{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
Minha viola chora prima Minha viola chora prima E a prima chora bordão mas óia, eu gosto dela (Toada de Cururu)
Eu tenho minha viola pra tocar o siriri Ai, toca ganzá Ai, toca tamboril (Toada de Siriri)
PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Li Incio Lla da Silva
Departamento de Patrimônio Imaterial GERENTE DE IDENTIFICAçãO
MINISTRO DA CuLTuRA
Ana Gita de Oliveira
Jca Ferreira GERENTE DE REGISTRO PRESIDENTE DO IPHAN
Li Fernando de Almeida CHEFE DE GABINETE
Fernanda Pereira PROCuRADORA-CHEFE FEDERAL
Lúcia Sampaio Alho DIRETORA DE PATRIMÔNIO IMATERIAL
Marcia Sant’Anna DIRETOR DE PATRIMÔNIO IMATERIAL E FISCALIzAçãO
Ana Cldia Lima e Alves GERENTE DE APOIO E FOMENTO
Teresa Maria Cotrim de Paiva Chaves
Centro Nacional de Cultura Popular CHEFE DA DIVISãO TéCNICA
Lcia Ynes CHEFE DO SETOR DE PESQuISA
Ricardo Gomes Lima
Dalmo Vieira Filho DIRETOR DE MuSEuS E CENTROS CuLTuRAIS
Jos do Nascimento Jnior DIRETORA DE PLANEJAMENTO E ADMINISTRAçãO
Maria Emlia Nascimento Santos COORDENADORA-GERAL DE PESQuISA, DOCuMENTAçãO E REFERêNCIA
Lia Motta COORDENADOR-GERAL DE PROMOçãO DO PATRIMÔNIO CuLTuRAL
Li Philippe Peres Torelly SuPERINTENDENTE REGIONAL EM GOIáS, MATO GROSSO E TOCANTINS
Salma Saddi Waress de Paiva SuPERINTENDENTE REGIONAL NO MATO GROSSO DO SuL
Maria Margareth E. Ribas Lima
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional DEPARTAMENTO DEPARTAME NTO DO PATRIMÔNIO IMATERIAL
SBN Quadra 2 Ediício Central Brasília 1o andar Cep: 70.040-904 - Brasília-DF Teleones: (61) 3414-6135 , 3414 6137 www.iphan.gov.br -
[email protected] CENTRO NACIONAL DE CuLTuRA POPuLAR
Rua do Catete, 179 CEP: 22.220-000 – Catete – RJ www.cncp.gov.br - diusao.
[email protected]
Projeto Celebrações e Saberes da Cultura Popular/CNCP/Iphan COORDENAçãO GERAL
Letcia Vianna CONSuLTORIA EM ETNOMuSICOLOGIA
Eliabeth Travassos EQuIPE DE PESQuISA
Edilberto Fonseca Gstavo Pacheco Letcia Dias Letcia Vianna ASSISTENTES DE PESQuISA
Aroldo Arrda Fbio Aleon Thiago Aqino
Edição do Dossiê EDIçãO DE TExTO
Edilberto Fonseca TExTOS
Carla Belas Edilberto Fonseca Eliabeth Travassos Letcia Dias Letcia Vianna Roberto Corra MAPA
Caito Mainier Edgar Fonseca TRANSCRIçõES MuSICAIS
Edilberto Fonseca Ricardo Gilly EDIçãO DE PARTITuRAS
Ricardo Gilly REVISãO DE TExTO
Grpo 108 de Comnicao (Helena Jansen) PROJETO GRáFICO
Victor Brton DIAGRAMAçãO
Grpo 108 de Comnicao (Carlos Magno do Amaral)
FOTOGRAFIAS
Gravras e Fotograas Acervo CNCP Alce Maynard de Araújo Carla Belas Dcio Daniel Edilberto Fonseca Eliabeth Travassos Emanel Oliveira Braga Francisco Moreira da Costa Karl von den Steinen Lúcia Carames Sartorelli Li Antonio Dailibe Li Iti Abe Ma Schmidt
Registro do Modo de Fazer Viola-de-Cocho Processo no. 01450.01090/2004-03 PROPONENTE:
Centro Nacional de Cultura Popular DADOS DO PROCESSO:
Pedido de Registro Aprovado na 45ª Reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, em 01/12/2004. Inscrição no Livro de Registro de Saberes em 14/01/2005.
INSTITuIçõES PARCEIRAS
Secretaria Estadal de Meio Ambiente, Cltra e Trismo de Mato Grosso do Sl Secretaria de Cltra do Estado do Mato Grosso Associao Folclórica de Vrea Grande Associao Folclórica de Mato Grosso Fndao de Cltra de Mato Grosso do Sl Institto do Homem Pantaneiro APOIO
Programa Artesanato Solidrio/Comnitas – Parcerias para o desenvolvimento solidrio Associao Cltral de Amigos do Mse de Folclore Edison Carneiro Fndao Jos Bonicio – FuJB
COORDENAçãO DE EDIçãO
Natlia Gerra Brayner Rvia Ryker Bandeira de Alencar PáGINA 2 FESTA DE SãO JOãO. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. PáGINA 4 ExPOSIçãO DE VIOLADE-COCHO PARA VENDA NA PORTA DA CASA DE CAETANO RIBEIRO CuIABá-MT, 2007. FOTO: EDILBERTO FONSECA.
sumário
10 APRESENTAÇÃO 12 Introduçã I ntrodução o 18 O instrumento musical 24 A viola-de-cocho e o conjnto instrmental 27 O ocio 33 O processo de abricao 38 Reerncias históricas 44 Rodas, cantorias, cantorias, ponteados e danças 49 O crr 57 O siriri 62 O reinado e as estas tradicionais
66 A dinâmica da tradição Os sentidos do registro e o desafio da salvaguarda 73 NOTAS 74 Fontes Bibliográficas 78 anexo 1 Parecer do RELATOR 82 anexo 2 titulação de patrimônio cultural do brasil
83 anexo 3 afinações afina ções e toques toques básicos básico s da viola-de-cocho 84 anexo 4 partituras 103 anexo 5 letras 109 anexo 6 capas cap as de discos
APRESENTAÇÃO
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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PáGINA 8
PáGINA AO LADO
ABAIxO
EuCLIDES MAIA DA SILVA
DESENHO DO MOLDE
DETALHE DE FOTO
FAz MARCAçãO A LáPIS,
PARA ENTALHE DO
DE VIOLEIRO DA
NA TORA, PARA CORTE DO
CORPO DA VIOLA-DE-
ORQuESTRA DE CâMARA
COCHO NuM TRONCO DE
COCHO.
DO ESTADO DE MATO
SERIGuELA.
CuIABá-MT, 2003.
GROSSO.
CuIABá-MT, 1988,
FOTO: FRANCISCO M. DA
CuIABá-MT, 2008.
FOTO: LuIz ANTONIO
COSTA.
FOTO: LÚCIA CARAMES
DuALIBE.
V
iola-de-cocho m instrmento msical de orma e sonoridade sui generis prodido na regio da bacia do Rio Paragai – baiada ciabana e adjacncias – nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl. Destaca-se como m instrmento ndamental nos gneros msicais crr e siriri, cltivados, sobretdo, em maniestaes cltrais ligadas religiosidade e brincadeira. é prodida de modo artesanal e, tradicionalmente, com matrias-primas etradas da natrea – da ana e da fora do pantanal e do cerrado. A salvagarda do processo de abricao artesanal do instrmento só possvel, portanto, se or ecologicamente sstentvel e ndada na relao harmoniosa e consciente dos artesos com o meio ambiente. Entretanto, a mera
SARTORELLI.
sstentabilidade ecológica no garante a preservao da viola-decocho como instrmento msical. A garantia do acesso s matriasprimas e da reprodo artesanal no so scientes para sa continidade. Essas aes devem estar integradas valoriao da sonoridade desse instrmento e de sas nes nas rodas, estas e celebraes qe animam a vida social no Brasil Central. é mito importante tambm qe a viola-de-cocho e sa música sejam amplamente conhecidas e apreciadas pelo conjnto da sociedade brasileira, pois epressam a identidade de m niverso cltral povoado de bichos, gente, santos, mitos, lendas e histórias ndamentais para a manteno da riqea simbólica de nosso pas. Esse oitavo volme da srie Dossiê Iphan tra a público aspectos
relevantes desse niverso qe devem ser compartilhados e divlgados para ampliar o conhecimento sobre esse patrimônio cltral. Pararaseando m verso bem poplar no crr: “Deia estar, jacar, qe essa riqea no vai acabar...”
Li Fernando de Almeida Presidente do Iphan
Introdução
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PáGINA AO LADO JOãO BATISTA RODRIGuES. CuIABá-MT, 1988. FOTO: ELIzABETH TRAVASSOS. ABAIxO DETALHE DE VIOLA DESENHADA. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
E
m 1988, o Centro Nacional de Folclore e Cltra Poplar, ainda vinclado Fnarte, realio ma eposio sobre a viola-de-cocho e sas epresses relacionadas, o crr e o siriri, na Sala do Artista Poplar, no próprio espao do Centro no Rio de Janeiro. A eposio tinha o objetivo de valoriar o modo de aer viola-de-cocho a partir de sa diso jnto a m público diversicado e no necessariamente amiliariado com o instrmento. instrmento. Condida pelos pesqisadores Eliabeth Travassos e Roberto Corra jnto a crreiros e artesos de viola-de-cocho na regio dos mnicpios de Ciab e Santo Antônio do Leverger, em Mato Grosso, a pesqisa etnogrca qe embaso a mostra compreende as prticas relacionadas ao modo de aer a viola-de-cocho, realiando registro otogrco de algns
dos principais artesos da poca, alm de gravaes qe originaram o disco Cururu e outros cantos das estas religiosas - MT. Em evereiro de 2002, o Projeto Viola-de-Cocho Pantaneira implemento nova pesqisa e docmentao etnogrca nos mnicpios de Cormb e Ladrio, em Mato Grosso do Sl.
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ANTÔNIO HéLIO. POCONé-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
O projeto oi coordenado pelo Centro Nacional de Folclore e Cltra Poplar com recrsos da Petrobras Distribidora, no mbito do Programa Artesanato Solidrio, e conto com ma rede de parceiros da maior relevncia, r elevncia, alm do apoio e a adeso no só dos músicos-artesos, mas de vrias instncias comnitrias e institcionais. A pesqisa oi coordenada por Letcia Vianna
e tinha por objetivo a gerao de conhecimento a ser disponibiliado para o público em geral; a elaborao de m plano de manejo ambiental para garantir matriaprima; a realiao de ocinas de edcao ambiental, de coneco e eeco msical do instrmento para repasse da tradio; a elaborao de estratgia para a colocao da viola no mercado e a diso do bem cltral por meio
de cartes postais, pblicaes e ma nova eposio na Sala do Artista Poplar. Os resltados da pesqisa do Projeto Viola-de-Cocho Pantaneira evidenciaram o risco iminente de desaparecimento da viola-de-cocho em Cormb e Ladrio, no Mato Grosso do Sl, pela idade avanada dos, ento, únicos detentores dos saberes a ela relativos. Diante deste ato e, tambm, do crescente reconhecimento da viola-de-cocho como m smbolo da identidade do Estado de Mato Grosso, sendo inclsive objeto de dispta jrdica sobre registro de marca em benecio individal, o Centro Nacional de Folclore e Cltra Poplar/CNFCP tilio a metodologia do Inventrio Nacional de Reerncias Cltrais/ INRC para a sistematiao de dados, levantamento, identicao e localiao de docmentos e reerncias sobre a viola-de-cocho
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JOãO GONçALO. LIVRAMENTO-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
visando instro do processo de registro para obteno do ttlo de Patrimônio Cltral do Brasil. Este trabalho, iniciado em 2003, oi realiado no mbito do Projeto Celebraes e Saberes da Cltra Poplar. Nesse sentido, em 2003, ma nova pesqisa oi levada adiante, com o objetivo especco de sbsidiar o pedido de registro do modo de aer a viola-de-cocho como bem cltral, tendo sido visitados os mnicpios de Nossa Senhora do Livramento, Pocon, Jangadas, Nobres, Rosrio Oeste, Diamantino e novamente em Santo Antônio do Leverger e Ciab, em Mato Grosso. Assim, o Inventrio Nacional de Reerncias Cltrais do Modo de Faer a Viola-de-Cocho nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl, integro ma das linhas de pesqisa e docmentao do Projeto Celebraes e Saberes da Cltra Poplar, desenvolvido
pelo Centro Nacional de Frto do processo de pesqisa, Folclore e Cltra Poplar, a docmentao renida e com o patrocnio da Secretaria sistematiada por meio do de Patrimônio, Mses e Artes Inventrio Nacional de Reerncias Plsticas do Ministrio da Cltra, Cltrais do Modo de Faer a no mbito do Programa Nacional de Viola-de-Cocho gero sbsdios Patrimônio Imaterial. Tratava-se de ormlao do dossi de instro, ma eperincia piloto no sentido qe garanti a inscrio do Modo de prodir conhecimento sobre de Faer Viola-de-Cocho no Livro as possibilidades, alcance e eccia dos Saberes, conerindo-lhe assim do Decreto-Lei 3551 de 4 de o ttlo de Patrimônio Cltral agosto de 2000. do Brasil, em 14 de janeiro de
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PáGINA AO LADO MAPA DE MATO GROSSO E MATO GROSSO DO SuL. MAPA DO BRASIL. AO LADO CuRuRuEIROS MANOEL SEVERINO, CAETANO RIBEIRO E JÚNIOR CéSAR, 2007. FOTO: CARLA BELAS.
2005. Neste dossi de instro oram disponibiliadas inormaes ndamentais qe, renidas e sistematiadas no decorrer de todo o processo de pesqisa, teve se echo provisório no Inventrio Nacional de Reerncias Cltrais do Modo de Faer a Viola-de-Cocho. Esse dossi reni tetos, imagens, vdeos, músicas, partitras, mapas e demais reerncias qe resltaram de pesqisas realiadas pelo Centro Nacional de Folclore e Cltra Poplar nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl, em diversos perodos nos mnicpios de: Santo Antônio do Leverger e Ciab (MT) em 1988; de Cormb e Ladrio (MS) em 2002; Nossa Senhora do Livramento, Pocon, Jangadas, Nobres, Rosrio Oeste, Diamantino e novamente em Santo Antônio do Leverger e Ciab (MT) em 2003; Vrea Grande e, mais ma ve, Ciab e Nossa Senhora do
Livramento (MT) em 2007. Cabe lembrar, contdo, qe mesmo no tendo sido possvel ainda implementar pesqisas mais pormenoriadas em otras regies dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl, relatos de crreiros e artesos conrmam a presena da viola-de-cocho nas cidades de Cceres o Baro de Melgao (MT), bem como em otras localidades e mnicpios de Mato Grosso do Sl.
