CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO ESPECIALIZAÇÃO EM BIOLOGIA ANIMAL E VEGETAL
ETNOBOTÂNICA EM COMUNIDADES INDÍGENAS GUARANIS NO RIO GRANDE DO SUL, BRASIL
Diogo de Souza Lindenmaier
Santa Cruz do Sul, dezembro de 2008
ETNOBOTÂNICA EM COMUNIDADES INDÍGENAS GUARANIS NO RIO GRANDE DO SUL, BRASIL
Trabalho de conclusão apresentado apresentado ao Curso de PósGraduação -Especialização- da Universidade de Santa Cruz do Sul para obtenção do título de especialista em Biologia Animal e Vegetal.
Orientador: Prof. Jair Putzke
Santa Cruz do Sul, dezembro de 2008
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Aos índios do Brasil
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AGRADECIMENTOS
Agradeço as comunidades indígenas do Irapuá, Itaúba e Salto Grande do Jacuí, em especial aos indígenas Luiz Caraí, Alex Acosta, Diego Duarte, Silvino Silva e João Paulo; aos Profs. de língua Guarani Eduardo Acosta e Anísio Duarte, e também a chefe familiar Dona Catarina Acosta. Agradeço aos professores do curso de Especialização em Biologia Animal e Vegetal da UNISC, Jair e Marisa Putzke, Eduardo Lobo, Andréas Köhler, Claudio Gastal e Carmem Lúcia de Lima Helfer. Agradeço especialmente a minha musa inspiradora, companheira, algoz e colega Natália Oliveira; à toda minha família, em especial a Douglas (irmão), Dagoberto (Pai) e Homero Lindenmaier (Avô). Aos amigos da 24ª CRE Anderson Borba (Chambão) e Elena Cristina Machado (Néca). Agradeço aos mestres e companheiros de ciência Jean Carlos Budke, Pierre Gautreau, Camila Dellanhese, Eduardo Giehl, João André Jarenkow, Jorge Waechter, Marcos Sobral, e à Escola Maria Ilha Baisch/Dona Francisca. Um agradecimento especial a Nhanderú (Deus guarani) e aos demais deuses e espíritos da floresta.
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Resumo O conhecimento tradicional sobre a utilização das plantas antecede o conhecimento científico. Os Mbya são um subgrupo Guarani, um dos remanescentes dos diversos povos que habitaram a região que hoje compreende ao Rio Grande do Sul. O presente estudo etnobotânico focalizou a identificação das espécies vegetais utilizadas em três comunidades indígenas Mbya/Guarani na região central do Rio Grande do Sul/Brasil, na localidade de Irapuá em Caçapava do Sul, no distrito de Itaúba município de Estrela Velha e no município de Salto do Jacuí. Foram realizadas entre os meses de dezembro de 2007 a setembro de 2008 entrevistas semi-estruturadas onde levantou-se informações informações como, nome das espécies vegetais em guarani, aplicação, aplicação, modo de preparo, ocorrência e origem fitogeográfica. As coletas foram depositadas no herbário HCB do Departamento de Biologia e Farmácia da Unisc. Foram identificadas 61 espécies vegetais com algum tipo de aplicação, distribuídas em 35 famílias botânicas. As famílias com maior número de espécies citadas foram Myrtaceae, Fabaceae e Poaceae. Das diversas aplicações que os indígenas fazem das plantas, grande parte destina-se ao uso medicinal. A grande maioria das espécies identificadas são nativas e de ocorrência natural na região. O conhecimento sobre a utilização, classificação e nomenclatura das plantas na região central do Rio Grande do Sul, em grande parte provém da cultura Guarani.
Palavras-chave: Mbya/Guarani, etnobotânica, plantas medicinais.
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Abstract – The traditional knowledge is very important for to construct the science and its technologies. The Mbya are a subgroup Guarani, one of the remnants of the various peoples who inhabited the region that today includes the Rio Grande do Sul state. Were studied three communities, one in the town of Irapuá in Caçapava do sul , another to district of Itaúba in Estrela Velha municipality and one in the municipality of Salto Jacuí. This ethnobotanical survey focalized the use of plants in three indians communities Mbya/Guaranis cited in the central region of Rio Grande do Sul state, southern Brazil. Local names in portuguese and guarani are provided, along phytogeografical phytogeografical origin of species species and modes of utility. utility. The plant collections collections were were deposited in the herbarium of the Department of Biology of Unisc. Was identified 61 plant species of 35 botanicals families with some type applications. The families with the highest number of species cited were Myrtaceae, Fabaceae and Poaceae. Of the various applications that are of indigenous plants, most is for the medicinal use. The vast majority of identified species are native and natural occurrence in the region. The folk nowledge about the use of plants, classification and nomenclature in the central region of Rio Grande do Sul, in large part comes from the Guarani culture.
Key words: Mbya/Guarani population, ethnobotany, medicinal plants.
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SUMÁRIO 1. Introdução ................................................ ....................................................................... .............................................. ............................................8 .....................8 1.1 As plantas e o homem....................................... homem.............................................................. .............................................. ...................................8 ............8 1.2 Ocupação do território ............................................ ................................................................... .............................................. ............................9 .....9 1.3 Os índio Mbya/Guarani Mbya/Guarani ........................................... .................................................................. .............................................. ..........................10 ...10 1.3.1 Subsistência Subsistência ........................................... .................................................................. .............................................. .........................................15 ..................15 1.3.2 Agricultura ................................................. ........................................................................ .............................................. .....................................17 ..............17 1.3.3 Os Mbyá/Guaranis Mbyá/Guaranis e as plantas .................................................. ......................................................................... ...........................18 ....18 2. Material e métodos .................................................. ......................................................................... .............................................. ............................20 .....20 2.1 Área de estudo ..................................................................... ............................................................................................ .....................................20 ..............20 2.1.1. Irapuá .............................................. ..................................................................... .............................................. .............................................. ........................20 .20 2.1.2. Itaúba ................................................ ....................................................................... .............................................. .............................................2 ......................211 2.1.3. Salto Grande do Jacuí ................................................................ ....................................................................................... ...........................22 ....22 2.2 Coleta dos dados ............................................ ................................................................... .............................................. ....................................23 .............23 3. Objetivos ............................................ ................................................................... .............................................. .............................................. ...........................24 ....24 3.1 Objetivos gerais ............................................... ...................................................................... .............................................. ..................................24 ...........24 3.2 Objetivos específicos específicos ............................................. .................................................................... .............................................. ............................24 .....24 4. Resultados .............................................. ..................................................................... .............................................. .............................................2 ......................255 5. Discussão .................................................. ......................................................................... .............................................. ..........................................27 ...................27 6. Conclusões .............................................. ..................................................................... .............................................. ............................................3 .....................311 7. Considerações Considerações .................................................. ......................................................................... .............................................. ...................................32 ............32 8. Referencias bibliográficas bibliográficas .................................................. ......................................................................... .......................................33 ................33 9. Anexos .............................................. ..................................................................... .............................................. .............................................. ...........................37 ....37
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1. Introdução 1.1 As plantas e o Homem As plantas são utilizadas pelo homem desde tempos imemoráveis que remontam o surgimento da própria consciência humana. Empiricamente ao longo dos tempos nas mais diferentes etnias do globo, o conhecimento sobre a utilização das plantas foi sendo estruturado e passado de geração em geração pela prática oral, de acordo com as necessidades. Eventualmente muito desse conhecimento pode ter se perdido Milliken et al. (1992).
