Coleção PSICOLOGIA TRANSPESSOAL 5/V
Orientação editorial DR. PIERRE WEIL
Da mesma coleção: 1. Pierre Weil: A Consciência Cósmica. 2. Swami Krishananda: Meditação Oriental. 3. Maria Helena Andrés: Caminhos da Arte. 4. Pierre Weil: Fronteiras da Regressão. Em prepa ro: Leonard G. B.: Educação e Êxtase.
CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, R J
P479 Pequeno tratado de psicologia transpessoal / Pierre Weil ... | etal. |. — Petrópolis: Vozes, 1978. (Coleção Psicologiatranspessoal; n. 5/1 a V). Conteúdo: Vol. 1: Cartografia da consciência humana. Vol. 2: Mística e ciência. Vol. 3: Psico fisiologia da consciência cósmica. Vol. 4: Expe riência cósmica e psicose. Vol. 5: Medida da cons ciência cósmica. Bibliografia. 1. Psicologia transpessoal I. Weil, Pierre II. Série. CDD — 154 78*0153 CDU — 159.96
MEDIDA DA CONSCIÊNCIA CÓSMICA Pequeno Tratado de Psicologia Transpessoal, vol. V RAYMOND P RIN cE K A RLIS O SiS EDWIN BOKERT M A R Y LOU C A R LS0N PIERRE WEIL LUIZ FLÁVIO COUTO SUZANA EZE0U IEL DA CUNHA
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VOZESy Petrópolis 1978
Os direitos desta edição revertem em benefício da SÍNTESE (Sociedade de Integração Transpessoal, Estrutural, Social e Energética de Minas Gerais, Av. Álvares Cabral, 441, Belo Horizonte), organização de fim não lucrativo. Foram cedidos por Dr. Jim Fadiman, em nome da Revista Transpersonal Psy chology, dos EUA.
Direitos de publicação reservados à Editora Vozes Ltda. Rua Frei Luís, 100 25.600 Petrópolis, RJ
Diagramação Valdecir M ello
SUMÁRIO
Raymond Prince l. EDITORIAL: AS EXPERIÊNCIAS MÍSTICAS SÃO COMUNS?, 9 Karlis Osis, Edwin Bokert e Mary Lou Carlson II. DIMENSÕES DA EXPERIÊNCIA MEDITATIVA, 15 Pierre Weil, Luiz Flávio Couto e Suzana Ezequiel da Cunha III. A CONSCIÊNCIA CÓSMICA E SUAS VARIÁVEIS, 55
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EDITORIAL: AS EXPERIÊNCIAS MÍSTICAS SAO COMUNS?*
* Este Editorial foi extraído da Newsletter Review, The R.M. Bucke Memorial Society for the Study of Religious Experiences. Volume VII, n° 1 e n* 2, primavera de 1974.
RAYMOND PRINCE
Até o ano passado, a questão de se as experiências mís ticas são raras ou comuns nunca tinha recebido uma rés^posta bastante satisfatória. Neste número incluímos uni resumo de uma monografia que apresenta os resultados preliminares de um estudo pioneiro neste assunto, realizado por Greeley e McCready. Membros de um grupo de pesquisa altamente experimentado, sediado em Chicago (NORC), eles apresentaram suas descobertas, no último outono, à Socie dade de Estudo Científico da Religião, em São Francisco. Esta pesquisa não é inteiramente sem precedentes. Marghanita Laski (1961) diz o seguinte, com relação ao seu famoso estudo: «Meu primeiro desejo foi saber se estas experiências de êxtase eram raras ou comuns», mas, como ela nos diz, não teve meios de entrevistar uma porção repre sentativa da população, mas apenas seus amigos. Sua pergunta-chave era: «Você conhece uma sensação de êxtase transcendente?» Se a resposta era «sim», ela continuava a questionar a respeito das circunstâncias que causaram o êxtase, sua natureza, a freqüência da experiência, e assim por diante. Ela nos diz que teve somente que fazer a per gunta a 63 de seus amigos para receber 60 respostas posi tivas! De fato, a maioria de seus amigos eram indivíduos criativos, dos níveis mais altos da escala social, tais como escritores, produtores de rádio, artistas, etc. Subseqüente mente, tentou coletar dados de uma população de classe mais baixa através da distribuição de questionários nas caixas de correio de uma centena de casas de uma área de trabalhadores em Londres. Somente onze destes questioná-
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rios foram devolvidos, e somente em um deles a perguntachave fora respondida positivamente. Embora o estudo de Laski seja, de modo claro, mais qualitativo do que quanti tativo, ela conclui (p. 275) que «a habilidade para desfrutar experiências de êxtase é bastante mais comum entre pessoas inteligentes, bem formadas e criativas». Um segundo estudo importante é o de Basil DouglasSmith (1971). Seu enfoque foi de algum modo diferente. Ele partiu em busca de uma amostra de pessoas que tives sem tido experiências místicas religiosas, e para «configurar fatos suficientes . . . para possibilitar uma comparação a ser feita entre místicos religiosos, por um lado, e psicóticos e neuróticos por outro.» Com este objetivo, publicou a seguinte carta em nove jornais ingleses: Estou empenhado na pesquisa sobre a natureza do misticismo. Reconheço três tipos de misticismo: misticismo teístico, no qual a pessoa que percebe sente-se como se estivesse consciente de Deus de maneira direta; misticismo natural, no qual a pessoa que percebe torna-se consciente de uma Mente na Natureza; e misticismo monista, no qual a pessoa que percebe sente-se como a Mente Una-e-Ünica. Caso qualquer dos leitores tenha passado por qual quer um desses três tipos de experiência, eu ficaria muito grato por uma pequena descrição de tal expe riência, juntamente com a idade em que a experiên cia se deu. Douglas-Smith enviou indagações semelhantes aos mem bros da Sociedade de Pesquisa Psíquica e de outras Socie dades cujos componentes se esperava que estivessem ocupados com tais assuntos. As pessoas que responderam positivamente receberam em seguida um questionário cuja finalidade era a de elicitar informações suplementares. Alguns milhares de cartas foram recebidos. Destas, con sideraram-se 211 como relatando experiências místicas reli
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giosas válidas. As análises demonstraram que os respondentes viviam em relativa harmonia e uniformidade com o sexo e uma esmagadora maioria provinha das camadas superiores da escala social. Com relação à idade, houve convergências em torno de 20 e de 35 anos. Os resultados pareceram demonstrar que estas experiências religiosas ocorreram numa população de características completamente diferentes daquela em que a psicose e outros tipos de Psico patologia eram mais freqüentes. O estado de Greeley e McCready é claramente muito mais sofisticado do que qualquer um destes estudos prévios. Uma coerência interessante nos três é a correlação positiva entre a experiência e a classe social. O estudo de Chicago, contudo, descobriu uma preponderância de homens no seu grupo de êxtase, enquanto que Laski e Douglas-Smith acharam um equilíbrio homens-mulheres. O estudo de Chicago sustenta a descoberta de Douglas-Smith de que aqueles que passam pela experiência estão em boa saúde mental. Eles descobriram que seus «místicos» relatam um estado de «bem-estar psicológico substancialmente maior do que a média nacional». Também descobriram que os mís ticos de cor branca eram provavelmente, de modo bem significativo, menos racistas do que a média nacional. Surpreendentemente, nenhum destes estudos menciona a meditação como uma causa imediata das experiências mís ticas. Também surpreendente foi a descoberta do grupo de Chicago, de que nenhuma das pessoas de sua amostra rela tou sua experiência mística como havendo sido induzida por droga. O relatório final deste importante estudo será de grande interesse. Tradução de Ricardo de Britto Rocha BIBLIOGRAFIA Laski, Marghanita (1961). Ecstasy. A Study of some Secular and Religious Experiences, Londres: The Cresset Press. Douglas-Smith, B. (1971). An Empirical Study of Religious Mysticism, Brit. J. Psychiat. 118:549-54.
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II DIMENSÕES DA EXPERIÊNCIA MEDITATIVA *
Este artigo foi extraído 1973, p. 109-135.
do
Journal
of
Transpersonal
Psychology,
N*
2,
K A R LIS osis, EDWIN BOKERT, M A R Y LOU CARLSON American Society for Psychical Research
Do ponto de vista histórico, a meditação é sobretudo uma prática que visa à indução da experiência religiosa. Ela difere da oração, porque a oração é uma inclinação predo minantemente verbal (silenciosa ou não) para uma divin dade pessoal externa. A meditaçãonão é necessariamente dirigida a uma divindade, mas refere-se mais à indução de mudanças no próprio meditante. Embora possam ser usados meios verbais (p. ex., cantos, estribilhos), em geral a ênfase está em práticas não-verbais. Alguns exemplos dessas prá ticas são o «silêncio mental» que se obtém através da exclu são de pensamentos e imagens, ou a «concentração mental» pela observação da própria respiração, da chama de uma vela, ou através da fixação de imagens mentais, como a de um lótus, de uma mandala, de uma luz, do semblante de Cristo ou de algum guru. A meditação efetiva induz a mudanças radicais no modo de experienciar do meditador. Ele é descrito em termos como «consciência expandida», «unidade», «estar na luz», etc. O estado meditativo é classificado como um estado alterado da consciência (Tart, 1969). Embora ele possa ter alguns elementos em comum com outros estados alterados da consciência, tais como a experiência hipnótica ou de droga psicodélica, os meditantes tendem a enfatizar a natu reza espiritual de sua experiência. Neste aspecto ele se assemelha mais à «experiência culminante» (peak-experience), que é um estado alterado da consciência descrito por Maslow em 1968.
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Contudo, as dimensões psicológicas do estado meditativo ainda não foram determinadas. Neste artigo, relatamos qua tro experimentos nos quais tentou-se descobrir essas dimen sões. Isso foi feito através das informações obtidas em questionários que os sujeitos responderam antes e após as sessões grupais de meditação realizadas em nosso laborató rio. Os resultados foram submetidos a uma análise fatorial. Esperávamos que esta análise nos possibilitasse uma defi nição mais clara dos diferentes aspectos do estado medita tivo. Pelo que sabemos, esta é a primeira aplicação da aná lise fatorial ao estudo da meditação. Na seleção dos sujeitos nos defrontamos com o seguinte problema: escolheríamos somente pessoas que praticassem uma técnica particular, ou incluiríamos também pessoas de orientações diferentes? Baseando-nos numa revisão da lite ratura da meditação, e em entrevistas feitas com meditadores experimentados, decidimos planejar nosso estudo a partir da hipótese de que diferentes técnicas de meditação, caso sejam bem sucedidas, abarcarão os mesmos tipos de pro cessos essenciais. Esta suposição é de fato bastante radical, não sendo necessariamente compartilhada pelos praticantes de meditação das diversas escolas. Não obstante, os teóricos da religião comparada, tais como Otto (1960), Stace (1960), Clark (1960) e Smith (1965), têm detectado dimensões experienciais que atravessam o condicionamento cultural e as diferenças individuais. De modo semelhante, estudos de experiências culminantes espontâneas, de caráter religioso, como, por exemplo, os de James (1963) e Laski (1968), sugerem que os eventos que desencadeiam estas experiên cias podem ser extremamente diferentes: a oração, estar no cume de uma montanha, dar à luz uma criança, etc. As diferenças na natureza destes eventos não parecem deter minar o conteúdo e a qualidade da experiência religiosa. Suponhamos, portanto, que as enormes diferenças de proce dimentos de meditação somente enriqueçam as dimensões universais mais amplas da experiência espiritual. Esperáva mos que esta última dominaria a cena e se cristalizaria em
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nossa análise fatorial. Na prática, tanto num estudo-piloto quanto nos nossos quatro experimentos, sujeitos provenien tes de tradições diferentes pareciam aprender muito uns com os outros, e convergir em suas experiências. A história da prática meditativa e o nosso próprio trabalho exploratório indicam que a meditação não pode ocorrer completamente num vácuo cognitivo. Parece que um conceito central é uma crença numa realidade espiritual sentida como mais ampla e de maior valor (mas que freqüentemente inclui) do que o eu pessoal. A realidade espiritual é conceitualizada como algo que pudesse ser ativado nas profunde zas do ser de uma pessoa. Tanto esta ativação quanto as mudanças de personalidade são consideradas como os meios primários para se alcançar um contato com a realidade espi ritual que abrange todas as coisas.1 Em todas as religiões encontramos a suposição de que o homem não é uma ilha, tendo a capacidade de transcender a si mesmo, de atingir algum tipo de contato com a realidade, que está além das suas capacidades sensomotoras. Isto pode ser expresso como um sentimento de «harmonia», «unidade», «samadhi», de se «estar enraizado no solo do ser», ou como diz o Bhagavad Gita (1951, p. 67): Aquele que se inflama com a alegria E sofre com a tristeza De cada uma das criaturas Dentro de seu próprio coração Tornando como sua Cada alegria e cada tristeza, A este eu considero como o mais alto De todos os iogues.
1. A meditação, especialmente na abordagem zen, freqüentemente é apresen tada como não exigindo nenhuma pretensão, nenhuma fé especial. Contudo, na prática, a meditação tanto no zen quanto em outras tradições religiosas se alterna com conferências e leituras de textos de doutrina. Um mestre zen pode enfatizar a abordagem experiencial não-verbal e produzir um livro de complexa teologia (Yasutani, 1966).