O atal processo de reconhecimento da dimenso patrimonial dos saberes e aeres engendrados no modo de aer da viola-de-cocho passa a ser, dessa orma, m dos caminhos viveis para o reconhecimento social e da valoriao de indivdos e grpos qe vm sendo reglarmente colocados margem do processo histórico de constro da identidade e da cltra brasileira.
O instrumento musical
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PáGINA AO LADO
ABAIxO
VIOLAS-DE-COCHO EM FASE
RASPAGEM LATERAL DO
DE ACABAMENTO.
CORPO.
CuIABá-MT, 2007.
CuIABá-MT, 2007.
FOTO: EDILBERTO FONSECA.
FOTO: EDILBERTO FONSECA. VIOLA-DE-COCHO, 1988. FOTO: DéCIO DANIEL.
O
nome cocho deve-se tcnica de escavao da caia de ressonncia da viola em ma tora de madeira inteiria; mesma tcnica tiliada na abricao dos recipientes nos qais so depositados os alimentos para o gado. Nesse cocho, j talhado no ormato de viola, so aados m tampo e, em segida, as partes qe caracteriam o instrmento msical, como cavalete, espelho,
paiêta, rastilho e cravelhas. O modo totalmente artesanal de prodo determina variaes no instrmento qe podem ser observadas de arteso para arteso, de brao para brao, de ôrma para ôrma. Tomando m padro, arbitrrio, em meio s dierenas próprias do modo de aer artesanal, podemos dier qe as violas tm, em mdia, cerca de 70 cm de comprimento e 25 cm de largra, com 10 cm de altra na caia de ressonncia. Algmas possem m peqeno ro circlar no tampo, de 0,5 a 1 cm de dimetro; otras so totalmente echadas, o qe no compromete a sonoridade: sem o ro, diem, gardam ses mistrios e no servem de abrigo a animais peonhentos. Para a coneco do corpo, as madeiras tradicionalmente preeridas so a imbva e o sarde-leite; hoje, no entanto, so tiliadas tambm madeiras como
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CORDAS DE NAILON EM SuBSTITuIçãO àS DE TRIPA DE ANIMAIS. CuIABá-MT, 2007. FOTO: EDILBERTO FONSECA. COLOCAçãO DO RASTILHO. CuIABá-MT, 2003. FOTO: EDILBERTO FONSECA. ENTALHE DO RASTILHO. CuIABá-MT, 2003. FOTO: EDILBERTO FONSECA.
a mangeira, o cedro rosa e o cajmanga. Para o espelho, cravelhas e pestanas so sados cedro, mogno, aroeira e otras madeiras, e, para o tampo, a rai de geira e a teca (ma madeira asitica de ampla tiliao, em especial na constro de embarcaes). Para colar as diversas partes, tradicionalmente emprega-se a batata-de-smar, o ainda o grde, eito base de beiga natatória de piranha, a “poca” de piranha. “Cola, olha, antigamente tem ma erva, qe chama smbar. A corta ela e j coloca em cima de ma madeira e a vai amaciando, virando, virando, virando, at amaciar. Antigamente, era na base do smbar, o poca de pintado. Hoje, no presente, a coisa mais cil. Voc pega aqela cola qe criana cola papel... T aqi, t colado.” [Joo Gonalo, 72 anos, Nossa Senhora de Livramento, 2003]
Com cera de abelha preparam-se os pontos, trastes eitos de barbante, para qe se em em na madeira. madeira. J com as tripas de algmas espcies de macacos so eitas as cordas. Entretanto, com eceo da madeira, esses materiais tm sido sbstitdos por prodtos indstrialiados, tais como cola indstrial, cera indstrial e linha de nilon para as cordas. No obstante as adaptaes necessrias relativas s matrias-primas, os artesos conservam tcnicas e critrios ndamentais, oerecidos pelo saber tradicional. A viola-de-cocho possi sempre cinco ordens de cordas. Pode apresentar-se com cinco cordas singelas o com qatro cordas singelas e mais m par de cordas anadas em oitava na terceira ordem. As sas cinco cordas so denominadas prima, contra, corda do meio, canotio e resposta, sendo anadas de dois modos distintos: canotio
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CANTORIA DE CuRuRu, SEu NHÓCA E SEu AGRIPINO MAGALHãES. CORuMBá-MS, 2002. FOTO : FRANCISCO M. DA COSTA.
solto e canotio preso. A anao das cordas, de baio para cima, nas modalidades canotio solto e canotio preso so, respectivamente lá-mi-silá-ré e lá-mi-si-sol-ré. A anao das violas eita de ovido, no sendo tiliado nenhm otro tipo de instrmento o diapaso como reerncia sonora. A segnda corda de ma viola a qe serve de reerncia r eerncia para a anao de todas as violas presentes na roda de cantoria. Ao nal da cantoria de determinado crreiro dentro de ma roda comm ocorrer ma sesso de conerncia da anao das violas, sendo rotineiro tambm qe, ao longo do tempo da cantoria, a anao v sbindo aos pocos. A viola-de-cocho apresenta dois o trs pontos (trastes). Qando possi trs, o intervalo msical entre eles de semitom; qando possi
dois, o primeiro d m intervalo de m tom, e, o segndo, de semitom. Os acordes sados so basicamente os de tônica e de dominante com stima; eventalmente, armando-se o de sbdominante. No siriri, em qe este último acorde mais sado, a anao empregada canotio preso, de orma qe ele possa ser armado com apenas dois dedos. A mesma armao, contdo, mitas vees sada na anao canotio solto.
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SuVENIRES DE VIOLA-DECOCHO, PAuLO SANTOS. CuIABá-MT, 2007. FOTO : CARLA BELAS.
A viola, sempre de abricao artesanal, sada principalmente por músicos das camadas poplares em sas estas e divertimentos tradicionais. Nas estas católicas de Mato Grosso, por eemplo, especialmente as do ciclo joanino, h sempre ma roda de crr o de siriri, nas qais a viola-decocho aparece como o principal instrmento.
As violas podem ser decoradas com temas do pantanal, desenhadas a ogo e pintadas com tinta colorida, o bem branqinhas, na madeira cra, com o sem verni. As tas coloridas amarradas no cabo indicam o número de rodas de crr em qe a viola oi tocada em devoo a algm santo, tendo cada qal sa cor particlar.
“...a ta, o cantador obrigado a pôr. Dia 10 de janeiro oi dia de So Gonalo, o santo qe toca a viola. As esteiras, qando recebem ma graa de algm santo, no dia desse santo levam ma ta para amarrar na viola do cantador, pra ele cantar pro santo. é ma promessa. A pessoa escreve se nome na ta colocada na viola do cantador. Acho qe para o santo saber qem oi qe pago a promessa. As tas tm cores dierentes, cada santo tem sa cor. Amarelo dia 8 de deembro, dia de Conceio, verde So Gonalo, rosa So Joo, vermelho Senhor do Divino, branca Nossa Senhora das Graas... Parece mentira, mas verdade; a pessoa est com criana com agonia, amanh, depois de amanh dia de santo, ele vai e ala: aei me lho sarar e e vo comprar m metro de ta pra levar pra cantar. Cada moda qe o cantador canta para m santo e cada pessoa tem com m santo. é ma
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VISTA PANTANAL. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
obrigao. O sjeito pede e recebe, milagre.” [Agripino Magalhes, 89 anos, Cormb, 2002] A chamada viola caipira de 5 o 6 cordas dplas, largamente conhecida em praticamente todo o Brasil, tambm tiliada em Mato Grosso, na música das catiras1, das bandeiras de olia, e nas modas de viola 2. Os mato-gr mato -gross ossens enses es chamam chamam-na -na viola viola de pin pinho ho.. Ningm cogita sla no crr, em sbstitio viola-de-cocho, j qe esta última no meramente ma viola qe se toca qando no h otro instrmento de cordas disponvel. Viola-decocho e viola de pinho so dois instrmentos distintos por sa estrtra, ainao e timbre. A individalidade sonora da viola-de-cocho oi ressaltada por qantos a oviram. Jlieta de Andrade observa:
“No caso da viola-de-cocho, qando as cordas so golpeadas com ora, soma-se, ao som msical emitido, m leve rdo ricativo qe integra a sonoridade do instrmento, individaliando-lhe o timbre.” (1981: 32) A viola pode ser tambm ponteada - tocada de orma dedilhada - ncionando como instrmento solista, mas nem todos os crreiros sabem sla dessa maneira. A eeco de melodias mais reqente no rasqeado, ritmo conhecido na regio do rio Paragai e mito comm nos bailes matogrossenses e tambm na chamada “música caipira”. Freqentemente os violeiros reerem-se aos sotaqes rio-abaixo e rio-acima o viola-rio-baiana e viola rio-acima, reerncias a dois trechos do rio Ciab: da cidade de Ciab, descendo-se
em direo ao Pantanal, o rio navegvel; na direo contrria, o rio tem corredeiras qe impedem a navegao. Entretanto, qando as epresses so sadas no conteto do crr e da viola-de-cocho, o ponto de reerncia passa a ser o mnicpio de Rosrio Oeste. De Rosrio para baio, inclindo Ciab, a viola tocada em andamento mais vivo. De Rosrio para cima (regio de Nobres, Alto Paragai, Diamantino), tocada mais lentamente, e, em conseqncia, o crr tem tambm andamento mais moderado. As dierenas de andamento so acompanhadas por maneiras dierentes de danar o siriri.
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A viola-de-cocho e o conjunto instrumental
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ABAIxO
PáGINA AO LADO
MANOEL SEVERINO.
VIOLAS-DE-COCHO, GANzá
CuIABá-MT, 2003.
E TAMBORIL.
FOTO: FRANCISCO M. DA
CORuMBá-MS, 2002.
COSTA.
FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
FESTA DE SãO JOãO. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
C
om orma e sonoridade singlares, a viola-de-cocho integra m sistema msical sui generis na regio Centro-Sl, especialmente nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl. O modo de aer a viola-decocho est relacionado, tambm, ao aer artesanal de m conjnto de instrmentos qe compem o compleo msical-poticocoreogrco do crr e do siriri, onde ela tem papel de destaqe. Os principais instrmentos qe compem o conjnto instrmental nessas maniestaes, ao lado da viola-de-cocho, viola-de-cocho, so o gan, o tamboril (o tamborim), o mocho e, tambm, o ade. O ganzá m instrmento de percsso, ma espcie de reco-reco, sendo, em algns lgares, tambm conhecido como cracachá o caracachá. Com aproimadamente 50 cm de
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crreiros, o gan se destaca tanto no crr como no siriri, pela pecliaridade de se timbre. O tamboril est presente apenas na dana do siriri, sendo m dos instrmentos qe do ritmo aos danarinos. Trata-se de m peqeno tambor apoiado em ps de madeira (geralmente cabos de vassora), medindo aproimadamente m metro de altra, sendo qe o tambor comprimento, eito de taqara e possi diversos cortes transversais a se comprimento (m corte a cada meio centmetro). Para aer o instrmento soar, necessrio riccionar m peqeno pedao de pa, osso o pedra de cima para baio e de baio para cima, no sentido do comprimento do instrmento. De volme mais elevado do qe as violas-decocho e as próprias voes dos
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
ABAIxO CONJuNTO INSTRuMENTAL DO SIRIRI: MOCHO, VIOLADE-COCHO E GANzá, NA CASA DE DONA MARCOLINA, BAIRRO PEDRIGãO, FESTA DE NOSSA SENHORA APARECIDA. CuIABá-MT, 1987. FOTO: LuIz ITI ABE.
propriamente (sem os ps) atinge qando e tinha 10 anos de idade cerca de 70 cm. é perctido só, ningm chegava nma roda com das peqenas baqetas de de crr pra no ter o ado; madeira, qase sempre eitas s vees tinha dois, s vees tinha tambm com cabos de vassora. trs, mas nnca altava. Ado O coro, de veado o carneiro, era tipo de m pandeiro, mesma reveste m cilindro de madeira coisa de m pandeiro.” [Manoel constrdo o aproveitado Severino, 1998] de algm tambor. J o mocho Trata-se de m peqeno o instrmento qe, como o pandeiro eito tambm de coro tamboril, acompanha o siriri, de veado o carneiro, com porm se ormato dierenciado platinelas de chapinhas de pois se parece mais com m banco rerigerante o cerveja. Segndo de madeira cjo assento eito de os crreiros, antigamente coro, no qal so perctidas as no era to comm encontr-lo das baqetas. nas estas, por ser considerado De todos os instrmentos instrmentos de eeco mais dicil em do compleo msical, o adue, relao aos otros instrmentos. segndo depoimentos colhidos, Atalmente ele no mais parece ser aqele qe est visto, pois alm de no haver praticamente etinto. qem o saiba tocar, no mais coneccionado artesanalmente, artesanalmente, “Qando e entendi por tendo sido sbstitdo, qando gente, comecei a qerer cantar aparece, por pandeiros e aer viola; naqele tempo, indstrialiados.
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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ABAIxO ESQuERDA
ABAIxO DIREITA
MEDINDO CORTE DE
CORTE DE MADEIRA,
MADEIRA (SARã-DE-LEITE),
VITALINO SOARES.
ALCIDES RIBEIRO E MANOEL
CORuMBá-MS, 2002.
SEVERINO.
FOTO: FRANCISCO M. DA
CuIABá-MT, 2003.
COSTA.
FOTO: FRANCISCO M. DA
O ofício
COSTA.
MODELAGEM DO TRONCO COM MOTOSSERRA, ALCIDES RIBEIRO. CuIABá-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
D
ierentemente de otros instrmentos msicais de so poplar (viola caipira, violo, cavaqinho, nmerosos instrmentos de percsso, etc.), coneccionados tanto por artesos tradicionais qanto por empresas, em escala indstrial, a viola-de-cocho prodto eclsivamente artesanal, eito por artesos para so próprio o para atender demanda de peqenos mercados locais constitdos por músicos, pesqisadores, pessoas ligadas ao crr e siriri e, tambm, tristas de m modo geral. Os crreiros costmam reconhecer acilmente o abricante de ma viola-de-cocho graas a certas caractersticas e marcas artesanais qe a individaliam. A tiliao tiliao atal da viola-decocho, especicamente por parte de músicos, tem demandado algmas modicaes na estrtra sica do instrmento. Isso se d por reqisio
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
PáGINA AO LADO
ABAIxO
ENTALHE DO CORPO DA
ESCAVAçãO VIOLA-DE-
VIOLA-DE-COCHO.
COCHO.
CuIABá-MT, 2003.
CORuMBá-MS, 2002.
FOTO: FRANCISCO M. DA
FOTO: FRANCISCO M. DA
COSTA.