É visível o papel que os povos tradicionais desempenham na exploração dos ambientes naturais, fornecendo informações sobre as diferentes formas de manejo executadas no seu cotidiano e usufruindo da exploração enquanto forma de sustentação desses povos. Assim, diante da marcha da urbanização e das possíveis influências da aculturação, é preciso resgatar o conhecimento que a população detém sobre o uso de recursos naturais. Nesse sentido, alguns autores propõem estimar o valor de uso das plantas com a finalidade de apontar as espécies e famílias de preferência da população humana no universo vegetal (Phillips & Gentry 1993; Phillips 1996; Pasa et al., 2004). Os povos selvagens, embora empiricamente, dadas às suas naturais condições de atraso, encontravam e ainda encontram nas matas luxuriantes e misteriosas, os valores terapêuticos terapêuticos necessários à luta contra os diferentes males do corpo (Cruz, 1965). Os índios utilizam muito as plantas para fins terapêuticos, aliás, segundo a OMS, 80% da população mundial fazem uso das plantas medicinais (Gottlieb & Kaplan 1993). O desenvolvimento de tratamentos médicos baseados em medicamentos químicos proporcionou grande ascensão da indústria farmacêutica em detrimento do desprestígio das práticas terapêuticas tradicionais. A partir daí, houve quase que um esquecimento da flora principalmente por parte das novas gerações, chegando muitas vezes ao descrédito em relação ao poder medicamentoso das plantas (Barbosa, Barros e Soler, 1996). Devido às mudanças extremamente velozes que neste século XXI transformam as sociedades década após década, o conhecimento etnobotânico dos indígenas pode ser ameaçado pela interferência de fatores externos à dinâmica social do grupo como, por exemplo: a) maior exposição das comunidades à sociedade envolvente e, conseqüentemente, conseqüentemente, às pressões econômicas e culturais externas (Amorozo & Gély 1988; Amorozo 2002); b) maior facilidade de acesso aos serviços da medicina moderna (Nolan 1999; Lima et al. 2000; Amorozo 2002); c) deslocamento das pessoas de seus ambientes naturais para regiões urbanas, o que leva à perda do caráter utilitário do 8
conhecimento popular acumulado há várias gerações e, conseqüentemente, ao seu desaparecimento desaparecimento (Valle, 2002; Pinto et al. 2006). As práticas indígenas brasileiras, aliadas aos conhecimentos orientais, são responsáveis responsáveis hoje pela forte medicina popular brasileira. O Brasil é privilegiado com uma das mais ricas e variadas floras do mundo, tanto em número de espécies como em indivíduos, destacando uma imensa coleção de plantas com valores medicinais. No entanto, pouco se conhece sobre as potencialidades potencialidades terapêuticas existentes nessas plantas, sendo imprescindíveis estudos de classificação, pois através deles podo-se encontrar a cura para graves doenças que afligem a humanidade. Trabalhos sobre o conhecimento acerca da utilização de plantas por povos autóctones no Rio grande do Sul são praticamente inexistentes e ignorados. Acreditamos que muito do conhecimento atual sobre plantas medicinais e seus fins terapêuticos sejam provenientes da cultura indígena. Atualmente é possível que o aculturamento destes povos possa ter inserido novos elementos fitoterápicos provenientes de outras regiões do Brasil e do mundo dentro de suas tradições medicinais. 1.2 A ocupação do território A presença de seres humanos na região sul do Brasil nos remete a cerca de 12.000 anos antes do presente. Nesta época grupos caçadores e coletores chegaram a região oeste do estado do Rio Grande do Sul através da calha dos rios Paraná e Uruguai. Com o aquecimento aquecimento do clima no período pós-glaciação, tornou-se mais fácil estabelecer vida nas regiões de altas latitudes abaixo do paralelo 30°. Neste período, fauna e flora utilizaram os “corredores naturais” dos rios (Paraná e Uruguai) para ganhar novos terrenos em direção ao sul. Os indígenas desta época, como sendo parte integrante desta fauna, que contava com animais hoje extintos (Tigre dente-de-sabre, dente-de-sabre, Tatu, Preguiça-gigante) Preguiça-gigante) também seguiram na mesma direção. Nesse período diversas plantas chegaram ao estado, começando por espécies campestres e mais tarde, à medida que o clima se estabelecia, espécies arbóreas, oriundas da região central e atlântica do continente (Rambo, 1961). Behling et al. (2005), observaram no estudo paleo-palinológ paleo-palinológico ico em uma turfeira no município de São Francisco de Assis (29°35’12” S, 55°13’02”W) diferentes camadas estratigráficas contendo polens das espécies ocorrentes na região juntamente com diversas camadas de cinzas que datam períodos do médio holoceno. Há indícios de que os indígenas daquela época utilizavam utilizavam fogo em larga escala, tanto para proteção, como para a caça. 9
Estes primeiros grupos indígenas que chegaram ao estado se expandiram e nos milênios seguintes se adaptaram tanto às paisagens abertas dos campos como às áreas florestadas Schmtz (1991); Ragge (2004). A cerca de 2.000 anos antes do presente, populações de culturas diferentes, oriundas da Amazônia e do Centro-Oeste brasileiro, deram início a um processo de ocupação da Região Sul, que culminaria no desaparecimento de seus antigos ocupantes. Com estas novas populações, relacionadas principalmente aos povos de língua TupiGuarani e Jê, chegam, portanto uma série de inovações tecnológicas e econômicas, como a cerâmica e a horticultura. Tais elementos juntamente com formas de organização mais complexas, lhes forneceram uma ampla capacidade adaptativa e, em pouco mais de um milênio, dominaram todos os ambientes, desde as matas subtropicais subtropicais e os pinheirais do planalto até as áreas litorâneas. Concomitantemente, paisagens abertas do sul do Rio Grande do Sul e do Uruguai, especialmente na costa atlântica e junto às grandes lagoas litorâneas, foram ocupadas por populações ceramistas adaptadas a áreas alagadiças e a uma economia baseada na caça e na pesca (Schmtz, 1991; Ragge, 2004). Estas populações ceramistas constituíram as sociedades nativas quando a chegada dos primeiros europeus, e duas delas, especialmente aquelas que ocupam as matas subtropicais e o planalto, possuem remanescentes vivos até hoje, como é o caso dos Mbya/Guarani e os Kaigang (Schmtz, 1991; Ragge, 2004).
1.3 Os índios Mbya/Guarani Os índios Guarani, em especial o subgrupo Mbya, diferenciam-se dos demais indígenas brasileiros por apresentarem traços culturais profundamente enraizados. Historicamente os Mbya/Guarani "... desenvolveram estratégias próprias que visaram não apenas a mera sobrevivência, mas também a permanente recriação de sua identidade e de seu 'modo de ser'..." (Monteiro, 1992: 473). Essas estratégias, criadas e recriadas conforme a necessidade e a situação em diferentes tempos e espaços inseridos no seu amplo território tradicional, possibilitaram que os Guarani sobrevivessem e integrem, ainda hoje, o quadro de populações indígenas do Brasil, que conta com cerca de 220 diferentes sociedades e uma população aproximada de 330.000 indivíduos. A migração e a mobilidade constituem traços característicos dos Mbya/Guarani , havendo uma dinâmica de ocupação territorial. Ladeira (1992) distingue migração de mobilidade. Denomina migração os deslocamentos oeste - leste (Paraguai > Argentina > RS > SC > PR > SP > RJ > ES) de famílias extensas guiadas por motivos religiosos. 10
Mobilidade é a conceituação dada ao movimento de intercâmbio entre as aldeias, reforçando relações sociais e de reciprocidade, casamentos, visitas a parentes, troca de informações, sementes, mudas de plantas, conhecimentos adquiridos nas relações com as diversas sociedades envolventes, assembléias e conselhos. De acordo com o Instituto Socioambiental, em 1995 a população Guarani no Brasil somava 30.000 indivíduos, perfazendo o maior grupo indígena do país. Desse levantamento demográfico é impossível precisar numericamente a população Mbya, podendo-se ressaltar somarem cerca de três mil indivíduos apenas na região sul do Brasil, conforme assinala Garlet e Assis (1998: 10). Até recentemente os Mbya não possuíam aldeamentos definitivos, sendo comum encontrá-los ainda hoje em pequenos grupos circulando pelas rodovias das regiões sul e sudeste do país. Vivendo em pequenas áreas bem circunscritas, de domínio público ou particular, os Mbya tendem a se isolar preferindo pouco contato com a sociedade nacional. Os que habitam terras de outros Guaranis, como dos Chiripa, ou de outras sociedades indígenas, como a Kaingáng ou Xokleng, sofrem variadas pressões e afirmam que estes grupos destroem a natureza e não respeitam seu sistema de vida. O Mbya se define como “índio do mato”, sendo também assim identificado por outros grupos indígenas. A terra Guarani é o lugar onde se dão as condições de possibilidade de teko, ou seja, a cultura, o modo de ser, o sistema, a lei, o comportamento, o hábito, o costume guarani. Os Guarani denominam tekoa a terra onde vivem, que deve compreender três espaços fundamentais para sua sobrevivência: aldeia, plantações e floresta. Conforme Melià (1989: 336): “A ecologia Guarani não se restringe à natureza, nem se define por seu valor exclusivamente produtivo produtivo (...). O tekoa significa e produz ao mesmo tempo relações econômicas, relações sociais e organização político-religiosa, essenciais para a vida Guarani.” É sua a conhecida e muito utilizada expressão: “Sem tekoa não há teko!” Tekoa, então, com mata virgem, representa terra fértil, lugar de moradia,
plantação, caça, pesca e coleta, ou seja, local que permita o Mbya viver de acordo com os preceitos. A inexistência destes pré-requisitos faz os Mbya desejarem constantemente constantemente a procura de outros lugares, o que justifica em parte, os incessantes incessantes deslocamentos deste subgrupo Guarani. Entretanto, as limitações para ocupação de terras condizentes em recursos e tamanho frustram os intentos das famílias, fazem com que o discurso diste da prática, encetam a discrepância entre realidade vivida e os costumes tradicionais (Litaiff & Darella, 2000). O Mbya muda, mas não desaparece, o que demonstra uma forte etnicidade. Como resultado da situação de constante contato com a sociedade envolvente, muitas 11
das características dos Mbya expostas em documentos da época da conquista (Litaiff, 1996) foram perdidas ou modificadas, considerando naturalmente que a cultura é algo dinâmico. A língua, a endogamia, as constantes movimentações em busca de melhores terras, o distanciamento geográfico e simbólico, são importantes características Mbya. É consenso entre os Guarani a consciência da causa de suas constantes viagens. Quando indagados sobre este assunto, os Mbya respondem de forma unânime: viajam para procurar uma terra boa para viver. Da terra boa, ( Yvy porã, tekoa) mato, depende o teko, a cultura Mbya ou Ñandereko katu, “nosso bom modo de ser” (Litaiff, 1996: 96).
