1 - CAPÍTULOS I A 15
B r u c e K. Wa l t k e
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PROVÉRBIOS
Comentários do Antigo Testamento - Provérbios — vol. 01 © 2011 Editora C ultura Cristã. Originalm ente publicado em inglês com o título The Book o f Proverbs - Chapters 1-15 by Bruce Waltke © 2004 W m. B. Ecrdm ans P ublishing Co. - 255 Jefferson Ave. S.E., Grand Rapids, M ichigan 49503. Todos os direitos são reservados. 1* edição 2011 — 3.000 exem plares C o n s e lh o E d i t o r i a l Ageu Cirilo de M agalhães Jr. C láudio M arra ( Presidente ) Fabiano de A lm eida O liveira F rancisco S olano Portela N eto Heber Carlos de Cam pos Jr. M auro Fernando M eister Tarcízio José de Freitas C arvalho Valdeci da Silva Santos
P r o d u ç ã o E d ito r ia l
Tradução Susana Klassen
Revisão Paulo C orrêa A rantes Edna G uim arães Wilton Vidal de Lima
Editoração Eline A lves M artins
Capa M agno P aganelli W 237c
W altke. B ruce Com entários do A ntigo Testam ento - Provérbios — vol. 01 / B ruce Waltke; tradução de Susana K lassen. 2011 784 p. T rad u ção T he book o f Proverbs ISB N 9 7 8 -8 5 -7 6 2 2 -3 6 7 -2 I. C om entários 2. E studo bíblico
I. T ítulo 2-277 CD U
S
6DITORR CULTURfl CRISTfi Rua Miguel Teles Júnior, 394 - CEP 0 1 5 4 0 -0 4 0 - São Paulo - SP Caixa Postal 1 5 .1 3 6 - CEP 0 1 5 9 9 -9 7 0 - São Paulo - SP Fone (11) 3 2 0 7 -7 0 9 9 - Fax (11) 3 2 0 9 -1 2 5 5 - 0 8 0 0 -0 1 4 1 9 6 3 w w w .ed ito racu ltu racrista.co m .b r - c e p @ c e p .o rg .b r
Superintendente: H averaldo F erreira Vargas Editor: C láudio A ntônio B atista M arra
Para Elaine, m inha com petente esposa, digna de de todo elogio.
Este co m en tário foi p lan ejado e escrito com o um ú nico volum e, m as sua extensão impôs a necessidade de publicá-lo em dois volum es. O leitor deve observar que a Introdução no prim eiro volum e abrange todo o livro de Provérbios; este segundo volum e com preende ap en as o co m en tário sobre P ro v érbios 1 5.30-31.31. Para a conveniência do leitor, cada volum e tem seu próprio conteúdo, lista dc abrevi atu ras e indices. D entro d o tex to deste volum e, as refe rên cias ao m aterial no prim eiro volum e são feitas na form a do algarism o rom ano I seguido por dois pontos e o núm ero da página; p o r exem plo, um a referência à página 100 no prim eiro volum e será citad a aqui com o 1:100.
SUMÁRIO
Prefácio do Editor Geral........................................................................................... 17 Prefácio do Autor...................................................................................................... 19 Abreviaturas............................................................................................................. 25 IN T R O D U Ç Ã O I. T ít u l o .........................................................................................................................37 II.
T exto e V e r sõ e s ..........................................................................................37
A. TEXTOS EM HEBRAICO.....................................................................37 B. VERSÕES EM GREGO (LXX).............................................................. 38 C. OUTRAS VERSÕES ANTIGAS........................................................... 42 D. CONCLUSÃO.........................................................................................44 III. E strutu ra .................................................................................................................. 45
A. INTRODUÇÃO.......................................................................................45 B. COLEÇÃO I: TÍTULO COM PREÂMBULO (1.1 -7), PRÓLOGO (1.8-8.36) E EPÍLOGO (9.1-18)............................................................... 47 1. Título com Preâmbulo (1.1-7)............................................................ 47 2. Prólogo e Epílogo (1.8-9.18)..............................................................47 a. Prólogo (1.8-8.36)...........................................................................47 b. Epílogo (9.1 -18).............................................................................. 48 c. Organização de 1.8-9.18................................................................ 49 C. COLEÇÃO II: PROVÉRBIOS DE SALOMÃO I (10.1-22.16)..........51 1. Introdução............................................................................................ 51 2. Seções da Coleção II........................................................................... 52 3. Unidades da Coleção II....................................................................... 55 D. COLEÇÃO III: OS TRINTA DITOS DO SÁBIO (22.17-24.22).........60 E. COLEÇÃO IV: MAIS DITOS DO SÁBIO (24.23-34)......................... 63 F. COLEÇÃO V: SALOMÃO II (25.1-29.27)............................................64 G COLEÇÃO VI: OS DITOS DE AGUR, FILHO DE JAQUE (30.1-33).... 65 H. COLEÇÃO VII: OS DITOS DE LEMUEL (31.1-31)............................ 67 IV. L iteratura de S abedoria do A ntig o O rien te P r ó x im o .........................68 V. A u t o r ia ....................................................................................................................... 71
A.SALOMÃO............................................................................................... 71
B. AGUR E LEMUEL....................................................................................76 C. O EDITOR FINAL.................................................................................... 77 VI. Formas dos Provérbios................................................................................78 A. POESIA......................................................................................................78 1. Concisão e aforismos............................................................................79 2. Imagens ou figuras................................................................................80 3. Paralelismo............................................................................................ 82 a. Sons e sílabas.....................................................................................83 b. Palavras, frases e sintaxe..................................................................84 c. Significado das metades dos versetos........................................... 85 B. POÉTICA.................................................................................................. 88 C. GÊNERO DE SABEDORIA....................................................................94 D. GÊNEROS NO LIVRO DE PROVÉRBIOS...........................................100 1. Definição de “provérbio” ................................................................... 100 2. Provérbios e ditos................................................................................ 102 3. Ditos curtos e admoestações longas.................................................102 E. AMBIENTE............................................................................................. 103 1. Ambiente de composição.................................................................... 103 2. Ambiente de disseminação..................................................................107 VII. T eologia.......................................................................................................109 A. INTRODUÇÃO......................................................................................109 1. A teologia de Provérbios e a teologia bíblica.................................. 110 2. Provérbios e a literatura de sabedoria pan-oriental........................ 111 B. DEUS....................................................................................................... 114 1. Nomes de Deus................................................................................... 114 2. Deus como Criador............................................................................. 114 3. A transcendência e a imanência do Senhor..................................... 116 a. A transcendência do Senhor...........................................................116 b. A imanência do Senhor...................................................................116 4. Retribuição.......................................................................................... 120 C. REVELAÇÃO, INSPIRAÇÃO E TRADIÇÃO................................... 124 1. Definições de “sabedoria” e de “conhecimento” .......................... 124 2. Revelação............................................................................................ 126 3. Inspiração............................................................................................ 129 4. A identificação da mulher sabedoria................................................. 132 a. Sua personalidade...........................................................................133 b. Sua realidade...................................................................................135 5. Tradição...............................................................................................138 D. ANTROPOLOGIA.................................................................................139 1. Os seres humanos em geral............................................................. 139 a. Palavras para a humanidade......................................................... 139 b. NepeS (tradicionalmente, “alma”) ................................................ 140
c. Coração.........................................................................................141 d. Espírito......................................................................................... 143 2 .0 sábio e o insensato....................................................................... 144 a. Introdução: termos correlatos.................................................... 144 b. O sábio e o justo...........................................................................145 ( 1 ) 0 sábio e o justo e outros termos correlatos..................... 145 (2) O temor do Senhor.............................................................153 (3) O sábio e as palavras.............................................................154 (4) O sábio e as riquezas.............................................................156 (5) O sábio e suas recompensas: vida.......................................157 (6) Provérbios promete demais?................................................161 c. O insensato e o perverso............................................................. 164 (1 ) In sen sato , p e rv e rso e o u tro s te rm o s c o r r e la to s ................ 164
(2 ) 0 ingênuo (fPti)..................................................................... 166 (3) Duas palavras para o insensato (*wil e kesil) ............... 167 (4) O escamecedor (tê$).............................................................. 169 ( 5 ) 0 preg uiçoso ( ‘SçêZ)...................................................................... 170
(6) O estúpido (hasar lêb)........................................................ 171 d. A sepultura (tradicionalmente Sheol) ....................................... 172 3. Masculino e feminino...................................................................173 a. Homem e mulher..........................................................................173 b. Esposo e esposa........................................................................... 174 c. Pai e m ãe.......................................................................................175 d. A esposa lasciva (“estranha”) .....................................................176 (1 )A “mulher!asciva” ( íSSá zãrâ) ............................................177 (2) A “estranha” (nôkriyâ) ........................178 (3) “Uma esposa infiel e apóstata” (ha'õzebet ’allãp ne'üreyhã we'et berít vlõheyhã sãkêhâ)....................... 180 (4) Conclusão.............................................................................. 182 E. PEDAGOGIA..........................................................................................184 F. CRISTOLOGIA....................................................................................... 184 1. A relevância duradoura de Provérbios........................................... 184 2. A mulher sabedoria como um tipo de Jesus Cristo.......................185 a. Pano de fundo histórico............................................................... 185 b. Similaridades e superioridade de Jesus Cristo em relação à mulher sabedoria............................................................................ 189 3. A superioridade de Jesus Cristo em relação à sabedoria de Salomão............................................................................................... 190 4. Conclusão............................................................................................192 VIII. Biblkk;kafia................................................................................................. 193 TEXTO E COMENTÁRIO................................................................................ 239
I. C oleção 1(1.1-9.18)................................................................................. 241 A. TÍTULO E PREÂMBULO (1.1-7)........................................................ 241 1. Título (1.1)...........................................................................................241 2. Preâmbulo (1.2-7).............................................................................. 242 a. Propósito e destinatários (1.2-6)................................................ 242 (1) Sumário do propósito: essência e expressão da sabedoria (1.2)......................................................................... 243 (2) A essência da sabedoria e os destinatários (1.3-5)............. 246 (3) A expressão da sabedoria (1.6)............................................... 249 b. O fundamento do livro (1.7)....................................................... 250 B. PRÓLOGO E EPÍLOGO (1.8-9.18)...................................................... 251 1. Primeira palestra: exortação a ouvir e a rejeitar o convite da gangue(I.8-19).................................................................................. 253 a. Uma exortação do pai e um adorno do filho (1.8,9).................. 255 (1) Destinatário e admoestação (1 .8 )...........................................256 (2) Motivação (1.9)........................................................................257 b. Lição: resistir ao convite da gangue (1.10-19)...........................258 (1) Introdução: declaração sumária (1.10).................................. 260 (2) Corpo: revelada a tentação dos pecadores (1.11-14).......261 (3) Corpo: revelada a advertência do pai (1.15-18)................... 264 (4) Conclusão: a moral da lição (1.19)........................................ 268 2. Primeiro interlúdio: repreensão da sabedoria ao ingênuo (1.20-33).............................................................................................269 a. O ambiente do sermão (1.20,21)...................................................273 b. O sermão da sabedoria (1.22-27)..................................................275 (1) Acusação introdutória (1.22,23)............................................. 275 (2) Denúncia (1.24-27)..................................................................277 c. Reflexão da sabedoria sobre seu sermão (1.28-33)...................282 (1) Certeza e finalidade do julgamento do ingênuo (1.28-31).. 283 (2) Conclusão: sumário sobre os destinos do insensato e do sábio (1.32,33).................................................................286 3. Segunda palestra: salvaguarda contra o perverso (2.1 -22)............ 288 a. Introdução: condições (2.1-4)...................................................... 294 b. Conseqüência: proteção (2.5-11)................................................ 298 ( 1) A educação religiosa conduz à proteção divina (2.5-8).... 298 (2) A educação ética conduz à proteção do caráter (2.9-11)... 303 c. O propósito da proteção (2.12-22)............................................... 305 (1) Propósito 1: livramento do homem perverso (2.12-15)...... 305 (2) Propósito 2: livramento da esposa lasciva (2.16-19)..........308 d. Conclusão: vida na terra versus morte (2.20-22).................... 311 4. Terceira palestra: as promessas do Senhor e as obrigações do filho (3.1-12)...................................................................................... 315
a. In tro d u ção : a d m o e s ta ç õ e s p a ra p re s e rv a r o e n sin o d o pai (3 .1 -4 ).........................................................................................................319 b. C o rp o : u m a lição ac e rc a d a p ie d a d e : c o n fie , te m a e h o n re ao S enhor (3 .5 -1 0 )..................................................................................322 c. C o n clu são : n ão reje ite a d isc ip lin a d o S enhor (3 .1 1 ,1 2 ) ....... 3 2 9 5. Q u arta palestra: o v alo r d a sab ed o ria (3 .1 3 - 3 5 ).................................. 331 a. E xórdio: o valor da sab ed o ria (3 .1 3 -2 6 )............................................3 36 ( 1 ) 0 v alo r da sab ed o ria p ara 'ãdãm (3 .1 3 -1 8 ).............................. 337 (2 ) O v alo r d a sab e d o ria p a ra o S enhor (3 .1 9 ,2 0 )..................... 342 (3 ) O v alo r d a sab ed o ria p ara o filho (3 .2 1 - 2 6 ).............................. 345 b. L ição: o b rig açõ es p actu a is p a ra co m os v izin h o s (3 .2 7 -3 5 ).... 347 (1 ) M an d a m e n to s: o b rig a ç õ e s p a ra co m o s b o n s v iz in h o s (3 .2 7 -3 0 )............................................................................................. 348 (2 ) L in h a cen tral (J a n u s ): n ão te n h a in v eja d e um h o m e m violento (3 .3 1 )................................................................................... 352 (3 ) A rg u m en to : o S enhor p u n e o p e rv e rso , m as re c o m p e n sa o ju s to (3 .3 2 -3 5 )................................................................................353 6. Q u in ta palestra: ad q u ira a heran ça fa m iliar (4 .1 - 9 )......................... 358 a. Introdução: d e stin a tário s e a d m o e sta ç õ e s ( 4 .1 ,2 ) ..................... 36 0 b. A lição: a p alestra d o av ô (4 .3 - 9 )......................................................... 361 (1) In tro d u ção n arrativ a à p a le stra d o a v ô ( 4 .3 - 5 ) .....................361 (2 ) A p alestra d o avô: ad q u ira a sa b ed o ria ( 4 .5 - 9 ) .....................363 7. S exta palestra: afaste-se do c a m in h o errad o (4 .1 0 - 1 9 )................. 368 a. Introdução e co rp o (4 .1 0 -1 7 )............................................................... 372 (1 ) A d m o e sta ç õ e s p a ra a n d a r n o c a m in h o da sa b e d o ria (4 .1 0 -1 3 ).............................................................................................372 (2 ) A d m o e sta ç õ e s p a ra e v ita r o c a m in h o do p e rv e rso (4 .1 4 -1 7 ).............................................................................................375 b. C onclusão (4 .1 8 ,1 9 )............................................................................... 378 8. S étim a palestra: n ão se d esv ie do c a m in h o re to (4 .2 0 - 2 7 ) ............380 a. Introdução: m an ten d o a an ato m ia in terio r (4 .2 0 - 2 2 )..................383 ( 1) D e stin a tá rio e a d m o e s ta ç õ e s a g u a rd a r o e n sin o d o pai (4 .2 0 ,2 1 )..............................................................................................383 (2 ) A rg u m en to m o tiv ad o r: o s e n sin o s d ã o v id a ( 4 .2 2 ) ............. 38 4 b. J a n u s : g u a rd a o c o ra ç ã o , a fo n te d e to d o o com portam ento (4 .2 3 ).......................................................................... 384 c. L ição: m a n te n d o a a n a to m ia e x te rio r fix a no q u e é certo (4 .2 4 -2 7 )...................................................................................................386 (1) A bo ca e os olh o s (4 .2 4 ,2 5 )........................................................... 386 (2) O s pés (4 .2 6 ,2 7 )............................................................ ................... 388 9. O ita v a p alestra : a in se n sa te z d o a d u lté rio , a sa b e d o ria do casam ento (5.1 - 2 3 ) ..................................................................................... 389
a. Introdução (5.1-6)..........................................................................395 (1) Destinatário, admoestação e objetivo (5.1,2)...................... 395 (2) Motivação (5.3-6).................................................................... 396 b. Lição (5.7-20)................................................................................ 399 (1) A insensatez do adultério (5.7-14)......................................... 399 (2) A sabedoria do casamento (5.15-20)..................................... 407 c. Conclusão (5.21 -23)......................................................................414 10. Apêndice: três tipos inferiores de homem (6.1 -1 9 ).....................416 a. Advertência contra se tomar fiador (6.1 -5 ).............................. 421 (1) Introdução: a situação do tolo (6.1,2)................................. 423 (2) Corpo: admoestações urgentes para resolver a situação (6.3,4)......................................................................425 (3) Conclusão: sumário da palestra (6.5).................................. 427 b. Advertência ao preguiçoso (6.6-11).......................................... 428 (1) Admoestação para aprender sabedoria com a formiga (6.6-8)....................................................................................429 (2) Condenação do preguiçoso (6.9-11)................................... 431 c. Advertência contra o revolucionário (6.12-19)....................... 435 (1) Sete marcas de um revolucionário (6.12-15)......................436 (2) Catálogo das sete abominações ao S enhor (6.16-19).....440 11. Nona palestra: o alto preço de uma esposa lasciva (6.20-35) ....444 a. Introdução (6.20-24)....................................................................445 (1) Destinatário e admoestação a estar atento (6.20,21)..... 446 (2) Motivação (6.22-24).............................................................. 446 b. Lição (6.25-35a).......................................................................... 448 (1) Admoestação (6.25).............................................................. 449 (2) Primeiro argumento: o castigo severo, inevitável e interminável do adultério (6.26-33).................................... 450 (3) Segundo argumento: o marido da adúltera não pode ser indenizado (6.34,35)....................................................... 456 12. Décima palestra: as táticas sedutoras da esposa lasciva (7.1-27).............................................................................................459 a. Introdução: destinatário e admoestações para ouvir a palestra do pai (7.1 -5 )..................................................................466 b. Lição: as táticas sedutoras da esposa lasciva (7.6-23)........469 (1) Encontro: as observações do pai (7.6-13).......................... 469 (2) Sedução: o modo de falar atraente da esposa lasciva (7.14-20)................................................................................476 (3) Queda: a submissão do ingênuo (7.21-23)......................... 483 c. Conclusão (7.24-27).................................................................... 485 (1) Admoestação: ouvir o pai, não a esposa lasciva (7.24,25)................................................................................ 485
(2) Motivação: a esposa lasciva é mortal (7.26,27)................. 486 13. Segundo interlúdio: autolouvor da sabedoria ao ingênuo (8.1-36)..............................................................................................488 a. Introdução (8.1-11)...................................................................... 496 ( 1 ) 0 ambiente e os destinatários do discurso da sabedoria (8.1-5).................................................................... 496 (2) Exortação da sabedoria a ouvir com motivação (8.6-11).. 499 b. Lição (8.12-31)............................................................................. 503 (1) Atributos comunicáveis da sabedoria no tempo histórico (8.12-21)..................................................................504 (a) O papel da sabedoria na ordem civil (8.12-16)............. 504 (b) Dons da sabedoria de glória material a seus amantes (8.17-21).............................................................508 (2) Nascimento e celebração da sabedoria nos tempos primitivos (8.22-31)................................................................511 c. Conclusão: convite e advertência finais da sabedoria (8.32-36)........................................................................................531 14. Epílogo: banquetes rivais da sabedoria e da loucura (9.1 -18)... 535 a. O banquete da sabedoria (9.1 -6 )................................................. 540 (1) Os preparativos para a refeição (9.1 -3 )................................ 540 (2) O convite da Sabedoria (9.4-6).............................................. 546 b. Suplemento do poeta ao convite (9.7-12)................................. 548 (1) As conseqüências para o sábio por corrigir o orgulhoso em vez do sábio (9.7-9)..........................................................550 (2 ) Janus\ o princípio e os benefícios da sabedoria (9.10).... 552 (3) As conseqüências de ser sábio por si mesmo ou um escamecedor (9.11,12)...........................................................553 c. O banquete da loucura (9.13-18).................................................554 (1) A anfitriã pretensiosa (9.13-15)............................................. 554 (2) O convite da loucura (9.16,17)...............................................557 (3) Conclusão: morte (9.18)......................................................... 558 II. C oleção II: S alomão I (10.1-22.16)....................................................... 559 A. COLEÇÃO 1IA: PARALELOS ANTITÉTICOS DO JUSTO VERSUS O PERVERSO (10.1-15.29)................................................... 559 1. Sobrescrito (10.1 a )..............................................................................559 2. O sábio e o insensato são definidos por seu comportamento na riqueza e no modo de falar (10.1 b-16)........................................ 560 a. Provérbio educativo introdutório (10.1 b )................................... 563 b. Sabedoria e riqueza (10.2-5)......................................................... 564 (1) Fundamentos éticos e teológicos da riqueza (10.2,3)......564 (2) O fundamento prático da riqueza (10.4,5).............................567
c. Efeitos do modo de falar sobre si mesmo e sobre os outros (10.6-14).........................................................................................569 (1) Sobre si mesmo (10.6-9)......................................................... 570 (2 ) Janus (10.10)........................................................................... 574 (3) Sobre os outros (10.11 -14)......................................................574 d. Riqueza e segurança (10.15,16)....................................................577 3. Ações e destinos do justo e do perverso contrastados (10.17-11.31).....................................................................................580 a. Introdução: efeitos sociais da obediência (10.17).................... 580 b. O modo de falar e as expectativas do justo e do perverso contrastados (10.18-32)................................................................581 ( 1 ) 0 modo de falar benéfico e nocivo (10.18-21).....................584 (2) Modo de falar e expectativas do justo e do perverso (10.22-32)................................................................................588 (a) Dor e prazer (10.22-26)..................................................... 588 (b) A segurança do justo versus a transitoriedade do perverso (10.27-30).......................................................... 593 (c) A permanência e a impermanência das bocas do justo e do perverso (10.31,32).........................................596 c. Segurança mediante honestidade e justiça (11.1-8).................. 598 (1) Segurança mediante a honestidade (11.1,2)........................ 599 (2) Segurança mediante a justiça (11.3-8)................................... 601 d. Janus: segurança da língua destrutiva mediante o conhecimento (11.9).....................................................................607 e. Palavras na comunidade (11.10-15)............................................ 608 f. Benevolência e comunidade (11.16-22)...................................... 616 g. Desejos e satisfações paradoxais ( 11.23-27).............................625 h. Alguns ganhos ou perdas (11.28-31)...........................................631 4. Duas subunidades sobre o modo de falar e as ações (12.1-28)............................................................................................ 637 a. A primeira subunidade (12.1-14)................................................. 642 (1) Introdução ( 12.1 -3 )..................................................................642 (2) O modo de falar e o lar de alguém (12.4-7)........................... 644 (3) Ações e propriedade (12.8-12)............................................... 648 (4) Janus, conclusão: palavras e ações (12.13,14).................... 654 b. A segunda unidade (12.15-28)..................................................... 657 (1) Um provérbio educativo introdutório (12.15)......................657 (2) Modo de falar sábio e tolo (12.16-23)................................... 658 (3) Trabalho diligente e bom modo de falar (12.24-27)............ 667 (4) Conclusão (12.28).................................................................... 671 5. Ensino, ética e modo de vida bons (13.1 -2 5 )..................................673 a. Introdução (13.1)............................................................................679
b. O discurso e a ética (13.2-6)....................................................... 680 c. Riqueza e ética (13.7-11)............................................................... 686 d. Satisfação mediante a sabedoria versus a frustração mediante a insensatez (13.12-19)................................................. 692 e. O futuro abençoado de um filho sábio versus o fim nocivo dos insensatos (13.20-25)..............................................................702 6. Vivendo em sabedoria (14.1 -32)....................................................... 709 a. Andando em sabedoria (14.1-7)................................................. 716 b. Não andando pela vista (14.8-15)................................................ 722 c. Contrastando caracterizações e conseqüências sociais (14.15-32)....................................................................................... 730 (1) Contrastando caracterizações da sabedoria e seu comportamento ético (14.15-18)............................................ 731 (2) Contrastando conseqüências do comportamento social usando principalmente termos éticos (14.19-24)..............734 (3) Contrastando caracterizações e conseqüências de vida ou morte (14.25-32)................................................................ 740 7. Confirmando a justiça com uma língua branda (14.33-15.4)..... 747 8. A importância da instrução (15.5-19).............................................756 a. As conseqüências de aceitar ou rejeitar a instrução (15.5-12) 758 b. A superioridade do vencedor às circunstâncias (15.13-19)... 765 (1) A superioridade do coração às circunstâncias (15.13-17) 765 (2) Dois vencedores (15.18,19).....................................................770 9. Conseqüências da retidão e da perversidade (15.20-29)............772 a. Alegria na educação (15.20-23).................................................... 774 b. Janus ( 15.24).................................................................................. 777 c. Os destinos do justo e do perverso (15.25-29)......................... 778
M uito tempo atrás, o apóstolo Paulo escreveu: “Eu plantei, Apoio regou; mas o crescimento veio de Deus” (1 Co 3.6). Ele estava certo: de fato, o ministério requer um esforço conjunto - os labores coletivos de muitas mãos e mentes hábeis. Um revolve a terra e lança a semente, enquanto outros regam o solo para nutrir o crescimento das mudas. O mesmo esforço conjunto foi responsá vel pela posição de preeminência que esta série de comentários ocupa nos dias de hoje. Ela foi “plantada” quarenta anos atrás pelo professor E. J. Young, que recrutou os primeiros colaboradores e também escreveu seu primeiro volume publicado. Foi “regada” pelo professor R. K. Harrison que recrutou outros estudiosos e editou com grande sabedoria o produto final de todos. Como editor geral, eu agora cuido do que eles plantaram e fiel às palavras de Paulo, ao longo de quatro décadas Deus graciosamente tem “[concedido] o crescimento”. Hoje o New International Commentary on the Old Testament possui um amplo público leitor constituído de acadêmicos, padres, pastores, rabinos e outros estudiosos dedicados da Bíblia. Milhares de leitores de todo o espectro religioso em inúmeros países consultam seus volumes para auxiliá-los em sua pregação, ensino e pesquisa. Eles recebem com entusiasmo a publicação de cada novo volume e aguardam com ansiedade a eventual transformação de uma “série” em desenvolvimento para um “conjunto” completo de comentári os. Porém, que tipo de série de comentários é o N1COT, tendo em vista o novo século da história que a humanidade está vivendo, uma época comumente chamada de “pós-modema”? O que distingue essa série de outras igualmente renomadas? Seus volumes visam publicar textos acadêmicos da mais alta qualidade. Cada colaborador escreve como um especialista, tanto no texto bíblico em si quanto na literatura acadêmica relevante, e cada comentário transmite os resultados de leituras amplas e reflexão cuidadosa e madura. Basicamente, seu espírito é eclético, uma vez que cada colaborador coleta discernimentos interpretativos de toda fonte que seja útil, qualquer que seja o seu ponto de vista religioso ou filosófico, e os integra à sua interpretação de um livro bíbli co. A série se vale de inovações metodológicas recentes na erudição bíblica, por exemplo, crítica ao cânon, a assim chamada “nova crítica literária”, as teorias de resposta do leitor e a sensibilidade às leituras baseadas no sexo e na etnia. Os volumes do N1COT procuram ser pacíficos quanto ao tom, resumindo
e criticando pontos de vista influentes com imparcialidade e, ao mesmo tempo, defendem seu próprio ponto de vista. Em sua lista de colaboradores, encontram-se estudiosos de ambos os sexos, provenientes de vários grupos da fé cristã. A diversidade de colaboradores e sua liberdade de lançar mão de todas as metodologias relevantes conferem a toda a série uma variedade empolgante e enriquecedora. Porém, o que verdadeiramente distingue esta série é o fato de se encontrar dentro da tradição interpretativa conhecida como Evangelicalismo. O Evangelicalismo é um movimento informal dentro do Protestantismo que encurta as divisas denominacionais tradicionais. Seu corpo e alma são a convicção de que a Bíblia é a Palavra inspirada de Deus, escrita por autores humanos dota dos, por meio da qual Deus chama a humanidade a desfrutar um relacionamen to pessoal de amor com seu Criador e Salvador. Fiel a essa tradição, os volumes do NICOT não tratam o Antigo Testamento apenas como um produto literário antigo, no mesmo nível da Iliada ou/ e Gilgamés. Não são autópsias literárias de cadáveres antigos de pergaminhos, mas confrontos reverentes com escri tos maravilhosamente humanos por meio dos quais o Deus vivo profere sua Palavra poderosa. O NICOT mantém um equilíbrio delicado entre a “crítica” (i.e., o uso de metodologias criticas clássicas) e o humilde respeito, admiração e até mesmo afeição pelo texto bíblico. Como um comentário evangélico, dedi ca atenção especial às características literárias do texto, temas teológicos e implicações para a vida de fé nos dias de hoje. Finalmente, o objetivo do NICOT é servir a mulheres e homens de fé que desejam ouvir novamente a voz de Deus por meio do Antigo Testamento. Com gratidão a Deus por duas dádivas maravilhosas - as Escrituras propria mente ditas e os estudiosos perspicazes para explicar sua mensagem —dou as boas-vindas aos leitores de todos os tipos para que saboreiem os bons frutos desta série. R o b k r t L . H ubbard J r .
Em
um mundo bombardeado por clichês vazios, lemas triviais e mensagens ímpias, a expressão da verdadeira sabedoria está em falta nos dias de hoje. A igreja se vê sozinha como receptáculo e repositório das tradições inspiradas que trazem a exigência de uma vida santa de sábios antigos, sendo o maior deles Salomão, e maior que este, Jesus Cristo. Como o curso e o volume de sabedoria bíblica, o livro de Provérbios continua sendo o modelo de currículo para o homem aprender a viver em sujeição a Deus e perante a humanidade. Em decorrência disso, convida a igreja ao estudo e aplicação diligentes. Ele serve de pedra de tropeço para o jovem não comprometido, mas de pedra fundamental para o comprometido. Tragicamente, porém, a igreja praticamente descarta o livro de Provér bios, o qual foi escrito para os jovens a fim de servir de bússola para guiar a embarcação de sua vida (veja 1.2-6). Dos seus 930 ditos antigos, muitos cris tãos conhecem três - temer ao Senhor (1.7), confiar nele (3.5,6) e “[ensinar] a criança no caminho em que deve andar” (22.6) - e possivelmente algo sobre a “mulher virtuosa” (31.10-31). Porém, o “temor do Senhor” é mal compreendido, o “confiar nele” (3.5) é um chavão dissociado do livro, a promessa de que a criança não abandonará a educação que recebeu na infância gera mais dúvidas do que soluções, e o poema sobre a mulher virtuosa parece antiquado. Para alguns leitores sinceros, como um aluno confessou, “Provérbios pa rece banal ou errado”. Obviamente “O que diz a verdade manifesta a justiça” (12.17), “A testemunha verdadeira não mente” (14.5) e são o prazer do Senhor (12.22). Para os teólogos circunspectos, as promessas de saúde, riqueza e prosperidade celestiais do livro são incômodas, e para muitos santos, elas parecem alienadas das severas realidades da terra. Alguns provérbios parecem contradizer outros: “Não respondas ao insensato segundo a sua estultícia” (26.4) é seguido de “Ao insensato responde segundo a sua estultícia” (26.5). Além disso, enquanto o livro de Provérbios assevera uma ordem justa, Jó (9.22) e Eclesiastes (9.2) negam a sua realidade. Para a mente lógica o livro parece coletânea confusa, sem pé nem cabeça no que se refere à disposição de seus ditos. Eles pulam de um tópico para outro como pessoas distraídas jogando conversa fora numa sala de estar. Como pregar e ensinar uma mixórdia como essa?
Para a mente moderna, o ambiente cultural do livro parece extremamente distante do século 21. Provérbios coloca uma elevada prioridade na tradição e na idade, enquanto que a mente moderna valoriza a mudança e a juventude. Provérbios admoesta os pais a não dispensarem a vara, mas os conselhos tutelares da criança e do adolescente querem prender aqueles que obedecem a isto. Sua psicologia é psicossomática; a psicologia moderna emprega termos mais científicos. Alguns acadêmicos, inclusive os evangélicos, não colaboram. São céticos a respeito da reivindicação de autoria salomônica do livro, colocam a confiança no homem no lugar da confiança em Deus e falam de uma ordem mundial, e não de retribuição divina. Em vez de aceitarem seus ensinos inspirados pela fé, exigem um estudo pautado pela racionalidade e experimentação humanas. Cer tos acadêmicos demonstraram que Provérbios se encaixa perfeitamente na lite ratura pagã pan-oriental, mas questionam se sua falta evidente de orientação israelita tem origem nas alianças de Israel e na literatura bíblica. De acordo com outros, em comparação com Jó e Eclesiastes, Provérbios representa “uma ge nuína falsa doutrina”. Para os cristãos, Provérbios parece irrelevante. Se Jesus é maior que Salomão, por que se preocupar em estudar e memorizar esse livro antigo? Além disso, “se Salomão era tão inteligente, como pôde ter morrido como um grande insensato?” Para o tradutor, Provérbios desafia a tradução. Um provérbio depende do som e do sentido. “Mais vale prevenir do que remediar” faz sentido por causa de sua aliteração bem como de seu bom senso notavelmente óbvio. Mas os sons e os jogos de palavras dos provérbios bíblicos não podem ser captados na tradu ção e, assim, diferente de um provérbio em inglês (bem como em português), eles não são comumente fáceis de lembrar. Além disso, o significado do que o livro chama de provérbio não é o normalmente aceito em inglês e português. Em inglês e português um provérbio expressa um truísmo universalmente aceito, mas “Confia no Senhor de todo o teu coração e não te estribes no teu próprio entendimento” não é um truísmo que muitos americanos aceitam. Os america nos podem alegar em suas moedas e notas de dólar que confiam em Deus, mas na verdade ensinam e pregam “confie em você mesmo”. Escrevi este comentário histórico-gramatical com tais questões em mente, na esperança de oferecer discernimento para as soluções sem necessariamente dar “a resposta”. Tratei alguns desses problemas de frente na Introdução e os levei em consideração na exegese dos versículos individuais. Para os leitores sinceros, a solução se encontra na compreensão dos profundos discernimen tos filosóficos e teológicos desse livro antigo. A lógica do livro escapa aos leitores modernos, porque eles não entendem a poética usada em sua compo sição. A mente moderna deve ser desafiada em seu orgulho e preconceito e os acadêmicos devem compreender que suas interpretações são, com frequência,
ditadas por uma crítica histórica “fundamentalista”, que é tão rígida quanto o fundamentalismo teológico. Os cristãos devem preservar o que há de melhor do passado com respeito aos avanços teológicos em Cristo. Este comentário é dividido em duas partes: uma Introdução e uma exegese do texto. A Introdução se dedica às questões críticas do texto, autoria, data e unidade, além de reflexões teológicas e filosóficas sobre assuntos mais am plos, como determinar se os provérbios são promessas ou declarações de expectativas gerais. Além disso, apresenta o estudo de muitos termos da sa bedoria em conexão com essas reflexões teológicas. As referências à Introdu ção, no comentário propriamente dito, citam com frequência apenas a primeira página de seus referentes na Introdução. A parte correspondente ao comentário fornece traduções de poemas, prin cipalmente na Coleção I (capítulos 1-9) e de conjuntos de provérbios nas outras coleções. Se uma unidade é particularmente longa, o comentário apre senta a tradução com as suas subunidades. Uma tradução palavra por palavra do original não produz uma tradução precisa. Uma vez que os padrões e a sintaxe são diferentes no hebraico e no inglês (e também no português), a transmissão precisa do significado visado pelo sábio exige uma atenção cons tante aos significados contextuais de suas palavras, expressões idiomáticas e modificações na estrutura das sentenças. Entretanto, esforcei-me para perma necer próximo do texto em hebraico. Nos casos em que a numeração dos versí culos no texto hebraico difere nas Bíblias em inglês e português, coloquei a versificação hebraica entre parênteses. Os comentários exegéticos devem ser lidos com a tradução em mãos. Em penhei-me, inicialmente, em determinar a estrutura dos poemas ou das cole ções, seções e unidades por meio de considerações temáticas com a crítica da forma e retórica. Em seguida, apresento comentários exegéticos sobre cada versículo, meio versículo e palavras individuais. No entanto, é impossível ana lisar a estrutura dos agrupamentos maiores sem uma exegese apriori cuidado sa de cada versículo. Por vezes, ofereço também reflexões teológicas. A fim de ajudar com a questão do som, forneço ocasionalmente transliterações da(s) palavra(s) hebraica(s). Discuto o significado de algumas palavras hebraicas teologicamente mais carregadas que ocorrem muitas vezes na introdução, e de outras palavras hebraicas repletas de sabedoria em sua primeira ocorrência, apesar de citar apenas sua interpretação em inglês. Por conseguinte, emprego a instrução “veja” com referências cruzadas para a mesma palavra hebraica, ainda que as versões em inglês e português apresentem diferenças considerá veis, e “cp.” para referências cruzadas para expressões do mesmo âmbito se mântico. Peço desculpas por fornecer, em algumas ocasiões, as mesmas refe rências cruzadas em versículos intimamente ligados, mas os provérbios devem ser estudados tanto coletivamente quanto individualmente, ocasionando o seu estudo em separado.
As notas de rodapé são voltadas principalmente para os estudiosos que desejam documentar determinado argumento e/ou realizar uma pesquisa mais profunda. O texto, por outro lado, é dirigido a pastores, a estudantes e àque les que amam a Bíblia. Por esse motivo, cito obras em alemão em minhas traduções delas. Espero que meus tratamentos de “o sábio e o discurso” e “o sábio e a riqueza”, na Introdução, sirvam de modelo para pregações tópicas. Os pregadores não devem hesitar em traduzir as formas literárias de Provér bios para o gênero homilético. Assim como a língua hebraica deve ser tradu zida para a nossa língua, também os gêneros de Provérbios precisam ser traduzidos para um sermão. Porém, os pregadores têm para com o sábio ins pirado a responsabilidade de serem fiéis ao seu significado e intenção e de considerarem o contexto mais amplo. Espero que o Conteúdo os capacite a identificar prontamente este contexto. Apesar de ter escrito para pessoas que não tiveram a oportunidade de estu dar o hebraico bíblico, pareceu-me quase impossível discutir o significado do texto sem apelar para o texto original em hebraico. Espero que os leitores que nâo conhecem o hebraico bíblico se disponham a examinar superficialmente termos técnicos, como o hifil, que matizam o significado de um verbo sem ter a impressão de que precisam compreender o termo, da mesma maneira como leem artigos sobre medicina e são capazes de entendê-los e tirar proveito deles sem necessariamente compreender seus termos técnicos. Ao escrever este comentário também enfrentei decisões estilísticas difí ceis. Optei por traduzir o Tetragramaton ( YHWH) como S e n h o r , e não Yahweh, por razões filológicas, históricas e teológicas. Em sua providência Deus não preservou a vocalização desse termo, de modo que sua reconstrução como “Yahweh” é, de fato, especulativa. Além disso, ao empregar o epíteto “Se nhor”, e não o nome pessoal, Deus abriu o caminho para a identificação de Jesus com o nome pessoal YHWH. Versículos como “todo aquele que invocar o nome de YWHW” (J1 2.32) podem facilmente ser aplicados ao Senhor Jesus Cristo: “Se, com tua boca, confessares Jesus como Senhor” (Rm 10.9), “Por que: Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo” (Rm 10.13). Em resumo, optei por sua tradução teológica em vez de sua especulativa pronún cia histórica. Também enfrentei o problema da escolha entre A.D. (anno Domini) e a.C. (antes de Cristo) ou E.C. (Era Cristã) e A.E.C. (Antes da Era Cristã). Optei pelas designações tradicionais A.D. e a.C.,* em vez das acadêmicas E.C. e A.E.C., por estar escrevendo para o leitor comum da Bíblia, não para a comu nidade acadêmica (inclusive eminentes estudiosos judeus), embora tenha pro curado apreciar de modo crítico a comunidade acadêmica no que diz respeito a seus pontos fortes e fracos. *Por razões de padronização da Editora Cultura Cristã serão utilizadas aqui as designações a.C. [antes de Cristo] e d.C. [depois de Cristo].
No inglês contemporâneo, o pronome da terceira pessoa do singular (“ele/ ela”) representa uma dificuldade estilística considerável. Apesar de ser meu desejo empregar o máximo possível a linguagem inclusiva, optei por continuar empregando o pronome masculino da terceira pessoa como o pronome comum para os dois gêneros, e espero não causar ofensa àqueles que adotam outras opções. A perda da individualização na mudança de construções no singular para o plural é excessivamente grande quanto ao sentido, como também o é a perda estilística decorrente da falta de concordância entre os sujeitos no sin gular e os qualificadores no plural, mediante a discordância gramatical ou pela mudança entre pronomes ou pela combinação dos mesmos. Esse comentário se encontra em produção há mais de 25 anos. Pela provi dência de Deus, depois que Derek Kidner e Alan Millard traduziram o livro de Provérbios para a Nova Versão Internacional, fui designado para trabalhar em três comitês sucessivos da NVI responsáveis por sua reelaboração. Estou em dívida com todos os membros desses comitês. Em parte a conclusão do co mentário foi adiada em função da nova crítica literária, a qual teve um impacto profundo sobre a exegese tradicional e exigiu que eu repensasse o livro todo. Essa nova abordagem valida o fato de que os provérbios estão organizados de modo consciente a fim de proteger os ditos vulneráveis de interpretações equivocadas e/ou enriquecer o seu significado. Em 2000, o Comitê para a Tra dução da Bíblia, do qual sou membro, encarregou-me de gerar propostas para a revisão de Provérbios. Estou em grande dívida com os seguintes estudiosos pelo encorajamento e instrução que recebi desse comitê: Kenneth Barker, Gordon Fee, Dick France, Karen Jones, Alan Millard, Don Madvig, John Stek, Larry Walker, Herb Wolfe Ronald Youngblood. Também reconheço com prazer minha dialética contínua com a comunidade acadêmica, sendo que a maioria de seus membros é citada na bibliografia. Foi um prazer especial usar ensaios e teses de meus alunos. Até mesmo os estudiosos com os quais discordo fizeram a contribuição heurística de desafiar meu pensamento e provocar aquilo que espero ser uma resposta útil. Não poderia ter trabalhado com bibliotecários (e suas respectivas equi pes) mais atenciosos do que Grace Mullen e Jane Petite, do Westminster Theo logical Seminary; Ivan Gaetz. David Stewart, Joan Pries, Audrey Williams e Matthew Freeman, do Regent College; e John Muether, Dan Wright e Kevin Nelson, do Reformed Theological Seminaries. Meus talentosos alunos ale mães, Johannes Kuhhom e Gabriel Braun me ajudaram com a tradução de Die Sprüche, de A. Meinhold. A Eerdmans Publishing Company e Robert Hubbard permitiram pacientemente que eu continuasse pesquisando e escre vendo ao longo destes muitos anos. O editor da Eerdmans, Milton Essenburg, trabalhou com grande meticulosidade na clareza, consistência e precisão do manuscrito original. Meus alunos do Regent College e do Reformed Theolo gical Seminary se dedicaram com assiduidade à revisão ortográfica e gramati
cal do texto e com disposição amorosa à verificação das referências cruzadas das Escrituras. Os seguintes indivíduos participaram da equipe do Regent College, coordenada por meu tutor multidotado em computação, Rob Barrett: Gay Atmajian, Lane Ayo, Matt Ghormley, Abram Kidd, Allison Koenicke, Max Kuecker, Rod McLain, Stephen Ney, Rosie Perera e Susan Ting. A equipe do Reformed Theological Seminary, que foi liderada por meu competente profes sor assistente, Scott Redd, foi formada por: Guillermo Bemáldez, Jason Foster, Rob Genin, Bryan Gregory, Chris Hackett, Brett Hedgepeth, David Kirkendall, Paul May, Omar Ortiz, Jennifer Redd, Ryan Reeves, Jonathan St. Clair, Cary Smith, Ron Thomas e Keith Welton. Jennifer Redd preparou o índice de assun tos para a Introdução. B ruce K . W
altke
ABREVIATURAS
ABD ABR
Anchor Bible The Anchor Bible Dictionary Australian Biblical Review
aca.
acadiano
ac.
acusativo
at.
ativo
AEL
M. Lichtheim, Ancient Egyptian Literature: A Book o f Readings, 3 vols. Berkeley: Universidade da Califórnia, 1973, 1976, 1980.
AfO AIR
Archiv fiir Orientforschung
AB
AJSL AJT Amen ANEP
P. D. Miller Jr., P. D. Hanson e S. D. McBride, orgs., Anci
ent Israelite Religion: Essays in Honor o f Frank Moore Cross. Filadélfia: Fortress, 1987. American Journal o f Semitic Languages and Literature Asia Journal o f Theology Amenemope J. B. Pritchard, org., The Ancient Near East in Pictures, 2* ed. Princeton: Universidade de Princeton, 1969.
ANET
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ANETS
Ancient N ear Eastern Text and
AnOr
Analecta orientalia
Studies
AOAT
Alter Orient und Altes Testament/árabe
Arab.
Arábico
Aram.
aramaico
ASTI
Annual o f the Swedish Theological Institute
ATD
Das Alte Testament Deutsch
AUSS AV
Andrews University Seminary Studies Versão Autorizada. Veja KJV
BA BARev BASOR
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BihBh
Bible Bhashyam
BibLit
Bible and Literature Series
BibOr BIOSCS BJRL BK
Biblica et orientalia Bulletin o f the International Organization fo r Septuagint and Cognate Studies Bulletin o f the John Rylands Library Bibel und Kirche
BKAT
Biblischer Kommentar: Altes Testament
BM BMB BN BO BOAS BR BRev BRL
Beth Mikra Bulletin du Musée de Beyrouth Biblische Notizen Bibliotheca orientalis Bulletin o f Oriental and African Studies Biblical Research Bible Review K.. Galling, org., Biblisches Reallexickon. Tübingen, J. C. B. Mohr, 1937.
BSac BSO(A)S BT BTB
Bibliotheca Sacra Bulletin o f the School o f Oriental (and African) Studies Bible Translator; veja também TBT Biblical Theology Bulletin
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BZAW ca. CAH cap. CAT CB
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ConBOT cons. CSIC CSR CTA
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Bíblia e Fé Biblische Zeitschrift
Beiheftzur ZAW circa, por volta de
Cambridge Ancient History capítulo Commentaire de 1’Ancien Testament Coniectanea biblica Calholic Biblical Quarterly Catholic Biblical Quarterly Monograph Series The Communicator’s Commentary Centre d’études supérieures spécialise d’histoire des religions comparar; conferir Collationes Gandavenses Commentary on the Holy Scriptures Congrès intemational Catholique des science bibliques. Sa cra pagina: miscellanea biblica Corpus inscriptionum semiticamm coluna The Australian and New Zealand Theological Review: Colloquium Coniectanea biblica, Old Testament construto Consejo superior de investigaciones científicas instituto “Francisco Suárez" Christian Scholar s Review A. Herdner, org., Corpus des tablettes em cunéiformes alphabetiques découvertes à Ras Shamra-Ugarit de 1929 a 1939. 2 vols. Paris: Imprimerie Nationale, 1963. Calvin Theological Journal Concordia Theological Monthly The Catholic University of American Studies in Sacred Theology Currenls in Theology and Mission
28
DBSup
COMENTÁRIOS DO ANTIGO TESTAMENTO L. Pirot, R. A. Cazelles e A. Feuillet. Dictionnaire de la Bible.
Supplément. Paris, 1928d.C
depois de Cristo
DD
Dor le dor
diss.
dissertação
DJD
Discoveries in the Judaean Desert
DSBS
The Daily Study Bible Series
DTT EB
Dansk teologisk tidsskrift Etude bibliques
EBC
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INTRODUÇÃO
Para saber mais sobre o universo do comentarista antes de ler este livro, por favor, leia o Prefácio do Autor. I. T ÍT U L O
Esta obra é um comentário sobre o que em hebraico é chamado de mislê “provérbios de”, em conformidade com a prática do antigo Orien te Próximo de usar a primeira palavra de um livro como seu nome. Em inglês, como em português, o título Provérbios vem de Liber Proverbiorum, “O Livro de Provérbios”, título em latim dado ao livro por Jerônimo na Vulgata. Provérbios faz parte dos “Escritos”, a terceira e última seção da Bíblia hebraica e está provido de cadências métricas distintas também conferidas a Jó e Salmos. Nas Bíblias em inglês e português, ele se encontra entre os livros poéticos (Jó - Cântico dos Cânticos). II. T E X T O E V E R S Õ E S
A discussão a seguir sobre os textos e versões antigos de Provérbios visa apenas esclarecer a base textual para este comentário.1 A. TEXTOS EM HEBRAICO
Este comentário se baseia principalmente no Códice de Leningrado (L) de Samuel, filho de Jacó (ca. d.C. 1000), que “copiou, pontuou as vogais e forneceu notas explicativas no formato massorético para este códice da Escritura sagrada a partir do manuscrito correto que o mes tre, Aaron, filho de Moses Ben-Asher [preparou]... e que constitui um exemplar extraordinariamente preciso”.2 Apesar dos erros ocasionais em L ou dentro da tradição massorética (TM), seu texto é uma testemu 1. Para um a introdução m agistral á crítica textual, veja E. Tov, Textual C riticism o f the H ebrew B ib le (M inneapolis: F ortress, 1992). 2. M inha tradução do frontispício do Códice de Leningrado B 19*. Esse Códice é o texto diplom á tico da B H S .J. Fichtner editou as notas textuais de Provérbios na BHS.
nha confiável do texto original.3 No entanto, em 8.16 (n. 29), segui a edição de Bomber, não L da BHS. Infelizmente, pouco uso pode ser feito dos manuscritos de Provér bios, dos Rolos do Mar Morto, encontrados na Caverna 4 de Qumrã. Provérbios a (4Q102, metade do primeiro século a.C.) e Provérbiosh (4Q103, metade do primeiro século até a virada da Era Cristã) são os únicos dois representativos de Provérbios, contendo 39 palavras ou par tes de palavras de Provérbios 1.27-2.1 e 125 palavras ou partes de pala vra de Provérbios 9.16 (possivelmente 9.4); 13.6-9; 14.6-13; 14.27,28 (?); 14.31-15.8 e 15.19-31 respectivamente. Juntos, os dois manuscritos produzem seis variantes do TM: duas são meramente ortográficas (15.27), uma diz respeito à ausência de um verbo de ligação (1.31), e uma parece ter origem na transposição de duas letras de uma variante ortográfica (15.19). Uma variante mais relevante é a omissão d eyehgeh (“meditar”, 15.28) e a variante mais relevante de todas é m w skt-m õ$ekot por m esübat (“cordão” no lugar de “apostasia”, 1.32). E possível que seja originada de uma combinação da transposição de duas letras e então copiando-se er roneamente um cafe no lugar da letra de aparência semelhante bete , ou pode ser decorrente da influência do segundo versículo de Jó 38.31 .4 B. VERSÕES EM GREGO (LXX)5
Apesar dessas variantes, os dois manuscritos de Qumrã apresen tam uma relação mais próxima com a recensão massorética (um tipo distinto de texto) do que com a Septuaginta (LXX, ca. 200 a.C.).6 Essa relação corrobora a antiguidade da base recensional do TM. Os acrés cimos e omissões na LXX e seu Vorlage (o texto hebraico diante do tradutor) recensional variam de palavras individuais a versículos intei ros. Por vezes, o próprio tradutor alterou o texto, por exemplo, ao ler as consoantes de forma diferente da sua pronúncia tradicional preservada pelos massoretas,7 e outras vezes ele encontrou leituras diferentes em suas fontes, que, por vezes, omitiram versetos (meios-versículos) ou versículos inteiros e, mais frequentemente, os adicionou. Esses últimos 3. Veja B. Waltke, “The Reliabilily o fth e Old Testam ent Text”, em NIDOTTE, 1:51 -67. 4. N. .lastram. “ Proverbs. Book o f ” , em EDSS, 2:701-2. 5. Este com entário aceita com o a m elhor edição disponível da LXX, a A. Rahlfs, Septuaginta: Id est Veius Testamentum graece iuxia LXX interpretes II de A. Rahlfs (Stuttgart: W ürttembergische Bibelanslalt, 1935). 6. J. Cook. “The Dating o f Septuagint Proverbs”, ETL 69 ( 1993) 383-99. 7. Veja IBHS, pp. 24-28, P. 1.6.3.
tipos de variação são mais radicais do que aquilo que normalmente se espera de um tradutor. Tov acredita que muitas delas representam uma recensão diferente do livro, sem negar que algumas sejam a obra do tradutor,8 mas Cook é da opinião que o tradutor é responsável pela maioria delas.9A questão não pode ser decidida terminantemente, pois faltam os Vorlagen hebraicos. Referimo-nos ao texto da LXX sem tentar resolver a questão. É suficiente observar aqui que, mesmo nos casos de diferenças nas recensionais, este comentário pressupõe, com Tov e Childs, a prioridade do TM como o “texto original” .10 Caso se devam ao trabalho do tradutor, fica evidente que são secundárias. Baumgartner," Gerleman,12 Tov13 e Cook14 concordam que a tra dução contém muita evidência de exegese contextual, tanto em deta lhes de maior importância quanto em detalhes secundários. Tov fala de um grande número de pares de tradução e argumenta a favor da pre sença de “exegese de tradução” mesmo no acréscimo de versículos ou versos inteiros e Cook matiza essa ideia observando que “De modo algum fica claro se um par de tradução vem do tradutor ou de outra mão posterior” .15 Frequentemente é dito que a LXX é uma tradução livre, mas na verdade é tanto livre quanto criativa. Uma “tradução li vre” significa que o tradutor representou o sentido geral das linhas em hebraico sem buscar as relações detalhadas entre as palavras e/ou sin taxe do original e os elementos da tradução. Mas a LXX foi além disso. Depois de traduzir alguns elementos do texto de maneira um tanto “lite ral”, ela se entrega à liberdade e, como diz Barr, “completa a frase com uma composição tão vagamente associada ao original que pode ser igualmente considerada uma composição original do que uma tradu ção”. Barr chega à conclusão de que, “Desse modo, a mente do tradu 8. E. Tov, “ R ecensional D iffcrences belw een the M asoretic Text and the S eptuagint o f Proverbs”, em The Creek and Hebrew Bible: Collecled Essavs by Emanuel Tov (Leiden: Brill, 1999), pp. 4 19-32, depois de m ostrar as diferenças entre as versões de Provérbios, inclusive diferenças quanto à seqüência e fatores positivos e negativos, chega à conclusão de que essas diferenças são recensionais. 9. J. C ook, The Septuagint o f Proverbs: Jewish andlor Hellenistic Colouring o fthe LXX Prover bs (VTSup 69; Leiden: Brill, 1997). 10. Waltke, “ Reliability", pp. 62-63. 11. A. J. Baumgartner, Elude critique sur 1'étal du texte du Livre des Proverbes daprès les principales traduetions anciennes (Leipzig: W. Drugulin, 1890). 12. G G erlem an, Studies in lhe Septuagint (L V A , N.F., 5 2 ,3 ; Lund: Glecrup, 1956). 13. Tov, “Recensional Differences in Proverbs", p. 420. 14. Cook, The Septuagint o f Proverbs. 15. Cook. The Septuagint o f Proverbs, p. 15.
tor... não tardou em observar fenômenos no texto em hebraico que podem oferecer indícios para uma tradução; mas também foi uma mente criativa em si mesma, pronta para formular ideias que parecem corre tas no contexto da comunidade judeu-helenista”.16Cook concorda: “O tradutor empregou tradições religiosas exegéticas judias a fim de tradu zir esse texto da maneira mais clara possível para os seus leitores ju deus”.17 De acordo com Cook, o ambiente histórico do tradutor moti vou suas “interpretações conspícuas”.18 A forma espantosa como a LXX reorganiza o conteúdo de 24.23 a 31.31 ilustra a sua criatividade. H. C. Washington argumentou de ma neira convincente que a LXX criou a ficção da autoria salomônica de todos os ditos em Provérbios ao mudar as observações editoriais das coleções e reorganizá-las. Eis a seqüência de apresentações no TM e na LXX: TM I 1.1 -9 .1 8 II 10.1-22.16 111 22.17 -2 4 .2 2 IV 24.23-34 V 25.1 -2 9 .2 7 VIA VIB
30.1-14 30.15-33
VI IA
31.1-9
VIIB
31.10-31
LXX Prólogo Provérbios de Salomão Trinta Ditos do Sábio Mais Ditos do Sábio Coleção de Salomão por Ezequias Oráculo de Agur Provérbios Numéricos de Agur A Mãe de Lemuel a Seu Filho A Mãe de Lemuel sobre a Esposa Virtuosa
I II III VIA IV VIB VIIA V VIIB
1 .1 -9 .1 8 10.1-22.16 22 .1 7 -2 4 .2 2 30.1-14 24.23-34 30.15-33 31.1-9 25.1 -2 9 .2 7 31.10-31
A reorganização da LXX não é arbitrária, antes, faz parte de sua ficção salomônica, como se pode ver na sua supressão da autoria de Agur e Lemuel em 30.1 e 31.1 e no reforço da autoria salomônica dos “ditos do sábio” em 22.17 e 24.23. Ela mantém a atribuição da autoria salomônica em 1.1 e 25.1, mas omite o sobrescrito em 10.1. Em 31.1, em vez de “Palavras de Lemuel, um rei...”, a LXX lê: “Minhas palavras 16. James Barr, “flV¥ - Molis: Prov. XI.31,1 Pet IV. 18”, 755 20 (1975) 158-59. 17. Cook, The Septuagint o f Proverbs, p. 38. 18. Cook, The Septuagint o f Proverbs, p. 292.
foram proferidas por Deus”, e em 24.23, em vez de “são também estes provérbios do sábio”, a LXX lê: “Digo estas coisas a vós, o sábio, para que compreendais”.19 O TM coloca os oráculos de Agur e Lemuel no final do livro como apêndices, enquanto a LXX os entrelaça entre as palavras do sábio, os quais ela atribui a Salomão, para dar a impressão de uma autoria salomônica sem qualquer emenda de 1.1 a 31.31. A LXX apresenta o livro todo como duas seções salomônicas, a primeira identificada como “Provérbios de Salomão” (paroimiai Salõmõntos, 1.1) e a segunda como “os ensinos de Salomão” (hai paideiai Salõmõn tos) copiados na corte de Ezequias, 25.1,20Apesar de Washington crer erroneamente que até mesmo no TM Provérbios pertence aos livros pseudepigráfícos judeus, ele conclui convincentemente que: “Consis tente com o interesse intensificado na tradição pseudepigráfica durante o período helenista posterior, o editor da LXX toma a atribuição salo mônica dos Provérbios mais enérgica do que na tradição hebraica”. Isso explica as diferenças entre a ordem do TM e da LXX e deixa clara a prioridade da seqüência do TM”.21 Cook explica outras organizações na LXX. Ele observa a ligação régia entre 31.1 e 25.1: o tradutor da LXX chama Provérbios 31.1 -9 de resposta oracular de um rei, e 25.1 e 2 fala, respectivamente, da glória do rei e da inescrutabilidade do cora ção do rei.22 Ele também observa que, ao combinar 29.27 com 31.10, o tradutor obteve um contraste impressionante entre o homem injusto e a esposa virtuosa, ao contrário da falta de conexão entre 29.27 e 30.1 no TM.23 Fica claro que a LXX representa um arranjo secundário. Não obstante, nas ocasiões em que o tradutor, que “atentou mais para a língua original semita do que para a língua grega para qual o texto estava traduzido”,24 traduz seu Vorlage de maneira um tanto “literal”, ele preserva, por vezes, uma leitura original em seu Vorlage em contraste 19. Ou, “Estas coisas eu vos digo para que possais compreender questões sábias”. 20. Os manuscritos gregos Alexandrino e Sinaítico (corrigido) leem paroimiai, e não paideiai, numa tentativa de harmonizar 1.1 e 25.1. 21. H. C. Washington, "Wealth and Poverty in the [nstruction o f Amenemope and the Hebrew Proverbs: A Comparative Case Study in the Social Location and Functionof Ancient Near Eastern Wisdom Literature” (diss. Ph.D., Princeton Theological Seminary, 1992), pp. 194-97. Cinco anos mais tarde Cook (The Septuagint o f Proverbs, pp. 304-5,307) chegou à mesma conclusão indepen dentemente: “Para [o tradutor da LXX] todos os provérbios eram, portanto, provérbios de Salomão... Ao que parece, somente os provérbios de Salomão são provérbios aceitáveis para ele, para Israel”. 22. Cook, The Septuagint o f Proverbs, p. 307. 23. Cook, The Septuagint o f Proverbs, p. 313. 24. J. Lust et al., A Greek-English Lexicon o f the Septuagint, Part I, A-l (Stuttgart, 1992).
com a leitura secundária preservada em L. Este comentarista encontra leituras originais na LXX, e não no TM, em 1.15; 3.3; 8.5 (n. 13), 28 (n. 42); 9.1 (n. 1), 11 (n. 21); 13.15 (n. 29); 18.19 (n. 22); 23.27 (n. 35); 28.23 (n. 24); 31.16 (n. 76); 31.17 (n. 79). C. OUTRAS VERSÕES ANTIGAS
Existe uma relação singular entre a LXX e a Peshita siríaca (Sir.; questionavelmente ca. d.C. 150) em Provérbios.25 Por exemplo, tanto a LXX quanto a Peshita acrescentam os mesmos quatro versículos a 9.18 e a Sir. basicamente concorda com sua tradução para o grego. É prová vel que se basearam num texto hebraico que difere do TM. No entanto, Cook argumenta, especialmente a partir de seus tratamentos distintos da “mulher adúltera” no prólogo (capítulos 1-9), que a Peshita toma o próprio caminho, exceto em alguns casos em que o hebraico é difícil e o tradutor da Peshita, ao precisar de ajuda, consultou a LXX.26 Apesar dessas duas versões concordarem entre si com frequência, essa concordância não se aplica aos detalhes, pois cada tradutor possui as próprias técnicas de tradução e/ou interesses teológicos em função de seus ambientes históricos distintos. Por exemplo, o grego e a Sir. traduzem 9.18a de maneira semelhante: “mas ele não sabe que homens poderosos morrem por meio dela”. Mas elas diferem em sua tradução do verseto B: “e ele encontra-se com o laço do Hades” (LXX) e “e no vale do Hades todos são convidados a ela” (Sir.). Cook chega à seguinte conclusão: “Em alguns casos, o tradutor da Peshita interpretou de ma neira singular e aparentemente usou a Septuaginta”.27 Quando as ver sões grega e siríaca seguem uma recensão hebraica diferente, ou quan do a Sir. depende da LXX, ou ainda, quando a Sir. interpreta o texto representado no TM, segue-se, logicamente, que a recensão do TM, e não a Peshita, apresenta maior probabilidade de conter “leituras origi nais”. Apesar do caráter secundário do texto da Peshita, ocasionalmen te, ele mantém uma leitura original do seu Vorlage, como se acredita ser o caso em 6.2 (n. 4). 25. Para citações da Peshita o comentário se baseia em Alexander A. di Lella, Vetus Testamentum Syriace iuxla simpUcem svrortim versionum, Pars. fasciculus v, Proverbia-Sapientia SalomonisEcclesiasles-Canticum Canlicomm (Leiden: Brill, 1979). 26. J. Cook, -‘The Relationship between the Peshitta and the Septuaeint Proverbs”, Textos 14 (1994)117-32. 27. Cook, The Septuagint ofProverbs, p. 291.
Também existe uma relação única entre a Targum aramaica de Pro vérbios (de data incerta) e a Sir.28 Há um consenso geral de que a Targ. de Provérbios usou, de alguma forma, o Sir. em razão de suas seme lhanças com a língua siríaca e ao fato de que a Targum e a Peshita são idênticas em 300 dos 915 versículos. Alguns estudiosos acreditam que ele se valeu diretamente da Peshita, o que torna a Targ. de Provérbios mais recente, ou que se valeu de uma fonte aramaica e/ou siríaca co mum com a Peshita, permitindo a possibilidade de que a Targ. de Pro vérbios seja anterior à Peshita. No entanto, por vezes a Targ. de Provér bios segue rigorosamente ao TM, discordando da Peshita. Em 85 casos, porém, ela concorda com a LXX, e não com o TM. Não fica claro se esses casos refletem um conhecimento específico da LXX, um conheci mento de tradições variantes, um Vorlage hebraico comum diferente do TM. Ao contrário das targuns de outros livros da Bíblia, a Targ. de Provérbios demonstra uma ausência extraordinária de explicações exegéticas. Healey explica seus poucos afastamentos do TM por causa do seu objetivo de elucidar o significado do texto, tomá-lo mais digno de crédito, moralizar, evitar referências objetáveis a Deus ou apresentar uma introdução “esclarecedora” ao nome divino.29 Por causa de sua forte dependência da Sir. e suas outras características secundárias, esta Targum é de pouco valor para a crítica textual e nunca é citada neste comentário como contendo uma leitura original. O Liber Proverbiomm de Jerônimo (ca. 400 d.C.) depende do proto-TM, o texto hebraico padronizado depois de 100 d.C. e, por esse motivo, é de pouco valor para a crítica textual.30 Em pouquíssimos ca sos, porém, quando seu Vorlage se afasta do TM preservado, ele reflete um estágio anterior dessa recensão e deve receber consideração séria. Além disso, ocorreram erros de escriba no início da transmissão do texto - nenhum escriba é capaz de copiar um texto sem erro algum - de modo que as correções textuais são inevitáveis, como sugerido em 1.11, 28. Discussões e citações da Targ. dc Provérbios são extraídas com mais frequência de John F. Healey, The Targum of Proverbs (The Aramaic Bible: The Targums, 15. Diretor do Projeto Martin McNamara. Kevin Cathcart, et al., orgs.; Collegeville, Minn.: Liturgical, 1991). Seguindo o conselho de Healey, este comentário usou a Targ. dc Provérbios em Walton’s Polyglot e o texto de Zamora da Targ. de Provérbios in L. Díez Merino, Targum de Provér bios: Edicicm Príncipe de! Ms. VMa-Amil n° 5 de Alfonso de Zamora (Madri: CSIC, 1984). 29. Healey, Targum, pp. 6-7. 30. A Vulg. é citada a partir de Bonifatio Fischer, O. S. B„ et al., orgs., Biblia Sacra luxta Vulgatam Versionem, Tomos II (Stutlgart: W ürttembergische Bibelanstalt. 1969).
18; 2.18; 6.24 (n. 4); 7.9 (n. 11); 7.22 (n. 33); 8.11 (n. 23); 12.12 (2x, texto); 14.14 (n. 30); 19.20 (n. 37); 22.20 (n. 112); 23.29 (n. 84). D. CONCLUSÃO
A evidência geral e a evidência comparativa dos textos e versões, a favor da confiabilidade do TM, são confirmadas pela transmissão con servadora conhecida da literatura de sabedoria do antigo Oriente Próximo. 1 Reis 4.29-31 (Hb 5.9-11) sugere que os sábios e seus escri tos eram tidos em alta consideração no mundo de Salomão. Seus escri tos confirmam essa impressão. Um papiro hierático expressa o valor da literatura de sabedoria da seguinte maneira: “Os livros de instruções se tomaram [dos escribas cultos] pirâmides. Existe outro semelhante a Ptahhotes e Khaires?”31 Na parede de um túmulo do Reino Novo em Sakkara, pode-se ver representações de estátuas em forma de múmia de oficiais importantes. Entre os vizires, encontram-se Imotepe e Kaires. Sem dúvida, a inclusão deles se deve, em parte, à sua reputação como sábios. Não é de surpreender que as obras desses sábios desfru tavam de um status aparentemente canônico. Merikare (35) lê: “Copie os teus pais e teus ancestrais... Veja, suas palavras permanecem na forma escrita. Abre, para que possas ler e copiar (sua) sabedoria. (As sim) o homem hábil se toma instruído"?2 Os escribas conservadores seguiram essa admoestação. A tablete de Turim contém a porção da Instrução de Amenemope correspondente a 24.1-25.9 no papiro com pleto do Museu Britânico. O tablete atesta a mesma organização de linhas, e o trecho copiado no tablete começa justamente no inicio de uma página no papiro completo. O colofão ao Conselho da Sabedoria diz: “Escrito de acordo com o protótipo e conferido”.33 Lambert comentou sobre o tablete bilíngüe da biblioteca de Assurbanipal, do qual não foi encontrado nenhuma du plicata ou cópia antiga: Este tablete, ou uma cópia anterior sobre a qual ela se baseia, foi copiado a partir de um original danificado, e o escriba foi extrema mente fiel na reprodução deste. Quando escreveu em uma linha aquilo 31. A. C. Beatty e A. H. Gardiner, The Lihrary o f Chester Beatty: Description o f a Hieralic Papryus with a Mythological Story, Love-Songs and Other Miscellaneous Texts (Londres: impres so por via particular por J. Johnson; publicado por Oxford University e S. Walter, 1931). 32./íA,£7',p.415. 33. ANET, p. 427.
que estava dividido em duas no original, o ponto de divisão no origi nal foi marcado com um par de cunhas usadas em comentários para separar palavras citadas das observações acerca das mesmas... Nos lugares em que o original se encontrava seriamente danificado, o escriba copiou exatamente o que ele viu e deixou espaços em branco marcados como “quebrados” nos quais não restava coisa alguma.3''
Mas a evidência também mostra que foram realizadas algumas al terações. A comparação entre os tabletes bilíngües mais recentes e seu texto babilônio antigo unilíngue em sumério se mostra uma lição útil sobre a história literária. E. I. Gordon encontrou 34 provérbios comuns ao texto unilíngue e aos textos bilíngües posteriores. Lambert observou casos em que não ocorreu nenhuma alteração. “O mais relevante é que conjuntos inteiros de provérbios na mesma seqüência são transpostos do unilíngue para os bilíngües posteriores.”35 Mas ele também obser vou que um tablete do período mais recente apresenta um provérbio que não se encontra na coleção anterior. Isso mostra que, apesar das coleções terem sido transmitidas de maneira conservadora, foi possível acrescentar a elas certos provérbios selecionados. Da mesma forma, o editor final de Provérbios se sentiu à vontade para reunir material de diversas fontes. Além disso, a circulação de formas variantes do mes mo provérbio também é um fenômeno bastante conhecido na coleção hebraica (cp. Pv 10.2 com 11.4). III. E S T R U T U R A A. INTRODUÇÃO
Os títulos (ou sobrescritos) em Provérbios dividem o livro clara mente em sete coleções (1.1; 10.1; 22.17; 24.23; 25.1; 30.1; 31.1). Ape sar de 22.17 não ter um título editorial distinto, sua referência a “pala vra do sábio”, sua forma característica e sua integridade com 22.17-21, que se referem, entre outras coisas, aos “trinta ditos” em 22.20 (corrigi do), reservam esses versículos como os trinta primeiros ditos. O sobrescrito editorial da coleção seguinte, “Estes também são provérbios do sábio” (24.23) identifica, sem sombra de dúvida, 22.17-24.22 como a terceira coleção em Provérbios. O livro de Provérbios costumava ser considerado uma coleção alea 34. W. G Lambert, Babylonian Wisdom Literature (3* ed.; Oxford: Clarendon, 1975), p. 239. 35. W. G Lambert, Babylonian Wisdom Literature, p. 223.
tória de provérbios, mas, conforme argumentarei a seguir, o estudo da poética mostra sua composição habilidosa. P. Skehan emprega um mé todo numérico muito questionável (i.e., um código numérico) para veri ficar a estruturação editorial cuidadosa do livro.1A seu ver, o editor dispôs as colunas do livro na forma de uma “casa de sabedoria”, se guindo o modelo do templo de Salomão,2 mas Skehan não conquistou muitos adeptos com sua ideia. Um dos problemas com esse conceito é que o texto deve ser reorganizado em vários lugares para apoiar sua teoria. No entanto, o valor numérico que ele atribui aos nomes nos títulos que combinam com o número de linhas nas coleções recebeu algum reconhecimento. O valor numérico dos três nomes em 1.1, slmh (Salomão), dwd (D avi)ejárY (Israel) é 375,14 e 541, um total de 930, que, de acordo com Skehan, é o número total de linhas no livro. No texto recebido, porém, o total é 934. Ele chega a 930 por considerar 1.16; 8.11 e 24.23-34 como comentários, o que enfraquece a sua equa ção. Uma correspondência numérica mais convincente é encontrada entre o valor numérico de $ (= 300), l (= 30), m (= 40) e h (= 5) em 10.1, um total de 375, que é equivalente ao número de versículos em Salo mão I (10.1-22.16), uma equação reconhecida anteriormente por C. Steuemagel.3 Essa correspondência entre o valor numérico do nome de Salomão e os 375 aforismos em Salomão I é notável demais para ser acidental e pode indicar uma edição mais recente de Salomão I. Contudo, Clifford comenta, “Apesar do valor numérico das consoantes hebraicas ser atestado apenas a partir do segundo século a.C., ele pode ser muito mais antigo”.'4Alan Millard, porém, ressaltou que no momento não há nenhuma evidência de que as letras do alfabeto eram usadas como nu merais no hebraico pré-exílico.5 Um conceito mais digno de crédito do 1. P. W. Skehan, Studies in Israelite Wisdom (CBQMS 1; Washington, D.C.: The Catholic Biblical Association o f America, 1971), pp. 27-45. 2. P. W. Skehan, Studies in Israelite Wisdom, pp. 27-43. 3. P. W. Skehan, Studies in Israelite Wisdom. pp. 43-45. De acordo com Skehan, em 25.1 o nome operativo é Ezequias, cujo valor numérico varia de acordo com sua ortografia, mas uma opção. 140, eqüivale a seu número dc linhas em Salomão II (25.1-29.27). Além disso, o valor numérico de hkmym ("homens sábios”) nos títulos de 22.17 e 24.23 é 118, correspondendo a seu número de linhas em 22.17-24.32 e 30.7-33. Mas sua contagem de linhas e sua omissão da biografia de Agur em 30.1-6 parecem arbitrárias. 4. Richard J. Clifford, Proverbs(CfXV, Louisville: Westminster/John Knox, 1999), p. 108. 5. A. Millard. "Strangers from Egypt and Greece: The Signs for Numbers in Early Hebrew”, in Immigration and Emigration within the Ancient Near East: Festschrift E. Lipinski, org. K. van Lerberghe e A. Schoors (Orientalia Lovaniensia Analecta 65: Leuven: Peeters. 1995), pp. 189-94.
que o numérico é o uso da crítica da forma e da retórica para mostrar a integridade das sete coleções de acordo com seus títulos editoriais. B. COLEÇÃO I: TÍTULO COM PREÂMBULO (1.1-7), PRÓLOGO (1.8-8.36) E EPÍLOGO (9.1-18)
A primeira coleção consiste de três seções: um título principal (1.1) com um preâmbulo (1.2-7), um prólogo (1.8-8.36) e um epílogo (9.1 18). O prólogo consiste de 12 unidades, totalizando 14 peças literárias distintas que abrangem a Coleção I. Na forma final do livro, a Coleção I apresenta o contexto para todas as coleções subsequentes (10.131.31), e não apenas para a Coleção II (= Salomão I, 10.1-22.16) e seus dois apêndices, os “Trinta Ditos do Sábio” (Coleção III; 22.1724.22) e os “Outros Provérbios do Sábio” (Coleção IV; 24.23-34). Con trastando com os aforismos concisos da Coleção II, com exceção do título em prosa, a primeira coleção é constituída inteiramente de poe mas em louvor à sabedoria. A intenção do editor final com essa dispo sição era motivar o sábio e o ingênuo a aceitar a sabedoria em todas as sete coleções de sua forma final de Provérbios. 1. Título com Preâmbulo (1.1-7) O título principal identifica seu gênero literário (“provérbios”) e autor (“Salomão, filho de Davi, o rei de Israel”). Seu preâmbulo, que modifica gramaticalmente o título, declara o propósito do livro, “Para aprender a sabedoria e o ensino; para entender as palavras de inteligência ...” (1.26) e lança o seu fundamento, “O temor do Senhor é o princípio do saber” (1.7). Em resumo, a primeira seção consiste de três unidades que decla ram o título do livro, seu propósito e princípio fundamental. 2. Prólogo e Epílogo (1.8-9.18) a. Prólogo (1.8-8.36) O prólogo consiste de 12 poemas: 10 palestras colocadas na boca do pai e dirigidas ao “filho meu” (1.8-19; 2.1-22; 3.1-12, 13-35; 4.1-9, 10-19, 20-27; 5.1-23; 6.1-19; 6.20-35; 7.1-27) e dois interlúdios, dis cursos extensos pela sabedoria, uma personificação feminina da sabe doria de Salomão para os jovens ingênuos (1.20-33; 8.1-36).6Como as 6. Adotei a terminologia “palestra" e “interlúdio” usada por Fox, “ Ideas o f Wisdom", pp. 613-33
dez palestras, esses dois poemas extensos começam tipicamente com uma introdução que indica a quem são destinados, os admoesta a ouvir a lição da palestra e substancia a admoestação com promessas motivadoras. De um modo típico, a lição exalta o ensino e/ou exige obediência sincera ao mesmo, e/ou adverte contra os discursos rivais do homem ganancioso ou da mulher libertina, que representa uma cosmovisão es tranha à sabedoria de Israel. A lição é tipicamente coroada com uma conclusão sumarizante. A palestra em 3.13-35, porém, começa de ma neira atípica, com estrofes em louvor à sabedoria antes da introdução e motivação típicas e termina com instrução ética específica. Tanto em sua forma como em seu conteúdo, o material de 6.1 -19 se destaca das palestras que o precedem e o seguem em 5.1-23 e em 6.2033. Falta à sua forma a chamada típica para dar atenção com motiva ções e lança-se diretamente para as instruções específicas. E seu con teúdo lida com três tipos inferiores de homem (6.1-5, 6-11, 12-19), e não com a esposa infiel, que é o tema das palestras ao seu redor. Uma vez que lhe falta um destinatário direto, é melhor considerá-lo um apên dice à palestra anterior, com o típico destinatário introdutório (5.1-6). Em resumo, as palestras e discursos do prólogo preparam o coração do jovem para aceitar os provérbios e ditos subsequentes no restante do livro. b. Epílogo (9.1-18) O capítulo 9 também é atípico. Como os interlúdios, ele apresenta uma introdução relativamente longa ao discurso da sabedoria ao ingê nuo (9.1 -3). Diferente dos interlúdios, porém, seu discurso é um convite extremamente breve acrescido de motivações (9.4-6) e é equiparado pelo discurso rival da loucura (9.13-18); entre um discurso e outro, encon tram-se instruções sobre a pedagogia. Quase todos os estudiosos con cordam que essa passagem serve de epílogo do prólogo. Em resumo, a Coleção I consiste de 14 seções e unidades: um preâmbulo e um epílo go, dez palestras e dois interlúdios. As palestras do pai e os discursos da sabedoria completam umas às outras. “Onde o pai é a voz autoritativa na família”, observa C. Newsom, “hokmôt (a sabedoria personificada) é a voz pública correspon e Proverbs 1-9, p. 44. No entanto, Fox considera 3.21 -35 como um discurso e 3 .13-20 como um interlúdio.
dente ‘nas ruas’, ‘nas praças’ ”.7Apesar da sabedoria se dirigir osten sivamente às massas, que inclui os ingênuos, seus elogios a si mesma se encontram, na verdade, ocultados dentro dos discursos ao filho (e.g., 8.32-36). Apesar de negar que as palestras do pai e os discursos da sabedoria são provenientes do mesmo autor, M. Fox observa sua conti nuidade ao documentar seus notáveis temas comuns. As passagens dos “interlúdios” são apresentadas abaixo entre colchetes: A obrigação de buscar a sabedoria (2.4 [1.28]), de ouvi-la (2.2; 4.20; 5.1; etc. [1-24; 8.32]) e de clamar por ela (2.3 [1.28; o tema comple mentar é o clamor da sabedoria: 1.21; 8.1]); achando a sabedoria (4.22 [ 1.28; 3.13; 8.17,35]) e as conseqüências perniciosas de aborre cer a sabedoria e a repreensão (5.12-14 [1.29-32]). Nas palestras, a personificação da sabedoria é encontrada em forma incidental e rudi mentar, como uma metáfora ao lado de outras, em 2.3,4; 4.8,9; 6.22; e 7.4. A loucura é abstraída das características da mulher adúltera das palestras. Sua casa deve ser evitada (5.8; 7.25 [9.13-18]), pois o cami nho para ela conduz à morte (2.18,19; 5.5; 7.27 [9.18]).8
c. Organização de 1.8-9.18 O prólogo (1.8-9.18) pode ser organizado segundo o padrão con cêntrico abaixo: A Convites rivais do pai e da gangue ao filho B A repreensão da sabedoria ao ingênuo C Janus: A ordem do pai para atender ao ensino como um salvaguarda contra homens perversos e a esposa lasciva D As ordens do pai para atender ao ensino D’ As advertências do pai contra a esposa lasciva C 'Janus: As advertências do pai contra a rival da sabedoria B ’ O convite da sabedoria ao ingênuo A’ Convites da rival da sabedoria e da loucura ao ingênuo
1.8-19 1.20-33
2.1-22 3.1-4.27 5.1-6.35 7.1-27 8.1-36 9.1-18
7. C. A. New som , “ Woman and the D iscourse o f Patriarchal W isdom: A Study o f Proberbs 1-9”, in Gender and Dijference in Ancient Israel, org. Peggy L. Day (Minneapolis: Fortress, 1989), p. 145. 8. Fox, “Ideas o f Wisdom”, p. 618.
AJA' estruturam o prólogo com dois convites, dos pais sábios (1.8,9) em contraste com o dos homens perversos (1.10-19) e da sabedoria personificada em contraste com o da loucura (9.1-6; 13-18). O movi mento dos convites dos pais para atender a sua sabedoria (1.8,9) para o da sabedoria ao ingênuo (9.1-6) reflete o movimento das palestras como um todo e sugere a equiparação da sabedoria com os ensinamentos dos pais (veja 1.20-33). O convite rival introdutório dos homens perversos ao filho (1.10-19), em contraste com o convite final conclusivo da lou cura ao ingênuo constitui um merisma ao redor do prólogo, pois são dirigidos aos dois destinatários mencionados no preâmbulo, a saber, o ingênuo (1.4) e o sábio (1.5). Os homens perversos e a mulher-loucura formam outro merisma envolvente, por meio das tentações distintas dos dois sexos, respectivamente: dinheiro fácil numa gangue (1.8-19) e sexo fácil com mulheres insensatas (9.13-18). B/B’ personificam a sabedoria de Salomão de maneira singular como um ser celestial, e ambos se dirigem de maneira igualmente ímpar ao ingênuo na porta da cidade. C/C’ funcionam como transições. Por um lado, o capítulo 2 remete ao capítulo 1, mostrando ligações verbais claras com o preâmbulo (1.27) e com a primeira palestra (1.8-19), ecoando seus assuntos e temas (cp. 1.3be2.9; 1.7e2.5; 1.8 e 2.1; 1.10-19 e 2.12-15). Em seu contexto imediato, o clamor e o levantar da voz da sabedoria (1.20,21) são res pondidos pelo clamor e o levantar da voz do filho (2.3). Por outro lado, sua ordem para aceitar os ensinamentos dos pais (2.1-4) prefigura as ordens que se desenvolvem, como “não te esqueças” (e.g., 3.1,21), nos capítulos 3 e 4 .0 objetivo da segunda palestra é livrar o filho dos homens perversos (2.12-15) e da esposa lasciva (2.16-18), prenuncia as adver tências contra eles nos capítulos 5 e 6. A unificação dos temas em um só poema mostra que, mesmo sendo distribuídos posteriormente em poemas isolados, eles são, na verdade, componentes inseparáveis da sabedoria. Por um lado, o capítulo 7 dá continuidade às advertências contra a esposa infiel nos capítulos 5 e 6 e, por outro lado, se preocupa com o ingênuo, como nos capítulos 8 e 9. Mais importante ainda é o fato de os capítulos 7 e 8 se apresentarem articulados como um díptico. O capítulo 7 retrata a esposa infiel surgindo na noite que cai sobre as ruas da cida de e “arrebatando” o ingênuo com sua fala sedutora. O capítulo 8, que é relacionado ao capítulo anterior, retrata a sabedoria quando ela levan ta sua voz em plena luz do dia junto à porta que conduz às ruas da
cidade a fim de salvá-lo com antecedência. Suas conclusões, que se assemelham às das dez palestras dirigidas a “filho meu” (cp. 7.24-27; 8.32-36), formam a segunda articulação deste díptico. D/D’ combinam a ordem do pai a seu filho para atender a suas instruções com suas advertências contra a sedução dos homens e mu lheres perversos. Essas duas seções de extensão praticamente igual e de formas mistas apresentam um padrão quiástico. As admoestações para dar ouvidos ao ensino dos pais (3.1 -26; 4.1 -27) giram em tomo de um eixo de ordens negativas concernentes ao próximo, especialmente o homem violento (3.27-35). Assim, também, os concernentes contra a adúltera (5.1-23; 6.20-35) giram em tomo de um eixo de ordens nega tivas que advertem progressivamente contra os três tipos inferiores de homem (6.1-19). As instruções éticas singulares (3.27-35) no final da quarta palestra (3.13-35) sugerem que as palestras no capítulo 3 cons tituem uma unidade maior que a do capítulo 4. Tanto na primeira quanto na última palestra, as palavras dos ho mens perversos (1.11 -14) e da mulher perversa (7.14-20) são citadas e, desse modo, formam um inclusio ao redor das palestras do pai. C. COLEÇÃO II: PROVÉRBIOS DE SALOMÃO I (10.1-22.16)
1. Introdução O subtítulo editorial “Provérbios de Salomão” (10.1a), unido com uma marcante mudança quanto às formas, distingue a primeira coleção dos provérbios de Salomão (= Salomão 1,10.1-22.16) do prólogo (1.89.18) e dos Trinta Ditos dos Sábios (22.17-24.22). Os extensos poe mas do prólogo dão lugar aos aforismos curtos, incisivos de um só ver sículo compostos quase que exclusivamente de bicola (os dois verse tos que dividem um versículo). Salomão I é separado dos Trinta Ditos do Sábio (22.17-24.22) pela referência aos “ditos do sábio” (22.17; cp. 1.6) com uma mudança na forma, passando de aforismos para ditos mais longos e fluentes. Vários dos trinta ditos se estendem por dois versículos ou mais e assumem a forma de admoestações com motiva ções corroborativas. As assim chamadas Coleção II (ou Salomão 1) e Coleção I (1.19.18) são, na verdade, duas unidades que se encaixam uma na outra dentro de um conjunto unificado, como demonstram os seis argumentos a seguir:
1. Analogias egípcias mostram que 1.1o título principal, e que 10.1 o subtítulo de uma coleção unificada (veja pp. 72-76). A divisão habitual de 1.1-22.16 em duas coleções, que também é seguida neste comentário, é pedagogicamente correta, porém historica mente imprecisa. 2. A referência aos provérbios e ditos do sábio em 1.6 se iguala às referências aos provérbios de Salomão I em 10.1 e aos ditos do sábio em 22.17 e 24.23. 3. A Coleção I, que chega à sua conclusão mediante um contraste claro entre a sabedoria e a loucura, prenuncia os paralelos antitéticos que caracterizam Provérbios 10-15. 4. O prólogo é concluído com a referência à esposa infiel que só volta a ser vista na conclusão de Salomão I (22.14). 5. O primeiro aforismo de Salomão I (10.1b), referindo-se ao pai,à mãe e ao filho e admoestando implicitamente que o filho aceite os ensinamentos dos pais, forma um janus entre o aforismo e as palestras do pai, que explicitamente admoestam o filho a dar ou vidos ao seu pai e à sua màe (veja 1.8). 6 .0 restante de Salomão 1 consiste de unidades de provérbios mar cadas pelo uso do vocabulário das admoestações introdutórias das palestras do pai (e.g., “filho”, “instrução”, “sabedoria”, “co nhecimento”, “perspicácia”, “prudência”, “ensino” e “mandamen to”; veja p. 60). 2. Seções da Coleção II Ao analisar a forma, o conteúdo e o estilo e ao empregar estatísti cas para quantificar suas descobertas, Udo Skladny esboçou uma divi são de Salomão I em A (capítulos 10-15) e B (16.1-22.16) e de Salo mão II (25.1-29.27) em C e D. Skladny cita a seguinte evidência. Os bicola de Salomão IA são principalmente antitéticos, enquanto que os de Salomão IB mudam principalmente para paralelos sinônimos e sinté ticos. (Na verdade, porém, a evidência desta mudança aparece em 15.30, pois, a partir desse ponto, os paralelos antitéticos são relativa mente incomuns.) Os paralelos antitéticos na Coleção A contrastam, com frequência, os benefícios dos justos com as desventuras dos per versos sem definir claramente esses termos. O objetivo da Coleção A é qualificar a “sabedoria” como um termo ético, não um termo intelectu al. Os justos são sábios. Além disso, a Coleção A não postula uma
“ligação entre ato e conseqüência” ( Tat-Ergehen Zusammenhang), mas sim uma “ligação caráter- destino” não qualificada (Haltung-Schicksal Zusammenhang). Além disso, na Coleção A o Senhor é o fiador da ligação, mas a coleção não faz qualquer tentativa de revelar sua natureza. Em B, porém, há um nítido declínio nos contrastes entre os justos e os perversos e uma preocupação muito maior com os futuros funcionários na corte do rei. A Coleção B enfatiza o abismo intranspo nível entre a justiça humana e a divina; na verdade, ninguém é inteira mente puro diante do seu Criador. Ademais, o Senhor é mais que um fiador da ordem moral. Ele se interpõe entre pensamentos e planos de uma pessoa e sua realização, de modo que ele aparece como aquele que dirige e efetua a vida de uma pessoa. Na Coleção B, o papel do rei é exaltado, de modo que ele é quase divino. B fala dos sábios e insensa tos, dos justos e dos perversos, em termos concretos, de modo que se pode listar suas ações específicas. Uma vez que B se concentra em atos específicos e suas conseqüências, deve-se falar agora de uma “Unidade Atos-Resultados” ( Taí-Folge Einheit). Além disso, o sentido ético da sabedoria se mostra menos acentuado dando lugar ao juízo e à astúcia. Porém, a invariabilidade absoluta da “Ligação Caráter-Destino” é mais qualificada (Skladny fala de um ceticismo crescente).9 Medi ante sua análise sistemática das quatro seções de Salomão 1e II, Skladny visa delinear o desenvolvimento histórico da sabedoria em Israel. Apesar de ele crer que as quatro coleções remontam ao período da monarquia hebraica e estão entre os textos de sabedoria mais antigos de Israel, ele organiza as Coleções A, D, B e C, em sua seqüência histórica.10 Para B. W. Kovacs, a Coleção B que, a seu ver, começa em 15.28, é a incorporação de uma cosmovisão consistente. Porém, por não ha ver feito uma comparação rigorosa entre as Coleções A e B, Kovacs não argumenta a favor da existência de suas subdivisões dentro de Salomão I." Goldingay observa que Salomão I começa com uma ob servação sapiencial-padrão para dar ouvidos à sabedoria (10.1). Esta é “seguida por uma observação acerca da justiça e da maldade (v. 2) e de uma observação acerca do envolvimento do Senhor na vida das pessoas (v. 3), no interesse da justiça (v. 4)”. Ele encontra a mesma 9. U. Skladny, Die áltesten Spruchsammlungen in Israel (Gõttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1962), pp. 7-46. 10. Skladny, Die àheslen Spruchsammlungen in Israel, pp. 76-82. 11. B. Kovacs, “Sociological-Structural Constrains upon Wisdom: The Spatial and Temporal Matrix o f Proverbs 15:28-22:16” (Diss. Ph.D., Vanderbilt University, 1978), pp. 307-516.
seqüência desses quatro tipos de dito (observação sapiencial-padrão, v. 1, inserida num contexto moral, v. 2, inserida num contexto teológico, v. 3, seguida de sabedoria pragmática, vs. 4-5) em 10.23-27,12.1-14,14.14 e 15.2-7, mas não após o capítulo 15.12 A repetição do mesmo provérbio em 14.12 e 16.25 pode indicar coleções originalmente distintas que incorporavam o mesmo provérbio (cp. 6.10, 11 e 24.33, 34). Mas em virtude das duas coleções incluírem provérbios parcialmente sinóticos, esse fato pode apontar para outras coleções, que não A e B conforme a divisão de Skladny.13A LXX tam bém mostra claramente uma junção por meio de uma série de omissões e uma seqüência diferente de versículos de 15.27 a 16.10.'4 Suas vari ações em relação ao TM podem refletir uma edição posterior de Salo mão I realizada na tradição textual ou no método criativo do tradutor ao traduzir a edição do livro, e não uma tradição textual alternativa (veja pp. 39-40). No entanto, a LXX oferece uma leitura alternativa importante aproximadamente no mesmo lugar em que Skladny obser vou uma junção em Salomão I. A unidade 15.30-16.15 ilustra de modo tão notável as diferenças apontadas por Skladny entre as seções A e B que convém considerá-la uma introdução à Seção B. Depois de um prólogo em 15.30-33 à cole ção B e/ou à unidade, a perícope se concentra na oscilação entre a soberania de Deus e a responsabilidade e obrigação humanas.'5 Em 16.8 a ordem moral é qualificada por um provérbio do tipo “melhor é”, no qual os justos têm pouco lucro e os perversos têm grande lucro. Em 16.10-15 o rei representa Deus, defendendo sua ordem moral na terra por meio dos tribunais. Apesar de Skladny ter conquistado adeptos à sua análise sistemáti ca das divisões, devemos observar que as diferenças são frequentemente 12. J. Goldingay, “The Arrangemenl o f Sayings in Proverbs 10-15", JSOT 61 (1994) 75-83. 13. Por exemplo, 10.1 = 15.20; 16.2 = 21.2; 19.5 = 19.9; 20.10 = 20.23; 21.9 = 21.19. Para a listagem mais completa de repetições variantes, veja Daniel C. Snell, Twice-Told Proverbs (Winona Lake, Ind.: Eisenbrauns, 1993). 14. Na LXX, 16.6 aparece como 15.27a; 16.7 como 15.28a; 16.8 e 9 como I5.29a-b. 15.30 é om itido com pletam ente, com 16.1-3. Alguns mss da LXX apresentam 16.1, seguido pela Sir. 3.18, geralmente com um asterisco e um óbelo. A LXX apresenta na seqüência um dito que não c encontrado no TM, e depois 16.5, seguido dc mais dois ditos exclusivos, 16.4 seguido de 16.1 Oss. 15. Veja B. K. Waltke. “The Dance between God and Humanity”, em üoing Theolog\>for the People of God: Studies in Honor ofJ. I. Packer, org. D. L. Lewise A. McGrath (Downers Grove, III.: InterVarsity, 1996), pp. 87-104.
de ordem quantitativa, não qualitativa. A expressão “os tesouros da impiedade” (10.2), por exemplo, sugere que o perverso ajunta uma for tuna à custa do inocente e 14.27, 28 liga o Senhor e o rei. No entanto, Skladny não obteve seguidores em seus conceitos sobre a seqüência histórica das divisões. Parece mais plausível, por exemplo, supor que uma evolução de ideias, de um “efeito atos-consequências” para uma “conexão entre caráter-destino” e do entendimento de sabedoria como um termo mais astuto para um termo mais ético do que o contrário. Além disso, é provável que a organização reflita uma intenção pedagó gica, e não um desenvolvimento histórico. Van Leeuwen entende a mu dança, de uma conexão não qualificada ato-consequência para uma mais qualificada, como sendo pedagógica, não como um ceticismo cres cente. “[Provérbios 10-15] é o á-bê-cê da sabedoria, as regras básicas que o jovem precisa para viver bem. Começando com o capítulo 16, exceção às regras básicas de vida aparecerão com muito mais frequên cia.”16 Whybray argumenta que, em sua forma editada, o “contraste justo-perverso” no início da coleção estabelece o contexto ético para Salomão I, enquanto os ditos sobre Yahweh reunidos na parte central (capítulos 15 e 16, especialmente 15.33-16.9) colocam as considera ções teológicas no ceme da coleção.17 3. Unidades da Coleção II Em 1928, Gustav Bostrõm investigou a possibilidade de alguns dos provérbios em Salomão I serem intencionalmente organizados de acor do com suas características em comum, e distinguiu os ditos seqüenciais por meio de suas ligações sonoras em comum, como consonância, assonância e aliteração.18 Porém, não demonstrou interesse pela organiza ção dos provérbios visando criar contextos significativamente ricos. Desde o estudo de Skladny de 1962 que distinguiu coleções por meio de material temático, estudiosos reconheceram a presença de outros agru pamentos e coleções de materiais dentro de Salomão I e Salomão 11. Em 1968, Hermisson continuou tanto o trabalho de Bostrõm sobre paronomásia quanto a análise de sentido de Skladny, avançou ao identifi car de modo experimental vários agrupamentos razoavelmente peque 16. R. C. Van Leeuwen, Proverbs (NIB 5; Nashville: Abingdon, 1997), p. 105. 17. R. N. Whybray, “Yahweh-Sayings and Their Conlexts”, em Sagesse, pp. 153-65. 18. Q Bostrõm, Paronomasi i tlen ãldre hebreisko Muschallitieraturen (LUÂ, N.F., Avd. 1, Bd. 23. Nr. 8; Lund: Gleerup. 1928).
nos constituídos de dois ou mais versículos por meio de critérios poéti cos e temáticos. Numa analogia com Siraque e as “instruções” egípci as, Hermisson sugeriu que um autor-editor combinou-as com grande habilidade e chegou à conclusão de que os ditos individuais devem, primeiramente, ser interpretados de modo independente e, então, den tro do contexto.19 Em 1972, usando de certos métodos do estruturalismo francês, G E. Bryce mostrou que Provérbios 25.2-27 constitui uma unidade literá ria e, desse modo, foi o primeiro a postular uma obra independente não identificada como tal pelo editor final.20Em 1979, R. N. Whybray argu mentou que um editor escolheu deliberadamente o lugar dos ditos de Yahweh em 10.1-22.16, mas argumentou que estes serviam para reinterpretar seu contexto imediato. Saeb0 chegou de modo indepen dente à conclusão similar de que os ditos de Yahweh fornecem aos ditos ao seu redor um contexto que molda teologicamente o seu signifi cado.21 Em 1984, R. C. Van Leeuwen, valendo-se do estruturalismo, da poética e da semântica, demonstrou de maneira convincente que os provérbios na Coleção C se encontram organizados em composições literárias mais amplas.22 Em 1985, B. V. Malchow propôs que a Cole ção D é uma coleção organizada de maneira complexa que serve como “Um Manual para Futuros Líderes”.23 Em 1987, S. C. Perry confirmou o trabalho de Bostrõm por meio de um estudo informatizado da paronomásia, mas negou que esses jogos de sons entre os provérbios sucessi vos forneciam um contexto que enriquecia a interpretação.24 Em 1988, Ted Hildebrandt encontrou 62 pares de provérbios em Provérbios 10.122.16, “duas frases proverbiais unidas (quer por meio da fonética, se mântica, sintaxe, artifício retórico, situação pragmática ou tema) numa unidade arquitetônica superior”. A seu ver, essas unidades foram “editorialmente planejadas” e refletem a “tendência teológica” e a “sensi 19. H.-J. Hermisson, Studien zur israelitischen Spruchweisheit (WMANT 28; Neukirchen-VIuyn: Neukirchener, 1968), pp. 172-83. 2 0 .G E. Bryce, “Anolher W isdom‘Book’ in Proverbs”, J B L 9 \ (1972) 145-57. 21. M. Saebe, “From Collections to Book: A New Approach to the Hislory ofTradition and Redaction ofthe Book o f Proverbs", em PNWCJS: Division A: The P eriodoflhe Bible, org. M. GoshenGottstein (Jerusalém: World Union o f Jewish Studies. 1986), pp. 99-106. 22. R. C. Van Leeuwen, “Context and Meaning in Proverbs 25-27” (Diss. Ph.D., University o f St. Michael’s College, 1984). 23. B. V. Malchow, “A Manual for Future Monarchs", CBQ A l (1985) 238-45. 24. S. C. Perry, “Structural Pattems in Proverbs 10:1-22:1: A Study in Biblical Hebrew Stylistics",(diss. Ph.D., University ofTexas em Austin, 1987).
bilidade literária” dos colecionadores.25 Em 1989, Jutta Krispenz espe rava identificar grupos em Salomão I e Salomão II com base na repeti ção de fonemas como na paronomásia, ligações entre palavras-chave e aliterações que, em sua opinião, se referem à repetição. Krispenz apre sentou uma tendência de negligenciar outros artifícios de estruturação, mas ela reconheceu agrupamentos com base no contexto semântico.26 Em 1990, Hildebrandt foi além das partes de provérbios para unidades composicionais maiores em Provérbios 10.27Os comentários de Plõger (1984),28Alonso-Schõkel (1984),29Meinhold (1991 )30e Garrett (1993)31 interpretam provérbios individuais tanto de modo independente quanto dentro de unidades literárias maiores. Plõger se mostra experimental nos agrupamentos além do par de provérbios e Meinhold é o que alcan ça mais sucesso em seu empreendimento, postulando o desenvolvimento de coleções por meio de estágios de pares e tríades para grupos maiores para seções ou parágrafos, para subcoleções e, finalmente, para as prin cipais coleções apontadas pelo editor. Meinhold observou que os ditos de Yahweh foram colocados em seu contexto atual durante o processo de compilação, sendo colocados principalmente, em sua maior parte, no iní cio e no final dos capítulos e parágrafos e indicando seus limites. Em 1993, McCreesh refinou nossa compreensão dos sons-padrões que os poetas empregam em seu sentido.32 Em 1994, a tendência de Whybray foi depreciar os esforços anteriores, mas ele o fez sem uma avaliação crítica. No entanto, ele agrupou alguns provérbios em con textos mais amplos e explicou de que maneira o contexto de determina do dito molda o seu significado e sua relevância.33 Em sua monografia 25. T. Hildebrandt, “Proverbial Pairs: Compositional Units in Proverbs 10-29”, JBL 107(1988) 207-24. 26. J. Krispenz, Spruchkomposilionen im Buch Proverbia (EHS.T, 349; Frankfurt am Main and Bem: Verlag Peter Lang), citado por Knut Martin Heim, "Structure and Context in Prover bs 10:1-22:16” (Diss. Ph.D., University o f Liverpool, 1996), p. 18. 27. T. Hildebrandt, "Proverbial Strings: Cohesion in Proverbs 10”, GTJ 11 (1990) 171-85. 28. O. Plõger, Spritche Salomos (Proverbia) (BKAT XV1I/2-4; Neukirchen-VIuyn: Neukirche ner, 1984). 29. L. Alonso-Schõkel e J. Vilchez, Provérbios (Madri, 1984). 30. A. Meinhold, Die Sprüche. Teil 1: Sprüche Kapitel 1-15 (ZBK; Zurique: Theologischer, 1991); A. Meinhold, Die Sprüche. Teil 2: Sprüche Kapitel 16-31 (ZBK; Zurique: Theologischer, 1991). 31. D. A. Garrett, Proverbs, Ecclesiastes, Song ofSongs (NAC 14;Nashville: Broadman, 1993). 32. T. P. McCreesh, O.P., Biblical Sound and Sense: Poetic Sound Pattems in Proverbs 10-29 (JSOTSup 128; Sheffield: ShefíieldAcademic, 1991). 33. R. N. Whybray, Proverbs (NCBC; Londres: Marshall, Morgan e Scott e Grand Rapids: Eerdmans, 1994).
The Composition o fth e Book o f Proverbs, publicada no mesmo ano, mas escrita depois do seu comentário, Whybray argumentou a favor do reconhecimento de agrupamentos no livro de Provérbios. Ele procurou provar através de documentos que outras conhecidas coleções de pro vérbios do antigo Oriente Próximo apresentam, por vezes, uma organi zação específica. Ele também argumentou que, visto que um único pro vérbio não pode refletir a complexidade da vida, o caminho natural de superar essa deficiência é combinar os provérbios em grupos maiores. De acordo com ele. a combinação de som (i.e., paronomásia, inclusive repetição verbal) e de sentido constitui um argumento particularmente forte a favor da identificação de grupos. Whybray elaborou começos e finais usando material formalizado, como instruções imperativas, ditos educacionais na linguagem de Provérbios 1-9. Desse modo, os provér bios originalmente isolados se tomaram parte da literatura de instrução de Israel (p. 52). Os ditos de Yahweh podem complementar provérbios avulsos ou, ainda, comentar ou resumir grupos maiores. Ao contrário de seu estudo de 1979, porém, nesta investigação Whybray concluiu que não se trata de uma questão de “reinterpretação”, mas de explica ção e enfoque.34 Também em 1994, Goldingay afirmou que os quatro tipos de dito observados em 10.1-5, 23-27; 12.1-4; 14.1-4 e 15.27, em cada caso, “parecem marcar o começo de uma nova subcoleção” nos capítulos 10-15. Observou, ainda, como este comentarista o fez independente mente, que “O primeiro dentre estes é a observação acerca da sabedo ria que constitui a introdução propriamente dita, uma exortação implíci ta à atenção, paralela àquelas que dão início aos sermões nos capítulos 1-9”.35 Em 1995, especialmente pela observação de repetições dos ditos, mas também se valendo de partes dos ditos, palavras e quiasmos, Ruth Scoralick agrupou os capítulos 10-15 nos seguintes segmentos de texto: 10.1-11.7; 12.8-13; 12.14-13.13; 13.14-14.27; 14.28-15.32. No entanto, ela não fez nenhuma tentativa de demonstrar a unidade do conteúdo dentro dessa estrutura ampla.36 Em 1996, Knut Heim, seguindo o esboço da pesquisa de Scoralick, apresentou uma história abrangente do estudo da organização dos ditos 34. R. N. Whybray. The Composition o f the Book o f Proverbs (JSOTSup 168; Sheffield: JSOT, 1994), esp. pp. 82-83. 35. Goldingay, “The Arrangement ofSayings in Proverbs 10-15”, pp. 75-83. 36. R. Scoralick, Enzelspruch undSammlung (BZAW 232; Berlim: Walter de Gruyter, 1995).
em Provérbios; avaliou criticamente cada um dos colaboradores cita dos, porém, curiosamente, ignorou o estudo de Sklandy, exceto por uma consideração de sua teoria do ambiente de uma escola. Ele desenvol veu o estudo argumentando que títulos pertencentes a campos semân ticos diferentes (e.g., '‘justos / perversos” versus “sábios/insensatos”), ainda que não sejam sinônimos, são correferências à mesma classe de pessoas; por exemplo, como Cotterell e Tumer observam, “O Líder de um Partido” e “Primeiro-Ministro” se referem à mesma pessoa, mas não têm o mesmo significado.37 Heim tentou provar sua tese analisan do os ditos em seu contexto “de acordo com seus agrupamentos por meios sintáticos, estilísticos e outros”. Seus agrupamentos amplos de Salomão I são capítulos 10; 11.1-13.25; 14.1-16.33; 17.1-20.4; 20.522.16. E surpreendente que ele não explica em detalhes o seu método de delimitação, como também não defende esses agrupamentos am plos. Dentro deles, porém, ele tenta delimitar cuidadosamente tanto ar ranjos maiores quanto menores em relação a estudos anteriores.38 Em 1996, tentei mostrar a estrutura e a coerência de 15.30-16.15;39 em 1998, de 10.1-1540 e de 26.1-1241, e em 1999, de 31.10-31.42Apesar de Whybray ter previsto que “comentários futuros seriam obrigados a le var a sério este aspecto do material”, Van Leeuwen (1997) e Clifford (1999) o negligenciam a maioria das vezes.43 Usando principalmente os provérbios de uma única linha que edu cam (ou pedagógicos), não pares instrutivos (e.g. 10.6, 7, 8, 9; 19.27, 28), como guia heurístico, este comentário identifica o início das unida des. Os provérbios educativos sinalizam o início de uma unidade e po dem ser considerados como refrães que organizam o material. Esse 37. Veja P. Cotterell cM .Tum er, Linguistics and Biblical Interpretation (Londres: SPCK., 1989), pp. 160-61; veja também J. Lyon, Semantics (2* ed.; Cambridge: Cambridge University, 1979), pp. 660-61. 38. Heim, “Structure and Context". 39. B. K. Waltke, “The Fear o f the L o r d ” , em Alive to God: Studies in Spirituality Presented to James Houston, org. J. I. Packcr e Loren Wilkinson (Downers Grove, III.: InterVarsity, 1992), pp. 17-33. 40. B. K. Waltke, “ Proverbs 10:1-15: A Coherent Collection?” in Reading and Hearing the Word from Text to Sermon: Essays in Honor of John H. Stek. org. A. E. Leder (Grand Rapids: CRC Publications, 1998), pp. 161-80. 41. B. K. Waltke, “Old Testament Interpretation Issues for Big Idea Preaching: Problematic Sources. Poetics, and Preaching the Old Testam ent, An Exposition o f Proverbs 26:1-12", in The Big Idea of Preaching, org. K. Willhite e S. M. Gibson (Grand Rapids: Baker, 1998), pp. 41-52. 42. B. K. Waltke. “The Role ofthe ‘Valiam Wife’ in the Market Place”. Crux 35 (1999) 23-34. 43. Clifford, Proverbs.
“refrão” educativo pode explicar a divisão medieval de capítulos em 10.1; 12.1; 13.1. A Coleção B é marcada de maneira singular por qua tro versículos intimamente ligados por seus sons e sentido (15.30-33). Sua extensão relativamente longa sugere que ela funciona como um pró logo para a Coleção IIB. Por meio do método da poética que hoje é amplamente reconhecido (veja pp. 88-94), testo a validade desses agru pamentos delimitados e analiso em mais detalhes a unidade em suas subunidades hierárquicas até os pares de provérbios, caso estes existam.44 Interpretando que os aforismos memoráveis de Salomão pretendem ori ginalmente ser independentes e secundariamente colecionados como li teratura que lhes dão contexto, eu os interpreto de ambas as formas. Convém ter sempre em mente as advertências prudentes de Whybray acerca de seus dois critérios de som e sentido. Com referência ao som, a possibilidade de coincidências é enorme, e com referência ao sentido, a lógica moderna pode ser ignorante quanto antiga. Em decorrência disso, o comentarista deve aplicar os critérios com bom senso. Todos os aspec tos da exegese e da interpretação envolvem tanto uma ciência objetiva quanto uma arte subjetiva que não podem ser provadas. D. COLEÇÃO III: OS TRINTA DITOS DO SÁBIO (22.17-24.22)
Apesar de não apresentar um título do editor em prosa, o dito edu cativo de 22.17 dá início a uma nova coleção. O estilo volta agora inten cionalmente para o discurso direto da Coleção I, com os imperativos do pai dirigidos ao filho (22.17; 23.15, 19, 22, 26; 24.13, 21). Os aforis mos curtos e judiciosos da Coleção II dão lugar às admoestações exten sas e fluentes seguidas por cláusulas motivo. Diferentemente da Cole ção II, os Trinta Ditos do Sábio com seus imperativos intencionalmente são dirigidos diretamente ao filho. Os marcadores sintáticos e poéticos mostram que 22.17 faz parte do primeiro dito unificado (22.17-21), que dá à coleção o nome de “ditos do sábio” (22.17) e que especifica seu número como 30 (22.20). O título editorial da coleção seguinte em 24.23 marca o final desta terceira coleção. A evidência externa dos trinta ditos da notavelmente similar obra egípcia, a Instrução de Amenemo pe (ca. 1186-1069 a.C.) confirma a evidência interna de que os Trinta Ditos do Sábio são uma antologia distinta de ditos de sabedoria. 44.0 comentário procura delimitar empiricamente os agrupamentos e refletir de modo convincen te sobre seu significado, não especulando sobre seu desenvolvimento histórico.
Os Trinta Ditos do Sábio (22.17-24.22) consistem amplamente, em termos mais amplos, do dito educativo introdutório (22.17-21), seguido de três seções também marcadas por ditos educativos introdutórios (23.12; 24.3; 24.13) e por suas estruturas e temas distintos. O primeiro dito introduz a primeira seção, um decálogo de ditos (22.17—23.11), e bem como o todo. Diferentemente do agrupamento dos quatro ditos edu cativos que introduz a Coleção I1B (15.30-33), esta introdução de cinco versículos emprega a forma de discurso “eu - tu” e é ligada por partí culas lógicas. O tópico da segunda seção (23.12-24.3) é o filho obedi ente, quase outro prólogo para as duas últimas unidades. A terceira seção diz respeito à competência da sabedoria em meio ao infortúnio (24.3-12) e a seção final à proibição com respeito ao perverso .45 O inclusio “para que a tua confiança esteja no Senhor” (22.19) e “teme ao Senhor” (24.22, ARA 21) estrutura toda a coleção. Mas os estudiosos não concordam quanto à identificação dos trinta ditos. A questão mais problemática é determinar se 24.10-12 deve ser contado como um ou dois ditos. Apesar da exegese desses versículos favorecer a ideia de que constituem uma unidade, alguns intérpretes os dividem em 24.10 e 24.11,12, supostamente para manter o número 30. Seu erro é contar 22.17-21 como prólogo, e não como primeiro dito. No entanto, Amenemope (3.8-10) enumera o material comparável em 22.1719 como seu o primeiro capítulo depois do preâmbulo {Amen. 1:2-6) e seu prólogo (Amen. 1:13-3:7) corresponde ao material no, não com a forma do, título de Provérbios 1.1. Seu primeiro “capítulo” (ou dito) começa: Ele diz: Capítulo 1 Dá ouvidos, ouve os ditos, Aplica seu coração para entendê-los; É proveitoso colocá-los em teu coração; Maldito daquele que os negligencia! Que descansem no esquife de seu ventre. Serão ancoradouro para tua língua.46 45. D. Rõmheld (Wege der Weisheit: Die Lehren Amenemopes und Proverbien 22:17-24:22 [BZAW 184; Berlim: deG ruyter, 1989], p. 59) agrupa os ditos de m odo bastante organizado em três decálogos, mas seu agrupam ento de 24.3-5 com os nove ditos anteriores (23.12-24.2) e sua junção de 24.3-12 e 2 4 .13-22 são indefensáveis. Além disso, seu procedim ento ao não contar o prólogo com o prim eiro dito e de separar 24.10 de 2 4 .11, 12 é questionável.
Glendon E. Bryce observa que Provérbios 22.17,18 eAmen. 3:8-17 apresentam em comum e na mesma seqüência “teu(s) ouvido(s)”, “ouve”, “palavras/ditos”, “é proveitoso/é agradável”, “teu coração”, “no esquife de teu ventre” / “teu ventre”, “teus lábios / tua língua” .47 A ligação com Amenemope é rompida com a introdução do nome de Deus em Provérbios 22.19. No entanto, é retomada em 22.20, e sua referên cia aos trinta ditos corresponde ao último capítulo de Amenemope. “Pres ta atenção a estes trinta capítulos” (30.7). Provérbios 22.21b corres ponde ao preâmbulo de Amenemope ( 1:5-6), sabendo como responder ao que fala para replicar ao que envia uma mensagem.
A estrutura gramatical comparável e a seqüência dos verbos “sa ber”, “lembrar” / “responder” e “enviar” sugerem uma tentativa em Provérbios de preservar conteúdos do preâmbulo de Amenemope bem como de seus primeiros e últimos ditos. Cinco linhas de evidência sugerem que se considere 22.17-21 como o primeiro dos Trinta Ditos, e não um preâmbulo separado de sua enumeração. 1. Três versículos em Provérbios 22.17-21 apresentam afinidades com o primeiro e o último ditos em Amenemope, mas apenas metade de um versículo apresenta afinidades com o preâmbulo de Amenemope, o qual não é contado como um dito. 2. Existem várias concordâncias entre o primeiro dito de Amenemo pe e Provérbios 22.17-21. 3. Trinta ditos em Amenemope são partes de um dito. 4. Uma vez que 22.17-21 está incluído sob o preâmbulo em Provér bios 1.2-7, a postulação de outro preâmbulo se toma improvável. 5 .0 prólogo depois do preâmbulo em Amenemope relembra o título de Provérbios 1.1, sob o qual seus Trinta Ditos estão também incluídos. Ao deixar de oferecer antecedentes imediatos aos seus pronomes “eu” e “tu” em 22.17, o editor-autor relaciona os Trinta Ditos com seu prólogo (1.8-9.18), permitindo que os leitores concluam que o pai rea firma em discurso direto ao filho (veja 1 .8 ). O pai, no entanto, é a boca 47. G E. Bryce. A Legacy of Wisdom: The Egyptian Contribution to the Wisdom ofIsrael ( Lcwisburg: Bucknell University, 1979), pp. 101-2.
de Salomão, de modo que, em última análise, é o rei famoso que, por sua sabedoria, está se dirigindo aos jovens de Israel (veja v. 1). Não obstante, a linha entre Salomão e o pai se toma tão tênue que o pai é representado como aquele que escreveu os ditos, caso o TM seja preciso (veja v. 20 ). O texto ainda existente continua a representar o rei perspi caz colocando suas palavras na boca do pai (veja v. 8 ). A Targ. de Provérbios ajuda a remover a ambigüidade no versículo 17 ao acres centar “filho meu”. Uma vez que este versículo caracteriza os Trinta Ditos como “palavras do sábio”, pode-se concluir com razão que Salo mão adotou e adaptou esses ditos do sábio como sendo de sua autoria (veja v. 6 ). Se Salomão não é o autor, então o autor dessa coleção é desconhecido, o que é improvável. Com seu apelo para confiar no Se nhor, o versículo 19 adapta os ditos à fé de Israel (cp. 1.7). E. COLEÇÃO IV: MAIS DITOS DO SÁBIO (24.23-34)
A frase “São também estes provérbios do sábio” (24.23a) marca o início da quarta coleção. O sobrescrito em 25.1 traça seu término. O termo “também” (gam ) indica que Salomão ou um colecionador poste rior anexou esses cinco ditos aos “Trinta Ditos do Sábio”. Uma vez que Salomão adotou e adaptou esses ditos para Israel (veja 22.17-21), é mais plausível pensar que o famoso rei fez o mesmo neste caso .48 As últimas seções da coleção anterior continham cinco ditos cada uma (2 4 .3,4,5,6, 7, 8,9, 10-12 e 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20,21,22), e o mesmo acontece nesta coleção (24.23b-25,26,27,28,29,30-34). Meinhold identifica nesta coleção três âmbitos conceituais desenvolvidos de acordo com um padrão alternado para modificar esses conceitos: A Comportamento no tribunal B Falar/pensar C Comportamento no trabalho A’ Comportamento no tribunal B ’ Falar/pensar C’ Comportamento no trabalho
julgar resposta correta positivo testemunhar resposta errada negativo
(24.23b-25) (24.26) (24.27) (24.28) (24.29) (24.30-34)'”
48. A LXX insere aqui a primeira metade dos ditos de Agur (30.1-14) sem citá-lo, dando a impres são de que Salom ão tam bém redigiu os ditos. Em seguida acrescenta esses seis ditos de modo a deixar clara a autoria dc Salomão: “ E isto vos digo” . E depois continua com a segunda m etade dos ditos de Agur sem qualquer nota editorial (30.5-33). 49. Garrett ( Proverbs, p. 2 0 1) analisa seu conteúdo em apenas duas esferas com um padrão alter
Meinhold comenta: “Duas esferas básicas de vida - justiça e traba lho - formam duas vezes a estrutura para os eventos de falar e pensar. Expressam, desse modo, aquilo que é particularmente importante para a vida humana. A coleção menor impressiona por sua brevidade e con cisão” .50 A semelhança entre seus últimos dois versículos e 6.10,11 serve como exemplo de como o mesmo material pode ser usado de maneiras diferentes. F. COLEÇÃO V: SALOMÃO II (25.1-29.27)
O sobrescrito de 25.1 indica o início da quinta coleção de Provérbios, Salomão II (25.1-29.27). Como o conjunto “Mais Ditos dos Sábios” (veja 24.23), Salomão II também se adapta à classificação de Kitchen, tipo A, consistindo de um título formal (25.1; cp. 24.23a) seguido imediatamente pelo texto principal (25.2-29.27; cp. 24.23b-34).510 estilo de Salomão II se iguala ao de Salomão I, mas sua estrutura é mais transparente. Conforme observado, Skladny analisou Salomão II como tendo duas seções: C (25.2-27.27) e D (28.1-29.27). A seção C é caracterizada pelos provérbios comparativos, com exceção dos provérbios antitéticos em 25.2; 27.6, 7, 12, mas D contém 33 conceitos antitéticos.52 Além disso, D tem consideravelmente mais conteúdo teológico e tom ético. Apesar de haver apenas duas referências explícitas ao Senhor (28.5, 25), Plõger ressalta que a operação do curso divino da justiça está im plícita do começo ao fim ,53 ao que Whybray acrescenta, “outra diferen ça em relação à seção anterior” .54 Em termos mais específicos, D se concentra em Deus, que educa e governa. Whybray resumiu suas dife renças temáticas: “Os capítulos 25-27 são caracterizados pela ausên cia quase total de referências a Yahweh, pelo número elevado de sími les e metáforas e pela quantidade relativamente grande de admoesta ções. Os capítulos 28 e 29, como um todo, possuem as características contrárias” .55 Bryce e Van Leeuwen demonstraram a unidade estrutunado: A/A ’ sobre os tribunais (24.23b-25, 28, 29) e B /B ’ sobre as prioridades econôm icas (2 4 .2 6 , 27, 3 0 -3 4 ). 50. M einhold, Die Sprüche, 2:410. 5 1. K. A. Kitchen, “Proverbs and Wisdom Books o f the Ancient N ear East: The Factual History o f a Literary Form ”, TynBul 28 (1977) 69-114, esp. p. 73. 52. Toy, The Book ofProverbs (ICC; Edinburgh: T&T Clark, 1977), p. x. 53. Plõger, Sprüche, p. 332. 54. W hybray, Proverbs, p. 357. 55. W hybray, Proverbs, p. 357.
ral de 25.2-27, e Van Leeuwen demonstrou a unidade das outras unida des na Seção C de maneira bastante detalhada. Malchow demonstrou a unidade estrutural de D .56 O poema longo em 27.23-27 separa as duas unidades, e sua referência à coroa (27.24) funciona como um janus. G COLEÇÃO VI: OS DITOS DE AGUR. FILHO DE JAQUE (30.1-33)
A sexta coleção é separada de Salomão 11 por um sobrescrito em forma de prosa combinada com a própria introdução de Agur, filho de Jaque: “Declaração inspirada do homem a Itiel. ‘Estou cansado, ó Deus, mas posso prevalecer’ [minha tradução] ”. Apesar de muitos estudio sos negarem a unidade do capítulo, o esboço a seguir e os argumentos baseados no mesmo apoiam a integridade do “oráculo” de Agur, filho de Jaque. I. Introdução: A confissão autobiográfica de Agur A. Sobrescrito B. Sua confissão 1. Seus ditos são inspirados 2. Suas duas petições: por veracidade e modéstia II. Texto principal: Sete ditos numéricos A. Primeira coleção, sem linhas iniciais de título 1. Provérbio de uma só linha contra a perturbação da ordem moral 2. Três ditos numéricos B. Segunda coleção, com linhas iniciais de título 1. Provérbio de uma só linha contra a perturbação da ordem moral 2. Quatro ditos numéricos III. Conclusão: Uma advertência aos filhos para não perturbarem a ordem moral
vs. 1-9 1 2-9 2-6 7-9 10-31 10-16 10 11-16 17-31
\7 13.31 32 33
A confissão de Agur está ligada aos ditos numéricos pelo numeral “dois”. Ele encerrou sua autobiografia com dois pedidos (30.7-9) e o primeiro número que usa como parte de umjanus para os ditos numéri cos intitulados é “dois” (v. 15a). Na verdade, ao se dirigir ao seu público ele insiste nesse número fazendo dele a palavra inicial no versículo 7,
semelhante às linhas com títulos dos ditos numéricos. Na primeira cole ção de ditos numéricos, os dois primeiros não têm títulos (vs. 11 -14,15a) e o terceiro tem título, mas não inicialmente, ao contrário da segunda coleção. Apesar da LXX e da Sir. representarem a sanguessuga como tendo três filhas “amadas” e transformarem o versículo 15 em um todo integrado, o TM e a Targ. tratam corretamente esses versículos como contendo dois aforismos, versículo 15a e versículos 15b, 16.57O primeiro aforismo sobe de uma para duas sanguessugas, e o segundo apresenta quatro insaciáveis pelo típico título cabeçalho numérico “três...quatro” no versículo 15b e os especifica no versículo 16. Ao combinar os dois aforismos relativos aos insaciáveis na ordem natural, Agur chega à se qüência numérica “dois... três... quatro” que, de acordo com Gluck, “cria um efeito cumulativo, um sentimento de intensidade crescente” .58 Além disso, a seqüência numérica dos versículos 15 e 16 funciona como umjanus. Por um lado, ao guardar a linha-título do versículo 15b, Agur reúne os ditos inicialmente sem título dos versículos 10-16. Por outro lado, a linha de título não inicial no versículo 15b conduz aos quatro ditos numéricos. Em resumo, o capítulo 30 contém sete ditos numéricos com linhas de título iniciais (vs. 11-14,15a, 15b-16,18-20,21 -23,24-28,2931), divididos pela introdução de uma única linha (v. 17) formando duas divisões de três e quatro ditos numéricos, que combinam com o escalo namento numérico três... quatro nas linhas de título. Cada metade desses ditos numéricos é introduzida por um provér bio simples que é contra a perturbação da ordem moral. O abuso do escravo atrai sua maldição, uma maldição que o S e n h o r sustenta (30.9), da mesma maneira como o S e n h o r é responsável por enviar as aves carniceiras que arrancam os olhos do filho rebelde (v. 17). Essas duas introduções fornecem as penalidades que claramente estão ausentes nos provérbios numéricos em si. Além disso, depois da confissão de Agur, quase todos os seus ditos são oráculos proféticos contra a perturbação da ordem social determinada por Deus. O mandamento para não calu niar o servo e assim levá-lo a transtornar a ordem social estabelecida sugere que aqueles que ocupam cargos de autoridade devem mantê-la tratando seus subordinados com sabedoria. A segunda introdução ocorre exatamente no meio do capítulo, sendo precedida e seguida por 16 versí 57. W. M. W. Roth. Numérica! Savings in lhe Old Testament: A Form-Critical Studv (VTSup; Leiden: Brill. 1965), p. 28, n. 3. 58. J. J. Gluck, “Proverbs xxx 15a” , f T 1 4 ( 1964) 368.
culos. A conclusão enfatiza esse oráculo (vs. 32,33). Voltando ao discur so direto da introdução, Agur adverte seu filho a não se exaltar acima dos outros a fim de evitar contenda. Essa integridade do tema e da estrutura confirma a ideia de que o sobrescrito diz respeito ao capítulo todo. H. COLEÇÃO VII: OS DITOS DE LEM UEL01.1-31)
Tanto a forma como o conteúdo de 31.1 o separam como um so brescrito, supostamente para o capítulo todo (cp. 1.1; 10.1; 25.1; 31.1 a). No entanto, muitos estudiosos atribuem apenas o poema “O Rei Nobre” (31.2-9) à mãe de Lemuel. Eles excluem o poema “A Esposa Virtuosa” (vs. 10-31) por causa de sua forma e estrutura distintas, sua separação dos versículos 1-9 na LXX, e um ceticismo acadêmico de caráter endê mico quanto às próprias reivindicações da Bíblia acerca de sua autoria. Se Lemuel não é o autor de “A Esposa Virtuosa”, esse poema é um órfao sem igual em Provérbios - isto é, falta-lhe um sobrescrito atribu indo sua autoria. Sem dúvida, o primeiro poema consiste de admoesta ções dirigidas ao rei e o último de ditos na forma de um acróstico, e o marido da esposa virtuosa não é o rei, pois seu marido se assenta à porta da cidade, não em um trono (v. 23). Todavia, diversos poemas com formas únicas não são prova de uma autoria diferente. Na verda de, os sábios, tanto no Egito quanto na Bíblia, compõem peças unifica das em diversas formas.59 Agur, filho de Jaque, mistura com grande habilidade a confissão autobiográfica e os ditos numéricos de vários tipos em um todo unificado. A evidência de provérbios na LXX não pode ser considerada como secundária, porque é parte da ficção salo mônica do tradutor (veja pp. 40-42). Ao comparar os dois poemas do capítulo 31 com analogias egípcias, Kitchen resume o argumento de que o sobrescrito se refere ao capítulo todo: O assunto dos versículos 10-31... é inteiramente consistente com a suposta origem da obra... ambos são femininos... De modo inverso, se os versículos 10-31 forem excluídos de Lemuel então, (i) a pri meira ‘obra’ resultante de apenas nove versículos se toma ridicula mente breve, e (ii) a suposta segunda ‘obra’ dos versículos 10-31 se toma um poema isolado sem título e fica completamente fora do gêne ro literário educativo. Seria, nesse caso, um corpo irregularmente es tranho em Provérbios.60 59. Kitchen, "Proverbs and Wisdom Books o f the Ancient N ear East”, pp. 100-101. 60. Kitchen, "Proverbs and Wisdom Books”, p. 101.
Além disso, M. Lichtenstein citou dados verbais e temáticos para demonstrar que uma mente organizada integrou os poemas formalmente distintos numa unidade .61 Os dois poemas começam com referências específicas a mulheres (vs. 3,10), demonstram preocupação com hayil (“força” [v. 3]; “valorosa” [v. 10]), com “abrir tua/dela boca/falar” (vs. 8,9,26), e proteger os pobres e necessitados (vs. 9,20). O sobrescrito atribui essa mente organizada a Lemuel. IV. L IT E R A T U R A DE SA B E D O R IA DO A N T IG O O R IE N T E PRÓ XIM O
Este comentário pressupõe a validade do bem reconhecido gramático-histórico de interpretação, isto é, suas palavras e gramática devem ser interpretadas à luz de seu contexto histórico. Um passo fundamental na interpretação do livro é decidir o ambiente histórico dentro do qual este deve ser interpretado. Antes dos textos extrabíblicos de sabedoria do mundo de Salomão terem sido descobertos e decifrados, muitos estudiosos que aplicaram um método histórico-crítico a Provérbios, tomando por certo o desen volvimento evolutivo da religião, chegaram à conclusão de que o teste munho do próprio livro de sua autoria salomônica ( 1.1; 10 .1; 25. 1 ) não podia ser aceito sem questionamento. Segundo eles, a comunidade ju dia pós-exílica sob influências gregas deve receber o crédito pelos em preendimentos literários atribuídos a Salomão. Já em 1922, Holscher colocou a chamada literatura proverbial mais antiga no período persa .1 Este entendimento exerceu um forte impacto sobre comentários erudi tos e até hoje valiosos como o de Crawford Toy.2 Sem dúvida, o livro pode ter adquirido sua forma final depois do exílio. Entretanto, literatu ra de sabedoria, semelhante às coleções de provérbios e ditos em Pro vérbios, circulava pelo Crescente Fértil não apenas antes de Salomão, mas até mesmo antes dos hebreus surgirem na História! Essa seme lhança concorda com a afirmação do deuteronomista de que os provér 61. M. H. Lichtenstein, “ Chiasm and Sym m etry in Proverbs 31”, CBQ 44 (1982) 202-11. Sua argumentação, baseada numa suposta semelhança de estilo e estrutura entre os vs. 2-9 e os vs. 10-31, é m enos convincente. 1. G Holscher, Geschichte der israelilischen undjüdischen Religion (G icssen: A. Tõpelmann. 1922), p. 148. 2. C. Toy, The Book o f Proverbs (IC C; Edimburgo: T& T Clark, 1899; im pressão m ais recente, 1977).
bios de Salomão faziam parte de uma literatura sapiencial internacional, pan-oriental (em lRs 4.29-34 [5.9-14]). Em seu relatório preliminar sobre os milhares de tabletes desenter rados nos arquivos reais em Tell-Mardikh (Ebla), Giovanni Pettinato alertou os estudiosos bíblicos de que alguns daqueles tabletes conti nham coleções de provérbios.3 Existem certas dificuldades para datar com precisão o palácio real em Ebla, uma vez que as evidências prove nientes dos artefatos indicam uma data entre 2400 e 2250 a.C., enquan to que a paleografía dos textos literários aponta um período por volta de 2450 a.C .4 Infelizmente, os trabalhos acadêmicos sobre esses textos foram interrompidos em função de questões políticas. E. I. Gordon publicou duas coleções de provérbios sumérios extraí dos das 15 seções que ele reuniu de centenas de tabletes de argila desen terrados dos alojamentos dos escribas em Nipur, Susã e Ur. Essas duas coleções contêm cerca de 200 e 165 provérbios, respectivamente, cuja forma apresenta uma semelhança impressionante com as coleções salomônicas, Salomão I (10.1-22.16) e Salomão II (25.1-29.27) respecti vamente. Gordon data as duas coleções sumérias ao período babilônico antigo (ca. 1760 a.C .).5 W. G. Lambert publicou textos proverbiais bi língües contendo provérbios sumérios e suas traduções em acadiano. Seis desses fragmentos, que datam do período médio assírio e posterio res, apresentam ou podem ser colocados em relação um ao outro, e desse modo fornecem uma parte considerável de um grupo de provérbios conhecido como Coleção Assíria. Lambert também publicou uma tra dução acadiana do período médio assírio de um original sumério intitu lado As Instruções de Shuruppak, bem como da famosa obra acadia na Os Conselhos da Sabedoria, que ele data do período cassita (15001200 a.C .).6 A literatura educativa egípcia apresenta afinidades notavelmente próximas, quanto à forma e conteúdo, das admoestações encontradas em Provérbios 1.2-9.18 e 22.17-24.22 e é datada do Reino Antigo até 3 .G Pettinato, “The Royal A rchivesofT elI M ardikh-Ebla", B/i 39 (m aio de 1976)45. 4. P. M atthiae. "E bla in the Late Syrian Period”, BA (setem bro de 1976) 94-113. 5. E. I. Gordon, Sumerian Proverbs: Glimpses o f Everyday Life in Ancient Mesopotamia ( Westport, Conn.: Greenw ord, 1969), pp. 24. 152. G ordon também observou que é bastante razoável pressupor uma data consideravelm ente mais antiga para a origem de pelo menos um grande número de provérbios que fazem parte dessas coleções. 6. W. G Lambert, Babvlonian Wisdom Literature (3* ed.: Oxford: Clarendon, 1975), pp. 9 2 ,9 7 , 22 2 .
o final do período dinástico recente e governo helenista. Aqui está uma lista de textos relevantes: O Reino Antigo (2686-2160 a.C.) A Instrução do Príncipe Hardjedef A Instrução Dirigida a Kagemni A Instrução de Ptah-hotep O Primeiro Período Intermediário (2160-2040 a.C.) A Instrução Dirigida ao Rei Merikare O Reino Médio (2040-1558 a.C.) A Instrução do Rei Amenemhet I a Seu Filho Sesóstris I O Novo Reino (1558-1085 a.C.) A Instrução de Anv A Instrução de Amenemope Literatura Demótica A Instrução de Ankhsheshonq A Instrução do Papiro Insinger1 Destas, a mais importante para Provérbios é A Instrução de Amene mope (veja pp. 60-62), pois seus ditos se assemelham mais intimamente aos da Coleção IV de Provérbios (especialmente 22.17-23.11). Desde o estudo comparativo de textos egípcios e bíblicos realizado pelo egiptólogo Adolf Erman, que indicou que o autor de Provérbios conhecia a obra egípcia, há um consenso acadêmico quanto à relação literária, ape sar de alguns argumentarem que Amenemope dependeu de Provérbios ou que ambos são derivados de um original semítico perdido .8 O con senso está baseado nas semelhanças de pensamento e expressão .9Uma semelhança especialmente impressionante pode ser observada entre “Por ventura, não te escrevi excelentes coisas acerca de conselhos e conheci mentos?” (Pv 22.20) e “Presta atenção nestes trinta capítulos (= ditos)” (Amen. 30:7). Nos dias de hoje, costuma-se atribuir Amenemope ao período de Ramsés, apesar dos manuscritos existentes serem de uma data posterior. Pode-se corroborar a datação desse texto antes do tem po de Salomão com um óstraco quebrado.10 7. AEL 1 ,2 ,3 . 8. A. Erman, "E ine ãgyptische Quelle der ‘Sprüche Salom os'”, SPA lf' 15 (1924) 86-93. 9. Veja G Bryce, A Wisdom Legacy: The Egyptian Contribution to the Wisdom ofIsrael (Lewisburg: Bucknell University, 1979), pp. 97-112. 10. R. J. Williams, “The Allcged Semitic Original o f the Wisdom o f Am enemope”, JEA 47 ( 1961) 100-106.
Essa literatura sapiencial do antigo Oriente Próximo traça um perfil da teologia de Provérbios e esclarece sua autoria, formas literárias, estrutura e organização, transmissão textual e a exegese de textos indi viduais. No Egito, por exemplo, o número sagrado “30” simboliza um ensino completo e perfeito, e é provável que devemos supor o mesmo acerca de Provérbios 22.20.“ Em Provérbios 24.12, Yahweh é repre sentado como “aquele que pesa os corações”. Essa figura remete ao deus egípcio Tote que com frequência é representado no julgamento dos mortos em pé ao lado de balanças com o coração humano. V. A U TO R IA
Os títulos das coleções citam o nome de quatro autores: Salomão (Coleções 1e II; 1.1; 10.1); “os homens de Ezequias” que colecionaram e editaram alguns dos provérbios de Salomão (Coleção V; 25.1); Agur (Coleção VI; 30.1); e Lemuel (Coleção VII; 31.1). A. SALOMÃO
A maioria dos estudiosos não questiona a autenticidade histórica das atribuições a Ezequias (25.1),1Agur (30.1) e Lemuel (31.1), mas contraditoriamente considera as atribuições a Salomão (950 a.C.) como pseudepigráficas, “um testa-de-ferro ao qual se podiam atribuir as decla rações de sabedoria” .2 Reconhecem, evidentemente, que o enfoque da sa bedoria em Salomão dificilmente pode ser de todo infundado, pois deve haver um motivo para associar a sabedoria a Salomão. Além disso, mui tos reconhecem também que pelo menos um pequeno núcleo de provér bios de Salomão se encontra preservado nos materiais atribuídos a ele. No entanto, dados factuais mostram que a verdadeira ficção está em se classificar Provérbios como uma obra pseudepigráfica. Os argu mentos para a aceitação da autoria salomônica de Provérbios 1-24 se baseiam nos dados da narrativa bíblica (1 Rs 3.5,6 [= 2Cr 1.7-9], 7-14;3 11. Rõmheld, Wegeder Weisheit: Die Lehren Amenemopes und Proverbien 22:17-24:22 (BZAW 184; Berlim: de Gruyter, 1989). p. 37. 1. R. B. Y. Scott, "Solom on and the Beginning o f Wisdom” (VTSup 3; Leiden: Brill, 1969), p. 273. 2. R. E. Clem ents, Wisdom in Theology (Carlisle: Patem oster e Grand Rapids. Eerdmans, 1992), p. 19. 3. L. Kalugila, The Wise King: Studies in Royal Wisdom as Divine Revelation in the Old Testa ment and Its Environment (ConBO T 15; Lund: G leerup, 1980, p. 111) defende a declaração de Salom ão. ‘‘N ão passo de uma criança" (1 Rs 3.7 ,8 ) da acusação de im precisão histórica ao apontar para expressões de humildade semelhantes proferidas por reis egípcios e mesopotâmicos.
4.29-34 [5.9-14]; 5.7, 21 [5.21, 26], 10.2b, 3, 23-25 [= 2Cr 9.22-24]; 11.41-43) e Provérbios (1.1; 10.1; 25.1). Também têm por base as se melhanças notáveis quanto à estrutura e conteúdo compatíveis à litera tura sapiencial do Egito, Mesopotâmia e do Levante, estendendo-se do universo bíblico do terceiro milênio aos tempos greco-romano. K. A. Kitchen documentou que a literatura sapiencial desse universo apre sentava duas estruturas. O Tipo A possui um título formal e um corpo principal, e o Tipo B possui um título formal, um prólogo e um texto principal, no qual os subtítulos são opcionais. Além disso, os dois tipos ocorrem lado a lado em uma proporção aproximadamente igual desde o terceiro milênio a.C. até o período greco-romano, tendo como exceção o fato de o Tipo A não ser atestado no início do segundo século a.C. As Coleções V-II, que evidentemente foram anexadas, apresentam estru turas do Tipo A, enquanto as Coleções 1-1V apresentam, juntas, estru turas do Tipo B, contando com um título principal, um prólogo e texto principal, com subtítulos concisos (10.1; 24.23), e uma interjeição titular em 22.17 que também se iguala a instruções egípcias comparáveis. Tomando por base essas estruturas análogas e na falta de qualquer dado contrário incontestável, Kitchen chegou à conclusão de que não há motivo algum para negar que “Salomão é, em todos os sentidos, o candidato mais apropriado” como criador de 10.1-22.16 e compilador de 22.17-24.34.4 Outras correlações entre Salomão e o Egito também ridicularizam a noção de uma pseudepígrafe salomônica. Anos atrás, Humbert mostrou as analogias do conteúdo de Provérbios com as cole ções egípcias anteriores a Salomão,5 e Kayatz observou as semelhan ças quanto às formas e temas nas instruções egípcias com referência a Provérbios 1-9, levando-a a defender a data pré-exílica desta Cole ção .6As semelhanças mais notáveis quanto à forma e conteúdo podem ser vistas entre Provérbios 22.16-24.22 e a obra egípcia As Instruções de Amenemope, que Cemy datou do final da vigésima primeira dinastia (i.e., por volta da época de Salomão [1000-950 a.C.]). Além das rela ções intelectuais e literárias múltiplas entre o Egito e Israel, Salomão se casou com uma princesa egípcia (1 Rs 3.1) e moldou sua administração segundo a do Egito. 4. K. A. Kitchen, "Proverbs and Wisdom Books o fthe Ancient N ear East: The Factual History o fa Literary Form ” , 77? 28 ( 1977) 69-114, aqui 99. 5. P. Humbert, Recherches sitr les sources Egyptiennes de la litteralure sapienliale d lsra e l (Neuchâtel: Secretariat de 1’Université, 1929). 6. C. Kayatz, Studien zu Proverbien /-9 (W M A N T I l;N eukirchen-V luyn: Neukirchener, 1966).
No entanto, isso levanta a pergunta de como as influências que se encontram na base dessa relação múltipla e literária entre Salomão e o Egito podem ser representadas. Baumgartner e Gressman mostraram que os arquivos de El-Amama (ca. 1350 a.C.) continham textos literá rios cuneiformes que chegaram ao Egito, onde eram usados como livros didáticos para familiarizar os escribas com a literatura babilônica, pois eles se preparavam para serviços diplomáticos estrangeiros. Esta práti ca deve ter contribuído, para a disseminação dessa literatura. Pode-se supor de maneira correspondente que obras literárias estrangeiras tam bém chegaram a Israel. Os escribas, que eram encarregados de cuidar da correspondência diplomática com cortes estrangeiras, deviam pelo menos ter um conhecimento fluente de várias línguas. Assim, Kayatz teoriza plausivelmente: “Uma vez que o ensino egípcio, como o israeli ta, era baseado principalmente no ouvir e no aprendizado por repetição, pode-se imaginar que essa classe erudita tinha a seu dispor esse conhe cimento da literatura estrangeira. Por esse meio, suas formas de conceituação e pensamento se encontravam registradas e disponíveis para serem usadas livremente nas próprias formas literárias.”7 Pode-se muito bem imaginar Salomão, em sua genialidade, familiarizando-se com a instrução egípcia dessa maneira. A evidência lingüística também apoia a autoria salomônica. Albright argumenta que Provérbios se encontra repleto de elementos peculiares à cultura Cananeia,8 e Dahood9 e Van der Weiden10 fazem uso amplo do ugarítico (ca. 1400 a.C.) em seus estudos filológicos de Provérbios. Além disso, as atribuições a Salomão, filho de Davi, rei de Israel (1.1; 10.1), inclusive o papel do rei Ezequias (25.1), e ao rei Lemuel (31.1) são intei ramente consistentes com análogos reais do antigo Oriente Próximo. Nas instruções paralelas de sabedoria egípcia são citados três reis (Khety I; o pai de Merikare; Amenemhet I) como autores. Hardjedef é um príncipe famoso da quarta dinastia; Ptah-hotep é um vizir da quinta dinastia. É provável que Agur (30.1) fosse um oficiaI do governo, como Amenemope, um funcionário do governo do escalão intermediário, res 7. Kayatz, Studien zu Proverbien , pp. 13-14. 8. W. F. Albright, “ Som e C anaanite-Phoenician Sources o f Hebrew W isdom ” , in Wisdom
in Israel and in lhe A ncient Near East: Presented to P rofessor H arold Henry Rowley (V TSup 3; Leiden: Brill, 1969), p. 9. 9. M. J. Dahood, Proverbs and Northwest Semitic Philology (Roma: Biblical Institute, 1963). 10. W. A. van der Weiden, Le Livre des Proverbes: Notesphilologiques (BibO r 23; Roma: Bibli cal Institute, 1970).
ponsável pela administração das terras, da produção agrícola e dos im postos numa região do Egito. A Instrução de Ankhsheshonq, uma obra mais recente, diz respeito à justiça e ao bom governo, tema de interesse dos governantes. A evidência muito limitada de analogias reais da Mesopotâmia apresenta apenas Shuruppak, um rei sumério lendário. Aicar, autor de uma coleção de provérbios e preceitos em aramaico, foi um conselheiro sênior dos reis assírios Senaqueribe (ca. 700 a.C.) e EsarHadom (ca. 675 a.C.). Segundo a proposta de Von Rad, uma nova classe de escribas em Israel produziu obras como as encontradas em Provérbios durante o chamado Iluminismo salomônico, em função do contato inspirador de Salomão com o Egito," mas Brueggemann atribui esse período iluminista a Davi.12 Skladny situa três coleções no início da monarquia: Provérbios 10-15; 28-29; e 16.1-22.16.13Ele interpreta a última como uma instrução para oficiais do rei. Bryce chegou a uma conclusão pa recida com respeito a Provérbios 25,14Van Leeuwen a respeito de 252715e Malchow a respeito de 28-29.16Kovacs acredita que Provérbios 10-29 foi obra de oficiais do governo.17 Wiles observa que os reis pa trocinaram a sabedoria, e a sabedoria era o esteio dos reis .18 Weeks nega o ambiente palaciano,19 mas Fox lhe responde indiretamente, ob servando, “Os ditos em questão falam não apenas sobre reis e corte sãos, mas a favor deles e para eles” .20 Em resumo, a literatura sapi encial se harmoniza naturalmente com o ambiente palaciano, que pode ser observado opacamente ao longo de toda a obra. Nenhum candidato se encaixa melhor nesse ambiente do que Salomão. 11. G von Rad, “The Beginnings o f Historical Writing in Ancient Israel", in The Problem o f the Hexateuch and Other Essays (Edim burgo e Londres: O liver & Boyd, 1966), pp. 166204; veja tam bém E. W. W heaton, Solomon s Ne w Men (L ondres: B atsford, 1974). Para um a crítica desta hipótese veja R. N. W hybray, “ W isdom Literature in the Reigns o f David and Solom on” , in Studies in the Period o f David and Solomon and Other Essays (Tóquio: L iteraturc-S huppansha c W inona Lake, Ind.: E isenbrauns, 1982), pp. 13-26. 12. W. Brueggem ann, In Man We Trust (A tlanta: John Knox, 1972). 13. U. Skladny, Die ãltesten Spruehsammliingen in Israel (Gõltengen: V andenhoeck& Ruprecht. 1962), pp. 25-46. 14. G E. Bryce, “ Another W isdom - ‘Book’ in Proverbs", JBL 91 (1972) 145-57. 15. R. C. van Leeuw en. Context and Meaning in Proverbs 25-27 (SB L D S 96; A tlanta: S cholars, 1988). 16. B. V. Malchow, “A Manual for Future M onarchs", CBQ 47 (1985) 238-45. 17. B. K ovacs, “ Is T herc a C lass E lhic?” , in Essays in Old Testament Ethics: J. Philip Hvatt in Memoriam (N ova York, 1974), p. 187. 18. J. K. Wiles, “Wisdom and Kingship in Israel", A JT 1 ( 1987), 55-70. 19. S. Weeks, Early Israelite Wisdom ( Oxford: Clarendon. 1994), pp. 1-56. 20. M. Fox, “ The S ocial Location o f the Book o f P roverbs", in TTT , pp. 227-39.
A argumentação contra a autenticidade das atribuições salomônicas se baseia na pseudepigrafia análoga do antigo Oriente Próximo e em dados lingüísticos. Por certo, a obra suméria da metade do terceiro milênio, A Instrução de Shuruppak, atribui esse texto a um rei lendá rio, e os estudiosos expressam ceticismo quanto à atribuição das instru ções egípcias do Reino Antigo de Hardjedef, Kagemni e Ptah-hotep.2I A motivação por trás da pseudepigrafia era associar a obra a uma pessoa famosa e ao passado. No entanto, egiptólogos não chega ram a nenhum consenso quanto a essas atribuições do Reino Antigo serem, de fato, pseudepigráficas.22 A opinião prevalecente na atualida de acerca da Instrução Dirigida ao Rei Merikare, do Primeiro Perío do Intermediário (ca. 2000 a.C.) é de que a obra foi composta por um escriba da corte a pedido do rei Merikare.23 A autenticidade da atribui ção da Instrução de Amenemhet do Reino Médio não é contestada. O mesmo vale para as obras do Novo Reino Instrução de Any (décima oitava dinastia)24e Instrução de Amenemope (décima nona dinastia?).25 As obras demóticas Instrução de Ankhsheshonq e Papiro Insinger são mais problemáticas, mas também podem apresentar atribuições au tênticas. (O mesmo pode ser afirmado acerca do Ditos de Aicar em aramaico.) Weeks acredita que a obra A Instrução Segundo os Es critos Antigos, provavelmente do Novo Reino, apoia a opinião de pseudonímia, mas seu anonimato contrasta claramente com as atribuições autênticas desse local histórico e, na verdade, sua integridade apoia a autenticidade das outras atribuições. Semelhantemente, a obra anôni ma do Reino Médio A Instrução de um Homem para o Seu Filho também confirma a historicidade das atribuições a sábios menciona dos. Em resumo, os análogos egípcios do terceiro milênio apoiam a noção de pseudepigrafia, mas as de cerca de um milênio antes de Salo mão e de meio milênio após ele, verdadeiramente confirmam a autenti cidade das atribuições a Salomão. A obra acadiana antiga Conselhos de Sube 'awilum também confirma indiretamente sua autenticidade. 2 1. Hardjedef é um príncipe da Quarta Dinastia, mas datado por M. Lichtheim na Quinta Dinastia. E la data K agem ni e Ptah-hotep no final da Sexta D inastia (veja AEL , 1:6-7). N o entanto, ela co n sid era essas o b ras com o p se u d ep ig ráficas, cm parte cm razão dc p ressu p o r que Salom ão é pscudepigráfico em Provérbios 1.1. 22. Weeks, Earlv Israelite Wisdom, pp. 10-11. l i . AEL. 1:9. 24. AEL, 2: 135. 25. AEL, 2:147.
Dentro do cânon da Bíblia Sagrada a atribuição de Salmos a Davi é extremamente digna de crédito.26 Nenhuma atribuição de autoria do Antigo Testamento pode ser provada como espúria. Apesar de muitos alegarem que os Ditos de Qoheleth reivindicam para si a autoria salo mônica, na verdade, o editor posterior dessa obra atribui as palavras de Qoheleth a uma figura semelhante a Salomão, não ao próprio Salomão, no que parece uma tentativa deliberada de evitar a prática moralmente questionável da pseudonímia. Por fim, a pseudepígrafe da LXX con trasta nitidamente com a tradição recebida. Por que um falsificador da tradição recebida combinaria atribuições a outros, como Ezequias, Agur e Lemuel e, incoerentemente, apresentaria como título do livro “os pro vérbios de Salomão”? Nenhum estudioso refutou os dados e argumentos de Kitchen a favor da composição e compilação de Provérbios 1-24 por Salomão; antes, a maioria deles curiosamente os negligencia ou ignora. Ainda assim, muitos acreditam que a Coleção I (1.1-9.18) é de origem pósexílica.27 H. C. Washington recorre ao inventário léxico do livro para sugerir uma ocasião de composição depois do fim da monarquia judai ca, mas deixa de observar que alguns desses dados são refutados por Kitchen,28e ele próprio confessa que “é precário datar os livros bíblicos somente com base em seu vocabulário” e que “nenhuma dessas pala vras constitui, isoladamente, uma evidência conclusiva” .29 Caso alguém pergunte: “Se Salomão é o autor sábio, como pôde morrer como insensato?”, convém observar que ele construiu a própria forca na qual ele se enforcou (19.27) - ou seja, deixou de ouvir a pró pria instrução. O sucesso espiritual de hoje não garante o sucesso espi ritual de amanhã. B.AGURE LEMUEL
Agur, filho de Jaque, não é conhecido nem datado. E possível que fosse um oficial da corte, certamente não era um rei, pois defende a sucessão dinástica (30.22), a realeza forte (v. 31) e adverte seu filho Itiel a não se tomar insensato exaltando a si mesmo (vs. 32, 33). Este, 26. B. Waltke, “ Superscripts. Postscripts or Both”, JBL 110 (1991) 583-96. 27. N. G ottwald, The Hebrew Bible: A Socio-Literary Introduction (Filadélfia: Fortress, 1985). 28. K. A. Kitchen, “ Proverbs and Wisdom Books o f lhe Ancient N ear East”, 77i 28 (1977)69-114. 29. H. C. W ashington, “ Wealth and Poverty in the Instruction o f Am enem ope and the Hebrew Proverbs” (Diss. Ph.D., Princeton Theological Seminary, 1992), pp. 180-82.
que é o seu último dito, segue imediatamente seu louvor a um rei “que ninguém ousa resistir”, sugerindo que o próprio Itiel poderia ser um oficial em posição de iniciar uma revolta no palácio. A referência a Lemuel - sobre o qual nada mais se conhece - como um rei é, evidente mente, apropriada dentro do contexto real da literatura sapiencial. Wolters datou seus ditos no período helenista em função da presença de sôpiyâ (“aquele que presta atenção”) em 31.27 que, segundo ele, forma um jogo de palavras com sophia. No entanto, Wolters admite a possibilida de de uma data mais antiga-antes de Alexandre. Washington documen ta que “Durante os dois séculos antes de 332 a.C. a Palestina viu um forte influxo da cultura grega” .30 Contudo, C. Gottlieb acredita que o trocadilho está mais próximo do egípcio sb3yt (“instrução”), lançando dúvida sobre a conclusão de Wolters.31 C. O EDITOR FINAL
Um editor final anônimo anexou as Coleções V-V1I às Coleções IIV de Salomão. A julgar por textos bíblicos análogos, ele permitiu que o cabeçalho original que atribui a obra a Salomão permanecesse como título de sua composição final, pois Salomão é o autor principal dos ditos (caps. 1-29) e o autor mais distinto de sua antologia. Jó é citado como autor de uma coleção que inclui ditos dos seus três amigos (Jó 31.40b), e Davi é citado no Salmo 72.20 como autor de orações que incluem alguns textos de Asafe. Esse editor final, o verdadeiro autor do livro, e não de seus ditos, provavelmente viveu durante o período persa (ca. 540-332 a.C.) ou na era helenista.32 Sua expansão do livro e manu tenção de sua atualidade para os fiéis, que podem explicar parte da filologia supostamente mais recente, se assemelham à composição de outros livros do Antigo Testamento. De acordo com W. F. Albright, “Um princípio que não se deve jamais perder de vista ao tratar de do cumentos do antigo Oriente Próximo é que, em vez de deixar arcaís 30. W ashington, “ Weallh and Poverty", pp. 185-86. 31. C. G ottlieb, "T he W ords o f lhe Exceedingly Wise: Proverbs 3 0 -3 1 ”, in The Biblical Canon in Comparative Perspective, org. K. L. Y ounger Jr., W. W. H allo e B. F. B atto (A N ET S I I ; L ew inston: Edw in M ellen, 1991), p. 290. 32. C. Cam p (Wisdom and lhe Feminine in the Book o f Proverbs [BibLit 11; Sheffield: JSOT, 1985], p. 233), optou posteriorm ente por um a data helenista para a redação final do livro in “ W hat’s So Strange about the Strange W oman?”, org. D. Jobling et al., in The Bible and
the Politics o f Exegesis: Essays in Honor o f Norman K. Goltwald on His Sixtv-Fifth Birthday (C leveland: Pilgrim , 1991). p. 303.
mos na ortografia e gramática evidentes, os escribas geralmente revi savam textos literários e outros documentos antigos de tempos em tem pos” .33 Segundo R. Polzin, um editor do exílio acrescentou 56 versícu los a discursos atribuídos a Moisés.34 Semelhantemente, um “epilogista” pós-exílico (Ec 12.9-13) reproduziu as palavras de um suposto Qo heleth pré-exílico a seu filho (cp. 1.1 e 12.9-13).35 Esse editor inspirado mediou os provérbios e ditos que foram dirigi dos, originalmente, a um público histórico, como Itiel, e à comunidade da aliança como um todo, os leitores implícitos, e o Espírito Santo san cionou a obra como canônica. De acordo com o seu preâmbulo, o livro é dirigido mais especificamente a jovens ingênuos (1.4) e filhos sábios (1.5, 8 ) a fim de capacitá-los para obter sabedoria e salvaguardá-los dos conceitos de mundo e de vida dos ímpios e antiéticos em qualquer época .36 VI. FO R M A S DOS PR O V ÉR B IO S A. POESIA
Com exceção dos sobrescritos editoriais, todas as linhas (ou versí culos )1 são compostas de acordo com as restrições que caracterizam a poesia bíblica - ou seja, concisão, imagens e paralelismo .2 Em decor rência desses três fatores, os versículos na poesia tendem a terminar com um “clique”, como numa apresentação de slides, enquanto na pro sa, tendem a íluir como num “filme”. Trataremos aqui apenas daqueles aspectos da poesia hebraica que afetam a interpretação de Provérbios.
33. W. F. Albright. From the Stone Age Io Christianit\’ (Garden Cily, N.Y.: Doubleday/Anchor, 1957), pp. 78-79^ 34. R. Polzin, Moses and lhe Deuteronomist: A Literary Sludy o f lhe Deuleronomic Historv. Pari One: Deuteronomy. Joshua. Judges (N ova York: Seabury, 1980). 35. Cp. M. F o x ,'‘Fram e Narrative and Com position in the Book o f Q oheleth", HUCA 48(1977) 83-106. e R. B. Dillard e T. Longman, An Introduction to the Old Testament (Grand Rapids: Zondervan, 1994), p. 253. 36. Cp. D. Howard Jr. Introduction to the Old Testament Historical Books (Chicago: Moody, 1993), p. 51. 1. Aqui, versículo não significa um tipo de discurso com propriedades formais, com o métrica ou rima, m as as divisões curtas nas quais os capítulos da Bíblia são tradicionalm ente divididos (i.e., versículos). 2. Para discussões excelentes e breves sobre a poesia hebraica veja R. B. Dillard eT . Longman III, An Introduction to the Old Testament (Grand Rapids: Zondervan, 1994), pp. 26-29; e A. Berlin, “ Introduction to Hebrew Poetry”,A7B (Nashville: Abingdon, 1996), 4:301-15.
1. Concisão e aforismos A poesia hebraica, como toda a poesia de qualquer cultura, tende a ser mais sucinta, e mais concisa, do que a prosa, e as relações e transi ções entre as linhas tendem a não ser expressas. Na poesia bíblica, a concisão dentro da linha costuma ser obtida omitindo-se o artigo defini do (ha, “a/o”), o indicador do acusativo (ou do objeto) (et, sem equiva lente em nossa língua) e o pronome relativo ( 10Ser, “que”/“o qual”, etc.) e, ocasionalmente, deixando de fora palavras ou orações inteiras. A con cisão entre as linhas é obtida pela omissão de conjunções e partículas como “e” ou “portanto”. Em Provérbios, a concisão se toma ainda mais forte; é o selo de qualidade de suas linhas. O sábio ensina a verdade por meio de aforis mos (uma formulação sucinta de uma verdade) que também são epigramas (um dito sucinto, sábio, espirituoso e, com frequência, paradoxal). Estes concentram ou destilam a verdade, não podendo, portanto, em função de sua natureza, expressar a verdade completa acerca de um assunto. “Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda quando for velho, não se desviará dele” (22 .6 ) expressa a verdade ou promessa de que a educação que os pais dão à criança afeta seu com portamento ao longo de toda a sua vida, mas não expressa toda a verda de bíblica acerca da pedagogia infantil. Antes, é um componente isolado da verdade, mas que deve ser encaixado a outros elementos da verdade a fim de se chegar ao padrão mais compreensivo e misturado da vida real. O livro pressupõe a responsabilidade da criança em aceitar o ensi no do sábio (veja 1.4) e ameaça os apóstatas com a morte (e.g., 1.20-33; 2.12-15; passim; cp. Ez 18.20), admitindo a possibilidade de certo insu cesso dos pais. Se o treinamento paterno constituísse a totalidade da verdade acerca da educação do filho, por que o livro se dirigiria aos jovens, e não aos pais? A falta de reconhecimento do gênero caracterís tico da concisão e sua função de declarar a verdade de maneira simples levam a muitos erros na interpretação de Provérbios. O aforismo em 10.3, “O Senhor não deixa ter fome o justo mas rechaça a avidez dos perversos”, ensina que Deus recompensa o virtu oso gratificando os impulsos e apetites que sustentam sua vida, mas castiga os perversos lhes negando suas necessidades básicas. No en tanto, essa verdade deve ser contrabalançada com seu par proverbial quiástico, “Os tesouros da impiedade de nada aproveitam, mas a justiça
livra da morte”. Ao ligar o presente “tesouros da impiedade” (v. 2a) com “[o S e n h o r ] rechaça a avidez dos perversos” (v. 3b), o par prover bial ensina que a frustração do perverso que lida com a morte se dá num futuro indefinido não necessariamente no presente imediato, no qual é possível que desfrutem de seus tesouros à custa dos justos. Até então, pode acontecer dos justos terem fome. Para evitar o exagero da verdade ou o ensino de meias-verdades por meio de provérbios isola dos, os sábios pedem que seus discípulos aprendam todas as palavras de sabedoria (22.18). 2. Imagens ou figuras As imagens ou linguagem figurativa também caracterizam toda a poesia. Além de ser evocativa, a imagem é outra forma de compaticidade, pois capacita ao autor comunicar sua mensagem em poucas pa lavras. Eis algumas figuras importantes para a interpretação de Pro vérbios: • Símile: uma comparação evocativa e explícita entre duas coisas de natureza diferente, mas que possuem algo em comum. “Como o louco que lança fogo, flechas e morte, assim é o homem que engana a seu próximo e diz: Fiz isso por brincadeira” (26.18, 19) compara explicitamente um mentiroso que encobre seu engodo chamando-o de brincadeira inofensiva a um louco que mata com armas mortais. O denominador comum da comparação, a saber, o uso pernicioso de instrumentos mortais, evoca o ultraje. • Metáfora: uma comparação evocativa e implícita entre duas coi sas de natureza diferente, mas que possuem algo em comum. Numa metáfora completa, as duas coisas a serem comparadas são de claradas. “Como joia de ouro em focinho de porco, assim é a mu lher formosa que não tem discrição” ( 1 1 .22 ) faz, implicitamente, a comparação absurda entre a beleza preciosa de uma mulher que abusa da mesma com uma vida impura e o ato de adomar o focinho de um porco imundo, que chafurda na lama e na lavagem. O deno minador comum de comparação, a beleza desperdiçada, evoca o ridículo e repugnância, numa metáfora incompleta, a declaração sugere a comparação “O rico e o pobre se encontram; a um e a outro faz o S e n h o r ” ( 2 2 .2 ) sugere que Deus não faz acepção de pessoas com base em distinções econômicas e evoca considera-
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ção igual pelo rico e pelo pobre. A metáfora proferida pela loucura, “As águas roubadas são doces”, é uma metáfora incompleta, pois emprega o prazer do benefício obtido desonestamente para evocar o prazer excepcional do adultério e visa suscitar o desejo pela espo sa infiel. Mas uma símile ou uma metáfora deve ser evocativa. “O camarão é [como] uma pequena lagosta” não é uma figura. “O camarão é [como] o paraíso num prato” é uma figura. Alegoria: uma metáfora ampliada. “Procura conhecer o estado das tuas ovelhas e cuida dos teus rebanhos, porque as riquezas não duram para sempre, nem a coroa, de geração em geração. Quando, removido o feno... os cordeiros te darão as vestes... e as cabras, leite em abundância para teu alimento...” (27.23-27) com para a manutenção da sucessão dinástica por meio de um governo prudente com a riqueza duradoura por meio de práticas agrícolas prudentes e evoca um desejo de atender à admoestação de cuidar dos súditos. Antropopatismo: atribuição de sentimentos, motivações ou com portamentos humanos a Deus; por exemplo, “para que o S e n h o r não veja isso, e lhe desagrade” (Pv 24.18). Antropomorfismo: aplicação de uma parte da anatomia humana a um Deus não humano. O antropomorfismo é possível porque os seres humanos, feitos à imagem de Deus, são representações ade quadas e fiéis de seus atributos comunicáveis. “E o que formou os olhos será que não enxerga?” (Sl 94.9). Sinédoque: declaração de uma parte para representar o todo, “as cãs” representam uma pessoa idosa (16.31; 20.29). Um merisma emprega duas declarações opostas para indicar o todo. “Terra” e “céus” em 3.19 significam o cosmos todo e “abismos e nuvens” em 3.20 se referem a todas as fontes de água que sustentam a vida. Metonímia: refere-se a algo mediante o uso de um item associado. A “coroa” em 27.24 diz respeito à realeza; “língua” e “mãos” em 6.17 se referem ao modo de falar e aos atos de uma pessoa. Personificação', atribuição de qualidades humanas àquilo que não é humano. Salomão personifica sua coleção de provérbios como uma anfitriã benevolente em 9.1-6. Hipérbole: exagero. A reivindicação de Agur de que ele é estúpi do demais para ser considerado um ser humano (30.3) traz à me-
mória um dos exageros do salmista, quando este diz que é um verme (SI 22.5 [6]). • Lítotes: suavização. Uma diminuição de algo para aumentá-lo (veja 10.19). • Ironia: dizer uma coisa visando o contrário, normalmente com sarcasmo. A mãe de Lemuel ordena sarcasticamente, “Dai bebida forte aos que perecem e vinho, aos amargurados de espírito” para ridicularizar o valor da bebida alcoólica (31.6). A ordem de Salo mão: “Deixe, filho meu, de ouvir a instrução para desviar-se das palavras de conhecimento!” (19.27) é irônica, pois ele quer dizer exatamente o contrário. Temerosos de que um leitor ingênuo não entenda a ironia, os tradutores eliminam do texto essa figura de linguagem poderosa fazendo-a dizer o oposto, ou seja, aquilo que é pretendido. 3. Paralelismo Assim como a métrica e a rima tradicionalmente caracterizam a poesia em nossa língua, mas nâo na língua hebraica, também o parale lismo caracteriza a poesia hebraica, mas não em nossa língua. O para lelismo é a pedra angular do seu significado e não apenas um adorno. Em Provérbios, o paralelismo se refere à correspondência de metade de uma linha (ou de um versículo) com outra. Neste comentário, os versí culos se referem à linha poética em sua totalidade, compostas de um bicolon (dois versetos), sendo que o verseto A se refere à sua primeira metade e o verseto B à sua segunda metade. As vezes, por motivos semânticos, é útil dividir os versetos A e B também em metades: Aa e A|3, e Ba e Bp, respectivamente.3 Os níveis de significação no verseto A que podem ser complementados no verseto B são sons e sílabas, palavras e frases, inclusive sua sintaxe e o significado dos meios-versículos. O primeiro diz respeito ao som, o segundo ao som e ao sentido e o último somente ao sentido.
3. Os acentos m assoréticos m arcam o versículo e seus versetos claram ente. N orm alm ente cada verseto consiste de um a cláusula inteira, m as por vezes o poeta em prega um enjambement (passa correndo do pensam ento de um verseto para outro de modo que palavras intimam ente relacionadas caiam em versetos diferentes).
a. Sons e sílabas Além da concisão e/ou imagens, provérbios manifestam em todas as línguas uma forte incidência de padrões sonoros. O que toma memo rável o ditado popular “Quanto mais rico, mais ridico”, por exemplo, é a consonância de Irl em “rico” e “ridico”, a repetição de “mais” e a rima de “rico” e “ridico”, além de sua imagem sucinta e picante, e sua pers picácia. Os sábios da Bíblia também usam a paronomásia (jogo de palavras baseado no som ou no som e sentido). O padrão sonoro mais comum é a consonância (como usado aqui, a mesma consoante aparece na mesma seqüência ou numa seqüência quebrada), assonância (rima) e aliteração (repetição de sons consonantais normalmente iniciais em duas ou mais palavras vizinhas ou uma combinação de identidade ou similaridades de consoantes e vogais em palavras intimamente relacio nadas). Por vezes, o padrão sonoro é encontrado em apenas um meioversículo. Observe a assonância de lãl e lôl em 11.2a: bã’-zãdôn wayyãbõ’ qãlôn
O orgulho vem e depois vem a desgraça.
Em outras ocasiões, o padrão sonoro une os versetos. Observe esta consonância de ///em 15.12a, b: 1’ y ’hb-ls hwkh Iw 'l-hkmym V ylk
O escamecedor não gosta de ser corrigido; aos sábios ele não vai.
Eis um exemplo de assonância em 15.32a, b: pôrêa' m ü sã r m ô'ês napSô
wesômêa' tôkahat qôneh lêb
O que despreza a instrução despreza sua vida, mas o que ouve a correção adquire juízo.
Em 16.3, a aliteração das suas últimas palavras liga 16.3a e b: gõl 'el- YHWH m á aéeykü weyikkõnü m ahsebõteykã
Confia ao Senhor as tuas obras, e os teus pensamentos serão estabelecidos.
b. Palavras, frases e sintaxe Os versetos também são ligados por palavras sinônimas. Além do padrão sonoro em 5.15, encontramos três paralelos verbais ligando os versetos. Setêh -m a yim m ibbôrekã w enõ 2? lim m itô k be 'êrekã
Bebe água da tua própria cisterna e água corrente do meio dos teus próprios poços.
Observe os paralelos verbais: m a yim “água” e riõzPlim “água cor rente”, m ib “da” e m itô k “do meio de”, e bôrekã “tua própria cisterna” e be'êrekã “teus próprios poços”. A partícula de inexistência nas frases 'ên h ôm â “sem um muro” e 'ên m a 'sã r “sem domínio” em 25.28 liga seus versetos. O paralelismo também ativa pares de palavras (palavras que ocorrem juntas em vários contextos). Em 15.32, antes citado, m üsãr “instrução” e tô ka h a t “correção” constituem um par de palavras co mum em Provérbios. Em 27.2, y 6hallelkã zã r w elõ '-pikã no kri we ’al-éep ã teykã
Seja um estranho que te louve, e não a tua própria boca; um forasteiro, e não os teus próprios lábios.
ambos, zã r “estranho” e no kri “forasteiro” e peh “boca” e éãpâ “lábios” são pares de palavras comuns em Provérbios. Os pares de palavras também podem envolver contrastes comuns e/ou expressões estereoti padas, quebradas, que podem ou não incluir merismas como “céu” e “terra” em 3.19 (antes citado). Em 10.1 bên h ã kã m y 6éa m m a h-'ãb übên k esil tü g a t 'im m ô
Um filho sábio toma o pai alegre, mas um filho insensato traz tristeza para a sua mãe.
“Sábio” e “insensato” são um par comum de palavras antitéticas, e os termos “pai” e “mãe” são uma expressão estereotipada quebrada que designa “os pais” (1.8; 4.3; passim). Por vezes, as expressões estereotípicas na prosa são divididas entre os paralelos. Por exemplo, nãqi
“inocente” écomumente associado a dãm (Dt 19.13; 27.25; ISm 19.5; 2Rs 21.16), mas em Provérbios 1.11, o par estereotipado “sangue ino cente” é separado.4 Na poesia hebraica, é comum formar pares com singular e plural, masculino e feminino, nomes e pronomes, etc., para obter um significa do mais rico e variações elegantes. Em 28.1, nãsü we'ên-rõdêp rãSã'
wesaddiqim kikep ir yibfãh
O perverso [sing.] fogem [pl.], apesar de ninguém estar perseguindo; mas os justos [pl.] são confiantes [sing.] como um leão.
os paralelos formam pares com um sujeito singular e um verbo plural e com um sujeito plural e um verbo singular e, numa característica singu lar da gramática hebraica, a forma gnômica (“fogem”) com uma forma habitual (“são confiantes”). Em 4.12, o singular “caminho da sabedo ria” é comparado e contrastado com o plural “ vereda[s ] dos perversos” no versículo 14, o que pode ser intencional, visando a distinguir um caminho certo de muitos caminhos errados e cativantes. Em 1.5, a va riação é obtida pelo quiasmo inicial yiSm a' “ouça” e y iq m e h “adquira”, mas também há uma progressão lógica. c. Significado das metades dos versetos Semanticamente, o verseto B corresponde em pensamento ao ver seto A e, em alguns casos, o desenvolve, muitas vezes o especificando ou o intensificando. O verseto normalmente passa do geral para o es pecífico, do abstrato para o concreto, do ambíguo para o menos ambí guo, do vocabulário comum para o vocabulário incomum e/ou do menos intenso para o mais intenso. Sua relação pode ser vista na organização em seqüência numérica. De acordo com as regras da poesia semítica e homérica, a segunda unidade é uma unidade superior e contém o núme ro real. A fórmula x-1 // x intensifica x. O sábio introduz seu catálogo de sete vícios em 6.16-19 da seguinte maneira: 4. E. Z. M elam ed, “ B reak -u p o f S tereotype P hrases as an A rtistic D evice in B iblical Poetry”, in Studies in the Bible, org. C. Rabin (ScrHier 8; Jerusalém: Magnes, 1961), pp. 11553; M. P. 0 ’Connor, Hebrew Verse Structure (W inona Lake: Eisenbrauns, 1980), p. 112.
SeS-hênnâ sã n ê' YHWH we$eba' tô'abôt napSô
Há seis [abominações] que o Senhor aborrece; sim, [elas são] sete abominações para ele.
Essa linha não ilustra apenas o fato de o verseto B desenvolver ou intensificar A, mas também a prática poética de deixar brecha visando à concisão. O termo Tô'abôt “abominações” deve ser fornecido no verseto A de B e hênnâ “são”, no B de A. Tendo em mente a função de desenvolvimento do verseto B, ainda assim é útil classificar os versetos paralelos semanticamente em sinôni mos (o verseto B participa do mesmo pensamento em palavras diferen tes), antitéticos (o conceito do segundo verseto é oposto ao do primei ro), e sintéticos (o segundo verseto expande o conceito do verseto A). No entanto, essas distinções não são imutáveis, e não é impossível uma taxonomia completa de subtipos, pois as variações são múltiplas. Em 7.16, m a rb a d d im rã badti 'arsí hafubôt 'êtü n m isrã yim
Provi a minha cama de colchas, tecido de lã bordado, o linho do Egito.
o paralelo sinônimo esclarece e intensifica o termo “colchas” de tal modo que também poderia ser classificado como sintético. Semelhantemente, nos paralelos de 31.6, fin ü -S êkã r le 'ôbêd w ey a y in lem ãrê nãpeS
Bebidas inebriantes sejam dadas aos que perecem, vinho, aos que estão amargurados.
“bebidas inebriantes” e “vinho” pertencem ao mesmo campo semânti co, assim como as frases “[os] que perecem” e “[os] amargurados”, mas “vinho” especifica “bebidas inebriantes” e, semanticamente, “os que perecem” se refere à sua condição exterior, e “[os] amargurados” diz respeito a seus sentimentos interiores, de modo que a linha entre o sinônimo e o sintético é atenuada. Em 15.32, antes citado, ocorrem paralelos antitéticos. “O que des
preza a instrução” contrasta com “o que ouve a correção”, e assim “despreza sua vida” contrasta com “adquire juízo”. Mas normalmente a antítese é imprecisa. O “aquele que adquire juízo” não é precisamen te antitético a “despreza sua vida”. A imprecisão sugere que “aquele que adquire juízo” não “despreza sua vida” e o “que despreza sua vida” não “adquire juízo” que preserva a vida. Um subtipo de paralelo antité tico está nos provérbios “melhor do que” (“porque melhor” ARA, cp. 3.14; 8.11,19; 12.9; 15.16,17; 16.8,16,19,32; 17.1; 19.1) que frequen temente contrastam a pobreza material com as riquezas espirituais e as riquezas materiais com a pobreza espiritual, considerando o primeiro caso melhor que o segundo (e.g., 16.8): (ôb-me'at bisdãqâ rriêrõb t?bü'ôt belõ' mispãt
Melhor um pouco com justiça, do que uma grande renda com injustiça.
Em 15.12 e 16.3, já citados, ocorrem paralelos sintéticos. Apesar de não ser possível apresentar qualquer taxonomia de seus subtipos, os provérbios comparativos citados (11.22 e 25.28) podem ser classifica dos proveitosamente como um subtipo de paralelos sintéticos. Provérbios não pode ser interpretado corretamente sem que se per gunte: “De que maneira os versetos paralelos de um versículo se relacio nam entre si?” Como foi dito, a tendência da poesia é ser elíptica e, como estes exemplos ilustram, muitas vezes o intérprete deve ler nas linhas mais do que elas realmente declaram. Podemos dizer que B escla rece A, mas também existe a possibilidade de lhe acrescentar alguma ambigüidade, exigindo que o intérprete atormente a interação dialética entre os versetos (veja 1.6 ). O provérbio comparativo em 26.9 ilustra esse ponto: hôah 'ãlâ beyad-sikkôr ümãSãl bepi kesilim
Um galho de espinhos na mão de um bêbado, e um provérbio5 na boca de um insensato.
5. A LXX Iêdouleia, “servidão", provavelmente um jogo de palavras sobre mõsel “domínio” e a Targ. (cp. Sir.),curiosamente lê sht.yuta', “insensatez” (
A metáfora pede que o intérprete equipare “galho de espinhos” com “um provérbio” e “na mão de um bêbado” com “na boca de um insensato”. E, o que é mais importante, exige que complete a ideia não declarada de que o provérbio na boca do insensato é tão inútil e tão potencialmente perigoso e prejudicial para outros quanto um galho de espinhos na mão de um bêbado. B. POÉTICA
A hierarquia dos níveis de significação em Provérbios é: coleções seções poemas/unidades estâncias/subunidades estrofes/pares de provérbios versículos/linhas meios-versículos/versetos frases palavras sílabas sons Consideramos, até aqui, os seis primeiros níveis de significação, do som até o versículo. A seguir, voltaremos nossa discussão do paralelis mo do versículo para as ligações mais amplas entre os versículos. Ao conhecer a poética que os narradores e poetas bíblicos de todos os tipos, inclusive os sábios, usavam para dar coerência e unidade às suas composições, o intérprete pode discernir ligações não declaradas e com frequência implícitas, não explícitas, existentes entre os versículos. Além disso, por meio dessas técnicas os sábios e/ou os compiladores dos provérbios e dos ditos do sábio tanto deram aos aforismos contextos semânticos significativamente ricos quanto protegeram os epigramas vulneráveis de interpretações errôneas. Em outro texto, B. Waltke e C. Fredricks comentaram: Adele Berlin define o estudo da poética como “uma ciência indutiva que procura abstrair os princípios gerais da literatura de diversas manifestações distintas desses princípios conforme estas ocorrem nos textos literários propriamente ditos” . Seu objetivo essencial não é
“trazer à tona o significado de qualquer texto determinado”, mas antes “encontrar os elementos constituintes da literatura e as regras pelas quais são reunidos”. Assim, “a poética está para a literatura aquilo que a lingüística está para a língua”. Em essência, a poética é a gramá tica da literatura. É impossível exagerar o seu valor para a hermenêuti ca. Devemos, em primeiro lugar, entender como um texto significa antes de poder entender o que ele significa.6
“Da mesma forma como as regras de gramática mudam de uma época para outra e de uma língua para outra, também os métodos literá rios mudam.” O “contexto histórico e social [dos sábios], distinto do público leitor contemporâneo, cria lacunas no conhecimento do último e na sua compreensão da intenção do autor, lacunas estas que devem ser cuidadosamente atravessadas. A tarefa do estudante da Bíblia é dis cernir as ‘regras’ empregadas num texto bíblico, conforme evidenciadas por esse texto. Essa tarefa envolve necessariamente uma espiral heurís tica. O indivíduo aborda o texto com ideias acerca de suas técnicas e princípios, ideias estas que o texto comprova ou refuta. Assim começa o diálogo com o texto que leva o ouvinte atento a aprender como o texto se comunica” .7 Em um poema, a maioria dos versículos não é independente, mas intencionalmente relacionada, quer explicitamente por meio de ligações sintáticas (e.g., conjunções, partículas, pronomes e referências deícticas, esperados na literatura coerente) ou por ligações semânticas implí citas. (As cláusulas condicionais introduzidas por 'im, “se” em 2.1-4 são seguidas pelas apódoses introduzidas por ’ãz “então” nos vs. 5 e 9.) Num poema, dois versículos intimamente relacionados são chamados de quarteto, uma coleção menor, uma estrofe e uma divisão maior é uma estância. A divisão entre estes, porém, torna-se às vezes tênue. As 12 palestras e interlúdios que abrangem o prólogo são todos poemas. Contrastando com um poema, os provérbios de Salomão e os ditos do sábio são principalmente coleções de ditos primariamente indepen dentes, que se expressam mediante uma ideia completa e que, secun dariamente, devem ser interpretados em relação a outros ditos. Esses agrupamentos carecem dos elos sintáticos normais de um poema, e as ligações entre os versículos são menos óbvias. Esse assíndeto cria a 6. A. Berlin, Poetics and Interpretation o f Biblical Narrative ( Bibl.it 9; Sheffield: Almond, 1983), p. 15. 7. B. Waltke com C. Fredricks. Genesis: A Commentary (Grand Rapids: Zondcrvan, 2001), p. 33.
impressão de que os ditos são desiguais, atomísticos e sem coerência. No entanto, novos discernimentos acerca da poética dos autores bíbli cos abriram novas janelas que capacitam o intérprete a visualizar liga ções até então imperceptíveis entre os provérbios e os ditos.8 A distin ção entre um poema e um agrupamento de provérbios ou ditos se toma, por vezes, tênue (e.g., 22.17-21; 27.23-27; cap. 30 [esp. nas seqüências numéricas]; 31.1-9, 10-31). Na hierarquia dos níveis de significação, os ditos são agrupados em pares de provérbios, subunidades, unidades, seções e coleções. Ainda que secundários, esses agrupamentos são intencionais e influenciam a interpretação dos ditos individuais. Especialmente úteis na Coleção II, os provérbios educativos de uma só linha, que apelam implicitamente à disciplina para atender os ensinos e que costumam usar o vocabulário do prólogo, tendem a sinalizar o início de uma nova unidade ou seção. Essa suposição heurística é confirmada ao se realizar um trabalho com outras características poéticas. Como os versetos de um versículo, também os versículos de um poema ou o agrupamento de ditos são ligados por fonologia, palavras e sintaxe, bem como pelo sentido. A anáfora (mesmo som ou palavra inicial dos versículos) de 'is “homem” liga 16.27-29, e a epífora (mes mo som ou palavra final) de lal liga 3.13-15. A sintaxe excepcional de lõ' mais o Hifil imperfeito faz a ligação em 1 0 .2 ,3 , tornando-o um par de provérbios, forçando o leitor a matizar o primeiro provérbio de acor do com o segundo (veja p. 423). Para fornecer um contexto aos seus ditos, além da paronomásia e sintaxe os poetas e/ou sábios empregam comumente um inclusio (que marca uma unidade literária mediante a combinação do final com o início), um Leitwort (= uma “palavra-chave” que se concentra no tópico da unidade), um lema que costura os ditos numa única peça - às vezes ocorre um sinônimo no lugar da Lei twort (tema) ou palavra-chave, sumarização (uma condensação ini cial ou final da ideia principal),janus (um dito transicional, voltado para aquilo que o antecede e para aquilo que o sucede), estruturas de pa dronização - destacando-se um padrão alternado (A B A’ B’), um padrão concêntrico (A B C C ’ B’ A’), ou um padrão quiástico (A B C X C ’ B’ A’), sendo que, nesse caso, o eixo (X) apresenta o enfoque 8. Para uma excelente história desse estudo, veja Heim, “Structure and Context in Pro verbs 10:1-22:16” (Diss. de PhD., University o f Liverpool, 1996), pp. 5-53.
da mensagem. Também se pode observar com frequência dentro das unidades escalada (ou intensificação) e ligações lógicas (e.g., causa > efeito), comparações e contrastes, generalização /sumarização > particularização, e preparação Iprenunciação (inclusão de material em uma parte do texto que serve para preparar o leitor para aquilo que ainda está por vir). Ao combinar as técnicas retóricas aparentes do texto (ou ligações sintagmáticas) com a profunda estrutura de seu sig nificado (ligações paradigmáticas), é possível discernir o contexto lite rário rico em significado de um provérbio ou dito. A fim de comunicar o seu ponto de vista numa narrativa, o narrador também emprega a des crição cênica (veja 7.6-9), a caracterização por meio da descrição ex terior e revelação de pensamentos interiores (vs. 10-13) e pelo discurso direto e/ou ações (vs. 14-20), desenvolvimento da trama (vs. 21-23) e comentários editoriais (vs. 24-27).9 Provérbios 26.1-12, “Espelho dos Insensatos” valida o método e ilustra a maioria dos artifícios poéticos. 10 A palavra-chave que une es ses provérbios, que pode ser lida de modo independente como tal, é “insensato”. Ela ocorre em todos os versículos, exceto no versículo 2, que é um par de provérbios com o versículo 1. No versículo 13, o as sunto muda de insensato para preguiçoso. Em termos formais, a com posição consiste de dez ditos no modo indicativo (vs. 1-3,6-12) e dois no imperativo (ou “admoestações”, vs. 4,5)." Exceto pelo versículo de conclusão, os dez ditos são ditos comparativos: seus versetos A apre sentam imagens notavelmente negativas da ordem da criação a fim de servir como metáfora do insensato na ordem social. A composição “Es pelho dos Insensatos” é constituída de uma introdução, que anuncia o tema (vs. 1-3); um corpo, que desenvolve seus dois lados (vs. 4-10); e uma conclusão (vs. 1 1 , 1 2 ). 26.1 funciona como uma sumarização a ser detalhada pelo corpo; anuncia o tema principal da composição: “a honra não convém ao in sensato”. O versículo 2 funciona como uma comparação e contraste com o versículo 1 ; ele se refere também ao que é inadequado acerca do proferir uma maldição contra uma pessoa inocente. Contudo, ele 9. Veja Waltke. Genesis, pp. 38-43. 10. Extraído de B. Waltke, “Old Testament Interpretation Issues for Big Idea Preaching" in The Big Idea o f Biblical Preaching (Grand Rapids: Baker, 1998), pp. 41-52. 11. A maioria dos críticos da forma faz distinção entre ditos e admoestações, mas se trata de uma distinção puramente formal. Os ditos, bem como as admoestações. têm por objetivo corrigir o com portamento do discípulo para se conformar à “sabedoria" (veja 1.2-6).
funciona principalmente como um contraste. Por um lado, a glória não é própria para o insensato porque, como o versículo 1 deixa claro (e o corpo deixará ainda mais claro), conferir-lhe uma posição social causa rá grande dano. Por outro lado, proferir uma maldição contra uma pessoa inocente é inadequado, mas não causará dano algum porque a maldição não tem onde cair. O contraste é auxiliado pela paronomásia. O heb. kãbêd, a raiz de “glória” (kãbôd), significa “pesado” e o heb. qãlal, a raiz de “maldição” (qetãlâ), significa “leve”. Na verdade, nas línguas semíticas ela pode significar “ser descuidado”, uma noção que suscita a ima gem de pássaros voando ao sabor do vento sem um lugar para descer. 26.3 é o ponto culminante da introdução e anuncia a contraposi ção positiva do tema negativo. Eis o que é apropriado: “a vara, para as costas dos insensatos” ! A assonância do final lôrl em sippôr (“pardal”), derôr (“andorinha”) e hamôr (“jumento”) ajuda a anunciar tanto a pro posição positiva, aquilo que é apropriado (v. 3), quanto a negativa, aquilo que não é apropriado (vs. 1,2). Em resumo, a introdução anuncia a tese com seus contrapontos. Duas admoestações formais (26.4,5) que desenvolvem o contratema daquilo que é apropriado para um insensato formam uma transição relativamente suave da introdução para o corpo. Além de fustigar o insensato para controlá-lo, o filho/discípulo sábio deve dar ao insensato uma resposta verbal. Sua resposta, porém, deve fazer distinção entre o que não é apropriado (v. 4) e o que é apropriado (v. 5). Sem descer ao nível do insensato (v. 4) e vencendo o mal com o bem (25.21), deve trazer a lume a verdade acerca da loucura do insensato (v. 5). Os cinco ditos de 26.6-10 voltam à forma comparativa e ao tema da introdução. Esses ditos respondem às perguntas acerca do significado da “honra” e por que ela não é apropriada aos insensatos. No entanto eles intensificam os padrões de comparação, chegando a imagens sur preendentes e jocosas a fim de desenvolver a proposição. Em vez de extrair imagens impessoais como as condições do tempo (v. 1 ) e dos animais (vs. 2, 3) impessoais, essas imagens são tiradas de pessoas deformadas (vs. 6 , 7) e perturbadoras (vs. 9, 10). A figura absurda do atirador de pedras ocupa o eixo (v. 8 ). 26.6 e 7 são ligados pelas imagens conectivas referentes a pessoas deformadas e pelas imagens de “pés” (raglayim) e “pernas” (Sõqayim). Ambas as imagens compartilham de modo ímpar a mesma sintaxe, o
número dual hebraico. Os versículos 8 e 9 são ligados pela associação de imagens referentes a pessoas degeneradas e pela paronomásia de “bêbado” Sikkôr, Sõkêr. Duane Garrett mostra que os compiladores organizaram esses di tos em uma estruturalpadrão quiástica. A Confiar negócios importantes a um insensato (v. 6) B Um provérbio na boca de um insensato (v. 7) X Honrar a um insensato (v. 8) B ’ Um provérbio na boca de um insensato (v. 9) A’ Confiar negócios importantes a um insensato (v. 10).12
Os compiladores desses ditos modelam o quiasmo repetindo textu almente em sua parte central interna, de cada lado do eixo, “um provér bio na boca do insensato”, como uma forma de palavra-chave exagera da. A parte central extema do quiasmo se refere à contratação do insen sato para um trabalho, sendo uma das tarefas enviar mensagens. À luz desse quiasmo, fica evidente que 26.8 é o eixo e que esse verso focal que também é o centro do corpo e da conclusão reafirma de maneira intensi ficada a ideia principal da composição: “a honra não é apropriada ao insensato”. Suas últimas palavras, “honra ao insensato”, repetem textu almente as últimas palavras da declaração sumária de abertura (v. 1). A figura absurda do lançador de pedras retrata o prosaico “não é apropria da” da sumarização (v. 1 ). O eixo também é ligado à introdução por meio da assonância de serôr (“ligar”), combinando com sippôr e derôr. Os versetos B situados em tomo do eixo e que declaram o tema esclarecem como se dá honra a insensatos. A parte central interna do quiasmo fala de colocar provérbios em sua boca (vs. 7,9), e sua estru tura extema fala de comissioná-los ou contratá-los (vs. 6 , 10). Seus versetos A esclarecem por que não é apropriado dar honra aos insensa tos. Essas imagens intensificam o perigo de honrar os insensatos, de causar prejuízo a si mesmo (vs. 6 , 7) até causar danos à sociedade em geral (vs. 9,10). A fim de indicar o perigo mortal de educar ou contratar um insensato, o compilador intensifica a imagem de um bêbado briguento sacudindo seu galho de espinhos para a imagem de um arqueiro frenético lançando flechas. 12. D. A. Garrett, Proverbs, Ecclesiastes, Son% ofSohm on (NAC 14; Nashville: Broadman, 1983), p. 212.
26.11, 12 conclui o “Espelhos dos Insensatos”. Um inclusio liga o versículo 11 à introdução. Assim como os versículos 1,2, este dito deri va sua imagem negativa do reino animal (pardal/andorinha, v. 2 ; cavalo/ jumento, v. 3; e cão, v. 11), não da esfera humana (vs. 6 -10). O versícu lo 1 2 está ligado ao corpo pela expressão-chave “sábio a seus próprios olhos” (v. 5). Essa ligação sugere que a conclusão, assim como as admoestações, desenvolvem o contratema positivo da composição, se gundo o qual a disciplina é apropriada para um insensato. O versículo 11 afirma que o insensato não pode salvar a si mesmo. Usando a estru tura/padrão alternada ABC::A’B ’C \ o dito justapõe um insensato com um cão desprezível, comparando sua loucura destrutiva com o vômito do cão e a teimosia do insensato com a natureza repulsiva do cão de voltar ao vômito. O versículo 1 2 também funciona como um de janus para a composição seguinte. O sábio sinaliza que ele está pres tes a deixar o insensato para trás e passar para um novo tema abando nando os ditos comparativos que usam imagens negativas extraídas da ordem criada, como padrão de avaliação do insensato. Em vez disso, ele usa agora o insensato como padrão de comparação para aquele que é sábio aos próprios olhos. O dito desvia o olhar do filho do insensato para o preguiçoso que se encastelou em sua presunção. A poética da maioria das unidades não é tão transparente quanto esse exemplo clássico, mas há casos suficientes de transparência poéti ca em várias unidades para nos predispor a ver os editores de Provérbios como autores, e não apenas colecionadores. Em outras palavras, é mais provável que improvável que os editores hebreus antigos organizaram os provérbios de maneira lógica para protegê-los, apesar desta lógica não ser transparente para o leitor moderno. C. G Ê N E R O DE SA BED O RIA
A poética se refere a todos os gêneros literários. A discussão se volta agora para as características distintivas do gênero de literatura de sabedoria ao qual Provérbios pertence, numa tentativa de lançar os fundamentos para a interpretação e teologia do livro. Os estudiosos da Bíblia incluem universalmente no gênero de sabedoria os livros bíblicos de Provérbios, Jó e Eclesiastes, com alguns salmos (e.g., Sl 37 e 49) e alguns livros apócrifos/deuterocanônicos, particularmente Sirácida (ou Eclesiástico) e Sabedoria de Salomão. Alguns estudiosos aplicam o ter
mo a outros livros, mas não se chegou a um consenso quanto a essas outras possibilidades. 13 Em 1908, J. Meinhold publicou o primeiro estudo inteiramente dedi cado à literatura de sabedoria do Antigo Testamento. 14 No entanto, a natureza e contexto exatos da literatura de sabedoria bíblica ainda es tão em discussão. Diz-se com frequência que são humanistas, interna cionais, não-históricos e eudemonísticos; mas como James Crenshaw observa, “Cada termo requer qualificação” . 15 O mesmo se aplica a outras marcas supostamente distintivas como a busca por ordem e seu tom sapiencial particular. Na opinião deste autor, a literatura bíblica difere dos outros gêneros em sua inspiração singular. Para Whybray, além de os livros de sabedoria apresentarem um vocabulário distinto, eles também são humanistas.16 Sem dúvida, referem-se primeiramente ao ser humano e seu mundo, e, em particular, à potencialidade e às limitações do indíviduo, mas é enganoso estigmati zar o gênero como humanista. Brueggemann17 alega que o conjunto de textos de sabedoria anuncia as novas jubilosas de que Deus confia que as pessoas dirigirão as próprias vidas, e Crenshaw declara que o cará ter distintivo da sabedoria de Israel era sua crença “na suficiência da virtude humana para alcançar o bem-estar nesta vida, sem a assistên cia divina” . 18 Estas alegações, contudo, dificilmente podem ser reconci liadas com a coleção em si. O livro baseia seus ensinos no “temor do Senhor” (veja p. 153), nâo na humanidade. Provérbios 3.7 adverte con tra ser sábio aos próprios olhos (i.e., autônomo) e 3.5 pede que o ho 13. Para a influência controversa da tradição sapiencial em outras partes do Antigo Testa mento veja J. A. Emerton, “Wisdom”, in Tradition and Interpretation: Essays by Members o f the Society fo r Old Testament Studv, org. G W. Anderson (Oxford: Clarendon, 1979), p. 221; R. P. Gordon. “A House Divided: Wisdom in Old Testament Narrative Traditions”, in H'I.4Í, pp. 94-105; J. A. Soggin, “Amos and Wisdom”, in WIAI, pp. 119-23; A. A. Macintosh, “Hosea in the Wisdom Tradition: Dependenoc and Independence”, in W1A/, pp. 124-32; H. G M. Williamson, “Isaiah and the Wise”, in WIA1, pp. 133-141; W. McKane, “Jeremiah and the Wise”, in WlAl, pp. 142-52; B. A. Mastin, “Wisdom and Daniel”, in WIAl, pp. 161-69. 14. J. Meinhold, Die Weisheit Israel in Spruch. Sage und Dichtung (Leipzig: Quelle & Meyer, 1908). 15. J. L. Crenshaw, “The Wisdom L iterature”, in The Hebrew B ible and Its M odem Interpreters, org. D. A. Knighl e G .M. Tucker (Filadélfia: Fortress e Decatur, Ga.: Scholars, 1985), p. 369. 16. R. N. Whybray, The Intelleclual Tradition in the Old Testament (Berlim: de Gruyter, 1974), pp. 71-155: R. N. Whybray, “The Social World o f the Wisdom W riters”, in The World o f Ancient Israel, org. R. E. Clements (Cambridge e Nova York: Cambridge Univer sity, 1989), p. 227. 17. W. A. Brueggemann, In Man We Trust (Richmond: John Knox, 1972). 18. Crenshaw, “Wisdom Literature”. p. 373.
mem deposite sua confiança no Senhor, e não em si mesmo. Nel argu menta que o etos da sabedoria “não é resultante da bondade do homem ou das funções superiores da razão humana” . 19 Tendo em vista as limi tações da humanidade, a fim de ser bem-sucedido o justo entrega o seu caminho ao Senhor (16.1 -3). Ao conduzir a própria vida debaixo do sol, Qoheleth achou a morte melhor do que a vida (Ec 4.2), e Jó não encon trou nenhuma solução para suas questões referentes ao sofrimento e para a pergunta: “Por que ser justo ? ” 20 A “Angst” de Jó foi aliviada somente quando o Senhor lhe respondeu do meio do redemoinho caóti co (Jó 38.1). O caráter internacional da sabedoria, especialmente sua ligação com a literatura de instrução egípcia, ficou estabelecido desde que E. A. Wallis Budge publicou a obra que veio a ser conhecida como A Instrução/Ensino de Amenemope (veja pp. 60-62, 70).21 Porém, a sabedoria de Israel coloca exclusivamente o temor do Senhor como o fundamento para a aquisição de sabedoria (Jó 28.28; Pv 1.7; 9.10; cp. Ec 12.13, 14) e, segundo a argumentação de Nel, é esse conceito que representa o princípio religioso central na literatura de sabedoria.22 Além disso, as leis, os hinos e outros tipos de literatura de Israel também mostram uma forte ligação com as formas de literatura do antigo Ori ente Próximo, colocando em dúvida o seu caráter internacional como uma sabedoria distinta. Com referência à sua natureza não-histórica, Murphy observa cor retamente que não há qualquer menção das promessas aos patriarcas, do êxodo e Moisés, da aliança e o Sinai, da promessa a Davi (2Sm 7) e assim por diante .23 Todavia, de acordo com Provérbios 1.1, como rei de Israel, Salomão olhou para a humanidade e seu mundo pela lente das alianças de Israel e chegou à conclusão de que a única maneira de in gressar no mundo da sabedoria é pelo temor do S e n h o r (1.7). Em con traste com Qoheleth e Jó e seus três amigos, que falam principalmente de “Deus” ( elohim), o título de Deus em sua transcendência, Provérbios 19. P. J. N el, The Slruclure and Ethos o f the Wisdom Admonilions in Proverbs (Berlim e N ova York: de G ruyter, 1982), p. 127. 20. J. G. Janzen. Job (Interpretação; Atlanta: John Knox, 1985), p. 3. 2 1. E. W. Budge, Second Series o f Facsimiles o f Egyptian Hieratic Papyri in the British Museum ( Londres: British M useum, 1923), Pis. 1-14. 22. N el, The Wisdom Admonilions, p. 127. 23. R. E. Murphy, O. Carm ., The Tree o f Life: An Exploration o f Biblical Wisdom Literature (Nova York: Doubleday, 1990).
fala do “ S e n h o r ” ( YHWH, padronizado como Yahweh), o título do Deus imanente de Israel entrou em aliança com seu povo. McKane,24 Wurthwein25 e Zimmerli26 acreditam que a sabedoria mais antiga de Israel era mais utilitária e eudemonística do que religio sa, mas já em 1979, argumentei que não se pode fazer qualquer distin ção entre secular/profano e religioso/piedoso na literatura do antigo Oriente Próximo.27 Em 1987, F. Wilson avaliou criticamente a distinção entre a sabedoria mais antiga e profana e a sabedoria mais recente e Yahweistica, e hoje ela é amplamente rejeitada.28 Até mesmo Why bray, que fez esta distinção, a rejeitou posteriormente .29 Com referên cia à alegação de que o livro de Provérbios baseia sua moralidade no eudemonismo (i.e., um sistema de ética de fazer o bem para obter pra zer), deve-se observar que o conjunto de textos sapienciais qualifica o eudemonismo da mesma maneira que o restante do Antigo Testamento (cp. Lv 26 e Dt 27,28); a felicidade depende da fé em Deus para manter essa tendência. Além disso, a fim de que o sábio não seja seduzido a confundir moralidade com prazer, o Senhor com frequência permite que sofram por causa da justiça e, desse modo, desenvolve a paciência, a esperança, a confiança e outras virtudes em seu caráter antes de fazer prevalecer a sua ordem moral, que inclui a justiça (veja Pv 3.1-12). Koch30, Gese31 e Schmid32 desenvolveram a noção de que é básico para a sabedoria uma busca pela "ordem” (i.e., um vínculo ação24. W. McKane, Prophets and Wise Men (Londres: SCM, 1965); W. McKane, Proverbs: A New Approach (OTL; Filadélfia: Westminsler, 1970). 25. E. Wurthwein, Die Weisheit Àgyptens und das Alte Testament (Marburg: 1967), repr. em Wort und Existenz (Gõttingen. 1970), pp. 197-216. 26. W. Zimmerli, “Zur Struktur der alttestamentlichen Weisheit”, ZAW 10(1933), 177-204; trad. B. W. Kovacs e reimp. in SAIW , pp. 175-99. 27. B. K. Waltke, “The Book of Proverbs and Old Testament Theology", BSac 136 (1979), 302-17. 28. F. M. Wilson, “Sacrcd and Profane? The Yahwistic Redaction o f Proverbs Reconsidered", in The Listening Heart: Essavs and Psalms in Honor o f R. E. Murphy, org. K. G Hoglund (JSOTSup 58. Sheffield: JSÒT, 1987), pp. 313-34. Veja também S. Weeks, Early Israelite Wisdom (Oxford: Clarendon, 1994), pp. 57-73. 29. R. N. W hybray, Wisdom in Proverbs: The Concept o f Wisdom in Proverbs 1-9 (Londres: SCM, 1965); R. N. Whybray, Proverbs (NCBC; Grand Rapids: Eerdmans e Lon dres: Marshall. Morgan, e Scott, 1994). 30. K. Koch. “Gibt es ein Vergeltungsdogma im Alten Testament?” ZTK 52 (1955) 1-42. 31. H. Gese, “ Lehre und W irklichkeit in der alten W eisheit”, in Um des Prinzip der Vergeltung in Religion und Recht des Alten Testaments (Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1972), pp. 213-35; H. Gese, Essavs in Biblical Theology, trad. K. Crim (Minneapolis: Augsburg, 1981). 32. H. H. Schmid. Gerechtigkeit ais Weltordnung: Hintergrund und Geschichte des alttestamentlichen Gerechtigkeitabgriffes (BHT 40; Tilbingen: J. C. B. Mohr, 1968).
destino) .33 Com base nesses estudos e na convicção de que a figura egípcia de Ma‘at foi adaptada tanto para a situação israelita quanto para a personificação da mulher sabedoria em Provérbios 1.20-33 e capítulo 8 , G. von Rad argumentou que Deus implantou a sabedoria (i.e., a ordem mundial de lei e justiça) na própria criação, e que essa revelação primordial persuade as pessoas a confiarem nesta revelação imanente.34 Porém, uma exegese cuidadosa de Provérbios 1.20-33 e 8.30 mostra que a mulher sabedoria é uma personificação da sabedoria revelada do pai, como ensinada no livro de Provérbios, não da sabedo ria na criação (veja pp. 132-133). Apesar de outros livros bíblicos enfa tizarem a revelação por Deus de sua sabedoria na criação e tomarem por certa a lei natural, nenhum texto no livro de Provérbios ensina que a criação revela sabedoria! Além disso, conforme Nel argumentou, o fundamento epistemológico do livro, o temor do Senhor, que por defini ção requer uma revelação especial, “não permite que a sabedoria seja interpretada como teologia natural” .35 Uma formulação mais apropria da seria que a literatura sapiencial revela o vínculo ação-destino, e não que busca essa ligação a fim de descobri-la. De acordo com Kidner, a sabedoria é distintiva por seu tom, seus oradores e seu apelo. Os aspectos “farás” ou “não farás” da lei e o urgente “assim diz o S e n h o r ” dos profetas são substituídos pelo apelo ponderado do mestre à razão .36 Sem dúvida, o tom da sabedoria difere dos gêneros legal e profético; ainda assim, o pai ordena ao filho com severidade, “Ouve!” (1.8 ), “não o consintas” (1.10), e assim por diante, e representa seus ditos como tôrâ (“lei”) e miswôt (“mandamentos”; veja 1.3), os mesmos termos usados para a lei de Moisés. Ademais, seu apelo é tão urgente quanto os de Moisés e dos profetas: trata-se de uma questão de vida ou morte. A mulher sabedoria “levanta a voz” com emoções fortes (1.20). Apesar de os sábios serem mestres, não legisla dores e profetas, falam com igual autoridade, como Kidner concorda ria. Também reivindicam ser inspirados (2.6), e seu conselho Çêsâ) é um decreto, e não uma questão de direito, não um conselho a ser avali ado (veja 1,25).37Além disso, em 1.20-33, a mulher sabedoria fala como 33. Seus pontos dc vista distintos podem ser encontrados cm Emerton, “ Wisdom”, pp. 215-19. 3 4 .G von Rad, Wisdom in Israel (Nashville: Abingdon, 1972),p. 191; veja também pp. 144-76. 35. Nel, The Wisdom Admonilions, p. 127. 36. D. Kidner, Introduction to the Wisdom o f Proverbs. Job and Ecclesiastes (Downers Grove, III.: InterVarsity, 1985), p. 11. 37. Veja B. K. Waltke,“TheAuthority o f Proverbs: An Exposition o f Proverbs 1.2-6". Presby . 13
um profeta. A sabedoria de fato apela para a mente, mas conhecer a sabedoria é mais precisamente uma questão de coração amoroso (veja p. 141). A inspiração distintiva da literatura sapiencial explica parcialmente algumas dessas diferenças, como sua preocupação com a humanidade em geral, não com a história de Israel em particular; seu caráter inter nacional; sua preocupação com a ordem e seu estilo. Durante o tempo em que superintendeu a redação do Antigo Testamento, Deus falou aos seus servos de diversas maneiras, produzindo sua variedade de formas literárias (Hb 1.1). A Moisés, o legislador, falou claramente e face a face, dando ao povo sua literatura legal; mas aos profetas, ele falou em visões e sonhos simbólicos, produzindo a literatura profética (Nm 12.18 ). Davi, o querido cantor dos cânticos de Israel, reagiu às suas experi ências de vida com petições e louvores ao Deus que guarda sua aliança com Israel, gerando a literatura hinológica (2Sm 23.1-3a). Deus usou as observações perspicazes do sábio acerca da criação e da humanidade e suas reflexões concludentes acerca das mesmas, orientadas pela fé no Deus que guarda sua aliança com Israel, para produzir a literatura sapiencial. Pode-se observar o sábio em ação em Provérbios 24.30-34. Seu laboratório é o campo do preguiçoso (vs. 30, 31): “Apliquei meu coração ao que observei, e aprendi uma lição com aquilo que vi” (v. 32 [minha tradução]). Em decorrência dessa obser vação, ele inventa ou cita um provérbio: “Um pouco para dormir... as sim sobrevirá a tua pobreza como um ladrão, e a tua necessidade, como um homem armado” (vs. 33,34). Qoheleth inicia seu ensaio observan do os ciclos da criação (Ec 1.3-11) e descobre que tudo é “vaidade” / “correr atrás do vento”, provavelmente um sentido duplo deliberado que os sábios gostavam de usar. Ele continua sua busca por sabedoria refletindo sobre suas experiências debaixo do sol. Jó baseou suas refle xões sociorreligiosas basicamente em sua experiência de miséria e não encontrou qualquer resolução para sua perplexidade até que o S e n h o r abriu os seus olhos para que ele visse que o caos e a morte na ordem criada são limitados pela ordem e pela vida (Jó 38-41). No entanto, a sabedoria deles não está baseada naquilo que os teó logos chamam de teologia natural. Antes, veem a criação pelas lentes ( 1987) 65-78; B. K. Waltkc, “Lady Wisdom as Mcdiatrix: An Exposition o f Proverbs 1:20-33’\ Presby. 14(1988) 1-15.
da fé pactuai de Israel. Em outras palavras, derivam a verdade da ob servação da ordem criada e da experiência dentro da estrutura de refe rências das alianças de Israel. Sem esta estrutura o reino animal ensi naria a lei da sobrevivência do mais forte (i.e., perversidade), não da justiça. Quando Salomão exalta uma formiga como paradigma de disci plina e prudência em Provérbios 6.6-11, não leva em consideração os seus efeitos desastrosos.38 Na verdade, Agur argumenta, com o autor de Jó (veja Jó 28, 31-41), que a criação ensina a impossibilidade de se obter sabedoria à parte da revelação especial (veja 30.1-6)! Ao refleti rem sobre a criação, Salomão e a mãe do rei Lemuel nunca deixam de ver a vida e o mundo pela lente de Israel. Qoheleth e Jó, entretanto, a removem temporariamente, mas a colocam de volta, pois aquilo que observam é perturbador demais, como Asafe também confessa (SI 73). Não obstante, a inspiração dos sábios difere em seu apelo à criação para ensinar sabedoria, e eles reivindicaram ser inspirados e possuir autoridade canônica tanto quanto os outros colaboradores da literatura canônica (cp. Pv 1.1; 2.1-8; 22.17-21; 25.1; 30.1-6). D. GÊNEROS NO LIVRO DE PROVÉRBIOS
1. Definição de “provérbio” A palavra de abertura do livro de Provérbios classifica seu gênero como mislê (pl. de mãsãl) “provérbios”. Os provérbios são uma espé cie de literatura de sabedoria de Israel, que podem estar na forma de poesia (o livro de Provérbios) ou de prosa (o livro de Eclesiastes), ou ambas (livro de Jó). O significado do termo “provérbios” em nossa lín gua é um tanto diferente do termo hebraico usado em Provérbios. E evidente que os provérbios em nossa língua não são escritos em parale lismo poético - tampouco na narrativa bíblica (ISm 1 0 . 1 2 ). O mais importante, porém, é que um provérbio em nossa língua se refere a um dito breve e incisivo de aceitação popular?9 mas mãsãl se refere a um apotegma aceito entre aqueles que temem o Senhor. “Os tesouros da perversidade [i.e., viver para si mesmo] de nada aproveitam”, o primei ro provérbio (10.1, 2), nâo é aceito pelo povo em geral. A sabedoria restringe a aceitação das suas palavras aos justos, “para os que acham 38. De acordo com McKane, Proverbs, p. 323. 39. B. Alster, Studies in Sumerian Proverbs (Copenhagen Studies in Assyriology 3: Mesopotamia: Copenhagen: Akademisk. 1975), p. 37.
conhecimento” (8.9 ).40 Se esses provérbios fossem apreciados pelas massas, a Sabedoria não teria que ficar à porta da cidade rogando para seus ditos serem ouvidos (1.20,21; 8 .1 -3). O verbo II mãSãl - que deve ser distinguido de I mãsãl - significa “ser semelhante a” .41 Landes, seguindo McKane42 afirma que o subs tantivo mãSãl significa “uma comparação ou analogia [criada] com o propósito de comunicar um exemplo, modelo ou paradigma” .43 A com paração diz respeito à função, e não ao conteúdo, apesar de alguns pro vérbios, especialmente em Salomão C, apresentarem paralelismos em blemáticos. Este discurso-ato, como Polk argumentou, exige mais espe cificamente que o leitor se envolva de modo a exercitar a imaginação num esforço de produzir algum tipo de equivalência ou conexão entre o provérbio e a situação do indivíduo que o lê.44 Polk emprega a ilustra ção de A. S. Herbert de mãSãl em 1 Samuel 10.12, “Está também Saul entre os profetas?” O provérbio pede que o público “veja” a semelhança entre o comportamento estranho do rei e faça um julgamento crítico do próprio comportamento. G. Wilson observa que nos contextos em que se pode encontrar a expressão de um hyh + prep. le + mãSãl (“tornarse um m ãsãr), mãSãl significa “algo ou alguém que está sendo apre sentado... como um exemplo negativo para desencorajar outros de se guirem o mesmo caminho” .45 Como disse Goethe: “Um poeta deve tratar daquilo que é específico e, se for competente, articulará o univer sal”. A forma de aplicação depende da resposta do leitor. Por exemplo, no Salmo 49, o “provérbio” mãsãl (v. 4 [5]) segundo o qual a pessoa sem entendimento “é como (nimSal) os animais que perecem” (vs. 1 2 , 20 [1 3 ,2 1 ]), confortará os humildes, tomará sóbrios os ilustres, adver tirá os ricos e consolará os pobres (v. 2). Nas palavras de Herbert, um provérbio é “sempre uma parábola expressa numa frase curta e incisi va, uma declaração vivida e impressionante, uma figura desenhada ra pidamente... Tem um propósito claramente reconhecível, o de estimular e levar à compreensão do real como sendo distinto do desejado, ou do 40. “Ora, o homem natural nâo aceita as cousas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura: e não pode entendê-las porque elas se discernem espiritualmente” (1 Co 2.14). 41. Deve ser distinguido de I msl “governar". 42. McKane, Proverbs, pp. 22-33. 43. G. M. Landes, “Jonah: A M S S S l T ’ in Israelite Wisdom , org. J. G. Gammie et al. (Missoula: Scholars, 1978), p. 140. 44. T. Polk, “Paradigms. Parables, and Xfisalim", CBQ 45 (1983) 563-84. 45. G Wilson, NIDOTTE, 2:1, 135, s.v. I mSl.
que é aceito de modo complacente; de compelir o ouvinte e/ou leitor a julgar a si mesmo, sua situação ou sua conduta” .46 Kovacs comenta: “o homem sábio não reage à vida por meio da aplicação mecânica de fór mulas a experiências; antes, ele possui a faculdade de compreender cada situação e aplicar o provérbio com habilidade e sucesso” .47 Uma vez que os provérbios e ditos requerem do leitor que ele “veja” essa ligação, são chamados de “parábolas” ou “enigmas” ( 1 .6 ). 2. Provérbios e ditos O livro de Provérbios faz distinção entre duas formas em seu con teúdo: os “provérbios” e os “ditos [palavras] do sábio” (1.6 ). Em ter mos estritos, neste livro, mislê se refere aos apotegmas de Salomão nas Coleções II ( 10.1) e V (25.1), e os “ditos do sábio” se referem às Cole ções III e IV (22.17; 24.23), VI e VII (30.1; 3 1 .1 )- ou seja, aos apêndi ces dos materiais atribuídos exclusivamente a Salomão. O termo mãsãl pode ser honorífico em razão do seu uso exclusivo associado a Salomão (10.1; 25.1), e/ou pode ter sido escolhido em função da seqüência que brada de msl slm[h] (= “provérbios de Salomão”). “Os ditos do sábio” também contêm apotegmas, de modo que os termos são, com frequên cia, intercambiáveis. Em resumo, não existe uma distinção uniforme formal entre “provérbios” e “ditos”. 3. Ditos curtos e admoestações longas Os críticos da forma costumam classificar a literatura de Provérbios em duas categorias: unidades mais longas em estilo admoestatório (Co leções I, III-IV) e ditos curtos (ou sentenças) no modo indicativo (Cole ções II e V). Esses gêneros amplos são, por sua vez, comumente divi didos em subformas. Os ditos em forma de sentenças podem ser dividi dos de acordo com seu paralelismo (antitético, sinônimo, sintético), ou por seu conteúdo (ditos com “melhor”, ditos numéricos, etc.). Por ve zes, uma admoestação ocorre na forma de sentença (cp. 19.27) e um poema mais longo no modo indicativo (30.1 -9; 31.10-31). O tipo admo estatório é semelhante às instruções egípcias, que eram chamadas de sby3t e os ditos em forma de sentenças são semelhantes aos encontra 46. A. S. Herbert, “The Parable [AÜM5Í] in the Old Testament”, SJT 7 ( 1954) 180-96. 47. B. W. Kovacs, “Sociological-Structural Constraints upon Wisdom” (Diss. Ph.D., Vanderbilt University, 1978), p. 302.
dos na Mesopotâmia. Em Provérbios, os “ditos” podem se referir a ambos os tipos. Por um lado, a distinção entre poemas admoestatórios e sentenças indicativas possui relevância hermenêutica. Nos poemas mais longos, a ligação racional entre os versículos e seus delimites é muito mais apa rente do que nos esquemas racionais e os delimites dos agrupamentos de ditos-sentenças. Além disso, os poemas mais longos tendem a conter um discurso bastante extenso para se protegerem de interpretações errôneas; mas os ditos-sentenças tendem a expressar uma verdade que pode pare cer com a verdade completa, mas de fato esses ditos devem ser qualifi cados por outros ditos-sentenças. Estes também exigem mais perspi cácia de sua audiência para compreender o seu significado. Em decor rência disso, os poemas admoestatórios longos e claros do prólogo pre param o terreno para a interpretação dos ditos-sentenças menos cla ros. Esse prólogo cria a chave hermenêutica do livro. Por outro lado, a distinção pode ser enganosa, pois as admoestações podem parecer mais pedagógicas e autoritativas. Mas as duas formas de ditos são ordens pedagógicas e autoritativas, apesar de apenas as admoestações serem expressas na forma volitiva “eu/tu”. O preâmbulo do livro deixa claro que os ditos-sentenças, bem como as admoestações, são dirigidos ao jovem ingênuo e/ou ao sábio (1.4, 5) e o prólogo se refere a ambas as formas como miçwôt “ordens” e tôrâ “ensino catequético” (1.8). Ademais, as duas formas, embora cada uma ao próprio modo, motivam seu público apelando para a tradição, para a promessa de uma vida abundante (e.g., saúde, riqueza e prosperidade), para uma preocupação natural em relação aos pais e aos outros e, em geral, para o bom senso. E. AMBIENTE
Conforme foi observado, a interpretação histórico-gramatical re quer uma investigação do ambiente histórico do livro. Aqui, o intérprete deve distinguir entre os ambientes de sua redação e disseminação. 1. Ambiente de composição A atribuição dos provérbios a Salomão e dos ditos aos sábios apon ta para um ambiente palaciano quanto à sua composição. “O sábio” se toma pessoa real quando seu nome é citado, como é o caso de Agur e
do rei Lemuel. Tendo em vista os sábios conhecidos da literatura do antigo Oriente Próximo, ao que tudo indica, devemos supor que os sábi os anônimos em 22.17 e 24.23 eram provavelmente reis ou conselhei ros do rei, tendo em vista seu poder de observação perspicaz, suas reflexões concludentes e seu discurso inteligente (veja p. 99). Como sacerdotes e profetas, os “homens sábios” podiam ser piedosos ou ím pios (cp. Is 19.11,12; 29.14; Jr 8 .8 ,9; 9.23[22]; 18.18; 50.35), homens como Husai, que foi leal ao piedoso rei Davi e como Aitofel, que lhe foi desleal (2Sm 16.20—17.14). Os sábios mencionados neste livro são, ob viamente, piedosos. Tendo desconsiderado as atribuições do próprio livro a Salomão, os críticos da forma não chegaram a nenhum consenso acerca do local onde os ditos desse livro foram compostos. Whybray concorda com a conclusão de Murphy de que não temos acesso ao ambiente de vida exato desses ditos, lançando dúvida sobre a legitimidade de usar somen te dessa abordagem para a crítica literária.48 De qualquer modo, a histó ria dessa pesquisa é instrutiva. Vários críticos da forma tentam identificar o ambiente do sábio to mando por base a suposição questionável de que eles expressam seu ambiente sociológico em ditos gnômicos. Mas R. N. Crenshaw se mos tra acertadamente cético em relação à análise da crítica da maneira como determinar o ambiente social da literatura de sabedoria e considera outros ambientes: a família, a corte e a escola .49 O provérbio “É melhor prevenir do que remediar” teve origem numa farmácia? O dito “Mais vale um pássaro na mão do que dois voando” foi cunhado por um omitólogo? Conforme anteriormente observado, o conteúdo de várias cole ções de ditos neste livro favorece um ambiente palaciano, mas esse critério não é decisivo. Em vez do ambiente palaciano, outros estudiosos preferem um am biente popular para grande parte da antologia. Scott faz distinção entre os ditos populares e acadêmicos em Provérbios.50 Murphy51 atribui a 48. R. N. Whybray. “The Social World o f lhe Wisdom Wriler”, in The World o f Ancient Israel, org. R. E. Clements (Cambridge: Cambridge University, 1989), pp. 227-50. 49. J. L. Crenshaw, “Prolegomenon”, in SAJW, p. 20. 50. R. B. Y. Scott, The Way o f Wisdom in the Old Testament (Nova York: Macmillan e Londres: Collier-Macmillan, 1971), esp. p. 63. 51. R. E. Murphy, “Assumptions and Problems in Old Testament Wisdom Research”, CBQ 29 (1967) 106.
maior parte dos ditos à comunicação social comum. Skladny acreditava que os capítulos 25-27 foram dirigidos a um setor mais agrícola da sociedade.52 Whybray argumentou em outro lugar que as coleções salomônicas condensaram o saber tradicional de pequenos agricultores israelitas e foram reunidas subsequentemente em conjuntos maiores visando a um propósito pedagógico.53 Fontaine examinou as narrativas do Antigo Testamento a fim de determinar a função dos provérbios na vida comum .54 Westermann situa grande parte dos capítulos 10-29 no meio do povo simples de um pequeno vilarejo agrícola num estágio cul tural pré-literário .55 Em tempos mais recentes, a tendência dos estudiosos tem sido de refinar o ambiente popular, para uma sociedade pré-literária. Wester mann,56 filho de um ex-professor de estudos da cultura africana na Uni versidade de Berlim, Barucq,57 Golka58 e Naré59 sugeriram uma ori gem pré-literária do material em Provérbios, especialmente os capítu los 10-29, mediante a comparação de seus ditos curtos com material aforístico de povos modernos não-letrados, especialmente na África. Whybray acredita que “este material novo marca o começo de uma nova era no estudo de Provérbios, comparável com aquilo que teve início com a publicação de Amenemope mais de setenta anos atrás” .60 Mas M. Fox adverte: “Devemos ter cautela quanto às conclusões tira das dos paralelos africanos” .61 Outros encontram a origem da sabedoria na lei. Gemser chegou à conclusão de que a sabedoria proverbial na forma legal pode ser muito 52. U. Skladny, Die ãltesten Spruchsammlungen im Israel (Gõttingen: Vandenhocch & Ruprecht, 1962), p. 43. 53. R. N. Whybray, The Composition o f Proverbs (JSOTSup 168; Sheffield: JSOT, 1994). 54. C. R. Fontaine, Traditional Sayings in the Old Testament: A Contextual Study (Sheffield: Almond, 1982). 55. C. Westermann, “ W eisheit im Sprishw ort”, in Schalom : Studien zur Glaube und Geschichte Israels. Fest. Aflred Jepsen. org. K. H. Bemhardt (Arbeiten zur Theologie 1/46; Stuttgart: Calwer, 1971), pp. 73-85. 56. C. Westermann, Wurzeln der Weisheit: Die ãltesten Sprüche Israels und anderen Volker (Gõttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1990). 57. A. Barucq. “Proverbes (Livre des)”, em Supplement au Dictionnaire de la Bible, vol. 8 (1972), cols. 1.395-1.476. 58. F. W. Golka. The Leopards Spots: Biblical and African Wisdom in Proverbs (Edimburgo: T&T Clark, 1993). 59. L. Naré, Proverbes salomoniens et proverbes mossi. Etude comparative à partir d une nouvelle analyse de Pr 25-29 (Frankfurt e Beme: Peter Lang, 1986). 60. R. N. Whybray, The Book o f Proverbs (Cambridge: Cambridge University, 1972), p. 33. 61. M. Fox, “The Social Location o f the Book o f Proverbs”, in 77T, p. 239.
antiga .62 Audet63 e Gerstenberger64 acreditam que as admoestações em Provérbios e na lei de Israel são derivadas de códigos específicos de comportamento usados na sociedade patriarcal e pré-monárquica (Sippenweisheit) de Israel. Semelhantemente, Blekinsopp acredita que a sabedoria e a lei procederam até certo ponto de uma origem em co mum.65 Wolff apoiou a teoria de Sippenweisheit para Amós,66 e Whedbee para Isaías.67 Richter, entretanto, fala de “etos de grupo” (Gruppenethos) para o desenvolvimento das leis, que foram então tomados pelas escolas de sabedoria.68 Porém, Nel argumenta que a forma admoestatória não pode determinar o ambiente, que é preciso manter a distinção entre a lei e a codificação da lei a fim de determinar a relação entre lei e sabedoria, e que a identificação da lei e da sabedoria pode ser expli cada a partir da identidade inerente no etos e conteúdo de ambas .69 Richter propôs um segundo ambiente para o pensamento sapiencial original, a escola. Por analogia com escolas de escribas no Egito, Volz retratou tanto escolas espirituais para a formação religiosa quanto es colas para a formação de escribas em Israel.70 Localizou e situou a origem dos ditos de Provérbios nas escolas ligadas à corte real, que preparavam a elite para a burocracia real.71 Shupak defendeu um ambi ente escolar a partir de termos equivalentes encontrados nos escritos associados a escolas egípcias,72 e Magass a partir de imagens metafó ricas em Provérbios.73 Lang74 e, especialmente, Lemaire75 argumenta 62. B. Gcmscr, “ Motive Clauses in Old Testament Law”, VTSup I (1953) 50-66. 63. J.-P. Audet. “Origines comparées de la double tradition de la loi et de la Sagesse dans le ProcheOrient ancien”, in International Congress o f Orienlalists (Moscou. 1964), 1:352-57. 64. E. Gerstenberger, IVesen undherkunft des 'apodiktischen Rechls' (WMANT 20; Neukir chen-VIuyn: Neukirchener, 1965). 65. J. Blenkinsopp, Wisdom and Law in the Old Testament: The Ordering o f Life in Israel and Earlv Judaism (Oxford Bible Series; Oxford: Oxford Univerity, 1983). 66. H. W. Wolff,Amos'geistige Heimat ('NMA.NX 18 ;Neukirchen-VIuyn: Neukirchener, 1964). 67. J. W. Whedbee, Isaiahand ffí.wfom(Nashvillee Nova York: Abingdon, 1971). 68. W. Richter, Recht undEthos: Versuch einer Ortungdes weisheitlichen Mahnspruehes (StANT 15; Munique: Kosel, 1966). 69. Nel, Wisdom Admonitions, p. 127. 70. P. Volz, Hiob und Weisheit (Gõttingen, 1921), p. 103. 71. H.-J. Hermisson. Studien zur israelitischen Spruchweisheit (WMANT; Neukirchen-VIuyn: Neukirchener, 1986). 72. N. Shupak, "The ‘Sitz im Leben’ o f Proverbs in the Light o fa Comparison o f Biblical and Egyptian Wisdom Literature”, RB 94 (1987) 98-119. 73. W. Magass. “Die Rezeptionsgeschichte der Proverbien”, LB 57 (1985)61-80. 74. B. Lang. “Schulc und Unterricht im alten Israel”, in Sagesse, pp. 186-201. 75. A. Lemaire, “Sagesse et écoles”, FT34 (1984) 270-81.
ram a favor da existência de escolas no Israel antigo a partir da evidên cia arqueológica. Em 1995, Davies ainda se mostrava favorável àque les que criam na existência de algum tipo de escola no Israel antigo .76 Mas Weeks77 (1994) considera a evidência a favor das escolas tão fraca que sua existência não deveria ser presumida, e Fox (1995), usando por vezes os mesmos dados que Davies, nega que os provérbios eram ensinados em escolas .78 Usando a terminologia da crítica da forma, pode-se concluir, a par tir dos autores citados, do contexto histórico do livro, do conteúdo e pela omissão da falha dos críticos da forma em demonstrar outro ambi ente, que os provérbios e ditos de Provérbios se originaram num am biente palaciano. A julgar pelo prólogo dos Trinta Ditos do Sábio, desde o início, as coleções foram tanto escritas (2 2 .2 0 ) quanto faladas (veja “inclina o ou vido”; 22.17). A forma escrita servia para preservá-los com exatidão (cp. Ec 12.10,12), a forma falada visava a criar no público a disposição para recebê-los (veja 1.8 e 2.2). Os textos foram escritos em um rolo (nfgillâ; cp. Sl 40.7 [8 ]) de papiro (cp. Jr 36.2, 4 LXX), couro ou pele “dentro” (página direita de um livro aberto) e, quando necessário, “nas costas” (verso) (cp. Ez 2.9, 10). Nesse caso, a pena era de junco rachado ou cortado de modo a servir como pincel. Nenhum artefato encontrado em escavações pode ser identificado categoricamente como um instrumento de escrita. No Egito antigo, a pena de junco era cortada de caniços com 15 a 40 cm de comprimento; sua extremidade era chanfrada a fim de possibilitar traços grossos ou finos com borda larga ou estreita.79 2. Ambiente de disseminação O ambiente palaciano para a origem dos provérbios e ditos deve ser distinguido do ambiente doméstico de sua disseminação. As refe rências ao pai e seu(s) filho(s) no prólogo do livro devem ser tomadas literalmente, mesmo que muitos estudiosos as interpretem equivocadamente como metáforas para um mestre e seu pupilo .80 E certo que José 76. G I. Davies, “Were There Sehools in Ancient Israel?" in WIAI, pp. 199-211. 77. Weeks, Early Israelite Wisdom, pp. 132-56. 78. Fox, “The Social Location”, pp. 227-39. 79. G R. Driver, Semitic Writting (Nova York e Londres: Oxford University, 1976), pp. 17ss. 80. Para um bom tratamento sobre o ensino nos lares no Israel antigo veja J. L. Crenshaw, “ Education in Ancient Israel”, JBL 104(1985) 601-15.
se refere a si mesmo como um “pai” para o faraó (Gn 45.8; cp. Jz 17.10), e a relação entre Elias e Eliseu é expressa pelos termos “pai” e “filho”. Também o diretor de uma escola suméria era chamado de “paiescolar” e o aluno era o “filho-escolar” .81 Mas os livros de sabedoria egípcios são dirigidos aos filhos do autor, e nunca a alunos sem paren tesco. Faltam evidências a favor da existência de escolas no Israel antigo.82 De acordo com Freedman, a introdução de escolas no judaís mo é atribuída de modo variado às reformas de R. Simeon b. Shetah e ao sumo sacerdote Joshua b. Gamala.83 Além disso, na literatura sapi encial do Egito e da Mesopotâmia, o orador é quase sempre um pai fictício ou real que se dirige a seu filho .84 O ambiente doméstico para a educação no antigo Israel, tanto para a lei mosaica (cp. Dt 6.7-9) quan to para os provérbios de Salomão, é apresentado de modo incontestável pelas referências à mãe (cp. Êx 20.12; Lv 19.3; Dt 5.16; 21.18-21; Lc 2.51; 2Tm 1.5; 3.14, 15) e, particularmente, em Provérbios (4.3; 6.20; 23.25; 31.1,26-28; cp. 10.1; 15.20).85As referências do prólogo à mãe como mestra com o pai no momento em que o filho está ingressando na vida adulta mostram que sua influência não era apenas sobre os filhos pequenos. A mãe do rei Lemuel e a esposa virtuosa são mencionadas igualmente como mestras (31.1,2,26,27). O pai e a mãe também eram mestres na instrução mesopotâmica.86 A educação no ambiente do méstico também é corroborada em 4.1 -9, em que a família piedosa que inclui o avô, o pai, a mãe e o filho - é representada, ainda que de modo fictício, como transmitindo a herança espiritual da família. Por fim, Fox encontra uma forte analogia às antigas instruções de sabedo ria no testamento ético judaico medieval. “Os testamentos éticos eram instruções escritas por homens em sua maturidade visando à orienta ção ética e religiosa de seus filhos e, por vezes, de suas filhas. Esses 81. W. Chomsky, “The Dawn o f Jewish Education”, in Gratz College Annual o f Jewish Studies, org. I. Passow e S. Lachs (Filadélfia: Gratz College, 1972), 3:20. 82. Weeks, Early Israelite Wisdom, pp. 132-56. 83. H. Freedman, “ K iddushin”, in The Babvlonian Talmud, org. 1. Epstein (Londres: Soncino, 1948), 4:140, n. 8. 84. M. Fox, “ Ideas o f Wisdom in Proverbs 1-9”, JBL 116 (1997) 620-21, n. 11. 85. Os livros de Reis e Crônicas citam os nomes das mães dos reis bons e maus, sugerindo que participavam de sua honra ou vergonha (veja 31.1). 86. De acordo com um provérbio acadiano, “Atente para as palavras de tua mãe como para as palavras de teu Deus” (J. J. A. van Dijk, La Sagesse Sumero-Accadienne [Leiden: Brill, 1953], p. 105). Contrastando com isso, a única referência no Egito é encontrada na instrução egípcia mais recente e Ankhsheshonq (13.20) traz um comentário mordaz acerca da instrução feminina: “Instruir uma mulher é como ter um saco de areia cujo lado está aberto” (A EL, 3:170).
textos são, na verdade, descendentes da antiga literatura sapiencial, uma vez que usam Provérbios como modelo... O pai se dirige ao seu filho (ou filhos) e, por meio dele, alcança um público leitor mais am plo .” 87 Em resumo, a intenção de Salomão era transmitir sua sabedoria aos jovens de Israel colocando seus provérbios na boca de seus pais piedosos (1.8 , 9), como Moisés disseminou a lei no lar (cp. Dt 6.7-9). Os discursos da sabedoria para o povo em geral (1.20-33; 8.1-31) são fictícios e, na verdade, dirigidos ao filho, como mostra a conclusão de seu discurso em 8.32-36. Sem dúvida, sua rival, a loucura, nunca se assentou num trono ou cadeira no ponto mais alto da cidade (9.14)! Esses discursos fictícios mostram que os ditos poderiam salvar o povo se ele desse ouvidos, mas não era esse o seu lugar de disseminação. Ao contrário de outros textos de literatura sapiencial do antigo Ori ente Próximo, Provérbios não cita o público ou classe a quem se dirige em seu título (veja p. 241). Diante disso, pode-se supor que a intenção do editor final também era democratizar o livro para toda a comunidade da aliança e que ele provavelmente anteviu que o texto continuaria a ser ensinado em lares piedosos.
VII. TE O LO G IA Depois de uma introdução, analisarei a teologia de Provérbios de acordo com as categorias da teologia sistemática, a saber, teologia pró pria (i.e., “Deus”), antropologia (i.e., “ seres humanos”), e soteriologia (i.e., “salvação”), mas expandirei a teologia própria dita numa discus são separada da bibliologia (i.e., “revelação” e “inspiração”, com a adi ção da “tradição”) e tratarei da soteriologia no item “O Sábio e Suas Recompensas” (pp. 157-158). A. INTRODUÇÃO
Antes de considerar esses conceitos clássicos, tratarei de duas ques tões introdutórias peculiares levantadas por Provérbios, a saber, um entendimento de sua relação com a teologia bíblica centrada em Israel e com a literatura pagã pan-oriental.
1. A teologia de Provérbios e a teologia bíblica Contrastando com os orientalistas que foram bem-sucedidos em mostrar semelhanças entre Provérbios e a literatura sapiencial pan-oriental antiga, os teólogos do Antigo Testamento se esforçam por integrar Provérbios ao restante da Bíblia. Hartmut Gese lamenta, “Sabe-se bem que a literatura sapiencial constitui um corpo estranho no universo do Antigo Testamento”.1Por causa de seus notáveis paralelos com a litera tura pan-oriental quanto à forma e ao conteúdo, Preuss chega a sugerir que os sábios de Israel procuraram moldar Israel à imagem de seu am biente pagão.2 No auge do movimento da teologia bíblica, Wright co menta que “em qualquer esboço da teologia bíblica é um tanto proble mático encontrar o lugar apropriado para se tratar da literatura sapiencial”.3 Isso porque, enquanto o restante da Bíblia diz respeito à irrupção do reino de Deus por meio de sua chamada e das suas alianças com Israel, a literatura sapiencial não menciona em momento algum a elei ção e as alianças de Israel que culminam na era messiânica quando ele será uma luz para todas as nações. Rylaarsdam diz: “A notável negli gência da história e religião judia pelos escritores de sabedoria canôni cos mostra claramente que o movimento sapiencial hebraico ainda nâo havia sido integrado ao movimento nacional”.4 Porém, a aparente falta de integração entre Provérbios e o restante do Antigo Testamento é mais superficial do que real. W. Kaiser os uniu corretamente em termos de seu apelo comum a suas audiências para “o temor do Senhor” (cp. Dt 6.5; Js 24.14; Pv 1.7; Is 29.13;[= “me adora”, NIV] passim).5 O S e n h o r é o nome pessoal de Deus, revelado a Israel em conexão com sua eleição e às alianças de Deus com seu povo (Gn 12.8; Êx 3.15; 6.2-8). Temê-lo significa, essencialmente, sujeitar-se à sua vontade revelada, quer através de Moisés ou de Salo mão (veja 1.7). Cada um, ao próprio modo, procura estabelecer a regra 1. H .G ese, Lehreund Wirklichkeit in der alten Weisheit (Tübingen: M ohr [Siebeck], 1958). p. 2. 2. H. D. Preuss, “ Erwãgungen zum theologischen O rtalttestam entlicher W eisheitsliteratur”, EvT 3 0 (1 9 7 0 ) 393-417. 3. G E. W right, God Who Acts (Londres: SCM , 1952), p. 115. 4. J. C. Rylaarsdam, Revelation in Jewish Wisdom Literature (Chicago: U niversity o f Chicago, 1946), p. 20. Sua pressuposição de que “o m ovim ento sapiencial hebraico” e o apelo popular dos “círculos de sabedoria" eram algum tipo de corporação sapiencial distinta em contraste com uma casta sacerdotal ou com as escolas proféticas, não recebe nenhum apoio bíblico ou histórico. 5. W alter C. K aiser Jr., Toward an Old Testament Theology (G rand Rapids: Z ondervan, 1991), p. 46.
do Deus que guarda sua aliança com Israel. Além disso, a teologia de Provérbios complementa a teologia unificada de Moisés e dos profetas. Goldingay observa que a sabedoria se concentra “mais na vida diária do que na História, mais no regular do que no raro, mais no indivíduo (porém não fora do seu relacionamento social) do que na nação, mais na experiência pessoal do que na tradição sagrada”.6 Kidner começa seu comentário, The Proverbs, dizendo: “Há detalhes de caráter bas tante triviais para escapar da malha da lei e dos ataques violentos dos profetas e, ainda assim, serem decisivos nas questões pessoais. Pro vérbios se move nessa esfera, perguntando como é viver com uma pessoa ou contratar seus serviços; como ela administra seus negócios, seu tempo e ela mesma”.7 Observei que Salomão confere a Deus os mesmos atributos e ações conferidos a ele por Moisés e os profetas. De acordo com os três, ele é o Criador do cosmos (Dt 10.14; Pv 1.7; 3.19,20) e de toda a humanidade (Dt 4.32; Pv 14.31; 29.13; Is 42.5). Ele é o mesmo Deus vivo que cas tigará a injustiça (Dt 32.35,40,41; Pv 5.21,22; Na 1.2) e o mesmo ser espiritual que consola seu povo e conhece os seus caminhos (Dt 23.14[ 15]; Pv 5.21; 15.3; Jr 16.17). Ele é o soberano que dirige a His tória (Dt 4.19; 29.4[3], 26[25]; Pv 16.1-9, 33; 19.21; 20.24; Is 45.113) e, no entanto, está presente nela, retendo e dando a chuva (Dt 11.1317; Pv 3.9, 10; Ag 1.10, 11), disciplinando seus filhos (Dt 8.5; Pv 3.11, 12; Is 1.4-6) e, em sua misericórdia, respondendo suas orações (Dt 4.29-31; Pv 15.8,29; Is 56.7). Ele é misericordioso (Dt 4.31; Pv 28.13; Is 63.7), se deleita na justiça e abomina a iniqüidade (Dt 10.17; Pv 11.1; 17.15; Is 1.16, 17), e possui sensibilidade ética e estética (Dt 22.4-11; 23.10-14[11-15]; Pv 3.32; 6.16-19; 11.20; 15.9; Jr32.35).8 2. Provérbios e a literatura de sabedoria pan-oriental A semelhança quanto à expressão e ao conteúdo teológico entre Provérbios e obras pagãs como Amenemope requer uma explicação teológica. Priest apresenta uma explicação histórica questionável para sua semelhança, a saber, que a era profética e a era da sabedoria ocor 6. J. Goldingay, “T he ‘Salvation H istory' Perspective and the ‘W isdom ' Perspective within the C ontext o f Biblical Theology”, E vQ 5\ (1979) 194-207. 7. D. Kidner, Proverbs: An Introduction and Commentary (TOTC; Leicester. Ing.: Inter-Varsity, 1964). p. 13. 8. B. K. Waltke, “The Book o f Proverbs and Old Testam ent Theology”, BSac 136 (1979)305.
reram simultaneamente e que havia “uma tradição religiosa comum no Israel antigo da qual os profetas, sacerdotes e sábios selecionaram ên fases específicas sem, necessariamente, rejeitar as ênfases escolhidas pelos outros grupos”.9 De acordo com esta opinião, o profeta e o sábio expressaram, juntos, a totalidade da fé de Israel, algo que nem um nem o outro podia fazer sozinho. Seria melhor apresentar uma argumenta ção contextual com base no próprio livro. Provérbios mistura ditos apa rentemente mundanos que podem ter se originado fora de Israel com ditos distintivamente teológicos referentes ao S e n h o r a fim de oferecer uma concepção holística e uma interpretação teológica da sabedoria peculiar a Israel. Apesar de não haver evidência alguma para uma reinterpretação dos chamados ditos seculares pelos ditos teológicos pos teriores, isto não faz nenhuma diferença na compreensão da teologia canônica do livro. Salomão testifica que adotou e adaptou ditos de ou tros sábios (22.17). Mas nesse dito ele acrescenta: “Para que a tua con fiança esteja no Senhor, quero dar-te hoje a instrução, a ti mesmo”. Em outras palavras, ele baseou as verdades e promessas dos ditos no Deus de Israel. Convém acrescentar a isto uma explicação teológica, fazendo distinção entre “o temor do S e n h o r ” e o “temor de Deus”. O primeiro se refere à revelação especial de Deus a Israel; o segundo, à revelação geral de Deus a todos os povos, especialmente por meio da consciência. “O temor de Deus”, como diz Whybray, refere-se “a um padrão de con duta moral conhecido e aceito pelos homens em geral”.10 O temor de Deus motiva as pessoas a ter um comportamento correto mesmo quan do o Estado não impõe sanções morais (cp. Gn 20.10, 11; Ex 1.17). Uma vez que o “temor do Senhor” que orienta Provérbios em questões de moralidade comum concorda com o “temor de Deus” que orienta Amenemope, é de esperar conteúdos semelhantes neles (cp. Dt 4.6; 2Co 4.2). A diferença entre os conjuntos de textos egípcio e bíblico é que o Deus de Provérbios é chamado pelo nome e, portanto, conheci do; o mesmo não ocorre em Amenemope. A semelhança de Provérbios com a literatura pagã é parte e porção da encarnação das Escrituras dentro de seu ambiente histórico. Sua re levância teológica não depende da originalidade de suas sentenças ou ditos individuais, mais que a relevância teológica do assim chamado 9. J. F. Priest, “W here Is W isdom to Be Placed?" in SAIW, p. 281. 10. R. N. W hybray, Wisdom in Proverbs: The Concept o f Wisdom in Proverbs 1-9 (Londres: SCM , 1965), p. 96.