COSTA.
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OFICINA DE PRODuçãO DE VIOLA, MESTRE SEVERINO MOuRA. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
dos próprios músicos em no dos novos contetos cltrais qe a viola-de-cocho vem ocpando. Tradicionalmente, o brao da violade-cocho, chamado de pescoo, eito com 15 centmetros de comprimento. Para os músicos qe vo ponte-la, no entanto, o ideal qe o pescoço tenha 16 o 17 centmetros, alm de ser m poco mais desbastado na parte posterior, a m de acilitar a empnhadra para o dedilhado.
“A viola-de-cocho sore esta mdana por eigncia de certos tocadores, certos músicos, qe so adeptos da viola-de-cocho. Como srgi o ogo a gs... antigamente se coinhava no tacr... a veio o ogo de barro, ogo de lenha; hoje t no ogo a gs, tem at o microondas, por qe no srgi a viola com algmas melhorias de qalidade? A a gente oi atendendo ao mercado, principalmente pra qem oi tocar música poplar brasileira.” [Alcides Ribeiro, Ciab, 2008] Hoje, a comercialiao mais ampla da prodo dos artesos, no mercado trstico, de músicos, colecionadores e de apreciadores de arte poplar – ora do mbito, portanto, do consmo tradicional eito por crreiros –, realiada tanto nas casas dos próprios artesos qanto por meio dos órgos ociais e instities, governamentais o no-governamentais, no-governamentais, qe trabalham
na promoo e diso do artesanato dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl. No entanto, eistem mitos peqenos abricantes, cja prodo contina vinclada somente s necessidades dos crreiros. O crreiro, se no ele mesmo m abricante, contina indo casa do arteso, se conhecido, levando-lhe ma tora de madeira e pedindo-lhe ma viola. Em algns casos, no h
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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AO LADO INáCIO SOuzA BRANDãO. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. ABAIxO FuRO DO CAVALETE. CuIABá-MT, 2007. FOTO: EDILBERTO FONSECA.
seqer venda propriamente dita, pois diversos artesos atendem aos pedidos de ses amigos e parentes, independentemente independentemente de qalqer pagamento em dinheiro. Para artesos como Alcides Ribeiro e Manoel Severino, cja prodo atende a m mercado diversicado qe vai de tristas a músicos, o preo das violas-decocho pode variar mito em no do tipo de comprador. Hoje, o preo de ma viola pode alcanar aproimadamente R$ 350,00. Porm, para os crreiros qe desejam comprar ma viola, os preos so menores e negociados, pois, como lembra Alcides, “eles qe vo segrar m poco mais a cltra”. Os artesos de viola qe mantiveram o saber vivo at hoje, no obstante o desinteresse do poder público e do mercado de música poplar, tm epectativas de apoio
institcional para qe possam aer, dessa atividade, ma prosso. Alm da peqena e tradicional prodo artesanal individaliada, observa-se em Ciab, na casa de Caetano Ribeiro, m caso de processo coletivo amiliar e domstico, com diviso de trabalho anloga a ma linha de montagem, qe proporciona amento de prodtividade e atendimento de ma demanda maior e mais variada. Nesse casos,
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SuVENIRES DE VIOLA-DECOCHO, PAuLO SANTOS . CuIABá-MT, 2007. FOTO: CARLA BELAS
violas-de-cocho dirigidas a novos algns artesos realiam o corte, mercados como os dos tristas, otros escavam a viola enqanto colecionadores e apreciadores de otros colaboram na liao e arte poplar. Manoel Severino acabamento nal. de Moraes, 76 anos, como otros A prodo de viola-de-cocho artesos antigos, arma ter renido, para o mercado, embora j no se somente entre 1974 e 1985, mil e vincle somente s necessidades treentas notas de artesanato, isto , dos crreiros, ainda m tanto notas de venda de violas-de-cocho incipiente. So pocos os artesos na Casa do Arteso de Ciab. qe ganham a vida coneccionando Mesmo ma prodo to elevada de violas-de-cocho, sem eercer otra 130 violas por ano, em mdia, no prosso. Joo Batista Rodriges, qe participo da pesqisa eita pelo signico qe Manoel Severino tenha deiado de trabalhar em prosses Centro e epôs na Sala do Artista Poplar, em 1988, m eemplo de como pedreiro o carpinteiro, nem arteso qe dedico todo se tempo qe as encomendas dos regeses tradicionais tenham cessado. coneco de violas. A crescente revitaliao do A Casa do Arteso (Fndao de interesse pelas epresses associadas Promoo Social Pró-Sol) e a Casa viola-de-cocho e amentar a da Cltra (Secretaria Mnicipal demanda pela prodo de svenires de Edcao de Ciab), órgos (chaveiros, porta-canetas e otros) qe promovem e comercialiam o para tristas, rmas e instities artesanato mato-grossense, vm se diversas, para compradores de otros constitindo, h algns anos, m estados e mesmo de ora do pas. espao de estmlo prodo de
So coneccionados, por eemplo, chaveiros e peqenas violas com inscries pirograadas como “Violade-Cocho – Ciab-MT”, alm de rases solicitadas pelos compradores. Feitas a partir de sobras de madeiras da prodo, esses svenires so coneccionados tanto por artesos em Mato Grosso do Sl, a eemplo de Everaldo Gomes, qanto em Mato Grosso, a eemplo de Palo Roberto dos Santos.
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
PáGINA AO LADO
ABAIxO
CuRuRuEIROS MANOEL
Pé DE xIMBuVA.
SEVERINO, CAETANO
CORuMBá-MS, 2002.
RIBEIRO E JÚNIOR
FOTO: FRANCISCO M. DA
CéSAR, 2007.
COSTA.
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FOTO: CARLA BELAS.
O processo de fabricação
A
coneco da viola-de-cocho oi docmentada por Francisca Ferreira (1978) e por Jlieta de Andrade (1981), sendo qe esta atora descreve detalhadamente o processo, identicando as matriasprimas sadas. A descrio eita, aqi, sobre o modo de aer a violade-cocho se apóia em dados colhidos nas recentes pesqisas realiadas jnto aos artesos das localidades de Ciab, Vrea Grande, Pocon, Baro de Melgao, Santo Antônio do Leverger, Jangadas, Rosrio Oeste, Diamantino, Nobres, Livramento (MT), alm de Cormb e Ladrio (MS). Vrias madeiras so tradicionalmente sadas na constro da viola. Para o corpo do instrmento, as preeridas so a imbva, o sar-de-leite e o cedro. Mais ceis de escavar, as madeiras macias so as preeridas para o corpo do instrmento, embora
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
“E acredito mito na la, algmas, jstamente por essa porqe a gente j tinha aqele qalidade, sejam mais ssceptveis hbito na olia... dia... qando ao ataqe dos insetos. O corte da madeira deve ser eito sempre na la mingante, cheia, crescente. E acredito qe a la boa pra tirar mingante. Caso no seja cortada madeira a mingante, mas vi na la certa, a madeira pode ser qe na mingante tdo dimini, atacada por m tipo de cpim, o desde o som da viola dimini. caruncho, qe esbraca toda a caia. Alm disso, h ma orma especca Agora, na cheia, t tdo grande... todo mndo de olho na la cheia. de aer o corte, seno, como di se Manoel Severino, “a madeira d Se tirar na cheia corre o risco de perder a madeira o ela bichar vento”, o seja, trinca e d ssra.
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bastante.” [Manoel Severino, 76 anos, Ciab, 2008] O sar-de-leite ma madeira encontrada nos baiades, beiras de rio qe passam grande parte do ano alagadas; ao contrrio da imbva, encontrada mais na terra rme. Na alta das madeiras mais adeqadas, vm sendo empregadas hoje tambm a serigela e a rcrana o sangra d´ga, o jacote, o cajeiro, o mandioco e a mangeira. Algns
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PREPARAçãO, COLAGEM E FIxAçãO DO TAMPO. CuIABá-MT, 2007. FOTOS: EDILBERTO FONSECA.
artesos sam o cedro para o corpo dicil localiao, reclama o arteso viola, qe tampada aqi, [qe] no do instrmento, embora esse tipo de Alcides Ribeiro. Otras madeiras madeiras tem braco, tem mistrio”. madeira seja preerido para partes tambm podem ser tiliadas, tais Tradicionalmente, as madeiras do instrmento qe necessitam de como a catana e a sapopemba, e, mais so retiradas com machado, porm maior resistncia. As violas-derecentemente, tambm a teca. Para o so da motosserra tem cocho eitas de cedro, pela própria as demais partes da viola, palheta otimiado o trabalho de corte e qalidade da matria-prima, so o paiêta, cravelha e pestana, so beneciamento da matria-prima. mito drveis, podendo chegar, escolhidos o cedro e, em algns casos, Com essa erramenta podem ser segndo contam, a mais de 100 anos. a taipoca. As violas podem apresentar- cortadas aproimadamente 10 violas Para o tampo da viola mais se com o sem oricio no tampo. de m único tronco, ao passo qe, commente sada a rai da geira, Damio de Almeida, de Rosrio com o machado, de ma rvore material qe atalmente de Oeste, di qe o povo ala qe “a como o sar, se ela or grossa, se
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AO LADO MODELAGEM DO TRONCO. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. ABAIxO COLOCAçãO DAS CRAVELHAS. CuIABá-MT, 2007. FOTO: EDILBERTO FONSECA.
aem at trs violas, resltando em menor prodo e maior perda. é o qe relata Ebio Freire, 67 anos, m dos únicos artesos do mnicpio de Diamantino qe ainda retira com machado a madeira para a eitra das violas-de-cocho. Na derrbada de ma rvore como o sar ele a at trs violas, se ela or grossa. é importante lembrar, contdo, qe para a retirada da madeira, seja com machado o com a motoserra, necessrio ter ma atoriao de órgos regladores, regladores, como o Ibama, qe atalmente tem validade de 90 dias, necessitando necessitando ser renovada ao m desse prao. Feito o corte, e após a madeira secar, preciso comear logo o entalhe da viola, pois, segndo Alcides Ribeiro, em dois o trs dias de sol “a madeira ca miba e nem aco qer cortar mais”, pois ela vai endrecendo. Normalmente o trabalho de entalhe das partes
estilete, trincha, lia, motosserra, aco e pregos) at qe adqira a orma da viola-de-cocho. A pea escavada para qe se obtenha o cocho propriamente dito, cjo acabamento interno ndamental: da na espessra da caia depender a boa ressonncia da viola-de-cocho. O tampo recortado, tambm, conorme o mesmo molde. Tradicionalmente, a colagem das partes era eita sando-se o smo da batata smbar, o, interna e eterna da viola eito em em sa alta, m grde eito da dias dierentes. Sobre m pedao vescla natatória dos peies, ma desenha-se o ormato da viola, com peqena beiga conhecida como o alio de m molde em papelo poca. Hoje, no entanto, esses o madeira qe, na verdade, elementos vm sendo sbstitdos ma seo longitdinal da viola. pelas colas indstrialiadas, em O molde aplicado das vees, a ace de sa praticidade, embora partir do eio central, o qe garante os depoimentos conrmem qe o ormato simtrico do cocho. tanto a cola da poca de peie como a de smbar eram mais Trabalha-se a pea de madeira resistentes, e o trabalho eito com com vrias erramentas erramentas (plaina, machado, serrote, ormo, martelo, elas drava bastante. Os pontos
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MOLDES PARA CORPO DE VIOLA-DE-COCHO. CuIABá-MT, 2007. FOTO: EDILBERTO FONSECA.
(trastes) so coneccionados com os de algodo, revestidos com cera de abelha e de mandagari o mandri. J os pontos eitos de barbante, segndo se Joo Gonalo, de Nossa Senhora do Livramento, no prestam. A maioria das violas arma-se com cinco cordas simples: qatro de tripa de animal e ma de ao. A corda de ao, chamada canotio o canotilho, tem aproimadamente o mesmo calibre da qarta corda e o qati) e de os de tcm est do violo e comprada em lojas de praticamente etinta, tendo sido, instrmentos msicais das cidades maiores. No instrmento, as cordas devido proibio da caa na regio recebem os segintes nomes: prima, ciabana e no Pantanal, sbstitda pelo emprego de linha de pesca. segnda o contra, do meio o Algns crreiros gostavam mais terceira, canotio e corda de cima. da oada das cordas de tripa; otros A tiliao dos encordoamentos preerem as cordas de nilon de base de tripa de animais pesca, por serem mais drveis. (preerencialmente o bgio, o Para a preparao das cordas, orio-cacheiro, o qat, o macaco preciso limpar, esticar e torcer prego, a irara, a porca magra, mas as tripas do animal. Depois, para tambm o caingel o cainganga
adqirir resistncia, elas so crtidas em rina o no sistema do meiro: drante trs dias, a tripa colocada sobre ma ogeira de madeira verde, qe prod mita maa; em segida, retirada e esregada at qe qe bem lisa e com espessra niorme. Os violeiros no esto sempre de acordo qanto qalidade do encordoamento de tripa: algns acreditam qe esse material to drvel qanto a linha de pesca, se a viola tocada sem golpes violentos com as nhas. Otros j tiveram sas cordas de tripa rodas por baratas, o qe, natralmente, no acontece com o o de matria sinttica. Para algns, at o canotio pode ser de tripa, sendo mesmo preervel ao de ao qando se sa a anao canotio solto, pois nesse caso a corda de ao soa mito mais do qe as otras, desestabiliando o eqilbrio sonoro do conjnto das cordas.
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íNDIOS GuATÓS DOCuMENTADOS POR MAx SCHMIDT. INíCIO DO SéCuLO 20.
