UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO
MARIA AMELIA DE ALMEIDA PINTO BOYNARD A ESCOLA MODELO ANEXA À ESCOLA NORMAL DE CAMPOS: a experiência da “Seis de Março” (1916-1932)
NITERÓI 2006
MARIA AMELIA DE ALMEIDA PINTO BOYNARD
A ESCOLA MODELO ANEXA À ESCOLA NORMAL DE CAMPOS: a experiência da “Seis de Março” (1916-1932)
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, como registro parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de Concentração: Educação Brasileira.
Orientadora: Profª Drª CLAUDIA MARIA COSTA ALVES
Niterói 2006
MARIA AMELIA DE ALMEIDA PINTO BOYNARD
A ESCOLA MODELO ANEXA À ESCOLA NORMAL DE CAMPOS: a experiência da “Seis de Março” (1916-1932)
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, como registro parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de Concentração: Educação Brasileira. Aprovada em 31 de março de 2006
BANCA EXAMINADORA
________________________________________ ___________________________________________________________ _____________________________________ _______________________ _____ Profª Drª Claudia Maria Costa Alves- Orientadora Universidade Federal Fluminense
_______________________ ___________________________________ _______________________ _______________________ _______________________ _________________ ______ Profª Drª Heloisa de Oliveira Santos Villela Universidade Federal Fluminense
_________________________________ _______________________ _______________________ _______________________ __________________ ______ _ ______________________ Profª Drª Silvia Alicia Martínez Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro
Niterói 2006
Esta dissertação é dedicada aos meus pais. Ao meu pai, Avelino (in memorian), que ao me presentearainda pequena- com a Coleção O Mundo da Criança forjou Criança forjou em mim a leitora que sou. À minha mãe, Amelinha, que ao me “tomar as lições de casa”, diariamente, quando eu cursava a escola primária, me ensinou a gostar de estudar. A ambos, pela luz de amor e força que derramaram sobre mim, durante todo o tempo em que escrevi este texto.
AGRADECIMENTOS
À minha família, meu porto seguro, onde encontro, sempre, lugar para ancorar meus sonhos. À Conceição de Maria Costa Muniz, através de quem ouvi falar, pela primeira vez, da Escola Modelo “Seis de Março”. Filha de Dona Teresa, professora daquela escola, ajudou-me muito a encontrar pessoas e pistas que me levaram a entender o que os documentos escritos muitas vezes ocultavam. À Profª Drª Cláudia Maria Costa Alves, minha orientadora, que com competência e fraternidade, me indicou os caminhos da pesquisa histórica. À Stella Muylaert Tinoco Dias, ex-aluna da Escola Modelo, em cujas lembranças- sempre tão amorosas- mergulhei e me apaixonei. À Profª Drª Silvia Alicia Martínez, parceira querida, pelo estímulo e ajuda intelectual durante todo o tempo do curso de Mestrado. Aos meus professores do Mestrado. Ao Chefe do Laboratório de Estudos de Educação e Linguagem da Universidade Estadual do Norte Fluminense, Prof. Dr. Sérgio Arruda de Moura. À Direção, Professores e Funcionários do Liceu de Humanidades de Campos, pela acolhida fraterna e permissão para penetrar no seu Arquivo Histórico. Aos profissionais dos Arquivos, Bibliotecas e Jornais nos quais pesquisei. Às pessoas que, com seus depoimentos orais, contribuíram para o entendimento do passado. Aos amigos, pelo incentivo ao trabalho. Àqueles que produziram os documentos nos quais pesquisei, minha gratidão e minhas preces.
“Como professora conscia de seus deveres, trabalho com amôr, visando tão somente o desenvolvimento de minhas alumnas, futuras formadoras do cidadão brasileiro, concorrendo, segundo me diz a consciencia, com uma particula do meu esforço para elevar o meu país á altura que suas montanhas nos indicam. Busco também pela sugestão incutir no espirito das jovens mestras que o analphabetismo deve desapparecer do Brasil, que nossos campos reclamam braços fortes, espiritos cultos e a ellas compete a solução desses dois magnos problemas”. Antonia Ribeiro de Castro Lopes, Professora de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos, em Relatório enviado ao Diretor da Escola Normal de Campos datado 13 de abril de 1927.
“Incentivada pela bondade fidalga e rara dos meus superiores e plenamente edificada do zelo inexcedivel de minhas auxiliares, procurarei elevar, dentro das minhas limitadas forças, ja pela disciplina, ja pela diffusão dos modernos methodos de ensino, o nivel da Escola Modelo ao das escolas verdadeiramente modelares”. Consuelo de Almeida Manhães, Diretora da Escola Modelo “Seis de Março”, em Relatório enviado ao Diretor da Escola Normal de Campos, datado 15 de abril de 1927.
SUMÁRIO
LISTA DE ILUSTRAÇÕES RESUMO
VIII;IX X
ABSTRACT
XI
INTRODUÇÃO
12
CAPÍTULO 1 A ESCOLA PRIMÁRIA FLUMINENSE NA PRIMEIRA REPÚBLICA
18
1.1 O CENÁRIO NACIONAL
21
1.2 O CENÁRIO FLUMINENSE
26
1.2.1 PERÍODO DE 1889 A 1915
28
1.2.2 PERÍODO DE 1916 a 1930
35
CAPÍTULO 2 HISTORICIZANDO A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA ESCOLA NORMAL
46
2.1 O PROJETO ESCOLA NORMAL: DE SUA GÊNESE CONFESSIONAL, A UMA INSTITUIÇÃO LAICA E PÚBLICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
46
2.2 A ESCOLA NORMAL DE NITERÓI, A PRIMEIRA DO BRASIL
51
2.3 A ESCOLA NORMAL DE CAMPOS
53
CAPÍTULO 3 HISTORICIZANDO A FORMAÇÃO PRÁTICA DE PROFESSORES EM “ESCOLAS MODELO”
61
3.1 A FASE MAIS REMOTA DO PROJETO “ESCOLA MODELO” NO BRASIL: AS ESCOLAS ANEXAS À ESCOLA NORMAL DE NITERÓI
62
3.2 A FACE MAIS CONHECIDA DO PROJETO “ESCOLA MODELO”: A ESCOLA MODELO “CAETANO DE CAMPOS” (SP)
65
3.3 A FORMAÇÃO PRÁTICA DE PROFESSORES NA ESCOLA NORMAL DE CAMPOS ANTES DA ESCOLA MODELO “SEIS DEMARÇO”
68
3.4 A ESCOLA MODELO ANEXA À ESCOLA NORMAL DE CAMPOS: ABORDAGEM INICIAL
74
3.5 A ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
78
3.5.1 O PAPEL DOS INTELECTUAIS NA CRIAÇÃO DA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
82
3.5.2 A ORDENAÇÃO LEGAL
84
3.5.3 O FIM DE UM MODELO
89
CAPÍTULO 4 A ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”: ASPECTOS DE CULTURA ESCOLAR
94
4.1 OS ESPAÇOS ESCOLARES NO PRÉDIO DO LICEU
96
4.1.1 O ESPAÇO DOS SECUNDARISTAS
96
4.1.2 O ESPAÇO DOS NORMALISTAS
97
4.1.3 O ESPAÇO DA ESCOLA MODELO
99
4.2 O TEMPO ESCOLAR
105
4.3 OS ASPECTOS ADMINISTRATIVOS
106
4.3.1 A MOVIMENTAÇÃO ESCOLAR
106
4.3.2 AS SÉRIES
108
4.3.3 AS FASES
110
4.3.4 AS NORMAS
113
4.3.5 INVENTÁRIOS E MATERIAIS DA ESCOLA MODELO
116
4.3.6 COMPRAS PARA AS ESCOLAS NORMAL E MODELO
121
4.4 OS ATORES EDUCATIVOS
122
4.4.1 AS DIRETORAS
122
4.4.2 AS PROFESSORAS
124
4.4.2.1 A importância de preparar alunas para a Escola Normal
128
4.4.2.2 O que liam as professoras de Campos
130
4.4.3 AS ALUNAS
131
4.4.4 OS SECRETÁRIOS DA ESCOLA MODELO, LICEU E ESCOLA NORMAL
134
4.4.5 A INSPETORA DE ALUNOS
135
4.4.6 O INSPETOR DO ESTADO NA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
135
4.5 OS ASPECTOS PEDAGÓGICOS
138
4.5.1 O CURRÍCULO FORMAL DA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO” (1923-1927) NA LEITURA DOS RELATÓRIOS DAS PROFESSORAS/1927
138
4.5.2 AS FESTAS E COMEMORAÇÕES CÍVICAS
147
4.5.3 RELAÇÃO ESCOLA- FAMÍLIA
150
4.5.4 O DESTINO DA ESCOLA MODELO E DE SUAS PROFESSORAS
150
CAPÍTULO 5 A TEORIA E A PRÁTICA NA/DA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
153
5.1 A TEORIA E A PRÁTICA NAS ESCOLAS DE CAMPOS: ANTONIA LOPES E CONSUELO MANHÃES
154
5.2 OS PROGRAMAS DE METODOLOGIA DA ESCOLA NORMAL DE CAMPOS: A TEORIA
165
5.3 OS MÉTODOS E PROCESSOS DE ENSINO NA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”: A PRÁTICA
167
5.3.1 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM NA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO” E A PRÁTICA DE ENSINO
168
5.4 A PRÁTICA DE ENSINO APÓS O FIM DA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
176
5.5 PEDAGOGIA, METODOLOGIA E PRÁTICA PEDAGÓGICA A PARTIR DE 1931. AS MUDANÇAS NO MODELO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
178
CONSIDERAÇÕES FINAIS
181
FONTES
186
BIBLIOGRAFIA
191
LISTA DE ILUSTRAÇÕES (As Ilustrações encontram-se no final do trabalho, numeradas conforme esta relação)
FIG.1- Fotografia de Antônio Joaquim de Castro Faria e de Sebastião Viveiros de Vasconcellos, Diretores da Escola Normal e Liceu de Campos. Ambos defenderam a instalação de uma escola de aplicação anexa à Escola Normalde Campos. Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada de fotos de jornais. FIG.2- Rascunho de documento no qual o Diretor da Escola Normal de Campos solicita a saída da Escola Modelo das salas do Liceu (1932). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada. FIG.3-Página do Diário Oficial do dia 18 de novembro de 1931, com a “Tabela das novas designações de grupos escolares”, anexa ao Decreto n. 2.676, de 17 de Novembro de 1931. Biblioteca Municipal Nilo Peçanha, Campos dos Goytacazes, 2005. Fotografia do original. FIG.4-Contrato para realização de obras de adaptação de sala da Escola Normal para receber a Escola Modelo, 1916. FIG.5-Documento que autoriza a aquisição de mobiliário para a Escola Modelo. FIG.6- Cartão Postal (s.d.) da fachada antiga do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada de documento do Arquivo Histórico. Fotografia (2004) da parte dos fundos do prédio do Liceu de Humanidades, onde se localizava a Escola Modelo “Seis de Março”. Arquivo da pesquisa. FIG.7- Esboço de planta (feita sobre original do Arquivo do Liceu) do espaço onde se localizavam a Escola Normal de Campos e da Escola Modelo “Seis de Março” no período de 1916-1932. FIG.8- Fotografia da Profª Stella Muylaert Tinoco Dias, ex-aluna da Escola Modelo“Seis de Março” e da Escola Normal de Campos, em visita às antigas dependências da Escola Modelo, no ano de 2005. Arquivo da pesquisa. FIG.9- Relação de material recebido pela Escola Modelo “Seis de Março”, da Comissão de Compras do Estado do Rio de Janeiro (1925). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada. FIG.10- Fotos de Maria Teresa da Costa Muniz, professora da Escola Modelo “Seis de Março”, e de Mercedes Sodré Ferreira Landim, professora e última diretora dessa Escola. Arquivo das famílias. Reprodução escaneada. FIG.11- Material usado na Prática de Ensino da Escola Normal de Campos. Modelo de
“Diário de Classe” organizado pela normalista Maria Carlota Baptista Tavares, em maio de 1919. Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Fotografia do original. FIG.12- Livros didáticos usados na Escola Modelo “Seis de Março”, relacionados nos Inventários da Escola. Biblioteca Central do Gragoatá. Universidade Federal Fluminense. Reprodução escaneada. FIG.13-Antônia Ribeiro de Castro Lopes e Consuelo de Almeida Manhães, respectivamente, Profª de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos e Diretora da Escola Modelo “Seis de Março”. Reprodução escaneada de fotos do Arquivo das famílias. FIG.14- Manual de Pedagogia usado na Escola Normal de Campos (1927). LOPES, Antonia Ribeiro de Castro. Synopse de Pedagogia e Methodologia Didactica. Campos: Typ. A Pena de Bronze, 1927. Biblioteca Central do Gragoatá. Universidade Federal Fluminense. Fotografia do original. FIG.15- “Caderneta de Prática Escolar” usada pelas alunas da Escola Normal de Campos, 192... Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Fotografia do original. FIG.16-Comunicação feita, ao Diretor da Escola Normal, pela Profª Antônia Lopes sobre a realização de “Excursão Pedagógica” (1920). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada. FIG.17-Documento no qual a Profª Antônia Lopes solicita, ao Diretor da Escola Normal, o material necessário ao estudo das “Lições de Coisas” (1916). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos.
RESUMO
O trabalho investiga, por meio de pesquisa histórica, uma experiência educacional vivenciada na cidade de Campos/RJ, na Primeira República, a da Escola Modelo”Seis de Março”. Essa escola, pública, funcionou de 1916 a 1932, como escola anexa à Escola Normal de Campos, e destinava-se à formação prática de professores. A pesquisa tomou como fontes privilegiadas Relatórios de Professoras e Diretoras, Mapas de Freqüência de Corpo Docente e Auxiliar, Termos de Visita de Inspetores Estaduais, Correspondências oficiais, registros de material utilizado nas aulas de Prática de Ensino, Programas da Disciplina Metodologia, dentre outros documentos, que caracterizam um acervo importante do ponto de vista da história da educação regional. Pretende-se, com a presente dissertação- apresentada como requisito acadêmico- focalizar o projeto “escolas-modelo”, tanto na especificidade própria da versão “campista”, quanto entendido como parte das experiências que caracterizaram o período, em especial o modelo praticado no Estado de São Paulo em fins do Século XIX, início do XX. Para tal, necessário se fez estudar o processo de escolarização primária, fluminense, no período, e o de institucionalização das Escolas Normais, no Ocidente. Compreender parte da cultura da Escola Modelo “Seis de Março”, posta em relação à da Escola Normal de Campos, seus espaços, tempos, currículos e atores educacionais, assim como a ação de intelectuais campistas na implementação do novo modelo, constituíram-se em objetivos da pesquisa, que pretende contribuir com a historiografia da História da Educação brasileira e, de modo especial, ressignificar uma experiência pedagógica pioneira de formação de professores, no interior do Estado do Rio de Janeiro. Palavras-chave: Escola Modelo; Campos dos Goytacazes; Formação de Professores
ABSTRACT
Through historical research, this work looks into an educational experience developed in the city of Campos/RJ, during the first republican period, at the Model School "Seis de Março". This public school was at work from 1916 till 1932 appended to the Teaching School of Campos and it was intended to the practical training of teachers. The research tries to retrieve written reports of teachers and directors, frequency maps of students and staff, minutes of state inspectors, official letters exchanged, written accounts of materials used in practical training, programmes of methodology, among other sources, which qualify any important collection from the point of view of a regional education history. This text, an academic dissertation submitted for mastership degree, focuses the project of ' model schools' in its local colours, without ignoring the multifarious influences coming from other regions, particularly those set up in the State of São Paulo, by the end of the XIX and the beginning of the XX centuries. In order to accomplish this, it was necessary to study the elementary schooling process in the State of Rio de Janeiro, and the institutionalization of Teaching Schools in the western countries. Restore part of the culture of this singular Model School "Seis de Março", within the experience of the Teaching School of Campos, its spaces, times, curriculums, educational actors, as well as the contributions of the local intelligentsia in its implementation, is the target of this research, meant to contribute to the history of Brazilian Education, and in a special way to reassess a pioneer pedagogical experience in the education of teachers in a interior town of the State of Rio de Janeiro. Key words: Model School, Campos dos Goytacazes, Teaching School
INTRODUÇÃO Itinerário de uma investigação
O presente estudo é o resultado de dois anos de investigação, nos quais se investiu em estudar uma escola de aplicação anexa à Escola Normal de Campos, a Escola Modelo “Seis de Março”. Localizada em Campos 1, cidade da região norte do Estado do Rio de Janeiro, na época- primeiras décadas do Século XX - uma cidade próspera, de bom comércio e economia baseada no cultivo e na produção da cana de açúcar e na criação de gado. Investigar a Escola Modelo “Seis de Março” significou uma oportunidade de olhar para minha própria vida de professora. Iniciei minha carreira docente em 1969, como professora do Quadro Permanente do Magistério do Rio de Janeiro, na Escola Reunida Fazendinha, localizada na zona rural do município de São João da Barra, Rio de Janeiro, alfabetizando crianças e adolescentes. Durante minha existência percorri, ora como professora-docente, ora como professorasupervisora educacional, salas de aula de todos os níveis e modalidades de ensino, estive sujeita a todas as Leis de Diretrizes e Bases da Educação e acompanhei a operacionalização dessas (e da legislação decorrentes) no interior das escolas do município de Campos dos Goytacazes. Essa vivência, que considero rica, forjou em mim grande respeito pela figura da professora primária que, na invisibilidade de seu trabalho, realiza uma função social extremamente importante. Crianças, manuais, espaço inadequado, tempo insuficiente, falta de verbas, “vocação e missão” construíram meu “saber de experiência”.
1
Atualmente a cidade se denomina “Campos dos Goytacazes”.
Saber esse que foi “renovado” no ano de 2003. A idéia de um estudo sobre a Escola Modelo da Escola Normal de Campos, denominada Escola Modelo “Seis de Março” surgiu quando, naquele ano, se levantavam dados, no Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos, para a pesquisa “História das Instituições Escolares no Norte Fluminense”, coordenada pela Profª Drª Silvia Alicia Martinez, e desenvolvida por pesquisadores do Laboratório de Estudos de Educação e Linguagem (LEEL), da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), dentre os quais me incluo. Ao dirigir a investigação para a busca de fontes documentais sobre a Escola Normal de Campos, primeira escola a ser investigada pelo Grupo de Pesquisa, deparei-me com Relatórios de Professoras e Diretoras, Mapas de Freqüência de Corpo Docente e Auxiliar, Termos de Visita de Inspetores, Correspondências entre a Diretoria dos Negócios do Interior e Justiça do Estado do Rio de Janeiro e Diretores da Escola Normal e Liceu de Humanidades, e entre estes e Diretoras da Escola Modelo “Seis de Março”, fontes que caracterizam um acervo importante, do ponto de vista da história da educação. Apresentado, inicialmente, como exigência de seleção acadêmica, este trabalho pretende apresentar reflexões feitas, com a contribuição dos estudos realizados para as disciplinas Educação Brasileira, Temas de Pesquisa, Epistemologia e Educação e História da Educação Brasileira, no curso de mestrado em Educação da Universidade Federal Fluminense, ao projeto inicial de pesquisa. Intitulado “A Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos: a experiência da “Seis de Março” (1916-1932)” o projeto de pesquisa passou por algumas reformulações que pretenderam definir melhor o objeto de pesquisa, suas limitações e possibilidades. Os objetivos da pesquisa dirigiram-se a investigar as forças sociais e outros determinantes históricos da sociedade campista que conduziram à criação, em 1916, de uma Escola de Aplicação, a “Escola Modelo”, no mesmo prédio da Escola Normal e do Liceu de Humanidades de Campos; a recuperar dados da cultura escolar da “Seis de Março”; a relacionar a teoria ministrada, às alunas da Escola Normal, na disciplina Pedagogia e Metodologia à sua aplicação, em turmas da Escola Modelo “Seis de Março”, pelas professoras do ensino primário; a recuperar a ação de duas intelectuais educadoras, a Professora de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal e a Diretora da Escola Modelo, que tiveram papel naquele momento, e a estabelecer relações entre a criação da Escola Modelo e o movimento escolanovista, ou mais amplamente, entre a experiência “campista” e os circuitos de trocas culturais do campo pedagógico naquele momento.
Ao recuperar dados que envolvem a existência dessa escola “modelar” em Campos, pretendo contribuir com a história da educação fluminense, preenchendo uma lacuna historiográfica e dando visibilidade ao “apagamento” dessa experiência pedagógica na memória social da região, pois de toda a literatura revista, apenas um historiador e dois memorialistas campistas citam, brevemente, a existência da Escola Modelo “Seis de Março”. Lamego (1943, Cap. III, p. 33) diz: “Apaga o tempo a memória dos fatos passados e cumpre aos vindouros avivá-los”. Nessa intenção, descreve a criação do Liceu de Humanidades de Campos, em 1880, e a da Escola Normal, em 1894. A seguir, cita as nomeações de professores e funcionários para ambas as escolas, ano após ano. Sem mencionar a criação da Escola Modelo, o autor diz, à p. 48, sem uma introdução sequer: “Em 1916 tomaram posse: em 1 de Março, Alzira Colares Quitete, regente da Escola Modelo anexa à Escola Normal...” e prossegue enumerando as demais ocorrências do Liceu e Escola Normal. A partir daí, até 1929 são feitas referências à nomeação de pessoal para a Escola Modelo. Almeida e Silva registram e acrescentam: “À Escola Normal é anexado um colégio primário, onde as normalistas treinam para a futura profissão. É a Escola Modelo, com Alberto Lamego registrando a professora Alzira Colares Quitete como diretora em 1916. Em 1919 a diretora é Consuelo Almeida Manhães” (1980, p.32). Assim, sem a intenção de recriar o vivido, mas buscando entender o que os documentos escritos e depoimentos orais mostram, ou ocultam, o texto pretende apresentar os resultados da pesquisa de dois anos de mestrado. Abordará a Escola Modelo “Seis de Março”, campo de prática profissional dos alunos da Escola Normal de Campos, do ano em que foi criada, 1916, ao ano de 1932, quando teve cessado seu funcionamento. Nessa perspectiva, para melhor entendimento, buscará situar o Estado do Rio de Janeiro no contexto dos primeiros anos da República, e a instrução, no momento em que era premente formar-se o cidadão brasileiro e a nação, e no qual a atuação da escola e da professora primária tem tido papel destacado na historiografia. Necessário se fez, durante a investigação, interpretar a política educacional, operacionalizada em forma de leis e decretos que, reformando o Ensino Normal, enfatiza o novo papel da escola e da professora na conformação do futuro cidadão. Foram analisados decretos e leis estaduais, do ano de 1912 ao de 1916, assim como do ano de 1931. Em conseqüência de depoimentos orais foi possível identificar lugares e pessoas referidos na documentação e entender melhor o cotidiano da Escola Modelo e seu entorno social. Doze entrevistas foram realizadas: sete delas no âmbito da Pesquisa da UENF, já
mencionada; as demais, foram feitas em 2005, com uma ex-aluna da Escola Modelo “Seis de Março” e da Escola Normal de Campos, a Profª Stella Muylaert Tinoco Dias, com a Profª Judith de Almeida Carvalho, ex-aluna do Grupo Escolar João Clapp, campo de prática das alunas da Escola Normal- anterior à criação da escola de aplicação a ela anexa-, com Rosane Carneiro Motta, sobrinha da diretora da Escola Modelo, Consuelo Manhães, e com Ilce Cunha e Isolina Carvalho Sampaio, ex-alunas da Escola Modelo 2, no âmbito da pesquisa registrada na presente dissertação. Este trabalho pretende sugerir a influência do projeto paulista de Escolas Modelo na experiência da Escola Modelo “Seis de Março”, na atuação de Antonia Ribeiro de Castro Lopes como professora de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos, e na de Consuelo de Almeida Manhães, na Direção daquela instituição modelar de ensino primário. Necessário se fez, então, recuperar a trajetória profissional dessas professoras e vincular a prática profissional das normalistas, feita na Escola Modelo, à teoria que elas recebiam nas aulas de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal, assim como foi impossível ignorar as necessárias trocas de saberes entre as profissionais da Normal e da Modelo, na consecução de um projeto de formação de professores adaptado às exigências de qualidade e excelência de ambas as escolas. Por fim, o trabalho pretende apresentar a cultura escolar que se vivenciou naquele tempo e local, através da descrição e análise de documentos que permitiram recuperar dados referentes a alunas, professoras, currículos, métodos de ensino, festas e momentos não festivos da Escola Modelo “Seis de Março”. O desejo de resgatar, minimamente, a cultura escolar da “Seis de Março” e o seu esquecimento aparente, na comunidade campista, exigiu o uso, na elaboração do texto dissertativo, de estudos teóricos referentes às categorias memória, história, gênero, cultura, metodologia e uso das fontes, fundamentalmente. Assim como Kenski (1994, p.49) esclarece que no relato oral
o sujeito busca construir uma identidade pessoal, que em alguns casos, não é exatamente a mesma que ele possuía no passado (e nem sempre ele sabe disso). O que ocorre é que geralmente no momento em que as pessoas vão relatar situações de suas vidas, elas aproveitam para ‘passar a limpo’ o passado e construir um todo coerente. As formas expressivas com que o indivíduo se autoreferencia no relato de suas memórias não podem ser consideradas como estatuto de verdade,
2
A Senhora Ilce Cunha reside em Niterói. A Senhora Isolina Carvalho Sampaio, em Campos. Ambas se recordam muito pouco da Escola Modelo.
Costa apud Louro, fala que “não foi sem luta que a mulher ingressou no sacerdócio do magistério”. Diz ainda que, historicamente, o magistério tem sido associado à missão, ao sacerdócio enquanto trabalho feminino fundado na ideologia do dom e da aptidão que só as mulheres possuiriam (1995, p.156-160). Le Goff (1994) e Nora (1993), por sua vez, dirigiram minha argumentação quando dizem que
falar dos silêncios da historiografia tradicional não basta; penso que é preciso ir mais longe; questionar a documentação histórica sobre as lacunas, interrogar-se sobre os esquecimentos, os hiatos, os espaços brancos da história. Devemos fazer o inventário dos arquivos do silêncio, e fazer a história a partir dos documentos e das ausências de documentos. Nenhum documento é inocente. Deve ser analisado.Todo documento é um monumento que deve ser des-estruturado, des-montado” (LE GOFF, p.87) e que “lugar de memória é parar o tempo, é bloquear o trabalho do esquecimento [...] prender o máximo de sentido num mínimo de sinais” (NORA, p.22).
Foi preciso, ao pretender transformar a Escola Modelo “Seis de Março” num lugar de memória, ter preocupação constante no trabalho com as fontes, considerando que a memória é seletiva e construída (POLLAK, 1992, p. 203-204) e que, portanto, “os lugares de memória só vivem de sua aptidão para a metamorfose, no incessante ressaltar de seus significados e no silvado imprevisível de suas ramificações” (NORA, 1993, p.22). Assim, foi requerido que, no diálogo com as fontes, fosse indagado: Quem fala? De onde fala? De que contexto social fala? Para quem fala? Como tratar, então, as fontes documentais, os periódicos, as fontes orais, essas últimas criadas através da história oral e compreendidas como uma metodologia que estabelece e ordena procedimentos de trabalho, e funciona como ponte entre a teoria e a prática (AMADO; FERREIRA, 1996)? Como fazer rigorosamente o cruzamento da documentação encontrada, desvelando aspectos da cultura escolar, ou do cotidiano escolar? Como perceber nas fontes as lacunas, o que ressaltam, o que ocultam? Como mapear o lugar social do qual falam os que produziram as fontes? Que cuidados observar na realização, transcrição e análise de entrevistas? Essas indagações procuraram dirigir minha postura de pesquisadora, o que foi um desafio constante, pelas muitas vezes em que me senti enredada pelo mistério e pelos fluidos emanados do local histórico em que se encontram a maioria das fontes, o Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos, uma sala no andar superior do casarão em estilo neoclássico do século XIX que encerra, em seu interior, histórias e memórias de um tempo em
que se misturavam o fausto e o esplendor trazidos pela riqueza do café e da cana de açúcar, e o sofrimento representado pela escravidão; e as tantas outras histórias “de escola” ali vividas. Em relação aos temas formação de professores nas Escolas Normais; prática de ensino; projeto Escola Modelo; método intuitivo; movimento da Escola Nova no Brasil, papel dos intelectuais, foram referência teórica, para mim, os estudos de António Nóvoa, Carlos Monarcha, Clarice Nunes, Diana Vidal, Heloisa Villela, Lacerda Nogueira, Leonor Tanuri, Lourenço Filho, Lucia Müller, Luciano Faria Filho, Marcos Cezar de Freitas, Marta Carvalho, Rosa Fátima de Souza, Silvia Alicia Martinez, Nosella e Buffa, Vera Teresa Valdemarin, em especial. Ainda no que diz respeito às fontes, os jornais que circulavam na época foram de grande importância. Além de favorecer melhor compreensão sobre o cotidiano da cidade, auxiliaram sobremaneira o entendimento de aspectos do cotidiano da Escola Modelo “Seis de Março”. Quero ressaltar que, ao lado de meu esforço pessoal, das disciplinas cursadas na UFF e da orientação competente da Professora Claudia Alves, foi da maior relevância na construção dos aportes teórico-metodológicos da minha pesquisa, a investigação que desenvolvo sobre a Escola Normal de Campos. Ao estudar essa escola, consegui dar às fontes outras leituras, e fazer as transferências de conhecimento necessárias ao estudo da Escola Modelo “Seis de Março”, um “anexo” muito importante na formação docente e na história de Campos.
CAPÍTULO 1 A ESCOLA PRIMÁRIA FLUMINENSE NA PRIMEIRA REPÚBLICA
Revendo a historiografia que trata da expansão da escola primária brasileira, após os movimentos abolicionista e republicano, para entender as forças sociais em movimento, as idéias subjacentes, as políticas educacionais 3 e os modelos pedagógicos por elas encetadosdentre os quais se situa o objeto dessa dissertação, a Escola Modelo “Seis de Março” anexa à Escola Normal de Campos- foi possível perceber a relação estreita entre essa experiência e o contexto histórico em que se situa. Esse modelo de escola, que teve apogeu em São Paulo, no final do século XIX, foi considerado, por seu mais entusiasta defensor, Antonio Caetano de Campos, como o “coração” da reforma da instrução pública, que então se instaurava naquele estado. De acordo com Reis Filho “as escolas-modelo exerceram múltiplas funções na evolução do ensino paulista: serviram de padrão de ensino e de organização. Pensada por Caetano de Campos como escola experimental, logo transformou-se em escola de demonstração metodológica, desde que o método intuitivo e os processos de ilustração pedagógica foram aceitos como técnicas desejáveis de ensino” (1995, p.53). A partir de 1894, aproximadamente, a organização de escolas unidocentes, “regidas por um professor que ministrava o ensino elementar a um grupo de alunos em níveis ou estágios diferentes de aprendizagem” (SOUZA, 2004, p.113), foi sendo alterada,
com a organização de classes com alunos do mesmo desenvolvimento cultural, adotando-se a homogeneização das classes e seriando por graduação o curso elementar. Foi essa organização que se difundiu na forma de Grupo Escolar [...]. As escolasmodelo ( paulistas) paulistas) transformaram-se em Grupo Escolar ou estes foram instalando-se já com a organização das escolas-modelo. As que eram, entretanto, anexas às escolas complementares ou à Escola Normal da Capital, continuaram na função de escolas de aplicação de exercícios dos alunos-mestres alunos-mestres (REIS FILHO, 1995, p.167).
Em 1916, quando da criação da Escola Modelo em Campos, a experiência das escolasmodelo paulistas já se defrontava com iniciativas de consolidação dos grupos escolares, 3
De acordo com Nagle (2001, p. 165-166) “durante todo o período da história brasileira, até 1930, não se encontra outra etapa de tão intensa e sistemática discussão, planejamento e execução de reformas da instrução pública”.
enquanto no cenário fluminense, esse tipo de escola ainda representava um percentual mínimo na rede estadual de ensino, em sua maioria composta pelas chamadas “escolas elementares, singulares ou isoladas 4 ”. Naquele ano, funcionavam no Estado “33 Grupos Escolares, 1 Escola Complementar, 2 Escolas Modelo ( Niterói ( Niterói e Campos, recém- instalada) instalada) e 400 escolas isoladas”, nos informa a Mensagem que o Presidente Nilo Peçanha enviou à Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro 5 ( Mensagem, Mensagem, Peçanha,1916, p.23). Os números, aparentemente baixos, já representavam, na verdade, um aumento considerável de escolas tipo “grupo”, se considerarmos que, em 1902, havia somente sete grupos escolares no Estado ( Mensagem ( Mensagem de de Quintino Bocayuva, 15/7/1902, p.15). Foi no governo do Dr. Raul de Moraes Veiga (1919-1922) que o desenvolvimento dos Grupos Escolares no interior do Rio de Janeiro, no período da República Velha, atingiu seu auge. Nessa época foram construídas grandes escolas no interior do Estado 6. O objetivo que levou o presidente a se empenhar por dotar “cada cidade, villa ou povoação, si não for possivel em todas, em sua grande maioria, de um predio escolar” ( Mensagem ( Mensagem 1920 , p.26), , p.26), foi o de comemorar o Centenário da Independência do Brasil , dois anos depois, dotando o Estado de grandes escolas. A preocupação em localizar, nas mensagens presidenciais, vestígios tanto da escolarização fluminense, como das tendências pedagógicas que começavam a fazer parte do discurso oficial, foi respaldada pela historiografia clássica. Todas as fontes consultadas foram analisadas de modo a nos permitir ultrapassar o simples registro dos fatos. Procuramos nos centrar nas circunstâncias em que esses aconteceram, o que implica dizer, no processo histórico de constituição da escola pública primária, e de seus atores. Como afirma Carvalho (2000, p.11), é preciso “compreender o ‘modelo escolar’ de educação como construção histórica resultante da intersecção de uma pluralidade de dispositivos científicos, religiosos, políticos e pedagógicos, que definiram a modernidade como sociedade da escolarização”. Nóvoa (1992, p.16) acrescenta que é impossível isolar a ação pedagógica dos universos sociais que a envolvem, o que faz com que a análise da escola só adquira 4
A denominação varia de acordo com a legislação. Por não ter sido possível aprofundar o estudo do tema, nesse trabalho, optamos por, apenas, apresentar os diferentes nomes, que se referem, sempre, ao “ensino primário” e, atualmente, às séries iniciais do Ensino Fundamental. 5 Essa fonte, Relatórios de Presidentes do Estado do Rio de Janeiro, doravante, será citada no texto como : ( Mensagem, autor, Mensagem, autor, data, página). 6 A partir dessa data, foi somente no governo de Ernani do Amaral Peixoto (1937-1945; 1951-1955, In: http://www.alerj.rj.gov.br/memoria/historia/gov88975/amar http://www.alerj.rj.gov.br/m emoria/historia/gov88975/amaral_peixoto.html) al_peixoto.html) que se construíram, no Estado do Rio, monumentais Grupos Escolares. Em Campos dos Goytacazes há registros em jornais e livros de memorialistas que podem comprovar que a malha escolar do município foi bastante ampliada no período.
“verdadeiro sentido se conseguir mobilizar todas as dimensões pessoais, pessoais, simbólicas e políticas da vida escolar, não reduzindo o pensamento e a ação educativa a perspectivas técnicas, de sensu”. gestão ou de eficácia stricto eficácia stricto sensu”.
Aliás, seria uma total insensatez não reconhecer que as grandes mudanças no modo como as sociedades encaram e praticam a educação extravasam claramente os contextos nacionais. Basta pensar, a título de exemplo, na substituição de uma cultura oral por uma cultura escrita, na lenta consolidação do modelo escolar, na dinâmica de estatização do ensino, no processo de escolarização das crianças e dos jovens, ou na profissionalização dos corpos docentes, para se perceber que estamos perante fenômenos que, apesar dos ritmos e das diversidades locais e nacionais, dizem respeito a mudanças sociais muito mais vastas (NÓVOA, 1992, p.218).
Nessa perspectiva, perspectiva, o pensamento e a ação educativos educativos que forjaram e foram forjados na Escola Modelo “Seis de Março” deverão ser analisados em suas relações com o momento histórico que envolve a expansão das escolas elementares no espaço fluminense, com as duas escolas normais do Estado do Rio de Janeiro à época, com as experiências inovadoras de formação docente desenvolvidas em São Paulo 7, e com sua “territorialidade espacial e cultural, onde se exprime o jogo dos atores educativos internos e externos” (NÓVOA, 1992, p.16). No presente Capítulo, tentaremos nos ater à expansão das escolas elementares no espaço fluminense, deixando para os próximos as abordagens sobre a formação de professores nas escolas normais e modelo, assim como instalação, espaços, tempos, currículos, atores educativos e “pedagogias em movimento” que construíram o objeto da pesquisa, a Escola Modelo “Seis de Março”. Voltando aos universos sociais que possibilitaram a criação da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, na tentativa de entender o (s) panorama (s) em que a instrução pública se delineava naqueles tempos, recorremos, em primeiro lugar aos historiadores da educação brasileira, para entender o cenário nacional. Para entender o cenário regional, por sua vez, utilizamos, além da obra de Lacerda Nogueira8 , os estudos de Heloisa Villela 9 , que tratam da Escola Normal de Niterói, e as
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Por representarem a maior influência percebida sobre a cultura da “Seis de Março”. Intelectual fluminense da primeira metade do século XX, e autor de obras históricas sobre o Estado do Rio de Janeiro. Autor de “A Mais Antiga Escola Normal do Brasil (1835-1935)”. Officinas Graphicas do Diario Oficial do Estado do Rio de Janeiro. Niterói, 1938. 9 “A Primeira Escola Normal do Brasil. Uma Contribuição à Historia da Formação de Professores” Professores” (1990); “ (1990); “A A Primeira Escola Normal do Brasil” (1992); “Da Palmatória à Lanterna Mágica: A Escola Normal da Província do Rio de Janeiro entre o artesanato e a formação profissional (1868-1876)” (2002). 8
Mensagens dos Presidentes da Província e do Estado do Rio de Janeiro às Assembléias Provincial e Legislativa, localizadas no arquivo virtual da Universidade de Chicago. 10 Por fim, no desconhecimento de uma historiografia sobre a educação no interior do Estado do Rio de Janeiro, alguns resultados da pesquisa desenvolvida na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) sobre a Escola Normal de Campos, obras de historiadores e memorialistas campistas, jornais, e principalmente os documentos existentes no Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos, foram as fontes usadas para o entendimento do contexto contexto local da educação escolar escolar campista, no período limitado pela pesquisa.
1.1 O CENÁRIO NACIONAL
No panorama mundial, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos, entre o último decênio do século XIX e o terceiro decênio do século XX, afirmaram-se na pedagogia mundial algumas experiências educativas de vanguarda, inspiradas em princípios formativos bastante diferentes daqueles em vigor na escola que passou a ser considerada tradicional, as chamadas “escolas novas 11”. Na base desta “inovadora” consciência educativa estavam não somente as descobertas da psicologia sobre o desenvolvimento infantil, formas de avaliação por testes e medidas e outras das quais a educação se apoderou, mas também o movimento de emancipação de amplas massas populares nas sociedades ocidentais (CAMBI, 1999, p.513). De forma esquemática, o desenvolvimento histórico do movimento escolanovista na sua dimensão internacional se deu da seguinte forma, segundo Nagle 12 (2001, p.309): 1ª fase1889 a 1900, quando foram criadas as primeiras escolas novas; 2ª fase: 1900 a 1907, período marcado pela atuação de John Dewey e formulação do novo ideário educacional; 3ª fase: 1907 a 1918, com a criação e publicação dos primeiros métodos ativos; 4ª fase: 1918 em diante: de difusão, consolidação e oficialização das idéias e dos princípios, dos métodos e das técnicas do “escolanovismo”. “escolanovismo”. 10
http://wwwcrl.uchicago.edu/content/brazil/jain.htm http://wwwcrl.uchicago.edu/content/brazil/jain.htm “Embora as “escolas novas” nasçam e se desenvolvam como experimentos isolados, ligados a condições particulares e a personalidades personalidades excepcionais de educadores educadores elas, justamente justamente porque tiveram imediatamente imediatamente ampla ressonância no mundo educativo, propiciaram uma série de pesquisas no campo da instrução, destinadas a transformar profundamente profundamente a escola, não só no n o seu aspecto organizativo e institucional, mas também, e talvez sobretudo, no aspecto ligado aos ideais formativos e aos objetivos culturais” (CAMBI, 1999, p.514). 12 Com o cuidado que o uso da periodização na história da educação requer, consideramos o estudo de Nagle pertinente para situar o objeto de nossa pesquisa nos movimentos movimentos renovadores da época. época. As fontes demonstram demonstram que, a partir de 1923, as práticas da Escola Modelo “Seis de Março” passaram a manifestar influências do movimento escolanovista. Esse tema será melhor trabalhado nos Capítulos 4 e 5. 11
Segundo o autor, no Brasil, as idéias desse movimento que realizou uma reviravolta radical na educação, colocando no centro a criança, em atividade, foram se irradiando pouco a pouco. Nagle afirma que a primeira fase dessa irradiação se dá do fim do período imperial até cerca de 1920, podendo ser caracterizada como o momento de “preparação” para as mudanças, com a “modesta infiltração destes ou daqueles procedimentos, idéias ou princípios”, que ajudaram a criar condições “facilitadoras para a mais sistemática e ampla difusão posterior do ideário” (p.310), e que a segunda fase do “escolanovismo” no Brasil compreende a década de 1920, e é uma fase de difusão e realizações, “sendo as primeiras iniciativas de caráter público, pois apareceram com o movimento reformista da instrução pública que se deu nos Estados e no Distrito Federal13” (NAGLE, 2001, p.311). No momento em que mudanças significativas, em todos os níveis, ocorriam no mundo, no Brasil, em particular, aconteciam consideráveis alterações na vida social, das quais o processo de industrialização (p. 26), o imigratório e o de urbanização (p. 38) são apontados, como exemplos, por Jorge Nagle (2001). De certa maneira, esses processos impulsionaram que o processo de escolarização se intensificasse. A referência à ação de “intensificar”, e não à de ‘iniciar” o processo de escolarização, decorre de estudos recentes que demonstram que, no período imperial, já “havia, em várias províncias, uma intensa discussão acerca da necessidade de escolarização da população”, inclusive de negros, índios e mulheres (FARIA FILHO, 2003, p.135). Enfocar a difusão da escolarização, para Faria Filho, requer tanto a relativização do papel e do lugar do Estado, como a do papel e do lugar que cabiam à escola. Assim, diz ele:
(...) a instituição escolar não ‘surge no vazio deixado por outras instituições’. Os defensores da escola e de sua importância no processo de civilização do povo tiveram de, lentamente, apropriar, remodelar, ou recusar tempos, espaços, conhecimentos, sensibilidades e valores próprios de tradicionais instituições de educação. Mas não apenas isso: a escola teve também de inventar, de produzir o seu lugar próprio, e o fez, também, em íntimo diálogo com outras esferas e instituições da vida social (2003, p.136).
De “escolas de primeiras letras” a “grupos escolares”, esse foi o itinerário percorrido pela educação elementar, primária, brasileira, do período imperial ao republicano. Esse caminho, em que se foram agregando novos conteúdos e práticas sociais, de acordo com as 13
“Entre 1920 e 1929, particularmente, a instrução pública nos estados e no Distrito Federal sofre muitas alterações, de que resultam a ampliação da rede escolar, o melhoramento das condições de funcionamento das instituições escolares existentes, a criação de novas instituições [...]. Com efeito, tratou-se, no decênio, de substituir o ideário educacional até então vigente, pelos princípios da nova teoria educacional representada pelo escolanovismo” (NAGLE, 2001, p.244).
normas da “pedagogia moderna” e com as experiências das nações mais desenvolvidas 14, foi aberto, em grande parte, pela legislação educacional. É abundante o número de textos legais sobre a instrução, produzidos na Primeira República, fato que parece indicar
que a normatização legal constituiu-se numa das principais formas de intervenção do Estado no serviço da instrução. Tempos, espaços, conhecimentos, sensibilidades e valores que deveriam ser vivenciados e transmitidos à infância brasileira, foram forjados, diferentemente, por cada Província, e dessa forma, um sistema nacional de escolas primárias foi sendo construído15 (FARIA FILHO, 2003, p.137).
Foi por São Paulo, no fim do século XIX, que “o sonho da República espargindo as luzes da instrução para todo o povo brasileiro, e democratizando a sociedade, ou o sonho de, pela instrução, formar o cidadão cívica e moralmente, de maneira a colaborar para que o Brasil se transforme numa nação à altura das mais progressistas civilizações do século”, teve início (FARIA FILHO, 2003, p.137). A reforma de ensino paulista de 1890 pelo Decreto nº 27, de 12 de março, e Regulamento de 14 de junho, ensejou que, “com o fim de preparar convenientemente o professor, se crie um órgão especial, a Escola Modelo, anexo à Escola Normal de São Paulo. Esta é a base de toda reforma da instrução pública paulista, nos primeiros anos da República”, pois a “chave de toda evolução do ensino escolar [...] repousa sobre a prática que devem ter os alunos mestres na escola-modelo” (CAETANO DE CAMPOS apud REIS FILHO, 1995, p.53; 56). Souza (1998), por sua vez, considera a instalação dessa escola de prática de ensino dos alunos-mestres da Escola Normal, “o primeiro ensaio de implantação de uma escola primária pública moderna” no Brasil (p.34). A autora afirma que
a criação das escolas graduadas com várias salas de aula e professores encontrava-se pressuposta nos projetos de reforma da instrução pública desde o início da República no Estado de São Paulo. Consta do Plano oferecido ao governo para a reorganização do ensino popular o seguinte texto: “as escolas do ensino primário funcionarão em um só prédio com vastas salas bem arejadas, pátios arborizados, museus escolares, 14
“O ideário civilizatório iluminista irradiava-se, a partir da Europa, para boa parte do mundo, e, também, para o Brasil” (FARIA FILHO, 2003, p.140). Villela (2003, p.116) registra que “dentro das perspectivas de difusão da instrução, as inovações pedagógicas [...] não paravam de chegar. Agora não só da Europa, mas principalmente dos EUA, o novo modelo que despontava na época” (fins do XIX). 15 A falta de estudos acadêmicos sobre a educação escolar na Província do Rio de Janeiro e no interior do Estado do Rio foi um dos principais entraves à construção de um panorama geral da escolarização no período da Primeira Republica, nesse espaço. Os que existem, via de regra, referem-se à educação no Município da Côrte e no Distrito Federal.
bibliotecas populares, mobílias, etc.” [...] e que “neste sentido, São Paulo foi o estado vanguardista na mudança do ensino primário no Brasil devido às suas favoráveis condições econômicas, sociais e políticas” (SOUZA, 1998, p.34).
Na consecução do ideal de disseminar a instrução e lutar contra o analfabetismo, a escola primária se destacou como a mais importante instituição da rede de escolas brasileiras, a legislação educacional, como o caminho, o (a) professor (a) como o instrumento. Eram as necessidades da escola primária que suscitavam as discussões, planos e reformas do ensino normal. Um exemplo, no âmbito do Estado do Rio, está no texto do Decreto nº 1241 de 13 de março de 1912 (expediente de 16/3/1912), que reformou o ensino normal e secundário do Estado: “Sempre que se introduzir nos programmas das escolas primarias alguma disciplina ou materia, até então não ensinada, se estabelecerá a cadeira correspondente do curso normal” (Art. 7º, Capítulo II, Título I). Competência dos estados, esses dois níveis escolares, Normal e Primário, estiveram, por toda a Primeira República, em relação. As orientações imprimidas, à teoria e à prática pedagógica estudadas na cadeira de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal, era “dada a ver” na sala de aula das professoras primárias, nas escolas de aplicação. Dessa forma, aprendendo e exercitando essa aprendizagem, se fazia a formação docente e se imprimia, no corpo e na alma das normalistas, um conjunto de hábitos, comportamentos e valores que as fizeram (re)conhecidas, posteriormente, pela historiografia, como “as Construtoras da Nação16”. Embora os modelos de escolarização fossem particulares de cada cultura, a literatura acadêmica demonstra a existência de pontos comuns na expansão da rede escolar primária, no Brasil, especialmente nos estados de São Paulo e Minas Gerais, estados com maior abundância de dados registrados pela pesquisa histórica. Dentre eles, aponta-nos Faria Filho, ao falar dos modelos de educação escolar que se configuraram no decorrer do Século XIX: a superioridade quantitativa de escolas particulares no século XIX, a precariedade dos espaços escolares públicos, a falta de prédios escolares, a baixa freqüência dos alunos à escola, a formação precária dos professores, os métodos de ensino que iam se alterando, paulatinamente, das escolas das regiões mais desenvolvidas às menos, a divulgação de modelos e idéias em colunas de jornais e revistas (2003). Transportando essas características para o período da Primeira República, e para outro espaço, o Estado do Rio de Janeiro,
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Termo utilizado por Lúcia Müller em MÜLLER, Lúcia. As Construtoras da Nação: Professoras Primárias na Primeira República. Niterói: Intertexto, 1999.
podemos concluir que os problemas e demandas foram similares, como tentaremos demonstrar no bloco específico da educação fluminense. Em meados da última década do século XIX, “primeiro em São Paulo e, depois, em vários estados brasileiros, surgem os “grupos escolares” 17, novo modelo de escola, que será importante peça no jogo republicano de romper com a tradição imperial e abrir a escola ao povo”. Assim, “o grupo escolar aparece como peça central do investimento republicano, traduzido na estratégia de marcar o advento do novo regime” (FARIA FILHO, 2000, p.11). Em São Paulo,
sua organização decorreu da experiência da Escola-Modelo criada por Caetano de Campos, e estava ajustada às novas condições urbanas de concentração da população. A teoria educacional da época, fundada na graduação do ensino, impunha uma melhor divisão do trabalho escolar, pela formação de classes com nível de aprendizagem semelhante. A homogeneização do ensino, a partir do grau de desenvolvimento cultural do aluno, possibilitou melhor rendimento escolar (REIS FILHO, 1995, p.138).
No Estado do Rio de Janeiro, não conseguimos reunir dados que nos possibilitem afirmar, com rigor, a data em que se instalou o primeiro grupo escolar. A única referência encontrada está em Nogueira (1938, p.200). Ao citar uma aluna que se formava, pela Escola Normal do ano de 1898, o autor diz ser ela diretora do Grupo Escolar Balthazar Bernardino, em Niterói18. A cultura dos grupos escolares “atravessou todo o século XX 19 , constituindo-se referência básica para a organização seriada das classes, para a utilização racionalizada do 17
No livro “Da Era das Cadeiras Isoladas à era dos Grupos Escolares na Paraíba” (PINHEIRO, 2002) fruto de sua tese de doutoramento, Antonio Carlos Ferreira Pinheiro, além de trabalhar a origem dos grupos na Paraíba, utiliza outros trabalhos acadêmicos que reconstituem a origem dos grupos escolares em São Paulo, no Rio Grande do Norte, Minas Gerais e Espírito Santo. Também Souza (2004, p.119) aborda o movimento de implantação dos primeiros grupos escolares no Pará (1899), Paraná (1903), Minas Gerais (1906), Rio Grande do Norte (1908), Espírito Santo (1908), Mato Grosso (1910), Santa Catarina (1911), Sergipe (1911), Paraíba (1916), Piauí (1922). Esses dados se revestem de importância se considerarmos que, embora a historiografia não lhes faça menção, no Estado do Rio de Janeiro, em 1898, já havia o Grupo Escolar Balthazar Bernardino, em Niterói (NOGUEIRA,1938, p.200), e que, em Campos, Sousa (1985, p.156) registra que “o primeiro grupo escolar criado em Campos foi denominado “Barão de Tautphoeus”, pela reforma Paranhos, em fevereiro de 1900, funcionando no mesmo edificio do Liceu”, o que confirma a sintonia da educação escolar no Estado do Rio, com o cenário nacional. 18 Essa informação comprova que as alunas da Escola Normal, em seus primórdios, já exerciam a função de ensinar. 19 E continua no presente. No Estado do Rio de Janeiro, os grupos escolares são atualmente denominados “Escolas Estaduais”. Mudou o nome, mas a estrutura continua bem semelhante, com classes seriadas, ensino graduado organizado com hierarquização de conteúdos escolares, aulas especializadas (música, educação física), gestão centralizada na figura do (a) diretor (a), utilização racionalizada de tempos e espaços. Mudou a metodologia, principalmente nas escolas mais bem dotadas de recursos materiais, que passaram a trabalhar com projetos pedagógicos e aulas de informática. Mudaram os critérios de avaliação, que passaram a envolver todos os aspectos da escola, e não mais somente os alunos. O maior quantitativo da rede escolar das séries iniciais do
tempo e dos espaços e para o controle sistemático do trabalho das professoras, dentre outros aspectos” [...] “Na estratégia republicana, o Grupo Escolar é a instituição que condensa a modernidade pedagógica” (FARIA FILHO, 2003, p.147). Um ponto a ressaltar, quando se fala do processo de expansão da escola brasileira, é o “aparecimento de inusitado entusiasmo pela escolarização e de marcante otimismo pedagógico no país”, principalmente principalmente a partir da segunda segunda década do do XX.
De um lado, existe a crença de que, pela multiplicação das instituições escolares, da disseminação da educação escolar, será possível incorporar grandes camadas da população na senda do progresso nacional, e colocar o Brasil no caminho das grandes nações do mundo; de outro lado, existe a crença de que determinadas formulações doutrinárias sobre a escolarização indicam o caminho para a verdadeira formação do novo homem brasileiro (NAGLE, 2001, p.134).
Após a breve análise sobre o cenário nacional da escola elementar, na Primeira República, onde se configura a preocupação em difundir a escola pública, abordaremos com maiores detalhes aspectos da situação da educação no Estado do Rio de Janeiro, procurando, dessa forma, começar a compor a paisagem em que se dará a criação da Escola Modelo na cidade de Campos.
1.2 O CENÁRIO FLUMINENSE
Os anos iniciais, sob o regime republicano, foram difíceis sob o ponto de vista econômico, social e político, para o Estado do Rio 20 . Essa circunstância desfavorável, entretanto, não lhe tirava o papel de possuir um pólo de industrialização, produtor de uma infinidade de produtos, que iam de fósforos a máquinas para “differentes misteres” 21. ensino fundamental, geralmente rural, municipalizada após 1996, porém, não perdeu as características de grupo escolar. 20 Assim mostram documentos oficiais produzidos pelos presidentes do Estado, e a historiografia. Desta, a principal referência que usamos é o trabalho de Marieta de Moraes Ferreira, Ferreira, segundo a qual, “principal “principal pólo econômico do país durante quase meio século do período imperial, graças à pujança de sua cafeicultura escravista, e um dos principais sustentáculos do regime monárquico, a então Província do Rio de Janeiro entrou em declínio ainda na década de 1880, tendo assistido à proclamação da República e à sua instalação em meio a grave crise política (FERREIRA, 1989, p.13). 21 Essa condição é minuciosamente posta à Assembléia Legislativa, em 1908, pelo Presidente do Estado, Sr. Alfredo Backer: “Pela estatistica que fiz organisar verificou-se que longa é a serie das industrias estabelecidas no territorio fluminense. Dentre as principais convem destacar as seguintes: as de tecidos de seda, casimira, algodão, etc.; confecções, bordados e outros trabalhos de agulha; industrias de ferro, cobre, chumbo e outros metais; machinas para differentes misteres; phosphoros de varias marcas e especies; carruagens, carros, construções navais, carros electricos; bengalas, objetos artisticos de madeira, instrumentos de corda, moveis, artigos de tanoaria e madeiras diversas; marmores, mosaicos, ladrilhos; louças (ceramica), trabalhos de terra-cota; chapéos;
Se levarmos em consideração o processo de urbanização que se desenvolvia no Estado, e as mudanças políticas, sociais e culturais que se sucediam, poderemos entender que a vocação industrial fluminense precisava ser incrementada com a força do trabalho e da direção, especializados. A expansão da escolarização passa a ser, então, uma das metas a ser perseguida pelos dirigentes do estado. estado. Na tentativa de apresentar, mesmo que de forma superficial, por não ser este o escopo da dissertação, a conjuntura educacional do Estado, priorizou-se nesse trabalho t rabalho a consulta aos relatórios de Presidentes do Estado do Rio de Janeiro no período de 1889 a 1930 22. Enviados pelos Presidentes do Estado do Rio de Janeiro à Assembléia Legislativa 23, as Mensagens-Relatórios contêm as principais ações do Governo em todos os setores da administração pública. Assim, são relatados os feitos e as projeções em áreas como Finanças, Saúde, Obras Públicas, Comércio, Agricultura e Educação, para citar alguns. Essas fontes foram privilegiadas, apesar de suas lacunas e de seu sentido “oficial”, porque se constituem em um corpus corpus documental pleno de sentido, sendo a realização e expressão de imperativos legais e uma das estratégias pelas quais os governantes se faziam ver , davam visibilidade a uma forma de organização da educação, da escola, da sociedade (FARIA FILHO, 2000, p. 17-19) Ao falar da instrução pública o presidente enfoca, com variações no grau de profundidade do relato, o ensino nas escolas agrícolas, profissionais, secundárias, normais e primárias- com algumas referências às Escolas Modelo da Escola Normal de Niterói e de Campos24. fumos; plantas medicinais, drogas e productos pharmaceuticos, aguas mineraes naturais e artificiaes e artigos de funilaria; esculptura; flores naturaes e artificiaes; massas alimenticias, farinhas [...]; banha de porco, presuntos e fiambres [...]; assucar de differentes qualidades; doces em conserva, goiabada, marmelada [...]; manteiga e queijos; cervejas, vinhos de frutas [...]; alcool; papel [...]; perfumarias; peixes e camarões; sal marinho; lythographia e fotographia; soldas; explosivos; artigos de seleiro; cafés, vários especimens da industria pecuária; fibras têxteis; minérios ( Mensagem Mensagem 1908, p.22). 22 Exceção feita à Mensagem de 15 de outubro de 1889, do Presidente da Província do Rio de Janeiro. 23 São relatórios escritos anualmente- com exceções feitas para os anos de 1890, 1891, 1893. Não há registros de Mensagens presidenciais nesses períodos. “No ano de 1901 foi apenas localizada uma pequena Mensagem do Mensagem do presidente do Estado, Sr. Sr. Quintino Bocayuva enviada á Assembléia Assembléia Legislativa em 15 de setembro setembro de 1900 nos “Annaes da Assembléa Legislativa- sessão ordinária de 3 de setembro a 16 de dezembro de dezembro de 1901. Rio de Janeiro, Typ. do Jornal do Commercio, 1901, Pgs. 12-23 microfilmada”. 24 A escola modelo anexa à Escola Normal de Niterói foi fartamente mencionada nas Mensagens. Sobre ela falou-se da construção do prédio, sua localização na cidade e até o número de dependências planejadas. Após sua inauguração, o foco desviou-se para as matrículas, professoras e inovações pedagógicas que ali se pretendia implantar. À escola modelo anexa à Escola Normal de Campos couberam, em geral, referências sobre matrícula e freqüência escolar. Em poucas mensagens podem ser encontrados relatos e críticas sobre a deficiência física de suas instalações. Sobre aspectos pedagógicos, a única referência foi feita às excursões pedagógicas feitas pela Profª de Pedagogia, Antonia Ribeiro de Castro Lopes, nos anos 1920. Essa referência evidencia evidencia a importância dessa professora no cenário fluminense, já que foi a única profissional do interior do Estado a ser citada nas n as mensagens presidenciais consultadas.
Tomadas inicialmente como subsídios para localizar, no discurso oficial, os antecedentes da criação da Escola Modelo “Seis de Março”, essas fontes, de riqueza inestimável para a história da educação fluminense, levaram-nos a outra trajetória. Ao buscar entender a história da escola que se constitui no objeto dessa dissertação de mestrado, tantos foram os dados da história fluminense que brotaram das Mensagens que, pouco a pouco, o cenário da educação do Estado foi, paulatinamente, se (re)compondo. Referências sobre o movimento inicial da república, as mudanças do final do XIX e as das primeiras décadas do XX, o debate em torno do projeto de nação; sobre a instrução pública, envolvendo envolvendo as condições dos prédios prédios e mobiliário escolares, os índices índices de matrícula e freqüência dos alunos; a legislação educacional; a estrutura administrativa do Estado e a formação de professores nas Escolas Normais de Niterói e Campos foram, recorrentemente, abordados pelos governantes, em suas Mensagens. Alguns desses dados serão referidos, brevemente, no texto. Os que se referem ao último tópico serão analisados no Capítulo 2 do trabalho. Na tentativa de contribuir com a historiografia educacional republicana até os anos 1930, examinamos como se deu, no interior fluminense, a evolução da escola pública primária, com seus artefatos culturais e seus métodos/metodologias, do ano de 1889 ao ano de 1930. Visando a dar um formato mais didático às inúmeras informações, as organizamos em dois blocos que, embora embora distintos, não são são independentes. independentes. O período de 1889 a 1915 compõe o primeiro bloco. O de 1916, quando foi criada a Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos a 1930, quando se encerra o período por nós estudado, compõe o segundo bloco.
1.2.1 PERÍODO DE 1889 A 1915
Em Mensagem Mensagem enviada ao Conselheiro Carlos Affonso de Assis Figueiredo, Presidente da Província do Rio de Janeiro, o Diretor de Instrução Pública, Dr. Manoel Ribeiro de Almeida diz:
O Brasil está passando por uma grande transformação. A escravidão, depois de uma agonia de poucos mais de 16 annos, é um cadaver sepultado no cemiterio da historia. Este facto basta so por si para elevar-nos no conceito das outras nações, como um grande passo dado no caminho do progresso [...]. Convem attender aos milhares de individuos que, sahidos da escravidão na maior ignorancia, sem crenças, sem noção dos deveres, precisam receber na escola a instrucção e educação necessarias para sua completa regeneração [...] ( Mensagem/1889, Mensagem/1889, p.S5-3-4).
Nesse discurso, escrito às vésperas da da Proclamação Proclamação da República, fica aparente aparente o papel regenerador, moralizador e salvador atribuído à Escola naqueles tempos, em que era preciso construir, no país e fora de suas fronteiras, a imagem de nação que ansiava pela ordem e pelo progresso. Na província fluminense, como no resto do país, era preciso desenvolver o sentimento de civismo que já envolvia a Nação do final do império, para o qual se tornava imprescindível o concurso da educação. Segundo Souza,
Educar pressupunha um compromisso com a formação integral da criança que ia muito além da simples transmissão de conhecimentos dados pela instrução e implicava essencialmente a formação do caráter mediante a aprendizagem da disciplina social- obediência, asseio, ordem, pontualidade, amor ao trabalho, honestidade, respeito às autoridades, virtudes morais e valores cívico-patrióticos necessários à formação do espírito de nacionalidade (2004, p.127).
