1 Kai Ambos
DIREITO PENAL DO INIMIGO* CRIMINAL LAW FOR THE ENEMY
Kai Ambos Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Göttingen, Alemanha.
Tradução: Pablo Rodrigo Alflen+
Resumo: O presente trabalho constata, após uma aproximação histórica ao conceito de inimigo, que o discurso de Jakobs passou de uma mera descrição a um programa político-criminal no qual reside o aspecto alarmante e perigoso da doutrina. Assim, o autor contrapõe ao modelo de Jakobs o modelo de um direito penal adequado ao ser humano que, apesar de não ser novo, volta a ser importante. Palavras-chave: Direito penal do inimigo; Direito penal do ser humano; Contramodelo. Abstract: The present work notices after a historical approximation to the concept of enemy that the discourse of Jakobs crossed over from a mere description to a political-criminal program in which resides the dangerous and alarming aspect of the Jakobs’ doctrine. Thus, the author confront to the Jakobs’ model the model of a criminal law adequate to the human being which one, in spite to not being new, stills important. Keywords: Criminal law for the enemy; Criminal law for the human being; Contramodel.
Introdução A retomada do direito penal do inimigo por parte de Günter Jakobs tem gerado ondas altíssimas não só no debate jurídico-penal de língua alemã, senão, *
Título original: «Feindstrafrecht», publicado na “Schweizerische Zeitschrift für Strafrecht”, tomo 124 (2006), 1-30: publicado em espanhol em Cancio Meliá/Gómez-Jara Díez (coord.), Derecho penal del enemigo. El discurso penal de la exclusión, Madrid/Buenos Aires 2006, vol. 1, p. 119-162. Agradeço ao ajudante científico Sr. Nils Meyer-Abich pelo importante auxílio prestado na coleta de materiais e pela conformação do artigo original; tradução do original de Carlos Gómez-Jara Díez. Atualização e revisão pelo autor, com a colaboração de Miguel Lamadrid, doutorando pela Universidade Pompeu Fabra e bolsista do DAAD no Departamento de Direito Penal Estrangeiro e Internacional do Instituto de Ciências Criminais da Universidade de Göttingen. Todas as traduções do original alemão são de Gómez-Jara, de Lamadrid ou do próprio autor. Tradução da versão espanhola atualizada ao português. + Professor da Universidade Luterana do Brasil.
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principalmente, de língua espanhola, portuguesa e italiana1. Como ocorre de forma tão habitual, o pensamento de Jakobs tem sido introduzido rapidamente por seus talentosos discípulos nos países dominantes do âmbito jurídico da Europa continental – o chamado “direito continental”. Na versão espanhola de minha “Parte general del Derecho penal internacional”, já havia me pronunciado sobre as novas teses de Jakobs, afirmando que: “Prescindindo de que tal concepção dificilmente possa se mover hoje no terreno de nossa ordem constitucional, centrado na dignidade humana, é mais preocupante o fato de que possa conceder a futuros regimes injustos, uma legitimação teórica, pense-se só na propagação em massa das teses jakobsianas no ambiente latino-americano.”2 “Trata-se (…) de estar conscientes e atentos frente à periculosidade intrínseca de uma concepção que, segundo seu próprio autor, de um mero instrumento de análise crítica do estado do direito penal, foi radicalizada e convertida em uma concepção que não se limita mais à mera descrição, senão que, ao contrário, postula e exige a exclusão e marginalização dos inimigos do sistema (dominante), o qual pode perfeitamente servir como base teórica ou fundamentação de um regime (penal) de corte autoritário3. Esta volta da concepção de Jakobs do direito penal do inimigo não foi percebida nem sequer por todos seus discípulos (…) e não pode ser defendida invocando simplesmente os méritos da concepção global do citado pensador. Enfim, o que merece ser criticado na nova posição de Jakobs é sua ambigüidade até mesmo na utilização de certos termos, uma ambigüidade que pode dar lugar a abusos.”4 Continuo considerando que esta crítica, de cuja essência compartilham vários autores5, é correta. No entanto, agora considero que deve distinguir-se entre a 1
Sobre o italiano “diritto penale da emergenza” Donini, in: Terradillos Basoco/Acale Sánchez, Temas, p. 214 s. com outras indicações; o mesmo, El Derecho penal frente al “enemigo” in Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 603-684; Cornacchia, La moderna hostis iudicatio. Entre norma y Estado de excepción, in: ibidem, p. 415-456; Manna, Erosión de las garantías individuales en nombre de la eficacia de la acción de lucha contra el terrorismo: la privacy, in: ibidem, p. 257-298; Moccia, Seguridad y sistema penal, in ibid., p. 299-320; Resta, Enemigos y criminales. Las lógicas del control, in ibidem, p.735-780. 2 Ambos, Parte General, p. 57. 3 Criticando esta afirmação Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 202 ss. Segundo este autor “as considerações de Jakobs são … descritivas de uma realidade existente, feitas por um observador que não modifica substancialmente o objeto de valoração … passa por alto que qualquer norma, inclusive a –aparente, formal, materialmente – mais garantista e democrática de todas é, nas mãos de um insensato, de um corrupto ou ditador, absolutamente manipulável”. Veja também Pastor, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 515: “…as idéias de um professor não tem na prática um poder tão grande, como o que na discussão se atribui, de legitimar ou de deixar de legitimar de forma tão contundente preceitos e usos penais” (no mesmo sentido a citação infra nota 178). 4 Ambos, Parte General, p. 58. 5 Conforme Muñoz Conde, in: Losano/Muñoz Conde, Globalización, p. 161, 170 ss.; fundamentalmente idêntico idem, RECJ Nr. 2/2005, 22 ss.; idem, RP 16 (2005), 123 ss.; Demetrio Crespo, RDPC 14 (2004), 88 ss., 109 (= in: Fernando Pérez Álvarez (ed.), Serta in memoriam Alessandro Baratta, p. 1027-1054, 2004, NDP 2004/A, p. 47-76); idem, ZIS 2006, p. 433 ss; Velásquez, RDPC 15 (2005), 215; Aponte, Feindstrafrecht, p. 126 ss. (131, 134 s.); idem, Guerra, p. 210 ss; Portilla Contreras, JpD 49 (2004), 43 ss. = FS Bacigalupo, tomo 1, p. 693 ss.; Greco, GA 2006, 113; Feijóo Sánchez, Derecho Penal Contemporáneo (DPC) 2006, p. 134 ss; Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 132; Mir Puig, Homenaje Rodríguez Mourullo, p. 675; Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 45 ss.; Gössel, FS Schroeder, 33 ss.; Streng, in Uwer, Ruhe, 244 ss.; Schneider/Morguet, in Uwer, Ruhe, 335 ss.; Albrecht, ZStW 117 (2005), 856 ss.; Kindhäuser, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 159 ss.; Lascano,in: ibidem, p. 204 ss. 218;
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aplicação do direito penal do inimigo como categoria analítico-descritiva para criticar o direito penal expansivo6 de caráter nacional e internacional e sua postulação e legitimação no sentido de um programa político-criminal7. A Jakobs só se pode reprovar o último na qualidade de protagonista da discussão atual. Portanto, no que segue me proponho demonstrar – depois de uma aproximação histórica ao conceito de inimigo (infra I) – que o discurso de Jakobs passou de uma mera descrição a um programa político-criminal (especialmente infra II.2.b)) e que é nesse ponto em que reside o aspecto alarmante e perigoso (II.). A isso lhe contraponho o modelo de um direito penal adequado ao ser humano, que apesar de não ser novo, volta a ser importante. 1. O inimigo – uma aproximação ao conceito 1.1. O inimigo na filosofia do direito e do Estado Em seus escritos sobre o Estado ideal, Aristóteles exige que suas cidades se preparem para tempos de guerra e para tempos de paz. Deve-se evitar que os inimigos conquistem a cidade e isso através de mecanismos reforçados e zonas e formas de construção de difícil acesso8. Quando trata o tema do inimigo externo, as reflexões de Aristóteles sobre aqueles cidadãos do Estado que «deveriam ter se comportado como as partes de um todo ao qual pertencem» fazem referência ao inimigo interno: aquele que não pode ou não deve viver em comunidade não é «membro do Estado e portanto nem um animal, nem um Deus»9. Mais claro ainda se manifesta Zeus a Hermes no mito de Prometeo: «a quem não pode fazer seus os costumes e o direito, pode-se matar como se mata a um membro enfermo do Estado»10. Cícero, ao contrário, adverte sobre somente levar em consideração os conterrâneos e não os estrangeiros; e isso devido ao fato de que, nesse caso, a sociedade comum ao gênero humano desaparece e com ela «o bem fazer, a generosidade, a bondade, e a justiça»11. Não obstante, este ideal de respeito mútuo referido ao estrangeiro tem certos limites em relação aos inimigos: «se um bom homem pudesse roubar as roupas do cruel e desumano tirano Parláis para não morrer de frio, ¿não o faria?»12. O próprio Cícero proporciona a resposta a esta pergunta retórica; assim, não o considera reprovável quando o bem social restringe os direitos «de quem não resulta de modo algum como útil»13. Mais ainda: neste Modolell in: ibidem, p. 333; Müssig in: ibidem, p.371; Sacher, ZStW 118 (2006), p 606-610; mostra-se igualmente crítico o discípulo e tradutor de Jakobs Cancio, DPC 2003, 39 ss.; idem, ZStW 117 (2005), 282 ss. No entanto, há também autores que tratam de “salvar” a Jakobs, veja por exemplo Aponte, in Uwer, Ruhe, 131 ss. com referência à várias conferências de Jakobs na Colômbia, nem todas publicadas; Zaffaroni, El enemigo, p. 155 ss. Por último estão os férreos defensores ver Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 187 ss. 6 Fundamental Silva Sánchez, Expansión. 7 Sobre a instrutiva distinção de Greco (GA 2006, 102 s.) entre um conceito de Direito penal do inimigo descritivo que denuncia criticamente e um legitimador afirmante veja infra nota 142 e o texto correspondente. 8 Aristoteles, Politik, n.m. 1330 b-1331 a, p. 260 ss. 9 Aristoteles, Politik, n.m. 1253 a, p. 5. 10 Platon, Protagoras/Theaitetos, p. 26. 11 Cicero, Vom rechten Handeln, III, § 28 s., p. 139 s.; p. 140: posto que assim se destruiria a sociedade humana, que se baseia na idéia de que resulta preferível lesionar-se corporal ou espiritualmente do que restringir os direitos de outro para o próprio bem. 12 Cicero, Vom rechten Handeln, III, § 29, p. 140. 13 Cicero, Vom rechten Handeln, III, § 30, p. 140.
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âmbito resultam necessárias a separação e a exclusão: “Com tiranos não existe sociedade alguma, senão a mais enérgica das separações e não é contrário à natureza roubar a quem é honroso matar. Toda esta estirpe que traz consigo a desgraça e encontra-se afastada de Deus, deve ser excluída da comunidade dos seres humanos, pois do mesmo modo que algumas partes do corpo tem que ser amputadas quando elas mesmas perdem o sangue e de certa forma o sopro da vida, prejudicando às demais partes do corpo, assim mesmo esta bestialização com forma humana, este monstro horroroso, deve ser excluído da comum humanidade do corpo”14. Também no Digesto15 se distingue entre inimigos externos e internos: inimigos são aqueles com os quais entramos em guerra; via de regra, ladrões e piratas16. Também é inimigo aquele que, com má intenção e espírito traiçoeiro, abandona a pátria17; mas não o é, no entanto, aquele com o qual existe uma relação de amizade, hospitalidade ou análogas18. Para Locke, a violência de um membro da, em si mesma, “pacífica” comunidade natural19 conduz ao estado de guerra20, o qual anula todas as obrigações fundamentadas no contrato social e outorga a cada indivíduo o direito de opor-se ao agressor.21 Locke diferencia entre este estado de guerra limitado que se desencadeia mediante uma violação da lei e a rebelião contra a ordem estabelecida22. Enquanto neste caso depende de em que medida a autoridade estatal tem provocado a rebelião23, no estado de guerra é “razoável e justo que eu tenha o direito de eliminar aquele que ameaça me eliminar. Posto que, assim como a lei fundamental da natureza é a de que a humanidade perdure tanto quanto seja possível, deve preferir-se a segurança do inocente quando não puder perdurar a segurança de todos”. Ao homem que declara guerra a outro, se deve matar assim como a um animal carnívoro, posto que “este tipo de seres humanos não estão vinculados mediante a lei comum da razão, e não conhecem outras regras que não sejam as da força bruta
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Cicero, Vom rechten Handeln, III, § 32, p. 141; lat.: De officiis, III, § 32, p. 106-107: “Etenim ut membra quaedam amputantur, si et ipsa sanguine et tamquam spiritu carere coeperunt, et nocent reliquis partibus corporis, sic ista in figura hominis feritas et inmanitas beluae a communi tamquam humanitate corporis segreganda est.” 15 Parte central do Corpus Iuris Civiles, compêndio dos escritos dos juristas clássicos a respeito do Direito romano, conforme Wesel, 1997, p. 157 s. 16 Pomponius, Dig. L, 16, 118 (citado segundo a edição de Mommsen, Corpus Iuris Civiles, n.m. 943, 18):“Hostes hi sunt, qui nobis aut quibus nos publice bellum decrevimos: ceteri latrones aut praedores sunt”; Cfe. Ulpianus, Dig. XLIX, 15, 24 (ibidem, n.m. 892, 5); Gaius, Dig. L, 16, 234 (ibid., n.m. 954, 28): “Quos nos hostes apellamus, eos veteres perduelles apellabant, per eam adiectionem iudicantes, cum quibus bellum esset.” 17 Paulus, Dig. XLIX, 15, 19 (segundo Mommsen, CIC, n.m. 890, 18): “qui malo consilio et proditoris animo patriam reliquit, hostium numero habendus est.” 18 Pomponius, Dig. XLIX, 15, 5 (según Mommsen, CIC, n.m. 886, 10): “In pace quoque postliminium datum est: nam si cum gente aliqua neque amicitiam neque hospitium neque foedus amicitiae causa factum habemus, hi hostes quidem non sunt.” 19 Locke, Abhandlungen, II, §§ 95 ss., p. 260 ss. 20 Locke, Abhandlungen, II, § 19, p. 211 que se afasta expressamente do estado de natureza em paz. 21 Locke, Abhandlungen, II, § 232, p. 345. 22 Locke, Abhandlungen, II, § 17 s, p. 210 s. 23 Locke, Abhandlungen, II, § 18, p. 211.