Livro da Aliança (Êx 21-23) se baseia na originalidade de seus manda mentos individuais. Pode-se encontrar paralelos de seus mandamentos ponto por ponto em leis babilônias, assírias e hititas, e refletem clara mente um corpo comum de tradição legal do antigo Oriente Próximo. O mesmo vale para os hinos de Israel; eles são caracterizados por uma hinologia comum ao antigo Oriente Próximo. A relevância teológica do Antigo Testamento repousa, antes, na ligação de toda a sua literatura com o S e n h o r , o Deus de Israel. A relevância teológica de Provérbios se encontra em sua afirmação de que o Senhor fez a “sabedoria” existir, revelou-a à humanidade e, como fiador, sustenta sua ordem moral reve lada. Hubbard escreve: “Apesar de também poder ser religiosa, a sabe doria pagã não tem nenhuma âncora no Deus da aliança”.11 O orientalista Henri Frankfort observa essa carência nos textos egípcios: “Mas não é impressionante que nenhum dos deuses são mencionados pelo nome em qualquer dos ‘ensinos’? Quando os egípcios apelam para ‘Deus’,... eles concedem ao interesse divino no comportamento do ho mem um caráter distintamente impessoal”.12 Keimer coloca a questão da seguinte forma: “Tem-se a impressão que para Amenemope há so mente um Deus; fica aberto para o indivíduo, porém, representar esse ser superior como lhe parecer melhor”.13 Bostrõm diz que “o motivo para o uso do termo genérico para divindade que é tão comum nos textos sapienciais é... que a especificação é deixada intencionalmente em aberto para o leitor e para a situação. Essas designações genéricas de Deus funcionam de maneira paralela aos espaços em branco num texto litúrgico, que devem ser preenchidos com a expressão apropriada pelo suplicante”.14 Como veremos, Moisés, os profetas e os sábios foram verdadeiros companheiros espirituais de jugo, compartilhando o mesmo S e n h o r , cul 11. D. A. H ubbard, “ W isdom ” , in NDB (G rand Rapids: E crdm ans, 1962), p. 1.256. 12. H. Frankfort, Ancient Egyptian Religion: An Interpretation (Nova York: H arper & Row, 1961), p. 76. Enquanto a m aioria dos estudiosos acredita que Amenemope tem em vista um “urg o tt” , tan to F ra n k fo rt q u an to H. B ru n n er (“ D er freic W illc G o ttes in d er ãg y p tisc h en W eisheit”, in Sagesses du Proche-Orient ancien [CESS; Paris: Presses U niversitaires France, 1963], pp. 103-20) supõem que o term o egípcio netjer (“deus” ) designa um deus pessoal dc um indivíduo, o seu deus. Joseph Vergote (“ La notion de Dieu dans les Livres de sagesse égyptiens", in Sagesses du Proche-Orient ancien, pp. 159-90) acredita que é possível fazer uma distinção entre a m enção de um “deus específico” e o deus “ único" anônim o. 13. L. Keimer, “The Wisdom o f Am en-em-ope and the Proverbs o f Solomon”, AJSL 43 (1927-28) II.
14. L. Bõstrom. G odof the Sages (ConBOT; Estocolmo: A lm qvist& Wiksells, 1990), pp. 44-45.
to, fé, esperança, antropologia e epistemologia, falando com a mesma autoridade, e apresentando exigências religiosas e éticas semelhantes aos seus ouvintes. Em resumo, beberam da mesma fonte espiritual. B. DEUS
1. Nomes de Deus De acordo com Bostrõm o livro se refere a Deus pelo nome em 94 versículos e por pronomes em 11 versículos nos capítulos 1-9, bem como por outros epítetos em 23.11; 24.12 e, possivelmente, 21.12, num total de 100 versículos dentre 915, ou seja, mais de 10% dos seus ver sículos.15 A maioria deles se encontra na Coleção II (10.1-22.16). O livro se refere a Deus quase que exclusivamente pelo nome “O Se n h o r ” (Yahweh), que ocorre 87 vezes.16 Em outras partes do Antigo Testamento este nome atua na alta revelação de Deus a Israel e em seu ato de firmar uma aliança com seu povo, e presumivelmente o rei e os sábios de Israel o usaram neste sentido em Provérbios. Apesar da literatura de sabedoria não mencionar a história de Israel, esta não é independente daquela. Zimmerli argumenta, com base no nome divino, que Israel entrou no mundo da criação e subordinou as esferas que encontrou dentro dele a Yahweh.17 Seu outro nome, “ Deus” ('elõhim, sua forma plural indica sua ma jestade), ocorre apenas cinco vezes - três vezes como um nome divino para o Deus de Israel (2.5; 3.4; 25.2) e duas vezes como o Deus pessoal de alguém (3.4; 30.9) - e em uma ocasião em sua forma singular (30.5). No Antigo Testamento, esse nome genérico serve para representar o poder, força e transcendência celestial de Deus sobre todas as pesso as; é usado com frequência para contrastar a sua existência com a existência humana (e.g., Nm 23.19). Os sábios se apresentam como oradores a favor deste Deus. 2. Deus como Criador O tema da criação é mencionado em dois poemas no prólogo (3.19, 20; 8.22-31), cinco vezes nos provérbios de Salomão I (14.31; 16.11; 15. Bõstrom, God o f lhe Sages, pp. 33-34. 16. E. Jcnni, TLOT, 2:523, s.v. YHWH. 17. W. Zim m erli e O. M crk, “B iblische T heologie 1 (AT)", in Theologische Realenzyklopadie , 6 :4 2 6 -5 5 .
17.5; 20.12; 22.2), uma vez em Salomão II (29.13), e uma vez no poe ma autobiográfico de Agur (30.2-4), num total de dez vezes. Os poe mas tratam da criação do mundo e os provérbios, da criação dos seres humanos. Essas referências à criação são totalmente consisten tes com os ensinos acerca da criação em outras passagens da Bíblia. Por vezes os poemas, como outros do Antigo Testamento, retratam a criação pelo uso de imagens e expressões extraídas de mitos pagãos sem tomar emprestada sua teologia (cp. 3.20; 8.29; 30.4). Todos esses textos se referem ao S e n h o r como o Criador - ne nhum deles fala da criação independente de sua atividade, e todos to mam por certo que ele é o único e soberano Criador. Sem essa fé, os argumentos dos sábios baseados na criação perdem grande parte da sua irrefutabilidade. Salomão e Agur usam a doutrina da criação como premissa para ensinar a sabedoria, e não visando primeiramente cele brar o caráter sublime de Deus como faz Davi em seus hinos. Neste sentido, são mais parecidos com os narradores hebreus que usaram a criação para explicar a história de Israel.18 O primeiro desses poemas, 3.19,20, faz parte da quarta palestra do pai (3.13-35) e aponta para a criação do mundo como firmemente esta belecida (3.19) como estando tanto protegida das profundezas caóticas abaixo (3.20a) quanto revigorada pela água vivificadora das nuvens acima (3.20b). O enfoque teológico da passagem, porém, não é Deus como o Criador (3.19) e Sustentador do mundo (3.20), o que é pressu posto; antes, a ênfase é sobre o fato de ele haver efetuado uma criação duradoura por meio da sabedoria. Agora, Salomão oferece a seu filho esta mesma sabedoria divina para produzir uma vida que dure para sempre, uma vida firmemente estabelecida e sustentada por tal sabedo ria divina. O segundo poema, 8.22-31, também apresenta a sabedoria associada ao S e n h o r como Criador e Sustentador do mundo; desta vez, porém, em vez de ser o instrumento que realizou essa criação, a sabedo ria é personificada como companheira do S e n h o r ao longo de todo o seu processo criador. Esse poema acerca da criação visa mostrar a autoridade da sabedoria que Salomão recebeu de Deus, nâo sua efeti vidade permanente (veja p. 512s.). Os provérbios acerca do S e n h o r como o Criador dos seres huma nos apresentam o S e n h o r como sendo transcendente e também imanen18. Waltke com C. Fredricks, Genesis (Grand Rapids: Z ondervan, 2001), p. 55.
te, como Soberano no céu e também presente na terra para experimen tar a miséria humana. Mas o objetivo desses provérbios é ensinar sabe doria ao filho. O S e n h o r criou ouvidos para ouvir e olhos para ver, a fim de que, dentre outras coisas, ele ouça e estude a sabedoria ( 2 0 .1 2 ) . Os outros provérbios cumprem uma função ética e social, uma preocupa ção central da literatura sapiencial. Eles representam o S e n h o r como soberano no céu e/ou como presente na terra, de modo a que ele é capaz de fazer justiça. Como soberano no céu, o S e n h o r fez a balança que o rei emprega para administrar pesos e medidas justos (16.11), e sob a soberania de Deus e a administração do rei, nenhum trapaceiro escapa ao julgamento ( 1 6 .4 , 1 4 ). Além disso, o Soberano criou todos, tanto ricos como pobres, investindo ambos de dignidade e responsabilidades, especialmente a responsabilidade de dar dignidade aos pobres ( 22 .2 ; 2 9 .1 3 ) . Quem escarnece deles insulta o S e n h o r , pois foi ele quem os criou ( 1 7 .5 ). Estando presente na terra, o S e n h o r experimenta a miséria dos oprimidos e castigará o opressor tão certamente quanto honrará aqueles que se compadecem deles ( 1 4 .3 1 ). Em resumo, “a Criação fun ciona como a base filosófica para a ética social” .19 3 . A tr a n s c e n d ê n c i a e a im a n ê n c ia d o S e n h o r
Salomão pressupunha o conhecimento do S e n h o r como conhecido por meio de Moisés, e o autor final de Provérbios pressupõe o conheci mento do S e n h o r como conhecido também por meio dos profetas. L. Bostrõm observa que a transcendência e a imanência de Deus são preeminentes em Provérbios.20 a. A transcendência do Senhor A atividade de Deus como Criador impõe em sua essência como ser transcendente. Como Criador, ele está antes e além de tudo o que ele fez. Sua transcendência significa que ele não está preso nem em sua natureza nem no seu escopo de atividade por qualquer limitação espacial e/ou temporal. Nada no céu ou na terra está oculto de sua visão ( 5 .2 1 ; 1 5 .3 ; 2 2 .1 2 ; 2 4 .1 2 ) . Nem mesmo as profundezas misteriosas da sepul tura e do Abadom abaixo da terra escapam à sua visão vigilante, quanto 19. Bostrõm, God o f the Sages, p. 60. 20. Uma leitura atenta de Bostrõm, G odof lhe Sages, mostrará quanto devo pelo conteúdo desta seção no que se refere à teologia propriamente dita.
mais os corações dos seres humanos estão abertos diante dele (15.11). Porém, ele não é um espectador passivo, mas trará julgamento até mesmo sobre aqueles que testemunham a injustiça passivamente (17.15; 21.3; 22.22,23; 23.10,11; 29.26[25]). Este conceito da transcendência de Deus, de que nada está além do alcance da sua onicompetência, orienta as Escrituras Sagradas como um todo (e.g., Gênesis 1). Também é propriedade comum das religiões do antigo Oriente Próximo. Na literatura sapiencial egípcia também há uma grande disparidade entre Deus e os seres humanos. Amenemope (19 . 12 - 17,2 0 , 2 1; 2 0 . 5 , 6), por exemplo, diz: “Deus está sempre em sua perfeição, o homem está sempre em sua deficiência. As palavras que os homens dizem são uma coisa, as palavras boas do deus são outra... O injusto está nas mãos de deus; ele sela o destino do perverso... Se a língua de um homem é o leme do barco, o Senhor de Tudo é todavia seu piloto” .21 A Instrução Dirigida ao Rei Merikare (linhas 4 9 - 5 0 , 12 3 - 2 5 ) diz: “Ninguém pode se opor ao senhor da terra; ele alcança tudo que seus olhos podem ver. E o deus que julga o justo; seu destino vem e o leva embora” .22 O apóstolo faz referência a esse conhecimento da graça comum em Romanos 1.19-21. A transcendência de Deus como Criador e Sustentador do mundo garante sua supremacia soberana, sua liberdade de decretar sua vonta de. O acaso não governa, mas o S e n h o r governa sobre o acaso, como simbolizado por seu governo sobre o ato de lançar sortes (16.33). Não há outros deuses para competir com ele (Dt 32.39), e os mortais terre nos não podem frustrar sua vontade e seus propósitos. Os perversos, que rejeitam e/ou desprezam seu governo são, evidentemente, insensa tos. Provérbios promete aos fiéis vida, saúde, riqueza e honra, mesmo apesar de seus inimigos (cp. 3.1-10; 16.7), mas, em última análise, so mente o Deus vivo, transcendente e onicompetente pode cumprir essas promessas em um mundo onde os perversos tentam se opor à vida e à prosperidade dos justos. Todas as bênçãos, quaisquer que sejam seus mediadores, vêm do Senhor (10.6). Provérbios não explica de que ma neira nem quando as bênçãos coroarão a cabeça do justo, diz apenas que o farão. Em Provérbios, a soberania de Deus se estende sobre to dos, até mesmo sobre o adúltero, da mesma maneira como se estendeu 21. AEL, 2:157-58.
sobre o idólatra em Deuteronômio (Dt 4.19; 29.26). Por um lado, o adúltero cai na cova profunda da “boca” da adúltera, pois o Soberano irado ali o lança, mesmo que ele não se dê conta disso (22.14). Por outro lado, o coração (ou os motivos) do rei, que é insondável para seus súdi tos, é “Como ribeiro de águas... na mão do Senhor; este, segundo o seu querer o inclina” (21.1). A soberania de Deus também é declarada na instrução egípcia e Ptah-hotep também amplia a soberania de Deus, a ponto de esta determinar a direção do coração humano. De acordo com a instrução egípcia (linhas 448-49): “aquele que ouve é amado do deus; aquele a quem o deus odeia não ouve” .23 Provérbios, porém, nunca faz essa ligação entre a liberdade de Deus e a liberdade do filho de ouvir ou de se fingir de surdo para com seu pai. O pai apenas roga ao filho: “para fazeres atento à sabedoria o teu ouvido e para inclinares o coração ao entendimento” (2.2). Lambert observa que também nas religiões mesopotâmicas antigas “todos os aspectos da sociedade humana eram decre tados pelos deuses” .24 A transcendência e soberania de Deus também envolvem sua inescrutabilidade. Se o coração ou os motivos do rei são insondáveis em sua esfera terrena, quanto mais os caminhos do Soberano são inescrutáveis. O rei procura saber dos negócios do Estado (25.2b), mas ninguém, nem mesmo o rei, compreende a vasta extensão e complexidade dos atos do Soberano celestial (25.3a). Tanto o rei quanto Deus obtêm glória por sua incompreensibilidade (25.2), mas o S e n h o r celestial muito mais, pois seus caminhos são ocultos até mesmo do rei. Uma vez que o S e n h o r inescrutável dirige os passos de uma pessoa, como pode, então, um mortal como o adúltero, já mencionado, compreender os seus cami nhos (20.24)? Visto que os seres humanos se mostram confusos acerca dos próprios motivos (16.2), o melhor que podem fazer é deixar que o S e n h o r onicompetente, que conhece seus motivos, estabeleça suas obras (16.2-3). Esses ditos acerca da incompreensibilidade de Deus qualificam os ditos acerca de sua justiça. Ele retribui o mal e recompensa o bem a seu tempo e a seu modo. A instrução egípcia também reconhece a inescrutabilidade de Deus: “De fato, não sabeis os planos de deus e não deveis chorar pelo amanhã” (Amen. 22:5-6).25 23. AEL, 1:74. Lichtheim (AEL, p. 80, n. 68) comenta: “Mais uma vez é soada a nota do determi nismo". 24. W. G Lambert, “ Destiny and Divine Intervention in Babylon and Israel”, OTS 17(1972) 67. 25. AEL, 2:159.
Os ditos acerca da soberania do S e n h o r sobre os seres humanos são complementados pelos ditos segundo os quais ele é pessoal e está próximo das pessoas, especialmente dos desamparados e dos justos .26 Em Moisés e nos profetas, as verdades sobre a proximidade de Deus também são estendidas à nação de Israel. Jacobsen observa: “Tanto quanto podemos observar, é somente Israel que estendeu de maneira decisiva a atitude de religião pessoal da esfera pessoal para a nacional” .27 O S e n h o r é o defensor dos fracos e indefesos. Além dos ditos sobre o S e n h o r como o criador do pobre, o que sugere que ele os protege (22.2; 29.13), outros ditos afirmam essa verdade explicitamente (14.31; 15.25; 17.5; 22.2,22,23; 23.10, 11; 29.13). Por um lado, “Quem se compadece do pobre ao S e n h o r empresta”, de modo que o S e n h o r o recompensará por seus atos (19.17). Por outro lado, “Abominável é ao S e n h o r todo arrogante de coração; é evidente que não ficará impune” (16.5). Ele res ponsabilizará até mesmo aqueles que não estão diretamente envolvidos por não livrarem os desamparados e oprimidos (24.11, 12). O S e n h o r será tanto o promotor quanto o juiz a favor dos injustiçados (23.11). No Egito, era dever dos reis e do povo ajudar os pobres em todo o tempo. No Reino Antigo, o motivo dado para isso é que os próprios ricos podem, um dia, se verem pobres, mas em textos da décima nona e vigésima dinasti as, pouco antes da época de Salomão, “o homem pobre era exaltado como um exemplo de humildade”. “Os pobres são mencionados com tanta frequência”, diz Bostrõm, citando Brunner, “e descritos em termos tão positivos... que a religião dessa época foi chamada de ‘a religião do pobre’” .28 Fensham observa que há diversas referências à proteção dos pobres por Shamash na literatura sapiencial babilônica, mas a viúva, o órfao e o estrangeiro nunca são mencionados explicitamente.29 26. Em outras religiões os deuses superiores tendem a estar distantes, pelo menos no início, dei oliosi que se retiraram de um envolv imento ativo no mundo, contrastando com os deuses pessoais com os quais o indivíduo se relaciona intimamente. Essa evolução é paralela à mudança ocorrida no Egito, de uma ênfase no ma' at impessoal nos tempos mais remotos para o livre-arbítrio do deus no Reino Novo (cp. Bostrõm, God o f the Sages, pp. 194-95). 27. T. Jacobsen, The Treasures o f Darkness: A History o f Mesopotamian Religion (New Haven, Conn.: Yale University, 1976), p. 164. 28. Bostrõm, The God o f the Sages, p. 206, citando H. Brunner. “ Die religioso Wertung der Armut in Alten Ãgypten”. Saeculum 12 (1961) 319-44. 29. F. C. Fensham, “Widow, Orphan, and lhe Poor in Ancient Near Eastem Legal and Wisdom Literature”, JNES 2 1 (1961) 129-39.
Como foi observado, o S e n h o r imanente prova todo coração, mas somente os justos, termo usado aqui de modo geral para outras pala vras que significam piedade (ou confiança no S e n h o r ) e os que têm caráter e comportamento ético, encontram sua aceitação e favor (heb. rãsôn; 8.35; 10.32; 11.1,20; 12.2,22; 15.8; 18.22) e, portanto, vida, saúde e prosperidade (3.1-10; 16.20; 19.17; 28.25). Uma vez que são seus amigos, são tratados como seus confidentes (3.32). Como tais descobrem que ele é seu escudo e defensor (14.26; 18.10; 30.5); de modo que podem correr sem medo de tropeçar (3.23-26) e evitar as armadilhas mortais (14.27). Essa pessoa é bem-aventurada (16.20). Entretanto, o S e n h o r causa a destruição dos escamecedores e perversos (3.33, 34; 10.3, 27, 29). Ele próprio é chamado de Justo em 21.12, mas esse atributo, como tal, não lhe é imputado explicitamente em outras ocasiões, mas pressuposto. Em sua natureza, Deus é visto como infinito e transcendente, en quanto a humanidade é limitada e restrita à terra. Em seu escopo de atividade, as capacidades e habilidades de Deus não são restringidas por qualquer limitação, mas as do homem são incompletas e restringi das por seu entendimento e poder limitados. 4. Retribuição Esses traços da transcendência e da imanência de Deus não são celebrados em louvor como em Salmos, mas considerados quanto à sua relevância para ser sábio. A fé na soberania de Deus e na retribuição divina torna o indivíduo sábio. Nas palavras de Bostrõm: “Somente a um Deus transcendente pode ser confiada ‘a impossível tarefa’ de dis pensar justiça a cada indivíduo e situação !” 30 Todos concordam que Provérbios apresenta uma “ordem mundial” que envolve “ato e destino”, ou seja, “Aquilo que você faz agora determi na o que acontecerá com você depois”. Uma formulação mais precisa é a conexão caráter > conduta > conseqüência - ou seja, aquilo que você é determina aquilo que você se tomará. O que está em questão aqui é a relação do S e n h o r com essa ligação. K. Koch e outros removem completamente Deus do envolvimento com o mundo ou, na melhor das hipóteses, o reduzem a uma causa primeira dentro de um conceito deísta da realidade (um assim chamado synthetische Lebensauffassung ).31 30. Bostrõm, God o f lhe Sages, p. 145. 31. K. Koch, "Gibt es ein Vergeltungsdogma im Alten Testament?” ZTK 52 (1955) 1-42.
De acordo com Murphy, muitos estudiosos defendem a tese de que a sabedoria bíblica é proveniente do esforço para descobrir a ordem de que ela parece ser um dos “resultados garantidos”, mas ele próprio tem seus receios acerca dessa abordagem à sabedoria israelita .32 Huwiler se queixa da ideia da noção de uma ordem determinada pelo destino: “Em sua forma extrema, a síndrome de ato-consequência remove a divindade de sua atividade no mundo. De acordo com esta opinião, a conseqüência segue o ato por si mesma e Yahweh, cujo poder é limita do ,33 encontra-se envolvido diretamente apenas como uma parteira ou um catalisador químico, ainda que tenha um envolvimento indireto como criador, que desencadeou a síndrome de ato-consequência” .34 Muitos ditos afirmam a ligação ato-destino, mas não pressupõem a inatividade divina. L. Bõstrom argumenta que a tradição sapiencial de Israel não pode ser descrita apropriadamente como deísta ou secular.35 A discussão da opinião de Koch levou à conclusão de que a ligação inexorável ato-destino refletia um conceito de realidade primitiva mági co antigo .36 Esta opinião se vale tanto dos princípios egípcios de m a 'at, que supostamente representa essa ordem rígida à qual até mesmo os deuses estão sujeitos, quanto dos muitos ditos que mencionam essa or dem sem qualquer referência ao envolvimento do Senhor (e.g., 1.19; 10.2, 4; 11.5, 6 ). De fato, 22.8 chega a usar a metáfora agrícola que Koch emprega para a sua argumentação: “O que semear a injustiça segará males”. Além disso, palavras como 'ãwen trazem combinados em si as noções de fazer o mal e colher o mal, e o sábio com frequência faz jogos de palavras com os dois significados de “mal”, rã', “mal mo ral” e “calamidade” (veja 1.16). Antes de tratar de Provérbios, porém, devemos observar que, nos últimos tempos, alguns egiptólogos modificaram consideravelmente essa opinião simplista sobre a religião egípcia. De acordo com eles, o princí 32. R. E. Murphy. "Wisdom — Thescs and Hypotheses”, in Israelile Wisdom: Theologi cal and Lilerarv Essays in Honor o f Samuel Terrien, org. J. G Gammie et al. (Missoula: Scholars. 1978), pp. 35-42. 33. E. Wilrthwein (‘‘Egyptian Wisdom and the Old Testament”, in SAIU', p. 122) afirma que, na literatura sapiencial, ‘‘o poder de Deus se lim ita a cuidar para que [a ordem] mantenha a sua validade através dos meios apropriados de retribuição. Assim, Yahweh se toma um Deus previsível, que é ‘inteiramente distinto’ do Deus da aliança” . 34. E. F. Huwiler, ‘‘Comrol o f Reality in lsraelite Wisdom” (Diss. Ph.D., Duke University, 1988), p. 64. 35. L. Bostrõm. The God o f lhe Sages. 36. H. G Reventlow, “Sein Blut kom meübersein Kaupt”, VT 10 (1960) 311-27.
pio de ma'at na religião egípcia se desenvolveu antes do tempo de Salomão em direção a uma ênfase na piedade e livre-arbítrio humanos e no poder do deus .37 É importante notar que essa ênfase se encontra especialmente evidente em Amenemope, o paralelo na instrução egíp cia mais próximo de Provérbios. Muitos ditos representam a ligação caráter-consequência sem apelar para o envolvimento do S e n h o r , mas Provérbios procura se proteger de várias maneiras da interpretação da conexão ato-destino como sendo fatalista. Em primeiro lugar, a discussão acerca da estrutura observou como os ditos combinam esses assim chamados “ditos sobre a ordem mundial” com os ditos sobre Yahweh. Como mencionado, Goldingay mostrou que a seqüência de observações sobre a justiça e a perversidade (10.2) é seguida de uma observação sobre o envolvimento do S e n h o r na vida das pessoas (10.3) e encontrou a mesma seqüência de 10.2-5 nova mente em 10.23-27; 12.1-14; 14.1-4 e 15.2-7.38A falta de compreensão dos paroimiologistas, da relevância da capacidade restrita dos epigramas de expressar toda a verdade e da retificação desse problema pelo agru pamento dos ditos, toma a discussão confusa (veja pp. 79-80). Na discussão sobre a estrutura também foi observado que a Cole ção I funciona como uma chave hermenêutica para o restante do livro. A chave para o livro e para a sabedoria, conforme apresentada em seu preâmbulo, é “o temor do S e n h o r ” , uma expressão que será explorada mais detalhadamente em relação à antropologia (veja pp. 153-154). Basta observar aqui que a “piedade para com Deus”, um estilo de vida religioso, não uma compreensão racional de uma ordem impessoal, é o que molda o caráter e o destino daquele que é verdadeiramente sábio. No prólogo do livro, a primeira palestra do pai coloca a responsabilida de pela morte final e certa sobre o pecador (1.19), e a isto a mulher sabedoria acrescenta que isso se deu porque os pecadores se recusa ram a temer ao Senhor (1.29). De acordo com o pai em sua segunda palestra, a proteção contra os pecadores depende da aceitação dos ensinos envolvidos no temor do Senhor (2.1 -5). A terceira palestra apre senta o Senhor e os fiéis como tendo, cada um, obrigações pactuais (3.1-10), concluindo com a verdade de que o próprio S f.n h o r assume o papel do pai na disciplina dos seus filhos. O quarto sermão termina 37. Brunner, "Der freie Wille”, pp. 103-20. 38. Goldingay, “The Arrangement ofSayings in Proverbs l-l5",7.Ç O r61 (1994) 75-83.
mostrando a ligação entre a retribuição do S e n h o r e o comportamento social humano (3.27-35). A primeira palestra completa contra a esposa infiel garante que a morte do adúltero se deve à onivisão do S e n h o r (5.21-23). Alguns provérbios das Coleções II e III afirmam claramente o en volvimento do S e n h o r . A primeira parelha de versos do primeiro con junto (10.2-5) baseia o suprimento das necessidades do justo e a priva ção sofrida pelos perversos (10.2) na atividade do S e n h o r (10.3); ou tros também falam explicitamente do seu papel ativo na retribuição ( 12 .2 ; 15.5; 16.7; 19.17; 25.21,22; 28.25; 29.25,26). Alguns provérbios falam da sensibilidade moral do S e n h o r - por exemplo, é o caso daqueles que apresentam a “formulação sobre a abominação” (11.1; 12.22; 15.8,26; 16.5; 17.15; 20.10,23), sugerindo que ele vomitará os abomináveis do reino da vida, ainda que só 16.5 declare explicitamente que eles serão castigados. De acordo com 21.30, nenhuma sabedoria ou entendimento ou conselho humano pode resistir ao S e n h o r nem a uma ordem impes soal. Além disso, a fim de que o sábio não pense que tudo depende de seu caráter e conduta, o conjunto introdutório da Coleção IIB assevera a soberania do S e n h o r , uma soberania que transcende a atividade hu mana (16.1-9). De acordo com seu prólogo, os Trinta Ditos do Sábio têm como seu objetivo firmar o filho na confiança no S e n h o r (22.19). Os ditos mais longos nessa coleção confirmam a doutrina da retribuição. É importan te observar que o primeiro e o último ditos, que estruturam o decálogo de ditos que proíbem a injustiça, ameaçam com a retribuição do S e n h o r (22.22, 23; 23.10, 11). A pergunta retórica enfática “E não pagará ele ao homem segundo as suas obras?” fornece uma formulação clássica da doutrina da retribuição. O livro de Provérbios conclui com um convite para um cântico de louvor pela mulher que personifica a sabedoria por meio do seu temor do S e n h o r ( 3 1 . 3 0 ) . E possível concluir, agora, que em se tratando do livro de Provérbios, é mais apropriado falar da retribuição divina pessoal do que de uma ordem mundial impessoal. Os sábios acreditavam e ensinavam uma or dem mundial harmoniosa criada e mantida pelo S e n h o r , mas não uma ordem impessoal. Nessa ordem mundial a justiça será finalmente distri buída, mas eles atribuem essa justiça ao S e n h o r sem especificar o tempo
ou o modo. Em algumas ocasiões, esses textos parecem tomar por certo que as redes de segurança social e legal da sociedade falharam no que diz respeito ao bem-estar dos oprimidos. Afirmam apenas que, apesar da intervenção humana a favor dos desamparados poder falhar, o S e n h o r não falhará, sem especificar o método ou processo de retri buição divina (23.10, 11). Além disso, não afirmam que a retribuição divina funciona como um relógio. Declarações como 11.5,6 precisam ser qualificadas por outros provérbios, não por alegações de que são excessivamente otimistas e/ou que exageram a verdade.39 Vários pro vérbios servem de contraponto, matizando seu ímpeto radical ao afir mar ou sugerir que a doutrina da retribuição divina também envolve a inescrutabilidade de Deus. Para algumas pessoas e em algumas oca siões, a ordem divina da retribuição parece subvertida. E possível que os justos vivam hoje em um mundo transtornado e turbulento. Tratarei adiante desse problema da teodiceia e das recompensas de vida, saúde e prosperidade de Deus. C. REVELAÇÃO, INSPIRAÇÃO E TRADIÇÃO
O distanciamento e a proximidade de Deus também orientam sua revelação da sabedoria. À parte de sua revelação dos Dez Mandamen tos ao falar diretamente ao povo, Deus falava por meio de intermediá rios. Deu a lei nas teofanias a Moisés, sua interpretação dessa lei em visões e manifestações audíveis para os profetas e sua sabedoria para suplementá-la por meio da observação perspicaz, das reflexões conclu dentes e da fé dos sábios. Esta seção trata dessa última ao definir a sabedoria, argumentar a favor de revelação e sua inspiração, identifi car a mulher sabedoria e discutir o papel da tradição na formação e transmissão da sabedoria. 1. Definições de “sabedoria” e de “conhecimento” “Sabedoria” (heb. hokmâ) significa, de um modo geral, “entendi mento de mestre”, “habilidade”, “perícia” .40 Em textos bíblicos fora de Provérbios, hokmâ é usado para habilidades técnicas e artísticas (Ex 28.3; 31.6), para as artes da magia (Êx 7.11; Is 3.3), para o governo (Ec 39. Pace Bostrõm, G odof the Sages, pp. 120, 122. 40. M. Saeba, TLOT, 2:420-22, s.v. hkm\ M. Fox. Proverbs 1-9 (AB; Nova York: Doublcday, 2000), pp. 32-34.
4.13; Jr 50.35), para a diplomacia (lR s 5.7[21]), e para a guerra (Is 10.3). Algumas pessoas têm a sabedoria (ou habilidade) para julgar (lR s 3.28; Is 11.1-6) ou para separar os culpados da comunidade e, desse modo, governar uma nação (Pv 20.26); a sabedoria também con fere aos governantes a habilidade de controlar as pessoas e situações (2Sm 14.2; Jó 39.15, 17). O próprio Salomão governou por meio do seu conhecimento enciclopédico ( lRs 4.29-34 [5.9-14]) e de sua capacida de de responder a questões difíceis (1 Rs 10.2, 3).41 A posse de sabedo ria capacita os seres humanos para enfrentar a vida42 e para realizar aquilo que, de outro modo, seria impossível. Por meio da sabedoria, criaturas fracas e vulneráveis como a formiga e o arganaz enfrentam adversidades insuperáveis e sobrevivem (Pv 30.24-28). A sabedoria é inseparável do conhecimento (dã 'a t). Os irmãos Wright fizeram o primeiro voo de avião [sic] porque antes disso haviam entendido as leis da aerodinâmica; um mecânico é capaz de consertar um carro com habilidade porque conhece a estrutura do seu motor. Em Provérbios, hokmâ denota, na maioria dos casos, domínio da experiên cia por meio do estado intelectual, emocional e espiritual de conhecer existencialmente a ligação ato-destino - isto é, agir com base no conhe cimento moral e espiritual em decorrência de sua intemalização ( 1 .2 ; 2.1-5), capacitando, desse modo, aquele que possui esse conhecimento a lidar com o inexplicável e com as adversidades, derribar fortalezas e, desse modo, promover a vida de um indivíduo e/ou comunidade (2 1 .22 ; cp. 24.5; Ec 7.19; 9.13-16).43 Uma pessoa poderia memorizar o livro de Provérbios e, ainda assim, não ter sabedoria, se ele não afetasse seu coração, orientando seu comportamento. Em Provérbios, hokmâ não se refere à concepção grega de sabedoria como teoria filosófica ou sofisma retórico (cp. ICo 1.18-24). 41. A. Alt (“Die Weisheit Salomos", TLZ 76 ( 19 5 1), cols. 139-44; ET, SAIW, pp. 102-12) compa rou os discursos de Salomão sobre plantas e animais (1 Rs 4.33 [5.13]) com a onomástica do antigo Oriente Próximo (i.e., a designação serial de coisas) como o Onomasticon de Amenemope (ca. 1100 a.C.; cp. Ramesseum Onomasticon, ca. 1797-1633 a.C.), que trata de plantas e animais. Ele sugeriu que essas onomásticas procuravam entender e ordenar tudo o que existe. No entanto, M. Fox (“Egyp tian Onomastica and Biblical Wisdom”, VT3b (1986] 302-10) argumenta que Alt não foi capaz de provar sua tese, e S. Weeks (Early Israelile Wisdom [Oxford: Clarendon. 1994], pp. 111-13) con corda com Fox. 42. E. W. Heaton, The Hebrew Kingdoms (Oxford: Oxford University, 1986), p. 165. 43. No Pentateuco não são as leis em si que personificam a sabedoria, mas o ato de segui-las e obedecê-las (veja P. Miller, Deuteronomy [Louisville: John Knox, 1990], p. 56).
Na declaração sumária do propósito do livro, a sabedoria (1.2) re quer todas as outras virtudes relacionadas em seu preâmbulo: “conhe cimento” (dã'at); “discernimento” (bina), “prudência” (h a sk il ), “astú cia” Çorm â), “discrição” (m ez im m â ), “aprendizagem” (leqah) e “ori entação” (tahbulôt). A estas, 1.25 acrescenta “conselho” Çêsâ ); 2.1-4, “entendimento” ou “competência” (t?bünâ) e “desenvoltura” (tâ siy â ); 8.14, “força heróica” (gfbúrâ). Essas virtudes vêm atreladas à sabedo ria (8.12-14). Von Rad se referiu à tendência bíblica de amontoar ter mos para sabedoria como uma maneira de pensar “estereométrica” para alcançar “a extensão desejada do âmbito conceituai” .44 Essas virtudes equipam o indivíduo para governar e lhe dão a gravitas ( ou dignidade) associada à riqueza (8.15-21). Além disso, como o preâmbulo deixa claro, essas capacidades são exercidas nos campos da retidão (sedeq), justiça (m isp â f ) e equidade (m êsãrim ), conferindo à sabedoria uma dimensão moral ( 1 .3; 8 .20).45 Em Provérbios, h o km â também tem uma dimensão religiosa, pois sua sabedoria inclui o conhecimento do Santo em si (veja 9.10; 30.3). Em resumo, esse livro transforma a palavra neutra “sabedoria” e seus ter mos correferenciais em virtude. Tal sabedoria ética-espiritual é um dom divino (2.6; cp. Êx 31.3; 35.31; lRs 3.4-14; Is 11.2) obtido por todo aquele queaestim a acima de todas as coisas (Pv 3.13-18; 8.11, 12) e toma a decisão sincera de aceitá-la em humildade (2.1-4; 3.5-8). Não pode ser comprada com dinheiro (17.16) nem adquirida simplesmente pela observação perspi caz e reflexão concludente acerca da ordem criada, como Agur deixa claro (30.1-6; cp. Ec 8.17; Is 19.11, 12).46 Por vezes, a verdade contra diz aquilo que os seres humanos depravados consideram correto (Pv 14.12; cp. Jz 17.6; 21.25; Is 8.11-15). 2. Revelação Na graça comum. Deus dota a todo lavrador com a sabedoria para cultivar a terra (Is 28.23-29). Segundo sua vontade soberana, ele distri bui habilidades técnicas e artísticas aos indivíduos. O conteúdo dessa 44. G von Rad, Wisdom in Israel (Londres: SCM, 1972), p. 13. 45. Fora de Provérbios, os termos sapienciais podem ser usados com referencia a religiões pagâs c a práticas ímpias e antiéticas (cp. Gn 4 1.8; 2Sm 13.3; Is 40.20; 44.25; Jr 9 .17[ 16]; 18.18). 46. Pace G von Rad, Old Testament Theology, trad. D. M. G Stalker (Nova York: Harper and Row, 1962), 1:418. 428.
revelação, porém, vem por meio de personalidades humanas, cujo pen samento é moldado por suas culturas; a revelação não ignora a teologia natural. Essa realidade explica as muitas semelhanças entre a lei e o Código de Hamurabi e entre Provérbios e a literatura egípcia. Porém, aqueles que estudam a história da religião restringem o conteúdo so mente ao fator humano ou o enfatizam de tal modo que a atividade divina de revelação se apresenta meramente como o testemunho de Israel acerca dessa revelação. Barr cita e aprova J. J. Collins: Existem certos aspectos fundamentais da abordagem dos sábios à realidade que são comuns à teologia natural em todas as eras. Os sábios procuravam, especificamente, discernir a dimensão religiosa da experiência humana comum e universal sem apelar para a revela ção especial ou para a experiência singular de um povo. A dimensão religiosa estava correlacionada com a tradição distintivamente israe lita, mas não era subordinada a ela.47
Porém, o conhecimento ético-espiritual e a sabedoria de Provérbios vão além da revelação geral, e o sábio não enfatiza tanto a sua psicolo gia que dá origem ao seu conteúdo revelador, apesar de fazê-lo (Pv 2 4 .3 0 - 3 4 ) , mas a origem divina da revelação. O S e n h o r gerou esta sa bedoria revelada que dá vida eterna àqueles que a encontram, a compre endem e não se apartam dela ( 3 . 1 3 - 1 8 , 2 1 ; 8 .2 2 - 2 4 ) . O deuteronomista atribui a sabedoria de Salomão ao S e n h o r : “Deu também Deus a Salomão sabedoria, grandíssimo entendimento e larga inteligência” (lR s 4 .2 9 [5 .9 ] ). Salomão também atribui sua sabedoria ao S e n h o r : “Porque o S e n h o r dá a sabedoria, e da sua boca vem a inteligência e o entendi mento” (Pv 2 .6 ) . Ao colocar esta sabedoria na boca dos pais, estes se tomam porta-vozes de Deus. Agur e o rei Lemuel rotulam seus ditos como massã \ o termo que os profetas usam para designar seus “orácu los divinos”, e Agur define seus ditos de modo mais particular como “declaração inspirada” ( 3 0 .1 ; 3 1 .1 ) . Os seres humanos devem olhar para o Deus de toda a sabedoria para que ele lhes revele a sabedoria ética-espiritual. Apesar da revela ção geral da lei moral de Deus por meio da consciência, as pessoas ainda fazem aquilo que é certo aos próprios olhos, mesmo estando erra das (14.12; 16.25). A fim de saber o que é preciso para viver, um co 47. James Barr, The Concept ofBiblical Theology: An Old Testament Perspective (Minneapolis: Fortress. 1999), p. 478.
nhecimento que requer tomar decisões sábias, é preciso saber todas as coisas. Em Provérbios, a idade avançada é considerada superior à juven tude, pois os idosos viram e experimentaram muito mais do que os jovens. Os cabelos grisalhos são sua coroa de esplendor (20.29). Mas nenhum ser humano vê e conhece todas as coisas. A sabedoria de Salomão, por sua vez, é representada como tendo nascido como um ser humano antes que qualquer coisa existisse (8.22,23) e como estando constantemente ( amôn; 8.30) ao lado de Deus quando ele trouxe à existência a grande esfera cosmológica de ar, água e terra (8.24-29). Além disso, ela estava prestan do atenção, pois estava se deleitando em cada aspecto desse processo, especialmente na criação da humanidade, que ela, e nenhum ser humano, testemunhou (8.31). Em decorrência disso, a mulher sabedoria é, ela mes ma, transcendente, antes e acima de todas as coisas. Somente ela pode responder de modo afirmativo ao desafio de Deus a Jó, que tentou usur par o trono de Deus. “Onde estavas tu quando eu lançava os fundamentos da terra?” (Jó 38.4). A sabedoria responde: “Eu estava com ele e era seu arquiteto [Pv 8.30] e meu é o conselho” (1.23-25; 8.14; cp. Jó 38.4). Em sua extensa autobiografia Agur, o autor inspirado, enfatiza a necessidade de conhecer abrangentemente para conhecer absolutamente (30.2-4) e a disponibilidade desse conhecimento e sabedoria absolutos aos fiéis por meio das Escrituras de Israel (30.5, 6 ). Para Agur, a me nos que alguém veja holisticamente, não pode ver com clareza nem fazer certas avaliações acerca de coisa alguma. Os seres humanos destroem o meio ambiente porque entendem sua ecologia apenas de modo parcial. Assim, também, sem um conhecimento abrangente, a arte delicada de viver é impossível (30.3). Agur argumenta que nenhum ser humano tem esse conhecimento abrangente, pois ninguém subiu ao céu para ver de modo holístico (30.4a). Sem a revelação do Santo, até mes mo Agur, que estudava a sabedoria, não passa de um animal irracional vivendo de acordo com seus sentidos imperfeitos (30.2, 3). Numa série de perguntas retóricas que caminham em direção a uma conclusão com a indagação “Qual é o seu nome?”, ele aponta para o S e n h o r transcen dente como o único Criador e Sustentador do cosmos e, portanto, implici tamente como o único possuidor de sabedoria. O S e n h o r estabeleceu os confins da terra e a sustenta com chuvas do céu (cp. 3.19,20). A pergun ta desafiadora de Agur a seu filho, Itiel, como a pergunta do S e n h o r a Jó, visa pôr fim às pretensões humanas de sabedoria e levar seu público à conclusão de sua fé, de que somente o S e n h o r possui sabedoria (30.4,5).
Mas o S e n h o r transcendente deve se aproximar do seu povo a fim de lhe mediar sua sabedoria distante. A última pergunta de Agur: “E qual é o nome do seu filho, se é que o sabes?” (30.4), tem por objetivo conduzir seu filho à compreensão de que Deus revelou sua sabedoria a Israel. Assim como a comunidade da fé sabe que o S e n h o r é o Criador e, portanto, o único possuidor de sabedoria, ela também sabe que o S e n h o r deu à luz Israel como seu filho (Êx 4.22). Agora, Agur permite que seu público chegue à conclusão de que, da mesma maneira como um pai instrui seu filho, também o S e n h o r instrui seu filho, Israel, por intermédio da revelação especial. Em 30.5a, ele aponta para a literatura canônica de Israel como sendo “pura”, desprovida de imperfeições, ci tando Davi ( S l 18.30[31]), e em 30.6b[6a], como sendo exclusiva, indi cando a fórmula canônica “Não acrescentareis à palavra que vos man do” (Dt 4.2; 12.32 [13.1]). Agur compõe seus ditos dentro dessa reve lação canônica. 3. Inspiração Mas de que maneira o S e n h o r media essa revelação? A última pergunta de Agur e suas respostas implícitas a essa pergunta aponta ram para a sua revelação especial nas Escrituras. Semelhantemente, Salomão e o editor final nas palavras de abertura do preâmbulo esco lhem o livro de Provérbios como o intermediário de Deus de sua sabe doria: “Provérbios de Salomão... para aprender a sabedoria”. E, no entanto, apesar dessa indicação óbvia, o conceito de Gese e Koch que define a sabedoria como uma “ordem criada” impessoal conduz à bus ca humana racional por essa “ordem”, trazendo confusão à discussão (veja, pp. 97-98). Von Rad, por exemplo, diz: “Esta ordem [mundial] simplesmente [estava] ali e poderia, em último caso, falar por si mes ma” .48 Esta asneira hermenêutica fundamental de substituir a busca por uma ordem cósmica autorreveladora é extremamente influente, le vando muitos ao engano, inclusive este autor.49Esses - desta vez citan do Crenshaw 50 - popularizam essa opinião. Ele identifica a sabedoria em 8.22-31 como “a ordem divina que permeia o mundo de Deus ” .51 48. Von Rad. Wisdom in Israel, p. 191. 49. Waltke, “The Book o f Proverbs and Ancient Wisdom Literature”, BSac 136(1979)232-35. 50. J. Crenshaw, Old Testament Wisdom (Atlanta: John Knox, 1981), p. 209. 51. D. J. Estes, Hear. My Son: Teaching and Leaming in Proverbs 1-9 (NSBT; Grand Rapids: Eerdmans. 1997), p. 23.
De acordo com ele, “Yahweh plantou a verdade no universo e dotou os seres humanos com a capacidade de descobri-la usando a inteligên cia”. Ele explica que o chamado da sabedoria para se obter sabedoria significa, em termos práticos, que “a busca por sabedoria envolve a observação cuidadosa da vida por meio da experiência pessoal” ,52 de terminando, com isso, que o livro ensina mais a confiança na investiga ção humana que em Deus, que garante a verdade de sua revelação. A noção de que Deus embutiu a sabedoria na criação é baseada no conceito egípcio de ma ‘at, em textos bíblicos fora de Provérbios, em Provérbios 3.19, 20 e 8.22-31, e no uso da criação na cunhagem de Provérbios. O conceito egípcio de ma ‘at foi rejeitado (veja p. 121). Além disso, Provérbios difere radicalmente das instruções egípcias na chamada do preâmbulo para o ouvinte “temer ao S e n h o r ” , um termo que implica uma revelação especial do S e n h o r (veja pp. 153-154). Por certo, textos bíblicos fora de Provérbios falam da própria revelação de Deus como Criador e/ou Juiz por meio da sua criação (cp. Jó 12.8, 9; 38.14; Sl 19.2[3]; 97.6; 104.10; Is 28.23-29; 44.9-20; Jr 8.7-9; At 14.17; 17.28; Rm 1.18-23; Cl 3.5), mas Provérbios não identifica essa revela ção como a fonte de sua sabedoria. Provérbios 3.19, 20 diz que Deus usou a sabedoria como instrumento para criar o mundo, não como um instrumento para revelar sabedoria. A característica principal do poema em 8.22-31 sobre o papel da sabedoria na criação é sua forte ênfase na abrangência cósmica e autoridade da sabedoria.53 A identidade da mu lher sabedoria será discutida adiante; basta observar aqui que o poema certamente não identifica a sabedoria como existindo dentro da cria ção. O significado de ‘ãrnôn (“artífice”, “arquiteto”?) em 8.30 é muito controverso e a lógica muito duvidosa para ser usada como base para uma epistemologia discutível de que a teologia natural (i.e., o conheci mento racional de Deus) é suficiente para conceder vida abundante à parte da revelação especial. Como foi comentado, Salomão, Agur e Lemuel, que compuseram todos os ditos de Provérbios, observaram e refletiram de modo bastante criterioso e concludente sobre os aspectos da criação e, por vezes, estabeleceram como premissa para seus ensinos analogias extraídas da natureza, por exemplo, “Vai ter com a formiga, ó preguiçoso, considera os seus caminhos e sê sábio” ( 6 .6 -8; cp. 30.1552. Estes, Hear. My Son, pp. 30-31. 53. R. E. Clements, Wisdomfo r a Changing World: Wisdom in Old Testament Theology ( Berkeley Lecture 2; Berkeley, Califórnia: Bibal, 1990), p. 19.
31). No entanto, não basearam sua autoridade nessas analogias. Antes, usaram-nas para apoiar seus conceitos sobre o mundo e a vida, que já estavam firmemente estabelecidos. Em sua autobiografia fictícia, o pai observou a mulher infiel rondando as ruas em busca de uma vítima a ser subjugada ( 7 .6 - 2 0 ) , mas sua lição de que os adúlteros se deitam num leito de morte é, provavelmente, uma declaração de fé, não de observação ( 7 .2 1 - 2 7 ) . Os sábios falavam por si mesmos com autorida de e em nome de Deus, e chamavam seus ditos de “lei/instrução” (tôrâ) e “mandamentos” (miswôt; 3 .1 ). Eles falavam como os oráculos de Deus, tendo suas declarações inspiradas ( 3 0 .1 ; 3 1 .1 ) . Em resumo, a base para a epistemologia e para as reflexões teológicas do livro de Provérbios não é a teologia natural, mas sim a revelação especial, por meio de porta-vozes inspirados (veja 3 0 . 5 , 6 ) . Os autores de Provérbios viam a criação pelas lentes da fé, consis tentes com o conceito sobre o mundo e a vida de Israel. O título do livro identifica seu autor especificamente como “rei de Israel”. O Deus de Israel, Deus fiel à sua aliança, ordenou que ele como rei de Israel, ao assumir o trono, “[escrevesse] para si um traslado desta lei num livro, do que está diante dos levitas e sacerdotes” (Dt 17.18). Davi instruiu Salomão: “Guarda os preceitos do Senhor teu Deus, para andares nos seus caminhos, para guardares os seus estatutos, e os seus mandamen tos, e os seus juízos, como está escrito na Lei de Moisés” (lR s 2.3). Agur, que provavelmente era um prosélito da fé, considerava a literatu ra canônica de Israel como palavra perfeita de Deus, e foi dentro do contexto dessa palavra que ele compôs seus ditos (veja pp. 128-129). Apesar da apologia retórica dos três amigos de Jó a favor de Deus manter a ordem moral, o testemunho honesto de Jó da sua experiência e as observações objetivas do Qoheleth, os refutam dolorosamente (Jó 9.22; Ec 9.2). A observação da “noite escura” da natureza sem as lentes bíblicas e valores da fé poderia ensinar a sobrevivência dos mais aptos, a destruição de outros visando à autopreservação e a lei do mais forte. Os autores de Provérbios se inspiraram na observação perspicaz e nas reflexões concludentes acerca da criação, mas para realizar essa tarefa empregaram a concepção sobre o mundo e a vida de Israel e usaram a criação para confirmá-la.54 54. M. Weinfeld (“The Wisdom Subslrata in Deuteronomy and the Deuteronomic Lite rature”, in Deuteronomy and the Deuteronomic School [Oxford: Clarendon, 1972], pp. 244-74) mostra uma ligação clara entre a literatura sapiencial e Deuteronômio, tanto em
No prólogo de Provérbios, bem como em seu preâmbulo, Salomão equipara seus ensinos, agora colocados na boca do pai, com a sabedo ria. “Filho meu, se aceitares as minhas palavras... a sabedoria entrará em teu coração” (2.1-9; minha tradução). Quando ele requer fé no S e n h o r em 3.5, 6 , ele se refere ao S e n h o r que inspirou seus ensinos, como se pode concluir pelo argumento do poema unificado em 3.1-12. Os versetos de 16.20 fazem um paralelo entre aquele que dá ouvidos à instrução e aquele que confia no S e n h o r . O primeiro dos Trinta Ditos requer fé no S e n h o r para sustentar o restante dos ditos: “Para que a tua confiança esteja no S e n h o r , quero dar-te hoje a instrução, a ti mesmo” (22.19). Apesar desse testemunho claro, G. von Rad rejeitou arbitraria mente esses ditos e outros provérbios que requerem a confiança no S e n h o r (veja também 14.26; 16.3; 18.10; 19.23; 28.25), considerandoos, essencialmente, irrelevantes.55 De acordo com ele, uma ordem mun dial investigada e impessoal explorada é um fato que não requer fé alguma no S e n h o r . Porém, em outras palavras, Salomão pede que o filho confie no S e n h o r , não em seus ditos de per si, pois o valor dos seus ditos está no S e n h o r que os revelou e os inspirou. Agur (30.1 -6) e o editor de Jó (28.12-28) apontam para a comple xidade do cosmos, usando-a como apologia para as doutrinas da reve lação e/ou inspiração. 4. A identificação da mulher sabedoria Convém agora defender que a sabedoria personificada no prólogo são os provérbios de Salomão, aos quais foram anexados os ditos de Agur e Lemuel. A interpretação de sua identificação depende, em pri meiro lugar, da identificação de sua personalidade (ou aspectos) e, então, da identificação da realidade por trás da mesma.56 termos de legislação especifica quanto de fraseados idênticos (cp. Dt 4.2; 13.1 e Pv 30.5, 6; Dt 19.14 e Pv 22.10; Dt 25.13-16 e Pv 20.23 [Dt 6.1-9 e Pv 3.1-10]). Porém, opondose à alegação do deuteronomista, Weinfeld confere uma posição de precminência à litera tura sapiencial e propõe que os deuteronomistas foram instruídos nos supostos círculos de sabedoria. Além disso, alguns de seus paralelos verbais e éticos específicos também são encontrados em textos sapienciais não israelitas. 55. Von Rad, Wisdom in Israel, p. 191. 56. A personificação é antecipada em 1.19; o lucro injusto tira a vida daquele que o obtém. A linha entre a personificação da sabedoria e a sabedoria propriamente dita se toma tênue (e.g., 2.3-5; 3.1318). Ao contrário de vários teólogos bíblicos, que acreditam que a personificação é uma evolução posterior na tradição sapiencial, a literatura do antigo Oriente Próximo oferece vários exemplos dessa figura dramática que dá um rosto humano a qualidades abstratas (veja K. A. Kitchen, “Some Egyptian Background to the Old Testament", TB 5/6 [1960] 4-18).
a. Sua personalidade Além da sua personalidade discutida em Provérbios 1.20-33 e seu paralelo em 8.1-36, a mulher sabedoria é personificada como um guia (6.22), uma irmã amada (= noiva) (7.4) e uma anfitriã (9.1-6). Essas personagens são todas femininas, pois, como Karl Brugman demons trou mais de um século atrás, nas línguas que distinguem seus substan tivos como masculino e feminino essa característica de gênero orientava a imaginação poética nas personificações. O substantivo abstrato hokmâ é feminino e, portanto, é personificado como uma mulher, assim como a “loucura”, kesilüt, outro substantivo feminino abstrato também é per sonificado como uma mulher em 9.13-18. Com referência à personalidade da sabedoria em 1.20-33, B. Gemser,57 H. Ringgren,58 W. Frankenberger,59 e S. Harris60 caracterizam-na como uma pregadora do arrependimento, uma profetisa (cp. Jz 4, 5; 2Rs 22.14). Kayatz cita vários temas proféticos em seu sermão .61 McKane, entretanto, a considera uma mestra da sabedoria, não uma profetisa62 e, de fato, seu discurso é salpicado de vários termos sapienciais além de “sabedoria” ( 1 .2 , 20).63 57. B. Gemser, Sprüche Salomos (HAT 16; Tübingen: J. C. B. Mohr, 1963), pp. 16, 17. 58. H. Riggren, Word and Wisdom: Studies in the Hvpostatization o f Dirine Qualities and Functions in the Ancient Near East (Lund: Hâkan Ohlssons Boktrychkeri, 1947), pp. 95-96. 59. W. Frankenberger, Die Sprüche (HAT\ Giíttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1898), pp. 22-23. 6 0 . S. Harris, Proverbs 1-9: A Studv o f Inner-Biblical Interpretation (SBLDS; Atlanta: Scholars, 1 9 9 5 ), p p . 8 7 -1 0 9 .
61. C. B. Kayatz (Studien zu Proverbien 1-9 [WMANT 22; Neukirchen-VIuyn: Neukirchener, 1966], pp. 120-29) observa os seguintes temas proféticos em 1.20-33: 'a d m ãtay (“até quando") no v. 22 (cp. Jr 4.14; 31.22; Os 8.5); tOSúbú (“atentar”) no v. 23 (cp. Jr 15.19; 18.11; 25.5; mais de 100 vezes nos profetas); sua acusação rcpreensora por não ouvir, introduzida com ya'an (“mas visto que” nos vs. 24, 25 [cp. Is 65.12; 6.4; Jr 7.24ss; 11.8; 17.23; 25.7; 32.33; 34.17; 35.14, 17]); frases sobre a destruição vindoura introduzidas por 'Sz (“então”) (v. 28) e taliat (“porquanto” ) no v. 29, veja Jeremias 4.18; 21.14; 35.17; 48.16; 49.8; frases sobre o clamor inútil dos pecadores no v. 28, veja Isaías 1.15; Jeremias 11.1, 14; Ezequiei 8.18; Os 5.6; Malaquias 3.4; Zacarias 7.13; e condenação dos incrédulos no v. 32, veja Jeremias 2.19; 3.6, II, 12; 8.12; 14.7; Oseias 11.7; 14.5. Nenhum desses temas é comum na literatura sapiencial. Kayatz (Studien. p. 133) descobriu que dois elementos de 1.20-33 não podem scr encontrados em parte alguma da instrução egípcia: (1) a repreensão direta e ameaça com a seqüência típica de "porque... assim... então" (cp. Jz 2.3; Is 8.3; 30.12; 37.29; Mq 3.4), e (2) os temas do riso e do escárnio e da recusa de responder e não seguir e de não se permitir ser encontrada como uma proclamação de julgamento e/ou ameaça de castigo. Esses temas proféticos - o riso escamecedor não é um tema profético - são supostamente anteriores aos escritos dos profetas de Israel que os empregaram. Para o tema do escárnio, por exemplo, veja o Salmo 2. 62. W. McKane, Proverbs (Filadélfia: Westminster, 1970), p. 273. 63. Por exemplo, "ingênuo” (1.22; cp. [1.4]), “os insensatos aborrecem o conhecimento” (vs. 22, 29), "temor do S e n h o r ” (v. 29; cp. v. 7 ). “ Eu te farei conhecer as minhas palavras”
W hybray64 a identifica com o um a deusa, um a hipóstase da sabedo ria de Deus, mas não um a figura fem inina puram ente m itológica. Seu status divino tam bém pode ser defendido. Q uanto à declaração da sa bedoria, “ Porque o que me acha acha a vida e alcança favor do Se nhor” (8.35), von Rad com enta: “ Som ente Yahweh pode falar dessa m aneira” .65 Além disso, em outras passagens, som ente Deus ri no tem po de julgam ento (Sl 2.4; 59.8[9]; cp. 37.13; 52.6[8]), nunca um profe ta. B. L. M ack fala de um a m itologização da sabedoria no Judaísm o recente,66 e Paula Johnson argum enta que “ Sofia [o term o grego para sabedoria] é uma personificação fem inina do próprio ser de Deus em seu envolvim ento criativo e salvador com o m undo” .67 N o entanto, sua argum entação se baseia quase inteiram ente na personificação da Sa bedoria no livro apócrifo de Sabedoria de Salom ão, não no livro de Provérbios (veja tam bém 186-187). A m aioria dos estudiosos associa a personificação e identificação da Sabedoria com o capítulo 8, pois nas duas passagens, o sábio faz algo incom um , colocando na boca da Sabe doria discursos extensos para o ingênuo junto à porta da cidade, usando para isso term os parecidos. C aso se aceite essa equiparação plausível, reflete o objetivo do livro (1.2). “Querer" (v. 30; cp. v. 10); “conselho” (v. 25), “repreensão” (v. 30), “cam in h o ” (v. 31), “ n éscios" (v. 32), “ escam eced o res” (v. 22) são todos term os com uns no vocabulário sapiencial. 64. R. N. W hybray, Wisdom in Proverbs: The Concepl o f Wisdom in Proverbs 1-9 (SB T n° 45; Londres: SC M , 1965), pp. 76-104. 65. G von Rad, Old Testament Theology, 1:444. 66. B. L. M ack, “ W isdom M yth and M ythology", Int 24 (1970) 46-60. K ayatz (Studien, pp. 120-22) apresenta um a avaliação crítica penetrante de R. Bultm ann (“ Der religionsgeschichtliche Hintergrund des Prologs zum Johannes-Evangelium ” , in EYXAPISTHPION: Stu
dien zur Religion und Literatur des Alten und Neuen Testament: Hermann Gunkel zum 60. Geburtstag, vol. 2, org. H. Schmidt [Gõttingen, 1923], p. 9). Para ele, o modelo da Sabedoria era uma figura feminina puramente mitológica, parte de um mito antigo de sabedoria que ele viu claramente em Jó 28; Sir. 2.1-11; Bar. 3.9-4.4; Et. Enoque 42.13; 4Esd 5.9; Sab. Salomão 7.21, 22, no prólogo do Evangelho de João e, especialm ente, em Provérbios 1.20-33. W. F. Albright (From the Stone Age to Christianity [Garden City, NY: Doubleday, 1957], pp. 28384; “ Som e C aan an ite-P h o en ician Sources o f H ebrew W 'isdom”, in WIANE, pp. 7-8, 13) também encontrou por trás de Provérbios 1-9 uma deusa cananita que depois foi subordinada a Yahweh e interpretada sim bolicam ente. M as C. B. K ayatz e R. N. W hybray (Wisdom in Proverbs [Londres: SCM , 1965], p. 96) consideram insuficientes os textos do antigo Oriente Próxim o em que essa teoria especulativa se baseia. Kayatz ( Studien, pp. 93-99) identifica a Sabedoria mais especificamente como a deusa M a'at, mas M. Fox (“World Order and M a'at”, JANES 23 [ 1994] 27-48) objeta que os paralelos entre a Sabedoria e M a'at nâo são exclusivos e que M a'at nunca fala. Ben Sira atribui a ela o status de membro do tribunal celestial (citado por M. Fox, “ Ideas o f W isdom in Proverbs 1-9", JBL 116 [1997] 625. 67. Paula Johnson, She Who Is: The Mystery o f God in Feminist Theological Discourse (N ova York: C rossroad, 1992), p. 91.
ela é representada com o tendo sido gerada por Deus no tem po prim or dial e, portanto, é distinta dele, e não eterna. Por fim , outros identificam sua personalidade com vários tipos de m ulher (a esposa sábia, a am an te, a provedora e a am ante desprezada),68 m as nenhum desses tipos faz justiça a seu papel profético, educacional e divino. Essa história da interpretação sugere, e a exegese decorrente con firma, que o sábio representa a sabedoria com o um a m ulher única que veste o m anto de um profeta, carrega os rolos dos sábios e traz sobre a cabeça um diadem a sem elhante ao de uma deusa.69 Os com ponentes proféticos, sapienciais e divinos de sua caracterização se interpenetram de tal modo que ele surge com o um a personalidade singular, cujo único par é Jesus Cristo. Sua identificação com o um ser celestial encarnado, que em hum ilhação aceita a rejeição das m assas para lhes oferecer vida eterna, funciona dentro do cânon com o um a prefiguração daquele que é m aior que Salom ão (veja pp. 189-190). Ela prega e roga com a paixão de um profeta, pensa e circula com os “ intelectuais”, m aneja a autorida de de Deus. Não é um a profetisa com um com o M iriã ou um sábio com o Etã, o ezraíta 1 Reis 4.31 (5.11). A m ulher sabedoria é um a m ediadora celestial excepcional que m edia a sabedoria de Deus para a hum anida de. A pesar de estar relacionada m ais estreitam ente com Deus do que com os seres hum anos, ela convive com as m assas no vaivém da porta da cidade e, num a dem onstração m aravilhosa de graça, convida os jo vens irresponsáveis a se arrependerem diante da sua repreensão antes que sejam tragados pela m orte eterna.
b. Sua realidade M as o que essa personalidade com plexa representa? Com o foi ob servado, m uitos consideram a sabedoria um a representação da ordem criada que Israel aprendeu a interpretar por meio de sua experiência com o m undo; porém , conform e argum entam os, essa teoria não possui qualquer apoio exegético em Provérbios. A interpretação de W hybray, de que a sabedoria é um a hipostatização do atributo de Deus, é parcial m ente verdadeira, pois, de fato, a sabedoria é gerada do próprio ser de Deus. M as W hybray não baseia sua interpretação num a exegese holís68. Veja Fox, “ Ideas o f W isdom ”, p. 625. 69. Fox (“ Ideas o f W isdom” , p. 625), seguindo C. Camp, tam bém comenta: “ A m ulher sabedoria pode reunir vários fenômenos dos âm bitos mundanos e da literatura, sem que ela própria represente determinada realidade conhecida".
tica do prólogo, nem explica com o as pessoas vêm a conhecer, por m eio da criação, seu atributo com unicável da sabedoria nem trata da ausência da atribuição de sabedoria a Deus em Provérbios. B. Lang chega m ais perto de um a resposta quando considera a Sabedoria com o a personificação da escola de sabedoria.70 Porém , com o observam os, no antigo Israel, a sabedoria era ensinada nos lares, não em escolas. De acordo com M. Fox, a sabedoria é um conceito universal, sem e lhante ao conceito platônico de universais (as “ ideias” transcendentes e perfeitas, o real). Tal sabedoria transcendente é ouvida no livro de Pro vérbios e, segundo Fox alega, na sabedoria de outras nações “na m edi da em que se conform a com os padrões éticos de Provérbios” . No entanto, seu m odelo é extraído da ideia platônica, não de seus dados, m ostrando a integridade entre as palestras do pai e os discursos da m ulher sabedoria em 1.20-33 e 8.1-36.71 Um a exegese holística do prólogo m ostra que a sabedoria, em seus vários aspectos, especialm ente com o m ediadora celestial, personifica a sabedoria inspirada de Salom ão, sendo que a com unicação desta é o objetivo e a base lógica do livro (1 .1 ,2 ). Há m otivos de sobra para crer que a “ sabedoria” tem o m esm o significado, intenção e origem que em sua declaração de abertura, não havendo razão para im aginar o contrá rio. Ela equipara sua repreensão com o “conhecim ento” e o “tem or do Senhor” (1.29; cp. 1.7), da m esm a m aneira com o Salom ão equipara o objetivo de seu livro com am bos. Paralelos notáveis associam os dois discursos da sabedoria ao ingênuo em 1.20-33 e 8.1 -36 com o preâm bulo de Salom ão (1.1-7). A queles a quem ela se dirige, o ingênuo e o filho, correspondem precisam ente ao público para o qual o livro foi es crito, de acordo com a declaração de 1.4, 5. Enquanto o pai dirige suas 70. B. Lang. Frau Weisheit: Deulitng einer biblisehen Gesta/t (Düsseldorf: Patmos, 1975), 147-84. 71. Fox, “ ldcas o f W isdom", pp. 629-30. Seu conceito de que a sabedoria é uma hipóstase ou projeçào, não a sabedoria de Deus. mas da humanidade (p. 630), é refutado pela reivindi cação do livro por inspiração divina (veja pp. 129-132). A pesar de ser fato que toda verdade é verdade dc Deus e que ele não limita a Israel (I Rs 5.10, 11), essa noção não e derivada do prólogo. Seu argumento de que “a sabedoria não está restrita a [Provérbios], pois não se pode esperar que os príncipes do m undo estudem o livro de P rovérbios e que os provérbios de Salom ão não estavam presentes na criação” é curioso. O livro foi escrito para os jo v en s de Israel (veja 1.4, 5) e, se é possível fazer um a extrapolação a partir de D euteronôm io 4.6, então por meio deles as nações seriam atraídas aos ensinos de Salom ão, da m esma maneira com o a rainha de Sabá foi ouvir o fam oso rei (cp. lR s 10.1-13). Alem disso, as verdades expressas por Provérbios estavam presentes na criação de acordo com a tese do próprio Fox sobre a sabedoria universal m anifesta nesses ditos.
palestras para o filho (singular) no lar, os dois discursos da sabedoria em 1.20-33 e 8.1-36 são dirigidos, em parte, para o ingênuo (plural) à porta, onde o sábio fala (veja 24.7; 31.23; cp. lR s 22.10).72 N ew son observa: “Esses discursos [da Sabedoria] servem para apoiar aquilo que foi dito pelo pai... e pertencem à m esm a voz cultural que fala por interm édio do pai” .73 Com referência às palestras do pai, a m ulher sabedoria ecoa os m esm os tem as. K idner observa que em 6.23, 24 “o m andam ento... a instrução... e as repreensões da disciplina” pelo pai, “te [guardarão] da vil m ulher” e em 7.5 a sabedoria “te [guardará] da m ulher alheia” .74 Em 8.32-36, suas adm oestações, “A gora, pois, filhos, ouvi-m e... ouvi o en sino... não o rejeiteis” e o m otivo que apresenta “ Porque o que m e acha acha a vida e alcança favor do S e n h o r ” , com binam perfeitam ente com a form a e os tem as dos ensinos do pai em outras passagens (e.g., 4.2022; 3.3, 4). A sabedoria prom ete segurança (1.33), com o o fazem os ensinos do pai (3.23). Em 8.32-36, é quase tão difícil distinguir entre o discurso da sabedoria e o do pai quanto é distinguir pelo estilo e conteú do se é o S e n h o r o u o pai que está falando nos profetas. A linha entre a sabedoria e o sábio se tom a tão tênue que não há com o se determ inar com certeza quem está falando em 9.6, um a distinção que não é im por tante. Os néscios rejeitam sua reprovação (1 .2 2 ,2 5 ), da m esm a m anei ra com o o insensato rejeitou a repreensão do seu m estre (5.12, 13). Ela em prega a m etáfora do “cam inho” predileta do sábio para seu ensino em 9.6. C ontextualm ente, a sabedoria em 1.20,21 clam a e ergue a voz pedindo que a escutem, e no poem a seguinte, o pai pede que o filho responda às suas palavras clam ando e erguendo sua voz para elas (2.1, 3). O prólogo não oferece nenhum candidato plausível para sua identifi cação senão os provérbios de Salomão e os ditos do sábio (1.6). Em 4.5, o avô apresenta sua identificação sem qualquer dúvida colocando a sabe doria personificada em paralelo com “ [as] palavras da minha boca” .
72. Lang, Frau Weisheit, pp. 147-84; Cp. A. N ew som , "‘W om an and the D iscourse o f Patriarchal W isdom ", in Gender and Difference in Ancient Israel (M inncapolis: Fortress, 1989), p. 145. 73. N ew som . “ W oman and the D iscourse o f P atriarchal W isdom ” , p. 145. 74. D. K idner, Introduction to the Wisdom o f Proverbs (T O T C ; D ow ners G rove, III.: InterV arsity, 1985). p. 23.
5. Tradição Se m inha interpretação de D. J. Estes está correta, ele afirm a que os autores de Provérbios derivaram seus ditos da tradição: “A tradição sapiencial reuniu essas observações num conjunto tradicional de infor m ações testadas. Em vez de cada pessoa precisar descobrir a sabedoria por meio da experiência individual, os m estres da sabedoria acum ula ram os discernim entos que as gerações passadas haviam observado” .75 Com o anteriorm ente vim os, o conceito de um “círculo sapiencial”, cha mado aqui de “tradição sapiencial” , não corresponde à realidade. Com exceção de 4.1-9, Salom ão nunca apela para a tradição com o fonte da sabedoria do pai, apesar de esperar que o filho receba os ensinos do pai por m eio da tradição. O discurso do avô em 4.3-9 é tanto um a ficção literária para representar o ensino transm itido a “ filhos” sucessivos (pl. em 4.1) com o o discurso de Salom ão colocado na boca dos m alfeitores em 1.11 -1 4 .0 pai não é, presum ivelm ente, Salom ão, assim com o o avô não é Davi. Se o avô não é fictício, de acordo com o sobrescrito, o autor do livro é Davi, e não Salomão! Em resum o, o poem a em 4.1-9 m ostra que Salom ão esperava que seus ensinos fossem transm itidos por meio da tradição, não que ele recebeu sua sabedoria por meio da tradição. D. J. Estes - desta vez citando Lang76- tam bém baseia a autoridade do livro na tradição. “O m estre... não fala som ente por autoridade pes soal, m as tam bém pela voz da tradição recebida que o transcende”,77 a qual Estes acredita que “provavelm ente era cultivada no clã e na fam í lia” .78 Tam bém cita M cK ane favoravelm ente: “O pai ou m estre pode dar testem unho pessoal da sagacidade acum ulada de várias gerações. Ele deriva sua autoridade da circunstância de que ele se encontra num a boa sucessão, pois viveu dentro da tradição e perm itiu que esta m oldas se sua vida” .79 Sem dúvida, Salom ão enriqueceu o conjunto de seus textos adotando e adaptando os ditos de outros sábios (22.17), m as de vem os enfatizar que essa herança foi, em sua origem , inspirada por Deus e purificada por m eio da lente da fé de Israel (veja p. 132). É preciso fazer um a distinção clara entre a inspiração da herança dentro do am biente palaciano de Israel (cp. 2.6; 30.1-6; lR s 4.29; passim ) e 75. 76. 77. 78. 79.
Estes, Hear, My Son, pp. 31 -32. B. Lang, Wisdom and lhe Book o f Proverbs (Nova York: Pilgrim, 1986), p. 37. Estes, Hear, My Son, p. 92. Estes, Hear. MySon, p. 64. Estes, Hear. MySon. p. 95, citando M cKane, Proverbs, p. 303.
sua transm issão dentro da fam ília israelita (pp. 107-109). Os julgam en tos m orais de um clã ou fam ília são tão relativos e potencialm ente equi vocados quanto os julgam entos individuais baseados na observação pes soal sem a revelação e inspiração divinas. A m enos que se faça uma distinção clara e enfática entre inspiração e tradição, pode-se entender que Provérbios oferece avaliações hum anas, não valores eternos. D. ANTROPOLOGIA
A pesar de ser pedagogicam ente útil distinguir entre a teologia pró pria e a antropologia, em term os teológicos isso é im possível. Van Til argum entou que conhecem os a Deus som ente por analogia, querendo dizer com isso que com preendem os sua natureza e o escopo de sua ati vidade apenas por m eio de com parações e contrastes com a natureza e a atividade da hum anidade.80 Jam es M. H ouston escreveu um tratado magistral acerca do “conhecim ento duplo” , querendo dizer com isso que a im perfeição hum ana é com preendida som ente à luz da perfeição sublim e de D eus.81 Q uando se diz que nâo é restringido por lim itações espaciais e tem porais, se pressupõe um conhecim ento hum ano dessas restrições. Em decorrência disso, os seres hum anos têm plena consciên cia da superioridade de Deus em relação a eles e de sua dependência dele. No entanto, diferem em seu modo de reagir. Os sábios, que são justos, confiam nele e lhe obedecem ; os perversos o negam e o afrontam. A responsabilidade hum ana e a retribuição divina são inseparáveis. Esta seção analisa a humanidade de um m odo geral e, em seguida, distingue os seres hum anos entre sábios e insensatos, entre masculino e feminino. 1. Os seres hum anos em geral
a. Palavras para a humanidade O term o hebraico m ais am plo para os seres hum anos é o substan tivo coletivo singular ’ã dãm, que ocorre 44 vezes em Provérbios. Aqui, 1ãdãm distingue os m ortais na terra de Deus no céu (veja ^ lõhim ; p. 114), o qual determ ina as potencialidades e lim itações dos terráqueos (11.7; 12.3; 16.1,9; 27.20; 30.2-4). ’Ãdãm organiza seus pensam entos e planeja seus passos, m as a resposta da sua língua vem do S e n h o r , e o 80. J. M. Frame, Cornelius Van Til: An Analysis ofHis 77K>MgA/(Phillipsburg, N.J.: Presbyterian and Refom ied, 1995), pp. 89-96. 81. J. M. Houston, “The ‘Double K now ledge’ as the Way o f W isdom”, em h-W/S, pp. 308-26.
determina os seus passos (16.1, 9), que frequentemente são incompreensíveis para os mortais (20.24). A única resposta sensata que adãm pode dar é entregar seus caminhos ao S e n h o r (16.3), que o sonda (15.11; 20.27) e o abençoa ou o castiga por suas palavras e obras (3.13, 18; 8.34; 12.14; 19.3; 20.25; 21.16; 24.12; 28.14, 17; 29.23). Outro termo amplo, ’ís, que ocorre 90 vezes em Provérbios, possui uma variedade de usos, normalmente designando um homem de qual quer idade, incluindo tanto o pai quanto o filho, ou “homem”/“marido” (veja 7.19) em contraste com “mulher’7“esposa” ( 'iSSâ). Também pode ser usado para a espécie humana, incluindo “homem” e “mulher”, distinguindo-os dos animais (veja 30.2, em que é paralelo a 'ãdãm). Ele também diferencia o indivíduo humano de Deus, tomando-o consciente da enorme distinção (veja 5.21; 14.12; 21.2; 30.2-4). Esse termo inclusivo é, às vezes, usado com geber, referindo-se ao homem em sua for ça, e ’enôs, referindo-se ao homem em sua fraqueza. Ao longo de todo o Antigo Testamento o ser humano é conceituado como uma unidade psicossomática, mas os componentes fundamentais de seu ser em Provérbios são nepeS (tradicionalmente, “alma”), lêb (“co ração”) e rüah (“espírito”). S en h o r
b. NepeS (tradicionalmente, “alma") NepeS ocorre 56 vezes em Provérbios, tendo essencialmente o mes mo conjunto de significados que no restante do Antigo Testamento. As versões em nossa língua costumam traduzir nepeS como “alma”, mas se trata de uma interpretação infeliz que leva os leitores a pensarem em “alma” no sentido do termo gregopsychê do Novo Testamento, como “a sede e o centro da vida que transcende aquilo que é terreno”.82 Porém, no Antigo Testamento, nepeS se refere aos impulsos e apetites intensos de todas as criaturas viventes, inclusive sua fome de alimento e seu desejo sexual (Pv 6.30; 10.3; 12.10; 16.26; 19.15; 25.25; 27.7; cp. Dt 23.24[25]; Ps 78.18; Is 5.14; Jr 2.21). Um glutão é chamado de ba'al nepeS (“aquele que possui apetite/fome” Pv 23.2), e uma pessoa ga nanciosa, com uma cobiça desenfreada, é chamada de i^hab-nepes (“de grande garganta/apetite” 28.25). É provável que esse significado 82. W. Bauer, A Greek-English Lexicon o f lhe New Testament and Olher Earlv Chrislian Literalitre. trad. e adapl. William F. Amdt e F. Wilbur Gingrich. 2* ed. rev. e exp. F. Wilbur Gringrich e Frederick W. Danker (Chicago: University o f Chicago, 1979), p. 893.
seja derivado de sua referência original a respirar ou exalar, que talvez tenha levado à referência do substantivo a “pescoço” ou “garganta”. Essa referência pode ser percebida em várias ocasiões (cp. 3.22, em que é paralela a g a r^rõ t, “pescoço”); Clifford prefere traduzir nepes como “garganta”.83 Nepes é usado com frequência com palavras que indicam anseio (13.19; 21.20). O anseio por Deus, porém, distingue o nepes humano do nepes animal (SI 42.1, 2[2, 3]; 84.2[3]; 119.20, 81). Uma vez que se refere à natureza básica do ser humano como tendo uma “ardente vitalidade”, é melhor traduzido, de acordo com o contex to, como “fome”, “si mesmo” (veja 1.18, 19), e “vida” (22.5). Neste comentário, nepes é traduzido como “alma” somente quando se refere claramente ao apetite (veja 13.19; 16.24).84 c. Coração “Coração” (lêb/lêbãb) é o termo antropológico mais importante do Antigo Testamento (veja 4.20-27, esp. 4.23),85 mas nossa língua não possui nenhum equivalente. Ocorre 46 vezes em Provérbios e 858 vezes no Antigo Testamento. Aqui ele é analisado de acordo com seu uso nas concepções modernas, mas o hebraico não fazia essas distinções. Os antigos atribuíam as funções do corpo ao coração. Quando o coração de Nabal morreu, seu corpo se tomou como pedra (i.e., paralisado, não morto; 1Sm 25.37,38).80Na antropologia bíblica, o coração controla o corpo, suas expressões faciais (Pv 15.13), sua língua (15.28; 12.23) e todos os seus outros membros (4.23-27; 6.18). O Antigo Testamento também atribui asfimções da psique ao cora ção. Nenhuma palavra em nossa língua combina a complexa interação entre intelecto, sensibilidade e vontade. O S e n h o r , que conhece o cora ção (17.3; 24.12), experimenta todas as suas emoções (cp. 12.25; 14.10, 30; 15.15). O coração também pensa, reflete e pondera (24.12). (A função do cérebro era desconhecida no Antigo Testamento.) Assim como os olhos foram feitos para ver e os ouvidos para ouvir, o coração se destina a discernir e levar à ação. Em 2.10, a LXX traduz coração como “entendimento”, pois para ela significava a mesma coisa. Quan 83. R. L. Clifford, Proverbs (OTL; Louisvillc: Westminster/John Knox. 1999). 84. Cp. B. Waltke, TWOT, 2:587-91, s.v. napaS. 85. Cp. B. Waltke, “Hcart”. em EDT . pp. 331-32. 86. As versões em nossa língua nâo traduzem “morrer” literalmente, pois. para os moder nos, quando o coração morre, começa o rigor mortis.
do uma pessoa não tem discernimento ou julgamento, o hebraico fala de uma “falta de coração” (10.13). O coração também planeja (6.14, 18; 16.9); é o fórum interior no qual as decisões são tomadas. A teolo gia egípcia de Mênfis diz: “Assim é que o coração e a língua têm poder sobre todos os membros... o coração pensa em tudo que deseja e a língua comanda tudo que deseja”.87 Os autores bíblicos também atribuíam funções espirituais ao co ração. Na esfera religiosa o coração aceita e confia (3.5). Ele sente todos os tipos de desejo, desde as formas físicas mais ordinárias, como fome e sede, até as formas espirituais mais elevadas, como reverência e remorso. Um elemento intimamente relacionado com sua função pie dosa é a atividade ética. O mestre adverte o filho para não permitir que seu coração cobice a beleza da adúltera (6.25) e não invejar os pecado res (23.17), mas “o coração sábio procura o conhecimento” (15.14). O estado ou condição espiritual do coração é básico para as suas funções fisiológicas e espirituais; ele pode ser sábio (14.33) e puro (20.9), ou perverso (17.20; 26.23-25). Essa direção ou predisposição do cora ção determina suas decisões e, portanto, as ações do indivíduo (cp. Ex 14.5; 35.21; Nm 32.9; lRs 12.27; 18.37). Por um lado, o sábio dirige sua condição espiritual do coração por meio da persuasão moral de seus apelos repetidos para aceitara sabedoria (2.10; 3.1; 22.17; 23.12; 24.32), da mesma maneira como, em parte, Ezequiel trouxe à vida os ossos secos e mortos, profetizando a palavra de Deus para eles (Ez 37.1-14). A instrução do sábio deve ser memorizada e guardada com afeição religiosa (3.3), não apenas pela memorização mecânica (cp. Is 29.13; Mt 15.18). Por outro lado, o coração pode rejeitar a correção e a disciplina (Pv 5.12) e se tomar tão endurecido que não é mais capaz de se mover numa nova direção espiritual (28.14;cp. Is 6.10; Mt 13.15). As admoestações para aceitar os ensinos do pai no coração indicam uma decisão consciente de amar, na qual todo o ser consente e faz parte de uma inclinação natural, a lição disciplinadora. A medida que o coração recebe esses ensinos, eles influenciam o caráter do todo, mas o coração como um todo deve permitir que essas forças entrem e de terminem sua direção.88 Uma vez que o coração é o centro de toda a atividade emocional, intelectual, religiosa e moral de um indivíduo, ele deve ser salvaguardado acima de todas as coisas (4.23). 87. Kayalz, Studien :ti Proverbien 1-9, p. 41. 88. J. Pedersen, Israel, lis Life and Culltire (Londres: Oxford University, 1964), p. 106.
Paradoxalmente, o olho e o ouvido são as portas para o coração e o moldam (veja 2.2; 4.21-23), mas ao mesmo tempo o coração decide o que ouvirá e verá (4.25, 26). Os insensatos são inteiramente responsá veis por sua aceitação ou rejeição dos ensinos do sábio (1.29-31). O filho com insensatez em seu coração e o ingênuo que ama o descompromisso devem escolher a sabedoria. A literatura sapiencial egípcia resol veu o paradoxo considerando Deus como a causa suprema do bem: “Aquele a quem Deus ama é capaz de ouvir; mas aquele a quem Deus odeia é incapaz de ouvir. E o coração que permite que um homem se tome um ouvinte ou alguém que não ouve, e aquele que é incapaz de ouvir é aquele a quem Deus rejeita”.89 “Se Deus ‘toca’ um coração, então, é ele quem determina sua vontade”, diz J. Pedersen.90Provérbios 20.12 também reconhece que o ouvido receptivo ao ensino e o olho moralmente criterioso vêm de Deus. Mas o livro de Provérbios enfatiza a responsabilidade de seu público de escolher o ensino e desaprova qual quer noção de fatalismo. d. Espirito O termo rüah, “vento” ou “espírito” ocorre 21 vezes em Provérbios. Ele indica, literalmente, “vento”, com a conotação de que também tem o poder de colocar outras coisas em movimento. Em Provérbios 25.23 se refere ao vento do norte, que traz chuva e outras condições climáticas. Não pode ser restringido (27.16). Entretanto, o vento poderoso também é passageiro (11.29). Com exceção da referência ao controle do vento como sinal da grandeza de Deus em contraste com os seres humanos, Provérbios, ao contrário de outros textos bíblicos, não associa rüah. com o S e n h o r . Rüah também indica “fôlego”, como uma expressão da vitalidade dinâmica do ser humano, ao contrário de neSãmâ (“respiração”), que indica apenas o processo de respirar. Rüah denota essencialmente o poder encontrado no “vento” ou no “fôlego”.91 A forma de respirar indica a forma de pensar do indivíduo: se é “curta”, demonstra nervo sismo (Pv 14.29); se é “longa”, indica “paciência” (17.27). Essa vita lidade dinâmica manifestada na respiração se toma atenuada em sua 89. Kayatz, Síudien, p. 45. 90. Pedersen, Israel, pp. 103-4. 91. R. AlbertzeC. Westermann. TLOT, 3:203, s.v. ríiah.
designação psíquica de “hum or” ou “espírito”, da m esm a m aneira como 'ap, “nariz” , a m anifestação física de raiva, se tom a atenuada no fenô m eno psíquico da raiva. Q uando na constituição com plexa, porém uni ficada, dos aspectos físicos e psíquicos de um ser hum ano a vitalidade física assum e o prim eiro plano, rüah é m elhor traduzido com o “fôlego” (cp. Jz 15.19 [ = “alento”, A R A ]; ISm 30.12 [ = “alento”, ARA]). Entretanto, quando a vitalidade psíquica da constituição hum ana assu me o prim eiro plano, é m elhor traduzido com o “espírito” (cp. Gn 45.27). Quando o rüah, “espírito” do indivíduo está quebrantado, sua vitalida de, sua moral e seu poder de prom over a vida estão destruídos. A com plexidade da vitalidade fisico-psíquica pode ser vista no m iserável A ca be ( l R s 21.4). A má notícia que recebe de N abote leva A cabe a se deitar em sua cam a, se voltar para a parede, recusar-se a ver qualquer pessoa e a deixar de comer. Provérbios 15.4 pressupõe que a língua da pessoa boa pode curar o espírito ferido e danificado causado pela lín gua corrupta da pessoa má (cp. Is 57.14-21, esp. vs. 15, 16, 19).
Rüah. tam bém pode atuar com o sinédoque para a disposição do indivíduo com o um todo (Ec 7.8, 9; Ez 11.19; 18.31; 36.26), da vida interior em sua totalidade (Jó 7.11; Sl 78.8) incluindo suas opiniões ou desejos (cp. Ez 13.3), m ente (Sl 77.6[7]), vontade (cp. Pv 16.32), e m otivações (16.2; cp. 2C r 36.22).92 O plural de rüah. em 16.2, paralelo a “cam inhos” indica que os padrões com plexos de com portam ento de pendem de m otivações com plexas. 2. O sábio e o insensato
a. Introdução: termos cor rela tos Existem diferenças enorm es entre os indivíduos, m as com frequên cia tam bém existem elem entos em com um em núm ero suficiente para perm itir categorizações com o sábios e insensatos (1 0 .1 ,5 ). Provérbios divide a hum anidade em duas classes: os sábios e justos em contraste com os insensatos e perversos. Estes term os éticos e sapienciais são correlativos, pois, apesar de não significarem a m esm a coisa, possuem o m esm o referente. Am bos tam bém são correlativos com outros ter m os éticos com o “bom ”, “ju sto ”, “ irrepreensível” ou “sensato” em con traste com “ perverso”, “m au” , “desonesto” e sem elhantes, pois esses
92. C p. R. G B ratcher, "B iblical W ords D escribing M an: B reath, L ife, S p irit” , BT 34 (1 9 8 3 ) 204.
termos revelam características com uns e relações sintagm áticas, e as expressões correspondentes apresentam conotações sem elhantes ,93 Skladny pensa, de m odo questionável, que em Provérbios 10-15 “o sábio não é o justo, mas os justos são os sábios [itálicos dele]” .94 Porém , essa form a de expressar a relação pode ser enganosa. C om o já afirm a m os, um coração sábio produz um com portam ento reto, e um coração insensato produz um com portam ento perverso. Entretanto, a retidão não é apenas um com portam ento, mas um m odo de ser. De qualquer m odo, não existe um a terceira categoria, um m eio-term o. Até o ingê nuo - que não é um term o correlativo de insensato - enquanto tom a um a decisão definitiva a favor da sabedoria, sofre o destino dos insen satos (1.22-33). A pesar de os ingênuos, ao contrário dos insensatos, não desprezarem a sabedoria, eles ainda não assum iram um com pro m isso com o aqueles que possuem o tem or do S e n h o r , o fundam ento espiritual dos sábios (1.7; 9.10). Na discussão a seguir serão definidos som ente os term os correlati vos m ais freqüentes. Por exem plo, um insensato é descrito de m aneira excepcional no capítulo 10 com o “ filho que envergonha” (v. 5), “que acena com os olhos” (v. 10), que “excita contendas” (v. 12), um a pes soa que “abandona a repreensão” (v. 17), fala de m ais (v. 19) e “retém o ódio” (v. 18). A lém disso, sem dados m ais detalhados, não fica claro se esses term os são aplicáveis a todos os insensatos.
b. O sábio e o justo ( 1 ) 0 sábio e o ju sto e outros term os correlatos A pessoa sábia (hãkãm ) possui e exibe as características da sabe doria (hokmâ ; veja pp. 124-126) em seu sentido religioso, social e éti co. Sua “dim ensão ético-religiosa”, diz, Saebo, “encontra expressão no paralelism o... de hãkãm e saddtq ‘ju s to ’, bem com o no contraste ‘sábio-insensato’, norm alm ente paralelo com ‘justo-perverso’ [veja 10.115]”.95 Em vez de ser ju sto na própria opinião (26.5, 11,12,16), o sábio é receptivo ao ensino, buscando o conhecim ento do qual o ingênuo pre cisa ( 18 .15), e entesourando-o ( 10 .14). Ele dá ouvidos à instrução (13.1) 93. K. M. H eim , “ Structure and C ontext in Proverbs 10:1-22:16” (D iss. Ph.D ., U niver sity o f L iv erp o o l, 1996), pp. 54-86. 94. U. Skladny, Die ãltesten Spruchsammlungen in Israel (Gõttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1962), pp. 11-12. 95. Saebo, 77.07', 1:423, s.v. hkm.
e ao conselho (12.5), aceita ordens (10.8) e até m esm o am a a repreen são (9.8). Um a pessoa sábia anda com os sábios (13.20) e está sem pre aum entando sua sabedoria (1.5; 15.31, 32; cp. 4.18).96 Depois de en contrar o conhecim ento, ela o propaga (15.7) e se tom a um a fonte de vida para a com unidade (13.14). Seu dom ínio da experiência é em ra zão do seu tem or do S e n h o r e se apartar do mal (10.16). Um a vez que as pessoas sábias estão sem pre em crescim ento, tom am -se extraordi nariam ente sábias (cp. 30.24); elas próprias se tornam autoras de ditos (1.6 e 22.17). Um a vez que são peritas na ordem m oral, têm a capaci dade de controlar suas em oções (29.11) e governar os insensatos (11.29). Dão alegria a seus pais (15.20; 23.24) são protegidas (13.14), e prom o vem a cura de outros (12.18). O prim eiro benefício m encionado do ser sábio é ser prudente ( m askil ), ter “um com portam ento sábio” e “bom senso” (1.3; cp. 10.5, 19; 14.35; 15.24; 17.2; 19.14; 21.16). Sêkel designa “a habilidade de com preender os significados ou im plicações de uma situação ou m ensa gem , a habilidade de entender questões práticas e relações interpessoais e tom ar decisões benéficas” .97 A pessoa prudente (maskil), por exem plo, dá atenção a uma situação am eaçadora, tem discernim ento acerca de sua solução, age de m aneira decisiva e, por isso, produz sucesso e vida e evita o fracasso e a morte. O sucesso de Davi contra os filisteus é um exem plo clássico dessa virtude (veja ISm 18.4, 14, 15).98 O sábio tem a necessidade básica do ingênuo de ser perspicaz (ou “astuto”, '3 rum fadj .yorm â [subst.]; 1.4), outro term o sapiencial. Para Fox, “ ‘o rm á é o talento para elaborar e usar táticas hábeis e astutas visando a alcançar seus objetivos, quaisquer que sejam eles... Som ente em Provérbios o substantivo e o verbo são usados para a astúcia em pre gada de m odo legítim o... a própria m ulher sabedoria legitim a ‘ormâ quando se vangloria de sua proxim idade da m esm a (8.12)” ." N esse livro seus objetivos são religiosos e éticos (veja 1.3). Os perspicazes têm a habilidade de planejar de m odo a conseguir o que desejam (cp. 14.8, 15), de ignorar insultos (12.16), de olhar para onde estão indo (14.15) e de ver o perigo se aproxim ando e se desviar dele (22.3; 27.12). 96. Um provérbio da Idade Média d i/: “O hom em só é sábio enquanto busca a sabedoria; se está convencido... é um insensato" (citado por G em ser, Spriiche, p. 13). 97. Fox, Proverbs 1-9, p. 36. 98. De acordo com W. M cKane, Prophels and Wise Men (Londres: SCM , 1965), p. 67. 99. M. Fox, “ W ords for W isdom ", 7.AH 6 (1993) 158-59.
Ser astuto requer agir com “conhecim ento” (13.16; cp. 14.18), m as os perspicazes não se vangloriam disto (12.23). Um a característica inseparável, porém distinta, do conhecim ento m oral do sábio é a sua discrição (ou “cautela”, m ezim mâ), que Fox define com o “um pensam ento privado e oculto e o privilégio dele” .100 Esses pensam entos privados frequentem ente dizem respeito ao plane jam ento. Por um lado, eles podem ser hostis e cheios de intriga (24.8) e assim condenados p o r Deus (12.2) e pela com unidade (14.17). Por ou tro lado, com o no preâm bulo, a discrição é orientada pela sabedoria do sábio (1.4; 2.11; 3.21; 5.2) e, desse m odo, tam bém é inseparável dela (8.12).101 Segundo Fox “Esse poder te protegerá das tentações da m u lher e do hom em perversos (2.11 s.; 5.2s.), pois quando estes tentarem te seduzir a seguir seus cam inhos, serás capaz de olhar para dentro, m an ter a independência de pensam ento e resistir à dissim ulação deles” .102 O preâm bulo e o prólogo, contudo, enfatizam que esse poder é decorrente de se ter os seus ditos à mão. As três virtudes de 1.4 são reunidas nova mente em 8.12. O utro correlativo sapiencial de “sábio” é criterioso ( nãbôn ; 1.5). Nãbôn significa estar no estado apropriado dito e/ou possível de bin/ binâ (“entender”/“discem ir” ).103 C om o Pan observa, o indivíduo crite rioso “possui um a m ente penetrante e previdente (15.21; 20.5; 28.11)... [e] fala e age sensatam ente (11.12; 17.28)” .104 M as a sabedoria consiste em transcender o m undo hum ano caído e participar daquilo que é santo e puro (9.10). Essa perspectiva experiencial e existencial oferece a ha bilidade mental e intelectual de distinguir entre o certo e o errado, entre o bem e o mal - a ordem moral que Deus ordena e sustenta (veja 1.2; 9.10). A verdadeira religião israelita sustentava um a distinção inviolá vel entre as esferas do sagrado e do profano (cp. N m 18.32), tom ando o discernim ento algo derivado de uma perspectiva divina inteiram ente di ferente da do discernim ento relativo do próprio indivíduo. Das oito oca siões em que nãbôn é usado fora do preâm bulo do livro (1.5), todas na 100. M. Fox, “ W ords for W isdom ", p. 161. 101. Mezimmâ tem um sentido positivo no prólogo (cp. 1.4; 2.11; 3.21; 5.2; 8.12) e na C oleção VII (31.16), m as um sentido negativo nas outras coleções de provérbios e ditos (cp. 10.23; 2 1 .27; 24.8. 9; 30.32). 102. Fox, “ W ords o f W isdom ” , p. 160. 103. Um Nifal participio gerundivo ( IBHS. p. 387, P. 23.3d). 104. Chou-W ee Pan. “ A Study o f the Vocabulary o f Education in P rovebs" (D iss. Ph.D., U niversity o f N ew castle upon Tyne, 1987), p. 106.
C oleção II, um a conclui que o criterioso busca e encontra o conheci m ento (l 4.6; 15.14; 18.15) e aceita prontam ente a repreensão (19.25). Com o resultado, a sabedoria do livro repousa em seu coração (14.33), é o em blem a de seu caráter (16.21). A pesar de ser instruído, ele se m anifesta perm anecendo calado (27.28), a m enos que possa falar com sabedoria (10.13). O criterioso adquire orientação (tahbulôt 1.5). Etim ologicam ente, tahbulôt pode ser um term o náutico para as cordas usadas para a pilo tagem de um navio, traduzido com o kybermsis na LXX, de onde vem o nosso term o “cibernética” . Se é esse o caso, a palavra conota que a orientação do livro perm ite que o criterioso conduza a si m esm o e a outros pela vida com o um navio bem pilotado. J. Janzen observa: “Não há dúvidas de que tahbulôt se refere ao poder de direção da sabedoria recebida de Deus... (Pv 1.1-7) e que, com o tal, é genericam ente um sinônim o de tôrâ (i 8)” .105 No entanto, Fox acredita que um derivativo de hebel, “corda”, perm itiria a tradução igualm ente apropriada com o “planos” . Ele argum enta que o conceito de “plano” (i.e., estratégias) se encaixa nos diferentes contextos m elhor que “direção” ou “orientação” . A distinção entre “planos/estratégias” e “orientação” é sutil dem ais para determ inar o significado exato das outras form as de uso de tahbulôt. Seus paralelos incluem “planos” ( mahsebôt; 12.5) “conselhos” (yã'as ; 11.14; 24.6), e “planos m ediante os conselhos” (20.18).
Entendimento (ou ter know-how, fíbúnâ) é um paralelo correlativo com um de “sábio” em Provérbios. T^bünâ ocorre 19 vezes no livro, sendo que em 13 ocasiões aparece no verseto B em paralelo com sabe doria (2.2, 6; 3.13, 19; 5.1; 8.1; 24.3; cp. 21.30) ou com um de seus sinônim os: “o que carece de entendim ento/coração” ( hasar lêb; 11.12; 15.21) ou “inteligência/coração” (lêb; 19.8) e “conhecim ento” (dã'at; 17.27). Em 2.3 ele ocorre em paralelo com binâ (veja 1.2). De acordo com Fox, que propôs a tradução “com petência” ou know-how, a distin ção entre esses epítetos para sabedoria é essencialm ente a seguinte: “T^bünS-h designa o aspecto pragm ático e aplicado do pensam ento, ope rando no cam po da ação; ele visa a eficácia e a realização. Binãh é a atividade conceituai e interpretativa do pensam ento, operando no cam po do significado; ele visa a percepção e com preensão” .106 N esse livro, 105. J. G Janzen, “The Root pr' in Judges v. 2 and Deuteronom y xxxii 42”, VT 39 (1989) 393-4 0 6 . 106. Fox, “Words o f W isdom", p. 154.
pessoas perceptivas e com petentes têm discernim ento da ordem moral e um a consciência social que m olda sua atividade. Têm um espírito sereno (i.e., autocontrole; 17.27), são pacientes (14.29), refreiam a lín gua (11.29), podem perscrutar as profundezas do coração do outro (20.5) e m anter um curso reto (15.21). Os insensatos não encontram prazer algum neste im perativo moral (18.2), e os tiranos carecem dele (28.16). Os aspectos éticos do ser prudente, um term o sapiencial, são “ fa zer o que é certo” (sedeq ) e ju sto (m ispãt ) e legítim o (ou reto; mêsãrím; 1.3). E. Kautzsch (1881 )107 e H. Stiger108 enfatizam que reto/retidão (saddíq [adj.]/?ede <7 [subst.]) significa sujeição a um a norm a, m as H. C rem er (1 899)109 e E. A chtem eier110 definem o term o com o um com portam ento socialm ente aceitável. H. H. Schm id agrupa essas duas categorias sob o conceito de um a ordem mundial universal que existe desde a criação, que se m anifesta nos âm bitos da lei, sabedoria, bên ção, natureza e fertilidade, guerra e bênção, e é garantida por Deus, que coloca o rei no trono com o seu representante terren o .111 J. W. Olley reúne essas noções e define a retidão com o “prom over justiça e harm onia para todos, para indivíduos, associadas na com unidade e nas esferas física e espiritual. Tem com o base o governo de Deus sobre o m undo” ." 2 Os retos (saddiq) estão dispostos a se colocar em posição de desvantagem em benefício da com unidade; os perversos estão dis postos a colocar a com unidade em posição de desvantagem em benefí cio de si m esm os. A m etáfora em Jó 29.14, “Eu me cobria de justiça, e esta me servia de veste”, m ostra que a “ju stiça” , é um padrão de vida, não m eram ente um a série de atos específicos. O que está em jo g o é o próprio ser, não apenas o desem penho; é a disposição, m ais do que m eras obras; o caráter por trás e além da conduta. E um a questão do coração (10.20), e é adquirida por m eio das palavras do sábio (veja 2.1 11). Com o a definição sugere, esse tipo de vida e com portam ento tem um a dim ensão religiosa, bem com o um a ética, um a vez que o justo depende do S e n h o r para m anter a ordem ética que ele estabeleceu 107. E. Kautzsch, Abhandlung iiber die Derivaie des Siammes ?dq em alttestamentlichen Sprachgebrauch (TUbingen: L. F. Fues, 1881), p. 53. 108. H. Stiger, TWOT, 2:752-55. s.v. sdq. 109. H. Crem er, Diepaulinische Rechtfertigiingslehre im Zusammenhang ihrer geschichlliehen Vorausselzungen (Gütersloh: Bcrtelsmann, 1900). 110. E. A chtem eier, “ R ighteousness in the O ld T estam ent", in IRD. 4:81. 111. H. H. Schm id, Gerechtigkeitais Wehordnung(Tübingen: Mohr, 1969). 112. J. W. Olley, '“ Righteous' and Wealth? The Description o fth e çaddiq in Wisdom Literature", Colloquium 22 (1990) 38-45.
visando o m elhor interesse da com unidade (cp. 3.5; 10.2). Os perversos renunciam a Deus, mas os justos se apegam a ele.113 O S e n h o r garante que sua justiça produzirá benefícios verdadeiros e segurança (2.11; 10.2, 3). Esta é, de fato, uma questão de vida ou morte (11.19; 15.9; 21.12).
HALOT esboça o desenvolvim ento dos significados de justiça ( mispãt ) da seguinte m aneira: “governo > decisão legal, julgam ento > caso > lei, direito, reivindicação > o que é devido a alguém em determ i nado caso” ." 4 G. Liedke observa: “O ato Spf se deu num a ‘relação de três pontas’: duas pessoas, ou grupos de pessoas, cuja interrelação nâo se encontra intacta são restauradas a um estado da Sãlôm por interm é dio de um a terceira parte, Spt”. E acrescenta, “A restauração da ordem da com unidade não deve ser entendida apenas com o um ato isolado, mas também com o um a atividade contínua, com o uma preservação constante de sãlôm". Em 1.3; 28.5 passim , porém, mispãt se refere a um a esfera, “àquilo que é devido”, “uma obrigação” , “aquilo que alguém deve fazer” e aquilo que é direito e correto (Êx 26.30; Jz 13.2; Jó 32.9), não se limitan do à esfera legal.115Além disso, como sedeq, mispãt resulta do caráter de um a pessoa; indica um a qualidade moral, bem com o um a ação. Um a vez que a “retidão” se refere à qualidade moral que estabele ce a ordem correta, e “ju stiça” se refere à qualidade m oral que restau ra essa ordem quando ela é perturbada, as duas ocorrem juntas com frequência (cp. 2.9). Viver corretam ente é fazer mispãt e sedãqâ (cp. Gn 18.19; SI 106.3; Pv 1.3; 2.3; 8.20; 16.8; 21.3; Is 5.7; 58.2); julgar corretam ente é ju lg ar de acordo com mispãf e sedãqâ (cp. Lv 19.15; Dt 1.16, 17; SI 9.4[5], 7, 8[8, 9]); governar corretam ente é governar de acordo com mispãt e sedãqâ (cp. 2Sm 8.15; lR s 10.9; SI 72.1-12; Ec 3.16; Is 9.7[6]), com o D eus governa todo o seu reino de acordo com mispãt e sedãqâ (cp. Jó 8.3; SI 33.5; 36.6[7]; 8 9 .14[15]). “Q uando usa dos em associação, esses substantivos caracterizam m ais com um ente a qualidade moral da qual resultam as ações (tanto divinas quanto hu manas). Porém , por vezes, são usados para se referir aos efeitos/con seqüências de tais atos m oralm ente qualificados” 116 (cp. Dt 33.21; SI 48.10, 11; Is 59.9, 11, 14a, 15b-17). Isso se aplica particularm ente a sedeq eyãsa' (cp. SI 51.14[16]; 98.1-19; Is 33.5, 6; 45.8). 113. 114. 115. 116.
G H. Livingston, TWOT, 2:864, s.v. HALOT, 2:615, s.v. mispãf. Liedke. TLOT, 3:1394, s.v. sp(. John Slek, com unicação pessoal.
r S S S .'.
A probidade (ou equidade, mêSãrim) é derivada da raiz yãsar, cujo significado literal tem a noção geom étrica de ser reto, quer horizontal quer verticalm ente, ou quando envolve um a superfície, algo plano (veja 3.6 [= endireitar]). Em 23.31 tem a noção m etafórica não-ética referen te ao vinho que desce “suavem ente” . Esse uso geom étrico pressupõe uma ordem fixa à qual algo pode ser com parado. A ssim , seu uso ético figurativo predom inante tam bém pressupõe um a ordem pela qual um a ação pode ser ju lg ad a com o reta, proba e uniform e. A raiz indica m eta foricam ente a conduta que não se desvia dos lim ites da sua ordem m o ralm ente fixada, o sentido da única outra ocorrência de mêSãrim em 8.6. Provérbios ensina a liberdade dentro da forma, a liberdade dentro da lei, a atividade sexual dentro do casam ento. Em Salm os, porém , mêSãrim apresenta um a preferência pelos contextos legais ou forenses. Ele é tipicam ente o objeto do Spt, “julgar” (Sl 58.1 [2]; 98.9), significan do que o indivíduo ju lg a de acordo com a ordem determ inada por Deus para o seu reino. Seu uso aqui com mispãt provavelm ente reflete o am biente palaciano de Provérbios. Isaías 33.15, em que ele é paralelo a “o que é reto”, lhe dá conteúdo: “o que despreza o ganho da extorsão; o que guarda a sua m ão de aceitar suborno...” . Esse tipo de reino é o reino eterno de Deus vindo à terra, pois seu trono está estabelecido na “justiça e direito” (Sl 89.14[ 15]; 97.2). O próprio Deus eterno julga os povos com equidade (Sl 9.8[9]; 75.2[3]; 96.10). Além dos term os “reto, ju sto e legítim o”, os term os éticos correla tivos incluem ser “irrepreensível” (tãm ), “bom ” ((ôb; 2 .9 ,20), e “hones to” (yãSãr; veja 1.3 e mêSãrim) e “confiável” m ünâ ), bem com o dem onstrar “bondade e fidelidade” ( hesed we'emet). Em 20.7, o reto anda em sua irrepreensibilidade.117
Irrepreensivel/irrepreensibilidade (tãm [adj.]/íõm [subst.]) indi ca inteireza e integridade (veja 1.12 [“ inteiros”]), não no sentido de alguém que persevera em seu trabalho e o com pleta, m as com referên cia a um processo que já foi realizado num a pessoa ou coisa e “que por m eio da necessidade im inente produzirá um resultado bom ou m au” .118 Com “cam inhar”, ele indica um com portamento consistente, “fazer algo com inteireza de coração” . Em Provérbios, tõm é um term o abrangente para um com prom isso total com o S e n h o r , conform e expressado por 117. Veja tam bém 19.25. 118. Cp. K. Koch. TLOT, 3:1,425, tmm.
seus sábios inspirados. A palavra é sem pre usada em associação com “andar” ou “cam inho” (veja 2.7; 10.9,29; 13.6; 19.1; 28.6; cp. 11.5,20; 28.10). Um a vez que o S e n h o r guarda seu cam inho, eles têm a prom es sa de sucesso futuro.
Bom (fôò) indica qualquer coisa ou pessoa desejável porque serve ao propósito para o qual foi criada.119 Q uando aplicado a pessoas, enfa tiza uma excelência especial ou qualidade positiva, dependendo do con texto, que a tom a desejável.120 A ju lg ar por seu uso em 2.20 e seu para lelo, “ju sto s”, tem -se em vista sua excelência ética e moral desejável. Elas servem ao propósito que Deus esperava no com portam ento hum a no. Termos paralelos a “bom ” incluem “ju stiça”, “retidão” (cp. Jó 34.4; Mq 6.8), e “honesto” (veja Dt 12.28; Jr 40.4). Ao contrário dos apósta tas, aqueles que guardam a aliança agem no m elhor interesse de Deus e dos outros seres hum anos, não de si m esm os. Trazem à terra o governo beneficente de Deus. Confiável ou “honesto” ou “consciencioso” (^m ünâ) designa não apenas as palavras de uma pessoa, m as tam bém seu caráter e conduta. De acordo com Jepsen, münãh não é tanto um a qualidade abstrata, ‘confiabilidade’, m as um m odo de agir que se desenvolve a partir da estabilidade interior, da ‘conscienciosidade’. Enquanto ’emeth é sempre usado em relação a algo (ou alguém ) [como palavras] em que (ou quem) se pode confiar, * münãh parece enfatizar m ais a própria atitude interior e a conduta que ela produz” .121 “O hom em ‘sincero’ não é tanto o hom em que conhece os fatos corretos e diz aquilo que corresponde à realidade, com o o hom em que é honesto, confiável e fidedigno, tanto em palavras quanto em atos... E m uito im portante ser ‘verdadeiro’ para com as outras pessoas, e não apenas verdadeiro em relação aos fatos. A pessoa que é sensível aos fatos, mas insensível às pessoas, que se orgulha de ‘não fazer rodeios’, não recebe nenhum elogio do sábio; isso porque tal pessoa pode causar tantos danos quanto o m entiroso.” 122 Por fim, bondade ( hesed ) significa essencialm ente “ajuda ao ne cessitado” e não tem um equivalente exato em nossa língua. R efere-se a um a situação em que um a parte necessitada depende de outra para receber livram ento e aquele que livra o faz voluntariam ente em decor 119. K.-D. Schunck, TDÜT. 5:298, s.v. fôb. 120. Schunck, TDOT, 5:306. 121. A. Jepsen. TDOT, 1:317, s.v. ‘ãman. 122. K. T. A itken. Proverbs (Filadélfia: Westminstcr. 1986), p. 136.
rência de seus instintos espirituais e sensíveis m ais excelentes (i.e., bondade, m isericórdia, am or e lealdade).123 Um a vez que o agente é livre para não usar da sua graça, fidelidade ou “confiabilidade” Çemet) é acrescida a hesed 21 vezes no A ntigo Testam ento.124 A com binação resultante significa exercitar hesed sem falta. (2 ) O te m o r d o S enhor O sábio/justo tem e ao S e n h o r , mas visto que o temor do S enhor (y ir a t YHWH) é a chave de Provérbios (1.7; 9.10), o sintagm a (um a
série de elem entos lingüísticos que form am um a unidade sintática dis tinta)125 m erece uma discussão separada. A fórm ula H ,0 não é o m esm o que as duas partes diferenciadas de hidrogênio e um a de oxigênio, e não se faz concreto sem m isturar cim ento com água. Assim com o não se pode entender o significado de “polichinelo” analisando “poli” e “chine lo” de m odo independente, tam bém não se pode entender o “tem or do S e n h o r ” estudando-se “tem or” e “do S e n h o r ” isolando esses term os. Trata-se de um a expressão com posta. O “tem or do S e n h o r (y ir’at YHWH) envolve sim ultaneam ente aspectos racionais e não-racionais.126 Seu aspecto racional requer um a revelação objetiva que pode ser ensinada (cp. SI 34.11 ss.[ 12ss.]) e m em orizada. No Salm o 19.7-9[810] o “tem or do S e n h o r ” é um term o correferencial para a “ lei” , “esta tutos” , “m andam entos” e “ordenações” do S e n h o r . O “tem or do S e n h o r ” , com o já dito, se refere “a um padrão de conduta moral conheci do e aceito pelos hom ens em geral” 127 e m otiva as pessoas a terem um com portam ento correto m esm o quando o Estado não im põe sanções m orais (cp. Gn 2 0.10,11; Êx 1.17). O “tem or do S e n h o r ” se refere, por com paração e contraste, à revelação especial do S e n h o r , quer por in 123. K. D. Sakenfeld (The Meaning of Hesed in the Hebrew Bible [HSM 17; M issoula, M ont.: S c h o la rs, 1978], p. 2 3 3 ) a c e rta a ltu ra d efin iu o term o co m o “ liv ra m e n to ou proteção com o lealdade para com outrem com quem alguém tem um relacionam ento” . Veja F. I. Anderson, "Yahweh, the Kind and Sensitive G od”, org. P. T. 0 'B rie n e D. G. Petcrson, in God Who Is Rich in Mercv (H om ebush, A ustrália: Lanccr, 1986), pp. 41-88. 124. G ênesis 24.49; 47.29; Êxodo 34.6; Josué 2.14; 2 Sam uel 2.6; 15.20; Salm o 25.10; 61.7[8]; 8 5 .10(11); 86.1 5 (1 6 ]; 89.5; P rovérbios 3.3; 14.22; 16.6; 20.28; seis v ezes com acréscim os secundários, com o uma preposição ou um sufixo (Gn 24.27; SI 7.4(5]; 40.11(12], 12(13]; 115.1; 138.2). 125. IBHS, p. 52. 126. B. W altke, “The Fear o f lhe L o ro ” , in Alive to God (D ow ners G rove, III.: InterVarsity, 1992), pp. 17-33. 127. R. N . W hybray, Wisdom in Proverbs: The Concept of Wisdom in Proverbs 1-9 (Londres: SCM , 1965), p. 96.
termédio de Moisés ou de Salomão. Por meio desse termo Salomão traça sua sabedoria à inspiração do S e n h o r . O “temor do S e n h o r ” também requer um aspecto não racional, uma reação emocional de temor, amor e confiança. Os polos psicologicamen te unificados do medo e do amor assumem o primeiro plano com preeminência no modo surpreendentemente uniforme como Deuteronômio con sidera “o amor ao S e n h o r ” e o “temor do S e n h o r ” como sinônimos (cp. 5.29 com 6.2, e 6.5 com Js 24.14; cp. 10.12,20; 13.5). Em Isaías 29.13 o “temor para comigo” distorcido de Israel é rejeitado justamente por ser constituído apenas de regras ensinadas por homens. De acordo com Provérbios 2.1 -5, “o temor do S e n h o r ” é encontrado por meio da ora ção sincera e da busca diligente das palavras do sábio. Em 15.33 a “hu mildade” e o “temor do S e n h o r ” são termos paralelos, e em 22.4 a “hu mildade” é definida como estando de acordo com o “temor do S e n h o r ” . Presume-se que o filho aceite a revelação porque ele teme e reveren cia o S e n h o r , que sustenta o ensino que promete vida aos obedientes e ameaça de morte os desobedientes. No clássico, O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa, de C. S . Lewis, quatro crianças entram através de um guarda-roupa em um mundo de fantasia, onde os acontecimentos e per sonagens de Námia representam a narrativa bíblica. Cristo é represen tado por Aslan, o grande leão. Quando o castor, que é o guia, instrui as crianças acerca de Námia, ele menciona o leão. As crianças perguntam: “Ele é seguro?” Ao que o castor responde: “Claro que não, mas ele é bom”. Assim como as pessoas em geral são motivadas a obedecer à sua consciência em função do temor de Deus, os santos respondem ao impe rativo moral das Escrituras sem quaisquer sanções legais ou eclesiásti cas. Para eles, o temor do S e n h o r é tão real quanto o amor que têm por ele (veja 14.27). As duas psiques se encontram arraigadas em sua fé: eles creem em suas promessas e o amam; eles acreditam em suas ameaças e o temem. Em resumo, C. Bridges diz: “[O temor do S e n h o r é] a reverência afetuosa, pela qual o filho de Deus se curva humilde e cuidadosamente para a lei de seu Pai” . 128 (3) O sábio e as palavras O comportamento do sábio/justo é, com frequência, pressuposto e 128. C. Bridges, An Exposition o f Proverbs (Evansville: Sovereign Gracc Book Club, 1959), pp. 3-4.
deixado sem definição, especialmente na Coleção IIA. Não obstante, dois campos semânticos se destacam claramente no contraste entre os sábios/justos e os insensatos/perversos: comunicação e riqueza. O ideal bíblico do discurso sábio se harmoniza com o ideal humanis ta de eloquentia - elementos já presentes no conceito clássico de sa bedoria. Gadamer observa: “Falar bem (eu legein) já apresenta dois significados, não é meramente um ideal retórico. Também significa di zer as coisas certas - aquilo que é verdadeiro, e não apenas a arte de falar - dizer com excelência seja lá o que for” . ' 29 E impossível exagerar a importância da eloquentia. Todas as rela ções sociais dependem de algum modo de comunicação. “A fala e a comunidade andam de mãos dadas. A comunidade depende da comuni cação - da informação e de atitudes compartilhadas” (cp. 11.30; 15.4), diz David Hubbard. 130 Nesta seção consideraremos o valor do discurso ou comunicação sábio, suas características e suas fontes. 131 Com respeito ao valor, a língua tem o poder da vida e da morte (18.21; cp. 10.19; 17.27,28), supostamente porque ela tem o poder de moldar as crenças e convicções que afetam destinos eternos. O pai depende de suas dez palestras para inclinar o coração do filho para a sabedoria e a vida. No entanto, o insensato incorrigível morre de fome porque se recusa a comer o bom fruto do ensino sadio ( 1 0 .2 1 ). O bom discurso é uma “árvore de vida” (11.30) e uma “fonte de vida” (13.14) disponível no presente. Segundo, a língua tem o poder de curar ou de destruir (6.12-15,16-19; 10.14; 11.9; 12.18; 16.24). O provérbio infantil “Paus e pedras podem quebrar os ossos, mas os insultos não podem feri-lo” não é verdadeiro, pois, como Kidner diz, “Aquilo que fazem a 129. H.-G Gadamer, Truth and Melhod. trad. e org. G Barden e J. Cumming (Nova York: Continuum, 1975), p. 19. 130. D. A. Hubbard, Proverbs (CB; Dallas: Word, 1989), p. 214. 131. Gemser (Sprüche, p. 31) observa que as seções mais longas do livro advertem acerca dos pecados da língua (10.18-21; 12.13-25; 18.6-8; 26.20-28; cp. Sir. 23.7-15), e também acerca do poder perigoso da língua, da boca e dos lábios (12.6; 13.3; 14.3; 18.20, 21; 21.23; Qoh. 10.12; Tg 3.1-12). “ Lábios mentirosos” são citados como uma abominaçâo ao S e n h o r em 12.22. Gemser reúne admoestações mais curtas desse tipo, as quais se encontram espalhadas por todo o livro (21.6; 4.24; 6.12; 8.13; 10.31, 32; 17.4, 20; 11.9; 14.3; 15.2; 2.16; 5.3; 6.24; 28.2). Ele comenta que os frutos dos lábios - tanto os bons quanto os ruins - acabam inevitavelmente por amadurecer (12.14; 13.2. 3; 18.20); porém, as palavras dos sábios e justos trazem uma bênção rica, e uma palavra branda e amigável faz maravilhas (15.1, 4; 25.15). Ele comenta ainda que a sabedoria egípcia também trata do poder da língua (Amen. 20:3-6, Insinger 4:5; 21:14; 29:15, 16) e considera a falsidade uma das maiores abominaçôes (Amen., cap. 10, 10-14.3).
você é pouco importante comparado àquilo que fazem dentro de você” . 132 Terceiro, a língua tem o poder de recompensar ou causar dano ao próprio indivíduo (10.10; 12.14; 18.6,7). A língua do insensato é comprida o suficiente para cortar a própria garganta. Os poderes de curar e destruir outros e de recompensar ou prejudicar a si mesmo são inseparáveis, como sugere a estrutura unificada de 10.6-14. Um aluno tomou algumas características do discurso sábio memo ráveis mediante o acrônico “Gentle Breath” (Respiração Gentil). Por gentil ele quis dizer que elas não são ríspidas e/ou irascíveis (15.1). O equivalente proverbial japonês é “o afável expulsa o severo”. As mulhe res sabem que o óleo pode ser mais eficaz que o vinagre. Agora o acrô nico (Breath em inglês): (Boast not) sem vangloria (27.1,2); (Restrained) sóbrio (10.19; 17.14, 27, 28); (Eavesdrops) sem mexericos (que não espalha boatos; 11.12,13); (Apt) apropriado (usado na hora certa e da maneira certa; 15.2); (Thoughtful) refletido (não precipitado; 15.28; 18.13); e (Honest) honesto (não falso; 8.7; 12.17, 19,22). O discurso sábio vem do coração (16.23); é produzido pela comu nhão com os sábios (13.20), pela preservação da doutrina sadia (22.1719) e pela oração (15.29). (4) O sábio e as riquezas Jesus contou mais parábolas sobre o dinheiro do que sobre qualquer assunto, provavelmente porque grande parte da comunicação humana esteja relacionada às riquezas. Como os políticos dizem: “E a economia, estúpido”. Em suas palestras, o pai procura salvaguardar seu filho do sexo fácil e do dinheiro fácil (1.10-19). A discussão a seguir analisa o tema da riqueza quanto ao seu perigo, limitação, valor e administração. O dinheiro é capaz de tomar o lugar da confiança em Deus. Em Provérbios, uma pessoa rica não é apenas alguém que tem mais do que o suficiente para suprir suas necessidades físicas, mas alguém cujo cora ção se apega às suas posses como fonte de segurança e sentido (veja 10.15; 18.10, 11; cp. S I 49.6[7]). O rico depende de si mesmo, não do S e n h o r , para viver (28.11); assim, ele é um insensato que vive no reino da morte. Além disso, Agur reconheceu que não poderia possuir coisas de mais sem se tomar vítima do poder desses bens (30.7-9). “A riqueza acabou com mais cristãos do que Nero”, diz o anúncio de um seminário.
Além disso, o valor do dinheiro é limitado (3.13-18). Ele pode ser usado para construir uma casa, mas não um lar; pode colocar o alimento na mesa, mas não a comunhão ao seu redor; pode dar a uma mulher joias e casacos de pele, mas não o amor que ela deseja de fato. A sabedoria, porém, oferece tanto o bem-estar material quanto a vida espiritual. Entretanto, o dinheiro tem valor. Ele salva quem o possui das per das espirituais associadas à pobreza. Agur também reconheceu que a falta de dinheiro o levaria a roubar e, desse modo, corromper sua cons ciência e aliená-lo de Deus (30.9). A pobreza também rouba a amizade. Embora aquele que despreza seu vizinho peque, a verdade é que as pessoas não querem a companhia dos pobres (14.20,21). O pobre não tem poder social (18.23; 22.7). A riqueza também permite que o indiví duo desfrute a vida mais plenamente (12.9). Muitos norte-americanos consideram máquinas de lavar louça, secadoras de roupas e geladeiras necessidades, mas não compreendem que as máquinas de hoje fazem aquilo que os escravos faziam nos tempos bíblicos. O dinheiro também permite que o indivíduo seja reto, no sentido de servir e enriquecer a comunidade (11.23-28; cp. Ef 4.28).133 A riqueza duradoura é recebida por meio do honrar a Deus com as primícias (3.9, 10), da generosidade (11.23-28), do trabalho árduo e oportuno (10.4,5), pelo contentamento, de não viver em função do pra zer (21.17), da paciência (13.11) e da provisão dos recursos necessári os antes de começar a construir uma casa (24.27). Como esses meios de obter riqueza deixam claro, é uma questão de caráter, não de méto do. Provérbios é um livro de “como ser” não de “como fazer”. Salomão é um teólogo melhor que Frank Sinatra. Sinatra canta, “Do-be, do-be, do” (Faça-seja, faça-seja, faça); Salomão canta “Be-do; be-do; be” (Seja-faça; seja-faça; seja). (5) O sábio e suas recompensas: vida O outro lado da doutrina da retribuição para os perversos (pp. 120-124) é a doutrina das recompensas para os justos (10.2; 11.5, 6 , 23, 27). Provérbios 3.1-10, chamado de “obrigações da aliança”, 133. Os provérbios que afirmam as vantagens limitadas da riqueza são 13.8; 14.20; 22.7, e aque les que declaram as desvantagens da pobreza são 14.20a; 18.23; 19.4b, 7; 22.7; 30.7-9. Contrastan do com isso, a riqueza do sábio é um bem ilimitado (cp. 10.4, 22; 18.10; 23.4, 5; 30.7-9; SI 61.3[4]).
apresenta as obrigações dos seres humanos em seus versículos ímpa res (1, 3, 5, 7, 9) e as obrigações do S enhor , a saber, vida e paz (v. 2), favor diante de Deus e das pessoas (v. 4), um caminho reto (v. 6 ), saúde (v. 8 ) e prosperidade (v. 10), nos versículos pares. Essas recom pensas são relativamente óbvias, exceto no caso do termo “vida” que, em Provérbios, costuma ser deturpado e/ou mal-entendido. O que está em questão é se “vida” (hayyim) se refere à vida eterna ou à vida temporal, a qual termina definitivamente com a morte física. Em outras palavras, a morte com a qual os perversos são ameaçados em Provér bios é a morte eterna ou a morte prematura? O substantivo hayyim ocorre 33 vezes e o verbo hãyâ quatro ve zes . 134 Em algumas ocasiões ele se refere à morte física. Em 27.27 se refere ao amparo clínico para as servas (27.27), e em 31.12 “todos os dias da sua vida” diz respeito ao tempo de vida da mulher virtuosa. Em 4.23, as “fontes de vida” são uma referência às atividades do corpo, mas em 14.30 hayyim é qualificado como “vida do corpo”. Em 4.22, hayyim é paralelo ao bem-estar físico. Em 3.2 a expressão “os teus dias e... anos de vida” (veja também 4.10; 9.11; 15.24) parece uma referência ao “tempo de vida” até que se compreende que Isaías usou essa mesma expressão em relação ao servo sofredor, para falar de sua vida depois de sua morte física (Is 3.10). Com mais frequência, porém, hayyim não é qualificado e se refere à “vida” que é acrescentada à vida física, aparentemente uma vida abun dante de saúde, prosperidade e estima social (3.21,22; 4.13; 8.35; 16.15; 21.21; 22.4). Com exceção de 16.15, estas e outras passagens apresen tam a vida como recompensa da sabedoria, uma recompensa que jamais será manchada pela morte (4.22; 6.23; 10.17; 11.19; 12.28; 13.14; 15.31; 19.23; 22.4). Isso também vale para todas as quatro formas de uso do verbo (4.4; 7.2; 9.6; 15.27). A “árvore de vida” representa figurativa mente a cura perpétua que garante a vida eterna (3.18; 11.30; 13.12; 15.4; cp. Gn 2.9; 3.24). E provável que o mesmo seja verdade da outra fonte, “fontes de vida” (16.22). Os perversos, ao contrário, desfrutam seus despojos durante sua vida física, mas a morte é o seu destino certo (1.10-19). “O salário da pessoa justa é, certamente, a vida; o pagamento da pessoa perversa é 134. W. Cosser, “The Meaning o f ‘Life’ (Hayyim) in Proverbs, Job, and Ecclesiastes”, GUOST 15 (1955) 48-53.
certamente o pecado e a morte” (1 0 .1 6 - minha tradução). Aqui, em sua oposição ao “pecado”, a “vida” sugere vida espiritual. Kidner co menta, “em várias passagens não é exagero dizer que ‘vida’ significa comunhão com Deus... Algumas das principais expressões do Antigo Testamento para a piedade são intercambiáveis com ‘vida’ ou ‘vi ver ’” . 135 Na teologia bíblica, a vida abundante, que é qualitativa e quan titativamente distinta do fôlego de vida e que é simbolizada pela árvore da vida (veja Gn 2.7,9; 3.22) é essencialmente um relacionamento com Deus. De acordo com Gênesis 2.17, a ruptura do relacionamento cor reto com aquele que é a fonte de vida significa morte. A sabedoria se preocupa com esse relacionamento correto (Pv 2.5-8) e, desse modo, com a experiência da vida em seu favor. Em resumo, na maioria dos textos de Provérbios, o termo “vida” se refere à vida abundante em comunhão com Deus, um relacionamento vivo que nunca tem como fim previsto a morte física, contrastando, portanto, com a morte eterna dos perversos (veja 2.22-23). Como Jesus disse: “Eu sou o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó? Ele não é Deus de mortos e sim de vivos” (Mt 22.32). Em momento algum Salomão descreve os perversos fisicamente vivos como estando no reino da luz e da vida; antes, encontram-se no reino das trevas e da morte, um estado de já estar morto, pois não têm qualquer relacionamento com o Deus vivo. Os textos que predizem a morte representam esse estado presente que se encerra com um final trágico, fim definitivo, não necessariamente uma morte prematura. 136 O lascivo lamentará seu caráter incorrigível quando “se consumirem a [sua] carne e o [seu] corpo” (5.11). A busca pela sabedoria e a prática da retidão salvam os sábios do reino e do destino da morte, mas nada pode livrar os perversos (1.4, 19; 10.2; 13.14; 14.27; 15.24). Sua morte física é uma viagem sem volta, sem uma segunda chance (1.20-33; 2.19,22; cp. SI 49.8[9], 15[ 16]; Is 26.19). Se a morte é o fim definitivo dos perversos, devemos concluir que a vida é o fim definitivo dos justos (cp. Mt 25.46). Outros textos ensinam mais explicitamente que essa vida abundan te continua depois da morte física. 137 Em Provérbios 12.28 os justos 135. Kidner, Proverbs, p. 53. 136. Pace C. H. Toy (The Book o f Proverbs [ICC; Edinburgh: T&T Clark, 1977], p. 48) e muitos outros. 137. A LXX hesita estranhamente entre a ênfase na vida depois da morte (14.32; 15.24) e na
são recompensados com “imortalidade” Çalmãwet). Provérbios 14.32 diz: “Mesmo na morte o justo busca refúgio em Deus” (minha tradu ção) e 23.17 assevera que sua esperança futura não será frustrada; os perversos, ao contrário, não têm nenhuma esperança futura (11.7a; 12.28; 24.19,20). Provérbios ensina a imortalidade, não a ressurreição, como é o caso de Jó 19.25-27; SI 49.15[ 16]; cp. 49.8; 73.23, 24; Is 14.13-15; e Daniel 12.2 (cp. Gn 5.24; 2Rs2.1). Mas Provérbios 15.24 sugere uma ascensão da sepultura. Considerado literalmente, o movi mento do lugar “embaixo”, que é usado em associação com sepultura (se ’ôl) “para cima”, se encaixa no ensino bíblico de que os piedosos terminam sua jornada na presença do próprio Deus (SI 16.9-11; 73.2326; Jo 14.1-4; 2Tm4.18; Hb 12.2). Ser salvo da sepultura é mais do que ser poupado de uma morte prematura, pois, de outro modo, “o caminho da vida” é, por fim, tragado pela morte. A morte não é deus e não tem a última palavra no livro de Provérbios, como não tem em nenhum livro da Bíblia (cp. Gn 5.24; 2Rs 2.1; SI 4 9 .15[16]; 73.23,24; Is 14.13-15). A esperança de uma vida depois da morte está inteiramente de acordo com a famosa crença egípcia na vida depois da morte. Os hinos e orações dos egípcios a Amenotepe IV Aquenaton, gravados nos tú mulos de cortesãos em Amama, registram suas esperanças de um fu turo abençoado. Lichtheim comenta: “Ao registrar suas esperanças de uma vida abençoada após a morte, os cortesãos não se voltam mais para Osíris e outras crenças reconfortantes. Somente o rei, o filho de Atom, restou como fiador de sua sobrevivência” . 138 As escolas egípci as onde se ensinava a sabedoria eram chamadas de “Escolas da Vida”. Uma vez que Provérbios demonstra uma forte dependência das instru ções egípcias, seria surpreendente se “vida” significasse menos em relação ao Deus vivo do que a esperança egípcia de vida em relação a um “não deus” (Dt 32.21), e cujo Livro dos Mortos mistura magia com moralidade. O conceito intuitivo de justiça que a humanidade possui exige essa doutrina (veja pp. 162-163).139 vida presente (12.28; 23.17, 18; 24.19, 20). V. Coltini (La vila futura nel livro dei Proverbi: Contributo alia storia dell-esegess (SBFA 20; Jerusalém: Franciscan Printing, 1984) conclui que se deve dar prioridade ao TM em sua crença numa escatologia aberta à transcendência. 138. A EL, 2:6. 139. A imagem da sabedoria segurando em uma das mãos a "vida longa” e , na outra, "riquezas e honra” em 3.16, provavelmente é derivada de várias representações da deusa egipeia Ma'at, que segura em uma das mãos o sinal de ank, o símbolo da vida e na outra, o cetro, símbolo de riquezas e honra. Essa imagem é expressa vividamente na “árvore da vida” em 3.18. Kayatz (Studien, pp. 106-7) faz uma ligação questionável com as árvores benefi-
Não obstante, é preciso reconhecer que Provérbios e as instruções egípcias se concentram na saúde, prosperidade e honra social nesta vida, contrastando com o enfoque cristão na ressurreição. Talvez isto se deva à falta de clareza acerca da esperança antes da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos. (6 ) Provérbios promete demais? Essas promessas celestiais de vida, saúde, prosperidade e honra parecem não estar ligadas às duras realidades da terra. As promessas parecem falsas considerando-se a experiência humana debaixo do sol, como Jó (9.22, 23) e Qoheleth (Ec 9.2, 3) se queixaram, e contrárias à sã doutrina. Elifaz solucionou o conflito por meio da doutrina do pecado original (Jó 4.17), mas o narrador de Jó nega essa argumentação (1.8 ), como também o faz o S e n h o r (42.7). Salomão, porém, acrescenta às obrigações da aliança em Provérbios 3.1-10 que o S e n h o r disciplina aqueles a quem ama (3.11, 12), provavelmente para motivar a pessoa a guardar suas obrigações pactuais, tomando-a apta para experimentar as bênçãos da aliança. Caso alguém pense que Salomão e os outros sábios são uns simpló rios que não conseguem ver ou raciocinar direito, que esse alguém se lembre de como a observação perspicaz e a reflexão concludente são as marcas do mestre sábio. Aitken comete um erro crasso ao sugerir que os sábios se mostraram excessivamente otimistas em suas promessas: “Há uma forte suspeita aqui de que os sábios de Israel fizeram confusão entre sua crença com aquilo que deve ser o caso e aquilo que é, de fato, o caso” . 140 Von Rad vai ainda mais longe, sugerindo que Qoheleth acusa os sábios da chamada “antiga sabedoria” de se “enredarem numa única doutrina falsa” . 141 James G Williams concorda com von Rad: “Sua [do Qoheleth] principal forma de apresentação de provérbios contrastan tes... visa contradizer a sabedoria tradicional” . 142 Essas soluções aba ccntcs egípcias, como o sicômoro na beira do céu. Um texto numa pirâmide, por exemplo, diz: “N. segura os dois sicômoros, que se encontram daquele lado dos céus". Ela observa que a árvore Isched egípcia também serve de tipo para a árvore da vida. Em textos mais antigos os nomes e anos dos reis são eternizados em suas folhas e, em textos posteriores, a vida da alma recebe garantia de existência eterna pelo próprio Thot que escreve um registro para o morto sob a ‘‘árvore da vida” . 140. Aitken, Proverbs, p. 43. 141. Von Rad. Wisdom in Israel, p. 233. 142. J. G Williams. Those Who Ponder Proverbs (Shcffield: Almond, 1981), p. 53.
lam Provérbios e o cânon e, desse modo, lançam dúvida sobre as rei vindicações de Cristo e de seus apóstolos de que toda a Escritura é inspirada por Deus, que não é autor de confusão, e que a Escritura não pode ser invalidada (Jo 10.35; ICo 14.33; 2Tm 3.16). A solução evangélica popular, segundo a qual não se trata de pro messas, mas de probabilidades, apesar de conter uma parcela de verda de, cria problemas teológicos, práticos e psicológicos ao apresentar a questão de modo tão impróprio. De acordo com essa forma de expres são, espera-se que o ser humano cumpra suas obrigações perfeitamente (3.1, 3, 5, 7 e 9), mas Deus pode cumprir suas obrigações imperfeita mente (3 .2 ,4 , 6 , 8 , 10). Na verdade, porém, “se somos infiéis, ele per manece fiel” (2Tm 2.13). Além disso, uma pessoa sóbria deseja saber as probabilidades, e uma pessoa psicologicamente saudável dificilmen te poderia confiar em Deus de todo o seu coração (3.5) sabendo que, normalmente, mas não sempre, ele cumpre suas obrigações. No entanto, é possível tomar outros passos para encontrar uma so lução. Em primeiro lugar, as promessas são parcialmente validadas pela experiência. Aquele que experimenta saúde e riqueza normalmente é o sóbrio, não o bêbado (cp. 23.29-35); o tranqüilo, não o esquentado (15.18; 19.19; 22.24; 29.22), e o diligente, não o preguiçoso (veja pp. 170-171). Em segundo lugar, como já observado, a natureza epigramática dos provérbios leva a audiência, frequentemente, a não prestar atenção nos contraprovérbios, que qualificam essas promessas. De acordo com Leeuwen, “Há muitos provérbios que afirmam ou sugerem que o per verso prospera... enquanto o inocente sofre” . 143 Já discutimos (veja p. 90) a necessidade de ler o primeiro par de provérbios (10.2, 3) como uma unidade. 1 0 .2 a afirma que os perversos têm tesouros obtidos por meio da perversidade por algum tempo, mas 10 .2 b diz que esses tesou ros não os livrarão da morte. A isto 10.3 acrescenta que (mais tarde) os anseios dos perversos serão frustrados, enquanto que os justos, que talvez estejam sendo afligidos agora, serão alimentados posteriormen te. Os vários provérbios que começam com “melhor... do que” pressu põem que, no presente, os perversos possuem dádivas materiais, e os justos não: “Melhor é o pouco, havendo justiça, do que grandes rendi mentos com injustiça” (cp. 16.8,19; 17.1; 19.1,22; 21.9,19; 22.1; 25.24; 143. R. van Leeuwen, “Weallh and Poverty: System and Contradiction in Proverbs", HS 33 ( 1992) 29.
28.6; SI 37.16; Ec 4.6). Sem esses ditos qualificadores é possível acusar Salomão legitimamente de declarar meias-verdades. Em terceiro lugar, o gênero literário de Provérbios, como cartilha de moralidade para os jovens, leva o livro a enfocar um futuro em que os justos se levantam, não um presente em que caem: “Porque sete vezes cairá o justo e se levantará; mas os perversos são derribados pela calamidade” (24.16). O número “sete” simboliza inteireza, como “a contagem até dez” no boxe e as “sete vidas” de um gato. Em resu mo, “Os justos são tidos como nocauteados para sempre”. Todavia, o dito descarta essa realidade dura numa cláusula concessiva. Entretanto, o efeito do empirismo nesse gênero leva Jó e Eclesiastes a enfocarem os sofrimentos dos justos antes destes se levantarem . 144 Por fim, como foi argumentado na seção anterior sobre “a recom pensa dos justos”, estes se levantam num futuro abençoado que se es tende além da morte. Além desses argumentos exegéticos, o conceito do livro de justiça requer esta esperança. É bastante instrutivo que a pri meira situação descrita na primeira palestra do pai seja semelhante à primeira situação da humanidade fora do jardim. Assim como Caim assassinou o justo Abel, provocando sua morte prematura, depois da qual Caim teve um tempo de vida normal, também o pai apresenta o “sangue inocente” ( 1 . 1 2 ) de um viajante que sofre uma morte prematu ra nas mãos de pecadores corruptos que tripudiam sobre a sua sepultu ra. Essas situações iniciais desabonam a interpretação popular de que a vida e a morte em Provérbios se referem, respectivamente, a viver até uma idade avançada e a sofrer uma morte prematura. A fim de que a justiça seja feita, como Provérbios garante que será (e.g., 3.31-35; 16.4, 5), Abel e o viajante inocente devem ser vingados e livrados da morte num futuro que se encontra além de suas mortes físicas. Se a morte física é a última palavra para as vítimas inocentes de emboscadas, en tão a primeira palestra, com outras histórias bíblicas acerca da morte de mártires, anula a reivindicação da Bíblia de que Deus sustenta a justiça. Farmer comenta com razão: “Toma-se necessário abrir mão da ideia de justiça ou empurrar sua execução para uma esfera além da evidência da experiência humana” . 145 E evidente que esse futuro não é 144. Veja B. Waltke, “ Proverbs: Theology o f ’, em NIDOTTE, 4:1089-93. 145. K. A. Farmer, Who Knows Whai is Good?: A Commenlary on the Books o f Proverbs and Ecclesiasles (Grand Rapids: Eerdmans, 1991), p. 206.
acessível à verificação, como Gladson observa criticamente, 146 mas sem esse tipo de fé é impossível agradar a Deus. Se essas promessas pudessem ser confirmadas pela experiência, por que o pai ordenaria que o filho confiasse no S e n h o r (3.5)? Se Deus recompensasse a virtude imediatamente, o filho confundi ria prazer com piedade, usando a piedade e a ética para satisfazer seus interesses lascivos. Colocaria o eudemonismo (i.e., o sistema de pensa mento que baseia a ética no prazer pessoal) no lugar das verdadeiras virtudes da fé, esperança e amor. Deus desenvolve o caráter de seus santos chamando-os a sofrer por causa da justiça enquanto vivem na esperança da vida etema. Desse modo, ele lhes ensina a virtude ao mes mo tempo em que sustenta a justiça (Rm 5.3, 4; 2Pe 2.3-11). Em resumo, Provérbios caracteriza os sábios como aqueles que vivem pela fé inteiramente (“de todo o teu coração”; 3.5), exclusiva mente (“não te estribes no teu próprio entendimento”) e exaustivamen te (“reconhece-o em todos os teus caminhos”; 3.5, 6 a). c. O insensato e o perverso ( 1 ) Insensato, perverso e outros termos correlatos De acordo com K. H. Richards, os “perversos” são os culpados aos quais sempre se faz referência em termos de uma comuni dade. 147 O antônimo mais importante de sedeq (“retidão”, fidelidade à comunidade [veja 8.20]) é rãsã', “perversidade”. “Ao contrário da raiz positiva sdq, rS' expressa comportamentos negativos - pensamentos, palavras e atos maus - um comportamento antissocial que revela si multaneamente a desarmonia e inquietação interior do indivíduo (Is 57.20).” 148 Se o justo beneficia a comunidade, mesmo à custa de pre juízos para si mesmo, então o perverso beneficia a si mesmo, trazendo prejuízos para a comunidade sob o governo de Deus. Nesse livro, ^s& im se refere aos ímpios que são gananciosos (10.3; 21.10), violentos (10.6), ameaçam vidas inocentes (12.6; 24.15), praticam o engano (12.5) e a crueldade (12.10) e falam perversamente (10.32; 11.11; 15.28; 19.28). 146. J. A. Gladson. “Retributive Paradoxos in Proverbs 10-29” (Diss. Ph.D.. Vanderbilt University, 1978). 147. K. Richards, “A Form and Traditio-historical Study o f r s '" (Diss. Ph.D., Claremont. 1970; cp. ZAW, 83:402). 148. C. van Leeuwen, TLOT, 3:1262, s.v. rs'.
O S e n h o r o s abomina e a seus caminhos (15.9, 29), inclusive seus sa crifícios (15.8; 21.27) e aqueles que os ajudam no tribunal (17.15; cp. 18.5; 24.24). Os termos éticos correlativos para insensatos e escamecedores mais freqüentes incluem “perverso”, “pérfido” e “malfeitor” (para “pecado”; veja 1 . 1 0 ). Seguindo a tendência do sábio de pensar em ética em termos geo métricos (veja p. 146), os perversos têm um discurso “obstinado” (tahpukôt', lit. “virar; estar de cabeça para baixo”). Tahpukôt é um substantivo abstrato que designa a ação de sua raiz verbal hãpak, “em borcar, subverter”, como quando o pão é virado enquanto está sendo assado (Os 7.8) e como tigelas que são emborcadas (2Rs 21.13). Em Deuteronômio 32.20, tahpukôt se refere a uma geração que subverte a herança mosaica de Israel. Em Provérbios é usado como termo geral para o opróbrio por causa das palavras (8.13; 10.31; cp. 17.20) do co ração perverso (cp. 6.14; 16.30) que planeja e tem como objetivo cau sar uma subversão repentina ou um processo que provoque uma mu dança brusca nos caminhos retos dos sábios, transformando-os em “ca minhos tortuosos” de um estilo de vida moralmente desordenado. 149 Este tipo de língua será “desarraigado”, pois essa ameaça à saúde pú blica deve ser tratada com uma cirurgia radical, como no caso de um câncer que coloca a vida do enfermo em perigo (10.31). Seus sinôni mos funcionais incluem 'qs (“tortuoso”, 2.15 e 6 . 1 2 ) e luz, “desencaminhado” (lit., fazer desviar; 2.15; 3.32 [= perverso]; 14.2). 'ãqaSé usado para se referir à distorção daquilo que era reto (cp. Mq 3.9). De acordo com Brueggemann, o ato perverso é realizado de modo independente da comunidade e contrário à mesma a favor daquele que o realiza (veja 10.9) . 150 Em Isaías 42.16 ele indica lugares acidentados e tortuosos em contraste com um lugar plano. A palavra combina a perversidade moral daquilo que as pessoas dizem e fazem (Pv 8 .8 ; 19.1; 28.6) com os resul tados calamitosos de seu estilo de vida; ele as faz tropeçar e cambalear pelo caminho (4.12; 22.5). Os perversos dentro de um país também são chamados de “pérfi dos” (bõgedím-, 11.3, 6 ; 13.2, 15; 21.18; 22.12; 23.28; 25.19). Bãgad expressa a deslealdade de uma pessoa a um relacionamento existente e estabelecido. As pessoas em questão são, mais especificamente, ho mens e mulheres que “deixaram” sua herança de relacionamento com 149. K. Seybold, 7/J07', 3:423, s.v. hãpak. 150. W. Brueggemann, “A Neglected Sapiential Word Pair”, ZAW%9{ 1977) 244.
Deus e com seus mestres (veja 2.13, 17; cp. S I 25.3). Em 2.21, 22 a comunidade externa da aliança é dividida em dois grupos: aqueles que são inteiramente comprometidos com o S e n h o r e com seus ensinos e aqueles que se recusam a honrar esse acordo que lhes foi transmitido por seus pais fiéis. “Aqueles que praticam (põ'alê, i.e., executam) a iniqüidade ( 'ãwen)” exercem seu poder negativo de violência e usam sua dissimulação con tra toda a humanidade, inclusive contra os irrepreensíveis, os quais são perseguidos por eles (veja 3.34; 6.12 [“homem vil”]; 10.29; 21.15b; cp. Êx 2 3.20-33 ; Mq 5.7-9[6-8]). Esses termos éticos sugerem a culpabilidade moral do insensato, não sua falta de inteligência. Porém, os termos sapienciais para os que são faltos de sabedoria não são correlativos, mas distinguem três ou quatro classes de insensatos de acordo com suas capacidades cogniti vas: o ingênuo, o insensato e o escamecedor. O preguiçoso é pior que o insensato (cp. 28.12, 16), mas não é tão incorrigível ou vil quanto os faltos de entendimento. (2 ) O ingênuo (peti) O termo pessoal “ingênuo” (I p eti/petã ’y im ) ocorre 14 vezes em Provérbios e os substantivos para “credulidade” (II p eti e p etayyút) uma vez cada um. Seu sentido maio partem em Provérbios deve ser distinguido com cuidado do seu sentido bono partem em Salmos. O verbopth indica basicamente a situação de ser facilmente desencaminhado; no Qal, “ser ingênuo”; no Nifal, “permitir-se ser persuadido” e no Piei, “seduzir, desencaminhar, tentar” (1.10). Esse significado da raiz de ser facilmente seduzido permanece em suas formas nominais. Apesar de serem intelectualmente falhos, osp etã ’y tm , “jovens inexpe rientes” apresentam o tipo mais suave de insensatez, 151 pois são male áveis, capazes de ser moldados e aperfeiçoados pelo processo educa cional (1.4; 8.5; 12.25; 21.11), e ainda há esperança de que se juntem aos sábios (cp. 1.22; 9.4 ) . 152 Tanto a sabedoria quanto a loucura com petem por sua submissão (cap. 9). Mas enquanto não optam por um compromisso com a sabedoria, permanecem inconstantes. De acordo 151. Skladny, Die ãllleslen Spruchsammlungen in Israel, p. 35; T. Donald, “The Scmantic Field o f ‘Folly’ in Provcbs, Job, Salms. and Ecclesiastes", VT 13 (1963) 285-92. 152. Cp. McKane, Proverbs, p. 265.
com os termos descritivos empregados com p eti, o ingênuo é um jovem (1.4; 7.7), falto de juízo (7.7; 9.4, 16), que não tem astúcia (14.15, 18), não é “discemente” ( 19.25) nem “sábio” (21.11), sem força de vontade (22.3; 27.15) e facilmente seduzido (7 .7 ,2 1 ,22).153Visto que ele é um jovem, a estultícia está ligada a seu coração (22.15). Uma vez que não tem compromisso e que se mostra aberto a diversas influências, pode ser encaminhado (9.1 -6) ou desencaminhado (vs. 13-18). Apesar dos ingênuos não serem chamados de perversos nem ímpi os e de não serem comparados ao “insensato”, sua credulidade não deixa de ter relevância moral ou religiosa e de ser um perigo para si mesmo e para aqueles com os quais se relacionam. Enquanto não se arrependem, estão agrupados com os insensatos e escamecedores mo ralmente culpados ( 1.22,32; 8.5). Em sua falta de compromisso, confi am ingenuamente em todas as palavras (14.15), caminham tropegamente [cambaleiam] para o infortúnio (22.3; 27.3) e herdam a “estultí cia” (14.18); sua “apostasia” (me$âbâ) os conduz à morte (1.32). Só poderão viver (9.6) se deixarem a comunidade dos seus semelhantes e tomarem o caminho do discernimento, aprendendo a astúcia (8.5; 9.4, 6 , 16). Sua necessidade básica é “perspicácia” Çormâ). A mulher lou cura, cujo caminho conduz à morte, é caracterizada pela “credulidade” (petayyüt; 9.13). Em resumo, apesar de ser possível salvá-los, são após tatas moralmente culpáveis, colocados no mesmo grupo dos insensatos e escamecedores (1.22, 32; 8.5) e estão rumando para a morte (1.32). (3) Duas palavras para o insensato (* wil e kesil) Ao contrário do ingênuo, o insensato está apegado à natureza cor reta da própria opinião, que se opõe claramente à ordem moral estabe lecida e revelada por meio do sábio. Ptah-hotep observou: “Um insen sato vê conhecimento na ignorância, proveito na nocividade... Ele vive daquilo que causa a morte, seu alimento é a distorção do discurso” . 154 Ele é o oposto do “sábio” em sua inteligência moral e religiosa. Os dois termos depreciativos, traduzidos como “insensato”, *wil e kesil se referem a pessoas com um caráter moralmente deficiente, o qual instiga seu comportamento irracional. São obstinadas pois, fazen do ouvidos moucos para a sabedoria, deleitam-se - em função de sua 153. Donald, “The Semantic Field o f ‘Folly’”, p. 287. 154. AEL, 1:74-75.
visão moral desvirtuada, da qual estão absolutamente seguras - em distorcer valores que beneficiam a comunidade. Fox distingue dois ter mos para a sua relação de causa-efeito com a obtusidade. De acordo com ele, “O *wil é obtuso em virtude de sua perversão moral”, e o kesil é, ou provavelmente se tomará, moralmente perverso em decor rência de sua obtusidade” . 155 De qualquer modo, ambos são obtusos e a distinção entre esses dois antônimos de sábio não pode ser delineada claramente pois compartilham as mesmas deficiências morais e conse qüências fatídicas. Ao citar primeiramente os textos que dizem respeito a *wil e, em seguida, a kesil, pode-se observar que ambos são carac terizados por ’iwwelet (“estultícia” 6.22 e 14.24; 17.12; 26.4, 5, 11), desprezam a disciplina e a correção (15.5 e 15.20), são desprovidos de sabedoria (10.14,21 e 14.33), são pobres no seu falar (10.8,10; 17.28; 27.3 e 10.18; 12.23; 15.2; 19.1), são faltos de autocontrole e facilmente irritáveis (12.16; 20.3 e 19.11), são moralmente insolentes, intratáveis e incorrigíveis (12.15; 24.7 e 15.14; 17.10; 18.2; 26.5,11; 28.26). Ligados desesperadamente à sua insensatez (27.22 e 14.24; 17.10, 16; 23.9; 26.11), são incapazes de administrar o próprio lar e finanças (11.29 e 21.20), não têm honra (20.23; 29.9 e 3.35) e são castigados por sua insensatez (10.14; 14.3 e 19.29; 26.3). O “insensato” (ou “louco”, *w il) que tem em Provérbios 19 das suas 26 ocorrências, apresenta como característica singular a falta ab soluta de interesse em reparar erros (14.9); sua provocação incessante é mais pesada do que carregar um saco de areia (27.3) e sua amolação perturba os outros (12.16; 17.25; 25.3; 26.4). Mas é provável que o mesmo se aplique a kesil. Ao contrário do sábio, o ^wil é autossuficiente e não dá ouvidos aos conselhos (12.15). Seu desprezo pela sabedoria (1.7) está arraigado em seu orgulho (SI 31.18[ 19]; 123.4). O substantivo “estultícia, insensatez” ( 'iwwelet) que ocorre 25 vezes na Bíblia, sendo 23 delas em Provérbios, de acordo com Fox, “é a corrupção moral do ponto de vista do seu impacto sobre o juízo e a razão” . 156 Apesar de ser possí vel remover 'iwwelet do jovem por meio da vara da disciplina (22.15), o ^wil encontra-se inseparavelmente ligado à estultícia (27.22). A conjun ção fatídica de ação e destino transforma a estultícia numa disciplina castigadora (müsãr, 16.22). O que vem da sua boca é extremamente explosivo (10.14) e sua ignorância provoca sua morte ( 1 0 .2 1 ). 155. Fox, Proverbs 1-9, p. 40. 156. Fox, Proverbs 1-9, p. 40.
Das 70 ocorrências de I kesil, com exceção de três, todas se en contram em Provérbios: “loucura” (kesilüt) aparece em 9.13.157 Seu significado original era “ser grosso, gordo” e, em uma ocorrência kesel tem o sentido físico de “lombo” (3.26; “segurança” ARA). Kesel se refere a “esperança e confiança” quer piedosas e louváveis (SI 78.7) ou temerárias e míopes (Jó 8.14; 31.24; SI 85.9[ 10]). Fox vê “um des locamento semântico fácil da confiança normal para a confiança ex cessiva e desta para a obtusidade presunçosa”. Ele defende a tese, observando que “vários versículos pressupõem a ligação entre confian ça (excessiva) e estupidez” (cp. 1.32; 28.26).158 Fox traduz o substan tivo pessoal como “tolo” ou “imbecil”, e o substantivo abstrato como “estupidez” ou “imbecilidade” . 159 Absolutamente seguro do seu ponto de vista (18.2; 26.12; 28.26; 30.32), esse indivíduo não tem nenhuma inclinação para a instrução ou desconsidera a verdade moral e temerariamente torna conhecida sua estultícia (12.23; 15.2; 29.6). Ao expres sar suas opiniões, ele coloca a outros (17.7) e a si mesmo (18.6, 7) em apuros. Irrita-se com facilidade (29.11), é imprudente (14.16) e se de leita na conduta perversa (10.23). Nas suas mãos o dinheiro é desper diçado (17.16). Tem uma propensão para divertimentos descuidados (19.10). Seus caminhos são visíveis a todos (13.16). É melhor se depa rar com uma ursa enfurecida, roubada dos seus filhotes, do que com um insensato em sua estultícia (17.12). Todo aquele que se mostra ex cessivamente autoconfiante é insensato (28.26). Em vez de considerar o conhecimento desejável e, desse modo, algo a ser conscientemente valorizado e buscado, os insensatos o têm como repulsivo e tentam se livrar dele. É por isso que o insensato volta à sua estultícia, “como o cão que toma ao seu vômito” (26.11 ) . 160 (4) O escamecedor (Zês) Os apóstatas mais endurecidos são os escamecedores (Zês[ím]), 157. M. Saebe, TLOT, 2:620. s.v. kesll. De acordo com Pan (A Study o f the Vocabularv o f Education in Proverbs, p. 142). em cerca de dez das 46 ocorrências em Provérbios, o kesil se encontra em oposição ao sábio (veja 10.1), com frequência, em contextos que contras tam sua indiferença para com sabedoria com o amor do sábio por ela. Em dez ocasiões é associado a ’iwwelet (“estultícia”): três com respeito ao discurso (2.9: 12.23; 15.2), quatro com respeito aos atos c seus resultados (3.16; 14.8, 24; 17.12), e duas com respeito ao caráter incorrigível do indivíduo (15.14; 26.11). 158. Fox, Proverbs 1-9, p. 40. 159. Fox, Proverbs 1-9, p. 41. 160. Veja 26.1-12 para uma coleção de provérbios sobre esse tipo de pessoa.
uma palavra que ocorre 14 vezes em Provérbios e duas vezes em ou tros textos (SI 1.1; Is 29.20). O substantivo “escárnio” (lãsôn) ocorre três vezes no Antigo Testamento (Pv 1.22; 29.8; Is 28.14). O escarnecedoré a antítese do sábio (Pv 9.12; 13.1; 20.1; 21.4), o qual ele odeia (9.7,8; 15.12), e do perspicaz (14.6; 19.25), e é colocado com os insen satos (1.22; 3.34,35; 14.6,7; 19.29), os ingênuos (1.22) e os soberbos e arrogantes (21.24). Seu problema espiritual se encontra arraigado em seu orgulho pretensioso (21.24). Sua arrogância desdenhosa o separa da sabedoria (14.6). E particularmente hábil na injúria e degeneração que impressionam o ingênuo enquanto consegue tudo a seu modo (19.25; 21.11). Abre sua bocarra e, desabafando tensões e pressões sobre uma comunidade, provoca discórdias em seu meio (22.10; 29.8) e a destrói (21.24; 22.10; 29.8). Sua influência nociva é evidente para a maioria das pessoas (24.9). “Nenhum homem é alvo de ódio mais universal ou o merece mais do que aquele que está sempre com um riso de escárnio nos lábios, que é incapaz de lealdade e reverência profundas e que supõe ser sua missão de vida promover a corrosão dos valores pelos quais os indivíduos e a sociedade vivem .” 161 A fim de restaurar a ordem ele deve ser removido à força da comunidade (22.10). De qualquer modo, por fim, o próprio Deus zomba dele e, assim, ele também desa parecerá (Is 29.20). (5) O preguiçoso ('õsê / ) 162 O termo 'ãsêl (“preguiçoso”) ocorre 13 vezes no AT, todas elas no livro de Provérbios ( 6 .6 , 9; 10.26; 13.4; 15.19; 19.24; 20.4; 21.25; 22.13; 24.30; 26.13, 14, 26). Variações da raiz ocorrem nos hápax legomena 'slh (19.15) e 'slwt (31.27). Fora de Provérbios pode-se en contrar a forma nominal 'sltym em Eclesiastes 10.8, sendo que seu texto e significado são controversos, e a forma verbal 'sl em Juizes 18.9, traduzida como “ser demorado/lento/preguiçoso/indolente”. O outro termo usado com mais frequência para identificar o preguiçoso é rmyh, que tem quatro das suas 15 ocorrências em Provérbios (10.4; 12.24, 27; 19.15). Em 19.15 os sinônimos são paralelos. Outras circunlocuções para o preguiçoso são mtrph bmVktw, “negligente na sua obra” (18.9) e ’y s mhswr aquele que “empobrecerá” (21.17). O oposto do 161. McKane./Voverás, p. 399. 162. Apóio-me extensamente num trabalho de um de meus alunos. D. Phillip Roberts, “The Sluggard in Proverbs” (monografia não publ. em OT 813, Wcstminster Theological Seminary, 1994).
preguiçoso é o h rw s, “o diligente”. Como 'sl, hrw s nunca ocorre fora de Provérbios, e em quatro das cinco vezes em que é usado aparece em paralelismo antitético com 'sl (13.4) e rm yh (10.4; 12.24, 27). So mente em 21.5, em que é paralelo a ’s está em contraste claro com o preguiçoso, mas, mesmo nesse caso, o preguiçoso não está inteiramen te fora da imagem. As duas seções principais sobre o preguiçoso são 6.6-11 e 24.30-34. A natureza não confiável e procrastinadora do preguiçoso faz dele um motivo constante de irritação para todos que precisam tratar com ele (10.26; cp. 26.6) e uma vergonha para seus pais (10.5), uma vez que ele destrói a herança da família (19.13-15; 24.31). D. Phillip Roberts observa que Provérbios não tem uma palavra para definir “aque les que trabalham compulsivamente” e comenta que os dois opostos, o preguiçoso e o diligente, são contrastados como vício e virtude. “Sim plesmente não é característico de Provérbios apresentar dois extremos negativos e, depois, encontrar um meio-termo aristotélico (cp., porém, o conselho de Agur em 30.8,9).” A pessoa preguiçosa precisa conside rar os trabalhadores diligentes como tolos, pois, do contrário, condena a si mesma; uma maneira de expressar em nossa língua a sabedoria que ela imagina possuir (22.13) é “Não posso ir para o trabalho hoje, pois há o risco de eu ser atropelado por um caminhão!” Em Provérbios, a preguiça é mais do que uma imperfeição de cará ter; é uma questão moral, pois conduz à perda da liberdade (12.24), à frustração perpétua de não se chegar a lugar nenhum (24.34) e à perda da vida (veja 6 .6 -11; 10.4; 18.9; 20.13; 21.25,26; 24.30-34; cp. 28.24). O preguiçoso é contrastado com os ySrym “retos” em 15.19 e com o §addiq “justo” em 21.25, 26; ele não tem nada a oferecer para a soci edade. Em momento algum ele é equiparado aos “pobres” (rãs, da l, ’ãn i), que são desvalidos em virtude de circunstâncias além do seu controle, como a tirania (13.23), mas o preguiçoso é pobre em virtude de sua degeneração moral. Não é digno de ser chamado de “pobre”. Assim, Provérbios instrui o discípulo a não alimentá-lo (cp. 13.4; 16.26; 19.17). Ao preguiçoso só resta mendigar durante a colheita e “se [far tar] de pobreza”, um oximoro bastante significativo (20.4; 28.19). (6 ) O estúpido (h asa r lêb) De acordo com Fox, o “falto de entendimento” (hasar lêb', lit. falto de coração/senso) é provavelmente um egipcianismo, pois tem um para-
leio exato no egípcio e ocorre somente na literatura sapiencial (13 ve zes em Provérbios; cp. Ec 10.3 e Siraque). Seu sinônimo, ’ên lêb (“ne gligente”) ocorre em Jeremias 5.21 e Oseias 7.11. Nas duas frases, lêb tem seu sentido cognitivo (veja pp. 141-142). Na Coleção 1, essa im perfeição moral é atribuída ao ingênuo (7.7; 9.4, 16) e à esposa lasciva (6.32); na Coleção II, àquele que despreza seu próximo (11.12), corre atrás de fantasias (12.11), se alegra na insensatez (15.21), comprometese como fíador (17.18) e é a antítese do justo (10.20, 21) e do sábio (10.13); na Coleção IV, é atribuída ao preguiçoso (24.30). Na Coleção I ele se mostra fraco na tentação, faltando-lhe previdência para enxergar as conseqüências fatais do adultério (6.32; 7.7). Em resumo, hasar lêb é uma imperfeição moral em todas as três ou quatro classes de insensatos. d. A sepultura (tradicionalmente Sheol) O destino da humanidade é o Sheol (se ’ôl), que ocorre nove vezes em Provérbios, quer dos insensatos/perversos como seu destino final (5.5; 7.27; 9.18), ou de todos (15.11; 23.14; 27.20; 30.16) inclusive os sábios/justos, mas não como destino final (1.12; 15.24; cp. Sl 49.8[9], 15[ 16]; veja pp. 157-159). Tradicionalmente, Se ’ôl é transliterado como “Sheol”, mas pode ser corretamente traduzido como “sepultura”. O subs tantivo ocorre 66 vezes no Antigo Testamento, 58 delas na poesia. As preposições freqüentes que o acompanham mostram que a sepultura fica embaixo da terra. Os poetas bíblicos empregam imagens ricas e variadas para descrevê-la. O Sheol tem uma “boca” (Sl 141.7), que ele “aumenta” (Is 5.14), e “nunca se farta” (Pv 27.20; 30.16). É tão pode roso que ninguém escapa de suas “garras” (Sl 89.48[49]; Ct 8.6), mas alguns são remidos dele (Sl 49.15[ 16]; Pv 25.14; Os 13.14). É como uma prisão com “cadeias” (2Sm 22.6) e um lugar com “portas” (Jó 17.16; Is 38.10). Nele, a decomposição é o “pai” e os vermes são “mãe” e “irmã” (Jó 17.13ss.). É uma “terra” da qual ninguém volta a esta vida (Jó 7.9); uma habitação onde as distinções socioeconômicas deixam de existir. Os ricos e os pobres (Jó 3.18, 19), justos e perversos (3.17) encontram-se lado a lado. É uma terra de silêncio (Sl 94.17), escuridão (13.3[4]), fraqueza e esquecimento (88.11 -19[ 12-20]). A natureza des trutiva desse reino é intensificada pelo acréscimo de “Abadom” (Pv 15.11; 27.20). E errado usar essa linguagem figurativa para construir uma doutrina acerca do estado intermediário. Entretanto, essas figuras vividas e poderosas transformam a sepultura de uma cova com sete
palmos de profundidade em um reino transcendente e metafórico, dis tinto da vida na superfície da terra habitada por mortais vivos e do céu habitado pelo Deus imortal e sua corte. Aqueles que descem ao Sheol jamais voltarão a participar da história da salvação ou se juntar à multi dão de santos no templo terreno (SI 6.5[6]; Is 38.18). Como o rio Jor dão e o monte Sião, a sepultura simboliza realidades eternas que trans cendem seu espaço físico. 3. Masculino e feminino Por fim, a humanidade é dividida em dois gêneros: masculino e feminino, distinguindo-os sexualmente como homem e mulher e, social mente, como esposo e esposa, pai e mãe. Uma vez que as palestras do pai falam mais sobre a esposa infiel, uma figura complexa, do que sobre qualquer assunto, convém tratar dela numa discussão separada. a. Homem e mulher O livro avalia a mulher sempre do ponto de vista do homem, e nunca o contrário. Em suas palestras, o pai se dirige a seu filho, e nunca à sua filha (1.8,10, 15, passim) e, em seus discursos mais extensos, adverte-o sobre uma esposa infiel (caps. 5 e 7), mas em momento algum adverte sua filha sobre um marido infiel. A mulher sabedoria se dirige aos homens na porta, não às mulheres no mercado (8.4). A esposa infiel e a mulher loucura assediam o rapaz ingênuo, mas nenhum equivalente masculino seduz a moça ingênua. Em seus provérbios, Salomão continua a falar do filho (10.1; 19.27), e não da filha; adverte novamente sobre a esposa infiel (22.14) e louva o casamento com uma boa esposa (12.4; 18.22; 19.14), mas não com uma mulher rixosa (19.13; 21.9,19; 25.24; 27.15). Em momento algum menciona um marido bom ou mau. Os trinta ditos do sábio, Agur e a mãe de Lemuel também se dirigem ao filho (23.15; 30.1; 31.1), mas não à filha. O livro termina com a descrição de uma esposa ideal sem mencionar um marido ideal para uma mulher. Entretanto, Provérbios deduz que a mulher não era excluída das instruções em seus provérbios e ditos. A referência à tua mãeÇimmek5) aponta para o lar como ambiente pedagógico do livro. As referências à mãe no prólogo (1.8; 4.3; 6.20) funcionam como exemplos para as ou tras palestras - ou seja, deve-se pressupor que a poesia concisa e os provérbios epigramáticos omitem a mãe, mas que, na verdade, ela é
uma voz de autoridade com o pai.163 A menção da mãe nos pontos de justaposição do livro, que introduzem tanto o prólogo quanto os provér bios, valida essa interpretação (veja 1.8; 10.1). No acróstico final, a esposa virtuosa é louvada por ter instruções fiéis em sua língua ao ad ministrar a casa. Essas referências à mãe como mestra no contexto do lar para a disseminação do conteúdo do livro requerem que os pais ensinavam suas filhas (1.8), e/ou que os maridos ensinavam suas espo sas (2.17). A fim de a mãe instruir sua família na sabedoria de Israel, ela própria precisava ser ensinada na sabedoria e no conhecimento do livro de Provérbios. A sabedoria é a herança desse livro, não algo inato ou aprendido pela observação da criação (veja pp. 137-138). Em vez de mencionar sua filha, o pai escolhe falar ao filho, pois se espera que os descendentes do sexo masculino assumam a liderança na definição da identidade e dos valores da família (4.3, 4; cp. Nm 30). Também escolhe o filho para aprender seus catecismos e não se desviar, pois a natureza do filho é a mais aventureira dos dois sexos, mostrandose propensa a ultrapassar os limites estabelecidos e se desviar da tradi ção herdada. A filha, ao contrário, apresenta uma tendência natural de cuidar do lar e da comunidade em seu cerne, como observou Follis.164 É importante lembrar também que os provérbios são, por natureza, emble máticos para muitas situações diferentes. Em outras palavras, os provér bios também são dirigidos à filha e devem ser aplicados corretamente de modo a também observarem os homens pelos olhos de uma mulher. b. Esposo e esposa Quando o filósofo alemão Heine disse: “O matrimônio é o alto-mar para o qual ainda não foi inventada uma bússola”, ele esqueceu de Provérbios. Com o restante do Antigo Testamento, Provérbios toma por certo que todo homem e mulher são casados e trata extensivamen te sobre ser um cônjuge sábio. O esposo sábio teme ao S e n h o r e é sábio e justo de um modo geral. Mais especificamente, ele depende de Deus para encontrar uma esposa prudente (18.22), o que, supõe-se, está relacionado à oração (15.8,29; 16.3), procura uma esposa virtuosa e competente (31.10-31) e rejeita aquela que não é amada pela co 163. Da m esm a m aneira A. M oss, “ W isdom as Parental Teaching in Proverbs 1-9 ”, Ile y J 38 (1 9 9 7 ) 4 2 6 -3 9 . 164. E. Follis, D irections in B iblical H ebrew P oetrv (JS O T Sup 40; ShefTield: Sheffield A cadem ic, 1987), p. 178.
munidade piedosa (30.23). Uma vez que é tão sábio e receptivo ao ensino, podemos supor que, ao encontrar essa mulher, ele a ame e, portanto, dá ouvidos à sua correção e a seus conselhos bons e sinceros (cp. 9.8, 9; 13.14, 20), como faria com um amigo (27.6, 9), da mesma maneira como Davi atentou para as palavras de Abigail (ISm 25.3235). (Se tiver uma esposa insensata, rejeitará seus conselhos como rejei ta o conselho de qualquer insensato, da mesma maneira como Jó refutou as palavras de sua esposa [Jó 2.9, 10], e Davi rejeitou a repreensão de Mical [2Sm 6.21, 22] e como Adão e Abraão não deveriam ter dado ouvidos às suas respectivas esposas [Gn 3.6,12; 16.2].) O esposo sábio se embriaga nos carinhos da esposa ao encontrar nela, em resposta às orações do pai, uma mulher que satisfaz totalmente suas necessidades sexuais (5.18, 19). Depois de encontrá-la, ele valoriza essa esposa que não o envergonha (12.4) nem destrói sua casa (14.1) como uma dádiva de Deus para ele (18.22) e a louva publicamente, levantando-se em sua presença e proclamando sua virtude (31.28-31). O amor encoberto não tem nenhum valor; é como piscar para uma moça no escuro (27.5). Assim também a esposa que teme o S e n h o r é sábia e justa de um modo geral (veja 31.32b) e, como tal, aceita de bom grado o ensino e correção piedosos do marido; é o tipo de pessoa na qual o esposo pode confiar como no S e n h o r (31.11). Ao contrário da esposa infiel, ela guarda a aliança do seu casamento (2.17; 15.4; cp. S l 15.14) e deseja ser uma coroa para a cabeça de seu esposo (12.4) e complementar a renda da família por meio de sua atividade a fim de deixar o marido livre para trabalhar em prol do bem da comunidade (31.13-25, esp. v. 23). Não é mal-humorada ou irascível, mas busca o carinho do marido (5.18-19). Ela ensina e administra toda a casa (31.28). Realiza-se, em resumo, com o enriquecimento dos outros, especialmente da sua casa. Em resumo, marido e mulher caminham juntos num espírito de hu mildade (15.33) e fé em Deus (16.3), expressam seu amor nos carinhos mútuos e na correção franca um do outro (27.5; cp. Lv 19.17, 18), confessam e renunciam seus pecados inevitáveis ao oferecerem mise ricórdia um ao outro (28.13). c. Pai e mãe
Juntos, o pai e a mãe constroem seu lar (cp. 14.1; 24.27) e educam os filhos no S e n h o r , valorizando-os como indivíduos únicos (4.3). Reco
nhecem que a criança é ignorante e precisa de instrução moral (1.2-6; 30.1; 31.1) e que a humanidade é depravada (14.12; 19.27; 20.9; 22.15; 29.18), mas creem que a educação oferecida pelos pais é eficaz (22.6). Fazem-no usando a disciplina verbal para formar o caráter do filho e conduzem-no pelo caminho da vida, para evitar a insensatez (caps. 110) e não retendo a vara a fim de impedir que se repita a insensatez. Pela fé aceitam seus valores como dádivas de Deus (2.6), tomando-os valores absolutos, não as avaliações relativas do mundo secular.165 Mostram-se unidos em sua instrução (1.8; 31.26), exemplares em sua submissão quando eram crianças (4.3, 4) e um ao outro, e diligentes a fim de penetrar o coração, como ilustra o padrão repetitivo das dez palestras. Suas palestras são vividas e dramáticas, permitindo que o filho perceba a sedução do mal nos discursos rivais dos homens perver sos e da esposa infiel e, ao mesmo tempo, sinta repulsa por eles (1.1019; 7.1-27), sob o risco de perder o filho pela imagem atraente que representa o mundo real. Ao desenvolver e alterar a tese de J.-N. Aletti,166Elizabeth Huwiler afirma: “Em vez de aprender a fazer distin ção entre o discurso de sabedoria e o de insensatez, o aprendiz sábio aprende a distinguir entre os interlocutores sábios e insensatos. Assim, a questão não é em quais palavras confiar, mas sim, nas palavras de quem confiar”.167 Em suas advertências acerca da esposa infiel, o pai emprega os interesses lascivos do filho. Ao usar uma imagem seme lhante àquela do Cântico dos Cânticos de Salomão, quando retrata a esposa lasciva no capítulo 7, ele inverte sua linguagem erótica, da ativi dade sexual no casamento para a atividade sexual no adultério. d. A esposa lasciva (estranha)
O livramento da sedução mortal da mulher volúvel e a conduta sexual apropriada se tomam a preocupação central das palestras do pai nos capítulos 5-7, depois de apresentá-la em 2.16-19. Murphy observa que o assunto é expandido em cerca de 65 versículos, “mais... do que qualquer figura, até mesmo da mulher sabedoria”.168 Mas quem é ela? Descobrir sua identidade envolve primariamente uma interpretação pre 165. Pace Harvey Cox, Secular City (Nova York: Macmillan, 1965), p. 31. 166. J.-N. Aletti, “Séduction et parole in Proberbes 1—IX”, VT1 (1977) 129-44. 167. E. F. Huwiler, “ControlofReality in Israelite Wisdom” (Diss. Ph.D., Duke University, 1989), pp. 235-36. 168. R. H. Murphy, "Winsdom and Eros in Probcrbs 1-9”, CBQ 50 ( 1988) 600.
cisa de sua apresentação como “mulher lasciva” ÇiSSâ zãrâ), “estra nha” (n o kriyâ ), “a qual deixa o amigo da sua mocidade” (ha'ozebet 'allüp n e'üreyhã\ 2.16) e “se esquece da aliança do seu Deus” (berít * lõheyhã sãkêhâ; 2.17). De acordo com as duas últimas descrições, ela pode ser caracterizada como “uma esposa apóstata e infiel”. Esse esboço do seu perfil em 2.15-18 será preenchido em formulações alter nativas em 5.1-23; 6.20-35; 7.1-27; 22.14; 23.27. G Yee argumenta que a adúltera no prólogo é uma mulher descrita de várias maneiras. Estes textos compartilham um conjunto de descrições em comum (e.g., todos eles se referem às suas palavras sedutoras e conseqüências de sastrosas; 2.16 é quase idêntico a 7.5; etc.); ela contrasta com a mulher sabedoria que também é apresentada de várias maneiras; e a macroestrutura de Provérbios 1-9 apoia uma figura unificada.169Quando con siderados em conjunto, os diversos vislumbres dessa mulher nas pales tras do pai apresentam-na como uma esposa lasciva, uma estranha na comunidade da aliança, que traiu seu marido fiel (2.16; 5.20; 6.24; 7.5) e se casou com alguém de fora da comunidade da aliança (6.29; 7.19). Ao longo de todo o prólogo ela se mostra, essencialmente, uma prostitu ta (6.26), que fica espreitando as ruas na tentativa de seduzir rapazes (7.10-21). Neste caso, a designação “prostituta” se refere a alguém que se envolve em relações sexuais sem qualquer intenção de ter um relacionamento comprometido ou duradouro.170 (1) A “mulher lasciva” ( ’issâ zãrâ) Ao comentar sobre a “esposa lasciva” ( ’i$sâ zãrâ; lit. “mulher es tranha”), Snijders diz: “Tendo em vista o significado de zü r II, ‘desviar, 169. G Yee. "I Have Perfumed My Bed with Myrrh: The Foreign Woman ('issá z&râ) in Proverbs 1-9", JSO T 43 (1989) 54. 170.0 texto acadiano Counsel o f Wisdom (veja H. W. F. Saggs, The Greatness That Was Babylon [Nova York: New American Library. Times Mirror, 1962], p. 332) adverte os jovens para não se casarem com uma prostituta (cultuai) c Proverbs o f Ahikar (veja R. H. Charles, “The Story of Ahikar", em The Apocrypha andPseudepigrapha o f lhe Old Testamenl [Oxford: Clarendon, 1976], 2:728-29) adverte os jovens a não a desejarem. A prostituição era aceita (J. Gasper, Social Ideas in lhe Wisdom Literature o f the Old Testament [CUASST 8; Washington, D.C.: The Catholic Univer sity o f America, 1947], p. 11, n. 49) e regulamentada no antigo Oriente Próximo. A lei mosaica eliminava sistematicamente todas as mulheres israelitas e residentes temporárias (veja Ex 12.49) dessa ocupação e ameaçava com o julgamento sobre a terra por envolvimento com a prostituição cultuai. No entanto, nenhuma lei proibia explicitamente a prostituição envolvendo uma estrangeira, como fazem esses textos de Provérbios. O Novo Testamento ameaça com o julgamento de Deus sobre lodo tipo de im oralidade sexual extraconjugal (IC o 6.9-20) e prescreve o casamento como um analgésico contra a impureza sexual (IC o 7.2).
afastar, partir’, o particípio zãr (‘estranho’) deve ser traduzido como ‘aquele que se distancia ou se afasta”’.171 Esse significado concreto pode ser visto em mayim zãrtm “águas que retrocedem”. Sua defini ção se encaixa de maneira admirável no esboço em 2.17, “a qual deixa o amigo da sua mocidade” (veja v. 17), combinando com a descrição dos homens perversos no esboço paralelo (2.15-18) como apóstatas do caminho certo. Além disso, zãrâ é hostil à comunidade da aliança. R. Martin-Achard afirma: “O outro é um intruso cujo comportamento co loca em perigo e existência do grupo pois ele/ela se encontra fora das leis da comunidade... Assim, zãr ‘outro’ pode adquirir um sentido um tanto negativo (‘perigoso, hostil’)”.172 (2) A “estranha” (nokriyâ) Snijders também argumenta que ela não é uma “estrangeira”, ape sar do paralelo rotulá-la como nokriyâ (fem. de nokri). Porém, Wiles argumenta que “ela é uma estrangeira infiel casada com um israeli ta”.173 Na grande maioria dos casos nokri ocorre em textos que dizem respeito à relação pactuai de Israel com o S e n h o r ( Ê x 2.22; Dt 14.21; Jz 19.12; lRs 8.41; Is 2.6) e se refere a outro povo que não Israel. Tomando por base Deuteronômio 23.21-23; 2 Samuel 15.19,20; 1 Reis 8.41-43 e 2 Crônicas 6.32,33, M. Guttman concluiu que a característi ca distintiva do “forasteiro” (nokri) é a conservação de seus laços po líticos e sociais com seu país de origem ou com o país que deixou. Em contraste, Guttman observou que o “estrangeiro” (ou “residente tem porário”, gêr), ainda que também venha de lugares distantes, rompeu seus laços com seu antigo país.174Tomando por base seu entendimento de que nokri(yâ) designa um forasteiro pagão, Bostrõm argumentou que essa mulher é uma devota de lstar, a deusa pagã da fertilidade,175 e 171. L. A. Snijders, TDOT, 4:53, s.v. z ú r / z S r . 172. R. Martin, TLOT 1:39-392, s.v. zSr. 173. J. K. Wiles, “The ‘Enemy’ in Israelite Wisdom Literature” (Diss. Ph.D., Southern Baptist Theologieal Seminary, 1982), p. 50. 174. M. Guttm an, "The Term ‘Foreigner’ (n k r y ) H istorically C onsidered”, HUCA 3 (1926) 1. 175. G Bostriim. Proverbiastudien: Die Weisheit und das fremde Weib in Spr. 1-9 (LUÃ, N.F., Avd. I, Bd. 3, Nr. 3; Lund, 1935). A improbabilidade de sua interpretação foi demons trada por L. A. Snijders, “The Meaning o f zãr in the Old Testament”, OTS (1954) 1-54; P. Humbert. “ La ‘femme étrangère’ du Livre des Proverbes", RES 2 (1937) 49-64; e idem, “ Les adjectifs 'zSr' et 'n o krí' et la femme étrangère des Proverbes biblique”, in Mélanges syriens offerts à M. R. Dussaud (Paris: Geuthner, 1939), 2:259-66. McKane (Proverbs. p.
Clifford deduziu que ela representa uma cena-tipo épica do antigo Orien te Próximo de uma deusa convidando o jovem herói a começar uma nova vida se casando com ela.176A proposta de Bostrõm, “citada com frequ ência... mas raramente aceita”,177 encontra apoio na associação que a mulher faz entre sexo e culto (7.14), mas o pai não a chama de (fdêsâ, o termo esperado para uma prostituta cultuai. Ela seduz o filho com prazeres sensuais, não com entusiasmo religioso e fertilidade, e a argumenta ção do pai diz respeito ao perigo representado pelo marido dela, não ao risco de apostasia do S e n h o r . Com referência à ideia de Clifford, ela está propondo ao filho um encontro amoroso de uma única noite, não um casamento, uma característica essencial da cena-tipo que ele supõe. Se, porém, se tratar de uma estrangeira, ela não seria censurada por sua etnia. A. Brenner ressalta que, ao longo de toda a história de Israel, era costume os israelitas se casarem com mulheres estrangei ras. Abraão se casou com Agar, uma egípcia e Moisés com Zípora, uma midianita. Na linhagem de Davi, encontramos Judá e a cananita Sua, e sua nora Tamar; Salmom e a prostituta cananita Raabe, mãe de Boaz; e Boaz e a moabita Rute. Os autores bíblicos não preferiam os casamentos endogâmicos aos exogâmicos, desde que a esposa pagã deixasse sua sociedade pagã e adotasse a fé verdadeira de Israel (cp. Sl 45.10-15[ 11-16]). Eles censuravam as esposas infiéis (e.g., a esposa de Potifar [Gn 39.6-10]; Dalila, a esposa de Sansão [Jz 14.1-3] e, de acordo com Brenner, a esposa lasciva de Provérbios 1-9).178 Fora dos textos que dizem respeito à relação pactuai de Israel, po rém, nokrl(yâ) não indica necessariamente um estrangeiro pagão, mas sim alguém “de fora da família”. Labão trata suas filhas como nokriyôt (Gn 31.15); o salmista é um zãr/nokri para a sua família (Sl 69.9[10]); as servas de Jó o tratam como zãr/nokrí (Jó 19.15); Provérbios 27.13, “que um zãr/nokri te louve”, dificilmente é uma referência a um nãoisraelita.179 Em resumo, é provável que nesse livro sapiencial, nokriyâ 284) rejeita o ponto de vista de Bõstrom, pois as Instruções Egípcias contêm advertências semelhantes acerca de relacionamentos com mulheres fora do culto. 176. Clifford, Proverbs, p. 27. 177. Fox, Proverbs 1-9, p. 136. 178. Brenner também observa que a maioria das histórias sobre essas noivas estrangeiras aprovadas enfatiza a sua sexualidade e habilidade de seduzir: Tamar (Gn 38.13-19), Raabe (Js 2.1), Rute (3.1-9), e, possivelmente, Bate-Seba, casada com Urias o heteu (ISm 11.2-5) (todas da linhagem do Messias) (A. Brenner, “nSym zrwt bmqr", BM, 30 [1984/85] 179-85). 179. Cp. R. Martin-Achard, TLOT, 2:740, s.v. nSkãr; S. M. Paul, Stndies in the Book o f the
(2.16; 5.20; 6.24; 7.5; 27.13) designe uma esposa lasciva que se encon tra fora da comunidade dos sábios, não uma estrangeira pagã. (3) “Uma esposa infiel e apóstata” (ha'õzebet 'allüp ne'üreyhã we'et berit *lõheyhã sãkêhâ ) Em lealdade ao seu marido morto, Rute recusou satisfazer seus apetites sensuais (Rt 3.10), mas esta prostituta lasciva quebrou delibe radamente seu compromisso com seu marido piedoso (2.17a) e, ao fazêlo, quebrou a aliança de Deus com ela (2.17b). O “amigo da sua moci dade” {'allüp ne'üreyhã) é uma metonímia para o seu marido como seu mestre. 'Allüp denota “um amigo [pessoal], confidente, compa nheiro [do peito], camarada” (cp. 16.28; 17.9; SI 55.14[15]; Jr3.4; 13.21; Mq 7.5).180Sua raiz verbal significa “instruir” e pode se referir à comu nhão intima que se desenvolve entre pessoas que compartilham de si e conhecem umas às outras cada vez melhor com o passar do tempo. Nesse tipo de relacionamento, os amigos se tomam vulneráveis um ao outro, pois sua confiança pode ser abusada. De fato, os sete usos dessa palavra se referem à confiança traída de um amigo intimo. Todas as versões antigas traduzem ’allüp como “ensino” ou “educador” e ter mos semelhantes (e.g., ducem [“guia”] na Vulg.).181 McKane acredita que o termo é uma metonímia para aquele que ensina a sabedoria na escola ou para o pai no lar. Ele encontra apoio em Jeremias 3.4, em que, de acordo com ele, a expressão, “amigo {'allüp) da minha mocida de” é uma referência a Deus como um mestre.182 A comparação e interpretação podem ser válidas, mas além da palavra parecer estranha para um pai, não sabemos coisa alguma sobre as escolas em Israel antes do período intertestamentário e a coeducação parece imprová vel. O. Plõger acredita que se trata da aluna do mestre da sabedoria e encontra apoio no paralelo em 5.18, apesar de ’allüp não ser usado. Covenanl in lhe Light o f Cuneiform and Biblical Law (VTSup 18; Leiden: Brill, 1976), p. 54, n. 6; P. Humbert. “ Les adjectifs zSr et nokri et ‘Ia femme étrangère’ des Proverbes bibliques", in Opuscules d'un Hebraisant (Neuchâtel: Secrctariat de 1’Université, 1988), pp. 111-18; J. M. Sasson. Ruth (Baltimore: Johns Hopkins University, 1979), p. 51. 180. Kühlewein, TLOT, 3:1 243-44, s.v. rea'. 181. A LXX traz didaskalian (“ensino” ) e NEB repontua para o termo não atestado 'illúp, "ensino” ; L. H. Brockington, The Hebrew Text o f the O ld Testament (Oxford: Oxford University and Cambridge: Cambridge University, 1973), p. 156. 182. W. McKane, “Textual and Philological Notes on the book o f Proverbs with Special Reference to the New English Bible”, GUOST 24 (1974) 82.
Porém, em 5.18, trata-se de um aluno do sexo masculino.183 Nessa palestra sobre a infidelidade sexual contra Deus, a metonímia ’allüp se refere mais provavelmente ao marido fiel. Da mesma maneira como Oseias orientou Gomer (Os 3.2, 3), também o ex-marido da esposa desleal a instruiu fielmente no caminho certo. Para fazer uma compa ração e um contraste, Malaquias fala da “mulher da tua mocidade” (cp. Pv 5.18), contra a qual o marido agiu infielmente (Ml 2.14, 16). No paralelo sintético, “esquece” (sãkêhâ) significa que ela se sepa ra de sua primeira aliança (veja 3.1), um equivalente sinônimo de “aban donar”. “Sua aliança” (berit) se refere a uma “imposição” ou “obriga ção” imposta sobre ela, mais especificamente, suas obrigações matri moniais, e o acréscimo de “do seu Deus” (* lõheyhã) sugere que o Cria dor é testemunha, fiador e, possivelmente, autor de suas obrigações matrimoniais.184 De acordo com Hugenberger, a questão de Malaquias 2.14, um paralelo bastante próximo de Provérbios 2.17, é a fidelidade no casamento, não uma referência à aliança feita no Sinai, algo impro vável neste livro.185 Em Ezequiel 16.8 o acordo matrimonial é chamado de berit. Hugenberger argumenta que se trata de uma referência ao Deus de Israel, não a uma divindade pagã, pois (1) *lõhim (“Deus”) nesse livro se refere ao Deus verdadeiro (2.5; 3.4; 25.2; 30.9). (2) YHWH não poderia ser usado com um sufixo pronominal (veja 2.5). (3) O sábio não a condenaria por sua deslealdade para com uma divindade pagã. (4) A evidência a favor do conceito de uma aliança entre divinda des pagãs e seus seguidores é insignificante demais para ser provável.186 (5) A mulher não é, necessariamente, uma estrangeira. Em resumo, em sua mocidade, essa apóstata aceitou o S e n h o r e sua sabedoria como ensinada por seu marido, mas se recusou honrar seu compromisso. Ao dar as costas para seu marido piedoso, também deu as costas para Deus e sua comunidade da aliança. Como contraste, o salmista ordena que a esposa estrangeira do rei esqueça de sua família pagã (Sl 45.10[ 11 ]). A 183. O. Plõger, Sprüche Salomos (Proverhia) (BKAT XVII/2 [Neukirchen-VIuyn: Neukirchener, 1984]), p. 27. 184. M. Weinfeld. TDOT, 2:255, 256, 261, s.v. berít. 185. Para uma defesa dessa interpretação tradicional de 2.17b veja G P. Hugenberger. Marriage as a Covenant: A Study o f Biblical Law and Ethics Governing Marriage Developed from the Perspective o f Malachi (VTSup 52; Leiden: Brill, 1994), 296-302. W. G Plaut (The Book o f Proverbs [Nova York: Union o f American Hebrew Congregations. 1961], p. 49) observa que “é possível que uma cerimônia de casam ento de caráter distintamente religioso só tenha se desenvolvido depois do tempo de Provérbios”. 186. Hugenberger, Marriage as a Covenant, p. 298.
“esposa infiel” do prólogo é uma prostituta entre os homens e uma meretriz para com Deus. (4) Conclusão A “esposa infiel” não é simplesmente uma “adúltera” (i.e., “esposa de outrem”).187Quando considerados em conjunto, os diversos vislum bres dessa mulher nas palestras do pai a apresentam como uma após tata lasciva, que deixou a comunidade piedosa, e uma esposa libertina, que traiu o marido fiel de sua mocidade (2.16,17; 5.20; 6.24; 7.5), como Gomer fez com Oseias (Os 1.2-11) e, tendo se casado novamente, dessa vez com um marido infiel e rancoroso de fora da comunidade da aliança (6.29; 7.19), também não honra seu compromisso com ele (5.9; 6.34, 35; cp. Jo 4.17, 18).188 Ao longo de todo o prólogo, essa esposa infiel se mostra, essencialmente, uma prostituta (6.26) que, em sua las cívia, espreita as ruas e tenta seduzir rapazes (7.10-21). Neste caso, a designação “prostituta” se refere a alguém que se envolve em relações sexuais sem nenhuma intenção de ter um relacionamento comprometi do e duradouro. Ela se mostrou infiel tanto ao marido piedoso da sua mocidade (2.17), como Gomer a Oseias (Os 1.2-11) quanto ao seu segundo marido, um ímpio (Pv 6.29; 7.19), como a mulher samaritana (Jo 4.17, 18). Essa descrição se encaixa no mundo bíblico. No antigo Oriente Próximo a prostituição era aceita e regulamentada.189 A lei mosaica eliminou sistematicamente todas as mulheres israelitas e estrangeiras (veja Êx 12.49) das funções de prostitutas e ameaçou com julgamento sobre a terra em caso de envolvimento com a prostituição cultuai. A Torá defende a monogamia como ideal (Gn 2.18-25), mas nenhuma lei explícita proíbe o sexo com uma prostituta fora da aliança. Provérbios toma sua presença por certa, mas ameaça o filho com a ruína da comu nidade (5.17), com golpes do marido dela e seu empobrecimento (6.3235) e, por fim, com sua morte pela mão de Deus (5.21-23; 7.23-27). O Novo Testamento adverte acerca do julgamento de Deus sobre todo 187. Pace Fox, Proverbs 1-9, pp. 139-40. 188. Dc acordo com Snijders, TDOT, 4:56, s.v. z ú r í z S r . Talvez um elemento importante para a datação do Prólogo seja o falo de que no período depois do exílio os homens israelitas foram infiéis às suas esposas judias e se casaram com estrangeiras (Ez 9.1, 2; Ne 13.23-28; Ml 2 .1 1, 12), ao contrário da situação em questão nesta passagem. 189. J. Gasper, Social Ideas in the Wisdom Literature o f the Old Testament, p. 11, n. 49.
tipo de imoralidade sexual fora do casamento (1 Co 6.9-20) e prescreve o casamento como antídoto para a impureza sexual ( ICo 7.2). O mun do antigo ameaçava de julgamento sobre a terra no caso de envolvi mento com a prostituição cultuai.190 Mesmo na sociedade doentia de hoje, o fomicador e o adúltero ainda podem esperar vingança de um homem enciumado, bem como doenças venéreas, perda de respeito e posição social e pagamento de pensão. A esposa lasciva também cumpre um propósito paradigmático. Por definição, os provérbios e ditos desse livro são modelos para julgar a vida em várias situações e, como tais, a infidelidade sexual da esposa adúltera contra seu marido piedoso serve de paradigma para a infideli dade espiritual contra o S e n h o r . 191 Essa interpretação é corroborada por sua personificação como mulher loucura no final do prólogo. E pre ciso decidir entre a sabedoria gerada por Deus e a loucura que se apre senta como rival da sabedoria. Além disso, a infidelidade sexual e espi ritual se interpenetram. Um adúltero sexual se mostra incapaz de man ter os olhos fixos em Deus. A infidelidade sexual de Salomão privou seu coração de amar a Deus, pois sua vida sexual estava ligada à sua vida espiritual. Os profetas usaram com frequência a imagem do casamento como uma metáfora para a relação de Israel com o S e n h o r . Paulo diz que o indivíduo anda no amor verdadeiro que procede de um coração puro, de uma consciência boa e de uma fé sincera (lTm 1.5). No en tanto, a intenção literal destas advertências acerca da mulher infiel não deve ser minimizada, como é indicado pela descrição detalhada que o pai fornece de seus engodos e a natureza econômica, não religiosa, dos argumentos que ele apresenta. 190. O tcxlo acadiano Counsel o f Wisdom adverte os jovens a nâo se casarem com uma prostituta (cultuai) (veja Saggs. The Creatness Thal Was Babvlon, p. 332). Proverbs o f Ahikar (veja Charles, “The Story o f Ahikar”. in The Apocrypha and Pseudepigrapha o f the Old Testament, 2:728-29) adverte os jovens a não desejá-las. 191. A LXX reescreve 2.16, 17 para grupos dc homens: aqueles que são derrotados por maus conselhos e aqueles que são guardados e guiados por bons conselhos. De acordo com Johann Cook, “Helenistic Influence in the Book o f Proverbs (Septuagint)?” BIOSCS 20 (1987): 344-46: idem, ‘"iSSâ zSrá (Proverbs 1-9): A Metaphor for Foreign Wisdom?” ZAW 106 [1994] 458-76), a esposa infiel é reinterpretada de modo a se referir à sabedoria estrangeira que é enganadora, não à infidelidade sexual. R. L. Giese ("Dualism in the LXX o f Prov 2:17”, JETS [1993] 289-95) acredita que boule k a k i “mau conselho” se refere a qualquer forma de conselho impio em contraste com o conselho reto. Também pode ser uma m etonímia para seu conselho perverso para se entregar à infidelidade sexual cm oposição ao conselho sábio do pai contra isso e nâo uma metáfora para a sabedoria estran geira. A disputa é entre o discurso construtivo do pai e o discurso destrutivo da esposa infiel.
E. PEDAGOGIA
O preâmbulo declara o propósito e o destinatário do livro, citando a maioria dos termos que fazem parte da sua pedagogia, como instrução, discernimento e entendimento. Estes serão discutidos no comentário. F. CRISTOLOGIA
A teologia cristã toma necessário integrar Provérbios na fé cristã. Nesta seção argumentarei, em primeiro lugar, que o livro possui uma relevância permanente e, em segundo lugar, que possui uma relevância relativa para a igreja. Seus ditos possuem uma relevância direta para o cristão, mesmo sendo sobrepujados pela revelação mais plena em Je sus Cristo. Antes de tratar da superioridade do ensino da Nova Aliança, porém, falarei da relação da personificação feminina da Sabedoria com Jesus Cristo. 1. A relevância duradoura de Provérbios Quatro argumentos defendem a tese de que Provérbios possui uma relevância permanente. 1. Por sua natureza, os provérbios expressam verdades eternas aplicáveis a muitas situações. Apesar de sua expressão da ver dade estar historicamente condicionada por mudanças políticas e culturais, a verdade que expressam é imutável. 2. A autenticidade do livro é certificada pela inclusão de Provérbios no cânon das Escrituras Sagradas por obra do Espírito Santo. Os rabinos, os pais da igreja, as sinagogas e a igreja primitiva reco nheceram universalmente Provérbios como parte da Bíblia. Uma vez que foi inspirado por Deus, também é “útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” (2Tm 3.16, 17). 3. Os apóstolos aplicaram o livro repetidamente à igreja. Os editores do Novo Testamento Grego, sob os auspícios das Sociedades Bí blicas Unidas, apresentam uma relação de 60 menções de cita ções diretas, alusões claras e paralelos literários de Provérbios no Novo Testamento. Pedro usa Provérbios 26.11 como um provér bio que diz respeito aos falsos mestres: “Com eles aconteceu o que
diz certo adágio verdadeiro: O cão voltou ao seu próprio vômito; e: A porca lavada voltou a revolver-se no lamaçal” (2Pe 2.22). Os apóstolos geralmente usam Provérbios para ensinar a igreja como ter uma vida piedosa. Alguns exemplos conhecidos são: contribuir generosamente, de acordo com sua capacidade (Pv 3.7 e 2Co 8.12); viver humildemente diante de Deus e dos outros, pois “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Pv 3.34; Tg 4.5; 1Pe 5.5); “Temei a Deus, honrai o rei” (Pv 24.21 e 1Pe 2.17); “Fazei caminhos retos para os pés” (Pv 4.26 e Hb 12.13); e “Se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer” (25.21,22 e Rm 12.20). 4. Para o autor de Hebreus, a palestra do pai ao filho, em 3.11, 12, é dirigida à igreja: “E estais esquecidos da exortação que, como filhos, discorre convosco: Filho meu, não menosprezes a corre ção que vem do S e n h o r ” (Hb 12.5, 6). 2. A mulher sabedoria como um tipo de Jesus Cristo a. Pano de fu n d o histórico
Desde cedo, começando com o apologista Justino Mártir (125 d.C.), os cristãos, quase sem exceção,192 identificaram Sofia (o equivalente grego do heb. hokm â) em Provérbios 8 com Jesus Cristo.193 Essa inter pretação quase universal da passagem envolveu a igreja numa contro vérsia acerca da natureza exata da relação entre Deus e Cristo. Desde o tempo de Orígenes (ca. 180 d.C.), a exegese patrística interpretou o nascimento da Sabedoria em Provérbios 8.25 como o “vir a ser” contí nuo de Cristo. Os arianos, porém, afirmavam que o Filho era a criatura mais exaltada de Deus, usando Provérbios 8.22, “o S e n h o r me pos suía” (que, por vezes, também é traduzido como “me criou”) como texto principal. De acordo com Allen Lee Clayton, “[‘O S e n h o r me criou’] reverberava em todas as ruas e becos de Alexandria e em todos os lugares que favoreciam as ideias de Ario”.194Os nicenos, ao contrá rio, afirmavam que Cristo era da mesma substância do Pai, o verdadei ro Filho de Deus, e não uma criatura. A fim de vencer o debate, os nicenos tiveram de recuperar Provérbios 8.22 por meio de uma inter 192. lrineu equiparou a Sabedoria ao Espírito Santo. 193. A. L. Clayton, “The Orthodox Recovery o f a Heretical Proof-tcxt: Athanasius o f Alexandria’s Interpretation o f Proverbs 8:22-30 in Confliet with the Arians” (Diss. Ph.D., Southern Methodist University, 1988), pp. 32-51. 194. Clayton, “The Orthodox Recovery”, p. 2.
pretação que apoiasse sua posição. Segundo Clayton, Atanásio (ca. 325 d.C.) conseguiu isso mediante duas estratégias exegéticas. De acor do com sua primeira estratégia, o Filho foi “criado” quando se tomou encarnado. De acordo com sua segunda estratégia, a “criação da Sa bedoria foi, na verdade, a criação da imagem da Sabedoria nas criatu ras à medida que estas foram criadas”.'95 A partir dessa época, a equi paração de Cristo com a sabedoria em Provérbios se tornou um dogma consolidado. Os primeiros pais basearam sua identificação entre a sabedoria e Cristo em seus supostos papéis de agentes na criação (Pv 3.19, 20; 8.22-31; cp. Jo 1.3; ICo 8.6; Cl 1.15-16; Hb 1.3). Como demonstrarei no comentário, porém, uma exegese histórico-gramatical de Provérbios 8 não apoia a exegese patrística. R. P. C. Hanson caracterizou o confli to exegético patrístico como sendo semelhante “a dois homens de olhos vendados tentando bater um no outro”.196Nas palavras de Rowan Greed, “No período patrístico, os princípios teológicos explicam os resultados exegéticos”,197 e Clayton observa: “Não se pode falar de exegese pa trística de modo independente da teologia patrística”.198 Como argu mentei (pp. 132-137), ler Provérbios em seus próprios termos leva à conclusão de que Salomão identifica a mulher sabedoria com seus en sinos, não com uma hipóstase (i.e., um ser celestial concreto que repre senta ou simboliza Deus e é independente dele). Além disso, as versões antigas de Provérbios 8.22-31 e a literatura sapiencial judaica não oferecem nenhum fundamento consistente, muito menos um que seja sólido, para a cristologia plena do Novo Testamen to. De acordo com J. Cook, a tradução da LXX (do período helenístico mais antigo) de 8.22-31 tem por objetivo tomar Deus o Criador explíci to e elimina intencionalmente qualquer ambigüidade que sugira que a sabedoria desempenhou algum papel na criação.199 Entre outras altera ções, a LXX traduz qãnâ como “criar” e muda da forma passiva “fui criada” para a forma ativa “ele gera-me”. Para ’ãmôn, a LXX traz 195. Clayton, “The Orthodox Recovery", pp. 255-312. 196. R. P. C. Hanson, “Biblical Excgesis in the Early Church” (CAH; Cambridge: Cam bridge University, 1970) 1:440. 197. R. Grecr, The Caplain o f Otir Salvation (BGBE 15; Tílbingen: J. C. B. Mohr [Paul Sicbcck), 1973), p. 5. 198. Clayton, “The Orthodox Recovery”, p. 14. 199. J. Cook, The Septuagint o f Proverbs: Jewish and/or Hellenistic Colouring o f lhe LXX Proverbs (VTSup 69; Leiden: Brill, 1997). pp. 218-46.
harmozousa, “estar em harmonia com”, “encaixar com”, mas não se
sabe ao certo o que se pretendia com essa palavra.200 Sirácida, tam bém conhecido como Eclesiástico (ca. 180 a.C.), enfatiza que o cami nho da sabedoria era guardar a Torá: “Aquele que observa a lei obtém sabedoria” (Sir. 15.1). Sirácida 8.24-33 desenvolve deliberadamente o que se encontra em Provérbios 8.22-31 e identifica a sabedoria explici tamente com a lei de Moisés: “Tudo isto... é a lei que Moisés nos orde nou como uma herança para a congregação de Jacó” (Sir. 24.23).201 Em outras palavras, não existe uma trajetória direta na literatura sapi encial judaica helenística que se desloque da sabedoria em Provérbios 8 para a sabedoria como agente da criação e, então, para Jesus Cristo como Criador. Na virada da Era Cristã, em sua tentativa de relacionar a fé judaica de modo favorável com os conceitos filosóficos gregos, Filo deu à sabe doria uma nova direção, dizendo que “o universo foi fabricado” por meio da atividade do Logos-Sabedoria (De Sacerdotis 5). A sabedoria de Salomão (37-41 d.C.)202 também procura relacionar os ensinos de Salomão com conceitos da filosofia grega. Em sua descrição da nature za da sabedoria (7.22b-8.1), o autor anônimo da pseudepígrafe descre ve a sabedoria de várias maneiras, usando como fonte Provérbios 8.2231 e outros textos.203 Primeiro, em 7.22b-24 ele relaciona 21 atributos (“inteligente, santa, singular, variada”, etc.) depois de chamar a sabe doria de “confeccionadora (technitis) de todas as coisas (Sab. 7.22). Em 7.24 ela é seguida de outra identificação como alma do mundo: “mais móvel do que qualquer movimento... ela permeia e penetra todas as coisas”. Então, em 7.27, 28, a íntima relação da sabedoria com os seres humanos é descrita do seguinte modo: “ela passa para as almas santas e as toma amigas de Deus e dos profetas”. Em 7.29-8.1 há uma volta à sua dimensão cósmica: ela é superior ao sol, às estrelas e à luz, e “ordena bem todas as coisas”. Em resumo, esse monoteísta anônimo representa a sabedoria como um poder demiúrgico - usando o termo de Orígenes - que serve de mediadora entre o Criador e a criação. 200. Cook, The Septuagint o f Proverbs, pp. 229-32. 201. P. W. Skehan e Alexander A. Di Lella. The Wisdom o f Ben Sira (AB 43; Garden City, N.Y.: Doubleday, 1987), pp. 331-38. 202. P. Enns, “ Wisdom and Solomon and Biblical Interpretation", in WW/S. p. 213. 203. Apesar de o autor nâo ser citado em nenhum momento, sua intenção é representar a si mesmo como Salomão. No entanto, não pode ser Salomão, uma vez que escreve em grego e usa conceitos filosóficos estóicos e platônicos e parece ter escrito em Alexandria, no Egito.
Outros textos judaicos representam a sabedoria de maneira semelhan te. A Targum de Jerusalém traduz Gênesis 1.1 em conjunção com Pro vérbios 8.22: “O S f.n h o r criou os céus e a terra pela sabedoria”. Os escritos judaicos da virada da Era Cristã podem ter fornecido aos apóstolos um veículo para expressarem a doutrina da Trindade, com Je sus Cristo representado como o agente por meio do qual todas as coisas foram criadas, mas eles não citam Provérbios 8.22-31 nem desenvolvem sua cristologia plena com base nessa passagem. O apóstolo João não equipara Jesus Cristo com a figura da Sabedoria em Provérbios 8. Em momento algum ele usa o termo sophia, “sabedoria” com referência ao logos (i.e., ao Filho de Deus encarnado como o Jesus histórico). Em sua refutação da teologia feminista da sabedoria-Sophia, Karen Jobes co menta: “Se o desenvolvimento da sabedoria-Sophia nos escritos judaicos helenísticos se encaixasse tão perfeitamente ao entendimento apostólico de Jesus que culmina com a cristologia plena no Evangelho de João, sem dúvida é estranho além da compreensão que o termo sophia não ocorra nenhuma vez no Evangelho de João ou nas epístolas joaninas”.204 Além disso, no Evangelho de João o logos difere significativamen te da mulher sabedoria. Jobes ressalta que em Provérbios 8 “A sabedo ria é criada por Deus, mas o logos é Deus; a sabedoria testemunhou a criação, mas o logos é o Criador; na sabedoria de Salomão, a sabedo ria-Sophia é ‘um reflexo da luz eterna’ (Sab. 7.26), mas o logos é a própria luz eterna”.205 Por fim, movendo-se fora do prólogo de João, em Provérbios 1.20-33 (um texto paralelo a Provérbios 8) a sabedoria ri no tempo de julgamento (1.26), mas o logos é o juiz (Jo 5.23,24,27). Na verdade, como Jobes comenta, “se João está mesmo usando algo da literatura sapiencial judaica, é possível que esteja empregando sua linguagem para refutar o conceito de que a Sophia judaica é a media dora da criação. Cristo, o Logos de Deus, é o verdadeiro mediador”.206 Paulo também não constrói sua cristologia plena com base em Pro vérbios 8 ou na literatura sapiencial judaica. Como Gordon Fee mostra, o que está faltando em Paulo para se estabelecer uma ligação entre sua cristologia e essa literatura “não é apenas a correspondência verbal... mas também ecos claramente identificáveis desses textos”. Fee tam 204. K. H. Jobes, "Sophia Christology: The Way o f Wisdom?” in WIVIS, p. 239. 205. Jobes. “Sophia Christology”. pp. 241 -42. 206. Jobes, "Sophia Christology”, pp. 242-43.
bém rejeita a ideia de ligar a referência de Paulo à “sabedoria de Deus” (1 Co 1.24) com a referência à atividade de Cristo na criação (1 Co 8.6). Com respeito a 1 Coríntios 8.6, Paulo “equipara Cristo com Deus como mediador da salvação [itálico meu] bem como da criação” e, como Fee observa, “não há nada sequer remotamente parecido com isso na tradição sapiencial judaica”. Com respeito à primeira referência, o após tolo relacionou o conceito de sabedoria dos coríntios com a crucifica ção de Cristo, não com sua encarnação (ICo 1.21-24, 30). A mulher sabedoria não tinha nenhuma participação na expiação em Provérbios 8 ou no Judaísmo helenístico. Voltando-se para Colossenses 1.15-17, Fee encontra praticamente a mesma coisa. Além disso, nessa passa gem, Paulo está afirmando que Deus deve ser conhecido agora em seu Filho amado, não por meio da sabedoria personificada (Cl 1.3; cp. 2Co 4.4-6). O uso que Paulo faz do “primogênito” em Colossenses é com pletamente diferente da ideia de que a sabedoria personificada existia antes de todas as coisas. Ao falar de “primogênito” Paulo quer dizer que “Cristo como Filho tem os direitos de primogenitura com respeito a cada uma das coisas criadas, uma vez que todas elas foram criadas por meio dele e para ele [itálico dele]”.207 h. Similaridades e superioridade de Jesus Cristo em relação à mulher sabedoria Não obstante, existem semelhanças notáveis entre a personifica ção literária que Salomão apresenta da sua sabedoria e a representa ção que João faz de Jesus Cristo: • Ambos existiam com Deus antes de todas as coisas. • Ambos tiveram um papel na criação. • Ambos desceram do céu para habitar com a humanidade e foram rejeitados pelo povo em geral. • Ambos ensinam a sabedoria celestial. • Ambos chamam aqueles que ouvem de “filhos”. • Ambos conduzem aqueles que ouvem à vida e à imortalidade e ameaçam aqueles que não ouvem com a morte. • Ambos oferecem bênçãos simbolizadas por alimento e bebida.208 207. G. D. Fee, “Wisdom Christology in Paul”, in WiVIS, pp. 251-79. 208. Cp. R. E. Brown, The Gospel according lo John (AB 29; Garden City, N.Y.: Doubleday, 1966), pp. cxxii-cxxvii.
Mas essas semelhanças com a mulher sabedoria, conforme sua representação no prólogo, devem ser consideradas com a superiorida de de Cristo. Para resumir o que discutimos até aqui: • • • •
Deus deu à luz a sabedoria, mas Cristo é o Filho eterno. A sabedoria testemunhou a criação, mas Cristo é o Criador. A sabedoria ri no tempo do julgamento, mas Cristo é o Juiz. A sabedoria foi gerada por Deus, mas Cristo é Deus.
Em outras palavras, a personificação apresentada por Salomão da mulher sabedoria serve de tipo de Jesus Cristo. Na tipologia, o antítipo é semelhante e também superior ao tipo. Sem esse movimento ascen dente a História ficaria estagnada. 3. A superioridade de Jesus Cristo em relação à sabedoria de Salomão Jesus Cristo afirmou ser maior que Salomão, desafiando seus discí pulos a ouvirem sua sabedoria incomparável (Mt 12.42). Sua superiori dade a Salomão e à sabedoria dele pode ser vista nos seguintes con trastes, citando primeiro os provérbios de Salomão e depois as referên cias do Novo Testamento. • A rainha de Sabá deu testemunho da sabedoria de Salomão neste mundo, mas ela se levantará no julgamento para condenar as pes soas por não darem ouvidos à sabedoria superior de Cristo (Mt 12.46). • Salomão ensinou seus discípulos a esperarem em Deus a retribui ção aos malfeitores, mas o próprio Cristo lhes retribuirá (Pv 24.12; Mt 25.41-46; Ap 2.23; 22.12; cp. Rm 2.6-8; 2Ts 1.8; 2Tm 4.14; lPe 1.17; Ap 20.12, 13). • Salomão dependia de Deus para disciplinar aqueles a quem ele amava, mas o próprio Cristo disciplina aqueles a quem ele ama (3.11, 12; Ap 3.19). • De acordo com os ensinos de Salomão, aqueles que repartem com os pobres serão recompensados por Deus, mas Cristo se identifica com os pobres e é aquele que recompensa os que se sacrificam por eles (Mt 25.31-45). • Salomão se concentrou na saúde e na riqueza de hoje e minimizou os sofrimentos presentes; Cristo se concentrou no sofrimento pre-
sente por causa da justiça e maximizou a glória eterna futura (3.1-10,34; Mt 5.3-12; 25.1-13). • Salomão oferece vida eterna de maneira vaga, enquanto Cristo, por meio de sua ressurreição, trouxe a imortalidade plenamente a lume (8.35; Mt 25.46; 2Tm 1.10). • Salomão incentiva seus discípulos a agradarem seus pais, mas Cristo, sustentando a honra aos pais, ensina seus discípulos a amarem ainda mais o Deus trino (10.1; 19.13; 23.22-25; 27.11; 29.3; Mt 5.45; 7.21; 10.32,33,35,37; 15.4; 23.9; 25.34; Lc 9.60). • A sabedoria de Salomão é um ribeiro borbulhante, mas Cristo oferece rios interiores de água viva (18.4; Jo 7.38). • Salomão oferece um banquete de comida e bebida, mas o próprio Cristo é o alimento e a bebida do cristão (Pv 9.1-3; Jo 6.53). • Nenhum cristão subiu ao céu para compreender o todo, mas Cristo tanto desceu do céu como subiu ao céu (30.4; Jo 3.13; 6.33). • Salomão dependeu, em parte, dos ditos de outros, mas Cristo fala como Filho do Homem que veio do céu investido de autoridade (Pv 22.23; Mateus 12). • Salomão pede que seus discípulos escrevam seus ensinos no co ração, mas Cristo envia o seu Espírito para gravar a Palavra no coração de seus discípulos (Pv 3.3; 2Co 3.3). • Salomão pede obediência, mas o Espírito de Cristo dá poder a seus eleitos para obedecerem (Pv 1.20, 21; Rm 8.1-8). • Salomão antevê um futuro rei ideal (16.10-15), mas Cristo é o Messias (Mt 27.37). • Salomão apontou para a expiação ao mostrar amor fiel por outros, mas Cristo demonstrou esse amor fiel aos que são seus quando morreu para fazer expiação por seus pecados (Mc 10.45; 2Co 5.14). • O próprio Salomão não foi capaz de obedecer à sua sabedoria, mas Cristo é o exemplo perfeito da dele (3.2; 25.26; 1Rs 11.9,10; Lc 2.52; Hb4.15). • Salomão perdeu seu reino, mas Cristo edifica o seu (lR s 11.10; Mt 16.18). • Salomão pediu que seus discípulos alimentassem seus inimigos, mas Cristo morreu pelos seus (25.21; Rm 5.8). Entretanto, apesar da sabedoria de Cristo ser tão superior à de
Salomão, não descartamos a última, assim como não jogamos fora uma nota de cinco reais porque temos também uma nota de cinqüenta reais. 4. Conclusão Nas palavras de Paulo, “[em Cristo] todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento estão ocultos” (Cl 2.3,4). O cristão preza a sabedo ria de Salomão como um tesouro escondido, mas preza ainda mais a vida no reino presente de Deus (Pv 2.4; Mt 13.44). Ele se alimenta da sabedoria de Salomão, mas reconhece que se regala num banquete no reino de Deus. Ele aprende os provérbios de Salomão à luz plena dos tesouros de sabedoria e conhecimento ocultos em Jesus Cristo. Em outras palavras, ele não coloca a pessoa e a obra de Cristo no lugar da sabedoria tradicional de Salomão. Como a rainha de Sabá, o cristão vai até o livro de Provérbios para ouvir e obedecer à sabedoria de Salomão (Mt 12.42) sem depreciar a pessoa e a obra de Cristo. Ele vai a Provér bios reconhecendo que vive na Jerusalém celestial, com aquele que é maior que Salomão, com Jesus, o mediador da Nova Aliança, e busca o sangue aspergido que fala de coisas superiores àquelas de que fala o sangue de Abel (Mt 12.42; Hb 12.22-24). J. I. Packer observa quatro Particularidades da Nova Aliança, que foram acrescentadas à sabedoria de Salomão: • Um acréscimo epistemológico. A mensagem apostólica de que a salvação se encontra na pessoa e obra de Jesus Cristo. “Essa mensagem consiste de fatos históricos com uma explicação teo lógica detalhada desses fatos, apresentando-os, entre outras coi sas, como cumprimento das predições e promessas do Antigo Tes tamento. Essa é a ‘sabedoria de Deus em mistério’ ” (ICo 2.7). • Um acréscimo cristològico. A proclamação apostólica da sabe doria em Cristo deve ser plenamente reconhecida ( ICo 1.23-25, 30; GI 3.13; Cl 2.3,9,10,13, 14). • Um acréscimo soteriológico. “Há um consenso que a salvação é o tema de todo o Novo Testamento: isto é, a salvação no sentido de resgatar da culpa e do poder do pecado, da ira presente e futura de Deus, de toda a perversidade que marca e desfigura esta ordem mundial atual, do domínio do diabo e da condição de desesperança, desamparo e ausência de qualquer relacionamento positivo com Deus.”
• U m a c ré sc im o comportamental. O s cristã o s d e v em se co m p o r tar com sab ed o ria, “ não co m o in sen sato s, m as co m o sábios, num a vida e ética fam iliar ch eia d o E sp írito , sen d o tu d o irradiado pelo co n h ecim en to de D eu s em Jesu s C risto ” .209 O s cristão s já viv em no final d os tem pos. Em am o r e fé, apeg u em o nos firm em en te à q u ilo q u e é bom d o p assad o , c o m p re e n d am o s a p re sen ça do re in o de C risto n o p re se n te e, co m um a e sp e ra n ç a certa, ag u ard em o s an sio sa m e n te a co n su m a ç ã o de to d as as coisas.
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T E X T O E C O M E N T Á R IO
A .T ÍT U L O E PR E Â M B U L O (l.l-7)
1 Provérbios de Salomão 1 filho de Davi, rei de Israel. 2 para conhecer a sabedoria e a instrução, para entender as palavras de discernimento; 3 para aceitar a instrução do comportamento prudente1, [para fazer]* o que é reto, e justo e íntegro;4 4 para dar ao ingênuo perspicácia, ao jovem, conhecimento e discrição — 5 ouças o sábio e acrescente a seu aprendizado,5 e o criterioso adquircf orientação7— 6 para entender um provérbio, a sabei*, uma parábola ,9 os ditos dos sábios, a saber, seus enigmas.'0 7 O temor do S e n h o r é o principio do conhecimento, mas os insensatos desprezam a sabedoria e a instrução. 1. Título (1.1) L igado sin taticam en te ao títu lo p rin cip al d o liv ro (1 .1), o p re âm b u lo d eclara ao d e stin a tá rio o s seu s o b jetiv o s (1 .2 -6 ) e su a ep istem o lo g ia (1.7 ). O títu lo se referia, o rig in alm en te, às C o le ç õ e s I-IV (1 .1 -2 4 .3 4 ), m as o e d ito r final o em p reg o u co m o o títu lo p a ra a an to lo g ia final, que 1. Gen. de autoria (IBHS, p. 143, P. 9.5.1.c). A sugestão de que “Salomão, filho de Davi, rei de Israel" é mais uma indicação de um gênero real do que de autoria é improvável (pace Gemser, Sprüche, p. 18; McKane, Proverbs, p. 262). 2. Um gen. atributivo (i.e., “instrução prudente"), ou mais provavelmente um gen. de efeito (i.e., “instrução que gera prudência", IBHS, pp. 146,149, PP. 9.5.2c; 9.5.3a). A Sir. traz m úsãr ufihaékèl (“instrução e comportamento sábio”). Para o Hifil interno veja IBHS, pp. 439-40, P. 27.2f, e para o infinitivo absoluto como um substantivo veja IBHS, p. 591, P. 35.3.3. 3 .0 v. 3b está em aposição a "instrução no comportamento prudente”. 4. Ou “reto” . Um pl. abstrato (IBHS, pp. 120-21, P. 7.4.2; i.e., “um grande número de ações justas” (Toy, Proverbs, p. 12). 5. Uma vez que o preâmbulo declara o objetivo do livro, a conjugação prefixai ambígua é jussiva, um sentido validado pelo jussivoyôsep. 6. Provavelmente um jussivo de pausa e não apocopado (IBHS, p. 566, P. 34.2.1 a). 7. Um pl. abstrato. 8. Ou “e”. 9. I.e., “Uma expressão alusiva” (HALOT, 2:590, s.v. m elí$â). 10. Ou “declarações enigmáticas" (M. Held. “Marginal Notes to lhe Biblical Lexicon”, in B iblical and R elated Studies, P resented lo Sam uel twry, org. A. Kort e S. M orshauser (Winona Lake, ind.: Eisenbrauns. 1985), pp. 93-96.
inclui as Coleções V-VI1 (25.1-31.31) (veja pp. 76-77). As Coleções 1IV pertencem a um livro unificado como conhecido a partir de textos comparáveis do antigo Oriente Próximo (veja p. 71). Os provérbios, [veja p. 100] de Salomão, filho de Davi (veja pp. 71-76) se referem à maior parte da coleção reunida na antologia do editor final (veja p. 77). Além disso, de acordo com 22.17 e 24.23, Salomão adotou e adaptou ditos de outros sábios. Salomão foi o último rei de todo o Israel (966926 a.C.), e seu contexto palaciano fica claro em vários de seus provér bios. Esse epíteto mostra que apesar de o sábio ter obtido a inspiração para criar os provérbios da observação e reflexão sobre a natureza e sobre o comportamento humano, ele o fez à luz da cosmovisão de Israel (veja pp. 129-131). Diferentemente de títulos análogos do antigo Oriente Próximo, po rém, este título não diz a quem é dirigido, por exemplo, a Roboão. A literatura sapiencial do antigo Oriente Próximo normalmente cita o nome do filho ou aprendiz ao qual o sábio destinou sua instrução, com o pro pósito especial de prepará-lo para suceder o sábio em seu alto oficio entre os oficiais da corte. Suas instruções dizem respeito à ética profis sional. Ao omitir um destinatário específico, Salomão e/ou o editor final “democratiza” sua obra de modo a moldar o caráter nacional de Isra el .11 A maioria dos provérbios diz respeito ao interesse de todas as pessoas, não apenas os de um príncipe (veja p. 109). 2. Preâmbulo (1.2-7) a. Propósito e destinatários (1.2-6) O preâmbulo, que foi escrito para pais e mestres que usarão o livro, articula o objetivo do texto (vs. 2 -6) e seu destinatário, a saber, o jovem educável de Israel (vs. 4-5). Ele também fundamenta a teologia e a epistemologia do livro no “temor do S en h o r ” ( v . 7 ). Uma vez que o preâmbu lo elogia a obra implicitamente, ele forma umjanus (ou transição) para o prólogo (1.8-9.18) que motiva a audiência a aceitar os provérbios e ditos nas coleções subsequentes. A palavra-chave, “ouça/ouve” no versículo 5 e no versículo 8, fortalece o vínculo entre o preâmbulo e o prólogo. Com exceção do versículo 5, cada um dos versículos 2-6 começa com “para” (le). Essa série singular de frases infinitivas liga o preâm-
bulo ao título. Um verbo como “foram colecionados” é eliminado - i.e., o pensamento completo é: “Os provérbios de Salomão... foram cole cionados para conhecer a sabedoria...”. O versículo 2 introduz cada um dos seus versetos de maneira singular usando essa construção para servir de declaração sumária dos dois lados inseparáveis do seu propó sito, a saber, conhecer a essência da “sabedoria” (v. 2 a) e entender sua expressão (v. 2b). De acordo com Kayatz, no sistema teológico de Heliópolis, o deus criador Rá é caracterizado por sja, “conhecimento” e por hú, “expressão” .1 A repetição de “para entender” no versículo 6 sugere que os “provérbios” e “ditos” nesse versículo são um desdobra mento de “palavras” no versículo 2 b e que sinônimos como “descrição/ prudência” nos versículos 3-5 são um desdobramento de “sabedoria” no versículo 2a. Características poéticas, como palavras-chave, que ligam os versículos 3-5 ao versículo 2a e uns aos outros validam essa hipótese. A última palavra do versículo 2a é “instrução/ensino” e tam bém a segunda palavra do versículo 3a. Os versículos 3, 4 são ligados pelo merisma “aceitar” (“obter”) da parte do estudante (v. 3) e “dar” da parte do mestre, e os versículos 4 e 5 da parte dos dois destinatários do livro, o “ingênuo” (v. 4) e o “sábio” (v. 5). Os versículos 2 e 4 são ligados por “conhecimento” (d a a t\ vs. 2a, 4b), e os versículos 3 e 5 pela raiz Iqh (“aceitar”/“aprender”). Uma ampla gama de termos correlativos para sabedoria une os versículos 2-5 como um todo. Por fim, o inclusio de “sabedoria” e “sábio”, nos versículos 2a e 5a, e de “discer nimento” e “criterioso”, nos versículos 2b e 5b, desloca a unidade da essência da sabedoria para a pessoa que a encarna. (1) Sumário do propósito: essência e expressão da sabedoria (1.2) Conhecer (lãda'at) significa “tornar-se cônscio de, tomar consci ência de, observar, compreender, perceber, experimentar” .2 A pedago gia para “conhecer” em 2.1-4 mostra que o conceito visado aqui é a intemalização ou experiência pessoal da sabedoria. A sabedoria (hokmâ\ veja p. 124) não pode ser possuída sem instrução (m üsãr, lit. “lição disciplinadora”) para corrigir as falhas morais. Os instrutores autoritativos podem ser os pais e/ou sábios (1.8) bem como Deus e a experiên cia (3.12; 24.32). Müsãr tem a conotação de uma autoridade à qual o discípulo deve se sujeitar (i.e., ter “humildade”, 'anãwâ\ 15.33) para 1. Kayatz, Studien :u Proverbien 1-9, p. 11. 2. W. SchottrofT. TLOT, 2 :5 1 1 ,s .v.yd'.
subjugar sua teimosia inata (cp. 22.15); implica, portanto, moldar o ca ráter.3 Ela está diretamente associada a tôkáhat (“repreensão”, i.e., “a necessidade de corrigir as coisas”) e tôrâ (“ensino”; 1.8). W. E. Lane observa que sua raiz ysr (“castigar”) sempre pressupõe um propósito educativo e nunca é usada para se referir à correção de animais ou à disciplina divina de nações estrangeiras.4 Uma vez que o objetivo é a edificação do indivíduo, o termo é correlativo à “sabedoria” (hokm â; 1.2,7), “conhecimento” (dã'at\ 8 .10), “discernimento” (òmô; 1.2; 4.1; 23.23) e “conselho” ('êsô; 19.20). Além disso, uma vez que a educação visada aqui se encontra dentro da estrutura da cosmovisão do verdadei ro Israel, ela é usada com a “verdade” ( ’emet; 23.23), “o temor do S e n h o r ” (yir’at YHWH; 1.7). Com os verbos para ouvir ou observar ela é adquirida por meio da repreensão verbal. O criterioso também obtém müsãr por meio da observação perspicaz e da reflexão concludente acerca do sofrimento dos outros (19.25; 24.32; cp. Dt 11.2; Ez 5.15). Ao ser aprendido dessa maneira, müsãr, impede atos de insensatez. Para evi tar a repetição da insensatez, müsãr é aprendido com “a vara”, o sím bolo da punição corporal, que nesse caso pode ser traduzida como “dis ciplina” (13.24; 22.15; 23.13, 14; 29.15). Shupak diz: “O substantivo hebraico müsãr e o verboyãsar, igualmente [seus equivalentes egípci os], têm o sentido duplo de ‘instruir-repreender’ e ‘castigar-bater’ ” .5 A responsabilidade de responder à instrução recai diretamente sobre o filho; ele deve escutá-la (1.8 ), aceitá-la (1.3; 19.20; 23.23), amá-la (12.1) apreciá-la mais que o dinheiro (4.7; 23.23) e não deixá-la (4.13). Uma vez aceita, a disciplina se emerge do poder internalizado da sabedoria, não de “decisões de Ano Novo” esporádicas. E uma questão de espíri to interior, não de vontade coagida e submissão servil. A sabedoria e a instrução não podem ser obtidas a menos que o ouvinte seja capaz de entender (lehãbin) as palavras do sábio. No Hifil, bin com um objeto indireto significa “explicar”, mas com um objeto direto, como é o caso aqui, denota o ato de dar atenção e considerar algo com os sentidos, de tal modo que o entendimento acerca do objeto ocor re no ser interior (i.e., ele adquire e possui seu objeto). Pode-se ver ou ouvir algo e, ainda assim, não o “perceber/entender” (Is 6.9). Por vezes a ênfase recai sobre “dar atenção/considerar” algo (Pv 7.7; 14.15; 28.5), 3. N. C. Habel, “The Sym bolism o f Wisdom in Proverbs 1-9”, Inl 26(1972) 138. 4. W. E. L ane, “ D iscip lin e", in ISB E (1979), 1:948-50. 5. N. Shupak, “ Egyptian Terms and Features in Biblical Hebrew” , Tar 54(1984/85) 107.
e em outras ocasiões sobre o “entendimento” adquirido (cp. 1 .2 , 6 ). O preâmbulo e a literatura sapiencial do antigo Oriente Próximo em geral não explicam de que maneira essa habilidade intelectual é adquirida, aparentemente na hipótese de que a habilidade de compreender o signi ficado de um dito é aprendida por meio do exercício de ouvir e/ou ler. O termo palavras ( ’imrê) se refere a uma declaração completa, não ao um elemento que pode ser separado de outros para produzir uma declara ção completa. O plural se refere aos ditos, não às palavras que constitu em um dito. E provável que tanto o olho quanto o ouvido estejam envol vidos na tarefa de compreender os ditos, que eram tanto escritos quanto lidos em voz alta. O verbo “ouvir” (e.g., 1 .8 ) e as referências ao “ouvi do” (e.g., 2 .2 ) mostram que os provérbios, embora escritos, eram apren didos e ativados oralmente. As referências ao “olho” (e.g., 3.21), caso não sejam metafóricas, sugerem que eram transmitidos na forma escri ta. Na Suméria e no Egito antigo, os alunos escreviam a literatura de instrução, e no Israel antigo a maioria das crianças era alfabetizada (Dt 6.9; 11.20; Jz 8 .14). Com a invenção do alfabeto na primeira metade do segundo milênio, toda pessoa de inteligência mediana podia aprender a ler e, provavelmente, a escrever em algumas semanas. O texto mais antigo existente em hebraico (ca. 900 a.C.) é um texto infantil que re calcula o calendário agrícola. A. Millard afirma que os documentos antigos escritos em hebraico demonstram que os leitores e escritores não eram raros e que poucos israelitas não tinham consciência da escri ta .6 A tradição sapiencial foi escrita para preservar com exatidão a he rança do sábio, nessa mídia a audiência tem o controle, ao optar por ler ou não a comunicação. Ela foi disseminada oralmente para impor a sua audiência; nessa mídia o orador está no controle da comunicação. Esse entrelaçamento de fala e escrita é amplamente atestado na tradição sa piencial do antigo Oriente Próximo.7 As palavras ou ditos desse livro visam dar ao jovem de Israel dis cernimento (ou entendimento, binâ). De acordo com M. Fox, “binâ é a faculdade do discernimento e interpretação intelectual, o exercício des sa faculdade ou o produto da mesma, em palavras ou atos” .8 Em 1.2; 3.5 passim, esse termo se refere à faculdade da razão e da inteligência 6. A. Millard, "A n Asscssment o f the Evidence for Writing in Ancient Israel", BibAT (1985) 301-1 2 . 7. Fox, Proverbs I 9, pp. 74ss. 8. M. Fox, “ Words for W isdom” , Z A H 6 (1993) 154; veja porém Fox, Proverbs 1-9, p. 30.
aplicada ao conteúdo do ensino do sábio. O sábio renuncia ao uso autôno mo do intelecto (veja 3.5). Em Jó 28.12,20 o entendimento é equiparado a “sabedoria” e, em Jó 28.28, ao “temor do S e n h o r ” . Essas equiparações são reunidas em Provérbios 9.10 (cp. 2.5). O paralelismo em 1.2 mostra que aqui ele também se refere à essência da sabedoria. O livro de Pro vérbios enfatiza como é importante buscar (2.4), adquirir (4.5,7; 16.16) e aprender (4.1; cp. 1.2; 2.3) sua sabedoria e entendimento. (2) A essência da sabedoria e os destinatários (1.3-5) 3 Para alcançar esse objetivo, os destinatários precisam obter ou aceitar (lãqahat) a instrução {müsãr, v. 2 ) disciplinadora do livro. iMqah pode significar “pegar, agarrar, apanhar (manualmente)”, “levar consigo” ou “aceitar algo (da mão de alguém) com aprovação ou fa vor” .9 O último significado é metafórico, sendo este seu uso aqui. Dizse, agora, que a instrução produz, como o primeiro dos seus benefícios, comportamento prudente (haskêl; i.e., “comportamento sábio”, “bom senso”; veja p. 145). Uma vez que a sabedoria e seus termos correlatos podem ser ma lévolos, não benevolentes, o versículo 3b qualifica a instnição como aquilo que serve e cura a comunidade: aquilo que é certo (ou “reti dão” sedeq-, veja pp. 149), e justo (ou “justiça”, miSpãf, veja pp. 149150) e íntegro (ou “correto”, mésãrím; veja p. 150). 4 Uma vez que o versículo 3 considerou o propósito do livro do ponto de vista do aluno, para dar (lãtêt) muda a perspectiva para o ponto de vista do professor. Nãtan “basicamente indica o processo por meio do qual um objeto ou matéria é colocado em movimento”, mais especificamente causar algo ou ir até alguém (= “dar”), como no versí culo 4, ou no sentido de causar, efetuar, ocasionar ( = “fazer”), como em 10.10. 10 Os primeiros destinatários citados pelo mestre são os dos ingênuos (petã'tm\ veja p. 166). Sua necessidade básica é ter perspi cácia (ou astúcia, 'orma; veja p. 146). O paralelo de £ eJ ã ± m , os jovens (na'ar, veja 2 2 .6 ) coloca o p eti moralmente desajuizado numa faixa etária que se estende da infância (Ex 2.6; 1Sm 1.22, 24; 4.21) até os 17 anos de idade (Gn 37.2), até os 30 anos de idade (Gn 41.12; cp. 41.46) e, supostamente, até qualquer 9. H. H. Schmid, TLOT, 2 :649-50,s.v. Iqh. 10. C. J. Labuschagne, TLOT, 2:776, s.v. ntn.
idade antes de ser considerado um ancião (zãqên; veja 17.6; 20.29). A distinção também diz respeito ao caso da inexperiência em contraste com a experiência (cp. 2Sm 14.21; 18.5; Jr 1.6 ). Um jovem era conside rado plenamente responsável por seus atos aos 2 0 anos de idade (cp. Nm 1.3, 18; 14.29; 26.2,4), mas só podia servir no templo a partir dos 30 anos (Nm 4.3)." Nesse livro o na ar está no limiar da maturidade, 12 e é absolutamente necessário que decida se juntar aos sábios a fim de ter o conhecimento (da'at\ veja 1.2) do sábio. A sabedoria e o conhecimen to são inseparáveis, pois o domínio da experiência da vida exige o co nhecimento da ordem moral divina, da ligação entre causa e conse qüência. Conhecimento é um termo correlativo e inseparável das pala vras do sábio (23.12), da instrução (1.7; 19.27), da prudência (1.4; 8 .12) e da competência (ou entendimento; 2 .6 , 1 1 ), bem como da sabedoria (2.6, 10, 11; 14.6) e do discernimento (9.10). Como esses correlativos, esse termo também possui uma conotação religiosa (veja 9.10; 22.12; 30.3). É imperativo que o jovem ingênuo “procure” (15.14; 18.15), “ache” (8.9) e “adquira” (18.15) esse conhecimento. Mas primeiro ele deve se tomar o tipo de pessoa que vive no temor do S e n h o r (1.7). O criterioso (veja v. 5b) o ama (12.1), o busca (15.14; 18.15) e descobre que ele se recomenda (8.9), vem com facilidade (14.6) e é agradável (2.10). Esse conhecimento transmitido, que agora está no coração e nos lábios do discípulo, o protegerá em meio à tentação (5.2), o capacitará a se com portar com sabedoria e a falar bem (12.23; 15.2; 17.27) e a crescer em força (24.5). Os insensatos, ao contrário, odeiam o conhecimento (1.22, 29). Os provérbios concedem discrição (ou cautela, m ezimmâ\ veja p. 146), que é inseparável, porém distinto, de conhecimento. 5 Do outro lado do espectro dos destinatários se encontra o sábio (hãkãm, veja p. 145). Assim, Salomão o convida a se banquetear em seu alimento sagrado - ouça (ou escute; yisma'). Sãm a\ que pode ter o mesmo conjunto bastante amplo de significados que o nosso termo “ouvir” , 13 nesse livro significa que a pessoa dá ouvidos externamente 11. Plaut, Proverbs, p. 3 1.
12. W. S. B en so n eM . H. Senter III, orgs., The Complete Youth MinislryiChicago: Moody, 1987), p. 328, observam quatro características gerais da adolescência: “ Em primeiro lugar, a adolescência é um tempo de m udanças físicas e emocionais radicais. Em segundo lugar, os adolescentes começam a se perguntar: ‘Quem sou eu?’ Em terceiro lugar, os alunos do ensino médio desejam fazer parte do grupo. Em quarto lugar, a adolescência também é um período de confusão mental. Os adolescentes estâo com eçando a contrastar ‘aquilo que me foi dito’ com ‘aquilo em que acredito’ ” , 13. H. Schult, TLOT, 3:1,376, s.v. Sm'.