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Diz-se com freqüência que uma tal continuidade entre o eu e o outro tem como resultado a aquisição de capaci dades extraordinárias que atualmente seriam chamadas de ESP (percepção extra-sensorial). Existe uma grande quan tidade de material anedótico que sugere a existência de poderes ESP em algumas personalidades religiosas alta mente desenvolvidas. Diz-se que Moisés obteve uma água divina no deserto do Sinai; Jesus «viu» a Natanael sob a figueira, antes de chegar a tal lugar e antes de o chamar; Ramakrishna (1952) «viu» seu discípulo principal, Vivekananda, muito tempo antes de encontrá-lo; e diz-se que Ramana Maharshi induziu a experiência religiosa em alguns de seus discípulos «concentrando-se» neles (Osborne, 1963). Baba Ram Dass (que se chamava anteriormente Richard Alpert) (1971) foi convertido por um guru que parece ter aprendido muito a seu respeito através da telepatia. A ESP é ainda um assunto controvertido, embora a Ame rican Association For the Advancement of Science tenha reconhecido, em 1969, o estudo da ESP como uma pesquisa científica legítima, quando aceitou a Parapsycological Asso ciation como um de seus membros. Tem havido muitos estu dos meticulosos que evidenciam a realidade da ESP. Senti mos que a relação entre a experiência meditativa e a ESP, tantas vezes sustentada, deveria ser testada, e por isso sub metemos os nossos sujeitos experimentais a testes de ESP após as sessões de meditação. Relacionamos então os resul tados dos testes de ESP às respostas dos questionários, que descreviam os estados meditativos do sujeito, e também aos fatores que se derivaram de tais respostas. Embora todos os nossos sujeitos fossem no mínimo aber tos para a possibilidade de ESP, e muitos deles estivessem realmente interessados no desenvolvimento de tais habili dades, esperávamos que houvesse atitudes defensivas e de inibição em relação à ESP. Este assunto é ainda um tabu na nossa cultura, e muitos ensinamentos religiosos conside ram que um interesse por «poderes ocultos» desvia a atenção do aspirante de sua tarefa principal, que é o seu crescimento
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espiritual. Desenvolvemos uma série de medidas da ESP, e também um modelo de processamento de informação da ESP destinado a diminuir as defesas contra a ESP. Estas medidas exigem extensas explicações técnicas para os leito res que não estão familiarizados com a parapsicologia. Uma vez que a maioria dos leitores provavelmente estará interes sada somente numa explanação geral dos nossos resultados de ESP, daremos uma breve descrição destes resultados, indicando a leitura de uma publicação anterior para aqueles que desejarem maiores detalhes (Osis & Bokert, 1971). O presente artigo dará somente uma descrição ampla da nossa pesquisa sobre a experiência meditativa. Após a meditação, os sujeitos preencheram um questio nário referente à experiência meditativa. Além disso, eles haviam respondido a um pequeno questionário sobre o seu estado de ânimo logo antes da sessão. Usando ambos os questionários na mesma análise fatorial, conseguimos deter minar a extensão da relação que havia entre os estados meditativo e pré-meditativo do sujeito. Algumas, ou todas, as dimensões meditativas representariam um continuum do estado pré-meditativo, ou seria o estado meditativo um esta do alterado da consciência nitidamente descontínuo. Havia dois resultados possíveis que nos dariam alguma resposta a esta pergunta: as informações do questionário que ante cedeu à sessão estariam misturadas em fatores que descre viam a experiência religiosa, ou elas se reduziriam a um fator nitidamente distinto? Portanto, os experimentos tinham dois objetivos prinei-f pais: 1) determinar as principais dimensões da experiência meditativa, e 2) testar as possíveis relações existentes entre estas dimensões ao registro de ESP. Os nossos experimen tos também lançaram alguma luz sobre dois tópicos rela cionados: o grau de universalidade da experiência medita tiva, por atravessar diferentes tradições religiosas, e o grau em que o estado meditativo do indivíduo é contínuo ou des contínuo ao seu estado mental anterior.
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OS EXPERIMENTOS Fizemos um estudo-piloto e quatro experimentos. Usa mos essencialmente o mesmo plano experimental nos quatro, mas os sujeitos variaram. Foram introduzidos refinamentos nos métodos de ano a ano, especialmente na testagem de ESP.
Seleção dos sujeitos Distribuímos questionários aos membros da American Society for Psychical Research e às platéias de conferências da associação, que perguntavam a respeito de estados de consciência modificados, tanto espontâneos quanto autoinduzidos. As pessoas que responderam positivamente foram convidadas para entrevistas em grupos, em que se discuti ram as suas experiências. A partir dessas entrevistas de seleção, formamos grupos de seis a oito pessoas, cuidado samente selecionadas de acordo com suas compatibilidades e experiências de meditação ou experiências espirituais ante riores. A maioria era do sexo feminino, na faixa de idade compreendida entre 20 e 60 anos. A maioria era formada de profissionais de vários campos diferentes, dos quais alguns já vinham praticando meditação há muitos anos, enquanto outros eram relativamente principiantes. No estudo-piloto e no experimento I houve dois grupos; nos experimentos II, III e ÍV houve três grupos. Como já dissemos, selecionamos sujeitos provindos de diversos backgrounds religiosos: uma pessoa que havia experienciado a iluminação zen, um praticante do raja ioga, um quaker, um judeu hassídico, um católico, um membro do New Thought Movement, etc. Tentamos formar os grupos de modo bem heterogêneo para diminuir a influência de sistemas religiosos particulares. Ressaltamos os objetivos experienciais da prá tica meditativa. Procuramos selecionar aqueles sujeitos para os quais a meditação significava uma procura de significado e de crescimento de suas vidas.
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Procedimentos de meditação Durante um período que variou de seis a oito meses, cada grupo se encontrou para sessões semanais de duas horas. Após um breve período de socialização, em cada uma das sessões, o sujeito avaliava o seu estado de ânimo num questionário especialmente elaborado para este fim. Isto feito, K.O. lia freqüentemente um poema ou algum trecho da literatura de meditação. O ambiente era escureci do, seguindo-se um período de silêncio de meia hora. Os sujeitos eram encorajados a seguir a prática de meditação que eles pessoalmente achavam ser a mais eficaz. Alguns usavam os métodos zen e ioga, outros uma imaginação profunda espiritualmente orientada ou técnicas de concen tração. A maioria sentava-se em cadeiras, mas outros utili zavam almofadas para fazer posturas especiais. A ilumina ção ambiente variava da semi-obscuridade à escuridão completa. Após o período de meditação, os sujeitos eram submetidos a testes de ESP. Preenchiam um questionário de duas pági nas descrevendo as suas experiências na meditação, e eram gravados os relatos dessas experiências. Em seguida o grupo discutia informalmente a sessão. os questionários Ambos os questionários foram desenvolvidos no estudopiloto em íntima colaboração com os sujeitos, que eram os nossos críticos mais valiosos. A primeira versão dos ques tionários encontra-se num artigo já publicado a respeito dos experimentos (1971). O questionário de pré-sessão consistia em quatro itens que mediam diferentes aspectos do estado de ânimo em que a pessoa iniciaria a sessão. Todos os itens desse e do outro questionário possuíam uma escala de nove pontos, representando um continuum que ia de um a outro extremo.
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Figura 1
Questionário pré-sessão (1) Sinto-me muito feliz e contente comigo mesmo. (2) Sinto-me muito cansado.
Estou muito descontente co migo mesmo. Meu sentimento é de gran de vitalidade. Sinto-me muito abatido.
(3) Sinto-me muito anima do. (4) Sinto-me muito ansioso e agitado.
Sinto-me tade.
bastante
à
von
Tentamos fazer com que o questionário pós-sessão fosse tão abrangente quanto possível, para que incluísse todos os tipos principais de experiências que os sujeitos pudessem ter durante a meditação. Tentamos também focalizar as dimensões principais da experiência meditativa descritas na literatura psicológica e histórica. Tentamos manter o ques tionário bem próximo à fenomenologia da experiência do meditante, evitando também termos associados a qualquer sistema de fé particular. O questionário pós-sessão empre gado nos experimentos I, II e III possuía 24 itens. Antes da realização do experimento IV, consultamos novamente os sujeitos, do que resultou uma revisão do questionário. Foram retirados 2 itens, acrescentaram-se 7 novos, e outros foram ligeiramente reformulados, obtendo-se com isso um total de 30 itens.
Os testes de ESP Foram usados dois tipos de teste de ESP. No teste de TV, o sujeito tentava deixar a mão mover-se automatica mente para o «alvo» ESP, que era um dos vinte e cinco quadrinhos de uma matriz quadrada que se encontrava dian te dele. Um outro membro do grupo, em um local isolado, observava num monitor de TV os movimentos da mão do sujeito. Este segundo sujeito possuía uma lista de alvos randomicamente selecionados, e tentava usar a ESP para guiar a mão do primeiro sujeito para o alvo escolhido. Foram usados dez alvos por sujeito em cada sessão.
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O outro teste de ESP empregou alvos pictóricos: ou slides, que eram vistos por um outro membro do grupo num local isolado, ou ilustrações, lacradas em grandes enve lopes, entre duas folhas de cartolina. Em ambos os casos, o sujeito escrevia ou desenhava, em papel branco, as suas impressões do alvo, Foram usados cinco alvos por sujeito em cada sessão. As correspondências entre os alvos e as impressões dos sujeitos eram avaliadas através de um jul gamento imparcial, feito por duas pessoas que usaram um sistema de graus de correspondência. A ANÁLISE FATORIAL Usamos o método ortogonal Verimax de análise fatorial.3 Uma vez que estávamos basicamente interessados nas di mensões experienciais gerais e não nas diferenças indivi duais, a unidade usada na análise fatorial foi o sujeitosessão (dados de um sujeito em uma sessão). Os experimentadores (geralmente 1 ou 2 por sessão) foram consi derados como sujeitos, pois eles também meditavam com os grupos e respondiam os questionários. Na amostra do experimento I houve 13 sujeitos e 197 sujeito-sessões, no experimento II, 25 sujeitos e 405 sujeito-sessões; no expe rimento III, 23 sujeitos e 443 sujeito-sessões; e no experi mento IV, 23 sujeitos e 380 sujeito-sessões.
2. A análise fatorial é um poderoso procedimento estatístico para separar dimensões básicas dos dados de uma massa de várias medições. Ela é ampla mente usada em psicologia, para determinar características básicas de per sonalidade, etc. Em essência, ela agrupa os itens (em nosso caso, as escalas psicológicas de ambos os questionários) em grupos naturais, ou fatores, baseando-se nas intercorrelações. Então cada item é pesado de acordo com a sua importância para o fator através de uma quantidade chamada "saturação” , que pode possuir um sinal positivo ou negativo. Os itens com grandes saturações são os que descrevem o fator. A análise fatorial ortogonal Verimax produz fatores que não se correlacionam mutua mente (Osis & Bokert, 1971).
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Figura 2
Questionário pós-sessão DATA
NOME (1) Para mim a medita ção transcorreu extrema mente bem. (2) Vi muitas imagens vi suais durante a meditação. (3) Minhas imagens visuais eram relevantes para a me ditação. (4) Fiquei bastante sono lento durante a meditação. (5) Durante a meditação alcancei uma grande sereni dade.
A meditação foi muito po bre. Não experienciei nenhuma imagem visual. Minhas imagens me dis traíam e eram irrelevantes para a meditação. Fiquei extremamente alerta e completamente acordado. Não experienciei nenhuma serenidade que estivesse além dos meus sentimentos costumeiros. Meu corpo ficou muito re laxado e livre de tensões.
(6) Às vezes meu corpo fi cou extremamente tenso e rijo. (7) Tive uma enorme sen sação de proximidade a ou tros membros do grupo; todas as barreiras que nos separavam haviam desapa recido. (8) Em nenhum momento deixei de ter uma forte sen sação de mim mesmo como um indivíduo distinto dos outros. (9) Tive poucos pensamen tos durante a meditação. (10) Em geral, meus pen samentos me distraíam, e eram irrelevantes para a meditação. (11) Experienciei, às vezes, sentimentos de amor ou alegria muito intensos. (12) Senti continuamente a grande sensação de delimi tação entre mim e o mundo ao meu redor.
Não experienciei nenhuma sensação de proximidade a outros membros do grupo.
Experienciei uma fusão com os outros; transformei-me no grupo e o grupo se transformou em mim. Minha mente estava cheia de muitos pensamentos. A maioria dos meus pensa mentos era relevante para a meditação. Não tive consciência de ne nhum sentimento positivo durante a meditação. Experienciei um sentimento de união no qual haviam se dissolvido os limites en tre mim e o mundo.
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Não senti nenhum influxo de energia durante a medi tação.
(13) Senti uma grande on da de energia ou poder dentro de mim, ou ao meu redor. (14) Durante a meditação, senti-me, às vezes, extrema mente frustrado. (15) Meus insights e co nhecimentos foram muito profundos e significativos. (16) Hora nenhuma tive uma sensação de afirma ção.
Não experienciei nenhuma vez qualquer sentimento de frustração. Não experienciei nenhum insight profundo. Às vezes senti uma profun da sensação de afirmação; tudo que existe é bom e de grande valor. Não senti nenhuma vez uma presença amedrontadora. Não tive qualquer consci ência de sons ou de ruídos.
(17) Senti, às vezes, uma presença amedrontadora. (18) Às vezes, tornei-me intensamente consciente de sons e ruídos durante a meditação. (19) Tive a capacidade de deixar à solta completamen te, deixar a meditação acon tecer sem qualquer esforço ou controle de minha parte.
Não tive a capacidade de deixar à solta; tudo o que ocorreu na meditação foi continuamente controla do por meus próprios es forços. Após a sessão, senti-me ex traordinariamente revigora do e cheio de energia.
(20) Minhas experiências durante a meditação deixa ram-me completamente fati gado. (21) Em nenhum instante experienciei a vida como trágica e impermanente. (22) Minha experiência não envolveu quaisquer modifi cações de percepção sensorial.
Às vezes tive uma profun da sensação da tragédia e da impermanência da vida. Durante ou após a medita ção, objetos ou sons pare ceram tomar qualidades sensoriais extraordinárias, tais como brilho, vibração, clareza. Minhas experiências apre sentaram flutuações e varia ram consideravelmente du rante a meditação. Senti que todos os meus recursos internos estavam inteiramente ao meu dispor.
(23) Minhas experiências se mantiveram no mesmo nível durante toda a medi tação. (24) Senti-me, às vezes, desligado de meus recursos internos.
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Algumas vezes, bastante ansioso.
(25) Estive bastante rela xado e livre de ansiedades durante a meditação. (26) Meu estado de cons ciência não se modificou durante a meditação. (27) Não experienciei sen timentos de raiva durante a meditação. (28) Minha atenção e mi nha consciência estavam quase que inteiramente di rigidas para meu ambiente exterior. (29) Minha experiência me ditativa foi extremamente intensa. (30) Durante o teste de ESP tive vontade de voltar à meditação.
senti-me
Meu estado de consciência se modificou acentuadamente. Experienciei, ocasionalmen te, intensos sentimentos de raiva. Minha consciência estava completamente dirigida para dentro. Minha experiência meditati va não foi de modo algum intensa. Hoje eu estava feliz ao prosseguir com o teste de ESP.