De acordo com o Diretor de Instrução do Rio de Janeiro era preciso, também, elevar o nível pedagógico das escolas brasileiras, mas sem descaracterizar suas culturas 25 e modos. A respeito, diz o Sr. Manoel Ribeiro de Almeida:
Para educar [...] é fôrça abandonar o veso da imitação [...]. Não é possivel, sob pena de impor á indole de cada brasileiro uma tortura e ao futuro da Patria uma perversão, tentar fazer do educando, segundo as preferencias do pedagogo, uma copia do typo humano de qualquer das nações cultas que nos servem de exemplo [...]. Pelo contrario, a conservação das nossas qualidades caracteristicas, deve attrahir dobrados esforços dos educadores ( Mensagem 1889, Mensagem 1889, p. XXIX e XXVIII).
Instaurada a República, trataram os novos governantes, desalentados com a república idealizada posta em confronto com a república real, de mostrar ao povo o descaso com que, dizem, o império tratara a educação. Duas mensagens, a primeira do final do século XIX, a segunda do início do XX, deixam clara a situação em que se encontrava a instrução pública do Rio de Janeiro no início da Primeira República. Em Mensagem de 1 de agosto de 1892, o Presidente do Estado, José Thomaz da Porciúncula, relatou que “a instrucção publica achava-se de tal fórma decadente, tão abaixo do gráo de civilisação dos fluminenses, tão acanhada para corresponder ás exigências deste culto Estado, que sériamente compromettia o aproveitamento intellectual da nova geração
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Utilizamos aqui conceito de cultura escolar como objeto histórico, de Dominique Julia, descrita como como “um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão transmissão desses conhecimentos conhecimentos e a incorporação desses desses comportamentos” comportamentos” (2001, p.10).
[...]” ( Mensagem 1892, p.17). Também dirigindo-se à Assembléia Legislativa, em 1903, o Presidente Quintino Bocayuva, diz:
Por falta de estatisticas não posso offerecer-vos o quadro completo de nossa população ainda na idade escolar. Creio, porem, poder assegurar que na sua grande maioria a infancia ou não frequenta a escola ou si a frequenta por algum tempo retirase desde que adquire os primeiros rudimentos da instrucção primaria. Desse modo a instrucção que proporcionamos com tanto sacrificio, só nos fornece uma população semi-analfabeta (1902, p.16). Virtualmente a situação é esta: temos professores e não temos escolas. O pessoal é numeroso, mas o exercício escolar restringe-se em toda parte [...]. As reformas até aqui realizadas não têm produzido o desejado effeito. É um ramo de serviço que carece de uma nova orientação e de uma nova adaptação, tornando-se o ensino mais pratico e menos theorico ( Mensagem 1903, p.11).
Tornar o ensino menos teórico e mais prático, “elevar a organização do ensino no Estado ao grau de progresso a que attingiu a Pedagogia Moderna e que já haviam alcançados alguns dos Estados do Brazil 26”, requer um novo tipo de professor e uma nova escola, esta “signo da instauração da nova ordem, arma para efetuar o Progresso” (CARVALHO, 2003, p.11). Na tentativa de apresentar os fatos que, em nosso entendimento, mais contribuíram para a difusão e consolidação do ensino primário no Estado do Rio, estudamos as Mensagens dos Presidentes do Estado à Assembléia Legislativa desde o início da República. A seguir, recortamos aqueles aspectos que poderiam nos auxiliar a entender o contexto fluminense no período de existência da Escola Modelo “Seis de Março”. Em sua primeira gestão no governo do Rio, o campista Nilo Peçanha em Mensagem à Assembléia datada de 1 de agosto de 1905, exaltou os primeiros atos tomados logo após sua posse, que “tiveram em vista o preparo do professor, o prestígio das escolas normais (com o magistério sendo exercido por professores diplomados) e a melhor distribuição das escolas primárias pelo Estado”. Segundo ele, essas medidas resultaram num favorável quadro de aumento do número de alunos da escola pública estadual, elementar, de 7.640 alunos em 1903 para 9.183 no 1º trimestre de 1904. Esse clima de euforia não foi acompanhado pelo Presidente que se seguiu, Alfredo Backer, para quem, em agosto de 1909, a “instrucção publica no Estado está ainda muito longe do que é de desejar”, embora registrasse que a matrícula nas escolas primárias do estado
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Mensagem enviada á Assembléia Legislativa em 15/09/1900 pelo Presidente do Estado Alberto Martins Torres.
fôra de 20.083 alunos, com freqüência média de 12.419 alunos ( Mensagem 1910, p.48), dados significativos se comparados aos de cinco anos atrás. Para o Presidente, a solução do problema educacional resumia-se em duas decisões: “na difusão do ensino primario e profissional 27, principalmente agricola e na simplificação e gradação do plano de estudos”, e em prover as escolas de prédios e mobiliário adequados ( Mensagem 1909, p.13-14). A difusão do ensino profissional foi iniciada em 1916. A Lei n. 1367, de 23/11/1916, expedida pelo Presidente Nilo Peçanha, “autorisou o Poder Executivo a crear três ou mais escolas profissionais, onde mais conveniente fosse” ( Mensagem 1917, Agnello Collet, p.29). Como um ensaio, o governo criou, em Niterói, a 1ª escola profissional e industrial, a que denominou de “Visconde de Moraes” (1917, p.29). Quanto à simplificação e gradação do plano de estudos, sucessivas reformas se sucederam com esse objetivo. A respeito da falta de prédios escolares, essa preocupação não era exclusiva do Presidente Backer, mas própria do administrador público fluminense do início do século XX. São recorrentes, nas mensagens, relatos como o de Backer, em 1910: “das 389 escolas, 15 funccionaram em predios estadoaes, quatro em predios gratuitamente cedidos e 370 em predios alugados” (p.48). Um fato significativo, se considerarmos as idéias pedagógicas renovadoras que circulavam pelo país, foi a proposta feita à Assembléia, pelo Presidente Francisco Chaves de Oliveira Botelho, a fundação, em Niterói, de “uma escola modelo, para 600 alumnos de ambos os sexos, em edificio expressamente construido, dispondo de apparelhos e terreno para jogos, campo de demonstracção e modesto posto zootechinico, officinas, museu escolar, gymnastica, esgrima, etc.” ( Mensagem 1911, p.23). Essa escola representaria, no Estado, uma inovação pedagógica importante sob o ponto de vista do quantitativo de alunos que se propunha abrigar, por ser mista e por dispor de certos artefatos importantes na visão do novo ideário que começava a ser divulgado no interior dos estados mais prósperos 28, e que, segundo Carvalho configura um dos aspectos da “pedagogia moderna”, que é a pedagogia encarada como a “arte de ensinar”, na qual ensino e aprendizagem são práticas fortemente atreladas à materialidade dos objetos que lhes servem de suporte (2003, p. 122;126). 27
Neste período, a preocupação com a escola elementar era a constituição de um outro tipo de força de trabalho, que atendesse às mudanças que se anunciavam, na vida social, em função do aumento da industrialização e da chegada de imigrantes para trabalhar. 28 Ao ser inaugurada, na década de 1920, essa escola tão bem aparelhada provocou certo desconforto na direção da Escola Modelo “Seis de Março”, anexa à Escola Normal de Campos, que passou a exigir melhor espaço para trabalhar, além das duas salas que eram a própria Escola. Esse assunto será tratado no Capítulo 4.
Importantes medidas a respeito da instrução pública foram regulamentadas no ano de 1911, através do Decreto nº 1200, de 7 de fevereiro, completado pelo Decreto nº 1213, de 29 de maio do mesmo ano. Dentre elas, podemos citar: a criação do Conselho Superior de Instrução, com funções consultivas e deliberativas, “dependendo da resposta delle a nomeação, promoção, remoção e exoneração dos professores publicos, assim consultados o merecimento e o direito destes; o estabelecimento da inspeção escolar remunerada, mediante concurso; a divisão das escolas em ruraes e urbanas, e complementares; a instituição de subvenção para as escolas particulares ( Mensagem de Oliveira Botelho, 1914, p.143;146). Se no início do século XX freqüentavam a escola pública fluminense 5.130 alunos, na segunda década, em 1912, esse número elevou-se a 23.233 O ensino primário, reformado pelo Decreto 1200, compreendia, então, três graus, sendo dado em escolas subvencionadas (1º grau), em escolas públicas elementares (2º grau) e nas escolas complementares (curso integral). Os professores primários se dividiam entre efetivos e adjuntos. Continuou a desproporção entre o número de escolas estaduais e o de prédios públicos para abrigá-las, sendo que mais de 94% delas funcionavam em prédios alugados ( Mensagem 1912, p.19-21). Outro aspecto que merece destaque, nas Mensagens, é a atenção dada pelos governantes, principalmente a partir de 1912, à aquisição do mobiliário escolar, até então importado dos Estados Unidos. Nesse período se inicia a fabricação de móveis escolares pela indústria nacional. A partir de 1917, aproximadamente, as oficinas da Prefeitura e as da Escola Industrial Visconde de Moraes, em Niterói, passam a executar esse mister, e não se faz mais, nas Mensagens, referência à compra de mobiliário para as escolas, no exterior . Outro fato que marcou profundamente a educação na primeira república, com ênfase nas duas primeiras décadas, foi a criação, pelo Decreto Estadual n. 1211, de 18 de Maio de 1911, da Inspetoria de Higiene e Saúde Pública. O fortalecimento de uma higiene escolar influenciou de forma inquestionável a educação, em especial a primária e a formação de professores para atuar nesse nível. Além dos aspectos ligados à saúde dos corpos infantis terem provocado debates sobre mobiliário, posição do corpo na escrita e tipos de letras a serem usados na escola, também serviu, esta, de instrumento de divulgação de cuidados higiênicos do/pelo Estado, como se depreende das palavras do Presidente: “A Inspectoria de Hygiene distribuirá em breve ás escolas publicas, e fará publicar pela imprensa do interior, conselhos ao povo sobre a prophilaxia dessas molestias” ( Mensagem 1912, p.32).
As moléstias referidas são a tuberculose e o impaludismo, a última, sobremaneira, abundante na região. Era muito comum que professoras e médicos, que trabalhavam em áreas mais afastadas do município, fossem acometidos pelo impaludismo 29. Na carreira do magistério, uma função passou, no período, a ser bastante valorizada na administração do Estado. Trata-se da exercida pelo Inspetor Escolar 30, nomeado por concurso e última escala da carreira docente, como se depreende do registro feito por Oliveira Botelho: “Houve toda a vantagem na creação desse serviço pela severa vigilancia exercida, ao mesmo tempo que anima o professor a trabalhar, para alcançar essa ultima escala da carreira que abraçou” ( Mensagem 1912, p.22). Outro ponto a ser destacado, nesse primeiro bloco, foi a difusão, no Rio de Janeiro, do ensino primário, por meio de escolas “subvencionadas”. Essa questão, entretanto, não era regional. Pensava-se nela em nível nacional. No dia 2 de julho de 1913 reuniu-se, na Bahia, o Congresso de Instrução “para o qual foi convidado o Estado (do Rio), que nelle se fez representar, tendo sido nomeado, para esse fim, o lente interino da Escola Normal de Nictheroy, Dr. J. Bernardino Paranhos da Silva. O parecer conclusivo, abaixo transcrito, atendeu à seguinte questão proposta ao Congresso: “O ensino subvencionado convem ou não efficazmente para resolver o problema da diffusão do ensino entre o povo e para reduzir o analphabetismo?” [...] Esse regimen, segundo os moldes da organização pedagogica fluminense, ha de produzir em qualquer ponto do Brasil, especialmente entre as populações ruraes, os mais beneficos resultados no combate efficaz ao analphabetismo. Traduzidas em facto naquelle estado, desde a reforma de 1911, que as instituiu, as escolas primarias subvencionadas vêm prestando excellentes serviços á instrucção do povo, a troco da pequena despeza que é feita com ella. As escolas subvencionadas são ruraes, ministram ensino rudimentar, estão debaixo de rigorosa e assidua fiscalisação official, especialmente quanto á frequencia e ao aproveitamenro; para ser docente o candidato prova moralidade, bom estado de saúde e a habilitação geral necessaria; o Estado satisfaz as quotas fixadas á razão de 3$000 mensaes por alumno freqüente e de 20$000 de uma so vez por creança que haja sido approvada em exame final da escola. Como se vê a instrucção primaria subvencionada dentro destras condições comprehende estas vantagens: - facilidade de diffusão do ensino, zelo do professor, segurança da frequencia escolar, auxilio á iniciativa particular, economia relativa para 29
Ou paludismo. Dentre os entrevistados para as pesquisas sobre a Escola Normal de Campos (UENF) e sobre a Escola Modelo Seis de Março (Mestrado), o Dr. Germano Ribeiro de Castro Filho, médico em Quissamã e a Professora Yeda Cortes, esta em conversa informal por telefone, contaram terem adquirido a doença no local de trabalho.Também a Professora Stella Muylaert Tinoco Dias, ex-aluna das Escolas Modelo “Seis de Março” e Normal de Campos, teve tempo de serviço adicional contado, por ocasião da aposentadoria, por ter trabalhado em Mombaça, considerada zona paludosa. 30 Em 15 de junho de 1930 realizou-se o I Congresso de Inspetores de Ensino do Estado do Rio de Janeiro. “As duas sessões se realizaram nos salões da Escola Normal, e de sua importancia e resultados praticos dizem as magnificas theses que foram apresentadas, as idéas debatidas, as suggestões trazidas ao Governo, o que tudo constará dos respectivos Annaes, mandados organizar para documentar a acção proficua desses auxiliares do ensino” ( Mensagem de Manuel de Mattos Duarte Silva, 1930, p.74).
os cofres publicos e diminuição de futuras responsabilidades para elle. Assinado Mendes de Aguiar ( Mensagem de Oliveira Botelho, 1913, p.21).
Em 1915, volta ao governo do Estado do Rio, o Dr. Nilo Peçanha, que avaliou, sob outro prisma, o ensino subvencionado, considerado por ele “apparelho político”, no qual “as subvenções são concedidas, com raras excepções, a individuos incompetentes que muitas vezes nem residiam nos municipios para os quaes foram subvencionados. Acabar com esses professores improvisados era, pois, medida acertada, ainda mesmo posta de lado a questão financeira. Foi o que fiz”. Essa medida certamente valorizou a formação de professores feita nas escolas normais do Estado. Outra medida tomada por Peçanha foi a criação de cursos noturnos, em Niterói, para “proporcionar o ensino primario áquelles que, por negligencia dos responsaveis ou por falta de meios para frequentarem as escolas durante o dia, não recebem instrucção” e o estabelecimento, no Estado, das escolas profissionais. Declarando ser “a diffusão do ensino primario constante preocupação do Governo que não poupará esforços no sentido de multiplicar as escolas para que o ensino distribuido nos municipios não seja insufficiente, chegando a todos os districtos de paz” ( Mensagem 1915, p.44), o Presidente criou, no ano seguinte, a segunda escola modelo do Estado do Rio de Janeiro e única do interior: a Escola Modelo “Seis de Março” que implementará, em Campos, as novidades na área de educação. Esses fatos foram, a nosso ver, os que mais se identificaram com o objetivo desse “bloco”, que é contextualizar o processo de difusão da escola primária no Estado do Rio de Janeiro, nos primeiros anos republicanos. Inicia-se, a seguir, a descrição e análise do segundo bloco de informações, retiradas das mensagens presidenciais aos deputados fluminenses, nos anos de 1916 a 1930. 1.2.2 PERÍODO DE 1916 A 1930
No período de 1916 a 1930 intensifica-se, no Estado, a preocupação não apenas de expandir o número das escolas e dotá-las de professores, mas com o aspecto material do ensino para atender aos reclamos dos novos métodos, com destaque para o intuitivo 31.
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As referências a esse método podem ser encontradas nos Capítulos 4 e 5.
É num clima de entusiasmo e otimismo pela educação, que se materializa, no Estado do Rio de Janeiro, a existência da Escola Modelo “Seis de Março”, anexa à Escola Normal de Campos. Em 1916, foi oficialmente relatada sua presença no cenário educacional do Estado.
Estão funccionando no Estado 33 grupos escolares, uma Escola Complementar, duas Escolas Modelo (grifo nosso), 400 escolas isoladas, comprehendendo 421 professores cathedraticos, 15 interinos e 172 adjuntos, ao todo 608. A matricula nessas escolas é de 27.916 alumnos (assim distribuidos: nos grupos escolares e escola complementar e modelo32, 7.200; nas escolas singulares, 20.716); mais os 7905 das escolas municipaes somam 43.021 alumnos ( Mensagem de Nilo Peçanha, 1916, p.26).
Eram difíceis os tempos no Estado no segundo governo de Nilo Peçanha. Segundo o próprio, “pesavam sobre a administração publica encargos muito maiores do que n’aquelle tempo (1903 a 1906 ) e o Rio de Janeiro é, neste momento, dado o seu territorio e a sua população, o Estado que mais deve no Brasil 33” ( Mensagem 1915, p. 6-8; 12; 26). Embora considerando a instrução “o mais poderoso elemento de felicidade do povo” foi nesse campo que o governante implementou as mais duras medidas visando a sanear as contas, e moralizar a educação pública: suprimiu cargos administrativos; dispensou professores que não tinham o curso da lei, o que valorizou o curso normal; transferiu para o interior escolas em excesso nas cidades; incentivou a edificação de prédios escolares por particulares; preferencialmente, o material escolar passou a ser feito nas oficinas da prefeitura de Niterói e, a partir de 1917, na Escola Industrial Visconde de Moraes, em Niterói, e não mais mandado fazer no exterior, feita pela American Seating Company, fornecedora desse material a vários Estados da Federação ( Mensagem 1912, p.23). “Por medida de economia, várias obras [...] como o da Escola Normal de Niterói foram interrompidas (FERREIRA, 1989, p. 212). A falta de prédios para as escolas e a necessidade de edificá-los 34 foi preocupação presente no governo de Peçanha que, partícipe de um momento em que na vida nacional
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Segundo Nagle, “os cursos complementares constituíam etapas intermediárias e obrigatórias entre a escola primária e a normal [...]. Representavam um aprofundamento e desenvolvimento do programa escolar primário [...] e permitiam que a escolarização de nível primário avançasse pelo nível médio, ampliando o conteúdo de modo a se aproximar do da escola secundária” (NAGLE, 2001, p.282-283). 33 Segundo Ferreira (1989, p.207) esse segundo governo de Nilo Peçanha, “a despeito das dificuldades iniciais, inaugurou um período de estabilidade interna e de compromisso com o governo federal, o que reavivou as expectativas de projeção nacional de Nilo, bem como seu projeto de redefinir a posição do Rio de Janeiro no conjunto da federação”. 34 “Bastaria que todos os annos fossem construídos dez ou doze edificios nos logares em que maior fosse a frequencia dos alumnos e mais caros os alugueis. Essas casas teriam um corpo principal para a direcção, dividido por septos moveis em salas que comportassem folgadamente 50 alumnos, amplamente illuminadas e arejadas,
imperava o ideário higienista, considerava que as escolas funcionavam em prédios acanhados e escuros, sem ar, luz e conforto, não raro desasseiados, tristes e insalubres. Em 1916 eram “apenas 20 (das 400) que se encontram installadas em proprios estadoais” ( Mensagem 1916, p.24-25). A carência de acomodações era tão grande que o governo passou a incentivar a construção de escolas “do Estado”, por particulares, numa clara demonstração da fragilidade da iniciativa pública, com a educação pública. Assim é que na Mensagem de 1916, Nilo Peçanha citou, e aplaudiu, dois exemplos em que o fato aconteceu: os grupos escolares de Miracema e da Vila de S. Gonçalo foram construídos pela população dessas cidades e “seria de desejar que tão patriotica iniciativa fosse imitada pelas demais municipalidades, em uma mesma louvavel união de sentimentos com o Estado” (1916, p.25). Parece que o desejo se fez realidade, pois no ano seguinte, o presidente que o substituiu inaugurou “um amplo edificio preparado a capricho, em S. Fidelis”, enquanto em Pádua e Itaocara (todas cidades da região noroeste fluminense) “commerciantes e industriaes, lavradores e proprietarios acabam de constituir um grande ‘comite’ para acompanhar esse movimento que se alastra pelo norte fluminense” ( Mensagem de Agnello Geraque Collet, 1917, p.9). Além de ser possível perceber, nas Mensagens Presidenciais, mudanças, permanências e influências que facilitaram, ou entravaram, a expansão da escola primária fluminense, é possível, também, identificar, na fala oficial, os fenômenos “entusiasmo pela educação” e “otimismo pedagógico”. Os trechos por nós selecionados e transcritos são documentos que mostram a versão fluminense de um fato percebido, anos atrás, na pesquisa acadêmica, por Jorge Nagle. As falas que iremos apresentar mostram maior ênfase ou em relação à expansão da escola, ou em relação ao seu aspecto pedagógico. Entretanto, consideramos, como NUNES (1992, p.157) que a melhor leitura seria pensar na expansão da escola e em seu aspecto pedagógico como movimentos complementares, sem reforçar a visão polarizada difundida pela obra de Nagle, uma obra de seu tempo, que grande contribuição forneceu à história da sociedade e da educação da Primeira República.
assoalhadas e cobertas de telhas francezas ou de asbestos. Um pateo para o recreio e mais as necessarias installações sanitarias completariam o plano do edifício” ( Mensagem 1916, p.24).
Primeiramente serão apresentadas as idéias que mostram a “ampliação da oferta de vagas nas escolas para incorporar grandes camadas da população na senda do progresso nacional” (NAGLE, 2001, p.134), presentes nos relatórios dos Presidentes do Estado do Rio:
Instrucção, o mais poderoso elemento de felicidade do povo tem merecido os especiaes cuidados do Governo. Precisamos de muitas e sobretudo de boas escolas afim de bem podermos preparar a grandeza da Patria e a riqueza do Estado (Nilo Peçanha, 1915, p. 44). As consequencias economicas do desenvolvimento e do aperfeiçoamento da instrucção publica, serão tão vastas e tão valiosas como as suas consequencias moraes e sociaes (Agnello Collet, 1917, p.9). Posso annunciar-vos um accentuado movimento de progresso na instrucção primaria do Estado. Foram creadas em cumprimento de autorisação legislativa, muitas escolas nas zonas ruraes do Estado, outras foram mais bem localisadas (Agnello Collet, 1918, p.10). O problema da instrução publica é um dos mais delicados [...], estou convencido de que é nelle que se encontrará, principalmente, a solução definitiva da chamada questão social [...] (Raul Veiga, 1919, p.23). Será preparando novas gerações de brazileiros que honraremos os nossos maiores; fundando escolas e combatendo o analphabetismo, teremos, penso, prestado um dos maiores serviços ao nosso Paiz (Raul Veiga, 1920, p.27). A par de quanto o Estado tem feito, creando escolas, melhorando as já existentes, ideando e pondo em pratica meios varios para chamar a attenção das classes desprotegidas da sorte para as facilidades que os poderes publicos lhes offerecem para adquirirem instrucção [...] (Raul Veiga, 1921, p.50). Entendo, e commigo a maioria dos pensadores de bom quilate [...] que o governo deve ter por missão primordial [...] distribuir a instrucção do povo [...] (Raul Veiga, 1922, p.33). Na applicação da obrigatoriedade da matricula e da frequencia encontrar-se-a seguramente o mais efficiente dos meios para a sua consecução, orientando o ensino no sentido de altear o seu nivel ao mesmo tempo que deve ser tornado accessivel onde quer que haja um nucleo, pequeno embora, de população escolar (Feliciano de Abreu Sodré, 1924, p.44).
A partir de 1925 começa-se a perceber, nas Mensagens, certa inclinação para o “otimismo pedagógico”: já se pensa na adoção de novos métodos e processos de ensino para formar o “novo homem brasileiro” (NAGLE, 2001, p.134):
Em execução há pouco mais de um anno o Decreto n. 2.017 que deu novo Regulamento ás Escolas Normaes do Estado, vae produzindo, no sentido de preparar bons mestres, aptos a bem desempenhar a elevada missão de ministrar o ensino primario, base indispensavel a toda cultura scientifica e literaria (Abreu Sodré, 1925, p.44). No dia 14 de março ultimo [...] inaugurou-se (na Escola Normal de Niterói) o “gabinete de Psychologia Experimental” e todo o apparelhamento exigivel ante os actuaes professores da pedagogia [...] (Abreu Sodré, 1926, p.53). Idéas coordenadoras; principios aconselhados pela moderna pedagogia; experiencias filtradas em organizações modelares, que se impunham como uteis paradigmas; suggestões sabias e sanccionadas pela pratica; providencias efficazes reclamadas pela didactica, constituiram a fonte norteadora das reformas que, com feliz inspiração do momento levei ao bom termo (Abreu Sodré, 1927, p.86).
[...] Acreditamos ter chegado a opportunidade de crear na Escola Normal a necessaria cadeira onde seja possivel ao futuro professor aprender a utilissima applicação dos variados “tests” que interessam aos diversos graus de ensino (Manuel de Mattos Duarte Silva, 1928, p. 8). A Escola não póde ficar estacionaria e sobre reflectir a cultura de sua epoca, deve acompanhar a evolução ambiente. Primeiro que tudo notareis que, em todas as modalidades da reforma, em tudo o referente á educação, puz o patriotico empenho de instituir serviços, aconselhar providencias, adoptar formulas, ampliar institutos e exigir technica que, dentro das modernas correntes pedagogicas, sejam efficazmente cumpridas (Duarte Silva, 1929, p.54). [...] O Estado do Rio de Janeiro, dia a dia mais se afervora no altissimo proposito de figurar no nucleo victorioso dos que vêm prestando á causa da educação nacional os mais assignalados serviços (Duarte Silva, 1930, p.61).
No governo do Presidente Collet (1917-1918), alguns avanços no campo educacional puderam ser notados. Ao considerar que de todos os problemas afetos a um administrador republicano, nenhum tem maior importância que o da instrução popular, “sendo esta uma necessidade social, que domina todas as outras, pois que dela dependem a garantia da ordem, o amor á justiça e o culto á liberdade” , ( Mensagem 1918, p.9-10), adotou medidas que parecem ter sido eficazes, em especial sob o prisma pedagógico. Em seus dois anos de governo, o mobiliário escolar das escolas foi renovado, e livros didáticos para o ensino da leitura foram adquiridos e distribuídos de acordo com a freqüência das escolas 35. Esses livros eram fornecidos aos alunos pobres. Além dos livros, o governo mandou fornecer material que se fazia necessario ao ensino intuitivo nos grupos escolares” ( Mensagem 1918, p.11). Existiu, também, a preocupação em instalar as escolas públicas em melhores edifícios, de modo a evitar a aglomeração de crianças em prédios que não reunissem as indispensáveis condições higiênicas e pedagógicas. Outra ação significativa foi a uniformização dos programas das escolas normais, “de maneira a fornecerem o ensino com a desejavel extensão e igualdade” ( Mensagem 1917, p.33). Em dois anos (1915 a 1917), a mudança se tornou significativa: de 400 escolas isoladas o número subiu para 430; de 33, o número de grupos escolares passou a 37. Foi criada, no Estado, a primeira “Escola ao Ar Livre” 36; foram criados 4 cursos noturnos, e teve 35
Sendo feita a ressalva de que “mappas geographicos e de historia natural não existem actualmente no mercado, em consequencia da guerra européa” ( Mensagem 1917, p. 33) 36 “Foi creada por Decreto n. 1512, de 3/11/1916, na cidade de Campos, em local especialmente preparado na praça Nilo Peçanha, a primeira escola ao ar livre, com a mesma organisação das escolas urbanas, adaptando-selhe entretanto um regimen especial, compativel com a indole desse instituto de instrucção primaria. Inaugurada solemnemente em 5/11/1916, deu-lhe o Governo a denominação de Presidente Wencesláo Braz, como uma homenagem ao Exmo. Sr. Presidente da Republica, que se dignou de presidir ao acto inaugural” (Agnello Collet, 1917, p. 10). A propósito, a escassez de pesquisas históricas sobre o antigo Estado do Rio de Janeiro fez com que Nagle (2001, p. 310), ao falar sobre as primeiras iniciativas de penetração do movimento escolanovista no Brasil, citasse como exemplo a “escola ao ar livre” criada por Armanda Álvaro Alberto em Angra dos Reis, em 1919, sem referir-se à primeira, localizada em Campos.
início nas principais escolas de Niterói, as instituições “peri-escolares”, que visavam a facilitar a permanência dos alunos nas escolas 37. Em 1919, a Presidência do Estado passou a ser exercida pelo Dr. Raul de Moraes Veiga. Os efeitos da guerra mundial na economia brasileira fazem-se sentir. Continua o “entusiasmo pela educação”:
O nosso Paiz, embora affastado do theatro da guerra, em que seus filhos, entretanto, tomaram parte e bem se conduziram, soffre as consequencias do desequilibrio geral. A vida se tem encarecido [...]; estou convencido de que é na instrucção publica que se encontrará a solução definitiva da questão social que terá de ser, por força, mais grave nos paizes onde a escola fôr menos perfeita ( Mensagem 1919, p.5; 23).
Contudo, era muito precária a situação das escolas; “tanto as ruraes como as das cidades, estão desfalcadas de todo o mobiliario indispensavel 38, obrigados os professores á improvização de moveis os mais extravagantes, quando não são os pais dos alumnos que concorrem com bancos toscos para que seus filhos tenham onde se assentar”. Percebe-se a intenção do governo em construir prédios para neles reunir as escolas isoladas mais próximas, melhorando as instalações e libertando “o Estado do jugo intoleravel e pezado dos senhorios, fazendo-se com isso, senão economia, ao menos uma equitativa distribuição dessa despeza, com mais algum proveito para a hygiene, o conforto e a melhor distribuição do ensino, sob o ponto de vista pedagogico” ( Mensagem de Raul Veiga, 1919, p.26). A respeito, algumas ações efetivas começam a surgir, para além do mero discurso. Em Campos, dois prédios foram adaptados para abrigar os grupos Escolares “João Clapp” 39 e “15 de Novembro”, na zona urbana. Em Niterói, dois prédios foram arrendados para acomodar os Grupos Escolares 13 de Maio e Aydano de Almeida, e foram feitas obras no prédio em que funcionara a Escola Normal, para ser ali instalada a Escola Modelo e um Jardim de Infância anexo 40 . Em Macaé, o edifício abandonado onde seria a Beneficência Portuguesa foi
37
Uma dessas instituições foi a das “Caixas Escolares”, “destinadas ao impulsionamento da frequencia, auxiliando os alumnos pobres com o necessario vestuario, medicamentos, alimentação, etc.” (Mensagem 1918, p. 11). 38 Como, na época, a Escola Industrial Visconde de Moraes fazia o mobiliário do Palácio da Justiça, “foi aberta concorrencia para o fornecimento de 400 bancos-carteiras para as escolas da Capital e das grandes cidades do Estado. Ás cidades do interior foram destinadas as carteiras que foram substituidas por esses bancos-americanos” ( Mensagem 1919, p.24). 39 Nesse grupo escolar era feita a prática de ensino dos alunos-mestres da Escola Normal de Campos imediatamente antes da criação da Escola Modelo a ela anexa. 40 Este prédio necessitaria de reparos e de um pátio de ginástica para os alunos, além de “uma escola annexa, que grandes serviços prestaria como escola de applicação para os mesmos alumnos, ora obrigados a fazerem taes exercícios de applicação em Grupos Escolares distantes da Escola. Esses exercicios praticos, que familiarizam os
adquirido pelo estado. Em Valença foi “lançada a pedra fundamental” para a construção de um grupo escolar. A ampliação da rede escolar continuou a ser relatada pelo Presidente Veiga. O número de escolas singulares é de 441 (292 rurais e 149 urbanas). Existem 41 grupos escolares instalados, uma Escola Complementar em Niterói e, em Campos, uma Escola Modelo, anexa á Escola Normal. As escolas noturnas são em numero de 4, na capital. A matrícula nas escolas isoladas é de 30.655 alunos; nos grupos escolares é de 8.390 e nas escolas noturnas de 166 alunos, perfazendo um total de 39. 211 matrículas ( Mensagem 1919, p.31). Em 1920, o ensino primário, regulado pelo Decreto n. 1723, de 29/12/1919, foi complementado pelo regimento das escolas isoladas e grupos escolares, posto em vigor pela Deliberação n. 6, de 5 de março de 1920; continuou a ser professado nas escolas isoladas, nos grupos escolares e escolas noturnas, de acordo com programas de ensino também para esse fim organizados ( Mensagem 1920, p. 33). Foram revistos os programas de ensino das escolas primárias, “fazendo-se uma nova distribuição de materias mais consentanea com a epoca actual e os progressos da pedagogia, assim como foram, tambem, revistos e publicados os das escolas normaes (Raul Veiga, 1920, p.10). De acordo com Nagle, na década de 1920 a escola primária se transforma na mais importante instituição do sistema escolar brasileiro. O movimento que procurou transformar o ensino normal no Brasil, nessa década, resultou da superestimação da escola primária, pois as discussões, planos e reformas nesse tipo de ensino foram freqüentes, mas com o objetivo de ajustá-lo às novas funções da escola primária (2001, p.152).
Em Campos, foram construídos dois pavilhões sanitários para a Escola Normal e para a Escola Modelo, annexa a essa escola, no valor de 19:615$000” 41 ( Mensagem 1920, p.56), o que representou possibilidades de ampliação de matrícula, já que os banheiros eram comuns a ambas as escolas. Para comemorar o Centenário da Independência do Brasil, o Presidente Raul Veiga propôs-se a construir escolas. “Nas cidades onde serão construídos resaltam (sic) como os mais grandiosos edificios locaes” (1922, p.34). Realmente, os anos 1920 parecem marcar o período de construção de grandes Grupos Escolares, para acomodar grande número de alunos, no interior do Estado do Rio. Os Grupos alumnos com a profissão a que se destinam, são feitos em dois Grupos de seis series, que, na medida do possivel, vão supprindo a falta da escola annexa a que me venho referir”( Mensagem 1920, Raul Veiga p.34). 41 Nesse valor estão incluídos reparos feitos na residência do porteiro do Liceu e Escola Normal.
Escolares Pedro II, em Petrópolis e o de Valença foram erigidos para acomodar, respectivamente, 600 e 500 alunos. Em Nova Friburgo foi adquirido um terreno para a construção de uma escola para 500 alunos. Por sua vez, os grupos escolares de Macaé e Santo Antonio do Carangola estavam em fase de conclusão, tendo sido iniciada a construção do grupo escolar de Natividade e do de Aurora (São Francisco de Paula). Foram autorizadas as obras dos grupos de Parati, Santa Tereza de Valença, Itaocara, Cantagalo, Madalena, Bom Jardim e Teresópolis. É ainda manifestado, na Mensagem Presidencial, o desejo de inaugurar até o período final do Governo, 1922, a Escola de Aplicação dos alunos da Escola Normal de Niterói, com a Escola Maternal anexa. A procura da população pela escola pública 42, fez com que, nesse ano de 1922, se inaugurasse, no Estado, o sistema de turnos escolares. Uma inovação que só vai acontecer anos mais tarde (1926) na Modelo, de Campos. Sobre a Escola Normal de Campos, o Presidente registra que funciona em prédio próprio, que passou por algumas reformas, no prédio e no mobiliário, e que matriculou 128 alunos. E, pela primeira vez utiliza a denominação “Seis de Março” ao falar da Escola Modelo: “Annexo á Escola, como escola de applicação, funcciona a Escola Modelo 6 de Março, onde fazem os alumnos do 4º anno a pratica escolar” (1922, p.41). Dois anos depois, no governo do Presidente Dr. Feliciano Pires de Abreu Sodré, nova organização foi dada à Secretaria do Interior e Justiça, que passou a contar com três diretorias: do Interior e Justiça, da Saúde Pública e da Instrução Pública, esta com duas seções, uma destinada aos serviços do ensino normal, secundário e profissional, e outra ao ensino primário (p. 29, 30) e o fortalecimento do serviço de higiene escolar, “para assegurar ás creanças das escolas as melhores condições physicas e mentaes para o seu perfeito desenvolvimento e o maximo aproveitamento escolar”(p.32). Nesse ano fortalece-se, também, a parte essencialmente pedagógica do currículo da escola normal, principalmente na de Niterói, com a expedição, pelo governo, do Decreto nº 2.017/1924, que entre outras medidas,
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No caso particular da cidade de Campos, no período compreendido entre o fim do Século XIX e os vinte, ou trinta, primeiros anos da República, o número de escolas particulares suplantava o das públicas estaduais. Demonstram o fato anúncios publicados no jornal Monitor Campista e registros feitos por Horacio Sousa (1985) sobre Campos de 1835 a 1935. Quanto ao número das escolas municipais, nada podemos informar, por desconhecimento.
poz todas as condições para que o ensino professoral tenha um cunho pratico, verdadeiramente caracteristico, e para que se torne uma realidade a pratica escolar dos professorandos mediante o ensino da methodologia didactica. Nesse pensamento, manteve, com a anterior organização, a Escola Modelo, annexa á Escola Normal de Campos, e creou, com o mesmo caracter e sob a mesma denominação, a complementar, annexa á Escola Normal de Nictheroy, com duas professoras e quatro adjuntas, obediente ao programma dos grupos escolares e adminiculada de “jardim da infancia”, sob a immediata fiscalisação do respectivo director e com assistencia da cathedratica de pedagogia e methodologia didactica e a esse respeito praz sobremodo ao actual governo deixar consignado que está projectada a construcção do predio a esse fim, no qual serão estabelecidos museus de historia natural e de pedagogia, um gabinete de psychologia experimental, e um horto botanico para cujo estabelecimento será aproveitada toda a vasta area de terreno disponível (alínea “j”, 1924, p.39).
Essas alterações refletiram, positivamente, no campo educacional fluminense. Em relação à Escola Modelo “Seis de Março” marcou o que consideramos a segunda fase da escola, “fase de consolidação”, com ampliação do número de alunas e professoras, introdução de inovações pedagógicas 43, criação do segundo turno escolar e valorização da cadeira de Pedagogia e Metodologia Didática da Escola Normal de Campos, pela legislação educacional. Em relação ao campo educacional, as mudanças puderam ser sentidas nos índices percentuais. Os resultados obtidos pelo ensino primário são animadores e confirmados pelos números; a matricula total, em 1925, elevou-se a 43.366 e a freqüência média a 27.171, verificando-se uma diferença para mais, em relação ao ano letivo anterior, de 6. 760 alunos na matricula e 3.597 na freqüência media (p.48). Em seu último ano de governo, o Presidente Abreu Sodré fez um detalhado balanço de sua gestão, ocorrida no período de 1923 a 1926. Período em que foram implantados “principios aconselhados pela moderna pedagogia; experiencias filtradas em organizações modelares, que se impunham como uteis paradigmas; suggestões sabias e sanccionadas pela pratica; providencias efficazes reclamadas pela didactica” ( Mensagem de 1926, p.86), o que podemos considerar como um período importante para as escolas normais e suas anexas, do Estado do Rio, em que teoria e prática pedagógica se completaram e influenciaram mutuamente. Numa clara demonstração das “pedagogias” que circulavam no Estado, em 1927 foi instituído um
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“Nas escolas primarias o ensino se ministra obediente aos methodos modernos e rigorosamente observado o programma approvado pela Junta Pedagogica e a Deliberação nº 139, de 21 de fevereiro de 1927, que representa uma evolução nos nossos processos de ensino. Attendeu-se ás advertências da mais racional methodologia, inherente a cada disciplina e para melhor orientação se aconselharam os livros didacticos, que se harmonizam com o espirito e a finalidade do programma” ( Mensagem 1927, p.100).
“systema de selecção natural que garantira o accesso automatico, facil e gratuito, das grandes capacidades intellectuais que se forem revelando em qualquer ponto do territorio fluminense”44 [...]. Do mesmo modo acreditamos ter chegado a opportunidade de crear na Escola Normal a necessaria cadeira onde seja possivel ao futuro professor aprender a utilissima applicação dos variados tests que interessam aos diversos graus de ensino ( Mensagem 1928, p.8).
Claramente se delineia, no cenário fluminense, a mudança da pedagogia “arte de ensinar” para a pedagogia “experimental, científica 45”. Ainda como prova da influência escolanovista, encontramos registro da realização de Conferências Nacionais de Educação, promovidas pela Associação Brasileira de Educação, em duas fontes. Uma é Nagle (2001, p.163), que diz terem sido três as Conferências, realizadas em 1927 (Curitiba), 1928 (Belo Horizonte) e 1929 (São Paulo). A outra fonte é a Mensagem do Presidente Duarte Silva (1930, p.89-90), que diz ter o Rio de Janeiro participado da II Conferência (através do Dr. Jayme de Barros), e da III Conferência. Nesta, o Estado contribuiu com seis teses, dentre elas um trabalho da professora de Pedagogia da Escola Normal de Campos, Antonia Ribeiro de Castro Lopes (1929, p.98). Como considerações finais, apresentaremos, a seguir, quadros que nos permitirão perceber a situação da educação fluminense em relação à educação primária, mantida pelo Estado, em 1916 e em 1929. O recorte temporal é limitado pela criação da Escola Modelo “Seis de Março” e pela última estatística, completa, existente nos relatórios presidenciais, no caso, na Mensagem do Presidente do Estado Dr. Manuel de Mattos Duarte Silva, 1929. Os dados numéricos sobre escolas, prédios escolares, professores e matrículas da rede estadual, primária, do Estado do Rio de Janeiro, no período, possibilitam-nos estabelecer algumas conclusões sobre a ampliação da escola primária no Estado, na Primeira República. No final dessa era, o ensino primário era administrado em escolas de três graus: o elementar, com duas séries, nas de 1º grau; o médio, com três séries, nas de 2º; o integral nas de 3º- grupos escolares, com cinco séries. Posta essa informação, passemos aos dados:
Dados da Educação Fluminense na Primeira República - 1916 e 1929 44
“Esse processo consiste, como já se dirige ao ser adoptado, as intelligencias supra-normaes, procurando aproveital-as nos cursos successivos. Com esse processo é possivel isolar a creança ultra intelligente do mais obscuro recanto do Estado e, de selecção em selecção, atraves das escolas de 2º gráo, dos grupos escolares, dos lyceus e outros estabelecimentos de humanidades, conduzil-a até ás mais graduadas academias de especialização” ( Mensagem 1930, p.9). 45 No Distrito Federal várias experiências estão em curso, dentre elas o famoso “Teste ABC”, criação de Lourenço Filho. Na Escola Modelo “Seis de Março”, nos anos subseqüentes, podem ser encontradas listas de pedidos de instrumentos para medir e testar as habilidades infantis.
Discriminação dos Itens / Anos
ESCOLAS Grupos Escolares Escolas Complementares Escolas Modelo Escolas Isoladas Escolas de 1º grau Escolas de 2º grau Escolas maternais Jardins de infância Escolas subvencionadas diurnas Escolas subvencionadas nocturnas Escolas nocturnas Cursos annexos ás escolas profissionaes TOTAL PRÉDIOS Prédios estaduais Outros: Cedidos por municipalidades Cedidos por particulares Alugados pelo Estado TOTAL
1916 1929
33 1 2 400 436
62 2 2 400 353 4 3 81 59 4 2 972
20
47
380 400
17 157 574 795
Discriminação dos Itens / Anos
MATRÍCULAS Por escolas Grupos Escolares Escola Complementar Escolas Modelo Escolas Isoladas/ Singulares Por séries Maternal e Jardim de Infância 1ª série 2ª série 3ª série 4ª série 5ª série Complementar TOTAL PROFESSORES Catedráticos Catedráticos efetivos Catedráticos interinos Adjuntos Adjuntos efetivos Adjuntos interinos Adjuntos estagiários Interinos Diretores Professores Subvencionados TOTAL
1916
1929
7.200
-
20.716
-
704 74.927 10.363 3.476 1.268 665 230 27.916 91.633 421 508 257 172 466 202 366 15 68 140 608 2.007
Dados coligidos a partir das mensagens dos Presidentes do Estado- 1916/1929
Percentualmente, o aumento do número de escolas, consideradas apenas os Grupos Escolares, Escola Complementar, Modelo e Isolada/Singulares/ de 1º e 2º grau, foi de 123% 46. A matrícula, seguindo o mesmo critério, cresceu 228%. O número de professores primários foi aumentado em 230%. Em relação à evolução do número de professores no Estado do Rio entre 1916 (608 professores) e 1929 (2.007 professores), o que os dados mostram é que, embora o crescimento tenha sido na ordem de 230%, o número de professores sem a formação nas Escolas Normais é bastante acentuado. Dentre os 765 professores catedráticos, somente 537 são diplomados; dentre os 1.034 adjuntos, só 751 são diplomados, o que equivale dizer que somente 42% dos 46
Não estão incluidas as escolas subvencionadas pelo Estado que, extintas em 1915 por Nilo Peçanha foram reativadas em 1925, por Feliciano Pires de Abreu Sodré, que assim diz: “ Foi estabelecido o regimen de subvenção para escolas diurnas ou nocturnas de ensino elementar, mantidas por associações ou particulares [...]”. ( Mensagem 1925, p.45).
professores catedráticos e 38% dos adjuntos têm a formação profissional mínima para exercer as funções docentes. Observa-se, como fator importante, a expansão das escolas particulares subvencionadas pelo governo. Em 1916, não havia nenhuma. Em 1929, são 140. Esse dado deve ser levado em consideração quando se analisa a qualidade da educação escolar ofertada, pelo Estado do Rio de Janeiro, a suas crianças e jovens. A par dos números, a principal marca do período é o fortalecimento da escola pública. Os índices mostram que, a despeito das precárias condições dos prédios escolares, deficiência de equipamentos e professores, os números de escolas e escolares dobraram no período aproximado de quinze anos. Se os processos de ampliação da rede estadual do Rio de Janeiro na Primeira República, e de escolarização da população fluminense, revestiram-se dos requisitos indispensáveis à educação democrática e de qualidade pretendida nos planos republicanos, somente um estudo mais aprofundado poderá atestar. É nesse contexto de expansão da escolarização e circulação de idéias pedagógicas renovadoras que surge, em 1916, a Escola Modelo “Seis de Março”, anexa à Escola Normal de Campos.
CAPÍTULO 2 HISTORICIZANDO A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA ESCOLA NORMAL
Neste capítulo pretendemos historicizar a criação da Escola Normal no Ocidente, sua origem confessional, tornada laica e pública na França após o movimento de 1789 e sua introdução, no Brasil, em Niterói, província do Estado do Rio de Janeiro, em 1835, e a que existiu na cidade de Campos de 1895 a 1954. Alcançar esse objetivo constitui duplo desafio: o primeiro, nos remete aos inúmeros trabalhos sobre o tema, o que impede qualquer tentativa de originalidade e nos leva a, por muitas vezes, repetir outros autores. O segundo, consiste em tentar contribuir com as reflexões sobre a consolidação do projeto Escola Normal, enfatizando a experiência, no Estado do Rio de Janeiro, das Escolas Normais de Niterói e Campos 47. A de Niterói, através da escrita de sua história por Lacerda Nogueira (1938) e dos trabalhos acadêmicos de Heloisa Villela (1990; 1992; 2002; 2003). A de Campos, pelos trabalhos produzidos 48 com base em pesquisa desenvolvida no Laboratório de Estudos de Educação e Linguagem (LEEL) do Centro de Ciências do Homem (CCH) da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF).
2.1 O PROJETO ESCOLA NORMAL: DE SUA GÊNESE CONFESSIONAL, A UMA INSTITUIÇÃO LAICA E PÚBLICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Há consenso, entre os historiadores, a respeito da origem confessional da iniciativa de formalizar um curso de formação de professores, no Ocidente. De acordo com Villela (1992, p.22) “as raízes da Escola Normal remontam, certamente, às iniciativas da Reforma e da Contra-Reforma, a experiências como o seminário de formação de professores leigos de Jean Baptiste de La Salle, ao movimento pietista alemão 47
Não cabe nesse trabalho analisar a Escola Normal da Côrte, importante centro de formação de professores do antigo Distrito Federal. 48 Alguns desses trabalhos, desenvolvidos em parceria por Martínez e Boynard encontram-se inseridos na bibliografia dessa dissertação. Abordam as memórias da Escola Normal de Campos (1894-1954) e as do Instituto de Educação de Campos (1955), usando as categorias de análise memória, cultura escolar e gênero e a metodologia da história oral. Outro documento, o Relatório FAPERJ elaborado por Martínez (2004) foi essencial à elaboração do item “Escola Normal de Campos”, nesse Capítulo.
[...]”. Somente durante a Revolução Francesa se concretizaria, pela primeira vez, a idéia de uma instituição pública e laica destinada a formar professores para a instrução primária” (VILLELA, 1992,p.22). Com ela concorda Martins (1996, p.54-55), que acrescenta que “a Reforma e a Contra-Reforma nos forneceram subsídios para compreender os rumos da educação a partir do século XVI [...], quando começaram a ser criadas condições para a publicização do ensino elementar, o que facilitou o crescimento da discussão sobre a necessidade de formar professores, para suprir essa nova exigência da educação formal 49. Alicerçada pelos ideais do movimento francês, pelas idéias liberais, é no início do século XIX que a formação de professores em Escolas Normais, laicas e públicas, adquire relevância, cabendo ao professor o papel de agente a serviço de um Estado Nacional que se construía a partir daquele momento; “a educação assumiu um papel de destaque no processo de construção de ‘novo homem’, o ‘cidadão ilustrado’ (MARTINS, 1996, p.57). A propósito, Alves (1992) afirma que ao fixar-se num ideal de povo ilustrado, o que está sendo proposto, no momento em que se constitui a categoria de cidadão, é que só participem do pacto do poder aqueles que forem considerados aptos para tanto. Nesse contexto, a atividade pedagógica assume uma feição civilizadora. A educação é o pressuposto da cidadania, cabendo a ela incutir o patriotismo e a consciência da nacionalidade. Ela encarna o ideal ambíguo de libertar as consciências e manter o controle social (p.52-53).
Assim, o estabelecimento das escolas destinadas ao preparo específico dos professores para o exercício de suas funções está ligado à institucionalização da instrução pública no mundo moderno, ou seja, à implementação das idéias liberais de secularização e extensão do ensino primário a todas as camadas da população (TANURI, 2000, p.62). O século XX, acrescenta Martins (1996, p.65), foi marcado por um esforço significativo para efetivar os sistemas nacionais de educação. Propagaram-se por toda Europa e também nas Américas, as Escolas Normais. Através do trabalho de Villela (1990, p.120-121) foi possível entender o cenário em que foi criada a primeira escola destinada a formar professores, no Brasil. Para a autora, manter a ordem e difundir a civilização era o mote da ação da classe dirigente da província fluminense, logo após o Ato Adicional de 1834.
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“Seis anos após a revolução burguesa na França, é criada uma Escola Normal totalmente leiga. Teve vida breve, funcionando apenas de janeiro a maio de 1795, mas deixou importantes marcas, sendo a principal delas o ‘caráter eminentemente científico” (MARTINS, 1996, p. 61-62).
Na construção dessa nova ordem, os dirigentes fluminenses tiveram como uma de suas primeiras preocupações a formação do professor, como ponto de partida para o exercício de uma direção. Criar a carreira do magistério era tornar esse professor um agente do governo do Estado capaz de estabelecer cotidianamente, no espaço escolar o nexo instrução-educação propiciando, por meio da formação disciplinada dos futuros homens e cidadãos, a sua inclusão numa civilização.
A primeira escola normal brasileira foi criada na cidade de Niterói, pela lei nº 10 de 4 de abril de 1935, cujo Art. 1º dizia:
Havera na capital da provincia do Rio de Janeiro uma escola normal para n’ella se habilitarem as pessoas que se destinarem ao magisterio da instrucção primaria, e os professores actualmente existentes que não tiverem adquirido a necessaria instrucção nas escolas de ensino mutuo, na conformidade da lei de quinze de outubro de mil novecentos e vinte e sete, artigo quinto (VILLELA, 1990, p.122).
Por essa lei imperial que “manda criar escolas de primeiras letras em todas as cidades,
vilas e lugares mais populosos do Império”, os professores precisavam dominar a instrução do ensino mútuo ou lancasteriano. Nogueira (1938, p.27), ao relatar os primeiros tempos da Escola Normal de Niterói, diz que esse método “era muito simples, favorecia a multiplicação de divisões nas classes pela transmissão dos conhecimentos ao grau de capacidade de cada um, suscitando actividade generalizada. Circumscrevia-se ás matérias elementares, revelando-se o tacto do instructor na escolha dos monitores: grupos de dez alumnos, decurias, dirigiam-nos outros menos ignorantes, decuriões”. Do ano da criação da Escola Normal de Niterói até o ano de 1881, Tanuri (2000, p. 65) registra a criação de vinte escolas normais no Brasil, a maioria criada e só implementada anos mais tarde, e apresenta o fato de que todas elas tiveram conturbados momentos de declínio, encerramento periódico de funções ou mesmo extinção de funcionamento 50. A autora enumera, ademais, algumas características comuns às primeiras escolas normais instaladas no país: eram dotadas de infra-estrutura física e humana deficiente; o currículo era muito primário e a formação pedagógica limitada à cadeira de Pedagogia. A partir de 1868, até aproximadamente 1870, transformações de ordem ideológica, política e cultural levam à crença de que ‘um país é o que a sua educação o faz ser’ e a difusão do ensino passou a se encarada como indispensável ao desenvolvimento social e econômico 50
Como parece ter sido o caso da Escola Normal de Barra Mansa, fechada juntamente com a de Campos, em 1900, e não mais reaberta.
da Nação (BARROS, 1959, p.23 apud TANURI, p.66). É nesse contexto, quando se consolidam as idéias liberais de democratização e obrigatoriedade da instrução primária, bem como de liberdade de ensino, que as escolas normais passam a se firmar no campo educacional.
Na transição do Império para a República, a Escola Normal, da mesma forma que o sistema educacional, pouca significação teve no panorama social do país. O ingresso no século XX despertou entre os liberais republicanos a idéia da educação como salvação dos males sociais e equalizadora de oportunidades. A formação de professores competentes e versados nas inovações educacionais ganhou força (ALMEIDA, 1994, p.76).
Foi, porém, durante o período republicano que esse tipo de escola experimentou um desenvolvimento mais acelerado e se efetivou como instituição responsável pela qualificação do magistério primário; embora ainda estivessem subordinadas a interesses políticos e econômicos dos grupos dominantes, os estados organizaram, ao sabor de seus reformadores, os seus respectivos sistemas. No Estado de São Paulo 51, pólo econômico do país, “a atuação dos reformadores permitiu que se consolidasse uma estrutura que permaneceu quase que intacta, em suas linhas essenciais, nos primeiros trinta anos da República e que seria apresentada como paradigma aos demais estados, muitos dos quais organizaram seus sistemas a partir do modelo paulista” (TANURI, 2000, p.68). De acordo com Almeida (2004, p.74), “na primeira metade do século XX, a Escola Normal alicerçou-se como instituição procurada também pelos segmentos médios, estando incumbida de formar os futuros quadros profissionais que o Estado necessitava para o ensino primário”. É a mesma autora que nos fala sobre o processo de feminização do magistério que começa a ser notado. Referindo-se ao Estado de São Paulo, diz: As cidades do interior viram florescer vários estabelecimentos de ensino para onde iam as filhas dos fazendeiros, dos ricos negociantes e profissionais liberais da região onde se localizavam [...]. Compunha-se assim um cenário no qual a educação feminina passou a ser importante, devidamente atrelada, em todos os níveis à ‘destinação natural’ das mulheres para lecionar e sempre em estreita ligação com o universo doméstico [...]. As escolas normais deveriam formar professores para um desempenho pedagógico calcado no humanismo, na competência e nos valores sociais. Essa educação, em nível médio e com um objetivo definido deveria bastar, e as jovens brasileiras cresceriam com o destino profetizado de serem esposas, mães, e em caso de necessidade, professoras. Nesse contexto, a Escola Normal voltava-se para a educação feminina como parte do projeto civilizador da nação e cumpre funções de educar e 51
Nesse estado, a reforma do ensino começou pela Escola Normal. Caetano de Campos, então diretor da Escola Normal de São Paulo, tomou a iniciativa e elaborou, com Rangel Pestana, o decreto de 12 de março de 1890. Inspirando-se no exemplo de países como Alemanha, Suiça e Estados Unidos, Caetano de Campos entendia “que devemos estudar nesses povos a maneira de ensinar, considerando, porém, a necessidade não de adotar, mas sim adaptar esses métodos à nossa necessidade” (REIS FILHO, 1995, p.76 apud SAVIANI, 2004, p.23).
instruir as futuras mães, as donas de casa encarregadas da educação familiar e do fortalecimento da família (ALMEIDA, 2004, p.74-75).
A fase que se segue à Primeira Guerra e se prolonga por toda a década de 1920 é de preocupação e entusiasmo pela problemática educacional, em âmbito nacional e internacional. A divulgação dos princípios e fundamentos do movimento escolanovista fundamenta as reformas estaduais do ensino primário e normal. No caso do Estado do Rio de Janeiro cabe citar a reforma de 1912 (Decreto nº 1241, de 13 de março), que desdobrou os estudos do curso normal em dois departamentos: a escola normal propriamente dita, destinada ao ensino profissional teórico; e a Escola Modelo ou escola anexa, de aplicação, destinada à prática profissional, o que já configura uma preocupação maior com a formação de um professor mais bem preparado para uma escola que se anunciava no cenário europeu e americano. No final dos anos de 1920 já havia alterações significativas na instituição Escola Normal. Novos currículos e práticas, dentre elas a atenção dada às escolas modelo ou escolas de aplicação. Não foi somente nesse nível que a introdução das idéias da Escola Nova na legislação escolar foi sentida. Em 1932, Anísio Teixeira implementou reforma na Escola Normal do Distrito Federal, transformando-a em Instituto de Educação, fato que produziu importantes ramificações em todo o país.
Movimento semelhante ocorreu em São Paulo com a reforma realizada por Fernando de Azevedo em 1933. Estava definido o modelo a ser adotado por outras unidades da federação configurando-se as grandes linhas que informariam a organização dos cursos de formação de professores até a Lei 5692/71: a preocupação central do currículo da Escola Normal desloca-se dos “conteúdos” a serem ensinados para os métodos e processos de ensino, valorizando-se as contribuições da Psicologia e da Biologia (TANURI, 2000, p.74).
De 1942 a 1946 as chamadas “Leis Orgânicas do Ensino” regulamentaram a organização e funcionamento de todos os tipos de ensino no país. O Decreto 8530/1946 estabelecia como finalidades do curso normal promover a formação do pessoal docente necessário às escolas e desenvolver e propagar os conhecimentos e técnicas relativas à educação da infância.
A estrutura do curso compreendia dois níveis: como curso de 1º ciclo passava a funcionar o curso de formação de regentes de ensino primário, com a duração de 4 anos, que funcionaria em escolas com o nome de Escolas Normais Regionais. Como cursos de 2º ciclo continuavam a existir os cursos de formação de professor primário, com a duração de 3 anos, que funcionariam em estabelecimentos chamados Escolas Normais. Além das Escolas Normais Regionais e das Escolas Normais foram criados
os Institutos de Educação que passaram a funcionar com os cursos citados acima, mais o Jardim de Infância e a Escola Primária anexos e os cursos de especialização de professor primário e habilitação de administradores escolares (ROMANELLI, 2003, p.164).
Outras mudanças, pela força das leis, alteraram a estrutura organizacional das escolas normais como um todo, refletindo-se na formação dos professores. Dentre elas, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 4024/61, que equiparou os cursos de ensino médio. “No Estado do Rio de Janeiro utilizaram-se escolas de segundo ciclo de grau médio para preparação de seus professores primários” (TANURI, 2000, p.78). Outra legislação, a Lei de Diretrizes e Bases 5692/71, que instituiu a profissionalização obrigatória do Ensino de 2º Grau, estabeleceu que as diversas unidades de ensino oferecessem, aos alunos, diferentes habilitações, o que fez com que o Curso Normal perdesse sua identidade e especificidade. “A legislação, ao defender escolaridade obrigatória dos 7 aos 14 anos, proporia a formação profissional dos professores que iriam atuar nas séries iniciais do 1º grau através de uma habilitação de 2º grau, a “Habilitação Específica de 2º grau para o Magistério”, extinguindo assim o Curso Normal” (ALMEIDA, 2004, p.91-92). A última das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9394/96 estabelece que “a formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação” (Art. 62 da Lei), abrindo uma grande polêmica que não cabe nesse texto discutir. Após esta sintética apreciação sobre a trajetória da formação de professores em escolas normais, desviaremos o foco para as duas escolas normais que durante algum tempo se constituíram nas únicas do tipo, no interior do Estado do Rio de Janeiro: a de Niterói e a de Campos.
2.2 A ESCOLA NORMAL DE NITERÓI, A PRIMEIRA DO BRASIL
Segundo Lacerda Nogueira, a Escola Normal criada em 1º de abril de 1835, em Niterói, visava a
encaminhar ás suas classes, afim de melhor se habilitarem, indivíduos predestinados ao sacerdocio da instrucção primaria, e também os mestres que não tivessem adquirido o necessario preparo nas escolas de ensino mutuo, na conformidade da lei imperial de 15 de outubro de 1927” (p.19) [...] Naquellas estancias heroicas do nosso ensino publico a Escola Normal forçosamente cumpriria missão relevante e centripeta, bitolando o preparo dos mestres de instrucção primaria. Urgia adextrar o professor e a
seguir montar o collegio e receber o alumno, cerebro plastico trabalhavel pelo guieiro official, responsavel pela modelagem da mentalidade do futuro cidadão (NOGUEIRA, 1938, p.24).