Segundo Litaiff & Darella (2000), os índios Mbya denominam a Terra como se fosse um ser vivo, dotado de alma e vontade, com seu corpo coberto de vegetação que seria seus pêlos e adornos, devendo eles, por este motivo, respeitar e venerar a natureza. Assim, entre estes índios, a extração de madeira, palmito ou outro elemento da floresta para fins de comercialização, é proibida e vista como imoral. Sobre isto, o cacique Augusto da Silva afirma: “Mbya puro não corta árvore porque o mato é a nossa casa. Tirar árvore só quando tá seca pra comida e calor e não vender. Aqui não pode cortar para vender como faz o Kaingáng em Chapecó e o Xokleng em Ibirama. Mesmo o Chiripa de Biguaçu faz isto e eles são Guarani! Não dá para entender! Lá em Ibirama e Chapecó eles derrubam muito a mata, de 1985 para cá acabou quase toda a madeira. Aí os parentes Mbya foram tudo embora, tão para cá agora procurando um pouquinho de floresta. As matas foram dadas por Deus, porque então vamos derrubar e vender madeira se Deus sempre vai ajudar seus filhos!? Mas Kaingáng e Xokleng é assim mesmo, não respeita a natureza, diferente do Mbya, por isso eles nos expulsaram de lá, eles queriam nos matar por defender a natureza. Lá ainda deve ter um pouco de paca, tatu, estas coisas, mas sem mato o bichinho não sobrevive, a terra fica ruim, então lá não podemos mais ficar”.
Segundo o mesmo cacique, Augusto da Silva: “O branco cerca a terra e diz: ‘É meu, quero vender’. Mas não dá pra ser assim. A terra tem muito tempo, existe antes mesmo do Guarani e do branco, não pode ser vendida. Terra é presente de Ñanderu, mas ninguém cuida, corta tudo as árvores, destrói o mato. Então Deus está castigando, não nasce mais tanta plantinha, terra treme, muita chuva, depois vai vir o fogo. O homem, tudo é da terra, mas terra não é do homem”. (Litaiff & Darella, 2000).
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Como é perceptível, os Mbya para poderem sobreviver tiveram que se adaptar aos limites impostos pelo modelo civilizatório ocidental, e a uma realidade que se modifica velozmente, também em termos econômicos. Entretanto, mesmo em contato com brancos e outros índios, conseguiram manter os aspectos mais importantes do seu sistema: cosmologia, língua, organização social - invisíveis aos olhares desatentos da sociedade envolvente. Extremamente pobres, alguns grupos circulam ainda pelas estradas do sul e sudeste do Brasil à procura de boas terras. Um dos efeitos disto é a atribuição de estereótipos, como “índios vagabundos, indiada preguiçosa, sujos, assimilados, assimilados, aculturados” (Litaiff & Darella, 2000). Os Mbya preferem viver no seio de sua comunidade, plantando, praticando seus rituais, fazendo seus artefatos, vivendo seu sistema. As aldeias Mbya são geralmente formadas por pequenas habitações divididas em núcleos diminutos, em cujo centro localiza-se a residênci r esidênciaa do cacique e a Opy, a casa de reza comunitária. Os Mbya procuram manter a endogamia, pois para eles o casamento ideal é entre indivíduos do mesmo subgrupo, da mesma aldeia ou de outras aldeias Mbya, sendo esta uma de suas principais características. Outro importante fator de identidade, segundo afirmam quase todos os indivíduos da etnia é a obrigatoriedade de moradia na aldeia. Se um membro do grupo casar com um não-Mbya, este deve deixar a comunidade. Como coloca o informante: “Eu acho que, se casar com jurua tem que ir embora mesmo. É difícil de acontecer, mas já teve. Os Kaigang deixam jurua morar junto nas terra, não se importam. Já tão tudo misturado com jurua”.
O mesmo índio completa sua informação com bom humor, revelando um aspecto interessante da cultura Mbya/Guarani: “O Guarani quando casa tem que morar perto da sogra”(rs). “... pode até ir embora, só que tem que q ue pedir permissão”.
A organização social dos Guaranis em geral e dos Mbya em particular, baseia-se na família extensa, ou seja, uma família composta do casal/pais/sogros, filhos solteiros, filhas casadas e genros, além dos netos, ou seja, uma família extensa agrega diversas famílias nucleares. A regra de residência é outro mecanismo básico de articulação nas sociedades indígenas, o que determina a composição da “família grande” Guarani. No caso dos Mbya ela é uxorilocal, e temporária, isto é, o genro habita a casa de seu sogro 13
até o nascimento do primeiro filho e a estabilização do casal, quando então estará livre para decidir seu destino residencial. De qualquer forma, há preferência das mulheres em viver próximas às suas mães. Os Mbya procuram sempre manter boas relações com os moradores não-índios das adjacências, mas como foi sublinhado, a maioria prefere habitar em locais remotos e de difícil acesso aos regionais. Assim, pode-se constatar a estreita relação entre distância (geográfica e simbólica), endogamia e preservação cultural. Do mesmo modo, pode-se fazer o entrelaçamento entrelaçamento entre terras condizentes, condizentes, alimentação, saúde e equilíbrio bio-psico-físico bio-psico-físico (Litaiff & Darella, 2000). No aldeamento de Itaúba entrevistamos um vizinho, que nos relatou desacordo com assentamento dos índios naquela região: (...) “Olha, eu não entendo certas coisas. Aqui todo mundo trabalha desde criança e só pára quando morre. (...) Esses dias achei que ia dar briga, eles tavam pegando pinhão na beira da estrada, mas a árvore tava no meu campo, e é o único pé de pinhão que produz (...) Me aproximei e falei que eles não podiam pegar, resumindo, achei que ia apanhar. Outro dia levaram as laranjas de um pomar próximo daqui. (...) E o governo federal dá tudo (...). Sei que eles (índios) também são gente, que tem que viver (...) A culpa é do nosso governo, não dos índios, eles estão certos (...) Esse é o nosso governo”.
Os Mbya/Guarani são conhecidos por sua docilidade, ou seja, não são agressivos, logo não alimentam conflitos por terra ou recursos como ocorre com tribos no norte do país. O “jeito de ser” Mbya não permite estas relações, o que em parte é positivo e negativo, tendo vista a necessidade de pressionar as autoridades para a elaboração de políticas condizentes com a cultura Mbya. E um aspecto positivo e pouco valorizado, é o fato de não haver conflito ou até mesmo violência envolvendo a questão territorial no sul do Brasil.
1.3.1 Subsistência Subsistência O estilo de vida ou como os próprios guaranis dizem o “jeito de ser” guarani, no que diz respeito à subsistência, está diretamente relacionado com a agricultura e a coleta (caça e pesca), porém atualmente eles têm encontrado alento no comercio de artesanato. No século XVI, Cabeza de Vaca (1987) e Hans Staden (1982) anotaram um número considerável de informações sobre a subsistência nas aldeias relacionadas aos cultivares, aos animais de caça etc. Cabeza de Vaca surpreendeu-se com a fartura de mantimentos, bem como com a alegria dos índios Guarani nas muitas aldeias pelas 14
quais passou nos caminhos percorridos entre a Ilha de Santa Catarina e Assunção/Paraguai entre os anos de 1541 e 1542. Comenta que os Guarani ocupavam grande extensão de terra, sendo falantes de uma só língua. Sobre o que presenciou nas proximidades do rio Iguaçu, está registrado: "É muito povoado em toda sua ribeira [rio Iguaçu], estando ali a gente mais rica de todas estas terras. São lavradores e criadores, além de ótimos caçadores e pescadores (de Vaca, C. 1987: 138). Menciona os cultivares de milho, mandioca, batata, amendoim; aponta a importância do mel, das frutas e das farinhas de milho, mandioca e pinhão. Informa que os Guarani eram criadores de galinhas e patos, ressalta que possuíam muitos papagaios. Cita como caça, os porcosdo-mato (catetos), veados, antas, faisões, perdizes e codornas. Staden também assinala a abundância de víveres dos Guaranis e cita o milho, o algodão, a pimenta amarela e a vermelha; o peixe pirati, o palmito, o genipapo-ivá, o guarapiranga; a caça do tatu, onça, gambá, de três espécies de macaco, veado, duas espécies de porco-selvagem, capivara. Alexandre Lucas Boiteux (1912), historiador em passagem por estas terras ressalta a plantação de milho, mandioca, cará, abóbora, feijão, banana, amendoim e algodão, assim como a fabricação das farinhas de mandioca e de milho. Assim como relatam Litaiff & Darella (2000), em estudo realizado com Mbya/Guarani na Serra do Tabuleiro, as atividades de subsistência, de forma geral, compõem um mosaico, diferenciado de acordo com as aldeias, os contextos, as épocas do ano, as realidades, as necessidades e as famílias, no qual encontram-se basicamente: agricultura em pequena escala; criação de animais de pequeno porte, principalmente aves; prestação de serviços temporários para vizinhos; venda de artesanato; caça e pesca (pluvial); coleta de frutas da época, mel ( ei); coleta para fins diversos, tais como habitação, artesanato, medicina, artefatos/instrumentos; recursos provenientes de aposentadorias e salários para lideranças, assistência de órgãos públicos e doações. Em duas das comunidades pesquisadas no presente estudo (Itaúba e Salto Grande), o programa do governo federal Bolsa Família constitui a principal fonte de renda para a subsistência destas populações, bem como salários de lideranças. Em geral trâmites para a obtenção destes recursos é intermediado através das respectivas secretarias de ação social dos municípios onde estão inseridas estas comunidades, e também através da FUNASA. O aldeamento do Irapuá tem como principal fonte de sustento o artesanato de cestos e esculturas em madeira. 1.3.2 Agricultura 15