às palavras do orador e as obedece internamente. 14 O título considera Provérbios um livro, mas o verbo “escutar” requer que seu contexto pedagógico seja oral (veja 1.2, 8 ). Ao usar a forma volitiva da palavra “ouvir”, o preâmbulo sutilmente inclui o filho entre os sábios aos quais a forma volitiva desta palavra se dirige (veja 1.8 ). A intensidade da forma volitiva, que varia de uma ordem a um pedido, funciona aqui como um convite, uma vez que os sábios desejam obedecer a essa ordem .15 E acrescente (yôsep) protege a ordem para “ouvir” de ser entendida como um compromisso original. Uma vez que, por natureza, os sábios ouvem e obedecem, cada nova ocasião em que ouvem os provérbios produz crescimento em seu conjunto de conhecimento. O próprio Salomão dá exemplo dessa característica ao adotar e adaptar os “Trinta Ditos do Sábio” (22.17). O aprender (leqah; veja 4.2) apresenta a mesma raiz hebraica traduzida como “aceitar” em 1.3 e significa “obter a posse daquilo que o mestre deseja transmitir” . 16 Esse é o seu significado em 4.2 e 9.9, nos quais seus paralelos são “ensino” e “toma-se mais sábio ainda”, com referência aos ensinos do sábio. Mas em 7.21, leqah, se refere à persuasividade da esposa adúltera, criando ambigüidade quan to a qual desses dois significados é pretendido em 16.21,23. É provável que, no preâmbulo, apenas o primeiro conceito seja pretendido, pois ele também se refere ao ensino do sábio. Os criteriosos (nãbôn\ veja p. 147) no versículo 5b, possuem bínâ (veja Dt 4.6; Is 29.14), inclusive a capacidade de entender as palavras de discernimento ( 1 ,2 b), ou são potencialmente capazes de possuí-lo, da mesma maneira como os “sábios”, no versículo 5a, encontram-se no estado presente ou possível de “sabedoria” do versículo 2a. A seqüên cia imediata do versículo 6 , que expande e explica o versículo 5b, apoia essa ligação. Adquirir (yiqneh) protege o convite para ouvir do signifi cado de apenas aprender pela memorização repetitiva (veja “conhe cer” em 1 .2 ), pois qãnã significa mais precisamente “comprar”, uma metáfora para “adquirir e possuir”/“obter” (16.16; 17.16; 18.15; 19.8; e especialmente 4.5,7). O objetivo é obter orientação (tahbulôt, veja p. 148).
14. Uma passagem do texto egípcio Instruction o f M erikare (ca. 1900 a.C.) fala de "cantar os escritos” (AEL, p. 101). 15. IB tlS , p. 565, P. 34.1c. 16. Atkinson, Proverbs, p. 25.
A repetição de para entender (lehãbin ; veja v. 2b) enfatiza a ne cessidade de compreender o significado das palavras a fim de captar sua verdade e sugere, mais uma vez, que essa habilidade é aprendida por meio do exercício do estudo. A repetição também liga o objeto de hãbin, “as palavras de discernimento” (v. 2 b) aos objetos de hãbin no versículo 6 , pertencentes à mesma esfera semântica, a saber, “provér bio”, “parábola”, “ditos do sábio” e “enigmas”. Todos estes, com exce ção de “ditos do sábio”, são usados juntos em Habacuque 2.6 para o mesmo poema, sugerindo que essas quatro palavras não representam necessariamente quatro formas distintas de discurso sapiencial. A re petição de provérbio (m ãsãl , veja 1 . 1 ) cria uma firme ligação entre o objetivo de “entender” e o título (v. 1) e o subtítulo (10.1) de Salomão 1 (10.1-22.16). Uma vez que é um dito curto e mordaz, seu conteúdo inerente precisa sempre de interpretação bem como de aplicação. Um provérbio é uma “alusão”, a saber, uma parábola ( m elisâ\ veja n. 9), na falta de um termo mais apropriado em nossa língua. Torczyner afir ma que “parábola” (m elis ) é um sinônimo de “provérbio” (m ãsãl).'1 como o termo “provérbio” forma uma ligação com os títulos das cole ções salomônicas (1.1; 10.1; 25.1), assim também o faz a expressão os ditos do sábio (dibrê hakãm im \ veja p. 1 0 2 ). dibrê é usado nos títulos/ sobrescritos ou pós-escritos da literatura sapiencial (veja 22.17; 30.1; 31.1; Jó 31.40; Ec 1.1). O sábio também fala de “minhas palavras” que devem ser aceitas (1.2, 23; 4.4, 20) e das “palavras” (dãbãr ) que de vem ser rejeitadas (12.6; 22.12,19,20). A saber, seus enigmas (hidõtãm) é anexado aos “ditos do sábio”, pois eles também são paradigmas que exigem funções noéticas e existenciais, como diz Kleinig. 18 O Salmo 78.1, 2, por exemplo, classifica a recitação da história de Israel nesse salmo não apenas como “ensino” (tô r â ; cp. Pv 1.8 ), mas também como “provérbio” (mãSãl ) e “enigma” (hidõt ), pois requer de sua audiência um julgamento crítico e intuitivo do próprio comportamento à luz dessa história.
17. H. T orczyner, “The Riddle in the Bible” , H UCA I (1924) 139. 18. J. W. Kleinig, "T he Banquet o f W isdom — An Exegetical Study o fP ro v e rb s9 :l-1 2 ”, L T J \1 (1983) 24-28. Infelizm ente, Kleinig coloca a ideia de que são truísm os em oposição à ideia de que são m odelos para a reflexão.
Tanto quanto à forma como quanto ao conteúdo Provérbios 1.7 se distingue das construções frasais de propósitos encontradas no objetivo do preâmbulo (vs. 2 -6 ) e da especificação do destinatário “filho meu” que inicia o prólogo. Os preâmbulos e prólogos da literatura análoga do antigo Oriente Próximo não apresentam nenhum paralelo . 19 Esse versí culo se encontra na frente do restante da coletânea como a expressão fundamental da gramática espiritual básica para o entendimento do li vro.20 Não obstante, ele está ligado à declaração sumária do preâmbulo (v. 2 ) por apresentar exatamente a mesma seqüência, d a a t hokmâ müsãr (“conhecimento, sabedoria, e instrução”; veja v. 2). Além disso, “instrução” é uma palavra-chave que liga o versículo 7b ao versículo 8 a. O temor do S e n h o r (yir'at YHWH) é fundamento teológico e epistemológicodo livro e foi discutido na Introdução (veja pp. 1 5 3 -1 5 4 ) . O princípio da (rê’Sit) pode significar, temporalmente, “a primeira coi sa”; qualitativamente, “a coisa principal” (i.e., a parte mais excelente); ou, filosoficamente, “a coisa mais essencial”. O segundo significado coloca o temor do S e n h o r no mesmo nível de qualquer ensino sapienci al e permite que a sabedoria seja obtida sem ele. Dificilmente esse conceito se encaixa neste contexto, que ainda não está preocupado em declarar o conteúdo específico da sabedoria, mas sim em preparar o caminho para o mesmo. A ambigüidade do versículo 7 é resolvida pela palavra empregada para “o princípio de” (fíhillat) na passagem parale la em 9 .1 0 , apontando para o primeiro significado .21 Porém, neste caso o primeiro passo temporal não se encontra num eixo horizontal, que pode assim ser deixado para trás, mas num eixo vertical, sobre o qual tudo mais repousa. Ela denota tanto o initium quanto o principium. Aquilo que o alfabeto representa para a leitura de textos, as notas para a leitura da música e os números para a matemática, o temor do S e n h o r representa para a obtenção do conhecimento revelado deste livro. A pontuação do TM neste versículo cria uma quebra de verso. O para lelo em 1.2a sugere que o conhecimento (daat) no versículo 7a trans 19. Kayatz, Studienzu Proverbien 1-9 , p. 25. 20. “O tem or do S en h or” é uma expressão que ocorre 2 1 ou 22 vezes, a maioria delas na literatura sapiencial, sendo 14 dessas ocorrências no livro de Provérbios (1.7, 29; 2.5; 8.13; 9.10; 10.27; 14.26,27; 15.16, 33; 16.67; 19.23; 22.4; 2 3 .1 7 )e e m Jó 28.28; Salm os 111.10. Seu equivalente "tem or [de] Deus” resum e o ensino de E clesiastes(12.13;ep. Eclo 1.14). 21. 7^hillat hokmâ talvez tenha sido escolhido cm vez de rl 'stt dã at em função do gosto do poeta por variações. D S 'a t foi escolhido para m anter a ligação entre os v. 2 e v. 7.
borda para a sabedoria (hokmâ) e a instrução (müsãr) no verseto B. Mutatis mutandis, “sabedoria e ensino” no verseto B transbordam para o “conhecimento” no verseto A. Os insensatos (^w ilim ; veja pp. 167168), porém, são incapazes de cumprir esse pré-requisito para o enten dimento do ensino do sábio e para o conhecimento da sabedoria, pois fazem deliberadamente a escolha moral corrupta de recusar os ensinos morais do sábio. Esses insensatos presunçosos, ao contrário dos sábios receptivos ao ensino, acreditam firmemente na exatidão das próprias opiniões - diferentemente dos ingênuos - e portanto não são educáveis. Na verdade, eles desprezam (bãzü; i.e., consideraram sem valor e desprezível; cp. 6.30; 11.12; 18.3) a revelação de Deus. Nas palavras de Gõrg, “Toda a ofensa à vontade de Yahweh implica .... ‘desprezo, desdém’ da parte de Yahweh (cp. 2Sm 12.9, 10) ” .22 Seu desdém está arraigado em seu orgulho (SI 31.18[ 19]; 123.4). B. PRÓLOGO E EPÍLOGO (1.8-9.18)
Na forma final do livro, o prólogo (i.e., seu prefácio ou introdução) forma o contexto para toda a coleção que segue (10.1-31.31), não ape nas para as Coleções II-IV, seu contexto original. Ao contrário dos afo rismos concisos da coleção seguinte, o prólogo é composto principalmen te de encômios à sabedoria na forma de dez palestras colocadas na boca do pai e dirigidas ao filho e de dois discursos extensos (ou “interlúdios”) feitos pela sabedoria, uma personificação do ensino do pai, aos jovens ingênuos (veja pp. 132-135). Esses doze discursos extensos, com o pre âmbulo e o epílogo (9.1-13), são encômios à sabedoria, os quais visam motivar o filho e o ingênuo a aceitar o ensino a fim de escaparem do dinheiro fácil oferecido pelos homens perversos e do sexo fácil proposto pela esposa lasciva. As palestras tendem a pressupor a obediência do filho, e os interlúdios tendem a tomar por certo a teimosia do ingênuo. De acordo com Erikson, a adolescência é a busca por um senso de identidade. 1 O filho e o ingênuo (1.4 e 5) encontram-se no limiar da idade adulta plena. E chegada a hora do filho e do ingênuo (vs. 4, 5) tomarem uma decisão definitiva a favor da visão de mundo e de vida, bem como dos valores, propostos pelos pais piedosos e pelos sábios. Duas cosmovisões rivais fazem seu apelo “da sabedoria/loucura”, “do 22. M. Gõrg, TDOT, 2:62, s.v. bãzá. 1. E. E rik so n , “ T he E ight A ges o f M an” , in Childhood and S o c ie ly (T riad /G ra n ad a, 1977), pp. 222s, citado por K. A tkinson, P roverbs, p. 70.
bem/falso bem”, “da vida/morte”, sendo preciso escolher entre elas, pois não há um terceiro caminho.2 Cada uma dessas duas visões rivais é representada por duas vozes. A favor da cosmovisão da sabedoria, o pai se dirige ao filho no lar e a figura literária da sabedoria se dirige ao ingênuo junto à porta da cidade. A favor da loucura, os perversos ofere cem o dinheiro rápido, e a adúltera, sexo sem compromisso. Numa batalha intensa, principalmente por meio de seus discursos, esses dois combatentes competem pela “alma” do jovem .3 Aquilo que está em jogo é de grande valor; é uma questão de vida ou morte. As duas cosmovisões também são representadas pelas metáforas repetidas de dois cami nhos (1.10-19; 4.10-19) e duas casas (2.18, 19; 9.1-6, 13-18). O cami nho do pai conduz à vida, mas o caminho dos homens maus, à morte. A casa da mulher loucura é a antecâmara da morte; a casa da sabedoria é um lugar de vida. O filho e o ingênuo já estão no caminho da vida e da morte, respectivamente; cada um conduz a um “fim” definitivo (5.4,11; cp. 14.12; 16.25; 23.17, 18; 24.19, 20 ) .4 O filho deve perseverar no caminho da vida; o ingênuo deve escolher esse caminho. Nessa conjuntura, quando é necessário se comprometer com um dos caminhos, o jovem se encontra mais vulnerável ao sexo e dinheiro fáceis, pois suas paixões sexuais são mais intensas e sua tendência a ser sábio aos próprios olhos - e, paradoxalmente, receber a aprovação do grupo ainda não foi temperada pela realidade. Os convites da gangue e da ten tadora, que visam persuadir o filho e o ingênuo a se juntarem a elas, apresentam um vocabulário semelhante: “Vinde!”, “espreite”, “encon tre” e “Sheol” .5 Uma vez que um reino espiritual e eterno não pode estar baseado no poder nu e cru, o pai usa de toda a sua capacidade de persu asão para ganhar seu filho para a sabedoria e afastá-lo da loucura. No nível superficial do texto em hebraico, o pai, os homens perversos e, com exceção de 9.13-18, a mulher loucura, todos atuam dentro do registro histórico da experiência real. Apesar da sabedoria também ser retratada de maneira erótica, é obviamente uma figura celestial (veja pp. 133-134) e sua poderosa oponente, de modo igualmente óbvio, fica à espreita de sua presa nas ruas da cidade (veja pp. 176-182). Essa justa posição irrelevante da sabedoria no registro metafórico, em contraste 2. R. C. van Leeuwen, “ Lim inality and W orldview in Proverbs 1-9”, Sem eia 50 ( 1990) 113-34. 3. De acordo com J.-N. A letti,“S cductionet paroleem Proverbs 1-X” , V T27 (1977) 129-44. 4. Veja R. C. van Leeuwen, “ Liminality and W orldview”, p. 114. 5. Cp. Clifford, Proverbs, pp. 41 -42.
com o tratamento extenso da mulher loucura, no registro histórico, sugere que a mulher loucura também representa uma imagem metafórica do apelo da loucura para seduzir o jovem impressionável, desviando-o do caminho da sabedoria para uma cosmovisão estranha, uma interpretação que é validada por sua personificação no epílogo (9.13-18; veja p. 183). 1. Primeira palestra; exortação a ouvir e a rejeitar o convite da gangue(1.8-19)
Escute, filho meu, a instrução de teu pai e não deixes o ensino de tua mãe. 9 Pois eles são uma grinalda atraente para tua cabeça e um colar para tua garganta. 10 Filho meu, se os pecadores te tentarem, não cedas. 11 Se disserem? “Vem conosco; façamos uma emboscada1para derramar sangue, 8 espreitemos9 os inocentes sem qualquer motivo ;w 12 traguemo-los11 vivos, como o Sheol, até mesmo inteiros, como os que descem à Cova.12 13 acharemos todos os tipos de bens preciosos encheremos as nossas casas com despojo; 14 lança 13 sortes conosco 8
6. A LXX e a Sir. acrescentam “a ti” (
todos nós dividiremos'4 uma bolsa”15 15 não'6 te sigas o caminho com ele detenha o teu p é[1 das suas veredas18 16 porque os seus pés correm19 para o mal. e se apressam para derramar sangue.20 17 Certamente uma rede é estendida21 em vão à vista de qualquer22 1963], p. 6) aponta para exemplos no ugar. nos quais a conjugação prefixai ocorre numa cláusula condicional sem uma partícula condicional. 14. Lit. “teremos”. 15. O par. da LXX "... todos têm uma ... têm uma bolsa” representa uma combinação de sinônimo, leituras duplas de um Vortage hebraico diferente ou da parte do tradutor, ou no dccorrcr da transmissão da tradução (veja Shemaryahu Talmon, "The Textual Study o f the Bible — A New Outlook”, in Qumran and lhe History o f lhe Biblical Texl, orgs. F. M. Cross e S. Talmon [Cambridge, Mass. e Londres: Harvard University, 1975], pp. 344-78; e E. Tov, “ Recensional Differences between the Masorctic Text and the Septuagint o f Prover bs”, in O f Scribes and Scrolts: Sludies on lhe Hebrew Bible, Interteslamental Judaism, and Chriilian Origins. Presented to J. Slrugnelt, org. H. W. Attridge [College Theology Society Resources in Religion 5; Lanham, Md., 1990], pp. 44-49). 16. A expressão “meu filho” do TM provavelmente foi omitida na LXX original e representa um estágio mais antigo na recensão da Bíblia hebraica do que no TM ainda existente (de acordo com E. Tov, "Recensional Diflerences”, pp. 43-56). No entanto, "meu filho” também é repetido na apódose da palestra de estrutura semelhante cm 6.1 -5 (veja 6.3). 17. Regei denota o órgão da locomoção, seja o pé ou a perna (HAIOT, 3:1,184), ou, talvez, ambos. 18. As versões antigas e vários mss. trazem o pl. sob a influência do pronome no pl. no verseto A. 19. A assim chamada forma masc. é , na verdade, comum (IBHS, p. 108, P. 6.5.3a). 20. Vários argumentos não conclusivos sugerem que este versículo é um comentário. (1) Não está presente na LXX original, mas possivelmente foi removido da recensão grega por ditografia em função dos começos semelhantes na LXX dc/ioi gar(v. 17)eou gar(v. 16). (2) Repete Isaías 59.7, mas estes versetos podem reunir em um versículo o que é expressado de modo independente em Provérbios 6 .17b e 18b, abrindo espaço para a possibilidade de que Isaías 59.7 cita esse versículo. (3) Parece interromper o fluxo da argumentação ao descrever em mais detalhes o pecador, em vez dc apresentar motivos concludentes para atentar para a admoestação do v. 15, mas pode ter um sentido duplo intencional que abrange as duas coisas. 21. A LXX provavelmente traduz mez5m como ekteinetai. e para dar sentido à passagem, acrescenta ou no início do versículo e omite tPênê (“pois as redes não são espalhadas em vão para os pássaros”). Quatro interpretações do TM foram apresentadas para o termo crucial mzrh: (1) Pual ptep. de zrh (“ser espalhado”, no sentido de “ser coberto de grãos espalhados") (M. Lyons, “Rashi’s Commentary on the Book o f Proverbs” [grad. para rabino, 1936], p. 18; McKane, Proverbs, p. 271; Plõger, Sprüche, p. 17). D. Winton Thomas (“Textual and Philological Notes on Some Passages in the Book of Proverbs”, in WIANE, p. 281) reforça esse significado apontando para uma palavra árabe que tem o mesmo sentido. (2) Qal ptep. pass. de um suposto mzr (mezürã, “estendido”), como na Sir. (HALOT 2:566). (3) Hofa! ptep. de zúr (múzSrâ, “comprimir" [G R. Driver, Bib 32 (1951) 173-74]). No entanto, não há necessidade dc apelar para cognatos ou revocalizar a palavra. O termo hebraico comum zhr pode significar “estender” (cp. Jó 18.15; Pv 15.7; Ml 2.3) no sentido de “quando é sacudido e estendido, é como se fosse espalhado” (de acordo com Delitzsch, Proverbs. p. 65). 22. Antes de um gcn. indeterminado, kol é usado no sentido mais indefinido (individualizante) dc todos os tipos, qualquer... ou. distributivamente, cada. lodo... (GKC #!27c).
Criatura que voa,23 18 mas eles fazem uma emboscada24 por seu próprio sangue; eles espreitam25por suas próprias vidas. 19 Tais são os caminhos26 de todos que são gananciosos por lucro; ele tira a vida de quem27 o obtém}* As formas características dos versículos 8 , 9 e dos versículos 1019 sugerem que originalmente a introdução e a lição eram duas perícopes. A primeira se assemelha à forma imperativa dos prólogos egípcios (i.e., uma prescrição desdobrada em vários imperativos [cp. v. 8 ]) se guida pela comprovação ou motivação (cp. v. 9). A última é semelhante à forma imperativa encontrada nesses mesmos textos (i.e., uma cláu sula condicional seguida de uma cláusula principal, outra forma carac terística dos paralelos egípcios) . 29 No entanto, a concisão dos versícu los 8 , 9, em comparação com as formas análogas no prólogo, e as for mas típicas da palestra, que consistem de uma introdução e uma lição com uma conclusão, sugerem que o compilador visou combinar as duas em um todo unificado (veja A/A’). a. Uma exortação do pai e um adorno do jilho (1.8, 9) A introdução exibe a forma típica de destinatário e admoestação para ouvir (v. 8 ) e o argumento que apoia a admoestação (v. 9). A admoestação coloca o pai e a mãe em pé de igualdade como pedago gos do filho (cp. Êx 20.12; 21.15, 17; Lv 19.3; Dt 21.18-21; 31.12). Porém, somente o pai fala em outras passagens na primeira pessoa, e 23. Para o significado de bdal-x veja IBHS, p. 149. P. 9.5.3b. Versões antigas e vários mss. medievais Ira/em o pl. em vez do individualizante (veja GKC # 127c). A construção 67x è encontrada em todos os níveis da língua hebraica e não indica um texto mais recente (pace A. Hurvitz, “Studies in the Language o f the Book o f Proverbs — Conceming the Use o f the Construct Structure ba'al-x", Tar 55 (1985/86) 1-17. Porém, Hurvitz faz a observa ção interessante de que a construção predomina em Provérbios e em textos jurídicos. 24. A LXX emprega meteehS, um sinônimo de koinõneõ (cp. v. 11). 25. Corrigindo o texto para yi$peyún (veja v. 11, n. 9). 26. Toy (Proverbs, p. 20) et al. corrigem 'orhôt para 'ahrtt, pressupondo que um escriba fez a metálese de hele e rer/n- e confimdiu e j/xJe, como provavelmente ocorreu em Jó 8.13 em que a LXX traz eschata (<’ahrit) em vez do TM 'orhôt. É possível que orhôt tenha o significado excepcional de “destino", conforme a opinião de Fox (Proverbs 1-9, p. 90). O mais provável é que “caminhos", um símbolo comum no prólogo, combine as ideias de ação e resultado nessa declaração sumária 27. Lit. “m estre" (um pl. honorífico; IBHS, p. 123, P. 7.4.3c). 28. O antecedente do sufixo pronominal na terceira pessoa masc. sing. em bFülãyw deve ser o masc. de b&$à, não o fem. nepeS. 29. Kayatz. Studien zu Proverbien 1-9, pp. 32-34.
ele identifica o ensino da mãe com o seu, nunca o contrário, sugerindo a liderança do pai no lar (veja 2.1; 4.1). Na hierarquia de autoridade, os próprios pais se encontram sujeitos à sabedoria de Salomão inspirada por Deus, e os filhos sujeitos aos pais. No novo Israel, Jesus Cristo se sujeita a Deus, o Pai (1 Co 11.3); os anciãos e a igreja aos apóstolos - que se assemelham aos pais - por ordem de Deus, o Pai, e do Filho (ICo 4.15; lTm 1.2; Tt 1.4; Uo 5.21); os pais e a igreja em geral aos líderes (Ef6.2; Hb 13.17); a esposa a seu marido (1 Co 11.3; E f5.22-24; Cl 3.18; lTm2.11, 12); e os filhos a ambos os pais (Ef 6.1; Cl 3.20; cp. lTm5.4). (1) Destinatário e admoestação (1.8) O prólogo começa com a admoestação do pai a seu filho para ouvir e, desse modo, contribuir com seu discernimento acerca da herança sa piencial de Israel, não a negligenciá-la. Uma vez que o livro foi demo cratizado e não cita um filho em particular como destinatário, ao con trário dos livros de sabedoria egípcios, as palestras são ficções literárias colocadas na boca do pai. Referem-se a todas as famílias em Israel. Moisés coloca sua lei na boca dos pais de Israel (Dt 6 .1-6) da mesma maneira. O Novo Testamento interpreta as palestras como sendo dirigi das a todos os cristãos (veja p. 185). Ouve (è^mcL; veja 1.5) liga a primeira admoestação ao preâmbulo e sutilmente identifica o filho com o sábio que ouve e acrescenta ao seu aprendizado (veja 1.5). O tratamento carinhoso, filho meu {ben i) signi fica que o pai considera seu filho como seu herdeiro espiritual, não apenas um descendente biológico (veja 4.3). Apesar de bên poder signi ficar “filho” ou “filha”, a orientação masculina do livro mostra que se tem em vista o filho, não a filha (veja pp. 173-174). Esse epíteto e teu pai ( abikã) são pressupostos com frequência, porém equivocadamente, como metáforas para a relação entre o mestre e o aluno (p. 108). Os livros de sabedoria egípcios são dirigidos aos filhos do autor, nunca a alunos sem nenhum grau de parentesco. É importante observar a men ção de tua mãeÇimmekã) nesta junção do livro (veja 1 0 . 1 ), apontando para ambos os pais como vozes autoritativas com referência aos filhos, na educação dos mesmos dentro do lar. A instrução (müsãr) liga a admoestação ao preâmbulo (1.2, 3) e à chave (1.7), vinculando desse modo o ensino dos pais aos provérbios de Salomão. Não deixes signifi ca, essencialmente, “não deixar alguém, alguma coisa ou alguma situa ção sem cuidados e atenção”. O ensino (tôrâ) apresenta o conceito de
um contexto catequético. “A raiz apresenta um conceito com uma Sitz im Leben no ensino e na catequese.” Ela pressupõe uma relação entre o instrutor, que possui autoridade sobre o outro e o recipiente da instru ção, que tem certas expectativas em relação ao mestre. ''Fica claro que somente quando essa relação mútua está presente com sua pronti dão para dar e receber é que o contexto de função indicado poryãrâ III é (plenamente) considerado .” 30 Quando a fibra moral de uma nação não é formada por esse tipo de catequese, a sociedade se desintegra e segue-se a anarquia (veja 29.18). (2) Motivação (1.9) A conjunção porque (k i) forma uma parelha de versos que ligam os versículos 8 ,9. A perseverança na herança sapiencial de Israel adorna o filho com uma guirlanda em sua cabeça e uma corrente em seu pes coço, símbolos de honra e vida que dificilmente podem ser desconside rados. O sujeito oculto eles (hêm) trata os termos correlativos “instru ção” e “ensino” como sendo distintos um do outro, talvez para combi nar com os dois adornos. O mais importante, porém, é que eles próprios são os adornos; os quais não são algo futuro ou extrínseco a eles. Atra ente (hên) indica a qualidade de algo que o toma agradável e atraente para outros e, desse modo, conquista seu favor (veja 3.4, 22, 34; 4.9; 5.19; 11.16; 13.15). A recompensa com uma grinalda (liwyat; que apa rece novamente apenas em 4.9), uma coroa (de folhas e/ou flores) retor cida para a cabeça (lerõ'sekã) - caso possamos supor que a imagem ornamental possui um significado semelhante em Israel e no Egito - é uma metáfora simbólica que significa vitória e vindicação sobre os inimi gos, poder e vida, bem como prestígio e status social elevado.31 Em um texto egípcio, a “coroa da vindicação” é concedida porque o herói segue a luz de Ma‘at, uma deusa egípcia que personifica a nação de ordem e verdade mundiais e, de acordo com o consenso acadêmico, é um equiva lente mitológico egípcio bastante próximo da “sabedoria” não mítica no livro de Provérbios.32 Diz-se a um deus: “Ma‘at vem a ti para lançar por terra os teus inimigos. Ela coloca a grande (coroa) sobre tua cabeça” .33 30. S. Wagner, TDOT, 6:339, s.v. Illyõrá. 31. Kayatz, Studien zu Proverbien 1-9, pp. 111-17. 32. Kayatz, Studien zu Proverbien 1-9, p. 113; cp. Frankfort, Ancient Egyptian Religion (Nova York: Columbia University, 1948), pp. 63,64. 33. Kayatz, Studien zu Proverbien 1-9, p. 114.
A coroa egípcia é concedida somente nas esferas do culto aos mortos, aos deuses e ao rei. Mas os ensinos de Salomão são democratizados de modo que todos os filhos que obedecem a seus pais piedosos e aceitam os ensinos do livro usam esses ensinos como os heróis usavam a “gran de coroa”. Além de poder e vida, a imagem ornamental de um colar (‘anãqim), para a garganta (legargerõ-teykã; veja 3.3; 6.21) simboliza orientação e proteção, caso possamos tomar por base os paralelos egíp cios acerca de Ma‘at,34 não meramente uma decoração como nas ou tras duas ocorrências de colar na Bíblia hebraica (Jz 8.26; Ct 4.9). No Egito, os juizes superiores e os vizires usavam uma corrente de Ma‘at ao redor do pescoço como expressão simbólica de que eles viviam de maneira exemplar a serviço de Ma‘at, e Ma‘at é chamada de “o colar” e “a corrente magnífica ao redor do pescoço do presidente do supremo tribunal”. No reino de Salomão, os filhos sábios usam figuradamente seus ensinos magníficos como um colar. E preciso ressaltar que o colar de Ma‘at simbolizava a vida eterna. Os egípcios em geral usavam pen dentes de Ma‘at na morte, possivelmente como um símbolo da espe rança de que, no julgamento dos mortos, seu serviço a Ma‘at lhes daria a promessa de vida .35 A interpretação dos símbolos com base nos para lelos egípcios é confirmada no restante do prólogo, no qual repetida mente é prometida orientação e proteção ao filho sábio (cp. e.g., 2 .8 , 10, 11; 3.23; 4.6, 11). De acordo com Kayatz, 36 tais promessas abran gentes não encontram analogias comparáveis na instrução egípcia. G Barkay e H. Roesel descobriram a bênção sacerdotal (Nm 6.24-26) em dois amuletos de prata do 7o século a.C., que eram usados em volta do pescoço.37 É possível que sejam elementos incipientes no desenvol vimento dos filactérios. A metáfora aponta para a realidade de exibir e recitar o ensino. Como uma aliança de casamento, esse sinal preeminente para os observadores é a melhor defesa contra a sedutora. b. Lição: resistir ao convite da gangue (1.10-19) A lealdade do filho à cosmovisão herdada de sua família deve ser claramente distinguida da gangue, que procura atraí-lo para sua corrup 34. Kayatz, Studien zu Proverbien 1-9, pp. 107-11. 35. Kayatz, Studien ztt Proverbien 1-9, pp. 108-9. 36. Kayatz, Studien zu Proverbien 1-9, p. 75. 37. Gabriel Barkay, “Excavations on the Slope o f H innom Valley in Jerusalem”, Qad 17(1984) 94-108; e Harmut N. Roesel, “Zur Formulierung des aaronistischen Segens aufden Amelettem vom Ketef Hinnom", BN 35 ( 1986) 30-36.
ção. Na advertência acerca dos pecadores, o pai oferece prudência e cautela a seu filho (cp. 1.4) mediante a exposição do discurso de seus rivais - estar precavido é estar preparado - e mediante a ridicularização de seu plano. Ao contrário do pai, que tem uma relação hierárquica com o filho em sua apresentação da cosmovisão tradicional da sabedoria, os pecadores são da mesma geração do filho, como é indicado pelo coortativo “vem conosco” e pelo uso repetido da primeira pessoa do plu ral. Newsom comenta: “O subtexto igualitário fica explícito no versícu lo 14b, “todos nós dividiremos uma bolsa”. Mas ela incrivelmente iden tifica toda a geração do filho com esses trapaceiros para interpretar que o texto ensina “a divisão do poder entre os homens mais velhos e mais jovens na sociedade patriarcal” .38 Esses criminosos são iguais ao filho somente na idade, não nos valores. Seu discurso antagônico está baseado no empreendimento comum de buscar a riqueza imediata fora dos limites da lei, em vez da riqueza mais demorada que vem mediante o desenvolvimento do caráter dentro da lei (veja 16.29). Aletti argu menta que as bênçãos do perverso não passam de falsificações das bênçãos do sábio. Tanto os perversos quanto os sábios falam de achar (ws’; 1.13; 2.5; 3.13; 8.17) riquezas (hôn; 1.13; 8.18) e de encher (m l’, 1.13; 3.10; 8.21) a casa com elas.39 Elas também prometem uma comu nidade falsificada baseada na convicção de que a prosperidade pode ser obtida fora da lei. Em sua cosmovisão eles não têm temor algum (veja 1.29), pois Deus não estabeleceu e/ou não sustenta os limites morais (cp. 1.14,29; 8.17-21). A refutação do pai se baseia no seu temor do S e n h o r (1.7) e em sua certeza de que Deus sustentará a justiça (cp. 16.5). Sua arma de argumentação é a sabedoria espiritual, não a humana (veja 1 . 1 ; 8.9; 30.1-6; Mt 11.25,26; 16.18; Jo 8.32; ICo 2.1-16; 2Co 10.4). A lição tem três partes. Sua introdução consiste de uma repetição do destinatário, filho meu (ben i , veja 1 .8 ), um resumo da situação se dutora introduzida pela conjunção se ('im, v. 1 0 a), seguida por uma breve admoestação, “não cedas”. Seu corpo começa tratando mais detalhadamente da situação sedutora, sendo introduzido novamente por “se” (vs. 11 -14), seguindo-se uma admoestação expandida (v. 15), apoi ada por um argumento (vs. 16-18). Sua conclusão extrai um princípio moral sumarizante a partir da situação específica (v. 19). Na análise a 38. Newsom, “Woman and lhe Discourse”. pp. 144-45. 39. Aletti, “Séduction et parole”, pp. 136-37.
seguir, as duas partes do seu corpo serão tratadas separadamente. Assim a introdução e a conclusão consistem de um versículo cada, e o corpo é dividido igualmente em quatro versículos de duas parelhas de versos cada sobre a tentação oferecida pelo pecador e a refutação do pai. (1) Introdução: declaração sumária (1.10) O vocativo, “filho meu”, antes da cláusula condicional é enfático (veja 2.1). Apesar de se Çim) apresentar uma situação hipotética e fic tícia, sua possibilidade é tão real quanto a possibilidade de se colocar como fiador de um desconhecido (veja 6 .1). A situação considerada como hipótese foi real durante o reinado de Manassés, que derramou muito sangue inocente (2Rs 21.16). Os homens maus são chamados aqui de pecadores (hafíã ’i m ) . Apesar da objeção de Koch, o significado da raiz h t’ é “errar (um alvo)”, “ficar aquém”. Esse sentido básico e não teoló gico é atestado com seu sentido religioso familiar de “pecado” (cp. 8.36; 19.2; Jz 20.16; Jó 5.24). H t’ é usado em vários tipos de circuns tância para um erro desqualificativo.40 Os termos correlatos perten centes ao mesmo campo semântico de “pecado” pressupõem um pa drão violado (hf, “errar”; peSa\ “rebelar-se” e 'ãwôn, “iniqüidade”, “culpa”), presumivelmente o “padrão de Deus”. “O pecado normalmente é descrito como sendo contrário a Deus ou em desobediência à Palavra de Deus” (cp. SI 51.4 [6 ] ) . 41 Uma vez que o relacionamento do indiví duo com Deus e com a comunidade é inseparável (cp. 3.27-35), esse termo teológico abrangente para “pecado” também se refere a uma ofensa desqualificadora “contra alguém com quem o indivíduo se relaciona dentro de uma comunidade institucionalizada” .42 O padrão nominal de haftã ’im significa uma ocupação ou ação repetida do significado do lexema (veja SI 1.1 ).43 Em outras passagens o epíteto também se refere a assassinos que matam por inveja (Gn 42.22; 50.17), ou talvez por sua cobiça de poder (2Rs 21.17), ou, como aqui, por venalidade. Fazendo jus ao ditado, “ninguém gosta de pecar sozinho”, eles tentam (y^pattúkã; veja 1.4) o filho para fazê-lo desviar-se dos caminhos da retidão e da justiça e, assim, errar (veja 1.3) . 44 A admoestação, não cedas ( ’al40. M. Saebo, TLOT, 1:406-8, s.v. k f . 4 1. A. Luc. NtDOTTE, 2:87-88, s.v. h t\ 42. K. Koch. TDOT, 4:311. 43. IBHS. p. 89, P. 5.4a. 44. Outras traduções válidas são "persuadir”, “instar” e “atrair”, mas não “seduzir", "enganar" ou
tõbê’) não se refere primariamente à intenção como um fator psicológi co interior à pessoa de seguir a direção proposta, mas aos primórdios de um padrão comportamental e ações positivas e reais que expressam essa intenção interior.45 (2) Corpo: revelada a tentação dos pecadores (1.11-14)
A tentação consiste em duas parelhas de versos: a proposta para que se junte a eles em seu ato sangrento (vs. 1 1 , 1 2 ) e os argumentos deles (vs. 13,14). O versículo 11 expõe sua preparação completa para o crime ostensivo do versículo 1 2 . 0 versículo 13 expõe sua venalidade e o versículo 14 sua fraternidade sinistra. 11, 12 A repetição de se ( ’im ) introduz o corpo. Eles disseram (yom erü cp. 1.2) introduz o discurso rival fictício. Com brilhantismo o pai coloca na boca dos pecadores palavras que ao mesmo tempo os condenam e revelam sua sedução. Com respeito à condenação, Newsom comenta: “Na verdade, o discurso dos pecadores está repleto de indica dores negativos: eles são levados a descrever suas vítimas como ‘ino centes’ (v. 11a). A metáfora que empregam para si mesmos é a da pró pria morte, Sheol tragando a vida (v. 12b). Eles agem sem nenhum motivo... (v. 1 1 b) ” .46 É evidente que se trata de um discurso fictício, pois, como Meinhold observa, dificilmente os tentadores usariam essas palavras condenatórias, sinais rudimentares que revelam em vez de ocul tar a vileza de seus atos.47 Porém, apesar do pai fazer esse convite parecer o rugido de um leão para causar repulsa no filho, ele também o envolve com a sutileza de uma serpente. Aitken comenta: “Seus encantamentos não são difíceis de encontrar: excitamento (vs. 1 1 , 1 2 ), dinheiro fácil (v. 13) e a camaradagem de fazer parte de uma gangue (v. 14)”.4S Esses “sujeitos sociáveis” começam sua tentação com as mesmas palavras que a mulher estranha usa em sua tentação (7.18): Vem (lekâ, veja 1.15), deixando implícito pela primeira vez a metáfora básica ou central do prólogo acerca do “caminho” (veja vs. 15, 19). Como seu “ludibriar", apesar destas serem traduções comuns para a nossa língua (veja D. J. A. Clines e D. M. Gunn, “‘YouTried to Persuade M e'and ‘ViolenceandOutrage’ in Jeremiah XX 7-8”, l/ 7'28 (1978) 20. 45. B. Johnson. TDOT, 1:24-25,s.v. 'SbkSh. 46. C. A. Newsom, "Woman and the Discourse o f Patriarchal Wisdom”, in Cender and Difference in Ancient Israel (Minneapolis: Fortress, 1989), p. 144. 47. Meinhold. Sprüche, p. 53. 48. Aitken, Proverbs, p. 19.
pai, o diabo, que tentou os primeiros seres humanos a o acompanharem em sua loucura (Gn 3.1-6), eles agora tentam esse filho. Conosco Çitãnu) indica fazer companhia e sugere sua distorção do desejo dado por Deus à humanidade de ter comunhão. Em vez de possibilitar a comunhão dos justos, eles anseiam pela companhia de pecadores san guinários. Façamos uma emboscada (ne^r^bâ), um verbo usado com frequência para animais à espreita de sua presa (cp. SI 10.9; Lm 3.10, 1 1 ), expõe seu crime como uma trama friamente calculada, arbitrária e selvagem contra uma vítima infeliz para não lhe dar nenhuma chance de escapar ou se defender. No versículo seguinte eles executam o pla no com a mesma frieza (veja Lc 10.30). O sangue (dãm ) se refere à morte violenta, uma sinédoque para a vítima assassinada.49 O paralelo de “façamos emboscada”, espreitemos (nispenâ; veja n. 9), expõe os pecadores ávidos se preparando para matar sua vítima. Sãpan significa essencialmente “esconder” ou “ocultar”, quer por motivos sinistros, como numa emboscada, quer para proteção e segurança (veja Êx 2.3; Js 2.4; SI 31.20[21]).50 Eles condenam a si mesmos chamando seu alvo de sangue inocente (nãqi). Nãqi reflete uma linguagem judicial, tendo como significado “livre de culpa” e, por vezes, aparece com “justo” (saddiq, Êx 23.7; cp. SI 15.2, 5). Nãqi costuma estar ligado a dãm (Dt 19.13; 27.25; ISm 19.5; 2Rs 21.16). Aqui, porém, o par de palavras estereoti pado “sangue inocente” (i.e., o assassinato de alguém sem culpa) está separado no paralelismo, um fenômeno comum na poesia hebraica.51 Por meio desse artifício, o pai conduz o versículo à sua culminância: a vítima era inocente! Sem qualquer motivo ou sem justificativas (hinnãm ; veja 1.17), que faz parte da retórica do pai, enfatiza a mons truosidade do seu ato contra tudo o que é correto. É provável que a intenção seja de fazer um jogo de palavras com o outro significado de hinnãm, “em vão” (ou “sem efeito”), no versículo 17. Motivados intei ramente pela ganância, esses criminosos insensíveis não sentem a ne cessidade de justificar o assassinato. 12 A metáfora evocativa, traguemo-los ... como o Sheol (ou “a sepultura”, niblaêm ki$'ôl), indica, como Plõger52 comenta, que está 49. Veja Keil e Delitzsch, Proverbs. p. 6 1. 50. Andrew E. Hill, in NIDOTTE, 3:840, s.v. çpn. 51. E. Z. Melamed, “Break-up of Stereotype Phrases as an Artistic Dcvice in Biblical Poetry”, in Studies in the Bible, org. C. Rabin (ScrHier 8; Jerusalém: Magncs, 1961), pp. 115-53: M. P. 0 ’Connor, Hebrew Verse Structure (Winona Lake, Ind.: Eisenbrauns, 1980), p. 112. 52. Plõger, Sprüche. p. 16.
em conluio com o Sheol (veja p. 172). O acréscimo de vivos (hayyim) e seu paralelo, inteiros, também indica que atingem suas vítimas incau tas como um terremoto, antes que ela tenha a oportunidade de se pro teger ou a chance de revidar. A mudança da vítima no singular para a terceira pessoa do plural deixa claro que não se trata de um assassinato isolado, mas de um padrão de vida. Até mesmo inteiros (üfím im im ) especifica que, em seu ímpeto neurótico, eles saqueiam suas vítimas desenfreadamente, um detalhe vivido que traz a lume sua total venalidade. A raiz tmm indica um processo que já foi realizado em algo ou em alguém. O substantivo tõm descreve o caráter completo de um ato e, combinado com “andar”, tem o sentido de um comportamento constan te, “irrepreensível” (2.7; 10.9; 19.1; 20.7; 28.6). Apesar de em outras passagens fimimim significar consistência moral, ser irrepreensível (veja 2 .2 1 ), aqui, como no caso das ofertas cúlticas, significa “uma qualidade física verificável e perfeita em contraste com um animal deformado ou doente” .53 A combinação de “vivos” e “inteiros” indica que estão em plena saúde, não velhos e enfermos, assim não esperam a morte. Em resumo, os pecadores liquidam os inocentes não os culpados, e o fazem de modo prematuro, completo, inesperado e injusto (cp. Mt 21.38). Como os que descem à Cova {kPyôr^dê bôr) é um paralelo enfático de “como a sepultura [Sheol]” e implica que “traguemo-los” no verseto A foi omitido no verseto B. Bôr diz respeito mais especificamente ao buraco de entrada na sepultura.54 O inocente assassinado deve esperar pela justiça que se encontra além da morte (veja pp. 163-164). 13, 14 A motivação que impele esses pecadores viciados é a ga nância, como são levados a confessar: Toda sorte de confere a kol seu sentido qualitativo, não quantitativo (i.e., “todos” ) . 55 Bens (hôn) indica “aquilo que está pronto” (i.e., “propriedades, posses ” ) .56 Uma vez que preciosos (yãqãr; veja 3.15) qualifica tais bens, podem ser traduzidos como “riquezas” (cp. 10.15). Tendo eliminado o dono da casa, podem agora saqueá-la (cp. Mt 12.29); como eles próprios dizem, enchere mos (nem allê’)... nossas casas (bãttênü). O termo “casas” pode indi car que eles faziam parte da sociedade estabelecida, não eram bandi dos que viviam à margem da mesma. Despojos (sãlãl) denota os es 53. K. Koch, TLOT, 3:1426, s.v. tmm. 54. J.-G Heintz, TDOT, 1:466, s.v. 6e í?r. 55. HALOT; 2:474-75, s.v. kol. 56. E. Kutsch, TDOT, 3:366, s.v. hôn.
pólios, a pilhagem, aquilo que se toma de um inimigo vencido (veja 31.11). As casas desses trapaceiros, que acreditam estar acima de todas as leis, são mansões com muros altos na melhor região da cidade. Os poderosos veem o mundo como um lugar a ser conquistado; os artistas vaidosos, como um palco no qual receber aplausos; e os cobiçosos como um lugar para transferir a riqueza da conta bancária de outros para a sua. Os pecadores amam as riquezas e usam as pessoas; os santos amam as pessoas e usam as riquezas para ajudar os outros. Como seu clímax final eles prometem “porções justas para todos” .57 O verseto A é uma prótase implícita, a condição: (se você) lançar (tappil, lit. “jogar”) sortes (gôrãlekã; veja 16.33) conosco (betôkênü). A “sorte” era uma pequena pedra usada para lançar sortes,58 e constitui um janus entre “despojos” (1.13b) e “uma bolsa” (v. 14b), pois a sorte imparcial era usada com frequência em conexão com “despojos”. O verseto B é a apódose implícita, a conseqüência: (então) todos nós dividiremos uma bolsa (kis ’ehãd yihyeh lekullãnü\ lit. “uma bolsa será para todos nós”) induz o neófito a conseguir mais do que poderia esperar obter por meio de seus esforços independentes.59 (3) Corpo: revelada a advertência do pai (1.15-18) Exatamente na metade de sua palestra o pai muda seu foco dos pecadores e seu discurso sedutor para a própria refutação. Ele equipa ra a retórica persuasiva dos tentadores a suas imagens vividas. Sua advertência também é constituída de duas parelhas de versos (vs. 15, 16, 17, 18). A primeira parelha de versos, que é ligada pela conjunção “porque”, provê a ordem de recusar se juntar ao covil de ladrões (v. 16) porque a justiça prevalecerá (v. 17). A segunda, que é ligada pela con junção “mas” (v. 18) revela a estupidez dos pecadores. As duas pare lhas de versos são ligadas pela justaposição inicial de ki em seu cerne (“porque”/“certamente”; vs. 16a, 17a) e por um jogo de palavras com dãm (“sangue [de outros]”/“[seu próprio] sangue”; vs. 16b, 18a). 15,16 Além do “porque” lógico, a ordem para não se juntar ao covil de ladrões e sua motivação estão ligadas pela justaposição quiástica de “teu pé” (v. 15b) e “os seus pés” (v. 16a). Dentro da tradição massorética a transição da cláusula condicional extensa (vs. 11-14) para a apódose 57. McKane, Proverbs, p. 269. 58. W. Dommershausen, TDOT, 2:450, s.v.gôrõl. 59. De acordo com Toy, Proverbs, p. 16.
(vs. 15-19) é auxiliada pela repetição do tratamento carinhoso “filho meu” (veja n. 16). Não sigas... com eles ('al-fêtèk... ’ittãm) responde quase literalmente ao apelo dos pecadores (v. 1 la). O caminho (bederek\ veja 16.17) é o primeiro de vários usos da metáfora básica (i.e., aberta a muitas variações) do prólogo.60 Enfadonhamente, derek indica uma es trada transitável, ou o movimento nessa estrada, que leva a um destino. Em seu sentido figurativo, derek e seus correlativos evocam três noções: ( 1 ) “curso de vida” (i.e., o caráter e contexto da vida); (2 ) “conduta de vida” (i.e., escolhas e comportamentos específicos); e (3) “conseqüênci as dessa conduta” (i.e., o destino inevitável desse estilo de vida).61 Em nossa língua a expressão “estilo de vida” abrange os dois primeiros concei tos, mas não o terceiro, que é importante. Koch disse: “Os atos de um homem se agarram a ele, por assim dizer, enrolando-se ao seu redor num domínio invisível que, um dia, se transforma numa condição ou estado correspondente e, então, recai sobre o executor” .62 Isso é ver dade, mas Koch se equivoca ao pensar que tal processo ocorre à parte da interferência divina mediante a negligência em ler Provérbios holisticamente. Outros provérbios ensinam que o S e n h o r sustenta o princí pio da retribuição (veja 5.21-23; 10.2, 3). Em resumo, o “caminho” é uma metáfora para o vínculo entre ato e destino mantido por Deus, sendo que o conhecimento da mesma é necessário para a sabedoria (veja p. 125). A vivida metáfora detenha (m en a \ veja 3.27; 23.13) teu pé (raglekã\ veja n. 17) das suas veredas (m innetibãtãm\ veja n. 61) indica que o filho não deve experimentar o vício dos perversos (cp. 60. Derek (“caminho” ou “estrada”) ocorre cerca de 710 vezes no Antigo Testamento, 75 vezes em Provérbios e 30 vezes em Provérbios 1-9 (N. C. Habel. “The Symbolism o f Wisdom in Proverbs 1-9”, Int 26 [1972] 137, n. 13; D. Dorsey. The Roads and Highways o f Ancienl Israel [Baltimore: Johns Hopkins University, 1991]). 61. Os três conceitos inseparáveis também se referem aos seus sinônimos: 'orah (1.19; 2.15, 19. 20; 3.6; 5.6; 9.15; 4.18; 9.15); ma'gal (2.9, 15; 4.11), nettbá (7.25; 8.2, 20). 'Orah (“caminho” ) é praticamente um termo poético - com exceção, possivelmente, do seu uso em Gênesis 18.11, 56 ou 57 vezes na poesia - sinônimo de derek, que significa estrada, e não um caminho secundário escolhido pelo viajante no meio de um bosque. O termo não era usado no quotidiano, mcigal (“trilha”) parece derivado de uma estrada marcada pelas rodas de carroças (veja 2.9. 15). As trilhas são criadas por homens que se deslocam durante seu trabalho, tfttibâ (“senda”) parece aludir um caminho secundário, e não uma rota principal (Jz 5.6; Jr 18.15), “uma passagem", não uma estrada aberta (Jó 18.10; Os 2.8). Apesar de 'orah ser um sinônimo poético de derek, Koch observa várias diferenças. Em primeiro lugar, 'orah ocorre predomi nantemente no pl. e derek predominantemente no sing. Em segundo lugar, um derek pode ser constituído de vários 'õre!fôt (cp. Is 3.12). Por fim, 'orah. enfatiza mais o estado ou condição do transeunte que suas ações (K. Koch, TDOT, 2:281, s.v. derek). 62. K. Koch, TDOT, 3:272-73, s.v. derek.
4.15-16).63Alexander Pope expressou de maneira compreensiva a ten dência de se endurecer no pecado: “O vício é um monstro de aparência tão assustadora que, para ser abominado, só precisa ser visto. Mas quando sua face é vista com frequência, toma-se um rosto familiar que, primeiro suportamos, depois, nos apiedamos e, por fim, aceitamos”. 16 Porque (kí) introduz a razão motivadora. Os seus pés correm (raglêhem yãrüsu) para o mal (lãra') dá forma concreta à compulsão desses viciados no mal (veja 4.14-16). Ra transmite essencialmente o julgamento factual de que algo está errado, quer se encontre no estado físico e concreto (e.g., vacas “feias”, Gn 41.3; figos “ruins”, Jr 24.2), quer em uma abstração, “calamidade/desastre”, ou um comportamento moral que prejudica a outros (veja 1.16; 2.12). A análise de que algo é ruim depende do gosto daquele que faz a avaliação; essa palavra é acrescida com frequência de “a seus olhos”. Isaías se queixou de que os oficiais da corte de Jerusalém pervertiam os valores tradicionais de Israel, chamando o mal de bem e o bem de mal (veja 5.20). Os provér bios de Salomão definem o “mal” do ponto de vista do Deus de Israel, o Deus que guarda sua aliança. Em 1.16 ele pode indicar mal moral ou calamidade. A expressão ambígua e se apressam para derramar san gue (wimaharú lispok-dãm) não esclarece a ambigüidade. A passa gem sinóptica em Isaías 59.7 fala do sangue “inocente” (veja n. 20). Rashi acredita que a omissão de “inocente” neste caso é propositada, de modo que o texto se refere ao sangue dos próprios pecadores em 1.16, da mesma maneira como é claramente a referência em 1.18.MSe esse é o caso, então ra quer dizer “calamidade”, “dano” para os peca dores, e não “mal” contra a vítima inocente. Sua interpretação seria mais persuasiva se 1.16 fosse adotado a partir de Isaías 59.7, mas se a palestra é de autoria de Salomão, seu argumento é enfraquecido. En tretanto a interpretação de Rashi se encaixa bem no contexto. O filho deve rejeitar a companhia dos pecadores porque esta resultará em ca lamidade para ele, no derramamento de seu próprio sangue. É provável que a intenção seja fazer um jogo de palavras; rõ‘ significa tanto “mal (moral)” quanto “dano (físico)” e “sangue” se refere tanto ao sangue do inocente quanto ao dos pecadores. Seus pés se apressam para pra ticar o mal moral contra outros e causam danos para eles mesmos, e 63. Para a distinção entre o sing. “caminho” c o pl. "caminhos/vcredas" veja 2.8. 64. Plaut, Proverbs, p. 36; cp. Cohen, Proverbs. p. 5. Rashi, como traduzido por Lyons (“Rashi’s Commentary”, p. 14), parafraseia “correm para o seu próprio dano”.
suas mãos derramam o sangue de outros (v. 1 1 ) e o seu próprio (v. 18). O inteligente sentido duplo, que habilmente se ajusta às descrições an teriores da tentação quanto às conseqüências calamitosas subsequen tes, resume de modo sucinto a conexão entre ato e conseqüência. 17, 18 O caminho dos pecadores não é apenas errado; como tam bém estúpido. Nos versículos antitéticos da segunda parelha de versos, a loucura dos pecadores, que não conseguem ver a ligação entre atos e conseqüências, é contrastada com o discernimento dos pássaros, que são capazes de ver essa conexão. Toda criatura que voa tem o instinto dado por Deus de evitar a rede do passarinheiro (v. 17), mas esses pecadores armam emboscadas para si mesmos (v. 18)! Em outras palavras, os pás saros representam os criminosos. Certamente (kí) enfatiza o contraste. Em vão (hinnãm ) é outro jogo de palavras, que significa agora “sem efeito”, em contraste com “sem qualquer motivo” (v. 11). Uma rede é estendida (m ezõrâ hãrãset) pode significar “a rede está sendo estendi da”, sugerindo que a situação representada é a de lançar a rede. Em vez de estender a rede à vista (be‘ênê\ lit. “aos olhos de”) dos pássaros, os passarinheiros chegam sorrateiramente por trás deles. A arte egípcia representa passarinheiros segurando a rede sobre a cabeça ao se apro ximarem sorrateiramente de pássaros ciscando. De qualquer dá ago ra a kol seu sentido distributivo e enfatiza que não há exceções. Cria tura que voa (ba'al kãriãp) traduz a expressão mais literal “possuidora de asas”. Em resumo, é inútil lançar uma rede na direção de qualquer criatura que voa, pois Deus lhe deu o bom senso de evitá-la.65 Com a ajuda de seu pai o filho sábio agora é capaz de desmanchar as armadilhas de palavras colocadas pelos pecadores. Como toda criatura que voa, o filho sábio alçará voo, pois eles espalham sua rede à sua plena vista. Eles próprios admitem que desejam fazer emboscada para um homem ino cente; eles não têm qualquer desculpa, pois alardeiam sua injustiça. 65. Rashi, citado com aprovação por muitos, interpreta o significado do versículo como: “quando os pássaros veem trigo e grãos pequenos espalhados pela rede, aos seus olhos não têm propósito, pois não percebem o motivo da rede se encontrar cheia de grãos espalhados, de modo que descem sobre ela e comem”. Essa interpretação é rejeitada, pois ( I ) zr nunca significa “coberto com grãos espalhados”, (2) a explicação de “em vão” com “porque não veem o perigo” acrescenta ao texto mais do que suas palavras permitem, (3) exige que o vau inicial do v. 18 seja interpretado como tendo uma tônica comparativa incomum, “ainda assim”, em vez de sua tônica adversativa normal em Provérbios, e (4) a suposta comparação entre uma ave passiva se alimentando numa rede e criminosos fazendo emboscadas para si mesmos ativa mente não é tão adequada quanto o contraste entre as aves prudentes fugindo de uma arma dilha e os criminosos preparando uma armadilha para si mesmos.
18 Agora o pai encerra a argumentação. Mas eles (wehêm) justa põe nitidamente a habilidade de toda ave, e espera-se do filho com a estupidez dos pecadores. Aqui o pai encara a proposta deles (v. 11b) usando as mesmas três palavras cruciais que eles empregaram, fazem emboscada por seu próprio sangue (ledãm ãm y e >erõbü)... esprei tam (yispenú; veja n. 50), com a notável exceção de que o objeto da emboscada não é mais o sangue de suas vítimas, mas suas próprias vidas (lenapêõtãm). Ele ressalta o clímax ao colocar em paralelismo quiástico “por seu próprio sangue” e “suas próprias vidas” na estrutura externa enfática. nepeS é mais apropriado aqui, pois o termo hebraico denota essencialmente apetite, desejo (veja p. 140). (4) Conclusão: moral da lição (1.19) 19 O pai chega à conclusão da sua palestra universalizando seu enredo dessa gangue de vilões. Plõger argumenta que o caso extremo não permite uma generalização universal.66 No entanto, o pai não está usando um argumento lógico, o qual seria indicado por “portanto” (tãkên), mas sim uma afirmação análoga indicada por tais (kên ). O enredo par ticular da palestra se concentrou no singular “caminho” (v. 15), mas o plural caminhos {'orhôt ; veja n. 61) representa todo tipo de comporta mento letal impelido pela ganância. Overland observa que todos (kol ; veja v. 17) aparece de modo preeminente como recurso cumulativo (cp. 1.19; 3.15,26; 4.7,22,23; 5.14; 6.14,29,31; 7.12,26; 8.8,9,11,16, 36) e pertence à categoria que B. Smith chama de “afirmações não qualificadas” .67 Que são gananciosos p o r lucro (bõsea bãsa') tra duz uma expressão idiomática que significa literalmente “que corta fora um pedaço”, como de um tapete. Essa expressão deu origem ao uso figurativo “cortar o cordão da vida” (cp. SI 88.5[6 ]) e “obter uma co missão”. Lucrar pode ser neutro, como no Salmo 30.9(10), mas na maior parte das vezes a palavra se refere a um lucro/comissão injusto, semelhante à nossa expressão “arrancar o couro” (veja 28.16; 115.27; cp. Êx 18.21; ISm 8.3; Is 33.15).68 O lexema bs (“separar”) sempre diz respeito a um lucro/comissão injusto, semelhante à nossa expressão 66. Plõger, Sprüche, p. 17. 67. P. Overland, “Literary Stmcture in Proverbs I-9 ” (Ann Arbor: University Microfilms Interna tional; dissertação de Ph.D. Brandeis University. 1988), p. 107; e B. Smith, Poelic Closiire (Chica go: University o f Chicago, 1968), pp. 182-86. 68. D. Kellermann, TDOT, 2:205-8, s.v. 6?’.
“arrancar o couro”. O sujeito de ele tira a vida {yiqqãh\ veja 1.3) se refere semanticamente ao “lucro injusto” personificado, não a “todos que são gananciosos”, como seria gramaticalmente possível. A vida (nepeS) liga esta lição sumarizante (v. 19) à comprovação do pai na ilustração específica (v. 18). A tradução quem o obtém (be'ãlãyw ; lit., “seu propri etário”) foi usada de modo a não permitir a interpretação incorreta de várias versões de que “o” se refere a “vida”. O lucro injusto se agarra ao criminoso e, por fim, o destrói. Jesus extrai uma proposição universal semelhante: “Todos os que lançam mão da espada à espada perecerão” (Mt 26.52). Em resumo, esse aforismo articula o conceito fundamental do livro de ato-consequência: o pecado gera dano (cp. G1 6.7). 2. Primeiro interlúdio: repreensão da sabedoria ao ingênuo (1.20-33) 20 A sabedoria 1 grita em alta voz2 na rua, nas praças públicas 3 ela levanta sua voz; 21 nos mais altos 4 muros 5 ela chama, na entrada das portasb para a cidade ela fa z seu discurso: 22 “Até quando, vós ingênuos, vós1 1. A forma esperada h°kSm ôt não é atestada (IBHS, p. 122, P. 7.4.3; C. Brockelmann, Grxmdriss der vergleichenden Grammalik der semitischen Sprache [Berlim, 1913], p. 2; P. 29b). W. Albright (“Some Caananite-Phoenician Sources o f Hebrew Wisdom”, in WIANE, p. 8) acredita que hokm ôt (9.1; 24.7; cp. 8.1) é um sing. fenicio. Essa ideia é apoiada pelo termo fenicio para “muro" (veja n. 4). O mais provável é que se trate de um pl. intensivo ou simplesmente de um substantivo abstrato (IBHS, pp. 120-22; PP. 7.4.2a; 7.4.3a). 2. Uma conjugação prefixai na terceira pessoa fem. do Qal com o assim chamado sufixo pseudocoortativo com um significado gnômico de rnn (IBHS, p. 576, P. 34.5.3; GKC #48d), não a antiga conjugação enérgica nun, pois o segundo nun faz parte do lexema (pace M. Dahood, Proverbs and Northwest Semitic Phiiology [Roma: Pontificai Biblical Institute, 1963], p. 4; HALOT, 3:1,248). K. J. Grimm, “The Form tãrõnná Prov. i.20; viii.3”, JBL 21(1902) 192-96 sugere que rnh é uma forma secundária de m n e, portanto, revocalizada para tirneh (de acordo com GKC #47k). Fichtner (BHS) propõe rinnãtsh. Mas essas correções não explicam o TM que é mais difícil. Por motivos incertos a LXX entendeu o verbo como “cantar". 3. Ou “praça pública”, interpretando o pl. como umpl. de extensão (IBHS, p. 120, P. 7.4.1c). 4. Ro ’s hm yt é um gen. superlativo (IBHS, p. 154, P. 9.5.3j). 5. Hõmíyôt do TM é Qal ptcp. pl. fem., mantendo o jode original da raiz hm h (GKC #75v), um adjetivo substantivai que significa lugares “niidosos”/“agitados”/“tumultuosos". “A entrada das ruas” ocorre cm Isaías 51.20; Lamentações 2.19; cp. Ezequiel 16.25. A LXX traz teicheSn, não de hõmòt (pace Fichtner [fi/Y.S]) pois essa retroversão não explica ojode, mas do ugar.-len. hm yt (“muro”). É comum os escribas fazerem confusão entre h e h .O paralelo em 8.2 bPrt>'s-meróm ím (“nas alturas mais elevadas” ) corresponde mais apropriadamente a “muros” do que a “ruidoso”. 6. Veja n. 3. 7. Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Phiiology, pp. 6-7) acredita que o t preformativo é uma forma rara de seu pl. masc. da conjugação prefixai conhecida do ugar. e das cartas de
amareis8 ser ingênuos"9— e os escarnecedores10 s) no mesmo versículo (de acordo com J. Emerton, “A Note on the Hebrcw Text o f Proverbs i.22-3”, JTS n.s. 19 [ 1968] 61). Além disso, um discurso somente para os ingênuos é coerente com 1.4. 8. 7®eh°bú é Qal, não Piei, pois fora do ptcp. 'hb não é atestado no Piei. Aanomalia é resultante do fato de que uma letra gutural depois de uma sílaba auxiliar não pode ser vocalizada com shewa (de acordo com Y. Ben-David Yisrael, “sny kkuqym smin hnu/ra", Lei 51 [1986/1987]: 118-21). 9. Peti (“ingenuidade” ) é um substantivo abstrato (de acordo com Emerton, “A Note on the Hebrew Text”, p. 609). 10. N. Richardson (“Some Notes on lyff and Its Derivalives”, VT 5 [1955] 163-79, esp. p. 172) sugere "tagarelas” como a ideia essencial de les. Sem dúvida, a tagarelice é a marca dos insensatos no livro de Provérbios e o discurso comcdido e tranqüilo qualifica o sábio, mas a julgar pelas formas de uso do lexcma no livro, sua tradução e excessivamente reducionista (veja p. 169). 11. A Sir. simplifica o texto, de modo a ler a segunda pessoa do começo ao fim. Mas a alternância entre segunda e terceira pessoas se encaixa na intenção do livro (veja 1.4, 5). 1 2 .0 Uimede de interesse, para indicar a dissociação determinada de si mesmos daquilo que se encontra ao seu redor (IBHS. p. 208, P. 11.2.1Od, ##34-37). 13. Emerton (“A Note on the Hebrew Text”, pp. 612-14) corrige o texto removendo v. 22b, c considerando-os inserções dc cscribas (como também faz Fichtner [B//S]). Ele argu menta: (1) que a mudança de segunda pessoa para terceira nos versetos B e C é brusca. (2) “O hüm edú perfeito é estranho entre dois imperfeitos”. (3) “Um versículo com três linhas é surpreendente”. (4) A sintaxe do v. 23 é dificil de explicar. (5) Uma ordem para os ingênuos obedecerem (v. 23) não se encaixa nos versículos seguintes. Seguindo o modelo de 6.9, ele corrige o texto acrescentando 'ad-mStay ("até quando”) no começo do v. 22. No entanto, um texto não deve ser corrigido em função de sua métrica “ irregular”, ou de uma mudança de tempo verbal ou do ponto de vista, uma vez que todas estas ocorrências são bastante comuns na poesia hebraica. Além disso, o TM se ajusta sutilmente aos propósitos do livro (1.4). Por fim. a referência a kesilím fornece a prefiguração necessária de sua menção no v. 32b. 14. Súb + le = "voltar-se para” e SÚ6 + min = “voltar de” (veja BDB, p. 997; HALOT. 4:1328), não permitindo “até quando vos voltareis na [= da] minha repreensão” (pace NAB e R. Murphy, “ Wisdom’s Song: Proverbs 1:20-33”, CBQ 48 [1986] 457-58). 15. A inserção que esclarece “vós” se refere aos ingênuos, não aos insensatos e escarnecedores do parêntese (veja v. 22). 16. Este é o único caso que GKC (P. 159 b-d) cita o coortativo na apódose. Normalmente esperase o uso de ufihinnêh para esse conceito (IBHS, pp. 677-78, P. 40.2.1e, ##28-30). T. Zewi ("The Particles hinnSh and wehinnlh’\ HS 37 [1996] 21-38). Não obstante, a lógica do argumento da sabedoria exige que o absoluto hinnèh, "vede” introduza a apódose. 17. Emerton ("A Note on the Hebrew Text”, p. 612) argumenta de modo convincente que rühi significa "meu fôlego”, uma metonímia para “declaração”, "palavra”, como no Salmo 33.6 e em Isaías 11.4. Observa que o Sir. de Ecclo. 16.25 traduz a mesma forma como "minhas palavras”. O objeto de nb' (Hifil) normalmente se refere ao discurso, o que corres ponde mais adequadamente ao paralelo no v. 23b. A NEB parafraseia a linha como: “Daria o meu conselho”, mas McKane (“Textual and Philological Notes on the Book o f Proverbs with Special Reference to the New English Bible”, GUOST 24 [1974] 84) objeta à supressão da
tornarei conhecidos de vós os meus ditos. 24 '[Mas], visto que'*, e vós recusais19 [escutar];20 e quando estendo a minha mão, ninguém dá atenção; 25 e escarneceis de todo o meu conselho, e não concordais com a minha repreensão 26 eu,2' por minha vez, me rirei quando a vossa desgraça22 ocorrer,23 e zombarei quando a vossa calamidade vier 27 quando vier a vossa calamidade como uma tempestade24 e como um redemoinho a vossa desgraça chegar, quando a aflição e a angústia vierem sobre vós. ’ 28 Então eles me invocarão, mas eu não responderei; eles me procurarão diligentemente, mas não me encontrarão, 29 porque eles odiaram o conhecimento, e não escolheram o temor do Senhor. 30 Eles não concordam com o meu conselho, rejeitaram toda a minha repreensão, 31 portanto eles comerão25 do fruto do seu caminho, e se fartarão de seus próprios planos.26 32 Certamente o desvio dos ingênuos os matará, e a complacência dos insensatos os destruirá; 33 mas o que me obedecer habitará em segurança, em paz mesmo e sem21 temor do dano!.2* figura. A Iraduçào. “derramarei meu espirito”, porém, levaria muitos leitores da nossa língua a associar a ideia incorretamente com Isaías 44.3; Jocl 2.28 (3.1). 18. Um perfectivo instantâneo (IBHS, p. 488, P. 30.5.1 d). 19. Com o («//-consecutivo, a conjugação prefixai curta tem o mesmo valor de tempo verbal que o perfectivo anterior (IBHS, p. 555, P. 33.31b). 20. Pace NI V e JB, “rejeitou-me”. Costuma-se usar um verbo com o infinitivo “obedecer" e outros semelhantes, c nunca com um objeto direto pessoal. 2 1 .0 pronome expressa a asserção enfática de si mesmo (IBHS, p. 2% , P. 16.3.2e). 22. Isto é preferível a “da vossa desgraça", encontrada na maioria das versões em inglês pois, "rirse de” normalmente é expresso por éãhaq + le, 'al, não be, como é o caso aqui (= “em vossa desgra ça") esclarecido pelo verseto B, “quando a vossa calamidade vier". 23. Lit., “em vossa desgraça”. 2 4.0 ksw 'h cm Q se encaixa ao padrão nom inal conhecido no hebraico. O ks ’wh em K foi causa do por uma ditografia de metátese. 25. IBHS, p. 5 11, P. 3 1.6.2. 26. A argumentação de G Drivers de que mõ'ê$â pode significar “desobediência” é refutada por J. Emerton (‘T h e Root ãsah and Some Uses o f e mõ'ê$â in Hebrew”, in OTSSWL, org. W. C. Wyk, OTWSA 15 e 16 [1972/73], pp. 13-26). 27. Min privativo (IBHS. p. 2 14, P. 11.2.11 e [2]). 28. Pares de gênero como rs' e rtj'd (comparar 1.16 com 6.18) não diferem em seus significados.
Por meio de outro discurso fictício, desta vez da sabedoria personi ficada para os ingênuos (vs. 20-27), mas basicamente para o filho (vs. 28-33), a palestra do pai cresce em intensidade, passando do perigo severo de morte certa para todos os pecadores (v. 19) - chamados agora de insensatos - para a verdade terrível de que sua morte é eterna. Não há um terceiro caminho entre a sabedoria e a loucura, e não há uma segunda chance entre a vida e a morte. O prólogo comumente personifica a sabedoria do sábio como uma mulher (veja pp. 132,136-137).29 Depois de apresentar a mulher sabedoria como uma “pregadora nas calçadas” (vs. 20, 21), o pai desenvolve o discurso dessa personifica ção com uma “duplicidade” simétrica extraordinária: I. Seu sermão: repreensão dirigida ao jovem ingênuo e indiferente A. Sua repreensão do ingênuo indiferente B. Sua acusação 1. Ela os acusa de rejeitar seu conselho 2. Ela os rejeitará na ocasião de seu julgamento II. Suas reflexões acerca do seu sermão A. A certeza e a finalidade do seu julgamento 1. Sua finalidade 2. Sua certeza B. Reflexão sumarizante acerca do destino dos insensatos e dos sábios
1.22-27 1.22,23 1.24-27 1.24,25 1.26,27 1.28-33 1.28-31 1.28,29 1.30,31 1.31-33
A mudança do discurso direto para o discurso indireto ressalta que, no tempo do julgamento, “a distância tomará o lugar da intimidade; a separação substituirá o envolvimento”, como observou P. Trible.30 Essa análise de suas duas metades permite o surgimento do seguinte padrão concêntrico, um padrão que facilita a transição dos seus sermões para suas reflexões em discurso indireto.31 29. Kitchen (“ Proverbs and Wisdom Books o f the Ancicnt Near East”, TB 28 [1977] 103) observa “a atestação ubíqua dessas personificações em todo o Oriente Próximo dos tempos bíblicos no 3o, 2° e Io milênios, até 15 séculos antes do nascimento de Salomão” . 30. P. Trible, “Wisdom Buildsa Poem:The Architecture of Proverbs 1:20-33”, JBL (1975) 50918. No entanto, ao incluir o contexto (vs. 19, 20), ela encontra um padrão quiástico que se concentra ao redor do v. 27. 31. Trible, “Wisdom Buildsa Poem”, p. 517.
A A exasperação da sabedoria com os ingênuos e os insensatos indiferentes B Os ingênuos são condenados por rejeitarem sua repreensão C Ela os rejeita no tempo do julgam ento C ’ Ela os rejeita no tempo do julgam ento B ’ Os ingênuos são condenados por rejeitarem sua repreensão A’ A morte dos ingênuos e de todos os insensatos em contraste com a segurança dos sábios
1.22,23 1.24,25 1.27,28 1.29,30 1.30,31 1.32,33
Os versetos AJA' agrupam de modo excepcional os “ingênuos” (petãyim ) do verseto A com os “insensatos” (kesilim ) do verseto B no
que diz respeito à sua necessidade de “mudar” (tãsübã/mesübat). A perícope começa com o grito da sabedoria por ouvintes e termina no versículo 33 com aqueles que ouvem, marcando seus quartetos como introdução e conclusão do interlúdio. Apesar dos tons sombrios do ser mão, suas reflexões terminam com uma nota alegre de promessa. Os versetos B/B’ tratam da rejeição do “meu conselho” (vs. 25a, 30a) e da “minha repreensão” (vs. 25b, 30b) pelos jovens ingênuos. Os versetos C/C’ afirmam que, em um quidpro quo (ato de retri buição), ela será tão indiferente para com eles no tempo do julgamento quanto eles foram para com ela no tempo da salvação. O padrão con cêntrico aponta para a sua ideia principal: “Não há uma segunda chan ce para os insensatos”. A justiça absoluta exige lex talionis: “Eu cha mo, e vós recusais” (v. 24) e então, “eles me invocarão, mas eu não responderei” (v. 28). a. O ambiente do sermão (1.20, 21)
20 A sabedoria (hokmôt\ veja n. 1; 1.2) não espera que a audiên cia venha até ela; tem uma missão tanto no lar quanto em público. O ambiente desta instrução, na rua (bahüs , i.e., “ao ar livre”; cp. 5.16; 7.12; 22.13; 24.27), significa fora das casas de uma cidade, em con traste com o ensino do filho que ouve no lar. Apesar do sermão ser uma ficção literária, a imagem sugere o pai, que também se assentava à porta da cidade (31.23) e fazia todo o esforço possível para alcançar o povo não comprometido com seus ensinos. Com entusiasmo, não com indiferença acadêmica, ela grita (tãrõnnâ ), uma palavra onomatopéi-
ca, para conseguir ser ouvida. Seu pódio é o lugar mais preeminente no centro da cidade, onde ela fala a plenos pulmões e com voz clara acima dos ruídos e do alvoroço da vida diária. Nas praças públicas (bã^hõbôt; veja n. 3) indica a área ampla que oferecia espaço para as transações comerciais e reuniões públicas em contraste com as ruas estreitas das cidades antigas. A praça podia estar situada bem no lado interno da porta ou entre as portas externa e interna da cidade, como no caso de Tel Dan,32 ou ainda num ponto onde começavam várias ruas. Apesar de ser difícil conceituar um discurso sendo entregue em vários lugares, é provável que se deva supor nesta ficção literária que os plurais contáveis apontam que seu discurso está sendo dirigido a todos juntos. Ela levanta sua voz (tittên qôlãh) se refere a uma situação que envolve fervor e emoções (e.g., profunda aflição humana, Gn 45.2; Jr 22.20; ameaça, Sl 46.7[8]; 68.34[35]; o rugido [de um leão], Jó 2.11; Am 1.2; 3.4; e o canto dos pássaros na criação, Sl 104.12). De acordo com Aitken “A mulher sabedoria não é uma persuasora delicada. Ela grita, suplica, repreende, debate, ameaça, adverte e até ri (veja vs. 24-33). Uma pregação que faz estremecer o púlpito e faz os ouvintes sentirem o fogo do inferno como nenhuma outra! Atitudes nada condizentes com uma dama e, nos dias de hoje, completamente fora de moda e até mes mo reprovadas”.33 21 Nos mais altos muros (berõ ’s hmywt; veja n. 5), o melhor ponto para ser vista e ouvida, ela chama (tiqrã ’) com uma voz clara e a plenos pulmões para que sua proclamação seja ouvida de longe e por todos. Ela escolhe se postar à entrada ou na abertura das portas (bepithê $e‘ãrim ) para confrontar e compelir os ingênuos a decidirem acertá-la a fim de guardá-los dos insensatos nefandos, inclusive a prostituta sedu tora, que vivem do lado de dentro dessas portas (7.6-23). Aporta desig na tanto os edifícios monumentais que protegiam do sol a passagem que havia dentro deles quanto as câmaras laterais onde os anciãos se assentavam em bancos de pedra para julgar e discutir os negócios lo cais. Esse ambiente simboliza que os provérbios de Salomão dizem res peito ao comércio, à corte e à administração, que não podiam ser exer cidos plenamente sem sabedoria, não ao templo, situado numa colina, completamente separado da vida diária da cidade. 32. A. Biran, “Tel Dan”, BA 37 (1974) 25-71. 33. Aitken, Proverbs, p. 22.
(1) Acusação introdutória (1.22,23)
22 Ela começa seu sermão com um apelo urgente aos ingênuos para que não a rejeitem mais e respondam à repreensão severa que ela está prestes a proferir, a fim de que não sejam lançados aos cães den tro da cidade. Sua pergunta exasperada, Até quando Çad-mãtay), com sua acusação subsequente (vs. 24-27), pressupõem um passado histó rico entre a sabedoria e esses jovens ingênuos já crescidos, talvez uma referência à sua rejeição do ensino de seus pais em casa; ela também expressa sua irritação com a situação aparentemente insolúvel e, no entanto, urgente. Fica implícito que esses jovens ingênuos (petãyim ; veja 1.4) cruzaram o limiar da idade de prestar contas e deveriam ter decidido assumir um compromisso com a sabedoria do livro numa oca sião anterior. Porém, em vez de aceitarem o ensino, os jovens apóstatas amam ser ingênuos (t^ W b ü peti). “Amor” indica o sentimento emo cional de desejar ardentemente algo que flui das percepções do indiví duo e que, como resultado, o leva a ir atrás (Jr 2.25b), buscar (Pv 8.17 [Q]), correr atrás (Is 1.23), apegar-se (Dt 11.22; 30.20; Pv 18.24) e permanecer fiel à pessoa ou coisa amada.34 Em vez de uma disposição de adquirir conscientemente e/ou conservar o S e n h o r e sua sabedoria revelada, eles anseiam com desejo apaixonado permanecer sem ne nhum compromisso e abertos para o pecado sedutor. Seu comentário à parte sobre os escamecedores e os insensatos (v. 1.22b) não faz parte de seu chamado ao arrependimento. Ela se dirige somente aos ingênuos (vs. 22a, 23). No entanto, esse comentário junta os ingênuos aos insensatos e escamecedores e os adverte implici tamente acerca de um endurecimento progressivo na apostasia; eles também podem vir a odiar a sabedoria e até mesmo a cobiçar a capa cidade que os outros têm de escarnecer dela. O comentário à parte também prepara o caminho para a explicação e o sumário de que o mesmo julgamento sobrevirá a todos os apóstatas (cp. vs. 29, 32). Ela choca os ingênuos ao citar em primeiro lugar a pior categoria de insen satos. Os escamecedores (lêsim ; veja p. 169s.) se deleitam ( hãmedü lãhem; veja n. 11) ou, mais literalmente, “cobiçam” para si mesmos o dom do escárnio ( lãsôn) . “Cobiçar” indica um sentimento de anseio
intenso por algo que é considerado deleitável, agradável e desejável, um sinônimo próximo de “amar”. Mais uma vez o problema é uma falta de disposição moral dentro da natureza humana, não apenas de capaci dade mental. Os insensatos [ou tolos, k esilim \ veja pp. 167-168] pre sunçosos [odeiam] o conhecimento (yisne 'u d a a t; veja 1.7). 23 Depois do comentário sobre as afeições religiosas dos escarne cedores e dos insensatos, a sabedoria volta a se dirigir aos jovens indi ferentes já em idade adulta, pedindo: Voltai-vos (ou arrependei-vos; tãSübi2); ainda há esperança para eles (veja Cap. 9), mas não para sempre (veja vs. 29-31 e o inclusio “desvio” no v. 32). Süb tem o significado central de “ter se movido numa direção particular e, depois disso, mover-se na direção oposta...”.35 Sua noção física original dá lugar metaforicamente à noção psíquico-espiritual de uma mudança do coração (veja 2.2) deixando o mal e voltando-se para o bem, largando a loucura e voltando-se para a sabedoria, tomando-se, portanto, o termo mais importante para arrependimento na Bíblia. Em 1.23, seus significa dos físico e psicológico se tomam atenuados. A sabedoria suplica para que os jovens até então indiferentes voltem e ouçam sua repreensão. Ela identifica seu sermão como uma repreensão (ou correção, tôkahat), cuja raiz significa, “determinar o que é certo”, que está na esfera dos proces sos judiciais. Das 16 ocorrências de tôkahat, em nove ocasiões o termo é combinado com müsãr (“instrução”). Em 3.11a instrução do pai é equi parada à do S e n h o r . A marca de uma “cria de um asno montês” (cp. Jó 11.12) é que ele se considera sábio (26.5,12; cp. 3.7) e, correlativamente, esses sujeitos convencidos fazem pouco de seus mestres. Essa descri ção do filho insensato em contraste com o prudente já é encontrada em Ptah-hotep (ca. 2450 a.C.).36 A lei mosaica prescrevia que os pais ape drejassem um filho obstinado e rebelde (Dt 21.18-21). “Essa provisão não surgiu de um senso exagerado de sabedoria e autoridade dos pais, mas sim de um senso extremamente sóbrio da importância da família como base para nutrir a vida dos indivíduos e da comunidade....”37Quando 35. W. Holladay, The Rool SHUBH in lhe Otd Teslament (Leiden: Brill, 1953), p. 53. 36. “O insensato que não ouve, não pode fazer coisa alguma. Ele considera o conhecimento igno rância e, para ele, o beneficio é malefício. Faz tudo o que é detestável e é culpado por isso todo dia; vive daquilo que é abominável, seu alimento é a distorção das palavras. Ciente do seu tipo é conheci da pelos oficiais que dizem: ‘Uma morte em vida cada dia’. Contrastando com ele: um filho que ouve é um seguidor de Hórus, que vai com ele depois que ele ouviu. Quando idoso, alcançará a veneração e falará semelhantemente a seus filhos, renovando a instnição de seu pai” (AEL. i :74-75, linhas 575-91). 37. Aitken, Pmverbs, p. 150.
usado para alguém que está errado, tôkahat significa “repreender”, “pedir explicação”, sendo esse o seu significado em 16 das 24 ocorrências em Provérbios.38 Se eles mudarem de rumo, a própria ação implicará seu arrependimento, pois eles terão se humilhado e reconhecido que a sa bedoria está certa, e que eles estão errados em alimentar seu amor por serem negligentes e livres de sua disciplina. No versículo paralelo, 23b, a sabedoria resolve proferir o severo sermão encontrado nos versículos 24-27. A expressão demonstrativa introdutória atentai ( hinnêh ) indica sua intenção e prende a atenção dos ouvintes àquilo que ela está pres tes a dizer, como em 2Crônicas 25.19. Emanarei Cabbtâ) indica um jorrar incontrolável ou descontrolado, por exemplo, das águas aumenta das de um wadi. A metáfora expressa “o livre derramamento de pen samentos e palavras, pois a boca é concebida como uma fonte (cp. 18.4; com Mt 12.34)”.39No Hifil seu objeto normalmente é uma decla ração na forma de discurso, como é o caso aqui. Meus pensamentos (rühi [lit. “meu espírito”; veja n. 17]) são, obviamente, expressos no paralelo, meus ditos (d ebãray ; veja 1.6) e se referem à sua acusação nos versículos 24-27. Para vós (lã kem ), e não “sobre vós outros” Çalêkem), observa Emerton.40 O paralelo de “emanar”, tornarei co nhecidos (’ôdiâ) significa que eles internalizarão de tal modo seu dis curso fervoroso que jamais esquecerão dele. Porém, quando o julga mento ameaçado sobrevier será tarde demais para responder. (2) Denúncia (1.24-27) 24, 25 Ela começa seu sermão com uma denúncia ou razões (vs. 24, 25) e termina com julgamento ou conseqüências (vs. 26-27). Sua denúncia muda a ênfase de suas ações positivas ao adverti-los (v. 24) para as reações negativas deles ao seu conselho (v. 25). E necessário pressupor que seus ouvintes respondem ao seu convite com um silêncio ensurdecedor ou que ela revela prematuramente o que lhes acontecerá se não derem ouvidos. É pouco provável que ela anteveja sua falta de resposta e, portanto, os advirta, pois essa interpretação toma seu convi te cínico. A falta de consenso mostra o problema dessa interpretação para a função sintática de hinnêh. 38. G Liedke, TLOT, 2:541-42. 39. Delitzsch, Proverbs. p. 71. 40. Emerton, “A Note on the Hebrew Text”. p. 611.
24 Mas é acrescentado para esclarecer o contraste implícito entre seu convite bondoso e a rejeição empedernida dos ingênuos a ela. Visto que (ya'an) introduz a prótase (vs. 24,25), quatro cláusulas de intensi dade crescente que lançam os alicerces para a terrível sentença judicial na apódose (vs. 26,27). Grito (qãrã'ti ) repete a introdução do sábio ao sermão da sabedoria no versículo 21a. Deus faz recair sobre as pesso as as conseqüências plenas de seus atos apenas depois que elas forem devidamente advertidas (cp. Ez 33.7, 8; Jn 3.4). E vós recusais (wattPmã^ênü ) se refere aos ingênuos, como em 1,23a, e significa sua má vontade subsequente em aceitar e/ou se sujeitar à sua oferta e/ou ordem (cp. 21.7, 25). Escutar é inserido com base no paralelo que completa a noção verbal. A expressão não qualificada quando esten do (riãtiti ) a minha mão (yãdi\ o membro que vai do cotovelo à ponta do dedo)41 é singular nas Escrituras. O paralelo “grito” pode sugerir um aceno, como em Isaías 13.2; 65.2 (cp. At 21.4), mas os verbos são diferentes. Em outras passagens ele é qualificado por “sobre/contra” (cp. Êx 7.5; 9.22; Is 5.25) e/ou como quem segura um cetro (Êx 14.16, 21) ou cimitarra ( ’e/; cp. Js 8.18, 19) e significa hostilidade para com o objeto (Êx 15.12). Essa noção se encaixa no gênero do sermão como uma repreensão (1.23, 25). Porém, sem qualquer exceção, ninguém dá atenção ( we ’ên maqSíb). QãSab (“dar atenção”), com “ouvido” como seu objeto (veja 2.2) denota um uso consciente, disposto e atento dos ouvidos, como é visto em textos como, “Os olhos dos que veem não se ofuscarão, e os ouvidos dos que ouvem (Sãma‘) estarão atentos (qãSab)" (Is 32.3; cp. Ne 1.6; Jr 6.10; Zc 7.11). 25 Agora a mediadora especifica a culpa de sua audiência (i.e., sua recalcitrância diante da autoridade legítima)42como rebelião contra o seu conselho. Da mesma maneira como a conjunção “e” coordena as cláusulas “visto que grito” e “vós recusais” (v. 24a), assim a conjunção e que introduz o versículo 25 coordena suas cláusulas com o versículo 24b. De acordo com Janzen, escarneceis (pr') não significa “ignorar”, mas “largar, deixar quieto, desconsiderar” e, portanto, rejeitar e se re belar contra estruturas e restrições,43 neste caso, contra todo o meu conselho Çesâ). Concordando com a maioria dos lexicógrafos, Fox define 'êsâ como “plano”, mas logo acrescenta em seguida, “Não é 41 . IBHS, p. 111, P. 7.1b. 42. Veja J. Crenshaw, "Sapiential Rhctoric and its Warrants”, VTSup 32 (1981) 16. 43. Cp. J. G Janzen, "The Rootp r in Judges v. 2 and Deuleronomy xxxii 42”, VT(1989) 39.
uma questão de controvérsia”.44 O substantivo esô ocorre cerca de 85 vezes, e sua raiz verbal y a a s , 45 vezes. Seu significado de “planejar” abrange desde o plano consultivo que Jetro ofereceu a Moisés (Êx 18.19) até os desígnios imutáveis de Deus (Pv 19.21; SI 33.10, 11), boulê na LXX (cp. Ef 1.11 ).45 J. Pedersen enfatizou a autoridade do yõ'ês (“conselheiro” ): o conselho era “mais do que uma proposta... a ser discutida”.46 Aqui o “conselho” se refere ao plano da sabedoria para que os ingênuos se salvem da morte ao dar atenção à sua repreen são, como esse paralelo mostra. Mais uma vez ela identifica seu ser mão como uma repreensão (tôkahat ; veja 1.23). De acordo com Trible, “A palavra repreensão (tôkahat ) liga esta seção literalmente à or dem que a prefacia (v. 23). Mas a ligação é irônica, pois o imperativo para dar atenção à sua repreensão encontra o indicativo que rejeita a repreensão”.47 A repetição costas com costas de concordais ( 'ãbâ, tra duzido como “cedas” em 1.10) em perícopes sucessivas sugere a divisão do mundo em duas esferas: os pecadores aos quais o filho não deve ceder, e os justos aos quais os insensatos não cedem. 26-27 A sabedoria assinala a mudança em sua denúncia dos ingê nuos de acusação para a sentença mediante a expressão inicial por minha vez ou “como recompensa” igam ), que, de acordo com BDB expressa “correspondência , esp. em matéria de retribuição":48 Ela também assinala a mudança por meio de um elemento enfático que liga a sentença judicial (vs. 26,27) intimamente à acusação (vs. 24,25) e ao eu ( ’°nf) enfático,49 pois os ingênuos são os objetos da acusação e ela é quem atua no julgamento. Os versetos A dos versículos 26, 27 estão intimamente ligados por uma estrutura quiástica paralela: desgraça... rirei / / zombarei... calamidade vier... calamidade II desgraça... chegar'0 44. Fox, "Words ofW isdom”. p. 160. Sua qualificação é essencial para proteger a definição das interpretações equivocadas abrangentes de W. Zimmerli (“The Place and Limit ofW isdom in the Framework o f Old Testamcnt Theology”, in SAIW, p. 316) e de G von Rad (Old Testament Theology, trad. D. M. G Stalker [Nova York: Harper and Row. 1962], 1:434). Eles acredi tam que, na literatura sapiencial, “conselho” é algo “discutível” e “não exige obediência, havendo sempre a necessidade de testá-lo... [é algo] aberto a correções” . 45. De acordo com P. Gilchrist, TWOT, 1:390. 46. J. Pedersen. Israel. Its Life and Cu/litre (Londres: Oxford University, 1964), p. 128. 47. Trible, “Wisdom Builds a Poem”, p. 513. 48. Veja BDB. p. 169, s.v. gam-, IBHS, p. 663, P. 39.3.4d. 49. IBHS, p. 295, P. 16.3.2d. 50. Veja S. Talmon, “The Textual Study o f the Bible — A New Outlook”, in Qumran and the History o f the Biblical Text (Cambridge, Mass.: Harvard University. 1975), p. 359.
O versículo 27b ocupa uma posição enfática no final. Além disso, a repetição quádrupla de um verbo que significa “vir” ressalta a certeza da catástrofe e seu caráter decisivo por meio da símile de um vento devastador. A sabedoria não ri da desgraça, mas do triunfo daquilo que é certo sobre o que é errado quando a vossa desgraça ocorrer ( be ’êdekem ). As 24 ocorrências de 'êd (desgraça ) encontram-se todas em textos poéti cos. Em Provérbios ele se refere a um evento calamitoso repentino que causa grande dano, prejuízo e destruição a alguém (cp. 6.15; 17.5; 24.22; 27.10). Em cerca de metade desses casos ele ocorre em relação ao “dia” ou “tempo” de desgraça. De acordo com BDB o pronome vossa signifi ca “a calamidade que vós mereceis” (cp. Jó 21.17), não “a calamidade que está para vos sobrevir”.51 Eu me rirei Çeáhãq) e seu paralelo quiás tico e zombarei ( 'eVag) expressa a alegria e desdém interior de um con quistador poderoso diante da derrota de seus inimigos desprezíveis (cp. Sl 2.4; 37.13; 59.8). A vitória é tão desproporcional que a mudança de sorte tem um aspecto cômico, provocando zombaria sobre o inimigo. A verdade é dura, e a sabedoria não a ameniza. Sua tática de choque visa persuadir o jovem a se voltar para ela. A mulher sabedoria não reivindi ca surrar os jovens ingênuos e rebeldes. Ela responde ao julgamento deles, mas não o inicia. Ela intensifica a ansiedade deles ao deixar de revelar o agente e/ou agentes. A única coisa de que podem estar certos é que os próprios atos e artifícios se voltarão contra eles. Para o filho, o pai revela que é o S e n h o r quem sustenta essa ordem moral (cp. 5.2123), mas ele não oferece aos insensatos qualquer oportunidade de usar seu nome em vão. Se não forem obtusos demais, os insensatos que ou vem as reflexões da sabedoria poderão inferir que o S e n h o r é o agente, pois ela atribui o julgamento deles à sua rejeição do temor do S e n h o r (1.29). Neste cenário, ela celebra o triunfo do S e n h o r por meio da or dem moral de ridiculizar o desafio “liliputiano” dos jovens que recusam essa ordem. Em resumo, a sabedoria se regozija em colocar as coisas em seu devido lugar neste mundo transtornado, quando a sabedoria destrói a loucura, a retidão expulsa a perversidade, o conhecimento vence a ignorância, a humildade derruba o orgulho e a vida traga a morte. Kayatz observou que o tema do riso diante da derrota não é comum na literatura sapiencial, mas pode ser encontrado nos salmos 51. Se estiverem certos, trata-se dc um gen. de posse inalienável, "algo intrinsecamcnte peculiar ao seu possuidor” {IBHS, p. 145, P. 9.5. lg), não um gen. objetivo.
pré-exílicos já citados com referência ao S e n h o r rir quando a desgraça sucede aos perversos que tramam o mal contra os seus santos.52 Na frase quando vier (bebõ’) bô' ocorre quatro vezes, três vezes e seu sinônimo ’th uma vez, não causando surpresa, portanto, que seja a palavra-chave para o julgamento que se aproxima (vs. 26, 27). Na litera tura sapiencial bô \ com frequência, expressa a relação entre conduta e conseqüência (cp. 6 .10, 11). Preuss diz: “O assunto indica que seria mais correto traduzir bô' como ‘vir inevitavelmente’, ‘vir necessaria mente’, ‘cercar’, etc., pois bô ’ transmite a ideia de entrar e se mover dentro da esfera de atividade que afeta o destino”.53 O termo calami dade (pahad) tem como ideia central “sacudir, tremer”, quer de alegria (Is 60.5; Jr 3 3 .9 ), quer, predominantemente, diante de algo terrível (Dt 2 8.66; ls 33.14). A forma nominal significa “temendo” e é usada para indicar uma emoção forte ou, por metonímia, aquilo que suscita o medo intenso. Aqui o paralelo, “desgraça”, sugere a segunda forma de uso. Este sentido é bastante apropriado pois, como Delitzsch observa, “aque les a quem o discurso é dirigido se encontram na condição de segurança carnal” (cp. v. 32).54 O versículo pode ser parafraseado como “Eu zom barei quando vier a terrível desgraça que vós mereceis” (cp. Jó 31.23). 27 Por meio de todo tipo de artificio retórico, a sabedoria se esfor ça para despertar seus ouvintes complacentes e indiferentes para a situação terrível em que se encontram. Num paralelismo quiástico ela repete o versículo 26 quase literalmente no versículo 27, acrescentan do, porém, imagens vividas de uma tempestade. No estilo caótico de um vendaval destruidor, ela quebra a estrutura de seu paralelismo nor malmente simétrico usando um terceiro verseto dissonante. Ele não tem tradução (pace Fichtner [S//S]). Nele ela combina a assonância de Sõ’â (“tempestade”; v. 27ala) e süpâ (“redemoinho”; v. 27aP) com çãrâ (“aflição”) e çúqâ (“angústia”) no versículo 27b. Quando vier a vossa calamidade (beb õ p a h d ekem ) repete o versículo 26b literal mente, e seu paralelo quando a vossa desgraça chegar (we ’êdekem... y e^teh ) repete o versículo 26a, mas substitui o sinônimo poético atá.55 A estes ela acrescenta agora as símiles perturbadoras como uma tem pestade ( k eSõ’â ) e como um redemoinho (k esüpâ) para expandir e 52. 53. 54. 55.
Kayatz. Studien zu Proverbien 1-9, pp. 120-21. H. D. Preuss, TDOT, 2:26. s.v. b ô '. Keil e Delitzsch, Proverbs, p. 72. H. D. Preuss, TDOT, 2 :20-21, s.v. bô
intensificar o julgamento vindouro. Em dez de suas 12 ocorrências, to das na poesia, Sõ’â denota “desolação”, como de um muro em ruínas (Jó 30.3) ou de uma terra devastada (Jó 30.3). Porém, em Ezequiel 38.9, num contexto semelhante ao de Provérbios 1.27, o termo significa “tempestade”. Em resumo, é uma tempestade que causa devastação, daí a possível tradução como “furacão” na REB. A raiz do paralelo, “redemoinho”, significa “chegar ao fim”, “cessar”, sugerindo também que se tem em vista uma tempestade catastrófica. Juntos, os dois parale los apontam para uma tempestade com a forma de um redemoinho de vastador que vira tudo em seu caminho de cabeça para baixo. As símiles combinadas retratam a calamidade que está para sobrevir aos ingênuos chegando repentinamente e tão catastrófica que ninguém sobreviverá. Para reiterar a severidade do julgamento vindouro de modo que sua audiência nunca esqueça, a sabedoria repete pela quarta vez quando... vier ( bebõ ’) e acrescenta agora aflição (sãrâ) e angústia ( w esüqâ ). Sãrâ se refere a qualquer coisa estreita ou que confina e, como aqui, “pode se referir à reação emocional intensa que um indivíduo experimen ta quando é pressionado externamente por inimigos ou internamente por decisões erradas”.56 Süqâ ocorre exclusivamente em combinação com “aflição” (Is 8.22; 30.6; cp. Sf 1.15), reforçando a noção de medo. Sobre vós Çalêkem) indica o pathos (sofrimento) que sentirão.57 Em resumo, a psique dos ingênuos em julgamento mudará da complacência e insubor dinação orgulhosa para o terror extremo. Nos paralelos egípcios a ordem justa é estabelecida na vida seguinte; em Provérbios, o tempo e o modo do julgamento vindouro certo são deixados em aberto, como no versículo 18. c. Reflexão da sabedoria sobre seu sermão (1.28-33) Ao refletir em discurso indireto sobre seu sermão feito em discurso direto, a sabedoria reforça o caráter (vs. 28, 29) e a certeza (vs. 30, 31) da morte do ingênuo, ao qual ela acrescenta todos os insensatos, em contraste com os sábios (vs. 32, 33). A ligação entre o sermão e a reflexão é estabelecida por meio de uma inversão: 24. Clamo.... e vós recusais [escutar], 28. Eles me invocarão... mas eu não responderei. 56. J. Hartley. TWOT. 2:778, s.v. sSríir I. 57. IBHS, p. 2 17, P. 11.2.13c.
28,29 Usando o paralelismo quiástico, a sabedoria argumenta que o princípio da lex talionis exige um julgamento definitivo. Uma vez que os ingênuos não lhe responderam no tempo da salvação, ela não lhes responderá no tempo de seu julgamento. Então Çãz), que se refere ao tempo do julgamento vindouro nos versículos 26,27, liga sua reflexão à sua repreensão. Eles me invocarão (yiqrã’u n n i ) se refere aos três tipos de insensato mencionados no versículo 22 porque sua explicação, “odiaram o conhecimento”, caracterizou todos os “insensatos” no ver sículo 22 e porque ela menciona os simplórios e os insensatos explicita mente outra vez no versículo 32. Q ãrã’, “chamar” repete o verbo inicial de sua acusação (v. 21), sugerindo o princípio da lex talionis. qãrã', que significa chamar a atenção de outro para si por meio da voz a fim de fazer contato com essa pessoa, sugere os julgados finalmente reco nhecerão que ela possui a vida e a segurança verdadeiras que eles trocaram por uma pseudovida e uma falsa segurança. Porém ela acres centa logo em seguida, mas eu não responderei ( welõ ’ ’e'eneh , i.e., não responderei ao seu chamado).58 “A oração, outrora onipotente, não terá poder algum”, diz Bridges.59 Ela acrescenta um detalhe ao caráter decisivo do julgamento ao intensi ficar o paralelo, eles me procurarão diligentemente (yesaharunní), ou tra maneira metafórica de descrever a tentativa deles de chegar até à sabedoria para se salvarem do terrível julgamento. Em termos etimológicos èãhar (procurar diligentemente) significa “a luz avermelhada que antecede a aurora”, daí a possível tradução “buscar-me logo cedo”. No entanto, esse significado não pode ser defendido a partir de seu uso real. Esse termo denota a dificuldade da busca, exigindo esforço extremo, não o seu tempo (cp. Jó 24.5; 7.21). Em outras passagens èãfuir se refere à busca do mortal pelo eterno, especialmente em meio à morte e a desgra ça (SI 78.34; Os 5.15). Assim como “eu não responderei” é o antônimo de “me invocarão”, mas não me encontrarão ( welõ’ y im sã ’unni) é o antônimo de “eles me procurarão diligentemente” (cp. Pv 7.15; 8.17). A 58. Em outras passagens no livro de Provérbios, um ser humano é o sujeito, sendo que nesse caso significa responder a outra pessoa num diálogo, ainda que não necessariamente num diálogo extenso ( 15.28; 18.23; 26.4, 5). Com a preposição bete ela significa "testemunhar contra” (25.18). A pala vra não significa apenas replicar a alguém (“responder”), mas responder de maneira comedida ou um tanto calculada (cp. 16.1; Jó 32.3; 33.12, 13; veja R. B. Allen, TWOT, 2:679, s.v. ‘Bnâ). 59. Bridges, Proverbs, p. 11.
voz salvadora da sabedoria não está à disposição dos seres humanos. Ela pode ser perdida em decorrência de uma rejeição anterior. 29 A expressão composta incomum porque/porquanto (tahat ki) introduz a cláusula que explica o caráter decisivo do julgamento. O versículo 29 pode estar ligado sintaticamente ao versículo 30 (como na REB, NVI e NRSV), porém o mais provável é que esteja ligado ao versículo 28 em função da duplicidade que caracteriza a estrutura de toda essa parte e porque, desse modo, fica claro que o padrão quiástico está apresentando dois pontos: A O caráter decisivo do julgam ento B porque não se arrependeram B’ porque não se arrependeram A’A certeza do julgam ento final
(v. 28) (v. 29) (v. 30) (v. 31)
Porque eles odiaram o conhecimento (sãne 'ü d a a t; veja v. 22). Com o temor do Senhor (yir'at YHWH\ veja 1.7), que é o paralelo quiástico e intensificador de “conhecimento”, ela conduz sua audiência ao cerne do seu problema. Sua indiferença obstinada e sua hostilidade contra o Deus de Israel, não contra uma ordem criada impessoal ou mesmo uma sabedoria humana hipostatizada. A submissão à sabedoria é equiparada à submissão a Deus. Não escolheram (lõ’ bãhãrü) ex pressa a decorrência lógica do seu paralelo, “odiaram”. Bãhar (“esco lher”) significa “uma escolha cuidadosa ocasionada por atos efetivos e, portanto, uma escolha extremamente consciente e que pode ser exami nada à luz de certos critérios [cp. 1S m 17.40; Is 40.20]”.60Uma vez que consideram o “temor do S e n h o r ” absolutamente desnecessário, os in sensatos não o escolheram cuidadosamente como seu modo de vida. De fato decidem contra ele e sancionam outros estilos de vida. A refle xão teológica sugere vários motivos pelos quais a sabedoria se distan cia no tempo do julgamento final, não oferecendo uma segunda chance aos insensatos depois desta vida. Em primeiro lugar, as escolhas huma nas antes do julgamento não passariam de decisões preliminares antes de uma escolha verdadeira feita depois da morte. Em segundo lugar, esta vida seria destituída de sua verdadeira dignidade se as escolhas feitas agora não tivessem nenhuma conseqüência eterna. Em terceiro lugar, os insensatos seriam confirmados em seu tratamento desta vida
com complacência indiferente. Em quarto lugar, os discípulos da sabe doria seriam considerados tolos se o prazer sensual pudesse ser obtido sem responsabilidade e prestação de contas. As pessoas negam a dou trina do julgamento final porque não desejam dar a esta vida a dignida de de que as decisões presentes afetam um futuro eterno de maneira decisiva e definitiva. 30, 31 Para ressaltar a certeza do julgamento que lhes sobrevirá, no versículo 30 a sabedoria basicamente repete a acusação do versícu lo 25, mostrando que a sentença recebida por eles é absolutamente justa (v. 31). Eles rejeitam seu conselho (v. 30); agora eles devem so frer a condenação por seus atos. Não concodaram com (lõ'-'ãbü) meu conselho ( la'“sã ti ) e toda minha repreensão ( kol-tôkahti ) repete o vocabulário e muda ligeiramente apenas a sintaxe do versículo 25. Mas em vez de “escarnecer”, agora ela usa rejeitaram ( n ã ’as ú ). O significado central de n ã ’as é “deixar de apreciar”, “subestimar” e, deste modo, menosprezar algo.61 Seu desprezo pela sabedoria está ar raigado na incredulidade em suas boas intenções (cp. Gn 3.4,5). Podese dizer por inferência que esses insensatos iludidos, restritos pelo tem po e pelo espaço a um conhecimento extremamente limitado, se toma ram tolamente tão sábios aos próprios olhos que não eram mais capa zes de enxergar as coisas do ponto de vista celestial de Deus e, portan to, julgaram a situação real de modo totalmente equivocado. O resultado de sua escolha é estabelecido na conjunção we, tradu zida como portanto. A metáfora, comerão do fruto (yõ'kelü m ipperi, i.e., nutrir o corpo mediante o comer alimento pela boca; veja 13.25; 24.13) significa, como no provérbio “você é o que você come”, a liga ção orgânica de retribuição entre atos insensatos e conseqüências fa tais (veja v. 19). A realidade literal por trás da metáfora é que eles experimentarão a desgraça súbita e catastrófica ameaçada no versícu lo 27 com todo o seu ser. O acréscimo de do seu caminho (d arkãm ; v. 15) interpreta o fruto como sendo referente ao seu estilo de vida (veja v. 15). E de seus próprios planos (üm im m õ ,asõtêhem) - sempre no plural com um sentido insidioso-oferece seu paralelo, “seu caminho”, a conotação mais sutil de que planejaram seu estilo de vida sem a sabe doria e, no entanto, tiveram uma vida abundante. Se fartarão (yiábã'ü ) volta à metáfora da alimentação mas enquanto “comerão” enfatiza o
início do julgamento (v. 26), “se fartarão” intensifica a ideia até sua medida plena e consumada (cp. v. 27). (2) Conclusão: sumário sobre os destinos do insensato e do sábio (1 .32,33) As reflexões finais da sabedoria voltam a agrupar os ingênuos (petãyim ) com os insensatos (kesilim ) em sua condenação certa e final (v. 32). A conjunção inicial e ( we) no versículo 33 estabelece a unidade do quarteto que contrasta o destino beneficente dos sábios com o fim pernicioso dos insensatos. Uma falsa sensação de segurança conduz os apóstatas à sua morte eterna (v. 32), um destino que se encontra em marcante oposição ao dos fiéis, que permanecem seguros para sempre tanto subjetiva quanto objetivamente (v. 33). E provável que as restri ções da poesia hebraica condensem os “escarnecedores” do versículo 22 com os “insensatos”. Certamente (ki; veja 1.17) declara a conclu são ampla. De acordo com a função de um provérbio, a sabedoria, assim como o pai na perícope anterior, faz uma ampla generalização com respeito ao destino de todas as pessoas tomando por base o inci dente particular desses insensatos à porta da cidade. As outras onze ocorrências de desvio (m esübat ) encontram-se todas em Oseias ou Jeremias, sempre com referência à apostasia de Israel, sua infidelidade e apostasia para com Deus e para com a aliança mosaica. Sua descri ção com o quem está se “desviando” para a morte funciona com o um jogo de palavras irônico em relação à admoestação para “voltarem-se” para a sabedoria a fim de serem preservados da morte (v. 23). Esse mesmo jogo de palavras ocorre em Jeremias 3.12: “Volta, ó pérfida Israel” . Como nos versículos 2 6 ,2 7 o enfoque não é sobre o agente ou agentes que matam, mas sobre a apostasia propriamente dita, que con tém em si o veneno letal. A sabedoria substitui as figuras provocativas dos versículos 26, 27 pela declaração clara e inequívoca os matará (taha^gêm). A lei mosaica também usa hãrag para o castigo pela apos tasia do S e n h o r ( Ê x 32.27; Nm 25.5 [cp. 31.7-19]; Dt 13.9[ 10]). Essas semelhanças que envolvem “desviar” e “matar” entre a lei e os profe tas e a sabedoria sugerem, no mínimo, que os ensinos de Salomão pos suem a mesma autoridade que os destes outros. Salwat ( complacên cia ) pode se referir partem bono à “paz e tranqüilidade”, com o em Provérbios 17.1, e à “segurança”, como no Salmo 11.7, ou partem maio aos “falsos sentimentos de segurança” em outras cinco ocorrências. O
sentimento de segurança levou Jeoaquim a desobedecer à palavra pro fética de Deus (Jr 22.21), os inimigos de Antíoco Epifanes a se arma rem contra ele (Dn 8.25; 11.21, 24) e Sodoma a fazer coisas detestá veis (Ez 16.49). Assim, a complacência dos insensatos (ou tolos; kesilim ), decorrente de sua falsa sensação de segurança, os induz a não tomar precauções contra o julgamento inevitável associado à sua insensatez e, deste modo, ela os destruirá (t?’abdêm\ i.e., os aniquilará).
33 Em contraste com o extermínio terrível dos insensatos tem-se a segurança abençoada daquele que me obedecer (sõmêa'li\ lit. “aquele que me ouvir”), o antônimo de “desviar” (v. 32a). A mudança do convite e rejeição no plural para a aceitação no singular se assemelha à história de Israel, na qual apenas um remanescente permaneceu no final. Ele habitará ou permanecerá (yiskon -) não indica, de p er si, coisa alguma acerca de seu modo e extensão. Essas noções são expressas por meio da frase adverbial em segurança ( befah ) , que requer, com o mostra o seu paralelo, a maneira (i.e., “em paz”), bem com o a extensão (i.e., “sem temor do dano” e, portanto, do fim). Betah (“segurança”) tem quase os mesmos significados que Salwâ, “sentir-se seguro, estar despreocupa do”. Também pode ter um tom negativo quando aquilo em que a pessoa confia é ilusório (Jz 18.7),62 ou ainda um tom positivo. Normalmente betah é a noção negativa quando buscada na humanidade, pois a pessoa ou grupo no qual o indivíduo confia se mostrou ilusório, ou de cunho positivo quando o objeto é Deus. Uma vez que, neste caso, trata-se do sentido positivo, seu uso coerente aponta mais uma vez para a íntima relação entre o S e n h o r e a sabedoria; os dois prometem verdadeira se gurança àqueles que obedecem. Seu paralelo, em paz mesmo (sa‘°nan), também pode ter a ideia pejorativa de se sentir falsamente seguro (cp. Is 32.9,11), ou designar a verdadeira segurança (cp. Is. 32.18), como é o caso aqui. Indica tanto a segurança subjetiva, a julgar pelo contraste com a pseudo-segurança dos insensatos, quanto a segurança objetiva (cp. 3.23), a julgar pelo contraste com “matará”. E provável que seu sentimento interior de segurança esteja baseado em sua experiência exterior. Sa10nan intensi fica befah, significando estar tão livre de infortúnio a ponto de considerá-lo com desdém (cp. Jó 3.18; SI 123.4). A sabedoria acrescenta uma terceira frase adverbial para intensificar ainda mais a segurança que seu ensino oferece, sem temor do dano ( mippahad m ‘ô [veja 1.16 ] ) , deixando implí
cito que a sensação permanente de tranqüilidade do fiel está baseada numa segurança objetiva. Pahad (“temor”) é a mesma palavra traduzida como “calamidade” nos versículos 26,27, referindo-se no caso desses versículos à realidade exterior que produz pavor, e aqui, à emoção negativa do medo pois a realidade objetiva é indicada por dano. Talvez ela ofereça essa promessa como um apelo de despedida a outros jovens rebeldes, que por ventura ouçam ou leiam suas reflexões, para abandonarem seus estilos de vida alternativos e buscarem a sabedoria (cp. 8.35, 36). 3. Segunda palestra: salvaguarda contra o perverso (2.1-22) 1 Filho meu, se aceitares as minhas palavras,
e guardares os meus mandamentos contigo 2 ao' fazer o teu ouvido atento à sabedoria, aplicarás2 o teu coração ao entendimento 3 de fato, se clamares para o discernimento,
e para o entendimento levantares a tua voz; 4 se o buscares5 como a prata; e como a tesouros escondidos o procurares, 5 então entenderás o temor do S enhor,
e acharás o conhecimento de Deus;4 6
porque o Senhor5 dá sabedoria,
da sua bocah vem1 o conhecimento e o entendimento; 1. Gerundivo le * inf. ( IBHS, pp. 608-9, P. 36.2.3c), nâo le final (pace Toy, Pmverbs , pp. 32-33). ele., pois tom ar o ouvido atento à sabedoria precede logicamente arm azená-la (v. I b) e a sintaxe do v. 2b o exige. 2. A conjugação prefixai costuma representar a apódosc de uma cláusula circunstancial implícita. A mesma construção ocorre em 5.2 (IBHS, P. 31.6.2). 3. Ou “a/sua” . O pronom e sing. sugere que “sabedoria”, ‘‘discernim ento" e “entendim ento” são termos correlatos para a mesma realidade. 4 . 0 gen. am bíguo pode ser um gen. de autoria (i.e., o S e n h o r é o autor do conhecim ento) e/ou um gen. de posse inalienável (i.e., o conhecim ento com o uma propriedade intrínseca do S e n h o r ) , e/ou um gen. objetivo (i.e., a instrução conduz o indivíduo a um relacionam ento pessoal com Deus) (IBHS. pp. 143, 145, 146, PP. 9.5.1c, Ig, 2b). 5. A posição inicial da palavra é enfática. 6. De m odo incomum a LXX lê apo prosõpou autou com o “de sua face" (< mippãnõyw). No entanto, as outras 23 ocorrências de m ippãnSyw sem pre significam hostilidade (cp. Gn 45.3; Êx 4.3; 23.21; ISm 18.15; J12.6; etc.), um conceito im próprio em Provérbios 2.6. A. J. Baum gartner
(Elude critique sur Vétat du le.xle du Livre des Proverbes d'après les principales Iraduclions anciennes [Lcipzig: W. Drugulin. 1890], p. 39), Delitzch (/VoiwAs, 1:77), eT oy (Proverbs, p. 38), ainda que sem argumentos, atribuem corretam ente à LXX um erro de cópia. 7. Implícito na prep. “da "(IBHS, p. 224, P. 11.4.3d).
7 o sucesso8 ele reserva1para os retos —
ele é'° um escudo para os que caminham na irrepreensibilidade'1 8 guardando as veredas da justiça e vigia o caminho dos que lhe são leais;12 9 então entenderás o que é correto, e justo, e ín te g ro to d a boa trilha; 10 porquantoMa sabedoria entrará no teu coração, e o conhecimento será agradável ao teu apetite; 11 a perspicácia te vigiará, o entendimento te guardará;'5 12 para te livrar do caminho do perverso, 16 do homem que diz coisas perversas, 13 dos 17 que abandonaram as veredas retas, para andar em caminhos de trevas; 14 dos que se alegram18 em fazer o mal, [e] se regozijam nas más perversões; 15 cujas veredas são tortuosas, e que são desviados em suas trilhas; 16 para te livrar da esposa lasciva,19 da estranha que faz as palavras serem agradáveis;
8. Ou sensatez ou desenvoltura, mas não se pode m anter uma reserva de “sensatez”. 9. Considerando_y?pn. (Q, Targ., Vulg.), e não w?pn, “e assim ele reserva” (K, LXX, Sir.). 10. Fornecido de m odo a deixar claro que “escudo”, não “sucesso”, se encontra em aposição a YHW H no v. 6a. 11. Gen. de posição (1BHS. pp. 147-48, P. 9.5.20. 12. Lendo o pl. hsydyw (Q, LXX, Sir.), e não o sing. hsydw (K). 13. A pontuação do TM cria uma quebra de vereo, o objeto de “entenderás", transbordando para o verseto paralelo. A LXX tem a leitura mais fácil, katorthõseis, “endireitarás” (< & ’aSSer). 14. A LXX considera o v. 10 a prótase e o v. 11 a apódose, mas essa interpretação contradiz a sintaxe geral do poema. 15. N u n não assim ilado para preservar a assonância com l n $ r no v. 8. 16. Ou “um cam inho perverso” (cp. derek lõ’-(ôb em 16.29 e o substantivo abstrato r& , com referência a andarem 3.7 [“apartar-se” ]; 4.27; 8.13; 28.10). É provável que r a ‘ seja um substantivo adjetival na função genitiva, em razão do paralelo 'íê medabbèr e aos particípios relativos iniciais, e '■Ser em 2.13-15. ‘ís provavelm ente é om itido no verseto A (cp. 6.24; 28.22; 29.6). 17. A poesia hebraica perm ite facilmente uma m istura na categoria gram atical de número. 18. A preposição le com o adjetivo verbal descreve seu estado psicológico e significa “com referên cia a” (cp. 17.5), não propósito, “para fazer o mal". 19. Para um a avaliação da LXX veja p. 183, n. 191.
17 a qual abandona o companheiro20 da sua mocidade,2'
e se esquece da sua aliança com Deus;21 18 certamente,23 seu caminho conduz24 à morte, e suas trilhas ao reino dos mortos; 19 todos que se dirigem a ela não voltarão, e não alcançarão as veredas da vida; 20 assim andarás no caminho dos que são bons, e permanecerás25 nas veredas dos justos; 21 certamente os retos habitarão na terra, e os irrepreensíveis serão deixados nela; 22 mas os perversos serão eliminados da terra, e os traiçoeiros serão arrancados26 dela.
20. A LXX lê "ensino” . A N EB repontua allúp para o term o não alestado lllúp, “ensino” (L. H. B rockington, The Hebrew Texl o f lhe O ld Teslamenl [O xford: O xford U niversity; C am bridge: C am bridge University, 1973], p. 156). 21. PI. abstrato (IBHS, pp. 120-21, P. 7.4.2a, b). 2 2 .0 sufixo pronominal modifica “aliança”, não “ Deus” (GKC, # 135n). No entanto, uma vez que em outras passagens Deus é o autor de alianças e o povo as aceita, ele é o autor de suas obrigações. A LXX om ite o sufixo pronom inal. Fichtncr (BHS) corrige desnecessariam ente para oh°lãh “sua tenda", conferindo ao term o o senlido de huppStãh, “sua tenda de cobertura” . 23. A cláusula adverbial enfatiza a cláusula em si, pois esta não apresenta nenhum a ligação lógica evidente com a cláusula anterior (IBHS, p. 665, P. 39.3.4e). 24. O texto e o significado exatos do v. 18a são incertos. O significado do hap. leg. SShâ, da raiz Süha, é dificil de determ inar (veja J. A. Emerton, Inslruclion and Interpretation [OtSt 20; Leiden: Brill, 1977], pp. 47ss). Alem disso, bêt é m asculino, excluindo-o com o possível sujeito. Poderia ser um acusativo de lugar, “em sua casa”, ou um acusativo de estado “com referência à sua casa”, mas essa imagem é improvável. A LXX traz “ela colocou sua casa junto à morte” (< satã 'al-mõwet), mas a figura é dificil. A Targ. traz “e no vale da morte está sua casa”, o que, provavelm ente, é um a paráfrase do TM , um a vez que é dificil ju stificar essa versão do ponto de vista da crítica textual. Ibn Ezra e D. Kidner (Proverhs, p. 62), consideram de modo duvidoso que o termo se encontra em aposição com mãwet (i.e., sua casa é morte). Também não fica inteiram ente claro se sua casa desce à m orte. D elitzsch ( Proverbs , 1:83) acredita que “sua casa” é permutado com a mulher, mas não oferece nenhum paralelo convin cente, J. A. Em erton (“A N ote on Proverbs ii.18” , JTS 30 [1979] 153-58) corrige o texto para súhá ("sua casa é uma cova [que conduz] à morte”; cp. 22:14; 23.27), mas não explica o TM dificil. A NEB e a NRSV corrigem byth para ntybth “seu cam inho” . O. Loretz (“ Ugaritische und hebrãísche L exikographie [III]”, UF 14 [1982] 141-48) defende a correção em parte atrib u in d o as v ariações aqui e em 7.27 no TM à influência de 5.8; 7.8; 9.14. Esta correção fornece o paralelo m ais apropriado. 25. A m esm a palavra é traduzida com o “vigiar” nos vs. 8 e 11. 26. O T M . que não entendeu a antiga forma Qal passiva d e y is ^ h ú encontrada num fragmento de Cairo Gcniza (veja C. Gordon. Ugaritic Manual [Roma: Pontificai Biblical Institute, 1955]. p. 65, n. 1, P. 9.27), norm almente o repontua com o Nifal ou Pual. Aqui provavelm ente entenderam o sujeito com o sendo indefinido (IBHS, pp. 7 0 -7 1, P. 4.4.2).
O discurso repetido do pai a seu filho ( beni , veja 1.8) querido e impressionável marca a segunda palestra do pai (veja 1.8-19), um encôm io brilhante a seu ensino em uma única sentença em hebraico. M. Fox comenta acertadamente que esse capítulo é um corretivo salutar para a noção popular de que a educação em Israel era uma prática severa e tediosa na qual “as exigências de obediência às regras eram aprendidas pela memorização mecânica e inculcada por meio de inces santes repreensões, promessas simplistas e, acima de tudo, castigos zelosos”.27 Esta segunda ordem para internalizar o ensino dos pais in crementa a primeira, pois passa do “ouvir” (1.8) para o “aceitar” (2.1). O poema “alfabético” é uma única sentença que consiste de 22 versículos, correspondendo ao número de letras no alfabeto hebraico, provavelmente para sugerir sua inteireza. Apesar de ser uma sentença complexa, suas partes são indicadas claramente por partículas lógicas à medida que ela avança numa única linha de pensamento lógico. Em termos de estrutura e lógica ela está dividida em duas metades iguais (2.1-11, 12-22), sendo que cada metade é constituída de duas estrofes de quatro versículos e uma terceira estrofe climática de três versículos. A primeira metade diz respeito ao desenvolvimento ou produção do ca ráter do filho. Ao internalizar o ensino dos pais (vs. 1-4) ele passará a temer e conhecer a Deus (vs. 5-8) e a aprender a retidão intuitivamente (vs. 9-11). A segunda metade diz respeito ao livramento ou proteção subsequente do filho das mãos dos homens perversos (vs. 12-15) e da mulher perversa (vs. 16-19), permitindo, desse modo, que ele experi mente vida, não morte (vs. 20-22). Depois do discurso, cada estrofe dos versículos 1-11 começa com a primeira letra do alfabeto hebraico álefe Çim, “se”; ’ãz, “então” [duas vezes]) e cada estrofe da segunda meta de, com a sua décima segunda consoante, lamed(lehaçsilekã, “para te livrar” [duas vezes] e lema‘an, “para que”).28 De acordo com a lógica apresentada pela colocação dessas letras em relação às partículas lógi cas, as duas partes e suas estrofes têm notáveis semelhanças quanto à sua extensão:
27. M. Fox, “The Pedagogy o f Proverbs 2 ",JBL 113 (1994) 233. 28. R. E. Murphy, Wisdom Lileralure (FOTL !3;G rand Rapids: Eerdm ans, 1981). p. 56.
A. Desenvolvi mento do caráter:
11 bicola (linhas de dois verse tos)
B. Defesa con tra os perver sos:
vs. 1-4 versetos vs. 5-8 verseto vs. 9-11 verseto
quatro bicola
vs. 12-15
quatro bicola
quatro bicola
vs. 16-19
quatro bicola
três bicola
vs. 20-22
três bicola
O estilo notavelmente ordenado do poema e seus paralelismos se mânticos regulares combinam com a esfera divina ordenada que o encôm io apresenta.29 O duplo benefício de se internalizar o ensino segue um padrão alternado:30 A Sumário: educação religiosa ('Sz tnbin, “então... entenderás”) B Comprovação (kl “porque”) o S e n h o r dá “sabedoria” C Resultado: proteção divina (n$r/Smr) A' Sumário: educação ética Çüz tãbin, “então... entenderás”) B’ Comprovação (ki, “porque”) “sabedoria” entra no coração C’ Resultado: proteção do caráter (S m r/n ç r)
v. 5 v. 6 v. 8 v. 9 v. 10 v. 11
AI A’ sumariza os benefícios religioso e ético da intemalização das palavras dos pais. Apesar de serem apresentados em duas estrofes, os benefícios religioso e ético são inseparáveis. Um relacionamento pes soal com o S e n h o r (vs. 5-8) requer um entendimento intuitivo daquilo que é certo nos relacionamentos humanos (vs. 9-11). R. Van Leeuwen observa que o movimento do divino para o humano é fundamental para a fé bíblica (e.g., Êx 20.1-7 seguido por 20.8-11, e Mt 6.9, 10 seguido por 6 .1 1 -1 3 ).31 B /B ’ baseia esse conhecimento religioso e ético na revelação do de sua sabedoria, a qual entrou no coração do filho de modo que ele tem predileção por esse conhecimento. S
en h o r
29. Uma análise meticulosa do paralelism o do poema pode ser encontrada em D. Pardee, Ugaritic anJHebrew Poelic Parallelism: A Trial C u t(n t andProverbs 2) (VTSup 39; Leiden: Brill, 1988). 30. D. Pardee (Parallelistic SlruclureofProverbs 2, p. 152) observa que “o paralelism o repetitivo é um dos principais recursos de recordação em Provérbios 2” . 31. R. Van Leeuwen, Proverbs, 5:45.
C/C’ explica que, por m eio do relacionamento vertical piedoso do filho com Deus e de seu relacionamento horizontal ético com as pes soas, ele será protegido. O quiasmo do par de palavras “guardar” (vs. 8a, 1lb) e “vigiar” (8b, 1 la) encerra a primeira metade.32 O duplo propósito do exórdio também apresenta um padrão alternado:
A “para te livrar” (nsl) do discurso dos homens perversos B “que abandonam” (‘zò) as veredas retas C descrição de suas “veredas” (ma'gal) tortuosas A’ “para te livrar” (nçl) das palavras da “estrangeira” B’ “que abandona” (‘zò) o companheiro da sua mocidade C’ descrição do “caminho” (ma‘gal) mortal dessa mulher
v. 12 v. 13 vs. 14,15 v. 16 v. 17 v. 18
PdA’ se refere à salvação (i.e., proteção) do discurso sedutor das mulheres e dos homens perversos da própria geração do filho. B /B ’ identifica as mulheres e os homens sedutores com o apóstatas de sua herança pactuai. C/C’ descreve o mau caminho dos homens como sendo de trevas e tortuoso e o caminho da adúltera com o sendo enganosamen te agradável e mortal. N o original, as duas estrofes terminam com a palavra “trilhas”. Observada de outra maneira, a prótase (= condições) nos versícu los 1-4 constitui a introdução do poema; sua longa apódose (= conse qüências), que consiste em dois pares de estrofes com seus padrões alternados, é seu corpo (vs. 5-19); e o sumário, que apresenta os desti nos de vida e morte dos justos e dos perversos, respectivamente, é sua conclusão (vs. 20-22). A metáfora repetida “caminho”, com seus qua tro sinônimos (derek “caminho”, 'orhôt “vereda”, mangai “trilha” e netíbâ “senda”) unifica o desenvolvimento do caráter do filho (cp. vs. 8 [duas vezes], 9) com seu livramento dos apóstatas (vs. 12,13 [duas vezes], 15, 18, 19), e liga o sumário conclusivo ao corpo principal (v. 20 [duas ve zes]). A metáfora se encontra dividida quase igualmente entre os cami nhos bom e mau.33 32. Y. Avishur, Stylislic Studies o f Word-Pairs in B iblical and Sem itic Literalure (AOAT 2 10; Neukirchcn-VIuyn: Neukirchener, 1984), p. 62. 3 3 .N .C . H ab el,“ T h eS y m b o lism o fW isd o m in Proverbs 1-9”, In t 2 6(1972) I3 7 ,n . 13.
O poema funciona como o primeiro janus (ou poema transicional) no prólogo (veja pp. 49-50). A metáfora de andar no caminho do justo em vez de nos caminhos do perverso será desenvolvida em 4.10-19; 4.20-27. Como os pais em 1.8, 9 rivalizam os assassinos em 1.10-19, aqui o filho é confrontado novamente com dois caminhos: o caminho mau dos sedutores perversos e o bom conselho do pai. Uma vez que está prestes a ingressar na vida adulta, o filho deve escolher entre os dois caminhos. A voz sedutora da mulher “estranha” concorda com as vozes do grupo de homens desleais. De acordo com Newsom:
O mundo é apresentado como um lugar de discursos rivais e conflitantes: as palavras do pai, as palavras dos homens desonestos, as palavras da estranha. O indivíduo é chamado a se voltar para várias direções... em discursos que constroem o mundo de maneiras muito diferentes.34 a. Introdução: condições (2.1-4) As cláusulas condicionais expandidas introduzidas por se gover nam as gloriosas conseqüências desenvolvidas no restante do poema. Essa estrutura reflete a natureza da sabedoria, a saber, a ligação entre atos corretos e destino próspero. Na profunda estrutura de significado, essa construção casuística é equivalente a uma construção imperativa;35 o objetivo de ambas é persuadir. Plõger observa uma intensificação ló gica da aceitação mais feminina e passiva da sabedoria pelo ouvido e pelo coração (vs. 1, 2) para a atividade masculina mais agressiva de clamar por ela e buscá-la.36 1 ,2 A primeira condição estipula que o filho se tome como o templo de Salomão, cujo santuário interior abrigava a Palavra de Deus. Ao con trário dos templos pagãos, que abrigavam ídolos que seus adoradores manipulavam por meio de mitos e rituais a fim de obter vida, no templo de Salomão e no coração do filho a vontade moral transcendente do S e n h o r governa e a sujeição a essa vontade resulta em vida (Cl 3.16). Aceitar (tiqqah. veja 1.3) lança o alicerce para todas as condições (vs. lb-4) e promessas (vs. 5-22; cp. Lc 8.15) subsequentes. As condições reque 34. C. A. Newsom , “ Woman and the Discourse o f Patriarchal Wisdom: A Study o f Proverbs 1-9 ” , in P. L. Day, org., Gender and Dijference in Ancienl Israel (M inneapolis: Fortress, 1989), p. 146. 35. N a antiga instrução egípcia predomina a construção casuística; nas instruções egípcias posterio res, prevalece a imperativa (de acordo com Kayatz, Sludien zu Proverbien 1-9 , pp. 15-17). 36. Plõger, Sprüche, p. 25.
rem compromisso. O filósofo da ciência Michael Polanyi argumenta que o verdadeiro conhecimento flui de um compromisso pessoal com um conjunto de particularidades, com o ferramentas ou pistas, para moldar uma realização engenhosa, não da observação desinteressada de tais particularidades. Este caminho do conhecimento requer habili dade. Por exemplo, um indivíduo sabe, descobre, aprende e experimen ta a habilidade de andar de bicicleta se dedicando à sua prática, corren do riscos e usando de habilidade, não pela aquisição de fatos acerca de uma bicicleta.37 O pai exige esse tipo de participação em seu ensino para se obter habilidades religiosa e ética. Em vez da declaração profé tica, “Assim diz o S e n h o r ” , o pai fala com autoridade acerca das mi nhas palavras (ou ditos, ’amãrãy veja 1.2), que ele equipara à sabedo ria (2.2) vinda do próprio Deus (v. 6). As palavras em vista são as admoestações e ditos nas coleções subsequentes (veja Introdução, p. 45), pois não há mandamentos neste capítulo. O paralelo quiástico ma tiza e intensifica “palavras” com o mandamentos (miswôt). Miswâ des creve uma forma específica de discurso: “o discurso de um superior ordenando e comandando um subordinado”.38 O pai baseia sua autori dade não em sua posição patriarcal ou na tradição, mas no próprio S e n h o r (veja 2.6). Pode-se esquematizar a cadeia de comando em ques tão: o S e n h o r (2.6; 30.6) > Salomão (1.1) > os pais (1.8; 2.1) > o filho. Em decorrência disso, a obediência ou desobediência a eles conduz à vida ou à morte, respectivamente, que somente o soberano administra (3.1,2; 4.4; 6.20,23; 7 .1,2; 10.8; 13.13,14; 19.16). Em outras palavras, a vontade do pai e a vontade pública terão autoridade somente se esti verem conformes com a vontade do S e n h o r . Ainda que, quanto à sua forma, os aforismos das coleções sejam ditos, quanto à sua função, eles são mandamentos. Teoristas do discurso-ato se referem à distinção entre o conteúdo de uma declaração e sua força como uma ilocução.39 Miswâ também significa que “a validade do mandamento se estende além de uma situação singular”.40 “Aceitar” é intensificado para guardar (ou 37. M. Polanyi, “The Scienlific Outlook: Its Sickness and Cure” , Science (m arço de 1957); M. Polanyi, PersonalKnowledge: Towards a Post-Critical/Vií/ojo/>M’ (Chicago: University ofC hica go, 1962). 38. F. Stolz, 77.07; 2:1062, s.v. s w h . 39. Cp. A. Thiselton, New Horizons in Hermeneutics (Grand Rapids: Zondervan, 1992), pp. 29398. Essa distinção provavelm ente explica por que 'S m a r “dizer" pode significar “ordenar” (H. H. Shmid, 77.07; 1:161, s.v. 'm r ) . 40. Stolz, TLOT, 2 :1063, s.v. $wh.
estimar) que, com o acusativo do objeto, significa esconder ou guardar em segredo para um propósito definido (cp. SI 119. I I ) .41 Esse conceito requer que a pessoa estime aquilo que guarda (veja 2.4; 10.14; Jó 15.20; 21.19; Os 13.12). A metáfora significa memorizar com afeição religiosa os “pronunciamentos breves” de Salomão a fim tê-los à mão quando a ocasião os exigir (cp. 5.2; 7.1; 22.18 ; cp. Jó 23.12; SI 119.11). Os rabinos diziam: “Aquele que repete sua lição cem vezes não é como aquele que as repete cento e uma vezes!” 42 Contigo significa que os mandamentos devem acompanhar o filho aonde quer que ele vá (cp. 6 .2 2 ). O à parte no versículo 2 esclarece o versículo 1 e é marcado por travessões, pois quebra a sintaxe entre a prótase nos versículos 1-4 e sua apódose nos versículos 5ss. O verseto A matiza a aceitação e me morização dos mandamentos do pai com um ouvido atencioso a eles, e o verseto B promete um coração transformado. Um texto egípcio diz: “O olho que vê, os ouvidos que ouvem, a respiração do nariz, trazem informação ao coração” 43 (cp. 22.17, 18; 27.9), mas somente ao fazer o teu ouvido atento (lehaqSib... hõznekã\ cp. 1.8; 1.24; 15.31) é que se promove a transformação moral. Prestar atenção a um mandamento implica obedecê-lo. íris Murdoch, seguindo Simone Weil e outros, argu menta que o aperfeiçoamento moral não ocorre pelo exercício da von tade. “A transformação moral vem de uma atenção ao mundo, cujo resultado natural é um decréscimo no egoísmo por meio de um senso cada vez maior da realidade de alguém ou de algo.” “A transformação do ser, metanoia, não se dá pelo esforço e pela ‘força de vontade’, mas por um processo longo e profundo de negar a si mesmo.” 44 A sabedo ria (lahokmâ veja 1 .2 ) se refere à essência do ensino dos pais - ou seja, aos provérbios de Salomão. O objetivo de sua instrução não é a sabedoria de per si, mas como um meio de vida (veja 1.2; 2.20-22 ) .45 A 41. Com o acusativo de pessoa çpn significa “esconder'7"proteger" (cp. Êx 2.2; Js2.4; SI 27.5; 3 1.20[21]) ou “ocultar” (Pv 27.16); com um objeto indireto pessoal pode significar “espreitar por” (1.11, 18; SI 10.8; cp. 56.6[7]). Com m in partitivo significa “ocultar de” e com m in comparativo quer dizer “entcsourar” (Jó 23.12). As formas adjetivais podem, por metonímia, designar como “te souro” aquilo que está oculto. 42. Aitken, Proverbs, pp. 26-27. 43. Kayatz, Sludien zu Proverbien 1-9, p. 44. 4 4 .1. Murdoch, Melaphysics as a Guide to Morais (Allen Lane: Penguin, 1993), pp. 52-54. 45. “O imperador Constantino permaneceu em pé durante horas para ouvira palavra; respondendo ao lhe pedirem para se assentar, ‘que ele considerava pecaminoso oferecer ouvidos negligentes, quando a verdade em questão era de Deus’.” —(Euseb. de Vila Constam, liv. iv), citado por Bridges, Proverbs, p. 14).
metáfora aplicarás (tafíeh) está baseada no uso literal do verbo “incli nar”, como as encostas dos wadis (Nm 2 1 .15), os ombros de um jumento (Gn 49.15) e um cântaro de água (Gn 24.14). A expressão idiomática, “para inclinar o coração” significa “voltar-se” para alguém ou algo, “con quistar”, “aquiescer” (cp. Jz 9.3; 2Sm 19.14[15]; 1Rs 11.3; SI 119.36). O teu coração (libbekã ) é o termo antropológico mais importante do Anti go Testamento (veja pp. 141-142). O entendimento (fíbünâ) provavel mente indica “discernimento pragmático”, “competência” (veja pp. 148). 3, 4 A palavra-chave “entendimento” {fibünâ) liga as condições passiva e receptiva (vs. 1 , 2 ) com as condições agressiva e iniciativa (vs. 3, 4). Tais condições intensificam a psique de modo a prestar o mais alto grau de atenção. “Oração” é atenção absolutamente concen trada e desejo puro. A expressão de fato marca a intensificação de uma recepção relativamente passiva da sabedoria para um convite agressi vo a buscar por ela. Se clamares (tiqrã’; veja 1.21) é a resposta do filho obediente à sabedoria personificada (i.e., Salomão e seu ensino), que clamou em vão para os insensatos em 1.20-33.0 verbo personifica implicitamente o discernimento {bínâ\ veja 1 .2 ) e seu paralelo, enten dimento (veja 2.2), os correlativos da sabedoria. Levantares a tua voz (tittên qôlekã), no paralelismo sinônimo, intensifica o “clamares” no verseto A e liga ainda mais estreitamente o clamor emocionado do filho à mulher sabedoria (veja 1 .2 0 ). Como terceiro e último passo para adquirir a natureza piedosa e a disposição ética para absorver os provérbios e ditos do sábio, tem-se a condição se o buscares (fíbãqSennâ). BãqaS tem em vista a busca por algo perdido ou de que se deu falta. Gerleman observa que quando o objeto procurado é uma qualidade ou um ideal, o objetivo é satisfazer um desejo ou executar um plano, e o verbo adquire uma nuança emocio nal, “esforçar-se por algo, ocupar-se, preocupar-se” (cp. 11.27; 14.6; 15.14; 17.9,11; 18.1,15).46O sufixo pronominal no singular “o” mostra que não se pretende qualquer distinção entre os termos correlativos “sabedoria”, “discernimento” e “entendimento”. O pai muda a imagem da busca por sabedoria de uma mulher que deve ser chamada para um metal precioso que deve ser buscado (v. 4). A símile, como a prata (kakãsep) se refere à prata minada e refinada, não ao metal precioso em seu estado natural. A referência à prata em vez do ouro pode indicar
um tempo mais antigo em que a prata era mais valiosa que o ouro.47 Seu paralelo quiástico intensificador e como a tesouros escondidos, se refe re a objetos tão valiosos como lingotes de prata e ouro ou pedras precio sas, que precisam ser escondidos em lugares secretos (Is 45.3; Jr 41.8; Mt 13.44), a fim de ficarem protegidos de ladrões (cp. 4.7) .48 A metáfora sugere que é preciso muito esforço e sacrifício para obtê-la (veja 4.7). b. Conseqüência: proteção (2.5-11) (1) A educação religiosa conduz à proteção divina (2.5-8)
5 A recepção da sabedoria e a busca por ela têm como conseqüên cia o conhecimento de Deus e a aquisição do temor do S e n h o r , a dispo sição necessária para internalizar o conteúdo do livro. A partícula lógica e temporal então (’az) liga a causa (vs. 1-4) com a conseqüência (vs. 5-8). Entenderás (tãbin\ veja 1.2, 6 ) significa ver com discernimento pelos sentidos e com entendimento (cp. 2.9; 7.7; 14.15; 19.25). Esse discernimento inclui conhecer “o que é correto, e justo, e íntegro” (2.9; cp. 28.5; 29.7), “ser sábio” (10.23), e ser “longânimo” (14.29), e “guar dar o ensino” (28.7). C. Newsom faz a observação perspicaz de que “a lealdade antecede o entendimento, não vice-versa” .49 O primeiro e prin cipal benefício valioso a ser obtido é o temor do S e n h o r (veja pp. 153154). As condições dos versículos 1-4 revelam o processo psicológico, que inclui seus aspectos cognitivos e afetivos, por meio do qual a chave espiritual do livro é forjada no coração (cp. 1.7). Seu paralelo quiástico e mais explicativo é o conhecimento [veja p. 125; cp. 1.2, 7] de Deus Çelõhim-, veja p. 114), uma expressão rara que se refere, pelo menos em parte, ao ingresso num relacionamento pessoal com o Criador (cp. I.2; Os 4.1; 6 .6 ) . 50 Não se deve argumentar, porém, quanto ao uso de *lõhim em 2.5 e 30.9, pois o nome constitui o paralelo requerido para S e n h o r , como acontece com frequência no Saltério. Em 2.17 “a aliança do seu Deus” é uma cláusula necessária porque “aliança do S e n h o r ” sugeriria a aliança do S e n h o r com Israel e o pronome não pode ser 47. C. A. Robinson, "God the Refincr o f Silver”, CBQ 11(1949) 188-90. 48. ‘“ Posso afirmar por experiência’ - diz o sábio - ‘que pouco proveito há na leitura superficial e desatenta da Bíblia. Faça-o, porém, diária e diligentemente, com atenção e afeição, e descobrirás eficácia tal que não pode ser encontrada em nenhum livro existente’” (Preface to Luke de Erasmo, citado por Bridges, Proverbs, p. 15). 49. Newsom, “Woman and Discourse”, p. 147. 50. O Messias será dotado com o Espírito, conferindo-lhe essa relação com a esfera divina (ls I I . 2).
usado com o S e n h o r ; e em 3.4 a designação “Deus” é usada porque o versículo emprega uma fórmula internacional comum. O “conhecimen to de Deus” não significa a mesma coisa que nosso termo “teologia”, o estudo das questões divinas. Segundo Terrien: Platão e Aristóteles empregaram [teologia] no sentido de “ciência das coisas divinas”. De modo bastante distinto, a expressão hebraica da‘at ’Elõhim, “conhecimento de Deus”, aponta para uma realidade que, ao mesmo tempo, inclui e transcende a investigação intelectual. Ela de signa o envolvimento da personalidade do ser humano em sua totali dade na presença de Yahweh por meio da palavra profética, da cele bração cúltica e do modo psicológico de comunhão em fé.51 Childs observa que Deus é conhecido por meio da obediência à sua vontade revelada (veja 3.6) . 52 Em resumo, “conhecimento de Deus” se refere à intimidade pessoal com ele por meio da obediência à sua Pala vra” (cp. 1Sm 3.7); as noções de resposta cognitiva a essa revelação e de intimidade existencial e obediência são inseparáveis. A metáfora acharás (ou obterás, veja 3.13) liga essa recompensa preciosa que surpreen de a imaginação com as condições figurativas, “clamar” e “buscar” (2.3, 4). 6 Não obstante, ainda que o filho busque a sabedoria, ele não compreende; antes é o S e n h o r quem a concede. Porque introduz a argu mentação e também a explicação do motivo pelo qual o filho conhecerá o S e n h o r (veja pp. 113-114) por meio das palavras do pai. Uma vez que somente o S e n h o r tem acesso à sabedoria (Jó 28.12-28) e a gerou a partir do seu próprio ser (Pv 8.22-24), somente ele dá sabedoria (cp. Dn 2.21,22). O S e n h o r , não Salomão, é o manancial da sabedoria (1 Rs 3.12; 4.29-34 [5.9-14]). Pela graça comum Deus concede algumas for mas de sabedoria a todos, inclusive a sabedoria instintiva dos animais (cp. 30.24-28) o conhecimento prático do agricultor para o cultivo das lavouras (ls 28.26,29) e o entendimento moral que a humanidade pos sui por meio dessa graça comum (Jó 22.22; 32.8). Aqui, porém, a refe rência é a um conhecimento e entendimento religioso e ético especial que o S e n h o r deu a seu povo por meio dos provérbios de Salomão, os quais foram disseminados pelos pais (veja 1.2, 8 ). As palavras do pai 51. S. L. Terrien, The Elusive Presence: Towarda New Biblicat Theology (São Francisco: Harper & Row, 1978), p. 40. 52. B. S. Childs, Old Testament Theology in a Canônica! Conte.rt (Filadélfia: Fortress, 1986), p. 51.
(2 . 1 ) são muito mais precisas e autoritativas que os “instintos humanos, os resultados da experiência, e a lei comum da moralidade”, segundo a opinião de Toy.53 Na verdade, como o paralelo esclarecedor afirma, os ensinos vêm da sua boca, um antropomorfismo que sugere que a boca do pai é representante da boca de Deus ( 2 .1 ) . Aqui o sábio reivindica possuir inspiração e autoridade com Moisés e seus sucessores proféti cos (cp. Dt 5 .2 3 - 3 1 ; 1 8 .1 6 -1 8 ) . Apesar de não martelar sua mensagem com a declaração profética “Assim diz o S e n h o r ” , o sábio usa a ex pressão profética comum, “a boca do S e n h o r [ o disse]” (e.g., Is 1 .2 0 ). A mulher sabedoria pregou como um profeta em 1 .2 0 - 3 3 , e Agur che gou a usar o termo profético “oráculo/encargo” para seu ensino (veja 3 0 . 1 ). A forma de inspiração do sábio é diferente, mas não o fato em si (Hb 1 . 1 , 2 ; veja pp. 9 9 - 1 0 0 ) . Meinhold54 minimiza equivocadamente esta reivindicação afirmando que trata de palavras faladas, não escri tas. Ele interpreta mal a ligação do prólogo ( 1 . 8 - 9 . 1 8 ) com as coleções subsequentes do livro. Conhecimento e entendimento criam uma liga ção ainda mais estreita entre as palavras do pai e sua inspiração divina (veja 1 .2 ,3 , 6 ; 2 .2 , 3 ). Apesar de Fox reconhecer que 3 0 .6 se refere às palavras reveladas, ele nega que 2 .6 sugira uma revelação verbal. Ci tando Jó 2 2 .2 2 e 3 2 .8 , ele argumenta que a sabedoria que Deus dá se refere “ao dom do espírito de sabedoria a um indivíduo ou à comunica ção de princípios de modo não verbal e indireto, mas por meio do espí rito humano” . 55 No entanto Fox falha em comentar sobre o kl (porque) que declara explicitamente a ligação lógica entre 2.5 e 6 . Ele reconhe ce que os vs. 1 -6 organizam os componentes do aprendizado numa cadeia complexa de causalidade, mas não segue a lógica, a qual pode ser esquematizada da seguinte maneira: As palavras do pai (v. 1) >
[dão]
sabedoria e entendimento (vs. 2, 3)
Palavras, Sabedoria e entendimento >
[dão]
conhecimento de Deus (v. 5)
Sabedoria, entendimento e conhecimento <
53. Toy, Pmverbs, p. 36. 54. Meinhold, Sprüche, p. 65. 55. Fox, Pmvebs 1-9, pp. 113-14.
[são dados pela]
É razoável deduzir a partir dessa organização lógica que as pala vras do pai vêm da boca de Deus; isto é, que são verbalmente inspira das. Fox provoca um curto-circuito na argumentação ao fazer do espí rito humano, não das palavras do pai, o instrumento da revelação de Deus. 7 Como resultado desse conhecimento religioso, Deus protege o fi lho, supostamente da apostasia e da morte do homem e da mulher per versos (cp. vs. 12-22). Fox faz um comentário proveitoso: “A proteção de Deus não é uma recompensa extrínseca ao conhecimento, mas sim uma conseqüência intrínseca a ele mesmo” .56 A metáfora ele reserva (veja n. 9) faz uma correspondência entre a atividade recíproca de Deus e a do filho (veja v. 1). Assim como o filho guarda e estima a sabedoria para conhecer a piedade e a ética, assim também Deus guarda como um tesouro oculto a proteção inerente a esse conhecimento. Deus e vida são inseparáveis. Fox, citando Ehrlich, observa que “guardar/reservar” algo para alguém implica exclusividade (veja Jó 21.19; Pv 3.22; Ct 7.13[ 14]).57 A raiz por trás de os retos tem o sentido concreto de algo que é geome tricamente reto e/ou plano (veja 1.3; 3.6). O epíteto metafórico os retos (veja p. 150) indica aqueles cuja conduta não se desvia da ordem divina mente revelada de piedade e ética ou, falando metaforicamente, “dos caminhos” da sabedoria revelada (veja 28.10). Aqui o S e n h o r separa como benefício singular para seus prediletos a virtude do bom senso (ou sucesso, tüsiyâ ) .58 Fox propõe o termo “desenvoltura”, que ele definiu originalmente como “raciocínio claro e proficiente no exercício do poder e operações práticas, distinto do raciocínio como um ato intelectual” 59 e, posteriormente, como “um poder interior, não necessariamente intelectu al, capaz de ajudar um indivíduo a escapar de um apuro” .60 Esse signifi cado se encaixa adequadamente ao paralelo, a metáfora escudo (mãgên), que era carregado pela infantaria leve para repelir lanças e flechas. No entanto, essa tradução não se encaixa bem em 18.1, e provavelmente não é uma palavra moralmente neutra neste livro. A tradução “bom sen so” é mais aproximada e pode ser usada de modo coerente em 3.21; 8.14 e 18.1. Apesar da possibilidade de “escudo” ser uma aposição de “de56. Fox, “ Pedagogy o f Proverbs 2”, p. 239. 57. Fox, Proverbs 1-9, p. 114. 58. Fox, “Pedagogy ofProverbs 2", p. 239. 59. Fox, “Words for Wisdom”, p. 165. 60. Meinhold, Sprilche, p. 65.
senvolto” 61 (cp. Ec 7.12; Ef 6.16), é mais provável que esteja em apo sição a S e n h o r em 2.6a, que continua a ser o antecedente dos prono mes nos versículos 6 b e 7aa. Em outras passagens no Antigo Testa mento (Gn 15.1; Dt 33.29; S I 3.3[4]; 18.2[3], 30[31]; Pv 30.5), o S e n h o r é comparado ao escudo protetor atrás do qual os santos se escon dem. Em 30.5 as palavras e a proteção do S e n h o r se mostram, mais uma vez, inseparavelmente ligadas. Em 2.7 os retos são definidos como aqueles que caminham na irrepreensibilidade (cp. p. 151). 8 Guardando (nsr) denota a situação de proteção e defesa do abandono, do prejuízo ou da destruição (cp. 27.18; 22.12; 24.12). Com objetos na esfera semântica de pessoas e coisas concretas (e.g., uma vinha; Is 27.3; uma figueira, Pv 27.18; caminhos, 2.8; ou filho, 2.11) nsr e Smr significam “guardar” do perigo de modo a preservar (cp. Is 27.3; veja Pv 2.8, 11; 4.13; 5.2; 13.6; 20.28; 22.12; 23.26; 24.12; 27.28; 28.7), mas com objetos na esfera semântica da sabedoria e dos manda mentos, significam preservá-los com cuidado por meio da obediência fiel e submissão (veja 3.1,21; 4.6,13; 6.20; 28.7; cp. 16.17), “protegêlos” de sofrerem qualquer dano. O sentido duplo com frequência per mite um jogo de palavras com os dois significados que resumem o ensi no do livro: guardar os mandamentos e eles/o S e n h o r o guardarão (e.g., 3.21,26). Aqui ele explica o propósito do escudo, que é o próprio S e n h o r . Em 2.8a o S e n h o r guarda o caminho da justiça; no versículo 8 b ele protege aqueles que lhe são leais. O S e n h o r protege as vidas e os inte resses dos santos das lanças dos perversos (vs. 12-15) e das setas da “estranha” (vs. 16-19) à medida que eles andam pelas veredas ( 'orhôt; veja 1.19) da justiça (mispaf, veja 1.3). Essas veredas são protegidas de tal maneira que aqueles que as percorrem alcançam seu destino, a vida eterna (2.19-22; cp. S I 16.9-11). Os termos éticos “retos” e “justi ça” facilitam a transição da piedade religiosa (2 .6 - 8 ) para a ética práti ca (vs. 9-11); a verdadeira religião e a ética são inseparáveis (Tg 1.27). Seu paralelo, o caminho (derek; veja 1.15; 3.17), continua a ligar essa atividade protetora do Deus Todo-poderoso à metáfora básica ou cen tral iniciada em 2.7 com o conceito de “caminho”. A combinação do singular “caminho” com o plural “veredas”, que provavelmente se ra mificam a partir da estrada principal, descreve a vida como um com promisso fundamental com vários padrões de comportamento. Basica-
mente, existem apenas dois caminhos: ser sábio ou ser insensato, bom ou mau, reto ou perverso (cp. 1.15). Um é vida; o outro é morte. Den tro desse compromisso religioso e ético o indivíduo faz outras escolhas éticas (veja 4.26). Normalmente o “caminho da vida” é singular e “os caminhos da morte”, plural (7.27; 14.12).62 O caminho da vida é reto, plano, bem iluminado, aberto e público. Os caminhos da morte são tor tuosos, acidentados, envoltos em trevas profundas e fechados. Os “retos” (2.7) são definidos ainda como os que lhe são leais (de hesed, veja p. 152, n. 1 2 ) - ou seja, aqueles que estão em aliança com Deus e que praticam o amor sincero para com ele, o que implica atos de bondade para com a humanidade, mesmo em meio a situações difíceis (veja 16.17).63 Essas pessoas fazem a vontade de Deus .64 O paralelo quiástico “justiça” mostra que esse compromisso inclui livrarem os opri midos, como o S e n h o r os livra (veja pp. 149-150). Seus opostos são “os que retomam para a insensatez” (SI 85.8[9]) e o “orgulhoso” (31.23[24]). O paralelo quiático é sinônimo de “guardar”, ele vigia (yiêmõr) significa, essencialmente, o exercício de grande cuidado sobre algo. Quando o objeto de sümar e nãsar é a sabedoria ou seus termos correlatos, os verbos significam “observar algo com cuidado de modo a fazê-lo”. Mas quando seu sujeito é o S e n h o r o u a sabedoria, ou ainda, seus termos correlatos, os verbos significam “observar algo com cuida do de modo a protegê-lo” (veja 2.20). Como no caso de rã', “mal” (veja 1.16), seus dois sentidos resumem apropriadamente a ligação entre causa e conseqüência: os ensinos também os guardam/protegem da mesma maneira como eles protegem/guardam as palavras do sábio (veja 2 . 1 1 ). (2) A educação ética conduz à proteção do caráter (2.9-11)
9 A sabedoria e o conhecimento divinos internalizados capacitam o discípulo a discernir o correto, justo e íntegro que o S e n h o r se compro mete a proteger. Então ( ’õz; veja v. 5) remonta a ética do filho ao processo pedagógico de dedicação total ao ensino inspirado (vs. 1 - 8 ). 62. De acordo com Fox, Proverbs 1-9, p. 129. 63. O padrão qStíl pode ter um sentido passivo ou ativo (IBHS, p. 388, P. 5.3c); pace K. D. Sakenfeld (The Meaning o f hesed in lhe Hebrew Bible: A New Inquiry- [Missoula, Mont.: Scholars, 1978]), segundo os quais deve ter um sentido passivo. O sentido ativo é confirmado por seus parale los: “fiel” (S I 12.1 [2]); “vós que amais o S e n h o r ” (97.10); “os que o temem" (85.9, 10); “dos que confiam em ti” (cp. 82.6). 64. H. Ringgren, Spriiche, Prediger, das Hohelied. Klagelieder. das Buch Eslher (ATD 16; Gòttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1967), p. 18.
Entenderás (tãbin) forma um paralelo com a conclusão sumariante com respeito à educação religiosa no versículo 5. O que é correto, e justo e íntegro (sedeq, ümiçpãt umêSãrim) ecoa o objetivo do livro de produzir um comportamento ético que obtém sucesso (veja 1.3). A metáfora aposicional toda boa trilha une essas três virtudes à metáfora do “caminho” que governa esta palestra. Toda (kol) abrange toda a gama de comportamentos éticos que conduzem à vida, paz e prosperidade (veja 3.1-12). Bom ((ôb) qualifica a trilha (i.e., o modo de vida) como sendo desejável pois serve ao propósito para o qual foi criada.65 Trilha (ma'gal; veja 1.15) se refere às “trilhas de carros” ou “sulcos de carros”. Enquan to a terra está fofa, as rodas do carro a compactam, formando as trilhas que outros são obrigados a seguir depois que essa terra seca endurece. 10 Porquanto (k t; veja v. 6 ) valida e elucida explicitamente que o discernimento ético prometido (v. 9) é graças a um coração regenerado. O paralelismo entre os versículos 6 e 1 0 mostra que a sabedoria (hokmâ\ veja 1.2) vem da boca do S e n h o r por meio das palavras do pai (2.6) entrará (tãbô’\ veja 1.27) no teu coração (belibbekã; veja 2.2). O relacionamento entre o S e n h o r e o filho não poderia ser mais íntimo. Esse conhecimento (da'at) espiritual maduro, que mais uma vez é pa ralelo à sabedoria (veja 1.2,7; 2.5), será agradável (yin'ãm ; veja 15.26) ao teu apetite (lenapSeka; veja p. 141). Os profetas chamavam essa transformação das afeições religiosas do coração de “um novo cora ção”, que os capacitava a guardar a nova aliança (Jr 24.7; 31.31-34; 32.37-41; Ez 36.27). Jesus usou a metáfora do nascer de novo (Jo 3.7). No Novo Testamento essa transformação ou regeneração resulta na imagem de Cristo sendo formado na humanidade (Rm 5.5; 12.2; 2Co 4.6, 16). Para os regenerados, a Palavra de Deus é mais doce que o mel (S I 19.10). E, para eles, os mandamentos do S e n h o r não estão escritos em pedra nem se encontram fora do alcance do seu entendi mento; antes estão inscritos espiritualmente no coração e, portanto, cumpridos como um impulso natural e motivo de deleite ( S I 1.2; Jr 31.33; 2Co 3.3). Do contrário, os mandamentos se tornam uma espada que mata (Rm 7.8-11). Em contraste com santos, os pecadores se deleitam na perversidade (1.14; 10.23; cp. Rm 1.32), e a mulher loucura chama o sexo fora do casamento de “doce” e “agradável” (9.17). 11 Uma vez que o coração piedoso se encontra formado e que os
gostos éticos apropriados foram adquiridos, a perspicácia (m ezim m a\ veja p. 146) te vigiará (tiSmõr; veja 2.8), capacitando-te a suportar a tentação, não escapar dela (cp. ICo 10.13; Ef 6.10-18). O entendi mento (fibünâ; veja 2.2, 6 ), que o S e n h o r concede por meio do proces so psicológico analisado nos versículos 1-4, te guardará (tinserekkâ; veja vs. 8 , 1 1 ). O jogo de palavras entre sm r e nsr é estruturado de modo quiástico (nsr/sm r , v. 8 ; Smr/nsr, v. 11) para encerrar a primeira metade da palestra sobre o desenvolvimento do caráter piedoso que defende o discípulo dos ardis e táticas do homem e da mulher apóstatas (vs. 12-19). Não há tensão alguma entre o S e n h o r que protege os san tos (veja vs. 7 , 8 ) e o caráter dos santos os guardar do mal. Assim como a sabedoria de Deus se tomou encarnada nas palavras do mestre, as sim também a proteção de Deus se toma eficaz por meio do caráter formado do filho. c. O propósito da proteção (2.12-22) A sabedoria e a perspicácia que vêm do coração piedoso e ético livram o filho daqueles que o tentam para o dinheiro fácil (vs. 12-15) e o sexo fácil (vs. 16-19), e ambas o colocam no caminho da vida eterna (vs. 2 0 - 2 2 ). (1) Propósito 1: livramento do homem perverso (2.12-15)
A proteção prometida é definida, inicialmente, como livramento dos apóstatas que optaram pelos caminhos tortuosos e escuros em vez dos caminhos retos e iluminados do pai (veja 1.10-19). 2 . 2 e 13 descrevem de modo quiástico os apóstatas (vs. 12b, 13a) e seus caminhos (vs. 12a, 13b), e os versículos 14, 15 explicam suas afeições religiosas (v. 14) e seus caminhos (v. 15). Porém, os versículos 13, 14 também ligam sua disposição interior perversa a seu comportamento mau. O todo também é unido pela repetição dos conceitos de “caminhos” (vs. 12 a, 13b), “veredas” (vs. 13a, 15a), “mal” (vs. 12a, 14a, b) e “perversidades” (vs. 12b, 14b). 12 Livrar (lehassilekà) do caminho (midderek\ veja 1.15) í/o per verso (rã'; veja n. 16; 1.15). Nãsal significa essencialmente tirar, re mover, libertar de qualquer tipo de criatura que segura firme” .66 Assirn como o S e n h o r livrou seu povo de várias situações aflitivas (cp. Êx 18.8; ISm 17.37; Ez 34.12), assim a capacidade religiosa madura e o
conhecimento ético do filho o arrancarão das garras do poder moral perigoso da visão de mundo e de vida do apóstata, o qual poderia con duzi-lo pelo caminho da morte e da qual ele não teria como escapar sozinho (cp. 1.15,16). A promessa pressupõe que o filho se encontra na situação perigosa e que não será inteiramente salvo dela. Em 2.12b o pai limita o caminho tentador do perverso a seu discurso sedutor que compete com as palestras paternas. A graça mediada do S e n h o r é es sencial para salvar o filho do homem que diz (mê’i$medabbêr veja 18.23) palavras sedutoras como os convites para obter riqueza sem considera ção pelos direitos dos outros (1.10-14). Tanto as palavras do pai quanto as dos apóstatas possuem poderes espirituais dinâmicos para o bem e para o mal na comunidade (veja 8.13; 10.31; 17.20). O “mal” é qualifi cado por seu paralelo coisas perversas (tahpukôt; veja p. 165). 13 Mais especificamente, o sedutor perverso tipifica aqueles que abandonaram (ha‘’õzebim) sua herança espiritual (veja 3.3 ). ‘ãzab (“abandonar”) é usado várias vezes na lei e nos profetas para a aposta sia de Israel do S e n h o r e de sua aliança (Dt 2 8.20; 2 9 .2 4 [2 3 ]; 3 1.16; Jr 1.16; 9 .1 2[ 11 ]). Aqui se refere aos homens infiéis que cresceram em lares fiéis à aliança, mas que, como Caim e Esaú, não abraçaram a piedade e moralidade verdadeiras de Israel. A metáfora que governa esta palestra, veredas ( 'orhôt; veja 1.15) retas (yõSõr; cp. 1.3; 2.9), descreve os provérbios e ditos do sábio que se conformam à ordem moral divinamente estabelecida (veja 2.8, 9) e, portanto, oferecem se gurança do caos que se encontra do lado de fora dessas normas (veja 4 .1 2 ). Os infiéis apostatam a fim de andar (lãleket) em caminhos (darkê) de trevas (hõSek), acrescentando à metáfora principal, além do conceito implícito de tortuosidade (veja v. 15), a noção de comporta mentos distantes da luz moral que oferece segurança, liberdade e su cesso (4.18, 19; 7.9; Is 2.5; 42 .6 ; etc.). A metáfora também indica uma ocultação maliciosa de seus comportamentos em nítido contraste com o caminho aberto e franco do sábio, cujas ações são tão inequívocas quanto suas palavras.67 Ptah-hotep descreve os malfeitores e seu mun do desordenado da seguinte maneira: O insensato vê conhecimento na ignorância, Utilidade na maldade.
Ele vive daquilo que causa a morte, Seu alimento é a distorção das palavras.68 14 Este versículo explica melhor e intensifica sua corrupção interior usando os termos absolutos típicos do livro. Da mesma maneira como os versículos 7 , 8 ,11 tendo em vista o caráter moral maduro do filho, assim agora a descrição dos apóstatas como aqueles que se alegram (haésemêhim) em fazer (la'aéôt) o mal (rõ'; veja 1.16; 2 . 1 2 ) aponta para a sua impiedade e imoralidade maduras (veja 4.16, 17). Èãtnah denota que os apóstatas ficam felizes ou se divertem com toda a sua disposi ção, de coração e alma, em sua oposição ao que é bom.6’ Eles recebem os atos de maldade com avidez e a mais pura alegria (veja 1.16; 2 . 1 2 ), como quando o rico explora o pobre. O âmbito semântico de 'ãSâ é bastante amplo, como seu equivalente em nossa língua, “fazer, reali zar”. Suas formas variadas de uso dependem de seus sujeitos e objetos, variando da produção (“fazer”) à ação (“realizar”). Se regozijam (yãgilü), o paralelo exterior de sua alegria interior, expressa abundan tes, entusiasmados e espontâneos gritos de alegria, como os que são ouvidos em teatros de baixo calão e em espetáculos sangrentos em estádios. Fox comenta que, “o comportamento insensato e autodestrutivo não se encontra arraigado na imbecilidade ou na ingênua ignorância, mas num desvirtuamento constitucional da visão moral, numa desvirtuação dos valores” .70 A expressão “em fazer o mal” é intensificada para nas más perversões (betahpukôt rã'; veja v. 12). “Como para o Satanás de Milton, sua palavra de ordem é ‘Ó, mal, sejas tu o meu bem ’ .” 71 15 Da mesma maneira como o versículo 14 qualificou os oradores perversos do versículo 1 2 b, encerrando com a repetição de tahpukôt, agora, cujas veredas ( ’aSer ‘orhõtêhem) qualifica seus caminhos ( ’orhôt; v. 12a). O adjetivo predicativo são tortuosas ('iqqeSim ) indica o oposto de “veredas retas” (v. 1 2 a), a norma pela qual o desvio pode ser medi do. Em outras passagens ‘ãqas é usado com o sentido de distorcer aquilo que era reto (cp. Mq 3.9). De acordo com Brueggemann, é um ato perverso separado da comunidade e contra a mesma a favor do próprio indivíduo (veja 10.9) . 72 Em Isaías 42.16 ele indica lugares aci 68.AEL, 1:74, 75, linhas 577-82. 69. Veja B. Waltkc. TWOT, 2:879, s.v. éãmah. 70. Fox, "Pedagogy o f Proverbs 2”, p. 2 4 1. 71. Aitken, Proverbs, p. 32. 72. W. Brueggemann, “ANeglected Sapiential Word Pair”, ZA W 89(1977) 244.
dentados e tortuosos em contraste com lugares planos e suaves. A pala vra combina a perversidade moral daquilo que dizem e fazem (Pv 8 .8; 19.1; 28.6) com os resultados calamitosos de seu estilo de vida; ela os faz tropeçar e pisar em falso abruptamente (4.12; 22.5). O paralelo, e que são desviados (ünelôzim; da raiz lúz, “desviar, afastar”), ressalta que seus planos e práticas “tortuosos” se afastam do caminho reto da sabe doria. Aqueles que seguem essas práticas em suas trilhas (bema'^ lô tã m veja v. 9) não temem ao S e n h o r , antes o desprezam ( 14.2), e não confiam em sua palavra (ls 30.12) mas antes, na própria conduta desviada e opres sora (Is 30.12). O S e n h o r o s considera repulsivos (Pv 3.32). (2) Propósito 2: livramento da esposa lasciva(2.16-19)
Agora o pai se aproxima do clímax final (vs. 20-22) ao tratar do tema da mulher volúvel e mortal (vs. 16-19). O livramento de sua sedu ção e a conduta sexual apropriada serão suas principais preocupações nos capítulos 5-7. Murphy observa que o assunto é retomado e expan dido em cerca de 65 versículos, “mais... do que qualquer elemento, até mesmo que a mulher sabedoria” .73 16 O paralelo correspondente ao versículo 12 , para te livra (lehassílekã; veja v. 12 ) introduz a esfera sexual da proteção do filho (veja vs. 8-11) da esposa lasciva (mê’iSSâ zãrâ\ veja p. 177), da es trangeira (minnokriyyâ', veja pp. 178-179). Como no caso do apóstata (cp. v. 12 b), o pai adverte sobre as palavras mortais da mulher que tenta o jovem a abandonar as palavras vivificadoras do pai (2.1). Que faz... serem agradáveis como óleo (hehelíqâ; veja 5.3) vem da raiz (II hlq) cujo derivativo nominal é usado para as cinco pedras “lisas” de Davi. O verbo é usado literalmente apenas para o “alisamento” do metal (Is 41.7). Em uma ocasião (Os 10.2) é empregado metaforicamente com respeito ao coração “liso” (i.e., enganoso, falso). Suas outras sete ocorrências (SI 5 .10[ 11];36.3[4]; 55.22[23]; Pv 2.16; 7.5; 28.23; 29.5) se referem ao discurso “agradável” e enganoso. Em 29.5 diz-se daquele que toma suas palavras agradáveis que ele prepara uma armadilha, e o Salmo 55.21(22) afirma que a boca de um inimigo é macia, mas que a guerra está em seu coração. Seu paralelo acrescenta: “as suas palavras eram mais brandas que azeite; contudo, eram espadas desembainhadas” .74 73. R. E. Murphy, “Wisdom and Eros in Proverbs 1-9”, CBQ50 ( 1988) 600. 74. No Hiftl, seus objetos são “ele próprio" (i.e., “ lisonjear/enganar a si mesmo”), “ língua” (SI 5.10; Pv 28.23) e as "palavras” da mulher sedutora (2.16; 7.15).
Além do sentido do verbo “lisonjear” em nossa língua (i.e., retratar de modo excessivamente favorável), a palavra hebraica também tem o sentido de “enganar”. Provérbios 7.13-21 dá expressão concreta às suas mentiras; ela promete se entregar a seu amante enquanto se guar da emocional e espiritualmente visando apenas usá-lo. Ela inflige a morte sobre ele e si mesma, pois tal personalidade dividida, no final das con tas, é destrutiva. 1 7 Por lealdade a seu marido morto Rute se recusou a satisfazer seus apetites sensuais (Rt 3.10), mas essa prostituta lasciva transgride deliberadamente o compromisso com seu marido piedoso (2.17a) e, ao fazê-lo, profana a aliança de Deus com ela (v. 17b). A qual abandona (ha^õzebet) esboça muito apropriadamente seu defeito mortal de infideli dade, o mesmo defeito usado para definir o homem perverso (v. 13). A sociedade desleal aos acordos verbais se desenreda e se desintegra rapi damente em anarquia. O com panheiro da sua m ocidade ( ’a llü p neüreyhã ) é uma metonímia para o seu marido como seu mestre (pp. 167-168). No paralelo sintético, se esquece (Sakêhâ; veja 3.1) significa que ela se separa de sua submissão anterior (veja 3.1), um sinônimo equivalente a “abandonar”. Sua aliança (berít ) significa uma “imposi ção” ou “obrigação” colocada sobre ela, mais especificamente, suas obrigações conjugais, e o acréscimo de com Deus (^ lõheyhã ; lit. “de seu Deus”) sugere que o Criador é testemunha e fiador, e o possível autor das suas obrigações conjugais (veja pp. 167-168).75 18 Assim como o versículo 17 é paralelo ao versículo 13 na carac terização dos apóstatas, os versículos 18,19 são paralelos ao versículo 15 na caracterização do seu caminho ( netibãtâ ; veja n. 24; 1.18) e das suas trilhas (m a '^lõ teyh ã ; veja 1.18b). O jovem que segue o caminho dessa mulher em troca dos seus favores sexuais descobrirá que esse caminho conduz (Sãhâ\ veja n. 24) à morte (m w t),76 que provavelmen te é uma alusão ao deus cananita Mot, cuja garganta escancarada é o portal para a sepultura. Se esse é o caso, trata-se de uma mitologia enfraquecida (i.e., uma imagem literária usada como símbolo daquilo que o mito representava). A boca da meretriz também é descrita como uma cova profunda (22.14), e ela própria é uma vala funda. Em outro lugar no prólogo, seu marido ciumento vinga a ofensa (5.7-14; 6.29-35), mas, por fim, o S e n h o r garante a morte dos voluptuosos (5.21-23), da 75. M. Weinfeld, TDOT, 2:255, 256,261. 76. Cp. Gálatas 5.19-21; Efésios 5.5; Apocalipse 21 .8; 22.15.
mesma maneira que ele conduziu o infiel Sansão à sua morte trágica por meio de Dalila (Jz 16.1 -22). Em Israel, a mulher e o homem adúlte ros deviam ser mortos pela comunidade (Lv 20.10; Dt 22.22), mas a prostituição, ainda que detestável, não era um crime capital (Lv 19.29; Dt 23.17[ 18], 18[19]). Essas trilhas ( m a ^ lõ t; veja 2.9, 15; cp. 5.6) íngremes [conduzem] ao reino dos mortos (r^pã^m), a comunidade dos mortos que habitam a morte.77 Em seu estudo exaustivo de ^p& im , M. Brown conclui que “a etimologia de i^p&trn não é clara e a ligação histórica e/ou ideológica entre as nuanças, o Refaim étnico e o rpum ugarítico (se havia, de fato, tal ligação) continua difícil de se reconsti tuir”. As versões antigas também não são de muita ajuda, pois con fundiram o Refaim étnico nos oito livros históricos com as oito ocorrênci as de ^pã^m (sempre no pl.) nos livros poéticos (veja Jó 26.5; SI 88.10[11]; Pv 2.18; 9.19; 21.16; Is 14.9; 26.14, 19)78 e em algumas ocasiões pontu aram a palavra como rõpe‘im, “médicos”. Esses textos poéticos se refe rem figurativamente a cadáveres na sepultura, e nenhuma revelação é oferecida além daquela que qualquer um pode observar acerca dessa situação (veja a nota sobre o Sheol em 1.12). R?pü’im é um equivalente poético de mêtim na prosa; são uma comunidade massificada de cadáve res separados do reino da vida, não “fantasmas” ou “espíritos mortos”. 19 Este versículo desdobra a metáfora do versículo 18 de um estrada íngreme que conduz à morte. Todos (kol) - sem exceção - que não estiverem protegidos por um relacionamento com o S e n h o r e um caráter espiritual maduro, e que se dirigem a ela (bã’eyhã, que foi tra duzido como “dormir com” pela NVI em Gn 16.2; Pv 16.29; e “foram” em Gn 6.4) é uma imagem poderosa para coire cum femina, tomando a própria mulher o orifício da morte, não voltarão (^Sübün; veja 1.23) do reino dos mortos. O mito sumério-acadiano acerca da Descida de Istar ao Mundo Inferior pode ajudar a mediar as alusões literárias que o poeta tem em mente. O mito se refere à terra dos mortos como “a terra 77. Nas historiografias de Josué, Samuel e Crônicas, r^pS 'ím designa um ou mais grupos étnicos assentados cm locais específicos em Canaã. Contrastando com isso, suas oito ocorrências (sempre no pl.) na literatura sapiencial e profética (Jó, Salmos, Provérbios e Isaías) se referem ao reino dos mortos. O Antigo Testamento não apresenta nenhuma revelação sobre eles além daquilo que qual quer um pode observar nos corpos numa sepultura. 78. McKane, Proverbs, pp. 287-88. S. Talmon (“ Biblical r^pR‘ím and Ugaritic rpu/il(m)", HAR 7 [ 1983] 235-49) conjeturam que no processo de sua transferência para a literatura hebraica, uma identificação errônea com o componente mt no epíteto repetido mi rpi para Danil nos textos de Aqht (nos quais mt significa "homem de...”) com a raiz hebraica mwt (“morto" ou “morte”) contribui para a associação de repS’ím com o mundo dos mortos.
sem volta”, “a casa escura”, “a casa que ninguém deixa depois de entrar”, “a estrada sem volta”, “a casa na qual aqueles que entram são privados da luz, onde o pó é sua mesa e o barro seu alimento, (onde) não veem luz alguma e vivem na escuridão” .79 Mais uma vez não se pode formar qualquer teologia acerca da vida após a morte com base em metáforas bíblicas de mitos enfraquecidos que descrevem cadáve res na sepultura (veja 1 . 1 2 ). O paralelo quiástico e não alcançarão ( welõ'-yaééigü), ressalta que ninguém que se junta aos mortos pela vontade dela escapará alcançando, finalmente, as veredas ( 'orhôt\ veja 1 .1 9 ; cp. 2 . 8 , 13, \ 5)da vida(hayylm ; veja 1 8 .2 1 ). Nesse livro, na maior parte das vezes o termo “vida” se refere à vida eterna abundante que vai além da morte física, a qual é apenas uma sombra ao longo do caminho da vida (veja pp. 1 5 7 -1 6 1 ). Uma vez que os provérbios são modelos que servem de referência para o indivíduo julgar a vida nas várias situações, essa infidelidade sexual no registro histórico pode servir de paradigma para a infidelida de espiritual ao S e n h o r num registro simbólico de significado. A infide lidade sexual de Salomão contribuiu para a sua infidelidade espiritual; a esfera sexual e a espiritual se interpenetram existencialmente. Os profe tas usaram frequentemente o casamento como uma metáfora para o relacionamento de Israel com o S e n h o r . Em outras palavras, seu rom pimento do contrato de casamento ilustra os filhos da aliança que hoje rompem seu contrato com Cristo. Um nível supra-histórico de significa do também é sugerido pela representação da mulher sabedoria no regis tro puramente simbólico. No entanto, convém repetir que o nível primá rio de significado é o histórico, como indicado pela descrição detalhada feita pelo pai dos engodos da mulher e dos argumentos econômicos, não religiosos, nas palestras subsequentes. d. Conclusão: vida na terra versus morte (2.20-22) Como na segunda palestra (veja 1.19), o pai termina a terceira pa lestra com uma generalização do livramento da morte com base no livramento específico das mãos da mulher e do homem perversos. 2.20 faz a ligação lógica desta conclusão com as estrofes anteriores e os versículos 2 1 -22 , usando a palavra-chave 'eres, contrastam a elimina ção dos perversos da terra com a sobrevivência dos retos nela.
20 H. A. Brongers mostra que a partícula lógica assim (lem a'an deve, por vezes, ser interpretada como elíptica e parafraseada: “isto terá como conseqüência...” (cp. Êx 10.1; 11.9; Is 30.1; Jr 44.8 ).80Aqui as palavras-chave são derek “caminho” (2 . 12 , 20 ), ’orhôt “veredas” (vs. 8, 13, 19, 20) e “trilhas”. Os caminhos de trevas e tortuosos dos malfeitores (vs. 12,14,15) e da esposa infiel conduzem à morte eterna (vs. 18,22), não à vida (v. 19), mas os caminhos daqueles que são bons lhes garantem a continuidade da vida na terra depois que os perversos forem exterminados dela (vs. 21, 22). Certo dessa verdade, o pai pro mete ao filho: andarás no caminho (têlêk derek\ veja 1.15; ligado a 2.7, 13) dos que são bons ((ôbim; veja 2.9). Quando aplicado a pesso as, dependendo do contexto, esse termo enfatiza uma excelência espe cial ou uma qualidade positiva que os torna desejáveis.81 A julgar por seu uso no versículo 9 e por seu paralelo, “justos”, a referência é à sua excelência moral e ética. Eles cumprem o propósito do comportamento humano esperado por Deus. Os termos paralelos a “bom”, são “justi ça”, “retidão” (cp. Jó 34.4; Mq 6 .8), e “honestidade” (Dt 12.28; Jr 40.4). Aqueles que guardam a aliança agem no melhor interesse de Deus e dos homens, não de si mesmos, ao contrário dos apóstatas. Eles trazem à terra o governo beneficente de Deus. Assim como 2.20a se liga ao versículo 9b, assim também em versículo 20b o paralelo quiásti co nas veredas (we ’orhôt, ligado aos vs. 8, 13, 15, 19) dos justos (saddiqim ) se junta ao versículo 9a. Os justos são aqueles cujo caráter e conduta os levam a fazer o que é certo para com os outros numa relação de aliança com Deus (veja 1.3). O outro paralelo quiástico é permanecerás (tism õr ; veja v. 8). “Os sábios estão mais preocupados com as conseqüências para aquele que realiza o ato do que com a especificação da conduta çdq (veja 10.25,30; 11.28,30; 12.3,7; 15.6).”82 2 1 0 advérbio certamente (ki\ veja v. 18) enfatiza o dito provavel mente bastante conhecido dos versículos 2 1 , 22 , que são ligados pelo vau inicial no versículo 22 (cp. 10.30; SI 37.9,11,22,28,29,34,38). Os retos {^sãrim ; veja 1.3; ligado a 2.7) habitarão (yiskenü\ veja 1.33) na terra Çeres). A palavra “terra” pode se referir, entre outras coisas, ao solo arável em geral ou a Israel em particular. Caso este fosse um texto da lei e dos profetas, estaria sem dúvida se referindo à terra que 80. H. A. Brongers, “Im n in der biblisch-hcbraischen Sprache", OtSt 18(1973) 89. 81. K.-D. Schunck, TDOT, 5:306. 82. K. Koch, TLOT, 2:1058, s.v. sdq.
o S e n h o r concedeu a seu povo da aliança em Canaã. Mas na literatura sapiencial, que trata a humanidade separadamente das alianças históri cas de Israel, o mais provável é que ereç se refira ao solo em geral com sua fartura (Gn 27.28), produção (Lv 26.4,20) e frutos (Nm 13.20); como tal, é uma metonímia para vida .83 A terra boa faz um contraste claro com a sepultura que contém os mortos (2.18, 19). A promessa, porém, é como as promessas da terra para Israel: ambas são a dádiva culminante do S e n h o r para seu povo; ambas tomam a permanência na terra dependente da obediência aos mandamentos de Deus (Dt 4.1; cp. Êx 20.12; Dt 5.16; 25.15); ambas concretizam suas bênçãos para aque les que são leais a ele (Dt 28.1-14); e ambas ameaçam os desleais de serem arrancados dessa terra (Dt 28.15-68). Não obstante, essas afir mações semelhantes não as tomam equivalentes exatos. Como os “re tos” em 2.21 a remetiam ao versículo 7a, agora o paralelo, e os irrepre ensíveis veja 1.12; ligado a 2.7), remete ao versículo 7b. Serão deixados (yiw wãfírü) significa, essencialmente, “restarão”. Depois que os perversos forem exterminados da terra boa, os sábios permanecerão (cp. Zc 13.8; Mt 5.5). Greenstone diz: “O retrato apre sentado aqui é de uma terra que foi purificada de todos os perversos, deixando nela somente os habitantes puros e retos (Ibn Ezra; cp. Is 60.21 [Mt S.S])” .84 22 Em contraste claro tem-se mas os perversos (ür^Saim ), que, de acordo com K. H. Richards, são os culpáveis e sempre referidos em termos de uma comunidade.85Rã$a', “perversidade”, é o antônimo mais importante de sedeq (“retidão”, fidelidade à comunidade; veja v. 20 ). “Em contraste com a raiz positiva sdq, rs' expressa o comportamento negativo - pensamentos, palavras e atos maus - o comportamento antissocial que revela, simultaneamente, a desarmonia e a inquietação interiores da pessoa (Is 57.20).” 86 Nesse livro, r^sê^tm se refere aos ímpios que são gananciosos (10.3; 21.10), violentos (10.6), que amea çam vidas inocentes (12.6; 24.15), praticam o engano (12.5) e a cruel dade (12.10), e falam perversamente (10.32; 11.11; 15.28; 19.28). O S e n h o r detesta esses indivíduos e seus caminhos (15.9, 29), inclusive 83. Comparar Salmo 37.9, II, 29, 34 com Mateus 5.5. 84. Greenstone, Proverbs, p. 24. 85. K. Richards, “A Form and Traditio-historical Study o f rs‘ " (Dissertação de Ph.D.. Clarcmont, 1970) (cp.ZAW 83:402). 86. C. van Leeuwen, TLOT, 3:1262, s.v. rs'.
seus sacrifícios (15.8; 21.27) bem como todos aqueles que os ajudam no tribunal (17.15; cp. 18.5; 24.24). Sua sentença judicial é: serão eli minados da terra ( mê'eres yikkãrêtü) sua fonte de vida física (10.30; 14.32; 15.25;M t3.10).Kõraí,noM /ü/, com sujeitos pessoais, significa “aniquilaçâo” e normalmente é usado com preposições e com o grupo do qual a pessoa é removida num anúncio de julgamento, como é o caso aqui.87 Mays sugere que o verbo “eliminar” (kãrat ) tem os tons purifi cadores das leis de excomunhão de Israel (e.g., Lv 17.10; 19.19; 20.3, 5,6,18),88 uma medida sagrada destinada não apenas como julgamento sobre uma pessoa, mas também para preservar o povo como um todo diante da ira do S e n h o r contra aquilo que não é santo. Vuilleumier acres centa que o verbo designa a excomunhão por exterminação.89Aqui os perversos serão eliminados porque profanam a terra e ameaçam a re lação dos retos com seu Deus.90 Pode-se inferir que o S e n h o r , que protege os seus santos retos, eliminará os perversos, apesar do texto não dizer que ele o fará. Aqui, a terra também serve de metonímia para os retos que são deixados no solo arável que sustenta a vida. No paralelo enfático, os perversos também são chamados de os traiçoeiros (bôgedim; veja 11.3,6; 13.2,15; 21.18; 22.12; 23.28; 25.19). Bãgad expressa a infidelidade de uma pessoa a um relacionamento existente e estabelecido. Mais especificamente, as pessoas em vista são homens e mulheres “que abandonaram” sua herança de um relaci onamento com Deus e com seus mestres (veja 2.13, 17; cp. S I 25.3). 2 .2 1,2 2 dividem a comunidade extema da aliança em dois grupos: aqueles que são inteiramente comprometidos com o S e n h o r e seus ensinos e aqueles que se recusam a honrar esse acordo que lhes foi transmitido por seus pais fiéis. O paralelo metafórico sinônimo serão arrancados (yissehü\ veja n. 26)91 dela (m im m ennâ ) volta a enfatizar que os após tatas culpáveis não herdarão a vida na boa terra (cp. Dt 28.63).
87. Cp. E. Kutsch, TL.OT, 2:636, s.v. krt \e Eugene Carpenter, NIDOTTE, 2:279, s.v. Krt. 88. J. L. Mayes, Micah (OTL; Filadélfia: Wcstminstcr, 1976), pp. 125-26. 89. R. Vuilleumier, “ Michée”, in Michée, Nahoum. Habacuc, Sophonie, por R. Vuilieumier e C.-A. Keller (CAT l lb ; Neuchâtel: Delachaux & Niestle, 1971), p. 66. 90. Para G Von Rad (Der heilige Krieg im alten Israel [Gõttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1952], pp. 13,19,68-69) o desenvolvimento das leis de excomunhão remonta à apresentação das guerras santas do S f n h o r e às tradições sobre a dádiva da terra, com a diferença de que. em vez dessas leis serem executadas por pessoas, o próprio S e n h o r realiza a purificação da terra. 91. Ysh ocorre quatro vezes (Dt 28.63; SI 52.7[9]; Pv 2.22; 15.25).
4.
Terceira palestra: as prom essas do filho (3.1-12)
S
enhor
e as obrigações do
1 Filho meu, não te esqueças do meu ensino, 1 e que teu coração guarde os meus mandamentos 2 porque extensão de dias e anos de vida, e paz e prosperidade eles lhe acrescentarão.2 3 Que a bondade e a fidelidade não te deixem; ata-as ao teu pescoço ; 3 4 e encontre 4 favor e boa reputação aos olhos de Deus e da humanidade. 5 Confia no S enhor com todo o teu coração, e no teu próprio entendimento não confie ; 5 6 em todos os teus caminhos deseje sua presença6 e ele fará retas e planas as tuas veredas. 7 Não sejas sábio aos teus próprios olhos; teme ao S enhor e afasta-te do mal; 8 que haja cura para o teu umbigo,1 e refrigério 8 para os teus ossos. 1. O termo nomitiõn na LXX foi induzido pelo paralelo rhêmata (< miçwôt, pi.). 2. Para o assim chamado verb. masc. com sujeito fem. veja 1.16. 3 .0 TM, Vulg., Targ. e Sir. acrescentam “escreve-as na tábua do teu coração”, mas essa frase é omitida na LXX B-s. E mais provável que o acréscimo seja um comentário mais antigo de 7.3 (veja L. H. Brockington, The Hebrew Text o f the Old Testament [Oxford: Oxford University and Cambrid ge: Cambridge University, 1973], p. 157) do que uma haplografia no texto original da LXX em razão de a homoioteleuton (grgrw tyk... Ibk). 4. Formas volitivas podem introduzir forçosamente conseqüências lógicas (IBHS, p. 572, P. 34.4), mas a ligação lógica entre a forma volitiva nos vs. 3 e 4 depende de significados léxicos, não da construção gramatical (IBHS, p. 577, P. 34.6a; p. 653, P. 39.2.5; GKC P. 11005. A LXX “não te interesses por" parece uma suposição para essa ocorrência ímpar de s'n em Provérbios. 6 .0 termo autSn (“ela”) na LXX pode se referir a sophia (< btná, "entendimento”) no v. 5. 7. A LXX, seguida pela NRSV lê sõmati (
9 Honra ao S enhor com tua riqueza, com as primícias de todo o teu lucro, 1 0 e os teus celeiros se encherão com abundância,9 e os teus barris transbordarão com vinho novo. 11 A disciplina do S enhor, fü h o meu,'0 não rejeites, e não detestes sua correção, 1 2 porque a quem o Senhor ama ele corrige, exatamente1' como o p a i 12 ao filh o em quem ele se deleita. O capítulo 3 contém a terceira (3.1-12) e a quarta palestras (vs. 1335), marcadas por seus temas, sintaxes, padrões estruturais e outros ar tifícios retóricos distintos e dirigidas novamente ao “filho meu” (vs. 1 , 2 1 ). Juntas, elas desenvolvem a segunda palestra (2.1 -22): de aceitar as pala vras do pai (2.1 -4) para guardá-las e não deixá-las (3.1,21), de promes sas de conhecer a Deus (2.5) e de vida eterna nos caminhos dos bons (2.20-22) para uma ordem para desejar a presença de Deus em todos os caminhos do filho (3.6), da sabedoria de Deus revelada ao pai (2.6) para o estabelecimento da criação por meio da sabedoria (3.19, 20), da pro messa de que seus ensinos conduzem à vida abundante com os bons e o salvam da morte com os perversos (2 .20 -22 ) para a promessa expandida de vida e salvação feita pelo S e n h o r ofendido, que amaldiçoa os ímpios e os imorais (3.31-35), e das bênçãos espirituais de uma educação religiosa e ética (2.5,9) para as bênçãos palpáveis da saúde, riqueza e prosperida de. Essa relação pode ser esquematizada da seguinte forma: tratamento” ) seja uma suposição baseada no paralelo iasis (< rip'út, “cura” ). A palavra hebraica norm alm ente significa “beber” ou “regar”, o oposto de “ murchar, secar” (Jó 21.24; 30.30; SI 2 2 .16[17]; 32.4; Pv 15.30; 17.22). É entendida como uma figura para refrigério (BDB, p. 1.052; Toy [Proverbs, p. 61], NASB, NRSV), alimento (NV1), medula, rega (AV) e unguento (REB). 9. Ou “cereal”. Na LXX, sitõu (< sebet, “cereal"), representando uma ligeira diferença de Sb' do TM, parece oferecer o paralelo mais apropriado para “ vinho novo” . Mas H. L. Ginsbcrg (citado por M. Dahood, Proverbs and Northwest Semitic Philology [Roma; Pon tificai Biblical Institute, 1963], p. 9) observa o paralelo Sb' wtrs, “vinho novo e abundan te”, na inscrição fenícia Karatepe (III, 7, 9). 10. A LXX, Sir. eTarg. transpõem “meu filho” para uma posição inicial. ll.O . Plõger (Sprüche Salomos [Proberbia] [BK.AT X V ll/l; Neukirchen-Vluyn: Neukirchener, 1981 ], p. 32) elimina o verbo de ligação, mas seu uso exegético é amplamente atestado (1BHS, pp. 652-53, P. 39.2.4). 12. Mastigoi, “ele surra/açoita” (< Heb. yak ‘ib, “ele causa dor”) da LXX pode ser preferível, pois o TM apresenta uma referência ímpar a Deus como Pai em Provérbios. No entanto, esse caráter excepcional pode fazer do TM a leitura mais difícil e, portanto, favorece que seja mantida em detri mento daquilo que pode ser uma leitura facilitada.
C o n s e q ü ê n c ia s esp iritu ais de 2.1-11
C ondições d e 3.1-12
C o n s e q ü ê n c ia s te m p o ra is
Entender o que é correto (2.9)
Q ue a bondade nun ca te deixe (3.2)
Favor social (3.4)
C onhecer a Deus (2.5b)
C onhecer ao S e n h o r (3.6a)
Veredas retas (3.6b)
Tem er a o S e n h o r (2.5a)
Tem er ao S e n h o r (3.7)
Saúde (3.8)
Essa ligação m ostra que as adm oestações condicionais da terceira palestra requerem obediência aos ensinos do pai (3.1). A palestra com eça se dirigindo novam ente ao filho meu (veja 1.8) e traz um a adm oestação para prestar atenção à instrução dos pais (3.1) seguida da m otivação porque (k i , v. 2). A repetição do padrão nos versículos 1 1 ,1 2 encerra a palestra, m as nesse caso a adm oestação som ente precede a indicação do filho com o o destinatário, criando des se m odo um a conclusão m ediante o quiasm o (i.e., destinatário + adm o estação [v. 1], adm oestação + destinatário [v. I I ] ) ,13 seguido de ki (vs. 2, 12).14A palestra consiste em seis quartetos, cada um apresenta um a (v. 9), duas (vs. 1 ,3 , 7, 11), ou três adm oestações (vs. 5 , 6a) nos versí culos ím pares e um argum ento m otivador nos versículos pares, que contêm um a (vs. 4, 6b) ou duas prom essas (vs. 2, 8, 10), ou um a razão (v. 12). O pai com eça com sua introdução típica para ouvir seu ensino com um a razão m otivadora. O corpo é constituído de ordens acerca da piedade com m ais razões m otivadoras e conclui com um a adm oestação para não rejeitar a disciplina do S e n h o r acom panhada de um a razão m otivadora. A palestra pode ser esquem atizada da seguinte forma: A d m o e s ta ç ã o /c o n d iç õ e s
A rg u m e n to /p ro m e s s a s
Introdução 1. G uarda os m eus m andam entos
2. Vida e paz
3. Não deixes o am or infalível
4. Favor com Deus e com as pessoas
13. M cKane ( Proverbs, p. 289) observa que a instrução egípcia “meu filho” também pode ser uma expressão retomada. 14. Extraído de P. Overland, "Literary Structure in Proverbs I - 9 ” (dissertação de Ph.D., Brandeis University, 1988), p. 303.
Corpo 5. C onfia no S e n h o r
6. Vereda reta
7 . Teme ao S e n h o r
8. Cura
9. Honra ao S e n h o r
10. Prosperidade
Conclusão 11. N ão rejeites a disciplina
12. Prova do am or “do pai
Fundam entando seus ensinos ainda m ais firm em ente no S e n h o r do que fez em 2.6, as adm oestações do pai envolvem um cham ado para preservar seu ensino (3.1), para reter o com portam ento ético aprendido (v. 3), para a piedade ativa: confiança (v. 5), hum ildade (v. 7), adoração (v. 9) e subm issão (v. 11). C. N ew som observa que o pai com eça usando o paralelo “m inha lei” e “ m eus m andam entos”, que “apresenta resso nâncias da tôrâ e miswôt de Deus a Israel e, portanto, sutilm ente asso cia o pai à autoridade divina” . Ela observa ainda que seus apelos para que o filho tenha um relacionam ento correto com o S e n h o r ( v s . 5-12) são paralelos “em estrutura e m otivação [ao] pedido do pai nos versícu los 1-4 para que o filho o obedeça” . Por fim, ela com enta que, “N ão é de surpreender que... a passagem term ine no versículo 12 com a m etá fora de Deus com o um ‘pai que repreende seu filho’ ” .15 Som ente o S e n h o r pode oferecer as recom pensas recíprocas dos versículos pares: vida longa e paz (v. 2), favor com Deus e com as pessoas (v. 4), um a vereda reta (v. 6), cura com pleta (v. 8), colheitas abundantes (v. 10) e o am or de um Pai celestial (v. 12).16 A introdução se refere a não abandonar o ensino do pai (v. 1), o que é resum ido pelas m etoním ias “am or e fidelidade” (v. 3). O corpo asso cia os ensinos éticos com a confiança em Deus, o tem ê-lo e o honrá-lo. Pode-se observar tam bém a intensificação de um a ordem referente à ética (v. 3), para um a referente à piedade (v. 5), para as duas dim en sões (v. 7). Com o em 2.5-8 e 9-11, a palestra não adm ite a separação das esferas religiosa e ética. N ão obstante, sua ênfase está na piedade. A conclusão se refere ao não-cum prim ento das prom essas. A s discipli 15. Newsom, “Woman and the Discourse o f Patriarchal W isdom”, pp. 149-51. 16. A forma dessas adm oestações se assem elha à instrução egípcia, m as a sabedoria israelita tem um a dim ensão muito mais forte que a sabedoria egípcia e a babilônica. J. Fichtner (Die altorientalische Weishei! in ihrer israelitisch-jiidischen Ausprcigung [BZAW 62; Giessen: Tõpelmann, 1933], pp. 55-56) comenta: “ Assim que se chega ao v. 3, fica evidente que o clima desta passagem é, de fato, bastante diferente do das Instruções internacionais”.
nas de D eus são p lan ejad as de m an eira h eu rística v isan d o c o rrig ir o filho para q u e ele d esfru te d a s p ro m essas. Esses benefícios palpáveis devem ser m atizados p o r provérbios opos tos que falam de privações antes do seu cum p rim en to (veja pp. 161-164). a. Introdução: admoestações para preservar o ensino do pai
(3.1-4) 1, 2 O pai co m e ç a firm an d o o filh o no meu ensino (ou catecism o , tôrãti; veja 1.8) qu e, na ed ição final de P ro v érb io s, se refere a to d as as suas in stru çõ es, q u e r n o p ró lo g o (e.g ., 3 .2 7 -3 5 ) q u e r nas c o leçõ es de p ro v érb io s e d ito s (1 0 .1 -3 1 .3 1 ). O pai é o p o rta -v o z d e seu e d ito r final (veja pp. 108-109). O co letiv o “ m eu e n sin o ” é d e sd o b rad o com o meus mandamentos ( miswôtay; v eja 1.8; 2.1). Não te esqueças Çal-tiskãh; veja 2 .17) p ro íb e o filho de se a fa sta r d os v a lo re s de Israel e se ju n ta r aos ap ó statas (v eja 2 .1 3 ,1 7 ). Guarde (yissõr; v eja 2.8 ) im p lica co lo c ar em p rática o s m an d a m e n to s q u e p ro v av elm en te fo ram m em o rizad o s (veja 1.8; 2.8). Porque in tro d u z m o tiv açõ es se m elh an tes àq u elas em D eu tero n ô m io 5.33 e o rien ta a au d iên cia a in te rp re ta r as form as v o litivas, em pelo m en o s 3.4 e 8, co m o p ro m essas v iv id as e en fáticas. A rec o m p en sa d o filh o p o r n ão d a r as co stas a seu pai é u m a v id a em paz. A extensão de dias ( 'õrek yãmim\ veja p. 157) é atrib u íd a em outras p assag en s à sab ed o ria (3 .1 6 ) e ao te m o r do S e n h o r ( 3 .16a), su g erindo que o en sin o d o pai é co rre la tiv o ao te m o r do S e n h o r (v eja 1.7). A s o b rigações p actu ais do filh o de g u a rd a r os m an d am en to s de seu s p ais e a p ro m essa d a alian ça do S e n h o r d e lhe c o n c e d e r vid a longa são se m e lhantes ao q u in to d o s D ez M an d am en to s. M as a e x p re ssã o “ g u ard e os m eus m an d a m e n to s” em v ez de “h o n re ” su g ere q u e S alo m ão e stá fa lando seg u n d o a p ró p ria a u to rid a d e (D t 5.1 6 ; cp. Ex 2 0.12; E f 6.2). O s dias são u n id ad es c u rtas de tem p o e anos ( üsenôt são u n id ad es lo n gas). De vida (hayyim; v eja 2 .1 9 ) se refere à v id a ab u n d a n te em c o m u nhão com o D eus v iv o e e te rn o (v eja pp. 157-161). A q u e b ra de v erso e paz e prosperidade (sãlôm) q u a lific a e ssa v id a co m o tendo toda su ficiên cia e felicid ad e, livre de h o stilid ad es e c arê n cias e, d esse m odo, rep leta de c o n te n ta m e n to interio r, d eleite, a le g ria e p raze r com o um a d á d iv a de D e u s .17 A n o s in fin d áv eis sem paz são um a m aldição. 17. G Gerleman(7Y.07', 3 :1343, s.v. sim) traduz sslôm com o “ter suficiente". J. I. Durtiam (“Sãlôm and the Presence o f G od”. in Proclamalion and Presence: Old Testament Essays in Honour
Acrescentarão (yôsipü ; veja 1.5) com os objetos “dias” e “ anos” signi fica um aum ento em núm ero e com os objetos “paz” e “prosperidade”, um aum ento em tam anho. Lhe (lãk ) enfatiza que o próprio filho é o recipiente dessa dádiva extraordinária. Em resposta ao pedido do rei por vida (hayyim ) o S e n h o r lhe concedeu “longevidade [extensão de dias] para todo o sem pre” ( 'õrek yãm im 'õlãm wã'ed, S I 21.4[5]). 3, 4 Agora o pai equipara o seu ensino com a ética (veja 2.9).18 Ele os resume usando as metonímias bondade e fidelidade (hesed we^met; veja p. 152). Ao contrário da maioria dos com entaristas, Fox argumenta que a expressão “bondade e fidelidade” se refere à bondade de Deus para com o aprendiz, pois não se diria que hesed we^emet do aprendiz deixaram o filho, m as sim que ele as deixou. N o entanto, para isso Fox se vê obrigado a pressupor, em oposição às regras de redação, que “ata-as” no verseto B se refere não ao paralelo e antecedente m ais próxim o hesed we^emet, mas ao ensino e aos m andam entos no versí culo 1.19Além disso, se é possível dizer em 20.28 que hesed we^emet o preservam em segurança, por que não se pode dizer: “que estas tuas virtudes nunca te deixem ?” Em 16.6 pode-se encontrar a m esm a com binação de hesed we^emet com o “tem or do S e n h o r e apartar-se do m al” que vem os nesta passagem (3.3, 7), sugerindo que, assim com o a últim a é um a virtude hum ana, tam bém o é a prim eira. Por fim, a estru tura geral da palestra favorece a interpretação da m aioria. Esta estru tura indica que as duas virtudes são, de fato, m etoním ias para o ensino e os m andam entos do pai que o filho deve atar em tom o do seu pescoço (cp. 6.20, 21; 7.1-3). As m etoním ias com binadas resum em a essência das ordens do pai e encontram um a exem plificação excepcional em 3.27-30. D. H ubbard com enta que essas virtudes “ influenciam todas as escolhas e ações” (cp. Os 4 .1-3).20 C ontrastam nitidam ente com o ego ísm o e a infidelidade dos perversos (1.10-19; 2.16) e da esposa lasciva (2.17). U m a vez que o paralelo se refere a hesed w ^m et com o plural o f G. H. Davies, orgs. J. I. Durham e J. R. P orter [Richm ond: John K nox, 1970], p. 280) afirma que sslôm descreve "um tipo abrangente de cum prim ento ou conclusão, de fato, uma perfeição em vida e esp írito que transcende qualquer sucesso que o hom em , m esm o nas circunstâncias m ais favoráveis, é capaz de alcançar por si m esm o” . 18. U m a co m p a ra ç ã o com p assa g e n s se m e lh a n te s em 6 .2 0 , 21 e 7 .2 , 3 m o stra que "bondade e confiabilidade” são m etoním ias para os ensinos/m andam entos do pai (veja 3.1), m ais especificam ente, aqueles que se referem à ética. 19. Fox ( Proverbs 1-9, pp. 144-45), R. N. W hybray (Proverbs, p. 61) e O. PIõger ( Sprüche, p. 33) tam bém apoiam essa sintaxe excepcional. 20. D. A. H ubbard, Proverbs, p. 70.
“elas” e, um a vez que as palavras são distinguidas e até m esm o inverti das em outras passagens (cp. SI 40.10, 11 [ 11,12]; 85.10[ 11 ]), os poetas hebreus as consideravam virtudes distintas, não uma hendíadis. Aqui, como acontece com frequência em Salmos, o sábio personifica os ensinos éti cos em sua ordem urgente não te deixem ( ’al-ya'azbukã', veja 2.13, 17), uma figura de linguagem para “não se esqueça” (v. 1; veja 2.17 para o m esm o paralelismo). A ordem positiva ata-as ao teu pescoço (qoSrêm ‘alar^rôteykã ; veja 1.9) vai além do paralelo negativo e m uda a figura para uma m etáfora incompleta. Aqui as m etonímias para os ensinos são com paradas im plicitamente a um colar que simboliza proteção, orienta ção, vida eterna e exaltação social (cp. 1.9).21 P. M iller enfatiza a impli cação apotropaica da imagem.22 Isso se dá a ponto dessa simbolização radical de sua identidade o proteger do mal.23 “Escreve-as no teu cora ção” provavelm ente seja um com entário (veja n. 3 e com entário em 7.3). O pai equipara a adm oestação para ajudar o necessitado à prom es sa recíproca do favor de Deus e das pessoas, as duas relações funda m entais da hum anidade. A prom essa pressupõe que o filho não é semvergonha. O sábio orienta o com portam ento do filho por m eio de am e aças e prom essas de dor e prazer sob a m ão poderosa de Deus (3.2, 6, 8, 10, 12), de vergonha e honra (v. 4),24 de censura e culpa na com uni dade (cp. 5.11-14), e de alegria e tristeza no lar (4.1-9; 10.1). O im pe rativo e encontre ( ümesã’) tom a a prom essa m ais enfática e vivida.25 A prom essa tem dois aspectos. Prim eiro, o favor (hên; veja 1.9), a palavra com um para “graça” denota aqui a disposição positiva do céu e da terra para com o filho em função de sua atratividade. C om o hesed, não pode ser com pelida; é estendida voluntária e unilateralm ente para preservar um relacionam ento valioso. O segundo aspecto, boa reputa ção ou estim a {éêkel-tôb\ lit. “boa prudência” ; veja 1.3) m uda a pers pectiva de éêkel. Em 1.3 a palavra se refere à “capacidade de com pre 21. A linguagem é metafórica, não literal, pois seria impossível usar ao redor do pescoço todos os provérbios referentes à ética. Ordens semelhantes em Êxodo 13.9, 16; Deutcronômio 6.8, 9; 11.18, 20 levaram os literalistas a usar amuletos (cp. 8.34c). No entanto, uma vez que sc viram limitados pelo espaço, tiveram de restringir o conteúdo somente a essas passagens, o que não é sua intenção. 22. P. D. Miller, “ A potropaic lm agery in Proverbs 6,20-22”, JNES29 ( 1970) 129-30. 23. B. K. W altke com C. Fredricks, Genesis: A Commentary (G rand Rapids: Z ondervan, 2001), p. 475. 24. Van Leeuwen (Proverbs, p. 48) comenta: “Contrastando com a autoavaliação daqueles que confiam cm si mesmos (28.6; cp. 18.11), que são ‘sábios/bons/retos aos seus próprios olhos’ mas que ignoram as percepções de Deus e dos outros (3.7; 26.12; cp. 27.2; Jz 17.6; 21.25)” . 25. IBHS, p. 572, P. 34.4c.
ender as im plicações de um a situação” do ponto de vista do observa dor, m as agora, de acordo com Fox, “se refere à percepção do ponto de vista do objeto, i.e., a m aneira com o os outros veem um a pessoa...” ( I S m 25.3).26 Aos olhos de (be'ênê ), segundo Fabry é literal, pois no antigo O riente Próxim o o favor é m ostrado no rosto, “ pelo olhar nos olhos de um a pessoa (cp. 15.30). Hoje em dia as pessoas olham para o sorriso” .27 M einhold acredita que a m enção inesperada Deus (^lõhím ; veja 2.5), não S e n h o r , é usada porque a expressão é propriedade co m um do antigo O riente Próxim o.28 O N ovo Testam ento tam bém valori za a honra social. Humanidade Cãdãm) funciona com o um m erism a com Deus, referindo-se juntos a todos os seres racionais no céu e na terra (veja p. 139; cp. Lc 2.52; Rm 12.17). b. Corpo: uma lição acerca da piedade: confie, tema e honre
ao Senhor (3.5-10) 5 ,6 A gora o pai firm a seu filho num relacionam ento pessoal com o Iigando-o a seu ensino (veja 2.6). Um a vez que o filho se com prom eteu com o ensino ético do pai, agora o pai ordena ao filho que confie no S e n h o r para guardá-los. A confiança do filho não é deposita da nem num a ordem criada im pessoal, sujeita a seu controle racional, nem num código de ética im pessoal herdado, por tradição, dos pais, m as sim num Deus que cum pre sua aliança e que está por trás da ordem e da herança moral, bem com o de suas prom essas (veja tam bém 22.19). Uma vez que o ensino é proveitoso som ente à m edida que Deus o sustenta, o discípulo deve confiar (be(ah\ i.e., fiar-se em função de um sentim ento de segurança, norm alm ente diante do perigo) no Senhor (cp. pp. 115-116; cp. 16.3, 20; 22.19; 28.25; 29.25). A fé nas prom essas de Deus e a ren u n ciad a confiança em si m esm o (cp. 18.10,11; 28.1 1 ,2 6 ) são contrárias à natureza e dons de Deus, m ediadas em parte pelas adm oestações e prom essas (veja 2.6; cp. Rm 9.14-17; E f 2.8, 9). N or m alm ente, bõtah tem um tom negativo no Antigo Testam ento. Segundo Jepsen, “A quilo em que se confia se m ostra enganoso, de m odo que as palavras derivadas da raiz bfh, são, na verdade, usadas para indicar S f.n h o r
26. Fox, Proverbs 1-9, p. 147. 27. J. Fabry, TDOT, 5:24, s.v. hõnan. 28. Meinhold, Sprüche. Teil i, p. 75. A inscrição fenícia de consagração do rei Yehawmilk do final do quinto século ou início do quarto diz: ‘'F. que [a mestra,] a Dama de Biblos, [lhe] conceda favor aos olhos dos deuses e aos olhos do povo deste país” (ANET, p. 502).
uma falsa segurança”, com o em outras pessoas e/ou em seus artifícios enganosos (cp. 11.28; SI 52.7; Jr 9 .2 3 ,2 4 [2 2 ,23]). E acrescenta: “A ci ma de tudo, o hom em não deve confiar em si m esm o (veja 3.7; 21.22; 28.26; cp. SI 62.10[ 11 ]; Is 30.12; [cp. Ez 16.15])... ou em sua própria ‘ju stiç a’ (Ez 3 3 .12)” .29 Porém , se não receber um a definição, a expres são “confiar no S e n h o r ” se tom a trivial; ela não exerce im pacto no pensam ento da pessoa a m enos que o próprio S e n h o r se expresse. A unidade do poem a e sua ligação com 2.6 m ostram que o indivíduo con fia no S e n h o r que fala por m eio do ensino inspirado do pai (veja pp. 129-132). Os sábios confiam que o S e n h o r sustentará sua ordem moral de m aneira livre (i.e., com o lhe aprouver em sua soberania) e contin gente (i.e., em resposta à atividade hum ana). Ao cum prirem suas obri gações, eles estão certos de que o S e n h o r cum prirá a parte dele a seu tem po e a seu m odo, m esm o quando os perversos prosperarem e os justos sofrerem (cp. 14.26; 16.3,20; 18.10; 19.23; 28.25; 29.25; 30.114). Essa confiança deve ser total, de todo o teu coração (cp. p. 142). Um a vez que som ente o S e n h o r dá sabedoria e oferece proteção (2.58), a segurança do indivíduo depende dele. No teu próprio entendi mento (ou discernim ento, veja 1.2; 2.3) constitui um a antítese clara com “no S e n h o r ” e, com 22.4, é um a form a de uso excepcional de binâ nesse livro. “Tendo em vista as suposições habituais do livro, um a fa culdade mental em pregada sem a confiança em Deus não poderia ser cham ada binãh.”30 Em outras passagens, binâ se refere à sabedoria em si, ou ao discernim ento acerca da sua interpretação. Um com pro misso total implica num compromisso exclusivo. Não confie ( ’al-ti$$ã'ên) ou não te apoies com o que num a m uleta quebrada, retrata o significado de “confiar” .31 Aquele que confia no próprio conhecim ento, que é ape nas um a gota quando com parado ao vasto oceano de saber ou no pró prio entendim ento, que com frequência é governado por paixões irra cionais que ele não pode controlar, é um insensato (26.5,12, 16; 28.26a; esp. 30.1-6; Jó 38.4, 5).
6 A gora o pai acrescenta a essa exigência de com prom isso total e exclusivo um com prom isso exaustivo - em todos [veja v. 5] os teus caminhos (derãkeykã\ veja 1.15; 2.8). Em vez da tradução deseje sua presença, a m aioria das versões em nossa língua traduz dã'êhú (lit., 29. A. Jepscn, TDOT. 2 :8 9 ,9 1, s.v. b(h. 30. Fox, Proverbs 1 9 , p. 148. 3 1. BDB. p. 1.043; cp. Isaías 50.10.
“conhece-o” ; veja 1.2; 2.5) com o “reconhece-o” . D elitzsch, porém , ar gum enta corretam ente que o verbo “não é plenam ente representado por ‘reconhece-o’ ” .32 “ R econhecer” no sentido de “confessar” pode ria representar yãda' no Hifil, m as duvidosam ente no sentido de “ reco nhecer os direitos e autoridade do S e n h o r ” . N esse livro, “conhecer” significa um conhecim ento pessoal, um a experiência íntim a com a rea lidade de um a pessoa (veja p. 125; 1.2; 2.5, 6). A ligação observada entre as conseqüências espirituais da segunda palestra e as adm oesta ções espirituais do capítulo 3 pressupõem que “conhecer” em 3.6a tem o m esm o sentido que em 2.5b. O conhecim ento pessoal de Deus resul ta em correr riscos para obedecer aos ensinos específicos que dizem respeito a todo tipo de com portam ento hum ano, confiando plenam ente que Deus cum prirá as prom essas associadas a tais ensinos (veja 2.1). Jerem ias equipara o conhecer ao S e n h o r ao ter a tôrâ escrita no cora ção (Jr 31.31-34). Salom ão faz o m esm o (veja 3.1), ainda que 3.4 não seja original (veja 7.3). No entanto, é difícil entender a noção de conhe cer a Deus em relação a todos os caminhos da pessoa. Mas quando o salmista afirma, “ Pois o S e n h o r conhece o caminho do justo” ( S I 1.6), ele está dizendo que “O S e n h o r tem consciência desse cam inho de m odo solidário (i.e., existencialm ente, não apenas noeticam ente)” > “entra em seu caminho” (e, portanto, o protege) > “o vigia” (NIV).33 Independente mente, Fox traduziu a expressão com o “m antê-lo em m ente” e com entou que indica “a consciência daquilo que [o S e n h o r ] quer, bem com o o dese jo de fazê-lo” . Infelizmente, neste caso raro ele se baseou “nos rabinos, e não na filologia”.34Além disso, com o no Salmo 1.6, o termo também pode indicar “desejo da sua presença protetora”. O sentido do modo im perati vo é ambíguo, pois nesse poem a as formas volitivas são em pregadas tanto para adm oestações puras com o para prom essas veem entes (cp. “encontre”, v. 4; “que haja”, v. 8). O padrão de colocar a prom essa divina nos versículos pares favorece a com preensão do verbo com o um a pro messa (i.e., ao confiares inteira e exclusivam ente em Deus tu o conhecerás). Porém, a conseqüência no verseto B, “e ele fará retas as tuas vere das” sugere que a adm oestação no verseto B funciona com o um a condi ção vis-à-vis “conhece-o pessoalmente, e e/e...” . 35 Retas eplanas (veja 32. Delitzsch, Proverbs, p. 81. Ydh (Hifi!) significa “confessar", "reconhecer” . 33. Veja HALOT, 2:391, s .v .y d . 34. Fox, Proverbs 1-9 , p. 149. 35. IBHS, p. 294, P. 16.3.2(1.
yãSar, p. 150; cp. 11.5) traduz o jogo de palavras dessa palavra hebraica de m odo a indicar sua realidade física e envolver seu sentido ético. Em termos figurativos, Alonso-Schõkel afirma corretam ente que ele indica “reto” (i.e.,yõsar, “conduta correta, honesta, direita que não se desvia ou não ultrapassa os limites” ; 2.13; 9.15) ou “ lisura” (i.e., “o sucesso de um em preendim ento ou ação” ; cp. 3.23; 4.12; Is 40.3).36 A estrutura de 3.112 mostra que, no mínimo, o sentido aqui é “plano” . Porém, um a vez que para conhecer ao S e n h o r o indivíduo deve se abster do mal, pois nele não há mal algum, esse relacionam ento faz o indivíduo andar “direito”. Tuas veredas ( 'õrehõteykã ; veja 1.19; 2.13) provavelm ente funcione com o um paralelo com um de derãkeykã “teus cam inhos” (veja 2.20). A fim de enxergar esta verdade é preciso considerar o curso da vida do ponto de vista de um pássaro, não do ponto de vista de um verme. Com o diz o provérbio popular, “ Deus escreve certo por linhas tortas” .
7 As adm oestações negativas e positivas no versículo 7a/ba defi nem de m odo quiástico as adm oestações positivas e negativas nos ver sículos 5 , 6. Não sejas sábio ( ’al-t?hi hãkãm, i.e., no sentido neutro de hokmâ, “habilidade”; veja 1.2) aos teus próprios olhos (beiêneykã, i.e., em sua própria opinião; cp. 12.15; Jz 17.6; 21.25) proíbe a pessoa de ser um sabe-tudo individualista, que faz as coisas ao seu m odo, um estado pior do que ser um insensato (26.12; cp. Rm 12.16).37 A expres são tam bém possui um a dim ensão ética. Deus instrui as pessoas a bus carem o bem dos outros, não de si m esm as, m as, no lugar desse ensino, os seres hum anos colocam a própria sabedoria para satisfazer a si m esm os (Tg 3.14-16). N a Fábula da Abelha, B em ard M andeville (1.670-1.733) equipara satiricam ente um a colm eia à cosm ovisão se gundo a qual cada pessoa pode ser centrada em si m esm a até o seu âm ago enquanto toda a sociedade perm anecer um paraíso. “Assim , cada parte estava cheia de depravação, m as o todo continuava sendo um paraíso.” Mas Isaías bradou, “ais” sobre os oficiais arrogantes da corte que escarneciam do plano de Deus (5.19), deturpavam sua ética (5.20) e, desse modo, corrom piam a cultura de Israel a ponto de reduzirem-na a uma anarquia sobre a qual ninguém queria governar. A s decla rações do profeta culm inam com a afirmação de que os oficiais corruptos e arrogantes eram “sábios aos seus próprios olhos” (i.e., confiavam em 36. L. Alonso-Schõkel, TDOT, 6:466, s.v. yãSar. 37. BAGD (p. 874) interpretam a tradução da L XX.phronim os para seaufô de modo a signifi car “sábio em [sua] própria avaliação = que confia em sua própria sabedoria” .
sua própria inteligência, não na palavra de Deus). Seu paralelo antitético, teme ao Senhor i ^ r ã ’ ’e t-YHWH\ vejapp. 153-154,3.7b), com plem enta “confia no Senhor” no versículo 5a (cp. Dt 10.20), e afasta-te do mal (wesür mêrã, lit. “aparta-te do m al”; veja 1.15; cp. 14.16; Jó 1.8; 2.3; ls 59.15) acrescenta um a dim ensão ética positiva paralela a “não sejas sá bio aos teus próprios olhos” . Sür significa essencialm ente “desviar-se da direção que se havia tom ado” (1 Sm 6.12), mas, entre outras conotações, desenvolve a ideia de “evitar” .38 A ordem positiva “teme ao S e n h o r ” e a negativa “aparta-te do m al” são inseparáveis e, juntas, apresentam a soma da piedade e bondade (2.5-11; 16.6; cp. Jó 1.1; 28.28; Am 5.14, 15). 8 A repetição léxica de t?hi (= “não sejas "/que haja) nos versícu los 7a e 8a reforça a ligação lógica entre a adm oestação no versículo 7 e a prom essa no versículo 8 (cp. 2C o 9.6-8; Fp 4.14-19). A piedade e a ética trazem grande recom pensa. Ao abandonar sua natureza pecam i nosa, a pessoa experim enta cura ( r ip ’ü t . i.e., restauração a um a condi ção anterior de bem -estar) espiritual, psicológica e física.39 C om o um dos resultados do pecado, a hum anidade está enferm a, cam inhando para a m orte e necessitada de cura, m as ao confiarem no S e n h o r , uma atitude relacionada inseparavelm ente ao se apartarem do mal endêm i co, as pessoas encontram cura rum o à vida eterna. A cura total é indi cada pelo m erism a de que ela se estende da parte exterior (o um bigo) para a interior (dos ossos). Para o teu umbigo (além desta ocasião, usado som ente em Ez 16.4; Ct 7.3[4]) é um a sinédoque,/?ars pro toto, para o corpo todo. Ibn Ezra,40 seguido por D elitzsch41 e M einhold,42 vê 38. S. Schwertner, TLOT, 2:796, s.v. súr; HALOT, 2:748, s.v. swr. 39. Os derivados da raiz r p ' se referem, em sua maior parte, a curar os feridos (e.g., 2Rs 8.29) e todo tipo de enfermidade (veja Gn 20.17; Lv 13.18, 37; 14.3; Dt 28.27). Sem cura, o indivíduo morre (Ec 3.3; Jr 14.19). Por todo o antigo Oriente Próximo, as enfermidades eram atribuídas à influencia de poderes divinos e/ou demoníacos, mas em Israel o S e n h o r é a lbnte suprema da enferm idade e da cura (cp. Êx 15.26; Dt 32.9; ISm 2.6; 2Rs 20.5, 8; S I 103.3; 147.3). Os enfermos com frequência pedem ao S e n h o r que os cure, sabendo que o pecado deles causou a aflição vinda do S e n h o r (cp. Nm 12.9; 2Cr 21.18). Assim, rp' está repleto de um conteúdo mais profundo, pois a cura está associada ao perdão como pré-requisito na ocasião da restauração ao bem-estar material (2C r 7.14; cp. 2Cr 36.16). A cura absoluta não pode ser encontrada m era mente no diálogo consigo mesmo ou com outros seres humanos. O S e n h o r cura a própria causa da enfermidade, nâo apenas seus sintomas (veja Jr 3.22; cp. Is 6.10), de modo que a restauração visível é o indicador exterior verificável da cura espiritual interior. As condições para Deus curar uma pessoa são: obediência (Êx 15.26), arrependimento (Is 6.10; Jr 3.22; Os 6.1), e/ou oração (veja 2Cr 7.15; SI 30.3[4]; Is 19.22); em resumo, sob a condição de sua piedade e ética (Pv 3.7, 8). 40. C itado p o r G reenstone, Proverbs, p. 27. 41. Delitzsch, Proverbs, p. 63. 42. M einhold. Spriiche, p. 76.
um a alusão ao em brião que encontra nessa parte central do corpo a vida que lhe é proporcionada. Ao observar as ordens de 3.7, com o que bebendo de um elixir divino, a pessoa experim entará um a nutrição e um revigoram ento m isteriosos da parte m ais interior e firm e do corpo, para os teus ossos (le'a$môteykã; i.e., esqueleto, estrutura corporal [cp. SI 109.18]).43 Provérbios 15.30(cp. 16.24) fala de engordar os ossos, 12.4 se refere à sua deterioração e 14.30 à sua decom posição, todas m etá foras para a psique. Sua noção básica é física, m as, com o Dalglish observa, atua basicam ente na categoria psíquica ou m etafórica (cp. SI 34.21 [22]; 35.10).44 Em resum o, um relacionam ento correto com Deus conduz a um estado de bem -estar físico e m ental com pleto, não ingenu am ente à ausência de enferm idade e mal-estar. 9 ,1 0 A adm oestação no versículo 9 intensifica a obrigação de pie dade interior do participante hum ano (vs. 5 ,7 ) para a sua m anifestação exterior na adoração (cp. 14.31; 19.1 7;cp. 1Sm 2.29; Dn 11.38). Em 3.10 o S e n h o r prom ete prosperidade ao m em bro da sua aliança que o adora, pois se pode confiar que esse indivíduo usará sua riqueza para ajudar os necessitados.45 Honra (kabbêd), cuja raiz kãbêd quer dizer “ser pesado”, significa estim ar um a pessoa com o sendo valiosa e de clará-la com o tal a fim de lhe dar peso ou preem inência social.46 Aqui essa declaração não é feita por palavras, m as por m eio do ato concreto de lhe apresentar tributo a partir da tua riqueza ( mêhônekã ; veja 1.13). O utros provérbios deixam im plícito que se devem oferecer sacrifícios ao S e n h o r (7.14; 15.8; 17.1; 2 1 .3 ,2 7 ), m as som ente este requer im pli citam ente sacrifícios cultuais.47 O paralelo quiástico indica que as ofer tas devem ser com as primícias (rê’sit ; lit. “prim eiro” ; cp. 1.7). Rê’Sit pode designar as primícias do ventre (Gn 49.3; Dt 21.27; SI 78.51; 105.36) 43. De acordo com Genesius-Buhl que concordam com Aquila, Sir., Jerônim o ittxla Heb. 44. E. Dalglish, Psalm Fiftv-One in lhe Lighl ofAncient Near Eastern Pallernism (Leiden: E. J. Brill, 1962), p. 142. “O sso" pode se tom ar identificável com a pessoa ou seu ser interior (cp. SI 51.8(1 0 ]; Pv 6 .3 , 4). 45. M atthew Henry com enta: “ Ele não diz vossas bolsas, m as sim . vossos celeiros, não vossos guarda-roupas, mas vossos lagares; Deus vos abençoará com um aum ento daquilo que é para o uso, nâo para ostentação ou adom o; para gastar e consumir, não para acum ular e armazenar. Aqueles que fazem o bem com aquilo que tem terão mais com que fazer o bem ” (citado por Atkinson, Proverbs, p. 65). 46. 1BHS, pp. 402 -4 , P. 2 4.2s., g. 47. N o livro de Provérbios os sacrifícios correspondem de maneira m uito íntima à quietude na instrução egípcia, não à forte ligação com o culto na literatura babilônia (P. Hum bert, Recherches sur les sources égyptiennes litterature sopienliale d ’israêI [Neuchâtel, 1929], pp. 37, 159-63, 170).
ou das colheitas (Os 9.10); e, com o tal, sim boliza “o m elhor” (cp. Nm 18.12, 13; Ez 48.14; Am 6.6). N a esfera cúltica ela assum e o sentido técnico de oferecer o m elhor das coisas m ateriais, com o a m assa de farinha ou o cereal (Nm 15.20;D t 18.4; 2 6 .2 ,10;2 C r3 1 .5 ;N e 10.38[39]; Ez 44.30),48 expandido aqui para todo o teu lucro (i.e., “rendim ento” ; Lv 23.10). Isso inclui as colheitas, com o sugere 3.10 e a renda em geral (cp. 3.14; 8.19; 10.16; 14.4; 15.9; 16.8), com o sugere o paralelo hôn. A m enos que o filho derram e em seu “sacrifício” do incenso de amor, confiança e devoção, expresso pela oferta daquilo que tem de melhor, tal oferta não é aceitável ao S e n h o r , com o Caim deveria ter aprendido (Gn 4.2-7).
10 A parte divina da aliança responde de m aneira equivalente (cp Dt 15.13, 14 e 28.8). E ... se encherão com (weyim m ãle’ü) indica um a conseqüência lógica de se atender à adm oestação em 3.9.49 Os teus celeiros ( >asãmeykã\ veja Dt 28.8) se refere aos frutos, às provisões, trazidos dos cam pos, inclusive grãos e legumes. No sistem a econôm ico dos tem pos bíblicos, o agricultor tam bém cultivava especiarias e vege tais. C om um a variação de duas sem anas, dependendo da região de Israel, a colheita com eçava na prim avera, com a cevada em abril, se guida do trigo no final de m aio, term inando com as uvas e outras frutas no final de setem bro. Os produtos agrícolas em seu estado bruto ou final eram guardados em estruturas especialm ente construídas no sub solo em buracos e silos e tam bém em pequenas dependências e gran des arm azéns na superfície. Os produtos eram guardados a granel ou em potes.50 Com abundância (éãbã') se refere à saciedade e pode ser um a m etoním ia para cereais. A argum entação pressupõe que o C riador da vida recom pensará o verdadeiro adorador sustentando sua vida (cp. Dt 28.8; 2C r 31.5-10; Ml 3.10; Fp 4.10-29). O paralelo quiástico com vinho novo (tírôs ; veja 9.5; 20.1), funciona com o um m erism a com “com abundância”, indicando um suprim ento pleno e adequado de ali m ento e bebida. De acordo com F. S. Fitzsim m onds, o vinho novo “re presenta o vinho feito da prim eira extração do suco antes das uvas serem colocadas no lagar. A ssim , era particularm ente forte...” .S1 O lagar era com posto de duas partes: um a lavrada na pedra, com cerca 48. Rs 'sit pode até ocorrer com outro substantivo pertencente ao âmbito dos sacrifícios (1 Sm 2.29; Ez 20.40) ou com o sinônim o bikkurím, “prim ícias dos frutos” (Êx 23.19; 34.26; Ez 44.30). 49. IBHS, p. 563. P. 33.4b. 50. O. B orow ski, “ A griculture”, in ABD, 1:96-97. 51. F. S. Fitzsim m onds, “W ine and Strong D rink”, in MBD, p. 1.254.
de um ou dois m etros, onde as uvas eram pisadas, e uma tina ou tanque inferior onde o suco era coletado, lavrado ainda m ais profundam ente na rocha e ligado ao lugar onde as uvas eram pisadas por um canalete na pedra (J1 3.13). Os teus barris (jfiqãbeykã) se refere a várias tinas ou tanques desse tipo. O suco produzido visualizado aqui é tão abundante que seriam necessários vários tanques coletores para o vinho produzido sem que sequer as uvas fossem pisadas! Transbordarão (yiprõsü ; veja Jó 1.10) significa ultrapassar a borda do tanque de pedra. A recom pen sa do C riador ao verdadeiro adorador é m ais do que centuplicada (Ml 3.10-12; Mc 10.29-30). c. Conclusão: não rejeite a disciplina do
Senhor
(3.11, 12)
A palestra que com eçou com o pai ensinando seu filho durante os anos form ativos, term ina com a disciplina am orosa do S e n h o r ao longo do restante da vida. A estrofe pressupõe que o filho não cum priu suas obrigações e que o S e n h o r teve de lhe dar castigo em vez de bênçãos. A prosperidade e a adversidade são a m istura sábia e necessária na condição de santo. A disciplina (ou instrução, müsãr ; veja 1.2) pode ser verbal e/ou física.52 O livram ento da insensatez da vida se dá por meio da vara (22.15; 23.13; cp. 13.24). Em term os instrutivos, a puni ção do S e n h o r ( YHWH), que pode assum ir a forma de um a enferm ida de ou algum sofrim ento, visa restaurar o aflito à conduta apropriada (cp. Dt 11.2), com o a sím ile para o castigo, “com o o pai ao filho” m os tra. A adm oestação não rejeites ( 'al-tim as; i.e., “não querer nada com alguém ou algo”)53 essa educação dolorosa (10.13; 13.24; 20.30) é es clarecida por um paralelo no Papiro Insinger: “Nenhum a instrução pode ser bem -sucedida se houver aversão” (S.24).54 O paralelo quiástico não detestes (i.e., sentir um a reação em ocional profunda que resulta em repulsa), intensifica a adm oestação. A pesar da palavra se referir a sentim entos, todavia pode ser ordenado ao filho m udar suas atitudes. O verbo (yãkah\ veja 3.12) por trás do substantivo sua correção (ou re preensão, tôkahat; veja 1.23; 3.12) pertence à esfera dos processos legais (cp. Is 29.21; Am 5.10), e no Hifil significa “estabelecer o que é 52. W hybray, Proverbs, p. 64. afirm a curiosam ente acerca de 19.18; 23.13, “N ão há nenhum a sugestão de que o filho fez algo para merecer o castigo” . Um pai que castiga um filho inocente não é am oroso nem bom. Acaso a intenção do pai de salvar seu filho da morte não deixa implícito que o comportam ento do filho o colocou nesse rumo? 53. H. Wildberger. TLOT, 2:653, s.v .m s. 54. AEL, 3:192: “Aversão" significa “ressentimento, censura” (p. 214, n. 28).
certo”. Seu sujeito normalmente é a autoridade que dá origem e faz cumprir a ação judicial a fim de estabelecer o que é certo. De fato, se alguém não toma providências para fazer o que é certo, ele é cúmplice com o malfeitor. Esse sentido judicial está subjacente em todas as suas formas de uso (veja 24.25). Aqui também apresenta uma importância pedagógica, como pode ser visto por sua ligação com m ü sã r (cp. 5.12; 6.23; 10.17; 12.1; 13.18; 15.5,10,32). A repreensão pode ser verbal ou por meio de alguma aflição (cp. 5.12) ou verbal auxiliada pela vara (2Sm 7.14; SI 141.5; Pv 19.25). Quando as admoestações do pai são desrespeitadas, o filho pode esperar que o S e n h o r as confirme com umas “palmadas” para evitar que o mau procedimento se tome habitual. 12 0 argumento para aceitar a disciplina rígida introduzido pela conjunção porq ue (k i) pode ser resumido no oximoro de que a discipli na é uma “misericórdia severa” .55 Apesar da repreensão ser dura, na verdade é um sinal do amor do S e n h o r , e não de sua ira, pois diz respei to àqueles a quem o Sen hor am a Ç et'aSer y e ^ h a b YHWH). Segundo Montefiore, este é “um dos ditos mais profundos da Bíblia” .56 C. S . Lewis ilustra a verdade observando que um artista pode não se aplicar muito a um desenho feito para entreter uma criança, mas que dedica esforços desvelados à sua grande e amada obra de arte. Lewis argumen ta que se sua m agnum opus fosse sensível, como “o artista que rasura e joga fora, e recomeçando pela décima vez”, ela gritaria de dor. E conclui que, quando nos queixamos de nossos sofrimentos não estamos pedindo mais amor, mas sim, menos.57 Estamos pedindo que Deus não nos leve tão a sério (cp. Jó 7.17-19; 10.20). Neste paralelo emblemáti co, o S e n h o r como educador é representado com o um p a i (k e ’ãb', veja 1.22; cp. 13.25; Dt 8.5; Hb 12.3-12). W. Lane observa que a analogia permite que o sofrimento seja entendido dentro da aliança (cp. Dt 8.5; Ec 7.14; Hb 12.3-12; Ap 3.19). Como pai amoroso, Deus deseja que o filh o ( ‘et-bên) experimente as bênçãos dos versículos pares, mas a condição para alcançar esse objetivo é cumprir as obrigações dos ver sículos ímpares. Portanto, ele impõe a disciplina sobre o filho, visando conformá-lo às suas obrigações e prova, desse modo, o seu amor. Lane conclui que a ausência de medidas corretivas indicaria rejeição .58 A 55. Extraído de S. Van Auken, A Severe Mercv (São Francisco: Harper c Row, 1977). 56. Citado por Plaul, Proverbs, p. 58. 57. C. S. Lewis, The Problem o f Pain (Londres: GeolTrey Bles and Centenary, 1940), pp. 30-33. 58. W. Lane, “ Discipline”, in ISBE, 1:948.
mesma intenção está presente no conselho dos amigos de Jó (Jó 5.1727; 33.15-30), mas estes reduziram erroneamente todo o sofrimento à justiça de Deus (cp. Jo 9.2, 3). O acréscimo de em quem ele se deleita (yirseh) também poderia ser traduzido como “a quem ele aceita favo ravelmente”. O “amor” paralelo favorece o sentido intensificado.59 Nas palavras de C. S. Lewis, “Deus sussurra para nós nossos prazeres, fala conosco em nossa consciência, mas grita em nossa dor” .60 5. Quarta palestra: o valor da sabedoria (3.13-35) 13 Abençoado1 o ser humano que acha2 sabedoria,3 o ser humano que obtém4 entendimento; 14 porque o lucro que ela dá5 è melhor que o lucro da prata, e sua rendab que o ouro.1 15 Ela é mais preciosa que os corais, s e todas as coisas desejáveis9 59. A LXX traz paradechetai “ele aceita” (também em Hb 12.5, 6). 60. Citado por Aitken, Proverbs, p. 44. 1. Uma exclamação nominal petrificada numa forma construta plural (IBHS, p. 681, P. 40.2.3b). 2. A conjugação sufixai indica uma situação continua e completa; a conjugação prefixai paralela representa uma situação contínua em desenvolvimento. As duas conjugações são usadas para variar o estilo. (IBHS, p. 500, P. 31.1e). 3. As personificações incompletas da sabedoria nas palestras, em contraste com suas personifica ções plenas em seus discursos, não são apresentadas com letra maiúscula. 4. II púq (HALOT, 3:869) provavelmente é um sinônimo poético mais elevado de mç ’, pois é o segundo elemento no paralelismo em 8.35; 18.22, mas não em 12.2. Para o seu correlato em línguas cognatas veja G R. Driver, “Problcms in the Hebrew Text o f Proverbs”, Bib 32 (1951) 176. 5. A ligação com “achar sabedoria” no v. 1 sugere que o sufixo deve ser construído como um gen. objetivo (i.e., “o lucro dela”), mas a ligação com os vs. 3ss. indica um gen. agentivo (i.e., “o lucro que ela dá”). É provável que a ambigüidade também seja intencional em “lucro da prata”. 6. A última palavra da linha em hebraico, fib ü ’ütüh, tem um som parecido com a última palavra do v. 13, t?bú'ná. 7. O termo poético hãrãç, ao contrário do prosaico zã k sb , sempre ocorre como segundo elemento em um par com kesep (SI 68.13[14]; Pv 8.10, 19; Zc 9.3), com exceção de Provérbios 16.16. Sua etimologia aponta para amarelo opaco, e a etimologia de kesep para branco opaco. 8. K tia/, mipffiniyim, mas Q traz o habitual mippPnínim. O significado é incerto. Os lexicógrafos comparam o hebraico ao seu equivalente fonético grego usado para uma espécie de molusco bivalve ou para "pérolas”. No entanto, de acordo com Lamentações 4.7, pnynym é mais vermelho do que o corpo humano, sugerindo rubis ou corais, que eram considerados extremamente valiosos pelos antigos e usados para a confecção de joias e amuletos (cp. Pv 20.15). Os corais, depósitos de pólipos calcários vermelhos encontrados no oceano Indico e no mar Vermelho, são preferidos pois a palavra poética não ocorre na lista de pedras preciosas de Êxodo 28.17-20; 39.10, II; Ezequiel 28.13. Na literatura grega, Teotrastes, um discípulo de Aristóteles, é o primeiro a menci onar rubis, sugerindo que eram desconhecidos no mundo mediterrâneo antes do quarto século a.C. 9. O TM traz h°pG$eyk5 “teus deleites”, mas as versões antigas trazem h°pã§im "deleites”.
não podem ser comparadas a ela. 16 A vida longa está em sua mão direita; em sua esquerda, riqueza e honra. 17 Seus10 caminhos são caminhos agradáveis, e todas as suas sendasu são paz e prosperidade. 18 Ela é uma árvore de vida para aqueles que se apropriam dela, e aq ueles que a seguram firm e m e n te 12
são declarados, cada um deles, abençoados,13 1 9 O S e n h o r pela sabedoria fundou a terra, estabeleceu os céus pelo entendimento; 20 por seu conhecimento as profundezas foram abertas, e as nuvens gotejam14 orvalho. 21 Filho meu, que eles15 [a sabedoria e o entendimento] não se afastem16 de teus olhos, guarda o julgamento sadio e a prudência, Apesar dc ser possível que o paralelo em 8.11 os tenha influenciado, o discurso direto se encontra deslocado neste macarismo sobre 'ãdãm (vs. 13-18) em contraste com a estância final dirigida ao filho (vs. 21-26). Na escrita angular do período anterior ao exílio, mem e cafe são graficamente semelhantes e, portanto, fáceis de ser confundidos um com o outro, como pode ser visto na transposição dc brw m para brwk em Ezequiel 3.12. 10. O genitivo é ambíguo. Pode ser agentivo (i.e., “os caminhos que ela prescreve”) ou, neste contexto sobre seus benefícios, um genitivo possessivo (i.e., “os caminhos ou bên çãos que ela possui para dar a outros"). O primeiro implica no último, pois “caminhos” sugerem que são agradáveis em seu percurso e desejáveis em seu destino. 11.0 termo menos comum do par derek e netibã volta a ocorrer na segunda posição. 12. Tmk significa “agarrar” ou “segurar firmemente” (HALOT, 4:1612); o último signifi cado é mais apropriado como transição para “guardar" no v. 21. 13. Fichtner (BUS) retroverte o pl. m e ‘uk-SSãrim da Sir. e Targ. GKC observa, porém, que "o plural de pessoas (especialmente no particípio) é, por vezes, constituído com o singular do predicado quando, em vez de uma classe de indivíduos, deseja-se apresentar cada um separadamente como sendo afetado pela declaração” (P. 145.1). O Pual é delocutivo (IBHS, pp. 402-3, 419, PP. 24.2s.; 25.2). 14. A conjugação sufixai usada nos v. 19 e 20a para representar a criação concluída é substituída agora pela conjugação prefixai para representar a situação contínua e repetida de regá-la (veja n. 2). 15. Uma vez que não reconhecem a unidade dos vs. 21-26 com os vs. 13-20, Toy (Proverbs, pp. 73-74), McKane (Proverbs, p. 298), Fichtner (BHS), et al. sentem-se obrigados a fornecer um sujeito mediante a correçüo do texto e transpondo o v. 21b antes de 21a, resultando em “julgamen to sadio c prudência”. Sua correção mostra que uma forma de uso catafórica do pronome (i.e., uma referência ao “julgamento sadio e discrição”) é pouco provável. Plüger (Sprüche, p. 39) acredita que “ensino” e “mandamento” no v. 1 são os sujeitos e que o texto sofreu alteração. No entanto. P. Overland (“Literary Structure in Proverbs 1-9” [dissertação de Ph.D., Brandeis University, 1988], p. 95, n. 63) conserva o TM, contrapondo que os sujeitos hokmã e fibúnâ nos vs. 19, 20 são próximos e que conservar esses sujeitos se ajusta à unidade lógica dos vs. 13-26. 16. A LXX traz “não sejam descuidados" (veja porém, 4.21); a Vulg. traz “que estes não fluam para longe dos teus olhos”. Essas variações podem ser ocasionadas pela falta de um antecedente claro.