Referências históricas
“é porqe oi me avô qe ensino pro me pai. Voc sabe qe, qando e chegei, nessa poca j vinha daqele tempo todo. Agora, vamos l saber de qe gerao veio isso, qem e isso... E mesmo no sei, oi me pai qe me ensino e o avô dele j brincava, ento mito bom isso a. Só sei qe mito bom.” [Severino de Mora, 80 anos, Cormb, 2002]
(1940), qe descreve brevemente as estas religiosas de Ciab, onde se cantava o crr. Segndo esse ator, os instrmentos msicais do crr ciabano eram os segintes, cem anos atrs: • Koschó: descrito como m violino
de cordas de tripa, eito de madeira de salgeiro; • Krakaschá: pedao de bamb o s pesqisas bibliogrcas ma cia comprida com entalhes, apontam reerncias ao so qe se toca com otro pedao da viola-de-cocho e epresses de bamb; Fora dos estados de Mato Grosso e associadas em Ciab (Von den Mato Grosso do Sl, • Adufe: pandeiro com moedas de Steinen, 1940); Ciab, Rosrio Rossini Tavares de Lima (1957) cobre como soalhas; Oeste e regio de Cormb entre pesqiso o crr em So Palo, • Viola: descrita como violino de os ndios Gatós (Schmidt, 1942); encontrando reerncias sobre violas cordas de arame; regio do Rio das Garas (Brasileiro, eitas a partir da mesma tcnica, em • Marimba dos Negros: sada s 1951); Ciab, Vrea Grande, pesqisas de campo em Piracicaba, vees no crr. Jacitara, Santo Antônio do Leverger, Tiet, Laranjal, Conchas e Pereiras. Nossa Senhora do Livramento, A notcia mais antiga sobre a A lista merece m breve Pocon, Sesmaria do Rosilho, viola-de-cocho data de nais do comentrio. A marimba dos Chapada dos Gimares, Santa negros parece deslocada demais sclo 19 e oi dada pelo cientista Teresa, Mimoso (Andrade, 1981). no conteto de ma descrio do alemo Karl von den Steinen
A
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FOTO DE uMA VIOLA CHAMADA “MOCHINHO” EM PuBLICAçãO DE 1947 INTITuLADA DOCuMENTO FOLCLÓRICO PAuLISTA, DE ALCEu MAYNARD DE ARAÚJO.
crr ciabano, ao menos se cientista teria eito meno a m parte dos presentes segia o ritmo tivermos em mente o crr atal. arco qe riccionasse as cordas do por meio de m pa qe roava Teria o ator visto o instrmento nma tripa de bamb, instrmento koschó. A descrio de Steinen, na atando em otro gnero msical? verdade, sscita mais dúvidas do qe denominam caracacha.Os O trecho no esclarece, nem se qe ornece certeas, mas permite dansarinos dispseram-se em das compreende por qe oi eita assegrar, pelo menos, qe tanto las e, depois, em crclo echado. a ressalva “s vees”. A viola de crr qanto viola-de-cocho Assim oi indo, cada ve mais cordas de arame seria talve eram comns em Ciab h mais animadamente, at a madrgada, semelhante a ma viola caipira, de m sclo. sendo apenas interrompido o qe hoje em dia no reqenta Ma Schmidt, otro etnólogo movimento, de ve em qando, o crr mato-grossense. O alemo, vi a viola-de-cocho e o para se anar os instrmentos ade, tambm chamado ado, crr em Mato Grosso em 1900/ de corda e dar agardente aos mencionado modernamente 1901 (Schmidt, 1942). Em Rosrio, cantores, o qe lhes emprestava por algns inormantes matono dia 31 de deembro de 1900, novas oras.” (Schmidt, 1942: 11) grossenses, qe se recordam de descreve da seginte orma a esta Schmidt no descreve a viola, t-lo visto na roda de crr; da Imaclada Conceio: mas otograo m eemplar sado alis, aparece tambm no crr pelos ndios Gatós, habitantes palista, assim como a viola “...agrpo-se entorno do da regio do pantanal próimo a (Araújo, 1949). O krakaschá de altar certo número de dansantes, Cormb, rea qe atalmente bamb o atal gan. Apesar de ormando semicrclo para integra o estado de Mato Grosso Steinen ter-se reerido ao koschó o comear a dansa do crrú, to do Sl. O instrmento otograado cocho como violino, pode-se conhecida em Mato Grosso. Parte por Schmidt praticamente spor qe o qe ele observo era dos qe dansavam acompanhava idntico viola-de-cocho atal, m instrmento de cordas na viola os versos al mesmo com 5 cordas simples, brao dedilhadas; caso contrrio, o improvisados pelos cantores. Otra bastante crto, oricio no tampo
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RODA DE CuRuRu, FESTA DE SãO PEDRO. SANTO ANTÔNIO DO LEVERGER-MT, 1987. FOTO: ELIzABETH TRAVASSOS.
ligeiramente maior do qe os qe se aem atalmente e caia de ressonncia com a base mais estreita do qe as atais (1942: 115). um instrmento chamado cocho, no qal caia de ressonncia e brao ormam ma pea única de madeira escavada, eistia em So Palo na dcada de 1940. Foi docmentado nma roda de crr de Tiet, em 1947, por Alce M. de Araújo. Era tocado
em conjnto com a viola caipira, ade e reco-reco, mas qase nada tem em comm com a viola-decocho: alm do ormato mito dierente, era monocórdio. O ator assim o descreve: “Instrmento msical eito de madeira. A caia de ressonncia escavada na madeira. Caia de ressonncia e brao constitem ma só pea. H ma peqena
abertra na rente anterior, eita a canivete. Na parte anterior da caia de ressonncia pregada ma tampa de madeira. Na haste qe o brao no h divises de metal, chamadas trastes. Ela lisa como na rabeca e no violino. Na ponta da haste h só ma cravelha qe serve para estirar a única corda. Nesse cocho havia ma corda si de violo. A corda presa na borda posterior, e estendida sobre a parte anterior at a haste, na rachadra qe h na cravelha. Próimo da peqena abertra colocam m rastilho de taqara. Conorme a toada anada a corda, e depois, o tocador com o polegar da mo direita -la vibrar, e com a mo esqerda ele acha a nota qe deve ser dada. Antigamente acompanhavam o Crr tocando este instrmento.” instrmento.” (Araújo, 1949: 58, nota 15) um desenho deste instrmento, eito a partir de m eemplar da coleo de Alce M. Araújo, o
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OFICINA DE VIOLAS-DECOCHO. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO MOREIRA DA COSTA,
de ma otograa tirada por este pesqisador, oi incldo em otra obra (Araújo, 1977: 135). Havia tambm em So Palo m certo cocho de qatro cordas: “Conhecemos otro tipo de cocho, eito como o anterior, mas sa qatro cordas. As cordas so de tripa de mico. Pedro Chiqito, crreiro, conto-nos qe vi perto de Pereiras, na casa de m
caboclo, velho cantrio, m cocho com cordas de tripa de mico, e qe ana moda de cavaqinho, r-solsi-r.” (Araújo, 1949: 58, nota 15) Segndo o mesmo ator, acompanhado por Antônio Cndido (1956), o crr palista seria ma dana bastante antiga, constitda no processo de sincretismo “lso-braslico, inteligente orma lúdica de qe o jesta lano
mo para ensinar História Sagrada aos cateqisados (...). Sem dúvida, o Crr a mais antiga e brasileira de todas as danas poplares; palista, piratiningana.” (Araújo, 1949: 35-36) O mesmo ator acreditava na diso desse gnero, de So Palo para o oeste, acompanhando a epanso bandeirante. Dessa orma o crr teria chegado regio de Mato Grosso. Contdo,
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VITALINO SOARES. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
ainda sabemos poca coisa sobre os instrmentos msicais sados nas danas palistas antigas e sobre sa irradiao para o interior. Tdo o qe sabemos qe o cocho palista docmentado em 1947 e a viola-de-cocho mato-grossense, docmentada desde o sclo 19, tm em comm, alm do nome, a tcnica de escavar na madeira a caia de ressonncia, cja orma alongada e estreita, nma das
etremidades, constiti ao mesmo tempo m peqeno brao. De modo geral, os crreiros e artesos no parecem preocpar-se com as origens do instrmento qe tocam. Li Marqes da Silva, antigo crreiro e presidente da Associao de Folclore de Mato Grosso, recolhe de algns colegas ma verso segndo a qal o instrmento oi constrdo
pela primeira ve por m caboclo qe no tinha meios para adqirir m violo. Tento reprodi-lo escavando ma tora de madeira, eatamente como aia cochos para dar de comer aos animais. Essa verso contada pelo sr. Li Marqes oi reiterada por Anjos Filho (2002), qe deende a idia de tratar-se, a viola-de-cocho, de ma adaptao da viola de Braga e da gitarra portgesa a partir do so de materiais e reerncias disponveis no local poca: o cocho, a cola de poca de peie e linhas eitas a partir das bras de ma palmeira conhecida como tcm. Embora os docmentos e a tradio oral no atoriem o estabelecimento de ma relao gentica entre cocho palista e viola-de-cocho mato-grossense, o processo de constro e o so do instrmento no no crr podem ser mais do qe simples coincidncias.
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TRANSPORTE DE MADEIRA (SARã-DE-LEITE), ALCIDES RIBEIRO E MANOEL SEVERINO. CuIABá-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
Com o m de identicar as infncias portgesas da viola-decocho, Anjos Filho (2002) realio entrevistas com artesos, músicos e pesqisadores em Portgal. Encontro terminologias comns aos dois pases como: mocho, ado (variante de ade, tiliado para acompanhar o crr em MT), enó, macete, cola de peie e cravelhame inclinado. Jnto ao pesqisador portgs Caldeira Cabral obteve o depoimento de qe a opo pelo processo de escavao do cocho na colônia portgesa no sclo 18, mesmo qando em Portgal j se tiliavam tcnicas mito mais renadas de abricao, relacionadas constro por partes, desde o sclo 16, pode ter resltado, alm da assimilao a reerncias cltrais e recrsos locais disponveis, da necessidade de se constrir m instrmento mais resistente ao calor e ao clima
da regio. Anjos Filho arma qe Cabral, em sas pesqisas históricas sobre o tema, docmento a eistncia de certas violas portgesas qe oram parasadas para enrentar as adversidades climticas do Brasil (Anjos Filho, 2002: 150). J a pesqisadora Jlieta Andrade (1930) retrocede ainda mais no tempo para bscar as origens da viola-de-cocho nos alaúdes crtos iranianos, cjas primeiras
reerncias datam do sclo 7 a.C. Independentemente Independentemente da pesqisa de sas possveis origens, o mesmo de tratar-se de ma adaptao de antigos alaúdes iranianos (Andrade, 1981), de violas portgesas (Anjos Filho, 2002) o de cochos palistas (Araújo, 1949), o certo qe oi no pantanal e nas cabeceiras do rio Ciab qe esse instrmento veio a assmir m lgar relevante na elaborao das identidades cltrais locais.
Rodas, cantorias, ponteados e danças
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PáGINA AO LADO CANTORIA DE CuRuRu. ROSáRIO OESTE-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. ABAIxO GRuPO DE SIRIRI. DIAMANTINO-MT, 2003. FOTO: EDILBERTO FONSECA.
A
viola-de-cocho desempenha papel central na sstentao harmônica do canto no crr e no siriri, como tambm na dana de So Gonalo, no boi-a-serra 3 e no rasqeado, sendo qe cada m desses gneros possi pecliaridades qanto música, potica e dana. No obstante a ameaa constante de desaparecimento, as maniestaes tradicionais segem acontecendo periodicamente. As cantorias tm lgar no domnio domstico, mas principalmente nas rodas de crr e siriri qe acontecem em estividades locais, como dias santos, casamentos e aniversrios, bem como naqelas organiadas como pagamento de promessas. As celebraes sagradas mais marcantes e concorridas so as estas de So Benedito, So Sebastio, So Gonalo, e aqelas ligadas ao ciclo jnino: So Pedro, Santo Antônio
e So Joo. Nelas, h sempre ma roda de crr qe, composta de m grpo de homens, dana em crclo e toca violas-de-cocho e gans, cantando sas lovaes ao santo homenageado, cja imagem ca eposta em m altar. Devotos de m determinado santo, geralmente donos de ma imagem sa o indivdos a ele ligados por ora de promessa, organiam-se em irmandades qe promovem
analmente as estas e convidam m grpo de crreiros para cantar e danar. As rodas de cantoria de crr alternam momentos distintos qe se ordenam em ma seqncia determinada. No primeiro deles observam-se as trovas compostas na orma versos + toadas. Os versos e toadas so especcos e diem respeito a cada m dos momentos da celebrao. So trovas criadas
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AO LADO RODA DE CuRuRu, FESTA DE SãO JOãO. CORuMBá-M, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. ABAIxO PROCISSãO PARA LAVAGEM DO SANTO NA BEIRA DO RIO, NA FESTA DE SãO JOãO. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
pelos próprios crreiros e giram em torno de temas como o amor, a natrea, o cotidiano, o pas e a vida dos santos. Eles gostam tambm de entoar trovas compostas pelos pais e avós, como orma de mant-las vivas na memória da comnidade. So especialmente apreciadas as trovas de letra o de escritura, qe abordam temas bblicos e tratam da vida dos santos, momento nos qais a cantoria se d sob orma de desaio, e os crreiros podem demonstrar todo o se conhecimento sobre o tema. Para iniciar a roda, as trovas so padas pela primeira vo e complementadas pela segnda, em intervalos msicais de tera. So cantadas trs o qatro trovas, logo segidas do baixão, qe inalia cada ma dessas sesses de cantoria de m determinado crreiro.
Trata-se de m acorde maior ormado pela entrada scessiva de voes, em qe se destaca a tera do acorde ma oitava acima da nota ndamental. J as rimas das trovas podem ser eitas segindo diversas terminaes: em ão , em ad o, o, em ar e assim por diante. Damio de Almeida, de Rosrio Oeste, d m eemplo de trova na rima de ar :
Esta hora é chegada Este santo nós louvar vamos indo São João no rio para lavar
As trovas vo sendo tiradas e prossegem com a passagem da cantoria de m para otro crreiro dentro do crclo ormado. Timidamente, a viola-decocho vem tambm se dindindo para alm das rodas tradicionais,
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
AO LADO VIOLEIRO DA ORQuESTRA DE CâMARA DO ESTADO DE MATO GROSSO, LEONARDO YuLE. CuIABá-MT, 2008 FOTO: LÚCIA CARAMES SARTORELLI. ABAIxO VIOLA-DE-COCHO NA ORQuESTRA DE CâMARA DO ESTADO DE MATO GROSSO (DETALHE). CuIABá-MT, 2008.FOTO: LÚCIA CARAMES SARTORELLI.
