-28. - R. GORDIS, The Book of God and Man, 1965. - A. GUILLAUME, "The Arabic Background of the Book of [ob", in: Hooke-Festschrift, 1963, 106-127. - IDEM, "The Unity of the Book of [ob", Annual of Leeds University Oriental 50ciety 4 (1962/63), 26-46. - J. PRAOO, "La perspectiva escatológica de [ob 19,25-27", EstBíb125 (1966), 5-39. - P. W. SKEHAN, "Job's Final Plea (Job 29-31) and the Lord's Reply (Job 38-41)", Bib145 (1964),51-62. - W. VON SODEN, "Dar Fragen nach der Gerechtigkeit Gottes im Alten Orient", MDOG 96 (1965),41-59. - S. TERRIEN, "Quelques remarques sur les affinités de [ob avec le Deutéro-Ésaíe", VT5uppl15, 1966,295-310. - M. TSEVAT, "The Meaning of the Book of [ob", HUCA 37 (1966), 73-106.
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SUPLEMENTOS
§ 51. O ECLESIASTES (QOHELET) Anchor Bible: R. B. Y. SCOTT, 1965. - La Biblia: A. M. FIGUERAS, 1966. E. BICKERMANN (§ 37). - G. E. CASTELLINO, "Qohelet and His Wisdom", CBQ 30 (1968), 15-28. - M. J. DAHOOD, "The Phoenician Background of Qoheleth", Bibl 47 (1966), 2.64-282. - F. ELLERMEIER, Qohelet, I 1 1967. - A. F. RAINEY, "A Study of Ecclesiastes", Concordia Theological Monthly 35 (1964), 148-157.
§ 52. A PROFECIA NO ANTIGO ORIENTE E EM ISRAEL P. L. BERGER, "The Social Location of Israelite Prophecy", American Sociological Review 28 (1963),940-950. - R. BORGER (§ 7). - G. FOHRER, Studien zur allttestamentlichen Prophetie (1949-1965), 1967. - ST. B. FROST, Old Testament Apocalyptic, 1952. - N. K. GOTTWALD, All the Kingdoms of the Earth, 1964. - H. GROSS, Gab es in Israel ein "prophetisches Amt"?, 1965. - W. W. HALLO,"Akkadian Apocalypses", IEJ16 (1966), 231-242. - E. HAMMERSHAIMB, Some Aspects of Old Testament Prophecy from Isaiah to Malachi, 1966. - S. HERRMANN, Dieprophetischen Heilserwartungen im AIten Testament, 1965. - A. S. KAPELRUD, Profetene i det gamle Israel og [uda, 1966. - H. KLEES, Die Eigenart des griechischen Glaubens an Orakel und Seher, 1965. - A. MALAMAT, "Prophetic Revelations in New Documents from Mari and the Bible", VTSuppl 15, 1966, 207-227. - IDEM, Prophecy in the Mari Documents and the Bible, 1967. - J. MUILENBURG, "The 'Office' of the Prophet in Ancient Israel", in: The Bible and Modern Scholarship, 1965,74-97. - L. M. MUNTINGH, "Profetisme in die Maritekste en in die Ou Testament", Ned. Geref. Teologiese Tydskrif7 (1966), 48-60. -M. NOTH, Geschichte und Gotteswort im AIten Testament, s.d. (= Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1957,230-247). - F. NÔTSCHER, "Prophetie im Umkreis des alten Israel", BZ NF 10 (1966), 161-197. - H. M. ORUNSKY, "The Seer in Ancient Israel", Oriens Antiquus 4 (1965), 153-174. - H. H. ROWLEY, The Relevance of Apocalyptic, 3 i1 ed., 1963 (alemão 1965). - D. S. Russa, TheMethodand Message ofJewish Apocalyptic, 1964. - A. E. RÜTHY, "Wãchter und Spãher im Alten Testament", ThZ 21 (1965), 300-309. - J. SCHARBERT, Die Propheten Israels bis 700 v. Chr., 1965. - IDEM, Die Propheten Israels um 600 v. Chr., 1967. - H. SCHULT, "Vier weitere Mari-Briefe 'prophetischen' Inhalts", ZDPV 82 (1966),228-232. - J. G. WILLIAMS, "The Prophetic 'Father"', JBL 85 (1966), 344-348. - G. E. WRIGHT, "The Nations in Hebrew Prophecy", Encounter 26 (1965), 225-237. - A. H. VAN ZYL, "Die Boodskapper van die Here", Ned. Geref. Teologiese Tydskrif 8 (1967),66-81.
§ 53. A PREGAÇÃO PROFÉTICA E SEUS GÊNEROS LITERÁRIOS P. BUIS, "Notification de jugement et confession nationale", BZ NF 11 (1967), 193-205. - R. J. CUFFORD, "The Use of Hôy in the Prophets", CBQ 28 (1966),458464. - G. FOHRER, Studien zur aIttestamentlichen Prophetie (1949-1965), 1967. - IDEM,
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Die symbolischen Handlungen der Propheten, 2i! ed., 1968. - N. HABEL, "The Form and Significance of the Call Narratives", ZAW 77 (1965), 297-323. - J. H. HAYES, "The Usage of Orades Against Foreign Nations in Israel", JBL 87 (1968), 81-92.D. R. HILLERS, Treaty-Curses and the Old Testament Prophets, 1964. - IDEM, "A Convention in Hebrew Literature: The Reaction to Bad News", ZAW 77 (1965), 86-90. - J. JEREMIAS (§ 39). - R. KILIAN, "Die prophetischen Berufungsberichte", in: Theologie im Wandel, 1967, 356-376. - P. D. MILLER, [r., "The Divine Council and the Prophetic Call to War", VT 18 (1968), 100-107. - A. SCHACHTER, Bundesformular und prophetischer Urteilsspruch, Bibl 48 (1967), 128-131. - E. SCHERER, Unpereõnlich formulierte prophetische Orakel, drei Formen prophetischer Rede, Diss. Berlin, 1964. E. SCHULZ, Formgeschichte des vorklassischen Prophetenspruchs, Diss. Bonn, 1958. - I. P. SEIERSTAD, Die Offenbarungserlebnisse der Propheten Amos, Jesaja und [eremia, 2i! ed., 1965. - G. WANKE, ';1< und 'i;,. ZAW 78 (1966),215-218. - J. G. WILLIAMS, "The Alas-Orades of the Eighth Century Prophets," HUCA 38 (1967), 75-91. § 54. COMPILAÇÃO E TRANSMISSÃO
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Glaubenskrise und Glaubensbewiihrung in den Dichtungen derJesajaapokalypse, 1967. - R. KNIERIM, "The Vocation of Isaiah", VT 18 (1968), 47-68. - TH. LESCOW, "Das Geburtsmotiv in den messianischen Weissagungen hei [esaja und Micha", ZAW 79 (1967), 172-207. - J. LINDBLOM, "Der Ausspruch über Tyrus in [es, 23", A5TI 4 (1965),56-73. - W. E. MARCH, A 5tudy of Two Prophetic Compositions in Isaiah 24,127,1, Diss. Union, 1966. - A. MATTIOLI, "Due schemi letterari negli Oracoli d'introduzione al Libro d'lsaia: Is 1,1-31", RivBibl 14 (1966), 345-364. - W.
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MCKANE, "The Interpretation of Isaiah VII, 14-25", VT 17 (1967),208-219. - J. MEJÍA, "Isaias 7,14-16: contribucián a la exegesis de un texto dificil", EstBíbl 23 (1964), 107121. - J. A. MILLER, "Emmanuel", Bibbia e Oriente 8 (1966), 51-59. - B. D. NAPIER, "Isaiah and the Isaian", VTSuppl15, 1966,240-251. - C RABIN, "An Arabic Phrase in Isaiah", in: Rinaldi-Festschrift, 1967, 303-309. - M. TREVES, "Little Prince Pele-Ioez", VT 17 (1967), 464-477.
§ 57. DÊUTERO-ISAÍAS 11 OS 40-55) ATO: C WESTERMANN, 1966.- J. D. SMART, History andTheology in Second Isaiah, 1965. W. BRUEGGEMANN, "Isaiah 55 and Deuteronomic Theologv", ZAW 80 (1968), 191-203. - H.-M. DION, "Le geme littéraire sumérien de I"Hymne à soi-même' et quelques passages du Deutéro-Isaíe", RB 74 (1967), 215-234. - G. FOHRER, Studien zur alttestamentlichen Prophetie (1949-1965), 1967. - PH. B. HARNER, "Creation Faith in Deutero-Isaiah", VT 17 (1967), 298-306. - S. HERRMANN, Prophetie und Wirklichkeit in der Epoche des babylonischen Exils, 1967. - E. HESSLER, "Die Struktur der Bilder bei Deuterojesaja", EvTh 25 (1965), 349-369. - E. KUTSCH, Sein Leiden und Tod unser Heil, 1967. - J. MORGENSTERN, "Further Light from the Book of Isaiah upon the Catastrophe of 485 B.C", HUCA 37 (1966), 1-28. - IDEM, "Isaiah 49-65", ibid. 36 (1965), 1-35. - H. M. ORLINSKY, The So-Called "Suffering Seroani" in Isaiah 53, 1964. - IDEM, - N. H. SNAITH, Studies in the Second Part of the Book of Isaiah, 1967. D. F. PAYNE, "Characteristic Word-Play in "Second Isaiah": A Reappraisal", JSS 12 (1967), 207-229. - J. B. PAYNE, "Eighth Century Israelitish Background of Isaiah 40-66", The Westminster Theological [ournal 29 (1966/67), 179-190; 30 (1967/68), 50-58, 185-203. - R. A. ROSENBERG, "Yahweh Becomes King", JBL 85 (1966),297307. - A. ScHOORS, Les choses antérieures et les choses nouvelles-dans le Orades deuiéroisaiens, 1964. - M. SMITH, "11 Isaiah and the Persians", JAOS 83 (1963),415-421. R. A. SoLOFF, The Fifty-third Chapter of Isaiah according to the Jewish Commentaiors, Diss. Drew, 1967. - C. STUHLMUELLER, '''First and Last' and 'Yahweh-Creator' in Deutero-Isaiah", CBQ 29 (1967), 495-511. - C WESTERMANN, "[esaja 48 und die 'Bezeugung gegen Israel'", in: Vriezen-Festschrift, 1966,356-366.
§ 58. TRITO-ISAÍAS III OS 56-66) H.-J. KRAUS, "Die ausgebliebene Endtheophanie", ZAW 78 (1966), 317-332.F. MAASS, "Tritojesaja"?, in: Rost-Festschrift, 1967, 153-163. - D. MICHEL, "Zur Eigenart Tritojesajas", TheoIogia viatorum 10 (1965/66),213-230. - J. MORGENSTERN (§ 57). - J. B. PAYNE (§ 57).
§ 59. JEREMIAS HAT: W. RUDOLPH, 3il ed., 1968. - Anchor Bible: J. BRIGHT, 1965. J. BRIGHT, "The Prophetic Reminiscence: its Place and Function in the Book
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§ 60. EZEQUIEL ATD: W. EICHRODT, 1966 (19-48). H. J. VAN DIJK, EzekieI's Prophecy on Tyre (Ez. 26,1-28,19), 1968. - G. FOHRER, Studien zur alttestamentlichen Prophetie (1949-1965), 1967. - R. FRANKENA, Kanttekeningen van eenAssyrioloog bij Ezechiêl, 1965. - N. C HABEL, "Ezekiel28 and the Fall of the First Man", Concordia Theological Monthly 38 (1967), 16-524. - J. Lusr, "Ez., XX, 426 une parodie de l'histoire religieuse d'Israél", EThL 43,3/4, 1967,488-527. - F. L. MORIARTY, "The Lament over Tyre (Ez 27)", Gregorianum 46 (1965), 83-88. - G. DE OLMO LETE, "Estructura literaria de Ez 33,1-20", EstBíbl22 (1963), 5-31. - M. H. WOUDSTRA, "Edom and Israel in Ezekiel", Calvin Theological Journal3 (1968), 21-3. - K. YARON, "The Dirge over the King of Tyre", ASTI 3 (1964), 28-57. - W. ZIMMERLI, "The Special Formand Traditio-Historical Character of Ezekiel's Prophecy", VT 15 (1965),515-527. - DERS., "Planungen für den Wiederaufbau nach der Katastrophe von 587", ibid. 18 (1968),229-255.
§ 61. OSÉIAS BK: H. W. WOLFF, 211 ed., 1965. - KAP: W. RUDOLPH, 1966. - Commentaire de l'Ancien Testament: E. JACOB, Hos; C-A. KELLER, [oel, Ob, [on; S. AMSLER, Am, 1965. G. FOHRER, Studien zur alttestamentlichen Prophetie (1949-1965), 1967. - E. GALBIATI, "La strultura sintetica di Osea 2", in: Rinaldi-Festschrift, 1967,317-318. E. M. GOOD, "Hosea and the [acob Tradition", VT 16 (1966), 137-151. - IDEM, "Hosea 5,8-6,6: An Alternative to Alt", JBL85 (1964), 273-286. - E. JACOB, "Der Prophet Hosea und die Geschichte", EvTh 24 (1964), 281-290. - W. RUDOLPH,
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"Eigentümlichkeiten der Sprache Hoseas", in: Vriezen-Festschrift, 1966,313-317. "Studies on the Books of Hosea and Amos", OuTWP 1965, 1966. § 62. JOEL BK: H. W. WOLPP, 1963. H.-P. MÜLLER, "Prophetie und Apocalyptik bei Joel", Theologia viatorum 10 (1965/66), 131-151. - G. R1NALDI, "Gioele e il Salmo 65", Bibbia e Oriente 10 (1968), 113-122. - W. RUOOLPH, "Wann wirkte Joel?", in: Rost-Festschrift, 1967, 193-198. §63. AMÓS BK: H. W. WOLFF, 1967SS. S. AMSLER, "Amos, prophête de la onziême heure", ThZ 21 (1965),318-318.A. CARLSON, "Profeten Amos och Davidsriket", Religionoch Bibel 25 (1966), 57-78. - S. COHEN, "The Political Background of the Words of Amos", HUCA 36 (1965), 153-160. - J. L. CRENSHAW, "The Influence of the Wise upon Amos", ZAW79 (1967), 41-51. - IDEM,"Amos and the Theophanic Tradition", ibid. 80 (1968),203-215. - G. FARR, "The Language of Amos, Popular or Cultic?", VT 16 (1966), 311-314. H. GOTTLIEB, "Amos og ku1ten", DTT 30 (1967), 65-101. - IDEM, "Amos und Jerusalem", VT 17 (1967), 430-463. - M. HARAN, "Von den Probleme des historischen Hintergrundes der "Võlkerprophetie" im Buche Amos (neo-hebr.)", Jediot 30 (1966),56-69. - A. S. KAPELRUD, "New Ideas in Amos", VTSuppl15, 1966, 193-206. - K. W. NEUBAUER, "Erwãgungen zu Amos 5,4-15", ZAW 78 (1966),292-316. - H. SCHMID, "Nicht Prophet bin ich, noch bin ich Prophetensohn", Judaica 13 (1967), 68-74. - L. A. SINCLAIR, "The Courtroom Motif in the Book of Amos", JBL 85 (1966), 351-353. - W. R STAPLES, "Epic Motifs in Amos", JNES 25 (1966), 106-112. "Studies in the Books of Hosea and Amos", OuTWP 1965, 1966. - L. L. WALKER, "The Language of Amos", Southwestern Journal of Theology 9 (1966/67), 37-48. M. WEISS, "The Pattern of Numerical Sequence in Amos 1-2", JBL 86 (1967),416413 (Tarbiz 36, 1966/67,307-318). § 64. ABDIAS
G. FOHRER, "Die Sprüche Obadjas", in: Vriezen-Festschrift, 1966,81-93. § 65. JONAS M. E. ANDREW, "Gattung and Intention of the Book of Jonah", Orita 1 (1967); 13-18,78-85. - R-J. BICKERMANN, "Les deux erreurs du prophête Jonas", RHPhR 45 (1965), 232-264. - R BICKERMANN (§ 37). - C-A. KELLER, "Jonas, le portrait d'un prophête", ThZ 21 (1965),319-340. - R. PESCH, "Zur konzentrischen Struktur von
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A. S. VAN DER WOUDE, "Predikte Zefanja een wereldgericht?", NedThT 20 (1965/66), 1-16. § 70. AGEU W. A. M. BEUKEN, Haggai - Sacharja 1-8. Studien zur Überliejerungsgeschichte derfrühnachexilischen Propheiie, 1967. - K. KOCH, "Haggais unreines Volk", ZAW 79 (1967),52-66. - H. G. MAY, '''This people' and 'This nation' in Haggai", VT 18 (1968), 190-197. § 71. ZACARIAS (ZAC 1-8) W. A. M. BEUKEN (§ 70). § 72. ZACARIAS 9-14 H.-M. LUTZ, [ahioe, Jerusalem und die VOlker. Zur Vargeschichte van Sach 12,1-8
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SUPLEMENTOS
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SUPLEMENTOS
Am 9,11; SI 1,1; Is 8,11; Ez 37,23(?); SI 2,1. Dt 5,28s; 18,18s; Nm 24,15-17; 4Q Testimonia Dt 33,8-11; Js 6,26. 4Q Tanhumim SI 79,2s; Is 40,1-5? 41,8s; 49,7,13-17; 43,1-2.4-6; 51,22s; 51,1-3; 54,1-10; 52,ls; Zac 13,9.