22 de modo que17 se tornem vida para ti, [e] um adorno18 atraente para teu pescoço. 23 Então andarás com segurança no teu caminho, e o teu pé não tropeçará. 24 Quando te deitares,19 não temerás; e quando adormeceres,20 o teu sono será agradável. 25 Não tenhas medo21 da repentina22 calamidade,23 ou da ruína dos perversos24 quando ela vier; 26 p orq ue o Sen hor esta rá ao teu la d o 25 e ele guardará26 os teus pés da captura. 27 Não retenhas [de fazer]11 o bem2i daqueles29 a quem este é devido,30 quando tu31 tens o poder32 de fazer [o bem]. 17. O vau simples com uma conjugação prefixai depois de uma forma volitiva normal mente significa propósito/resultado (veja Lambdin, IBH, p. 119, P. 107). 18. Lit. “graça”, “favor”, em seu sentido estético (cp. 3.4; Dt 4.11) e uma metonimia de adjunto para o adorno. 19. A LXX lê “quando te sentares” (< tèsêb) sendo seguida por várias versões. Sua diferença do TM que lê tskb (“deitar-se”) é pequena e fornece um progresso adequado do movimento de “andar” (v. 23a) para “sentar" (v. 24a) para “deitar" (v. 24b). Porém, o temor vem mais facilmente quando se está deitado, nào sentado. A semelhança em forma entre k e 6 é, mais provavelmente, causada por uma haplografia na LXX do que pelo acréscimo de k por ditografia. Skb tem uma ampla gama de significados, desde “deitar-se” (cp. I Rs 3.19), até “retirar-se para o seu leito” ( I Sm 3.3) e “deitar-se e dormir” (Gn 28.11), permitindo sua repetição aqui com sentidos diferentes. 20. A mudança de acento aponta para um vau consecutivo para uma situação (con)sequencial (IBHS, pp. 520,523, PP. 32.1.1b, 32.1.3). 21. Min marca a causa (JBHS, p. 213, P. 11.2.11d). 22. NormalmentepWõm é um advérbio, mas funciona como um substantivo depois do pré-genitivo. 2 3 .0 mesmo termo hebraico é traduzido como •‘temer” no v. 24. 24.0 gen. pode ser agentivo (= "pelos perversos” ) ou objetivo (= “sobre os perversos"). A única outra ocorrência de SS'â cm Provérbios ( 1.27) se refere à ruína dos perversos, e Overland (“Literary Structure”, p. 322) observa quep it 'Sm em Jó e Provérbios significa retribuição, não desastre aleató rio (cp. 6.15; 7.22; 24.22). 25. Ou “será a tua confiança”. 26. Vau consecutivo para significar (con)sequência (veja n. 20). 27. A frase estereotipada “para fazer o bem” é dividida entre os dois versetos (veja “sangue inocen te” em 1.11). 28. A LXX captou o sentido de “para fazer [o bem]" com “socorrer/ajudar”. 29. Se o paralelo “próximo” em 3.28 é original, o pl. pode ser melhor analisado como um pl. contável, não como um pl. intensivo (cp. IBHS, p. 122, P. 7.4.3a). 30. Lit. “do seu possuidor”. 31. A palavra “mão(s)” é omitida (veja nota seguinte). K. e Sir. trazem ydyk (pl.), mas Q, LXX e Targ. trazemydA (sing.) em conformidade com a expressão idiomática hebraica. 32. Nunca se duvidou do significado da expressão 'in/ygsh le 'il yadh ( + sufixo pronominal) e variações encontradas em Gênesis 31.29; Deuteronômio 28.32; Neemias 5.5; Miqueias 2.1
28 Não digas ao teu próximo:™ " Vai e volta, e amanhã eu darei”,14sendo que já o tens contigo.35 29 Não planejes o mal contra o teu próximo, enq uanto e le h a b ita co n fiad am e n te con tigo .
30 Não levantes uma acusação36 contra uma pessoa sem razão, se ela não fe z37 mal a ti. 31 Não tenhas inveja de uma pessoa violenta, e não esco lh a s 38 q u a lq u e r um de seus cam in h os;
32
porque os desencam inhados são um a abom inação ao Senhor, mas com os retos está seu conselho.
33 A maldição do
Sen h or
está sobre a casa dos perversos,
(cp. Eclo 5.1), mas explicações gramaticais mais antigas não foram bem-sucedidas. F. M. Cross ( TDOT, 1:261, s.v. 'St) argumenta que a expressão idiomática deve ser dividida de modo a se ler 'ínlyÇsh l s ’ le ^ l yadh (+ pronome) a fim de incluir uma palavra da raiz l'y, "minha/tua mão tem/não tem poder”. A raiz Vy é extremamente comum no cananita com cognatos, bem como em outras línguas semiticas, com o significado de “ser poderoso". W. G E. Watson (“ Reclustcring Hcbrew l ‘l y d - \ Bib 58 [1977] 213-15) chegou à mesma conclusão independentemente. 33. K traz I r y k (pl.), mas Q e algumas versões antigas trazem I r k (sing.). O paralelo bPslUyw no par. de provérbios dos vs. 27, 28 favorece K, mas o sing. lek wõSúb “vai e volta” favorece Q. Na verdade, porém, esses singulares podem explicar Q. A discordância gramatical cm número não é excepcional no hebraico (GKC, #1451, m). A LXX om ite a palavra completamente, tomando ainda mais próxima a ligação entre o v. 28 e o v. 27. 34. Seguindo o TM em oposição a BHS, N1V, NRSV, et al. Observe a seqüência e assonância de ettên ufiygS 'ittãk. 35. Lit. “há contigo” (veja BDB, p. 86, s.v. II “?*)• M. V. Fox (“ LXX Proverbs 3:28 and Ancient Egyptian Wisdom”. HAR 8 [1984] 63-69) argumenta que a LXX mais “pois não sabes o que o amanhã trará (lit. ‘dará à luz’)"c original, pois no contexto ele se conforma à sabedoria do Oriente Próximo, especialmente do Egito. Fox também argumenta que seu caráter funcional incomum para a disposição mais ética c religiosa da LXX - argumenta a favor de sua originalidade. No entanto, a maioria dos comentaristas considera, com razão, que o acréscimo foi extraído de Provérbios 27.1, como vários acréscimos inlerpolados em Provérbios na LXX. Esse acrés cimo destrói a forma do poema ao interromper as admoestações negativas equilibradas, nos vs. 27-31, com um motivo funcional que destoa dos argumentos ético-religiosos baseados no S f .n h o r , nos vs. 32-35. Além disso, no verseto B. em vez de “se ele não fez” a LXX traz “para que ele não faça”, fazendo a sentença perder seu impacto moral em troca de um impacto puramente funcional (de acordo com Baumgartner, Elude critique sur 1'état ihi texte du Livre des Proverbes [Leipzig: W. Drugulin, 1890], p. 51). 36. K trwb é excepcional: Q tryb é normal. 37. K. Seybold (TDOT. 3:25, s.v.gãm al) afirma qucgSm al significa realizar deliberadamente "um ato eticamente relevante” (cp. Pv 31.12). 38. Fichtner (BHS) retroverte duvidosamente a expressão da LXX zllõsSs como tithar. Mas nos supostos paralelos (SI 37 [Grego 36]: I; Pv 24.19) o verbo traduz qn ’, não hãrá (Hitpael). McKane, que seguiu a LXX em seu comentário, duvidou posteriormente da sua decisão (“Tex tual and Philological Notes on the Book of Proverbs with Special Relerence to the New English Bible”, GUOST 24 [1974] 79).
34 Em se tratando de escarnecedores,39 ele40 escarnece; e em se tratando dos41 humildes e oprimidos,42 ele mostra favor. 35 Os sábios herdarão honra, mas insensatos são aqueles que adquirem43 desgraça. As admoestações para não esquecer, mas para guardar o ensino do pai em 3.1-12 são repetidas enfaticamente e expandidas em 3.13-35. Mais uma vez o pai equipara seu ensino à sabedoria, mas desta vez, não explicitamente como em 2.1,2, e sim implicitamente. Os termos do poema anterior que se referiam à instrução dos pais (3.1), à ética (v. 3) e à piedade (vs. 5, 7,9), são substituídos pelos termos sapienciais “sa bedoria”, “entendimento” (vs. 13, 19; cp. 1.2), “conhecimento” (3.20; cp. 1.2), “sucesso” (cp. 2.7) e “prudência” (3.21; cp. 1.4; 2.11). Os termos ético-religiosos e sapienciais são, provavelmente, correlatos, pois ambos determinam recompensas para o filho com as mesmas promes sas singulares cujo cumprimento depende inteiramente do S e n h o r : “vida longa” (3.2, 16), “paz” (vs. 2, 17) e “favor” (vs. 4, 22). Esta estrofe afirma que o cosmos existe por meio da sabedoria (3.19,20), e o mes mo sucederá à vida do filho, como a estrofe seguinte deixa claro. 39. C. van Leeuwen (“Die particle 'im", OTS 18 [1973] 47-48; IBHS, p. 643, P. 38.7a) acredita que 'im é temporal, "quando”, e Fichtner (BHS), a fim de obter esse sentido, corrige para ‘im, citando o Salmo 18.26ss, mas as construções diferem. Com essa interpretação, vau é interpretado como um vau raro de apódose (GK.C, P. 143d). Porém Fox (Proverbs, p. 168) cita proveitosamente Jó 9 .19, em que 'im le significa “se com referência a”, traduzido “se se trata de” . 4 0 .0 pronome tautológico dá um enfoque psicológico (IBHS. p. 296, P. 16.3.2e). 41. Supondo que 'im é omitido. 42. A hendíadis em nossa lingua traduz o termo hebraico wela°nãyim (K)/ wel a “nS.wtm (Q e versões). 43. Para várias tentativas de corrigir o texto veja D. W. Thomas, “Some Passages in Prover bs”, VTSup 3 (1969) 282. Y. Hochcmian (“ 'y w n y m g z r w n y y m b ls w n h m q r a " , BM 32 [1986/ 87] 240) argumenta de modo plausível que m ê r i m é um substantivo ou adjetivo verbal de m ú r , “comprar, adquirir", como 'S d de ú d , m S tim de m ú t e l i n i m de l ú n (cp. Ne 13.21). Delitzsch havia observado a última analogia, mas infelizmente não a aproveitou e corrigiu o texto laboriosamente. J. Rcider e outros (citados por D. W. Thomas). inclusive HALOT (2:530), corrigem o texto de modo plausível, porém, desnecessário para os particípios m ã r l m (Qat) ou m e m i r i m (Hifil) “trocar”, da raiz m ú r . Plõger (Spriiche, p. 41) também considera o Hifil de m ú r , mas entende que o sentido é, “ele troca honra por vergonha” (cp. Os 4.7). D. W. Thomas exclui a possibilidade de m úr, pois “deixa de considerar ... que mSrim ocorre novamente numa passa gem análoga, a saber, xiv 29, com um sujeito singular...”. Através de seu paralelo r b , nesse texto, ele prefere, como outros, o significado “acentuar, aumentar” . No entanto, não levou em consideração o fato de que o sujeito aqui é k s y l y m (pl.) e que o paralelo é “herdar".
A quarta palestra foi foijada a partir de quatro poemas outrora in dependentes, como pode ser discernido por sua forma (3.13-18,19,20, 21 -26,27-35). Estes foram compostos de tal modo que as três primeiras estrofes funcionam como uma estrofe introdutória para motivar o filho a adquirir e não abrir mão do ensino do pai, e a quarta é a lição propria mente dita sobre o relacionamento correto com o seu próximo. Como resultado dessa história de composição, o destinatário, “filho meu” só aparece na segunda estrofe. a. Exórdio: o valor da sabedoria (3.13-26) Enquanto a palestra anterior argumentou combinando as admoesta ções nos versículos ímpares com as comprovações nos versículos pares, esta estrofe apresenta a argumentação de maneira lógica, progredindo das comprovações nos versículos 13-20 para as admoestações no versí culo 21, com mais comprovações nos versículos 22-26. Em sua disserta ção, P. Overland44 divide o poema de 3.27-35em três partes: 1.
O valor da sabedoria para valor da sabedoria para 3. O valor da sabedoria para
2. O
um 'ãdãm vs. 13-18 o S e n h o r comoCriador vs. 1 9 -2 0 o filho vs. 21-26
Os dois primeiros poemas, antes independentes, têm como seus temas “sabedoria” e “entendimento” (vs. 13,19), e o pronome plural na admoestação do versículo 2 1 a, “que eles não se afastem”, leva de volta aos mesmos assuntos que os antecedentes mais próximos. Overland confirma essa interpretação observando o desenvolvimento lógico e temporal de “achar” e “obter” no versículo 13, de “se apropriar” e “segurar firmemente” no versículo 18 , e de “não se afastar” e “guar dar” no versículo 21. Além disso, eles fornecem uma intensificação climática para o exórdio. O grande valor da sabedoria para a humani dade em geral (vs. 13-18 ) e até mesmo para o Criador (vs. 19 ,20) pode pertencer ao filho se ele guardar as virtudes em questão (vs. 21-26). O tratamento de Overland é superior ao tratar os versículos 13-20 como um interlúdio que interrompe as palestras do pai e os discursos da sabedoria.
44. Overland, “Literary Stnicture in Proverbs 1-9", pp. 285-328. Gemser (Sprüche, p. 22), Fichtner (BHS), et al. também estendem o limite inferior do exórdio para o v. 26.
A primeira estrofe é unificada pelo tema da bem-aventurança de encontrar a sabedoria pelos pronomes “ela”/“sua”, remetendo à sabe doria em cada versículo por meio de assonância 45 e de um padrão concêntrico: A Introdução: o pai declara abençoado o 'ãd ãm que encontra a sabedoria B A superioridade da sabedoria aos minerais preciosos B’ Os benefícios da sabedoria são especificados A’ Conclusão: todos aqueles que se apropriam da sabedoria são declarados abençoados
v. 13 vs. 14,15 vs. 16-18a v. 18b
Em AJA' a palavra inicial “abençoado” e final “são abençoados” emoldura a estrofe quiasticamente. A estrofe se intensifica do indivíduo “que acha sabedoria” para “aquele que a segura firmemente”. Em B/ B’, a superioridade da sabedoria aos minerais preciosos é especificada como vida longa com riqueza e honra (v. 16), deleite e paz (v. 17). Overland observa a semelhança estrutural entre os versículos 14, 15 e os versículos 16, 17. Os três primeiros versetos citam qualidades asso ciadas à sabedoria, e o quarto chega ao seu ápice com a expressão abrangente “e todas” .46 A estrofe culmina com a promessa de imorta lidade no versículo de conclusão. 13 Os sábios reservam a exclamação laudatória abençoado/Aew aven tu rad o ( 'aSrê ) para pessoas que experimentam a vida de modo ideal, como era a intenção do Criador. W. Janzen observa que a maioria desses 26 pronunciamentos se refere ao futuro próximo ou distante, mas que o futuro depende de um relacionamento presente com Deus.47 Por exemplo, Elifaz chama aquele que é disciplinado pelo S e n h o r de “bem-aventurado” (Jó 5.1 7; cp. Pv 3.11, 12), e o Senhor Jesus, usando o equivalente grego m akario s, se refere àqueles que são perseguidos e que choram como sendo bem-aventurados em função de sua felicidade futura (Mt 5 .3 - 12). Janzen também observa que o pronunciamento não 45. 3.13-15 apresentam em comum um -â (v. 13) e um S h (vs. 14, 15) no final. O v. 16 em sua parte central tem um S h final; o v. 17 tem um -hã final na palavra inicial e o v. 17, de forma quiástica, tem em sua parte central tanto um S h quanto um -hã finais. 46. Overland, “ Literary Structure in Proverbs 1-9", p. 310. 47. W. Janzen, ‘"aSrê in the Old Testament”, HTR 58 (1965) 223.
confere bênção - esse conceito diz respeito a brk - mas serve, antes, para mostrar um ser humano como modelo a ser invejado e imitado pelo destinatário .48 A cha (m ã s ã ’\ 1.13; cp. Dt 22.23,25,27; Jr 2.34; Pv 1.13) implica numa busca agressiva, não num acontecimento fortuito. Sabedoria (h o k m â ; veja 1.2) é o alvo verdadeiro e acessível do esforço e da busca do ser hum ano ( ’ã d ã m ; veja p. 139). Ele adquire (yãpiq) sabedoria por meio de uma decisão de aceitar o ensino do pai pela fé (veja 2.1 -4; 3.1). N. Habel contrasta essa fé com o paradigma que Horatio Alger apresenta da elevação rápida de um estado de pobreza para um de riqueza por meio da habilidade, da sorte ou do trabalho árduo.49 E nten dim ento (tebúnâ\ veja p. 148) é o apogeu da aspiração humana e o epítome do sucesso, não como um fim em si, mas como um meio de se alcançar vida abundante (3.16; 11.30) e sãlôm (veja 3.2), que é repleta de riqueza e glória, prazer e prosperidade. 14,15 O quarteto a seguir está ligado ao versículo 13 pela conjun ção lógica porque (ki) e pela assonância do -â/ãh final. Esse quarteto comprova a exclamação laudatória comparando a sabedoria obtida com os minerais preciosos - prata e ouro (v. 14), corais e todo tipo de joia (v. 15; cp. Jó 28.1 -11). A metáfora o lucro que ela dá (sahrâ) cuja raiz tem um significado relacionado às transações comerciais (veja 31.14, 18; Is 23.3), aponta tanto a “transação” de comprar sabedoria (veja 4.5-7) quanto a “transação” vantajosa de empregá-la como meio para obter a vida abundante (veja n. 5). Ela é m elhor que o lucro da prata ( m issehar kãsep; veja 2.4), pois o dinheiro pode colocar a comida na mesa, mas não a comunhão ao redor dela, pode dar uma casa, mas não um lar e pode dar joias a uma mulher, mas não o amor que ela deseja de fato. A sabedoria, por sua vez, pode oferecer tanto benefícios físicos quanto espirituais. A comparação da sabedoria com a prata e o ouro (üm êhãüç; veja n. 7) não deprecia a riqueza, mas, para a argumentação funcionar, pressupõe que ela é uma parte essencial da vida plena (cp. 16.16). Habel comenta, “Se a riqueza é um bonum, a sabedoria é o sum m um bonum ” (cp. 8 . 1 0 , l l ) .50 A metáfora sua renda (tP bú^tãh, veja v. 9) esboça os benefícios especi ficados nos versículos 16-18. £ mais preciosa (y^qãrâ h i ’) implica tanto num alto valor qualitativo quanto num escasso total quantitativo.5' Jó 48. Janzen. “ 'a&rê in the Old Testament”. p. 225. 49. N. C. Habel, “ Wisdom, Wealth and Poverty Paradigms in the Book o f Proverbs”, BibBh 14 (1988) 26-49. 50. Habel, “ Wisdom, Wealth and Poverty”, p. 30. 51. S. Wagner. 77)07’, 6:280, s.v.yqr.
reflete que os metais preciosos e joias podem ser obtidos por meio da habilidade e perícia humanas, mas que a sabedoria - mais valiosa que ambos - não pode ser adquirida dessa maneira. Jó compreende que as pessoas não têm o gosto nem a habilidade para comprá-la. A verdadei ra sabedoria é encontrada em outra dimensão que não faz parte das atividades terrenas. Deus reserva para si a tarefa de encontrar e distri buir a sabedoria e de revelá-la às pessoas que a compreendem pelo dom divino da fé (Jó 28.1-28; veja Pv 30.1-6). B. Smith observa que a afirmação ilimitada e todas ( w ek o l ) funciona como um recurso de en cerramento .52 A metonímia coisas desejáveis (h ap ã sêk ã \ veja n. 9) designa toda a classe de metais e joias preciosas nesta estrofe (cp. Is 54.12). Um provérbio talmúdico diz: “Falta-te sabedoria, então o que adquiriste? Adquiriste sabedoria, então o que te falta? ” .53 16, 17 A estrofe seguinte especifica os benefícios da sabedoria que a tomam incomparável a joias. De acordo com C. Kayatz, a ima gem da sabedoria segurando vida longa ( 'õrek y ã m im ; veja 3.2) na sua m ão direita ( b im in ã h ) e, na sua esquerda ( biSm õ‘lã h ), riqueza e honra ÇõSer wekãbôd), é derivada da figura de Ma‘at, a deusa egípcia da sabedoria e da justiça. Várias representações pictóricas egípcias mostram Ma‘at, um equivalente egípcio próximo de h o km â , e outros deuses segurando um sinal de a n k h (“vida”) em sua mão esquerda e, na outra mão, o cetro was, símbolo da imobilidade das colunas dos céus e de domínio .54 Porém, ao colocar a vida na mão direita da sabedoria, o pai lhe dá mais valor que as riquezas e a honra (veja Gn 48.14; Ec 10.2; Mt 25.33). Mas a vida longa sem riqueza e dignidade não é muito desejá vel (veja 3.2). A riqueza é um estado desejável e é a recompensa da sabedoria (veja 3.9,10), não o objetivo da vida da pessoa. Salomão serve de paradigma: ele pediu um “coração compreensivo”, não vida longa e riquezas. Portanto, o S e n h o r o recompensou com esses benefícios tam bém (1 Rs 3.9). Honra (kãbôd ) significa, literalmente, “peso”, uma meto nímia para a estima social que a riqueza confere (veja 3.9). “Há uma correspondência entre o ‘peso’ (gravitas ) de uma pessoa e sua habilida de de galgar os degraus elevados e imponentes do governo.” 55 Em Pro 52. B. Smith, Poelic Closure (Chicago: University o f Chicago, 1968), pp. 182-86. 53. Cohen. Proverbs. p. 17. 54. Kayatz. Sludien zu Proverbien 1-9, p. 105; O. Keel, The Symbolism o f the Biblical World (Nova York: Seabury, 1978), p. 96. 55. McKane, Proverbs, pp. 295-96.
vérbios 8.18a riqueza possui importância ético-social de acordo com a qual aquele que a possui pode influenciar a comunidade a seguir cami nhos justos. As riquezas e a honra também são atribuídas ao temor do Senhor em 22.4, sugerindo mais uma vez que a sabedoria e o temor do S e n h o r são termos correlatos. Seus cam inhos (d erã keyh ã ; veja n. 10; 1.15) são cam inhos agradáveis (darkê-nõ‘am ). Nõ^am indica que o comportamento da sabedoria é bondoso e benéfico .56 Como o mel, essa educação disciplinada é doce para o paladar e curativo para o corpo (cp. 16.24). E todas ( wek o l ) fecha novamente a estrofe (cp. 3.15). O plural repetido suas sendas (n etibôteyhã ; veja 1.15) continua a repre sentar os vários provérbios individuais ligados ao comportamento da pessoa ao percorrer o caminho da sabedoria (veja 2.8). Paz e p ro sp e ridade (Sãlôm ; veja 3.2) são substantivos, não adjetivos, “pacífico e próspero”, vis-à-vis, a paz e a prosperidade em si (veja “eu era as suas delícias” em 8.30). 18 Este versículo conduz a estrofe a uma conclusão climática, indo além dos sumários de encerramento dos versículos 15 e 1 7 .0 conceito de uma árvore de vida ( ‘ês-hayyim \ veja Pv 11.30) para representar a vida eterna faz parte da cultura do antigo Oriente Próximo da qual Israel participava. Ela é mencionada em Gênesis 2.2; 3.22,24; Provér bios 3.18; 11.30; 13.12; 15.4e, posteriormente, na literatura escatológica judaica (4Esd 8.52; Ap 2.4 e 22.2), e em fontes mandeístas e maniqueístas.57 Fora de Provérbios, a imagem representa figurativamente a imortalidade; em 13.12; 15.4 e Apocalipse 22.2 também significa cura (cp. Ez 47.12). Assim, devemos supor que, neste caso, o símbolo tam bém representa as noções inseparáveis de cura e imortalidade (veja 3.8). Essa interpretação é apoiada pela literatura religiosa do antigo Oriente Próximo (1.9), por outros textos da 1iteratura sapiencial do An tigo Testamento (e.g., SI 49 ;58 Jó 19.25-27) e pelo livro de Provérbios (veja 12.28; 14.32).59A narrativa de Gênesis apresenta 'ãdãm buscan 56. HALOT, 2:706, s.v. nõ'am. 57. R. Marcus, "The T reeof Life in Proverbs”, JBL 62 (1943) 118. 58. G von Rad ( Wisdom in Israel [Londres: SCM, 1972], p. 204) diz: “Assim, a solução mais provável é entender a sentença [SI 49.16] como a expressão de esperança de uma vida de comunhão com Deus que se estende além da morte”. 59. Toy (Proverbs, pp. 66-67) afirma arbitrariamente que se trata de uma expressão figurativa para vida longa c paz, e Gemser (Sprüche, p. 22) declara categoricamente que a figura não tem mais o seu “realistisch-magischen Ciedanken” original. Plõger (Sprüche, p. 38) acredita que o conceito tem suas raízes nas histórias do antigo Oriente Próximo sobre o paraíso, mas Meinhold (Sprüche, p. 80) observa que esses mitos mencionam uma “planta da vida”, não uma “árvore da
do uma sabedoria independente de Deus ao lançar mão da árvore do conhecimento do bem e do mal (i.e., formular as próprias leis acerca do certo e do errado, um direito que pertence exclusivamente a Deus) .60 Sua rebelião resultou em sua exclusão da árvore da vida. Os seres humanos recuperam essa árvore ao se humilharem e receberem as palavras de vida eterna pela fé. Na iconografia do antigo Oriente Pró ximo, a árvore é ladeada por criaturas e toca as criaturas ao seu redor, supostamente como sua fonte de vida e força. Daí o pai falar não da queles que comem do seu fruto, mas daqueles que se apropriam dela (lam m ahaziqim bãh\ veja 7.13; 26.17) e, num paralelo quiástico, daque les que a seguram firm em en te (w etõ m ekeyhã). O pronome se refere à sabedoria, que na metáfora foi equiparada à árvore da vida. Na icono grafia do antigo Oriente Próximo, divindades, seres humanos e animais aparecem com frequência ladeando o que se acredita ser a árvore da vida e, por vezes, a seguram com suas mãos ou cascos. T ãm ak pode significar “se apropriar de” ou “segurar com força” (28.17).61 É prová vel que “se apropriar” hãzaq be se refire a “achar” e “adquirir” no versículo 13, e tã m a k serve de transição para “não se afastar” no ver sículo 21 (veja n. 12). Se esse é o caso, então, contextualmente “segu rar firmemente” é a melhor opção. Em resumo, Provérbios funciona de maneira simbólica (e provisional), uma vez que a “árvore da vida” foi perdida em Gênesis 2.22-24. Ao incluir essa metáfora com certa preeminência, o autor deixa claro que até que alcancemos a “árvore da vida vida". Marcus (‘T ree o f Life", pp. 117-20) afirma que em Provérbios “árvore da vida” tem o mesmo sentido que o termo do Heb. posterior sm hyym, “medicamento que dá vida” ou “remédio", não imortalidade, mas as expressões são diferentes. Também faz distinção entre seu simbolismo de imortalidade na literatura escatológica judaica e seu simbolismo de cura na literatura sapiencial judaica, mas argumenta em círculos, pois cita apenas o livro de Provérbios para o último caso. Em seu comentário de 1970, McKane ( Proverbs, p. 296) entende a expressão como sendo "apenas uma bela figura de linguagem”, mas em sua revisão da NEB de 1974 (“Textual and Philological Notes”, p. 81) rejeita a tradução "vara da vida”, dizendo: “é importante não obliterar a ligação entre hayyím em Provérbios e hahayyim cm Gênesis 2.9 e 3.22, nem separá-la da árvore da vida em seu contexto mais amplo de mito e ritual” . Kayatz (Sludien ni Proverbien 1-9, p. 106) liga o conceito à religião egípcia. De acordo com ela, a religião egípcia dos mortos apresenta um conceito rigidamente definido de se agarrar a determinada árvore com o objetivo de obter vida. O indivíduo segura os dois sicômoros do outro lado do rio da morte para chegar ao reino da vida eterna: a árvore Isched egípcia também garante a vida eterna. No entanto, os textos egípcios não falam de uma árvore da vida. Além disso, ela não reconhece que em Provérbios 3.18 o discípulo agarra “a ela” (i.e., hokmá [fem.]), não a árvore ('<>$ [masc.]). 60. Waltke, Genesis, p. 86. 6 1. HALOT, 4:1751, s.v. tmk.
que se encontra no paraíso de Deus” (Ap 2.7), nos apegamos firme mente à sabedoria vivificadora do livro de Provérbios e, o que é mais importante, a Jesus Cristo, que suplanta a sabedoria de Salomão (veja pp. 190-191). O pai volta eloquentemente ao singular são declarados, cada um deles, abençoados ( m e ’uSSãr ), ligando a última palavra da estrofe gramaticalmente, bem como lexicamente, à sua palavra inicial. (2) O valor da sabedoria para o S e n h o r (3.19,20)
Plõger62 e Overland63 sugerem, independentemente, que a referên cia à árvore paradisíaca da vida na antiguidade, no versículo 18, provê um ponto de articulação entre as estrofes. A segunda estrofe intensifi ca o elogio do pai à “sabedoria” e ao “entendimento” da aclamação do seu valor para ’ãdãm para o louvor do seu valor para o próprio Criador. O paralelismo de hokmâ e t?búnâ nas primeiras linhas dessas estrofes (vs. 13, 19) mostra que, nessa estrofe, o pai está se referindo a seu ensino (veja 1.3; 2.2). O S e n h o r criou o mundo habitável (3.19,20a) e sustenta sua vida (v. 20b) por meio da sabedoria. Esta estrofe e a se guinte suplementam a ligação entre o S e n h o r , a sabedoria do pai e o filho. Em Provérbios 2 o ensino do pai mediou a sabedoria do S e n h o r ao coração do filho (2.1, 5 , 6 , 10). Agora, se o filho se apegar à sabedoria, ela também estabelecerá e preservará a sua vida. A estrofe toma por certo que a sabedoria é anterior à criação, mas essa argumentação só é desenvolvida em 8.22-31. 19 A sabedoria também é de grande valor para o S e n h o r . De acord com a Coleção I, por meio dela ele criou a terra (3.19; 8.22-31) e a sustenta (3.20; veja pp. 115-116). A posição inicial de YHWH justapõe enfaticamente o S e n h o r com 'ãdãm (v. 13). O restante do versículo é organizado de maneira quiástica, com a moldura externa se referindo aos instrumentos da criação e a moldura interna aos atos criativos. Pela sa bedoria (hokmâ, versículo 13) com referência à criação indica os pesos imensuráveis do vento e do mar, os caminhos percorridos pelos raios sem deixar vestígios e as complexidades da ecologia. Ninguém pode entender o que é sábio sem entender o todo, como Salomão (8.22-31), Agur (veja 30.1 -6 ) e o editor de Jó conheciam (28,31 -41). R. E. Clements diz: “En quanto o ‘espírito’ [cp. Gn 1.2] enfatiza o aspecto do poder divino [na 62. Plóger, Sprüche, p. 38. 63. Overland. “Literary Structure”, p. 293.
criação], a ‘sabedoria’ aponta para a sua natureza intencional e inteligen te”. 64 A sabedoria humana que implica sobriedade, bom senso, prudên cia, planejamento cuidadoso, trabalho árduo, paciência e todas as outras virtudes ensinadas em Provérbios (cp. Jr 10.12; SI 104.24) tem sua base dentro do amplo escopo da sabedoria do S e n h o r . Se, ao usar a sabedoria como sua ferramenta, o S e n h o r realizou as maravilhas das diferentes fases da criação - colocar a terra em seus fundamentos separando as águas primevas e colocar os céus em seu devido lugar e regar a terra com o orvalho das suas nuvens - pense no que sua sabedoria revelada fará com a vida daqueles que a encontrarem .65 Entendimento (fibünâ; veja 3.13) é o paralelo comum da sabedoria. O merisma fundou a terra (yã sa d *ãres) e estabeleceu os céus (kônên sã m a yim ) abrange a cria ção firmemente estabelecida de todo o cosmo.66 Yãsad , “fundou” retrata figurativamente ares (veja 2 .2 2 ) como estando fundamentada num ali cerce firme para ter estabilidade e permanência.67 Seu paralelo, kônên , “estabeleceu”, também indica firmeza.68 A ideia de firmeza, estabilidade e permanência do cosmo por meio da sabedoria combina com sua dádiva de “vida longa” aos seres humanos, retratada como a “árvore de vida”. 20 Além de estabelecer a terra de uma vez por todas, o S e n h o r a sustenta com as águas vivificadoras. O S e n h o r não recria a terra, mas sim a renova. O versículo 2 0 a elabora sobre a criação usando a imagem mitológica da divisão das águas primevas e o versículo 2 0 b vai além da criação do mundo habitável e trata do seu sustento pelas águas vivificadoras. A oposição de profundezas repletas de água e orvalho do céu une os dois versetos.69 P or seu conhecimento (bed a 'tô ; veja 1.2, 7) no ver sículo 20 é um paralelo de “sabedoria” neste quarteto (veja 1.7).70 As profundezas (fíh ô m ô t) indicam as profundezas primevas, não as atuais águas subterrâneas e/ou oceanos como em Salmos 71.20 e 135.6. Fo ram abertas (n ib q ã 'ü ) em conjunção com “fundou” e “estabeleceu” se refere à situação por ocasião da criação (cp. Gn 1.9, 10; Jó 38.8-12; SI 64. R. E. Clements, “ Wisdom” in ll Is Written: Scripiure Ciling Scripiure: Essays in Honour o f Barnabas Lindars, SSF, orgs. D. A. Carson e H. G M. Williamson (Cambridge: Cambridge University, 1988). p. 70. 65. Hubbard, Proverbs, p. 75. 66. R. Mosis, TDOT, 6:114, s y.ysd. 67. Mosis, TDOT, 6 :111. 68. E. Gerstenberger, TLOT, 2:604, s.v. kün. 69. Deuteronômio 33.13 também combina o orvalho do alto com as profundezas abaixo. 70. “ Em Provérbios ... da‘at (40 ocorrências) e hokmá (39 ocorrências)... podem ser usados de modo intercambiável"(G J. Botterweck. TDOT, 5:465, s y.yS d a ).
104.8-13). O verbo tem um sentido hostil, provavelmente mantendo a imagem, não a teologia, da antiga batalha dos mitos da criação. Nessas teomaquias, uma divindade criadora abre o que Gênesis 1.2 chama de “abismo” (t?hôm) para libertar as forças essenciais da vida (terra, céu e águas vivificadoras; cp. SI 74.13,14; Is 27.1; 51.9).71 Esse sentido bene ficente resultante forma um janus com o orvalho benéfico no paralelo. Em seguida, o versículo justapõe a água beneficente que goteja do céu com as profundezas libertadas, cada uma contribuindo para a vida. E as nuvens (sehãqim) significa, aqui, “nuvens que dão água na forma de orvalho e/ou chuva” ( S I 77.17[18]; Jó 36.28).72 Gotejam (yir'ap ü ), em suas outras duas ocorrências, significa “derramam” (Jó 36.28) e “fluem” ( S I 65.12[ 13]), não apenas “pingam”, e a forma verbal aponta para o fato de o S e n h o r regar a terra regularmente.73 Depois que o sol se põe, o vento ocidental traz umidade suficiente do mar e, durante a noite, ela cai na forma de orvalho abundante ((ã l; cp. Ct 5.2). No verão quase sem chuva de Canaã, a terra dependia dessa umidade para a vida, de modo que o orvalho é mais impressionante para os orientais do que para os ocidentais que, tendo chuvas em maior quanti dade, não dependem tanto do orvalho. A edificação implícita dos elementos tripartidos do mundo - terra, céus e mares - por Deus, como uma casa com um alicerce firme por meio de “sabedoria, entendimento e conhecimento” exemplifica o dis cípulo que constrói sua casa de acordo com as mesmas virtudes (24.3, 4; cp. Sl 127.1).74 71. M. K. Wakeman (Gods Ballle wilh the Monsler: A Study in BíblicaI Imagery [Leiden: E. J. Brill, 1973]) analisou doze mitos de batalha da Suméria. índia, Anatólia, Mesopotâmia, Grécia c Canaã. Concluiu que todas essas teomaquias são "mais ou menos a mesma coisa”: (1) um monstro repressor (e.g., Tiamate), (2) a derrota do monstro por um deus heróico (e.g., Marduque que, com isso, liberta as forças essenciais à vida) e (3) o controle final do herói sobre essas forças. Overland (“Litcrary Structurc in Proverbs 1-9", p. 312; cp. Scott [Proverbs, p. 48]) acredita que a alusão literária diz respeito aos oceanos primevos no tempo do Dilúvio, pois a única outra passagem em que bãqa' “romper” é usado com tehòm “abismo" é Gênesis 7.11. No entanto, o fraseado não é exata mente o mesmo e bãqa é usado de modo oblíquo com fthòmôt no Salmo78.1 5.0 orvalho é sempre benéfico (Gn 28.29; Dt 32.2; 2Sm 1.21; Pv 19.12; Mq 5.6[7]; Ag 1.10) de modo que o conceito de desestabilizar a terra destoa dos outros três versetos da estância. J. A. Emerton (‘“ Spring and Torrent’ in Psalm LXX1V 15”, VTSup 15 [1966] 127), McKane ( Proverbs, p. 297) c Plõger (Sprüche. p. 38) argumentam que a expressão se refere às fontes que jorram das profundezas, mas não interagem com os argumentos apresentados aqui. 72. HALOT, 4:1465, s .v.sahaq. 73. Um não-perlectivo comum (IBHS, p. 506, P. 3 1.3e). 74. Na cosmovisão bíblica, Deus criou os céus e a terra como seu templo (veja Sl 29; 104; Is 6.3; 66.1; Mt 5.34, 35; cp. Sl 78.69). R. Van Leeuwen ("Building God’s House”, in WlVis, pp.
(3) O valor da sabedoria para o filho (3.21-26) Na estrofe final o pai muda do modo indicativo empregado para descrever o papel da sabedoria na criação e para a humanidade em geral para o imperativo urgente para utilizá-la. O jogo de palavras com nãsar “guardar” (ou “conservar”; v. 21) e Sãmar, “conservar” (ou “guardar”) um par paralelo comum (veja 2 .8 ), constitui um inclusio ao redor da estrofe. Se o filho “guardar” a sabedoria do S e n h o r (v . 2 1 ), o S e n h o r o “guardará” de ser “capturado” (lãked), um termo cunhado para refor çar a reciprocidade (v. 26).75 A moldura cerca uma estrofe unificada pelo uso de “tu/teu” em todos os versetos, pela referência a partes do corpo (“olhos”, “pescoço”, “pé”, “lado”) e pelo tema da segurança. Essa unidade emoldurada argumenta contra a ligação dos versículos 25, 26 com os versículos 27-35, que têm a própria estrutura unificada. 76 A estrofe consiste em três quartetos: a admoestação para dar atenção ao ensino (vs. 21, 22), a argumentação que conduz à segurança (vs. 23, 24) e, assim, a admoestação para não temer porque o S e n h o r dá segu rança (vs. 25,26), sugerindo que o S e n h o r está por trás do ensino. 21, 22 O discurso dirigido novamente ao filh o m eu (veja 1 .8 ), in troduz a estrofe climática - para o destinatário não inicial (veja 1.15; 3.11). Que eles não se afastem ( 'al-yãluzú ) intensifica os verbos da aquisição “achar”/“obter” (v. 13), e de compreensão “apropriar-se”/ “segurar firmemente” (v. 18) para retenção, como em 1 .8 e, na ordem inversa, em 3.1. O pronome obriga a audiência a procurar por seus antecedentes em sabedoria e entendim ento em 3.13, 20 (veja n. 75). D e teus olhos (m tê n e y k ã ) sugere que o ensino foi visivelmente pre servado, apesar da recepção original provavelmente ter sido oral (cp. 1 .8 ; 2 .2 ), e significa que é necessário dar atenção constante e diligente ao ensino e não negligenciar nem ignorar um só detalhe (cp. 4.21). Guarda (n esô r ; veja 2.8; 3.1; cp. 3.26) o ju lg a m en to sadio (tü siy â ; veja 2.7) e a prudência (ü m ez im m â \ veja p. 146) de modo que se tornem (w ey ih y ú ; veja n. 17) vida (hayyim \ veja pp. 157-161) p a ra ti 204-8), chama a atenção para o uso de “sabedoria, entendimento e conhecimento” para a construção do tabemáculo por Bezalel (Ex 31.1-3; 35.30, 31), para a construção do templo por Hirâo ( t Rs 7.14) e para a edificação da casa do discípulo (24.3, 4). Ele chega à conclusão de que nosso trabalho deve ser modelado segundo a obra de Deus e determinado por ela, a fim de “harmonizar-se com a casa cósmica de Deus, preservar e restaurar a criação como glória de Deus onde habitar e tomar a glória de Deus manifesta na cultura humana”. 75. Veja n. 2. 76. Paee Whybray (Proverbs, pp. 69,71) c Van Leeuwen (Proverbs, p. 47).
(nepeS ; veja p. 140). Combinando com a vida dentro da garganta, o sentido original de nepeS é um adorno atraente (h ê n , i.e., um colar) do lado de fora, ao redor do pescoço {gargerõteyka\ veja 1.9; cp. 3.3). 23, 24 Então (’5z; veja 2.5, 9) liga a condição implícita de o filho guardar a prudência (v. 2 1 ) e, desse modo, obter a vida e o favor (v. 2 2 ) com a promessa de que ele terá segurança (vs. 23, 24). O merisma do movimento de caminhar (v. 23) e o descanso de se deitar (v. 24) ligam esses dois versículos numa estrofe que significa segurança em todo o tempo e em todas as situações. A declaração geral e metáfora andarás... no teu cam inho (têlêk... darkekã', veja 1.15) com segurança (lãb efa h ; veja 1.33) é seguida da concretização e o teu p é (w eraglek 5; veja 1.16) não tropeçará (lõ'tiggôp\ lit. “não toparás [com o pé (numa pedra)]”; cp. Sl 91.12).77 Normalmente a raiz ngp indica “bater/golpear, causan do ferimento grave (até fatal)” .78 A partícula de hipótese se ( ’im ; veja 1 . 1 0 ) se refere à situação mais vulnerável, quando te deitares (tisk a b ; veja n. 19). O rei egípcio Amenemhet (ca. 1960 a.C.) adverte seu filho: “Mesmo quando estiveres dormindo, guarda, tu mesmo, o teu coração, pois nenhum homem tem adeptos no dia da aflição” .79 O sábio, ao con trário, garante a seu discípulo que ele não tem erá (lõ'-tiphãd veja 1.26, 33). E quando adorm eceres (w esã ka b tã ; veja ns. 19, 20), o teu sono {Senãteka ) será agradável (w e'orbâ ; i.e., livre de perigos reais e/ou pesadelos, Jó 7.13-15, e terrores, Sl 91.5; cp. 127.2). O sono revigoran te é negado aos viciados (Pv 4.16) e aos ricos (Ec 5.12[ 11 ]). O sono doce (cp. Jr 31.26) é fruto da fé em Deus (Sl 3.5[6]; 4.8[9]) e da sabedoria (Pv 6.22; 19.23). 25, 26 “Porque” unifica a última estrofe, a palavra-chave p a h a d “ruína”/“calamidade” (vs. 24, 25) a liga à segunda estrofe, e a ordem negativa urgente ’al, à primeira.80 O tema da segurança une toda a estrofe. A ordem não tem as ( 'al-tírã ’) é interpretada como uma oratio variata (veja 3.4), uma forma poética de reforçar “uma forte promessa subjacente” ,81 ou uma ordem real (cp. Dt 20.3; Is 10.24). No último caso, é o “outro lado” da ordem positiva “confia no S e n h o r ” (3.5). O 77. HALOT, 3:669. 78. BDB, p. 619, s.v. nãgap. 79. AN ET, p. 4 18. 80. De acordo com Cox (Proverbs, p. 123), esta “é a única ocorrência da forma negativa de temor na literatura sapiencial". 81. Perowne, Proverbs, p. 56.
destemor pode ser ordenado, pois, como o versículo 26 explica, o pró prio Deus poupará o filho da repentina (p it^m ', vejan. 22; cp. lTs 5.3) ruína (m i$$õ’at; veja Pv 1.27) dos perversos (r ^ stfim , veja n. 24; pp. 164-165), quando v ie r (k i tãbõ’; veja 1.27). Jesus fala mais claramen te de um dia de julgamento, quando ele separará as ovelhas dos bodes e os peixes bons dos maus, não se tratando de um infortúnio aleatório. Porque (k i ) confirma e motiva a ordem de 3.21. O S e n h o r ( YHWH\ veja pp. 114-115) estará (yihyeh) confere ao verbo seu sentido estativo, não ativo (ao contrário do v. 2 2 ) e toma a promessa condicional, mediante o cumprimento das condições do versículo 25.82 A o teu lado (bekislekã; lit. “junto ao teu quadril”, Lv 3.4,1 0 , 15; S I 38.7[8]; Jó 15.27) é uma tradução melhor que “como tua segurança” por motivos filológicos, contextuais e lógicos. A KBL favorece a volta ao latus (“lado”) proposto por Jerônimo. Kesel significa com frequência “flanco/quadril” no equilíbrio ugarítico entre “pé e kesel" P Em termos contextuais, essa estrofe apresenta partes do corpo (olhos, pescoço, pé, quadril). Em termos lógicos, se o S e n h o r será a segurança do filho, não há necessi dade de admoestá-lo a não temer. O S e n h o r estará bem ao seu lado na ocasião do julgamento, como esteve ao lado de Noé e Ló e suas famí lias (2Pe 2.5-9). E, como resultado de sua presença, ele guardará (weSãm ar ; veja 2.8; 3.21) o teu p é (raglekã\ veja v. 22), mostrando que o S e n h o r é a fonte oculta de firmeza. Overland argumenta que o poeta cunhou a expressão da captura (m illã k e d ) para conferir unidade à estrofe. O verbo Iqd ocorre mais de 1 2 0 vezes, mas somente aqui como um substantivo. Além disso, outras palavras na esfera semântica de calamidade se encontram próximas, de modo que o poeta não tinha necessidade alguma de criar um termo. Overland argumenta que ao cunhar esse termo ligado a Sãmar, o poeta combinou a ideia do S e n h o r guardar o pé do perigo, que une os versículos 23-26, com seu sinônimo n sr no sentido de guardar em memória no versículo 2 1 . b. Lição: obrigações p a ctu a is p a ra com os vizinhos (3.27-35) O exórdio foi concluído com uma ordem urgente para “não fazer X” + “porque” (k i\ 3.25,26), formando uma transição estilística para a 82. IBHS, pp. 511-13, P. 31.6.2. 83. M. Held (“ Studies in Comparative Semitic Lexicography”, in Sludies in Honor o f Benno Landsberger [Chicago: University o f Chicago, 1965], pp. 395-406) argumenta que significa nervos ou tendões.
lição, que também começa com ordens urgentes, de “não fazer X” (3.27-31), acompanhadas de motivos (ki\ 3.32-35). O mais apropriado é tratar esta estrofe, originalmente isolada, como a lição da quarta pa lestra; de outro modo ela fica separada das palestras formais sem a introdução típica que indica o destinatário, uma admoestação para ouvir e os argumentos motivadores. O tema da segurança também diz res peito a todas as três estrofes da estância anterior, especialmente às duas últimas, apesar de ser pressuposta na promessa de vida eterna na primeira estrofe e de estabilidade do cosmo na segunda estrofe. A lição sobre ser um bom vizinho para com o necessitado (vs. 27-30) a fim de receber a bênção do S e n h o r , não sua maldição (vs. 32-35), oferece uma aplicação prática à ordem urgente do pai para não deixar a “bon dade e fidelidade” se afastarem (3.3) a fim de obter o favor de Deus (3.4). O exórdio termina com a promessa de que o S e n h o r guarda o sábio de ser apanhado numa armadilha, mas o novo poema começa com um bom vizinho necessitado de ajuda. A tensão entre a promessa e a realidade representa duas faces da verdade: o S e n h o r protege seu parceiro na aliança da condenação que sobrevirá aos perversos, mas, nesse ínterim, a pessoa boa pode se ver necessitada de algo, como fica implícito em 3.3 e é afirmado mais claramente em 3.34 (veja p. 163). A estância sobre ser um bom vizinho consiste de duas estrofes de extensão igual, ligadas por uma linha central (ou janus): A Mandamentos: obrigações para com os bons vizinhos B Linha central (oujanus): não inveje um vizinho violento C Argumento: o S en h o r castiga os perversos, mas abençoa os retos
vs. 27-30 v. 31 vs-32-35
A ligação lógica entre as ordens para ser um bom vizinho e o argu mento mostra que o comportamento social e a teologia se encontram entretecidos. (1) Mandamentos: obrigações para com os bons vizinhos (3.27-30) A primeira estrofe é constituída de dois quartetos que ensinam a não reter o “bem” (i.e., a ajuda) imediato ao bom vizinho (vs. 27,28) e a não prejudicá-lo de maneira alguma (vs. 29,30). Em termos sintáticos e estilísticos, os dois quartetos também estão ligados em seus versetos A pela anáfora inicial dos mandamentos urgentes “não faça X”, e em
seus versetos B pelas situações que qualificam o mandamento. Eles também estão ligados pelos pecados justapostos de omissão (vs. 27, 28) e de comissão (vs. 29-30), pela epífora de ’ittãk (“contigo”) que encerra os versículos 28 e 29, e pela palavra-chave rê'aykã “teu(s) próximo(s)” nos versetos A dos versículos 28 e 29. Além disso, o pri meiro versículo de cada quarteto diz respeito a ações, e o segundo, a palavras. Numa anábase, os quartetos e a linha central ampliam a es trutura de referência com respeito ao próximo de um peticionário (vs. 27,28), para um próximo confiante (vs. 28,29) e deste para a humani dade em geral ( ’ãdãm ; v. 30). Porém, numa catábase, as admoesta ções da estância endurecem progressivamente quanto à injustiça co metida contra o próximo começando com a retenção da ajuda (vs. 27, 28), passando para a maquinação do mal (vs. 29, 30) e, por fim, para a manifestação de qualquer forma de violência contra o próximo (v. 31). 27, 28 Além do contraste entre o pecado de deixar de ajudar um vizinho necessitado e o pecado de feri-lo, este par de provérbios é distin to do seguinte pela mudança do plural implícito em “daqueles a quem é devido” para o singular “próximo”. 27 Não retenhas ('al-timna; veja 1.15) o bem (tôb\ veja 2.9,20) d a entender que os próximos estão necessitados de bondade confiável (hesed we^met", veja 3.3). Apesar de (ôb poder se referir ao bem ético (2 .20 ) como objeto de “reter”, a pertinência semântica exige que seja entendido como o bem tangível (31.12). A metonímia permite que a ad moestação designe qualquer objeto (como dinheiro), ação (como a admi nistração de justiça) ou situação (como ferimentos) que tem utilidade prática e relevância para os necessitados. Daqueles a quem este é de vido (míbbe'ãlãyw; i.e., que têm direito a ele) traduz uma construção excepcional que significa literalmente, “o bem de seus possuidores” .84 Não pode significar “não retenhas benefícios daqueles que já possuem o bem” (i.e., benefícios), pois isso não seria convincente. É possível que o sentido seja, “Não retenhas o bem daqueles que são bons” (cp., “da queles que o merecem” NIV). Se esse é o caso, “possuidor” (ba'al) é uma palavra de status, indicando o proprietário/possessor de um objeto que personifica sua maneira, natureza, qualidade ou caráter. Um cog nato acadiano dessa expressão hebraica ímpar quer dizer “benfeitor” .85 84. A LXX parafraseou adsensum como "para os pobres/empobrecidos” (como também Ibn Ezra). A Targ. omite a palavra. 85. HALOT, 1:143, s ,\.ba'al.
No entanto, isso exige que o leitor reinterprete o significado do prono me antecedente de maneira duvidosa como “bem” ético e não físico. Meinhold chegou à conclusão mais provável de que ba'al significa “Besitzer/Herr (von Anspruchen)”, “possuidor/senhor (de direitos)” .86 Fox apresenta dados filológicos de um paralelo em aramaico que apoia im plicitamente sua proposta intuitiva. De acordo com Fox, num papiro elefantino, b'l tbtkm “significa, aproximadamente, alguém que tem di reito sobre as boas graças [da sua casa]” ou “um indivíduo para com o qual se têm ou tinham obrigações”. Ele explica que isso significa que alguém tem o direito moral à sua assistência (Pv 3.27) e ilustra a ideia com uma pessoa cujo jumento em virtude do peso da sua carga (Êx 23.40). “Se você puder ajudar esse homem, tem a obrigação de fazê-lo mesmo que ele seja seu inimigo [itálico dele].” 87 De acordo com Deuteronômio 24.19, na providência de Deus, aquilo que os ceifeiros dei xavam de apanhar pertencia à viúva, ao órtao e ao estrangeiro .88 Pessoas más como o preguiçoso (cp. 19.24; 2Ts 3.10,12), a sangues suga (Pv 30.15) e o servo mal acostumado (29.21) não são boas nem têm direito legal sobre a beneficência. O verseto B qualifica a admo estação: quando tu tens o poder de ja zer [o bem] (bihyôt le ’êl yãdeyka la'°sôt; veja n. 32; 2.14). A Bíblia não pede que o fiel dê aquilo que não tem (2Co 8 .12; G1 6 .10), e o adverte para não servir de fiador de desconhecido (veja 6 .1 -5). 28 No entanto, a admoestação é intensificada por uma advertência para não temporizar. Não digas ( ’al-tõ'mar, veja 1.11) representa dra maticamente a verdade para resistir à tentação de se demorar em fazer o bem, quer por preguiça, indiferença, egoísmo, capricho, desejo de poder ou qualquer motivo. Ao teu próximo (lerê'akã) é um termo amplo para “aquelas pessoas com as quais se tem contato e com as quais é preciso viver em função das circunstâncias da vida” .89Abrange desde um amigo próximo que “em todo tempo ama” (veja 17.17; cp. 22 . 1 1 ; 27.9, 10), passando por uma pessoa a quem “se faz companhia à mesa 86. .Meinhold, Sprüche, p. 86. 87. Fox, Proverbs, pp. 164-65. 88. Os mestres dc Israel instruíam seus discípulos a se manterem atentos à dor e à pobreza (10.15; 13.8; 14.20) e seu perigo (30.8, 9) e a reconhecerem os atos de bondade a favor dos pobres como uma virtude que agrada a Deus de modo especial (cp. 11.17, 24-26; 14.21, 31; 19.17; 21.26; 22.9; 28.27; 29.7, 14; 31.6, 7, 20; Sl 37.21; Mt 25.3-46; Mc 9.41; Lc 10.29-37; Rm 13.8; G1 6.10; E f 4.28; lTs 4.15; Tg 5.4). 89. HALOT, 3:1254, s.v. f ê d .
e com a qual se trocam saudações amigáveis”90 até outra pessoa em qualquer relacionamento (veja 3.28; 6.1,3,29; 11.9,12; 14.20,21; 16.29; 17.18; 18.17, 24; 19.4, 6 ; 21.10; 24.28; 25.8, 9, 17, 18; 26.19; 27.17; 29.5). Jesus definiu, não redefiniu, nosso próximo como alguém com quem nos deparamos e que se encontra necessitado de ajuda (Lc 10.2936). Vai e volta (lêk wãSüb; veja 1.15, 23) ilustra de modo dramático uma maneira de reter os benefícios por deferimento (cp. Lc 18.2, 3). E amanhã to darei ( ü m ã h ã r’ettên) visa mais se livrar do peticionário do que lhe prometer auxilio .91 “A ajuda que se demora pelo caminho não é ajuda nenhuma.” 92 Publilius Syrus (50 a.C.) disse, bis dat, qui cito dat, “Aquele que dá com presteza dá duas vezes” .93 Sendo que j á o tens contigo (weyês ’ittãk - observe a assonância com 'ettên ) é paralelo a “quando tu tens o poder de fazer o bem” (v. 27), ligando mais estreita mente os dois versículos da estrofe. “[Estejam] prontos a repartir”, diz o apóstolo (lTm 6.18; Tt 3.1; cp. 2Co 8.10). 29,30 O segundo quarteto intensifica o comportamento antissocial de não reter os benefícios do próximo necessitado para não tramar o mal contra o próximo confiante. Não planejes ( ’al-taharõS) traduz de um verbo que significa concretamente “arar” e, figurativamente, sem pre com tom ético, “preparar [i.e., planejar]” atos bons ou maus (3.29; 6.14, 18; 12.20; 14.22; ISm 23.9). Rashi supõe plausivelmente que os dois conceitos estão ligados, pois a “aragem” é a preparação para a semeadura.94 Se “bem” se refere a alguém ou algo que beneficia a vida (3.27), mal (rã'â ; veja 1.16, 33; 3.7) contra o teu próximo (al-rêíokã\ observe a assonância de 'al-reiakã rã'â; cp. Sl 15.3) se refere àquilo que prejudica sua vida. O qualificador tautológico enquanto ele habi ta... contigo (weh ú ’-yôSêb) ressalta confiadamente (lãbetah\ i.e., o estado psicológico de se sentir seguro [veja 1.33; 3.5]) contigo {'ittãk - observe a epífora).95 McKane comenta que a confiança é “uma con dição indispensável para a comunidade” .96 O próximo se sente seguro 90. Gemser, Sprüche, p. 23. 91. Para ilustrações veja Joseph Telushkin, Jewish Wisdom: Elhicaland SpiritualandHistorical Lessonsfrom lhe Great Works ofThinkers (Nova York: W. Morrow, 1994), pp. 54-57. 92. Aitken, Proverbs, p. 5 1. 93. Cohen, Proverbs, p. 19. 94. Citado por H. Ringgren, TDOT, 5:222, s.v. hãraç. 95. A Bíblia fornece vários exemplos de traição desprezível (17.13; cp. Gn 34.13-29; ISm 18.17, 18; 2Sm 3.27; 20.9, 10; Sl 55.12-14[ 13-15]; Jr 41.12; Mq 2.9; Jo 13.2). 96. McKane, Proverbs, p. 300.
porque nâo fez nenhum mal e, portanto, além de ter direito à bondade, não tem nenhum motivo para suspeitar de traição vil (cp. “sem razão” em 3.30a). Se o próximo fosse culpado de algum mau procedimento, teria motivo para temer a calamidade que está sendo preparada para ele. Quando as pessoas renunciam a seus apetites excessivos, devem ser capazes de se sentar sob as próprias vinhas e sob as próprias figuei ras sem que ninguém as aterrorize (Mq 4.5), mas a condição de não cobiçar existe somente no reino messiânico (cp. Rm 3.10-18; Mq 2.3,4). 3.29 e 30 estão ligados pela palavra-chave m 'c, “mal” em sua mol dura externa (vs. 29a, 30b) e pelo conceito de “sem razão” em sua parte central (vs. 29b, 30a). Não levantes uma acusação ( ’al-tãrib; veja n. 36) restringe a preparação do mal a levantar uma acusação infundada contra qualquer pessoa e, desse modo, perturbar a comunidade. Acu sação (rib) significa “reivindicar o direito de”. Prevê uma situação na qual uma parte ofendida faz uma queixa oral contra a parte considerada responsável pela ofensa (veja 22.23; 23.11; 25.9).97 Uma pessoa ( 'ãdãm; veja 3.4, 13) indica as limitações e potenciais do próximo sob Deus. Sem razão (hinnãm ; veja 1.11) na segunda parte do cerne da estrofe (v. 30a), explica parcialmente por que o próximo vive confíadamente na primeira parte (v. 29b). O paralelo, se ela não te fez mal ( ’im-lõ’gemãleka ra â ) detalha “sem razão”. O ato de iniciar deliberadamente um pleito legal contra alguém que não lhe fez nenhum mal deve ser atribuído à malignidade perversa e/ou à cobiça por lucro (veja 1.19). (2) Linha central {janus): não tenha inveja de um homem violen to (3.31) A linha central enfática se destaca tanto pela mudança de assunto, de vizinhos bons e confiantes para o vizinho violento, quanto pela ruptu ra do padrão no verseto B, de uma ordem qualifícadora para a repeti ção de “Não faças X”. A ordem dupla adverte enfaticamente contra a imitação da pessoa violenta até mesmo nos menores detalhes (v. 31 b). Não tenhas inveja (al-fiqannê’) especifica de maneira ampla a atitude irascível de uma parte contra a outra que lhe é rival. Aqui, qn tem o sentido mais específico de “ter inveja de, ser invejoso”, em contraste com seu outro sentido, “encher-se de cólera, ficar furioso, tornar-se 97. Veja B. Waltkc, “Micah” , in The Minor Prophets: An Exegetical and Expository Commentary, org. Thomas Edward McComiskey (Grand Rapids: Baker, 1993), pp. 726-27.
agitado” (3.31; 23.17; 24.19).98A inveja é a raiz de todo o tipo de peca dos. Foi o que instigou Eva a competir com Deus e levou Caim a matar seu irmão. Haag define uma pessoa violenta ( ’is hãmãs) como aquela que transgride os direitos dos outros a sangue-frio. A pessoa violenta age desse modo por ganância e ódio e, com frequência, usa a violência física, brutalidade e falsas acusações no tribunal para alcançar seus fins inescrupulosos. De acordo com Haag, em 3.31 ela “só consegue se preocupar com sua riqueza, a qual ela arrancou de outros” (cp. 10 .6 ; 16.29).99 E não escolhas (we ’al-tibhar) significa fazer uma escolha cuidadosa e bem pensada.100 Apesar do aparente sucesso fácil da pes soa violenta (cp. 1.10-15) e de seu estilo de vida agradável no presente (cp. 4.16), o filho deve se lembrar do fim cruel ao qual o Senhor destina essa pessoa (veja pp. 161-163). Aquele que imita qualquer um de seus caminhos (bekol-derãkãyw; veja 1.15) é seu camarada e, como tal, está sob a maldição do Senhor (3.32-35). (3) Argumento: o S e n h o r pune o perverso, mas recompensa o justo (3.32-35)
O argumento, que é introduzido pela conjunção porque (k i), subs tancia a ordem urgente para ser um bom vizinho (vs. 27-30) e especial mente a não escolher nenhum dos caminhos da pessoa violenta (v. 31). Gemser estabelece a ligação entre os versículos 31 e 32-35 em seu comentário de que “a pessoa violenta” no versículo 31 é considerada a partir de pontos de vista diferentes nos versículos 32-35 como “o desencaminhado” (v. 32), “o perverso” (v. 33), “o escarnecedor” (v. 34), e “o insensato” (v. 35). De acordo com Gemser, todos esses adjetivos descrevem as pessoas que não têm qualquer respeito por Deus ou pelos valores éticos e que se enriquecem mediante a desonestidade insensível e atos violentos.101 O argumento apresenta as motivações teológicas para as admoestações sociais. Com exceção do último versículo, o S e n h o r (YHWH; veja 1.7) é mencionado em todos os versículos como aquele que recompensa ou pune apropriadamente os atos das pessoas umas para com as outras. As atitudes sociais e religiosas, a ética e a piedade são fios do mesmo tecido. Cada versículo do argumento contém dois 98. G Sauer, TLOT, 3:1,146. s.v. qln'â. 99. H. Haag, TDOT, 4A19-M. s.v. qin'â. 100. H. Seebass, TDOT , 2:75, s.v. bãhar. 101. Gemser, Sprüche, p. 24.
contrastes com uma série de sinônimos que se reforçam e expandem para contrastar os dois tipos de próximo e as reações do S e n h o r a eles.102 Os versetos A dos versículos 32-34 dizem respeito ao próximo perverso e seu castigo, os versetos B ao próximo justo e suas recompensas, mas o versículo 35 inverte o padrão para indicar o final do poema (cp. 9.1 -6,1318; Mt 7.24-27). O argumento parte de referentes singulares (3.32, 33) para plurais (vs. 34, 35) e é encerrado pela mudança de termos éticos para seus termos sapienciais correlatos, “sábio” e “insensato”. 32 Os próximos violento e bondoso são caracterizados aqui respec tivamente como o s d e s e n c a m i n h a d o s ( n ã l ô z ; veja 2 .7 ) e o s r e t o s (y 6 S ã r i m ; veja p. 15 0 ; 2 . 15 , 2 1). Os primeiros são u m a a b o m i n a ç â o (t ô 'ê b â ; i.e., “afrontosos aos sentimentos de outrem” 103 e “causam repulsa” 104). Clements observa que nas 21 ocorrências de “abominaçâo” em Provér bios, o termo indica conduta moral perversa de um tipo social e que 12 dessas ocorrências se encontram na formulação “uma abominaçâo ao S e n h o r ” i05. De acordo com ele, “Aquilo que toma certas atitudes e ati vidades odiosas a Deus deve ser considerado desse modo em função de sua natureza perniciosa e hostil... Sua intenção é infligir dano mediante o engano, humilhação ou até mesmo defraudação de outra pessoa” .106 O ultraje do S e n h o r serve de base para sua sanção moral. A reação do S e n h o r não é apenas uma reação interior, mas também inclui suas ações, pois, como diz Koch, de outro modo, “Yahweh seria relegado à posição de espectador” . 107 Enquanto a repugnância impõe uma distância entre o S e n h o r e o perverso, o S e n h o r recebe o justo em s e u c o n s e l h o (s ô d ; i.e., sua conversa mais íntima e confidencial, 11.13; 15 .2 2 ; 2 0 . 19 ; 2 5 .9 ; cp. Gn 18.17 ) . 108A orientação desse conselheiro maravilhoso (15 .2 2 ; cp. Is 9 .6 ) garante sua proteção, sucesso e vida eterna em suas dimensões mais plenas. Os retos experimentam seu conselho porque a sabedoria do Se n h o r entrou em seu coração (Pv 2.6, 10). Nesse contexto, “conselho” 102. Hubbard (Proverbs, p. 79) comenta sobre esse agrupamento de sinônimos: “Seu poder se encontra na intensificação provocada por sua repetição, não no significado dos termos individuais”. 103. B. Waltke, "Abomination”, in 1SBE, 1:13. 104. Aitken, Proverbs, p. 52. 105. In Amenemope, a desonestidade no discurso (13.15, 16) e na escrita (15.20, 21) é chamada dc abominaçâo ao deus (ANET , p. 423). 106. R. E. Clements, “The Concept o f Abomination in Proverbs”, in 77T, p. 220. 107. K. Koch, “ Is There a Doctrine o f Retribution in the Old Testament?” in Issues in Religion and Theology 4: Theodicy in lhe Old Testament, org. J. L. Crenshaw (Filadélfia: Fortress e Londres: SPCK, 1983). p. 62. 108. R. D. Patterson, TWOT, 2:619, s.v. sôd.
provavelmente também tem seu sentido ampliado de “assembleia” (i.e., um círculo íntimo e harmonioso de amigos; cp. Jr 23.18).I(WO S e n h o r odeia a intriga, mas aqueles que são sinceros e retos, que conhecem a virtude da franqueza e da simplicidade, recebem a sua atenção. Uma assembleia desse tipo triunfará sobre seu rival maquiavélico. 33 As designações “desencaminhados” e “retos” são reforçadas respectivamente por perversos (r ã s ã veja pp. 1 6 4 - 1 6 5 ; 2 .2 2 ) e ju s tos (saddiq; veja pp. 1 4 9 - 1 5 0 ; 1 .3 ), e “abominação” e “conselho” são intensificadas por “maldição” e “abençoa”. A rejeição emocional do S e n h o r se torna, agora, sua maldição (me *êrat; i.e., ele pronunciará contra eles a fórmula de maldição “maldito seja”). “Essa fórmula”, diz Scharbert, “é o ‘decreto’ mais poderoso expresso por uma autoridade, e por meio dele um homem ou grupo que cometeu uma transgressão grave contra a comunidade ou contra uma autoridade legítima (Deus, os pais) é entregue ao infortúnio” . 110A ativação do infortúnio está estreitamente relacionada a uma intervenção do S e n h o r ( YHWH\ veja 3 . 1 9 , 2 6 ) , “não de modo independente dele como se as palavras tivessem um poder má gico”. 111 E a maneira mais severa de separar os perversos da segurança, justiça e sucesso da comunidade dos justos (cp. Gn 3 .1 4 ; 4 . 1 1 ) . 112 A maldição do S e n h o r sobre a casa (bebêt) dos perversos (rãSã'; pp. 1 6 4 1 6 5 ) significa que tudo aquilo que o culpado considera precioso - sua vida, saúde, fertilidade, família e segurança - é lançado fora da presen ça benevolente do S e n h o r . Em hebraico, assim como em outras línguas, o significado de “casa” muda com frequência para o conteúdo da famí lia (“propriedade” ou “posse”; Gn 1 5 .2 ) e as pessoas que habitam na casa (Js 2 4 .1 5 ) , tanto a família quanto sua posteridade. Assim como os perversos expulsaram os necessitados de sua presença, assim o S e n h o r agora expulsa os perversos e tudo o que possuem de sua presença que sustenta a vida. O provérbio pressupõe a solidariedade corporativa da família (cp. Nm 1 6 .3 2 ; Js 7 .2 4 , 2 5 ; Et 8 .1 ). Entretanto, os indivíduos são, em si mesmos, responsáveis por fazer essa identificação comum (Ez 1 8 .2 0 ). Abel se distinguiu do amaldiçoado Caim, e o abençoado Jacó fez o mesmo com o antiabençoado Esaú. Em paralelismo quiásti co antitético à “casa dos perversos”, tem-se a morada (nãweh) dos 109. HALOT; 2:745, s.v. sôd. 110. J. Scharbert, TDOT, 1:411, s.v. ‘rr. 111. Scharbert. TDOT, 1:412. 112. Deuteronômio 27.16-25 é constituído de 12 fórmulas de maldição contra maus vizinhos.
justos. O termo nãweh, usado principalmente na poesia, designa um lugar de pastagem para animais ou um povoado. Com referência ao pri meiro, indica provisão, e com referência ao último, proteção, segurança e descanso. Quando é usado para a habitação do S e n h o r ( Ê x 1 5 .1 3 ) ou de seu povo, indica sustento e segurança, conceitos que não são necessari amente encontrados em associação com “casa”. Ele abençoa (y6bãrêk) pode ou não envolver o pronunciamento de uma bênção. A bênção de Deus enche os objetos de vigor para a vida (vitalidade, prosperidade, abundância, fertilidade), capacitando-os a vencer seus inimigos (veja Gn 2 2 .1 7 ). Em resumo, sua bênção sobre a morada dos justos lhe media vida, inclusive tanto sua provisão quanto sua proteção (cp. Jr 3 1 .2 3 - 2 6 ) . 34 A repetição de em se tratando de ( ’im le n. 3 9 ) mostra que os paralelos são antitéticos. Agora o poeta intensifica a caracterização dos desencaminhados e perversos com a designação escarnecedores (Zcsf/7i;veja p. 1 6 9 ), um termo empregado para um comportamento ex tremamente antissocial, e dos retos e justos com a designação humil des e oprimidos, se pudermos supor como Gemser que esses termos são correlatos nesta estância. O versículo introduz a contraverdade importante, porém com frequência ignorada, de que antes de o S e n h o r amaldiçoar os escarnecedores, pode acontecer que eles oprimissem os justos (veja p. 1 6 3 ) . 0 pronome enfático ele (veja 3 .6 ) liga o versículo 3 4 aos versículos 3 2 e 3 3 , nos quais o S e n h o r , o único antecedente possível, é mencionado pelo nome ." 3 Escarnece (yãliç) é repetido para sugerir o princípio da lex talionis. Eles receberão de Deus exatamente aquilo que dão a outros: assim como destroem tudo com suas bocas, o S e n h o r o s destruirá com sua maldição (veja v. 3 4 ) ; assim como cobrem os outros de vergonha, o S e n h o r os cobrirá de humilhação (cp. 1 .2 4 -3 3 ; Sl 1 8 .2 5 , 2 6 [ 2 6 , 2 7 ] ) . Humildes e oprimidos é uma hendíadis para o termo hebraico ía n iyim íanãwim, que deveria ser traduzido como “os pobres e oprimidos”, indicando aqueles “numa circunstância de capaci dade, poder e valor diminuídos” .114 'Àni indica os explorados (cp. Jó 2 4 .4 ; Is 3 2 .7 ; 3 7 .1 4 ) e nunca é usado para a pobreza merecida. O S e n h o r se refere a eles como “meu povo” (Êx 2 2 .2 5 [ 2 4 ] ) ; ele é seu protetor especial (Pv 2 2 .2 2 , 2 3 ). Seus antônimos são o perverso (Sl 1 0 .2 ), o violento {paris\ Ez 1 8 .1 0 - 1 2 ) , e o opressor (‘õSeq; Am 4 .1 0 ) , não o rico. Além disso, os paralelos “retos” (v. 3 2 ) , “justos” (v. 3 3 ) e 113. A LXX traduz como ky-rios. 114. R. Martin-Archard, TLOT, 2:342, s.v. 'nh.
“sábios” (v. 35) sugerem que a referência é tanto à sua disposição espiritual quanto à sua aflição exterior. Os pobres em vista são os pie dosos e os éticos (cp. Tg 4.6; 1Pe 5.5). Eles são os próximos economi camente necessitados (3.27) e/ou aqueles que são economicamente explorados pelos escamecedores violentos (v. 30). “Sua aflição exteri or”, observa Coppes, “produz aflição interior que resulta num clamor a Deus por socorro (Sl 25.16; 34.6[H 7]; 69.29[H 30])”. 1,5 O S e n h o r mostra favor (yitten-hên\ lit. “dar favor”, i.e., tomar atraente a outros; veja 1.9; 13.15) para com eles. Ele não se esquece deles, antes tem piedade deles e os salva (Sl 9.18[ 19]; 34.6[7]; 35.10; 72.2,4; 74.19; Is 49.13). “Somen te de Deus se diz explicitamente que ele ‘mostra favor’”, dizem Freedman e Lundbom. Aqui podemos pressupor que ele mostra o próprio favor para com eles, não que ele negocia favor entre os indivíduos. 116 Tiago (4.6) cita o versículo para advertir os cristãos a não experimentarem a oposição de Deus devida a seu orgulho e para instá-los a experimentar a graça de Deus sendo submissos a ele (Tg 4.6). Pedro o emprega para instar todos os cristãos a serem humildes uns diante dos outros (1 Pe 5.5). Maria, a mãe de Jesus, exemplifica sua verdade (Lc 1.46-55). 35 De maneira climática, os pobres retos e justos são caracteriza dos como os sábios (veja p. 145), e os escamecedores desencaminha dos e perversos, como insensatos (k esilim ; veja pp. 167-168). O signi ficado de herdarão (yinhãlü) depende do substantivo nahHâ. Referese essencialmente a uma parte inalienável e, portanto, permanente de uma propriedade que cabe a um indivíduo ou grupo por meio da con cessão da mesma na transmissão de uma herança ou por meio da expropriação do dono anterior. Os sábios tomam posse da sua proprieda de segundo seus direitos dentro da família de Deus, não por meio da habilidade ou manipulação. Aqui sua herança é honra (kãbôd\ veja 3.16) duradoura, uma metonímia para a propriedade que lhes dá a esti ma da comunidade e um sinal de seu sucesso ao lhe conceder favor. Os insensatos, ao contrário, são aqueles que adquirem ou merecem (mêrí/n; veja n. 43), não herdam, a humilhação pública (ou opróbrio, qãlôn) devida a seu caráter intratável. Qãlôn é derivado de qlh, “ser pouco estimado” e indica ser mantido em ignomínia e desonra (veja 3.35; 11.2). Implica na decadência social de um indivíduo resultante da embriaguez e da prostituição (Os 4.18), da derrota na guerra (Sl 115. L. J. Coppes, TWOT, 2:683, s.v. 'õnõw. 116. D. N. Frecdman e i. R. Lundbom, TDOT, 5:30, s.v. hünan.
83.17[ 18]) e da aflição (Jó 10.5). É o antônimo de kãbôd (“honra”; cp. 3.35). Aqui é uma metonímia do adjunto adverbial para a perda de pro priedade e, portanto, um sinal de fracasso. 6. Quinta palestra: adquira a herança familiar (4.1-9) 1 Ouvi. filhos, a instrução de um pai, e prestai atenção ao conhecimento que dá discernimento. 2 Porque eu vos dou[ uma boa educação não deixeis o meu ensino} 3 Quando eu era1 um filho para o meu pai, ainda tenro e estimado4 por minha mãe 4 então ele5 me ensinava e me dizia: “Que o teu coração retenha as minhas palavras, guarde os meus mandamentos e viva.6 5 Adquire sabedoria! Adquire discernimento!1 Não te esqueças8 e não te desvies das9 palavras da minha boca! 6 Não a deixes e ela te guardará; ame-a, e ela te protegerá. 7 O principio da sabedoria é [este], adquire 10 a sabedoria! Em troca de todas as tuas aquisições
1. O perfectivo instantâneo apresenta a situação como ocorrendo no exato momento em que a expressão está sendo proferida (IBHS, p. 488, P. 30.5.1 d). 2. A versificaçào sugere que o verseto A é a prótase e o verseto B é a apódose. 3. Meinhold (Sprüche, 1:91) atribui a h ã y a um sentido ativo (= “tomou-se”), mas o verbo omitido no paralelo exige o sentido estativo. 4.YShíd lipnê significa, lit., “um único diante de”. Mais de 20 mss. trazem a leitura simplificada yãhtd libnê “dos filhos de”. 5. A LXX traz “aqueles que cstavam falando e ensinando” e muda “minhas palavras” para “nos palavras”, provavelmente para harmonizar o texto com a menção de ambos os pais no v. 3 .0 mais adequado é não traduzir o vau consecutivo narrativo depois dos indicadores de tempo no v. 3 (IBHS, p. 553, P. 33.2.4). 6. A LXX omite “e vive” . Pode se tratar de um comentário do TM de 7.2, mas a LXX também remove os vs. 5a e 7. 7. A LXXB não traz os vs. 5a e 7, apresentando, portanto, um texto mais simples para atentar ao ensino dos pais. Outras tradições gregas acrescentaram o TM de m aneiras diversas. “Não a deixes” exige uma referência anterior à sabedoria. 8 .0 conjuntivo mer^ka liga os dois mandamentos que, portanto, nâo são paralelos. 9. A menos que a expressão “das palavras da minha boca” seja um zeugma, ela modifica apenas “não te desvies”. 10. Ou “a sabedoria é essencial. Adquire”. Veja Ec 12.13. 11. Um coletivo singular convencional (IBHS, p. 113, P. 7.2.1c).
adquire o discernimento. 8 Estime-a, e ela te exaltará; ela te honrará se a abraçares. 9 Ela dará uma grinalda para agraciar tua cabeça; uma esplêndida coroa ela te concederá”. A quinta palestra do pai, a terceira que expande as admoestações em 2.1-4, consiste de duas partes: a introdução típica que inclui como destinatários os filhos e os netos, admoestações para ouvir e reter o ensino com motivações confirmadoras (4.1,2), e a lição (vs. 3-9). Sua lição é, na verdade, a palestra do avô para ele. Em estilo narrativo auto biográfico, o pai introduz essa palestra citando a si mesmo como o des tinatário da mesma e dando a motivação (vs. 3 ,4a) e, em seguida, cita a palestra em questão (vs. 4b-9). Ela também apresenta a introdução típica (v. 4b) e a lição (vs. 5-9), que é levada a uma conclusão climática com a promessa de que a sabedoria dará ao filho a coroa do vencedor (veja 1.9). A palestra é ligada por “eu vos dou (nãtan) uma boa educa ção” (v. 2 ) e “ela dará (nãtan) à tua cabeça uma grinalda atraente” (v. 9). Mediante sua repetição, as palestras se reforçam mutuamente. Além disso, ao citar seu pai e colocar a si mesmo como exemplo, o pai sugere a antiguidade do ensino e a própria experiência solidária dentro da tra dição, dando-lhe autoridade e credibilidade.l2Como escreveu Chesterton, “Tradição significa dar o direito de voto para a classe mais obscura de todas, a de nossos antepassados. Ela é a democracia dos mortos. A tradição se recusa a sujeitar-se à oligarquia minúscula e arrogante da queles que meramente estão em circulação... Aceitaremos os mortos em nossas assembleias” .13 No entanto, a tradição pode se tomar um “círculo de privação” ou, como neste caso, um “círculo de afirmação” .14 “A boa educação dos filhos requer a quebra dos círculos viciosos e a continuidade dos salutares” 15.
12. Um argumento semelhante é usado no texto egípcio Instruction o f Ptah-hotep (585-95): “Um filho que... as coisas lhe vão bem quando ele ouve. Quando idoso, alcançará a veneração e falará semelhantemente aos seus filhos, renovando a instrução de seu p a i... Falará a seus filhos para que eles falem aos filhos deles...” (AEL, 1:75). 13. Citado por Barbara Grizzuti Harrison, “Arguing with the Pope”, Harper s (abril de 1994) 56. e citado por R. Van Leeuwen, Proverbs, p. 62. 14. Atkinson, Proverbs, p. 68. 15. Hubbard, Proverbs, p. 81.
a. Introdução: destinatários e admoestações (4.1, 2)
Como em 1.8, a admoestação consiste de ordens para dar atenção à instrução (4.1) e, depois de aceitá-la, para retê-la (v. 2b). Na segunda palestra (2.1 -22 ), as várias admoestações se referiam somente a acres centar ao corpo da sabedoria, na terceira palestra (3.1-12), principal mente a retê-la, e na quarta palestra (3.13-26), inteiramente a preservar o ensino (veja 3.20). Agora o pai volta à admoestação positiva e negati va como em 1.8 . Todas as palavras desta introdução repetem o preâm bulo e as introduções anteriores: “Ouve, filho meu/Ouvi, filhos” (1.5, 8), “a instrução do pai” (1.2, 8 ), “prestai atenção” (1.24), “conhecimen to” (1.2, 8), “discernimento” (1.2), “educação” (leqah. = “saber”; 1.5), “ensino” (1.8; 3.1) e “não deixes/deixeis” (3.3; cp. 2.13, 17). 1 A indicação indefinida e plural do destinatário,filhos (bãnim ), ímpar nas admoestações introdutórias das onze palestras do prólogo (cp. 1.8[10, 15], 2.1; 3.1, 21; 4.10, 20; 5.1; [6.1], 20; 7.1), mas não deixa de ter analogia nas palestras e discursos (5.7; 7.24; 8.32; cp. Sl 34.11 [12]). Apesar de ser preciso admitir que o plural vocativo de bên nunca ocorre em Provérbios com o sufixo pronominal, levantando ques tões acerca da força da construção indefinida, o sufixo pronominal é usado com o vocativo em 1 Samuel 2.24; 2 Crônicas 29.11; Isaías 43.6. Se esse argumento é válido, a oração indefinida a instrução de um pai (müsãr ’ãb\ veja 1 .2 ,8) aponta para o tipo ou classe de instrução como sendo de um pai para um filho, não como tipicamente é o caso, para a identidade do pai como aquele que se dirige a seu filho (cp. 1 .8 ; 6 .20 ; 13.1). Em última análise, a instrução do pai é derivada de Deus (veja 2.1 - 6 ). Fox comenta, “A autoridade dos pais é um canal para a comuni cação da vontade de Deus. As duas fontes de autoridade se reforçam mutuamente e, em outras passagens em que somente uma é menciona da, a outra não fica excluída por meio disso” .16 O orador é o pai, não a mãe, pois o “eu” em 4.2 se identifica como um filho no versículo 4. Essas duas construções indefinidas sugerem que o pl. “filhos” é diacrônico (i.e., uma referência à linhagem de filhos), e não sincrônico (i.e., uma referência aos filhos contemporâneos de um pai). Esse conceito é apropriado para esta palestra, a qual diz respeito a herdar a sagacidade boa e confiável dos pais. Newsom observa:
Existe sempre certa medida de identificação entre o pai e o filho, de modo que um filho entende e pensa, “quando eu crescer, é isso que eu serei”. O status de pai já existe como potencialidade no filho. Essa identificação é, evidentemente, essencial para a negociação da divi são intergeracional da sociedade patriarcal... O capítulo 4 trata da transformação dos filhos em pais dentro da cadeia da tradição. O sujeito masculino é, até certo ponto, dividido entre ser pai e ser filho.17 Eprestai atenção (wehaqsibü; veja 2 .2 ) é um paralelo sinônimo de S ã m a'. Para “conhecer” o conhecimento que dá discernimento (leda'at; veja 1 .2 ) é melhor que “para conhecer o conhecimento”, pois o substantivo da'at é um paralelo mais adequado para mâsãr, “instru ção” que o verbo, e porque hqsb sempre é seguido de um substantivo que se refere às palavras de ensino, nunca de um verbo (2.2; 4.1, 20; 5.1; 7.24; 17.4; 29.12). 2 “Instrução” e “conhecimento que dá discernimento” na motiva ção confirmadora são identificados com o ensino do pai. Porque (ki; cp. 1.9) eu vos (lãkem ) dou (nãtatti; veja 1.4) ressalta que a educa ção (leqah.; veja 1.5) é transmitida num encontro bastante pessoal en tre pai e filho. Boa (tôb; veja 2.9,20) significa que serve aos interesses da família (veja 2.20; 3.27). Por esse motivo não deixeis ( ’al-ta'azõbú veja 2.13; 3.3), o meu ensino (tôrãti; veja 1.8). b. A lição: a palestra do avô (4.3-9) (1) Introdução narrativa à palestra do avô (4.3-5) 3 Quando ou “porque” (ki) introduz a lição narrativa que fornece mais motivações para se ouvir e reter o ensino dos pais .18 O pai volta a usar a forma indefinida eu era um filho (bên hãyltí), não “eu era uma criança (yeled hãyitiY\ para qualificar a natureza da sua infância. Essa declaração aparentemente banal se refere de maneira significativa à sua natureza espiritual. Como o código genético de uma semente modela com precisão o código da planta que carrega a semente, ele, como um “filho verdadeiro” para o [meu] pai (le’ãbi; veja 1 .8) reproduzia a natureza espiritual do pai (cp. Gn 1.11, 12; 3.15; Pv 14.26). Segundo J. E. Barrett, “No pensamento hebraico a filiação era entendida não como 17. Newsom, “Wisdom and the Diseourse o f the Patriarchal Tradition”. p. 151. 18. Para kí temporal veja HALOT, 2:471.
uma questão de biologia, mas como uma questão de obediência” .19 Um filho rebelde era rejeitado (cp. Dt 21.18-21; 32.19,20; Os 1.9; Mc 3.35; Lc 15.18, 19; Hb 12.8; cp. Mc 3.31-33).20A nossa língua não consegue capturar esse conceito mediante a ingênua declaração “eu era um fi lho”. Ela pode ser auxiliada, portanto, pela paráfrase da LXX, “filho obediente”. O pai começava o ensino rigoroso logo depois que a criança era desmamada, a julgar pelo exemplo de Samuel (cp. Pv 20.11; 22.6). Assim que Ana desmamou Samuel, ela o levou para o templo em Silo, onde o sumo sacerdote Eli iniciou imediatamente a tutelagem de Samuel (cp. 1Sm 1). No antigo Oriente Próximo o desmame se dava depois dos três anos de idade. O texto egípcio Instrução de Any (7.19) fala do “seio da mãe em tua boca por três anos” . 21 No tocante à [minha] mãe Cimmí), que também foi sua mestra (veja 1 .8), ele era tenro (rak\ veja 15.1; 25.15 [ = “dócil”]; NIV); em outras palavras, seu corpo e seu caráter eram fracos e sensíveis porque ainda não havia se desenvolvi do plenamente e era inexperiente (cp. Gn 33.13; 2Sm 3.39; lCr 22.5; 29.1) e tão fácil de moldar quanto um ramo tenro (Ez 17.22). Ademais, ela o considerava estimado (i.e., como o “único” \yãhid]\ um adjetivo que ressalta seu status único e amado junto dela. Apesar de Abraão ter gerado outros filhos, somente Isaque é chamado de seu yãhid (Gn 22.2, 12,16) para enfatizar o status especial do filho de Sara. Aquila, Símaco e Teodócio apreenderam esse conceito mediante o termo grego monogenês, “filho unigênito” (i.e., “singular”, “incomparável”; cp. Jo 3.16; Hb 11.17). A LXX o traduz como “amado”, entendendo yãhid como unice dilectus. Os mais de 20 manuscritos medievais que leem “filhos” (libnê) em vez de “antes” (lipnê', veja n. 4) mostram que inter pretaram yãhid como uma referência ao status social, não estritamen te ao número. BDB define lipnê como “inteiramente às vistas de, sob os olhos de, à disposição de, na estima de” .22 É possível que o último sentido seja pretendido neste caso. Essa breve porém bela descrição de um lar israelita piedoso no qual o pai foi um filho inexperiente que dependeu do temo cuidado do pai e do carinho da mãe constitui a tran sição para a palestra do avô. 19. J. E. Barrett, “Can Scholars Take the Virgin Birth Seriously?” RR 4 (1988) 15. 20. Conselhos de Ptah-hotep: "Se ele [a semente de um homem] se desvia e transgride teus planos e não executa as tuas instruções ... DEVES EXPULSÁ-LO; ELE NÃO É, DE MODO ALCiUM, TEU FILHO. Ele não é, verdadeiramente, nascido de ti"(.i4A/£T,p.413). 21. AEL, 2:141. 22. BDB. pp. 816-17, s.v.pSneh.
4a De modo bastante apropriado o pai introduz seu relato autobio gráfico da palestra de seu pai com uma forma narrativa do verbo. En tão, ele me ensinava (wayy^rêni) que é a forma verbal de tôrâ (veja 1.8), representa um contexto catequético. Há uma relação mútua entre o instrutor investido de autoridade pronto para ensinar algo e o aprendiz pronto a receber esse ensino. E me dizia (wayy^õmer) introduz formal mente a palestra como sendo oral e aprendida pela repetição ( 1 .2 , 8). As duas admoestações do avô, que repetem as do pai, se movem logicamente da recepção do ensino - q u e o teu coração (libbekã', veja pp. 141 -142) retenha (yitmok] veja 3.18) as minhas palavras (debãray; veja 1 .6) - para guardar (§emõr; veja 2 .8) e, desse modo, para a re tenção e obediência escrupulosa do mesmo. O imperativo e viva (wehyêh; veja pp. 141-142), uma oratio variata como em 3.4 para a promessa motivadora. Como numa sinfonia, esta nota específica será desenvolvida posteriormente num versículo inteiro que promete segu rança (v. 6 ) e em dois versículos que garantem honra (vs. 8, 9). (2) A palestra do avô: adquira a sabedoria (4.5-9) A lição provavelmente caracteriza a mulher sabedoria como uma noiva a ser adquirida e amada, nas admoestações, e como uma benfeitora que recompensa seu amante nas motivações. Convém lembrar que as personificações costumam reunir fenômenos ecléticos em sua representação. A lição segue um padrão alternado: A Admoestação: adquire sabedoria B Motivação: ela protegerá o seu amante A’ Admoestação: adquire sabedoria B’ Motivação: ela honrará o seu amante
4.5 4.6 4.7 4.8-9
5 A palavra-chave adquire ou “compre” (qenêh; veja 1.5) ocorre quatro vezes na lição, duas no versículo 5 e duas no versículo 7. A múltipla repetição enfatiza a importância da ordem. Estas várias ex pansões acerca do peso e da prioridade da sabedoria no prólogo não têm paralelo na instrução egípcia.23 Qünâ significa adquirir bens mó veis por meio de uma transação financeira. “Seu significado principal e, portanto, seu significado básico? - dificilmente é o termo geral ‘ob-
ter’, mas sim o preciso ‘comprar’ ”, diz W. Schmidt.24 Seu antônimo é mãkar, “vender” (cp. Gn 47.20; Lv 25.14; Ne 5.8): “Compra a verdade e não a vendas” (Pv 23.23). Com frequência ele é combinado com uma indicação de preço (Gn 33.19; 47.19; 2Sm 24.24), como é o caso nesta palestra, “em troca de todas as tuas aquisições” (4.7; cp. 17.16). A tradução “comprar” é normal em outras passagens (cp. Ex 21.2; Rt 4.8; Pv 20.14). Não obstante, qãnâ pode ser uma metáfora obsoleta para a aquisição da sabedoria (Pv 1.5; 16.16; 18.15). Além desses tex tos, o paralelo “não te desvies” adverte para não considerar a metáfora de modo excessivamente literal. Se ainda é uma metáfora em uso, o código econômico para “comprar” é combinado nesta palestra com o código erótico para “amar” (v. 6 ) e “estimar” (v. 8), sugerindo, como entende Meinhold, que sabedoria ou a sabedoria (hokm â; veja pp. 124-125), um termo co-relevante com discernimento (binâ veja 4.1), é imaginada como uma noiva (cp. 7.4; 8.35; Eclo 14.20ss; 51.13-22; Sab. Sal. 6.12ss; 8.2-21) pela qual é necessário pagar um dote. Meinhold observa que em 4.7 “o preço da compra, a compensação, pode ser pago somente pelo filho e eqüivale a tudo o que ele possui” . 25 Trata-se, porém, de uma personificação rudimentar, pois na admoestação parale la negativa não te esqueças Çal-tiskah', veja 2.17) e, de modo climáti co, não te desvies (we ’al-têt) - usada figurativamente aqui para desviar-se de um caminho (veja 1.23 e 17.23) - ela é justaposta com das 24. W. H. Schmidt, TLOT, 3:1149, s.v. qnh. 25. Meinhold, Sprüche, pp. 91-92. Explica: “Em Israel, a jovem virtuosa adquiria o status de noiva quando atingia a maturidade sexual, por volta dos 12 anos ou doze anos e meio de idade, segundo o Talmude. Ela ficava noiva c era considerada 'esposa legítima’ (matrimonium ratum [Dt 22.22-27]) na ocasião em que seu pai ou responsável aprovava o casamento e quando o valor total do dote era pago (cp. 2Sm 3.14). Porém somente quando era levada para a casa de seu marido é que se tomava esposa de fato (matrimonium consummatum; cp. Gn 24.57-66). A Bíblia não apresenta nenhuma instrução explícita a respeito do valor do dote (Gn 29.15-30; ISm 18.17, 18. 23-25) exceto no caso de casamentos Ibrçados (Dt 22.28, 29). No entanto, o dote não era um preço dc 'compra’. Antes, era uma recompensa pela perda econômica que a família da noiva sofreu no período de transição até ela ser levada à casa do marido”. Fox (Proverbs 1-9. p. 147) objeta a essa interpretação pois, apesar de qSnã ser usado no hebraico mishnaico para tomar uma esposa, não é usado desse modo na Bíblia. Mas seu argumento de que "nada na passagem em questão faz referência ao casamento” não leva em consideração o apelo de Meinhold ao código erótico nas admoestações. Uma vez que, nas motivações, ela é personi ficada claramente como a mulher ativa em seu relacionamento com o homem, é provável que devamos pressupor a existência de um homem ativo em seu relacionamento com uma mulher nas admoestações. As ordens para “amá-la” e "abraçá-la” e, possivelmente, “acariciá-la” infe rem um relacionamento de marido e mulher. Fox se refere ao significado de salselehS no hebraico mishnaico ("tratá-la com carinho”) além do significado “exaltá-la/estimá-la”, o sen tido esperado de acordo com o uso bíblico de sll.
palavras da minha boca (m ê’imrê-pi; v eja 1.2; 2.6). Nãtâ significa, essen cialm en te, e ste n d e r u m a p e sso a ou co isa d e u m a p o siç ão para outra. Foi trad u zid o co m o “ e ste n d o ” em 1.24, m as u sado de m odo in tran sitiv o co m o a b lativ o “ d a” sig n ifica e ste n d e r-se p ara longe. C o m ex ceção dessa fig u ra, as re fe rê n cia s cru z a d a s m o stra m que o pai usou o m esm o v o c a b u lá rio q u e o seu pai. E m resu m o , o pai se ap ro p ria da sag acid ad e h erd ad a re p etin d o -a, m as em su as palav ras. 6 O tem a da m otivação m istura adm oestaçõ es que m ostram a sabe doria com o um a noiva com m otivações que a retratam com o um a benfeitora que recom pensa seu am ante. A ordem negativ a não a deixes ('al ta'azbehã; veja v. 2) e o p aralelo positivo ame-a (^hãbehã; v eja 1.22) intensificam a o rdem p ara “co m p rar sabedoria” (v. 5). A ju lg a r po r D euteronôm io 6.5, “am arás, pois, o S e n h o r teu D eus” , “ am ar” é a linguagem da lei,26 da ob ed iên cia - o am o r p ode ser o rdenado (D t 1 1 .1 ,1 3 ,2 2 ) - das em oções e do com p ro m isso espiritual. “ A ssim , d izer que ‘am arás o S e n h o r teu D e u s’ é , em ú ltim a análise, linguagem legal não é rem o v er a ordem d a esfera das em oções, m as apenas afirm ar que o conceito legal m olda o term o em ocional. A m a r é d ep o sitar as afeições sinceras no S e n h o r da aliança e ex p ressar essa afeição pelo serviço leal.”27 A s resp ec tivas prom essas, e ela te guardará ( weti$merekã ; v eja 2.8) e seu parale lo sinônim o enfático e ela te protegerá ( wetissrekã ; v eja 2.8), se refe rem , presum ivelm ente, a q u alq u er perda, inclusive a m orte. E ssas p ro m essas (idênticas a 2 .8 ,1 1 ) são tão atenuadas que a m u lher sabedoria e o ensino do sábio são prontam en te m isturados, co m p ro v ando ainda m ais sua igualdade co m o sub stân cia e expressão , respectiv am ente (veja pp. 135-136). O jo g o de palavras com sãmar, “guard ar” e, portanto, observar com cuidado (v. 4) e “guard ar” e, portanto, p ro teg er (v. 6), ligam ainda m ais estreitam ente as ad m o estaçõ es com as pro m essas m otivadoras. 7 A o q u e b ra r o m o d o v o litiv o co m u m a d eclaração in d icativ a, o princípio da ( r ê ’Síí; v e ja 1.7) sabedoria é ( hokm â ; v eja 1.2, 7), o p re leto r in d ica u m a m u d an ça n a estru tu ra d o se g u n d o ciclo de sua p a lestra eq u ilib rad a. O s três sig n ific a d o s de rê'sit - um p o n to de partida, 26. Os tratados de suserania nos arquivos de El Am am a costumavam pedir que o vassalo am asse o suserano: “Q ue meu irmão preserve o am or para com igo dez vezes m ais do que o fez seu pai” (29:166). O tratado de vassalagem de Assurbanipal ordena: “Amarás a Assurbanipal como a ti mes mo” . Veja William L. M oran, “The Ancient N ear Eastem Background o f lhe Love o f God in Deuteronom y”, CBQ 24 ( 1963) 78-84. 27. D. Hillers, Covenam: The History o f a Bíblica! Idea (Baltimore: Johns Hopkins, 1969), p. 154.
um prin cíp io inicial ou a co isa p rin cip al (v eja 1.7) - se en caix am neste contexto, sugerin d o q u e p ode ser delib erad am en te polissêm ico. E m ter m os sin tático s f ê ’Sit p ode ser en ten d id o co m o um c o n stru c to ou com o um predicad o n om inativo. Se fo r o últim o, rê 'sit p ro v av elm en te signifi ca “ a co isa p rin c ip a l” (cp. a p o ssív e l tra d u ç ã o “a sab ed o ria é su p rem a ” N IV ). E ssa in terp retação fo rn ece um m o tiv o p ara se c o m p ra r a sab e d o ria em tro ca de to d as as co isas q u e se po ssu i. N o en tan to , os acentos do T M favo recem q u e seja in terp retad o c o m o um co n stru cto , c o m o em G ên esis 1.1 e P ro v érb io s 1.7; 9 .1 0 , sen d o qu e, n esse caso, p ro v a v e l m en te tem o m esm o sen tid o de “c o m e ç o ” com a c o n o ta ção de p rin c í pio inicial, co m o em 1.7. K id n e r afirm a q u e e ssa é u m a fo rm a o b jetiv a de dizer: “N ão é p reciso g ran d e in telig ên cia ou o p o rtu n id a d e, m as sim um a decisão. Você a q u er? E n tão v en h a p e g á -la ” .28 Adquire a sabe doria... Adquire o discernimento ( qenêh hokmâ... qenêh binâ rep ete en faticam en te a ad m o estação do p rim eiro ciclo (4.5a). O c o n c eito etim o ló g ico de noção co m ercial do v erb o assu m e o p rim eiro p lan o com o a créscim o de em troca de todas as tuas aquisições (übekol-qinyãnekã). O preço é tudo o que o filho adquiriu até então. N en h u m a som a é alta dem ais para essa pérola de grande v alo r (cp. 3.13-18; 31.10; cp. 23.23). T udo o que ele en tesourou em seu co ração com o sendo m ais precioso que a sabedoria, e em que ele investiu seu tem po, energia e recursos, deve ser entregue p ara adqu irir a sabedoria. O dote que esse tipo de C risto exige não é nada m enos q u e o seu co ração (veja pp. 141-142).
8 N e ste v ersícu lo , co m o no v ersícu lo 6, as m o tiv açõ es q u e re p re sentam a sab ed o ria co m o u m a b en feito ra, são co n d ic io n a d as pelas a d m o estaçõ es q u e talv ez a rep resen tem co m o u m a noiva. A ad m o e sta ção para acariciá-la in ten sifica a o rd em p ara am á-la (v. 6), e a p ro m es sa de que “ela te h o n ra rá ” in ten sifica a p ro m e ssa de q u e “ ela te p ro te gerá” . O v ersícu lo 9, p o r su a v ez, in ten sifica a p ro m e ssa “ ela te h o n ra rá” para “ um a coroa... ela te c o n c e d e rá ” . Estime-a ( salselehã ) é um a su p o sição in telig en te com b ase n o sen tid o de um v erb o ím p ar que q u er d ize r “p re z á -la ” ou “ a c a ric iá-la /a fa g á -la ” . O sig n ificad o “p re z a r [i.e., lhe d ar g ran d e v alo r]” está b a sead o na raiz sll, “ e le v ar alg o ” , com o um a estrada (15.19; cp. Is 6 2 .1 0 ) ou um cân tico (S l 6 8.5), en ten d id o aqui m etafo ricam en te co m o “e stim a r” a fim d e se a d a p ta r ao paralelo “ ab raç ar” .29 E sse sig n ificad o c o rresp o n d e ad e q u a d a m en te à p ro m es 28. Kidner, Pmverbs, p. 67. 29. Toy, Pmverbs, p. 89; HALOT, 2:757, s.v. sll.
sa, “ ela te e x a lta rá ” . O sig n ific a d o de “a c a ric iá-la /a fa g á -la ” está b ase ado no heb raico m ish n aico e em seu uso na literatu ra rab ín ic a para ind icar p ro x im id ad e o u in tim id ad e (“ a fa g a r” , Y ebam oth 76a; T. Sotah 5.7), e é ap o iad o p o r “ am o r” no T argum e na P esh ita.30 O T M tam b ém é traduzido co m o “ a b ra ç a r” . E sse sig n ificad o c o m b in a igu alm en te com as ou tras ord en s na p alestra do av ô , “ a m á -la ” e “ a b ra ç á -la” , ligado a “a d q u iri-la /c o m p rá-la ” .31 Fox se m o stra p ru d e n te ao a c eita r as duas o p çõ es m ais p lau sív eis u san d o o term o “a p re c ia r” (i.e., te r em alta es tim a), satisfa z e n d o d esse m o d o a p e rso n ific a ç ão ru d im en tar.32 E ela te exaltará ( üterômemekã ) sig n ifica, literalm en te, fa z e r v o cê ter um a e x ten são co n sid eráv el p ara cim a a p a rtir de u m a b ase plana. A q u i, com o seu p aralelo m o stra, a c o n o tação é a lc a n ç ar um a p o sição social e lev a da na so cied ad e, e le v a r u m a p esso a em seu status e a u to rid ad e,33 com todos os seus benefícios (cp. 8.15-21). E m resum o, seu am ante se to m a rá um líder influente (cp. 14.34). Ela te honrará ( t?kabbêdekã ; veja 3.9) é seu paralelo quiástico. O adv érb io clau su lar enfático se (ki), com ên fa se condicional, norm alm en te representa um caso que é m ais provável de ocorrer do que o advérbio condicional clau su lar ’im usado com m ais fre quên cia.34 A abraçares (t?habbe qennâ) tem um sentido erótico em 5.20 (cp. Ec 3.5; C t 2.6; 8.3). N o A n tig o T estam ento u m a m u lher virtuosa era um a virgem na casa de seu pai o u um a m u lh er casada. P ode-se presum ir que a sabedoria é p ersonificada aqui com o um a esposa. 9 A re c o m p en sa de h o n ra o ferecid a p ela sab ed o ria é ex p an d id a num a co n clu são clim á tic a pela m etáfo ra de d ar ao seu am an te um a co ro a gloriosa. Ela dará (titên , lit. “ dar, c o n c e d e r” ; v eja 1.4; 4 .2 ) uma guirlanda para agraciar tua cabeça (lerõ’Sekã liwyathên; v eja 1.9). Seu paralelo q u iástico , uma coroa esplêndida Çateret tip'eret\ veja 16.31; 19.11), in ten sifica seu esp len d o r.55 E ste term o geral para co ro a 30. G reenstone. Proverbs, p. 40. 31. A LXX traz "sitiar"/“cercar” com um baluarte, o que não faz muito sentido, a menos que, como W. McKane ( Proverbs, p. 306) acredita, “cercar” signifique “abraçar". 32. Fox, Proverbs 1-9, p. 175. 33. H.-P. Stahli, TLOT, 3:1222. s.v. n u m . 34. BDB. p. 473, s.v. kt. 35. Pã a r ocorre 13 vezes: seis vezes no Piei, com o significado de “embelezar, glorificar", sempre tendo Deus com o sujeito, e sete vezes no Hitpael. “glorificar a si mesmo, jactar-se” . O substantivo se refere a tudo o que leva a pessoa a se regozijar e orgulhar: “adorno, esplendor, fulgor, orgulho" dc um guerreiro (Jz 4.9), ou de um rei ou rainha (El 1.4: Jr 13.18), ou de uma noiva (Is 62.3; Ez 16.12, 17), ou dc pessoas comemorando ( Is 28.1). A maioria das ocorrências do verbo e do substantivo reflete a alegria e o prazer de Israel nas obras de Deus. O substantivo ocorre com frequência associado a uma coroa real (Pv 4.9; 16.31). Também é comum a ocorrência numa série de substantivos
(,
10 Ouve, filho meu, e aceite minhas palavras, a fim de que 1 os anos de vida sejam muitos para ti. 11 Eu te instruo1 no caminho 3 da sabedoria,
te conduzo ao longo de trilhas retas. 12 Quando andares, o teu passo 4 não será dificultado, e se correres, não tropeçarás .5 sem anticam ente relacionados: cp. Et 1.4; ksbôd, “ honra” (“glória” ; Êx 28.2), sèm , “ reno me” (D t 26.19) e tPhillà "louvor” (Sl 71.8; Is 3.12); gõ'ôn, “orgulho” (Is 4.2); ?e6t, “ glória” (Is 13.19); 'ôz, “ fortaleza” (Is 52.1), hãdttr, "esplendor” (“ glória” ; Sl 96.6); hôd, “m ajes tade” (Sl 96.6), etc. (Vedder, TLOT, 2:963-64, s.v. p a ’ar). 3 6 . Pode designar a coroa de uma rainha (Jr 1 3 .1 8 ), de um nobre (Et 8 .1 5 ), ou de um noivo (Ct 3 .1 1 ). Podia ser feita de ouro e prata (Sl 2 1 .3 [4 ]) ou de flores (Ez 2 3 .4 2 ). Realça a beleza daquele que usa (Ez 1 6 .1 2 ) e está associada à honra, dignidade, autoridade e dom ínio de um governante ( 2 S m 12.3 [= lC r 2 0 .2 ] ; Jó 3 1 .6 ; Et 8 .1 5 ; Is 2 8 .3 , 5 ). Q uando um rei perde sua coroa, perde sua glória (Is 2 8 .3 ; J r 1 3 .1 8 ; Ez 2 1 .2 6 [3 1 ]). É usada m etaforicam ente com respeito aos cabelos grisalhos (Pv 1 6 .3 1 ), aos netos (1 7 .6 ), a uma boa esposa ( 1 2 .4 ) , à riqueza ( 1 4 .2 4 ) e à nova Jerusalém na mão do S enhor (Is 6 2 .3 ). É empregada até para o S e n h o r , que será a coroa do rem anescente (ls 2 8 .5 ) . 37. HALOT, 2:545, s.v. m g n \ M . A. G risanti, N/DOTTE , 2:846, s.v. rnãgên. 1. Vau com um imperfeito depois dc um imperativo indica propósito (Lambdin. IBH, p. 119, P. 107). 2. Pcrfectivo instantâneo (IBHS, p. 488, P. 30.5.1 d). 3. A LXX, Sir. e Targ. trazem o pl., provavelmente uma assimilação retórica de “trilhar” no verseto B. A discordância em núm ero não é excepcional na poesia hebraica (veja 3 .1 8 .2 8 )e mais difícil de dar satisfação. 4. $a'ad não é usado com o coletivo no sing. A LXX (cp. 5.5), Sir. e Vulg. apresentam o pl. 5. O significado da raiz pode ser determinado pelas ideias de bater, tropeçar ou cair, mas também pode combinar duas dessas ideias ou até mesmo todas as três (C. Barth, TDOT, 7:353, s.v. kêl).
13 Agarre a instrução; não pares; 14 15
16
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guarda-a, porque ela é tua vida. Não entres na vereda dos perversos,6 nem dês passos largos1 no caminho dos maus. Despreze*-o*; não viajes nele; desvia-te de ir10p o r ele" e passa adiante. Porque são privados do sono 12 até forjarem o m al;'3 e seu sono lhes é arrancado a menos que façam [alguém]'* tropeçar 15 porque comem o pão da perversidade , 16 e do vinho dos atos violentos 17 eles bebem.'*
6. N os capítulos 1-9, a LXX traduz rãSS' com o asebís (2.22; 3.25; 3.33; 4.14, 19; 9.7), enfatizando a falta de relacionam ento com Deus, nâo a falta dc ética nas atividades relaci onadas a outros seres hum anos. Em 5.22 usa anêr. 7. Os dicionários associam o Heb. cíSar I (= “cam inhar/avançar” no Qal, “liderar” no Piei) com o ugar. 'Ir = “m archar” . Sua derivação ‘ãsúr significa “passo” e seus cognatos em árabe e etíope querem dizer "pegada/rastro”, "seguir o rastro” . Uma vez que o significado pretendido aqui é o do Qal, não o do Piei. HALOT(l:97,s.v. 'Sr) propõe plausivelm ente apontar a forma como te ^Sar. H. N ich r(“Z ur Etym ologie und Bedeutung von 'askar I” , U F 17 [1986] 231-35), porém , considera o term o um a forma secundária do heb. ySr = “ser/ir reto” (= aca. Esherti). N o entanto, seu uso nâo exclui aquela que parece a raiz. 8. Ao que parece, não sabendo o significado do term o Heb., a LXX traz “ lugar no qual podem acam par” (veja L. B. A dam s, “ Lexical Equivalence in LXX Proverbs 1-9; A Study in Translation Technique” [tesed e M. C. S., R egentC ollege, 1992], p. 163). 9 . 0 antecedente é “cam inho" ou “vereda". 10. As preposições deixam implícito este verbo de movim ento (IBHS, p. 224, P. 11.4.3d). 11. A LXX traz “deles” , tom ando “p erversos... maus” o antecedente. 12. Fichtner (BHS) conjetura desnecessariamente que o p a ls l imperfeito de Sõ 'an é “estar em paz, protegido” (cp. HALOT, 2:447-48, s .\.ysn). 13. Hifil interno (IBHS, p. 446, P. 27.5c). 1 4 .0 uso absoluto d e ya skil com o objeto im plícito tam bém ocorre em 2 Crônicas 25.8. 15. K traz yikSSlâ (Qal), “eles tropeçam” (cp. Nifal no v. 12); Q, Sir., Targ. e Vulg. trazem y a f e ítá (Hifil), que constitui um paralelo bem m ais adequado de “forjar o m al” . A LXX traz “eles adorm e cem ”, provavelm ente d c yisksb ü . Essa interpretação implica alterar o condicional “se” para “e”, resultando no sentido banal “eles não dormem ” . Desenvolvendo o conceito da LXX, Fichtner (BHS) conjetura u m y aékílü no original ("com portam -se prudentem ente” ) -y a é k llú , “ fazem o que é in sensato, se fazem de insensatos” . Porém Adams (“ Lexical Equivalence” , p. 164) observa que a LXX traduziu ksl por um equivalente som ente em 4.19 das cinco vezes que ocorre em Provérbios, suge rindo que o tradutor da LXX traduziu o term o contextualmenle. 16. Caso seja figurativo, é um gen. de espécie (= “ pão de perversidade” ; IBHS, p. 152, P. 9.5.g); caso seja literal, é um gen. de agente subjetivo abstrato: "pão obtido por m eio da perversidade” (IBHS, p. 144, P. 9.5. le). 17 . 0 pl. é excepcional. Das 60 ocorrências do substantivo, som ente quatro sào pl.; as outras três funcionam com o gen. atributivo com 'ts ("hom em ” ). Assim, é mais apropriado considerar o pl. uma metonímia contável para os atos violentos (cp. IBHS, p. 119, P. 7.4.1a). V ejan. 16 para o uso do gen. 18. A LXX traz, “tom aram -se embriagados” . Na verdade, “eles bebem ” é m ais enérgico, pois um gole dessa bebida terrível já é demais.
18 Agora 19 a vereda dos justos é como o sol da manhã,10 que brilha 21 de modo cada vez mais reluzente11
até o dia estar firme.13 19 O caminho dos perversos é como 24 a escuridão; eles não sabem o que os fa z tropeçar.:25 O lim ite en tre 4.1 -9 e 4 .1 0 -1 9 é d e m arcad o pela in d icação típ ica do destin atário e d a o rd e m in tro d u tó ria “O u v e, filho m eu ” (cp. 1.8; 4.1), num a p ale stra estru tu ra lm e n te b em eq u ilib rad a, q u e c o n siste em um co rp o e um a co n clu são , e p ela m u d an ça tem ática d o uso do có digo de “c o m p rar” e “ am a r” a sab ed o ria p ara o c ó d ig o da ação no c am in h o da sabedoria. “O s p asso s que d am o s e o s cam in h o s q u e trilh am o s d ep en dem não a p en as d aq u ilo q u e h erd am o s, m as tam b ém do d estin o que dese jam o s a lc a n ç ar.”26 O s su b stan tiv o s e v e rb o s-ch av e a n u n ciam o tem a do poem a. O s su b stan tiv o s q u e d izem resp eito à e sfe ra sem â n tic a do cam in h o são “ c am in h o ” (vs. 11a, 14b, 19), “ trilh a ” (v. 1 lb ), “p a sso ” (v. 12) e “ vere d a ” (vs. 14, 18). O s v erb o s d esse âm b ito sem ân tico são “ c o n d u z ir” (v. 11b), “ an d ar” (v. 12a), “ co rre r” (1 2 a), “ tro p e ç a r” (vs. 12b, 16b), “p a ra r ad ian te” (v. 13), “e n tra r” (v. 14), “ d ar um p a sso ” (v. 14b), “ v iajar” (v. 15a), “ d e sv ia r” e “p a ssa r” (v. 15b). O p o em a tam b ém é un ificad o pela ep ífora “ tro p e ç a r” ( kêl ) p reced id a d e “n ã o ” ( lõ ’) em cad a u m a de suas 19. Fichtner (BHS), seguindo G em ser (Sprüche, p. 26), acredita que o vau inicial m ostra que os vs. 18 e 19 devem ser transpostos. Porém a seqüência de justo (v. 18) e perverso (v. 19) na conclusão, corresponde á mesm a seqüência no corpo principal (cp. vs. 10-13 versus vs. 14-17). O vau é disju n tiv o , não co p u lativ o , introduzindo novos p articipantes (IBHS, pp. 6 5 0 -5 1 , P. 3 9 .2 .3 a, c). 20. S. Aalen ( TDOT, 1:151, s.v. ôr) afirm a que nõgah "claridade”, se refere à aurora, mas confor m e alguns dados sugerem , or se refere à manhã, quando com eça a claridade total (Jz 19.26). 21. J. B. C u rtis ("O n the H iphil Infinitive A bsolute o f H s la k " , ZAH 1 [1988] 30-31) identifica hôlêk com o um Hifil infinitivo absoluto interno (cp. IBHS, pp. 439-40, P. 27.2s.; = exibindo continuam ente). N orm alm ente, porém , essa construção envolve um verbo prin cipal paronom ástico de m ovim ento (IBHS, pp. 589-90, P. 33.3.2b, c). Hôlek we, com o Qal particípio ativo é uma forma de uso am plam ente com provada. Aqui, em Êxodo 19.19 e em 2 C rônicas 17.12 as formas ligadas são Qal particípios estativo (i.e., adjetivos verbais). 22. O Qal p articíp io (v eja D elitzsch, Proverbs, p. 113) é trad u zid o m ais literalm ente com o “to rn an d o -se m ais claro ” . 23. Lit. “ [a parte de] tom ar-se estabelecido do dia” . O Nifal particípio é adjetival, mais especifica mente, insgressivo (IBHS, pp. 385-86, PP. 23.3a-c). 24. Toy ( Proverbs , pp. 94, 96) observa que 15 m ss. trazem b d rk . “ na escu rid ão ” e as versões em pregam a construção com predicado nom inativo sim ples, “ escuridão", m as ele prefere corretam ente o TM , em função de k ’w r no v. 18. 25. Lit. “pelo que são feitos tropeçar” . 26. Van Leeuwen, Proverbs, p. 63.
estrofes. O sáb io “ n ão tro p e ç a rá ” (v. 12b); os p erv erso s não c o n se guem d o rm ir en q u a n to n âo fazem alg u ém “tro p e ç a r” (v. 16b); e os p erv erso s n ão sab em o q u e o s “ faz tro p e ç a r” (v. 19b). A s d u as p rim ei ras referên cias su g erem o an ta g o n ism o dos p erv erso s, cu jo sono lhes escap a a m en o s q u e d erru b em alg u ém , em relação ao s ju sto s, que eles não p odem derrubar. C o m o O v erlan d o b serv a, a re fe rê n cia final e n v o l ve o p rin cíp io da re trib u iç ã o .27 A p alestra n ão o ferece nen h u m a o rie n tação esp ec ífic a sob re o c am in h o certo e o errad o . A n tes, ela serve para p rep a ra r o filho p ara re c e b e r os en sin o s e sp e c ífic o s ac erca do co m p o rtam e n to co rreto e do e rrad o , a p resen tad o s ex te n siv am e n te nas coleçõ es su b seq u en tes à C o leção I (v eja tam b ém 16.16-19). U m a co n trib u iç ã o p a rtic u la r d essa p alestra é su a d e scriç ão do c a ráter dos perv erso s. A p rim e ira p alestra do pai, q u e c o n siste in te ira m ente em u m a ad v e rtê n c ia c o n tra os p erv erso s (1 .1 0 -1 9 ), ap resen to u g ra fic am en te seu s atos re p re e n sív e is co m o a ssa ssin o s de san g u e-frio que dão cab o de u m a p esso a inocente. S ua sexta p alestra rep resen ta g raficam en te seu estad o m ental in terio r ao re p re se n tá -lo s co m o “v ic ia dos na m ald a d e ” . T am an h o é o seu v ício de p ra tic a r o m al, que se to m o u seu sed ativ o à noite e seu alim en to e b eb id a d u ran te o dia. A n tes, os jo v e n s não co m p ro m e tid o s se m o strav am co m p lac en tes em re lação ao m al (v eja 1.20-33) a g o ra o m al assu m iu o co n tro le, triu n fo u e destru iu aq u eles q u e não o ev itaram . O pai to m a p o r certo que o apetite m oral do seu filho lhe cau sará rep u lsa d ian te d o retrato hed io n d o de seu an seio p o r p ra tic a r o m al, da m esm a m an eira co m o e sp ero u a n te rio r m en te que ele re c u a sse d ian te d os crim es d o s p erv ersos. N o co rp o da p alestra, o pai o rd e n a a ace ita çã o da sa b ed o ria an tes de p ro sseg u ir tratan d o sobre su a co n tra p a rte n eg ativ a pela m esm a ra zão que o fez em su a p alestra p ro g ra m á tic a, “ S alv ag u ard a c o n tra os p erv erso s” (cap. 2). A m e lh o r p ro teção c o n tra os p erv erso s é o in d iv í duo a c eitar a sab ed o ria d iv in a em seu caráter. O pai div id e sua p alestra sob re os d o is cam in h o s em d u as m etades iguais: u m a a d m o estação p ara a c e ita r seu en sin o e se g u ir o c am in h o da sab ed o ria (vs. 10-13, q u atro v ersícu lo s) e um a ad v e rtê n c ia para não se ap ro x im a r do c a m in h o dos p erv erso s (vs. 14-17, q u atro versícu lo s). A s sím iles su m arian tes n a c o n c lu sã o tam b ém a p re se n ta m duas m etades na m esm a seq ü ên cia, co n tra sta n d o o d e se n v o lv im e n to da luz no cam i-
nho da sab ed o ria com a escu rid ão en v o lv e n te no c a m in h o dos p e rv e r sos (vs. 18, 19). E ssa ju sta p o siç ã o , se m e lh a n te d o S alm o 1, co m eç a a sin aliza r a m u d a n ç a n o p ró lo g o das o rd en s d o s p ais p ara p re sta r aten ção em seu en sin o (3 .1 -4 .2 7 ) p ara suas ad v ertên cias c o n tra os p e rv er sos (5 .1 -6 .3 5 ). E sta p alestra sobre os “ D ois c a m in h o s” será seguida de um a p alestra so b re os “ D ois C o ra ç õ e s” .28 a. Introdução e corpo (4.10-17) (1) A dm o estaçõ es para an d ar no cam inho da sab edoria (4.10-13) A introd u ção do discu rso , com sua ord em p ara ou v ir o en sino aco m p an h ad o de u m a m o tiv ação (v. 10), en c o n tra -se tão in teg rad a nos v er sículos 10-13 q u e é m ais ap ro p riad o tra ta r esses v e rsícu lo s co m o um a unidade. A o rd em in tro d u tó ria h ab itu al p a ra d a r ate n ç ã o ao en sin o dos pais (v. 10) form a u m inclusio co m o v ersícu lo 13; ju n to s, e les e m o ld u ram a p rim e ira m etad e d o co rp o da palestra. A m b o s c o n têm a d m o e sta ções (vs. 10a, 13a) co m u m a p ro m essa de v id a ab u n d a n te n u m a epífora no tex to em h e b raico (vs. 10b, 13b). O v ersícu lo 13 in ten sifica a ad m o estação p a ra um c o m p ro m isso total com a sab ed o ria (v. 10) para um a e x o rtação a p e rse v e ra r nela. D en tro d essa estru tu ra, o pai d escre ve seu en sin o co m o u m a trilh a reta (v. 11), na q ual o filho po d e an d a r com seg u ran ça (v. 12). O s v e rsícu lo s 10, 11 m o stram a in tim id ad e do pai e do filh o num re la c io n a m en to pessoal “ eu e v o c ê ” , in cen tiv an d o o filho a se id e n tific a r co m seu pai (v eja 4.3).
10 A in tro d u ção c o n siste tip ic a m e n te d o ch am ad o e id entificação do d estin atário , Ouve, filh o meu (sem a' beni\ v eja 1.8), m as a c re sc en ta, atip icam en te, um seg u n d o im p erativ o , e aceite ( w eqah ; v eja 1.3; 2.1), p ara ressaltar q u e n ão é su ficien te o o u v ir sem a in te m a liz aç ão das palavras. Minhas palavras ( >nmãrãy v eja 1.2; 2.1 ) fu n cio n a com o o ob jeto das d u as o rd en s; seu p a ra le lo , “ sa b e d o ria ” ( hokm â ) é en c o n trado no v ersícu lo 11. A p ro m essa, ex p re ssa co m o u m a clá u su la de pro p ó sito , a fim de que os anos de vida sejam muitos para ti ( weyirbü lekã senôt hayyim ) é sem elh an te a 3.2. A o d iz e r qu e e les serão m uitos, o pai en fatiza su a g ran d e q u a n tid a d e 29 e n ão re q u e r q u e eles term in em 28. N. Habel, "The Sym bolism o f Wisdom in Proverbs 1-9”, Int 26 (1972) 135. 29. As raízes Heb. rbb e rbh significam , essencialm ente, “ ser m uitos” . O significado “m uitos" tende à m aioria “todos” (cp. 10.21; 19.6), mas, em algum as passagens, é necessário traduzir para nosso idioma com o “ grande” no caso do adjetivo sing. ( 13.7; 14.29; 1 5 .6 .16).
com a m orte física (v eja pp. 158-161). O restan te d o p o em a ca ra c te ri za a q u alid a d e ag rad áv el d esse s anos. 11 No caminho (bederek\ v eja 1.15) da sabedoria hokmâ; (v eja pp. 124-125) in icia o c ó d ig o b á sic o da p a le stra e o c ern e da prim eira seção (4.10 -1 3 ). A m etáfo ra d o a n d a r num c a m in h o im p lica num estilo de vid a prático e c o n tín u o , n ão n u m a co n te m p la ç ão teórica. A B íblia fala com freq u ên cia de se g u ir u m c a m in h o em v ez de se g u ir outro. Eu te instruo (hõrêtikã um a fo rm a v erb al de tôrâ\ v eja 1.8; 4 .2 ) su gere que esse c a m in h o p a ra a v id a n ão é e n c o n tra d o p o r acaso ou p o r a c i d ente, m as p o r m eio d o cate c ism o (Sl 25.8, 12; 32.8). A tra d u ç ão am b í gua “g u io ” (N IV ) p o d e lev ar a um a in terp retação in d ev id a d a p e d ag o gia d este livro. Te conduzo ( hidraktikã ) é u m a fo rm a verbal de derek, “c am in h o ” .30 A s trad u çõ es co m u n s d o s v erb o s yrh e drk no Hifil, “g u i ar” e “co n d u z ir” , resp ectiv am en te, são ex cessiv am en te im precisas, pois essas trad u çõ es po d em in d icar q u e o a p ren d iz p a rtic ip a da d esco b erta da v erd ad e sob a su p erv isão de um g u ia ou líd er e/ou que o g u ia não ex ig e a sub m issão . A p ed a g o g ia m o d e rn a ap lau d e e ssa s co n o taçõ es, m as elas não estão p resen tes n o s v erb o s h eb raico s. O p aralelo q u iásti co de “ca m in h o da sa b e d o ria ” , pelas trilhas (bema g?lê\ veja 2.9) re tas (yõSer; v eja 3.6; cp. “ da re tid ã o ” , 2 .1 3 ) ap o n ta p ara seu p rim eiro atrativo. O s v ários aspectos da sabedoria - ob serve a m udança para o pl. “trilhas” (veja 2.8) - são m oralm en te retos e livres de com portam entos tortuosos e desen cam in h ad o s e de co n seq ü ên cias perigosas. U m a trilha não é um a estrad a que veio a existir sem q u e as pessoas transitassem po r ela; antes, é u m cam inho p o r m eio do qual e d entro do qual as pessoas se m ovem . O filho andará num cam in h o antigo e provado. 12 O ca m in h o q u e co n d u z à v id a a b u n d an te é p ro v ad o e reto e, p o rtan to , seguro. Quando andares ( belekt?kã ; v eja 1.15) m uda a d es crição d a cen a p ara a a tiv id a d e do filho. A m etáfo ra in co m p leta se refere à p ercep ção de u m a v isão c o rreta d e m u n d o e de v id a .31 O teu passo (sa'adekã ) se refere ao filho m a rch an d o , an d a n d o a p asso s lar gos ou cam in h an d o pela estrad a p ara a qual o pai o d irig iu , u m a m etáfo ra para cad a d ecisão e co n d u ta no c am in h o da v id a no qual o pai o colocou. Não será dificultado ( lf5'-yêsar\ i.e., ap e rta d o , im p ed id o ou restrito) de m o d o q u e ele p o d erá p ro sse g u ir v ig o ro sa m e n te, com um 30. HALOT, 1:2231, s.v. <**. 31. Cp. Plõger, Sprüche , p. 48.
ritm o re g u la r e com a p len a certeza de q u e a lc a n ç ará o seu destino. M cK ane o b serv a q u e “ E o p asso... ap ertad o , n e cessário em fu n ção de um a su perfície irreg u lar e traiço eira, que p ro d u z a p reen são e fadiga, e tira do viajan te a se n sação de b e m -e sta r” .32 O s sáb io s são livres de ob stá cu lo s m o rais d e b ilita n te s q u e trazem o ju lg a m e n to de D eus (veja v. 19; Jó 18.7). E ssa v id a d e sc o m p lic a d a é ag rad áv el m esm o sem c o n sid erar o alvo. E se correres ( we 'im-tãrüs\ v eja 1.16) in ten sifica o m o v im en to m ais seg u ro de a n d a r p ara a n o ção m en o s seg u ra d e correr. D avi louvou ao S e n h o r que lhe d eu um cam in h o am plo on d e não torceu os c alcan h ares m esm o ao p erseg u ir seus in im ig o s (Sl 18.36[37]). A m etáfo ra não tropeçarás (lõ ’ tikkãSêl) tem , neste caso , a co n o tação de ficar fraco ou c a n sad o (cp. Is 5.2 7 ; 4 0 .3 0 , 31) e/ou d e ser levado à ru ína (cp. Sl 27 .2 ; Jr 50.32). A form a p assiv a su g ere um ag en te, su p o s tam en te o m al m oral e/o u físico (v eja 4 .16). 13 E n q u an to que na estru tu ra inicial (4 .1 0 ) o pai usou d u as ord en para en c o ra ja r o c o m p ro m isso total com o c a m in h o da sab ed o ria, aqui ele usa trê s em su a c o n c lu sã o p a ra p e rse v e ra r n esse cam in h o . Em p rim eiro lugar, a o rd em agarre (halfzêq be\ v eja 1.18; cp. M q 7.18) p ode te r um a n u an ça in co ativ a “ se g u ra r firm em en te” (cp. 3.18), m as os p aralelos su g erem q u e ele tem seu co n ceito d u ra d o u ro aqui (cp. Ê x 9.2; Jz 7 .8 ).33 “A g a rra r” a instrução ou “ d isc ip lin a ” ( m üsãr ; v eja 1.2), que inten sifica “ m in h as p a la v ra s” (4 .1 0 ), é c o m o se su jeitar ao regim e de um atleta com u m a d ieta, e x ercício s e tre in a m e n to inteligentes. A o se lim itarem d esse m o d o , o s atletas têm a lib erd ad e de co rrer co m o m áxim o de d e sem p en h o e v e lo cid ad e, sem “tro p e ç a r” .34 E m segundo lugar, não pares Çal-terep) sig n ifica literalm en te “ fazer/se d eix a r cair ou a b an d o n a r um a a tiv id a d e ” (cp. IS m 15.16; Sl 46.1 [2]), im p lic ita m ente de re te r a in stru ção . D e a c o rd o com E zeq u iel 18.26, 27, se os ju sto s deix arem sua retid ão , cairão na m orte. Em terceiro lugar, guar da-a (nisserehã ; v eja 2.8). O o b jeto pro n o m in a l é fem in in o , m o stran d o que o an teced en te ag o ra é “ sa b e d o ria ” , não o seu an tece d en te m ais p róxim o, “ in stru ção ” , su g erin d o q u e n ão se p re te n d e fazer q u a lq u er distin ção en tre eles. A p ro m essa m o tiv ad o ra em 4 .1 3bp, porque ela é a tua vida (hayyeykã) c o m p le ta a estru tu ra (v eja v. 10b). E m quatro o ca siões (3.22; 4 .2 2 ; 8.35) n a C o leção I a sa b e d o ria /in stru ção é eq u ip ara 32. M cKane, Proverbs, p. 308. 33. HALOT, 1:303, s.v. hzq. 34. Van Leeuwen, Proverbs, p. 59.
da à vida. A figura, um a m eto n ím ia de efeito , e q u ip ara a in stru ção do pai (v. 10) e a sab ed o ria (v. 1 3 )- d o i s lados d a m esm a m o e d a - à vida. A m etáfo ra do c am in h o não retrata a v id a do b erço à sep u ltu ra, m as sim o cam inh o para a vida etern a versus o cam in h o para a m orte etern a.35 (2) A dm o estaçõ es para ev itar o cam in h o d os perv ersos (4.14-17) A seg u n d a m etad e do co rp o da p alestra é d iv id id a en tre os im p era tivos para ev itar o c a m in h o d o s p erv erso s (vs. 14, 15) e co n firm açõ es de que o m al é v ic ia d o r (vs. 1 6 ,1 7 ), co m o um sed ativ o d u ran te a noite (v. 16) e um a dieta san g ren ta d u ran te o dia (v. 17).
14 A c o n tin u a ç ã o d a m e tá fo ra co m nas veredas (be>õrah ; veja 1.19) une a seg u n d a m etad e à prim eira. N ã o se p reten d e fazer d istin ção de sig n ificad o en tre “ c a m in h o ” (derek) e “ v e re d a ” ( 'õrah), p o is na c o n clu são os term o s são in v ertid o s co m re fe rê n cia aos ju s to s e aos p erversos. É p ro v áv el q u e 'õrah ten h a sid o esco lh id o para esse v e rsí c u lo em fu n ç ã o de su a a sso n â n c ia c o m ’ô r , “ lu z ” . Dos perversos (r^s&im; veja pp. 164-165) sig n ifica que eles p o ssu e m e usam o c a m i nho errado. P ara e n fa tiz a r seus p erig o s, o pai a m o n to a seis im p erativos inten sificad o res p ara o filh o p e rm a n e c er a fastad o d e sse cam in h o , d o b ran d o o n ú m ero d e d o is (v. 14) p ara q u atro (v. 15), o q ue po d e su g erir o p o d e r se d u to r do m al. O s p e rv e rso s d ev em se r re sistid o s firm em ente d esd e o p rin cíp io ; n ão se p o d e c ed er a eles em nada. Não entres Çaltãbõ’; v eja 1.26) d en o ta aç ã o q u e en v o lv e tan to a en trad a q u an to o p ro sseg u im en to d en tro d o seu âm b ito e d irig id o p ara o seu alv o antissocial e eg o ísta no tem p o e n o espaço. A seg u n d a o rd em , co n stru íd a de form a q u iá stic a , nem dês passos largos (we ’alt?’a$$êr; v eja n. 7) in ten sifica e au m en ta a prim eira. O restan te d o q u iasm o , no caminho (veja v. 11) dos maus (bederek rã'im) d á ao c a m in h o d o s p erv erso s um tom de m ald ad e m oral ten eb ro sa (v eja 1.16; 3.7). E m 2 .20, entretan to , os ju s to s e as p esso a s de b em são eq u ip arad o s. 15 A terceira o rd em , despreze-o (pera'ehü; v eja 1.25), n o rm a l m ente trad u zid a co m o “ a b rir m ão, d eix ar q u ieto , d e sc o n sid erar” , sig n i fica m ais e sp e c ific am e n te se re b e la r c o n tra as estru tu ra s e restriçõ es que se disfarçam co m o o q u e é v e rd ad eiro e c o rre to .36 A q u arta ordem , não viajes nele ('al-ta'abor-bô) en v o lv e m o v im en to d irig id o para pas 35. Pace Aitken. Proverbs, p. 56. 36. J. Janzen. “The R oot p r " , V T 39 (1989)406.
sar de um lu g ar p ara o u tro ; co m a p re p o siç ã o bete, co m o neste caso, sig n ifica “ p a ssa r p o r” (Êx 12.12) ou “ a tra v e ssa r” (v e ja Jó 33.18) d eter m in ad a área. A q u in ta o rd em , desvia-te (éefêh ) sig n ifica redirecionar, alterar ou m u d a r o cu rso d e lib e ra d a m en te se a fa sta n d o da p o siçã o p re sente; p o d e se r p a ra p io r (cp. N m 5.1 9 ,2 9 ) ou p ara m elhor. A co n stru ção, co m o sür em 3.7, p o d e su g e rir q u e o filh o já está n esse cam inho, m as se fosse o caso , p o r q u e a d v e rti-lo p ara n ão e n tra r n e m an d ar nele? P ortan to , “d e” , na p re p o siç ã o c o m p o sta “ p o r ele” , n esta co n stru ção ú nica, p ro v av elm en te é g o v ern ad o p elo v erb o su p rim id o “ ir” ( = de ir p o r ele).37 A o rd em fin al, e passa adiante (wa'abôr; v eja o verseto A ; cp. G n 18.5; 30.32), v o lta a aten ção do filh o n o v am en te para o c am i nho certo. E m resu m o , em v e z d e se d esv iar d o c a m in h o da sab ed o ria, ele deve p e rse v e ra r nele. 16 Porque (ki), re p e tid o no v e rsíc u lo 17, in tro d u z os dois lados d razão para se e v ita r o c o n tág io v ig ilan tem en te. É tão v iciad o r que, à noite, suas v ítim as n ão co n seg u em d o rm ir a m enos q u e forjem o m al (v. 16) e, d u ran te o dia, elas se alim en tam de e x e c u ta r seus p lan o s (v. 17). O m al assu m iu su a v erd ad eira n atu reza. D e a co rd o co m M ein h o ld , c o m o c o n se q ü ê n c ia , as fu n çõ es físicas q u e m an têm e re g e n e ram o corpo, o so n o e o co n su m o d os alim en to s, são d ed icad as ao p la n e ja m ento e ex e c u ç ão de atos de v io lê n c ia .38 São privados do sono (lõ’ yisnü; lit. “ não co n seg u em d o rm ir” ; v eja 3 .2 4 ), seg u n d o H abel, “é um a ind icação de seu im p u lso in te rio r p ara c a u sa r tra n sto rn o s ao lo ngo do ca m in h o ” (cp. Sl 3 6 .1 -4 [2 -5 ]).39 D ão p rio rid a d e p ara a n o ite, q u an d o p lan ejam suas ativ id ad es p ara o d ia seg u in te. A m en o s que fo rjem , ou até forjarem o mal Çim lõ ’ yãrê’ü) trad u z um sen tid o m ais literal, “fa ze r o m al” . M iq u eias d iz que os p erv erso s “n o seu leito... m aquinam o m al” (M q 2.1). R en au d ex p lica d e m o d o p lau sív el que a distin ção en tre p la n e ja r e ag ir é a ten u ad a na an tro p o lo g ia se m ític a.40 P or e x e m p lo, no S alm o 5 3 .2 [3 ], o v erb o pã'al (“ fa z e r” ) e stá ligado à ativ id ad e “ no co ra çã o ” . S o m en te d ep o is de terem fo ija d o o p lan o para p reju d icar o u tros (veja 3.7) a fim de b en e fic ia r a si m esm o s é que eles co n seg u em d o rm ir (cp. 3.24). O p aralelo , e seu sono (áenãtãm) lhes é arrancado 37. IBHS, p. 224, P. 4.3c. 38. M einhold, Sprüche, p. 93. 39. N. Habel, “The Sym bolism o f W isdom in Proverbs 1-9” , p. 138. 40. B. Renaud, La formation du Livre Michée: tradition et actualisatioii (EB; Paris: Gabalda, 1977), p. 66.
( wenigzelâ ; v eja 2 2 .2 2 ; 2 4 .1 9 ), rep ete a id e ia de “ so n o ” e ac rescen ta “a rran car” p ara in te n sific a r o v íc io q u e o s im p ele n eu ro ticam en te. A au to p re serv a çà o g erad a p elo m ed o e m an tid a à cu sta de o u tro s se to r nou a co n d ição n ec e ssá ria p ara su a ex istê n c ia (cp. T t 3.3). A té que [i.e., a menos que] façam [alguém] tropeçar Çim lõ’ yaksilü', v eja v. 12) e sclarece q u e seus p lan o s m a lic io so s en v o lv em o e n fraq u e cim en to e/ou a p ilhag em de suas vítim as, p rep aran d o o ca m in h o para o versículo 17. A ssim co m o o s p e rv e rso s se rev ig o ra m à n o ite co m seus plan o s m alig n o s, assim tam b ém d u ran te o d ia se alim e n ta m d a sua ex ecução.
17 Porque (k i ; v eja 4.3 ) comem ( lãham ü ) é u m a p alav ra p o ética rara (9.5; 2 3 .1 , 6; D t 3 2.24; Sl 141.4), q u e c o m b in a com seu co g n ato acusativo. O pão ( lehem ) era o alim e n to co m u m d o s an tig o s heb reu s e, p o rtan to , rep resen ta o alim e n to em geral. Da perversidade ( resa'; veja 2.22; 4 .1 4 ) p o d e se r d e lib e ra d a m en te am b íg u o , sig n ific a n d o p o ssiv el m ente d e m o d o literal, “o p ão o b tid o p ela m an ip u la ç ã o p erv ersa” ou, o que é m ais p ro v áv el, co m o u m a fig u ra, “a p e rv e rsid a d e co n stitu i sua d ie ta reg u lar (cp. Jó 15.16 )” .41 A pe rv e rsid a d e se to m o u o seu n u trien te n ecessário. P tah -h o tep (581 s.) usa a m esm a fig u ra, “ E le [o insensato] viv e d aq u ilo q u e cau sa a m o rte, seu alim e n to é a d isto rção do d isc u r so” .42 O paralelo q u iástico e do vinho (weyayin)... bebem (yistü), for m a um m erism a com “ co m em o p ã o ” ; ju n to s, eles re p resen tam fazer um a refeição. S ua dieta reg u lar an seia p o r b ru talid ad e, co m o q u an d o os jo g a d o re s co n stro em seus c a ssin o s g ran d io so s ex p lo ra n d o os viciad o s, ou q u ando o s rico s c o n stro e m suas m an sõ es p ag a n d o aos trab a lh a d o res m enos do que lhes é d ev id o , ou ainda, quan d o funcio nários vivem no luxo d efrau d an d o a em p resa. Dos atos violentos (hamãsím\ v eja 3.31) e sclarece qu e a p e rv e rsid a d e q u e o s su sten ta p sic o ló g ic a e fisicam en te en volve o h o m icíd io e o d e rram am en to de san g u e (cp. 1.10-15; M q 3.2, 3). E p o ssível que a c o r do v in h o , na m etáfo ra, c o m b in e com o sangue de su as vítim as, na realid ad e. A lé m d isso , o p lu ral ex cep cio n al pode co n v id a r a u m a c o m p aração en tre e sm a g a r m u itas u v as p ara u m copo de vinho e m atar m u itas v ítim as p ara c o lo c a r o v in h o na m esa. N o m ito g rego de M ed u sa, o c o ração de q u a lq u e r um q u e o lh a sse de frente para seu rosto h o rren d o era tra n sfo rm a d o em pedra; assim tam b ém o filho co rre o risco de te r seu co ração tra n sfo rm a d o em p ed ra ao se en v o lv e r de algum m odo com os perversos. A lex an d er Pope ex p ressou de m aneira 41. Greenstone, Proverbs, p. 42. 42. AEL, 1:75.
b astante p erc e p tiv a a ten d ên cia de se to m a r en d u recid o no p e cad o em sua h eró ica p arelh a de versos: “O v ício é um m o n stro de a p a rê n cia tão assu stad o ra qu e, p a ra ser a b o m in ad o , só p recisa ser visto. M as quan d o sua face é vista co m freq u ên cia, to m a -se um ro sto fa m ilia r que, p rim e i ro su p o rtam o s, d ep o is, n o s a p ied am o s e, p o r fim , a c e itam o s” . O sr. H yde dentro d eles triu n fo u in teiram en te so b re o dr. Jekyl. A p ro p a g a ção da h o m o ssex u alid ad e nos E stad o s U n id o s em m en o s de um a g e ra ção valid a o p erig o do en d u re c im e n to p ro g ressiv o no p ecado. b. Conclusão (4.18, 19) A co n clu sã o seg u e a m esm a se q ü ê n c ia d a p rim e ira d escriçã o dos ju s to s e, d ep o is, d o s p erv erso s, m as su b o rd in a a m etáfo ra do cam in h o às sím iles d a luz c rescen te e da escu rid ão esp essa. A p alav ra inicial “v ered a” e o v erb o final “ fazer tro p e ç a r” a sso c ia m cla ra m en te a seg u rança num cam in h o (vs. 10-13) com a luz (v. 18) e o p erig o num c a m i nho (vs. 14-17) com a escu rid ão (v. 19). C o m e ssa m u d an ça, p assan d o do cam in h o dos p erv erso s de vo lta p ara o c a m in h o dos ju sto s, o pai cria um a cen su ra, se p aran d o a co n c lu sã o d o c o rp o .43 18 Agora a vereda do ju sto ( we,õrah saddiqim ; v eja 1.19; 2.20 c o n trasta claram en te co m “ a v ere d a d os p e rv e rso s” no v e rsícu lo 14. É como o sol da manhã ( ke 'ôr riõgah) trad u z “c o m o u m a luz b rilh an te” , m as “ luz” p ode se referir à lu z m atinal (cp. Jz 19.26; N e 8.3), o sentido ex ig id o p elo p aralelo q u e se m o v e do in ício da m a n h ã para o dia pleno. Nõgah se refere à clarid ad e rad ian te o u b rilh o , co m o da lua (Is 4.5; 50.10) ou d as e strelas (J1 2.10; 3 .1 5 [4 .1 5 ]),44 e in d ica que n ã o há n e n hum a n uvem , nem m esm o u m a so m b ra, n esse cam in h o (cp. 2S m 23.4; Is 62.1). A luz sim b o liza a v erd ad eira p ied ad e e m o ralid ad e co m a se g u rança, a salv ação e o b e m -e sta r (Sl 43 .3 ; Jó 22.28; 2 9 .2, 3; Is 9.2[ 1]; 42.16). D e fato, o p ró p rio S e n h o r é luz (Sl 2 7.1). O c am in h o p ara os peregrinos é d u p lam en te seguro e protegido: é livre de obstáculos (4.12) e ilu m in ad o p o r u m a luz fu lg u ran te, de m o d o q u e p o d e m v e r ao nde estão indo e o n d e c o lo c a r os pés. S ua v id a é livre do m al e, caso ele se faça p resen te, eles o v eem d e im ediato. Brilhando de modo cada vez mais reluzente (hôlêk wã'ôr) su g ere qu e, a p e sa r de P ro v érb io s n o r m alm en te c o n tra sta r os ju s to s e os p erv erso s co m o o p o sto s ab so lu to s, 43. Segundo Fox, Proverbs 1-9, p. 182. 44. HALOT, 2 6 6 7 ,1 nõgah.
existe, na v erd ad e, um cre sc im e n to na retid ão e, co m isso, im p licita m ente, um a seg u ran ça cada v ez m ais in ten sa num c a m in h o que j á é seguro (cp. M c 4 .2 8 ). Até ( ’ad) e x p ressa “ um lim ite q u e não é ab so lu to (que en cerra a aç ã o an terio r), m as a p en as relativ o , além do qual a ação ou estado descrito na cláu su la principal ain d a tem co n tin u id ad e” .45 A p e sar do sig n ific a d o ex ato da ex p ressão ú n ica o dia estar firm e ( nekôn hayyôm) ser c o n tro v e rso ,46 seu sen tid o g eral d ev e ser q u e o ca m in h o do ju s to c h e g a à ilu m in ação p e rfe ita e, com isso, à salv ação absoluta. S aadia co m en ta, “O s ju s to s são c o m o a luz da m an h ã que co n tin u a au m en tan d o , e n ão co m o a luz da tard e que está se m p re d im in u in d o ” .47 19 E n tretan to , o caminho dos perversos (derek r^Saim ; veja v. 14) é como a escuridão (kã^pêlâ); a m esm a p alav ra é u sada para as trevas esp essas d o E gito (Ê x 10.22) e p ara a e sc u rid ã o do s ceg o s que tateiam ao m eio -d ia e n ão co n se g u e m en c o n tra r o seu c am in h o (D t 28.29). O ob jetiv o da sím ile é esclarecid o em 4 .1 9b. S em a luz m oral da consciência interior ou da revelação exterior, eles não sabem (lõ ’ yãde'i2; v eja 1.2) a c a u sa de sua c a lam id ad e, p o is não co n se g u e m v er a relação entre o p ecad o e a m orte. M ein h o ld o b serv a qu e, p ela prim eira vez, é declarado qu e eles não sabem . Ele prossegue afirm ando que o m esm o ju lg am e n to é pronu n ciad o sobre a esp o sa lasciva (5.6), sobre a m ulher loucura (9.13) e sobre aqueles que são seduzidos p o r ela (7.23; 9 .1 S).4* A ignorância tanto da natureza quan to das conseq ü ên cias da perversidade é a m arca da d ecad ên cia m oral absoluta (cp. 24.12; 28.22). O que os fa z tropeçar (bammeh yikkãsêlü lit. “em que tro p eçam ” ; v eja vs. 12, 16) se refere a qualq u er agen te que p rovoca a fad ig a e a m orte dos perversos. Por exem plo, hoje em dia m uitas pessoas não veem n enhum a relação entre as doenças venéreas e a im oralidade sexual, en tre a ganância indul gente e a dívida nacional, entre a guerra e a m entalidade tribal. E m últim a análise, o agente é o S e n h o r , que liga o s atos m aus às conseqüências m ás (cp. 5.21-23; D t 28.28, 29; Jó 12.24, 25; 5.13, 14; Jr 13.16; 23.12). O s perversos, porém , n ão são cap azes de v er essa ligação e m orrem .
45.G K C , pp. 164-65. 46. BDB (p. 465) e outros conjeturam que se refere "ao meio-dia. quando o sol parece estar parado no meio do céu". Fleischcr (citado por Delitzsch. Proverbs, p. 113) cita paralelos em outras línguas em que o m eio-dia é com parado ao ponto lixo de um a balança. Porém , de acordo com Aalen ( T D O T 1:151-55, s.v. or), os hebreus não associavam a luz do dia ao sol. Alem disso, o Heb. expressa o meio-dia como çõh°rayim. Toy ( Proverbs, p. 94) acredita que “provavelm ente significa a vinda do dia pleno em contraste com a prim eira luz ou aurora” . 47. C itado por G recnstone, Proverbs, p. 43. 48. M einhold, Sprüche, p. 94.
20 Filho meu, presta atenção às minhas palavras 21 22 23 24 25
volta o teu ouvido para os meus ditos. Não permita que se apartem2 de diante3 dos teus olhos;4 guarda-os dentro do teu coração; porque são vida para aqueles que encontram,5 e remédio para o corpo todo. Acima de todab a vigília,1 guarda o teu coração, porque tudo o que fazes f l u i 8 dele.9 Mantenha uma boca torta afastada 10 de ti, e os lábios desencam inhados 11 coloca longe de ti. Que os teus olhos olhem bem em frente, e que as tuas pupilas 12 olhem 13 diretamente diante de t i u
1. A LXX traz o sing. “ m inha palavra” (tam bém em 4.4.). 2. O Hifil perm issivo (IBHS, p. 445, P. 27.5) e possivelm ente o Hifil interno (IBHS, p. 4 3 9 , P. 2 7 .2 s.) de l&z (v e ja G K C # 7 2 e e ; cp. o Q al a lte rn a tiv o cm 3 .2 1 ). Em o u tra s passagens ocorre no Nifal (2.15; 3.32; 14.2; Is 30.12). 3. Preposição om itida (IBHS, pp. 224-25, P. 11,4.3e). 4. A LXX traz “ para que tuas fontes nâo falhem”, confundindo 'ayin, "olho” com 'ayin, “ fonte” (um sím bolo sexual?) e desconsiderando completamente a sintaxe. 5. A Sir. traz o sing. para conform ar com o verseto B. 6. Provavelm ente um mem comparativo. Uma expressão sem elhante ocorre em A hiqar98: “A ci ma de toda a vigilância, vigia a tua boca” (ANET, p. 428). A LXX, Sir. e Vulg., que trazem “com toda vigilância”, sugerem a retroversâo a bete. Targ. e revisões gregas posteriores trazem o term o mais difícil min. 7. BDB (p. 582, s.v. m in ) observa que “na poesia, por vezes, a ideia da qual o com parativo depende não é expressa, devendo ser fornecida pelo leitor". A ideia com pleta é “acim a de toda a vigília que tu deves guardar". 8. Min é regido por um verbo om itido de movim ento (IBHS, p. 224, P. 11.4.3d). 9. A LXX traz, “ pois destas”, provavelmente considerando com o antecedente “palavras” no v. 20. 10. HALOT (2:849, s.v. s ú r ) também traduz s ú r (Hifil) de maneira ímpar em 4.24 com o “m anter distante". 11. A LXX conjetura o sentido “ injusto” para o substantivo ím par lezât. A forma provavelm ente seja o construto de lUzút, derivado de luz (3.21,32; 4.21). Seu cognato árabe quer dizer “desviar” (veja HALOT, 2 :522,525, s.v. l&z, lõzât). 12. Tradicionalm ente, 'ap ‘appayim era traduzido com o “pálpebras” e ainda é em algum as ver sões em Jerem ias 9.18[ 17]. KBL2 (p. 723, s.v. 'appayim ) afirm aram que, na verdade, significava “olhar de relance”, e essa tradução é encontrada nessas versões. No entanto, HALO T (2:861, s.v. 'appayim ) traduz com o “cilios” . M. H. Pope (Job [AB; N ova York, Londres, Toronto, Sidnei, Auckland: Doubleday, 1973], pp. 3 0 -3 1) cita um paralelo ugarítico em que os 'p'p(m ) são descritos com o tigelas feitas de algum tipo de pedra preciosa. M. Dahood ( Psalms, III, quarta nota de Sl 132.4) cita um texto de Q um rã no qual os ‘p 'p veem . A m elhor conjetura parece “globos oculares”, traduzidos com o “p upilas” . 13. “ Diante de ti” é regido por um verbo om itido desse tipo (IBHS, pp. 223-25, P. 11.4.3). 14. A LXX traz, interpretativam ente, “que tuas pálpebras se movam para coisas justas” .
26 Vigia 15 a trilhalf>p a ra o teu pé, e q u e 17 todos os teus cam inhos sejam firmes.™
27 Não vires p a ra a direita ou p a ra a esquerda; guarda o teu p é do mal.
O chamado renovado para o filho ouvir o ensino dos pais ajuda a diferenciar esta palestra da anterior (vs. 10-19). Ela muda o código dos dois caminhos para a “anatomia do discipulado”19(cp. 6.12-15, 16-19; Sl 115.5-7; 135.16, 17). O todo é estruturado pelo inclusio quiástico que envolve o verbo n ã ( a \ “torcer/desviar”. Newsom observa que o discípulo como indivíduo é reescrito como uma série de partes do corpo: o ouvido (v. 20b), os olhos (v. 21a), o coração (vs. 21b, 23a), o corpo (v. 22b), a boca e os lábios (v. 24), os olhos e as pupilas (v. 25) e o pé (vs. 26a, 27b). Ela acrescenta que, “entretecidos com esse inventário do corpo estão termos de um código de orientação física (inclinar, estender, torcer, desviar, distorção, curva tura, manter distância, reto, em frente, diante de, virar para a direita ou para a esquerda)”.20 O código de orientação final no “caminho” (4.11a, 26b)/vereda (4.11b, 26a) certo - observe o quiasma - no segundo versículo contando a partir do começo e do fim das palestras, respectivamente, liga este poema ao anterior. Além disso, ambos afirmam que as palavras instru tivas do pai “são vida” (4.13, 22). Por fim, os dois poemas advertem 15. A raiz de pallês é controversa. BDB (pp. 813, 814, pãles) sugeriram um Piei denominativo de peles, “balança, peso”, passando disso para “nivelar". No entanto, o verbo normal para essa ideia é yãsãr, “tomar reto, plano” (veja 3.6) mas esse verbo não faz muito sentido em 5.6, 21. HALOT (3:934-35, s.v. I e II pis.) se equivoca. Em primeiro lugar, acredita que I pãías cognato do acadiano palBsu , “perfurar" (= Heb. Piei “nivelar” ou “abrir um caminho”; i.e., remover qualquer desvio ou obstáculo moral). Semelhantemente, a LXX traduz como “fazer caminhos retos”, uma verdade citada em Hebreus 12.13. Em segundo lugar, HALOT propõe II pSlas, cognato do acadiano paiãsu, “olhar” (em direção a), “examinar” (Heb. Piei significa “observar”). Atribui esse significado inequivocamente em 5.6, 21. Parece mais apropriado manter a constância do significado, especialmente considerando-se que “observar" combina bem com “olhar” em 4.25. Essa palestra não pede que o filho crie o próprio caminho, mas que se comprometa com os caminhos que já foram abertos para ele sem sc desviar deles. 16. A LXX traz o pl. “trilhas” para corresponder ao paralelo “caminhos”. 17. As formas volitivas paralelas inequívocas nos vs. 24-27 sugerem que essa forma ambígua é jussiva (como e o caso nas versões antigas e cm algumas versões modernas), nâo imperfeita (i.e., “todos os teus caminhos serão seguros”, como aparece em algumas versões modernas). 18. A LXX traduz o jussivo provável com o imperativo “endireitar”. 19. Hubbard, Proverbs, p. 87. 20. Newsom, “Gender and the Discourse”, p. 152.
energicamente contra qualquer desvio do caminho certo (4.14, 15, 26, 27). A sexta palestra advertiu o discípulo para não entrar no caminho dos perversos; a sétima palestra o admoesta a andar pela trilha reta e a não desviar nem para a direita nem para a esquerda. Esse poema unificado consiste da introdução típica, qua inclui a identificação do destinatário, admoestações para dar atenção ao ensino (vs. 20,21) com motivações confirmadoras (v. 22) e a lição para dedi car seu coração (v. 23), suas palavras (v. 24), sua atenção (v. 25) e suas ações (vs. 26, 27) ao caminho reto. Um inclusio quiástico ao redor da última estrofe, usando a palavra-chave hãsêr nos versículos 24a e 27b, caracteriza o manter as partes do corpo afastadas do mal, e seu segmento central caracteriza o compromisso com aquilo que é cer to (vs. 22, 23). O versículo 23 funciona como um janus, tendo como característica singular a presença em um mesmo versículo de uma ad moestação (23a) e de um argumento (23b), que combinam as admoes tações e os argumentos nos versículos 20-22. O janus olha para trás, para as admoestações para aceitar o ensino, pois o coração é o recep táculo que abriga a palavra viva (v. 23a; cp. 2.2; 3.4 [TM]). Ele forma um inclusio com o versículo 20 ao redor da introdução, pois, de acordo com 2.2, o ouvido (4.20) é a chave para o coração (v. 23). A admoesta ção no versículo 23 para guardar o coração (i.e., de tramar o mal) é desenvolvida a partir da admoestação do versículo 2 lb para guardar as palavras formativas no coração, e o argumento no versículo 23b de que a vida flui do coração é desenvolvido com base no argumento do versí culo 22a de que as palavras do pai são vida.2' O janus também olha 21. Apesar das instruções egípcias não terem convocações correspondentes para ouvir a instru ção como introduções a unidades individuais, a literatura egípcia reconhece o papel essencial do coração tanto como receptáculo de estímulos exteriores por meio dos órgãos dos sentidos quanto como órgão que govema o restante do corpo. Kayatz (Proverbien 1-9, pp. 43-47) dedica uma digressão extensa ao tema dos órgãos e membros do corpo na literatura egípcia. Cita, por exemplo, “A Teologia de Mêmfis” (ca. 2700 a.C.): “Ver com os olhos, ouvir com os ouvidos, cheirar o ar com o nariz, tais atos reportam ao coração. É isto que faz todo [conceito] completo surgir, e é a lingua que anuncia o que o coração pensa ... Em verdade, tudo... vem de fato a existir por meio daquilo que o coração pensou e a língua ordenou... Assim foram realizados... os gestos dos braços, o movimento das pernas, e a atividade de cada membro, em conformidade com (essa) ordem que o coração pensou, que surgiu por meio da língua e que dá valor a tudo” (ANET, p. 5). Kayatz prossegue documentando que na literatura sapiencial o “coração que ouve” tem uma importância central e superior a todos os outros membros. Na literatura egípcia, a capacidade auditiva do ouvido é dependente de um coração sábio, o dom de deus. Ptah-holep (ca. 2450 a.C.), por exemplo, disse: “Aquele a quem Deus ama, pode ser um ouvinte; mas aquele a quem Deus abomina, não pode ouvir. E o coração que faz seu senhor ser como aquele que ouve ou aquele que não ouve. A vida, a prosperidade e a riqueza dc um homem c o coração” (ANET, p. 414). De acordo com o Papiro
para a frente, para a vida que flui do coração e anima o restante do corpo para que este não se desvie daquilo que é certo. Logicamente, a introdução menciona os órgãos receptores: ouvidos (v. 20), olhos (v. 21a) e coração (vs. 21b, 23a), e a lição fala dos órgãos ativos: boca/ lábios para falar (v. 24), olhos/pupilas para manter o rumo (v. 25) e pés para se locomover (vs. 26, 27), uma seqüência semelhante que vai da recepção à busca em 2.1-4. Uma parte do corpo, o coração, é mencio nada de maneira ímpar nos dois versetos do ja n u s , pois o coração interior é o receptáculo da palavra (4.23a) e o agente que governa as ações do corpo (v. 23b). Em resumo, a primeira metade trata da interioridade ou cenário interno, mantendo as fontes de vida espiritual firmes no ensino (vs. 20-23a), e a segunda metade de sua exterioridade ou cenário externo, mantendo os membros firmes no caminho certo (vs. 23b-27). O inclusio com nata, “voltar-se para as minhas palavras” (v. 20b) e “não virar para a direita ou para a esquerda” (v. 27a), resume a passagem. Aquilo que a pessoa é não pode ser separado daquilo que ela faz. Mais uma vez, as palavras e ditos específicos devem ser internaliza dos e o caminho da vida a ser seguido deve ser buscado em outro lugar além desta palestra - isto é, especialmente nas coleções subsequentes. a. Introdução: m antendo a anatom ia interior (4.20-22) O uso da terceira pessoa do plural nos versículos 21,22 diz respeito a “palavras” no versículo 20. A promessa “para aqueles que as encon tram [as palavras]” liga o argumento do versículo 22 às admoestações do versículo 20. (1) Destinatário e admoestações a guardar o ensino do pai (4.20,21) 20 Filho m eu ( ben i\ veja 1.8), p resta atenção (h a qsibâ ; veja 1.24; 2.2) às minhas palavras ( lid ebãray ; veja 1.6) é o vocabulário introdu tório típico de uma palestra, mas a combinação é única. Volta (ha(\ veja 2.2) o teu ouvido ('o zn ekã ; veja 2.20) p a ra os m eus ditos ( >am ãray; veja 1.2; 2.1; 4.10), enfatizando a ordem, também é paradoxalmente uma expressão típica e única. Insinger ( 3 0 .1 9 ) (ca. final do período ptolcmaico), o coração e a língua sâo o lugar do deus. Meinhold (Sprüche, p. 9 7 ) afirma que isso significa que o coração se encontra aberto para a divindade e que a boca formula a percepção que foi captada e guardada no coração. Em Provérbios dc Salomão, ao contrário, o sábio usa a persuasão moral dos ensinos para levar o filho a ouvi-lo e, desse modo, vivificar o coração (veja também 2.2).
21 Não permita que se apartem ( 'al-yallizü; veja 3.21; cp. “desencaminhados” em 3.15), como em outras passagens, intensifica a admoestação da aceitação para a retenção das palavras (veja 1.8; 3.13, 18, 21; 4.4, 6, 10, 13). Os ditos/palavras são personificados como se tivessem pés e caminhassem longe do filho. A sabedoria exige busca constante. De diante dos teus olhos ou “fora das tuas vistas” (mê'êneykS; veja 3.21) pressupõe que os provérbios de Salomão, da mesma maneira como as instruções egípcias muito mais antigas e contemporâneas, eram transmitidos por escrito para uma audiência letrada (veja 1.8). Guardaos (Somrêm; veja 2.8) dentro (betôk\ veja 1.14)do teu coração (lebabekã; veja pp. 141-143) reforça ainda mais a ordem para reter o ensino. Assim como os Dez Mandamentos celestiais ficavam abrigados na arca situada no centro do Santo dos santos, o ensino do pai deve ficar abrigado no centro do coração do filho (cp. 2.1; ICo 3.16; Cl 3.16). É evidente que se tem em vista a função imaterial e moral-espiritual do coração. (2) Argumento motivador: os ensinos dão vida (4.22) 22 Porque (k i) introduz a argumentação de forma típica (1.9; 3.2; 4.2). São vida (hayyim hêm\ veja pp. 157-161) para aqueles que as encontram (lemõse ’êhem; veja 1.28). O verbo “encontrar” (obter, ad quirir) é apropriado tendo em vista a ordem para prestar atenção (v. 20), pois aquilo que é encontrado, normalmente foi, antes, procurado (veja 3.13). O paralelo de “vida”, remédio (m a r p ê veja 3.8) implica restauração à vida plena que foi perdida (veja 3.18). O ensino sadio preserva uma pessoa melhor que os remédios, embora os dois não de vam ser colocados em oposição um ao outro. Delitzsch explica a mu dança para o sing., para o corpo todo (ülekol-beéãrô; lit. “e para a carne toda”): “pois aquilo que é dito se refere a cada um dos muitos (iii. 18, 28, 35).”22 “... a piedade para tudo é proveitosa, porque tem a pro messa da vida que agora é e da que há de ser” ( lTm 4.8). b. Janus: guatda o coração, a fonte de todo o comportamento (4.23) O comparativo acima de toda (m ikkol-) constitui o padrão pelo qual a qualidade de guardar o coração é medida (i.e., deve ser conside rada mais importante do que qualquer coisa que a pessoa deve refre ar). A forma substantivai vigilia (miSmãr) liga-se ao verbo sãmar, “guar-
dar” os mandamentos no versículo 21. M iSm ãr se refere a um lugar sob guarda, uma prisão (Gn 42.19), ou a montar guarda, o sentido neste caso. Nesse sentido ela pode significar a vigilância para manter alguém ou algo sob custódia e, desse modo, controlar como um prisioneiro (Gn 41.10; Lv 24.12) ou como um dragão (Jó 7.12), ou proteger de inimigos externos, como os guardas de Neemias protegeram Jerusalém (Ne 4.22[16]; 7.3). A ordem guarda (ou protege, nãsar; veja 2.8) tem a mesma ambigüidade. A julgar por 13.6, quando o sujeito é uma pessoa e o objeto é uma parte do corpo, significa proteger ou impedir de fazer o mal. “O que guarda (nõsêr ) a sua boca” significa guardar a língua de falar mal. Ahiqar (98) usa “vigiar” da mesma maneira. “Acima de toda a vigilância, vigia a tua boca, e [àquilo] que tu ouves endurece o teu coração.”23 E provável que esse seja o sentido de o teu coração (veja pp. 141-143) - ou seja, impedir o coração de tramar o mal (veja 6.14, 18). A ordem é uma metonímia de efeito. Ao guardar os mandamentos dentro do coração (veja 4.21b),24 ele permanece guardado das más intenções. Porque (ki; veja v. 22) introduz aqui a motivação confirmadora para guardar o coração acima de todos os outros membros de fazer o mal. O antecedente de dele (m im m e n n ü ), um ablativo de ori gem, é o coração que governa todas as atividades (veja 2.2), não a “vigilância”.25 Tudo o que fa z e s traduz a expressão idiomática hebrai ca “as fontes de vida”. O substantivo (tôse ’ô t ; “fontes”) é formado pela prefixação de tau à raiz verbal y s ’, “sair” e, portanto, designa a ação do verbo, as “saídas”.26 O cartógrafo emprega o termo para as “saídas” de uma cidade (Ez 48.30) e, por metonímia, para as “fronteiras”, as “extremidades” de um território (1 Cr 5.16); o salmista resgatado o em prega para “escapar” da/diante da morte (Sl 68.20[21 ]). O que está em discussão aqui é o coração como a fonte das atividades do corpo (veja 2.2). Convém lembrar que os antigos atribuíam as funções do corpo ao coração: suas expressões faciais (15.13), sua língua (12.23; 15.28) e seus outros membros (6.18). O plural se refere às muitas e diversas questões da vida manifestadas nos diferentes membros do corpo. De acordo com Delitzsch, a metáfora sugere não apenas que a vida tem suas fontes no 23./íA'£7',p.428. 24.0 coração tambcm pode ser "guardado" das intenções perversas (veja 7.10). 25. Pace Toy, Proverbs, p. 98. Se “vigiar” fosse neutro, seria de esperar um pronome feminino (IBHS, p. 305, P. I6.4f). 26. IBHS, pp. 90-91, P. 5.5c.
coração, “mas também que a direção que ela toma é determinada pelo coração”.27 É provável que, “da vida” (veja pp. 157-161) possa ser inter pretado mais corretamente como um genitivo, de efeito, ou seja, as fon tes produzem vida diretamente, como o “pão da vida” e a “água viva”.28 A vida em questão é moral-espiritual, pois o agente é a palavra do pai, não o pão físico, mas ainda assim elas vivifícam as diversas partes do corpo, como especificado nos versículos 24-27.0 coração que vivifica e controla o corpo deve, obviamente, ser impedido de tramar o mal. c. Lição: mantendo a anatomia exterior fixa no que é certo (4.24-27) As admoestações específicas com respeito às partes do corpo res ponsáveis pela orientação (vs. 24-27) são estruturadas pelo inclusio quiástico da ordem negativa kãsêr, “manter-se afastado de” (vs. 24a, 27b), ao redor de um cerne de ordens positivas para manter “os olhos” sempre em frente (v. 25) e “o pé” firme na direção certa (v. 26). Os versículos 24 e 25 são unidos na menção das partes mais abrangentes do corpo, “boca” e “olhos”, nos versetos A, e de suas partes mais espe cíficas, “lábios” e “pupilas” nos versetos B. O “pé” nos versículos 26a e 27b liga esses dois versículos num paralelismo quiástico. O fato de dois versículos serem dedicados ao pé ressalta a importância do fazer. (1) A boca e os olhos (4.24, 25)
24 Não basta apenas refrear o coração. Também é preciso vigiar os membros do corpo por meio dos quais a vida interior se manifesta.29 A lista não pretende ser exaustiva, mas sim paradigmática para o viver correto.30 Como na literatura egípcia, a boca ocupa um lugar de honra, pois é o canal direto para e do coração. Por um lado, ela permite que se avalie em primeira mão o que está se passando no coração.31 “O indiví duo é aquilo que fala”, diz McKane (cp. Lc 6.45; Rm 10.10).32 Por outro lado, aquilo que a pessoa diz afeta o coração. “Hábitos superficiais de conversa reagem sobre a mente”, diz Kidner, “de maneira que, e.g., a 27. Delilzsch, Proverbs, p. 115. 28. IBHS, p. 146, P. 9.5.1c; cp. João 4.14; 7.38. 29. Gemser, Sprüche, p. 27. 30. Plõger, Sprüche, p. 49. 31. Plõger, Sprüche, p. 49. 32. McKanc, Proverbs, p. 310.
conversa cínica, as reclamações da moda, a tagarelice, as meias-verdades, todas insinceras, se cristalizam em hábitos fixos do pensamento.”33 Mantenha... afastada de ti (hãsêr m im m ekã; vejasúrem 3.7; cp. 4.15; 5.8; 30.8) é uma tradução mais apropriada de hãsêr min que “remove de ti”, seu sentido normal. Em suas palestras o pai coloca o filho entre os sábios, não entre os perversos, apesar de ser suscetível às duas cate gorias (veja pp. 145,248,249; 1.8). Além disso, o paralelo “coloca lon ge” (cp. 5.8; 30.8), e a mesma construção no inclusio quiástico (4.27), em que ela deve significar “manter afastado” e não “remover”, confir mam a tradução proposta. O paralelo boca (peh) torta (
certa direção a fim de ver algo.36 A oração adverbial bem em fren te (len õ ka h ) pressupõe que o caminho diante do filho é reto e, portanto, tem por objetivo concentrar seu olhar no caminho reto da sabedoria concretizada no ensino do pai. Os olhos estão sempre à procura de novos estímulos (27.20), de modo que o filho deve ser admoestado a guardá-los de se desviarem para os estímulos errados. De acordo com 17.24, os discementes se concentram na sabedoria, enquanto que os insensatos dissipam o seu foco olhando para todas as outras partes. “A prática de olhar ao redor, curiosa e despropositadamente, afeta a alma, descentralizando constantemente e contaminando-a com facilidade”, diz Delitzsch.37 Tuas pupilas ( we'ap'appêkã ; veja n. 12) é um paralelo enfático bastante comum para os olhos. O paralelo olhem diretam ente diante de ti (yaysirünegdekã) assevera a importância de se manter o foco no caminho certo (cp. Mt 6.22). Enquanto as pessoas estão olhan do fixamente para a verdade celestial. Satanás não tem nenhuma van tagem sobre elas. Eva só caiu depois de olhar para o fruto proibido. (2) Os pés (4.26, 27)
Os versículos 26 e 27 são ligados pela repetição de “o teu pé” nos versículos 26a e 27a, sugerindo que os versículos são construídos de forma quiástica (i.e., vs. 26a e 27b formam uma moldura ao redor dos vs. 26b e 27a). Esses versículos combinam o código de uma parte do corpo, o pé, a ação num caminho, o código dos versículos 10-19 e, portanto, ligam os dois discursos. O versículo 26 admoesta claramente a um compromisso com o caminho certo, e o versículo 27 adverte acer ca de se desviar dele para o mal, combinando a boca e os olhos em não se desviar daquilo que é reto. 26 Vigia (pallês; veja n. 15) provavelmente desenvolve “olhem” n versículo 25 da mesma maneira que a trilha (m a'gal; veja 1.15) toma explícita a pressuposição de que os olhos fitaram o caminho reto (i.e., o curso e a conduta apresentados pelo pai; veja 1.15). O filho deve cuidar para que cada passo esteja em conformidade com esse caminho; um passo em falso pode se mostrar fatal. O teu p é ( raglek ã ) chama a atenção para cada passo dado no caminho da vida. Nesta palestra, que exige a adesão resoluta aos ensinos do pai, e que... sejam fir m e s 36. HALOT, 2:661, s.v. nb( traduz “olhar numa direção específica". 37. Delitzsch, Proverbs, p. 116.
(yikkõnü; veja 3.19) significa que o filho deve ser firme em seu com promisso com eles. O salmista almeja: “Tomara sejam firmes os meus passos (yikkõ n ü d erãkãy) para que eu observe (liSm õr ) os teus precei tos” (119.5; cp. Sl 51.10[ 12]; 57.7[8]; 108.1 [2]; 112.7).38 Todos os teus cam inhos (w ekol-derãkeykã; veja 1.15; 2.8; cp. “suas trilhas” em 5.6) é uma metáfora incompleta para as várias facetas do comportamento do filho. A tradução “segue apenas caminhos que são firmes” (NIV) transgride a expressão idiomática hebraica. 27 Não vires ('al-têf) um inclusio com o versículo 20, toma por certo que o filho está andando no caminho certo (veja 4.11, 18). Para a direita ou p a ra a esquerda (yãm in üéem õ ’u l) constitui um merisma, uma figura comum para o desvio moral de qualquer tipo (Dt 5.29; 17.11, 20; 28.14; Js 1.7; 23.6; 2Rs 22.2). A figura não se refere ao caminho do meio que passa entre dois extremos prejudiciais, como proposto por Aristóteles.39 O pai exige uma separação extrema do caminho errado e um compromisso extremo com o caminho certo. Não há um terceiro caminho. Num entendimento incorreto do merisma, a LXX acrescen tou inapropriadamente a homilia: “Pois Deus conhece o caminho da mão direita, mas os da esquerda são tortuosos. E [Deus] fará retos os teus caminhos e guiará os teus passos em paz”. O paralelo no verseto A, que descreve o filho na trilha certa e sem ter entrado no caminho errado mostra claramente que o paralelo ambíguo hãsêr “virar” ou “ m anter-se afastado'’’ deve significar “ conservar-se afastado” (veja v. 24). O teu p é (raglek ã ) completa o quiasmo com versículo 26a. Ao tomar cuidado para dar cada passo no caminho reto, o filho também deve tomar cuidado para guardar cada passo do m al (veja 1.16; 2.14). 9. Oitava palestra: a insensatez do adultério, a sabedoria do casamento (5.1-23) 1 M eu filh o , p resta atenção à m inha sabedoria;
inclina teus ouvidos p a ra as m inhas palavras de en ten d im en to , 1 38. De acordo com HALOT, 2:464, s.v. kún. 39. Pace Cohen, Prowrbs, p. 25, citando Malbim e Plõger, Sprüche, p. 50, citando Hesiod: “Per manece no caminho do meio”. I. Lit. “compreensão”. A LXX também acrescenta “para as minhas palavras” (cp. 1.2; 3.19; 4.20), provavelmente adsensum.
2 para que conserves2 a discrição,3 e para que4 os teus lábios5 guardem o conhecimento,6 3 Porque os lábios da esposa lasciva gotejam mel, e o seu paladar é mais suave que o azeite. 4 Mas no fim, ela1 é amarga como8 a losna; afiada, com o um a espada de dois 9 gum es.
5 Seus pés estão descendo'0 para a morte11 seus passos se prendem à sepultura. 6 A vereda da vida ela12 não'1 vigia; suas trilhas serpenteiam sem rumo'4 ela não o sabe.'5 2. Ao inserir 'ãleykã (cp. 2.11) Fichtner (BUS) muda a cláusula de propósito para resulta do e o significado de sttmar de "observar escrupulosamente" para “proteger” . 3. Pl. abstrato (cp. 8.12; 12.2; 14.17; 24.8; IBHS, pp. 120-21, P. 7.4.2); em outras passagens, sing. (1.4; 2.11; 3.21), provavelmente sem qualquer diferença em significado. 4. Uma construção inf. é, com frequência, continuada por um verbo finito (IBHS, p. 611, P. 36.3.2). 5. A LXX traz “meus lábios... a ti” < éepõtay lekB. 6 .0 rebi°‘ nâo permite a ligação gen. (i.e., “conhecimento dos meus lábios”). 7. Lit. “fim dela”, um gen. de agência (i.e., o fim que ela efetua; IBHS, p. 143, P. 9.5. lb). 8. A LXX traz "mais amargo” ' (Fichtner, BHS). 14. Perfectivo persistente (IBHS. p. 487, P. 30.5.1c). 15. Afirmando que a raiz comum ySda' não faz sentido aqui, D. Winton Thomas ("The Root y tf in Hebrew", JTS 36 [1935] 409-12 e “A Note on lS' td in Proverbs v 6”, JTS 36 [ 1935] 5960), seguido por McKane (Proverbs, p. 315), etc., propõe uma derivação de uma raiz cognata ao árabe w adua, “ficar tranqüilo, quieto, despreocupado”. Porém, W. Johnstone, (''YD' II, 'Be Humbled, Humilatcd’ ”, VT 41 [1991] 49-62) não considerou as evidências do árabe convincen tes e J. Emerton (“Thomas’s Theories about YADA", VT 41 [1991] 145-63), concordando com Johnstone, considerou as evidências apresentadas por Thomas a partir das versões antigas, exegese judaica e passagens bíblicas insuficientes para confirmar a teoria. A LXX traz, “Não são bem conhecidos" (em oposição a 7.26). Fox (Proverbs 1-9, p. 193) cita como outros exemplos do objeto não declarado de ySda (“conhece”) o fato afirmado na cláusula anterior, bem como Jó 9.5; 14.21 e 37.5.
7 Agora, pois, filhos,10 escutai-me e não vos desvieis das palavras da minha boca.17 8 Mantei o vosso caminho longe18 dela; e não vos aproximeis da porta da sua casa, 9 para que não entregueis o vosso esplendor a outros,19 e a vossa dignidade20 aos cruéis;2' 10 para que as estranhas não se satisfaçam com a vossa força, e os vossos trabalhos árduos não fiquem na casa de um estrangeiro. 11 E gemereis22 no fim de vossa vida, quando o vosso corpo e a vossa carne estiverem consumidos; 12 e direis, "Como odiei a instrução. [como]13 meu coração rejeitou a repreensão.2A 13 E não escutei a voz dos meus mestres,25 não inclinei meus ouvidos para aqueles que me ensinavam. 14 Logo26 me vi em sérias dificuldades no meio da congregação e da assembleia”. 16. A LXX e a Vulg. trazem a forma sing., provavelmente para harmonizar com o v. 1. 17. A LXX traz “minhas palavras” (< m i 'tmrõy), provavelmente refletindo uma haplografia em seu Vorlage. 18. Um indicador da liberdade estilística entre os autores semitas de mudar o número (e.g., pl. no v. 7, mas sing. no v. 8) pode ser visto numa mudança semelhante na inscrição de Tell-Fekheriyeh (ca. 9o século?) negando o transcurso de um período longo de transmissão através de escribas sucessivos (A. Abou-Assaf, P. BordreuileA. R. Mi 1iard, ü,a slalue de Tell Fekherye. Recherchesur lesCivilisations, vol. 7 [Paris: ADPF, 1982]). Aqui o verbo não signitica "remover o seu caminho”, pois o impe rativo seguinte deixa implícito que o filho ainda não foi ter com ela. 19. A LXX traz “tua vida” porque leu h a y y i m ou interpretou equivocadamente h ô d , ou ainda, adivinhou o seu sentido (veja L. Adams, “Lexical Equivalence in LXX Proverbs 1-9: A Study in Translation Technique" [tese de M.C.S., Regent College, 1992]). A Targ. e Sir., leem h ê l e k a “sua força” (veja 31.3) ou parafraseiam h ô d e k õ como uma referência à virilidade. 20. Ou “anos [de vida]”. Porém a forma nominal de III s n h (= “brilhar intensamente”, “ser impo nente”; HALOT, 4, s.v. III S n h ) , é preferível, em vez de I S ã n á . “anos”, pois oferece um paralelo mais adequado para h ô d . E provável que sua tônica seja s e n ã t e k ã . A LXX traz "tua vida” para evitar a dificuldade gerada por S n h ou como uma tradução livre (cp. 3.2, 16; 9 .1) (veja Adams, “Lexical Equivalence”, p. 160). 21. Uma vez que o adjetivo 'akzãri provavelmente não aceita declinação (HALOT, 1:4S, s.v. 'aksãrí), não há necessidade de restaurar/6 ‘akzBrím com base nas versões antigas (pace Fichtner, [B//S]). 22. A LXX e Sir. trazem “e vos arrependereis” (< w e n i k a m t ã ) ; porém “gemer” é mais forte. 2 3 .0 vau epexegético não é traduzido (IBHS, pp. 652-53, P. 39.2.4). 24. A LXX traz o pl. 25. A LXX traz o sing. que é mais fácil. 26. Ou “quase” (veja HALOT, 2:61 l,s.v. me a().
15 Bebe água da tua própria cisterna,21 e das correntes que influem do meio211do teu próprio poço.29 16 Deveriam30 tuas fontes transbordarem para fora? Os teus31 canais32 de água nas praças públicas? 17 Sejam para ti mesmo33 somente,34 e35 não tenhas nenhum estranho31' contigo. 18 Que o teu manancial seja37 abençoado,38 e obtém prazer39 da esposa da tua mocidade,40 19 [Que ela sejaj4i uma corça amorosa, uma cabra montês graciosa; que os seus seios42 te embebam43 a todo o tempo; e que com as suas carícias tu sempre te embriagues.44 27. A LXX traz “tua vasilha de beber" (cp. ITs 4.4; lPe 3.7). 28. Ou “para fora dc”, “de” (cp. Am 6.4). 29. A LXX traz o pl., perdendo a distinção entre os vs. 15 e 16. 30. Interpretando a forma prefixada como um imperfeito deliberativo (IBHS, p. 508, P. 31.4s.), não como um jussivo (IBHS, p. 316, n. 1). 3 1 .0 sufixo pronominal é, por vezes, omitido no verseto B. 32. Peleg pode designar as correntes de um rio (Sl 46.4[5]) ou, como hipérbole, lágrimas correndo pelorosto(SI 119.136; Lm3.48). 33. O lâmede de interesse em lekã determina "ti mesmo" na expressão idiomática lebaddekã como sendo firmemente separado de estranhos; seu conceito é de isolamento e reclusão e seu uso com o imperativo não pode ser traduzido (IBHS, p. 208, P. 11.2.1 Od). 34. Lit., “em um estado de separação para si mesmo”. 35. O vau epexegético intensifica ou reitera a cláusula anterior (IBHS, pp. 652-53, P. 39.2.4). 36. Lit., “e não há de estranhos”. LezSrím é um gen. perifrástico (IBHS, p. 157, P. 9.7b). Sem lamede. pode-se pensar exclusivamente em zõrim no v. 10. 37. Ao acrescentar hãyâ com o particípio, é acrescentado um indicador progressivo aspectual, “seja continuamente bendito" (IBHS, p. 628, P. 37.71b). 38. A LXX traz “teu somente” (< lebaddekH\ veja v. 17). 39.0 imperativo funciona como um imperfeito enérgico (veja 3.4, n. 4). 40. Conforme observado na Massorá do Códice de Leningrado, a forma é excepcionalmente defectiva para n^ãreks, um abstrato pl. de estado (IBHS, p. 121, P. 7.4.2b). O gen. provavelmente é temporal (IBHS, pp. 146-47, P. 9.5.2d). 41. A construção nominal do v. 19a é excepcional, mas Plõger (Sprüche, p. 53) rejeita prudente mente o suplemento no aparato da BHS, decorrente do acréscimo na LXX. 42. Pode-se argumentar fortemente a favor da mudança de tônica daddeyhã (“mamilos” ) para dsdeyhã (“suas carícias”). Essa é sua tônica em 7.18 com rwh, sendo mais apropriado a seu paralelo 'ah^bãiãh (“carícias” ) no v. 19b e encontrada em algumas revisões gregas. Mas o TM é difícil de justificar. Plõger (Sprüche, p. 53) defende o TM em função do seu uso de hiq (“peito”), a contraparte de “seios” no v. 20. NRSV corrige a “afeição” da RSV com “seios” do TM. Apesar de favorecer a mudança de tônica do texto como dsdeyhs. Fox (Proverbs 1-9, p. 203) cita um cântico egípcio, no qual uma jovem diz ao seu amante, “Toma os meus seios, que a dádiva deles flua para ti”. 43. Ou “refrigerem” (veja 7.18; HALOT, 2:1195, s.v. rwh). 44. As versões antigas não conservam como conteúdo sensual como faz o TM neste versículo.
20 Agora, p o r que se embriagar, meu filh o , com uma esposa lasciva? [P or que] abraçar o p eito de um a m ulher infiel? 21 Porque os cam inhos de um hom em estão perante
os olhos do 45 Senhor; ete está vigiando todas as suas trilhas.
22 Suas iniquidades o a p anharão ; 46 e com as cordas do seu pecado ele será preso firmemente. 23 E le 47 morrerá em sua fa lta de instrução, e na a b u ndância da su a insensatez ele será desviado.**
A palestra programática do pai no capítulo 2 admoesta o filho com razões motivadoras a ouvir o ensino dos pais (vs. I - l l ) para salvaguar dar o filho dos homens perversos (vs. 12-15) e da esposa adúltera (2.1619). Suas palestras nos capítulos 3-4 desenvolveram essa admoestação racional e suas palestras nos capítulos 5-6 desenvolveram as ad vertências contra os homens e mulheres perversos a fim de salvaguar dar as gerações de buscarem o sexo e o dinheiro fáceis (veja o prólo go). Além disso, suas duas últimas palestras no capítulo 4, sobre evitar o caminho dos perversos e sobre um compromisso inabalável com o caminho do pai, prepararam o cenário para as três palestras seguintes sobre o manter-se afastado da esposa lasciva (caps. 5-7). Entre essas palestras contra a esposa lasciva, em 5.1-23 e 6.20-35, o pai insere como um apêndice ao capítulo 5 advertências contra três tipos progres sivamente inferiores de homens, os quais também ameaçam a herança da família (6.1-19). A “rigorosa advertência de homem para homem”49contra o adulté rio, o tema da oitava palestra do pai, começa com a introdutória típica do destinatário e com o pedido por atenção (5.1,2), acompanhado das razões motivadoras (vs. 3-6). O corpo principal mostra a insensatez do 45. Nõkah ênê (veja 3.4) é ímpar, mas provavelmente semelhante a le'ênê ("para os olhos de”) em seu sentido e também a lipnê 'ênê (“diante dos olhos de”). 4 6 .0 TM acrescenta “a saber, ao perverso”. Para o uso 'et em aposição veja IBHS. pp. 182-83, P. 10.3.2. A suspeita de que a frase é um comentário é validada pela ausência na LXX. 47. Com referência ao pronome pessoal enfático veja IBHS, p. 296, P. 13.3.2c. 48. A sugestão dc Fichtner de consideraryissspeh (= “ele será destruído”) com base na LXX, “ele perecerá” perde a ligação que provavelmente era pretendida de sgh com os vs. 19 e 20. O suplemento da LXX interpreta o sentido corretamente. 49. McKane, Pmverbs. p. 312.
adultério (vs. 7-14) e a sabedoria da atividade sexual dentro do casa mento (vs. 15-20). A palestra termina com uma predição sombria acer ca das conseqüências fatais de se pecar contra Deus e rejeitar a instru ção do pai (vs. 21-23). Ao refletir sobre a advertência contra o adultério e o “convite aberto para os prazeres eróticos do amor conjugal”, Van Leeuwen comenta com grande discernimento: “O contraste entre o adul tério e o amor conjugal mostra de maneira concreta que o pecado e a insensatez ultrapassam limites estabelecidos, enquanto que a execução do eros dentro do casamento ilustra a liberdade dentro dos padrões”.50 Além do tema principal, que defende o distanciamento da esposa lasciva de outrem (v. 8) e a intimidade e dedicação à própria esposa (v. 15), a palestra como um todo também é pontuada pelo tema da aceita ção do ensino do pai. Convém observar as ordens explícitas (vs. 1,7), o arrependimento tardio do filho por haver rejeitado o ensino (vs. 12,13) e o sumário de conclusão segundo o qual o pecador morre por falta de instrução e por sua insolência obstinada contra a sabedoria (v. 23). Esse subtema é necessário, pois o pai está se opondo ao discurso ado cicado da mulher libertina. A coesão do todo é mantida pelas partículas lógicas e palavraschave. Um ki (“porque”; v. 3) inicial lógico liga as duas partes da intro dução (vs. 3 , 6)eum & í (“porque”) final liga a conclusão (vs. 2 1 - 2 3 ) ao todo. “Agora, pois” (v. 7) liga o corpo principal (vs. 8-14) à introdução. O último “por que” (v. 20) conduz o corpo principal à sua conclusão lógica. As palavras-chave e paronomásias (jogos de palavras fonológicos) também ligam as partes da palestra e lhe dão foco. Observe éepãtayim (“lábios”; vs. 2 , 3 ) ; hikkãh (“seu paladar”; v. 3 ), e hêq (“pei to”; v. 2 0 ) 51; zãrâ (“esposa lasciva”; vs. 3 , 2 0 ) ; ’aharit (“fim”; vs. 4, 1 1); beni bãnim (“meu[s] filho[s]”; vs. 7 , 2 0 ) ; sãgãh (“embriagar-se”; vs. 19, 2 0 , e “ser desviado”; v. 2 3 ) . Foram realizadas várias tentativas de reorganizar o texto, mas Plõger comenta prudentemente que, para ele, a linha de pensamento no capítulo 5 não é prejudicada de maneira expressiva pelos pontos aparentemente desarmoniosos.52 A palestra consiste tipicamente de introdução (vs. 1-6), lição (vs. 720) e conclusão (vs. 21-23). 50. Van Leeuwen, Proverbs, p. 66. 51. De acordo com R. Alter, The A n o f Biblical Poelry (Nova York: Basic, 1985), p. 182. 52. Plõger. Sprüche, p. 54.
(1) Destinatário, admoestação e objetivo (5.1,2)
A indicação introdutória típica do destinatário, meufilh o (ben i ; veja 1.8; cp. pl. no v. 7), e a admoestação presta atenção (haqSibâ ) e, mais especificamente, inclina teus ouvidos (haf 'oznekã) repete a admoes tação introdutória da palestra anterior (4.20). No entanto, em vez de usar “palavras” e “ditos” como expressões exteriores da sabedoria, o pai emprega agora a m inha sabedoria (leh o km ã ti\ veja 1.2; pp. 124125) e as m inhas palavras de entendim ento (ou “meu bom senso”; littb ü n ü ti veja 2.2), a essência e o resultado final de suas palavras. O uso de “minha(s)” para indicar o pai como o autor da sabedoria e do bom senso é único nesse livro. Paralelos como 2.6 protegem o signifi cado da interpretação errônea de que se tem em vista a sabedoria hu mana, não divina. Em outras passagens o pai fala de “meu ensino” (1.8; 2.1) e assim por diante, que dissemina a sabedoria divina. Nesta pales tra o pai pressupõe que o filho tem idade suficiente para experimentar a tentação e o prazer sexuais. Ou o filho é casado ou está prestes a se casar. Fox argumenta que as pessoas se casavam ainda bastante jovens no antigo Oriente Próximo. Josias e Amom se casaram aos 14 anos de idade, Joaquim aos 16. No Egito, as meninas podiam se casar a partir dos 12 anos, e os meninos, dos 15. 'Abot (5.21) aconselha que os homens se casem aos 18 anos de idade. Um paralelo nas “cartas egípcias populares de instrução dos escribas” mostra que o filho era casado.53 Entretanto, os amantes apaixonados de Cântico dos Cânticos estão prestes a se casar. 2 O objetivo da admoestação é declarado. P ara que conserves (liSm õr ) e seu paralelo e p a ra que eles guardem (yin sõ rü ; 2.8), tendo os lábios como seu sujeito, significa prestar muita atenção para sempre fa la r em total conformidade com os ensinos éticos e religiosos do sá bio, não ingenuamente “mantê-los/preservá-los”. Fox cita o paralelo mais próximo: “Porque os lábios do sacerdote devem guardar (yism erú, o equivalente de yin zõ r) o conhecimento, e da sua boca [as pessoas] devem procurar a instrução” (Ml 2.7; cp. Pv 22.18). “O sacerdote ‘guar da’ o conhecimento fa la n d o , especificamente ao instruir o povo.”54 D iscrição ou p rudência (m ez im m â ; veja p. 146; 1.4; 2.11; 3.21) se refere ao dieta, à prudência transmitida (veja v. 1), e à sua expressão 53. Fox, Pmverbs 1-9, pp. 206-7. 54. Fox, Pmverbs 1-9, p. 191.
pessoal de prudência em meio à tentação (veja “lábios” nos vs. 2b, 3). Os sábios não falam apressadamente, antes consideram as conseqüênci as. Os teus lábios (éepãteykã\ veja 4.24), uma metonímia gráfica comum para o ato de falar, está em justaposição com os “lábios da esposa lasci va” (v. 3), descritos como febris e cheios de mel, e fornecem uma prote ção contra eles. O paralelo quiástico de “discrição”, conhecimento (da'ai; veja p. 125) significa que é preciso internalizar as virtudes da sabedoria. Os sábios falam com ponderação, não de modo impulsivo. Delitzsch co menta: “Os lábios que preservam o conhecimento não permitem que es cape deles (Ps xvii.3b) coisa alguma que não procede do conhecimento de Deus... e visam à prática desse conhecimento” (cp. Ml 2.7).55 (2) Motivação (5.3-6)
3 Porque (kí) introduz de modo típico o argumento a favor de se prestar atenção total ao ensino. Por inferência, sem a discrição ponde rada e o falar em defesa do que é certo, o filho não será capaz de resistir à mulher sedutora. Os lábios do filho devem dizer a verdade, como fez José com a esposa de Potifar (cp. Gn 39.8,9), para se defen der do discurso suave e malévolo que vem dos lábios (éiptê) da espo sa lasciva (zãrâ; veja p. 177). Newsom observa a relação inseparável entre as palavras e a sexualidade: “A sexualidade é, por natureza, dialógica, como o termo ‘relação sexual’ sugere. Em termos culturais, está intimamente associada à fala: as palavras de galanteio, as palavras se dutoras, as canções de amor, coisas sem sentido sussurradas ao ouvi do”. Ela observa, ainda, que “o ponto em que a fala horizontal da mu lher entra em conflito com a fala vertical da autoridade do pai é justa mente o ponto da transição de uma fase da vida para outra, quando o menino se toma um homem”.56 Enquanto a ordem do pai a seu filho para que este desfrute de sua esposa (v. 18b) pressupõe ou antevê o casamento do filho, a esposa lasciva já é casada (cp. 6.34; 7.19). Gote jam (tifíõpnã) quer dizer “cair gota a gota” (Jz 5.4; Ct 5.5). Assim, mel (nõpet) - observe a assonância de nõpet titfõpnâ- se refere a comer o mel que goteja diretamente do favo,57 o mel mais puro e doce (cp. Jz 14.18; Sl 19.10[11]; 119.103; Ct 4.11). O açúcar não era conhecido naquela época. McKane explica a metáfora incompleta: “Ela fala em 55. Delitzsch. Proverbs, p. 119. 56. Newsom, “ Woman and the Discoursc of Patriarchal Wisdom”, p. 153. 57. HALOT, 2:713, s .x. nõpet.
tonalidade que goteja charme sedutor”.58 Seu paladar (hikkãh\ “sa bor” [NIV]; 24.13), outra metonímia para suas palavras, é mais suave que o azeite de oliva filtrado (hãlãq missemen; 27.16), uma metáfora para a lisonja enganosa (2.16; 29.5; cp. Sl 55.21 [22]). A menos que o texto indique unguentos cosméticos (Rt 3.3; 2Sm 14.2; Sl 104.15) ou óleo de mirra (Et 2.12), todas as outras menções bíblicas ao óleo se referem ao azeite, o produto das oliveiras, árvores abundantes na Pa lestina. O óleo era usado para fins cerimoniais nas observâncias religi osas (Lv 8.26), para a unção dos sacerdotes (Êx 29.2) e dos reis (1 Sm 10.1) ou do corpo depois do banho (2Sm 12.20), para cozinhar (IRs 17.12-16), para lâmpadas (Is 42.3), e também como remédio de uso interno ou tópico (Is 1.6). O óleo agradável simbolizava alegria (Is 61.3) e prosperidade (Dt 33.24), e sua ausência indicava tristeza ou humilha ção (J11.10). Era produzido batendo as azeitonas num pilão (Êx 27.20) ou moendo-as numa prensa de pedra (cp. Dt 33.24). De acordo com McKane, o discurso lascivo e sedutor da mulher “atrai sua vítima irre sistivelmente para o mistério, a excitação e o deleite”.59 Sua língua (6.24) e suas palavras suaves (7.5), bem como seus “lábios” indicam que é fácil se tomar íntimo dela. Seus lábios gotejantes e paladar suave provavelmente têm um significado duplo (Ct 4. II);60 “Na descrição mais explicitamente erótica, diz-se que ‘seus lábios gotejam mel’ e o interior de sua boca é ‘mais suave que o azeite.”61 W. G. E. Watson também acredita que “lábios” se refere, mais provavelmente, tanto aos lábios com os quais ela fala quanto às suas partes pudendas.62 4 Mas... ela justapõe nitidamente o começo suave com as conse qüências finais amargas da relação sexual com a esposa lasciva. Quem se envolve com ela experimenta o oposto daquilo que ela apresentou. Aitken comenta: “De acordo com um ditado antigo, ‘O mel é doce, mas a abelha ferroa’; e essa mulher tem um ferrão na sua parte traseira”.63 No fim (aharitãh) designa o seu “depois” e serve de metonímia para o julgamento final de ter um caso com ela. Amarga (mãrâ) é uma metáfora 58. McKane, Pmverbs, p. 314. 59. McKane. Proverbs, p. 314. 60. Ao longo de toda a palestra o pai usa imagens que atuam em dois níveis, o da realidade e o do simbolismo. Veja V. Cottini, “Sulla Composizione di Provcrbi 5",SBFLA 37(1987)21-52. 61. Newsom, “Woman and the D iscourseof Patriarchal Wisdom”, p. 153. 62. W. G E. Watson. Classic Hebrew Poetry: A Cuide to Its Techniques (JSOTSup 26; Sheffield, JSOT, 1984), p. 247. 63. Aitken, Proverbs. p. 63.
para as experiências dolorosas enumeradas nos versículos 7-14 e a morte final predita no versículo 3. A dor que ela inflige é como a losna (kalla'anâ).MA losna ou absinto em si não é venenosa, mas está ligado com frequência a rõ ’s (“fel”), que se refere a uma planta amarga e venenosa. O seu golpe de misericórdia é associado ao golpe letal da espada de dois gumes. Afiada (haddâ), o segundo adjetivo predicado para o hiato “no final ela é”, quase sempre qualifica uma espada e é uma metáfora incompleta para a agudeza da sua personalidade cruel que se manifesta no dia do acerto de contas. Seu “mel” se transforma em “los na” e sua “suavidade” se toma “afiada”. Uma tradução mais literal que como uma espada de dois gumes (kehereb piyyôt; cp. 12.18; 25.18; 30.14) é “uma espada de bocas”, que, de acordo com Isaías 1.20, “devo ra” as pessoas. Seus lábios e paladar suaves, no dia do acerto de contas se tomam uma boca devoradora. A espada ou adaga consiste de um cabo com um punho e uma lâmina. A espada de dois gumes e de lâmina reta podia ser usada para perfurar o inimigo e desferir golpes contra ele (veja Jz 3.16; Sl 149.6). Suas lâminas eram mantidas afiadas de modo a matar com eficácia e ficavam guardadas numa bainha (1 Sm 17.51; 2Sm 20.8). Na profissão da esposa lasciva, diz McKane, “a sobrevivência só é possível se todos os ingredientes de uma relação humana verdadeira forem excluídos sistematicamente de seus relacionamentos com os ho mens”.65 Ela pica suas vítimas em pedaços sem compaixão alguma. 5 A atenção se volta agora de suas conseqüências letais para s personalidade mortal. Seus pés (ragleyhã; veja 4.26, 27), uma sinédoque para a esposa lasciva, muda o foco do alto para baixo e serve de metonímia para o caminho (2.18). Também pode ser um jogo de pala vras com seu uso eufemístico para a região púbica.66 Estão descendo (yõr^dôt, veja 1.12) para a morte é um ato que não pode ser repetido e, portanto, representa a destruição definitiva da esposa lasciva e de to dos que se unem a ela. Para a morte (mãwet; veja 2.18; 7.27) pode ser um mito incompleto para a partida do mundo iluminado para Mot, o deus cananita do reino dos mortos. Uma vez que, segundo a lei mosai ca, para os israelitas o adultério era um crime capital (Lv 20.10; Dt 64. La'“n& è, “provavelmente, Arlemisia herba-alba Asso (também chamada dc losna branca), um arbusto pequeno, cheio de galhos, com folhas cinzentas pilíferas” (M. G Rcddish, ABD, 6:973, s.v. “wormwood"). 65. McKane, Proverbs, p. 314. 66. Masculina: Êxodo 4.25; Juizes 3.24; 1 Samuel 24.3(4); Isaías 7.20; cp. Gênesis 49.10; femi nina: Deutcronômio 28.56; Ezcquiel 16.25. HALOT, 3:1185, s.v. regei.
22.22), mas nâo o contato com uma prostituta e/ou estrangeira (cp. Lv 19.29; Dt 23.18[ 19]), era Deus, não um corpo legal reunido quem infli gia a morte (veja vs. 14, 23). Seus passos (se'ãdeyhã; veja 4.12) retra ta seus pés descendo a passos largos para a sepultura. Se prendem (yitm õkü; veja 3.18) intensifica “descer” até o final do declive. Sepul tura (se 'ôl; veja p. 172) marca o final da sua existência febril. 6 A vereda ( ora/i; veja \. \5 ) d a vida (hayyim; veja pp. 157-161) ela não vigia (pen-fípallês; veja n. 13; 4.26). Uma vez que escolheu abandonar a Deus e a sua aliança matrimonial (2.17) e não observar o caminho da vida, ela perambula sem rumo nas trevas morais. A metáfo ra incompleta suas trilhas (m a ^lõ teyh ã ; veja 1.15; 2.8), aponta para os diversos aspectos de seu comportamento (veja 4.26). Elas serpentei am sem rumo (ou andam a esmo, nã'ü;cp. 2Sm 15.20; Sl 109.10; Lm 4.15) descreve sua situação de perambulação despropositada, como a de Caim longe da terra arável (Gn 4.12; cp. Am 4.2, 3) e a do povo de Israel no deserto (Nm 32.13; cp. 2Sm 15.20) e indica que ela não tem lar, como os mendigos (cp. Sl 109.10) ou os exilados (Lm 4.15). Sem lar e sem esperança para o futuro, a esposa infiel cambaleia em seu peca do (Jr 14.10; Am 4.18). Ela não o sabe (lõ ’ têdã'; i.e., que está andan do a esmo; veja 4.19; cp. 12.15) expressa sua completa decadência moral. Ela nâo tem instrução exterior nem consciência interior, de modo que não é mais capaz de distinguir entre o certo e o errado e, sem uma bússola moral para lhe indicar a direção para a vida verdadeira, ela se desvia para a sua morte. b. Lição (5.7-20) (1) A insensatez do adultério (5.7-14) Agora o pai especifica os efeitos mortais da esposa lasciva (vs. 36). Ele introduz o corpo (ou lição) com outro pedido urgente de atenção (v. 7; cp. 7.24a; 8.32a), que é corroborado pela ordem para evitá-la (5.8). Nos três versículos equilibrados que se seguem, ele retrata, do ponto de vista econômico e social, o lado negativo de se envolver com essa mulher (vs. 9-14), primeiro declarando os fatos objetivamente (vs. 9-11) e depois apresentando o discurso autorreprovador do insensato (vs. 12-14). A falência econômica do filho diz respeito às estranhas (vs. 9,10), enquanto que sua falência social diz respeito a seu povo, a saber, seus mestres (vs. 12, 13) e à congregação (v. 14). O estilo narrativo
começa no versículo 11, um janus, que remete aos versículos 9, 10, e o gemido do voluptuoso no versículo 11 é articulado nos versículos 12-14. Sua ruína financeira provocada pelas estrangeiras também envolve sua perda pessoal de esplendor social, enquanto que sua ruína dentro da comunidade envolve sua destruição psico-espiritual e física à medida que ele lamenta seu passado. A possível falência econômica e social que a lasciva traz, sem falar na sentença de morte proferida pelo S e n h o r ( v s . 21-23), é motivo suficiente em si mesmo para levar à obediência. 7 Agora, pois (we'attâ) introduz uma mudança no rumo da argu mentação com uma continuidade de assunto e referência.67 Filhos (.bãnim; veja 4.1) se refere diacronicamente à linhagem de descenden tes do pai, a perspectiva apropriada numa seção que trata de manter a força econômica e social da família acumulada ao longo das gerações. O imperativo singular no versículo 8 sugere que se tem em vista cada filho sucessivo, não um grupo de filhos. Um elo fraco na cadeia pode acabar com o futuro da família. O chamado inclui tanto a obediência inicial ao ensino, dai-me ouvidos ($im'ú li; cp. 5.1), quanto a perseve rança contínua nele, e não vos desvieis (we ’al-tãsúrü; veja 3.7) da direção proposta, um contraste notável com as trilhas tortuosas da meretriz descontrolada. Talvez ele acrescente minha boca (pi; contra 4.20) à das palavras da (mê'imrê; veja 4.5) para contrastar suas palavras com as da esposa lasciva, mas a frase é típica (4.5; 6.2; 7.24; 8.8). 8 O imperativo mantei... longe (harhêq; veja “descartar para lon ge” em 4.24), a lição em poucas palavras, também pode ser encontrado em admoestações sapienciais babilônicas e egípcias (cp. Mt 5.28, 29; 2Tm 2.22).68 Vosso caminho (darkekã; veja 1.15) dela (mê'ãleyhã) claramente liga a admoestação à descrição da esposa lasciva em 5.3-6. Aqui a preposição composta significa “do lado de”, tendo como nuança “de ligação com” (Jr 2.5; Ez 11.15), e/ou “de associação com” (Jó 19.13). Os impulsos biológicos de um homem e suas responsabilidades sociais estão em conflito; seus impulsos inatos devem ser canalizados dentro dos padrões corretos, da mesma maneira como a locomotiva de um trem funciona melhor nos trilhos. E não vos aproximeis (we%ãltiqrab) denota estar ou chegar “à proximidade mais estreita e íntima do objeto (ou sujeito)”.69Da porta da ( ’el-petah; veja 1.21, i.e., o ponto de 67. IBHS. p. 667, P. 39.3.4s. 68. Veja W. O. E. Oesterley, TheSayings o f lhe Jewish Fathers (Nova York: Macmillan, 1919), p. 36. 69. L. J. Coppes, TWOT, 2:811, s.v. qãrab.
entrada sem uma saída), mostra que, desde o começo, o filho deve evitar sua casa (bêtãh\ veja 2.18), o lugar de perigo (cp. 7.8b, 11 b). 9 Os versículos 9 e 10 são ligados pela anáfora para que não (pen; veja n. 13), a partícula lógica que introduz as conseqüências ne gativas de não obedecer à ordem no versículo 8. Essa anáfora sugere que os quatro substantivos adjetivais - “outros” e “cruéis” (v. 8), “es tranhos” e “estrangeiro” (v. 10) - são correlatos paralelos do mesmo grupo e do mesmo indivíduo, respectivamente. Os versículos falam da sangria econômica do filho e enquanto as estranhas engordam, as quais se encontram socialmente fora da comunidade dos sábios (veja zãrâ e nokri; 2.16); os mencionados nos versículos 12-14 dizem respeito a pro blemas dentro da comunidade. O versículo 9 se refere à perda do esplen dor e o versículo 10 à perda da força pela qual esse resplendor é adquiri do. Entregueis (tittên; veja 1.3) afirma a responsabilidade do próprio filho pelo seu empobrecimento. Ao contrário do inocente em 1.10-19, que os homicidas tramaram saquear, o voluptuoso vitima a si mesmo ao en tregar a outros o seu vigor. A outras (**hêrim) é o primeiro de quatro substantivos adjetivais. Snijders observa que “no heb., a palavra ’ahêr é usada quando na comparação de duas quantidades”.70 No restante desta seção (vs. 9-14), a casa do “estrangeiro” (vs. 9, 10) é contrastada com a congregação do filho (vs. 11-14). Uma vez que Provérbios 6.24, 29, 34 testifica que a esposa lasciva é casada, pode-se fazer a suposição plausí vel de que “outras” se refere à família do marido da meretriz (veja 6.20ss.). Vosso esplendor (hôd) designa uma dignidade real, elevada ou grandio sa, e também pode ser traduzida como “majestade”, “dignidade”, “mag nificência” ou “pompa”.71Vetter observa que, “em maior ou menor grau, em todas as passagens a expressão implica experimentar admiração e alegria”,72 e Plõger diz que ela representa aquilo que faz a vida valer a pena.73Com “entregar a outras” funciona como uma metonímia para “os frutos dos melhores anos da vida” (cp. 29.3b).74 “A independência e autonomia pertencem à ‘honra’ (hôd) do homem, de modo que a ameaça e a perda de riqueza podem representar uma perda da honra.”75£ a 70. L. A. Snijders, “The Meaning o fzSr in the Old Testament” (OTS 14; Leiden: E. J. Brill, 1954), p. 76. 71. Veja paralelos in D. Vetter, TLOT, 1:356, s.v. hôd. 72. Vetter, TLOT, 1:355, s.v. hôd. 73. Plõger, Sprüche, p. 56. 74. Gemser, Sprüche, p. 34. 75. G Warmuth, TDOT. 3:355, s.v. hôdh.
vossa dignidade é uma tradução rara de Sãnâ III, como sugere o paralelo hôd (veja n. 20). Os dois substantivos são metonímias para o aumento de força e poder. Fox acredita que o versículo 9 se refere à dissipação do vigor sexual e o versículo 10 à dissipação dos frutos do seu trabalho.76 O mais provável, porém, é que o versículo 9 implique uma metonímia de efeito e o versículo 10 em uma metonímia de causa - isto é, sua força e trabalho produzem a riqueza que dá esplendor. A cruéis (le ’akzãri; cp. 12.10) denota pessoas insensíveis e sem miseri córdia que propositada, deliberada e impiedosamente infligem dor so bre outros. “A cruéis” é paralelo a “inimigo” em Jeremias 30.14 e está associado a “ardente furor” em Isaías 13.9. A NVI traduz esse termo como “impiedosos” em Provérbios 17.11.0 adjetivo indeclinável pode ser plural em paralelo com o pl. “outras” ou singular, em paralelo com “estranha” (nokri) em 5 .10b. Tanto no versículo 9 quanto no versículo 10 o verseto B é mais específico que o A, sugerindo que o verseto A de cada um se encontra no plural, enquanto que o verseto B está no singu lar. O termo paralelo neste quarteto (i.e., vs. 9, 10), “estranho” (masc.) elimina a possibilidade de identificar os “cruéis” com a esposa lasci va,77 com enfermidades ou com a morte.78 Meinhold observa que as outras ocorrências de “cruel” com referência a pessoas (11.17; 12.10; 17.11; cp. sua personificação em 27.4a) e o remorso do adúltero depois de entregar seus bens elimina a morte como opção.79 Os paralelos em 6.29,33-35 e 7.19 aponta para o marido ciumento espreitando nas som bras. “O versículo se refere a uma situação na qual o adúltero acaba sendo arruinado pelo ultraje do marido ou da família de sua companhei ra.”80A mudança do singular com referência ao marido da lasciva para o plural, sugere que o plural se refere à sua família. Em vez da riqueza ficar dentro da linhagem dos sábios, ela é passada para a família de um estranho em razão do erro numa fase da vida. 10 Para que... não (pen-) introduz a cláusula negativa de propósi to paralela neste quarteto e está subordinado ao versículo 8, não ao versículo 9. O versículo 9 mostra a falência econômica do filho insen sato; o versículo 10, o enriquecimento dos estranhos (zãrím ; veja 2.16), que é paralelo a “outros” (v. 9a) e esclarece esse termo. Se satisfaçam 76. Fox, Proverbs 1-9, pp. 194-95. 77. Pace Toy, Proverbs, p. 108. 78. Pace Snijders, “The Meaning ofzãr", p. 98. 79. Meinhold, Sprüchc. p. 103. 80. Whybray, Proverbs, p. 88.
(yiébe'ú; veja 1.31) é usado em um grande número de ocorrências para saciar a fome, e se refere a uma função elementar da vida humana e animal. A vossa força (kõhekã) serve de metonimia para aquilo que os poderes vitais do filho produzem. Enquanto “esplendor” e “dignidade” no versículo 9 se referem a manifestações exteriores de riqueza, “for ça” e “trabalho”, no versículo 10, se referem à capacidade interior de produzir riqueza. E os vossos trabalhos árduos (wa'asãbeykã) diz res peito à dor e sofrimento associados ao trabalho. A mesma palavra é usada em Gênesis 3.14 para o parto doloroso da mulher na geração de filhos. Em Provérbios 15.1 ela designa “uma palavra que fere”, e em 14.23 a “labuta” estrênua e cansativa. Aqui ela é uma metonímia para as aquisições obtidas pelo trabalho árduo. A fortuna da família, conquis tada laboriosamente, será saqueada e deixada na casa de um estran geiro (bebêt nokri; veja 2.16), a cena do adultério. Snijders define o nokri como “alguém que não reconhece algo ou alguém como sendo seu”.81 E evidente que, nessa cultura, o marido ciumento podia ser inde nizado tomando o adúltero seu escravo para o restante da vida; nenhum pagamento em dinheiro poderia ressarci-lo (veja 6.26,30-35). O castigo autoinfligido de se envolver com a esposa lasciva é tão terrível quanto ter a casa saqueada por estrangeiros (cp. 1.10-14; Sl 109.11b). Embora a imoralidade sexual nos dias de hoje possa não resultar em escravidão, ela ainda traz o pagamento de pensões para o cônjuge e para os filhos, lares despedaçados, dor, ciúmes, pessoas solitárias e doenças venéreas. 11 O janus que dá início à narrativa combina, agora, a depleção física com a falência social, “E gemereis”. Em termos semânticos, o versículo 11b, que diz respeito ao corpo e à carne exauridos, se liga ao versículo 10 que diz respeito à perda de força e trabalho desperdiçado, e a expressão inicial “e gemereis” (v. 1la) se liga à expressão inicial “e direis” (v. 12a). Egemereis ou vos enfurecereis, rugireis (wenãhamtã; cp. 19.12) indica um grito de angústia resultante de penúria e exaustão extremas e representa uma situação de acerto de contas, quando o pesar e o remorso chegam tarde demais (cp. Hb 12.17). No fim de vossa vida (be ’aha ritekã; lit. “no vosso depois”; veja 29.21) é equipa rado mais apropriadamente com o “fim” amargo provocado pela mu lher sedutora (v. 4), “quando os resultados da insensatez do jovem se mostram em termos de penúria e fome”.82 O “fim” se refere ao resul 81. Snijders, “The Meaning o f zõr", p. 98. 82. Whybray, Proverbs, p. 88.
tado, aquilo que vem depois, o futuro à luz do qual o todo deve ser avaliado. “Não se pode julgar a vida de acordo com a aparência do momento; é preciso ter ‘o fim’ sempre em vista.”83 Quando... consu midos (bikelôt entra a conotação negativa do verbo que significa che gar à conclusão, quer de modo positivo ou negativo, “terminar”. HA LOT traduz klhcomo 1. “cessar, chegar a um fim”; 2. “estar terminado, completado”; 3. “desaparecer, desvanecer” (citando Pv 5.11); 4. “pe recer”; 5. “ser determinado”; 6. “falhar”.84 Aqui ele significa que o corpo definha, é exaurido, gasto, e chegou a um ponto de colapso. Não definha em decorrência da atividade sexual excessiva (cp. vs. 18, 19), mas do trabalho árduo ocasionado pela ilegalidade e imoralidade.85 A palavra mais comum vosso corpo (tfsãr^kõ; veja 4.22; 14.30; 23.20), denota a substância camosa do corpo como um todo; e, enfaticamente, a vossa carne (use>êrekã; além desta passagem usada somente em 11.17, em que provavelmente foi escolhido por sua assonância com tfáãr^kã) designa a carne cheia de sangue, próxima aos ossos, indican do o vigor físico. O filho pródigo libertino lamenta por ter desperdiçado sua vitalidade madura, mas não lastima uma morte prematura. O versí culo coloca em dúvida a interpretação moderna, representada por McKa ne, “a descida ao Sheol é uma tragédia apenas se surpreende um ho mem antes de sua vida ter chegado à plena maturidade”.86 12 Como os versículos 9, 10, os versículos 12 e 13 depois do janu (v. 11) também são paralelos. Ambos são construídos de modo quiásti co; ambos se referem à desatenção negligente do libertino em aceitar a instrução (v. 12) e em obedecer a seus mestres (v. 13); e ambos em pregam “eu” como sujeito em seus versetos A e os órgãos receptores “coração” e “ouvido” (veja 2.2) em seus versetos B. Esse paralelismo sugere que e direis (we 'ãmartã) vocaliza o resmungo baixo de dor e aflição (v. 11). Em outras passagens o pai também permite que os per versos se condenem pela própria boca (cp. 1.11-14; 7.1-20). Em quatro ocasiões nos dois versículos o insensato obstinado condena a si mesmo como sendo o único responsável por não ouvir. Se o pai não tivesse advertido o filho com toda a sobriedade, teria de carregar o peso da culpa (cp. Ez 33.1-9). Como ( ’êk) é uma exclamação de lamentação. 83. G von Rad, Wisdom in Israel (Londres: SCM, 1972), p. 202. 84. HALOT, 2:476-77, s.v. klh. 85. Toy, Proverbs, p. 109. 86. McKane, Proverbs, p. 365.
Ela é omitida no verseto B. Aborreci (sãnê’ti; veja 1.22) revela seu coração não regenerado; não tinha nenhum gosto pelas coisas celesti ais. Os paralelos quiástico instrução (müsãr, veja 1.2) e repreensão (wetôkahat\ veja 1.23) podem ser encontrados juntos em 3.11 num con texto semelhante; esses substantivos abstratos sumarizam os ensinos específicos de seus mestres, que são mencionados nos versículos se guintes. Meu coração (libbi; veja pp. 141-142) rejeitou (nã’as; veja 1.25) enfatiza ainda mais a depravação inerente do filho. Essa é a es sência do subtema da lição. No entanto, sua confissão sugere que o castigo físico levou à sua salvação, pois é preciso ter humildade para fazer essa confissão que implica arrependimento e, por fim, aceitação da repreensão. Fox observa: “Provérbios enfatiza que o castigo é uma força educacional positiva, um caminho para a sabedoria (12.1; 15.5, 31,32; 29.15), a vida (6.23; 10.17; 15.31) e a honra (e.g. 13.18)”.87 13 E coordena a rejeição anterior do voluptuoso do ensino com a rejeição dos mestres. Não escutei (welõ’-Sãma'ti; veja 1.8) tem a ex tensão comum ã voz (beqôl; lit. “na esfera da voz”), que na expressão idiomática hebraica significa aquiescer ou seguir ao que é ordenado pela voz. O plural meus mestres (môrãy, áeyrh III; veja 1.8) pode se referir aos mestres na família (i.e., pai, mãe e avô [veja 1.8; 4.1; 5.1,7]) e/ou aos sábios à porta que se dirigem aos ingênuos (veja 1.20-33; 31.23) e/ou aos sábios que ensinavam o povo como um todo, como Agur (cap. 30) e Qohelet (Ec 12.9), e não professores de escolas (veja p. 106). O voluptuoso intensifica sua condenação própria reconhecendo que teve mais de um mestre e rejeitou a todos eles. Para aqueles que me ensi navam (welim elammeday; lit. “para aqueles que me acostumaram a algo”),88 diferente deyãrâ III, que sempre pressupõe comunicação lin güística (mesmo que por meio de sinais em 6.13), também é encontrado com referência a animais (Jr 31.18; Os 10.11). Uma vez que os sacerdo tes ensinavam a lei ao povo como um todo, e podemos supor o mesmo dos sábios (cp. Sl 119.99), esse pecador arrependido confessa, não in clinei meus ouvidos (lõ’-hiUití 'õzni; veja 4.20; 5.1). 14 O devasso conduz sua triste litania de remorsos a um clímax usando como pano de fundo a tragédia pública da sua relação ilícita secreta. Me vi (hãyiti; veja 4.3) volta ao passado, quando ele sofreu na 87. Fox, Proverbs 1-9 , p. 197. 88. IBHS, p. 401. P. 24.2c.
casa do estrangeiro. Kirriat significa logo (i.e., rapidamente; cp. Sl 2.12; 81.14[ 15]) ou “quase” (veja Gn 26.10), referindo-se a uma situa ção real que aconteceu logo depois de seu relacionamento com a espo sa lasciva ou a uma situação que por pouco não se concretizou. O primeiro significado é preferível, uma vez que o pai equipara o castigo do adúltero ao de um pássaro que se lança numa armadilha (Pv 7.23); parece improvável que ele representaria o pecador como tendo esca pado por pouco do castigo. Em sérias (bekol\ lit. “em todo tipo de”) 89 dificuldades (rã'\ veja 1.16) deixa a situação indefinida e ambígua. Uma vez que o pecador já estava numa situação de mal moral, a refe rência deve ser a uma situação de mal físico, uma calamidade. E mais provável, porém, que não se trate de falência econômica, mas de outra coisa, uma vez que a falência lhe sobreveio na casa do estrangeiro. No caso de um homem e de uma mulher dentro da comunidade da aliança, a lei mosaica determinava o apedrejamento (Lv 20.10; Dt 22.22, 23), que era precedido de um julgamento (Eclo 23.24; cp. Ez 16.40; 23.24); mas que não se aplica ao caso de um relacionamento com uma prosti tuta. Talvez as dificuldades fossem sua acusação pública, excomunhão, confisco de quaisquer propriedades que ainda lhe restavam (cp. Sal. Sl 16.13, 14), e/o açoite (cp. Pv 6.33). Meinhold conjectura que a obscu ridade do perigo o toma ainda pior.90 No meio (betôk; veja 1.14) da congregação (qãhãl) se refere a várias pessoas reunidas com uma finalidade específica. Nunca se refere ao ato de chamar as pessoas para se reunir e nunca ocorre no plural.91 Aqui é usado para a assembleia legal numa audiência pública de um tribunal (também 26.26; cp. Eclo 7.7). Uma imagem vivida da reunião de uma assembleia desse tipo, inclusive os líderes do povo assentados à porta da cidade, é apre sentada no julgamento de Jeremias no templo (Jr 26.9-10). Ao que pa rece, a congregação reunida também era chamada de kol-qehal hã'ãm “todo o povo reunido” (v. 17). E da assembleia (we'êdâ) se refere a um corpo legal nomeado por outros ou por seus membros para analisar uma questão judicial. E derivado da ra iz /d . Denota, essencialmente, a manifestação de uma decisão ou resolução, tão ligada em termos de expressão a determinado lugar, tempo ou situação, que um desvio des sa decisão é considerado desobediência a uma ordem.92 De acordo 89. HALOT; 2:474-75, s.v. kõl. 90. M einhold, Spríiche, p. 103.
9 1 .0 pl. é maqhelím (Sl 27.12) e maqhèlôt, para o qual não há sing. 92. G Sauer, TLOT, 2:552, s.v.yd.
com Hubbard, “Uma vez que se toma público, o adultério provoca ver gonha pessoal, humilhação diante dos entes queridos e perda do respei to da comunidade em geral”.93 Trata-se de uma ofensa social, não ape nas pessoal, e ainda acaba com carreiras políticas. (2) A sabedoria do casamento (5.15-20)
Na segunda estrofe da lição, o pai passa da insensatez da promis cuidade com a esposa lasciva para a sabedoria da satisfação sexual com a própria esposa. Usando de uma alegoria (vs. 15-17) ele ensina a fidelidade conjugal como um anódino para o impulso sexual elementar (vs. 18, 19; cp. ICo 7.9). O prazer revigorante de fazer amor com a própria esposa oferece uma proteção concreta contra a esposa lasciva (5.20).94 O tema aqui é o prazer do sexo, não a procriação. “A mulher é um poço”, diz o servo em Pessimistic Dialogue between Master and Servant (8.59).95 15 A admoestação figurativa bebe água (setêh mayim; cp. 4.17 entre as admoestações claras e ingênuas dos capítulos 1-9 é excepci onal e causa problemas de interpretação. O pai corre o risco de cair em ambigüidade em seu intento de estimular o envolvimento e a reflexão pessoal do filho. A alegoria quase exaure o vocabulário para fontes de água: “cisterna”, “poço”, “fontes”, “canais de água”. A chave para a sua interpretação, mediada por “manancial” em 5.18a, é dada no para lelo no versículo 18b, “obtém prazer da esposa da tua mocidade”. No versículo 15, como em Cântico dos Cânticos 5.1, “água” representa saciar a sede sexual. A satisfação do instinto sexual é equiparada a ingerir alimento sólido em 30.20 e água e alimento em 9.17. Da tua própria cisterna (mibbôrekã; cp. Is 36.16) equipara sua esposa a um bem precioso para armazenar a água da chuva na região árida e pedre gosa de Canaã. O reservatório de água tinha o formato de pera e al guns metros de profundidade, e normalmente era escavado no solo ro choso. Em Isaias 36.16 ele é uma sinédoque para desfrutar o próprio 93. Hubbard, Proverbs, p. 92. 94. Ringgren ( Sprüche, p. 29) observa a sem elhança entre a alegoria e C ântico dos Cânticos de Salomão (o amado como uma fonte [Ct 4.16]; reclusa [4.12]; imagem de animais para graça e beleza [2.7, 9; 4.5]; as carícias como o ato de beber [7.9; 8.2]). As semelhanças sugerem que Cântico dos Cânticos de Salomão serve para celebrar o casamento literal dentro do cânon das Escrituras, da mesma maneira como esta alegoria serve para ensinar o prazer sexual por intermédio da fidelidade conjugal. 95. AN ET, p. 438.
lar. “Beber” é omitido no verseto B, e a “água” da cisterna, recebida de fora, é intensificada pela expressão poética e das correntes (wenõzelim) que fluem do meio do teu próprio poço (mittôk be>êrekã). As corren tes subterrâneas de água que reabastecem o poço oferecem uma água de qualidade superior àquela armazenada numa cisterna (cp. Ct 4.15). “A imagem sugere refrigério para desejos ardentes, que são extingui dos pelo ‘beber’, isto é, pela atividade sexual.”96 O texto pressupõe que a esposa de um marido lhe pertence; também é verdade que o corpo dele pertence a ela (cp. ICo 7.4, 5). 16 A forma verbal ambígua, traduzida como deveriam... transbor darem (yãpüsü), e que espera a resposta negativa “Claro que não!” à pergunta oposta (de acordo com REB, NVI, NRSV), também pode ser traduzida como uma ordem, “e que se derramem para fora”. A LXX e Eclo acrescentam “tua rua” ao verseto B: “que tuas fontes transborda ram em tuas ruas”. A NJPS a traduz como uma ingênua promessa futu ra: “tuas fontes transbordarão”. Snijders defende esse ponto de vista, argumentando que a virilidade da qual o versículo 16 fala é conseqüên cia de sua fidelidade conjugal no versículo 15.97 No entanto, nesse caso o termo esperado é weyãpúsú. São ideias improváveis, pois como McKa ne objeta corretamente, “qualquer que seja a orientação, a passagem se move em sentido contrário a essa interpretação e sugere que a dis seminação das fontes nas ruas é algo a ser evitado”.98 O elemento mais decisivo para se determinar o significado da for ma verbal ambígua é a interpretação de tuas fontes (m a ^n õ teykã ) que designa, literalmente, os locais das fontes de água. Além da LXX, Vulg. e NJPS, Saadia, Ibn Ezra e muitos outros intérpretes posteriores acreditam que a alusão é positiva e designa “poder generativo” ou “a promessa de prosperidade abundante ou a rica bênção de filhos”,99 que serão dados ao homem que desfrutar o casamento. Delitzsch cita a expressão “águas de Judá” (Is 48.1) e “águas manarão de teus baldes” em paralelo com “sua semente” em Números 24.7.100 Essa interpreta ção considera os filhos (i.e., os descendentes devem pertencer somen te ao filho, não a diferentes círculos familiares) o sujeito do versículo 96. Fox, Proverbs 1-9, p. 199. 97. Snijders, "The Meaning o f zãr", p. 98. 98. McKane, Proverbs, p. 318. 99. Snijders, “The Meaning o f zãr", p. 93. 100. Delitzsch, Proverbs, p. 128.
17. Essa interpretação explica a mudança do singular (v. 15) para o plural (vs. 16, 17), mas tem como erro fatal a mudança de tema, epitomado na imagem da água, variando entre imagens de refrigério sexual (vs. 15,18) e descendência (vs. 16, 17). Além disso, a ideia de filhos fora do casa mento dispersa a alegoria. Mais uma vez, seria de esperar um vau “e/ para que” antes de “transbordar” onde esse significado é pretendido. Gemser,101 Meinhold102 e Fox103 acreditam que “fontes/canais de água” representam a esposa. De acordo com eles, a falha do marido em levar a sério suas responsabilidades conjugais, enquanto sucumbe à esposa lasciva, levou sua esposa a abrir sua porta para estranhos e a permitir que a plenitude do seu amor se transbordasse para fora (i.e., para outros). Fox apela para outros textos sapienciais para apoiar essa opinião (veja Jó 31.10). Ele cita as palavras siríacas, não aramaicas, de Ahiqar: “Meu filho, não cometas adultério com a esposa de teu próxi mo, a fim de que outros não cometam adultério com a tua esposa”.104 Essa opinião mantém a coerência da imagem da água como referência à esposa e satisfaz 5 .17b, “não tenhas quaisquer estranhos contigo”, mas não explica a mudança das imagens singulares referentes à esposa nos versículos 15 e 18 para as imagens plurais referentes a ela nos versícu los 16,17.105Além disso, essa opinião pressupõe de modo questionável que a esposa virtuosa se tomará uma meretriz caso seja tratada com negligência. Por fim, para interpretar o versículo como uma ameaça Fox precisa corrigir o texto, acrescentando pen, “para que não”. Kruger oferece uma interpretação melhor, observando que “toda a alegoria se baseia numa questão de propriedade privada versus pro priedade comum"', a própria cisterna (v. 15) contrasta com as fontes e canais de água nas praças públicas (v. 16); a água que pertence somente a ti (v. 17) contrasta com as águas em lugares abertos, que são propriedade de estranhos (zãrim\ v. 17). “A cisterna, que normal mente era propriedade privada nos tempos do Antigo Testamento (2Rs 18.31 = Is 36.16) serve de argumento para esta metáfora.” 106 Em 101. Gemser, Sprüche, p. 37.
102. Meinhold, Sprüche, p. 104. 103. Fox, Pmverbs, pp. 200-201. 104. Fox, Proverbs, p. 201. 105. Sem dúvida, em Cântico dos Cânticos 4.15 o pl. n õ ^ lim , “torrentes que correm" é usado para a esposa, mas provavelmente modifica o termo indeclinável mayim, e nâo m ayãn (“fonte”) e ^ ‘Sr (“poço” ) em seu verseto A, que são metáforas incompletas para a esposa. 106. P. A. Kruger, “ Promiscuity or Marriage Fidclity?” JNSl, 13 (1987) 60.
contraste com as posses privadas (v. 15) tem-se ‘“ os canais de água nas praças públicas’ (v. 16), um símbolo de propriedade comum à qual todos têm acesso... A rua (sâq/húsâ) e praças públicas (rehõbôt) são o território da meretriz” (cp. 7.12). Kruger acrescenta: “püs (transbor dar) é uma alusão pictórica ao seu típico padrão de conduta: o transbordamento incessante das fontes representa a sua perambulação incan sável em busca de amantes”. Ele está no caminho certo, mas não con segue explicar como no versículo 17 “sejam - observe o plural - para ti mesmo somente” pode se referir a prostitutas. A interpretação de Kruger deve ser aperfeiçoada de modo a iden tificar “as fontes”/“canais de água” como qualquer fonte feminina de satisfação sexual. O plural é necessário justamente para evitar a infe rência de que a esposa virtuosa se tomará uma meretriz. Para fora (hüsâ; veja 1.20) é um conceito relativo; aqui designa o lugar fora da casa.107 Hüsâ “fora” e bãr^hõbôt nas praças públicas (veja 1.20)108 são, de fato, lugares onde as meretrizes exerciam sua ocupação abomi nável (7.12); encontram-se em oposição a “para ti mesmo somente” (5.17a). O paralelo quiástico teus canais de água (veja 21.1) é outra expressão poética para o refrigério sexual do filho. “De água” forma um quiasmo com “água” em 5.15a. 17 O jussivo sejam (yihyü) dá continuidade à admoestação para encontrar as fontes de prazer sexual na privacidade do casamento, e não em fontes no meio da população comum. A privacidade do amor conjugal é ressaltada por para ti mesmo somente (lekã; lit. “para ti mesmo em isolamento radical de outros”; veja n. 33). A admoestação paralela e não tenhas nenhum estranho contigo (we 'ên lezãrim 'ittãk) enfatiza ainda mais a necessidade de privacidade no prazer conjugal e oferece uma ligação verbal com as admoestações nos versículos 8-10. 18 A fim de poder saciar sua sede, o filho deve ter um poço que seja fonte constante de água doce. Assim, o pai ora para que seu filho tenha uma esposa que possa saciar essa sede quantitativamente, a todo o tempo, e qualitativamente, da maneira mais satisfatória possível. O 107. Cp. HALOT, 1:298. 108. J. B. Gray, Joshua, Judges, Rulh [Greenwood, S.C.: Attic, 1967], p. 376, comenta: “Os assentamentos eram bastante apertados, cercados de muros. As ruas eram vielas estreitas, mas os espaços dentro das portas eram abertos e, portanto, lugares de negócio e vida social (cp. Rt 4.1; Jó 27.9; Pv 31.23); e.g., a Porta de Damasco da Jerusalém moderna com seus cambistas, tabeliões e cafés. Nesse local os anciãos da cidade intermediavam conflitos, as causas eram julgadas (Dt 22.24; Am 5.15) e a reputação de um homem era honrada ou desdourada (Pv 3 1.23)”.
jussivo que... seja dirigido implicitamente ao âmbito divino, ex pressa uma oração, um desejo de bênção contínua (cp. lRs 10.9; Rt 2.19). O teu manancial (meqôrekã) é derivado da raiz rara qür (“ca var para encontrar água”; 2Rs 19.24) e designa uma nascente de água corrente, uma vez que é usado com m a 'yã n (“fonte”), uma fonte borbulhante de água em Provérbios 25.26 e Oseias 13.15.0 adjetivo aben çoado (bãrük; veja 3.33) denota o estado de ter o poder de produzir bem-estar;109 ele é definido com precisão no versículo 19. Scharbert observa que a fórmula, “abençoado seja...” não é usada para qualquer um, mas somente para pessoas às quais se é particularmente grato (ISm 26.25), ou com as quais se está ligado socialmente ou pela mes ma fé (Dt 33.20; Sl 118.26)."° Em outras passagens a bênção se refe re com frequência à fertilidade (cp. Dt 28.4; Sl 128.3-4), mas a julgar pelas petições subsequentes, aqui se refere exclusivamente à satisfa ção sexual. A conjunção e (ú ) indica que, como conseqüência do esta do abençoado da esposa, o filho encontrará alegria nela. Ruprecht ob serva que obtém prazer ( éem a h ) não significa, por via de regra, um estado mental reprimido, algo neutro, mas sim alegria elementar, espon tânea e exterior.111 Em festivais, essa alegria dionísica se manifesta nas brincadeiras joviais (Jr 50.11), em bater os pés e bater palmas (Is 55.12; Ez 25.6), e também na dança, na música e nos gritos de alegria (e.g., ISm 18.6;2Sm 6.12,14; lRs 1.40,45; Ne 12.27). A alegria é tão efusi va que a pessoa fica fora de si. Ruprecht observa ainda que, com refe rência a algo duradouro, a alegria que se renova nas situações variadas do quotidiano pode estar numa pessoa: na esposa (Pv 5.18), no filho (10.1), ou no rei (Jz 9.19, ironicamente).112Meinhold cita um texto ugarítico que apresenta um conceito semelhante: “E que minha mãe se deleite em meu pai”.113 Da é escolhido no lugar do prosaico “na” (cp. Jz 9.19) para trazer à mente a imagem de tirar água de um poço. O paralelismo com uma das fontes de água na série dessas fontes forne ce a chave para a interpretação da alegoria. Toy114 e Gemser115 co mentam corretamente que, apesar de da esposa (mê^Set) ser repre 109. C.-A. Kcller, TLOT, 1:268, s.v. brk. 110. J. Scharbert, TDOT, 2:286-87, s.v. brk. 111. E. Ruprecht, TLOT, 3:1273-74,s.v.brk. 112. E. Ruprecht, TLOT, 3:1275. 113. Meinhold, Sprüche, p. 105. 114. Toy, Proverbs, pp. 115-16. 115. Gemser, Sprüche. p. 29.
sentado aqui somente como o mediador do prazer sexual, o ensino não exclui um conceito mais elevado do casamento (2.17; 11.16; 31.10ss.). O caráter unilateral da admoestação tem um motivo um tanto pedagó gico - um homem sensual pode encontrar com sua esposa satisfação que nenhuma mulher pode lhe dar. Aqui o casamento é considerado intensamente monogâmico. Da tua mocidade (ne'ürekã; cp. 1.4) pode ser traduzido como “tua juvenil [esposa]”, mas as construções seme lhantes em 2.17 e Malaquias 2.14 validam a tradução apresentada. A expressão aponta para um casamento numa idade tenra (veja 2.17) e representa (ou melhor, antevê) o filho como estando casado. 19 A bênção pedida em oração com respeito à esposa é detalhad primeiro implicitamente, por meio de comparações com animais, de pois, por referências mais explícitas às suas carícias. A palavra rara amorosa Cahãblm cp. 1.22) se refere ao amor sensual em Oseias 8.9, e seu congênere ’°hãbim em Provérbios 7.18 à relação sexual, lançan do dúvida sobre a tradução de HALOT, “charmosa” ou “atraente”, em função do paralelo “graciosa”."6A corça ('ayyelet) é, provavelmente, o gamo iraniano (Dama dama mespotamica), cuja fêmea chega a ter mais de 78 cm de altura, pesando 29-55kg; somente os machos têm armações (chifres)."7 E de cor vermelho-pálida ou marrom-acinzentada, salpicada de manchas nas costas.118A cabra montês (yaíQlat) gra ciosa (hên; veja 1.9),119 é mencionada somente nessa passagem da Bíblia e, de acordo com Meinhold, é o íbex/capricómio (Capra ibex nubiana). É da mesma família das cabras e chega a uma altura de aproximadamente 85 cm nos quartos dianteiros, com chifres grossos que se expandem para cima e para trás sobre as costas. Os chifres da fêmea são mais curtos e mais estreitos.120 Cântico dos Cânticos tam bém reflete uma cultura que emprega a imagem de animais como me táforas evocativas para temas eróticos (cp. 2.9; 4.5). Eu tinha dificul dade de me identificar com a cultura e a imagem até que, em certa ocasião, no alto de Tel Hesi, tive contato próximo com cabras montesas e observei seus olhos pretos brilhantes, seus membros graciosos e seus pelos irresistivelmente sedosos. A palavra seus seios (daddeyhã) tem origem na balbuciação dos bebês; seu cognato em árabe significa “ma 116. HALO T, 1:18, 'Okab. 117. E. Firmage, ABD , 6:1142, s.v. “deer”. 118. Meinhold. Sprüche, p. 105. 119. HALO T, 2:421, s ,v . y a alâ. 120. Meinhold, Sprüche. p. 105.
milos” (cp. titthos autês de Áquila); está associado a temas eróticos em suas únicas outras ocorrências (Ez 2 3 .3 ,8 ,2 1 ) . 121A fonte de bebida mais rica e satisfatória se encontra nas regiões erógenas da esposa, representadas pelos seus seios. Te embebam (y6rawwukã) dando con tinuidade à imagem de beber, significa no Qal “beber até à saciedade” e no Piei, “tomar saturado com um líquido”. De acordo com o paralelo, o líquido que sacia, implícito na imagem, são as carícias da esposa. ‘Et normalmente se refere a um tempo determinado, uma hora marcada (veja 5.23), mas este sentido pode ser neutralizado pelo uso generalizante e pluralizante, a todo (bekol) o tempo, ou “a qualquer hora”. Aqui ele significa sempre que o filho tiver sede (cp. Êx 18.22, 26; Lv 16.2; Sl 34.1 [2]; Pv 6.14; 8.30; 17.17). A qualidade de sua atividade sexual é totalmente satisfatória e a quantidade é interminável. As suas carícias (be’ahabãtãh) é uma tradução interpretativa para uma pala vra que significa ingenuamente “amor”, quer entre um homem e uma mulher (Ct 2.4, 5, 7), quer entre amigos (ISm 18.3, 20); ou o amor de Deus pelos seus (Dt 7.8; lRs 10.9; Os 3.1). A metáfora incompleta no verseto A implicava “embeber” agora é identificada como “carícias”. Aqui, o embebedar-se com os seios é equiparado implicitamente ao em briagar-se com vinho. Te embriagues (tisgeh) significa, literalmente, “te perdas inconscientemente”. E usado para ovelhas (Pv 19.2; cp. Ez 34.6; Pv 5.23), com referência a “virar ou serpentear” em razão de bebidas ou visões embriagantes (Pv 20.1; Is 28.7), ou para sexo (5.19,20; cp. Ct 5.1 [“bebam e se embriaguem, amantes”, sikrü dodim]). Fox comenta, “Aqui o termo não indica desaprovação, mas talvez tenha um tom ligeiramente ‘travesso’ nas sugestões de se ‘desencaminhar’ deliciosamente entorpe cido pelo êxtase da relação sexual”.122 O pai admoesta que as inibições devem ser deixadas de lado no leito conjugal. Sempre (tãm id; i.e., repe tidamente, constantemente, regularmente; veja 6.14,21; cp. Is 60.11; 62.6; Sl 34.1 [2], que também traz “a todo tempo” e “sempre” em paralelo) enfatiza novamente que as carícias abençoadas da esposa devem estar sempre disponíveis para embebedar e embriagar o marido sedento. 20 O disjuntivo agora (we) coloca a alegoria de volta no contexto da palestra para evitar a esposa lasciva.123 em vista do caminho melhor 121. HALOT, 1:214, s.v. dad. 122. Fox, Proverbs 1-9, p. 203. 123. J. E. Goldingay (“Proverbs V and IX", RBH4[] 977] 80-93), perde a ligação ao mudar o v. 20 dc lugar, colocando-o entre os vs. 2 e 3.
da dificuldade conjugal com a esposa abençoada, o envolvimento com a esposa lasciva é absurdo. Por que (lãmmà) é usado de maneira qua se retórica para apresentar uma alternativa indesejável.124 A pergunta retórica expressa admiração e indignação contra a alternativa. Se em briagar (tisgeh) liga o caminho insensato ao caminho sábio (veja v. 19). A repetição de meu filho (ben i) forma um inclusio com os versí culos 1 e 7 e ajuda a integrar a alegoria de volta na estrutura da pales tra. O líquido inebriante e nocivo alternativo é identificado: com as ca rícias, omitidas deste versículo, de uma esposa lasciva (bezãrâ; veja p. 177s.). “Por que” é omitido no verseto B. E abraçar (úfihabbêq; veja 4.8) designa uma expressão de amor pela posição ou ação das mãos ou braços em relação a um parente (Gn 29.13), a si mesmo (Pv 6.10), ou a um parceiro sexual, quer de modo virtuoso (Ct 2.6; cp. Pv 4.8b) ou, como neste caso, em adultério. O peito (hêq) designa a parte exterior e ligeiramente inferior do corpo abaixo dos seios, onde os entes queridos, inclusive um filho (lR s 17.19), uma esposa (2Sm 12.8), ou bebês (Rt 4.16) e animais (2Sm 12.13), são aconchegados. Achegar-se ao peito é um eufemismo para relações sexuais (Gn 16.5; Pv 18.22). De uma mulher infiel (nokriyâ; veja 2.16) se refere a uma mulher com uma cosmovisão diferente da família do pai. c. Conclusão (5.21-23) Na conclusão o pai fundamenta seu ensino na teologia, isto é, na onisciência (v. 21) e justiça (vs. 22,23) do S e n h o r . A combinação impli ca perfeita justiça para todos. Por um lado, a linguagem religiosa dos versículos 20,21 diz respeito a pecar contra Deus, e os termos sapienciais correlatos do versículo 22 a rejeitar a instrução, um inclusio apro priado para a introdução da palestra. A ligação assume que o pecado contra Deus e a insolência para com a instrução da sabedoria são inse paráveis. Por outro lado, em termos temáticos, o versículo 21 se refere à onisciência de Deus e os versículos 21,22 à sua justiça que entrega o pecador à sua morte. Esses versículos estão ligados pelo pronome en fático “ele”, que inicia o versículo 23 e remete ao culpado no versículo 22. Mais uma vez, um pecado específico exemplifica um moralismo universal (1.19; 2.20-22). Todos os perversos, sem exceção, não ape nas os adúlteros, morrerão.