conqistando novos espaos pelas mos de artistas, colecionadores e ovintes apreciadores de sa rara belea.O recente reconhecimento da viola-de-cocho como m Patrimônio Cltral do Brasil e, ainda, o investimento dos governos locais na valoriao de especicidades cltrais tem estimlado o interesse pela viola e por epresses tradicionais a ela associadas, como o crr e o siriri. De orma cada ve mais constante, vemos srgir dierenciados espaos de insero onde essas tradies assmem novos signicados em consonncia com os contetos modernos de prodo cltral e em sa relao com o mercado. Como eemplo desses novos espaos esto a criao de m estival anal de crr e siriri em Ciab, a epanso do interesse de músicos pela aplicao da viola-de-cocho na música
poplar, a ormao de m naipe de viola-de-cocho na Orqestra de Cmara do Estado de Mato Grosso, alm da constitio, em Cormb, no Mato Grosso do Sl, de ocinas de prodo de violas e svenires destinados comercialiao. O Festival do Crr e do Siriri, qe ocorre pela primeira ve em 2001, ma iniciativa da Preeitra de Ciab. No incio,
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
apenas grpos de siriri se Mais recentemente, a violaapresentavam. Hoje, j na 6ª de-cocho passo a participar edio, o estival promove tambm tambm dos crclos de música a competio entre crreiros. erdita com a inclso de m A preeitra nancia os prmios naipe de instrmentos dentro da e oerece, alm de dinheiro aos Orqestra de Cmara do Estado primeiros colocados, a gravao de do Mato Grosso. Organiada m m CD com as músicas classicadas. classicadas. ano antes, a orqestra, j em 2006, Esse investimento do governo se consolidava com ma trn local tem atrado para o estival m internacional e ma temporada número crescente de danantes, de 83 concertos em Mato Grosso. com grpos concorrentes de todo Desde o incio a orqestra chamo o estado, contando com m grande a ateno pela sa singlaridade público para as apresentaes. apresentaes. em no da incorporao de No mbito da música poplar, instrmentos caractersticos da violeiros como Roberto Corra, cltra poplar local como: violasPalo Freire, Abel Santos, Ivan de-cocho, bracas e gans. Em Vilela e Daniel de Pala, entre relao, especicamente, viola-detantos otros, tm, j h algm cocho, a única orqestra do pas tempo, tiliado a viola-de-cocho a possir “m naipe ‘permanente’ prossionalmente, dedicando ao de violeiros qe atam jnto aos instrmento inúmeras composies instrmentos clssicos tradicionais qe, gravadas em CD, tm como o violino, a viola clssica, o alcanado reconhecimento por violoncelo e o contrabaio” (Falco, parte do público. 2007: 69). Composies e arranjos
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para o instrmento vm sendo desenvolvidos por compositores, arranjadores e intrpretes locais qe aem, assim, a relao entre a cltra erdita e a poplar tradicional. Assim, atravs de iniciativas como estas, e depois de m longo perodo de baia epressividade no cenrio rbano, a viola-decocho, o crr e o siriri se veem novamente valoriados como smbolos de identidade cltral da regio, passando a ocpar novos espaos cltrais. Entretanto, no podemos deiar de observar qe se os saberes (artesanato e a prtica msical) relativos ao instrmento esto vivos, sendo transmitidos e reprodidos, isso se deve, antes de tdo, responsabilidade e vontade dos crreiros qe, obstinados, encontraram meios de salvagardar o qe hoje o Estado reconhece como patrimônio cltral do pas.
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FESTA DE SãO SEBASTIãO. NOSSA SENHORA DO LIVRAMENTO-MT, 2007. FOTO: CARLA BELAS.
O cururu
O
crr realiado apenas por homens, podendo se apresentar como cantoria em orma de desao, o como ma celebrao marcada por trovas de lovao, toqes de violas-de-cocho e dana em roda. A reerncia bibliogrca mais antiga ao crr na regio oi identicada no livro Entre os Aborígenes do Brasil Central, onde o etnólogo alemo Karl von den Steinen descreve as etapas de ma apresentao de crr conorme ocorrncias nas estas de santo em Ciab no nal do sclo 19: “Dana-se e canta-se em roda do santo, e qem passa diante dele, a ma genfeo. Em segida cantase em honra do rei e da rainha, os dois entram no crclo mnidos da garraa de cachaa, oerecendo m trago a cada m e jntando-se depois ao crclo, qe passa a cantar para otro personagem, o qal, por
sa ve, oerece cachaa, e assim por diante. H versos em qantidade, sempre em qadras, e sobre os mais variados assntos; no crr, os cantos de devoo so segidos pelos de amor, de ombaria e otros inventados conorme as inspiraes do momento; as qadras adaptam-se ao hmor da esta e as conhecidas so sbstitdas, dentro em poco, pelas improvisadas.” (Steinen, 1940: 117) Posteriormente, no incio do sclo 20, Ma Schmidt identica e descreve a prtica da dana do crr entre os ndios gatós em pesqisa na regio pantaneira, atal Mato Grosso do Sl: “Poco depois e-se m intervalo em qe oi servida agardente e, ento, agrpo-se em tôrno do altar m certo número de dansantes, ormando semicrclo para comear a dansa do crrú, to conhecida em Mato Grosso.” (Schmidt, 1942: 14)
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
BANDEIRA DE SãO
COLOCAçãO DA BANDEIRA
SEBASTIãO.
NA FESTA DE SãO
NOSSA SENHORA DO
SEBASTIãO.
LIVRAMENTO-MT, 2007.
NOSSA SENHORA DO
FOTO: CARLA BELAS.
LIVRAMENTO-MT, 2007.
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FOTO: CARLA BELAS.
“Todos eram crclo, Joo Caracar ano a viola, algns pratos serviam de pandeiros para as colheres e, logo depois, oviram-se os gemidos das voes qe entoavam os versos nssonos. O andar reglarmente ritmado em crclo era de momento a momento interrompido por ns plos eectados pelo nosso amigo Reginaldo, qe ainda procrava completar o rdo dos chamados instrmentos, batendo com as palmas
das mos nas dierentes partes do corpo propcias para isso.” (Schmidt, 1942: 109-110) Rossini Tavares de Lima, ao pesqisar as origens da dana do crr no estado de So Palo, relaciona estas s danas de So Gonalo, recolhendo em entrevista a seginte história: “S. Gonalo era m menino pobre. Vivia descalo, por no ter
dinheiro para comprar sapato. Por isso, andava triste e chorava constantemente. Certo dia, m sapateiro de ma corao de-lhe m calado, cjos pregos da sola se achavam mostra. Assim mesmo o santo calo-o e qando andava dava ns passos e mancava. Com esse sapato, ele tambm danava mancando. Srgi desse modo a dana do Crr, qe nos ses movimentos recorda o splcio de
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
RODA DE CuRuRu AO Pé DO
FESTEIRO AMARRANDO A
MASTRO NA FESTA DE SãO
BANDEIRA AO MASTRO
SEBASTIãO.
FESTA DO DIVINO.
NOSSA SENHORA DO
CuIABá/MT, 2008.
LIVRAMENTO-MT, 2007.
FOTO: EMANuEL BRAGA.
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FOTO: CARLA BELAS.
S. Gonalo.” (Lima, 1957:12-13) Qanto s origens do nome crr, Cmara Cascdo (1954), citando Alce Maynard Araújo, indica qe provavelmente estaria ligada detrpao da palavra Cr, em no do hbito, entre os indgenas, da repetio da última slaba, o qe teria resltado em Crr. Cascdo eplica qe a dana oi traida pelos coloniadores com ns de
cateqiao, sendo, por isso, danada diante da cr. Tanto o crr qanto o siriri aem parte do calendrio anal de estividades das localidades identicadas. Normalmente os crreiros esto ligados a m grpo e/o irmandade qe promovem as estas nos dias consagrados aos santos padroeiros, renindo os recrsos necessrios. Algmas das principais estas de crr realiadas hoje nos
grandes centros rbanos contam, tambm, com a ajda e a colaborao de atoridades e pessoas ilstres. J nas cidades do interior, a maior parte dos recrsos obtida ainda somente jnto amlia do esteiro. Segindo o calendrio católico, as estas concentram-se, principalmente, nos perodos dos estejos jninos, entre jnho e agosto, sendo retomadas no ciclo de nal de ano, de deembro a janeiro. Os perodos de maro
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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ALTAR PARA SãO BENTO E SãO SEBASTIãO. CuIABá-MT, 2008. FOTO: EMANuEL BRAGA.
a maio e de setembro a deembro se no so de recesso, concentram menor número de estas. Os crreiros so nnimes em armar qe as estas de hoje j no acontecem como as de antigamente. Os mais velhos lembram qe, qando eram crianas, a amlia as realiava com os próprios recrsos, no havendo necessidade de assentar esteiros como se a hoje. A irmandade organiavase ao longo do ano e ia reservando os recrsos necessrios. Ainda hoje algmas delas orglham-se de serem as únicas promotoras da esta. “uma coisa bem claro qe e vo deiar pra voc: os donos de esta de antigamente, eistia ... enraiada, ningm tomava aqela do lano... sabe por qe? A minha vó aia esta de... Conceio. Só qe no era, dia da Conceio dia 8 de deembro, só qe ela nm no aia de dia 9 de deembro. Era dia 12 de
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
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CRIANçAS NA FESTA DE SãO PEDRO. SANTO ANTÔNIO DO LEVERGER-MT, 1987. FOTO: ELIzABETH TRAVASSOS.
otbro, at no dia qe e nasci. A esta de hoje deerente, dierente a minha avó no precisava da ajda de ningm, t? Pr aer a esta, no assentava esteiro, nem nada... no, no tirava nada. Mas sabe por qe? L tinha galinha de Nossa Senhora, tinha porco de Nossa Senhora, tinha vaca de Nossa Senhora, t? A vaca pari m beerro macho, deiava pra esta. J ia deiando pra esta, qanto nascesse era pra esta.” [Manoel
Severino, Ciab, 2003] De modo geral, as preeitras locais no participam com recrsos nanceiros, atando mais como regladoras. Normalmente, nas reas rbanas, preciso m alvar de licena das preeitras para a realiao das estas, qe ocorrem, preerencialmente, preerencialmente, de seta a domingo. Nesse alvar est indicado o horrio de incio e trmino da atividade, bem como por qanto
tempo a ra poder permanecer interditada. Pode ser necessrio tambm qe se page a dois o trs policiais para qe mantenham a ordem e a esta acontea de orma tranqila. Geralmente a Igreja Católica no colabora com recrsos nanceiros, resmindo sa participao celebrao da missa de domingo drante o perodo das estas. Em mitos casos, ao contrrio, so os esteiros qe reservam parte da renda consegida com o leilo de beerros para ser entrege paróqia mais próima. é comm qe grpos de crreiros sejam reqisitados para tocar nas estas promovidas pelas irmandades e devotos da regio, qando lhes so oerecidas condo e alimentao; em algns casos, ornece-se at mesmo o niorme. Porm, no recebem nenhm tipo de remnerao, cantando e tocando por pra devoo.
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REzA DA LADAINHA NO ALTAR NA CASA DE DONA MARCOLINA, BAIRRO PEDRIGãO, FESTA DE NOSSA SENHORA APARECIDA. CuIABá-MT, 1987. FOTO: LuIz ITI ABE.
Como costma dier Li Marqes, o crr como ma pea de teatro4 . No nal da tarde de seta-eira tm incio as atividades. Após o jantar, o esteiro convoca os crreiros para tomarem posio, em crclo, diante do altar, cja arrmao dentro das casas, o nos qintais, ma das obrigaes do esteiro. Qem est do lado direito do altar inicia a no, e cada crreiro vai cantar sadando o santo, o próprio altar e o dono da casa. Em segida, sempre cantando, eles chamam os devotos ormando assim a procisso, o aleres de bandeira e o capito, qe convidam todo o reinado para acender as velas, base da ilminao. O próimo passo a cantoria para qe cada membro do reinado pege sa obrigao. Cada m dos personagens do reinado relacionase a m objeto em particlar: o
rei, imagem do santo padroeiro celebrado na esta. A rainha, vela consagrada. O aleres, bandeira. O capito-do-mastro, ao mastro e/o coroa. Os jes e as jas, aos ramos. Essas obrigaes, imagens, insgnias e objetos sagrados vo variar dependendo do padroeiro homenageado. Assim, cantando e versejando, os crreiros vo orientando o reinado a pegar o santo padroeiro
qe est no altar, a bandeira, a coroa e as demais imagens. Formada a procisso, comea a chamada para qe todos se encaminhem ao batente o porto. Canta-se ento para par a procisso at o batente, o qe eito em ritmo lento, com paradas a cada cinco passos dados. Meus colega companheiro meus colega olião vão chegar até o batente com essa linda procissão
Para passar pelo batente, preciso qe cada crreiro bena o corpo a m de poder par a procisso. Em segida, eles cantam para plar o batente, segidos do reinado. Com a entrega do menino São José fcou contente Convido essa procissão vamos pular esse batente
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SEu AGRIPINO MAGALHáES NA FESTA DE SãO JOãO. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
O tambm, Vão azer um paradêro antes de pular o portão Convido meus companheiro e os olgado olião
é a hora de “eperimetar” a bandeira no mastro. uma ve aprovada, ela retirada do mastro, e canta-se para dar permisso a se encaie no mastro: Eu quero cantar meu verso no meio dessa fleira senhores e senhorita pode encaixar essa bandeira.
Tambm para o encaie so toados, ento, cantos apropriados: Essa madeira oi tirada onde existe terra boa Se o aleres encaixou a bandeira capitão encaixa a coroa.
Em segida o rei chamado para encaiar o creiro no nal do mastro. Antes de se erger o mastro, preciso qe os crreiros cantem para qe a procisso beije o padroeiro e a bandeira. Chega o ponto clminante do rital, qe o levantamento do mastro, qase sempre em rente casa do esteiro, para o qe ndamental a presena dos crreiros. Ao som de sas trovas, o mastro ento ncado
na sepltra de Ado, m braco assim chamado porqe nele broto o ramo de oliveira. Em algmas estas, primeiramente sspende-se o mastro; em otras, rea-se para depois sspend-lo, a m de qe a bandeira tambm pege a orao. Meus colega companheiro é chegada a ocasião pode plantar essa semente na sepultura de Adão.
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CuRuRu, FESTA DE SãO PEDRO. SANTO ANTÔNIO DO LEVERGER-MT, 1987. FOTO: ELIzABETH TRAVASSOS.
Alm do mastro principal, podem ser ergidos dois otros, qe simboliam o momento do sacricio de Jess Cristo e dos dois ladres. Alm dessa verso para a presena dos trs mastros, Joo Gonalo, do mnicpio de Nossa Senhora do Livramento, di haver tambm ma relao simbólica com as esttas de brone qe Des mando Moiss constrir. uma ve ergido o mastro, cantase para o capito colocar terra em sa base, onde tambm se acendem trs velas, qe representam a Santssima Trindade. J segndo Joo Gonalo, so qatro velas, representando os qatro gardas qe, enviados por Herodes, gardaram o seplcro de Jess a m de qe se corpo no osse robado. Pesqisas de campo tm mostrado, no entanto qe, mitas vees, so acesas mesmo mais do qe qatro velas. Para naliar, termina-se com ma trova como
Foi erguido esse mastro no meio da multidão aonde nele está cravado o flho de Conceição.
Fiado o mastro, a procisso d trs voltas em torno dele, no sentido horrio, tendo rente os crreiros. Toma rmo, ento, de volta ao altar, da mesma maneira como veio: aendo ma parada a cada cinco passos. Depois de todos passarem pelo batente da casa, os crreiros cantam para serem assentados todos os santos e imagens presentes. Meu colega companheiro meus amante olião pode assentar o padroeiro que está em vossa mão.