§ 79. FORMAS TEXTURAIS NÃO-MASSORÉTICAS J. BARR, "St. [erome's Appreciation of Hebrew", BJRL 49 (1966/67),281-302. -IDEM,"St jerome and the Sounds ofHebrew",JSS 12 (1967), 1-36. - D. BARTHÉLEMY, Les devanciers d'Aquila, 1963. - IDEM, "L'Ancien Testament a müri à Alexandrie", ThZ 21 (1965), 358-370. - A. BENOIT - P. PRIGENT, "Les citations de l'Écriture chez les Peres", RHPhR 46 (1966), 161-168. - J. W. BOWKER, "Haggadah in the Targum Onqelos", JSS 12 (1967), 159-169. - J. CANTERA, "Puntos de Contacto de Ia "Vetus Latina" con la recensión le Luciano y con otras recensiones griegas", Sefarad 25 (1965), 69-72. - IDEM, "Puntos de contacto de la Vetus Latina con el Targum Arameo y con la Pesitta", ibid. 223-240. - S. DANIEL, Recherches sur le vocabulaire du culte dans la Septante, 1966. - F. DUNAND, Papyrus grecs bibliques (Papyrus F. Inv. 266), Volumina de la Genêse et du Deutéronome, 1966. - G. FOHRER, "Hin zu den Quellen", ZAW 78 (1966),225-229. - H. F. FUHS, Die iithiopische Übersetzung des Propheten Micha, 1968. - D. W. GOODING, "The Shimei Duplicate and its Satel1ite Miscel1anies in 3 Reigns Ir, JSS 13 (1968), 76-92. - P. GRELOT, "Les versions grecques de Daniel", Bibl47 (1966), 381-402. - X. JACQUES, "Le vocabulaire de la Septante", Bibl48 (1967),296-301. - J. G. JANZEN, Studies in the Text of [eremiah, Diss. Harvard, 1966. - S. JELUCOE, "The Septuagint To-day", ET 77 (1965/66), 68-74. - B. KASSER, "Les dialectes coptes et les versions coptes bibliques", Bibl46 (1965),287-310. - L. KRUSE-BuNKENBERG, "The Pesitta of the Book of Malachi", StTh 20 (1966),95-119.IDEM, "The Book of Malachi according to Codex Syro-Hexaplaris Ambrosianus", ibid. 21 (1967),62-82. - R. J. LEDOGAR, "Verbs of Praise in the LXX Translation of the Hebrew Canon", Bibl48 (1967),29-56. J. MALFROY, "L'utilisation du vocabulaire sapientiel du Deutéronome dons le Targum Palestinien (Codex Neofiti)", Semitica 17 (1967), 81-96. - M. McNAMARA, Targumic Studies, CBQ 28 (1966), 1-19. - IDEM, "Some Early Rabbinic Citations and the Palestinian Targum to the Pentateuch", RSO 41 (1966), 1-15. - G. Q. A. MEERSHOEK, Le latin biblique d'aprês Saint [érõme, 1966. - M. F. MARTIN, "The Palaeographical Character of Codex Neofiti I", Textus 3 (1963), 1-35. - C. A. MOORE, "A Greek Witness to a Different Hebrew Text of Esther", ZAW 79 (1967), 351-358. - G. CARD. MERCATI, Psalterii hexapli reliquiae, Pars prima "0sservazioni", 1965. - The Old Testament in Syriac according to the Peshitta Version, Sample Edition, 1966. - E. T. RASMUSSEN, Relationships of Codand Man according to a Text and Targum of Deuteronomy, Diss. Brigham Young ,1967.J. REIDER - N. TURNER, An Index to Aquila, 1966. - L. G. RUNNING,"An Investigation
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ÍNDICE DE AUTORES A Aalders, G. Ch. - 156,415,469,568,589,621,665,674 Aalders, J. G. - 186, 583, 619 Abel, F. M. - 276 Abrahams, M. - 715 Abramowsky, R. - 542 Ackroyd, P. R. - 288,393,517,596,608,609,646,655 Adinolfi, M. - 136 Africano, J. - 36 Agostinho - 513, 622, 724 Aharoni, Y. - 271, 700 Ahlemann, F. - 329 Ahlstrõm, G. W. - 304, 359, 361, 363, 401 Aistleitner, J. - 44, 87, 400 Albrektson, B. - 410 Albright, W. F. - 44, 64, 123, 136, 174, 185,257,260,271,282,288,316,324, 329,400,405,415,421,430,447,449,486,573,640,695,701 Alexander, J. B. - 669 Alfrink,B.J.-271,276,671 Allegro, J. - 397 Allgeier, A - 469,714,715 Allis, O. T. - 529 Allrik, A. L. - 335 Allwohn, A. - 589, 592 Alonso Schõkel, L. A. - 33, 43,58,204,284,289,491 Alt, A. - 44, 81, 86, 92, 97, 98, 100, 136, 170, 174, 190,229,242,271,282,286, 303,319,334,335,365,425,455,523,596,627,669 Altmann, P. - 246 Amann, F. - 715 Amiran, R. - 700
762
ÍNDICE DE AUTORES
Amon, G. - 599 Anderson, B. W. - 521, 527 Anderson, G. W. - 629 Anderson, R. T. - 515 Anthes, R. - 425, 428 Apaméia, P. de - 666 Ap-Thomas, D. -115,319,727 Aptowitzer, V. - 695, 698 Áquila - 698, 707, 716, 718, 721, 725 Arbez, E. P. - 394 Arconada, R. - 398, 404, 405 Arens, A. - 387, 406 Aristéias - 722 Arnold, W. R. - 633 Ascher, A. ben - 710 Ascher, B. - 709, 710 Ascher, M. ben - 710 Asensio, F. - 396 Asmussen, J. P. - 329 Astruc, J. - 37, 154 Atanásio - 232, 682 Auerbach, E. - 58, 247, 284 Augé, R. - 573, 605, 623, 624 Augustin, F. - 548 Auvray,P.-394,398,568,583 Avi-Yonah, M. - 334
B Bach, R. - 92, 96, 491, 589, 598, 617 Bachmann, J. - 714 Baentsch, B. - 147, 186, 194,584 Baethgen, F. - 387 Baillet, M. - 695, 700, 712 Balla, E. - 60, 66, 362, 359, 483, 496, 555, 581, 586, 606, 639 Ballantine, W. G. - 583 Baltzer, K. - 92 Bardtke,tI.-151,345,559,560,565,695
ÍNDICE DE AUTORES
763
Barnes, VV.E.-582,583 Barns, J. - 722 Barnstein, H. - 712 Barr, J. - 122 Barth, Chr. - 359 Barthélemy, D. - 695, 700, 715 Barton, G. A. - 458, 469, 472, 673 Baruq, A. - 445 Bas, E. E. Le - 653 Batten, L. VV. - 327,455,589,592 Bauckmann, E. G. - 445 Baudissin, VV. G. - 38, 155, 156, 496, 531, 535, 657 Bauer, H. - 695 Bauer, J. B. - 250 Bauer, L. B. - 257 Bauer, Th. - 81, 88 Baumann,E.-257,359,387,405,555,576,582,589,599,606,610 Baumgartel,F.-453,457,458,459,469,491,498,502,548,568 Baumgartner, VV. - 33, 44, 122, 229, 425, 483, 548, 557, 589, 600, 606, 665, 669,670 Baumstark, A. - 713 Bea, A. - 151,329,345,417,436,469,471, 715 Beaucamp, E. - 401 Beek,~.J\.-521,612,665,674
Beer, G. - 115, 147, 192,260,396,711 Begrich, J. - 60, 92, 103, 110,207,316,353,359,500,503,519,523,527,531, 532,536,727 Behler, G. ~. - 557 Behr, T. VV.-527,531 Behrmann, G. - 665 Bekel, H. - 618 Bender, A. - 257 Ben-Hayym, Z. - 695 Benoit, P. - 695 Bentzen, A. - 33, 151, 157, 229, 289, 301, 330, 359, 466, 514, 518, 541, 548, 560,612,633,635,646,665,668,669,670 Bentzen, B. - 260 Benzer - 332
764
ÍNDICE DE AUTORES
Benzinger, L - 257, 266, 312, 313, 327 Ben-Zvi, L - 710 Beran, Th. - 75 Berliner, A. - 712 Bernhardt, K.-H. - 33, 44, 87, 125,359,361,362,712 Berry, G. R. - 229, 568, 572 Bertheau, E. - 284, 327, 341, 345, 350 Berthold, L. - 657 Bertholet, A. - 147, 159, 194,236,327,341,360,491,568,573,583,584,615, 673 Bertram, G. - 713 Bethe, E. - 122 Bevan, A. A. - 665, 675 Bevver,J.J\.-39,230,295,533,551,552,582,583,589 Beyer, K. - 491 Beyerlin, W. - 43, 167, 170, 177,289,293,311,625,630 Bic - 602, 605, 608, 619, 620, 652, 657 Bic, M. - 387, 599, 608, 618, 649 Bickell, G. W. H. - 60, 68,453,460,469,472,473,633 Bickerman, E. J. - 333 Billen, A. V. - 714 Binns - 193, 199 Bird, Th. E. - 621 Birkeland, H. - 51, 53, 370, 397, 400, 506, 548 Birnbaum, S. A - 695 Biser, E. - 622 Bissing, F. W. von - 425 Blackman, A M. - 82, 353 Blank,Sh.fL-111,l15,514,518,523,527,548,557,710 Blau, L. - 695 Blau, Y. - 181 Bleek, F. - 38, 154 Blenkinsopp, J. - 289, 291 Blieffert, H. J. - 469 Bloch, J. - 713 Bloomhardt, P. F. - 646 Boecker, H. J. - 92, 102,491,504
ÍNDICE DE AUTORES
Bôer, P. A. H. de - 116, 395,425, 523, 527, 535 Bohl, F. M. Th. de L. - 68, 84, 85, 257, 353, 538 Bõhlíg, A. - 714 Bohrne, VV.-284,621623 Bõhmer, J. - 396, 410, 460, 575, 651 Boissier, A. - 75 Bornan, Th. - 621623 Bornberg, D. - 711 Bondt, A. de - 555 Bonfrêre - 152 Bonkarnp, B. - 387 Bonnard,P.E.-387 Bonnet, H. - 485 Borger, R. - 79, 88, 173 Bom, A. van den - 296, 312, 327, 568, 571, 580, 586, 592, 593 Bostrõm, G. - 69, 434, 445, 450 Bottéro, J. - 91, 173 Botterweck, G. J. - 330, 394, 606, 614, 615 Bouhot, J. P. - 151 Bourke, J. - 599,603 Bowrnan, R. A. - 327 Boyd, J. O. - 714 Boyer, G. - 77, 81 Brandenstein, VV. - 136,212 Brandon, S. G. F. - 75, 84 Brastsiotis, N. P. - 557 Breit, H. - 230 Brekelrnans, C. H. VV. - 161, 167 Brekelrnans, Chr. H. E. - 177 Brentjes, B. - 173 Bressan, G. - 308 Brichto, H. Ch. - 106 Briggs, E. G. - 387 Bright, J. - 33, 132,271,322,335,556,749 Brinker, R. - 230, 233 Broadribb, D. - 415 Brongers, H. A. - 92, 359, 491 Brooke -723
765
766
ÍNDICE DE AUTORES
Brouwer, C. - 655, 656 Browne,L.E.-568,571 Brownlee, VV.lf.-64,310,568,583,584,637,638,712 Bruce,F.F.-658,695 Brunet, A M. - 330 Brunner, E. - 428, 429 Brunner,lf.-425,442,449 Bruno, A - 61,415,419,625 Bruston, Ch. - 158 Buber, B. - 58 Buber, M. - 311 Büchler, A - 359, 387 Buck, A de - 173,425 Budde, J. - 69, 158,233,252,261,262,266,274,292,299,306,411,418,420, 460,461,517,535,538,543,592,596,614,638,641 Budde, K. - 39, 61, 158,204,212,230,257,271,284,296,330,375,395,396, 410,415,453,506,514,518,520,535,538,554,559,589,600,626,637,681 Buess, E. - 122 Buhl, F. - 453, 458, 681 Buis, P. - 317 Buit, M. du - 240 Bulmerincq, Avon - 661, 663 Burchard, Chr. - 701 Burkitt, F. C. - 714, 715 Burney,Ch.F.-284 Burrows,M.-185,334,335,341,568,572,695 Buss, M. J. - 387, 589 Bussche, H. van den - 304, 330, 403 Buttenwieser, M. - 387, 453, 568 Buxtor, J. - 697 Buzy, D. - 415, 417, 418, 420, 436
c Caird, G. B. - 296 Cales, J. - 387 Calmet - 659 Cameron, D. - 661
ÍNDICE DE AUTORES
Campbell, E. F. - 290, 317 Camps, G. Ma. - 182 Cannawurf, E. - 523, 629 Cannon, VV. VV.-599,637,655 Capellus, L. - 521, 697 Caquot, A. - 136, 172,237,304,397,398,402,403 Cardascia, G. - 75 Carlier, A. - 316 Carlson, E. L. - 305, 625, 626 Carlson, R. A. - 296 Caspari, VV.- 186, 192,257,296,398,426,522,527,530,612 Cassin, E. - 669 Cassuto, U. - 157, 455, 640, 700 Castellino, G. - 353, 401 Castellio - 416 Castro, F. P. - 712 Causse, A. - 230, 353, 359, 375, 425, 545 Cavaletti, S. - 398 Cazelles, H. - 151, 186, 192,240,307,330,345,397,451, 535, 536, 551 Celso - 152 Chajjim, J. ben - 156, 596, 598, 711 Chapira - 550 Charles, R. H. - 665668 Chary, T. - 483 Chase, M. E. - 375 Châteillon - 416 Cheine, K. - 514 Chiera, E. - 428 Childs, B. S. - 122,551,621,624 Christian, V. - 345, 485 Churgin, P. - 712 Çig, M. -77 Clarke, A. G. - 387 Clere, J. de - 152 Clericus, J. - 152, 207 Closen, G. E. - 394, 401 Coehrane, J. S. - 631 Cohen, S. - 610
767
768
ÍNDICE DE AUTORES
Condamin, A - 61 Contenau, G. - 75 Cook, S. S. - 701 Cook, St. A- 289 Cooke, A - 568, 573, 583, 585 Cooke, G. - 397, 401 Coppas, B. A - 625, 626 Coppens,J.-353,395,398,403,518,523,537,671,727 Cornelius, F. - 90, 257 Cornill, C. H. - 38, 234, 266, 292, 296, 299, 404, 461, 483, 514, 548, 558, 568, 643 Cotter, G. - 674 Couroyer, B. - 98, 397, 450 Court, E. - 396 Cowley, A E. - 91,717 Cramer, K. - 542, 606 Cramer, M. - 375 Creager, H. L. - 403 Crim, K. R. - 359 Cripps, R. S. - 606, 610, 615 Crisóstomo - 232 Crook,M. B.-452,523,628 Cross, F. M. - 257, 260, 271, 334, 396, 397, 527, 550, 695, 700, 701 Culley, R. C. - 51 Cumming, Ch. G. - 353 Cumont, F. - 673 Curtis, E. L. - 327