21 Porque (ki) introduz o argumento sumariante. Por trás de todos os argumentos funcionais existe, em última análise, um motivo religioso o S e n h o r onisciente sustenta uma ordem moral na qual o pecado traz o próprio castigo; uma pessoa colhe aquilo que semeia (GI 6.7). Os cami nhos de um homem (darkê ‘is; veja 1.15) expande o ensino para todos os indivíduos (cp. 'is; Jó 42.11), não apenas para o adúltero, da mesma maneira como “todas” no verseto B o expande para todos os comporta mentos. A metonímia perante “ou bem em frente de” (nõkah) os olhos do S e n h o r Çênê YHWH) se refere à “presença do S e n h o r ” . 125 O parale lo sugere que, além disso, esta metonímia significa “sua avaliação, seu julgamento”, como a expressão “aos olhos de” (cp. 15.3). A construção participial ele está vigiando (m epallês; veja 4.26) significa que o S e n h o r examina constantemente todas as suas trilhas (kolma'g^lõtãyw; veja 1.15,19). De acordo com Gemser, o adúltero acredita equivocadamente que pode agir na escuridão sem que ninguém perceba (7.19,20; Jó 24.15), mas o S e n h o r , que vê todas as coisas (2Cr 16.9; Jó 34.21; S l 33.13-15; Pv 15.3,11; 24.12; Jr 16.17; 32.19; cp. Eclo 23.18-21), deixa que o pecado castigue a si mesmo (cp. 1.31, 32).126 22 Este versículo concentra o foco no comportamento pecaminoso. Suas indica o perverso como o agente que pratica as iniquidades Çawõnõtãyw), uma palavra holística que engloba tanto os delitos quanto seu castigo (i.e., iniqüidade que resulta em culpa).127O restante do texto enfatiza a última. Em 1.18 os perversos fazem emboscadas contra o próprio sangue; agora, personificadas, as próprias iniquidades preparam e acionam a armadilha que conduz à morte. Como em outras passagens em Provérbios, não se faz nenhuma distinção nem se percebe nenhuma tensão da parte do sábio, entre o S e n h o r que sustenta a ordem moral e a ordem moral de ato-consequência propriamente dita (veja pp. 120-124). Ele não é atingido por um raio do céu. Antes, os pecados o pegarão (yilkedunô; veja 3.26) como a armadilha de um caçador, apresentando aqui um uso figurativo para “capturar”. Lãkad é usado com mais frequ ência no contexto de guerra para a captura do território de um inimigo (cp. Nm 21.32; 32.39,41,42; Pv 16.32) ou de uma pessoa (Jr 48.7), mas o paralelo e com as cordas (übehablê) mostra que se tem em vista seu uso menos freqüente, a captura de um animal numa armadilha (Jó 36.8; 125. A. R. Hulst, TLOT, 2:878, 'ayin. 126. Gemser, Sprüche, p. 29. 127. R. Knierim. TLOT, 2:863, s.v. 'S w õ n .
SI 9.6; 35.8; Pv 6.2; Ec 7.26; Is 8.5; Jr 18.22; 48.44; Am 3.5). Ao concei to de que o julgamento é inevitável, a cláusula coordenada do verseto B acrescenta a ideia de que é impossível escapar dele. O paralelo de “suas iniquidades”, seu pecado (hattã’tô; veja 1.10) indica mais uma vez o homem perverso como o agente do pecado, e o pecado é personificado novamente, desta vez como tendo as cordas que capturam a vítima, o homem que ficará preso firmemente para o abate (yitfãmêk; veja 3.18). 23 A linguagem religiosa é agora integrada ao vocabulário da sabe doria: “instrução”, mãsãr, versus “insensatez”, ’iwwelet. Ele (hü) se re fere ao culpado no versículo 22, concentrando a atenção enfaticamente no perverso (cp. LXX, “tal indivíduo”). Morrerá (yãmút) se refere à morte eterna em contraste com a vida eterna dos justos, não apenas a uma morte prematura (veja v. 11) ou à morte física. Com exceção de 30.7, em que “morrer” se refere à morte física, o termo diz respeito à morte ocasionada pela rejeição e/ou falta da instrução vivificadora (veja 10.21; 15.10; 19.16; 23.13). Os imorais são privados da vida que está arraigada no verdadeiro amor e lealdade encontrados em Deus e em seu povo, agora e para sempre (veja pp. 157-161). Hubbard descreve o adultério como “uma morte ambulante” (veja v. 5).128 Na sua falta de (ibe ’ên; lit. “no não haver”) instrução (m üsãr; veja 1.2) se refere tanto aos dieta quanto à disciplina pessoal em que implicam (cp. 22.15). A conjunção coordenativa e (m) liga o contraste notável entre “na esfera em que falta instrução” e na abundância (berõb\ cp. v. 13) da sua insensatez ( ’iwwaltô; veja p. 168). Ao descartar a bússola moral do sábio, a qual poderia mantê-lo no caminho para a vida, o adúltero, como a meretriz (veja v. 6), será desviado (yisgeh', veja vs. 19, 20) para a morte, como atesta o paralelo. Nos versículos 19 e 20 Sãgâ se refere a ser desencaminhado por prazeres legítimos, mas aqui, refere-se a des viar no erro moral depois de rejeitar perversamente o caminho certo. 10. Apêndice: três tipos inferiores de homem (6.1-19) 1 Meu filho, se te tornaste fiador por1 teu próximo, 128. Hubbard, Proverbs, pp. 94-95. 1. Em outras passagens ”a favor de” com rb é expresso por um acusativo, não por este lamede excepcional. HALOT (2:876, s.v. I 'rb) simplesmente equipara as duas construções sem explicação; BDB (p. 786, s.v. II ‘5 rab) traduzem como “dar fiança para alguém (no nome de outrem)”. Mas Gemser (Sprüche, p. 28), McKane (Proverbs, pp. 321-22) e Plõger (Sprüche, p. I I I ) argumentam que a construção ímpar deve significar “com” ou “para” o seu
[se]2 bates te tua palma1 por um estranho, 2 fostes enredado pelas palavras de teus lábios; fostes capturado pelas palavras da tua boca.* 3 Assim, faze isto,s meu filho eh livra-te,1 pois caíste nas mãos do teu próximo: vai, fatiga-te8 e importuna teus próximos,9 4 Não dês sono a teus olhos, nem descanso às tuas pupilas. 5 Livra-te como uma gazela da mão de alguém,10 próximo, e não “a favor de”, quer a pessoa a quem as palavras são dirigidas tenha contraído uma dívida para si mesma, quer tenha dado garantia para a dívida de outrem. Argumentam que 3ap “caíste nas mãos do teu próximo” faz mais sentido se o próximo for o credor. Mas a LXX, Targ. e Sir. entenderam que 'rb F significa “dar fiança a favor dc”. Em aramaico “a favor de” com 'rb é expresso por lamede, e L. A. Snijders (“The Meaning o f zõr in the Old Teslament" [OTS 10; Lciden: E. J. Brill, 1954]), p. 82) observa que no hebraico talmúdico ‘rb le (lado a lado com o verbo mais o acusativo) significa “ser fiador de”. Assim, nesta construção, o lamede supostamente eqüivale à construção acusativa; pode ter sido ocasionado pelo lamede no verseto B. Além disso, 3ap faz mais sentido se o próximo for o devedor, não o credor. Dificilmente se esperaria de um credor que este perdoasse a dívida, e o mestre sábio não admoestaria o filho a importuná-lo de modo a não lhe pagar o que lhe é devido, no entanto, poderia se esperar que o devedor perdoasse o fiador ingênuo. 2. Não reconhecendo que o “se” é omitido, a LXX começa a apódose aqui. 3. L e a maioria dos mss. medievais trazem o pl., porém mais de 20 mss. medievais e versões antigas trazem o sing. As práticas dc se tomar fiador não são conhecidas o suficien te para resolver a questão textual. Cp. o pl. par. em 11.15. 4. A fim de evitar a repetição incomum. ‘imrê pikõ altera o texto da Sir. para bidbar sPpGtêkQ. 'imrê nunca ocorre com “lábio”. A LXX traz “lábios” nos dois versetos: cheili e cheilesin, respectivamente. 5. A. J. Baumgartner (Elude critique sur I 'élat du texte du Livre des Proverbes d'après lesprincipales traduetions anciennes [Leipzig: Imprimerie Orientale W. Drugulin, 1890], p. 66) comenta que, na presença de um grande número de variações textuais nas versões antigas, é fácil entender por que o TM é mais correto e mais puro. 6. O primeiro imperativo funciona como uma condição; o segundo declara as conseqüên cias envolvidas (GKC #325, 11 Os.). 7. No Hifil, nãçal designa a remoção ou libertação de alguém ou algo de todo tipo de situação em que este se encontra preso. Com este verbo, o Nifal funciona como uma raiz passiva/reflexiva do Hifil {IBHS, p. 394. P. 23.6.3). Este Nifal permissivo combina o conceito reflexivo com o conceito de permitir um agente, neste caso, o devedor, a fim de realizar sobre o sujeito a ação indicada pelo verbo. Também envolve um elemento de eficácia: aquilo que o sujeito permite que aconteça pode, de fato, ser levado a cabo (IBHS, pp. 389-90, PP. 23.4s., g). 8. Ou “humilha-te”. A LXX traz “não desista!” (< ’al titrappeh; "não seja negligente”). No entanto, o sentido pode ser defendido usando o TM. Gemser (Sprüche, p. 36) sugere “unverweilt” (“sem demora”) com base no assírio ina repsi “de imediato”. 9. A LXX, Sir. e Vulg. trazem um sing. simplificado (veja v. I ). 10. De acordo com vários estudiosos, o miyySd (“de certa mão”) do TM não é cabível. L. Adams (“Lexical Equivalence in LXX Proverbs 1-9: A Study in Translation Technique” [tese de M.C.S., Regent College, 1992], p. 110) enumera cinco correções propostas: (1) fornecer
e como um pássaro da mão11 do passarinheiro. 6 Vai ter com a formiga, ó preguiçoso; observe seus caminhos e torna-te sábio. 7 Ela não tem superior,'2 nem oficial, nem governante. 8 Ela providencia o cereal no verão; ajunta seu alimento na colheita.13 9 Até quando, ó preguiçoso, ficarás deitado? Quando14 te levantarás do teu sono? 10 Um pouco de sono, um pouco de descanso, um pouco de cruzar os braços para se deitar,'* 11 e a tua pobreza te sobrevirá como um vagabundo,16 a tua escassez,'1 como um homem armado.'9 12 Um revolucionário, uma pessoa malévola, é aquele que anda19 com uma boca torta, (“caçador” ); (2) fornecer p h (“armadilha para passarinhos”); (3) corrigir para mqyd (“de um caçador”); (4) tirar m yd e colocar em seu lugar mph com base em vários mss. Heb.; LXX, Sir. e Targ.; (5) transferir o vau de wkspwr para yd, e assim considerar mydw (“como uma gazela dc sua mâo, como um pássaro”); (6) ou acrescentar o vau ao termo antecedente m yd ( = mydw), explica sua perda como sendo decorrente de haplografia. Porém. Delitzsch (Proverbs, p. 102), Cohen (Proverbs, p. 31), Meinhold (Die Sprüche, 1:111) et al., argumentam que visto que 1 Reis 20.42 “da mâo/do aperto da mão” também ser usado sem uma definição mais precisa, não é necessário fazer nenhuma mudança textual neste caso (de acordo com a Vulg.). 11. A LXX traz “do laço/da armadilha”, que representa uma tradição textual diferente da do TM ou uma paráfrase livre do mesmo para oferecer um paralelo mais apropriado para “dos labores” em seu verseto A. 12. Para o termo qSçín (“líder” ) do TM, a LXX usa geõrgiou (“campo”). 13. A LXX acrescenta uma consideração mais longa acerca da abelha, cujas realizações diligentes c respeitadas, apesar de sua aparência insignificante, podem ser um exemplo para os seres humanos. 14. Lit. “ [Até] quanto tempo”. 15. A LXX traz, inexplicavelmente, stllhê, “ao peito”. Baumgartner (Elude critique, p. 67) acre dita que o tradutor leu lédym (“ao tórax"), mas C. Toy (Proverbs, p. 130) acredita que Iskb não estava presente em seu Vorlage. 16. A forma é Hilpael em paralelo com 24.34, apesar de vários códices também trazerem o Piei nessa passagem. 17. A forma é pl., em paralelo com 24.34. 18. ü R. Driver (“Studies in thc Vocabulary o f the Old Testament IV”, JTS 33 [1932] 44; “Studies... VI”, JTS 34 [1933] 383-84) acredita numa ligação entre mOgen (“armado") e o termo árabe m ajin[nu] (“impudente’7“impertincnte"). Albright (“Some Canaanite-Phoenician Sources of Hebrew Wisdom”, VTSup 3 [1955] 9-10) aponta para o ugar. mgn, “implorar” e muda a tônica do texto para mõgên ou maggõn. Mas o significado hebraico normal e a interpretação tradicional não é “sem sentido aqui”, como alega Albright. A Vulg. traz vir armatus . A LXX, por motivos incertos e discutíveis, traduz “como um corredor veloz” e a Targ. e a Sir. também não são dc grande ajuda. A LXX inseriu aqui um versículo adicional que parafraseia as possíveis vantagens da diligência com outras comparações. 19. Possivelmente, “um agitador é uma pessoa sinistra que anda...”.
13 pisca os olhos20 maliciosamente, arrasta os pés,21 e aponta com seus dedos. 14 Perversões encontram-se em seu coração; ele planeja o m aP em todo tempo. Ele desencadeia conflitos.23 15 Portanto, repentinamente?4 sua calamidade virá; num instante será quebrado, e sem um remédio. 16 São seis25 [abominações] que o Senhor odeia, sim, [são]26 sete21 abominações28 para ele: 17 olhos arrogantes, uma lingua mentirosa, e mãos29 que derramam sangue inocente, 18 um coração que planeja projetos malévolos, pés que se apressam a correr para o mal,i0 19 uma testemunha que mente,31 20. K. traz o sing. “olho” ; Q provavelmente o dual (veja v. 17). 21. Lit. “com seus pés” . K. traz o sing. “pé” . Q provavelmente o dual (veja v. 18). 22. Usando um ms., Gemser ( Sprüche, p. 30 [cp. BHS]) remove “ mal” (veja nota em BHS = “ele planeja perversidades em seu coração; a todo tempo incita controvérsia”). W. McKane (“Textual and Philological Notes on the Book o f Proverbs with Special Reference to the New English Bible”, GUOST 24 [1974] 83) defende o TM observando a estrutura tripartida também no v. 13. 23. K traz midSním (cp. 6.19; 10.12), porém medônim em 18.19; 2 1.19; 23.29; 25.24; 26.21; 27.15; Q traz mediy3ním (como também K em 18.18; 21.9) sem nenhuma diferença em significado. 24. Pit 'Sm ("repentinamente”) é uma forma adverbial do radical p t uma paronomásia com seu paralelopeto' (“num instante”). 25. A LXX traz “ele se regozija”, tendo considerado 555, e nãoses. 26. P. D. Miller (“Synonymous-Sequential Parallelism”, Bib 61 [1980] 256) chama essa omis são seqüencial de “paralelismo seqüencial sinônimo”, i.e., versetos “nos quais alguns elementos são paralelos de forma sinônima, e outros são seqüenciais ou contínuos uns com os outros”. 27. A LXX traz “e ele é esmagado”, necessário em função de sua interpretação incorreta do ses inicial. 28. K traz o pl. tô'abõt; Q., LXX trazem o sing. tô'abat. O sing. é encontrado em enumerações e, neste caso. vem depois do numeral (IBHS, p. 114, P. 7.2.2b). 29. A forma dual provavelmente indica um par, não um pl. indefinido, pois a lingua e o coração de um agitador, que não ocorrem cm pares, são sing. 30. Para lãrúç tãraâ, a LXX traz "fazer o mal", omitindo lõrúç e interpretando a frase nominal como lamede + infin. do verbo não atestado rS‘â. E provável que /3rú? tenha saído de seu Vorlage por haplografia em razão dc homoioteleuton. Kfhêrá yãrúç no Salmo 147.15 apoia o TM. 31. Lit. “uma testemunha de mentiras” (yüpiah kezõbim) é uma expressão idiomática fixa (6.19; 14.5, 25; 19.5, 9); yõpiah ocorre isoladamente somente em 12.17. Tradicionalmente os lexicó grafos analisaram yõpiah como Hifil imperfeito de pwh “respirar” em seis ocorrências em Provér bios. No entanto, a forma nesta lista se encontra em aposição a “abominação” e em paralelismo com “olhos”, “língua”, “mãos”, etc. e, portanto, espera-se um substantivo, não um verbo. Além disso, em termos sintáticos, dificilmente pode ser um predicado para “testemunha que mente” ou uma cláusula atributiva relativa. O enigma foi solucionado pela raiz ugar. yph “testemunha", um equivalente semântico e sintático de 'èd (veja 14.5). O substantivo tem o padrão nominal qõtíl
aquele que perjura,32 e aquele que desencadeia conflitos entre parentes. No centro da seção sobre as salvaguardas contra os perversos (veja pp. 50, 164-165) o tema volta mais uma vez aos perversos (1.10-14; 2.12-15; 3.27-35). Esse apêndice à oitava palestra do pai, “A insensa tez do adultério e a sabedoria do casamento” ou “Fique afastado da esposa lasciva” (5.1-23), consiste de três lições que dizem respeito a tipos diferentes de personae inferiores: o fiador (6.1-5), o preguiçoso (vs. 6-11) e o encrenqueiro (vs. 12-19). A última é constituída de duas estrofes originalmente independentes (vs. 12-15,16-19). Apesar da pri meira dessas três lições ser dirigida ao filho, nenhuma delas apresenta os típicos imperativos introdutórios do pai para escutar associados ao vocabulário sapiencial. O endereçamento para o filho contrasta com o endereçamento para o preguiçoso na segunda lição e, na terceira lição, o destinatário não é identificado. Nem o preguiçoso nem o agitador são reconhecidos como filho (veja 4.3). As duas primeiras lições estão fortemente ligadas: (1) pelos vocativos duplos, “meu filho” (6.1,3) e “preguiçoso” (vs. 6,9); (2) pelas palavras-chave “vai” (vs. 3b e 6), “dormir” e “descansar” (vs. 4, 9, 10); (3) pelo tema do perigo comum do “sono” inoportuno e do “descanso” indo lente (vs. 4, 10); (4) e pelo uso do exemplo da sabedoria dos animais, a saber, da gazela e da ave (v. 5) e da formiga (v. 6). As duas estrofes se ocupam com a proteção do bem-estar futuro do indivíduo - primeiro ao não colocá-lo em perigo e, a seguir, ao se preparar para ele. As duas últi mas estrofes dizem respeito ao encrenqueiro, que é descrito primeiro por seis e depois por sete características malévolas, inclusive o uso indevido de cinco partes do corpo; dentre estas, seu coração perverso é descrito basi camente nos mesmos termos (vs. 14, 18). Em ambas as estrofes ele é acusado de malevolência (vs. 12a, 18a) e de incitar conflitos (vs. 14b, 19b). (IBHS, p. 88, P. 5.3c). Para explicar a falta de redução a shevá na sílaba inicial daquilo que parece um estado construto, Dennis Pardee ("yph ‘Witness’ in Hebrew and Ugaritic”, VT 28 [1978] 20413) conjetura que a palavra foi tomada emprestada pelo hebraico como uma palavra erudita para “testemunha” de um dialeto no qual a mudança de vogal cananita (S > 6) não era costumeira. P. D. Miller ("yaphtah in Psalm XII 6”, VT 29 [1979] 4% ) objeta, mas não oferece nenhuma solução para a falta de redução. E provável que a form a m ostre que os m assoretas interpretaram o substantivo original indevidamente como um verbo e indicaram-no como Hifil imperfeito de pwh em vez de um construto do substantivo ySptah. 32. “Uma testemunha de falsidade.” Uma vez que, provavelm ente, a palavra principal e o apositivo são com pletam ente idênticos, o últim o identifica, não qualifica, o prim eiro (IBHS, p. 229, P. 12.2a; 12.3a).
Essas composições sapienciais realistas intensificam a insensatez. E significativo que o interlocutor se dirija ao fiador como filho, mas não faça o mesmo com o preguiçoso e o encrenqueiro. Enquanto o fiador e o preguiçoso prejudicam a si mesmos, o encrenqueiro prejudica a ou tros. O preguiçoso e o encrenqueiro também são ligados pelas adver tências conclusivas, implícita (v. 11) e explicitamente (v. 15), de que o julgamento “sobrevirá” repentinamente. O dito numérico (vs. 16-19) se refere pela primeira vez e de modo culminante ao S e n h o r , para quem o encrenqueiro é uma abominação e que é o Juiz final de tudo. Aquele que se torna fiador e o preguiçoso não são perversos, mas a ingenuida de do primeiro e a preguiça do último constituem o início de algo que pode facilmente levar ao mal do perverso. As ligações entre a mulher estranha do capítulo 5 e os tipos inferiores de homem de 6.1-19 mostram que as palestras do pai foram organizadas de modo hábil e consciente. O dito introdutório, contra se tomar fiador, dá continuidade ao tema do empobrecimento econômico causado pelo pró prio indivíduo, ao mesmo tempo em que este enriquece o estrangeiro, reforçado pelas palavras-chave “estrangeiro” (veja 5.10; 6.1) e “preso/ capturado” (veja 5.22; 6.2). O dito final, contra o encrenqueiro, liga as conseqüências fatais da perversidade ao S e n h o r como o Agente final do julgamento, da mesma maneira que na oitava palestra (5.22, 23; 6.1519).33 Plõger acredita que a advertência acerca desses tipos inferiores de homem é inserida na coerência das admoestações acerca da mulher es tranha para que as advertências acerca dos ingênuos e dos perversos sejam consideradas tão importantes quanto as da mulher estranha.34 a. Advertência contra se tornar fiador (6.1-5) A forma de 6.1-5 é semelhante a de 1.10-19. Ambas começam com o destinatário, “meu filho”, seguido de “se” que introduz a prótase que contém a situação insensata, em vez de admoestações para dar atenção ao ensino seguido de uma argumentação. Além disso, no TM, ambas repetem o destinatário “meu filho”, quando inicia a apódose. A lição consiste de uma introdução: um discurso chamando a aten ção do filho para a situação insensata de se tomar fiador (vs. 1, 2); o corpo principal admoestando a solução sábia de escapar da situação 33. De acordo com M einhold, Sprüche, p. 108. 34. Plõger, Sprüche, p. 67.
imediatamente (vs. 3,4); e uma admoestação sumariante para se livrar da armadilha sem demora (v. 5). O corpo principal é constituído de sete admoestações curtas e urgentes, contando a omissão de “não dês” no versículo 4b. A admoestação central para se livrar (v. 3a; cp. v. 5a) é qualificada pelas outras que explicam como: ir, engolir o orgulho, gritar ou importunar os próximos (v. 3b), e fazê-lo sem demora, negando a si mesmo o sono inoportuno e o descanso indolente (v. 4). Essas três partes estão ligadas entre si por palavras-chave. NôqaS, “enredado”, no início do versículo 2, eyãqus, “passarinheiro”, no final do versículo 5, ambas da raizyqs, ligam a introdução e a conclusão. “Mão(s)/palma” (vs. 1 e 3) e “teu(s) próximo(s)” (vs. 1, 3) ligam a introdução e o corpo, sendo que o corpo e a conclusão estão ligados pela expressão “livra-te” (vs. 3, 5). A Bíblia prescreve àqueles que têm meios que sejam generosos com os necessitados (3.27, 28; Dt 15.7-11) e condena a cobrança de juros do pobre (Êx 22.25[24]; Lv 25.35,36). Ademais, dentro de certos limites, a lei permitia que um credor tomasse algo do devedor como garantia do pagamento de uma dívida (Êx 22.26[25], 27[26]; Dt 24.1013, 17; cp. 2Rs 4.1; Ne 5.3). O livro de Provérbios, porém, adverte repetida e incondicionalmente contra o se tomar fiador ou devedor a favor de uma dívida de um estranho (6.1; 11.15; 17.18; 20.16 [=27.13]; 22.26). Siraque, entretanto, atribui dignidade a essa prática35ao mesmo tempo em que adverte sobre seus perigos.36 A seu ver, o avalista deu sua vida por aquele que tomou emprestado: “Não te esqueças de toda a bondade do teu fiador, pois ele deu sua vida por ti... Ajuda o teu próximo de acordo com a tua capacidade, mas cuida para que tu mesmo não caias” (Eclo. 29.14-20; cp. 8.13). A prática já era conhecida na lei babilônica, bem como na lei grega e romana posteriores.37 Os textos bíblicos e extrabíblicos, porém, não fornecem informações suficientes para um discernimento claro de vários dos seus detalhes. Paulo se res ponsabilizou pelas dívidas passadas de Onésimo, mas, como Kidner observa, não pelas suas dívidas futuras (Fm 18, 19).3SO comércio mo35. “Um homem bom será fiador a favor de seu próximo, mas um homem que perdeu seu senso de vergonha não o socorrerá” (Eclo 29.14). 36. “Ser fiador arruinou m uitos hom ens que eram prósperos e os abalou com o um a onda do mar; levou hom ens de poder ao exílio, e eles vagaram entre as nações estrangeiras” (Eclo 29.18). 37. K. Minkner, “Die Einwirkung des Burgschaftsrechts a u f Leben und Religion Altisraels” (dis sertação, Halle, 1974); K. Minkner, “ Die Einwirkung des Burgschaftsrechts a u f Leben und Religion Altisraels”, TLZ 102 ( 1977) 3 18. 38. Kidner, Proverbs, p. 72.
demo se baseia essencialmente nos juros sobre empréstimos, uma prá tica desconhecida no antigo Oriente Próximo. (1) Introdução: a situação do tolo (6.1,2) 1 O destinatário meu filho (beni; veja 1.8) desperta o filho para nova lição contra a benevolência sem discernimento e impulsiva e/ou a especulação. Se ( ’im ) introduz a situação insensata observável gerada pelo fiador descuidado; o versículo 2 apresenta o discernimento do sá bio acerca da situação decorrente. Te tornaste fiador (‘ãràbta) signi fica, em Provérbios, “comprometer-se como garantia pela dívida de outro” (também 11.15; 17.18; 20.16; 22.26; 27.13). A literatura legal da Bíblia permite que um credor exija uma garantia para se guardar da falência do devedor (cp. Gn 38.17, 18; Êx 22.26). A garantia era, com frequência, uma peça de roupa, um substituto simbólico para a própria pessoa.39 A literatura legal não trata da questão de se tomar fiador de um devedor, mas Provérbios desaprova a prática no caso de um estranho. O fiador assumia a responsabilidade pelo pagamento da dívida e se tomava passível de confisco caso o devedor não pagasse (Pv 11.15; 17.18; 20.16 [=27.13]; 22.26,27). O significado depor (i.e., “a favor de”; veja n. 3) pressupõe que o teu próximo (veja 3.28,29), que aqui tem o sentido mais fraco “outra pessoa, com a qual se tem um relacionamento recí proco”, 40 é um termo correlato para “estranho”. Bateste tua palma (cp. “mão”, 1.24) representa um gesto para selar um acordo (cp. 2Rs 10.15), provavelmente na presença de testemunhas, inclusive o credor e, na literatura sapiencial, sempre para servir de fiador (cp. 11.15; 17.18; 22.26; Jó 17.3).41 No entanto, não há um consenso entre os estudiosos se por um estranho (zãr; veja p. 177) é um termo correlato de “pelo próximo” apesar do paralelismo de outro modo sinônimo nos versetos. “Em oposição à maioria dos comentaristas”,42 Bostrõm,43 McKane,44 39. Conform e R. de Vaux, Ancienl Israel: Ils Life and Inslilutions, trad. J. M cHugh (Londres: Darton, Longman & Todd, 1965), p. 171. 40. BDB, p. 946, s.v. ria'. 41. Snijders (“The M eaning o f zãr", p. 80) cham a a atenção para os com entários de Koschaker acerca dos term os Su (m ão), katu (m ão) e mahi ? puti (= aquele que bate a favor de), que são palavras ligadas à fiança em docum entos sum érios e babilônios. 42. Fox, Proverbs 1-9, p. 2 1 1. 43. G. Bostrõm, Proverbiasludien: Die Weisheil und das fremde Weib in Sprüche 1-9 ( LUÂ, N.F., Avd. 1, Bd. 30; Lund, 1935), p. 100. 44. McKane, Proverbs, pp. 321 -22.
Plõger,45 Meinhold e Fox acreditam que o próximo é o credor e o es trangeiro é o devedor. Meinhold argumenta que “teu próximo” e “um estranho” não podem ser equiparados, uma vez que “estranho” é usado com um cunho bastante negativo em outras passagens, e conclui que “o caso pressuposto pode muito bem ser de alguém que serviu de fiador para um estranho no lugar do seu próximo que, no momento, não podia pagar”.46 Mas em 6.3 o próximo, não o credor, funciona de maneira negativa (como caçador e passarinheiro) contra o fiador. Além disso, Snijders observa que zãr significa ingenuamente alguém de fora e que, nesta situação, o próximo está fora do modo de vida e interesse do fiador,47 e Fox reconhece que em alguns contextos um rêa‘ pode ser um zãr.48 No entanto, Fox argumenta curiosamente que “Um fiador não se toma dependente da boa vontade daquele que contrai a dívida, mas sim do credor”.49 Mas se aquele que contrai a dívida não cumpre seu compromisso com o credor e o fiador se vê obrigado a pagar a dívida, perdendo até a capa que o protege do frio da noite (cp. 27.13), então o futuro do fiador depende da boa vontade do devedor de pagar a dívida. Não obstante, ele ressalta corretamente que o fiador se tomou responsável por um “estranho”, pois em 20.16 o zãr é equiparado a um nokri (veja 2.16).50 Talvez “teu próximo” descreva o credor à vista do fiador negligente e “um estranho” de acordo com a avaliação do sábio. 2 O sábio apresenta agora um discernimento das conseqüências da benevolência impetuosa, ou vaidade descuidada, ganância ou de quais 45. Plõger, Sprüche, p. 63. 46. M einhold, Sprüche, 1:110. 47. Snijders, “The M eaning o fz õ r" , p. 84. 48. Fox, Proverbs 1-9, p. 212. 49. Fox, Proverbs 1-9, p. 2 11. 50. HALOT (1:279, s.v. zãr) define zãr como “estranho, diferente, heterogêneo, ilícito”, e nunca sim plesm ente com o “outra pessoa’V“outrem ” . BDB (p. 266, s.v. zür) traduz com o "estranho (adj.)/estranho (subst.)” (incluindo 6.1; 11.15; 10.16; 27.13) e “outro” (em relação à pessoa, incluindo 14.10; 27.2). Em outros textos de sabedoria tem o m esm o sentido de “estranho”/ "forasteiro” (Jó 15.19; 19.15) e “outro”, contrastando com o próprio indivíduo em questão (Jó 19.27). O referencial de Provérbios sobre a identidade daquele que toma emprestado em Provér bios 6.1; 11.15; 27.13 é 20.16, em que zãr é paralelo a nokrim (Kethiv, i.e., uma pessoa desconhe cida). A tradução “outro” funciona em 14.10; 27.2 e Jó 19.27 pois zSr é contrastado com o próprio indivíduo em questão. Mas essa tradução dá uma ideia equivocada em 6.1 e 11.15 (pace NIV e A. H. Konkel [NIDOTTE, 1:1142, s.v. zãr]). Uma vez que, obviamente, aquele que toma emprestado não é o próprio indivíduo mencionado, “outro” significa “qualquer pessoa”, que não é a ideia de zãr. A questão em 6.1; 11.15; 20.16; 27.13 é que a pessoa que toma emprestado é de fora da família/ comunidade do avalista, com o a família da esposa infiel (cp. 5.10). “Fica claro que o ‘estranho’ [em 6.1; 11.15] é alguém que não pertence á família” (L. A. Snijders, TDOT, 4:57, s.v. zúrízSr).
quer interesses que estejam envolvidos. Siraque (29.19) observa, “O pecador que se comprometeu como fiador e busca o lucro será alvo de ações judiciais”. Existe um consenso geral a favor da tradução fostes enredado (ou fostes pego com isca [ r a ô g a S í ã ] ) . 51 A esfera conceituai de caça recebe ainda maior apoio do versículo 5. Uma armadilha es conde seu perigo mortal a fim de pegar sua vítima de surpresa e destruí-la antes que ela possa se livrar. A metáfora é interpretada pela declaração “pois caíste nas mãos do teu próximo” (v. 3). Pelas palavras da tua boca (veja n. 4) se refere ao compromisso assumido pelo fiador junto ao devedor e infere que o acordo foi feito mediante um contrato oral e selado pelo ato de bater as mãos de alguma maneira, o equivalente ao aperto de mão nos dias de hoje. O paralelo sinônimo pelas palavras dos teus lábios (veja 5.7) enfatiza o próprio discurso como o agente da in sensatez autoinfligida. Fostes enredado (veja 5.22) também expressa figurativamente ser pego numa armadilha; a figura indica que um acordo verbal tinha tanto efeito quanto um documento escrito. Do mesmo modo como o fiador se colocou nas mãos de outro, deve, agora, se livrar delas. (2) Corpo: admoestações urgentes para resolver a situação (6.3,4)
3 As tautologias fa ze isto (veja 2.14) e meu filho ressaltam a ur gência da situação. Assim extrai a conclusão lógica da situação do fia dor insensato. E livra-te (veja 2.12) apresenta a admoestação principal e o ensino desta seção (veja v. 5). A noção de sair imediatamente da esfera de aflição é bastante apropriada com a imagem de ser pego numa armadilha. Pois introduz o argumento por trás do imperativo prin cipal. Caíste [veja 1.26] nas mãos (veja 6.1) coloca no lugar da ima gem zoomórfica de um animal ou ave apanhado numa armadilha a rea lidade de que o fiador se entregou nas mãos do próximo. Tornar-se fiador é insensato porque o fiador faz promessas referentes a um futu ro que ele não pode controlar (cp. 27.1). Além do mais, ele se entregou ao devedor, que pode lançá-lo sem misericórdia nas mãos do credor. Siraque (29.17) observa; “Aquele que não se sente grato [ao fiador] 51. HALOT, 2:432. s.v.yqS. O cognato ugar. d eyqS provavelm ente significa "passarinheiro” (M. Dahood, Psalm IU[AB X V IIA ;G arden City, N.Y.: Doubleday, 1970], p. 213). G R. Driver (“ Reflections on Recent Articles", JBL 73 [ 1954] 131-36) dem onstrou de modo irrefutável que "apesar de ...yüqai Q ser em pregado no AT som ente no contexto de um a pah ['arm adilha'] o uso da raiz em môqêS [veja 12.13] para derrubar a vítim a m ostra com o y çs Ni (provavelm ente um verbo denom.) pode se referir à vítim a que foi derrubada e, assim, pega e presa, apesar de isso ocorrer apenas m etaforicam ente ( Dt 7.25: Is 7.15; 28.13; Pv 6.2)” .
abandonará seu resgatador”. As três expressões curtas em 6.3b{3 po dem refletir a tensão da situação. Os sete imperativos (no texto hebrai co) visam levar o filho descuidado a tomar uma atitude enérgica. A interjeição vai (lêk) incita à ação imediata.52 Fatiga-te significa esfor ça-te até à exaustão na tarefa de não dar descanso algum ao teu próxi mo por meio de teus pedidos insistentes.53E importuna (“grita”, “abor rece com insistência”, üi^hab) quer dizer aqui “empurrar alguém vio lentamente” (cp. Is 3.5). De Vaux acredita que o fiador importunou o devedor para pagar a dívida.54 O mais provável é que deva se livrar da responsabilidade antes de chegar a hora de pagar a dívida. Como o juiz iníquo que não pode resistir á audácia desavergonhada da viúva (veja Lc 18.1 -5) e o amigo que não pode suportar a amolação do seu compa nheiro (Lc 11.8), o devedor não deve ser capaz de resistir à importunação ainda mais intensa do seu fiador. O pl. os teus próximos (veja 6.1) mostra que o fiador deve suplicar à pessoa com quem se comprometeu bem como à família desta e/ou às testemunhas (veja 17.18). Meinhold defende a ideia questionável de que os parentes estão sendo importu nados para ajudar o fiador a honrar seus compromissos.55 O sábio não envolveria outros na situação do fiador insensato. 4 Não dês [cp. 1.4] sono [veja 3.24] a teus olhos (veja 1.17) enfatiza a necessidade de uma atitude urgente e imediata para livrar o fiador ingênuo da promessa. Quanto antes possível, antes mesmo de vir à noite, ele deve fazer de tudo para cancelar seu compromisso. A ur gência de priorizar ao máximo a questão é ainda mais intensificada por nem descanso (üfinümâ; cp. Sl 132.4) às tuas pupilas (veja 4.25). Apesar de Schupphaus acreditar que nwm “descansar” é apenas um equivalente poético deyS/i, “dormir”,56J. Thomson argumenta que nüm 52. G KC, P. I20g. 53. No Qal e no Nifal (veja 25.26), hitrappês significa "tomar a água lamacenta", e seu equiva lente nominal em Isaias 57.20 significa “ lama e sujeira” (trazidas pelo mar) (HALOT 3:1279s.. rps). Assim, o Hitpael rãpas pode significar “tornar-se contaminado ao pisotear" e, portanto, ser uma figura para se humilhar, rastejar (de acordo com Rashi e Ibn-Ezra, citado por Delitzsch, Pmwrbs. pp. 137-38 e McKane, Proverbs, p. 332, que segue BDB, p. 952, s.v. rps). G R. Driver, porém, observa que a raiz em acadiano e siríaco significa “pisoteado" e em árabe, “chutado” . E o que é mais importante a raiz reflexiva N no acadiano é usada metaforicamente vis-à-vis “estar moido de cansaço” - (G R. Driver, “Notes and Studies”, JTS 30 [1929] 374-75). Esse sentido se encaixa no texto, especialmente com referência ao v. 4, sem introduzir o conceito duvidoso de "engolir o seu orgulho". 54. De Vaux, Ancient Israel , p. 173. 55. M einhold, Sprüche, p. 110. 56. J. Schilpphaus, TDOT, 6:439, s.wyãSên.
significa ficar sonolento ou tirar uma soneca: “fínüm â se refere ao que os neurologistas modernos descrevem como estágio pré-dormitum do sono; i.e., o período que antecede o sono propriamente dito, quando o fluxo de pensamento é modificado”.57 G S. C. Williams argumenta, com base nos cognatos que nwm indica um sono mais leve do queysn, e define t?nümâ como a descrição de uma situação de “fechar os olhos e cochilar”. O sono inoportuno e o descanso indolente podem, por fim, provocar a falência econômica. Esses termos constituem a ligação en tre as seções sobre o fiador descuidado e o preguiçoso indolente (6.611) (veja “sono” e “descanso” no v. 10). (3) Conclusão: sumário da palestra (6.5)
5 Este versículo sumaria e desenvolve ainda mais a lição repetindo livra-te (hinnãsêl), sua principal admoestação, e repetindo as compa rações zoomórficas de ser pego numa armadilha/laço (v. 3) e de estar “na mão” de outro. Como uma gazela é mencionado apenas nesta passagem de Provérbios. Existem duas espécies de gazelas em Canaã, a dorcas (Gazella dorcas) e a gazela montês ou árabe (G. gazella). A última, com até 1,40 m de altura, é mais de duas vezes mais alta que a G. dorcas, A G. gazella é de cor marrom-acinzentado e a G. dorcas é marrom-claro. A G. dorcas habita nas planícies do deserto, enquanto que a G. gazella é encontrada nas montanhas. Não podem ser criadas como animais domésticos, pois são ariscas e se apavoram ao ser confi nadas. Da mão provavelmente se refere ao método principal de caçar gazelas, mediante o uso de currais naturais de pedra na forma de triân gulos, abertos numa extremidade e para dentro dos quais as gazelas eram conduzidas. Apesar dos muros desses currais serem baixos de mais para servir de barreira, as gazelas não saltavam para fora. Presas ali e, com frequência feridas, eram abatidas todas de uma vez.58E como uma ave (ukesippôr) muda a imagem de um equídeo para um pássaro a fim de enfatizar a necessidade de livramento e esclarecer a questão. Sippôr “pássaro que chilra” é o termo geral para aves comensais.59Tan to a gazela quanto a ave, ao perceberem que foram pegas numa armadi lha, dedicam toda a sua atenção a escapar da mão do caçador. Da mes 57. J. G Thomson, S.S., “Sleep: An A spect o f Jewish Anthropology”, VT5 (1955) 421. 58. E. Firm age, "Z o ology (A nim al P rofiles)” , in ABD, 6:1141. 59. “Um pardal" provavelmente é uma expressão onomatopéica; no hebraico, o termo começa com sp-, imitando o goijeio do pássaro.
ma maneira o fiador pode, pela agilidade e rapidez, escapar da armadilha na qual suas palavras o prenderam. A menção repetida de da mão, ape sar de ser lexicamente distinta de “palma” (veja 1.24; 31.13,16,19,20), é seu equivalente semântico. Assim como ele caiu na armadilha por um aperto de mão, deve agora escapar dessa mão. Do passarínheiro (yãqüs) é derivado da raiz “apanhar numa armadilha” (veja v. 2). b. Advertência ao preguiçoso (6.6-11) O tema do empobrecimento econômico autoinfligido continua. En quanto os agentes da aflição financeira até aqui foram a esposa lasciva (5.7-10) e o devedor (6.1 -5), agora é a ordem criada em si que se recusa a ser desafiada. O preguiçoso desafia essa ordem, que oferece suas co lheitas abundantes em troca de trabalho honesto, mas que priva dos frutos da terra aqueles que a desafiam. Interpretando o fiador como um especulador à procura de lucro sem trabalho, Meinhold observa a se melhança entre o fiador e o preguiçoso. De acordo com ele, ambos desejam algo de outro modo que não o trabalho honesto, algo que lhes garanta um modo de vida, escasso (o preguiçoso) ou mais confortável (o especulador incauto).60 O outro lado da advertência contra a pregui ça é uma admoestação à diligência. Os dois estilos de vida são contras tados em passagens como 10.4, 5; 13.4; 15.19.61 O poema é constituído de duas partes iguais (6.6-8, 9-11), ambas introduzidas pelo vocativo “ó preguiçoso” (vs. 6 e 9). A primeira o ad moesta a ir e considerar a sabedoria e diligência da formiga (cp. 1Rs 4.33[5.13]), e a segunda o condena por sua insensatez e indolência. O preguiçoso é um indivíduo inútil, um imprestável, que está muito abaixo do animal, que não precisa de tal repreensão. Essa imprestabilidade pode ser vista como um ponto de conexão para a seção seguinte, na qual as marcas do imprestável são citadas na forma de uma enumeração. Não obstante, apesar de estar satirizando o preguiçoso, Salomão não o deixa sem esperança alguma; antes, lhe oferece uma crítica construti va a fim de torná-lo sábio, pressupondo que ele é capaz de se corrigir. Sua admoestação dá esperança de salvação ao preguiçoso antes que 60. M einhold, Sprüche. p. 111. 61. A Instrução de Cheti louva com eloqucncia a atividade dos escribas em contraste com vário s tip o s de trab alh o m anual árduo c com a ag ricu ltu ra. Porém , a instrução egípcia tam bém adm oesta à d ilig ên cia, ainda que com m enos frequência que P rovérbios. A nkhsheshonq diz: “todo aquele que não junta lenha no verão não tem calor no inverno" ( 9 .17).
seja tarde demais. O preguiçoso é a audiência explícita, mas o discurso também é voltado implicitamente para o filho e para o ingênuo aos quais o livro se dirige (veja 1.4,5). Através da repreensão do preguiço so o filho está sendo advertido acerca da preguiça (veja 19.25). (1) Admoestação para aprender sabedoria com a formiga (6.6-8)
A seção referente à formiga é constituída de admoestações para ir e considerar seus caminhos e se tomar sábio (v. 6) e de um argumento, uma descrição de seus caminhos sábios (vs. 7, 8). 6 A ordem vai (veja 6.3b), colocada no início para dar ênfase, des perta o preguiçoso da sua letargia (cp. Ef 5.14). Ter com a formiga (nemãlâ; veja 30.25) é provavelmente uma expressão genérica (exis tem mais de 100 espécies de formiga),62 mas a formiga a que o texto se refere provavelmente “é a ceifeira” (Messor semirufus), encontrada em toda parte na Palestina. Ela armazena cereais em seu ninho e, portanto, é usada como exemplo de diligência”.63ToperofFderiva nemãlâ de mui “circuncidar ou cortar”, mas em seu dicionário talmúdico Jastrow es creve que n'm lh é uma contração de n'mlh, derivado do radical 'ml, “labutar”.64 Se esse é o caso, então forma um excelente jogo de pala vras com 'sl, “preguiçoso”.65 A designação preguiçoso toca um tipo importante de insensatez pela primeira vez neste livro (veja p. 170). Observa traduz o verbo comum que, neste caso, tem como nuança particular “olhar por volição direta” (veja 7.7)“ e “com discernimento moral” (veja 20.12). Tanto em 30.25 como aqui os caminhos da formi ga (derãkeyhã; veja 1.15) ensinam basicamente a autodisciplina, a pre vidência e a diligência - mais especificamente, a diligência prudente. Os detalhes da lição são dados por meio de sua descrição nos versícu los 7,8. A Midrash acrescenta duas qualidades a estas: a honestidade e a solidariedade comunitária.67 Quando a formiga é estudada com aten ção e discernimento moral, segue-se necessariamente o imperativo e torna-te sábio (veja p. 145). As três admoestações visam gerar ener 62. S. P. ToperofT, “The Ant in the Bible and Midrash'", DD 13 (1985) 179-85. 63. F. S. Bodenheimer, “ Fauna and Flora o f the Bible”, in Helps fo r Translators (Londres: United Bible Societies, 1972), p. I. 64. M. Jastrow, Dictionary o f the Targumim, lhe TalmuJ Babli, 1-2 (Nova York, 1903), p. 930. 65. Delitzsch ( Proverbs, p. 138) observa que em alem ão Ameise “ form iga" é derivado de Emsigkeii (“diligência” ). 66. BDB, p. 907, s.v. rS‘â. 67. Topcroff, “The Ant” , pp. 180-82.
gia suficiente para fazer o preguiçoso se mover e, desse modo, come çar o processo de reestruturação de sua vida. 7 O primeiro detalhe da lição é que a formiga não tem líder. Em 30.27 essa característica exemplar também é observada acerca do gafa nhoto. Aristóteles68 também afirmou que as formigas trabalham sem governantes para dirigi-las. Os entomologistas modernos descobriram uma organização social perfeita entre as formigas, mas como Plaut ob serva, isso “não sugere que exista uma hierarquia de comando”.69Super visor {qãsin) está associado à raiz árabe qãdaya (“julgar”) e correspon de à raiz hebraica qãsâ (“cortar”).70 Assim, o qãsin é aquele que deve cortar, decidir, resolver uma questão. Em alguns textos (Js 10.24; Jz 11.6, 11; Dn 11.18) qãsin significa o líder que preserva a ordem. Para Isaías (1.10-17) eles são responsáveis por manter a lei. As formigas não preci sam de tal indivíduo para decidir seus deveres e resolver conflitos acerca de tempo, distribuição e ordem de trabalho. O oficial (Sofêr) é uma pala vra emprestada derivada do acadiano que significa “anotar; relacionar funcionários” e designa “o administrador distrital”, “o superintendente”.71 Encontramos superintendentes egípcios obrigando os israelitas a traba lhar em Êxodo 5.6, 10, 14. Ou governante (mõSêl) se refere principal mente àquele que governa a conduta de um subordinado. O verbo parece ter esse sentido geral aquieem 12.24; 17.2; 19.10; 22.7, ao contrário do sentido político em 23.1; 29.2, 12, 26.72 Em vez de ter líderes externos que organizem o trabalho com relação à sua natureza e seu tempo e providenciem para que seja concluído, a formiga tem a sabedoria que Deus lhe deu para trabalhar e, o que é igualmente importante, para orde nar seu trabalho de maneira sábia. Ao admoestar o preguiçoso a apren der com esse exemplo, o autor espera que ele intemalize sua sabedoria. 8 A atividade esperada dos líderes sobre um grupo de trabalhado res é detalhada e aplicada à formiga. Ela providencia (tãkim\ veja 8.27) no Hifü significa basicamente “preparar e colocar em ordem de modo apropriado”, “preparar”, “arrumar de modo a estar pronto” (veja 8.27).73 Em várias ocasiões, é usado para a preparação de implemen 68. De Animis 1.1.11. 69. Plaut, Proverbs, pp. 85-86. 70. J. M. P. Van der Ploeg, "L eschefs du peuple d ’lsrael et leurs titres”, RB 57 (1 9 5 0 )5 2 . 71. HALOT, 4:1476, s.v. S(r. 72. J. C. Scoggin, TLOT. 2:689, msl. 73. BDB, p. 466, s.v. kún; HALOT, 2:465, s.v. kún. HALOT traduz a forma verbal como “determi nar, estabelecer” em Provérbios 16.9.
tos e de alimentos, e aqui, mais explicitamente, para a preparação de seu sustento em tempos adversos (cp. Êx 16.5; Jó 38.41; Sl 78.20). O cereal traduz lehem, que em outras passagens significa “pão de cere ais” (Is 28.28), “pão” (Êx 29.23) e outros tipos de alimento (cp. Lv 3.11). No verão (baqqayis) se refere ao tempo da colheita, a única época em que a formiga pode juntar as provisões necessárias para a estação fria (30.25). A colheita referida é a de cereais, cuja época depende das condições climáticas de determinada região geográfica. No Vale do Jordão, a colheita da cevada tem início no começo de abril; na planície costeira, de oito a dez dias depois; e nas regiões montanho sas mais para o fim de abril. O trigo é colhido cerca de duas semanas depois. Ajunta ( ’ãgar) e armazena especificamente de que maneira ela providencia seu alimento {lehem), que se refere a todos os tipos de comida (e.g., em lCr 12.40[41] abrange farinha, bolos de figos, vinho, azeite, bois e ovelhas [cp. 9.5]). Deus provê o alimento (Sl 104.14,15; 136.25; 146.7; 147.9), mas a formiga o colhe com diligência, da manei ra certa e na época apropriada. Na colheita (baqqãsir - observe a assonância com qayis, seu paralelo também em 10.5), derivado de “cor te”, com “verão” indica toda a época de colheita (cp. Gn 8.22; Jr 8.20).74 De acordo com o calendário Gezer (ca. 900 a.C.), uma colheita não especificada de um mês (supostamente do trigo) vinha depois da co lheita da cevada, que também durava um mês. Assim, a colheita toda correspondia a um período de dois meses. A colheita da cevada come çava com a festa da Páscoa (no final de março) e o final da colheita do trigo era celebrado com a festa das Semanas/Pentecoste (final de maio).75 Em outras palavras, “Prepare o feno enquanto há sol”. (2) Condenação do preguiçoso (6.9-11)
A segunda seção (vs. 9-11) consiste de uma acusação contra o preguiçoso por insensatez indolente (v. 9), com uma terrível advertên cia (vs. 10, 11). A atividade prudente da formiga cria um contraste gritante com o sono inoportuno do ser humano insensato. 9 A pergunta acusadora Até quando? Çad-mãtay; veja 1.22) pres supõe que a colheita já está em andamento há algum tempo, e a menos que se tome uma atitude decisiva de imediato, o julgamento sobrevirá. 74. HALOT, 3 :1123, s.v. qã$ir. 75. O. Borow ski, in ABD, 1:97, s.v. “agriculture” .
A pergunta retórica admoesta o preguiçoso implicitamente a se arre pender de sua preguiça insensata, a se levantar rapidamente e a com pensar pelo tempo perdido antes que seja tarde demais. A pergunta, com o vocativo repetido, ó preguiçoso (veja 6.6), visa despertá-lo de sua letargia e, exigindo uma resposta, coloca a responsabilidade sobre seus ombros. O verbo Skb, traduzido com frequência ingenuamente como “deitar” adquire a nuança deftcarás deitado (tiskãb, com 'ad;76 cp. 3.24) e em paralelo com “sono” significa “ficar deitado dormindo”. Como no Salmo 68.13[14], é indicação de negligência e indolência. Quando [veja n. 14] te levantarás? é o oposto do verseto A. O verbo é frequentemente coordenado com um verbo ativo, designando então o começo da ação ou do movimento. Aqui a ideia completa é: “Quanto te levantarás do teu sono (veja 6.4) e trabalharás?” 10 O sábio passa do comportamento exterior, observado no pregui çoso (v. 9), para um discernimento mais profundo das conseqüências invisíveis do seu comportamento (v. 10). Essa advertência é constituída de uma prótase implícita que retrata a situação insensata (v. 10; cp. vs. 1, 2) e de uma apódose que mostra suas conseqüências terríveis. Os dois versículos estão ligados pela construção quiástica “sono” (vs. 9b, 10a); “ficarás deitado” (vs. 9a, 10b). Um pouco (me'af, veja 5.14) se refere a uma quantidade que não é numerosa, porém maior do que um, “pequena quantidade”. O termo pode imitar o preguiçoso: “Deixe-me dormir um pouco”. Em outras palavras, ele responde à pergunta espe cífica “Quando?”, com um vago “algum dia”, pois é incapaz de assumir e manter um compromisso firme. A pessoa diligente, entretanto, faz um plano e se compromete com sua execução (21.5). Sono, aqui, encon tra-se no plural (o que se repete somente no paralelo 24.33), “um pouco de sonos”, e se refere a algumas ocorrências inoportunas de sono (veja 20.13; 26.14). O sono é uma característica que define o preguiçoso (cp. 20.13); para ele, o amor ao sono é escapismo puro - uma recusa em encarar o mundo (26.14). Ao contrário do sono doce do trabalhador (4.16; Ec 5.12), o sono narcótico do preguiçoso cria mais desejo de dormir para escapar da dor de viver (19.15). Um pouco de descanso (cp. 6.4; também pl. Jó 33.15) se refere a alguns cochilos indolentes. A repetição tripla de “um pouco” enfatiza que a calamidade não sobre vêm em decorrência de muito tempo de trabalho perdido. Kidner co menta, “Ele não se compromete com uma recusa, mas engana a si
mesmo com a pequenez das suas rendições. Assim, centímetro por centímetro, minuto por minuto, suas oportunidades lhe escapam”.77 O tempo de trabalho é curto e todas as oportunidades devem ser aprovei tadas. Cruzar é encontrado somente aqui e na passagem paralela em 24.33, mas a forma verbal da qual o termo é derivado é bastante co mum (veja “abraçar”; 4.8; 5.20). Os braços (yãdayim; veja 1.24), não as palmas, se refere aos dois membros humanos que se estendem do cotovelo à ponta dos dedos que abraçam o corpo. O insensato cruza os braços em cima do peito num gesto que epitoma sua recusa insensata de trabalhar (Ec 4.5) para se deitar (liskãb) em sono narcótico (veja v. 10). Observe as mãos que traem o preguiçoso (cp. 10.4; 19.24; 21.25). 11 A tua pobreza (m ahsor) - expressão encontrada exclusiv mente no livro de Provérbios (10.15; 13.18; 24.34; 28.19; 30.8; 3 1 .7 )indica penúria, não apenas um estado de posses limitadas (cp. 25.21). Pelo menos 14 provérbios relacionam implícita ou explicitamente o ócio à pobreza, o fim amargo do preguiçoso (cp. 20.13; 24.33,34). A pessoa preguiçosa não é desprovida de riquezas, mas de alimento, uma neces sidade básica da vida (cp. 19.15; 20.13). Convém observar que os ad jetivos rãs e dal, “pobre” e 'ny, “oprimido” nunca são usados para des crever a pessoa preguiçosa, mesmo em seu estado final. Essas pala vras para “pobre” são usadas principalmente para aqueles que são po bres em virtude de circunstâncias além do seu controle. O S e n h o r se preocupa de maneira especial com esses indivíduos (19.17). A pessoa preguiçosa também experimenta um anseio que não é preenchido (13.4). De maneira irônica como Roberts observa, “Os preguiçosos geralmen te não são aqueles que têm poucos desejos. Antes, seus devaneios os conduzem a desejos exagerados, e estes, por sua vez, a uma falta de esperança de realização” (cp. 21.25, 26).78 O preguiçoso acaba se tor nando um mendigo (cp. 20.4) - não alguém digno de caridade. No texto hebraico, e... sobrevirá com referência à necessidade (veja 1.26), é a primeira palavra do versículo, ligando as conseqüências terríveis deste versículo à insensatez do versículo 10. Em Provérbios a pobreza, como falta de alimento, se deve à insensatez - preguiça, tirania, vileza, con versa despropositada, negligência, ou amor ao luxo (11.24b; 13.4a; 14.23b; 20.4; 21.5b, 17; 22.16; 28.22, 2 7 b )-n ã o a tragédias naturais como secas, doenças e pragas. Jó não dedica as calamidades à criação 77. Kidner, Proverbs, p. 42. 78. D. Phillip Roberts, "The Sluggard in Proverbs” (m onografia não publicada; OT 813, Westm insterTheological Seminary, 1994), p. 15.
das pessoas. Provérbios não trata da pobreza decorrente de tragédias naturais, como a escassez geral de alimentos, pois isso não serve a seus propósitos. No entanto, não comete a falácia lógica de reductio ad absurdum, o erro dos três “amigos” de Jó, de atribuir toda escassez à insensatez. A símile como um vagabundo (ou “um mendigo”, “um va dio”) personifica a pobreza como um viajante infame e inepto que va gueia sem qualquer meio de sustento como um parasita, mendigando tudo o que pode.79Além disso, conota as visitas imprevisíveis e o perigo de roubo, dando à pobreza do preguiçoso conotações sinistras que con denam seu estilo de vida.80O contexto e o paralelo sugerem um sentido pejorativo, mas os dados não permitem ir além da tradução de Albri ght.81 A pobreza personificada não tem lar, nem segurança, tampouco sustento, de modo que anda sem rumo na tentativa de roubar tais coisas sempre que podem ser encontradas. A tua escassez (umahsõi^kã) define “pobreza” como “falta”, supostamente a falta de alimento (con tra v. 8; cp. 12.9), uma situação de morte certa. Agora a personificação da pobreza é intensificada para como um homem armado (ke ’is mãgên). Ele também chega de modo inesperado para tomar à força não apenas de maneira furtiva, o que pertence a outrem. Aos conceitos de infiâmia, falta de lar e de alimento atribuídos à pobreza, essa nova símile acres centa a conotação de um ataque do qual a vítima não pode se defender. Ademais, a imagem deixa implícito que o saqueador defende a vida e os bens que carrega pela força e por roubo, de modo que a vítima não é capaz de reavê-los. O alvo mais fácil de um vagabundo ou bandido é o preguiçoso adormecido, ao qual falta tanto a vigilância quanto a dili gência para guardar sua riqueza. A julgar pelas referências freqüentes à possibilidade de ser destruído pela calamidade total, a pobreza era um perigo sempre presente. Whybray explica por que: “Naquela sociedade não havia qualquer controle tecnológico ou programas sociais mantidos pelo governo que servissem de rede de segurança contra a pobreza”.82 79. A forma significa, literalmente, “com o alguém que fala (sobre)” ; cp. Eclcsiastes 4.15, a única outra passagem com Piei ptep. de hlk. Em 24.34 a forma é Hilpael, “como aquele que anda de um lado para o outro” . A Vulg. traduz com o vialor, “ viajante” e cursor, “corredor”. A LXX parafraseia 6.11 com o “ viajante perverso” . A lbright, citando o acadiano m u talliku , traduz m ithallêk com o “errante” (W. F. Albright, “Som e Canaanite-Phocnician Sourccs o f Hcbrew W isdom”, in WIANE, p. 10). 80. BDB et al. concluem , precipitadam ente, que o significado é “um ladrão de estradas” (BD B, p. 235, s.v. hslak), e a N1V traduz com o “ bandido". 81. Veja tam bém HALOT, 1:247, s.v. hlk. 82. R. W hybray, Weahh and Povertv in lhe Book o f Proverbs (JSO TSup 99; Sheffield: JSOT, 1990), p. 31.
O assunto passa do preguiçoso indolente (vs. 6-11) para o revolucio nário nefando (vs. 12-19). Essa terceira estância sobre homens moral mente inferiores é provavelmente constituída de duas estrofes antes independentes: a menção de um revolucionário e seis ou sete compor tamentos repreensíveis de pessoas, que podem ser chamadas de agita doras (vs. 12-15), intensificada para uma lista de sete coisas que o S e n h o r abomina a respeito das mesmas (vs. 16-19). Apesar das duas estrofes originalmente independentes apresentarem sua própria integri dade, a lista expande a primeira estrofe, de modo que ambas devem ser consideradas em conjunto como uma estância. Apesar do encrenqueiro não ser citado nos versículos 16, 17, a lista de partes doentes do corpo, bem como das intrigas e atos antissociais se ajustam a ele “como uma luva”. Cada abominação, partes do corpo usadas indevidamente, não representa um indivíduo diferente antes funciona como uma sinédoque que manifesta a psique e o comportamento de um tipo de pessoa consi derada “revolucionária” no versículo 12; acima de tudo, apresentam suas atitudes e ações como sendo abomináveis ao S e n h o r . Não se trata de descrições de uma pessoa qualquer, mas sim de pessoas que mere cem o título de encrenqueiras e cujo comportamento o S e n h o r detesta. A ligação entre as duas estrofes é forjada pela listagem de partes doentes do corpo dos encrenqueiros: boca/língua mentirosa (vs. 12b, 17), olhos, e mãos/dedos (vs. 13,17), pés (vs. 13,18), e especialmente o coração que maquina o mal (6.14, 18). O elo final e indestrutível entre elas é constituído de suas conclusões climáticas e paralelas “ele desen cadeia contendas/conflitos”. O primeiro versículo da listagem identifica o S e n h o r implicitamente como o Agente (v. 16) do castigo predito no último versículo da primeira estância (v. 15). Em 16.27-30, algumas características de um revolucionário aqui observadas também são atri buídas a outros tipos. Nessa passagem, um revolucionário é marcado por tramar o mal e por ter um discurso inflamado (16.27; cp. 6.14a); uma pessoa perversa que desencadeia conflitos (cp. 16.14b); um calunia dor que separa amigos íntimos (16.28; cp. 6.19); uma pessoa violenta que usa gestos sedutores como o piscar do olho (16.29, 30; cp. 6.13). Pode-se concluir que “agitador” é um termo mais inclusivo que engloba o perverso, o caluniador e o violento. Essas descrições vividas do revolucionário visam formar os jovens
de Israel (veja 1.4, 5) de modo a se tomarem membros construtivos da comunidade, ao detalhar claramente as características abomináveis de um encrenqueiro e advertindo acerca de seu julgamento inevitável. Es ses sinais mortais são o produto final de se envolver, ainda que superfi cialmente, com o mal, de modo que é necessário manter-se afastado desses indivíduos tumultuadores. Um indivíduo dá os primeiros passos no caminho para se tomar um encrenqueiro e se encontrar sob a ira de Deus ao tentar ganhar dinheiro fácil, por exemplo, ao ser fiador ou evitar o trabalhar. (1) Sete marcas de um revolucionário (6.12-15)
Nos versículos 12-15 o revolucionário é mantido em primeiro plano em cada versículo pelo pronome catafórico “ele/seu”. Essa estância identifica o assunto como o encrenqueiro malévolo no versículo 12a, e depois caracteriza seu raciocínio diabólico e comportamento sinistro nos versículos 12bp-14, tomando tal pessoa merecedora do castigo re pentino e irremediável predito no versículo 15. A descrição de sete ca racterísticas de um encrenqueiro por meio de cinco particípios (vs. 12b14a), o último dos quais é modificado adicionalmente pela frase “perver sões encontram-se em seu coração”, e um verbo final (v. 14b) suplemen ta a descrição dos perversos em 2.12-15; como eles, o encrenqueiro é “mau”, “perverso” (2.12, 14; 6.15), e “torto” (2.15; 6.14) em suas pala vras e pensamentos. Essas descrições identificam os critérios pelos quais ele procede para alcançar seu alvo de subverter a ordem divina. 12 De vez em quando Provérbios define tipos de pessoa conceitu almente por meio de um nome ou declaração equivalente (veja 16.21 a; 21.24a; 24.8b, 9b).83Aqui um revolucionário (ou encrenqueiro; ’ãdãm beliya'al) é equiparado a uma “pessoa malévola”; em outras passagens seus paralelos são rãSã', “perverso” e sêfim “prevaricações” (cp. Sl 101.3).84Um beliya'al indica aquele que é implacavelmente perverso e que instiga contendas contra tudo o que é bom. O termo é usado para encrenqueiros de todos os tipos, revolucionários que se opõem a Deus e a seu povo piedoso (Dt 13.13; ISm 2.12; Na 1.11, 15[2.1]), a seu rei 83. De acordo com M einhold, Sprüche, p. 113. 84. Sua etimologia e incerta c controversa (veja B. Otzen, TDOT, 2:131-33, s.v. bPltyaal; N. J. Trom p, “The Hebrew Particle Bal", OTS 21 [1981] 277-81). Provavelm ente com bina beU (“sem ” ; cp. Jó 26.27) e ya'al (“ proveito, benefício”; cp. Jr 2.8). Um a derivação m itológica baseada em seu uso poético nos Salm osl8.5[6] e 4!.8[9] é m etodologicamente questionável.
ungido (ISm 10.27; 2Sm 20.1; 2Cr 13.7; cp. 2Sm 16.7), à justiça (1 Rs 21.10[=13]; Pv 19.28), à solidariedade da comunidade (Dt 15.9; ISm 30.22; SI 101.3), à propriedade social (Jz 19.22 [=20.13]; ISm 1.16), e até mesmo à própria vida (2Sm 22.5 = SI 18.5[6]; 41.8[9]). Seu dis curso provocador é citado em Deuteronômio 13.13[ 14] (Jz 19.22) e descrito como um fogo ardente (Pv 16.27). Ele é implacável (1 Sm 25.27; 2Sm 23.6). A doença de um belíyáal (“peste maligna” [NVI]; SI 41.8[9]) é terminal. Uma vez que a expressão é usada para uma grande varieda de de perversões, ela significa uma qualidade do caráter, não uma per versão específica. Na literatura judaica posterior e no Novo Testamen to esse “ser humano diabólico” se tomou uma designação explícita para o diabo, o comandante dos demônios (2Co 6.15).8S Essa conceituação do agitador malévolo, extraída de fontes externas a esse texto, se ajusta admiravelmente a essa caracterização que, sem dúvida, é sua descri ção mais extensa; ele encabeça a lista de indivíduos perigosos em 16.2730. O texto visa censurar esses comportamentos, uma vez que perten cem ao beliya'al\ seu objetivo não é descrever uma pessoa como sendo portadora de todos esses comportamentos censurados. ’Ãdãm (“ser humano”) é substituído agora por pessoa ( ’is\ veja p. 139), que designa um indivíduo. Bernhardt define a raiz de malévolo ( 'ãwen) como “po der usado em relação a uma comunidade ou indivíduo com intenção ou efeito negativo”. Também observa que indica (1) um conceito que en volve condenação e julgamento; (2) comportamento antissocial contrá rio à vontade de Deus; (3) abuso de poder; e (4) engano e mentira com a finalidade de magoar outros.86Esses conceitos correspondem inteira mente à definição de beliya'al. Os versículos 12bB-14 detalham os com portamentos perversos do encrenqueiro. “Quando alguém anda (hôlêk - o primeiro particípio - i.e., age e/ou empreende algo), segue certos critérios.87 Nesse caso, sua boca torta Çiqqe$üt peh veja 4.24) des creve metaforicamente seu discurso fraudulento (cp. 6.19), que distor ce a verdade sobre a qual uma sociedade reta e sadia é construída. 13 0 fato de ele deturpar a verdade conscientemente fica claro po seus gestos sinistros feitos pelas costas da vítima (vs. 12b, 13) e pela caracterização de seu coração (v. 14). Seus gestos sugerem que ele tem seguidores que concordam e conspiram com ele, e entendem sua 85. Fox, Proverbs 1-9, p. 220. 86. K . H. Bernhardt, TDOT, 1 :1 4 3 , s.v. H w n . 87. F. J. Heltmeyer. TDOT, 3 :3 9 1 . s.v. hBlakk.
linguagem não verbal (cp. 1.10-14; 16.30). Mowinckel acredita que esses gestos são “mágicos” ou que são sinais que “geram poder”. De fato, são poderosos e alcançam o seu fim malévolo, mas a ideia de magia é importada da religião pagã, não da verdadeira religião de Isra el. Bemhardt rejeita acertadamente a ideia de Mowinckel.88 Pisca... maliciosamente (qõrês, o segundo particípio) significa, essencialmen te, comprimir, contrair, apertar junto, “beliscar”, sendo usado para o barro (Jó 33.6) ou os lábios (= “franzir/fechar”; cp. Pv 16.30, onde está ligado a “fechar os olhos”) ou, como neste caso, para os olhos. No Qal, sempre com referência a partes do corpo, ele denota comportamentos insidiosos, maliciosos e antissociais. Delitzsch cita um provérbio árabe, “O Deus, perdoa o piscar culpável com o olho”.89 Em nossa língua, o “piscar”, de per si, pode indicar diversão ou brincadeira, sendo neces sário, portanto, acrescentar a qualificação “maliciosamente”; a tradu ção, “estreita os seus olhos” não sugere um gesto em nossa língua.90 Depois de mencionar a boca como o principal instrumento do agitador, seus olhos (be'ênãyw; lit. “com seu par de olhos”) são escolhidos como primeiro gesto não-verbal. O significado do hap. leg. arrasta (mõlêl, o terceiro particípio) é controvertido. KBL2empregou m il, “falar, profe rir” originalmente com um significado distinto quando modificado pela expressão “com seus pés” (também a LXX).91 BDB e, posteriormente, HALOT consideram com uma raiz, com base no hebraico pós-bíblico, que traduzem como “esfregar, raspar” (também Vulg., Sim., Áquila).92 Seus pés (beraglãyw, “seu par de pés”; veja 1.15), na parte inferior do corpo, pode ser um gesto escolhido para constituir um merisma com “olhos” na parte superior do corpo, de modo a incluir todos os gestos desonestos. E aponta (mõreh, o quarto particípio) é derivado deyrh (veja 1.8; 5.20). O verbo mostra que ele está passando instruções para um cúmplice. Depois do merisma, ele escolhe com os dedos (be ’esbe'õtãyw). “Por 88. Bemhardt, TDOT, 1:144, s.v. Hvert. 89. Delitzsch, Proverbs, p. 105. 90. Fox (Proverbs 1-9. p. 220) discorda dos tradutores gregos que pensaram que os gestos em 6.13 eram dicas ou sinais para outros “porque neste contexto não há cúmplices presentes c porque os outros movimentos não são sinais” . Ele sugere que “provavelmente são todos sintomas de um distúr bio de personalidade”. N o entanto, sua interpretação se desintegra em sua discussão sobre “apontar o seu dedo” , o terceiro elem ento da tríade. Ele interpreta o ato de apontar o dedo com o o infame envolvendo outros em conflitos - ou seja, um gesto, não um distúrbio dc personalidade. Apontar os dedos em 16.29 - observe que 16.30 menciona os m esmos m ovim entos encontrados aqui - e em Isaías 58.9 provavelm ente se refere tam bém a gestos, não a uma gesticulação nervosa. 91. HALOT, p. 532, s.v. mil. 92. BDB, p. 576, s.v. 11 mülal, HALOT, 2:594, s.v. IV mil.
meio de seus movimentos maliciosos e execráveis ele procura depreci ar outros e, desse modo, rebaixar seu status aos olhos dos seus compa nheiros. O encrenqueiro, por sua vez, se sente superior e tal satisfação do ego é seu desejo e objetivo supremo.”93 14 O abuso exterior dos membros do corpo permite que o sábio discemente penetre no coração oculto. Perversões (tahpukôt; veja 2.12) encontram-se em seu coração (belibbô; veja pp. 141-142); ele planeja (hõrêS - o quinto particípio - veja 3.29) o mal (rã'; veja 1.16). De modo quiástico, “ele planeja” combina com “seu coração”, e “mal” combina com “perversões”. Em todo tempo (bekol-'êt; veja 5.19), de acordo com a pontuação massorética, modifica “ele planeja”, não “ele desen cadeia” (ao contrário de várias versões), a sexta acusação. Como o povo no tempo de Noé, toda a imaginação do seu coração é continua mente má (Gn 6.5). Desencadeia (y6êallêah) traduz o verbo, que em geral indica colocar um objeto numa direção afastada do agente, e no Piei literalmente “soltar/libertar”.94 A palavra é usada para a ocasião em que as raposas em chamas são soltas nos milharais dos filisteus (Jz 15.5; cp. Gn 8.7; Is 32.20). Conflitos (m idyãnlm), apesar de ser deri vado do termo judicial “julgar” (diri), não é usado com sentido forense em Provérbios, e significa ingenuamente “conflito e discórdia amar gos”. Em Provérbios 15.18 o indivíduo irascível incita discórdia e dissensão. Por sua métrica nitidamente irregular, a pontuação massorética conduz a acusação à sua conclusão climática com esta sexta acusa ção. Constitui, significativamente, o elo com a seção seguinte, que ter mina com uma expansão da mesma declaração conclusiva (veja v. 19). 15 De acordo com o pensamento sapiencial típico referente à liga ção entre ato e destino (veja pp. 120-124), portanto Çal-kên, lit. “con sequentemente”) liga o destino do encrenqueiro a seus planos e atos que desafiam e subvertem a ordem reta do S e n h o r . A calamidade que causou recairá sobre ele (veja 'ãwen; v. 12): “Um tema particular da Literatura Sapiencial é o fato do castigo de Yahweh ser uma conse qüência inevitável para todos que cometeram ’ãven em qualquer as pecto (Jó 21.19; 31.3)”.95 Seguindo a lex talionis, ao subverter a or dem de Deus de maneira brusca, repentinamente (pit^õm; veja 3.25) 93. Plaut, Proverbs, p. 88. 94. Cp. M. Delcor e E. Jenni, TLOT, 3:1332, Slh; HALOT 4:1514-15, s.v. slh; IBHS, pp. 404-7, P. 24.3. 95. Bernhardt, TDOT, 1:144, s.v. Hven.
sua calamidade ( 'êdô; veja 1.27) virá como um redemoinho (yãèó; veja 1.27). O uso paralelo do advérbio “repentinamente” com um ad vérbio intensivo, num instante ( p e t a veja n. 24) e a colocação de ambos na cláusula inicial ressalta o caráter inesperado do julgamento. A metáfora será quebrantado (yiSSãbêr) compara implicitamente a calamidade que o encrenqueiro merece ao fato que ele será quebrado com violência e reduzido a fragmentos, como um navio que naufraga (cp. 1Rs 22.48[49]) ou como o pescoço sendo quebrado (1 Sm 4.18). A voz passiva divina fica explícita na próxima estância, indicando o Se n h o r como o agente por meio das ligações verbais entre os versículos 12-15 e 16-19. A destruição repentina provavelmente é um sinal da ira divina96e, de maneira indireta, coloca o encrenqueiro com os perversos (veja 3.25). E (we) intensifica o julgamento associando a seu caráter súbito o conceito de sem um remédio ( ’ên marpê; veja 3.8; 4.22). Ne nhum agente, nenhum instrumento, é capaz de remediar a calamidade inevitável quando esta sobrevêm, sendo esse o tema de 1.20-33 (esp. vs. 26-28). Seu fim é a morte eterna. (2 )
Catálogo das sete abominações ao
S e n h o r ( 6 .1 6 - 1 9 )
Esse catálogo numérico pode ser dividido em duas ou três partes: primeira, a introdução ao catálogo das coisas que o S e n h o r abomina (v. 16), e, em seguida, o catálogo das partes do corpo empregadas indevi damente (vs. 17, 18) e de duas ações antissociais (v. 19). Cada um causa a destruição de suas vítimas, mas recairão sobre o encrenqueiro e o destruirão. Juntos, os sete itens apresentam uma descrição concisa e vivida do encrenqueiro; nenhum tipo de pessoa se encaixa na descri ção. Plõger observa que, ocasionalmente, alguns dos vícios isolados nesta passagem são mencionados especificamente na coleção de pro vérbios na forma de um provérbio de abominação, de modo que temos um sumário: a perversidade do coração (11.20), os lábios falsos (12.19), os ataques malignos (15.26) e a arrogância (16.5).97 McKane observa que “os tipos de comportamento que são considerados têm em comum que todos são de tendência disruptiva e todos são caracterizados pela arrogância ou pela malícia ou pela violência, e que todos rompem o elo de confiança e lealdade entre um homem e outro”.98 96. Toy, Proverbs, p. 127. 97. Plõger, Sprüche, p. 65. 98. McKane, Proverbs, p. 326.
O catálogo gira em tomo do coração interior; ao redor desse cerne tem-se pares combinados que criam urna estrutura quiasmática: mãos com pés, e língua mentirosa com falso testemunho. “Olhos arrogantes” fica separado no início e “desencadeia” encontra-se em posição culmi nante no final. Ross contrasta esse catálogo às sete bem-aventuranças: a primeira bem-aventurança, “Bem-aventurados os humildes de espíri to” (Mt 5.3) contrasta com a primeira coisa odiada, os “olhos altivos” e a sétima, “Bem-aventurados os pacificadores” (Mt 5.9), contrasta com a sétima abominação (“desencadeia conflitos”; v. 19)." 16 São seis (SeS-hênnâ) abominações {tô'abat; veja 3.32) é o ob jeto do assunto, que o Senhor ( YHfVH) odeia (sãnê’; veja 1.22). Ao comentar sobre outras referências ao ódio de Deus, Giacumakis diz: “Em cada caso é expresso o caráter e/ou as atividades dos odiados; assim, Deus se opõe, se separa e traz conseqüências de sua abomina ção sobre os indivíduos não apenas como pessoas, mas como pessoas corrompidas”.100 Sim [são] sete (weSeba') intensifica a sua aversão (veja pp. 85-86). Uma vez que as sete características são detestáveis para ele (napsô\ veja p. 140), aquele que as possui será removido de sua presença benévola e entregue à perdição. A ligação com o versícu lo 15, ainda que não explícita, é clara (veja Mq 2.1-3). A iniqüidade é totalmente incompatível com o Santo (cp. 9.10). O som sibilante ressoa por todo o catálogo, especialmente neste versículo: SeS (“seis”), sãnê’ (“aborrece”), Seba' (“sete”) e napSô (“ele”). 17 Olhos arrogantes ('ênayim rãmôt; lit., “par de olhos que se levanta”) descreve o pomposo invasor assírio em Isaías 10.12-14, bem como o rei orgulhoso em Daniel 11.12. Esses olhos manifestam uma negação da autoridade do S e n h o r (Jó 21.22; 38.15; S I 101.5; Is 2.11 -17; 10.33) e uma desconsideração pelos direitos humanos. A arrogância é a exaltação de si mesmo sobre outras pessoas e transgride a honra fundamentalmente igual de cada indivíduo (cp. 8.13; 16.5; 29.23). O S e n h o r humilhará o orgulhoso que se coloca acima de outros e os trata de modo arrogante (30.13; S I 18.27[28]). Gemser acredita que essa característica é colocada logo no início do catálogo das abominações porque nenhum vício se opõe mais claramente à sabedoria e ao temor de Deus que o orgulho (Is 2.11 -17), e nenhuma virtude está mais próxi 99. Ross, Proverbs, p. 935. 100. Giacum akis, TWOT, 2:880, s.v. áãnê\
ma deles que a humildade e a modéstia (cp. 3.34; 15.33; 16.18; 22.4; Eclo 10.6-18).101 Meinhold acredita que esse item encabeça a lista por que ela se move do alto do corpo para baixo (veja v. 13a).102 Ambos estão certos. Mentirosa (Sãqer) se refere a “falsidade agressiva que visa prejudicar o outro, infidelidade, perfídia, mesmo quando resultante apenas de palavras”; kãzãb significa falsidade, incorreção.103 Seqer é usado para Judas (cp. Sl 109.2 e At 1.20). Lingua (le$ôn) é uma meto nímia comum do instrumento para a fala. E (we) liga a terceira abominação aos dois vícios anteriores como seu clímax inevitável. “O des prezo pelos outros e pela santidade de sua reputação está a apenas um passo do desprezo pela santidade da vida em si”.104 Mãos {yãdayim; veja 1.24) que derramam sangue inocente (Sõpekôt dãmriãqí) são ilus tradas vividamente em 1.11-14. “Derramar sangue” não é uma expres são neutra para “matar”; antes julga o ato; é um homicídio intencional e, portanto, apesar da exceção da compensação (Gn 9.6), um homicídio que envolve culpa.105 Esses assassinos são impelidos por sua ganância ávida (cp. Ez 22.27; 2Rs 21.16). Enquanto os piedosos usam os bens para ajudar os outros, os avarentos amam as coisas e usam as pessoas. 18 Mais uma vez encontramos no cerne da lista o coração (lêb\ veja pp. 141-142) - o centro que dá origem a toda a atividade física e espiritual da pessoa — que planeja (hõrêS; veja 6.14) projetos (mahsebôt) malévolas (awen; veja 6.12). O significado do substanti vo, “cálculos criativos”, depende em grande parte de sua raiz verbal (hãSab) que quer dizer essencialmente calcular, computar e também, planejar, conceber, inventar. Seybold observa que não é de surpreender que a raiz apareça com mais frequência nos aforismos sapienciais.106 Os pés (raglayim; veja 1.15) colocam a pessoa toda em movimento em direção ao mal que ela deseja realizar. Que se apressam a correr (memaharôt lãrüs) enfatiza seu zelo e interesse de seguir a compulsão interior para o mal o mais rápido possível (cp. 1.16a; Sl 147.15b; Is 59.7), não a rapidez na corrida. Todas as palavras encontradas neste versículo, inclusive para o mal (lãrã'â), apesar de não se encontrarem na forma feminina, e sim, masculina, também podem ser vistas em 1.16. 101. Gem ser, Sprüche, p. 3 1. 102. M einhold, Sprüche, p. 115. 103. M. A. Klopfenstein, TLOT, 3:1400, s.v. Seqer. 104. Plaut, Proverbs, p. 89. 105. HALOT, 4:1630, Spk. 106. K. Seybold, TDOT, 5:236-37, s.v. hssab.
Aliás, 1.11 -15 é uma ótima ilustração dessa quinta abominação. O ver seto “capta o tom de urgência envolvido no crime - nenhum passo é poupado, nenhum segundo é perdido, nada é deixado de fora na execu ção do plano”.107 19 A vivida descrição por meio das partes do corpo é deixada de lado, e os particípios substantivais (adjetivos verbais) são empregados para levar o catálogo das práticas abomináveis e antissociais do en crenqueiro a uma conclusão. Uma testemunha que mente [yapiah kezãbim) se refere a alguém que comunica conscientemente aquilo que é falso, contrário à verdade. “No alicerce da verdade, quer de acordo com a correspondência, coerência ou teoria relacionai da verdade, en contra-se o caráter de Deus. Ele não é um homem, pois um homem pode mentir.”108 Talvez por haver a possibilidade de a forma ser com preendida erroneamente (cp. n. 31), o apositivo aquele que perjura (lit. “uma testemunha enganosa”; cp. 21.28) foi acrescentado (cp. 19.5, 9; 12.17). Porém, o acréscimo deixa claro que a testemunha visa ame açar a vida e/ou a propriedade de alguém, não necessariamente defen der ou promover a si mesma (cp. Êx 20.16; Dt 19.18). Esse malfeitor sofre exatamente o mesmo castigo que ele pretendia impor a seu acu sado (Dt 17.7 e 19.18, 19), pois atrai sobre si a ira de Deus (Dt 29.1521 [14-20]). O sábio egípcio exige testemunho honesto e correto (Amenemope, caps. 19, 20.7-19). Em sétimo lugar, aquele que desencadeia conflitos (meSalêah medãnim; veja v. 14) mais uma vez conduz o catálogo à sua conclusão de modo climático. A definição mais restrita entre parentes ( ’ah) indi ca o pior tipo de profligação (cp. 3.27-32). 'Ah, pode indicar parentes de sangue, desde um puro irmão de sangue (Gn 25.26) ou um membro da mesma família (Gn 14.14) até um compatriota (Gn 31.32; 18.19). “Para a última forma de uso do termo é fundamental o conceito de que as tribos e a nação descendiam de um mesmo pai.”109 “Parentes” con trasta com “estranho” (nokri veja 2.16; 5.10; Dt 17.15; 23.19, 20[20, 21]), enfatizando agora os efeitos do comportamento disruptivo sobre relacionamentos bem mais íntimos. 107. Hubbard, Proverbs, p. 102. 108. Eugene Carpenter e M ichael Grisanti, NIDOTTE, 2:620, s.v. kzb. O reche líquido fluente ressoa por todo o verseto 18b: raglayim m emah°rôt lãrús lõrõ'â (cp. “corredores se apressando para correr rumo à corrupção/desastre” [“seus pés... para o m al”, v. 18b]). 109. H. Ringgren. TDOT, 1:190, s.v. 'aeh.
20 Guarda, meu filho, o mandamento de teu pai e não deixes o ensino de tua mãe. 21 Ata-os regularmente no teu coração, prende-os na tua garganta. 22 Quando caminhares, ela1 te guiará;2 quando te deitares, ela te guardará. Então acordarás, (e) ela falará contigo. 23 Porque o mandamento é uma lâmpada, e o ensino é uma luz e as correções3 da instrução são o caminho da vida; 24 para te guardarem da esposa do teu próximo ,4 e da doçura da língua da esposa infiel. 25 Não cobices sua formosura no teu coração, e não deixes que ela te capture com as pupilas dos seus olhos; 26 pois o preço de uma prostituta5 pode ser reduzido a6 um pedaço de pão, mas a esposa de um homem1 caça vida preciosa. 27 Pode um homem carregar* fogo em seu peito, 1. A Vulg. traz o pl. para corresponder cm núm ero ao v. 21. 2. A LXX apresenta “traga-a contigo”, tendo vocalizado o verbo com o Hifil com força volitiva. 3. A LXX, Targ. Vulg. e um ms. hebraico medieval trazem o sing. “correção” , e a LXX e algum as Targ. tam bém trazem “e instrução” , provavelm ente fazendo uma m etátese do vau pl. de tôkahôt para um conjuntivo com músSr. 4 . A LXX, seguida pela REB. parafraseia “homem casado”, tendo lido rêá (“próximo” ) como em 6.29, não rã' (“perverso” ) com o no TM . A. J. Baum gartncr (Eludes critiques sur I 'état du textedu Livre des Proverbs [Leipzig: W. Drugulin, 1890], p. 72) objeta que 'êset rêa (“esposa de outro homem ” ) tem um sufixo pronom inal em suas outras onze ocorrências (veja v. 29; cp. Êx 20.17; Lv 20.10; Dt 5.21; 22.24; Jr 5.8; Ez 1 8 .6 ,1 1, 15; 22.11; 33.26). No entanto, é provável que o cafe final original tenha sido rem ovido graças à sem elhança na escrita angular do cafe final com o mem no com eço de mhlqt, causando a pontuação do TM. Toy (Proverbs, p. 135, seguido por Fichtner [£//S]), corrige o texto para mê'issâ zãrâ, visando conform á-lo a 7.5 (veja tam bém 2.16) m as o faz sem justificativa crítico-textual. 5. Lit., o preço de uma m ulher, um a prostituta. Para esse padrão de aposição veja IBHS, p. 230, P. I2.3.b, ##7-9. 6. W (para) é elíptico e exige um verbo de m ovim ento com o “reduzido a” (IBHS, p. 224, P. 11.4.3c). 7. M einhold (Sprüche, p. 116, n. 20, 119) acredita que o term o 'athnãh com we 'SSet ‘is no TM permite a tradução: “pois, por um a prostituta e uma esposa de um homem (ele [o preço] vai) para um pedaço de pão, m as tu buscas a vida preciosa” . O ‘ô/e weyôred com k ik ka r lãhem do TM não permite essa interpretação. 8. Imperfeito de capacidade (IBHS, p. 507, P. 31.4c).
28 Ou pode um homem andar sobre brasas incandescentes, e seus pés não serem marcados? 29 Assim é com aquele que entra à esposa do seu próximo; todos que a tocarem não escaparão do castigo. 30 As pessoas não mostram desprezo por um ladrão se ele rouba para saciar seu apetite quando está com fom e;9 31 mas se ele é pego, deve reembolsar o sétuplo; ele entregará todos os bens de sua casa. 32 O adúltero10 é aquele a quem falta juízo; como aquele que arruina sua própria vida, ele assim o faz. 33 Ele encontrará açoites11 e vergonha, e a sua repreensão não será apagada. 34 Porque o ciúme [suscita]'2 a ira de um homem, e ele não mostrará compaixão quando executar vingança. 35 Ele não aceitará nenhuma indenização,13 e ele não cederá ainda queu aumentes o suborno. Esta estrutura final que adverte acerca do adultério com a esposa lasciva, como parte inicial (5.1 -23), desenvolve 2.16-19, acrescentando não cobiçar essa mulher (cp. Êx 20.17; Dt 5.21). A palestra consiste de uma introdução típica na segunda pessoa (6.20-24); a lição é dada na terceira pessoa (vs. 25-35), mas é concluída com a volta à segunda pessoa no versículo 35b, criando um inclusio ao redor da palestra. a. Introdução (6.20-24) A introdução consiste num quarteto que admoesta o filho a preser9. Alguns intérpretes leem a cláusula com o sendo interrogativa, “A s pessoas não despre zam ?” (Toy, Proverbs, p. 140; M einhold, Sprüche, p. 120; REB; cp. 5.16), m as a m aioria rejeita essa possibilidade (M. Gõrg, TDOT, 2:62, KJV, N A SB, NIV, NRSV). A o contrário do v. 27, este versículo não tem o indicador de interrogação. 10. Lit., “o adúltero com uma esposa” . 11. Um sing. coletivo com o o term o “praga” em nossa língua (IBHS, p. 113, R 7.2.1b). 12. Lit., “o ciúme inflama um hom em ”. G R. Driver (“Problems in the Hebrew Text o f Proverbs”, Bib 32 [ 1951 ] 177) corrige o texto plausivelmente para tãhêm gbr (“ inflama um hom em” ) no lugar de h^maí-gãber. 13. Fichtner (BHS) conjetura a redistribuição das consoantes da expressão do T M p n y kl-kpr para pnyk Ikpr (“ [ele não levantará] o teu rosto m ediante indenização” ; cp. N EB “Com pensação não com prará seu perdão” ). 14. Para este uso de ki veja IBHS, p. 695, P. 39.3.4e; BDB, p. 473, s.v. ki.
var o ensino dos pais (vs. 20,21) e de um quarteto que argumenta que o ensino guia e protege os fiéis (vs. 22,23). Mais especificamente, ele protege o indivíduo da “esposa lasciva” (v. 24). Essa elaboração forma a transição para o corpo principal. O jogo de palavras com o par de sinônimos nsr “guardar” (o ensino; v. 20) e (o ensino) Smr (te) “guar dará” (v. 24) estrutura a introdução (veja 2.8; 4.4, 6). (1) Destinatário e admoestação a estar atento (6.20, 21) Esse pedido de atenção para o ensino se assemelha a pedidos de atenção para a lei mosaica. Ambas devem estar atadas ao filho (cp. v. 21; Dt 6.6-9; 11.8, 18-20); ambas oferecem orientação constante (cp. v. 21; Dt 6.7; 11.19); e ambas são uma lâmpada e uma luz (veja SI 119.105). 20 Guarda (nesõr; veja 3.1), meu filho (ben i; veja 1.8), o manda mento (m iswat; veja 2.1 )d e teu pai ( 'ãbikã; veja 1.8). Aqui, “manda mento” está no singular (ao contrário de 2.1; 3.1), pois trata do manda mento específico contra a esposa lasciva, não do ensino dos pais de um modo geral. E não deixes o ensino de tua mãe repete 1,8b. 21 Ata-os (qoSrêm; veja 3.3) regularmente [ou sempre/repetida mente, tãmid; veja 5.19; cp. Is 57.13; Jr 52.3; SI 16.8] no teu coração Callibbekã; veja pp. 141-142). Em 3.3, o ato de “atar” ou “prender” retratou o filho usando-os como uma corrente de proteção e exaltação em tomo do pescoço (veja 1.9); aqui o retrata memorizando-os de tal maneira a ficarem permanentemente impressos em seu ser essencial, mental e espiritual, a fim de motivarem todas as suas ações. Prende-os Rondem) traduz um verbo encontrado apenas aqui e em Jó 31.36, em ambas as ocasiões em textos poéticos e no verseto B. Na tua gargan ta ('al-gargerõtekã; veja 1.9). (2) Motivação (6.22-24) O filho deve dar ouvidos ao ensino dos pais, pois ele o guiará como um pastor em meio às armadilhas perigosas da esposa lasciva volúvel. 22 Quando caminhares (behithallekekã, um hithpael durativo/iterativo) provavelmente significa “andar com, conversar intimamente”.15 O plural dá lugar ao singular feminino, ela, quer pelo fato de “manda mento” e “ensino” serem sinônimos para o mesmo referente extralin-
guístico, a saber, o ensino dos pais, como Plõger supõe, ou como Mei nhold e Toy acreditam, por se tratar da sabedoria.16 A personificação incipiente por meio de uma mudança silenciosa da expressão para a substância (veja 1.2) é apropriada, pois o texto pede que o filho faça dela, não da tentadora, a sua companheira (veja 1.8-9.18). Te guiará (tanheh), de acordo com Jenni, tem origem na vida do pastor de ove lhas.17 Esse é um verbo favorito do salmista nas metáforas que envol vem um pastor (cp. Sl 23.1; 77.20[21]) e usado com frequência em situações que envolvem conduzir alguém em meio a armadilhas de modo seguro e triunfal para um destino desejado e prometido (Êx 15.13; 32.34; Dt 32.12; Sl 5.8[9]; 23.3; 78.14, 53). Convém contrastara caminhada protegida do filho sábio com os passos do jovem ingênuo em 7.6ss. A acentuação massorética liga quando te deitares (beSokbekã ; veja 3.24) a “quando caminhares” de modo a formar um merisma que indica pro teção constante (cp. Dt 6.7; Sl 139.2). Mais uma vez, vê-se um jogo de palavras com os sinônimos nãsar (“guardar/preservar” o mandamento do pai; v. 20) e ela te guardará (ou “te vigiará”, tiêmõr; veja 2.8, 11; 3.21, 26; 4.6). O mandamento protege aquele que o obedece pois os perigos atrelados à desobediência são evitados (2.11, 12), e o S e n h o r sustenta a ligação justa de ato-consequência abençoada (2.7-8). Então acordarás (wahaqisôtü) indica proteção durante a noite cheia de peri gos (veja 3.24) e conota buscar e ouvir o ensino pela manhã, antes de começar o trabalho e outras relações sociais. Falará (tPéihekã) signifi ca “discurso entusiasmado, proferido em alta voz e repleto de emoção”.18 Ela é ainda mais audível que a consciência. Em resumo, os três versetos personificam a sabedoria, que foi internalizada como um superego, um líder, um protetor e um conselheiro (cp. Dt 11.18-20).19 23 Porque (ki) introduz a explicação do motivo pelo qual o man damento (miswâ) do pai e o ensino (tôrâ) da mãe (veja v. 20) guiará, protegerá e instruirá. Eles são sua fonte de luz. Os versículos pressu põem que, ao caminhar (v. 22b), ele prossegue sua jornada em comu nhão com a sabedoria (v. 22a). Lâmpada (riêr) e luz ( ’ôr) são metáfo16. Plõger, Sprüche, p. 69; M einhold, Sprüche, p. 117; Toy, Proverbs, p. 134. 17. Jenni, TLOT, 2:730, s.v. nhh. 18. HALOT, 3:1320, s.v. étah. Veja H.-P. Müller, “Die Hebrãische W ur/el étah", VT 19(1969) 361-71. 19. Greenstone ( Proverbs, p. 69) observa que os rabinos interpretam “quando cam inhares” com o um a referência à vida neste mundo, “quando te deitares” com o o dia da m orte e “acordarás” com a vida depois da m orte (Sofah 21a e Rashi).
ras para a orientação e a proteção nesse caminho (veja 4.18), em ou tras palavras, a forma como iluminam o certo e o errado e as conseqüên cias benéficas e prejudiciais de cada um (cp. Jó 18.6; 29.3; Pv 13.9). O mesmo caráter e valor atribuídos à Palavra de Deus no Salmo 119.105 são conferidos às palavras dos pais (cp. 2.6). Cohen observa que a assonância em tôrâ “ensino” e 'ôr “luz” é combinada na Vulg. por lex e lux.20 Aqui o ensino dos pais lança luz sobre a sedutora, cuja boca é uma “cova profunda” (22.14; cp. 23.27). Ao “mandamento” e ao “ensi no” são acrescentadas agora as correções (tôkehôt\ veja 1.23) da ins trução (m üsãr; 1.2). A julgar pelo paralelismo dessas duas palavras em 3.11 e 5.12, “repreensões” especifica a “instrução” determinando o que é certo. O plural sugere que vários pecados são corrigidos por essa instrução. Essas repreensões são o caminho da vida (derek hayyim; veja 5.6). Em resumo, o ensino dos pais ilumina o caminho que o Se n h o r vigia, o caminho da vida plena e abundante, o caminho no qual o filho será protegido das ciladas ocultas. 24 Mais especificamente, ele necessita ser protegido da espos infiel lisonjeira. O versículo 24 constitui um janus entre a introdução e a lição. Para te guardarem (lismoi^kã; veja 22ap) forma a estrutura ao redor da introdução (veja 6.20). Da esposa do teu próximo (mê eSet rê'ek5 veja n. 4) introduz a sedutora perigosa capaz de arruinar o filho. Sua doçura (helqat; veja 2.16) será ilustrada de maneira dramática na palestra seguinte (7.13-21). Do ponto de vista daquele que é tentado, as palavras da mulher são fluentes e lúbricas; do ponto de vista do pai, são enganosas e traiçoeiras. A ligação verbal mostra que as três passagens tratam de uma mulher caracterizada pela lisonja enganosa. Sua identifi cação como infiel (nokrlyâ\ veja pp. 178, 179; 2.16) confirma que cada uma das quatro passagens a seu respeito lança mais luz sobre o mesmo tipo de sedutora. Enquanto 2.16 e 7.5 mencionam suas “palavras” de maneira não figurada, 5.3 e 6.24 usam as metonímias do “paladar” e da língua (lãsôn), respectivamente. Sua língua ameaça rasgar o tecido do lar piedoso na junção onde as gerações são costuradas uma à outra. b. Lição (6.25-35a) A lição consiste de uma admoestação para não desejar a esposa lasciva (v. 25), corroborada por uma sucessão de argumentos de apoio
caracterizados por kl, “pois/porque” (vs. 26, 34). O filho não deve de sejá-la ardentemente pois o preço do adultério é severo, inevitável e interminável (vs. 26-31) e porque o marido traído, ardendo de ciúmes, não aceitará nenhuma indenização pelo mal que lhe foi feito senão a destruição total do adúltero (vs. 32-35). O primeiro argumento é cons tituído de comparações e contrastes. A severidade do castigo é estabe lecida pelo preço contrastante da prostituta - uma refeição - como o da adúltera - a própria vida da pessoa (v. 26). Seu caráter inevitável é ilustrado pela comparação do adultério com o brincar com fogo (vs. 2729). Sua duração interminável é determinada pelo contraste do adulté rio com o roubo: um ladrão pode indenizar a pessoa a quem ele prejudi cou, o adúltero não (vs. 30-33). Os versículos 32, 33 também servem de janus entre a primeira e a segunda parte do argumento, reunindo e tomando mais específicas as severas penalidades do adultério, a saber, a destruição total (v. 32b), definida como ferimentos físicos, o opróbrio social (v. 33a), e o vexame interminável (v. 33b). Os versículos 29 e 33 fazem menção a ng' (“tocar”). No versículo 29 se refere ao toque prazeroso estendido a uma mulher; no versículo 33 aos açoites doloro sos que acertam o adúltero. Essa inversão dinâmica ressalta a inversão do prazer para a dor, o preço que o adúltero pagará. (1) Admoestação (6.25) A questão central da palestra é curta e direta. “Não deixes que ela te capture com os olhos”, de modo a ser tentado a cobiçar sua beleza. A admoestação pressupõe que, uma vez suscitado, o desejo maligno do filho o arrastará para o pecado e para a morte (Tg 1.13-15). Não cobi ces ( ’al-tahmõd\ veja Ex 20.17; Dt 5.21), ou suspires (veja 1.22) é explicado como um desejo induzido por sua formosura (yãpyãh). A associação freqüente da raizyph com tõ ’ar (“forma”) e mar'eh (“apa rência”) mostra que se trata da beleza exterior. A beleza representa o ideal bíblico feminino somente quando é acompanhada de prudência ou do temor de Deus (5.18-20; 11.22; 31.30; cp. 1Sm 25.3). A cobiça se dá no teu coração (bilebãbekã; veja pp. 141-142; cp. Mt 5.27, 28). A ordem pressupõe que as pessoas podem governar seus corações (Pv 4.23) atando ao mesmo o ensino dos pais (6.21). Paulo sabia, por expe riência própria, que o indivíduo precisa do poder do Espírito Santo para resistir à tentação, não apenas da volição humana (Rm 7.7-8.17). O paralelismo entre “não cobices sua formosura” e “não deixes que ela te
capture com os olhos” sugere que a cobiça começa pelo permitir o contato visual. O desejo entra em seu coração através do estímulo vi sual suscitado por “sua formosura” e, mais especificamente, pelas “pu pilas dos seus olhos”, seguido das suas palavras doces. E não deixes que ela te capture (we 'al-tikkãhakã ; lit. “tomar”; veja 1.3) muda a perspectiva do papel do homem no verseto A para o papel da mulher de conseguir possuí-lo e controlá-lo. Ela desperta seu desejo por ela com as pupilas dos seus olhos (be>aprappeyhã; 4.25). Provavelmente devese supor que ela usava maquiagem nos olhos, uma mistura de substância queimada negra ou de antimônio triturado, para ressaltar sua beleza (cp. 2Rs 9.30; Jr 4.30). Arqueólogos descobriram caixas, tigelas e colheres de cosméticos. “A prostituição de uma esposa se mostra em seus olhos sen suais, e ela é conhecida por suas pálpebras” (Eclo 26.9). Assim, o filho deve estar de guarda contra seus meios verbais e não verbais de sedu ção. O pecado começa pelo desejo e pela imaginação (vejaTg 1.14-16). (2) Primeiro argumento: o castigo severo, inevitável e interminável do adultério (6.26-33) Pois (ki) introduz o primeiro argumento, começando com o alto preço do adultério (i.e., a severidade do seu castigo). Ao contrário da prostituta, que pode ser possuída em troca de uma refeição, a lasciva lhe custará sua vida. A interpretação do versículo 26a é difícil. Literal mente, o TM oferece duas locuções preposicionais, “a favor de uma prostituta por um pedaço de pão”. Todos os estudiosos transformam essas duas frases numa cláusula. A KJV, NASB e N1V inserem um sujeito sem justificação gramatical, traduzindo como “por causa de uma prostituta um indivíduo/um homem/tu é/és reduzido a um pedaço de pão” (= “uma prostituta te reduz” NIV). De acordo com essa interpre tação, o versículo 26a apresenta o homem como sendo passivo (ele é reduzido a um pedaço de pão) - enquanto que o versículo 26b apresen ta a mulher como sendo ativa ao sair à caça de vida preciosa. Essa interpretação equipara a esposa lasciva a uma prostituta. Meinhold de fende essa equiparação, pois em 7.10-13 a lasciva se comporta como uma prostituta. No entanto, o fato de ela se comportar como tal não significa que ela o seja. Tamar apenas se disfarçou de prostituta (Gn 38.13-19). G. R. Driver, seguido de HALOT,1' REB e NRSV, oferece
uma solução melhor ao interpretar be'ad como um substantivo único que significa “mudança, troca,preço”?2mas Fox obtém a melhor solu ção ao interpretar be‘ad como “em troca de” (Jó 2.4).23 As versões antigas buscaram uma solução semelhante, traduzindo be'ad como “va lor” (LXX), pretium (Vulg.). Essa interpretação contrasta o preço de uma prostituta (zônâ), que oferece sexo em troca de pagamento,24 com o preço dessa adúltera. (As prostitutas estrangeiras eram aceitas tacitamente no Antigo Testamento como parte de um cenário vulgar.) Plõger argumenta que a prostituta é claramente distinguida da mulher casada no sentido de que a primeira se contenta com um pagamento relativamente baixo, “um pedaço de pão”, enquanto que a última sai à caça da “coisa” mais preciosa de todas, a vida.25 A proposta de Fox de que ‘ad significa “até” (cp. Et 5.6), “como se ela pudesse custar ainda menos”, não é tão convincente. O mais provável é que pressuponha o verbo reduzido 'ad (i.e., tanto quanto) um pedaço de pão.26 Meinhold objeta que, tendo em vista o cabrito que Tamar exigiu e a estipulação legal em Deuteronômio 23.18(19), a um pedaço de pão, ou um pão redondo (veja 9.5)27 seria um preço baixo demais. No entanto, pode-se supor que o preço variava; uma prostituta mais barata podia ser obtida em troca de uma refeição. Na verdade, a esposa infiel (2.16-19; 5; 7) não exige pagamento algum; ela parece abastada (veja 7.14-20). Com respeito à moralidade do argumento do sábio, Toy diz: “Caso essa ideia seja adotada, o versículo não aceita a relação com meretrizes..., mas ingenuamente enfatiza o caráter mais nocivo de outra classe de mulhe res lascivas (cp. o contraste entre o ladrão e os adúlteros, vs. 30-32)”. O primeiro argumento do pai, de que o adultério custa mais caro que a prostituição, não endossa mais a ideia de sexo por dinheiro que seu terceiro argumento (de que praticar adultério é mais insensato que rou bar) não endossa o roubo. O Novo Testamento adverte com sobrieda de que os indivíduos que se envolvem com a prostituição participarão da ira de Deus, não de sua vida (1 Co 6.13-20; G1 5.19-21; Ef 5.5; lTs 4.1 -8). Porém o adultério é pior pois envolve a quebra do voto matrimo nial (veja 2.17), danos ao cônjuge, a destruição do lar e, como é argu22. G R. Driver, “ Problems and Solutions” , V T4 (1954) 244. 23. Fox, Proverbs 1-9, p. 232. 24. G Hall, NIDOTTE , 1:1123, s.v. znh. 25. Plõger, Sprüche, p. 69. 26. Fox, Proverbs 1-9, p. 632. 27. HALOT, 2:473, s.v. kikkar.
mentado aqui, uma dívida que foge ao controle. Mas a esposa de um homem (weêSet ‘is ) é qualificada tanto pelo predicado quanto pelo con texto como a esposa lasciva. Caça (tãsüd) é uma metáfora incompleta do uso da sua voz e dos seus olhos para caçar a sua presa (v. 25). Vida preciosa (nepeS yPqãrâ; veja 1.18, 19) se refere a toda vida, inclusive a do adúltero. Suas presas são os jovens vigorosos (cp. 7.11, 12). A metáfora será definida no versículo 33 (cp. Ez 13.18, 20). Essa raposa sabe muito bem o que quer, enquanto que sua vítima incauta, quando não comprometida com a sabedoria, é uma presa fácil.28 27-29 A argumentação muda agora da severidade do castigo para seu caráter inevitável. Duas ilustrações com fogo (vs. 27,28) mostram a ligação inescapável entre ato e conseqüência na esfera moral (v. 29), mas o contato indireto do fogo com a roupa (v. 27) é intensificado para o contato direto do fogo com os pés. Os versículos 27 e 28 são ligados por vários elementos. Ambos são perguntas opostas. Em ambos, seus versetos A são cláusulas condicionais que descrevem atos da pessoa insensata ('is) e seus versetos B são cláusulas principais que retratam as conseqüências terríveis e inevitáveis. Por fim, a argumentação ressalta que o adultério é como brincar com fogo. Na verdade, 'S em suas várias formas - 'êSet 'is (“esposa de um homem”; v. 26 ),'ís eS (“homem”, “fogo”; v. 27), e ’ís (v. 28) 'êSet (v. 29) - é a palavra-chave desta seção. 27 A pergunta oposta pode (ha), com base na experiência, não sendo um caso de gramática ambígua, exige uma resposta negativa. “Claro que não.” Ao fazer perguntas, o pai visa envolver o filho numa participação atenciosa (veja 1.22). Um homem ( 'is ) pode designar qual quer pessoa (veja 5.21), mas neste contexto é provável que se trate de alguém do sexo masculino (cp. geber no v. 34). Carregar ou levar (yahteh) pode ser um termo técnico, como no hebraico posterior (séculos 6 a 4 a.C.), no aramaico e no hebraico moderno, “apanhar, pegar (brasas de fogo)” (cp. 25.22).29 Fogo ( eá) deve ser carregado com cuidado num 28. D. W inton T hom as (“Som e Passages in the Book o f P roverbs", in WIANE, pp. 28384) liga “caçar" com o term o árabe relacionado usado para uma m ulher “que pega, captura, enlaça, algo do seu m arido” (cp. Ec 7.26; Eclo 9.3). Além disso, em vez de “vida preciosa” , ele interpreta nps com o significado “um a pessoa de peso” (i.e., um a pessoa de recursos que pode m antê-la co n fo rtáv el). Em term os filo ló g ico s, sua interp retação é p o ssível, porém nâo plausível. O significado norm al de “destruir a vida” é um paralelo apropriado para as outras advertências acerca da m ulher estranha que destrói seus am antes israelitas para que seus co m p an h eiro s estran g eiro s se refestelem (2.18, 19; 5.8-14, 22, 23; 6 .32-35; 7.12b, 21, 22) e con stitu i aptam ente a transição para o argum ento principal (6.27-35). 29. M. Dahood, “Two Pauline Quotations from the Old Testam ent”, CBQ 17 (1955)22.
fogareiro (Êx 27.3; Lv 10.1) ou num pedaço de cerâmica (cp. 25.22; Is 30.14), não em seu peito (behêqô\ veja 5.20), na parte exterior do corpo logo abaixo do peito. Suas vestes (begãdãyw) pode ser uma referência a qualquer peça de roupa que uma pessoa vista.30 Sem que... sejam quei madas é uma metáfora incompleta para o dano permanente, doloroso e potencialmente fatal resultante do comportamento insensato. 28 Ou pode um homem ('im -... 'is) liga o versículo 27 ao versícu lo 28; andar sobre (j6hallèk) transmite a mesma ideia que em 6.11. A LXX traduz o plural brasas incandescentes (haggehãlim) como “bra sas de fogo” (cp. 25.22) e em 26.21 como “brasas”. Refere-se ao carvão usado para fundir o cobre (Ez 24.11) e para cozer e assar ali mento (Is 44.19).31 E seus pés (weraglãyw) talvez trouxesse também à mente a ideia do órgão sexual (veja 5.5). Todo aquele que toca essa mulher “quente” queima muito mais que a ponta dos dedos. Sem que... sejam crestados (tikkãweynã) traduz o verbo raro kãwâ, encontrado além desta passagem somente em Isaías 43,2.32 2 9 Assim (kên) introduz a moral a ser extraída dessas duas ilustra ções. Aquele que entra à (habbã' ’el) é uma metonímia poderosa para o envolvimento sexual com uma mulher (veja 2.19). Essa é a realidade literal por trás da ideia de tocar em brasas ardentes (vs. 27a, 28a). Esposa do seu próximo ( 'êSet reêhú\ veja 3.28; 6.1) mostra claramente que se trata de adultério, não apenas de prostituição. A figura dá lugar à designação “adúltero” no versículo 32. O próximo é mencionado aqui, pois é ele quem toma o castigo inevitável. Todos (kol\ i.e., “a totalidade, tudo, o todo”)33 intensifica o particípio paralelo, “aquele que entra à”, e leva o argumento à sua conclusão (veja 3.15). Que a tocarem (hannõgêa') significa, basicamente, “tocar (com as mãos)”, outra metonímia para a relação sexual com ela (veja Gn 20.6; cp. ICo 7.1). Não escaparão ao castigo (ou serão inocentes, lõ’ yinnãqeh) é a realidade literal por trás das duas imagens anteriores, “sem que... sejam queimados/crestados” (vs. 27b, 28b) e resume o argumento de que o castigo é inevitável. Os versículos 30-35 esclarecem a forma de castigo. 30. Cp. “vestidos” Gênesis 24.53; “vestes de viuvez” Gênesis 38.14; “vestes sagradas” Êxodo 28.2; “trapo da imundícia” Isaias 64.6[5]. Podem ser tingidos (Is 63.1), trançados (Ez 26.16), rasga dos (Gn 37.29), lavados (Lv 11.25), comidos por traças (Jó 13.28), ou queimados (Lv 13.52). 31. H. F. Fuhs, TDOT, 2:462, s.v. g h l. Isaias 6.6 usa rispâ, que pode se referir a uma pedra quente. 32. Seu derivativo em Êxodo 21.25 provavelmente significa “marca feita com ferro quente”, suge rindo o sentido mais especificado atestado no árabe, “marcar com ferro quente”, “queimar”, ou “chamuscar" (Delitzsch, Proverbs, p. 153).
30-33 A argumentação muda agora para a duração interminável da dor do adúltero, contrastando o estigma social temporário de um ladrão, que transgride a lei para satisfazer a fome de alimento (napsô; v. 30b; vs. 30,31) com o do adúltero que transgride a lei para satisfazer seu apetite sexual (napsô; v. 32b; vs. 32, 33). Uma vez que há uma medida de justificação no primeiro caso, mas nenhuma no segundo, a comunidade não considera o ladrão com desprezo, ao contrário da sua reação para com o adúltero. Também, o primeiro pode designar por seu crime, enquanto que o segundo não. Em resumo, o adúltero é descuida do, é desajuizado e provoca a própria destruição (v. 32). 30 O versículo é constituído de uma cláusula principal, as pessoas não mostram desprezo p o r (lõ '-yã b â zü ; veja 1.7) um ladrão (laggannãb) e de uma cláusula condicional, “quando está com fome”. Até mesmo o piedoso Agur pressupõe que, se ele se tomar pobre, tam bém roubará (30.9). A Targ. é enfática: “Não convém se admirar com o ladrão que rouba para que seu apetite seja satisfeito porque ele está faminto”.34 Se (ki; veja 4.8) ele rouba (yignôb) se refere a roubar bens (furtar), não pessoas (raptar) furtivamente e de modo fraudulento, não por força.35 Apesar do roubo ser um ato criminoso em qualquer cir cunstância (Êx 20.14; Dt 5.18; Pv 30.8,9), as atitudes das pessoas para com esse ato são um tanto abrandadas pelas circunstâncias que leva ram a ele. Para saciar (lemallê’) tem o sentido essencial de “encher”, mas adquire um sentido especial com seu apetite (napsô; veja p. 140, 141). A intenção aqui não é fazer uma comparação entre roubar prazeres sexuais e alimento (cp. 9.17b; 30.20), pois os dois pecados estão sendo contrastados.36 Quando está com fome (yir'ãb) se refere à fome desesperadora, a estar morto de fome, como durante uma escassez geral de alimentos (cp. Gn 41.55; Is 8.21; 9.20[ 19]). Ele não precisa ser pobre, pois quando há uma falta generalizada de alimentos até uma pessoa rica passa fome. 31 Não obstante, apesar de um ladrão faminto não ser desprezado por roubar, todo ladrão condenado deve ser castigado. Mas se ele é pego (wenimsã') significa essencialmente encontrar algo, mas aqui como 34. A história egípcia do “Camponês Eloqüente” mostra uma leniência semelhante para com um ladrão: “O roubo efetuado pelo ladrão é um delito dc alguém que é pobre. Não se pode repreendê-lo; ele apenas busca algo para si. Mas tu és farto com teu pão, embriagado com tua cerveja, rico dc todo o tipo de [tesouro]” (AEL, 1:174). 35. Domeris. NIDOTTE, 1:879, s.v.gnb.
na lei, adquire a conotação mais técnica de apanhar um criminoso (Êx 22.2,7,8[ 1,6,7]; Dt 22.22,28; Jr 2.26; 48.27). No Livro da Aliança, ele deve reembolsar (y6Sallêm) é um termo legal: “pagar”, “acertar as contas”, “cumprir”, “ressarcir”, “compensar”;37 sendo que a reparação pelos danos varia de acordo com as circunstâncias, indo desde o dobro até o quíntuplo (Êx 22.7,9[6, 8]; 22.1 [21.37]; cp. Lc 19.8), mas nunca o séíuplo (Sib'ãtãyim). Normalmente, o ladrão devia reembolsar o do bro, pois além de exigir que ele devolvesse a propriedade roubada, a justiça requeria que ele próprio fosse defraudado da quantia que ele pretendia ter roubado da sua vítima. “Sete vezes” é uma figura para reparação absoluta (cp. Gn4.15; Lv 26.28; cp. Mt 18.21,22), cobrindo todas as indenizações exigidas pela lei; é provável que não reflita um castigo mais severo que o determinado pelo Livro da Aliança.38 O ver seto paralelo corrobora essa interpretação. Todos [’et-kol; veja v. 29] os bens [hôn; veja 3.9] de sua casa [bêtô\ veja 3.33] entregará (yittên; veja 1.4), um sinônimo de “reembolsará”. Essa expressão convencio nal para perder tudo (Ct 8.7) implica que ele perde seus campos, seu meio de sustento e, desse modo, sua liberdade, para se tomar um es cravo (veja Êx 22.3b[2b]; Mq 2.2). 32 A argumentação chega a um ponto climático e se volta para os castigos do adúltero (nõ^p), daquele que tem relações sexuais com a esposa ou a noiva de outro homem (cp. Êx 20.14; Dt 5.18). A lei distingue essa prática da poligamia (Êx 21.10), da fomicação (Êx 22.16[ 15], 17[ 16]) e da prostituição (Lv 21.9). É possível que a expressão aparentemente tautológica, com uma mulher ÇiêSâ) tenha sido acrescentada para evitar interpretações errôneas (veja Lv 20.10). De qualquer modo, ele é levia no, a quemfalta juízo ( haSar lêb', veja p. 140,141) . O paralelo quiástico interno, e como aquele que arruina sua própria vida (mashtt napSô', veja v. 30), esclarece e intensifica a falta de julgamento sadio, colocando em seu lugar uma metonímia de efeito. Sãhat indica devastação ou ruína total e é usado para uma grande variedade de objetos (veja 11.9; 25.26). A forma como ele arruina a própria vida será descrita no versículo 33.0 pronome enfático ele (hü’) é qualificado como um sinônimo de “adúlte 37. Em Êxodo 21-22 este verbo é encontrado em 14 frases de cunho legal e de conteúdo semelhante. Também aparece, como neste caso, nos textos legais da Babilônia e da Assíria, SalSmu é encontrado em questões legais como um termo criado para esse fim e tem o mesmo sentido que no Livro da Aliança. Diante desse uso claro e certo, não há necessidade dc mais investigações acerca de seu significado essencial. 38. Pace Gemser, Sprüche, p. 33.
ro” que assim ofaz (ya'asennâ, i.e., comete adultério; veja 2.14). A raposa sai à caça da sua vida, mas ele é responsável por sua autodestruição. 33 Ele encontrará (yimsã’\ veja 3.13) é a mesma raiz traduzid como “pegar” no versículo 31. Enquanto o ladrão experimenta a falên cia financeira, o adúltero também sofre a ruína física e social (veja 5.9, 10). Açoites {nega') se refere ao ataque violento que provoca dor em seu recipiente; ele pode ser infligido por outros seres humanos (Dt 17.8; 21.5; 2Sm 7.14), por Deus (cp. Êx 11.2), ou por enfermidades (várias vezes em Levítico 13-14). Nos dois últimos casos é, por vezes, tradu zido como “peste/praga”. Vergonha (ou opróbrio, qãlôn; veja 3.35) ex clui qualquer possibilidade de ser honrado como mártir. Os “açoites” e a “vergonha” são tidos como uma hendíadis (i.e., “açoites que causam vergonha”). Talvez se trate de um tribunal pagão ou de um açoitamento em público. Se ele tivesse cometido adultério com uma verdadeira filha de Israel, não com uma mulher estrangeira, teria sido aplicada a pena de morte (veja 5.14; cp. Lv 20.10; Dt 22.22; Ez 23.45-47). Entretanto, a prostituição e o casamento com estrangeiros não eram crimes capi tais, apesar de serem proibidos (cp. Gn 38.15; Lv 19.29; 21.7, 9; Dt 23.17, 18[18, 19]; Ed 9.1; Ne 13.23-27). No tempo de Jesus, a mulher pega em adultério não foi morta, pois todos eram culpados (Jo 8.3-11). Os açoites vergonhosos são comparados ao fogo nos versículos 27,28. Provérbios 18.3 diz que, com a “ignomínia” vem a “vergonha”; aqui, também, a “vergonha” no verseto A é intensificada e expandida no verseto B para e a sua repreensão (herpâ). Herpâ se refere à desgra ça indelével que a sociedade coloca sobre aquele que tentou desinte grar seus alicerces e sua coerência social; ela o castiga desse modo para denegrir sua importância, dignidade e possível influência. Seu des prezo não será apagado (lo'-timmãheh). Mãhâ significa “limpar” e é usado com referência a um prato, à boca ou a lágrimas do rosto (2Rs 3.13; Pv 30.20; Is 25.8). Tem, com frequência, o sentido mais específi co de “apagar” ou “obliterar” algo escrito ou uma lembrança de algum tipo (Ex 32.32; Nm 5.23; Dt 9.14), sendo usado metaforicamente para o ato de apagar um registro de pecados (SI 51.1 [3]; 109.13-15; Is 44.22). Aqui tem o sentido metafórico de que seu opróbrio jamais será removido. (3) Segundo argumento: o marido da adúltera não pode ser indenizado (6.34,35) O motivo para a destruição e degradação totais do adúltero por
meio de açoites, desgraça e vergonha interminável é sua incapacidade de indenizar o marido ciumento e, desse modo, escapar de sua ira impiedosa (vs. 34,35), ressaltada pela repetição quádrupla do advérbio negativo “não”, lõ '(vs. 33b, 34b, 35a, b). 34 Porque (ki) introduz a argumentação que explica o motivo dos castigos impostos ao adúltero serem severos, inevitáveis e interminá veis. O ciúme (q in a ; veja 3.31) do marido da adúltera envolve sua forte ira contra seu rival em função de seu zelo por sua propriedade, neste caso, sua esposa (Nm 5.14, 15, 18, 25, 29, 30; Pv 27.4). Esses zelos intensos inflamam a sua ira (hamat) uma palavra derivada da raiz yhm , “ser quente”, “ser ardente”, de onde se desenvolveu o signi ficado específico usado aqui, “irritação”, “raiva”, “ira”, contra alguém decorrente de um sentimento de ter sido prejudicado (Pv 15.18; Is 34.2; Jr 6.11). De acordo com Schunck: “Chêmãh provavelmente dava ex pressão à exasperação interior intensa acompanhada de raiva”.39 Os sábios avaliam esse aspecto da natureza humana de maneira negativa (15.18; 19.19; 22.24; 29.22). O marido ciumento é chamado de homem (geber, cp. 'ãdãm, e 'is no v. 27), pois essa palavra designa um ser humano do sexo masculino com toda a sua força e competência. Por natureza, a ira é cruel e impiedosa e excede todos os limites quando instigada pelo ciúme (27.4). Cântico dos Cânticos 8.6 compara à dureza inexorável da sepultura cruel e implacável. O verseto B desenvolve sua implicação psicológica, e ele não mostrará compaixão (ou não terá pena; não se compadecerá de, lõ'-yahmôl\ cp. Ex 2.6; 2Sm 21.7) e não poupará seu rival de qualquer dor que lhe puder infligir (cp. ISm 15.15; 2Sm 21.7) quando executar vingança (nãqãm). Mendenhall argu menta que nãqãm é um termo legal que designa o direito legítimo de um soberano de exercer força para defender e proteger seu reino, livrando os súditos injustiçados e castigando os culpados que não respeitam seu governo, desconsiderando Provérbios 6.34.40 Mas por que o marido lesado deve ser visto como um indivíduo atuando por sua própria conta ao castigar o amante, e não como alguém exercendo seu poder legítimo de vindicar o ataque do adúltero a seu lar numa ação defensiva? Peels 39. K.-D. Schunck, TDOT, 4:463, s.v. chêmãh. 40. G E. Mendenhall, The Tenth Generation: The Origins o f lhe Biblical Tradition (Baltimorc: Johns Hopkins University, 1973), p. 95. Apesar de ser necessário desconsiderar agora o estudo feito por Mendenhall sobre a ra i/ na literatura de Amama (veja W. T. Pitard, "Amamae&emí and Hebrew riBqõm", Maarav 3 [1982]), ele afirmou corretamente que nqm designa vindicação defensiva, não vingança (i.e., uma rixa pessoal de sangue) (pace E. Lipinski, TWAT, 5:602-12, s.v. nqm).
limitou o significado em 6.34 à frase: “a execução legítima e justa do castigo por uma autoridade competente”.41 Se esse é o caso, o marido implacável e emocionalmente sobrecarregado colocou o castigo nas mãos da autoridade legítima da comunidade a fim de proteger seu lar. O castigo por adultério era uma questão comunitária (cp. Jó 31.11; Pv 5.14) considerada uma ofensa grave, até mesmo passível da pena de morte (Lv 18.20; 20.10; Dt 22.22; Ez 16.38; 23.45). 35 O marido da adúltera exigirá por meio do tribunal a vinganç plena, pois não aceitará nenhuma indenização financeira. “Ele não mos trará compaixão” significa aqui, “ele não se deixará subornar”. Ele não aceitará (lõ-yiééã' p enê ; lit. “ele não levantará o rosto”) significa “ele não será levado a uma disposição favorável”.42 Nenhuma [ou ne nhum tipo de, kol\ 43 indenização [ou resgate, kõper], um termo legal. “Indica a oferta material que estabelece um relacionamento amigável entre a parte ofendida e a parte ofensora.”44 Mais especificamente, se refere ao resgate pela vida de uma pessoa. Por exemplo, a vítima de um boi dado a chifrar pode aceitar o pagamento de kõper pelo dono do animal ou insistir que o animal seja abatido (Êx 21.30). Apesar do tribu nal poder sentenciar o adúltero à surra, vergonha e perda de todas as suas propriedades, o marido traído jamais será apaziguado e não dese jará nada além da morte do adúltero. O verseto B personaliza a realida de dura, levando a palestra à sua conclusão. Ele não se satisfará com um suborno mesmo que maior que a indenização exigida pelo tribunal. E ele não cederá (welõ’-yõ'beh, lit. “ele não consentirá”; veja 1.10). Ainda que aumentes (ki tarbeh) muda o argumento da descrição ob jetiva do pai acerca do adúltero para a confrontação direta do filho como se ele fosse o adúltero, a fim de fazê-lo sentir a intensidade do argumento. Ademais, desse modo ele cria um inclusio com a introdu 41. H. G L. Peels, “ Passion or Justice? The Interpretation o f beyôm nõqãm in Proverbs VI 34”, VT 44 (1994) 270-72. 42. O significado básico de n é\ é “carregar" e, com frequência, se concentra no ato inicial de “ levantar e, portanto, carregar” (cp. 19.19). Com p&ntm “levantar o rosto”, adquire o sentido de ‘le r uma disposição favorável para com alguém” . O uso do verbo para movimento físico pode ser transferido para a mente. Tendo nepeS como objeto, significa “estar voltado para algo, i.e., desejar, ansiar por” (veja 19.18). “Carregar” também permite o sentido figurativo “produzir". Em sua forma reflexiva “eu me levanto”, a frase indica uma demons tração arrogante de autonomia e independência. A forma passiva transmite o mesmo concei to com os "olhos” (30.13), pois os olhos revelam a disposição interior do indivíduo. 43. GKC # 127b. 44. B. Lang, TDOT, 7:301, s.v. kipper.
ção e a ordem (6.20-25). Suborno (Sohad) se refere a um presente, normalmente em dinheiro, para corromper a justiça, uma prática proibi da pela lei mosaica (Êx 23.8; Dt 10.17; 16.19; 27.25; Pv 17.8,23; 21.14). De acordo com J. Finkelstein, apesar de haver evidências suficientes de que o suborno de juizes era considerado no mínimo uma transgressão moral em outras culturas do antigo Oriente Próximo, “não existe nenhu ma lei registrada em escrita cuneiforme proibindo o suborno de maneira específica”. Ele conclui dizendo: “[o suborno] não era apenas uma práti ca comum, mas também reconhecida como uma transação legal”.45Esse conceito de suborno se encaixa perfeitamente neste contexto referente a estrangeiros. O marido da adúltera não abrirá mão de sua determinação de levar o pleito legal adiante para conseguir a vingança completa sobre seu rival. A palestra não informa o destino da esposa lasciva. 12.
Décima palestra: as táticas sedutoras da esposa lasciva (7.1-27
1 Filho meu, guarda os meus ditos, e os meus mandamentos conserva contigo 2 Guarda os meus mandamentos e vive, e o meu ensino, como a menina do teu olho;2 3 ata-os aos teus dedos; escreve-os na tábua do teu coração; 4 dize à sabedoria “Tu és minha irmã ”, e clama ao discernimento, “Tu és meu3 parente”;* 5 para te guardarem da esposa infiel, da esposa lasciva que fa z suas palavras serem suaves. 6 Porque em pé junto à5janela da minha6 casa, pela abertura eu olhei para baixo. 45. J. Finkelstein, “The Middle Assyrian Shulmanu-Tcxts", JAOS 72 (1952) 77-80. 1. A LXX acrescenta entre os vs. 1 e 2 , "filho meu, teme ao S e n h o r e serás forte, e ao lado dele, não teme ninguém mais” (cp. 3.7, 9; 14.26). O acréscimo não se mostra de acordo com o contexto, que visa firmar o filho no ensino do pai contra as palavras sedutoras da adúltera (Toy, Proverbs, p. 144). 2. Lit. “olhos”. A LXX obtém a concordância numérica ao ler “pupilas”. 3. Para a omissão do sufixo pronominal no verseto B veja M. Dahood, TheAnchor Bible: Psalms Ut: 101-150(Garden City.N.Y.: Doubleday, 1970), pp. 430-31. 4. Mõdã, que provavelmente é um epiceno - encontrado, além desta passagem, somente em Rute 2.1 e em Provérbios 3.12, nos quais sua forma feminina é usada com um referente masculinoprovavelmente é feminino adsensum, pois se refere a biná. 5. A preposição requer um verbo omitido (IBHS, p. 224, P. 11.4d). 6. A LXX e a Sir. trazem a terceira pessoa do sing. para todos os pronomes e verbos nos vs. 6, 7, tornando o sujeito a “esposa infiel”, não o pai. No entanto, é difícil entender como é
7 E vi entre os ingênuos, atentef entre os filhos para um jovem que carecia de juízo. 8 Ele passava pela rua junto à esquina;9 ele andava a passos largos no caminho da casa dela, 9 no crepúsculo9 no fin a l do dia,]0 quando se aproximavam11 a noite e as trevas. 10 E veja! Uma mulher vem para fora'2 a fim de colocar-se defronte delen possível ela estar olhando pela janela e, ao mesmo tempo, estar esperando por sua vítima na rua e nas praças da cidade (vs. 12-13). Toy (Prowrbs, p. 146) diz: “Se ela está dentro de casa nos vs. 6-9, seria de esperar no v. 10: ela saiu ao seu encontro; a mulher parece introduzida como uma personagem nova no v. 10”. Plõger (Sprüche, p. 77) afirma que a narrativa na primeira pessoa no texto hebraico é muito mais vivida. Mas Albright et al. (“Some CanaanitePhoenician Sources o f Hebrew Wisdom”, in WIANE, p. 10) defendem implicitamente a LXX observando a proximidade da LXX com os cultos de fertilidade do antigo Oriente Próximo. Astarte, a deusa do amor do culto de fertilidade cananita, e Istar, sua figura correlata no cuito babilônio, chamam da janela e, como a mulher estranha, combinam as características do sexo e da fertilidade (cp. vs. 16-18) com o abate (vs. 22, 23). Albright também associa a esposa infiel “olhando pela janela" (= LXX parakyptousa) à conhecida Afrodite parakyptousa da terminologia cipriota e de outros cultos gregos e concorda com Herbig que a identifica com o tema comum das pragas fenícias encontrado em Samaria. Arslan, Tash, Nimrude e Corsabá, conhecido como “a mulher junto á janela”, que mostra a cabeça de uma mulher dentro da moldura dc uma janela, indicando que a mulher provavelmente quer chamar a atenção (veja ANEP, p. 39, pl. 131). Plõger (Sprüche, p. 77) e outros usam os mesmos dados para descartar justificadamente a LXX. L. A. Snijders (“The Meaning of z3r in the Old Testament” [0 7 5 10; Leiden: E. J. Brill, 1954], p. 98, n. 72) objeta a ideia de seguir a LXX com base nos paralelos cultuais do antigo Oriente Próximo, pois aqui a mulher olha pela janela para observar, enquanto que a deusa cultuai está junto à janela para ser observada. Mesmo que a LXX seja seguida, a ligação cúltica é desnecessária, pois o tema de uma mulher nobre, não de uma figura cúltica que olha pela janela, é conhecido no Antigo Testamento (cp. Jz 5.28; 2Sm 6.16; 2Rs 9.30). Em resumo, não há nenhum argumento convincente para preferir a LXX ou, se esta for seguida, para identificar a mulher olhando pela janela com uma figura cúltica. 7. Um pseudocoortativo (IBHS, p. 576, P. 34.5.3) e um H ifil interno (i.e., levar a si mesmo a obter entendimento; IBHS, pp. 439-40, P. 27.2s.). 8. Normalmente a forma é pinnãtõh, nãopinnSh. A LXX trazpinnâ. “uma esquina”. 9. A LXX “e falando” é uma conjetura para este hap. leg. (de acordo com L. Adams, “Lexical Equivalcncc in LXX Proverbs 1-9: A Study in Translation Technique” [tese de M.C.S., Regent College, 1992], p. 165). 10. Fichtner (BHS) corrige o hap. leg. para um inf. cons. “quando o dia se tomou noite” sem qualquer justificativa (cp. Jz 19.9). 11. Corrige ‘tsôn ("pupila [da noite]”, que os massoretas provavelmente entenderam como “meio da noite”, para *nus "aproximação [da noite]”. O meio da noite é tarde demais para o contexto. A mesma confusão existe em Provérbios 20.20, K lê 'tsôn e Q ^nüs num contexto semelhante. A expressão da LXX, “quando está quieto” pode refletir alguma forma de ysn (de acordo com A. J. Baumgartner Études critiques sur letal du texie du Livre des Proverbs d'après les principales Iraductions anciennes [Leipzig: Imprimerie Orientale W. Drugulin. 1890], p. 76). 12. Veja n. 5. O verbo é fornecido no v. 15. 13. Apesar de liqrS'tô poder ser um inf. dc II qãrã' (“encontrá-lo”; BDB, pp. 896-97, s.v. 11
com vestes de uma prostituía e com um coração astuto.14 11 Ela é obstinada e provocadora; 15 seus pés não param em sua casa; 12 ora nas ruas, ora nas praças, e ao lado de toda esquina ela fica à espera. 13 E ela o agarrou e o beijou; endureceu sua face e lhe disse: 14 Eu devia16 um sacrifício de comunhão;'1 hoje cumpri os meus votos. 15 Por isso, saí ao teu encontro, para buscar o teu rosto diligentemente, e te encontrei! 16 Já provi o meu leito com colchas, peças bordadas,™ o linho19 do Egito. 17 Eu perfumei20 minha cama com mirra, aloés21 e cinamomo. qãrU’), é mais apropriado entender a forma como uma preposição fixa dessa forma com o sentido de “oposto”, “defronte de”, traduzida aqui por “encarar” (HALOT, 3:1131, s.v.II qr'). 14. Lit., “e cauto”. As versões antigas interpretaram incorretamente n esu ra t como uma referência à reação que ela procura produzir naqueles que deseja seduzir. A LXX traz, “faz o coração dos rapazes palpitar"; Vulg., “pronta para tomar corações”; Sir. e Targ. “transtorna o coração dos jovens” . 15. G R. Driver (“Problems in ‘Proverbs’”, ZAIV50 [1932] 141-42) argumenta com base num cognato acadiano que sõrãret significa “desassossegado” ou “inconstante". Esse conceito se encaixa no contexto, mas o sentido hebraico normal também. 16. Lit., “estava sobre mim [i.e., como obrigação]” (BDB, p. 753, s.v. ’al). 17. G Gerleman (TLOT, 3:1346, s.v. sim ) acredita que o pl. “se refere às porções sacrificiais individuais apresentadas” (i.e., um pl de composição; IBHS, p. 119, P. 7.4. lb). 18. É provável que o fem. pl. Qal ptcp. pass. ha(úbôt seja um substantivo, “bordado, peças borda das” (HALOT, 1:307, II h(b), um padrão frequentem ente pl. (IBHS, p. 88, P. 5.3d). O acento disjuntivo massorético não permite que se considere o termo um cons. com 'S(ún (= "linho bordado”). Os dicionários costumam considerar uma raiz dupla h(b, sendo um signi ficado “cortar ou juntar lenha” e o outro, um hap. leg. em Provérbios 7.16, “colorido”, talvez de muitas cores, mas M. Gõrg (“ Beobachtungen zur Basis Hfb", BN 5 [1978] 7-11) argumenta com base em fontes egípcias e no Salmo 144.12 a possibilidade de uma raiz única, deixando implícita a manipulação artística de vários tecidos, com a tradução especí fica resultante dependente do tecido em questão. O paralelo m arbaddím , “colchas” prova velmente também envolvia adornos bordados. 19. A LXX traz “cobertas” (< hfty ou 'th [de acordo com Toy, Proverbs, p. 154]). J. P. Brown (“ Literary C ontexts o f the Common H ebrew -Greek Vocabulary” , J S S 13 [1968] 171) sugere que 'êfún é uma palavra que foi tomada emprestada da língua egípcia, que talvez fosse traduzida como 'othonS. 20. H ALO T(2:682, s.v. II núp) faz distinção entre I nüp (“mover de um lado para o outro” ) e II núp (“borrifar [com perfume]"), mas BDB (p. 631, s.v. I nüp) não fazem essa distinção. Apesar de II núp ser um hap. leg. no Qal, I núp no Qal é intransitivo e seu significado não é apropriado para chuva e neve no Salmo 68.9[ 10]; Eclo 43.17. G R. Driver (“Problems in ‘Proverbs’”, 142) acredita que II nüp pode ser uma forma secundária dc npp (“aspergir”). 21. A LXX traduz 10hülím como “minha casa”, considerando 'oh°lt como “minha tenda”.
18 Vem, embriaguemo-nos22 de amor23 até pela manhã; gozemo-nos um ao outro24 com amor;25 19 porque o meu marido não está em casa;26 ele saiu para uma longa viagem 21 20 Ele tomou em sua mão uma bolsa repleta de prata; ele voltará para casa na lua cheia.2* 21 Ela o desencaminhou com sua imensa29 persuasiva; com a suavidade dos seus lábios ela o desnorteou. 22 Ele a seguiu rapidamente,30 como um boi que entra31 num matadouro,32 e como veado que pisa num la ç o 33 22. Apesar da forma poder ser imperfeita, depois do imperativo é mais apropriado ser considerada coortativa (IBHS, p. 577, P. 34.6a), o que é confirmado pelo paralelo coortativo nt'lsh. 23. Dõdím é sempre pl. com o significado “amor sensual, o prazer do amor”. O pl. abstrato pode significar uma série repetida dc ações (IBHS, p. 12!, P. 7.4.2c). 24. O Hitpael provavelmente tem um recíproco (“deliciemo-nos um ao outro” ; IBHS, p. 431, P. 26.2g). 25. Provavelmente um pl. abstrato. 26. Lit., “na casa”. 27. Lit. “de longe” (veja Pv 15.29), indicando que o ponto de partida ou origem da jornada é distante (cp. Is 22.3; 23.7). 28. L apresenta cquivocadamente hakkese’em vez de hakkese’. Observe a assonância com hakkesep no verseto A. Este significado, “lua cheia”, do termo problemático leyóm (veja 16.4; 21.31) hakkese ’ (que. além desta passagem, aparece somente no SI 81.4[5]) já era conhecido nas versões antigas e foi estabelecido recentemente pela identificação de um cognato acadiano (B. Kedar-Kopfstein, “Glossen zurtraditionellen biblischen Philologie”, ZAH 2 [1989] 208-9). 29. Uma vez que leqah pode se referir à persuasiva, não há necessidade de corrigir berõb para berõk (com a suavidade). Fox (Proverbs 1-9, p. 249) apoia essa correção pelo Tur-Sinai a partir de um ponto de vista crítico-textual: “a diferença gráfica (b/k) é minúscula em vários manuscritos", mas isso não se aplica quando são as letras finais. 30. A LXX traz kepphõtheis "persuadiu”. G B. Caird (“Towards a Lexicon o f the Septuagint. II”, JSS 20 [ 1969] 21-22) corrige o TM de modo a ler kpth, “como um insensato”, argumentando que a LXX reflete a tentativa do autor de traduzir kpth com um homófono. O mais provável é que a LXX tenha interpretadopí m como uma forma depth (“insensatez/insensato”) (de acordo com Baumgartner, Êltide critique, p. 75; McKane, Proverbs, p. 340; Fichtner [BHS\) ou que tivesse um Vorlage dife rente, como npth (“ser simples/enganado/seduzido”; de acordo com Toy, Proverbs, p. 159). 3 1. A LXX traz agetai (“é conduzido”) e, com base nisso, Fichtner (BHS) corrige parayáòa \ Mas a voz ativa do TM apresenta de modo convincente o boi entrando voluntariamente no matadouro e corresponde às vozes no part. ativo nos vs. 22b e 23a. 32. L traz equivocadamente (Sbah em vez de tebak. “Abate” depois de “entrar” provavelmente é uma metonimia de adjunto para lugar, “matadouro”. 3 3 .0 texto é incerto. O TM pode significar “como quem traz uma corrente ao calcanhar, sendo levado para a disciplina aplicada a um insensato”, mas “disciplina aplicada a um insensato”, como também para a morte, seria excepcional. A LXX (bem como Sir. e Targ.) traz “como um cão amarra do (lendo m ôsid, não m úsar) e como um veado adulto (lendo k e ’ayyOl, não *w tl)”. A Vulg. traz
23 até que uma flecha abre o seu fígado; como um pássaro que se apressa para uma armadilha. E ele não sabe [que age] contra34 sua própria vida. 24 Agora, pois, filhos ,35 dai-me ouvidos e prestai atenção às palavras da minha boca. 25 Não permitais que o vosso coração se desvie para os caminhos dela; e não vos extravieis na direção de36 suas veredas. 26 Porque ela derrubou muitasyi [vítimas] abatidas, até os poderosos, todos mortos por ela. 21 A sua casa38 apresenta os caminhos para a sepultura, que descem às câmaras da morte. Esta é quarta e climática palestra para salvaguardar o filho da esposa lasciva (cp. 2.16-19; 5.1-23; 6.20-33), também é a última (veja pp. 47, "como um cordeiro brincando, alegre e ignorante, ele está sendo conduzido feito um insensato para os grilhões”. Nem “cão” nem “cordeiro” sào satisfatórios em termos textuais. Baumgartner (Études critique, p. 79) e Toy (Proverbs, p. 159) acreditam que a LXX leu kklb, não k^ekes, mas Adams (“Lexical Equivalences in LXX Proverbs 1-9”, p. 166) e Delitzsch (Proverbs, p. 169) acreditam que o tradutor está conjeturando um hap. leg. G R. Driver (“Problems in ‘Proverbs’”, p. 143; cp. Fichtner [BHS]) propôs, em princípio, ufika'akõs ‘el-moslr ayyãl (“como um veado adulto atado a uma corda”), associando 'ks com o árabe 'akasa. “amarrar (um camelo) com uma corda” . Posteriormente, Driver (“Hebrew Notes”, VT 1 (1951) 241; cp. BHS e McKane, Proverbs, p. 221) corrigiu o texto de modo semelhante ( uke’akkes el-môsír ayyãl), mas considerou o significado “como um veado adulto pula/salta num laço”, associando 'ks com um verbo árabe denotando sacudidelas ao caminhar (cp. Sim. skipton; cp. Is 3.16). 34. A preposição requer um verbo (IBHS, p. 224, P. 11.4.3d). 35. A LXX suaviza o texto usando sempre o sing. “filho meu”. 36. Fox (Proverbs 1-9, p. 250) traduz a expressão tS'â be “não te desencaminhes pelas veredas dela” (i.e., como alguém vagando e perdido naquela região, pois esse é o seu sentido em outras três ocasiões [Gn 21.14; 37.15; Sl 107.4]). No entanto, a forma não é um ptep., como no caso de Gênesis 37.15, e é a única ocorrência da frase no modo jussivo. “Não vagueies" parece implicar que o filho já desobedeceu à primeira ordem, “não te desencaminhes pelas veredas dela” e agora, tendo entrado no caminho condenado, é proibido de vagar nele. A oração paralela, “extravieis na direção dc" suge re que a preposição bete representa o alvo (IBHS, p. 196, P. 11.2.5b). 37. Veja IBHS, p. 259, P. 14.3.1b. 38. A discordância em número entre o singular bêtah (“sua casa” ) e o pl. darkê (“os caminhos”) é difícil. O. Loretz (“Ugaritische und hebrãische Lexikographic (III)”, UF 14 [1982] 141-48) argu menta que em Provérbios 7.27 e 2 .18 os termos originais eram ntybwtyh e ntybth. Entre outros argumentos, ele considera 7.26 um comentário e observa o paralelismo de drkyh // ntybwtyh nos versetos de 7.25. De acordo com ele (veja também BHS), o texto foi mudado de propósito para byth sob a influência de Provérbios 5.8; 7.8; 9.14. No entanto, o TM pode ser resolvido mediante o suprimento dc um verbo que faça sentido nessa oração nominal, por exemplo, “apresenta” (bietet; Plõger, Sprüche, p. 74), “simboliza” (bedeuten, E. Kautzsch. citado por Loretz, “ Ugaritischc und hebrãische Lexikographie”, p. 143, n. 14), ou "oculta" (birgt\ V. Hamp. citado por Loretz, “Ugaritische und hebrãische Lexikographie”).
48). O capítulo 5 trata principalmente dos prejuízos financeiros e sociais decorrentes de ser seduzido ao adultério e recomenda o casamento como anódino prático para o impulso sexual humano. Ao mesmo tempo em que mostra os perigos do adultério, 6.20-35 se concentra no marido traído. A palestra no capítulo 7 visa desmascarar as táticas sedutoras da esposa infiel. Ele forma um inclusio com a primeira palestra (2.16-19) por meio das semelhanças verbais de suas introduções (cp. 2.16 e 7.5) e conclusões (cp. 2.18,19 e 7.26,27). Suas declarações sucintas acerca das conseqüên cias trágicas do adultério (7.22,23,26,27) pressupõem os castigos especí ficos apresentados na segunda e terceira lições (5.9-14; 6.32-35). Nessa última palestra o pai retrata graficamente o perigo que a esposa lasciva representa numa narração autobiográfica fascinante da sedução de um ingênuo, apesar de ser mais provável que se trate de uma autobiografia fictícia, pois dificilmente ele ouviu a meretriz fazer uma proposta indecorosa ao jovem em forma poética. Não obstante, seu testemunho ocular detalhado da sedução impudente e lasciva dela é tão envolvente e plausível que parece autêntico. Ele contrapõe suas imagens sedutoras de comer carnes saborosas, sentir o aroma de especiarias raras e fazer amor numa cama suntuosa com imagens igual mente memoráveis de um boi e de um veado indo para o matadouro e de um pássaro se apressando para uma armadilha. No final da palestra ele desmascara a sedutora como uma amazona de conluio com a mor te, a palavra final e culminante da palestra. Uma vez que se trata de uma narrativa, o intérprete deve aplicar ao texto a poética apropriada para interpretar a teologia narrativa (veja pp. 90-92). A estrutura da palestra sugere a urgência do pai em proteger seu filho. O chamado para escutar (7.1-5, 24-27) emoldura a caracteriza ção que o pai apresenta de uma esposa infiel que personifica tudo o que é contrário à visão de mundo e de vida do verdadeiro Israel (vs. 6-23). Como em sua descrição dos criminosos em 1.10-19, ele encara o desa fio de fazer seu filho sentir a sedução da mulher, mas de tal modo que ela se tome inteiramente repugnante para ele. Ele o faz emoldurando o discurso sedutor (7.14-20) da tentadora com suas caracterizações ne gativas da raposa (vs. 6-13) e das conseqüências terríveis para suas presas. Ela é uma caçadora provocadora, ruidosa e impudente à procu ra de presas nas ruas da cidade a qual conduz suas vítimas à sepultura. Tragicamente, o ingênuo que se recusa a dar ouvidos ao sábio (1.2033) obedece a essa mulher.
O comentário introdutório do pai pede a atenção do seu filho (7.1 4), primeiro claramente (vs. 1,2) e depois figurativamente (vs. 3,4). O corpo principal, a lição, apresenta o argumento na forma de uma narra tiva autobiográfica dramática (7.6-23; cp. 4.1-9). Nela o pai caracteri za o vestido, os motivos ardilosos, a natureza essencial (“turbulenta”, “rebelde”, “sempre fora de casa”) e as ações agressivas (agarrar, bei jar, etc.) da mulher. Atenta, acima de tudo, para seu discurso que riva liza com o discurso paterno em sua tentativa de atrair o filho para longe da sabedoria que ele herdou apresentando-lhe possibilidades luzentes. O jovem ingênuo, entretanto, é caracterizado apenas com o epíteto cur to, “que carecia de juízo”. A conclusão do pai admoesta o filho a ficar longe da lasciva (vs. 24-27), incluindo um discurso e um chamado à obediência firme (vs. 24, 25), com uma nova argumentação (vs. 26, 27). O versículo que serve dejanus entre a introdução e o corpo, assim como o janus nas outras três palestras, afirma que seu objetivo é pro teger o filho da língua suave (hãlãq) da mulher estranha (2.16; 5.2, 3; 6.24; 7.5). Convém observar a simetria entre as quatro linhas dedicadas à introdução e à conclusão (vs. 1-4,24-27). Também há quatro versículos para cada parte da introdução à narrativa (vs. 6-9, 10-13), equilibrados por quatro linhas completas para sua conclusão (vs. 21 -23, como corrigi do), emoldurando sete (o número da inteireza) linhas completas dedica das ao discurso propriamente dito (vs. 14-20). É interessante observar, ainda, o uso da raiz ’m r (“dizer”) nos versículos 5 e 13bp. Essa palestra final serve de janus, voltam para as palestras anteri ores contra a esposa infiel e colocada com o grande discurso da mulher sabedoria no capítulo 8, que também descreve a geografia, o caráter e o discurso da lasciva (cap. 8). “Apesar de serem bastante diferentes em termos de estilo e conteúdo, esses poemas acerca da mulher estra nha e da sabedoria personificada formam um díptico. O capítulo 8, com seus fortes tons míticos, é redigido em sua maior parte de modo simbó lico; o capítulo 7, por sua vez, é basicamente realista.”39 Eles também são ligados formalmente pelo fato único de terem discursos de conclu são semelhantes à introdução às palestras (cp. 7.24-27; 8.32-36), am bos sendo dirigidos a “meus filhos”. A junção da esposa infiel com a sabedoria personificada prepara o caminho para o confronto da sabe doria personificada com a mulher insensata no capítulo 9. No entanto, a
esposa infiel também pode servir de representação simbólica de uma cosmovisão sedutora estranha ao verdadeiro Israel, o filho de Deus (veja p. 181s.). a. Introdução: destinatário e admoestações para ouvir a p a lestra do pai (7.1-5) A introdução típica, que emprega o vocabulário habitual e chaman do o filho a dar atenção à instrução do pai, separa esta palestra da anterior.40 1 O destinatário e admoestação, filho meu (beni; veja 1.8) guarda (.semõr; veja 2.20; 3.26; 4.4) os meus ditos ( ^mãrãy, veja 2.1), que são combinados enfaticamente com o paralelo sinônimo e os meus manda mentos (ümiswôtay) conserva contigo {tispõn\ veja 2.1 b), se mostram claramente opostos às palavras da esposa lasciva (7.5, 13; cp. v. 21). Esta introdução típica tem como objetivo levar as gerações subsequentes a adotarem o ensino de que as condições para a vida são “liberdade dentro das normas, amor dentro dos limites e vida dentro da lei”.41 2 O verseto 2a corresponde a 4.4ba. A repetição única e imediata de guarda ($emõr; veja v. 1a) e de meus mandamentos (miswôtay; 7.1b) cria um paralelismo escalonado que enfatiza a importância dos preceitos paternos. E vive (veja pp. 157-161) fundamenta a ordem para memorizar e obedecer a seus ensinos na afirmação breve de que a vida preciosa do filho está em perigo (6.26b). A promessa de vida abundante ao seguir o pai contrasta nitidamente com a ameaça de morte eterna ao seguir a esposa infiel (v. 27; cp. 2.16,17). Depois de repetir duas vezes que suas “palavras” são, na verdade, “mandamentos” obrigatórios, ele as equipara ao termo catequético meu ensino (tôrãti; veja 1.8). Para realçar a preciosidade incomparável de seus ensinos, ele ordena que o filho os proteja como o globo ( ’isôn. i.e., pupila) ocular ÇêneykS; veja 4.25).42 Esse membro extremamente delicado e, ao mesmo tempo, ex tremamente precioso da anatomia humana (cp. 3.14-26; 8.11; 31.10) é essencial para a iluminação e orientação - sem ele só há escuridão (cp. 40. Pace H. Ringgren c W. Zimmerli, Sprüche!Prediger: überselzt und erklârt (Gõttingen: Vandenhoeek & Ruprecht. 1962), pp. 32-35. 41. R. Van Leeuwen, Proverbs, p. 86. 42. Etimologicamente, 'tsôn significa “a pessoa pequena” refletida no olho, a menor imagem da quilo que é visto na pupila do observador. O mesmo vale para o lat. pupUlits, daí o nosso termo “pupilo” (IBHS, p. 92, P. 5.7b).
Dt 32.10; cp. “Guarda-me como a menina dos olhos” em Sl 17.8;. Zc 2.8[12]; Mt 6.22, 23) - e, portanto, simboliza aquilo que necessita da proteção mais diligente. 3 A fim de obter essa atenção constante, o pai emprega a metáfora ala-os aos teus dedos (qoSrêm 'al-’esb'õteykã; cp. “ata-os ao pesco ço” em 3.3c; 6.21), que pode ser uma referência a colocar as faixas de oração (Tefilim = filactérios); (Mt 23.5; Josefo, Ant. 4.8.13), apesar de não se saber ao certo desde quando essa prática existe (cp. Dt 6.8, 11.18).43 O filactério também é atado ao dedo médio. Uma vez que não se pode atar mandamentos verbais, a possível prática funciona como uma figura para memorizar os mandamentos e recordá-los com fre quência. Uma vez que as mãos estão sempre visíveis, a metáfora admoestadora (cp. 3.3; 6.21) pode ter como significado guardar o ensino do pai em lugar sempre visível, para outros os verem e também para serem uma lembrança constante para o próprio filho.44O pai intensifica sua ordem retratando a memorização e a recordação constantes de seu ensino e mandamentos mediante imagem exterior dos dedos para a or dem referente à parte interior, ao coração, escreve-os na tábua do teu coração (veja pp. 140-142). Couroyer propõe uma interpretação literal da admoestação, pois é provável que as revelações proféticas fossem escritas em tábuas (cp. Is 30.8 e Hc 2.2). Semelhantemente, no Egito antigo, os textos clássicos eram escritos em tábuas de madeira e deviam ser memorizados pelo coração. Essas tábuas mediam 12 cm x 75 cm e tinham furos para passar cordas, sendo usadas por crianças na escola, da mesma maneira como as lousas eram usadas até pouco tempo atrás. Ele sugere que essa tábua exterior com o ensino do sábio, usada em cima do coração, se tomava um meio de internalizar a instrução. Porém, Couroyer se vê obrigado a reconhecer que as representações gráficas egípcias não fornecem exemplos dessa prática. Além disso, ele confunde o peito com o coração.45 Apesar de seu estudo ajudar a explicar a figura, uma inter pretação mais natural equipara a tábua com o próprio coração, como em Jeremias 17.1; 31.33.4* Assim, a expressão também é uma metáfora para a memorização e retenção das ordens do ensino do pai (cp. Is 30.8). 43. De acordo com Plõger, Sprüche, p. 76 ;pace Toy, Proverbs, p. 145. 44. Gemser (Sprüche, p. 35) acredita, equivocadamente, que além de guiar o indivíduo, também o guardava como um amuleto, protegendo-o de más influências. Ele apela para fontes egípcias e não leva em consideração o ensino do AT que proíbe a feitiçaria. 45. B. Couroyer, “ La tablettc du coeur", RB 90 (1983) 416-34, esp. 426-28. 46. “Coração” é um gen. de associação (i.e., “tábua que é o leu coração”. IBHS, p. 153, P. 5.3.h).
Porém, o mais importante é observar que a figura representa sua impres são indelével no caráter do indivíduo. Ao serem assimilados como um modo de vida dentro do cerne que governa o indivíduo, o seu caráter muda e se desenvolve de modo que o ensino é guardado em seu interior (2.2; 4.23; cp. Jr 31.31 -34). Os teólogos cristãos empregam o termo “re generação” no lugar dessa metáfora (cp. Jo 3.1-16). 4 A metáfora impessoal de escrever o ensino é substituída pela metáfora extremamente pessoal de se casar com ela como o objeto mais digno de amor puro e sincero. Com essa ação pode-se evitar a tentação do desejo ilícito. Na teoria do discurso-ato, dize é executivo (e.g., o casamento é efetuado pela declaração “Aceito... para ser meu legítimo esposo/minha legítima esposa”) e provavelmente implica num compromisso de casamento com a sabedoria (veja pp. 124-125), outra personificação incompleta da sabedoria dentro das palestras (cp. 6.22). Tu és minha irmã ( 'ahõti 'ãt) expressa, no mínimo, uma aceitação da sabedoria como família querida e, provavelmente, é a linguagem do amor para designar o compromisso do noivo com sua noiva (Ct 4.9,10, 12; 5.1,2; Eclo. 15.2; cp. Jó 17.14) pela qual ele deixou pai e mãe (Gn 2.23,24; cp. Tob. 7.16). Semelhantemente, em textos da décima oitava dinastia egípcia (ca. 1500-1300 a.C.), “irmã” é um termo carinhoso para a amada.47 O paralelo quiástico da moldura externa, e clama ao discernimento (veja 2.3), intensifica “dize” e acrescenta à sabedoria o conceito de discernimento e interpretação perspicaz (veja 1.2). Tu és meu parente (ou família; veja n. 4), o paralelo quiástico de “tu és minha irmã”, ressalta que o filho se compromete num relacionamento íntimo e confidencial com essa figura idealizada do ensino dos pais, como se fosse com um membro da família. A metáfora não deve ser levada longe demais, de modo a colocar a sabedoria e o filho em pé de igualda de social. Na palestra seguinte a sabedoria pede a obediência do filho (8.32-36). Seu compromisso com a sabedoria num relacionamento cari nhoso o protegerá das seduções perigosas da esposa devassa. 5 Para te guardarem (lisemorekã) liga o janus sintaticamente a 7.1 -4, e jogo de palavras com s kmar “guardar” (i.e., observar com cui dado e “proteger”; veja 2.8) forma um inclusio com 7.1, 2 ao redor da introdução. O infinitivo mais com da esposa infiel e, no paralelismo quiástico sinônimo, da esposa lasciva liga essa palestra com a palestra 47. T. L. Thompson, The Hisloricity o f the PatriarchalNarratives (BZAW 33; Berlim: de Gruyter, 1974), pp. 246-48.
programática em 2.16-19. Que fa z suas palavras serem suaves (veja 2.16b) enfoca mais nitidamente a transição para a lição que caracteriza seu discurso suave. b. Lição: as táticas sedutoras da esposa lasciva (7.6-23) A lição tem três partes: (1) o encontro, conforme observado pelo pai (7.6-13); (2) o falar lisonjeiro da mulher (vs. 14-20); e (3) a declara ção final do pai acerca da sua eficácia mortal quando o ingênuo se sujeita a ela (vs. 21-23). (1) Encontro: as observações do pai (7.6-13) O encontro consiste do ambiente do mesmo (vs. 6-9), e na caracte rização da mulher pelo pai (vs. 10-13). 6-9 O pai pinta o cenário mediante o contexto fazendo uma descri ção cênica (vs. 6, 7) do ingênuo a caminho da casa da esposa lasciva (v. 8) no início da noite (v. 9). 6 Porque explica a razão da palestra. Junto à janela se refere uma abertura na parede de uma casa para a passagem de luz e ar. A julgar pelos retratos egípcios e sírios de fortalezas e casas, tinha cerca de 50 cm quadrados. Ela simboliza o distanciamento do pai do mundo dessa mulher e o ato de ele olhar para a cena com uma visão de mundo ede vida diferente (cp. Gn 26.8-10; Js 2.13-21; Jz 5.26-30; ISm 19.11, 12; 2Sm 6.16; 2Rs 9.30, 33; Pv 7.6).48 Da minha casa (bêti) contrasta o pai em casa com a mulher na rua. Conforme se sabe pelos estudos arqueológicos, as casas israelitas combinam com a descrição desta cena. Em geral, tinham um ou dois andares, sendo que o piso superior era a esfera doméstica, onde a família vivia e onde ficavam guardados os 48. Gênesis 8.6; 2 Reis 13.17 e Sofonias 2 .14 empregam o singular hln, mas não fazem nenhuma menção de olhar para baixo ou passar “pela” janela. R. H. 0 ’Connell (“Proverbs 7:16-17: A Case of Fatal Deception ina ‘Womanand lhe Window’Type-Scene”, VT 41 [1991] 235-41) não é convin cente ao afirmar que as sete ocorrências de fylwn na Bíblia envolvem atração sexual explicita em suas cenas, como em Gênesis 26.8 e Provérbios 7.6, ou, como nos outros casos, um potencial para a atração sexual que é frustrado por circunstâncias ameaçadoras e nas quais “se observa o uso de certa dissimulação por um personagem e uma ameaça ominosa de morte espreitando em segundo plano" (ibid., p. 236). A. Brenner e F. van Dijk-Hemmes (On Gendering Texls: Femate andMale Voices in the Hebrew Bible [Leiden, Nova York, Koln: E. J. BrilI, 1993], p. 57)desconstroem o texto, argu mentando que a pessoa que fala é a mãe, sentada na janela em posição desconfortável com as outras mães desaprovalivas. Sua tese não apresenta evidências textuais e reflete o próprio condi cionam ento histórico moderno.
bens mais leves, enquanto que o piso térreo constituía a esfera econô mica, sendo usado como estábulo e/ou para armazenar bens maiores e ferramentas. Só se tem informação sobre o piso térreo, que costumava ser dividido em três ou quatro cômodos. Durante o período da monar quia, a entrada ficava no centro da parede da frente, dando num pátio de chão de terra batida.49 Pela (be'ad, “a uma distância de” > “através de”) abertura (hallôn) é um sinônimo de “janela”. A ordem de Eliseu, “abre a janela” (2Rs 13.17) parece pressupor uma veneziana ou treliça de madeira50 através da qual o pai podia ver sem ser visto. Olhei para baixo (do alto, niSqãptV, veja Gn 26.8)51 pressupõe uma casa de dois andares e forma a transição para o restante da palestra, que é apresen tada como um relato vivido do testemunho ocular. Como medida de segurança contra ladrões, o piso inferior das casas israelitas não tinha janelas. Apesar de ser fictícia, sua narrativa mostra que os sábios de Israel encontravam inspiração observando e refletindo de modo con cludente acerca do mundo ao seu redor (cp. Introdução, pp. 98-99). 7 Agora, o pai explica a cena da rua abaixo de onde ele extrairá sua lição. E vi (wã ere’; veja 6.6) entre os ingênuos (veja p. 166) se refere aos rapazes que recusaram assumir um compromisso com a sabedoria antes de entrarem na cidade e que, portanto, são presas para os perver sos (cp. 1.20). Atentei Çãbinâ; veja 1.2b) significa que ele usou seus sentidos com seu discernimento e interpretação intelectuais para obter entendimento (cp. 24.32). Entre os filhos, um paralelo de “ingênuo” indica o relacionamento íntimo que deveriam ter com seus pais (cp. 1.8; 4.3) e a transição malsucedida de uma geração para outra. O jovem (1.4) ingênuo e inexperiente que está sendo observado se encontra no limiar da maturidade e está prestes a trair esse relacionamento e des perdiçar a herança da família. Além disso, ele carecia de juízo (hasarlêb; veja p. 142). 8 Ele passava [veja 4.15] pela rua (baSSüq, uma palavra poética rara empregada para a rua de uma cidade) junto à esquina dela, onde ficava a casa da mulher, não onde o transeunte se encontra (v. 12).52 Aqui, o ingênuo mostra o seu erro fundamental; ele é obtuso e descui 49. J. Holladay Jr. in ABD, 3:308-9, s.v. “Mouse” , "Israelite” . 50. W. G Plaut (Proverbs, p. 100) observa que as janelas de vidro passaram a ser usadas no tempo do império romano. 51. HALOT, 4 :1645, s.v. Sqp. 52. Pace Gemser, Sprüche, p. 34, n. 8a.
dado, não percebe o perigo de andar nas ruas cada vez mais escuras do dominio da mulher infiel. Ele andava (yis'ãd) normalmente significa “feierehrlich einherschreiten” (“andar cerimoniosamente [com soleni dade e dignidade”]),53 “marchar”,54 sugerindo certa pompa em suas maneiras. Ele não é um sujeito totalmente imoral a caminho (derek\ veja 1.15) da sua casa dela (bêtâ; veja 7.6) intencionalmente, pois ela precisa sair ao seu encontro e seduzi-lo; antes, é uma pessoa lerda que precisa ser fortemente persuadido a fim de ir para a cama com a esposa lasci va.55Uma vez que não tem um compromisso firme com o caminho certo (cp. vs. 1-4), também não tem o bom senso necessário para se poupar do perigo moral de se desviar para o caminho dessa mulher (veja v. 25). 9 Sua insensatez é acrescida por seu desvio para o lugar errado na hora errada. Ele abraça as sombras da femme fatale durante o período curto entre o crepúsculo vespertino e a escuridão completa. Todas as expressões ou palavras no versículo 9 desta descrição cênica se refe rem à escuridão. A mulher estranha chega ao anoitecer, no início da noite e da escuridão. Na oração, no crepúsculo ( bene$ep) , neSep signi fica etimologicamente “soprar”, referindo-se à hora em que o vento acompanha o início da escuridão noturna. Nessa hora as estrelas já estão visíveis (Jó 3.9), os perversos que fazem emboscadas (2Rs 7.6) e os adúlteros (Jó 24.15) se deslocam sem serem reconhecidos, e tam bém se tropeça com facilidade em terrenos acidentados (Is 59.10; Jr 13.16). Uma vez que neSep pode designar o crepúsculo matutino ou vespertino (cp. Jó 7.4), o apositivo no final do dia ( be'ereb yôm), a hora do “pôr-do-sol”, remove a ambigüidade. O terceiro apositivo, quan do se aproximavam {be ^nüs; veja n. 11) a noite e as trevas (laylâ wa^pêlâ; veja 4.19; cp. Jó 24.15; Ct 3.1-4; 5.2-8), deixa ainda mais clara a hora em questão. Essas designações de tempo são sinônimas, não temporalmente progressivas uma em relação à outra, pois tratam do período curto do crepúsculo da noite, durante o qual o restante da narrativa se desenrola. A escuridão simboliza as trevas morais da mu lher estranha e, ao mesmo tempo, o destino escuro que agora se “apro xima” da sua vítima. Em sua cena descritiva do rapto de Lucrécia por Tarquínio, Shakespeare escreve: 53. HALOTi 3:1040, s.v. ?a'od. 54. HALOT’, p. 809, s.v. t f a d . 55. Também Cohen, Proverbs, p. 40; Cox, Proverbs, p. 144; Aitkcn, Proverbs, p. 75, contra Delitzsch, Proverbs, p. 159 e Ross, Proverbs, p. 939.
Dito isto, [Tarquínio] colocou seu pé na luz, Pois a luz e a lascívia são inimigas mortais; A vergonha oculta na noite cega dissimulada. Quando menos observada, é que mais tiraniza.
10-13 Agora o pai caracteriza sua abordagem e vestimentas como as de uma meretriz (v. 10), sua disposição interior turbulenta e rebelde (v. 11), seu habitat para caçar a presa nas ruas e praças (v. 12) e suas táticas impudentes (v. 13), de modo que o filho esteja prevenido e, por tanto, preparado.56 10 Com uma exclamação representativa, E veja ( wehinnêh) o pa traz sua audiência para dentro da cena de maneira vivida e imediata a fim de ver com os próprios olhos da imaginação a aparição repentina de uma mulher ( ’is$â; veja 2.16). Ele a prenunciou nos versículos 5 e 8, mas agora a coloca no palco de modo dramático, caracterizando-a por sua abordagem ousada em roupas sedutoras de prostituta, pelos intentos ocultos que abriga no coração e por seu beijo atrevido e confrontador. Ela conhece sua vítima, de modo que vem para fora com toda a audácia afim de se colocar defronte dele (liq m tô ) com vestes (sit, uma palavra rara encontrada, além desta passagem, somente no SI 73.6) de uma prostituta (zônâ\ veja 6.26; não qedeSá, “prostituta cultuai”). Como Tamar, é provável que ela tenha vestido um traje de prostituta, que possivelmente incluía um véu (cp. Gn 38.14), não apenas para seduzir sua vítima, mas para ocultar do público sua verdadeira identidade de es 56. S. C. Jones (“Womarfs Pedagogy: A Comparison of Proverbs VII and 4Q I84” [traba lho acadêmico apresentado a Bruce K. Waltke, 2001], pp. 9-13) argumenta que o texto está repleto de sentidos duplos. As interpretações alternativas consideram suas palavras falsas e mostram seu caráter mortal latente através de imagens associadas à guerra. (1) 'rb (v. 13). traduzido como “espreitar”, normalmente significa “emboscar” (veja 1.11, 18); (2) “enca rar" (liqrü'tô\ vs. 10, 15a) significa literalmente, “contrário a, oposto” e Holladay observa que normalmente é usado com um verbo de movimento no contexto de guerra conferindolhe o sentido de “ contra” (cp. Gn 32.7; Nm 20.18, 20); (3) N esse am biente belicoso ( hehezíqâ) ( = “agarrou”) pode ter o sentido mais exato de “estuprar”, “violar” (F. Hesse, TDOT, 4:304, s.v. hzq); (4) “Encontrar (mS?2 ’) pode significar “obter, conquistar" com referência aos despojos numa guerra (cp. Nm 31.50; cp. Holladay, s.v. q r ’ II); (5) Shr, traduzido como “buscar” pode ser tirado de Shr III que, em acadiano, significa “lançar um feitiço”, “encantar” e sua forma participial significa “ feiticeiro” (W. von Sodcn, org., Akkadisches Handwõrterbuch , [W iesbaden: O tto H arrassowitz, 1972], 2:1009, #1, d). Sem elhantemente, o termo árabe Sahara significa “enfeitiçar, encantar, fascinar” . Em resumo, “com um discurso aprazível, mas um coração determinado a guerrear; com pala vras mais suaves que azeite mas que, na verdade, são espadas desembainhadas” (SI 55.21 [22]) a raposa impudente mata o simplório que foi enfeitiçado por ouvir o seu discurso falso, pois não sabe discernir o seu caráter verdadeiro.
posa de um mercador rico. Perdue sugere que ela veste mais especifica mente os trajes de uma sacerdotisa cultuai ou de uma devota do culto à fertilidade para apoiar sua alegação de que ofereceu sacrifícios e preci sava de um companheiro do sexo masculino para a sua refeição de co munhão (7.14,15).57Sem distinguir com cuidado entre a prostituição cul tuai e a secular - sendo a linha divisória entre ambas variável (cp. Jr 3.2; Am 2.7, 8) - Beatrice Brooks as descreve da seguinte maneira: Elas se aparamentavam de maneira elaborada e ostentosa com vestes escarlate, muitas joias e cosméticos (Jr 4.30; Ez 23.40)... E possível que cantassem para chamar a atenção (Is 2 3 .16), e traziam uma marca especial na testa (Jr 3.3)... Podiam ser encontradas à beira dos cami nhos (Tamar [Gn 38.19], Ez 16.25 e Pv 7.12), “em todo outeiro e debaixo de toda árvore frondosa” (Jr 2.20), junto aos altares (Ez 16.24) e nas eiras (Os 9.1 ).58
Seus trajes ousados combinam com sua abordagem atrevida, pois uma prostituta não tem vergonha alguma (30.20). Suas vestes exterio res, que parecem prometer seu corpo à vítima, escondem sua intenção de usar o jovem para satisfazer a própria luxúria. O pai, que observa essas vestes, também discerne sabiamente o seu intento. Amsurat (as tuto) significa, literalmente, “guardado” (veja 2.8, 11), mas aqui tem a conotação singular de “ardiloso”, “arguto”, “engenhoso” com coração (lêb; veja 2.2).59 Para o sábio discemente, seu traje desavergonhado revela suas intenções ocultas, mas para o moralmente estúpido é uma camuflagem.60 Seu objetivo é apenas se entregar à sua lascívia sensu al. Ela finge ser fiel a seu marido rico enquanto ele está em casa, mas, quando o marido está fora, lisonjeia seu amante como se fosse seu único amado. Na verdade, ela usa a ambos e não ama nenhum. Essa esposa mordaz sabe muito bem que quando seu marido autoritário for traído por ela, arrancará de seu amante tudo o que ele possui caso os dois sejam descobertos e o destituirá de toda a sua dignidade e respeito (5.7-14; 6.33-35). No entanto, ela não teme por si mesma. Se a esposa de Potifar conseguiu fazer um rapaz brilhante como José parecer cul pado, quanto mais essa raposa ardilosa não pode fazer o tolo desajeita 57. L. Perdue. Wisdom and Cult: A Criticai Analysis o f the View o f the Cult int lhe Wisdom Literatures o f Israel and the Ancient Near East (M issoula, Mont.: Scholars, 1977), p. 149. 58. B. Brooks, “Fertilíty Cult Functionaries in the O T \JB L (1941) 236-37. 59. HALOT, 2:718; também G R. Driver, “Hebrew Notes”, 250. 60. Plõger, Sprüche, p. 78.
do parecer culpado caso os dois sejam descobertos.61 Em resumo, ela “estupra” homens obtusos usando a dissimulação astuta. 11 Num à parte parentético dentro da descrição narrativa, usando de seus poderes de observação aguçada e reflexão concludente, o sá bio revela mais duas características da disposição interior da esposa devassa (v. 11 a). Ela é obstinada (hõmiyâ), indicando a mistura confu sa de ruídos altos e movimento incessante. G R. Driver chama a aten ção para um cognato árabe, “que anda de lá para cá”.62 A essa ideia de movimento incessante, Baumann acrescenta barulho. “Em várias pas sagens [que usam hãmâ e seus derivativos]... é possível falar ingenua mente de ‘tumulto’. A combinação de efeitos visuais e auditivos fica especialmente clara numa tempestade que se aproxima (1 Rs 18.45) e no estrondo das rodas dos carros (Jr 47.3), bem como na confusão geral de um acampamento militar, especialmente no momento de um ataque e de pânico (1 Sm 14.16,19;2Sm 18.29;cp. Is 31.4; Ez 1.24).”63 Aqui resumem os movimentos ruidosos dessa mulher da rua. Sua dis posição e comportamento são exatamente o oposto de uma mulher tran qüila, prezada pela sabedoria (cp. lPe 3.1-6). E ela é provocadora (wesõrãret) indicando sua rebeldia contra o que é decente, preferindo uma vida de devassidão. O significado original da raiz verbal ainda pode ser reconhecido na imagem de uma vaca teimosa (Os 4.16); ela se irrita com qualquer tipo de controle e se revolta contra as regras da sociedade respeitável. O original grego “idiota” se refere a uma pessoa individual em sua capacidade individual. A inquietação e rebeldia dessa mulher desavergonhada são verificadas pela observação de que seus pés ou pernas (veja ragleyhã; 5.5) não param (lõ’-yisken ü ; veja 1.33) em sua casa (bebêtãh), mesmo com o cair da noite. “Ela tem uma casa, mas não um lar; é uma mulher sem raízes em sua família e comu nidade que só consegue viver numa temperatura febril e cuja natureza irrequieta é o indicador de sua falta de lar e de sua alienação de uma experiência social verdadeira” (contrastar com Tt 3.5).M Quando ela está em sua casa, se comporta com luxúria, de modo que seu domicílio se toma apenas uma parada no caminho para a morte (veja 2.18; 7.27). Ela é qualquer coisa, menos a mulher religiosa pela qual se faz passar. 61. Delitzsch, Proverbs, p. 161. 62.G R. Driver, “Problems in ‘Proverbs’”, 142. 63.A. Baumann, 7Z>0r,3:415,s.v. hamSh. 64. McKane, Proverbs, p. 336.
12 0 verseto 12a desenvolve em mais detalhes sua disposição tur bulenta, inquieta e impetuosa. Se ao menos o jovem ingênuo observas se e refletisse sobre a perambulação constante dessa mulher, o argu mento de que ela estava à procura dele lhe pareceria absurdo (v. 15). Infelizmente, ele não é nem observador nem dado à reflexão. Ela fica à espreita em todos os melhores lugares para encontrar sua vítima, ora (pa'am ) nas ruas (bahüs; veja 1.20), ora (pa'am) nas praças (bãrhõbôt; veja 1.20), como uma mulher lasciva rondando, não como uma esposa piedosa edificando o seu lar. Pa'am também significa “pé” e pode indi car “um pé na rua, um pé nas praças”. Fox comenta: “Em outras pala vras, seus pés estão em toda a parte da cidade. Pode-se tratar de um sentido duplo reforçado pelo versículo anterior”.65 Apesar de ela ser rica (cp. 7.16-20) e de não ser uma prostituta comum, ela se comporta como tal. Assim como o versículo 12a expressa de maneira concreta sua agitação (veja v. 11a), o versículo 12b registra a sua rebeldia contra a sociedade propriamente dita: ela fica à espera [ou de tocaia, te^rõb', veja 1.11, 18; 12.6] ao lado Çêsel) de toda esquina (kol-pinnâ; veja 7.8). Sua qualidade predadora é retomada e expandida na conclusão da narrativa (vs. 22,23). Ela escolhe as ruas e praças barulhentas, especi almente as esquinas, onde as ruas se cruzam, pois é nesses lugares que a maioria das pessoas se reúne, dando-lhe mais oportunidade de encon trar uma presa. A esquina próxima à sua casa não basta para lhe forne cer caça suficiente. O ingênuo se perdeu nesse território desconhecido para ele, mas extremamente familiar para ela. 13 Esse versículo retoma a narrativa do versículo 10 com a conjun ção e (we) ligando “ela vem para fora a fim de colocar-se defronte dele” com ela o agarrou (heheziqâ òô; veja 3.18) como situações correlacio nadas ou sobrepostas, não seqüenciais.66 Seus atos diretos e ousados revelam sua determinação cruel de subjugar a sua vítima. E o beijou (wenãseqâ-lô) supostamente nos lábios (veja 24.26), é apresentado como outra impropriedade conjuntiva, não seqüencial (veja Ct 8.1). De acor do com A. S. van der Woude, endureceu a face (hê"êzâ pãneyhã) significa “dreistes und schámloses Verhalten"61 (i.e., ela se tomou impudente, insolente, atrevida e desavergonhada em seu comportamento; cp. Dt 28.50; Ec 8.1, 2a; Ez 3.7-9; Jr 3.3; Eclo. 8.16). D. Garrett acres 65. Fox, Proverbs, p. 245. 66. IBHS, p. 653, P. 39.2.5a. 67. A. S. van der Woude, THAT, 2:254, s.v. ‘zz.
centa que isso significa que ela lhe contou uma mentira “na cara dura”.68 E lhe disse ( wattõ'mar lõ) retoma a narrativa e forma uma transição para seu discurso nos versículos 14-20. De acordo com Brenner e Van Dijk-Hemmes, sua abordagem de agarrar e beijar o rapaz e seu discurso atrevido e sedutor são as contrapartes femininas do estupro masculino. O homem domina a mulher pela força bruta; a mulher usa a sedução.69 (2) Sedução: o modo de falar atraente da esposa lasciva (7.14-20)
Sua sedução se dá em duas fases de intensidade crescente. Pri meira, ela coloca um enfeite de intenção séria sobre sua inquietação e rebeldia (vs. 14-17), e depois faz sua proposta indecente ao ingênuo, argumentando que ele não tem nada a temer (vs. 18-20). 14-17 Ela disfarça suas intenções dando a impressão de que preci sa de um parceiro sexual por motivos religiosos (v. 14), idolatrando o jovem descuidado (v. 15) e preparando para ele com todo o luxo o seu boudoir erótico para uma noite de sexo (vs. 16, 17). 14 Ela não se apresenta como prostituta, mas como parte de um sociedade ordeira, e exibe sua impudência ao encobrir sua lascívia com uma motivação religiosa. Eu devia um sacrifício de comunhão (zibhê Selãmim 'ãlãy; veja n. 16), um tipo específico dezebah, “sacrifício”, se refere ao sacrifício praticado pelos cananeus e israelitas visando unir a divindade e os comungantes por meio de uma refeição, da qual partici pavam a divindade, os oficiais sacerdotais, os adoradores e os convida dos (Lv 17.11-21; ISm 9.11-13; e Jr 7.21). Depois que a divindade “devorava” a gordura e os intestinos, e depois que certas partes eram entregues aos oficiais cultuais, os adoradores e os convidados comiam o restante da carne em casa.70“Sacrifício de comunhão” ou “sacrifício de comunhão”, se é esse, de fato, o significado exato de selãmim, acres centa ironia dramática à narrativa, pois essa mulher não sabe coisa alguma sobre comunidade e verdadeira comunhão. Supõe-se que ela 68. D. Garrett. “Votive Prostitution Again: A Comparison o f Proverbs 7. 13-14 e 21.28-29”, JBL 109 ( 1990) 681 -82. Garrett observa que 21.28 se refere a uma falsa testemunha e que 21.29a, que ele associa a esse versículo, é a única outra passagem na qual 'zz no Hifil (“ser forte”) ocorre associado a pãnirn (“rosto”). Seguindo Q e LXX em oposição a K, Targ. e Vulg., Garrett interpreta 21.29b com o significado de que o justo enxerga o que há por trás das mentiras descaradas do homem perverso. 69. A. Brenner e F. van Dijk-Hemmes, On Genderirtg Text, p. 59. 70. Perdue, Wisdom and Cult, p. 149.
se apresentava como devota de um culto estrangeiro, uma vez que a prostituição e o adultério eram proibidos dentro do culto a Yahweh. Um tipo específico de sacrifício de comunhão era aquele associado a um voto, à promessa de um petiocionário de oferecer um sacrifício caso a divindade atendesse à petição (cp. 31.2). Essa mulher insolente e dissi mulada em todos os sentidos, agora alega hoje (hayyôm) cumpri (Sillamti, i.e., retribui) os meus votos ( nedãrãy ) sendo possível que o plural se refira a vários votos acumulados. Naquela cultura, sua decla ração teria sido entendida como, “Tenho comida dos meus sacrifícios em casa”. O Pregador adverte, “Quando a Deus fizeres algum voto, não tardes em cumpri-lo”. Ele prossegue falando de mensageiros envi ados do templo para exigir o pagamento (cp. Ec 5.4-6; cp. também Dt 23.21 -23[22-24]; Pv 20.25). De acordo com a lei mosaica e, suposta mente, com as práticas religiosas cananitas, a refeição que cumpria o voto devia ser comida no dia que o sacrifício era realizado e/ou no dia seguinte, uma vez que tudo o que restava depois desse período se tor nava contaminado e não podia ser consumido (Lv 7.16-18). Presumin do a ligação dessa mulher com o culto de fertilidade cananita, a refei ção comunal também envolvia a necessidade de um parceiro do sexo masculino para relações sexuais. Na religião cananita os sacrifícios comunais eram seguidos de ritos de fertilidade (Êx 32.1 -6; Nm 25.1,2). O convite para ter sexo com ela também era um convite para participar da religião da fertilidade.71 Mas será que ela está dizendo a verdade? Garrett argumenta que não. Se “ela se tomou atrevida” significa “con tou uma mentira na cara dura”, então essa “interpretação envolve uma rejeição da posição de G. Bostrõm, W. McKane, G von Rad e R. B. Y. Scott de que a mulher fizera um voto a Afrodite e devia cumpri-lo com uma relação sexual”. Mesmo que Garrett tenha estendido excessiva mente o significado de hê'êzâ pãneyhã, o discurso da mulher está tão repleto de falsidades e sentidos duplos que não pode ser aceito sem questionamento. O pai caracterizou as palavras da raposa ardilosa como sendo “suaves” (v. 5) e as suas vestes como parte da camuflagem astuta. Também caracterizou a mulher como sendo rebelde, não religi osa. Ela mente sobre como encontrou o rapaz (vs. 11-13, 15) e, talvez, a respeito de seu marido, pois o ingênuo é pego de surpresa (vs. 19-23). Então, por que acreditar em sua devoção religiosa? Todavia suas pala vras são tão suaves que encantam até os comentaristas, fazendo-os
colocar de lado seu ceticismo habitual e engolir a isca, o anzol, a linha e a chumbada. O pai já interpretou seu caráter como sendo inquieto e rebelde, sem fazer menção alguma à religião (vs. 11, 12). No entanto, McKane está correto ao dizer que ela é particularmente perigosa pois oferece muito e não pede nada em troca.72 15 Por isso Çal-kên) pressupõe que a audiência tenha algum conhe cimento do culto à fertilidade antes descrito. Sua declaração sai (yãsã’ti) ao teu encontro (liqrã'tekã) combina com a observação do pai (v. 10). Em outra ironia dramática, além da sua pretensa religiosidade (cp. v. 12), a sedutora de palavras doces lisonjeia o rapaz lhe dizendo que saiu para buscar o [seu] rosto diligentemente (leSahêr; veja 1.28), seu rosto (pãneykã), uma expressão idiomática que significa fazer um pedido e que dá a entender que seus traços atraentes o destacaram dos demais, fazen do dele um convidado honrado para essa ocasião especial. Na verdade, ele é o rapaz certo porque parece descuidado. Então, o discurso chega ao seu ápice com a exaltação astuciosa, e te encontrei (wa’emsã'ekã; veja 3.13), você, seu bonitão charmoso. Essa idolatria evidente, porém talvez dramaticamente irônica, da sua vítima - ela o escolheu e a mais ninguém, ela o buscou diligentemente, e agora o convida pessoalmente para sua casa luxuosa (cp. 9.3, 15, 18) - oculta sua concupiscência. Tanto a mu lher sabedoria quanto a mulher insensata e seus respectivos amantes buscam e encontram um ao outro (cp. 1.28; 2.4; 3.13; 8.17,35). 16 Depois de lisonjear seu ego, ela estimula seu apetite sexual apre sentando uma visão do leito luxuoso que ela preparou de antemão para o banquete e para a noite de amor. Já provi (rãbadti) e colchas (marbaddim) são duas palavras raras, mas que são atestadas por tex tos ugaríticos (ca. 1400 a.C.) com o sentido esperado de “prover (uma cama) com cobertas”. Essas colchas eram usadas para tomar o leito macio (cp. 31.22). O substantivo na frase o meu leito (ou divã;73 'aréi) ocorre oito vezes na forma poética, uma vez em prosa (Dt 3.11) e três vezes em paralelo com m iffâ1 (SI 6.6[7]; Am 3.12; 6.4). Sabe-se ao certo que era usado para se reclinar e dormir (SI 132.3) e, possivelmen te, uma vez que não se pode fazer nenhuma distinção entre m ittâ’ e 'ereé em Amós 3.12; 6.4, também para se reclinar durante uma refei ção. Em baixos-relevo amplos da Assíria pode-se ver o rei Assurbani72. McKane, Proverbs, p. 339. 73. HALOT, 2:889, s.v. 'ereé.
pal reclinando-se num leito de jantar repleto de almofadas levando uma taça de vinho aos lábios. Plaut explica que o costume antigo de se reclinar para o lado esquerdo ao beber vinho na refeição do Sêder re monta à postura antiga assumida para comer; o homem livre se reclinava no leito durante sua refeição.74No versículo 16b ela passa do apelo sensual do conforto da cama para o apelo estético. Como paralelo es clarecedor de “colchas” ela acrescenta, peças bordadas (hatubôt\ um hal. leg.\ veja n. 18). O linho ( etón; um hap. leg.) do Egito (misrãyim) se refere a um linho de cor vermelha, um artigo de luxo exportado pelo Egito antigo (cp. 31.22).75 A palavra emprestada da língua egípcia era “linho real”.76 D. Edwards observa acerca de vestes: “A cor era, com frequência, sinal de status, como também o era a qualidade da veste; assim, a indústria da tintura era de grande importância, como fica evi dente pelo grande número de estabelecimentos dedicados a essa ativi dade por todo o Israel antigo. Uma indústria particularmente importan te era a da tintura púrpura...” (veja 31.22).77 17 Agora ela o estimula com aromas afrodisíacos; os três nome de perfumes neste versículo também são encontrados em Cântico dos Cânticos 4.14 como imagens odoríferas do amor sexual. Para concluir a preparação do leito, ela diz, Eu perfum ei (n a p ti) minha cama (miskãbi) com especiarias aromáticas preciosas, pressupondo que a audiência sabe de que maneira as camas eram perfumadas. Sua cama (lit., “um lugar para se deitar” [cp. 22.27]) pode ser sinônimo de “leito”, porém agora, mais claramente, um lugar para fazer amor (Gn 49.4; Is 57.7, 8). A cama consistia num estrado colocado sobre quatro pés, re vestido de modo que almofadas e cobertores pudessem ser colocados sobre ele. No oriente antigo somente os ricos tinham móveis 78. As fragrâncias também contribuem para o cenário luxuoso.79 O verseto B dá o nome dos perfumes. A mirra (mõr) é uma resina de goma aromá 74. Plaut, Proverbs, p. 103. 75. HALOT, 1:37, s.v. ún; R. H. 0'Connell, “Proverbs 7:16-17: A Case o f Fatal Deception ina ‘W omanandthe Window’Type-Scene”, KT4I (1991)239,n.6I. 76. F. C. Fensham, NBD, p. 702, s.v. “linen”. 77. D. R. Edwards, ABD, 2:235, s.v. “dressand omamentation”. 78. Meinhold, Sprüche, p. 128. 79. A identificação das fragrâncias está baseada no estudo de 0 ’Connell, “Proverbs 7:16-17”, pp. 237-38. No entanto, 0 ’Connell não é convincente ao afirmar que os adornos da cama da sedutora, inclusive as fragrâncias, são nuanças enganadoras ou ominosas de morte, de modo que “o insensato de Prov. vii é seduzido pelas palavras refinadas da mulher nos vs. 16, 17, totalmen te alheio à sua intenção de preparar seu sepultamento (cp. vs. 22, 23)”.
tica usada tanto em forma sólida quanto líquida, extraída de árvores de bálsamo do sul da Arábia ou da África (Commiphora myrrha ou Commiphora kataf). A mirra também era pulverizada até se transformar num pó fino colocado num sachê, o qual as mulheres usavam entre os seios (Ct 1.13). O aloé ( 'aliãlím) era uma especiaria preciosa extraída da planta com o mesmo nome (Aquillaria agallochum) encontrada no sudeste da Ásia e norte da índia. Na Bíblia, ele ocorre sempre com mirra (Ct 4.14). O cinamomo (qinnãmôn) é obtido da casca da árvore de canela, mais especificamente da Cinnamomum zeylanicum, nativa do Sri Lanka e da costa da índia. A casca era arrancada e dela se extraía um óleo claro e fluído ou era seca e vendida na forma de barras. Esses perfumes tinham de ser adquiridos de mercadores que viajavam distâncias enormes, e eram estimados e expostos como parte de um tesouro real (2Rs 20.13). Somente os reis e os muito abastados podiam usar esses produtos em grandes quantidades (SI 45.7, 8[8, 9]; Ct 3.6, 7). A esposa do mercador estava disposta a gastar tudo isso para satis fazer sua paixão sexual ardente. Seu amante lisonjeado não podia igno rar tamanho investimento e oportunidade, como ela argumenta implici tamente. Talvez da sua parte, o ingênuo também tenha dado provas de possuir alguma riqueza para atraí-la, supondo que de fato o seu boudoir era decorado tão luxuosamente como ela afirma. 18-20 Agora ela faz sua proposta indecente: o lucro sensual volup tuoso explica seu investimento (7.18), e eles não têm nada a temer (vs. 19,20). 18 A inteijeição vem (leM ; veja 6.3) pede uma ação imediata, embriaguemo-nos ( nirweh ; veja 5.19). A HALOT traduz rwh no Nifal “sich laben” (“refrescar-se/regalar-se/revigorar-se, participar de igua rias”) mas não oferece nenhum motivo convincente para descartar to dos os dados léxicos que indicam o significado “ser/estar saturado”.80 Os seios da mulher saciam o seu amante em 5.19, e a expressão idio mática “beber amor”, provavelmente relacionada à metáfora de “beber água” para o coito e “água do poço” para a vagina (veja 5.15-18; 9.17), ocorre em Cântico dos Cânticos 5.1 Com o verbo sth, “beber”: $etü weSikrü dôdim (“bebei fartamente, ó amados”).81 Na Bíblia o plural dôdim (com amor) sempre se refere a um relacionamento de cunho 80. Cp. BDB, p. 924, rüwâ-, HALOT, 3:1195, s.v. rwh. 81. Notado por Fox, Proverbs 1-9, p. 248.
sexual, e em Cântico de Salomão tem um forte sentido erótico intenso. No acadiano o plural também é usado constantemente com esse senti do erótico.82Até ['acl-habbõqer] pela manhã quando o sol nasce impli ca que ela antevê passar a noite desfrutando lentamente toda a forma e deleite da relação sexual. Desfrutemos um do outro (nit'allesâ) res salta sua dependência recíproca e enfatiza o prazer da experiência. Com amor (bo^hãbim; veja 1.22), que se refere somente ao amor eró tico (2Sm 13.1; Os 8.9), parodia o verdadeiro amor que é mais forte que a morte, um fogo intenso que nem muitas águas podem apagar (Ct 8.6-8). A tentadora promete amor sexual sem inibição erótica, mas se recusa a assumir o compromisso fundamental da entrega de si mesma ao amante, um requisito do verdadeiro amor. Seu tipo de erotismo traz complicações, até mesmo a morte, de modo que deve ser rejeitado. “Dizer fisicamente ‘estou me entregando a você’ e, ao mesmo tempo, guardar a si mesmo emocional e espiritualmente do compromisso pac tuado é, na verdade, viver uma mentira - uma divisão na personalidade que, por fim, se mostra estressante e destrutiva.”83 19 Os versículos 19, 20 são ligados pelo assunto “meu marido” pela expressão “minha casa”. Seu argumento final visa remover o medo do rapaz descomprometido de que o marido dela os pegará em adulté rio (6.34, 35). Porque (ki) é uma elipse de “porque você não tem nada a temer, uma vez que”. Suas tentações são semelhantes às de Satanás. Ao apelar para a cobiça de Eva pelo alimento, estética e sabedoria independente, Satanás coloca de lado as reservas de Eva para não pecar prometendo, “Não morrerás”. Se a esposa devassa que é se mente de Satanás estivesse certa, então toda a base da ética bíblica é solapada: atos e conseqüências não têm nenhuma ligação. “A relevân cia da sedução da mulher estranha se encontra no fato de ela ser rea lizada numa linguagem que separa os atos das conseqüências. Em Pro vérbios 7... a mulher não procura convencer sua presa de que o adulté rio é certo, mas apenas de que ele pode escapar impune porque o ma rido dela não está em casa.”84 Ela usa tanto as suas roupas como sua linguagem para mascarar a realidade. Ela representa meu marido por “o homem” (h ã ’i$), não “meu marido” ( ’iSv, cp. Gn 29.32,34; 30.15,20; 82. J. Sanmartin-Ascaso, TDOT, 3:144, s.v.dôdh. 83. Atkinson, Proverbs (Leicester, Eng. e Downers Grove, III.: Inter-Varsity, 1997), p. 77. 84. C. V. Camp, “Woman Wisdom as Root Metaphor: A Theological Consideration”, in TLH, p. 51.
Js 2.9,18; 2Sm 24.5; 2Rs 4.1) ou “meu senhor” (ba a li; somente em Os 2.16[ 18]), mas não se pode argumentar que essa designação tem um tom de repúdio.85 A expressão idiomática hebraica usa o artigo onde em nossa língua se prefere o pronome pessoal.86 Em casa traduz o hebraico “na casa dele” (bêtô), mas essa expressão idiomática não su gere necessariamente que, em termos emocionais, ela se encontra ali enada dele, pois naquela cultura ela não falaria de “minha casa” (cp. 6.31; 11.29; 15.27; Jó 8.15; 20.28; 38.20), mesmo que o pai obrigatori amente se refira à residência da esposa infiel várias vezes como “sua casa” (2.18; 5.8; 7.8, 27; 9.14; cp. 9.1 e 14.1; 31.21). Nem o marido nem a esposa estão presentes nessa casa pagã; a ausência de um e de outro é inter-relacionada. Um aspecto importante é que ela anuncia claramente que sua proposta envolve só o prazer sexual, não um com promisso que implicaria divórcio e novo casamento. Antes, ela reco nhece abertamente que seu marido voltará em duas semanas, dando a entender que ela pretende continuar casada, ainda que infiel, deixando o tolo sem nenhuma desculpa moral para a prática estúpida de adulté rio. O tolo devia saber que a mulher não é digna de confiança, pois seus argumentos revelam que ela é dissimulada e infiel. Além do mais, seu discurso destrói sua camuflagem de prostituta profissional, pois o sexo com uma profissional não atrairia sobre o amante o furor de um marido. A prova de que o marido saiu (hãlak) de viagem (bederek\ veja 1.15; cp. Nm 9.10)para longe [ou para uma longa viagem] é provavelmente uma mentira, a julgar pelas conseqüências terríveis que sua vítima sofre (7.22; cp. 5.9, 10). De acordo com o pai, seus motivos se devem à sua natureza lasciva e rebelde, e não à cobiça de sua casa pagã (veja 7.11, 12). 20 Ela reforça a ideia de que o jovem não tem nada a temer acres centando a distância física (v. 19) e temporal (v. 20) do marido. Sua declaração vividamente concreta, tomou (lãqah; veja 1.3) em sua mão (ibeyãdô; veja 1.24) uma bolsa (serôr) significa que ele está fora numa viagem de negócios. A qualificação cheia de prata (hakkesep; veja 2.4) indica que ele tem vários negócios a realizar e que, portanto, ficará fora por um bom tempo. Tomando por base essas declarações é impos sível fazer qualquer dedução a respeito da etnia desse homem ou sua época, pois todas as nações têm negociantes itinerantes; Israel os tinha 85. Pace Fox, Proverbs 1-9 , p. 248. 86. IBHS, p. 243, P. 13.5.le.
pelo menos desde o tempo de Salomão87. O seu lar luxuoso apoia o argumento de que ele levou muita prata. Sua declaração voltará para casa (yãbõ ’ bêtô; lit. “entrará em sua casa”) serve para ressaltar que ela não tem nenhuma intenção de abrir mão do seu estilo de vida confor tável em troca de um relacionamento de uma noite só. O objetivo maior dessa parasita é satisfazer seus desejos, não servir a seu Criador que lhe deu a vida, à sua comunidade que lhe dá estrutura social, ou a seu marido que a sustenta. Na lua cheia (leyôm h a k k e s e lit. “no dia da lua cheia”)88 dá a entender que ele ficará fora duas semanas, se podemos supor que ela ofereceu seu sacrifício na lua nova (v. 14), quando o crepúsculo ves pertino sem lua é particularmente escuro e sombrio (v. 9).89 Bostrõm apoia sua interpretação de que ela é, de fato, uma prostituta cultuai que necessita de um cúmplice do sexo masculino que não o seu marido, com o argumento de que na lua nova a constelação da Lua e do Sol mostra certa afinidade com a relação sexual. No entanto, Plõger se opõe corre tamente, afirmando que Bostrõm lê mais do que as indicações textuais escassas mostram.90 O argumento da raposa é plausível no sentido de que os viajantes aproveitavam a lua cheia quando as viagens eram me nos perigosas. É evidente que ela não faz menção de outras possíveis testemunhas de sua infidelidade, como o pai, que poderia delatar os aman tes ao marido. Se o marido os flagrasse em seu encontro amoroso, podese supor que a mulher acusaria o rapaz de estupro (cp. Gn 39.6b-20). (3) Queda: a submissão do ingênuo (7.21-23)
O pai conclui sua narrativa com um comentário acerca da eficiência mortal do discurso da mulher. O versículo 21 apresenta sua eficiência, enquanto que os versículos 22,23 mostram suas conseqüências mortais. 21 Ela o desencaminhou (hittatü; veja 2.2) é uma declaração literal e metafórica: ela dirigiu a lascívia dele para seus atrativos sensu ais e, deste modo, dirigiu o corpo dele para a sua casa. Com sua... persuasividade traduz liqhãh, que, se tiver seu significado normal de “ensinar” (1.5; 6.25), representa o discurso dela como a apresentação de uma visão de mundo e de vida contrária à do pai. O mais provável é que seu significado essencial, “levar” denote o ato de ela “levar” (i.e., 87. Cp. Gemser, Sprüche, pp. 35-36. 88. HALOT, 2:401.487, s x.yôm , kese'. 89. Meinhold, Sprüche, p. 129. 90. Plõger, Sprüche, p. 80.
seus caminhos atraentes/sedutores) ou de “assumir o controle” da mes ma maneira como o verbo lãqah foi usado para os seus olhos seduto res.91 Aqui, se refere a ela “levá-lo” por sua conversa suave (i.e., ser persuasiva; cp. 11.30; 16.21,23). Imensa (rõb\ veja 5.23; 10.19) quali fica que seus “encantos” são muitos. O cerne do quiasmo, com a sua vidade (behêleq - observe a seqüência quebrada de Iqhh bhlq) dos seus lábios (áepãteyhã\ veja 5.3; cp. 6.4) acrescenta outro qualificador a seu discurso eficiente e forma um inclusio com a introdução (cp. 7.5). A parte exterior do quiasmo, ela o desnorteou (taddíhennü; i.e., ela o leva por força ou o afugenta)92 significa que sua sedução tirou o “tolo” do seu rumo no caminho da vida e o forçou para a casa dela, o vestíbulo da morte (veja 2.18,19). 22 As “imagens cativantes e horrendas” 93 que o pai apresenta d destino do ingênuo visam impressionar o filho com a “realidade” dura de que o salário do pecado é a morte. As declarações breves “ela o desencaminhou” e “ela o desnorteou” são substituídas pela afirmação vivida e dramática, ele a seguiu (hôlêk, um particípio durativo; “ele a estava seguindo”). Rapidamente (pit'õm\ 3.25; 6.15) determina o mo mento da decisão e indica que o ingênuo agiu sem refletir, permitindo que suas glândulas pensassem no lugar de seu cérebro. De modo edito rial, o sábio interpreta e ilustra a cena com três comparações usando animais. A primeira símile, como um boi (kesôr) que entra ( y ã b ô veja v. 22) num matadouro, compara a vítima da mulher ao rei dos animais domésticos com toda sua força física e indica que o jovem insensato, ao seguir seus instintos animais em vez do bom senso intelectual e espiritual, privou-se de todas as oportunidades e força que lhe foram concedidas e até mesmo da vida. No abate ritualmente puro (cp. 9.2) de um boi, o pescoço era cortado abaixo da jugular, seccionando a traqueia, o esôfago e as veias de grosso calibre do pescoço, levando à morte imediata em função da hemorragia.94 A segunda símile, e como veado intensifica a realidade fatal e acrescenta a graça do veado à força do boi, e que pisa no laço (üke'akkes ’el-môsêr 'ayyãl', veja n. 33) acrescenta a ideia de cilada, um conceito apresentado por “ela fica à espreita” (v. 12). 91. BDB, p. 544, s.v. leqah\ HALOT, 2:535, s.v. leqah. D. Winton Thomas (“Textual andPhilological Notes on Some Passages in Proverbs”, in WIANE, p. 284) acrescenta a esse significado gestos sedutores que acompanham a persuasão verbal. 92. Cp. L. J. Coppes. TWOT, 2:556, s.v. nsdâ. 93. Brenner e Dijk-Hemmes, On Gendering Text, p. 60. 94. Meinhold, Sprüche, p. 130.
23 Em termos semânticos, até Cad; veja v. 18) que uma flecha (hês) abre (yepallah) o seu fígado (k ebêdô) está relacionado mais apropriadamente ao versículo 22b conforme a correção (veja n. 33). Apesar do texto nos versículos 22b e c ser difícil, o significado é claro: a vítima encontra seu fim (veja vs. 26,27). O texto não visa identificar quem atirou a flecha; traz apenas o efeito fatal de atingir o fígado de um veado pego num laço. O fígado, derivado nas línguas semíticas do radi cal “ser pesado”, sugere que o órgão está cheio de sangue. O fígado humano, mencionado apenas em mais uma passagem, Lamentações 2.11, aparece com frequência na literatura acadiana, e é considerado a sede da vida. Abrir o centro do suprimento sanguíneo e de vitalidade do animal é o mesmo que provocar sua morte instantânea. A terceira sími le, como uma ave {ke... §ippôr\ veja 6.5) que se apressa (mahêr; veja 25.8a) para uma armadilha ( ’el-pãh\ veja 22.5), acrescenta à ideia de cilada o elemento da velocidade que o apóstata encontra seu destino fatal. O conceito implícito de ignorância do boi e do cervo agora é explicitado. E não sabe (weõ ’-yãda‘; veja 5.6) ele (k ã ‘) [que age] contra a sua própria vida (benapSô\ veja 1.18). O sábio completa conclusão narrativa com esse resumo claro. Os animais estultos não veem nenhuma ligação entre as armadilhas e a morte, da mesma ma neira como pessoas moralmente estúpidas não veem nenhuma ligação entre seu pecado e a morte (cp. 1.17, 18; Os 7.11). c. Conclusão (7.24-27) O pai conclui a palestra repetindo a admoestação para o filho ficar longe da lasciva (vs. 24,25), acompanhada de mais uma argumentação (vs. 26,27). (1) Admoestação: ouvir o pai, não a esposa lasciva (7.24, 25) A admoestação é típica, pedindo atenção (v. 24) antes da ordem específica (v. 25). 24 Ao contrário das conclusões da maior parte das palestras, esta repete enfaticamente o pedido por atenção a seu ensino, formando um inclusio com os versículos 1-5. Agora, pois (we'attâ) filhos (bãnim\ veja 4.1) estende a instrução do filho do versículo 1 para a linhagem de filhos. Escutai-me (sim 'ü-li) repete literalmente a exortação introdutó ria da lição da primeira palestra completa sobre a esposa lasciva (veja
5.7). O paralelo enfático é eprestai atenção (wehaqèlbü\ veja 2.2) às palavras da minha boca (le>imrê-pi; veja 4.5), que são necessárias à contraparte das palavras da boca da mulher estranha. O pai separa radicalmente a posteridade que dá ouvidos às suas palavras (veja 1.4). 25 Não permitais que o vosso coração (libbekã; veja pp. 141142) se desvie Çalyêsf, veja 4.15) usa sãtâ como mais um sinônimo para sür, “desviar” (veja nãtâ; v. 21) para os caminhos dela ( ’elderãkeyhã; veja 1.15). A metáfora incompleta representa as dissimula ções misteriosas; a lascívia inquieta, irracional e incontida; infidelidade ao marido; tirania contra a sociedade; e indiferença insensível para com o destino do jovem. O paralelo sinônimo não vos extravieis ( ’al-fêta i.e., deixar um ponto de referência) na direção de suas veredas (binetibôteyhã; veja 1.15), enfatiza a proibição e implica numa admoes tação para permanecer no caminho reto da sabedoria herdada. T h é usado para as perambulações de uma pessoa perdida (cp. Gn 21.14) ou para o andar cambaleante provocado pela embriaguez (cp. Is 28.7). (2) Motivação: a esposa lasciva é mortal (7.26,27) 26 Porque introduz as duas razões nos versículos 26, 27 por trás das duas admoestações no quarteto anterior (vs. 24, 25). “As palavras finais do pai nos versículos 24-27 expõem a dimensão mítica monstruo sa da mulher estranha. Ela não é apenas uma mulher que seduziu um rapaz simplório. E uma predadora que abateu multidões. De fato, sua vagina é a porta do Sheol. Seu ventre é a própria morte.”95 Esses versí culos estão intimamente relacionados com a conclusão do ensino introdu tório acerca da casa de perdição da mulher estranha em 2.18, 19 e for mam um inclusio com eles. Ela derrubou (hippilâ) resume suas táticas enganosas e eficazes (vs. 6-23). Sozinha, ela subjugou muitas (rabbim) vítimas (homens). Abatidas (hfllãlim), literalmente, “ser esvaziado, traspassado” (cp. o veado em 7.23), é, neste caso, um termo técnico para ser “traspassado” numa batalha - apesar de poder ser usado para qualquer pessoa assassinada ou executada - e como metonimia para os cadáve res que são despidos e sepultados. Esse termo, empregado para uma morte violenta e inatural ocorre com frequência com a raiz npl (cp. Jz 9.40; ISm 31.8), como é o caso nesta passagem. Até os poderosos (wa'asumim ) se refere a homens cujo poder agressivo e/ou força de-
fensiva se baseia em sua superioridade numérica.96 Apesar de seu nú mero, são um rebanho de bois sendo conduzido ao matadouro por uma única mulher agressiva. O significado de “muitos” está mais para todos (kol): ninguém é eximido da morte certa.97 Mortos por ela (harugeyhã; veja 1.32) aparece com frequência em paralelo a “abatido”. Hãrag teve origem na terminologia bélica. O genitivo agentivo apresenta numa cena culminante a mulher como conquistadora vitoriosa que derrotou um exér cito de homens que ela própria caçou (veja 6.26). A imagem está intima mente ligada às divindades Istar da Babilônia e Inanna da Suméria, sendo que ambas exerciam a dupla função de deusas do amor e da guerra. 27 Este versículo desloca a imagem, de sua vitória no campo d batalha para a imagem de sua casa e seus caminhos, a fim de represen tar o caráter final da morte das vítimas. A sua casa (bêtâ\ veja v. 8), que ela representou como uma casa de prazeres lascivos (vs. 16-18), na verdade apresenta o vestíbulo para os caminhos (darkê; veja v. 25; 2.8) que conduzem à sepultura (êeôl\ veja p. 172). O plural indica que em sua casa há vários caminhos errados (i.e., vários aspectos do seu comportamento insensato) e conduz ao reino da morte abaixo dela; qualquer um desses caminhos conduz à morte.98 A ideia de conduzir à sepultura é agora explicada. Os estilos de vida materializados na espo sa lasciva [descem] (yõr^dôt; veja 1.12; 5.5) às câmaras (hadrê) da morte (mãwet; veja 2.18), a palavra final e culminante da palestra. Heder “sempre se refere a um cômodo que protege seu interior da parte exterior, ou que não pode ser observado por alguém do lado de fora”. Seu componente semântico básico é “câmara interior (ou escura) de uma construção sólida”. O plural vê a sepultura dividida em várias câmaras; a pior é a mais inferior, onde suas vítimas se encontram (veja 9.18). Assim como pode haver um jogo de palavras com “seus lábios” entre o exterior e o interior (5.3), também pode haver uma correlação entre a sepultura e o corpo da mulher. Em outras passagens de Provérbios, heder se refere às “partes mais íntimas do corpo ou do ser” (18.8 = 26.22; 20.27, 30). Price afirma que “na literatura mishnaica e talmúdica, heder assumiu a conotação adicional de parte interior dos órgãos genitais femininos e, no plural, a nuança de recônditos mais remotos ou sigilo absoluto”.99Gemser diz: “O quarto da mulher não é um salão de baile, mas sim um campo 96. R. Wakely, NIDOTTE, 3:487-94, s.v. ’sm. 97. T. Hartman, TLOT, 3 :1197, s.v. rab. 98. De acordo com Meinhold, Sprüche, p. 132. 99. J. D. Price, NIDOTTE, 2:28-30, s.v. hdr.
de batalha com corpos estirados pelo chão e de onde muitos são manda dos para o mundo inferior (2.18s.; 5.5; 9.18), para as câmaras mais pro fundas da fortaleza da morte, destinadas aos mais desrespeitados dentre os mortos (Ez 32.23, 27; Is 14.15s., 19s.)”.100 Apesar de Deus não ser mencionado neste capítulo, as outras expressões claras da visão de mun do e de vida do sábio mostram que Salomão toma por certo que Deus é o Agente final que sentencia o ingênuo à sua morte (e.g., 5.21-23). 13.
Segundo interlúdio: autolouvor da sabedoria ao ingênuo (8.1 -36)
1 Acaso a sabedoria não clama,' e o entendimento não ergue sua voz? 2 Nos pontos mais altos,2junto ao caminho, nas encruzilhadas3 ela se coloca,4 3 Ao lado5 das portas6 às entradas1 da cidade,8 nas aberturas9 das passagens'0 ela clama em alta voz:u 4 A vós, ó homens,n eu clamo; de fato, eu clamo em alta voz [a ti], humanidade. 5 Vós ingênuos, entendei a perspicácia, e vós insensatos colocai nela o vosso coração.13 100. Gemser, Sprüche, p. 45. 1. A LXX entendeu tiqrü' como segunda pessoa masc., “proclamarás a sabedoria” e traduziu o verseto B livremente como “para que o entendimento possa te seguir”. ATarg. e Sir. também remo veram a personificação. 2. Ou “no cume da altura”. Br’S-mrwmym “no cume das alturas” é um superlativo que exige uma construção no pl. (veja 1.21). Em Jó 22.12 rõ '&kôkãbtm significa “a estrela mais alta” (veja HA LOT, 3:1166, s.v.rõ's). 3. A forma é II byt (fem. de byn); lit., “entre as veredas” (HALOT, 1:129, s.v. II bayit). 4. Umperfectivo instantâneo (IBHS, p. 488, P. 30.5.1 d). 5. Veja HALOT, 2:388, s.v.yad. 6. Ou “porta”, entendendo o pl. como um pl. de extensão (IBHS, p. 120, P. 7.4.1c;cp. 1.21). 7. Lit. “boca da”. 8. Qrt é um termo encontrado exclusivamente na literatura sapiencial. Uma vez que é atestado no ugaritico ( UT, #2284), não é recente (pace BDB, p. 900, s.v. qeret). A LXX não conhecia esse termo (veja L. Adams, “Lexical Equivalence in LXX Proverbs 1-9: A Study in Translation Technique” [tese de M.C.S., Regent College, 1992], p. 68). 9. Entendendo o sing. como um coletivo (IBHS, pp. 113-14, P. 7.2.1c). 10. Veja n. 6 para a forma pl. 11. Veja 1.20 para a forma. 12. Normalmente o pl. de ’£í é o pl. fenício regular, que também é encontrado no Salmo 141.4, atribuído a Davi, sugerindo que não é recente (pace HALOT, 1:43, s.v. ’fs). 13. A repetição de hõblnú no TM é textualmente suspeita. A LXX traz enthesthe kardian “arma zenar no coração” (< hkynw lêb\ de acordo com Baumgartner, Êlude critique sur l ’état du
6 Escutai, pois falo o que é certo,'* e o abrir15 dos meus lábios fa la 16 o que é reto.'1 7 Certamente o meu paladar profere a verdade e a perversidade é uma abominação para os meus lábios. 8 Todas as palavras da minha boca são ditas18em retidão, e não há nenhuma sequer entre elas que seja enganosa ou perversa. 9 Todas elas são retas para aqueles que entendem, lexle du Livre des Proverbs [Leipzig: W. Drugulin, 1890], p. 82; Lagardc, Anmerkungen zitr griechischen Übersetzung der Proverhien [Leipzig: Brockhaus, 1863], p. 27), uma confu são gráfica fácil com hbynw. Apesar dc ser conccbívcl que entithêmi pudesse traduzir bin no Hifil, traduz hbynw no verseto A como noèsate (< hbynw) sem qualquer escrúpulo estético quanto à repetição (para estatísticas veja Adams, “ Lexical Equivalence”, p. 87, pace McKane [Proverbs, p. 43]). Se hõkinü é original, a expressão idiomática hkyn lêb significa “estar decidido, estar firmemente determ inado”, como em 1 Crônicas 29.18; Jó 11.13; Salmo 10.17 (veja HALOT, 2:465, s.v. kün) e 'ormâ é omitido, como a LXX possivelmente também pressupõe. A Targ., talvez confusa em função de “coração”, muda o verbo e traz "Que os néscios raciocinem em seu coração". 14. f^ g íd tm significa “príncipes, governantes"; os lexicógrafos mais antigos sugeriram o significado excepcional “coisas valiosas” (BDB, p. 618, s.v. nSgid). Gemser (Sprüche, p. 36) cila Efésios 4.29; Filipenses 4.8; Colossenses 4.6. Toy (Proverbs, p. 166) corrige o texto para nekõhtm , "coisas direitas” (cp. BHK e BHS). Esse conceito combina com o v. 9 e forma um paralelo mais apropriado com mêsãrim “coisas retas” e com as outras palavras nos vs. 7-9: “verdade", “retas”, “direitas”. As versões antigas parafraseiam negidlm como “verdade” (veja v. 7). R. P. L. Grollenberg (“ A propos de Prov. V1I1,6 et XVII,27”, RB 59 [1952] 40-42), seguido por HALOT (2:666, s.v. neged), obtém o mesmo significado revocalizando o texto para negãdim . uma forma pl. da preposição neged que mantém seu valor como um substantivo (“aquilo que se encontra diante de alguém” ). O hebraico aplica palavras referentes a se encami nhar para certa direção a valores moralistas. Assim, com a preposição nõkah “o que está em frente da pessoa, diretamente diante dela” pode-se encontrar o substantivo ríãkOah (“o que está em frente de, em linha reta” ) com o valor moral, “reto, o que é certo”. A sabedoria diz que suas palavras no v. 9 sào nekõhtm (i.e., são claras e verdadeiras; cp. 24.26; Is 59.14). Do mesmo modo. os mestres sábios empregavam uma forma pl. de neged com um valor moralista que é praticamente um sinônimo de nekõhim e mêSSrim. Grollenberg responde à objeção de que essa forma não é atestada em outras partes da Bíblia afirmando que Provérbios 1-9 é caracterizado por um vocabulário único no que se refere a raízes freqüentes com formas raras ou excepcionais. Essas palavras expressam qualidades de ordem moral empregando especialmente pl. abstratos e formas com sufixo -út; cp. 3.8, ripút, um hap. leg.; 4.24, 'iqtf&üt (que, além desse versículo, aparece somente em 6.12); 9.13, kesilút. um hap. leg.; e pfitayyüt. Em razão da curta duração de algumas palavras, os copislas ajustaram este hap. leg. á palavra comum nõgid, com a qual estavam mais familiarizados, assim como transformaram SelSSím em sSlíSim em 22.20. Se podiam dizer: “escrever sobre maiorais”, por que não poderiam dizer “falar sobre príncipes”? pergunta Grollenberg com sarcasmo. 15. Miptah é outro hap. leg. neste versículo (cp. Targ., “e o discurso da minha boca” ). 16. Lit. “o abrir dos meus lábios é imparcialidade/equidade”. 17. Apesar de mêSSrim ser traduzido como “justo” em 1.3, aqui seu sentido seria ambíguo. “Reto” permite que o leitor veja o inclusio formado com y^SSrim ("direitas") no v. 9b. 18 .0 verbo é omitido, mas fica implícito pela preposição (IBHS. p. 224, P. 11.4.3d).
sim, retas para aqueles que encontraram conhecimento. 10 Escolhei19 minha instrução20 em vez da21 prata, meu conhecimento em vez do22 que o ouro fin o P 12 Eu, a sabedoria,24 habito2i com a perspicácia; e conhecimento e prudência eu encontro.26 13 O temor do S e n h o r é aborrecer o mal - 21 19. Para este significado de Iqh veja HALOT. 2:534, s.v. Iqh. 20. A LXX, Sir. e Targ. trazem “instrução”. O TM, talvez em razão de uma ditografia de semelhan ça, formoujode e depois vau; ou a LXX pode ter uniformizado o texto com da'at, mas o sufixo pode estar exercendo duas funções (veja M. Dahood, The Anchor Bibte: Psalms III: 101-150 [Garden City,N.Y.: Doubleday, 1970],pp.430-31). 21. H*’al ou welo ’ em semiticopode funcionar como um comparativo (i.e., ao invés de adquirir prata, adquira instrução; veja Delitzsch, Proverbs, p. 177; Gemser, Sprüche, p. 44; H. Kruse, “Die ‘dialcktischeNegaíion’ ais Semitische Idiom”, V T 4[\ 954] 389). 22. Min denota uma comparação de exclusão, não de grau (IBHS, p. 265, P. 14.4e). 23. Todos os mss. e versões acrescentam o v. 11: “porque a sabedoria é melhor do que corais, e não se compara com todas as coisas que alguém deseja”. A estrutura do poema indica que “corais” é um comentário interpolado de 3.15, sugerido a um escriba antigo pela referência a prata e ouro no v. 10, correspondendo a 3.14. O uso de “sabedoria” no lugar de “ela”, uma variação necessária em relação a 3.15, e sua reformulação como um provérbio excepcional do tipo “melhor... do que” valida a amputação da inlerpolaçào. Somente neste provérbio com parativo a mulher sabedoria fala na terceira pessoa, não na primeira, como faz no restante de seu discurso (cp. P. Skehan, “Structures in Poems on Wisdom: Proverbs 8 and Sirach 24”, CBQ 41 [1979] 368; Van Leeuwen, Proverbs, p. 88; cp. Meinhold, Sprüche, 1:137). 24. Ou “eu sou sabedoria; eu habito”, um paralelo com o v. 14b. No entanto, o uso de hokmâ no v. I como um nome próprio para introduzir o discurso da sabedoria sugere que ela também o emprega aqui como um nome próprio. O maquefe que liga “eu - sabedoria” como uma só palavra, ajuda a confirmar essa interpretação (cp. IBHS, p. 64, P. 4.2.1a). 25. A Targ. e a Sir. trazem “crio” (< sikkentí = “eu estabeleço”?). Fichtner (BHS), seguido por Plõger (Sprüche, p. 85), traz Sckentt fem. ou Sãk?n (= “Eu sou sabedoria. Minha vizinha é a Pers picácia”). O sentido é não muito diferente do TM, que tem o apoio da LXX. 26. Fichtner (BHS) corrige d t... ’m ?’ para môda'at mezimmôt ‘imrnSsS’ (“sou tida como parente da prudência") sem nenhuma justificativa. Compara, curiosamente com a LXX: “Eu, sabe doria, habitei com o conselho e o conhecimento e invoquei o entendimento". Adams (“Lexical Equivalence”, p. 124) observa que, na LXX, dez das 25 ocorrências de ’ms ’em Provérbios são alinhadas com palavras que não apresentam nenhuma semelhança semântica com esse termo. 27. Apesar de ser atestado em todas as versões antigas, o v. 13 ou v. 13a pode ser uma tradução arcaica. O v. 13 interrompe a continuidade entre a ligação da sabedoria com a "prudência” (v. 12) e o “conselho” (v. 14) e volta para o tema do discurso corrupto (cp. vs. 6-11), e seus próprios tópicos, o temor do Srnhor ( v . 13a) e uma conduta humilde (v. 13b), são ímpares neste capítulo. A métrica do v. 13a é atípica neste capítulo: suas duas últimas palavras, “aborrecer o mal”, repetem de modo quiástico as últimas palavras do v. 13a, p, sendo semelhante a Jó 28.28; Provérbios 3.7; 16.6. A NEB deleta este verseto, mas a REB não. Mas uma vez que as três virtudes anexas no v. 12 também podem ser vícios, é apropriado que sejam salvaguardadas de uma interpretação equivoca da, como também é apropriado enumerar antônimos das virtudes que acompanham a sabedoria. Além disso, a estrutura simétrica dos vs. 12-31 com duas metades estilísticas e substantivas argumenta indiretamente a favor de sua inclusão. O quiasmo que envolve “mal” e “aborreço” pode atestar a unidade do versículo.
o orgulho, a arrogância e um mau caminho29, e uma boca perversa eu aborreço. 14 Conselho e desenvoltura pertencem a mim; eu sou o discernimento; a força heróica é minha. 15 Por meu intermédio reinam os reis, e os potentados decretam o que é certo. 16 Por meu intermédio governam os governantes, e os nobres - todos os juizes da terra.29 17 Quanto a mim, aqueles que me amami0 eu amo e os que me procurarem com diligência me acharão. 18 Riquezas e honra estão comigo, riqueza duradoura e prosperidade.31 19 Melhor é o meu fruto do que ouro, até mesmoi2 do que ouro puro e o meu rendimento do que a prata fina. 28. Rs' é construído como um adjetivo substantivai, não como um substantivo, a fim de evitar uma tautologia com o verseto A e de conformá-lo às outras 30 ocorrências de derek no construto com um substantivo pessoal, nunca com um gen. atributivo (c.g., 2.8; 3.17, 23; 4.19, 26). 29. Vários mss. do TM trazem 'Iodos os juizes justos” (gõpPfê sedeq). Toy (Proverbs, pp. 167-68, 171, seguido por Fichtner [B//S]), toma por base a LXX (“por meu intermédio nobres governam sobre a terra”) e reconstrói o v. 16 como nedíbim yiSpPfú Ures. pois esta leitura obtém simetria com os vs. 15a, b e 16a. No entanto, sua reconstrução tropeça em kot. Adams (“Lexical Equivalence”, pp. 151 -52) argumenta que a LXX é uma tradução livre que visa justamente obter a simetria, como fica evidente por seu acréscimo de “por meu intermédio” no lugar de kol. Os manuscritos e edições massoréticos se dividem em duas partes quase iguais entre eres (“terra”) e sedeq (= “justo”). O primeiro termo tem o apoio da LXX, o segundo, das outras versões antigas. Sopfifé ocorre quase sempre com 'eres, e nunca com sedeq (cp. SI 2.10; 148.11; Is 40.23). Delitzsch (Proverbs, p. 180, n. I) argumenta que se os massorctas que compilaram a Massora soubessem disso, provavelmente o teriam anotado na Massorá como layit (“uma vez"). Além disso, é mais provável que sedeq tenha passado a fazer parte do texto mais por ditografia da última palavra do v. 15 do que pelos massoretas terem simplesmente substituído o termo por 'eres. No entanto, Delitzsch está equivocado quando diz que sedeq não é necessário. Nem todos os juizes se mostram conformes aos atributos éticos da sabedoria. M. Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Philology [Roma: Pontificai Biblical Institute, 1963], p. 15) defende sedeq atribuindo ao termo o significado de “legítimo". O mais provável, porém, é que nesta tradição textual se tenha em vista a retidão ética (cp. 2Cr 19.6, 7). Apesar de sedeq não ser mencionado explicitamente no v. 16, deve-se pressupor que sedeq no v. 15b também qualifica esse versículo. 30. K traz ‘Bh°bêkõ (“aqueles que a amam” ), mas Q e versões antigas trazem ‘Sh‘bay ("aqueles que me amam”). Kayatz (Studien zu Proverbien 1-9, p. 102) ressalta que a formu lação de K preserva um protótipo egípcio que empregava rigidamente a terceira pessoa, mas não cita nenhum texto. 31. Sedãqâ também é traduzido como “retidão”. O disjuntivo r^bP' mugrSS não permite interpretar sedeq como um acréscimo à construção (i.e., “riqueza duradoura e reta”; cp. IBHS, p. 139, P. 9.3b). 32. Lendo K. Q omite o vau.
20 Eu ando33pelo caminho da retidão, no meio das sendas da justiça, 21 de modo aM conceder bem aos que me amam, e encher seus tesouros. 22 O Senhor me fez existir como a primeira do seu caminho,15 a mais antiga das suas obras do passado.36 23 No tempo mais remoto fu i formada,31 no princípio, desde os tempos mais antigos da terra. 24 Quando não havia abismos,3* eu fu i gerada, quando não havia fontes abundando39 com água. 25 Antes das montanhas serem plantadas, antes das elevações, eu fu i gerada. 26 Antes40 de ele fazer a terra e os campos abertos, e os primeiros torrões de terra41 do mundo 27 Quando ele estabeleceu os céus, eu estava lá, quando ele gravou um círculo sobre a face do abismo. 28 Quando ele fe z as nuvens firmes no alto, quando ele estabeleceu firmemente*2 as fontes do abismo; 29 quando determinou para o mar os seus limites - as águas não podem ir além da sua ordem —43 33. O PieI frequentativo de "andar” (IBHS, pp. 414-15, P. 24.5a,b). 34. Interpretando o inf. como se este denotasse uma cláusula de resultado (veja IBHS, p. 607. P. 36.2.3d). 35. A LXX, Sir. e Vulg. trazem o pl., provavelmente para um paralelo mais suave com “suas obras” . 36. A LXX traduz o vetseto B como “pelas obras dele”, um eiro segundo Toy (Pmverbs, pp. 181-82). 37. A LXX e Targ. trazem “tu me estabeleceste”. Sem levar em consideração o fato de que o tradutor mudou a voz para manter o S k n h o r como sujeito em toda a seção dos vs. 22-31, Baumgartner (Étude critique, p. 88), P. Lagarde (Anmerkungen, p. 29) e H. B. Swete (Introduction to the Old Testament in Greek [Cambridge: Cambridge University e Nova York: G P. Putnam, 1914], p. 337) corrige nissakti para nôsadtí (“Eu fui estabelecida/fundada”). HALOT (2:754, s.v. II skk e 2:703, s.v. II nSsak) acredita que é o Nifal de II skk ou de II nõsak, sendo que ambos significam “ser formado”, de “entretecer”, “ formar”. Gemser (Sprüche, p. 46; seguido por Fichtner [B//.S]) corrige para nesakkõti, o Nifal esperado de skk. 38. McKane (Proverbs, p. 354) considera, de modo questionável, o dual “dois oceanos”, a fim de conformar com o texto do épico ugarítico de Baal. 39. O Nifal gerundivo ptep. de kbd (“estar pesado com água”) é apropriado para fontes (IBHS, p. 387, P. 23.3d), não sendo necessária nenhuma alteração no TM (pace Fichtner [B//S]). 40. Lit. “até ainda não” (veja HALOT, 2:787, s.v. III 'ad). 41. Ou “os primeiros [torrões de]”, (de acordo com HALOT, 3:1166). 4 2 .0 TM traz ba'azôz (“quando... se tomou forte”), um erro de cópia fácil de ocorrer pela metátese de um b^aziPzô original, considerado pelas versões antigas e que preserva a gramática paralela e imagem dos vs. 28-30. 43. Lit. “sua boca” que, aqui, denota a função do órgão.
30 E eu estava ao seu lado constantemente; e eu me deleitava [diante deleJ45 dia após dia,Ab celebrando diante dele em todo o tempo; 31 celebrando sua47 terra habitada,48 e meu deleite era a humanidade49. 32 De modo que agora filhos, escutai-me - e50 abençoados são os que’1 guardam os meus caminhos. 33 Escutai a instrução esl tornai-vos sábios, e não a desprezeis . 53 34 Abençoada é a pessoa que me dá ouvidos, velando às minhas portas dia a dia, observando os batentes das minhas entradas; 35 porque o que me acha acha54 a vida, e assim obtém55 favor do Senhor, 36 mas o que me deixa escapar é aquele que pratica violência contra si mesmo; todos os que me aborrecem amam a morte. Os dois grandes poemas emparelhados - da “esposa lasciva” (cap. 7) e da “mulher sabedoria” (cap. 8) - são separados pela admoestação 44. A LXX traz “quando ele fez forte” (< bfib.02iPkô) em razão da confusão por semelhan ça gráfica de w com z. 45. Lit. “eu era deleites”. A LXX traduziu livremente como “em quem ele se deleitou” (veja Adams, “Lexical Equivalence”, p. 161). 4 6 .0 sing. é repetido para dar um sentido distributivo (IBHS, pp. 115-16, P. 7.2.3b). 47. Lit., “em sua” . 48. Lit., “o mundo habitável de sua terra”. ‘Eres é um gen. de gênero, a classe mais ampla à qual pertence tlbêl (IBHS, p. 153, P. 9.5.3Í; veja Jó 37.12, M. H. Pope, Jó [AB 15; Nova York: Doubleday, 1973]). 49. A partícula 'et marca enfaticamente o predicado dessas orações sem verbo (veja IBHS, pp. 180, 183, PP. 10.3b e 10.3.2c). 50. A construção causai paratáctica implica num relacionamento de causa (= “pois”) (IBHS. p. 649, P. 39.2.1c). 51. A LXX traz “e bem-aventurado é o homem que”. 52. A ligação lógica é léxica, não gramatical (veja 4.4). 53. Ou müsãr foi omitido (cp. 13.18; 15.32), ou , o que é mais provável, ’ôtô foi excluído por homoioteleuton depois do vau final que o precede. 54. K (cp. LXX e Sir.) traz mõçe 'ay mõçe e, mas Q traz ’í mã$U com pouca diferença quanto ao significado. 55.0 vau consecutivo dá continuidade ao perfectivo gnômico (IBHS, p. 555, P. 33.3.1 b) e prova velmente deve ser entendido como uma conseqüência lógica da declaração anterior (IBHS, pp. 547-48, P. 33.2a).
final para se manter afastado da esposa lasciva (7.24-27) e pela intro dução ao discurso da mulher sabedoria, que se assemelha à sua intro dução ao seu discurso em 1.20, 21 (8.1 -3).56Apesar de serem bastante diferentes em termos de estilo e conteúdo, esses dois poemas sobre a mulher devassa e a sabedoria personificada formam um díptico. A es posa lasciva se desloca secretamente durante o crepúsculo vespertino e fala com falsidade; a sabedoria se desloca publicamente e fala a verdade franca e autoritativa. “Ao contrário do discurso suave, sedutor, porém enganoso da mulher estranha, as palavras da sabedoria são ‘cor retas’, ‘retas’ e ‘verdadeiras’, não ‘distorcidas’ ou ‘tortuosas.”57 A es posa estranha conduz suas vítimas à escravidão, ao empobrecimento e à morte; o discurso da sabedoria conduz seus seguidores à realeza, riqueza e vida. A esposa estrangeira habita a esfera terrena e munda na; a sabedoria se eleva no céu acima do espaço e do tempo. Ambas se encontram na cidade e apelam ao amor dos descomprometidos, dos jovens ingênuos - a esposa lasciva, de maneira erótica, e a sabedoria, de modo espiritual. A casa da esposa infiel é uma armadilha moral; a mansão da sabedoria é a vida abundante (veja também cap. 9). O jo vem simplório e maleável deve tomar com urgência a decisão crítica de amar a sabedoria e deve fazê-lo antes de entrar na cidade a fim de ser fortalecido contra os ataques da mulher estranha. Visando obter o amor desse jovem, a sabedoria exalta as próprias virtudes e recompensas. Esse hino de louvor próprio tem correlatos nos hinos mesopotâmicos nos quais uma divindade louva a si mesma na primeira pessoa.58 Van Leeuwen analisa a apologia de autoelogio da sabedoria como sen do constituída de sete subseções com cinco versículos cada uma.59 Depois de adotar e adaptar sua análise, podemos combinar essas se ções de modo a formar a introdução, lição e conclusão da apologia com suas subdivisões de cinco versículos. I. Introdução 1-10 A. O ambiente e destinatários do discurso da sabedoria 1-5 56. A Targ. liga os dois poemas ao começar 8.1 com “Portanto”. 57. Newsom, “Woman and the Discoursc o f Patriarchal Wisdom”, pp. 155-56. 58. H.-M. Dion, “Le genre littéraire sumérien dc P-hymmc à soi-même et quelques passages due Dcutéro Isaiê 3”, RB 74 ( 1967) 215-34. 59. Van Leeuwen, Proverbs, p. 88.