Pode-se apreender, nas palavras do autor, a função da primeira escola normal brasileira: formar/ treinar novos professores ou aqueles já em atuação, para, sendo o “guieiro oficial”, pôr na bitola (medida reguladora; padrão, modelo, norma); adestrar (palavra derivada de destro, que por sua vez deriva de passal, significando também uma forma de medida); modelar seus alunos, futuros cidadãos. Assim era necessário [...] “civilizar para melhor conhecer e controlar o povo” (MATTOS apud VILLELA, 1992, p.28). Criada pela força de um grupo político, “os saquaremas”, a Escola Normal de Niterói, em sua origem serviu para consolidar e expandir os objetivos e interesses da classe política hegemônica daquela província, diz-nos Villela (1992, p.25-28). Sua trajetória não foi linear nem tranqüila. Foi ultrapassando vários empecilhos que a Escola Normal de Niterói conseguiu se impor no cenário regional, como escola de formação de professores. Sua trajetória, como a de tantas outras escolas do tipo, foi interrompida e retomada, por mais de uma vez. Sua existência em parte do período imperial foi estudada por Heloisa Villela; até 1930, é possível encontrar algumas referências à Escola, como número de formandos, nas Mensagens enviadas pelos Presidentes do Estado do Rio; até 1935, aproximadamente, é possível também encontrar informações em Lacerda Nogueira. A partir dessa data nada foi encontrado na revisão feita na bibliografia, o que nos levou à pesquisa virtual, onde encontramos as seguintes informações no Arquivo do Jornal Educação Pública, CECIERJ52, de 11/ 09/ 2001:
Criada em 1835, foi pouco seu tempo como Escola Normal. Na Reforma do Ensino de 1847, foi incorporada ao Liceu Provincial, juntamente com a Escola de Arquitetos Medidores e o Colégio das Artes Cênicas. Foi restabelecida em 1862, como escola mista. Em 15 de abril de 1890, no primeiro governo republicano de Francisco Portela, a Escola Normal foi novamente extinta, sendo reabsorvida pelo Liceu de Humanidades de Niterói, agregada como simples cadeira pedagógica. Aos poucos, de reforma em reforma, vão ressurgindo as cadeiras do Curso Normal e, por fim, em 1900, a própria Escola Normal. Em 15 de janeiro de 1931, foi criado junto à Escola Normal o Curso Ginasial, ambos sob a denominação de Escola Normal de Niterói e Liceu Nilo Peçanha. No ano de 1938 - por um decreto do interventor do Estado do Rio, Almirante Ernani do Amaral Peixoto - a Escola Normal e o Liceu Nilo Peçanha passaram a se chamar Instituto de Educação do Estado do Rio de Janeiro. Desligado do Liceu em 1954, passou a ser chamado Instituto de Educação de Niterói. A denominação de Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho, IEPIC, foi adotada em 1965, como homenagem a uma das grandes figuras do magistério fluminense. (http://www.educacaopublica.rj.gov.br/jornal/sub_mat.asp?seq=16&sub_mat=1) 52
Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro.
Sem maiores referências historiográficas que nos permitam tratar a história da Escola Normal de Niterói no período da Primeira República, abordaremos, a seguir, parte da história da Escola Normal de Campos.
2.3 A ESCOLA NORMAL DE CAMPOS Campos tem duas horas alegres, profunda e eminentemente alegres: uma pela manhã e a outra à tarde. A primeira hora alegre da cidade reside à rua Treze de Maio, a segunda instalou-se na Praça São Salvador, no ponto dos bondes. Mas quem faz essas duas horas alegres e cheias de vigor, plenas de mocidade, ricas de alvoroço, transbordantes de alegria e de reverência não é propriamente o povo, mas sim as estudantes dos nossos diversos estabelecimentos de ensino, as senhorinhas que pela manhã se dirigem às escolas e à tarde regressam dos estudos. Quantas são? Mais de duas centenas. [...] Há o grupo das liceanas: saia de brim caqui e blusa de seda palha. É o mais numeroso. Há o grupo das normalistas, o último e definitivo ano, pois como se sabe a Escola Normal integrou-se ao Liceu. As normalistas trajam saia azulmarinha e blusa branca. Pois são essas almas femininas que fazem a hora alegre e matinal da rua Treze de Maio. Mal a nossa principal artéria desperta e recomeça a labuta de todos os dias, ei-las que chegam sorridentes, sobraçando pastas, empunhando livros para ocupar seus respectivos pontos, onde esperam os bondes da linha Estação do Saco. E ao fim do dia, quando a labuta vai cessando, quando a tarde entra em agonia [...], surge a segunda hora alegre de Campos, agora na Praça São Salvador, no clássico ponto dos bondes. São elas ainda, são as estudantes que regressam do Liceu, da Escola Normal, do Colégio Bittencourt recordando as peripécias do dia e comentando os acontecimentos das aulas num vozear alegre como um bando de pardais que se recolhe à fronde amigas das árvores, como uma nuvem de andorinhas que procura a quietude dos beirais (Fragmento do Jornal Monitor Campista do dia 24 de maio de 1933, intitulado “Impressões da cidade”).
Num contexto nacional de grandes mudanças, no qual a sociedade brasileira convivia com a introdução de novas tecnologias, crescimento industrial e demográfico, crescente processo de urbanização e alteração nos padrões de poder, a região norte fluminense e a cidade de Campos 53 , tradicional na produção de açúcar, café e pecuária sentiram essas alterações de modo profundo. A uma oligarquia de fazendeiros e senhores de engenho veio se juntar, entre 1870 e 1900, uma nova elite, formada principalmente, por intelectuais, jornalistas, comerciantes, imigrantes, profissionais liberais, políticos (FARIA, 2001, p.790). Foram o espírito progressista e a força combativa desses últimos grupos, muitos dos quais pertencentes à maçonaria54- instituição da qual tomava parte a maioria de representantes da política, 53
Com uma população estimada em 426.212 habitantes distribuídos numa área de 4.032 Km2, a cidade de Campos está situada ao norte do Estado do Rio de Janeiro. 54 Eram maçons e tiveram lugar na história do Liceu e da Escola Normal: Nilo Peçanha, Quintino Bocayuva, Candido de Lacerda, José do Patrocínio, Joaquim Ribeiro de Castro, Antonio Joaquim de Castro Faria, Sebastião Viveiros de Vasconcellos, dentre outros. Essa questão não será aprofundada nesse trabalho.
comércio e intelectualidade local- os responsáveis pela contribuição, reconhecida nacionalmente, da região campista aos movimentos republicano e abolicionista. Desse modo, ao considerarmos ter sido a criação do Liceu de Humanidades de Campos o resultado de um projeto de formação de elites intelectuais desde fins do século XIX, a criação da Escola Normal a ele anexa, pode ser compreendida como um projeto de formação de professores no interior desse projeto maior de uma fração oligárquica de Campos, que, além de pensar em formar elites intelectuais que elevassem a região na política estadual e nacional, tinha o objetivo de transformar a cidade de Campos na capital da Província do Rio de Janeiro. Esse desejo está manifesto no Relatório escrito, em maio de 1924, pelo Diretor do Liceu e Escola Normal de Campos, Sebastião Viveiros de Vasconcellos 55 , quando descreve o prédio do Liceu.
Funcciona o Lyceu de Campos, inaugurado em 4 de março de 1884 sendo então presidente da Provincia Dr. José Leandro de Godoy e Benevides, no antigo palacete do Barão da Lagoa Dourada, proprio municipal, adquirido, em hasta publica, por um grupo de campistas, para o fim prefixado de ser nelle installado o Lyceu de Campos, ou servir de residencia do presidente, quando fosse esta cidade a capital da então Província [...] (VASCONCELLOS, 1924).
A Escola Normal de Campos foi criada como escola anexa ao Liceu de Humanidades de Campos cinco anos após a proclamação da República 56, pela Lei no 164 de 26 de novembro de 189457 quando era presidente da Província do Estado do Rio de Janeiro José Thomaz da Porciuncula. Em 1895 foi instalada no edifício do Liceu, com a presença do Dr. Antonio Aydano Gonçalves Almeida, Diretor de Instrução Pública, tendo sido matriculados, em abril, 45 moças e 4 rapazes. A fundação e alguns dados complementares sobre a Escola Normal de Campos foram registrados por Lamego (1943), Silva e Almeida (1980), Sousa (1985), Carneiro (1985), Rodrigues (1988). Estes historiadores/memorialistas locais enumeram os nomes dos primeiros professores e do primeiro diretor da escola, o também diretor do Liceu, Joaquim Ribeiro de Castro, registram o fechamento da escola em 1900 e relatam os esforços do diretor junto a “outros devotados campistas” (SOUSA, p.157) para criar a Escola Normal Livre. O restabelecimento da Escola Normal, por pressão da Câmara dos Vereadores junto ao 55
Esse documento está em rascunho, sem destinatário e data. Indícios como a assinatura do diretor encontrada em outros documentos, levaram a concluir ser o relatório uma produção do professor Viveiros de Vasconcellos dirigida ao Inspetor de Instrução ou a outro superior hierárquico do poder central. 56 Época “que se inicia com dois fatos importantes: a abolição da escravidão, que traz para a sociedade novas questões e novas perspectivas e o início do regime republicano em que houve uma grande transformação na composição demográfica” (DEMARTINI, 2001, p.123). 57 Correspondência da Diretoria da Instrução Pública, encaminhada ao Diretor do Lyceu de Humanidades e Escola Normal, em 2 de maio de 1895 (Arquivo Histórico do Liceu).
Presidente do Estado, o republicano Quintino Bocayuva (Decreto 677, de 16 de março de 1901), é por eles citado, também de forma breve. A organização do ambiente do Liceu para receber a Escola Normal, porém, só pôde ser percebida após análise de documentos do arquivo histórico do Liceu. São abundantes as fontes que tratam da composição de mobiliário 58, corpo docente, currículo, assim como são de extremo valor as várias notas fiscais expedidas pelo comércio e por prestadores de serviço (como lavadeira e jardineiro), e as listas de compras, que vão de livros importados a simples materiais de limpeza. Voltando à historiografia, os campistas Silva e Almeida assinalam a criação da Escola Modelo, anexa à Escola Normal 59 em 1916, “colégio primário onde as normalistas treinam para a futura profissão” (p. 32), e Carneiro (p.143) acrescenta que foi o Decreto de nº 1.468, de 7 de fevereiro de 1916, transformado na Lei de nº 1.317, de 17 de outubro, o instrumento legal responsável por essa criação. Lamego (p.33-73) faz minucioso registro dos Atos de Nomeação de Professores para o Liceu, Escola Normal e Escola Modelo. Sousa (p.159), aluno da primeira turma da Escola Normal de Campos, e quem mais se prolongou na escrita sobre ela, assim se referiu às mudanças provocadas na escola a partir de 1931, quando o modelo de formação de professores foi profundamente alterado.
Depois de ter a Escola enriquecido tanto a instrução do nosso Estado, pela formação de muitas turmas de professores, foi tão útil instituição golpeada de morte no ano de 1931 60 , no Governo do interventor Plínio Casado, sendo Secretário do Interior e Justiça, o Dr. César Tinoco61. Assim, a última turma de professoras normalistas foi diplomada no início do ano passado (1985, p.159).
As últimas referências à Escola Normal de Campos, na historiografia, cessam com a publicação do livro Na Taba dos Goitacazes, do jornalista Hervé Salgado Rodrigues, em 1988. Ao enfocar o “Liceu de Humanidades” (p. 116-122), o autor menciona, em quatorze linhas da página 118, a criação da Escola Normal, seu fechamento em 1900 e restabelecimento em 1901. 58
Há, no Arquivo do Liceu, correspondência em francês a respeito de móveis encomendados pelo Diretor do Liceu e da Escola Normal. 59 O modelo de Escola Normal com escola de aplicação anexa para a realização da prática de ensino dos futuros mestres estava previsto desde a criação da escola, mas só veio acontecer na segunda década do século XX. 60 Pelo Decreto de nº 2.539, de 13 de janeiro de 1931, a Escola Normal passou a ter um novo currículo, o que para muitos, inclusive ex-alunas formadas após esse período, representou o fim da antiga Escola Normal (MARTÍNEZ; BOYNARD, 2002). 61 O Dr. César Nascentes Tinoco é citado entre as personalidades de Campos por Rodrigues (1988, p.323), como jornalista, advogado e político. Prefeito de Campos em 1921-1922, Secretário do Interior e Justiça do Estado do Rio de Janeiro após o movimento de 1930, fundou o Partido Socialista e foi eleito para a Constituinte de 1934.
Outras fontes documentais escritas, arquivadas no Liceu, demonstram que de sua reabertura, em 1901, à sua transferência para outro endereço, em 1955, a Escola Normal partilhou, com o Liceu de Humanidades, espaço, diretores, professores e funcionários. Somente a partir do ano de 2000, a história da formação de professores que se fez na Escola Normal de Campos passou a ser revivida, como objeto de pesquisa, por equipe do Laboratório de Estudos de Educação e Linguagem (LEEL) da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), coordenada por Silvia Martínez. Martínez (2004) periodizou, de modo preliminar, com o fim inicial de facilitar a organização das fontes no Arquivo Histórico do Liceu e permitir, ao grupo de pesquisa da UENF, ter uma visão geral da trajetória da Escola Normal de Campos, as seguintes fases na existência da Escola: 1ª fase: 1895-1900, “fase de instalação e primeiros anos de funcionamento”; 2ª fase: 1900, ano em que funcionou como “Escola Normal Livre” (quando foi extinta a Normal oficial); 3ª fase: 1901-1915, “Escola Normal no Século XX até a criação da Escola Modelo; 4ª fase: 1916-1931, “Consolidação da Escola Normal e seu abrupto “fechamento”; 5ª fase: 1931-1938, “Curso de Especialização e Aperfeiçoamento”; 6ª fase: 1038-1946, “Escola de Professores do Instituto de Educação de Campos”; 7ª fase: 1946-1954, “Curso Normal do Colégio Estadual do Liceu de Humanidades de Campos”. De forma breve, aportada na autora supracitada, apontaremos as características detectadas, até o estágio atual da pesquisa, como as que marcaram cada um dos períodos. Em relação à “fase de implantação”, foi percebida grande movimentação no Liceu para receber a Escola Normal, com aquisição de equipamentos, material didático e de consumo, obras de adequação do prédio, realização de concursos e nomeação de professores. Também ressaltam da documentação, as condições para ingresso do aluno ao curso da Escola Normal, e a importância atribuída às disciplinas Física e Química. Extinta pelo Decreto nº 558 de 26 de janeiro de 1900, por força do diretor e professores, a escola funcionou como “Escola Normal Livre” até 1901, fase que demarca a segunda fase da instituição. Reinstalada pelo estado, em 1901, pelo Decreto 677 de 16 de março, nunca mais a Escola Normal foi fechada. Passou, sim, por grandes transformações a partir da Reforma Francisco Campos, de 1931, até transmutar-se em outro modelo, Curso Normal, em 1946,
com a Lei Orgânica, modelo curricular que foi adotado nos primórdios do Instituto de Educação de Campos, em 1955. Dentre os acontecimentos que tiveram influência na cultura da Escola Normal de Campos, em sua terceira fase, encontram-se as reformas propostas, a esse nível de ensino, pela legislação educacional. A principal delas foi a prevista no Decreto 1241 de 13 de março de 1912, que instituiu o Regulamento do ensino secundário e normal do Estado do Rio de Janeiro. Por esse decreto, as normas para admissão à Escola Normal (tanto de alunos quanto de professores), matrícula, avaliação, disciplina, currículo, dentre outras, ficam definidas e são bastante rigorosas. À guisa de exemplo, ilustramos o texto com a transcrição do Art. 13 do Decreto supracitado, que trata dos critérios necessários à efetivação da matrícula no primeiro ano da Escola 62: “1º- Idade minima de 15 anos completos e maxima de 25; 2º- Prova de vaccinação ou revaccinação e isenção de molestia infecto-contagiosa ou repulsiva, ou defeito physico incompativel com o exercicio do magisterio; 3º - Preparo que consiste em saber as disciplinas que constituem o programma do curso primario completo” (Art.13). A matéria de exame prevista na legislação pode ser comprovada pela Circular nº 1, de 9 de março de 1914, enviada pelo inspetor de Instrução Pública do Estado do Rio de Janeiro ao Diretor da Escola Normal de Campos. Cópia dessa fonte foi localizada no Arquivo Histórico do Liceu e comprova a matéria das provas escrita e oral realizadas pelos candidatos à Escola Normal, que era a seguinte:
Prova escripta: a) composição sobre assumpto concreto ou applicação de proloquio em pequena historia ou a biographia de um Brazileiro illustre; analyse logica de um trecho em prosa; b) cinco questões de arithmetica, dentro do respectivo programma; c) tres questões sobre assumptos do programma de lições de cousas; d) tres questões de geographia geral, e as cartas do Brazil e do Estado do Rio, nos termos do regulamento; e) uma questão sobre historia patria; f) um trabalho de desenho. Prova oral: argüição sobre todas as materias que constituem o programma da 6ª serie.
A partir da implantação do Decreto nº 1420, de 13 de abril de 1915, o Parágrafo 3º do Art. 13 do decreto anterior (de 1912) passa a vigorar com a seguinte redação: “§3º- Preparo que se provará com o exame de admissão, prestado na Escola Normal em que se pretenda matricular, constando tal exame, de portuguez, arithmetica e geographia, com a extensão do actual programma de 6ª série das escolas complementares”.
62
A lei é estadual, vigindo, portanto, para as duas escolas normais oficiais do Estado.
Outras leis e decretos, expedidos pelo governo estadual, no período, serão analisados no capítulo referente à Escola Modelo “Seis de Março”. Aliás, a criação dessa escola de aplicação, anexa à Escola Normal, marca o início da quarta fase da instituição, e constitui-se, talvez, no aspecto mais significativo de sua história, pois deu nova feição ao curso oficial de formação de professores da região norte fluminense, e ofereceu maiores possibilidades de desenvolvimento às disciplinas teóricas “Pedagogia e Metodologia Didática”. O período que abrange os anos de 1916-1930 é marcado por forte controle exercido pela Diretoria dos Negócios do Interior e Justiça na organização e funcionamento do Liceu, da Escola Normal e da Modelo. É grande o número de correspondências, dentre elas alguns telegramas, trocadas entre os diretores da instrução pública do Estado, os da Escola Normal e entre esses, o secretário do Liceu, professores e diretoras da “Seis de Março”. Referem-se desde a orientações gerais como data para início de matrícula ou adiamento do início das aulas, até a comunicação, pelas professoras (não encontramos nenhum professor no caso) do local onde passariam as férias. São feitas, também, em especial nos primeiros anos do período, muitas compras, tanto para a Escola Normal, como já focalizamos, como para a Modelo, que se encontrava em fase de instalação. A respeito das fontes, foram encontrados quatro minuciosos relatórios (três deles em rascunho) que apresentam, com detalhes, aspectos relativos às instalações, organização e funcionamento, e necessidades das três escolas que funcionavam no mesmo espaço, o do Liceu de Humanidades. Outra fase da Escola Normal foi quando se transformou em “Curso de Aperfeiçoamento”, pelo Decreto Estadual 2571 de 1931. A respeito, diz Martínez (2004, p.77): “esse Decreto veio modificar, profundamente, o Curso Normal, tanto na duração como nas disciplinas que o compunham, trazendo alterações na cultura da escola. Na verdade, o decreto chegou a extinguir a Escola Normal, criando o Curso de Aperfeiçoamento, com um ano de duração para quem tivesse feito o Curso Secundário”. No período de 1938 a 1947, o curso de formação de professores passou a ser denominado “Escola de Professores do Instituto de Educação de Campos” 63. O arquivo do Liceu apresenta escassez de documentos sobre essa fase. As fontes que foram analisadas, até
63
“Nesse período o Liceu de Campos passou a ser denominado Instituto de Educação de Campos, funcionando com dois cursos: o Secundário e a Escola de Professores” (MARTÍNEZ, 2004, p.84).
o momento, contêm, segundo Martínez (2004) uns poucos indícios de influência da Escola de Professores do Distrito Federal, criada pelo Decreto 3810 de 1932, na experiência de Campos. A denominação que designou a formação de professores entre o ano de 1947 e o de 1954, último da Escola junto ao Liceu de Humanidades, foi “Curso Normal do Colégio Estadual do Liceu de Humanidades de Campos”. Nesse período, o Liceu retomou seu nome anterior, e a Escola de Professores foi fechada, nascendo o Curso Normal de Campos. É um período marcado, predominantemente, por dois fatos. Um deles, que acontecia em local distante, mas envolvia brasileiros e, por vezes, interferia na rotina das normalistas, a guerra mundial; o outro, a implantação, pelo governo federal, da Lei Orgânica do Ensino Normal, de nº 8539, de 1946. A respeito, diz Martínez (2004, p. 89): “a partir de 1946, as diretrizes que iriam orientar a formação de professores em todo o Brasil ficariam a cargo do governo federal e não mais nas mãos de cada Estado como era feito, organizando todo o ensino normal”. Em 1954, pela Lei de nº 2146, de 12 de maio, da Assembléia Legislativa do Estado, foram criados dois Institutos de Educação, o de Niterói e o de Campos. Visando a atender, primordialmente, ao preconizado no Art. 9º da referida legislação 64, as alunas das três séries da Escola Normal do Liceu, acompanhadas do Diretor Décio Ferreira Cretton, de professores e inspetoras de alunos, tiveram que deixar o aristocrático prédio do Liceu e se transferir para o do Grupo Escolar Saldanha da Gama, em área então periférica da cidade, no bairro Turf-Club. Nova fase e nova cultura se iniciam no magistério campista. Com a criação do Instituto de Educação de Campos (IEC), formado pela Escola Normal, Grupo Escolar, Jardim de Infância e Curso Ginasial, este implementado dois anos depois, as memórias da Escola Normal foram-se apagando na memória social campista. Martínez e Boynard (2004b, p.4), identificaram alguns fatores que contribuíram para esse apagamento de parte da história da formação de professores em Campos 65 . Para as pesquisadoras, a memória da Escola Normal, eminentemente feminina, foi ofuscada por 64
O art. 9o da referida Lei estabeleceu que os Institutos de Educação manteriam os cursos: Pré-Primário; Primário (Grupo Escolar) subdividido em elementar e complementar; Secundário, regido pela legislação federal; Normal, destinado à formação de professores de ensino primário; de Aperfeiçoamento, para o aprimoramento do nível cultural dos professores primários; de Administração Escolar de grau primário, para habilitação de diretores e orientadores de ensino; e de Especialização. Os cursos de Aperfeiçoamento, de Administração Escolar e de Especialização, sonho de Anísio Teixeira, não chegaram a se efetivar no marco do Instituto de Educação de Campos (MARTÍNEZ; BOYNARD, 2004a, p.19). 65 Essa história está sendo resgatada pela pesquisa da UENF. Os primeiros resultados da pesquisa começam a ser divulgados em palestras para professores, seminários e congressos; trabalhos monográficos de conclusão de curso começam a ser escritos; alunos de iniciação científica da Universidade freqüentam os arquivos em busca da história e de memórias da Escola Normal, o que nos faz vislumbrar, a longo prazo, que, via conhecimento científico, se compreenda a importância da instituição “Escola Normal de Campos” para a história da educação fluminense.
vários fatores. Dentre eles, o lugar social que a mulher ocupava, no Brasil, e nas cidades do interior do país 66 , em particular, nas cinco primeiras décadas do Século XX; o “culto” extremado à memória do Liceu, em especial após a reforma Francisco Campos (1931), quando se aboliu a “separação” que havia entre secundaristas (Liceu) e normalistas (Escola Normal), transformando todos os alunos que estudavam no Liceu, em liceístas; e, por fim, à saída da Escola Normal do edifício do Liceu, em 1955 67. Em novo espaço, uma nova cultura de formação de professores foi sendo construída, geração após geração. O tempo passado, a aposentadoria dos professores- que se transferiram, com alunas e funcionários, da Escola Normal para o Instituto de Educação de Campos-, a morte de muitos, e o pouco interesse que, em geral, existe em relação à preservação da história e da memória das instituições de ensino no país, fizeram com que os quase sessenta anos de história da formação de professores na Escola Normal de Campos sejam pouco conhecidos e valorizados na região. Em Campos, hoje, poucas pessoas sabem que o atual Instituto Superior de Educação Prof. Aldo Muylaert (ISEPAM), única escola oficial de formação de professores- em nível Médio e Superior- da cidade de Campos, é herdeiro da Escola Normal de Campos que funcionou junto ao Liceu de Humanidades, e produziu muitas professoras, e alguns professores, que se destacaram no magistério estadual, na direção de escolas primárias particulares, e na administração pública do Estado.
CAPÍTULO 3
HISTORICIZANDO A FORMAÇÃO PRÁTICA DE PROFESSORES EM “ESCOLAS MODELO”
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Em Campos foram identificadas importantes funções exercidas pela mulher. Todas, entretanto, no limite da casa e da família. 67 Maiores detalhes sobre a Escola Normal de Campos poderão ser encontrados em Martínez; Boynard, 2003, 2004a, 2004b.
A experiência inicial de formação de professores em escolas primárias modelo, oficiais, cuja prática mais antiga conhecida é a que teve início, no período imperial, na Escola Normal de Niterói, via de regra, ainda é pouco explorada na historiografia sobre o tema. A maioria dos estudos em história da educação brasileira coloca o Estado de São Paulo como o que mais influenciou esse nível de escolaridade, no Brasil. São as Escolas Modelo paulistas o “modelo” em que se espelham a maior parte das pesquisas que têm como objeto de investigação a escolaridade das crianças nos primeiros tempos da República. Tomando as palavras de Clarice Nunes (1992, p.154) referindo-se ao fato de São Paulo ser tomado, no Brasil, como “o protótipo da cidade brasileira”, o que faz com que se “embaralhem no mesmo feixe” diferentes versões de teorias/modelos educacionais
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,
pensamos que também em relação à experiência de escolas modelo é preciso, sem ignorar a importância dos estudos e inovações pedagógicas empreendidas por influentes intelectuais paulistas, como Caetano de Campos e Oscar Thompson 69, que se procure “regionalizar” ou particularizar as experiências de cada Estado ou escola, se possível. Somente assim, poder-se-á relacionar as primeiras experiências da escola modelo republicana, paulista, com as dos demais estados e estabelecer as contradições, permanências e mudanças dos vários modelos, contribuindo de forma crítica para o estudo do tema. Nessa perspectiva, abordaremos de forma breve as experiências de formação prática de professores no Brasil, que se deram em Niterói, e em São Paulo. Para apresentar o objeto da presente dissertação, nos deteremos no projeto de formação prática de professores que foi implantado na Escola Modelo “Seis de Março”, na cidade de Campos, Estado do Rio de Janeiro, durante o período de 1916 a 1932.
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No caso, a autora refere-se especificamente “às diferentes versões da Escola Nova em nosso país”, que em geral ficam sufocadas pelo modelo paulista. 69 Antonio Caetano de Campos, médico, nascido em São João da Barra/RJ, município vizinho a Campos, foi diretor da Escola Normal de São Paulo por um período de 20 meses, de janeiro de 1890 a setembro de 1891. Dizia que “as aulas teóricas são importantes, mas estão longe de ser o fundamental; “a escola Normal era a cabeça da reforma (de 1890, que implantou), mas seus braços e pernas estavam nas escolas-modelo (WARDE e GONÇALVES, 2002, p.110). Oscar Thompson, bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas, paulista, estudou na Escola Normal da Capital no período em que Caetano de Campos foi o Diretor (1889-1891) e implementou a primeira reforma republicana na Escola. Em 1892 foi nomeado adjunto da direção da Escola-Modelo do Carmo. Com a inauguração do prédio da Escola Normal de São Paulo na Praça da República, assumiu a direção do desdobramento da Escola Modelo do Carmo, que permaneceu no antigo local, chamada Segunda Escola-Modelo Anexa à Escola Normal. Foi responsável pela introdução de mudanças pedagógicas significativas e pela criação do Laboratório de Pedagogia Experimental. Assumiu por duas vezes a Inspetoria-Geral da Instrução Pública (WARDE e GONÇALVES , 2002, p. 867-872).
3.1 A FASE MAIS REMOTA DO PROJETO “ESCOLA MODELO” NO BRASIL: AS ESCOLAS ANEXAS À ESCOLA NORMAL DE NITERÓI
Lacerda Nogueira, no livro A Mais Antiga Escola Normal do Brasil (1835-1935) afirma que, em Niterói, no período de 1859 a 1861, os normalistas “adquiriam pratica numa escola de cada sexo designada pelo chefe do governo” (1938, p.51). Continua a relatar que a legislação de 15 de fevereiro de 1869, que estabelece o programa a ser observado na Escola Normal, faz referência a uma escola anexa, “na qual o normalista começará ouvindo as lições, depois será encarregado da regência de uma classe sob direcção do professor, e finalmente, fará as funcções de professor, encarregando-se de toda a direcção da escola pratica” (1938, p.71). Acrescenta que, em 1868, José Carlos de Alambary Luz, Inspetor Federal da Instrução e Diretor da Escola Normal de Niterói diz que “os exercícios nas escolas annexas vão fazendo conhecer alumnos-mestres a realidade de sua futura profissão, e habilitando-os a pôr em prova as theorias aprendidas na escola normal” (1938, p.93). Informa que são duas as escolas primárias anexas à Escola Normal de Niterói, uma feminina, outra masculina, cada uma regida por um professor, e que
Ahi os normalistas do 3º anno começaram ouvindo as lições na qualidade de monitores; depois foram encarregados da regencia de classes sob a direcção dos professores das escolas primarias nos dias em que a escola normal é frequentada por sexo differente da turma em exercicio na aula pratica; e sob as vistas do de
pedagogia duas vezes por mez; hoje cada um dos alumnos exerce por sua vez as funcções de mestre, e com o auxilio de seus collegas encaminha todos os trabalhos do ensino, redige officios, risca e enche mappas como se fora o proprietario da cadeira.Terminado o exercicio, o normalista que regeu a escola faz por escripto o relatorio de todos os successos nella occorridos, expondo o seu parecer sobre o modo como desempenharam seus deveres os monitores [...] (1938, p.93).
Segundo Villela, na Escola Normal de Niterói “as escolas anexas, previstas desde 1862, só vieram a funcionar de fato como escolas modelo a partir da gestão de José Carlos de Alambary Luz (1868). A lei de 1857 determinava que os alunos mestres praticassem em duas escolas públicas, uma masculina e outra feminina. Essas escolas eram apenas duas escolas primárias da província designadas para receber os alunos em sua prática, não pertencendo à jurisdição da Escola Normal, o que dificultava seu funcionamento como escola modelo” (2002, p.103).
Só a partir do início de 1874, com a Reforma de 22 de novembro de 1873, foram criadas duas escolas, uma masculina e outra feminina, que passaram a funcionar como escolas de aplicação submetidas à orientação pedagógica da escola normal. Para dirigi-las, foram escolhidos dois alunos recentemente formados, com distinção, pela Escola Normal. Nos documentos em que pesquisou, Villela encontrou provas da modernização e pioneirismo que o Diretor Alambary Luz imprimiu à Escola Normal de Niterói, com a “utilização de métodos novos ( como o da Lição de Coisas), pela importação de materiais didáticos sofisticados, antecipando um modelo pedagógico que só viria se firmar muitos anos depois” (2002, p.1). Consideramos que o modelo de prática pedagógica proposto por Alambary Luz representa a base das atividades práticas que os cursos de formação de professores seguem até nossos dias, qual seja: os alunos [...] começam “ouvindo as lições na qualidade de monitores; depois, encarregam-se da regência de classes sob a direção dos professores das escolas primárias e sob as vistas do professor de Pedagogia [...] e, terminado o exercício fazem por escrito o relatório de todas as atividades desenvolvidas, expondo o seu parecer sobre o modo como desempenhou suas tarefas” (RELATÓRIO DO DIRETOR DA ESCOLA NORMAL/ 1869, p.11 apud VILLELA, 2002, p.104). Essa não é a dinâmica da “observação, co participação e docência” vivenciada nas Escolas Normais 70? Outra observação que, a meu ver, demonstra o nível de responsabilidade pedagógica de Alambary refere-se à defesa que empreendia, ante os órgãos estaduais de instrução, para que a formação pedagógica dos alunos tivesse início no segundo ano e não no terceiro, como previa o programa adotado pela Escola Normal de Niterói.
Pelo regulamento, estava prevista a prática dos alunos apenas duas vezes por mês, mas Alambary defendia que essa obrigatoriedade fosse ampliada. Pretendia também iniciar a formação pedagógica dos alunos no segundo ano e não apenas no terceiro, como acontecia pelo programa adotado. Assim, evitaria de chegarem ao terceiro ano já praticando nas escolas anexas por vários meses sem que tivessem ainda completado o programa da parte metodológica” (RELATÓRIO do Diretor da Escola Normal/1870, p.13 apud VILLELA, 2002, p.104).
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Em alguns Cursos de Pedagogia, o modelo é o mesmo.
No período republicano, dadas as lacunas na historiografia 71, as informações possíveis sobre a Escola Modelo anexa à Escola Normal de Niterói, foram retiradas de Nogueira (1938) e das Mensagens enviadas pelos Presidentes do Estado do Rio à Assembléia Legislativa. Por essas fontes é permitido saber que, pelo Decreto de 25 de janeiro de 1900, o Presidente Alberto Torres imprimiu caráter mais prático à Escola Normal de Niterói, o que possibilitou que, “independente dos exercicios praticos nas escolas- modelo, em companhia do lente desta cadeira, e sob sua direção, poderão os alumnos-mestres realisar uteis visitas a estabelecimentos de instrucção e musêos pedagógicos” (1938, p. 212). Nos anos de 19151916, Mattoso Maia, Secretário Geral do governo Nilo Peçanha, diz que “o ensino da pedagogia continuou a ser dado em aulas theoricas na Escola Normal e em lições praticas na Escola Modelo” (1938, p.222). A partir dos anos de 1920 é possível encontrar muitas referências às obras de adaptação do antigo prédio em que funcionava a Escola Normal de Niterói para ali ser instalado um “Grupo Escolar Modelo, tendo annexo um jardim da infancia ou escola maternal, em edificio para esse fim construido especialmente” (1919, p.23). Esse edifício foi inaugurado no ano de 1926 (1926, p. 53). Em 1927, a formação prática dos normalistas de Niterói parecia se dar a contento. Mensagem do Presidente à Assembléia, diz a respeito da Escola Normal de Niterói: “As suas installações materiaes se eram optimas foram, recentemente, melhoradas com a construcção da Escola Modelo e do Jardim da Infância, levada a effeito para que se proporcionasse ás normalistas um utilissimo campo de applicação pedagogica, seja na parte de escola primaria, seja no que concerne á methodologia montessoriana”( 1927, p.104). Citando, especificamente a Escola Modelo de Niterói, diz que essa instituição É complementar da Escola Normal, e estabelecimento de applicação ou pratica escolar, indispensavel ao ensino da methodologia didactica, destinada ás alumnas do 3º e 4º anno, que exercitando-se nos trabalhos lectivos tambem revelam suas vocações profissionaes. Funcciona a escola em 6 salas amplissimas, com mobiliario adequado, e ainda existe um gabinete para professores, um gabinete pedagogico e uma pequena bibliotheca infantil. Nesse estabelecimento o curso acompanha a orientação da escola de 3º gráo- ensino integral- em 5 series, todas regidas por cathedraticos, auxiliados por adjuntas. A matricula de 1926 foi de 219 alumnos, assim distribuidos: 1ª serie- 72; 2ª serie- 37; 3ª serie-35; 4ª serie-30; 5ª serie- 45 ( Mensagem 1927, p.106).
Em 1930, “os dois institutos de ensino que funccionam annexos á Escola Normal ( de Niterói) como estabelecimentos de pratica pedagogica para o alumno-mestre, tiveram a
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Heloisa Villela limitou seus estudos sobre a Escola Normal de Niterói a dois períodos: da criação ao ano de 1851 (Mestrado, 1990), e ao período da direção de Alambary Luz , de 1868 a 1876 ( Doutorado, 2002).
seguinte matricula: Escola Modelo, nas 5 séries do curso- 142; Jardim de Infancia- 112 (1930, p.75). Esses números demonstram, assim como o fato de contar com um Jardim de Infância, que a formação prática de professores feita na Escola Modelo de Niterói ingressou no segundo período republicano com tendência à expansão. Por quanto tempo manteve as características informadas, e com que outras chegou aos nossos dias, a pesquisa não se preocupou em estudar, por fugir aos limites delineados para a escrita dessa dissertação. Como afirmamos, inicialmente, embora em antiguidade a “Modelo” de Niterói tenha primazia, em termos de concepção de projeto inovador, é a escola anexa à Escola Normal de São Paulo, a principal referência no Brasil.
3.2 A FACE MAIS CONHECIDA DO PROJETO “ESCOLA MODELO”: A ESCOLA MODELO CAETANO DE CAMPOS (SP)
Em São Paulo, capital, logo após a proclamação da República, uma legislação, o Decreto nº 27, de 1890, reformou a Escola Normal e criou as escolas-modelo. Essas eram classes primárias anexas à Escola Normal, cujo objetivo era melhorar a formação de professores e desenvolver um padrão de ensino considerado de excelência para nortear as escolas oficiais. A respeito, é pertinente a seguinte observação de Casemiro dos Reis Filho:
Não há dúvida, os republicanos-democratas paulistas dos primeiros meses da República identificam com rigor o passo essencial para a renovação eficiente do ensino: a preparação científica e técnica do professor. Essa precisão funda-se no conhecimento da realidade educacional, mais do que em formulação teórica. As tentativas imperiais de reforma do ensino elementar, sem professores, foram tantas e de tão longa data: não há Presidente da Província, nem relatório de Diretor Geral da Instrução Pública, que não assinale as deficiências do magistério primário. Deficiências culturais e técnicas. Professores que mal sabem o que ensinam, sem método e sem recursos pedagógicos de qualquer espécie. [...] É a identificação da realidade educacional concreta que possibilita o realismo da solução: preparação prévia e adequada do professor, por meio de um órgão específico para a sua formação” [...] Com o fim de preparar convenientemente o professor, “cria-se um órgão especial- a Escola Modelo- anexo à Escola Normal”. É a base de toda reforma da instrução pública paulista, nos primeiros anos da República. Sua concepção,
organização e orientação dominaram o pensamento e a ação de Caetano de Campos72, inteiramente, nos 21 meses que dirigiu a Escola Normal (REIS FILHO, 1995, p.51;53).
“Destinadas à preparação científica e técnica do professor”, e concebidas nos moldes de um ensino primário de longa duração, integral, graduado, as escolas-modelo fundamentaram sua metodologia, especialmente, nos processos intuitivos de ensino, de modo tão radical que, em 1892, todo o ensino público de São Paulo deveria observar os seus princípios. De acordo com o Artigo 6º, §1º da Lei nº 88 de 8 de setembro de 1892, “serão minuciosamente especificadas em programas as matérias que constituem o ensino e sua distribuição conforme o desenvolvimento intelectual dos alunos, observando-se com rigor os princípios do método intuitivo”.
Utilizando o método intuitivo, oferecem-se dados sensíveis à observação e à percepção dos alunos, propondo-se a observação espontânea e a experiência como meios de aquisição de conhecimentos que, posteriormente, serão elevados ao plano do pensamento discursivo. Concebe-se, assim, a educação como amplo processo de investigação, que permite ao aluno recapitular as verdades científicas firmadas pela ciência (MONARCHA, 1999, p.180).
Comprova-se, assim, a afirmativa de Nagle (2001, p.291) de que o projeto das escolas modelo foi implantado [...] em São Paulo, como núcleo de renovação do ensino normal e de introdução de novas práticas escolares, métodos e processos de ensino 73. Com a inauguração, em 1894, de um novo edifício para a Escola Normal, na Praça da República, em prédio monumental 74, foram abertas matrículas para a instalação da Escola Modelo anexa atraindo diversos alunos da Escola do Carmo, onde funcionava. Cabe destacar que, embora alguns de seus professores tenham sido transferidos para a Escola Normal da Praça, a Escola do Carmo continuou a funcionar sob a direção do professor Oscar Thompson, com a denominação de Segunda Escola Modelo. Essa escola, que fora “destinada à demonstração de procedimentos didáticos, de observação e prática de ensino para os alunos do 3º ano do curso normal, configurou-se como um ponto de irradiação de técnicas fundamentadas no método intuitivo de ensino” 72
Caetano de Campos, incentivado por Rangel Pestana, organizou e pôs em ação- em curto espaço de tempo, pois faleceu precocemente, a Reforma de 1890. É considerado, pela maioria dos historiadores da educação, o artífice do projeto das Escolas Modelo, em novas bases pedagógicas, na fase republicana. 73 “Apesar das vantagens, alguns diretores (de escolas paulistas) queixavam-se das dificuldades de adoção da nova metodologia (método intuitivo) apresentando como problema a falta de preparo dos professores e a falta de material” (SOUZA, 1998, p.166). 74 “Edifícios majestosos, amplos e iluminados, mobiliário, material didático, trabalhos executados, atividades docentes e discentes, tudo devia ser dado a ver de modo que a conformação da escola aos preceitos da pedagogia moderna evidenciasse o Progresso que a República instaurava” (CARVALHO, Marta, 2003, p.24).
(MONARCHA,1999, p.179), num centro de referência e pólo difusor de teorias científicas e pedagógicas, além de palco de experiências educacionais que marcaram a história da educação brasileira. O fato de muitos republicanos e novos dirigentes paulistas conhecerem de perto o problema educacional, em virtude de muitos deles terem exercido o magistério, foi decisivo na organização e expansão da escola pública primária e normal, e na valorização do magistério em relação à melhoria de salário e de condições de trabalho. Antonio Caetano de Campos e Oscar Thompson, ex-alunos da Escola Normal e, posteriormente dela diretores, foram intelectuais referência nesse nível de excelência de que se revestiram as escolas Normal e Modelo paulistas (MONARCHA, idem). Os intelectuais republicanos de São Paulo se preocuparam não somente com a consolidação do novo modelo de escola primária e normal, em seu Estado. O trabalho realizado nas escolas paulistas foi amplamente divulgado para o resto do país através de cursos e publicações em jornais e revistas pedagógicas. Nessa linha, a pesquisa apontou para possíveis influências da Escola Modelo Caetano de Campos na escola primária campista. Viagens da Professora Antonia Ribeiro de Castro Lopes, por ela registradas em uma espécie de anotações de sua vida 75, a São Paulo, para cursos, contatos com Thompson e Theodoro de Moraes 76, artigos publicados na imprensa campista, em 1914, relatando suas impressões sobre o ensino em São Paulo, e propondo a introdução da caligrafia vertical nas escolas do Estado do Rio de Janeiro, assim como documentos e livros deixados, permitem levantar a hipótese de que foi aquela professora quem introduziu, na Escola Normal de Campos, em suas aulas de Pedagogia e Metodologia, e na Escola Modelo anexa, as idéias que fervilhavam em São Paulo, nas décadas de 1910 a 1930. Necessário se torna registrar que alguns historiadores da educação ressaltam a característica, particular, que as idéias paulistas assumiram nas várias experiências em que foi identificada sua influência. Essa informação é importante para a análise que se fará da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, cidade com história (s) bastante diversa (s) da (s) de São Paulo. Antes de começarmos a apresentação dos resultados da pesquisa sobre a formação de professores feita na Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, necessárias se fazem
75 76
Ver verbete Antonia Lopes, do Dicionário de Educadores no Brasil (MIGNOT; MARTINEZ, 2002, p.89-96). Autor de livros didáticos.
algumas observações percebidas, na pesquisa, sobre escolas onde as normalistas da Escola Normal de Campos praticavam a docência, antes da criação da “Seis de Março”.
3.3 A FORMAÇÃO PRÁTICA DE PROFESSORES DA ESCOLA NORMAL DE CAMPOS ANTES DA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
Em Campos, a Escola Normal foi criada em 1894 pelo Presidente Dr. José Thomaz da Porciúncula e instalada, em 1895, pelo Sr. Antonio Aydano Gonçalves Almeida (SOUSA, 1985, p.157). Sobre a prática profissional das normalistas 77, as fontes encontradas, um Ofício e duas notas de jornal, demonstram que, em 1898 78 já se tratava do assunto, o mesmo acontecendo em 1901. O ofício, enviado pelo Sr. Luiz Alves Monteiro, Diretor de Instrução Pública do Estado do Rio de Janeiro, ao Diretor do Liceu de Humanidades e Escola Normal de Campos, foi escrito em Petrópolis 79, em 30 de março de 1898. O teor do documento é uma resposta a ofícios que lhe foram enviados, pelo diretor campista, no dia 26 daquele mês, e informa “que logo que seja publicado o novo regulamento da instrucção, providenciara esta Directoria no sentido do preenchimento das cadeiras de portuguez e francez desse Liceu, da escola de applicação annexa a essa Escola e sobre a construcção da casa para o porteiro e installação de gaz corrente para os gabinetes de physica e chimica desses institutos”. A descoberta desse ofício pôs por terra nossa hipótese original de que a “Seis de Março” fôra a primeira e única escola primária no espaço do Liceu.
Na busca de
entendimento para a questão, ajudou-nos o memorialista campista e aluno da 1ª turma da Escola Normal de Campos, Horácio Sousa. Na página 156 do capítulo destinado à “Instrução”, do livro Cyclo Áureo. História do Primeiro Centenário de Campos (1835-1935), o autor diz que “o primeiro grupo escolar criado em Campos, foi denominado “Barão de Tautphoeus”, pela reforma Paranhos, em fevereiro de 1900, funcionando no mesmo edifício do Liceu”.
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A referência ao gênero feminino em relação à clientela da Escola Normal de Campos, prende-se ao fato de ter sido a escola predominantemente feminina durante toda a sua existência. 78 Sendo o Curso Normal dado em quatro anos, e sabendo-se que a disciplina Pedagogia era dada no terceiro e quarto ano, consideramos que esses documentos marquem o início da parte prática da formação oferecida pela Escola Normal de Campos. 79 Então a capital da Província.
Como no ano de 1900, a Escola Normal não funcionou, estranha-se a data de instalação dessa escola80, aparentemente prevista no documento de 1898, supracitado. Até novembro de 1904, o Grupo Escolar Barão de Tautphoeus funcionou no espaço da Escola Normal de Campos, que foi reconduzida para o Liceu, em 1901. Confirma-o a Mensagem 1904, A-54, do Presidente do Estado Nilo Peçanha, à Assembléia dos Deputados. Na página 54 da Mensagem encontra-se transcrito o Decreto nº 840, de 23 de janeiro de 1904, cujo caput diz: O Presidente do Estado do Rio de Janeiro, usando da attribuição que lhe confere o art. 56, n.1, da Constituição e de accôrdo com o art. 1º da lei nº 608, de 3 de novembro ultimo, decreta: Art.2º- A professora de trabalhos de agulha da Escola Normal de Campos, que estava em exercício no extincto (sic) grupo escolar Barão de Tautphoeus, regerá essa cadeira na mesma escola, com o vencimento annual de 1:800:000. Ass. Nilo Peçanha e Dr. Alfredo Augusto Guimarães Backer, Secretario Geral do Estado (http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u873/index.html).
A leitura do Jornal “Monitor Campista” dos dias 16 de março e 18 de julho de 1901 reforçou a existência de uma escola de aplicação nos primórdios da Escola Normal de Campos. Notícia da edição de 16 de março dá conta do restabelecimento oficial da Escola Normal de Campos, fechada pelo Decreto n. 558, de 26 de janeiro de 1900 81. O fato foi assim relatado: A Campos victoriosa pela justiça, os nossos sinceros parabens na hora memoravel em que se annuncia o restabelecimento da Escola Normal, ardente aspiração de todos os corações campistas. No Palacio Dourado de Martins Pinheiro82, hoje transformado em tabernaculo do estudo de todos os magistrados da Sciencia Contemporanea, dentro de poucos dias, irão funccionar o Grupo Escolar (grifo nosso), e a Escola Normal e o Lyceu [...] (MONITOR CAMPISTA, 1901).
Em 18 de julho do mesmo ano, ao registrar sua visita ao Liceu, o editor 83 do Monitor Campista escreveu:
80
Seria possível que esse grupo escolar servisse de campo de estágio das alunas da Escola Normal Livre, criada, pelo diretor e professores da Escola Normal de Campos, para funcionar no seu lugar, enquanto essa permanecesse extinta? 81 “O decreto restabelecendo a Escola Normal teve o n. 677 e foi datado de 16 de março de 1901” (SOUSA, 1935, p.158). De janeiro de 1900 a março de 1901 funcionou como Escola Normal Livre, organizada pelo Dr. Joaquim Ribeiro de Castro- diretor do Liceu na época em que a Escola Normal de Campos foi criada- “e outros devotados campistas” (Idem). 82 José Martins Pinheiro é o nome do Barão da Lagoa Dourada, em cuja antiga residência funciona, até hoje, o Liceu de Humanidades de Campos. 83 Como o artigo não está assinado e o texto não faz referências, concluiu-se ser o visitante o próprio jornalista.
Da visita que fizemos ao nosso importante Estabelecimento de Instrucção trouxemos agradabilissima impressão. Fomos justamente no momento em que funccionava (sic) diversas aulas do Lyceu, da Escola Normal e do Grupo Escolar. A ordem escrupulosamente mantida, a perfeita independencia entre alumnos e alumnas, a regularização de uma ordem bem disposta para o harmonico funccionamento dos tres cursos, (grifos nossos) a observancia rigorosa dos preceitos de uma bôa disciplina são attributos que falam brilhantemente do tino administrativo, do criterio e da competencia da direcção (MONITOR CAMPISTA, 1901).
Os registros demonstram que, com certeza, existiu uma escola de aplicação anexa à Escola Normal de Campos, pensada em 1898, instalada em 1900 e extinta, provavelmente, em 1904. Dessa data até 1913 não foram encontrados dados sobre a prática de ensino das normalistas: nem o local, nem os aspectos pedagógicos. Foi o encontro com o Relatório escrito, em 1914, pelo Diretor da Escola Normal e Liceu de Humanidades, Sebastião Viveiros de Vasconcellos, que começou a apontar para a necessidade, percebida pela direção do estabelecimento, de se melhorar o ensino prático da Escola Normal. Segundo o diretor, isso seria feito com a reorganização dos tempos escolares e com a aproximação dos espaços onde se ensina a teoria e se dá a prática docente. Assim,
No intuito de melhorar o ensino pratico de Pedagogia, venho lembrar-vos a conveniencia de serem feitos diariamente ou pelo menos alternadamente os exercicios dessa disciplina, e não semanalmente, como acontece e pede o Regulamento. Si continuar o regimen de irem os alumnos, uma vez por semana (aqui ás sextas-feiras) praticar em uma escola complementar, positivamente nullo, nessa parte, será o ensino da materia. Pode dar-se uma direcção mais proveitosa e sadia, bastando, apenas, uma ligeira mudança no horario, de modo que das 10 ás 13 horas estejam os alumnos nas aulas praticas, vindo, em seguida, para a Escola Normal, onde continuarão as lições do dia até a ultima hora de trabalho lectivo (VASCONCELLOS, 1914).
Continuou o Diretor da Escola Normal a apresentar sugestões ao Inspetor de Instrução. Agora em relação ao melhor espaço para instalar a escola modelo. Inicialmente, o lugar preferido pelo administrador escolar era a casa do porteiro da escola. “Mas poderia ser também útil que se procure uma escola complementar proxima, como é a João Clapp, donde poderão os alumnos fazer em 10 minutos, a pé, o percurso até a Escola Normal”. A segunda sugestão foi a acatada, inicialmente, pelo governo do Estado. Onde, porém, ficava o Grupo Escolar João Clapp, em 1914?
Depoimentos orais situam-no “na esquina da Rua da Constituição com Beira-Valão 84, em prédio muito bom”, diz a Profª Stella Muylaert Tinoco Dias, nascida em 1911, ex-aluna da Escola Modelo “Seis de Março”. Outra professora entrevistada, a Profª Judith de Almeida Carvalho, nascida em 1919, ex-aluna do Grupo Escolar João Clapp, relata: “Eu já fui para o colégio alfabetizada, porque isso a minha mãe ensinava em casa mesmo. Eu entrei lá já sabidinha”. Do João Clapp só saiu quando fez o Exame de Admissão para a Escola Profissional Nilo Peçanha, onde se formou em “Rendas e Bordados” 85. Assim ela descreve o local:
O João Clapp era na Beira Valão... lembra onde foi a Casa Vitória 86 ? Então, ali naquele quarteirão de frente mesmo para o Valão. É isso aí, ele era mais ou menos assim no meio do quarteirão que não é muito grande não. Tanto que a nossa escola, era na face da rua, uma porta larga, me lembro bem que só abria a metade, não abria toda assim não. Então a gente entrava e era uma parte plana do mesmo nível da rua e depois tinha uns degraus, não eram muitos não, mas da largura toda assim (gestos). Depois da porta tinha um espaço onde começavam os degraus, vinha a parte lisa e aí tinha salas de um lado e salas de outro; de frente tinha uma sala que era o gabinete. A nossa diretora era Dona Carmen Amancio Machado, uma criatura muito boa, muito cuidadosa, muito mesmo. Então, nós entrávamos e ficávamos na sala à direita, para poder formar e cantar o hino, todo dia se cantava o hino (CARVALHO, J., 2005).
Acontece, entretanto, que a informação de que o grupo João Clapp possuía um bom e amplo prédio não coincidia com a que recolhêramos no arquivo do Liceu: a de que essa escola, visitada pelo “Diretor de Higiene e Assistência Pública Municipal de Campos”, em 1915, havia sido considerada inadequada à freqüência de seus quase 300 alunos, e que, por isso, não poderia mais servir de campo de prática das normalistas 87. As fontes que nos ajudaram a levantar a hipótese de que as três pessoas entrevistadas pensaram no Grupo Escolar João Clapp pós- anos 1920, quando este já havia sido transferido
84 85
Atual Av. Alberto Torres com Av. José Alves de Azevedo, área central da cidade de Campos. Judith de Almeida Carvalho nasceu no dia 31 de março de 1919. Fez o curso primário no Grupo Escolar João
Clapp, estudou para o exame de admissão com Dona Olímpia, aula particular, e formou-se em “Rendas e Bordados” pela Escola Profissional Nilo Peçanha. Sobre sua trajetória profissional, conta: “Comecei a trabalhar na escola de Dona Isabel Parente, a sala de aula era na casa de Dona Isabel, em Sapucaia; de lá trabalhei em Murundu, eu fui substituir em Murundu; de Murundu eu fui para São João da Barra, eu trabalhei seis anos no Grupo Escolar Alberto Torres. De lá é que eu fui para o Grupo Escolar Benta Pereira e depois para o 15 de Novembro, onde me aposentei como professora de Trabalhos Manuais” (Depoimento Oral/ 24/03/2005). 86
Casa comercial de material de junco e vime. Lá as professoras primárias ( década de 1970, inclusive) adquiriam grandes bolsas de vime para nelas carregarem os “cadernos de casa” de seus alunos. A referência foi feita no intuito de nos oferecer um ponto de referência conhecido. 87 Maiores detalhes na página 77.
para um espaçoso prédio adaptado para escola, foram as Mensagens do Presidente do Estado Dr. Raul de Moraes Veiga, dos anos 1920 e 1921. Na Mensagem Presidencial de 1920 (p.56, 67), Raul Veiga relata que foram orçadas em 26:379$000 as obras de adaptação para o grupo escolar João Clapp, da cidade de Campos, achando-se as mesmas terminadas. Na Mensagem de 1921 (p.48), o presidente diz que “adaptaram-se aos fins da instrucção outros muitos predios, de accordo com os preceitos da hygiene e da pedagogia, taes como: em Campos, dois espaçosos predios para os grupos escolares “João Clapp” e “Quinze de Novembro”, já installados, com todo o mobiliario e material novo”. Fica, portanto, sujeita a pesquisa mais aprofundada, a resposta à pergunta que temos: Qual a distância entre a Escola Normal e a João Clapp, sugerida como campo de prática, pelo Diretor Viveiros de Vasconcellos? O que temos de concreto é que foi essa escola a escolhida, pela Instrução Pública Estadual, para funcionar como escola de aplicação da Normal, em 1915. Que critérios havia para que uma escola primária, pública, fosse considerada modelo de formação de novos professores? Mostram as experiências de Niterói e São Paulo que professores competentes, disciplina rígida, direção firme e ensino inovador eram pontos importantes. Em Campos, a João Clapp sempre teve conceito de boa escola 88, como afirma a ex-aluna Dona Judith. E como demonstram os documentos que se encontram no arquivo do Liceu. Por não ser o objeto desse estudo, os documentos enviados pela direção da “João Clapp” para a direção do Liceu, no ano de 1915, não serão analisados em profundidade. Essas fontes situam-se, no tempo, entre os meses de agosto de 1915 e fevereiro de 1916. É curioso o fato de que há documentos expedidos pela mesma diretora, Carmen Pereira Amancio, contendo três denominações diversas para a “João Clapp”. Isso acontece, por exemplo, em quatro mapas mensais, todos de 1915; no de 31 de julho, consta “Escola Complementar João Clapp”; no de 31 de agosto, “Escola Modelo João Clapp”; no de 31 de outubro,“Grupo Escolar João Clapp”, e o do dia 31 de novembro, o documento se identifica como proveniente da“Escola Modelo João Clapp” 89. 88
Apesar de não dispor de maiores elementos de análise, já que o arquivo da “João Clapp” não foi encontrado, foi possível, por meio das entrevistas, saber que essa escola ministrava ensino considerado de qualidade, preparando muito bem alunos para o exame de admissão à Escola Normal e ao Liceu de Humanidades de Campos. 89 A denominação “Escola Modelo João Clapp” está completamente em desacordo com os termos do Decreto nº 1468, de 07 de fevereiro de 1916, que criou a escola modelo anexa à Escola Normal de Campos: “Considerando que na falta de Escola Modelo (grifo nosso) os exercícios práticos dos alumnos da Escola Normal de Campos
De qualquer forma, se o tempo da prática profissional das normalistas na Escola João Clapp, foi pequeno, deixou rastros documentais que nos permitem saber: o horário de entrada dos alunos (às 10 horas), o número de séries da escola; a lista de conteúdos- para as seis séries- do currículo escolar; características da matrícula, abundante nas três primeiras séries e escassa nas últimas; a proporção meninos/meninas nas séries; que no dia do pagamento das professoras não havia aula e que dia de chuva era dia de pouca freqüência. Os documentos mostram, também, que Dona Carmen morava na própria escola e parecia não estabelecer limites entre o público e o privado em relação à sua morada, como registra documento datado de 18 de outubro de 1915. Nele, Dona Carmen comunica ao Diretor da Escola Normal, Antonio Joaquim de Castro Faria, que “mandei proceder a caiação e outros reparos nos commodos deste predio destinado a minha residencia, por isso as aulas deste grupo não funccionarão um ou dois dias, 19 e 20 do corrente, porque vou mandar lavar todo o predio”. Outro fato que reflete a cultura escolar, refere-se a uma situação de atrito, em parte provocada pelo Diretor da Escola Normal, acontecida entre a diretora do Grupo Escolar João Clapp, Dona Carmen, considerada muito rígida 90 , e uma das professoras da Escola, por motivo de não cumprimento de horário. O caso, acontecido no dia 06 de setembro de 1915, véspera de feriado nacional, foi levado, por Dona Carmen, ao conhecimento do Diretor da Escola Normal 91. Assim escreveu a diretora: Em officio de 6 do corrente a V. Sª diz: “Porque me conste que os alumnos dessa escola não comparecerão hoje ás aulas rogo-vos consentir que as Senhoras Adjuntas possam retirar-se uma vez assignado o respectivo livro de presença”. No entanto tal não succedeu porque compareceram 220 alumnos. Entretanto a Senhora Adjunta Maria da Conceição Soutto Mayor, depois que eu recebi o officio de V. Sª quis retirarse da escola, allegando que eu recebera ordem de V. Sª o que muito surprehendeu-me porque não lhe tinha dito o que continha o officio. Expliquei-lhe que esse officio não vinham tendo lugar no grupo escolar “João Clapp” [...] decreta: Artigo Único – Fica creada a Escola Modelo annexa à Escola Normal de Campos [...]”. 90 Quem forneceu a informação foi o Dr. Admardo Peixoto, ex-aluno da João Clapp, de onde saiu para cursar o Liceu de Humanidades de Campos. Aos 97 anos de idade, perfeitamente lúcido, o Senhor contou, em Depoimento Oral/2005, que Dona Carmen não hesitava quando tinha que brigar, sendo pessoa muito correta e dedicada à escola. 91 Anteriormente parece ter havido outro conflito na escola, entre o lente de Pedagogia da Escola Normal, Sr. Benedicto Hermógenes de Menezes e uma professora da escola. Essa conclusão provém da leitura de um Ofício do Diretor dos Negócios do Interior e Justiça, João Bicalho Gomes Souza, datado de 5 de julho de 1915, enviado, como resposta, ao diretor Castro Faria, no qual, textualmente, citando o Art. 136 e seu parágrafo único, do Decreto 1420/1915, diz que as escolas modelo anexas às escolas normais “terão a mesma organisação das escolas complementares e serão regidas pelo regulamento e regimento das escolas publicas, sendo, porem, a sua fiscalisação immediata exercida pelo director da respectiva Escola Normal, sem prejuizo da que compete ao Director dos Negocios do Interior e Justiça”, sendo, portanto, evidente que tanto a professora da escola modelo como o lente de pedagogia, mesmo quando em exercícios práticos, são subordinados a uma direcção commum,ambos recebem instrucções do director da Escola Normal, que é o director mediato da escola modelo”.
me impunha a execução de nenhuma ordem porque nem sempre um constar é a expressão da verdade; eu não podia sem motivo justificado dispensar as adjuntas e os alumnos. Roguei-lhe que continuasse com seu serviço, ella recusou-se. Mostrei-lhe então os paragraphos 2º e 3º do “Regimento Interno” em vigor. 2º- O professor adjunto não poderá retirar-se antes de terminados os trabalhos escolares, salvo em caso se subita enfermidade. Por qualquer outro motivo, perderá o dia de trabalho. 3ºSob nenhum pretexto poderá o professor adjunto retirar-se da escola, mesmo em hora de recreio para voltar a ella depois, salvo licença especial do Inspector de Instrucção. O que assim proceder e igualmente o professor de escola complementar que em tal consentir, terão commetido infracção grave da Lei”. Mais uma vez D. Maria da Conceição Soutto Mayor recusou-se a obedecer o regulamento; comportou-se inconvenientemente, offerecendo aos alumnos presentes um exemplo de indisciplina escolar incorrendo pois nas penas do artigo 100 do Decreto 1200 de 7 de fevereiro de 1911, ainda em vigôr. Como a execução dessa pena excede a minha alçada, eis porque em officio de 6 do corrente solicitei a presença de V. S nessa escola. Respondendo V. S. immediatamente o meu officio, levei ao conhecimento de D. Maria da Conceição Soutto Mayor como a V. S. havia resolvido a questão. Esta adjunta, como todas as outras, permaneceu na escola até as 3 horas. A adjunta Maria do Carmo Ayres Neves retirou-se depois de ter assignado o ponto allegando para isso ter obtido licença com V. S.
Dois pontos são dignos de comentários nesse caso: o primeiro é a atitude do diretor da Escola Normal que, de forma profética, transferiu para a escola João Clapp uma situação que talvez vivenciasse no Liceu e na Escola Normal: o “enforcamento” de dia próximo a um feriado; o segundo foi a atitude firme de Dona Carmen que, diante da alta freqüência do alunado92 fez valer sua autoridade. Além de se recusar a obedecer ordens, mostrou conhecer a legislação educacional, na qual se ancorou para expor sua posição de diretora geral da escola. Esse fato, aliado a outro da ordem da saúde pública, levou-nos a pensar na saída da prática de ensino das normalistas daquele espaço. Apesar de a denominação “Escola Modelo João Clapp” constar de alguns documentos, a primeira escola do tipo “modelo”, em Campos, foi a criada, em fevereiro de 1916, para funcionar como escola anexa à Escola Normal de Campos.