Entre os Mbya estudados, o milho ( awati/avaxi/avachi/abati) e a mandioca (mandio/manji'o/mandiog) são os principais alimentos, sublinhando-se a centralidade do milho na agricultura Guarani, alimento físico e espiritual. Para os Guaranis, o milho tradicional é o verdadeiro ( awati etei). Além disso, o calendário econômico-religioso anual organiza-se a partir de sua plantação (Litaiff & Darella, 2000). Observa-se também o cultivo da batata-doce ( jety), abóbora (andai), melancia (sandiáu), feijão (kumanda), amendoim ( manduvi), cana de açúcar ( takuaree avaxi) e abacaxi ( nana) (Soares & Treviso, 2005). Noelli (1993: 112) aponta para as atividades de manejo das plantas anuais e perenes, afirmando que a postura dos índios Guaranis, frente ao ambiente não é passiva e sim baseada no profundo conhecimento dos meios bióticos e abióticos. De acordo com o autor: a) "Havia uma prescrição cultural que regrava tudo que fosse consumido, aproveitado ou adaptado à elaboração de cultura material" (p. 113). b) Os Guarani praticaram alterações fitogeográficas fitogeográficas e fitossociológicas fitossociológicas no interior da floresta subtropical subtropical (p. 140). c) Os Guarani diferenciavam floresta primária e floresta secundária. A primeira era a mata intacta, “virgem” e, a segunda, era o local preferencial para a instalação da roça que, uma vez abandonada, abandonada, se recompunha até atingir novamente o estágio de vegetação primária (p. 146-7). d) A relação entre equipamentos e estratégias de subsistência, a lista etnobotânica e etnozoológica e, a divisão sexual do trabalho são os pontos de partida para entender os diversos níveis de utilização da área de domínio (p. 157). e) Os Guarani faziam intenso manejo ambiental para fins de coleta, o que estreita cada vez mais a diferença conceitual entre agricultura e coleta, já que parte significativa da coleta se efetivava em áreas com plantas cultivadas em antigas roças abandonadas, ao longo de trilhas, em clareiras, bordas de mato etc., ou seja, áreas de vegetação secundária (p. 158 e 5-6). A roça, assim, é também espaço de manejo agroflorestal. A plantação visa alimento, medicina, atração da caça, matéria-prima e lazer. f) "os Guarani dispunham de um sistema agroflorestal similar ao padrão demonstrado pelos autores da etnobotânica e da biotecnologia amazônica" (p. 262). Além disso, vegetais cultivados na roça e algumas frutas têm sua origem na Amazônia. g) Na lista de plantas cultivadas na roça, composta por Montoya no início do século XVII, "a comparação com as técnicas de agricultura, os ecossistemas ocupados, bem como a similaridade lingüística com as demais línguas da família Tupi- Guarani refletem, através da analogia direta, uma similaridade do manejo agroflorestal" agroflorestal" (p. 280). 16
h) "O cultivo das plantas alimentícias anuais realizado pelos Guarani se caracterizava pela diversidade de cultivares e pelo consorciamento dentro das áreas manejadas" (p. 277). j) A soma de recursos alimentares animais e vegetais (cultivo e captação) alcançava mais de 1.000 itens de consumo ao longo do ano (p. 6). Muitas plantas úteis eram cultivadas em grandes extensões, como por exemplo, os palmeirais, os jabuticabais e as madeiras diversas. k) Os Guarani possuíam um amplo cabedal relacionado à cultura material: a) equipamentos e estratégias de sobrevivência (arco e flecha, arco de bolas, lanças, maças de guerra e rituais, boleadeiras, canoas, armadilhas para caça e pesca, redes, instrumental portátil de caça, anzóis, peneiras, puçá etc.); b) equipamento doméstico e de trabalho (trançado, tecelagem, cerâmica, moluscos, lítico, madeira, couro); c) utensílios para preparar, servir e armazenar alimentos (pau de cavouco, estrados e armários, tipiti, ralador, recipientes de madeira, pilão e mão de pilão, peneiras, abanos, colher, espátula/pá, escumadeira, "pano de limpeza, vassoura e escova", cestos, cobertura para recipientes, cabaças, "facas" de capim, taquara e dentes, fogão, grelhas para moquear e defumar, utensílios de transporte para lenha, produtos da roça, frutos etc.). 1.3.3 Os Mbya/Guaranis e as plantas Um dos aspectos que caracteriza o sub-grupo Mbya dentro da cultura Guarani é sua estreita relação com a natureza, em especial com as plantas. Eles as utilizam para os mais variados fins: alimentação, medicina, construção, caça, pesca, artesanato, etc. Algumas plantas são consideradas sagradas para os Mbya/Guarani, como o milho (avaxi) por exemplo. pindo), assim como o cedro ( ygary) e ainda outras, são árvores A palmeira ( pindo
sagradas para os índios Guarani (Litaiff & Darella, 2000). Darella escreveu trabalho intitulado Árvores cósmicas/sagradas: o pindo e o ygary na cosmovisão dos índios Guarani para a PUC-SP em 1999. Tanto a palmeira quanto o cedro são árvores que integram a Mata Atlântica e as florestas do alto-Uruguai. As grandes concentrações arbóreas de espécies úteis no interior e na periferia da floresta primária eram referidas através da inclusão do sufixo tiba, que significa “abundância”, ao nome da planta. (p. 148) Assim, os palmeirais ( Syagrus romanzoffiana) eram denominados pindotiba ( pindo pindo + tiba).
Noelli (1993: 144) informa que as classificações dos Guarani para plantas evidenciam evidenciam dez categorias supragenéricas, sendo que a categoria árvore ( yvyra) engloba 17
as plantas de caule lenhoso, de grande porte, encimados pelas copas; ( ka'a) ervas; ysypo) cipós; (kapi'i) capins; (temity) plantas da roça; ( karagwata) caraguatás, ( ysypo porã) plantas bromeliáceas; ( yvyra rehegwa) epífitas e parasitas; ( pohã) remédios; ( porã
sagradas criadas pelos seres sobrenaturais; ( yvy rehegwa) musgos. Entre os anos de 1612 e 1617, o jesuíta Antonio Ruiz de Montoya elaborou o Vocabulario e Tesoro de la lengua Guarani, publicado em 1639, abordando com
profundidade a relação linguagem - cultura e oferecendo a amplitude do conhecimento dos índios Guarani relacionados à biologia. Montoya é assim, o autor da primeira lista abrangente das plantas cultivadas na roça guarani. Os pesquisadores Isabelle Vidal Giannini (1994) e Francisco Silva Noelli (1993 e 1998) sublinham a informação do naturalista sueco Carl von Linné no século XVIII, que se referiu aos índios Guarani como primus verus systematicus na biologia, dando já naquela época o devido crédito à contribuição intelectual deste grupo. Desde o século XVI jesuítas, cronistas, viajantes, naturalistas, leigos e vários pesquisadores observam a cultura, levantam dados, identificam conhecimentos e processos de mudança, inscrevem as nomeações/palavras transmitidas pela educação, percebem atividades e comportamentos. Noelli (s/d) chama a atenção para o volumoso e aprofundado conhecimento botânico e fitoterápico guarani, exemplificando que numa amostragem de 800 plantas, foram demonstradas 151 espécies medicinais para 78 finalidades terapêuticas. Segundo o autor "a existência de diversas plantas com funções terapêuticas contra doenças introduzidas pelos europeus na América do Sul após 1.500, comprova que os Guarani possuíam um corpus estruturado e dinâmico de procedimentos sistemáticos para estudar a eficácia de cada planta" (p. 12). Isso ainda pode ser verificado atualmente nas aldeias Guarani, a partir do conhecimento, trabalho e dedicação dos curadores/rezadores/lideranças religiosas. E Noelli (1993: 241-2) lembra que somente após duzentos anos o sistema classificatório Guarani foi apresentado ao mundo acadêmico. Segundo ele, Moisés Bertoni, Júlio Storni e Carlos Gatti dicionarizaram o vocabulário botânico; León Cadogan, Raul Martínez-Crovetto e Wilson Garcia efetivaram a etnobotânica quantitativa e cognitiva geral do inventário das plantas úteis para os Guarani, e Bartolomeu Melià, Grünberg & Grünberg e José Perasso ofereceram acréscimos significativos, auxiliando no aumento da lista, que ainda não é definitiva e nem está completa. Martínez-Crovetto citado por Litaiff & Darella (2000), ao estudar os Mbya, depurou que de 639 plantas conhecidas, 590 tinham nome e 438 eram utilizadas na maior parte para fins medicinais, seguidas dos alimentares. Isso permite afirmar o 18
extenso e intenso conhecimento botânico dos índios Guarani e especificamente dos Mbya há séculos, o que é corroborado pela língua portuguesa falada no Brasil, cujo vocabulário integrou mais de 10.000 palavras de origem tupi, relacionadas em grande quantidade à flora e à fauna.