D Dahl, G. - 230, 568 Dahood,M. J.-398,399,401,430,445,453,469,474,475, 727 Dahse, J. - 156,406 Daiches, S. - 404, 581 Dalglish, E. R. - 353, 398 Dalman, G. - 417 Danelius, E. - 288 Danell, G. A - 405, 608
ÍNDICE DE AUTORES
Dannel- 609 Daube, D. - 92, 289, 347 Daumas, F. - 484 David, M. - 78, 94, 282, 341, 561 Davies, G. H. - 122, 204 Deaver, G. R. - 396 Deden, D. - 589,620,624 Deissler, A. - 397, 404, 629 Deissmann, A. - 722 Delcop, M. - 637 Delcor, M. - 657, 658 Delekat, L. - 387, 389, 391, 712, 713 Delitzsch, F. - 147, 154, 155,473, 536, 582, 711, 727 DeU'Oca, E. C - 399, 400, 403 DeUa Vida, G. L. - 257 Delorme, J. - 575 Dennefeld, L. - 81, 461, 599 Dentan, R. C. - 75, 589 Dequeker, L. - 669, 671 Descamps, P. - 359 Dhorme, E. -196 Dhorme, P. - 458 Diamond, A. S. - 190 Diettrich, G. - 713 Dieu, L. - 714 Dijk, J. J. A. van - 353, 425, 427, 464 Dijkema, F. - 617 Dillmann, A. - 147, 155,217,271,453,459,514,714 Dinur, B. - 136 Diringer, D. - 695,700 Dobbie, R. - 230 Dõderlein - 528 Doderlein, J. Chr. - 528 Dold, A. - 714 Dommers, W. - 670 Doniach, N. S. - 345 Donner,ff.-81,315,447,514,695,699,700 Dorneseiff, F. - 230, 284, 353
769
770
ÍNDICE DE AUTORES
Dostal, W. - 173 Dotan, A. - 710 Draffkorn, A. E. - 172 Drijvers, P. - 387 Drioton, E. - 82, 450 Drioton, O. - 450 Driver, G. R. -78,87,91,156,164,301,353,396,397,403,415,449,460,608, 609, 727 Driver, S. R. - 38, 147,453 Duhm, B. - 306, 387, 453, 460, 483, 514, 517, 521, 522, 528, 531, 532, 533, 535, 542,543,548,551,556,589,590,593,601,602,637,641,660 Duhm, H. - 136 Dumermuth, F. - 182, 230 Dürr, L. - 95, 395, 396, 425, 442, 568, 581, 617 Dus, J. - 207, 273, 276, 301, 307, 582 Dussaud, R. - 83, 550, 571, 576
E Eaton, J. H. - 514, 517, 638 Eberharter, A. E. - 92, 681 Eberling, E. - 427 Ecker, R. - 714 Edelkoort, A. H. - 618, 619, 620 Edsman, C-Mo - 124 Edzard, D. O. - 87, 170, 171 Eerdmans, B. D. -156,387,453,669 Ehrentreu, E. - 695 Ehrlich, E. L. - 136 Eichhorn - 154,299,461,528 Eichrodt, W.- 159,230,555,568,573,583,599 Eilers, W. - 78 Eising, H. -170, 182 Eisler, R. - 396 Eissfeldt, O. - 33, 44, 51, 87, 118, 119, 120, 122, 135, 136, 143, 144, 151, 156, 157, 159, 174, 175, 177, 181, 185, 189, 194,209,215,218,220,228,236, 240, 242, 252, 254, 262, 266, 273, 292, 295, 196, 204, 212, 223, 252, 257, 271, 284, 295, 296, 299, 303, 313, 319, 323, 331, 333, 343, 344, 359, 365,
ÍNDICE DE AUTORES
771
367,377,396,398,400,401,402,403,404,405,411,414, 434, 435, 442, 449, 454, 460, 477, 483, 485, 522, 527, 530, 532, 533, 535, 536, 539, 543, 552, 554, 556, 558, 559, 560, 561, 565, 580, 582, 583, 590, 592, 594, 597, 601, 607, 611, 612, 615, 618, 619, 620, 627, 628, 629, 630, 639, 648, 657, 665,668,669,672,675 Eissfeldt, N. - 229 Eitan, 1.- 514 Elliger, K. - 92, 97, 100, 111, 136, 144, 147, 186, 194, 195,247,252,307,527, 536, 539, 541, 542, 543, 583, 589, 594, 625, 627, 632, 634, 641, 644, 652, 657, 658, 660 Elliot - 193, 199 Elliott-Binns, L. E. - 186 Elmslie, W. A. L. - 327 Emerton, J. A. - 230,672 Englert, D. M. C. - 713 Engnell, L - 33, 43, 46, 51, 52, 53, 92, 157, 160,308,332,361,390,394,465, 491,519,532,535,538,582 Erbt, W. - 345,418, 548 Erdmann - 156 Erman,J\.E.-64,68,85,353,425,449,484 Esra, L - 36, 65, 152 Eupôlemos - 722 Eusébio - 722 Ewald, H. G. A. - 38, 154, 155,410,411,415,531,659,660
F Fairman, H. W. - 82 Faley, R. J. - 257 Falk, Z. W. - 92 Falkenstein, A. - 77, 78,82,84,353 Farina, G. - 89 Farmer, W. R. - 583 Farndale, W. E. - 387 Fecht, G. - 68 Feigin, S. - 653, 658 Feinberg, Ch. L. - 353, 430, 453, 464, 656, 649 Feldmann, F. - 514
772
ÍNDICE DE AUTORES
Fensham, F. Ch. - 92, 97, 106, 190,277,286,288,317,396,397,400 Festugiêre, A. J. - 672 Feucht, Ch. - 92, 97, 186 Feuillet, A. - 359, 396, 415, 417, 621, 623, 672 Février, J. G.- 83, 196 Fey, R. - 507, 526 Fichtner, J. - 122,425,515,527 Field, F. - 715 Filo - 152, 682, 688, 722 Filóxeno - 719 Filson, F. V. - 681 Finegan, J. - 317, 568 Finkel, J. - 402 Fischel, H. A. - 533 Fischer - 536, 568, 573 Fischer, C. St. - 699 Fischer, J. - 514, 535 Fischer, L. R. - 257 Fish, T. - 427 Fitchtner - 434 Flõckner, c.- 410 Fohrer, G. - 30, 31, 33, 34, 43, 46, 52, 57, 61, 66, 67, 69, 92, 94, 97, 106, 107, 135, 159, 161, 166, 167, 170, 177, 186, 222, 227, 243, 257, 261, 303, 311, 319, 425, 432, 440, 447, 453, 455, 456, 459, 461, 467, 483, 491, 493, 503, 505, 507, 508, 514, 517, 518, 521, 523, 524, 526, 527, 528, 533, 542, 549, 555, 568, 569, 574, 580, 590, 599, 600, 607, 618, 621, 625, 631, 637, 643, 646,650,655,661, 717, 727 Fosbroke,H.E. VV.-589 Foster, F. H. - 463 Foster, R. S. - 582 Fraine, J. de - 46, 182,284,327,341,402 Franken, H. J. - 387 Frankenberg, VV.-293,445 Frankfort, H. e H. A. - 46, 75 Free, J. P. - 173 Freedman,[).~.-33,61,257,260,580,317,330,396,550,580,695
Frey, H. - 589, 594, 651 Freydank, H. - 80
ÍNDICE DE AUTORES
773
Friedrich, J. - 80 Fries, K. - 463 Fritsch, Ch. Th. - 445, 447 Frost, St. B. - 396, 572 Fucht-194 Fullerton, K. - 397, 453, 457, 458, 460, 514 Fuss, W. - 307
G Gábor, L - 61 Gadd, C. J. - 665 Galdos, R. - 398 Gall, A. von - 665, 668, 712 Galling, K. - 100, 111, 147, 230, 237, 240, 243, 319, 321, 327, 330, 331, 333, 335,336,469,472,475,477,521,568,646,647,649,651,652,70O Galling, K. - 46 Gamaliel - 717 Gan, M. - 345 Garber, P. L. - 318 Gardiner, A. H. - 86, 89 Garelli, P. - 84 Garrett, J. - 582 Gaspar, J. W. - 445 Gaster, Th. H. - 75, 345, 348, 425, 581, 614, 640 Gebhardt, C. - 415, 419 Geddes, A. - 154 Gehman, H. G. - 93 Gehman, H. S. - 722 Gelb, L J. - 695 Gelderen, C. van - 589 Gellin, A. - 387, 548, 558 Gemser,B.-174,359,429,445,448,450,491 George, A. - 276 Gerhardsson, B. - 51 Gerleman,G.-289,341,343,345,375,379,415,419,421,583,643,645,713 Gerstenberger, E. - 93, 97, 491, 501, 555 Gertner, M. - 596, 695
774
ÍNDICE DE AUTORES
Gese,fI.-75,93,97, 136,304,425,428,445,453,464,476,583,606 Gevirtz, St. - 61, 93, 97 Giblin, Ch. H. - 280, 533 Giesebrecht,F.-387,458,514,548,558,584 Ginsberg, n. L. - 87, 333, 469, 470, 471, 474, 518, 533, 550, 589, 596, 665,675 Ginsburg, Ch. D. - 695 Ginsburger, M. - 712 Gispen, W. H. - 589 Glahn, L. - 66, 528, 542 Glanzman, G. S. - 341 Glaser, O. - 288 Glaue, P. - 717 Gleave, H. C. - 714 Glombitza, O. - 401, 402, 405 Godbey, A. H. - 434 Goedicke, H - 75, 86 Goettsberger, J. - 327, 665, 675 Goetze, A. - 78, 85, 90, 91, 485 Goff, B. L. - 204 Goitein, S. D. - 621624 Goldberg, L. - 717 Goldmann, M. D. - 549, 558 Golénischeff, W. S. - 64, 86 González, A. - 400, 401 Good, E. M. - 93 Goossens, E. - 393 Gordis, R. - 415, 421, 425, 469, 473, 474, 589, 592, 606, 615, 616 Gordon, C. n. - 33, 46, 64, 83, 87, 91, 95,172,174,240,401,474,475,518,596 Gordon, E. I. - 425, 427 Goshen-Gottstein, M. H. - 695,710,713 Goslinga, C. J. - 296, 303, 309, 330 Côssmann, F. - 84 Gõttsberger, J. - 581 Gottwald, N. K. - 410, 411, 413, 518 Graetz, H. - 475 Graf, G. - 714 Graf, K. H. - 38
ÍNDICE DE AUTORES
775
Graham, W. c. - 633 Granild - 551, 552 Grant, E. -111 Grapow, H. - 64, 68, 86, 89 Gray, G. B. - 61, 66, 147,453,514 Gray, J. - 46, 87, 123, 619 Greenberg,~.-156, 172, 173,582 Greiff, A. - 116 Grelot, P. - 247, 400, 545, 712 Gressmann, H. - 39, 41, 123, 143, 147, 160, 170, 177,230,233,271,284,296, 300, 312, 341, 359, 425, 439, 449, 491, 496, 528, 535, 538, 542, 551, 589, 591,592,672 Grether, O. - 286, 289 Grill, S. - 247, 400 Grimm, H. - 473 Grimme - 473 Grintz, J. M. - 277 Grollenberg, L. - 401 Groot, J. de - 181 Grosheide, H. H. - 330 Gross, K. - 566 Grossouw, W. K. M. - 714 Cruenthaner.M, J. - 665 Grzegorzewski, K. - 353 Gualandi, D. - 395 Guilding, A. - 389 Guillaume, A. - 62, 483, 520 Guitton, J. - 415 Gunkel, H. - 33,39,41,54,94, 122, 123,132, 143, 147, 160, 170,204,226, 250,291,312,319,321,341,342,343,345,347,359,360,362,365,376, 387,405,439,483,493,494,496,522,536,551, 592,630,633,672 Gunkel, N. - 551 Gunneweg, A. H. J. - 51, 53, 93, 95, 96, 506, 608 Gurewicz, S. B. - 240 Gurney, O. R. - 78, 85 Güterbock, H. G. - 83, 90 Guthrie, H. H. - 582 Gyllenberg, R. - 389
776
ÍNDICE DE AUTORES
H ffaag,ff.-533,568 Haase, R. - 80 Hadassi, J. - 697 Haefelí, L. - 713 Hahn, H. F. - 33 ffaldar, A. - 48, 483, 631632, 635, 636 ffaller, E. - 319, 342, 345, 418, 484, 536, 621, 668 Haller, M. -181, 327, 341, 345, 359, 409, 415, 527, 530, 589, 665, 671 ffallo, W. W. - 55, 520 ffallock, F. L. - 714 Hammershaimb, E. - 91, 518, 606, 625, 631 ffanel, J. - 327, 330, 713 Hanhart, R. - 317,674,713 Happel, O. - 631, 633, 641 ffaran,M.-136,247,255,271,277,282,531,528 Hardy, E. R. - 403 Harford, J. B. - 568, 572 Harland, J. P. - 181 Harms, K. - 491 Harnack, A. von - 35,666 Harper, W. R. - 589 ffarvey,J.-491,504 Hassler, C. D. - 393 ffaupt,P.-345,347,394,396,400,415,473,475 Hauret, Ch. - 295, 387 Hausen - 670 Haussíg, H. W. - 75 Hayatt - 538 Heathcote, A. W. - 317 Heaton, E. W. - 527 Heermann - 592, 593 ffegel- 38 Hehn, J. - 181 Heídel, A. - 84, 123 Heíler, F. - 483 Heinemann, G. - 93, 97
ÍNDICE DE AUTORES
777
Heinemann, H. - 401 Heinisch, P. - 147, 189,568 Hellbardt, H. - 204 Heller, Ch. - 713 Heller, J. - 321 Hempel, J. - 40, 46, 51, 53, 58, 93, 101, 103, 106, 123, 143,230,232,239,244, 247, 253, 266, 358, 395, 435, 442, 453, 483, 491, 493, 494, 496, 535, 578, 582,712 Hengstenberg, E. W. - 38 Henry, M. L. - 204 Hentschke, R. - 93, 98,483 Herbert, A. S. - 51, 434 Herder, J. G. - 37, 415, 417, 420,655 Hermann,J\.-89,353,379,579,589 Herntrich, V. - 568, 572 Heródoto - 644 Herrmann, J. - 234 Herrmann, W. - 119,240,375 Hertzberg, H. W. - 257, 271, 284, 286, 296, 318, 341, 469, 472, 473, 475, 491, 533,548,558,566,651 Herz, J. - 453 Heschel, A. J. - 483 Hesíquio - 722, 724 Hesse, F. - 70, 116, 120,394,491,504,613,646,681 Hessen, J. - 483 Hessler, E. - 528, 538 Hillel- 718 Hitzig, F. - 415, 469, 548, 589, 665 Hobbes, T. - 37152, 232 Hofbauer, J. - 401 Hoffmann, H. W. - 30 Hoftijzer, J. - 170, 196 Hõhne, E. - 581 Holladay, W. L. - 548, 557 Holm-Nielsen, S. - 387, 397, 403, 405 Hõlscher,G.-61,64,68, 137, 159,204,211,217,220,221,230,233,244,266, 273, 276, 284, 297, 299, 312, 313, 334, 335, 453, 460, 461, 483, 491, 493, 496,514,531,535,543,568,578,591,592,665,668,675,681