3.4 A ESCOLA MODELO ANEXA À ESCOLA NORMAL DE CAMPOS: ABORDAGEM INICIAL
Partiram da direção da Escola Normal e Liceu de Humanidades de Campos as primeiras investidas junto à Diretoria de Instrução Pública do Estado, para a criação de uma escola modelo anexa à Escola Normal de Campos. Essa demanda exigiu muitos esforços dos dirigentes da Casa, demonstram as fontes. Essas nos falam da insatisfação com a “escola 92
A matrícula do Grupo Escolar João Clapp, em 31 de agosto de 1915 era de 328 alunos, sendo 160 do sexo masculino e 168 do feminino, dos 6 aos 14 anos. Desses, a freqüência média, por série, era: 216 da 1ª série, 49 da 2ª, 30 da 3ª, 11 da 4ª, 11 da 5ª e 8 da 6ª série (MAPA ESTATÍSTICO, 1915. Arquivo do Liceu).
complementar distante” em que as alunas aprendiam a ensinar; demonstram que já circulavam na Escola Normal de Campos idéias de uma educação renovada; e mostram o papel de alguns intelectuais na construção de um projeto de formação de professoras primárias no interior de um projeto maior, de formação de elites intelectuais, que auxiliassem a formar o novo cidadão brasileiro idealizado pela República. Em 1915, devido aos insistentes apelos do diretor Viveiros de Vasconcellos, seus superiores determinaram que a prática pedagógica das alunas da Escola Normal de Campos passasse a ser feita no Grupo Escolar João Clapp, localizado mais próximo ao prédio do Liceu. Desde início do mês de julho de 1915, porém, notava-se um certo movimento para que a prática de ensino deixasse de ser feita na “João Clapp”. Primeiramente, o clima no Grupo Escolar João Clapp parecia não ser muito amistoso para o pessoal do Liceu. Estavam acontecendo atritos entre a diretora Carmen Amancio e a direção e professores da Escola Normal, já relatados anteriormente. Outro fato importante foi que, em 28 de julho do mesmo ano, o diretor Antônio Joaquim de Castro Faria solicitou a visita da Diretoria de Higiene e Assistência Pública Municipal de Campos à Escola “João Clapp”, para proceder à fiscalização das condições do prédio. Em 3 de agosto, o Dr. Alpheu Gomes, Diretor daquele órgão, assim escreveu ao Diretor:
Informo-vos que encontrei a dita escola nas piores condições de higiene, o que se me afigura da maior gravidade em vista da elevada matricula de mais de 300 alumnos que ali ficam 6 horas durante o dia expostos aos inconvenientes de uma tal situação sanitaria. Para que o predio onde funcciona essa escola possa ficar nas condições prescriptas pela higiene, é de todo o ponto indispensavel a installação de 4 latrinas destinadas 2 a cada sexo; 2 lavatorios; 1 talha com torneira para evitar que a agua de beber seja contaminada pela caneca. É também de rigorosa necessidade que se proceda à caiação e limpeza geral do predio, promovendo-se as providencias necessarias para impedir que as aguas pluviais se canalisem para o porão do predio, estabelecendo uma humidade extremamente prejudicial à saude. Cumpre-nos lembrarvos que as medidas ora indicadas por esta Directoria devem ser postas em pratica com a maior urgencia, por assim o exigir a saude de mais de 300 creanças ameaçadas pelas pessimas condições em que se acha o predio.
Esse fato teve repercussão rápida. Em 17 de setembro do mesmo ano, o Sr. João Bicalho Gomes e Souza, diretor do Interior e Justiça do Estado comunicava ao Sr. Castro Faria,
para os devidos fins, que no officio em que propuzestes a creação de uma escola primaria modelo junto á Escola Normal e que funccionaria somente ás sextas-feiras,
com turmas de alumnos do grupo escolar “João Clapp”, o Exmo. Snr. Secretario Geral do Estado proferiu, em 15 do corrente, o seguinte despacho: “Declare-se que o Director da Escola Normal de Campos providenciará para que seja installada no edificio proprio da Escola, funccionando no proximo anno lectivo, uma escola primaria modelo, nos moldes do regulamento vigente, a qual abrirá matricula que não excederá de 35 a 40 alumnos. Cessará, desde então, o funccionamento do grupo escolar “João Clapp” como escola modelo.
Essa notícia foi registrada, por Castro Faria, em seu relatório de 1916, relativo a 1915. “Como auxilio ao ensino pratico da Pedagogia creou o Governo nos ultimos dias do anno de 1915 a Escola Modelo, annexa á Escola Normal, sendo que so no proximo anno me será licito tratar dos enormes beneficios que ella vai prestar ás Snrs. alumnas mestras”. Preparada pelas experiências anteriores, a das escolas anexas de Niterói e São Paulo, foi a idéia de uma escola modelo anexa à Escola Normal de Campos tomando corpo ainda na primeira década republicana. O processo político de criar escolas e prover a instrução foi fortemente marcado, nesse período, pela legislação educacional. Essa afirmativa é referenciada por Casemiro dos Reis Filho, para quem a legislação se constitui num dos mais eficazes instrumentos através do qual a escola brasileira foi-se con(formando) no tempo:
Os liberais, ao aceitarem como tarefa do Estado criar e manter escolas, especialmente, ao atribuírem, ao estado, o dever de criar para todos, oportunidades iguais de educação, tiveram que admitir a legitimidade da ação legislativa do Estado no campo da educação [...]. De qualquer modo, do debate de idéias parte-se para a concretização legislativa. Ou se consegue impor o modelo pedagógico na legislação e, por ela chegar-se à ação pedagógica, ou, com maior ou menor persistência, mantém-se o debate cada vez menos ouvido... (REIS FILHO, 1995, p.46).
Ao menos durante um período considerável de tempo, em especial no período abarcado pela pesquisa, anos 1916 a 1932, realmente é a legislação, abundante, que delineia os rumos da educação fluminense e, nela, as muitas normas da formação de professores primários93. No meio de um fervilhante campo de idéias pedagógicas renovadas, que transitavam entre São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Distrito Federal, para falar do campo nacional, os intelectuais e políticos fluminenses possibilitaram, pela legislação educacional, que fosse materializada, na cidade de Campos, uma escola modelo que, dirigida à formação de
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A respeito “as modificações de decretos, instruções, editais, poderia elucidar não só o dinamismo desse processo, tão pouco aparente, já que permanece oculto no caráter formal do texto divulgado, mas também as lutas travadas para manter ou interferir no poder de legislar” (NUNES, 1992, p.174).
professores pudesse contribuir, de forma efetiva, com o desenvolvimento da educação elementar e com o combate à chaga do analfabetismo. Embora não sendo a legislação responsável, diretamente, pela criação da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, o Decreto de nº 1241 de 13 de março de 1912, Expediente de 16 de março do mesmo ano, pode ser considerado, de forma indireta, seu embrião, pois estabelece a escola modelo como o espaço, por excelência, da formação prática docente. Por esse motivo, será enfocado de forma minuciosa, nesse trabalho. O bloco de leis 94 que se segue à de 1912, todas com referência às escolas modelo de Niterói e Campos 95, está assim composto: Lei nº 1224, de 6 de março de 1914; Lei nº 1229, de 18 de janeiro e Decreto de nº 1420, de 13 de abril do ano 1915. Sobre elas, serão feitas breves referências, no texto. Se considerarmos que o Liceu foi fruto da aspiração e luta da nova burguesia que se formava na planície campista em fins do XIX, pela formação de líderes intelectuais, e que a Escola Normal de Campos, republicana, foi desejada para formar as professoras primárias “construtoras da nação” 96 , entende-se a demanda pela escola modelo como um projeto também político, e inovador: formar professores capazes de praticar, com excelência, a arte de ensinar 97. Criada a Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, em 1916, cumpre-nos analisar os antecedentes dessa criação, as forças sociais e outros determinantes históricos da sociedade campista capazes de influir junto ao governo do Estado na “importação” de um projeto modelar de formação de professores, bem sucedido em outros estados, principalmente em São Paulo. Nessa análise, alguns pontos se destacam em nível de relevância: o contexto histórico da cidade de Campos, o descontentamento da direção da Escola Normal com o prédio e com a reação da direção da escola João Clapp à sua ingerência; a força política de intelectuais como Antonio Joaquim de Castro Faria, Sebastião Viveiros de Vasconcellos e Antonia Ribeiro de Castro Lopes; a presença do campista e liceísta Nilo Peçanha no governo do Estado do Rio de Janeiro, e a legislação educacional que exigia que a prática profissional se fizesse em escolas modelo. 94
As fontes legais foram recuperadas a partir da análise de documentos da Escola Modelo “Seis de Março”, nas quais eram citadas e, posteriormente, localizadas e transcritas dos arquivos da Biblioteca Nacional. 95 Mesmo que oficialmente o modelo só venha a ser operacionalizado em 1916, desde 1912 é referido na legislação. 96 Expressão usada por Lucia Müller. 97 Segundo Carvalho (2003, p. 125-128), o ato de ensinar foi entendido, em diferentes fases, na Primeira República, como “arte” e/ou como “ciência”.
3.5 A ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
O dia 7 de fevereiro de 1916 marcou a origem da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos98. Pelo Decreto nº 1468, o Presidente do Estado do Rio de Janeiro, Nilo Peçanha, decretou, e o Secretário Geral do Estado, José Mattoso Maia Forte entendeu e fez executar que “fica creada a Escola Modelo annexa à Escola Normal de Campos, na conformidade dos artigos 3º, lettra b e 136, do Decreto 1420, de 13 de abril de 1915 99. Por fim, a Lei nº 1317 de 17 de outubro de 1916, “approva o Dec. 1.468, de 7 de Fevereiro de 1916, creando a Escola Modelo annexa á Escola Normal de Campos”. Definida como instituto de ensino primário, misto, destinado aos exercícios práticos dos alunos da Escola Normal de Campos, a Escola Modelo-ainda sem a denominação “Seis de Março”-foi criada no mês de fevereiro, com a mesma organização das escolas complementares, pois tinha 6 séries. Somente no dia 17 do mês de outubro, porém, através da Lei nº 1.317, assinada no Paço da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, por seu Presidente, João Antonio de Oliveira Guimarães, o Decreto 1.468 foi aprovado. De forma diversa de suas co-irmãs fluminense e paulista, a escola de aplicação da Normal de Campos, não era mista. Em desacordo com a legislação, foi uma escola exclusivamente de meninas. Diferentemente das outras 100 , também, foi uma escola mal instalada, fisicamente, em salas da Escola Normal que, por sua vez, carecia de espaço apropriado e de mais banheiros, pois estes eram usados tanto pelas normalistas, como pelas crianças da Modelo. Prova-se, assim, que um dos motivos da criação da escola, talvez o maior deles, encontra-se na definição, política, de um novo projeto de escola, primária e de prática profissional das futuras professoras.
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O Decreto não faz referência ao nome Seis de Março, como a escola passou a ser denominada oficialmente em documentos. A respeito, não foi possível identificar o motivo desta denominação especial. Observamos, entretanto, que a escola foi criada com o nome “Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos” (documento de 1916). Em 1917 é referida como Escola Modelo “6 de Março”. A partir de 1918, todas as fontes trazem a denominação Escola Modelo “Seis de Março” (Arquivo Histórico do Liceu). 99 O Art. 3º diz que a Escola Modelo ou escola anexa de aplicação, é destinada à prática profissional e o Art. 136 define as escolas modelos anexas às escolas normais como institutos de ensino primário, mistos, destinados aos exercícios práticos dos alunos das mesmas escolas normais. 100 Na década de 1920 foi inaugurado o novo edifício da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Niterói, com todas as exigências requeridas pela pedagogia moderna.
Outro fator seria provocado pelo momento histórico vivido na cidade de Campos, inserida no debate das mudanças sociais e políticas daqueles tempos, e o papel, de “construtoras da nação”, atribuído às professoras primárias.
Ao ser abolida a escravidão e, em seguida, com a proclamação da República, intensifica-se a discussão sobre a nação. A idéia de nação pressupõe o cidadão e pressupõe, portanto, uma pauta de direitos e deveres entre o cidadão e sua nação. Significa também a aquisição de sentimentos, o “amor” à pátria”, a “veneração aos heróis pátrios”, “respeito aos símbolos pátrios”, especialmente o “respeito à bandeira”. A escola primária assume, então, um papel fundamental. Será através dela que a identidade e o sentimento nacional poderão ser construídos. Entra em cena, então, a professora primária (MÜLLER, 1999, p.11-12).
Pode-se, entender, ainda, a resolução do governo de instalar, a partir de 1916, “no predio em que funccionam os institutos sob vossa direcção, a escola modelo annexa ao grupo escolar “João Clapp” 101 e de afirmar que cessará, desde então, o funccionamento do grupo escolar “João Clapp” como escola modelo ”102 ao espaço em que funcionava a João Clapp na época. Considerando que as moças da Escola Normal eram, em sua maioria, filhas de comerciantes bem sucedidos, profissionais liberais, usineiros e fazendeiros da sociedade campista103 -até hoje apegada à tradição das famílias da Casa-Grande e de seus sobrenomese levando em consideração, também, as limitações no ir e vir da mulher naqueles tempos e a forte influência do higienismo, inclusive o escolar, na época, seria a Escola Modelo anexa à Escola João Clapp o melhor espaço para a prática profissional daquelas moças? Ou seria um espaço desvalorizado para a freqüência das alunas-mestras da Normal de Campos, pela sua estrutura física deficiente e anti-higiênica? A respeito, Escolano destaca que
não apenas o espaço-escola, mas também sua localização, a disposição dele na trama urbana dos povoados e cidades, tem de ser examinada como um elemento curricular”. O autor acrescenta que “a produção do espaço escolar no tecido de um espaço urbano 101
Ofício do Diretor dos Negócios do Interior e Justiça do Estado do Rio de Janeiro ao Diretor da Escola Normal e Lyceu de Campos, em 4 de outubro de 1915. 102 Ofício, de 17 de setembro de 1915, do Diretor dos Negócios do Interior e Justiça do Estado do Rio de Janeiro ao Diretor da Escola Normal e Lyceu de Campos. 103 Os depoimentos orais mostram que a clientela que freqüentava o Liceu e a Escola Normal provinha de uma fração economicamente bem situada da cidade, o que não é de se estranhar considerando que a escola pública ainda se constituía em espaço de acesso restrito para as camadas populares. Essa afirmação não invalida, entretanto, as exceções. Uma coisa é certa: ricos ou pobres, todos eram a elite intelectual da região. A propósito, em São Paulo esse fato se confirmou. Segundo Almeida (2004, p. 74) “pode-se afirmar que até os anos de 1940, a clientela da Escola Normal era formada por jovens provenientes das classes médias altas”.
determinado pode gerar uma imagem da escola como centro de um urbanismo racionalmente planificado ou como uma instituição marginal e excrescente (1998, p.28).
Outro fator considerado pertinente foi a resistência da diretora da escola João Clapp, Carmen Amancio, à “direção mediata”, ilimitada, do diretor da Escola Normal, Castro Faria, conforme demonstram fontes já citadas anteriormente. Outra hipótese que levantamos para a instalação de uma Escola Modelo no prédio do Liceu, refere-se à forte ligação que parecia existir entre políticos e intelectuais do recém-nato Estado do Rio de Janeiro, alguns deles campistas, como Nilo Peçanha 104 , Presidente do Estado no ano da fundação da Seis de Março e ex-liceísta, com diretores do Liceu. Essa hipótese foi levantada num entrecruzamento de dados, e no fato de, em Campos, existirem escolas primárias instaladas em prédios que, certamente, ofereceriam às crianças e professoras da Escola Modelo, melhores acomodações físicas. Localizada no Liceu, a Seis de Março nunca utilizou mais de duas salas: inicialmente foi-lhe cedida uma sala e, após o ano de 1923 mais uma105, ocupando, portanto, duas salas que eram destinadas às normalistas, nos fundos do prédio principal, o Solar do Barão, este reservado, pelo menos até a reforma Francisco Campos, aos alunos e professores do ensino secundário 106. Um outro aspecto relevante que o cruzamento das fontes apontou é que, em 1914, quando o diretor Viveiros de Vasconcellos escreveu seu relatório, encontrava-se matriculada no 5º ano da Escola Normal a Professora Antonia Ribeiro de Castro Lopes 107, recém-chegada 104
Segundo Peçanha (1989), Nilo “era tão ligado a Campos, que sua alcunha era Nilo Goiabada” (p.148). “Deputado duas vezes no Governo do Estado do Rio, Vice-Presidente e Presidente da República, Ministro e Senador” (p.36), Nilo Peçanha mantinha contato pessoal com Candido de Lacerda, Francisco Portela, Quintino Bocaiúva, personalidades cujos nomes se encontram assinando atos do Liceu. “Na chefia do governo do Estado do Rio Nilo criou escolas profissionalizantes e agrícolas, incentivou a instrução primária, instituiu uma taxa de pagamento para as escolas normais [...], novos prédios escolares” (p.76). “Estabeleceu a norma de só nomear professoras concursadas para o magistério, mostrando a importância e a seriedade com que via a tarefa de educar” (p.82). “Em novembro de 1916, como Presidente do Estado, levou a Campos o Presidente da República para inaugurar a Escola Wenceslau Brás (nome dado ao então mandatário da Nação), a primeira escola ao ar livre, inovação no campo pedagógico, fruto de suas observações de viagem à Europa” (p.104). Em 1917, ao assumir o cargo de Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil, lançou um manifesto onde dizia que “As Escolas serão os templos onde ele (o povo) irá receber a revelação dessas conquistas magníficas ( a Independência, a Abolição e a República) e aprender a amar e servir à Pátria e à Humanidade” (p.107). 105 Essa segunda sala foi cedida para ali funcionar um Jardim de Infância, de breve existência. Fechado o Jardim, a sala ficou para a Modelo. 106 A partir dessa Reforma, que extinguiu a “velha Escola Normal”, o espaço do Solar passou a ser usado, também, pelos alunos normalistas, em algumas aulas. A respeito da distribuição espacial do Liceu de Humanidades de Campos e da Escola Normal de Campos num espaço único, ver Martinez e Boynard (2004b). 107 Voltou Antonia Lopes a cursar a Escola Normal de Campos depois de 13 anos- pois formou-se em 1901 pela Escola Normal Livre- aos 40 anos de idade, para se especializar e poder reger Grupo Escolar (Lei nº 1224 de 6 de março de 1914 § 1º e 2º do Artigo 3º). Teve sucesso nesse aspecto. Foi nomeada para reger a Escola Complementar “Quinze de Novembro”, nos termos do Art. 3 §2º da lei 1224 de 6 de Março de 1914, a partir de 5 de março de 1915 (ARQUIVO DO LICEU: Ficha Funcional, 1933).
de São Paulo, para onde viajara em busca de tratamento para sua saúde, e de onde voltou vivamente impressionada com o ensino que “presenciou” na Escola Normal daquele Estado, e em sua anexa Escola Modelo 108. Chegava a Campos, via Antonia Lopes, o novo ideário pedagógico em prol de uma escola “renovada e ativa”, onde o projeto Escola Modelo, bem sucedido em São Paulo, ocupava lugar de destaque na formação de “novos professores” para os “novos tempos” republicanos. Se a indicação do diretor da Escola Normal 109 para que Antonia trabalhasse “com uma classe de principiantes” teve o efeito desejado, imediatamente, não é possível afirmar. Contudo, em 10 de abril de 1916, a professora foi nomeada para reger, como substituta, a cadeira de Pedagogia da Escola Normal de Campos, substituindo o titular, Benedicto Hermógenes de Menezes, com quem trabalhara no início de sua carreira, que se encontrava doente. A partir daí, sua presença e influência na Escola Normal de Campos foi exigida até sua aposentadoria. Somente em 1936, ao se aposentar e passar a residir na cidade do Rio de Janeiro, deixou de ter atuação direta na formação de professores campistas 110. Fatos como esses se constituem em fortes indícios de que a Professora Antonia, importante formadora de professores, tenha exercido papel de destaque na criação da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos 111. Papel que teve, também, a participação de outros atores, como veremos a seguir.
3.5.1 O PAPEL DOS INTELECTUAIS NA CRIAÇÃO DA ESCOLA MODELO”SEIS DE MARÇO”
Nos anos finais do século XIX, liberais, maçons, positivistas, republicanos e protestantes norte-americanos põem em circulação novos modelos pedagógicos, fundando escolas, difundindo-os pela imprensa e trazendo-os para o debate parlamentar. A ‘Propaganda Republicana” amplia e qualifica a difusão desses modelos, alardeando a indissociabilidade do trinômio “Educação, República e Cidadania”. Será no repertório assim constituído que os primeiros governos republicanos irão buscar os modelos e os ingredientes necessários à institucionalização de uma nova escola, que, 108
Em Ficha Funcional (1933), Antonia Lopes diz que “em 1913 fez curso de aperfeiçoamento na Escola Normal de S. Paulo” (Arquivo Histórico do Liceu). 109 Conhecer Antonia, ele conhecia, pois no relatório, diz: “Matriculada, como está, no 5º anno, a professora D. Antonia Ribeiro de Castro Lopes, veio de S. Paulo, onde estudou methodos do ensino primario que lá adotam e seria de grande vantagem que tivesse a seu cargo uma classe de principiantes, applicando, desse modo, os referidos methodos” (RELATÓRIO/1914. Arquivo Histórico do Liceu). 110 Pequena biografia da Profª Antonia Ribeiro de Castro Lopes consta do Capítulo 5 dessa dissertação. 111 A propósito, em 26 de dezembro de 1917, Antonia Lopes foi transferida, por permuta, do Grupo Escolar “Quinze de Novembro” para a Escola Modelo “Seis de Março”. A permuta foi feita com a Profª Alzira Collares Quitete, que dirigia, até então, a Modelo. Essa alteração de direção induz-nos a pensar que se desejava imprimir, na “Seis de Março” uma orientação pedagógica realmente modelar, da qual Antonia parecia, por sua experiência anterior, ser a representante ideal.
remodelada, segundo os preceitos da “pedagogia moderna”, fosse signo de excelência do novo regime e do Progresso que dele deveria advir (CARVALHO, 2003, p.336).
Em 1915, Campos era uma progressista cidade, com um bom comércio, cinemas, teatros, escolas e livrarias, embora fincada, ainda, na monocultura da cana-de-açúcar. Era também considerada um centro político importante, não mais somente pela força do dinheiro dos usineiros e donos de terra, mas pela nova elite que se foi formando, exigindo escolas para seus filhos e posição no cenário regional e nacional. Assim é que não se pode ignorar a força dessa elite na idealização do projeto que, gestado ainda no período imperial, criou o Liceu de Humanidades, acomodou-o num prédiomemória de poder e riqueza, e posteriormente, lutou pela Escola Normal e por uma escola de aplicação no mesmo espaço cheio de simbolismo e representações. Dentre os vultos que mais se empenharam na consecução de projeto de formação de professores com ênfase na formação prática, onde “os futuros mestres podiam ver como as crianças eram manejadas e instruídas” (CARVALHO, 2003, p.337), destacam-se os diretores da Escola Normal e Liceu de Humanidades, Antonio Joaquim de Castro Faria (de 1915 a 1919) e Sebastião Viveiros de Vasconcellos (1914, 1924 a 1926). Sobre Antonio Joaquim de Castro Faria (FIG.1) quem nos fala é Georgina de Castro Pache Faria, sua prima-irmã 112. Antonio Joaquim de Castro Faria era o primeiro filho varão do fazendeiro José Joaquim de Faria e de Delphina Angélica de Castro Faria. Estudou as primeiras letras na fazenda do Sapateiro, onde nasceu. Com esses poucos estudos veio cursar o Liceu de Campos, onde logo se sobressaiu pela inteligência. Foi contemporâneo de Nilo Peçanha. Aos 17 anos foi morar na Corte, com um tio, o Barão do Flamengo, que entusiasmado com sua inteligência o mandou estudar na Inglaterra, em 1888, para fazer o curso de engenheiro mecânico. Ali se aperfeiçoou na língua inglesa, tornando-se professor particular. Voltando para o Brasil sem terminar o curso, casou-se e passou a residir numa fazenda do município. Quando o governo do Estado do Rio de Janeiro abriu concurso para preencher diversas cadeiras do Liceu, inscreveu-se primeiramente em Matemática, mas para não prejudicar um concorrente amigo, mudou a opção para Inglês, obtendo êxito.
112
Conhecida como “Iaiá Faria”, Georgina foi professora de Português da Escola Normal de Campos. Foi ela quem custeou os estudos de Castro Faria na Inglaterra e escreveu sobre ele uma pequena biografia, importante fonte de pesquisa, que se encontra sob a guarda da Srª Eneida Lima de Faria Perez, filha de Sertório de Castro Faria, neta de Antonio Joaquim de Castro Faria.
Possuiu uma escola primária e secundária, com mais dois professores, o reputado “Pensionato Silva Tavares”. Foi diretor do Liceu nos seguintes períodos: 1906, 1907; 1911 a 1913; 1915 a 1919 (BOLETIM DO ARQUIVO HISTÓRICO DO LICEU, 1981, p.6). Faleceu em 1919, aos 51 anos, de esclerose cerebral. Sobre Sebastião Viveiros de Vasconcellos (FIG.1), fala-nos o memorialista campista Waldir Carvalho, em “Gente que é nome de rua”(1985, p.196). Sebastião Viveiros de Vasconcellos iniciou seus estudos na Vila de São Sebastião, município de Campos, onde nasceu, e concluiu seu aprendizado no Liceu de Humanidades de Campos. Foi o fundador do “Colégio Viveiros”, particular, e Vice-diretor e Diretor do Liceu e Escola Normal de Campos em várias ocasiões. Era homem de letras, e membro da Loja maçônica Atalaia do Sul 113. Sua atividade intelectual envolvia a poesia, a prosa, a filologia e a oratória. No campo da didática muito contribuiu com o seu livro “Verbos Portugueses e Rudimentos de Análise Léxica”, lançado em 1910, quando já era professor do Liceu e da Escola Normal, e hoje na 134ª edição. Como se pode perceber, ambos os professores eram homens do interior que estudaram no Liceu e se tornaram influentes em seus campos profissionais, fato que se repetiu por incontáveis vezes na história do Liceu e que pode ser apontado como um dos responsáveis pela criação da “mística liceísta114”. Uma mulher trilhou o mesmo caminho: Antonia Ribeiro de Castro Lopes. Nascida em Campos, morou numa fazenda até os dez anos de idade. Estudou na Escola Normal anexa ao Liceu de Humanidades e tornou-se referência na educação fluminense. Dentre seus feitos na área, pensamos na influência que exerceu, mesmo que de forma indireta, na criação da Escola Modelo “Seis de Março”, pois desde 1914, essa professora fazia circular, em Campos, os modelos pedagógicos que conheceu em São Paulo. Através de artigos de jornais115, configurando o que Carvalho (2003, p.37) chama “processos materiais de exposição e circulação de modelos pedagógicos”, que são “objetos culturais como livros, mobiliários, noticiário impresso em jornais ou revistas, etc. que, na sua materialidade dão a ver modelos de organização das “aulas” e ou práticas que põem esses modelos em circulação, 113
Fonte: Annuario Campista, 1920, p.102. A respeito, Décio Cretton diz ser aquela que “se traduz na crença numa educação democrática, concebida como direito do liceísta de se realizar plenamente e de participar na construção de um mundo melhor, através de edificações do futuro da pátria comum” (CRETTON, “O Espírito Liceísta”. In: VENÂNCIO, Maria Thereza da S. (org.). Poesia e Prosa para uma Homenagem. Campos, Liceu de Humanidades de Campos, 1980, p.70). 115 Em 12 e 13 de junho de 1914, o jornal Monitor Campista publicou artigo seu intitulado “Impressões sobre o ensino no Estado de São Paulo. Em 1915, Antonia Lopes escreveu um artigo sobre o uso da caligrafia vertical, que foi publicado, no mesmo jornal, nos dias 9 e 11 de maio, e que será comentado no Capítulo 4 dessa dissertação. 114
como viagens, correspondência, relatórios, exposições pedagógicas”, Antonia Lopes divulgava o que havia experimentado na Escola Normal de São Paulo:
Sentem-se bem as crianças na escola paulista; porque o ensino alli é todo intuitivo, pratico, conhecendo ellas, immediatamente a utilidade, a aplicação pratica do que aprendem; além disso o ensino é variado e suavizado pelas aulas de musica, que na Escola Modelo são habilmente dirigida pelo talentoso maestro João Gomes Filho (MONITOR CAMPISTA, 13/06/1914).
A outra força, política, que não pode ser ignorada na luta pela escola de aplicação anexa à Escola Normal é Nilo Peçanha, ex-aluno do Liceu, contemporâneo de Castro Faria e ocupante do mais alto cargo do Estado. Além da influência dos intelectuais, outro fator se impôs como determinante na criação da Escola Modelo: a legislação educacional.
3.5.2 A ORDENAÇÃO LEGAL
Assinado pelo Presidente do Estado do Rio de Janeiro, Dr. Francisco Chaves de Oliveira Botelho e pelo Secretário Geral, Domingos Mariano Barcellos, o Decreto nº 1241 de 13 de março de 1912, “reforma o ensino normal e secundário do Estado do Rio de Janeiro”. Embora não seja a legislação responsável, diretamente, pela criação da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, esse decreto pode ser considerado, de forma indireta, seu embrião, pois estabelece a escola modelo como o espaço, por excelência, da formação prática docente. A legislação de 1912 estabelece que cada escola normal
116
“constará de dous
departamentos, a escola normal propriamente dita, destinada ao ensino profissional theorico; e a Escola Modelo ou escola annexa, de applicação, destinada á pratica profissional”(art. 3º a e b), e define as Escolas Modelo “como institutos de ensino primario, mixtos, destinados aos exercicios praticos dos alumnos das mesmas escolas normaes” (art. 136), sendo “organizadas de maneira que os alumnos mestres nellas possam praticar convenientemente, sendo typos do 116
No decreto, as escolas normais são definidas “como estabelecimentos de ensino profissional, externatos, mixtos, de ensino leigo e frequencia obrigatoria- destinados a preparar os seus alumnos para exercerem scientificamente o magisterio primario nos seus diversos gráos” (Art.1º). A legislação determina “que o curso completo das escolas normaes será de quatro anos; que de todas as disciplinas serão ensinadas a theoria e a pratica; que sempre que se introduzir nos programas das escolas primarias alguma disciplina ou matéria, até então não ensinada, se estabelecerá a cadeira correspondente no curso normal” (Arts. 5º a 7º).
seu gênero” (Art.10). Aos alunos do 4º ano, caberá “acompanhar, não só os trabalhos da Escola Modelo, como também os serviços administrativos, interessando-se em tudo que se relacione com a execução do regulamento interno das escolas publicas” (Art.52). Esclarece, ainda, a forma de registro das observações “relativas aos trabalhos praticos, notas das excursões pedagogicas e resumo das lições que houverem dado, em cadernetas , devendo essas serem “examinadas e visadas mensalmente pelo lente de pedagogia” (Art.52). Esse lente será também o responsável pelas excursões pedagógicas, feitas “com a autorização do diretor, em dias previamente fixados” (Art. 51). Em relação ao tempo, o Decreto prevê que “o anno escolar será de oito mezes, contados de 15 de março a 14 de novembro, que as aulas funccionarão durante o dia, principiando ás 10 horas da manhã e findando, no máximo, ás 4 horas da tarde, que serão feriados além dos domingos, os dias de festividade nacional, os declarados pelo Governo, os que decorrem de 24 a 30 de junho, os de carnaval e os que decorrem da terminação dos exames á abertura das aulas” (Arts. 45, 46 e 53); e que “as lições theoricas para cada lente serão três, pelo menos, por semana, sendo que na cadeira de pedagogia, além das três aulas theoricas, haverá aulas praticas, semanalmente, no 4º anno” (Art. 47). “Na organização do horário a distribuição do tempo será feita de modo que as aulas no quarto anno occupem uma parte do dia, sendo o tempo restante reservado á Escola Modelo, devendo ficar inteiramente disponível um dia da semana para os exercícios na escola de applicação sob a direcção do lente de pedagogia” (Parágrafo Único do Art. 47). Dentre as atribuições que cabem ao porteiro da Escola Normal, há uma que se refere à Escola Modelo. A ele incumbe “a guarda, vigilancia e asseio do predio e material, tanto da Escola Normal como da Escola Modelo” (Art. 97, §2º), sendo de sua incumbência receber “o auxilio para asseio da Escola Modelo” (Parágrafo Único do Art. 97). Quanto ao uso do material, o Art. 134 do Decreto define que “os laboratorios, gabinetes, observatório meteorológico e a Escola Modelo, destinados aos trabalhos práticos dos alumnos, serão organizados de modo a corresponderem ás exigências do ensino experimental, devendo ser augmentados, gradativamente, de accôrdo com as dotações orçamentarias, dos melhores instrumentos, apparelhos, mobiliario e material destinado a ilustrar o ensino”. Nas Disposições Gerais, o Decreto nº 1241/1912 estabelece que “as Escolas Modelo terão a mesma organização das Escolas Complementares e serão regidas pelo regulamento e regimento das escolas publicas, sendo, porem, a sua fiscalização immediata exercida pelo Director da respectiva Escola Normal, sem prejuízo do que compete ao Inspector de
Instrucção; cada Escola Modelo será visitada, pelo menos mensalmente, pelo Director da Escola Normal, que, no respectivo livro, lavrará termo de visita, de que mandará enviar copia ao Inspector de Instrucção” (Art. 136, §§1º e 2º). Um outro aspecto definido pelo Decreto é o que se refere à seleção e vencimentos de professores para a Escola Modelo: “serão eles designados dentre os do quadro actual de professores complementares, unicamente tendo-se em vista o merecimento. Não perceberão, a mais, vencimento ou gratificação alguma, além do que lhes competirem como professores primarios (Art. 137), e serão nomeados por um biênio, podendo ser reconduzidos (§ 1º)”. Esse mesmo artigo prevê que “se no edificio da Escola Modelo não houver accommodações para a residência de sua professora, esta recebera um auxilio para o aluguel de casa, que será fixado pelo Secretario Geral” (§2º), e que “cada Escola Modelo terá tantos adjunctos quanto os grupos de quarenta (40) alumnos que puderem ser constituidos (§3º)”. A legislação que se segue, Lei nº 1224, de 6 de março de 1914, tem por fim aprovar o Decreto anterior -de nº 1241/1912-, e o faz com modificações. Dentre elas, podemos citar o aumento de quatro para cinco anos no “curso completo das escolas normaes” (§ 1º do Art. 2º). Enquanto aumenta o número de anos do Curso Normal, a Lei 1224/1914, no Art. 4º, diminui o número de lições teóricas para cada lente, inclusive o de Pedagogia. As três inicialmente previstas, passam a duas. Em relação ao tempo rigidamente estabelecido, no Decreto 1241/1912, para que os alunos do 4º ano se dediquem às atividades na Escola Modelo- um dia da semana deveria ser dedicado aos exercícios na escola de aplicação-, a Lei abranda a forma, definindo que “a distribuição do tempo será feita de modo a deixar o maior espaço para os exercicios na escola de applicação (Art. 5º)”. Em 1915, é promulgada a Lei nº 1229, de 18 de janeiro que, no art. 1º, autoriza o Poder Executivo a “reformar o Ensino Primario, Secundario e Normal [...] organizando, com economia, o quadro geral das escolas publicas primarias (complementares e singulares), fixando o numero de umas e outras”. Essa lei é operacionalizada pelo Decreto de nº 1420, de 13 de abril do ano 1915, que expede o “Regulamento do Ensino Secundário e Normal do Estado do Rio de Janeiro”, que altera a estrutura das Escolas Modelo (e Normais), nos seguintes aspectos: o Curso Normal volta a ser de 4 anos (Art. 5º), as aulas teóricas a serem três, por semana, para cada lente, sendo que na cadeira de pedagogia haverá além dessas, mais três aulas práticas, no 4º ano (Art.47). Outra mudança refere-se à nomeação dos professores para as Escolas Modelo, que “serão nomeados em comissão e conservados enquanto bem servirem” (§2º do Art.137), diferentemente do tempo de “um biênio” previsto no Decreto 1241/1912.
Do ano de 1915 ao de 1932 as alterações de rumo na Escola Modelo “Seis de Março” foram, de modo especial, causadas pela grande procura da comunidade campista, pelo ensino ministrado na escola. Essa conclusão se deve ao número considerável de alunos matriculados e esperando desistências 117, situação que, além de submeter a Diretora Consuelo Manhães à reprimenda de superior hierárquico, provocou a instalação de um segundo turno na escola e o aumento do número de professoras. Essas alterações na cultura escolar, não foram feitas por decreto. Quase sempre se fizeram por ofícios e circulares trocados entre diretores das escolas Normal e Modelo, inspetor de ensino e diretor de instrução pública. Assim, somente em 1931, outra legislação merecerá comentários, pois interferiu, profundamente, na concepção da Escola Modelo “Seis de Março”, e afetou, “de morte”, a Escola Normal. Refiro-me ao Decreto de nº 2.571 de 22 de abril de 1931, a Reforma Francisco Campos 118, que modificou o ensino secundário, imprimindo a esse nível um caráter nacional. Segundo Dutra119 (2005, p.40), em decorrência da Reforma do Ensino Secundário, no ano de 1931, a Escola Normal de Campos sofreu grandes transformações, que modificaram profundamente sua cultura escolar. Desde sua implantação em 1895 até o ano de 1931, a Escola Normal funcionava "junto" ao Liceu, pois havia matrícula separada e era considerada outra escola, que compartilhava o mesmo prédio, funcionários, alguns professores e muitas histórias.
Ao criar o ensino secundário básico obrigatório de cinco anos e o exame de admissão, o Decreto transformou todos os alunos em “liceístas”, acabando com a divisão entre estes e as “normalistas”120. A partir de então todos tinham que fazer o exame de admissão para o Liceu. Quem desejasse ser professora tinha que fazer o curso normal, que passou a constar de duas partes: a) do curso completo de humanidades e b) das cadeiras anexas ao curso do Liceu ( Trabalhos Manuais, nas 1ª e 2ª séries; Educação Física na 3ª, 4ª e 5ª séries) e ainda de mais um ano de 117
Fonte: Relatório de Consuelo de Almeida Manhães, 1927. A primeira reforma que Francisco Campos realizou, após tomar posse no Ministério da Educação e Saúde, foi a publicação do Decreto 19.890 que implantava a Reforma do Ensino Secundário. Sua consolidação se deu pelo Decreto 21. 241 e regulamentou-se pelo Decreto 2.571 (DUTRA,2005, p.40). 119 Aluna de Iniciação Científica do Curso de Bacharel em Ciência da Educação, membro do grupo de pesquisa da UENF, em sua monografia de conclusão do curso intitulada “A Escola Normal de Campos entre 1931 e 1938: o curso ginasial e o de especialização e aperfeiçoamento”, orientada pela Profª Silvia Alicia Martinez. 120 Inclusive o direito de estudar nas salas do Solar , até então reservadas aos liceístas. Estes, da mesma forma, passaram a usar a parte dos fundos do prédio do Liceu, reservada às normalistas. 118
especialização e aperfeiçoamento, onde seriam estudadas as seguintes disciplinas: pedagogia, metodologia didática, higiene- incluindo puericultura e primeiros cuidados médicos.” (Arts. 77 e 79 do Decreto Estadual n° 2.539 de 13/01/1931). Ao regulamentar a parte pedagógica do currículo e a prática de ensino, o Decreto previu que “as aulas praticas realizar-se-hão nas Escolas Modelo, que obedecem ao programma dos grupos escolares, que o ensino pratico compreenderá ainda excursões e visitas aos museus, jardins, fabricas, estações experimentais, conferencias, etc. e que as excursões fóra da cidade somente serão permittidas em periodos de ferias (Art.87 e Paragrafo Unico)”. Se a Escola Normal se transformou em Curso, perdendo seu caráter profissionalizante, a Escola Modelo perdeu sua função “inovadora”, pois passou a obedecer ao programa dos grupos escolares. Muda o caráter da prática de ensino. Muda o modelo pedagógico. É o início do processo que levará, em tempo indeterminado, mas para local conhecido, a “Beira-Valão” a Escola Modelo “Seis de Março”, na feição de Grupo Escolar “João Pessoa”. Quem nos informou a nova direção da Escola, foi a Profª Aldarina da Penha Carneiro, ex-aluna da Escola Normal de Campos, que trabalhou no Jardim de Infância anexo ao Grupo Escolar “João Pessoa”.
Quando saiu do Liceu, a Escola Modelo foi para a Beira-Valão [...] num famoso prédio que aqui tinha... (rindo) que chamavam de... era a residência de Dona Ana Pimenta. Essa criatura tinha uma coisa nela. Dizem que ela era muito má para as escravas, e as escravas a mataram. E esse prédio ficou famoso: era a residência de Dona Ana Pimenta. Mas, o João Pessoa ficou lá ... Quase na esquina da Rua Formosa [...]. Tinha um prédio grande, não é, que era o tal, de dois andares, de Dona Ana Pimenta que o Jardim e o Grupo ficaram lá (CARNEIRO, A., 2002).
3.5.3 O FIM DE UM MODELO
O fator que está na base do final do modelo “escola-modelo” em Campos, é a substituição de um projeto de formação de elites intelectuais, até então concentrado na Escola Normal, para o Ensino Secundário. Em tempo de uma sociedade que se urbaniza e industrializa, tramitando para uma sociedade urbano-industrial, a demanda se volta para a formação de profissionais liberais, engenheiros, advogados, e quadros intermediários que preencham tanto as funções do Estado, como as necessidades do capital: profissionais para a administração do comércio, da indústria e de outros setores afins.
Bem ou mal, o processo de escolarização já estava em curso. Não eram mais as professoras as únicas a “construir” a Nação brasileira. Precisava-se, no momento, de engenheiros para abrir estradas e pontes, médicos para controlar moléstias advindas do “progresso”, advogados para avaliar contratos e negócios, políticos e quadros dirigentes competentes. Vários “sintomas” ou “sinais” dessa questão começam a se fazer presentes no cotidiano do Liceu e da Escola Normal. A legislação educacional (Reformas Rocha Vaz (1926) e Francisco Campos (1931), essa última de forma decisiva, fortalecem o ensino secundário e, conseqüentemente, o Liceu de Humanidades que, com matrícula em expansão, passa a requerer o uso dos espaços ocupados pela Escola Normal e pela “Seis de Março”. O diálogo com as fontes levou-nos a concluir que o fim do modelo “Escola Normal”, pela Reforma Francisco Campos- sem dúvida o motivo mais forte- materializou-se em fatos que contribuíram para a saída da Escola Modelo do Liceu. O primeiro deles foi o Ato do Diretor de Instrução Pública, publicado no Diário Oficial do dia 2 de abril de 1932, p.2, que diz:
Foram declaradas adidas ao ‘Liceu de Humanidades de Campos’ as professoras do extinto Curso Propedêutico, da mesma cidade, Sylvia Rosário de Almeida, Jupyra Rodrigues, Lucia Lamy, Hercilia Reis, Maria do Carmo Abreu, Marianna Martins Santa Rita, Rosita Cardoso, Anita Gregory Barbeitas, Maria da Penha Vasconcellos Alvarenga, Enedina Moura Gonçalves, Antonia Xavier Rocha Campista, Vivaldina Oliveira, Jandyra Teixeira de Queiroz Freitas, Dulce Freitas de Souza, Faride Miguel Chacar e a adjunta de 1ª classe Jurema Cruz.
Eram 16 novas professoras, chegando ao Liceu e precisando de espaço para trabalhar... O segundo fato teria sido o grande aumento de matrícula do Liceu, ocasionado pela reforma de 1931. Quadro elaborado por Dutra (2005, p.41), mostra a evolução da matrícula dessa escola de 1921 a 1932 Ano
Alunos Matriculados
Ano
Alunos Matriculados
1921
81
1927
216
1922
75
1928
159
1923
78
1929
213
1924
149
1930
245
1925
211
1931
490
1926
175
1932
577
FONTE: Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos - documentos vários
Como terceira evidência apontamos para as mudanças de paradigmas que se faziam sentir no campo da prática de ensino, principalmente na Escola Normal do Distrito Federal, sob a influência direta das idéias da Escola Nova impregnadas nas ações dos chamados “renovadores da educação nacional”. Ao estudar a Reforma da Instrução Pública no Distrito Federal entre 1931 e 1935, Clarice Nunes mostra que essa Reforma, implementada por Anísio Teixeira, teve como base o “movimento de modernização escolar iniciado por Antonio Carneiro Leão (1922- 1926) e Fernando de Azevedo (1928-1931)” (NUNES, 1992, p.159). Em 1931, extingue-se no Estado do Rio a iniciativa das “Escolas Modelo” e passa-se a vivenciar a experiência das “Escolas de Demonstração”. Grande crítico do primeiro e defensor do segundo modelo de formação prática de professores foi o Prof. Lourenço Filho (2001), que diz:
Para execução da prática de ensino, a escola anexa a institutos de formação do magistério não poderá nem deverá ser concebida como “escola-modelo”– escola de esquemas feitos e intangíveis–, mas como “escola de demonstração”, escola de alto nível técnico, com caráter experimental. Há que explicar, certamente, esta última denominação. Uma “escola-modelo” é uma organização rígida, de conclusões feitas. Uma “escola de demonstração”, ao contrário, é uma escola flexível, aparelhamento que admite variações, segundo princípios definidos, e fatores bem determinados e controlados. Esses princípios são dos fundamentos do próprio ensino pedagógico da escola de preparação para o magistério a que esteja anexa (p.57).
Por fim, o último ato que consideramos decisivo para o fim da Escola Modelo é um ofício de 6 de abril de 1932, do Diretor em exercício do Liceu e Escola Normal , Manoel Martins Manhães121, ao Diretor de Instrução Pública, no qual o primeiro faz referência às grandes mudanças no uso do espaço escolar, com o aumento de turmas do curso secundário. Ressente-se com a falta de serventes para fazer o “asseio do edifício”, com a falta de “inspetores e inspetoras” (agora são muitas as moças do Liceu), e com as dificuldades de adaptar as mudanças curriculares ao tradicional tempo liceísta, pois, diz: “com a criação da cadeira de Educação Física, pela Portaria de 30 de junho de 1931, pelo Ministro de Educação e Saude Publica, fui obrigado a estabelecer o horario das aulas dessa disciplina para as 8 horas da manhã, começando as outras aulas ás 10 horas, menos para o 1º e 2º ano, que começam ás 13 horas e terminam ás 17”. Por fim, apresenta uma solução para os problemas que o afligem. E lança a sentença que extingue a Escola Modelo:
121
O Prof. Manoel Martins Manhães era pai da Professora Consuelo Manhães, diretora da Escola Modelo “Seis de Março”, já afastada da direção dessa escola, na época.
Torna-se imprescindivel a saida da Escola Modelo das salas que ocupa no Liceu, visto que, com o numero de turmas de alunos é impossivel funcionar todas as salas que tenho disponiveis. Atualmente são 19 turmas, mas com o desdobramento das turmas de Francês do 1º e 2º ano, e de Inglês do 2º, o numero de turmas será de 30, que com mais 4 turmas de Trabalhos Manuais do 1º ano e de 3 turmas do 2º ano, elevar-se-á a 37 turmas (MANHÃES, M., 1932)-(FIG.2).
Considerando, entretanto, que a turma que começou o 1º ano da antiga Escola Normal em 1930, antes da reforma Francisco Campos, deveria terminar o curso em 1933, pelo currículo antigo, como é de direito, é possível que o tempo da Escola Modelo, no Liceu, tenha se estendido um pouco além. A pesquisa não conseguiu esclarecer a data exata da saída da Escola Modelo do prédio do Liceu. As dúvidas foram, em parte, provocadas, por instruções legais recolhidas em dois jornais “Diário Oficial” do ano de 1931. Na edição de 6 de novembro de 1931, p.5, na parte relativa à Diretoria da Instrução Publica do Estado do Rio de Janeiro, encontramos a “Súmula demonstrativa do corpo docente, matricula e freqüência das escolas públicas do Estado, no mês de Setembro do ano de 1931”. É a seguinte: “Classificação das escolas: Escolas Maternais (4), Jardins de Infancia (4), Escolas de 1º gráo (407), Escolas de 2º gráo (405), Grupos Escolares (71), Escolas Modelo (--), Cursos Propedeuticos (2), Escolas Subvencionadas (61 diurnas e 39 noturnas), Escolas Noturnas (6), Cursos anexos ás Escolas Profissionais (1). Total: 1000 escolas”. Como se vê, oficialmente em 6 de novembro de 1931 não há mais Escola Modelo em Campos. De forma instigante, no “Diário Oficial” de 13 de novembro de 1931, p.7, também no espaço da Diretoria da Instrução Pública, encontramos a “Relação das comissões examinadoras do corrente ano da Inspetoria da Quarta Região Escolar (Campos, S. João da Barra e Itaperuna)”. Dentre outras escolas, consta a chamada para exames, em 16 de novembro, da “ Escola Modelo “Seis de Março”. Serão “9 os examinandos”. A comissão examinadora era composta pelas Professoras “Maria Manhães Corrêa, Presidente; Maria Thereza (sic) Ribeiro da Costa, Clara Maria Spittler Wagner, Ester Feydit e Maria Zenith de Almeida- Data dos exames, 16 de Novembro”. Como que para encerrar tantas dúvidas a respeito da provável data da saída da Escola Modelo do Liceu, localizamos, no “Diário Oficial” do Estado do Rio de Janeiro de 17 de novembro de 1931, n.117, capa, em Atos do Governo Provisório, a seguinte legislação: Decreto nº 2.676, de igual data, assinado por Pantaleão da Silva Pessoa, Oswaldo Luiz
Cardoso de Mello, Sylvestre Rocha, Brasiliano Americano Freire, Archimedes de Lima Câmara, que diz:
Considerando que a designação de institutos de ensino publico deve ter por finalidade o estimulo á pratica de virtudes cívicas e privadas; Considerando que o artigo 105 do Regulamento aprovado pelo Decreto 2.383, de 28 de janeiro de 1929, institúe que os grupos escolares tenham designação especial em homenagem a extintos brasileiros, a professores extintos ou a grandes datas nacionais; Considerando que apezar deste dispositivo legal exigir que a designação fique limitada a pessoas extintas, ha varios estabelecimentos de ensino com designação feita contrariamente ao preceito legal, e em epoca em que o ato dessas designações significava apenas homenagem a detentores do poder, Decreta: Artigo Unico- Ficam sem efeito as designações dadas a estabelecimentos de ensino que contrariarem o disposto no artigo 105 do Regulamento aprovado pelo Decreto n. 2383 de 28 de janeiro de 1929, e alteradas as que constam da tabela anexa assinada pelo Secretario de Negócios do Interior e Justiça.
No dia seguinte, na página 3, foi publicada a seguinte tabela a que se refere o Decreto, com “Observações”.
“Tabela das novas designações de grupos escolares, anexa ao Decreto n. 2.676, de 17 de Novembro de 1931” (FIG.3) Municípios Angra dos Reis Araruama Bom Jardim Cabo Frio Campos Campos Campos Campos Campos Iguassú Itaocára Itaperuna Macaé Niterói Niterói Parati Petropolis
Designação Lopes Trovão Annibal Benévolo Ramiro Braga Jansen de Mello José do Patrocínio Benta Pereira Pereira Barreto João Pessôa Mariana Barreto Rangel Pestana Saldanha da Gama Pereira Passos Visconde de Quissamã Joaquim Tavora João Kopke Raul Pompéa Thomaz da Porciuncula
Observações A instalar Ex- Wencesláo Braz Curso Propedeutico Antiga Escola Modelo Escola Maternal A instalar Ex- Raul Veiga Ex- Arthur Bernardes Escola Maternal, a instalar A instalar Escola Maternal, a instalar
Valença Barão de Miracema Fonte: Diário Oficial, 17 de novembro de 1931
Em novembro de 1931, a Escola não é mais modelo, é grupo escolar 122. A formação prática de professores, em Campos, volta à que se fazia até o início de 1916: fora da Escola Normal, em grupos escolares da cidade.
CAPÍTULO 4 A ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”: ASPECTOS DE CULTURA ESCOLAR
Criada a Escola Modelo, começaram os preparativos para acomodá-la junto à Escola Normal. Foi grande a movimentação na direção e secretaria da Escola, conforme demonstram documentos expedidos e recebidos, em 1915. 122
Consta dos arquivos do atual Colégio Estadual João Pessoa a informação de que foi criado em 17 de novembro de 1931, como herdeiro da Escola Modelo.
Na tentativa de registrar alguns dos momentos que caracterizaram a instalação da Escola Modelo em Campos, tentaremos apresentar os principais fatos que recortamos num universo de informações. No dia 6 de setembro, o diretor da Escola Normal recebeu, do Sr. João José de Mendonça Cardoso, Substituto do Diretor dos Negócios do Interior e Justiça do Estado do Rio de Janeiro a comunicação de “que o Governo vos autorisa a propôr a locação de um predio em melhores condições hygienicas para a mudança immediata da escola modelo João Clapp, nessa cidade”. O local se define no dia 26 do mesmo mês. Em Ofício dessa data, o Sr. João Bicalho Gomes Souza, Diretor dos Negócios do Interior e Justiça do Estado diz estar resolvida “a instalação da escola modelo no proximo anno, no edificio onde funcionam os institutos sob vossa direcção” e, em 4 de outubro, chegou ao Liceu autorização para se utilizar “verba de custeio para ali instalar a Escola Modelo ora anexa a João Clapp” . Em 31 de março do ano seguinte, o Diretor da Escola Normal e Liceu, Antonio Joaquim de Castro Faria, autorizou aos Senhores Miranda Salgado, e Cia a “fazer a adaptação de uma sala à Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos com a substituição de duas janelas por portas de madeira de lei, de uma porta por janela, mais pintura. Pela quantia de 220$000 (duzentos e vinte mil réis)”, a ser usada da verba “custeio” (FIG.4). Relatório escrito por Castro Faria, em 1916, demonstra que não era apenas a sala motivo de preocupação:
Autorisada pelo Governo, providenciou esta Directoria a acquisição do mobiliario adaptavel, typo americano, para a Escola Modelo annexa á Escola Normal, dentro da verba para esse fim destinada, achando-se encommendadas 30 carteiras a uma fabrica dos Estados Unidos da America do Norte, que deverá entregal-as aqui em Julho deste anno, o mais tardar (CASTRO FARIA, 1916)-(FIG.5).
A grande preocupação com o espaço para abrigar a Escola Modelo, era compreensível, já que no prédio já funcionavam o Liceu de Humanidades e a Escola Normal de Campos. A solução encontrada foi instalar a Escola Modelo em uma das oito salas da Escola Normal. Mobiliário e sala de aula. Essas preocupações transparecem dos documentos. Nada existe, entretanto, sobre como se procedeu a escolha da professora que deveria dirigir os primeiros anos da Escola. Sua identificação foi possível graças a Lamego (1943, p.48) que diz: “Em 1916 tomaram posse: em 1 de Março, Alzira Colares Quitete, regente da Escola Modelo anexa à Escola Normal [...]”.
Visando a organizar as informações obtidas nos arquivos dentro e fora da escola, de modo a re(significar) a cultura escolar da Escola Modelo “Seis de Março”, entendida como objeto histórico e conceituada por Julia (2001, p.10 ) como “um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos”, uma preocupação, tomada ainda desse autor, se torna basilar, qual seja: “A partir de quais elementos e como podemos examinar a cultura escolar de maneira rigorosa?” À luz dos estudos de Mogarro (2005), Magalhães (1999), Buffa (1996), estabelecemos algumas categorias que orientem a análise do objeto Escola Modelo “Seis de Março”, questão primeira da pesquisa, não permitindo que dele nos distanciemos, demasiadamente, nem que percamos de vista o rigor da investigação científica. Assim, origem, espaço, tempo, aspectos administrativos e pedagógicos, e atores educativos constituirão o suporte “materializado” sobre o qual repousa a presente análise. Ao examinar a cultura da Escola Modelo “Seis de Março” levaremos em consideração, então: o ESPAÇO, seu estilo e sua organização (local/lugar; edifício/topografia; projetos); o TEMPO, o calendário, horário, o tempo “escolar”; ASPECTOS ADMINISTRATIVOS, as normas, a movimentação escolar, as relações com órgãos institucionais e com a direção do Liceu de Humanidades e Escola Normal de Campos, os recursos materiais; ATORES EDUCATIVOS,
as
diretoras,
professoras,
alunas
e
funcionários;
ASPECTOS
PEDAGÓGICOS, os conteúdos escolares, o currículo formal e o “em ação”, avaliação, manuais escolares, métodos de ensino, ideário pedagógico, as relações teoria-prática/Escola Normal-Escola Modelo. Nessa perspectiva, o estudo se fará por partes, embora o todo, em nenhum momento, deixe de compor o fundo de cena da história e das memórias aqui relembradas.
4.1 OS ESPAÇOS ESCOLARES NO PRÉDIO DO LICEU DE HUMANIDADES DE CAMPOS
“Um dos elementos-chave na configuração da cultura escolar de uma determinada instituição, juntamente com a distribuição e comunicação nela utilizadas, é a distribuição e os usos do espaço” (VINÃO, 2005). Para falar do espaço onde funcionava a Escola Modelo será preciso, antes, falar dos espaços escolares divididos no prédio do Liceu de Humanidades de Campos.
Fundado em 1880, o Liceu foi instalado na antiga residência do Barão da Lagoa Dourada, um aristocrático solar. Até 1894 habitou, sozinho, aquele espaço. A partir de 1895, e por quase sessenta anos, abrigou a Escola Normal de Campos, na parte dos fundos do prédio. Com a criação da Escola Modelo, em 1916, mais um instituto de ensino passou a dividir o espaço escolar, mais precisamente, o reservado às normalistas. Dentre os anos de 1916 a 1932 foram vivenciadas três experiências educacionais diferentes naquele espaço: uma escola secundária, uma escola normal e uma escola primária, de formação prática de normalistas. Necessário se faz acrescentar que a ocupação desse espaço sofreu mobilidade, e foi (re)construída à medida em que esses projetos de escola sofreram modificações, fossem elas de cunho pedagógico ou administrativo.
4.1.1 O ESPAÇO DOS SECUNDARISTAS (FIG.6)
Descrever poeticamente o prédio do Liceu parece ter sido uma constante nos relatórios dos diretores e nos artigos dos historiadores e memorialistas. Algumas filigranas, abaixo transcritas, pretendem fazer conhecer o espaço.
O palácio possui dois pavimentos. [...] Ao penetrar os umbrais, deparamos logo com duas gigantescas portas de ferro, grandiosas, apoiadas em imensas lajotas de pedra e de onde nasce a ampla escadaria, bifurcada em dois lances e que vão dar acesso ao esplendoroso Salão Nobre [...]. Um amplo salão na parte posterior é a sala dos banquetes, encimada e decorada por frutos tropicais em alto relevo, não faltando sequer, na parte central, um pequeno coreto interno para orquestra de cordas ou conjunto camerístico [...]. (CUNHA, 1980, p.54-55).
Ampliando a descrição do interior do prédio, o Diretor Castro Faria, ao relatar ao Diretor de Instrução Pública, como se dera o funcionamento das Escolas em 1915, destacou o local amplo (3.000 metros quadrados) e central em que estão situadas, ao afirmar que “o edificio em que funccionam a Escola Normal e o Lyceu de Humanidades de Campos, está situado á praça Barão do Rio Branco, o local mais elevado da cidade de Campos, e é servido por linhas de bonds, que o põem em communicação directa com o centro populoso” 123. O registro feito por outro diretor, Viveiros de Vasconcellos, em maio de 1924, abaixo transcrito, resgata um pouco da história da aquisição do prédio, e de quebra, revela a intenção
123
Essa observação é relevante, pois no início do Século XX, a localização do Liceu era tida como periférica. Houve, por isso mesmo, mudança dessa escola para o prédio da Câmara Municipal, situado ao lado da Igreja Matriz, no centro da cidade, por breve período.
do povo de Campos de fazer da progressista cidade, à época, a capital da província do Rio de Janeiro. O documento reserva, ainda, uma informação importante, qual seja a intenção (abortada ainda no rascunho, pois está riscada) de se mandar construir um edifício para a Escola Modelo, já que os demais documentos que tratam dessa instituição falam em adaptar espaços ( geralmente a casa do porteiro) para tirar a Modelo das salas da Escola Normal.
Funcciona o Lyceu de Campos, inaugurado em 4 de março de 1884 sendo então presidente da Provincia Dr. José Leandro de Godoy e Benevides, no antigo palacete do Barão da Lagoa Dourada, proprio municipal, adquirido, em hasta publica, por um grupo de campistas, para o fim prefixado de ser nelle installado o Lyceu de Campos, ou servir de residencia do presidente, quando fosse esta cidade a capital da então Provincia. É edificio de architetura antiga, mas de construcção muito solida e possue, alem de luxuoso salão nobre, salas amplas e bem ventiladas, por onde se acham distribuidas a administração e as diversas aulas. Está situado na antiga praça do Pinheiro, hoje Barão do Rio Branco, olhando para esta e possuindo bastante terreno dos lados, que podem ser aproveitados para a construcção do pavilhão de gymnastica e edificio da escola modelo (atachado no original ). (VASCONCELLOS, 1924).
Passamos, a seguir, aos registros sobre o espaço reservado à Escola Normal de Campos, também constantes dos relatórios de diretores 124.
4.1.2 O ESPAÇO DAS NORMALISTAS (FIG.7)
Localizadas na parte de trás do prédio principal há oito amplas salas de aula 125. Não se sabe se faziam parte da planta original da residência, ou se foram construídas, posteriormente, para abrigar a Escola Normal. O certo é que, em 1913, essas salas passaram por uma reforma que mereceu comentário do diretor Viveiros de Vasconcellos:
124
Esses relatórios, importantes fontes, foram produzidos em 1914 (Viveiros de Vasconcellos), 1916 (Castro Faria), 1924 e 1925 (Viveiros de Vasconcellos) e 1927 (7 relatórios produzidos pela diretora e pelas professoras da Escola Modelo “Seis de Março”). 125 Os primeiros relatórios dos diretores da Escola Normal e Liceu, falam do tempo em que as oito salas eram usadas para as aulas das normalistas. Entretanto, os depoimentos orais de alunas que estiveram na Escola Modelo “Seis de Março”, antes dos anos 1930, registram a Escola Normal funcionando em quatro salas do lado esquerdo do prédio, ficando as outras para laboratórios e outros fins. Após 1931, o uso do espaço se modificou, com todos os alunos, liceístas e normalistas, usando tanto as salas do Solar, como as do prédio dos fundos, que ficou conhecido por “senzala”. Interessante observar que as pessoas mais idosas, entrevistadas, não sabem desse apelido dado àquele espaço, o que nos faz levantar a hipótese de que esse nome tenha sido cunhado a partir da época em que os alunos do Liceu, que viviam no Solar, passaram, também eles, a usar a parte de trás do prédio “nobre”. Martinez e Boynard estudaram o uso dos espaços escolares no texto “Atrás da Casa-Grande: memória, gênero e espaço escolar da Escola Normal de Campos (1894-1954), 2004b.