Chega ento a hora de cantar para apagar a ilminao (as velas):
Tão bonito esse estejo nessa linda ocasião pode apagar essas velas que se encontram em vossas mão.
Finalmente despacha-se a procisso, e os crreiros entoam trovas de agradecimento ao dono da esta. Terminada essa etapa, os capeles, de p o sentados mesa, pam as reas, qe so respondidas pelas mlheres. As reas tm sempre relao com o santo homenageado especicamente naqela ocasio, sendo qe, dependendo da localidade, elas podem ocorrer antes o depois do crr. Essas reas e ladainhas, normalmente aprendidas pelos devotos jnto aos pais, podem drar mais de ma hora. Finaliada essa parte, os crreiros cantam para arrodear a no e podem segir nessa roda de cantoria de crr at o dia amanhecer.
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GRuPO FLOR DO CAMPO – VíDEO FESTIVAL SIRIRI DE CuIABá. CuIABá-MT, 2006.
O siriri
S
iriri m de esta... o smbolo da esta o Crr”, dessa orma qe Francisco Salles, conhecido crreiro, h 29 anos rente do grpo Viola-de-Cocho, dene a distino entre as das epresses. O siriri ma dana de pares, em geral casais, e m gnero msical no qal so tiliados trs instrmentos da regio de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl: viola-de-cocho, gan e tamboril o mocho. é danado principalmente por mlheres, e (6/8) com ma peqena variao tem lgar nas estas católicas o em da diviso da plsao entre trs otras ocasies de divertimento e/ e qatro batidas. O estilo do o devoo, inclsive no carnaval e canto responsorial: os homens estivais drante todo o ano. tocam os instrmentos e pam os Do ponto de vista msical, versos entoando a primeira parte ntida a dierena entre os da estroe em solo, sendo qe o padres rtmicos qe regem o último verso sempre respondido crr e o siriri. No crr, o pelos demais participantes. Os ritmo eectado em compasso tetos cantados no siriri so binrio simples (2/4), e no siriri, crtos e leves, pois no eigem o em compasso binrio composto conhecimento religioso do crr.
“
Os temas alam de pssaros, otros animais e sobre a mlher. Esses aspectos oram ressaltados por Karl von den Steinen j no nal do sclo 19: “Absoltamente no raro eectar-se danas de animais nas estas de santos, só qe no correspondem maneira indgena. Trata-se, sobretdo, de danas circlares, e qem as eecta so as
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AO LADO SIRIRI. ROSáRIO OESTE-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. ABAIxO RENASCER DO VALO VERDE – VíDEO SIRIRI, CuRuRu E REzA CANTADA. SANTO ANTÔNIO DO LEVERGER-MT, S/D.
mlheres. Assim, p. e. ma dana de jacar com as segintes palavras: Deia estar, jacar, sa lagoa h de secar...” (Steinen, 1940: 712) Ma Schmidt descreve ma apresentao de siriri em Ciab, em 1900, drante ma esta de santo: “Enqanto se dansava o crr dentro de casa, l ora se realiava otra espcie de dansa, mito apreciada em Mato Grosso, o Ciriri acompanhado, tambm, por música e versos cantados... Dansarinos e cantores ormavam ma roda em qe ia constantemente m par para o centro a dansar. A dansa tinha mitas variaes e os movimentos eram cada ve mais rpidos, principalmente no m, qando os dansarinos j no vinham em par e sim cada m de per si.” (Schmidt, 1942:14) Alm da dana de roda, o siriri composto tambm pela dana de la, onde ocorre a disposio
rente rente de das leiras, ma de rapaes e otra de moas. Entre os eectores da dana no h nenhm tipo de restrio, nem qanto idade nem qanto ao seo (Anjos Filho, 2002). Matilde da Silva, do grpo Flor do Campo, conta qe antigamente no eistiam grpos de siriri, e a dana era cltivada de orma espontnea drante as estas. Para ela, a palavra siriri teria origem
no nome dado a m tipo de cpim alado, de vôo assanhado e mito comm na regio. J se Li Marqes no acredita qe o siriri tenha qalqer origem indgena, como algns armam. Ele eplica qe, devido ao isolamento sorido por Mato Grosso por mais de m sclo, em relao aos otros estados do Brasil, oi inevitvel qe a sociedade criasse sas próprias maniestaes cltrais.
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AO LADO GRuPO VIOLA-DE-COCHO – VíDEO FESTIVAL SIRIRI DE CuIABá. CuIABá-MT, 2006.
Segndo ele, antigamente o siriri era sado como orma de aproimao entre os casais devido severidade da edcao dada pelos pais aos lhos. Dierentemente Dierentemente do crr, qe acontecia qase sempre nas salas, o siriri tinha lgar nos terreiros das casas, e, sendo dana de par jnto, servia como ma orma de ferte entre os casais. Tradicionalmente, as pessoas qe participavam do crr e do siriri nas estas, no savam nenhm tipo de niorme o ropa especial. Elas apenas iam “com ma ropa melhor” como conta se Caetano Ribeiro. Hoje, no crr, no sado nenhm tipo de niorme especial, enqanto nos grpos de siriri se so reqente. Os diversos grpos olclóricos aem eibies públicas nas mais variadas sitaes, apresentando-se sempre niormiados.
A dana do siriri vem sendo “Nós qando era criana, qe objeto de projetos sociais e nós era inda criana, nós no entrava ocinas jnto aos alnos das no crr de gente grande de mais escolas públicas, onde homens e velho... no. Pai no deiava. Fica mlheres, conhecedores, ensinam só espiando. E aprendi aer viola as letras das cantigas e os passos só de ver me pai aer, e aprendi mais tradicionais, como o caso cantar crr só de ver otro de Domingas Leonor, do grpo cantando, e pegava e ‘tm’. Ele Flor Ribeirinha, da comnidade no gostava de qe nós pegava a viola de So Gonalo Beira-Rio, em dele. Nós aprendemos assim de si Ciab. Dessa maneira, vrias próprio e vendo ele cantando, como escolas públicas tm organiado ele aia l, isso a oi entrando na grpos de dana do siriri. Algmas minha idia... Nós cantava entre nós pessoas, por pertencimento criana, na estrada da roa, isso nós a amlias de crreiros o cantava. A qando chegava na esta, reqncia de longa data em nós samos ora, e algm qe alava: estas tradicionais, j conhecem Venha lano cant! Nós ia mas tdo os passos da dana. Contdo, Contdo, o mndo com vergonha, assim do mais aprendiado se d tanto de maneira velho, n. Mas como ele chamava, inormal, drante os estejos, nós ia. Foi assim qe e aprendi. E como tambm por meio de tinha vocao pra aprender e gosto ensaios organiados pelos grpos do crr e do siriri. No baile, constitdos, como no caso do e gosto de m rasqeado de ma grpo Flor do Campo de Matilde dana no jeito...”[Angelo da Costa, da Silva, qe ata desde 1984. Pocon, 2003]
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GRuPO FLOR DO CAMPO, VIDEO FESTIVAL SIRIRI DE CuIABá. CuIABá-MT, 2006.
H inúmeros grpos da dana Mnicpio de Ciab: de siriri em ambos os estados, Viola-de-Cocho do So Joo sendo algns apoiados por dos Laros; Flor do Campo do instities e órgos de governo, Parqe Ohara; Raes Ciabanas como aes na rea de cltra, do Parqe Ohara; Tchapa y Cr por meio de estivais nos qais da Bela Vista; Flor Ribeirinha do participam. Talve por no possir So Gonalo Beira-Rio; Corao o carter religioso do crr, o Ciabano (Categoria Mista); siriri hoje bem mais dindido, Siriricando (Categoria Inantohavendo em vrias localidades Jvenil); Raes Ciabanas (Categoria estivais de siriri nos qais se Inantil); Yay (Categoria Inantil). apresentam inúmeros grpos. Em Ciab, o Festival de Mnicpio de Vrea Grande: algmas categorias especcas, os Siriri, promovido pela preeitra Renascer do Valo de Verde; Nhana grpos qe oram selecionados dentre em parceria com a Federao das Santa (Categoria Inantil); Passos as 31 comnidades visitadas pela Associaes dos Grpos de Crr Midinhos (Categoria Inantil). Comisso Jlgadora da última edio e Siriri, conta com o patrocnio de do estival de Ciab. entidades e instities públicas e Mnicpio de Chapada privadas, estando j em sa 6ª Edio. Grpos selecionados pela dos Gimares: Recentemente oi lanado m DVD Flor do Cambmbi; Patcha. Comisso Jlgadora do de divlgao do evento, a eemplo VI Festival do Siriri em Ciab do qe e tambm o mnicpio de Mnicpio de Santo Antônio Local/Grpo (s) Santo Antônio do Leverger, onde do Leverger: igalmente acontece m importante Araras de Mimoso; Bico de Prata; Mnicpio de Cceres: estival. A lista abaio mostra, segndo Gatô. unidos da Avenida; Renovao
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GRuPO VIOLA-DE-COCHO VíDEO FESTIVAL SIRIRI DE CuIABá. CuIABá-MT, 2006.
de Varginha; Melhor Idade da Varginha (Categoria Melhor Idade). Mnicpio de Baro de Melgao: Pôr-do-Sol do Pantanal; Tradio Pantaneira. Mnicpio de Tangar da Serra: Os Pssaros de Tangar da Serra. Mnicpio de Nossa Senhora do Livramento:
Sereno da Madrgada; Qilombolas de Mata Cavalo (Categoria Mista). Mnicpio de Pocon: Esperana. Mnicpio de Diamantino: Cral (Categoria Inanto -Jvenil); Acorda Mato Grosso (Categoria Inanto Jvenil).
A ataliao do ormato tradicional da dana do siriri, com apresentaes dos grpos ocorrendo sobre m palco, com grinos e coreograas prodidas especialmente para a ocasio, recrsos de eeitos de l e amplicao do som dos instrmentos e da vo dos cantores, semelhana da prodo de m show pop, tem eito do estival m scesso garantido, principalmente entre o público jovem.
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DONA TERESINHA. NOBRES-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
O reinado e as festas tradicionais
T
odo ano, ao nal de ma esta, os devotos solicitam ao esteiro qe sejam assentados os personagens do reinado do ano seginte, pois a ele qe cabe a distribio dos cargos de rei, rainha, ji, ja, capito-domastro e aleres de bandeira. As estas tradicionais mobiliam no só inúmeros recrsos materiais, mas tambm o trabalho volntrio de toda a irmandade e do pessoal envolvido. Os preparativos comeam m ms antes, e qase toda a comida, oerecida gratitamente s centenas de pessoas presentes, eita no próprio dia da esta. A preparao das comidas demanda mito tempo j qe, normalmente, so oerecidos m jantar na seta, m almoo no sbado e, no domingo, o ch com bolo, alm de otro almoo. Em algmas estas ocorre ainda ma eijoada de encerramento na segnda-eira. Os pratos oerecidos podem variar bastante, dependendo da
apreciam, a pra (cachaa com rai de bgre e de jatob). Dos principais personagens da esta, o rei e a rainha so aqeles qe arcam com as maiores despesas. Normalmente o rei oerece m boi o beerro, e, a rainha, ma ajda em dinheiro o recrsos materiais. As despesas menores cam por conta dos demais personagens da esta. A parte mais importante da esta acontece na seta-eira noite e assim pode ser resmida: comea regio, sendo os principais: a vaca com o crr, erge-se o mastro atolada, tambm chamado de aogadão e depois h a rea e a ladainha o ensopadão (carne com mandioca para o santo; a partir da, ento, a reogada), carnes de vaca, leitoa e cantoria dos crreiros prossege rango, a cabea de boi assada com madrgada adentro. mandioca ermentada, alm de No sbado de manh no h macarro, aroa de banana, arro, nenhma atividade relacionada tt de eijo, sarapatel e molhos. esta alm do preparo das comidas So eitos tambm vrios tipos de qe sero servidas noite. Todos doces, biscoitos e bolos. As bebidas se mobiliam e participam desses costmam ser os licores de go, preparativos. à noite acontece o leite e peqi, e, para aqeles qe baile, qe comea por volta de 22
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COLOCAçãO DA BANDEIRA NA FESTA DE SãO SEBASTIãO. NOSSA SENHORA DO LIVRAMENTO-MT, 2007. FOTO: CARLA BELAS.
reorada com a cobrana de ingresso; em otras, a entrada gratita.
horas e se prolonga pela madrgada, at cerca de qatro horas da manh. O som ca a cargo de m conjnto de música regional, geralmente o rasqeado, e de disc-jóqueis (DJs) qe iro aer a programao msical da noite. é comm haver venda de cervejas e rerigerantes, cja renda permitir aos promotores do baile o pagamento dos músicos e do eqipamento de som tiliado. Em algmas localidades, essa renda
“E gosto de crr, minha brincadeira, j vo alar a verdade, crr, siriri, So Gonalo e rea. Parte de baile j com me irmo, a j no meo com ele, e me irmo j gosta... E j parto mais pro lado da cltra mesmo... pra. E no sei no... desde criana qe e no me do, minha natrea no vai com esse tipo de brincadeira, de orró, esses trem... mas ele gosta, mas cada m dentro da sa natrea...” [Ebio Freire, Diamantino, 2003] Segndo os crreiros e esteiros mais antigos, a entrada da música mecnica talve tenha sido a principal modicao na dinmica das estas tradicionais. “E considero qe a música poplar tomo conta... qe nm eistia música poplar. Mas depois
qe aparece, ningm largo mais, abrange... a nossa co “escoado”. Mas sobre divertimento, todo mndo tem qe divertir, no so contra. Só qe essas das... tipo de brincadeira, diverso, elas no do certo jnto, o crr e o baile jnto, nm tem como ir... todo mndo tem qe divertir. Nm vo contra...” [Manoel Severino, Ciab, 2003] Segndo os depoimentos colhidos, a introdo do baile no conteto dessas estas parece sitarse dentro da nova dinmica social estabelecida pelo advento de novos hbitos e costmes traidos pela crescente rbaniao e tambm pela epanso da indústria cltral. “E vo dier pra voc, qe qando inicio a aprendiagem em comrcio, qe o povo, os pais de amlias sai do stio e veio pra o comrcio, acabo tdo. Pessoas qe aprendem o crr, no aprendem
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SEu AGRIPINO MAGALHãES E SEu MARTINHO, CANTORIA DE CuRuRu.CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
mais. Por q? No vai deiar de ir no baile, o toqe l do instrmento, violo, sanona, voc no vai deiar de danar, n?... pra vir aprender crr. Mas l no stio eles aprendem, porqe no tem otro divertimento. Os pais t cantando, eles aprendem. E imagino qando tinha me pai vivo, e ajdava ele cantar, porqe e aprendi com ele... a aer tambm a moda, a moda de crr. Hoje os meninos só aprendem a ma eclsividade deles, j qe divertir e otros cantam. Aqeles os idosos praticamente no mais antigos aem ma toada participam. A comnidade, mas, bonita, l eles aprendem e cantam. sobretdo os mais jovens, só se Porqe no capa de aer. No interessam em saber se vai o no tem inclinao. Porqe o crr haver o baile drante as estas, e tem qe ter inclinao. Todas a maioria dos meninos e meninas coisa tem qe ter inclinao. No j no se preocpam em car para mesmo?” [Joo Gonalo, Nossa acompanhar o crr. Senhora do Livramento, 2003] Atalmente o baile passo a ser o principal centro de “Hoje qando a a esta de interesse dos mais jovens e qase santo, o crr nm dia, o baile
no otro. Tem algns lgares qe devido aos novos qe vem vindo, no consege aceitar qe o crr primeiro qe o baile. Eles acham qe tem qe sar os crreiros só pra levantar o mastro e comea a esta do baile. Isso t mdando. Hoje, qando pede pra levantar o mastro os crreiros no to mais indo. Por q? Tem qe ter mais respeito com o crr qe a tradio.” [Alcides Ribeiro, Ciab, 2008]
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CANTORIA DE CuRuRu, FESTA DE SãO SEBASTIãO. NOSSA SENHORA DO LIVRAMENTO-MT, 2007. FOTO: CARLA BELAS. BAILE DE RASQuEADO – FESTA DO DIVINO ESPíRITO SANTO, 2007. FOTO: EMANuEL OLIVEIRA BRAGA.