2. Material e métodos 2.1 Área de estudo 2.1.1. Irapuá De acordo com dados obtidas no sitio da Fundação Nacional do Índio (http://www.funai.gov.br/. Acesso em 18 ago. 2008) a FUNAI, em 1769, o Governo da Província criou o aldeamento de São Nicolau, no chamado Passo do Fandango, às margens do rio Jacuí. Em 1780, transformado em freguesia de N.Sra. da Conceição da Cachoeira, o aldeamento contava com 383 "índios missioneiros". 19
Em 1814, censo da Província registrou 425 índios, que se dispersaram posteriormente. Em 1974, 290 famílias Mbya/Guarani instalaram-se à margem da rodovia BR 290. Em 1993 a FUNAI, através da portaria nº 1.136, de 12/11, constitui grupo de trabalho que identificou a presença indígena e apresentou proposta de delimitação de 12 ha, com perímetro de 01 km. Atualmente a comunidade Mbya/Guarani encontra-se estabelecida na mesma área, que constitui uma reserva não demarcada. No passado o aldeamento localizava-se junto ao rio Irapuá, na divisa dos municípios de Cachoeira do Sul e Caçapava do Sul (Fig. 1), região central do Rio Grande do Sul, hoje a comunidade encontra-se encontra-se um pouco mais retirada em relação ao rio, dentro do município de Caçapava do Sul, nas coordenadas 30°14’28 35”S e 53°01’50 01”W. Segundo informações do cacique Silvino da Silva responsável pela comunidade, o aldeamento existe a pelo menos 55 anos. No momento do estudo a aldeia contava com 52 indivíduos, sendo destes, 33 crianças, distribuídos em 8 famílias. O clima regional é do tipo Cfa, segundo a classificação de Köppen, ou seja, subtropical úmido, sem período seco, com a temperatura média anual de 19,2°C, sendo a média do mês mais quente superior a 24°C e a média do mês mais frio em torno de 13°C, com precipitação de 1.594 mm/ano (IPAGRO, 1982). A grande variação de temperatura ocasiona ocasiona uma grande amplitude térmica durante o ano, com picos acima de 40°C e mínimas de até -4°C. Os solos pertencem à unidade de mapeamento Rio Pardo, classificando-se classificando-se como Argissolo Vermelho (Streck et al., 2002), A área do estudo encontra-se em uma região que pode ser considerada área de tensão ecológica (Fig. A). Localiza-se entre as regiões fisiográficas da Depressão Central e da Serra do Sudeste, abrangendo no seu entorno formações campestres, floresta ripária e vegetação pioneira (Teixeira et al., 1986). A vegetação na área do estudo, por tratar-se de uma área marginal à rodovia, de um modo geral é composta por espécies pioneiras e invasoras.
20
54°
52° 52°
54°
Salto Grande Itaúba Irapuá
30° 30°
Figura 1. Mapa das áreas indígenas estudadas no Rio Grande do Sul/Brasil
2.1.2. Itaúba O distrito de Itaúba está localizado no município de Estrela Velha a aproximadamente 35 Km do centro da cidade. As terras indígenas (S 29°18’245 W 53°12’963) na região de Itaúba (Fig. B) ainda esperam demarcação e homologação pela FUNAI, e a sua ocupação data de período recente, a cerca de 6 anos. Com a construção da barragem de Itaúba no Rio Jacuí, algumas áreas foram desapropriadas pela Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), sendo algumas destas, como é o caso de Itaúba e Salto Grande, aproveitadas para instalar comunidades indígenas na tentativa de saudar dívidas territoriais com estes povos. O clima regional é do tipo Cfa, segundo a classificação de Köppen, subtropical úmido, sem período seco, com a temperatura média anual de 19,2°C, sendo a média do mês mais quente superior a 24°C e a média do mês mais frio em torno de 13°C, com precipitação precipitação de 1.594 mm/ano (IPAGRO, 1982). A vegetação predominante na região é Floresta Estacional Decídua, que encontram-se restrita as áreas marginais escarpadas do Rio Jacuizinho e Jacuí. A topografia do terreno é fortemente ondulada, ao longo dos tempos os dois rios escavaram o terreno e atualmente correm no fundo de profundos vales. 21
O aldeamento de caráter permanente conta com 5 famílias extensas e aproximadamente aproximadamente 38 pessoas (Fig. b) 2.1.3. Salto Grande do Jacuí Segundo o breve registro histórico que consta no site da FUNAI (http://www.funai.gov.br/. Acesso em 18 ago. 2008), no século XVIII, os Guaranis exploravam os ervais ervais junto ao rio Jacuí, Jacuí, na Serra do Botucaraí. No final do século século XIX, a área junto ao rio Jacuí foi ocupada por grupos Nhandéva vindos da região do rio Iguaçu, que permaneceram até 1955, quando começou a construção da barragem Maia Filho. Na década de 1970, os Mbya passam a freqüentar a área de preservação da Cia. Estadual de Energia Elétrica, à margem esquerda do rio Jacuí e, em 1991, passam a ocupá-la permanentemente. permanentemente. A FUNAI constitui grupo de trabalho, através de portaria nº 1.136. de 12/11/93, que identifica e delimita a área em 238 ha. Pela portaria nº 105, de 13/02/96, o Ministério da Justiça declara a área de posse permanente indígena. A reserva Salto Grande do Rio Jacuí localiza-se no município de Salto do Jacuí (S 29º03’394 W 53°13’664), e é uma reserva indígena demarcada (Fig.1). Conta com 234 hectares e teve origem, como vimos anteriormente, a partir de desapropriações realizadas para a construção da barragem de Salto do Jacuí. Neste local, antes da alocação dos índios, foram realizados plantios de espécies exóticas ( Pinus sp. e Eucalipus sp.) como medidas compensatórias à construção da barragem.
O clima regional é do tipo Cfa, segundo a classificação de Köppen, ou seja, subtropical úmido, sem período seco, com a temperatura média anual de 19,2°C, sendo a média do mês mais quente superior a 24°C e a média do mês mais frio em torno de 13°C, com precipitação de 1.594 mm/ano (IPAGRO, 1982). A vegetação na região é de Floresta Estacional com influência ripária, neste caso, devido a proximidade do Rio Jacuí, dispondo esta de significativa área relativamente preservada, além da presença das espécies exóticas já mencionadas (Fig. C). 2.2 Coleta dos dados A coleta dos dados ocorreu entre os meses de dezembro de 2007 a julho de 2008, e realizou-se por meio de entrevistas não estruturadas e semi-estruturadas (Tab. 2). Adotou-se como critério para a coleta de dados, entrevistar a pessoa mais velha e/ou o Karaí (curandeiro) da aldeia. Foram levantadas informações como o nome da espécie 22
em guarani, aplicação e parte da planta utilizada. A identificação das espécies conhecidas foi realizada in loco, sendo as espécies desconhecidas coletadas e identificadas através de revisão de bibliografia e consulta a especialistas, onde as mesmas foram agrupadas nas famílias reconhecidas pelo APG II (2003). Todo material coletado está depositado depositado no herbário HCB da UNISC. U NISC.
3. Objetivos 3.1 Objetivos gerais 23
O presente estudo tem por objetivo resgatar o conhecimento sobre as plantas utilizadas por indígenas Guaranis no Rio Grande do Sul/Brasil; descrever como esta cultura nativa da América do sul se relaciona com as plantas, seja para quais finalidades. Objetivamos nesta pesquisa avaliar quanto deste conhecimento pode ter se perdido com o aculturamento que de longa data sofrem os povos autóctones, como é o caso dos Guaranis. Nos propomos também analisar a influência Guarani na forte cultura da medicina popular sul-rio-grandense. sul-rio-grandense. A falta de informações científicas sobre as espécies utilizadas, suas indicações, coleta e herborização, bem como inventário dos nomes populares e indígenas, constituem informações básicas para qualquer projeto ou ação junto a estas comunidades. Nosso objetivo principal é o resgate da informação e a valorização do conhecimento local, a fim de subsidiar idéias para a melhoria da qualidade de vida nas comunidades indígenas estudadas. 3.2 Objetivos específicos Objetivamos neste estudo etnobotânico responder as seguintes perguntas: - Quais são as espécies vegetais utilizadas por indígenas Mbyá/Guarani no Rio Grande do Sul, em particular nas reservas Irapuá, Itaúba e Salto Grande do Jacuí? - Qual o nome indígena destas espécies? - Quais as aplicações destas plantas? - Que as partes das plantas são utilizadas? - As espécies utilizadas pelos índios são de ocorrência natural na região ou são espécies cultivadas? - Existem espécies exóticas a flora local sendo utilizada pelos indígenas? Quais e como são utilizadas?
4. Resultados 24
Foram identificadas 61 espécies vegetais pertencentes a 35 famílias botânicas, com algum tipo de utilização pelos índios Mbya/Guarani das três aldeias estudadas na pesquisa. O nome científico, popular e indígena, bem como a indicação de uso e parte da planta utilizada, encontram-se listados na Tabela A. As famílias mais importantes quanto ao número de espécies com algum tipo de aplicação foram Myrtaceae, Fabaceae e Poaceae com 5 espécies, seguida de Rutaceae com 4 espécies, e das famílias Meliaceae e Euphorbiaceae com 3 espécies cada (Fig. 2). 6 5 s e i c4 é p s e e3 d o r e2 m ú N
1 0 Myrt Myrtac acea eaee
Faba Fabace ceae ae
Poac Poacea eaee
Ruta Rutace ceae ae
Meli Meliac acea eaee
Eup Eupho horb rbia iace ceae ae
Família botânica
Figura 2. Relação entre famílias botânicas e número de espécies utilizadas por indígenas Mbya/Guarani no Rio Grande do Sul/Brasil
A terra indígena Salto Grande do Jacuí foi à aldeia que apresentou maior número de espécies vegetais com algum tipo de utilização, foram 38 espécies. Em Itaúba identificamos 31 espécies e no Irapuá 17 espécies com algum tipo de aplicação (Fig. 3).