Quase concluidas as obras da Escola Normal, faltando apenas uma pequena parte, actualmente residencia do porteiro do estabelecimento. O que está feito é um trabalho magnifico. São oito salas destinadas ás aulas, completamente reformadas. Solo empedrado e cimentado, assoalhos novos, caiação, pintura interior e exterior, tudo apresenta a todas as luzes, a impressão de um serviço intelligente
(VASCONCELLOS, 1914).
Pode-se observar, no relato acima, que em 1913 a Escola Normal tinha oito salas a ela reservadas. Nesse ano, segundo o documento “Estatistica da matricula e frequencia dos anos de 1908 a 1916- Liceu e Escola Normal” localizado no arquivo do Liceu, havia 122 alunos na Escola Normal, sendo 9 do sexo masculino e 113 do feminino. Concluíram o curso, 16 moças. Considerando que em 1911 cessou a equiparação do Liceu com o Colégio Pedro II, com a Lei Rivadávia Correa 126, “o que levou quase à morte o velho estabelecimento, padrão de ensino e orgulho dos campistas [...] com sua matrícula baixando, pavorosamente, ao numero de oito alunos, sendo cinco gratuitos!” (VASCONCELLOS, 1913), pode-se concluir que havia muito espaço sem uso no Solar do Barão naquele tempo. A partir desse momento, com o Curso Normal praticamente mantendo a vida do Estabelecimento, no espaço eram usadas sete salas de aula para a Escola Normal e uma, a de nº 4 (última do lado esquerdo) era reservada à Escola Modelo. Nela, existiam 30 carteiras simples; 30 bancos simples para as respectivas carteiras; 8 bancos duplos; 4 carteiras duplas; 1 estrado; uma mesa para o professor; uma cadeira de braço; duas mesas pequenas; 1 tinteiro; 1 escarrador higiênico; duas moringas; 1 copo; 1 lavatório; 2 globos geográficos; 14 mapas; 1 tímpano; uma sineta. Havia, também, uma Sala de Espera dos alunos da Escola Normal e o pavilhão sanitário dos alunos da Escola Normal (INVENTÁRIO do ano de 1923). O espaço para a Escola Normal e Modelo parece ter-se reduzido, paulatinamente, com a retomada do crescimento do Liceu 127, o que se deu, paulatinamente, com impulso maior em 1916, quando, em 1ª de março de 1916, o Sr. Carlos Maximiliano, Ministro da Justiça 126
É o Decreto n. 1241 de 13 de março de 1912 que confirma que, logo após a Reforma Rivadávia Correa, o “Lyceu de Campos” tornou-se, por certo tempo, uma ‘Secção Annexa de Ensino Secundario” da Escola Normal de Campos. “As disciplinas serão leccionadas nas proprias aulas da Escola Normal, ou em aulas especiaes, se assim o exigir a frequencia, havendo aulas distinctas de inglez, latim, algebra, geometria e trigonometria”(Art. 4º). Nas Disposições Transitórias diz: “Art. 1º- O pessoal administrativo do Lyceu de Campos será o mesmo da Escola Normal dessa cidade, sem mais remunerações. Art. 4º- Na regencia de cadeiras novas ou vagas nas escolas normaes poderão ser aproveitados lentes ou professores vitalicios do Lyceu de Humanidades de Campos”. 127 Documento existente no arquivo do Liceu mostra que em 1908, num total de 94 alunos apenas 6 concluiram o curso do Liceu. Em 1913 a matrícula foi de 10 alunos; em 1914, de 36; em 1915, de 85; em 1916, de 102 alunos. Por sua vez, a matrícula da Escola Normal manteve, no mesmo período, matrícula média entre 120 e 140 alunos.
assignou a portaria, equiparando aos estabelecimentos officiais de ensino, os seguintes: Faculdade de Medicina de Porto Alegre; Escola Polytechnica da Bahia; Escola de Pharmacia de Ouro Preto; Gymnasio da Capital do Estado de São Paulo; Gymnasio de Campinas; Gymnasio de Ribeirão Preto; Gymnasio Espiritosantense; Lyceu de Humanidades de Campos; Lyceu Paraibano e Lyceu Cuiabano (Jornal MONITOR CAMPISTA, 03 de março de 1916).
4.1.3 O ESPAÇO DA ESCOLA MODELO (FIG.6 e 7)
Foi localizado, no Arquivo Histórico do Liceu, um esboço de “planta baixa” dos fundos do prédio do Liceu. Por ele, é possível localizar o espaço destinado a cada um dos segmentos escolares: o Liceu, no prédio principal, representado pelas escadas do fundo do Solar, a Escola Normal (1895/1931), a Escola Modelo e a casa do Zelador 128. A planta baixa (FIG.7) mostra que o espaço de circulação da Escola Normal era voltado para o centro do terreno, entre as duas alas de salas. Já o da Escola Modelo voltavase para o lado de fora do prédio, do lado esquerdo de quem entra no Solar. Segundo Stella Tinoco Dias, em seu tempo de estudante da Escola “Seis de Março”entre 1919 e 1926 129- não havia nenhuma comunicação entre a Escola Modelo e as outras duas escolas. Com exceção da entrada, que era feita pelo mesmo portão da Escola Normal (lado esquerdo do prédio, reservado às mulheres), no interior do prédio não havia comunicação. Outra ex-aluna, da Escola Normal, Aldarina da Penha Carneiro, assim se recorda da Escola Modelo “Seis de Março”:
Até me lembro muito, que no meu tempo havia na Escola Normal a Escola Modelo, que depois se tornou João Pessoa. Essa Escola Modelo, as meninas que estudavam lá, terminavam a 5ª série, entravam sem fazer o Exame de Admissão, mas tinham que fazer o exame de Francês, porque lá não ensinavam Francês e o Exame de Admissão tinha Francês [...]. A Escola Modelo era junto com o Liceu, com a Escola Normal, entendeu? Mas, tinha que fazer o exame de francês, porque o exame de admissão tinha que fazer francês, e lá na Escola Modelo não se dava francês. Então... eu tinha umas quatro colegas que entraram assim para a Escola Normal, mas tiveram que fazer exame de francês. A Escola Modelo era um Grupo Escolar, da 1ª à 5ª série, era uma escola primária completa. Era dentro do Liceu... era continuação...engraçado, que no tempo em que eu estudei, eu nunca soube que aquilo...mas hoje eu soube que aquilo se 128
Esse documento foi o único em que a função de “zelador” é citada. Nos demais, aparece a denominação “porteiro”. 129 Consta, em “Diário de Classe” preparado pela normalista Maria Carlota Baptista Tavares para aula prática na Escola Modelo, em maio de 1919, o nome de Stella Tinoco como aluna da 1ª série, o que nos leva a supor que essa aluna tenha cursado da 1ª série A, B e C, à 6ª série da Escola Modelo, já que se formou, pela Escola Normal de Campos, em curso de 4 anos, em 1930.
chama senzala, não é? Você já ouviu falar? Mas nós estudávamos ali, tinha salas de um lado e do outro, mas eu nunca soube que aquilo era senzala, ninguém falava. Tinha um lado e outro, não é? No fim desse lado (esquerdo), me lembro muito, desse lado aqui tinha duas salas que eram a Escola Modelo, entendeu? A Escola Modelo era separada da gente, não é? Tinha lá a diretora dela, as professoras. Eu me lembro muito que eu estava na sala de aula da gente quando elas passavam, as professoras, para irem para lá. [...] As crianças eu não sei, não me lembro, era aluna mais velha, não me lembro se as crianças entravam lá por trás. Eu sei que as professoras entravam pelo Liceu, porque a gente estava em aula, nós tínhamos aquelas salas de aula na famosa senzala (riso), não é, e elas passavam por ali para ir para a Escola, para ir lecionar, disso eu me lembro muito. Agora, criança eu não me lembro (CARNEIRO, A. 2002).
A pesquisa identificou que, pelo menos até o ano de 1927 a Escola Modelo “Seis de Março” funcionou em sala da Escola Normal. Até o ano de 1922 em uma sala; depois em duas. Há, porém, expresso desde 1914, o desejo de que, caso se instalasse no Liceu, a Escola Modelo deveria ocupar a casa do Zelador ( atrás das salas do lado direito, na Planta), o que não sabemos se chegou a acontecer, ou para ela deveria ser construído um prédio em terreno do Solar, o que temos certeza de que nunca foi feito. Esse fato trouxe muitas indagações sobre o verdadeiro local da escola após 1927. Ficamos com a versão de Dona Stella (FIG.8), que estudou na Modelo de 1919 a 1926 e deu aula de prática de ensino, no 4º ano da Escola Normal, em 1930. Ao voltar ao Liceu no dia 9 de abril de 2005, Dona Stella observou que a parte de trás do edifício, onde funcionavam as escolas Normal e Modelo, do seu tempo de estudante, estava muito diferente. Mas que ainda guardava resquícios do passado, como por exemplo, a faixa negra pintada na parede da antiga sala da Escola Modelo, o quadro-negro, que, lembrouse, fora mandado pintar por seu pai, João Baptista de Seixas Tinoco, Secretário do Liceu, em substituição ao quadro negro disposto em cavalete. Outras lembranças de Dona Stella Muylaert Tinoco Dias foram assim relatadas, sempre com muita emoção, pois como nos disse, “jamais imaginei que alguém fosse, um dia, me perguntar alguma coisa sobre a Escola Modelo”:
A Escola Modelo era isso aqui (ao entrar na última sala do lado esquerdo). No nosso tempo era no final da escola. A entrada era por lá, não existia essa comunicação (com a área interna do edifício). Nós do primário, da Escola Modelo entrávamos por esse portão, íamos pelo lado do Liceu todo, até o fim, porque lá no fim é que tinha a Escola Modelo. Isso eu me lembro perfeitamente. O recreio era do lado; a saída e entrada também. Esse lado era todo nosso (lado do pátio feminino), não tínhamos comunicação com a Escola Normal nem com o Liceu, nós éramos a Escola Modelo. A
sala estava sempre cheia, era muita criança. Não havia castigo, era tudo muito sereno, muito certo. Era muito disciplinada, ordeira, muito bem organizada. Era o colégio modelo para as outras escolas. Não me lembro das colegas. Nunca pensei que eu ia ver isso outra vez... a carteira era diferente, era de madeira, levantava a tampa, acho que era individual, não sei. A arrumação era comum, em fileiras. Todas as pessoas que freqüentavam a Escola Modelo tinham o privilégio de entrar na Escola Normal sem precisar fazer o exame de admissão. Só fiz exame de admissão de francês; quem terminasse o curso, passava automaticamente para o Normal. Era muito bom, um colégio calmo, não me lembro de brincadeiras . No 4º ano da Escola Normal nós treinávamos as aulas práticas aqui, antes de ser diplomada eu dei aula aqui (DIAS, 2005).
A visita a suas escolas da infância- lembrou-se de que ia todos os dias, pela manhã, levada por seu pai, para a Escola Modelo- e da juventude, a Escola Normal, permitiu que Dona Stella “identificasse os âmbitos de suas primeiras experiências, os espaços vividos, e provavelmente também identificar-se a si mesmo naqueles lugares, os quais ela não havia desalojado completamente de sua memória” (FRAGO; ESCOLANO, 1998, p.22). Entretanto, institucionalmente, o espaço ocupado pela Escola Modelo, em sala (s) da Normal, nunca deixou de ser questionado. Assim o fizeram o diretor da Escola Normal Viveiros de Vasconcellos e, mais tarde, a diretora da “Seis de Março”, Consuelo de Almeida Manhães. Em maio de 1924, ao retornar à Direção das Escolas 130 , Sebastião Viveiros de Vasconcellos escreveu Relatório 131 ao Diretor de Instrução Pública, no qual descreve a localização da Escola Modelo: Occupa as duas ultimas salas da ala esquerda da Escola Normal. Foi installação i nfeliz, porque fere principios de pedagogia. Não tem o aspecto de um estabelecimento de ensino, sobre ser acanhada e deficiente em tudo: nem apparelhamento proprio, nem espaço para as alumnas, nem uma dependencia para as professoras, nem um compartimento para o archivo, nem installações sanitarias (VASCONCELLOS, 1924).
No ano seguinte, além do local, outros fatores começaram a preocupar a direção da Escola Normal. 130
Após as gestões de Castro Faria (1915-1919), Dr. Carlos Tinoco da Fonseca (1919; 1921), Teophilo Carlos de Gouvêa (1919), Joaquim Silvério dos Reis Junior e Dr. Ignácio de Moura (1920-1922), e Alberto Frederico de Moraes Lamego (1923-1924). 131 Como os outros relatórios de Viveiros de Vasconcellos, escritos em 1914 e 1925, também esse, escrito em 1924 está em rascunho.
Occupando, como já disse, dependencias da Escola Normal, é facil de ver que ficou esta diminuida de duas salas de aula, alem do inconveniente que sempre se observa de perturbarem as alumnas da “Modelo” o trabalho das normalistas com ruido proprio de crianças e cantico de hymnos patrioticos, alem das idas e vindas para se servirem das sanitarias da Escola Normal. O problema é de facil resolução. Cortando, em angulo recto, no fundo, as duas alas da Escola Normal, está a casa onde reside o porteiro. É grande, ampla e pode, excellentemente, com uma pequena obra de adaptação servir á “Escola Modelo” construindo o governo, em um canto do terreno, pequena casa para o porteiro, ou dando-lhe um accrescimo para pagamento de aluguel de casa, como se faz em Niteroy. Com esta ligeira adaptação, ter-se-ia a “Escola Modelo” bem apparelhada, em edificio contiguo, mas independente, e com a secção- Jardim de Infancia- como fala o actual Regulamento, que para tudo ha terreno e espaço. Seria obra de relevo para o ensino e digna do honrado governo do Estado (VASCONCELLOS, 1925).
Com essas palavras, Viveiros de Vasconcellos demonstra que a Escola Modelo “começava a incomodar a Escola Normal”. Ruído de criança, cantoria, deslocamento para os banheiros, tudo passa a ser questionado por um diretor que vivenciava, naquele momento, um aumento de demanda pelo ensino secundário e normal o que, contraditoriamente, o colocava na contramão de uma situação pela qual tanto havia lutado, qual seja, a proximidade entre a teoria dada na Escola Normal, e a prática pedagógica vivenciada na Modelo- mote de seus primeiros brados por uma escola de aplicação anexa `a Escola Normal de Campos. O número de matrículas para o Liceu estava em franco crescimento. Se em 1914 estavam matriculados 36 alunos no Liceu e 118 na Escola Normal, num total de 154 alunos, em 1925 a situação se mostrava bem diversa: eram agora 369 alunos: 202 liceístas e 167 normalistas132. Esses números demonstram ter sentido a preocupação do Diretor da Escola Normal e Liceu em transferir a Escola Modelo das duas salas da Escola Normal que ocupava. As manifestações não partem somente do diretor da Escola Normal. Também a diretora da Modelo, ao apontar, em seu relatório de 1927, as necessidades da escola, afirma:
Achando-se a Escola Modelo installada apenas em duas salas, somos forçadas a trabalhar 3 professoras em uma só dependencia. Constitue tal pratica, grande infracção aos methodos pedagogicos pois além de se fazer mister uma vigilancia ininterrupta e energica, traz o grande inconveniente de, quando duas professoras fazem preleção ao mesmo tempo, além de uma perturbar a outra, as alumnas, como é natural, são levadas a prestar attenção na preleção mais interessante, em de premento (sic) da outra explicação. Para sanar taes inconvenientes e attendendo ao grande incremento que vem tendo a Escola Modelo, incremento provado pelo numero elevado de candidatas, que se apresenta annualmente, acho que o Governo solicito como é em attender as causas justas, deveria dar, á guisa de Niteroy, um predio proprio á Escola Modelo, embora sendo este mais modesto. Acredito que tal problema não tardará a ser 132
Fonte: Relatórios apresentados pelos Diretores da Escola Normal e Liceu de Campos em 1914, 1916 e 1925.
solucionado visto como em sua ultima visita a Campos, o Exmo Snr. Dr. Presidente do Estado133 bem como o Exmo Snr Secretario Geral do Estado tiveram occasião de constatar que além da Escola Modelo estar occupando salas que fazem grande falta á Escola Normal, são estas insuficientissimas para o bom funccionamento da Escola Modelo (MANHÃES, 1927).
O apelo carregado de emoção, feito por Consuelo, teve um motivo maior, a nosso ver. Recentemente havia sido inaugurada, em Niterói, uma “nova” Escola Modelo, em prédio da antiga Escola Normal, perfeitamente adaptado, e pleno de possibilidades de uso- Museu Pedagógico, Laboratório Experimental, Jardim de Infância, etc.- o que pôs a nu as diferentes realidades vividas pelas duas escolas fluminenses. Em mensagem enviada à Assembléia Legislativa em 1927, o Presidente do Estado, Abreu Sodré, fala sobre as duas escolas modelo do Estado e seus Jardins de Infância. Sobre a de Niterói, diz:
É complementar da Escola Normal, e estabelecimento de applicação ou pratica escolar, indispensavel ao ensino da methodologia didactica, destinada ás alumnas do 3º e 4º anno, que exercitando-se nos trabalhos lectivos tambem revelam suas vocações profissionaes. Funcciona a escola em 6 salas amplissimas, com mobiliario adequado, e ainda existe um gabinete para professores, um gabinete pedagogico e uma pequena bibliotheca infantil. Nesse estabelecimento o curso acompanha a orientação da escola de 3º gráo- ensino integral- em 5 series, todas regidas por cathedraticos, auxiliados por adjuntas (p.106).
Sobre a de Campos, diz: Annexa á Escola Normal, funcciona no mesmo predio este estabelecimento de ensino. A sua matricula foi em 1926 de 163 alumnos e em 1927 de 160. A professora de methodologia adoptou nas aulas a caderneta de pratica escolar e nos mezes de agosto costuma transformar a escola modelo nos diversos typos de escolas primarias, para que cada normalista durante 20 minutos tenha a regencia da classe, assim como, annualmente, faz excursão pedagogica (p.108).
A respeito dos Jardins de Infância, informa:
O Jardim de Infância de Niterói teve installação adequada porque fiz construir um pavilhão que, sem exaggeros architectonicos, mas em linhas sobrias e elegantes, satisfaz ao seu fim educativo. Ahi se ministra o ensino pre-escolar ás crianças de 3 a 7 annos, segundo os methodos de Froebel e Montessori, caracterizando-se esse
133
Fotografias divulgadas no convite para as comemorações dos 125 anos do Liceu de Humanidades de Campos, em 2005, mostram o Presidente Nilo Peçanha em jantar de gala na “Sala de jantar do Barão”, em 1918, levandonos a concluir que pode ser essa a data a que Consuelo Manhães se refere.
estabelecimento como um ponto de ligação entre a escola maternal e a escola elementar ou primaria de 1º gráo (p.107).
Sobre o Jardim de Infância de Campos, diz: “Em 1º de setembro de 1923 fundou-se a classe de Jardim da Infancia funccionando em sala da Escola Normal, e porque não tivesse installação apropriada foi extincta em 1924 e restabelecida em 4 de Maio do anno fluente, com a matricula de 20 crianças” (p.107). Falar dos espaços da Escola Normal e Modelo implica, também, em falar de instalações sanitárias para as alunas. Ao abordar a situação dos banheiros da Escola Normal, Viveiros de Vasconcellos desvenda um segredo: o porquê de ser feminina a Modelo. “Estão actualmente matriculados na Escola Modelo 60 alumnos do sexo feminino. Como se vê, não ha alumnos do sexo masculino, não obstante ser mixto o instituto, pela circunstancia unica de se servirem as alumnas dessa Escola das sanitarias da Escola Normal” (VASCONCELLOS, 1924). Nada se faz e, no ano seguinte, a dificuldade agravada pelo número crescente de matrícula provoca nova reclamação do diretor ao superior hierárquico: “Continua a Escola Normal necessitando de mais sanitarias. As três que existem actualmente não bastam a 194 alunas normalistas e 170 meninas da Escola annexa “Seis de Março”(VASCONCELLOS, 1925). Vistas as condições de acomodação do espaço destinado à Escola Modelo, é possível indagar: Que modelo de escola foi a Escola Modelo “Seis de Março”?
4.2 O TEMPO ESCOLAR
O tempo escolar é uma das marcas da escola moderna. Segundo horário da Escola Normal do ano de 1920, o dia letivo começava às 10 horas e terminava às 15 horas, de segunda-feira a sábado. Sem intervalo. De acordo com o Art. 45 do Decreto nº 1241 de 13 de março de 1912, “o anno escolar será de oito mezes, contados de 15 de março a 14 de novembro”. Imagina-se que a Escola Modelo, como escola anexa, deveria seguir o mesmo ritmo: horário de entrada, saída, férias. Como nenhum documento da Escola Modelo nos apresentou esses horários, os tempos da Normal servirão de base na contagem do tempo da “Seis de Março”.
Até o ano de 1924 o ensino na Escola Modelo tinha seis séries. Seguia o modelo de escola conhecido como “escola complementar” (Art. 136 do Decreto nº 1241 de 13 de março de 1912). Em Mensagem à Assembléia Legislativa, em 1913, o Presidente do Estado do Rio de Janeiro diz que as escolas complementares tanto podem ser grupos escolares graduados, como na organização pedagógica fluminense, ou escola primaria de 2º gráo, como na Bahia, e em outros Estados. Esse dado confirma estudos feitos por Jorge Nagle e Neide Fiori, no Ceará e em Santa Catarina. De acordo com NAGLE, “o curso complementar, de dois anos anexo à Escola Normal, e sob a mesma direção, tem por fim preparar os alunos que, tendo feito o curso primário, desejem, sem solução de continuidade, prosseguir os seus estudos no curso Normal [...]” (2002, p.273). FIORI diz, referindo-se à experiência catarinense, que “as escolas complementares objetivavam dar seqüência ao ensino ministrado pelos grupos escolares e facilitar a formação de professores normalistas” (1975, p.100). Embora a interpretação seja feita à luz de documentos que não se referem ao Estado do Rio de Janeiro, parece haver fundamento para explicar as seis séries da Escola Modelo. Pela análise dos relatórios de diretores do Liceu e Escola Normal assim como pelos das professoras da Seis de Março as seis séries transformaram-se em cinco a partir de 1925, por Ato de 2 de março de 1925134.
4.3 OS ASPECTOS ADMINISTRATIVOS
Dentre os aspectos a serem abordados encontram-se os relativos `a estrutura e funcionamento da Escola, o que implica falar em matrículas ( evolução), séries, fases, normas estabelecidas, recursos materiais e relações diversas. 4.3.1 A MOVIMENTAÇÃO ESCOLAR
Pelo documento “Elementos para o Relatório da Escola 6 de Março” no ano de 1916, foi possível saber que a Escola Modelo iniciou suas atividades com sete (7) alunas, no mês de março. Em abril já eram 24 (freqüência média de 13); maio, 27 (freqüência média de 19); de junho a dezembro eram 30 alunas matriculadas, com freqüência média de 27 alunas. O acréscimo de matrículas, mais de 400% em quatro meses, e a freqüência, que também foi-se tornando regular a partir de junho, mostram que o novo projeto, implementado sob a direção da Professora Alzira Collares Quitete, teve pronta aceitação na sociedade campista. 134
Não possuímos outra referência que explique melhor essa mudança.
Em relação ao ano de 1917, só encontramos os nomes de três alunas que prestaram exames na Escola Modelo, em dezembro: “Mercedes Franco, com 15 anos, aprovada com distinção da 5ª para a 6ª série; Edna Cardoso, com 14 anos, e Maria Custodia Barcellos, com 12 anos, aprovadas com distinção da 4ª para a 5ª série” 135. Os dados que se seguem, com exceção dos de 1918 (retirados de Ata de Promoção), foram retirados de Relatório feito pela Diretora da Escola, Consuelo Manhães, em 1927, no qual ela registra seu período de direção, de 1919 àquela data. Movimentação Escolar Ano 1916 1917 1918 1919 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927
Nº de Séries Nº de Alunas Nº de Professoras 6 7 (mar); 24 (abr); 27 (mai); 30 (jun a dez) 1 6 ? 1 6 26 1 6 31 1 6 37 1 6 44 1 6 45 1 6 47 (mais 24 do Jardim de Infância) 3136 6 60 3 5 133 (mais 80 aguardando vaga) 4137 5 163(mais 90 aguardando vaga) 7138 5 160 7139 Dados compilados a partir do Relatório da Diretora Consuelo Manhães, 1927
Alguns dados serão melhor explicados, durante a narrativa, para entendimento do que configura, a meu ver, os períodos da Escola Modelo: o que se estende de 1916 a 1922, período de crescimento; o período de consolidação - em número de alunas e professoras- que compreende os anos de 1923 a 1927, e o que se dá desta data até a saída da escola do prédio do Liceu, quando se aprofundam as dificuldades.
4.3.2 AS SÉRIES
135
Fonte: Termos de Exames dos dias 1 e 3 de dezembro de 1917. “A Comissão Examinadora dos exames foi composta pelos professores Benedicto Hermógenes, Maria Francisca Freitas e Alzira Collares Quitete, sob a presidência do primeiro. As alunas apresentaram trabalhos cartográficos de desenho e de agulha, que foram julgados optimos pela comissão examinadora”. 136 Consuelo Manhães (Diretora); Mercedes Landim ; Josepha Cardoso Lopes (Profª do Jardim de Infância). 137 Consuelo Manhães (Diretora); Mercedes Landim ; Josepha Cardoso Lopes, Laudelina de Castro e Faride Chácar. 138 Consuelo Manhães (Diretora Geral); Mercedes Landim (Diretora do 2º turno, após o mês de julho); Josepha Cardoso Lopes; Laudelina de Castro; Faride Chácar; Odysséa de Castro Nunes e Mylita Pereira Soares. 139 Consuelo Manhães (Diretora Geral); Mercedes Landim ; Josepha Cardoso Lopes; Laudelina de Castro; Faride Chácar; Odysséa de Castro Nunes; Isaurina de Carvalho. Constam em Lamego (1943, p.56) as nomeações das professoras Maria Teresa Ribeiro da Costa e Lucia Lamy para a Escola Modelo, em 1927, porém não foram encontrados registros sobre o trabalho delas, na documentação arquivada no Liceu.
A Escola Modelo foi criada nos moldes de uma Escola Complementar, portanto, com seis séries. A comprovação se fez após a leitura da Ata de Promoção das alunas da “Seis de Março”, enviada pela Diretora Antônia Ribeiro de Castro Lopes ao Diretor da Escola Normal, em 5 de dezembro de 1918 140. Através dos relatórios enviados pelas professoras à diretora Consuelo, em 1927, foi possível entender que até o ano de 1924 a escola teve seis séries e, a partir de 1925, cinco séries. Quem explica essa mudança é a professora Mercedes Sodré Ferreira Landim, quando diz que “em 1925 [...] com a reforma da instrucção primaria, quando foi suprimida a 6ª serie a Exma Sra Directora me entregou a 5ª série” (LANDIM, 1927). Em 1923, além das séries do primário, foi fundada a classe de Jardim de Infância anexa, “em uma sala da Escola Normal contígua á Escola Modelo” (VASCONCELLOS, 1924). Essa classe Maternal 141 foi extinta logo a seguir, em 1924, segundo Consuelo Manhães “por não estar convenientemente installada” (MANHÃES,1927). Sob o comando da professora Josepha Cardoso Lopes, o Jardim de Infância da Escola Modelo funcionou de setembro a dezembro de 1923, com 24 crianças de 4 a 6 anos divididas em 3 períodos. Josepha Cardoso Lopes, especialmente designada pela Instrução Pública para reger o Jardim, assim descreve sua atuação pedagógica com as crianças:
Era com prazer que elles descreviam de nossa Bandeira as suas cores como symbolo representativos da grande Patria. Faziam gymnastica e declamavam e os canticos diarios que precediam o inicio e terminação das aulas. Como trabalhos manuaes executavam tecelagens, dobraduras, construcções com torninhos, alinhavos em cartolina e [...], trabalhinhos estes que figuravam na exposição organisada pela Escola Modelo, por occasião de encerramento das aulas no referido anno (LOPES, J., 1927).
O trabalho executado pela Profª Josepha mostra sua preocupação com a formação de “rotinas pedagógicas” e com a utilização de materiais variados que provocassem, nas crianças pequenas, o prazer de aprender. Ao mesmo tempo, nota-se que a professora não se descuidava
140
Transcrição da Ata: “Pelo Decreto nº 1638 de 14 de Novembro findo, foram promovidas, pelas médias, as seguintes alunas da escola modelo “Seis de Março”: Alzira Franco, Marina G. de L. Ribeiro de Castro e Alzira Barroso, á 2ª série; Izabel Pereira Nunes, Maria da Penha de Souza, Heloisa Carvalho e Jocila de Castro Peixoto, á 3ª série; Ida Zulckner, Ceci Mendes, Helvia Moreira e Mercedes Barroso, á 4ª; Antônia M. de Castro Peixoto, Carmelita Limongi, Helena Mazzucchi, Inaiá Faria de Moraes e Antonieta Santos, á 6ª série. Completaram o curso médio, isto é, foram promovidas á 5ª série, as alunas Rute de Castro Moreira (12 anos), Silvia de Souza (12 anos), Carmelita Barroso (14 anos), Maria Nunes Machado (12 anos), Maria da C. de Castro Peixoto (12 anos), Zenir Bacelar da Silva (12 anos). Foi também julgada habilitada pelas médias, a aluna da 6ª série, Arezina Moreira (12 anos)”. 141 Assim também denominada a classe de Jardim de Infância, na documentação.
da educação que visava ao desenvolvimento integral do aluno, em seus aspectos físico, intelectual, moral e “cívico”142. Em 1927 houve nova tentativa, também sem êxito, de fazer funcionar um Jardim de Infância, como diz Consuelo Manhães:
Acha-se a Escola Modelo desfalcada de três auxiliares [...] a adjunta Josepha Cardoso de Araujo Lopes foi designada para reger a classe do Jardim de Infancia [...]. “Quanto ao Jardim de Infancia não foi possivel faze-lo funccionar, dada a falta de guardiã que é de todo imprescindivel. Esperamos, entretanto, ver em breve a sua installação definitiva, dados os recursos que vem angariando a professora de Methodologia Dona Antônia Ribeiro de Castro Lopes, para esse fim, tendo já o Esmo. Snr. Dr. Director de Instrucção autorisado a reorganização da dita classe e permettido, conforme o officio dirigido á citada professora, a construção de uma barraca, estylo Docker, nos terrenos da Escola Normal” (MANHÃES, 1927).
Mais uma vez pode ser percebida a influência de Antônia Lopes no andamento e inovações da Escola Modelo. Em 1931 há mapas estatísticos, no Arquivo Público do Rio de Janeiro, que comprovam a existência de um Jardim de Infância anexo à Escola Modelo Seis de Março, com a Denominação Especial Zuleika Moraes. Não há, nos mapas, porém, nenhum endereço. Quem esclareceu a questão, embora não se referisse ao nome Zuleika, foi a Professora Aldarina Carneiro que, anos depois se tornou (e se aposentou como) diretora do Jardim de Infância Antônia Lopes. Assim relata:
Antônia Lopes foi uma grande professora. Ela era... quando eu comecei a trabalhar, o Jardim não tinha nome. Mas, Dona Antônia Lopes, que até era conhecida como Dona Antunica Lopes, não é, era professora de Metodologia e Pedagogia, e foi uma criatura muito inteligente, ela fez curso na Europa, no Instituto Claparède, fez curso de Pedagogia, Metodologia, era muito famosa a Dona Antônia Lopes. Eu não cheguei a ser aluna dela, ela já estava aposentada. Era professora uma sobrinha dela, D. Laudelina. Mas, acontece que o Jardim não tinha nome... mas ela foi quem fundou o Jardim, porque ela estudou na Europa, nesse tal Instituto Claparède, que eu não sei se ainda existe, e quando ela voltou, ela era professora da Escola Normal... juntou... tinha até o retrato assim grande, lá no meu Jardim, ela e todas as alunas da Escola Normal fizeram festa e fundaram o Jardim de Infância, que naquele tempo não tinha nome, não é? Eu é que consegui o nome para ela. Ela, então, fundou o Jardim de Infância, que funcionava no... no... não é bem um barracão, mas era uma casinha de madeira; tinha no Liceu a tal senzala, não é, terminava... as últimas salas eram da Escola Modelo e o Jardinzinho de Infância era então uma casinha de madeira, sem nome. Aí depois, a Escola saiu dali, transformou-se em João Pessoa, não é, o Jardim de Infância foi atrás, não tinha nome. Quando eu fui trabalhar... eu me formei, depois eu fiz um Curso de Jardim de Infância, fui nomeada, o Jardim não tinha nome. Era um Jardim 142
Valdemarin (2004, p.106) aborda o processo de transposição didática por meio do qual a teoria do conhecimento é desdobrada em lições e atividades- próprio do método intuitivo- no qual são incluidas a modelagem e variadas técnicas de desenho sobre papel pontilhado, em cores, [...].
anexo ao João Pessoa, era o Jardim da Beira Valão, depois mudamos e ficou o nome de Jardim da Beira - Valão. Só mais tarde eu consegui que se desse a ele o nome de Jardim de Infância Antônia Lopes (CARNEIRO, A.,2002).
Indagada se Dona Antunica costumava freqüentar o Jardim de Infância depois que este saiu do prédio do Liceu, respondeu:
Não, D. Antônia era aquela professora de nome, não foi nem minha professora mais, porque quando eu cheguei a ser aluna dela, ela já estava prestes a se aposentar. A sobrinha dela, D. Laudelina Castro é que foi minha professora. Aí o Jardim de Infância ficou anexo ao João Pessoa. Mas quando as salas, eram duas salas, começaram a apresentar rachaduras, era na Rua Formosa, então tivemos que arranjar uma casa; a Diretora do Jardim arranjou na Beira-Valão. Ficamos ali, muito tempo. Era alugada, mas era casa. Depois, mudamos para a 21 de abril esquina da Rua do Gás. Também não tinha nome. Mas, a minha Diretora, D. Maria Correa, tinha muita vontade de dar o nome de D. Antunica Lopes, porque ela é que tinha sido a fundadora da Escola, não é? E fazia muita pressão. Eu ajudei, não é? Quando fui nomeada diretora, pedi. E aí arranjaram e puseram o nome dela (CARNEIRO, A., 2002).
4.3.3 AS FASES
Fatos analisados durante a pesquisa, no diálogo com as fontes, levaram-nos a concluir que houve três fases na Escola Modelo: de 1916 a 1922; de 1923 a 1927, e desta data até sua transformação em Grupo Escolar, e mudança de prédio. Esses fatos podem ser resumidos nos seguintes aspectos. No ano de 1923 houve o que podemos considerar como uma ruptura com a cultura escolar, original, da instituição. De uma só professora passaram estas a ser três, e às seis séries primárias foi acrescido um Jardim de Infância que, embora de curta vida, certamente deve ter alterado a rotina escolar, pela presença de crianças bem pequenas e suas distinções etárias. A primeira fase, que chamaremos “fase de instalação” se caracterizou pela presença de uma professora apenas, fazendo também o papel de diretora, até 1922, por iniciativas de compra de livros e equipamentos escolares e da solicitação de novas docentes. A segunda fase consolidou a Escola Modelo na sociedade campista, haja vista a grande procura por vagas na unidade escolar.
Esse fato, se por um lado mostra a vantagem de a aluna da “Seis de Março”, aprovada “com distinção”, entrar na Escola Normal sem prestar o temido exame de admissão, por outro acentuou os inconvenientes causados pela falta de espaço físico e de banheiros suficientes 143. Em relação à segunda fase, comprova que foi importante, para consolidar a “Seis de Março”, a chegada de novas professoras, insistentemente solicitadas, por Consuelo ao Diretor, e deste ao seu superior. São vários os ofícios enviados e recebidos, de parte a parte. O interessante, porém, é que as solicitações já indicavam as professoras desejadas: Faride Chacar, Laudelina de Castro e Isaurina de Carvalho. Curiosa é a observação que o Diretor, numa das últimas correspondências, faz para justificar, junto ao Diretor de Instrução Pública, suas escolhas. A respeito, diz: “Si tomo a liberdade de indicar a V. Ex. os nomes das adjuntas, é porque desejo que trabalhem sob minha direcção professoras de minha confiança, já pelo seu preparo, já pela sua educação e moderado temperamento”(Ofício de 3/6/1925). Essa determinação não se esgota em si mesma. Essas professoras, Faride, Laudelina e Isaurina possuem “auto-estima social”. Nesse caso, fica explícito o clientelismo, que gera um processo de seleção socialmente determinado: prestígio político, famílias que transformam em eleitas as pessoas que estão naquele nível social, dentre outras razões. Dos três nomes propostos pelo Diretor da Escola Normal, dois foram aceitos: o das Professoras Faride e Laudelina, adjuntas de grupo escolar. A terceira indicada, Isaurina, não pôde ser designada “por serem necessarios os seus serviços na escola onde se encontra” , justificou o Sr. Horacio José de Campos, remetente do Ofício. Outro fator importante que marca a nova fase da Escola Modelo é o número sempre crescente de matrículas. Sobre isso, diz o diretor Viveiros de Vasconcellos no relatório enviado ao Diretor de Instrução em 1925: “Vai em crescendo admiravel a matricula nesse estabelecimento. O anno passado foi de 60 o numero de matriculados e este anno 170 candidatos requereram inscripção. Para isso, precisará de organizar turnos, para o que são necessarias mais duas professoras, como tive occasião de pedir em officio dirigido a V. Ex 144 (VASCONCELLOS,1925). A dificuldade que a escola sentia em administrar espaço, docentes e alunos, era visível nas fontes consultadas. Em 1925, Viveiros de Vasconcelos, segundo Consuelo Manhães, 143
Continuavam poucos os banheiros, o que parece contradizer a informação recolhida no Annuario Campista de 1920, p. 106, sob o título “A acção do Governo do Estado: Obras Publicas no município de Campos. Melhoramentos Geraes do Estado. Na escola Normal e na Escola Modelo, em adaptação e pavilhões sanitarios gastaram-se 5:831$250”. 144 É um Ofício de 1 de abril de 1925, do qual consta: “Sendo excessiva a matricula na Escola annexa Seis de Março, resolvi dividir os alumnos em turnos, precisando, porém, para isso de mais uma professora. Peço, pois, a V. Exa. que se digne designar para esse fim a adjunta do Grupo Escolar Barão (sic) do Rio Branco, professora Maria Isabel Peixoto”.
“grande amigo e protetor da Escola Modelo” solicitou, além da nomeação das adjuntas, autorização para organizar dois turnos, na escola. Afinal, estavam 65 alunas em uma sala que acomodava 35, “infringindo as regras da Hygiene e da Pedagogia”, como lhe havia comunicado a diretora que, continua a narrativa, estava “aguardando a cada momento, a autorisação para a organização dos turnos, a qual seria immediata, conforme a promessa do Snr. Inspector”. Sob alegação de falta de verbas, o Estado negou autorização para a divisão da Modelo em turnos. Comunicada a respeito, Consuelo Manhães insistiu, como mostra essa passagem do seu relatório: “Promptifiquei-me então a declarar que prescindiria da gratificação a que tinha direito pela organisação de mais um turno e a comprometter-me que limitaria as despesas, não excedendo estas as feitas, por um só turno”. O argumento foi aceito pelo órgão superior de ensino pois, continua a falar Consuelo, “finalmente em julho veio a ordem do Exmo Snr Director de Instrucção para a organisação pedida, passando os turnos a funccionarem regularmente a 6 deste mesmo mês. Foi designada para reger o 2º turno a adjunta mais antiga, Dona Mercedes Sodré Ferreira Landim” (MANHÃES,1927), que assim registrou: “Após as ferias de Junho, tendo vindo ordem para fossem feitos 2 turnos, devido ao grande nº de alumnas matriculadas e deficiencia de salas, fui designada pelo Exmo. Sr. Professor Viveiros de Vasconcellos D.D. Director da Escola Normal, para reger o 2º turno, visto ser eu a adjuncta que possuia mais tempo de serviço na escola” (LANDIM, 1927). É preciso observar, nesse acontecimento, o poder de luta de que eram imbuídas as professoras primárias. O poder de acreditar, incondicionalmente, num papel social que lhes foi sendo amalgamado desde que se interessaram pela profissão docente. Contra tudo, Consuelo Manhães insistiu nos seus propósitos, e conseguiu o que queria. Em 1927 a situação se agravou na escola, parecendo configurar, talvez, a última fase da escola. Nesse ano,
acha-se a Escola Modelo desfalcada de três auxiliares, pois a adjunta D. Mylita Pereira Soares foi transferida para Niteroy; a adjunta Dona Josepha Cardoso de Araújo Lopes foi designada para reger a classe do Jardim de Infância e o 2º turno funcciona sem Inspectora. As aulas, portanto, vão tendo o seu funccionamento irregular, resultando da falta das supra-citadas auxiliares (MANHÃES, 1927).
Mesmo tendo a Profª Josepha sido destinada à turma do Jardim de Infância, esta não chegou a funcionar, por falta de guardiã. Outra questão que marca essa fase da Escola Modelo foi a sanção imposta a Consuelo Manhães pelo fato de ela aceitar pedidos de matrículas para além da capacidade da Escola, tanto de espaço quanto de profissionais. A respeito, assim diz Dona Consuelo em seu Relatório/1927: “foram matriculadas 160 alumnas, obedecendo [...] as ordens exaradas em officio de 21 de Janeiro, do Exmo Snr Dr. Director de Instrucção” 145. Nesse ofício ao qual a diretora se refere, o Diretor de Instrução Pública diz, textualmente, ao Diretor da Escola Normal: “Declaramos que a directora ( da Escola Modelo) deve limitar a matricula do estabelecimento sob sua direcção á capacidade das salas de aula”. A partir desse fato são mudadas as regras de efetivação de matrículas para a Escola Modelo “Seis de Março”. As matrículas deixaram de ser realizadas na própria escola, passando a sê-lo na Diretoria da Instrução Pública, através de um burocrático trabalho processual que excluiu, quase totalmente, a participação da diretora da escola no processo. Essa atitude pôde ser comprovada por dois processos de matrícula arquivados no Liceu, das alunas Yolanda Flora e Yolanda da Conceição, que serão descritos adiante.
4.3.4 AS NORMAS
A localização de documentos trocados entre o Diretor da Escola Normal e Liceu de Campos e órgãos superiores da Administração Pública, como Diretoria de Instrução Pública, Diretoria dos Negócios do Interior e Justiça e Inspeção Escolar além do jornal Monitor Campista permitiu a recuperação de algumas normas reguladoras do funcionamento da “Seis de Março” referentes a processo de matrícula ( idade mínima, dados que compõem o processo), a dados de identificação das alunas em Atas de Exames e a abono de faltas. Em alguns casos foi possível estabelecer relação entre os ofícios e outras correspondências e a legislação educacional. É o caso de comprovar vacinação antes da matrícula, por exemplo. Em outros, não há registros no arquivo escolar. Foi preciso utilizar outras fontes documentais (duas notas feitas publicar, pela Escola Normal, no jornal Monitor Campista) para esclarecer os procedimentos de matrícula para os anos iniciais da Modelo.
145
Importante relembrar que, no ano anterior, tinham sido matriculadas 163 alunas, havendo mais 90 crianças aguardando vaga.
Em 21 de março de 1916, sob o título Escola Modelo anexa a Escola Normal de Campos146, é dito: “De ordem do Sr. Director, faço publico que se acha aberta a matricula para admissão a escola acima para 30 meninas, sobre as seguintes condições: idade de 8 a 11 annos, attestado de vacinação e de que não sofre de molestias infecto contagiosas. Secretaria da Escola Normal de Campos, 15 de Março de 1916, Seixas Tinoco, Secretario” (MONITOR CAMPISTA, 1916). No ano seguinte, em 16 de março, sob o título Escola Modelo 147, o Secretário informa: “Está aberta a renovação da matricula á Escola Modelo, anexa a Escola Normal de Campos. A idade minima é de 10 annos, e atestado de vaccinação e de que não soffre de molestia contagiosa (MONITOR CAMPISTA, 1917). A alteração da idade mínima de entrada na Escola Modelo: de 8 para 10 anos não consta de nenhuma outra fonte, se não do jornal 148 . Não foi encontrada, na legislação, nenhuma orientação sobre critérios de matrícula às duas escolas modelo do Estado. Essa questão de idade, porém, provocou curiosa situação, pois para ingressar na Escola Normal a aluna deveria ter 15 anos. Entrando na Escola Modelo, ou em qualquer outra escola primária, aos 8 anos, aos 13 a (o) menina (o) já terminara o primário. Para não ter que esperar dois anos para prosseguir os estudos, alguns pais- com o acordo do responsável pelo Cartório-, faziam expedir nova certidão, falsa, que era apresentada à Escola Normal 149. Voltando ao caso da matrícula para a Escola Modelo passar, a partir de 1927, a ser efetivada na Diretoria de Instrução Pública, há, no Arquivo do Liceu, dois processos de pedido de matrícula para duas meninas, Yolanda da Conceição Soares e Yolanda Flora Paes, que apontam para essa nova regra, configurando mudanças na cultura escolar: a Escola “Seis de Março” passa a ser submetida a um controle superior, ao mesmo tempo em que perde a autonomia para inscrever suas próprias alunas. Pede pela primeira, seu pai, Ernesto Soares e pela segunda, a mãe, Francisca Paes. São os processos de nº 136/1927 e 8/1928, respectivamente. O que mudou foi o órgão ao qual deveria ser dirigido o pedido de matrícula: da Escola, para a Secretaria de Estado do Interior e
146
Jornal Monitor Campista, 21 de março de 1916, p.2. Jornal Monitor Campista, 16 de março de 1917, p.2. 148 Há possibilidade, inclusive, de ter sido erro do jornal, se considerarmos que Stella Tinoco Dias, nascida em 1911, foi matriculada na Escola Modelo em 1919. 149 Essa informação foi passada à pesquisadora, em depoimento oral, um deles arquivado no Núcleo de História Oral da UENF, por duas professoras formadas pela Escola Normal, cujos pais adotaram a prática. 147
Justiça através da Diretoria da Instrução Pública. O motivo está expresso em documento emitido pela 1ª Seção da Diretoria, em 23 de janeiro de 1928, que diz:
Regulamentarmente, as matriculas nas Escolas Modelo cabem na competencia dos directores das respectivas escolas normaes. Entretanto, porque tenham as mesmas sido procuradas por avultado numero de candidatos, que as disputavam, transferindo-se de outras escolas para ali, á vista das vantagens que lhes conferia a bôa carta de habilitação no final do curso, facultando-lhes o ingresso na escola normal, independente de exames,- resolveu a autoridade superior reservar ao Governo a approvação dos pedidos de matricula nas alludidas Escolas Modelo. E assim foi expedida a circular nº 1, de 20 de Janeiro de 1927, consubstanciando aquella resolução. Cabendo, assim, ao Governo a approvação desses actos, convem, pensamos, ser ouvido, a respeito, o Snr. Director da Escola Normal de Campos, que poderá informar da opportunidade do pedido e validade dos documentos que instruem a pretensão”.
Assinam o documento o “Primeiro oficial” Elysio Pinheiro, o Chefe ( assinatura ilegível ) e José Duarte ( Diretor da Instrução Pública), que encaminhou o documento ao Diretor da Escola Normal no dia 26 do mês de janeiro. A resposta da Escola Normal se dá em 14 de fevereiro. O Diretor Antonio Bastos Tavares assim se dirige ao Diretor de Instrução:
Cumprindo as determinações do officio n. 126, de 31 de Janeiro pp., devolvo a V. Ex. o requerimento e demais papeis do Snr. Ernesto Soares, pedindo matricular a sua filha Yolanda da Conceição Soares na Escola Modelo “Seis de Março”. Tendo ouvido a Snra Directora da Escola Modelo, declaro nada ter a oppor á matricula da referida menor.
Constam do verso desse documento despachos do Chefe (?) que diz: “De accôrdo com as informações do Sr. Director da Escola Normal de Campos, penso pode o Sr. Director da Instrucção autorizal-o a admittir na Escola Modelo a alumna de que trata o processo”. Ao que esse diretor respondeu com um “officie-se aoh Director no sentido do parecer supra”, em 29/2/1928. No processo da outra aluna, Yolanda Flora Paes, o trâmite seguido foi o mesmo. Há alguns pontos, porém, que esclarecem um pouco mais a mudança, pois dizem que por conveniência da Instrução, passaram a ser resolvidos, a critério do Governo, os pedidos de matrícula na Escola Modelo, tendo essa orientação sido determinada por uma portaria do Secretário do Interior. Esclarece, outrossim, que deve ser ouvido, previamente, o Diretor da Escola Normal de Campos.
Faz parte do processo da aluna Yolanda Flora, além do requerimento de sua mãe, Certificado expedido pela 4ª Região da Inspetoria Escolar, no qual consta que a aluna, de 11 anos de idade, aluna da escola n. 20 do município de Campos, foi submetida no ano de 1927 à prova de habilitação no curso médio (Reg. Art. 2º), tendo sido aprovada com distinção, nota 4,7. Esse documento foi assinado pelo inspetor Regional, Jayme Memoria. Esses requerimentos de matrícula apontam para novas regras na matrícula para a Escola Modelo a partir da Circular nº 1, de 20 de janeiro de 1927. Os documentos que envolvem os processos das duas alunas confirmam o que Dona Stella Tinoco Dias afirmou em depoimento oral: “Era um privilégio estudar na Escola Modelo...” (DIAS, 2005). Em relação às Atas, há um Ofício enviado ao Diretor da Escola Normal de Campos por Oscar de Azevedo Quintanilha, Diretor dos Negócios do Interior e Justiça do Estado do Rio de Janeiro, datado de 13 de dezembro de 1917, que determina que, ao encaminhar as Atas de Exames Finais, a professora da Escola Modelo delas deveria fazer constar naturalidade, data de nascimento, filiação e nota de aprovação de cada um dos alunos. Outra fonte analisada foi um requerimento do Sr. Antonio R. Peixoto, pai de três alunas da Escola “Seis de Março” chamadas Antônia, Maria e Jocilla, datado de 29 de março de 1918, no qual o pai solicita, à Diretora da Escola Modelo, que sejam relevadas as faltas de suas filhas, “á abertura das aulas devido a ter havido sarampo em minha casa e receiar o contagio com outros alumnos”. É possível entender o processo de organização que foi sendo imprimido à Escola Modelo “Seis de Março”, pela leitura das normas que nela se foram implantando, continuamente, pelos anos e que delineiam, de forma inquestionável, o papel controlador do Estado em relação ao ensino público, na Primeira República.
4.3.5 INVENTÁRIOS E MATERIAIS DA ESCOLA MODELO
Houve dois momentos em que equipamentos e materiais da Escola Modelo foram inventariados: 1919 (só a Modelo), e 1926 150. 150
Antes desses dois inventários, há um rascunho de 1918, com a localização das salas da Escola Normal, que apresenta, na Sala 25 (que na planta corresponde à 1ª sala do lado direito do espaço da Escola Normal ) uma relação de materiais. Dentre eles existe “Armário da Escola Modelo”, no qual existem “seis livros grandes da escripta, dez vidros de drogas, quatorze volumes, vinte solidos de madeira e papelão, um compasso de madeira para giz, três caixas de giz, um carimbo com caixa, dois decímetros cubicos de fragmentos mineraes”. Em 1923 foi feito um inventário da Escola Normal de Campos, por sala (8 salas), sendo a SALA 4 referida como “Escola Modelo”, contendo: “30 carteiras simples; 30 bancos simples para as respectivas carteiras; 8 bancos duplos; 4
Ao assumir a Direção da Escola Modelo “Seis de Março”, em 8 de maio de 1919, a Professora Consuelo Manhães, recebeu da diretora anterior, Antônia Lopes, a relação de todo material existente na Escola. Esse documento, assinado pelas duas professoras e visado pelo Inspetor Dr. Carlos Fonseca e pelo Inspetor Escolar Cardoso Junior, classifica o material como: de “uso coletivo”, de “uso especial” e de “uso individual”. Outro inventário foi feito em 1926. Com data de 13 de novembro, foi assinado pela Diretora Consuelo de Almeida Manhães nesta data e visado, em 15 de março do ano seguinte, pelo Inspetor Dr. Antonio Bastos Tavares. Conforme o de 1919, também esse inventário obedece à classificação “material de uso coletivo, individual e especial”. Para melhor entendimento, subdividimos o bloco referente ao material de “uso coletivo”, da seguinte forma: mobiliário; material de higiene; material didático; retrato, quadros e bandeira; outros. O bloco relativo ao material de “uso individual” também foi por nós reagrupado, tentando seguir um índice disciplinar. Apresentaremos, a seguir, o material inventariado nos dois anos sob a forma de quadro comparativo, de modo a facilitar ao leitor perceber o crescimento da Escola Modelo pela análise de seu material permanente e de consumo. Consideramos importante relembrar que quando o primeiro inventário foi feito, em 1919, a Escola “Seis de Março” era apenas uma sala anexa à Escola Normal de Campos e que, em 1926, quando o segundo inventário foi apresentado, a Escola possuía duas salas de aula e dois turnos.
INVENTÁRIOS DA ESCOLA MODELO ATERIAL Uso Coletivo Mobiliário
1919
1926
30 carteiras e os respectivos bancos, para um só aluno 3 carteiras e 3 bancos, com dois alunos cada uma 1 mesa para a professora 1 cadeira para a professora 1 estrado
30 carteiras e os respectivos bancos, para um só aluno 35 bancos- carteiras duplos 6 bancos isolados 6 cadeiras singelas 2 cadeiras de braços 4 estrados
carteiras duplas; 1 estrado; uma meza para o proffessor; uma cadeira de braço; duas mezas pequenas; 1 tinteiro; 1 escarrador hygienico; duas moringas; 1 copo; 1 lavatorio; 2 globos geographicos; 14 mappas; 1 timpano; uma cineta (sic)”.
1 mesinha para moringues
7 mesinhas (5 pertencentes à Diretora e 1 oferecida pela professora D. Antonia Lopes) 2 armários (1 pertencente à classe Maternal) 1 cavalete
Material de higiene
1 capacho 1 escarrador higiênico 1 cesto para papéis 1 pires 2 moringues 1 copo
1 filtro 1 copo de vidro 1 escarrador higiênico 1 lavatório com bacia e jarro 4 toalhas para mãos, oferecidas pela Diretora 3 cestas para papéis (1 da Classe Maternal) 1 capacho
Material didático
1 compasso de madeira
4 compassos 1 esquadro várias réguas 1 caixa com cilindrozinhos
1 coleção de cartas de Parker, para o ensino de Aritmética 1 contador mecânico 2 mapas de sistema métrico decimal 10 sólidos geométricos 1 caixa com tornos
1 coleção de cartas de Parker, para o ensino de Aritmética 1 contador mecânico 1 coleção de mapas para o ensino de Aritmética e Linguagem 1 coleção de mapas para o ensino de Aritmética e História Pátria 1 mapa do sistema de pesos e medidas 1 mapa para o ensino das figuras geométricas 1 disco para o ensino do reconhecimento das horas 1 coleção de 8 sólidos geométricos 1 caixa com tornos
1 tabuleiro para o ensino de Geografia 2 globos geográficos (esfera celeste e terrestre) 2 globos geográficos, representando a América do Sul, América do Norte, Brasil, Produções do Brasil, Europa, Ásia, África, Oceania, Mapa Mundi e o A. B. C. dos Termos Geográficos
1 tabuleiro para o ensino de Geografia 2 globos geográficos (1 celeste e 1 terrestre) 1 coleção de 12 mapas representando: o Brasil, diversas partes do Estado do Rio e a América do Sul. 13 mapas representando: o Brasil, político, produções do Brasil, América do Sul (2) América do Norte (2) Europa (Antiga e Moderna) Ásia, África e Oceania. 1 A. B. C. dos termos geográficos
41 mapas incompletos para o ensino de Lições de Coisas 5 vidros contendo- sal, açúcar, grafite 1 pedaço de lixa, um vidro com almíscar, outro com ácido cítrico, um potinho com almacega, 2 pedaços de lacre, 6 lápis de desenho a pastel
54 quadros murais para o ensino de Lições de Coisas Vários objetos, tais como: cascas de moluscos, fragmentos de rochas, vidros contendo: sais, açúcar, vinagre, ácido sulfúrico, etc... almecega, fragmentos de troncos de certas árvores, folhas, etc., para o ensino de L. de Cousas.
5 bustos para o ensino das raças
5 bustos para o ensino das raças 5 cartas para o ensino de H Natural
1 mappa para o ensino de desenho
Retratos, Quadros e Bandeira
Outros
Uso Individual
6 quadros de honra 1 quadro para horário 1 quadro 1 retrato do marechal Floriano Peixoto
5 quadros de honra 1 quadro com o horário do turno da manhã 1 quadro com o Decálogo Pedagógico Retratos dos senhores Marechal Floriano Peixoto, Tte Cel Benjamin Constant, Dr. Ruy Barbosa, Dr. Oswaldo Cruz, Olavo Bilac e D. Pedro II. 1 Bandeira Nacional 1 moldura de madeira
3 canetas 1 tinteiro para a professora 1 pantógrafo 1 caneta e 1 gronômetro 1 carimbo 1 tesoura grande 1 tesoura pequena
30 tinteirinhos 2 tinteiros para as professoras 3 canetas 1 limpa penas (da Diretora) 1 sineta 2 campainhas (1 da Classe Maternal) 1 despertador (pertencente à adjunta D. Josepha Lopes) 1 pantógrafo 1 carimbo 7 limpa pedras, estando 1 em mau estado de conservação 1 flecha
1 Dicionário de Simões da Fonseca
1 Dicionário por Simões da Fonseca
Historietas por J. P. Silva
1 Historieta por J. P. e Silva 1 Historieta por E. Pinto da Fonseca
Primeiro livro por Francisco Vianna Meus deveres por J. P. Silva
1 livro de leitura de Francisco Vianna 41 livros de leitura, de Erasmo Braga (19 intermediários, 10-I, 7-II, 5-III) 3 livros de Leitura de Hilario Vianna 3 Páginas Cariocas 1 livro de leitura por M. Bomfim 1 Gramática, por Menezes Vieira ( of. pela Diretora) 27 livros de leitura de Thomaz Galhardo
Nossa Pátria por Rocha Pombo
1 Nossa Pátria por Rocha Pombo Nossa Pátria de Veiga Cabral História do Brasil de Veiga Cabral
Minha Pátria, 1º ano e 2º- por J. P. Silva
Minha Pátria (1º ano e 2º)
Mario por Paulo Tavares
1 Livro Mario
Geometria Prática por Olavo Freire
2 Geometrias (1 de O. Freire e 1 de C. Rosa, oferecida pela Diretora)
História Natural por Carlos Novaes
6 História Natural (1 de Josaphap, oferecida pela Diretora, 1 de Carlos Novaes, 1 de Colkins e 3 de W. Potak)
Aritmética 1º curso e 2º por Souza Lobo
4 Aritméticas (1 de Trajano, oferecida pela
Diretora, 2 de Souza Lobo, 1 de C. de Alvarenga) 1 livro sobre lições de cousas Calkins15 cadernos de Desenho Uso Especial
1 livro de matrícula 1 livro de freqüência das alunas 1 “ “ termos de visita 1 “ “ inventário 1 “ “ termos de exame
1 Geographia de Lacerda (oferecido pela Diretora) 28 lapis de graphite, algumas canetas 1 livro de matrícula 1 livro de freqüência de alunos 1 livro de termos de visitas 1 livro de inventários e recibos 1 livro de termos de exames 2 coleções de mapas mensais( uma antiga e outra moderna, sendo que deste faltam os mapas das adjuntas) 1 mapa semestral e um anual
Em relação ao material de uso coletivo, é interessante observar que a prática ainda hoje existente, principalmente em escolas da zona rural do município de Campos, em que diretoras e professoras ajudam a compor o ambiente escolar com objetos particulares, vem de bastante tempo atrás. Percebe-se, também, que o material didático relacionado em 1926 está acrescido de itens que procuram, cada vez mais, tornar o ensino concreto e “intuitivo”, o que comprova a circulação de idéias escolanovistas no ambiente da Escola Modelo. Para desenvolver, nas alunas, o amor pelo Brasil e o respeito aos mais conhecidos vultos da Pátria houve um considerável acréscimo de material, em cerca de treze anos, com a introdução, nas salas de aula da Escola Modelo, de retratos de novos personagens ilustres e de uma bandeira. O conceito do que representava ser uma “boa” professora foi exposto, na parede, sob a forma de um decálogo pedagógico. Uma manifestação cultural visível, nas relações de objetos, era a presença do escarrador higiênico e do tinteiro. Na sala de aula da “Seis de Março” havia, ainda, “duas moringas, 1 copo e 1 lavatório”, o que indica que as alunas não saíam da sala para beber água. Até por que, segundo diz o Relatório do diretor da Escola Normal, o bebedouro automático desta escola estava com defeito. Usariam, ainda, o copo coletivo, tão criticado pelo diretor Viveiros de Vasconcellos 151?
151
No relatório 1924, ao se referir ao item “bebedoiro automatico”, o diretor diz: “é imprescindivel e urgente que seja collocado um bebedoiro automatico para os alunos do Lyceu, á semelhança do que possue a Escola Normal, que se encontra com defeito. Não se pode compreender a continuação da pratica criminosa do chamado copo colectivo, por onde bebem agua 143 alumnos. É mister insistir que os alumnos do Lyceu se servem desse copo unico, causando, por isso, grande risco em sua saude, pela facil propagação de qualquer molestia contagiosa, alem de attentar contra elementares principios de asseio”.
Um sineta, duas campainhas e um despertador assinalam para a prática de chamar a atenção das alunas para a disciplina e o trabalho, e para marcar tempos escolares. É possível perceber, nas listas, um acréscimo não apenas quantitativo no material da Escola Modelo de 1926. A qualidade do material didático se aprimorou, novos jogos e coleções foram introduzidos, sem falar dos livros, constantes do material de uso individual, com a introdução de novos autores para serem trabalhados, em especial, nas disciplinas Português e Matemática.