778
ÍNDICE DE AUTORES
Holstijn, W. - 464 Holtzmann, O. - 661 Holwerda, B. - 613 Holzinger, H. - 147, 151, 159,284,297,312,599 Holzmann - 663 Hommel, H. - 405 Honeyman, A. M. - 399 Hooke, S. H. - 46, 82, 84, 208 Hoonacker, A. vam - 665 Hornig, B. - 116 Hornig, G. - 33 Horst, F. - 61, 93, 106,205, 230, 239, 244, 317, 376, 379, 404, 453, 491, 502, 548,550,568,581,589,614,632,633,634,636,641,644,652,657,681 Hort, G. - 182 Hoschander, J. - 345 Hospers, J. H. - 230 Hotten, H. - 91 Howie, C. G. - 568, 573 Hueso, V. V. - 396 Huijser, Ph. J. - 116 Hulsbosch, A. - 446 Hulst, A. R. - 230, 250 Humbert, P. - 151,207,247,250,252,341,403,425,446,463,477,589,592, 596,597,631,632,633,635,637,639,641,642 Hupfeld, H. - 33, 155 Hurd, H. P. - 353 Hvidberg, FI. - 207, 250 Hyatt, J. Ph. - 538, 548, 550, 551, 552, 558, 613, 629, 643, 644 Hylander, I. - 297, 308 Hylmõ, G. - 521
I Ibscher, H. - 695 Ilgen - 154 Illyricus, F. - 697 Irwin, W. A. - 311, 447, 453, 458, 461, 519, 568, 572, 578, 638, 640 Ismael, S. ben - 712
ÍNDICE DE AUTORES
779
Iversen, E. - 234 Iwri, S. - 400
J [acob, B. - 156 [acob, E. - 87, 137, 483, 589, 596 [acob, G. - 417 Jacobsen, Th.-75,84,87 Jahnow, H. - 376 Jahnow, J. - 413 [ames, E. O. - 75 [ames, F. - 646, 655 Jampel, S. - 345 Jansma, T. - 655 [aritz, K. - 257 [aspers, K. - 584 Jastrow, M. [r. - 453 Jean, F. Ch. - 428 Jefferson, H. G. - 402, 403, 546 Jefferson, H. H. - 400 Ieffery, A. - 665 Jellicoe, S. - 713 [enni, E. - 271, 284, 297, 312, 483, 491, 519, 530 Jennings, F. Ch. - 514 Jensen - 348, 605 Jensen, K. - 599 Jensen, P. - 345 Jepsen,J\.-93, 106, 137, 170, 186, 192,204,211,253,266,312,314,317,335, 341, 342, 402, 421, 453, 515, 599, 602, 605, 625, 630, 649, 652, 655, 657, 665,681,727 Jeremias, J. - 583, 625 Jerônimo - 232, 328, 591, 666, 693, 722, 724, 725 [espen -139 Jirku, A. - 46, 87, 93, 230, 353, 389, 699 Johnson - 722 [ohnson, A. R. - 46, 359, 434, 483, 624 [ohnson, N. B. - 116 [ohnston, J. - 427
780
ÍNDICE DE AUTORES
Iolles. A. - 75 [ones, D. - 514, 517, 655, 657 [osefo - 68, 152,416,667,682,684,689,690, 722 [oüon, P. - 394, 401 [ozaki, S. - 573, 606 Jung, c. G. - 453 [unge, E. - 244 Junker,fI.-82, 147, 181,319,395,398,400,464,518,523,582,589,594,613, 614,633,665,669,727
K Kadman, L. - 700 Kahle, P. - 123,376,381,695,698,708,709,711,712,713,716,717, 719, 720, 721 Kaiser, O. - 82, 170, 172,402,514,523,535,538 Kallai-Kleinmann, Z. - 271, 282 Kallen, n. M. - 463 Kalt, E. - 458 Kaminka, A. - 401 Kammenhuber - 90 Kapelrud, A. S. - 87, 307, 330, 334, 491, 528,600,602,605,606,608,609,615, 616,625,631,670,672 Kardimon, S. - 172 Karlstadt - 37, 152 Kase, E. H. - 722 Kasser, R. - 714 Kat - 459 Katz, P. - 681, 696, 713 Katzenstein, H. J. - 335 Kaufmann, Y. - 156,247,271,289 Kautzsch, E. - 39, 159,538 Kautzsch, K. K. - 455 Kázmér, J. - 425 Keil- 411 Keil, C. F. - 410 Keil, K. F. - 38 Keller, C. A. - 123, 170,208,250,271,319,525
ÍNDICE DE AUTORES
781
Kellermann, D. - 83 Kelso, J. L. - 582 Kennedy, J. - 727 Kennicott, B. - 696, 698 Kenyon,F.G.-696,714,722 Kessler, H. - 387 Kessler, W. - 93, 521, 542 Keunen -155 Kevin, R. O. - 450 Kilian, R. - 93, 186, 194, 199 Kilpatrick, G. D. - 722 King, L. W. - 88 Kipper, B. - 186 Kissane - 360, 387,403,453,461,514 Kittel, H.-J. - 93 Kittel, R. - 33, 95, 137, 266, 284, 292, 297, 312, 327, 333, 387, 514, 530, 533, 531,535 Kiuan - 97 Kizilyay, H. - 77 Klaehn, Th. - 297 Kleinert, P. - 469, 631 Klengel, H. - 173 Klima, J. - 77 Kline - 233 Klopfer, R. - 257 Klostermann,J\.- 156, 186, 193,258,296,306,312,333,584 Knierim, R. - 177 Knudtzon, J. A - 91 Koch,K.-33, 111, 186,200,247,445,448,582,665 Kõhler - 66, 365,466, 491, 496, 528 Kohler, J. - 78 Kohler, L. - 59, 66, 93, 365, 396, 518, 520, 528, 607 Komlós, O. - 621, 623 Kõnig - 155,233,461,473,475,535,542 Kõnig, E. - 38, 61, 147, 151,230,387,453,473,514,681 Kõnig, F. - 599 Koole, J. L. - 395 Koopmans, J. J. - 395
782
ÍNDICE DE AUTORES
Komfeld, W. - 186, 196,318,619 Korosec, V. - 75, 79, 80, 81 Koschaker, P. - 78 Kosmala, H. - 99, 181 Kossen, H. B. - 671 Kraeling, E. G. H. - 39, 91, 288, 453, 455, 457, 461, 518, 658, 669, 672 Kraetzschmar, R. - 93, 568, 579 Kraft, Ch. F. - 61 Kramer,S.-75,77,84,353,425,427,442,464 Kratzchmar - 584 Kraus-360, 363, 387, 390, 394, 396,409,412,414,447, 561, 671 Kraus, F. R. - 75, 87 Kraus,H.J.-33,123,276,286,359,404,491,558 Krauss, S. - 715 Kremer, J. - 658 Kremers, H. - 562 Krinetzki, L. - 395, 397, 398, 403, 415, 417 Kritzinger, H. J. - 600 Kroeber, R. - 469, 476 Kroeze, J. H. - 453, 461, 582 Kruse,H.-395,398,403,665,669 Küchler, F. - 111 Küchler, S. - 186 Kuenen, A. - 38, 156, 216, 530, 531, 657 Kuhl, C. - 95, 143,382,415,416,453,459,568,573,587,596 Kuhn, G. - 400, 415, 445, 469 Külling, S. R. - 247 Kupper, J. R. - 485 Kuschke, A. - 255, 464, 520, 559 Kutal, B. -599, 605, 606, 618, 620 Kutsch, E. - 169, 197,289,304,600 Kuyper, L. J. - 459
L L'Hour, J. - 186,230,280 Labat, R. - 81, 85 Lacheman,E. L.-643,644
ÍNDICE DE AUTORES
Lachmann, J. - 637 Lack, R. - 257 Lacocque, A. - 415 Laessoe, J. - 51, 85, 126 Laetsch, Hh. - 589, 605, 661 Lagarde, P. de - 345, 348, 696, 698, 712, 720, 721 Lagrange, A. - 671 Lake, H. K. - 723 Lamarche, P. - 655, 656 Lambert, G. - 427, 464, 671 Lambert, M. - 77 Lambert, W. G. - 85, 126, 173,353,389,425,464 Lamparter, H. - 632 Lanczkowski, G. - 86, 303, 484 Lande, I. - 106, 116 Lande, J. - 111 Landersdorfer, S. - 312 Landsberger, B. - 97 Landsberger, F. - 415 Langdon, St. - 82, 85 Langhe, R. de - 64, 84, 87, 360 Langton, E.- 712 Lapp, P. W. - 700 Laroche, E. - 91 Lassalle, St. - 657 Lauha, A. - 260, 359, 551 Lauterburg - 641 Lee -719 Leeseberg,M. W.-330 Lefêvre, A. - 335 Lehmann, M. R. - 251 Lehming, S. - 181, 182,607,610 Leimbach, H. A. - 296 Leimdõrfer, D. - 475 Leipoldt, J. - 681 Lemp, W. - 558 Leovy, J. G. - 93 Lerch, D. - 416
783
784
ÍNDICE DE AUTORES
Leslie, E. A. - 387, 548 Lessing - 232 Leveen, J. - 395 Levita, E. - 684, 697 Levy,L.-156,235,348,469,471 Levy, S. - 85 Levvy,I.- 156, 182, 190 Lewy, J. - 317, 345 Ley, J. - 61, 653 Liebreich, L. J. - 334, 397, 405, 514, 517, 519, 520, 715 Liebschütz, N. - 400 Lindblom, J. - 33, 111, 124, 398, 425, 441, 454, 455, 460, 483, 484, 491, 493, 496,504,518,520,521,522,536,554,589,592,625,636 Linder, J. - 665, 666 Linder, S. - 417 Lindhagen, C. - 533, 538 Lippl, J. - 589, 626 Lipschütz, L. - 710 Littmann, E. - 376, 417, 542, 543 Liver, J. - 156, 277 Lods, A. - 39, 51, 111, 151,485,535,631,632,681 Loehr, M. - 296 L6fgren, O. - 714 Lofthouse, F. - 491, 537 Lüher,M.-374,410 Lohfink, N. - 93, 230, 235, 237, 257, 280, 594, 598 Lohmann,P.-376,521 Lõhr - 157, 185,230,233,247,312 Lohr, I. - 404 Lohr, M. - 157 Lühr,M.-395,409,458,461 Loretz, O. - 341, 476, 477, 514, 621, 623 Louis, C. J. - 395 Lõwinger, D. S. - 669, 710 Lowth, R. - 37, 61, 63, 65 Lubliner, M. - 568 Luciano - 722, 724, 725 Lüddeckens, E. - 376, 381
ÍNDICE DE AUTORES
Ludwig, O. - 521 Lund, N. W. - 637 Lutero - 37, 350, 388, 391, 497, 600, 683, 693, 711 Luther, B. - 204, 247, 330 Lyon, D. G. - 699
M Maag, V. - 75, 174,204,230,353,607,615 Maarsingh, B. - 230 Maass, F. - 491 Macartney, C. E. - 439 MacCormack, J. - 608 MacCown, Ch. C. - 701 MacDonald, D. B. -156, 692 Macho, A. D. - 712 Mackay, C. - 582 Mackenzie, R. A. F. - 125,459 MacLaurin, E. C. B. - 284, 297, 312 MacNeile, A. H. - 469~ Macqueen, J. G. - 86 Madsen, A. A. - 327 Magne,J.-396,397 Maier, J. - 169,.271,297,370,632 Maier, W. A. - 631 Mailland, A. - 522 Mairnônides - 710 MaisIer, B. - 137 MaIarnat,A.-90,136,271,288,289,307,485,550,559,658 MaIy, E. H. - 208, 291 Mand, F. - 359 MandeI, S. - 700 ManIey, G. Th. - 230 Manson, Th. W. - 673, 723 Mansoor,M.-696 Marcus, R. - 374 MargaIioth, R. - 529 Margoliouth, D. S. - 463
785
786
ÍNDICE DE AUTORES
Margolis - 720 Marks, J. H. -715 Marmorstein, A. - 712 Marschall, G. - 370 Marsh, J. - 147, 628 Marti, K. - 514, 521, 531, 589, 595, 601, 649, 656, 659, 665, 668 Martin, M. - 696 Martin-Achard, R. - 257, 396, 558 Marty, J. - 116 Masius -152 Mat, L.A. - 397 Matous, L. - 428 Matthews, L G. - 568, 572 Mauchline, J. - 589 May,fI.G.-389,537,548,550,552,568,572,578,580,581,582,592,650 Mazar, B. - 336, 701 McCarthy, D. J. - 93, 103, 105 McCullough, W. St. - 387, 542, 543, 607 McKenzie, J. L. - 123, 181, 207, 304, 589 Mc1ean -723 Medico, H. E. Del - 403, 257 Meek, Th.J.-97,354,409,415,418,528 Meer, P. van der - 317 Meier, G. - 82 Meinhold, J. - 39, 159,204,257,425,523,665,668 Meir - 273 Meissner, B. - 64, 68, 348, 428, 430 Melamed, E. Z. - 61 Melkman, J. - 669 Mendelsohn, L. - 308 Mendenhall, G. E. - 93, 103 Menes,A.-186,192,230 Mensching, G. - 681 Mercati, G. - 714 Mercer, S. A. B. - 714 Merkel, H. - 410 Merwe, B. J. vand er - 528 Merx, E. O. A. - 191, 600
ÍNDICE DE AUTORES
Messel, N. - 568, 571 Metzger, M. - 207 Meuli, K. - 439 Meyer,E.-89,204,274 Meyer,R.-258,262,274,318,670,696 Meyers - 342 Meysing, J. - 404 Mezzacasa, F. - 330 Michaéli, F. - 681 Michaelis, J. D. - 36 Michaud, H. - 554 Michel, D. - 365, 387 Micklem, N. - 147 Mihelic, J. L. - 557, 631, 636 Mildenberger, F. - 297 Milgrom, J. - 515, 555 Milik, J. T. - 336, 670, 695, 700 Miller, A. - 415, 469, 556, 568, 587 Miller, J. W. - 549 Milles, J. C. - 78 Milne, H. J. M. - 723 Misch, G. - 137 Mitchell, H. G. - 589 Moe, O. - 673 Môhle, A. - 715 Mõhlenbrink, K. - 272, 302, 336, 651 Molin, G. - 315 Müller, H. - 61, 387, 454 Müller, W. - 156, 665, 666 Monier-Cardascia-Imbert - 75 Montet, P. - 450 Montgomery,J.J\.-61,312,665,668,675,720 Moore, G. F. - 284, 714 Mopsuéstia, T. de - 416 Moran, W.L.-230,257,258,598 Morawe, G. - 375 Morenz,S.-518,681 Moret, A. - 82
787
788
ÍNDICE DE AUTORES