B. A exortação da sabedoria para ouvir acompanhada de admoestações 6-1060 II. Corpo/Lição 12-31 A. Os atributos comunicáveis da sabedoria no tempo histórico 12-21 1. O papel da sabedoria na ordem civil 12-16 2. As dádivas de glória material da sabedoria àqueles que a amam 17-21 B. O nascimento e celebração da sabedoria nos primórdios 22-31 1. A gênese da sabedoria antes da criação do cosmo 22-26 2. O deleite da sabedoria na ordem criada 27-31 III. Conclusão: convite final e advertência 32-36 Apesar do discurso da sabedoria começar no versículo 4, os versí culos 4, 5 servem como parte da introdução do sábio indicando os des tinatários. A segunda estância da introdução contém a forma típica das palestras, mas consiste atipicamente em dois imperativos bastante se parados para “escutar” (v. 6; cp. 1.8) e “escolher” (v. 10; cp. 2.1), cada um com a própria cláusula causai (ki; vs. 6, 11) que assevera o valor precioso das palavras retas da sabedoria. As duas estâncias de dez versos da lição são marcadas por suas palavras iniciais: “eu” (v. 12) e “o Senhor”(v. 22). A partícula lógica “De modo que agora” introduz a conclusão lógica (v. 32). Recursos retóricos como inclusios (e.g., “hu manidade”, que emolduram a instrução da sabedoria em seu discurso e lição [vs. 4-31]) e palavras-chave unem as suas diferentes partes. Por exemplo, “clamar” (qãrã’) liga o ambiente aos destinatários na introdu ção; (vs. 1, 4); “perspicácia” (ou astúcia; 'ãrüm, vs. 5 e 12) liga a introdução e a lição (vs. 4, 12); “escutar” ($im'ü) junta as admoesta ções introdutórias e conclusivas para dar atenção (vs. 6, 32, 33). As sete estâncias podem ser analisadas em função de seus temas ou sinta xe em sêxtuplos de três versos e quartetos de dois versos (vs. 1-3,4, 5; 6-8,9-10; 12-14, 15, 16; 17-19,20, 21; 27-29, 30, 31; 32-34,35, 36). A seqüência de dois versículos seguidos de três ocorre somente na quinta estância (vs. 2 2 ,23,24-26). Essa personificação da sabedoria na porta da cidade é a penúltima perícope no prólogo, contrabalançando a personificação paralela na segunda a partir do início (veja pp. 49-50). Os ambientes, os destinatá-
rios e o vocabulário desses dois discursos da sabedoria são semelhan tes (1.20-21; 8.1-4), e suas conclusões, contrastando a sorte dos que dão ouvidos a ela com a daqueles que a rejeitam, também são pareci das. Diferem, porém, no seu corpo principal. A primeira condena os ingênuos e insensatos por rejeitarem-na; a última louva sua excelência e suas recompensas para conquistar a lealdade dos ingênuos. A figura da sabedoria personificada que se dirige tanto às massas - mais espe cificamente aos ingênuos e aos insensatos - quanto aos filhos sábios, é expressada de maneira concreta no papel duplo de ensino do mestre sábio na porta da cidade (24.27; 31.23) e no lar, com a mãe (veja p. 109). Mais uma vez a mulher sabedoria assume a forma de uma mediadora celestial retratando, originalmente, a sabedoria de Salomão e, em última análise, a edição final do editor do livro de Provérbios (veja 1.20-33). a. Introdução (8.1-11) (1 )0 ambiente e os destinatários do discurso da sabedoria (8.1-5) 0 poeta introduz os dois monólogos extensos da sabedoria identifi cando-a como a oradora (1.20; 8.1), situando seu discurso à porta da cidade (veja 1.20,21; 8.2), e mostrando o seu zelo para obter a atenção do seu público (1.20,21; 8.1, 3). Em 1.20,21 sua localização e atitude se misturam, mas aqui sua localização preeminente (vs. 2 ,3 ) está situ ada entre os verbos que indicam seu chamado (tiqrã’) e seu clamor (tãrõnnâ). Em 1.20, 21 o poeta empregou uma catábase, passando da palavra mais forte (rnn) para a mais fraca (qry), mas aqui ele emprega uma anábase, invertendo essa ordem. Depois de sua sêxtupla introdu ção em forma de sexteto (vs. 1-3), no quarteto seguinte à própria sabe doria emprega a introdução típica das palestras do pai: destinatário e exortação (vs. 4,5), seguido de motivações que começam com kt, “por que” (v. 6). 1 A pergunta retórica acaso... não clama (halõ’... tiqrã’) funciona como uma afirmação enfática, envolve a audiência e a atrai para o ponto de vista da oradora. A sabedoria (hokmâ) personifica os ensinos de Salomão (veja pp. 135-136). Apesar de qãrã’ ser um termo mais fraco que “clamar em alta voz” (rnn\ veja v. 3), indica que a sabedoria faz sua proclamação ser ouvida por toda a parte e não espera que uma audiência venha a ela. Os verbos e pronomes no singular no restante da palestra com referência à oradora mostram que entendimento (fíbünâ]
veja p. 148) é outro nome para a sabedoria, com discernimento (8.14). A indicação de que ela ergue sua voz (tittên qôlãh) intensifica o seu fervor (veja 1.20). 2 Seis frases adverbiais (vs. 2, 3) situam seu discurso como sendo proferido nos caminhos (v. 2) e às portas da cidade (v. 3). Ela fala nos pontos mais altos (ou nas alturas; berõ’$-merômim[veja n. 2]), prova velmente uma metonimia para os muros mais altos (cp. seu paralelo em 1.21 e “altura fortificada” para uma fortificação construída pelo ho mem em Jr 51.23), de modo a ser vista e ouvida pelo maior número de pessoas possível. Do alto da “Pedra do Derrotado”, em Jerusalém, di vulgavam-se coisas que haviam sido perdidas e achadas.61 Junto ao caminho Çalê-dãrek veja 1.15; cp. 2Sm 15.2) conota os lugares onde o povo anda, encaminhando-se para escolher o seu modo de vida. Nos cruzamentos (bêt netibôt; veja 1.15) - o ponto onde muitos devem resolver se vão seguir a sabedoria ou a loucura (aqui, não há um tercei ro caminho [cp. SI 1.1,2]) —ela se coloca (nissãbâ; cp. yasçêb, 15.25) para rogar que sigam os caminhos dela. 3 Ao lado das portas (leyad-Seãrím) onde havia assentos e câma ras laterais, indica o lugar onde o povo se reunia para comprar e vender, para resolver contendas e tratar de política (veja 1.21). Nas entradas {lepí; veja n. 9) da cidade (qãret) mostra que a sabedoria apela para que as pessoas decidam a favor da ética e da prudência religiosa antes de se envolverem com o comércio e a política da cidade e para fortalecê-las de modo a resistirem às mulheres e homens perversos dentro de seus muros. Nas aberturas (m ebô ’) das passagens (petãhim), as aber turas que davam acesso à porta, ressalta o lado de entrada, não de saída, da porta (cp. 1.21). “Aqui são tomadas decisões, e as pessoas ‘entram’ em situações novas e iniciam novas jornadas.”62 Ela clama em alta voz (tãrõnnâ; veja 1.20), enfatiza que ela fala com fervor e convicção, não desapaixonadamente como num discurso erudito. Ao contrário dos sofistas, ela não se preocupa em mostrar sua destreza ou seus talentos retóricos de per si. O sábio, aquele que transmite a he rança de Salomão, não se enclausura num mosteiro nem num círculo esotérico de pessoas versadas ou religiosas, nem mesmo exclusiva mente no lar. Antes, talvez como um ancião à porta, ele se faz ouvir em 61. Citado por Plaut, Proverbs, p. 107. 62. Van Leeuwen. Proverbs, p. 89.
praça pública, onde a competição pelo coração dos indivíduos é mais acirrada (cp. 24.23; 31.23). Em seguida a sabedoria cita a humanidade em geral como sua au diência (8.4) - ela tem algo a apresentar para todos - e, particularmen te, aos ingênuos e insensatos (v. 5; cp. 1.23). Seu discurso, como as palestras do pai, apresenta de maneira típica a indicação do destinatário ligado ao chamado para ouvir (v. 6), seguida da motivação para atender (8.7ss.). Porém, ela rompe de modo singular o chamado para ouvir indicando o seu público (vs. 4,5) e depois rogando que “ouçam”, apre sentando na seqüência as motivações (vs. 6-9). O chamado para aten der (vs. 4, 5) também está ligado às motivações (vs. 6-9) pelo inclusio de hãbinlmêbin (vs. 5, 9). No versículo 4, ela declara por meio de dois indicativos e dois vocativos que está clamando em alta voz para o povo em geral, e no versículo 5, usando dois imperativos e vocativos, ela afirma que visa mais preci samente dar discernimento aos ingênuos e insensatos. 4 Ela começa esse encontro pessoal com um apelo ousado e direto, a vós (^lêkem). Apesar do vocativo homens ( ’isim ; veja p. 49) poder designar os seres humanos sem distinção de sexo, é provável que desig ne indivíduos do sexo masculino, pois no prólogo o ingênuo deve esco lher entre a esposa lasciva e a mulher sabedoria (cp. pp. 132-135; 176181). Eu clamo ( ’eqrã’) e seu paralelo quiástico intensivo clamo em alta voz (“[ 'eqrã ’] qôli") liga sua introdução à descrição da cena (v. 1). Humanidade (bênê ‘ãdãm; veja v. 31) enfatiza a referência a pessoas comuns (cp. SI 49.1, 2[2, 3]; Eclo 24.3-6) sem distinção de raça, sexo ou diferenças socioeconômicas (cp. SI 49.2). Seu discurso conforta os humildes e adverte os nobres, consola os pobres e modera os ricos. O termo contrasta a humanidade fraca e frágil com os seres celestiais e pode prenunciar a transcendência celestial da sabedoria (veja 1,24-28).63 5 Ela declara seu objetivo enfaticamente usando o imperativo en tendei (hãbinü; veja p. 148). Ela restringe os seus destinatários aos ingênuos (petã'im\ veja pp. 166-167) malformados, descomprometi dos e incultos. Ela os convida para o seu programa educacional, pedin do que atentem para a perspicácia Çormâ; veja p. 146). Coloca-os no mesmo grupo dos espiritualmente tolos e insensatos insensíveis (kesilim; veja pp. 167-168) admoestando-os também a colocar [ou firmar] nela o
[seu] coração (hablnü lêb; veja n. 13). Em seu primeiro discurso aos ingênuos, ela pressupôs que a tivesse rejeitado irrevogavelmente para que ela pudesse argumentar que não há uma segunda chance depois do julgamento; aqui, porém, ela ainda lhe oferece uma oportunidade de dar ouvidos e adquirir discernimento moral. (2) Exortação da sabedoria a ouvir com motivação (8.6-11) Seu discurso, como as palestras do pai, indica de maneira típica os destinatários (vs. 4, 5) em conexão com o chamado para ouvir (v. 6), seguido por motivações para atender (vs. 6-10) introduzidas por “por que” (k i). No entanto, ela emoldura esta estância com imperativos para escutar suas palavras e para aceitar sua lição disciplinadora (m üsãr; veja 1.2). Ela merece uma audiência “porque” suas palavras são perfei tas (vs. 7-9) e sua instrução é inestimável (v. 10). Ela louva seu discurso por seu estilo e conteúdo éticos (vs. 6-9), usando pelo menos um termo qualificador em cada um de seus oito versetos, e por seu valor precioso que excede o valor da prata e do ouro (v. 10). Na moldura externa de imperativos, o inclusio mêsãrim/y^Sãrím na segunda posição (vs. 6,9) também emoldura a estância. O sêxtuplo (vs. 6-8) é unido por palavraschave e sinônimos para os órgãos da fala (“lábios” [vs. 6, 7], “paladar” [vs. 7, 8]). Os versículos 6-8 também são estruturados de modo quiástico, colocando os termos qualifícadores do discurso da sabedoria na moldura externa e os termos para a sua fala na parte interna. O padrão é quebrado no versículo 9, que forma uma transição para o segundo conjunto de motivações referentes às suas recompensas preciosas (v. 10, seguido pela próxima estância). As duas seções motivadoras são ligadas pelo termo “conhecimento” (dã'at\ vs. 9,10), a palavra-chave que forma o quarteto de conclusão. A sabedoria deve enfatizar o valor das suas palavras, pois precisa “vender” sua ideia: “algumas das coisas que ela tem a dizer são pesadas e algumas das verdades que deseja proclamar causam desconforto, e ela fala sobre autodisciplina e não comodismo”.64 O discurso da esposa infiel é doce no começo e amargo no final; o discur so da sabedoria exige disciplina no começo e promete vida no final. Por fim, a identificação daqueles que aceitam seu discurso como aqueles que têm entendimento e encontram conhecimento moral (v. 9) forma a transição do estilo e conteúdo ético-religioso do discurso da
sabedoria (vs. 6-9) para o seu valor palpável (vs. 10-21). Assim como as duas primeiras estâncias terminam com a superioridade da sabedo ria em relação à prata e ao ouro (v. 10) para aqueles que têm discerni mento (v. 9), as duas últimas terminam com a promessa de que ela dá ouro e prata (vs. 18, 19) para aqueles que a amam (vs. 20, 21). 6 O imperativo curto escutai (Sim 'ü; veja 1.8) implica que tomem uma decisão de atentar e aceitar o ensino do sábio (cp. 2.1 -4; 8.17,21, 34; 9.4,5). Pois (k i) introduz o primeiro conjunto de motivações (vs. 69). Falo Ç°dabbêr, veja 2.12) indica um apelo oral do qual os ouvintes não podem se esquivar, ao contrário do imperativo escrito que eles po dem ignorar recusando-se a ler (cp. 1.8). Primeiro ela qualifica seu discurso como o que é certo ou reto (neg idim ; veja n. 14) e, portanto, confiável. O abrir (âm iptah; pode indicar o lugar em que essa abertura ocorre ou o ato abstrato de abrir)65 dos meus lábios (éepãtay) enfatiza a forma oral do discurso. O segundo qualifícador, parte da moldura, é outro plural abstrato, o que é reto (mêSãrim\ veja 1.3). A expressão idiomática hebraica (“abrir... é equidade”; veja n. 16) significa que as suas palavras são totalmente justas (veja “eu sou seus deleites” em 8.30 [“eu era suas delícias”]). 7 Certamente (ou porque, ki) enfatiza que a dimensão ético-religiosa do discurso da sabedoria (vs. 6, 7) é essencial para se entender a verdade suprema. Como no versículo 6, os substantivos qualificadores verdade (ou aquilo que é confiável; 'emet; veja 3.3; cp. seu uso como paralelo para “sabedoria” no SI 51.6[8]) e seu antônimo “perversidade” formam a moldura externa do versículo estruturado de forma quiástica. O meu paladar (hikki; veja 5.3) é a segunda metonímia para o ato de falar. Profere (yehgeh) tem uma ampla gama de significados que vai de “meditar” ou “ponderar” (veja 15.28; cp. SI 1.2) até “proferir sons inarticulados” (Is 3.4; 38.14) ou “sussurrar” (Is 8.19), incluindo ainda a ideia de “falar”, seu significado nesta passagem.66 Perversidade (re$a'\ veja pp. 164-165) emprega o gênero figurativamente para definir a es pécie, o discurso perverso. O discurso dos homens avarentos (e.g., 1.11 -15) e da esposa lasciva (7.14-21) é considerado condenável, pois é hostil a Deus e à humanidade, negando que o S e n h o r sustenta a liga 65. Padrão nominal com prefixo mern pode indicar um local (i.e., “entrada”) ou ser uma abstração (i.e., “abertura”) desse substantivo impar, a menos que se emende 1 Crônicas 9.27 (IBHS, p. 90, P. 5.6b). 66. A. Negoitã, TDOT, 3:322, s.v. hSghãh.
ção entre o comportamento antiético e a morte. Esse discurso falso é uma abominação (tô'abat; veja 3.32; 6.16) para os meus lábios (sepãtay), como também o é para o S e n h o r (6.16, 17). 8 Os paralelos ligam o quinto qualificador (retidão) de suas pala vras com o sexto (não enganoso) numa relação implícita de causa e efeito. Todas (kol) as palavras da minha boca Çimrê-pV, veja 4.5) são ditas em retidão (besedeq; veja pp. 149-150), o quinto qualificador do seu discurso. “Em” qualifica a esfera dentro da qual a sabedoria fala ou a norma de acordo com a qual ela fala.67 Não há nenhuma sequer entre elas ( ’ên bãhem), que no texto hebraico é o centro do paralelismo sintético com “todas... boca”, dá sua contraparte negativa. Enganosa (nipfàl) ou perversa (ou tortuosa, we'iqqêS; veja 2.15) é melhor enten dida como uma hendíadis. Esses dois sinônimos ocorrem juntos com certa frequência (Dt 32.5; 2Sm 22.17; SI 18.27[28]). Essa ligação das duas palavras em um só conceito no final do versículo combina com a estrutura dos vs. 6-9. Em termos concretos, niptãl significa “torcer” (cp. pãtil, “cordão torcido”), e com um sentido ético tem uma conota ção de ardil. Algumas versões traduzemptl no Nifal como “astuto” em Jó 5.13 e no Hitpael como “mostrar-se perspicaz” em 2 Samuel 22.27. “Tortuoso” Çiqqês; veja 2.15; 4.24; 6.12) também dá a ideia de perver ter, desvirtuar, distorcer a norma ética. Ela não precisa ser “tortuosa” (i.e., perverter, desvirtuar ou distorcer a norma ética) pois não busca os próprios interesses. 9 Todas elas, repetindo o kol do versículo 8, ressalta que nenhuma das suas palavras é eximida dessas seis qualificações. A sétima qualifi cação, retas (ou direitas, nekõhim) é sinônimo de negidim (veja v. 7), que deu início à série. A sabedoria apresenta essa grande quantidade de sinônimos e antônimos para enfatizar que tanto o estilo quanto o conteúdo do seu discurso estão de acordo com os ideais éticos de agir visando beneficiar a sociedade e seus membros. No entanto, ela res tringe o reconhecimento dessa verdade, [àqueles] que entendem (rríêbin; veja v. 5), que a HALOV traduz como “einsichtig” (“criterioso, razoá vel, inteligente, discemente”).68Aquilo que é conhecido é inescapavelmente relativo ao conhecedor, e o conhecimento opera dentro de com promissos espirituais (veja 2.5; Jo 8.31, 32). Calvino observou: “Pois 67. IBHS, p. 198, P. I1.2.5e. 68 .HALOV, 1:118.
sabemos muito bem pela experiência como, apesar de nossas boas in tenções, falhamos tantas vezes. Nossa razão é sobrepujada por tantas formas de engano, é sujeita a tantos erros, se depara com tantos obstá culos, é enredada em tantas dificuldades, que fica longe de nos dirigir corretamente”.69 Aqueles que não estão dispostos a assumir um com promisso com a sabedoria, distorcerão e/ou desconstruirão até mesmo o seu discurso claro e verdadeiro. Como diz Gerard Hopkins, sua “pai sagem interior” (i.e., a maneira como integra os dados de seus senti dos) lhes permite ver a paisagem exterior como ela é de fato. Uma vez que seus olhos espirituais são saudáveis, podem ver a luz e estão cheios dela (cp. Mt 6.22). Retas (wiSãrim\ veja p. 150) significa que seu dis curso não ultrapassa os limites da ordem ético-religiosa do S e n h o r . Para aqueles que encontraram conhecimento (lemõse 'ê dã'at) indica aque les que buscaram a sabedoria com entendimento, sujeitaram-se a seus ensinos e, deste modo, obtiveram o conhecimento pessoal, espiritual e moral transmitido pelo livro de Provérbios (veja 1.2, 7,28; 2.5,9; 3.3; 4.22; 8.35). Somente esse tipo de pessoa reconhece a veracidade das palavras da sabedoria. “Trata-se de uma declaração praticamente im par no AT” (cp. Ez 18.25; Jo 3.21; 7 .17).70 10 A mudança de foco da excelência do discurso da sabedoria para suas recompensas é marcada pelos dois imperativos do verseto 10a. “Escutai” (v. 6), que destaca o ato inicial de dar atenção à sabedoria, é complementado agora por sua contraparte télica, escolhei (qehü\ veja n. 19; 2.1). Cada imperativo implica no outro. Em Provérbios, a raiz Iqh normalmente tem a nuança educacional de aceitar aquilo que é verda deiro (cp. 1.5; 2.1; 24.32) ou falso (6.25; 7.21; 22.24,25), não de desen volver uma faculdade crítica independente. Aquilo que você escolhe afeta você. A minha instrução (m üsãri) se refere às repreensões ver bais da sabedoria dadas nas coleções (caps. 10-31) para corrigir e transformar a insensatez inata de sua audiência (veja 1.2,3). O compa rativo em vez da (we ’al; lit. “e não”) modifica o verbo “escolher” omi tido aqui. Quando prata (kãsep; veja 3.14), uma sinédoque para rique za, é a recompensa da sabedoria, ela edifica (veja vs. 17-21); mas quando é o alvo da vida do indivíduo, ela corrompe (1 Tm 6.9, 10). A sabedoria não tolerará nenhuma rival. Se uma pessoa ama as riquezas - e só se pode amar a sabedoria ou as riquezas, não há um terceiro caminho (Mt 69. João Calvino. Institutes o f the Chrisíian Religion, II.ii.25. 70. Toy, Proverbs, p. 163.
6.24) - a sabedoria se afasta, deixando o indivíduo, na melhor das hipó teses, em sua condição temporária de rico insensato, mas rumando para a morte eterna (veja pp. 157-161). Porém, a sabedoria não deprecia a riqueza, removendo-a de seu devido lugar (3.14,15; 8.17-21 a). “A fim de que essa comparação cumpra seu propósito, deve-se pressupor o grande valor desses bens.”71 São uma parte importante da recompensa da sabedoria para aqueles que a amam (vs. 17-21 a). O verbo “adqui rir” é omitido no verseto B; a Targ. fornece “juntai para vós”. Conhe cimento (dã'at\ veja p. 125) é um bem distinto do seu paralelo, “discipli na” e, no entanto, essas dádivas preciosas vêm juntas e são insepará veis (veja 12.13; cp. 23.12). Em vez do não permite que o ouro (mêhãrús; veja 3.14) seja transformado no objeto de afeição do cora ção e no objetivo de vida do indivíduo. Fino (nibhãr) indica o ouro preferido que a pessoa escolhe cuidadosamente por sua pureza e gran de esplendor (veja v. 19; cp. 1.29). 11 Este versículo é um comentário (veja n. 23). b. Lição (8.12-31) Depois da transição dos versículos 6-11 que louvam as suas pala vras, a sabedoria desenvolve o seu encômio em duas metades iguais de dez versículos. A primeira trata do tempo histórico (vs. 12-21) e a se gunda, do tempo primordial (vs. 22-31). A primeira mostra os atributos comunicáveis da sabedoria: conselho, entendimento e força que capa citam os reis a governar e que concedem riquezas e honra aos que a amam. A segunda diz respeito tanto à sua geração divina antes do res tante da criação, conferindo-lhe “patente nobreza”, competência e au toridade, quanto ao seu deleite na maneira como o S e n h o r ordenou o cosmos que abriga a terra habitada (vs. 22-31). A autoridade e a ordem que ela concede aos governantes no tempo histórico (vs. 12-21) estão alicerçadas em sua distinção, dignidade e autoridade, concedidas por Deus no tempo primordial. Além do mais, a capacidade do governante sábio de decretar a ordem social se conforma ao deleite da sabedoria nos decretos de Deus que ordenaram o cosmos (vs. 22-31). As suas palavras são o meio à sua disposição para expressar essa autoridade e ordem (vs. 6-11).
(1) Atributos comunicáveis da sabedoria no tempo histórico ( 8. 12- 21)
O encômio da sabedoria acerca do seu valor na História apresent duas partes iguais, cada uma com cinco versículos: (1) seus atributos comunicáveis (vs. 12-14) por meio dos quais os reis governam (vs. 15, 16), e (2) a glória material que ela concede fielmente (vs. 17-19) àque les que a amam (vs. 20, 21). Essas duas divisões são marcadas pela repetição do pronome “eu” nos versículos 12 e 17 e pela estrutura “aque les que me amam” ao redor dos versículos 17-21. Em resumo, ela trans mite seus benefícios preciosos àqueles que a estimam. (a) O papel da sabedoria na ordem civil (8.12-16)
12 O pronome “vós” no modo imperativo dos versículos 4-11 é substituído agora por eu (vs. 12, 14, 17) e pelo modo indicativo. No versículo 12 diz-se que as mesmas três virtudes relacionadas em 1.4 a acompanham. O nome próprio que ela usa para si mesma, sabedoria (hokmâ; veja pp. 124-125), revela seu caráter essencial. Na Bíblia, um nome é muito mais uma revelação de caráter que um rótulo de identifi cação. O prólogo afirma em várias ocasiões que a “sabedoria” é uma virtude comunicável (1.2; 2.1 -4; 4.5-8; 7.4; 8.11; 9.1 -6). A figura habi to (èãkanti; veja 1.33) ressalta o conceito de proximidade e intimida de,72 e indica que a perspicácia Çormâ\ veja p. 146) está inseparavelmente ligada à sabedoria. Conhecimento (dã'at; veja p. 125) é um companheiro inevitável da perspicácia e da sabedoria, pois esse bem precioso é essencial para ambas (veja 1.4; 8.9). Prudência (mezimmâ\ veja p. 146) sempre indica a capacidade de fazer planos, uma virtude no prólogo (caps. 1 - 9), mas um vício nas coleções posteriores (12.2; 14.17; 24.8). A hendíadis “conhecimento e prudência” refere-se à “agi lidade mental, versatilidade e sagacidade”.73 O restante da vida de uma pessoa se encontra no futuro, e o sucesso no futuro depende do plane jamento no presente. Eu encontro (ou “obtenho”; ’emsã’, veja 3.13; 8.9), uma indicação de que a própria sabedoria exibe o papel de uma pessoa que crê e busca a virtude, é outra figura para mostrar que essas virtudes não podem estar separadas da sabedoria e que são comunica das através da sabedoria herdada (cp. 1.4; 2.10, 11; 5.1, 2). 72. V. P. Hamilton. TWOT, 2:925, s.v. sskan.
13 O temor do S e n h o r (yir’at YHWH\ veja pp. 153-154) é aborre cer (áenõ’t; veja 1.22) o mal (r a veja 1.16). Apesar de ser semelhante a Jó 28.28 quanto à sua ideia; Provérbios 3.17; 16.6 não é um comentá rio, pois a maneira de expressar é diferente. Na segunda metade do versículo, a sabedoria prenuncia o mal, movendo-se logicamente de uma disposição orgulhosa para o mau comportamento que ela produz e para o discurso perverso usado como disfarce. Ela relaciona o orgu lho, a arrogância logo no início (gê’â wegã'ôn - observe a assonância), pois o mal está baseado nesses vícios fundamentais que não acei tam sujeitar-se à autoridade (cp. 29.23). Além disso, “são os males aos quais a pessoa perspicaz e inteligente está mais susceptível”.74Apesar de gê a ser um hapax legomenon, seu sentido fica claro em função de sua raiz e seu contexto. Os dois substantivos são derivados da raizg ã ’â (“ser ou tornar-se alto”). A raiz é usada em seu sentido literal para o crescimento das plantas (Jó 8.11) e para a água que se eleva das pro fundezas (Ez 47.5). Seu sentido literal é atenuado com seu significado figurativo em Jó 10.16, em que o erguer a cabeça é um sinal de orgu lho.75 Por um lado, gã'ôn pode se referir à majestade do S e n h o r (Is 24.14; Mq 5.4[3]) ou à glória de Israel (Sl 47.4[5]; Is 4.2). Por outro lado, pode se referir ao orgulho humano, uma atitude de confiança em si mesmo que coloca o governo de Deus de lado para buscar os interes ses egoístas (cp. Pv 16.19; 29.23). A arrogância destrói o relaciona mento com o S e n h o r , corrompe a ordem e conduz a comportamentos antiéticos para com o próximo (cp. Jó 35.12; Sl 10.2; 17.10; 73.6; 140.5[6]). “Aquilo que outras passagens descrevem em detalhes como ‘despotismo, iniqüidade, luxo e presunção militar’ é resumido aqui na palavragã'ôn (cp. Is 2.12; 9.9[8]; 13.11; 14.11; Ez 16.49; Sf 3.11; passim).”76 Daí a combinação com e um mau caminho (derek rã'; veja 1.15). Deus não responde às orações de pessoas que confiam em si mesmas e acreditam que controlam o próprio destino (Jó 35.12, 13); antes ele as destrói (Pv 15.25; 18.18). Os justos, entretanto, pedem que Deus os proteja dos arrogantes (Sl 31,23[24]; 36.11 [12]). Ao compor tamento mau, a sabedoria acrescenta e uma boca perversa (pi tahpukôt; veja p. 165; 2.12) que procura subverter a ordem moral e ética do S e n h o r . Uma vez que a qualidade essencial da sabedoria impli 74. Hubbard, Proverbs, p. 121. 75. G V. Smithe V. P. Hamilton, NIDOTTE, 1:787, s.v. g'h. Veja Jeremias 48.29 para um jogo de palavras com seus vários derivados. 76. D. Kellermann, TDOT, 2:349, s.v.gõ‘Sh.
ca aborrecer o mal, a sabedoria emprega a figura eu aborreço (áãriê’ti) no final do verseto paralelo, para indicar esses vícios que não podem acompanhar suas virtudes. 14 A sabedoria deixa implícito que, como proprietária dessas virtu des, ela pode concedê-las àqueles que a amam. Conselho ('êsâ; veja 1.25) e desenvoltura (wetüsiyâ\ veja 2.7) neste contexto podem se referir ao conselho político e militar dado a um rei (cp. 2Sm 7.7; lRs 1.12; Pv 20.18). Em 8.14b, ela se identifica com a expressão eu sou ( 'ani), mostrando que o discernimento (binâ; veja p. 147; 1.2) faz par te de sua essência e que os outros atributos se reúnem ao redor dele. Tanto sua essência quanto seus atributos são comunicáveis, pois aque les que a aceitarem participarão do seu ser e do seu caráter. Agora a sabedoria se volta para os seus atributos, dizendo que a força heróica (f^büra) é minha (li). Gebürâ apresenta duas nuanças. Uma, que pode ser traduzida como “bravura”, vem da linguagem de guerra e toma uma pessoa corajosa e capaz de enfrentar adversários temíveis. A ou tra, conota a ideia de capacidade, de qualificação e de bravura (veja Mq 3.8).77 O conselho valioso deve apresentar não apenas uma estra tégia para o sucesso, mas também a força para executá-la e não vaci lar diante da oposição. McKane observa que 'êsâ e ^ b ü r â estão inti mamente relacionados: “A prova rigorosa de 'êsâ é o grau de sucesso que alcança quando é colocado em prática e, portanto, não é muito proveitoso gastar tempo com o 'êsâ a menos que se tenha poder para executá-lo”.78 Esse agrupamento de atributos aproxima a sabedoria grandemente do próprio Senhor, pois de acordo com Jó 12.13 o Senhor também possui aquilo que a sabedoria afirma ter. Essas qualidades ce lestiais são necessárias para um governante (veja 8.15). Isaías atribui o Espírito dinâmico do Senhor como seu Mediador para o Rei messiânico (Is 11.2), mas a sabedoria transmite essas qualidades àqueles que a amam. Somente Jesus Cristo as obteve com perfeição, e ele se tomou “sabedoria” de Deus para a sua igreja (ICo 1.30; veja pp. 188-190). 15 Os versículos 12 e 14 se concentram nas habilidades práticas da sabedoria necessárias para a arte de governar no quarteto que concluía estância (vs. 15,16), que são ligados pela repetição da afirmação inicial por meu intermédio (bi). Suas virtudes éticas relacionadas no versícu77. Veja B. Renaud, La formation du Livre de Michée: Iradilion et aclualisalion (EB; Paris: Gabalda, 1977), p. 136. 78. W. McKane, Prophets and Wise Men (Londres: SCM, 1965). p. 67.
lo 13 também são retomadas nesta seção. Os atributos comunicáveis da sabedoria permitem influenciar nações. Esses versículos pressupõem a administração realizada por pessoas sábias, não por um código im pessoal de leis. As habilidades da sabedoria que contribuem para o governo são intensificadas, esclarecidas e expandidas de modo a incluir todos os governantes mediante acúmulo de cinco sinônimos para eles nesses versículos e terminando a listagem com a expressão sumariante “todos”. Todos os governantes são instrumentos visíveis da sua obra oculta e ilustração paradigmática de sua atividade.79 Convém lembrar que ela se dirige aos homens na rua, não aos poucos membros de uma elite. O sucesso que os príncipes têm em seu bom governo a sabedoria promete mutatis mulandis para todos aqueles que a amam. Como é típico numa série de sinônimos, ela começa com os termos mais impor tantes, reinam os reis (m elãkim yimlõku), referindo-se a todos os tipos de personagem reais que governam sobre uma cidade-Estado, um país, um território, uma tribo ou um povo (cp. 14.28; 16.10-15; 19.10, 12; 22.29; 24.21; 25.1-7; 29.4, 14; 30.31; 31.4).80 Tomando por base um levantamento das monarquias no antigo Oriente Próximo, Ishida che gou a quatro conclusões acerca da estrutura básica da realeza: (1) su cessão dinástica; (2) eleição divina; (3) em circunstâncias especiais, nomeação por assembleia popular; e (4) por vezes a autorização do chefe supremo.81 O verseto B enfatiza e esclarece seu benefício políti co. Potentados (rôzPnim) é um termo comum usado pelos poetas pa ralelo a “rei”.82 “Usando como referência um cognato árabe, entendese que o termo significa aquele que é influente, solene, de julgamento firme - que não pode ser abalado, de compostura majestosa, palavras e ações honradas como convém a alguém investido de grande poder.”83 “Sabedoria”, “perspicácia”, “prudência”, “conselho”, “desenvoltura” e “força heróica” também permitem que os governantes decretem (yehõqeqü). Hqq quer dizer “estipular, determinar”,84 e na raiz D pode se referir a um governante que aprova ou decreta regras e prescrições (veja Pv 31.5; Is 10.1; Jr 31.35). O termo funciona como uma palavrachave importante para os decretos do S e n h o r na criação (v. 29). O que 79. Também Plõger, Sprüche, p. 90. 80. J. A. Soggin, TLOT , 2:675, s.v. m elek. 81. T. Ishida, The Roval Dvnastics in lheA ncieni Israel (Nova York e Berlim: Walter de Gruyter, 1977), pp. 7-25. 82. S. Gervirtz,Pattems inEarly Hebrev. Poetrx(Chicago: UniversityofChicago, 1964),p. 3 ,n. II. 83. Culver, TWOT, 1:508, s.v. mãlak. 84. H. Ringgren, TDOT , 5:141, s.v. hãqaq.
é certo (sedeq; veja 8.8) é uma metonimia para leis e ações justas. Os governantes podem decretar perversidades (cp. Is 10.1), mas tais deter minações não permanecerão. 16 O versículo 16a corresponde semântica e sintaticamente ao ver sículo 15a. O terceiro sinônimo, governantes (úãrim) está relacionado ao acadiano Sarru (“rei”) e indica os governantes e oficiais da casa do rei. Assim como yimlõk (“reinam”) no versículo 15a é um denominativo de melek (“rei”), também yimlõk, governam, é um denominativo de érr (i.e., atuar como éar). Nobres (nedibim ) é usado na prosa para aquele que está disposto e na poesia para um funcionário público, um fidalgo, um oficial poderoso da corte real (veja 17.7). A palavra provavelmente é derivada do conceito de que se trata de alguém disposto a contribuir generosamente,85 mas em Isaías 32.8 indica aqueles que são nobres apenas em função de suas origens, não por sua disposição. O restante do verseto B é textualmente difícil. Yãéõrü no TM é omitido no verseto B. Todos (kol-) resume o catálogo. Os juizes da terra (Sõpe(ê-'ere$; veja n. 29) se refere a todo tipo de governador, administrador da justiça e governante.86 (b) Dons da sabedoria de glória material a seus amantes (8.17-21) “Aqueles que me amam” estrutura esta segunda estância dos atri butos comunicáveis da sabedoria e seu valor no tempo histórico, e anuncia a condição essencial para se obter esses atributos (vs. 17,21). Enquan to que em 1.20-33 ela usou um discurso ameaçador, aqui ela fala so mente a linguagem do amor (cp. Mt 11.16-19). O enfoque muda de sua posse desses atributos e seu valor político para a sua comunicabilidade aos seres humanos e seu valor material. 17 A repetição da expressão enfática ^ n i, traduzida como quanto a mim (veja v. 12), ajuda a demarcar a estância. Aqueles que me amam ( ’õhabay; veja 1.22) afirma implicitamente as afeições do coração para receber suas virtudes comunicáveis e implica no arrependimento dos ingênuos aos quais ela se dirige. Eu amo ( 'êhãb), o discurso do amor, já é visto em 4.5-7 (cp. Os 11.1; 14.5[6]; Ml 1.2). A reciprocidade com pleta do amor entre aquele que procura e aquele que é procurado ex 85. Cp. HALOT, 2:675, s.v. nSdib. 86. Cp. Delitzsch, Proverbs, p. 179.
pressa sua ligação pessoal. A personificação significa que quando os ensinos do sábio forem memorizados com afeição espiritual eles serão assimilados pelo caráter do indivíduo (2.1-5). Declarações semelhantes são feitas acerca do relacionamento com Deus (e.g., “Aos que me honram, honrarei, porém os que me desprezam serão desmerecidos”, 1 Sm 2.30; cp. 2Sm 22.26 [= SI 18.26(27)]). Meinhold também observa paralelos na literatura sapiencial egípcia. “Ptah ama todos aqueles que o amam e pedem a ele.”87 Tomando por base outras teologias bíblicas fica claro que a sabedoria exige uma natureza humana transformada, aquilo que Jesus chamou de nascer de novo, pois em Adão todos mor reram espiritualmente e, portanto, “o homem natural não aceita as coi sas do Espírito de Deus” (cp. ICo 2.14). Apesar de a sabedoria se oferecer a toda a humanidade, sua oferta só é eficaz para aqueles cujo coração foi regenerado para amá-la. Ela realiza essa mudança por meio das palavras. Aqueles que a amam são, por definição, os que me pro curarem com diligência (meSaharay, veja 1.28; cp. 8.36).88 Seme lhantemente, “Eu amo” tem como paralelo a conseqüência efetiva, me acharão {yimsã'unni\ veja 1.28; 8.35). 18 Riquezas e honra CõSer-wekãbôd; veja 3.16; 10.4) também se complementam mutuamente (cp. Et 1.4; 5.11), apesar de poderem apa recer em oposição (veja 11.16). Juntas indicam o bem-estar material que dá ao indivíduo dignidade e importância social (veja 3.16; 10.4). Estão comigo Çitti) significa que as riquezas duradouras têm uma liga ção inseparável com a posse da sabedoria. A sabedoria dispõe delas como lhe apraz e não podem ser exigidas dela ou arrancadas dela à força, mas ela não as retém daqueles que a amam. Ainda que durante o tempo de teste e desenvolvimento do caráter da pessoa elas possam parecer separáveis (veja 3.12), em última análise, elas não o são. “As sim como é impossível pensar em bênção sem retidão ou obediência, também é impossível pensar em obediência sem bênção.”89 Duradou ra (NIV, NASB, NRSV, 'ãfêq) traduz um hapax legomenon da raiz 'tq, que significa em relação a espaço “avançar, continuar, afastar-se” e em relação a tempo, “envelhecer”. A LXX conjetura “abundantes/ grandes posses”. O significado do hapax legomenon 'ãtiq (Is 23.18), outra forma adjetival da mesma raiz, também é incerto; é traduzido 87. Meinhold, Sprüche, p. 146. 88. Toy, Proverbs, p. 169. 89. J. G McConville, Law and Theologv in Deuteronomv (JSOTSup 33; Sheffield: JSOT, 1984), p. 15.
como “fino” com o sentido de “esplêndido” em algumas versões e como “seleto” em outras. Lexicógrafos mais antigos propuseram para 'ãtêq “antigo e extremamente valioso” ou “insuperável e seleto” ou ainda, “eminente”, e a HALOT traduz como “consagrado pelo tempo”, “vene rável”, ou “esplêndido”.90No entanto, venerável sugere que já é antigo; a perspectiva aqui é de abundância (hôn\ veja 3.9) futura, uma rique za que se tornará venerável. Prosperidade (REB, NIV, NRSV; ou “sucesso” emNJPS) traduzsedãqâ. No Salmo 40.9-10 (10-1 \ ) s edãqâ se refere aos detalhes da ação divina com base num sedeq abrangente (veja 8.8), mas “em Provérbios é praticamente impossível perceber uma distinção entre as duas formas do substantivo”. Esses dois substan tivos “nunca abrangem apenas um comportamento ético mas... uma cir cunstância de sucesso sólido, incontestável e favorável... Por vezes es ses aspectos predominam a ponto do tradutor se sentir compelido a tra duzir o substantivo como ‘bem-estar’ (e.g., Is 51.1-5)”.91 Paradoxalmen te, quando a riqueza é buscada, ela corrompe, mas quando a sabedoria, é buscada, a riqueza edificante é concedida (cp. 1Rs 3.4-15). A pessoa que adquirir riqueza em decorrência do seu esforço para obter sabedoria e com essa riqueza obtiver, inevitavelmente, poder, será benevolente e civi lizada. McKane encontra ideias semelhantes em instruções egípcias: “Se ele obtém preeminência, o sucesso não pode ser um laço para ele, pois quanto mais bem-sucedido ele é e mais poder tem ao seu dispor, tanto melhor é sua sintonia com a ordem que molda a sociedade egípcia”.92 19 A metáfora agrícola incompleta o meu fruto para a “medid justa de prosperidade” (cp. Is 54.17)93 concedida pela sabedoria conota a ligação inerente entre a causa espiritual interior e o efeito material exterior. Melhor é... do que o ouro (fôb ... mêhãrü§\ veja 3.12, 14) protege seus benefícios de serem distorcidos como materialismo cras so. “Ouro” é intensificado por até mesmo que ouro puro (ümippãz) um substantivo ímpar em Provérbios usado para o ouro que é separado tanto do local onde se encontra o minério que o contém quanto de ligas metálicas. A Targ. entende como ouro num cadinho que foi submetido à prova do fogo. Aquele que ama a sabedoria não escolhe prata e ouro (8.10, 11; 23.4), mas as recompensas da sabedoria não excluem esses bens (veja 8.18,21). A sabedoria combina riqueza (v. 18a) com benefí 90. HALOT; 3:905, s.v. 'W q . 91. K. Koch, TLO T.2:m 2, 1057, s.v. 92. McKane, Proverbs, p. 65. 93. Toy, Proverbs, p. 169.
cp. BDB, p. 842, s.v. çedeq.
cio ético-espiritual (v. 18b). E o meu rendimento (üiPbü 'ãti; veja 3.14) é outra metáfora agrícola incompleta para a ligação inseparável entre encontrar as virtudes da sabedoria e desfrutar seus benefícios. A prata (kesep; veja 3.14)fina (nibhãr; veja 8.10) já foi refinada do chumbo e de outras impurezas e é o oposto da prata rejeitada (Jr 6.30). 20 Em outras passagens de Provérbios 1-9 o sábio admoesta o filho a andar no caminho da sabedoria, não da perversidade (veja 1.15), mas agora a situação se inverte. A sabedoria declara a respeito de si mesma: Eu ando ( ®hallêk; veja 1.15) pelo caminho ( ora/i; veja 1.15, n. 61) da retidão (§edãqâ; veja v. 18). O duplo uso de sedeq (veja vs. 15,16, n. 31) nos versículos 12-16 destaca o aspecto de seu significado que se refere ao comportamento ético das pessoas, e o duplo uso de $edãqâ (vs. 18,20) nos versículos 17-21 destaca o aspecto que se refe re a seus benefícios. A cláusula de propósito no versículo 21 a e o con texto geral dos versículos 18-21 valida essa interpretação.94 O verseto B intensifica a ideia. No meio (betôk) das sendas (netibôt veja 1.15, n. 61) esboça todas as situações nas quais ela buscou e encontrou a reti dão e a justiça (mispãt; veja 1.3; 2.8). 21 O infinitivo de propósito liga o versículo 21 ao versículo 20. A sabedoria anda em retidão e justiça de modo a conceder [ou “dotar de”, lehanhil; veja 3.35] bens (ou “recursos”, “posses”; cp. Eclo 42.3), um significado único deyês, que normalmente quer dizer “ser existente”. Por meio dessa metáfora incompleta, que combina com “me acharão”, a sa bedoria mostra que somente aqueles que me amam ( 'õhabay; veja v. 17) têm direito à riqueza duradoura que ela possui. Uma vez que ela é reta e justa (v. 20), sua rica herança (v. 21) não lhe será negada. Trata-se, aqui, das propriedades do rei, como é esclarecido por seus tesouros (ou depó sitos, '0§erõtêhem) que contêm essa riqueza. 'Ôsãrôt indica as casas do tesouro e cofres cheios de coisas magníficas e valiosas (1 Rs 14.26; 7.51) e/ou os metais preciosos, alimentos valiosos, móveis, especiarias e afins (cp. Js 6.19,24; Is 2.7; 39.2; Jr 15.13; 38.11). Sua herança é mais do que abundante, como indica o paralelo encher (y-mallê'; veja 1.13; 6.30). (2) Nascimento e celebração da sabedoria nos tempos primitivos (8.22-31) A Septuaginta insere uma ponte entre os versículos 21 e 22 para ligar
o tema das recompensas empiricamente comprovadas da sabedoria no tempo histórico (vs. 12-21) ao tema do seu nascimento no tempo primor dial (vs. 22-31). “Se eu lhe declaro as coisas que acontecem diariamente, [também] me lembrarei de relatar o que aconteceu no tempo primordial.” A mudança de assunto é marcada pela mudança de “eu” (vs. 12-21) para o Senhor (vs. 22-31). A seção começa com “o S e n h o r ” e termina com benê ’ ãdãm (“humanidade”), o ponto culminante e o objetivo da obra criadora de Deus e a audiência do apelo da sabedoria (v. 4). Esta seção, unificada tematicamente pela ligação da sabedoria com as obras criadoras de Deus, pode ser dividida em duas estâncias iguais, a quinta e a sexta do interlúdio. A primeira se refere à sua origem antes da criação (vs. 22-26); a segunda, à sua presença e celebração durante a criação (vs. 27-31). Essas duas metades são ligadas por um quiasmo temático: A, a origem da sabedoria (vs. 22,23); B, o estado negativo da criação (vs. 24-26); B’, a apresentação positiva da criação (vs. 27-29); A’, a celebração da sabedoria pela origem da humanidade (vs. 30, 31). Esse quiasmo pode explicar a excepcional seqüência de dois versículos seguidos de três versículos nessas duas estâncias. Meinhold também observa que quando a sabedoria aparece pela primeira vez no passado remoto, ela apresenta a si mesma como sendo completamente passiva, sendo criada pelo S e n h o r (vs. 22-26). Em seguida ela apresenta a si mes ma como estando presente durante a criação do cosmos (vs. 27-29) e, por fim, ela apresenta a si mesma como uma adoradora ativa (vs. 30, 31 ).95 Esse poema extremamente imaginativo e figurativo, que eleva o ensino de Salomão a alturas transcendentes (veja pp. 132-136), funcio na de três maneiras. Em primeiro lugar, investe a sabedoria de Salomão de patente nobreza, mostrando que sua antiguidade é anterior à criação (vs. 22-26). O pano de fundo egípcio retrata essa função. Nos “Textos dos Sarcófagos”, Atom anuncia que sua filha, Tefnut, a irmã de Shu, é Ma‘at. Ele relata que em seu tempo primordial, quando ainda não exis tia nada - num estilo semelhante aos versículos 24-26 - somente Ma‘at e Shu, seus filhos, estavam com ele. Nos versículos 22-26, e em outros textos egípcios, a patente de nobreza está baseada na preexistência em comparação com a criação. A antiguidade da sabedoria antes da cria ção lhe concede a mais elevada posição, dignidade e autoridade (vs. 22-26).% Em segundo lugar, só ela tem o conhecimento que a toma 95. Meinhold, Sprüche, p. 143. 96. De acordo com Kayatz, Studien zu Proverbien 1-9, pp. 93-95.
competente para aconselhar. Somente alguém que observou a criação desde o seu início sabe a história toda e, portanto, tem o conhecimento para aconselhar outros. Além disso, “no âmbito humano, somente a longa experiência confere discernimento acerca da natureza humana e conhecimento acerca dos indivíduos” (cp. 20.29; cp. lRs 12.1-19; Jó 15.7; Jo 1.1-3; ICo 1.15-20).97 Esse conhecimento abrangente lhe dá competência para falar de maneira dogmática (veja pp. 126-129). Em terceiro lugar, a ligação verbal hqq (“decretar”) nos versículos 15 e 29 esclarece a função desta estância. A sabedoria se deleitou e celebrou o decreto criador de Deus que deu estrutura duradoura ao cosmos (vs. 27-31), e ela, por sua vez, capacita os governantes de modo a publica rem decretos que confiram estrutura duradoura à sociedade. Sua or dem civil reflete, em miniatura, a ordem cósmica divina. “A casa... é o universo que o homem constrói para si, imitando a criação paradigmática dos deuses, a cosmogonia.”9*A revelação da sabedoria concorda com os decretos cosmológicos invioláveis do S e n h o r ( v s . 27-31). Kidner explica: “É preciso ser piedoso para ser sábio; não porque a piedade compensa, mas porque a única sabedoria por meio da qual você pode lidar com as coisas diárias, em conformidade com a natureza delas, é a sabedoria por meio da qual elas foram divinamente criadas e ordenadas”.99 As notáveis semelhanças quanto à forma e ao conceito entre os versículos 22-31 e os textos egípcios sugerem que Salomão investiu em uma forma literária egípcia com o monoteísmo ético de Israel. E possí vel que, em outros tempos, os versículos 22-31 fossem um poema sepa rado, daí a descontinuidade evidente em termos de conteúdo e estilo em relação aos versículos 12-21. No entanto, a função do poema, exaltar o direito da sabedoria de governar e falar de seu deleite na estrutura que restringe o caos, também apresenta uma continuidade evidente com as recompensas concedidas aos governantes nos versículos 12-21. O pa pel da sabedoria na comunidade histórica (vs. 12-21) não é descontínuo com seu papel no contexto cosmológico primordial (vs. 22-31). 22-26 A primeira estância define que a precedência da sabedoria em posição e dignidade acima do restante da criação é tanto qualitativa (i.e., foi gerada, não criada) quanto temporal (i.e., existente “antes” de 97. Van Leeuwen, Proverbs, p. 92. 98. M. Eliade, The Sacred and the Profane: The Nature o f Religion (Nova York: Harcourt Brace Jovanovich, 1959), pp. 56-57; ep. pp. 172-79. 99. Kidner, Proverbs, p. 32.
qualquer criatura). Em decorrência disso, ela é competente para acon selhar e, quando fala, tem autoridade. A primeira estrofe da estância apresenta a geração da sabedoria no passado primordial (vs. 22, 23), e a segunda estrofe apresenta sua geração antes do mar (v. 24), da terra (vs. 25,26) e, implicitamente, do céu (v. 27). 22, 23 A primeira estrofe mostra a sabedoria vindo a existir no passado primordial pelas preposições “do” e “desde”, com sinônimos para o passado remoto. 22 O significado de me fe z existir (qãnãni) tem sido motivo de controvérsia desde a heresia ariana (veja pp. 185-186). Três interpreta ções são dignas de consideração. Alguns estudiosos afirmam, por bons motivos, que qãnâ significa “adquirir ou possuir”.100 (1) Esse é seu significado em outras ocorrências em Provérbios e, mais especifica mente, quando o termo está associado a adquirir sabedoria/conheci mento/verdade (1.5; 4.5,7 [2x]; 16.16; 17.16; 18.15; 23.23) ou entendi mento (15.32; 19.8), e em uma ocasião, tem sentido comercial (20.14). (2) E o uso normal de qãnâ’ no restante do Antigo Testamento. (3) Aquila, Símaco e Teodócio, ao iniciarem uma tradição nas traduções que foi continuada pela Vulg., e pelo Códice Siro-Hexaplar, interpreta ram o termo dessa maneira. (4) Essa interpretação se harmoniza me lhor com a declaração em Jó 28.27 de que Deus manifestou a sabedo ria, não que ele a criou. Porém, a segunda interpretação, “criar”, é tão certa para Meinhold que a argumentação não é mais necessária. No entanto, é preciso justificar essa posição.101 (1) Trata-se de um signifi cado mais adequado para qnh do que “possuir”, pelo menos em Deuteronômio 32.6 e no Salmo 139.13, e provavelmente em Gênesis 4.1; 14.19, 22. (2) Combina melhor com os outros verbos em Provérbios 8.22-26 que falam da sabedoria vindo a existir. (3) A LXX, a Targ. e a Sir., traduziram qnh como “criar”. (4) Seu derivativo qinyãn no Salmo 104.24 significa, mais provavelmente, “criaturas”, pois o seu paralelo é ma'aseyka (“suas obras”). Em termos mais precisos, porém, qnh pro vavelmente significa “gerar”, “fazer existir” em Provérbios 8.22. Procriação não é o mesmo que criação. Irwin baseia essa terceira inter pretação nos seguintes argumentos filológicos e contextuais.102(1) Em 100. Defendidas mais aptamente por Bruce Vawter, “ Prov 8:22: Wisdom and Creation”, JBL 9 (1980) 205-16. 101. Meinhold, Sprüche, p. 144. Veja W. H. Schmidt, TLOT, 3:1147-1153, s.v.qnh. 102. De acordo com W. A. Irwin, “Where Shall Wisdom Be Found?''./fi/. 30(1961) 133-42.
Gênesis 4.1 qãnâ tem um sentido biológico, “ser pai/mãe de”. Um con texto de nascimento e, portanto, um sentido semelhante, também é en contrado em Deuteronômio 32.6, em que Deus é comparado a um pai que gera e no Salmo 139.13 (cp. Êx 15.16; Sl 74.2).103 (2) A ideia de “criar” é possível em Gênesis 14.19,22, mas el ‘elyôn qõnêh está rela cionado a um epíteto cultuai cananita que significa “ser/tomar-se pai/mãe de”. (3) Das nove ocorrências dessa raiz no ugarítico, que podem signifi car “criar”, como citadas por Cyrus Gordon, em uma delas quer dizer “obter”, em uma quer dizer “criar”, em duas o significado é incerto e em cinco ocasiões ocorre no epíteto de Aserá como qnyt ’lm, provavelmente com o sentido de “procriadora dos deuses”. (4) Acima te tudo, esse sig nificado é mais apropriado para os verbos paralelos em 8.22-26, “Eu fui formada” (v. 23) e “eu fui gerada” (vs. 24, 25). Como procriador, o S e n h o r também adquiriu sabedoria, mas essa é uma ideia derivativa. No entanto, no livro de Provérbios é impensável uma interpretação politeísta que envolva o S e n h o r com uma parceira sexual para a geração da sabe doria. A metáfora, “me fez existir”, significa que a sabedoria inspirada de Salomão vem do ser essencial de Deus; é uma revelação que tem uma ligação orgânica com a própria natureza e ser de Deus, ao contrário do restante da criação que veio a existir fora dele e de maneira independen te do seu ser.104Além do mais, uma vez que sua sabedoria existia antes da criação e que suas origens são distintas dela, a sabedoria não é aces sível à humanidade nem pode ser dominada pelos seres humanos; antes, deve ser revelada às pessoas e aceita por elas. Como a primeira (rê'sit) significa “primeira” com referência ao tempo (i.e., “como o princípio” ou “no princípio”), não em importância ou qualidade como melhor de uma série (i.e., “mais excelente”, “princi pal”, “mais notável”), nem em princípio (veja 1.7; 4.7), tampouco em virilidade (i.e., “primogênito”). Nos versículos 22,23 o min (“de”, “des de”) temporal é repetido quatro vezes associado a termos como o para lelo qedem, quase esgotando o vocabulário para o tempo primordial. 103. Se o salmista pode dizer “tu formaste (fihôlêl) a terra” (Sl 90.2), pode afirmar com mais facilidade ainda “deste à luz às minhas partes interiores (lit. ‘rins’)” (pace Van Leeuwen, Proverbs, p. 92). 104.0 conceito segundo o qual a sabedoria é gerada eternamente está baseado no dogma cristão, não na exegese. Os vs. 22-26 representam a origem da sabedoria como um acontecimento e ação singulares, não como um nascimento e/ou um “vir a possuir" de caráter eterno. Agostinho, Calvino, et. al. se equivocaram ao interpretar a sabedoria incorretamente como uma hipóstase de Deus que equipararam a Jesus Cristo e não com uma personificação da sabedoria do mestre sábio (veja pp. 135-137, 185-189).
Poderia significar “o principal” se nissakti no versículo 23 tivesse o sentido de “fui investida/empossada”, ou poderia significar “mais notá vel” ou “primogênito” se darkô quisesse dizer “sua força”. Mas esses significados são questionáveis demais para derrubar os indicadores tem porais claros. Do seu caminho (darkô) provavelmente tem seu sentido normal como metáfora para a conduta com o sentido mais específico de “atividade” ou “obras” como sua forma plural pode ser traduzida em Jó 26.14. O paralelo “suas obras” apoia essa interpretação. No entan to, tomando por base o ugarítico drkt (“domínio real”), Albright cria que derek significava “nobreza, domínio”.105 Koch atribui a derek o signifi cado de “poder” em Provérbios 8.22; 10.29 e Jó 40.19.106 Mas Fox observa, “Esse significado... é contextual. Derek se refere ao governo quando o ‘caminho’ ou comportamento em questão está relacionado ao ato de administrar como governante, o que não é o caso aqui”.107 Po rém, a HALOT atribui a derek o significado de “poder”, “força” ou “vigor” no Salmo 138.5b, em Provérbios 31.3, Jeremias 3.13 e Oseias 10.13, mas os significados “ação” ou “atividade” em Jó 40.19 e Provér bios 8.22, respectivamente. O conceito de “poder” ou “força” toma difusa a ideia de 8.22-26 que, de outro modo, se concentra na prece dência cronológica da sabedoria em relação ao restante da criação, não no poder de Deus. O verseto paralelo enfatiza Deus gerando a sabedo ria como o primeiro dos seus atos, não sua virilidade. Mais antiga (qedem) pode indicar a esfera divina (i.e., “o eterno”; Dt 33.27; Hc 1.12), mas nesta estrofe que diz respeito à preexistência da sabedoria em relação ao restante da criação, tem seu outro sentido, designando o passado mais remoto (veja Pv 8.23; cp. Dt 33.15; SI 44.2[3]; 68.34[33]; 74.2 [em que modifica ç õ n ó ’]; 78.2; 119.152).108 Das suas obras (mip'ãlãyw), cuja única outra ocorrência está no Salmo 46.8[3]; 66.5, distingue a sabedoria do S e n h o r , da mesma maneira como o restante da passagem a distingue do restante da criação. Do [i.e., o ponto inicial] passado (mê*ãz) é usado no Salmo 93.2 com respeito ao trono de Deus e paralelo a “tu [Deus] és desde a eternidade”. 23 No [lit. “desde o”] tempo mais remoto (m eôlãm ) que pode designar tanto o passado quanto o futuro mais remoto, se refere con105. W. F. Albright, “Some Canaanite-Phoenician Sources of Ilebrew Wisdom”, in WIANE, p. 7. 106. K. Koch, TDOT, 3:286, s.v. derekh. 107. M. Fox, Proverbs 1-9 (AB; Nova York: Doubleday, 2000), p. 281. 108. Jenni, rZ-OT-, 3:1103, s.v.qedem.
textualmente ao ponto inicial no terminus a quo do passado mais dis tante, mas não um período determinado mais antigo. “O tempo mais remoto” é um conceito relativo de acordo com o horizonte temporal pressuposto no contexto. A expressão pode ser traduzida, por exemplo, como “desde a/na antiguidade” (Gn 6.4; Jr 28.8) ou “há muito” (Jr 2.20). A sabedoria não está afirmando ser eterna, pois o tempo em vista é aquele do seu nascimento. Somente nos contextos teológicos em que Deus é considerado como existindo antes de qualquer começo é que niê'ôlãm pode ser traduzido como “desde a eternidade” (Sl 25.6; 90.2).109 O paralelo designa esse tempo como o começo da terra. Fui formada (nissakti) pressupõe, com HALOT, que o lexema é o Nifal de nãsak II ou sua forma secundária nãsak II (ser tecido, moldado), que é usada figurativamente no Salmo 139.13 no Qal de gestação e em paralelo com qãnâ. Porém, BDB o considera o Nifal de nãsak III (“investir/ empossar”, i.e., ser consagrado como líder com uma libação), que ocorre no Qal num contexto semelhante no Salmo 2.6 (cp. yPlidtíkã, “eu te gerei”; Sl 2.7)."° Apesar da última opção ser gramaticalmente possível, o melhor é excluí-la, uma vez que o conceito importante de que a sabedo ria foi estabelecida ou empossada (como uma rainha?) não é explicado nem desenvolvido nesta estância. Aqui a suposta metáfora de tecer indi ca a proximidade e o relacionamento íntimo da sabedoria com o S e n h o r . No [lit., “desde o”] principio (m êros; lit. “desde a cabeça”) tem uma conotação temporal (cp. Is 40.21),'11como fica claro pelo apositivo des de os tempos mais antigos (miqqadmê). A HALOT traduz qedem neste uso como “tempo primevo”.112Rõ‘S ecoa rê'sit no versículo 22a, e qedem ecoa qedem no versículo 22b. Da terra ( ares) tem seu sentido cosmológico (veja v. 16). A Bíblia divide o universo com respeito a Deus e à humanidade em céu, onde Deus e os seres divinos habitam (Sl 115.16), terra, onde os seres humanos vivem (cp. Gn 1.1; 14.19, 22; Is 66.1) e a sepultura, o reino dos mortos (veja 1.12; 5.5; 7.27; 9.18; Sl 139.8). 24-26 A segunda estrofe da estância representa a origem passiva da sabedoria antes da criação do universo, mudando da preposição min “de/desde” para outros marcadores de origem, a saber, “quando não havia” (v. 24) e preposições que significam “antes” (vs. 25,26) associa 109. Jenni, TLOT, 2:854, s.v. 'ôlãm. 110. HALOT (2:703, s.v. II nsk) harmoniza o Salmo 2.6 com Provérbios 8.22. 111. De acordo com HALOT, 3:1166,rõ ‘s. 112. HALOT, 3:1070, s.v. qedem.
dos à representação dos atos criadores de baixo para cima. Seguindo o estilo das cosmogonias do antigo Oriente Próximo, primeiro a sabedoria declara a situação negativa antes da criação.113 Meinhold observa que ela representa os atos criadores desde abaixo da terra até acima dela. Convém observar o movimento desde as profundezas subterrâneas (v. 24a) passando por fontes que levam à superfície (v. 24b), pelas monta nhas visíveis arraigadas nas profundezas (v. 25a), pelos montes (v. 25b), pela terra e seus campos (v. 26), até o céu e seu horizonte (v. 27).114 O mar, a terra e o céu retratam todo o universo dos seres vivos. Dentro da seção unificada dos versículos 24-26, as grandes esferas geográficas são intensificadas com referência à habitação humana: dos mares, que são mais remotos (v. 24), até as montanhas, que são menos remotas (v. 25) culminando com a terra, onde os seres humanos habitam (v. 26). A última é intensificada progressivamente de “terra”, passando por “cam pos abertos” até “solo arável”. Fox observa que essa representação unificada deixa claro para a audiência que “a criação é um panorama coerente, não um conjunto de fenômenos”." 5 24 Quando não havia (be 'ên) é a primeira das cinco determina ções nos versículos 24-26 de que a sabedoria é anterior ao cosmos. Abismos (ou correntes de água; fíhõmôt) pode se referir ao abismo primevo ou aos atuais oceanos e/ou correntes de água abaixo da super fície da terra."6 A referência a “fontes” no verseto B favorece a última interpretação, mas o paralelo em 3.20 sugere a primeira. Talvez não se tenha em mente nenhuma distinção. As correntes dos oceanos ou ma res têm sua origem nas profundezas ou abismo primevo (fíhôm ) antes de este ser separado (veja 3.20). Em Gênesis 1.1-3 o abismo primevo fazia parte da terra antes da obra criadora de Deus intervir e transfor mar o caos no cosmos. No entanto, a sabedoria já existia antes desse abismo primevo e seus remanescentes. Reymond nega essa interpreta ção, pois, de acordo com ele, a ideia de que houve um tempo em que o abismo primevo não existia não tem paralelo no Antigo Testamento. Antes, ele acredita que a referência é a “fontes” como em Deuteronômio 8.7.1,7 113. Cp. Gênesis 1.2, 3; 2.5-7; Enuma Elish (linhas 1-9); A N ET, pp. 60-61; Provérbio 80 dos Textos de Sarcófago do Egito (citado por Meinhold, Sprüche, p. 135). 114. Meinhold, Sprüche, p. 145. 115. Fox, Proverbs, p. 282. 116. C. Westermann, TLOT. 3:1412-13, s.v. tPhôm. 117. P. Reymond, L ’eau, sa v/e, etsasignificancedans l ’Ancien Testament (VTSup 6; Leiden: Brill. 1958). p. 175.
No entanto, deve-se dar espaço para cada livro da Bíblia mostrar seu caráter individual. O significado normal de “abismos” como massa pri meva de água no começo da criação (Gn 1.2;118 Jó 38.16; S l 33.7; 104.6; Pv 3.20) é mais apropriado neste contexto que mostra a existên cia da sabedoria como sendo anterior ao restante da criação. Eu fu i gerada (hôlãlti) toma por certo que o S e n h o r é o agente, como pode ser deduzido de seu paralelo ativo, “o S e n h o r me fez existir” no versí culo 22. H?Z(“contorcer-se no parto”) começa com as primeiras contra ções e cessa com o parto do bebê do corpo da mãe (cp. Pv 25.23; 26.10; Jo 16.21)'19 e, portanto, expressa inquestionavelmente a metá fora do nascimento sugerida por qnh no versículo 22. “Uma vez que Jó ainda não estava presente quando as montanhas se encontravam em trabalho de parto e quando o primeiro homem nasceu (Jó 15.7), seu status era inferior e ele devia permanecer calado. Uma vez que a sa bedoria, ao contrário, já estava presente antes dos abismos e das fon tes, antes das montanhas e das elevações (Pv 8.24s.), ela se encontra acima de todo o restante da criação e próxima de Deus.”120 Convém repetir, porém, que o texto não visa tratar de nenhuma realidade mitoló gica, pois o S e n h o r não tem cônjuge, e sem uma companheira, a reali dade mitológica é impossível (cp. S l 90.2). A repetição de quando não havia (be’én) enfatiza a situação negativa. Fontes (ma'yãnôt\ veja 5.16) indica os lugares de onde a água jorra das profundezas subterrâneas para nutrir a terra. Numa região árida como o Oriente Próximo, abun dando com água (nikbaddê-mãyim) provavelmente enfatizava seu po der de fertilizar a terra. É possível que seja pretendido um merisma entre os oceanos que ameaçam a vida e as fontes que produzem vida. 25 Antes (be(erem) introduz a terceira determinação de que a sa bedoria tem precedência quanto ao tempo e ocupa uma posição superi or em relação ao restante da criação. Montanhas (hãrim ) é uma refe rência às fundações da terra no meio das profundezas do oceano. Se rem plantadas (ou “afundadas”/“assentadas”, ha(bã'ü esclarece a ideia. Jonas 2.6[7] apresenta as raízes das montanhas como estando localiza das nas profundezas do mar. Não obstante, elas também se elevam saindo das águas (Sl 104.6-8) e contrastam com as águas, formando 118. D. T. Tsumura (The Earth and lhe Waters in Genesis I and 2 [JSOTSup 83; Sheffield: Sheflficld Acadcmic Press, 1989], p. 78) considera o fihôm parte de um par de palavras hipônimas com a terra (i.e., que fornece informações sobre a terra quando da criação). 119. A. Baumann, TDOT, 4:345, s.v. hdl.
um merisma com elas. Assim como os abismos representam o tempo primevo, as montanhas conotam os aspectos mais antigos da terra (cp. SI 90.1,2; Mq 6.2). É importante ter em mente que os poetas represen tam o fenômeno cosmos objetivo de maneira figurativa. As montanhas, por exemplo, podem ser retratadas como colunas alicerçadas no ocea no e que sustentam a terra (cp. SI 18.7, 16[8, 17]), mas não se trata de uma descrição literal, assim como a ideia de que vieram a existir atra vés de um parto também não é literal (SI 90.2). Jó não permite uma interpretação literal: “Sobre o que estão afundadas (hotbã'ü) as bases da terra?” (Jó 38.6). A repetição de antes, porém desta vez com lipnê, enfatiza ainda mais a precedência da sabedoria em relação até mesmo aos aspectos mais antigos e duradouros da criação, tão fundamentais para a vida e a existência humana. Elevações (jfb a ô t) é um termo comum usado pelos poetas em paralelo com “montanhas”, ressalta sua altura (elevando-se acima da terra) e contrastando com “plantados” (no mar). O paralelo quiástico eu fu i gerada (hôlãltí; veja 8.24a) cria uma ligação próxima entre os versículos 24, 25.120 26 Uma quinta determinação da precedência da sabedoria é intro duzida por uma construção rara para antes Çad; veja n. 40). O prono me anafórico ele, que se refere ao S e n h o r no versículo 22, é menciona do pela primeira vez como o agente da criação (vs. 24-26). Liga a atividade criadora do S e n h o r na criação com seu ato procriador nos versículos 22, 23 e forma uma transição para a apresentação do S e n h o r como o agente ativo executando a criação nos versículos 27-29. Fazer Çãsâ; veja 2.14) é uma palavra comum para a obra criadora de Deus, especialmente da terra, e não deve ser distinguida muito nitida mente de seu sinônimo mais pitoresco e definido, bãrã' (“criar”; Gn 1.1 comÊx 19.1 l;G n 1.16 com SI 148.3-5 e Is40.26; Gn 1.21 com 1.25; 1.26 com 1.27; e os dois verbos em Gn 2.4a). A terra Çeres) tem seu sentido cosmológico de superfície terrestre em contraste com os céus (cp. vs. 27,28a) e o mar (cp. vs. 28b-30), inclusive tanto a terra cultivável quanto a não-cultivável. Mais especificamente e, no entanto, distintamente, a sabedoria acrescenta e os campos abertos (húsôt; cp. 1.20) fora da cidade (Jó 5.10), onde os rebanhos pastam (SI 144.13). E os primeiros (rv’s ; lit. “cabeça”) tem seu sentido figurativo temporal, referindo-se ao começo do tempo neste relato da criação (cp. mêrõ’s no v. 23).121 Do 120. Baumann, TDOT, 4:347, s.v. húl. 121. H.-P. Müller, TLOT, 3:1189, s.v. fõ 'S.
mundo (têbêl) provavelmente qualifica os “torrões de terra” como sen do pertencentes à esfera da terra firme cultivada e habitada.122 Tor rões de terra ('oprôt) se refere, basicamente, aos pedaços pequenos e soltos de terra, está “intimamente relacionado ao campo semântico de 10dãm â, ‘cultivável’... e eres”.123 Se o plural raro (para enfatizar sua vastidão?) - ocorrendo em duas de 110 vezes - tem o mesmo sentido que o singular, dentre suas várias formas de uso (cp. Gn 2.7 e 3.19), refere-se aqui àquela parte do solo da qual o homem foi feito, que ele cultiva e ao qual ele volta. E seu berço, seu lar e sua sepultura. 27-31 Em termos temáticos, na próxima estância (vs. 27-31) a sabedoria representa em primeiro lugar a si mesma como estando pre sente quando o S e n h o r estruturou firmemente o universo complexo que abriga a humanidade (vs. 27-29) e, em seguida, em deleite constante, expressa provavelmente por meio da dança, diante do S e n h o r , especi almente quando ele criou a humanidade (vs. 30,31). Em termos grama ticais, porém, a estância é essencialmente uma frase extensa. Depois de uma frase introdutória sumária no versículo 27, uma frase extensa e complexa apresenta uma série de cláusulas temporais subordinadas e paralelas apresentando os atos criadores do S e n h o r ( v s . 28,29), segui da da cláusula principal que apresenta a sabedoria “ao seu lado cons tantemente” (v. 30a) e celebrando seus atos criadores (vs. 30b, 31). As duas estrofes são ligadas pela estrutura “eu estava lá” (v. 27a) e “eu estava ao seu lado constantemente” (v. 30a). 27-29 Em termos gramaticais, a estrofe sêxtupla está ligada pelo uso em seis ocasiões da preposição be acrescida do infinitivo construto (“quan do ele...”). Em termos contextuais, ao contrário dos versículos 24-27, que apresentaram um panorama das ações criadoras do S e n h o r num movi mento de baixo para cima, os versículos 27-29 as apresentam na direção contrária, movendo-se dos céus (v. 27a) e de seu horizonte (v. 27b), para o firmamento e as nuvens (v. 28a), descendo às fontes no abismo (v. 28b) e às praias (v. 29b) e, finalmente, aos alicerces da terra (v. 29b). Em termos temáticos, a sabedoria apresenta o S e n h o r estabelecendo firme mente as entidades cósmicas que sustentam e, ao mesmo tempo, amea çam a existência humana. Mas em ambas as estrofes (vs. 24-27 e 2729), unidas pelos céus/firmamento que ligam os movimentos como um janus no versículo 27, o alvo da apresentação é a terra como esfera da 122. HALOT, 4:1682-83, s.v. tèbel. 123. G. Wanke, TLOT, 2:940, s.v. 'ãpSr.
vida humana.124Todas as metáforas para a criação nos versículos 27-29 significam que cada uma das entidades cósmicas das quais a vida huma na depende se encontra tão firmemente estabelecida dentro da ordem cósmica criada que não pode ultrapassar seus limites nem ser contraria da por outra. Se não fosse assim, o cosmos se desintegraria no caos. A existência física da humanidade depende de um universo firmemente es truturado. A ordem fixa criada pelo S e n h o r serve de modelo para os seus limites morais estabelecidos para os seres humanos, a fim de evitar que a sociedade caia em anarquia. “A ordem terrena [no Egito antigo] imita a ordem celestial e, como a celestial, é garantida pela divindade.”125 27 Quando ele estabeleceu (bahakinô\ cp. 6.8) funciona como uma metáfora para “criar”. Céus (Sãmayim) se encontra em oposição à terra. EuÇãni; veja v. 12) estava lá (Sãm - observe a aliteraçâo com Sãmayim - cp. Is 48.16) mostra a sabedoria presente na criação do cosmos e, portanto, tendo a oportunidade de contemplar e celebrar a maneira como Deus o ordenou e estruturou. Quando ele gravou (behüqô; veja 8.29) um círculo (hüg - note a aliteraçâo com hüq), como se desenhasse com um compasso, é uma metáfora incompleta para a criação do horizonte (cp. Jó 22.14; 26.10; Is 40.22). “A tradução ‘abóbada’, sugerida com frequência, é derivada da cosmologia do anti go Oriente Próximo com o seu céu em forma de sino.”126 Sobre a face Çal-penê) do abismo (fíhôm, talvez um quiasmo com o v. 24a) prova velmente designa, agora, o anel de água que, nos dias de hoje, circunda a terra além das costas dos continentes. A metáfora indica a separação e os limites entre as duas grandes esferas cósmicas do céu e do mar. Jó 26.10 acrescenta que o horizonte formou um limite entre a luz e as trevas. “Eu estava lá” é omitido no verseto B. 28 O verseto A faz o céu etéreo descer às suas nuvens e, num merisma antitético o verseto B muda o foco para baixo, para as fontes subterrâneas. Quando ele fez... firmes (be ’am m esô) significa, mais literalmente, “quando ele fez forte” e, no caso das nuvens, indica que elas permanecem suspensas acima da terra, não que permanecem fi xas sem movimento. A menção da água no verseto paralelo sugere que as nuvens (Sehãqim ) são nuvens de chuva, como em 3.20 (cp. Dt 124. Também M einhold, Sprüche, p. 145. 125. O. Keel, The Symbotism o f lhe Biblical Word: Ancienl Near Eastem Iconography and lhe Book o f Psalms (Nova York: Seabury, 1978), p. 96. 126. K. Seybold. TDOT,4:2 4 5 -4 6,s.v. chúgh.
33.26; Jó 37.18; Sl 18.12[ 13]; 36.5[6]); 77.17[18]), associadas aos céus.127 No alto (m im m ã'al) serve para contrastar num merisma as fontes de águas nos céus (v. 28a) com aquelas nas profundezas (v. 28b). A oração inicial, quando ele estabeleceu firmemente (beazzezô\ veja n. 42) no verseto B ressalta enfaticamente seu paralelo sinônimo, “quando ele fez... firmes”. As fontes Çinôt) do abismo (t?hôm\ veja vs. 24, 27) é uma referência à provisão de água para as profundezas subterrâneas. Foi preciso criá-las fortes, de modo a garantir o supri mento constante e abundante de água nas profundezas. 29 A sabedoria muda a descrição cênica da criação do cosmos para se concentrar mais estritamente no lugar da humanidade dentro dele. Ela move o seu foco dos céus remotos e seus horizontes (v. 27) e das fontes de água nas nuvens e nascentes subterrâneas (v. 28) para a terra, que está separada da água por ordem de Deus, e na qual as criaturas vivas se movem e vivem (Is 45.12). Quando determinou (beéúmô) significa, aqui, que o S e n h o r ordenou algo, estabeleceu uma lei e/ou prescreveu um decreto.128 Para o mar (layyãm) indica que Deus agiu em oposição ao mar de modo a impedir que inundasse a terra fértil. Tendo em vista a fúria intensa do mar numa tempestade, ele simboliza as forças do caos hostis à vida. Huqqô (seus limites-, veja v. 27b) também indica “um decreto para ele”. Hõq e o equivalente femi nino huqqâ são termos comuns do vocabulário bíblico para lei e justiça. Em alguns casos hõq pode significar “limite” ou “fronteira”, como quan do Deus determina um limite para o mar (Jó 38.10; Sl 148.6; Pv 8.29; Jr 5.22). Mas aqui também podem estar envolvidos os conceitos de “man damento” e “ordem”. Jó 38.10, 11 e o Salmo 148.5, 6 mencionam as ordens de Deus associadas a esses limites. Em resumo, “limites” é uma metonímia de efeito do decreto de Deus. Muitos textos afirmam que o S e n h o r controlou o mar determinando seus limites (cp. Sl 93; 104.6-9). E as águas (ümayim) não podem ir além (lõ ’y a'abrü; veja 4.15) da sua ordem (piw; cp. Nm 22.18) repete Jó 38.11: “e disse: Até aqui virás, e não mais adiante”. Essa repetição não deixa dúvidas que a sabedoria tem em mente que o Criador estabeleceu as leis ou regulamentos inalteráveis que determinam os limites para a terra e que o mar hostil não pode trans gredi-las (veja Jó 38.8-11). A energia caótica do mar opera dentro de limites rígidos. Não obstante, mantém um elemento de liberdade dentro 127. HALOT, 4 :1464-65, s.v. mhaq. 128. BDB, p. 963, s.v. éúm.
das limitações divinas e, neste sentido, mantém também seu sentido no cosmos, no plano geral ou “ordem” criada.129Enquanto Provérbios enfa tiza as estruturas controladoras, o livro de Jó ressalta a liberdade associ ada ao caos, que toma a vida humana dentro da ordem relativamente imprevisível e inexplicável. No relato da criação em Gênesis 1.1-2.3, Deus afirmou que o mar, limitado pela terra, era “bom” (1.9,10), mas não disse o mesmo acerca da água separada apenas pelo firmamento (1.68). A repetição de quando ele demarcou (behúqô\ veja v. 27b) parece, em princípio, um tanto improvável. Mas o uso de outro sinônimo para “firmar” (de acordo com a LXX; veja n. 42) parece mais apropriado para o versículo 28 do que para o versículo 29, que diz respeito à limitação do mar para “demarcar” a terra. Esse conceito é expresso de maneira bas tante adequada por um paralelo nominal e outro verbal, respectivamente, huqqô “seus limites/sua ordem” (verseto A) e behüqô (verseto B). Ade mais, behüqô pode funcionar como um inclusio com a primeira expres são depois da declaração “eu estava lá” (v. 27), e a declaração seguinte, “e eu estava ao seu lado” (v. 30). Os fundamentos da terra (môsedê; veja v. 26) se refere aos extremos mais inferiores das montanhas arrai gadas nas profundezas do mar (cp. v. 25a; Mq 6.2). 30, 31 A sabedoria chega ao cerne da sua prótase extensa de clá usulas temporais apresentando as ações criadoras do S e n h o r ( v s . 28, 29), repetindo a declaração sumária da estância (v. 27), “eu estava lá”. A isto ela acrescenta agora que ela estava lá constantemente, bem ao lado do Criador (v. 30a), celebrando cada um dos seus atos criadores (vs. 30b, 31a), especialmente a criação da humanidade (v. 31b). Se Jó obscureceu os desígnios de Deus e falou sem conhecimento porque não estava presente na criação (Jó 38.1,2), a sabedoria fala com auto ridade, pois ela possui o conhecimento abrangente previamente neces sário que faltou a Jó. 30 O inclusio “eu estava lá” (v. 27) e eu estava ao seu lado (wã 'ehyeh 'eslô) além de estruturar esta estrofe, ressalta a preexistên cia da sabedoria em relação à criação e sua grande proximidade do Criador nessa ocasião. O texto e o significado de constantemente ( amôn) foram examinados muitas vezes.130Existem quatro interpreta 129. J. G Janzen, Job, pp. 234-35. 130. Para um levantamento da história da interpretação do hap. leg. ‘ãrrión veja R. B. Y. Scott, “Wisdom in Creation: The ‘Smôn of Proverbs viii:30a”, K7~ 10(1960)213-23. H.-P. Rüger,“AMON — Pflegeking: Zur Auslegungsgeschichte von Prov. 8:30a”, in Übersetzung und Deutung;
ções plausíveis. (1) a maioria dos estudiosos (cp. NIV, NRSV e HA LOT)"1favorece os significados “artífice”, “artesão”, ou semelhantes.132 Muitos afirmam que 'ãmôn ocorre como um coletivo com o significado de “artesãos” em Jeremias 52.15, referindo-se àqueles que foram para o exílio na Babilônia em 586 a.C., mas essa afirmação é duvidosa. Ela toma por base a pressuposição questionável de que 'ãmôn significa “artí fice” em Provérbios 8.30, fazendo a argumentação se mover em círcu los. Além do mais, o texto e/ou significado de 'ãmôn em Jeremias 52.15 é incerto, pois a passagem sinóptica em 2 Reis 25.11 diz hehãmôn (“multi dão”) e um texto paralelo em Jeremias 39.9 se refere ao “sobrevivente do povo”. De acordo com 2 Reis 24.14, 16, “todos os artífices” (kolhehnrãs) foram para o exílio em 598 a.C., deixando implícito que não restou nenhum para ser levado para o exílio em 586 e que se o narrador quisesse dizer “artífice” em 2 Reis 25.11, ele teria usado hãrãs, o termo hebraico normal para essa ocupação. C. F. Keil chega à conclusão de que heftmôn é uma forma secundária de hehãmôn, “a multidão”.133 Em resumo, não existe nenhuma evidência léxica para esse significado que não tome necessário argumentar em círculos. Essa interpretação pode encontrar apoio em Provérbios 3.19, que pode ser entendida como uma afirmação de que Deus usou a sabedoria como um agente na criação; o significado mais provável, porém, é que a sabedoria foi seu instrumento. Uma coisa é ser um instrumento nas mãos de um criador; outra bem diferente é ser o artesão que aconselha e/ou executa a obra. Por fim, é possível que as versões antigas (LXX, Eclo, Vulg.)134bem como a Sabe doria de Salomão (ca. 40 d.C.; cp. 7.21,22; 8.4-6) tenham interpretado o texto dessa maneira, porém não Ben Sira(ca. 130 a.C.; cp. 1.4,9;24.9).135 Festschrift A. R. Hulst, org. D. Barthelemy (Nijkerk: Callenbach, 1977), pp. 154-63 tam bém faz um levantamento da história da interpretação desse termo. 131. HALOT, 1:62, s.v. 'Smôn. 132. O padrão qStôl pode indicar uma ocupação (cp. bshôn, "acrisolador”, Jr 6.27; 'SSôq “opressor", Jr 22.3), mas a maioria dos estudiosos acredita que é um termo que foi tomado emprestado do acadiano um m Snu , “capataz” por intermédio do aramaico, e corrige o texto para 'ommün (cp. Ct 7.2). 133. C. F. Keil, 1 and 2 Kings; 1 and2 Chmnicles (Comentário sobre o Antigo Testamento por C. F. Keil e F. Delitzsch; Peabody. Mass.: Hendrickson. reimp. 1996), p. 364. 134. R. B. Y. Scott (“ Wisdom in Creation: The 'Smôn o f Proverbs viii:30", VT 10 [1960] 213-23) argumenta que as versões antigas e a sabedoria de Salomão vocalizavam ‘mn como 'Omên “aquele que une”. Para ele, essa forma significa que a Sabedoria foi o elo vivo entre o Criador e sua criação. 135. Peter Enns, “Wisdom of Solomon and Biblical Interpretation”, in p. 213. Midrash Gen. Rab. 1.1 equipara a Sabedoria com a Torá e interpreta 'mn como o plano-mestre de Deus para a criação.
Além de não ter apoio léxico adequado, a interpretação “artesãos” torna contextualmente difusa a mensagem de Provérbios 8.22-29 de que o S e n h o r é o Criador de todas as coisas e Procriador da Sabedo ria.136 Uma declaração de que ela é, de fato, o artesão, surgiria inespe radamente do nada e seria descartada logo em seguida de modo igual mente inesperado. Até este ponto em sua discussão, a Sabedoria está argumentando que possui autoridade solene ao afirmar que foi gerada por Deus antes da criação vir a existir e ao estar presente na ocasião em que o S e n h o r estabeleceu os céus, os mares e a terra (vs. 25-29). Se fosse sua intenção representar a si mesma como uma agente ativa na criação, seria de esperar que ela fizesse tal contribuição importante para a sua argumentação afirmando que ela conhece todas as coisas, pois ela planejou e/ou executou todas elas e, portanto, que as pessoas devem lhe dar ouvidos (8.32). Além do mais, essa interpretação ofere ce um paralelo pobre para “deleitando/folgando” e “celebrando/dan çando” em sua obra; seria de esperar para essa interpretação termos como “ensinando”, “conversando”, “fazendo” e outros semelhantes (cp. Is 40.14).137 Por fim, seria excepcional e contrário à poesia hebraica a Mulher Sabedoria descrever a si mesma mediante uma imagem mas culina, a menos que se argumente que se tratava de um substantivo epiceno não atestado.138 (2) Outros mantêm esse significado de 'ãmôn, mas o consideram como uma aposição ou como um sufixo pronominal (i.e., “ao lado dele, o artesão”),139 ou ainda, como um acusativo de estado (i.e., “ao lado dele como um artesão”, significando, “quem é um artesão”), não ao 136. Van Leeuwen (Proverbs, p. 94) apela para o poema narrativo sumério “ Enki e a Ordem Mundial” (veja Samuel Noah Kramer, The Sumeríans: Their Historv. Cullure, and Character [Chicago c Londres: University o f Chicago, 1963]), pp. 171-83). Van Leeuwen acredita que o autoelogio de Enki (aca. Ea), o deus sumério da sabedoria, como artífice e conselheiro do rei divino Anu é um paralelo conceituai exato da sabedoria como “arquiteta-conselheira” de Yahweh, por meio da qual o rei [Yahweh] coloca todas as coisas em sua devida ordem”. No entanto, Enki atribui a si mesmo, não a Anu, o papel dc criador da vida, dc sustentador dos limites e de Senhor do universo, enquanto que a sabedoria atribui a criação somente ao S e n h o r , não a si mesma. Isaías 40.9, 10 desmente a ideia de que o S e n h o r precisou de um conselheiro como Enki/Ea (veja R. N. Whybray, The Heaventy Counselor in Isaiah xI 13-14: A Sludy o f lhe Sotirces o f lhe Theology o f Deulero-ísaiah (Cambridge: Cambridge University, 1971), pp. 64-84. 137. No entanto, não se deve levantar nenhuma objeção à ideia de um artífice se deleitar e celebrar sua criação, como Van Leeuwen, Proverbs, p. 95 argumenta aptamente. Porém, a sabedoria não está celebrando a própria criação, mas sim a criação do S e n i w r , e o S e n h o r não está se deleitando no papel ativo da sabedoria na criação (pace Van Leeuwen, Proverbs, p. 95). 138. veja IBHS, p. 100, P. 6 .3 .le. 139. M. Dahood. “Proverbs 8:22-31”, C B Q 30(1968) 519.
sujeito como no caso da interpretação anterior.140Assim eles evitam as objeções contextuais e teológicas de apresentar a Sabedoria como cocriadora com o S e n h o r . N o entanto, essa interpretação está sujeita às objeções de que esse significado de 'ãmôn não tem apoio histórico só lido, sugerindo que a análise gramatical é improvável,141 e que não acres centa nada à argumentação. (3) Muitos, apelando para Áquila, corrigem o TM para amün, um Qal no particípio passivo 'mn II que significa “ser cuidado por”, “nu trir” (cp. Lm 4.5).142O significado “protegido” ou “lactente” se encaixa tanto com a imageria do S e n h o r gerando a sabedoria (vs. 22-24) quanto aos paralelos de “deleitar” e “rir/celebrar”. Kayatz defende essa inter pretação tomando por base paralelos egípcios sobre Ma‘at, uma equi valente egípcia próxima de hokmâ, que é equiparada a uma criança brincando e dançando diante da divindade (cp. Is 11.8; Zc 8.5).143 Mas é de esperar uma forma feminina correspondente ao Qal no particípio ativo 'õmenet, “ama” em 2 Samuel 4.4; Rute 4.16, que tende a negar qualquer especulação desse termo como um substantivo epiceno não atestado. M. Fox chega a um significado semelhante ao analisar a for ma como Qal no infinitivo absoluto, significando “sendo criado”/“crescendo”, funciona como um complemento adverbial para o verbo princi pal.144 Sua interpretação não exige correção textual nem uma forma feminina, e foi apoiada por Ibn Janah e Moshe Kimchi. No entanto, é gramaticalmente questionável.145 O Qal infinitivo é ativo e significa “criando”, pois o Qal particípio de 'mn I é ativo, como provavelmente também o é o infinitivo construto em Ester 2.20. O conceito de “estar sendo criado/crescendo com” exige, supostamente, o Nifal passivo. Qualquer que seja o texto ou a forma, a afirmação da Sabedoria de que enquanto ela era criança ela se regozijava com grande prazer na obra criadora do S e n h o r não dá muita credibilidade à sua alegação de pos suir autoridade solene. (4) Hoffman146 e Plõger147 interpretam o termo independentemen 140. C. Rogers III, "The Meaningand Significanceofthe Hebrew Word
mwn
in Proverbs8:30”,
ZAW 109(1997) 18-21. 141. Veja porém ibid., p. 220, n. 39. 142. Também Toy, Proverbs, p. 177 e McKane, Proverbs, p. 357. 143. Kayatz, Studienzu Proverbien 1-9, pp. 93-95. 144. M. Fox, Amôn Again”, JBL 115(1996) 699-702; M. Fox, Proverbs 1-9, p. 287. 145. IBHS, pp. 588-89, P. 35.3.2a. 146. J. C. K. von Hofmann, Der Schriftbeweis (Nürdlingen: C. H. Beck, 1857-60), 1:98. 147. Plõger, Der Sprüche, p. 95.
te como um Qal infinitivo absoluto de ’mn I “ser firme, fiel”, a raiz entendida por Símaco, Teodócio e a Targum.148 A objeção de Toy de que o significado “fielmente”/“continuamente” “não é admissível” é arbitrária, e a objeção de Fox de que a raiz produtiva de I ’mn é Nifal não é justificável. O Qal de 'mn I é atestado em 'ãmên (originalmente, “confiável”) - suas formas nominais são 'õniên “confiabilidade”, 'omnâ “verdade” e 'emet “confiabilidade”. Além do mais, o Nifal infinitivo absoluto de ’mn I não é atestado e alguns lexemas ocorrem inespera damente em formas isoladas em raízes de outro modo improdutivas (e.g., dõbêr, Qal particípio ativo de dbr, cuja raiz é, de outro modo, sempre Piei). Ademais, o Qal infinitivo absoluto é usado comumente com a raiz Nifal, sugerindo que pode servir aqui como substituto.149 Essa interpretação é a que satisfaz mais adequadamente os paralelos de acordo com os acentos do TM: E eu estava E eu estava
ao lado dele me deleitando celebrando diante dele
fielmente; diariamente; em todo o tempo.
Apesar das três interpretações serem possíveis e terem apoio his tórico, a última se encaixa melhor no contexto mais amplo dos versícu los 22-31 e no contexto imediato do versículo 30. Apesar de Scott pen sar apenas no adjetivo “fiel” e não considerar a opção de uma forma infinitiva absoluta, comenta corretamente: “Esse significado da palavra é inteiramente apropriado no contexto em geral e, particularmente, no versículo 30, no qual corresponde aos advérbios ‘diariamente’ [sic!] (yôm yôm ) e ‘sempre’ (bkl 'í)”.l5° E eu estava (w ã’ehyeh) repete e, portanto, enfatiza o versículo 30a. Sa'aSu'im (deleitando) significa literalmente “deleites”, mas isso levan ta quatro perguntas. O que significa “eu me deleitava”? Por que a for ma é plural? Quem está se deleitando em quem? E, se a Sabedoria é a agente, por que ela está celebrando? A julgar pelo Salmo 109.4: “Eu sou oração”, que significa, “Sou inteiramente dado à oração” e pelo Salmo 120.7, “Eu sou paz”, que significa, “Sou inteiramente dado à paz”, a 148. Este com entarista tam bém chegou à mesma conclusão antes de consultar os comentários. 149. IBHS, P. 3 5 .2 .ld. 150. Scott, “ Wisdom in Crcation", p. 220. Num a nota de rodapé ele acrescenta, “ F. Dclitzsch afirmou que. nesta passagem, ‘ã môn é equivalente a lám id (“sempre”)” (citado por R. Stecher, ZKT 75 [1953] 435, n. 9).
expressão idiomática quer dizer: “Estou me deleitando inteiramente”. Uma vez que as nove ocorrências de $a'aSu'im são sempre plurais, nunca em oposição clara ao singular, essa característica faz parte da expressão idiomática. Fox segue a LXX e acrescenta “os deleites dele” (i.e., Deus está se deleitando), argumentando que a palavra hebraica significa “fonte [itálico dele] de deleite” a julgar por seu uso em outras passagens (Sl 119.24; Is 5.7; Jr 31.20). A HALOT concorda, definindo o termo como “desejo, deleite; na realidade, um objeto de folguedo, de divertimento, de prazer”. A forma absoluta (i.e., sem um sufixo prono minal) é encontrada apenas em Jeremias 31.20, e esse contexto deixa claro que o S e n h o r está se deleitando em seu filho, Efraim. Porém, o paralelo quiástico em 8.31b refuta essa interpretação e mostra que a Sabedoria é o agente principal. Nas outras nove ocorrências de SaaSu'im, o sufixo pronominal é agente e a HALOT, pressupondo que Sa'aSu'tm significa “desejo”, reconhece que Sa'aSu'ay deve significar “e o meu desejo... é com (pelos) filhos do homem”.151 Fox pressupõe que Sa'aSu'im significa “fonte de deleite” e traduz a frase no versículo 31 b como “meu deleite está na humanidade”. Mas o paralelismo quiás tico da estrutura externa da estrofe sugere que Sa'a$u'im tem um signi ficado constante, da mesma forma que meáaheqet, “celebrando”, tem um significado constante na sua parte central. O significado que se encaixa com os dois paralelos é “deleite”, o sentido de $” no pilpel e a interpretação das versões antigas e modernas.152 A prótase extensa dos versículos 28, 29 acerca do S e n h o r executando sua ordem cosmológica firmemente estabelecida pode ser explicada mais adequadamen te se na apódose a sabedoria se deleitar na criação (cp. Sl 119.24, 77, 92, 143, 174)153 do que se o foco for mudado repentinamente para o S e n h o r se deleitando na sabedoria. “Diante dele” (v. 30P) provavel mente é omitido no versículo 30ba, assim como “eu estava” (v. 30ba) é omitido nos versículos 30bp e 31 a, um fenômeno amplamente atestado no paralelismo hebraico.154 Deleitar-se na obra de Deus é correto e saudável; não se gloriar nela é inapropriado e doentio. Mas deleitar-se 151. HALOT , 4:1619, sa'asu'tm . 152. Cp. BDB, p. 1.044, s.v. II s“ . D. C a rcw e J. D. Price, NIDOTTE, 4:207, s.v. s“ . 153. Plõger (Sprüche, p. 96) interpreta o texto excessivam ente e causa confusão ao especular que a Sabedoria observou a criação com atenção infantil e adquiriu um conhecim ento im par dos atos criativos. N o entanto, o texto não faz m enção algum a de aprendizado e conhecim ento. 154. Veja P. D. Miller, “ Synonym ous-Sequential Parallelism in the Psalm s", Bib 61 (1980) 2 5 6 -6 0 .
nela de per si como faziam os românticos, e não diante do Criador, é impróprio. Dia após dia (yôm yôm) indica que a criação se deu ao longo de vários dias, como em Gênesis 1; enfatiza e esclarece cons tantemente no verseto A. Celebrando (m eéaheqet) em geral indica “alegrar”, “brincar”, quer com um sentido negativo de ridiculizar e es carnecer (cp. SI 2.4) ou, o que é mais freqüente, com um sentido posi tivo de expressar vitalidade jubilosa e favor em ações que envolvem dança e música (1 Sm 18.7), brincadeiras e pulos de alegria (SI 104.26), ou divertimento em geral (ISm 18.7; Jr 15.17; cp. Pv 26.19). Deleitarse e dançar, duas ações que andam juntas, diante dele (lepãnãyw\ i.e., do S e n h o r ) , são um ato de culto.155 Em 2 Samuel 6.5 (= lCr 13.8) e 2 Samuel 6.21 (cp. lCr 15.29), as únicas outras passagens em que o deleite e a dança se dão diante do S e n h o r , dizem respeito à adoração. Em Jó 38.7, os seres divinos adoraram cantando juntos e gritando de júbilo no começo da criação. Enquanto o humor depende da transgres são de normas esperadas, a sabedoria (i.e., os ensinos de Salomão) celebra com grande entusiasmo a estrutura inviolavelmente ordenada do cosmos. Em todo tempo (be kol -'êt) enfatiza pela terceira vez que a Sabedoria nunca deixou de celebrar o universo estruturado que o S e n h o r criou. Implicitamente, assim como a sabedoria exultou diante de Deus constantemente quando ele estruturou a criação para sempre, seus adeptos se regozijam constantemente diante dele em sua forma ção imutável. “Não há uma folha de grama nem uma cor neste mundo que não tenha sido planejada para nos fazer regozijar” (Calvino). 31 Enquanto o versículo 30 enfatizou a constância da celebração da Sabedoria diante de Deus, o versículo 31, o seu paralelo quiástico, quali fica o âmbito ao qual a celebração da sabedoria diz respeito: ela estava celebrando (meéaheqet', veja v. 30) sua terra habitada (têbêVarsô), conforme a tradução de Ottoson.156 A frase funciona como uma siné155. M einhold (Sprüche, p. 147) acredita que, enquanto o S e n h o r criava o m undo a sabedoria brincava e folgava diante dele o tempo todo com o uma mulher jovem e bela. Desse modo, argumenta Meinhold, ela o motivou, alegrou e, assim, incitou a sua atividade criativa. Porem essa interpretação está baseada em paralelos egípcios, nos quais as deusas egípcias M a'at e Hathor tinham o papel de se alegrar e incitar os deuses, com o é dem onstrado por O. Keel (Die Weisheit spiell vor Goll: Einikonographische Beitrãg zur Deulung des nfáaheqet in Sprüche 8:30 [ZPT; Gfittingen: Vandenhocck und Ruprecht, 1974], pp. 63-68, figuras 1-34). De acordo com Keel, uma alegria divertida e “ L ebensfreudlichkeif subjacentes se encontram na base do universo (ibid.. p. 72). Mas interpretar este texto com o conceito pagão da sabedoria com o uma mulher jovem e bela que estimula o S e n h o r sexualmente á atividade criativa pela dança e o divertimento é inapropriado para a tendência antimítica do pensamento bíblico. 156. M. O ttoson, TDOT, 1:394, ‘eret$.
doque para toda a criação e sugere que o objetivo da criação era um mundo apropriado para a humanidade. “A sabedoria, que descobriu o exercício alegre em toda a parte e estágio da criação, à medida que esta avançava, encontrou seu gozo consumado na adaptação do todo completo para ser o lugar de habitação do homem.”157A estrutura dos versículos 24-26 e 27-29 sugeria o que agora é explicitado. As palavras-chave ’eres (vs. 26,29) e têbêl' (v. 26) ligam o versículo 31 a esses versículos. A conjunção e (we) que inicia o verseto B se concentra a celebração e deleite da Sabedoria de modo ainda mais preciso na hu manidade (benê'ãdãm), levando seu discurso de elogio a si mesma a seu ponto culminante. “Humanidade”, no início (v. 4b) e no final do encômio da Sabedoria, forma uma estrutura notável e significativa e uma transição para a conclusão. Apesar de a humanidade em sua fra queza estar extremamente afastada do reino celestial, onde Deus e a sabedoria pairam, a pessoa na rua é o objeto do deleite da sabedoria (veja 8.4) e pode ser o recipiente do seu conhecimento.158 Ela se sente à vontade, tanto com Deus quanto com a humanidade e, assim, é medi adora da sabedoria do céu para as pessoas na terra. Uma vez que ela se deleita nelas, apela para que compartilhem da sua vida (veja 8.4,32). No versículo 31 ela se refere aos seres humanos antes destes rejeita rem o pedido para que a amem (cp. 1.20-33). Seu apelo final, nos ver sículos 32, 33, dividirá a humanidade entre aqueles que a amam e en contram vida e aqueles que a aborrecem e amam a morte. c. Conclusão: convite e advertência finais da sabedoria (8.32-36) A partícula lógica “De modo que agora” (v. 32) e a forma da intro dução do pai às suas palestras, que consistam dos destinatários (“os filhos”), imperativos para “escutar” (vs. 32-34) e uma argumentação ou 157. Perowne, Proverbs, p. 82. 158. Alguns cosm ólogos adotam o “princípio antrópico", a saber, que o cosm os está ajustado com precisão para gerar, inevitavelm ente, observadores inteligentes de sua constituição (veja J. D. Barro w e F. J. Tipler, The Anlhropic CosmologicalPrincipie [Oxford: Clarendon, 1986]). O principio se baseia cm várias coincidências numericamente delicadas e intimamente entretecidas na origem e estrutura do cosm os físico. Por exem plo, “na expansão inicial do universo, é necessário haver um equilíbrio perfeito entre a energia expansiva (que faz as coisas se separarem) e a força da gravidade (que faz as coisas se juntarem ). Se a expansão predom inasse, a m atéria se separaria rapidam ente dem ais im possibilitando a ocorrência da condensação em galáxias e estrelas. Nada de interessante poderia acontecer em um m undo tão disperso. E ntretanto, se a gravidade predom inasse, o mundo sofreria um novo colapso interior sem que houvesse tempo de dar início ao processo da criação da vida” (J. Polkinghom e, One World: The Interaction o f Science and Theology [P rinceto n : P rin ceto n U niv ersity , 1986], p. 57).
motivação introduzida por ki (“porque”; vs. 35,36), marcam a conclusão do discurso. Nela a Mulher Sabedoria muda sua identidade, cenário e destinatário. No lugar de sua imagem de mediadora junto à porta da cida de se dirigindo às massas (8.1 -21) e de personagem primordial ao lado do Criador (8.22-31), ela se mostra como a dona de uma casa se dirigindo aos filhos e convidando-os a velarem junto à sua porta a fim de encontrar a sabedoria. E uma questão de vida ou morte. Na primeira estrofe ela mistura suas ordens, “escutai-me” (vs. 32a, 33), com bem-aventuranças motivadoras (“abençoada é”; vs. 32b, 34a). “Guardar” (Sãmar) forma um inclusio ao redor da estrofe. Na segunda estrofe, ligada à primeira pela conjunção inicial “porque” (ki), ela intensifica a motivação comprovadora para vida (v. 35) e morte (v. 36). Sua ordem, “Escutai-me” é definida mais precisamente como “Escutai a instrução... e não a despre zeis” (v. 33) e intensificada figurativamente como forte expectativa (v. 34b). Suas palavras iniciais, “De modo que agora, filhos, escutai-me” e sua palavra final, “morte”, corresponde perfeitamente à conclusão do pai no discurso anterior (cp. 7.24a, 27b). Nele o pai pede que o filho se case com a Sabedoria (7.4); agora, a Sabedoria pede que ele a encontre quan do ela aparece à porta da sua casa (8.34). A intertextualidade exata dos dois grandes poemas reunidos nos capítulos 7 e 8 valida a ideia de que a Mulher Sabedoria personifica o mestre sábio e seu ensino. 32 Uma vez que o versículo 32a é paralelo ao versículo 33 e o versí culo 32b é paralelo ao versículo 34, é provável que o versículo 32 funcio ne como um sumário introdutório para os versículos 32-34. De modo que agora, pois (we'attâ\ veja 7.24), “que com frequência introduz um novo assunto ou seção”159indica que a conclusão é uma dedução lógica do seu encômio de autolouvor para as massas. Seu discurso para o povo como um todo serviu, em parte, para realçar sua imagem para os destinatários mais específicos, os filhos (veja 1.4, 5, 8; cp. 1.20-27 e 28-33). A Sabe doria estrutura o seu encômio com escutai ($im'ü; veja 1.8) na introdu ção e na conclusão do discurso (8.6,32), mostrando que essa é a questão central do seu elogio. A repetição de “escutai-me” (li; veja 5.7; 7.24) nas conclusões dos dípticos dos capítulos 7 e 8 sugere fortemente que dar ouvidos à Sabedoria e ao mestre sábio é, na verdade, a mesma coisa. Ela motiva a obediência de sua audiência através de exclamações laudatórias, e abençoados são aqueles (u>e ’a$rê; veja 3.13) que guardam (yismõrú; veja 2.8; 8.20) os meus caminhos (derãkay, veja 1.15).
33 A repetição de escutai (Sirríü) liga o versículo 33 ao versículo 32a e enfatiza a ordem. A instrução {müsãr, veja 1.2) interpreta a metá fora meus caminhos no versículo 32. Uma vez que ela não proferiu ne nhuma palavra de disciplina, é provável que o termo se refira às coleções subsequentes de provérbios e ditos (10.1 - 31.31). £ tornai-vos sábios (wahakãm ü; veja 6.6) infere que o ensino autoritativo é o meio pelo qual se desenvolve a competência ética (veja pp. 124-125). O complemento negativo de “escutai” é não... desprezeis (we 'al-tiprã'â; veja 4.15) as estruturas invioláveis e os limites que o ensino da sabedoria apresenta. 34 A combinação da bem-aventurança do versículo 32b, abençoa da [veja 3.13] é a pessoa ('ãdãm; veja 8.4), com a ordem do versículo 32a, que me dá ouvidos (Sõmêa' li) cria uma ligação entre os versícu los 32 e 34. O restante do versículo intensifica a ordem para escutar por meio da metáfora da vigília cheia de expectativa. Velando (liSqõd) indica esperar alertamente por alguma oportunidade (e.g., um leopardo à espreita para capturar sua presa [Jr 5.6]). Às minhas portas ('aldaltõtay) designa a característica arquitetônica que permite ou impede a entrada na sua casa,160e provavelmente prenuncia o convite da sabe doria para o banquete em sua casa em 9.1-6. Há divergências quanto ao motivo dos filhos estarem velando, se é por favores reais,161 servi ço,162 ou mais precisamente, como servos à porta do seu senhor aguar dando instruções,163 permissão para entrar164 ou, o que é mais prová vel, como seus pretendentes à espera de seu convite para entrar165 (veja v. 35; cp. 4.6; 7.4; 8.17, 21; Ct 8.8-IO).166 Jó retrata uma lasciva à espreita junto à porta de um vizinho (petah\ Jó 31.9), e o pai adverte os filhos a evitarem a porta (petah) da esposa infiel. “Provérbios 8.34 deixa implícito um contraste entre esperar à porta da Sabedoria e espe rar à porta de uma sedutora.” 167 Além do mais, a semelhança notável 160. Delet c usado para a porta no portão da cidade ou santuário, e tam bém dc uma residência particular (veja R. Hess, NIDOTTE, 1:962, s .v. delet). 161. Toy, Proverbs, p. 180. 162. Plõger, Sprüche, p. 96. 163. McKane, Proverbs, p. 358. 164. BDB, p. 1.052, s.v.Sõqad. 165. De acordo com M einhold, Sprüche, p. 148. 166. M. V. Fox (The Song ofSongs andlheAncient Egyptian Love Songs [M adison: University ofW isconsin, 1985], p. 75) cita dois cânticos dc am or egípcios de um papiro da vigésim a dinastia que apresentam o tem a de um am ante proibido de entrar na casa de sua amada: “ Ela me deixou em pé à porta dc sua casa quando entrou...” e "Passei por sua casa aturdido. Bati à porta, mas ela não foi aberta para m im ...”. 167. Fox, Proverbs 1-9, p. 290.
deste versículo com 18.22 sugere que por trás dessa imagem se encon tra a metáfora do amor e do casamento. A repetição de dia a dia (yôm yôm\ veja versículo 30) coloca a vigilância da Sabedoria na criação como modelo para os filhos. Observando (lismõr) constitui um jogo de palavras com “guardam” (Sãmar) no v. 32 (veja 2.8). Os filhos devem usar de grande cautela para não perder a oportunidade ímpar de rece ber permissão para entrar (cp. 2.4; 4.7). O detalhe os batentes (mezüzõt) das minhas entradas (petãhãy; veja 8.3b) - uma metonimia para as portas e suas dobradiças - intensifica a imagem de sua grande expec tativa de desfrutar o banquete da sabedoria (veja 8.17; cp. Mt 25.1-13). 35 Porque (ki) liga o versículo 35 ao versículo 34. Eles aguardam atentamente o momento em que sua amada abrirá as portas a fim de não perderem sua oportunidade. O versículo adapta à sabedoria a pro messa de que encontrar uma esposa é equivalente a encontrar o bem e obter o favor do S e n h o r (18.22). O que me acha (mose 'i\ n. 54; 3.3) implica amá-la e buscá-la com diligência (veja 8.17; cp. 1.28; 7.15). Acha (mãsã ’) a vida (hayyim; veja pp. 157-161) ressoa com a declara ção em 3.18 de que a sabedoria é árvore de vida. Tanto a Sabedoria quanto os pais prometem a seus filhos obedientes a recompensa mais preciosa de todas, a vida eterna, sugerindo mais uma vez a equiparação da Sabedoria e suas palavras com o pai e seu ensino (veja 3.1,2,21,22; 4.10, 13, 20-22; 6.23). E assim obtém (wayyãpeq; veja 3.13) o favor (rãsôn) do S e n h o r (mêYHWH; veja 1.7) implica que a pessoa buscou seu favor. De acordo com Walker, “o significado da raiz de rãsôn é duplo, a saber, vontade e prazer, quer em relação a si mesmo ou a outrem. Atender à própria vontade e prazer envolve o próprio desejo, mas atender à vontade e prazer de outra pessoa resulta em aceitação, aprovação, deleite nela e, por reciprocidade, ofavor e bênção dela”.168 Em Provérbios rãsôn indica o conceito abstrato de estar ou passar a uma condição de favor diante de outros, normalmente de uma autorida de elevada, na maioria das vezes, de Deus (8.35; 11.1, 20; 12.2, 22; 14.9; 15.8; 18.22) e do rei (14.35; 16.13,15; 19.12). EmMalaquias2.13 o paralelo de não encontrar favor é “ele já não olha para a oferta”.169 Em resumo, o possuidor da vida a media para aqueles que a buscam por meio da sabedoria inspirada do sábio. 168. N. Walker, “The Renderings o f rõçôn", JBL 8 1(1962) 184. 169. N os livros do período após o exílio pode se referir a um a decisão arbitrária tom ada pelo rei pagão (Et 1.8; 9.5; Ne 9 .2 4 ,3 7 ; Dn 8.4; 1 1 .3,16,36) na expressão “ segundo a sua vontade".
36 Mas (we) introduz o que está em jogo ao se achar ou perder Sabedoria. O que me deixa escapar ( h õ f 'i veja 1.10) atribui a kã(ã‘ no Qal com seu sentido original, pois se encontra em oposição a “acha” (cp. Jó 5.24; Is 65.20).170 Se alguém acha a Sabedoria por meio da vigilância, segue-se que ele a perde por falta da mesma. Esse tipo de indíviduo é aquele que pratica a violência (hõmês; veja 3.31) contra si mesmo (napsô; veja p. 140). O verseto B intensifica o singular “o que” para o plural todos (kol-), e também o comportamento exterior objetivo daqueles que não têm sabedoria para o estado emocional por trás dele, a saber, me aborrecem (m eéan’ay veja 1.22) e sua psicologia perversa, amam [veja 1.22; 8.17] a morte (mãwet; veja 2.18; 5.5; 7.27), a palavra climática do discurso (veja 7.27). 14. Epílogo: banquetes rivais da sabedoria e da loucura (9.1-18) 1 A sabedoria edificou sua casa; ela erigiu1 suas sete colunas. 2 Ela abateu seus animais;2 ela misturou seu vinho; e ela preparou sua mesa. 3 Ela enviou suas criadas;3 ela4 clama5 no topo6 das elevações1 da cidade. 170. HALOT, 1:305, s.v. hf'. 1. A LXX, Targ. e Sir. trazem “erigiu” ( hissibá ), que é m elhor do que o term o do TM hatfbá (“lavrar orifícios na rocha para poços e cisternas” ou "entalhar” ou “esculpir” pedras). H e h são confundidos com frequência (cp. S. Segert. “ Hebrew Poetic Parallelism as Reflected in the S e p tu a g in t” , in La Septuaginta en Ia investigación contem porânea 5 Congreso de la IOSCS, org. N. F. M arcos (M adri: Instituto “ A rias M ontano” , 1985), pp. 133-48. W. F. A lb rig h t ( “ S om e C an aan itc-P h o cn ician S ources o f H ebrew W isdom ” , in WIANE, p. 9) sugere que o verb. sing. com o antecedente pl. apresenta “um a peculiaridade gram atical típica do ugarítico”, mas tam bém é típico do hebraico, especialm ente no plural intensivo ou hono rífico (G K C # I45h). 2. Lit. “ seus abates” um acusativo de objeto realizado (IBHS, p. 166, P. 10.2.1 s.). 3. A LXX e a Sir. traduzem , curiosam ente, o fem. ha 'a rõt com o m asc. doulos e 'abde, respectivam ente. Seu senso dc decoro im pedia que servas fossem enviadas para a rua? 4. ATarg., Sir. e Vulg. dão uniform idade ao texto traduzindo “ para que clam em ” . Toy (Proverbs, p. 187) afirma que o pl. é original, mas tropeça no sing. ’ãm erâ no v. 4b. McKane (Proverbs, p. 361) sugere que o sing. deve ser entendido como distributivo. 5 .0 presente imperfeito representa uma situação repetida na imagem que, até aqui, foi apresentada de modo holístico. A LXX parafraseia com o svnkalousa, “convidando” . 6. A tradução “topos” , do hap. leg. gappê está baseada em seus cognatos siríacos e árabes (HALOT, 1:200, s.v. gap). Tomando por base gpt g 'r in ugar., W. F. Albright (“Some CanaanitePhoenician Sources o f Hebrew Wisdom", in WIANE, p. 9) traduziu 'ai gappê m erBmé qSret como “na beira da acrópole da cidade”. Mas M. Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Philology
4 “Quem é ingênuo, volte-se para aqui. ” Quanto ao que não tem nenhum senso, ela lhe%diz:9 5 “Vem, janta™ do meu alimento, e behe do vinho que misturei. 6 Deixai os vossos caminhos, vós ingênuo,11 e vivei,12 e andai pelo caminho do discernimento ”.13 7 Todo aquele que repreende um escamecedor14 recebe vergonha, e todo aquele que corrige um perverso15 se prejudica,16 [Roma: Pontificai Biblical lnstitute, 1963], p. 18) se opõe, afirmando que a etimologia de gpt é incerta e que o paralelo em 8.2 aponta para o significado de “topo” nesta passagem. 7. A Targ. acrescenta à “elevações” o adjetivo “ fortificadas” . 8. A Sir. traz “e eu digo” (< w ’mr), provavelm ente uma versão sim plificada para produzir um a frase mais uniforme. O TM não pode ser descartado justificadamente do ponto de vista crítico-textual. 9. A sintaxe de h,asar-lêb é ambígua. Talvez o verseto A esteja ligado ao verseto B como discurso direto de “ela diz”, e "todo aquele que não tem senso” encontra-se em aposição a "lhe [a ele]”. Porém, o conjuntivo “e ela... diz” no paralelo (v. 16) não permite essa interpretação e deixa claro que o verseto está ligado sintaticamente ao discurso direto no v. 5 (cp. AV, NJPT, NRSV). Desse modo. ela distingue dois aspectos de seu convite. Primeiro, ela clama aos ingênuos (v. 4) para que mudem de rumo (v. 4a). Em seguida, ela diz ao descuidado (v. 4b), "vem, janta” (v. 5). 10. Lhm 6® significa “comer de" alguma coisa (cp. Lv 22.11; Jz 13.16; Jó 21.25) assim como no verseto B, stw 6® significa “beber de” (IBHS, pp. 198-99, P. 11.2.5s.). No entanto, não se deve fazer nenhum a distinção m ais nítida da construção acusativo direta (veja 4.17; 31.4). HALOT (2:526, II lhm ) argumenta que significa “provar” com be (SI 141.4; Pv 9.5), mas os dados não são suficientes para fazer uma distinção em relação a “com er” em 4.17; 23.1-6. 11. A s versões antigas provavelm ente trazem p eti ou p etayyút, m as é bem possível que p etõ'yim contraste com a forma abstrata no v. 13b. Além disso, a tradução da LXX é livre dem ais para ser usada para reconstituir o Vorlage do term o. Fox (Proverbs 1-9, p. 417) acredita que o concreto agora representa o abstrato, m as em Provérbios é o abstrato que rep resen ta o co n creto , não o co n trário . D elitzsch (Proverbs, p. 200) p refere co n sid erar p e ts 'y m co m o um v o cativ o com o im p erativ o 'Iz b ú , fo rn ec en d o o o b je to a p a rtir do conceito d e p etã'ym (= “deixar [a sim plicidade], vós ingênuos” ) ou um acusativo direto (i.e., “abandonar os ingênuos” ). A segunda opção, deixar o grupo de sem elhantes, é pertinente, m as a m aioria das traduções e com entários não a aceita. A solução m ais adequada é pressu por que derek no verseto B é om itido cm A: “Deixai os vossos cam inhos, vós ingênuos” . 12. A ligação lógica entre as formas volitivas no verseto A está baseada na sem ântica, não nas construções gram aticais (veja 3.4, n. 4). 13. A leitura da LXX do v. 6 difere significativam ente do TM. Talvez represente um a recensão diferente e/ou paráfrase e/ou uma de duas palavras da mesma raiz, porém com significados distintos (veja p. 38). 14. A LXX parafraseia o epíteto “ escam ecedor" usado pela sabedoria por seu equivalente éticoreligioso “perverso” . 15. A LXX traz “ím pio” para enfatizar o aspecto religioso (i.e., o relacionamento fracassado com Deus) de rSSã' que, na verdade, é um term o ético para o relacionamento fracassado com a hum ani dade que acarreta culpa diante de Deus. 16. Ou “traz sobre si m ácula m oral” . Lit. “todo aquele que repreende uma pessoa perversa é seu dano (física e/ou m oralm ente)” . M üm é um predicado nom inativo; o sufixo pronom inal, paralelo a 16, é um genitivo de objeto m ediado (IBHS, pp. 146-47, P. 9.5.2d).
8 Não corrijas um escamecedor, para que ele te não aborreça; corrijas um sábio para que17 ele te ame. 9 Dê [instrução718 ao sábio para que ele se torne ainda mais sábio, informe ao justo para que ele cresça em saber. 10 O temor do S en h o r é o princípio da sabedoria, e o conhecimento do Santo19 é discernimento.20 11 Certamente por meio da sabedoria21 os teus dias serão muitos, e anos de vida serão acrescentados22 a ti. 12 Se és sábio, para ti mesmo o és; mas [se] escarneces, somente tu23ficarás sujeito à culpa.2* 13 A mulher25 loucura26 é turbulenta; é totalmente ingênua27 e não sabe28 coisa alguma.29 17. O vau com a conjugação prefixai ( = jussivo; veja o v. 9b) depois de um im perativo deno ta p ro p ó sito (IBHS, p. 577, P. 34.6). 18. O objeto leqah provavelm ente qualifica tên e hôda', bem com o yôsep. 19 . 0 pl. de qãdss provavelmente é honorífico, não contável (i.e., "seres divinos” ), tendo em vista
IBHS, pp. 122-23, P. 7.4.3b). 20. Refletindo um desenvolvimento posterior dentro da tradição sapiencial, a LXX relaciona esta sabedoria e conhecim ento à lei: “pois conhecer a lei é uma mente sà” . 2 1. Lit. “ela”, considerando bsh com o a LXX, Targ. e Sir. O TM bi (“por mim” ) é inadequado, pois essa interpretação implica que a Sabedoria continua a falar no interlúdio sem nenhuma indicação de que ela deixou de falar aos descuidados (v. 4) para se dirigir à audiência do livro (v. 12). O m ais provável é que o interlúdio todo (vs. 6-12) seja dirigido à audiência do livro. O jode do TM pode ser justificado com o um erro de cópia em razão dos jodes anteriores e posteriores. Além disso, hê e jode eram form ados de m aneira um tanto parecida na escrita angular anterior ao exilio, causando confusão entre os dois. 22. Com base na LXX (Sir., Vulg.), Fichtner (BHS) reconstrói ufiyiwwãsPpú. Trata-se de algo im provável, pois uma raiz passiva de ysp não é atestada cm nenhum lugar. O pl. na terceira pessoa com um funciona com o um sujeito indefinido (IBHS, pp. 70-71, P. 4.2.2). 23. Lit.. “em tua separação” (veja BDB, p. 94, s.v. II bad). 24. /Vá’(“levarás sobre ti”) é usado de forma absoluta (cp. 19.19), uma forma curta excepcional, provavelm ente d e n á ’ 'Swôn “ levar culpa" (BDB, p. 971, s.v. nõéã"). 25. Fichtner (BHS) acredita que s t se deve à ditografia do tá' antecedente, mas a inversão das consoantes p arece um a ocorrência deliberada, não um acidente excepcional. 26. E provável que o gen. seja atributivo numa expressão idiomática hebraica convencional (IBHS, p. 149, P. 9.5.3b). 27. Lit. “sim plificada de”. Para os hap. leg. ksylw t e ptyw t, veja Grollenberg, “ A propos de Prov. VII 1,6 et X V II,27”, RB59 (1952) 40-42. 28. M cKane (Proverbs, p. 367) segue D. W. Thomas (“The R o o ty tf in H ebrew ", JTS35 [ 1934] 236-38) ao derivar a palavra yct do árabe u i i ; veja porém 5.6, n. 15. 2 9 .0 pronom e interrogativo funciona aqui com o pronom e indefinido (GKC # 137c), e o daguesh pode indicar o uso inesperado (IBHS, p. 22, P. 1.5.4e). A LXX (Sir.) traz "vergonha” . M cKane (Proverbs, p. 367) acredita que essa tradução é decorrente de “ um a tentativa de dar sentido a um texto hebraico difícil, não de um a tradução de kelimm
14 E ela se assenta à entrada da sua casa, num trono nas alturas da cidade, 15 clamando30 àqueles que passam pelo caminho, àqueles que fazem retas as suas veredas, 16 "Quem é ingênuo, volte-se para aqui. ” Quanto ao que não tem nenhum senso, ela lhe diz.3' 17 “A água roubada é doce, e a comida oculta é agradável”. 18 Mas ele não sabe que os mortos estão ali; aqueles que ela convidou32 estão nas profundezas da sepultura.33 A antítese entre a esposa infiel e a mulher sabedoria no prólogo, que estava se movendo para um clímax nos dois grandes poemas reu nidos nos capítulos 7 e 8 chega a seu ápice. Como os retratos rivais dos capítulos 7 e 8, os dois convites contidos no capítulo 9 também formam um díptico, mas agora as duas mulheres são apresentadas de forma quiástica num poema unificado a partir de suas apresentações naqueles dois capítulos. Enquanto que, até aqui, a Sabedoria foi apresentada no registro simbólico e a esposa lasciva no registro histórico, agora a espo sa lasciva também é elevada ao registro simbólico na forma de mulher loucura. No capítulos 8 a Sabedoria foi personificada como uma figura celestial, e no capítulos 7 a esposa infiel como uma prostituta surgindo da escuridão. No epílogo a Sabedoria é retratada como uma benfeitora nobre e a loucura como uma anfitriã pretensiosa. As duas convidam o ingênuo para um banquete em sua casa. Motivada por seu amor verda deiro, a Sabedoria compete pelo coração dos descomprometidos; moti vada por seu desejo erótico, a loucura compete pelo corpo deles. A Sabedoria os convida a deixarem para trás sua antiga identificação e a se tomarem sábios em seu banquete suntuoso; a loucura seduz aqueles do T M ” . Toy (Proverbs, p. 189), ainda que adotando essa interpretação hesitantem ente, observa que a palavra hebraica im plícita significa “ infâm ia” em outras passagens, e não “ sentim ento de vergonha” (SI 35.26; Pv 18.13; Is 50.7; J r 51.51). 30. Uso gerundivo de lamede com o cons. inf. (IBHS, pp. 608-9, P. 36.2.3e). 31. Lit. “e ela diz a ele” . Para o uso de um conjuntivo depois do absoluto nominal veja IBHS, pp. 76-77, P. 4.7c, #6. A terceira pessoa é preferida em vez da primeira pessoa mais fácil usada na LXX e na Sir. 32. Lit. “os que foram cham ados por ela” . 33. A LXX original adiciona ao v. 18 um a longa e infeliz expansão de cerca de dois versos, que adm oestam sobre a fiiga da esposa infiel, para reforçar a advertência contra a esposa estranha.
que estavam andando retamente a se desviar, sem pensar nas conseqüên cias, em sua refeição libertina que visa apenas o próprio prazer. Aqueles que aceitarem o convite da Sabedoria viverão; os apóstatas morrerão. A referência às “portas” em 8.34 prefígura as duas casas no capítulo 9. “Entre os capítulos há um movimento implícito que vai da espera (8.34) até a entrada ao receber o convite (9.1-6, 13-18; cp. Mt 25.10).”34 O filho sábio aguarda com grande expectativa o pedido insistente da Sabe doria para que entre. Tratando implicitamente do problema de quem é educável e de que não é, o capítulo esboça três tipos diferentes: o sábio, que aceita a herança do sábio (vs. 8b, 12a); o apóstata ingênuo ou insen sato, que é instado a assumir um compromisso de fé com a sabedoria e se tomar educável (9.1-6,13-18);eo escamecedor, que não pode mais ser educado (vs. 8a, 12b).35 Os convites das duas mulheres são estrutura de forma quase idêntica numa estrutura alternada (vs. 1-6 e 13-18).30 a. Os preparativos para a refeição designação atividade/atributos clamor localização b. Convite Convite para o ingênuo Convite ao descuidado Oferta de alimentos simbólicos c. Conclusão: vida ou morte
1-3 laa lap-3 3a 3b 4,5 4a 4b 5 6
13-15 13aa 13ap-15 15 14b 16,17 16a 16b 17 18
As estruturas paralelas, a preparação dos banquetes e a convoca ção dos convidados refletem um tema literário convencional do antigo Oriente Próximo.37 A última estância é unida pelo inclusio “não sabe” (vs. 13 e 18). Esses indivíduos moralmente simplórios não têm nenhum conhecimento do certo e do errado e tampouco de suas conseqüências. A seção intermediária dos versículos 7-12 explica por que a repre ensão é voltada para os ingênuos, que ainda são receptivos ao ensino, e não aos escamecedores, que são incorrigíveis. A sabedoria admoesta 34. Van Leeuw en, Proverbs, p. 95. 35. Para um estudo extenso e proveitoso desse problem a tanto no Egito com o em Israel veja Fox, Proverbs 1-9, pp. 309-18. 36. M einhold, Sprüche, p. 1:150-51. 37. M. Lichtenstein, “The Banquet M otifs in Keret and in Proverbs 9”, JANES I ( 1968/69) 19-31.
os primeiros a mudar de direção (v. 4) e deixar seus companheiros (v. 6). A primeira e a última estâncias deste poema são convites para os ingênuos; a inserção central é uma instrução. O poema de conclusão do prólogo funciona como um janus para Coleção II (Salomão I; 10.1-22.16) e para o restante do livro. Por um lado, ele reúne em um poema o conflito entre a Sabedoria e a esposa devassa envolvendo a vida e a morte. Ao longo de todo o prólogo elas competem pela vida dos jovens inexperientes, que devem decidir a fa vor de uma ou de outra, uma vez que não há um terceiro caminho. Por outro lado, ao reunir a antítese numa unidade, o poema prepara o cami nho para os provérbios antitéticos entre os sábios/justos e insensatos/ perversos na Coleção II, especialmente em 10.1-15.29. A imagem da Sabedoria como tendo construído sua casa e preparado seu banquete pode representar figurativamente o prólogo e as Coleções, respectiva mente. A casa (i.e., o prólogo introdutório) está terminada, e o banquete (i.e., os provérbios de Salomão) está prestes a começar. Seus mensa geiros (i.e., os pais) foram enviados para convidar o jovem descompro metido e obtuso a comer e beber em sua mesa suntuosa. Seus filhos já estão esperando a Sabedoria abrir suas portas. a. O banquete da sabedoria (9.1-6) (1) Os preparativos para a refeição (9.1-3) A Sabedoria, a personificação dos ensinos de Salomão, apresentase agora como uma nobre anfitriã (veja pp. 132-134). Seus preparati vos para o banquete incluem a construção de sua casa ampla (v. 1), a preparação do banquete exuberante (v. 2) e o envio de um convite aberto (v. 3), sugerindo que seu staíus na sociedade é tal que se espera que cumpram suas obrigações morais e sociais. “Nas sociedades tradi cionais... parte do preço do poder é o dever de oferecer hospitalidade freqüente e suntuosa, numa escala proporcional à posição do indiví duo....”38 Na literatura narrativa, os versículos 1-3 funcionam como “exposição” (i.e., servem de “introdução para as ações descritas na narrativa, fornecendo o pano de fundo, apresentando os personagens, informando seus nomes, características, aparência física, situação na 38.1. M. Lewis, Social Anthmpolog)’ in Perspective (Harm ondsworth: Penguin. 1976), p. 175, citado por B. Lang, “Die Sieben Sàulen der Weisheit im Licht israelitischer Architektur”, VT 33 (1983 )4 9 0 .
vida e as relações entre eles, e oferecendo outros detalhes necessários para se compreender a história”).39 Aqui, a exposição é essencial para se compreender o convite nos versículos 4-6. 1 A construção da casa pela Sabedoria (hokmôt\ veja 1.20) prefi gura a construção de lares por todas as suas filhas (veja 14.1; 24.3). Fox cita a comparação feita por Vattioni com a designação assiro-babilônica de Apsu (o deus da água doce subterrânea) como “a casa de sabedoria”. Fox complementa: “Talvez o conceito de casa de sabedoria seja anterior a Provérbios 9.1, mas se esse é o caso, foi apropriado e dimitologizado”.40 Edificou (banetãh) indica o processo de fazer algo existir por meio de um tipo específico de habilidade. “Fundamentalmen te, ‘edificar’ sempre está relacionado a ‘criar’ ou ‘trazer à existência’ e ligado à ideia de um poder criador atuante.”41 O verbo também sugere que a Sabedoria estendeu seu convite aos ingênuos na ocasião da con sagração da sua casa (i.e., na conclusão do prólogo). Meinhold cita vários textos do antigo Oriente Próximo que associam um banquete à consagração de um edifício (cp. lRs 8.62-66).42 A cena retratada em 9.1-3 é particularmente próxima da consagração do palácio de Baal em textos ugaríticos; tanto os textos bíblicos quanto os pagãos apresentam a seqüência construir > abater animais > convidar > banquetear. Na consagração do palácio de Assurbanipal II (883-859 a.C.) 69.574 con vidados consumiram quantidades enormes de alimento e bebida num banquete.43 Sua casa (bêtãh; veja 3.33; 7.6) é provavelmente a casa de um aristocrata.44 O verseto B intensifica e esclarece o verseto A. 39. S. Bar-Efrat, NarrativeArt in lhe Bible (JSO TSup 70; Sheffield: ShefTield Academic, reimp. 1989), p. 111. 40. Fox, Proverbs 1-9, p. 297. 4 1. S. Wagner, TDOT, 2 :168, s.v. bãnSh. 42. M einhold, Sprüche, p. 1:152. 4 3 ./W £ T ,p . 560.
44. Os estudiosos diferem quanto a sc tratar ou não de colunas de um a habitação com Gemscr (Sprüche , p. 41) aponta para pilares na colunata numa associação com a sala do trono de Salomão na Casa do Bosque do Líbano (lR s 7.2-7) e para os salões de Bit Akitu (“Casa do Festival de Ano-Novo”) na frente da cidade de Assur. De dois lados dc um pátio interior, a casa de Akitu apresenta salões abertos ou colunatas com sete pilares de pedra de cada lado. Albright ("Som e Canaanite-Phoenician Sources”, p. 9) imagina um santuário com sete colunas livres, não pilares de apoio, na extrem idade de uma acrópole. H. Ringgren e W. Zimmerli (Sprüche / Prediger: Oberselzl und erklãrl [G õttingen: Vandenhoeck & R uprecht, 1962], p. 42) usa a interpretação de Albright e, pressupondo que a Sabedoria assum iu o controle do tem plo da deusa-m ãe na extrem idade da acrópole, acredita que os presentes divulgam, dos santuários, o convite para a refeição cúltica da deusa. Essa definição cúltica da casa da Sabedoria chama a atenção de Plõger (Sprüche Salomos, p. 102) para o relato de 1 Reis 7.17, segundo o qual uma
Ela erigiu (hissibâ; veja n. 1), paralelo de “edificou”, contrasta a dili gência e habilidade da sabedoria com a preguiça e incompetência da mulher insensata, pois ela apenas se assenta na entrada da sua casa (9.14). Suas sete colunas ('ammüdeyha sib'â) provavelmente perten ciam à sala aberta voltada para o pátio interior e sustentavam essa parte do telhado, conforme dados arqueológicos da Idade do Ferro em Israel (veja 7.6). O comprimento da sala e o tamanho geral da casa determinavam o número de colunas de sustentação (normalmente três).45 Um provérbio árabe diz a respeito de um homem rico: “Sua casa é sustentada por doze colunas”.46 Tendo em vista as restrições de espaço nas cidades do antigo Israel, sete colunas de sustentação indi cam uma estrutura excepcionalmente ampla e imponente, própria para abrigar um grande número de convidados. Nesta ficção literária, “sete” simboliza perfeição (cp. 6.16; 24.16; 26.16, 25);47 sua casa perfeita tinha espaço de sobra para receber todos (cp. Jo 14.2). rede de sete cadeias entretecidas adornava os capitéis no alto das duas colunas. M cK ane ( Proverbs, p. 363) dá apoio adicional à interpretação cúltica sugerindo que “ho km ô t, na analogia de m ilk ô t (veja 1.20), é outra indicação de que a Sabedoria é um a suplente ou substituta de uma deusa". As evidências apresentadas ate aqui a favor de um a interpretação cúltica são extraídas, em sua totalidade, de fontes arqueológicas e analogias lingüísticas duvi dosas. A conceitualização da Sabedoria com o uma deusa seria excepcional, é difícil de incorpo rar no monoteismo rigoroso de Israel, alem de ser desnecessária (veja pp. 132-133). Ademais. Ploger ( Sprüche , p. 103) argum enta que, caso se tratasse de um templo, seria de esperar que o verbo usado para o abate de um animal no v. 2 fosse zãbah (“abate cúltico”; cp. 7.14), e não lãbah (“abate profano”; cp. Gn 43.16; Êx 22.1; ISm 2 5 .1 1; Jr 11.19; 51.40). Prevendo essa objeção, McKane ( Proverbs , p. 364), tenta evitá-la através do argum ento lingüístico inválido dc que zbh e (bh têm duas consoantes cm comum e que, obviamente, estão relacionadas quanto ao seu sentido. Mas o h. final representa duas raízes separadas, como se sabe pelo ugar. Além disso, se as consoantes finais fossem, dc fato, iguais, o argumento continuaria sendo inválido. Nekel. “astúcia” e éekel, “prudência”, também apresentam em comum as duas últimas conso antes com certa sobreposição sem ântica, mas suas letras iniciais diferentes distinguem esses dois term os radicalm ente. Ou, com pare c contraste ‘ãçgl (“preguiçoso” ) e ‘amSl (“ trabalha dor” ). G Bostrõm (Paronomasi i den ãldre hebreiska Maschallitteraturen [LUÂ, N.F., Avd. 1, Bd. 23, Nr. 8; Lund, 1928], pp. 1-14) argumentou, citando 3.19; Jó 38.6; S alm ol04.5, que a casa da Sabedoria é o mundo, dando a entender, também, que ela é uma deusa, o oposto de Afrodite. Além das objeções acima a se identificar a Sabedoria com o uma deusa, sua interpre tação contunde a Sabedoria com o Criador (veja 8.30) e pede que o aluno estude o cosmos, não os ensinos de Salom ão (veja pp. 126-129). O utros acreditam que a casa da Sabedoria é um "palácio”, fazendo da Sabedoria uma rainha. N o entanto, seria de esperar que o texto desen volvesse esse conceito. Em resum o, parece mais apropriado considerar essa casa com o uma residência israelita ilustre, tendo a Sabedoria com o sua anfitriã nobre. Em 31.10-31 a mulher virtuosa parece uma esposa nobre, não uma deusa ou rainha. 45. M einhold, Sprüche. p. 152; Lang, "D ie sieben Sâulen” . pp. 489-90. 46. T. Veblen, The Theorv o f lhe Leisure Class (Londres, 1925), p. 75. citado por Lang. “ Die sieben Sâulen”, p. 490. 47. O utros interpretaram o núm ero sete de forma alegórica (i.e., interpretando cada detalhe
2 Todas as palavras hebraicas deste versículo terminam com lã/[h] referindo-se à Mulher Sabedoria e, portanto, ressaltando sua diligência nesta cena de preparação. A repetição de “ela” e “seus/suas” procura expressar sua atividade e aplicação. Ela abateu os seus animais ((ãbehâ tibhãh) se refere, como no ugarítico e em Gênesis 43.16; Êxodo 22.1(21.37); Deuteronômio 28.31 (cp. Mt22.4; Lc 15.23), aos preparati vos para um banquete comemorativo.48 O verbo também pode indicar “cozer” (cp. ISm 9.23,24). O abate, assim como a atividade difícil e de grande responsabilidade de edificar uma casa, normalmente era uma ta refa executada por homens (cp. Gn 18.7; Jz 6.19; ISm 25.11), mas a Sabedoria é uma mulher extraordinária,49 como também o é sua encar nação como Esposa Nobre (cp. 31.10-31). Ela misturou (mãsekâ) pro vavelmente significa que ela acrescentou algo como mel e/ou ervas para tomar o vinho mais condimentado, forte e agradável (veja Ct 8.2; cp. SI 75.8[9]; Is 5.22), não que ela o diluiu com água porque o vinho forte “não é apropriado para se beber quando totalmente concentrado”.50 De acor do com Isaías 1.22, adicionar água ao vinho é algo detestável. No entan to, é provável que a LXX tenha optado pela segunda interpretação, acres centando “numa tigela”, que era usada pelos gregos para misturar seu vinho com água: “para eles, beber vinho não misturado era algo impróprio (Platão, Laws, I.9)”.51 A seqüência seus animais > seu vinho (yênãh) reflete uma convenção desde muito existente e amplamente difundida no antigo Oriente Próximo (cp. Is 22.13; 55.1, 2; Am 6.4-6; Jo 6.51, 55).52 Juntos, esses dois elementos simbolizam um banquete que, por sua vez, da personificação como tendo outro significado). R. J. Toumay (“ Book Review o f Gerhard von Rad, Israel à Ia sagesse", RB 80 [1973] 130) afirm a que se refere aos sobrescritos das sete coleções de Provérbios (cp. 1.1; 10.1; 22.17-21; 24.23; 25.1; 30.1; 31.1). Isso seria m ais plausível se os capítulos 1-9 tivessem sido redigidos e anexados depois de outros apêndices (e.g., caps. 30. 31); no entanto, é mais provável que Salomão seja o autor de 1.1-9.18, inviabilizando essa sugestão (veja pp. 71-77). G Bostrõm (citado por Plõger, Sprüche, p. 102) acredita que se tratam dos sete planetas conhecidos pelos antigos (U rano e Plutão foram descobertos em tem pos m odernos). N as interpretações ju d aicas elas se referem aos sete pilares do m undo (Hagigah 12b do B. Talmude) ou aos sete dias da criação (Sinédrio 38a) ou ainda, por uma nova divisão do Pentateuco, aos sete livros da Torá (Plaut, Proverbs, p. 116). Outros o consideram uma representação das sete ciências humanas, dos sete dons do Espirito Santo, dos sete sacra mentos ou das sete igrejas de Apocalipse, entre outras conjeturas (Toy, Proverbs. p. 185). Com exceção do caso de Toumay, todas essas interpretações são eisegéticas, não exegéticas. 48. V. H am p, TDOT, 5:283-85, s.v. (Sbah. 49. De acordo com M einhold. Sprüche, p. 152. 50. M. Lyons, "R ashi’s C om m entary on the Book o f Proverbs” (graduação rabino, 1936), p. 53. 51. Toy, Proverbs, p. 185. 52. Lichtenstein, “The Banquct M otif in Keret and in Proverbs 9”, pp. 24-30.
representa os muitos deleites das realidades espirituais mais elevadas dos ensinos de Salomão que tomam o indivíduo mais forte e feliz (cp. Is 55.1; Jo 6.35),53 e que contrastam com a água e o alimento da loucura (9.17). O sexo ilícito é apenas água quando comparado ao vinho forte e aromático da sabedoria.54E ( 'ap-) organiza o estilo de apresentação do verseto B de acordo com o estilo do conteúdo no verseto A.55 Ela preparou sua mesa Ça^kã Sulhãnãh), uma metonímia para o alimen to e seus recipientes, indica que os provérbios de Salomão são organi zados da maneira extremamente agradável para o deleite daqueles que os estudam. Agora tudo está preparado para o banquete. Evidências arqueológicas, artísticas e textuais indicam que nos lares abastados era comum haver mesas (cp. Jz 1.7; 2Sm 9.7-13; lRs 4.10; Jó 36.16), mas que estas não eram encontradas em casas comuns.56 3 Enviou (Sülehâ\ veja 6.14) indica que o banquete está pronto. M Dahood matiza “enviar” de modo a indicar “dispensar”, pois “podemos estar razoavelmente certos de que o senso semita de decoro não permi tira enviar servas para chamar convidados do sexo masculino”.57 Po rém, no texto ugarítico Lenda do rei Keret (ca. 1400 a.C.), o rei instrui sua esposa a preparar uma refeição, abater os melhores animais do seu 53. Dclitzsch, Proverbs, p. 198; Gemser, Sprüche, p. 4 1. 54. Provérbios considera o vinho lanto de m odo favorável com o desfavorável. Em 20.1 o vinho e a cerveja provocam brigas. Em 21.17 e 23.19-21 o vicio ou excesso de vinho, azeite de oliva e carne conduzem ao torpor e à pobreza; em 23.31 beber excessivamente é condenado como algo insensato e que causa vício; em 31.4, 5 a embriaguez provoca erros judiciais. Entretanto, o vinho simboliza a vida alegre e próspera (3.10) e é misturado pela própria Sabedoria (9.6). Essa mesma ambivalência é encontrada em outras passagens do Antigo Testamento. Por um lado, o vinho e a cerveja são proibidos nas situações que exigem entendimento aguçado (cp. Lv 10.9; Is 5.11, 12, 22) e para o nazireu que é separado das alegrias terrenas para Deus (Nm 6.3). Também simboliza buscar a satisfação somente dos próprios prazeres (Is 28.1-5; Am 6.6). Por outro lado, o vinho é uma indicação da bênção de Deus (Gn 27.28; Éx 29.40; Dt 14.26) e é louvado como o elixir dos deuses e do povo (Jz 9.13). O salmista usa duas imagens relacionadas ao vinho: “o vinho que nos faz cambalear” (cp. SI 75.8[9]) e o “vinho que alegra o coração do homem” (104.15). "Esses dois aspectos do vinho, seu uso e seu abuso, seus benefícios e sua maldição, sua aceitação e sua abominação aos olhos dc Deus, encontram-se entretecidos em todo o AT, de modo que pode alegrar o coração do homem (SI 104.15) ou fazer sua mente errar (Is 28.7), pode estar associado a grande alegria (Ec 10.19) ou à ira (ls 5.11), é usado para descobrir a vergonha de Noé (Gn 9.21) ou, nas mãos de Melquisedeque, para honrar Abraão (Gn 14.18)” (F. S. Fitzsimmonds. in NBD, p. 1.254). João se abstém do vinho, Jesus não (M t 11.17-19). Provérbios se protege de eliminar o lado benélico do vinho restringindo sua condenação aos inebriados. 55. 1BHS, p. 663, P. 39.3.4d. 56. A designação “preparar a mesa” (Ez 23.41) se tom ou o tema da coleção das prescrições judai cas para a vida dc acordo com a Torá; essa coleção foi escrita por Joseph Caro (1488-1575) em Safed e editada pela prim eira vez em 1565 (M einhold, Sprüche, p. 153). 57. Dahood, Proverbs and Northwest Semitic Philology, p. 17.
rebanho da engorda, abrir os recipientes de vinho e convidar os dignitá rios e chefes de tropas. Aos convidados ela declara o cumprimento da ordem do marido: “Convoquei-vos para beber e comer: seu senhor Keret tem um sacrifício”.58 Até mesmo a rainha pode sair para convidar ho mens para um banquete com todo o decoro!59 As suas criadas ou servas (na'arõteyhã\ veja 1.4; cp. Gn 24.14, 61; Êx 2.5; Rt 2.8; ISm 25.42; 2Rs 5.2; Et 2.9; 4.16; Pv 27.27; 31.15) são, como o pai e a mãe, uma representação dos mestres sábios que ensinam a sabedoria de Salomão (cp. Mt 22.1 -14; Lc 14.15-24). Malbim diz: “Isso indica que o homem não recebe sabedoria diretamente, mas por meio de sábios, profetas e mestres... que o convidam para o salão de banquete magní fico da sabedoria”.60 McKane, exigindo incorretamente uma analogia completa, nega essa identificação “uma vez que esses [sábios] não são jovens nem do sexo feminino”. No entanto, reconhece corretamente que “elas [as moças] falam, em sua maior parte, como mestres da sabedoria”.61 Em Ester 6.14 os mensageiros acompanham os convida dos de volta para o local do banquete. A sabedoria, que é necessaria mente feminina (veja p. 132), envia servas, não servos, para retratar os mestres desfrutando a maior proximidade e intimidade possível com a Sabedoria. Ao contrário da loucura, essas “moças... têm uma missão educacional; convidam os rapazes não para a cama, mas para a esco la”.62A linha divisória entre a Sabedoria e suas servas é atenuada pelo verbo no singular, ela clama (tiqrã’\ veja 1.21) que, associado a um banquete, significa “convidar” (cp. (fru ’eyhã; “seus convidados”, 9.18; ISm 9.13). A linha entre um cliente e seu mensageiro costuma ser tão atenuada que “o mensageiro foi autorizado a falar segundo o estilo do cliente” (cp. Nm 22.5; Jz 6.22; 10.14,27,28).63 Essa atenuação mostra que a Sabedoria, que pertence à esfera divina do céu, convida pessoal mente seus convidados e sugere o status elevado dos mestres que são identificados com ela e cujas casas se tomam sua casa (cp. 8.30,31). A Sabedoria, de quem os sábios ficam à espera para se encontrar às portas da sua casa (8.34), agora sai para a rua a fim de convidar todos 58. ANET, p. 146. 59. De acordo com M einhold, Sprüche, p. 153. 60. M eir Leibush M albim, The Book o f Proverbs, condensado e adaptado em inglês pelo rabino Charles Wengrov, com base num rascunho original de Avivah Gottlieb Zom berg (Jerusalém e Nova York: Feldheim, 1973), pp. 88-89. 61. M cKane, Proverbs, p. 360. 62. M cKane, Proverbs, p. 360. 63. M einhold, Sprüche, p. 224.
por intermédio das suas criadas. O verseto B esclarece que o convite é proclamado do topo (qappê\ veja n. 6; cp. 1.21; 8.2 para seu sinônimo) das elevações (m erõmê; veja 8.2), uma metonímia para os muros da cidade (qãret; veja 8.3). A metáfora volta a dramatizar o fato de que a sabedoria diz respeito a todos e à vida da cidade (veja 1.20,21 e 8.1 -4), e a repetição desse cenário na exposição da mulher estulta mostra que ela compete com a sabedoria para conquistar os ingênuos (veja 9.14). (2) O convite da Sabedoria (9.4-6)
Apesar de não ser formalmente introduzido por um verbo indicando discurso - como costuma ser o caso na poesia (cp. SI 2) - e apesar de ser uma mistura de discurso direto e indireto, o convite da sabedoria começa no versículo 4 e se estende até o versículo 6 Seu convite aberto para os ingênuos é emoldurado pela raizpty, “ingênuo”, singular no versículo 4 e plural no versículo 6. Siraque apresenta um convite semelhante a seus alunos: “Achegai-vos a mim, vós que não tendes instrução e alojai-vos em minha escola” (Eclo 51.23). Ela convida os ingênuos a se encaminhar para a sua casa (v. 4) e a participar da sua refeição suntuosa (v. 5). A conclusão desdobra as duas ideias. A fim de encorajar os jovens ingênuos e insensatos a mudarem de rumo e deixa rem seus antigos companheiros com a promessa de vida eterna (v. 6a), ela infere que se alimentar da sua comida significa andar firmemente no caminho do discernimento (v. 6b). Ela os motiva a responder-lhes prometendo vida eterna (v. 6aP). 4 No versículo 3 o poeta apresenta o convite da sabedoria encon trado no versículo 4a, e no versículo 4b, o convite dos versículos 5, 6. Em outras palavras, o versículo 4 é um janus: o versículo 4a olha para trás, para “ela clama” no versículo 3, e o versículo 4b olha para frente, para o versículo 5 (veja n. 8). O pronome indefinido quem (mi-) esten de o convite a todo aquele que é ingênuo (peti; veja pp. 166-167). Enquanto que em 1.22 eles rejeitaram seu convite, aqui, como em 8.5, eles ainda podem ser influenciados. A designação implica que uma pes soa deve avaliar se considera estar entre aqueles que são crédulos e precisam assumir um compromisso. Se esse indivíduo aceita o convite 64. G em scr ( Sprüche , p. 40) supõe que o v. 4 em sua totalidade é um à parte escrito por um poeta e nega que 4a faça parte do convite da Sabedoria. De acordo com ele, “aqui” é uma referência ao livro do poeta, m as em paralelo aos vs. 16, 17 ele é obrigado a interpretar “aqui” de m odo contrário ao natural e irônico ou m udá-lo para “ lá” .
da Sabedoria, então que volte-se (yãsur, veja 3.7; 5.7), arrependendose de seu descompromisso, comprometendo-se com a sabedoria do mestre sábio e humilhando-se (cp. 9.16). Desse modo um indivíduo ingênuo se toma um sábio e um convidado digno de se assentar à mesa da Sabedoria. Aqui (hênnâ\ lit., “mais perto”) se refere à casa magní fica da Sabedoria (i.e., à sua casa do saber), onde o banquete está pronto (vs. 1-3). Siraque diz: “Bem-aventurado o homem que medita na sabedoria... Aquele que olhar atentamente por suas janelas também ouvirá às suas portas; aquele que acampar perto da sua casa também fixará a estaca da sua tenda às paredes dela; ele armará sua tenda próximo dela e se alojará numa excelente paragem” (Eclo 14.23, 24; 51.23). Quanto ao que não tem senso (hasarlêb; veja p. 142), sem uma conjunção, sugere que o descuidado se encontra em aposição ao ingênuo. O singular ela... diz ( ’ãmerâ; cp. “ela clama”, v. 3) ressalta mais uma vez que a Sabedoria convida pessoalmente o fraco e espiritu almente descuidado para se arrepender e voltar o rumo da sua vida para ela. Lhe (lô) divide o grupo em convidados individuais. 5 A sabedoria passa do lado negativo do arrependimento de “vol tar-se” para o lado positivo de aderir a algo. Vem (lekü; lit. “vai”; veja 7.18) acrescenta urgência ao apelo. Agora os imperativos estão no plu ral, mostrando que todos são instados a vir. A personificação nesse encontro pessoal, “janta do meu alimento”, refere-se metaforicamente à aceitação do ensino (cp. Is 55.1-3; Eclo 15.3; 24.19; Jo 6.35). Janta (lahamü) é uma palavra poética para o consumo de alimento (lehem; 6.8) sólido, incluindo a carne abatida e cozida em 9.2aa.65 E bebe do vinho que misturei (üsetü beyayin mãsãkti) remete ao versículo 2ap (cp. 3.10; 21.17). Um texto ugarítico fornece um merisma paralelo de alimento e bebida: “Come do alimento, ah! Sim, bebe do fermento do vinho, ah!”.66 Os insensatos são convidados a desfrutar um banquete completo, implicitamente sem qualquer custo financeiro (veja Is 55.1). Assim como o alimento e a bebida dão vida física, os ensinos de Salo mão dão vida espiritual. Essa verdade é concretizada de maneira ainda mais apropriada no convite de Jesus para o banquete no reino de Deus (Lc 14.15-24; veja pp. 190-192). A Sabedoria fez sua parte; agora os fracos e insensatos devem tomar uma decisão de banquetear e serem curados. Seu convite se opõe nitidamente à dieta dos perversos; eles 65. O term o árabe lahm significa “carne" (veja UT, verbete 1.366). 66. John Gray. The Legacy o f Canaan (V TSup 5; Leiden: E. J. Brill. 1965), p. 194.
comem do alimento da perversidade e bebem do vinho da violência (4.17). 6 Agora a sabedoria retrata o arrependimento como uma mudanç de direção ao longo do caminho, usando a metáfora predileta do sábio, a imagem do “caminho” como representação do seu ensino (veja 1.15,2033). Deixais os vossos caminhos Çizbü; veja 2.13) intensifica o “voltese” (v. 4). O vocativo vós ingênuos (petã ’y im\ veja n. 11 e pp. 166-167; cp. ICo 13.11) deixa claro que os descuidados (v. 5b) e os ingênuos são correlatos. E vivei (wiheyú\ veja pp. 157-161) tem sua explicação mais clara em João 6. O que está em jogo na aceitação ou recusa do convite da Sabedoria é de suma importância; é uma questão de vida ou morte (veja 3.18; 4.13,22; 5.6; 6.23; 8.32-35). O caminho para o discernimento implica que a casa da sabedoria é uma entrada para a vida e não, ao contrário da casa da sedutora, o caminho para a morte (2.19; 7.27). En quanto o aspecto negativo do arrependimento é apresentado em 9.6a, correspondendo ao versículo 4, o seu aspecto positivo é dado no versículo 6b, correspondendo ao versículo 5. E andai pelo caminho (we,iSrü; cp. 4.11,14,15,18,19) implica que os ingênuos se arrependeram e se encon tram no caminho da vida. “[A vida] está associada ao progresso ao longo da ‘estrada’ e, portanto, tem a ver com o manter-se no rumo correto e ao ter acesso à orientação segura. A cada momento ela pode crescer ou decrescer, pois ninguém permanece parado. O indivíduo deve prosseguir em sua jornada e, se perder o rumo, pode perder sua vida” (veja 9.11, 15).67 O rumo do arrependimento contrasta vividamente com o rumo do perverso (veja 4.14). Do discernimento (binâ; veja p. 147, 148) supre a necessidade básica daquele “que não tem nenhum senso”, ligando o ver sículo 6b ao versículo 4b, da mesma maneira como o sinônimo referente aos “ingênuos” ligou o versículo 6a ao versículo 4a. b. Suplemento do poeta ao convite (9.7-12) Uma vez que os versículos 7-12 interrompem os convites rivais da Sabedoria (vs. 1-6) e da Loucura (vs. 13-18), a maioria dos estudiosos modernos considera esses versículos uma composição distinta e secun dária acrescentada ao texto. A fluência textual do capítulo também é sugerida pelo caráter um tanto desarticulado da interrupção e pela omis são de alguns versículos em certos mss. hebraicos, bem como extensos
acréscimos na LXX (veja notas). Apesar de não negar a probabilidade de sua origem diferente, o que provavelmente se aplica à maioria dos provérbios antes da sua compilação, sua coleção é coerente e sua in clusão é lógica. Não convém seguir o exemplo de Fox e atribuir sua inserção a um escriba posterior, que os incluiu por “duvidar que os ‘inex perientes’ e ‘insensatos’ são, de fato, os recipientes do convite da sabe doria, introduzindo, portanto, uma admoestação”.68A Mulher Sabedo ria sempre se dirige aos ingênuos, não ao filho (1.20-33; 8.1-31), e o preâmbulo afirmou que o livro foi escrito tanto para os ingênuos quanto para os sábios (veja 1.4,5). Plõger mostra-se justificadamente relutan te em separar esta seção do seu contexto.69 As considerações temáti cas e estilísticas apoiam a sua posição de que os versículos 7-12 suple mentam os versículos 1-6,13-18.0 interlúdio é constituído de três partes: I. As conseqüências para o sábio de corrigir os orgulhosos em vez dos sábios II. Janus: o princípio e os benefícios da sabedoria III. As conseqüências para o próprio indivíduo de ser um sábio ou um escamecedor
9.7-9 9.10 9.11-12
Os versículos 7-9 contrastam as reações opostas dos escamecedores e dos sábios com os efeitos negativos e positivos correspondentes que suas reações exercem sobre o mestre da sabedoria, a saber, a rejeição e vergonha em contraste com a aceitação e o amor. Esse con ceito combina com o convite para aqueles que são potencialmente educáveis nos versículos 1-6, pois apresentam uma admoestação velada para convidar aqueles que são capazes de se tomar sábios, bem como uma advertência velada para não convidar os escamecedores. O con vite implica numa repreensão: “abandone os ingênuos”. Em decorrên cia de sua disposição, os escamecedores não podem aceitar essa re preensão implícita (veja p. 169). Os versículos 11,12 contrastam o be nefício pessoal de ser sábio com o prejuízo enorme de ser um escame cedor. O versículo 10, que forma um inclusio com 1.7, funciona como um janus. Remetendo aos versículos 7-9, o versículo 10a afirma que o fundamento essencial para ser educável ou sábio é o “temor do Se n h o r ” , e olhar para a frente, o versículo 10b menciona o “discernimen to” decorrente do conhecimento do Santo como um fundamento es68. Fox, Proverbs 1-9, p. 306. 69. Plõger, Sprüche, pp. 105-6.
sencial para os benefícios da sabedoria (vs. 11,12a). A colocar os bene fícios da sabedoria no início (v. 11) e as conseqüências negativas do es cárnio no final (v. 12), o poeta não forma apenas um inclusio quiástico com a primeira estrofe (orgulhoso-sábio [vs. 7-9] versus sábio-orgulhoso [v. 12]), mas também oferece uma excelente transição para o convite da Loucura nos versículos 13-18. Os sábios estão entre os convidados rece bidos pela Sabedoria, e os orgulhosos entre os partidários da Loucura. Além disso, “seu conteúdo corrige a impressão de que os homens são salvos ou se perdem apenas por uma decisão isolada e impulsiva. A esco lha é vista amadurecendo em seu caráter e, portanto, em seu destino”.70 (1) As conseqüências para o sábio por corrigir o orgulhoso em vez do sábio (9.7-9)
Em termos estilísticos, os versículos 7 e 8 estão ligados por duas ocorrências de “escamecedor” e três ocorrências da raiz ykh, “repre ender” e os versículos 8 e 9 estão ligados por três ocorrências da raiz hkm, “ser sábio”. A raiz Iqh, “receber”, forma um inclusio ao redor da estrofe (vs. 7a, 9b). 7 O sábio deixa a metáfora do convite da Sabedoria a favor da decla ração literal, todo aquele que repreende (yõsêr; veja müsãr em 1.2).71 O derivativo indica um superior corrigindo um subalterno (cp. Dt 8.5) e a insensatez inerente do último (22.15). A sabedoria admoesta os ingênuos, pois eles ainda são impressionáveis e até mesmo crédulos, mas um escarnecedor (lês; veja p. 169) está tão cheio de si e desdenhoso dos outros que recusa se humilhar sob qualquer autoridade, até mesmo a autoridade do S e n h o r . Consequentemente, o disciplinador de um escarnecedor recebe (lõqêah; veja 1.3) vergonha ou insultos (qãlôn\ veja 3.35). Esse opróbrio é resultante de se desperdiçar tempo e energia im prudentemente numa causa inútil (cp. 14.6; 15.12; 21.24; Mt 7.6) ou, o que é mais provável, a julgar pelo versículo 8 do próprio escamecedor, pois seu ódio foi instigado, levando-o a atacar o sábio verbalmente e a humilhá-lo publicamente (22.10). Corrige (raizy/s/i; veja 3.12) repete os substantivos paralelos sinônimos comuns müsãr e tôkahat (5.12; 10.17; 12.1; 13.18; 15.5, 32). As duas raízes indicam a correção de um erro. O S e n h o r está por trás da correção do sábio: “Em Pr. 1-9, o twkht do 70. Kidner, Proverbs, p. 82. 71. Seus paralelos incluem:ykh, Hifil, “repreender”; Imd Piei “ensinar”;yrh Hifil, “catequizar” e Súb “virar-se”. M. Saeba, TLOT, 2.549, s.v.ysr.
mestre da sabedoria é tido como o twkht do S e n h o r (cp. 1.29)”.72 Uma vez que os escamecedores rejeitam “o temor do S e n h o r ” ( 9 . 7, 8), a ava liação religiosa do escamecedor como um perverso (lerãSã(; veja pp. 164- 165) é apropriada. “Escamecedor” e “perverso” são termos correlatos no Salmo 1.1. Visto que o zombador está decidido a seguir um rumo perverso, todo aquele que o corrige se prejudica (ou “traz sobre si uma nódoa moral”, mümô). Müm indica: (1) uma imperfeição física, mancha ou injúria, normalmente associada ao defeito físico de um animal sacrificial (Lv 22 .20, 25 ; Dt 15.21; 17.1) ou de um sacerdote (Lv 21.17-18 ,21, 23), ou ( 2) uma nódoa moral (Dt 32.5 ; Jó 11. 15; 31.7), ou ( 3) um ferimen to físico (Lv 24 . 19- 20 ). A HALOT atribui o segundo significado a este caso.73 O ódio do escamecedor transborda em abuso verbal e/ou físico (veja 22. 10). “Aquele que tocar o que é sujo se sujará.”74 8 Não corrijas ( ’al-tôkah) um escamecedor (lês) explicita a ad moestação implícita no versículo 7. A associação de y k h (“corrigir”) tanto ao “escamecedor” quanto ao “perverso” (v. 7a) sugere que “es camecedor” e “perverso” são termos correlatos. A ordem para corrigir seu próximo francamente em Levítico 19.17 deve ser matizada por este provérbio. Para que ele não te aborreça (pen-yisnã’ekã; veja 1.22; 15.12) significa evitar o sentimento negativo, passional e emocio nal que rejeita um relacionamento. O sábio visa conduzir aqueles que são potencialmente educáveis a se arrepender e, desse modo, estabele cer com eles uma amizade espiritual verdadeira. Se a repreensão não cumprir esse objetivo, como será o caso com aqueles que estão decidi dos a não aprender, então é melhor não ser expressa (cp. 17.14). A fim de salvar o simplório impressionável, o escamecedor deve ser penaliza do (21.11). Entretanto, o sábio admoesta aquele que tem autoridade a corrijas (hôkah.) um sábio (lehãkãm ; veja p. 145). Apesar do sábio possuir sabedoria (veja 1.2), ele não é perfeito (cp. 4.18). Antes, ele é o retrato da própria educabilidade (1.5; 12.1; 13.1; 14.6; 15.31; 19.25; 21.11; Mt 13.12). Ao detectar que um indivíduo tem o ingrediente es sencial para obter a sabedoria, isto é, o temor do S e n h o r , o superior é admoestado a corrigi-lo para que ele te ame (weye ^hãbekã', i.e., se tome teu amigo espiritual comprometido; veja 1.22). Tendo em vista 72. Chou-Wee Pan, “A Study o f the Vocabulary of Education in Proverbs” (dissertação de Ph.D., University o f Newcastle upon Tyne, 1987), p. 246. 73. HALOT, 2:556, s.v. müm. 74. Plaut, Proverbs, p. 118.
suas psiques distintas, a arrogância dos perversos e a humildade dos justos, a correção repele os primeiros e desperta nos últimos um desejo de ser superior que os aprimora (veja 15.31; 18.15). 9 O versículo 8 tem por objetivo desenvolver o relacionamento en tre mestre e aprendiz; o versículo 9 procura tratar apenas do último. Dê (tên) é um correlato de lãqah (veja 1.3,4). Instrução traduz no verseto B o leqah, (veja 1.5) omitido. A palavra-chave ao sábio (lehãkãm) liga firmemente o versículo 9a ao versículo 8b. Apesar do sábio e do insen sato normalmente serem apresentados em Provérbios como opostos antitéticos e estáticos, a cláusula de propósito, para que ele se torne ainda mais sábio (weyehkam ~'ôd), ressalta que o sábio é um indivíduo em processo de crescimento e amadurecimento e que tem defeitos (veja 1.5 ; 4.18). Ptah-hotep (ca. 2500 a.C.) observou: “Os limites da arte não são alcançados. Nenhum artista possui habilidades perfeitas”.75Informe (hôda'\ lit. “faz saber”; veja 1.23) também é qualificado pelo conjunto de ensino recebido. Ao justo (lesaddiq\ veja pp. 149-150) pressupõe que um dos componentes ético-religiosos essenciais de ser sábio é servir a comunidade, não a si mesmo. Para que ele cresça em saber (weyôsep leqah) ecoa o propósito do livro (veja 1.5a; Mt 13.12; 25.29). (2) Janus: o princípio e os benefícios da sabedoria (9.10) Depois de falar sobre o aumento da sabedoria e conhecimento en tre os sábios justos nos versículos 8b, 9, o sábio atribui a origem da sabedoria deles ao princípio da sabedoria (fíhillat hokmâ; i.e., ao primeiro de uma série de acontecimentos que o levaram a uma com preensão e habilidade magistrais; veja 1.2, 7). Assim ele revela sua fonte essencial, seu princípio fundamental, a saber, o temor do Senhor (y ir ’at YHWH\ veja 1.7). Os sábios, que são dignos de se assentar à mesa da Sabedoria, começam sua educabilidade com sua submissão à autoridade suprema, o S e n h o r . O s aspectos cognitivos e afetivos dessa expressão são elaborados pelo paralelo, conhecimento (da'at veja p. 125; 2.1-5) pessoal do santo ( qedõ$im ; cp. 30.3; Os 11.12[ 12.1]). Esse título para o S e n h o r enfatiza sua “diversidade”, a esfera da sua santida de, separado de tudo aquilo que é mundano, comum e profano. “O temor do S e n h o r ” é um equivalente muito próximo daquilo que R. Otto
chamou de “a ideia do Santo”.76Ao se encontrar com o Santo, o indiví duo é enchido tanto de temor quanto de confiança e expressa essa reverência sujeitando-se à ética implícita na pureza do Santo. A sabe doria consiste em transcender o mundo humano decaído e participar daquilo que é divino, daquilo que é santo. (3) As conseqüências de ser sábio por si mesmo ou um escame cedor (9.11, 12) 11 Apesar de ki com frequência significar “porque”, certamente é preferido pois o versículo 11, que aponta para os benefícios da sabedoria, dificilmente introduz um argumento sobre o porquê da dimensão religiosa ser necessária para a verdadeira sabedoria e discernimento. Ao que pa rece a ligação está no fato dessa dimensão religiosa produzir o discerni mento que promete vida e evita a morte. Agora o argumento passa dos benefícios colhidos pelo sábio por sua instrução do sábio (mas não do escamecedor), para os benefícios obtidos pelo sábio atento e as conse qüências perniciosas sentidas pelo escamecedor obstinado por suas res postas variadas à instrução do mestre da sabedoria. Por meio da sabe doria traduz bãh (lit., “através dela”; veja n. 21). Apesar do sufixo femi nino poder se referir aos substantivos femininos “sabedoria”, “temor”, “conhecimento” ou “discernimento”, em casos semelhantes em outras passagens o antecedente provavelmente é “sabedoria” (cp. 3. 13, 14). Os teus dias serão muitos (yirbü yãmeykã', cp. 3 .2 ) pode ser restrito a certo número de anos (e.g., 20 em 1Sm 7.2 ), ou pode ser tão abundante quanto os dias dos céus acima da terra (e.g., Dt 11.21). Em Provérbios os dias do sábio, ao contrário dos dias dos insensatos, terminam em vida, não em morte (veja pp. 157-161). Como em 3 .2 , a unidade mais curta de tempo é intensificada pela mais longa, e anos de vida te serão acrescentados (weyôsípü lekã senôt hayyim), uma mistura de cláusula de 3.2 e 4 . 10. 12 Se és sábio ( ’im-hãkamtã; veja v. 9), então para ti mesmo o és (hãkamtã lãk), ou seja, cada pessoa é a beneficiária principal e final, porém não exclusiva, da vida abundante que o sábio adquire. Entretan to, se escarneceres (uiela§tã) indica que você aborrece o sábio que o corrige (vs. 7, 8a) e que, na verdade, você é ética e religiosamente perverso (cp. v. 7b). A expressão ficarás sujeito a culpa (tissã’; veja 76. B. Waltke, “Fear o f the Lord", in Ative to God: Studies in Spirituality Presented to James Houston. orgs. J. I. Packer e L. Wilkinson (Downers Grove: IntcrVarsity, 1992), pp. 17-33.
n. 24) significa “levar sobre si responsabilidade, castigo” (Êx 28.43; Lv 5.1,17; 7.18; 17.16; 19.8;Nm5.31; 18.1,23) e sugere a pena capital, a recompensa pela arrogância e impenitência. O acréscimo de somente (lebaddekã) ressalta a doutrina do individualismo, a saber, que cada um deve se responsabilizar pelas conseqüências dos próprios pecados (cp. 15.32; Ez 18.20; Gl 6.4, 5). Assim como a introdução (vs. 7-9), a con clusão (v. 12) enfatiza a responsabilidade pessoal por escolher ou rejei tar a sabedoria. A LXX (seguida pela Sir.) estende o benefício da reti dão no verseto A aos que estão ao redor do indivíduo, “também serás sábio para os teus próximos” e limita as conseqüências do pecado ao próprio indivíduo, “somente tu levarás o mal sobre ti”. De acordo com Toy77, que ignora a natureza epigramática de Provérbios (veja p. 162) trata-se de uma afirmação agradável, porém incorreta. Kidner afirma de modo mais convincente, “As conseqüências dessa escolha não têm por objetivo negar que as pessoas são beneficiadas ou sofrem em fun ção do caráter uma das outras (cp. 10.1), mas enfatizar que, em última análise, aquele que sai ganhando ou perdendo é o próprio indivíduo”.78 c. O banquete da loucura (9.13-18) Em vez de construir uma casa, preparar uma refeição suntuosa e enviar servas em preparação para o seu banquete, a prostituta personi ficada assenta-se pomposamente num trono elevado à entrada da sua casa (vs. 13-15). A partir dessa postura pretensiosa e posição preeminente ela seduz o ingênuo a roubar de seu marido os prazeres eróticos que são dele por direito (v. 16). A tragédia é que os ingênuos, tão moral mente ignorantes quanto a prostituta, não sabem que a casa dela é uma armadilha mortal (v. 17; 2.18; 7.27). (1) A anfitriã pretensiosa (9.13-15) Os versículos 13-15 fornecem a explicação para o convite da lou cura nos versículos 16-18 (cp. 1-3). O sábio descreve primeiro o cará ter dessa mulher como sendo turbulento, ingênuo e moralmente igno rante (v. 13) e, depois sua situação pomposa, pretensiosa e preeminente à entrada da sua casa (v. 14), de onde faz, em alta voz, o seu convite sedutor para os jovens ingênuos (v. 15). 77. Toy. Proverbs, p. 195.
13 A Mulher Loucura ( 'êSet kestlüt) personifica a rival da Mulher Sabedoria no prólogo, a “esposa lasciva” (veja pp. 176, 177). Tanto a Loucura quanto a esposa lasciva são turbulenta[s] (ou rebeldes, hõmiyâ; veja 7.11), ingênuas e ignorantes (5.6), amantes concupiscentes inte ressadas no corpo do ingênuo, não em sua mente (7.13; 9.17), de modo que ambas lhe fazem uma proposta indecorosa (7.7,18; 9.15,16); am bas são casadas (7.19; 9.17) e, o que é mais importante, são mortais (2.18, 19; 5.23; 7.27; 9.13). O poeta deixa inequivocamente explícita sua transição do registro da “esposa lasciva” para a sua personificação simbólica da “Loucura”, colocando a última num trono sobre o monte mais alto da cidade, uma imagem que dificilmente pode ser considerada literal. Apesar de, em outras passagens de Provérbios, o acréscimo de ’eset indicar uma mulher real (veja 14.1; 31.10 versus 1.20; 8.1; 9.1), devemos pressupor que o poeta acrescentou esse termo para ligar a Loucura à sedutora. Assim como a esposa nobre de 31.10-31 é um epítome da sabedoria, a esposa devassa do prólogo personifica a loucu ra. Totalmente ingênua (petayyüt, “ingenuidade”; veja 1.4) traduz a expressão idiomática “ela é ingênua” (cp. “eu me deleitava”; 8.30). Falta-lhe toda a vontade e determinação para deixar sua ignorância e complacência e fazer aquilo que é certo (veja 1.32). E (ú) introduz um corolário interrelacionado e sobreposto acerca de ser ingênuo: não sabe coisa alguma (bal-yãde'â mâ\ cp. 5.6).79 A expressão “coisa alguma” deve ser restrita em termos de discurso ao conhecimento moral, não mental (veja 5.6; cp. 4.19). Sem o conhecimento moral ela necessaria mente não tem perspicácia benevolente e prudência (veja 8.12,14). Ela não tem um conceito claro de seus objetivos porque não possui valores firmes. Em decorrência disso, muitas vezes ela é deixada ao seu belprazer e poder, decidida a não saber que o fim disso é a morte. 14 No capítulo 7, a esposa libertina é retratada aparecendo no cair da noite para representar seu comportamento clandestino e dissimula do. Agora ela é retratada assentada em público de modo preeminente, para representar seu apelo ousado e amplamente aceito para seguir seu estilo de vida. As declarações não são contraditórias mas servem para representar aspectos diferentes da mulher insensata. E (we) intro duz cláusulas que definem sua conduta em relação a seu convite. Com todo desleixo, a loucura se assenta (yãsebâ\ veja 3.29) à entrada
(lepetah\ veja 8.34) da sua casa (bêtãh; veja 9.1), sem haver prepara do a refeição, misturado e decantado o vinho, posto a mesa e enviado mensageiros. Seu estilo de vida é tão empolgante e desprovido de exi gências morais que ela não precisa de nenhuma disciplina, de nenhum esforço e de nenhum investimento para atrair os insensatos. Seu convi te grosseiro é suficiente para atrair o povo para a sua refeição emocio nante, porém fatal. Seu zelo para obter convertidos (cp. 1.11-14) é tão fervoroso quanto o da sabedoria (cp. v. 4). Num trono (kissê’) significa num “lugar de honra” (com exceção, possivelmente, de 2Rs 4.10). De acordo com Oswalt, das 136 ocorrências de kissê\ todas, exceto sete, se referem a um trono real ou divino.80 E provável que as cadeiras fossem tão raras que só os nobres mais ilustres possuíssem uma. No tempo da rainha Elisabete as cadeiras eram um luxo. O povo em geral se assentava em banquinhos e bancos e a pequena nobreza em almofa das no chão, e até mesmo os salões de baile mais luxuosos raramente tinham mais do que uma cadeira. Somente o nobre propriamente dito se assentava nela. Quando um professor de escola era promovido a pro fessor universitário ele recebia como presente uma cadeira de verdade, como símbolo de seu status elevado na esfera acadêmica. Assim, no livro de Provérbios, a cadeira ou trono também representa um lugar de honra (cp. 16.12; 20.8,28; 25.5; 29.14). Sentar-se é a postura de auto ridade que os mestres assumem. Os escribas e fariseus se assentavam na cadeira de Moisés (Mt 23.2), e o Senhor Jesus se assentava para pregar (Mt 5.1; Lc 4.20, 21). Quando o papa fala ex cathedra (“da cadeira”) os católicos romanos fiéis se sujeitam à sua autoridade. A impostora pretensiosa se apresenta como uma imperatriz que governa sobre uma cidade, e os ingênuos se sujeitam à sua autoridade. Desde os tempos mais remotos os insensatos freqüentam sua casa carnal (cp. Gn 38.14; Js 2.1, 15; Jr 3.2). Competindo com a Sabedoria, que clama dos muros mais altos da cidade (9.3b), a Loucura se assenta nas altu ras da cidade (merõmê qãret; veja 9.3) para chamar a atenção do povo e impor seu governo sobre ele. Alguns estudiosos veem aqui uma alusão a um monte no formato de uma acrópole da cidade, onde fica vam os templos pagãos e suas prostitutas cultuais, mas é provável que essa interpretação extrapole a metáfora.81 15 Clamando (liqrõ\ veja 9.3) introduz a circunstância em questão 80. J. Oswalt, TWOT, 1:448, s.v. kissl'. 8 1. Mais recentemente, Perdue, Proverbs, pp. 147-52.
nos dois versículos anteriores e compete com a Mulher Sabedoria (v. 3). A loucura dirige o seu convite àqueles que passam (le'õberê; veja 7.8)pelo caminho (dãrek; veja 1.15). Em 4.15 “passar” contrasta com “desviar” (v. 16). A loucura distrai aqueles que não pretendiam se des viar para a sua casa. Ela só se vê numa posição de vantagem quando consegue a atenção deles, da mesma maneira como a serpente malé vola só passou a ter poder sobre Eva quando voltou toda a atenção da mulher para a árvore proibida (Gn 3.1-3). Como uma criança apren dendo a andar de bicicleta que tende a colidir com a árvore na qual ela fixa o seu olhar, também as pessoas tendem a pecar uma vez que fixam seus olhos na tentação. A cláusula apositiva àqueles que fazem retas (hameya$$erim\ veja 3.6) as suas veredas ( 'õrehôtãm; veja 1.15) in tensifica e esclarece que o alvo e modo de vida dos ingênuos não visa vam, em princípio, sair dos limites da conduta moral (veja 3.6; 15.21). A esposa insensata serve para testar a força da sua resolução. Uma vez que lhes falta determinação, os ingênuos são presas vulneráveis para aqueles que sabem muito bem o que querem (veja 7.10-22). A arte da sedução consiste em dissuadir habilidosamente um indivíduo de seguir o caminho que ele havia planejado. (2) O convite da loucura (9.16, 17) A mulher obtusa também pede ao jovem descuidado que se volte para ela (v. 16) e que coma do seu alimento roubado (v. 17). Aqueles que aceitam o convite acabam nos recônditos mais inferiores da morte (v. 18). 16 O convite da loucura repete literalmente o da sabedoria (veja v. 4), com exceção do acréscimo de “e” antes da frase que termina com “ela lhe diz”. Mais uma vez as designações “ingênuo” e “o que não tem nenhum senso” exigem que o indivíduo a quem o discurso é dirigido avalie sua verdadeira identidade tomando uma decisão quanto a mudar de rumo. Se o indivíduo considera o seu estilo de vida insensato e se volta para a casa da sabedoria, ele é sábio e se toma digno de vida. Entretanto, se um indivíduo parece discemente (veja v. 15), mas após tata ao ser tentado, se mostra um discípulo falso e digno de morte (cp. ICo 15.2; Cl 1.22,23; 2Tm 2.12). As pessoas se mostram sábias perseverando no caminho certo quando são testadas (veja Mt 13.1 -9). Essas pessoas se desviam exteriormente da congregação dos justos, mas em seu ser interior nunca fizeram parte dela (Uo 2.19).
17 0 convite da loucura para o seu banquete forma um quiasmo com o convite da sabedoria ao inverter a seqüência de alimento e bebi da para bebida e alimento. Ela formula o seu convite na forma de um provérbio que mostra aquilo que as pessoas consideram atraente - uma compreensão mais profunda daquilo que é proibido e censurado. No entanto, o provérbio é uma meia-verdade, pois apesar de ser agradável por algum tempo, no final é repulsivo. Agua (m ayim ; veja 5.15) é uma metáfora incompleta para o prazer sexual. Talvez a metáfora exija o uso de “água”, não de vinho, não sendo pretendido, portanto, qualquer contraste com a oferta de vinho pela sabedoria. No entanto, uma vez que a carne dos animais abatidos também não é mencionada como parte de sua refeição, a intenção é formar um contraste entre os ali mentos ricos oferecidos pela Sabedoria e a comida comum apresenta da pela mulher insensata. Mas a Loucura compensa essa deficiência com a atração daquilo que é secreto e oculto, daquilo que é incomum e estranho (v. 17). Roubada (gfnübim) qualifica o prazer sexual como sendo tomado do cônjuge ao qual ele pertence por direito (cp. 2.17; 5.9; 6.30-35; 7.19). É doce (yimtãqü; cp. 16.21, 24) contrapõe “é amarga” (veja Ex 15.23-25). De acordo com um provérbio árabe, “Tudo o que é proibido é doce” .82A insensatez seduz sua vítima com a meia-verdade de que o pecado dá prazer (cp. Hb 11.25), mas, como Satanás (cp. Gn 3.4), ela nega a ligação entre o pecado e a morte. E a comida (welehem; veja v. 5) serve mais uma vez como parte de um merisma para um banquete completo, outra metáfora parcial para o prazer sexual (veja 30.20). Oculta (setãrim ; veja 25.23) complementa “roubada”, pois o adúltero encobre o seu “roubo” (veja 7.19,20) da mesma maneira como um ladrão precisa roubar suas vítimas encoberto pela escuridão. O adul tério é agradável (yin'ãm\ veja 2.10) para o pecador e deleitável a seu paladar depravado (cp. 4.16, 17). Seu provérbio é enganoso, pois, na verdade, ela convida suas vítimas para um banquete que brinda a mor te. A prostituta impudente não sabe que o salário do seu pecado é a morte ou não se importa se suas vítimas acabam morrendo. (3) Conclusão: morte (9.18) O sábio corrige essa meia-verdade enganosa com um mas (we). Por trás da cena de prazer sensual se encontra uma cena de morte (v. 82. D. Winton Thomas, “Notes on Some Passagcsin the Book o f Proverbs”, PT 15 (1965) 271-79.
18a) nas profundezas da sepultura (v. 18b). Ele não sabe que (lõ ’ yãda'; veja 4.19; 9.13) expressa o erro fundamental da loucura (veja v. 13) e de seus partidários: eles não sabem ou não se importam com as conseqüências de seus atos. São deliberadamente alheios ao discerni mento fundamental da sabedoria de que o Deus ético sustenta a ordem moral, na qual ele recompensa a justiça com a vida, e a perversidade, como roubar e adulterar, com a morte. Os mortos veja 2.18) estão ali (Sãm; veja 8.27) se refere aos cadáveres na casa “festiva” da loucura (veja 9.13, 14). Aqueles que ela convidou (qer u ’eyhã; veja “clamou no v. 3) se refere aos apóstatas que atenderam ao seu convite sedutor (v. 18). Se eles tivessem percorrido caminhos retos, que levam à vida, não se encontrariam desviados e nas profundezas (be'imqê; veja 25.3) da sepultura (Se ’ôl; veja p. 172). “Muitos ‘comem’ na terra aquilo que ‘digerem’ no inferno.”83 Com essa advertência severa o sábio encerra o prólogo, esperando estimular o jovem descomprometi do a escolher a vida que ele oferece na coleção seguinte.
II. C O LEÇÃO II: SALOMÃO I (10.1-22.16) Para a estrutura da Coleção II, veja pp. 52-60. A. COLEÇÃO I1A: PARALELOS ANTITÉTICOS DO JUSTO VERSUSO PERVERSO (10.1-15.29)
1. Sobrescrito (10.1a) la Os provérbios de Salomão O janus (10.1) que liga a Coleção I (1.1-9.18) à Coleção II, é constituído de um sobrescrito (10.1 a) e de um dito educativo (10.1 b). O filho sábio voltará a ser mencionado em 13.1 e 15.20 na Coleção IIA. O sobrescrito curto, os provérbios de Salomão (mislê Selõmõh) repe te, essencialmente, 1.1a. A Coleção II consiste de 375 provérbios, pro vavelmente para corresponder ao valor numérico das consoantes do nome (veja p. 45). 83. Ross, Proverbs, p. 9 5 1. I. Veja 1.1. Esse sobrescrito não está presente na LXX e Sir., mas encontra apoio na literatura sapiencial do antigo Oriente Próximo (veja pp. 71-72) e nos títulos de outras coleções em Provérbios (e.g., 22.17; 24.23; 25.1; 30.1; 31.1). Sc esse título tivesse mais de três palavras, ele teria sido transmitido na tradição massorética como um versículo separado.
2. O sábio e o insensato são definidos por seu comportamento na riqueza e no modo de falar2 (10.1 b -16) 1b Um filho sábio alegra a seu1 pai, mas um filho insensato4 causa5 tristeza6 para1 sua mãe. 2 Os tesouros obtidos mediante perversidade não têm nenhum valor eterno, mas a retidão* livra da morte. 3 O S e n h o r não permite9 que o apetite10 do reto permaneça insatisfeito, 11 mas aquilo que o perverso12 almeja ele lança para longe. 4 Um pobre é fe ito 13 comu uma palma negligente, mas a mão dos diligentes15 traz riqueza. 5 Aquele que ajunta [seu alimento]'6 no verão é um filho prudente; 17 aquele que dorme na colheita é um filho que causa vergonha.18 2. Aqui o discurso é usado como uma sinédoque para todo o tipo dc comunicação. 3. “Seu” é omitido no verseto A (veja M. Dahood, Psalms III: 101-150 [AB; Garden City, N.Y.: Doubleday, 1970], pp. 429-30). 4. Lit. “um filho, um insensato”. 5. Lit. “é aflição”. A cláusula nominal significa “aflição total" (cp. 3.6; 8.6,30). 6. Tügâ se refere à triste/a fundamental em reação à dor, sofrimento e ou/aflição, não a uma dor fisica e/ou mental isolada. 7. Um gen. de objeto mediado (IBHS, p. 144, P. 9.5.2d). 8. A forma fem. de $dq para contrastar com a masc. de rs' (veja A. Bcrlin, The Dynamics o f Biblical Parallelism [Bloomington: Indiana University, 1985], pp. 4 1-50; IBHS, p. 106, P. 6.4.3a). 9. Construído como um Hifil permissivo (IBHS, p. 445, P. 27.5b). 10. Heb. nepeS (veja p. 140). 11. I.e.. que tem um desejo intenso por alimento (Jr 42.14; cp. SI 37.25). 12. PI. para contrastar com o sing. saddiq (A. Berlin, Dynamics o f Biblical Parallelism, pp. 41-50). 13. Lit. “há quem faça um homem pobre”, uma construção indefinida (veja IBHS, pp. 70-71, P. 4.4.2). 14. Um acusativo não cognato que indica o órgão ou o meio pelo qual a ação fisica é realizada (veja IBHS, p. 167, P. I0.2.1g; GK.C #117s). 15. BDB (p. 358, s.v. hãraç) deriva a palavra de III hãras, “cortar, aliar, decidir”. D. Freedman e J. R. Lundbom (TDOT, 5:218, s.v. h&raç) dizem: “No livro dc Provérbios, hSrítç geralmente se refere a um indivíduo “astuto” e traduz o termo como “alerta, perspicaz, refletido”, mas HALOT, (1:352, s.v. VI hãras), tomando por base cognatos semíticos, traduz como “assíduo, diligente”. 16.0 objeto implícito é fornecido a partir do paralelo em 6.8. 17. Lit. “que faz a si mesmo ser considerado/declarado/reconhecido como criterioso” . Nesse Hifil interno do verbo Qal intransitivo ékl, “ter discernimento, entendimento”, o sujeito leva a si mesmo a ser ou fazer algo (IBHS, pp. 438-40, P. 27.2s.). 18.0 Hifil pode ser um Hifil elíptico de dois lugares (i.e., faz que [seus pais] sejam envergonhados) ou um Hifil de um lugar, sendo que nesse caso o Hifil interno pode ser delocutivo, i.e., “um filho que faz a si mesmo ser considerado/declarado/reconhecido como vergonhoso” (IBHS, pp. 437-40, PP. 27.2d. e, f).
6 Bênçãos19 vêm sobre20 a cabeça dos retos, mas a violência oprime a boca dos perversos.21 7 Os retos são invocados em bênçãos,22 mas o nome dos perversos apodrece.11 8 O sábio de coração aceita ordens, mas o insensato tagarela24 cai em ruína. 9 Aquele que anda na irrepreensibilidade anda seguro; mas o que torce seus caminhos será conhecido 25 10 O que maliciosamente26pisca o olho causa problemas, mas o insensato tagarela21 cai em ruína.29 11 A boca do reto é manancial de vida, mas a boca do perverso esconde violência 29 19. A LXX (c também a Vulg.) parafraseia “a bênção do S e n h o r ” (veja 10.22), mas a Targ. traz o pl. com o TM. 2 0 .0 verbo de movimento é omitido com a prep. lamede (IBHS , p. 224, P. 11,4.3d). 2 1 .0 heb. do v. 6b é o mesmo que do v. 11b (veja n. 29). 22. Lit. “a memória do reto [é] uma bênção”. Delitzsch (Proverbs, p. 155) traduz UbrSká como “permanece em bênção”. De acordo com ele, a expressão idiomática hebraica “expressa crescer até se tomar algo e, desse modo, entrar num estado de permanência”. Ele apoia sua argumentação de que a expressão é um substituto do o passivo ^ bõrak , “serão abençoados”, com o uso de hyh liqlãlá em Jeremias, que ele parafraseia mediante um passivo. Mas em Jeremias (25.18; 42.18; 44.8, 12; 49.13) essa expressão é usada para uma “pessoa ultrajada”, que "se toma uma ‘maldição’ (çflalâ) personificada e exemplar, citada por outros em suas imprecações”. Librfikâ é ativo (i.e., “ser uma bênção”) em Deuteronômio 23.6 e em Neemias 13.2, e passivo ou ativo no Salmo 37.27. Em resumo, os dados léxicos apoiam um sentido ativo para librSkâ. 23. Fichtner (BHS) corrige para yúqõb “será amaldiçoado”, para um paralelo mais ade quado (cp. 11.26; 24.24, 25). 24. Lit. “o insensato de lábios”, um gen. de espécie (IBHS, p. 152, P. 9.5.3g). 25. Vários estudiosos (veja Fichtner [£//.“>]) corrigem o TM yiwwBdía' (“será conhecido") para yírôa (“será prejudicado"; cp. 11.15; 13.20), pois o TM nâo fornece nenhum paralelo antitético claro para “andar seguro". A confusão feita pelos copistas de dálete e reche e erros de metátese são ocorrências bastante conhecidas (B. Waltke, "Text o f the Old Testament”, in NtDOTTE, 1:6263), e a LXX comete o mesmo erro em 13.20. No entanto, o TM oferece uma assonância excelente com o yillsbêf final nos vs. 8 e 10 e pode ser entendido como uma metonimia para ‘‘e se arruina”, assim como "pecado” no v. 16 é uma metonimia para castigo. “Esse uso imaginativo dc palavras não é raro nestes provérbios curtos e compactos” (Whybray, Proverbs, p. 162). 26. Lit. “pisca” (veja 6.13). A LXX esclarece o sentido acrescentando “enganosamente” nesta passagem, mas não em 6.13. 27. Lit. n. 24. 28.0 TM (seguido essencialmente pela Targ.) lê de maneira suspeita o mesmo que o v. 8. A LXX (seguida pela Sir.) traz “mas aquele que repreende abertamente cria paz” e oferece uma antítese esperada. Talvez no TM o v. 8 tenha sofrido ditografia. Ainda assim, a repetição do TM marca o v. 10 como a linha central e o janus dos vs. 6-14. Uma repetição sem elhante em 26.7b, 9b contribui para a poética de 26.1-12. 29. O hebraico do v. 1lb. é o mesmo que do v. 6b. Uma vez que “bênção” e o sujeito no v. 6a,
12 O ódio desperta conflitos, mas o amor cobre todas30 as transgressões.3I 13 Nos lábios de uma pessoa criteriosa se acha sabedoria, mas a vara é para as costas daquele que é falto de senso. 14 Os sábios entesouram o conhecimento, mas a boca de um insensato é um terror iminente}1 15 A riqueza do rico é a sua cidade fortificada; o terror do pobre é a sua pobreza. 16 O salário do justo certamente33 é vida; o rendimento34 do perverso certamente são pecado e morte. Um provérbio educativo introdutório apresenta a primeira unidade que contrasta o comportamento do reto com o do perverso em relação à riqueza e ao modo de falar (10.1 b). O versículo 1b também funciona como uma estrutura ao redor dos versículos lb-5 que se referem à riqueza e à pobreza. Os versículos 15 e 16, que dizem respeito ao mes mo assunto, estão ligados de forma quiástica aos versículos 2-5 pela paronomásia de rã ’ê (“pobre”, v. 4a) e rê’S (“pobreza”, v. 15b) em sua estrutura externa e de ta'asir (“traz riqueza”, v. 4b) e 'ãSir (“rico”, v. 15a) em sua parte central, e provavelmente pelas palavras-chave saddiq (“reto”; vs. 2b, 3a, 16a) e rãsã'im (“perverso”; vs. 2a, 3b, 16b) em sua parte central e estrutura externa, respectivamente. Se essa ligação é seu antônimo, “violência” é, supostamente, o sujeito no v. 6b. Assim também, uma vez que “boca do reto” é o sujeito no v. IIa, "a boca dos perversos” é, supostamente, o sujeito no v. 11b. 30. Ou, “todos os tipos de”, “toda espécie de” (HALOT, 2:474-75, s.v. kol). 3 1. A LXX traz “aqueles que nào amam contendas” e acrescenta o negativo para obter um paralelo e dar sentido. Nem Tiago 5.20 nem I Pedro 4.18 seguem a LXX. “A possibilidade de múltiplas sinuosidades e volteaduras é uma característica do Mashal” (Delitzsch, Proverbs, p. 216). 32. F. Maass ( TDOT, 5:278, s.v. h sta t ) define a raiz de m ehittâ (veja 10.15, 29; 18.7; 21.15) como “medo, contusão ou fraqueza”, não “destruição” ou “ruína”, preferindo “ser cheio de terror”. Em sua discussão desta raiz comum, ele traduz todas as suas formas congêneres pelos sinônimos “medo”, “terror” e “assombro”. Das quatro ocorrências de m ehittâ fora de Provérbios, ele omite Jeremias 17.17, mas traduz por “terror (ou horror)” em Isaías 54.14 e Jeremias 48.39 e, questionavelmente, por “destruição” somente no Salmo 89.40(41). Outras ocorrências em Provérbios, todas na Coleção 11(10.14, 15,29; 13.3; 14.28; 18.7; 21.15), podem significarem seu contexto “terror/ assombro” e/ou “destruição/ruína”, mas em 21.15, “terror" fornece uma antítese mais direta para a alegria da primeira oração do que “destruição”. Diante desses dados, é prudente restringir o sentido “terror” e pressupor que funciona como uma metonímia fixa para "ruína”. 3 3 .0 lamede provavelmente é enfático (IBHS, p. 211, P. 11.2.1 Oi), mas Harman acredita que a questão é discutível (NIDOTTE, 4 :1040, s.v. “particles”). A opção “salário para vida [ou conduz à vida]” não parece adequada. 34.0 padrão nominal de p^ullâ e t^bú '&indica o resultado ou produto de um ato (IBHS, p. 90, P. 5.5b).
válida, ela forma uma estrutura ao redor de uma subunidade central de provérbios que se refere à comunicação (10.6-14). As três subunidades contrastam o reto e o perverso e hayyim, “vida” (vs. 11,16) e sua contraparte, “livra da morte” (v. 2). Em resumo, o que está em jogo é de suma importância; a conduta do indivíduo em relação ao dinheiro (vs. 2-5,15, 16) e ao modo de falar (vs. 6-14) são questões de vida ou morte. a. Provérbio educativo introdutório (10. lb) Neste ponto de junção do livro, a introdução volta a mencionar o pai e a mãe (veja 1.8) e contrastar o efeito psicológico de um filho sábio (bên hãkãm\ cp. p. 145 ) e de um filho insensato (bên kesii, cp. pp. 167-168) sobre eles. Como no prólogo, a declaração pressupõe que a sabedoria é uma questão dos filhos receberem as tradições de gerações (veja pp. 137-138). O dito é expresso de uma maneira geral a fim de que a verdade possa permanecer aberta a situações diversas (cp. 13.1; 15.20; 17.25). A frase estereotipada do pai ( ’5b) e da mãe ('êm) é separada entre os membros paralelos (p. 85). O “pai” e o “sábio” sem pre ocorrem no verseto A em contraste com a “mãe” e o “insensato” no verseto B (cp. 1.8; 6.20; 15.20; 19.26; 23.22; 30.11,17) de modo que torna alegre (y®éammah; veja 5.18) não diz respeito somente ao pai, e causa tristeza (tügat) - quando justaposto com “alegra” (14.13; 17.21) - não se refere exclusivamente à mãe. Outros provérbios atribuem a tristeza ao pai (17.21, 25) e a alegria à mãe (23.25). Ao se sujeitar à instrução dos pais, o filho sábio percorre com sucesso o seu caminho em meio às tentações do dinheiro fácil (1.10-19) e do sexo fácil (2.1618). Ele também preserva os valores e a herança da família (cap. 5) e está a caminho de ser coroado como um pai sábio (4.1 -9). O filho insen sato aflige os pais, pois cancela a herança da sabedoria. A lei motiva os filhos a honrarem os pais valendo-se da autoridade divina (Ex 20.12; Dt 5.16), mas este e outros provérbios os estimulam valendo-se das temas afeições familiares (cp. 15.20; 17.21,25; 19.26; 23.15,16,24,25; 27.11; 28.7; 29.3). Não temos como saber ao certo os motivos exatos para os ditos acerca do impacto psicológico do comportamento do filho sobre seus pais, mas sabemos que o provérbio não seria usado se não fosse considerado relevante para os filhos. O versículo lb também pode ter como objetivo encorajar os pais a instruir e a disciplinar seus filhos, a fim de experimentarem alegria, não tristeza (27.11), mas de acordo com o preâmbulo, Provérbios foi redigido para os jovens (1.4), e o prólogo pres
supõe que os pais são sábios. A educação bem-sucedida ou malograda dos filhos afeta a sociedade de modo espacial desde a esfera social mais próxima, o lar, até a comunidade como um todo e, de modo temporal, de geração em geração. A introdução para a seção seguinte, versículo 17, amplia a influência do filho do lar sobre a comunidade como um todo. b. Sabedoria e riqueza (10.2-5) No texto hebraico, a subunidade referente à riqueza é estruturada de forma quiástica pela expressão inicial “filho sábio/insensato” nos dois versetos do versículo 1 e pela final “prudente/vergonhoso” nos dois versetos do versículo 5 .0 versículo 5 define o sábio e o insensato em termos de hábitos de trabalho. O padrão alternado nesses paralelos de virtude (+) e de vício (-) (i.e., costura-os de tal modo que a preposição no final de um versículo é retomada no começo do seguinte. O tema dos filhos sábios versus o insensato, no versículo 10.1 b, é engor dado pelos dois quartetos (vs. 2, 3 e 4, 5). O primeiro associa a ética à teologia (cp. 3.27-35): o “reto” serve a comunidade e encontra a salva ção da morte; o “perverso” serve a si mesmo e não encontra nenhuma salvação. Isso porque o S e n h o r recompensa o primeiro e frustra o último (v. 3). O segundo quarteto diz respeito à teologia prática. Os retos traba lham diligentemente (v. 4) e no tempo certo (v. 5). Quando o indivíduo não adquire riquezas por meio do trabalho árduo, ele as adquire à custa dos outros. A literatura sapiencial egípcia compartilhava desses mesmos valores. “Adquirir propriedades na juventude como salvaguarda contra a pobreza na velhice; afastar-se de todos os meios maus de adquirir rique za; compartilhar a riqueza liberalmente e desfrutar as coisas boas da vida - esses são os ensinos básicos... [na] sabedoria egípcia clássica.”35 (1) Fundamentos éticos e teológicos da riqueza (10.2,3) Os versículos 2,3 estão firmemente ligados por sua sintaxe e pala vras.36 A estrutura externa apresenta os perversos - seu lucro não traz benefícios (v. 2a) e seu anseio é frustrado (v. 3b). Na parte central, a retidão livra da morte (v. 2b) e o reto não passa fome (v. 3a). Em 35. AEL, 3:152-53. 36. Chama a atenção o fato de ambos começarem excepcionalmente com lõ ’ + Hifil imperfei to e ambos empregarem, em ordem quiástica. os lexemas $dq e rs ' , primeiro como termos abstratos, “perversidade” em contraste com “retidão", e depois como adjetivos, “reto” em contraste com “ perverso”.
termos temáticos, ambos tratam da relação dos perversos/retos com os bens materiais. O versículo 2 diz respeito à segurança de suas vidas e o versículo 3 à saciedade dos seus apetites. Não são dois elementos des conexos, pois, em última análise, o apetite humano visa preservar a vida. Ao reunir os “tesouros obtidos mediante perversidade” no presen te com “aquilo que o perverso almeja o S e n h o r lança para longe”, o quarteto infere que a frustração do perverso e a satisfação do reto se dão num futuro indefinido, não necessariamente no presente. Até esse tempo de retidão pode acontecer de o reto passar fome (veja p. 163 Lc 4.2; 6.21; 1Co 4.11; 2Co 11.27; Ap 6.6). 2 A primeira admoestação do prólogo para prestar atenção na ins trução dos pais a fim de viver (1.8, 9) foi seguida imediatamente pela admoestação para não se juntar aos perversos em sua pilhagem, pois isso acaba em morte (1.10-19). Semelhantemente, o primeiro dito da Coleção II implica na necessidade de se obedecer aos pais, e o segun do adverte sobre a riqueza ilegal. Nos paralelos antitéticos do versículo 2, os tópicos, “os tesouros obtidos mediante perversidade” egoistamen te acumulados versus a “retidão” beneficente, formam seu cerne, e seus predicados antitéticos, “não têm nenhum valor” versus “livra da morte” sua estrutura externa.37 Os tesouros (ou tesourarias, ’ôserôí; veja 8.21) podem livrar o indivíduo da aflição futura. Mas quando são obtidos mediante perversidade (reSa' veja pp. 164-165), não têm nenhum valor eterno (“não trazem beneficio” ou “não são úteis” [yô'ilü\). Y l ocorre 17 vezes em textos proféticos, incluindo 1 Samuel 12.21, e seis vezes em textos de sabedoria (Jó 15.3; 21.15; 30.13; 35.3; Pv 11.4), e sempre se refere a opções individuais e à utilidade em ques tões de ética e teologia, não a “uma ‘utilidade’ neutra, profana ou até mesmo eudemonística”. Em Provérbios y'l é sempre negativo com re ferência a riquezas: “de nada aproveitam no dia da ira”, e sempre apa rece em paralelismo antitético com “mas a retidão livra da morte” (11.4). De acordo com Saebo, “O verbo é inteiramente teológico”.38 Retidão (sedãqâ\ veja pp. 149-150), em contraste com “tesouros obtidos medi ante perversidade” tem seu sentido mais específico de “misericórdia” ou “benignidade” (cp. SI 22.31 [32]; 31.1 [2]; 51.14[16]; 69.27[28]; 103.17; 143.1, 11). Na literatura posterior ele indica “ofertas carido sas” (Dn 4.27[24]; cp. Tob. 12.9; Mt 6.1-4). Paradoxalmente, os per 37. Observe a assonância d e /o / no verseto A: lõ'-yô'ílú '6$erôt reSa. 38. M. Saebe. TLOT , 2:555, s . v . / / Hifil.
versos usam outros para entesourar bens materiais para si mesmos e perdem suas vidas, enquanto que os retos usam seus recursos para servir outros e entesouram vida para si mesmos. Livra (tassil; veja 2.12) da morte (mimmãwet) não significa “uma morte infeliz” (i.e., uma morte inesperada, prematura; de acordo com a Targ.). Até aqui, mãwet se referia à sepultura (veja 2.18; 5.5; 7.27), e não há motivo para qualificar o termo acrescentando “infeliz” neste caso (veja pp. 158-161). O termo “infeliz” é acrescentado para tomar o provérbio mais crível para a experiência humana, mas os retos com frequência sofrem uma morte física inesperada (Mt 23.35) ainda que tenham a vida espiritual e eterna (veja pp. 161-164). O Salmo 49, um salmo sapiencial, ensina claramente que as riquezas acumuladas, quer pela insen satez, quer pela sabedoria, não podem impedir a pessoa de experimen tar a sepultura (49.7[8]), mas Deus remirá os retos dela (49.14, 15[ 15, 16]).39O provérbio pressupõe que é possível acumular riquezas às quais está apegada a perversidade (cp. 1.13) e indica claramente que não existe um cálculo exato entre virtude e suas recompensas e o vício e suas retribuições. Os tesouros acumulados para repelir a morte são enganosos; no tempo do julgamento (cp. 1.26, 27) eles se mostrarão inúteis (cp. 18.11). A riqueza do homem rico (cp. 10.4), apesar de lhe dar prazer por algum tempo (cp. 20.17), causa a morte de outros e dele próprio (cp. 1.10-19) e não salva ninguém - nem a ele mesmo, nem ao necessitado, nem à sociedade. 3 Num paralelo quiástico e antitético o versículo 3 fornece o racio cínio teológico por trás do aforismo do versículo 2. O S e n h o r ( YHWH\ veja 1.7) é o agente que alimenta o reto faminto e faz o cobiçoso passar fome (veja pp. 120-124). Não permite que... permaneça insatisfeito (lõ'-yar'ib) é uma sinédoque para todos os apetites que sustentam a vida. O apetite (nepeS; veja p. 140) do reto (saddiq', veja 10.2) anseia pela vida, e esse anseio é satisfeito na salvação da morte. O singular ressalta que isso se aplica a cada indivíduo. Aquilo que o perverso almeja (hawwat ^Sã'lm ) representa o apetite desenfreado, descon trolado e cobiçoso daqueles que não estão dispostos a viver dentro dos 39. Ptah-hotcp diz: "A injustiça nunca é bem-sucedida em seus empreendimentos. [Pode ser que) a fraude traga riquezas, [mas] a força da justiça é que dura” (ANET, p. 412). O Talmude associou a retidão com a vida depois da morte: “A boa obra salva da morte, e não apenas da morte inatural, mas da morte em si” (Shabbat 156b; também cp. Baba Bathra 10a; Rosh HaShana 16b, citado por Meinhold, Sprüche, p. 167). “Os provérbios ainda são recitados em alguns cemitérios enquanto os presentes são convidados a fazer uma doação” (Plaut, Proverbs, p. 126).
limites da ordem de Deus (cp. 2.22; 3.25; 11.6).40 O plural indica que não há exceções. “Em termos ideológicos, a questão central [do an seio] é que o homem deve dar ouvidos à voz de Deus e se adaptar às ordenanças de Deus a fim de ser capaz de agir retamente. Quando o homem rompe com Deus e não obtém dele sua sabedoria... toma-se um rasha', ‘perverso’, ou boghedh, ‘traiçoeiro’, que segue os impulsos e desejos desordenados do seu coração mau, que conduzem à malícia, mentira, perversidade, opressão, etc.”41 Ele despreza (yehdõp) sugere que aquilo que os perversos desejam é uma metonímia para a prosperi dade acumulada a fim de satisfazer seu apetite desenfreado. No final, o autor de toda a vida alimenta os seus santos, ainda que eles sintam fome por algum tempo - e, por fim, retém esse alimento de seus inimi gos (cp. 21.13; 22.16; 23.17,18; 24.16,20; 28.20; cp. Dt 8.3; SI 34.10[ 11]; 37.2, 3; Is 33.16; 65.13; Mt 6.32, 33; Lc 1.53; Ap 7.16). Aqueles que não usaram de misericórdia para com seus próximos para adquirir seus tesouros (21.10) e que fecharam os ouvidos ao clamor dos pobres, des cobrirão que os seus clamores não serão atendidos (1.24-31; 21.13). (2) O fundamento prático da riqueza (10.4, 5) Os versículos 4, 5 contrabalançam as afirmações teológicas dos versículos 2,3 com teologia prática: a diligência versus a indolência (v. 4) e a necessidade do trabalho oportuno (v. 5). Sua estrutura externa trata da pobreza e da vergonha (vs. 4a, 5b), e sua parte central da riqueza e da prudência (vs. 4b, 5a). Os dois ditos práticos acerca da riqueza (vs. 4, 5) estão ligados fonética42 e tematicamente. Ensinam que a diligência, o contentamento, a economia e a previdência produzi rão riqueza e protegerão da pobreza (cp. 12.11; 13.4, 11; 14.23; 18.9; 19.15; 20.4, 13; 21.5, 6, 17, 20, 21, 25; 28.14b, 24, 27), e devem ser considerados com os contraprovérbios que pressupõem que, tempora riamente, os justos podem ser pobres e os perversos podem ser ricos em função da tirania dos últimos.43 O trabalho dos retos será recom 40. S. E rlandsson (TDOT, 3:356-58, s.v. h a v v S h ) rejeita a opinião de G uillaum e de que h a w w â significa “ordem , m aldição” , ainda que o ugarítico h w t pareça estar relacionado ao
acadiano awBiu am ãtu (palavra) e ocorra em oito de seus 16 usos com órgãos da Tala ou ao lado de uma palavra que indica o ato de falar. Ele sugere que significa “tanto a raiz interior do m al, *o d esejo d eso rd en ad o ’ quanto as suas conseqüências, falsidades, perversidades, engano e in fortúnio". 41. Erlandsson, TDOT, 3:357, s.v. havm h. 42. O bserve a assonância de seu 'B é e h (“aquele que faz” ) e Tigir (“aquele que ajunta"). 43. Veja 1.10-19; 10.2a; 21.6.
pensado num futuro que se estenderá além da morte (veja 10.2,3; lTm 4.8). 4 Nos paralelos antitéticos do versículo 4, os agentes, “palma negli gente” versus “mão diligente” constituem a parte central, e os predica dos, “um pobre é feito” contrastando com “traz riqueza” constituem sua estrutura.44 Um pobre (rã ’$) indica alguém que não tem meios de subsistência45. Efeito Çõéeh; veja 2.14) é um oximoro: a mão negligen te, que não é capaz de realizar nada positivo, forma um homem pobre. Palma (kap) indica o membro do pulso até a ponta dos dedos e funcio na como uma sinédoque para o preguiçoso. O caos está sempre amea çando desmanchar a ordem criada e, se for deixado por sua conta, sem o cuidado da diligência, destrói a riqueza obtida com trabalho árduo (24.30-34). Negligente (r*miyâ) indica um arco frouxo e solto no Sal mo 78.57; Oseias 7.16 e um comportamento preguiçoso, negligente e relaxado em Jeremias 48.10 (veja Pv 12.24, 27; 19.15); ele envolve descuido e negligência. No paralelo quiástico, bastante comum a kap, mão (yad) indica o membro que vai do cotovelo até a ponta dos dedos e funciona como uma sinédoque para a pessoa diligente. Os diligentes (hãrüsim) são previdentes, não apressados (veja 21.5), acumulam ri queza (veja 10.24; 12.27; 13.4), e alcançam poder e domínio (veja 12.24). Seu paralelo antitético é r^miyâ aqui e em 12.24, 27, e seus paralelos sinônimos são “preguiçoso” (13.4, 'õsêZ; veja p. 170) e “apressado” (21.5). O oposto de miyâ é constância, atenção e persistência num esforço para realizar algo. Essa mão traz riqueza (ta'asir\ i.e., a situ ação de adquirir uma grande quantidade ou depósito de bens valiosos). A riqueza adquirida por meio da virtude é um bem positivo, quer ex pressa pelo substantivo 'õSer (veja 14.24; 22.4) ou pelo verbo 'ãSar (Hifii, veja 10.22; 21.17), mas isso não se aplica quando é adquirida por meio do vício (11.16; 23.4; 28.20; veja pp. 156-157).40 5 O contraste entre a indolência e a diligência é apresentado de modo concreto pelos paralelos antitéticos do versículo 5. A repetição de palavras, em combinação com o padrão de sons, reforça a antítese nítida dos retratos neste provérbio. 44. As duas m etades são ligadas pela consonância dc !rí em quatro de suas seis palavras: rã '$
'õéeh kap-r^miyâ ufiyad hõrãçim t a “$ír. 45. Veja 13.8,23; 14.20; i 7.5; 18.23; 19.1. 7; 22.2, 7; 2 8 .3 ,6 ; 29.13. 46. R. E. Murphy, “ Proverbs 22:1 -9”, Iní 41 (1987)401. O texto egipcio Instrução de Ani (5.14) ensinava: “aquele que é negligente não dá em nada” (AEL , 2:139).
A. 'õgêr baqqayiç bên maékil: aquele que ajunta no verão, um filho prudente. B. nirdSm baqqãsir bên mêbis: aquele que dorme na colheita, um filho que causa vergonha. Em cada caso, os paralelos no nível semântico são contrastantes ou sinônimos; mas em cada caso também ecoam no nível fonético. semântico: a. b. fonético:
oposição ’gr nrdm repetição Irl
equivalência baqqayiç baqqãsir repetição Ibaqqçl
equivalência bên bên
repetição bên
oposição maékil mêbis repetição Im, (é~ S)/.A1
Um filho (bên', veja 10.1) que ajunta [seu alimento] ( ogêr) no verão (baqqayis) é como a formiga exemplar (veja 6.8). Ele represen ta todo filho ou filha que dá alegria aos pais se tomando digno da honra de ser declarado prudente (maékil; veja p. 146). José aproveitou a oportunidade que teve de preparar e preservar sua vida para um futuro que, de outro modo, não tinha nenhuma perspectiva (Gn 41.46-57; cp. Jo 9.4). Entretanto, aquele que dorme (nirdãm) indica uma pessoa num estado de sono tão profundo, traumático e entorpecido que se en contra inteiramente inconsciente de tudo ao seu redor (veja Jz 4.21; SI 76.6[7]; Dn 8.18; Jn 1.5, 6; cp. Pv 6.6-11). Na colheita (baqqãsir) enfatiza a urgência de sua situação (veja 6.8; Jr 8.20). E um filho que causa vergonha (mêbis; veja n. 18) provavelmente significa que seus pais se propuseram a ter um filho, mas tendo fracassado em sua educa ção, sofrem agora a tristeza da vergonha pública. Também pode signi ficar que ele trouxe opróbrio público sobre si mesmo em seu empreen dimento agrícola fracassado.48 c. Efeitos do modo de falar sobre si mesmo e sobre os outros (10.6-14) A subunidade que trata da comunicação apresenta partes do corpo no primeiro versículo de cada quarteto: “cabeça” e “boca” (v. 6), “co ração” e “lábios” (“tagarela”; v. 8), “olhos” e “lábios” (tagarela; v. 10), 47. T. P. M cCreesh, BiblicalSoundandSense: Poelic SoundPattems in Proverbs 10-29 (JSOTSup 128; Sheflfield: Sheffield Academic, 1991), p. 126. 48. Para o significado de bôs com o um em preendim ento m alsucedido, veja H. Seebass, TDOT, 2:52, s.v. bôs.
“boca” (duas vezes; v. 11), “lábios” e “costas” (v. 13). A seção é divi dida em duas metades iguais de quatro provérbios antitéticos (vs. 6-9, 11-14) em tomo de um de janus central (v. 10). “A boca” é menciona da especificamente na introdução das duas metades (vs. 6b, 11a, b); sua menção novamente no versículo 14b forma um inclusio ao redor da seção. Os versículos 6-9 tratam dos efeitos da boa e da má comuni cação sobre o próprio indivíduo, e os versículos 11-14 falam dos seus efeitos sobre outros. O centro do versículo inverte esse padrão de for ma quiástica, apontando para a dor causada a outros pela comunicação inadequada no verseto A e ao próprio indivíduo no verseto B. As duas metades são introduzidas pela justaposição dos retos com os perversos (vs. 6, 11) com um jogo de palavras que chama a atenção (veja n. 29).Usando a mesma sintaxe, suas orações nominais nos versetos A descrevem o estado do reto e suas cláusulas verbais nos versetos B descrevem o destino dos perversos. Além do assunto central que de fende o modo de falar sábio, toda a seção é pontuada pelo tema do valor da sabedoria, especialmente nos ditos educativos dos quartetos (vs. 7,9, 13), como acontece no capítulo 5. (1) Sobre si mesmo (10.6-9)
6,7 Este quarteto está ligado por palavras-chave (i.e., “bênção[s]” - a primeira palavra em 6aoc e a última em 7a - e também “reto” e “perverso” nos versetos B) e pela sintaxe.49 O versículo 7 intensifica a bênção dos retos e as conseqüências malogradas dos perversos nesta vida para um futuro que se estende além da morte física. 6 Nos paralelos quiásticos antitéticos do versículo 6, “bênçãos” versus “violência” constitui a estrutura externa, e os predicados, “coro am a cabeça dos retos” versus “a violência oprime a boca dos perver sos” formam sua parte central. Os paralelos não são exatos, sugerindo que as bênçãos não coroam os perversos e que a violência não cobre a boca dos retos. Como nos versículos 1-5, cada verseto liga a conduta com as conseqüências.50 Bênçãos (berãkôt) indica o preenchimento de uma pessoa com vigor para reproduzir vida, produzir riqueza e ven cer inimigos. O plural indica tanto sua qualidade quanto sua quantidade 49. Sintaticamentc am bos consistem de cláusulas nominais com lamede introduzindo seu predica do nos versetos A e um a cláusula verbal nos versetos B. 50. A tradução gram aticalm ente possível “a boca do perverso esconde violência (de acordo com a Targ., NRSV et al., versus a LXX, Sir, KJV, JPS, NI V, et al.) destrói esse paralelism o e o padrão.
(i.e., todos os tipos de bênçãos, e.g., a geração de filhos, o crescimento dos rebanhos e aumento das colheitas). Seu conceito de riqueza forma um janus entre a unidade anterior sobre riquezas e esta seção sobre o modo de falar. As mãos prudentes e a boca prudente produzem bên çãos. Convém observar que tanto o versículo 4 quanto o versículo 6 se referem a partes do corpo.51 Uma pessoa que reparte bênçãos é um nepeS berãkâ (11.25), mas mesmo quando não é mencionado explicita mente Deus é sempre considerado o doador da bênção.52A LXX deixa isso claro (veja n. 19). A “bênção” do Criador pode ser mediada por uma pessoa sagrada, como um patriarca (cp. Gn 27.7), um sacerdote (cp. Lv 9.23), um rei (cp. 2Sm 6.18), um moribundo (cp. Jó 29.13), e/ou a congregação sagrada (cp. 11.26). Aqui as “bênçãos” são as palavras de bênção que o povo profere em oração sobre a cabeça dos retos (cp. Rt 2.4; 3.10). Quando as bênçãos são mediadas por outros, as palavras e o poder abençoador se tomam conceitos misturados. De acordo com a expressão idiomática hebraica, as bênçãos vêm sobre a cabeça da pessoa recompensada (cp. Gn 49.26). Os retos (veja pp. 149-150) fa zem a comunidade prosperar e enriquecer, e as bênçãos da comunida de o recompensam. Assim como o S e n h o r recompensa os retos com prosperidade por meio das bênçãos da comunidade grata e piedosa, tam bém recompensa os violentos e opressores com a violência de outros (cp. 1.19).A violência [veja 3.31] cobre (y6kasseh) significa essencialmente colocar a violência sobre a superfície dos perversos (veja pp. 164-165) e, nesta passagem, indica “ocupar a superfície de” (= “cobrir”) e não “cobrir de modo a esconder” (como em nossa língua, “encobrir”, “ocul tar”, “dissimular”) como é o caso em 10.1 lb. A boca (veja 2.6) é uma metonímia para as suas palavras hostis. As maldições injuriosas proferi das por sua boca se voltam contra eles e os calam (cp. Hc 2.17).53 7 Agora os retos (veja pp. 149-150) são investidos de imortalidade e influência sociais (veja SI 112.6). São invocados ou “mencionados” (zêker; lit. “memória”) indica a atividade cognitiva ativa com pessoas ou situações mediante retenção e recuperação de impressões acerca das mesmas, proclamando-as a outros.54 Em bênçãos (veja v. 6, n. 22), de acordo com Scharbert, “provavelmente tem em mente a fórmu 5 1. De acordo com K. M. Heim, "Structure and Context in Proverbs 10:1-22:16”, (dissertação de Ph.D.,University ofLiverpool, 1966). 52. J. Scharbert, TDOT, 2:282, s.v. brk. 53. Delitzsch, Proverbs, p. 154, dando crédito a Fleischer. 54. H. Eising, TDOT, 4:66, s.v. zSkar.
la bãrükh[i.e., “bem-aventurado seja”] usada por uma pessoa piedosa. A menção (zeker) dos retos se dava para (com o propósito de) abenço ar”.55 Em resumo, o verseto A significa “O nome de uma pessoa reta é mencionado para invocar uma bênção sobre alguém”. Entretanto, a sina dos perversos e egoístas além da morte combina com sua vida inúltil: ambas não têm valor algum. Seu nome representa seu caráter e funções; não é apenas um rótulo de identificação. Em vários casos “nome” também eqüivale a memória (cp. Êx 3.15; SI 97.12; 102.12[13]; Os 12.5[6]). O nome de todos os perversos [veja pp. 164-165] apo drece (yirqãb) no esquecimento, como a madeira carcomida (veja Is 40.20; Os 5.12). As poucas outras ocasiões em que a raiz rãqab é usada ela indica evaporação ou aniquilação (cp. LXX, “é extinto”). A metáfora provavelmente foi escolhida para associar a aniquilação do nome/ memória dos perversos com seu corpo se decompondo na sepultura. Deus apaga somente o nome/memória dos perversos (cp. SI 9.6[7]; 34.16[ 17]; 109.15]). No entanto, a condição abençoada da memória dos retos além da morte deve ser qualificada por outras realidades. “Debaixo do sol”, os mortos são esquecidos (Ec 9.5) e, como o Marco Antônio de Shakespeare declarou, “O mal que os homens praticam vive depois de les; o bem com frequência é sepultado com seus ossos”.56 Porém, o provérbio olha para o fim da questão (veja pp. 162-163). De acordo com a teologia posterior, os retos receberão novos nomes (Ap 2.17). 8,9 Esses versículos estão ligados em termos sintáticos57 e concei tuais. Seus versetos A representam o estilo de vida dos sábios, e seus versetos B o perecimento dos perversos. O último conceito se desen volve no versículo 7b. O versículo 8a apresenta a educabilidade dos retos, e o versículo 9a sua segurança decorrente. “Lábios” (traduzido como “tagarela”; cp. n. 24) no versículo 8b e “toma perverso” (tradu zido como “torce os seus caminhos”) no versículo 9b, normalmente uma referência ao modo de falar perverso, dão continuidade ao assunto dos versículos 6-14. 8 O sábio [veja p. 145] de coração (veja p. 141), em contraste com “o sábio a seus próprios olhos” (cp. 3.7), sabe que ele necessita de instrução e a recebe de bom grado (veja 9.8b-12a). Esse discernimento lhe confere o título de “criterioso” (veja 16.21; p. 147). Ao reconhecer 55. J. Scharbert, TDOT, 2:299-300, s.v. brk. 56. Julins Caesar, 3.2. 57. Um Nifal imperfeito, 3* pessoa, masc. sing. conclui os vs. 7-9, ligando os vs. 8, 9 ao v. 7.
as limitações do próprio coração, ele aceita (yiqqah; veja 1.3) humilde mente as ordens (miçwôt; veja 2.1) dos mestres sábios inspirados (cp. 1.7, 8; 2.1-6). Enquanto os sábios de coração são caracterizados pelo crescimento espiritual interior e contínuo que conduz a um modo de falar sábio (16.23), o insensato tagarela (lit. “lábios”; ^w il, veja pp. 167-168) despreza a sabedoria e a disciplina (1.7). O insensato está tão cheio de si que, em vez de ter a capacidade de aceitar a sabedoria, matraqueia perigosamente acerca das próprias “opiniões inteligentes” que são desprovidas da verdadeira sabedoria (cp. 10.13) e que quei mam como fogo (cp. 16.27). Ele se enreda com suas palavras indisci plinadas e cai em ruína (yillãbêt; veja Os 4.14). Ao vitimar outros, os insensatos vitimam a si mesmos e se tomam escravos dos “sábios de coração” (cp. 11.29). É melhor ser pobre do que ter lábios perversos (cp. 19.1). As antíteses não são exatas, o que sugere que os sábios não são “balbuciantes”, que os insensatos são incorrigíveis, e que os educáveis não caem em ruína. A humildade salva o sábio (cp. 4.10-19). Seu coração guia sua boca (cp. 16.23), o que, por sua vez, o salva (cp. 5.2; 12.19). O provérbio implica que a aceitação das ordens revela que o sábio de coração e o insensato tagarela podem ser reconhecidos pelo fato de obedecerem ou não as ordens.58 9 Aquele que anda (hôlêk\ veja 2.7), implicando “caminho” (cp. 1.11, 15), na irrepreensibilidade (battõm; p. 151) anda seguro (cp. 1.33; 3.23,24; 4.10-19).59Entretanto, o que torce (m e'aqqê§; lit. “torna tortuosos [ou perversos]”; veja p. 308) os seus caminhos (derãkãyw; veja 1.15) - o plural serve para indicar seus muitos desvios dos padrões de Provérbios (veja 2.8; 3.7) - será conhecido (yiwwãdêa') e, conse quentemente, sofrerá dano (cp. n. 25; 5.14), sem especificar o agente. Em suas cinco ocorrências em Provérbios (11.20; 19.1; 28.6,18), o par de palavras hebraicas tãm-iqqêS, “irrepreensível”/ ‘tortuoso” (ou “per verso”) serve para definir a relação entre o indivíduo e a comunidade. Brueggemann observa que uma pessoa de integridade (tãrn) aceita o próprio interesse em termos de sua solidariedade para com a comuni dade saudável. Ele encontra força e aprovação no contexto da edifica ção da comunidade.60 Não é traiçoeiro (p. 165; 2.21,22), mas os 'iqqês são associados ao modo de falar perverso (veja 4.24; 6.12). As pala 58. Plõger, Sprüche, p. 125. 59. A aliteraçâo do v. 9a é impressionante: hõlik batSm yllek befah. 60. W. Brueggem ann. “A N eglected Sapiential Word P air", ZA W 89 (1977)244.
vras destrutivas e tortuosas dos perversos solapam o bem-estar de ou tros em vez de edificá-los. (2) Janus (10.10) O dito central, que liga o par de quartetos nos versículos 6-14, é marcado pelos seus paralelos sintéticos negativos ( - ::- ) em contraste com os paralelos antitéticos dos seus quatro quartetos. Ele está ligado aos versículos 6-9 pela repetição literal do versículo 8b no versículo 10b e pela sintaxe.61 Ele se une ao versículo 11 fonética62 e conceitualmente, apresentando de modo quiástico o uso e o abuso das partes do corpo na comunicação secreta e destrutiva (vs. 10a, 1lb). Os paralelos sintá ticos do versículo 10 apresentam como assuntos complementares dois tipos de má comunicação: gestos secretos e maliciosos e tagarelice despropositada. Seus predicados declaram seus efeitos danosos: sofri mento para outros e ruína para aquele que fala. O que maliciosamente pisca o olho (veja 6.13) faz um gesto antissocial insidioso que causa (yittên; lit. “dá”)problemas Çassãbet; veja 15.13; Jó 9.28; SI 16.4; 147.3) sérios.63As cinco ocorrências de 'aç§ebet se dão em textos poéticos e se referem à tristeza ou dor interior e aqui em conexão com os conflitos sociais. O encrenqueiro causa dor a outros, mas é possível que se tenha em vista também uma reação correspondente. Apesar do texto da LXX não ser original (veja n. 28), ele afirma o fato de que enquanto os gestos hostis do encrenqueiro perturbam a comunidade, “aquele que repreende abertamente” promove sua cura (cp. Lv 19.17; Pv 25.12; 27.5; 28.23). (3) Sobre os outros (10.11-14) O jogo de palavras com p i r^s&im ^ka sseh hãrríãs (= “a violência oprime a boca dos perversos”) no versículo 6, versus “a boca dos per versos esconde violência”, no versículo 1la, revela as diferenças con ceituais das duas subunidades. A primeira (vs. 6-9) trata das conse qüências negativas da má comunicação sobre o próprio indivíduo, e a segunda metade (vs. 11-14) de seus efeitos sobre os outros. 1 1 ,1 2 Estes versículos estão ligados pela palavra-chave “esconde/ 61. O s vs. 9a c 10a com eçam com particípios Qal e os vs. 9b e 10b term inam com Nifal im perfeitos, 3* pessoa, m asc. sing. 62. Observe a seqüência Iq ri em qõrêç e m eqôr. 63. No Salm o 147.3 'a$$ebet é uma m etonimia para “ feridas”.
oculta” e pelo som.64 Em termos sintáticos, ambos são estruturados de forma quiástica internamente e um em relação ao outro. No versículo 11 os tópicos constituem a parte central e, no versículo 12, a estrutura externa. Em termos conceituais, o versículo 12 investiga as atitudes por trás da boa e da má comunicação do versículo 11. 11 O círculo virtuoso da comunicação construtiva consiste do cora ção sábio que guia a boca [veja o v. 6] do reto (veja pp. 149-150; Mt 12.33-37) e informa aquilo que o ouvido ouve e que inclina o coração (veja pp. 141 -142; 2.1 -4). A boca do reto, os ensinos do sábio (13.14) e o temor do S e n h o r (14.27) são chamados de manancial (m eqôr; veja 5.18)de vida (hayyirn; veja pp. 157-161), equiparando implicitamente o reto ao sábio e ao piedoso. A dependência da vida da água é experi mentada existencialmente por toda a terra, especialmente no antigo Ori ente Próximo, onde a água não é abundante. As fontes de água corrente são particularmente preciosas (cp. Jr 2.13), e as pessoas se reúnem em tomo delas. O modo de falar sincero e benevolente do reto é igualmente necessário para a comunidade, oferecendo a todos vida abundante temporal, intelectual, moral e espiritual. A palavra certa, dita na hora certa (15.23) e na forma certa (15.1; 17.27), sustenta ou corrige uma comunidade de uma maneira que promove sua vida. Enquanto a comu nidade se reúne em tomo do modo de falar sincero da pessoa honesta a fim de viver, a boca {pi) dos perversos veja v. 7) esconde violência (y®kasseh hãmãs\ veja 10.6) de maneira hipócrita, pois para ser bem-sucedido, o modo de falar egoísta deve ser velado. 12 0 quarteto trata agora da fonte de toda comunicação construti va e destrutiva, a saber, a maneira como as pessoas veem aqueles que as afrontaram e, desse modo, mostra o caminho para a reconciliação. O ódio (sin ’â; veja 1.22) está arraigado na repulsa subjetiva da pessoa em relação a outrem, a julgar pelo paralelo, provavelmente a um trans gressor. Aqui o ódio personificado desperta (t?'ôrêr\ cp. Jó 3.8; Ct 2.7; Is 14.9; Zc 9.13) conflitos ou dissensões personificadas (medãnim\ veja 6.14) do seu sono entorpecido. Agora despertos e plenamente ati vos, os conflitos transbordam em embates violentos entre o ofendido e o ofensor. Porém, aquele que odeia pode travar suas batalhas sob um disfarce de amizade (26.26; cp. v. 11b). O amor ( ’ahabâ; veja 1.22; 64. O bserve a aliteraçâo de p i r^Sã^m (v. 11) e p eSS'im (v. 12b) e, possivelm ente, a consonância das sibilantes seqüenciais r^S&ím ^ kasseh hõmãs áin’á.
5.19), ao contrário, trata bem o ofensor, como um amigo a ser conquis tado, não como um inimigo a ser vencido por vingança (1.22). O amor personificado cobre (ou coloca um véu sobre, y^kasseh; veja v. 11) todas [todo tipo de, kol] as transgressões (pesã'im ). PeSa' indica ofen sas contra propriedades (Êx 22.9[8]) e pessoas (Am 1.3, 6, 9, 11, 13; 2.1, 6), inclusive violações claras dos direitos pessoais (e.g., Am 1.6). Também pode se referir ao processo de cometer um crime. O verbo pãsa' significa uma rebelião ou estado de hostilidade entre pessoas ou nações (cp. 1Rs 12.19; 1Rs 1.1; cp. 2Cr 10.19). A oração de Salomão na consagração do templo reconhece que os p eS a im cometidos por Israel contra o S e n h o r podem ser remediados somente por suas mise ricórdias (cp. também Is 1.2; 43.27; Jr 2.29; Ez 2.3; Os 7.13). No cál culo do céu, aquele que ama baixa a cortina de modo a esconder todas as transgressões, por mais numerosas e terríveis que sejam (Tg 5.20; 1 Pe 4.8). Em vez de colocar o transgressor no palco e abrir as cortinas para expor suas faltas (veja 17.9) e, desse modo, executar vingança, o amor suporta suas injúrias a fim de promover a reconciliação, salvar o transgressor da morte (cp. 25.21,22; ICo 13.4-7; Tg 5.20) e preservar a paz (cp. Pv 19.11). O amor remove do fogo a lenha que alimenta a fofoca (17.9; 26.20,21), mas o indivíduo briguento e esquentado incen tiva o conflito, fazendo-o adquirir proporções desastrosas e produzindo ainda mais transgressões (26.21,22). Este dito deve ser contrabalança do pela verdade de que um amigo espiritual corrige o pecador trans gressor (cp. Lv 19.17; Pv 7.6; G1 6.1). 13,14 Estes versículos estão ligados pela raiz hkm (hokmâ “sabe doria” [v. 13a], hakãm im , “sábios” [v. 14a]) e pelas metonímias para o ato de falar: “lábios” (v. 13a) e “boca” (v. 14b). Como em 10.2 e 3, existe uma associação de qualidades abstratas (retidão [v. 2]; sabedo ria [v. 13]) com aqueles que alcançaram essas qualidades (reto [v. 3]; sábio [v. 14]). Juntas, elas mostram que os insensatos devem ser corri gidos tanto pela disciplina física quanto pela repreensão (veja também 26.3-5). Eles não são capazes de salvar a si mesmos, pois se voltam para a sua insensatez como os cães voltam ao seu vômito (26.11). 13 Nos lábios (beéiptê; veja v. 10) de uma pessoa criteriosa (riabôn; veja p. 147) mostra que a fonte do modo de falar magistral é o caráter da própria pessoa que considera e compreende a situação e seus resultados (veja 1.5). A sabedoria (hokmâ; pp. 124-125) que vem de Deus por intermédio do ensino fiel, agora se acha (timmãsê’; veja
2.5) nos lábios para motivá-lo e guiá-lo (veja 1.5). Porém, para controlar a energia bruta do insensato é preciso o uso da força, não apenas das palavras (10.14; 14.3; 18.6, 7; 19.29; esp. 26.3; cp. SI 32.9). A vara (Sêbe() indica a parte da árvore a partir da qual se pode confeccionar um bastão ou uma arma. Um indivíduo em posição de autoridade, como Deus (Jó 21.9; 37.13), um pai (13.23,24; 22.15; 29.15), ou o Messias (SI 2.9) a usavam para a disciplina física de um escravo (Êx 21.20), de um insensa to (Pv 26.3) e de um filho (13.24; 22.15; 23.13, 14; 29.15; cp. 2Sm 7.14; Is 10.15). A surra corretiva com a vara era aplicada nas costas (legêw; cp. 19.29; 26.3b) daquele que é falto de senso (hasar-lêb; veja 6.32). 14 Os sábios (hPkãmim; veja 10.1, 13) entesouram (yispenü; veja 2.1) o conhecimento (dã'at; veja p. 125; 1.7) do livro de Provérbios para desativar a bomba-relógio na boca do insensato, que pode explodir a qualquer momento e abalar a comunidade. O poder terrível e destrui dor da boca (pi; veja 10.6b, 11b) de um insensato (^w il; veja 1.7; 10.8) faz os outros viverem com medo. Iminente (qerõbâ) indica a proximidade temporal do seu terror (mehittâ; veja n. 32)65. A boca do insensato, como a da adúltera, está sempre por perto, pronta para explo dir (cp. 5.1-6; 7.1-5; 26.1-12; cp. 14.3). O plural sugere que o sábio age com outros, não isoladamente, para enfrentar a ameaça em comum. A reticência dos sábios no falar (10.19; 11.13; 12.23; 13.16; 15.2; 17.27) deve ser qualificada pelo fato de que eles não se eximem de sua respon sabilidade social de compartilhar seu conhecimento indispensável para a vida da comunidade (10.21,31; 11.10, 11; 15.7; 26.5). d. Riqueza e segurança (10.15, 16) O tema muda da comunicação (10.6-14) de volta aos bens ou ri quezas ('çr; veja 10.2-5). A palavra-chave m ehittâ (“terror”) e a fonologia ligam os versículos 13 e 14 aos versículos 15, 16.66 A palavrachave mostra que tanto o modo de falar noscivo quanto a pobreza po dem ser um terror, assim como a “bênção” é devida tanto ao trabalho (vs. 4, 5) quanto às palavras (vs. 6-9). Os quartetos também podem ser ligados pelos conceitos de entesourar palavras explicitamente no versí culo 14a e riquezas implicitamente no versículo 15a. Os versículos 15, 16 estão ligados pela sintaxe e por termos pertencentes à esfera se 65. HALOT (3:1139, s.v. qSrôb) e BDB (p. 898, s.v. qõrôb) restringem o sentido aqui á pro x im id ad e tem p o ral. 66. Observe a seqüência de !q, ri em qerõbâ (“ iminente”, v. 14b) e qiryaí (“cidade”, v. 15a).
mântica da riqueza. “Rico” e “pobre” no versículo 15 se referem ao status econômico, e “salário” e “rendimento” no versículo 16, à sua renda e uso.67 O versículo 16 qualifica a segurança do dinheiro. A fim de que ninguém valorize sua segurança excessivamente, ela é justapos ta com a segurança moral: a retidão dá vida eterna; a perversidade gera pecado e morte. A relação nos versículos 15 e 16 é equiparada pelo par proverbial 18.10,11: “É impossível ler 18.11 (e 10.15) sem considerar os argumentos significativos que são apresentados em 18.10, 12. O nome do S e n h o r (18.10); (e não os ricos! 18.11) é a torre forte que oferece segurança e o orgulho [do rico] antecede sua queda (18.12)”.68 15 Metade das dez ocorrências de riqueza (hôn\ veja 3.9) nos pro vérbios de Salomão instrui os jovens a estimá-la (12.27; 13.7; 19.14; 29.3; cp. 19.4), e a outra metade, a não confiar nela. Quando adquirida apressadamente, ela definha pouco a pouco (13.11; cp. 28.8, 22; 29.4) e não tem valor algum no dia da ira (11.4). Este provérbio declara tanto suas características positivas quanto as negativas. O rico ÇãSír) em todas as suas formas de uso, com exceção de 18.11, é justaposto a “o pobre”. Os dois estados são avaliados de modo negativo. Apesar de 15.16 deixar implícita a vantagem do rico sobre o pobre, a maneira como o mestre sábio trata “o rico” “não é nada simpática” e este é “sempre considerado com hostilidade”.69 Sua riqueza o engana, fazen do-o pensar que ela provê verdadeira segurança (18.11); ela o seduz de modo a se tomar sábio aos próprios olhos (28.11), um estado pior que o do insensato (26.12); e o leva a tiranizar o pobre (22.7; cp. 2Sm 12.1 ss.) e lhe responder com aspereza (18.23). Aquele que lhe dá presentes empobrece a si mesmo (22.16). “Cujos caminhos são perversos” (cp. 28.6) provavelmente é uma cláusula não restritiva (i.e., descreve cada 'ãsír, cp. Is 53.9). As outras referências ao “rico” também devem ser entendidas como avaliações negativas (14.20; 22.2,7). As riquezas são passageiras (23.5); quando excessivas, seduzem a pessoa a negar a Deus (30.8, 9); quem confia nas riquezas cairá (11.28a), mas quem confia no S e n h o r está seguro (3.5; 18.10; 22.19). O rico pode ter segu 67. E stes quatro term os sâo genitivos, e os quatro versetos são form ados por cláusulas nom inais com o padrão sujeito, predicado e avaliação positiva da riqueza, seguida de uma negativa. Nenhum dos dois ditos apresenta a conjunção ufi (“e/m as” ) para ligar seus paralelos, ao contrário dos vs. 6-14. 68. Murphy, “ Proverbs 22: i -9”, Int 4 1 (1987) 4 0 1. 69. R. N. W hybray, Wealth andPovertv in lhe B o o ko f Proverbs (JSO TSup 99; Sheffield: JSOT, 1990), p. 22.
ro para todos os seus bens e ter dinheiro no banco para tempos difíceis, mas quando a morte chegar, sua insuficiência moral o arruinará (Sl 49; Lc 12.13-21). Fortificada (ou forte, 'uzzô) indica uma cidade (qiryat, o equivalente poético de 'ir) firmemente assentada e inviolável; é forti ficada com muros altos que podem resistir a um cerco (veja 8.28b); seu paralelo em 18.19 é “ferrolhos de um castelo”. Sua é irônico; a riqueza material é a segurança do “rico” iludido; ele apenas imagina estar segu ro, como o paralelo literal em 18.11 deixa claro (cp. Jó 27.19). O pro vérbio também adverte acerca da pobreza. O terror (mehittat veja 10.14b) se refere ao suspense, ao medo e às preocupações constantes em razão da ruína iminente. A morte, a fome, o trabalho forçado, a injustiça e a tentação de roubar estão sempre rondando os necessitados. Dos pobres (dallim ) traduz outra palavra além de rã’s que ocorre com mais frequência e é traduzida como “pobre” (veja 10.4). Whybray não encontra distinções importantes entre as duas palavras.70 Ambas são antônimos de 'ãsír e apresentam as mesmas predicações. No entanto, ele observa que o verbo “oprimir” (‘ãSaq) é usado nesses capítulos ape nas com dal, indicando que os pobres não têm poder para se defender. Consequentemente, a sua pobreza (rêSãm; i.e., suas privações dos ele mentos mais necessários da vida [veja rã’S no v. 4]) lhes causa pânico. 16 Os paralelos antitéticos do versículo 16 concordam fonética sintaticamente.71 O dito protege a declaração descritiva do versículo 15 do abuso como um dito moral. A fim de ter valor duradouro, as riquezas devem ser adquiridas por meio da retidão, não da perversidade. Salá rio (pe'ullat) se refere ao trabalho árduo recompensado (2Cr 15.7; Jr 31.16). O salário do reto (saddiq; veja 10.2, 3) certamente (le; veja n. 33) não é nada menos do que a vida (hayyim) eterna abundante. Seu oposto, o “pecado”, implica vida espiritual (vejapp. 157-161 esp. 158). Somente o S e n h o r , o autor da vida, pode pagar esse salário (veja v. 3). O rendimento [ou receita; t?buat\ veja 3.9] do perverso (rãsã'\ veja 10.2, 3) é obtido por meio do trabalho antissocial e egoísta. Somente Deus pode sustentar a ordem moral que liga os atos às suas conse qüências. Certamente é (le; veja n. 33) ressalta a certeza igual do as pecto negativo. Pecado e morte (ha(tã’t; 1.10), com outros substanti vos derivados da raiz h t’ em geral se refere a transgressões objetivas 70. W hybray, Wealth andPoverty , pp. 14-22. 7 1. Observe a assonância d cp e ullat e fibü ’at, seguida pelo lamede enfático raro (“certam entc” ), da consonância de Ihl c da repetição tripla do final Itl.
de um relacionamento comum. Aqui, a julgar por seu paralelo (“vida”), a expressão é uma metonímia para a morte associada ao pecado (veja n. 40). Assim como a vida implica no relacionamento com o Deus vivo (veja v. 11), o pecado implica toda uma esfera de conflito com ele, não em uma única ocorrência, meramente física. O pecado “diz respeito à esfera contínua da conduta observada por Yahweh, conduta esta que um dia ele castigará ou que deve ser expiada”.72 Nesta esfera de ação, o pecado gera mais pecado e morte (cp. Rm 6.23). 3. Ações e destinos do justo e do perverso contrastados (10.1711.31) Mais uma vez, um único provérbio educativo (10.17) introduz uma nova unidade que trata amplamente dos atos e destinos contrastantes dos retos e dos perversos (veja 10.1). A análise poética indica sete subunidades demarcadas de maneira mais ou menos clara e, em algumas ocasiões, suas respectivas unidades secundárias, sem contar o janus em 11.9. a. Introdução: efeitos sociais da obediência (10.17) 17 Aquele que guarda a instrução é um caminho para a vida,' mas aquele que abandona a correção fa z desviar.2 O provérbio educativo introdutório de 10.1 declarou os efeitos da educação dos filhos sobre os pais; este fala de seus efeitos sobre ou tros. Estejanus está ligado ao versículo 16 pela palavra-chave lehayyim (“certamente é vida/para a vida”) e facilita a transição de volta ao tema do modo de falar e, mais especificamente, a seus efeitos sobre outros (10.18-21). Aquele que guarda (Sômêr; veja 2.8) com o objeto instru ção (müsãr; veja 1.2) significa reter na memória (4.21), praticar e ob servar essa instrução (2.20; 4.4; 5.2; 7.1, 2; 8.32, 34). Esse filho é um caminho ('õrah; veja 1.15) para a vida (lehayyím), uma referência a 72. K. Koch, TDOT, 4:312, s.v. hã(ã'. 1. Apesar da tradução “o cam inho da vida guarda a instrução” (cp. Targ., Sir., e Vulg.) ser gram a ticalmente possível, ela fornece um paralelo inadequado para o verseto B. Neste paralelism o quiástico, o “cam inho da vida” é o paralelo antitético de “ faz desviar” na parte central m ais externa, sugerindo a antítese “aquele que guarda a instrução" e “aquele que abandona a correção” na parte central mais intema. 2. Ou “se desvia” , um Hifil (intransitivo) de um lugar (IBHS, p. 439, P. 2.2ss.; cp. Jr 42.20). O paralelism o favorece um Hifil de dois lugares com o objeto om itido (IBHS, pp. 436-37, P. 27.2a, b; cp. Is 30.28).
toda a esfera da vida em relação ao Deus vivo (veja 10.16). A metáfora para instrução, “um caminho para a vida” combina com a metáfora “manancial de vida” no versículo 1 1 .0 filho fiel fornece um caminho para a vida como um meio de salvação da influência contagiosa do apóstata. Entretanto, aquele que abandona (we'ôzêb; veja 2.13) a correção (tôkahat; veja 1.23) fa z desviar (mat'eh; veja 7.25) outros e/ ou a si mesmo do caminho da vida (v. 17a) para o pecado e a morte (veja v. 16b).3 Nenhum objeto é declarado, pois, como Rashi explica, “ele próprio e os outros” estão incluídos. Os apóstatas louvam os per versos (28.10) e procuram fazer convertidos, talvez para encontrar se gurança num consenso ignorante (cp. 1.10-19; 9.13-18). b. O modo de falar e as expectativas do justo e do perverso contrastados (10.18-32) 18 Quanto ao que esconde o ódio com lábios mentirosos e àquele que publica um relato injurioso, ele é um insensato.4 19 Ao multiplicar palavras a transgressão não cessa,s mas o que refreia seus lábios é prudente. 20 A língua dos retos é prata escolhida ,6 o coração dos perversos é de pouco valor. 3. Seus paralelos antitéticos são ligados pela assonância de fo!\ 'õrah ... SômSr ... 'ôzèb tôkahat. 4. A sintaxe é: nom inativo absoluto, sujeito, predicado ( IBHS , p. 131, P. 8.4.1b). O TM apresenta uma quebra de verso que com bina o particípio no verseto A com seus paralelos no verseto B como um sujeito composto dc uma cláusula. Essa tradução é melhor que “aquele que esconde o ódio tem lábios mentirosos, e o que espalha calúnias é um insensato”. ( 1 ) 0 texto não fornece o lamede possessivo esperado, m as um acusativo de modo não excepcional (IBHS, p. 172, P. 10.2.2e). (2) Ele fornece um paralelismo mais adequado. Se os dissimulados e caluniado res estão sendo apresentados como dois tipos inferiores, é de esperar o uso do predicado pl., “são insensatos” . 5. Com um sujeito pessoal, hdl significa: ( I) “reter, deixar, abandonar", ou (2) “ se conter, abster-se de” . Com um sujeito impessoal, significa “cessar, chegar ao fim” (Gn 18.11; Êx 9.29, 33, 34; Dt 15.11; Jó 14.7; Pv 10.19; ls 24.8; cp. HALOT 1:980, s.v. hdl). BDB (p. 293, s.v. hõdal) apresenta para este verbo a tradução controversa “está em falta” , m as, além desta passagem, atribui esse significado ímpar somente a Jó 19.14. No entanto, o mais provável é que esse texto mostre que os parentes de Jó deixaram de existir, e a lei da parcimônia não permite introduzir um significado desnecessário. A interpretação tradicional “não está ausente” pode estar baseada na Vulg., in multiloquio pecatum non deeril, “na multidão de palavras não haverá escassez de pecados", que pode ter sido influenciada por 'A bot 1.17 (= “trazer pecado”) e pelos rabinos. A LXX traz “por uma multidão de palavras não escaparás do pecado”. A Sir. traz: “Os perversos não se livram pela abundância de palavras” . Os dois consideram n$l e não hdl. 6. Ou “purificada”. Com base na LXX pepyrõmenon (< pepeiramenos ?) não há necessidade de se corrigir o texto para nibhSn (pace Fichtner [B/íS]). Em Jó 34.4, 33; Isaías 48.10, bhr
21 Os lábios do reto “pastoreiam”1 muitos, mas os insensatos morrem por* falta de senso.9 22 Quanto à bênção do S enhor, ela traz riqueza, e ele10 não acrescenta labuta dolorosa11 a ela. 23 Cometer uma vileza é como [o prazer do] riso para um insensato, mas a sabedoria12 [é como o prazer do riso]13 para o entendido. 24 Quanto ao terror de um perverso, este lhe sobrevirá, mas aquilo que o reto deseja será dado.14 25 Assim que15 a tempestade passa, o16perverso não existe mais, mas o reto é um fundamento perpétuo. 26 Como vinagre para os dentes e como fumaça para os olhos, assim é o preguiçoso para aqueles que o enviam. 27 O temor do S enhor acrescenta dias, significa “testar” . Gem ser (Sprüche , p. 112), H. W ildberger ( TLOT', 1:210, s.v. bhr) e HALOT (1:120, s.v. bhr) argumentam que esse é o significado do Nifal em Provérbios 10.20, apelando também para o aramaico. Se esse é o caso, “testado” se refere a algo refinado pelo fogo. A LXX traduz nibhãr com o de dokim asm enon (“provado” ) em 8.10, mas como ekletos (“escolhido") em 10.19. 7. A tradução mantém a metáfora para envolver vários sentidos específicos de r'h: “alimentar”, “levar para o pasto”, “ proteger”, “apascentar [i.e., revigorar, nutrir]” (cp. HALOT, 3:1259, s.v. rh ). 8. Bete causai (IBHS, p. 198, P. Il.2 .5 e ). 9. Considerando A°sar o construto de heser ou hõser, e não o construto Qai ptep. de k õ sir “aque le que é falto [de senso]”. 10. Ou “e não há dor algum a” (de acordo com a Sir.), considerando o sujeito com o sendo indefini do (IBHS, pp. 70-71, P. 4.4.2). 11. A LXX e a Vulg. restringem a dor ao âm bito emocional (i.e., “tristeza do coração"). 12. O verseto B pode ser traduzido como: “M as a pessoa de entendim ento tem sabedoria” (Targ., Sir., KJV), mas essa ideia não fomece um paralelo adequado para o verseto A. Também poderia ser traduzido com o “mas [cometer vilezas] é sabedoria para um homem com petente” . Ninguém adota a últim a tradução por se tratar de um a heterodoxia e o paralelo não apoia a prim eira tradução anterior. 13. Pressupondo incorretam ente que o texto hebraico deve significar “ mas a vileza é sabedoria para uma pessoa com petente” (de acordo com Targ., S ir, KJV), Fichtner (BHS) propõe úkehêmâ (mas “com o raiva”) ou ufitôêbâ (veja Toy, Proverbs, pp. 214-15). A última opção não é convincen te do ponto de vista da critica textual e a primeira é contextualm entc insatisfatória. O mais provável é que “com o riso” seja om itido no verseto B (cp. NASV, NAB, NEB, N1V, REB, NJPS e NRSV). A estrutura quiástica do texto hebraico e os acentos disjuntivos tendem a apoiar essa interpretação: predicado, acento disjuntivo, su jeito :: sujeito, acento disjuntivo, predicado. 14. Y íttln é indefinido (“alguém dá” = “é dado” ; veja Jó 37.10; Provérbios 13.10; IBHS, pp. 7011, P. 4.4.2). 15. Cafe tem poral, não com parativo (= “com o passa o vendaval, assim tam bém o perverso deixa de ex istir” ; cp. Sir., V ulg., Targ.) pois “ a com paração não é ap ro p riad a para a ideia de im p crm an ên cia” (Toy, Proverbs , p. 215). 16. Lit. “e não há um perverso” (cp. IBHS, p. 649, P. 39.2.1c).
mas os anos dos perversos serão curtos. 28 A expectativa dos retos termina em17 alegria, mas a esperança dos perversos perece. 29 O caminho do S e n h o r é uma fortaleza na montanha para o irrepreensível, 18 mas terror para os que praticam a iniqüidade. 30 O reto nunca19 é derrubado, e os perversos não habitarão na terra. 31 A boca do reto produz20 sabedoria, mas a língua dos perversos será cortada fora. 32 Os lábios do reto sabem21 o que é agradável, mas a boca dos perversos [sabe] o que é perverso. A estrutura de 10.18-32 diz respeito aos órgãos da fala, seus efeitos sobre outros (vs. 18-22) e sua duração (vs. 31, 32), e sua parte central diz respeito às expectativas com relação à dor, ao prazer (vs. 23-26) e à segurança (vs. 27-30). 17. Lit. “é alegria”. Ruprecht ( TLOT', 3:1273, s.v. émh) observa que em Provérbios 11.23, bem como em outras passagens, a conclusão do processo de espera é expressa por uma cláusula nominal. 18. A tradução possível, “um forte na montanha para a irrepreensibilidade” (i.e., para a perfei ção) é o caminho do S e n h o r ” é um paralelo inadequado para “terror para os malfeitores” . Toy ( Proverbs, p. 217) acredita que “‘forte’ é um predicado incomum de ‘cam inho’ (ou ‘método de governo')” e, portanto, muda a sintaxe e o substantivo abstrato tõm para o adjetivo substantivai tãm (“ irrepreensível” ): “um refúgio para aquele que é perfeito em seu cam inho” . Porém , a predicação de “ forte” para “caminho” não é mais estranha que a prcdicaçâo de "forte refugio” para “o tem or do S e n h o r ” (14.26). Além disso, a sintaxe é a m esma que em 21.15. Delitzsch (Proverbs, p. 164) defende o TM observando que tüm nunca ocorre com o um prefixo, em contraste com tõm. que pode justificar o uso do abstrato para representar o concreto. 19. Bal é advérbio negativo com um com o im perfeito mô( ( HALOT , 1:131, s.v. bal; cp. IBHS, p. 57, n. 6). 20. Lit. nüb significa "se desenvolver", “prosperar” (HALOT, 2:677, s.v. nüb). Com o acusativo, com o é o caso aqui, quer dizer “se desenvolver até a produção de” . 21. M. Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Philology [Roma: Pontificai Biblical Institute, 1963], p. 21) apoia seu argumento de que yãnúb no v. 31 significa “fluir”, não “produzir" com sua interpretação de y S d ^ú n como uma forma secundária de "yízP ún, “ fluir”, um verbo não atestado em outros textos hebraicos, mas do qual zt& “suor” é derivado. A LXX toma essa interpretação atraente ao traduzir os dois verbos excepcionalm ente com o apostazei, “deixar cair gota a gota” , “destilar". Alguns mss. gregos e versões gregas posteriores trazem epistatai, “saber”, m as prov av elm en te se trata de um a correção do texto grego projetada no texto hebraico, não uma deturpação do grego. No entanto, é perigoso preferir uma tradução de outro modo extrem am ente livre, com frequência entendida incorretamente e um verbo hebraico não atestado ao texto recebido, cujo significado é inteligível de acordo com o uso norm al das palavras hebraicas. A LXX pode ter interpretado o term o raro yãnúb da m elhor m aneira que pôde, e tropeçado na figura “ lábios... sabem ” . H itzig, seguido por Fitchner ( BHS ), corrige desnecessariamente y ê d ^ ü n para yabbt ún, “gotejar” .
A mudança de assunto de volta para o modo de falar (veja vs. 11-14) é marcada claramente pelas metonímias para o ato de falar: “lábios” (vs. 8, 19, 21) e “língua” (v. 20). A volta para o tema dos versículos 6-14 é garantida por várias palavras-chave: no versículo 18, por ksh (“esconder/ocultar1'-, vs. 11, 12) e éin'â (“ódio”; v. 12); no versículo 19 por pãSa' (“transgressão”; v. 12); no versículo 20, por saddiq II r^Saim (“reto//perverso”; vs. 6,7,11 ); e no versículo 21, por ^ w ilfim j (“insen sato”; v. 10) e hasar-lêb (“falto de senso”; v. 13). Asubunidade consiste de dois quartetos que se referem à questão do modo de fa la r benéfico e do nocivo: os versículos 18, 19, que usam os termos “insensato” e “prudente”, e os versículos 20 e 21, seus termos correlatos e éticos, “reto” e “perverso”. Os correlatos “reto” e “insensato” são usados juntos no provérbio final. Os quartetos estão ligados foneticamente22 e pela palavra-chave rb (“muitos”; vs. 19,21) ao redor de seu oposto, m'{ (“pouco”; v. 20). Heim observa sua ligação semântica: “Versículo 19a: ‘muitas palavras’ - versículo 19b: ‘refreia os lábios’ (i.e., ‘poucas pala vras’); versículo 20a: ‘língua... é prata escolhida’ (i.e., ‘rara’, mas ‘de muito valor’)-versículo 20b: ‘a mente... é de pouco valor’(i.e., ‘nãoé de muito valor’) - versículo 21a: ‘alimenta muitos’ - versículo 21b: ‘falta de senso’ ”.23 Em termos semânticos, o primeiro quarteto se con centra nos efeitos letais do modo de falar nocivo, e o segundo, no resul tado vivificador para outros do modo de falar construtivo. 18, 19 Este par de provérbios sobre o modo de falar prudente e insensato está ligado foneticamente.24 Hildebrandt observa um padrão semântico AB/BA entre eles: “ódio escondido/calúnia difundida:: mui tas palavras/poucas palavras”.25 O insensato usa sua língua para espa lhar mentiras e boatos (v. 18); o prudente a refreia (v. 19). 18 A quebra do versículo 18 combina o mentiroso - quanto ao que 22. O bserve a seqüência de Ik, s~á~8~g/ nos vs. 18, 19 e o kesep inicial no v. 20. 23. K. M. Heim. “Structure and Contcxt in 10:1-11:16” (dissertação de Ph.D., Liverpool University, 1996), p. 101, n. 56. 24. Observe a seqüência de /d , 6/ em dibbá (“relato injurioso”, v. 18b) e deb&rtm (“palavras”, v. 19a) da seqüência quintupla quebrada /k~q, s~é~S/ de m ekasseh (“esconde”), Saqer (“menti roso"), kesíl (“insensato” ; v. 18) e de hõsêk (“refreia” ) e m aékil (“prudente”) no v. 19b; e a seqüência tripla quebrada /p , é~i! de áiptê (“ lábios” ) no v. 18 e dc pesa' (“transgressão” ) e &p&tSyw no v. 19; e. o que é mais impressionante, a aliteraçâo de suas palavras finais, kesil ("insensato”) no v. 18 e maákll (“prudente” ) no v. 19 (cp. Bostrõm. Paronomasi i den ãldre hebreiska MaschallUteraturen [LU Â , N.F., Avd. 1, Bd. 23, Nr. 8; Lund, 1928], p. 125). 25. T. H ildebrandt, “ P roverbial Strings: C ohesion in Proverbs 10”, GTJ 11 (1990) 180.
esconde (m ekasseh ; veja 10.6, 11, 12) o ódio (sin 'â; veja 1.22; 10.12) com lábios mentirosos (spty-Sqr ; veja 10.8, 10) - com o caluniador
como o sujeito composto com um predicado. A construção não deixa dúvidas de que o ódio inspira calúnias resultantes de insinuações, meias-verdades e fatos distorcidos e exagerados a ponto de se tomarem irreconhecíveis (cp. 6.17, 19). Em outras palavras, esse insensato es palha calúnias, escondendo o seu ódio com lábios mentirosos. Hildebrandt comenta a respeito dos sons sibilantes: “Este provérbio apresen ta o que Akhmanova chamou de fonestema: ‘uma combinação repeti da de sons semelhantes ao morfema no sentido de que certo conteúdo ou significado está mais ou menos associado claramente a ele’ [e.g., palavras com /esc/ - escorregar, descambar, escapulir, escangalhar, etc.]. Em termos fonéticos, os sons sibilantes predominam, sendo repe tidos seis vezes por meio de várias letras (s,é,S,s), três vezes em posi ções iniciais (m ksh én'h épty-Sqrwm w s’... ksyl). Assim o som sibilante é usado para reforçar a mensagem - permitindo que a audiência ouça o silvo do caluniador espalhando seus segredos”.26 Àquele que publi ca (m ô si\ lit., “que faz sair”, “que gera” ou “que relata”; Jó 8.10; Ne 6.19; Is 48.20) contrasta o ódio encoberto com sua expressão manifes ta.27 Relato injurioso (dibbâ ) indica um relato tendencioso que visa prejudicar a vítima.28Tomando por base cognatos semitas, Van Zijl tam bém acrescenta que dibbâ “ocorre na esfera forense” (i.e., de acusa ção). A Septuaginta traduz a palavra com loidoria , “que é o termo grego para [o hebraico] ríò”.29 A acusação falsa pode encher de terror a pessoa contra a qual ela é dirigida (SI 31.14[ 15]; Jr 20.10). Esse insensato (ou tolo [kesíl\, veja pp. 167-168) destrói reputações e a comunidade, não fazendo bem a ninguém (veja 1.22; 10.1), e atrai jul gamento sobre si (veja 10.11b). O amor proveniente de um coração regenerado o salvará (veja 10.12b). Entretanto, uma “má reputação” justificada fica com a pessoa para sempre (25.10). 19 Nos paralelos imprecisos e antitéticos do versículo 19, cada ver seto pode ser considerado de modo independente: multiplicar palavras 26. Hildebrandt, “ Proverbial Strings” , p. 180. 27. Tendo “m á reputação” com o sujeito, a NIV traduz o verbo com o “ difam ar” (Dt 22.14), e em três das outras nove ocorrências de dibbâ associado a "relato injurioso”, com o “espalhar” (Nm 13.32, 36, 37). 28. Veja Gênesis 37.2; N úm eros 13.32; 14.36, 37; Salmo 31.14(15]; Provérbios 10.18; 25.10; Jerem ias 20.10; Ezequiel 36.3. 29. P. J. Van Zijl, “A Discussion o f thc Word DIBBÂ in the Ugaritic Texts, Proverbs and Song o f Songs”, OTWSA 15 e 16; OTSSWL, 1972/73, pp. 100-102.
não detém o pecado, mas sim o faz aumentar; aquele que refreia as palavras é prudente (cp. 10.14; 13.3; 17.27, 28; 21.23; Ec 5.2-7). Jun tos, os paralelos implicam que os prudentes não multiplicam suas pala vras a fim de dar cabo da transgressão; antes, mostram comedimento. Ao multiplicar [ou com uma multidão de, berõb\ veja 5.23] palavras (debãrim; cp. 1.6) se refere às palavras efusivas do perverso (veja 13.13) em contraste com as palavras comedidas do sábio (12.6; 15.23; 25.11; cp. 12.25; 18.4; 24.26; Jó 15.3; Ec 10.12ss.; I s 32.4,6). “ALiteratura Sapiencial contém advertências acerca do modo de falar efusi vo, precipitado, lisonjeiro ou falso e, com isso, também contra a confi ança indevida nas palavras de outrem (Pv 10.19; 14.15, 23; 18.8, 13; 22.12; 26.22; 29.12, 19s„ 30.8; cp. 23.8; Ec 5.2s., 7[ls„ 6]; 6.11; 7.8, 21; 10.12ss., 20).”30 Por meio do modo de falar efusivo e autoconfiante a transgressão (pãSa; veja 10.12) não cessa (yehdai, veja n. 5), que constitui uma lítote.31 O pecado não é impedido pela multiplicação das palavras porque o pecado é uma questão do coração, e, além disso, quando as palavras são multiplicadas, elas não podem ser ponderadas adequada e precisamente (cp. 29.20). Uma vez que saem da boca, não podem ser negadas com facilidade. Entretanto, o que refreia (hõéêk, i.e., exerce domínio próprio para refrear) é prudente, pois não tem confi ança em si mesmo e sabe que a palavra benigna e eficaz vem do S e n h o r (16.1). Ele também conhece o poder letal das palavras precipitadas (veja p. 155). É possível que o poeta tenha escolhido seus lábios (éepãtãyw; veja v. 18) como uma metonimia para o modo de falar em função de sua consonância de fé/ com hõéêk e maékil {prudente; veja 10.5). 20, 21 Este quarteto que promove o uso correto do discurso pelo reto contrabalança o quarteto anterior que trata da necessidade de refrear o modo de falar nocivo dos insensatos. O par de provérbios está ligado pela repetição de palavras-chave e sons.32 Em termos semânticos, a metáfora da “prata purificada” para o discurso do reto (v. 20) é expli cada por outra metáfora, os lábios do reto “pastoreiam” muitos.33 30. W. H. Schm idt, TDOT, 3:109, s.v. dãbhãr. 31. E. W. Bullinger, Figures ofSpeech Used in lhe Bible (Londres: Eyre and Spottiswoode, e Nova York: E. e J. B. Young, 1898), pp. 159-64. 32. Observe a seqüência de partes da boca [“ língua”/“ lábios"] + “ do reto" (nos versetos A) + “coração” (em seus versetos B). Bostróm observa a seqüência quebrada lh, rl em nbhr (“esco lh id a” , v. 20a) e h sr (“ falta” , v. 21b), e H ildebrandt reforça essa ligação fonética observando que am bos são seguidos de III (Iswn [“ língua"] e lb [“senso” ]). 33. T. A. Hildebrandt, “ Proverbial Poetry: lts Settings and Syntax” (tese de Th.D., G race Theological Seminary, 1985), p. 674.
20 Neste paralelismo quiástico antitético os temas língua (lesôn\ veja 6.17) do reto (saddiq; veja 1.2; 10.2) e coração (lêb; veja pp. 141-142) dos perversos (r^s&im; veja pp. 164-165) constituem sua parte central mais interna, e seus respectivos predicados de avaliação “prata escolhida” versus “de pouco valor” formam a parte central mais externa.34 A justaposição de “coração” (lêb) e “língua” (lesôn) - ob serve a aliteração de /// - é imprecisa, sugerindo que um infere o outro; o coração produz as palavras, e as palavras revelam o coração.35 O provérbio admoesta o filho a ser reto, pois suas palavras serão de gran de valor; de outro modo serão essencialmente inúteis. A metáfora que compara seu modo de falar à prata (kesep', veja 2.4) escolhida (nibhãr; veja n. 6) significa que ela tem o valor mais elevado e é aceita em todo lugar, pois se mostra livre das ligas e/ou escória das intenções e efeitos malignos (10.21a). A avaliação de que o modo de falar pode ser de pouco valor (kim'ãt; lit. “como uma ninharia/pouco”)36 é assustadora para uma criatura feita à imagem de Deus. Apesar de ser capaz de inventar toda a sorte de instrumentos, o coração do perverso inventa o pecado e a violência (v. 1lb). Essa “genialidade” não tem valor algum. 21 A metáfora da “prata escolhida” para o modo de falar reto é esclarecida pela metáfora do “pastor”. Nos paralelos antitéticos do versículo 21, os temas lábios (êiptê; veja v. 19) dos retos (çaddiq; veja “língua dos retos” no v. 20a) e insensatos (* w ilim; veja 10.8,10) e seus respectivos predicados “pastoreiam muitos” e morrem (yãmütü', veja 10.16)porfalta de senso (bahasar-lêb\ veja n. 9) formam uma oposição imprecisa. Essa imprecisão sugere que apesar do insensato estar cerca do pelas palavras que preservam a vida do reto, que alimentam a muitos, ele morre de fome pois lhe falta o bom senso para se alimentar dessas palavras. Não pode receber nem dar vida. Pastoreiam (yir'â) é um cha vão metafórico do estilo palaciano do antigo Oriente Próximo usado para representar a monarquia ideal. Ezequiel 34.23,24 e o Salmo 23 exploram essa figura: ele provê, lidera, revigora e defende seus protegidos (veja Mq 5.4[3]). Num provérbio ele serve como exemplo de qualquer pessoa numa posição de “pastorear” outra. Enquanto a multidão de palavras não 3 4 .0 Ikl inicial na primeira e na última palavra (kesep, "prata”... k i m S f “de pouco valor”) contri bui para a coerência do dito. 35. “O coração dos insensatos está na sua boca, m as a boca dos sábios está no seu coração" (Eclo 21.26). 36. HALO T (2 :6 11, s.v. m e' ã() traduz a frase por “com o nada” .
faz nenhum bem (10.19), as poucas palavras escolhidas de uma pessoa reta dão vida a muitos (rabbim; veja 7.26). O provérbio admoesta o filho a entesourar a sabedoria ética dos pais (10.14) de modo que ele, e todos aqueles que desejarem suas palavras, possam viver e não morrer. (2) Modo de falar e expectativas do justo e do perverso (10.22-32) O assunto passa do modo de falar (vs. 18-21) para as expectativas dos retos e dos perversos, para a sua dor e prazer em relação à sua segurança (10.22-30). Consiste em duas subunidades: a primeira se con centra em sua dor e prazer, e a segunda, em sua segurança. Como em 10.6, a referência à “bênção”, um dito implícito de Yahweh, forma uma transição do modo de falar para a riqueza, mas na seqüência inversa. Além disso, o dito de Yahweh no versículo 22 funciona, com o dito de 10.27, para ligar as duas metades, as quais seguem este padrão alternado: A Dito de Yahweh [ S e n h o r ] + “acrescenta” (ysp) B Alegria (áehôq, “riso”) C O reto está seguro “para sempre” Çôlõm ) A’ Dito de Yahweh + “acrescenta” (ysp) B’ Alegria (éimhâ, “alegria” ) C ’ O reto está seguro “para sempre” Çôlãm )
22 23,24 25b 27 28,29 30a
Convém observar a intensificação para uma dimensão eterna e o quiasmo que serve para conduzir à conclusão nos versículos 25b e 30a. Os paralelos antitéticos nos versículos 23-25 apresentam a virtude po sitiva em seus versetos B, os versículos 27-30 apresentam-na em seus versetos A. As duas unidades motivam o filho a buscar a retidão e a se manter afastado da perversidade. O versículo 26 funciona como uma estrutura associada ao versículo 22. Assim como a unidade sobre o modo de falar apresenta ligações verbais importantes com 10.1b-16, assim também a “bênção do S e n h o r ” e “traz riqueza” no início ecoam essa seção (cp. 10.4,6,15), e sua conclusão encerra a unidade aplican do os conceitos de segurança e insegurança ao ato de falar (vs. 31, 32). (a) Dor e prazer (10.22-26) Esta unidade é estruturada por dois paralelos sintéticos, + :: + (v. 22), introduzindo a virtude positiva nos versetos B dos versículos 22-25, e - - (v. 26), formando um janus aos vícios negativos nos versetos B
dos versículos 27-29. A paronomásia de 'eseb (“labuta dolorosa”; v. 22b) e 'ü$êl (“preguiçoso [doloroso]”; v. 26b) reforça a estrutura. Vá rias técnicas literárias adornam a subunidade. Uma sintaxe comum re úne os versículos 22 e 2437 e o comparativo kaph (“como”) nos versí culos 23 e 25. O versículo 24 é um janus que se relaciona tanto ao versículo 23 quanto ao versículo 25. Os versículos versículos 23 e 24 estão ligados pelo tema da dor e do prazer dos perversos e dos retos no presente e pela aliteração de t?bünâ (“entendido”), a última palavra do v. 23b, e fíbô^ennü (“sobrevirá”), a última palavra do versículo 24a.38 O prazer dos insensatos no presente (v. 23) implica a dor de uma cons ciência pesada à espera de um fim terrível (v. 24a), enquanto que o prazer do reto implica numa consciência limpa e numa expectativa con fiante de uma recompensa segura. Os versículos 24, 25 se referem à transitoriedade dos perversos e à segurança dos retos, servindo de tran sição para o tema dos versículos 27-30. 22 O S e n h o r ( YHWH; veja 1.7) é o agente que proporciona a ri queza (v. 22a) e não a mancha com labuta dolorosa para obtê-la (v. 22b). A sintaxe enfatiza que sua bênção (birkat veja 10.6,7) - sim, ela (hV) - traz riqueza (ta'aSír; veja 10.4). O quarteto seguinte se refere aos retos em contraste com os perversos (vs. 24-25) - lembrando que retos e perversos são termos correlatos (v. 24) - e a estrutura que apresenta o preguiçoso (v. 26) protege o provérbio da interpretação equivocada de que a bênção do S e n h o r da verdadeira riqueza ocorre de modo independente do trabalho diligente. O preguiçoso, que é pior que o insensato, se recusa trabalhar e constitui uma fonte inesperada de dor e danos (10.26). A retidão que usa a riqueza para servir a outros é a causa imediata da riqueza duradoura (cp. 10.1-4; 11.22-27; 21.17; 23.4; 28.20), e o S e n h o r é sua fonte suprema (cp. I S m 2.7). A mão diligente do reto trabalha sob a bênção do S e n h o r . N o contexto dos versículos 22-25 tem-se em vista a riqueza duradoura. Provérbios 10.22b, porém, qualifica 10.4. A expressão labuta dolorosa ('eçeb; veja 5.10), quando usada de modo absoluto como é o caso aqui, indica trabalho estrênuo.39 Ele não acrescenta (welõ ’-yôsp; veja 1.5)... a ela Çimmãh) exclui a doutrina do sinergismo. A reta diligência é o canal da bênção de 3 7 . O a b s o lu to n o m in a tiv o ( “ q u a n to à b ê n ç ã o d o S e n h o r ” , v. 2 2 a ) e ( “ q u a n to a o te r r o r d e u m p e rv e r s o ” , v. 2 4 a ), a c re s c id o d o p r o n o m e s u m a r ia n te ( “ t r a z r i q u e z a ” / “ l h e s o b r e v i r á ” ).
38. Bostrõm, Paronomasi, p. 125. HALOT, 2:865, s .v . II 'eseb.
39.
hi ’ ( " e l a ’7 “ e l e ” ) e
d a 3* p e s s o a f c m . s i n g . im p f .
Deus, mas sua bênção não depende somente do trabalho árduo e estrênuo. O trabalho prejudicial vem da ambição própria (10.3) e se encon tra sob o julgamento de Deus, não sob sua bênção (cp. SI 127.1; Pv 20.21; 28.22; lTm 6.9, 10; Tg 3.1-16). 23 Ademais, o trabalho sob a bênção de Deus não inclui atos des trutivos de vileza. Cometer Çaáôt\ veja 2.14) dá continuidade ao tema do trabalho. Nesta passagem, vileza (zim m â) denota qualquer afronta grosseira contra indivíduos e contra a comunidade. Zimmâ pode indicar “um plano”, “uma intenção” - com um valor positivo ou neutro (Jó 17.11) ou com um sentido negativo (SI 119.150; Pv 24.9; Is 32.7) - ou lascívia (na maioria das vezes com referência a atos sexuais) e outros tipos de vileza que podem ser especificados por um paralelo como as sassinato (Os 6.9) ou permanecer sem especificação (SI 26.10; Pv 21.27). Para um insensato (lekesil; veja pp. 167-168) arrombar fecha duras e coisas do gênero é como [o prazer do] riso (éehôq). As 15 ocorrências de éehôq na poesia indicam uma expressão exterior audí vel da alegria e prazer interiores, expressando vitalidade e favor jubilo sos (veja “celebrando” em 8.30).40Ao contrário da vileza, a sabedoria (,hokmâ; veja pp. 124-125) dá prazer agradável para o entendido (ou competente; le 'is fíbünâ] veja p. 148). Assim como os fortes têm pra zer em realizar feitos de força e os músicos encontram alegria em seu talento, a pessoa competente se deleita no trabalho construtivo. O pro vérbio admoesta o filho a guardar seu estado espiritual que é decisivo para determinar que tipo de atividade dá prazer (4.16; 15.21 a; 21.10a). 24 Este versículo matiza o versículo 23 ao afirmar que apesar de, no presente, o insensato se comprazer em praticar o mal, ele sofre de uma ansiedade inteiramente justificada e de dores de consciência que o perseguem até o seu destino infeliz (cp. Gn 4.13, 14). Entretanto, a pessoa competente será plenamente recompensada por aspirar por aquilo que lhe dá prazer. Quanto ao terror (m egôrat) de um perverso (rõsã'; veja 10.2,3) provavelmente se refere ao seu terror interior (cp. S I 34.5[6]; Is 6.4)41 e difere radicalmente do temor do S e n h o r . A sintaxe - sim, ele (ki’; veja 10.22) - enfatiza que o terror esperado pela consciência pesada se concretizará. Lhe sobrevirá (1?bô'ennü\ veja 1.26) expressa a con 40. Éehôq pode indicar zombaria (i.e., alegria à custa dos outros) quando usado com hSyah ("ser"/ "tom ar-sc” ; Jó 12.4; Jr 20.7; 4 8 .2 6 ,2 7 ,3 9 ; Lm 3.14). 4 1 . 0 masc. derivado de III gúr, mãgôr, refere-se ao terror que vem de fora, com o a espada (Jr 6.25; 20.4) e o estandarte na batalha (Is 31.9).
vicção de que a punição será de acordo com o crime. Contrastando com isso, o S e n h o r providenciará uma recompensa que esteja de acor do com “aquilo que o reto deseja” (cp. Mt 5.6). Deseja (ta ’awat) é um sinônimo de hãmad (“cobiça”; veja l .22) e indica aspirações profun damente arraigadas na existência da pessoa.42 O perverso egoísta de seja derrubar os outros para garantir o próprio avanço (SI 140.8[9]), mas todo aquele que é reto (saddiqim ; veja 10.3) almeja que Deus estabeleça seu governo justo (10.3). Enquanto “sobrevir” denota o ca ráter inevitável do julgamento, seu paralelo, [lhe] será dado (yittên; veja 1.4), indica a recompensa graciosa de Deus (veja 2.6; 10.22; cp. SI 37.4). O provérbio introdutório, versículo 22, também protege o versí culo 24 da interpretação errônea de que esses destinos contrastantes se devem a uma ordem impessoal (veja pp. 120-124). Porém, enquanto o S e n h o r não os cumprir, o mundo pode ficar moralmente de cabeça para baixo (veja pp. 161-164). 25 O destino do reto e do perverso é intensificado para uma dimen são eterna. Assim que (ka) indica que seu julgamento antecede imediata mente sua eliminação final. A metáfora incompleta da tempestade catas troficamente destruída (süpâ; veja 1.27aP) evoca as imagens da natureza súbita e absoluta da devastação do julgamento final do perverso. O singu lar, o perverso (jubilosa rõáã'; veja v. 24), sugere que nenhum deles es capará. Não existe mais traduz a partícula existencial negativa ’ên (“não há”). “Assim que a tempestade passa”, no verseto A, não tem contraparte no verseto B, sugerindo que ela modifica as duas cláusulas. Nem mes mo uma tempestade pode remover o reto. Perpétuo Çôlãm; veja 8.23) significa “um caráter durável, final e inalterável”.43 Fundamento i^sô d , uma ocorrência única em Provérbios) é derivado do verbo yãsad (veja 3.19), cuja principal ênfase está na estabilidade e permanência,44 e signi fica que o reto (saddíq) se encontra tão firme e seguro que nem mesmo o maior dos infortúnios pode abalá-lo. Ele é o tipo de pessoa sobre a qual se pode construir um reino. O enredo prenuncia a era escatológica vin doura, quando os perversos serão removidos da terra e somente os retos permanecerão (veja 2.21, 22; cp. Mt 7.24-27).45 42. G Mayer, TDOT, 1:135, s.v. 'SvSh. 43. Jenni, TLOT, 2 :8 5 6 , s.v.'ôlãm. 44. R. M osis, TDOT, 6:112, s.v. yãsad. 45. N o Judaísm o rabínico, o v. 25b foi considerado um a com provação da convicção dc que a contin u ação da ex istên cia do m undo seria garantida em função de um reto (Y om a 38b, citado por M einhold, Sprüche, p. 182).
26 Este versículo completa a estrutura ao redor dos versículos 2226. O comentário de Hildebrandt de que o paralelismo “sintético” do versículo 22 o isola como um provérbio singular, demarcando uma divi são estrutural também se aplica ao versículo 26.40 O versículo 22 tam bém funciona como um janus, estando ligado ao versículo 25 pelo kaph (“como”) inicial e aos versículos 27-30 ao citar os aspectos negativos no verseto A. De modo formal, o versículo 26 (cp. 26.1) consiste de uma dupla comparação devida a uma ênfase. Ele compara duas coisas irritantes e prejudiciais ao corpo (10.26a) com aquilo que é frustrante e danoso nos relacionamentos sociais (v. 26b).47 O ponto de comparação como... assim deve ser inferido (ka ... kên\ cp. v. 23). O elemento comum entre aquilo que o vinagre acidífero faz com dentes estragados, a fumaça com os olhos e o preguiçoso com aquele que o envia é a sensação inesperada de irritação e dor. A LXX acrescenta “danoso” ao verseto A. Vinagre (Jwm.es) se refere ao vinho que se tomou acidífero e acre pela fermentação acetosa (cp. 25.20). O Salmo 69.21 [22] se refere à refeição nauseante de fel amargoso como alimento e vinagre como bebida como forma de punição. Na forma diluída, essa bebida fermentada fornecia refrigério aos trabalhadores (Rt 2.14), e foi aceita pelo Cristo crucificado em contraste com o analgésico que era aromatizado com mirra. Aqui, trata-se da sua forma acidífera não diluída e desa gradável. A Sir. acrescenta, “quebrado” a para os dentes (lassinnayim). Uma vez que não recebiam cuidados dentários, podemos pressupor que muitos adultos do antigo Oriente Próximo tinham problemas nos dentes. A pessoa que estava bebendo esperava vinho doce, mas, em vez disso, recebeu vinagre azedo. Como fum aça (ke'ã sã n ) para os olhos (la'êriãyim) infere os mesmos pontos de comparação. Uma pessoa pre parando alimentos esperava um fogo construtivo para cozinhar a refei ção, mas, em vez disso, recebeu fumaça e lágrimas. O preguiçoso (he'ã$êl; veja 6.6) é mais degenerado moralmente que um insensato e, 46. Hildebrandt, “ Proverbial Strings”, p. 182. Albright (“Some Canaanile-Phocnician Sources” , pp. 5-6) observa que essa forma era comum no ugarítico (ca. 1400 a.C.), mas totalmente ausente no texto aramaico de Ahiqar (ca. 650 a.C.), sugerindo a data de Provér bios como sendo bem mais antiga que a dc Ahiqar. 4 7 .0 padrão sonoro no verseto A dá mais força ao comparativo duplo e reforça sua ligação com o objeto da comparação. Com referência às semelhanças fonéticas das duas símiles no verseto A. ob serve em khms Isnayim wk'sn inayim a consonância do Ikl inicial, a aliteraçâo do / naylml final e a seqüência quebrada/A S Sn //(McCreesh, Sound and Sense, p. 77). Com respeito à sua ligação com o verseto B, observe novamente em kn he'G$Sl Islhyw, o Ikl inicial e as sibilantes, bem como a aliteraçâo de keOSBn repetida em k e'ã.fêl. Além disso, “o tema do I l, í / inicial de Isnym da primeira símile é repetido em Islhyw" (mesmo).
como o perverso, não tem senso moral de responsabilidade para com outros (veja p. 169). Ele decepciona, irrita e exaspera aqueles que o enviam (lesõlehayw). A. D. Crown mostrou que, no antigo Oriente Pró ximo, os mensageiros reais podiam ter status bastante elevado, chegando a fazer parte da corte. Sabiam das ideias e confidências mais íntimas do rei e, com frequência, eram incumbidos de tarefas extremamente difíceis que envolviam o transporte de prisioneiros e a transmissão e o recebi mento de informações percorrendo distâncias enormes. Muitas vezes eram investidos de um alto grau de autoridade que transcendia a mera transmissão de instruções (veja também 13.17).48 Apesar do provérbio não se restringir aos mensageiros reais, pode-se supor que aqueles que enviavam um mensageiro ocupavam cargos de grande responsabilidade. A informação coletada e transmitida pelo mensageiro devia ser buscada e levada com diligência a fim de garantir sua exatidão e, deste modo, um desfecho rápido e bem-sucedido do assunto em questão. Se ele se mos trasse preguiçoso, o efeito podia ser inesperadamente amargo.49 (b) A segurança do justo versus a transitoriedade do perverso (10.27-30) Esta subunidade trata do tema da permanência dos retos em contras te com a transitoriedade dos perversos (cp. vs. 24,25). Whybray observa quatro características que unem esses versículos: (1) Eles são paralelos antitéticos com o lado negativo no verseto B. (2) Todos eles empregam termos éticos - “reto” (vs. 28,30) “temor do S e n h o r ” (v. 27); “irrepreen síveis” (v. 29) versus “perversos” (vs. 2 7 ,2 8 ,30)/“malfeitores” (v. 29) não termos sapienciais (e.g., “sábio” versus “insensato”). (3) As pala vras “reto” e “perverso” predominam. (4) A subunidade é voltada para a piedade Yahwehista (cp. vs. 27, 29). De modo bastante apropriado a unidade começa com “o temor do S e n h o r ” , “uma fórmula absolutamente abrangente que dá o tom do grupo como um todo”.50 48. A. D. Crown, “Messengers and Scribes: The Sopher and Mazkir in the Old Testament", VT 24 (1974) 366-70. 49. Ptah-hotep (cap. 8) instrui: “Se és um homem de confiança, enviado por um grande homem para outro, permanece fiel à natureza daquele que te enviou, transmite a mensagem dele como ele a proferiu” (AEL, p. 165). Na instrução egípcia Sátira sobre as Profissões, o pai instrui seu filho: “Quando um oficial te enviar com uma mensagem, transmite-a como ele a proferiu, sem omitir nem acrescentar a ela” (AEL, p. 190). Paulo instruiu seu mensageiro, Timóteo: “transmite [o que da minha parte ouviste] a homens fiéis e também idôneos para instruir a outros” (2Tm 2.2). 50. Whybray, Proverbs, p. 172.
27, 28 Estes versículos estão ligados pelo tema do destino, pel palavra-chave “perversos” (r^stfim ) em seus versetos B, pela fonéti ca51 e por sua sintaxe idêntica.52 27 A antítese entre o temor do Senhor (yir’at YHWH\ veja pp. 153-154) e os perversos ( ; veja pp. 164-165) é imprecisa, sugerindo que os perversos não são caracterizados pelo temor do Se n h o r . O predicado indefinido do primeiro, acrescenta ( tôsip ; veja v. 22) dias (yãmim; veja 3.2), é especificado como eterno no versículo 30 e, quanto aos últimos, anos (senôt; veja 3.2) serão curtos (tiqsõrnâ)53 é equivalente a “não existem mais” no versículo 25. Comparado aos re tos, “o pecador, tendo 100 anos de idade, será amaldiçoado” (Is 65.20). 28 Os destinos contrastantes dos retos e dos perversos são expres sos agora em termos de expectativas e esperanças satisfeitas e nãosatisfeitas, prenunciando o assunto de 11.23-27. Expectativa (tôhelet) designa a ação do verbo yhl (“aguardar”, “ter esperança de” algo me lhor). No Salmo 39.7(8) tôhelet é paralelo a qãwâ, “esperar”, sugerindo que não há nada de estranho nos paralelos hebraicos de “alegria” e “perece”. Do reto (saddiqim; veja pp. 149-151), sem exceção, qualifi ca a esperança como aquilo que honra a Deus e faz a comunidade prosperar. Seu objetivo, a alegria (éimhâ), é uma metonimia de resul tado para todas as bênçãos futuras quando os retos triunfarem sobre os perversos (cp. 3.34). Simhâ indica estar satisfeito ou alegre com toda a disposição, como indicado por sua associação com o coração (cp. Êx 4.14; SI 19.8[9]; 104.15; 105.3) enepeS (i.e., desejose apetites, SI 86.4). Essa alegria não é uma disposição reprimida da psique, uma condição inativa, mas sim a alegria que se expressa com espontaneidade e sim plicidade: saltando de alegria (Jr 50.11), batendo os pés e batendo pal mas (Is 55.12), dançando, tocando músicas e dando gritos de júbilo (ISm 18.6; 2Sm 6.12,14). Essa “exuberância dionisiana” é encontrada em festas de casamento (Ct 3.11; Jr 7.34; 25.10), na colheita das uvas para o vinho (Is 9.3[2]; 16.10), na recepção de guerreiros vitoriosos (ISm 18.6), na coroação de um rei (1 Sm 11.15; lRs 1.40,45) e em dias santos (Nm 10.10). Simhâ pode ser um termo técnico para gritos de 51. A consonância dos dentais ocorre cinco vezes no v. 27 e seis vezes —quatro inicialmente - no v. 28, e a seqüência it, q/ {tiqsõrnâ, “são curtos”, e tiqwat, “expectativa” ). 52. Cons. tem. + nom. + predicado:: cons. fem. + gen. cons. “perversos” + imperfeito fem. 53. Qçr no sentido de “ser curto” ocorre em outras ocasiões somente com referência a braços (Nm 11.23), cama (Is 28.20) e mão (Is 50.2; 59.1), todos curtos em termos espaciais.
júbilo (Gn 31.27; ISm 16.6; 2Sm 6.12; lRs 1.40; Is 16.10; Jr7.34).54 Não se pretende nenhuma distinção entre expectativa (tôhelet) e espe rança (tiqwâ) cuja raiz significa esperar por algo ou procurar algo com expectação ansiosa.55 A antítese desse paralelismo se refere a uma inversão das sortes dos retos e dos perversos (^s& im ; veja v. 27). Perece (tõ'bêd) significava, originalmente, “fugir”. Esse significado de 'ãbad foi expandido de modo a ter o sentido de “perecer” com nuanças de se perder (Lv 26.38), se desviar (SI 2.12), ou morrer (Et 4.16). Seu paralelismo impreciso com “alegria” sugere que a alegria dos retos não perece, e que os perversos esperavam experimentar alegria. O provér bio garante aos justos que em sua longevidade, não lhes será negada a celebração jubilosa que acompanhará o ápice das suas vidas cheias de realizações (23.18; 24.14). A esperança de alegria transcendente dos perversos, entretanto, secará e morrerá, apesar de seu desejo de pre servar a vida mediante acúmulo dos seus espólios. O conceito de derek “expectativa”/“esperança”/“anseio” implica numa mudança de sorte para algo melhor. No presente, os malfeitores atormentam os retos (cp. 4.34). “Expectativa” pode pressupor um corretivo necessário para o otimismo predominantemente alegre da seção. No presente os justos podem estar aflitos enquanto anseiam por um futuro melhor. Na teologia bíblica a esperança é fruto tanto da posse quanto da carência. As bên çãos presentes dos fiéis ainda não satisfazem tanto quanto as que, eles esperam pelo desdobramento e a conclusão futura do triunfo de Deus sobre o pecado, o sofrimento e a morte. Antes de experimentarem a concretização da sua visão de bem-aventurança, porém, muitos fiéis com frequência recebem o mal (veja p. 162). O Senhor Jesus, “em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz” (Hb 12.2). Os perver sos esperam manter seus prazeres do presente, mas sua expectativa ter minará num suspiro de morte (Jó 11.20), pois aquilo em que se deleitam é inconsistente com o caráter do Santo que controla o futuro (Pv 11.7,23). 29, 30 Estes versículos estão ligados fonética,56 sintática57 e con54. Ruprecht, TLOT, 3:1274, s.v. im h. 55. As duas raizes ocorrem com frequência em conjunção entre si (cp. Jó 30.26; SI 130.5; Is 51.5; Lm 3.26 [cp. v. 25]; Mq 5.6[7]) ou como um paralelo sinônimo (SI 39.7[8]; Pv 10.28; 11.7; cp. IQH 9:14). 56. Observe o III inicial na segunda palavra de cada verseto: latõm : lepõ'°lé (“os que praticam a iniqüidade/malfeitores” : “os perversos", v. 29) e PôlSm : lõ' “para sempre” : “não”, v. 30. 57. “lrrepreensivel”/"reto” no sing. (cp. pl. no v. 28), “os que praticam a iniquidade”/“perversos” no pl.
ceitualmente. Seus paralelos antitéticos contrastam a estabilidade dos irrepreensíveis/retos com a transitoriedade dos perversos. 29 A segurança dos retos e a perdição dos perversos têm como fundamento o caminho ( derek\ veja 1.15) do Senhor ( YHWH\ veja 1.7). Em 8.22 esta metáfora indica sua obra na criação, mas neste contexto se refere a seu caráter e conduta para revelar e sustentar seus caminhos de piedade e ética, e sua determinação de abençoar os retos e amaldiçoar os perversos (cp. S I 27.11; 67.2[3]; 119.27; 143.8; Mt 22.16; At 9.2; 18.25, 26; 24.14). Em outras palavras, a figura se refere ao governo moral do S e n h o r sobre o mundo e/ou ao seu código de ética. Esse governo é uma fortaleza na montanha (ou um baluarte, mã'ôz).ss A metáfora indica segurança para o irrepreensível (tõm\ veja p. 151) mesmo durante uma tempestade (veja v. 25). Entretanto, o mesmo governo moral é terror ( mehittâ\ veja 10.14, 15) para os que praticam, isto é, executam, a iniqüidade (põ'alê ^ãwen\ veja p. 165). 30 Este versículo lança a salvação e a perdição dos retos e dos perversos, respectivamente, para um futuro eterno. A segurança dos caminhos do S e n h o r representada pela fortaleza na montanha que pro tege dos malfeitores (v. 29) garante que o reto (saddiq; v. 28) nunca (bal 'ôlãm, “não pela eternidade”; veja v. 25; S l 15.5; 30.7[8]; 112.6) é derrubado (yimmôt). Môf significa “balançar ou estremecer e cair de uma base”. O agente implícito da voz passiva é o julgamento final do S e n h o r (veja v. 25; cp. Rm 8.37-39).59 Esse julgamento final também explica por que os perversos ; 2.22; 10.2, 3) não habitarão (yiskenú; veja 1.33) na terra ( ’ãre$; veja 2.21, 22). (c) A permanência e a impermanência das bocas do justo e do perverso (10.31, 32) Os sujeitos continuam sendo os retos e os perversos, e o tema volta ao órgão da fala (vs. 17-21), mas com referência ao seu destino (vs. 22-30). Os versículos 31,32 estão firmemente ligados. Eles têm em comum as palavras-chave “reto” (çaddiq) em seus versetos A e “per versos” (tahpukôt) nos versetos B, os órgãos sinônimos da fala coloca 58. HALOT, 2:610, s.v. mã'6z. O substantivo consiste de mS, indicando lugar, e da raiz üz. que significa "buscar abrigo rapidamente” (C. Shultz, TWOT, 2:652, s.v.' úz). 59. “A primeira cláusula se refere à permanência fisica, não à manutenção da integridade moral" (Toy, Proverbs, p. 218).
dos sintaticamente no início de cada verseto, sendo que “boca de” for ma uma estrutura quiástica, e a mesma estrutura sintática.60 31 A boca (pi; veja 10.6) do reto (saddlq) encontra-se em justa posição contrastante com a língua (le$ôn; veja 6.17; 10.20) dos per versos (tahpukôt; p. 165). A antítese predicativa é imprecisa, sugerindo que será cortada fora (tikkãrêt; veja 2.22) não se aplica à primeira e que a última não produz (i.e., viceja até a produção de; veja n. 20) sabedoria (hokmâ; veja pp. 124-125). Aqui “sabedoria” é uma metonímia para o modo de falar que conduz o destinatário à harmonia com o S e n h o r e com seu governo eterno (cp. 1.2; 10.29), e assim produz vida eterna, da mesma maneira como o pecado produziu, implicitamente, a morte (veja 10.16). O discurso dos retos, que é comparado de modo implícito ao fruto, é degustado com prazer e revigora aqueles que se alimentam dele. O discurso obstinado dos perversos, entretanto, procu ra subverter essa ordem ética sustentada pelo S e n h o r e expressa por sua sabedoria revelada (veja 2.12; 8.12). Uma vez que não está de acordo com a realidade suprema, esse modo de falar é uma mentira (veja 6.24). O S e n h o r é o agente que corta fora a língua deles, como é indicado pelos ditos introdutórios de Yahweh (vs. 22,27; cp. v. 29). Ele sustentará seu governo pela expurgação do discurso subversivo que corrompe a boa terra, prejudica a comunidade e desafia sua soberania. 32 Este versículo define o caráter das pessoas em função da natu reza dos discursos. “Sêneca, o filósofo romano do primeiro século a.C., observou, ‘O modo de falar é o indicador da mente’.”61 Os lábios do reto (éiptê saddiq; veja 10.21) se contrapõe a boca dos perversos (pi ^sW im ; veja 10.6, 11). Mais uma vez os paralelos predicativos são imprecisos, sugerindo que sabem (yêde'ün; veja 1.2) o que é agradá vel (rãsôn; veja 8.35) significa que não se envolvem com o que é perverso (tahpukôt v. 31). Aqui rãsôn é uma metonímia para o discur so que encontra o favor do S e n h o r e, possivelmente, da humanidade. Ela indica que o orador busca o favor e, tendo-o encontrado, encontra uma bênção do S e n h o r . Os perversos, ao contrário, calculam como podem ser os advogados do diabo, para confundir o julgamento moral de outros e subverter o governo de Deus.62 Quando o S e n h o r retém o seu favor, a destruição deles é certa. 60. Cons. + gen. + conjugação prefixai + acusativo e cons. + gen. + conjugação prefixai. 6 1. Citado por Cohen, Proverbs, p. 64. 62. De acordo com McKane, Proverbs, p. 424.
1 Balanças enganosas são uma abominação para o S e n h o r , mas um peso satisfatório encontra o seu favor. 2 O orgulho vem, e depois vem a desgraça, mas com os modestos está a sabedoria,63 3 A integridade dos honestos os guia; mas a perversidade dos traiçoeiros os devasta.M 4 A riqueza de nada aproveita no dia da ira,65 mas a retidão livra da morte. 5 A retidão do irrepreensível fa z o seu caminho reto, mas pela sua própria perversidade o perverso cai. 6 A retidão dos honestos os livra, mas por [seu] anseio66 os traiçoeiros são capturados. 7 Quando um ser humano67 morre, a esperança6* perece, e a expectativa de força69 perece.10 8 O reto é livrado71 da adversidade, e12 o perverso chega a seu lugar. 63. É melhor entender o verseto B como uma cláusula nominal. Se o poeta tivesse a intenção dc omitir “vem", ele teria escolhido o substantivo abstrato “modéstia”, não o adjetivo. 64. Considerando Qal imperfeito ^SoddSm de Sdd (veja GKC #67n). K traz ufisoddãm (vau e substantivo soddSm, “mas... é sua devastação” ). ATarg. mantém o vau de K e procura fazer sentido do verseto: “mas os assaltantes são exilados e esmagados”. 65. Relacionado a II 'br (HALOT, 2:780-82, s.v. 'br e'ebrã), não I 'br (“passar sobre”,pace BDB, pp. 716, 720, s.v. 'Gbar,'ebrâ\ cp. Pv 14.16; 20.2). 6 6 .0 TM parece trazer “através do anseio de, os perversos serão capturados”. Hawwat é combi nado de maneira estranha com bgdym e, no entanto, separado desse termo pelo acento disjuntivo rebí°' mugrõsh. Estará cumprindo uma função dupla numa elipse: “... anseio [dos traiçoeiros], os traiçoeiros...?”. McKane (Proverbs, p. 79) soluciona o problema mudando a forma para o pl. hmvwôt. A LXX pode ter lido hawwõtõm, interpretando kawwâ como "destruição”. O mais provável é que “seu” tenha sido acrescentado para facilitar a tradução. Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Philology, p. 2 1) considera a forma como a escrita fenícia normal do substantivo fem. sing., encon trando apoio na mesma sintaxe e acentuação que envolve da'at em 11,9b. 67. A maioria dos mss. medievais do TM, Targ., Sir., e Vulg. trazem 'Qdãm rSí5' (“uma pessoa perversa” cp. KJV, NASV, NAB, NJPS, REB, NIV, NRSV), mas a tradução segue dois mss. hebraicos que omitem rs' pois as evidências internas favorecem sua omissão. É preciso admitir, porém, que o tema de 11.1-6 e 8 trata da sobrevivência dos retos em contraste com a morte dos perversos. 68. A Targ. e a Sir. trazem “sua esperança”, o que provavelmente é uma paráfrase (cp. NIV, NRSV). 69. Pl. abstrato (IBHS, pp. 120-21, P. 7.4.2a) e gen. de origem. 70. Para a alternância entre o imperfeito habitual e o perfectivo gnômico, veja IBHS, p. 500, P. 31.1. le, #6. 71. Um perfectivo gnômico (IBHS, p. 488, P. 30.5. lc). 72. Kau-consecutivo indicando sucessão (IBHS. pp. 547-48, P. 33.2. Ia).
Em 11.9-15 voltará a tratar das palavras e da comunicação, mas com referência a seu serviço à comunidade (11.9-15; cp. 10.11-14), não à estabilidade pessoal (10.31, 32; cp. 10.6-9). Entre estas duas subunidades sobre as palavras, 11.3-8 desenvolve o tema da segurança por meio da honestidade (11.1, 2) e da retidão (11.3-8). (1) Segurança mediante a honestidade (11.1,2)
A palavra-chave “favor” (rãsôn) liga 1.1 com 10.32. A retidão e o discurso honesto trazem o favor de Deus e segurança (10.31a, 32a), como também o faz a honestidade no lugar de trabalho (11.1). Entre tanto, uma vez que Deus abomina a perversidade, quer pela fala (10.32) quer por práticas enganosas (11.1), os perversos serão cortados. O padrão de avaliação muda de + :- (10.27-32) para -: + (11.1,2), talvez para sinalizar uma nova subunidade. Os versículos 1,2 dizem respeito às avaliações honestas no mercado a fim de se obter o favor de Deus (v. 1) e de si mesmo a fim de ser sábio (v. 2). Os dois provérbios também estão ligados foneticamente pela notável aliteraçâo de r^sônô (“seu fa vor”), a última palavra do versículo 1, ezãdôn (“orgulho”) e qãlôn (“des graça”) no versículo 2a. A menção explícita da repugnância moral do S e n h o r em 11.1, acarretando em seu julgamento, ressalta que ele é o agente que determina o destino dos retos e dos perversos. De outro modo, com exceção de 11.20, ele se encontra quase inteiramente escondido nas sombras desta subunidade sobre a segurança e a transitoriedade. 1 Nos paralelos antitéticos de 11.1 os sujeitos, os pratos e pesos de uma balança, são distribuídos entre os dois versetos. Balanças (i.e., os dois pratos da balança) podiam ser falsificadas pelo uso de pratos im precisos ou de um travessão torto, ou ainda, pelo manejo indevido. Não é possível determinar se a referência é a uma balança de mão, como se pode ver no modelo hitita. Enganosas (m irm â)73 denota um intento malévolo de enganar uma vítima a fim de lesá-la. Aqui se refere à antítese de uma medida satisfeita (20.23; Os 12.7[8]; Am 8.5). Ao con trário de seu sinônimo kãzãb, “mentir”, este ressalta a ideia de dano provocado mediante fraude.74 Essas balanças são uma abominação para o S e n h o r (tô'abat YHWH, i.e., suscitam o seu ultraje moral e 73. Mirmâ é associado com “dificuldade” e “calamidade" (Jó 15.35), "homens sanguinários” (SI 5.6(7]), “os perversos” (36.3[4]; 43.1; 109.2), “fazer o mal” (38.12[ 13]), “fraudulenta” (52.4[6]), “mentiras” (10.7), e “violência” ( Sf l . 9; cp. Dn 8.25). 74. ANEP, p. 36, pl. 117.
punição [3.32; 20.10,23; cp. Lv 19.35,36; Dt 25.13-16; Ez 45.9, 10; Os 12.7(8); Am 8.5; Mq 6.10, 11]). Entretanto, um peso, com o sentido específico de 'eben (“pedra”) satisfeitório (ou inteiro e sem ranhuras [âãfôm], o sentido básico de èãlôm; veja 3.2), encontra o seu favor porque o agrada (/^sônô; veja 10.32; 12.22; cp. rãsâ em 16.7). “Na Antiguidade, os pesos eram pedras... com bases planas e esculpidas em diferentes formatos que facilitavam sua identificação (e.g., tartaru gas, patos, leões). Era comum trazerem gravados o peso e o padrão seguido. Os pesos eram carregados numa bolsa ou estojo de couro (Dt 25.13; Mq 6.11; Pv 16.11) para que o comprador pudesse verificar os pesos usados pelos comerciantes de determinado local (Gn 23.16).”75 Um negociante inescrupuloso carregava pesos diferentes em sua bolsa (Dt 25.13; Pv 16.11), um pesado demais para compras, e um leve de mais para vendas. Exteriormente, os comerciantes desonestos defraudam seus próximos e, interiormente, negam a Deus. O Criador e sustentador da ordem moral tem aversão a eles, e sua sensibilidade moral ofendida exige uma reação ativa; de outro modo, ele seria relegado à posição de um expectador. As pessoas honestas, que buscam o seu favor e o encontram, creem que ele concede as bênçãos duradouras de vida e prosperidade (veja 8.35). Esse ensino era particularmente ne cessário em função dos instrumentos de medida rudes usados no antigo Oriente Próximo. As balanças antigas tinham uma margem de erro de até 6%, e poucos pesos hebreus com o mesmo valor gravado se mostra ram exatamente iguais.76 O temor de Deus na consciência também ensi na medidas honestas.77As medidas precisas de Provérbios dizem respei to a várias práticas comerciais (cp. Mt 7.12; ICo 6.8; Fp 4.8; lTs 4.6). 2 Este provérbio emparelhado volta a apresentar primeiramente avaliação desonesta, seguida da rejeição do domínio do S e n h o r . Orgu 75. D. J. Wiseman, NBD, p. 1.245, s.v. “Weights and Measures". 76. Ibid. 77. A instrução egípcia Amenemope (17.15-20) exigia quantidades fiéis: “Guarda-tc de disfarçar a medida, de modo a falsificar suas frações... Medindo de acordo com seu tamanho verdadeiro, tua mão nivelando com exatidão” (AEL, 2:156-57). O código de Hamurabi (P. 94) diz: "Se um comer ciante emprestou cereais ou dinheiro com juros e, quando emprestou com juros pagou o dinheiro usando o peso pequeno e os cereais pela medida pequena, mas quando recebeu de volta pesou o dinheiro com o grande e os cereais com a medida grande, esse comerciante deve abrir mão daquilo que emprestou” (ANET, p. 169). O Hino a Shamash ensinava: “Aquele que opera as balanças com falsidade, que muda deliberadamente os pesos de pedra e diminui o seu peso fará a si mesmo mentir por lucro e depois perderá sua bolsa de pesos” (ANET, p. 388). O Talmude instrui: “o dono de uma loja deve limpar suas medidas duas vezes por semana, os seus pesos uma vez por semana e suas balanças depois de cada pesagem" (Cohen, Proverbs, p. 65).
lho {zãdôn) indica um estado psicológico no qual o indivíduo possui uma opinião exagerada de si mesmo que não corresponde à realidade social. Sua personificação pelo verbo vem (6o ’) indica que a arrogância encontra o favor dos perversos. A desgraça (qãlôn; i.e., falência social; veja 3.35) vem porque a presunção da importância própria implica na usurpação da autoridade que pertence por direito ao S e n h o r e a outros em cargos de autoridade, implica na provocação e até mesmo na rebelião contra o seu governo (veja 13.10; 21.24; cp. 6.17; 16.18, 19; 18.12). Os perversos chamam o orgulho para vir como seu convidado, mas como uma gêmea inseparável, a desgraça o acompanha sem ser convidada.78 A repetição da palavra vem (wayyãbõ ’; veja 6.11) e a aliteração de zãdôn e qãlôn enfatizam o caráter inseparável dos convidados desejado e indesejado. O texto não esclarece de que maneira ocorre sua falência social. Em última análise, ela é executada pelo S e n h o r que sustenta a ordem social, como é declarado explicitamente em 3.34 (cp. Gn 11.5-8; Nm 12.2, 10; 2Cr 26.16-21; Et 5.11; 7.10; Dn 5; Lc 18.14; At 12.22, 23). Contrastando com isso, com ( 'et; i.e., na companhia de) os modestos {fn ü 'im ) está a sabedoria (veja pp. 124-125), pois eles julgam os limi tes precisamente, os aceitam calmamente e se amoldam a eles confiadamente.79 Tendo em vista o significado essencial de sn', “ser criterioso” quanto aos relacionamentos e, assim, ser cauteloso e “circunspeto”, “mo desto” é um antônimo preciso de “orgulho”, uma opinião exagerada que excede os limites.80A antítese imprecisa “vem a desgraça” versus “está a sabedoria” sugere que a sabedoria termina em honra (veja 3.35) e que a desgraça é o resultado final da insensatez (cp. 16.18). Paradoxalmente, o exaltado é humilhado enquanto que o humilde é exaltado. (2) Segurança mediante a justiça (11.3-8) Os versículos 3-8 desenvolvem o tema da segurança exclusiva mente por meio da retidão e da certeza de que a morte é o “não” final de Deus para os perversos. Uma avaliação modesta de si mesmo em 78. Dc acordo com Meinhold, Sprüche, 1:186. 79. Meinhold, Sprüche, 1:186. 80. Além desta passagem, §ri só ocorre como forma verbal em Miqueias 6.8. HALOT (3:1039, s.v. ?n") permitindo os significados “cauteloso, cuidadoso, sábio, razoável, atencioso [circuns peto]”. Stoebe ( TLOT, 3:1088, s.v. çn‘) argumenta a favor do significado "comportamento criterioso” considerando Provérbios 13.10, redigido de forma análoga, no qual “aqueles que aceitam conselho” é contrastado com z S d ô n , “arrogância”, “insolência”, “orgulho”. Em Eclo 34.22 ele traduz como “circunspeto”.
sujeição a Deus e dentro da sociedade (v. 2b) lança o alicerce para a integridade moral nos relacionamentos humanos (cp. 6.12-19). Os ver sículos dentro desta subunidade (vs. 3-6) que se referem a princípios motivadores contrastantes, são unidos firmemente por palavras-chave e seus sinônimos. As raízes nominais incluem sdq (“reto”; vs. 4b, 5a, 6a), tmm (“integridade/irrepreensível”; vs. 3a, 5a), cySr (“honestos”; vs. 3a, 6a)81 em contraposição com bgd (“traiçoeiros/perversos”; vs. 3b, 6b) e rs' (“perversos”; vs. 5b; cp. v. 8b). Os verbos incluem t§l (“livrar”; vs. 4b, 6a; cp. o sinônimo hls no v. 8a) em contraposição com Sdm (“devastar”; v. 3b),ypl (“cair”; v. 5b), Ikd (“capturar”; v. 6b; cp. o sinônimo ’bd, “perecer” no v. 7). Esta unidade consiste de dois pares de provérbios ou quatro quartetos antitéticos, versículos 3, 4 e 5, 6. Por meio de repetições, os dois pares enfatizam o poder salvador da integri dade e retidão dos honestos. Estas virtudes os guiam e endireitam os seus caminhos (vs. 3a, 5a), e os livram da morte (vs. 4b, 6a). Entretan to, a perversidade dos traiçoeiros devasta provocando sua ruína final (vs. 3b, 5b, 6b). A seção é concluída com duas admoestações. Primei ra, nenhum mortal é capaz de salvar outro (v. 7) e quando o S e n h o r salva os retos de suas adversidades presentes, fica implícito que ele coloca os perversos em seu devido lugar (v. 8). 3, 4 A riqueza que os subversivos e traiçoeiros acumulam em sua rebelião contra o governo do S e n h o r e à custa de outros se voltará contra eles e não os salvará no tempo da ira de Deus (vs. 3b, 4a). Contrastando com isso, a integridade dos honestos os guiará à salvação (v. 3a), e sua retidão os protegerá do julgamento vindouro que sobrevirá aos perversos (v. 4b).82 3 O provérbio declara os princípios intemos opostos que orientam o retos e os perversos. A integridade (tummat; i.e., inteireza, completude, totalidade que se reflete em atos concretos; veja 2.7) dos honestos (y®sãrim; veja 1.3) os guia (tanhêm; veja 6.22) em meio à adversidade para o refugio que é seu destino. O estilo de vida de completa lealdade ao S e n h o r e aos outros é o bem inalienável daqueles que, por definição, não se desviam do caminho reto divinamente revelado. O resultado de des frutar de liberdade dentro da forma e de liberdade dentro da lei os conduz como um pastor pelo caminho da segurança e salvação. O caminho “reto” de José até o trono do Egito o conduziu pela escravidão e pela prisão, da 81. Veja pp. 145-151. 82. Sua primeira e sua última palavras, tmt e mmwt apresentam uma seqüência quebrada.
mesma maneira como o caminho do S e n h o r para a Jerusalém celestial o fez passar pela cruz e o sepulcro na Jerusalém terrena. A perfídia dos desleais, entretanto, se voltará contra eles com tanta ferocidade que os destruirá completamente. Perversidade (selep; veja 15.4, sua única ocor rência, e “subverte” em 13.6) indica a atividade negativa que derruba alguém ou algo e o coloca de cabeça para baixo. Numa demonstração da predileção do sábio por palavras que dizem respeito à retidão geométrica pela virtude ética, esta raiz indica “distorcer, perverter” e, portanto, “der rubar” a verdade por meio do discurso (cp. Êx 23.8; Pv 15.4) ou de outro comportamento que causa/conduz algo ou alguém à ruína (Jó 12.19; Pv 13.6; 19.3; 21.12). A perversidade é o bem inalienável dos traiçoeiros (bô^dim-, veja 2.22) e os devasta (ou despoja^ S o d d êm ; veja n. 64).83 O Qal apresenta o sujeito no ato momentâneo de lidar com eles com violência; o Piei (somente em Pv 19.26; 24.15) representa o objeto no estado contínuo de ser tratado com violência.84 4 O versículo 4b repete 10.2b. Este paralelismo antitético contrasta as causas, riqueza (veja 3.9) e retidão (sedãqâ) com suas respectivas conseqüências, de nada aproveita {lõ ’ yô'tt) e livra da morte (tassil m immãwet).85 O que se tem em vista é a riqueza desdourada, não ho nesta (cp. 3.9; 8.18; 10.22). Provérbios 10.2, cópia deste verso, coloca “tesouros da perversidade” no lugar de “riquezas”; aqui a riqueza está ligada a no dia da (beyôm ; veja 6.34) ira ('ebrâ). 11.4a intensifica seu paralelo em 10.2a a partir de uma declaração de que a riqueza ilícita de nada aproveita de modo que ela atrai sobre si a ira de Deus. O que está em vista é a ira de Deus, pois ela é equiparada à morte no verseto B, e somente Deus tem o poder de vida e de morte. Quando usado em relação a Deus, 'ebrâ é um sinônimo de hêmâ (“ira”; veja 6.34), mas acrescen ta ao termo a nuança de ferocidade; ela expressa uma devastação es magadora e total (Is 13.9). A ira de Deus arde, transborda e devasta tudo diante de si (cp. Ez 22.21, 31). No dia da 'ebrâ do S e n h o r nada pode impedi-la.86 Os perversos, que acumulam riquezas por meio da 83. HALOT,4'-\4\9,s.v. sdd. 84. E. Jenni, Das Hebrãische Pi ei: Synlaktisch-semasiologische Untersuchung einer Verbalform imAllen Teslamenl (Zurique: EVZ, 1968), p. 209. 8 5 .0 verseto A ressoa com a assonância de /o/ em suas quatro primeiras palavras: lõ ’-yó'í l hón IPyôm. Os versetos sào ligados por assonância com o lál final no quiasmo de 'ebrá e sPdttqâ em sua parte central e com as aliteraçôes quiásticas dc I tl l em yõ W l t a & í l (de acordo com McCrecsh, Sound and Sense. p. 60). 86. De acordo com J. Emerton. “Notes on Jercmiah 12:9 and on Some Suggestions of J. D. Michaelis about the Hebrew Words nSchâ, 'ebrâ cySdâ", ZAW 81 (1969) 189.
injustiça e da opressão para protegerem a si mesmos, desagradam o Se de tal modo que ele libera sua ira contida contra a cidade fortificada dos iníquos e esta não pode salvá-los (cp. 10.15). O paralelo “da morte” traz à mente uma catástrofe que sobrevêm aos indivíduos perversos (cp. Is 10.3; Ez 7.19; Sf 1.14-18) ou uma calamidade final que sucederá aos perversos quando não houver mais retos na terra (veja 2.21, 22). 5, 6 Estes versículos se encontram relacionados por seu tema co mum (i.e., a retidão salva e a apostasia condena), por sua sintaxe se melhante,87 pela anáfora do termo inicial sidqat (“a retidão do[s]”) em seus versetos A e be (“pela/por”) em seus versetos B. Ambos asseve ram os princípios contrários que orientam os irrepreensíveis/retos e os perversos/traiçoeiros, ligando-os ao versículo 3. Os versículos 5 e 6 diferem essencialmente apenas em suas metáforas: “caminho” (de uma jornada) e “capturados” (de um animal). O progresso correto dos ho nestos pelo caminho no versículo 5a é intensificado para o seu livra mento da morte no versículo 6a. A ligação mostra que a retidão do caminho deve ser avaliada à luz de seu resultado. Os perversos do versículo 5b são definidos de maneira mais exata como apóstatas im prestáveis no versículo 6b, e sua perversidade é atribuída à sua cobiça desenfreada. Os dois versículos reforçam o apelo para assumir um compromisso irrestrito com aquilo que é certo. 5 A retidão (sidqat ) é um bem inalienável do irrepreensível (tãm im ) faz reto (fíyaSSêr; veja 3.5, 6) o seu caminho (veja 1.15).88 Entretanto, pela própria perversidade (berish'ãtô ; veja 4.17), que é o princípio interior do perverso, o perverso (rãsã ' veja pp. 164-165) cai (yippõl ; cp. 1.14), o que significa, nesta metáfora do caminho, que vai violentamente para a sua morte e destruição.89 A antítese entre “faz reto o seu cami nho” e “cai” na parte central sugere uma ausência de obstáculos que possam fazer o reto tropeçar (veja 10.17). A lealdade da comunidade para com o peregrino que está inteiramente comprometido com aquilo que é certo tomará o seu caminho plano e/ou reto, enquanto que o com portamento antissocial do perverso o fará tropeçar e causará sua queda. Não existe nenhuma tensão entre o S e n h o r , que toma o caminho dos seus santos reto (veja 3.5,6), e seu próprio caráter reto que produz um cami nho livre de ciladas e despenhadeiros mortais (veja 11.3,6; cp. 2.8,11). nhor
87. Cons. nom. +■adj. + verbo. fem. sing. + prep. b. 88. Veja p. 150.
6 Este versículo matiza a ausência de obstáculos no caminho dos irrepreensíveis. Quando são confrontados com as armadilhas da morte, sua retidão os livra. Ajustiça (sidqat ) também é o bem inalienável dos retos (^S ã rim ) e os livra (tassilêm ; veja v. 4). Uma vez que a irrepreensibilidade é crucial para o estilo de vida dos honestos (cp. v. 3), sua retidão é o fator decisivo para a sua avaliação (v. 6a). O texto não diz do que eles são salvos, mas a metáfora do paralelo antitético, “são capturados”, sugere que se trata da cova ou das armadilhas da morte (veja 10.2; 11.4). Contrastando com isso,p o r [sew] anseio ( behaw w at ; veja 10.3) os traiçoeiros (bõg?dim\ veja p. 165; 11.3b) são captura dos (yillãkêdü ; veja 3.26; 5.22). A perversidade, que ataca a comuni dade e vitima o próprio indivíduo (v. 5b), é motivada pela cobiça ativa e pela relutância de ser restringido pelas leis de Deus (cp. 4.16, 17). O anseio desenfreado dos perversos é, provavelmente, uma metonímia para aquilo que eles tomaram indevidamente de outros e que os “captura”.90 7 No meio dos provérbios antitéticos que detalham as conseqüências fatais da retidão e da perversidade, este provérbio sinônimo, usando um padrão declara a futilidade de se confiar em mortais. A esperança depositada neles morre com eles; todas as promessas de poder resul tam em nada (cp. 10.28; Sl 49.5-12[6-13]). Escribas e tradutores anti gos acreditavam equivocadamente que o texto original do verseto A significava que a esperança de qualquer pessoa, incluída até mesmo a dos retos, perece quando ela morre (cp. n. 68). Eles removeram este sentido não ortodoxo (cp. 10.28; 12.28; 14.32; 23.17,18) acrescentan do “perversos” (rãSa) a 'ãdãm (“seres humanos”), sobrecarregando desse modo o verseto A em comparação, até aqui, com todos os verse tos da Coleção II, e tomando 'ãdãm uma tautologia. A LXX preservou a ortodoxia de modo diferente: “Quando um homem reto morre, a espe rança não é cortada, mas a jactância dos ímpios perece”, pressupondo com isso a imortalidade dos retos. Essa mudança também facilitou a leitura do paralelismo antitético esperado.91 Porém o suposto texto ori ginal, atestado por apenas dois manuscritos, deve se referir à esperan ça dos insensatos e dos perversos, pois estes confiam na humanidade, não em Deus, ao contrário do que fazem os retos (Pv 3.5; 18.10; cp. Sl 49.5-12[6-13]). Quando um ser humano ('ãdãm; veja p. 139) morre 90. Dc acordo com Meinhold, Sprüche, p. 188. 91. A. J. Baumgartncr, Elude critique zur Vêtat du texle du Livre des Proverbes (Leipzig: W. Drugulin, 1890), pp. 105, 110-11.
(bemôt) se refere aqui à morte física (cp. 5.23; 10.27). A esperança (tiqwâ ) diz respeito à expectativa de alguma coisa boa que os perversos colocam na existência continuada dos mortais. Assim como “esperança” é paralela a “ser humano” nas duas metades do verseto A, assim tam bém perece (tõ 'bad; veja 10.28) é paralelo a “morre”. Quando John Kennedy morreu, em 1963, as esperanças que os norte-americanos deposita ram nele desapareceram. O conjuntivo e (vau) é epexegético; o verseto B explica o pensamento de que “a esperança perece” (cp. 11.10a(3). Expectativa (tôhelet; veja 10.28) é um paralelo sinônimo de “esperan ça”; os dois termos implicam esperar algo de bom. O termoforça ( ’ônim) ocorre 12 vezes e é usado como metonímia para os descendentes do poder generativo (Gn 49.3; Dt 21.17; Sl 78.51; 105.36), para a força física (Jó 40.16; Is 40.29; Os 12.4[5]), para o poder sustentador de Deus (Is 40.26) e para a riqueza (Jó 20.10; Os 12.8[9]). Seu paralelo, 'ãdãm, mostra que se trata da força física e da concessão de poder. Mas quando o indivíduo morre, esse recurso perece ('ãbãdâ] veja Pv 10.28). 8 O verseto A implica que o perverso (rãsã') se aproxima do su cesso, pois o justo (saddiq ) é livrado (ou arrebatado, nehelãs )92 da adversidade (ou aflição; veja 1.27)93 pelo S e n h o r . E significa que na ocasião em que o S e n h o r livra o reto, o seu atormentador chega (veja 11.2) a seu lugar,9* a saber, no âmbito da aflição (cp. 3.34). Por exem plo, o perjuro que visa a morte do inocente é, ele próprio, condenado à morte (Dt 19.16-18; cp. Et 5.14; 7.10; 9.1 -10; Dn 6.23, 24[25, 26]; Lc 16.25). Essa retidão clara deve ser vista à luz da eternidade. “Mais 92. Hãlas tem a ideia original de “escapar, se retirar" (C. Barth, TÜOT, 4:438, s.v. chslaç), mas não é possível provar que essa etimologia o distingue de outros verbos no âmbito semântico do livramento. Seus paralelos são, entre outros, n$l, “livrar”, originalmente, "puxar para fora” (2Sm 22.20; cp. Pv 2.12, 16; 6.3, 5; 10.2; 11.4, 6), c o Hifil ySSa', originalmente, “abrir espaço para alguém” (Sl 6.4[5]; cp. Pv 20.22; 28.18). As traduções desses verbos nas versões antigas sugerem que não se pcrccbia nenhuma diferença semântica fundamental entre eles. “No entan to, hBlas pressupõe que o S e n h o r é o libertador. Em todas as passagens o sujeito que realiza o ato de livramento é Yahweh... As formas passivas nos Salmos 60.7(5); 108.7(6); Provérbios U.8s. não mencionam nenhum sujeito explicitamente, mas o contexto nâo deixa dúvidas: somente Yahweh providencia para que os homens ‘sejam libertos’” (Barth, TDOT, 4:439). 93. SSrá ê derivado de uma raiz que significa "ser estreito, restrito, apertado" (HALOT, 3:1053, s.v. ?ãrá) e é usada para sofrimento fisico e/ou mental extremo (veja 1.27) e/ou para o estado de extrema necessidade ou infortúnio (Is 8.22). De qualquer modo, a dificuldade produz angústia. 94. Tahat, que tem o sentido fundamental de “abaixo” (IBHS, 11.2.5), é usado aqui com o sentido abstrato de “em troca de”, como na lei da retaliação (e.g., “olho por olho”, “dente por dente” ; Ex 21.24 e Lv 24.20), não no sentido de substituição (cp. Gn 22.13; Pv 21.18). A tradução da LXX, a n ti- pode significar “em troca de” ou “em lugar de” (B. Waltke, “The Theological Significance o f ’ANTi and HUPER in the New Testam ent” [dissertação de Th.D., Dallas Theological Seminary, 1958], pp. 98, 102).
cedo ou mais tarde o perverso se toma herdeiro permanente das difi culdades com as quais o reto se depara apenas de passagem”95 (veja 3.1-12; 10.28). Nesse ínterim, “a justiça divina se manifesta neste mun do apenas como um prelúdio, mas não de maneira perfeita e final”.96 d. Janus: segurança da língua destrutiva mediante o conhecimento (11.9) 9 Com a boca o enganador destrói o seu próximo, mas por meio do conhecimento os retos se livram.
Por um lado, os versículos 8 e 9 estão unidos em sua estrutura externa por “reto(s)” e “ser livrados/se livram” (vs. 8a e 9b), uma for ma hebraica única no livro de Provérbios. Fica implícito que os retos se encontram numa situação aflitiva em decorrência do modo de falar de um perverso. O quiasmo sugere que os retos são livrados (v. 8a) por seu conhecimento (v. 9b), e que os perversos são afligidos (v. 8b) pelo próprio discurso destrutivo (v. 9a; veja vs. 10,11). A opressão dos retos não é encoberta, mas sim colocada dentro da perspectiva da sua salva ção dela. Por outro lado, o versículo 9 está ligado aos versículos 10-15 pelo tema das “palavras na comunidade” e outras características poé ticas. Em resumo, o versículo 9 funciona como um ja n u s entre os ver sículos l-8 e o s versículos 10-15. 9 Os paralelos antitéticos do versículo 9 justapõem os temas do en g an ad o r (h ã n ê p f1 e dos retos (veja pp. 149-150) com seus respectivos predicados d estró i (yaSh .it; veja 6.32) o seu próxim o (veja 3.28,29) e se livra m (yêh alêsü ; veja 11.8); e seus respectivos meios, com a b oca (veja 10.31, 32) e p o r m eio do conhecim ento (veja p. 125). Os paralelos antitéticos imprecisos sugerem que o próximo não é reto. Uma vez que 95. Martin, citado por Cohen, Proverbs, p. 66. 96. Delitzsch, Proverbs, p. 234. 97. HALOT (1:335-36, s.v. hõnêph) define hãnèp como "ímpio”, “alienado de Deus”. Mas K. Seybold (TDOT, 5:37-38, s.v. changph.) observa: “passagens com sujeitos humanos pessoais, que envolvem principalmente formas nominais, indicam conduta antissocial que usa de hipocrisia e engano para enganar a si mesmo e aos outros. Ao observarmos a ligação com o discurso falso (Pv 9.11 [i/c/ 11:9]; Is 32.6; 9.15 [na ARA, v. 17]; Jr 23.11, 15), chegamos á seguinte paráfrase: ‘enganador, mentiroso, hipócrita, vil, santarrão, secretamente pérfido’...” Ele apoia esse signifi cado com o hebraico da Mishná, com o aramaico judaico e com duas versões da palavra na LXX. Aquila, Teodócio e Símaco traduzem o termo aqui como hypokrilSs, “fingidor, dissimulador". A palavra é usada com mera. “malfeitor” em Isafas 9.16 e em paralelo com “pecadores” (Is 33.14), “os perversos” (Jó 20.5), “todos quanto se esquecem de Deus” (Jó 8.13), e “ímpio” (Jó 27.8).
não é fortalecido pela retidão, o vizinho incauto é desencam inhado pelas manifestações de am izade e destruído, mas os retos, que entesouraram conhecim ento (10.14), veem o que se encontra por trás da m áscara do enganador (28.11). Ao saber o que dizer, com o expressar isso e quando falar (12.6, 13; 14.3), eles salvam a si mesm os da armadilha.98 e. Palavras na comunidade (11.10-15)
10 Na prosperidade dos retos a cidade exulta, e quando os perversos perecem há um grito de louvor. 11 Pela bênção dos honestos uma cidade é exaltada. mas pela boca dos perversos ela é destruída. 12 Uma pessoa que não tem senso despreza99 o seu próximo, mas uma pessoa criteriosa refreia a sua língua. 13 Aquele que se põe a agir como um caluniador é quem revela um segredo, mas aquele que é fiel em espírito é aquele que oculta uma palavra. 14 Onde não há nenhuma orientação um povo cai, mas a segurança [se encontra]m na multidão de conselheiros.101 15 O indivíduo102 sofre danos gravemente103 quando se torna fiador de um estranho, 104 mas o que detesta bater [palmas] è o que está seguro.m A subunidade de 11.9-15 reitera o poder das palavras de revigorar ou destruir a com unidade (veja 10.6-14). Goldingay observa as palavras em pregadas para a comunidade: próxim o, cidade e nação.106 O versículo 98. Greenstone, Proverbs, p. 115. 9 9 .0 imperfeito habitual paralelo sugere que bãz c Qal perfectivo, não ptep. (cp. Zc 4.10). 100. A preposição bete implica que rSb é coordenado por um verbo omitido (IBHS, p. 224, P. 11.4.3d). 101. Em enumerações o hebraico emprega a forma sing. para o pl. (IBHS, p. 224, P. 11,4.3d). 102. Sujeito indefinido (cp. 12.14; IBHS, pp. 70-71, P. 4.4.2a). 103. Um acusativo interno (IBHS, p. 167, P. 10.2. lg). Não há necessidade de se corrigir para o Qal inf. absoluto não atestado ou explicar como seu equivalente (pace Fichtner [BHS\\ Toy, Proverbs, p. 230; Plõger, Sprüche, p. 134). 104. Com exceção da Vulg., as versões antigas entendem o versículo erroneamente. A Targ., por exemplo, traz, “O homem perverso faz o mal a um homem reto, uma vez que este é fiador de um estranho, e odeia aqueles que depositam sua esperança em Deus”. Ao que parece, a Targ. entendeu que o homem reto foi fiador de um estranho graças à sua confiança em Deus. 105. A. Jepscn, TÜOT, 2:93, s.v. bafah. 106. J. E. Goldingay, “Proverbs”, in NBC: 2Isl Century Edition (Leicester, Eng., e Downers Grove, III.: Inter-Varsity, 1994), p. 595.
15 fala sobre se tomar fiador, mas convém lembrar que isso é feito por meio de palavras e deve ser resolvido por meio do discurso insistente (6.1-5).107 Estes versículos são unidos por padrões complexos. Supondo que o versículo 9 é um janus entre duas unidades, ele consiste em quatro quartetos: os versículos 8,9 tratam da vindicação dos retos; os versículos 10,11, da integridade pessoal e do bem-estar da comunidade; os versícu los 12, 13, do desprezo e da calúnia; e os versículos 14, 15, do silêncio e discurso discreto e indiscreto.108 Os versículos 8-11 estão ligados pela justaposição de “retos” e “perversos”. Nos versículos 9 e 11 todos os versetos A começam com be e todos os versetos B começam com übe; os versículos 12 e 15 também começam com 6. Os versículos 11 e 12,13 estão ligados pelo discurso imprudente e os versículos 13, 14 por sôd, “conselho secreto” eyô'ês, “conselheiros”, que formam um sôd, “conse lho”.109 Os versetos 9a e 11b dizem respeito à “boca (peh) dos perver sos”, e os versículos 9 e 12 estão ligados pelo discurso destrutivo contra o próximo (rê'êhü). Garrett observa, “No versículo 9, o reto escapa ileso dos ataques verbais ao seguir o ensino do sábio e, de acordo com o ver sículo 12, sem contra-atacar no mesmo nível”.110 Nos versículos 12-14 os termos “pessoa que não têm senso”, “caluniador” e “onde não há nenhuma orientação” substituem o termo ético “os perversos”, e “pessoa criteriosa”/“aquele que é fíel”/“conselheiros” substituem o termo ético “os retos”. Os versículos 9-13 se referem ao discurso construtivo e des trutivo, e os versículos 14,15 constituem uma coda para a seção: há um momento de dar conselho a respeito dos interesses nacionais (v. 14), e um momento de permanecer calado por motivos pessoais (v. 15). Onde os versículos 8-11, com exceção do versículo 9, compartilham do padrão de avaliação +:: -, os versículos 13-15 compartilham do padrão -: +. Os versículos 8-13 encorajam os retos a terem um comportamento prudente quando forem afligidos pelo discurso destrutivo. Provérbios não faz ne nhuma tentativa de explicar o sucesso efêmero dos perversos. 10-11 Os elementos do primeiro quarteto estão firmemente ligados entre si por palavras-chave ou sinônimos,111 sintaxe112 e tema. A pri 107. Meinhold, Sprüche, pp. 189-90. 108. E. Jones, Proverbs and Ecclesiastes: Words o f lhe Wise (Torch Bible Paperbacks; Londres: SCM, 1961), pp. 115-17. 109. Em 15.22 sôd “segredo” (v. 13) eyô‘ê$ “conselheiros” (v. 14) estâo ligados. 110. Garrett, Proverbs, p. 125. 111. “Pessoas retas”/"pessoas honestas", “cidade" (q i r y a t / q õ r e t ), "pessoas perversas”. 112. Be “em/quando” + cons. nom. (“prosperidade”/“bênçâo”) + gen. (“dos retos”/“dos hones tos”) = 3* pessoa fem. t a clõs “exulta”/fSrúm “exaltada” + sujeito (“cidade”).
meira metade destes quatro versetos declara a causa, a sua segunda metade, as conseqüências. O destino merecido dos retos e dos perver sos faz a comunidade se regozijar (v. 10) porque seu bem-estar depen de disso. Estes versículos intensificam o apelo para ser reto, e não perverso, contrastando a avaliação social de seus destinos. Os retos prosperam com a aprovação total da comunidade (cp. 10.8; 28.12, 28; 29.2, 16), mas os perversos perecem em opróbrio. 10 Prosperidade (túb) resume todas as manifestações concreta das coisas que as pessoas desejam, como cereais, vinho novo e azeite e filhotes dos rebanhos e manadas (Jr 31.12). Por definição, os retos usam o seu “bem” {fôb) para promover o bem cívico. Em última análi se, a sua prosperidade não é determinada pela humanidade, mas sim em razão da graça de Deus (Jó 2.10). Quando Deus recompensa o bem deles com o bem, uma cidade (qiryâ; veja 10.15) celebra o triunfo da moralidade. As outras oito ocorrências do verbo traduzido como exulta (ta'alõs ) dizem respeito à alegria jubilosa no culto que acompa nha o triunfo sobre inimigos (veja lCr 16.31,32; Pv 28.12; Sl 9 .2 ,3[3, 4]; 6 8 .2 ,3 [3 ,4 ]).' 13 É sempre “uma vitória já conquistada por Deus ou a ser conquistada por ele, dando a seu povo motivo e liberdade para ‘se regozijar’”.114 Os gritos jubilosos da boca expressam a exultação do coração (veja ISm 2.1). “A cidade exulta” é emparelhado de maneira imprecisa com “gritos de alegria”, sugerindo que o primeiro é omitido no verseto B e o último no verseto A.115 Mas as condições do regozijo diferem radicalmente: “na prosperidade dos retos” em contraste com quando os perversos perecem (veja 10.28; 11.7).116 Um grito de lou vor (rinnâ ) em hebraico pode ser uma expressão onomatopéica para um tipo de grito ressoante de vitória. O Salmo 118.15 diz: “Ouvi! O som de um grito de vitória (rinnâ wisü'â) nas tendas dos justos” [trad. do autor] (cp. Is 14.7; 35.10; 44.23; etc.). O grito de livramento implicava numa confissão de louvor (cp. Sl 35.27; 107.22). A cidade festeja por 113. L. Perdue (Wisdom and Cull: A Criticai Analysis o f the View o f Cull in lhe Wisdom Literatures o f Israel and lhe Ancient Near Easl [Missoula, Mont.: Scholars, 1977], p. 362) documentou que os mestres sábios consideravam o âmbito do culto uma parte importante dentro das ordens da realidade. 114. A. Millard,“ 7? ‘To Exult’”, JTS 26 (1975) 87-89 cm resposta a J. A. Emerton,‘‘Notes and Studies”, pp. 216-20. 115. Essa ligação é ressaltada pela eufonia de âr, r i/e a rima nas palavras finais dos versetos qiryâ e rinnâ (McCreesh, Biblical Sound andSense, p. 78). 116. A seqüência Ib b d tm l reforça a associação desse contraste (ibid.).
que o seu bem-estar depende dessas recompensas justas. Não há motivo algum para se pensar bem dos egoístas e imorais, e eles provarão um fim amargo e solitário. Roma se regozijou com a morte de Nero e, na Revo lução Francesa, o povo se regozijou com a morte de Robespierre. O provérbio deve ser mantido em tensão com 24.17. O indivíduo não deve se alegrar com a queda de um inimigo pessoal, antes deve mostrar amor, pois ele também é um ser humano (cp. 25.21, 22). O próximo par de provérbios (vs. 12, 13) adverte acerca do desprezar qualquer pessoa. 11 A bênção (veja 10.6, 7) dos retos (veja p. 150) significa a con cessão da bênção a eles por Deus e/ou a bênção que os honestos con cedem à cidade por meio da sua presença benéfica e orações. A liga ção com o versículo 10 favorece a primeira interpretação; o paralelo antitético favorece a segunda. De qualquer modo, o honesto media a bênção divina “que opera irresistivelmente, como o fermento na massa, para elevar todo o ambiente [cp. Gn 18.26; 39.5]”.117 Qãret (cidade; veja 8.3) é uma forma secundária de qiryâ no versículo 10. É exaltada (tãrüm) significa literalmente “é edificada”,118mas uma vez que o agente da edificação é o discurso, o sentido deve ser metafórico. Não obstan te, seu sentido literal provavelmente continuou a ser sentido, pois o pa ralelo antitético significa “demolido”, o antônimo de bãnâ, “construir” (veja Jó 12.14; Sl 28.5; Pv 14.1; Ez 36.36; Ml 1.4). Mas pela bocados perversos (veja v. 9a) é um paralelo apropriado a “bênção”, pois esse termo implica numa bênção verbal (veja 10.6). É destruída (têhãrês) traduz a metáfora “é demolida”, usada com frequência, como no antigo árabe do sul, para um ataque e “demolição” ou “destruição” de cidades (veja 2Sm 11.25; 2Rs 3.25; lC r2 0 .1 ;Is 14.17; Jr 31.40; Ez 36.35), de muros (Pv 24.31; Jr 50.15; Ez 13.14; 26.4,12), de fortalezas (Lm 2.2; Mq 5.11 [10]) e de uma casa (Pv 14.1), bem como de altares e lugares de culto (Jz 6.25; lRs 18.30; 19.10). A metáfora indica que a calúnia desmo raliza e destrói, com seus ataques, a cidade “edificada” pelo honesto. 12, 13 O quarteto descreve em mais detalhes o caráter e discurso dos perversos e dos retos (cp. vs. 9, 10b, 11 b) e protege os versículos 10.11 de qualquer abuso. Os versículos 12,13 ensinam o domínio pró prio no uso da fala e “os efeitos destrutivos que a comunidade sofre 117. Malbim, Proverbs, p. 112. 118. O significado de rwm/rmm tanto no ugarítico quanto em Gênesis 3 1.45; Jó 39.27; Esdras 9.9; Isaías 49.11; e quatro vezes em Ezequiel 16, nos quais ocorre a forma nominal rSmâ. O mesmo significado também pode se aplicar ao verbo prh cm Provérbios 14.11.
com os comentários depreciativos de indivíduos”.119 As observações ofensivas do caluniador (v. 13a) contrastam nitidamente com o silêncio dos sábios diante de insultos (v. 12b). O emparelhamento sugere que a calúnia (v. 12a) está arraigada no desprezo (v. 13a), enquanto que o silên cio prudente (v. 12b) está arraigado num espírito fiel (v. 13b). A alitera ção de h ãrês “demolir” e h ã ra S “permanecer em silêncio” também une os versículos. Apesar de ambos compartilharem o padrão de avaliação :: +, eles se encontram num paralelo quiástico. O par é estruturado pelas causas do desprezo versus a fidelidade (vs. 12a, 13b) enquanto a parte central é constituída dos seus resultados, a saber, o silêncio prudente (v. 12b) versus a calúnia insensata (v. 13a). Estes versículos continuam a sugerir que os retos devem suportar o triunfo temporário dos perversos. 12 Partindo do pressuposto de que “uma pessoa criteriosa” é tema do verseto B, uma pessoa que não tem senso (veja p. 142) é o tema do verseto A, criando uma estrutura quiástica com os sujeitos na parte interior e seus predicados na parte exterior. Despreza (bãz; veja 1.7; 6.30) leva o indivíduo a desrespeitar a ordem correta, a subjugar outros e a pecar (14.21). O desprezo dos insensíveis está arraigado em seu orgulho (veja Sl 31.18[19]; 123.4). De acordo com Gõrg, “Toda ofensa à vontade de Yahveh implica num bãzãh, ‘desprezo, desdém’ de Yahweh (cp. 2Sm 12.9, 10)”.120 Também está arraigado na ignorância de si mesmo como um ser desprezível (cp. Mt 7.3-5) e do seu próximo como a imagem de Deus e sua própria carne e sangue (cp. Ml 2.10; At 17.26). O verbo sugere que aquele que despreza o outro está tranqüilo e ocupa, por enquanto, uma posição de vantagem (cp. Jó 12.5, 21). Mas uma pessoa criteriosa ( ’is tebünôt; veja p. 148) refreia intenci onalmente a sua língua (yaharis) - um paralelo de “põe a mão na boca” (Jz 18.19) - de modo a não destruir a comunidade.121 Tem a prudência de não expressar impensadamente as suas ideias e senti mentos (cp. 12.23; 13.3; 17.14,27), algo extremamente difícil de fazer quando se está ansioso (cp. Jr 4.19) ou quando se é insultado (veja Gn 34.5; ISm 10.27; 2Sm 13.20;2Rs 18.36; Jó 13.5). O paralelismo antitético sugere que ele foi “menosprezado” pelo insensível. Por vezes esse comedimento exige autocontrole, como Eliezer demonstrou enquanto esperava Deus responder sua oração (Gn 24.21) e como os israelitas 119. Whybray, Proverbs, p. 180. 120. M. Gõrg, TDOT, 2:62, s.v. bãzSh. Ele considera búz e bãzâ formas secundárias. 121. A. Baumann, TDOT, 3:262, s.v. chãrash.
demonstraram no Mar Vermelho diante do ataque dos egípcios (Êx 14.14). Os sábios se controlam porque amam seu próximo e não abri gam ódio em seu coração (10.12, 18). Além disso, os competentes es peram pela hora e lugar certos para falar (cp. 12.23; 15.2,28; Is 41.1), da mesma maneira como o S e n h o r faz (cp. Is 42.14; Hc 1.13 com 2.2, 3). O sábio não paga com a mesma moeda (cp. 26.4; G16.1). O verseto B ressoa o ideal egípcio do “silencioso”.122 13 Este versículo ensina que aquilo que foi planejado e dito em particular não deve ser proclamado em público, pois esse conhecimen to favorece os rebeldes e prejudica o círculo de amigos que prestam contas uns aos outros. Uma pessoa confiável guarda segredos. A antí tese entre os versetos é imprecisa, sugerindo que o caluniador é desleal e que os leais não caluniam (veja 20.19). Ele se põe a agir (hôlêk ) indica uma pessoa se dedicando a uma tarefa e agindo de acordo com certos critérios (veja 6.12). Das seis ocasiões em que a expressão como um caluniador (rãkil ) é usada, todas elas, com exceção de Ezequiel 22.9, ocorrem com o verbo hãlak, mostrando que se trata de uma ex pressão idiomática para o ato de caluniar. Jeremias e Ezequiel retratam os caluniadores como mentirosos empedernidos e enganadores deter minados a destruir suas vítimas (veja Jr 6.28; 9.3; Ez 22.9). A lei que prescreve amar ao próximo como a si mesmo (cp. Lv 19.18) também proíbe o discurso nocivo, inclusive a calúnia, que coloca em perigo a vida de um próximo e que vem de um coração cheio de ódio e/ou que anseia por vingança (Lv 19.16-18). A ligação com o versículo 12 fica clara. O desprezo pelo próximo gera calúnias contra ele, mas o pruden te refreia a sua língua. “As referências do Antigo Testamento ao fofo queiro (com exceção do caso indeterminado em 20.19) o retratam como um indivíduo malicioso em vez de indiscreto; ele é um informante deci dido a ferir outros.”123 Quem revela (m egalleh ) significa “tomar aber to, tomar descoberto” e, com “segredo/confidência” quer dizer mais especificamente “tomar audível”, “divulgar” intencionalmente (veja Pv 20.19). Sôd (segredo ; cp. 3.32) se refere à “conversa” que se dá entre amigos e, especialmente, a seus “planos” secretos, que são necessários para garantir a vitória na guerra (cp. Sl 83.3[4]; Pv 11.14; 20.19). A Septuaginta parafraseia sôd com boulas en synedriõ, “conselho numa 122. Amenemope (6.1-12; cp. 7.7; 22.1 - 18): “O que é verdadeiramente silencioso, que se mantém separado, é como uma árvore que cresceu numa campina” (AEL, 2:151,159). 123. Kidner, Proverbs, p. 91.
assembléia”. Mesmo num tribunal, um segredo não deve ser revelado a fim de se ganhar uma causa (25.9). O caluniador malicioso, porém, age de acordo com a sua deslealdade e divulga uma confidência, incita o inimigo, semeia dissensão e perturba e destrói a comunidade, inclusive seus amigos mais íntimos (cp. 16.28; 17.9). Sua malícia pode ser moti vada por vingança, lucros materiais ou brincadeiras licenciosas. Mas aquele que é fie l (tie^man) designa uma pessoa que permanece liga da à outra fielmente e que é digna de confiança, e em espírito ( rüáh ; veja p. 143) significa que este é seu estado moral.124 Ele é tão fiel aos interesses dos outros quanto aos próprios. Esse indivíduo é aquele que oculta (m ekasseh ; veja 10.6b) uma palavra (ou questão, dãbãr; veja 1.6)125 que, se revelada, separará amigos. 14, 15 0 versículo 14 contrabalança os ensinos acerca do silêncio prudente (vs. 12, 13) com o modo de falar prudente. Tanto o versículo 14 quanto o versículo 15 justapõem a ação imprudente que provoca tragédias com a ação prudente que dá segurança, mas o versículo 14 trata de questões cívicas, enquanto que o versículo 15 se refere a as suntos pessoais.126 Apesar de seguirem o padrão de avaliação - : +, suas estruturas externas condenam o silêncio imprudente (v. 14a), elogi am o silêncio prudente (v. 15b) e suas estruturas internas elogiam o dis curso prudente (v. 14b) e condenam o discurso imprudente (v. 15a). Os dois versículos implicam ser confidentes de outrem, primeiro de maneira positiva (v. 14) e então de maneira negativa (v. 15). 14 Este versículo contrabalança o versículo 13 ao observar a ne cessidade de conselho e conselheiros sábios para se alcançar o suces so como comunidade. Nestes paralelos quiásticos a estrutura externa com a frase preposicional introduzida por be (“onde” e “em”) apresen ta as condições, a esfera dentro da qual o indivíduo encontra seguran ça, e a parte central apresenta as conseqüências. Nosso provérbio equi valente é “Duas cabeças pensam melhor do que uma”. Onde não há nenhuma ( ’ên) é uma declaração categórica. Apesar da orientação (fahbulôt ; p. 148) ser mais importante que a força física, não deve ser 124. BDB, p. 925, s.v. rúah. 125. Também pode se referir a uma espécie de discurso como “pensamento (Ez 38.10), promessa (1 Rs 2.4), ameaça (12.15), comissão, ordem (Gn 24.33; Et 1.12,19), regra, regulamento (Et 9.31), ordem (lR s 13.1), preceito (Sl 50.17; 119.57), sugestão, conselho (Nm 31.16; 2Sm 17.6), pedido, desejo (2Sm 14.15), notícia, informação (Gn 37.14), atitude, recusa (Et 1.17)” (W. H. Schmidt, TDOT, 3:104, s.\.dõbSr). 126. Garrett, Proverbs, pp. 125-26.
colocada em oposição com força heróica (cp. 8.14; 21.31). Não se trata aqui do conselho perverso (cp. 12.6-9). Um povo Çãm) possui o conceito fundamental de relacionamento.127 Seus membros se conside ram indivíduos que se relacionam com um grupo (familiar, étnico, judici al, político e/ou religioso) e uns com os outros, encontrando nesse meio a sua proteção. Talvez se tenha em vista “uma nação”, que combina todos esses elementos. No entanto, o grupo todo tropeça e cai (yippol ; veja 11.5) quando não recebe supervisão, conselho e direção. Os ver setos B paralelos sugerem que forças externas hostis ameaçam a co munidade, mas o paralelo 29.18 vê uma rebelião interna. O verbo mas a segurança [se encontra ] ( üt?Sü'â, raiz ys') se distingue de nãsal (veja 11.3,6), hãlas (veja 11.9, 10) e outros verbos semelhantes de duas maneiras. É o termo soteriológico mais comum em contextos religiosos, porém mais raro na linguagem quotidiana, e implicam ajudar aqueles que estão em dificuldade em vez de livrá-los da situação difícil.128“A segu rança vem do S e n h o r , não de cavalos de guerra” [trad. do autor] (21.31; cp. 28.18). Na multidão de (berõb\ veja 5.23) indica o grande número de indivíduos cujos argumentos e contra-argumentos garantem que o plano concebido pelo seu consenso não falhará, mas será bem-sucedido apesar do perigo. Conselheiros {yôl'ê$) é um termo técnico de uma raiz que significa “determinar”, “planejar” ou “aconselhar”. Qualquer pessoa com petente, quer do sexo masculino ou do feminino (cp. 2Cr 22.3), podia atuar como conselheiro num caso específico (cp. 12.20). Provérbios nun ca fala de um único conselheiro, mas sempre de um grande número de conselheiros que se reúne para formar um sôd (“conselho”; cp. 11.13; 15.22; 20.18; 24.6) e chegar a um plano. O provérbio contrapõe o perigo de práticas políticas dominadas por um único partido. 15 Este versículo é um janus que forma uma transição entre o modo de falar que prejudica o próprio indivíduo, ao contrário da segu rança dos conselheiros (vs. 8-14), e o perigo da riqueza benevolente porém arriscada (vs. 15-21 ).129 “O uso da riqueza exige bom senso para não desperdiçá-la em causas benévolas, porém arriscadas, como afiançar ou garantir um empréstimo para um desconhecido.”130 A su127. Observe as fórm ulas comuns, “reunido a um povo” e “separado de um povo” e expressões como "habito no meio do meu povo” (2Rs 4.13), citado por Hulst, TLOT, 2:900, s.v. 'Sm . 128. De acordo com J. F. Sawyer, TDOT, 6:442,yOsha'. 129. M. Heim ("Stracture and Context in 10:1-22:16”, pp. 116-17) o associa exclusivamen te aos vs. 16-21. Heim observa de maneira proveitosa o inclusio de rif que estrutura os vs. 15-21. 130. Goldingay, “ Proverbs” , p. 595.
bunidade seguinte contrasta a bondade com a riqueza obtida de m odo desonesto. A adm oestação contra o ser fiador de um estranho em 6.15 ocorre num a linha sem elhante de raciocínio (cp. 6.12-19). O versícu lo 15aa apresenta a tragédia de perder a segurança e proteção ao se envolver nessa situação im prudente. O indivíduo sofre danos (yêrôa ; veja 13.20) pode ser um denom inativo da raiz ra (veja 1.16). Em Deuteronôm io 30.15 “vida ( hahayyim ) e prosperidade ( hattôb)” são con trastadas com “m orte [hammãwet] e destruição [/iã rõ ']” . Quando (kí) introduz a situação im prudente: se torna fiador de um estranho Çãrab zãr; veja 6.1). Mas o que detesta (weéõnê'; veja 1.22) bater [palmas] ( tõqe'lm ; veja 6 . 1), um gesto que funciona com o um ato de “ modo de falar ” que concretiza a situação, é o que está seguro, “se sente des preocupado” (bô(êah; veja 3.5), não oprim ido por preocupações ou sob o risco de falência financeira (veja 6.2-5). f. Benevolência e comunidade (11.16-22) 16 Uma mulher graciosa obtém honra, 131
mas os homens violentos obtêm riqueza.'32 131. A LXX acrescenta dois paralelos entre os vs. 16a e b: “Uma mulher graciosa traz glória para o seu marido, mas uma mulher que aborrece a retidão é um trono de desonra. O preguiçoso vem a ter falta de riquezas, mas o valoroso descansa em riqueza segura” . A lgum as versões modernas (NAB, NEB e NRSV) acompanham a LXX. Baumgartner ( Critique, p. 114) acredita que a LXX nâo considerou a oposição encontrada no TM m arcante o suficiente, apesar de ele próprio acreditar que o TM é melhor que a LXX. Toy (Proverbs, p. 231) considera estranha a expressão da LXX, “trono de desonra” e acredita que a “concisão vigorosa” do TM favorece sua originalidade. E. Tov (“ Recensional DifTerences between the M asoretic Text and the Septuagint o f Proverbs”, in O f Scribes and Scrolls: Sludies on lhe Hebrew Bible, Inlerteslamemal Judaism. and Christian Origins: Presenled to John Strugnell, orgs. H. W. Attridge, J. J. Collins e T. H. Tobin, S. J. [College Theology Society Resources in Religion 5; Lanham, Md.: Nova York e Londres: U niversity Press o f A m erica, 1990], p. 46 ) acredita que o trad u to r não entendeu o significado exato do primeiro verseto nem a natureza precisa do paralelism o - dai seu acréscimo dos dois versetos. Ele explica o “trono de desonra” como estando em oposição ao “trono de honra” mencionado em I Samuel 2.8; Isaías 22.23; Jerem ias 14.21; 17.12. 132. O u “ e hom ens vigorosos se apossam de riquezas” . G R. D river (“ P roblem s in the Hebrew Text o f Proverbs", Bib 32 [1951] 180) argumentou com base num cognato árabe que '5 riçim tem um bono sensu em vez de um maio sensu: “ele descreve uma atividade nervosa e vigo ro sa que pode se ex p ressar pela energia irrequieta, com o é o caso em um a ou duas passagens (cp. Sl 37.35), ou pela violência implacável, com o norm alm ente é o caso no A T ’. D river poderia ser confirm ado pela LXX, que traduziu o term o com o “valoroso, varonil, corajoso”, investindo-o com um sentido positivo, e por outras versões antigas que o traduzi ram com os adjetivos am bíguos “poderoso”/“ forte” . É provável, porém, que a LXX trouxes se, originalmente kBrüçim, “diligente” (veja 10.4), em vez dc Sríçím. Se Hríçtm é em pregado com um sentido positivo, “riqueza” pode se tom ar parte da expressão quebrada “riqueza e honra” (veja 8.18; 22.4) tendo tam bém um sentido positivo (veja 10.4). Além disso, oferece
17 Uma pesso a bondosa é alguém que recom pensa a si mesma, mas a pessoa c m el é alguém que fe re a sua própria carne . 133 18 Uma pesso a p erversa é alguém que trabalha
p o r um salário enganoso, m as aquele que sem eia retidão [tra b a lh a p e la ] verdadeira recom pensa. 19 Sim, de f a t o ! n i O reto ns a lca n ça nb vida, m as aquele que busca o m al alcança sua morte. 20 P essoas com um coração perverso são um a abom inaçâo p a ra o S enhor, uma excelente com paração e contraste com 11.22; as duas partes da estrutura apresentariam , entâo, paralelos sintéticos em oposição (i.e., + : : + versus M as 'ãrísim tem apenas um significado negativo em suas outras 19 ocorrências, incluindo o Salm o 37.35, que é a única passagem bíblica que Driver cita para validar sua interpretação. Esse significado constante favorece a ideia de que a riqueza é negativa, com o em 11.28; 22.1; 30.8. 133. A sintaxe hebraica norm alm ente coloca o predicado dc um a cláusula classificadora antes do seu sujeito (IBHS, p. 132. P. 8.4.2), não adm itindo a tradução “Aquele que faz bem a si m esmo é bondoso (para os outros); m as aquele que faz mal à sua própria carne é cruel” (pace R albag, citado aprobativam ente por Plaut, Proverbs , p. 139). Porém Toy (Proverbs, p. 22 9 ) re je ita co rre ta m e n te a in v ersão da sin tax e , um a vez qu e esta to rn a necessário acrescentar “outros" no verseto A e porque “ no contexto (vs. 18-20, 24-26) os sujeitos das linhas são palavras com o reto, perverso, bondoso, c ru e r. A Targ. adota a sintaxe alterna tiva do verseto B e, com isso, destrói o paralelism o. 134. A LXX. Sir. e um ms. hebraico trazem o termo mais fácil bên, “ filho [da justiça]” que envolve a confusão com um entre b e k[ln], mas, neste caso, a expressão seria excepcional. Kamp, seguido por Toy ( Proverbs, p. 236), corrige para rõ'eh, “que se alim enta de” . Gcm scr (Sprüche, p. 56) e Barucq (Le Livre des Proverbes [SB; Paris: Gabalda. 1964], p. 110) propõem kãn. um Qal não atestado de kún com um significado transitivo (cp. Jó 31.15), “todo aquele que caça/que se esforça para obter” (G em ser), “estabelece” (Barucq). Plõger (Proverbs, p. 134) prefere “com o reto... : assim é aquele que busca ...” (assim também a Targ.), pois forma uma ligação mais adequada com o v. 18, mas um vau conjuntivo na segunda cláusula nunca ocorre como equivalente de kên na primeira. O significado de kên é controverso, cm parte porque kin é um homônimo. I kên é um substantivo que significa “o que é certo"/"o que é firme",'“verdade”; II kên é um advérbio dictico “assim'7“deste modo” ; e III kgn quer dizer “base”/“apoio” . A sintaxe não perm ite o últim o significado (= “a retidão é um a base para a vida” [veja G reenstone. Proverbs, p. 119]). Rashi e D elitzsch interpretam “a verdade da retidão...” , m as M einhold (Sprüche, p. 195) pergunta acerca dessa experiência “ inatural” (assim Toy, Proverbs, p. 232) se ela não implica que existe algo além da verdade na retidão e, portanto, deprecia esse termo crucial no livro. M einhold opta por II k in , m as Toy objetou anteriorm ente que “a relação de ideias entre este versículo e o anterior não sugere nem justifica um assim conectivo” (Toy, Proverbs, pp. 231-32). Algumas versões modernas (NIV, NRSV) aceitam I kên como referência ao caráter (veja Gn 42.11, 19) (= “aquele que é verdadeiramente reto”/“todo aquele que é firme na retidão” ) mas de outro modo o termo tem esse sentido no pl. HALOT (2:482, s.v. kên) et al. optam por I kên com o uma resposta confirm adora: “ É certo” (= “certam ente”, “sim ” ; cp. Js 2.4), sendo este também o seu sentido no hebraico moderno. 135. Um substantivo abstrato em paralelo com um substantivo concreto pode ser concreto. 136. A p rep o siç ã o co m tamede im p lica num v erb o de m o v im en to (IBHS, p. 224, P. U .4.3d). A sintaxe difere da mesma expressão em 10.16, mas os provérbios estão cheios de jo g o de palavras.
mas aqueles que são irrepreensíveis em seuni caminho encontram o seu favor. 21 Uma coisa é certa : 138 uma pessoa perversam não ficará sem castigo, mas aqueles que são retos140 escaparão. 22 [Como] um anel de ouro no focinho de um porco [é] uma mulher form osa quem se desvia da discrição . 142 O tem a da retidão versus a perversidade passa agora do m odo de falar construtivo/silêncio discreto versus o m odo de falar destrutivo/ silêncio indiscreto (11.8-15) para o tem a de que a benevolência traz recom pensas para o benevolente, m as o egoísm o prejudica o egoísta (11.16-27). A notável m enção de um a m ulher ( ’issâ ), que em outras passagens ocorre nas ju nções (cp. 11.22; 12.4; 14.1; 18.22; 21.9), m ar ca essa m udança. A declaração sum ária do versículo 23 é desenvolvida em dois quartetos (vs. 18, 19 e 2 0 , 2 1 ). A estrutura da subunidade (vs. 1 6 - 2 2 ) contrasta um a m ulher gra ciosa que adquire verdadeira honra (v. 16) com a m ulher bela, porém indiscreta que não tem nenhum a honra (v. 2 2 ) . A subunidade intensifica as conseqüências pessoais da benevolência em contraste com o egoís mo, progredindo da honra e riqueza versus com a riqueza enfadonha (vs. 16, 17), para a vida em contraste com a m orte (vs. 18, 19), e para as avaliações do S e n h o r que garantem o seu resultado legal (vs. 2 0 , 2 1 ). O versículo 16 introduz a subunidade: a fim de obter as verdadeiras riquezas da honra, é necessário graça, não força bruta. O versículo 17 introduz o paradoxo de que um a pessoa bondosa tam bém beneficia a si m esm a, enquanto que um a pessoa egoísta prejudica a si m esm a. Os versículos 1 8 - 2 1 , que desenvolvem a proposição, estão ligados pelas 137. A LXX traduz o hebraico da mesma maneira. 138. Lit. “mão em mão”, “com o significado de ‘sem dúvida, pode ter certeza’, Provérbios. 11.2 1; 16.5” (HALOT, 2:387, s .v.yõd). A LXX, Sir. e Targ. não entenderam a expressão idiomática. Murphy cita Alonso-Schõkel para o significado “mais cedo ou mais tarde” (M urphy, Proverbs, p. 83). 139. De acordo com BDB, p. 948. s.v. r s ' . 140. Çaddiqim é um gen. de espécie (cp. Is 1.4; 65.23; IBHS, p. 152, P. 9.5 .3g). "U m a referência à posteridade seria inapropriada neste caso, em que o propósito é im plícito de m odo a co n trastar o s d estin o s do perverso e do reto ” (Toy, Proverbs, p. 2 33). A LXX m odificou essa expressão m ais difícil tom ando-a um participio com um substantivo abstra to, “aquele que sem eia retidão”, sob a influência de 11.18b. 14 1. Lit. “e quem ”, uma hendíadis. 142. G en. de lugar com o verbo de m ovim ento (IBHS, p. 17, P. 9.5.2s.).
palavras-chave reto (retidão) versus perversidade (rs ') e mal (r ã ') es truturado pelas palavras-chave dupla zõrêa' sedãqâ (“sem eiam reti dão”) e zera' saddiqim (“sem ente dos retos”). 16, 1 7 Este par de provérbios está ligado por sua sintaxe , 143 paronom ásia 144 e tem a. Seus quartetos apresentam com o sujeitos paralelos a “m ulher graciosa” e “a pessoa bondosa” nos seus versetos A, versus “os hom ens violentos” e a “pessoa cruel” nos seus versetos B, e introduzem o tem a da subunidade: as características nobres do caráter tra zem recom pensas verdadeiras, m as as características ignóbeis se m os tram desprovidas de benefícios.
16 U m a única m ulher graciosa obtém glória e riqueza, m as m uitos hom ens poderosos obtêm apenas riqueza tem porária. A estim a social é mais valiosa que a riqueza obtida por “vitórias grosseiras ” 145 (veja 11.28; 22.1; 30.8). O proveito m aior obtido por um a única m ulher em relação a hom ens violentos (pl.) sinaliza que a “graça” é superior à força bruta. A pesar de graciosa (hên\ veja 3.4, 22) poder se referir à sua beleza física (com o em 31.30; veja 4.9; 5.19), é m ais provável que se tenha em vista sua beleza interior. Provérbios 31.30, na verdade, não leva em conta a beleza física, e a beleza indiscreta em 1 1 . 2 2 tem tanta honra quanto um anel de ouro no focinho de um porco (cp. Ec 8 .1; lT m 2.9, 10; lP e 3.3, 4). Suas nobres características de caráter, com o lealdade para com seu m arido, conquistam o favor da com unidade (veja 31.1031). Mulher ( ‘êSet) contrasta com “hom ens violentos”, tanto em gêne ro quanto em núm ero ela é m ais fraca do que eles. N ão obstante, ela obtém e retém (titm õk ; veja 3.18) honra (kãbôd ), que im plica riqueza (veja 3.16; 8.18; 22.4). Em oposição a ela estão os homens violentos Çãríçim). A raiz verbal de 'ãrisim significa “trem er” , “tem er ” , 146 BDB a traduz com o “apavorante” (Êz 28.7), “ im placável” (Sl 37.35), “que inspira grande medo” (Is 25.3),147“violento” (Is 49.25), “cruel” (Jr 20.11), 143. ’E set , “ m u lh er” + g en . a trib u tiv o h ê n , “ g ra c io sa ” (v. 16a) é em p arelh ad o a ’is “ hom em ” + gen. alributivo hesed , “ bondoso” (v. 17.a). 144. Observe nos versetos B a seqüência quebrada de r s~S, k / em 'ãrisim yitm ekú-'õSer (v. 16b) e 'õklr se 'Srô 'akz&ri. O bserve também as aliterações quiásticas entre õSSr “rique za” , a palavra final do v. 16 e 'õklr “aquele que faz m al”, a palavra inicial do v. 17b no original, e entre 'ãrisim “hom ens violentos” , a palavra inicial do v. 16b e 'akzSri “cruel”, a palavra final do v. 17b no original. 145. Cohen, Proverbs, p. 68. 146. HALOT, 2:888, s.v.V ?. 147. BDB, p. 792, s.v. ‘Srfç.
e HALOT, com o “tirano ” . 148 Aqui ela está ligada a “cruel” (11.17). A arrogância é o bem inalienável desse terrível inim igo (Is 13.11; cp. Sl 86.14). Seu fôlego é com o um a tem pestade batendo contra um m uro (Is 25.4). Seus paralelos são “perverso” ( rãêã'; Jó 15.20; 27.13), “escar necedor” (lês; “os que cogitam da iniqüidade” Is 29.20), que “não têm Deus diante de si” (Sl 54.3[5]). D éspotas obtêm (yitmekü ) riqueza Çõser; veja pp. 156-157), um a expressão que frequentem ente tem um sentido favorável (Pv 3.16; 8.18; 13.8; 14.24; 22.4), m as que não traz, necessariam ente, a estim a social (22.1), pode alienar de Deus (30.8) e dar um a falsa sensação de segurança (11.28). As realizações m ais ex celentes dos tiranos se tom am o inim igo m ais hostil de sua vida; eles não possuem fam a duradoura, nem a verdadeira riqueza que buscavam (veja 10.2; 11.4).
17 É possível que os versículos 16 e 17 estejam ligados por hên “graciosa” e hesed, “bondosa” . A recom pensa de hesed em 3.3 é hên em 3.4, sugerindo que a “m ulher graciosa” é benevolente. Uma pessoa bondosa ( ’is hesed) nega a si m esm a para ajudar seu próxim o neces sitado e, desse m odo, conquista o seu favor (veja 3.2). Paradoxalm en te, porém , negar a si m esm o para ajudar outros com pensa, pois, na verdade, essa pessoa è alguém que recompensa (gõmêl) a si mesma (napSô; veja p. 140). Gãmal indica a realização deliberada de um ato que afeta outrem de m odo favorável ou desfavorável (veja 3.30), m as seu antônim o “prejudicar/ferir” atesta o sentido favorável neste caso. Aqui ela indica que o benevolente afeta a si m esm o favoravelm ente por m eio das bênçãos de seus beneficiários. Entretanto, a tentativa dos cruéis de derrubar a outros a fim de gratificar a si m esm os se volta contra eles m esm os e causa, de modo inesperado, a ruína de seus pró prios interesses (veja 11.29; 15.6, 27). A pessoa cruel ('akzãrí; veja 5.9) ou “ im piedosa” inflige dor sobre outros de m odo inexorável, insen sível e, no entanto, intencional. N a verdade, porém , ela é alguém que fere Çõkêr). 'Kr denota a conduta de alguém que im pede e/ou prejudi ca violentam ente o bem -estar e a segurança de outro indivíduo com o qual ele se relaciona (cp. Gn 34.30; Js 6.18; ISm 14.29; lR s 18.17, 18).149 Aqui sua ação antissocial prejudica violentam ente a sua pró 148. HALOT, 2:884, s.v. 'ãris. 14 9 .0 significado original dc ‘k r era “deter ou em purrar algo para trás de maneira forçosa, violen ta ou hostil” . A partir desse significado se desenvolveu a ideia expandida “obstruir, oprimir, tratar com inim izade, fazer m al” (TDOT, 6:76).
pria carne ($e erô; veja 5.11). NepeS (veja p. 140) considera a pessoa do ponto de vista interior; Se er, do ponto de vista exterior. O term o pode ser um jo g o de palavras tanto para seus parentes de carne e san gue (cp. Lv 18.6, 12, 13, 17; Pv 11.29; 15.27; de acordo com Sim., Vulg., Rashi, Lutero) quanto sua própria “carne” (cp. Mq 3 .2 ,3 ), m as o paralelo “a si m esm a” e seu detalham ento no versículo 19 favorecem apenas a últim a interpretação. De acordo com o livro de Jó, ferir a própria pele é o pior tipo de aflição, m uito pior que perder os seus bens (Jó 1.12 e 2.4-6). E o S e n h o r quem sustenta os paradoxos, com o o provérbio final desta subunidade afirm a (veja 11.20-21). N a teologia paulina a bondade é um fruto de andar pelo Espírito (G1 5.16-23). 18,19 O s versículos 18 e 19 estão ligados por quiasm os. “ R etidão” ( sedãqâ) ocorre na parte central (vs. 18b, 19a) e os sinônim os “perver sos” r õ s ã '/ ‘m al” rã'â na estrutura externa (vs. 18a, 19b), enquanto que os sinônim os “verdadeira” e “sim , de fato” são justapostos no final do versículo 18b e início do versículo 19a. Eles em pregam duas metáforas: “sem ear a retidão” (v. 18b) e “buscar o m al” (v. 19b). O em parelham ento sugere que o salário enganoso e o salário verdadeiro do versícu lo 18 são definidos com o vida e m orte no versículo 19 (veja 10.16).150 18 Uma pessoa perversa ( rãsã '; veja pp. 164-165) é retratad com o alguém que trabalha Çõéeh; veja 10.4) por um salário {pe'ullat, i.e., a recom pensa do trabalho árduo; veja 10.16) enganoso (Sêqer, i.e., sua aparência difere da sua realidade; veja 6.17). Ele realizou seu tra balho egoísta a duras custas, na esperança de garantir vida, paz e pros peridade para si m esm o, mas seu egoísm o lhe rendeu destruição e m or te, com o o restante da unidade m ostra (veja tam bém 1.10-18; 10.2,25; 11.4; cp. Rm 6.21). O faraó lançou os bebês do sexo m asculino no rio (Ex 1.22), m as Deus afogou todo o exército egípcio no M ar Vermelho (Ex 14.28). E ntretanto, a pessoa benevolente é com parada im plicita mente a um agricultor, aquele que semeia (z õ r ê a i.e., espalha sem en tes). A época da sem eadura em Israel coincide com o início do período das chuvas, por volta de novem bro/dezem bro (veja 10.5). Sua retidão (§edãqâ veja pp. 150-151) é com parada im plicitam ente às sem entes espalhadas pelo agricultor. Esse “ agricultor” [trabalha pela ] verda deira ( * met, i.e., garantida, definida e confiável, veja 11.13) recom 150. Sintaticam enle, o v. 18 está ligado ao v. 17 ao descrever os tópicos usando particípio ativo Qal em cada um de seus quatro quartetos.
pensa (seker) um a palavra rara para o pagam ento por serviços e usa da, supostam ente, por sua paronom ásia com “enganoso” Seqer.15' A m etáfora traz à m ente vários fatos: (1) A sem eadura envolve esforços e investim entos oportunos com a esperança de um a recom pensa (veja 11.27; cp. Sl 126.5; M t 6.20; Lc 16.9). “N ão há nenhum conflito entre se esforçar pelo grau m ais elevado de autorrealização e servir ao bem com um . ” 152 (2) A pessoa colhe aquilo que sem eou; “ Sem eia retidão [sedãqá\ para ti m esm o, colhe o fruto da bondade [hesed]" [trad. do autor] (Jó 4.8; Os 10.12; Pv 22.8; 2C o 9.6; G1 6.7). (3) Na verdade a pessoa colhe cem vezes m ais do que sem eia (M t 19.29). (4) A imagem de espalhar sem entes faz lem brar o conceito de realizar m uitos atos de bondade por toda a parte. (5) O “ sem eador” depende de Deus, que provê m isteriosam ente o crescim ento. ( 6 ) A distância tem poral entre a sem eadura e a colheita sugere que o reto espera por sua recom pensa (Tg 5.7, 8 ). É necessário acrescentar a palavra “verdadeira” , pois no âm bito da agricultura a colheita é um tanto incerta; o m esm o nâo se aplica na esfera moral (cp. Sl 19.11 [12]; 37.3-6; Is 3 2.17,18; Ap 22.12).
19 O tem a do verdadeiro salário e do salário enganoso é definido aqui e intensificado com o vida e m orte, respectivam ente. A expressão dram ática, sim, de fato! (kên) ressalta a realidade daquilo que está para ser dito (cp. “um a coisa é certa” ; lit. “m ão à m ão”/ ‘que está próxim a”, no v. 21 ). O justo (Sedãqâ ; veja n. 135) alcança vida (lehayyim; veja pp. 157-161). Entretanto, aquele que busca num a perseguição ou ca çada ( meraddêp; veja Os 2.7[9]), o mal (r ã 'â ; veja 1.16) em razão de sua com pulsão interior (cp. 1.16; 4.16; 6.18; 15.9) alcança a sua mor te (lemôtô, i.e., sua separação eterna do âm bito da vida). 20, 21 “A atitude de Deus para com indivíduos (repugnância/pra zer) no versículo 2 0 corresponde ao resultado da vida deles (desgraça inescapável/livram ento) no versículo 21 ” . 153 Em 16.5 “abom inável ao S e n h o r ” e “um a coisa é certa” são paralelos; aqui se encontram sepa rados entre os versículos 2 0 a e 2 1 a . 154
151. “Também há uma série de sibilantes na m aior parte do provérbio... A primeira m etade de cada parte dos dois pontos também faz u m jogo com os sons: ...rs‘ 'éh... u>zr' sdqh" (M cCreesh, Sound and Sense, p. 151). 152. M cKane, Proverbs, p. 433. 153. G arrett, Proverbs, pp. 126-27. 154. Segundo Plõger, Sprüche, p. 140.
O s paralelos antitéticos do versículo 2 0 justapõem pessoas com um coração (lêb; veja pp. 141-142) perverso Çiqqe$ê; i.e., “distorci do” ; veja p. 307) com aqueles que são irrepreensíveis (t?mímê\ veja p. 151). Os prim eiros se colocam contra Deus e a com unidade para servir a si m esm os; os últim os estão totalm ente com prom etidos com Deus e com a com unidade. Eles tam bém justapõem a reação de Deus: os prim eiros são uma abominaçâo para o S e n h o r (tô'abat; veja 3.32; 11.1), e os últim os encontram o seu favor (r^sôno; veja 11.1). N âo há nenhum contraste nítido entre as m etoním ias “coração” e caminhos ou conduta (derek; veja 1.15). O coração é a origem da conduta moral. O S e n h o r é a suprem o corte de apelação, e apesar de som ente ele poder avaliar o coração, os cam inhos que o indivíduo percorre m ostram se o seu coração é irrepreensível. Som ente Deus dá vida e morte. O pro vérbio requer um a transform ação das afeições hum anas a fim de que estas correspondam às afeições de Deus. O indivíduo deve ser sincero em seu coração e constante em seus cam inhos. N ão há m eio-term o. 2 0
21 O s paralelos antitéticos e quiásticos do versículo 21 contrastam
uma pessoa perversa (rã'; veja 1.16) com aqueles que são justos (.zera' saddiqím; veja n. 140) na sua parte central, e os respectivos predicados, não ficará sem castigo (lõ'-yinnãqeh ; veja 6.29) com escaparão (nimlãt) na estrutura externa. Ml{ é um a reunião de term os hebraicos que se referem ao livram ento (cp. nãsal em 11.4, 6 , hãlas em 11.9,10 eyê' em 11.14). N o Nifal, mlt significa “ ‘escap ar’, ‘encontrar segurança’ (de um perigo m ortal)” : “ [Seu significado] é... ilustrado pela expressão ‘ninguém escapou’ (Jz 3.29; IS m 30.17; IR s 18.40), que denota vitória com pleta sobre o in im ig o ;... e a associação com verbos referentes a luta (esp. nus e bãrah)... 1 Sam uel 19.10, 12, 17s.; 22.1; 2 Samuel 1.3s.; 1 Reis 20.20; Jerem ias 48.6; 51.6; cp. 48.19” .IS5 Eles escapam da m orte (veja v. 19; cp. 10.2; 11.4): “ Ml(... com o os substan tivos de plt se refere principalm ente a escapar da m orte am eaçadora. O indivíduo escapa antes de sobrevir a calam idade, G ênesis 19.17-22. Ou foge dela de m odo a ser capaz de relatar sobre o ocorrido, Jó 1.15ss.” .156 A declaração inicial uma coisa é certa (yãd leyãd, “m ão à m ão” ; “que está próxim o” ) traduz um a expressão idiom ática provavel m ente derivada da prática de bater palm as, quer as próprias ou com outra pessoa, ao afirm ar ou garantir algo, com o ao dar garantia de fian 155. G. Fohrer, TDNT, 7:979, s.v. sõzõ. 1 56. Ibid., p . 9 8 0 .
ça por outrem (veja 6.1; Jó 17.3).157 Essas afirm ações veem entes e quase suplicantes (cp. “sim, de fato!” no v. 19) de que os perversos não serão libertos, mas os retos sim, sugerem a realidade de que, com fre quência, a justiça é deturpada, de m odo que os perversos escapam da morte física, enquanto que os retos são perseguidos e afligidos . 158 Pelo m enos escaton dos tem pos a retidão será perfeitam ente estabelecida, de modo que som ente os retos permanecerão (2.21-22). A ligação com o versículo 20 m ostra que o agente im plícito é o S e n h o r , cuja indignação moral condena os culpados à morte (cp. v. 19), apesar dos meios e a m aneira não serem especificados. O provérbio “afirm a a retidão supre ma de Deus, não com base na observação empírica, m as com base na natureza de Deus ” . 159 O provérbio conclui a unidade sobre a verdadeira e falsa recom pensa de m aneira dram ática e decisiva.
22 Este provérbio sarcástico de um a única linha em prega o padrão sintético + /-:: +/- e forma um inclusio com o versículo 16, separando, deste m odo, os versículos 16-21 dos versículos 23-28. E o segundo provérbio a em pregar o paralelism o em blem ático (veja 10.26). Seus paralelos em blem áticos (veja 10.26) fazem um a com paração absurda entre um anel de ouro que adorna no focinho de um porco im undo, que fuça na lam a e em sua lavagem , e um a m ulher bela que não tem discri ção e, im plicitam ente, que afunda em perversidade a beleza que a ador na (veja 1.21). Anel de ouro (nezem zãhãb) se refere a um anel de nariz que as m ulheres usavam no antigo O riente Próxim o. E liezer deu a Rebeca um anel desse tipo que pesava cerca de 5,5 gram as (G n 24.22). As m ulheres beduínas ainda usam na narina direita um adorno desse tipo, que chega até a m etade direita da boca. Os brincos (cp. Êx 32.2, 3), bem com o os anéis de nariz, têm a form a de um anel aberto com duas extrem idades pontiagudas. Eram um sím bolo de riqueza (cp. Gn 2 4 .2 2 ,3 0 ,4 7 ; Jz 8.24; Jó 42.11) e serviam para intensificar a atratividade da pessoa (Is 3.21; Ez 16.12; Os 2 .13[ 15]). No focinho de um porco (be ’aphazir ) se refere a um javali (Sl 80.13[14]) ou a um porco dom esticado (Lv 11.7; Is 65.4). A m bos eram considerados de m aneira negativa com o im puros e ordinários. A m etáfora envolve o hábito de testável do porco de com er lavagem e fuçar no esterco, bem com o sua insensibilidade ao desperdiçar e sujar um adorno precioso. A freqüente 157. Cp. a expressão idiom ática “ falar com o coração na mão”, i.e., falar com sinceridade. 158. De acordo com M einhold, Sprüche, p. 196. 159. Van Leeuwen, Proverbs, p. 119.
associação d eyãpâ {formosa) com tõ ’ar, “form a” (Gn 41.18; Dt 21.11; ISm 25.3; Et 2.7), ou mar'eh, “aparência” (Gn 12.11; 41.2, 4; ISm 17.42; 2Sm 14.27), ou am bos os term os (Gn 29.17; 39.6) m ostra que a beleza se refere à aparência exterior da mulher ( ’issâ ; veja 11.16). N orm alm ente ela é considerada de m aneira positiva com o um a dádiva de Deus que desperta o am or do sexo oposto (veja 2.16; cp. 1Sm 25.3; Et 2.7; Jó 42.15). E ( w e) liga com o um a unidade a beleza colocada no lugar errado. Que se desvia (sãrat, “ sair de um curso adotado” ; veja 3.7; 5.7; 9.4, 16) apresenta a m ulher com o um a apóstata daquilo que é norm ativo por m eio da consciência e/ou da revelação especial educati va. Tã'am, traduzido com o discrição (cp. “sábio” em 26.16), tem um âm bito sem ântico bastante am plo. Sua raiz verbal significa “provar, perceber com o sentido do paladar” (cp. 2Sm 19.35[36]; Jó 12.11; 3 4 3 ) .i6 ° nesse sentido tam bém é um a dádiva de Deus (Jó 12.11, 20). Q uando usado m etaforicam ente, esse substantivo derivativo denota “o sabor subjetivo ou a percepção subjetiva do sabor por parte de indivídu os, e assim , o dom da discrim inação que Deus concede e que perm ite o bom julgam ento” (lS m 25.33; Jó 12.20; Sl 119.66). G ratianvê no sabor um a “espiritualização da anim alidade” e ressalta que há um a m elhoria (cultura) nâo apenas da m ente ( ingenio ), m as tam bém do paladar (gusto).16' Aqui o term o denota “o juízo refletido e sensato da perfei ção” . Ao deixar qualquer juízo sensato do com portam ento m oral que outrora ela cultivava e/ou possuía, fica implícito que essa m ulher se trans formou num animal grosseiro em sua forma de vestir, falar e se com por tar. Na verdade, ela é pior que um porco. A porca é grosseira por nature za, m as esta m ulher “se desvia” da sua dignidade. Em vez de realçarem sua beleza, os adornos colocados nos lugares errados a fazem parecer insensatamente esbanjadora, grotesca e repulsiva. Em vez de alcançar honra por meio do seu dom natural, ela é ridicularizada (11.16). O provér bio instrui o jovem a priorizar a graça interior, não a beleza exterior. g. Desejos e satisfações paradoxais (11.23-27) 23 O desejo dos retos é somente o bem,
mas a esperança dos perversos é ira . 162 160. J. Schüpphaus, TDOT , 5:345, s.v. (ã'am. 161. Citado por H .-G Gadam er, Trulh and Melhod, trad. org. G arrett Bardcn e John Cum m ing (Nova York: Continuum . 1975), p. 34. 162. Um ms. e a LXX trazem 'ãbsdâ (“perece” ), uma leitura sim plificada que harm oniza o texto com 10.28, m as que não era a intenção original (Plõger, Sprüche. p. 134).
24 Há alguém que espalha e que é aumentado ainda mais, 163 e alguém que retém daquilo164 que é justo e que só vem165 a carecer. 25 Uma vida que concede bênçãom será engordada, e quanto ao que dá de beber167 ele próprio será embebido.168 26 Quanto ao que retém o cereal, as pessoas o amaldiçoam, mas a bênção [está] sobre a cabeça169daquele que o vende. 170 27 Quem procura diligentemente171 o bem alcançará favor,
mas ao que corre atrás do mal, estem lhe sobrevirá. O s versículos 23 e 27 form am um a estrutura ao redor desta subuni dade. Eles estão ligados pela palavra-chave (ôb, “bem ” (vs. 23a, 27a) e pelas generalizações acerca do tem a dos desejos e sua satisfação pa radoxal. Dentro dessa estrutura, os versículos 23-25 dão form a ao pa radoxo de que o doador recebe e o vitim ador fustiga a si m esm o (veja vs. 17-21). M ais especificam ente, a liberalidade do doador no versículo 25 detalha a sua generosidade no versículo 24a, e sua arm azenagem no versículo 26a detalha a sua m esquinhez no versículo 24b.173 Os quarte tos dos versículos 2 3 ,2 4 e dos versículos 2 5 ,2 6 estão ligados por pala vras-chave. 163. E xpressando acréscim o e/ou repetição (B D B , p. 729, s.v. ‘ô d ). 164. A KJV e RV consideraram o m in com parativo (“mais do que é certo”), m as o significado ablativo é preferível em função do paralelo “espalha”, no v. 24a, e da unidade que trata da generosi dade irrestrita. 165. Um verbo om itido é exigido por sua sugestiva preposição (IBHS, p. 224, P. 11.4.3d). 1 66.0 gen. “de bênção” é am bíguo. Com o um gen. subjetivo abstrato significa que a pessoa é a ben eficiária da b ên ção div in a (IBHS, p. 144, P. 9 .5 .le ). P orém , neste co n tex to , sobre a generosidade em contraste com a avareza, é um gen. do objeto m ediado de m odo a indicar a dispensação da bênção divina sobre outros (IBHS, pp. 147-48, P. 5.2d). 167. Sir. “ aquele que am aldiçoa” parece um a leitura sim plificada (veja a nota textual). 168. Com exceção da Vulg., nenhuma das versões antigas lê o TM. A LXX traz, inexplicavel m ente, "sincero”; Targ. “ aquele que ensina” ; e Sir. "aquele que am aldiçoa” , form ando uma excelente antítese com "concede bênção” . N o entanto, ela perde as m etáforas agrícolas que unem os vs. 25-26 (cp. Gemser, Sprüche, p. 45). Mais de 20 mss. medievais trazem ySreh. Os estudiosos explicam ou corrigem a forma de várias m aneiras diferentes. A m elhor solução é entender a forma no TM como um Hifil interno de y r ‘ (cp. HALOT, 2:436, s.v. II yrh), “ leva a si mesmo a ser em bebido” (IBHS, pp. 439-40, P. 27.2s.). 169. Veja 10:6. 170. Hifil denom inativo de 11Seber, “cereal a ser vendido" (IBHS, p. 443, P. 27.4a); cp. HALOT, 4:1406, s.v. II Seber). 171. SBhir Qal ptep. excepcional, nâo o Piei norm al, para dar assonância com os participios iniciais nos vs. 26-29. 172. Rã'â funciona com o um objeto d e dõrSS e também com o sujeito àefibô'ennú. 173. De acordo com M einhold. Sprüche, p. 198.
23 Este versículo intensifica 10.28; “expectativa” é substituída por “desejo”, “alegria” por “som ente o bem ” e “perecer” por “ ira” . O de sejo dos retos (ta >awat saddiqim; veja 10.24b) indica suas aspirações arraigadas em sua natureza de fazer o bem a outros. “ [O desejo] é a asa da alm a, pela qual ela se m ove, e é levada àquilo que am a, com o a águia à carcaça... (Jó 39.30; M t 24.28), para se alim entar dela e se satisfazer com ela . ” 174 Somente ( ’a k) destaca “um a conclusão inespe rada ” 175 e o conceito de sem exceção (cp. 11.24; 14.23; 21.5; 22.16).176 E impossível m isturar o mal, quer moral ou físico, com o bem (fôb; veja 3.27). O jo g o de palavras pretendido significa que eles desejam som en te o bem dos outros, nunca o seu mal, m esm o às próprias custas (veja vs. 23-25), e que obtêm som ente o bem tanto para os outros quanto para si mesmos. O verseto B tam bém apresenta um jogo de palavras. A esperança dos perversos (tiqwat r^Saim; veja 10.28) è ira Çebrâ; veja 11,4 ) . 177 A ira que os perversos esperavam infligir sobre outros recai sobre eles. Eles esperavam prosperidade derrubando os outros; em vez disso, porém, são recompensados com a ira de Deus. Apesar do paralelo “pere cer” em 10.28 poder sugerir que sua ira é decorrente da não-satisfação do seu anseio, o uso da palavra e do paralelo “bem” sugerem que se trata da ira de Deus, não do aborrecimento humano até à ira. Uma vez que pagar o bem com o mal é uma injustiça digna de ser castigada com o infortúnio constante (17.13), o Soberano moral deve pagar o bem com o bem. 24 Este versículo é um janus. Por um lado, ele está ligado lexical m ente ao versículo 23 por ’ak “ som ente/só” (vs. 23a, 24b) e pelo prin cípio dos pagam entos paradoxais, que é concretizado agora com a re ferência à generosidade do reto e à cobiça im ensurável do perverso (cp. 10.3; 21.26). Por outro lado, ele está ligado aos versículos 25, 26 pelos princípios de que “o hom em de m ão fechada acaba m ais pobre, enquanto o hom em de m ão aberta acaba m ais rico ” 178 (cp. Ec 11.1; M t 25.14; Lc 16.9,38; 2Co 9.6; lT m 6.18, 19). M ais especificam ente, os versículos 25 e 26 detalham os versículos 24a e 24b respectivam ente. N as duas m etades do versículo 24 tem -se a união de coisas que basica 174. Reynold, citado por B ridges, Proverbs, p. 124. 175. IBHS, p. 670, P. 39.3.5d. 176. A. Even-Shoshan, ha-milon he-hadash (Tel-Aviv, 1977), p. 56. 177. Um ms e a LXX harm onizam o texto com 10.28 lendo libãdâ, "perece", m as essa alteração fácil perde o jo g o de palav ras e o paradoxo d esta unidade (vs. 23-27), a saber, que as recom pensas con trad izem as ex p ectativas hum anas. 178. Aitken, Proverbs, p. 126.
mente se contradizem. Portanto, é possível falar de paradoxos, nos quais duas entidades são reunidas numa relação de modo surpreendente e aparentemente contraditório a fim de esclarecer uma questão que não é óbvia. Há (yês) indica que algo existe.179 O verbo que espalha (mepazzêr) ocorre nove vezes na Bíblia com o sentido de “lançar am pla, generosa e livremente”. Seus objetos incluem Israel como um re banho (J1 3.2[4.2]; cp. Et 3.8; Jr 50.17), ossos (Sl 53.5[6]; cp. 141.7), favores (sexuais) (Jr 3.13), geada (Sl 147.16) e presentes (Sl 112.9), nunca “sementes”. Nenhuma das suas formas de uso “sugere meticulosidade, cuidado ou prudência. Aqui ‘espalhar’ significa distribuir de maneira ampla, generosa, talvez impetuosa, dando pouca atenção a onde a beneficência vai parar”.180 Seu objeto não especificado yõSer “o que é justo” (i.e., o “bem” que favorece a vida, veja v. 23) deve ser suprido a partir do paralelo, descartando a ideia de que o provérbio aprova os esbanjadores. Ele é paralelo a “retidão” no Salmo 112.9. Os versículos 23-27 definem “o que é justo” em termos de serviço à comunidade, não a si mesmo. O objeto indireto não especificado é “os necessitados”. E (we) reúne a contradição de maneira surpreendente a fim de apresen tar o fato de que aquele que dá a outros liberalmente aquilo de que necessitam, esgotando os próprios recursos, é, na verdade, nôsãp (aquele que é aumentado). Yãsap é traduzido como “aumentado” (i.e., au mentar em tamanho ou número) em 1.5; 3.2; 10.9, 22, 27. Ainda mais Çôd) implica num acréscimo daquilo que ele deu. Em contraste com isso, alguém que retém pela própria vontade (hôéêk; veja 10.19) da quilo que é justo (miyyõSer; veja 2.13) ultrapassa os limites morais estabelecidos. Yõõer indica dever, como em Jó 33.23, ou comportamento apropriado para algo/alguém. Paradoxalmente, a pessoa mesquinha só [vem] ( ’ak; veja v. 23) a (le), aquilo que é a conseqüência de se desviar da generosidade, a saber, carecer (mahsôr; veja 6.32) das necessidades básicas e de riquezas (veja “escassez/necessidade” em 6.11). “O ato de dar aos necessitados foi comparado a uma criança mamando. Quanto mais ela mama, tanto mais leite a mãe produz.”181 O paradoxo se refere à filantropia, não ao investimento pessoal. Além da avareza, outras cau sas imorais de privações físicas são a preguiça (14.23), a pressa (21.5; 28.22), a perversidade (13.25; cp. 10.3), a intemperança (21.17), e a generosidade imprudente (22.16). 179. IBHS, p. 72, P. 4.5b. 180. Hubbard, Proverbs, p. 166. 181. G reenstone, Proverbs, p. 122.
2 5 , 2 6 Além de esclarecer o versículo 24a e b, respectivamente, os
versículos 25, 26 também estão ligados de modo quiástico por berãkâ (“bênção”) à referência ao generoso que abençoa outros (v. 25a) e, em seguida, à referência às bênçãos que ele recebe (v. 26b). Os dois ver sículos usam metáforas da agricultura e tanto 25b quanto 26a usam uma construção nominativa absoluta (i.e., “quanto ao...”). 25 Este versículo detalha a verdade da reciprocidade (v. 24) atra vés de duas imagens: “engordar”, do âmbito da criação de animais e “embeber”, do âmbito da horticultura. A imagem dupla serve para res saltar a certeza da reciprocidade por se ser generoso (veja 10.26). Uma vida (nepeS veja p. 140) que concede a bênção (berãkâ\ veja 10.6) divina se refere a cumprir o dever para com os necessitados (v. 24), incluindo a oração. Num resultado surpreendente, a pessoa que der será engordada (t?dus$ãn). Especialmente em países onde se come pouca gordura, a metáfora de “ser engordado” sugere riqueza, abun dância, satisfação plena e saúde (cp. Dt 31.20). É usada para o refrigério dos ossos em paralelo com o regozijo do coração em Provérbios 15.30. É dado ao generoso uma abundância daquilo que satisfaz rica mente e promove o bem-estar (11.25), ao diligente (13.4), e ao que confia em Deus (28.25). Ao conceito de quantidade retribuída (v. 24) é acrescentada a ideia de qualidade máxima. A metáfora e quanto ao que dá de beber (ümarweh\ veja “saturar” em 5.19) sugere uma terra seca que precisa de água, uma comparação implícita com os pobres e necessitados. Por sua vez ressalta o princípio de reciprocidade da or dem divina (veja 1.26). O pronome enfático ele ( h u ) - usado para destacar a reciprocidade entre generosidade e beneficio próprio - será embebido (yôre') acrescenta à metáfora da água como bênção a me tonímia da água para uma colheita abundante. 26 O paradoxo de que a generosidade traz benefícios e a mesqui nhez não traz coisa alguma é colocado aqui em termos de vender cereais, supostamente a preços normais de mercado em contraste com a arma zenagem desses produtos, causando, implicitamente, a fom e-para fa zer os preços subirem. Quanto ao que retém (m õ n ê a veja 1.15) se refere ao comerciante que não coloca à venda o produto necessário para a subsistência, explorando a necessidade dos outros em benefício próprio. Cereal (bãr) se refere aos cereais/grãos valiosos dos campos (Sl 65.13[ 14]; 72.16) levados para a eira (J12.24), e usados para preparar os alimentos; é o oposto da palha não comestível (Jr 23.28). Simboliza as
necessidades básicas da vida, não os luxos, como uma sinédoque para tudo o que é produzido nos campos, pomares e hortas e que sustentava a vida e a economia de Israel. Dentre esses produtos, os cereais ocupavam um lugar de honra. O cereal geralmente usado para preparar pães era o trigo; a cevada e outros tipos de grãos eram cultivados para forragem. Debaixo de casas, foram encontrados depósitos particulares para arma zenar cereais e, desse modo, atender à demanda por esses produtos no período entre as colheitas. O comerciante de cereais tinha estoques abun dantes à sua disposição e, supõe-se aqui que ele podia retê-los em tem pos de escassez para elevar os preços. Em Gibeão e Megido existem enormes silos subterrâneos para a armazenagem de cereais.182 Amós 8.4-8 se refere a esse abuso na venda dos cereais essenciais. As pesso as (le 'ôm) traduz uma designação arcaica ou arcaizada para a humani dade.183 O amaldiçoam (yiqqebuhü), tem uma ampla gama de significa dos. Fundamentalmente, significa “períurar”/“trespassar” (2Rs 12.9[10]), um sentido expandido para “picar”, “distinguir” e, desse modo, designar como sendo “mau”, sendo que, com esse sentido, toma-se “maldição”. Uma vez que somente o S e n h o r pode realizar a maldição, as pessoas se voltam para ele a fim de ver o cumprimento da sua proclamação imprecatória (cp. Êx 22.22-24 [21-23]; Am 8.4-8; Tg 5.4). Mas bênção [es/á] sobre a cabeça (überãkâ lerõ’s) provavelmente se refere às palavras abençoadoras pelas quais as pessoas piedosas mediam a bênção divina (veja 10.6; cp. Jó 29.13). Daquele que o vende (= que vende o grão) (masbir) é usado com referência a José que, ao se agravar a escassez de alimentos, “abriu os celeiros e vendeu cereais” [trad. do autor] (Gn 41.56; 42.4). Quando Seom, rei de Moabe, se recusou a vender cereais para os israelitas que estavam de passagem em sua região, o S e n h o r guerreou contra ele (Dt 2.26-38, esp. v. 28). “O versículo traz à baila a dimensão celestial pelas orações e imprecações que são provocadas.”184 27 A unidade que declara que a bondade compensa é concluíd com uma generalização acerca dos desejos, correspondendo ao versí culo 23 em termos de duas pessoas que estão em busca de algo. Quem... diligentemente (Sõhêr; veja 1.28) indica uma pessoa diligente em bus 182. Cinco das 14 ocorrências de III b ãr são encontradas em associação com o m odo prudente com o José ajuntou e vendeu os cereais aos egípcios e à sua família durante a escassez de alimentos. 183. H ALO T, 2:513, s.v. le 'ôm. Seus paralelos incluem gô y\ytm ), “nações” (Pv 14.34; Gn 25.23), ‘Sm \m .ím \, ‘‘povo(s)” (Pv 14.28; Gn 27.29); m eíãkím, “ reis" (SI 148.11[12]); ’°dSm ôt, “terras” (Is 43.4); etc. 184. Kidner, Proverbs, p. 94.
ca de alguém ou de algo não obstante as dificuldades. Uma vez que “mal” no verseto B se refere a fazer mal a outros, bem (fôb) se refere a prover bem-estar para o próximo (veja 3.27; 11.23). Procura (y6baqqêS; veja 2.4) indica a busca por algo que não está presente para satisfazer um desejo.185 Favor (rãsôn) denota estar em e/ou passar a um estado de aceitação diante de Deus (veja 8.35; 10.32; 11.1, 20; passim)186 e, portanto, é uma metonímia para a sua bênção. Mas ao que corre atrás (wedõrêS) indica uma pessoa que se esforça cuidadosa187 e energica mente188 (cp. 31.13) para satisfazer uma paixão (cp. 11.19). Sua busca é pelo mal (rã'5; veja 1.16), o esforço moralmente errado de degradar a vida do seu próximo chegando a provocar sua morte (veja 11.19). Este [i.e., o mal] lhe sobrevirá (t?bô’ennü) expressa o caráter inevitá vel da lei moral da reciprocidade sustentada pelo Criador e Governante Moral do Universo (veja 1.26-27; cp. Et 7.10; Sl 57.6[7]; 2Ts2.10, 11). Os sinônimos para procurar, ambos significando atividade enérgica para satisfazer desejos, mostram que os benevolentes servem ao necessitado em função dos desejos do seu coração, não por coação, interesse próprio, ou hipocrisia. Além disso, eles são piedosos porque buscam o favor de Deus, apesar de também conquistarem o louvor dos homens. O provér bio admoesta sua audiência a ser como Jesus, que fez o bem por toda a parte e foi recompensado com a vida eterna (cp. Mt 25.35,36; Tg 1.27). A verdade, “buscai e achareis”, adquire novo significado: aquilo que você busca para outros, você encontra para si mesmo (cp. Mt 6.33; 7.7). h. Alguns ganhos ou perdas (11.28-31) 28 Quanto ao que confia em sua riqueza, ele cairá, mas como a folhagem os retos brotam. 29 Aquele que arruina189 sua casa herda vento, e um insensato é um escravo do sábio no coração. 30 O fruto de um reto é uma árvore de vida,m 185. D river (J S S 12 [1967] 108), seguido por W hybray (P roverbs, p. 187), argum enta que biqqêS aqui e em 29.10; Salm o 83.17[ 18] e D aniel 9.3 é cognato do acadiano baqOSu “se r g ran d e”, e aqui dá ao term o o sen tid o de “ o b ter am p lo fav o r” . M as os ex em p lo s bíblicos dados por D river não são convincentes. B uscar o favor de D eus se encaixa em outras form as verbais deste provérbio, sendo que todas elas tratam de buscar e encontrar. 18 6 .0 favor perante as pessoas é expresso por hên e/ou ágkel-fôb em 3.4. 187. Coppes, TWOT, 1:198, s.v. dãraá. 188. S. Wagner, TDOT, 3:294-95, s.v. dOraS. 189. A LXX parafraseia o hebraico usando uma forma negativa, “aquele que não trata com bondade” . 190. A ideia com pleta é "com o o fruto da árvore da vida” (cp. C t 1.15, “ teus olhos são
e o que "ganha vidas” é sábio.191 31 Se]92 os retos são punidos193 na terra, pombas, i.e., com o os olhos das pom bas” [GKC # 1 4 ld], e “Q ue seus frutos sejam com o o Líbano, i.e., com o [os frutos do] L ibano” [veja W illiam H. lrvvin, “T he M etaphor in Prov. 11,30", Bib 65 (1 984) 98, n. 4]). 191. A LXX traz, "m as. no final, as vidas dos transgressores são tom adas”, considerando hãm ãs (“ violência” ), e não h S kã m (“sábio” ) (cp. 13.2; cp. 4.17; 16.29), e interpretando nepãsôt com o um paralelo dc hayytm. E possível que ele também tenha encontrado nsp tanto em 11.30 quanto em 13.2, bem com o no S alm o 119.147 (veja B aum gartncr, Critique, p. 117). A Sir. p arece seguir a LXX, “e as alm as dos m alfeitores são espalhadas” . M cK ane (Proverbs, p. 432) acredita que lõqêah nep5$ôt se encontra no estado absoluto depois do construto om itido perl (i.e., “ m as [o fruto de] aquele que tom a vidas é violência”, m as essa seqüência é irrelevante. Toy (Proverbs, p. 238) interpreta h ã m S s com o o sujeito: “m as a violência toma vidas” . Isso é mais apropriado caso se considere hãmõs em vez de kãkãm e se supo n h a que o su b stan tiv o ab strato “v io lên cia” serve de equivalente para o substantivo concreto pessoal “homem violento”. A Targ. e a Vulg. seguem o TM. Observe, a favor do TM, que k s k ü m é ím par neste capítulo e pode servir para ligar o v. 30 ao v. 29. O resultado é bastante apropriado: dois paralelos sintéticos antitéticos desenvolvem o v. 28. Os estudiosos tentaram m anter hãkãm repontuando Iqh ou em pregando lõqSah nepãsôt com significados excepcionais. Plrtger (Sprüche, p. 143) repontua lõqêah para leqah “ instrução” , obtendo o sentido “e os sábios adquirem a instrução (de outros)” . Snell (“ ‘Taking S ouls’ in Proverbs 11:30”, VT 33 [1983] 363-64), tom a por base leqah “en ten d im en to ” em 4.2 e em prega welõqêah com um conteúdo intelectual, “e aquele que com preende alm as é sábio” (i.e., eles entendem sua natureza e necessidade [cp. 12.10; 27.23]). Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Philology, p. 24), tom a por base um paralelo ugarítico e prefere interpretar Iqh com o “obter” . Além disso, de acordo com ele, nepSSôt é um pl. de excelência que significa “ vida eterna” e é paralelo de hayytm com o ’al mSwet “ im ortalidade” é paralelo de 12.28: “ E o homem sábio adquire vida eterna” . No entanto, nepS$ôt sem pre indica vidas individuais (cp. 1.18; 14.25), nunca “vida” num sentido abstrato, sendo ilógico ligar 'al müwet a nepãsôt porque ambos são paralelos de hayytm. Observando que em 6.25 o verbo significa “capturar” num sentido negativo, Delitzsch (Proverbs, p. 249) o emprega aqui com um sentido positivo: “o sábio se tom a um conquistador de alm as” . Ele com para com “ pescadores de hom ens” no N ovo T estam ento (M t 4.19). lrvvin (“T he M etaphor in Prov. 11,30” , pp. 97-100) chega a um a conclusão sem elhante argum entando que “ fruto” e “árvore” no verseto A conferem a lãqalf seu sentido agrícola peculiar, “ apanhar/juntar/colher” (cp. Gn 3.6, 22; 4 0 .9 -1 1; Nm 13.20; Dt 1.25); daí “e o sábio ju n ta /c o lh e (i.e., salva) v id as” da m orte. E le apoia sua interpretação em P rovérbios 13.14; 14.25 e no Salm o 4 9 .16[17]. A rgum entando de m odo questionável que nepã$ôt também pode significar “vida” abstrata, pois é um paralelo excepci onal de hayytm, ele chega a uma interpretação coerente ao associar o "fruto” do verseto A à vida eterna que o reto espera obter. A. Bonora (“ A ccogliere ‘Ia vita’ in Pr 11,30”, RivB 37 [1989] 313-16) refina essa ideia ao especificar “vida” npSwt claramente com o o fruto maduro da árvore. H eim (“ S tructure and C ontext” , pp. 123-24) apoia D elitzsch indiretam ente ao observar que os sintagm as com nepeS não apresentam sempre o m esmo sentido (veja especi alm ente 29.10b). lrvvin oferece bases filosóficas mais sólidas quando sugere que a expressão lõqêah nepãsôt é uma ironia intencional. 192. Lit. “ Vê” (i.e., se é verdade que. cp. BDB, p. 243, s.v. 11 hên). 193. A LXX, que é a base de I Pedro 4.18, parafraseia^ S u ll õ m de m odo característico e introduz o significado específico *‘é salvo por pouco” . Jam es Barr ("Ei ho mên dikaios molis sõzetai: Prov. X 1.3I, I. Pet. IV. 18” , JJS 20 [1975] 56-57) propôs um a ex p licação razoável para essa paráfrase com base num Vorlage sem elhante ao TM.
quanto mais o perverso e 194 o pecador.195
28-30 Provérbios 11.28-30 dá continuidade ao tema do ganho ou perda, porém com mais ênfase sobre sua certeza do que sobre a ativi dade de servir aos outros ou a si mesmo (cp. vs. 16-22). Os versículos são elaborados de maneira semelhante aos versículos 24-26. O versí culo 29 detalha a imagem da casa apresentada no versículo 28a, pres supondo que a “queda” se refere a uma construção196 e o versículo 30 detalha a imagem da árvore apresentada no versículo 28b.'97 28 Os paralelos antitéticos imprecisos do versículo 28 contrastam aqueles que confiam em sua riqueza com os retos e seus respectivos destinos - uma queda fatal versus o florescimento. O paralelismo é impreciso, sugerindo que os retos não confiam em sua riqueza e que aqueles que o fazem não são retos (veja 10.15).198Aquele que confia (bôtêah; veja 3.5) em sua riqueza (be'oSrô; veja 11.16) nâo vê o eixo vertical entre o céu e a terra e, portanto, toma-se um indivíduo antiético que fracassa no eixo horizontal. A fim de preservar a base da sua espe rança, o ímpio protege sua riqueza com grande zelo em vez de dividi-la com os necessitados. Este (hi2; veja v. 25) - a sintaxe realça o tipo de insensato em vista - cairá como uma casa (yippõl 11.5), uma metáfora incompleta para se encaminhar violentamente para a morte e destrui ção (cp. 7.26; 13.17). Se a referência fosse a uma folha seca, combi nando com a imagem do verseto B, o verbo seria nãbal (“murchar”; veja Sl 1.3; Is 1.30; 34.4; 64.6[5]; Ez 47.12) ou niddãp (“ser arrebatado pelo vento”; Lv 26.36; Jó 13.25), mas nunca nãpal.'99 A imagem pode implicar numa casa construída sobre um alicerce defeituoso, especial mente se houver uma ligação substantivai entre os versículos 28 e 30. A posse de riquezas pode ser uma bênção (cp. 3.14, 15; 8.18; Gn 24.35; 1Cr 29.12; 2Cr 1.11, 12; Jó 42.11, 12), mas confiar nelas é um empre endimento insensato (Mc 10.21-25) e, por fim, um empreendimento fatal. A riqueza é passageira (23.5) e, no final, não pode salvar da morte 194. O vau hendíadis liga as duas partes separadas em uma só expressão. 195. Qal ptcp. nom inal (veja BDB, p. 307, s.v. IBHS, pp. 614-15, P. 37.2). 196. De acordo com Toy, Proverbs, p. 237. 197. De acordo com M einhold, Sprüche, p. 200. 198. A LXX alivia a tensão p ercebida traduzindo o verseto B com o “ aquele que ajuda hom ens retos p ro g red irá” . P lõger ( Sprüche , p. 142) rejeita co rretam ente essa alternativa, pois ela acrescenta um sujeito novo c equipara os retos aos pobres. 199. Dahood ( Proverbs and Northwest Semitic Philology, p. 64) faz confusão entre npl e nbl, m as em Jó 14.18 eles são distintos.
(cp. 10.2, 15; 11.4; 18.11; 28.11; 30.7-9). Contrastando com isso, os retos (saddiqim veja 1.3; 10.3) baseiam a sua fé em Deus (veja 3.5), buscam o seu favor (11.27) e, portanto, compartilham sua riqueza. So mente ele é verdadeiramente confiável (3.5; 16.3,20; 22.19; 28.25; 29.25). “Que Deus seja amado e honrado supremamente, e ele determinará para nós se o lucro terreno será uma providência ou uma tentação.”200 Como resultado de sua providência, como a folhagem [eles] brotam (iweke'ãleh... yiprãhü). A símile implica no surgimento de vida nova e forte, a antítese de “cair”. “Folhagem” é usado para a folha ou as folhas de várias árvores (Gn 3.7; Is 8.11; esp. Ne 8.15) e da vinha (Is 34.4). 29, 30 Estes versículos detalham de modo quiástico as duas ima gens do versículo 28a, b em dois provérbios sintéticos que contrastam o destino do insensato e o destino do sábio com referência a outros. O primeiro arruina a sua casa e acaba se tomando escravo do sábio (v. 29). Os retos, por sua vez, produzem vida abundante para outros e os salvam da morte; estes são verdadeiramente sábios (v. 30). Os provér bios também estão ligados estilisticamente pelo emprego das metáforas do vento e das árvores frutíferas e pela palavra “sábio”, que, exceto por este caso, não aparece neste capítulo. 29 Este paralelismo sintético identifica “aquele que arruina sua casa como um “insensato” e intensifica a sua desgraça de “herda o vento” para o fato de que se toma “escravo do sábio”. Aquele que arruina Çôkêr) indica aquele que prejudica outras pessoas com as quais ele tem um relacionamento (veja 11.17). Sua casa (bêtô; veja 3.33) designa tanto sua solidariedade com sua casa quanto, por metonímia, seus bens pessoais, inclusive suas ferramentas, servos e posteridade. Herda (yinhal; veja 3.35) indica a transmissão de propriedades antigas que proveem o sustento da família. Vento (rüah; veja 15.4) é uma metáfora para ser deixado sem nada (Jó 15.2; 16.3; Ec 1.14; Is 26.18; Jr 5.13; Mq 2.11). Um insensato ( ^ w il; veja 1.7) é um escravo Çebed; i.e., seu trabalho, que é em grande parte forçado, ainda que por vezes voluntá rio, é sempre sentido como algo restritivo [veja 5.9,10; 6.32-35; 14.35]) do sábio (lahakam ; veja 10.1) de coração (lêb; veja pp. 141-142). Tendo perdido sua propriedade, o insensato perde sua liberdade, de modo que sua energia pode ser usada produtivamente por um indivíduo competente para beneficiar a sociedade, e não negativamente para o
seu detrimento (14.19; 17.2; cp. 6.6). Sua avareza causa sua miséria. O fato de ele ter arruinado os próprios descendentes (11.17b) em fun ção de sua falta de piedade e ética (veja 15.6,27) é ampliado de modo a abranger toda a sua casa (i.e., a família, com seus servos e bens pessoais). Em vez de transmitir a propriedade herdada (19.14) e aumentá-la por meio da sabedoria (24.3, 4, 27), ele reduz a herança da família a uma ninharia passageira, e ele próprio se toma um escravo, deixa de ser um homem livre. A energia natural da família e das suas propriedades utilitárias é entregue a fim de ser administrada por alguém que conhece a ordem social etema de Deus de servir aos outros (11.2327) e cuja vida se conforma com essa ordem (veja 10.8). Acã, o ho mem que deu origem ao nome do vale de Acor (Js 7.26), oferece um exemplo clássico desse provérbio. Ao guardar egoistamente o alimento e a água de sua casa para seus próprios homens, Nabal trouxe tragédia sobre sua casa, que foi salva pela sabedoria de Abigail (1 Sm 25.17,33). 30 O versículo 29 desenvolveu a queda trágica do insensato po meio da imagem de uma casa reduzida a vento (v. 28a) e o versículo 30 detalha o florescimento do reto mediante a imagem de uma árvore fru tífera (v. 28b). Seus paralelos sintéticos apresentam, em primeiro lugar, suas palavras e atos terapêuticos como “árvore de vida”. A isso, o verseto B acrescenta que o fruto vivificador dos retos é tão atraente que faz as pessoas se desviarem para comê-lo, de modo que ele “tira vidas” da morte. O fruto de um reto (peri-saddiq) é uma metáfora incompleta para as conseqüências de seus atos, que nascem de um impulso interior (veja 1.31). Assim como um fruto é organicamente repleto de sementes, também as realizações e recompensas são ine rentemente fecundas em seu estilo de vida (cp. 27.18). O fruto das mãos se refere a realizações (31.16, 31), o “fruto da boca” se refere ao discurso produtivo (12.14; 13.2; 18.20,21); aqui “fruto” diz respeito aos benefícios, à vida abundante, que os retos produzem na comunidade por meio de suas palavras e atos. A metáfora sustentada é uma árvore de vida, ou “o fruto da árvore de vida” ('ês hayyim\ veja n. 190; 3.18). A metáfora indica uma fonte de cura e de vida etema abundante para todos que comem dela. Que “tira vidas ” (lõqêah nepãâôt) é uma ironia intencional. Nas seis ocorrências de lãqah nepeS (1 Sm 24.11 [12]; lRs 19.10, 14; Sl 31.13[ 14]; Pv 1.19; Ez 33.6) a frase significa “tirara vida” no sentido de “destruir, matar”; nunca é usada de maneira positi va. Mas a mente rejeita a associação desse sentido com ser sábio
(Àã&5m;veja 10.1,8,14; 11.29). O dito exige o significado oposto, “tirar para a vida”. “Assim o dito não apenas afirma a ligação do sábio com a vida, mas exige que em seu movimento a mente compreenda o signifi cado de modo a negar a ligação do sábio com a morte.”201 Esta inter pretação fornece a mesma síntese que 13.14: os retos produzem vida eterna e, por sua atratividade, salvam outros da morte. 31 A seção sobre os pagamentos é concluída com uma afirmação climática de que o crime não compensa. Meinhold chama o provérbio de “expressão fundamental final” em razão de sua forma e conteúdo. Esta é a primeira vez que ocorre a forma de clímax (i.e., quanto mais!).202 Se (hên) traz a premissa no verseto A para a conclusão apresentada por “quanto mais” no verseto B, um argumento a fortiori do menor para o maior (cp. 15.11; 17.7; 19.7, 10; 21.27; cp. também 17.26; 19.2).203 Os retos (saddlq\ veja pp. 149-150) liga os versículos 30a e 31. São recompensados (y6Sullãm; veja 6.31; 7.14) pode se referir à recompensa no versículo 30a (cp. 13.13, 21) e ao castigo no versículo 30b, mas “essa interpretação dá o sentido insatisfatório de que é mais certo que Deus castigará os perversos do que recompensará os re tos”.204Aqui ele funciona como um termo legal para indicar a obtenção de indenização e satisfação por danos. Barr observa que a premissa toma por certo a hipótese da literatura sapiencial de que “até os melho res indivíduos apresentavam uma retidão tristemente inadequada” (cp. Jó 4.17-19; 25.4-6; Ec 7.20; cp. Sl 143.2). No entanto, ele argumenta que na terra (6õ ares) é adjetival, modificando “os retos”, e não adver bial, modificando “são recompensados”, e que o acréscimo de “na ter ra” é meramente estilístico, “para preencher o equilíbrio do versícu lo”.205 Apesar do acento cair no verbo, a frase não denota o âmbito histórico, a esfera de tempo e espaço da humanidade, onde o princípio de retidão divina opera a favor dos retos. Quanto mais Çap-ki) é uma expressão unificada para introduzir a parte mais importante do argu mento a fortiori.206 A combinação de o perverso (rõáõ'; veja pp. 164165) e o pecador (wehô(ê’\ veja 1.10) indica sua culpa diante de Deus 201. Irwin, “The M etaphor in Prov. 11,30", pp. 97-100. 202. M einhold, Sprüche, p. 1:202. 203. IBH S, p. 676, P. 40.2.1c. 204. Toy, Proverbs, p. 240. 205. Barr, "Ei ho mSn dikaios m olis sõzetai", p. 161. Ele aponta para “os aflitos da terra" Çny 'r$, cp. S f 2.3; S175.9[ 10]”, mas as construções não são paralelas. O gen. é. por natureza, adjetival; as frases preposicionais normalmente são adverbiais. 206. BDB, p. 65, s.v. 'aph.
pelos erros contra a humanidade. São recompensados é omitido, mas “na terra” não. E provável que o verseto implique numa distinção entre o castigo presente e corretivo dos retos “na terra” e o castigo futuro penal dos perversos, o tema desta seção. Os provérbios anteriores não deixam dúvidas que se trata da sua morte etema. A voz passiva incom pleta não especifica o agente, mas outros provérbios apontam para o S e n h o r . Se a retidão divina fosse de algum modo relaxada, ela o seria a favor dos retos. No entanto, uma vez que não é relaxada nem para eles (v. 30a), muito menos o será para os pecadores (v. 30b). A história sagrada está repleta de ilustrações desse princípio: Moisés e Arão (cp. Nm 20.12 com Dt 3.23-26; Nm 27.14 com Sl 99.6-8), Eli (ISm 2.2736), Davi (2Sm 12.9-12; Sl 32.3,4; 38. l-5[2-6]), Salomão (1 Rs 11.913), o profeta desobediente (lR s 13.2-24) e Ezequias (Is 39.1-7). Os retos são disciplinados pelo S e n h o r para que não sejam condenados com o mundo (3.11, 12; ICo 11.32). No entanto, os retos são disciplinados dentro da História, “na terra”, que herdarão para sempre (2.21,22; 10.30). Contrastando com essa realidade, os perversos necessariamente não ex perimentam o que lhes cabe aqui na terra (i.e., durante sua vida [veja 3.112]). Antes, seu julgamento ocorrerá quando tiverem sido, por fim, arran cados da terra (2.21 -22; 10.30). Semelhantemente, na conclusão do capí tulo 10, pode-se encontrar a afirmação do princípio de retribuição etema para os retos e para os perversos com referência à terra (veja 10.30). Apesar da LXX parafrasear “são retribuídos” de maneira positiva como “são salvos”, ela mantém o argumento afortiori e o sentido do TM ao modificá-lo com a expressão molis “raramente”. Pedro argu menta de modo parecido, provavelmente com base na LXX: “Pois é chegada a hora do julgamento começar com a família de Deus: e se começa conosco, qual será o resultado para aqueles que não obedecem ao evangelho de Deus?” [trad. do autor] (lPe 4.18). 4. Duas subunidades sobre o modo de falar e as ações (12.1-28) 1 Aquele que ama a instrução é aquele que ama o conhecimento, mas aquele que odeia a correção é um ignorante. 2 Uma pessoa boa obtém o favor do S e n h o r , mas o astucioso ele condena. 3 Um ser humano não é estabelecido pela perversidade, mas os retos não são desarraigados.
4 Uma esposa nobre e virtuosa é a coroa do seu marido, mas como podridão nos seus ossos é uma esposa vergonhosa. 5 Os planos dos retos são [para com a] justiça a orientação dos perversos é [para com] o engano.2 6 As palavras dos perversos são uma emboscada sangrenta3, mas a boca dos honestos os livra.4 I Derruba5 os perversos e6 eles não existem mais, mas a casa dos retos permanece firme. 8 De acordo com7 a sua prudência uma pessoa é louvada, mas o que tem uma mente desvirtuada* será menosprezado9 9 Melhor ser alguém considerado desprezível10 e, no entanto, tem um escravo,11 do que ser alguém que exalta a si mesmo e que tem falta de pão.'2 10 A pessoa reta é aquela que conhece os desejos doseu animal, mas a misericórdia dos perversos é cruel. II Aquele que trabalha na sua terra está cheio de alimento, mas o que corre atrás de fantasias não tem nenhum senso.'3 1. Ou “sáo justos”, pressupondo que mahsPbôt foi omitido e que m isp ã t é um gen. de espécie. 2. Ou, “as pessoas são engano” (veja n. I). 3. Lit., “estão à espera de sangue” (cp. 1. 11). 4 .0 antecedente ambíguo provavelmente é “os honestos” (1 1.6). certamente não os perversos (cp. 11.31; 12.2). 5. O inf. absoluto funciona com o um substituto para o im perativo (IBHS, p.593,P. 35.5.1a) e funciona aqui com o uma oralio variata (IBHS. p. 570, P. 34.3d). 6 .0 vau clausal liga formalmente as duas preposições do v. 7a, mas introduz logicamente a apódosc depois de uma cláusula condicional (IBHS, p. 648, P. 39.2.1c). 7. Lit. “com respeito à boca”, uma expressão idiomática que significa “com respeito á porção de” (BDB, p. 805, s .v.peh). 8. “ Um coração confuso ou um a mente perturbada" (HALOT, 2:796, s.v. ' w h ) . “N o hebraico da Mishná ‘wh significa 'ag ir com perversidade’, e a 7* forma em árabe quer dizer ‘ser torto’, de modo que u^na^wíh-lêb é alguém cuja mente é torta, que não consegue pensar direito e que, portanto, tem uma mente confusa ou obstinada” (M cKane, Proverbs, pp. 441 -42). 9. Lit., “se tom ar um desprezo” (cp. nossa expressão idiomática, “se tom ar um a piada” ). 10. Nifal tolerante (IBHS, p. 389, P. 23.4s.); i.e., “que se perm ite ser m enosprezado” . 11. A RSV, NAB. REB, LB et al., seguindo a LXX, Sir. e Vulg. repontuam o substantivo na função de ptep. Çõbed, “que serve |a si m esmo]"), m as os com entários clássicos consideraram o TM , de outro modo mais confiável, inteiramente satisfatório e apresentam um contraste m ais apropriado para "falta de pão” . A N RSV volta ao TM , com a Targ. e NIV. 12. Lit. “é alguém que tem falta”. 13. A LXX acrescenta o seguinte provérbio entre os vs. 11 e 12: “ Aquele que se esbalda em banquetes de vinho deixará desonra em suas próprias fortalezas”. É provável que o acréscimo reflita a atuação do fator tradução na LXX (E. Tov, “ Recensional D ifferences betw een the Masoretic Text and the Septuagint o f Proverbs”, in The Creek and Hebrew Bible: Collected
12 O perverso deseja14 a fortaleza15 dos malvados, 16 mas a raiz dos retos permanece. 13 Na transgressão dos [seus] lábios se encontra a armadilha17 colocada para um homem mau, 18 e assim o reto escapa19 da angústia.20 14 Do fruto da sua boca uma pessoa se farta de coisas boas, e os atos das mãos de um indivíduo21 voltam22 para ele. 15 O caminho de um insensato é certo a seus próprios olhos, mas a pessoa sábia é aquela que dá ouvidos a conselhosP 16 Quanto a um insensato, sua vexação é revelada24 no mesmo dia,25 Essays b y Em anuel Tov [Leiden, Boston c Kõln: Brill, 1999], p. 47). Trata com mais detalhes do tem a das “ coisas sem valor” do v. II com os “ d eleites do vinho” e com “ fortalezas” adiantando a ideia de “perm anecer" firm e no v. 12. 14. Hitzig corrigiu o texto com habilidade mudando h m d (“cobiçar") para h m r (“é barro que esfarela” ), o que é plausível do ponto de vista crítico-textual, oferecendo um paralelo apro priado para o verseto B e reso lv endo um problem a lógico. Em 4.14 os “ perv erso s” são equiparados aos “ maus”, levantando a questão: “ Por que os perversos desejam aquilo que já têm ?” . Porém , uma vez que todos os m ss hebraicos e versões antigas trazem o term o inteli gível h m d , não convém corrigir o texto. 15. Ou “ red e/laço ” , um a m etoním ia para “ pilhagem ". 16. O u “ coisas m ás". 17. Lit. “aquele que golpeia”. A Targ. traduz m ôqiS com o m itt?qal, “é pego/derrubado” (O Ithpeel de tq l (< múqBS], e a LXX traz “pelo pecado de seus lábios um homem perverso cai em ciladas”, tendo lido lemôqS8 ou nôqSS. Mas o TM é apoiado por 18.7 e 29.6 e pela ideia paralela em 11.9: "Se [a dica para o significado do v. 13 se encontra em 11.9] ... a tradução da LXX ... não entende corretam ente a argum entação no hebraico” (M cK ane, P roverbs, p. 452; p a c e F ichtner [B //S ] e G em ser, Sprüche, p. 58). 18. O gen. ambíguo pode ser um gen. de objeto mediado (= “uma armadilha preparada para um hom em perverso” , IB H S pp. 146-47, P. 9.5.2d), e/ou um gen. de agente (“um a arm adilha preparada por um hom em perverso” ; IBH S, p. 143, P. 9.5.1b). G ram aticalm ente, “perverso pode ser um adjetivo atributivo (= "arm adilha perversa"), m as o paralelo antitético “o reto” sugere que se trata dc um substantivo adjetival (veja BD B , p. 948c, s.v. r ã ' ). Em 29.6 a ambigüidade é evitada pela construção 'ÍS rã‘. 19. A conjugação prefixai com vau consecutivo significa, aqui, um a situação gnôm ica subsequente (IB H S, pp. 560-56, P. 33.3.4c). 20. A LXX acrescenta curiosam ente, “Aquele cujos olhares são m ansos será tratado com com paixão, m as aquele que en frenta (hom ens) nas portas aflig irá alm as” , um provérbio contra obter a ju stiça severa que é devida por processos litigiosos. 21. Heb. a d a m (“ ser hum ano"). 22. K traz o Qal: “ voltar”; Q traz o Hifil: “ele [i.e., Yahweh] volta” ou “alguém volta” (= “é devolvido” , IBH S, pp. 70-71, P. 4.4.2a; cp. a LXX, S ir , Targ. e Vulg.). 23. H s k a m provavelm ente é o sujeito do verseto B, pois se encontra em oposição a “o cam inho de um insensato” , o sujeito do verseto A. 24. BDB, p. 394, s.v. y S d d (cp. 14.33; ISm 22.6; N e 4.9; cp. Pv 10.9 [TM ]; Jr 28.9). As versões antigas trazem y õ d è a ', "to m a a sua vexação conhecida” . 25. Lit. “naquele dia”, que a LXX interpreta com o “no m esm o dia” . Será um equivalente
mas a pessoa astuta26 ignora um insultoP 17 Uma testemunha confiável28 declara aquilo que é correto, mas um perjuro [declara] engano.™ 18 Há aquele que fala precipitadamente como o golpe de uma espada, mas a língua dos sábios é um remédio. 19 Um lábio sincero é estabelecido para sempre, mas uma língua mentirosa é [apenas] por um momento. 20 O engano está no coração daqueles que planejam o mal, mas aqueles que aconselham a paz têm alegria. 21 Nenhum tipo de malevolência sucederá30 ao reto, mas os perversos estão cheios de dano.31 2 2 Os lábios mentirosos são uma abominação ao S e n h o r , mas os que mostram confiabilidade encontram o seu favor. 2 3 Uma pessoa astuta é aquela que oculta o conhecimento, mas o coração dos insensatos proclama a loucura. 2 4 A mão de pessoas diligentes governará, mas a pessoa negligente32 se tornará labor compulsório. 2 5 A ansiedade no coração de um indivíduo o prostra,33 mas uma boa palavra o anima. 2 6 O reto sai à procura34 de seu amigo de confiança, mas o caminho dos perversos o fa z desviar. de kayyôm (= •‘im ediatam ente” ; BDB, p. 400, s.v. yôm )? 26. Veja n. 71. 27. Lit. “um a d esgraça". 28. Para a co n stru ção veja 6.19, n. 31. Aqui o substantivo p rovavelm ente se encontra com binado com o gen. atributivo. 29. O u “é engano” . 30. A LXX. Sir. e Targ. trazem “agradará", provavelmente por haverem lido nll 'weh (= “Nenhum a injustiça agrada uma pessoa reta” ). Plõger (Sprüche, p. 147) acredita que essas versões procuram m anter a ligação com o v. 20. A Vulg. traduziu com o “o entristecerá” . Talvez as versões procurem evitara dificuldade de harmonizar essa promessa com a experiência humana, uma dificuldade criada por essa palavra hebraica incomum. 31. E/ou "perversidade” . Rtí indica tanto a disposição para com a perversidade moral quanto as suas conseqüências prejudiciais. 32. Um substantivo abstrato tem um sentido concreto quando é contrabalançado por um substanti vo concreto (M. Dahood, Psalm III: 101-150 [AB; Garden City, N.Y.: Doubleday, 1970], p. 411). 33. A discordância de gênero entre o substantivo (fem.) e o verbo (masc.) não é excepcional. É possível que desejo de assonância com y6éammehennâ no verseto B tenha influenciado yashennâ, de modo que o seu sufixo fem. remeta a lêb masc. (“coração”; de acordo com Plõger, Sprüche, p. 147) e ocasionando o Hifil excepcional de Shh ou mesmo Súah (cp. Sl 44.26[27]; Lm 3.20). 34. Cp. HALOT, 4:1707-9, s.v. târ.
27 A pessoa negligente não assa nenhuma caça para si mesma,3S mas uma pessoa diligente [assa] a riqueza preciosa da terra* 28 Na vereda da retidão está a vida, e na jornada da sua sendo’1 está a imortalidade.3S
O capítulo 12 é constituído de dois provérbios de igual extensão qu tratam do modo de falar e dos atos (vs. 1-14, 15-28). Cada metade começa com um aforismo educativo que contrasta a natureza educável do sábio com a natureza incorrigível do insensato (vs. 1,15) de modo a encorajar o filho a aceitar os ensinos subsequentes. Cada metade ter mina com um provérbio sintético - um fenômeno raro na Coleção IIA que promete aos retos vida agora e para todo o sempre (vs. 14, 28). A relação entre 12.1 e 11.31 corresponde à relação entre 13.1 e 12.28, mas o paralelismo sintético de 11.31 ameaça os perversos com julga mento certo, usando um padrão de avaliação e 12.28 promete vida eterna aos retos usando um padrão de avaliação + :: +. Cada subunidade é dividida em subunidades parciais que começam com um aforismo que caracteriza os retos e os perversos de maneira muito ampla e terminam com aforismos que afirmam a permanência dos primeiros e a impermanência dos últimos: versículos 1-3,4-7,8-12 (vs. 13,14 são um janus final) e os versículos 16-19,20-23 e 24-28. Os versículos 1-3 funcionam como uma introdução e, entre outras coisas, apontam para o S e n h o r como o agente moral que sustenta os ensinos deste capítulo (v. 2; veja também v. 22). As subunidades apresentam a ligação entre caráter, conduta e conseqüências com respeito ao discur so e aos atos em padrões conectivos intrincados. 35. Um gen. p o ssessiv o , “ sua caça” (IB H S, p. 145, P. 9 .5 .Ig) e/ou um gen. de objeto m ediado, “caça p ara si m esm o " (IB H S, pp. 146-47, P. 9 .5 .2d). O prim eiro sugere que o preguiçoso nunca completa um projeto; o último que ele não econom iza nada para si mesmo. 36. Veja HALO T, 1:14-15, s.v. IV S d ã m . 37. Considerando a form a com o o m asc. d e r e k + sufixo fcm. -<} com o a M assorá (veja Delitzsch, Proverbs, p. 195). As versões antigas leem 7, como o termo esperado 'el (“para”) e não com o o 'al inesperado (“ nâo”) do TM e. assim , fornecem esse significado citado. Essa leitura também provoca várias correções, sendo a mais provável delas do ponto de vista criticotextual, a de R. Toumay (“ Relectures bibliques concemant Ia vie future et 1’angélologie", RB 69 [1962], 495-97), seguida por M cKane (Proverbs, p. 451): p e tí bs' (“vem a insensatez”). 38. B al, o equivalente ugarítico do hebraico 'al, também é encontrado com m w t nos textos ugaríticos (ca. 1400 a.C.) com o sentido de “ im ortalidade” : “O parêntese formado por h y m (‘vida’) // blm t, ‘imortalidade’, requer uma nova tradução e exegese de Provérbios 12.28. Também implica, especialmente na poesia, numa reavaliação de caráter escatológico. Estamos fazendo jus à intenção do autor quando entendem os h y y m meram ente com o vida tem poral, ou devem os entender que o termo significa vida no sentido pleno, como zS?, ‘vida’, em algumas passagens do N T T ' (M. Dahood, Ras Shamra Parallels [Roma: Pontificai Biblical lnstitute, 1971], 1:82).
Depois de uma introdução que declara as verdades fundamentais acerca da sabedoria, da ética e da teologia (vs. 1-3), o corpo do texto contém duas subunidades parciais iguais que tratam do modo de falar (vs. 4-7) e dos atos (vs. 8-12). Um janus final une os dois temas (vs. 13, 14). Um jogo de palavras com “bom” {0b) sobre pessoas (v. 2) e coisas (v. 14), estrutura a subunidade de modo essencial.
(1) Introdução (12.1-3) A introdução apresenta os elementos fundamentais da unidade: uma caracterização dos sábios e dos insensatos como estando dispostos ou não a ser moldados (v. 1); o S e n h o r , como o agente que sustenta a ordem moral (v. 2); e os destinos eternos dos perversos e dos retos (v. 3). A introdução começa com uma referência à fauna (“ignorante/bes tial”; v. 1) e termina com uma referência à flora (“desarraigados”; v. 3). Como 10.1-3 que seguiu o padrão de um provérbio educativo ligado a um dito teológico (v. 2) e a um ético (v. 3), este capítulo também junta o provérbio educativo a um dito ético (v. 2) e a um teológico (v. 3) com referência aos destinos eternos contrastantes (cp. vs. 21, 22). Este par de provérbios dos versículos 2,3 mostra um padrão de avaliação quiástica :: +, no qual a raiz rs' (yarSia', “ele condena” e reSa', “perversidade”) constitui sua parte central, e “bom”/ ‘reto” forma sua estrutura. O versículo 2 trata do julgamento do S e n h o r , e o versículo 3 de seus efeitos permanentes. Uma vez que os retos obtêm o sorriso do S e n h o r , eles existem e permanecem, mas aqueles que ele condena dei xam de existir (cp. 10.25; J z 9.54-57; IRs 16.9,10;2Rs 15.10-14;etc.). 1 Este provérbio educativo introdutório ressoa com o vocabulário do prólogo - instrução (müsãr, 1.2), conhecimento (da'at; veja 1.2,7) e disciplina (tôkahat, 1.25, 29, 30) - e com seu objetivo de colocar o jovem no caminho da vida ao inclinar suas afeições para a aceitação da instrução dos pais e ao desviá-lo da insensatez. Essa instrução é um sinal de amor (13.24). Ao caracterizar o discípulo como aquele que a m a^hèb', 1.22), os pais tocam nos desejos que motivam o comporta mento (veja 1.22). Sua persuasão retórica e moral altera as afeições religiosas do filho de modo a transformá-lo num amante da instrução e do conhecimento. “Instrução” acentua o seu objetivo, e “conhecimen to”, o caminho para alcançá-lo.39 Mas aquele que odeia (weéõnê’;
veja l .22) a repreensão está fora da esfera divina do modo de falar sensato e pertence ao reino animal (cp. 30.2). Ignorante (bã'ar) “se refere a um homem estúpido, desprovido da racionalidade, que diferen cia os seres humanos dos animais (Sl 73.22)”.40 Fox comenta: “A estu pidez animalesca é sua marca identificadora”.41 Associações etimológicas com “besta” (òe 'ir, lit. “estrume de camelos e gado”) costumam vir à baila.42 Ele é distinguido de “insensato” (kesil) no Salmo 49.10 (11), é um paralelo dele no Salmo 92.6 (7) e de “animal” no Salmo 73.22, e contrastado com os seres humanos tanto nesse texto quanto em Pro vérbios 30.2. As afeições religiosas do incorrigível o alienam do Santo e o restringem a pensar e a se comportar como um animal (cp. Sl 32.9). 2 O dito educativo (v. 1) está ligado agora aos ditos de cunho reli gioso e ético. Todo aquele que se esforça para obter a sabedoria por meio do conhecimento (v. 1a) é uma pessoa boa ((ôb; veja p. 151), pois contribui para o bem-estar da comunidade com sua bondade fiel (cp. 3.3). Na suprema corte de apelação ele obtém o favor do S e n h o r (rasôn mêhuãh), a fonte de todo o bem (Mc 10.18; G15.22; Tg 1.17) e o único que pode dispor da vida (cp. Pv 8.35; Is 58.11). Caso se consi dere a ligação entre os versículos lb e 2b, o astucioso ( ’ís m ezimmôt\ veja “prudência”, p. 146), o oposto de “uma pessoa boa”, designa o bruto que, por ter o seu coração alienado de Deus, cria estratagemas perversos para beneficiar a si mesmo prejudicando a comunidade. Ele condena (yarsia') significa que o S e n h o r o declara culpado de trans gredir as normas da sabedoria (i.e., culpado de um comportamento ím pio e antiético) e, portanto, o entrega à morte (cp. Ml 3.5; Jo 3.19,20). 3 O sábio (v. 1) e o bom (v. 2) agora são chamados de “retos”.43 Os destinos contrastantes dos perversos e dos retos são apresentados de maneira negativa: os primeiros não serão estabelecidos, e os últimos não serão movidos. Um ser humano ( ãdãm; veja p. 139) não será estabelecido (yikkôn; veja kõnên, 3.19) pela perversidade (reSa'; veja pp. 164-165). Em sua forma passiva, como é o caso aqui (cp. 4.18 e 26), kün significa concretamente “estar firme, alicerçado, ancorado”: com referência às colunas pelas quais um templo é sustentado (Jz 16.26, 40. Chou-W ee Pan, N/D O TTE , 1:691, s.v. b'r. 41. Fox, Proverbs 1-9, p. 39. 42. HALO T, 1:146, s.v. IV6V. 43. K. H eim ,“S tnictureandC ontextin Proverbs IO :!-2 2 :l6 ” (dissertaçãodcP h.D .,U niversityof Liverpool, 1996), p. 125.
29), aos seios de uma jovem (Ez 16.7), aos montes e ao mundo (Sl 93.2; Is 2.2). Seus sentidos abstratos são ser “duradouro/firme” e “confiável, verdadeiro, seguro”. Aquilo que não está firmemente alicerçado no Santo não permanecerá. Contrastando com isso, a metáfora agrícola incom pleta da raiz (SõreS) traz à mente a imagem de uma árvore (cp. 11.28, 30) e indica que o Santo é a fonte de uma existência vigorosa (cp. Jz 5.14; Jó 14.7-9; Is 11.1). Se a raiz permanecer, a árvore florescerá (Dn 4.15[ 12]), mas se for cortada, a esperança perecerá (Am 2.9; Ml 4.1 [3.19]). Quanto aos retos ($addlqim; veja pp. 149-151), estes não são desarraigados (yimmôt, lit. “raiz... não é movida”; veja 10.30; i.e., ela permanecerá). (2) O modo de falar e o lar de alguém (12.4-7)
A primeira subunidade parcial do corpo do texto começa com uma caracterização geral de uma só linha, contrastando os dois tipos de esposa (v. 4) e pressupondo que a esposa nobre e virtuosa é reta e que a esposa vergonhosa é perversa, conclui contrastando a impermanência e a permanência de suas casas (v. 7). Este inclusio relaciona o discurso e o destino de uma pessoa com toda a sua casa (v. 7). A esposa de um homem o qualifica pois, como o provérbio pressupõe, ela é osso de seus ossos (veja Gn 2.23). Essa surpreendente referência à esposa separa o corpo do texto (vs. 4-12) da sua introdução (vs. 1-3). Os versículos 5-7 são ligados pelas palavras-chave “retos”/ ‘honestos” e “per versos”, pela sintaxe44 e pela intensificação temática do contraste das suas atitudes em relação à retidão (v. 5), para as suas palavras que visam matar ou livrar (v. 6), e para os destinos eternos contrastantes (v. 7). 4 O provérbio contrasta a esposa sábia e a insensata através das metáforas da coroa na cabeça versus a decomposição nos ossos. A pri meira é elevada, exterior e extremamente visível à comunidade; a últi ma é profunda, interior e invisível. A antítese imprecisa sugere que a esposa que causa vergonha tira do marido sua posição social, enquanto que a esposa nobre fortalece o próprio ser lhe dando honra social e poder para governar a comunidade (cp. 31.23). A esposa ignóbil conso me secretamente sua força e vitalidade e o leva a se desintegrar de dentro para fora. A hendíadis nobre e virtuosa traduz hayil (veja 31.10 44. Seguem o padrão sintático X ça d d iq im II r^S& im X (dc acordo com G arrctt, Proverbs, p. 130, n. 20).
e Rt 3.11 para a sua única outra ocorrência com ’issâ). Hayil significa “força, poder”: refere-se às pernas de um homem (Ec 12.3) e a um cavalo (Sl 33.17); à potência sexual (Pv 31.3); ao poderio militar ou “exército” (cp. Sl 18.32[33], 39[40]; 110.3); e à riqueza (Jó 20.18; Ez 28.5). Ela também pode se referir à força de caráter e à competência ou capacidade: dos israelitas encarregados dos rebanhos do faraó (Gn 47.6), de juizes (Êx 18.21, 25) e dos porteiros do templo (1 Cr 26.7, 9, 30). Com respeito a uma mulher, ela se refere à força física e espiritual, ao caráter nobre e à força competente (Rt 3.11; Pv 14.1; 31.10, 29). Provérbios 31.10-31 dá exemplos da nobreza e força física das mulhe res (cp. Ef 5.22, 23; Tt 2.5; 1Pe 3.1 -6). A menção de esposa ( eáeí) se refere a uma mulher real, não a uma virtude idealizada (veja, porém, 9.13). E a coroa ('a(eret) significa que ela é o adorno social mais preeminente do seu marido e simboliza o fato de que ela o capacita a governar (veja 4.9; 31.10-31; cp. Jó 19.9). Marido (ba’lãh) significa, amplamente, “senhor” e, com seu numa referência feminina, mais es pecificamente, “proprietário” (cp. Pv 1.19; 4.27) ou “senhor” da sua casa. Pedro apresenta Sara como uma esposa ideal, pois, ao falar de si mesma, ela chamava Abraão de seu “senhor” ( ’ãdôn, um sinônimo de ba'al\ lPe 3.6; cp. Gn 18.12). O provérbio pressupõe que o marido é piedoso e devoto (18.22; 19.14), sábio e reto, bom e generoso, que não é egoísta e que se sacrifica pelo bem da esposa (cp. lPe 3.7). Uma esposa vergonhosa (mebisâ) significa que o marido se arriscou ao casar para obter dignidade e a medida plena da sua estatura, mas expe rimentou justamente o oposto daquilo que esperava (veja 10.5). Ela o enfraquece sendo infiel (2.17), briguenta (19.13; 21.9,19) e/ou impie dosa e incompetente (cp. 31.10-31). Metaforicamente, ela é como “po dridão nos seus ossos”. O termo podridão (rãqãb) ocorre cinco vezes e designa “decomposição” (e.g., “podridão dos ossos”; 12.4; 14.30; Hc 3.16). Em Oseias 5.12, rqb é paralelo a 'ãs (“traça”) e em Isaías 40.20 sua forma verbal é aplicada à madeira. Em seus ossos (beaçmôtãyw; veja 3.8) indica sua estrutura física e psíquica básica. A medida que a podridão se espalha, ele é solapado lenta e continuamente de sua felici dade interior e utilidade exterior, “até que, por fim, a parte do corpo que os ossos sustentam e a vida toda do homem são arruinadas”.45A partir das afeições religiosas opostas desses dois tipos de esposa (veja 12.1) emergem suas formas contrastantes de pensar (cp. Rm 12.2; Ef 4.23)
e agir. O casamento é um assunto sério; a esposa constrói ou destrói o homem em seu lar e em sua comunidade (veja 14.1; 18.22; 19.14; 31.1031). A lei mosaica permitia que um homem se divorciasse de uma esposa que tivesse corrompido a santidade do lar (Dt 24.1-4; cp. Mt 19.3-12). 5 Os planos dos retos e dos perversos são diametralmente opostos. Este provérbio está ligado conceitualmente ao versículo 2: ambos falam dos planos dos perversos, mas aqui estes se referem à perversão da retidão. Planos (mahsebôt\ veja 6.18) e orientação (tahbulôt; veja p. 148) têm um som parecido e compartilham o mesmo campo semântico que se refere aos propósitos e planos para alcançar um alvo. Os planos dos retos (saddiqim ; veja pp. 149), decorrentes de sua piedade e ética, visam a justiça (m iSpãt; veja p. 149-150), mas os dos perversos (i^Saim; veja pp. 164-165 ) são voltados para o engano (m irm ãr; veja 11.1), sugerindo que os intrigantes do versículo 2 visam a injustiça. A fim de serem bem-sucedidos, os objetivos egoístas exigem dissimula ção (cp. Jr 17.9; Mt 15.19). 6 O provérbio seguinte mostra de que maneira esses planos con trastantes são executados. Nele o filho volta a se deparar com a sedu tora (veja pp. 176-180) e com os pecadores (1.10-19; 2.12-15; 4.14-19; 6.12-19), que são todos caracterizados por um discurso pervertido (veja 10.32). Os planos enganosos dos perversos (r^Saim; veja pp. 164165) são demonstrados por suas palavras letais (dibrê; veja 10.19). Tanto o conteúdo das suas palavras (e.g., falsas acusações, subornos, etc.; veja 1.11 -14; 10.11,18) quanto o estilo delas (e.g., sinais sinistros, códigos secretos e retórica ardente; veja 6.12, 13; 10.10; 16.27) têm por objetivo matar o inocente. Metaforicamente, o seu modo de falar é uma emboscada sangrenta ( ’ereb dãm; veja 1.11), indicando que tem o efeito de prender e matar os inocentes incautos e cidadãos ho nestos (1.10-14; 11.5-7; cp. 1Rs 21.1-14). No entanto, suas palavras são correspondidas pelas palavras salvadoras da boca \pi veja 4.5] dos honestos (y6Sãrim; veja p. 150). O provérbio epigramático não pretende apresentar nenhuma oposição entre a salvação por Deus no céu (16.3, 7; 18.10) e pela retidão na terra (10.2; 11.4, 6). Os livra (yassilêm; veja 2.12) significa salvar da morte os cidadãos inocentes e honestos, inclusive os próprios agentes desse livramento (cp. 11.6a; 12.7; cp. Lc 21.14, 15; At 4.13, 14). Os retos fazem isso diretamente por meio de seu discurso oportuno no tribunal e indiretamente por seu conselho e ensino (cp. 10.11a; 11.30; 18.21 a). A seqüência de paralelos
sugere que os planos nobres e as palavras francas dos retos prevalece rão sobre os planos e as palavras enganosas e letais dos perversos (veja 10.14). 7 Assim como os planos (veja v. 5) dão origem a palavras (v. veja 16.27), as palavras dão origem a destinos (v. 7). Este clímax, se melhante ao do versículo 3, contrasta a perda de vida da pessoa perver sa com a vida abundante e sem fim dos retos por meio das metáforas “derrubar” e “permanecer firme”, respectivamente. Derruba (hãpôk) se refere a um transtorno e uma inversão súbitos numa cadeia de acon tecimentos ou uma mudança inesperada de condição.46O contexto trans forma um verbo numa metáfora para o julgamento de Deus (cp. 12.2, 22; Gn 19.21,25,29). De maneira enfática e vivida, esta forma grama tical cria uma promessa que o S e n h o r cumprirá no futuro (veja n. 5). Ele condenará à morte os perversos (r^Sã^m; veja pp. 164-165) que tramam para enganar suas vítimas (v. 5) e que criam uma teia de pala vras para emboscá-las (v. 6). E liga a condição, “eles são derrubados”, sua conseqüência, eles não existem mais ( 'ênãm; lit. “e eles não são”); em outras palavras, eles não terão forças para se recuperar da sua eliminação futura da terra arável e fértil depois do seu julgamento (veja 2.21, 22; cp. lRs 15.4; Et 7.10). Jesus intensifica o julgamento desses indivíduos ressaltando o tormento deles depois da morte (Mt 25.31 -46; Lc 16.19-31). O destino de tais pessoas corresponde a seus planos e palavras: os prevaricadores e homicidas morrerão, e os retos que con formam suas vidas ao Santo e que visam dar vida a outros, viverão. Mas a casa (übêt; veja 11.29) é a “base indispensável da prosperidade sólida”47 sobre a qual todos os esforços dos retos (saddíqim ; veja pp. 149-150) devem estar alicerçados, tanto em termos espaciais, na co munidade, como cronológicos, no futuro (cp. 12.4; 14.11; 15.6; Is 56.4, 5; Ap 3.12). A metáfora permanece firm e48 (ya'amõd) indica que ela está construída sobre um fundamento firme, capaz de resistir às tem pestades que ameaçam destruí-la (10.25,30; 12.3, 12; cp. Mt 7.24-27). A salvação sempre foi uma questão familiar (cp. At 16.28). O destino da família de Noé em contraste com o de sua geração exemplifica esse provérbio. 46. K.. Seybold, TDOT, 3:423, s.v. h ã p h a kh . 47. M cKane, Proverbs, p. 449. 48. H ALO T, 2:841, s.v. ’m d .
A segunda subunidade do corpo começa contrastando de um modo geral as características daqueles que têm ou não bom senso (v. 8) e conclui com um aforismo que contrasta sua permanência ou impermanência (v. 12; cp. vs. 3, 7). Os versículos 9-11 detalham o “bom senso” ou falta do mesmo. Os três provérbios estão arraigados na vida na terra e instruem o jovem a fazer provisão de modo a suprir suas necessida des: possuindo um escravo (v. 9); cuidando dos seus trabalhadores, não os explorando (v. 10); e, ele próprio, trabalhando arduamente (v. 11). Tratam das práticas econômicas estáveis de cuidar dos rebanhos (v. 10) e da agricultura (v. 11) e das práticas instáveis de fazer o mal e correr atrás de fantasias. O versículo 9 aponta para a necessidade de modéstia ao se ter um escravo para trabalhar a terra, e os versículos 10,11 tratam da provisão de alimentos para os animais, para si mesmo e para a própria família. Os versículos 8, 9 se referem ao status públi co: o respeito conquistado por se mostrar prudente (v. 8), não pela jactância pretensiosa (v. 9). Os versículos 9 e 10 estão ligados tematicamente pela referência a trabalhadores, “um escravo” e “seu animal”.49 Os versículos 9 e 11 estão ligados pelas últimas palavras em seus versetos B: “tem falta de pão” (hasar-lehem) e “não tem nenhum senso” (hasar-têb) e por 'ebed, “escravo” e 'õbed, “aquele que trabalha” em seus versetos A. Os versículos 10 e 12 estão ligados pelo par antitético, o reto versus o perverso (ambos no singular) e, como os versículos 1 e 3, pela referência à flora (v. 12) e à fauna (v. 10). Esta referência ao reto e ao perverso liga os versículos 8-12, que tratam do trabalho, aos versículos 5-7, que tratam das palavras. 8 De acordo com o versículo 4, a esposa de um homem determina a sua estima na comunidade; agora, o elemento decisivo para este provér bio generalizador é a sua prudência (éiklô; veja p. 146), o fato de ele não ser desatinado.50 Os ditos gnômicos dizem respeito à toda pessoa ( ‘is; veja p. 139) virtuosa. E louvada (y6hullal) se refere à aclamação públi ca que concede honra social a algo ou alguém (cp. Gn 12.15; 2Sm 14.25; Ez 26.17). Em 3.4 sêkel está diretamente associado a “boa reputação” (cp. 13.15a), um atributo que exaltou José, Daniel e Davi. “A sabedoria de nosso Senhor também foi louvada, não apenas pela voz do povo (Mt 49. Garrett, Proverbs, p. 131, n. 2 4 1. 50. Pode haver uma aliteração intencional entre as palavras finais bôs (“ vergonhosa"; v. 4) e búz (“desprezado” ; v. 8).
7.28,29), mas até pelo testemunho dos seus inimigos (Jo 7.46).”51 Mas o que tem uma mente desvirtuada (wena 'awêh lêb; veja n. 8) é incapaz de ver as coisas como elas são de fato, se coloca em situações difíceis inadvertidamente e, portanto, não é honesto. Ainda que, por ora, tal indi víduo possa receber louvores (cp. 28.4), mais cedo ou mais tarde será desprezado (lãbüz). Büz indica um sentimento interior que considera os inferiores desprezíveis e imprestáveis (veja 11.12). Na melhor das hipó teses, a pessoa moralmente confusa diverte os outros e se toma o alvo de suas piadas. No entanto, esse aforismo deve ser mantido em tensão com contra-aforismos. Uma pessoa sábia resgata sua cidade sem que esta lhe seja grata (Ec 9.15), e os apóstatas louvam os perversos (Pv 28.4). Por vezes, ainda que condenados em vida, os sábios são elogiados depois que morrem (cp. Mt 23.29-32), e quando o S e n h o r voltar certamente os louvará (Mt 5.11,12; Lc 12.42-44; 2Co 10.18). Casos como os de Abigail versus Nabal (ISm 25) e do filho pródigo depois da sua conversão, não antes (Lc 15.16,17), exemplificam esse provérbio. 9 Este versículo apresenta uma aplicação específica da generaliza ção do versículo 8. Viver confortavelmente sem importância social é melhor do que demonstrar afluência exteriormente para conquistar o louvor pú blico que esconde a pobreza (cp. 15.17; 30.8-9). Melhor (fôb) introduz com o padrão A ([situação] negativa) + B (positiva) + C (positiva) + D (negativa) (cp. 15.16,17; 16.8,19; 17.1)oprimeiroditocom “melhor... do que” em Provérbios. Aqui a situação A (negativa) é alguém considera do desprezível(niqleh\ veja Dt 25.3; Is 3.5; 16.14). O paralelo antitético, a riqueza fingida de uma pessoa que não tem alimento, sugere que a pessoa tida em baixa consideração não possui o tipo de riqueza associada à honra (cp. ISm 18.23). Esse indivíduo modesto se permite ser despre zado pela sociedade a fim de não viver acima das suas possibilidades. Neste caso a situação B (positiva) é e, no entanto, tem um escravo (ou servo; we'ebed lô) que realiza o trabalho pesado no campo para prover o alimento de seu senhor.52 O paralelo antitético “tem falta de pão” (i.e., 51. Bridgc, Proverbs, p. 135. 52. 'Ebed (“escravo” ) não significa aquilo que é entendido comumente como “escravo" em nossa lin gua. Associamos o termo “escravo” com escravos africanos que foram raptados e trazidos para o continen te americano. No Antigo Testamento, raptar um escravo era um crime capital (Êx 21.16). Tanto na lei quanto em Provérbios o termo indica uma pessoa que perdeu sua liberdade por falência financeira e, apesar de ser um escravo, se tomou parte da família mais ampla dentro da proteção da comunidade da aliança (Êx 21.21,32). “O caráter distintivo dessa instituição social é visto quando percebemos que o texto legislativo mais extenso sobre escravos no Antigo Testamento tratava da legislação sobre os servos que nâo desejavam que sua serv idão cessasse (Êx 2 1. 1-6)" (Atkinson. Proverbs, p. 84).
carece dos elementos básicos para sustentar a vida) sugere que ter um escravo é considerado uma necessidade básica (cp. 30.8, 9). No antigo Israel um escravo valia 30 siclos (cp. Ex 21.32; cp. também 2Mac 8.11; Mt 27.3) e era acessível aos que não tinham muitas posses.53A situação C (positiva) é do que ser alguém que exalta a si mesmo (m im m etakkabbêd) ou, mais literalmente, “do que ser alguém que se estima e declara [falsamente] ser honrado”.54Ele finge ter riqueza digna de honra (cp. 8.18; 11.16; 21.17). £ que tem falta de pão (wahasar-lãhem), a situação D (negativa), mostra que essa honra é falsa; na realidade, ele passa fome. A pessoa mesquinha gasta os seus escassos recursos insen satamente para manter uma aparência fútil. Algumas pessoas fingem ter competência quando, na verdade, são incompetentes, e algumas fingem ser religiosas quando, na verdade, se encontram espiritualmente falidas. A pessoa modesta é humilde de coração, enquanto os pretensiosos têm um coração pervertido (cp. 13.7; Lc 14.11). O pretensioso é escravo da opinião dos outros e condenado ao opróbrio (cp. 11.2). 10 O tema da riqueza sensata (v. 8) muda agora da prosperidade merecida dos retos em contraste com a riqueza fingida (v. 9) para a ideia de cuidar do trabalhador e não explorá-lo (v. 10). Uma pessoa reta (saddiq) que, por definição, serve a outros, não a si mesma (veja pp. 149-150), é aquela que conhece (yôdêa'; i.e., ouve, presta aten ção e é solidária às necessidades;, veja 1.2)55 os desejos (ou “apetites e motivações”; nepeá; veja p. 140) do seu animal (befiêmâ). Behemâ se refere a qualquer quadrúpede doméstico, como um cavalo ou mula (veja Ne 2.14; Is 30.6; 46.1), ou parte do rebanho ovino, caprino ou bovino (veja Lv 1.2). O Criador tem compaixão dos animais (cp. Dt 11.15; Sl 36.6b [7b]; 104.14, 17; Jn 4.11) e ordenou em sua lei que Israel compartilhasse os seus sábados com eles (Ex 20.10; 23.11, 12; 53. “No antigo Israel a posse de escravos - ou pelo m enos de um escravo - não era de m aneira algum a indicação de riqueza ou poder superior. O s escravos israelitas não eram , necessariam cnte, co m p rad o s num a transação puram ente com ercial, apesar de haver essa possibilidade. Com frequência um escravo era um devedor inadimplente ou uma pessoa pobre que nâo tinha alternativa senão se entregar com o servo. De acordo com P rovérbios 12.9, com o a passagem costuma ser interpretada, possuir somente um escravo podia ser um sinal de um m odo de vid a m o d esto ” (R. W hybray, Wealth and Poverlv in the Book o f Proverbs [JSOTSup 99; Sheffield: JSOT, 1990], p. 81). 54. IBHS, pp. 4 3 0 -3 1 , P. 26.2s. 55. “O âmbito semântico extenso de y õ d a \ que varia desde o conhecimento puramente aperceptível até ‘tom ar cuidado, prestar atenção em ’ fica claro por seu uso em paralelo co m áím . ‘atenlar’(ls 4 1 .2 0 , 22),sSkal, ‘considerar’ (Is 41.20; 44.18); btqqlS, ‘procurar’ (Jr 5.1); b&han, ‘provar com cuidado’(Jr 12.3),e9<íía6, ‘prestar atenção’(ls3 2 .3 )” (G J. Botterweck, TDOT, 5:462, s.v. yBda').
Lv 25.1 -7). É provável que o provérbio implique num argumento a mi nores ad maiores. Se o indivíduo demonstra misericórdia pelas criatu ras menores, quanto mais nâo o demonstrará pelas criaturas maiores.56 Na lei, suprir as necessidades do boi que trabalha funciona como pro vérbio para cuidar dos seus trabalhadores (Dt 25.4; ICo 9.9, 10).57 Sendo esse o caso, pode haver uma ligação entre possuir um escravo (v. 9) e cuidar dele prevendo suas necessidades (v. 10). Entretanto, se os perversos são cruéis com as criaturas de menor valor, quem poderá lhes confiar as de maior valor (cp. Mt 25.23)? Esse é o argumento do verseto B. Misericórdia (rehem) pode indicar a qualidade abstrata de misericórdia, seu sentido habitual (de acordo com a Targ., Sir, AV, NJPS, NRSV, cp. N1V), ou as entranhas, os intestinos (i.e., os sentimentos), o centro da misericórdia (cp. Gn 43.30; 1Rs 3.26; de acordo com a LXX, Vulg., NAB, NEB). “Misericórdia” indica os anseios temos, afeições e o amor de um superior por um inferior desamparado, arraigado numa ligação “natural” criada pela graça comum de Deus. “A profundidade desse amor é demonstrada pela relação dessa palavra com rehem/raham [‘útero’]. Convém comparar com Jeremias (21.7), que usa o termo para o amor da mãe para com o filho que ela amamenta ,...”58 Porém, atribuir “misericórdia” aos perversos veja pp. 164-165), que por natureza não temem a Deus nem socorrem outros, é sarcástico. Quando o perverso pensa estar sendo movido pela compaixão, na ver dade, está sendo cruel (veja 5.9), empedernido. Enganados acerca de suas afeições profundas, os perversos infligem dor em outras criaturas de modo consciente e intencional, visando o benefício próprio (veja 5.9; 11.17). Hoje em dia, por exemplo, alguns fazendeiros maltratam aves e rebanhos, reduzindo-os a máquinas eficientes e consideram uma de monstração de misericórdia lhes dar a melhor ração a fim de aumentar sua produtividade e/ou engordá-los para o abate! Com uma visão aguça da pelo holocausto, Dietrich BonhoefFer afirmou que os atos maus de uma pessoa boa são melhores do que os atos bons de uma pessoa má. 11 Os provérbios referentes à economia se voltam agora dos traba lhadores do indivíduo para o próprio trabalho. Aquele que trabalha Çõbêd; cp. 'ebed no v. 9) indica aquele que se esforça e labuta para produzir algo. 56. Cp. Gemser, Sprüche , p. 58. 57. Com base em Deuteronômio 11.15 “ os rabinos deduziram a regra de que um homem deve alimentar seus animais antes dc se alimentar" (Cohen, Proverbs, p. 75). 58.Coppes. T W O T ,2 M \,s.v.ra h a m .
Com o objeto terra tem a nuança mais específica de adubar, cultivar e arar um campo a fim de produzir alimentos para sustentar a vida. Sua terra ( ’admãtô) designa a terra marrom avermelhada e fértil (húmus) demarcada por pedras de divisa e cultivada por alguém como meio de subsistência, constituindo a sua base econômica. O provérbio pressupõe que o indivíduo trabalha nessa fonte de sustento com a diligência e a inteligência de uma formiga (veja 6.6-8). Talvez o provérbio “seja uma exortação para seguir a agricultura como uma maneira de sustento” (cp. 28.19).59É mais provável, porém, que “o versículo não esteja louvando a agricultura de modo especial, mas sim considerando-a uma atividade co mum, legítima e rentável”,60 uma vez que a Bíblia menciona de modo favorável funcionários e artesãos, como metalúrgicos, perfúmistas e co zinheiros (Êx 28.3; 36.1; ISm 8.13), e que o provérbio é exemplar por natureza. Está cheio (yisba'; veja 1.31) indica a saciedade do apetite com uma medida tão cheia e perfeita de alimento (lahem; 6.26) que elimina completamente sua fome (veja 1.31; 5.10). Aqueles que servem à criação, o animal alegórico (v. 10), bem como à terra (v. 11) são, por sua vez, servidos por ela. Em contraste com o trabalhador honesto que labuta para aplacar sua fome e sustentar sua vida, vê-se o que corre atrás de (ou persegue [meraddêp]; veja 11.19) fantasias (rêqim) rêqim (“vazio” “imprestável”) pode se referir a “pessoas imprestáveis”, mas o paralelo antitético “sua terra” favorece que se considere a expressão como uma referência a “coisas sem valor” (cp. Sir., margem da RV/ ASV, e a maioria das versões modernas). O que se tem em vista não é apenas a especulação ou os empreendimentos ou negócios arriscados que nâo envolvem trabalho árduo e/ou não contribuem para o enriqueci mento da comunidade. A abstração é ampla o suficiente para incluir qual 59. Cohcn (Proverbs, p. 75) e McKane (Proverbs, p. 444) apoiam a opinião de que se trata de um ideal agrícola, tanto em função de Eclo 7.15, “ Não aborreças o trabalho penoso, nem o trabalho de lavrar que foram criados pelo Altíssimo” quanto dos ensinos rabínicos, “ Um homem sem terra nâo é um homem” e “ Que todo homem reparta o seu dinheiro, investindo um terço em terras e um terço em negócios e poupando um terço” . 60. Toy, Proverbs, pp. 248-49. Rêqim ocorre 14 vezes, dez delas como um adjetivo atributivo que indica um objeto “ vazio” como uma cova (Gn 37.24) ou um cântaro (Jz 7.16; 2Rs 4.3; cp. Ez 24.11), ou ainda, pessoas “ desprezíveis” (i.e., “ aventureiros” /“ salafrários abjetos” ; Jz 9.4; 11.3; 2Sm 6.20; 2Cr 13.7). O conceito dc “ vazio” é atenuado com “ desprezível” em relação a uma pala vra “ vazia/sem valor” (Dt 32.47) e a um grão de cereal "vazio/sem valor” (Gn 41.27). Em duas ocasiões é usado como adjetivo predicativo: com referência a um apetite que permanece vazio (i.e., nâo satisfeito; Is 29.8) e a uma pessoa sacudida para fora, expulsado templo (Ne 5.13). Em Provér bios é usado duas vezes como um substantivo adjetival depois de "bolsa” ( 12.11; 28.19) e como paralelo antitético com "lavrar a terra para obter alimento” .
quer plano para enriquecer da noite para o dia (21.5,6) ou a ideia de um indivíduo ficar à espera do dia em que tirará a sorte grande.61Aquele que faz negócios arriscados não tem nenhum senso (hasar teb\ veja p. 142) para preservar sua vida. O S e n h o r está silenciosamente presente por trás da ordem criada que requer trabalho honesto, não enriquecimento instantâneo (veja 10.3; 12.2). O provérbio é repetido com um final dife rente em 28.19.62 O livro de Provérbios nâo se preocupa com a perda de alimento decorrente de casualidades. Mas o fato de que maus hábi tos geram pobreza deve ser contrabalançado pela realidade da pobreza decorrente de um ambiente desfavorável e da má administração (veja 10.4), questões tratadas em Jó e Eclesiastes. 12 0 provérbio aumenta de intensidade, passando da prudência com respeito ao benefício econômico através do trabalho viável (vs. 10,11a), não de empreendimentos insensatos (v. 11b), para a censura das ativida des perversas, contrastando a impermanência dos perversos por meio da metáfora de uma fortaleza, ainda que falsa, com a permanência dos retos por meio da metáfora de uma raiz (cp. vs. 3,7 e 10.24a, 25a; 21.10). Com sua visão depravada, o perverso (rãSã'; veja pp. 164-165) deseja (ou anseia por, hnmad\ veja 1.22) e, portanto, age de modo a se apoderar da fortaleza [ou rede, mesôd\ dos malvados ( rã'im; veja 1.16).63 A pala vra rara mesôd também pode significar “fortaleza [na montanha]” (Ec 9.14; de acordo com a Vulg., e HALOT)64 ou “laço/rede”65 (Ec 7.26; de acordo com a Targ. e BDB).66A LXX e a Sir. solucionaram o problema deixando de traduzir o termo! A escolha do sentido correto é complicada pela ambigüidade do verseto B paralelo, que provavelmente significa “raiz... permanece” ou, possivelmente, “raiz... brota”.67“Baluarte”, uma 61. Hubbard, Proverbs , p. 157. 62. Amenemope (8.17-20) admoesta: ‘‘Ara os teus campos e encontrarás o que precisas. Reccberàs pão da tua eira. Melhor uma medida que te é dada pelo deus, do que cinco mil medidas obtidas por meios ilícitos" (AEL , 2:152). 63. R ã 'ím , “ males” , se refere a homens maus ou coisas más. Meinhold ( Sprüche , p. 208) prefere o último, pois os perversos são equiparados aos maus em 4.14 e, portanto, desejariam o que já possuem, entretanto, em 1.22 os néscios desejam a necedade que já possuem. “ Desejar" em 1.22 e 12.12 significa que desejam mais daquilo que apreciam. Homens maus desejam coisas más, atenuando a distinção entre as duas opções. 64. HALOT , 2:622, s.v. m esôd. 65. Jó 19.6 é citado com frequência para o significado “ rede” , mas a forma naquela passagem é m e$üd. 66. BD B, pp. 844-45, s.v. m e?6d. 67. A N V I evita o problema usando a tradução “ floresce", que pode significar tanto paciência quanto produtividade.
metáfora militar para segurança, é um paralelo mais apropriado para “raiz... permanece”, uma metáfora agrícola para segurança (veja 12.3). “Rede”, uma metáfora da caça, provê um paralelo mais apropriado para “raiz... brota”, uma vez que as duas metáforas se referem à pro dução, a primeira pelo roubo e a segunda pela produtividade contínua.68 Os paralelos climáticos nos versículos 3 e 7 se referem à segurança, não à produção, favorecendo o significado “baluarte”. Na verdade, é provável que m e$ôd represente uma corrupção de m esôr (com certeza, “baluarte”) - os escribas confundiam com frequência dalete e reche. Os perversos cobiçam as defesas contra calamidades que os homens maus levantam mediante sua prática de saquear suas vítimas (veja 1.1019; 11.16); eles imaginam que sua riqueza é uma cidade fortificada (veja 18.11). A metáfora incompleta a raiz (SõreS) significa tanto vida quanto estabilidade (veja 12.3) e contrapõe a m esôd. Supondo que seu significado seja “baluarte”, o contraste mostra que os perversos preci sam cobiçar uma defesa obtida ilegalmente de fora; pois não a possu em dentro de si. Mas os retos (saddiqim\ veja pp. 149-150) possuem uma segurança legítima enraizada em seu próprio caráter. E mais ade quado corrigir yittên por yitan {permanece)69 do que atribuir ao verbo comum yittên o significado de “brotar” ou “dar frutos” sem um obje to.70 De modo bastante instrutivo a LXX e a Targ. traduzem o verbo final do verseto B como “firmar” e “manter-se firme”. Apesar de ser questionável, eles leemyitan e é possível que tenham lido [be]’êtãn, e pelo menos reconheceram o conceito de “firmar/manter-se firme” como o predicado mais plausível tendo “raiz” como sujeito. (4)Janus, conclusão: palavras e ações (12.13, 14) 13,14 Estes versículos são unidos por “lábios” e “boca”, órgãos da fala. O modo de falar de um pecador o conduz à sua morte (v. 13); o discurso do reto o farta de coisas boas (v. 14). Estes versículos servem de conclusão para os versículos 1-14 ao combinar no versículo 14 o tema das palavras (vs. 4-7, 14a) com o do trabalho (vs. 8-12, 14b) e ao empregar um provérbio sintético raro como aqueles que, com frequên cia, demarcam as unidades na Coleção II. Esses dois versículos tam bém funcionam como um janus entre os versículos 1-14 e versículos 68. De acordo, essencialmente, com Meinhold, Sprüche, p. 208. 69. HALOT, 2:451, s.y.ytn. 70. B D B , p. 679, s.v. nSian.
15-28, que também se referem às palavras (vs. 15-23, esp. 17-22) e ao trabalho em conjunto com as palavras (vs. 24-28). De modo mais es pecífico, estão ligados imediatamente aos versículos 11 -14 de modo qui ástico por palavras-chave. “Está cheio”/ ‘se farta” (yisba') com referên cia ao alimento, mas também a boas obras no versículo 11b e boas pala vras no versículo 14b, ocorre em sua estrutura externa. “Mau” (rã') com referência a pessoas no versículo 12a e coisas no versículo 13a, ocorre na parte central. Ao mesmo tempo, porém, a palavra-chave “lábios” (v. 13) os liga às falas e suas partes do corpo nos versículos 17-22 (esp. 18, 19 e 22) e “mão” ao trabalho nos versículos 24-28 (esp. v. 24). 13 O provérbio adverte acerca do modo de falar pecaminoso que visa apanhar os inocentes em uma armadilha, pois a armadilha acabará prendendo o ofensor, permitindo que o inocente ou reto (i.e., aquele que é declarado reto ou inocente) escape (cp. 29.6). Na (be, i.e., no âmbito da) transgressão (pesa'; veja 10.12) dos [seus] lábios (éepãtayim; veja 10.13) se encontra a armadilha (môqês). MôqêS designa a pin guela de uma armadilha. Um dos quatro tipos de armadilha emprega dos pelos árabes egípcios modernos, “que provavelmente remontam a tempos antiquíssimos”, é “uma armadilha com duas barras curvas exa tamente correspondentes, uma acima da outra, como a maxila superior e a inferior, sendo que a superior é solta de modo que, quando a presa pega a isca, essa barra superior cai e prende o pescoço da presa à barra inferior, que é fixa”. A parte superior, a barra letal, representa pars pro toto da “armadilha”.71 A metáfora retrata o discurso letal que pega uma vítima de surpresa e a destrói antes que consiga se livrar. Colocada para um homem mau (rã'; veja 1.16) provavelmente tem dois sentidos duplos. Em primeiro lugar, significa colocada por um ho mem mau e também confeccionada por ele (veja n. 18) e, em segundo lugar, com referência ao homem mau, este preparou a armadilha para pegar o reto, mas sem que percebesse a confeccionou para si mesmo, pois em vez de prejudicar o reto, o discurso pecaminoso desse homem se voltará contra ele próprio. Pode-se observar jogo de palavras seme lhantes com “armadilha” e “homem mau” em 18.7 e 29.6; nos três casos, o planejador se toma vítima dos próprios planos (veja 1.16). A conjunção seqüencial e (way) favorece o significado “colocada para um homem mau”, pois sugere que, como resultado do perverso ser 71. G. R. Driver, “ Reflcctions on Some Recent Articles” , JBL 73 (1954) 131-36.
pego, o reto (saddiq; veja pp. 149-150) escapa iyêsê').12 Das 781 ocor rências do verbojyõçõ ’ no Qal, “a maioria (quase 400) envolve o signifi cado de alguém [em contraste com algo e com a terminologia técnica militar e, também, com outros conjuntos de expressões idiomáticas] vindo ou indo.... de/para um lugar, partindo, saindo ou escapando....”.73 O pon to de partida é sugerido na frase adverbial da angústia (missãrâ; veja 1.27; 11.8) que, de acordo com o paralelo, inclui pelo menos uma armadi lha preparada pelo perverso. Os retos também são libertos da morte para a vida. O provérbio sugere que, por vezes, os retos se encontram em armadilhas mortais e angústias preparadas por pessoas moralmente re pugnantes, mas quando a mesa vira contra o opressor, o inocente aflito escapa (veja 3.34; cp. 1Rs 2.22,23; Dn 6.7, 8[8, 9], 24[25]; Mt 27.25). 14 O paralelo sintético final, que pressupõe um ponto de vista holí tico da vida sob a providência, promove e associa o discurso ético favo rável e o trabalho, pois eles recompensam o indivíduo bom (v. 2), aquele que fala e faz o bem, com coisas boas (cp. Ec 11.1; G1 6.5). Do fin to da sua boca (mippert pi; veja 10.31; 11.9 - observe a aliteração de / pi/) tem um paralelo egípcio que significa “afirmação” e reflete a influ ência direta de seu vocabulário sapiencial.74 Como os frutos mais exce lentes da árvore, os bons ensinos, a orientação pacificadora, as exorta ções piedosas e o encorajamento consolador revelam as característi cas fundamentais do indivíduo, são produzidos sem esforço e susten tam a vida da comunidade (cp. 10.20, 21). Uma pessoa ( ’is) se refere, aqui, à pessoa reta.75 Ela é farta (yiéba'; veja 12.11) em seu ventre (veja 18.20) de coisas boas (0b; veja p. 151) que beneficiam sua vida. A medida que a natureza interior desse indivíduo produz bons frutos que alimentam outros, o bem se volta para ele e o alimenta, produzindo vida dentro dele. Sua recompensa é mais palpável do que a satisfação decorrente de fazer o bem. Além disso, os atos (jfmül; vejagãmal em 3.37; 11.17) indicam atos eticamente relevantes, e o paralelo, “coisas boas”, demonstra atos favoráveis. O provérbio não permite nenhuma divisão entre o modo de falar de uma pessoa reta e aquilo que é produ zido por suas mãos. A menção de “boas” sugere que a expressão as mãos de um indivíduo (y^dê- 'ãdãm.) é uma metonímia para os atos 72. “ O modus consecutivo... é, aqui, de maior importância que. e.g., em xi, no qual a ligação segue sem ele... a partir da ideia de mudança de lugar" (Delitzsch. Proverbs, p. 187). 73. H. D. Preuss, TDOT, 6:227-28, s.v. ySsS'. 74. N. Shupak, “ Egyptians Terms and Features in Biblical Hebrew” , Tar 54 (1984/85) 475-83. 75. A Sir. une (ôb a ’í$.
dos retos, como descritos nos versículos 9 -11,24 e 27. Voltam (yãsúb\ veja 1.23) para ele (lô, i.e., aquele que realiza o ato) afirma o ensino sapiencial segundo o qual os atos e suas conseqüências são insepará veis. Os parâmetros da unidade mostram que o S e n h o r é aquele que sustenta a ligação (cp. 12.2, 22). O conceito ético e religioso de que o S e n h o r retribui ao agente seus atos éticos favoráveis é expresso pela vigorosa metáfora dos negócios: “O S e n h o r empresta àquele que ajuda os pobres, e lhe recompensa por seu ato” (19.17) [trad. do autor].76 “O menor dos exercícios de amor será recompensado abundante e eterna mente.”77 Delitzsch comenta: “O provérbio encontra sua confirmação conclusiva no julgamento final (cp. Mt xii.37)”.78 b. A segunda unidade (12.15-28) Um aforismo educativo introdutório (v. 15), seguido de um corpo principal constituído de uma coleção de provérbios sobre palavras (vs. 16-23) e obras (vs. 24-27), e concluído com um paralelismo sintético magnífico (v. 28), reflete a estrutura da primeira coleção, bem como a sua extensão. Além disso, o vocabulário sapiencial do primeiro provér bio educativo introdutório (i.e., “insensato” e “sábio”) dá lugar aos ter mos éticos e teológicos “perverso” e “reto”, e cada unidade começa novamente com uma generalização, seguida de especificações. O con junto todo é estruturado pelo inclusio derek, “caminho”, com referên cia ao insensato no versículo 15 e ao reto no versículo 28. Suas subuni dades são adornadas de maneira elaborada, de modo que não é fácil distinguir algumas unidades das outras sem desintegrá-las. (1) Um provérbio educativo introdutório (12.15) O provérbio educativo introdutório da segunda metade (v. 15) é ane xado ao texto sem mudanças bruscas ao ser formado como um par pro verbial com o versículo 16 por meio da palavra-chave “insensato” (vs. 15a, 16a), e dos sinônimos “sábio” e “astuto”, como suas palavras finais, pela sintaxe (“mas a pessoa...”; vs. 15b, 16b)79 e, talvez, pela semântica. Apesar do insensato presunçoso acreditar dentro de si que ele é honesto 76. Na literatura profética e hinica, porém, a expressão composta “ retribuir pelos atos” significa com frequência julgamento (cp. Sl 28.4; 94.2; Jl 3.4, 7[4.4, 7]; Ob 15). 77. Bridges, Proverbs, p. 139. 78. Delitzsch, Proverbs, p. 258. 79. Ambos começam com Qal particípio ativo.
e não precisa de correção (v. 15), sua falta de probidade fica evidente a outros quando ele não demonstra domínio próprio (v. 16). Sua avaliação equivocada de si mesmo é corrigida pela avaliação pública.80Além disso, ele também introduz os versículos 17-23, que tratam do discurso, pois apesar de não dizer respeito à fala de modo direto, é fundamental a ela. Se o indivíduo é sábio (hãküm) por dar ouvidos aos conselhos (v. 15), tem a língua de uma “pessoa sábia” hakãmim que promove cura (v. 18). O versículo 15 ressoa um vocabulário semelhante ao do prólogo (1.8-9.18; cp. 10.1; 12.1) e, como o prólogo, define “sábio” e “insensa to” em termos de aceitação ou rejeição do conselho dado com autori dade. Os paralelos antitéticos são imprecisos, sugerindo que o insensa to não dá ouvidos a conselhos e que o sábio não determina sua retidão em função da sua opinião acerca de si mesmo. O sábio reconhece sua necessidade de conselho; o insensato arrogante está convencido de que não precisa de correção alguma (cp. 14.12 = 16.25; 16.2; 21.2) e, portanto, se recusa a dar ouvidos (cp. 26.5, 12, 16; 28.11 a). O caminho (derek; veja 1.15) de um insensato ( ’ewil; veja pp. 167-168) é certo (yãsãr; veja p. 150) aos seus próprios olhos (be'ênãyw; i.e., em sua própria opinião; veja 3.5,7) mas, na verdade, ele está praticando o mal aos olhos do S e n h o r (cp. Jz 2.11; 3.7; 17.6; 21.5). Esse individualista sabe-tudo, que faz as coisas à sua maneira, está vivendo numa ilusão, mas ninguém pode lhe dizer isso (cp. 16.2; 21.2). Entretanto, a pessoa sabia (hãkãm ; veja p. 145) é aquela que dá ouvidos (weSõmêa' le; veja 1.5) a conselhos Çêsâ; veja 1.25) dados com autoridade. (2) Modo de falar sábio e tolo (12.16-23) Esta subunidade trata do uso e do abuso da boca. A unidade é estruturada de forma quiástica pela combinação dos versículos 16 e 23 em sua parte exterior e dos versículos 17 e 22 em sua parte interior. As palavras-chave da estrutura externa também são organizadas de forma quiástica: “insensato” (^ w il), “ignora” (kõseh) e “astuta” Çãrüm) em 16b em contraste com “astuta” Çãrüm), “oculta” (kõseh) e “insensa tos” (* w ilim ) no versículo 23. Os versículos 17 e 22 também estão ligados de forma quiástica pelas palavras-chave “confiável” (* m ünâ; vs. 17a, 22b) e “mentirosos” (Seqãr; vs. 17b, 22a). A unidade como um todo está ligada de várias maneiras: as partes do corpo que dizem res peito à fala: “lábios” (vs. 19,22; cp. v. 13), “boca” (cp. v. 14) e “língua”
(vs. 18, 19); a parte do corpo que as orienta, o “coração” (vs. 19, 23); as referências à comunicação (“é revelada” em contraste com “ocul ta” em vs. 16, 23; “testemunho”, v. 17; “aconselham”, v. 20; “procla ma”, v. 23). Além disso, entre os versículos inicial e final os aforismos são unidos pelo padrão de avaliação -:: + nos versículos pares e + :: nos versos ímpares.81 O versículo 22 lança o alicerce teológico para a unidade toda. O S e n h o r é o agente que sustenta a ordem moral com respeito ao modo de falar. Depois da introdução (v. 15), que é emparelha da com o versículo 16, a unidade pode ser separada em duas partes iguais, os versículos 16-19 e 20-23, constituídos, cada um, de uma estru tura (vs. 16 e 23) e uma parte central (vs. 17-19,20-22). A palavra-chave “engano”, a última palavra da primeira unidade (v. 17) e a primeira pala vra da segunda (v. 20), dão início a cada unidade, sem contar a estrutura. 16-19 Estes versículos estão ligados por um paralelismo alternado: as reações descuidadas versus as reações cuidadosas (v. 16), as pala vras precipitadas versus a cura (v. 18), empregando o padrão de avali ação - :: +, e o testemunho honesto versus as mentiras (vs. 17 e 19), empregando o padrão +:: -. A palavra-chave ’m n (* m ü n â , “correto” e *m et , “veraz”) nos versetos A e Sqr (seqãrim , “perjuro” e Sãqer, “men tirosa”) nos versetos B reforça o emparelhamento dos versículos 17 e 19. Os versículos 18 e 19 estão ligados por lesôn, “a língua dos”, com referência a seus efeitos (v. 18) e à sua duração (v. 19). A unidade progride do discurso intencional falso no versículo 17b, para o discurso não intencional descuidado que é igualmente prejudicial no versículo 18a, e deste para a transitoriedade da pessoa mentirosa (v. 19b). Ela também aumenta em intensidade de uma testemunha confiável (v. 17a), para palavras de cura (v. 18b), e destas para o caráter eterno da pessoa sincera (v. 19a). Sua conclusão volta a tratar da permanência e da impermanência (v. 19; cp. vs. 3, 7, 12). Aquele que prejudica outros (vs. 17b, 18a) não permanece (v. 19b), mas aquele que serve a outros (vs. 17a, 18b) permanece para sempre (v. 19a). 16 Este versículo em forma de ja n u s provê uma ponte do dito educativo introdutório (v. 15) para a ética e a teologia do discurso (vs. 17-22; cp. 10.1-3) e, com o versículo 22, forma uma moldura ao redor desta coleção. Seus paralelos quiásticos antitéticos admoestam a práti ca do domínio próprio sobre as emoções perigosas, ao chamar aquele que não possui essa capacidade de “insensato” e aquele que a possui 8 1. Talvez o padrão da estrutura externa -::+ (v. 15), seja invertido no janus (v. 23).
de “astuto” em sua estrutura externa. A palavra-chave enfática quan to a um insensato ( ^wil; veja pp. 167-168), une este ao versículo 15. A raiz de sua vexação (ka'sô) significa “ficar agitado”, “ficar perturba do”, “ficar exasperado”.82 Os sábios consideravam essa disposição in terna de exasperação uma emoção perigosa: ela mata o insensato (Jó 5.2) e deve ser contida; o sábio não a demonstra (Pv 12.16). Não obs tante, um filho insensato é uma vexação para seu pai (17.25), como também o é o insensato para a sua esposa (27.3); uma esposa também pode causar essa vexação (21.19). De acordo com o rabino Ileaj (do terceiro ou quarto século d.C.), pode-se reconhecer uma pessoa por sua taça (kôs), sua bolsa (kis) e seu aborrecimento (ka'as) (T. B. ‘Erubin 65b; i.e., pela maneira como ela se comporta quando está bebendo, tratando de finanças e numa atitude de agitação interior).83 E revelada (yiwwãda'; veja n. 24; 10.9) indica a sua manifestação pública. Os gestos e o modo de falar do insensato comunicam sua atitude intoleran te e incorrigível. Ele é dado a acessos de raiva (cp. 29.11), começa brigas com facilidade e quer partir para a violência (cp. 20.3). No mes mo dia indica que ele não consegue se controlar (veja 25.28). Em vez de governar seu espírito e de controlar seu ambiente, ele é governado pelo seu temperamento irascível e é motivo de vergonha (cp. 14.17,29).*4 A pessoa astuta Çãrüm; veja p. 147), entretanto, ignora (kõseh; cp. 10.6, 11, 12, 18; 11.13) um insulto (qãlôn; veja 3.35). Kãsâ significa “cobrir” e é usado para aquilo que é coberto de tal modo a não ser visível (“ocultar”; 10.6,11,12,18; 11.13; 24.31; cp. ISm 19.13) ou para proteger ou manter algo aquecido (1 Rs 1.1). No Salmo 32.1, a única ocorrência de ksh no Qal, é usada metaforicamente para o ato de cobrir os pecados, significando perdão, seu termo paralelo. Ringgren o traduz nesta passa gem como “ignora”. Em vez de dar espaço para uma reação emocional intensa ao insulto (veja 3.35; 6.33; 9.7; 11.2), aquele que tem conheci mento prevê o perigo de tal reação e ignora a afronta. Os versículos 1719 esclarecem que, desse modo, o indivíduo pode reagir de modo razoá vel e eficaz. Por meio de sua inescrutabilidade implícita ele controla sua língua e seu ambiente. Seu domínio próprio e caráter inescrutável restau 82. Expressões paralelas são h r k , “estar irado” (Ne 4 .1[3.33]) e h r q S i n n í m , “ ranger os dentes” (Sl 112.10). Seu antônimo é sq(, “ter descanso/paz”. Com frequência o substantivo ocorre com o verbo para reforçar a ideia (cp. ISm 1.6, com referência a insultos entre pessoas; IRs 15.30; 2Rs 23.26). 83. Citado por Meinhold, Sprüche, p. 210.
ram implicitamente o seu respeito na comunidade. Confiando na provi dência de Deus, os sábios não demonstram nenhum zelo fanático em castigar os perversos. O mestre sábio aconselha com humildade (11.2), aceitando a correção (12.1,15), demonstrando bondade (11.17; 12.10) e comedimento em seu discurso ao transmitir conhecimento (cp. 10.14; 11.13; 12.23) ou ao ser incorreto (cp. 10.19; 11.12; 12.16; 19.11).85 17-19 A subunidade passa agora do refreamento das emoções ne gativas para uma descrição positiva do caráter que responde com vera cidade, mesmo sob pressão. O versículo 17 trata do modo de falar que busca ou que se desencaminha da retidão deliberadamente, e o versí culo 18, do discurso que é involuntariamente prejudicial a outros (cp. Lv 5.1).8'’ Apesar de apresentarem motivações diferentes, o caráter que os orienta é semelhante, como também são os seus efeitos, necessitan do de compensação. 17 Este versículo promove o discurso confiável no tribunal (v. 17), como também o faz o versículo 19 em termos mais gerais, apesar de na LXX o último também ter um caráter forense. O versículo 17 trata do caráter confiável da testemunha e seu efeito sobre o veredicto e sobre a retidão, enquanto que o versículo 19 detalha seu caráter e ressalta sua permanência. Uma testemunha (yapiah; veja 6.19) escrupulosa declara a verdade, toda a verdade, nada além da verdade e, deste modo, fortalece a comunidade; uma pessoa que não é digna de confiança tem por objetivo enganar e prejudicar outros. Uma testemunha (yaggid) confiável (ou honesta, *münâ veja pp. 152-153) se refere ao processo pelo qual o orador comunica a B, o destinatário, C, a mensagem de importância vital. Presume-se que o destinatário, neste caso, é um juiz. O depoimento da testemunha é vital, porque o que está em jogo é a vida ou a morte de alguém.87 Aquilo que é correto (sedeq; veja pp. 85. “Feliz é aquele que ouve e ignora; cem males passam por ele" (Talmude, citado por Cohcn,
Proverbs, p. 76). “Não cabe a ele julgar ou condenar indivíduos. É suficiente que ele compreenda. Os insensatos causarão sua própria destruição” (J. J. Collins, “Proverbial Wisdom and the Yahweist Vison”, Semeia 17 [ 1980] 1-17). Jesus advertiu seus discípulos para não julgarem (Mt 7.1), e quan do seus inimigos o insultaram, ele não retaliou; quando sofreu, não fez nenhuma ameaça ( I Pe 2.23). O autocontrole “é, verdadeiramente, uma vitória mais honrada que um triunfo marcial (cap. xvi.32; xix. 11; xx.3), subjugando não apenas o próprio espírito, mas também comovendo a dureza de nosso adversário (Rm xii.l8.21)” (Bridgcs, Proverbs, p. 141). 86. Jesus advertiu: "Digo-vos que de toda palavra frívola que proferirem os homens, dela darào conta no Dia do Juízo; porque pelas luas palavras serás justificado e pelas tuas palavras serás conde nado” (Mt 12.36, 37). 87. Westermann. TLOT, 2:715, s.v. ngd.