A manh de domingo o momento da missa, bem como do ch com bolo, tradicional renio qe acontece em diversas estas e ocasies sociais na regio de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl. Em algmas localidades o siriri comea após o ch com bolo; em otras, os grpos só se apresentam tarde, após o almoo de domingo. domingo. Segndo os depoimentos colhidos, parece ser jstamente a compleidade da ormlao de trovas e a densidade rital do crr qe a com qe, atalmente, os mais jovens só se interessem pela dana do siriri, qe tem ma dimenso mais lúdica. Ainda no domingo, tem lgar tambm a descida do mastro, qe dependendo do esteiro, pode ocorrer pela manh o mais no nal da tarde, sendo, contdo, ndamental a presena dos crreiros, qe vm novamente entoar trovas especiais para esse momento.
A dinâmica da tradição
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PáGINA AO LADO MENINOS COM GANzá. CuIABá-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. ABAIxO EVERALDO GOMES. CuIABá-MT, 2007. FOTO: EDILBERTO FONSECA.
qerem só baile. Se no tiver baile pra eles no esta.” [Tereinha Nonato, Nobres, 2003]
Os sentidos do registro e o desafio da salvaguarda
“Porqe e j esto assim nesta idade, 72 anos. Eles alam qe vai aer a esta mas tdo dierente, porqe eles qer otras coisas. Depois qe nós nm agent qe nós vamos ver qem dos novos vai qerer aer isto. Rear ladainha todos eles ream. E tenho m sobrinho deste tamaninho assim, ele t com one anos, toca gan, toca viola-de-cocho... Mas os jovens no qerem mais tocar viola,
A
preservao da viola-decocho est diretamente relacionada a atores como a transmisso da tradio artesanal e msical; a preservao da capacidade hmana de aprender e apreciar msicalidades diversas e alternativas, mitas vees incompatveis com o atal padro de mercado da música poplar veiclada pela mdia; a diso do se valor cltral por vrios meios e, tambm, a preservao do patrimônio ambiental, imprescindvel continidade do se modo de prodo tradicional. No qe di respeito aos saberes ligados coneco da viola-decocho e aos recrsos natrais necessrios, esto implcitas qestes relacionadas tanto
s condies de transmisso permanente da tradio artesanal, qanto qelas qe implicam no desenvolvimento continado de planos de manejo sstentvel das espcies vegetais qe servem de matria-prima, tendo em vista a preservao do patrimônio ambiental da regio. Se por m lado as matriasprimas de origem animal j esto sendo sbstitdas por prodtos
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BuSCA DE MADEIRA NO RIO CuIABá. SANTO ANTÔNIO DO LEVERGER-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
indstriais sem maiores danos para a integridade do instrmento, a madeira ainda empregada segndo tcnicas tradicionais, para no provocar a descaracteriao completa de sa sonoridade. Tendo em vista a legislao ambiental qe determina a atoriao para corte de rvores, mitas vees os artesos se veem na posio de ilegalidade por cortar madeira o com ela trabalhar sem esse licenciamento, dadas as dicldades em obt-lo jnto s instities ambientais competentes. Eistem, assim, algns obstclos livre prodo do instrmento pelos artesos/ crreiros qe comprometem a reprodo dos saberes relacionados sa abricao e eeco msical. Por otro lado, as pesqisas realiadas tm apontado qe, nas estas onde a viola-de-cocho se a presente, as
rodas tradicionais vm perdendo espao para otras maniestaes cltrais em decorrncia das presses geradas pela cltra de massa. Em contetos sociais marcados pela tradio, j no so tantas as brincadeiras sem tempo, sem hora para acabar. Hoje, nas estas poplares, as rodas de cantoria se inserem na lógica dos espetclos e dos shows de música poplar, contando com cachs e se apresentando em meio a otras atraes. Perdem, assim, m tipo tradicional de praer lúdico, integrao comnitria e epressividade, posto qe, nesses contetos, se acham desvincladas das motivaes devocionais qe originalmente as animavam. A realiao do baile ao som de música mecnica, na noite de sbado, estabelece m otro lgar para o crr dentro das estas tradicionais.
“E acho qe deve continar assim... cada m indo de sa ve. Voc vai aer ma brincadeira na sa casa, marca para m dia m e otro dia otro, qe a todo mndo diverti, todo mndo gosto. Agora vai qem qiser, vai l na esta do crr qem qiser, vai l na esta do baile qem qiser, ningm pode proibir, no me ver no pode, dono de esta e qem vai na esta, no pode proibir. Ah! Porqe, o qe lano vai aer? No... A diverso pra todo mndo. Alegria... qem qe no qer alegria, no mesmo?” [Manoel Severino, 2003] Em meio permanente ameaa de dilio dos signicados das epresses tradicionais rente s novas demandas colocadas pela cltra de massa, as rodas tradicionais continam acontecendo, e a viola-de-cocho, amplamente conhecida e reconhecida, oi
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PLACA DE VENDA DE VIOLADE-COCHO. CuIABá-MT, 2008. FOTO: EMANuEL BRAGA. FRANCISCO SALES. CuIABá-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
tombada como patrimônio nos dois estados da ederao, o qe rearma se papel de smbolo de identidade cltral. A recente constitio da gra do registro patrimonial de bens cltrais de natrea imaterial no mbito do Estado institi, ento, novos mecanismos de salvagarda salvagarda para o sistema cltral qe compreende o instrmento. Em Mato Grosso, o processo de tombamento oi defagrado como reao a ma solicitao provisória de registro da marca “viola-de-cocho” jnto ao Inpi, por m estdioso de música de Ciab, na dcada de 1990. Após ampla mobiliao e protesto por parte dos setores ligados cltra local, a solicitao oi indeerida5, e o bem, em segida, tombado. Em Mato Grosso do Sl o tombamento veio como conseqncia de m projeto de omento e valoriao da tradio artesanal e msical qe estava invisvel no estado.
O projeto, idealiado e desenvolvido pelo Centro Nacional de Folclore e Cltra Poplar jnto aos artesos e crreiros, com recrsos da Petrobras Distribidora, conto com as parcerias do governo do estado, universidade Federal de Mato Grosso do Sl, Ibama, Institto de Meio Ambiente Pantanal, alm de otras instities locais. Dessa orma, o qe se observa hoje a viola-de-cocho em processo de adaptao a otras matrias-primas e a otros contetos perormticos e de interesses. Nesse conteto, o registro do modo de aer a violade-cocho, como patrimônio imaterial, no Livro dos Saberes, tem se mostrado hoje como mais ma ao complementar aos esoros qe vm sendo empreendidos de coletar, sistematiar, valoriar e salvagardar conhecimentos tradicionais,
testemnhos signicativos da plralidade cltral da nao. O registro, alm de ato ocial de reconhecimento e valoriao dos saberes relacionados ao bem cltral, agrega valor e poder estimlar o desenvolvimento de polticas de preservao patrimonial pelos poderes públicos, com a participao eetiva dos segmentos da poplao, diretamente envolvidos na prodo desse bem. Em parceria com as Sperintendncias Sperintendncias Regionais do Iphan nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sl, o Centro Nacional de Folclore e Cltra Poplar tem colaborado hoje com as comnidades detentoras do modo de aer a viola-de-cocho na ormlao, implementao e condo de m Plano de Salvagarda. Esse Plano vem sendo constrdo em conjnto com entidades, instities e
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OFICINA DE PRODuçãO DE VIOLA, MESTRE SEVERINO MOuRA. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
representaes dos crreiros e dos artesos de viola-de-cocho, visando garantir a continidade dessa epresso por meio da melhoria das condies sociais e materiais de transmisso e reprodo qe possibilitam a sa eistncia. A constro da poltica de preservao e salvagarda deve necessariamente envolver o conjnto das instities, grpos e
agentes cltrais qe direta e indiretamente esto vinclados ao bem cltral. J h algm tempo inúmeras associaes e entidades de crreiros e artesos tm srgido para implementar aes de valoriao do crr, do siriri e de sas epresses relacionadas. Em algmas localidades, como por eemplo, Ciab, Vrea Grande e Rosrio Oeste, as associaes de grpos de crreiros tm
permitido ma maior articlao com o poder público e instities locais a m de angariar apoio dos mais diversos tipos para a manteno de grpos e a promoo das estas. Entretanto, na maioria das vees, em vrias localidades, essa articlao bastante dicil, sendo, ento, m dos desaos para o plano de salvagarda qe implementado após o registro. Nesse qadro, as aes de salvagarda podero, por eemplo, articlar dierentes instncias ociais dos mbitos nacionais, dos estados e mnicpios, com a comnidade, no sentido de: 1) promover o apereioamento das leis de incentivo cltra e o desenvolvimento de instrmentos qe acilitem o acesso direto dos detentores dos saberes s dierentes instncias de patrocnio e nanciamento para a prodo
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VIOLA DESENHADA. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA. ASSOCIAçãO CENTRO DE TRADIçõES NOBRENSE DE CuRuRu E SIRIRI, NOBRES-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
cltral no pas, de modo qe tenham atonomia e agilidade; 2) estimlar a interloco entre as eseras da sociedade e os poderes públicos de modo a implementar manejo ambiental continado das matrias-primas vegetais empregadas na prodo do instrmento msical (licenciamento do corte, por artesos, para a etrao controlada e progresso de replantio das espcies vegetais); 3) incentivar o apoio ocial s associaes e grpos de crreiros para qe tenham condies de controlar, manter e promover a transmisso dos saberes relacionados ao bem, conorme ses interesses; 4) estimlar a inclso e o aprondamento dos temas relacionados ao bem cltral na agenda escolar, de modo qe passem ao mbito dos saberes especcos das localidades, marcas
identitrias, testemnhos da riqea cltral do pas. O qadro atal aponta, enm, para a necessidade de valoriao de prticas e conhecimentos ligados coneco da viola-de-cocho, no conteto das inevitveis mdanas traidas pelo crescimento das cidades, pela conscincia ambiental e pela cltra de massa. Hoje, a viola-de-cocho e sas maniestaes relacionadas, o crr e o siriri,
so de ato m patrimônio imaterial do povo dos estados de Mato Grosso Grosso e Mato Grosso do Sl. um patrimônio qe merece ser preservado, para qe as novas geraes de brasileiros possam ter acesso rara belea e misteriosa sonoridade deste instrmento to singlar, ainda poco conhecido pelo grande público de otras regies do Brasil, mas qe permanece vivo na cltra do se povo.
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PANTANAL. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
notas
1. Dana de conjnto com ormao em leira, de origem amerndia, tendo sido, no primeiro sclo da coloniao, aproveitada pelo Padre Anchieta nas estas católicas. é mais reqente a eeco masclina. Qando ocorre a presena eminina, das leiras, ma de homens, otra de mlheres, se derontam para apresentar cantos, sapateados, palmas e troca de lgar com danadores ronteiros,
breves saltos e rpida ormao em por dias, pode variar em no da crclo. O acompanhamento eito localidade, do santo homenageado e especialmente por violas, em geral da própria tradio do lgar. das. Os violeiros, os únicos qe cantam, tambm aem parte da 5. O indeerimento da dana e dirigem a coreograa, qe se solicitao de registro ocorre parece com a dos cocos nordestinos. em 26.05.1998, tendo como é danada nos estados de So Palo, jsticativa o art.124 inciso VI da Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Lei de Propriedade Indstrial qe Grosso e Gois (CNFCP, 2008) impede a apropriao de nome de so comm. No entanto, em 2. Gnero msical qe se 04.08.1998, a empresa solicitante caracteria por orma estróca, entro com recrso e ganho asncia de metricao msical o direito de sar o nome com (ritmo livre), versos narrativos e restries. Em 22.12.1998 a marca eeco por dois cantores em teras oi ento nalmente concedida. o setas paralelas (CNFCP, 2008). Como as marcas devem ser renovadas a cada 10 anos, a empresa 3. O boi-a-serra no oi dever solicitar legalmente, este docmentado drante a pesqisa, ano, a renovao dessa marca qe no tendo sido ainda recolhido ainda est em vigor. O histórico de registro msical desse olgedo. despachos reerentes a essa marca encontra-se no portal eletrônico do 4. Seqncia rital qe ser Institto Nacional de Propriedade apresentada aqi, inclindo a diviso Intelectal - Inpi, na internet.
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anexo 1 Parecer do RELATOR
PROCESSO Nº - 1450.01090/2003-03 REGISTRO DO BEM CULTURAL DE NATUREZA NA TUREZA IMATERIAL MODO DE FAZER VIOLA-DE-COCHO, ESTADOS DE MATO GROSSO E MATO GROSSO DO SUL.
Trata o presente processo do reconhecimento como Patrimônio Cltral Brasileiro pelo institto jrdico do registro, estabelecido
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delo Decreto nº 3.551, de 04 de agosto de 2000, do MODO DE FAZER VIOLA-DE-COCHO.
maniestaes regionais qe tm na viola-de-cocho se principal instrmento.
Conorme parecer nº 018/04GAB/PROFER/IPHAN o processo em pata cmpre todas as eigncias processais, estando apto a ser submetido à apreciação do Egrégio Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, para deliberao.
Pelos docmentos complementares complementares constantes do aneo 1 do processo podemos vericar qe, desde 1996, os mestres crreiros e as comnidades de artesos e instrmentistas de viola-decocho tm se mobiliado para o reconhecimento da viola como m patrimônio cltral, movimento este qe levo ao tombamento estadal do instrmento msical.