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e da violência. Portanto, deve-se-lhes tratar como a animais carnívoros, como a qualquer criatura perigosa e lesiva que aniquila alguém quando cai em seu poder” 24. Enquanto que neste ponto se trata da vida em comum de uns cidadãos com os outros e da exclusão daqueles que abandonam o pacífico estado natural – e que portanto devem ser tratados como animais carnívoros – em outro lugar Locke se refere à vulneração dos direitos políticos e ao conseqüente direito de resistência do povo25 frente ao inimigo comum: “Quem usurpa violentamente, quer seja senhor ou súdito, os direitos do príncipe ou do povo, que conduzam a um golpe de estado à constituição e à totalidade da estrutura de um governo justo, é culpado pelo pior dos delitos que, na minha opinião, um homem pode cometer. Deve responder por todos os males de derramamento de sangue, roubos e devastação que provoca em um país a destruição do governo. E quem se comporta desta maneira é considerado, com razão, como o inimigo comum, como parasita da humanidade e deve ser tratado, em correspondência, como tal”26. Na concepção de Rousseau – que se fundamenta igualmente no contrato social –, o homem que vive na comunidade política tem deveres como súdito e direitos como cidadão27. Converte-se em inimigo aquele que só persegue sua própria ambição de poder e posse, menosprezando, com isso, as normas sociais e, desta forma, o bemestar dos demais28. A ruptura do contrato social eqüivale à renúncia as qualidades relativas à pessoa moral e representa uma traição à pátria: “À medida que infringe suas leis, deixa de ser um membro desta e lhe faz guerra. (…) Ao culpável se lhe deixa morrer mais por inimigo do que por cidadão” 29. Como tal não “é uma pessoa moral, é um indivíduo e neste caso constitui um direito de guerra matar ao derrotado” 30. A ruptura do contrato social e a conseqüente exclusão de quem o rompe como inimigo interno deve diferenciar-se da situação de guerra entre dois Estados, na qual os soldados se enfrentam a limine como inimigos31, porém somente enquanto dure a guerra: “à medida em que se depõem 24
Locke, Abhandlungen, II, § 16, p. 209 s., conforme também ibidem, § 19, p. 211, segundo o qual também a morte de um agressor poderia justificar-se, posto que este não proporciona a segurança de que se possa viver; pelo contrário, ao ladrão só “se deve lesionar apelando à lei”. Em outro lugar (ibidem, § 18, p. 210 s.) Locke fala da morte legítima de um ladrão que intenta “atrair para seu domínio uma vítima utilizando a violência para privá-la (…) de seu dinheiro”. Isso só resulta coerente se se considera que o furto com violência se converta em roubo. Uma análise da legítima defesa contra inimigos em Locke encontramos em Palermo in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 454 ss. 25 Locke, Abhandlungen, II, §§ 232 ss., p. 345 ss. 26 Locke, Abhandlungen, II, § 230, p. 344 (grifo do autor). 27 Rousseau, Staat, p. 30; conforme Pérez del Valle, Estudios, p. 57. 28 Conforme Pérez del Valle, Estudios , p. 61. 29 Rousseau, Staat, p. 33 (grifo de K.A.). Zaffaroni, El enemigo, p. 120 y 121 coloca em evidência a contradição de Rousseau em sua obra já que no capítulo IV do livro I afirma que “um Estado não pode ter por inimigo senão a outro Estado, e não a homens, pois não podem estabelecer-se verdadeiras relações entre coisas de natureza diversa”. 30 Rousseau, Staat, p. 34; em outro lugar (ibidem, p. 14 s.) Rousseau se expressa de maneira crítica e nega tal direito; conforme Brandt, Rousseaus Philosophie, p. 87. O fato de que se trata de uma chamada ao direito penal ou de uma justificação fundamental da pena de morte é controvertido; conforme Pérez del Valle, Estudios, p. 58. 31 Conforme Rousseau, Staat, p. 14, esta é a única possibilidade na qual os seres humanos podem opor-se entre si como inimigos; nem no estado de natureza, nem no estado de sociedade são os seres humanos, inimigos.
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[as armas] e se entregam, convertem-se novamente em homens por antonomásia – dado que já não são nem inimigos, nem instrumentos dos inimigos”32. A exclusão do inimigo fundamentada no contrato social se converte em manifesto político da revolução francesa: “Depuis le peuple francais a manifesté sa volonté tout ce qui lui est opposé est hors le souverain; tout ce qui est hors le souverain est ennemi. (…) Entre la peuple et ses ennemis il n´y a plus rien de commun que le glaive.”33 Também merecem ser mencionados Hobbes e Fichte, os quais partem – assim como Locke e Rousseau sobre a base do contrato social – de uma recaída no estado de natureza, quando se produzem delitos qualificados como a rebelião etc. Como conseqüência disso não se castiga a um súdito, senão a um inimigo (Hobbes)34, isto é, ao autor se lhe proclama como “uma coisa, um pedaço do rebanho” e se lhe relega ao estado da proscrição (Fichte), que autoriza qualquer um – não só ao Estado – a “prendê-lo, torturá-lo e matá-lo arbitrariamente”35. De maneira similar, segundo Kant36, pode-se tratar como inimigo o homem ou o povo em estado de natureza que através da falta presumida da Lei deste estado representam uma ameaça37. No entanto, não se deve perder de vista que para filósofos do iluminismo como Kant o conceito de inimigo foi estreitamente vinculado à doutrina da guerra justa.38 A compreensão moderna do conceito de inimigo, de cunho jurídico, deve vincular-se decididamente a Carl Schmitt39. Para Schmitt o inimigo é a medida central, poder definitório e essência do político: “Todo antagonismo ou oposição religiosa, moral, econômica, étnica ou de qualquer classe se transforma em oposição política quando ganha força suficiente para agrupar de um modo efetivo os homens em amigos e inimigos” 40. O inimigo não constitui um contrário geral ou privado no sentido de um competidor ou um antagonista; este somente o é o inimigo aberto: “Hostis is est cum quo publice bellum habemus”41. “Existencialmente” o inimigo é, “em um sentido especialmente 32
Rousseau, Staat, p. 15. Notícia do Comité de salut public, Rapport del 10 de octubre de 1793: Choix de rapports etc. Paris 1818 ss, T. XIII, p. 119, citado conforme Friesenhahn, Der politische Eid, p. 16 [Em francês no original: NT]. 34 Hobbes, Leviathan, 28. Kap, p. 242; idem, Vom Menschen, II., Kap. 14, par. 22, p. 233. Sobre Hobbes neste contexto, porém crítico, Bung, in Uwer, Ruhe, 265 s. 35 Fichte, Grundlage des Naturrechts, p. 272: “não se pode aduzir causa alguma sobre a base dos direitos externos do porquê deste não poder tomar o primeiro que mais lhe agrade e torturá-lo e matálo arbitrariamente; porém tampouco existe motivo para fazê-lo”. Sobre Fichte neste contexto, porém crítico Frommel, in Uwer, Ruhe, 62 ss. 36 Kant, Frieden, 2.ª parte com nota p. 24. 37 Sobre estes autores Jakobs, HRRS 3/2004, 89 ss. (= Ritsumeikan Law Review 21 (2004), 93-107 e in: Jakobs/Cancio, Enemigo, 19-56); Gracia Martín, RECPC 07-02 (2005), 13 ss. 38 Conforme Schünemann, FS Nehm, 222 s. para quem, por esta razão, a posição de Kant não pode ser invocada como justificação de um direito penal do inimigo. De modo similar Bung, iin Uwer, Ruhe, 263; Albrecht, ZStW 117 (2005), 857 s. 39 Sobre seu significado para a ideologia nacional-socialista veja, crítico, Rüthers, Entartetes Recht, p. 101-180 com outras referências; sobre Schmitt neste contexto veja Uwer, in: Uwer, Ruhe, 41 ss.; Kaleck, in: Uwer, Ruhe, 290 ss.; Müssig, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 381 ss. 40 Schmitt, Begriff, p. 26 ss, 37 [El concepto de lo político, 1991, p. 67]. 41 Forcellini, Lexicon Totius Latinitatis III, 320 y 511, conforme a citação completa de Schmitt, Begriff, p. 29, nota 5, como sigue: “Hostis is est cum quo publice bellum habemus (…) in quo ab inimico 33
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intensivo, algo diferente e alheio”; com o inimigo podem dar-se conflitos “que não podem decidir-se nem mediante uma norma geral adotada com precedência, nem através da hipótese de um terceiro ‘indiferente’ e neste sentido ‘imparcial’”42. Enquanto que com o inimigo privado se pode acordar a paz43; a resposta que, em última instância, se pode dar ao inimigo público é sempre a guerra. Portanto, inimigo e luta não constituem de modo algum conceitos que pertencem a uma discussão puramente espiritual ou a uma luta simbólica: “Os conceitos de amigo, inimigo e luta adquirem seu sentido real pelo fato de que estão e se mantém em conexão com a possibilidade real de matar fisicamente. A guerra procede da inimizade, já que esta é uma negação ótica de um ser distinto. A guerra não é senão a realização extrema da inimizade”44. Portanto, a guerra deve continuar sendo uma possibilidade real “para que o conceito de inimigo tenha sentido”45, posto que tampouco “a guerra adquire seu sentido para referir-se a ideais ou normas jurídicas, senão para dirigir-se contra um inimigo real” 46 . Portanto, no sistema de Schmitt não há lugar para o “inimigo da humanidade” no sentido de Locke, posto que a humanidade e o agrupamento em amigos e inimigos se excluem mutuamente47. O conceito de humanidade implica um estado no qual desaparece “a distinção entre amigo e inimigo também pela mera eventualidade”48. Quem deva ser considerado no caso concreto como um inimigo, virá determinado, ao menos em situações críticas, pelo Estado49; isto é, por quem detenha o poder fático de decisão no Estado: o soberano50. 1.2. O inimigo na praxis política Até hoje, na prática política, a qualificação do contrário como “inimigo” serve para justificar qualquer forma de medidas repressivas, desde sanções econômicas até a guerra interna ou externa51. Na Alemanha a “justiça política”52 perseguiu a esquerda radical ou extrema no começo do século XX e durante a guerra fria dos anos 60, como inimigos do sistema differt, qui est is, quocum habemus privata odia. Distingui etiam sic possunt, ut inimicus sit qui nos odit; hostis qui oppugnat”. 42 Schmitt, Begriff, p. 27. 43 Schmitt, Begriff, p. 30. 44 Schmitt, Begriff, p. 33 [El concepto de lo político, 1991, p. 63]. 45 Schmitt, Begriff, p. 33. 46 Schmitt, Begriff, p. 50 s.; é através da guerra que o inimigo adquire o status de oponente e, com isso, a possibilidade de obter um acordo de paz ou a anistia, ibidem, p. 11, 46 ss.; veja também Schmitt, Partisanen, p. 87 (declaração de guerra como “Feind-Erklärung”), 91 (“…Unterscheidung der Feindschaft, die dem Kriege seinen Sinn und Charakter gibt”); de modo similar Schmitt, Feind, p. 82: “Der totale Krieg aber erhält seinen Sinn durch den totalen Feind”. Compare também a diferenciação de Rousseau, Staat und Gesellschaft, p. 14 s. 47 Schmitt, Begriff, p. 54 p. e p. 56: “A humanidade (…) é (…) um sistema de relações em indivíduos concretos que se converte em realidade quando se exclui a possibilidade real de uma luta e resulta impossível qualquer agrupamento de amigos e inimigos.” 48 Schmitt, Begriff, p. 54 e p. 55: neste sentido o conceito de humanidade é um “instrumento ideológico”; quem o utiliza quer defraudar. 49 Schmitt, Begriff, p. 46 s. 50 Conforme Schmitt, Politische Theologie, p. 11, 20; Schmitt, Partisanen, p. 87. 51 Conforme também Muñoz Conde, RECJ 2/2005, 17 ss.; Demetrio Crespo, RDPC 14 (2004), 90; Gracia Martín, RECPC 07-02 (2005), 3 s.; Zaffaroni, El enemigo, p. 147 ss. 52 Assim o famoso estudo de Otto Kirchheimer, Politische Justiz, Frankfurt 1981.
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(capitalista).53 Na Espanha de Franco, se denominava inimigo a quem permitia comunicar publicamente uma oposição ao regime franquista ou quem exigia direitos fundamentais54. Os militares argentinos, durante os anos da ditadura, qualificaram como inimigos – com base na doutrina da segurança nacional55 – aos “ideólogos que envenenam as almas de nossos jovens em nossas Universidades”56, e ameaçam com que “os inimigos destroçariam as almas dos argentinos”57. O antigo presidente de Ruanda, Jean Kambada, que em outras questões tem sido condenado por genocídio, aplaudia o trabalho de uma emissora de rádio que incentivava à persecução e morte de membros da tribo Tutsi e dos Humus moderados, como “arma imprescindível na luta contra o inimigo”58. Nos conflitos no e ao redor do Oriente Médio o conceito já se encontra desde há muito. Hamas estigmatiza o “inimigo sionista”59; o presidente da Palestina, Abbas, denomina a “Israel” 60 como Ariel Sharon o fazia com o antigo presidente da Palestina, “Arafat”61: como inimigo. No Islâ os inimigos são os não-crentes, que serão excluídos da Umma (comunidade).62 A mídia norte-americana qualifica os rebeldes iraquianos de “força inimiga” 63, e esta denomina a Bush como “inimigo do Islâ, inimigo de Alá, inimigo dos muçulmanos” 64. O próprio Bush tem estilizado habilmente o conceito de inimigo como conceito de luta desde o 11 de setembro de 2001: “We are the target of enemies who boast they want to kill: kill all Americans, kill all Jews and kill all Christians” 65. Em seu discurso à nação três dias antes do começo da guerra contra o Iraque, Bush declarou as possíveis conseqüências de continuar com uma política de paz como “destruction never before seen on this Herat” e justificou desta maneira o ataque preventivo: ao “evil man” ou a “Duch enemies” não se deve dar a oportunidade de atacar primeiro66. Recentemente Bush confirmava que “Against 53
Conforme Kaleck, in Uwer, Ruhe, p. 285 e ss. que, ademais, considera que a criminalização de movimentos de resistência ou protesto constitui uma prática do direito penal do inimigo (294 ss.). 54 Muñoz Conde, in: Losano/ Muñoz Conde, Globalización, p. 175; idem, RECJ 2/2005, 30. 55 A fundamentação teórica desta doutrina se pode remontar à Schmitt, Partisanen, p. 30, 40 ss., 85 s. e passim, quando ele caracteriza o guerrilheiro como combatente irregular e ilegítimo, como “Träger der absoluten Feindschaft” [“portador da inimizade absoluta”, N.T.] (91) que pode ser combatido somente “na forma de guerrilha” (“Partisanenart”) (83). 56 Coronel Juan Carlos Moreno, citado de acordo com Serrano-Piedecasas, FS-Cerezo Mir, p. 1508: “São inimigos (…) os ideólogos que envenenam em nossas universidades a alma de nossos jovens.” 57 General Luciano Menéndez, citado segundo Serrano Piedecasas, FS-Cerezo Mir, p. 1508: “Os inimigos da alma argentina serão destruídos”. Conforme também Velásquez, RDPC 15 (2005), 211, que faz referência à política “correta” da limpeza de “inimigos” do continente latino-americano. 58 Prosecutor v. Kambanda, Judgement and sentence 4.9.1998 (ICTR-97-23-S), para. 39 (vii). 59 Scheich Ahmad Yassin, (am 22.3.2004 dirigente falecido [por ordem de Sharon] de HAMAS), Interview vom 1. Juli 2003, www.rebelion.org/palestina/030710mhuammad.htm. 60 Mahmoud Abbas, USA TODAY, 1.4.2005, www.usatoday.com/news/world/2005-01-04abbas_x.htm?csp=34 61 Ariel Sharon, CNN World, 29.3 2002, //archives.cnn.com/2002/WORLD/meast/03/28/mideast/. 62 Conforme Thiée, in Uwer, Ruhe, 195 ss. que demonstra (223 s.) que a distinção entre amigo e inimigo tem um significado constitutivo nas sociedades islâmicas mais relevante que nas sociedades ocidentais. 63 Washington Times, 17. 7 2003, //washingtontimes.com/national/20030717-121015-6169r.htm. 64 Abdel Aziz al-Rantissi, (dirigente falecido de HAMAS el 17.4. 2004), BBC News, 28.3.2004, //news.bbc.co.uk/2/hi/middle_east/3576563.stm. 65 Wahlkampfrede, Atlanta/Georgia, 8.11.2001, “a única resposta possível é confrontá-lo e vencê-lo. Este novo inimigo busca destruir nossa liberdade e impor suas visões. Nós valoramos a vida, os terroristas a destróem sem piedade”, CNN.com, 8.11.2001, http://archives.cnn.com/2001/US/11/08/rec.bush.transcript/. 66 Bush, Discurso à Nação, CNN World, 17.3.2003: www.cnn.com/2003/WORLD/meast/03/17/sprj.irq.bush.transcript/.
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such enemy there is only one effective response: We will never back down, never give in and never accept anything less than complete victory”67. No marco desta retórica, o direito penal terrorista vem se convertendo cada vez mais em um direito penal do inimigo68. Um exemplo sobre a utilização do conceito de inimigo no debate político interno proporciona recentemente um líder sindical quando qualificou de “inimigos” determinadas empresas que deviam ser “aniquiladas”69. O direito internacional contempla a anacrônica cláusula sobre Estados inimigos no artigo 107 dos estatutos da ONU70, que se refere ao eixo de potências da Segunda Guerra Mundial e que, hoje em dia, praticamente carece de significado71. Desde o ponto de vista do direito penal (internacional) resulta muito mais importante a tradicional teoria sobre o hostis humani generis, que remonta fundamentalmente a Cícero, e que pode ver-se como um precursor da persecução mundial dos delitos do direito penal internacional sobre a base do denominado Princípio da Justiça Universal72. Se bem que no começo se denominavam, neste sentido, como inimigos da humanidade, os piratas – “pirata hostes humani generis” –, possibilitando desta maneira que qualquer Estado pudesse perseguí-los, hoje em dia este conceito se refere a qualquer autor de um delito de direito penal internacional (delicta iuris gentium) 73. 1.3. Resumo: inimigo interno e externo Após este histórico tour d’horizon, resulta evidente que se deve distinguir entre inimigos “internos” e “externos”. O inimigo “externo” ameaça o próprio desde fora da própria sociedade. Aparece assim, principalmente, na guerra clássica entre Estados e instituições pré-estatais. O inimigo aqui é o contrário do da guerra, que, em virtude do seu status, concede determinados direitos e com quem, inclusive, pode-se celebrar acordos de paz e de anistia. A “declaração de inimizade”, isto é, a exposição e caracterização do inimigo, advém da situação de guerra. Meu inimigo é 67
Bush, Discurso de 6.10. 2005, www.cnn.com/2005/POLITICS/10/06/bush.transcript/. Sobre os EUA ver também Cole, in Uwer, Ruhe, 165 ss.; Sinn, ZiS 2006, 109 s. 68 Conforme Ambos, PVS 2006 com referências de direito comparado à Espanha, França, Itália, Inglaterra e EUA; Portilla Contreras, in: LH-Bacigalupo, tomo 1, p. 708 ss.; Asua Batarrita in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 248 ss.; Donini in: ibidem, p. 645 ss.; Orce in: ibidem, p. 414 ss.; Sánchez García De Paz in: ibidem, p. 861 ss.; Scheerer/Böhm /Víquez, in: ibidem, p. 929 ss.; Zaibert in: ibidem, p. 1166 ss.; sobre a Espanha Cancio, DPC 3 (2003), 43 ss.; PolainoOrts, Derecho penal del enemigo, p. 71 ss.; sobre o plano internacional veja também Sinn, ZiS 2006, 111 s.; quanto à Guantanamo Schünemann, FS Nehm, 221; Müssig in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 390; quanto ao desenvolvimento legislativo norte-americano logo após o 11 de setembro Manna in: ibidem, p. 255 ss.; quanto ao desenvolvimento policial norteamericano demarcado dentro da guerra contra o crime Dubber in: ibidem, p. 687 ss. 69 Assim o Presidente do IG-Bau Wiesehügel, 5.10. 2005, www.n-tv.de/587492.html. 70 “As medidas que (…) os governos adotaram ou permitiram como conseqüência da Segunda Guerra Mundial em relação ao Estado que durante esta constituía o inimigo de um dos Estados signatários, estão derrogadas e proibidas por esta Carta” (grifo do autor). Conforme também a referência contida no Art. 53 UNS: “…estão excluídas as medidas contra um Estado inimigo, no sentido do parágrafo 2”. O Art. 53, par. 2 define como “Estado inimigo” “qualquer Estado que durante a Segunda Guerra Mundial tivesse sido inimigo de algum Estado signatário”. 71 A favor da derrogação veja o Secretário Geral da ONU, Kofi Annan, citado segundo Fassbender, UN-Reform und kollektive Sicherheit, p. 29: “é um momento adequado para eliminar as anacrônicas “cláusulas” do inimigo”. 72 Neubacher, Strafgerichtsbarkeit, p. 111 com outras referências. 73 Conforme Mü-Ko-Ambos, §§ 3-7, n.m. 47 ss. com outras referências.
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aquele ser humano que se encontra em uma situação de confronto bélico comigo. No entanto, quando cessa o confronto bélico, os inimigos podem se converter em amigos ou, no mínimo, em parceiros em alianças políticas.74 O inimigo externo pode ter também, precisamente, (algum) direito; em todo caso, possui determinados direitos mínimos – hoje em dia garantidos pelo direito internacional dos direitos humanos 75 – a um tratamento humano; o inimigo não perde estes direitos, não se converte em um “sem lei”. Diferentemente resulta a questão relativa ao inimigo interno. Ele é um “desviante” em sua própria sociedade. Inimigo é aquele que não quer vincular a uma comunidade sua existência como indivíduo e não quer integrar-se à esta; é aquele que não quer ou não pode acatar os valores sociais fundamentais dominantes. A clássica guerra entre Estados se converte em uma “guerra interna” entre seres humanos ou grupos de seres humanos soltos que, assemelhando-se aos animais no estado de natureza ou em qualquer caso desvinculados dos valores dominantes, colocam em perigo o ser da sociedade, a convivência pacífica76. Porém, quem é concretamente o inimigo interno? Quando se produz um desvio dos valores fundamentais de uma determinada sociedade de tal magnitude que justifique a exclusão do desviante? Deve manifestar-se externamente o comportamento desviante? A filosofia não dá uma resposta exata a estas questões. O aspecto da ameaça ocupa um papel predominante77: a negação do outro que ameaça a identidade e a existência própria é um critério constitutivo para o inimigo. Inimigo é, portanto, quem pode me questionar no sentido cultural-espiritual ou físico-real – isto é: de quem temo que possa fazer isto78. O inimigo interno assim definido nunca poderá ter direito algum79. O hostis humanis generis pode ser tanto um inimigo externo como um inimigo interno; não depende de uma questão fática. Os delitos internacionais podem ser cometidos tanto em uma guerra – concretamente: em um conflito armado – como em tempos de paz. Os inimigos da humanidade sempre existem, na medida em que se cometem esse tipo de delitos. O hostis humanis generis se distingue, no entanto, do mero conceito de inimigo interno por sua referência a delitos internacionais – a referência ao fato proporciona, em todo caso, uma determinação relativa. Ao passo em que ao conceito de inimigo externo não se pode negar uma certa legitimidade, a do inimigo interno só serve para desacreditar o contrário e a 74
Isto reconhece também Schmitt, Partisanen, 16: acordo de paz como fim natural da guerra. Conforme 76 Conforme também Hohmann, Geschichte von Feindbildern, p. 40; Brandt, Rousseaus Philosophie, p. 87 com outras referências. 77 Conforme Kant, Frieden, 2.ª parte com nota na p. 24 e s. “no estado de natureza puro” se ameaça sua segurança já por sua situação a-legal, pelo que resulta legítimo obrigar-lhe a um “estado sóciojurídico” ou expulsar-lhe da “vizinhança”, isto é “tratá-lo como inimigo”. 78 Schmitt, Ex captivitate salus, p. 88. 79 Em relação à distinção inimigo interno/inimigo externo aqui estabelecida, Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 86, 87, pá da página 20, assinala que esta distinção não se pode aplicar ao conceito que Jakobs maneja sobre o inimigo, já que quando nos referimos ao inimigo interno, excluímos totalmente a juridicidade. Inclui Polaino-Orts, p. 96, ao pé da página 34: “alguns críticos de Jakobs absolutizam seu conceito de inimigo, desnaturalizando-o mediante uma interpretação sui generis que não diz respeito às características originais … não obstante a despersonalização do inimigo, mantém substancialmente seus direitos fundamentais, sendo restringidas unicamente algumas garantias …” 75
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justificação da forma de proceder própria, sem proporcionar uma fundamentação material para a exclusão do outro. Este conceito de inimigo não tem limites. Isso resulta, sobretudo de forma evidente, da posição de Schmitt, que, por um lado, exclui qualquer questionamento das causas do conflito apelando ao Estado livre de valores como máquina neutra e, por outro lado, postula a guerra como única conseqüência possível da inimizade, subtraindo desta forma qualquer fundamento para possibilidades alternativas de solução a limine80. A falta de contornos se vê acompanhada do exagero: o super-dimensionamento da ameaça aparente, junto com a negação simultânea das características boas, desfiguram a realidade e fazem com que o confronto se torne inevitável. Com o inimigo (interno) não se tem nada em comum; representa uma ameaça para a própria existência de qualquer um e, neste sentido, se encontra sempre fora da própria identidade – individual ou coletiva. Sob esta perspectiva o inimigo nunca é um conceito sem importância ou inócuo: sempre lhe é imanente uma ameaça que deve ser esclarecida ou eliminada. Posto que já não pode acontecer uma comunicação com o inimigo, somente resta o confronto militar: a guerra. Em inúmeras ocasiões se cria o inimigo – no verdadeiro sentido de «derivado do conceito»81 – que há que eliminar mediante sua denominação como tal – no sentido exato do labelling approach82. 2. O conceito de inimigo em Jakobs 2.1. A transformação do conceito de inimigo Nas jornadas de professores de direito penal que tiveram lugar em Frankfurt am Main no ano de 1985, Jakobs utilizava, todavia, o conceito de direito penal do inimigo como um topos para a análise crítico-descritiva do direito penal alemão vigente83. Este compreendia disposições que transformavam o autor punível em uma mera «fonte de perigos», em um «inimigo do bem jurídico»84, privando-lhe assim de sua esfera privada e de seu status como cidadão. Posto que quando o Estado penetra na esfera privada, na «esfera cidadã interna», «acaba a privacidade e com ela a posição do sujeito como cidadão; sem seu âmbito privado não pode existir o cidadão»85. O destinatário das denominadas regras do direito penal do inimigo – que se caracterizam por uma antecipação da intervenção jurídico-penal, uma legislação de luta no lugar de uma legislação penal e pela supressão de garantias
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Schmitt, Begriff, p. 33: “a guerra é o resultado da inimizade, posto que esta é a negação essencial de outro ser. A guerra só é a realização externa da inimizade.” Deve existir a possibilidade da guerra “se é que o conceito de inimigo deve seguir tendo sentido”. Quando, conforme Schmitt, a inimizade é a essencial da política, porém dita inimizade só deve entender-se a partir da guerra, a guerra se converte na essência da política, conforme Laufer, Kriterium des politischen Handelns, nota 69, p. 156. Uma análise interessante da obra de Schmitt neste ponto faz Zaffaroni, El enemigo, p. 135 ss. e Aponte, Guerra, p. 113 ss. 81 Laufer, Kriterium politischen Handelns, p. 150 ss., fala, neste sentido, da distinção entre conhecimento do inimigo e determinação do inimigo. 82 Conforme a “labeling approach” tanto o delito como o delinqüente são resultados de uma definição social; isto é, se conformam no marco da imputação social, conforme Schneider, Kriminologie, p. 551. Sánchez García De Paz in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 855. 83 Jakobs, ZStW 97 (1985), 753; conforme idem, Strafrecht, 2. Aufl. 1991, 2/25c. De outra opinião Bung, in Uwer, Ruhe, 251 ss. para quem esse texto de Jakobs é, pelo menos, ambíguo. 84 Jakobs, ZStW 97 (1985), 753. 85 Jakobs, ZStW 97 (1985), 755.
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processuais86 – se converte em um inimigo que não goza do status de cidadão87. A “desprivatização” permite o acesso a um “elemento interno diferenciado”, mais concretamente à relação típica de planejamento na qual se situa o comportamento88. Portanto, não goza do privilégio de cidadão “quem realiza um complô junto com outra pessoa que, por sua vez, não goza, com relação ao Estado, de um direito à privacidade – por exemplo, com o representante de uma potência estrangeira”89. Resumidamente: o direito penal do cidadão se impõe com regras de direito penal do inimigo e nesta contaminação do “puro” direito penal do cidadão é onde se situa o verdadeiro perigo do direito penal do inimigo90. Este nível puramente analítico-descritivo foi abandonado posteriormente por Jakobs, especialmente com seu discurso nas jornadas berlinenses organizadas por Eser, Hassemer e Burckhardt no ano de 1999 sob o título “A ciência do direito penal ante a virada do milênio”91. Nesse momento, Jakobs fala de algumas “leis de luta”92, com as 86
Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 51. Em concreto, segundo Jakobs (ZStW 97 (1985), 757; idem, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, 2000, 51; idem, HRRS 3/2004, 93) também se incluem todos os preceitos que criminalizam os comportamentos prévios na esfera privada (§§ 30, 129, 129a do StGB), assim como os delitos de falsidade documental em sua modalidade de criação e confecção (§ 267 do StGB), assim como os §§ 30 I, Nr. 1, 31 I, Nr. 1 da BtMG, §§ 211 I, 49 I Nr. 1 do StGB, §§ 31 ss. EGGVG, como §§ 112, 112 a, 81 a, 100a, 100c, 110 do StPO. 87 Jakobs, ZStW 97 (1985), 756, 761. 88 Jakobs, ZStW 97 (1985), 773. 89 Jakobs, ZStW 97 (1985), p. 776 com referência aos §§ 98, 99 do StGB. 90 Conforme Jakobs, ZStW 97 (1985), 757, 784; também idem, Staatliche Strafe, p. 45 s.; idem, HRRS 3/2004, 93 p. Conforme também Díez Ripollés, RECPC 7-01 (2005), 24; Aponte, Guerra, p. 190; Mana, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 285–289; Perez del Valle, in: ibidem, p. 569; Feijóo Sánchez, DPC 2006, p. 134 critica o argumento de Jakobs da coexistência de um direito penal do inimigo com o direito penal do cidadão para conservar este último. Por sua parte Scheerer/Böhm /Víquez in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 925-926 consideram mais habitual a existência do direito penal do inimigo que a do direito penal do cidadão na história. Zaffaroni, El enemigo, p. 155, 157 apóia a idéia de Jakobs no sentido de que se faz para evitar que todo o direito penal se contamine. Igualmente Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 183, 261, pé da página 20 considera possível a convivência de ambos os tipos de direitos, e de fato a vê como algo real e vantajoso já que evita abusos, porque o direito penal do inimigo está bem delimitado e, ademais, a política criminal é incidental e conjuntural. Hörnle, GA 2006 dá vários exemplos de uma contaminação do direito penal “ordinário” (82 ss.) e admite que é inevitável que existam lugares onde influi um pensamento de segurança no direito penal de cidadãos (“Einbruchstellen eines sicherheitsbezogenen Denkens… in ein Bürgerstrafrecht”, p. 93). Ver também Sinn, ZiS 2006, 108 s. e Krauß, in Uwer, Ruhe, 88 ss. considerando em particular o direito penal das drogas como direito penal do inimigo; sobre o “Intensivtäter” (“autor intensivo”) na prática (policial) Jasch, in: Uwer, Ruhe, 268. Exemplos do direito penal europeu encontram-se em Scheffler, FS Schwind, 127 ss. que, no entanto, emprega um conceito demasiadamente amplo de direito penal do inimigo. Para Silva Sánchez in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 984-1010, a legislação e prática do aborto constitui um exemplo de direito penal do inimigo, porque implica que não se reconhece o status do embrião como ser humano; ver também Orce in: ibidem, p. 425 ss.; Palermo in: ibidem, p. 437 ss., dá exemplos relacionados com a legítima defesa. 91 O grande conhecedor de Jakobs, Cancio, ZStW 117 (2005), 277 com nota 32, observa um desenvolvimento em três fases: 1985/1991, 1999/2000 e 2003/2004; de modo similar Saliger, JZ 2006, 757 ss.; Aponte, in Uwer, Ruhe, 131 ss.; idem, Guerra, p. 183, 192; Portilla Contreras, JpD 49 (2004), 44 fala de uma “mudança qualitativa”; Prittwitz, in: Mir/Corcoy, Politica criminal, pp. 112 ss. de uma “mudança de sentido”. Conforme também Donini, in: Terradillos Basoco/Acale Sánchez, Temas, p. 214 com nota 33 (“função de legitimação”); Greco, GA 2006, 99 (“O tom … mudou substancialmente”); Díez Ripollés, RECPC 7-01 (2005), 20; Kaleck, in: Uwer, Ruhe, 283. Feijóo Sánchez, DPC 2006, p 139 ss.; Müssig, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 384; Pastor, in: ibidem, p. 504. Modolell in: ibidem, p. 325 ss. acredita ser necessário diferenciar
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quais se combatem indivíduos: “que em sua atitude (delitos sexuais), em sua vida econômica (criminalidade econômica, relativa às drogas e outras modalidades de criminalidade organizada) ou por seu envolvimento em uma organização criminosa (terrorismo, criminalidade organizada) tem se afastado, provavelmente, de modo permanente, porém, em todo caso, com certa seriedade, do direito, dito de outro modo: que não prestam a garantia mínima que é imprescindível para ser tratado como pessoa em direito”93. Aí se encontra algo mais que a mera descrição da lex lata de direito penal do inimigo; concretamente, a criação de um conceito de inimigo sobre a base da compreensão jakobsiana da finalidade da pena: o inimigo é um indivíduo “que, não só de maneira incidental, no seu comportamento (...) ou em sua ocupação profissional (...) ou, principalmente, através de sua vinculação a uma organização (...), isto é, em qualquer caso de forma presumidamente duradoura, tem abandonado o direito, e por conseguinte já não garante o mínimo de segurança cognitiva do comportamento pessoal e o manifesta através de sua conduta”94 Se bem que parece possível, evidentemente, tratar o “delinqüente habitual” “não como um indivíduo perigoso, senão como uma pessoa que atua equivocadamente” – isto é: como pessoa e como cidadão –, o certo é que resulta mais difícil fazê-lo no caso de “autores por tendência ou com o autor que se torna membro de uma organização.”95 Em todo caso, quem deve ser tratado como inimigo é o terrorista, que nega de fato a “legitimidade do ordenamento jurídico por princípio” e “pretende destruí-lo” 96. Jakobs já não define o inimigo somente em atenção ao direito penal especial em concreto – de certo modo como produto do legislador –, senão se afasta dos tipos concretos e se abstrai: o inimigo é “o encosto perturbador” conformado por aqueles que “não se deixam vincular a, nem tampouco separar-se de” um estado cidadão97. Esse indivíduo “não pode desfrutar parcialmente dos benefícios do conceito de pessoa”98, posto que “quem continuamente se comporta como Satã, ao menos não poderá ser tratado como pessoa em direito, no que diz respeito à confiança de que cumprirá com seus deveres”99. Ademais, se se “parte de sua orientação com base entres versões e significados nas afirmações de Jakobs. Contrário à existência de uma mudança de discurso Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 47, considera que “as sucessivas contribuições do autor alemão, desde a sua primeira conferência em 1985 até a última (ainda inédita) de 2006, são produto de uma análise coerente em seu sistema funcionalista, de maneira que entre uma e outra não há rupturas nem mudanças, senão plena evolução lógica”. 92 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, com 10 ss.: assim, por exemplo, as leis de luta contra a criminalidade econômica, o terrorismo, o tráfico ilícito de drogas e outras formas de manifestação da criminalidade organizada, e de delitos sexuais e outros fatos delitivos perigosos. 93 Jakobs, Staatliche Strafe, p. 42 [=La pena estatal. Significado y finalidad, 2006 (grifo de K.A.)]; de modo similar com referência à “terroristas” Jakobs, ZStW 117 (2005), 842 ss. 94 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 52 (sem grifo no original) [=Dogmática de Derecho penal y la configuración normativa de la sociedad, 2004, pp. 44 s.]. 95 Jakobs, HRRS 3/2004, 92. 96 Jakobs, HRRS 3/2004, 92. 97 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53. Em outro lugar, (Prólogo, in: Jakobs/Cancio, Enemigo, p. 14) Jakobs o formula de maneira ainda mais decisiva: “há que separar-se de quem não admite ser incluído sob uma constituição civil.” 98 Jakobs, HRRS 3/2004, 92. 99 Jakobs, Staatliche Strafe, p. 41.
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no lícito e no ilícito”, também esta “expectativa normativa deve encontrar-se alicerçada no fundamental, de maneira cognitiva, e isso com tanto maior clareza quanto maior for o peso que corresponda às normas em questão”100. Quanto ao tratamento de terroristas em particular, Jakobs propõe examinar se a (criticada) “contaminação” é necessária na luta contra eles.101 E, em sua conclusão, afirma esta necessidade ao considerar admissível que, por um lado, cidadãos inocentes possam ser sacrificados para evitar um atentado terrorista (concretamente: através de um avião seqüestrado por terroristas)102 e, por outro, que o Estado pode (inclusive: tem que) usar métodos proibidos de interrogar supostos (sic!) terroristas.103 2.2. Considerações críticas 2.2.1. Quem é o inimigo? Se anteriormente já se criticou a insegurança a efeitos de delimitação conceptual que existia104, agora a distinção entre pessoa/cidadão e inimigo desaparece totalmente quando a argumentação se afasta dos tipos concretos como o único critério apreensível e se passa a definir abstratamente o inimigo. Assim, já não só se determina o “inimigo” à luz de uma classificação legal – em qualquer caso reativa –, senão se determina, independentemente disso, com base em um postura “inimiga” a respeito da ordem estatal e – possivelmente – com base na decisão, a oposição duradoura aos valores deste ordenamento (criminalidade organizada), isto é, como conseqüência da suposta incapacidade de orientar-se no futuro em conformidade com tais valores (autor por tendência). Portanto, de acordo com isso, os “Hangtäter”NT1 e os criminosos organizados são inimigos “potenciais”, enquanto que os terroristas são inimigos “seguros” – sem ter em conta a dificuldade que é definir corretamente o terrorista105 e, da prática conhecida, e já referida, denominar como 100
Jakobs, HRRS 3/2004, 91 [=“Derecho penal del ciudadano y Derecho penal del enemigo“ (Tradução de Manuel Cancio Meliá), in: Jakobs / Cancio Meliá, Derecho penal del enemigo, 2003, p. 38]. 101 Jakobs, ZStW 117 (2005), 841, 851. 102 Jakobs, ZStW 117 (2005), 848 refere-se à lei alemã para a segurança do tráfego aéreo (“Luftsicherheitsgesetz” del 11.1.2005, BGBl. I 2002, 78) que foi declarada inconstitucional pelo Bundesverfassungsgericht na sentença de 15 de fevereiro de 2006 (1 BvR 357/05), publicada, inter alia, in: NJW 2006, 751-761; EuGRZ 2006, 83-97; JZ 2006, 408-417. 103 Jakobs, ZStW 117 (2005), 849 refere-se ao § 136a do StPO que, inter alia, proíbe a tortura. Em relação ao uso da tortura nestes casos Zaibert, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 1168 ss 104 Conforme, já em 1985, a crítica de Puppe, Schmidhäuser, Lampe, Hirsch y Köhler, reproduzida por Gropp, ZStW 97 (1985), 920 ss., 924, 926. Crítico também Schüler-Springorum, 1991, 240; Muñoz Conde, in: Losano/Muñoz Conde, Globalización, p. 174; Portilla Contreras, JpD 49 (2004), 45 com a nota 17; Hörnle, GA 2006, 89 ss.; Uwer, in: Uwer, Ruhe, 51; Aponte, in Uwer, Ruhe, 141 ss.; Streng, in Uwer, Ruhe, 246. Uma boa revisão do estado da discussão o proporciona Greco, GA 2006, 99 ss.; Zaffaroni, El enemigo, p. 157 ss. faz referência a um conceito limitado de um hostis limitado. PolainoOrts, Derecho penal del enemigo, p. 222 ss. considera que assim como não se exige aos autores que delimitem conceitos como inimputável ou criminalmente perigoso quando os utilizam, tampouco cabe exigir-lhe a Jakobs que delimite e defina aqueles que são os inimigos. - Sobre críticas similares à Schmitt veja Laufer, 1962, 138, 150, 153: não se esclarece o alheio, quando um se converte em inimigo. Schmitt evita a questão de por que e como um ser humano ou um grupo de seres humano nega o ser de outro ser humano ou grupo de seres humanos. NT1 O substantivo composto Hangtäter, traduz-se como “autor por tendência”. 105 Conforme Martin, Understanding Terrorism, Challenges, Perspectives, and Issues, p. 9, 35 s., 116: “Quem é terrorista para uma pessoa, pode ser o defensor da liberdade para outra.” Sobre o aspecto internacional veja com mais detalhes Ambos, PVS 2006, 417 ss.
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tal a qualquer oponente odiado106. Afinal de contas, a definição depende do poder de definição e este poder o tem, o Estado – auctoritas, non veritas facet legem.107 Desde o ponto de vista processual se estabelece a questão de conforme quais regrais procedimentais se produz a “identificação de inimigos”. Realmente só existem duas possibilidades: ou se procede conforme as regras do direito penal do cidadão e se procura separar a palha (os inimigos) do trigo (os cidadãos), ou se procede conforme as regras do direito penal do inimigo e se atribui de maneira abstrata o status de inimigo. Quanto ao primeiro caso devemos ter em conta que isto se realizaria no marco de um processo jurídico-estatal – onde vige a presunção de inocência!108 –, pelo qual se aplicaria o direito penal do cidadão aos inimigos, e portanto se desacreditaria o discurso do direito penal do inimigo. Por isso, desde a perspectiva do direito penal do inimigo, resulta mais conseqüente a segunda possibilidade, a qual significaria, ademais – exatamente no sentido de uma petitio principii –, que se pressupõe aquilo que antes de mais nada teria que demonstrar (o status como “inimigo” de determinados indivíduos).109 O próprio Jakobs reconhece que a questão da delimitação entre cidadão e inimigo “pode contestar-se de diferentes maneiras, dependendo dos pressupostos”110. Reconhece que o cidadão e o inimigo são apenas dois “tipos ideais”, que “dificilmente serão levados à realidade de modo puro”111. Portanto não pode “tratarse de contrapor duas esferas isoladas do direito penal, senão de descrever dois pólos de um só mundo ou de mostrar duas tendências opostas em um só contexto jurídico-penal”112 E previne: “quem não diferencia com clareza entre inimigo e delinqüente civil não deve se surpreender se confunde os conceitos de ‘guerra’ e ‘processo penal’.”113 Embora em seu último trabalho (publicado) Jakobs postule uma distinção exata (“sauber unterscheiden”), não desenvolve critério para ela.114
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Conforme, por exemplo, a declaração do general argentino Videla que também considerava que el autor por convicção era um terrorista: “o terrorista não só é considerado por matar com uma arma ou colocar uma bomba, senão também por ativá-las através de idéias contrárias a nossa civilização ocidental e cristã” (citado conforme Serrano-Piedecasas, FS-Cerezo Mir, p. 1508). 107 O problema do poder de definição também foi advertido por Alejandro Aponte (conferência, Congresso IBCCrim, São Paulo, 1.9.2006) com especial referência ao atual processo de paz colombiano, onde os paramilitares se converteram de inimigo absoluto em inimigo relativo, inclusive amigo; assim o poder de definição vem com as normas, em outras palavras, é eminentemente normativo e concede discrição praticamente absoluta ao legislador (ao contrário Mir Puig, Homenaje Rodríguez Mourullo, p. 690). 108 Sobre a importância dela neste contexto veja Schünemann, FS Nehm, 226. 109 Sobre esta “caixa sem saída” também Gracia Martín, RECPC 2005, Nr. 07-02, 2-28. A “circularidade de uma dogmática jurídico-penal que vive da ocorrência já vinha sendo criticada por Schünemann, GA 2001, 211. 110 Citado de acordo com Gropp, ZStW 97 (1985), p. 928. 111 Jakobs, HRRS 3/2004, 88, 90. Ver também Aponte, Guerra, p. 202-03: “o inimigo é sempre um inimigo construído… na diferença de tipos ideais sempre intermedia uma decisão… política por natureza”. 112 Jakobs, HRRS 3/2004, 88 [=“Derecho penal del ciudadano y Derecho penal del enemigo“ (tradução de Manuel Cancio Meliá), in: Jakobs/Cancio Meliá, Derecho penal del enemigo, 2003, p. 22]. 113 Jakobs, Staatliche Strafe, p. 46, veja sobre isso, também Cancio, ZStW 117 (2005), p. 288: “ou ações de guerra em sentido estrito ou delitos, tertium non datur.” 114 Jakobs, ZStW 117 (2005), 850.
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Apesar das incertezas descritas, a classificação cidadão/inimigo segue constituindo a base da argumentação jakobsiana115. Jakobs não se centra na imagem das forças opostas que existem dentro de um ser humano (um cidadão ou uma pessoa), senão em duas regras de atuação separadas que se dirigem a cidadãos – direito penal do cidadão – ou a inimigos – direito penal do inimigo – dependendo do seu comportamento. Também a pena se orienta a destinatários diferentes dependendo da função: seu efeito confirmador se orienta a pessoas entendidas como «partícipes na comunicação, que ponderam sobre o direito», e a dissuasão e o estímulo da fidelidade ao direito se orienta a “quem não está, per se, juridicamente disposto”.116 Gera-se, assim, a impressão de que existem homens que basicamente se comportam ou conforme a direito ou contra o direito117. O que decide sobre a pertença ao grupo dos inimigos não é o fato (direito penal do fato), senão as características do autor (direito penal do autor) 118. Esboça-se uma imagem do homem – como cidadão ou como inimigo – que não existe de maneira tão absoluta;119 a oposição cidadão/inimigo – de maneira similar à oposição schmittiana amigo/inimigo (supra I.1) 120 – postula o inimigo conforme a sua essência, remetendo-se, para isso, à realidade: “Em todo caso, aqui não nos interessa saber se é rechaçável ou não o fato de que os povos sigam agrupando-se conforme se considerem amigos ou inimigos, nem se se trata de um resquício atávico de épocas de barbárie; tampouco vamos nos ocupar das esperanças de que algum dia essa distinção desapareça da face da terra, nem da possível bondade ou conveniência de fazer, com fins educativos, como se já não houvesse inimigos. Não estamos falando de ficções nem de normatividades, senão da realidade ôntica e da possibilidade real desta distinção.”121 No plano da política social prática, o agrupamento cidadão/inimigo conduz a um aumento na pressão sobre os grupos sociais que de todas as maneiras tem que lutar contra sua marginalização, como, por exemplo, os imigrantes, os judeus ou os que 115
Por exemplo Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 50; idem, Staatliche Strafe, p. 42 s.; idem, HRRS 3/2004, 88 s., 93. 116 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 50; conforme nota 143. 117 Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 99 para este autor uma das características do conceito de inimigo é que para ele a conversão de inimigo e conseqüente auto-exclusão, é potestativa dos cidadãos. Ver também Perez del Valle, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 561. 118 Neste sentido também Gracia Martín, RECPC 07-02 (2005), 22; Cancio, ZStW 117 (2005), 281, 284, 286 s., 289; Demetrio Crespo, RDPC 14 (2004), 90 e ZIS 2006, p. 435 ss; Hefendehl, StV 2005, 157; Díez Ripollés, RECPC 7-01 (2005), 21; conforme também Puppe, citado segundo Gropp, ZStW 97 (1985), p. 920. Crítico também Sinn, ZiS 2006, 116; Seligman de Menezes, Boletim do IBCCrim 2006, p. 19; Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 133; Asua Batarrita in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 242; Donini in: ibidem, p. 614 ss.; Garcia Amado, in: ibidem, Derecho penal del enemigo, p. 909 ss; Lascano in: ibidem, p. 220 ss, 230 ss; Müssig, in: ibidem, p. 388; Pastor Muñoz, in: ibidem, p. 538; Portilla Contreras, in: ibidem, p. 658; Scheerer/Böhm/Víquez in: ibidem, p. 919. Polaino-Ort, Derecho penal del enemigo, p. 218 considera que inevitável usar o direito penal do autor para adequar as sanções penais. 119 Crítico também Schünemann, FS Nehm, 225 para quem não existem pessoas que por princípio se oponham ao direito. Zaffaroni, El enemigo, p. 158 assinala que todos os humanos se dividem entre cidadãos e inimigos, como conseqüência de se ter admitido as medidas de segurança. Portanto isto não é nenhuma invenção de Jakobs, que só descreve a realidade do direito penal de duas vias. Similar Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 229 ss. 120 Crítico também em relação à similitude Schulz, ZStW 112 (2001), 659 s.; Greco, GA 2006, 106; Uwer, in: Uwer, Ruhe, 42 e passim; Kaleck, in: Uwer, Ruhe, 290; Gomez Martín, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 1031 ss. 121 Schmitt, Begriff, p. 28 s. [El concepto de lo político, 1991, p. 58]
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pertencem a subculturas que só aparecem de maneira condicionada nas relações de reciprocidade que se percebem na sociedade122. Quando Jakobs, além disso, recorda o perigo da «pluralidade extrema»123, e a “força explosiva da denominada multiculturalidade124”, suas reflexões se dirigem sobretudo contra os outros que provém de uma cultura estrangeiro. Se a pena tem que confirmar a identidade da cultura dominante – sem ter em conta a realidade multicultural das modernas sociedades industriais que, certamente, exclui uma base cultural homogênea para o Direito Penal125 –, então o emigrante que permanece em seu próprio meio cultural não pode oferecer a segurança cognitiva necessária para estar seguro de sua fidelidade ao direito126. 2.2.2. Da descrição ao programa político Diferentemente de Schmitt127, Jakobs alega que suas declarações devem ser entendidas como descritivas e, de fato, em 95%128 ou 98%129. Somente ele quem
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Conforme Bock, in: Kaiser/Jehle, Opferforschung, p. 180 ss.; Aponte, Feindstrafrecht, p. 135; Zaffaroni, Cuestión penal, p. 156 e El enemigo, p. 64. Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 31 ss. Em relação à perseguição ao islamismo Quintero Olivares, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 687-696. 123 Esta pluralidade, conforme diz Jakobs, ZStW 107 (1995), 868, debilita “a igualdade pessoal”, o qual conduz a um “resultado instrumental” na medida em que “alguém se converte reciprocamente em natureza”; neste sentido deve levar-se em conta que Jakobs, HRRS 3/2004, 92 descreve o estado de natureza como um estado a-jurídico onde falta uma segurança cognitiva: “o estado de natureza é precisamente um estado no qual falta a norma, isto é um estado tanto de liberdade excessiva como de luta excessiva. Quem ganha a batalha determina que é a norma e quem perde tem que acatar esta determinação”. Veja ademais idem, in: Eser/Hassemer/Burckhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 52: os inimigos proliferam, dado que a sociedade perdeu os apoios de uma religião em conformidade com o Estado, a instituição e a família e a consciência de uma nacionalidade comum, pelo que aumenta a possibilidade de conformar uma identidade separada do direito”. 124 Como multiculturismo inócuo de uma cultura ou como convivência perigosa de várias culturas veja Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burckhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 52. 125 De acordo também Martínez, Necesidad, p. 33; veja também Aponte, Feindstrafrecht, p. 135: Ciudadano, ¿aquel que se adapta a la “cultura dominante”? Aponte, Guerra, p. 208 ss. alega que esta concepção dá lugar a modelos racistas e de persecução de imigrantes, sobretudo pelo fato da falta de clareza e ambigüidade manejada por Jakobs ao falar destes temas. Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 32, recorda o fato de que dentro das mesmas sociedades, como, por exemplo, na Colômbia, a diversidade cultural é patrimônio cultural da Nação. 126 Conforme Zaffaroni, Cuestión penal, p. 156, que, neste sentido, fala dos excluídos do mundo civilizado, isto é, os imigrantes e os parados entre outros, idem, El enemigo, p. 66: “Em todos os tempos, desde Roma até a atualidade, o imigrante é um bom candidato a inimigo”. Veja também Demetrio Crespo, ZIS 2006, p. 431. 127 O que neste ponto pode soar como empírico e descritivo (por exemplo, em Schmitt, Begriff, p. 28 s.: “Se se considera ou não que algo é reprovável e quem sabe considere que é um resto atávico dos tempos de barbárie o fato de que os povos tenham se agrupado em amigos e inimigos, ou se espera que a distinção desapareça da face da terra algum dia, ou inclusive que, quem sabe, resulta bom e acertado fingir, por questão de educação, que no fundo não existem inimigos, pois bem, tudo isso não se leva em consideração aqui. Aqui não se está tratando com ficções e normatividade, senão com uma realidade essencial e com a possibilidade real desta distinção”), deve estabelecer-se em um contexto programático (supra notas 37 e ss. e o texto correspondente) e assim se pretende. 128 Assim nas jornadas de professores de Direito penal de Frankfurt/Oder em maio de 2005, conforme o relatório de discussão em ZStW 117 (2005), 886. 129 Jakobs no vigésimo nono (XXIX) dia dos advogados defensores em Aachen, citado segundo Sauer, NJW 2005, 1704. Críticas em Scheffler, FS Schwind, 124; Schulz, in Uwer, Ruhe, 325; Demetrio Crespo, ZIS 2006, p 434.
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trouxe as más notícias, e por elas serem indecorosas, acabou repreendido130. Agora, se o próprio Jakobs se auto-considera descritivo assume alguma importância para ele a crítica de que o seu pensamento tem se tornado afirmativo e programático.131 É descritivo só na medida em que toma como objeto de análise certos preceitos de lege lata. No entanto, sua mera caracterização como direito penal do inimigo pressupõe uma valoração, posto que o conceito de «inimigo» é um conceito normativo por excelência132. A «tese da contaminação»133, perfeitamente compreensível, se vê obrigada a pagar um preço muito alto pelo direito penal do cidadão – o direito penal do Estado de Direito –, e precisa em razão da carga normativa do conceito de inimigo. E isso devido ao fato de que não se pode obter uma definição de inimigo que seja tão exata, que não resulte que o dano ao Estado de Direito não seja ainda maior do que já é por si de lex lata (contaminada pelo direito penal do inimigo). A falta de precisão do conceito de inimigo é, portanto, também o argumento decisivo contra sua capacidade de prestação analítica134. Apesar disso, o conceito não é nada novo como se depreende de nossa reconstrução histórica e política (supra I, 1. e 2). O salto qualitativo da descrição à programação pode comprovar-se em inúmeras declarações dos últimos tempos e culmina na postulação de um «tratamento para inimigos» que Jakobs considera adequado135: resulta – ao contrário – precisamente «desonesto abusar da evidência do direito penal do cidadão declarando como cidadãos os inimigos136». Ademais, “hoje em dia não existe nenhuma alternativa visível ao direito penal do inimigo”137. De fato, “pode muito bem perguntar-se” se não 130
Jakobs, in: Jakobs/Cancio, Enemigo, p. 15: “se mata o mensageiro que traz uma má notícia por ser indecorosa sua mensagem”. Assim mesmo Jakobs, no prólogo ao livro de Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 18 131 No entanto, para Frommel, in Uwer, Ruhe, 72 a reconstrução jakobsiana é somente “dogmática”; para Saliger, JZ 2006, 757 a Jakobs não interessa a distinção entre normativo e descritivo, pois seu discurso flui entre ambos os lados. 132 Conforme também Greco, GA 2006, 107 s.; Prittwitz, in: Mir/Corcoy, Política criminal, p. 114; Kunz, in: Barton, 2006, 77: “A valoração, em seu resultado ... depende de uma pluralidade de precedentes normativos” (“Bewertung, deren Ergebnis ... von einer Vielzahl normativer Vorentscheide abhängt“). Veja também Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 212 133 Conforme supra, nota 90 e o texto correspondente. 134 Igualmente crítico Greco, GA 2006, 110 e Saliger, JZ 2006, 759 ss., 762 que duvida do valor crítico-analítico do conceito. De outra opinião Hörnle, GA 2006, 81 que quer usar a terminologia para descrever “Elementos e pontos comuns transcendentes das mudanças político-criminais dos últimos anos” (“übergreifende Elemente und Gemeinsamkeiten von kriminalpolitischen Veränderungen der letzten Jahre …”) ; também Streng, in Uwer, Ruhe, 231; Neumann, in Uwer, Ruhe, 300 s., 314. Ante esta situação Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 102 propõe uma definição de inimigo: “Inimigo é quem, inclusive mantende intactas suas capacidades intelectiva e volitiva, e dispondo de todas as possibilidades de adequar seu comportamento à norma, decide motu propio auto-excluir-se do sistema, rechaçando as normas dirigidas à pessoas razoáveis e competentes, e despersonalizando a si mesmo mediante a manifestação exterior de uma ameaça em forma de insegurança cognitiva, que – precisamente por colocar em perigo os pilares da estrutura social e o desenvolvimento integral do resto dos cidadãos («pessoas em direito») – tem de ser combatida pelo ordenamento jurídico de forma especialmente drástica, com uma reação garantidora mais eficaz. Esta reação se circunscreve a garantir e restabelecer o mínimo respeito para a convivência social: o comportamento como pessoa no direito, o respeito às demais pessoas e – em conseqüência – a garantia da segurança cognitiva dos cidadãos na norma”. 135 Jakobs, Staatliche Strafe, p. 46: “o que resulta adequado frente à traidores, terroristas ou outras pessoa contrárias, por princípio, ao ordenamento jurídico” [seu tratamento como inimigos, K.A.]. 136 Jakobs, Staatliche Strafe, p. 47. 137 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53. Aponte, Guerra, p. 194 ss., 205 ss. Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 193 ss. assinala que é um fato que existe o
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se está impondo ao Estado uma limitação inadequada na luta contra o terrorismo, e não se poderia “chamar de outra forma” aquilo “que se deve fazer contra os terroristas se não se quer sucumbir” ao “direito penal do inimigo, guerra refreada”138 Last but not least: “trata-se do restabelecimento de condições de retorno aceitáveis, por meio da (…) neutralização daqueles que não oferecem uma garantia mínima cognitiva, a qual é necessária para que, para efeitos práticos, possam ser tratados atualmente como pessoas. É verdade que o procedimento para tratamento de indivíduos hostis está regulado juridicamente, porém trata-se da regulamentação jurídica de uma exclusão: os indivíduos são atualmente não-pessoas. Indagando em seu verdadeiro conceito, o direito penal do inimigo é, portanto, uma guerra cujo caráter limitado ou total depende (também) do quanto se teme o inimigo. Tudo isto soa chocante e, certamente, o é, pois se trata da impossibilidade de uma juridicidade completa, isto é que contradiz a equivalência entre racionalidade e personalidade”139. A tarefa da ciência do direito penal neste contexto é “identificar as regras do direito penal do inimigo”140, “e separá-las daquele que funciona sob a denominação de direito penal, isto é, trazer à colação o complemento do direito penal através de um direito penal de luta contra o inimigo”. Caso contrário, a ciência do direito penal “se verá marginalizada por uma sociedade dominada pela economia, como conseqüência de sua falta de efetividade”141. Tudo isso é o programa políticocriminal do direito penal do inimigo e o pedido à ciência do direito penal de que contribua ativamente a dar forma a este programa. É a passagem de um conceito descritivo e crítico-denunciador a um conceito afirmativo-legitimador do direito penal do inimigo142. direito penal do inimigo, já que como tal existem normas que cumprem estas características, no entanto, tais normas não conformam um corpo normativo, senão sua existência advém da aplicação do princípio da proporcionalidade que impõe, para esse tipo de ações, um trato diferenciado. 138 Jakobs, HRRS 3/2004, 92 [=“Derecho penal del ciudadano y Derecho penal del enemigo“ (tradução de Manuel Cancio Meliá), in: Jakobs / Cancio Meliá, Derecho penal del enemigo, 2003, p. 42]; neste sentido deve ter-se em conta que “a Guerra refreada” é a conseqüência de uma concepção que, como a de Jakobs, parte de um estado de natureza bélico que se vê dominado por um contrato social. Sobre o tratamento dos terroristas como inimigos por Jakobs veja a nota 101 e ss. e texto correspondente. Para Krauß, in Uwer, Ruhe, 100, a referência de Jakobs à ruína (“Untergang”) do Estado é “palavreado político” (“politisches Geschwafel”); crítico também Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 129; Portilla Contreras, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 676 ss. 139 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53 [=“La ciencia del Derecho penal ante las exigencias del presente” (tradução de Teresa Manso Porto), in: Jakobs, Dogmática de Derecho penal y la configuración normativa de la sociedad, 2004, pp. 45 s.]. 140 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53. 141 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53 s. 142 Sobre esta terminologia Greco, GA 2006, 104, que considera que Jakobs a utiliza de forma legitimadora-afirmativa. O salto qualitativo que aqui se descreve vem sendo reconhecido também pelos discípulos de Jakobs; só se discute o momento temporal concreto. Assim, para Cancio, ZStW 117 (2005), 278 com a nota 34, “o desenvolvimento posterior das teses de Jakobs em tempos recentes [denominado “tercer empujón”], supra nota 83] … já não deixa dúvida sobre o fato de que, em determinadas circunstâncias, ultrapassa a descrição e considera que o direito penal do inimigo é legítimo”. Assim Saliger, JZ 2006, 758 s., 762; Feijóo Sánchez, DPC 2006, p. 140 ss.; Demetrio Crespo ZIS 2006, p. 434; Abanto, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 2 ss.; Durán, in: ibidem, p. 729 ss.; Gomes/ Bianchini, in: ibidem, p. 963; Gómez-Jara, in: ibidem, p. 979 ss.; Gómez Martín, in: ibidem, p. 1007 ss., 1026 ss.; Portilla Contreras, in: ibidem, p. 661; Scheerer/Böhm/Víquez in: ibidem, p. 920 ss.; Urquizo, in: ibidem, p. 1034. Contrariando o entendimento de que Jakobs está legitimando o direito penal do inimigo Aponte, Guerra, p. 196 ss.
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Com o exagero da periculosidade do «inimigo» e do perigo que se ameaça com ele, aumenta-se assim mesmo a despersonalização jurídica143. E isso devido à que a reação contra o inimigo depende sobretudo «do que se teme dele»144. Ao mesmo tempo, parece que aumenta o peso da ameaça com o exagero, posto que na aplicação do direito penal do inimigo esgota-se o reconhecimento da capacidade do autor de questionar de maneira fundamental – e não só marginal – a vigência da norma145. Isso volta a legitimar o próprio rearmamento e a reação do direito penal do inimigo146. A linha divisória entre perigo real e o meramente afirmado desaparece, a percepção do perigo se determina conforme o direito penal do inimigo, atraindo assim o perigo, sem que o discurso do direito penal do inimigo encontre apoio algum na realidade147. A guerra preventiva, de qualquer forma, parece converter-se em indispensável como reação a essa realidade fictícia. As liberdades dos cidadãos – que o direito penal do inimigo pretende garantir – também se vêem afetadas por isso; deste modo, estas, em vez de resultarem (apenas) protegidas, se vêem debilitadas. Jakobs argumenta intra-sistematicamente – sobre a base do conceito luhmaniano de pessoa como subsistema psíquico-físico148 que se define como tal pela garantia cognitiva mínima149 – e sobre a base de um normativismo extremo que inclusive sobre-denomina escandalosamente a realidade até nas palavras que escolhe150. Assim, em relação ao perigo de reincidência contemplado no § 112 do StPO, tratase «do asseguramento de uma fonte de perigos, como no caso de um animal selvagem, mas não do trato com uma pessoa»151. No entanto, ainda que se Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 188, 204 ss., 259 ss. defende a posição de Jakobs: “A descrição de uma realidade normativa em um Estado de Direito não pode legitimar o que já está legitimado, e – portanto – tal descrição não pode ser nunca inconstitucional” (p. 206). 143 Jakobs, Staatliche Strafe, p. 44. 144 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p.53. 145 Conforme Cancio, ZStW 117 (2005), p. 286; Schulz, ZStW 112 (2001),p. 663 s. 146 Conforme Zaffaroni, Cuestión penal, p. 163 s.: “armamentismo“ do discurso: o inimigo se converte na justificação de armamentismo próprio. Veja também Aponte, Guerra, p. 292 ss., 486 ss. 147 Sobre a falta de base empírica veja também Prittwitz, in: Mir/Corcoy, Política criminal, p. 116, 118, 119. Contrário a isto Polaino-Orts, Derecho penal del enemigo, p. 72: “as normas enquadráveis no fenômeno do direito penal do inimigo existem realmente nas legislações penais da atualidade: o Direito penal inimigo tem uma base empírica inquestionável”. No entanto, a crítica não nega que existam normas de direito penal do inimigo, senão somente que com estas normas se transforme a realidade. 148 Conforme Jakobs, ZStW 107 (1995), 843 ss, 851 ss, 859, 874 com a nota; Luhmann, Wissenschaft, p. 33 s.; idem, Recht, p. 124 ss, 225. Veja também Bung, in Uwer, Ruhe, 259 s.; Neumann, in Uwer, Ruhe, 310 ss.; Aponte, Guerra, p. 429 ss.; Portilla Contreras, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 672 ss. 149 Veja supra notas 93 e s., 139 e texto. Crítico à respeito Bung, in Uwer, Ruhe, 260 ss.; Schulz, in Uwer, Ruhe, 325 ss. 150 Conforme Cancio, ZStW 117 (2005), p. 280 s.; Gössel, GA 2006, 280: “cegueira frente à realidade ôntica da vida” (“Blindheit gegenüber den ontischen Lebenssachverhalten”); igualmente crítico Prantl, SZ, 5./6. 3. 2005, 17: formulações que “pela primeira vez em 60 anos se escutam na Alemanha”; Sauer, NJW 2005, 1705: “incendiário espiritual”; Schneider/Morguet, in Uwer, Ruhe, 351. Em defesa Zaffaroni, El enemigo, p. 154: “… justamente o seu vocabulário é o seu melhor acerto, pois com sua terminologia coloca em aperto a todo o penalismo… ao deixar expresso o conceito de inimigo e seu inevitável caráter de não pessoa, deixa claro o fenômeno e, com isso, a má consciência histórica do direito penal …” 151 Jakobs, Staatliche Strafe, p. 41; Conforme Lesch, GA 2000, 363, segundo o qual, a “ética de consciência subjetivista” que estende sobremaneira o princípio nemo-tenetur e vulnera o princípio da
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compartilhe com Jakobs a idéia de que o homem é um animal perigoso e incontrolável, tratá-lo como um inimigo pressupõe que já não é um ser humano, senão somente um animal – precisamente uma “não-pessoa” – e como tal não merece tratamento jurídico algum. No entanto, esta conseqüência não pode deduzirse do conceito jakobsiano de pessoa, pois este não pode fundamentar, por que a não-pessoa deve receber um tratamento que não seria admissível contra pessoas.152 Se alguém quer chegar a esta conseqüência, abandonando o nível puramente filosófico de análise, tem que levar em conta as valorações constitucionais153 – a perspectiva de um direito penal dos direitos fundamentais – e neste ponto choca com os princípios que aqui se defendem (infra III.). A medida no direito sempre resulta válida para o ser humano, cuja dignidade não é uma construção normativa, senão deriva de sua existência humana em si mesma154. 2.2.3. Dogmática penal sem conseqüências Nas mencionadas jornadas berlinenses sobre o futuro da ciência jurídico-penal, Björn Burckhardt denominou “dogmática sem conseqüências” a todos aqueles princípios, teorias e sistemas jurídico-dogmáticos que não eram nem relevantes para a prática, nem aplicáveis, que não exerciam efeito algum sobre a declaração de culpabilidade ou da pena, ou que resultam contraditórios ou neutralizados pela praxis (legislação, aplicação do direito) 155. Mais ainda; também aparece uma dogmática sem conseqüências «quando não encontra um eco adequado»156. Se se toma aqui este critério, dificilmente se poderá duvidar da relevância imediata do direito penal do inimigo – para além da mera descrição de lege lata –; seu «eco» aumenta na discussão científica e político-criminal157. Assim, por exemplo, nas próprias jornadas berlinenses, Eser apresentou imediatamente seu posicionamento a respeito da tese programática de Jakobs, a qual se examinará mais adiante. Porém voltando às teses de Jakobs podemos afirmar que estas se tem propagado como um incêndio pelo mundo penal de língua espanhola, portuguesa e italiana, de tal maneira que, hoje em dia, sobretudo na América Latina, a discussão sobre o direito penal do inimigo possui o mesmo caráter que as questões fundamentais da teoria do direito e do sistema jurídico-penal158. Em que pese possa se tratar de uma responsabilidade traz consigo o perigo de que “a qualidade do acusado como pessoa se vê destruída e, em seu lugar, se o insere na categoria de uma existência de animal ou criatura”. 152 Neumann, in Uwer, Ruhe, 309; Demetrio Crespo ZIS 9/2006. p. 432; Gracia Martín, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 1060 ss. 153 Neumann, in Uwer, Ruhe, 313. 154 Conforme Gracia Martín, RECPC 07-02 (2005), 34 ss.; Gössel, FS Schroeder, 39 ss.; Brunkhorst, in Uwer, Ruhe, 110 ss.; Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 22; Urquizo, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 1044 ss. 155 Burkhardt, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 111 (127 s.). Ao contrário disso Schünemann, GA 1995, 203, 221 ss. considera que a por ele conceptualmente denominada “dogmática sem conseqüências” contém um bloco dos dois que trazem consigo a “ciência jurídicopenal alemã”, “cuja causa encontra-se seja no ecletismo seja no tradicionalismo, e sobre cuja base, na atualidade, só se pode encontrar uma política de interesses afastada da ciência”. (203). Veja também Aponte, Guerra, p. 205 ss. 156 Burkhardt, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 128. 157 De outra opinião Schünemann, GA 2001, 211 s., o qual atribui a categoria do direito penal do inimigo, juntamente com a da dogmática jurídico-penal “circular” (supra 109), à dogmática sem conseqüências, pelo que concebe esta de maneira um tanto distinta da que faz Burkhardt (conforme nota 155). 158 De maneira similar ao interesse na teoria da imputação objetiva, que nos anos 90 do século passado se introduziu na América Latina através da ciência penal alemã e espanhola, hoje em dia
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questão antiga, o caráter programático das teses de Jakobs (supra b)) pode conter um potencial político-criminal que – independentemente da posição material que provoque a alguém – pode resultar em conseqüências político-criminais de grande alcance, seja no plano judicial como no legislativo. As possíveis conseqüências na América Latina159 ou outras regiões com estruturas jurídico-estatais de fragilidade similar, motivam certas dúvidas. Quando, como faz Eser, se parte do dever científico de questionar as possíveis conseqüências de sua teoria160, então há que reprovar a Jakobs a infração de tal dever, pois constitui uma «falta de consciência a respeito das conseqüências»;161 parece que a única coisa que o preocupa é a coerência interna de seu sistema, independentemente das conseqüências. Basicamente, Jakobs não leva em conta as críticas que não vêm formuladas em categorias jurídicas: o medo não é uma «categoria jurídica»162, e se o seu diagnóstico dá medo é devido ao fato de que o mundo pode nos dar medo de vez em quando163. Jakobs argumenta exclusivamente em categorias jurídicas abstratas e ignora os efeitos reais que estas categorias podem ter em colegas e cidadãos. Jakobs não vê a si mesmo na tradição de Carl Schmitt (e muito menos como «respaldo de personalidades autoritárias»)164, embora se remeta a Hobbes em relação à «seu» direito penal do inimigo165, coincide com Schmitt, o qual considera Hobbes como um «representante clássico (...) do tipo decisionista», e apesar de derivar da acentuação da autoridade estatal em prejuízo da verdade («auctoritas, non veritas facit legem»), suas teses relativas à primazia do Estado sobre o Direito166. «Se se produz este Estado [o Estado de exceção, K.A.], se vê com clareza ninguém pode evitar ter que tomar uma posição a respeito do direito penal do inimigo. Inclusive constitui um módulo próprio em alguns cursos de pós-graduação. 159 Velásquez, RDPC 15 (2005), 215, que conforma sua crítica no marco de uma crítica geral ao funcionalismo de Jakobs. Sobre a admissibilidade do direito penal do inimigo e o fato de recordar modelos de segurança cidadã e guerra irregular compare Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 132; Abanto, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 26 ss.; Lascano, in: ibidem, p. 207 ss. 160 Eser, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 443: “não se trata de introduzir uma teoria no mundo, senão de poder manejá-la na prática”. Ibidem, p. 445: “desenhar sistemas jurídico-teóricos, por muita coerência interna que tenham, é uma coisa; outra é deduzir conseqüências disso, e isto não é menos importante no âmbito da responsabilidade científica”. 161 Eser, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, 445 com a nota 3. 162 Conforme Eser in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, 445 com a nota 3. 163 Jakobs, Prólogo, in: Jakobs/Cancio, Enemigo, p. 15. 164 Conforme a carta de Jakobs a Muñoz Conde reimpressa em Muñoz Conde RP 16 (2005), 124 com a nota 9, pelo que também aqui – assim como no conflito entre Velásquez e Jakobs no marco de uma conferência na Universidade de Externado da Colômbia, Bogotá, em outubro de 2004, na qual Jakobs abandonou indignado a sala (assim o viram pelas ruas vários presentes, Conforme também Muñoz Conde RP 16 (2005), 125 com a nota 11; na versão escrita da conferência de Velásquez, RDPC 15 (2005), 197, não se faz referência ao acontecido). – a discussão científica se transfere a um plano pessoa pouco frutífero, o qual também deve conduzir em parte à mal-entendidos idiomáticos por parte de Jakobs. 165 Jakobs, HRRS 3/2004, 89 s. 166 Conforme Schmitt, Leviathan, p. 67 ss. Schmitt, no que diz respeito à sua concepção de Estado e suas autoridades, se remete continuamente a Hobbes (ibidem, especialmente p. 66 ss, 131 s.), apesar de que a visão subjacente de Hobbes resulte, desde a perspectiva da interpretação do próprio, claramente conflitiva (conforme Aponte, Feindstrafrecht, p. 96 ss.). Assim como naquele, a interpretação que Schmitt realiza de Hobbes considera que o Estado deve, da mesma forma que uma máquina, ser livre de objetivo e convencimentos políticos, e deve manter uma neutralidade a respeito dos valores e da verdade como a que mantém um instrumento técnico. Assim Schmitt (Leviathan, p. 63) se entusiasma da seguinte maneira: “Que visão curta e confusa é a luta entre princípios teológicos, jurídicos ou similares! Pelo contrario quão ‘exata’ e ‘limpa’ é a máquina! Quão evidente é a
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que o Estado permanece enquanto Direito retrocede»167. Como é sabido, esta argumentação serve especialmente às ditaduras latino-americanas para justificar o desmantelamento do Estado de Direito da mão da razão de Estado, isto é, para a sustentação do próprio Estado – que contraditio in adiecto!168. O discurso do direito penal do inimigo, tal como o propugnava Schmitt, outorga à repressão estatal uma direção inquietante: a exclusão de grupos inteiros da população169. Neste sentido, pode-se considerar que Schmitt foi o «precursor» ou o «mentor espiritual» do direito penal do inimigo e, portanto, o precursor do discurso jakobsiano170. E como mínimo pode reprovar-se a Jakobs a consagração científica da política criminal do direito penal do inimigo – isto é, do discurso populista da segurança pública e da tolerância zero171 –, ainda que possa não querer nada disso. Além do que já foi dito antes, um conceito legitimador-afirmativo do direito penal do inimigo submete-se à reprovação de aproximar-se do pensamento nacional-socialista, tal como se expressa na proposta de lei sobre «estranhos à comunidade»172 e em Edmund Mezger: «o extermínio de partes da população que contém povos e raças perigosas»173, assim como da conformação de dois direitos penais; um para a generalidade e outro para determinados grupos de pessoas: os delinqüentes por tendência174. Isso não permite indicar nada a respeito da inclinação política de Jakobs ou de outros partidários de um moderno direito penal do inimigo – Jakobs encontra-se muito além de qualquer dúvida, graças ao conjunto de sua obra jurídico-penal!175 e, de fato, o direito penal nazista foi, todavia, muito além do direito penal do inimigo176; no entanto, os paralelismos históricos terminam impondo-se quando se leva a cabo uma análise detalhada. concepção de que o valor do Estado reside em que é uma boa máquina, ou aliás, a grande máquina, a machina machinarum!” E posteriormente na p. 69: “Semelhante Estado tecnicamente neutro pode ser tão tolerante como intolerante; em ambos os casos segue sendo neutro na mesma medida. Adquire seu valor, sua verdade e sua justiça em sua plenitude técnica”. O Estado é a negação da guerra – isto é, da guerra civil – e evita a guerra. Se não se leva isto à cabo, “então volta a reinar o estado de natureza e já não existe Estado algum. Um exclui o outro”. (ibidem, p. 72). 167 Schmitt, Politische Theologie, p. 18. 168 Aponte, Feindstrafrecht, p. 107. Também se mostra muito crítico a respeito da razão do Estado como o “único fundamento” do direito penal Muñoz Conde, in: Losano/ Muñoz Conde, Globalización, p. 173, para quem esta é a posição do funcionalismo extremo de cunho jakobsiano. 169 Conforme também Muñoz Conde RECJ Nr.2 (2005), 25. 170 Prantl, SZ del 5./6.3.2005, 17; e mais: “desmantelamento do Estado de Direito”, “cisão cultural”, “com um vocabulário que já não se escutava na Alemanha há seis décadas.” No entanto Zaffaroni, El enemigo, p. 155 considera que “a proposta de Jakobs não está aparentada com a de Schmitt, como tampouco o estiveram todas as anteriores que postularam o tratamento penal diferenciado do inimigo com outro nome…” 171 Prittwitz, in: Mir/Corcoy, Política criminal, p. 118. Conforme Díez Ripollés, RECPC 6-03 (2004), 24: “defeituosa… ao campo da ideologia da segurança cidadã”; também Mana, in: Cancio Meliá/GómezJara, Derecho penal del enemigo, p. 259 ss. Para Zaffaroni, El enemigo, p. 183 este novo tipo de legislação baseada nesta tendência cria confusão na medida em que procura agrupar tudo em um tipo e termina gerando contradição e impunidade. 172 Projeto de Lei 17.3.1944, BA R 22/944, Bl. 225 ss, 233 ss; sobre isso, fundamental, Werle, JustizStrafrecht, p. 619-680, especialmente pp. 636 ss; Muñoz Conde, Edmund Mezger, p. 206 ss. 173 Mezger, Kriminalpolitik, p. 247. 174 Conforme o parecer de Mezger para o Projeto de Lei citado à nota 172, referido em Muñoz Conde, Edmund Mezger y el derecho, p. 239 ss. Conforme também Muñoz Conde, in: Losano/ Muñoz Conde, Globalización, p. 171 s.; Portilla Contreras, JpD 49 (2004), 49 à nota 58. 175 No mesmo sentido Aponte, in Uwer, Ruhe, 132. 176 Enquanto o direito penal nacional-socialista, aliás, queria eliminar “inimigos do povo” (“Volksfeinde”) e “antisociais” (“volksschädlinge”) não perigosos, conforme Saliger, JZ 2006, 761 à nota 82.
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No que diz respeito especialmente à América Latina177, resulta surpreendente a falta de cuidado com a qual Jakobs tem postulado seu pensamento sobre o direito penal do inimigo na realidade ali existente178; sobretudo se se parte, em seu favor, de que em inúmeras viagens tem se familiarizado com as condições político-criminais dominantes e não quer regar com azeite o fogo da concepção dominante, cuja tendência ao direito penal do inimigo resulta evidente179. Algumas expressões de Jakobs, em particular, fomentam que surja a dúvida a respeito do fato de que se Jakobs tem consciência do peso de suas palavras, e se, de fato, se esforça em não converter a si mesmo em um «provedor de personalidades autoritárias» ou em não ser mal-interpretado como tal. Assim, em relação à Colômbia180, Jakobs tem sustentado a opinião de que – em uma situação tão «desastrosa» como a que vive esse país – «obrigatoriamente aparece uma situação de direito penal do inimigo»181. Não obstante, é plenamente consciente das complexas condições do conflito colombiano que já dura anos? Por acaso sabe que na América do Sul sempre existiu um direito penal do inimigo devido mais precisamente ao domínio colonial espanhol e português, tendo contribuído para isso a criminalização de minorias sociais e étnicas (entre outras), assim como de grupos sociais oprimidos?182 Se, como indica Jakobs, a mera «existência de grupos com diferentes concepções normativas» e os correspondentes «conceitos não homogêneos de pessoas» conduz obrigatoriamente ao direito penal do inimigo183, então resulta igualmente válido para a América Latina o que resulta para as sociedades multiculturais européias: os marginalizados em qualquer caso, seguirão sendo marginalizados (supra a) in fine). Esta crítica em concreto não se vê afetada pela objeção genérica de que «toda construção teórica pode ser objeto de abusos»184. Assim mesmo, a indicação de que a Corte Constitucional da Colômbia, precisamente recorrendo ao conceito de Jakobs de direito penal do inimigo, declarou inconstitucionais vários preceitos jurídicos185, não 177
Conforme Aponte, Guerra, p. 215 ss., 468 ss.; Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 40 ss.; Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 131; Seligman enemigo, p. de Menezes, Boletim IBCCrim 2006, p. 19. 178 Zaffaroni, El enemigo, p. 160 ss. considera que a proposta de Jakobs de fato reduziria o âmbito de aplicação e a prática existente atualmente na América Latina em setores como o da prisão provisória. De outro lado considera Pastor, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 516, que “os juizes sem rosto e os Estados de ‘não direito’ ibero-americanos, por exemplo, não parecem ser instituições cuja legitimidade ou ilegitimidade varia realmente com cada publicação das expressões de um jurista europeu. Pelo contrário, dificilmente se modificará o mundo real graças aos textos de Jakobs, nem tampouco graças às nossas reflexões, seus críticos” (no mesmo sentido a citação supra à nota 3). 179 Aponte, Guerra, p. 222 ss., 370 ss.; Zaffaroni, El enemigo, p. 67 ss., 77 ss.; Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 45 ss.; Polaino-Orts, Derecho penal del 71 ss. 180 Aponte, Guerra, p. 213 ss.: são da maior importância para a discussão penal os esforços realizados em todos os níveis na Colômbia para tratar de desencadear a guerra dentro de um contexto jurídico. De fato a Colômbia é a mostra da existência de guerra e Estado, algo que no pensamento de Jakobs ainda não se tem podido articular. 181 Jakobs, entrevista com Martínez, in: Martínez, Necesidad de Pena, p. 28. 182 Sobre a Colômbia Aponte, Feindstrafrecht, p. 221 ss., 331 ss.; idem, in Uwer, Ruhe, 161 ss. para quem o caso colombiano é um exemplo de um direito penal do inimigo fracassado; também Sinn, ZiS 2006, 111. Quanto à Argentina Aboso, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 61 ss.; quanto ao Peru García Cavero, in: ibidem, p. 931 ss. Crítico no tocante ao dano que produz o direito penal do inimigo à América Latina Prittwitz, in: Mir/Corcoy, Política criminal, p. 119; Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 39 ss. 183 Jakobs, in: Martínez, Necesidad de Pena, p. 28. 184 Cancio, in Jakobs/Cancio, Enemigo, p. 93 = Cancio, ZStW 117 (2005), 283. 185 Cancio, in Jakobs/Cancio, Enemigo, p. 93.
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resta um ápice às dúvidas estabelecidas. Eu mesmo já me pronunciei sobre esta proposta de contrapor ao Jakobs do direito penal do inimigo, um Jakobs do direito penal mínimo e ponderar um contra o outro ao mesmo tempo (isto por si só não elimina os problemas do discurso do direito penal do inimigo do mundo), como segue: 186 “… não se trata aqui de negar a possibilidade do abuso de concepções teóricas, muito menos de postular a capacidade de tais concepções de tornar imune um ordenamento jurídico-penal à evoluções ilegítimas. Tampouco se trata de negar que a concepção integral de Jakobs … ‘produziu em várias ocasiões construções dogmáticas com um alto potencial de supressão da punibilidade’187 e, portanto, pode servir para a Constituição (colombiana) face ao expansionismo penal do poder executivo (se bem que sabemos que a influência desta concepção na Corte Constitucional Colombiana se deve muito mais à admirável atuação do –antigo– Magistrado Eduardo Montealegre, eminente integrante da escola jakobsiana na Colômbia, que por seu conteúdo garantista: não é a única, nem a mais convincente concepção do moderno direito penal para salvar as garantias constitucionais ante um regime autoritário). Não se trata disto. Trata-se muito mais de estarem conscientes e atentos à periculosidade intrínseca de uma concepção que, de acordo com o seu próprio autor, de um mero instrumento de análise crítica do estado do direito penal foi radicalizada e convertida em uma concepção que não se limita mais à mera descrição, senão que, ao contrário, postula e exige a exclusão e marginalização dos inimigos do sistema (dominante)188, o qual pode servir perfeitamente como base teórica ou fundamento de um regime (penal) de cunho autoritário. Esta virada na concepção de Jakobs do direito penal do inimigo não foi percebida nem mesmo por todos os seus discípulos (inclusive a decisão da Corte Constitucional colombiana –sentença C-939/02 de 31/10/2002–, citada por Cancio, se baseia na concepção anterior de Jakobs –de 1985– ignorando a nova linha de pensamento do seu mestre)189 e não pode ser defendida simplesmente invocando os méritos da concepção global do citado pensador. Enfim, o que merece ser criticado na nova posição de Jakobs é a sua ambigüidade até mesmo na utilização de certos termos, uma ambigüidade que pode dar lugar a abusos.”190 Ademais, a crítica que aqui se efetua é dirigida, em seu sentido fundamental, à conformação unilateral da ciência jurídico-penal alemã e por bem exportável aos países do âmbito jurídico da Europa continental; e como tal, não só afeta a Jakobs, senão também a outros expoentes da ciência penal alemã191. O ponto de vista unilateral do qual parte o sistema alemão no mundo, faz com que as exportações jurídico-penais sejam imunes – ou ao menos parcialmente cegas – aos conhecimentos dos sistemas ou ciências jurídico-penais do Estado receptor e, em muitas ocasiões, precisamente às realidades sociais destes Estados. As razões para isso são diversas e vão desde uma falta de domínio do idioma até uma presunção intelectual das exportações (alemãs) e um exagerado respeito às importações (latino-americanas, em particular). Não obstante, tudo o que foi mencionado não justifica as sempre claramente desiguais relações entre a ciência penal alemã e 186
Ambos, Parte General, p. 58 (com notas parcialmente modificadas). Cancio, in: Jakobs/Cancio, Derecho penal, p. 92. 188 Veja supra II. 1. 189 Veja a nota 38 da sentença, onde se cita o trabalho de Jakobs de 1985. 190 Neste sentido também, desde o ponto de vista latino-americano (colombiano), Aponte, Feindstrafrecht, p. 126 ss, 131, 134 f; Conforme também Greco, GA 2006, 103. 191 Conforme Ambos, Allgemeine Teil, p. 54 ss.; idem, PG, p. 49 ss. Conforme também Muñoz Conde, RP 16 (2005), 255. 187
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outras ciências do âmbito jurídico da Europa continental; ao contrário, deveriam continuar os primeiros passos dados para uma abertura da ciência penal alemã192. 3. Contra-modelo: um direito penal para todos os seres humanos 1. Após as indicações efetuadas até agora, deveria ter ficado claro que o direito penal inimigo deve ser rechaçado por muitos motivos193. O conceito carece de precisão e encontra-se normativamente sobrecarregado. Mesmo quando se quer outorgar uma lógica função analítica à sua variante crítico-descritiva (supra II.1), deve seguir sendo rechaçado por sua falta de operatividade derivada dos problemas de delimitação já descritos (supra II.2.a) e pelo perigo de abuso – sobretudo, tanto nos sistemas que resultam precários desde o ponto de vista do Estado de Direito, como, fundamentalmente, nos totalitários – (supra II.2.c)). Ademais, exerce de forma contra-producente seu conteúdo polêmico e polarizador, à luz da necessária discussão de caráter crítico-racional da expansão jurídico-penal perceptível em todos os lugares. Em vez de abrir o caminho para esta discussão, o conceito provoca um intercâmbio emocional de golpes, no qual se utilizam argumentos pessoais no lugar dos materiais e a razão é deixada de lado194. Apesar disso, o conceito de inimigo se situa em uma continuidade histórica que pesa, precisamente, como um conceito de luta, o qual sempre encontra aplicação quando se rompe a comunicação195 e resultam excluídos (ou combatidos) seres humanos ou grupos de seres humanos. O fundamental vem a ser que o direito penal do inimigo se baseia na distinção entre o ser humano – isto é, o indivíduo – como conceito pré-jurídico e a pessoa como construção normativa da imputação jurídico-penal196. Somente quando se constrói «normativamente» a pessoa neste sentido, como destinatário das normas penais – mais concretamente: quando a aplicação do direito penal do cidadão se faz depender do reconhecimento como pessoa – só resta ao mero indivíduo, como «não-pessoa», o direito penal do inimigo197. Estas premissas separam o direito penal do inimigo de um direito penal orientado pelo ser humano e fundamentado na 192
A “nova abertura” pode constatar-se em vários indícios, por exemplo, nas intensas atividades e capacidades lingüísticas de jovens penalistas alemães ou no amplo círculo de colaboradores estrangeiros na revista GA e nas crescentes publicações dos colegas estrangeiros. 193 Conforme também Guillamondegui, Discursos, p. 15; Cancio, ZStW 117 (2005), 280 ss.; Hefendehl, StV 2005, 158; Greco, GA 2006, 113 s.; Gössel, FS Schroeder, 33 ss.; Streng, in Uwer, Ruhe, 244 ss. Zaffaroni, El enemigo, p. 168 ss., 173 ss.; Aponte, Guerra, p 216; Feijóo Sánchez, DPC 2006, p. 174 ss.; Aller, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 111; Gomes/Bianchini, in: ibidem, p. 975 ss.; Luisi, in: ibidem, p. 255; Modolell, in: ibidem, p. 337; Palermo, in: ibidem, p. 473; Scheerer/Böhm/Víquez, in: ibidem, p. 934 ss. 194 Conforme também Greco, GA 2006, 114: “Se a razão deve conservar seu lugar no direito penal, não há espaço para o direito penal do inimigo.” De modo similar Saliger, JZ 2006, 761. Aponte, in Uwer, Ruhe, 150 fala de uma “terminologia perigosa”; de modo similar Neumann, in Uwer, Ruhe, 314. 195 Sobre a capacidade comunicativa, inclusive do terrorista veja Sinn, ZiS 2006, 114. 196 Conforme Schünemann, in: Moreno, Problemas, p. 266, onde se contrapõem a “categoria ontológica do ser humano” à “categoria normativa da pessoa”. Crítico também Saliger, JZ 2006, 761 falando de um dualismo “relativo ao sujeito” (relativo ao autor)” entre cidadão e inimigo. Scheffler, FS Schwind, 123 ss. distingue entre Direito Penal do amigo e do inimigo (“Freund- und Feindstsrafrecht”). Uma aplicação comparativa a diferentes níveis de um direito penal do inimigo e do cidadão mostra Hörnle, GA 2006, 81 s. Veja também Mir Puig, Homenaje Rodríguez Mourullo, p. 676, pé da página 32: “Só é concebível maior desprezo da dignidade humana, que merece todo indivíduo de nossa espécie, o que negar-lhe a condição de pessoa.” 197 Gracia Martín, RECPC 07-02 (2005), 34, 41 s.
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dignidade humana – que é pelo qual, aqui, se advoga. Um direito penal “cujo caráter total ou limitado depende (também) de quanto se tema o inimigo,198 que “frente ao inimigo (...) somente seja coação física, até a guerra”,199 e onde “todavia, não existe acordo de que se trate de direito”200, inclusive falando-se da “impossibilidade de uma juridicidade absoluta”201, não pode ser um direito penal adequado ao ser humano. A distinção entre homens “bons” e “maus”, cidadãos e inimigos, constitui uma simplificação, cujas conseqüências não são compatíveis com a dignidade humana202. A contaminação do direito penal do cidadão com regras do direito penal do inimigo (supra b)), mediante a criação de um direito penal do inimigo em separado é como exorcizar o diabo com o belzebú e mandar ao inferno aqueles tachados de inimigos. Por sua vez, com dita separação desaparece a influência moderada do direito penal do cidadão sobre o direito penal do inimigo. Um direito penal do inimigo isolado não pode em nenhum caso garantir o Estado de Direito do restante direito penal do cidadão (embora o estabeleça como pretexto), posto que a a-juridicidade, que deveria se referir apenas a alguns indivíduos isolados, não constitui «um âmbito situado nas fronteiras do Estado, senão que, obrigatoriamente, recorre à totalidade do Estado e destrói o núcleo do Estado de Direito»203. Em outras palavras, o direito penal do inimigo não salva o direito penal do cidadão, senão é ele o próprio inimigo deste.204 Em poucas palavras, desde a perspectiva do direito adequado ao ser humano, o direito penal do inimigo não é direito, somente uma contradictio in adiecto205. Isso se deve a diversas causas que aqui somente poderão ser resumidas: 198
Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53. Jakobs, HRRS 3/2004, 90. 200 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 51. 201 Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53. 202 Ambos, Allgemeine Teil, p. 60; idem, PG, p. 55; assim mesmo Gössel, FS Schroeder, 39 (“Enthumanisierung”), 41 ss.; Neumann, in Uwer, Ruhe, 313; Schneider/Morguet, in Uwer, Ruhe, 342 ss.; Saliger, JZ 2006, 762 criticando a tensão do conceito de pessoa de Jakobs com a garantia constitucional da dignidade humana. Para Aponte, Guerra, o conceito de dignidade é de grande importância, como vemos ao longo de sua obra. Assim, na p. 207 assinala que na América Latina a defesa da dignidade é um processo inaceitável. Na p. 639 inclui a relevância especial da dignidade humana em países como Colômbia e Alemanha e em geral em países da tradição continental, onde a Constituição tem dado uma ênfase na dignidade humana. Finalmente, o autor considera que a dignidade humana é a barreira frente às decisões de política criminal (p. 642 ss.). Ver também Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 32 ss. 203 Bielefeldt, Folterverbot, p. 10; de modo similar Kunz, in: Barton, 2006, 86 (“do ponto de vista do Estado de Direito insuportável”); Schünemann, FS Nehm, 226 (“não pode existir um inimigo como não-pessoa no Estado de Direito”); Saliger, JZ 2006, 761 s. advertindo o caráter totalitário do conceito. 204 De modo similar Streng, in Uwer, Ruhe, 248. 205 Conforme Cancio, ZStW 117 (2005), 282 ss. (286 com notas 68, 288); idem, DPC 3 (2003), 39 ss.; Prittwitz, ZStW 113 (2001), 795;idem, in: Mir/Corcoy, Política criminal, p. 114; Gracia Martín, RECPC 07-02 (2005), 30 (conforme também 27, onde ele só considera o direito desde o ponto de vista procedimental – "desde el punto de vista do Estado como agente" – ); Silva Sánchez, Expansión, p. 187; Laurenzo, RDPC 12 (2003), 456; Sauer, NJW 2005, 1704; Jäger, in: Neubacher/Klein, Recht der Macht, S. 62 (“Unwort”). Igualmente crítico Greco, GA 2006, 104; Uwer, in: Uwer, Ruhe, 45; Frommel, in Uwer, Ruhe, 76; Albrecht, ZStW 117 (2005), 858 (“abuso do termo ‘direito’”). – Inclusive o próprio Jakobs (conforme Gropp, ZStW 97 (1985), 930) admite dúvidas: o fato de se o “Direito penal de necessidade” é todavia Direito depende de em que medida se procede de tal maneira: se chega a um Direito penal no pleno sentido da palavra quando se aplica radicalmente. E isso, posto que então se perde o caráter jurídico, o Direito cede passagem à luta, à guerra. Nesta situação a denominação direito penal do inimigo seria apenas uma expressão eufemística. 199
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- Trata-se principalmente de uma defesa frente a perigos, isto é, de um direito preventivo, também policial, como da ordem – e não de um direito penal repressivo;206 em sua forma extrema (em particular na aplicação contra “terroristas”) não se trata nem sequer de direito, senão de pura força (militar ou policial)207; - Conduz a uma virada do fato para o autor, isto é, em trocar o direito penal do fato por um direito penal do autor. 208 - Não pode aspirar a nenhum efeito geral de estabilização da norma no sentido de uma prevenção geral positiva, pois estabelece regras especiais para certos “inimigos”209. Ao direito penal do inimigo deve opor-se um direito penal para todos os seres humanos, isto é, uma concepção humanitária do direito penal que parta do indivíduo e sua inalienável dignidade humana210, no sentido da relação de reconhecimento kantiana211, que era livre, igualitária, recíproca e se baseava na dignidade humana – a auto-finalidade do ser humano212. Um direito penal adequado ao ser humano percebe o homem real «de carne e osso» como um sujeito de imputação213. Dispõe de fundamentos jurídico-estatais e jurídico-constitucionais; sobretudo a dignidade 206
Zaffaroni, in: Cuestión Penal, p. 158 (“administrativização“) e El enemigo, p. 156, 165 ss. onde afirma que o conceito jurídico de inimigo só é admissível em um Estado absoluto. E que a existência de Estados de polícia se apresenta encapsulada dentro dos Estados de Direito que os contém. Daí que seja missão do direito penal orientar-se pelo ideal de um Estado de Direito, já que do contrário estaria se aproximando perigosamente a um Estado de Policia; conforme também Albrecht, Sicherheitsbegriff, p. 12; Hassemer, StV 2006, 327 s.; Neumann, in Uwer, Ruhe, 303, 306. Conforme, assim mesmo, a valoração de Elsea, Detention, p. 7, no sentido de que a detenção de cidadãos norte-americanos como “inimigos combatentes”, assim como, em geral, os presos de guerra e os inimigos cívicos não tem nada a ver com as medidas penais: “a detenção (…) é mais administrativa que punitiva, e portanto não se requer procedimento penal algum.” Naturalmente, o direito penal também tem um efeito dissuasivo e assim preventivo, porém isto não o converte em puro direito preventivo (ver também Schünemann, FS Nehm, 224 s.; Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 128; Denkowski, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 524 ss., 535 ss.; Donini, in: ibidem, p. 643 ss; Scheerer/Böhm/Víquez, in: ibidem, p. 924 207 Conforme Schünemann, FS Nehm, 224: “Substituição do direito penal pela força militar”. 208 Conforme supra II. 2. a) com outras referências à nota 118. 209 Cancio, ZStW 117 (2005), 284 ss; conforme Hörnle, GA 2006, 94; Streng, in Uwer, Ruhe, 244 s.; ver também Zaffaroni, in: Cuestión Penal, p. 154 quem testemunha que o “Derecho penal del enemigo”, na realidade, realiza um labor mais preventivo geral que, com o passar do tempo, seria vítima não só da liberdade senão também da segurança. 210 Sobre isso Ambos, Allgemeine Teil, p. 65 ss.; idem, Parte General, p. 61 ss. Assim Gracia Martín, RECPC 07-02 (2005), 34 ss.; Ramírez, Derecho penal del enemigo, p 47 ss.; Demetrio Crespo, ZIS 2006. p. 422 ss.; ver também Zaffaroni, El enemigo, p. 169 ss., 183: “A melhor garantia de eficácia do direito penal é o respeito aos direitos humanos”. 211 Sobre uma aplicação frutífera da filosofia kantiana para uma “filosofia dos direitos humanos” válida em todo o mundo, conforme Bielefeldt, Philosophie der Menschenrechte, p. 45 ss. (62 ss.), 158 ss., 202 p. 212 Conforme Greco, GA 2006, 105 com referência a Kant. Neste sentido também Eser, FS Lüderssen, p. 196 s., 203; idem, UNED, Modernas tendencias, p. 17 s., 31 ss.; Ramírez, Derecho penal del enemigo, p. 34 ss. 213 Schünemann, in: UNED, Modernas tendencias, p. 655; assim Gracia Martin, RECPC 07-02 (2005), 34 ss. (34, 37, 41 ss. com outras referências especialmente a Pufendorf e Welzel); antes Hardwig, Die Zurechnung, p. 118; Maiwald, ZStW 78 (1966), 54. Ver também Mir Puig, Homenaje Rodríguez Mourullo, p. 189 em relação à função do direito penal como construção social do homem para o homem.
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humana e a liberdade da personalidade214. Somente o reconhecimento da individualidade do membro da sociedade pode garantir «uma correção da comprovação de construções abstratas sociais»215. Somente a «parcial asociabilidade do indivíduo» assegura a observância da dignidade humana e a humanidade garantidas na Constituição:216 «a humanidade como divergência e liberdade frente às obsessões e alucinações coletivas, como proteção dos indivíduos e das minorias, como possibilidade de auto-responsabilidade através da autodeterminação (…)217. A dignidade humana deve ser o ponto fixo e ao mesmo tempo de partida de todo o sistema de direito penal;218 só então pode opor-se à «“total desmitificação” do mundo (Weber) operada por um funcionalismo formalmente orientado a um fim (…), um obstáculo consideravelmente amplo e esperemos que insuperável»219. Resumidamente: os membros de um sistema de direito penal baseado na dignidade humana são sempre sistemas com o status de cidadão, em virtude de sua própria existência humana. O direito penal desse sistema jurídico não conhece inimigos e não tem lugar algum para a exclusão de alguns seres humanos. A ciência jurídico-penal desse sistema não tem nada a ver com as «regras do direito penal do inimigo»220, senão «mediante a investigação dogmática e a co-participação da política criminal, pode realizar uma prestação à liberdade no seio de uma segurança humanitária»221. A ciência do direito penal deve ser, neste sentido, também ciência prática que oriente suas teses e teorias às conseqüências externas do sistema222. Evidentemente, tudo isso resulta válido também para o crescente direito penal internacional. Trata-se antes de mais nada, e em primeiro lugar, de direito penal; em razão do que, neste devem resultar igualmente vigentes os mesmos princípios jurídico-estatais que deve obedecer o direito penal nacional223. E mais: seria desastroso que as conquistas jurídico-estatais que, no marco de um liberal direito penal do cidadão, se tem conseguido com muito esforço desde a Ilustração, fossem sacrificadas no altar de um neo-punitivismo humanitário que não pode distinguir os 214
Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 127-131 Soeffner, in: Amelung, Verantwortung, p. 26. 216 Aponte, Guerra, p. 645 ss.: direito penal da Constituição; de modo similar Fernández, in: Schöne, Estado de derecho, p. 127 se refere ao direito penal como direito constitucional aplicado; ver também Moccia, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 320. 217 Soeffner, in: Amelung, Verantwortung, p. 26. 218 Explicitamente Albrecht, ZStW 117 (2005), 852: “A dignidade humana como bem universal da civilização é indivisível.” (“Die Menschenwürde als universelles Gut der Zivilisation ist unteilbar.”). Ver também as referências supra à nota 202. 219 Soeffner, in: Amelung, Verantwortung, p. 27: «restlosen Entzauberung (Weber) der Welt durch einen formalzweckrationalen Funktionalismus (…) ein ziemlich sperriges und hoffentlich unüberwindliches Hindernis in den Weg». 220 “… e inclusive nem “identificar-se “, Jakobs, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 53, Conforme supra nota 140 e o texto correspondente. 221 Eser, in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 446 222 Muñoz Conde, in Eser/Burkhardt/Hassemer, Strafrechtswissenschaft, p. 202. 223 A idéia vem se impondo na discussão sobre direito penal internacional conforme, recentemente, Fletcher/Ohlin, JICJ 3 (2005), 539 ss. No mesmo sentido, contra um direito penal internacional do inimigo Jäger, in: Neubacher/Klein, Recht der Macht, p. 62 alegando que d.p.i. não é preventivo (como o direito penal do inimigo) senão repressivo. Ver também Zaffaroni, El enemigo, p. 175 ss.; Aponte, Guerra, 216 ss. Para Pastor, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 487 s. “[a] importação do direito penal nacional por parte de sistemas inter-estatais tem dado lugar a um produto frustrado … uma criação que podemos sob o nome de poder penal internacional.” (grifo no original). Ver também sua obra fundamental e muito crítica com o mesmo título do ano de 2006. 215
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princípios do direito penal dos princípios programáticos humanitários e exige a punição a qualquer preço224. A conseqüência seria, de fato, um direito penal internacional do inimigo225, que ignora tudo aquilo que seus apologistas huminatários defendem por outro lado – se é que não se trata de delitos graves contra a humanidade: precisamente as garantias e princípios jurídico-estatais de um direito penal ilustrado (humanitário). Em um recente trabalho Daniel Pastor afirma que “… o poder penal internacional é o protótipo do direito penal do inimigo”, “… é o direito penal do inimigo em sua versão mais pura”.226 No mesmo trabalho diz (referindo-se à afirmação de Jakobs de que na ordem internacional nos movemos no exercício da pura força, de tal forma que mais do que uma pena, trata-se é de puro submetimento): “Quem não cair na hipocrisia de acreditar que existem valores comuns a toda esta humanidade… deverá aprovar as palavras precedentes de Jakobs”.227 Neste contexto me considero como “um dos mais fervorosos crentes nos – a meu juízo completamente imaginários – consensos internacionais mínimos em torno dos direitos humanos”.228 Esta afirmação é, como toda a posição de Pastor em seu excelente estudo sobre o poder penal internacional (2006), exagerada e ademais polêmica. Estou absolutamente de acordo com este autor em que o direito penal internacional (“dpi”) tem que respeitar padrões internacionais jurídico-estatais e inclusive já tenho advertido do perigo de um direito penal internacional do inimigo na versão original alemã deste mesmo trabalho229 (que Pastor, no entanto, não leva em conta). Ademais, sempre tenho reclamado e sigo reclamando por uma dogmatização do direito penal internacional, com vistas à conformação de princípios fundamentais próprios de um direito penal de acordo com o Estado de Direito, em particular o princípio da culpabilidade e da legalidade material; de fato, esta já foi minha posição em minha Parte Geral (bem conhecida por Pastor) e ultimamente em dois trabalhos publicados em inglês.230 No entanto, conheci a realidade das negociações do Estatuto de Roma por minha participação como “especialista independente” da delegação alemã e tive que aprender que o resultado deste tipo de negociações consiste muitas vezes em compromissos políticos pouco guiados pela teoria pura (e muito menos por uma verdade dogmática); justamente por isso (e por outras razões) estes resultados podem ser facilmente criticados desde um ponto de vista puramente acadêmico-dogmático. Naturalmente para nós, especialistas e acadêmicos, que participamos destas negociações e somos co-responsáveis pelo seu resultado, é difícil defender tal ponto de vista (puramente acadêmico) – porque é pouco realista – porém evidentemente reconhecemos que o Estatuto de Roma tem certos defeitos; eu inclusive já o disse em meu primeiro trabalho sobre o Estatuto de Roma231 que Pastor, no entanto,
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Conforme, especialmente na América Latina e sobre a jurisprudência expansiva de direitos humanos da Corte Interamericana de direitos humanos, instrutivo Pastor, NDP 2005 A, 73 ss. Ver também Yacobucci, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 1101. 225 Sobre a discussão com Jakobs neste contexto Ambos, Allgemeiner Teil, p. 63 ss.; idem, Parte General, p. 58 ss.; ver também Aponte, in Uwer, Ruhe, 156 ss. 226 Pastor, in: Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, pp. 489 e 517. 227 Ibidem, p. 496. 228 Ibidem, p. 496 com nota 76. 229 Ver supra nota *. 230 Ver sobretudo o trabalho no Journal of International Criminal Justice, 5 (2006), 660 ss.; ver também o trabalho em Haveman/Olusanya, Sentencing, 2006, 17 ss. 231 Em Ambos/Guerrero, Estatuto de Roma, p. 99 ss.
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cita232 só parcialmente quando diz que eu considero o Estatuto de Roma “uma grande obra” omitindo o resto da frase que contém uma importante reserva (“ainda que melhorável”)233 e, ademais, prescindindo de todo meu prólogo crítico à análise do Estatuto, onde assinalo que o mesmo “não segue critérios lógico-objetivos, senão que representa o resultado de um processo de discussão político-jurídico de muitos anos, marcado pela busca de soluções suscetíveis de consenso e de máxima predisposição de compromisso. Intentou-se, porém, não foi possível chegar a soluções maduras no plano dogmático e juridicamente livres de contradição; tão só se procurou refundir os diferentes interesses político-criminais das delegações dos Estados em uma forma aceitável para todos.”234 Justamente por tudo isso digo ao final de minha análise que o Estatuto é “melhorável”, porém, desde o ponto de vista da Realpolitik, não foi possível um Estatuto melhor neste momento e, insisto, em todo caso, o Estatuto foi e é um avanço, comparado com tudo o que existia anteriormente. Isto não quer dizer sejamos “fervorosos crentes nos... consensos internacionais mínimos em torno dos direitos humanos”, como Pastor supõe,235 e muito menos que sejamos hipócritas, como Pastor parece supor.236 Sim, acreditamos que existem valores – desafortunadamente não comuns a toda a humanidade – para cuja proteção necessitamos – lamentavelmente – também e com todos seus defeitos do direito penal internacional. Também acreditamos que, frente à realidade das violações em massa e graves dos direitos humanos, não tem sentido rechaçar todo este direito penal internacional, senão, ao contrário, o que se deve fazer é propender pelo seu melhoramento, por certo para um direito que mereça este nome. As freqüentemente evocadas exigências por mudanças237 também podem encontrarse com um direito penal que faz justiça ao ser humano sem renunciar às conquistas jurídico-estatais fundamentais238. A resposta adequada à ameaças externas deve ser uma reação de normalidade239. As normas e os valores só podem estabilizar-se mediante uma reação que leve em consideração os critérios da proporcionalidade e imputação jurídico-penais240. O fato de que, além do mais, o direito penal pode dirigir-se de diversas maneiras aos seres humanos que habitam em seu âmbito de vigência, não só corroboram os freqüentemente citados fins da pena, senão também 232
Em Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 517 com nota 147. Conforme em Ambos/Guerrero, Estatuto de Roma, p. 145. 234 Ibidem, p. 102. 235 Em Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 496 com nota 76. 236 Conforme Pastor, ibidem, p. 496. 237 Conforme Kuhlen in: Eser/Hassemer/Burkhardt, Strafrechtswissenschaft, p. 57 ss, quem, neste sentido, cita a proteção de bens universais de difícil concreção, a problemática dos delitos de perigo abstrato, o relaxamento da imputação individual mediante a responsabilidade pelo atuar organizativo, a flexibilização das conseqüências jurídicas, a ampliação das autorizações de intervenção por parte das autoridades de persecução penal e as conseguintes fronteiras obscuras a respeito do direito penal de polícia e a problemática das conformidades processuais. 238 Demetrio Crespo, RDPC 14 (2004), 98; Guillamondegui, Discursos, p. 14; no mesmo sentido Jäger, in: Neubacher/Klein, Recht der Macht, p. 63. 239 Neste sentido Zaffaroni, El enemigo, p. 182 considera que se deve – quanto ao terrorismo – aplicar “a lógica do verdureiro”, isto é, deve-se passar esta pergunta a especialistas, não ao direito penal. A pergunta é, ao contrário, o que o direito penal pode fazer os terroristas e a resposta depende de suas ações: “se estes não fazem nada, o direito penal nada pode fazer; se cometem delitos, corresponde individualizá-los, detê-los, processá-los, julgá-los, condená-los e fazê-los cumprir a pena. Isso é o que pode fazer o direito penal…”. Ver também Pastor, in Cancio Meliá/Gómez-Jara, Derecho penal del enemigo, p. 506 ss.; Zaibert, in: ibidem, p. 1172. 240 Cancio, ZStW 117 (2005), 285 s. 233
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o sistema de dupla via. Este leva em conta a distinção entre a retribuição repressiva da culpabilidade e o asseguramento preventivo dos autores especialmente perigosos241. Além disso, existem também outras propostas como a do direito de intervenção de Hassemer242 ou as diversas velocidades do direito penal de Silva243, que, no fundo, propõe uma reação especial frente à determinados perigos. Independentemente da opinião que mereçam cada uma destas propostas,244 não devem ser confundidas, em todo caso, com o direito penal do inimigo245, mas devem ter preferência ao pensamento perigoso e indefinido deste246, posto que se movem basicamente sobre a base jurídico-estatal dos sistemas constituídos democraticamente e reduzem a gravidade das sanções na medida em que se eliminam as garantias jurídico-estatais.247 REFERÊNCIAS Abanto Vásquez, Manuel A., El llamado Derecho penal del enemigo. Especial referencia al Derecho penal económico, en: Cancio Meliá/Gómez-Jara Díez (coords.), Derecho penal del enemigo. El discurso penal de la exclusión, Madrid/Buenos Aires 2006, vol. 1, p. 1-52. Aboso, Gustavo Eduardo, El llamado "Derecho penal del enemigo" y el ocaso de la política criminal racional: El caso argentino, en: Cancio Meliá/Gómez-Jara Díez (coords.), Derecho penal del enemigo. El discurso penal de la exclusión, Madrid/Buenos Aires 2006, vol. 1, p. 53-78.
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