40 35 s 30 e i c é p 25 s e e 20 d o r e 15 m ú 10 N
5 0 Sal to
Itaú ba
Irap uá
Aldeias indígenas
Figura 3. Gráfico demonstrando a riqueza de espécies utilizadas em três comunidades indígenas no Rio Grande do Sul/Brasil.
A maioria das espécies vegetais citadas pelos indígenas (32 sp. ou 52,5% do total) são utilizadas para fins medicinais; 15 espécies (24,6%) são utilizadas para alimentação; 11 espécies (18%) são utilizadas para fins de artesanato e 5 espécies foram citadas com funções místico/religiosas. As demais espécies apresentaram aplicações variadas como
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fabricação de cabos para ferramentas; pesca; repelentes naturais; combustível (fogo), entre outros. Analisando quais partes das plantas são utilizadas, encontramos valores de 39,3% para caule; 34,4% para folhas; 11,5% para raízes e frutos e 5,5% para sementes. Algumas espécies, especialmente herbáceas, utilizam-se a parte vegetativa ou até mesmo toda planta no preparo do medicamento. No total de espécies identificadas dentro das áreas indígenas, 15 foram citadas com mais de uma aplicação, sendo assim consideradas espécies importantes (Tab. A). Mais de 83% das espécies vegetais (83,6% ou 51 sp.) são originárias da América do Sul, e por isso foram consideradas nativas, no outro extremo, 16,4% (10 sp.) das espécies são oriundas de outras partes do mundo, sendo trazidas para a América do sul pelos colonizadores europeus, ou mais recentemente, cultivadas em silvicultura (Fig 4).
Exóicas m e g i r O
Nativas
0
10
20
30
40
50
60
Número Número de e spécies
Figura 4. Relação entre origem fitogeográfica e número de espécies utilizadas nas comunidades indígenas Mbya/Guarani estudadas no Rio Grande do Sul/Brasil.
Cerca de 15 espécies identificadas (24%) nas comunidades estudadas, são cultivadas pelos indígenas em pequenas roças ou próximo as habitações, não apresentando crescimento espontâneo, destas 7 espécies são exóticas (11,5%), originárias de outros continentes. O nome indígena das espécies pode ser observado na Tabela A, assim como o nome popular, que em muitos casos tem relação direta com a língua Tupi/Guarani.
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5. Discussão Nas três comunidades estudadas identificou-se 61 espécies vegetais com hábitos de vida (arbóreo, herbáceo, trepador...) e aplicações variadas, sendo que 15 destas apresentaram mais de um modo de utilização, podendo ser consideradas de maior significado cultural, em detrimento das demais espécies identificadas nas comunidades. O Pindó (Syagrus romanzofiana ), por exemplo, é utilizado como medicinal e também na cobertura das casas de reza (Fig. G). Como foi referenciado no desenvolvimento deste trabalho, o Pindó também serve de alimento para homem e para caça, além de outras utilidades, tem valor simbólico para a cultura Mbya, como sendo uma árvore Aristolochia brasiliensis), sagrada. Outra espécie a ser destacada é o Yxypó-milombre ( Aristolochia
largamente utilizado junto com o chimarrão, combate e previne diversos males segundo os indígenas entrevistados. O Cipó-milom é uma planta trepadeira comum nas matas da região sul do Brasil e também muito utilizado na medicina popular na região central do Rio Grande do Sul no combate a doenças cardíacas, diabetes e também o câncer. O milho, genericamente conhecido pelos índios por Avaxi ( Zea mays), e que apresenta diversas variedades, talvez seja a planta mais importante para a cultura Mbya/Guarani. Além de utilizada na alimentação dos índios e dos animais domésticos, os Guaranis utilizam na fabricação de receitas próprias da cultura Mbya como o Kaguijy (caldo de farinha de milho), o Mbojapé (pão de farinha de milho, sem fermento, assado na brasa), o Mbytá Avaxiku’ i (pão sem fermento, cozido na panela), e o Avaxiku i manduvi reveguá (paçoca de milho pilado com amendoim torrado). Os Mbya cultivam
diversas variedades de milho em consórcio com outras plantas como a mandioca, feijão, abóbora, batata, melancia entre outros.
Definitivamente Definitivam ente o milho assume uma
centralidade na cultura Mbya, sendo considerado alimento para o corpo e para o espírito, além disso, até o calendário econômico-religioso anual organiza-se a partir de sua plantação Soares & Treviso, (2005); Litaiff & Darella, (2000). Do total de 61 espécies identificadas como de utilidade direta para os índios, 10 são espécies exóticas (16,4%), em geral cultivadas, originárias de outras partes do mundo. O aldeamento de Salto Grande do Jacuí, embora tendo no seu território territóri o considerável área de mata nativa, apresenta grande quantidade de florestamento com espécies como o Eucalyptus sp. e Pinus sp., as quais os índios atribuem pouco valor, mas que acabam utilizando, principalmente como combustível. Convêm salientar que as atuais habitações dos índios são feitas com madeira de Eucalyptus sp. e telhas industrializadas, o que não lhes confere o mesmo conforto das
casas tradicionais, principalmente principalmente em relação ao isolamento térmico. 27
Outra espécie exótica amplamente distribuída pelo sul do Brasil, considerada invasora, e que foi constatada no aldeamento de Itaúba é a Uva-do-Japão ( Hovenia dulcis). Esta espécie é dispersa por aves, e tem crescimento espontâneo e agressivo,
desenvolvendo-se bem tanto no interior quanto na borda das florestas. A melancia (Citrullus lanatus ), denominada pelos guaranis de Jandiaú merece destaque. Amplamente cultivada em várias comunidades guaranis de todo Brasil é muito apreciada pelos indígenas e totalmente inserida dentro da cultura guarani (Litaiff & Darella, 2000), apesar apesar da bibliografia descrever descrever a planta como como originária da África central. A Taquara ( Bambusa sp.), uma espécie exótica é de extrema importância em diversas comunidades indígenas no sul do Brasil, em especial no Irapuá. Existem diversas espécies de taquaras exóticas muito cultivadas em todo mundo, o que dificulta a determinação da espécie. A utilização da Taquara no aldeamento do Irapuá, é uma constatação importante deste estudo, tendo vista, que esta aplica-se a produção de cestos e balaios, que consistem numa das mais importantes expressões da arte indígena e principal fonte de subsistência para aquela comunidade, sem a qual o aldeamente dificilmente existiria. A grande maioria das espécies citadas pelos Mbya/Guarani em ambas as comunidades (83,6%), são plantas nativas, que apresentam ocorrência natural na região do estudo. Durante o presente estudo, nas saídas a campo, os indígenas reconheceram praticamente o nome de todas as espécies perguntadas, muitas não entraram na lista etnobotânica deste estudo, por não apresentarem uma aplicação direta, ou os índios não souberam precisar a utilização, demonstrando ao mesmo tempo o grande conhecimento que os guaranis mantém sobre a natureza local, e também o possível desaparecimento deste conhecimento. Bueno et al. (2004) encontraram 34 espécies vegetais utilizadas como medicinais, distribuídas em 22 famílias botânicas em uma comunidade Guarani e Kaiowá na reserva Caarapó, no Mato Grosso do Sul. Morais et al. (2005) constataram a utilização de 63 espécies de plantas como medicinais entre os índios Tapebas no Ceará. Litaiff & Darella (2000) estudando guaranis na Serra do Tabuleiro, litoral de Santa Catarina, identificaram 37 espécies vegetais utilizadas pelos Mbya que lá vivem. Riqueza esta que pode ser considerada baixa, tendo em vista tratar-se de uma área de vegetação com floresta atlântica, conhecida por sua grande riqueza e diversidade de espécies. Comparando o presente estudo com o estudo realizado na Serra do Tabuleiro por Litaiff & Darella, (2000), constatamos que 15 espécies são vegetais são comuns as comunidades comunidades estudadas, sendo a maioria, espécies cultivadas. Isso reforça o significado 28
cultural que estas espécies têm para os Mbya/Guarani e demonstra, como foi explicitado no transcorrer deste texto, o intenso intercâmbio entre comunidades Mbya/Guarani em uma ampla área geográfica. A riqueza de espécies utilizadas pelos indígenas na região central do Rio Grande do Sul pode ser considerada de nível intermediário, quando comparada aos estudos anteriormente citados, realizados em diferentes regiões e formações vegetais do Brasil. O artesanato tem sido uma alternativa importante de subsistência para grande número de indígenas, tanto guaranis como Kaiguangues. Em destaque citamos os cestos (ajaka), colares e pulseiras e as esculturas em madeira dos índios Guaranis. Neste cenário destacamos a importância de uma espécie exótica, a Taquara ( Bambusa sp.), principalmente na aldeia Irapuá, onde grande número de cestos são comercializados. Para fins de amarração, estes Guaranis usam geralmente cordões de plástico. Em função da gradativa dificuldade do uso da tinta vegetal, os Mbya da BR 290 costumeiramente tingem os balaios com tinta para tecidos, colorindo vistosamente as fibras de taquara. Por viverem ao lado da BR-290, não dependem do transporte que torna mais complicado a comercialização dos produtos devido ao volume excessivo das cestas. O intenso movimento de turistas na rodovia também ajuda nos negócios. Segundo Litaiff & Darella (2000) a cestaria pode ser utilizada como um exemplo ilustrativo da dinamicidade e plasticidade da cultura Mbya: anteriormente eram confeccionadas apenas para uso familiar, doméstico, bem como para carregar produtos da roça, como milho e mandioca - atualmente, com a influência do comercio e do turismo, acentuam-se inovações quanto à forma, função, matéria-prima e decoração. Habitualmente existem alguns formatos únicos e próprios da cultura Mbya (Waag, 1972). Em Itaúba e Salto Grande fabricam-se preferencialmente pulseiras e colares utilizando sementes de uma gramínea introduzida, chamada por eles de Kapiá (Coix sp.) e colmos de uma taquara nativa, conhecida por Taquarinha-criciúma ( Chusquea sp.), apenas os cordões não são naturais, sendo adquiridos no comercio local. A confecção de colares e pulseiras foi constatada apenas nas aldeias de Itaúba e Salto Grande. Esse fato decorre destes aldeamentos serem afastados de centros urbanos com potencial de comércio. O aldeamento de Itaúba está localizado aproximadamente a 35 Km do centro da cidade de Estrela Velha, sendo praticamente impossível o transporte de cestos, por estes serem volumosos. Em geral as pulseiras são encomendadas por intermediários para então serem revendidas em cidades como Santa Cruz do Sul ou Santa Maria. Também ocorre dos índios fabricarem estes artigos, e em determinada época do ano, alguns saem e percorrem cidades da região vendendo os artesanatos. 29
Esculturas em madeira representando a figura de animais nativos da região como onça, tatu, quati entre outros (Fig. F), são preferencialmente esculpidas utilizando-se a madeira da árvore conhecida localmente como Leiteiro ou Curupi e denominada pelos indígenas do Kurupi (Sapium glandulosum ), planta nativa, latescente, e segundo os índios, macia para trabalhar, e após seca dificilmente apresenta rachaduras.