Encontramos seis fatores que aparecem em 3 ou 4 dos experimentos, e três fatores (um deles composto principal mente dos novos itens do questionário do experimento IV) dos quais cada um apareceu uma vez. Na nossa opinião, somente os fatores replicados indicam dimensões reais da meditação, e por isso restringiremos nossa discussão a eles. Os seis fatores replicados são: transcendência de si mesmo e sinceridade; estado de ânimo no qual o sujeito iniciou a sessão, ambos aparecendo em todos os quatro experimentos; e intensificação e mudança de consciência, dimensão signi ficado, exclusão forçada de imagens e sucesso geral na meditação, dos quais todos apareceram no mínimo, em três dos experimentos (tabela 1). As tabelas de 2 a 5 fornecem os fatores dos experimentos I, II, III e IV, respectivamente. Os itens com saturação de ao menos 0,3 sob cada fator são listados de acordo com a capacidade de saturação.s Ao discutirmos esses fatores, 3, No estudo-piloto e nos dois primeiros experimentos descobrimos serem ótimas cinco rotações, que produziam cinco fatores: eles não eram nem muito gerais (com muitos itens altamente saturados), nem muito específicos (com poucos itens altamente saturados). Também tentamos realizar tantas rota-
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separaremos os itens de que eles constam, isto é, que cumu lam o fator ao nível 0,3 ou acima, em itens de núcleo (os que constituíam parte do fator na maioria dos experimentos em que ele aparecia) e itens periféricos (que eram parte do fator a metade ou menos da metade das vezes em que ele era identificado). Assim podemos definir o fator con forme itens centrais apenas e avaliar a sobreposição entre os fatores, de acordo com o número de itens centrais que eles compartilham.
Tabela 1
Dimensões que aparecem nos experimentos de I a IV EXPERIMENTOS
FATORES Transcendência de si mesmo e abertura Estado de ânimo no qual a pessoa iniciou a sessão Significado intensificação e mudança de consciência Exclusão vigorosa de imagens Sucesso geral na meditação Enriquecimento energizado Silêncio mental Experiência negativa *
III
IV
I II III I II III III I II III II III III I
IV
I II
IV IV IV IV
Transcendência de si mesmo e abertura Este fator foi sugerido no estudo-piloto e apareceu nos quatro experimentos. Teve um núcleo central de quatro itens. Os itens de núcleo indicam relação do indivíduo com o resto ções quanto possível, coerentes com a obtenção de fatores que intuitivamente pareciam estar unificados. No experimento IV, um fator adicional pareceu necessário para acomodar muitos dos novos itens do questionário, acrescen tados para aquele experimento. No experimento III cinco rotações produ ziram um fator raramente geral e quatro outros, a maioria dos quais era relativamente pobre de conteúdo. Sete rotações foram necessárias para pro duzir fatores mais equilibrados. Parece que naquele experimento as expe riências relatadas pelos sujeitos eram mais globais ou unificadas, isto é, tinham a tendência a se modificar ao longo de todas as dimensões simulta neamente. * Principalmente os novos itens introduzidos no experimento IV.
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do mundo, entre as realidades subjetiva e objetiva. Na meditação, os limites normalmente bem demarcados do eu podem tornar-se difusos, ou, em alguns casos, inexistentes. Isto pode ser sentido na forma de proximidade a outros membros do grupo (unidade): «Tive uma sensação avas saladora de proximidade a outros membros do grupo; todas as barreiras que nos separavam haviam se dissolvido»; ou na forma de uma inclusão dos outros dentro dos limites do seu próprio eu: «Senti uma fusão com os outros; tornei-me o grupo, e o grupo tornou-se eu». Pode-se também ressal tar um sentimento não pessoal de unidade com a realidade exterior: «Experienciei um sentimento de unidade, no qual os limites entre aquilo que eu sou e aquilo que está fora de mim se dissolveram». Um quarto item de núcleo expressa sentimentos de alegria ou de amor. Nenhum dos itens teve saturação negativa neste fator. Os quatro itens de núcleo parecem sê-lo também em rela ção ao fator «intensificação e mudança de consciência». Entretanto, à exceção de «alegria e amor», todos os itens de núcleo têm cargas muito superiores em «transcendência de si mesmo e abertura». Estes itens descrevem bem as dimen sões gerais deste fator mais importante. Damos alguns exemplos de descrições livres de alguns sujeitos como ilus trações que podem fornecer tanto uma «sensação» deste fator como também maiores insights a seu respeito. Por exemplo, parece ter desvanecido qualquer sentimento de se paração com relação ao ambiente: «Alguém tossiu, ‘Deve ter sido eu’». A unidade social é freqüentemente «vista» em imagens naturais: «Senti como se o grupo inteiro fosse como que feixes de trigo amarrados no centro, e o sol se punha, amadurecendo este feixe de trigo». Algumas vezes, imagens do organismo parecem expressar o sentimento de unidade: «Senti que o grupo havia se transformado numa parte de uma entidade maior, como se fosse parte da cavi dade toráxica. O meu batimento cardíaco identificou-se com o seu batimento cardíaco. Tudo estava num estado de pulsação».
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A transcendência de si mesmo de modo algum se limita às emoções. Diz-se, por exemplo, que a forte unidade psicofísica de uma personalidade torna-se radicalmente alterada. O eu é subitamente percebido como não mais equivalente ao corpo: por exemplo, partes periféricas do corpo não mais se incluem no domínio do eu. «Tornei-me inconsciente de parte do meu corpo. Minhas mãos se tornaram como algo que não fizesse parte de mim. Elas se tornaram tão com pletamente relaxadas que parecia que eu não mais possuía mãos, o mesmo acontecendo a meus pés.» Mesmo a parte central do corpo pode perder sua identidade com o eu: O que notei a seguir foi algo realmente novo para mim, uma sensação de não possuir corpo. Tive um sentimento de ser somente uma cabeça suspensa num espaço infinito, talvez nem mesmo uma cabeça, so mente um ponto ou um foco de consciência. Eu sabia que eu ainda possuía um corpo, mas ele parecia estar em algum outro lugar, e a cadeira na qual eu estava sentado, o quarto, e tudo o mais pareciam estar um pouco afastados de mim. Não muito longe, mas era uma espécie de separação que eu nunca havia experienciado anteriormente. A imagem corporal não é mais o centro absoluto ao redor do qual se organiza o mundo perceptual. As relações espaciais podem mudar completamente: «Tive uma expe riência ocular interessante, na qual a orientação do quarto sofreu uma rotação de quase 90o». Um assistente de labo ratório relatou que: «Quando abri os olhos, as pessoas que estavam dentro do meu campo visual pareciam duas vezes maiores do que normalmente». As constâncias de brilho parecem também modificar-se. Tudo é mais brilhante, mais iluminado. As relações de tempo mudam drasticamente: o tempo subjetivo torna-se muito mais longo ou curto do que o tempo cronométrico. Mesmo o modo de percepção dualístico, na sua totalidade, se altera
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e recebe estranhas qualidades, nas quais o eu e o não-eu parecem menos articulados: Subitamente tive a sensação de que meu rosto de saparecera, era como que um vácuo, uma escura abertura, e os pensamentos e as coisas estavam vindo em minha direção, absorvidos no meu ser. A mente oscila através da matéria, ou age através da matéria... Eu estava olhando para uma área escura de água e então tive o pensamento de que o processo de ver envolvia também a coisa que estava sendo vista, e assim ela se tornou como que um olho que estava olhando para mim. Existe uma seqüência — as mudanças no sistema perceptual parecem seguir-se à transcendência do eu social: «Houve profundos sentimentos de amor por cada uma das pessoas do grupo. Então comecei a experienciar luz, que se tornou cada vez mais intensa. Foi como se eu esti vesse deixando-me para trás e estivesse imerso em luz». À transcendência do eu social parece também preceder ESPs espontâneas. Algumas vezes, imagens bastante deta lhadas foram compartilhadas por membros do grupo: «A impressão que se seguiu foi a de nós todos juntos, como num amontoado de pessoas num jogo de futebol (ameri cano), todos se abraçando, de cabeça baixa, como se esti véssemos escutando alguma coisa». O experimentador que se encarregava desta sessão (E.B.) teve exatamente a mes ma imagem: Amontoado de pessoas como num jogo de futebol, de cabeça baixa, escutando.
Estado de ânimo no qual a pessoa iniciou a sessão Este fator é o mais compacto e independente, aparecendo em todos os quatro experimentos e compreendendo o esta do de ânimo pré-sessão que incluía exaltação, contentamento consigo mesmo, ausência de ansiedade e vitalidade. O ta
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manho relativo das saturações colocou estes itens quase que invariavelmente na ordem acima mencionada: a exaltação sempre foi o mais saturado, e a vitalidade, o menos satu rado. Embora levemos em consideração o fato de que o Estado de Ânimo pré-sessão tenha sido medido separadamente, parece estar claro que ele representa uma entidade que é inteiramente diferente dos aspectos dos estados alte rados de consciência medidos pelo questionário pós-sessão. Nenhum de seus itens-núcleo apareceu sob qualquer dos outros fatores. Nenhum outro fator (e nenhum outro item) representa uma continuação do estado de ânimo no qual a pessoa começou a meditação.
Intensificação e mudança de consciência Este fator apareceu nos Experimentos I, III e IV. Ele parece ser o fator mais central e complexo. Treze (ou seja, a metade) dos itens do questionário pós-sessão são itensnúcleo deste fator. Ele possui também itens-núcleo que o são também de todos os fatores replicados, com exceção de Estado de Ânimo pré-sessão. Consideramo-lo central por estar mais relacionado às outras dimensões do que qualquer outro fator. Para que pudéssemos descrever melhor este fator, inspe cionamos os cinco itens que obtiveram as saturações mais altas em cada um dos experimentos. Dois deles estavam sempre entre os mais altos: «Minha experiência de medi tação foi extremamente intensa» e «Meu estado de cons ciência modificou-se acentuadamente». Dois outros itens apareceram ao grupo dos mais saturados, em dois de três experimentos: «amor e alegria», e «enriquecimento perceptual» («...objetos ou sons pareceram se carregar de qua lidades sensoriais extraordinárias, por exemplo, brilho, vibra ção, clareza, etc.»). Havia um enriquecimento emocional e perceptual. No experimento IV introduzimos um item que se referia a uma onda de energia («Senti uma grande onda de energia dentro de mim, ou ao meu redor»), e ele pareceu ser o item
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mais saturado do fator. Os itens de núcleo do fator «trans cendência de si mesmo e abertura» são também itens de núcleo com saturações inferiores com relação à «intensifi cação e mudança da consciência». Outros itens de núcleo são o sentimento de que a sessão foi boa e «afirmação do exterior». Dois itens de «dimensão significado» foram tam bém itens de núcleo deste fator: «insights profundos» e uma «sensação de presença». Dois outros itens de núcleo de saturações menores ressaltam o aspecto energizador: «revigorado após a sessão» e «recursos internos dispo níveis». O s psicofisiologistas geralmente simplificam demais os processos incluídos neste fator: certamente ele não se resu me num despertar de um estado de imobilidade para outro de hiperatividade, mas inclui um processo bastante complexo. A intensificação e mudança de consciência podem ser acom panhadas por uma ativação organísmica, como acontece no processo criativo de fazer uma escultura ou de escrever um poema. Uma observação de um psicólogo que foi um dos sujeitos pode dar uma idéia disso: Eu comecei a ver luz e a ser parte dela. Esta sensa ção tornou-se mais intensa. Minha respiração tor nou-se acelerada, meu coração começou a bater mais rápido e eu me senti extremamente quente, embora a sala tivesse ar condicionado. Eu me fun dia cada vez mais com a luz. «Presença e clareza mental», «vida» e «vibração de ser» são outras metáforas que foram usadas. Do mesmo modo que há mais música por minuto nas composições de Mozart e de Beethoven, tam bém há mais coisas significativas acontecendo na presença da consciência intensificada.
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Dimensão significado A dimensão significado foi encontrada nos experimentos I, II e III. É um fator bastante compacto que possui cinco itens de núcleo e três itens periféricos. Houve dois itens que foram proeminentes em todos os experimentos, que indicam a relevância das imagens e dos pensamentos para os sujei tos: estas imagens e pensamentos são mais do que distra ções. Outros itens de núcleo são a experiência de que «minha compreensão e insights tornaram-se bastante profundos e significativos», uma «sensação de presença» e «alerta». A busca de significado apareceu com freqüência nas fantasias dos sujeitos, por exemplo, simbolizada por imagens da des coberta de um tesouro afundado ou de uma jóia brilhante: «Senti que a luz (da jóia) era um símbolo de todo o co nhecimento». Exclusão vigorosa de imagens Este fator apareceu nos experimentos II, III e IV. Possui cinco itens de núcleo e quatro periféricos. O aspecto pre dominante é tensão: saturações negativas em relaxamento, serenidade e afirmação do exterior ( « . . . tudo que existe é bom e de grande valor»); e saturações positivas em alerta. O outro elemento é a ausência de imagens visuais, indicando que o pólo oposto desta dimensão é uma fantasia semelhan te à dos estados hipnagógicos: «Comecei a ser incomodado por estranhos pensamentos, e o período de meditação transformou-se numa espécie de batalha. Com a mesma rapidez com que eu apagava um pensamento estranho da minha mente, dois ou três outros se introduziam furtivamente nela». Em outras ocasiões esta sua disciplina de «apagar os pen samentos» foi completamente eficiente. Sucesso geral na meditação Este fator foi identificado no estudo-piloto e nos experi mentos II, III e IV. Ele consiste de cinco itens de núcleo de sete itens periféricos. O item mais geral «para mim, a meditação transcorreu extremamente bem» foi proeminen
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te nos três experimentos, como também os itens «expe riência mantida no mesmo nível» e «recursos internos dis poníveis». Em dois experimentos, os itens «poucos pensa mentos» e «ausência de imagens visuais» também foram incluídos. Este fator aparentemente inclui alguns aspectos do fator silêncio mental que apareceu no experimento I. Esta dimensão é relativamente confusa, parecendo descrever uma experiência de satisfação serena.
Fatores não replicados Os fatores silêncio mental e enriquecimento de energia não foram replicados. Entretanto, um dos fatores não repli cados, experiência negativa, merece algumas considerações. Em nosso último experimento, introduzimos novos itens no questionário que davam aos sujeitos a oportunidade de ex pressar emoções (p. ex., ansiedade, raiva, frustração) que pareciam estar resistindo a seus esforços de meditação. Na tabela 5, os títulos dos itens refletem o fim positivo da escala, mas todas as saturações são negativas. Resultados de ESP Realizamos três tipos diferentes de avaliação dos dados de ESP: 1. testou-se a hipótese nula, isto é, se os escores de ESP eram diferentes de coincidências casuais; 2. avaliouse a covariação entre os fatores de meditação e a ESP (in cluindo todos os sujeitos); 3. também se avaliou a covaria ção intra-sujeito. Damos aqui somente uma visão geral dos resultados destas análises bastante complicadas. Houve trinta e nove sujeitos tomando parte no teste de TV de ESP, com um total de 424 sessões do teste. No teste de slide ou gravura, houve 17 sujeitos tomando parte, com um total de 217 sessões. O escore total do teste de slide e de gravura para os quatro experimentos em conjunto (os valores atribuídos pelos dois juizes aos mesmos dados sub metidos a um sistema de média) foi significativamente supe rior ao nível esperado por acaso (z= 3,40; P = 0,0006).