4.3.6 COMPRAS PARA AS ESCOLAS NORMAL E MODELO
As compras de material de consumo, livros e outros exclusivamente para a Escola Modelo eram raras diante do volume de notas, geralmente escritas pelo Secretário das Escolas, Sr. João Baptista de Seixas Tinoco, com pedidos para a Escola Normal. Nestas eram incluídos itens que, por vezes, identificamos como relativos às necessidades da “Seis de Março”. Em Campos, a principal loja fornecedora de material para as Escolas era a firma Salgado e Cia. Fora de Campos, encomendas eram feitas a firmas do Rio de Janeiro e do exterior. Artigo de Hervé Salgado Rodrigues, jornalista campista, nos permite identificar a firma Miranda & Salgado com a Livraria “Ao Livro Verde” 152, fundada em 1844. Segundo Rodrigues, “a mais antiga livraria do Brasil dava-se ao requinte de importar diretamente livros da literatura francesa, que a influencia do francês era decisiva no Brasil e em Campos. Um dos seus proprietários foi o meu tio avô Manuel Joaquim Domingos Salgado, quando a firma passou a ser Miranda Salgado e Cia.” (SOFIATTI NETTO, 1981). Após as compras iniciais para receber a Escola, é no ano de 1918 que há registro, em notas fiscais, de maior volume de compras para a Escola Modelo. No mês de abril, há notas de vários pedidos feitos à Miranda Salgado e Cia: uma Gramática, um mapa de sólidos geométricos, um cronômetro, um compasso de madeira, um esquadro, uma tesoura grande e um vidro de tinta carimbo. No mês seguinte, há outra nota para a mesma firma, pedindo um pantógrafo, 200 cadernos de desenho sob modelo, um quilo de goma arábica em pó, dois
152
A livraria mais antiga do Brasil, com registro no Guiness Book, começou por iniciativa do português José Vaz Corrêa de Coimbra que, com a finalidade de atender aos barões de café, fundou a livraria. Dentro de pouco tempo, começou a importar livros de Londres, Paris, Hamburgo, Lisboa e Porto, que eram desembarcados no porto de São João da Barra. Com sua morte, em 1901, a livraria ficou sob a administração de outro português, Manuel Joaquim Miranda Salgado. Em 1923, a Ao Livro Verde passa às mãos de M. Zulchner e Cia. Na década de 1950 entra na sociedade João Sobral, cujos filhos e netos permanecem, até hoje, à frente da centenária livraria (Jornal O Diário, 30/10/2005, p.4, SOCIAL).
litros de tinta Sardinha153 e um livro “Lições de Coisas”. Já do mês de junho, dia 30, existe uma nota da Escola Normal de Campos pedindo a Miranda Salgado e Cia uma coleção de sólidos geométricos. Nessa nota é feito pedido de uma assinatura da “Revista Primaria”, e de dois livros “Pinto Silva, o 2º e o 3º livro”. Em 1925, o Estado envia livros e cadernos para a Escola (FIG.9). Dentre os pedidos de material, especificamente destinados à Escola Modelo “Seis de Março”, constam alguns em rascunho, escritos por Antônia Lopes e por Consuelo Manhães. Em 1926, por exemplo, Consuelo organizou uma lista de material necessário à Escola, na qual se pode perceber seu desejo de implantar um Museu Escolar, já existente na Modelo de Niterói, e previsto desde 1912 na legislação, e de adquirir jogos e materiais específicos para as séries iniciais, dentro da tendência de desenvolver a inteligência infantil através de métodos pedagógicos baseados na observação, e no uso dos sentidos. O que pedia Dona Consuelo? Um piano, duas coleções, uma de Montessori, outra de Froebel, cubos para o ensino de Aritmética, novos mapas para o ensino de História Natural e uma coleção de sólidos, dentre outros itens como armário, capacho, bebedouro, cabide e relógio (MANHÃES, 1927).
4.4 OS ATORES EDUCATIVOS
4.4.1 AS DIRETORAS
Por ordem de entrada, apresentamos as professoras que dirigiram a Escola Modelo “Seis de Março”. São elas: Alzira Collares Quitete; Antônia Ribeiro de Castro Lopes; Maria Francisca de Freitas; Consuelo de Almeida Manhães e Mercedes Sodré Ferreira Landim 154 (FIG.10). Os dados em itálico foram retirados do livro de Termos de Posse e Exercicio dos Professores e Funcionarios, localizado no Arquivo Histórico do Liceu. A primeira diretora foi Alzira Collares Quitete. “Ao primeiro dia do mez de Março do anno 1916, tomou posse e 153
Parecia ser a tinta preferida da época. Há interessante documento no Arquivo do Liceu, no qual o Secretário Seixas Tinoco devolve a tinta de outra marca que foi mandada para a escola, com bilhete de reclamação, ao proprietário da Miranda Salgado e Cia. 154 Em Documento de 14 de junho de 1916, o diretor dos Negócios do Interior e Justiça, João Bicalho Gomes Souza comunica ao Diretor da Escola Normal de Campos que aprovou a designação da professora Izabel Zilinda Silvério dos Reis para substituir a diretora da Escola Modelo, Alzira Collares Quitete, durante o seu impedimento. Não foi possível determinar esse tempo.
entrou em exercicio do cargo de directora da Escola Modelo, annexa á Escola Normal de Campos, a professora diplomada Dona Alzira Collares Quitete, nomeada por acto do Governo de 7 de Fevereiro de 1916, para reger a dicta Escola”. Sobre o período de direção de Dona Alzira, não há vestígios no arquivo. Há, porém, num Mapa de Freqüência de adjuntas da Escola Modelo “Seis de Março”, do ano de 1934, a assinatura de Dona Alzira como Inspetora Regional, o que nos faz supor que, anos mais tarde, ela retornou à escola que ajudou a implementar, em outra função, hierarquicamente superior na carreira do magistério público estadual. O próximo registro é o da nomeação da Professora Antônia Ribeiro de Castro Lopes. Consta em Ata que “Ao dia 1 de janeiro do anno mil novecentos e dezoito, tomou posse do cargo de directora da Escola 6 de Março, annexa á Escola Normal de Campos, a professora diplomada pelo quinto anno desta Escola, Dona Antônia Ribeiro de Castro Lopes. É interessante a ressalva de ter a professora cursado o 5º ano da Escola Normal, o que lhe dava, legalmente, condições de dirigir escola. Após pequeno período à frente da escola, Antônia Lopes foi substituída por Maria Francisca de Freitas, nomeada no dia 8 de Junho de 1918 (LAMEGO, 1943, p.49). Na pasta de 1917 do Arquivo Histórico do Liceu, foi encontrado documento no qual essa professora consta como professora de Trabalho de Agulha e Economia Doméstica da Escola Normal de Campos. Exatamente onze meses depois, em 8 de maio de 1919, “ tomou posse e entrou em exercício do cargo de directora da Escola Modelo “6 de Março”, annexa á Escola Normal de Campos, a Senhora Professora Dona Consuelo de Almeida Manhães, designada por acto de 2 do corrente para reger a referida Escola durante o impedimento da directora effectiva” 155 , Antônia Lopes, que substituía o Professor Benedicto Hermógenes, de Pedagogia, que se encontrava enfermo. Até o ano de 1926 Consuelo Manhães foi a única diretora da “Seis de Março”. Após as férias de Junho de 1926, porém, tendo vindo ordem para que fossem feitos dois turnos, devido ao grande nº de alunas matriculadas e deficiência de salas, foi designada pelo Diretor da Escola Normal, para dirigir o 2º turno, por ser a adjunta que possuía mais tempo de serviço na escola, a Professora Mercedes Sodré Ferreira Landim. Com a saída de Consuelo Manhães, em 1929, para ser professora da Escola Normal de Campos, Dona Mercedes continuou na Direção da Escola quando esta, saindo do prédio do 155
Fonte: p.2 vº Livro “Termos de Posse e Exercício dos Professores e Funcionários,1918”. Arquivo do Liceu.
Liceu, mudou de modelo, deixando de ser escola de aplicação para ser Grupo Escolar, o Grupo Escolar “João Pessoa”. Foi possível identificar, na pesquisa, o prestígio atribuído ao cargo de diretor da Escola Modelo, assim como perceber que todas as diretoras foram alunas da Escola Normal de Campos e pertenciam a famílias de destaque na cidade: Quitete, Ribeiro de Castro, Manhães e Landim. O sobrenome Ribeiro de Castro é até hoje ligado a grandes proprietários de terras no município de Campos e Quissamã. A família Manhães, da qual fazia parte Consuelo, tinha como distinção o seu pai, o patriarca, Manoel Martins Manhães, professor e diretor do Liceu, muito respeitado. Pelo casamento, Consuelo se tornou esposa de médico, profissão socialmente destacada, na época. Mercedes Landim, a última das diretoras da Escola Modelo “Seis de Março” era filha de um juiz de direito e parenta de prefeito de Campos, advogados e professores respeitados.
4.4.2 AS PROFESSORAS
Até 1923, a Escola Modelo funcionava com apenas uma professora, que acumulava a função com a de diretora. Sucederam-se no cargo, entre 1916 e 1923, Alzira Collares Quitete, Antônia Ribeiro de Castro Lopes, Maria Francisca de Freitas e Consuelo de Almeida Manhães, citadas anteriormente. Em 1923 foram nomeadas as professoras Mercedes Sodré Ferreira Landim e Josepha Cardoso de Araujo Lopes, esta especificamente para o Jardim de Infância. Em 1925 passaram a trabalhar na escola mais duas professoras, Laudelina de Castro e Faride Miguel Chácar. Em 1926 o grupo foi acrescido de Odysséa de Castro Nunes e Mylita Pereira Soares 156. No ano de 1927 o grupo de docentes era composto por: Consuelo de Almeida Manhães, Faride Miguel Chacar, Isaurina de Carvalho, Josepha Cardoso de Araujo Lopes, Laudelina de Castro, Mercedes Sodré Ferreira Landim, Odysséa de Castro Nunes. Acrescidas a essas informações, verificamos, que nesse ano, segundo LAMEGO (1943, p.56) foram empossadas em 2 de junho de 1927, Maria Teresa Ribeiro da Costa (FIG.10) e Lucia Lamy, e que em 1 de maio de 1929 a escola recebeu mais três professoras: Mirtes (sic) de Vasconcelos, Jupyra Rodrigues e Thertes Seixas (Ibidem, p.59). Pesquisando em relatórios e livros de posse e exercício encontrados no arquivo do Liceu, pudemos saber um pouco do que fizeram as professoras da Escola Modelo até 1927. 156
Dados recompostos através do relatório que cada professora enviou à Diretora Consuelo Manhães em 1927.
Reunindo informações tentamos escrever uma pequena biografia de cada mestra, por dois motivos: o primeiro, afetivo, é uma forma de homenageá-las, inscrevendo seus nomes na história da educação campista. O segundo, é demonstrar- através de citações de conceitos emitidos pelas professoras- o que a historiografia da Primeira República afirma: o caráter missionário e maternal com que exerciam sua função de educar crianças. Por ordem de entrada na escola, apresentamos: Mercedes Sodré Ferreira Landim- Nasceu em Campos no dia 24 de abril de 1902, filha de Geraldo das Mercês Ferreira Landim, Juiz de Direito, e de Mariana Lolita Sodré Landim. Formada pela Escola Normal em 1920 157, foi a 1ª Adjunta da Escola Modelo, nomeada como Adjunta interina em 10 de abril de 1923. Tomou posse e entrou em exercício a 16 do referido mês. Tornou-se professora efetiva em 1925. Em 1927 acumulou as aulas com a direção do 2º turno. Foi a última diretora da Escola Modelo “Seis de Março”, tendo continuado na Direção da Escola quando esta se transformou no Grupo Escolar.“João Pessoa. Josepha Cardoso de Araujo Lopes, formada pela Escola Normal em 1920 158 foi nomeada Adjunta interina em 24 de agosto de 1923, para reger a Classe Maternal, com posse e exercício em 1º de setembro do mesmo ano. De 1924, quando foi suprimida a aludida Classe, a 1927, atuou sempre como docente das séries iniciais da escola. A partir de 1931 transferiuse para a Escola Normal de Campos como lente substituta de Pedagogia e Metodologia Didática. Foi a última professora de Metodologia da Escola Normal de Campos, que em 1954, se transformou em Instituto de Educação de Campos. Era chamada “Dona Filhinha”, pelas alunas da Escola Normal. A respeito dessa professora, lembrou-se a ex-aluna da Escola Normal, Gilda Duncan Tavares: “Metodologia era com Dona Filhinha. A Metodologia do Ensino Primário eram os métodos que aplicava. Eu me lembro... ela ensinava à gente aqueles métodos de sentenciação, de alfabetização, como ensinar à criança, como despertar... sendo que era muito pequeno, antigamente, o campo nessa parte, o estudo” (TAVARES, 2001). Lembrou-se de Dona Josepha, também, a ex-aluna Conceição Muniz: “D. Josefa Cardoso Lopes, professora de Pedagogia, era ela que dava os ensinamentos de normas de ensino e a gente estudava, Claparède e Maria Montessori. Me lembro que ela dava muito... D. Filhinha era também muito exigente” (MUNIZ, 2001).
157
Fonte: Jornal Monitor Campista, 12 de dezembro de 1920. Fonte: Jornal Monitor Campista, 12 de dezembro de 1920.
158
Laudelina de Castro também foi aluna da Escola Normal de Campos. Sobre sua vida funcional, ela relata: “De adjunta effectiva do Grupo Balthazar Carneiro, passei a trabalhar em commissão, na Escola Modelo “Seis de Março”, tendo tomado posse e entrado em exercicio em 13 de outubro de 1925”. Laudelina de Castro lecionou na Escola Modelo até 1930. Em 1931 tomou posse como regente de Pedagogia e Metodologia Didática da escola Normal, tendo lecionado também no Instituto de Educação de Campos. Parenta da Professora Antônia Lopes, com ela trabalhou, na década de 1920, no Externato Antônia Lopes, escola particular que funcionava na Rua do Sacramento, em Campos. Dona Laudelina foi a última professora de Pedagogia da Escola Normal de Campos. É lembrada, com carinho, por suas ex-alunas. Dentre os depoimentos a seu respeito, selecionamos dois, de duas ex-alunas: Gilda Duncan Tavares e Marluce Guimarães Silva
E as aulas eram com D. Laudelina, uma professora que nós tínhamos, ela era muito exigente, a gente tinha um medo dela danado, mas ela era ótima. Ela era exigente, mas boa e ela acompanhava a gente nas salas. A gente ia de bonde e bonde dava a volta e passava em frente ao Liceu e depois dali ia para os colégios, a gente ia de bonde. [...] Nós íamos ao Visconde (do Rio Branco), ao Quinze de Novembro, qualquer colégio, João Pessoa, a gente... (TAVARES, 2001). Mas, nós normalistas, como ficávamos orgulhosas com o nosso jaleco branco de mangas compridas, esperando com D. Laudelina, o bonde na porta do Liceu, para nos levar até o Grupo Escolar Saldanha da Gama, hoje Instituto de Educação, para darmos aulas práticas (SILVA, 2005).
Faride Miguel Chacar. Formada pela Escola Normal de Campos em 1918, foi nomeada em 13 de outubro de 1925 para a Escola Modelo. Em 1927 era professora adjunta da 5ª série dessa escola. Em 1932, foi adida ao Liceu. Em 1934 foi empossada, por concurso, em 9 de julho, regente da cadeira de Geografia e Cosmografia do Liceu. Em relatório que enviou a Dona Consuelo, em 1927, deixa claro qual era o papel da professora primária de seu tempo: “Apesar dos esforços empregados, sinto-me ainda, muito ainda, muito affastada do ponto desejado: mas, com calma e resignação talvez chegue a alcançar o meu ideal- propagar e lutar pela causa da Instrucção”. Odysséa de Castro Nunes. Entrou na Escola Normal de Campos em 1922 159. Designada para servir como adjunta efetiva da Escola Modelo “Seis de Março” em 16 de Março de 1926, 159
O jornal Monitor Campista de 08 de março de 1922, página 4, publica a relação de habilitados ao exame de admissão à Escola Normal de Campos. Dentre eles se encontra essa professora, o que significa que era recémformada, quando tornou-se professora da Escola Modelo.
tomou posse e entrou em exercício em 18 de Março do referido ano, regendo a 1ª série. A partir de Julho do mesmo ano, com a designação de outra adjunta para a 1ª série, coube-lhe a classe mais adiantada, pois a 1ª série foi subdividida em três classes. Em 1927 lecionou na 2ª série. Mylita Pereira Soares. Nomeada em 1926, ficou pouco tempo na Escola Modelo, pois foi transferida para Niterói em 1927. Isaurina Carvalho. Como Odysséa, entrou para a Escola Modelo recém-saída da Escola Normal. Tomou posse, em 5/7/1926, como adjunta. No Relatório de 1927, assim descreve sua turma e sua prática pedagógica na 2ª série, em 1926: “Composta ( a turma) de 36 alumnas, pequenas e meigas creancinhas, que com facilidade se habituaram á disciplina e ordem do estabelecimento. Procurei ministrar-lhes sempre os conhecimentos com nitidez, empregando os methodos e processos modernos que a Methodologia nos ensina”. Maria Teresa Ribeiro da Costa -Professora formada, em 1925, pela Escola Normal de Campos, empossada como adjunta da Escola Modelo em 2 de junho de 1927 (LAMEGO, 1943, p.56), foi regente da Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos até 1931, quando cessou o funcionamento da Modelo. Sobre seu trabalho na “Seis de Março” não encontramos registro. Acompanhou a mudança dessa escola para outro endereço, como Grupo Escolar João Pessoa, de onde se aposentou em 1963. Professora com “p” maiúsculo, como disse sua filha Conceição, Dona Teresa não se limitava ao trabalho fora do lar. Ensinava aos filhos, e colegas deles, graciosamente, em sua casa, na Rua Carlos de Lacerda, 225, dando a esses cursos o nome de dois de seus filhos, que faziam parte da classe, ao mesmo tempo em que retratava sua fé. O primeiro foi o “Curso Santa Therezinha”, que funcionou na década de 1940, tendo como alunas sua filha Therezinha da Costa Muniz e a filha da vizinha, Rosicler Gomes Rebel. O interessante é que as duas, todos os dias, se arrumavam para “ir à aula” e, antes de ingressar no ambiente que lhes era familiar, davam uma volta no quarteirão para “fazer de conta” que estavam indo para a escola 160. O outro curso de Dona Teresa, foi o Curso “Santo Afonso”, que funcionou na década de 1950 e teve como alunos Cloris Caldas Pessanha, José Luiz Moraes de Souza, Ana Lucia Pereira Nunes Gonçalves, José Maria Soares Figueiredo, Luiz Marcelo Soares Figueiredo, Paulo André Chaves, Lia Márcia Chaves, Ovídio Manhães Carneiro, 160
Essa história nos foi relatada pela filha de Dona Teresa, Conceição de Maria Costa Muniz, em depoimento oral, 2001.
Carlos Roberto de Castro Viana, Fabio Lontra Costa, Afonso Luiz da Costa Muniz. Falecida em 1994, aos 91 anos, Maria Teresa da Costa Muniz deixou lastro na educação primária de Campos, tendo sua memória respeitada por gerações de campistas. Sobre as demais professoras, não encontramos subsídios sequer para uma pequena biografia. Cabe frisar alguns aspectos comuns na história dessas professoras: todas foram formadas pela Escola Normal de Campos, em geral todas eram recém-formadas quando foram nomeadas para trabalhar na Escola Modelo. Algumas tiveram cursos particulares, como foi o caso de Mercedes Landim, Laudelina de Castro e Maria Teresa da Costa Muniz. Consuelo Manhães, Faride Chácar, Laudelina de Castro e Josepha Cardoso Lopes tornaram-se, anos depois, professoras da Escola Normal de Campos e do Liceu. Esses dados nos permitem pensar a Escola Modelo “Seis de Março” como um lugar que conferiu destaque, constituiu identidades profissionais, construiu professores. Dois adendos se fazem necessários ao item “Professoras da Escola Modelo”: a importância de que se revestia, para elas, preparar as alunas para o exame final à Escola Normal, e o que liam as professoras de Campos.
4.4.2.1 A importância de preparar alunas para a Escola Normal
Conforme falou a Professora Stella Muylaert Tinoco Dias, “era um privilégio estudar na Escola Modelo, pois só fazíamos exame de Francês para entrar na Escola Normal”. A consulta às fontes, porém, mostra que as alunas da Modelo passavam por rigoroso processo de “Exame Final”, na própria escola. Eram avaliadas na 6ª série, até 1924 e na 5ª a partir desse ano, com a extinção daquela 161. A tarefa de preparar as alunas para esses exames era recebida como desafio pelas professoras da Modelo, como podem comprovar as palavras contidas em relatório enviado à Diretora da escola, no ano de 1927, por Mercedes Landim: “Em 1925 já effectiva por acto de 2 de Março com a reforma da instrucção primaria, quando foi supprimida a 6ª serie, a Exma. Sra. Directora me entregou a 5ª serie, composta de 10 161
“De accordo com a reforma (Dec. nº. 2.105, de 2 de março de 1925- que dotou a instrucção publica com um perfeito apparelhamento destinado á inspecção do ensino e deu nova organização ao ensino primario), o ensino primario é administrado em escolas de 3 gráos: o elementar, nas de 1º gráo, o medio, nas de 2º, o integral nas de 3º- grupos escolares, havendo, nas primeiras, duas series, nas segundas tres series, e nas terceiras, cinco series (MENSAGEM 1925, Feliciano Pires de Abreu Sodré, p.45).
alumnas que em Novembro prestaram exame final, sendo approvadas com distincção, o que lhes deu ingresso directo á Escola Normal e as outras 5, plenamente”. Como se percebe, a entrada sem exame de admissão não era para todas as alunas, mas apenas para as que fossem aprovadas “com distinção” 162, caso de Stella no ano seguinte 163, que, preparada pela Profª Laudelina de Castro, relatou:
Eu passei com distinção. Acontece até o seguinte, que muita gente ficava admirada, inclusive o meu namorado nessa época, que foi o meu marido, que foi o único namorado meu, ele veio me parabenizar pela alta nota que eu tive, não é, eu expliquei pra ele: É que eu só fiz francês e tive 5, quer dizer eu passei com a nota 5. Para mim foi ótimo, me ajudou, porque eu fiz o Normal, nunca tive uma reprovação, e fui professora todo o período que o governo exigiu, não é, de professora primária naquela época. Nunca me arrependi de ser professora, nunca, mas também gostava muito de bordado, que havia aprendido com a minha mãe, e aprendi também na Escola Normal com D. Maria Eugênia Landim, professora de bordado. Era uma professora maravilhosa. E isso me ajudou na vida. Além da renda que eu tinha como professora de bordado, porque eu trabalhava em bordado e adquiri muita amizade boa, por intermédio de bordado. Tudo isso eu devo ao meu princípio na Escola Modelo, porque eu entrei muito novinha lá também, não é? (DIAS, 2005).
Sobre essa experiência, na qual empregou “sempre o methodo intuitivo no ensino de todas as materias, tendo por base a intuição, variando de processo, conforme a necessidade do ensino o exigio [...] e de accordo com o adiantamento das alumnas”, Dona Laudelina diz:
Se grande foi a confiança da minha Directora, entregando-me a 5ª serie, maior foi meu esforço para satisfaze-la [...]. Fui forçada entretanto a completar os programmas anteriores, para depois proseguir (sic) o da 5ª serie, visto que, além das 9 alumnas que foram promovidas á 5ª serie, não terem tido tempo de completar o programma, as 13 que vieram de outras escolas estavam em identicas condições.Consegui no entanto, com grande esforço, preparar 22 alumnas, sendo 12 approvadas com distincção que se matricularam na Escola Normal fazendo apenas o exame de Francês; 7 approvadas com plenamente, as quaes prestaram o exame de admissão á Escola Normal tendo todas obtido boas notas nesses exames (CASTRO, 1927).
4.4.2.2 O que liam as Professoras de Campos
162
De acordo com o Art. 67 do Decreto 1420, de 13/04/1915, “as notas das provas de exame serão: optima, boa, soffrivel, má e péssima, sujeitas á graduação seguinte: 0, péssimo; 1, má; 2, 3, 4 e 5, soffrivel; 6, 7, 8 e 9, boa; 10, optima. O resultado dos exames obedecerá ao seguinte julgamento: a) approvado com distincção, o examinado que reunir totalidade de notas optimas, tendo media de anno nove ou superior a nove”. Não há comprovação de serem esses os critérios usados para as alunas da Escola Modelo. 163 “Com muita satisfação aqui deixo consignado que as maiores notas do exame de admissão á Escola Normal couberam ás alumnas da 5ª serie da Escola Modelo “Seis de Março”: Emyrene Braga, Ilde Bittencourt, Stella Tinoco, Edméa Tamega, Maria Leonor de Almeida, Maria Leonice Campista, Maria Luisa Bilot, Maria de Lourdes Soares de Castro, Olga Corrêa, Maria Antônia Brito de Campos, Diahir de Azevedo, Carmem Chagas, Dagmar Costa, Idalina Martins, Maria Stella Vieira Netto, Maria Julia Caetano, Normedia Lyrio, Nicia Alves, Judith Faria Castro” (CASTRO, 1927).
O jornal Monitor Campista de 19 de março de 1922 traz o seguinte anúncio: “Cartilha Brasileira”, por Clemente Guaglio, Professor de Psycologia Experimental e Pedagogia. A venda na “A Pena de Bronze”. Esse manual era usado na Escola Normal de Campos na época em que o professor de Pedagogia e Metodologia Didática era Benedicto Hermógenes de Menezes. Após sua morte, assumiu Antônia Lopes que não fez registro do manual de Pedagogia que usava. Em 1927 publicou o seu, Synopse de Pedagogia e Methodologia Didactica. Em agosto de 1934, ao completar 90 anos, a tradicional livraria campista Ao Livro Verde, editou o “Boletim Bibliographico e Commercial do Ao Livro Verde”, para “registrar informativamente, as novidades que, quer na litteratura de ficção, quer na litteratura scientifica, quer na litteratura didactica, forem surgindo nessa quadre fecunda do pensamento humano, de sorte a melhor servir ás classes docente, discente e á intellectualidade em geral, no heterogêneo de suas predileções e tendências” (1934, p.1). Na página 7 do Boletim164, há uma seção intitulada “Últimas novidades recebidas”, onde se lê: “Algumas obras do nosso variado stock de livraria165”. Da área de Pedagogia constavam os seguintes autores e títulos:
Sud Menucci- Crise Brasileira de Educação; Maria dos Reis Campos- Escola Moderna; Anisio Teixeira- Educação Progressiva; Afranio Peixoto- Noções de Historia da Educação; John Dewey- Como Pensamos- (Tradução); Ed. Claparède- A Educação Funccional (Tradução); Ev. Backheuser- A Arithmetica na Escola Nova; Dr. Iago Pimentel- Noções de Psychologia; Lucia de Andrade Magalhães- Psychologia Pedagogica da Adolescência; L.Castro Afilhado Rumos novos (Em torno do problema educacional); Tristão de Athayde- Debates Pedagogicos.
Da série organizada por Lourenço Filho, Bibliotheca da Educação, constavam os seguintes livros:
Henri Piéron- Psychologia Experimental; Ed. Claparède- A Escola e a Psychologia Experimental; Sampaio Dória- A Educação Moral e a Educação Econômica; Henrique Geenem- Temperamento e Caracter sob o ponto de vista educativo (Trad.); Emile Durklein- Educação e Sociologia; Octavio Domingues- A Hereditariedade em face da educação; Firmino Proença- Como se ensina Geographia; Coryntho da Fonseca- A Escola activa e os Trabalhos Manuaes; Ad. Ferriére- A Escola Activa e a lei 164
Consultamos o Sr. Ronaldo Sobral, um dos atuais proprietários de Ao Livro Verde à procura de outras edições do “Boletim”, mas ele desconhece a existência dessa publicação e de outras que procuramos localizar, como por exemplo, os manuais escritos por Antônia Ribeiro de Castro Lopes, alguns editados pela livraria. 165 A transcrição é fidedigna ao documento, excetuando a omissão do valor em réis de cada livro, dado constante do original. O livro de menor preço para venda custava 4$000, de alguns volumes da Biblioteca da Educação, e o mais caro, custando 10$000, era o “Noções de Psychologia”, do Dr. Iago Pimentel.
Biogenética; Binet e Simon- Testes da Medida da Intelligencia; Lourenço FilhoIntrodução ao Estudo da Escola Nova; John Dewey- Vida e Educação; Jonathas Serrano e Venancio Filho- Cinema e Educação; Abner de Moura- Os “Centros de Interesse na escola”; Estevão Pinto- A Escola e a formação da mentalidade popular do Brasil; Firmino Costa- Como ensinar linguagem; William Kilpatrik- Educação para uma civilisação em mudança e O Problema da Educação dos Bem dotados.
Por meio dessa relação pensamos ser possível saber que autores liam os professores de Campos, já que de forma quase sistemática nas livrarias de interior, eram os próprios leitores que sugeriam a compra de determinados títulos. Embora a Escola Modelo “Seis de Março” não mais existisse, e o modelo de prática de ensino tenha se transformado com o curso normal após a Reforma Francisco Campos, acreditamos que autores como Claparède, Sampaio Dória, Binet e Simon, Lourenço Filho, Dewey e outros, fossem conhecidos, há algum tempo de professoras como Antônia Lopes 166 e suas seguidoras na Pedagogia e Metodologia da Escola Normal, Laudelina de Castro e Josepha Lopes. Era o ideário escolanovista circulando nos meios acadêmicos da cidade de Campos.
4.4.3 AS ALUNAS
Os primeiros registros de nomes de alunas da Escola Modelo 167 foram localizados em Ata de Termo de Exames feitos aos dias 1 e 3 de dezembro de 1917 na Escola “Seis de Março”. Nesse ano prestaram exame para a 6ª série a aluna “Mercedes Franco, com 15 annos, e para a 5ª série as alunas Edna Cardoso, com 14 annos, e Maria Custodia Barcellos, com 12 annos”. Três outros documentos nos possibilitaram resgatar nomes de alunas da Escola Modelo. O primeiro é uma Ata de Promoção de 1918, que foi encaminhada ao Diretor da Escola Normal por Antônia Lopes; o segundo, é o Relatório escrito por Consuelo Manhães, em 1927, e o terceiro trata-se de um documento intitulado “Diário de Classe” (FIG.11), feito pela normalista do 4º ano, Maria Carlota Baptista Tavares, para aula prática na Escola Modelo em 1919.
166
Nesse ano ela já tinha fundado o Instituto Claparède, escola ao ar livre, e ali empregava os métodos e técnicas propostos por Edouard Claparède no Instituto Jean Jacques Rousseau, na Suíça, onde esteve e com quem estudou, em 1930. 167 Existe um documento, no Arquivo do Liceu, intitulado “Elementos para o Relatório de 1916”, que registra somente o número de alunas matriculadas.
A informação abaixo transcrita, contida na “Ata de Promoção”, além de apresentar as alunas, confirma a hipótese de que a Escola Modelo “Seis de Março” foi mesmo uma escola do tipo “Complementar”, isto é: até a quarta-série era considerado “Curso Médio”. A 5ª e a 6ª séries compunham o ‘Curso Complementar”.
Pelo decreto n. 1638 de 14 de novembro de 1918 foram promovidas pelas médias as seguintes alunas: Alzira Franco, Marina G. de L. Ribeiro de Castro e Alzira Barroso á 2ª série; Izabel Pereira Nunes, Maria da Penha de Souza, Heloisa Carvalho e Jocila de Castro Peixoto á 3ª série; Ida Zulckner, Ceci Mendes, Helvia Moreira e Mercedes Barroso á 4ª; Antônia M. de Castro Peixoto, Carmelita Limongi, Helena Mazzuchi, Inaiá Faria de Moraes e Antonieta santos, á 6ª série. Completaram o curso médio, isto é, foram promovidas á 5ª série, as alunas Rute de Castro Moreira, Silvia de Souza, Carmelita Barroso, Maria Nunes Machado, Maria da C. de Castro Peixoto e Zenir Bacelar da Silva. Foi também julgada habilitada a aluna da 6ª série Arezina Moreira, com 12 anos.
A seguir, por ano, de 1919 a 1926, a relação das alunas que prestaram Exame Final na Escola Modelo, para ingresso na Escola Normal de Campos, contida no segundo documento supracitado:
1919:Antônia Maria de Castro Peixoto e Dagmar de Abreu Neves (6ª série 168). 1920: Carmelita Barroso, Sylvia Souza e Zenir Bacellar da Silva (6ª série). 1921: Augusta Lontra Pinto e Mercedes Barrozo. 1922: Amelia Marins e Erinéa Barreto. 1923: Evelina Teixeira. 1924: Alzira Barroso, Grasiela Paes de Campos, Lygia de Azevedo Ramos e Maria da Gloria Nogueira. 1925: Celia Gomes Cruz, Lecticia Ferreira Landim, Maria Luisa Ribeiro, Maria Barroso Wagner, Gilda Pizzotti, Maria do Carmo Gomes, Maria José Botelho, Maria Dalva de Queiroz e Nair de Almeida Parente. 1926: Carmem Chagas, Dagmar Costa, Diahyr Azevedo, Edmea Tamega, Emyrene Braga, Idalina M. da Costa, Ilde Peres Bittencourt, Judith F. Castro, Maria Antônia B. de Campos, Maria Stella V. Netto, Maria Julia Caetano, Maria Leonor de Almeida, Maria Leonice Campista, Maria de Lourdes Castro, Maria Luiza Bilot, Normedia Lyrio, Nicia Alves, Olga Corrêa, Stella M. Tinoco, Odysséa Moraes169.
No “Diário de Classe” da aluna-mestra Maria Carlota, estão registrados, por série, os nomes das meninas que cursaram a Escola Modelo “Seis de Março”, em 1919.
1ª série: Cecília Franco; Marina Galvão; Ruth Povoa; Stella Tinoco 2ª série: Alzira Franco; Alzira Barroso; Letícia Silva; Marietta Nunes 3ª série: Heloisa de Cavalho; Isabel Peixoto; Jocila Pereira Nunes; Maria G. Souza 4ª série: Augusta Pinto; Ida Zulckner; Luciola Silva; Mercedes Cardoso; Myrthes Barroso 5ª série: Carmelita Barroso; Cidia Tavares; Maria Peixoto; Nair Tavares; Ruth Moreira; Sylvia de Souza; Zenir Barcellar da Silva 168
Dona Consuelo diz que as preparou para exame, que não chegaram a prestar, por circunstâncias particulares. A aluna Odysséa Moraes faltou ao exame.
169
6ª série: Antônia Peixoto; Dagmar de Abreu Neves
Nesse item da dissertação, em que se fala das alunas que estudaram na Escola Modelo, não poderíamos deixar de registrar nosso contato com três delas, Stella Muylaert Tinoco Dias, Ilce Cunha e Isolina Carvalho Sampaio. Conhecer novas pessoas, perguntar, voltar a perguntar, gravar, transcrever, dar forma a informações soltas, relacioná-las à historiografia faz parte do trabalho de investigação científica. Pessoalmente, de todas essas funções, considero que a primeira é a melhor. Através da pesquisa pudemos conhecer e conversar com apreciáveis “senhorinhas”. A última a ser encontrada foi Dona Stella, para quem sou “a mais nova velha amiga”. A entrevista foi feita em sua casa, na praia de Atafona, município de São João da Barra/RJ, no verão de 2004. Com quase 95 anos, Dona Stella é lúcida e bem disposta. Gentilmente, tornou-se minha maior informante das coisas da Modelo, pois fica feliz quando se lembra do passado e de suas idas para a Escola Modelo “Seis de Março”, sempre levada pelo pai, o Secretário do Liceu e Escola Normal, João Baptista de Seixas Tinoco. Acompanhada por sua filha Stelmar Tinoco Dias Torres, Dona Stella foi conosco, num sábado pela manhã ao Liceu, no dia 9 de abril . Lá identificou a sala em que estudou, sentouse em uma carteira (“que era de outro tipo”), lembrou-se de que foi seu pai quem mandou pintar a faixa preta na parede, em substituição ao quadro-negro, em cavalete, e estranhou a localização da porta da sala, que se abre para o lado direito de quem entra no Liceu, pois a Escola Modelo tinha entrada, recreio e saída independentes da Escola Normal e do Liceu. Nessa visita, ao passar pela “sua” sala da Escola Normal, Dona Stella recordou que foi ali que aprendeu, com a Profª Maria Eugênia Landim, professora de Trabalhos de Agulha daquela escola, a bordar. Foi ali que aprimorou uma tendência, familiar, de bordadeira 170. Com Ilce Cunha e Isolina Carvalho Sampaio a entrevista foi feita por telefone. Dona Ilce, que reside em Niterói, lembrou-se de que usava “saia azul marinho plissada, blusa branca” e de que “as meninas maiores vinham medir a saia do colégio”. Dona Isolina, por sua vez, contou que ficou pouco tempo na escola, de onde não guarda boas lembranças. A disciplina era muito rígida para uma criança bem pequena, como diz ser na época. Lembra-se da inspetora “Dona Sinhazinha” que lhe metia medo, por ser bastante idosa. 170
É com muito orgulho que Stella se refere à profissão que acumulou com a de professora. Profissão com a qual ajudou seu marido a educar os filhos e que lhe deu muitos amigos, pois Dona Stella é reconhecida, na região, pelos belos enxovais bordados que fez para noivas e bebês. Esse papel de profissionalização da Escola Normal pôde ser percebido também na entrevista feita com Aldarina da Penha Carneiro, ex-diretora do Jardim de Infância Antônia Lopes, exímia nas artes do crochê.
4.4.4 OS SECRETÁRIOS DA ESCOLA MODELO, LICEU E ESCOLA NORMAL
O Secretário da Escola Normal de Campos e do Liceu de Humanidades quando foi criada a Escola Modelo era o Sr. João Baptista de Seixas Tinoco, chamado pelos Diretores, nos documentos, de Seixas ou Seixas Tinoco. Serviu às Escolas de 1912 a 1923 (LAMEGO, 1943, p.75). Homem culto foi admitido, em 03 de junho de 1908, como membro titular da “Societé Astronomique de France 171 ”. Depois que saiu do Liceu dirigiu a Estação Meteorológica da cidade de Campos. Seixas Tinoco era pessoa bastante considerada no Liceu, como comprovam dois relatórios de diretores da Casa, dirigidos à Instrução Pública. Em 1914, Sebastião Viveiros de Vasconcellos, diz:
A Secretaria esteve e está confiada ao Sr. João Baptista de Seixas Tinoco, secretario dos dous estabelecimentos. É uma repartição digna de ver, pela ordem, aceio (sic), intelligencia e honestidade com que a superintende o respectivo funccionario. Pena é que a ultima reforma o esquecesse. Augmentaram-se os vencimentos de todos professores, porteiros, contínuos, inspectores, mas o secretario continuou a perceber o mesmo, com a circunstancia condenavel de ganhar menos que o porteiro e quase o mesmo que o continuo (VASCONCELLOS, 1914).
Dois anos depois, Antonio Joaquim de Castro Faria, no relatório que escreveu em 1916, ao focalizar a Secretaria das Escolas, diz: “Continua essa dependencia da administração a cargo do Snr João Baptista de Seixas Tinoco, que desempenha as suas funcções a inteiro contento desta Directoria”. Há no Arquivo Histórico do Liceu inúmeros documentos, notas de compras, bilhetes devolvendo material que não chegou com a referência pedida, reclamações aos fornecedores, ofícios, correspondências por ele enviados, Atas da Congregação do Liceu e da Escola Normal, Atas de Concursos, Listas de material para a Escola Modelo, dentre outros, em que sua organização administrativa se faz sentir. Depois de Seixas Tinoco, secretariou o Liceu e Escola Normal, o Sr. Carivaldino Pinto Martins172, de 27 de abril de 1923 a 18 de julho de 1941 (LAMEGO, 1943, p.75). Sobre ele
171
Diploma assinado pelo Secretário Geral da Sociedade, em poder da filha Stella Muylaert Tinoco Dias. O cargo era “Secretário-Bibliotecário”. O ato de nomeação de Carivaldino Martins torna “sem effeito o acto de 2 do corrente mez na parte em que nomeou Tarquínio Bernardes Pereira para o mesmo lugar” (MONITOR CAMPISTA, 25 de abril de 1923). 172
não conseguimos maiores informações, a não ser que se tornou nome de rua, no bairro Parque Califórnia, em Campos dos Goytacazes.
4.4.5 A INSPETORA DE ALUNOS
Até pelo menos o mês de maio de 1924, a Escola Modelo não dispôs de funcionária de apoio. Quem afirma é o diretor Viveiros de Vasconcellos, em correspondência à administração superior: “Não tem a “Escola Modelo” nenhuma inspectora, pelo que se impõe a nomeação de uma funccionaria para esse lugar” (VASCONCELLOS, 1924) no que foi atendido, pois no relatório do ano seguinte, escreveu: “felizmente foi criado o lugar de inspetora e acha-se provido pela funcionaria Dona.....”. Como o relatório se encontra em rascunho, supõe-se que ele, no original, tenha escrito o nome de Emilia da Cunha Brito, nomeada como sub-inspetora da Escola Normal em 5 de janeiro de 1925 (LAMEGO, 1943, p.55). Durante sua existência, a escola careceu de pessoal não-docente. A classe de Jardim de Infância em 1927 foi fechada em pouco tempo, por falta de guardiã. É recorrente, em todos os relatórios, sejam de diretores da Escola Normal e Liceu ou da diretora da “Seis de Março”, a solicitação pela ampliação dos recursos humanos para as escolas.
4.4.6 O INSPETOR DO ESTADO NA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
Os Presidentes do Estado do Rio de Janeiro começaram a valorizar, já na segunda década do século XX, a função do inspetor escolar, formada por professores nomeados por concurso e última escala da carreira do magistério, como se depreende do registro feito pelo Presidente Oliveira Botelho. “Houve toda a vantagem na creação desse serviço pela severa vigilancia exercida, ao mesmo tempo que anima o professor a trabalhar, para alcançar essa ultima escala da carreira que abraçou ( Mensagem 1912, p.22). A implantação de “assidua fiscalização permittirá avaliar do encaminhamento do ensino e dará ao Estado o indice da competencia dos mestres, da sua dedicação na ingente e patriotica lucta contra a ignorancia, como permittira localizar acertadamente escolas e ter criterio seguro na distribuição de material escolar ( Mensagem 1924, p.44). Há, no Arquivo Histórico do Liceu, provas da passagem de representante da inspeção escolar do Estado na Escola Modelo “Seis de Março”, em duas ocasiões: 18 de junho de 1919,
às 13 horas e 50 minutos, e em 26 de maio de 1923. São dois Termos de Visita do inspetor José Bernardo Cardoso Junior , divididos em vários itens: aspectos estatísticos, higiênicos, pedagógicos e materiais. Em ambas as visitas, a Diretora era Consuelo de Almeida Manhães. Em 1919, como diretora interina, pois encontrava-se, diz ele, “substituindo a D. Antônia de Castro Lopes, effectiva da Escola, supra, a qual é só para o sexo feminino”. Em 1923, como diretora efetiva. Sob o ponto de vista estatístico, relatou:
Esta escola matriculou, em 1918, 34 alumnas do sexo feminino; a media deste anno attingiu a 30 alumnas. A matricula em 1919, até a presente data, é de 33 alumnas distribuidas no seguinte modo: na Serie A, ha uma alumna; na Serie B, ha 4 alumnas; 2ª Serie, 5; na 3ª Serie, 6; na 4ª Serie, 8; na 5ª serie, 7; na 6ª Serie, 2. A media do mês de Março do corrente anno é de 22 alumnas; a de Abril, 22; a de Maio, 21. No momento da visita encontravam-se na sala de aula 31 alunas e a professora.
Sob o ponto de vista higiênico observou que a Escola “está installada em uma magnifica sala, bem arejada, suavemente elluminada, orientada para o lado de Sueste; sua capacidade é para uma média, diaria, de 30 alumnas. As alumnas compareceram, asseiadas, á aula e comportaram muito bem durante a minha visita”. A observação mais interessante, porém, é a que o Sr. José Bernardo Cardoso Junior fez sobre os aspectos pedagógicos: “Esta Escola tem todos os elementos necessarios e sufficientes. Assisti a uma aula de português de 2ª serie, ella constou de leitura, sendo um trecho da mesma analysada lexiologicamente. Agradou-me o modo pelo qual a professora tomou esta aula”. Para a Professora Consuelo foi só elogios: “exerce uma direção competente, e é esforçada, já que nada falta à organização material da Escola”. Encerrando o termo de visita, solicitou que no prazo de 24 horas a diretora enviasse cópia do mesmo à Superintendência Geral do Ensino do Estado do Rio de Janeiro e observou: “Em tempo. As aulas começam, sempre, com o canto do Hymno Patriotico”. Quase quatro anos depois, em 26 de maio de 1923, o mesmo inspetor, José Bernardo, encontrou a escola com mais uma professora, Mercedes Landim, e 44 alunas matriculadas até aquela data, estando assim distribuídas: “3 alumnas na 6ª serie; 7, na 5ª; 4, na 4ª; 7, na 3ª; 12, na 2ª e 11, na 1ª. A media de Março do corrente anno attingiu a 34 alumnas; a de Abril a de 37”. Sob o ponto de vista higiênico, o Termo de Visita registra que “serve á Escola Modelo, supra, uma boa sala da Escola Normal; sua luz é bilateral, porem fraca; é bem ventilada e sua
capacidade é para uma media de 30 alumnos. Agora, havendo uma adjunta, ha necessidade de mais uma sala, para uma professora não embaraçar o ensino da outra”. Considerando que as disciplinas do programa “estão distribuídas, eqüitativamente, pela Snra Directora e sua Adjunta”, assistiu às aulas das duas professoras. De Consuelo Manhães “assisti a uma aula de syntaxologia, dada á 5ª serie e a 6ª. Esta aula foi profissientemente (sic) desenvolvida, segundo os processos da grammatica moderna; agradoume esta aula muitíssimo”. Da Professora-Adjunta, “assisti a uma aula de Hygiene, dada a alumnos de 4ª serie; esta aula versou sobre molestias contagiosas e sobre o meio de evital-as. Agradou essa aula”. O comportamento das alunas foi também observado e registrado: “As alumnas durante a minha visita, comportaram-se muito bem”. Além dos aspectos estatísticos, higiênicos e pedagógicos, o inspetor, nessa visita preocupou-se em observar, também, os aspectos materiais da Escola Modelo. A propósito, comunicou, em Termo, que foi enviada à Diretoria Geral de Instrução Pública a relação do material da Escola e que a escola não recebeu o seu devido material de custeio. É interessante observar a atuação do inspetor nas visitas à Escola Modelo. Assistiu às aulas e registrou os assuntos sobre as quais versavam, demonstrando que as atribuições da função de inspetor escolar estavam se ampliando- da mera fiscalização à observância de aspectos pedagógicos. Confirmando essa observação encontramos, em Mensagem do Presidente do Estado, a seguinte orientação
Com a ampliação desse serviço, dando-lhe maior efficiencia, assignalando-lhe uma serie de attribuições relevantes, foi pensamento do governo manter a rigorosa fiscalização dos estabelecimentos de ensino primario, porém não lhe foi estranha a vantagem que decorreria do facto de achar-se a autoridade de inspecção em contacto assiduo com o professor, dando-lhe instrucções, assistindo-o com os seus conselhos, proporcionando-lhe aulas-modelo, acompanhando a dedicação e o interesse do mestre e o aproveitamento das classes, corrigindo os methodos condemnaveis e reconhecendo as necessidades materiaes da escola para provel-a convenientemente (1925, p.96).
4.5 OS ASPECTOS PEDAGÓGICOS
4.5.1 O CURRÍCULO FORMAL DA ESCOLA MODELO SEIS DE MARÇO- 1923 A 1927- NA LEITURA DOS RELATÓRIOS DAS PROFESSORAS/1927
Pode-se inferir que de sua fundação até o ano de 1923, todas as matérias do currículo eram ministradas pela Professora-Diretora, única da Escola. Não há registros sobre os conteúdos ensinados 173. A partir de 1923, com a nomeação da adjunta Mercedes Landim, as atividades escolares passaram a ser desenvolvidas pela Diretora (“em menor número”), e por sua auxiliar. O quadro que se segue foi elaborado a partir da análise dos Relatórios de 1927, enviados pelas professoras da Escola Modelo à Dona Consuelo Manhães, diretora, encontrados no Arquivo Histórico do Liceu.
Classes
1923
Maternal(1º, Josepha 2º, 3º Períodos) 1ª série
2ª série 3ª série 4ª série 5ª série 6ª série
s e d e c r e M e o l e u s n o C
Distribuição das Professoras: 1923 a 1927 1925 1926 Até A partir de Até junho A partir de outubro 13 de (1 turno) julho (2 outubro turnos)174 Classe extinta 1924
1927
-
Josepha (A, B, C)
Josepha
Josepha
Josepha Odysséa (A,B, C)
Josepha (A,B) Mercedes
Josepha
Josepha
Mercedes
Odysséa (C) Mercedes (A,B) Isaurina
Consuelo Isaurina175 Consuelo Mercedes (sem profª) Mercedes Suprimida
Faride
Mylita
Mylita176
Odysséa (A, B) Isaurina
Laudelina
Faride (A,B) Laudelina
Faride
Mercedes
Laudelina
Faride
Consuelo ? ?
Mercedes
Laudelina (A,B) Josepha (C)
Numa tentativa de reconstituir o currículo formal de 1923 a 1927, ano a ano, analisamos os dados e chegamos às conclusões que se seguem e trazem ao presente, aspectos da cultura da “Seis de Março”. A primeira observação diz respeito ao método utilizado no processo de ensino-aprendizagem, o intuitivo. Sobre o mesmo, diz SOUZA:
173
Em Relatório ao Diretor da Escola Normal de Campos, 1927, Consuelo Manhães não faz menção ao currículo formal que trabalhava, preocupando-se em relatar o nome das alunas que fizeram exame final, estratégias de organização, nomeação de professoras, número de matrículas e necessidades da escola. 174 A Profª Josepha substituiu a Profª Mercedes (licenciada), na direção da escola, de 17 de agosto a 13 de outubro. 175 A Profª Isaurina de Carvalho trabalhou de 14 de maio de 1925 até 4 de agosto de 1925, quando foi transferida para outra escola. 176 A Profª Mylita Pereira Soares entrou em 18 de março de 1926 e foi transferida no início de 1927.
A transformação de uma educação fundamentada, essencialmente, no ensino da leitura, do cálculo e da doutrina cristã, por outra baseada na educação do corpo, na ciência, nos valores morais e cívicos e nos saberes instrumentais para o trabalho, foi fruto de um longo e conflituoso processo de escolarização de saberes oriundos de fontes diversas. Essa adaptação pedagógica, tendo em vista a aprendizagem infantil, efetivou-se, especialmente, mediante o método intuitivo (2000, p.17).
Todo o currículo formal da Escola Modelo era transmitido dentro dos preceitos do método intuitivo, como demonstram as práticas escolares desveladas nos relatórios das professoras. A Professora Josepha Cardoso de Araújo Lopes; por exemplo, quando tinha sua classe de Jardim de Infância, em 1923, dividida em 3 períodos e freqüentada por crianças de 4 a 6 anos de idade, trabalhava o seguinte currículo: “Exercícios de Linguagem, Rudimentares Noções de Higiene, Geografia, Lições de Coisas e Moral e Cívica”, utilizando o método “baseado na intuição, que tão bem fala á intelligencia infantil, empregando os methodos que mais se apropriam ás diversas materias- o analytico no ensino da leitura, o inductivo em Arithmetica” (LOPES, J., 1927). Por sua vez, a Professora Odysséa de Castro Nunes relata que empregava, em suas aulas, “o methodo e processos intuitivos” (NUNES, 1927). O método intuitivo,
conhecido também como lições de coisas, consistiu no núcleo principal da renovação pedagógica. Fundamentado especialmente nas idéias de Pestalozzi e Froebel, pressupunha uma abordagem indutiva pela qual o ensino deveria partir do particular para o geral, do conhecido para o desconhecido, do concreto para o abstrato. Esse método racional fundamentava-se em uma concepção filosófica e científica pela qual a aquisição de conhecimentos advinha dos sentidos e da observação” (SOUZA, 2000, p.4).
Falar em currículo formal é falar também em livros e outros materiais didáticos. A respeito, Souza (1998, p. 168) nos diz que, em função do uso do método intuitivo- observação direta- os professores ( paulistas) parecem ter estabelecido
uma dependência direta entre o método e o uso de materiais escolares. Para tudo era necessário material: para o ensino de aritmética, do sistema métrico decimal e da geometria: cartas de Parker, compassos, contadores mecânicos, quadro de geometria, tabuinhas, contador de mão e de pé, caixa de formas geométricas, cadernos de aritmética. Para o ensino da linguagem: coleção de abecedários [...], cartas de alfabeto, cadernos de caligrafia. Para o ensino de geografia e história: globo terrestre, tabuleiros de areia, quadros de história do Brasil, mapas. Para o ensino de ciências físicas e naturais: laboratórios, museus, [...], estampas, quadros de história natural, esqueleto humano, [...]. Para o desenho: esquadros, modelo para desenho em gesso, coleção para desenho. Para trabalhos manuais: caixas de tornos, pranchetas para modelagem, máquinas de costura.
Num cruzamento entre fontes177, foi possível estabelecer os livros (FIG.12) e materiais didáticos que eram usados na Escola Modelo, nas matérias de estudo em que se distribuía o currículo escolar. A relação de disciplinas, que se segue, referidas nos Relatórios das Professoras da Escola Modelo “Seis de Março”, parecem compor o provável currículo formal dessa Escola. Será apresentada com o seguinte critério: procurar identificar, em cada uma delas as finalidades com que eram trabalhadas 178 , e identificar o uso, provável, dos equipamentos, livros e materiais constantes dos inventários da Escola Modelo dos anos de 1919 e 1926 (FIG.9). Foram as seguintes as disciplinas citadas nos Relatórios das Professoras da Escola Modelo “Seis de Março”: Português- Em relação ao ensino da leitura e da escrita, diz-nos Vademarin (2004, p. 109) que, segundo alguns autores de manuais pedagógicos por ela pesquisados, “o pensamento e a linguagem são fatos observáveis; o pensamento adquire uma forma por meio das palavras, que são compreendidas pela junção dos sons, o que justifica a análise dos sons que compõem as palavras, acompanhada do estudo dos signos que as representam, isto é, a escrita”. O material por nós identificado foi “uma coleção de mapas para o ensino de Linguagem”, e os seguintes livros: Livros de “Leitura” dos seguintes autores, de Thomaz Galhardo, Erasmo Braga, Hilário Vianna, Francisco Vianna e Manoel Bonfim. “Gramática”, de Menezes Vieira. “Páginas Cariocas”, de Nelson Costa. “Historieta”, de J. P. e Silva. “Dicionário”, de Simões da Fonseca. Aritmética/Geometria- Em relação ao ensino da matemática “sobressaem os métodos concretos que precedem as operações escritas e o uso formal e metódico dos algarismo s” (SOUZA, 2000, p. 19). Para concretizar o ensino, havia na Escola Modelo “Seis de Março”: 1 disco para o ensino do reconhecimento das horas; 1 mapa para o ensino das figuras geométricas; compassos e réguas de madeira; 1 esquadro; 1 coleção de cartas de Parker; 1 contador mecânico; 2 mapas de sistema métrico decimal; 1 mapa do sistema de pesos e medidas; 10 sólidos geométricos; 1 caixa com cilindrozinhos; 1 caixa com tornos; 1 coleção 177
Relatórios de Professoras, Inventários da Escola, Lista de compras, Manual Synopse de Pedagogia e Metodologia (LOPES, 1927). 178 Dentro da perspectiva proposta por Rui Barbosa em seus Pareceres, que segundo SOUZA (2000, p.2) “foram adotadas nas reformas da instrução pública realizadas em várias províncias na década de 1880, e posteriormente pelos estados nas primeiras reformas educacionais da era republicana”.
de mapas para o ensino de Aritmética; 1 coleção de 8 sólidos geométricos. O ensino da geometria pelo método intuitivo deriva de “suas aplicações cotidianas [...] podendo ser desenvolvida à mão livre ou com a utilização de instrumentos e materiais específicos, como régua, modelos, etc.” (VALDEMARIN, 2004, p.109-110). Os livros usados eram: “Geometria Prática”, de Olavo Freire e C. Rosa; “Arithmetica”, dos seguintes autores: Souza Lobo, Trajano e Cora de Alvarenga 179. Ginástica- De acordo com Rosa Fátima Souza “a educação física das crianças no Brasil emerge atuando na preparação do corpo feminino para a reprodução dos filhos da pátria e na preparação do corpo do soldado tornando-o útil à pátria e ao capital” ( SOUZA, 2000, p. 9). Na escola primária essa prática educativa esteve, sempre, ligada a conceitos de moral, higiene e saúde, sendo “o contrapeso necessário ao trabalho intelectual”. Higiene- As práticas educativas eram quase sempre perpassadas por conceitos higienistas. Em relação ao ensino da leitura e da escrita, havia a “higiene da leitura” e a “higiene da escrita”. A “higiene da leitura” compreendia o tamanho das letras,
precisa ser evitado o emprego de textos escritos com letras pequenas, sobretudo nos primeiros anos de escolaridade. Segundo as melhores opiniões, os livros para o primeiro anno de leitura devem ser impressos em letras cujas minúsculas meçam 3mm, com entrelinha de 5 mm, para o 2º e 3º annos devem as letras ser de 2mm., com entrelinha de 4 mm., e para o 4º anno devem as letras ser de 2 mm., com entrelinha de 4 mm., e para o 4º anno devem as letras ser de 1.8 mm., com entrelinha de 3.5 mm. (FONTENELLE, 1930, p.834-837).
Também têm influencia “sobre o trabalho de leitura a illuminação do local, a incidência do raio visual, a distancia do livro e a correcção de attitude do leitor”. Esse último aspecto, “na escola, somente póde ser obtido por meio de rigorosa e permanente fiscalisação da professora”. Em relação à “higiene da escrita”, é preciso que o aluno tome posição symetrica, a que repousa o corpo sobre o solo pelos pés, estando a pernas verticalmente collocadas de modo a encontrarem em angulo recto as coxas que, por sua vez, formam com o tronco um angulo também recto”, para evitar curvaturas na coluna vertebral e a produção da miopia, sendo também necessária “constante fiscalisação exercida pela professora” (FONTENELLE, 1930, p.834-837).
179
Cora de Alvarenga era professora formada pela Escola Normal de Campos.
Caligrafia- Para entender a caligrafia que era ensinada no cenário fluminense da época, Martínez; Boynard (2005) utilizam dois documentos que datam de 1915, produzidos por dois professores campistas. Do Prof. Carlos Hamberger, professor da cadeira de “Caligrafia, Desenho Geométrico e de Ornato” da Escola Normal de Campos, é analisada uma carta que escreveu ao diretor do Liceu, defendendo a tradição e a manutenção do ensino da caligrafia inclinada nas escolas. Da Profª Antonia Ribeiro de Castro Lopes, diretora da Escola Complementar Quinze de Novembro, é analisado um artigo, publicado em partes, no jornal Monitor Campista nos dias 9 e 11 de maio, no qual a professora, recém-chegada de curso na Escola Normal de São Paulo, e em sua anexa Escola Modelo, pregava a introdução do ensino da caligrafia vertical nas escolas do Estado do Rio de Janeiro. Ambos os discursos versavam sobre as vantagens e desvantagens que cada tipo de letra provocava nas crianças, e o cuidado com a posição do corpo, do papel e da forma de segurar a pena, numa abordagem baseada num movimento fortemente presente no Brasil da época, qual seja o movimento higienista. Lições de Cousas- “As lições de coisas possibilitaram e, de certa forma, potencializaram a tradução do conhecimento científico em noções elementares para o uso nas escolas” (SOUZA, 2000, p. 14). Para o ensino das “Lições de Coisas”, havia na Escola Modelo: 41 mapas (incompletos); 54 quadros murais; 5 vidros contendo sal, açúcar, grafite, acido sulfurico,1 pedaço de lixa, 1 vidro com almíscar, 1 vidro com acido citrico; 1 pote com almacega; 2 pedaços de lacre; 6 lápis de desenho a pastel; 2 pedaços de vidro de forma retangular, sendo um fosco e outro transparente. O livro usado pelas professoras era o “Lições de Cousas”, de Calkins. Valdemarin (2004, p.109), por sua vez, afirma que “a adequação do método intuitivo ao campo das ciências naturais é claramente percebida, dado que esse conteúdo de ensino pode ser apresentado aos alunos de modo atraente e prático, com a atenção voltada para a compreensão dos usos industriais dos elementos naturais e do trabalho desenvolvido pelo homem para este fim”. História- Segundo Valdemarin, até mesmo a História poderia ser ensinada pelo método intuitivo, “desde que tenha seu início com a observação dos fatos contemporâneos, prosseguindo com aproximações graduais e sucessivas dos acontecimentos passados, por meio de seus traços materiais observáveis, fazendo-se uso da história pitoresca, da história dos costumes, dos hábitos e da indústria, que são temas acessíveis às crianças” (VALDEMARIN, 2004, p.109). O material disponível na Escola Modelo “Seis de Março” para essa disciplina,
era: 5 bustos para o ensino das raças; 1 coleção de mapas para o ensino de História Pátria. Os livros usados eram os seguintes: “Minha Pátria”; “Nossa Pátria”, de Rocha Pombo; “Nossa Pátria”, de Veiga Cabral; “História do Brasil”, de Veiga Cabral. Geografia.Em relação ao ensino dessa disciplina,
[...] convinha que o ensino iniciasse pelas lições de lugar, pelo conhecimento do meio mais próximo – a escola, o bairro, o distrito, para depois deter-se na província, no reino, nos outros países. O método consistia em partir da observação, único recurso capaz de dar concreticidade aos dados e às definições. Na impossibilidade da observação direta dos fenômenos, as lições deveriam partir sempre do conhecido para o desconhecido utilizando objetos familiares aos alunos [...], sendo imprescindível estar atento ao método, ao uso de bons livros e materiais didáticos, tais como planetários, globos terrestres, cartas em relevo, cartas planas e cartas escolares parietais (SOUZA, 2000, p.14).
Para isso, havia, na “Seis de Março”, 1 coleção de 12 mapas representando o Brasil, diversas partes do Estado do Rio e América do Sul; 13 mapas representando o Brasil político, produções do Brasil, América do Sul e do Norte, Europa, Ásia, África e Oceania; 1 tabuleiro para o ensino de geografia; 2 globos geográficos (esfera celeste e terrestre); 2 globos geográficos representando a América do Sul, do Norte, Brasil, Produções do Brasil, Europa, Ásia, Oceania, Mapa Mundi e o ABC dos Termos Geográficos. História Natural- Para esse ensino, existiam “cinco cartas”, e os seguintes livros: “História Natural”, de vários autores: Carlos Novaes, Josaphap, Colkins, W. Potak. Desenho- De acordo com Valdemarin (2004, p. 110), “todos os exercícios de desenho devem estar voltados para a educação do olhar e para o adestramento da mão”. Do ponto de vista didático, incentiva-se tanto a expressão livre do pensamento infantil como a cópia de modelos dados pelo professor. Foram encontrados, nos Inventários da Escola Modelo, os seguintes materiais para o ensino de desenho: 1 mapa para o ensino de desenho; 1 pantógrafo; 1 tesoura grande; 1 tesoura pequena; lápis de grafite; borracha; cadernos próprios. Instrução Moral e Cívica-
À educação moral180 e a educação cívica convinha desenvolver sentimentos e hábitos, cultivar valores morais desejáveis, tais como: respeito à ordem, disciplina, abnegação, tolerância, amor ao dever, apreço ao trabalho, frugalidade, o bom emprego do tempo, probidade, sinceridade, autocontrole, decência, lealdade, caridade, amor à pátria.Vinculada à educação moral, a educação cívica era tida como uma de suas faces. Tratava-se, eminentemente, da educação patriótica alicerçada sobre os valores morais e intimamente relacionada com a história e a geografia (SOUZA, 2000, p. 16).