30
6. Conclusões - Os indígenas estudados utilizam um número considerável de plantas quando comparado a outros estudos com outras comunidades indígenas no Brasil (Litaiff & Darella, 2000; Bueno et al., 2004 e Morais et al., 2005) e a totalidade de espécies conhecidas nas formações vegetais da região. - Atualmente diversas espécies exóticas são fundamentais para a sobrevivência dos guaranis, dentre elas a Taquara ( Bambusa sp.), utilizada no artesanato de cestos, e imprescindível para a manutenção principalmente da comunidade do Irapuá. - O conhecimento sobre a utilização de muitas espécies de plantas provém, em grande parte da cultura guarani. Podemos concluir através dos dados deste estudo, que o conhecimento sobre a utilização das plantas precede a colonização européia. Situação que pode ser ainda melhor visualizada, quando cruzados dados ortográficos com os dados fitogeográficos fitogeográficos deste estudo. estudo. Podemos afirmar que a forte medicina medicina popular popular sulrio-grandense, bem como, nomenclatura, classificações, relações ecológicas e demais aplicações aplicações das plantas, foram herdadas à partir do conhecimento conhecimento pré-estabelecido pelos povos autóctones desta região, neste caso, os Guaranis. - Atualmente a cultura Mbya/Guarani passa por modificações, fruto das pressões da sociedade nacional circundante, muito embora como foi destacado no corpo deste trabalho, os Mbya tem por característica a preservação da sua cultura. Assim como Milliken et al. (1992) cita as seguintes modificações pelas quais passa qualquer cultura, devido ao contato com outras civilizações, podemos citar: 1) uso de plantas exóticas; 2) descontinuidade de uso de espécies vegetais, como resultado da substituição exóticas ou outros materiais; 3) alteração no manejo de florestas; 4) perda de recursos vegetais por perda de terras; 5) perda de conhecimento tradicional por morte de idosos das comunidades sem o apropriado repasse de conhecimento aos mais jovens. Também podemos citar perda da estrutura familiar e o interesse pela própria cultura, fruto de diversas eventos e problemas, entre os quais destacamos, os alarmantes índices de alcoolismo entre os indígenas observados neste estudo.
31
7- Considerações A comunicação com os Mbya/Guarani fora difícil. Eles costumam falar pouco, em tom baixo, são objetivos nas respostas, muitas vezes limitando-se responder sim ou não. Em suma, não se interessam pelos “brancos” e não entendem nossa cultura, da mesma forma como não os entendemos. São os orientais do ocidente. O Karai (líder esperitual), Luiz Natalício, por exemplo, não revelava que determinada planta era utilizada em rituais místico/religiosas de batismo, limitava-se a dizer que determinada planta era bom para “banhar criança recém nascida”, sem fornecer a referência da possível eficácia da planta. Os Mbya detêm considerável conhecimento sobre relações ecológicas e isso se reflete diretamente no “jeito de ser” Mbya. Suas plantações sempre seguem o modelo ensinado pelos antepassados. Cultivam pequenas roças próximo a floresta, utilizando o princípio da parcimônia, plantando sempre diversas espécies juntas e abandonado a terra após alguns cultivos, para que a mesma possa se restabelecer. Algumas espécies são imprescindíveis para a sobrevivência das comunidades indígenas, por isso é importante o plantio, por exemplo, de novos taquarais, principalmente no Irapuá, onde os indígenas utilizam a longo tempo taquaras cedidas por vizinhos. É importante também a continuidade do intercâmbio de sementes de milho crioulo, a espécie de maior valor econômico e cultural dos Mbya/Guaran Mb ya/Guarani.i. A atual nomenclatura de diferentes elementos da natureza (animais, rios, montanhas), neste caso em especial as plantas, na região central Rio Grande do Sul, ainda preserva muito da influência Tupi/Guarani.
32
8. Referencias bibliográficas AMOROZO, M.C.M. & GÉLY, A.L. Uso de plantas medicinais por caboclos do baixo Amazonas, Barcarena, PA, Brasil. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, Série Botânica 4(1): 47-131, 1988. AMOROSO. M. C. de MELLO. Uso e diversidade de plantas medicinais em Santo Antonio do Leverger , MT, Brasil. Acta Botânica Brasilica . 16(2): 189-203, 2002. APG II. An update of the Angiosperm Phylogeny Group classification for the orders and families of flowering plants: APG II. Botanical Journal of the Linnean Society 141:399-436. 2003. BARBOSA,W. L. R.; BARROS,W. e SOLER, O. Etnofarmacêutica: uma abordagem de plantas medicinais pela perspectiva da ciências farmacêuticas. Rev. Bras. Farm., Rio de Janeiro, v. 77, n. 3, p. 82-84, 1996. BEHLING, H.; PILLAR, V.D.P. & BAUERMANN, S.G. Late Quaternary grassland (Campos), fire and climate dynamics, studied by pollen, charcoal and multivariate analysis of the São Francisco de Assis core in western Rio Grande do Sul (southern Brazil). Review of Palaeobotany and Palynology 133: 235-248, 2005. BRANDÃO, C. R. Os Guarani: Indios do Sul, Religião, Resistência e Adaptação. Documento preparado para o Programa de Investigação: Palavra e Obra no Novo Mundo: Imagens e Ações Interétnicas. Trujillo, Espanha. Estudos avançados 4(10), 1998. BUENO, N.R; CASTILHO, R.O; COSTA, R.B; POTT, A; POTT, V.J; SCHEIDT, G.N. and BATISTA, M.S. Medicinal plants used by the Kaiowá and Guarani indigenous populations in the Caarapó Reserve, Mato Grosso do Sul, Brazil. Acta Botanica Brasilica. 19(1): 39-44. 2005. CABEZA DE VACA, Á. N. Naufrágios e comentários . Porto Alegre: L&PM, 1987. CRUZ, GILBERTO L. DA. Livro verde das plantas medicinais e industriais no Brasil . Belo Horizonte: [s.n.], 1965. FUNAI – Mapa de etnias Acesso em 18 ago. 2008) GARLET, I. e ASSIS, V. S. de. Diagnóstico da população Mbyá-Guarani no sul do Brasil. Cadernos do COMIN ; 1998. GOTTLIEB, O.R. & KAPLAN, M.A.C. Das plantas medicinais aos fármacos naturais . Ciência Hoje 89: 51-54, 1993. 33
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35
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36
9. Anexos Tabela A. Estudo etnobotânico em comunidades indígenas guaranis no Rio Grande do Sul, Brasil. N= nativa; E= exótica Família/Espécie/Nº do herbário Acanthaceae Justicia sp. HCB 02595 Anacardiaceae Schinus terenbthifolius Raddi. HCB 02601 Annonaceae Rollinia salicifolia Schltdl. HCB 02597 Arecaceae Syagrus romanzoffiana (Cham.) Glassm. Aristolochiaceae Aristolochia brasiliensis Autn. M. eT Zucc. HCB 02581, 02599 Asteraceae Achyrocline satureoides (Lam.) DC. Baccharis trimera (Less.) DC. HCB 02584, 02591 Bignoniaceae Jacaranda micrantha Cham. Boraginaceae Patagonula americana L. HCB 02586 Bromeliaceae Tillandsia usneoides L. HCB 02593 Cannabaceae Celtis iguanae (Jacquin) Spreng. HCB 02568 Cactaceae Lepismium cruciforme (Vell.) Miq. Convolvulaceae Ipomoea batatas L. (Lam.) Curcubitaceae Citrullus lanatus (Thunb.) Matsun & Nakai Curcubita sp.