A solicitao de registro ma demanda ormlada em diversos abaio-assinados provenientes dos estados de Mato Grosso, mnicpios de Jangadas, Diamantino, Nobres, Ciab, Livramento, Pocon e Rosrio Oeste e Mato Grosso do Sl, mnicpios de Cormb e Ladrio, rmados em especial por artesos e instrmentistas da Viola-de-Cocho Viola-de-Cocho e representantes dos grpos de crr e siriri,
Naqele ano oi realiado m movimento contra a pretenso de m particlar reqerer jnto ao Inpi (Institto Nacional de Patrimônio Indstrial) o registro de marca - viola-de-cocho. O docmento reerente a esse episódio est incldo no processo, no volme de docmentos avlsos.
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As aes de identicao e de artesanal, em especial por mestres prodo de conhecimento sobre o crreiros, a viola no encontra bem em qesto se desenvolveram similares em termos de design e no mbito do Projeto Celebraes sonoridade. Sa coneco se d e Saberes da Cltra Poplar a partir de m tronco de madeira do Centro Nacional de Cltra inteirio – origem esta qe Poplar – CNCP/Iphan, qe jstica o se nome. Esclpida tambm oi responsvel pela com esmero pelo mestre arteso, instro no Dossi de Registro. a madeira toma a orma da viola Alm da implementao da e ganha os contornos qe a metodologia do Inventrio transormam em ma verdadeira Nacional de Reerncias Cltrais caia de emoes sonoras. Esse – INRC, a docmentao instrmento integra os compleos apresentada no dossi recpera msicais, coreogrcos e poticos otros levantamentos realiados do crr e do siriri – jntamente em 1978 e 1981, com os estdos com o gan e o tamborim – e est de Francisca Ferreira no Inventário presente em otras maniestaes da Cultura Popular Mato-grossense cltrais e epresses da cltra de Jlieta Andrade em Cocho poplar da regio. Mato-grossense um alaúde brasileiro, respectivamente. Destacamos no parecer tcnico qe instri o processo qe “a viola-de A viola-de-cocho ma eprescocho, como, bem cultural, corresponde so única do aer poplar. a um modo de azer único e especial, Realiada de modo inteiramente caracterizando um oício com suas ormas de
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produção e de execução artístico-musical, geralmente associadas a ormas de expressão específcas, dentre as quais se destacam o cururu e o siriri.”
Ainda, conorme parecer da Gerncia de Registro do Departamento do Patrimônio Imaterial, so vrias as raes qe jsticam a inscrio do MODO DE FAzER VIOLA-DE-COCHO VIOLA-DE-COCHO no Livro de Registro dos Saberes, entre elas destacamos : • saber enraizado em práticas e vivências culturais coletivas de transmissão oral e inormal; • reerência cultural importante para grupos ormadores da sociedade brasileira; incorporando contribuições de diversas etnias, como tradição que se reitera e atualiza. O Dossi de Instro, elaborado pelo Centro Nacional de Folclore e Cltra Poplar e
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reerendado por parecer tcnico do Departamento de Patrimônio Imaterial, apresenta, de orma eemplar, a descrio da Viola-deCocho e o se modo de aer, alm de oerecer jsticativa para se registro como Patrimônio Cltral de Natrea Imaterial:
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para o gado). Nesse cocho, já talhado no ormato de viola, são aixados um tampo e, em seguida, as partes que caracterizam o instrumento, como cavalete, espelho,rastilho e cravelhas. A conecção, artesanal, determina variações observadas de artesão para artesão, de braço para braço, de orma para orma. A Viola-de-Cocho é elemento presente e indispensável em “ A viola-de-cocho é um instrumento musi- várias maniestações e expressões da cultura cal singular quanto à orma e sonoridade, popular dessa região, como o boi-a-serra, produzido exclusivamente de orma artesadança de São Gonçalo, olião, ladainha, nal, com a utilização de matérias-primas rasqueado limpa banco (ou rasqueado existentes na Região Centro-Oeste do cuiabano), e em estas religiosas tradicionais Brasil. É parte de uma realidade ecorealizadas por devotos associados em sociocultural construída historicamente irmandades, citadas e descritas no pelos sucessivos grupos sociais que vêm processo. Destaca-se, no entanto, como ocupando os atuais estados do Mato Grosso instrumento integrante do complexo e Mato Grosso do Sul, em suas relações de musical, coreográico e poético do cururu troca com o meio natural e com a sociedade e do siriri, juntamente com o ganzá (recoenvolvente. Seu nome deve-se à técnica de reco de taquara) e o tamborim ou mocho escavação da caixa de ressonância da viola (banco cujo assento de couro é percutido em uma tora de madeira inteiriça, mesma com baquetas de madeira), cultivado por técnica utilizada na abricação de cochos segmentos das camadas populares como (recipientes em que é depositado o alimento diversão ou devoção a santos católicos”.
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“A produção da viola-de-cocho é realizada por mestres cururueiros, seja para uso próprio, seja para atender à demanda do mercado local, também constituída por cururueiros e mestres de dança do siriri. Os materiais utilizados tradicionalmente tradicionalmente para sua conecção são encontrados no ecossistema regional, correspondendo a tipos especiais de madeiras para o corpo, tampo e demais detalhes do instrumento; ao sumo da batata “sumbaré” ou, na alta desta, a um grude eito eito da vesícula natatória dos peixes (ou poca) para a colagem das partes componentes; ios de algodão revestidos de trastes (que, na região, também são denominados pontos) e tripa de animais para as cordas.” “ As violas podem ser decoradas, desenhadas a ogo e pintadas, ou mantidas na madeira crua, envernizadas ou não. As itas coloridas amarradas no cabo indicam o número de rodas de cururu em que a viola oi tocada em homenagem a algum santo – que possui, cada qual, sua cor particular.”
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VIOLA-DE-COCHO. 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
“ A viola-de-cocho encontra-se em processo de transormação e observa-se que a preservação desse bem está diretamente relacionada à transmissão permanente da tradição musical: ao estímulo às novas gerações de apreender e apreciar musicalidades diversas e alternativas àquelas veiculadas pela indústria do entretenimento. Além disso, relaciona-se à transmissão permanente da tradição artesanal que implica desenvolvimento continuado de planos de manejo sustentável das espécies vegetais que servem de matéria-prima, e a substituição de outras matérias-primas, matérias-primas, A viola-de-cocho e essas crr e do siriri. E qe nos tendo em vista a preservação do patrimônio maniestaes maniestaes msicais no devem planos de salvagarda, sejam ambiental da região.” ser dissociadas ma das otras por previstas oicinas de repasse do se tratarem de bens relacionados conhecimento do “modo de aer Isso posto, acatamos o parecer a m mesmo niverso eco-socio- viola-de-cocho”, iola-de-cocho”, possibilitando tcnico do Departamento de cltral. sa permanncia e diso. Patrimônio Imaterial e votamos avoravelmente inscrio do Por esse motivo, recomendamos MODO DE FAzER VIOLA-DEqe sejam realiados os estdos COCHO, no livro de Registro dos complementares complementares qe possibilitem Saberes, com a devida meno ao tambm a inscrio, no livro compleo msical, coreogrco e das Formas de Epresso, do potico do crr e do siriri.
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anexo 2 titulação de patrimô trimônio nio cultural do brasil
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anexo 3 Afinações e toques básicos da Viola-de-Cocho
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CAMILO DE LELIS. NOBRES-MT, 2003. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
anexo 4 partituras
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anexo 5 letras
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Canto de entrada da Bandeira de folião
Em vossa casa chego
(Francisco Salles, Renato, Marcolina e Joel Gregório)
Divino Esprito Santo
Me senhor dono da casa é hora da reverncia Dentro da vossa morada Concede a vossa a licena Concede a vossa licena Com praer e alegria Recebe esta bandeira Como a toda companhia Des te salve altar sagrado Onde mora as santidade Viva Des qe est no c Viva toda cristandade Viva toda cristandade Qem por ela os anjo canta E j a sadao J sadei santos e santa
Qem nos livra dos trabalho Veio pedir m agasalho Veio pedir m agasalho Com grande contentamento Bendito, lovado seja Santssimo Sacramento Agasalha esta bandeira Pelos caminho da l Nome do Pai e do Filho Para sempre, amm Jess
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Toada de cururu cururu
Menina, magina bem
Toada de cururu cururu
(Conrado Roqe de Lima, Benedito Aristides da Costa e Olympio Santana de Figeiredo)
E choro por se respeito
(Migel Arcanjo de Soa e otros)
Da ro do Chorando me corao
Venho vindo l de longe, ai ai
Ai da ro do
E vim só pra passear Ai, moa morena
Minha viola chora prima Minha viola chora prima
Menina, magina bem
E no esqeo d’oc
E a prima chora bordo
Mas qanto qe dói ma sadade
E a sadade vai comigo
E e j sori demais
E qero lhe dar m presente
Mas oi, e gosto dela
Ai, moa
Passa por perto de mim
Pra qando e voltar pra Ciab
Mas no venha me sadar Voc me a tirania, venham ver Assim qe m alegre a Mas espera m bocadinho Ai da ro do Mas espera m bocadinho Ai da ro do Devagar no sei brincar
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Toada de cururu cururu
Toada de cururu cururu e baixao
(Eclides Maia da Silva, Oswaldo Francisco de Silva, Lcindo Farias de Frana e Francisco Salles)
(Francisco Salles e Dorlio da Silva) Oi ai oi ai ai da ran dai do Oi ai ai la ran lai lo
Oi ai ai Des te salve casa santa
Foi a sagrada palavra qe Des deio
Oi ai ai
Na Escritra Sagrada
Onde Des e a morada
Qando andar no m dos tempo Tanta coisa dierenciava
Me Jess qando morre
Qe o bem vai diminindo
Chego Santa Madalena
E o mal vai mltiplicando
Para visitar o túmlo Onde estava a sepltra
Ai, saracra qando canta
Fico borrecida
é hora de amanhecer
Chego em Monte Calvrio
Ô, me amigo Roberto Escta qe e vo dier, ai Ai, carro no anda sem boi E no canto sem beber!
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siriri (nhandaia)
Toada de cururu cururu e baixão
lá pra fora é siriri, aqui dentro é cururu
(Francisco Salles, Dorlio da Silva, Bonicio e Grpo de Siriri de Dona Marcolina)
(Manel Virglio de Arrda e Elinto de Melo)
(Agripino S. Magalhes)
E qero cantar me verso
ê la lai la lai la lo
Nhandaia, nhadaia
Nessa boa ocasio
ê la lai la lai la lo
Vamos todos nhandaiar
Mas qem me dera se e pdesse
Brinqedo aqi t bo demais
E qeria ser sereno
Por isso qe e tô brincando
Me padre Santo Antônio
Pra serenar l no jardim
Venha me ensinar danar
E ia cair naqela rosinha branca
L pra ora siriri
Pe esta perna
Onde est me pensamento!
Aqi dentro crr
Se no servir esta
E so caboco de arra
Pe esta otra
Qalqer paio me adeverte
Pra senhora moa Arrodeia, arrodeia, arrodeia
E sa de Cormb
Fica de joelho
Pra brincar em Campo Grande
Pe a mo na cintra
Brinqedo aqi t bo demais
Pra aer misra
Por isso qe e tô brincando
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roubaram roubaram minha consciência
quiseram me incriminar
(Agripino S. Magalhes)
(Vitalino S. Pinto)
Aqi vai primeiro verso
Oi, la lai la lai la lo
Qe e canto neste lgar
Oi, la lai la lai la lo
No alta gente soberba neste mndo Des est no c e na terra
Qiseram me incriminar
Só porqe est de vestido novo
Só por casa daqela moa t me
Nem boa noite me de
agradando
Deia estar, Jacar
Ja, Rainha
Sa lagoa vai secar
E qero qe a Me me leva Nas ondas de tes cabelos, me bem Oi, la lai la lai la lo Oi, la lai la lai la lo Jogaram So Joo no ogo Teiado de p e mo Jogaram So Joo no ogo Teiado de p e mo Qanto mais So Joo qeimava, ai Mais chegava enganao, ai
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marrequinha da lagoa (siriri)
sou filho de mato grosso, não nego meu natural
Oi la ai la
(Domnio público)
(Agripino S. Magalhes e Grpo Pantaneiro de Siriri)
O lai lai lai lai lai a
O la i la O la i la
So lho de Mato Grosso
O la i la
No nego me natral
I la i la
So lho de Mato Grosso
I la i la
No nego me natral
Marreqinha da lagoa
Moro na cidade branca
Tii do Pantanal
Capital do Pantanal
Marreqinha da lagoa
Moro na cidade branca
Tii do Pantanal
Capital do Pantanal
Marreqinha pega peie
Oi la ai la
Tii j vem tomar
Oi lai la
Marreqinha pega peie
O lai lai lai lai lai a
Tii j vem tomar Moa morena cor de canela Moa morena cor de canela Entra na coinha Qe e te espero na janela
Oi lai la
Mame olha carneiro Carneiro d, carneiro d Carneiro qer me mai Carneiro d, carneiro d Oi la ai la Oi lai la O lai lai lai lai lai a E perdi o me anel No braco da parede E perdi, tornei a achar Me anel de pedra verde.
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{ Modo de Faer Viola-de-Cocho }
Crr do Pantanal SlMatogrossense/2002 TBG/Governo do Estado do Mato Grosso do Sl Crr e otros cantos das estas religiosas. -MT/1988 CNFCP/1988 Crr e Siriri – Nossa Tradies/s.d. Violade-Cocho Prodes Artsticas - Telemat
anexo 6 Capas Cap as de Discos
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Crr e Siriri – Chants et msiqes des tes religieses d Mato Grosso (Brsil) / 1999 Daniel Loddo - Cordea / La Talvera Primos e Irms de So Joo dos Laros/s.d. TCO/Telemat - Violade-Cocho Prodes Artsticas
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VIOLA DESENHADA. CORuMBá-MS, 2002. FOTO: FRANCISCO M. DA COSTA.
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Este livro oi produzido no verão de 2009 para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
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FICHA CATALOGRáFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA ALOíSIO MAGALHãES M692 Modo de aer Viola - de - Cocho. _ Braslia, DF : Iphan, 2009. 112 p. : il. color. ; 25 cm. + CD ROM. – (Dossi Iphan ; 8) ISBN: 978-85-7334-117-1 1. Patrimônio Imaterial. 2. Viola - de - Cocho. 3. Patrimônio Cltral. 4. Bens Cltrais. I. Institto do Patrimônio Histórico e Artstico Nacional. II. Srie. Iphan/Brasilia-DF
CDD 784.192
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