A preocupação com a instrução moral e cívica estava bem presente na Escola Modelo “Seis de Março”. Como elementos da cultura escolar poderiam ser encontrados, entre 1919 e 1926, segundo os inventários desses anos, nas paredes das salas de aula da Escola, emoldurados, retratos e quadros. A respeito, aportamo-nos em Frago; Escolano (1998) que afirmam que
a arquitetura escolar [...] pode ser contemplada também como suporte de outros símbolos acrescidos. O edifício-escola, como se sabe, serviu de estrutura material para colocar o escudo pátrio, a bandeira nacional, as imagens e pensamentos de homens ilustres, os símbolos da religião, algumas máximas morais e higiênicas, [...]. Isso expressa toda uma instrumentalização da escola a serviço dos ideais nacionais, religiosos e sociomorais (p.38).
O primeiro vulto a ser reverenciado na Escola Modelo foi o Marechal Floriano Peixoto (INVENTÁRIO/1919). Mais tarde, a este retrato se juntaram os do Tenente Coronel Benjamin Constant, Dr. Ruy Barbosa 181 , Dr. Oswaldo Cruz, Olavo Bilac e D. Pedro II (INVENTÁRIO /1926), numa clara demonstração de cultivo à memória e aos feitos de brasileiros que faziam a história do Brasil na política, nas artes e nas ciências. Ainda como elementos de uma cultura muito própria, onde se evidenciam práticas que podem ser ressignificadas, e é o que pretendemos fazer, emolduram as paredes, ao lado dos vultos nacionais, os quadros de honra; 1 quadro para horário; 1 quadro com o horário do turno da manhã e 1 quadro com o Decálogo Pedagógico. Tempo(s) e ordem (ns) estão nesses quadros nitidamente marcados! O tempo escolar, marcado nos “quadros de horário” para cada turno. A valorização da ordem, da disciplina, do asseio com o material, o “bom comportamento”, enfim, estão expressos nos quadros de honra. Sobre estes, diz Antônia Lopes, em seu manual de Pedagogia 180
Usada“para reprimir as reações emocionais exaggeradas e combater ou modificar as más tendencias hereditarias. Como a criança é originalmente um ser amoral é preciso educal-a pela suggestão dos exemplos. Um professor de moral, diz Binet, apesar de toda sua sciencia, somente é um ser moral quando sua conduta também o é” ((FONTENELLE, 1930, p.289). 181 O retrato de Rui Barbosa na sala da Escola Modelo remete às Lições de Coisas e ao método intuitivo, por ele defendidos em seus Pareceres, e totalmente aceitos no ensino da escola.
O regimento interno das escolas primarias do nosso Estado cogitava exclusivamente das penas disciplinares, esquecendo-se dos premios, só instituindo as notas e, para os grupos escolares e escolas complementares, o quadro de honra, cabendo, pois, ao professor a instituição desses meios disciplinares. Só mais tarde o decreto nº 1616 de 5 de Junho de 1918, creando as Caixas Escolares institui os prêmios escolares- livros, etc. As recompensas não devem visar somente o esforço intellectual, e sim tambem o bom comportamento, o capricho do alumno na organização dos trabalhos [...]. Existem algumas que são condemnadas pela pedagogia moderna por despertarem a vaidade e o orgulho, sentimentos que corrompem a alma taes são: as fitas, medalhas e bancos de honra (LOPES, 1927a, p.51).
Marcam o tempo escolar, ainda, 1 sineta; 2 campainhas ( 1 da classe maternal ); 1 despertador ( pertencente a Dona Josepha182). Como dizem Viñao Frago e Escolano,
o relógio funciona como um organizador da vida da infância. Ele marca as horas de entrada na escola e de saída dela, os tempos de recreio e todos os momentos da vida da instituição. A ordem temporal se une, assim, à do espaço para regular a organização acadêmica e para pautar as coordenadas básicas das primeiras aprendizagens. Os relógios escolares- também os relógios domésticos e os de uso pessoal- ao regular a conduta diária, [...] organizam as primeiras percepções cognitivas da temporalidade e garantem a internalização dos valores da exatidão, da aplicação e da regularidade, que são, na expressão de Foucault, as virtudes fundamentais do tempo disciplinar (1998, p.43).
Uma bandeira nacional guarda e inspira sentimentos de amor à pátria, naquele pequeno território de pequenas almas republicanas. E o “Decálogo Pedagógico” 183 forja a professora primária devotada à missão de ensinar, a segunda mãe, aquela a quem é delegado, pelo ideário republicano, o papel de ajudar a construir a Nação. Esse Decálogo, embora se dirija ao professor, retrata, em verdade, a professora idealizada, aquela que “deixa seus problemas fora da sala de aula”, a que ama, compreende pacientemente, e estimula. A professora que diz coisas como essas: [...] Seguindo a trajetória de minha existência, tendo envidado todos os meus esforços para não me desviar um só instante da verdade recta e dignificante do dever. [...] Promptifiquei-me então a declarar que prescindiria da gratificação a que tinha direito pela organisação de mais 1 turno e a comprometter-me que
182
Não seria o despertador de Dona Josepha, que trabalhava ora com a Classe Maternal/ Jardim de Infância, ora com a 1ª série, “um símbolo cultural e um mecanismo de controle social da duração do tempo” (FRAGO; ESCOLANO, 1998, p. 43) de forma a, desde a mais tenra idade, despertar a infância para o dever e a responsabilidade? 183 Transcrito na página 184.
limitaria as despesas, não excedendo estas as feitas, por 1 só turno. (MANHÃES, 1927). Em março de 1927 regressámos ás nossas lidas diarias, cheias de ardor e coragem, certas de que as alumnas compensariam nossos esforços (CHÁCAR, 1927). Parcos, porem, eram os elementos de que dispunha. Empreguei, todavia, esforços no desempenho desse mister, organisando eu mesma o material de que necessitavam as alumnas para jogos e trabalhos em aula (LOPES, J. ,1927).
Ao recuperar parte do currículo seriado da Escola Modelo, comprovamos, mais uma vez, ser essa escola uma escola do tipo “complementar”, não somente por ter seis séries e preparar as alunas para a Escola Normal, mas pelo currículo trabalhado, que é bem semelhante àquele exigido para os exames finais das escolas complementares. Optamos por transcrever a matéria exigida para esses exames, embora já o tivéssemos feito no Capítulo 2 dessa dissertação, para facilitar o entendimento do leitor.
Prova escripta: a) composição sobre assumpto concreto ou applicação de proloquio em pequena historia ou a biographia de um Brazileiro illustre; analyse logica de um trecho em prosa; b) cinco questões de arithmetica, dentro do respectivo programma; c) tres questões sobre assumptos do programma de lições de cousas; d) tres questões de geographia geral, e as cartas do Brazil e do Estado do Rio, nos termos do regulamento; e) uma questão sobre historia patria; f) um trabalho de desenho. Prova oral: argüição sobre todas as materias que constituem o programma da 6ª serie (Circular nº 1, de 9 de março de 1914, enviada pelo inspetor de Instrução Pública do Estado do Rio de Janeiro ao Diretor da Escola Normal de Campos. Arquivo do Liceu).
Ainda a respeito do currículo formal da Escola Modelo “Seis de Março”, através do Plano de Prática Escolar , da Profª Antonia Lopes, contido no Relatório/1927, foi possível identificar vários conteúdos das cinco séries da Escola. Por esse documento pode-se entender como era feita a distribuição das alunas da Escola Normal para as aulas práticas na Modelo, os horários das aulas, as séries e os conteúdos que deveriam ser abordados pelas normalistas. No que nos interessa no momento, listaremos, apenas, os conteúdos sobre os quais deveria se basear a aula prática:
1ª série A: Leitura analítica. Séde e orientação da escola. Numeração pelo contador. 1ª série B: Leitura analítica. Formação de frases com nomes de flores. Idéia das dezenas, centenas e milhares, ordem, classe pelo contador mecânico. 1ª série C: Leitura explicada (historieta na cartilha). Formação de frases com palavras de determinadas terminações.
2ª série A: Oceano Atlântico e seus mares principais. Higiene dos sentidos. Estabelecimento de um só governo. Estados dos corpos. 2ª série B: Primeiras colônias fundadas no Brasil. Propriedade dos corpos que se podem perceber pela vista-A vista. O bicho da seda. Água- seus usos e aplicações. 3ª série: Higiene da circulação. Inconvenientes dos exercícios imoderados. Episódio dos Palmares. Caracteres de divisibilidade, os mais simples. América (carta). Regras de Ortografia. Reinos da Natureza. Leitura comentada. Estado do Rio (carta) agricultura e indústria. 4ª série: Circulação. Principais monumentos e edifícios públicos da localidade. O chumbo. Palavras cognatas. 5ª série: Francês 184 (vocabulário, partes do corpo, formação de frases, parte do vestuário). Colônia de Sacramento. Metaplasmos (LOPES, 1927b).
Através desse material é possível saber como eram aplicados, ao ensino primário, os conteúdos das diversas didáticas estudadas na cadeira de Metodologia da Escola Normal, assunto que será abordado no Capítulo 5.
4.5.2 AS FESTAS E COMEMORAÇÕES CÍVICAS
Como afirma Ozouf (1990, p.216), “a festa se encontra ocupada em reabilitar, lutando contra os valores pacientes e tensos do trabalho, a gratuidade festiva”. Em todos os tempos, as festas escolares foram momentos importantes de integração. Na Escola Modelo, mais que integrar alunas e professoras, as festas também mostravam para um público bem maior, o trabalho desenvolvido, em classe, pelas professoras. O entoar de cânticos, a recitação de poesias para uma platéia composta de alunas e professores da Escola Normal- além de o Diretor do Liceu- não seria uma oportunidade ímpar de Consuelo Manhães e Mercedes Landim demonstrarem o trabalho feito, o currículo exemplar que se queria imprimir, a disciplina das alunas, a escola modelar 185? Não seria, como nos diz Marta Carvalho 186 , a oportunidade de expor e fazer circular modelos pedagógicos ? Nos arquivos da escola não encontrei vestígios de risos e festas. As fontes documentais nada deixaram vislumbrar; os relatórios das seis professoras da Modelo, feitos
184
Estranhamos a aula prática de Francês, uma vez que consta, tanto no Relatório da Profª Laudelina de Castro (1927) quanto nos depoimentos orais de Stella Tinoco Dias e Aldarina da Penha Carneiro que não se estudava francês na Escola Modelo “Seis de Março”. Não foi possível esclarecer a dúvida, nesta pesquisa. 185 Indagada a respeito da disciplina na Modelo, a ex-aluna Stella Tinoco diz não se lembrar de que lá existissem castigos físicos. Lembra-se das crianças- muitas- quietas e educadas. Foram encontradas referências da existência, na sala de aula, de um Quadro de Honra. Seria ele o moderador do natural comportamento infantil? 186 A respeito, diz Carvalho: “mobiliário, material didático, trabalhos executados, atividades docentes e discentes- tudo devia ser dado a ver de modo que a conformação da escola aos preceitos da pedagogia moderna evidenciasse o Progresso que a República instaurava” (2003, p.24).
em 1927, prendem-se a aspectos relativos ao desenvolvimento de currículos e programas. Nada falam de festas e comemorações, como se não fossem elas importantes elementos curriculares. As respostas vieram através do jornal Monitor Campista de 1923. Nesse ano, o dia 12 de outubro, Dia da Criança, foi comemorado! Houve festa no Liceu na véspera, dia 11. Na edição do dia 11 de Outubro, sob a manchete de capa “Escola Modelo “6 de Março”, encontra-se o seguinte texto: “As dignas Professoras da Escola Modelo “6 de Março”, anexa a nossa Escola Normal, organizaram para hoje uma grande festa, na qual tomarão parte quase todos os alumnos, professores e professoras da Escola Normal. O programma foi caprichosamente organizado, promettendo portanto a festa revestir-se do maior brilho”. Quase todos os alunos, professores e professoras da Escola Normal deverão ir à festa... Indícios de integração? No dia 12 de outubro, um dia após a festa, novas notícias foram publicadas no mesmo jornal: Com a presença do Diretor do Lyceu, Dr. Alberto Lamego, e de todos os alunos da Escola Normal, realizou-se ontem, ao meio-dia na Escola Modelo “6 de Março”, a festa annunciada na edição do jornal do dia 11, capa. Foram pelas alumnas recitadas poesias analogas à Primavera, e cantados hymnos patrioticos, [...]. O Dr. Alberto Lamego, em rapidas palavras, louvou a bella iniciativa das Directoras da Escola Modelo “6 de Março”, respectivamente as Senhoritas Consuelo e Mercedes Landim, convidando-as a que continuem com a mesma dedicação que até aqui tem cuidado dos misteres a seu cargo, isto é, preparando as futuras Mestras para desbravarem as trevas do analfabetismo do nosso Estado, [...]. Ao Dr. Lamego foram offerecidos diversos ramalhetes de flores naturais pelas alumnas da Escola (MONITOR CAMPISTA, 1923).
Ao recuperar essa festa da Escola Modelo, alguns aspectos da cultura escolar se manifestaram: o primeiro é que a festa aconteceu no final do turno, único na época, o que supõe que os alunos não tenham sido dispensados das aulas para a festa e explica certo rigor com a observância do tempo dedicado ao estudo. O segundo, refere-se a uma cultura típica das comemorações nas escolas primárias- a recitação de poesias e canto de hinos patrióticos, sonetos e a oferta de pequenos mimos às autoridades da escola, ou aos visitantes- pelas crianças187. Outro aspecto a considerar foi a também “cultura” que prevê o discurso do diretor após a festa! Em seu discurso, o autor de A Terra Goitacá, diretor Alberto Frederico de 187
Oferecer presentes às professoras- desde frutas e legumes até galinhas e perus de Natal era comportamento usual para os alunos das escolas rurais dos municípios do interior do estado do Rio de Janeiro. A respeito, recordo-me com saudade do carinho de meus alunos dos anos de 1969-1970, anos vividos como professora na localidade de Fazendinha, no município de São João da Barra/RJ.
Moraes Lamego, não perdeu a oportunidade de relembrar, às professoras, sua missão na tarefa de combater o analfabetismo e formar o cidadão republicano. As datas cívicas sempre são momentos de congraçamento entre os diversos setores escolares e entre escola e comunidade. Em outra oportunidade, em 1925, isso foi fato acontecido entre o Liceu, a Escola Normal e sua anexa, a comunidade campista e autoridade da educação estadual. Em 31 de agosto de 1925, o Diretor do Liceu e Escola Normal oficiou ao Presidente da Sociedade Musical Lyra de Apolo, nos seguintes termos:
Realizando os alumnos do Lyceu de Humanidades, da Escola Normal e da Escola Modelo “Seis de Março” (annexa á Escola Normal) uma festa civico-militar no dia 7 de setembro proximo venho solicitar de VV. Ex. o concurso gracioso da aguerrida banda musical por VV. Ex. dignamente dirigida, para maior brilhantismo da data da nossa Independencia.
Em 2 de setembro, o diretor das três escolas enviou, ao Inspetor da 3ª Região do Ensino, Dr. Jayme Memoria, um convite. Nesse, transparece que as comemorações pelo “Dia da Pátria” se estenderiam além do desfile cívico:
No dia 7 do corrente mês os alumnos do Lyceu, Escola Normal e Escola “Seis de Março”, annexa á Escola Normal levarão a effeito uma festa civico-militar que constará de passeata pelas ruas da cidade e de uma sessão literaria no Trianon188; e, para tomar parte, como orador official nessa festa commemorativa de nossa Independencia, tomo a liberdade de convidar V. Ex.
O jornal Monitor Campista do dia 06 de setembro de 1828 traz uma matéria intitulada “Lyceu de Humanidades”. O texto confirma que havia certa integração entre as três escolas que ocupavam o prédio do Liceu. Diferentemente do outro registro de festa, em que foi a Escola Modelo quem recebeu os convidados, desta vez são as meninas da Escola Modelo que são convidadas para participar de uma festa do Liceu. O Diretor do Liceu e Escola Normal, Antonio Bastos Tavares, relata que, desde julho, havia convidado para a maior festa cívica do Brasil, a do dia 7 de setembro, “alumnos do Lyceu e alumnos da Escola Modelo“Seis de Março”, sob a provecta Direcção da Professora Dona Consuelo Manhães”.
4.5.3 RELAÇÃO ESCOLA-FAMÍLIA
188
Cine-teatro existente na cidade à época.
Embora não sendo possível recuperar as relações que se davam entre as professoras e diretora da Escola Modelo Seis de Março e as famílias dos alunos, algumas pistas parecem demonstrar que se buscava integrar a escola com as famílias, pelo menos no sentido de demonstrar disciplina e controle escolares. Assim é que, no relatório que enviou à Diretora da Escola Modelo em 1927, Josepha Lopes disse: “Mensalmente registro nos boletins dos alumnos o numero de faltas, comparecimentos, medias de applicação e conducta, e os envio aos Snrs Paes para que os visem”. Essa preocupação da Profª Josepha foi identificada também por Faria Filho em suas pesquisas, (2000, p.54) que assim nos diz: “detectamos um intenso trabalho, tanto das diretoras quanto dos inspetores, buscando levar as famílias a se interessarem pela escola. Para isso, valiam-se de mecanismos como o boletim, que devia voltar assinado pelo pai, pela mãe ou pelo responsável legal...”.
4.5.4 O DESTINO DA ESCOLA MODELO E DE SUAS PROFESSORAS
Visitando o Arquivo Público do Rio de Janeiro à procura de fontes, encontramos nove mapas estatísticos que forneceram subsídios para entender o destino da Escola Modelo após a reforma de 1931 que modificou o sistema secundário de ensino e a formação de professores feitas em escolas normais. As informações extraídas daqueles documentos são: a escola continuou com dois turnos, cinco séries e oito turmas: três de 1ª série; uma de 2ª, uma de 3ª, uma de 5ª e duas de 4ª série. Treze era o número de professores adjuntos efetivos, havendo também um estagiário diplomado e um interino diplomado. Mercedes Sodré Ferreira Landim continuava diretora efetiva. As férias de meio de ano aconteceram do dia 15 ao dia 30 de junho. Nesse ano, visitou a escola, no mês de agosto, “para inaugurar o curso de religião católica”, o Vigário Geral Mons. João Barros Uchoa; em novembro, a visita recebida foi a do Inspetor Regional Dôrval Ferreira da Cunha. A partir de novembro de 1931, a escola passa a ser denominada Escola Modelo de 3º Grau, Denominação Especial (D.E.) “Seis de Março”. Outra observação a ser feita é a respeito do Jardim de Infância. Sobre ele foram encontrados mapas estatísticos identificados como “Jardim de Infância anexo à Escola Modelo 6 de Março, Denominação Especial Zuleika de Moraes”, em anos alternados a partir
de 1929189, contendo 20 documentos, sendo seis deles referentes ao ano de 1931. Somente sobre os desse ano será feita breve análise. Maria Manhães Corrêa era a diretora do Jardim de Infância, ficando a freqüência média das crianças em torno de quarenta e cinco crianças, divididas em 1º, 2º e 3º períodos, funcionando em apenas um turno. Aparecem nesse mapa os nomes da adjunta Rosalina Lacourt da Cruz e da guardiã, Anide Povoa Tavares. Sem alterações até outubro, o mapa de 14 de novembro registra a visita do Inspetor Regional Dr. Dôrval Ferreira da Cunha. Como é o único mapa cuja data de encerramento não é o dia 30 ou 31 do mês, supõe-se que a visita do inspetor marcava o fim do período letivo. Quanto ao destino das professoras da Escola Modelo “Seis de Março”, quase todas foram aproveitadas como professoras da Escola Normal. No ano de 1929 foram para lá transferidas Consuelo de Almeida Manhães, em 19 de janeiro, como “regente do Liceu e Escola Normal” Laudelina de Castro, Myrtes (sic) de Vasconcelos e Josepha Cardoso de Araujo Lopes. A primeira, empossada como regente do Liceu e da Escola Normal; a segunda, em 24 de abril como regente de Metodologia e Pedagogia, sendo Myrthes nomeada professora catedrática de Educação Física em 20 de maio. A professora Josepha Cardoso Lopes assumiu, inicialmente como lente substituta de Pedagogia e Methodologia Didactica 190 , em 1931, tomando posse como catedrática em 3 de abril de 1936 (LAMEGO, 1943, p.60-63). A nova safra de professoras da Escola Normal, forjada na “Seis de Março”, foi acrescida por Faride Miguel Chacar, primeiramente adida ao Liceu, em 4 de abril de 1932 e habilitada em concurso, como catedrática de Geografia e Cosmografia, em 9 de julho de 1934 (LAMEGO, 1943, p.62, 63). Permaneceram como professoras primárias do Grupo Escolar João Pessoa as professoras Mercedes Sodré Ferreira Landim, diretora, e Maria Teresa Ribeiro da Costa. A análise das fontes, neste Capítulo, nos levou a refletir sobre o que era ser professora primária na Primeira República. O caso da Escola Modelo “Seis de Março”, considerada um modelo de escola, nos mostra a aparente fragilidade desse modelo: a defasagem existente entre o número de alunas e professoras- durante todo o funcionamento da escola no prédio do Liceu-; a sujeição a precárias condições de trabalho- houve época em que três professoras trabalhavam, com grupos de alunas e disciplinas diferentes, na mesma sala; a dificuldade de se implantar o Jardim de Infância, tão desejado; a necessidade de acumular a função de 189
Os anos são: 1931, 1934, 1939 e 1942. Há uma observação no mapa de 1934, que é a seguinte: “a partir de outubro de 1934, passa a ser denominada Jardim de Infância sem nome e perde a D.E.”. 190 Consta do livro “Continuação do pessoal docente do Lyceu e relação do pessoal docente da Escola Normal e do Corpo administrativo dos dois estabelecimentos”, do mês abril de 1931, localizado no arquivo do Liceu.
direção com a de docência; a falta do material didático que a nova metodologia requeria- o que obrigava a professora das crianças menores a confeccioná-lo, por vezes-; a falta de funcionários de apoio ao trabalho escolar... Considerando essas questões, não podemos deixar de registrar a impressão de que muitas vezes a história parece se repetir...
CAPÍTULO 5
A TEORIA E A PRÁTICA NA/DA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO” “Dedico á pratica escolar todo amor e carinho, porque julgo que a theoria sem a pratica pouco vale e que a formação do professor muito depende da pratica”. Antonia Ribeiro de Castro Lopes, 1927b
Ao introduzir o último Capítulo da dissertação com palavras de Antonia Lopes, o fazemos pelo que representou essa intelectual, professora de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos, na formação teórico- prática de professores do norte do Estado do Rio de Janeiro, desde 1916, quando em 10 de abril, foi nomeada para reger, como substituta, a cadeira de Pedagogia da Escola Normal de Campos, até se aposentar, em 1936. Considerando que a Escola Modelo foi criada em 1916, pode-se concluir que a influência de Antonia foi relevante na organização e na estruturação pedagógica da prática de ensino das normalistas, ali realizada. Por alguns meses, em 1918, assumiu a direção da Escola Modelo, mas seu lugar foi sempre a Escola Normal. Todas as professoras da Escola Modelo “Seis de Março” foram formadas pela Escola Normal de Campos. Todas foram alunas de Pedagogia e Metodologia de Antonia Lopes. As práticas inovadoras da Escola, após 1919 foram, ou herdadas de Dona Antonia, conforme deixa claro Consuelo, ao substituí-la na direção da mesma: “Quanto aos methodos empregados pela minha predecessôra, procurei sempre segui-los, pois sua longa pratica e grande amor ao progresso das letras, constituiram-na auctoridade em materia de ensino”, ou negociadas, dada a íntima relação profissional que havia entre ambas, como relata a ex-aluna Stella Muylaert Tinoco Dias, que reteve, em sua memória da infância, as freqüentes visitas de Dona Antonia à Escola Modelo: Conheci muito Dona Antunica191. Era uma senhora alta, de idade192, e ela ia muito lá. Mas não me recordo que ela tivesse sido diretora, não me recordo, mas ela ia muito na nossa escola. Eu tenho a impressão de que era uma espécie de inspetora, qualquer coisa assim. Quando ela ia à escola era muito bem recebida, compreendeu? Eu me lembro muito dela (DIAS, 2005).
191
Modo como é chamada, na cidade de Campos, por pessoas que cursaram a Escola Normal de Campos ou o Instituto Claparède. 192 Em 1926, Dona Stella cursava a 6ª série da Escola Modelo. Antônia Lopes tinha, nessa época, 52 anos de idade.
Considerando o papel que tiveram essas duas professoras no magistério campista, podemos afirmar que a formação oficial de professoras em Campos, de 1919 a 1932, tem nome de mulher. A teórica chama-se ANTONIA RIBEIRO DE CASTRO LOPES. A prática, CONSUELO DE ALMEIDA MANHÃES (FIG.13).
5.1 A TEORIA E A PRÁTICA NAS ESCOLAS DE CAMPOS: ANTONIA E CONSUELO
A análise das fontes permite-nos afirmar a importância dessas duas intelectuais na consolidação do projeto “Escola Modelo Seis de Março”. Antonia Lopes, como professora substituta de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal, com posse e exercício em 10 de abril de 1916, diretora da Modelo por meses, no ano de 1918 e, posteriormente, como catedrática, efetivada, por concurso, em 7 de outubro de 1919 193; Consuelo Manhães, como Diretora da Escola Modelo “Seis de Março” de 1919 até 1929 194, pelo menos. Sobre Antonia Ribeiro de Castro Lopes existem dois trabalhos de pesquisa. O primeiro, um verbete no Dicionário de Educadores no Brasil (MIGNOT; MARTÍNEZ, 2002). O segundo, parte de um texto produzido por BOYNARD (2004), para o III Congresso Brasileiro de História da Educação. Nesse trabalho, são atribuídas à Professora Antonia Lopes as possíveis influências das idéias de educação de São Paulo, nas duas escolas de Campos, a Normal e a Modelo. Outras fontes, como Relatórios e correspondência mantidos entre ela e o diretor da Escola Normal e Liceu 195, que iremos desvendando no decorrer da narrativa, demonstram a linha pedagógica progressista que seguia na docência, e o ideal de servir ao ensino, que movia suas ações e sua vida. Mostram, também, que Antonia Lopes articulou, metodicamente, o trabalho desenvolvido na cadeira de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos àquele que era realizado pela diretora, professoras e auxiliares da Escola Modelo. Imprimiu à prática pedagógica o uso de método intuitivo, as excursões pedagógicas 196 , o uso de recursos 193
A nomeação de Antônia Lopes para a Escola Normal foi destacada pela imprensa campista. Em 9 de outubro de 1919, o jornal Monitor Campista, na coluna intitulada “Escola Normal”, página 2, publicou a seguinte nota sobre o acontecimento: “O Governo do Estado, por acto de ontem, nomeou Dna. Antônia Ribeiro de Castro Lopes para o cargo de Professora da Cadeira de Pedagogia e Methodologia da Escola Normal de Campos”. 194 Nesse ano, Lamego (1943, p.59) registra que Consuelo Manhães, em 1 de junho de 1929, tomou posse, em comissão, da cadeira de Geometria e Trigonometria da Escola Normal de Campos. 195 Por lei, o diretor era o mesmo para as duas escolas, devendo ainda ser o responsável pela inspeção da Modelo. 196 Essa atividade de “prática pedagógica” era prevista, desde 1912, na legislação da Escola Normal de Campos e Niterói (Art. 51 do Decreto Nº 1241 de 13 de março de 1912). Entretanto, é Antônia a única professora citada por um Presidente do Estado em sua Mensagem anual à Assembléia Legislativa. Assim ele escreveu: “a
auxiliares, solicitou compra de equipamentos de medição e de livros, o que nos faz pensar que Dona Antunica levou para suas aulas de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos e, destas, para a prática na “Seis de Março”, as idéias que fervilhavam em São Paulo nos anos da década de 1920. São fortes os indícios da influência do modelo escolar paulista no ensino da Escola Modelo “Seis de Março”. O primeiro é que Antonia conhecia de perto esse modelo. Em 1913 esteve em São Paulo para tratamento de saúde, e aproveitou para conhecer o trabalho que se desenvolvia tanto na Escola Normal “da Praça’, como na Modelo Caetano de Campos. Em artigo republicado197 no Jornal Monitor Campista dos dias 12 e 13 de junho de 1914, intitulado “Impressões Sobre o Ensino no Estado de São Paulo” , não deixou dúvidas sobre a forte marca que a visita imprimiu em seu pioneiro espírito de professora 198.
Atravessando os umbrais da Escola Modelo Caetano de Campos, anexa a Escola Normal, apreciei as vantagens do methodo analytico que me empolgaram o espirito; acompanhei (pari-passu) o progresso dos alumnos e confesso que me senti estasiada! [...] São extraordinarias as vantagens que do methodo analytico adivem, methodo esse que naquelle Estado, vai sendo applicado a todas as disciplinas. Elle desenvolve a intelligencia infantil, liberta o cerebro da sobrecarga que nelle accumulam a soletração e a syllabação tornando a infancia antagonista da leitura, a ponto de considera-la um supplicio.O methodo analytico, que é o reflexo do methodo intuitivo, ao contrario, produz na criança a alegria, enthusiasmo, interesse pela leitura, além disso é um corretivo a linguagem infantil (MONITOR CAMPISTA, 12/06/1914). [...]Aqui nessas ligeiras penadas deixo patenteada a minha admiração pela organização e desenvolvimento do ensino do Estado de São Paulo, luzeiro que nos mostra a trajectoria do progresso (MONITOR CAMPISTA, 13/06/1914).
Outra evidência do papel que o modelo paulista teve no ensino primário em Campos está registrada em “Synopse de Pedagogia 199 ”, o Manual que Antonia escreveu em 1927 (FIG.14). Assim fala a autora:
professora de methodologia adoptou nas aulas a caderneta de pratica escolar e nos mezes de agosto costuma transformar a escola modelo nos diversos typos de escolas primarias, para que cada normalista durante 20 minutos tenha a regencia da classe, assim como, annualmente, faz excursão pedagógica” (Mensagem Abreu Sodré, 1927, p.108). 197 O artigo fôra publicado, anteriormente, no JORNAL DO COMMERCIO. 198 É preciso registrar que, em 1913, Antônia tinha 9 anos de serviço como professora estadual. Em 1914 voltou à Escola Normal para fazer o 5º ano e poder reger escola da cidade, o que se deu em 1915, quando foi nomeada, nos termos do Art. 3 §2º da lei 1224 de 6 de Março de 1914, para reger a Escola Complementar “Quinze de Novembro”, em Campos, onde ficou por aproximadamente um ano. 199 Embora o livro tenha sido publicado em 1927, o ideário pedagógico de Antônia Lopes, nele exposto, já era vivenciado nas duas escolas de formação de professores, como demonstram os relatórios das professoras da “Seis de Março” e os planejamentos didáticos da autora, professora de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos. Esse manual é citado por Nagle (2001, p.345) como uma das obras de caráter metodológico publicadas entre 1920-1929, com a “preocupação de sistematizar o conjunto de normas técnico-pedagógicas que devem ser empregadas na condução de classes e no ensino das disciplinas”. Entretanto, o autor cometeu um considerável equívoco, que demonstra a necessidade de se incentivar a produção de pesquisas sobre a história da educação fluminense. Posta ao lado de obras de Antonio Sampaio Dória, Afrânio Peixoto, Elivásio Antonio de
O ensino primario acha-se desenvolvido no E. de S. Paulo e procuram imita-lo o E. de Minas, o Districto Federal, E. do Espirito Santo, Ceará e Paraná que solicitaram do Governo daquelle Estado uma missão de professores como remodeladores do Ensino. Oxalá que o nosso Estado, que, em desenvolvimento caminha a par e passo com os mas adeantados da União, busque, em breve, o que antevejo pela confiança que me inspiram as novas professoras, remodelar o ensino primario, dando-lhe feição moderna e orientação proveitosa, desenvolvendo os cerebros em vez de só accumular nelles, insipidamente, conhecimentos inaproveitáveis (LOPES, 1927a, p.244).
Demonstrando ter conhecimento da situação educacional do país, e que avançou para além do modelo paulista, o que a pesquisa não nos permitiu comprovar, Antonia Lopes mostrou o que esperava do seu Estado em termos de educação da infância, sua confiança nas “novas professoras” ( por ela formadas) e perpetuou a luta pela educação que considerava de qualidade, da qual nunca se afastou enquanto viveu. Sua luta e feitos são muito pouco lembrados pela história da educação da cidade de Campos. Embora nomeie duas escolas públicas estaduais, o “Jardim de Infância Antonia Lopes”, anexo ao Colégio Estadual Visconde do Rio Branco, e a “Escola Estadual Antonia Lopes”, de 1ª à 4ª série do Ensino Fundamental- a primeira em área central da cidade de Campos dos Goytacazes, a segunda localizada no Distrito de Lagoa de Cima- o trabalho inovador dessa mulher campista é desconhecido até mesmo por diretoras e professoras das escolas que ostentam seu nome no alto dos prédios. Para aqueles que a conheceram, porém, Dona Antunica é lembrada com admiração. Duas ex-alunas do Instituto Claparède, Yêdda Ferreira Paes Ribeiro e Mirtô Barroso Barbosa Leite e a Professora e Assistente Social, Conceição de Maria Costa Muniz referem-se a ela como uma professora pioneira e forte; um ex-diretor e ex-professor do Liceu, Desembargador Décio Ferreira Cretton, em depoimento prestado, em 2001, ao Núcleo de História Oral da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) sobre sua gestão à frente da Escola Normal, assim se referiu a Antonia
O currículo da Escola Normal era separado do Liceu [...]. E depois tinha as cadeiras especializadas, Didática, Pedagogia, Filosofia da Educação, um pouco de Sociologia e aí aquela professora que introduziu Pedagogia ali no Liceu, dona Antunica Lopes não é, ela fez, até por causa de... O Liceu não tinha nada, não tinha instalações para isso. Ela criou ali no pátio feminino, fizeram uma escolinha, um salão, uma escolinha provisória para a prática dessas cadeiras, foi Dona Antonia Lopes quem introduziu aquilo ali, Pedagogia e Didática (CRETTON, 2001b). Sousa, a Synopse de Pedagogia e Metodologia de Antônia Ribeiro de Castro Lopes é atribuída a Antonio R. Castro Lopes.
Essa escolinha, a que se refere o ex-diretor, era um Jardim de Infância, criado pela mestra, no pátio esquerdo do Liceu para auxiliar a prática das normalistas. Professora totalmente dedicada à profissão, era uma intelectual dentre as que Clarice Nunes (1992, p.155) considera como as divulgadoras dos ideais escolanovistas, em espaços micro, como as escolas primárias e as salas de aula da Escola Normal. Não se furtou, também, em expandir suas idéias pedagógicas em colunas dedicadas à educação em, pelo menos, dois jornais, a Folha do Commercio200 e o Monitor Campista, e em Congressos e Conferências. Em 1922, segundo KUHLMANN JR. (2002, p.479-480) participou do Congresso Brasileiro de Proteção à Infância em conjunto com o 3º Congresso Americano da Criança no Rio de Janeiro, de 27 de agosto a 5 de setembro de 1922, apresentando trabalho sobre a criança e a escola, na Seção Pedagogia. Participou, também, de duas Conferências de Educação, em 1927 e em 1929, ambas organizadas pela Associação Brasileira de Educação (ABE).
Em 1927, Antonia Ribeiro de Castro Lopes, como professora da Escola Normal de Campos, participou da I Conferência Nacional de Educação, em Curitiba, promovida pela Associação Brasileira de Educação (ABE), apresentando ima tese na qual defendia a importância da criação de Escolas Normais Superiores visando a preparação pedagógica do professorado (MIGNOT; MARTINEZ, 2002, p.91).
Sobre a III Conferência, realizada em São Paulo, em 1929, Mensagem do Presidente Duarte Silva (1930, p. 89- 90), informa ter o Rio de Janeiro participado da III Conferência, e contribuido com seis teses, dentre elas um trabalho da professora de Pedagogia da Escola Normal de Campos, Antonia Ribeiro de Castro Lopes ( Mensagem 1929, p.98). Viagens pedagógicas foram registradas, por Antonia Lopes, em sua “Ficha Funcional” da Escola Normal (1933) e em anotações que intitulou “Resumo de minha vida profissional” (1965): a São Paulo, para cursos e contatos com Teodoro de Morais 201 e Oscar Thompson 202; a Curitiba, em 1923; à Europa, onde estudou com Claparède, em 1930 203; a Pernambuco e Bahia, em 1933. 200
Diário da Associação Comercial de Campos. Professor da Escola Normal de São Paulo e autor de livros didáticos. 202 Oscar Thompson, quando na Direção da Escola Modelo daquela capital, havia introduzido mudanças pedagógicas importantes nos procedimentos de ensino da leitura, caligrafia e desenho, e, naquele momento, acumulava as funções de Diretor e lente de Pedagogia da Escola Normal da Praça da República (GONÇALVES; WARDE, 2002, p.868). 203 Teve o cuidado de registrar que fez “sempre todas as viagens de estudos a expensas próprias”. 201
Antonia Lopes escreveu Manuais. Sobre eles, diz:
Com o intuito de auxiliar as alumnas na pratica escolar e facilitar-lhes o estudo theorico, tenho escripto alguns trabalhos e dentre elles já publiquei: “O Ensino de Numeração pelo Contador Mecanico”, “Promptuario das Professoras Fluminenses”, “Synopse de Pedagogia e Methodologia Didactica” e “Como se ensinam Lições de Coisas” (LOPES, 1927b).
Em 1933 (LOPES, Ficha Funcional), Antonia acrescenta mais uma às suas obras: “Exercícios de Linguagem”. Dona de forte personalidade, a professora, ao mesmo tempo em que detalhava, respeitosamente, suas atividades ao Diretor da Escola Normal, a ele enviava solicitações e reclamações quando a estrutura e o funcionamento das duas escolas, a Normal e a Modelo, não lhe satisfaziam. Antonia Lopes nasceu em família rica. Ainda criança, viu seu pai fracassar nos negócios e perder o lugar social destacado, de abastado fazendeiro, que ocupava na sociedade campista. Estudou com ajuda de parentes, casou-se, teve três filhas, perdeu marido e filhas precocemente e só então terminou a Escola Normal. Por sua competência, fez-se respeitada no campo educacional do Estado, chegando a ocupar uma cadeira no Conselho de Educação do Estado, nomeada pelo Comandante Ary Parreiras. A par de todas as suas qualidades, acreditamos que o sobrenome “Ribeiro de Castro”, de família ainda hoje influente na região norte fluminense, ajudou a abrir seus caminhos profissionais, o que em nada invalidou sua trajetória de sucesso, baseada na dedicação ao trabalho em educação.
Quem são esses educadores? São intelectuais que fizeram uma escolha existencial pela tarefa educativa. Esta escolha é um nó onde se enlaça a história pessoal, a experiência de geração e a sua produção. São profissionais que circulam espacialmente, institucionalmente e ideologicamente. São intelectuais criados pelos cursos superiores tradicionais: o Direito, a Medicina e a Engenharia (Escola Politécnica), mas não só por eles. Os seminários, as livrarias, as editoras, os bares e os quartos de pensão foram também locus de reunião e formação desses intelectuais (NUNES, 1992, p.155).
Tomando as palavras de Clarice Nunes, podemos considerar que a formação intelectual de Antonia Lopes se fez na praxis, aqui considerada como o movimento constante de ir à teoria e voltar à prática, numa dialética permanente entre o saber e o fazer, sendo este o parâmetro daquele.
Sobre Consuelo de Almeida Manhães 204 o que se sabe, através de depoimento oral de uma sobrinha205, é que aos dezoito anos tornou-se diretora da Escola Modelo; em junho de 1929, professora da Escola Normal, e que se aposentou como professora de Matemática do Curso Clássico do Liceu de Humanidades de Campos. Consuelo cursou e concluiu, com êxito, o Curso Normal, como demonstram as fontes, obtendo, por mérito lugar gratuito na Escola. Da Ata da Congregação das escolas do dia 9 de maio de 1912, ao meio- dia, consta a Sessão para dar cumprimento ao §2º do art.115 do Decreto 1241 de 13/3/1912 206 . Assinada pelo diretor Antonio Joaquim de Castro Faria, diz:
Apresentados os documentos de que tratam os citados artigos e paragraphos e sujeitos á apreciação da Congregação foram classificados de acordo com as suas respectivas notas as seguintes alumnas: 1º anno: D. Consuelo Manhães; 2º anno: D. Lucy de Aguiar ; 3º anno: D. Maria Amelia Tavares; 4º anno: D. Izabel F. Silverio dos Reis. Das quatro alumnas classificadas teem as trez primeiras direito a um logar gratuito nesta Escola de conformidade com o Artigo 26 do ja citado Decreto.
A entrada da Professora Consuelo Manhães na Escola Modelo “Seis de Março” foi na função de diretora substituta. Designada por Ato de 2 de maio, tomou posse e entrou em exercício no dia 8 de maio de 1919 207. O jornal Monitor Campista de 7 de maio publicou a notícia, na página 2 da Coluna Estado do Rio: “Foi nomeada a professora diplomada pela Escola Normal de Campos, Dna. Consuelo de Almeida Manhães para reger como substituta a Escola Modelo “6 de Março,” anexa á Escola Normal da referida cidade, no impedimento da professora effectiva208”. Essa professora, cuja memória está circunscrita à família, produziu importantes fontes de pesquisa. No ano de 1927 fez completo relatório da escola sob sua direção e exigiu o mesmo das seis professoras que compunham o corpo docente. Na Introdução ao seu Relatório feito em 15/04/1927, Consuelo mostra sua “missão” profissional: 204
Consuelo de Almeida Manhães da Silva Gomes, depois de casada. Senhora Rosane Carneiro Motta. 206 Art. 115 do Decreto 1241/1912: “As sessões da congregação serão ordinárias e extraordinárias. §1º- a congregação reunir-se-a em sessão ordinária, na primeira quinzena de fevereiro, para tomar conhecimento do horário das aulas, proposto pelo director, e decidir sobre os programmas para o anno lectivo em questão; §2ºreunir-se-a também em sessão ordinária, na primeira quinzena de março, para resolver, á vista de documentos que lhe forem apresentados pelo director da escola, sobre a classificação dos estudantes mais distinctos para os effeitos deste regulamento”. 207 Esses dados encontram-se na p.2vº do Livro “Termos de Posse e Exercicio dos Professores e Funcionarios1918”. 208 A Professora Antônia Ribeiro de Castro Lopes era a diretora efetiva, mas encontrava-se substituindo o Professor Benedicto Hermógenes de Menezes na cadeira de Pedagogia da Escola Normal. 205
Incentivada pela bondade fidalga e rara dos meus superiores e plenamente edificada do zelo inexcedível de minhas auxiliares, procurarei elevar, dentro das minhas limitadas forças, ja pela disciplina, ja pela diffusão dos modernos methodos de ensino, o nivel da Escola Modelo ao das escolas verdadeiramente modelares (MANHÃES, 1927).
Sob o prisma pessoal, foi sua sobrinha Rosane Motta quem informou ter Consuelo nascido em 29 de abril de 1901 e falecido falecido a 01 de janeiro de 1987. Era a segunda dos quatro filhos de Manoel Martins Manhães 209, professor e Diretor do Liceu e Escola Normal de Campos (no período de 1932-1933;1936-1938) e de Maria de Almeida Martins Manhães. Casada com o Dr. Alpheu da Silva Gomes, médico homeopata e legista, sua principal referência pessoal, na memória dos que a conheceram, foi a beleza e a elegância.
Ela era uma pessoa muito bonita, muito alinhada; as aulas que dava no Liceu eram todas com chapéu, bolsa... Consuelo gostava muito de viajar; nas férias, ia sempre com a família do marido para o Rio, de onde trazia o que havia de mais moderno e melhor” (MOTTA, 2005).
A lembrança de Rosane Motta foi confirmada por Stella Tinoco Dias, aluna de Consuelo Manhães, na década de 1920 na Escola Modelo “Seis de Março”. Com memória prodigiosa aos quase 95 anos, lembra-se das elegantes botas usadas por Consuelo “as primeiras que vi em minha vida” (DIAS, 2005). A observação de Dona Stella sobre a figura de sua professora primária Consuelo é, nesse trabalho, pertinente, pois ratifica que, em todos os tempos, a imagem da professora primária desperta, nas crianças pequenas, principalmente, os mais fortes e sinceros sentimentos de amor ilimitado. Expostas as duas figuras por nós consideradas principais na consolidação da Escola Modelo “Seis de Março”, passamos a seguir à apresentação das fontes fundamentais ao trabalho de ressignificar as práticas que se realizavam na Escola Normal e na “Seis de Março”: os programas de Pedagogia e Metodologia elaborados por Antonia Lopes nos anos de 1920 e
209
Carinhosamente chamado de “Professor Manequinho Manhães”. Muito rígido com as normas disciplinares do Liceu, em especial o uso do uniforme, cujo alinhamento vigiava, inclusive nas ruas da cidade é, entretanto, figura recordada com imenso carinho pelos ex-alunos do Liceu e da Escola Normal, entrevistados, como professor competente, bom e amigo. Estudou Engenharia até o 5º ano, tendo que abandonar o curso por motivo de saúde. Faleceu a 19 de fevereiro de 1938, como diretor do Liceu. Seu corpo foi levado, pelas mãos de alunos, professores e familiares, a pé, da Rua Direita nº 50 (atual Rua 13 de Maio), situada no centro da cidade de Campos, até o cemitério do Caju, no distante bairro da Coroa (MOTTA, 2005).
1927210, e oito relatórios escritos em 1927: um de Antonia Lopes, outro de Consuelo Manhães, dirigidos ao Diretor da Escola Normal; os seis restantes, das professoras da Escola Modelo, dirigidos à Dona Consuelo. Os “Programas” de Antonia Lopes serão brevemente comparados e analisados em suas relações com as aulas práticas. Os “Relatórios” são as mais relevantes fontes da pesquisa. De modo especial, nos permitiram recompor o currículo formal da “Seis de Março” e perceber, na leitura das entrelinhas, os movimentos provocados pelas teorias e práticas que circulavam nas duas escolas, Normal e Modelo. Por tudo isso, e baseada em afirmação de CARVALHO (2003, p.127) de que em São Paulo foi possível identificar, na formação docente, duas correntes pedagógicas, em épocas distintas, a da “arte de ensinar” e a da “pedagogia científica” 211, arrisco-me a dizer que a leitura das fontes parece indicar ter existido um interessante movimento, em que essas pedagogias dialogavam, na Escola Normal de Campos e na Escola Modelo “Seis de Março”, nas décadas de 10 a 30 do século XX. Com o cuidado que a pesquisa histórica exige, arrisco-me a falar em pedagogias norteando a formação teórica e prática das alunas da Escola Normal de Campos, ao menos nos últimos anos da Escola Modelo “Seis de Março”. São essas “pedagogias” compostas por métodos e processos de ensino, e tendências pedagógicas que este Capítulo do trabalho se preocupará em descrever e analisar. Sem perder, porém, de vista a preocupação com o trabalho formador e os sentimentos e afetividade que brotam dos discursos de um pequeno segmento, modelar, das professoras campistas da Primeira República. Antes de passarmos aos Programas de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos, sentimos necessidade de identificar, nos quase sessenta anos de vida da Escola Normal de Campos, os professores de Pedagogia, aqueles que ensinavam a teoria que iria guiar, tanto a observação inicial, quanto a participação da aluna-mestra na aula de prática de ensino. Os dados sobre esses docentes foram recuperados de Livros de Posse e Exercício, localizados no Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos.
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Foram localizados no arquivo do Liceu, dois programas, de Pedagogia e Metodologia do ano de 1918, elaborados por Benedicto Hermogenes de Menezes, o professor que antecedeu Antônia Lopes na cátedra. 211 A da “arte de ensinar”, em que a prática da observação modula a relação ensino-aprendizagem(e está) centrada na produção de condições materiais que (favoreçam) a imitação inventiva de modelos, ou uma pedagogia científica, com a autonomização dos métodos de ensino,(isto é) como método dissociado da prática, “das artes de fazer”, do que decorrem importantes deslocamentos nas estratégias de formação docente.
O primeiro professor de Pedagogia e Metodologia foi o Dr. Homero Moretzhon Campista, terceiro diretor do Liceu 212, nomeado para a Cadeira em 1897 (LAMEGO, 1943, p. 40). Quando a Escola Normal Normal foi fechada, em 1900, tendo funcionado como Escola Normal Livre, consta como seu professor de Pedagogia, o Sr. Candido Mendes (SOUSA, 1985, p.158), substituído, em 1 de abril de 1901, pelo Professor Benedicto Hermógenes de Menezes (LAMEGO, 1943, p.43), já na “restabelecida” Escola Normal de Campos. O trabalho de Hermógenes como professor das matérias pedagógicas durou quase vinte anos 213, quando teve início o da professora Antonia Lopes (que teve duas auxiliares durante o percurso), continuado pela de suas “herdeiras” Laudelina de Castro e Josepha Cardoso de Araujo Lopes. O critério para ser professor dessas cadeiras não pôde ser recuperado. Se o Professor Homero Moretzhon Campista tinha experiência pedagógica, não sabemos. Sabemos, entretanto, que o Prof. Hermógenes havia sido diretor da Escola Primária nº 11 (MIGNOT; MARTÍNEZ, 2002, p. 90), o que lhe dava, ao menos tecnicamente, condições para dirigir a cátedra pedagógica e a prática de ensino 214. Em 1916, o Prof. Hermógenes adoeceu. A partir desse ano, Antonia Lopes o substituiu em seus impedimentos 215, até que, em 9 de outubro de 1919, como professora concursada, tomou posse e entrou em exercício do cargo de professora da cadeira de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos, vaga pela morte do antigo mestre. O concurso que Antonia Lopes prestou, foi feito nos moldes do Decreto n. 1420 de 13 de abril de 1915, Capítulo IX, segundo o qual “só poderá ser nomeado lente ou professor, quem provar por meio de concurso, conhecer perfeitamente a theoria e a pratica da disciplina a leccionar, sendo motivo de preferência para nomeação e, em igualdade de condições ser diplomado por escola normal do estado” (Art.100). O Decreto 1420/1915 determina, ainda, que:
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Conseguimos identificar somente o início de sua gestão no Liceu, 1885 (LAMEGO, 1943, p.41). Em 22 de junho de 1914, para auxiliá-lo, foi nomeada como adjunta da cadeira de Pedagogia, Isabel Zilinda Silverio dos Reis (Livro Termos de Posse e Exercício dos Professores e Funcionarios,1918, p.42). 214 No Liceu de Humanidades de Campos, o Prof. Benedicto Hermógenes de Menezes começou a trabalhar em 1902, quando foi nomeado professor de Grego (LAMEGO, 1943, p. 44). Em 1903 e 1904 lecionou, naquela instituição, respectivamente, Português e Latim, e Latim e Grego (LAMEGO, 1943, p.44). 215 Em 14 de abril de 1916; em 8 de junho de 1918, quando era diretora da Escola Seis de Março; em 8 de abril de 1919 (Livro de Termos de Afirmação e Posse dos funcionários do Liceu e Escola Normal de Campos -1895 a 1918, p. 48vº, Arquivo do Liceu). 213
Os concursos effectuar-se-hão na capital do estado, sob a presidencia do secretario geral perante uma commissão examinadora216 (Art. 101). Os requerimentos de inscripção para o concurso, serão acompanhados dos seguintes documentos: 1º, certidão de idade que prove ter o candidato mais de 21 e menos de 50 anos; 2º, folha corrida; 3º, attestado de vaccinação; 4º, attestado medico da directoria de hygiene de estado, provando não soffrer de molestia contagiosa ou repulsiva ou de qualquer defeito physico incompativel com o exercicio do magisterio. É preciso ainda, que o candidato não tenha vicio que o impeça de exercer convenientemente as suas funções (Art.103).
No ano de 1921, a professora Antonia Lopes se afastou da Escola Normal por 120 dias (de 17 de março a 8 de julho) para tratamento de saúde 217. Tomou posse, para substitui-la, no dia 7 de abril, a professora diplomada Dona Maria Amelia de Vasconcellos (Livro de Termo, p.7 vº). Em 1925, “adoecendo e impossibilitada de fazer as preleções que a matéria do 3º anno exige, recorri á bondade do Snr. Director de Instrucção, Dr. Horacio de Campos e pedi-lhe que addisse á cadeira de Pedagogia a Profª Nair da Motta Almada, diretora do Grupo Escolar de Guarulhos” (LOPES, 1927). A partir de 24 de abril de 1931 passou a contar com a ajuda de Laudelina de Castro nas duas disciplinas (LAMEGO, 1943, p.61), o que foi reforçado, em 3 de abril de 1936, quando Josepha Cardoso de Araujo Lopes também tomou posse como catedrática de Pedagogia e Metodologia Didática da Escola Normal (LAMEGO, 1943, p.65). A partir dessa data, sem Antonia Lopes, que se aposentou, parece ter havido a seguinte distribuição de disciplinas na Escola Normal de Campos: Dona Laudelina era a professora de prática de ensino e Dona Josepha, de Pedagogia. Confirmando essa afirmação, temos o depoimento oral da Professora Aldarina da Penha Carneiro. Ao ser indagada, em entrevista realizada no dia 10 de junho de 2002, sobre as disciplinas pedagógicas do Curso Normal, e sobre as professoras, assim se expressou Dona Aldarina Carneiro:
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Na página 15 do livro de Atas da Congregação da Escola Normal de Campos, consta que “no dia 6 de Agosto de 1919, ás 13 horas, no edificio do Lyceu e Escola Normal de Campos, presente a Congregação abaixo assignada, declarou o Snr. Director que se achava aberta a sessão, para o fim especial de se tratar da eleição da commissão examinadora que deverá servir no concurso de Pedagogia que será realizado em Niteroy (sic). Aberta a Congregação foi eleita a seguinte commissão para examinar no concurso de Pedagogia a se realizar em Niteroy: dna Maria Luiza Peixoto Landim; Joaquim Silverio dos Reis Junior e Sebastião Viveiros de Vasconcelos, lentes desta Escola”. À comissão examinadora competia organizar os pontos, por occasião de cada uma das provas e examinar os candidatos; assistir ás provas, fiscalizá-las; apresentar ao director do interior e justiça, parecer sobre o resultado do concurso e a relação dos candidatos habilitados, classificando-os por ordem de merecimento” (§1º ao 3º do Art.105). 217 Ficha Funcional 1933. Arquivo Histórico do Liceu.
Magistério era assim... Pedagogia, Metodologia, Pedagogia era a ciência sobre a educação; Metodologia era já a prática, a gente dava aula aos alunos da Escola Modelo. Eram as duas matérias: Pedagogia e Metodologia. A professora era D. Laudelina Castro. Seria D. Antunica, mas ela se aposentou antes de eu chegar. Então, foi D. Laudelina, que era sobrinha de D. Antunica. E tinha D. Filhinha, D. Josefa Lopes. D. Filhinha era de Pedagogia, e D. Laudelina de Metodologia (CARNEIRO, A., 2002).
Antes de iniciar a análise dos programas de Pedagogia e Metodologia usados por Antonia Lopes, em 1920 e em 1927, julgamos importante apresentar essas disciplinas do Curso Normal, sob a luz da legislação educacional. Disciplinas da Escola Normal de Campos: Pedagogia e Metodologia CURRÍCULO 1912 Curso de 4 anos/ Decreto nº 1241 de 13 de março de 1912 (Expediente de 16 de março de 1912) 3º ANO
4º ANO
CURRÍCULO 1914 Curso de 5 anos/ Lei nº 1224 de 6 de março de 1914 (Expediente de 11 de março de 1914) 3º ANO
4º ANO
5º ANO
Pedagogia- Pedagogia/Metodologia: Pedagogia: Pedagogia: Pedagogia 3 horas 3 horas semanais 3 horas teoria e Instrumental: semanaisteóricas, mais aulas semanais prática teoria e teóricas práticas semanais (as com 12 prática, com aulas no 4º ano deverão horas 12 horas ocupar uma parte do semanais semanais dia, sendo o tempo restante reservado à Escola Modelo). Ficará inteiramente disponível um dia da semana para exercícios na escola de aplicação sob a direção do lente de pedagogia.
CURRÍCULO 1915 Curso de 4 anos/ Decreto nº 1420, de 13 de abril de 1915 (Expediente de 15/04/1915) 3º ANO
4º ANO
Pedagogia: Pedagogia/Metodologia: 3 horas Três aulas teóricas semanais, semanais 218 e três aulas teóricas práticas no 4º ano (Art. 47). Parágrafo Único: Na organização do horário a distribuição do tempo será feita de modo a deixar o maior espaço para os exercícios na escola de aplicação. Trabalhos práticos de Pedagogia: 3 horas.
Observações: 1-Em 1918 foi recomendada a inclusão de três aulas de Prática Pedagógica e de mais uma aula semanal de Higiene e Pequenos Cuidados Médicos, no 4º ano da Escola Normal, como exigência do Decreto nº 1420, de 13/04/1915 (Ofício do Diretor dos Negócios do Interior e Justiça do Rio de Janeiro ao Diretor da Escola Normal, em 05/07/1918. ARQUIVO do Liceu) 2- Em 16/04/1920, Antonia Lopes escreveu ao Diretor da Escola Normal que, para o bom funcionamento das aulas práticas, dividiu o 4º ano, às sextas-feiras, em turmas (ARQUIVO do Liceu).
Feita essa introdução ao assunto, passaremos, a seguir, a apresentar a teoria pedagógica estudada na Escola Normal, para o que utilizaremos como fontes principais três Programas de Ensino da disciplina Metodologia 219: um do Professor Benedicto Hermógenes de Menezes (1918) e dois da Professora Antonia Lopes ( 1920 e 1927 ), ambos arquivados no Liceu de Humanidades de Campos. 218
Art. 47 – As lições theoricas para cada lente serão três, pelo menos, por semana. Nesse trabalho não analisaremos os programas de Pedagogia da Escola Normal, devido à inconsistência de fontes. O Programa elaborado por Antônia Lopes, em 1927, baseava-se essencialmente na psicologia- infantil e da educação-, com o estudo dos sentidos, percepção, afetividade, paixões, emoções, métodos de Binet e Simon, testes para determinar o desenvolvimento e as anomalias físicas, o caráter individual, as faculdades cognitivas, dentre outros temas. 219
Para a análise da prática de ensino realizada na Escola Modelo “Seis de Março”, serão utilizadas aulas preparadas por Antonia Lopes, explicadas, metodicamente, passo a passo.
5.2 OS PROGRAMAS DE METODOLOGIA DA ESCOLA NORMAL DE CAMPOS: A TEORIA
Em 1918, o programa de Metodologia do 4º ano da Escola Normal de Campos, do Prof. Benedicto Hermógenes de Menezes
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, apresentava, dentre outros, os seguintes
conteúdos, divididos em lições: nas lições IV a VII eram estudadas a “metodologia de ensino e a pedagogia de Sócrates, Pestalozzi, Girard, Gautier e Froebel” 221; das lições VIII a XII se estudavam as “ formas de ensino e a processologia”; as lições XIII até a XVII focalizavam a “metodologia especial: aplicação de princípios metodológicos no ensino das diversas disciplinas”; as de númeroXVIII até a XXII eram dedicadas ao estudo da “Lições de Cousas”. A última lição a ser estudada, a de número XXXV era: “Modos de ensino- Bell e Lancaster”. A professora Antonia Lopes dividiu seu programa, de 1920, em 22 lições. Pode-se perceber que a nova professora não fez grandes mudanças no programa de seu antecessor na disciplina. É possível, no entanto, fazer duas observações sobre o programa por ela elaborado: a primeira delas refere-se à ordem dos conteúdos programáticos. De modo diverso do professor, que parecia se preocupar em abordar, inicialmente, a pedagogia clássica, a professora procurou, desde as primeiras lições, introduzir temas facilitadores à atuação prática da normalista na Escola Modelo. Como no 3º ano já se tinha estudado a teoria, Antonia iniciou o curso de Metodologia com uma revisão do conteúdo: “Pedagogia, sua definição e divisão. Educação, sua necessidade, sua possibilidade e seus limites”, partindo imediatamente para temas como jogos, disciplina escolar, e metodologias de várias áreas, ensino este que intercalou com aspectos meramente teóricos, como a história da pedagogia e a influência da revolução francesa na história da educação. A segunda observação que julgamos pertinente refere-se ao cuidado de Antonia Lopes em estabelecer relações entre os conteúdos programáticos. Assim fez, por exemplo, no ponto de nº 12º do seu programa: Metodologia da escripta- Methodologia no Oriente- Chinezes, 220
Foram localizados no Arquivo Histórico do Liceu os Programas de Pedagogia e Metodologia de Homero Moretzhon (1898), os de Benedicto Hermógenes de Menezes (1918), e os elaborados por Antônia Lopes: Metodologia (1920), e Pedagogia e Metodologia (1927). Não foi localizado o Programa de Pedagogia de 1920. 221 O estudo desses teóricos comprova o que diz Valdemarin (2004, p. 6): que “o método de ensino intuitivo, adotado na 2ª metade do século XIX nas escolas européias, americanas e brasileiras, tinha Pestalozzi e Froebel como os autores apontados como influenciadores do referido método nos manuais didáticos e nos compêndios de Pedagogia [...]”.