Morgans, G. C. - 549 Morgenstern, J. - 159, 186, 191, 192,212,250,303,365,395,396,398,401, 403,404,528,530,534,545,546,607,611,617,673 Morris, A. E. - 345 Morstad, E. - 235 Moscati, S. - 75,90 Mowinckel, S. - 51, 53, 61, 63, 65, 87,93, 100, 106, 123, 132, 137, 157, 161, 166, 167, 170, 185, 186, 195, 204, 211, 212,215, 260, 272, 273, 274, 275, 276, 278, 282, 283, 304, 310, 317, 330, 334, 335, 359, 360, 365, 367, 370, 390, 391, 395, 400, 438, 483, 491,506, 514, 517, 518, 528, 531, 535, 536, 538,539,549,556,561,592,640,673 Muilenburg, J. - 34, 58, 61, 398, 492, 514, 522, 527, 538,673 Mulder, E. S. - 521, 522 Müller, H.-P. - 182,396,518,523 Müller, W. M. - 354 Munch,P.J\.-374,397,398,400 Murphy,R.E.-360,400,415,425 Murtonen, A. - 608 Musil, G. - 417 Myers - 605 Myers, J. - 341 Myers, J. M. - 230,284,600 Myres, J. L. - 318, 583
N Nagel, G. - 403 Naphtali, B. - 709, 710 Napier, B. D. - 319 Naveh, J. - 116, 700 Neher, A. - 549, 607, 615 Nelis, J. T. - 665 Nestle, E. - 232, 289, 600, 714 Neufeld, E. - 80 Newman, M. - 311 Nichols, H. - 461 Nicolau de Lyra - 36 Nicolsky, N. - 360, 370
ÍNDICE DE AUTORES
789
Nieboer, E. W. - 250 Nielsen, E. - 52, 53, 54, 290, 301, 637, 639, 641 Nober, P. - 401 North, C. R. - 46, 52, 151,527,533,541 North, F. - 559 North, F. S. - 653, 727 North, R. - 330 Noth, M. - 40, 43, 46, 93, 103, 107, 132, 137, 138, 147, 160, 161, 166, 167, 170, 171, 175, 179, 180, 182, 186, 192, 195, 197, 205, 211, 216, 220, 221, 230, 233, 235, 245, 252, 263, 266, 267, 271, 272, 273, 274, 276, 282, 284, 286, 295, 297, 300, 303, 304, 308, 312, 314, 330, 331, 333, 334, 336, 338, 425, 485, 581, 665, 671 Nõtscher, F. - 473, 548, 552, 641 Nougayrol, J. - 81, 91, 427, 464 Nowack, W. - 93, 186,284,296,341,445,469,589,595,601, 618, 628, 634 Nübel, H.-U. - 297,301 Nyberg,H. 5.-52,54, 182,533,536,589
o O'Cal1aghan, R. T. - 354, 401 O'Connel, M. J. - 93 O'Doherty, E. - 293 Obermann, J. - 87, 374, 521, 672 Odeberg, H. - 542 Oesterley, W. O. E. - 354, 387, 425, 450, 568 Oesterley-Robinson - 602, 633, 641, 644, 657 Oestreicher, Th. - 230,233 Oettli, 5. -147,271, 284, 289, 327, 341, 344, 345, 410, 415 Ohly, F. - 416 Olávarri, E. - 618 Olmstead, A. T. E. - 523 Olshausen, J. - 387, 698 Oppenheim, A. L. - 75 Orelli, C. von - 155,514,548,568,589,618 Orígenes - 152, 328, 716, 721, 722, 725 Orlinsky, H. M. - 523, 714, 720 Ortmann, H. - 230, 558
790
ÍNDICE DE AUTORES
Osswald, E. - 491, 607, 672 Ôstborn, G. - 111,589,597,681 Otten, H. - 75, 80, 83, 86, 90, 354 Otto, E. - 84, 89, 90, 426, 429, 442, 464 Otzen, B. - 655, 657 Oudenrijn, M. A. van den - 415
p Paffrath, Th. - 409 Pákozdy,L.M.-185,528,555 Pânfilo - 722 Pap, L. 1.-365 Parente, P. P. - 416 Paret, O. - 696 Parker, N. H. - 402 Parker, P. - 673 Parker, R. A. - 89 Parrot, A. - 318 Parzen, H. - 323 Paterson, J. - 387, 426 Paton, L. B. - 230, 345 Patton, J. H. - 64, 354 Pautrel, R. - 395, 399, 400, 405 Pax, E. - 360, 397 Payne, E. A. - 551 Payne, J. B. - 714 Pedersen, J. - 93, 103, 107, 157, 161, 166,469,486 Peiser, F. E. - 78 Pereira - 152 Perlitt - 34, 38 Peter, H. - 122 Peters - 458 Peters, C. - 713 Peters, N. - 387, 453 Petschow, H. - 78 Petuchowski, J. J. - 93, 182 Peyrêre, L de La - 152
ÍNDICE DE AUTORES
791
Pfeiffer, R. H. - 99, 143, 159, 186, 191,260,292,297,347,349,350,430,455, 463,543,558,559,560,573,584,593,629,632,633,661,662,719 Pfleiderer - 477 Piatti, T. - 61, 66, 289 Pieper, M. - 85 Pirenne, J. - 75 Pirot, J. - 434 Plath, M. - 600 Plautz, W. - 103 Pleiderer, E. - 477 Pleissis, J. - 583 Plínio - 485 Ploeg, J. van der - 52, 93, 396, 398, 445, 469, 535 Plõger, O. - 116, 297, 312, 521, 522, 600, 602, 655, 660, 665, 666, 673, 677, 701 Podechard, E. - 387, 400, 401, 469, 472, 473 Pohl, A. - 173 Policarpo - 719 Pollard, W. G. -143 Pollock, P. H. - 404 Pope,M.H.-523,576,672 Porfírio - 666, 668 Porteous, N. W. - 665, 673 Porter, J. R. - 405, 435 Porúbcan, St. - 404, 528 Posener, G. - 429 Posselt, W. - 461 Pouget, G. S. - 415, 419 Power, A. D. - 445 Power, E. - 520 Pratensis, F. - 711 Preiser, W. - 93 Press, P. - 651 Press, R. - 111, 297, 360, 394, 398, 537 Preuss, H. D. - 389 Prijs, J. - 714 Prijs, L. - 61 Pritchard, J. B. - 700
792
ÍNDICE DE AUTORES
Procksch,().-147, 159,213,216,259,310,317,514,517,520,521,531,581, 585,714 Puukko, A. F. - 230, 236, 370, 398, 551
Q Quell, G. - 93, 360, 382,491,520
R Rabast, K - 93, 98, 100, 156, 186 Rabenau, K von - 568, 577, 580 Rabin, Ch. - 696 Rad, G. von - 93, 116, 137, 147, 159, 161, 167, 170, 186, 200, 205, 231, 241, 247,252,330,360,336,338,339,426,433,441,459,491,523,527,557,586 Rahlfs, A. von - 713, 714, 717, 720, 723 Rahmani, L. - 700 Ranke, H. - 64, 68 Ranke, R. - 484 Rankin, O. S. - 426, 469 Ranston, H. - 445, 469, 477 Ratschow, K-H. - 398 Reanud, B. - 523 Rebt, W. - 418 Régnier, M. A. - 458 Rehm,M.-334,658 Reicke - 630 Reider, J. - 727 Reifenberg, A. - 700 Reike, B. - 630 Reiner, E. - 82 Reiser, W. - 321 Reisner, G. A. - 699 Remboy, J. G. - 583 Renan,E.-473 Renaud,B.-625,628 Rendtorff, K G. - 257 Rendtorf~R.-lll, 137, 186,208,247,396,483,491,497,528,549
ÍNDICE DE AUTORES
793
Resch, A. - 137 Reuchlin, J. - 36 Reuss - ISS, 192,242 Reventlovv,fI.(;.-93, 186, 194, 199,484,549,550,557,565,569,586,607, 609 Rhodes, A. B. - 671 Rhodokanakis, N. - 454, 457 Ricciotti, G - 410, 411, 415, 417 Richter,(;.-181,286,289,291,466 Richter, H. - 454 Richter, W. - 60, 137, 284, 286 Ridderbos, J. - 365, 387, 461, 656 Ridderbos, N. H. - 137,250,360,370,389,396,397,398,461,484 Riderbos, R. - 656 Rieger, J. - 589, 607 Riehm, E. K. A. - 38, 155,233 Riemschneider, K. K. - 80 Rignell, L. G - 517, 518, 528, 533, 650, 653 Rinaldi, C. M. - 410, 411, 599 Ringgren,fI.-52,124,345,348,378,387,400,415,426,445 Rivera, L. F. - 397 Riveto - 37 Robert,J\.-359,388,394,404,415,417,446,552,569 Robert, R. - 394 Roberts, B. J. - 696, 720 Roberts, C. n. -722 Robertson, E. - 111, 156, 189,284,311,517,717,727 Robinson - 233, 354, 514, 601, 602, 603, 615, 619, 620, 626, 627, 632 Robinson, O. W. B. - 231 Robinson, H. Wh. - 46, 376, 681 Robinson, Th.fI.-61,69,204,484,506,509,549,589,590,593,594,618,64O Roeder, G - 82 Rohland, E. - 492 Roiffer, A. - 401 Roller, O. - 91 Rollig, W. - 81, 695, 699, 700 Rosenmüller - 698 Rosenzweig, F. - 58
794
ÍNDICE DE AUTORES
Ross, J. F. - 492 Rossi, De - 698 Rossi, G. B. de - 696 Rost, L. - 29, 30, 44, 123, 161, 167, 171, 174, 192, 193,200,202,211,221,226, 232, 242, 243, 250, 255, 260, 262, 292, 297, 300, 305, 333, 520, 554, 559, 560, 561, 590, 592, 594, 602, 614, 615, 619, 622, 624, 628, 629, 635, 651, 673,681 Roth, J. - 247 Roth, W. M. W. - 436 Rothenberg, B. - 317 Rothmüller, C. - 696 Rothstein, J. W. - 61, 327, 336, 400, 637, 638, 641, 646, 647, 648, 650 Roussel, L. - 271 Rowley, H. H. - 34, 93, 257, 317, 319, 334, 341, 394, 398, 403, 415, 418, 454, 455, 469, 484, 536, 550, 551, 552, 569, 573, 589, 608, 666, 668, 669, 674, 675,714 Rowton, M. B. - 550 Rozelaar, M. - 257, 260 Rudolf - 215 Rudolph, W. - 67, 93, 111, 157, 177, 213, 215, 258, 318, 327, 330, 333, 334, 336,341,344,345,409,411,413,414,415,417,420,421, 520, 521, 522, 535,548,551,552,554,556,558,560,564,592,618,619 Rüger, H. P. - 583 Rundgren, F. - 421 Rüthy, A. E. - 653 Rylaarsdam, J. C. - 260, 426 Ryssel, V. - 147, 327, 345
s Sabourin, L. - 360 Saebe, M. - 524 Saggs, H. W. F. - 91, 581 Sainte Fare Garnot, J. S. F. - 429 San Nicolõ, M. S. - 78 Sanders - 722 Sanders, G. B. - 669 Sanders, J. A. - 389
ÍNDICE DE AUTORES
795
Sant, C. - 616 Sarna,~.11.-402,454,455
Sauber, R. - 94 Sauer,().-210,360,426,430,436,445,451 Savignac, J. de - 151,403,447 Saydon,P.P.-276,564 Scarpat, G. - 715 Schaeder,lf.lf.-330,333,334 Schãfer, K. Rh - 89, 714 Schâfers, J. - 714 Scharbert, J. - 537 Scharf, A. 11. - 399 Schedl, C. - 317, 395, 398, 399, 403 Schelhaas, J. - 303, 519 Schildenberger, J. - 181,345,400,623, 715, 727 Schmid, R. - 83 Schmidt, n. - 94, 106, 107, 123, 137, 207, 231, 234, 250, 257, 260, 318, 360, 361, 365, 367, 369, 387, 398, 404, 410, 434, 435, 514, 548, 561, 568, 573, 589, 590, 592, 593, 599, 607, 616, 621, 623, 628, 632, 634, 637, 639, 651, 652,722 Schmidt, J. - 66 Schmidt, 11. A. - 569 Schmidt, W. - 607 Schmidtke, F. - 87 Schmitt, E. - 445, 454 Schmitt, G. - 272 Schmokel,lf.-46,54, 75, 77,84,94,205,354,378,415,418 Schneider, B. - 345 Schneider, H. - 327 Schoff, W. H - 583 Schofield, N, - 551 Schoneveld, J. - 341 Schott, A. - 85 Schott, S. - 84, 85, 354 Schrader, E. - 155, 158 Schreiden, J. - 318 Schreiner, J. - 623 Schrey,lf.lf.-34
796
ÍNDICE DE AUTORES
Schrõder, O. - 396 Sehult, H. - 318 Sehultz, W. - 290 Sehultze, H. - 205 Schulz,J\.-58,271,284, 296, 341 Sehulz, S. - 34, 182 Sehunek, K. D. - 272, 284, 297, 301 Sehürer, E. - 722 Sehwally, F. - 549, 560, 643 Seott - 496 Scott, R. B. Y. - 389, 431, 447, 496, 514, 521, 523 Seale, M. S. - 289 Seebass,H.-171,172,307 Seeligmann, I. L. - 123, 137, 143,696 Segal, M. H. - 156,231,415 Segert - 68, 69 Segert, Sr. - 61 Segert, St. - 34, 341 Seidl, E. - 75 Seierstad, I. P. - 492, 607 Seineeke - 531 Sekine,M.-454,558 Sellers, O. R. - 592, 601 Sellin, E. - 29, 38, 44, 98, 192, 193,202,211,221,232,242,243,258,259,260, 262,289,290,292,300,413,520,535,536,554,559,560, 562, 589, 590, 601, 602, 614, 615, 618, 619, 620, 622, 624, 628, 629, 632, 634, 635, 639, 641,648,653,657,659,660,662,668,675 Selms, A van - 186, 190,286,288,578 Semler, J. S. - 37 Sethe, K. - 82 Siegfried, C. - 415, 460, 469, 472, 473 Siegfried, K. - 327, 345 Sierksma, F. - 181 Sievers, E. - 6166, 69 Sílverstone, A E. - 713 Símaeo - 707, 716, 721, 725 Simeox, C. E. - 530 Simha - 697, 709
ÍNDICE DE AUTORES
797
Simon, M. - 304 Simon, R. - 37, 152, 698 Simon, U. - 291, 528, 530 Simons, J. - 137, 212, 282 Simpson - 159, 266, 292, 353 Simpson, C. A. - 137, 147, 159,231,284 Simpson, D. C. - 151, 353, 359 Sirker, H. - 360 Sixto Senense - 37 Sjõberg, E. - 673 Skeat, Th. - 723 Skehan,P. VV.-64,258,400,445,447,454,696,700 Skinner, J. - 147, 156,549 Skladny, U. - 445, 448, 451 Sklany - 437 Slotki, I. VV. - 69, 289, 396, 397, 399, 404 Slotky, J. J. - 463 Smal, P. J. N. - 387 Smart, J. D. - 396, 589 Smend,R.-94, 151, 158, 159,220, 169,221,266,273,274,284,292,297,299, 312,313,330,535,558,566,568,579,598,610,617 Smith, G. A. - 354, 376, 528, 530, 549, 571, 582, 583, 589, 631, 644 Smith, H. P. - 296 Smith, J. - 569 Smith, J. M. P. - 94, 341, 593,625,643 Smith, S. - 81, 91 Smith, VV. R. - 38 Snaith, N. H. - 365, 387, 389, 537, 590, 597 Snidjers, L. A. - 172, 397 Soden, VV. von - 85, 353, 426, 485, 670 Soggin, J. A. - 123, 137, 161,276,311 Soisalon-Soininen, L. - 714 Sonne, I. - 394, 395 Soper, B. K. - 612 Soucek, V. - 80 Sparks, H. F. D. - 52 Speier, S. - 607 Speiser, E. A. - 137, 174, 247
798
ÍNDICE DE AUTORES
Sperber, A. - 696, 713, 714, 716, 718, 723 Spiegel, H. - 455, 573, 715 Spiegel, J. - 85, 86, 354 Spiegel, Sh. - 454, 569 Spinoza,B.-37,152 Spuler, B. - 75 Stade,B.-38,210,284,549,554,558,560,625,628,630,637,638,655,656 Staerk, W. - 61, 231, 387,410,415,447,537,637,641,655,681 Stamm, J. J. - 94, 99, 189,360,395,464,518,571,599 Staples, W. E. - 341, 343, 461, 469 Stecher, R. - 448 Stechow, E. - 182 Steiner, H. - 589 Steinmann, J. - 151, 171,573,469,514,569 Stennig, J. F. - 713 Stenzel, M. - 398, 638, 715 Stephan, St. H. - 417 Steuernagel, C. - 38, 147, 174,231,271,398 Steuernagel, S. - 164, 192,236, 237, 244, 259, 299, 349, 350, 496, 522, 535, 584,657 Stevenson, W. B.-436,454,528,530,666 Stiehl, R. - 345, 347 Stier, F. - 453 Stinespring, W. F. - 330, 590, 592, 595 Stoebe, H. J. - 181,207, 302,303,398,403,549,607,610,629 Stollberg, L. - 621 Stone, P. F. - 555 Story, C. I. K. - 430, 445 Strack, H. L. - 38, 155, 445, 698 Straeten, C. van der - 410 Strobel, A. - 399, 555 Strugnel, J. - 404 Studer - 459 Stuhlmann, M. M. - 461 Stuhlmueller, C. - 52, 53, 528 Stummer, F. - 151, 354, 436, 715 Sugi, I. - 80 Sukenik, E. L. - 696
ÍNDICE DE AUTORES
Sundberg, A. C. - 681 Suphan,B.-417 Sutcliffe, E. F. - 451, 715 Swete, H. B. -714, 723 Szczygiel, P. - 453 Szlechter, E. - 77, 78 Szõrényi, A. - 388
T Tadmor, H. - 657 Talmon, S. - 345, 400, 712, 727 Tannert, W. - 528, 549 Tattam, H. - 715 Tãubler, E. - 94, 137, 181, 284, 288 Taylor, G. M. - 93 Taylor, W. R. - 387 Teerien, S. - 441 Teicher, J. L. - 696 Teodocião - 674, 707, 716, 721, 725 Teodoreto - 666 Terrien, S. L. - 453, 607 Tetuz, M. - 722 Thackeray, H. St. J. - 714, 720, 723 Theis, J. - 589, 618 Thenius, O. - 296, 299, 409 Thexton, S. C. - 520 Thieberger, F. - 318 Thiele, E. R. - 317 Thilo, M. - 415,419,469,471,666 Thirtle, J. W. - 389 Thomas, D. W. - 549, 589, 727 Thompson, J. A. - 589, 601 Thompson, S. H. P. - 673 Thomsen, P. - 46 Tiktin, H. - 297 Tilesse, G. M. de - 230, 237 Tischendorft, C. von - 723
799
800
ÍNDICE DE AUTORES
Todd, E. W. - 317 Tofet - 561 Tolkowsky, S. - 290 Toombs,L.E.-123 Torczyner, N. H. - 116,435, 453, 454, 457, 700 Torralba, J. G. - 99 Torrey,Ch.C.-330,331,334,337,345,395,451,474,519,523,528,542,549, 551,569,571,637,661,666 Tournay,R.J.-257,260,388,395,396,398,400,401,402,403,405,415,417, 458,537 Toy, C. H. - 445, 569 Trencsényi, L - 309 Treu, F. - 528 Treves,~.-396,410,413,600,605,657
Trigt, F. van - 181 Trost - 572 Truat - 428 Trumper, V. L. - 290 Tsevat, ~. - 304, 308, 388, 569, 657 Tuch -154 Tur-Siani, N. H. - 396, 453, 457,550 Tushingham, D. A. - 590
u Uchelen, N. A. van - 257 Úlfila - 725 Ullendorf, E. - 55 Unger, M. F. - 649 Ungern-Sternberg, R. von - 632 Ungnad, A. - 78, 348 Ussíel. M. ben - 710
v Vaccari, A. - 622 Vater, J. S. - 154 Vatke, W. - 38
ÍNDICE DE AUTORES
801
Vattioni, F. - 309 Vaux, R. de - 83, 151, 171, 172,255,319,333,695 Vawter, B. - 484 Veiser -192 Veldcamp, H. - 618 Veliokovsky, L - 182 Vellas, B. M. - 589 Vergote - 185 Vergoth, A. - 171 Vermes, G. -185,459 Vetter, D. - 492, 502 Viana, J. E. - 388 Vieyra, M. - 86 Vincent, L. H. - 257, 318 Virgulin, O. St. - 514 Vogelstein, M. - 571 Vogt, E. - 116,396,397,400,549,569,608 Volck, W. - 453, 469 Vollborn, W.-284,286 Volz,P.-157,213,215,360,365,398,404,445,453,458,459,466,469,527, 531,536,539,543,548,549,558,560,564,727 Vôõbus, A. - 713 Voort, A. van der - 403 Vries, S. J. de - 34 Vriezen, Th. C. - 94, 246, 297, 301, 514, 527, 593, 596 Vuilleumier, R. - 607, 590, 598, 616 Vulliaud, P. - 416
w Waddell, W. G. -722 Wagner, S. - 179 Waldapfel, M. - 309 Waldow, E. von - 492,504,528,532 Walker, H. H. - 637 Walker-Lund - 639 Wallis, G. - 297, 311, 445 Walther - 37
802
ÍNDICE DE AUTORES
Walz, R. - 173 Wambacq - 551, 560 Wambacq,B.~.-409,548,674
Wanke, G. - 30, 42, 366 Ward, W. B. - 401 Ward, W. rI.-589 Waser, R. A. - 448 Waterman, L.- 186, 191,247,336,415,418,419,590,646,653,727 Watts, J. D. W. - 257, 260, 607, 608, 614, 616 Weber, R. - 715 Weidner, E. - 78, 79, 80, 88, 324, 428 Weil, G. E. - 696, 697 Weil, rI. M. - 518, 626 Weinfeld, M. - 231 Weippert, M. - 396 Weir, C. J. M. - 569 Weiser, A. - 44, 46,96, 124, 137, 141, 165, 167, 168, 169,202,209,211,216, 217, 218, 221, 252, 260, 261, 263, 273, 289, 297, 300, 302, 303, 311, 315, 344, 360, 361, 387, 390, 400, 409, 413, 414, 453, 454, 459, 492, 536, 539, 543,548, 552, 554, 556, 559, 560, 562, 565, 580, 589, 590, 601, 603, 607, 611, 614, 615, 616, 618, 619, 623, 624, 627, 628, 629, 632, 633, 634, 635, 638,639,640,659,662,687 Weiss, M. - 58, 398, 403 Welch, A. C. - 186, 192,231,233,242,330, 334,388,484,549 Wellhausen, J. - 38, 155, 156, 159,244,252,256,274,299,505,535,589,592, 601,614,615,618,620,628,638,641 Wendel, A. - 116 Wernberg-Moller, P. - 395 Westermann, C. - 123, 169, 360, 363, 388, 396, 454, 458, 466, 485, 492, 496, 498,499,528,532 Wette, W. M. L. de - 38, 154, 155,207,232 Wetzstein, J. G. - 415, 417, 419 Wevers, J. W. - 360, 714 Whitley, C. F. - 94, 250, 290, 323, 484, 519, 527, 549, 550 Widengrens - 53, 55 Wiese, K. - 284 Wiesmann, H. - 410, 414, 445 Wilcox, M. - 713
ÍNDICE DE AUTORES
803
Wildberger, H. - 257, 311, 496, 523, 526, 549, 566 Wildeboer, G. - 39, 345, 445, 469 Wilils - 311 Wilke, F. - 551 Willesen, F. - 400 Williams - 644 Williams, D. L. - 643 Williams, R. J. - 439 Williams, W. G. - 555 Wilson, J. A. - 75 Winckler, H. - 284, 312 Windengren, G. - 52, 94, 123,354,403 Winnett, F. V. - 157 Wirgin, W. - 700 Wiseman, D. J. - 79, 81, 88, 91, 156,212,317 Wittekindt, W. - 378, 415, 418 Witter, H. B. - 37, 154 Wolfe, R. E. - 589 Wolff, H. W. - 94, 205, 367, 394, 441, 484, 492, 496, 518, 533, 589, 590, 592, 594,595,596,597,598,599,601,603,605,607,646 Wood,P.S.-555 Wothl, W. -713 Woude, A. S. van der - 161, 167, 171, 177 Wright, G. E. - 34, 46, 137, 147,258,271,272,318 Wünsche, A. - 439 Würfel, R. - 428 Wurster, P. - 186 Würthvvein,E.-94,319,400,405,454,492,504,518,607,608,613,696 Wutz,F.-387,714,720
y Yadin, Y. - 699 Yeivin, S. - 116,318,700 Young - 156, 529, 591, 666 Young,E.J.-529,533,665,666,673 Young, G. D. - 64
804
ÍNDICE DE AUTORES
z Zapletal, V. - 469, 473 Zeitlin, S. - 681 Zenner, J. K. - 410 Ziegler, J. - 514,714,715,720 Zillessen, A. - 542, 543 Zilliacus, H. - 722 Zirnrnerli, W. - 34, 94, 147,247,426,469,504,542,568,569,573,577,580, 582,586 Zirnrnerrnann, F. - 474,666,675 Zirnrnern, H. - 345, 348 Zobel, H.-J. - 94, 95, 284 Zolli, E. - 395, 640 Zolli, L - 594, 640 Zorell, F. - 715 Zyl, A. H. van - 284, 396, 521
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS ANTIGO TESTAMENTO
Gênesis 1 - 146,440,447,524 1.1-2.4a - 393, 395 1.1-2.4a - 248 1.1-2.4a e 2.4b-25 - 163 1.1-2.4a; 6.9-9, 17; 17 - 253 1.31-115 1; 3; 22-24 - 702 1-11 - 125, 145, 171, 185 1-11 -149 1.16-35.8 - 723 2.18 - 452 2.23 - 95 2.4b-3.24 - 205 2.88 - 223, 224 3.14 - 109 3.148 -109 3.168 - 210 4.1- 94 4.11; 9.2588 - 109 4.158; 25.2788; 27 - 128 4.17 -126 4.238 - 227 5 -126 5.1-254 6 -702 6.1-4 -124 6.5 - 210
6.5-9.17 -162, 163 6.588 -134 8.21 - 209 9.6 - 65 9.20-27 - 164 9.25 -109 9.25-27 - 226 9.2588 -131 9.6 - 100, 181 10 - 138, 164, 212 10.888 - 212 11.1-9 -130 12.2,7; 17.5,8 - 174 12.3 -109 12.6; 13.7 - 153 12.10-20; 20.1-18; 26.7-11 - 208 12.1088 - 164 12.1088; 20; 26 -182 12.1188; 14.19; 22.1688; 28.1388-109 12.13 - 107 12; 20; 26 - 163 14 - 258, 265 14.14 - 153 15 - 172,213,217,222 15.1 - 217 15.2 - 258 15.988 -104 15.11-111
806
ÍNDICE OOS TEXTOS BÍBLICOS
15.16 - 219 16 - 164, 181 16.755 - 130 16.115 - 95 17 - 131, 181, 250 17.1; 26.24; 28.13; 46.3 -112 17-18 - 702 18.3; 47.29 - 107 18-19 - 222 18.22 -707 18.22b-33 - 210 19 - 130,207 19.3055 - 131,227 19; 36 - 702 20 -164, 216 20.3,6; 28.12; 31.11 - 218 20.4,18 - 60 20.7 - 120, 218 20.9 -115 21.11 - 219 21.17 - 116 21.17; 28.12 - 218 21.22-31 - 130 21.22-34; 22-1-19 - 216 21.2255 - 104, 133 21.2255; 26.2655 - 104 22.1-19 - 219 22.6,8 - 60 22.175 - 219 22.20-24 - 138 23 - 104, 202, 250, 251 23.6 -116 23.165 -104 24.4,10 - 172 24.455; 31.24 - 180 24.60 -107 25 e 35 -149 25.23 -112
26 -702 27.2755 - 109 27.2755,395; 48.155,20 - 109 27.29 - 209 28.1055 - 111, 130, 216 28.1855; 35.20 - 219 29.1-14; 30.25-43; 31.17-43; 31.4432.1 - 223 31.4455 - 104 32.10-13 - 120 32.21- 69 32.2555 - 130,227 32.29; 35.10 - 175 32-35 -702 33.8,195 - 220 33.1855; 35.155 - 130 34 -133 34.7 -115 35.17 - 94 35.2 - 219 35.8,19 - 218 36.31 - 153 36.31-39 - 181 37 - 216 37.555; 405 - 142 37.36 e 39.1 - 145 37; 39-48; 50 - 129, 163, 184 39.755 -128 40.15 -153 41.8 - 426 42.15 -110 43.29 -109 44.5 -111 45.28 -117 47.15 -107 48 - 131 48.18 -116 49 - 95, 96, 110, 138,208,217
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
49.145 - 95 50.105 - 153 Êxodo 1-702 1.1-15.21 - 149 1.6,8,10b,12a - 206 1; 7; 9; 11; 12; 21; 26; 30; 32 - 702 1.7,9,lOa,11,14a - 224 1.7,135 - 249 1.7-14 - 264 1.12b - 214 1.12b - 216 1.15-21 - 224, 264 1-12-215 1-15 - 166 1-27 - 702 2.10 -132 2.15-22 - 207, 264 3 - 164, 181, 216 3.6 - 218 3.8 - 176, 209 3.8; 13.17 -176 3.1055 - 290 3.14 - 217 3.145 - 213 3.15,16 - 222 3.15; 6.6 - 163 3.215; 11.25; 12.355 - 227 4 - 264 4.1-9 -124 4.155 - 128 4-6 - 702 4; 12; 18; 21-22; 27; 31; 19; 34702 4.18 -108 4.24-26 - 131,227 4.2455 -181
807
5 -702 5.5-21 -182 6.13-30; 12.42b,43-51; 13.15; 27.205; 30.1-38; 31.1-11; 35-40 - 253 6-37 -702 7.17; 8.6,18; 9.29; 11.7 - 577 12 - 146 125 - 250, 263 12.21 -167 12.24-27a; 13.3-16 - 231, 237 12.27 -102 13.145 -102 13.18 - 218 13.19 - 267 13.20; 14.15; 15.225 - 138 14.13-96 15.1-19 - 375 15.1-18-64,142 15.1-19 -167, 259 15.1-19 - 259 15.20 - 62 15.205 - 68, 177,226,380 15.21; 16.2355 - 142 16 -181, 222 16.3 -108 16; 19-21 - 702 17 - 181 17.855 -131 17.855; 24.13-15; 32.175; 33.11-180 17.16 - 379, 382 17.10 -179 17.14 -152 17.16 - 142,226 17.1855 - 267 18 -177 18.8 - 223 19 -167 19.3b-8 - 261
808
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
19.3b-8 - 261 19.3b-8 - 261 19; 33.1988 - 125 20 - 100, 195 20.1-17 - 98, 231 20.2 - 105, 106 20 e 34 - 105, 201 20.18-21 - 202 20.22-23.23 - 188 20.22-23.9 - 144 20.24 -163 20.24-23.9 - 188 21.1-22.16 - 144 21.288 - 102,239 21.2-22.16 - 685 22.6-19 - 100 21.12-17 -101 21.1288 - 239 21.22,15-17; 22.188 - 101 22.158 - 239 23.10-19 - 100 23.108 - 239 23.15; 34.18 - 167 24.388 - 99 24.4 - 152 24.7 -187 24.8 -104 24.12; 31.18; 32.158; 34.28 - 685 24.11 -104 25 - 200 27-29 - 252 28.1 -163 28.41; 30.30 - 252 29.35 - 69 29.7,29 - 252 30.1-10; 35-40 - 252 31.3 - 426 32 -131,216,217,219,220
32.34 - 220 33 ou 34 -188 34 - 100, 188 34.14-26 - 99 34.1488- 208 34.16 - 264 34.27 -152 35.21-29 - 138 45.21-25 - 197
Levítico 1-7 - 150, 200 1-7; 11-15 - 251 4.14 - 252 4.35,16 - 252 6.2,7,18 - 114 8 -703 88 - 252 9.3 - 252 9.24 -131 11- 703 11-15 -115, 200 11-15; 20-21 -144 16 - 200 17.23 -144 18 - 97 18.7-17a - 67 19.11 - 99 19.13-18 - 100 19.3-12 - 100 20.2,9-13, 15-16,27; 24.16 -101 23.36 - 163, 256 23.40 - 256 27 - 253 Números 1.1-10.10 - 150,249 1.4-16; 7.12-83; 13.4-16 - 251
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
1.5-15 26 - 138 1.46, 2.32 - 255 2 - 255 3.1- 254 3-4 -703 4.3ss,23ss - 252 4-6; 15; 18.8-32; 19 e 28-30 - 200 4-6; 15; 18.8-32; 19; 28-30 - 251 5.11ss - 113, 686 6.24-26 - 110, 251 6.24ss -109 7 -703 7.1-88 - 253 8.23ss - 252 9 -102 10.35s - 96 10.29 - 223 10.29-36 - 207, 225 10.35 - 208 11 -181 11.4-35 - 215 l1.4ss - 222 l1.14ss - 182 11.28-29 - 180 l1.28s - 267 11.29 - 218 13.2 - 281 13-14 - 178 14.21-110 15.24 - 252 15.32s - 102 16 - 390 16s - 132 17.16ss - 111 18 - 703 20 -181 20.7s -703 21.4-9 - 216
21.4ss - 130, 181 21.14 - 385 21.14s - 377 21.14s,17s,27-30 - 382 21.17s - 376 21.27-30 - 377 21.14,17,27 - 218 21.14s - 217 21.14s,27-30 - 142 21.17-18 - 142 21.21-31 -179 21.27 - 54 22.1 - 153 22.24 - 59 22.28ss - 129 22-24 - 109, 142, 163, 185,379 23 -185 23.5 - 501 23.9b - 219 23.11-115 23.21- 221 23.21s - 219 24 -185 24.3 - 502 24.41 - 501 25.1-5 - 227 26.1-51 - 251 27.15-23 - 180 27.36 -102 28.27-30 - 144 31.32-47 - 138 31.8ss - 185 32.1-38 - 279 32.1ss -179 32.39-42 - 179,273,274 33 - 138, 139, 703 33.2 -153 34; 36 -702
809
810
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
Deuteronômio 1-703 1.1 - 36 1.1,5 - 153 1-11 -150,238 1-11 2788 - 235 1.14 - 115 1.13,15 - 432 1-30 - 231 1.3; 4.41-43 - 250, 267 1; 4; 8; 9; 11; 13; 14; 16 - 703 1.5 4.45 31.9,24 - 153 1; 8; 9; 11; 15; 17; 21; 24; 25; 2833 -703 3.10-12 e 27.1-8 - 36 3.14; 34.6 - 153 4.2; 13.1; 31.26 - 685 4.298 -105 5.26[29] - 108 6.4 - 701 7.288; 23.488 - 264 7-9 -703 7-34 -703 10 - 703 10-12; 14-15 - 703 12.14 -163 12.3388 - 234 12-16 -164,202 13.2-6 - 142 14.3-21 - 200 15.1-11 - 239 15.188 - 239 15.1288 - 239 16.1-8 - 166 16.19 - 432 16.13 - 163 17 -703
17.1488 - 153 17.18 -148, 231 18.68 - 234 18.7 - 163 19.14 - 240 19.188 - 239 20.5-8 -118 21.1-9 - 240 21.78 -100 21-25 - 144 22.1388 - 306 22.22; 13-14 - 306 22.288; 15-20 - 306 23.1 - 306 23-28 -723 25.13-16 - 240 25.9 -101 26 -703 26.588 -167 26.158 - 167 26.19 - 703 27 - 98,167 27.1-8 - 202 27.2,8,5-7 - 202 27.5-7 -130 27.1388 - 110 27.15-26 - 67, 101, 200 27.1588 - 109 31.36-32.7 - 722 31.14,23 - 180 31.14,16,23 - 207 31.14,23 - 267 31.14-17,23 - 215 31.14-17,23; 33-34 - 267 31.26 - 235 31.30 - 153 32 - 142,375,703 32.13 - 545
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
32.1-43 - 64, 258, 261 32s - 306 33 - 95, 96, 109,217,261 33.13ss - 221 34.1 - 153,249 34.9 - 180 34.10 -153
Josué 2-6 - 273 3 en 4 - 276 5.2-15 - 276 5.2-9 -131 5.2ss - 181 6.2 - 96 6.16-96 6.26 -109 7.11-99 7.14ss -113 8.30-35 - 202 8.34 -167 9.15 -104 10 - 131 10.12 - 379 10.13 - 385 1O.12s - 142 13.22 - 185 15 - 282 15.13-19 - 274 15-19 -138 15.55 - 630 23 - 266, 280 23.24 -119 24 -105 24 -167 24.2ss - 217 24.26 -104 24.30ss - 220
24.32 - 267 40.1-8 - 509
Juízes 1 - 274, 283 1.1 - 272 1.1-2.5 - 273, 281 1-2.5 - 280 1.2-2.5 - 272, 274 1.10-15 - 274 1.16 - 223 2.5 - 273 2.6-10 - 280 2.6ss - 266 3-16 - 131 5 - 62, 95, 142,289,380 5.4s - 125 5.11 - 383 5.12 - 380 5.15-17,28-30 -142, 377 6; 9 -703 6.12 - 108 6.23 - 97 7.13 -142 7.14 -142 8.1 - 115 8.14 - 55 9 -140 9.7ss -118 9.8-15 -143 9.16-20 - 439 9.27 - 376 9.29 -108 10.10 -120 10.15 -120 11.34 - 380 11.12 -115 14.3 - 107
811
812
14.14 - 436 14.14 - 143 15.188 - 129 16.2388 - 380 16.28 - 120 178 -130 17.2 - 109 19.6 -107 Rute 2.2,10 - 107 2.20 -109 2.4 - 108, 109, 705 3 -705 4 -104 4.11 - 107 4.14 - 110 1 Samuel 1.1-3 - 308 1-2-703 1-3 - 131 1-7 - 298 1.17-112 1.22-2.25 - 701 1.26 - 110 2.1-10 -142,310,375 2.22-36 - 310 3 -111 3.17 - 109 31 - 306 4.1-7 - 301 4.1-7.1 - 302 4.18b - 310 4.20 - 94 5-6 - 302 7 - 310 7.2-6,15-17 - 311
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
8; 10.17-27 - 308 8; 10.1788 - 299 8-15-298 9 -128 9.9 - 487 9.1-10.16 - 299 9.1-10.16; 11; 13-14; 31 - 302 20; 125; 126; 129; 130 - 704 10.588 - 487 10.11; 1O.21b-27a - 104 10.24 -107 10.25 - 235 11 - 140, 311 11; 13-14 -131 12 - 119, 292, 309, 310 12.10 - 120 13.1 - 287 13.7b-15bá - 309 13.888 e 15.1088 - 299 14.39 -110 15 - 309 15.13 - 108 15.25 -107 16 - 299 16.7 - 435 16.1-13 - 309 16.14 - 303 16.188 - 304 16.7; 24.14 - 143 16; 19; 21; 23 - 703 16-31 - 298 17 - 128,299,304,309 17.55 -116 18 -703 18.68 - 68, 104,380 18.7 - 142 20 - 304 20.42 -109
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
21.11ss e 27 - 299 22.23 - 97 23.2,11 - 112 24 e 26 - 299 24.14 - 431, 435 24.15 -117 24; 26 - 129 25 - 630 25.6 -108 25.8 -117 25.32 -110 26.16 - 115 28 - 309 28.7ss -111 28.12s - 97 2 Samuel 1-8 - 298 1.18-385 1.19-27 - 381 1.15-59 1.17ss - 303 1.19-27; 3.33s -142 2.25s -118 3.1 e 3.6a -145 3.33s - 303 4; 24 - 703 5 - 303 5.10,12 - 303 5.13-16 - 304 5.22s -111 5.3 - 104 5.4s - 310 5.8 -143 6 - 301 6.1-12,14,20-23 - 302 6; 7 - 301 6; 7.1-7.17 - 306
7 - 304, 310 7.8-16.18-29 - 305 7.1-7.17 - 302 7.18-29 - 120 8 - 299 8-9 - 304 8.10 -108 8.16-18; 20.23-26; 23.8-39 - 138 9; 10-12 - 304 9-20 - 298, 305 10.12 - 96, 118 11.15 -121 11.17,21,24 - 60 11.21 - 117 12 -143, 439 13.3 - 426 13.12 -115 14.4 -107 15.10-97 15.3 -115 15.9 -108 16.10 -115 16.4 -107 18.17; 19.9; 20.22 - 97 20; 21; 23 - 703 21.1-14 - 307 21-24 - 299, 310 22 - 310 23 -110 23.7 - 705 23.1-7 - 310 23.8ss - 129 24 - 307 24.23 -117 1 Reis 1-703 1-2 - 298, 305
813
814
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
1-11-313 2 -119 2.26 - 549 2.10 - 314 2.39 - 306 2.46 - 306 3 - 305 3.4-15 - 305 3.4ss - 140 3.5ss - 111 3.6-9 - 120 3; 12; 22 - 703 3.16ss - 60, 128 4.7-19; 5.7s -138 5.6ss -104 5.10 - 430 5.11- 390 5.12-416 5.12-13 - 431 5.17 - 96 6.1 - 293, 294, 306 6-8 - 139 8 - 375 8.4 - 131 8 e 11.1-13 - 317 8.33ss; 21.9ss - 367 8.53 - 385 8.23-26,41-51 - 324 9.15ss - 139 10.lss - 467 10.5 - 436 11.29ss; 12,15; 14,lss; 15,29 - 487 11.29-39; 12.15; 14.1-18; 15.29 - 323 11.41 - 140,317 11.41s - 287 12 - 104,313 12.21ss - 487 12.24s - 381
12.1-19 - 319 12.16-97 12.21-24 - 323 12.28ss - 220 12.32-13.32 - 323 14 - 316 14.5ss - 497 14.19 - 140,317 14.21s,29-31 - 316 14.29 - 317 15.1 - 316 17.1; 18.1a-2a,16s,41-46 - 319 17.2-6 - 320 17.10 - 107 17.16 -128 17.17-24; 18.1a - 320 17.18 - 115 17-19 - 320 17-19; 21 - 319, 487 18.19ss - 485 18.10 - 261 18.11-14 - 117 20.1-34 e 22 - 319 20.11 - 143,435 20.13.2 - 577 20.13s - 577 20.28 - 577 20.35-43 - 324 21 - 320 21.17-19 - 499 21.13 - 100 21.8-10 - 121 22 - 323, 625 22.11- 487 22.13ss - 487 22.17 - 501 22.34s -131
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
2 Reis 1- 487 1.1-17 - 319 1.38 - 499 1.2-8,17a - 320 1.9-16 - 320 2; 3.4-27; 4.1-8.15; 9.1-10; 13.14-21 - 321 2.8 - 124, 128 2-13 - 487 4.158 -128 4.23 -108 5.21-110 5.58 - 121 5-10 - 703 6.3 -107 6.26; 9.5 - 116 9.188 - 115 9.2288 - 316 9-10 - 319 10.28 - 121 10.19 - 485 10.3488 - 316 11 - 316 11.17-104 1188 - 318 12.1088 - 139 13.17 - 379 13.12; 14.15 -140 13.158 - 60 14.25 - 621 14.6 - 147 14.9 - 143,439 15.31- 317 17 - 313 17.38 - 313 17.7-20,29-40 - 324 17.278 -152
18.8 - 314 18.13,17-20,19 - 523 18.13; 18.17-20.19 - 322 18.1788 - 118 18-25 - 313 19.14 - 235 19.9-14 -121 20 - 523 20.1 - 117,497,498 20.288 - 498 20.19-12 - 323 21.7-15 - 323 228 - 232, 236, 313 22.20 - 324 22.8,10 - 235 23.1-3 -104 23.4-15 - 314 23.88 - 234 23.25b - 324 24.18-25,30 - 563 24.5 - 317 25.27 - 324 25.2788 - 314
1 Crônicas 1-9 - 329 2.4-15 - 343 2-9 - 331, 335 12 - 336 15.4-10,16-24; 16.5-38,418 - 336 15.1788 - 390 22.7-16; 28.2-10; 29.1-5 - 338 23.3-27.34 - 336 29.29 - 297, 331 35.15 - 390 2 Crônicas 1-9 - 329
815
816
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
8.15 - 337 9.29 - 331, 502 11.5b-lOa - 332 12.5-8; 15.1-7; 16.7-10; 19.25; 20.37; 28.9-11 - 338 12.15 - 331 13.22 - 331 13.3-20 e 14.8-14 - 332 13.4-12; 20.5-12 - 338 13.455 - 118 14.5-7; 17.2a,12b-19; 25.5; 27.35332 16.11; 25.26; 28.26; 32.32 - 331 17.7 - 338 20.1-30 - 338, 340 20.20 -118 20.34 - 331 24.27 - 331 25.4; 30.16; 35.12 -147 25.4; 35.12 - 152 26.10 - 630 26.16-21 - 338 26.22 - 331 27.7; 35.27; 36.8 - 331 29.3 - 338 29.3-31.21 - 338 32.32 - 331 33 - 340 33.18 - 331 33.19 - 331 34.3 - 338 35.25 - 386, 410 35.1-19 - 338 36.225 - 327 Esdras 1.1-3 - 327 1.1-4.5 - 339
1-6 - 329 2 -138, 336 2.41 - 390 2.55,57 - 470 2.685 -138 3.2; 7.6 - 152 3-6 - 646 4.6-6.18 - 333, 337 4.655 - 338, 339 4-5 - 705 4-6 - 121 5.1; 6.14 - 646, 650, 6.18; 10.3 - 147 7 - 329 7.155 - 256 7.11-9.5 - 334 7.12-26 - 339 7.28; 8.25 - 463 8.2 - 667 8.1-14 - 335 9 -120, 375 9.6-15 - 336 10.18,20-44a - 138 Neemias 1.1- 7.5 - 332 1.1-7.5 - 334 4.4 - 142,376 7.44 - 390 7.6-72 - 336 85 - 256 8.3; 13.1 -147 8.4; 10.3,7,24 - 667 8.13s5 - 256 8.18-256 9 - 375 9.6-37 - 336 10 - 335
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
10.2-28,38b-40 - 336 10.31 - 264 10.31-40 - 100 10.32 - 264 11.3-36 - 138, 336 12.16 - 650 12.1-26 -138, 336 13.4-31 - 337 Ester
5.3,6 7.2 - 60
Jó 1.1-5) - 454 1.5 -109 1.21b - 95 2.7-10) - 454 3.8 -127 5.13-426 5.17 - 439 5.19-22 - 436 6.8 -108 10.34; 15.25 - 687 13-14 - 705 18 - 438 18.5-21 e 20.4-29 - 438 19.2 -118 19.23 - 108 22.28, 35.6-8 - 434 26.3 - 434 28 - 432, 438 31 - 100, 109, 113 31.31 -108 32-37 - 432 33 -705 33.148 - 436 36 -705 40.3-5; 42.1-6) - 455
817
42.10-17) - 455 Salmos 1 - 386, 408, 447, 524 1 e 128[127] - 438 1.2 - 65 1.3 - 65 1.6 - 65 2 - 372,704 2.7 - 94 2; 9; 12-14; 17; 18; 43; 59; 77; 78705 2 e 110[109] - 373 3-41[40] - 406 5; 6; 25; 31; 33; 35; 36; 38; 71; 47; 53; 54; 56; 63; 66; 67; 69 6 - 369 7.488 - 113 8 - 393 8; 104[103] - 364 9 elO - 388 9/10 - 389 9/10[9]; 37[36] - 374 9-10; 119 [118] - 65 13 - 369 15 - 113 15 [14]; 24 [23].3-6 - 100 15; 16 -705 15[14] - 114 15[14] e 24[23] - 366, 373, 374 15[14].24[23].3-6; 133[132]; 134[133].3 - 143 17; 18 -705 18 - 310 18 [17], 39; 110 [109], 1 - 96 18; 16; 27; 28; 35; 37; 45; 49-53704 18[17] - 299, 372
818
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
18[17].888 - 125 18[17]; 51[50]; 52[51]; 54[53]; 56[55]; 57[56]; 59[58]; 60[59] 19.588 - 127 19[18] - 389 19[18],2-7.8-15 - 389 19[18]A; 29[28] - 364 20 [19].7; 85 [86].988 - 112 20[19] e 144[143] - 372 20[19],788; 60[59],888; 85[84],988; 95[94],788 - 497 21[20] - 372 22.1-12.13-22; 59.2-6,7-15; 69.1-7,813; 88.2-10,11-13,14-19; 102.223,24-29; 109.1-20,21-31; 140.26,7-12 - 639 22.2 - 717 22; 107; 109 - 704 22[21] - 369 24 [23].3-6 - 113 25[24],2 - 368 25[24]; 34[33]; 111[110]; 112[111]374 26; 27; 135 - 704 27[26] - 369 29 [28] - 358 30[29] - 391 31; 33; 35 - 704 32[31]; 73[72] - 371 33[32] - 406 33[32]; 103[102] - 374 33-34 -723 35.1-10.11-27; 86.1-13,14-17 - 639 35-40; 68; 78; 81 - 705 37.1,37b - 450 37[36],16 - 438 38[37] e 70[69] - 391 39[38],1; 62[61],1 - 390
39[38]; 51[50] e 130[129] - 368 40[39],788; 51[50],1788 - 409 42[41]f43[42] - 389 42[41]-49[48] - 407 42[41]-83[82] - 407 42-43 [41-42]; 46 [45]; 80 [79]; 107 [106] - 65 44 - 704 44[43] - 372 45[ 44] - 64 45[44] - 372, 378 46[45] - 361 46[45]; 48[47]; 76[75]; 84[83]; 87[86]; 122[121] - 366 47[46],3.8 - 365 47[46]; 93[92]; 96[95]-99[98] - 365 48; 49 -704 49[48] e 73[72] - 409 49[48],5; 78[77],2 - 438 49-50 -723 50[49],14; 141[140],2 - 409 50[49]; 73[72]-83[82] - 407 50[49]; 81[80]; 95[94] - 114 51[50] - 393 51[50] e 73[72] - 361 51[50],9 - 367 51[50]-72[71] - 407 53[52] - 407 55[54].7 - 108 55[54].7; 75[74].78 - 69 5768 - 706 60[59],8-10 - 367 62[61],12 - 436 65[64],14 - 376 65[64]; 67[66] - 376 66[65] e 107[106] - 374 66[65],13 - 370 68,19 - 717
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
71 - 639 72[71] - 372, 407 72[71],20 - 388, 390, 406 73.25-28 - 468 76 [75],3 - 258 76-78; 81; 86; 88; 89; 104; 105; 109; 115; 116; 120; 125; 126; 129; 130 77[76],1 - 390 78 -704 78 [77] e 106 [105] - 119 78[77] - 263, 438 78[77]; 105[104]-106[105] - 364 81[80] - 373 82[81] - 366 82-83 -723 84[83]-89[88] - 407 86; 92; 94; 95; 96; 119 - 704 89/88 - 390 89[88] - 372 90[89]-104[103] - 408 90[89]-104[103]+105[104]-107[106] 408 90[89]-149[148] - 407 91-94; 98-100; 102; 103; 112-116; 118 -704 93; 95; 97; 98 - 704 96[95],45 - 384 98[97] e 150 - 363 101-103; 105; 109; 146; 148; 121132; 119; 135; 136; 118; 145; 139; 137; 138; 93; 141; 133; 144; 142; 143; 149; 140; 140; 134; 36; 118; 145; 139; 137; 138; 93; 141; 133; 144; 142; 143; 149; 140; 140; 134; 143; 149; 140; 140; 134705 103; 104 - 704
819
103[102] - 393 104 -704 104 [105] - 358 104[103] e 148 - 440 105[104]; 106[105] - 438 107[106] - 372 108[107]-110[109]+111[110]114[113A] - 408 108[109]-110[109]; 138[137]145[144] - 408 11[10]; 16[15]; 23[22] - 370 110 [109],4 - 259 110[109] - 372 112[111] -438 114-116 - 704 114 e 115 - 388 115[114]; 119[118] e 137[136] - 408 116 (1-9,10-19) - 388 116,10-19115 - 388 116[115],13 - 370 119 -704 119[118] - 374, 393 120[119]-134[133] - 408 120[119]-134[133]+135[134]136[135] - 408 122[121] e 134[133] - 366 125[124]; 129[128] - 370 126-128 - 704 127[126],5 - 439 129[128],1 - 362 129[128].8 - 109 132.U}1] - 372, 373 133(í32] - 439 134[133] - 366 134[133],3 - 373 135; 136 - 704 136[135] - 372, 374
820
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
137[136] - 361, 393 137[136],3 - 366 138[137]-145[144]+146[145]-149 408 14[13] - 407 143 -704 147 (1-11,12-20) - 388 147; 104 - 704 150 - 408 151 - 389 Provérbios 1.6 - 435 1-2; 14-15 - 705 1-9 - 432, 443, 524 6.16-19; 30 - 436 8 - 375 8.1-36 - 438 10.lss - 437 10.6.11 - 435 10.26 - 437 11.2 - 629 11.24; 20.17; 25.15; 27.7 - 431 11.2a; 16.18; 18.12 - 431 11.9-12 - 443 11.26 -109 15.13s.16s - 443 15.9,29; 20.25; 21.3,27; 28.9; 30.1434 16 - 443 16.10; 22.29; 25.2s - 437 17.27 - 432 22.17ss - 450 25.1 - 432, 437 25.23; 26.20; 27.20 - 431 26.4s - 443 31.10-31 - 452 31.lOss - 443
Eclesiastes 5-7 -705 1.9 - 41 9.4 - 435 9.4 -118 11.9-12.8 - 440 12.12 - 442 12.9 - 62 Cântico dos cânticos 1-705 1.1 - 390 1.2ss,5s,7s; 3.1-5; 4.9-11; 6.8,9a; 7.711- 67 1.9-11 - 379 3.3; 5.7 - 377 30.2-8 - 459 Isaías 1 - 393, 510, 704 1.1 - 705 1.18-20 - 501 1.2 - 495 1.2-3; 3.12-15 - 504 1.4-9 - 500 1.10-113 1.10-17; 33.14-16 - 113 1-12-509 1-26 -703 1-35 - 510 1-39 - 529, 563 1-39 e 40-66 - 510 2.12-17 - 506,606 3.lOs; 32.6-8; 40.18-20+41.7; 44.920; 46.5-8 - 441 3.25-4,1; 7.18s,20,21s; 10.24-27; 17.1s,3,4,5,5b.; 18; 29.9-11; 30.2733; 32.9-14 - 499
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
3.1-9,16-24; 8.5-8; 28.1-4,14-22; 29.13s; 30.6s,8-14,15-17 5 -705 5.1-7 - 379 5.1-7; 10.15; 29.16; 45.9 - 439 5.8-10.11-13; 22.1-14,15-19; 30.1-4; 31.1-3 - 499 5.8ss; 10.5-15; 29.15 - 500 5.9 - 502 5-10 - 509 5.11-13 - 377 5.20s; 29.14; 31.1-3 - 432 6 - 502 7.1-9 - 67, 500 7.3-8.1-4 - 593 7.3; 8.1-4 - 495 7-8 - 509 7.13ss - 493 7.11; 31.9 - 69 8.2 - 650, 657 8.8a - 64 8.11 - 495 8.16 - 492, 507, 529 8.16-18 - 492 8.16 - 57 8.19 -111 9.2 - 376 9.7-20+5,25-29 - 504 9.7ss - 494 10.13 - 426 10-11 - 705 11-703 13 - 604, 606 14.4ss - 322, 382 19.11 - 428 21.1-10 - 521 21.12 - 377 22.13 e 56,12 - 377
821
22.14 - 498 23.15s - 377 24-27 - 636 24-27; 33 - 374 24-27; 33; 34-35; 56-66 - 489 27.1 - 127 28.23-29 - 441 28.4b - 439 30 -705 30.8 - 507 33.14-16 -100 34.4 - 699 36-39 - 135,322 37.22ss - 500 37.24 - 642 38.10-20 - 375 40 -704 40.5b - 545 40.27-31 - 662 40-55 - 510 40.66 - 546, 656 41.7 - 115 42 -703 42.1-4(5-7); 49.1-6; 50.4-9; 52.13-12 - 532 42.15 - 69 44.6; 45,5 - 366 44.12-20 - 377 44.21s - 501 44.25 - 426 47 - 378 48.3 - 686 50.10-11 e 52.13-53.12 - 537 51.7s - 468 51.9s - 127, 380 52.12 - 545 52.15-54,12 - 382 52.13-53.12 - 533
822
ÍNDICE DOS TEXTOS BíBLICOS
54 -705 57.1s - 629 62 - 66, 67 63.7-64.11 - 262 65.25 - 524
Jeremias 1.4-10 - 502 1.4ss - 509 1.4-10 - 67 1.5ss - 290 1-2?,14 - 509 1-6 - 643 1.11 - 502 1.13 - 502 1-25,14; 25.15ss e 46-51; 26-35 - 510 3.21-25; 14.7-9,19-22 - 368 4.5-8.13,22 - 495 4.5bss - 502 4.5ss - 493 4-6 - 493 4-6; 46.49-51 - 604 4.31 - 502 7.9 - 99 8.8s - 432 8.1-4-67 8.10a-12 - 564 9-10 - 704 9.16 - 54 9.19-21 - 380 11.5 -109 11.14 - 120 12.9b - 544 14.2-15,2 - 374, 639 14.2-15.2 - 67 14.13 - 488 16.5 - 380 18.1-11 - 439
18.7; 27.8 - 261 18.18 - 432, 437 20.9 - 494 20.14-18 - 462 22.18 - 381 22.185 - 380 23.9 - 508 23.28 - 435 23.25ss - 142 25.3-7 - 501 25.11- 671 25.30 - 615 26.18 - 625 26.20-23 - 550 26.11 - 117 27.9 - 485 28.8s - 498 29 -146 29.26 - 487 29.1-14 -121 29.24-32 - 121 31.31-34 - 34 32 - 104 34.18 -104 36 - 507 36.1ss - 367 36.2 - 699 36.10 - 441 36.29b - 507 37.17 - 497 39.15-18; 45 - 60 42-44; 46-49 - 704 49.7 - 430 50.35 - 426
Lamentações 1; 2e4-411 1; 2; 4 - 374
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
1; 3 - 705 1-4 - 65 3 - 374, 3 - 411,705 4-5 - 705 4.20 - 410 5 - 374, 401, 411
Ezequiel 1.1-3,15 - 502,509 1-24 - 509 1-24; 25-32; 33-48 - 510 2.98 - 699 3.22-27; 24.25-27; 33.218 - 492 4-5 -704 4-5, 7, 10, 13 - 704 6 - 509 7.1-16 - 581 12.1-11; 24.15-24 - 503 12.2188 - 492 14.12-13 - 456 14.14,20 - 454, 667 15; 16; 23 - 440 16 - 704 16.1-43 - 382 16 e 23 - 379 17.1-10; 19.1-9; 31.1-18 - 439 17.1-21 - 67 17.18 -104 18.2 - 435 18.5-9 - 100 21.26 -112 24.1588 - 380 28.3,17 - 430 29-32; 35; 388 - 604 36 - 393 36.2588 - 398 44 - 256 48 - 282, 283
Daniel 1-2 - 705 2; 7-8 - 705 3 -705 3.31[98]-4.34 - 122 5.12 - 436 6.11,14 - 121 7-8 -705 8; 10-12 - 705 9 -120, 375 Oséias 1-3 - 510 1-10 - 560 2 -706 2.4 - 95 3 -141 4.2 - 99 4.12 -111 5.148 - 705 5.15-6.6; 14,2-9 - 374 6.1-3; 14.3b-4 - 368 6.7-11a; 10.3-4 -104 8.1-545 9.7b - 492 10.1 - 189
Joel 4.16 - 615 Amós 1-704 1.2-9,7 e 9.8-15 - 510 1.3-2.16 - 510 1.388 - 436, 494 1.388; 4.1-3 - 499 1.18-20 - 662 1.3388 - 500
823
824
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
3.2 - 503 3.3-6 - 441 3.8 - 494 3.9-11; 4.7-11; 6.1-7.135; 8.4-7 - 499 3.13b-15; 4.165; 8.95,11-14 - 499 4.1- 495 4.6-12 - 504 5.1-3 - 382 5.5-8.14 - 218 5.12; 6.12 - 500 5.14-501 5.16 - 54 5.18-20 - 506, 606 6.4-6 - 377 7.155 - 120 7.1-6 - 498 7.1-3 - 67 7.1055 - 492 7.165 - 499 7.10-17 - 67, 141 8.1-3 - 502
Abdias 8 - 430 17a - 604 Jonas 2.1. 11; 4,558 - 439 Miquéias 1-3 - 630 1-3 e 4-5; 6-7.7 e 7.8-20 - 510 1; 6 -706 3.8 - 545 4.1-3(4) - 523 4-7 - 656 6.6-8 -113 7.8-20 - 374
Naum 1.255- 727, 728 1-3 -706 1.11; 2,13; 3,1 - 642 3.1- 495 Habacuc 1-2 - 706 2.14 - 524 Sofonias 15 - 604 1-2 - 706 1-2,3; 2.4-3.8; 3.9-20 - 510 1.12 - 435 Ageu 2.10-14 -113 Zacarias 1.4; 7.7 - 686 1.7-6.8 - 67 1-8 - 646, 661 12-14 - 656, 659, 688 13.1-6 - 686 5.2 - 699 5.4 -109 7.155; 8.185 - 412 7.1-3; 8-185 -113 9-11 - 656, 658 9-11; 12-14-661 9-14 - 655, 662 Malaquias 1.1 - 655 3 - 604 3.22 -151
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
825
APÓCRIFO, DEUTEROCANÔNICO E PSEUDOPÍGRAFOS DO AT
4 Esdras
2 Macabeus 1.1988 - 131 2.1388 - 688 15.36s - 349
14.18-48 - 684 63; 66; 67; 69 - 704 9[58]; 60[59] - 36
3 Macabeus 6.2s8 -120
3 Esdras 1-3 - 683
Tobias 14.4.8 - 623 7.13[14] - 95 7.16-104 1 Macabeus 2 -119 2.598 - 667 7.49 - 349 8.2288 - 104 913 -118
Eclesiástico 16.25 - 629 23.16; 25.7-11; 26.5,28; 50.258 - 436 24 - 375 38.25 - 376 44-49 - 349, 667 45.5 - 62 47.9 - 62 48.2288 - 688 49.10 - 623 49.19 - 513 51.1388 - 705
826
ÍNDICE DOS TEXTOS BÍBLICOS
NOVO TESTAMENTO
Mateus 5.17 -147,689 5.17-19 - 35 19.75 - 152 23.25 - 689 24.15 - 667 27.95 - 656 27.46 - 717 Marcos 12.26 - 147, 152 13 - 675 15.34 -717 Lucas 10.25-28 16.1 9- 31 - 35 11.49 - 693 15.11s5 - 536 20.42 - 388 24.24 - 688
15.21 - 152 28.23 - 689
Romanos 10.5 -152 1 Coríntios 2.9 - 693 2 Coríntios 3.5-18 - 34 10.1355 - 682
Gálatas 6.16 - 682 Efésios 4.8 -717 5.14 - 693 2 Tessalonicenses 2.4 - 675
João 5.465 - 152 6.26 -109 7.38 - 693
Judas 145 - 693
Atos 1.20 - 388
Tiago 4.55 - 693