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Os escores totais do teste de TV não foram significativos estatisticamente. As variações diárias das experiências de meditação foram expressas em escores de fator. Nós os relacionamos, agru pados por experimento e por teste, aos escores de ESP através da Stepwise Multiple Regression Analysis. A maio ria dos fatores de meditação pareceram covariar com os escores de ESP nos testes de TV. Deduziu-se isso a partir da predominância de regressões positivas em transcendên cia de si mesmo e abertura, estado de ânimo em que a pessoa iniciou a sessão, dimensão significado e experiência negativa. Entretanto, intensificação e mudança de consciên cia deu resultados misturados (diferentes para experimentos diferentes). O teste de slide e gravura ofereceu resultados que pareceram sistematicamente relacionados somente a dois fatores: intensificação e mudança de consciência estava as sociado a um aumento do escore de ESP, e sucesso geral na meditação, a uma diminuição. TABELA 2
Descrição de fatores e saturações. Experimento I FATORES E ITENS
SATURAÇÃO
I. Transcendência de si mesmo e abertura Coesão com os outros* Sensação de que foi uma boa sessão Unidade com o grupo * Unicidade com o externo Relax ação Serenidade Afirmação do externo Senso de presença Reanimado depois da sessão Recursos internos disponíveis Amor e alegria
0,45 0,62 0,60 0,59 0,59 0,57 0,47 0,43 0,37 0,37 0,32
A proporção da Variância total atribuída a cada fator, em ordem numérica é: Experimento I: 11%, 1%, 9%, 8% e 9%, Experimento II: 3%, 3%, 3%, 4% e 3°/o. Experimento III: 6%, 8%, 5%, 6%, 5%, 6% e ll°/o. Experimento IV: 13%, 8%, 9%, 7%, 3% e 6%.
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II. Silêncio mental Ausência de imagens visuais Estado de alerta Ausência de consciência de ruído Experiência mantida no mesmo nível Poucos pensamentos Enriquecimento de percepção Insights profundos Reanimado depois da sessão Coesão com os outros
0,54 0,44 0,44 0,44 0,38 0,39 0,38 0,31 0,31
Estado de ânimo com que a pessoa iniciou a sessão 0,84 Animação * 0,82 Libertação de ansiedade 0,82 Satisfeito consigo 0,41 Grande vitalidade 0,33 Espontaneidade Dimensão significado Imagens visuais relevantes* Pensamentos relevantes * Insights profundos * Estado de alerta * Senso de presença * Recursos internos disponíveis
0,79 0,77 0,50 0,38 0,35 0,33
Intensificação e mudança de consciência Intensificação da consciência * Modo de experienciar modificado * Amor e alegria * Enriquecimento de percepção * Segurança Reanimado após a sessão * Insights profundos * Unidade com o grupo * Sensação de que foi uma boa sessão * Experiência transposta para o teste
0,70 0,60 0,54 0,53 0,48 0,41 0,37 0,34 0,34 0,33
* Itens de núcleo (v. p. 27).
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TABELA 3
Descrição de fatores e saturações. Experimento II FATORES E ITENS
SATURAÇÃO
I. Transcendência sobre si mesmo e abertura Unicidade com o externo Coesão com os outros Unidade com o grupo Modo de experienciar modificado Amor e alegria Segurança
0,43 0,41 0,37 0,35 0,34 0,31
II. Estado de ânimo com que a pessoa iniciou a sessão Animação * 0,55 Contente consigo * 0,54 Libertação de ansiedade * 0,42 Vitalidade * 0,41 III. Dimensão significado Imagens visuais relevantes* Pensamentos relevantes * Insights profundos*
0,48 0,47 0,34
IV. Exclusão vigorosa de imagens Relaxação * Afirmação do externo * Estado de alerta * Ausência de imagens visuais* Serenidade * V. Sucesso geral de meditação Recursos internos disponíveis* Sensação de que foi uma boa sessão* Poucos pensamentos* Experiência mantida no mesmo nível * Serenidade Reanimado após a sessão * Itens de núcleo (v. p. 27).
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— 0,50 — 0,50 0,33 0,32 — 0,30
0,41 0,38 0,35 0,33 0,31 0,31
TABELA 4
Descrição de fatores e saturações. Experimento III FATORES E ITENS
SATURAÇÃO
I. Dimensão significado Pensamentos relevantes * Imagens visuais relevantes* Estado de alerta * Amor e alegria Senso de presença* Sentimento de que foi uma boa sessão
0,59 0,54 0,48 0,42 0,41 0,33
II. Estado de ânimo com que a pessoa iniciou a sessão Animação * 0,81 Contente consigo * 0,79 Libertação de ansiedade * 0,78 Vitalidade * 0,59 III. Sucesso geral na meditação Sentimento de que foi uma boa sessão * Falta de consciência de ruído Experiência mantida no mesmo nível * Recursos internos disponíveis * Ausência de imagens visuais * Estado de alerta IV. Exclusão vigorosa de imagens Relaxação * Espontaneidade Serenidade* Ausência de imagens visuais * Afirmação do externo * Recursos internosdisponíveis Sentimento de que foi uma boa sessão V. Enriquecimento energizado Reanimado depois da sessão Segurança Enriquecimento de percepção Experiência transposta para o Serenidade * Itens de núcleo (v. p. 27).
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teste
0,54 0,46 0,37 0,41 0,33 0,32 — 0,56 — 0,49 — 0,41 0,41 — 0,38 — 0,34 — 0,31 0,52 0,51 0,4,1 0,41 0,41
VI. Transcendência de si mesmo e abertura Coesão com os outros * Unidade com o grupo * Unicidade com o externo * Amor e alegria * Segurança VII. Intensificação e mudança de consciência Intensificação da consciência * Modo de experienciar modificado * Insights profundos* Senso de presença* Recursos internos disponíveis * Unicidade com o externo * Sentimento de que foi uma boa sessão * Amor e alegria * Pensamentos relevantes * Coesão com os outros * Enriquecimento de percepção * Ausência de imagens visuais Afirmação do externo *
0,70 0,70 0,48 0,37 0,35 0,78 0,64 0,54 0,47 0,49 0,42 0,41.39 0,39 0,39 0,36 0,33 0,32 0,31
TABELA 5
Descrição de fatores e saturações. Experimento IV SATURAÇÃO
FATORES E ITENS I. Intensificação e mudança de consciência Onda de energia+ Modo de experienciar modificado * Intensificação da consciência * Enriquecimento de percepção * Amor e alegria * Insights profundos Senso de presença * Serenidade Sentimento de que a sessão foi boa * Afirmação do externo * Reanimado após a sessão * Recursos internos disponíveis * Unidade com o grupo * Unicidade com o externo * Itens de núcleo (V. p. 27). + Novo item no questionário do experimento IV.
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0,66 0,63 0,62 0,60 0,59 0,57 0,54 0,53 0,53 0,52 0,44 0,41 0,39 0,36
Coesão com os outros Espontaneidade
0,32 0,32
Estado de ânimo com que a pessoa iniciou a sessão 0,86 Animação * Contente consigo * 0,79 Libertação de ansiedade * 0,76 Vitalidade * 0,53 Nenhum sentimento de tragédia da vida + 0,33 Transcendência de si mesmo e abertura Unicidade com o externo imagens visuais relevantes Pensamentos relevantes Unidade com o grupo * Falta de consciência de ruído Coesão com os outros * Poucos pensamentos Sentimento de que foi uma boa sessão Intensificação da consciência Afirmação do externo
0,61 0,60 0,60 0,57 0,53 0,49 0,4S 0,36 0,32 0,30
Sucesso geral de meditação Experiência mantida no mesmo nível * Espontaneidade Poucos pensamentos * Ausência de frustração + Recursos internos disponíveis* Sentimento de que foi uma boa sessão * Intensificação da consciência Serenidade
0,61 0,52 0,51 0,51 0,44 0,39 0,34 0,33
Exclusão vigorosa de imagens Estado de alerta * Ausência de imagens visuais* Coesão com os outros Relaxação *
0,51 0,43 — 0,37 — 0,32
Experiência negativa Livre de ansiedade durante a sessão+ Nenhum sentimento de raiva * Ausência de frustração + Consciência dirigida para o interior + Amor e alegria Recursos internos disponíveis Afirmação do externo Nenhum sentimento de tragédia da vida +
— 0,59 — 0,55 — 0,53 — 0,42 — 0,38 — 0,33 — 0,32 — 0,31
* Itens de núcleo (v. p. 27). + Novo item no questionário do experimento IV.
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Os resultados do teste de TV pareceram ser bastante de finidos, mas as correlações pobres do teste de slide e gra vura apresentaram um problema: seriam todos os dados não correlacionados, ou as correlações de sujeitos indivi duais iam em direções diferentes, de modo que se anulavam mutuamente? Realizamos o teste de correlação de Pearson (método de regressão de Pearson) entre os escores de ESP de câda sujeito que possuía oito ou mais sessões de teste de ESP por experimento, e os escores do sujeito em cada um dos itens do questionário. Vinte e seis sujeitosdo teste de TV e dezessete sujeitos do teste de slide e gravura tiveram o número de sessões exigido. * Estes resultados individuais dão um quadro bastante diferente dos resultados do grupo. A maioria das correlações com ESP foram nega tivas; esta tendência foi mais forte nos dados do teste de TV, onde ela se aplicou aos itens para cada um dos fato res. Esta tendência foi bastante surpreendente, e poste riormente tentamos esclarecer através de análises mais amplas. Este trabalho tornou-se realmente um trabalho de detetive. Como mencionamos anteriormente, as perspectivas tradicionais freqüentemente caracterizam a ESP como um obstáculo ao desenvolvimento espiritual; Poderia esta atitu de negativa estar também presente em alguns de nossós sujeitos, causando assim repressão da ESP? Separamos os prováveis «repressores» daqueles sujeitos que pareciam estar abertos para a ESP, pelos critérios de seus próprios escores: «receptivos» se seus escores estives sem acima do nível esperado por mera casualidade; «repres sores» se seus escores estivessem abaixo do nível esperado como se devendo ao acaso. Realmente descobrimos que as correlações negativas individuais com ESP estavam concen tradas nos «repressores», mas não num grau marcante. Observamos, contudo, que realmente alguns sujeitos não gostavam de interromper uma boa meditação para se sub meterem aos testes de ESP. Assim, no experimento IV, in4. Para simplificar as interpretações dos resultados, estamos agrupando os itens por fator (sob o qual o item tinha uma saturação de 0,30 ou mais).
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troduzimos no questionário um item que visava avaliar «re sistência à tarefa» («durante o teste de ESP eu queria voltar à meditação»), o qual suspeitávamos que estivesse interfe rindo nos desempenhos dos sujeitos nos testes de ESP. Resistência à tarefa era o ressentimento que os sujeitos pode riam sentir com a interrupção de uma meditação gratificante para se sujeitarem aos testes de ESP. Se isto constasse, poderia anular a esperada influência favorável de uma boa meditação sobre os escores de ESP, pois seria mais difícil interromper uma boa meditação do que uma pobre. Divi dimos os sujeitos na mediana de seus escores médios neste item em dois grupos: os relativamente afetados e os relati vamente não afetados pela resistência à tarefa. Os sujeitos que mostravam pouca resistência à tarefa tiveram uma ligeira predominância de relações positivas sobre as relações negativas entre suas ESPs e os escores do item. Aqueles que possuíam maior resistência à tarefa tinham relações forte mente negativas entre este item e o escore de ESP. Talvez tivéssemos conseguido finalmente pegar o réu: resistência à tarefa! O questionário pré-sessão era respondido antes da medi tação, ou seja, antes que se manifestasse qualquer resistên cia à tarefa. Quando omitimos as correlações com os quatro itens do questionário pré-sessão, os resultados tornaram-se bastante definidos: quase todas (86%) as correlações de alta resistência à tarefa foram negativas, ao contrário dos 37% de correlações negativas dos sujeitos de baixa resis tência à tarefa. A resistência à tarefa e a repressão de informação de ESP neutralizaram as associações positivas entre a experiência meditativa e os testes de ESP.
DISCUSSÃO A meditação é classificada, descrita e interpretada de modos bastante desnorteantes e diversos. É possível que algumas ou todas estas divergências se devam mais às
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idiossincrasias dos autores do que à meditação. Tentamos reduzir a nossa própria subjetividade introduzindo métodos de análise fatorial nos quais o computador bastante impar cialmente isola as dimensões realmente contidas nos dados. Entretanto, é um segredo que todos sabem o fato de que o que se extrai da análise fatorial é qualquer coisa que nela se introduza, e esta tendenciosidade vem especialmente da seleção dos itens do questionário. Tentamos de certa forma anular esta possibilidade convidando os sujeitos a participarem na elaboração dos itens, isto é, os primeiros esboços dos questionários foram totalmente discutidos com os sujeitos, como uma tentativa de chegarmos a um consenso. Tentamos oferecer questões que tornariam possível a dife rentes sujeitos a expressão do que eles experienciaram na meditação. Neste sentido, os sujeitos eram experimentadores participantes. De fato, também os grupos são tendenciosos, mas sentimos que a participação dos sujeitos na elaboração dos itens de algum modo ampliou os fundamentos e enfra queceu as tendências do experimentador. Na nossa expe riência, a participação dos sujeitos causou uma profunda inflação nas opiniões preconcebidas dos experimentadores. Parece que necessitamos no mínimo seis fatores para descrevermos os nossos dados. Um deles se refere aos esta dos pré-meditativos, e se demonstrou completamente distinto dos outros. Os outros fornecem dimensões fenomenológicas da experiência de meditação. Cinco destes fatores da expe riência de meditação são replicados no mínimo três vezes, e são razoavelmente estáveis no sentido de que persistiram de ano a ano. São eles: transcendência de si mesmo e abertura, intensificação e mudança de consciência, a dimen são significado, forte exclusão de imagens e sucesso geral na meditação. O fator experiência negativa apareceu tão logo introduzimos no questionário itens que cobriam as experiências negativas. Esta dimensão bastante provavel mente é uma pseudodimensão, que tem pouco a ver com a meditação bem sucedida e que expressa os opostos da afirmação e da profunda aceitação de si mesmo e dos outros.
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Parece expressar o sentimento de que a meditação sofreu interferência. É encorajador que, a despeito da afirmação quase uni versal de que a experiência meditativa é inefável, estejam surgindo dimensões claras. E, além disso, estas dimensões não parecem expressar estados de consciência cotidianos: o modo de experienciar modificou-se definidamente. Os itens do estado de ânimo cotidiano que foram medidos em nosso questionário pré-meditação não se saturaram apreciavelmente em quaisquer outros fatores da experiência de meditação, e formaram um outro fator forte e compacto. Os comentários livres dos sujeitos sustentam a perspectiva de que a meditação bem sucedida leva a estados alterados de consciência. Estas dimensões verdadeiramente refletem os aspectos essenciais da experiência de meditação, ou somente os siste mas de fé dos sujeitos? Sentimos que o fato de que nossos sujeitos tinham diferentes backgrounds religiosos e usavam técnicas diferentes fortalece a hipótese de que as dimensões essenciais foram reveladas, e enfraquece a hipótese do siste ma de fé, porque as várias convicções de diferentes sujeitos se anularão mutuamente. Mais tranqüilizador ainda é o fato de essas dimensões principais concordarem com as tendên cias básicas da experiência espiritual encontrada na litera tura clássica, tanto oriental quanto ocidental. Os sujeitos foram encorajados a expressar francamente suas experiên cias, mais do que suas crenças, e nossa impressão é a de que eles assim o fizeram.
Transcendência de si mesmo e abertura está em íntima ligação com a mais básica dimensão da experiência religiosa que foi identificada pelos psicólogos da religião. Clark (1964) chama-a «a consciência unitária». Stace (1960) enfatiza-a acima de outras dimensões: «A Unidade, o Uno, que devemos encontrar, é a experiência central e o conceito central de todo o misticismo, qualquer que seja o seu tipo...» Transcendência de si mesmo foi experienciada por
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nossos sujeitos como uma modificação gradual que pode ria ocorrer em maior ou menor grau em diferentes sessões — não o fenômeno tudo-ou-nada, freqüentemente indicado na literatura religiosa. Somente nas muito poucas experiên cias culminantes intensas (peak experience), relatadas por nossos sujeitos em suas gravações após as sessões, eles sen tiram «a perda do self — que eu não mais existia». A experiência de unidade e de identidade é mais comumente interpretada como abertura para o mundo interno e externo, ou seja, como diminuição das defesas contra o exterior e também contra as camadas mais profundas da personalidade. Nossa pesquisa sugere que estas interpre tações são válidas num sentido limitado, mas que elas não vão muito longe. Os místicos orientais e ocidentais são qua se unânimes em relação ao fato de que há algo maiS: uma consciência direta de forças que estão além do alcance de uma psique individual. Os sujeitos bastante freqüentemente respondiam os itens do questionário em seu grau extremo: «Sentimento de União, como se os limites entre o que eu s o u e o mundo tivessem se dissolvido». «Experienciei uma fusão com os outros, como se eu tivesse me transformado no grupo e o grupo tivesse se transformado em mim». Na verdade, é notável que muitas pessoas bem formadas e atualizadas de nossos grupos se expressam em termos que tomam a transcendência de si mesma literalmente. Mas isto significa realmente que os limites comuns do eu foram transcendidos no sentido de que o não-eu, o sujeito da cadeira mais próxima ou mesmo a realidade em sua totali dade, tornou-se de algum modo acessível à consciência dire ta? Em outras palavras, existem indícios empíricos para uma real consciência na dimensão transpessoal, tal como ela é definida por Elmer e Alice Green (1971)? De fato, tais experiências poderiam também ser auto-enganos. Pode ria ser que o sentimento de transcendência de si mesmo é somente um borbulhar de emoções, enquanto que o sujeito na realidade está tão desligado dos outros sujeitos como alguém que estivesse sentado sob uma cúpula geodésica
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Buckminster Füller, em perfeito isolamento? Esta é uma hipótese que necessita um teste empírico. Existem relatos de pessoas realizadas espiritualmente (Swedenborg, Ramakrishna) portadoras de enormes poderes de ESP, mas nós temos também visto pessoas que pretendem estar na «cons ciência cósmica», cuja sensibilidade não é muito maior do que a de um tanque de guerra. Nossos dados de ESP têm alguma relação com esta questão. Os resultados de ESP foram bastante modestos. Nenhum de nossos sujeitos poderia ostentar resultados dos testes de ESP muito sólidos — como se poderia esperar dos Aforis mos de Ioga de Patanjali (1953). Não é verdade que, quando alguém se senta em meditação, as «portas da per cepção» se apresentarão automaticamente abertas. Ocasio nalmente, pegamos as «portas» entreabertas e então observamo-las se fechando rapidamente — uma inferência de nossas análises correlacionais. A experiência de «união» ou de «fusão com o grupo» é verificada por nossos resulta dos só de maneira superficial. Poderia ser completamente ilusória? Seria precipitado fazer tal afirmação. Realmente, observamos indícios do oposto: havia mais acontecendo do que os testes de ESP revelaram. Em primeiro lugar, é quase que impossível pegar o sujeito com testes de ESP quando sua experiência de transcendência de si mesmo está no seu pleno vigor. Como constatamos a partir de entrevistas com os sujeitos, a situação de teste de tarefa orientada acabava rapidamente com a disposição meditativa, apesar dos esfor ços que os sujeitos faziam para mantê-la; somente uma tênue presença da transcendência de si mesmo parecia ainda permanecer. Possuímos provas quantitativas de que a resis tência à tarefa que surgiu na rivalidade entre a meditação e as tarefas de ESP dificultaram os resultados dos testes. As descrições de fantasias iguais compartilhadas por diversos membros do grupo também indicaram que as «por tas da percepção» estavam mais abertas durante a medita ção do que durante a realização dos testes. Por exemplo, após algumas sessões, os relatos dos sujeitos, gravados
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separadamente, mostrariam que eles tinham percebido as mesmas coisas na meditação, como por exemplo um cálice, uma fonte de uma forma particular, pessoas morenas saindo de um lago. Os limites individuais de nossos sujeitos pode riam estar realmente «fundindo» em alguma extensão. O modelo de psicologia transpessoal de Eimer Green (1971) sugere a transcendência de si mesmo numa escala gigan tesca. Poderíamos testar somente algo incomparavelmente menor. Contudo, a parapsicologia tem acumulado conside rável massa de informação que poderia ser pertinente ao modelo de Green, e a análise deste material em relação a seu modelo seria um empreendimento valioso. A parapsico logia poderia se transformar numa nave espacial utilizável para explorações empíricas no domínio transpessoal por parte para os psicólogos que escolhem esta como sua área de trabalho.
Intensificação e mudança de consciência é um fator de bastante amplitude, indicando uma covariação íntima entre energização e mudança, tanto quanto enriquecimento perceptual, sentido de presença, insights profundos, amor e alegria. Este conjunto de itens persiste de ano a ano, indi cando a natureza global das mudanças induzidas pela medi tação. As dimensões da experiência meditativa não devem ser consideradas como coisas isoladas, mas antes como partes intimamente integradas de um todo pulsante, vivo e pensante. A intensificação é descrita como uma experiência central na literatura histórica. A energização que é experienciada como um influxo de «poder» ou «mana» é tratada por R. Otto (1960) e outros. A literatura indiana descreve os «ca belos em pé» como um sinal de autenticidade da experiên cia. Os nossos sujeitos também tomaram os sintomas fisio lógicos de excitação como um sinal de algo mais importante acontecendo para eles, por exemplo, intensidade do experienciar. Alguns deles usaram expressões tais como «poder grupai», contato com um «campo de energia» ou «vida
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livre». Esta qualidade experiencial de ser carregado por alguma espécie de campo transpessoal não foi comparti lhada por outros sujeitos, que atribuíram a energização a seus próprios organismos, por exemplo, ao conceito psicanalítico de redução de conflito ou à idéia hindu do levantar do poder de kundalini desde a base da espinha. Há algum crédito tanto para o conceito de liberação de energia pessoal quanto para o transpessoal. A pesquisa parapsicológica identifica experimentalmente a psicocínese (PK), um poder da «mente sobre a matéria» (Rhine, 1970) ou uma ação à distância de organismos vivos. Aparente mente, o homem pode também influenciar outros organismos vivos (Grad, 1970), especialmente na situação de cura espi ritual. Os conceitos transpessoais são necessários para ex plicar intensificação e mudança de consciência? Não sabe mos. Sentimos que a informação está dentro do alcance da ciência, se variáveis parapsicológicas adequadas (PK) forem incluídas na pesquisa sobre a meditação. A dimensão significado da meditação parece ter menos correlações com os resultados de ESP. Uma interpretação poderia ser que a experiência do sujeito, de algo importante e pessoalmente significativo, tende a obscurecer a mensagem de ESP e fazer com que ela pareça trivial em comparação com a outra. Talvez a função de ESP seja algo diferente das tarefas dos testes. Os testes de ESP são todos dirigi dos a uma averiguação de uma certa imagem ou impulso na mente do emissor. Mas os relatos espontâneos dos sujeitos com relação a contatos extra-sensoriais com outros indi cam um processo radicalmente diferente: uma espécie de harmonização entre pessoas, uma procura e um encontro de alma mais do que uma apreensão de um conteúdo mental particular. Uma tal harmonização interpessoal é um aspecto muito real da meditação, e desenvolveram-se relações huma nas de um tipo mais profundo, menos egoístas, entre alguns, mas não todos, dos membros do grupo. A dimensão forte exclusão de imagens parece se relacio nar mais aos procedimentos específicos usados na medita
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ção do que à experiência que o procedimento visa propiciar. As saturações do fator indicam que o sujeito está tenso, está se forçando com uma determinação inflexível — uma disciplina necessária para os estágios iniciais. Sucesso geral na meditação parece indicar o que o nome diz: a meditação é agradável e está indo bem. Este fator é bastante amplo para fornecer insights sobre os processos envolvidos.
Estado de ânimo no qual a pessoa iniciou a meditação marca nitidamente as diferenças entre a experiência de me ditação e o estado de ânimo do dia; ele não mostra pratica mente nenhuma superposição com os fatores que contêm experiências da meditação. O estado meditativo não é sim plesmente uma continuação do estado de ânimo pré-sessão. A relativa estabilidade de nossos fatores, de experimento a experimento, apesar da mudança de sujeitos, parece refle tir elementos comuns na própria experiência meditativa, como também elementos comuns na situação experimental, e sustenta a nossa impressão de que diversos indivíduos e abordagens diversas, apesar de tudo, cobrem as mesmas dimensões básicas da meditação. Parece que ao redor de 40% de nossa variância reflete geralmente dimensões que se mantiveram estáveis de experimento a experimento. Um começo modesto, nós o sentimos, foi feito através da apli cação de uma combinação de métodos psicológicos costu meiros (análise fatorial) e da parapsicologia para eviden ciar aspectos das experiências de meditação. Isto funcionou de certo modo. O instrumental de pesquisa tocou pontos chamados intangíveis e forneceu uma informação útil. Estamos bastante cientes das limitações das escalas introspectivas utilizadas em nossas análises fatoriais, como também das dificuldades de testagem de ESP. Mas elas nos dizem coisas a respeito das quais as ondas cerebrais são silenciosas e às quais os REMs (rapid eyes movement) não piscam. Certamente é hora de ampliar as abordagens de pesquisa e de utilizar todos os recursos metodológicos da instituição psicológica. Nestes experimentos nós estamos
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tentando definir aspectos de uma experiência, a meditação, cujo objetivo é contestar toda a categorização, isto é, pro duzir um estado mental além de toda descrição. Pode-se dizer que nossos fatores no mínimo definem algumas dimen sões das experiências de pessoas que estão buscando ou que estão no processo de alcançar um tal estado. Tradução de Ricardo de Britto Rocha BIBLIOGRAFIA Ciark, W . H. Mysticism as a basic concept in defining the religious seíf. Lumen vitae, 1964, 19, 221-232. Grad, B. Healing by the laying on of hands: Review of experiments and implications. Pastoral Psychol., 1970, 206, 19-26. Green, E. E., Green, A. M. On the meaning of transpersonal: Some metaphysical perspectives. /. Transpersonal Psychol., 1971, 1, 27-46. James,W . The varieties of religious experience. New Hyde Park, N. Y.: University Books, 1963. Laski, M. Ecstasy. Westport, Conn.: Greenwood Publ. Corp., 1968. Maslow, A. H. Toward a Psychologyof being (2* ed.). Princeton: Van Nos trand, 1968. Osborne, A. Romana Maharshi and the path of self-knowledge. Londres: Rider, Osis, K., Bokert, E. ESP and changed states of consciousness induced by meditation. J.A.S.P.R., 1971, 65, 17-65. Otto, R. (j. W . Harvey, Trad.). The idea of the holy. Nova Iorque: Oxford University Press, 1960. Patanjali (Swami Prabhavananda e C. Isherwood, Trad.). How to know God: The yoga aphorisms of Patanjali. Hollywood, Cal.: Vedanta Press, 1953. Ram Dass. Be here now. San Cristobal, N.M.: The Lama Foundation, 1971. Ramakrishna (Swami Nikhilananda, Trad.). The gospel of Sri Ramakrishna. Nova Iorque: Rama'krishna-Vivekananda Center, 1952. Rhine, L. M. Mind over matter. Nova Iorque: Macmillan, 1970. Smith, H. The religious of man. Nova Iorque: Harper & Row, 1965. The song of God: Bhagavad Gita (Swami Prabhavananda e C. Isherwood, Trad.). Nova Iorque: New American Library, 1951. Stace, W . T. Mysticism and philosophy. Nova Iorque: Lippincott, 1960. Tart, C. T. (Ed.) Altered states of consciousness: A book of readings. Nova Iorque: John Wiley, 1969. Yasutani, Hakuun (Eido Tai Shimano, Trad.). Eight beliefs in Buddhism. Jerusalem: Lychenheim & Son, Ltd., 1966.
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in A CONSCIÊNCIA CÓSMICA E SUAS VARIÁVEIS Uma abordagem psicométrica
PIERRE WEIL, LUIZ FLAVIO COUTO E SUZANA EZEOUIEL DA CUNHA Pesquisa realizada na Universidade Federal de Minas Gerais (Departamento de Psicologia e Instituto de Ciências Exatas)
COLABORADORES Pessoal auxiliar: aplicação de questionários José Iwaldo Morais Drumond Lúcio Vaz Sampaio José D’Âvila Fonseca Lina Márcia Silveira Sérgio de Castro Pércio Magalhães Ageu Heringer Lisboa Gabriel Juarês de Andrade
Colaboradores diretos: Prof* Mestra Stella Green Machado Prof* Adjunta de Matemática — ICEX/UFMG e colaboradora no Centro de Computação e Estatística da Reitoria da UFMG Assunto: amostragem Prof» Marília Campos — Prof* de Psicologia Social da FAFICH/UFMG Assunto: programação da pesquisa para computador
A CONSCIÊNCIA CÓSMICA E SUAS VARIÁVEIS
Uma abordagem psicométrica 1. Introdução Nestes últimos anos tem surgido um novo ramo da psico logia: a psicologia transpessoal, cuja finalidade é o estudo dos estados alterados da consciência (Altered States of Consciousness) e mais particularmente o estudo da chamada «consciência cósmica», também conhecida por «experiência mística». Os aspectos teóricos e metodológicos já se fizeram objeto de uma publicação (Weil, 1975) e por isto faremos aqui apenas um pequeno resumo para o leitor não avisado. A consciência cósmica é o nome que inúmeros autores têm dado a um estado de consciência experimentado e des crito por místicos de todo o mundo. Estes estados não têm sido objeto de estudos científicos, particularmente entre psi cólogos, pois sempre se pensou que tal fenômeno se situava aos antípodas da ciência por ser demasiado «subjetivo», quando não era considerado como um fenômeno patológico. Certo número de fatores estão contribuindo para mudar radicalmente as posições da psicologia a respeito do assun to; entre os principais podemos citar: L As descrições, pela física moderna, da existência de uma dimensão fora do tempo-espaço e de uma potencialização da energia numa fonte única, assim como a redução da matéria à energia, se assemelham (quando
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não se confundem) com as visões dos místicos e das pessoas que atingiram estados de consciência cósmica (Le Shan, 1973; Puthoff e Tart, 1974). O estudo psicofisiológico de grandes iogues ou budistas zen em estado de meditação tem revelado alterações sensíveis nos registros metabólicos, respiratórios, eletrocardiológicos e eletroencefalográficos; estes registros permitem acompanhar, com bastante precisão, os esta dos das pessoas que entram ou saem do estado medita tivo (Brosse, 1963; Das, Wallace e Benson, 1972; Tart, 1957; Kamiya, 1969). Estudos de biofeedback confirmam estas medidas, pois demonstram a possibilidade, por condicionamento operante, de se controlarem as ondas alfa eletroencefalográficas, as quais são uma das características dos esta dos meditativos assim como dos fenômenos psi e pk da parapsicologia (Kamiya, 1969). A psicanálise, já há muito tempo, vem se preocupando com o que Freud chamava de «experiência oceânica» e que é atribuída a um fenômeno de regressão a serviço do ego. Em recente trabalho, temos emitido a hipótese de que se trataria de uma regressão a níveis pré-uterinos bastante arcaicos; a hipótese da existência de memó ria celular vem reforçar esta posição (Weil, 1974). A psicofarmacologia, graças ao LSD, tem confirmado plenamente as descrições de Huxley sobre As Portas da Percepção. Existem realmente estados de consciência em que as pessoas saem da dimensão tempo-espaço e têm uma experiência de caráter inefável, perdem o medo da morte, pois viveram «experiencialmente» a parte eterna do seu eu como parte integrante de um eu maior (Huxley, 1966; Leary, 1970; Grof, 1975). A parapsicologia assinala que fenômenos de clarividên cia, clariaudiência, muitas vezes comprovados, acompa nham a evolução em direção à consciência cósmica (Mitchell, 1975; Grof, 1975). A parapsicologia faz hoje parte integrante da Associação Americana de Psicologia
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Científica, e considera a consciência cósmica como um dos poderes chamados «paranormais» do homem (Rhine e Brier, 1968; Soai e Baterman, 1968). A psicologia existencial tem assinalado e insistido sobre o valor terapêutico de certas experiências que Maslow chamou de «culminantes» e sobre as quais fizemos um trabalho em português (Weil, 1969). A nossa experiên cia clínica de psicodrama analítico também confirma esta posição (Weil, 1974). Há quem afirme mesmo que a esquizofrenia seria uma viagem regressiva para alcançar a consciência cósmica, viagem interrompida ou contrariada pelos tratamentos psiquiátricos clássicos e às vezes pela contratransferência ansiosa de psicanalistas (Laing, 1974). Os trabalhos de Jung, demonstrando a existência de arquétipos como ponte simbólica e energética entre o inconsciente individual e o inconsciente coletivo, aceita vam certos fenômenos parapsicológicos que ele chamava de «sincronicidade». Ele mesmo teve uma experiência de consciência cósmica que descreve nas suas memórias (Jung, 1970). A história das religiões e a antropologia religiosa, sob a liderança de Mircea Eliade (1959), demonstraram o caráter universal da experiência mística e descreveram toda uma tecnologia do êxtase, que varia em função da cultura, mas que apresenta certos caracteres comuns, tais como o uso de vibração sonora, concentração em objetos interiores ou externos, respirações especiais, posturas de relax completo, regimes alimentares e muitas vezes abstinência sexual (Weil, 1975). A análise de conteúdo, visando comparar experiência cós mica de várias culturas, tem revelado uma certa identi dade em torno de critérios que fizeram objeto de várias descrições (Bucke, 1902; Tart, 1969; White, 1972).
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Os — — — — — — — — —
critérios em geral aceitos são os seguintes: sentimento de realidade da experiência percepções não usuais inefabilidade fenômenos transensoriais experiência fusional êxtase transcendência de tempo-espaço transitoriedade da experiência mudanças posteriores de comportamento e valores — perda do medo da morte.
Como mostramos no trabalho já citado, há necessidade de aperfeiçoamento destas análises de conteúdo, pois são elas suscetíveis de tratamento estatístico como é o caso de um TAT ou de um Rorschach. Estamos fazendo esforço neste sentido na UFMG. Recentes trabalhos de psicometria mostraram existir certas dimensões da ex periência meditativa, assim como a possibilidade de sub meter este tipo de experiência à análise fatorial (Bekert e Carlson, 1973). Nesta experiência foi usado o método ortogonal Verimax de questionários aplicados antes e depois de sessões de meditação. Seis fatores foram isolados, a saber: transcen dência de si mesmo (fusão eu-outros), estado de ânimo (paz, contentamento, ausência de ansiedade), intensificação e mudança de consciência (fusão com luz, percepções ener géticas, vibrações intensas etc.), dimensão «significado» (sentimento de que a experiência é profunda e significativa), exclusão forçada de imagens (tentativas de eliminar ima gens e pensamento) e sucesso geral da meditação (parece ser um sentimento posterior de satisfação serena). Também foi demonstrado ser possível fazer levantamen tos estatísticos da freqüência deste tipo de experiência em determinada população (Prince, 1974).
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Este autor cita algumas, indicando a presença de expe riências místicas em pessoas normais, inteligentes e cria tivas, com pouca influência de meditação ou droga; haveria experiências místicas espontâneas numa população normal. Todos estes fatos levam os autores a aceitar a existência de uma percepção de outra ordem de realidade e a colocar em evidência que a nossa ciência só se baseia num nível de consciência orientada pelos cinco sentidos. Como mostra Tart (1971), há necessidade de se criar outra ou outras ciências fundamentadas em outros estados de consciência. Convencionamos chamar de CEC 1 (Ciência de Estado de Consciência 1) a ciência atual e de CEC 2 (Ciência de Estado de Consciência 2) a ciência de Estados de Cons ciência Cósmica e correlatos. O nosso estudo sobre a Esfin ge (Weil, 1972) já reclamava a possibilidade de usar os processos metodológicos da ciência tradicional para contro lar os fenômenos descritos até então sob o rótulo de «ciên cias ocultas» ou ainda «ciências esotéricas». O presente trabalho constitui uma contribuição a esta demonstração. Pretendemos aqui mostrar a possibilidade de criação de um instrumento permitindo, ao exemplo dos testes psicológicos, «medir» e «investigar» as diferentes variáveis da consciência cósmica. Vamos passar a expor a pesquisa tal como foi planejada e realizada.
2. Origem e histórico da pesquisa Quando resolvemos iniciar esta pesquisa, um de nós tinha acabado de redigir um livro sobre a influência da variável «sublimação sexual» na experiência mística (Weil, 1975). Neste livro, mostramos como nos grandes místicos encon tramos uma abstinência sexual completa e procuramos ex plicações disto na psicologia ocidental e mais particularmen te na psicanálise, assim como nas tradições esotéricas oci dental e oriental.
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Ocorreu-nos, então, a idéia de elaborar um questionário em que a experiência sexual aparecesse como variável inde pendente e a experiência mística como variável dependente. Ao redigirmos o questionário, no entanto, verificamos que não se podia ter uma idéia da influência desta variável e do seu peso verdadeiro sem também incluírem-se outras variáveis, também conhecidas como relevantes no desenvol vimento da consciência cósmica, tais como a meditação, a seleção de alimentos, o jejum, etc. etc. Assim, a nossa pesquisa se transformou numa pesquisa de variáveis da experiência cósmica. Ao redigirmos o questionário, nos veio também a idéia de que o mesmo poderia ser elaborado de tal modo que ser visse de teste ou inventário do grau de desenvolvimento da experiência cósmica, ao mesmo título de qualquer inventário de personalidade. Os primeiros delineamentos do trabalho foram feitos em setembro de 1971. Uma vez redigida a primeira forma do questionário, foi ele aplicado como primeira testagem a um grupo de trinta pessoas. Em função das observações, análise e crítica dos resultados, fizemos as correções necessárias e chegamos à sua forma atual. Graças à colaboração do Conselho de Pesquisas da Uni versidade Federal de Minas Gerais, pudemos efetivar a pes quisa. Com a ajuda do Instituto de Ciências Exatas, conse guimos resolver o importante problema da amostragem. O questionário foi aplicado a uma amostra proveniente de organizações ou grupos humanos em que há um certo treino com fins místicos e a um «grupo de controle» composto de universitários supostamente não místicos. À medida em que este trabalho prosseguia, surgiam notí cias do estrangeiro sobre desenvolvimento de um novo ramo da psicologia: a psicologia transpessoal, cuja primeira re vista tinha sido publicada a partir de 1969, isto é, dois anos antes do início da nossa pesquisa. A leitura dos primeiros artigos reforçou a nossa convicção de que nossa pesquisa estava plenamente justificada. Conseguimos precisar melhor
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ainda os nossos objetivos, tarefa bastante difícil por se tratar de um terreno praticamente desconhecido do ponto de vista científico. Isto explica que os objetivos iniciais foram ampliados e transformados progressivamente dentro de um espírito de «expérience pour voir», como diria Claude Bernard.
3. objetivos do trabalho Os objetivos a que nos propusemos são os seguintes: 1’ ) Pesquisar a incidência da consciência cósmica num gru po místico e num grupo de universitários. 2o) Identificar variáveis que favorecem o desenvolvimento da consciência cósmica e a ordem de sua importância. 39) Isolar os fatores que compõem a consciência cósmica verificando as seguintes hipóteses: a. existência de um fator CC (consciência cósmica) geral. b. existência de fatores específicos, tais como: — — — —
percepção exteroceptiva percepção proprioceptiva poderes parapsicológicos experiência transcendental.
4Ç) Dar «a posteriori» uma definição operacional da «cons ciência cósmica» — a partir de indicadores relevantes. 59) Elaborar um instrumento válido de medida da consciên cia cósmica, que permita diagnosticar o grau de seu desenvolvimento no homem. O mesmo informaria tam bém sobre áreas ou fatores mais ou menos desenvolvi dos da consciência cósmica. A construção de um instrumento de medida do desenvol vimento da consciência cósmica atende a inúmeras necessi dades e interesses teóricos e práticos. Citaremos os princi-
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pais, além do já fixado de «medir» e«diagnosticar» o grau de consciência cósmica do homem. a. Conhecer a relação entre a consciência cósmica e outras variáveis da personalidade, o que poderá ser efetivado através de cálculos de correlação entre a ou as variáveis medidas pelo nosso questionário e outras variáveis medi das por outros instrumentos. Trabalhos desta natureza já têm sido feitos nestes últimos quarenta anos no domí nio da parapsicologia, onde já se conhecem intercorrelações entre inteligência, extroversão, introversão, sugestibilidade de um lado e as performances obtidas em testes objetivos de psi ou pk (Gordon Mangam, 1958; Schmeidler, 1960; Rhine, 1971) de outro lado. b. Saber se a consciência cósmica obedece à lei de Gauss. Conseqüentemente, poder pressupor que se trata de uma aptidão ao mesmo título da inteligência ou da memória. c. (Poder acompanhar mais objetivamente e controlar os mé todos atuais ou futuros de desenvolvimento da consciên cia cósmica, tais como: a ioga, o zen, o rosa-cruz, a teosofia, ou o Silva Mind Control. Uma experiência deste tipo já está em andamento com ajuda do nosso questio nário. Trata-se aqui de um problema atual da pedagogia experimental. d. Realizar pesquisas no domínio da Psicopatologia, pro curando precisar melhor as relações existentes entre a psicose e a consciência cósmica. A comparação entre um grupo místico e um grupo de universitários também apresenta aspectos interessantes, tais como: a. conhecimento da incidência da consciência cósmica e dos fenômenos correlatos em um grupo de universitários, «a priori» pouco inclinado para tais problemas. Como vere mos mais adiante, a nossa pesquisa nos reservou verda deira surpresa a respeito; b. validação do próprio instrumento de pesquisa. Com efei to, é de se esperar que haja diferença significante entre os dois grupos, já que muitas pessoas do primeiro grupo
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(místico) são supostamente detentoras de experiências neste terreno; se houver diferença significante entre os dois grupos, ter-se-á um sinal a favor da validade do instrumento; c. identificação dos aspectos da experiência cósmica mais desenvolvidos em cada um dos grupos, pela análise por menorizada das respostas a cada um dos itens do ques tionário. O terceiro objetivo, o de isolar as variáveis por análise fatonal, já é um objetivo teórico por si só, mas a sua solu ção permitiria responder a outros problemas, tais como: — da correlação existente entre os poderes parapsicológicos e a experiência cósmica. A literatura sobre a expe riência mística assinala constantemente a presença de pode res, identificados pelo povo como «milagres» dos grandes santos de todas as culturas. De outro lado, a experiência empírica nos aponta inúmeras pessoas que possuem estes poderes, mas na realidade não têm nenhuma experiência transcendental; — da solução do primeiro problema, decorre um segundo que é saber se se justifica, dentro do próprio questionário e na vida em geral, manter esta relação entre estes poderes e a consciência cósmica. Os parapsicólogos incluem a cons ciência cósmica como um caso especial de clarividência ou de psigama (Lyra, 1970). Se, pelo contrário, a experiência mostra haver uma cor relação bastante positiva entre as duas ordens de fenômenos, teremos uma prova de que o desenvolvimento de um dos aspectos implica no desenvolvimento de outro, sendo o de senvolvimento de poderes parapsicológicos a porta de en trada ou uma das portas de entrada à consciência cósmica. 4. Metodologia 4.1. Classificação da variável dependente: critério externo A classificação dos diferentes tipos de experiência descri tos de maneira operacional no questionário foi feita, em
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primeiro lugar, de maneira apriorística em função de nosologias clássicas em psicologia experimental, dos nossos conhecimentos de parapsicologia, assim como das nossas leituras sobre experiência mística. Usamos, arbitrariamente, os seguintes agrupamentos, sendo que para cada um ten tamos uma definição que permitiria fácil verificação. Submetemos o processo de classificação ao critério de juizes múltiplos, isto é, pedimos a cinco psicólogos experi mentados neste tipo de trabalho e ao mesmo tempo profes sores universitários que fizessem o rateio das perguntas entre as quatro classes escolhidas, submetendo-os às defi nições seguintes: A. Percepções tidas como exteroceptivas É toda espécie de percepções ligadas aos cinco sen tidos, que parecem para o sujeito respondente ao questionário ter a sua fonte de estimulação fora do corpo. Usamos a expressão «tidas como», em virtude de se tratar de percepções que normalmente não são manifestadas a partir dos nossos cinco sentidos, mas são ligadas a eles, de alguma forma. B. Percepções proprioceptivas É toda espécie de percepções que envolvem parte ou todo o corpo, na sua superfície ou no seu inte rior, incluindo as de movimentação (ou cinestésicas). C. Aptidões parapsicoíógicas Classificamos nesta categoria todos os «poderes», já descritos nos manuais clássicos desta matéria, tais como: fenômeno psi, psicocinesia, telepatia, clarividência, clariaudiência, mediunidade, poder de curar, transporte chamado de «astral», premonição etc. D. Experiência transcendental Trata-se aqui de toda espécie de experiência de entrada num plano de consciência fora da nossa dimensão espácio-temporal, em que há um intuir de
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uma totalidade, de um contato direto com a reali dade cósmica, de uma fusão do eü e do mundo exte rior implicando num desaparecimento de toda espé cie de dualidade. Esta experiência pode ser acom panhada de estados emocionais intensos ditos de sentimento de «algo superior», indescritível, «divi no» etc. Obtivemos as seguintes percentagens de acerto entre as cinco classificações: Psic. 1 Psic. Psic. Psic. Psic.
1 2 3 4
Psic. 2
Psic. 3
Psic. 4
90%
78% 70%
97% 90% 75%
.
Psic. 5
Psic. 5 81% 75% 90% 75%
Pretendemos, a partir da análise fatorial, verificar se tal classificação corresponde de fato a fatores específicos inde pendentes ou se existe um fenômeno geral chamado místico, ou ainda, se existe um fator geral místico com alguns subfatores específicos. Esta última hipótese se apóia na expe riência hinduísta e budista, segundo a qual as pessoas que chegam a estágios superiores de consciência (samadhi, nir vana, estado de Buda, satori) vêem também aparecer pode res ou «sidhis», a maioria dos quais são descritos no ques tionário da pesquisa, assim como são sujeitos aos tipos de percepções extero e proprioceptivas também aqui relatadas. Neste caso, estaríamos em presença de um fenômeno análo go ao da Inteligência em que existem fatores específicos como os isolados por Thurstone (numérico, verbal, espacial etc.) e um fator geral como o descoberto por Spearman (fator G). Provisoriamente, a experiência dos juizes múltiplos nos mostra que cinco psicólogos, usando independentemente os mesmos critérios, chegam a um resultado variando de 75% a 95% de concordância. Finalmente chegamos à seguinte classificação dos itens, feita em função das percentagens de concordância, por critério de maioria absoluta.
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CATEGORIAS A. Percepções tidas como exteroceptivas B. Percepções tidas como proprioceptivas C. Aptidões parapskològicas D. Experiência transcendental
INDICADORES itens 39, 40, 43, 46, 52, 54, 56, 59, 61, 63, 66 e70 itens 41, 47, 50 e67 itens 44, 48, 49, 55, 58, 60, 65, 68, 69 e71 itens 42, 45, 51, 53, 57, 62 e 64
Esta classificação servirá de hipótese a ser confirmada pela análise fatorial. Duas perguntas abertas completam o questionário. Uma deixa margem à descrição de outros po deres não previstos no questionário. Um convite final para observações livres permitirá eventualmente certas revisões deste instrumento de medida. 4.2. Amostragem No planejamento da amostragem, a fim de atender aos objetivos àcima descritos, previa-se a organização de dois grupos: um chamado de «místico» composto de 795 pessoas fazendo parte de organizações místicas. Na realidade, não foi possível conseguir nem os estratos desejados, nem o número esperado. Certas organizações religiosas ou místicas negaram-se completamente. Outras, pelo contrário, abriram as suas portas ao nosso trabalho. Assim sendo, o grupo experimental consta de 250 pessoas (tabela 1) sorteadas aleatoriamente entre algumas sociedades ou grupos espiri tualistas (tabela 7). Um outro grupo, chamado de «grupo de controle» foi composto por 100 estudantes sorteados tam bém aleatoriamente entre todos os estudantes da Universi dade Federal de Minas Gerais. Para o grupo de controle, através do computador eletrônico da UFMG, foi feito o selecionamento do arquivo por posição, considerando o dígito verificador do número de alunos em seqüência descendente, onde então se teve a 3’ posição do nome do aluno em ordem ascendente mais a 4« posição do número do aluno em ordem descendente. Com isso, obteve-se a composição dos núme ros para a seleção do registro.
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As tabelas 1 a 9 nos dão a composição das amostras. Conforme se pode constatar, há uma semelhança bastante acentuada no que se refere às variáveis sexo, religião e tra tamento psiquiátrico. Diferenças consideráveis existem no que se refere à idade (o grupo de universitários é manifestadamente mais moço, o que era esperado) e ao estado civil (como decorrência do fator precedente, o grupo de univer sitários tem maior proporção de solteiros do que o grupo experimental). Estas semelhanças e diferenças deverão ser levadas em consideração na discussão dos resultados. Durante algum tempo, tivemos dúvidas quanto a dar ou não o rótulo de «experimental» ao grupo místico, já que tanto a variável dependente como as variáveis independentes não estavam sob o nosso controle. Se usarmos uma classi ficação adotada com bastante clareza por A. Rodrigues (1975), a maior parte das variáveis independentes são va riáveis ambientais, embora possam elas também ser consi deradas como variáveis ativas, com a diferença apenas que estas variáveis, tais como a meditação, a respiração ou abs tinência sexual, são variáveis manejadas por organizações ou pessoas. O autor acha que mesmo no caso de variáveis estranhas e independentes de natureza organísmica ou am bientais, podem ser satisfeitas as condições essenciais da pesquisa experimental, desde que se equalizem «os grupos em tudo, menos a variável independente e as variáveis estra nhas incontroláveis» (A. Rodrigues, 1975). É o que tentamos fazer, na medida do possível nesta pesquisa que não tem ainda precedente e, por conseguinte, ausência de modelo prévio.
5. Confronto entre o grupo experimental e o de controle
5.1. Variáveis independentes
Pode-se levantar a hipótese de que o grupo experimental apresenta diferenças significativas em relação ao grupo de controle, no que se refere às variáveis como indicadores da
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experiência cósmica; em outras palavras, se o grupo «místi co» apresentar incidência maior de respostas positivas em relação às variáveis, como, por exemplo, meditação ou jejum, pode-se supor que meditação e jejum tenham alguma influência na experiência mística. O estudo posterior das correlações entre variável dependente e independente permi tirá, graças ao confronto com esta primeira comparação, confirmar as hipóteses levantadas aqui. Eis os resultados encontrados para os dois grupos, com a significância das diferenças entre as respectivas médias nos indicadores mensurados. Houve uma inversão intencio nal, já assinalada anteriormente, dos critérios de avaliação em cinco categorias. A fim de facilitar a leitura destes resul tados, vamos lembrar a escala utilizada: 1: constantemente 2: muitas vezes 3: algumas vezes
4: 5: 0:
raramente nunca ?
Exceção foi feita em relação à atividade sexual, cuja resposta representa a média semanal de relações ocorridas.
Indicadores Reza Carne Derivados animais Álcool Jejum Calmantes Soníferos Drogas psicodélicas Peak experience Gosta de música Gosta de pintura Gosta de poesia Pratica música Pratica pintura Pensa em sexo
Grupo de controle
Grupo experimental
MÉDIA 3,070 1,210 1,220 3,130 4,650 4,540 4,780 4,470 1,830 1,010 1,150 1,270 1,770 1,800 2,380
MÉDIA 2,120 2,244 1,716 3,664 4,404 4,296 4,532 4,796 2,072 1,032 1,208 1,204 1,876 1,868 3,032
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Nível de signifi cância da dife rença Pelo t de Student 0,005 0,005 0,005 0,005 0,005 0,005 0,005 Não sign. Não sign. Não sign. Não sign. Não sign. Não sign. Não sign. Não sign.
Ativ. sexual Secreções ou poluções sexuais Pensa em mística Usa incenso Medita
2,880
3,052
Não sign.
3,530 3,120 4,727 3,590
3,984 2,768 3,667 2,237
Não sign. 0,005 0,005 0,005
Do exame destes dados, podemos observar o seguinte: R O grupo experimental se diferencia significantemente do grupo de controle da seguinte forma: é um grupo que come menos carne e derivados animais, reza mais freqüente mente, bebe menos álcool, usa menos calmantes e soníferos, está pensando mais freqüentemente em assuntos místicos, medita mais, se isola mais e usa mais incenso. Todos estes dados vão ao encontro do que era esperado de um grupo desta natureza. Além disto, o menor uso de calmantes, soní feros e álcool permite supor que se trata de um grupo mais em paz, menos tenso do que o outro grupo. 2*. Contrariamente ao que se podia esperar, não foram encontradas diferenças significantes no que se refere ao interesse pelo sexo e atividades sexuais, nem quanto à fre qüência de atividade sexual nem a poluções noturnas ou secreções vaginais. Convém fazer observar que aqui há, provavelmente, uma influência de idade, e do estado civil, já que o grupo de controle é muito mais velho e com maior proporção de casa dos do que o grupo experimental. O relatório Kinsey aponta uma diferença bastante grande entre solteiros e casados e entre grupos de idade (Kinsey, 1948). Seria preciso separar as variáveis sexo, idade e estado civil para se esclarecer este ponto. No relatório Kinsey, por exemplo, a freqüência semanal de relações sexuais dos homens de 21 a 25 anos de idade é quase idêntica à dos casados de 36 a 40 anos, o que é também o caso da nossa amostra. 3’. Espera-se também, adotando-se as conclusões de Maslow sobre as «peák-experiences», que haja maior pro porção de amantes e praticantes da música e da pintura no grupo experimental; também aqui não houve diferenças
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significantes; entretanto, cabe uma ressalva: o grau cultural do nosso grupo de controle, que é de nível universitário, provavelmente influiu bastante, já que no grupo de controle se supõe que o nível cultural seja mais variado. Controles posteriores revelam-se necessários. 4’. A priori, seria de se esperar maior índice de consumo de drogas psicodélicas no grupo experimental, já que se conhece sua propriedade de despertar experiências transpessoais (Grof, 1975). Crê-se que a própria limitação da seleção do grupo experimental às pessoas de grupos «mís ticos» tenha impedido que esta variável aparecesse com sua devida relevância. Nos dois grupos há pessoas que usam este tipo de droga. 5.2. Variáveis dependentes Conforme o pressuposto inicial, se para cada uma das trinta e duas perguntas (ou variáveis dependentes) encontrarem-se diferenças significantes entre os dois grupos ex perimental e de controle, tem-se indicação de que, de um lado, o questionário permite discriminar místicos de nãomísticos, ou seja, tem-se um dado a favor da sua validade como instrumento de medida da consciência cósmica e dos eventuais fatores que a integram. Na quadro a seguir estão em visão sinótica os resultados encontrados: a. das percentagens de respostas obtidas para cada pergunta e cada categoria graduada de resposta, para cada um dos grupos (GC e GE). b. das médias obtidas para cada um dos dois gru pos nas últimas colunas. (A ressalva feita no parágrafo precedente também vale aqui: médias mais elevadas significam incidência mais baixa da variável em foco). Quanto ao quarto objetivo, que é o de saber quais são os indicadores da consciência cósmica, há nesta pesquisa vários interesses em jogo, como, por exemplo:
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— Possibilidade de serem usados os indicadores relevantes como meios de desenvolvimento da consciência cósmica, numa pedagogia da consciência cósmica ou pedagogia transpessoal. — Possibilidade de serem eliminados deste treinamento as pectos irrelevantes. Se, por exemplo, ficar comprovado que a abstinência sexual não é fator relevante para se chegar a tal estágio evolutivo, poder-se-á elaborar méto dos que dispensem este sacrifício, o qual, muitas vezes, está situado acima das possibilidades de muitas pessoas. 6. O instrumento O questionário é constituído de 76 perguntas complemen tadas por um convite final para «escrever tudo que lhe ocor rer de importante». As perguntas podem ser agrupadas, do ponto de vista experimental, em duas grandes categorias: 1». As de nç 1 a 38 e as de n’ 72 a 74 e o n’ 76 são perguntas que sereferem a variáveis que, por hipótese, consideramos como variáveis independentes, tais como: — — — —
Idade Sexo Estado civil Religião: este item foi desdobrado, visando dis criminar pessoas que foram criadas numa religião, as que praticam real mente uma religião e qual o tipo de religião. — Filiação a grupos em que há certo condiciona mento para experiência cósmica, a saber: padres ou freiras, membros de círculo de joga, espíritas, umbandistas, teosofistas, maçons, rosa-cruzes, logosofia.
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— Ontros itens se referem sucessivamente à prática de oração, a práticas alimentares, como comer carne ou derivados animais, tomar álcool, dei xar inteiramente de comer, consumo de remé dios calmantes ou narcolépticos. — Destaque especial é feito ao uso de drogas psicodélicas (LSD, maconha etc.) visando inserir este assunto dentro das pesquisas relacionadas com a consciência cósmica. — A atividade sexual ocupa várias perguntas, indo do fato da preocupação com o assunto até a freqüência real de atividade sexual e a existên cia de poluções noturnas. •— Uma pergunta se refere à preocupação com coi sas místicas, indagando-se com isto o fator motivacional como variável independente. — A pergunta n’ 76 se refere a eventual tratamento psiquiátrico, e se desdobra em dois itens se refe rindo um ao próprio indivíduo, outro à sua famí lia. É um modo de verificar-se a correlação exis tente entre Psicopatologia e experiência cósmica. — É importante frisar que uma correlação elevada deverá ser objeto de análise ocurada, pois, como já se mostrou em outros trabalhos, por detrás 'deste assunto se encontra o problema de definir o que é alucinação e o que é realidade. — Outras perguntas se referem ao uso de incenso, à prática d© meditação e do isolamento. 2»; Trinta e duas perguntas (39 a 71) se referem aos indicadores da variável dependente «experiência cósmica». Todas as perguntas permitem uma resposta sob forma de múltipla escolha em cinco categorias: constantemente, mui tas vezes, algumas vezes, raramente, nunca. Adotou-se nu meração invertida destas diferentes categorias, isto é, o nú mero 5 foi atribuído à categoria mais fraca (nunca) e o número 1 à categoria mais forte (constantemente), a fim
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de evitar o fenômeno de contaminação, forçando mais o pensamento do examinando. Na medida do possível, as perguntas referentes a variável dependente foram objeto de resposta por escolha múltipla em cinco categorias, para maior homogeneidade da forma do questionário. 7. Análise dos resultados 7.1. Análise de resultados de itens 1». Examinando-se o quadro de percentagens, constatouse a existência de percentagens razoáveis de respostas positivas para todos os itens, no grupo de controle. Com efeito, esperava-se que, num grupo universitário, em ambiente altamente racional, seriam encontradas muito pou cas pessoas apresentando fenômenos ligados à consciência cósmica e às variáveis ligadas à mesma, pois é sobejamente conhecida a descrença, nos meios universitários, deste tipo de dimensão da consciência. Ê verdade que nem todos os estudantes examinados per tencem ao ramo científico. Diante desta descoberta, será assunto de pesquisa posterioi verificar, por cotejo de dife rentes subgrupos de universitários, que dimensões da cons ciência existem, por exemplo, entre estudantes de letras, de filosofia e de ciências. Para perguntas referentes à telepatia, os resultados indi cam semelhança entre os dois grupos indicando aceitação do fenômeno por grande parte dos universitários: a percen tagem de respostas «nunca» a este item indica que 38% devem ter tido alguma experiência deste tipo na sua vida. O mesmo se observa no aspecto da experiência cósmica de fusão tempo-espaço, onde não foi encontrada diferença significante entre os dois grupos. O fato vem ao encontro das pesquisas de Maslow, sobre as «peak-experience», se gundo a qual inúmeros universitários pesquisados teriam este tipo de experiência, pelo menos uma vez na vida.
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A ausência de diferença para as perguntas que se refe rem à percepção de luz interior e à capacidade de ver o passado antes do nascimento, talvez tenha se originado pela redação do item, que oferecia margem a interpretações dúbias. 2’. Com exceção das quatro perguntas comentadas, todas as outras acusam diferença significante entre os dois grupos examinados. Isto permite dizer que o questionário poderá ser utilizado para análise «clínica» (no sentido de Lagache), já que as perguntas diferenciam um grupo místico de um grupo nãomístico; é quase total o número das perguntas que podem ser consideradas como válidas, segundo este critério externo. 7.2. Análise de resultados totais Pelo exame dos escores totais dos 350 indivíduos exami nados é plausível dizer: L A distribuição dos escores totais dos examinados no questionário é bem próxima da normal com média 141 e desvio padrão 25. Verifica-se assi metria negativa num grau considerável, causada pelos elementos do grupo A que obtiveram esco res totais baixos, ou seja, entre 30 e 97. Somente a partir de 97 pontos, no teste, encontramos os escores dos elementos do grupo B. De outro lado, os maiores escores foram obtidos pelos ele mentos do grupo B. 2. Há evidente possibilidade de ser a consciência cósmica uma habilidade como as demais que se distribuem como numa curva normal unimodal. 3. O presente questionário é capaz de discriminar diferenças individuais na habilidade à consciên cia cósmica. Pelo teste do x* Para curvas normais, ao nível alfa = 0,01, não rejeitamos a hipótese nula: as diferenças entre freqüências experimentais e fre qüências teóricas aconteceram ao acaso.
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4. Pelo quadro I verificamos as diferenças entre as médias dos grupos A e B em relação à média dos dois grupos reunidos: a média do grupo A é 134,4 e a do grupo B é 150,0. A média do grupo A é significantemente menor do que a mé dia da população estudada; a média do grupo B é significantemente maior. As razões críticas para cada grupo acham-se no quadro I. Quadro I Grupo B N =
Grupo A N = 250 A X
52,5
S
12,5 RC
100
D
TOTAL
A
B
C
D
TOTAL
11,4 43,6
26,8
134,4
60,0
12,5
46,7
30,8
150,0
7,3
6,0
25,6
5,6
2,7
4,2
5,0
14,3
B
3,1 — —
C
RC = + 5,05
3,99
O grupo A é constituído, realmente, de elementos com grande consciência cósmica mais acentuado do que os ele mentos do grupo na sua totalidade. A diferença entre as médias do grupo A e B é, realmente, notável. 7.3. Análise de resultados por área Os resultados por área dos grupos A e B estão repre sentados no quadro II. Todas as áreas apresentam distribuição apenas aproxi mada da normal, na amostra total. Talvez o aumento da amostra forneça a configuração exata dos comportamentos das áreas. Em todas as áreas, o grupo B comparado com o A apresenta média maior e dispersão menor. Como o pressuposto de distribuição normal é básico, o comporta mento dos dados em cada área, acompanhando o da curva normal, vem comprovar a coerência dos critérios emprega dos pelos juizes no seu trabalho de agrupamento dos itens
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do questionário nas quatro áreas A, B, C e D. A hipótese de que os totais das áreas indiquem dimensões da consciên cia cósmica pode ser mantida. Salientamos que não só o aumento do número de elemen tos da amostra dos sujeitos é aqui fator relevante para comprovação da hipótese acima, mas também o aumento da amostra de itens em cada área é importante. Neste estu do, que consideramos piloto, estas indicações resultantes são altamente válidas, no que se refere à metodologia do trabalho e comprovação das hipóteses iniciais básicas, para estudos ulteriores. 7.4. Os indicadores Tanto no grupo A como no grupo B, 90% dos compo nentes já experimentaram estados de consciência cósmica, pelo menos raramente. No grupo A, 12% o experimenta ram muitas vezes ou constantemente, enquanto, no grupo B, este percentual cai para 0,2%. A experiência cósmica no grupo B apareceu associada, significantemente, a 13 elementos, ao nível alfa = 0,01. 1. jejuar 2. ser eremita 3. fazer meditações 4. usar incenso 5. ser umbandista 6. ter religião infantil 7. não ter religião 8. não comer carne 9. praticar ou gostar de música 10. praticar ou gostar de pintura 11. ser virgem 12. usar sonoríferos 13. usar calmantes. Esses elementos estão ordenados de acordo com o seu grau de associação com a experiência cósmica. Concluímos ser de interesse o estudo de grupos maiores com as características acima para comprovação desses re
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sultados. Até que ponto estes 13 comportamentos facilitam ou desenvolvem a habilidade de consciência cósmica? Até que ponto existe interação entre estes e outros fatores da personalidade ou da capacidade cognitiva do indivíduo? Que fatores não foram evidenciados neste estudo? 7.5. A análise fatorial Pela análise fatorial dos resultados, confirmou-se a hipó tese da existência de 4 fatores independentes de consciên cia cósmica, tais como: 1. percepção exteroceptiva; 2. per cepção proprioceptiva; 3. poderes parapsicológicos e 4. ex periência transcendental. Estas 4 dimensões foram denominadas, respectivamente, áreas A, B, C e D, como já vimos. A matriz fatorial final do grupo A (quadro II) demonstra que os quatro fatores ou areas da consciência cósmica são ortogonais, podendo-se falar de aspectos independentes. A configuração vetorial dos resultados encontram-se nos gráficos III. Nos gráficos III foram representados, em plano bidimensional, as dimensões das áreas A, B, C e D, duas a duas. A matriz das saturações evidencia, em cada linha, a maior saturação fatorial encontrada para cada uma das áreas. A variância da área A é explicada pelo fator IV: esti mulações exteroceptivas. A variância da área B é explicada pelo fator I de esti mulação proprioceptivas: Indivíduos com tendência a per cepções de estímulos exteroceptivos tendem um pouco a experimentar percepções proprioceptivas. Geralmente não têm experiências parapsicológicas ou transcendentais. A variância da área C é explicada pelo fator III de apti dões parapsicológicas. A variância da área D é explicada pelo fator II de experiência transcendental. Em resumo, os fatores de variância da matriz de intercorrelações apresentaram-se da seguinte forma: fatores I e IV com alguma inter-relação; fatores II e III inteiramente independentes.
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L 2. 3. 4.
Fator I Fator IV Fator II Fator III
— — — —
Percepções proprioceptivas Percepções exteroceptivas Experiência transcendental Aptidões parapsicológicas.
Quadro 11 Grupo A MATRIZ FATORIAL (4 FATORES) ÁREAS A B C D
I 0.22389 0.97198* —0.04944 —0.04936
II —0.05351 —0.05294 —0.00238 0.99753 *
III —0.07167 —0.05271 0.99653 * —0.00256
IV —0.97049 * —0.22284 0.06678 0.04987
* Maiores saturações
A análise fatorial dos itens e das áreas de aptidões da consciência cósmica nos estimulam a continuação dos estu dos e do aperfeiçoamento do nosso instrumento. Realmente, parece confirmada a nossa hipótese inicial de ser possível construir um instrumento para medir a habili dade de consciência cósmica. O presente questionário, provisoriamente, pode ser utili zado com tal finalidade. 8. As normas As variações e, conseqüentemente, as classificações dos examinandos, apresentam-se em escalões. Cada um, equiva lente a um desvio padrão. O escalão D eqüivale a meio des vio padrão em torno da média. A escala total classifica os casos raros, 3,5 desvios padrões em torno da média.
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ÍLÕES A B C D E F G
SIGMA — 2,5 a —3,5 — 1,5 a —2,5 +0,5 a — 1,5 +0,5 a +0,5 +0,5 a +1,5 + 1,5 a +2,5 +2,5 a +3,5
PROBABILIDADES 0,60 6,06 24,12 38,34 24,12 6,06 0,60
Acima e abaixo do escalão médio têm-se 3 escalões per fazendo um total de 7. O escalão A engloba indivíduos de habilidade para a consciência cósmica em grau excepcional. O escalão B en globa indivíduos de habilidade superior; o escalão C en globa indivíduos acima da média. Os escalões E, F e G englobam indivíduos, sucessivamente, de mais fraca habili dade para a consciência cósmica. Acima de +3,5 ou — 3,5 desvios padrões podem ser encontrados os casos muito raros. tabela para classificações de examinandos a partir do seu resultado total (tabela geral) GRAUS A B C D E F G
AVALIAÇÃO Excepcional Müito superior Acima da média Médio Abaixo da média Fraco Muito fraco
ESCORES 104 ou menos 105 a 116 117 a 128 129 a 153 154. a 165 166 a 177 178 ou mais
9. Conclusões 1. A consciência cósmica pode ser considerada uma habi lidade como as demais habilidades humanas, cujo comporta mento obedece ao modelo gaussiano. 2. A consciência cósmica parece apresentar uma estrutu ra composta de, pelo menos, quatro fatores independentes. 3. Os fatores da consciência cósmica parecem ter ligações com determinados tipos de experiência de vida, ou práticas determinadas.
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4. Ê possível, por meio da análise fatorial, ampliar os estudos dos fatores de consciência cósmica, de sua natu reza e de sua estrutura. 5. É possível chegar-se à construção de um instrumento altamente válido para a medida da habilidade de consciên cia cósmica no homem.
Resumo A presente pesquisa se inscreve dentro de um novo ramo da psicologia: a psicologia transpessoal. Ela tem como ob jetivo a elaboração de um instrumento de medida da cons ciência cósmica, permitindo não somente fazer um diagnós tico, conhecer a incidência deste fenômeno em determinada população, mas ainda fazer uma análise fatorial visando identificar as variáveis ou fatores que compõem a consciên cia cósmica além de descobrir as variáveis que a provocam. Um questionário foi aplicado a um grupo experimental de 250 pessoas fazendo parte de grupos místicos e de 100 estudantes escolhidos aleatoriamente. O s resultados evidenciam a possibilidade de medir a cons ciência cósmica da mesma forma que qualquer outra aptidão. Quatro fatores foram isolados: percepções exteroceptivas, percepções proprioceptivas, aptidões parapsicológicas, expe riência transcendental. Mesmo no grupo de controle, verificou-se a incidência de pessoas sujeitas a este tipo de fenômeno. As variáveis independentes que parecem provocar este tipo de fenômeno são entre outras: certas restrições alimentares, práticas de meditação, isolamento, uso de incenso e certa preocupação para assuntos místicos. BIBLIOGRAFIA Brosse, Th. Etudea instrumentales des teehniques da yoga. Expérimentation psychosomatique. Paris, Maisonneuve, 1963. BuCke, R. M. cosmic Consciousness. Nova Iorque: Datton, 1969. Cunha, Suzana Ezequiel. Estatística Descritiva. Rio de Janeiro, Editora Fo rense, 1970.
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COLEÇÃO PSICOLOGIA TRANSPESSOAL/5 Pequeno tratado de Psicologia Transpessoal VOLUME V
A Psicologia Transpessoal cujo objetivo principal é estudar o fe nômeno da consciência cósmica por meio de metodologia científica está penetrando recentemente no Brasil. Havia necessidade de co locar à disposição do público, mais especialmente dos psicólogos, psiquiatras, médicos, filósofos e sacerdotes, assim como de to dos os interessados nos aspectos das descobertas mais recentes no campo tradicionalmente conhecido como “experiência m ística" ou “transcendental", um pequeno manual que contenha textos hoje já considerados clássicos, dos pesquisadores mais recentes e mais conhecidos no assunto. Foi pensando nisso que a Vozes fez um acordo com a SÍNTESE (Sociedade de Integração Transpessoal, Estrutural, Social e Energé tica) para publicar a tradução ou originais em português de arti gos reunidos em cinco volumes que constituem as grandes linhas atuais deste novo ramo da Psicologia: Volume Volume Volume Volume Volume
I: Cartografia da Consciência Humana II: Mística e Ciência III: Psicofisiologia da Consciência Cósmica IV: Experiência Cósmica e Psicose V: Medida da Consciência Cósmica
Ouais as fases e fronteiras da evolução da consciência no homem? Como abordar a experiência mística de modo científico e quais as relações atuais entre m ística e ciência? Ouais as pesquisas já realizadas no sentido de medir os concomitantes fisiológicos da experiência cósmica? Como distinguir o autêntico estado de cons ciência cósmica e os estados ditos psicóticos e quais as relações entre psiquiatria, Psicopatologia e psicologia transpessoal? Como usar estatística e métodos de psicometria e psicologia experimen tal em psicologia transpessoal? A estas e a outras perguntas é que estes cinco volumes procuram ajudar a encontrar uma resposta.
VOZESJ
ATENDEMOS PELO REEMBOLSO