Japonezes e Hindus (sic), quando ao estudar a “escrita” aproveitou para estudar a pedagogia dos povos onde essa se iniciou, historicamente. O mesmo tipo de relação parece acontecer quando, no ponto de nº14º, Higiene Escolar, Antonia Lopes estabeleceu relações com a Metodologia das ciências físicas e naturais. Ao propor o estudo dos Educadores brasileiros e da pedagogia feminina (Ponto de nº 18º), não estaria Antonia Lopes antecipando o que seria sua marca futura? Ou seja, o estudo e a difusão, entre alunos e colegas da Escola Modelo, de modelos pedagógicos, por ela perseguidos em cursos, viagens, leituras, trocas culturais, e a defesa intransigente dos direitos da mulher, com sua participação, na década de 1930, da Federação Brasileira para o Progresso Feminino? Em ambos os programas, de Benedicto Hermógenes e Antonia Lopes, pode-se perceber, claramente, o lugar de destaque dado ao ensino das Lições de Coisas, metodologia seguida por Consuelo Manhães e suas professoras da Escola Modelo. Quanto a outro assunto comum entre os professores, o estudo da Pedologia, é em Antonia que se observa a maior ênfase ao uso, na escola, de testes, aparelhos e inquéritos. O tema higiene escolar é também abordado nos dois programas, o que não seria incomum, dados os contextos, social e educacional, da época, estarem impregnados pelo ideário higienista. De todo o exposto, podemos concluir que, ao passo em que Hermogenes visava a dar uma sólida base teórica aos normalistas, Antonia, sem perder de vista esse aspecto, pretendia oferecer às normalistas, desde o início do curso, condições de observação e participação do “fazer pedagógico” na Escola Modelo. Em 1927, Antonia Lopes elaborou outro Programa de Metodologia. Nele, continuou a trabalhar temas como Lições de Coisas; jogos infantis; metodologias das várias áreas 222 ; educação intelectual, moral, cívica e estética; métodos e processos; higiene escolar; pedologia, para citar alguns. Introduziu, entretanto, os seguintes temas ao seu planejamento: autoeducação; escoteirismo; escolas ao ar livre, escolas-navio e colônia de férias; nacionalização do ensino, as escolas cidade; o cinema como auxiliar do ensino; a escola primária, os jardins de infância e as escolas maternais; Froebel e Montessori (LOPES, 1927b), o que nos leva a constatar que nessa época, ao lado da pedagogia tradicional, circulavam idéias inovadoras no campo da pedagogia sobre “o que” e, principalmente, o
222
Metodologia da leitura e da escrita, do desenho, da música, da aritmética e da geometria, da linguagem, da geografia e da história, das ciências físicas e naturais, dos trabalhos manuais.
“como’ ensinar. Para Sampaio Dória (apud SOUZA, 2004, p.139), a seleção de conteúdos de ensino e o modo de aplicá-los era questão
a ser encaminhada em conformidade com leis científicas, enunciadas especialmente pela psicologia, ciência capaz de desvelar o conhecimento da alma infantil mediante leis de sua evolução. Fatores de ordem social e individual estavam implicados na dedução de princípios para a pedagogia, e em decorrência, para a elaboração dos programas e estabelecimento do método de ensino.
É o que podemos perceber na seleção de conteúdos do Programa de Metodologia de Antonia Lopes em 1927. Considerando-se a legislação educacional que previa que “sempre que se introduzir nos programmas das escolas primarias alguma disciplina ou materia, até então não ensinada, se estabelecerá a cadeira correspondente do curso normal” (Art. 7º do Capítulo II, do Título I, do Decreto nº 1241 de 13 de março de 1912), concluímos que a seleção de conteúdos e a orientação metodológica imprimidos à disciplina de Antonia Lopes, na Escola Normal, eram feitos sob a observância das demandas que as professorandas encontrariam na sala de aula da escola primária, à luz da ciência.
5.3 Os métodos e processos de ensino na Escola Modelo “Seis de Março”: a PRÁTICA
Nesse item serão abordados o modelo pedagógico que parecia dirigir a prática de ensino da Escola Normal de Campos e os métodos e processos de ensino, aprendidos, pelas alunas-mestras, nas aulas teóricas dessa escola e aplicados na Escola Modelo “Seis de Março”. Será também focalizada uma aula prática planejada por Antonia Lopes, assim como seu planejamento de aulas práticas na Escola Modelo, com distribuição de alunas, horários e conteúdos. Existindo num tempo em que novo ideário pedagógico circulava pelos maiores centros do país, o que se constituía em fator provocador de mudanças para a prática do professor- que deveria tornar-se competente- para utilizar os novos recursos, os métodos de leitura e escrita, os jogos e materiais de demonstração didática, a Escola Modelo “Seis de Março” precisava contar com professoras inovadoras, para fazer jus ao seu nome. A Escola Normal de Campos era, portanto o celeiro natural onde se preparavam e desenvolviam as capacidades técnicas das mestras. O estudo da Escola Modelo “Seis de Março” confirma que, ao lado do nível de exigência com a qualidade técnica e pessoal das professoras, ali predominavam a preocupação
com a sala de aula, o “manejo de classe”, o “como ensinar” (métodos e processos), com a capacidade de transmitir conhecimentos, comportamentos e atitudes, e com a aprendizagem de procedimentos e recursos que tivessem respaldo na ciência reconhecida universalmente.
Nesse contexto, os Colégios de Aplicação, escolas modelo, foram concebidos como espaços onde a formação inicial poderia se realizar de forma plena: ali poderiam ser observadas as melhores aulas, pois contavam com os professores mais competentes e preparados para atuar nas experiências de formação propiciadas, onde eram aplicados os princípios da racionalidade técnica [...] ou seja, o professor em formação observa, de acordo com orientações previamente definidas, as “boas práticas de ensino” onde as “aulas dadas, com suas técnicas e recursos, são objeto de atenção para posterior reprodução (MONTEIRO, 2000, p.132;134).
Os métodos de ensino obedeciam às tendências da pedagogia moderna, que, segundo CARVALHO (2003, p.336) se refere ao “conjunto de inovações pedagógicas que, nos Estados Unidos e na Europa vinham imprimindo à instituição escolar um novo perfil: ‘jardins de infância [...], ensino simultâneo da leitura e da escrita, seriação dos conteúdos, [...], métodos intuitivos, lições de coisas [...]”, conjunto de inovações vivenciado na “Seis de Março” e incentivado pelas autoridades educacionais do Estado. Em 1927, ao tratar dos programas das escolas primárias do Estado, o Presidente Abreu Sodré disse: “Nas escolas primarias o ensino se ministra obediente aos methodos modernos e rigorosamente observado o programma approvado pela junta pedagogica e a Deliberação n. 139, de 21 de fevereiro de 1927, que representa uma evolução nos nossos processos de ensino” ( Mensagem, 1927, p.100). Nesse contexto transcorria a prática de ensino das normalistas na Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos.
5.3.1 O processo de ensino- aprendizagem na Escola Modelo “Seis de Março” e a prática de ensino
Como o próprio nome revela, o objetivo dessa atividade ( prática de ensino) era aprender a ensinar através da observação da ‘prática de ensino’ bem sucedida de professores competentes e pela realização de atividades docentes onde o professor em formação realizava a ‘prática de ensino’, ou seja, deveria demonstrar saber aplicar, da melhor forma possível, as diretrizes aprendidas anteriormente, reproduzindo de alguma forma, os modelos de aulas de professores bem sucedidos observadas até então. A ‘prática’ era para ser observada e reproduzida da melhor maneira possível” (MONTEIRO, 2000, p.131-132).
Como já foi dito, o grupo de professoras da Escola Modelo “Seis de Março” era “modelar”. Identificamos dois critérios a partir dos quais era selecionado o corpo docente daquela escola: a competência profissional e certos requisitos pessoais. Havia grande preocupação, da direção da Escola Normal e da Modelo, em dispor de mestras capazes, dignas de confiança, flexíveis às orientações. Aquelas consideradas competentes tinham seus nomes insistentemente pedidos à Diretoria de Instrução Pública. Assim aconteceu com Faride Chácar e Laudelina de Castro. Confirmando a afirmação, citamos as palavras do Diretor da Escola Normal de Campos ao Diretor de Instrução do Estado, ao solicitar, por mais de uma vez, a transferência das duas mestras de outras escolas, para a “Seis de Março”: “Si tomo a liberdade de indicar a V. Ex. os nomes das adjuntas, é porque desejo que trabalhem sob minha direcção professoras de minha confiança, já pelo seu preparo, já pela sua educação e moderado temperamento” (Ofício de 3/6/1925). Considerando as peculiaridades de uma escola de aplicação, e ainda por cima, modelo, pode-se entender a preocupação do dirigente com a composição do corpo docente. Curioso observar que, embora fosse uma escola de aplicação, esse fato não tivesse sido mencionado nos relatórios que as professoras dirigiram a Consuelo Manhães, em 1927. As únicas referências que parecem indicar a relação prática-teoria, encontram-se no relatório da professora Faride Chácar. Ao explicitar como trabalhava em cada área, diz que as matérias “são as indicadas pelo programma seguindo os methodos exigidos pela Methodologia, de accordo com o grau de adeantamento e intelligencia das alumnas” , o que pode ser considerado uma comprovação de que os métodos e processos pedagógicos trabalhados, quer na Escola Normal, quer na Modelo, obedeciam a uma mesma direção. O método de ensino privilegiado na “Seis de Março” era o intuitivo (FIG.14). Todas as professoras o usavam no desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. Faride Chacar, por exemplo, na 5ª série, explicava gramática “partindo do concreto para o abstrato, do exemplo para a regra, não adoptando livro, para evitar que as alumnas decorassem”. Os exercícios escritos de Português “eram resumos de historietas contadas no momento, interpretação de estampas, descripção de objetos concretos, redacção de cartas, officios e requerimentos explicados precisamente”. Os pontos de Aritmética “determinados pelo programma, partiam, sempre, do exemplo para a regra. Para que a creança tivesse idea de fracção, empreguei traços na pedra e pedaços de maçã” . No ensino de Geografia, “empreguei o methodo intuitivo e o processo concêntrico” . Em Historia Pátria “tambem utilisei do
methodo intuitivo, empregando os mappas para tornar mais claras as licções”. Em Francês, “empreguei o methodo intuitivo”, assim como em Instrução Cívica, “mostrando mappas e gravuras”. Isaurina Carvalho também procurava empregar em suas aulas, na 2ª série, “os conhecimentos com nitidez, empregando os methodos e processos modernos que a Methodologia nos ensina”, o mesmo sucedendo com Laudelina de Castro, que relatou: “emprego no ensino os methodos analytico e intuitivo, por meio dos quaes, apesar de pouco tempo de serviço, meus alumnosinhos têm progredido”. Odysséa de Castro Nunes vai um pouco além, na aplicabilidade do método intuitivo, pois conta que, em 1926, ao “ministrar o ensino ás alumnas que constituiram no anno findo, a serie mais atrazada da escola, o fiz sempre empregando o methodo inductivo e os processos intuitivos, notando com a applicação dos mesmos, grande desenvolvimento das faculdades intellectuaes das alumnas e real aproveitamento”. Vários processos de ensino eram utilizados pelas professoras da Modelo. Quem os cita é Faride Chácar. Pelo processo imitativo, ensinava as disciplinas Trabalhos Manuais e Desenho e Caligrafia, usava o concêntrico para ensinar Geografia e o de Lições de Coisas para Ciências Físicas e Naturais. Na correção do ditado “empreguei ora o processo simultaneo tabular e ora o simultaneo mutuo tabular”. A diferença entre método e processo de ensino, assim como a explicação de algumas dessas metodologias aprendidas na Escola Normal de Campos nos é apresentada pela própria professora de Pedagogia, Antonia Lopes. Todas as etapas dos métodos e processos estão minuciosamente descritas em seu Manual, publicado em 1927.
Metodo de ensino é o caminho seguido pelo espirito para descobrir, demonstrar, ensinar uma verdade. Processologia é a parte da Methodologia que trata dos processos. Processos são os meios que o professor emprega para tornar mais facil e mais compreensivel o ensino. [...] O processo simultaneo ocorre quando cada aluno faz a correção do proprio trabalho à vista do modelo feito pelo professor; se o professor escrever o modelo no quadro negro, o processo será simultaneo tabular; será simultaneo mutuo tabular, se os alunos trocarem, para correção, os cadernos entre si, e o professor empregar o quadro negro. (LOPES, 1927a, p.86-87).
Dentre os processos utilizados no ensino para a aprendizagem das alunas, um se destacou: o de Lições de Coisas. Considerado por Antonia Lopes “um processo de ensino, uma das aplicações da intuição” as “Lições de Coisas” eram privilegiadas na Escola Modelo, para o ensino, em especial, “da história natural, das artes úteis e das ciências físicas”. Visando a “desenvolver os sentidos, principalmente o da vista, pela observação do objeto [...]; fazer a criança
compreender, por objectos materiaes, idéas abstratas [...]; augmentar os conhecimentos da criança por novas concepções [...]; estimular e desenvolver, pela observação, a reflexão e o espírito de investigação [...]; auxiliar sempre a formação da linguagem [...]”, as Lições de coisas “são verdadeiras palestras entre alumnos e mestre, obrigando assim ao preparo previo da materia a explicar e ao conhecimento dos assumptos aproveitaveis” (LOPES, 1927a, p. 92; 95). Essas convicções pedagógicas de Antonia Lopes são corroboradas, no presente, por alguns historiadores da educação. Dentre eles, Rosa Fátima de Souza. Ao fazer a análise do uso do método intuitivo na escola, essa historiadora afirma sua importância na “introdução das idéias do movimento de renovação pedagógica, especialmente entre os professores do ensino primário” e na instauração de certos princípios e práticas até hoje vivenciados nesse nível de escolaridade: “o apelo à experiência e à observação, o estímulo à curiosidade da criança, a organização do programa partindo do concreto para o abstrato, do simples para o geral, do conhecido para o desconhecido” (SOUZA, 1998, p.170). Em suas aulas na Escola Normal, a Profª Antonia Lopes ensinava essa faceta do método intuitivo às normalistas. A respeito, encontramos, no Arquivo do Liceu, um documento datado de 14 de junho de 1916, em que a professora solicitava ao seu Diretor, as seguintes “substancias necessarias para o estudo das lições de cousas”: (FIG.17)
lapis a pastel (côres principaes) 24; vidro polido fosco, madeira 1 exemplar de cada. Assucar, sal 250,0 gr (sic) da 1ª e 0,5 l da 2ª. Aloés 5,0 gr, acido citrico 30,0, pedrahume 10,0. Lixa 1 folha, velludo 0,10 m, sebo e cera 200,o gr de cada; pedra-pomes 30,0, graphite 20,0 gr, almecega 10,0gr, giz 10 lapis. Ammonia 30,0 gr, almíscar 5,0, acido chloridrico 30,0. granito, ferro, borracha e vidro ad libitum; arame 2m, alcool 1 garrafa, camphora 10,0, lacre nº 1, esponja nº 1.
Além desse documento que descreve o material de uso na aula de “Lições de Coisas” há, no relatório de Antonia Lopes o planejamento de uma aula prática a ser dada na 5ª série da Escola Modelo, que se constitui em rico registro de uma experiência pedagógica da escola primária da Primeira República. Visando a preservar detalhes de um documento histórico extremamente importante, optamos por transcrevê-lo na íntegra:
“PLANO DA LIÇÃO 1º- Materia: - Chimica
2º- Assumpto:- Ferro 3º- Serie: - 5ª 4º- Methodo; - Eccletico (analytico-syntetico) 5º- Processo:- Intuitivo 6º- Forma da lição:- Dialogica 7º- Duração:- 20 minutos 8º- Material illustrativo:- pedaços de ferro e de ouro, objectos desses metaes e papel, para o resumo, ou quadro negro. 9º- Propozito da lição:- preparar o espirito do alumno para o estudo das sciencias naturaes. A lição se compõe de três partes: 1ª- preparação do conhecimento; 2ª- formação do conhecimento; 3ª- applicação do conhecimento. 1ª PARTE PASSO FORMAL PREPARAÇÃO DOS CONHECIMENTOS APERCEPTIVOS (aprendizado concreto) O professor: tomará um pedaço de ferro e perguntará ao alumno se conhece aquella substancia. Alumno: isso é um pedaço de ferro Professor: o ferro é um metal muito util, etc. Proseguirá o professor em uma serie de perguntas tendentes todas a trazer ao campo da consciencia do alumno todas as ideias que elle já tinha em relação ao ferro. Vocês já conhecem o ouro, não é assim? Hoje estudaremos portanto o ferro. Escreve no quadro negro a palavra ferro. Depois do professor ter feito muitas perguntas accerca do ferro, podendo até contar uma historia allusiva a esse metal, que desperte o interesse dos alumnos, elle passará á segunda parte da lição. 2ª PARTE PASSO FORMAL FORMAÇÃO DOS CONHECIMENTOS Apresentação:- 1º- Conhecimento intuitivo a) forma-Prof. – Aqui temos pedaços de ferro; que forma tem este? E este? etc. ; e este de madeira, e o de ouro? b) côr- Prof. - De que côr é este pedaço, etc; c) peso- Prof. – Qual destes três pedaços é o mais pesado? Alumno. – O ferro é mais pesado que a madeira e o ouro. Prof. – Por quê? Prof.- (colloca o ferro dentro d’agua e o mesmo faz com a madeira, a cortiça, etc.). Alumno- O ferro foi para o fundo, etc. d) consistencia e) lugar onde se encontra o ferro f) utilidade do ferro, etc... Resumo feito pelo professor Resumo feito pelo alumno (imitação) Aprendizado activo 3ª PARTE PASSO FORMAL ASSOCIAÇÃO 1º- Comparação—(compare as qualidades do ferro com as do ouro e as da madeira) (Comparação e abstração) 4ª PARTE PASSO FORMAL GENERALIZAÇÃO 1º- Definição—Prof.- Que classe de mineral é o ferro? Para que serve? Alumno. – (responde) Repita F....; repita L...; etc. (Aprendizado activo, inductivo e retentivo)
5ª PARTE APPLICAÇÃO Prof.- Manda que os alumnos façam no quadro negro e depois no papel (em casa) uma composição sobre o ferro. (Synthese ou deducção) Campos, 13 de Abril de 1927 Antonia Ribeiro de Castro Lopes, lente de Pedagogia e Methodologia Didactica da Escola Normal de Campos”(LOPES, 1927b).
Que lições essa aula nos traz? Apoiando-nos em Valdemarin (2004, p.107), concluímos que a Profª Antonia Lopes seguiu, em seu planejamento de aula, o caminho que visava levar o aluno a “progredir da percepção à idéia, do concreto ao abstrato, à inteligência por meio dos sentidos, ao julgamento por meio de provas. A lição intuitiva, posta em prática numa linguagem apropriada aos alunos, assume a forma de diálogo, com perguntas e respostas que provocam e dirigem a atividade das faculdades intelectuais”. Além da aula utilizando o processo intuitivo, o mesmo Relatório (1927) contém a descrição, pormenorizada, de aulas de prática escolar do 3º e do 4º anos da Escola Normal. À vista do documento original, tentamos organizar o seguinte esquema de comportamentos, habilidades e passos que formariam a racionalidade prática das futuras professoras. No 3º ano Normal, inicialmente era trabalhado o 1º dia de aula. À Aluna-mestra, competia: mostrar a “escrita” da Escola Modelo (explicar como era feita, indicar o modo de se justificar as faltas e entradas tarde); observar a organização do horário e a distribuição das matérias223; registrar a impressão da aula na caderneta de prática escolar (FIG.15); observar o comportamento dos alunos da Escola Modelo: entrada e saída, maneira de distribuir e guardar o material didático, tudo por sinais, abaixo discriminados:
Para evitar a vozeria das crianças ao darem as respostas, quando a professora faz a pergunta, devem ellas dar o signal de que sabem responder, erguendo as mãozinhas, em silencio; a professora designará, dentre as que ergueram a mão, a que deve responder. É um bom processo de manter a disciplina, o silencio, pondo, ao mesmo tempo, a classe toda em actividade. Para manter a disciplina na saída e na entrada de aulas, os alumnos devem caminhar em fórma, tendo as mãos para trás, evitando assim que empurrem o collega que os precede; convem conserva-las na mesma posição, para evitar os mesmos inconvenientes quando cantam os hymnos (LOPES, 1927a, p.52).
223
Segundo Antônia, isso “requer grande cuidado, porque devemos poupar da fadiga os cerebros novos, visto ser enorme o dispendio de energia no periodo de crescimento” (LOPES, 1927a)
O planejamento previa, também, as atividades da 1ª semana e as atividades após a observação inicial. Na primeira semana, a aluna deveria “assistir às lições dadas pelas adjuntas da Escola Modelo”. Após a observação inicial, deveria “assistir a aulas dadas, pela professora ( Antonia Lopes), na sala do 3º Normal- para alunos da Escola Modelo- e repetir essas aulas (LOPES, 1927b). No 4º ano Normal, a prática escolar era feita às sextas-feiras das 9 às 11h e das 13 às 15h224. Cada aluna deveria: preparar sua aula e organizar a “folha de aula prática”; fazer o “seu” diário de classe e registrar, na caderneta de prática escolar, “a impressão sobre a aula que deu ou assistiu: falar da disciplina, do modo de distribuir o material didatico, dos metodos e processos empregados, enfim, fazer a critica pedagogica” (LOPES, 1927b). Havia, ainda, no 4º ano, às quartas-feiras, durante uma hora, mais uma atividade de prática escolar. Nesse dia, as alunas designadas no momento, davam a aula que a adjunta da Escola Modelo deveria dar, sendo que o “ponto” era indicado, previamente, a todo o 4º anno, para que as normalistas preparassem a lição. Enquanto as designadas trabalhavam, as demais assistiam, registrando todas, em suas cadernetas, a aula dada (LOPES, 1927b). Sobre essa sistemática da prática de ensino da Escola Normal, poucas lembranças tem Dona Stella Tinoco Dias. Entretanto, lembrou-se, com exatidão, do dia da semana em que se realizavam as aulas práticas e da impressão que estas causavam em sua turma da Escola Modelo. Quando, em depoimento oral, foi indagada se as aulas práticas perturbavam o desenrolar dos trabalhos na “Seis de Março”, respondeu:
As alunas do 4º ano Normal davam aula na Escola Modelo. Isso eu me lembro. Elas iam dar aula e nós gostávamos que elas fossem, não é? Não me lembro de pormenores, agora sei que a gente dizia... eu tenho a impressão de que era um dia na semana, sexta-feira: “Hoje é dia das normalistas!”. As normalistas vinham à nossa escola! A gente recebia bem... sempre era uma novidade, não é? Professora nova... (DIAS, 2005).
As atividades relatadas, no planejamento de Antonia Lopes, aconteciam no primeiro semestre letivo. A prática escolar do 2º semestre era bem diferente. No mês de julho são organizadas aulas ao ar livre; Em agosto, a Escola Modelo é “transformada” ora em escola rural, ora em urbana isolada, ora em grupo escolar 225: 224
O 4º ano é dividido em duas turmas de 16 alumas cada; esse grupo é novamente subdividido em grupos de quatro “porque melhor eu observo e lhes corrijo os defeitos da aula; emquanto quatro alumnas leccionam, as outras observam. As aulas são de 20 minutos com intervallos de 10 minutos” (LOPES,1927b). 225 Localizamos referência a essa prática no Relatório de Presidente do Estado, 1927. Ao abordar a Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, o Presidente Dr. Feliciano Pires de Abreu Sodré, relata: “Annexa á Escola Normal, funcciona no mesmo predio este estabelecimento de ensino. [...] A professora de methodologia
cada alumna mestra, sempre sob minha orientação, rege, durante 20 minutos, um desses typos de escola, sendo, na regencia de grupo escolar, auxiliada pelas collegas, que lhe servem de adjuntas” [...]. Nos meses de setembro e outubro são realizadas excursões pedagógicas, sendo as alunas “acompanhadas por mim e minha auxiliar, professora Nair da Motta Almada (LOPES, 1927b).
A respeito das excursões pedagógicas, eram essas previstas na legislação desde 1912. O Decreto 1241 desse ano, ao estabelecer as atribuições dos alunos do 4º ano normal das escolas do Estado, determina que deverão “acompanhar, não só os trabalhos da Escola Modelo, como tambem os serviços administrativos, interessando-se em tudo que se relacione com a execução do regulamento interno das escolas publicas”. Estabelece, ainda, a forma de registro das observações “relativas aos trabalhos praticos, notas das excursões pedagogicas e resumo das lições que houverem dado”, devendo ser essas “cadernetas examinadas e visadas mensalmente pelo lente de pedagogia” (Art.52). Esse lente será também o responsável pelas excursões pedagógicas, feitas “com a autorização do diretor, em dias previamente fixados” (Art. 51). Algumas excursões pedagógicas puderam ser identificadas na pesquisa.(FIG.16). No ano de 1920, no dia 20 de agosto, a professora Antonia Lopes, lente de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos, realizou uma excursão pedagógica com seus alunos do 4º ano 226. Essa excursão foi feita à Escola Wencesláo Braz 227. Esta escola, fundada em 1916 no Governo Nilo Peçanha, foi a primeira escola ao ar livre do Estado 228. Funcionava na Praça Nilo Peçanha, em prédio de estilo greco-romano. Hoje ali é a sede da Academia Campista de Letras. As excursões continuaram, pois em 1925, o Diretor da Escola Normal de Campos, Sebastião Viveiros de Vasconcellos, em Relatório à Diretoria de Instrução Pública, diz:
Constantemente, acompanhadas da professora de Pedagogia , esforçada e intelligente preceptora, iam as alumnas em excursões pedagogicas, visitando fabricas, usinas e institutos de ensino e educação. A mais e mais proveitosa dellas foi a que empreenderam á capital do Estado e da Republica, onde colheram excelentes frutos para a sua aprendizagem.
adoptou nas aulas a caderneta de pratica escolar e nos mezes de agosto costuma transformar a escola modelo nos diversos typos de escolas primarias, para que cada normalista durante 20 minutos tenha a regencia da classe, assim como, annualmente, faz excursão pedagógica ( Mensagem 1927, p.107). 226 Fonte: Comunicação enviada pela professora ao Diretor da Escola Normal em 19/08/1920. 227 A Escola Wencesláo Braz também sofreu a mesma transformação que a Modelo “Seis de Março” em 1931. Passou a chamar-se Grupo Escolar José do Patrocínio. 228 Treze anos mais tarde, em 1933, Antônia Lopes, já aposentada e recém-chegada de viagem à Europa, criou em Campos o Instituto Claparède, que parece ter semelhanças com a Wencesláo Braz, embora existência mais breve.
Também o jornal Monitor Campista, 11 de outubro de 1932, na capa da edição, informa, sob a manchete “Uma aula prática para o 4º anno da Escola Normal”,
Approximando-se o final do curso da Escola Normal, o 4º anno tem tido varias e interessantes aulas praticas de pedagogia, ministradas pela professora Antonia Lopes. De vez em quando, as alumnas deixam o importante estabelecimento e, num bando carrulo, dirige para o campo, para as usinas e outros estabelecimentos e indústrias, acompanhada pela illustre educadora, que lhes ministra as necessarias aulas. Hoje haverá um desses passeios proveitosos. As estudantes do 4º anno deverão visitar a estação da Companhia Thelefonica cujo gerente, attendendo solicitamente a um pedido da professora Antonia Lopes, franqueou o edificio para os importantes estudos.
Se considerarmos os locais escolhidos pela Profª Antonia Lopes para as excursões da Escola Normal- “usinas, outros estabelecimentos e indústrias”- poderemos perceber nelas, uma outra função além da pedagógica: a de ser ferramenta capaz de sintonizar as futuras professoras com o progresso, com o trabalho nas máquinas, com a modernidade, enfim, com um cotidiano que a escola renovada não poderia mais ignorar.
5.4 A PRÁTICA DE ENSINO APÓS O FIM DA ESCOLA MODELO “SEIS DE MARÇO”
A pesquisa demonstrou que, do início de 1916 até, pelo menos, o fim do ano de 1931, a escola de aplicação da Escola Normal de Campos era a Escola Modelo “Seis de Março”. A partir daí, as escolas da rede estadual passaram a ser o local de prática. As mudanças parecem ter começado a desestruturar o esquema e a qualidade da prática de ensino proposta por Antonia Lopes, pois em 20 de setembro de 1933, assim ela se dirigiu, por escrito, acompanhada por Laudelina de Castro e Josepha Cardoso Lopes, ao Dr. Teobaldo de Miranda Santos, diretor do Liceu e Escola Normal de Campos:
Em cumprimento á Vossa determinação vimos fazer-vos conhecedor das necessidades urgentes da cadeira de Pedagogia da Escola Normal de Campos. Preliminarmente temos a dizer-vos que sem uma Escola de Aplicação perfeitamente apparelhada-não ha rendimento- o ensino é defeituoso e falho. Nas que possuimos ao enves de observarem as alunas-mestras o que aprendem nas aulas teoricas o contraste se lhes apresenta: uma escola tradicional em que há deficiencia de mobiliario e o que existe é arcaico e arruinado. Para a pratica escolar não precisamos de um Grupo com series sub-divididas onde trabalhem muitas adjuntas com a preocupação de completar programa para exame, servindo-lhes as professorandas de estorvo; bastar-nos-ia uma escola isolada ao lado das demais series de um Grupo e um Jardim de Infância [...].
Essa carta configura, em nosso entendimento, o início de uma prática profissional docente mais aligeirada e sem a “marca de qualidade” requerida por Antonia. Essa marca merece uma observação, se considerarmos o que diz o Prof. Lourenço Filho a respeito da prática de ensino realizada nas escolas modelo.
Se quisermos, pois, formar professores, teremos que pô-los em situações reais de ensino, em face de classes reais, vivendo experiências reais. Eis o primeiro ponto. Mas a experiência, que assim se pretenda ensejar, pode ser de base grosseiramente empírica, a realizar-se pela sugestão de modelos que só se apresentem feitos, e, por isso mesmo, mostrados como “perfeitos”. Simples imitação. Cópia. Arte de barbeiro... Vão os alunos para uma sala de aula e “observam” o que realiza um professor, tido como dos mais exímios, ou brilhantes, da “escola-modelo” anexa. Nada se explica, nem os alunos-mestres podem sentir da situação real dos alunos, de suas capacidades, de sua experiência anterior, do andamento geral do ensino, da motivação que os anime (LOURENÇO FILHO, 2001, p.54).
Não sabemos a que período da experiência “escola modelo” Lourenço Filho se refere, nem a que escolas, uma vez que não estudamos as práticas da Escola Normal de Niterói, da do Município do Rio de Janeiro nem a anterior experiência da Corte. É certo, porém, que não se referiu à prática de ensino feita pelas alunas da Escola Normal de Campos na Escola Modelo “Seis de Março”. As fontes dão a entender que, nessa, as alunas viam e faziam, não apenas copiavam modelos, embora estivessem sujeitas a todas as deficiências relativas à falta de espaço físico, aspecto não abordado por Lourenço Filho como um problema. Pensamos ser necessário não perder de vista dois aspectos: o primeiro se refere às diferenças existentes entre as práticas vivenciadas nas escolas localizadas em capitais, daquelas localizadas em cidades do interior 229; o segundo, refere-se ao momento histórico em que o fato se deu, e que deve justificá-lo por si. Assim, embora entendendo a posição de Lourenço Filho como a de um educador que desejava uma outra escola, que levasse em consideração “variáveis” como:
teor geral da classe, situação material, estado biológico das crianças, situações psicológicas dominantes, aprendizagem anterior, interesses permanentes e fortuitos, certos fatos acidentais, costumes da localidade, do bairro, da rua, os jogos da temporada, efeito de leituras, do cinema, dos esportes – tudo, enfim, quanto possa estar atuando sobre as crianças – e, nessa atuação, por certo, também estará a ação continuada do professor, se realmente educativa, bem planejada e metodicamente exercida (LOURENÇO FILHO, 2001, p.55),
229
A cidade de Campos ainda é considerada, por muitos professores, como aquela que cumpre, à risca, as determinações emanadas pelos órgãos superiores.
não podemos concordar com seu discurso, que nega o passado e a prática real, que eram outros. Afinal, foi sobre a experiência desse passado e dessa prática que se construiu o modelo preconizado por Lourenço Filho, o das “escolas de demonstração”.
5.5 Pedagogia, Metodologia e Prática Pedagógica a partir de 1931. As mudanças no modelo de formação de professores
Assinado por Plínio Salgado, interventor federal do Estado do Rio de Janeiro, por Cesar Tinoco, Secretário do Interior e Justiça e pelo Secretário de Estado de Finanças, Vicente Ferreira de Moraes, o Decreto nº 2571 de 22 de abril de 1931 ratifica a nova estrutura do Curso Normal (Art.77 do Decreto 2539 de 13/01/1931), agora dividido em duas partes: “ a) do curso completo de humanidades e b) das cadeiras annexas ao curso do Lyceu ( onde se estudaria no 1º e 2º ano, trabalhos manuais; no 3º, 4º e 5º educação física (Art.78) e de um anno de especialização e aperfeiçoamento” ( onde seriam estudadas pedagogia, metodologia didática e higiene (incluindo puericultura e primeiros cuidados médicos (Art.79). Se no modelo anterior, o ensino de Pedagogia e Metodologia Didática era distribuído em dois anos, a partir da operacionalização do Decreto, os estudos pedagógicos passam a ser feitos em um ano apenas, conforme prevê o Artigo 86: “O ensino da Pedagogia e da Methodologia Didactica, feitos no curso de especialização e aperfeiçoamento serão ministrados com duas aulas theoricas semanaes para cada uma, e três aulas praticas semanaes para a segunda e uma para a primeira”. O local das aulas práticas continuou a ser as Escolas Modelo do Estado, sendo as mesmas revestidas de nova orientação, qual seja, que obedecessem “ao programma dos grupos escolares” (Art.87). Outras alterações se fizeram sentir: “O ensino pratico compreenderá ainda excursões e visitas aos Museus, Jardins, Fabricas, Estações Experimentaes, conferencias, etc.”, sendo que “as excursões fóra da cidade somente serão permittidas nos periodos de ferias” (Parágrafo Único do Art.87). O uso de testes como medida de avaliação passou a ser incentivado: “Haverá durante o curso de Pedagogia quatro concursos bimestraes, nos quaes se apurará o aproveitamento dos estudantes tanto quanto possível por meio de “tests”. O mesmo regime se adoptará para a cadeira de Methodologia didactica” (Art.89). O decreto define como deverão ser os procedimentos de avaliação.
Em relação à disciplina Pedagogia, serão duas provas, uma prática e outra oral (Art. 91). A prática constará da confecção de um “test” simples (§1º); a oral “será uma dissertação sobre um dos pontos do programma, sorteado com meia hora de antecedencia, podendo o candidato consultar compêndios ou notas” (§2º), sendo aprovada a aluna que obtiver a nota cinco. O exame de Metodologia Didática “constará de duas provas praticas, feitas em dias diversos. Cada uma dellas constará de uma aula dada a alumnos de um Grupo Escolar sobre assumpto tirado á sorte com 24 horas de antecedência”. Como se vê, foram significativas as mudanças, na Lei. Sobre elas, falou-nos a Professora Aldarina da Penha Carneiro:
( Inicialmente) o estágio era tudo lá (no Liceu), porque tinha a Escola Modelo. Tinha o colégio para a gente fazer estágio. Que passou a ser Grupo João Pessoa. Porque eles acabaram com a Escola Normal. Você sabe, não é? Acabaram, assim...não acabaram... a Escola Normal separada acabaram. Minha irmã, por exemplo, que foi formada, era assim: fazia o Liceu e mais dois anos de Normal, entendeu? [...] Eu saí em 1931 e a última turma da Escola Normal saiu em 1933. Quer dizer, de 1934 em diante faziam o curso do Liceu e mais dois anos... primeiro era um ano, depois dois anos. Quando inauguraram o Instituto de Educação, acabou a Escola Normal lá e passou para o Instituto, não é? Mas enquanto não tinha Instituto era assim: faziam dois anos, três...minha irmã fez lá (CARNEIRO, A.,2002).
No cotidiano, sabe-se que as aulas práticas passaram a ser feitas em grupos escolares da cidade, sendo as alunas da Escola Normal levadas por Dona Laudelina, de bonde, conforme depoimentos das ex-alunas Gilda Duncan Tavares e Marluce Guimarães Silva, registrados no Capítulo 4. Como mais um exemplo, deixamos aqui o relato de Conceição de Maria Costa Muniz, aluna da Escola Normal de Campos nos anos 1947-1949. Dona Laudelina, falava muito, contava muita história de Dona Antunica, que ela foi criada... eu não sei se ela tinha algum vínculo de parentesco, mas foi criada por Dona Antonica Lopes. Dona Laudelina era professora de Prática de ensino. Acompanhava, ela acompanhava, nós íamos com ela. A prática era em turmas do Primário e Jardim de Infância. Inclusive no Instituto, eu não me lembro, não sei mais como que é, mas naquela parte de baixo, o jardim era um salão grande e as turmas eram assim...quase que conviviam, assim... 1º, 2º e 3º período. Eu me lembro até que quando eu fiz exame final de Prática de Ensino no pré-primário, eu idealizei uma aula de música. Aí eu pedi a meu Tio Fernando, ele fez o “Castelo de Dona Música”. Então, você ia subindo os degraus: Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si, e você chegava num Castelo. Ele fez lindamente. Quando eu cheguei na sala para começar , que eu olhei... quer dizer: eu dava uma aula aqui, outra dava outra, outra dava outra..., do meu lado, Norma estava com um bolo de vela -a motivação dela era um bolo de vela. Eu falei: “pronto, não adianta que essas crianças não vão prestar atenção na minha aula”. Mas eu fiquei tão nervosa... eu dei a aula toda, eu dei a aula olhando para as crianças, mas eu estava preocupada. Eu me lembro que era Dona Filhinha, Dona Lucília, e Doutor Décio Cretton assistindo à aula. E quando acabou a aula, eles falaram assim: “Mas sua aula
estava ótima, mas que pena que você disse que as teclas do piano são tiradas da tromba do elefante” (risos). Eu mesma que me traí. Mas era assim, a gente ia lá dava aula ali e tal...assistia às aulas também, e a teoria era no Liceu (MUNIZ, 2001).
A experiência de Conceição Muniz ilustra alguns aspectos que consideramos importante focalizar: o primeiro se refere ao fato de serem dadas várias aulas práticas num mesmo espaço, o que nos reporta à mesma experiência vivenciada na antiga Escola Modelo “Seis de Março”, no início do século. O segundo, diz respeito à importância que se dava, na Escola Normal, à atividade de Prática de Ensino, que era assistida não apenas pela professora de Metodologia, ou Pedagogia, mas por uma espécie de “banca” de avaliação. Que, no caso em pauta, era composta, inclusive, pelo Diretor do Liceu de Humanidades e Escola Normal de Campos. Por fim, é preciso considerar, também, o momento da aula prática como a realização de um trabalho minuciosamente preparado para uma clientela e uma escola, na maioria das vezes, idealizada e irreal. Momento esse que, dificilmente, seria revivido na prática cotidiana da sala de aula e que, portanto, se configura como uma das grandes contradições da formação de professores, até nossos dias.
CONSIDERAÇÕES
ALGUMAS PALAVRAS INICIAIS (NA PRIMEIRA PESSOA)
Concordando com Clarice Nunes quando ela diz que “as trajetórias escolares e as memórias de formação são lugares privilegiados de construção do entendimento [...], são experiências internas de exposição e autoconhecimento, de descoberta dos laços entre a memória pessoal e social” (NUNES, 2002/2003, p. 23), estudar a Escola Modelo “Seis de Março” constituiu-se numa atividade apaixonante, na qual se misturaram às memórias materializadas nos arquivos, as minhas próprias memórias. Memórias das muitas escolas públicas nas quais trabalhei, ora como professora primária, ora como supervisora educacional/inspetora de ensino, ora como professora formadora de professores, por mais de trinta anos. Se, como disse Benjamin, “a rememoração é uma retomada salvadora do passado” (BENJAMIN apud BOSI (2003, p.33), meu passado profissional retornou com muito vigor quando comecei a analisar os documentos da Escola Modelo. A letra desenhada das professoras, as observações que faziam a respeito de seus modos de ensinar, o amor à profissão, a luta por uma escola pública de qualidade fizeram-me entender, hoje, o que não enxergava quando moça. Minhas memórias voltaram às estradas e me transportaram ao passado. Sucessão de imagens rodaram em minha mente. Lá estavam a Escola Reunida “Fazendinha”, no Município de São João da Barra; os Grupos Escolares “Almirante Barroso”, no Distrito de Tócos; “Alberto Lamego”, no de Martins Lage; “Coronel Francisco Ribeiro da Motta Vasconcellos”, no de Baixa Grande; “Azevedo Cruz”, no Município de Cardoso Moreira; a pequena escola do “Espinho” e a da “Barra do Jacaré”, na Baixada Campista; a de “Sambra” e a de “Duas Barras”, no Município de Italva, e outras tantas, das quais não sei mais a denominação. Não me recordei de muitos nomes, mas refleti que, embora constituíssem culturas escolares diferentes- como diferentes eram as individualidades que nelas circulavam- eram todas quase iguais em alguns aspectos: na arrumação enfileirada das carteiras nas salas de aula; na pintura azul e branca das paredes; nos cadernos das crianças; nos quadros negros cheios de escritos para cópia; nas leituras em coro; no Hino Nacional cantado na hora da entrada; nas festas que obedeciam a um calendário quase invariável- Páscoa, Dia das Mães, Festa Junina, Dia da Criança, 7 de Setembro, Natal...-; na disciplina rígida: “-levante a mão quando quiser ir ao banheiro, ou responder à pergunta feita, etc.”; nas cartilhas de leitura; na tabuada e nos verbos “cantados”; nos beijos suados recebidos pela professora na hora da saída; nas filas; e em tantos outros rituais e tradições- que foram sendo constituídos historicamentedesde as primeiras escolas de ler e escrever aos grupos escolares, no século XIX.
Nessa perspectiva, que papel tiveram as escolas modelo, em especial, a “Seis de Março”? Os mais relevantes resultados da pesquisa estão aqui apresentados. Buscam refletir sobre uma escola que representou um projeto inovador de educação primária e de formação de professores no interior do Estado do Rio de Janeiro, na Primeira República, e que, certamente, ajudou a construir práticas e saberes; constituiu subjetividades; enfrentou contradições e dificuldades, tendo sido uma experiência importante no processo histórico de constituição da escola primária brasileira e da prática de ensino que temos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Escola Modelo “Seis de Março” era exclusivamente uma escola feminina, por razões de espaço físico, porque a legislação que regulamentou essa nova proposta previa que fosse mista. A Escola Normal de Campos à qual era anexa era mista, com predominância de alunos do sexo feminino. A esse respeito, julgamos necessária a seguinte explicação, antes de entrarmos propriamente nas considerações finais. Ao denominarmos a clientela da Escola Normal de Campos, em toda a dissertação, usando o substantivo “normalista” e “professora”, apoiamo-nos em dados estatísticos que comprovam ter sido aquela escola predominantemente feminina, nos anos que delimitaram nosso estudo. “Quadro Estatístico” localizado no Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos mostra a proporção entre homens e mulheres que cursavam a Escola Normal entre os anos 1910-1917: ANO
HOMENS MULHERES ANO
HOMENS MULHERES
1910 1911 1912 1913
4 3 3 9
6 5 2 1
150 153 120 113
1914 1915 1916 1917
112 114 127 141
Embora não tenhamos conseguido reunir dados de outros anos, percebemos pela leitura de documentos que esse índice permaneceu o mesmo por algum tempo, sendo seguido de um período em que não havia rapazes fazendo o Curso Normal, o que comprova o caráter
eminentemente feminino da profissão docente, também na cidade de Campos, e justifica nossa opção pelo uso do gênero feminino nas menções às alunas e normalistas. Para compreender o que significou o projeto escola-modelo na iniciativa republicana brasileira procuramos pensá-lo no contexto histórico do qual emergiu. Um contexto político e social em mudança, no qual a escola pública que existia foi posta em questão. Um contexto que revelava a necessidade de superação de princípios e de estruturas pedagógicas consideradas arcaicas e tradicionais- diante das idéias de uma escola ativa e renovada- que se vivenciava em certos países da Europa e nos Estados Unidos. Essa escola “diferente” era contrária ao ensino baseado na memorização e na explicação professoral, vigente na maioria das escolas primárias brasileiras. Essa escola “diferente”, “capaz não apenas de instruir e educar a infância e a juventude, mas de produzir um país ordeiro, progressista e civilizado” (FARIA FILHO, 1999 apud FARIA FILHO, 2002, p.24), passou a ser a meta do projeto republicano paulista e se irradiou para outros estados da federação.
Como signo da instauração da nova ordem, a escola devia fazer ver [...]; para fazer ver, a escola devia se dar a ver; educar era a aspiração uníssona que se levantava em todos os países. Não bastava, contudo, ensinar: era preciso saber ensinar. Não poderia haver ensino produtivo sem a adoção de métodos que estariam transformando em toda parte o destino das sociedades (CARVALHO, 2003, p.13;24).
É nesse quadro de “Construção da Nação” que surge, em São Paulo, em 1890, a Escola Modelo anexa à Escola Normal Secundária que, com proposta inovadora, alicerçada por vigorosa decisão política, começa a espargir “as luzes” de uma escola nova pelo país. No cenário fluminense, percebemos que, nos primeiros anos após a proclamação da República, era significativa a preocupação dos governantes com a educação que poderia salvar o povo do analfabetismo e elevar o Brasil ao nível das maiores potências. As Mensagens de Presidentes do Estado são consistentes em propostas de instalação de escolas, aquisição de mobiliário e melhoria de prédios escolares. Aprofunda-se, nesse momento a preocupação com a formação de professores. Afinal, de que adiantaria construir escolas se os professores eram “atrasados e os alunos fugiam das aulas”? É nesse quadro de “otimismo pedagógico”, que se materializa a Escola Modelo anexa à Escola Normal de Campos, em 1916, como locus de implementação da inovação pedagógica.
Essa Escola foi conquistada, para a cidade de Campos, por um importante grupo de intelectuais da cidade e do Liceu de Humanidades. Dentre eles uma figura se destacou, a da Profª Antonia Ribeiro de Castro Lopes. Essa professora teve, na Escola Modelo “Seis de Março” o campo favorável para a experimentação de teorias e práticas que, desde 1913, tivera oportunidade de conhecer nas Escolas Normal e Modelo de São Paulo e as quais procurava difundir, inclusive, com o uso de espaço no Jornal do Commercio e no Monitor Campista. Dentre as práticas que, a partir de 1918, introduziu na Escola Modelo da Escola Normal de Campos, destacou-se o uso do método intuitivo que, nas palavras de Caetano de Campos- o “pai” do projeto paulista- tinha por mérito “a cultura intensiva do espírito, o aproveitamento de todos os detalhes, cada cousa em cada hora, o alimento intelectual o mais completo, dado na proporção da receptividade psicológica” (CAETANO DE CAMPOS apud CARVALHO, 2003, p. 25-26). Para o entendimento da produção desse espaço de formação prática de professores, que desde seu início contou com o apoio da sociedade campista- haja vista que a Escola Modelo iniciou com 7 alunas no mês de março de 1916, em abril já eram 24 e em dezembro 30, chegando a ter, em 1926, 163 alunas matriculadas e mais 90 aguardando vaga- é preciso nos remeter não somente às propostas da Profª de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal, mas às professoras primárias que acreditaram e se envolveram, por inteiro, na construção de uma escola que fosse o modelo para as demais. Modelo de escola primária onde as normalistas poderiam ver, na prática, as teorias e métodos que estudavam na Escola Normal. Esse é outro aspecto que merece nossa reflexão. A prática de ensino que se fazia na Escola Modelo “Seis de Março” era planejada minuciosamente e avaliada da mesma forma. Assim, podemos considerar, pela análise das fontes, que sua função formadora foi alcançada. A partir dessa constatação, a pesquisa nos levou a questionar parte da historiografia das escolas-modelo. De modo específico, a integrada pelo Prof. Lourenço Filho, crítico contumaz do projeto, ao qual se refere depreciativamente em seu artigo “Prática de Ensino”, publicado originalmente nos Arquivos do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, em 1945, e republicado em 2001, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP). Consideramos que, pelo menos durante o período em que a Profª Antonia Lopes esteve à frente da cadeira de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal, e a Profª Consuelo Manhães, da direção da Escola Modelo “Seis de Março”- de 1919 a 1929- aproximadamente, a prática de ensino se constituiu num momento importante e, certamente, contribuiu como parte da cultura de formação de professores no Brasil. Em que a Escola Modelo “Seis de Março” foi realmente modelo?
Essa indagação foi feita no texto ao considerarmos as dificuldades por que passou, como escola sem prédio próprio, abrigada em duas salas da Escola Normal. A respeito, concluímos que essas dificuldades devem ser valorizadas, pois contribuem para que se entenda a força desse modelo de formação de professores e de constituição de identidades profissionais, na Primeira República. Assim, concluímos que a Escola Modelo “Seis de Março” foi modelo, sim, de escola elementar que conseguiu ser de qualidade para sua época. Qualidade que se evidenciou na luta de diretores para mantê-la funcionando junto à Escola Normal- no espaço simbolicamente privilegiado do Liceu de Humanidades-, na procura por vagas, na escolha criteriosa de professoras, no prestígio que angariou na sociedade campista. Ter sido professora da Escola Modelo representou um nível de prestígio profissional que se estendeu além da extinção da experiência anexa à Escola Normal de Campos. O trabalho que ali se realizou amalgamou, naquelas professoras, um corpo de normas e saberes que pode explicar por que o projeto foi vitorioso, mesmo diante das adversidades. O “Decálogo Pedagógico” posto na parede da sala de aula é a síntese simbólica dessa construção de subjetividades. “PROFESSOR, I. II. III. IV. V. VI. VII. VIII. IX. X.
Conservai-vos sempre calmo durante a aula Esforçai-vos para conhecer o caracter dos vossos alumnos Sede Justo, sincero e imparcial Fazei com que a criança reconheça as próprias faltas Reflecti antes de agir Aconselhae com calma e naturalidade Despertae e exercitae a intelligencia, o sentimento e a vontade dos alumnos Ensinae o que a criança pode assimilar Começae a ensinar do conhecido da criança, não do vosso A caminho da escola pensae nos alumnos e armae-vos de paciencia” Não estava na parede para disfarçar uma realidade, mas como um espelho no qual a
professora se via, se refletia.
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FONTES 1- DOCUMENTAIS
1.1 Legislação: Decreto nº 1241, de 13 de março de 1912. Expediente de 16 de março de 1912. Lei nº 1224, de 6 de março de 1914. Expediente de 11 de março de 1914. Lei nº 1229, de 18 de janeiro de 1915. Expediente de 22 de janeiro de 1915. Decreto 1420, de 13 de abril de 1915. Expediente de 15 de abril de 1915. Decreto nº 1468, de 7 de fevereiro de 1916. Expediente de 10 de fevereiro de 1916. Lei nº 1317 de 17 de outubro de 1916. In: Carneiro, Marilia B. S. Atos e Fatos da Antiga Campos.Zé Garoto: União A Gaivota Dados Editora,1985. Edição pelo Sesquicentenário de Campos. Decreto Estadual nº 2571, de 22 de abril de 1931. Expediente do dia 23 de abril de 1931. Decreto 2676, de 17 de novembro de 1931 (D. O. 17 de novembro de 1931) e Anexo (D.O. de 18 de novembro de 1931).
1.2 Principais documentos localizados no Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos Correspondências trocadas entre Diretor do Liceu e Diretora do Grupo Escolar “João Clapp” sobre assuntos diversos: 1915. Ofício da Diretoria de Higiene e Assistência Pública Municipal de Campos. 3 de agosto de 1915. Contrato para reforma e adaptação de uma sala do Liceu de Humanidades de Campos para a Escola Modelo-1915. Ofícios autorizando compra de mobiliário e material diverso: 1915, 1918. Quadro de freqüência do Corpo Docente da “Escola Complementar João Clapp” em 1916 Termos de Exames de Alunas da Escola Modelo “Seis de Março” em 1917. Programas das cadeiras de Pedagogia e Metodologia. 1918, 1920, 1927.
Livros de Termos de Posse e Exercício de Professores e Funcionários do Liceu, Escola Normal, Escola Modelo. 1918;1931. Modelo de “Diário de Classe” elaborado para aula prática de normalista na Escola Modelo “Seis de Março”, 1919. Correspondência da Profª de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos aos Diretores da Escola Normal, vários anos. Inventários do material existente na Escola Modelo “Seis de Março” em 1919 e em 1926 feitos pelas Diretoras da Escola. Termos de Visitas do Inspetor Escolar do Estado à Escola Modelo “Seis de Março”- 1919 e 1923. Ofícios vários com Pedidos de Professoras para a Escola Modelo- Diretor do Liceu e Escola Normal e Diretor de Instrução; Inspetor de Instrução Pública- 1925. Processos da Secretaria de Estado do Interior e Justiça- Directoria de Instrucção Publica, datado de 1927, sobre pedido de matrícula na Escola Modelo Seis de Março. Correspondência entre a Directoria de Negocios do Interior e Justiça do Estado do Rio de Janeiro, entre o Diretor de Instrucção Publica e o Diretor do Liceu e Escola Normal, várias datas. Modelo da Caderneta Escolar usada pelas alunas da Escola Normal de Campos em suas aulas práticas-1927. Mapas de freqüência de Professoras da Escola Modelo “Seis de Março”- 1931. Ficha Funcional da Profª de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos, 1933. Ofício no qual o Diretor do Liceu de Humanidades e Escola Normal de Campos, Manoel Martins Manhães pede a saída da Escola Modelo “Seis de Março” do prédio do Liceu, 1932. Relatórios de Diretores da Escola Normal e Liceu de Humanidades de Campos à Diretoria de Instrução Pública: 1914, 1916, 1924, 1925. Citados como: (CASTRO FARIA,1916). (VASCONCELLOS, 1914). (VASCONCELLOS, 1924). (VASCONCELLOS, 1925). Relatório da Profª de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos ao Diretor do Liceu e Escola Normal- 1927. Citado como: (LOPES, 1927b). Relatório da Diretora da Escola Modelo “Seis de Março” ao Diretor do Liceu e Escola Normal- 1927. Citado como: (MANHÃES, 1927).
Relatórios de seis professoras da Escola Modelo dirigidos à Diretora da mesma- 1927. Citados como: (CARVALHO, I.,1927).- Isolina de Carvalho. (CASTRO,1927). Laudelina de Castro. (CHÁCAR,1927). Faride Miguel Chácar. (LANDIM,1927). Mercedes Sodré Ferreira Landim. (LOPES,J.,1927). Josepha Carvalho Lopes. (NUNES,1927). Odysséa Nunes Ofício de 6 de abril de 1932, do Diretor em exercício do Liceu e Escola Normal , Manoel Martins Manhães, ao Diretor de Instrução Pública. Citado como (MANHÃES, M., 1932). 1.3 Documentos localizados na Biblioteca Municipal Nilo Peçanha. Campos dos Goytacazes/RJ Revista Pérola do Sul, de 1912 Annuario Campista 1920. Diário Oficial de 17 de novembro de 1931. Diário Oficial do dia 2 de abril de 1932. Jornal Vida Fluminense, anno I, 1/8/1932. Boletim Bibliographico e Commercial do “Ao Livro Verde”, agosto de 1934. Artigo “Campos no Magistério” de Álvaro Barcelos, 1965. Boletim do Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos, Números 1, 2 (1981); número 4 (1983). Artigo “O Ciclo Nobiliárquico do Solar”, por Barbosa Guerra, 192.. 1.4 Documentos localizados no Arquivo Público do Rio de Janeiro Mapas Estatísticos da Escola Modelo “Seis de Março” do ano de 1931- até o mês de outubro. Mapas de 1934, 1939 e 1942 sobre o Jardim de Infância que nasceu anexo à Escola Modelo. 1.5 Documentos localizados no Arquivo Público Municipal de Campos dos Goytacazes Jornal Folha do Commercio (Anno 6), 1914. 1.6 Documento encontrado no relatório de estágio dos alunos de licenciatura da UENF, feito no Colégio Estadual João Pessoa no segundo semestre de 2001, diz que a Escola Modelo anexa à Escola Normal do Liceu de Humanidades de Campos foi transformada no Grupo Escolar João Pessoa, em 1931. Diz, ainda, que, com a cheia do rio Paraíba do Sul, em janeiro de 1966, uma das maiores enchentes acontecidas na cidade, a escola foi inundada e perdeu quase todo o seu arquivo permanente e bens materiais. 1.7 Jornais
Monitor Campista, vários anos. Jornal do Commercio, 1914. O Diário, Campos dos Goytacazes, 30 de outubro de 2005. 2- ORAIS As entrevistas assinaladas com um * encontram-se arquivadas no Núcleo de História Oral (NuHo) da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) e foram realizadas para a pesquisa “História das Instituições Escolares no Norte Fluminense”, do Laboratório de Estudos de Educação e Linguagem (LEEL) da UENF. As demais foram feitas especificamente para a pesquisa sobre a Escola Modelo “Seis de Março”. 1. Dr. Décio Ferreira Cretton, ex-diretor do Liceu de Humanidades e da Escola Normal de Campos (depoimento oral, 2001). Citado como (CRETTON, 2001b).* 2. Profª e Assistente Social Conceição de Maria Costa Muniz; filha de Dona Teresa, Profª da Escola Modelo “Seis de Março” (depoimento oral, 2001). Citada como (MUNIZ, 2001).* 3. Profª Gilda Duncan Tavares, ex-aluna da Escola Normal de Campos (depoimento oral, 2001). Citada como (TAVARES, 2001).* 4. Srª Yêdda Ferreira Paes Ribeiro, ex-aluna do Instituto Claparède, em Campos (depoimento oral, 2001).* 5. Srª Mirtô Barroso Barbosa Leite, ex-aluna do Instituto Claparède, em Campos, (depoimento oral, 2001).* 6. Professora Aldarina da Penha Carneiro, ex-aluna Escola Normal de Campos; exdiretora do Jardim de Infância Antônia Lopes (depoimento oral, 2002). Citada como CARNEIRO, A., 2002).* 7. Professora Stella Muylaert Tinoco Dias, ex-aluna da Escola Modelo “Seis de Março” e da Escola Normal de Campos (depoimento oral, 2005). Citada como (DIAS, 2005). 8. Dr. Admardo Peixoto, ex-aluno do Grupo Escolar João Clapp e do Liceu de Humanidades de Campos (depoimento oral, 2005).* 9. Profª Judith de Almeida Carvalho, ex-aluna do Grupo Escolar João Clapp (depoimento oral, 2005). Citada como (CARVALHO, J., 2005).
10. Profª Isolina Carvalho Sampaio, ex-aluna da Escola Modelo “Seis de Março” (depoimento oral, 2005). 11. Srª Ilce Cunha, ex-aluna da Escola Modelo “Seis de Março” (depoimento oral, 2005). 12. Srª Rosane Carneiro Motta (depoimento oral, 2005). Citada como (MOTTA, 2005). 3- ICONOGRÁFICAS -Fotografia da Professora Antonia Ribeiro de Castro Lopes (arquivo familiar). -Fotografia da Professora Stella Muylaert Tinoco Dias (tirada para a pesquisa, em Janeiro de 2005). -Fotografia de Maria Teresa da Costa Muniz (arquivo familiar). -Fotografia de Mercedes Sodré Ferreira Landim (arquivo familiar). -Fotografia de Consuelo de Almeida Manhães (arquivo familiar). -Fotografia do Espaço onde funcionou a Escola Modelo (tirada para a pesquisa no ano de 2004). -Postal da fachada do Liceu de Humanidades de Campos, s.d. Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. -Esboço de planta baixa da parte dos fundos do prédio do Liceu de Humanidades de Campos. Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos.
FIG.14-.Manual de Pedagogia usado na Escola Normal de Campos (1927). LOPES, Antonia Ribeiro de Castro. Synopse de Pedagogia e Methodologia Didactica. Campos: Typ. A Pena de Bronze, 1927. Biblioteca Central do Gragoatá. Universidade Federal Fluminense. Fotografia do original.
FIG.15-“Caderneta de Prática Escolar” usada pelas alunas da Escola Normal de Campos, 192... Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos Fotografia de original.
FIG.12- Livros didáticos usados na Escola Modelo “Seis de Março”. Fontes: Inventários da Escola Modelo “Seis de Março” dos anos de 1919 e 1926; Biblioteca da Universidade Federal Fluminense. Reprodução escaneada.
FIG.13- Antonia Ribeiro de Castro Lopes, Profª de Pedagogia e Metodologia da Escola Normal de Campos (1919-1936) e Consuelo de Almeida Manhães, Diretora da Escola Modelo “Seis de Março” (1919-1928)
Antonia Lopes
Consuelo Consuelo Manhães Manhães
FIG.10- Fotos de Maria Teresa da Costa Muniz, professora da Escola Modelo “Seis de Março”, e de Mercedes Sodré Ferreira Landim, professora e última diretora dessa Escola. Arquivo das famílias. f amílias. Reprodução escaneada.
Mari Mariaa Tere Teresa sa da Co Cost staa Muni Munizz
Merced Mercedes es Sodré Sodré Ferrei Ferreira ra Landim Landim
FIG.3- Página do Diário Oficial do dia 18 de novembro de 1931, p. 3, com a “Tabela das novas designações de Grupos Escolares” (Decreto n. 2.676, de 17 de Novembro de 1931). Biblioteca Municipal Nilo Peçanha, Campos dos Goytacazes, 2005. Fotografia do original.
FIG.11- Material usado usado na Prática de Ensino Ensino da Escola Normal de Campos. Campos. Modelo de “Diário de Classe” organizado pela normalista Maria Carlota Baptista Tavares, em maio de 1919. Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Fotografia do original.
FIG.6- Cartão Postal do “Liceu de Humanidades de Campos”, s.d. Reprodução escaneada de documento do Arquivo Histórico do Liceu.
FIG.6-Fundos do edifício do Liceu de Humanidades, onde se localizava a Escola Modelo “Seis de Março”. Fotografia tirada em 2004. Arquivo da pesquisa.
FIG.16- Comunicação feita, ao Diretor da Escola Normal, pela Profª Antônia Lopes sobre a realização de “Excursão Pedagógica” (1920). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada.
FIG.17- Documento no qual a Profª Antônia Lopes solicita o material necessário ao estudo das “Lições de Coisas” (1916). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada. escaneada.
FIG.9-Relação de material recebido pela Escola Modelo “Seis de Março”, da Comissão de Compras do Estado do Rio de Janeiro (1925). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada. escaneada.
FIG.5- Documento que autoriza a aquisição de mobiliário para a Escola Modelo. 1916. Reprodução escaneada.
FIG.2-Rascunho de documento no qual o Diretor da Escola Normal de Campos solicita a saída da Escola Modelo das salas da Escola Normal (1932). Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada.
FIG.1-Fotografia de “Antônio Joaquim de Castro Faria” e de “Sebastião Viveiros de Vasconcellos”, Diretores da Escola Normal e Liceu de Campos. Ambos defenderam a instalação de uma escola de aplicação anexa à Escola Normal de Campos. Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos. Reprodução escaneada de fotos de jornais.
Antônio Joaquim de Castro Faria
FIG.4- Contrato para realização de obras de adaptação de sala da Escola Normal para receber a Escola Modelo, 1916
FIG.8- Profª Stella Muylaert Tinoco Dias, ex-aluna da Escola Modelo “Seis de Março” e da Escola Normal de Campos, em visita às antigas dependências da Escola Modelo, em 2005. Arquivo da pesquisa.
FIG.7-Esboço da parte dos fundos do Solar do Liceu. Reprodução sobre planta do Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos