Doméstica – Corpos que chegam, que ficam e que vão (Rossana Brandão Tavares)
Pag. 105 “No início do dia, pela manhã, quando caminhamos pelas ruas de grandes cida cidade dess bras brasile ileir iras as,, não não é difí difíci cill iden identitific ficar ar os moime moiment ntos os opos oposto toss de diferentes corpos pelas cal!adas de bairros de classe média e alta. "orpos que se diferenciam não apenas pelas roupas, pelo #nimo, pela cor, pela classe, pelo g$nero. "orpos que se distinguem principalmente pelo sentido% uns que ão e outros que chegam. &s que ão são as patroas e os patr'es que se direcionam ao seu local de trabal trabalho ho ou aos seus seus afa(er afa(eres es relaci relaciona onados dos ) famíli família. a. *uitos *uitos saem saem em carros, mas h+ aquelesas- que utili(am o transporte pblico e esbarram com os corp corpos os em sent sentid ido o opos oposto to.. Ness Nesse e mome moment nto, o, gran grande de part parte e dos dosas as-residentes desses bairros iencia dois moimentos. /m na rua e outro em sua casa. uando outros corpos chegam ao bairro e as suas casas, eles são chamados de domésticas. No entanto, quando o dia est+ apenas come!ando para essas pessoas, para as domésticas + é a segunda etapa de sua ornada. 2m seus bairros de origem, elas não são domésticas . 3ão mães, a4s, irmãs, filhas, amigas. 3ão i(inhas, moradoras de faela, de bairros periféricos ou ainda de municípios pr4 pr4im imos os.. 6ie 6iers rsas as dela delass se lea leant ntam am e saem saem de casa casa,, quan quando do aind ainda a amanhece, para enfrentar o transporte pblico até o seu destino% 7a casa da patroa8.9 Pag. 10: “uando falamos de transporte, as eid$ncias são mais eplícitas. ; maioria dos relatos da pesquisa reali(ada reela que grande parte do nmero de trabalhadorases- que saem antes das 5 e < horas da manhã em municípios da =aiada >luminense, por eemplo, e antes das < e ? horas nos bairros do subrbio do @io de Aaneiro, são mulheres e, proaelmente, domésticas. Para quem ie nos bairros de classe média e alta no @io de Aaneiro como Biuca, "opacabana, "atete, >lamengo, =arra, Aacarepagu+-, onde trabalham as domésticas entreistadas, não é difícil perceber, pouco a pouco, mulheres chegando )s portarias dos prédios residenciais que dominam a paisagem urbana dessas +reas. C...D9 Pag. 10E “Não podemos ignorar que as eid$ncias de seus corpos identificados como domésticas não se dão por suas roupas, suas bolsas, pelo seu eito, mas sobretudo pelo g$nero e por sua cor de origem.9 “;s diaristas diaristas entreista entreistadas das + trabalhara trabalharam m como domésticas domésticas mensalist mensalistas. as. 2ssa característica tem sido aaliada como uma tend$ncia desde F01F, ap4s a chamada 7P2" das 6omésticas8 a 2menda "onstitucional nG <
Pag. 110 “"om o intuito de compreender como as trabalhadoras aaliam essa depend$ncia de seu trabalho no dia a dia das famílias, perguntamos sobre as diferen!as entre a din#mica do trabalho doméstico em suas casas e nas 7casas das patroas8. Bodas citaram a organi(a!ão. 2m suas resid$ncias, são elas as principais respons+eis pelo trabalho doméstico e, por essa ra(ão, mant$m uma din#mica cotidiana autInoma, por e(es contando com a auda de i(inhosas-, familiares mães, irmãs, tias- ou dosas- pr4priosasfilhosas- para garantir a reprodu!ão da ida doméstica. Nas famílias de classes média e alta mantémJse o comportamento de responsabili(ar a mulher pelo trabalho doméstico não h+ uma din#mica colaboratia em rela!ão aos afa(eres domésticos-, e esta transfere parte desse trabalho )s domésticas, para garantir minimamente a din#mica de organi(a!ão do espa!o residencial. Nos registros das entreistas, as diaristas, por eemplo, reelam a percep!ão de que se espera muito mais do seu trabalho do que realmente elas podem oferecer. "onsequentemente, mais do que fa(er faina, as patroas esperam que elas organi(em suas casas em apenas um dia de trabalho semanal. Por outro lado, as mensalistas que dormem no seri!o di(em não obserar muitas diferen!as, isto que sua ida doméstica quase se confunde com a ida da família para qual trabalha. *uitas aceitam essas condi!'es pela dist#ncia de sua resid$ncia sobretudo aquelas que moram em municípios i(inhos na região metropolitana-, deiando a cargo de outras pessoas principalmente a outros membros da família- a reprodu!ão do trabalho doméstico, tornandoJse apenas proedoras e isitantes de sua pr4pria casa.9 Pag. 111 “;lgumas diaristas assumem que, por e(es, eem antagens em dormir 7no seri!o8 por conta de sua eperi$ncia cotidiana no transporte pblico. ;s horas dispendidas no percurso, a m+ qualidade e os perigos ienciados por elas não são um fenImeno recente, como obseramos ao longo do processo de urbani(a!ão da região metropolitana. 2las afirmam que as alternatias e suas estratégias de prote!ão são antigas e que, na erdade, cada e( mais elas precisam 7aprimor+Jlas8. Krande parte das domésticas entreistadas possui idade superior aos L0 anos. 2ntretanto, sair em grupo ou acompanhada, buscar transporte alternatios, mesmo que ilegais, e o uso da agulha de costura no trem ou Inibus lotados predominam entre os meios de defesa de se corpo.9 Pag. 11F “;s entreistadas moradoras de subrbios cariocas iem em bairros com melhores condi!'es urbanas que as que residem na =aiada >luminense, principalmente em rela!ão ao entorno. M+ mais op!'es de seri!os e la(er, por mais que algumas ainda prefiram gastar seu tempo de folga em casa.9 Pag. 11F e 11 “M+ outras que não dispensam a 7cereinha8, o funO ou o samba nos finais de semana. 73e eu não fi(er isso, eu fico doida, enlouque!o8 depoimento de @oberta, moradora de 2ngenho da @ainha-. Porém, são bastante discriminadas por isso no bairro onde moram e pelas patroas, especialmente
as mais elhas, acima dos 5 anos, segundo os relatos. &s discursos que predominam para recrimin+Jlas é, 7uma mãe de família trabalhadora tem que se dar ao respeito...8. & controle sobre o seu corpo é cotidiano, sea no trabalho, nas ruas, no transporte pblico, no boteco, ou em casa. 3ão obseradas, analisadas e ulgadas. *as não sucumbem ) imposi!ão de mulher passia, submissa e dedicada ao lar. C...D9 Pag. 11 “&s membros das famílias de classes média e alta, diferentemente das domésticas, t$m seu cotidiano restrito )s centralidades urbanas da cidade. ; maioria não conhece os bairros e municípios onde elas residem. Por mais que descream as situa!'es que ienciam no dia a dia, dificilmente conseguem transmitir a dimensão de seus desafios urbanos. ;lguns relatam que o nico ponto de contato mais profundo que t$m com a realidade das periferias e subrbios é atraés da presen!a dos corpos dessas mulheres em suas casas. Por outro lado, o trabalho como doméstica para algumas é uma oportunidade de ienciar diferentes eperi$ncias urbanas, onde se concentram amenidades sobretudo na (ona 3ul do @io de Aaneiro-, como caminhar pela orla de "opacabana, 7pegar uma brisa8 sem ser igiada por i(inhos e familiares. também a independ$ncia econImica e psicol4gica de um marido ciumento e machista, mas ao mesmo tempo a oportunidade de desmistificar sonhos e ideais urbanos. C...D9 Pag. 11L “C...D Beresa, a diarista, e Beresa "aldeira F000-, a antrop4loga, nos fornecem pistas de como as pr+ticas sociais reelam a indiferen!a aos impactos da segrega!ão socioespacial e suas consequ$ncias. Podemos afirmar que não s4 prédios e condomínios são enclaes, nos termos de "aldeira, mas também bairros inteiros. 2m seu liro Cidade de muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo , a autora denomina enclaes as propriedades de terra priada de uso coletio, restrito a um grupo. 76esalori(am o que é pblico e aberto na cidade. 3ão fisicamente demarcados e isolados por muros, grades, espa!os a(ios e detalhes arquitetInicos. 3ão oltados para o interior e não em dire!ão ) rua8 "aldeira, F000, p. F5:-, com eímio controle por sistemas de seguran!a que imp'em regras de inclusão e eclusão, eplicitando o deseo pela ida pblica da cidade. *otiados pela criminalidade, reprodu(em fronteiras urbanas priati(ando espa!os, ou constrangendo o seu uso. ; indiferen!a ) diferen!a e a diersidade de din#micas urbanas estão tanto no discurso quanto no modo como inmeras famílias de classe média e alta ienciam sua eperi$ncia urbana em bairros da (ona 3ul, (ona &este, como =arra, @ecreio e Aacarepagu+, e Biuca, na (ona Norte. 3endo assim, é uma indiferen!a social com as pr4prias trabalhadoras que cuidam de suas casas, com quem estabelecem uma rela!ão de afeto e cumplicidade. ; tend$ncia ) homogenei(a!ão do espa!o urbano, que não faorece o encontro e o inesperado Aacobs, F000-, e o constrangimento ) apropria!ão de espa!o urbano, em bairros de classe média e alta, pela eliti(a!ão do consumo e por esquemas de seguran!a em loas e shoppings, refor!am os
processos de segrega!ão e estigmati(a!ão de corpos que carregam consigo a diferen!a. Nesse sentido, podem ser considerados também uma forma de enclae em outra escala. ;s +reas onde as trabalhadoras domésticas residem se distinguem do que se entende como cidade, a cidade formal onde se concentram as benesses e amenidades urbanas. Nessas +reas, elas estão mais sueitas a assédios, assaltos, riscos, ao transporte pblico prec+rio, ) discrimina!ão de seus corpos, )s desigualdades sociais.9 Pag. 115 “"laro que h+ limites para a resist$ncia, pois considero que não são os espa!os que as protegem, como bel hooOs 1EE0- caracteri(a as negras estadunidenses em rela!ão ao seus lares e domicílios, por eemplo, diante da segrega!ão racial presente nas cidadesQ por mais que as casas seam igualmente lugares de restaura!ão e renoa!ão de seus corpos e espíritos. *as no nosso caso, as +reas onde as domésticas residem não oferecem seguran!a e prote!ão nos termos da autora. 3endo assim, os espa!os generificados de resist$ncia não se caracteri(am por determinado lugar e não são fios, uma e( que a primeira dimensão dos espa!os generificados de resist$ncia reside no corpo das mulheres, a partir de suas pr+ticas sociais. 6este modo, são os espa!os que suscitam pr+ticas generificadas de resist$ncia, diante dos processos de desigualdade, discrimina!ão, eplora!ão, opressão e segrega!ão socioespacial que se territoriali(am.9