Nome popular
Nome guarani
Utilização/Parte da planta/Modo de preparo
N/E
Junta-de-cobra
Mãinovy
Vômito/Caule e folha/Infusão
N
Yvyvaja remb' i 'u
Sapinho na boca de criança/Folha/Infusão
N
Aroeira-vermelha
N
Araxiku
"Dieta" para as mulheres que ganham bebê; Alimentação/Folha, fruto/Infusão
N
Coqueiro, Jerivá
Pindó
Dor de dente/Raiz/Infusão - Utilizase como cobertura das casas tradicionais
Cipó-milom
Problema do coração, pressão alta; "É bom pra tudo"/Folha e caule/Infusão
N
Yxypómilombre
Doença intestinal/Flor e folha/Infusão "Dar banho" em criança; Vermifugo/Caule e folha/Infusão
N
Araticum
Macela
Ypotyju
Carqueja
Taxopuã
N N
Jacarandá, Caroba
Caroba
Artesanato/Fruto N
Guajuvira
Guajayvi
Cabo de ferramentas/Caule N
Barba-de-pau
Evitar gravidez N
Esporão-de-galo
Jety
Juapekã
Dor de dente/Folha/Infusão N
Pegue' puã
"Para as juntas machucadas"/Amassar e aplicar no local
Batata-doce
Alimentação/Raiz
N E
Melancia Abóbora
Jandiaú Andai
Alimentação/Fruto Alimentação/Fruto
N Continua
37
Continuação
Euphorbiaceae Gymnanthes concolor Spreng. HCB 02571, 02589 Manihot esculenta Crantz Sapium glandulosum (L.) Morong Fabaceae Albizia edwallii (Hoehne) Barneby & Grimes Arachis hypogaea L. Erythrina crista-galli L. Myrocarpus frondosus Allemão HCB 02574 Phaseolus vulgaris L. Lamiaceae Vitex megapotamica (Spreng.) Mold. Lauraceae Persea americana Mill. Malvaceae Luehea divaricata Mart.
Laranjeira-domato Mandioca
Yvyrau Mandió
Ferimentos e m “Machucado”/Folha/Torrar, moer e aplicar no local Alimentação/Raiz
Leitero, Curupi
Curupi
Artesanato/Madeira
N
Alecrim
Yvyrata' i Mandu' wi/Manduvi
Ferramentas e artesanato/Madeira
N
Alimentação/Semente
N N
Cabreúva Feijão
Yvyra' pagé Kumandá
Artesanato/Madeira Pressão alta/Folha e caule/Infusão Alimentação/Semente
N N
Tarumã
Tarumã
Hemorróida/Caule/Infusão
N
Alimentação/Fruto
E
Amendoim Corticeira-dobanhado
Abacateiro Açoita-cavalo
Yxongy
Sida sp. HCB 02579 Meliaceae Cabralea canjerana (Vell.) Mart. Melia azedarach L. Trichilia clausenii C.DC. HCB 02590 Myrsinaceae
Guanchuma
Typyxa
Canjerana Cinamomo
Kanxarana Praixo
Catiguá
Myrsine sp. HCB 02573 Myrtaceae Britoa guazumaefolia (Camb.) HCB 02592 Campomanesia xanthocarpa O.Berg Eucalyptus sp. Eugenia uniflora L. HCB 02570 Myrcianthes pungens (O. Berg.) Phytolaceae Phytolacca dióica L.
Gripe e dor de garganta/Caule/Infusão Dor de barriga e hemorróida/Raiz/Infusão
N N
N N
Kaxigua
Artesanato/Fruto Pressão alta/Caule/Infusão Artesanato, extrai-se corante/Caule/Decocção
N
Capororóca
Yvyra' timbó
Utilizado na pesca/Caule/Decocção
N
Veludinho
Araxá
Guabiroba
Guavirá
Pitanga
Pitanga
Guabijú
Yvaviju
"Lavar" criança/Folha/Infusão "Lavar" criança; Alimentação/Folha/Infusão Cabo p/ ferramentas; Combustível (fogo) Doença intestinal; Alimentação/Folha e caule/Infusão Evitar gravidez; Alimentação/Caule/Infusão
Umbú
Umbu
Repelente de insetos/Folha/Infusão
Eucalipto
N E
N N E N N N Continua
38
Continuação
Pinaceae Pinus sp. Poaceae Bambusa sp.
Pinus Taquara
Taquara
Chusquea sp. HCB 02576, 02594 Coix lacryma-jobi L. HCB 02575
Taquarinhacriciúma Lágrina-de-NossaSenhora
Taquarembó, Criciúma
Saccharum officinarum L.
Cana-de-açucar
Kapi' i ' a Takuaree avaxi
Milho
Avaxi
Zea mays L. Polypodiaceae Microgramma squamulosa (Kaulf.) de la Sota Micrograma sp. 2 Pteridaceae Adiantum sp. HCB 02585, 02600 Rhamnaceae Hovenia dulcis Thunb. Scutia buxifolia Reiss HCB 02577 Rosaceae Prunus sellowii Koehne HCB 02587 Rutaceae Citrus sinesnis (L.) Osbeck.
Combustível (fogo)/Caule
E
Artesanato/Colmo Evitar gravidez; limpar o organismo da mulher depois do parto; Artesanato/Folha e colmo
E N
Artesanato/Semente
E
Alimentação/Colmo Alimentação; Misticoreligiosa/Semente
E N
Erva-de-passarinho
"Limpar o organismo da mulher depois do parto"/Toda planta/Infusão "Evitar gravidez"/Rizoma/Mastigar
Avenca
Amambai' y
"Limpar o corpo da mulher depois do parto"; "É bom pra tudo"/Parte vegetativa/Infusão
N
Juu
Alimentação/Fruto "Dor de dente"/Folha e caule/Infusão
N
Yvaro
"Perna dormente"; "resfriado"; "dor de dente"; "Banho"/Folha/Infusão
N
Erva-de-passarinho
Uva-do-apão Curunilha Pessegueiro-somato Laranjeira
Citrus reticulata Blanco Bergamota Helietta apiculata Benth. HCB 02598 Canela-de-veado Zanthoxylum fagara (L.) Sarg. Mamica-de-cadela Santalaceae Phoradendron affine (DC.) Engler & K. Krause Salicaceae Casearia sylvestris Swartz Chá-de-bugre, HCB 02596 Carvalinho Sapindaceae Allophylus edulis (A. St.Hil., Cambess. & A. Juss.) Chal-chal, HCB 02578 Vacunzeiro Cupania vernalis Cambess. Camboatá-vermelho
N N
Alimentação/Fruto "Vômito e problemas no fígado"; Alimentação/Folha/Infusão "Fortalecer os ossos das crianças"/Folha/Infusão
N
Artesanato/Madeira
N
É utilizada como medicinal
N
Yvyra' i
"Dor no corpo"/Caule/Infusão
N
Guãku
"Problema no estomago"; "febre"/Folha e caule/Infusão Artesanato/Sementes
N N
Mandarina Guaxupy
E E
Continua
39
continuação
Solanaceae Solanum mauritianum Scop. Sapotaceae Chrysophyllum gonocarpum (Mart. & Eichler) Engl. HCB 02569 Urticaceae Urera baccifera (L.) Gaudich. ex Wedd. Urtiga dioica L.
Fumo-brabo
Aguaí-da-serra
Kavaxigui' u
Dor de dente/Folha e raiz/Infusão
N
Aguai
Artesanato/Semente; O fruto é comestível
N
Urtigão
Pyno
Urtiga
Taramiarã
Infecção urinária/Folha e raiz/Infusão Infecção urinária/Toda planta/Infusão
N N
40
Tabela B. Planilha semi-estruturada para entrevista sobre a utilização de Plantas Medicinais por indígenas Mbya/Guaranis Mbya/Guaranis de três comunidades no Rio Grande do Sul/Brasil Nome da Espécie Aplicação
Parte da planta utilizada/modo de prep.
Natural/ cultivada
41
Imagens Fotografia: Natália Oliveira
Fig. A. Aldeia do Irapuá na BR. 290 em Caçapava Do Sul
Fig. C. Salto do Jacuí: Diogo entrevista Luiz Karaí , o lider espiritual e responsável pelas curas
Fig. B. Visão geral das terras indígenas de Itaúba em Estrela Velha/RS
Fig. D. O artesanato dos índios do Irapuá
Fig. E. Kapiá: gramínea (Poaceae) introduzida CoixFig. F. Artesanato: esculturas em madeira com Ku(Sapium glandulosum) Lacryma-jobi rupi
.
42
Fig. G. Opã: A casa das rezas. Coberta com Pindó (Syagrus romanzoffiana). Distrito de Itaúba
Fig. H. Saída para coleta próximo a foz do Rio Jacuízinho em Itaúba
Fig. I. Pontsa: o urubú de estimação do cacique em Salto do Jacuí/RS
Fig. J. Prof. Anísio corrigindo as palavras escritas em guarani por Diogo de Souza. Salto do Jacuí/RS
Fig. K. Aspecto da vegetação na reserva Salto Grande do Jacuí
Fig. L. Aspecto da vegetação em Itaúba
43
Fig. M. Os guaranis do Irapuá preparando a taquara para a feitura dos cestos
Fig. N. Fisionomia da região de Itaúba: topografia, espécies introduzidas e pequenas roças
Fig. O. Identificações, nomenclaturas e utilizações
Fig. P. Entrevista em Itaúba
Fig. Q. Criança Mbya/Guarani
Fig. S. Dona Catarina, líder de uma família extensa, juntamente com uma das noras e netos
Fig. R. Mulher Mbya/Guarani de 92 anos
Fig. T. Diogo Lindenmaier e a bióloga e fotógrafa Natália Oliveira
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