149-150) é uma metonímia para palavras que atendem mais adequada mente aos interesses da retidão e da comunidade; o juiz pode confiar nelas para garantir um veredicto correto. Falsidade (Seqãrim) é o an tônimo de ’emünâ( Sl 119.29,30 [também 89.33(34); 119.86]; Pv 12.17; Jr 5.1, 2; 9.3[2]; Is 59.4); também se refere ao caráter que gera a conduta. “Klopfenstein declara corretamente com respeito a Seqer: ‘Portanto, o caráter de falsidade ou da sinceridade sempre afeta a pes soa como um todo’. Assim, esta terminologia se refere a mais do que a apenas palavras falsas ou verdadeiras.”88 Uma testemunha Çêd) é “uma pessoa que tem conhecimento direto de um acontecimento ou alguém que pode testemunhar com base num relato que ouviu” (Lv 5.1). Essa pessoa tem a obrigação de testemunhar (cp. Pv 6.19; 29.24).89A vida do acusado depende do depoimento de uma testemunha confiável para salvá-lo (14.25). Uma vez que as sociedades antigas não possuíam métodos científicos sofisticados para determinar a autenticidade de pro vas forenses, o testemunho ocular era extremamente importante para se descobrir a verdade (12.17; 14.5,25; 18.21; 19.5,9,28; 21.28; 24.28; 25.18; 29.24; Êx 23.1-3; Lv 19.15). De acordo com o princípio lex talionis, o perjuro devia sofrer o mesmo castigo que seria aplicado à vítima (Dt 19.16-19). No entanto, Qoheleth observou a experiência humana universal de que nos locais de retidão deste mundo, “havia perversidade” e “até mesmo a lei austera de Deuteronômio 19.18-21 não adiantou de coisa alguma para Nabote - nem para Jesus”.90 Enga no (m irm â; veja 11.1) é uma metonímia para palavras que visam enga nar o juiz e frustrar a justiça ao declarar o reto culpado e o culpado inocente (cp. ISm 22.9, 10; IRs 21.1-14; Mt 26.60,61; Jo 2.19-21). 18 O provérbio promove o discurso cuidadoso ao comparar explici tamente o dano espiritual causado pela “língua” descuidada ao dano físico causado pela espada letal e contrastando-o com o discurso que cura. Há (yêá; veja 11.24) aquele que fala precipitadamente (ou im pensadamente/impetuosamente; bõteh; veja Lv 5.4), a reação do in sensato (v. 16). Bã(ã' é usado para o discurso precipitado e impensado que irrompeu dos lábios de Moisés junto às águas de Meribá (Sl 106.32, 33; cp. Êx 17.4-7; Nm 20.8-12)91 e para o ato de se comprometer fa 88. A. Jepsen, TDOT, 1:318, s.v. "Sman. 89. Schultz, TWOT, 2:648, s.v. ‘êd. 90. Kidner, Proverbs, p. 132. 91. Ahuviah (“WhatevcrOne Utters — ln an Oath”, BM 28 [1982/83] 107-10), (afirmando que nâo há base para essa interpretação de b( ’, argumenta que todas as suas ocorrências bíblicas (Lv 5.4;
zendo um juramento (Lv 5.4; Nm 30.7[8], 9[ 10]). Como o golpe (kemadcfrôt) traduz um verbo que significa “trespassar”, normalmente com uma espada ou lança (Nm 25.8; Jz 9.54; 1Sm 31.4; Zc 1.10; 13.3). E interessante comparar o efeito penetrante do discurso exaltado e impulsivo com a expressão em nossa língua, “suas palavras foram como uma facada no coração”,92 e seu efeito letal com “suas palavras aca baram comigo”. Uma espada (hareb\ veja 5.4; 25.18), o instrumento de batalha criado e usado para matar, simboliza o ato intencional e in sensível de matar outra pessoa. Contrastando com isso, a língua (le$ôn; veja 6.17) - provavelmente escolhida porque sua forma se assemelha à de uma espada - dos sábios (hakãmin\ veja p. 145) é um remédio (marpê’; veja 4.22). A metáfora significa sua reconciliação depois de conflitos nocivos (cp. v. 20), e a seqüência de ideias indica que seu discurso alivia a dor causada pelas palavras nocivas e cura as suas feridas fatais (cp. vs. 6, 25). O modo de falar que serve a outros não pode ter como objetivo promover a imagem de quem fala, ansiando por admiração e servindo aos próprios interesses.93 “O mestre sábio não está interessado, prioritariamente, em vencer debates, e evita o discur so que gera amargura e levanta barreiras entre ele e outros.”94 19 O provérbio quiástico também admoesta implicitamente o dis curso confiável. Em sua estrutura externa ele contrasta o lábio sincero com a língua mentirosa. Em sua parte central - usando em seu cerne um jogo de palavras com 'ad (lã'ad “para sempre” e 'ad-argl'â “por um momento”)95- declara que o primeiro é estabelecido para sempre, enquanto que o último existe por apenas um momento fugaz.96 Lábio {éepat\ 10.8; 12.13) qualifica como se referindo à palavra falada e sin cero (* met) se refere à qualidade de ser confiável (veja 3.3; 12.17). Aquilo que a pessoa escrupulosa diz é conforme com aquilo que ocor Nm 30.7,9; Sl 106.33; Pv 12.18) mencionam explicitamente juramentos que foram proferidos. No hebraico moderno significa “jurar precipitadamente”. No entanto, bf ‘qualifica Sb' em Levítico 5.4; Ahuviah declara, questionavelmente, que Deus é o sujeito do verbo no Salmo 106.33 apesar dc Moisés ser claramente o sujeito dos outros verbos e de Deus não ser mencionado. A LXX, Targ. e Sir. traduzem o verbo em Provérbios 12.14 como “diz”, apesar de Jerônimo traduzi-lo como promillil, "promete". 92. Plaut, Proverbs, p. 147. 93. Cp. Meinhold, Sprüche, p. 211. 94. McKane, Proverbs, p. 446. 95. E. Jenni, TLOT. 2:837, s.v. 'ad. 96. Laad, “para sempre” e we'ad "por apenas [um momento]” são colocados lado a lado no centro visando a aliteraçâo e intensificação da antítese (cp. v. 16).
reu e que é fato. Uma vez que o lábio se mostra conforme à ordem criada, sustentada e conhecida pelo S e n h o r e, portanto, é confiável, ele é estabelecido (tikkôn lã'ad; ou firmado; veja 3.19). Para sempre (lit., “para um futuro duradouro”)97 é um sinônimo de 'ôlãm e designa um futuro irrestrito, um período de duração ilimitada e imprevisível.98 En tretanto, uma língua (leSôn; veja v. 18) mentirosa (we... Sãqer; veja 6.17; 12.17), é apenas por um momento Çad-’argi'â,) porque em vez de desfrutar a aceitação do S e n h o r , é uma abominaçâo a ele (12.2, 22; cp. Is 51.4; Jr 49.19; 50.44). 'Ad-'argi'a; significa, literalmente, “en quanto eu conceder descanso”99 com um pseudocoortativo100 ou “um movimento deliberado [das pálpebras]” (i.e., “até eu piscar”).101 20-23 Estes versículos são estruturados pelo inclusio “coração” (vs. 20a, 23b), passando do engano que o coração planeja para a insen satez que ele proclama. Os versículos 20-22 são semelhantes à introdu ção em 12.1-3 e 15-19, caracterizando primeiro as disposições interio res das pessoas (v. 20), depois, contrastando seus destinos (v. 21) e, por fim, apontando para o S e n h o r como o agente (v. 22). Os versículos 20, 21 estão ligados pela palavra-chave rã' (“mal”) em sua estrutura exter na (vs. 20a, 21b) e pela preposição le (“para” [“aqueles que aconse lham a paz” e “o reto”]) em sua parte central (vs. 20b, 21 a). Em termos conceituais, eles apresentam a disposição interior dos conselheiros: os perversos são enganadores (v. 20a) e, portanto, repletos de mal (v. 21 b), e os retos são repletos de alegria (v. 20b); nenhum mal lhes sobre virá (v. 21a). Os sábios buscam o bem dos outros e o obtêm para si mesmos.102 A combinação de modo de falar (v. 22a) e atos (v. 22b) antevê a combinação de atos (vs. 24, 27), assim como estes remetem de modo quiástico aos versículos 9-15 e 16-19. O uso negativo de “co ração” (vs. 20, 23) prenuncia o mesmo uso no versículo 25. 20 Este provérbio se refere à natureza e às conseqüências do planos do coração, o órgão que orienta as partes do corpo. Seu cerne contrasta aqueles que tramam o mal para infligir dor com aqueles que aconselham para promover a paz, e sua estrutura exterior contrasta o 97. HALOT, 2:786, s.v. ‘ad. 98. E. Jenni, TLOT, 2:837, s.v. 'ad. 99./Í4 /.0 7 -, 3:1188, s.v .rg . 100. GKC # 108h; IBHS, p. 576. P. 34.5.3. 101. Delitzsch, Proverbs, p. 262. 102. Garrett, Proverbs, p. 133.
engano dos primeiros com a alegria dos últimos. Esse paralelismo im preciso sugere que os conspiradores dissimulados não experimentam verdadeira alegria, e que os conselheiros que promovem a paz não são dissimulados. O engano (mirmâ; veja 11.1; 12.5, 17), que é essencial para o perverso ser bem-sucedido, está arraigado no coração (beleb; veja pp. 141-142) daqueles que planejam o mal (hõrsê rã'; veja 3.29; 6.14). Seus planos são moralmente repreensíveis pois visam prejudicar vítimas inocentes (veja 1.16). Enquanto o insensato usa o discurso im pulsivo e impensado do versículo 18, estes enganadores executam com grande aptidão seus planos insensíveis e cuidadosamente calculados (cp. 6.14; 12.5; 24.8). Mas o paralelo antitético “alegria” sugere que seus planos se voltam contra eles e que eles acabam prejudicando a si mesmos (veja 10.6 e 11). Apesar de seu oposto, aqueles que aconse lham (yõ'asê) ser um termo mais ou menos técnico para aqueles com autoridade para aconselhar um plano de ação (veja 11.14; cp. Is 14.24), aqui é possível que se refira a qualquer conselheiro competente e expe rimente num caso específico (cp. 24.6).103 É bastante significativo que Provérbios sempre apresente os conselheiros como um grupo (11.14; 15.22; 24.6). Paz (sãlôm; veja 3.2), o oposto de rã' também em Jeremi as 29.11, é uma metonímia para um curso de ação reconciliatório, sem desejo algum de magoar outros. Os reconciliadores têm alegria (simhâ; veja 10.28) e contentamento em todo o seu ser (cp. 10.28; Rm 7.22), ao contrário daqueles que planejam o mal, cujo mal se volta contra eles. 21 Este provérbio contrasta o destino dos retos e dos perversos, e suas ligações quiásticas com o versículo 20 indicam uma aplicação par ticular a esses dois tipos de conselheiro. Apesar dos enganadores pla nejarem sua violência contra os retos ou inocentes (v. 20a), nenhum tipo (Zõ’ ... kol) de malevolência Çãwen; veja 6.12) sucederá {^'unneh) ao justo (lassadiq; veja pp. 149-150; cp. 22.8a). A promes sa deve ser interpretada à luz do resultado final (veja pp. 162-163). Dentro do reino de Deus tudo o que acontece, inclusive as dificuldades, redunda naquilo que é melhor, de modo que o princípio e a realidade se encontram em perfeita harmonia (veja 3.5; cp. Gn 50.20). Romanos 8.28 deveria ser traduzido como “Deus trabalha com aqueles que o amam para realizar o bem”. Ele os sustenta nas provações, os livra delas e os santifica por meio delas.104 Entretanto, os perversos (í^sã^m; 103. Cp. L. Ruppert, TDOT, 6:161, s.v. ytfaç. 104. Bridges, Proverbs, p. 144.
veja pp. 164-165) estão cheios do dano e, possivelmente, de mal (rã'). Se rã' se refere à disposição moralmente repreensível dos perversos, “cheio de” é uma metáfora para “no coração”, como no versículo 20a. Mas o paralelo supostamente antitético no versículo 21a favorece a interior de “cheio de” como uma referência à medida plena de dano que será infligido aos planejadores perversos. 2 2 O S e n h o r fica nas sombras guardando aqueles que são seus (cp. 12.2,22; S l 91.1, 10) a fim de produzir esses destinos contrastan tes. Uma abominaçâo ao S e n h o r (tô'abat YHWH\ veja 3.32) significa que os mentirosos provocam tamanha repulsa em sua natureza que ele os lança fora. A sinédoque os lábios mentimsos (éiptê-Sãqer; veja 12.17, 19a, b) se refere aos insensatos, àqueles cujo caráter não confiável os faz distorcer os fatos involuntariamente (12.17) e/ou intencionalmente (vs. 19b, 20a). Os que mostram Çõéê; lit., “fazem”; veja 10.4) concentra a atenção naquilo que as pessoas fazem no sentido mais amplo, sem se restringir a seu discurso (veja 6.32; 8.26; 10.4).105 Confiabilidade (ou honestidade, 'emünâ\ veja 12.17a) é uma metonímia para os atos bons que nascem de seu caráter confiável. A metonímia encontram o seu favor (resônô; veja 11.1) significa que chegam a um estado de aceitação diante dele e, portanto, desfrutam sua proteção e prosperidade (veja 12.2). 2 3 De acordo com a estrutura ao redor dos versículos 16-23, o insensato não é capaz de esconder suas emoções perigosas (v. 16a) nem sua insolência moral (v. 23b), mas o astuto coloca um véu sobre os insultos lançados contra ele (v. 16b) e sobre o seu conhecimento (v. 23a). Este provérbio, que usa o vocabulário sapiencial (“astuto”, “co nhecimento”, “coração”, “insensato” e “loucura”) pode funcionar como um de janus, introduzindo também a próxima subunidade. Enquanto a pessoa astuta ( ’ãdãm 'ãrúm\ veja p. 146) oculta seu discernimento moral, guardando-o para a situação certa, os insensatos (kesüim \ veja pp. 167-168) criam tumulto constante ao proclamar palavras de inso lência moral (cp. 12.16; 13.16). A pessoa astuta é aquela que oculta (kõseh', veja 12.6b) o conhecimento (dã'at; veja p. 125), pois não é impelida neuroticamente pelo orgulho para exibir seu conhecimento, nem pela raiva para causar dano. Esse indivíduo tem domínio próprio 105. ‘Sá ocorre 2.527 vezes na raiz Qal. É usado de várias formas diferentes com referência à conduta humana em relação a outros seres humanos e a Deus: p ra tic a ro ra ',“mal"(75x);m/SpS(, a “justiça" (5üx); hesed, a "bondade” (36x); yãsãr, a "honestidade” (34x); (ób, o “bem” (32x); sPd&qâ. a "retidão” (23x), etc. (Vollmer, TLOT, 2:946, s.v. 'áh).
para esperar pela situação certa e prudência para saber quando falar (cp. 3.7; 10.14a; 11.13; cp. Mt 7.6). Nesse ínterim, ele mantém uma inescrutabilidade por meio da qual controla sua situação. Este versículo não significa que ele esconde o seu conhecimento daqueles que o bus cam; antes, ele o oculta dos insensatos que não têm ouvidos para ouvilo ou da situação em que esse conhecimento pode ser prejudicial, em vez de promover a cura.106 Os três amigos de Jó tiveram de aprender que nem toda verdade é apropriada para todas as pessoas ou em todas as ocasiões (cp. Jó 32.6, 18, 19; Ec 3.7; Am 5.13; Mt 7.6; 16.20; 17.9; Jo 1.12; 2Co 12.1-6).107 Mas o coração (welêb; veja pp. 141-142) funciona como uma metonímia para os atos e palavras (cp. 15.2b). O dos insensatos (kesílim ) proclama alto e em bom tom (yiqrã’; veja 1.21) a loucura (veja pp. 167-168), uma metonímia para as palavras e atos de insolência moral (veja 5.23). (3) Trabalho diligente e bom modo de falar (12.24-27)
A estrutura ao redor de 12.24-27 compara de modo quiástico o dili gente (hãrüs[im\; vs. 24a, 27b) e o remisso (remíyâ; vs. 24b, 27a). As palavras-chave sugerem que a diligência conduz ao poder (v. 24) e à riqueza (v. 27). A estrutura emprega o padrão de avaliação + - (v. 24), - + (v. 27), mas sua parte central inverte esse padrão, apresentando -:: e sugere uma ligação entre a ansiedade no coração (v. 25a) e o comportamento errado no caminho (v. 26b) e entre o discurso construtivo que alegra o coração (v. 25b) e a proteção dos retos por meio da investi gação de seus amigos próximos capazes desse mesmo tipo de discurso (v. 26a). Esta coleção associa, com frequência, o discurso prudente com o trabalho prudente, não permitindo nenhuma separação entre esses dois elementos essenciais da sabedoria (e.g., 10.1-15; 12.4-12, 13,14). 24 A subunidade muda do discurso construtivo para o trabalho cons trutivo por meio de uma paronomásia de 'ãrüm (“astuto”) e harús (“diligente”) que envolve a aliteração das guturais articuladas e não articuladas r~ h + r+ ül.m O versículo 24 promove a diligência ao contrastar o destino político do diligente, a saber, o governo, com o destino do negligente, a saber, o trabalho pesado. A mão de pessoas 106. Comparar com o texto egípcio Instrução de Amenemope: "Melhor é aquele cujo discurso está em seu ventre do que aquele que o profere para causar dano” (AEL, 2:159). 107. Bridges. Proverbs, p. 145. 108. Essas guturais diferem apenas quanto a serem vocálicas /'/ ou nâo-vocálicas Ihl.
diligentes (yad-hãrüçim\ veja 10.4), que podem governar a si mesmas, manterá sua independência, obterá poder e, desse modo, governará (timSôl; veja 6.7). Um mãSal é alguém que govema a conduta de um subordinado quer em termos não-políticos (e.g., a raça humana gover nando a criação; Sl 8.6[7], e um senhor governando suas escravas; Êx 2 1 .8) ou políticos (e.g., um governante de uma nação, Gn 37.8). Apesar da natureza precisa do governo ser tão variada quanto as situações reais nas quais a administração é necessária para manter a ordem e prosperidade na sociedade, seu denominador comum é que os senhores são diligentes. Mas a pessoa negligente (remiyâ; veja 10.4), que não é capaz de governar a si mesma se tornará labor compulsivo (mas). Mas designa um imposto fixado em trabalho pesado sem tomar o indi víduo inteiramente escravo (Js 17.13; Jz 1 .2 8 -3 0 ,3 3 -3 5 ; Is 31.8; cp. Êx 1. 11 ). O mas levou Israel a se rebelar contra Salomão ( 1Rs 5.1 3 -1 6[2730]; 12.18). Por ironia, a mão que evita o trabalho acaba realizando as tarefas mais pesadas, e aquele que não é capaz de governar a si mes mo perde a sua independência e o seu fim é o trabalho pesado (veja pp. 169, 170; Mt 2 4 .4 5 -4 6 ; 2 5 .2 l).109 Em termos menos sutis, “o diligente chega ao topo enquanto que o preguiçoso afunda”.110 25 A ideia muda da correção da supressão política e física po intermédio da diligência para a cura da depressão psicológica por inter médio de uma palavra bondosa (v. 18b). A depressão psicológica e a política estão relacionadas. O provérbio promove o modo de falar que anima o coração (yeáammehennâ) para contrapor a ansiedade que o faz pesar (yaShennâ) - observe a assonância dessas palavras finais. Ansiedade (de>ãgâ) indica a angústia emocional extrema causada por uma situação de medo de perder algo essencial para a vida (cp. ISm 9.5; 10.2; Jr 38.19; 49.23). No coração de um indivíduo (beleb-’iS veja 12.20) não é restritivo, ressaltando que a preocupação afeta a pes soa em seu cerne, desestabilizando todo o seu comportamento, de modo que ela oscila como o mar agitado. A metáfora incompleta o prostra (veja n. 33) implica num peso intolerável e esmagador, como uma psique deprimida (cp. Sl 44.25[26] [ = “encurvado no pó”]; Lm 3.20). Rashi afirma que a ansiedade o afasta de seu pensamento racional.111 Mas 109. “Aquele que é indolente não dá em nada” (Ani 5 :14; AEL, 2:139). 110. Ross, Proverbs, p. 973. 111. M. Lyons, “ Rashi’s Commentarv on lhe Book o f Proverbs" (graduação para rabino, 1936), p. 69.
uma boa palavra (wedãbãr fôb\ veja 1.6. p. 152 cp. 16.1) indica, aqui, o discurso que trata com eficácia a ameaça que produz a ansiedade prejudicial. Enquanto a ansiedade toma a pessoa incapaz de agir, a palavra pessoal e bondosa, agradável e doce, oportuna e cuidadosa a restaura com ânimo e esperança (15.30; 25.25; cp. 1Sm 2.24). Ezequiel conduziu Israel miraculosamente para fora do vale de ossos secos e de volta à terra prometida ao dar aos ossos sem vida uma visão de esperança (Ez 37.1 -14). Jeremias solucionou a ansiedade por meio de sua promessa: “é como a árvore plantada junto às águas... no ano de sequidão” (Jr 17.7,8). Oanima(yesammehennâ', veja5.18; 10.1),como o espírito de Jacó foi reanimado quando ele descobriu que José ainda estava vivo no Egito (Gn 45.27; 1Rs 8.56; Sl 119.92; Pv 15.23; 16.21, 24; 25.12; Is 35.3,4; At 16.28-34; 2Co 1.4; Fp4.4). 26 Uma palavra boa vem de uma pessoa boa; sem os meios d graça a pessoa se desvia para a sua morte. O provérbio admoesta extrema cautela na escolha do amigo mais íntimo, pois viver num con texto de perversidade faz o indivíduo se desviar do caminho da vida para o da morte. O reto (saddiq\ veja pp. 149-150) procura de (yãtêr; cp. Jz 1.23, “enviar para obter informação inteligente”)112- uma metá fora que indica uma investigação cuidadosa, diligente e penetrante a fim de descobrir aquilo que está oculto113 - seu amigo de confiança (mêrêa'). Mêrêa' se refere a um conselheiro pessoal (Gn 26.26) ou a um amigo íntimo (2Sm 3.8)."4 Parte do fracasso de Sansão se deveu ao fato de ele buscar amigos íntimos entre os filisteus incircuncisos (Jz 14.11), inclusive aquele que poderia ser chamado de “seu padrinho de casamen to” (14.20; 15.2,6), não entre os da sua própria família.115HALOT traduz o termo como “amigo do peito”116 um significado que devemos admitir em textos obscuros (Jó 6.14; Pv 19.4, 7). Os olhos dos retos estão bem abertos para sinais de incorrigibilidade (cp. 12.1, 15), engano (12.20), tagarelice (12.23) e/ou conduta que não se mostra confiável (20.17, 19, 22) em seus companheiros. Mas a vaidade monstruosa e o egoísmo co 112. HALOT, 4:1709, s.v. túr. 113. Das 22 ocorrências de túr, ele é usado 16 vezes para espiar uma terra (Nm 10.33; 12 vezes cm Nm 13 e 14; Dt 1.33; Jz 1.23; Ez 20.6), duas vezes para buscar sabedoria (Ec 1.13; 7.25) e aquilo que os sentidos desejam (Nm 15.39; Ec 2.3) e uma vez para espiar o “caminho” (2Sm 22.33). 114. Safren, “Ahuzzath and the PastofBecrsheba”, 101 (1989) 190-98. 115. “Contar” é um tema importante na queda de Sansão, passando do fato de ele nâo haver contado algo aos seus pais para o fato de ele haver contado algo à sua esposa filisteia (cp. 14.2, 6, 9, 16). 116. HALOT, 2:637, s.v. mêria .
lossal dos perversos os cega e os impede de ter uma perspectiva correta da realidade (cp. 1.10-15).117 O caminho (derek; veja 1.15) dos perver sos (r^sã^m; veja 4.19) não inclui dar ouvidos à sabedoria, nem ter ami gos íntimos que os conduzam pelos caminhos da retidão, pois eles odeiam a sabedoria (veja 12.1). Os fa z desviar (tat'êm ; veja 10.17) aqui, pelo fato do sujeito ser o conjunto de perversos que se desviam moralmen te,118 “deve se referir aos problemas que sobrevêm aos perversos; eles se perdem e se deparam com a calamidade”.119Ademais, o antecedente do plural “os” é “dos perversos”, não o singular “o reto”. 27 A estrutura antitética do provérbio contrasta claramente um pessoa negligente (r^miyâ 12.24) com uma pessoa diligente (hãrüs; 12.24), mas sua diferença é um tanto incerta, pois a sintaxe e o sentido das palavras-chave são obscuros. Não assa (lõ’-yaharõk) é um hap. leg.120 Nenhuma caça (sêdô) indica animais selvagens caçados para alimento.121 Caçar nunca é contrastado com lavrar a terra (12.11) e criar animais (27.23-27); essa atividade também exige planejamento, paciência, habilidade e grande esforço. Portanto, para si mesma é me lhor que “sua carne de caça” (veja n. 35). A última interpretação impli ca que ele é um caçador que levou sua caça para a casa, mas que é preguiçoso demais para prepará-la. No entanto, é pouco provável que o preguiçoso tenha planejado e se esforçado para pegar a caça. A tradu ção proposta implica que ele não obtém o alimento mais facilmente disponível para sustentar sua vida pegando ou preparando-o. Porém, 117. Meinhold, Sprüche , p. 215. 118. Tk quer dizer simplesmente “vagar" em Gênesis 20.13, mas em suas outras 20 ocorrências significa, implícita ou explicitamente, “cambalear” ou “fazer desviar", da retidão e da vida para o pecado e a morte (veja 10.17; cp. e.g., 2Rs 21.9; Is 3.9; 9.16[15]; 19.13; 30.28). 119. John A. Emerton, “Note on Proverbs 12:26", ZAW 65(1964) 191. 120. As versões antigas trazem “obter/conseguir/pegar”, talvez lendo y a d rtk . A tradição judaica e algumas versões modernas traduziram o termo como “assar", com base no aram. t f r a k , “assar, chamuscar”. BDB (p. 355, s.v. 1h ã ra k ) prefere “colocar em movimento, começar”, com base no árabe h a ru k a , “mover" ou “começar" e HALOT (1:353, s.v. I h r k ) opta tanto por uma quanto por outra. Delitzsch (Proverbs. pp. 193-94) defende “suscitar", “começar”, “assustar”, com base em Ovídio (M etamorfose , 10.538): “ela (Vênus) assusta a corça” como parte de sua caçada por animais inofensivos, inclusive as lebres velozes e o veado adulto com seus chifres imponentes. No entanto, a interpretação tradicional é apoiada por um tablete do século 14 a.C., de Ras Ibn Hani, perto de Ugarite. na qual \y]h.rkn é paralelo a y s h m m , “que ele aqueça” (M. Dahood, “The Hapax h B ra k in Proverbs 12,27", B ib 63 [1982] 61). 121. $êd ocorre 14 vezes: dez vezes com referência a Esaú como um caçador, um homem do campo (Gn 25.27, 28) e à caça que ele trouxe para Jacó (Gn 27.3, 5, 7, etc.); duas vezes com referência a Ninrode, um caçador poderoso (Gn 10.9); e uma vez numa proibição da ingestão de sangue dos animais ou aves caçados (Lv 17.13).
“seja alguém que não termina o que começa ou alguém que nem sequer começa algo, esse homem joga fora as suas oportunidades”.122Como o incorrigível morre de fome espiritualmente em meio a ensino abundante (10.21), assim o preguiçoso morre de fome fisicamente em meio ao alimento abundante. Contrastando com isso, o diligente aproveita a gra ça comum benevolente de Deus e “assa” a caça que os campos abun dantes lhe oferecem, supondo que “assar” é omitido no verseto B. Como em 13.1, porém, o advérbio de negação não é estendido para o paralelo. A riqueza (hôn\ veja 3.9) preciosa (veja 1.13) da terra ( 'ãdãm\ veja n. 36) é uma metonímia para os animais selvagens que vivem no campo (i.e., as riquezas da caça). Dahood compara hôn-'ãdãm com a decla ração de uma inscrição fenícia whwn ym l'gd Im mlhm “e a riqueza do mar os marinheiros verdadeiramente... juntaram para si”.123 Essa in terpretação é coerente com a sintaxe do TM, o estilo desse livro que, em outras passagens, combina hônyãqãr “riqueza preciosa” (1.13; 24.4), e fornece um excelente paralelo para sêdô. (4) Conclusão (12.28) 28 Este paralelo sintético que conclui a segunda metade do capítulo 12, e talvez todo o capítulo, expressa de maneira mais criativa e intensa que os retos mantêm um relacionamento com Deus para sempre; a morte física não os separa de uma relação com o S e n h o r . “Se compa rarmos xiv.32 com isso, fica evidente que a ‘sabedoria’ começa a rom per os limites desta vida e anunciar uma vida fora do alcance da mor te.” 124 Na vereda (be 'õrah; 1.19) da justiça (sedãqâ\ veja pp. 149150) indica a rota de viagem ao longo da existência humana na esfera ética da piedade para com Deus e da bondade e confiabilidade para com a humanidade. Uma pessoa pode escolher fazer da retidão a esfe ra do seu estilo de vida, mas não pode escolher as próprias conseqüên cias.125 Somente o S e n h o r sustenta a ordem moral, de modo que a retidão é a esfera da vida abundante, da vida (hayytm ; veja pp. 158161) eterna. A condição de retidão se encontra diante do S e n h o r (veja 10.16, 17), que recebe no reino da comunhão eterna com ele aqueles que se encontram nesse caminho (veja 2.19; 3.18, 22; 10.11). Os retos 122. Kidner, Pmverbs, p. 99. 123. Dahood, “The Hapax hõrak in Proverbs 12,27", p. 62. 124. Delitzsch, Pmverbs, p. 195. 125. Hamilton, TWOT, 1:71, s.v. ‘õ rah.
já possuem essa comunhão, mas ainda não experimentaram sua pleni tude. A tradução na jornada para derek, que costuma ser traduzido como “caminho” (veja 1.15), evita a tautologia, “o caminho da sua senda”. Derek indica de maneira ampla todo o contexto, conduta e conse qüências do estilo de vida de uma pessoa, o caminho em geral que se divide em ’orhôt ou netibôt (veja Jó 6.18; Jr 17.5), e consiste nos mes mos (Is 3.16). Da tua senda (netibâ) restringe o curso mais amplo do estilo de vida de um indivíduo ao aspecto específico de sua retidão (veja 1.15). Diz-se agora que as conseqüências determinadas por Deus para esse estilo de vida se encontram no âmbito da imortalidade ( ’ál-mãwet\ n. 38), o texto da maioria dos códices dentro da tradição massorética. Porém, todas as versões antigas e mais de 20 códices medievais tra zem “para a morte” Çel-mãwet). No que se refere à crítica ao texto, ’al-mãwet é a leitura mais difícil de explicar, pois é um hap. leg. no hebraico bíblico e, ainda mais especificamente, ’al é a partícula em pregada com verbos, não com substantivos.126 Uma vez que compreen deram incorretamente essa construção ímpar, os textos e versões tam bém tiveram de alterar o verseto de outras maneiras, como “mas os ca minhos daqueles que se lembram das ofensas conduzem à morte” (LXX). Além disso, um crítico do texto não tem como justificar esse uso excepcional de a/, a menos que se encontre firmemente arraigado na tradição oral. “Um conjunto complexo de evidências indica que o TM não poderia, de nenhuma maneira séria ou sistemática, representar uma reconstrução ou falsificação dos dados.” Por fim, em casos que envol vem a vocalização que acompanha a escrita consonantal, como aqui, os competentes críticos do texto devem preferir o TM às versões antigas.127 Em termos filológicos, em ugarítico (ca. 1400 a.C.) e no hebraico pósbíblico, ’al-mSwet é a palavra comum para “imortalidade”.128Assim, existe “uma continuidade notável do significado ‘imortalidade’ para5al-mãwet da literatura síria do segundo milênio a.C. até a literatura judaica pósbíblica”.129 Em termos contextuais, as unidades nesta seção da Coleção 126. Delilzsch (Proverbs, p. 194) cita ’a l- ( a l (nenhum orvalho) em 2 Samuel 1.21 como outro exemplo de 'a l com um substantivo, mas como ele próprio reconhece, nesse caso, o verbo y P h t (“que nâo haja’’) é omitido, contrário ao seu uso em Provérbios 12.28. 127. IBHS, pp. 26-28, PP. 1,6.3h-m. 128. M. Dahood. Ras Shamra Parallels, 1:82; HALOT, 1:48, s.v. 1 'al. 129. J. F. A. Sawyer, “The Role o f Jewish Studies in Biblical Semantics", in Scripla Signa Voeis: Studies about Scripts, Scriptures, Scribes and Languages in the Near East, Presented to J. H. Hospers by His Pupils, Colleagues, and Friends, orgs. H. Vanstiphout et al. (Groningen: E. Forsten, 1986), pp. 204-5.
II costumam terminar com sinônimos raros ou com paralelismo sintético, e um novo bloco se inicia com um aforismo educativo. A relação de 12.28 com 13.1 se equipara exatamente com a relação de 11.31 com 12.1 e de 12.14 com 15. “O provérbio em xii.28 é tão sublime, tão momentoso, que forma claramente uma oração e uma conclusão. Isso é confirmado pelo provérbio seguinte que começa com x. 1 (cp. 5), e mais uma vez caracte riza a coleção como sendo voltada para os jovens.”130 Por fim, em ter mos teológicos, a imortalidade dos retos é apresentada implicitamente ao longo de todo o livro (veja 2.19; 10.2,16; 11.4,19; 12.3,7,12,19; veja pp. 161-163); sua expressão explícita nesta passagem não causa surpresa. A doutrina é encontrada apenas posteriormente na Sabedoria de Salomão: “pois a retidão é imortal” (1.15); “Deus criou o homem para a incorrupti bilidade e o fez à imagem da sua própria eternidade” (2.23). “Nada é mais natural do que o Chokma em seu constante contraste entre vida e morte, começar a expressar a ideia de athanasia ‘sem morte’.”131ARSV traz 'el-mãwet (“para a morte”), mas a NRSV volta a ’al-mãwet (“nenhu ma morte” ou “sem morte”), supostamente por haverem encontrado evi dências extremamente convincentes. Com frequência os comentaristas rejeitam essa interpretação não por motivos exegéticos, mas para defen der o dogma moderno de que não existe vida depois da morte. 5. Ensino, ética e modo de vida bons (13.1-25) 1 Um filho sábio [escuta] a instrução de um pai,' mas um escarnecedor nâo escuta a repreensão} 130. Delitzsch, Proverbs, pp. 269-70. 131. Delitzsch, Proverbs, p. 194. 1. O hebraico traz “Um filho sábio [é] a instrução do pai”. A Vulg. entendeu isso como significan do que o filho é o produto da instrução do pai, “o que é difícil e improvável” (Toy, Proverbs, p. 260). B. Gemser (Sprüche. p. 62) et al. corrigem Sè para 'õhsb (“ama”). G R. Driver (“Problems in ‘Proverbs” ’, ZAW 50 [1932] 144) deriva esse sentido considerando ” em Oseias 5.2. Gemser (Sprüche, p. 62) sugere um Hofal ptep. de ySsar “é aquele que se permite ser instruído (por um pai)”, mas seria de esperar o Nilhpael (HALOT, 2:419, s.v. ysr) para esse sentido. A. J. Baumgartncr (Elude critique sur l etal du lexle du Livre des Proverbes d après les principales traduetions anciennes [Lcipzig: Imprimerie Orientale W. Drugulin, 1890], p. 125) afirma que o termo da LXX, hypèkoos, traduz um ptep. passivo de ysr. A Sir. oferece a solução mais simples e adequada entendendo o “dará ouvidos” do verseto B como sendo omitido no verseto A (veja v. 22 para o mesmo fenômeno). 2. Pode-se imaginar que “ filho" foi omitido, “um filho escarnecedor”, como na LXX, mas isso é desnecessário.
2 Do fruto da boca de uma pessoa3 alguém come4 coisas boas, mas o apetite dos traiçoeiros é violência. 3 Aquele que guarda a sua boca é aquele que protege a sua vida, mas quanto àquele que abre os lábios excessivamente, esse tem terror. 4 O apetite5 do preguiçoso anseia, e ele nada tem;6 mas a vida dos diligentes é engordada. 5 Uma pessoa reta aborrece uma palavra falsa,1 mas uma pessoa perversa torna-se um fedor* e vem9 a se sentir envergonhada.10 6 A retidão guarda o caminho" irrepreensível, 12 mas a perversidade subverte o [caminho]13 pecaminoso.14 7 Há quem finja ser rico e, no entanto, não tem nada;'5 e [há]Xb quem fin ja ser pobre17 3. Ou “ele”. 4. Em l2.I4,.yÉá6a' (cp. Sir., Targ. c Vulg.). A LXX de 11.30 traz: “do fruto da retidão”. 5. Lit. “seu apetite, do preguiçoso" (veja IBHS, p. 127, n. 8). 6. Lit. “c não há”. 7. Ou “coisa”. Porém, em outras passagens de Provérbios, dõbsr significa •‘palavra” (cp. 4.20; 10.19; 11.13; 13.13; 18.4, e esp. 29.12), o sentido é mais apropriado para este contexto. 8. Um Hifil interno, “faz a si mesmo ser um fedor" (IBHS, pp. 339-40, P. 27.2f, g). Gemser (Sprüche, p. 112) cita o árabe ba’isa “ser mau, perverso” e o traduz como •'handelt niedrig" (= “ele age de modo abjeto" [não “estar num estado miserável" (sicf); HALOT, 1:107, s.v. ò ’s]). Ackroyd (“A Note on the Hebrew Roots b'sh e bws", JTS 43 [1942] 160) acredita que é uma forma secundária de bws e traduz como “causa vergonha”. Delitzsch (Proverbs, p. 198) já havia rejeitado essa opção. Bã aS ocorre sete vezes no Hifil: três vezes com um objeto “fazer alguém/algo feder” (Gn 34.30; Êx 5.21; Ec 10.1), e quatro vezes sem um objeto, “fazer a si mesmo tomar-se um fedor” (Êx 16.24; ISm 27.12; Sl 38.6[7]; Pv 13.5). 9. Um im perfeito ingressivo com ambos os verbos. A estrutura interna tem poral da situação é imaginada como tendo início e continuando num tempo não passado (IBHS, pp. 505, P. 31.3d). 10. Vm Hifil interno, “faz a si mesmo ser envergonhado" (IBHS, pp. 23-24, P. 27.2f, g). 11. As versões antigas apresentam um substantivo concreto, “inocente” para a metonímia abstrata tôm. Ou elas pontuaram o texto equivocadamente com a simplificação tSm ou interpretaram corre tamente o TM. 12. Lit. “inculpável em seu caminho”, um gen. epexegético (IBHS, p. 151, P. 9.5.3c). 13. As versões antigas também tomam “pecado” ou “perversidade” concreto (i.e., pecadores ou perversos), em vez de traduzir ambos como substantivos abstratos (veja n. 11). 14.0 substantivo abstrato paralelo sugere que derek é omitido no verseto B. 15. Lit. “e não há nada” (veja BDB, p. 482, s.v. kõi, cp. 2Sm 12.3). A cláusula circunstancial introduzida por.y?s omite 16 (“para ele” ) expressando posse. 16. W* sugere q u e ^ S seja estendido para o verseto B. 17. Ou “toma a si mesmo rico... toma a si mesmo pobre”, ou “se considera rico... se considera pobre”. O Hilpael/Hilpolel de 'Sr e rús é ambíguo; pode ser factitivo (= “fazer a si mesmo”; veja IBHS, p. 429, P. 26.2.b) ou estimativo (= “se considera”), ou ainda, estimativo com respeito á ques tão da veracidade (“finge ser”; IBHS, pp. 430-31, P. 26.20-
e, no entanto, temls grande riqueza. 8 O resgate da vida de uma pessoa é a sua riqueza, mas um pobre não escuta a uma repreensão.'9 9 A luz dos retos b rilh a intensam ente,
mas a lâmpada dos perversos é apagada. 10 Há20 contenda somente21 com orgulho, m as com aqueles que aceitam conselhos22 [h á p i sabedoria.
11 A riqueza [obtida] por24 meios indevidos25 se definha, mas aquele que ajunta com a mão26 aumenta [sua riqueza].11 12 A expectativa adiada fa z o coração adoecer, m as um a á rv o re de v id a é o desejo satisfeito.
13 Aquele que despreza uma palavra [inspirada] será arruinado por ela, m as quanto àq u e le que teme um m andam ento,
ele será recompensado. 18. Lit. “e [há] grande riqueza” . 19. Fichtner (B H S)conigcge'arâ arbitrariamente para m ã^S' ( f'u llâ "não encontra redenção”. 20. Veja 10.24. 21. Gemser (Sprüche, p. 62), McKane (Proverbs, p. 454) et al. preferem rêq com o sentido de “[cabeça] vazia” e HALOT(3:1229, s.v. rêq) com o sentido de algo frívolo ou vão. A LXX traz “um homem perverso”, talvez uma paráfrase de “cabeça vazia” . Mas não há motivo algum que obrigue a corrigir o TM. 22. Gerundivo (IBHS. p. 387, P. 23.3d) e/ou tolerante (“que se permitem ser aconselhados” [IBHS, pp. 389-90, P. 23.4f, g]). Com uma pequena mudança de consoantes risym (nffB çtm ) pode ser corrigido para ç n y m (i}en ü ím , “modéstia”; veja 11.2). Provavelmente, a intenção é fazer uma variação (Toy, Proverbs, p. 267). 23. Yittên é omitido no verseto B. 24. Min causai (IBHS, p. 213, P. 11.2.1 ld) pressupõe que um verbo como “obter” é omitido (IBHS, p. 224, P. 11,4.3d). 25. Uma tradução de mêhebel, “do vento” (veja 21.6; 31.30). Driver (“Problem in ‘Prover bs”’, p. 144) observa que os comentaristas retroverteram m ebõhõ (“obtido apressadamente") do termo da LXX epispoudazom enl que, além da passagem em questão, é usado na LXX somente em Provérbios 20.9. Ele acredita que essa evidência é escassa demais e prefere retroverter m ehubbãl “obtido por intriga/de modo fraudulento”, cujo verbo ocorre novamen te na expressão semelhante bPgOzíl 'al-tehbãlú, “não intrigue visando lucro” (Sl 62.10(11]). 26. Lit. “sobre a mão”. McKane (Proverbs, pp. 458-59) diz: “aos poucos, por meio de esforços constantes e proveitosos, e é uma confirmação de caráter e valor”. 27. O objeto é omitido, “ele fará [a riqueza] aumentar” ou é um Hifil intemo: “ele fará que ele próprio aflua” BDB (p. 9 15, s.v. rãbâ) traduzem yarbeh como “produzir abundantemente” e optam pela primeira alternativa (cp. Jó 2.6; Pv 22.16), observando que tem esse sentido em oposição a m a'at em Gênesis 35.8; Êxodo 16.17, 18; 30.15; Provérbios 13.11. Porém McKane (Proverbs, p. 459) escolhe a última alternativa, comentando, “O aumento de riqueza é, então, um indicador de uma vida que está se movendo em direção a um climax apropriado”.
14 O ensino do sábio é uma fonte de vida, que fa z [o indivíduo] desviar28 dos laços da morte. 15 O bom julgamento obtém favor, mas o caminho dos traiçoeiros conduz à sua destruição.29 16 Toda pessoa astuta se protege por meio doM conhecimento, mas um insensato espalha a loucura. 17 Um mensageiro perverso perece31 pelo mal, mas um enviado fie l é aquele que traz cura. 18 A pessoa que ignora a instrução se depara com a pobreza e a desgraça, mas aquele que atende a correção será honrado. 28. É um gcrundivo infinitivo que explica e/ou desenvolve as circunstâncias ou a natureza dc uma ação anterior (IBHS, p. 608, P. 36.2.3c). 2 9 .0 texto é incerto. ’êtõn. do TM, significa “sempre cheio de água corrente" ou “permanente/ duradouro”, sendo que nenhum dos dois sentidos se encaixa aqui. Delitzsch (Proverbs, p. 280) e outros argumentam que indica um vale rochoso que não pode ser cultivado (Dt 2 1.4) - segundo o Talmude - e serve de designação figurativa para a habitação rochosa dos queneus (Nm 24.21). Esse fato sugere que o caminho dos traiçoeiros é “difícil, duro e não cultivado”. No entanto, seus signifi cados normais também se encaixam em Números 24.21; o termo é traduzido como “lugar de habita ção permanente” por HALOT (1:45, s.v. 'êtSn). A expressão idêntica de Deuteronômio 21.4 em Amós 5.24 significa claramente “riacho perene”. Em resumo, nâo há nenhuma evidência léxica para o significado “pedregoso”. J. E. Hartlcy ( TWOT, 1:419, s.v. e/Sn) e M. A. Grisanti (NIDOTTE, 1:392. s.v. 'étSn) afirmam que êtSn se refere a uma determinação inalterável de persistir na traição. No entanto, o termo “é usado em todas as outras passagens com um sentido laudatório, como indica ção de força, e nunca com um sentido ético e/ou negativo” (Toy, Proverbs, p. 272). A Targ. acrescen ta “perecerá” (= ts'bèd). Kaminka retroverte yittõm [s/c] para yittSm (= Hifil de tm m ), “cessar, chegar ao fim, destruir”? Driver (“Problems in the Hebrew Text o f Proverbs”, Bib 32 [ 1951 ] 181) sugere plausivelmentc que a partícula negativa rara ’i foi omitida por haplografia e emprega bgdym com um sentido abstrato (cp. 23.28 Sir.): “o caminho da traição desaparece". Apesar de ele não mencionar esse fato, sua sugestão ofcrecc uma assonãncia agradável entreyittên no verseto A e ’i'êtSn no verseto B. Não obstante, bogedim é, de outro modo, sempre pessoal, nâo abstrato. A melhor solução é retroverter ’êdãm da LXX (cp. Sir.) para apõleia. 30. Ou “age com". Tradicionalmente, o verbo incerto foi identificado como I 'ãsâ, a raiz comum (mais de 1.550 vezes), “fazer", "realizar”, que, quando usado de forma intransitiva, pode ter a nuança especifica “agir com efeito” (BDB, p. 794, s.v. 'S á â ) , “comportar-se” (HALOT, 2:891, s.v. 'S á â ). No entanto, com base no cognato árabe, o possível derivado hebraico m a ‘a á e h é “nuvem” (cp. J. Reider, “Etymological Studies in Bibl ical Hebrew” VT4 [ 1954] 284; e I. Eitan, “A Contribution to Isaiah Exegcsis”, HUCA 12-13 [1938] 83), e outras duas ou três passagens do Antigo Testamento (e.g. Ez 17.17), G R. Driver (“Problems and Solutions”, VT4 [1954] 243) e j. Barr (Comparative Philology and the Text o f the Old Testament [Oxford: Clarendon; reimp. com adições, Winona Lake, Ind.: Eisenbrauns, 1987], p. 333) identificou a raiz como III 'Síá. Driver argumenta que “esse uso dc 'B é á é confirmado pelo intercâmbio com k B s a h ‘coberto’ num sentido metafórico (Pv xiii 16; cp. xii 23)” . HALO T(2:893, s.v. ‘á/t) usa expressões ambíguas entre essas duas raízes. O paralelo antitético “espalha” (como um mascate faz com seus produtos) favorece III 'S á â . 31. Lit. “cai” ; “Vulg. = se arruina, perece, etc. (c. 30t); ... peculiar a Provérbios, são Provérbios 11.5; 13.7; 17.20; 28.14” (BDB, p. 657, 2b, s.v. nãpal).
19 Um desejo que se cumpre32 è agradável para a alma, mas uma abominaçâo para os insensatos é apartar-se do mal. 20 Anda33 com os sábios e torna-te sábio,34 pois todo aquele que se associaiS com os insensatos sofre dano. 21 A dificuldade persegue os pecadores, mas coisas boasib recompensam37 os retos. 22 Uma pessoa boa dá [riqueza] como herança58 aos seus netos, mas a riqueza de um pecador é armazenada para a pessoa reta. 23 O campo não arado das pessoas pobres39 produz fortuna de alimento, 32. Nihyal é um Nifal ptep. fem. sing. e um ptep. relativo assindético. 33. Considerando K (Qal inf., IBHS) com os códices Vaticano e Sinaítico, e não Q (Qal ptep., masc. sing.) com o Alexandrino da LXX c correções posteriores do Sinaítico e outras versões antigas (Targ., Sir., e Vulg.). A leitura Q pode ser justificada como sendo devida ao estilo típico dos provér bios, e especialmente do ptep. paralelo r&eh.O inf. funciona como um substituto para um imperati vo, uma característica da gramática hebraica bíblica mais antiga (IBHS, p. 593, P. 35.5.1 a). 34. Considerando K (waJt°kSm) com Vaticano e Sinaítico, e não Q (yehkam) dos textos gregos posteriores e versões antigas. Considerações semânticas, não a gramática, mostram que essa é a apódose depois de uma prótase condicional (cp. 3.4,6,8 para as mesmas construções). 35. RS'eh. que ocorre seis vezes (Jz 14.20; Jó 24.21; Pv 13.20; 22.24; 28.7; 29.3), é uma Qal ptep., não um substantivo, a julgar pelas suas formas verbais em Juizes 14.20; Provérbios 22.24. 36. Como seu paralelo, “perversidade”, é mais apropriado considerar “bondade” o sujeito da cláu sula e uma personificação (cp. 12 .14; Sl 23.6). 37. A LXX traz “mas o bem alcança (ya ééig êm ) o reto", oferecendo um paralelo mais adequado para “persegue” (cp. Jó 27.20; Is 59.9). Gemser (Sprüche, p. 64) retroverte yaéáigSm, “os alcança” para uma ligação mais próxima com yslm , mas é gramaticalmente impossível para a LXX. No entanto, a LXX é, com frequência, criativa, e o TM não pode ser descartado justificadamente a partir de um ponto de vista crítico-textual. Fichtner (BHS) muda infundada mente para yaslim (“a boa fortuna tem aliança com os retos”). 38. Yanhíl em Deuteronômio 32.8 parece um Hifil dc dois lugares de nhl (IBHS, p. 437, P. 27.2d) (i.e., dar uma herança a alguém), mas a raiz aqui pode ser 11 nhl, “espalhar”, “semear” (G R. Driver, “Three Notes”, VT [1952] 356-57). Em outras passagens, é um Hifil de três lugares (IBHS 27.3): “uma pessoa faz outra herdar algo”, seja terra (Dt 1.38), e com frequência, um trono (ISm 2.8), ou riqueza (Pv 8.21). Assim, o termo “riqueza” no verseto B deve ser estendido para o verseto A (cp. ICr 28.8 para uma elisão semelhante; cp. HALOT, 2:686, s.v. nhl). 39. Qal ptep. pl. masc. de rüs (segundo BDB, p. 930, s.v. rúS; HALOT, 3:1209, s.v. rãs; cp. r a ’s 13x em Provérbios). A forma também pode significar “chefes” (a Vulg. traz patrum). De acordo com Plòger (Sprüche, p. 164), o provérbio pode significar que as novas realiza ções de nobres podem ser destruídas pela injustiça, mas esse salto do alimento produzido por solo nâo cultivado para novas realizações nâo é justificado. E quem pode destruir aquilo que esses “chefes” produzem? McKane (Proverbs, p. 463) acredita que o provérbio ensina a retribuição: “a abundância que é produzida por injustiça não será consolidada em riqueza duradoura"; mas essa equiparação dos chefes com a injustiça não tem fundamento.
mas há40 uma dissipação41por meio da injustiça,42 24 Aquele que retém sua vara é aquele que odeia a seu filho, mas aquele que o ama o busca diligentemente43 com disciplina. 25 Uma pessoa reta é aquela que come a ponto de satisfazer o seu apetite, mas o ventre dos perversos carece [de pão]. Todas as palavras do provérbio educativo introdutório em 13.1, com exceção de ge'ãrâ (“repreensão”), refletem o vocabulário do prólogo, que pede que o filho escute às instruções dos pais. Como seus paralelos em 10.1, 17; 12.1,15, ele se encontra no início de uma unidade e admo esta implicitamente os membros jovens da aliança a ouvir as instruções aforísticas que seguem (cp. 1.5). O versículo 2 proclama de imediato o tema do capítulo: por meio do ensino e do comportamento moralmente bons o indivíduo comerá aquilo que é materialmente bom (v. 2), uma ligação reforçada pelo jogo de palavras com (ôb como bem moral (bô nus) no versículo 2 e bem material (bonum) no versículo 2 1 .0 versí culo 2 forma um inclusio com o versículo 25 através das palavraschave ’kl “comer” e nepeS “apetite”. A unidade aumenta em intensida de da admoestação implícita para o filho dar ouvidos aos pais (v. 1) para uma admoestação implícita para os pais disciplinarem seus filhos (v. 24), uma ligação reforçada pela palavra-chave müsãr (“instrução”/ “disciplina”). De acordo com o tema e as paronomásias, o capítulo consiste de quatro unidades parciais que vão se intensificando: os versí 40. YêS poderia se referir a “riqueza”, como em 8.21, mas em outras passagens, quando aparece no começo de uma cláusula, é o predicativo de existência (veja 11.24; 12.18; 13.7), um conceito mais pertinente cm termos semânticos neste caso. 41. HALOT (2:764, s.v. sph) apresenta como opções para o Nifal ptep. sing. masc. a forma neutra “aquilo que c dissipado” ou a forma pessoal, “aquele que é...” (segundo a Targ.). Toy (Proverbs, p. 277) prefere a última opção e acredita que é um substantivo adjetival para os retos, mas reconhece que, de acordo com sua interpretação, “não há nenhuma relação óbvia entre as duas cláusulas - a produtividade da tenra de um homem pobre não tem nada a ver com um homem perecer por injustiça”. Delitzsch (Proverbs, p. 207) acredita que a passagem trata dos iníquos, mas interpreta o texto excessivamente. Em 1 Crônicas 21.12 nispek é nominal (= “ser consumido”), o significado provável neste caso a julgar pelo sentido e sintaxe do provérbio. 42. Ou “sem justiça”. Apesar de em outras passagens belõ' mispõ( poder significar, questionavelmente, “sem justiça", nesta a expressão não ocorre com uma construção passiva. Não há motivo para investir m ispãl com o significado excepcional de bom senso (i.e., bom cultivo da terra) encontrado em Isaías 28.26 (pace KJV). 43. Alguns estudiosos acreditam que o verbo é I Shr, “ser escuro", uma indicação de uma discipli na inicial ou oportuna, nâo shr “buscar".
culos 2-6 tratam do modo de falar, os versículos 7-11 da riqueza, os ver sículos 12-19 do anseio satisfeito, e os versículos 20-25 do destino eterno. As duas primeiras unidades parciais e as duas últimas se encon tram mais firmemente ligadas que a segunda e a terceira. O versículo 7 forma um janus entre as duas primeiras subunidades. Essas unidades parciais, sobre “discurso e ética” e “riqueza e ética”, são ligadas pela prefiguração do tema da riqueza e ética na linha central da primeira unidade. Meinhold trata as duas unidades como uma só.44 O versículo 20 também funciona como janus entre as duas últimas unidades por meio de paronomásias que envolvem kesilim (“insensatos”; vs. 19b, 20b) e rã' (“mal”/“dano”, as últimas palavras dos vs. 19 e 20). O tema da terceira unidade, “desejos realizados” (vs. 12-19), é reafirmado como provérbio final (v. 25) na unidade que se refere ao destino final, deixan do claro que os retos realizam os seus desejos no final (vs. 20-25). A oração-chave “escuta a uma repreensão” liga a segunda subuni dade à introdução (vs. lb, 8b), bem como o seu tema de ser educável à palavra-chave “sabedoria” (v. 10b). Outras paronomásias, além da quelas já observadas, também dão coesão às unidades: hkm (“sábio”/ “sabedoria”, vs. 1,10,14,20), nepeS (“vida”/ ‘apetite”, vs. 2 ,3 ,4 , 8,9, 19,25), bõgedim “traiçoeiros” (vs. 2,15), ‘wh (“anseia”, “expectativa”, “desejo”; vs. 4, 12,19), bem como $dq (“reto”/ ‘retidão”, vs. 5 ,6,9,25) e rs' (“perverso’7“perversidade”, vs. 5, 6,9, 17, 23,25). a. Introdução (13.1) Este dito educativo introdutório visa motivar o filho a dar ouvidos à instrução dos pais que continua nesta unidade, ao lhe oferecer um pon to nítido de contraste entre um filho sábio (bên hãkãm ; veja 10.1) e um escamecedor (lês; veja 169). O primeiro, [escuta]... de um pai (a è ; veja 1.8; 10.1) a instrução (müsãr; veja 1.2) disciplinadora. O último despreza a repreensão (jfã r â ) moral e o processo educativo.45 GP'ãrâ ocorre 14 vezes no hebraico bíblico, sempre na literatura poética, e indica um protesto com indignação moral.*’ Os agentes em Provérbi 44. Meinhold, Sprüche, pp. 217-18. 45. A. A. Macintosh (“A Consideration o f G'R", V T 19 [1969] 478-79) faz uma distinção questi onável entre o significado deg ^B rá para indicar um protesto irado (Gn 37.10; Rt 2 .16; Is 30.17) ou um protesto irado num sentido moral e de julgamento, "uma repreensão censuradora”, “uma admoestação moral feita com autoridade". 46. Em oito ocasiões o S e n h o r é o agente que expressa sua indignação moral contra seus inimigos
os sào os sábios, inclusive os pais. A palavra implica que o escarnecedor pecou, mas recusa a censura moral (cp. 1.22; 9.8). A antítese implica que o filho sábio escuta a repreensão de seu pai, e o escarnecedor não (30.17). Uma repreensão moral dirigida a uma pessoa sábia é mais eficaz do que cem açoites em um insensato (17.10), e fustigar o escarnecedor arrogan te toma o ingênuo sóbrio (19.25). O servo sofredor que prenuncia o nos so Senhor dá exemplo de um filho sábio. Ele aceitou a escola dolorosa da disciplina para “aprender a obediência” (Is 50.5; Hb 5.8). b. O discurso e a ética (13.2-6) Esta subunidade trata, em sua maior parte, do modo de falar que, com a riqueza, é o tema predominante da Coleção IIA. A subunidade é constituída de dois quartetos acerca do modo de falar (vs. 2,3 e 5,6) ao redor de um provérbio acerca da diligência (v. 4). A descrição do dis curso construtivo nos versículos 2, 3, primeiro com referência a seus valores (v. 2), depois com referência a seu comedimento (v. 3), é inten sificada para os âmbitos da ética e da teologia, como os retos versus os perversos (vs. 5, 6). A unidade termina com um clímax típico, prome tendo a permanência dos retos e a destruição dos perversos, que tam bém é o tema da última unidade parcial. A unidade está intimamente ligada à introdução, e a lógica e as paronomásias garantem a coesão do todo. O filho sábio se mostra pronto para ouvir (v. Ia) os ditos salutares que lhe trazem benefícios (v. 2a) é tardio para falar (v. 3a). Ao mesmo tempo, é dito por meio de um jogo de palavras, que o pai desfruta a recompensa de um filho bom (v. 2a). Contrastando com isso, os escamecedores incorrigíveis rejeitam a re preensão moral (v. lb), anseiam pela violência (v. 2b), e através de sua violência (v. 2b) vivem em terror e são arruinados (v. 3b). O sábio tem ouvidos abertos (v. Ia) e boca fechada (v. 3a); o insensato tem ouvidos fechados (v. 1b) e boca aberta (v. 3b). As palavras-chave p i “boca” e nepeS (um jogo de palavras que significa “apetite” e “vida”) ligam o versículo 2 que trata do valor do discurso construtivo, com uma adver tência acerca da tagarelice (v. 3). Um jogo de palavras com nepeS com efeitos devastadores: os poderes terríveis da natureza (2Sm 22.16 = Sl 18 .15[ 16); Is 50.2), das nações (Is 17.13), ou do seu próprio povo (Is 51.20). Em duas ocasiões (Is 30.17), os inimigos de Israel são agentes que, na expressão de seu protesto irado, fazem ameaças de aniquilação. Em três ocasiões na literatura sapiencial, os sábios ameaçam os insensatos com a desolação (Pv 13 .1; 17.10; Ec 7.5).
envolvendo os dois sentidos liga o tema da diligência, que pode ser aplicado aos atos de aprender e falar, e prenuncia a próxima subunidade. As palavras-chave sdq “reto”/“retidão” e rs' “perverso”/“perversidade” dão coesão aos provérbios éticos e a palavra-chave “guardar” (nsr) mostra que o interlocutor cauteloso guarda sua vida (v. 3a) no caminho da reti dão (v. 6a). Diante disso, o bom orador (v. 2a) odeia aquilo que é falso (v. 5a), e o orador violento e precipitado é arruinado (vs. 2b, 3b) em função da perversidade (vs. 5b, 6b). A intensificação é evidente. No cerne da introdução tem-se o provérbio independente do versí culo 4. Ele prenuncia as três subunidades seguintes nas quais o apetite (nepes) apenas anseia Çawwâ), mas a vida (nepeS) do diligente é en gordada. Esta linha central contém a palavra-chave nepeS repetida duas vezes, ligando-a à sua ocorrência dupla nos versículos 2 e 3 e aos versículos 19 e 25. Também contém a palavra-chave “anseia” ( ’awwâ; v. 4a), que a liga a “desejo” (ta^wâ; vs. 12b, 19a). O padrão de avali ação - + do versículo 4 o destaca dos versículos 1-3 e 5, 6, que se guem o padrão 2 Este provérbio com a metáfora de comer emprega sentidos du plos para formar uma transição suave do ato de ouvir (v. 1) para o ato de falar (v. 3). O verseto A é uma réplica de 12.14a (cp. 18.20), mas não necessariamente com o mesmo sentido. A antítese entre do fruto da boca de uma pessoa47(mipperí pi- ’i$; veja 12.14) e o apetite (nepeS; veja p. 140) dos traiçoeiros (bõ^ditn; veja p. 165) é imprecisa.48 As sim, o orador que produz frutos comestíveis é leal a Deus e à comuni dade, e os desleais não produzem frutos comestíveis. Alguém come \yõ’kal\ veja 1.31] coisas boas ((ôb; veja 2.9, 20; 12.14) - uma meto nímia para as coisas desejáveis e benéficas que o modo de falar con fiável produz - é um jogo de palavras intencional. Por um lado, o sujeito indefinido “alguém”49significa que o ouvinte é espiritualmente alimen tado pelas declarações fiéis do orador (cp. 3.18; 11.30; 15.4; Is 55.2). De acordo com esse sentido, o versículo 2a está ligado ao versículo la, entre outras aplicações, ao comparar implicitamente a instrução dos pais no versículo 1b com o fruto agradável. Se o filho der ouvidos, ele experimentará o bem (v. 2b). Por outro lado, o sujeito pessoal “ele” 47. A NVI traduz “boca" como “lábios” para evitar uma imagem repulsiva. 48. NepeS pode significar “garganta”. Sc esse é o caso, então a ideia é que as palavras deles produzem violência para eles próprios e para outros. 49. Para o sujeito indefinido veja IBHS. pp. 70-71, P. 4.4.2.
significa que, ao alimentar a outros com seu discurso construtivo, o orador produz conseqüências sociais positivas para si mesmo, o sentido em 12.14a (cp. 10.21; 11,27b).50 Nesse sentido, há uma forte ligação com a advertência no v. 3a para o indivíduo guardar suas palavras a fim de guardar a vida. A antítese no verseto B também contém um jogo de palavras intencional. Por um lado, os traiçoeiros, aqueles cujas palavras não são dignas de confiança, anseiam por violência (hãm ãs; veja 3.31) para a comunidade ao infringirem seus direitos, principalmente através de seu discurso e, portanto, os saqueiam (veja 4.17; cp. 10.11; 19.9). Pessoas desse tipo, inclusive o escamecedor, precisam ser repreendi das com severidade (veja 13.1b). Por outro lado, sua violência contra os outros se volta contra eles próprios (veja 10.6; 11.27b). O versículo 3b detalha esse sentido. A antítese também implica que os desleais não têm desejo algum de receber instrução bondosa e fidedigna, e que os confiáveis não têm apetite algum por violência. 3 A palavra-chave “boca” traça o desenvolvimento do raciocínio No versículo 2 ela proferiu declarações construtivas; agora, refreia de clarações destrutivas. Um jogo de palavras com a outra palavra-chave nepeS intensifica a ideia de “apetite” para “vida”. Com o uso apropria do da boca, o apetite come por aquilo que é bom (v. 2a); seu comedimento apropriado protege a vida do indivíduo (v. 3a). O que está em jogo é de grande valor; o caráter construtivo ou destrutivo do discurso é uma questão de vida ou morte (veja p. 154).0 uso indevido dos órgãos da fala para produzir “violência” (v. 2b) é intensificado agora para “ter ror e ruína” (v. 3b).51 Isoladamente o aforismo adverte acerca do dis curso egotista, impensado e tagarela, mas considerado dentro do con texto desta passagem, se refere mais especificamente ao discurso vio lento que causa terror ao orador (cp. 21.23). A antítese aquele que guarda (nõsêr; veja 2.11) a sua boca (piw; veja 13.2a) e quanto àquele que abre os seus lábios excessivamente (põéêq) implica que o primeiro é cauteloso, não tagarela, e em que o último é descuidado e falador. Além desta passagem,pãéaq ocorre somente em Ezequiel 16.25 para se referir a uma mulher que abre suas pernas de maneira promís cua. Usado com os lábios (éepãtãyw\ veja 12.13) a expressão pode 50. “Mas aquele que está sendo instruído na palavra faça participante de todas as coisas boas aquele que o instrui” (G16.6). 5 1 .0 versículo está repleto de consonâncias c assonâncias: cinco das suas sete palavras contêm uma sibilante; quatro contêm um som Ipl, e quatro, o sufixo w. Observe também a aliteração de nõsêr... Sõmer.
indicar o ato de escancarar os lábios fazendo as palavras fluírem de senfreadamente em torrentes,52 e/ou, de acordo com Ezequiel 16.25, significa um discurso lascivo e indiscreto que não se restringe às nor mas de propriedade, especialmente se “lábios” tiver uma associação sexual (veja 5.3).53 Semelhantemente, a antítese aquele que protege (Sümêr; veja 2.8) a sua vida (napsô; veja p. 140) e tem terror (mehittâlô\ veja 10.14) sugere que o indivíduo que mantém os lábios fechados não tem terror, e que o “falador” não guarda sua vida. O versículo 3a é expandido em um provérbio completo em 21.23 (cp. Sl 141.3; Ef 4.7; Tg 3.2, 3). “Faze contrapesos e balanças para as tuas palavras, e faze uma porta e um ferrolho para a tua boca” (Eclo 28.25). 4 Um jogo de palavras com os dois sentidos de nepeS (“apetite” [v. 2] e “vida” [v. 3 ]) muda o pensamento do tema do modo de falar para o tema da diligência, mas a paronomásia sugere a aplicação da diligên cia aos ensinos acerca do modo de falar nos versículos 2, 3.54 Por um lado, o “apetite dos traiçoeiros” prejudica a comunidade por meio do seu modo de falar violento (v. 2b) e o apetite do preguiçoso (napSô 'ãsêl; veja p. 170) esgota os seus recursos. Por outro lado, a vida da quele de poucas palavras é protegida (v. 3a), uma ideia intensificada na afirmação a vida dos diligentes (nepeS hãrusim; veja 10.4) è engorda da (fíduSSãn-, veja 11.25). Contrastando com isso, o apetite do preguiço so não é engordado, antes anseia [ou nunca é satisfeito, m it’awwa', veja 10.24],55 e ele nada tem (w ã’ayin). O termo não qualificado wã'ayin se refere a tudo quanto seus impulsos e apetites humanos desejam, como comer (Jó 33.20; Mq 7.1), beber (2Sm 23.15) e se relacionar com o sexo oposto (Sl 45.11 [12]; Jr 2.24). A antítese implica que todo o apetite da pessoa diligente é satisfeito com abundância, inclusive seu anseio por Deus (veja Sl 42.1 [2]; 63.1 [2]). O provérbio pressupõe que todos os ele 52. De acordo com Meinhold, Sprüche, p. 2 19. 53. Também Nachmias, citado por J. Greenstone, Proverbs with Commentary (Filadélfia: The Jewish Publication Society o f America, 1950), p. 138. 54. E possível que também haja um jogo de palavras no provérbio em si, pois pode significar “os desejos do diligente são engordados (i.e., plenamente satisfeitos)”. 55. No Hitpael, 'wh ocorre no acusativo ( 13.4) ou com lamede (22.1), sem nenhuma diferença de significado. No Piei, é usado no contexto da fome física (Dt 12.20; 14.26; ISm 2.16; Mq 7.1)eda vontade de Deus (Jó 23.13; Sl 132.13) ou para o almejo piedoso (Sl 13.4; Is 26.9). No Hitpael, é usado para o desejo do rei por sua noiva (Sl 45.12[ 13]) e para o anseio de Davi pela água do poço de Belém (2Sm 23.15). Em suas outras quatro ocorrências em Provérbios (21.26; 23.3, 6; 24.1) se refere a um desejo intenso e ilícito. No décimo mandamento (Dt 5.21) representa um equivalente semântico de "cobiçar” (cp. Êx 20.17).
mentos essenciais para a vida se encontram disponíveis com fartura sob a mão bondosa de Deus (Sl 128.1-3), mas que não estão presentes para o preguiçoso (Sl 128.1).56O versículo 24 fornece uma correção necessá ria para um sistema simplista de retribuição (veja também 3.1-12; 10.3). 5-6 As palavras-chave alternadas “reto’7“retidão” (vs. 5a, 6a) e “perverso”/ ‘perversidade” (vs. 5b, 6b) dão coesão a estes provérbios. Os aspectos gerais em relação ao modo de falar (vs. 2, 3) e à diligên cia (v. 4) são definidos agora em termos éticos de retidão e perversida de. Além disso, assim como o princípio segundo o qual o discurso cons trutivo e cauteloso recompensa e protege todos, mas a tagarelice e a precipitação conduzem à violência e ao terror (vs. 2, 3) também a rejei ção do falso discurso protege o reto da desgraça social (v. 5) e os atos de retidão protegem os irrepreensíveis (v. 6). Os retos odeiam as mentiras (v. 5a) e, portanto, são protegidos dos perigos de se tomarem um fedor social, experimentando a vergonha (v. 5b) e a ruína (v. 6b). No entanto, a retidão acarreta em ser diligente para concretizar seu destino (v. 4). 5 A pessoa cujos lábios produzem e comem frutos bons (v. 2a), que protegem a sua vida pelo discurso discreto (v. 4), e que pela diligência tem todos os seus apetites satisfeitos (v. 4b), é definida aqui como uma pessoa reta (saddiq\ veja 1.3; 10.2, 3). Ela anseia por Deus e o encon tra (Sl 42.1, 2[2, 3]). Uma vez que o reto ama o S e n h o r , que odeia lábios mentirosos, se compraz na fidelidade (12.22) e valoriza as pesso as que, por sua vez, são mais beneficiadas pela verdade, ele aborrece com veemência (yiénã’; veja 2.22) toda palavra (dãbãr) falsa (Seqer; veja 6.17).57 Mas uma pessoa perversa (werãsa; veja pp. 164-165), cuja vaidade e egoísmo envenenam os relacionamentos pessoais e destroem a sociedade (veja 10.2, 3) torna-se um fedor (yab’is; veja n. 8). Bã'aS implica que o mentiroso foi desmascarado, tomando-se, portanto, repulsivo para a sociedade. Essa pessoa também vem a se sentir en vergonhada (weyahpir; cp. Pv 19.26; Is 33.9; 54.4).58 A desgraça pú 56. “O preguiçoso almeja o ganho da diligência, sem a diligência que ganha. Deseja ser sábio sem estudo c rico sem trabalho” (Bridges, Proverbs, p. 151). 57. “Se o coração se volta para a falsidade, perverte a justiça, dá ouvidos aos mexericos maldosos e à difamação, e vê o pior nos outros, denegrindo sua reputação e desonrando-os pelas costas, por meio de palavras perversas e caluniosas” (Rabino Charles Wengrov, Malbim on Mishley: The Commentary ofRabbi Meir Leibush Malbim on lhe B o o ko f Proverbs, baseado num esboço original dc Avivah Gottlieb Zomberg [Jerusalém: Feldheim, n.d.], p. 132). Agur orou para que o S f n h o r remo vesse dele toda menlira antes de ele morrer (Pv 30.7, 8a; cp. Sl 119.29). 58. HALOT( 1:340-41, s.v. II hpr) afirma que no H ifil\\hpr, que normalmente segue tô s, signi
blica e a vergonha pessoal ocorrem no contexto da calamidade (Is 1.19; Jr 15.9; Mq 3.7). A antitese imprecisa sugere que a pessoa reta não é envergonhada num contexto social e pessoal e que uma pessoa perver sa não aborrece aquilo que distorce a realidade. 6 A personificação da retidão como um protetor e da perversidade como um destruidor combina com os destinos dos oradores e agentes das ações nos versículos 1-4. Consequentemente, os versículos 5, 6 definem os oradores dos versículos 2,3 e os trabalhadores do versículo 4 em termos éticos. Essa ligação é reforçada pela palavra-chave “guar dar” com referência ao orador no primeiro quarteto (v. 3a) e com refe rência à retidão no último (v. 6a). Além disso, o versículo 6 intensifica o seu destino a uma dimensão eterna. A retidão (sedãqâ; veja pp. 149150) guarda (tissõr; veja 2.8) o caminho (veja 1.15) irrepreensível (tom; veja p. 151). Assim como a metonímia “sacrifícios de retidão” no Salmo 4.5(6) e “portas da retidão” no Salmo 118.19 não descrevem sacrifícios e portas em si, mas o estado ou qualidade de retidão de uma pessoa que sacrifica e que passa pelas portas, respectivamente, tam bém assim “caminho irrepreensível” (tom-darek) se refere ao contex to, conduta e destino daqueles que têm todos os passos voltados para o S e n h o r e para o bem-estar do seu reino universal.59 Mas a perversi dade (risâ; veja pp. 164-165) subverte (físallêp; veja selep, “perversi dade” em 11.3) o [caminho] pecaminoso (hatfã't; veja 1.10). Sãlap significa “torcer, distorcer, perverter e, deste modo, arruinar algo refe rente à ética”.60 Em Provérbios 21.12 o termo “calamidade” (“mal”; lãrã') é acrescentado a slp. A metáfora “caminho” significa que a reti dão e a perversidade embutiram neles seus destinos apropriados. A veracidade confiável daqueles que amam a Deus e a humanidade os guarda, mas as mentiras em que não se pode confiar subvertem e arrufica “sentir-se envergonhado” (Is 54.4; 33.9) ou “agir de modo vergonhoso” (Pv 13.5; 19.26). No entanto, Klopfcnstein argumenta que II hüpar indica "um sentimento subjetivo de vergonha ou embaraço em contraste com sua causa, e uma 'desgraça' objetiva" (citado favoravelmente por J. Gamberoni, TDOT, 5:109, s.v. II hpr). 59. Em outras ocasiões em Provérbios, tom ocorre com o verbo “andar” (veja também 19.1; 20.7; 28.6), e é implícito aqui. 60. Sãlap ocorre sele vezes no hebraico bíblico, quatro delas em Provérbios. O verbo tem como significado básico “torcer", mas é usado principalmente de forma metafórica nos contextos que tra tam do comportamento moral e social. Em três ocasiões ocorre com o objeto “palavra” no sentido particular de que os subornos “pervertem” ou "torcem” as palavras dos retos (Ex 23.8; Dt 16.19) e de que o S e n h o r "subverte” ou “transtorna” as palavras dos perversos (Pv 22.12), indicando que ele as “frustra” tomando-as ineficazes e destruindo-as. Com “pessoas” (Jó 12.19; Pv 21.12) e com "caminho” (Pv 13.6; 19.3), também significa “subverter" e/ou “transtornar".
ínam os pecadores. Usando o mesmo verbo, Provérbios 22.12 aponta para o S e n h o r como agente supremo que protege e frustra no campo da ética. Salomão não coloca essas causas imediatas em oposição às causas finais; antes, em sua visão, o S e n h o r opera por meio da ordem ética que tem origem em seu próprio ser e que ele sustenta (veja 2.8,11). c. Riqueza e ética (13.7-11) Um jogo de palavras com rãb (“grande”) e hôn (“riqueza”), as duas últimas palavras do versículo 7, e “aumenta riqueza”, a primeira palavra e a última do versículo 11 no texto original, formam um inclusio que estrutura esta subunidade sobre “riqueza e ética”. Esta subunidade está ligada à introdução (v. 1) e estreitamente relacionada à subunidade sobre “modo de falar e ética” (vs. 2-6). Tanto a introdução quanto esta subunidade se referem a ser sábio (vs. Ia, 10b), e as descrições do escarnecedor e do pobre incorrigíveis são idênticas (vs. lb e 8b). Os versículos 4a e 7a usam um Hitpael seguido de we ’ên para o preguiço so almejante e para a pessoa rica que, na verdade, nâo tem nada; am bos são falsos e carentes.61 Empregando o padrão de avaliação sintéti co o versículo 7 forma um janus entre os versículos 2-6 e 8-11. Por um lado, contrastando com a riqueza real obtida por meio da dili gência (v. 4) e comparando com o falso discurso (vs. 2, 3) e a perver sidade (vs. 5, 6), ele fala da falsa riqueza e da pobreza. Por outro lado, as palavras-chave “rico” ('Sr) e “pobre” (rüs) ligam os versículos 7 e 8. Os versículos 8 e 9 estão ligados pela paronomásia de r ‘5 (“pobre”, v. 8b) e ^sW im (“perversos”, v. 9b), um jogo de sons que também envolve 'Sr (vs. 7, 8). O versículo 8b afirma que um pecador pobre (rãs) rejeita uma repreensão que envolva um resgate, e o versículo 9b diz que os perversos (í^sã^m ) são apagados com sua riqueza. Os três incorrigíveis - o escarnecedor, o pecador pobre e o perverso - estão condenados. Essa unidade parcial aumenta em intensidade, passando da riqueza enga nosa (v. 7) para as causas da pobreza e da riqueza duradoura (v. 11 b). Assim como a primeira unidade parcial volta a citar provérbios acerca do discurso, desta vez em termos éticos, também os provérbios descritivos sobre a riqueza nos versículos 7, 8 intensificam os provérbios sobre os retos e os perversos expressos em termos éticos (v. 9) e em termos sapienciais (v. 10). Os versículos 8-11 seguem uma estrutura alternada: 61. Também segundo K. Hcim, “Structure andContext in Proverbs 10:1-22:16” (dissertação de Ph.D., University ofLiverpool, 1996), pp. 141-42.
A A vantagem da riqueza para tomar um indivíduo educável (v. 8) B Riqueza e ética duradouras (v. 9) A’ Ser educável e ter sabedoria (v. 10) ETRiquezas e paciência duradouras (v. 11) A ligação entre os versículos 8 e 10 sugere que o pecador que reage a uma ameaça moral se junta aos sábios. O versículo 11 define a retidão e a perversidade no versículo 9 em termos de acúmulo de rique za ligada ao caráter, e não obtida às pressas e isolada do caráter. 7 O provérbio é maravilhosamente ambíguo. Pode ser traduzido como Há [veja 12.18] quem fin ja s e r ric o ( m it'a S S ê r ) e, no entanto, não tem n ad a ( w e ’ê n k õ l); e há quem jin ja s e r p o b re (m itrôSêS; cp. r ã 's em 10.4) e, no entanto, tem g ra n d e ( rã b ; veja 7.26) riq u ez a ( h ô n ; veja 3.9). Lido dessa maneira, o provérbio censura os cobiçosos que se enriquecem à custa dos outros e, na verdade, perdem tudo (Mt 16.26; Lc 12.16-21; 16.19-26) e elogia o paradoxo da “pobreza rica”, como exemplificado por Cristo e pelo apóstolo Paulo (Mt 19.29; Jo 12.24; 2Co 6.10; 8.9). Também pode ser lido como “... que se conside ra rico... e que se considera pobre...”. Lido desse modo, o provérbio censura as pessoas iludidas que se consideram ricas e não conhecem a sua pobreza (Ap 3.17, 18) e aqueles que “são cegos demais para traba lhar com aquilo que têm” (Lc 19.11-27).63 Por fim, pode ser lido como é apresentado no texto. Lido dessa forma, o provérbio condena os fingidos. O insensato pobre finge possuir uma grande quantidade de bens valiosos a fim de projetar uma aparência de sabedoria e sucesso e se tomar digno do respeito social (veja 12.9). O insensato rico finge ser pobre, provavel mente para evitar dar esmolas (13.7b) e, desse modo, é negligente em transmitir suas bênçãos (lTm 6.18). Os dois mentirosos são perversos (vs. 5b, 6b). Em primeiro lugar, defraudam a sociedade. O primeiro rece be honra imerecida e o último priva a sociedade da ajuda financeira ne cessária. Em segundo lugar, eles difamam e defraudam o S e n h o r ; um finge ter recebido a bênção do S e n h o r , enquanto que o outro nega suas dádivas bondosas.63 Quando esses mentirosos são desmascarados, eles se tomam um fedor para a sociedade e se sentem envergonhados. 8 Este provérbio muda o foco de atenção da riqueza e pobreza falsas para as verdadeiras vantagens da riqueza e a desvantagem efe 62. De acordo com Van Leeuwen, Proverbs, pp. 131 -32. 63. Bridges, Proverbs, p. 154.
tiva da pobreza. Apesar de nesta antítese quiástica “sua riqueza” e “o pobre” na parte central serem paralelos bastante precisos, “o resgate da vida de uma pessoa” e “não escuta a uma repreensão” não apresen tam esse mesmo paralelismo. No paralelismo sintético, normalmente cada verseto implica no outro, o seu oposto. A pessoa que tem como resgatar sua vida pode ser motivada a responder a uma censura moral que ameaça sua existência, mas a pessoa pobre que não tem nada a perder não pode ser influenciada de modo a reagir a essa ameaça. O resgate (kõper; veja 6.35) ocorre uma dúzia de vezes na Bíblia e desig na o preço pago ou exigido em troca da salvação de uma vida, quer de uma pessoa inocente ou de uma pessoa culpada.64 Kõper é traduzido mais adequadamente como “suborno” quando o perverso exige um kõper do reto (cp. ISm 12.3; Jó 36.18; Am 5.12), e melhor traduzido como “resgate” quando o reto exige um kõper do culpado (cp. Êx 21.30; Nm 35.31, 32). A julgar pelo paralelo, “não escuta a uma repreensão”, a pessoa rica em vista é a parte culpada, não a vítima de extorsão, mas pode resgatar sua vida.65 Da vida de uma pessoa (nepes-’is\ veja p. 140; 13.2, 3) se refere à vida de qualquer pessoa. O predicado é a sua riqueza Ç ôsrô; veja 3.16) pressupõe que uma pessoa normal dará tudo o que possui em troca da sua vida (Jó 2.4) e que a parte ofendida o aceitará.66 Contrastando com isso, um pobre (rã S ) não pode ser moti vado a responder à censura moral com a ameaça de perder a sua vida a menos que a redima. No livro de Provérbios o rã s é completamente destituído. Ele é evitado por todos, vizinhos, amigos e parentes (14.20; 19.7); oprimido pelos tiranos (28.3); e necessitado de caridade (28.27); e suplica por misericórdia (18.23).67 Nunca é apresentado como sendo pobre em decorrência de uma conduta indevida,68 mas em 13.8, o po 64. Para este caso não são relevantes as passagens nas quais Deus exige um resgate para salvar o inocente (Jó 33.24; Sl 49.8[9]; Pv 21.18; Is 43.3). 65. “ Exemplos de uma situação na qual somente o dinheiro salva a vida são abundantes nas histó rias judaicas e de outras culturas” (Toy. Proverbs, p. 264). 66. No entanto, o marido traído nâo aceita um resgate do adúltero (Pv 6.35). 67. Rus ocorre 21 vezes, sendo que 14 destas estão nas Coleções Salomônicas de Provérbios (13.23; 14.20; 17.5; 18.23; 19.1,7; 22.2, 7; 28.3,6; 29.13), duas vezes em Eclesiastes, três vezes na pará bola de Natã (2Sm 12 .1-4), c uma vez em 1 Samuel 18.23 e no Salmo 82.3. Na última passagem todas as palavras do campo semântico de “pobre” (dal, 'ünt, rUi e 'ebyôn) ocorrem juntas. As diferenças entre elas são mínimas (Whybray, Weatth andPoverlv in the Book ofProverbs) JSOTSup 99; Sheffield, JSOT, 1990), pp. 16-18. 68. “Nenhuma das ocorrências de rãí em Provérbios se relcrc à pobreza merecida, e várias delas falam de rS í em termos bastante diferentes e positivos: sua pobreza pode ser acompanhada de integridade moral superior à dos ricos (19.1, 22; 28.6); zombar dele é um insulto ao seu Criador
bre é culpado de alguns pecados. Sã ma' (não escuta; lõ’-Sãma'; veja 1.8) fora de Provérbios pode significar “ouvir uma palavra com o ouvi do extemo” (cp. Jó 3.18; 39.7; cp. Is 6.9), mas suas 30 ocorrências em Provérbios indicam “ouvir com o coração”, “ouvir e obedecer”, seu significado no paralelo exato em 13.1 b.69Assim como no paralelo, re preensão ãrâ) indica um protesto irado de censura moral que en volve perda, quer real ou ameaçada (veja 13.1), não ameaça de extor são.70No entanto, a pessoa destituída não dá ouvidos à repreensão que a ameaça com a perda de sua propriedade porque ela não tem recursos para se salvar.71 Em resumo, uma pessoa rica pode responder à censu ra moral que a ameaça com a perda de sua vida, pois ela é capaz de redimi-la. Porém a pessoa pobre não pode ser motivada dessa maneira. Sem esperança, ela faz ouvidos moucos para a repreensão ameaçadora. 9 Este provérbio intensifica o valor da riqueza passando do seu potencial para salvar uma pessoa culpada ao motivá-la a responder a uma repreensão moral (v. 8) para a riqueza duradoura dos retos que respondem prontamente à correção moral. Um jogo de sons entre rãs (“pobre”; v. 8b) e r^Sã^m (“perversos”; v. 9b) ajuda na transição. Os pobres culpados não podem ser motivados a abandonar sua perversida de mediante exigência de um resgate, e a prosperidade atual dos perver sos não durará. O provérbio contrasta a riqueza duradoura dos retos com a extinção dos perversos e, implicitamente, da sua riqueza contrasta a lâmpada dos primeiros, que brilha intensamente, com a dos últimos, que é apagada. Uma vez que a lu z(’ôr) é parte da frase estereotipada quebra da “a luz do candeeiro” (Jr 25.10; cp. Jó 18.5, 6; Pv 6.23; veja p. 83), deve ser interpretada como parte dessa imagem e não contrastada com a luz artificial de uma “lâmpada” moderna. A luz de uma lâmpada simboliza o sucesso e o bem-estar de uma pessoa, implicando sua permanência na vida, não apenas na vida física (cp. 2Sm 21.17; Et 8.16; Jó 18.5-6; 21.17; 22.28; Pv 24.20; Lm 3.2; Am 5.18, 20).72 O contraste entre os versetos (17.5); o próprio Yahweh criou tanto cie quanto o rico (22.2; 29.13)” (Whybray, Wealth and Poverty, p. 16. n. I). 69. Veja também HALOT, 1:192, s.v.g^õrá. 70. “Alguns consideram repreensão = ameaça (um sentido que a palavra não tem em nenhum lugar) e entendem o significado como o homem pobre, seguro no fato de que não tem nada que possa ser roubado dele não ouve nem atenta para ameaça alguma, não se preocupa com as intrigas de opressores poderosos. - Essas traduções são forçadas e improváveis” (Toy, Proverbs, p. 265). 71. Supõe-se que possa responder a tôkahat (correção moral que nâo é motivada pela perda de riqueza; veja 1.25, 30; 10 .17). 72. Veja S. Aalen, TDOT, 1:162, s.v. or.
diz respeito à prosperidade duradoura dos retos versus a duração tem porária da luz da lâmpada dos perversos (i^Saim; cp. vs. 5, 6). Apesar de brilha intensamente (yiémãh) significar alegria e contentamento, ela indica “brilhar’', “irradiar”, o contraste mais apropriado a “ser apagada” (i.e., veja 6.23; 31.18).73As sete ocorrências do verbo éapagado (yid'ãk) se referem sempre a apagar deliberadamente um candeeiro ou pavio; o A/agente não é especificado. Simboliza o infortúnio e desespero derra deiros dos perversos (veja 24.20; cp. 20.20; Jó 18.5,6). 10 Assim como o versículo 9 desenvolveu o tema da riqueza e ética apresentado no versículo 8, o versículo 10 desenvolve o tema de dar ouvidos à repreensão. Nos versículos 8,9 os assuntos foram desenvol vidos com referência ao próprio malfeitor, mas o versículo 10 expande as reações éticas a seu efeito sobre outros. A antítese imprecisa, “so mente com orgulho” em oposição à “com aqueles que aceitam conse lhos”, sugere que aqueles que têm uma opinião exagerada acerca de sua própria importância não aceitam conselhos. A outra antítese impre cisa, “contenda” versus “sabedoria”, implica que a sabedoria é carac terizada por paz, e que contenda não é sabedoria. Há (yittên-, veja “dar”; 1.4; 10.24) significa, com um sujeito indefinido, “colocarem movimen to”. Seu objeto, contenda (massâ),74se refere à maneira como as pes soas culpadas com um ego exagerado reagem à repreensão moral. Em Isaías 58.4 massâ é combinado com rib para indicar uma queixa oral da parte da injustiça contra a parte opressora. O insensato arrogante não está preparado nem é capaz de aceitar convicções melhores que as suas e, portanto, de ceder. Fala apenas de cima para baixo e não ouve. Repreender esse indivíduo resulta apenas em discussões violentas e transtornos para a comunidade (veja 9.7, 8). Somente (raq) modifica “orgulho”, não a cláusula toda ou “contenda”, pois o termo é seguido de uma frase preposicional, não de um verbo ou de uma cláusula nomi nal.75 Com orgulho (bezãdôn; veja 11.2) indica o estado psicológico de uma opinião exagerada acerca da própria importância dentro da socie dade e uma recusa em aceitar seu devido lugar dentro da sua estrutura sob Deus. Em outras palavras, “onde há contenda, há orgulho”. A arro gância, que é o comportamento impertinente e tolo de todo tipo de in 73. HALOT, 3:1335» s.v.ém h com ampla bibliografia. 74. Mas$â, ocorre somente três vezes e é formada pelo modelo nominal do abstrato mem prefixado pela raiz nsh “ lutar” (IBHS, p. 90, P. 5.6b). 75. Cp. HALOT, 3:1286-87, s.v. raq.
sensato, causa contendas ao se opor à ordem apropriada da sociedade sob Deus, de acordo com as normas de moralidade. Mas com aqueles que aceitam conselhos (we ’et nô'ãsim; veja 1.25; 12.20) se refere àqueles que têm a modéstia necessária para reconhecer as limitações do seu conhecimento e a humildade de se permitir serem corrigidos, criticados e conduzidos a um plano de ação melhor. Com aqueles que dão ouvidos a conselheiros competentes [há] sabedoria (hokmâ; veja pp. 124-125), o conhecimento da realidade e da ordem correta e a ação adequada que conduzem à paz. 11 O inclusio a riqueza (vs. 7b, 1la) completa a subunidade sobre riqueza e ética. Assim como o versículo 10 desenvolveu o conceito de aceitar conselhos apresentado no versículo 8, o versículo 11 desenvolve o conceito da riqueza permanente dos retos em contraste com a rique za não permanente dos perversos apresentado no versículo 9. O pro vérbio argumenta a favor do acúmulo de riquezas por meio da virtude, não de planos para enriquecer facilmente e vícios, o enriquecimento honesto. [Obtido] por meios indevidos (mêhebel) significa, basica mente, “um sopro de ar/vapor”; é com frequência usado de forma me tafórica para aquilo que não tem permanência. A metáfora de adquirir dinheiro de um vapor sugere aquilo que chamamos, em nossa língua, de “dinheiro fácil”, incluindo meios como a tirania, a injustiça, a extorsão, mentiras, golpes de sorte, à custa de outros. Plõger afirma que a rique za que foi adquirida do nada atrai sobre si suspeitas de ter sido conse guida ilegalmente.76Em vez desses métodos “volúveis”, Provérbios pres creve os métodos substanciais da paciência, diligência, prudência, ge nerosidade e fé, virtudes testadas e aprovadas pelo tempo. Definham (yim 'ã() é um denominativo de ma'at, que indica “ser pouco”, com o sentido de tamanho pequeno (10.20; 13.11) e/ou pouca duração (5.14; 6.10). O termo qãbas em mas aquele que ajunta (weqõbes) significa, neste caso, “coletar/colher”, não “reunir/agregar”, seu sentido mais fre qüente.77 O objeto implícito “riqueza” é omitido no verseto B com os dois verbos. No hebraico pós-bíblico, com a ('al veja Ed 8.33) mão (yãd 1.24) indica “gradualmente”, o sentido aparente neste caso. A situação simboliza um acúmulo lento, pequeno e contínuo de riqueza, 76. Plõger, Sprüche, p. 160. As versões antigas refletem a mesma interpretação. A LXX acrescenta ilegalidade. A Targ. parafraseia, “uma fortuna obtida pela perversidade”, e a Sir., “riqueza adquirida injustamente”. Driver (“Hebrew Notes on Prophets and Proverbs”, JTS 41 [ 1940] 162-75) sugere corrigir mihebel para m ehubbül, “se valeu dc um ardil”. 77. Sawyer, Tl.OT, 2:1100, s.v. gb$.
um punhado de cada vez, e não por um “golpe de sorte”. Esse equiva lente de “mão diligente”, em contraste com “mão negligente” no versí culo 4, sugere aplicação e paciência. A Vulg. parafraseia: “mas aquilo que é juntado pouco a pouco com a mão”. A LXX entendeu que a expressão significa alguém que junta “mediante piedade”, a Targ., como “e dá para os pobres” e a Sir., como “justamente”. É provável que as três virtudes - “piedade, generosidade e retidão” - e várias outras, estejam envolvidas no ato de ajuntar “na mão”. Esse provérbio descri tivo não explica por que a riqueza juntada rapidamente definha e o trabalhador paciente aumenta [sua riqueza] (yarbeh; veja 4.10).78Mas a brevidade da riqueza obtida indevidamente e a duração da riqueza obtida honestamente são indicadores do caráter e valor dos perversos em contraste com os retos. “E provável que se trate de uma referência aos gastos descuidados com luxos, dissipação, especulação e empreendi mentos ilegais...; e, entretanto, a diligência legítima será acompanhada de cautela e economia.”79O provérbio tem paralelos em 12.11; 20.21; 28.22. d. Satisfação mediante a sabedoria versus a frustração medi ante a insensatez (13.12-19) O inclusio que forma a estrutura externa “desejo satisfeito/que se cumpre” declara o assunto desta unidade parcial (vs. 12b, 19a). O in clusio que forma a estrutura interna que se refere a aceitar ou a des prezar “a palavra [inspirada]” do mestre sábio, bem como o seu “man damento”, a sua “instrução” e “correção” declara seu complemento (vs. 13, 18). Ter os seus desejos satisfeitos é, em si mesmo, uma árvore de vida, mas a fim de gozar desse fruto é preciso antes ter um anseio pelos ensinos do mestre sábio, que são uma fonte de vida. O apetite saudável dos sábios e retos é recompensado com cura e vida, mas o apetite doentio dos insensatos provoca morte e desgraça irremediáveis. A “palavra inspirada” e o “mandamento” (v. 13) são definidos mais detalhadamente como “o ensino do sábio” (v. 14a). Quem o aceita é “prudente” (tem “bom julgamento”; v. 15a) e “astuto” (v. 16a), mas 78. Cp. 12.11; 28.22. Amen. 9 .1 6-10.7 e Jerem ias 17.11 tam bém afirm am que a riqueza obtida sem virtude desaparece rapidam ente. “C om o foi adquirida, assim tam bém foi perdi da” (SW L , 695, citad o por M einhold, Sprüche, p. 221). O provérbio co rrespondente em nossa língua é “O que vem fácil, vai fácil” . 79. Toy, Proverbs, p. 268. Mas Toy faz uma contraposição nociva entre retribuição divina e virtu de e vício hum anos. A teologia correta afirm a que Deus executa seu plano por m eio do caráter humano, nâo de modo independente dele (veja pp. 120-124).
quem o despreza é “traiçoeiro” (v. 15b) e um “tolo” (“insensato” v. 16b). Os primeiros são recompensados com os desejos do coração vida eterna (v. 14), favor diante de Deus e das pessoas (v. 15a), prote ção (v. 16a) e honra (v. 18b), mas os últimos caem em laços mortais (v. 14b), destruição (v. 15b), desonra pública (v. 16b), pobreza e desgraça (v. 18a). O provérbio acerca do mensageiro perverso e do fiel (v. 17) parece fora de lugar neste contexto, sugerindo que funciona como um exemplo do destino dos perversos e dos cuidadosos; os primeiros perecerão por meio de seu mal, enquanto que os últimos trarão cura para todos. 12 Este provérbio que estrutura a unidade parcial também funciona como um janus com o versículo 11. Os dois ditos contrastam a riqueza acumulada lentamente pelos retos com as expectativas frustradas dos perversos. A diminuição gradual da riqueza dos perversos provoca, por fim, um coração frustrado e doente (vs. 1la, 12a), mas o acúmulo de riqueza dos retos se toma uma árvore de vida para eles (vs. 11b, 12b). O provérbio contrasta os efeitos das expectativas não cumpridas dos ímpios com os desejos satisfeitos dos piedosos. Expectativa (tôhelet; veja 10.28; 11.7) indica uma mudança do infortúnio observado para a felicidade. Adiada (m emuSSãkâ) não implica num cronograma revisa do, mas numa extensão interminável de tempo.80Essa situação exterior desesperadora debilita o coração (lêb\ veja pp. 141-142), o centro do qual fluem as energias física, psíquica e espiritual para o restante do corpo. Os elementos determinantes do contexto podem delimitar o âmbito bastante amplo de faz... adoecer (mahfllâ) à impotência física e/ou mental, enfermidades físicas e/ou lesões (cp. 23.25).81 Aqui o paralelo antitético sugere que o indivíduo frustrado sofre uma perda de ânimo. Uma vez que seus verdadeiros anseios nunca são satisfeitos, ele cam baleia resignado e desesperado até sua morte. Contrastando com isso, os desejos satisfeitos dos retos são como comer o fruto da árvore da vida (cp. 13.25). Um desejo (ta’awâ; veja 10.24b) indica uma aspira ção arraigada profundamente na personalidade do indivíduo e que o conduz a um estado desejado (13.12). Satisfeito (bã’â\ veja 1.26) tra 80. MBSak ocorre 36 vezes, com exceção de seis, todas no Q al e significa, essencialmente, “puxar” (i.e., “ fazer se m over em determ inada direção através de um a força de tração ou com o que através desta”). Adquire nuanças específicas, com o “ puxar para cim a” (= “ levantar”; Gn 37.28), “puxar para dentro" (= “associar-se” com ; Sl 28.3), “ puxar para fora” (= “estender"; Sl 109.12; Jr 31.3). As três formas dc uso do Pua! indicam o sentido passivo factitivo “estender”, quer em termos espaciais com o um corpo estendido = “alto” (ls 18.2,7) ou em term os tem porais, com o uma expec tativa estendida (i.e., adiada, postergada). 81. K. Seybold, 7Ü 07', 4:402, s.v. h a l a h .
duz o verbo bô “vir/entrar”, usado com frequência em Provérbios para a concretização das conseqüências apropriadas a uma causa. A metá fora uma árvore de vida Çês hayyim; veja 3.18) funciona como a antítese para a enfermidade; o indivíduo é transferido da esfera da en fermidade e morte para a esfera da saúde e vida. O fruto dessa árvore revitaliza as energias, renova a coragem para viver e planejar o futuro e estende a vida para sempre. Apesar do provérbio não apresentar termos éticos, exerce, com o versículo 19, a função de moldura ao redor dos versículos 13-18 e sugere que se tem em vista o sábio e o reto. Além disso, um desejo mau jamais poderia ser equiparado à árvo re de vida. As esperanças dos retos podem ser adiadas por algum tem po, mas seu coração não adoece, pois sabem que o S e n h o r cumpre suas promessas. Ainda que sejam provados, nunca são decepcionados em sua fé (cp. Gn 15.3 com 21.3-6; S l 137 com 126; Lc 2.25-30 com Ag 2.7; cp. Mt 13.16, 17; Lc 24.41; At 12.12-16). O provérbio é um indicador de vidas que estão rumando para desesperança final de toda a expectação na morte ou para uma satisfação de todos os desejos na presença eterna do S e n h o r (Rm 8.19,23-25; ICo 15.51-54; 2Co5.1-4; Hb 10.37,38; Ap 22.7, 12,20). 13 Este versículo emprega a descrição do déficit ou benefício ps cológico de se ter as expectativas de um futuro melhor frustradas ou satisfeitas com a teologia de que esses estados dependem da rejeição ou da aceitação dos mandamentos inspirados de Deus. O provérbio contrasta a ruína daquele que despreza (bãz ; veja 1.7) a Palavra de Deus com a recompensa daquele que teme (yãrê'; veja 1.7) seu man damento (miswâ; veja 1.8; 3.1). Dãbãr, traduzido como uma palavra [inspirada], pode significar “assunto/questão”, o seu sentido em 11.13 (cp. 18.4) e preferido pela LXX, que traduz, “aquele que despreza uma questão”.82A Vulg. também considerou esse significado e interpretou o versículo como uma afirmação de que o indivíduo não deve desprezar coisa alguma, “pois ele se compromete no futuro” em vez de ter paz. No entanto, é mais provável que signifique “palavra” de acordo com bãz (cp. 15.31 ).83 O paralelo no versículo 13b, “mandamento”, seguido de “ensino do sábio” (v. 14a) não deixa dúvidas quanto a esse sentido. Esses termos associados matizam “palavra” com o significado mais específico “palavra inspirada”. Fichtner acredita corretamente que se 82. De acordo com BDB, p. 183, s.v. dabSr. 8 3 .G M ayer, TD O T,3:W 7,s.\.dãbãr.
refere à Palavra de Deus.84 Em Deuteronômio 30.11 e 14 o “manda mento” do S e n h o r e a “palavra” do S e n h o r se referem à mesma pala vra divina, e em Provérbios 16.20 “palavra” é seguida de uma bênção para aquele que confia no S e n h o r . O fato de que o “mandamento” deve ser temido (v. 13b) também sugere que se tem em vista a Palavra de Deus. No entanto, a linha divisória entre a Palavra de Deus e a de Salomão é atenuada, pois Salomão é o porta-voz de Deus (veja pp. 129-132). O singular pode indicar qualquer palavra em particular. Se apenas uma palavra for desprezada ou apenas um mandamento for temido, será recompensado como o desprezo ou cumprimento de toda a instrução.85 Será arruinado por ela traduz yêhãbel lô (lit. “se toma rá um devedor para ela”).86A metáfora incompleta provavelmente apre senta os incorrigíveis que desprezam a Palavra de Deus, considerandoos culpados e obrigados a pagar sua dívida por ocasião do julgamento, pois o S e n h o r cumprirá o seu plano moral inviolável, segundo o qual os atos perversos redundarão em conseqüências lamentáveis (Ex 5.2; 14.28; Jr 36.23-32; lPe 3.20; 2Pe 2.5; Hb 12.25). Outros provérbios deixam claro que a dívida é sua vida.87 No verseto B a palavra inspirada é chamada de “mandamento” (veja 3.1; 19.16). Ela não pode ser ignora da sem trazer sobre quem a ignora a ruína infligida pelo soberano go vernante moral do universo (2.1; 3.1; 7.1; 10.8). Seu mandamento visa conformar aquele a quem se dirige com a ordem moral, na qual os atos retos redundam em conseqüências benéficas. O pronome tautológico ele (h ü ’) enfatiza exatamente essa pessoa. Será recompensado (^Sullãm ; veja 11.31) em antítese com “será arruinado”, tem seu sen tido positivo de receber a recompensa justa. A honestidade e a integri dade do S e n h o r exigem que ele sustente a ordem moral e cumpra as suas promessas. Contrastando com isso, aqueles que o temem temem 84. C itado por M ayer, TDOT. 3:109, s.v. dõbSr. 85. De acordo com W engrov, Malbim on Mishley, p. 135. 86. A raiz do Nifal excepcional é controversa. A Targ., a Sir. e algum as versões modernas acreditam que o verbo é II h sb a l (= III em HALOT) “ ser destruído"; sendo que o lamede costum a ser entendido com o reflexivo. Uma vez que no Qal essa raiz indica “ com portarse de m odo corrupto" e no Piei, “destruir”, essas versões corrigem o texto com frequência para o Puat, que ocorre duas vezes no AT. Outros, porém, afirm am que sua raiz é I hsbal (= II em HALOT) “se tom a penhorado a ele” . HALOT (1:285, s.v. hãbal) usa ora uma raiz, ora outra, apresentando “se dará mal” ou “um penhor é tom ado dele” . Aqui, há pouca diferença de sentido, pois o prim eiro é en tendido com o uma m etáfora, “ ele se to m ará devedor de m odo a pagar a pena” . 87. A LXX insere o provérbio: “ Um filho astucioso não terá nada de bom, mas um servo sábio terá atos prósperos, e seu cam inho será dirigido corretamente” .
a sua revelação, serão recompensados por guardarem a ordem moral apresentada pela diretriz inspirada (Sl 119.161,162). 14 Assim como “ensino” (tôrâ)e “mandamento” (miswâ )constituem paralelos em 3.1, aqui são quebrados para ligar os versículos 13 e 14. Em 14.27, que é idêntico em todos os sentidos a 13.14, “temor do S e n h o r ” (cp. v. 13b) é substituído por “ensino do sábio” (v. 14a), implicando uma ligação entre “ensino do sábio” e “aquele que teme um mandamento”. Tendo em vista a ligação entre os dois versículos, pode-se inferir que a dívida a ser paga por desprezar a Palavra de Deus (v. 13a) é a morte (v. 14b), e a recompensa oferecida por temer sua palavra inspirada (v. 13b) é a vida (v. 14a), o desejo do coração. Esse provérbio sintético defende o ensino inspirado deste livro ao declarar que ele provê a vida abundante (v. 14a) que salva da morte certa (v. 14b). O ensino (tôrâ; veja 1.8) do sábio (hãkãrn; veja p. 145) é retratado como uma fonte (meqôr; veja 5.18) de vida (hayyim; veja pp. 158-161) que jorra do solo ao longo do caminho repleto de armadilhas letais. Fazendo... desviar (lãsür; veja 3.7) expressa uma cláusula de resultado (“de modo que...”, [NJPS, NIV, NRSV]) ou uma cláusula de propósito “([o ensino é dado] para...)”.88 A Vulg. mantém a ambigüidade com ut “este”. O objeto pessoal omitido, sábio, é fornecido pelo prólogo, em que o filho e os ingênuos são admo estados a se tomarem sábios ao temerem ao S e n h o r e se apartarem do mal (veja 3.7). Aqueles que se desviam do mal são sábios (14.16). Dos laços (mimõqeSê; veja 12.13) da morte (mãwet; veja 10.2) é um mito e/ ou expressão idiomática quebrada como “árvore de vida”. No primeiro caso, é derivado de um mito no qual a morte, como um caçador ou passarinheiro, esconde suas armadilhas para capturar e matar os incautos, mas na Bíblia o mito funciona como uma figura estática para os perigos mor tais (Sl 18.5[6]; Pv 21.6). A fonte representa a vida abundante na comu nhão com Deus por meio do ensino inspirado deste livro (veja 2.1 -8), e as armadilhas representam os vários agentes letais - os discursos, atos maus, homens e mulheres perversos - que capturam e matam o ingênuo des comprometido e o insensato obtuso. Mediante o seu estilo direto e sua excelência moral o ensino do sábio atrai as pessoas para que bebam da verdade vivificadora. Em decorrência disto elas percebem as armadilhas ocultas e são fortalecidas de modo a resisti-las. Existe somente uma fon te de vida, mas muitos laços de morte (cp. 2Tm 2.24-26). 88.
M. Lyons, “ R ash i's Commemary on the Book o f Proverbs” (graduação para rabino,
1936), p. 74.
15 Em 16.22 a prudência é comparada a uma fonte de vida, suge rindo uma ligação entre a prudência em 13.15 e a fonte de vida no versículo 14. O ensino do sábio é uma fonte de vida, e aquele que dá atenção à sua instrução e bebe dessa fonte adquire uma percepção moral tão aguçada e ação tão apropriada que obtém o favor de Deus e da humanidade, um desejo do coração, em contraste com os traiçoeiros que perecem. Ao modificar “prudência” (áêkel; veja 1.3) - traduzida aqui como julgamento - com o adjetivo bom ((ôb; veja 2.9), o provér bio ressalta uma clareza moral particular e excepcional para perceber o curso de ação apropriado para promover vida. Obtém ou produz (yitten; veja 1.4) emprega nãtan, que significa mais amplamente “dar”, com uma nuança particular, “produzir”, “ocasionar ou causar”, “realizar”.89 Delitzsch sugere que, em contradição com yim sã ' (“encontrar”, “ob ter” para o possuidor; veja 3.4), “[Nãtan] remove de modo geral um muro de separação e aproxima os homens uns dos outros”.90 Favor (,hên; veja 1.9) indica ser agradável e atraente para os outros, suposta mente para Deus e para a comunidade. Mas enquanto o sábio obtém o favor de Deus e da sociedade e, portanto, permanece, o caminho (wederek; veja 1.15) dos traiçoeiros (b õ ^d im , ou desleais; veja p. 165) termina num beco sem saída. Conduz à traduz o yittên omitido para completar em nossa língua a expressão sobre o “caminho” e sua destruição Çêdãm; veja n. 29). A antítese sugere que “boa prudência” e deslealdade são características incompatíveis, e que obter o favor de Deus e da humanidade é o oposto de ser destruído (cp. Rm 14.18). José (Gn 39-41), Samuel (ISm 2.26), Davi (ISm 18.14-16) e Daniel (1.9, 19, 20; 6.1-3[2-4], 28[29]) obtiveram favor, como também o fez nosso S e n h o r ( L c 2.52) e Paulo (At 27.43; 28.2). 16 Além de vida e estima, o coração também deseja segurança. Esse provérbio contrasta toda (kol, i.e., sem exceções) pessoa astuta Çãrüm\ veja p. 146) com um insensato ( kesil ; veja p. 167). A pessoa astuta se protege por meio [ou age com, ya'aseh be, veja 2.14] conhe cimento (bedã'at ; veja p. 125), um conhecimento que inclui ver o perigo de antemão e se refugiar (22.3) e que fala com cautela e prudência (veja 12.23). Uma vez que Jesus sabia o que havia no interior dos seres humanos, ele não confiou neles (Jo 2.23,24). Os santos buscam refugio e se protegem ao não andar na companhia de alguém que se diz irmão 89. BDB, p. 679, s.v. nãtan. 90. Delitzsch, Proverbs, p. 281.
ou irmã, mas que vive de modo imoral (1 Co 5.11); eles não estão incon sistentes das ciladas de Satanás (2Co 2.11). Pore intermédio desse co nhecimento eles alcançam seus objetivos e protegem a vida. Por outro lado, o insensato narcisista, que detesta ligar o comportamento moral às conseqüências morais, exibe neuroticamente a sua loucura Çiwwelet', veja pp. 167-168), uma metonímia para suas palavras e atos moralmen te insolentes. Pãraé, traduzido como espalha (yiprõé) aceita como ob jetos uma veste, rede de pesca, laço, e assim por diante. Aqui é usado metaforicamente com o sentido específico de “exibir”, “como um mas cate que espalha seus produtos abertamente diante dos olhares de to dos os homens”.91 Seus paralelos são “proclamar” (12.23) e “derra mar” (15.2). Pela sua antítese, “se proteger (= “se refugiar”), “espalha a loucura” implica que por meio disso ele causa a própria ruína. Entre outras coisas o insensato demonstra sua exasperação de imediato (12.16). “Se tiver a mínima chance, o insensato se faz de tolo em público.”92 17 Este provérbio compara o caráter do mensageiro perverso e sua desgraça com o enviado cuidadoso e a cura que ele promove na comunidade. É possível que eles representem o caráter e os destinos contrastantes de todas as pessoas perversas ou confiáveis, de todos que têm os seus desejos frustrados ou satisfeitos. “O mensageiro per verso corresponde a bgdym (v. 15), que é traiçoeiro, não se mostra digno de confiança e prejudica o seu empregador.”93 Seu paralelismo impreciso sugere que os perversos afligiam a comunidade (26.6), e que o valor terapêutico do enviado confiável também envolve benefícios para ele próprio. Com base em fontes egípcias, hebraicas e acadianas, A. Crown mostrou que a função e o status de um mensageiro (m a l^k), o termo usado com mais frequência para um emissário, permaneceu praticamente constante durante vários séculos e comum por todo o antigo Oriente Próximo. Os mensageiros eram treinados profissional mente segundo padrões elevados, apresentando certa facilidade na es crita e nas línguas em razão das funções diversas que exerciam, como diplomatas, soldados, agentes do rei, governadores militares, agentes de inteligência, carteiros, acompanhantes e agentes secretos usados para provocar ações ilegais em seus inimigos. “O mensageiro profissi onal devia ser corajoso e ousado e seu treinamento devia incluir o estu 9 1. Toy, Proverbs, p. 273. 92. Plaut, Proverbs, p. 154.
93. Heim, “Structure and Context”, p. 146.
do de estratégias e táticas militares.” Eles também desfrutavam de um extraordinário que lhes dava direito a um tratamento privilegia do: “Seus nomes se encontram entre os nomes de oficiais que chega ram até nós por meio da literatura”.94 Também eram autorizados a falar na primeira pessoa em nome daqueles que os enviavam; tinham de ser exatos e ao mesmo tempo flexíveis dentro dos termos de nego ciação, uma vez que algumas coisas mudavam ao longo das idas e vindas cansativas entre os remetentes e os destinatários (veja 10.26).95 Uma vez que o S e n h o r sustenta a ordem moral, o mensageiro p e rv e r so ( rã S ã '; veja p. 164)p erece (y ip p õ l; i.e., se lança na ruína; veja n. 31 ) p elo m al (r ã '), provavelmente um jogo de palavras sobre o seu mal moral e a calamidade que lhe sobrevêm (veja 1.16). O mensageiro que trata uma ordem que recebe e seu cliente que o envia de maneira per versa e egoísta e, deste modo, cria confusão e tensão entre o cliente e os seus destinatários cai, ele próprio, no mal que criou (cp. 2Rs 5.26, 27; Mt 25.26; Lc 16.1).96 Dentre outras calamidades ele cai em vergo nha por sua traição (veja v. 18). A representação metafórica de um enviad o (s ir )91 fie l ( v m ü n â ; ou confiável, veja p. 152) como aq uele que traz cu ra (veja 4.22) o apresenta como um agente terapêutico que refrigera aquele que o envia (25.13) e contribui para a cura de uma comunidade enferma. A seqüência de cláusulas sugere que o enviado cuidadoso pode até mesmo remediar a devastação causada pelo per verso. O provérbio não se preocupa com a questão tratada pelo mensa geiro, mas sim com a qualidade do mensageiro. O sucesso da missão do embaixador depende de sua estabilidade, integridade e escrúpulo interio res, as virtudes essenciais para qualquer serviço responsável (cp. Jó 33.2326; At 20.27; 1Co 4.1,2; 2Co 2.17; 1Ts 2.3-6). 18 Este provérbio, o segundo da unidade parcial contando do final corresponde ao versículo 13, o segundo contando do começo. Os dois relacionam a recompensa e o castigo com o ser corrigível ou incorrigí status
94. A. D. Crown, “Tidings and Instructions: How News Traveled in the Ancicnt Near East”, Jour nal ofEconomic and Social Historv ofthe Orient 17(1974) 244-71, esp. 254-66, "M essengers and Scribcs” , VT 24 (1974) 366-70. 95. M einhold, Sprüche, p. 224. 96. A literatura sapiencial egípcia proveniente das escolas de hom ens sábios em sua preparação para cargos de oficiais tam bém oferecia algum as instruções com respeito ao im portante tópico de transm itir mensagens corretam ente (veja Gemser, Sprüche, p. 59). 97. Em suas quatro ocorrências fora de Provérbios çfr é um em baixador entre as nações (Is 18.2; 57.2; Jr 49.14 [= Ob 1], Is 18.2; 57.2), apoiando a interpretação de m a l ‘S k com o sendo um oficial de cargo elevado e status real.
vel, respectivamente. O provérbio pesa ambos na balança e constata que o fim do incorrigível é a pobreza vergonhosa, enquanto que o edu cável é louvado e recebe honra e riqueza (veja 3.16; 8.18). ^4 pessoa que ignora (pôrêa'; ou despreza; veja 1.25) as restrições da instrução ( músãr ; veja 1.2) disciplinadora se depara com a pobreza (rês weqãlôn\ veja 6.11) e a desgraça (veja 11.2). A expressão composta é uma hendíadis que indica a pobreza vergonhosa. Contrastando com isso, aquele que atende (sômêr ; veja 2.8; 10.17) a correção (tôkahat ; veja 1.25) será honrado (y6kubbãd; veja 3.9). Apesar de “desgraça” no verseto A que vem da raiz “ser leve”,98 e de “honrado” no verseto B, que vem da raiz “ser pesado”, serem opostos exatos, a “pobreza” não tem um oposto claro. Uma vez que “será honrado” está em oposição a “pobreza vergonhosa”, como em outras passagens, a honra implica ri queza que dá ao indivíduo importância social (cp. 3.9; 4.8; 8.18). A pobreza tem muitas causas: preguiça (10.4,5; 12.24; 13.4; 15.19; 19.15; 20.4, 13; 21.25), amor ao prazer e ao luxo (21.17; 28.19), uma tendên cia de falar em vez de trabalhar (14.23), perversidade em geral (13.25) e vileza (11.24). Este provérbio aponta para um problema mais funda mental, a saber, a recusa, como do cavalo e da mula (Sl 32.9), em ouvir as instruções e corrigir essas falhas. A pobreza decorrente do fracasso moral traz desgraça, mas a pobreza com virtude (17.1; 19.1), decorren te, por exemplo, da injustiça (13.23), não é vergonhosa. Paradoxalmen te, aqueles que desprezam a disciplina formativa são disciplinados pela pobreza e pela vergonha, mas aqueles que se sujeitam a tal disciplina vinda de outros adquirem importância aos olhos dos outros. 19 Este inclusio com o versículo 12, que também funciona como estrutura, incentiva os retos em seu desejo por aquilo que é bom. Eles experimentam a alegria aprazível de ver seus desejos satisfeitos, mas os insensatos nunca têm seus apetites saciados, pois não abrem mão do mal em troca dessa alegria. A única antítese exata de seus versetos quanto ao conteúdo e som é entre “agradável” te'erab (v. 19a) e “abominação” (= repugnante) tô'abat (v. 19b) - observe a seqüência de três das suas quatro consoantes. Fora isso, os paralelos são imprecisos. O versículo 19a apresenta fatos psicológicos, e o versículo 19b, fatos éti cos. Estes devem ser estendidos de forma antitética entre si. O desejo que é realizado e é “doce para a alma” tem uma inclinação que detesta o mal, mas uma vez que para o insensato é repugnante deixar sua impi 98. Qõlôn é constituído da raiz qalal “ser leve” e do sufixo -ôn, formando um substantivo abstrato.
edade e imoralidade, ele jamais experimentará essa gratificação agra dável. Essa extensão é validada por outras considerações. Em primeiro lugar, convém observar as semelhanças dos versículos 19a a 13.12b, nos quais a expectativa correspondida era uma “árvore de vida”. Em segundo lugar, versículo 25a assevera explicitamente que é a pessoa justa que tem seus apetites satisfeitos. Por fim, outros provérbios afir mam que o S e n h o r satisfaz somente os desejos dos retos (10.3,4; 11.23; cp. 14.16a; 16.17a). “A primeira linha se aplica, com qualquer perma nência que seja, somente a um objeto digno: compare Isaías 53.11 com Salmo 106.15; Eclesiastes 2 . 1 0 , 1 1 Uma vez que um desejo (to10wat; veja 13.12b) encontra-se em antítese imprecisa com “apartar-se do mal”, as versões antigas qualificaram “desejo”. A LXX e o Siro-Hexaplar substituíram “o desejo do piedoso” por “o desejo que se cumpre” e a Targ. e a Sir. leram n aw a como “agradável”, “bom”, “apropriado”, em vez de nihyâ, “que se cumpre”. Que se cumpre100 (nihyâ) é um sinônimo de bã'â em 13.12b; em Ezequiel 21.12( 17) e 39.8 os dois particípios também são usados de forma sinônima. O desejo realizado é agradável (te'erab; veja 3.24) para a alma (nãpeS; veja p. 140). To dos os seres viventes têm um anseio por vida, mas o insensato compla cente jamais terá o seu apetite satisfeito, pois ele anseia por vômito (26.11). Apartar-se do mal (sür mênã'\ veja 3.7) é uma abominação (tô'abat; veja 3.32)para os insensatos (kesilim ; veja p. 167). Somente os insensatos preferem a morte em vez da vida (v. 14), destruição em vez de favor (v. 15), perigo em vez de segurança (v. 16), perdição em vez de cura (v. 17) e pobreza vergonhosa em vez de dignidade social (v. 18). Sua natureza, que os inclina a desprezar a palavra inspirada do sábio, os aliena de um relacionamento com o S e n h o r da vida, o único relaciona mento que é verdadeiramente gratificante e que sustenta a vida (Sl 17.15; 42.1). Se mudassem sua atitude para com Deus, deixariam de lado o seu comportamento repulsivo para com a humanidade (3.7; 16.6). Sem rege neração, “até mesmo a ideia de que deve se comportar de qualquer outra maneira é impensável para ele; na verdade, é uma abominação (13.19), pois ele acredita que acabará com sua diversão (10.23)”101(cp. 15.21). O desejo de Balaão, “que eu morra a morte dos retos” (Nm 23.10), teria sido “agradável para a sua alma” em seu cumprimento, mas para ele era 99. Kidner, Proverbs, p. 104. 100. Um Nifal ptep. dependente relativo da raiz hãyá que, nessa forma, designa o vir a ser ou a ocorrência de algo, não o mero ser ou existir (H. Ringgren, TDOT, 3:376, s.v. hSyãh). 101. Aitken, Proverbs, p. 100.
uma abominaçâo deixar “o prêmio da injustiça” (2Pe 2.15). A diferença entre os apetites e destinos dos sábios e dos insensatos é tão grande quanto o abismo que separa o céu do inferno (cp. 29.27). Em resumo, a vida de uma pessoa depende da satisfação dos seus apetites e necessida des mais básicas. O insensato frustrado cambaleia de fracasso em fra casso, mas o reto satisfeito cresce de força em força. e. O futuro abençoado de um filho sábio versus o fim nocivo dos insensatos (13.20-25) Depois de um versículo introdutório que chama o filho a se juntar aos sábios para evitar os estragos provocados pelos insensatos (v. 20), a última subunidade trata da questão do bem e do mal. O versículo 21 declara a proposição: o mal persegue o pecador até a morte que o espera no final, mas a bondade recompensa o reto implicitamente até o fim. Nesse ínterim, as pessoas boas passam sua riqueza adiante como uma herança, de geração em geração, e, por fim, os pecadores perdem tudo (v. 22). Num padrão alternado, o versículo 23 matiza o versículo 21 ao observar que a tirania acaba com a abundância de alimentos disponíveis para todos, e o versículo 24 matiza o versículo 22 ao obser var que o patrimônio é transmitido com sucesso por meio da disciplina firme. O versículo 25 completa a unidade garantindo novamente que, apesar da tirania no presente, no final os retos terão todos os seus apetites satisfeitos e os perversos morrerão de fome (veja 10.2, 3). Os versículos estão ligados por paronomásia. Na verdade, o versículo 20 é um janus, pois está ligado ao provérbio anterior pela palavra-chave tsilim (insensatos, vs. 19b, 20b) e por um jogo de palavras com rã' “mal” (o mal moral, malus, v. 19b; e o mal/dano material, malum, v. 20b). A palavra-chave h f , “pecador” é um jogo com tôb, “bom” (bonum [bem material]; v. 21b, bonus [bem moral]) ligam os versículos 21,22. Um jogo de palavras com okêl/okel (“alimento”, v. 23a, e “aquele que come”, v. 25a) mostra o padrão alternado observado por Garrett, apresentado aqui com algumas modificações: A Uma herança material (v. 22) B A fome decorrente da perversidade (v. 23) A’ Uma herança moral (v. 24) B’A fome dos perversos (v. 25)102 102. D. Garrett, Pmverbs , p. 139. Em função da estrutura com plexa dos provérbios, o v. 22 forma um par com o v. 21 e tam bém alterna com o v. 24.
Além disso, 'õkel/'õkêl forma uma estrutura ao redor do versículo 24, o último provérbio educativo. Essa estrutura ajuda a intensificar a aceita ção pelo filho da “instrução” (müsãr) dos pais no versículo 1 para a apli cação amorosa pelos pais da “disciplina” (müsãr) no final do capítulo. 20 Uma admoestação rara que ordena ao filho andar com os sábios e não com os insensatos, introduz a subunidade.103Anda (hãlôk; veja n. 33) é uma metáfora incompleta para o contexto, a conduta e as conse qüências de seu estilo de vida (veja 1.15). Com ('et) indica acompanha mento (companhia e comunhão; cp. Am 3.2)'04 e implica estar “sob a instrução, encorajamento e exemplo”105 dos sábios (hakãm im ; veja p. 145). Em decorrência disso, o filho [se torna] sábio (wehãm ; veja n. 41). O verseto B apresenta mais motivações para prestar atenção à ad moestação por meio de um contraste. Todo aquele que se associa (rõ'eh) também é usado de maneira negativa em suas duas outras ocorrências em Provérbios como um paralelo antitético aos virtuosos: “que se associa com os glutões” em contraste com “quem guarda a instrução” (cp. 28.7) e “que se associa com prostitutas” em contraste com “quem ama a sabe doria” (cp. 29.3). Ele também tem um sentido negativo em seus dois usos verbais: andar com um irascível (22.24) e o companheiro de Sansão que, posteriormente, se casou com a esposa de Sansão (Jz 14.21). Com os insensatos (kesilim ; veja p. 167) implica que eles também moldam o filho, não para o bem, mas sim para o mal, estimulando seus interesses, formando suas resoluções e sedimentando seus hábitos (1.10-19; 16.29; 22.24,25; cp. Rt 1.16; 2Rs 2.4; 2Cr 24.1-16 versus 17-27; Sl 1.1; 106.35; 119.63; ICo 5.6, 7; 2Co 6.14-18; H b \0.25).106Sofre dano (yêrôa; veja 11.15) é um jogo de palavras com o substantivo rã' no versículo 19b, mas enquanto naquele versículo indicava o dano moral contra outros, aqui, a raiz verbal indica o dano contra si mesmo.107 103. Observe a assonància do term o repetido hkm no verseto A, e das duas consoantes cm rõ'eh c y ir õ a '. “eine schoene Paronom asie” (G em ser, Sprüche, p. 64). 104. IBHS, p. 195, P. 11.2.4. 105. Bridges, Proverbs, p. 164. 106. Com respeito a b u scar a com panhia dos sábios, Ben Sira instruiu: “ P erm anece na assembleia dos anciãos. Quem é sábio? Apega-te a ele! Estejas pronto para ouvir toda narrativa e não perm itas que os provérbios sábios te escapem. Se vires um homem inteligente, visita-o logo; e que o teu pé desgaste o degrau da porta da casa dele” (Eclo 6.34-36). O utros ditos expressam a mesma verdade: “Diga-me com quem andas, e eu te direi quem és” e “Te tomaras semelhante àqueles com quem andas” (citado por Meinhold, Sprüche, p. 227). “N âo cabe a nós determinar se haverá uma influência; somente qual ela será” (Bridges, Proverbs, p. 164). 107. D elitzsch (Proverbs, p. 284) acredita que, neste caso, significa malus (pejor) fie l
21, 22 O versículo 21 está ligado de forma quiástica ao versículo 22 ao colocar como os extremos de sua estrutura externa a raiz h f (“pecadores” e “pecador”) e um junto do outro em sua parte mais cen tral, a paronomásia com tôb “coisas boas” e “pessoa boa” : “pecado res... boas” : “boa ... pecador”. Desse modo o par de provérbios une os benefícios, definidos como “riqueza” no versículo 22, com as pessoas moralmente boas. 21 O provérbio trata da ligação entre os atos e o destino de um ponto de vista diferente. Normalmente um agente realiza uma ação. Neste provérbio, porém, as coisas, infortúnio e felicidade - são personi ficados como os agentes, e os objetos são pessoais, “pecadores” e “os retos”. Nesta personificação o mal que os pecadores infligiram a ou tros se volta contra eles e os destrói, enquanto que o bem que os retos concederam a outros os recompensa justamente. A dificuldade (rã'â; ou mal; veja 1.16) é personificada como um caçador. Assim como o vingador de sangue perseguia o homicida (Nm 35.19; Sl 140.11 [ 12]), o mal feito a outros persegue (t?raddep\ veja 11.19), vai ao encalço, alcança, captura e destrói os pecadores (ha(fã’im ; veja 1.10). O mal que eles perseguiam (veja 11.19; 12.11) a fim de satisfazer seus apeti tes exagerados e depravados, agora se volta contra eles para caçá-los até a morte.108 É nesse sentido que a arte grega dá asas a Nêmesis. Em contraste com isso, as coisas boas (fôb; lit. “bom”; veja 13.2) são personificadas como um benfeitor que recompensa (y^Sallem; veja 13.13; cp. Gn 44.4) os retos (saddiqim; veja pp. 149-150; cp. Sl 23.6). Os benefícios vivifícadores que os retos concederam a outros, agora os recompensam com esses mesmos benefícios. “Nem mesmo o menor bem, ‘ainda que seja um copo de água fria a um destes discípulos’ (Mt x.42) ou honra demonstrada para com seus servos (Mt x.41; 1Rs xvii. 1623) - ‘perderá sua recompensa’ (Hb vi.10).”109 22 O bem que os retos experimentam (v. 21 b) é duradouro, trans mitido de uma geração para outra (v. 22a), e o mal que destrói os peca dores (v. 21a) transfere as riquezas que estes acumularam para as mãos dos retos (v. 22b; cp. G n 3 1 .9 ,16; Êx 12.36; 20.6; Js 11.14; Et 8.1, “ faz m al” , cm contraste com maio afficieiur, “sofre um m al" em 11.15; o m ais provável, porém , é que haja um significado uniform e, e ele nâo explica o uso da raiz Nifal. 108. O relato bíblico está repleto de exem plos da verdade desse provérbio (Gn 4.10-13; Js 7.20-26; Jz 9.24, 56, 57; I Rs 21.19; 22.38; 2R s 9.26; etc.). 109. Bridges, Proverbs, p. 166.
2; Jó 27.17; SI 105.44). Tôb, a última palavra no texto original do versí culo 21, se refere ao bem material (bonunt), enquanto que a primeira palavra no texto original do versículo 22 se refere a uma pessoa boa (bonus). A pessoa que age de acordo com o fim para o qual foi criada, dá [riqueza] como herança (yanhll; veja 3.21) aos seus netos (benêbãnim; lit., “filhos dos filhos”),110indicando que a herança da família é duradoura, passando de uma geração para a outra. Hayil, traduzido como riqueza, tem aqui o significado essencial de “força” ou “poder” e funciona como uma metonímia para toda e qualquer propriedade de valor (veja 12.4). A riqueza coloca o indivíduo na circunstância favorá vel de ser capaz de ajudar outros, mas a riqueza de um pecador (hô(ê'; veja 1.10) é armazenada (sãpün ; veja 2.1) para a pessoa reta (saddiq ; veja pp. 149-150). Sâpan implica que o pecador acumulou sua riqueza para algum propósito específico. Sua intenção era que ela satisfizesse sua ganância, mas sob a providência é ironicamente armazenada para aqueles que servem ao reino universal de Deus. O provérbio pressupõe que os perversos têm sua riqueza enganosa por algum tempo e que a retribuição não está estritamente ligada a uma ordem temporal. Também toma por certo que uma família “boa” conseguirá passar adiante seu patrimônio (cp. 1Rs 21.3). Contrastando com isso, “os filhos indisciplina dos do pecador normalmente acabam desperdiçando sua herança”.111 Mais cedo ou mais tarde, a riqueza de todo pecador será transferida para as pessoas retas, com as quais permanecerá para sempre (2.20-22). 23, 24 Estes dois provérbios qualificam os versículos 21, 22, res pectivamente. A tirania fora da família impede que o princípio da retri buição se concretize com precisão matemática, e a disciplina baseada no amor entre as gerações garante a transmissão bem-sucedida da riqueza dentro da família. 23 Sem fazer menção direta do S e n h o r , o provérbio ensina que ele proveu a terra e seu povo de tal maneira que há alimento em abundân cia para o pobre diligente, mas por vezes os tiranos dissipam os alimen tos/os pobres por meio da injustiça. O campo não arado ( nir ) é usado em outras duas ocasiões (Jr 4.3; Os 10.12).112 Os campos das pessoas pobres (rã'sim\ veja 10.4) podem ser os campos escassos e marginais 110. H. Haag, TDOT, 2: 150, s.v. bèn. 111. Elmslie, citado por Cohen, Proverbs, p. 85. 112. BDB, p. 644, s.v. 1nir. A expressão “a lavoura dos pobres” para outros proprietários não tem apoio filológico nem contextual (pace Cohen, Proverbs, p. 85).
dos pobres ou a terra que um proprietário deixou sem arar e sem usar durante o ano sabático para que os pobres pudessem retirar alimentos dela(Êx 23.10,11; Lv25.1-7), uma lei que Israel não observava corre tamente (Lv 26.34,35,43; 2Cr 36.21; Ne 10.31 [32]). De qualquer modo, até mesmo os campos não arados rendem alimentos em abundância. O problema dos pobres não é a criação de Deus, mas sim a injustiça. O provérbio pressupõe que os pobres em questão trabalham arduamente ajuntando fartura de alimento (rob-^kel, uma abundância de grãos). Talvez assim como José armazenou um suprimento de víveres durante os sete anos produtivos nas cidades-celeiro (Gn 41.35, 36), os pobres também armazenavam alimentos durante o ano sabático. Infelizmente, há ( weyêS; veja n. 40) uma dissipação ( nipseh ; veja n. 41). A julgar pelo paralelo e a sintaxe, a expressão se refere à dissipação de alimen tos, mas é possível que os pobres também estejam em questão. O ver bo é uma metáfora para a destruição violenta: de Ló com Sodoma (Gn 19.15, 17), de Israel com Coré (Nm 16.26), de Israel por seus inimigos (ISm 12.25), de Davi por Saul (ISm 27.1) e de Israel pela espada (1 Cr 21.12). Em Isaías 13.25 se refere de modo excepcional a ser captura do, mas nunca é usado de maneira neutra para ser acumulado.113 Por meio da (be) injustiça (lõ ' miSpãf, veja 16.8) significa que a tirania é o agente que furta o alimento que os pobres obtiveram honestamente por meio do trabalho árduo. De acordo com esse provérbio, a falta de ali mento para os pobres diligentes se deve à tirania, não ao meio ambien te. “Os pobres, sempre os tendes convosco” (Mt 26.11) pois sempre haverá pessoas em pobreza e tiranos que roubam o alimento abundante que deveria sustentá-las. Este provérbio apresenta um corretivo salutar a uma interpretação e aplicação simplista do princípio de retribuição declarado nos provérbios anteriores. A injustiça existe nos dias de hoje, projetando o princípio de retribuição para um futuro que pode estar além da morte física. 24 A motivação pedagógica do S e n h o r , que é amor, e seu método de castigo ponderado (veja 3.12; 11.31; cp. Dt 8.5; Ap 3.19) também são úteis para os pais (Hb 12.7)."4 Aquele que retém ( hôéêk ; veja 10.19; 11.24) a sua vara de correção terapêutica (sibfô; veja 10.13) é
( ,
113. Pace G Bostrõm, Paronomasi i den àldre hebreiska MaschalliUeraturen LUÀ N.F., Avd. I, Bd. 23. Nr. 8; Lund, 1928), pp. 65-66. 114. As sibilantes lé-è-si, com a assonância de lol dão coesão ao dito: hô&k Sibpô éônê' b e n ô u f i ^ h r b ô S ih ar ô m ú s õ r .
aquele que odeia (s ô n ê veja 1.22) seu filho (benô; veja 1.8). Mas aquele que o ama (we 'õhabô\ veja 1.22), a despeito das dificulda des envolvidas o busca diligentemente (siharô; veja 1.28; 7.15; 8.17; 11.27) com disciplina (müsãr; veja 1.2). Os pais amorosos (veja 1.8; 10.1) procuram corrigir as faltas de seus filhos porque, como a unidade anterior mostrou, o que está em jogo é a vida, o favor, a proteção, a cura, a dignidade e a prosperidade de seus filhos. Os pais desamorosos dão as costas para os filhos e os entregam à morte, à ruína social, à exposição pública, à calamidade e à pobreza vergonhosa (13.14-18). Em resumo, como esta subunidade resume a questão, os pais amorosos buscam diligentemente o bem dos filhos; os pais desamorosos mostram seu desprezo pelos filhos entregando-os ao mal. O provérbio está base ado em várias pressuposições. Em primeiro lugar, que o lar é a unidade social básica para a transmissão de valores (cp. Êx 20.12). Em segun do lugar, que os pais têm valores absolutos, não apenas avaliações. Em terceiro lugar, que a insensatez está ligada ao coração da criança (22.15; cp. Gn 8.21). Em quarto lugar, “que será preciso mais do que palavras para desalojá-la”.115O ditado “quem não usa a vara, mima a criança” é verdadeiro e historicamente comprovado.116O método bíblico de educa ção dos filhos é amá-los, o que implica no uso de disciplina rigorosa e na valorização da criança como uma dádiva de Deus (4.3; 31.2). Os ensinos do Novo Testamento não anulam nem substituem esse método, que não deve ser abandonado na igreja como algo antiquado (cp. Ef 6.4; Hb 12.511) nem justificado como algo culturalmente condicionado. “Um caminho árduo para a sabedoria é melhor do que um caminho suave para a mor te.”117 O fracasso do mundo ocidental apóstata em dar continuidade à prática bíblica deixou a civilização num estado de caos moral, e agora os 115. Kidner, Proverbs, p. 51. 116. No Egito, a palavra para “educar” é acompanhada do determinativo de um homem segurando uma vara (N. Shupak. “Egyptian Terms and Features in Biblical Hebrew”, Tar 54 [1984/85] 47583; [1984/85] 107). No Papiro Lansing, um manuscrito do Novo Império (1554-1080 a.C.), o aluno diz ao seu professor, “Cresci como uma criança estando ao teu lado: tu me batesle nas costas e foi assim que tua instrução entrou em meu coração” (H. Brunner, Allàgyptische Erziehung [Wicsbaden: Otto Harrassowitz, 1957], pp. 174-76). No Papiro Anastasi 111, o pupilo advertia, “O ouvido de um menino se encontra em suas costas, ele atenta para aquele que bate nele” (Shupak, “Egyptian Terms", p. 110). Ahiqar (ca. 700 a.C.), diz: “Não retém a vara de teu filho, de outro modo, não salvarás [o teu filho da perversidade}. Se eu te bater, meu filho, tu não morrcrás, mas se eu te deixar ao encaixo do teu próprio coração [tu não viverás]” (ANET, p. 428, linhas 81-82). Veja também Eclesiástico 3 0 .1, 2. 11-13. Na literatura sapiencial, tanto da Bíblia quanto do Egito, os objetos dos golpes são os jovens (22.15; 23.13), o filho (13.24), o escamecedor (19.25), o insensato (17.10; 26.3) e o falto de senso (10.13). 117. Kidner. Proverbs, p. 51.
pais odeiam aquilo que veem: “seu fim será que ele odiará seu filho, pois, no final, ele o verá partindo para atos perversos”." 8 25 O provérbio retoma o assunto da unidade parcial anterior e vê o apetite do reto (nepeS; veja vs. 2-4) inteiramente satisfeito, enquanto que o estômago dos perversos fica vazio. Trata-se de um provérbio de retribuição que mostra um sistema de recompensa e castigo, não de moderação. De modo recíproco, uma pessoa reta (saddlq; veja pp. 149-150) é alimentada de modo que também seja aquela que come ('õkê/; veja 1.31), uma função necessária para a vida, o bem-estar e a alegria (cp. 13.2; cp. Dt 12.17, 18; 14.23). Apesar da palavra ser em pregada literalmente, neste provérbio gnômico ela também pode ser usada metaforicamente para a satisfação do apetite espiritual. Por trás dessa alimentação se encontra a boa mão do Rei celestial, que dá de comer generosamente àqueles que pertencem ao seu reino (Gn 1.29) no devido tempo (SI 104.27) de modo que todos sejam saciados (v. 28). A ponto de satisfazer (leéõba'\ veja 3.10) o seu apetite (napSô; veja p. 140), que se refere às suas necessidades e desejos físicos, espirituais e emocionais (veja 13.2, 4, 19). A generosidade para com os pobres protege o indivíduo da necessidade (Pv 28.27), mas o egoísmo o faz passar fome (cp. 10.3). O ventre (be(en) indica a região inferior do abdome de um homem ou de uma mulher (Ct 7.2[3]; Os 9.11) e, mais especificamente, ao estômago que recebe e distribui o alimento (Pv 13.25; 18.20; Ez 3.3), ou ao útero (Pv 31.10; Is 46.3; Jr 1.5).'19 O ventre dos perversos (r^Saím; veja p. 164) carece [de pão] (tehsãr; veja 12.9). O verbo é, frequentemente, incoativo para a transição até essa condição, “vem a carecer”. Quando o estômago carece de pão, a implicação é que a vida do seu dono se tomou marginalizada e, a menos que a situação seja remediada, esse indivíduo morrerá. A lei mosaica também ensina que a harmonia perfeita reina entre o doador dos ali mentos e o seu povo, desde que esse seja fiel no cumprimento das suas responsabilidades pactuais (Lv 25.19; 26.3-5). A abundância de alimento indica um relacionamento correto com o S e n h o r e com a comunidade, mas uma falta de comida representa um relacionamento mal-sucedido 118. Rashi, Proverbs, p. 76. 119. Um homem também pode dizer que os filhos vêm de seu befen. A expressão idiomática hadrê “câmaras do ventre” (18.8; 20.27,30; 26.22) provavelmente vem de uma expressão egípcia, “um esquife do ventre". De acordo com Shupak (“Egyptian Terms”, 478-81) ela retrata o ventre como uma caixa dentro da qual reside o coração, i.e., a mente e os pensamentos de um homem.
(cp. 10.3; Dt 28.48,57; Jr 44.18; Ez4.17). No entanto, esse julgamento se aplica somente ao fim de uma pessoa; antes disso, as pessoas conti nuam vivendo em um mundo de cabeça para baixo (veja pp. 161 -164). “Mas quão intolerável será essa carência consciente quando uma gota de água para refrescar a língua atormentada for negada! (Lc xvi.24)”.120 6. Vivendo em sabedoria (14.1-32) 1 Quanto às sábias1 dentre as mulheres2 [cada umaP edifica a sua casa, mas uma mulher insensata4 com as próprias mãos a lança por terra. 2 Todo aquele que teme ao Senhor anda em seu ser honesto,5 mas todo aquele que o despreza é perverso em seus caminhos.6 3 Na boca do insensato está uma vara de soberba,1 120. Bridges, Proverbs, pp. 169-70. 1. Hakmôt não deve ser corrigido de modo a se harmonizar com hokmôt em Provérbios 1.20; 9.1 (pace HALOT, 1:134, s.v. hokmâ ) pelos seguintes motivos (1) O TM não pode ser descar tado justifícadamente. (2) Em contraste com a Coleção I, as outras coleções não personificam a sabedoria. (3) Na Coleção II, em todos os outros casos, o texto trata de mulheres reais (cp. 11.22; 12.4). (4) A antítese de construir e destruir não tem paralelos na Coleção I (veja também Plòger, Sprüche, p. 168). (5) Nõsim pode ter sido acrescentado para ressaltar a diferença. 2. Gen. partitivo de relação que envolve estrutura social ( IBHS, p. 145, P. 9.5.ig). Omitir nõsim para harmonizar com 14.1 a 9.1 é arbitrário (pace Gemser, Sprüche, p. 66). A LXX traz sempre o pl. no verseto A e omite o sufixo em “sua" casa, e a Sir., Targ. e Vulg. trazem o sing. 3. A mudança do tópico pl. para o verbo sing. sugere que a frase inicial serve de nomina tivo absoluto com a forma sing. sumariante esperada omitida (IBHS, p. 76, P. 4.7b). Além disso, “o pl. de pessoas... é, por vezes, combinado com o sing. do predicado, quando em vez da classe toda de indivíduos cada um deve ser representado separadamente como sendo afetado pela declaração" (GK.C, #1451 [n. I]; cp. Pv 3.18). 4. O substantivo abstrato 'iwwelet (‘‘insensatez” ) quando paralelo com o substantivo adjetival “sábio" funciona como um substantivo concreto (M. Dahood, Psalms III: 101-150 [AB; Garden City, N.Y.: Doubleday, 1970], p. 4 1 1). 5. A gramática heb. favorece que se considere como sujeito “temor do S e n h o r ” em vez de “todo aquele que anda em seu ser honesto” (IBHS, p. 132, P. 8.4.2). Os pagãos podem andar honestamente sem conhecer o S e n h o r , e o temor do S e n h o r costuma ser o tema de Provérbios (veja 1.7; 3.7; 14.16, 26,27). Uma vez que “todo aquele que o despreza” é sua antítese, essa expressão também é o sujeito de sua cláusula. 6. Gen. de lugar (IBHS, p. 147, P. 9.5.207. A correção dega ~°wâ para gêwõh (HALOT, p. 182, s.v. I gêw, e REB, NIV, NRSV), ainda que possa, talvez, ser apoiada por uma suposta corrupção semelhante em Jó, é rejeitada. ( 1 ) 0 álefe não pode ser justificado. (2) E uma versão simplificada que visa obter um paralelismo preciso, apesar dos paralelos imprecisos serem comuns em Provérbios. (3) “Vara” provavelmente implica castigo (veja Is 11.1, a única outra ocorrência da palavra).
mas os lábios dos sábios8 os protegem? 4 Sem gado a manjedoura10 permanece limpa, 11 mas há12 colheitas abundantes13 pela força de um boi. 5 Uma testemunha honesta não mente, mas uma testemunha falsa é uma perjura.14 6 O escarnecedor procura a sabedoria, e não a tem,15 mas o conhecimento é uma questão fácil para os perspicazes. 7 Sai da presença de uma pessoa insensata, porque16 não'1 terás conhecido18 lábios de conhecimento. 8. Para discordâncias gramaticais, veja n. 1. 9. A maioria dos estudiosos corrige tismúrlm para tismerüm , mas formas plene semelhantes podem ser encontradas em Êxodo 18.26; Rute 2.8. 10. Ebús é uma palavra emprestada do horeu para manjedoura, o tabuleiro tèchado para cereais (W. F. Albright, “Some Canaanite-Phoenician Sources of Hebrew Wisdom”, in WIANE, p. 11, n. 3; cp. Jó 39.9; Isaías 1.3. O denominativo 'bs significa “alimentar, engordar”, IRs 5.3; Pv 15.17). 11. Alguns (cp. HALOT, p. 1:153, s.v. II bar, Toy [Proverbs, p. 282], BHS) corrigem ebús bar para epes bar (= “nenhum cereal” [cp. 14.28]) pelos seguintes motivos. (I) II bar, que em geral significa moralmente/espiritualmente “puro”, é estendido de modo a significar fisica mente ‘‘limpo". (2) III bar (“cereal” ) oferece a antítese simples “nenhum cereal” em con traste com “colheitas abundantes” . No entanto, “uma manjedoura para cereais”, a penúltima palavra no original do verseto A, constitui um excelente paralelo com “colheitas”, a segunda palavra no original do verseto B e, lado a lado, “ limpa” br (i.e., vazia) e “abundante” rb apresentam um excelente quiasmo semântico e sonante (veja J. S. Kselman, “ SemanticSonant Chiasmus in Biblical Poctry”, Bib 58 [ 1977] 219-23). Observe, também, a assonância entre 'Sbüs e t ? b ú M. Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Philology [Roma: Pontificai Biblical Institute, 1963], pp. 30-31) cita analogias desse desenvolvimento semântico: “purus in campis arboribus puris significa ‘vazio’, enquanto um ‘navio limpo’ é uma embarcação que nâo tem coisa alguma em seus compartimentos de carga” . Também cita um análogo hebraico do uso de dBkã' em Jó 22.9. 12.0 hebraico sucinto traz: “limpa, colheitas abundantes...”. 13. 7®6ú ‘ôt provavelmente um pl. contável, não abstrato, pois a forma sing. ocorre 35 vezes e a pl., oito vezes, das quais quatro são claramente pl. (Lv 25.15, 16; Dt 33.14; 2 Rs 8.6) e quatro são ambíguas (Gn 47.24; Jr 12.13; com rob em Pv 15.6; 16.8). 14. Veja 6.19. 15. Veja 13.4. 16.0 verseto B oferece a base para a ordem do verseto A, sugerindo que o vau clausal significa causa ( IBHS, p. 385,387, P. 39.2.1c; 39.2.3b). 17. Bal com o perfectivo é uma negação afirmativa (Tromp, “The Hebrew Particle bal", OtSt 21 [1981] 285; cp. 9.13; 10.30). 18. Um futuro perfeito perfectivo (IBHS, p. 491, P. 30.5.2). Saadia (citado por Toy, Prover bs, p. 284) considera bal yãda'ta como um futuro simples, “pois tu não saberas", mas apesar disto ser possível seria de esperar uma conjugação prefixai (veja IBHS, p. 567, P. 34, n. 6; pp. 511-12, 31.6.2a). A LXX traz hopla de aisthgseõs (< kly d t), “armas de destruição". Apesar de cafe ser facilmente substituído por bete e da redivisão das palavras ser comum, “armas de conhecimento e armas de destruição” não é uma ideia apropriada, e o paralelismo antitético da LXX depende de sua leitura improvável do termo como kl, e nâo Ik. no verseto A, que diz: “todas as coisas são adversas para os homens insensatos”. A conjetura de Dahood (Proverbs and
8 A sabedoria do astuto é ter discernimento do seu próprio caminho, mas a estultícia dos insensatos é engano.19 9 Quanto aos insensatos20 cada um1[ escarnece na culpa,22 mas entre as pessoas honestas [há] favor. 10 O coração conhece a sua própria amargura,23 e da sua alegria um estranho não participa,24 11 A casa25 dos perversos será aniquilada, mas a tenda dos honetos florescerá. 12 Há um caminho que é direito segundo o julgamento de uma pessoa, mas o fim dele são os caminhos para a morte. 13 Até mesmo no riso o coração pode doer26 e o fim do regozijo21 é tristeza. 14 O apóstata2%será plenamente castigado29 Northwest Semilic Phitology, p. 31) de que y S d a tã é uma variação dialetal de *yãza'tS “fluir”, é improvável, desnecessária e inapropriada. Fichtner (BHS) corrige para r ^ ô t (‘‘mas te apressa para o companheiro de”) com potencial e Gemser (Sprüche, p. 66) para übal taddah ( ’et) ... (“e nâo rejeita os lábios instruídos”). 19. A LXX traz en planê. “faz desviar” (< m a fâ ou m a íâ ou merammâ\ veja D. W. Thomas, “Textual and Philological Notes on Some Passages in the Book of Proverbs”, in WIANE, p. 286) mas não precisa ser seguida, pois o paralelismo antitético hebraico é, com frequência, impreciso. 20. A LXX provavelmente traz oikiai paranom&n (< bty m lysym , “casa de transgresso res”) em função de haver considerado byt, nâo byn no verseto B. 2 1. Para a discordância gramatical, veja n. 3. 22. É melhor considerar 'asam (“culpa” ) como o objeto (como também fazem Targ., Sir., Vulg.), não como o sujeito (pace Delitzsch, Proverbs, pp. 213-14, que pressupõe o significado “oferta pela culpa” e pace Meinhold, Sprüche, 1:232, que opta pela personificação). O significado cúltico de 'S S S m é improvável em Provérbios, e a personificação é inapropriada. 23. Apesar de morrat scr um hap. leg., nâo há dúvida quanto ao seu significado, pois é óbvio que deriva da raiz comum mrr (cp. Êx 15.23; Dt 32.32; Pv 5.4; 27.7). Essa raiz costuma ser estendida em seus vários derivados de modo a expressar situações trágicas, emocionalmente destrutivas e aflitivas (cp. Rt 1.20). 24. II 'a rab ocorre sempre no Hitpael. Com b significa “ser misturado com” (Ed 9.2; SI 106.35); com l e ‘im “se envolver com alguém” (Pv 20.19; 24.21). 25. Sing. coletivo. 26. Apesar da conjugação prefixai normalmente ter seu conceito habitual em Provérbios, o con traste com a cláusula nominal no verseto e a experiência humana sugerem que, neste caso, tem sua nuança potencial (IBHS, pp. 127-35, P. 8.4.2; p. 506, P. 31.3e; p. 508, P. 3 1.4e). 27. Lil. “O final dele, quanto à alegria”, um acusativo de especificação (IBHS, p. 173, P. 10.2.2e). A NEB separa h de ah°rítãh e o liga a éim hâ (L. H. Brockington, The Hebrew Text o f the Old Testameni [Oxford: Oxford University Press, 1973], p. 161). Delitzsch (Proverbs, p. 216) já havia rejeitado essa correção, explicando a forma como “uma expressão da synlaxis om ata do heb.” . O TM também deve ser mantido, pois a construção incomum liga os vs. 12b e 13b. 28. Lit. “o apóstata quanto ao coração”. O significado essencial de I sú g (“apostatar”) é se
em função de seus caminhos, mas uma pessoa boa [será plenamente recompensada] por seus atos.30 15 O ingênuo dá crédito a qualquer coisa,31 mas o astuto atenta para o seu passo. 16 Uma pessoa sábia é aquela que teme e que se desvia do mal, mas um insensato é aquele que se encoleriza e todavia se sente seguro.32 mover numa direção diferente daquela que se pretendia no início. De suas 14 ocorrências no Nifal, ela aparece 11 vezes com 'ãhór ("de volta” ), na maioria das ocasiões com o sentido reflexivo “fazer a si mesmo voltar", e duas vezes na expressão (mS'ahar) “de diante [de Deus/ do S enhor ]” (Is 5 9 .13 ; Sf 1.6). Nesse grau é usado duas vezes com um sentido literal (2 S m 1.22; cp. Jr 4 6 .5 ), uma vez para a desgraça de ser obrigado a retroceder, apesar do texto ser questio nável (Mq 2 .6 ), e quatro vezes com o sentido passivo dos inimigos do salmista serem obrigados a retroceder envergonhados (SI 3 5 .4 ; 4 0 .1 4 [ 15] [= 7 0 .3 ] ; 1 2 9 .5 ). Em cinco ocasiões é usado com o sentido figurativo de “voltar atrás" em relação a Deus (S I 4 4 .1 8 [ 19 ] ; 7 8 .5 7 ; Is 4 2 .1 7 ; 5 0 .5 ; Jr 1.6; 3 8 .2 2 , em que é usado em paralelo com wayyibg^dú [“ foram inliéis”]). No Qal é sempre usado com o sentido figurativo de “apostatar", “desertar" do Senhor, sem a nuança reflexiva (SI 5 3 .3 [ 4 ] , em que é paralelo a (6b, como aqui). Neste caso o substantivo verbal abstrato tem o seu sentido concreto, pois é paralelo a ’£s (6b. L2b é um gen. epexcgético (IBHS, p. 1 5 1 , P. 9 .5 .3 c ) ou um acusativo de especificação (IBHS, p. 17 3 , P. 1 0 .2 .2 e ). 29. Lit. “será enchido", com o sentido metafórico de “será plenamente retribuído”. Os conceitos específicos de “castigar” e “recompensar" são derivados dos sujeitos antitéticos; o verbo é omitido no verseto B. 30. O termo do TM, m&ãl&yw (“de sobre ele”), foi interpretado de várias maneiras. Alguns acreditam que significa que a pessoa boa obtém satisfação de si mesma, porém Toy (Proverbs, p. 290) objeta como sendo questionável o hebraico ter esse significado e afirma que “seria contrário à maneira de pensar de Provérbios”. Cohen (Proverbs, p. 89) acredita que significa que a pessoa boa se destaca dos infiéis, mas a expressão nunca é usada desse modo c “não ofereceria nenhum contraste, ou o contraste seria indefinido” (cp. Delitzsch, Proverbs, p. 217). Meinhold (Spriiche, p. 235) acredita que 'al tem o mesmo sentido que em 7.14 e se refere àquilo que a pessoa boa tem obrigação de fazer, mas essa ideia também fornece um contraste indefinido. O provérbio contrasta a pessoa boa com a infiel, que se desvia deliberadamente do bem. O TM provavelmente pressupõe que “caminhos” também seja omitido no verseto B e emprega 'al (= “em função de”, “porque”) com o mesmo sentido causai que min (“de"). No entanto, tendo em vista a ambigüidade e a dificuldade do TM, muitos corrigem o texto de modo plausível inserindo duas letras que poderiam facilmente ter sido omitidas por haplografia e leem fàlõyw, “e dos seus atos” (cp. BDB, p. 759). Delitzsch (Proverbs, p. 217) defende a correção. (1) drkym e rrillym são palavras intercambiáveis e, de fato, um par quase inseparável (cp. Jr 17.10). (2) Isaías 3.10 (“dizei aos retos que bem lhes irá; porque comerão do fruto das suas ações [ma'allêhem]") parece quase uma paráfrase profética do verseto B. 3 1. DõbSr emprega kol com o sentido de “de todos os tipos, qualquer”, não com um sentido distributivo “cada, todo” (GKC #127b). 32. HALOT (1:120, s.v. II b(h) distingue II b(h “cair ao chão” em Jeremias 12.5 e Provérbios 14.16 em contraste com a raiz comum I b(h (“sentir-se seguro”), mas Harman (NIDOTTE, 1:649, s.v. b(h) citando Juizes 18.10; Isaías 32.9-11 e Amós 6.1, acredita que 1 b(k também é apropriado para Jeremias 12.5 e o prefere categoricamente em Provérbios 14.16.
17 Uma pessoa irritável33 comete loucura, e um intrigante34 é odiado. 18 Os ingênuos herdam35 a loucura, mas os astutos são coroados com o conhecimento. 19 Os maus se inclinarão perante os bons, e os perversos nas portas de um reto. 20 Até pelo seu próximo o pobre é odiado, mas os amigos do rico são muitos. 21 Aquele que despreza ao seu próximo36 é um pecador, 33. QPçar appayim (“curto de rosto”) é um hap. leg. (cp. veja 10.27). De acordo com M. I. Gruber (Aspecls o f Nonverbal Communication in the Ancient Near East [Studia Pohl 12/1, II; Roma: Biblical Institute Press, 1980], pp. 486-87), em 36 de suas 46 atestações 'appayim corresponde aos seus cognatos cm acadiano, aramaico e ugarítico e indica "rosto”; em quatro casos, “narinas”. Ao contrário do sing. ’ap, que também pode indicar ira em relação a raízes como hrh, o dual nunca indica “ira” (veja 14.29). O adjetivo qSçèr/qãsúr (“curto”) ocorre quatro vezes, sempre idiomaticamente e combinado com absolutos diferentes: y S d (“mão” = “curto de poder”, “fraco”; 2Rs 19.26 [= Is 37.2]); ySm ím (“curto de anos” = “efêmero”, Jó 14.1); rúah. (“curto de espirito” = “impaciente”, Jó 21.4; Mq 2.7 e a julgar também pela expressão idiomá tica nepeS com o verbo qãçar, Nm 21.4; Jz 10.11; 16.16; Zc 11.8). A Sir. traduz a expressão ímpar como “apressado”; a Vulg. e BDB (p. 894, s.v. qãsêr) como "impaciente”, o sentido de
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mas quanto àquele que mostra favor para com o pobre,31 bem-aventurado ele é. Acaso38 os que maquinam o mal não se desviam, e acaso os que planejam o bem nâo encontram bondade confiável?39 Em todo trabalho vigoroso há proveito mas a conversa fiada40 leva apenas à escassez. A coroa dos sábios é a sua riqueza,*' mas a estulticia42 dos insensatos è loucura. Uma testemunha sincera é aquela que livra vidas, mas um perjuro43 é enganador44 No temor do Senhor há forte segurança, e seus filhos têm um refúgio.45 O temor do Senhor é uma fonte de vida, desviando [os sábiosj46 das armadilhas da morte. Na multidão de súditos está o esplendor47 de um rei,
37. Q traz '*nãw tm (“oprimido”), K c versftcs antigas trazem '■ntylm (“pobre”) (cp. 16.19). “A questão de serem dois termos separados, ‘pobre’ e ‘humilde’, ou variações de uma única palavra é especialmente relevante para a interpretação de certos Salmos, mas de pouca impor tância em Provérbios” (R. Whybray, ÍVealth and Poverty in lhe Baok o f Proverbs [JSOTSup 99; Sheffield: JSOT, 1990], p. 14, n. I). 38. Perguntas polares negativas expressam afirmações veementes. 39. Lit. “e planejadores do bem, da bondade e da confiabilidade”. 40. O verbo de movimento está implícito na preposição le (IBHS, p. 224, P. 11,4d). 41. A LXX traz p a n o u rg o s (= “um homem prudente”), que Gemser adota e reconstrói como 'orm SISm , e Fichtner (BHS) como 'orm á. Schleusner (Lexicon, II, 635, col. 1, citado por J. Reider, “Etymological Studies in Biblical Hebrew”, PT 2 [1952] 125, n. 1) argumenta corretamente que a LXX leu '5 rúm pela omissão de chim em 'Srm . A LXX fornece uma antítese mais precisa para “estulticia”, mas os paralelos antitéticos são com frequência imprecisos, e perde a ligação entre “proveito” (v. 23) e “riqueza” (v. 24). Aquila e Teodócio corrigiram o grego de volta para o proto-TM. 42. Para captar a ideia, a LXX traduziu o 'wlt inicial no verseto B de modo livre e correto como hs de diatribe aphroriõn "mas os atos dos insensatos”. A Targ. traduziu o ’wl inicial como “glória” e Sir. “legado”. Toy (Proverbs, p. 302) et al. corrigem o texto para liwyai (“o diadema”). Mas em outras passagens, “diadema” (1.9; 4.9) e seus equivalentes (12.4; 14.18; 16.31) são usados em relação a virtude, e nunca a vício (Meinhold, Sprüche, p. 240) a menos que se pretenda um oximoro sarcástico do tipo “a coroa de um asno”, mas isso é contrário ao uso hebraico. 43. Veja 6.19. 44.0 substantivo abstrato tem um sentido concreto em paralelo com o substantivo pessoal adjeti val “aquele que livra” (veja 14.4,17). 45. Apesar de mahseh ser o equivalente morfológico do Hifil ptep. m ahseh, e um substantivo (veja HALOT, 2:571, s.v. mahseh). 46. A expressão “os sábios” é fornecida pois em 14.16 diz-se que os sábios temem e se desviam do mal. 47. O substantivo fem. hadrat ocorre cinco vezes e quatro delas na expressão “em vestimentas santas” (lC r 16.29; 2Cr 21.21; SI 29.2; 96.9). Apesar de “esplendor do rei” ser uma expressão
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mas ficar sem um povo enche o potentado de terror. A paciência é uma grande competência, mas o irritável é aquele que exalta a loucura. A vida no corpo todo48 é um coração calmo, mas a paixão ardente é podridão nos ossos. Aquele que oprime49 ao pobre zomba do seu Criador, mas aquele que é bondoso para com o necessitado honra a Deus.$0 O perverso è derrubado pelo seu próprio mal, mas o reto 51 se refugia52 no Senhor em sua morte}1
impar, provavelmente parte de um par de gênero com o substantivo masc. h fid ã r (“esplendor”, “majestade”, “glória”, “grandeza”). Com base nessa ligação e no antônimo m eh ittâ (“terror”/ “destruição”), G Warmuth (TDOT, 3:340, s.v. kãdhõr) diz: "a tradução em [Pv 14.28] é certa”. Pressupondo que hadrã é parte de um par de gênero com hodãr (veja n. 56), alguns paralelos sào “glória” (kfibôd, SI 21.5[6]), “poderosos feitos” (nipl3'ôt, SI 145.5), “formosura" (g®búrôt, SI 145.12), “beleza” (tip ’eret, SI 96.6; Pv 20.29), “majestade" e “glória” (gü'ôn egsbah. Jó 40.10). 48. O pl. excepcional bérym provavelmente é um pl. de extensão (IBHS, p. 120, P. 7.4.1c). 49. Ou “difamar”. O verbo ‘ãsaq ocorre 37 vezes (36x no Qal). Ninguém nega que pode ser traduzido como “oprimir" para apresentar uma situação em que o mais fone toma, direta ou indiretamente, a renda e o trabalho do mais fraco, sem dar nada em troca. Pode fazê-lo usando balanças adulteradas (Os I2.7[8]), extorsão, demonstração aberta de força (Is 52.4; Jr 50.33), pelo sistema judiciário (veja Mq 2.2; 6.9-12; 7.1-6) cm relação à realização de empréstimos e execução de hipotecas (Am 5.7, 10-17), ou ao deixar de pagar um trabalhador contratado que é pobre e precisa do seu pagamento antes do pôr-do-sol (Dt 24.14). E associado com frequência a roubar (gzl) e negar a justiça (Ez 22.29). No entanto, também pode significar “difamação”. A LXX, seguida pela Sir., traduziu o termo em Provérbios 14.31 como “difamador" e a Vulg. como qui calum niatur. Em outras versões, Áquila, Simaco e Teodócio também traduziram 'SSaq como “difamar". Alguns estudiosos acreditam que esse significado é necessário no Salmo 73.8 e em Isaías 59.13. Os dois significados se encaixam nesta passagem e um sentido duplo é apropri ado na literatura proverbial (veja J. A. Emerton, ‘“ Spring ant Torrent' in Psalm LXXIV 15”, VTSup 15 [1966] 206). 50. Lit. “ele” . 51. Uma vez que “o perverso” é claramente o sujeito do verseto A, seu paralelo antitético provavelmente é o sujeito no verseto B, como Jerônimo reconheceu (contrário à LXX, Sir. e Targ.). 52. A palavra h õ sá ocorre 37 vezes, sempre com o sentido “buscar refugio” e nunca "ter um refugio” ou “encontrar refúgio”. Em 34 ocorrências, não contando Provérbios 14.32b, é usada com referência a se refugiar em Deus ou sob a sombra das suas asas (cp. Pv 30.5). Em Isaías 14.32 os aflitos se refugiam em Sião, um termo substituto para Deus e, em Isaías 30.2, o profeta usa “buscando... abrigo, à sombra do Egito” de modo sarcástico. O significado pretendido era que o povo de Jerusalém devia buscar refúgio no Senhor. O Qal ptep. de h sk ou a ocorrência dc h sh numa cláusula relativa indica um adorador devoto, “aquele que se refugia no Senhor”. Em outras ocasiões além de Provérbios 14.32b. o Qal ptep. é usado dc forma absoluta: “Mostra as maravilhas da tua bondade, ó Salvador dos que à tua destra buscam refugio” (m ôsia hósim : SI 17.7). Uma tradução possível aqui é “salvador dos que se refugiam em ti". J. Gamberoni (TDOT, 5:71, s.v. h sh ) concorda que o Qal ptep. tem o mesmo sentido “ético-religioso” em Provérbios 14.32b que tem no Salmo 17.7. Plõger (Sprüche , p. 176) e Mcinhold (Sprüche, p. 245) chegaram, independentemente, à
A referência a uma mulher sábia que edifica sua casa em 14.1 ressoa 9.1 no prólogo, sugerindo que 14.1 também funciona como uma introdução para uma nova unidade. Esta unidade consiste tematicamente em três subunidades: andando em sabedoria (14.1 -7) e não pela vista (14.8-15), e caracterizações e conseqüências contrastando do com portamento social (14.15-32). Elas são tratadas como subunidades pois as palavras-chave e os versos de janus as combinam. A união entre as duas primeiras é tão hábil que Heim é levado a delimitar indevidamente 14.5-12 como uma subunidade separada.54 No que se refere aos temas, a primeira subunidade do capítulo 14 segue um padrão quiástico equilibrado: A Abrace uma esposa sábia, não uma insensata e tema ao S e n h o r (vs. 1 - 2 ) B O discurso insensato destrói; o discurso sábio protege (v. 3) C Aumente a riqueza por iniciativa e diligência no uso da criação (v. 4) B’ O caráter de uma pessoa determina seu discurso (v. 5) A’ Fique longe dos escamecedores e lacivos (vs. 6, 7) A/A’ A unidade é estruturada pelas admoestações implícitas para abraçar a sabedoria (v. 1) mediante a ter uma esposa sábia, não uma insensata, e a temer ao S e n h o r , o alicerce teológico da sabedoria (v. 2 ; cp. 1.7). Em termos léxicos, um inclusio é formado pelas palavrasconclusão de que YHWH é o objeto não declarado de hõseh em Provérbios 14.32b, e McKane (Proverbs, p. 475, citando Barucq) reconhece que esse é o sentido no TM. 53. Em vez de “quando ele morre”, a LXX traz t i keautou hosioíSti (“aquele que confia em sua santidade” [< betum m ô]). A diferença nas consoantes envolve a ligeira metátese de m tw (“em sua morte”) para btmw (“em sua integridade”). A LXX, “em seu mal", que ela restringe à malfeitoria, pode ser outra de suas diversas versões criativas e simplificadas para fornecer um paralelo antitético mais preciso (Lange. Proverbs, p. 143). McKane (Proverbs, p. 475) rejeita o TM pois, “Não creio que a sentença declarasse isso originalmente [uma convicção de que há vida depois da morte]”. Ele segue a LXX e traduz: “Mas aquele que confia em sua própria piedade é um homem reto", contrariando tanto as expectativas léxicas de hõseh (veja n. 85) quanto as expectativas exegéticas do livro como um todo. Provérbios encoraja persis tentemente a fé no Senhor (cp. 3.5; 18.10; 22.19), nunca a fé baseada na piedade do próprio indivíduo, e hasá nunca tem tal abstração como seu objeto. O infinitivo m ôt pode ser considerado um substantivo, “em sua morte”, mas uma vez que o sujeito está exercitando fé, é possível que se tenha em vista o processo de morrer, não o estado de morte. 54. K. Heim, “Structure and Context in Proverbs 10:1-22:16” (dissertação de Ph.D., University o f Liverpool, 1996), pp. 173-74.
chave “sabedoria”, “insensatez”, “insensata” (vs. 1, 6), e “anda/sai” (hãlak; vs. 2, 7). O padrão de avaliação negativo sintético ( - :: - ) em contraste com os paralelos antitéticos nos versículos 1-6, ajuda a con cluir a unidade. B/B’ tratam do modo de falar insensato e sábio, seus efeitos des trutivos e protetores (v. 3) e suas causas no caráter de uma pessoa (v. 5). Eles também empregam um padrão de avaliação quiástico de . O versículo 3 está ligado à introdução (v. 1) pelo padrão quiástico “sabedoria” (hokmôt), “insensatez” Çiwwelet): “insensato” (^ wil), “sá bio” (hakãm im ) e com a conclusão pelas palavras-chave “sábio” (v. 6), “insensato” e “lábios” (v. 7). C, que é o eixo, apresenta a sagacidade, a diligência e o investimen to como uma maneira de aumentar a riqueza. Como a primeira unidade e outras até aqui na Coleção II (e.g., 10.1-16, etc.), o discurso prudente e a diligência são unidos como marcas de referência da sabedoria. Uma pessoa edifica uma casa (v. 1) com base na ética associada ao temor ao S e n h o r (v. 2 ) , que implica um discurso sábio (v. 3 ) e em diligência pru dente (v. 4). Os versículos 1-3 também estão ligados pelo tema do comporta mento “auto-protetore autodestrutivo” e os versículos 5-7 pelo tema de “olhe quem está falando”.55 1 Além de sua semelhança com 9.1, esta nova subunidade também é delimitada pelas referências anteriores à esposa (veja 11.16,22; 12.4) e por uma admoestação implícita a abraçar a sabedoria por meio dessa esposa (veja 12.4), tomando-o, portanto, um provérbio educativo. Pro vérbios 31.10-31 exemplifica de que maneira uma mulher sábia edifica a sua casa e liga sua sabedoria ao temor do S e n h o r (veja 14.2; 31.30). Mais uma vez o provérbio volta a atenção do filho para a importância de se ter uma boa esposa (veja 12.4; 18.22; 19.14). Seus paralelos antitéticos contrastam a prosperidade crescente da casa da esposa sá bia com a destruição da casa da mulher insensata. Quanto às sábias [veja n. 1 e p. 145] dentre as mulheres (nãsim ) mostra que se tratam de mulheres reais, não de uma abstração personificada como em 1.20; 9.1. [Cada uma] edifica (banetâ; veja 9.1) concentra a atenção em cada uma que toma iniciativa e assume responsabilidades individual mente. Enquanto em 9.1 “edificar” tinha o seu sentido literal com uma
mulher figurativa, aqui atua metaforicamente com uma mulher real. Ela contribui e regula o bem-estar material e espiritual da casa. Em 9.1 sua casa (bêtãh) se refere a uma aristocrata construindo sua casa; aqui designa a solidariedade da mulher com a comunidade e a propriedade ligada à sua “casa” (3.33). Mas uma mulher insensata (we ’iwwelet; veja pp. 167-168) é uma antítese clara à mulher sábia, tanto em número quanto em sentido. O plural pode sugerir que os sábios vivem em co munidade e produzem muitas casas excelentes para viverem na terra, mas a mulher intratável e moralmente estulta (veja 5.23) vive sozinha, e no fim do dia a sua casa não existe mais (cp. 9.13-18). Com as própri as mãos (beyãdêhã\ veja 1.24) ressalta que a destruição da sua família e propriedade se deve à sua própria incompetência (i.e., sua arrogân cia, incorrigibilidade, discurso destrutivo, irritabilidade e falta de domí nio próprio). A figura lança por terra (tehersennü), um paralelo antitético comum para “construir” (Jó 12.14; SI 28.5; Jr 24.6; 42.10; Ez 36.36; Ml 1.4), significa “arruinar”, “destruir”. Isto pode se referir à casa da mulher sábia, pois é de se duvidar que uma mulher insensata seria ca paz de edificar uma casa, para começar (cp. 9.13-18), mas o provérbio pode pressupor que ela destrói a casa que porventura a tenha recebido pela graça comum de Deus ou, mais provavelmente, antes de apostatar (veja 2.17). Uma boa esposa não é uma questão insignificante, pois ela edifica ou destrói o marido (12.4) e a casa. A lei permitia que o homem se divorciasse de uma mulher lasciva (Dt 24.1), pois sem uma esposa sábia, dificilmente é possível ter um lar piedoso. “Era comum os rabinos identificarem a casa com a dona da casa (Yoma 2a).”56 Rute 4.11 fala de construir uma família gerando filhos, mas a antítese “lança por ter ra” sugere que não é esse o conceito em questão aqui. Provérbios toma por certo a geração de filhos e se preocupa com a educação deles (veja 1.8; 31.26). Provérbios 24.3 apresenta uma verdade semelhante a 14.1 a, mas associada à sabedoria como um instrumento, referindo-se possi velmente a um artesão, não a mulheres sábias. 2 Os paralelos antitéticos deste provérbio contrastam o estilo de vida dos piedosos com o dos ímpios pela metáfora de dois caminhos: o reto e o tortuoso. Ele descreve todo aquele que reverencia ao S e n h o r ou que o despreza, como aqueles que conformam seu estilo de vida com a ordem moral determinada e prescrita pelo S e n h o r o u como aque-
les que se desviam dela de acordo com suas concupiscências. A pieda de em contraste com a impiedade e a ética construtiva em contraste com o comportamento destrutivo são inseparáveis. Todo aquele que teme ao S e n h o r (jPre’ YHWH; veja pp. 153-154) é classificado como aquele que anda (hôlêk; veja 1.15; 10.9) em seu ser honesto (beyãSerô\ veja p. 150), uma metonímia para o seu caminho. “Seu” mostra que o seu caráter e conduta são intrinsecamente próprios dele; são o seu bem inalienável.57 Mas todo aquele que o despreza (i.e., ao S e n h o r , ü ... bôzèhü; veja 1.7) é classificado como perverso (nelôz\ veja 2.15). Esse antônimo de “ser honesto” retrata o perverso como aquele que se des via dos limites determinados da ordem moral consistente com o caráter de Deus e sustentada por ele. Em seus caminhos (derãkãyw; veja 1.15) tem a mesma função que “andar” no verseto A. O plural “cami nhos” sugere que a pessoa que despreza o S e n h o r não tem um rumo fixo; antes ela vagueia de acordo com suas concupiscências. Essa pes soa é uma abominação para o S e n h o r e não pode ter nenhuma comu nhão com ele (3.32). Ela revela suas afeições religiosas por sua ética, não por suas atividades cúlticas. José demonstrou a atitude do seu co ração para com Deus se recusando a pecar contra Potifar (Gn 39.9). 3 Este versículo aplica as abstrações dos versículos 1,2 ao discur so. Seus paralelos antitéticos contrastam os efeitos punitivos do discur so do insensato arrogante com a proteção proporcionada pelo discurso do homem sábio. Para o insensato, o seu orgulho é uma vara em sua boca que o fere - ele mesmo é o seu pior inimigo - e que também prejudica a outros. Contrastando com isso, através de sua discrição cautelosa os sábios protegem a si mesmos de sofrimento desnecessário (cp. 10.13; 26.3). Na boca (bep i; veja 11.9, 11) identifica a vara como a língua do insensato (^wil; veja 1.7; 12.15, 16). A metáfora incom pleta vara ou ramo (hõ(er) para a língua é uma metonímia para o modo de falar. Em Isaías 11.1, sua única outra ocorrência, indica um renovo, um ramo que sai de um tronco. A metáfora significa que ele brota e floresce(cp. 12.14; 18.20,21)e/ouque inflige castigo. A interpretação de um ramo em flor é apoiada por Isaías 11.1 e pelo fato de que, em outras passagens, Sêbef se refere a uma vara usada para castigar. No entanto, o conceito de uma vara punitiva é apoiado pelo paralelo antitético “prote gem” e pelo aramaico, no qual hõter pode ser “vara (para castigar)”.58 E 57. IBHS, p. 145, P. 9.5. Ih. 58. Clifford, Proverbs, p. 143; cp. HALOT, 1:307. s.v. hõter.
provável que a metáfora signifique uma vara punitiva que floresce. O genitivo instrumental qualificador de orgulho {ga^wâ', lit. “de orgu lho”; cp. 8.13) mostra que é um instrumento doloroso e/ou um revela dor do orgulho. Não fica claro se o modo de falar do insensato causa dor em outros, no próprio insensato ou em ambos. Mas os lábios dos sábios ( weéiptê hakãmim; cp. 10.21,32) também é uma metonímia para o seu discurso. É possível que os lábios devam ser considerados refrea dos. Os protegem (tiSmürêm; veja 2.8,11 ) do discurso indiscreto e insultoso que leva outros a reagirem com raiva, escárnio, desdém e vingança e/ou do discurso do insensato que visa prejudicá-los (veja 10.11,14; 11.9). 4 As abstrações ligadas à edificação ou destruição de uma casa são aplicadas agora ao trabalho prudente. “Apesar de um agricultor poder economizar trabalho e despesas escolhendo não ter bois, trata-se de uma falsa economia” (cp. 12.10; 27.23-27).59 O provérbio é organi zado de forma quiástica sendo que gado/boi ocupa a estrutura externa e a sua contribuição material a parte central, combinando uma suces são de consoantes invertidas em bar (“limpa”) e rob (“abundantes”). Quando um indivíduo investe de modo inteligente em suas fontes de renda, como ilustrado pelo boi forte, os benefícios são muito maiores que os custos. Sem (be>ên; veja 5.23; 8.24) designa uma situação em que não há trabalho animal (veja 5.23). Gado Ç0lãpim) se refere ao boi doméstico e dócil (Dt 7.13; SI 8.7[8]) e representa aqui, por meio de sinédoque, todos os animais que trabalham na terra e que precisam de forragem e mingau (Is 30.24). Eram usados para arar (Jz 14.18), puxar carroças (1 Sm 6.7; SI 144.14) e debulhar (Dt 25.4). A manjedoura ( ebüs\ veja n. 10) permanece limpa (bãr; veja n. 11). Contrastando com isso, há colheitas [veja 3.9] abundantes (rob; veja 5.23) pela força [veja 5.10] de um boi (veja 7.22), o rei dos animais domésticos em função de sua força extraordinária. O singular sugere que se um único boi produz colheitas abundantes, quanto mais o gado mencionado no verseto A. 5 O provérbio volta ao tema do modo de falar (veja v. 3), mas agora se concentra no caráter de uma testemunha (cp. Ex 20.16; Dt 19.18). A repetição de 'êd (“testemunha”) nas frases externas e de kzb (“men tir”) nas frases internas mostra que o provérbio emprega uma constru ção quiástica na qual a estrutura externa apresenta o caráter da teste munha cuidadosa versus o perjuro culpado, e que a estrutura externa
declara seus testemunhos contrastantes no tribunal: nenhuma mentira versus uma sucessão de mentiras. Uma testemunha Çêd; veja 6.19) honesta ('emúnim; ou digna de crédito/cuidadosa/confiável; veja 13.17) não mente (lõ’ y^kazzêh', veja 6.19). O versículo 5b repete 6.19, suge rindo que o tema é o “peijúrio”, não o seu comentário. Um juiz pode fazer distinção entre testemunhos verdadeiros e falsos por meio do ca ráter das testemunhas (veja 12.17). Tanto os bons quanto os corruptos dão os seus frutos (Mt 7.17, 18; 12.33-35). Quando testada, uma teste munha confiável não é influenciada por súplicas, subornos ou promes sas, nem ameaças a fazem desviar da verdade. 6 ,7 A conclusão, que mostra escamecedores e insensatos nos versetos A em contraste com o “sábio” e o “conhecimento” nos versetos B, apresenta o outro lado da introdução (vs. 1, 2). O par de provérbios está ligado pela palavra-chave “conhecimento” (da'ai) relacionada a outros termos sapienciais que apareceram no preâmbulo do livro (1.27): “escamecedor”, “sabedoria”, “perspicaz”, “insensato” e “conhe cer”. O versículo 6 se refere a habilidade intuitiva do discípulo de obter conhecimento; o versículo 7 à incapacidade do insensato de ensinar esse conhecimento. O versículo 6 adverte acerca da hermenêutica da suspeita que caracteriza o escamecedor e o impede de aprender em contraste com o perspicaz, e o versículo 7 admoesta a apartar-se do insensato pois há tanta verdade moral em seus lábios quanto uvas num espinheiro (cp. 13.20). As referências ao conhecimento formam a tran sição para o saber subsequente. 6 A sabedoria não é um bem que os orgulhosos podem tomar para si; somente os humildes a encontram. O escamecedor (lês veja p. 169) procura (biqqes; veja 2.4) e até mesmo começa a busca pela verdade ou sabedoria (hokmâ\ veja pp. 124-125; cp. Jr 42.1-22; 43.13; Ez 14.1-4; 20.1 -3; Jo 18.38). E não a tem(wã'ãyin; i.e., não é capaz de encontrar o objeto da sua busca). Sua arrogância o impede de se humilhar sob a revelação de Deus dessa realidade por meio dos seus mestres sábios inspirados e o cega para a verdade revelada acerca da piedade e da ética (cp. 9.7; 18.2; 24.7; 2Tm 3.7). Falta-lhe seriedade moral para servir a outros e não a si mesmo. Em vez de encontrar algo que está além dele próprio em Deus por meio dos mestres inspirados e ser corrigido por esse conhecimento, sua opinião exagerada acerca de sua própria importância e seu desejo de obter poder social e exaltação o levam sempre de volta a si mesmo. Entretanto, o conhecimento (da'at
veja p. 125) é uma questão fácil (nãqãl; veja 2Rs 3.18) para os pers picazes (ou criteriosos [leriãbôn\, veja p. 147), pois eles têm uma apti dão intuitiva para aquilo que buscam. 7 Os paralelos sintéticos deste versículo admoestam o jovem a fica longe dos ensinos dos insensatos, o corolário de 13.20 (cp. 15.31). Sai (lêk) retoma a metáfora comum neste livro para o contexto, conduta e conseqüências sobre a vida do indivíduo (veja 1.11,15; 6.6). O imperativo raro na Coleção II implica urgência (veja 6.6). Da presença de (minneged) significa se afastar de uma pessoa insensata ( ’is kesil\ veja p. 167). Porque [veja n. 16] não terás conhecido (veja n. 18) na expe riência pessoal (veja 1.2) lábios (veja 10.8 passim) de conhecimento (veja p. 125). O provérbio emprega a forma negativa como exposição incompleta de uma forma positiva enfática (veja n. 17). Quando afirma mos, “Aquele sujeito não é tolo”, queremos indicar que ele é bastante sábio. O que o sábio quer dizer é, “Vocês terão enchido o ventre de insensatez” (cp. 17.10;22.24,25;23.20; 28.7; ICo 15.33; 2Co6.17; lTm6.4,5). b. Não andando pela vista (14.8-15) A subunidade que admoesta os jovens a andarem como os sábios nos caminhos da sabedoria revelada, para edificarem uma casa, é combinada agora como uma subunidade que os adverte para não andarem segundo as aparências, como fazem os insensatos e, deste modo, destruírem sua casa (cp. 14.1,12). As palavras-chave relacionadas ao vocabulário sapiencial do prólogo são usadas para ligar os dois primeiros versículos intro dutórios (“sabedoria” emparelhada com “insensatez/estultícia” [vs. 1,8], “honesto” [vs. 2a, 9b] e “caminho” [vs. 2a, 8a] e versículos 8, 9 com a conclusão nos versículos 6, 7 (“discernir” [vs. 6b, 8a], “estultícia” e “in sensatos” ['iwwelet, *wilim, vs. 7a, 7b e 9a e kesil, vs. 7b, 8b], e “escar necer”, vs. 6a, 9a). Garrett observa que esta seção sobre não se deixar levar pelas aparências apresenta um padrão concêntrico. A O astuto e os insensatos (v. 8) B Fazer reparação pelo pecado (v. 9) C Segredos do coração (v. 10) D A destruição dos perversos versus a prosperidade dos honestos (v. 11) D’ O caminho enganoso para a morte (v. 12) C’ Os segredos do coração (v. 13)
B’ Receber retribuição pelo pecado (v. 14) A’ Os ingênuos versus os astutos (v. 15) A/A’ estão ligados de forma quiástica, repetindo como um inclusio que estrutura a unidade “o astuto atenta Çãrâm hãbin/yãbin) para os seus caminhos/passos”. Também seguem um padrão quiástico de avalia ção: B/B’ se referem a pagar pelo prejuízo causado. Os insen satos escarnecem da ideia de fazer reparação e não encontram ne nhum favor (v. 9), mas os honestos sabem que algum dia a retribuição divina virá. “A aparência de escapar impune depois de cometer um crime é desmentida por uma retidão que não é óbvia nem rápida, mas que é certa.”60 C/C’ revelam aquilo que ninguém pode discernir pelo riso exterior, a saber, as tristezas pessoais “do coração” (lêb), uma pa lavra-chave que liga os versículos 10 e 13 com “alegria” (éimhâ). D/D’ chegam ao cerne da unidade, o aparente sucesso dos perversos que vivem de acordo com as próprias percepções daquilo que é certo, mas que perecerão em morte terminal. A palavra-chave “fim” ( ’aharít) liga os dois ditos. Além disso, como em outras unidades, os provérbios são enfileirados por palavras-chave e ligações lógicas. 8 Este versículo apresenta a unidade sobre engano ao contrastar sabedoria dos astutos em observar as conseqüências de seus caminhos com a estulticia dos insensatos em enganar a si mesmos e a outros. Os criteriosos sondam abaixo da superfície das aparências através de seu conhecimento das ligações morais entre atos e destino. O provérbio acrescenta às admoestações para ser educável (v. 6) e para escolher bons mestres (v. 7), o conselho para regular a vida de modo que esta seja conforme à piedade e à retidão, não àquilo que prejudica outros. A sabedoria (hokmat', veja pp. 124-125) do astuto Çãrüm; veja p. 146) é ter discernimento do (hãbin; veja 1.2; 8.5) seu próprio caminho (darkô\ veja 1.15). Mas a estulticia (we’iwwelet\ veja pp. 167-168) dos insensatos (k esilim\ veja p. 167) é engano (veja 11.1; 12.5,20). O paralelismo sugere que se tem em vista o “autoengano”, bem como o seu significado em outras passagens, a saber, enganar os outros. Os sujeitos, “a estulticia dos insensatos” e “a sabedoria do astuto” são paralelos antitéticos precisos, mas o mesmo não acontece com seus predicados, “ter discernimento do próprio caminho” em contraste com “engano”. Esses predicados antitéticos imprecisos devem ser projeta
dos no paralelo: os insensatos não atentam para o seu caminho, e os sábios se afastam do engano. A pessoa astuta escolhe seus passos de acordo com o seu conhecimento moral, para assegurar vida para si mesma (cp. 13.16). Contrastando com isso, em seu caráter moral in sensível e intratável os insensatos tramam para vitimar a outros, sem saber que também estão vitimando a si mesmos. 9 Este versículo possui uma ligação quiástica com o versículo mediante as palavras-chave “estultícia” ( ’Zu;u;efeí)/‘insensatos” Çewilim; vs. 8b, 9a) e, possivelmente, da assonância de hãbin (“atentar para”) e übên (“entre”; vs. 8a, 9b). Os insensatos vivem enganados (v. 8) e escarnecem da culpa (v. 9; cp. 19.28). O provérbio admoesta o indiví duo a ser honesto, não um insensato que causa danos e se recusa a fazer reparação. Quanto aos insensatos Çewilim; veja pp. 167-168), cada um escarnece (yãlis; veja 1.22; 3.34; 19.28) da culpa ÇãSãm). 'Ãáãm indica uma obrigação de se livrar da culpa dando algo (cp. 30.10, em que é traduzido como “tomar-se sujeito a”).61 De acordo com Jeremias 51.5, ’ãSãm traz castigo quando o S e n h o r vinga a inretidão (e.g., Jr 51.5), e de acordo com o Salmo 68.21(22), aqueles que continuam em sua ’ãSãm certamente perecerão.62A lei mosaica aplica o termo ao pecado inadvertido (Lv 4.13, 22), à impureza cerimonial (5.2) e à culpa moral, inclusive prestar falso juramento (5.4), roubar e defraudar (6.4[5.23]; cp. SI 10.2-11). Nessa lei levítica as obrigações eram revogadas mediante o sacrifício 'ãSãm, com outras reparações. Hoje, essa culpa é revogada pelo sacrifício de Cristo que ofereceu sua vida como sacrifício pela culpa (Is 53.10). Mas entre (übên; veja 6.19) as pessoas retas (yeSãrim\ p. 150) [há] favor ( rãsôn ; veja 10.32; 11.1). A oposição com “culpa” sugere que se trata do favor diante de Deus e das pessoas (cp. também 11.1; 12.22); o último é apoiado pela frase preposicional qualificadora “entre as pessoas honestas”. O favor mútuo e divino e a aceitação prevalecem no meio deles em função de sua retidão (cp. “agradável ao S e n h o r ” em 16.7). As pessoas honestas não se envolvem em situações nas quais se expõem à culpa e, se er ram, fazem as reparações apropriadas. Como no versículo 8, o parale lismo antitético é imperfeito. “Insensatos” e “entre as pessoas hones tas” são antíteses razoavelmente precisas, mas o mesmo não pode ser dito de “escarnece da culpa” e “[há] favor”, sugerindo que cada um 61. Knier, TLOT, 1:192, s.v. asam . 62. Cp. D. Kellermann, TDOT, 1:430, s.v. 'ãáãm.
deve ser projetado no paralelo antitético. Os insensatos erram e escar necem de fazer reparações, mas não encontram nenhum favor e acei tação divina ou mútua. A harmonia benevolente dos honestos contrasta com a discórdia zombeteira e egoísta entre os insensatos. 10 No plano humano horizontal, a amargura e a alegria - um merisma que representa a gama completa de emoções - só são conhecidas pela pessoa que as experimenta. Na verdade, há circunstâncias exteri ores que todos podem ver (veja v. 11), mas as aparências são engano sas (veja v. 13). O coração (lêb; veja pp. 140-141) conhece (yôdêa'\ veja 2.5) a sua própria (napSô, uma perífrase profundamente emotiva para “a própria pessoa”; veja p. 140) amargura (morrat; ou aflição, como a esterilidade [ISm 1.10], o furto enganoso [Gn 27.34], o sofri mento e as dificuldades pessoais [Jó 7.11; Is 38.15], etc.). E cia sua alegria (ubeéimhãtô; veja 10.28; 12.20) um estranho [ou forasteiro; zãr; veja 2.16-20] não participa (lõ ’-yit'ãrah; veja n. 24). Os meca nismos emocionais, intelectuais, religiosos e morais de um indivíduo são complexos, internos e individualistas demais para serem experimenta dos por outros, ou mesmo para serem apresentados adequadamente a outros (cp. 1Co 2.11). Somente Deus tem conhecimento absoluto do coração humano (15.11; 16.2; 21.2; 24.12). O provérbio infere a digni dade e a importância de cada indivíduo e, para ser mal-interpretado (cp. ISm 18.20; 2Sm 6.16; 2Rs 4.27), adverte para não avaliar os ou tros segundo as aparências exteriores e ser fiel ao próprio coração (cp. Jó 19.27). Sua verdade também nos leva a fazer como Ana e orar para o Sumo Sacerdote compassivo, que nos conhece melhor do que nós mesmos nos conhecemos (lR s 8.38; Jo 14.16, 17; Hb 4.15, 16). Não obstante, apesar de nossas limitações, outras passagens das Escrituras nos incentivam a ter empatia pelos outros (cp. Rm 12.15). 11 Este provérbio também ensina implicitamente que o discípulo caminha pela fé, não pela vista. Paradoxalmente a casa dos perversos é menos segura do que a tenda dos honestos. A casa (bêt\ veja 3.33) significa mais segurança e esplendor que uma tenda, como se vê no desejo de Davi de substituir a tenda do S e n h o r por uma casa (2Sm 7.46). A casa dos perversos ( r ^ ã ^ m ; veja p. 164) será aniquilada (yissãmêd; cp. 2Sm 14.7).63 Entretanto, a tenda ( 'õhel) dos honestos 63. S s m a d está intimamente relacionado com os verbos k r t “exterminar"/“destruir” (Lv 26.30), Piei ‘6d("destruir"; Nm 33.52), H ijil n k h (“destruir”; Js 11.14), h r g (“matar”; Et 3.13), H ifit h rm (“destruir"; Dn 11.44).
(j^Sãrim; p. 150)florescerá (yapriah; ou brotará; veja 11.28). De acordo com Koch, a tenda não é de maneira alguma usada para qualquer tipo de habitação, antes se refere a uma tenda nômade.64 Trata-se de uma tenda abaulada que era sustentada por uma estaca de madeira na parte central e composta de várias cortinas escuras feitas de peles de ca bras. Era presa com cordas amarradas a estacas. A tenda é a essência do estilo de vida nômade, mas ocasionalmente os habitantes da terra usavam tendas como estábulos ou mesmo como habitações. Dificil mente a habitação de um indivíduo é chamada de ohel, somente quan do ela se refere a um grupo de tendas. A metáfora “florescer” significa que suas casas sempre brotam novamente com vida e prosperidade. A tenda nômade aparentemente instável dos honestos, que permaneceu firme desde os antepassados, é o “centro do lar” e seus habitantes não apenas permanecem para sempre, mas florescem com vida nova (cp. Jó 14.9; SI 1.3; 92.12-14[ 13-15]; Jo 15.1-17). 12 Este provérbio na parte central da subunidade, que adverte o discípulo a não andar segundo as aparências, apresenta claramente o motivo para isso. Ele está ligado de forma quiástica ao versículo 11 pela raiz ySr (“honestos”, v. 1lb, e “direito”, v. 12a) e pelo conceito de exter mínio/morte (vs. 11a, 12b), e também está ligado ao versículo 13 pela palavra-chave ’aharítãh (“o fim”, vs. 12b, 13b). O provérbio usa a metá fora de uma “jornada” para advertir os jovens acerca de avaliarem por sua própria conta as conseqüências de seu estilo de vida (veja 12.15). Há (yêS; veja 11.28) um caminho ( derefc, veja 1.15) que é direito (ou reto; yãsãr; veja 1.3). A retidão é julgada por um padrão de comparação, em relação ao qual um objeto é “direito”. O verbo dessa raiz é quase sem pre usado como um qualificador como segundo o julgamento de (ou “estimativa de”; lipnê, lit. “diante”).65 Yãsãr costuma ser usado com “caminho” e aceita facilmente o sentido figurativo de comportamento ético que não se desvia daquilo que é considerado correto e que, por tanto, conduz ao sucesso. “O sentido duplo da raiz ySr permite que certas expressões hebraicas pareçam imprecisas ou mesmo ambíguas, como se tivessem a intenção de sugerir que a conduta ética não apenas é correta mas também conduz ao sucesso” (cp. 2.13; 11.5).66 7s (p. 64. K. Koch. TDOT, 1:119-21, s.v. 'Ohel. 65. E equivalente a le'ênê (Dt 4.6) e be'ênê “aos olhos de” no sentido de “segundo a avaliação de", “cm vista de" (A. S. van der Woude, TLOT, 2:1003, s.v. pBním ). 66. L. Alonso-Schõkel, TDOT, 6:466, s.v. yãsõr.
139), com seus sinônimos 'ãdãm e ^nôs, faz uma distinção nítida entre o ser humano e Deus (cp. Nm 23.9; Jó 9.32; 12.14; 32.13; Pv 5.21; Os 11,9).67 Mas o fim dele (we 'aharitâh; veja 5.11) se refere ao resultado, àquilo que acontece depois, o futuro à luz do qual o todo deve ser ava liado. Dele (no original, fem.) não se refere ao “caminho” (masc.) an tes, funciona como um pronome neutro com referência à situação do verseto A.68 O plural, os caminhos identifica o seu caminho, que ele considerava correto, em seus vários comportamentos, que na verdade são tortuosos e pecaminosos (veja 2.13; 3.31; 16.2), como os resulta dos deixam claro,60 morte (mãwet, a habitação dos mortos; veja 2.18; 10.2). Uma vez que a morte é o fracasso final, esse desenlace mostrou que o caminho dele era o oposto daquilo que ele considerava bemsucedido. A segurança e o destino de uma estrada nem sempre são aquilo que parecem (Mt 7.13, 14). A estrada enganosa conduz tão cer tamente à morte quanto aquela indicada claramente. Ela é enganosa porque há um conflito entre a percepção humana limitada e obscura da verdade e a constituição da realidade propriamente dita. A casa do perverso é aniquilada porque é construída sobre a fundação frágil da epistemologia humana, a verdade relativa acessível à visão humana. Somente o Deus onisciente e onipotente conhece o verdadeiro caminho que conduz à vida, à realidade como ela é de fato. A verdade está fora do alcance da humanidade finita; o próprio S e n h o r precisa revelar o cami nho certo através do seu mestre sábio inspirado, e o discípulo deve acei tar essa revelação pela fé (3.7; 30.1-6). A importância deste provérbio pode ser medida por sua repetição em 16.25 num contexto diferente. 13 Além da palavra-chave “o fim” ( ’aharítãh), este provérbio dá continuidade ao tema de que as aparências presentes são enganosas e de que a verdadeira realidade é manifestada em seu resultado. A alegria exterior pode mascarar angústia, mas no final a tristeza se manifestará. Até mesmo (garn) coloca a ênfase sobre a frase seguinte.70 No riso (bisehôq; veja 10.23) o coração (lêb; veja pp. 140-141) pode doer [veja yik ’ab; veja n. 26].71 E ofim do (we ’aharitãh\ veja v. 12) alegria (éimhâ; 67. N. P. Bratsiotis, TDOT, 1:229, s.v. 'ís. 68. IBHS, p. 110, P. 6.6d. 69. Meinhold (Spriiche, p. 235) acredita, questionavelmente, que a distinção entre "um caminho” e o pl. “caminhos" mostra que a perversão que alguém escolhe se toma cada vez mais descontrolada em seus resultados perniciosos. 70. BÜB.p. 169, s.v.gam . 71. Em quatro ocasiões k ’b indica sofrimento físico (Gn 34.25; Jó 14.22; 33.19; Ez 28.24) e em 26
veja 10.1) é tristeza (tügâ; veja 10.1). A aflição forma um pano de fundo constante dos momentos ocasionais de alegria que trazem algu ma distração. A vida começa com o choro de desconforto e insatisfa ção do bebê e termina com um suspiro de morte e tristeza. Nesse ínte rim, o riso tem traços de angústia (14.13a), e no final a aflição segue de perto a alegria (v. 13b). “Uma vez que os seres humanos morrem, a alegria termina inevitavelmente em tristeza (veja 27.1). A festa sempre acaba; atos de amor cessam.”72 Este provérbio excepcionalmente pes simista deve ser interpretado à luz das afirmações dominantes e otimis tas do livro, segundo as quais a expectativa do reto é alegria (10.28), vida (10.16, 17; 11.19; 13.12, 14) e esperança futura Çahartt\ 23.17, 18), em contraste com os perversos que não têm nada disso (24.19, 20). Ao descrever a condição humana como estando desconjuntada, o provérbio aponta para uma salvação e um verdadeiro lar que se encon tram além da experiência humana normal num relacionamento com Deus que continua depois da morte (3.1-12). Se o desejo do coração de não sentir nenhuma dor fosse satisfeito antes da morte, a perfeição seria alcançada nesta vida e experimentaríamos o céu antes da morte. Não é esse o caso, como Provérbios afirma e a experiência confirma. No entanto, momentos fugazes de alegria no presente dão esperança de uma salvação futura, quando a sabedoria será aperfeiçoada no rela cionamento crescente do discípulo com Deus (4.18). De fato, a afirma ção categórica do provérbio seguinte protege este dito de uma possível interpretação equivocada como sendo totalmente pessimista. 14 Este provérbio, que está ligado ao versículo 13 pela palavra chave lêb (“coração”; veja n. 28), toma relativo o “fim” da alegria passageira do presente, experimentada neste mundo (v. 13), ao apontar para além desse fim, para uma retribuição final. Apesar da angústia e tristeza que seguem a alegria no presente, o discípulo deve prosseguir com fé, esperando com total confiança que o S e n h o r recompensará os bons e castigará os incrédulos (veja 10.28). Apesar das aparências con trárias e do fato de as pessoas não terem como esconder para sempre a sua aflição fundamental, os atos e o destino são inseparáveis, como ilustra a metáfora de um “caminho” (derek\ cp. 1.15). A essa verdade este provérbio acrescenta uma variação inédita aplicando-a à aposta vezcs, como neste caso, sofrimento emocional, mental e espiritual, apesar de, cm algumas passagens, ser difícil separar um do outro (Êx 3.7). 72. Van Leeuwen, Proverbs, p. 141.
sia. Depois de escolher o caminho bom, o discípulo deve perseverar nele. O Soberano providencia para que o caminho dos infiéis, apesar do bem que porventura estes tenham feito ante à sociedade, contenha sua plena punição e que os atos bons do fiel incluam em si mesmos plena recompensa (cp. 25.16; Jr 18.7-10). Os paralelos antitéticos contras tam o apóstata (ou pessoa rebelde/perversa; veja n. 28) com uma pessoa boa ('is fôb; veja p. 152; cp. SI 80.19[20]; Is 59.13-14). O apóstata será recompensado, mas não da maneira como ele espera; ele será plenamente castigado ( y i s b a veja n. 29; 1.31; 14.14) em fu n ção dos seus caminhos (m idderãkãyw; veja 1.15). O plural indica suas várias manifestações perversas que envolvem uma sentença judi cial e trágica de morte. Mas uma pessoa boa [será plenamente re compensada] por seus atos (bons) (m im a'alãlãyw; veja n. 30). 15 Este versículo é um janus, que apresenta a estrutura final das subunidades acerca de andar pela fé (vs. 1-7) e não pela vista (vs. 815), bem como a estrutura introdutória dos provérbios educativos que contrastam as caracterizações intelectuais e espirituais (vs. 16-18; veja 14.16-32). Este provérbio acrescenta à metáfora do “caminho” à de cada “passo” no mesmo, advertindo o discípulo acerca da ingenuidade que leva o indivíduo a se desviar. Ele deve testar o seu caminho consi derando se cada passo está conforme com a verdadeira piedade e éti ca. O ingênuo (peti; veja p. 166) dá crédito {yaam in), que significa adquirir estabilidade, confiar e crer em alguém e, com le, como é o caso aqui, confiar num mensageiro e/ou em sua mensagem,73 a qualquer coisa (kol-dãbãr). Com he’eminle, dãbãr tem o sentido mais específi co de confiar numa palavra ou declaração, porque “palavra e fé são correlativos”.74 Mas o astuto (we'ãrüm; veja p. 147) atenta (yãbin; veja 14.8) para o seu passo (la ’aurõ; veja 4.14).75 “Passo”, um sinô nimo de derek, “caminho” (veja 14.8), é usado figurativamente para representar um estilo de vida. O provérbio motiva os jovens a ouvirem os outros de modo crítico e a praticarem o seu próprio discernimento ao qualificar os descuidados como “ingênuos” e os cuidadosos como “as tutos”. Os paralelos antitéticos são precisos, mas suas descrições são imprecisas. E necessário acrescentar ao verseto A que o ingênuo não atenta para seu estilo de vida, e o astuto, que vigia para não dar um 73. A. Jepsen, TDOT, 1:302, s.v. 'õ m a r t. 74. Delitzsch. Proverbs, p. 218. 75. Observe a assonância do verbo central em cada verseto: y a 10m i n
c y S b tn .
passo em falso, não confia na opinião humana. Se Deus não deposita nenhuma confiança nem mesmo em seus santos, porque ninguém é puro e confiável a ponto de merecer sua confiança, os seres humanos em geral e suas palavras são ainda menos confiáveis (Jó 4.18; 15.15). A pessoa astuta, entretanto, confia implicitamente em Deus, tanto com referência à sua mensagem (Gn 15.6) quanto seus mensageiros (Ex 4.1-3; 14.31;Nm 14.11), apesar de ambos serem com frequência inse paráveis (Jn 3.4; cp. Mt 12.41), e diante disso marca os seus passos a fim de não se desviar. c. Contrastando caracterizações e conseqüências sociais (14.15-32) A unidade pode ser analisada da seguinte maneira: A. Contrastando caracterizações da sabedoria e seu comportamento ético (vs. 15-18) B. Contrastando conseqüências do comportamento social usando prin cipalmente termos éticos (vs. 18-24) C. Contrastando caracterizações e conseqüências de vida ou morte (vs. 25-32) A primeira destas subunidades usa de caracterizações para enco rajar os jovens a se juntarem aos sábios. A segunda os encoraja a ter um comportamento ético ao mostrar as conseqüências da boa e má conduta social. Essas duas primeiras subunidades são estruturadas pela referência ao “sábio” e ao “insensato” na forma singular, no versículo 16, e plural, no versículo 24. Além disso, as caracterizações lançam os fundamentos para a conduta ética e suas respectivas conseqüências, nos versículos 19-24. Usando a metáfora da “coroa” o versículo 18 funciona como umjanus que liga os versículos 15-18 e 19-24. Aqueles que temem ao S e n h o r se apartam do “mal” (vs. 16, 19, 22), enquanto que os insensatos fazem loucuras (v. 17) e colhem suas conseqüências (v. 18). A terceira subunidade intensifica a unidade parcial combinando dois conceitos, climático de modo culminante que os perversos serão lançados na destruição final, mas que mesmo em sua morte o reto bus cará refúgio no S e n h o r .
(1) Contrastando caracterizações da sabedoria e seu comporta mento ético (14.15-18)
Como anteriormente observado, o versículo 15 constitui umja n u s . Esta subunidade é estruturada por um inclusio por meio da repetição do contraste entre o “ingênuo” e o “astuto”, passando de sua represen tação no singular, no versículo 15 (pet i :: 'ãrum) para a sua representa ção no plural, no versículo 18 (petã ’y im :: 'arümim). Interposto entre esses dois tipos de sabedoria e usando sinônimos encontram-se duas espécies de tolos (cp. kesil, v. 16a e ’iwwelet, v. 17a): a pessoa irascível (mt'br, v. 16b e qsr-'pym, v. 17a) e o “intrigante” (v. 17b). O jogo de palavras com “loucura” ( 'iwwelet), a última palavra dos versetos 17a e 18a, liga o par de provérbios à estrutura. A subunidade conclui com a promessa de que os astutos serão coroados com o “conhecimento” (veja 1.2), uma transição para o conhecimento da ligação entre atos e conseqüências detalhada nos versículos 19-24. 16 O provérbio adula os jovens para aceitarem um estilo de vida submisso ao S e n h o r e a seus mestres sábios, e a não serem incorrigí veis ao classificar os primeiros como um a pessoa s á b ia (h ã k ã m ; veja p. 145) e os últimos como um insensato (k es il; veja p. 167). O substan tivo adjetival que tem e (yãrê ’) significa “que teme ao S e n h o r ” .76 Em outras passagens em Provérbios,yãrê'' no modo afirmativo, não negati vo, se refere ao “temor do S e n h o r ” (veja 1.7, 29; 2.5; 3.7; 8.13; 9.10; 10.27; 14.27; 15.16,33; 16.6; 19.23; 22.4; 23.17; 24.21 [+ “rei”]; 31.30) ou a seu equivalente próximo, “temer o mandamento”. Esse significado é apoiado pelo acréscimo de e que se d esvia do m a l (wesãr mêrã'), a conseqüência de temer ao S e n h o r (veja 3.7; cp. 1.16).77 Contrastando com isso, o insensato se en co leriz a ( mit'abbêr)n contra o S e n h o r e/ou 76. O verbo y r ’ perm ite várias nuanças, inclusive reverência, apreensão e m edo da m orte, dependendo do acusativo ou do inf. complementar. Aqui, porém, os exegetas não chegaram a um consenso quanto à sua nuança, uma vez que o verbo não é modificado. McKane (Proverbs, p. 464) sugere o medo ligado “às dificuldades e perigos envolvidos em determinado curso de ação”; Toy ( Proverbs, p. 291), com o estar “apreensivo (em relação a homens e coisas) e vigilante”; e Sasson (Jonah [AB; Nova York, Londres, Toronto, Sydney, Auckland: Doublcday, 1990], p. 97), à “ansiedade que é experimentada quando se está planejando o mal” . Ninguém confirma o seu significado. O verbo nunca é usado com qualquer desses sentidos no livro de Provérbios. 77. Observe a consonância de Irl no verseto a - y r ’ w sr m r - e a aliteração de sSr rríèrã' com m ifa b b êr no verseto B. 78. HALOT (2:781, s.v. II 'br) traduz as oito ocorrências do Hitpael com o “mostrar-se irado”, “ ficar irritado” e “explodir de raiva” . Ocorre com as preposições 0a (Dt 3.26; SI 78.62), 'im (SI 89.39[40]), e 'al (Pv 26.17), sem um objeto direto (SI 20.2; 78.21, 59; Pv 14.16), e com um
aqueles que o temem, como sugere o paralelo “teme ao S e n h o r ” . E todavia se sente seguro e, portanto, fica despreocupado (úbôtêah; veja 3.5; cp. 28.26). Jepsen observa que “o particípio usado de forma absoluta tem o sentido de ‘crédulo’, ‘autoconfiante’”. Com respeito às suas formas de uso em 14.16; Isaías 32.9-11; 47.8; Jeremias 49.31; Ezequiel 30.9; 39.6; Sofonias 2.15, ele comenta, “Em todas essas passagens ele se refere àquele que ‘pensa estar seguro’, mas que está errado”.79 “Que se desvia do mal” e “se sente seguro” não são exatamente antité ticos e devem ser projetados num verseto que lhes dê equilíbrio. Aquele que teme ao S e n h o r não se superestima nem se sente autoconfiante, como o insensato arrogante que não se desvia do mal (cp. 13.19). Paulo admoesta os cristãos de Filipo a “desenvolver a [sua] salvação com te mor e tremor” (i.e., expressar sua salvação no crescimento espiritual e numa reverência ativa em resposta à graça de Deus) (Fp 2.12). 17 O provérbio dá continuidade ao tema da loucura. Numa comb nação rara de um padrão de avaliação - - dentro de paralelos antitéti cos, ele adverte acerca de ser uma pessoa irritável (veja n. 33), que age impetuosamente, ou um intrigante ('is mezimmâ; veja 1.4; cp. 12.2), que calcula maneiras de alcançar seu objetivo malévolo e execu ta seu plano deliberadamente. Os predicados apresentam os motivos pelos quais ser impetuoso ou malevolamente astuto é mau. O irascível comete (ya'aseh; veja 2.14) loucura ( 'iwwelet; veja pp. 167-168), um singular abstrato coletivo que indica vários atos específicos de insolên cia moral (veja 5.23; 14.1,8). Ele é indisciplinado e descontrolado; sua cólera imprevisível e impetuosa obscurece seu entendimento e o priva de todo o senso de proporção, de modo que ele reage exageradamente, arruinando a comunidade e/ou a si mesmo. Os rabinos ilustravam essa questão usando a imagem de um caldeirão com seu conteúdo fervente: “Quando o conteúdo do caldeirão ferve, transborda pelos próprios la dos”.80 Os mestres da sabedoria de Israel consideravam a ira humana de maneira negativa: a ira é cruel (27.4), produz contenda (30.33) e objeto direto (Pv 20.2). Com o objeto direto, significa “fazer uma pessoa se mostrar irada”; nos outros casos, significa “ficar irado” com alguém e implica numa rejeição da pessoa contra a qual a ira é dirigida, uma recusa em ouvir a outra pessoa e o castigo da ira sobre ela. Uma vez que o S e n h o r se irou contra Moisés, recusou atender a sua súplica (Dt 3.26), e pelo fato de se irar contra seu ungido, ele o rejeitou (SI 89.39[40]); fez o mesmo com Israel (SI 78.50), e os entregou à sua ira ( S I 78.21, 59, 62). 79. A. Jepsen, TDOT, 2:91, s.v. b&tafy. 80. C ohen, Proverbs, p. 90.
deve ser apaziguada (15.1; 29.8,11). Johnson diz: “O ideal de sabedoria é o homem calmo que não peca quando se ira ou, nas palavras de 17.27, que é ‘sereno e de inteligência’ (q a r r ü a c h ’is h teb h ü n ãh ). As sim, neste caso q ar, ‘calmo’ é usado como antítese para o homem que é incitado e inflamado pela raiva. O AT censura o homem irascível (15.18; 29.22). Portanto, também encontramos admoestações para o indivíduo não se ira e não pecar ao se irar (SI 37.8; Pv 16.32; Ec 7.9; Jó 36.18). A ira caracteriza o insensato, o irracional e o malfeitor (Pv 17.14, 29; 29.11; Ec 7.9; Jó 5.2)”.81 O intrigante, entretanto, é disciplinado e controla suas emoções com rédeas curtas; sua tranqüilidade determi nada lhe permite pensar claramente de antemão e agir racionalmente, a sangue-frio, prejudicando os outros para beneficiar a si mesmo e, deste modo, provocando sua inimizade. O primeiro tipo erra aberta e clara mente; o segundo secreta e indiretamente. Os dois tipos antissociais, o colérico e o fleumático, são insensatos porque prejudicam a outros e a si mesmos. Esse tipo de insensato é od iado (y is é ã n ê ’; veja 1.22) e, portanto, Deus e/ou a comunidade se livra dele. 18 Os versículos 17 e 18 estão ligados pela palavra-chave “loucu ra” e pelo contraste entre um intrigante sagaz e malevolente e um astu to perspicaz e benevolente. O provérbio fecha a estrutura ao redor dos versículos 16-18 usando metáforas vividas para fazer um contraste entre o ingênuo e o astuto. Ele adverte acerca do pertencer ao grupo dos ingênuos (p e tã ’y im ; veja pp. 166-167) porque metaforicamente eles herdam ( n a h fllü ; 3.35) como bem permanente a ignomínia e a vergo nha da lo u cu ra ( ’iw w e le t ; veja 14.17), uma metonímia para os atos e os efeitos da insolência moral obstinada. A metáfora é usada com sarcas mo; normalmente uma herança serve para sustentar a pessoa, mas aqui essa herança destrói aquele que a possui (veja 11.29). No entanto, o provérbio admoesta a juntar-se aos astutos (veja 14.8, 15) pois ao se sujeitarem aos ensinos dos sábios eles são, metaforicamente, coroados iy a k tirü f'2 com o conhecim ento ( d ã 'a t ; veja p. 125). O fato de interna lizarem as verdades morais reveladas lhes permite escolher corretamen te o seu caminho no meio do perigo e adquirir domínio e dignidade. Sem querer os ingênuos “herdam” a loucura; os astutos obtêm suas coroas por meio da humildade. 81. E. Johnson, TDOT, 1:356, s.v. 'Snaph. 82. Cp. Theod. stephthisontai.
(2) Contrastando conseqüências do comportamento social usando principalmente termos éticos ( 14 .19-24)
A subunidade seguinte admoesta o jovem a se manter firme numa boa conduta ética e a rejeitar o mal, pois implicitamente a Providência recompensará a primeira e castigará o último. Van Leeuwen observa que este conjunto de ditos trata dos relacionamentos entre pessoas di ferentes em termos morais ou socioeconômicos.83 Como o versículo 15, o versículo 18 também é um janus, sendo a estrutura final dos versículos 15-18 e uma estrutura introdutória dos versículos 19-24. Usan do termos sinônimos, o inclusio dessa estrutura promete uma coroa (ktr [v. 18] e 'ateret [v. 24]) aos astutos (v. 18), um termo correlato para os sábios (v. 24). Em termos conceituais os versículos 18, 19 e os versículos 23, 24 formam pares de provérbios. O primeiro associa a coroação dos astutos ao ato dos malfeitores se curvarem diante dos retos. O último liga o lucro do trabalho árduo à coroa de riqueza usada pelos sábios. Além disso, os versículos 19 e 22 formam uma estrutura interna dentro dessa estrutura externa; elas expressam o mesmo con ceito e repetem as palavras-chave “mau”/ ‘mal” (rã' ) e “bom”/“bem” (tôb). Entre essas duas estruturas temos o par de provérbios dos versí culos 20, 21 que, como Heim observa, se aplica ao axioma geral do versículo 19. Ele também observa que o par está ligado pela aliteração entre 'ãSir (“rico”) e ’aSrãyw (“bem-aventurado ele é”), pela palavrachave que aparece no meio de cada versículo “seu vizinho” (lerê'êhü) e pelos sinônimos para “pobre” (rãs, v. 20a e 'anãyim, v. 21 b).84 Essa referência à riqueza e pobreza forma uma transição para a estrutura final que fala da riqueza (vs. 23,24). 19 0 conceito segundo o qual o astuto é coroado com o conheci mento é intensificado agora para o ato dos malfeitores se curvarem diante das pessoas boas como fariam diante de reis. A ligação temática sugere que, por meio do seu conhecimento, os astutos são ligados aos retos e aos bons e que, pela sua falta de compromisso com a sabedoria, os ingênuos são associados com malfeitores e perversos. Como em 2.20 e 4.14, neste paralelismo sinônimo, os maus (rã'im ; veja 1.16) são equiparados aos perversos (r^sã^rn;** veja p. 164), e os bons ((ôbim) com um justo (saddiq; veja pp. 151-152). O provérbio motiva os jo 83. Van Leeuw en, Proverbs, p. 142. 84. A ssim tam bém H eim , “ Structure and C ontext”, p. 160. 85. Observe a aliteração de rS'ím :: r^stfím S a arê.
vens a se juntarem àqueles que servem à comunidade mediante a ver dade paradoxal de que eles se tomarão a classe governante, e os ego ístas se inclinarão (sa /m)*6perante eles como seus súditos servis. O fato de os perversos se curvarem juntos às portas (Sa'arê)87 dos retos sugere que os retos se assentarão no lugar de julgamento e farão justi ça aliviando os oprimidos e castigando os culpados.88Os súditos culpa dos se inclinam perante seus senhores triunfantes como os irmãos de José se inclinaram perante ele. Este provérbio gnômico nem sempre se concretiza, pois, como o livro de Provérbios reconhece, há ocasiões em que o mundo se encontra moralmente desordenado (veja pp. 161 ss.). No entanto, é uma verdade universal quanto à forma como as coisas acontecem (cp. Gn 21.22; 42.6; Êx 8.8[4]; 9.27, 28; 11.8; 1Sm 24.1621 [17-22]; 26.21; 2Rs 3.12; 5.9; Et 7.7; At 16.39). Em Sabedoria de Salomão 1.16-5.23 (2.23; 3.1-5; 5.16) o fim é projetado explicitamente no futuro além da morte. O mesmo se aplica ao pobre Lázaro (Lc 16.20). De acordo com Ross, o provérbio é “o cumprimento final do conceito encontrado em Filipenses 2.10”.89 20 O provérbio fornece o corretivo necessário para o versículo 19 deixando implícito que os perversos podem ser ricos por algum tempo. No entanto, contrasta o empobrecimento social do pobre com os bene fícios sociais do rico (cp. 19.4,7) e revela uma verdade dura e explícita acerca da natureza humana. Até (gam\ veja 14.13) enfatiza pelo seu próximo (lerê'êhü; veja 3.23) o pobre (rãS; veja 13.8) é odiado (yiéáãriê\ veja 1.22; 14.17). Mas os amigos do (we 'õhabê, traduzido como “aqueles que amam” em 8.17, 21 e que indica um desejo intenso de se ligar a 86. A raiz shh ocorre 18 vezes: 12 vezes no Qal, quatro no Nifal, e duas no Hifil. Isaías a usou com o eq uivalente de SBpel (“ ser baixo” , “ afundar” ; cp. Is 2.9, 11, 17; cp. 5.15). N o Qal significa "encurvar o corpo próxim o ao chão”, por exem plo, os leões se “ agacham ” yãSõhú em seus covis (Jó 38.40). Em outras passagens ocorre no contexto de se curvar sob o peso físico e/o u psico ló g ico e, p ortanto, pode ser traduzido com o “ en co lh er-se”, “ curv ar-se” , “rastejar" de medo diante da am eaça de um poder superior (Jó 9.13; Is 60.14), “ceder” sob uma força superior (SI 10.10; Hc 3.6) ou , na maioria das vezes, “se prostrar” em derrota (SI 35.14; 38.7; 107.39; Is 2.11, 17; 60.14; Lm 3.20), a conotação em P rovérbios 14.19. 87. BDB (p. 1.045, s.v. sa a r) e HALOT (4:1616, s.v. Sa ar) acreditam que se tratam das portas de um a residência particular, m as esse uso seria excepcional no A ntigo Testamento. Em outras partes de Provérbios "portas” designa as portas complexas da cidade, uma sinédoque para julgam ento (veja 1.21; 8.3; 22.22; 24.7; 31.23, 31). Se o texto aqui se refere a uma residência particular, o pl. “portas” sugere que “retos” é um coletivo sing. e que se tem em vista muitas mansões. Mas uma vez que a intenção é falar das portas da cidade, o pl. indica sua com plexidade (veja 1.22). 88. O bserve a consonância quebrada de e Sa'aré. 89. Ross, Proverbs, p. 988.
alguém) rico (' ãSir ; veja p. 578) são muitos (rabbim ; veja 7.26; 19.4). Ao contrário da pessoa rica que tem bens materiais suficientes, mas é deficiente em termos morais, o pobre é materialmente deficiente, mas nunca é apresentado com deficiências morais. Embora “pobre” e “rico” impliquem deficiência e suficiência materiais extremas, respectivamente, este provérbio afirma que o primeiro também sofre a falta de amizade, enquanto que o último possui muitos amigos íntimos. Infelizmente, por um lado, as pessoas desejam se livrar do pobre, quaisquer que sejam suas virtudes, pois ele é um peso. Elas o isolam de modo que ele não possa lhes apresentar suas queixas ou reivindicações. Por outro lado, desejam ficar com o rico, quaisquer que sejam seus vícios, pois ele pode lhes dar alguma coisa sem exigir nada em troca. A luz desse lado sombrio da natureza humana cobiçosa, o provérbio adverte os jovens acerca de serem ricos ou pobres. O primeiro é odiado por todos, e o último é amado pelo tipo errado de pessoa. Este provérbio se refere à natureza humana não redimida, que busca a segurança no plano huma no horizontal, em vez de em Deus (veja 18.10, 11; 22.16; SI 49; 62.9, 10[ 10, 11]; 146.3, 4).90 O provérbio seguinte, que adverte acerca desse lado sombrio de nossa natureza, implica que a redenção desse estado natural é possível. Além disso, 18.24 também sugere exceções ao con trastar os muitos amigos que aparecem nos tempos de prosperidade com 0 amigo que se mostra mais chegado que um irmão (cp. Rt 1.14,21,22; 1Sm 19.1 -7; 23.16; Sl 72.12,14; 109.31; Mt 4.18-22). Solfrid Storoy su gere que por meio da sua relação sintática, rítmica e paradigmática com seu contexto imediato (14.19,21) e mais amplo (14.14-22), 14.20 tem por objetivo estimular a reflexão acerca da maneira como se deve responder àqueles que de algum modo parecem inferiores ou peculiares.91 21 Este versículo protege o versículo 20 de ser interpretado equi vocadamente como uma racionalização para evitar um próximo pobre. Na verdade, a q u e le q ue d esp reza [veja 1.7] o seu p ró x im o [veja 14.20a] é um p e c a d o r ( hô fê ’; veja 1.10; 8.36). Ao considerar o seu próximo como desprezível, esse indivíduo é culpável de arrogância e de transgressão dos padrões de Deus (veja 5.22). M a s quanto àq u ele que m ostra fa v o r p a ra com (veja 3.4) indica aquele que considera o 90. Van Leeuw en, Proverbs , p. 142. 91. S. Storay, "W hy Does the T hem e o f Povcrty C om e into the C ontext o f Prov 14:20?” in Texl and Theology: Studies in H onour o f Professor Dr, Theol. Magne Saebo , A rvid Tângberg (O slo: Verbum, ca. 1974), pp. 298-310.
seu próximo digno de favor e, portanto, o aceita ativamente e realiza atos de bondade a favor dele. Esse favor não é forçado, mas sim con cedido espontaneamente. Quando é estendido aos necessitados ele implica piedade, misericórdia e generosidade; não implica tratamento preferencial. “Ser bondoso significa ajudar os pobres, alimentar os fa mintos, livrar os aflitos da derrota e da morte.”92 As variações p o b re Ç ã n i) e op rim id o Ç ã n ã w ; veja 3.34) refletem um problema textual de pouca importância (veja n. 37). “Aquele que despreza” e “aquele que mostra favor” são paralelos antitéticos, mas o mesmo não pode ser dito de “próximo” e “oprimido”, que devem ser projetados em seus parale los antitéticos, dando o sentido de “próximo pobre/oprimido” nas duas metades. A exclamação laudatória bem -aventurado e le é ( ’a S rã y w ; veja 3.13; 8.32,34), apresenta a pessoa bondosa como a ideal, pois em decorrência de seu relacionamento presente com Deus ela desfruta a perspectiva de felicidade futura. A antítese imprecisa deixa implícito que o “bem-aventurado” não é um “pecador” e que o pecador não tem nenhuma perspectiva de felicidade futura. O provérbio adverte o discí pulo para não ser o tipo de pessoa que, ao dar lugar ao lado sombrio da sua natureza (veja v. 20), foge do seu próximo pobre e/ou oprimido em função de um coração duro e uma arrogância insensível. Somente a pessoa que demonstra bondade para com o seu próximo necessitado desfruta um relacionamento correto com o S e n h o r e gozará a felicida de ideal futura, e somente o S e n h o r , aquele que controla o futuro, é capaz de cumprir as ameaças e promessas deste provérbio (veja 17.5; 19.17). O pecador avalia seu próximo por suas próprias preferências deprava das, nâo pelos parâmetros de Deus segundo os quais cada pessoa, por ser a imagem de Deus, tem dignidade e merece respeito (veja 14.31; 17.5; 19.7). Tanto o Antigo quanto o Novo Testamento ordenam: “Ama ao teu próximo como a ti mesmo” (Lv 19.18; Mt 22.39,40; Rm 13.9,10). 22 As palavras-chave “bem” e “mal” encerram os versículos 1922. O versículo 22 expande o atributo de Deus de demonstrar favor (v. 21) para os outros atributos de sua graça de demonstrar bondade e fidelidade (Ex 34.6). Além disso, ele intensifica aquele que despreza o seu vizinho para aquele que planeja o mal contra ele, e aquele que demonstra favor para aquele que planeja o bem. Por fim, ele qualifica o pecador como alguém caminhando para a sua morte sem esperança
alguma de salvação, e o estado abençoado do misericordioso como ele próprio encontrando em seu momento de necessidade, bondade confiá vel naqueles que podem salvá-lo, especialmente da parte do S e n h o r . O ímpeto da pergunta retórica antagônica acaso... não (halô ’) omitida no verseto B, chama a atenção do discípulo e lhe mostra o ponto de vista do mestre sábio ao esperar uma resposta negativa enfática, “Aqueles que planejam o mal certamente se desviarão!” (veja 8.1; cp. Rt 2.8,9; 3.1, 2).93 Os que maquinam o mal (hõr^Sê rã'\ veja 3.29; 6.14; 12.20; cp. 6 .18), em contraste com os que planejam o bem (hôr^Se tôb\ veja 2.9; 11.23; 12.25; 14.14,19), retrata metaforicamente aqueles que des prezam os necessitados, não os misericordiosos, como artífices que con feccionam com habilidade e talento atos morais que prejudicam os ou tros ou beneficiam a si próprios. De modo irônico, os primeiros se des viam (yit'ü), uma metáfora que retrata esses artífices laboriosos como indivíduos que perambulam sem esperança ou bêbados que cambalei am, indicando que deixaram o caminho ético onde a pessoa oferece e recebe bondade, e agora andam prejudicando aos outros e a si mesmos (7.25). Contrastando com isso, ao permanecerem no caminho certo, os que planejam o bem encontram bondade confiável (hesed we^met; veja 3.3). A personificação “encontram” é fornecida em harmonia com a personificação comum desses atributos. Os sujeitos são antônimos exatos, mas o mesmo não pode ser dito de seus predicados, que devem ser devidamente projetados em seus paralelos antitéticos. Os planeja dores malévolos nâo encontram bondade e assim caminham para a sua morte, e os planejadores benevolentes nâo se desviam do caminho cer to e, assim, alcançam um destino salvador. 23 Este provérbio antitético exemplifica “aqueles que planejam o bem” como aqueles que, por meio do trabalho árduo e honesto, rece bem retomo material e circunstancial maior que os gastos (cp. 10.4, 5; Is 49.4; Hb 6.10; cp. Jo 6.27). Entretanto, a mera composição de pala vras somente leva de modo surpreendente a um estado e a circunstân cias que deixam o indivíduo sem vida. Em qualifica o campo no qual se obtém o proveito. Se trabalho vigoroso ('eseò; veja 5.11 e esp. 10.22) é definido, o que é possível na poesia, kol - tem o sentido de todo, “a totalidade”, “o todo”; mas se é indefinido, significa “todo tipo de”.94Há 93. H. A. B rongers, “Som e R em arks on the B iblical P article h a l õ " \ in B. A lbrektson, Remembering AH lhe Wav: A Colleclion o f Old Testamenl Studies (OTS 21; Leiden: E. J. Brill, 1981), pp. 177-89. 94. GK.C, # 127c.
(yihyeh) indica a verdade universal de que o lucro existe, é presente, ou está no processo de se concretizar no futuro. O paralelo “leva” confir ma o último conceito. Proveito (môtãr) indica “aquilo que resta”; o sentido de excesso é fundamental na raiz.95 Aqui sua forma abstrata indica os resultados, a vantagem e o benefício que excedem e se en contram além e acima do empreendimento. Mas a conversa fiada traduz “mas as palavras dos lábios” (üdebar-sepãtayim; veja 2Rs 18.20)96 e deve ser contrastada com os muitos outros provérbios que ensinam sobre o poder das palavras (e.g., 10.10,11 eesp. 14.25). O verbo implí cito leva... à é uma metáfora incompleta de uma jornada que leva a um objetivo (cp. 11.24). Apenas Çak; veja 11.23) restringe o que antecede para destacar a conclusão subsequente inesperada. Escassez (mahsôr\ veja 6.32; 11.24) indica a falta de um estado, de circunstâncias e de oportunidades necessárias para a vida. Provérbios 21.5 atribui môtãr e mahsôr - observe a aliteração das últimas palavras de cada verseto - à diligência e à rapidez; outros provérbios censuram a verbosidade (cp. 10.19; 12.18a; 18.6). 24 A referência à coroa encerra os versículos 18-24. O provérbio dá continuidade ao tema da riqueza e da pobreza iniciado no versículo 20 e, mais especificamente, intensifica o “proveito” ou as riquezas ad quiridas e mencionadas no versículo 23 para uma coroa que adorna. A ligação semântica sugere que o diligente, não os faladores ociosos do versículo 23, é um termo correlato a sábio em contraste com os insen satos do versículo 24.97 A coroa C0teret, um sinal visível do favor de Deus; veja 4.9; 12.4) dos sábios (hakãm im ; veja p. 145) é a sua ri queza ÇoSrãm; veja 3.16), conferindo-lhes importância social, dignida de e domínio, e permitindo-lhes confrontar uma ameaça. Apesar de ser verdade que o discípulo não deve confiar na riqueza (10.15, 16; 11.28), e que a riqueza pode ser obtida por atos condenáveis (11.16), também é fato que o S e n h o r recompensa a virtude com riqueza (veja 3.16; 8.18; cp. lRs 3.13; S l 112.3). A estulticia dos insensatos Çiwwelet kesilim; veja n. 42; pp. 167-168) indica a insolência moral intratável daqueles que são cegos e insensíveis à verdade moral, e funciona como metonímia para os atos que os insensatos infligem sobre outros. E estulticia 95. B. Waltke, “ M icah” , in The Minor Prophels: An Exegetical and Expository Commenlarv, org. T. E. M cCom iskey (Grand Rapids: Baker, 1993). p. 706. 96. W. H. Schm idt. TDOT, 3:104, s.v. dSbhar. 97. Plôger ( Sprüche, p. 174) tam bém reconhece a ligação no T M , mas recusa ser orien tado por ela. preferindo a versão alternativa na LXX.
Çiwwelet) é um jogo de palavras, pois agora “estulticia” indica o efeito bumerangue da insolência moral que os insensatos infligem sobre si mes mos (veja 14.8,18; 16.22b). Roboão “perdeu dez pedras preciosas de sua coroa real” (1 Rs 12.12-16).1'8 (3) Contrastando caracterizações e conseqüências de vida ou morte (14.25-32) Com exceção do versículo 28, a subunidade final combina quatro caracterizações com as conseqüências de vida ou morte: os versículos 25, 26, 27, 29, 30 e 31, 32. A primeira é a testemunha honesta em contraste com a falsa (v. 25), corrigindo uma possível interpretação equivocada do versículo 23. Na verdade, a mera conversa não produz riqueza, mas num tribunal as palavras também podem ser uma questão de vida ou morte. As conseqüências de ser temente a Deus, a segunda caracterização, também dizem respeito à vida e à morte, expandindose do indivíduo (v. 26a), para a sua família (v. 26b) e para os outros (v. 27). A terceira caracterização, outro par proverbial, é sobre a pessoa paciente em contraste com a pessoa impaciente (vs. 29, 30). O último par proverbial diz respeito à piedade e ao comportamento social (v. 31) e suas conseqüências eternas (v. 32). De forma climática, o último par de provérbios aponta explícita (v. 31) e implicitamente (veja v. 32) para o S e n h o r como o sustentador da ordem moral. A última caracterização volta a falar do opressor dos pobres em contraste com a pessoa que se mostra bondosa para com eles (vs. 20,21,31). Trata-se, mais uma vez, de uma questão de vida ou morte, pois o defensor dos pobres é o pró prio Criador. A unidade termina com uma declaração sumária dramáti ca que liga o “opressor”, com o termo correlato “perverso”, e o “bon doso” com o “reto”. Os primeiros acabam num colapso final mediante seu próprio mal, enquanto que os últimos continuam a buscar refúgio no S e n h o r mesmo em sua morte física! No entanto, o versículo 28 permanece separado. É o primeiro de vários ditos reais nas Coleções e, de maneira significativa, é um dentre vários que foram colocados próximos de provérbios sobre o S e n h o r : 16.115; 20.26-28; 21.1 -14; 22.11,12; 25.2-7; 29.12-14. Whybray sugere: “Essa justaposição parece ter como propósito central enfatizar que a obediên cia a Yahweh é particularmente importante para os reis, em cujas mãos
se encontra a vida de seu povo”.99 Também está ligado ao versículo seguinte pela palavra-chave rob (“multidão”, v. 28a; “grande”, v. 29a). 25 Este versículo é semelhante ao versículo 5, mas a ênfase agora é sobre a verdadeira e a falsa testemunha, não apenas sobre seu cará ter. Ele define a testemunha confiável (v. 5a) como aquela que não mente e, deste modo, salva o inocente (v. 25a). O versículo 25b repete literalmente 12.17b. Estes versículos, com 19.5, 9, 28; 21.28; 24.28; 29.24, tratam da execução correta ou incorreta da justiça, que depende da veracidade dos testemunhos. No cerne desse paralelo quiástico, uma testemunha sincera com informações de primeira mão num tribunal Çêcl *met\ veja 14.5) é o antônimo exato de umperjuro (yãpiah kezãbim; veja 14.5), mas um predicado em sua estrutura externa, é aquela que livra (m asil; veja 2.12) vidas (nepãsôt; veja p. 140), não é a antítese exata ao outro, é enganador (m irmâ, i.e., que planeja enganar a fim de prejudicar outros; veja 11.1; 14.8). Esses predicados devem ser projeta dos de modo apropriado em seus paralelos antitéticos. “Compelida por seus escrúpulos e não dissuadida pela covardia”, a língua da testemunha sincera não engana,100 mas um peijuro tem a disposição para enganar a fim de beneficiar a si mesmo à custa dos inocentes (veja 2.12-19). “A situação visualizada nestes provérbios é o ato de prestar falso testemu nho contra um homem inocente e não a favor de um homem culpado” (cp. Dt 1.16; Pv 29.24).101 No antigo Israel um grande número de acusa ções acarretava na pena de morte, mas o acusado só podia ser sentenci ado mediante o depoimento de duas ou três testemunhas (Dt 19.15). 26, 27 A expressão inicial “temor do S e n h o r ” (yir'a,t YHWH) liga os versículos 26 e 27 temática e verbalmente. Além disso, os dois ver sículos compartilham o padrão sintético de avaliação +:: +, incomum na Coleção II. O primeiro elemento do par trata da segurança, esclarecida no versículo 27 como segurança da morte; o segundo trata de vida. Os dois aspectos são necessários. Uma vez que o mal não apenas ataca mas também atrai, os pais devem conhecer (e mostrar à sua família, v. 26b) algo mais forte e melhor. 26 O discípulo deve ter santa reverência pelo S e n h o r e seus man damentos, pois se ele fugir para esse âmbito, não para as seguranças humanas, ele e seus filhos encontrarão uma defesa inviolável dos laços 99. W hybray, Proverbs. p. 221. 100. C p. D elitzsch, Proverbs. p. 222. 101. A ilken, Proverbs, p. 206.
da morte (veja 18.10; 29.25). No [veja 14.23] temor do S e n h o r (veja pp. 153-154) significa que a família santa reverencia o Autor e obedece a seus ensinos com cuidado. Forte ('õz; veja 8.28b; 10.15) indica aquilo que está firmemente estabelecido e inviolável (3.5). Segurança (mibtah, da raiz 6 $ ; veja 3.5) ocorre 15 vezes, sempre na poesia, e indica uma fonte ou base de sentimentos tão seguros e confiantes que permitem ao indivíduo ficar despreocupado.102E seus filhos têm (úlebãnãyw yihyeh) designa os filhos implícitos obedientes desses pais, não apenas os des cendentes biológicos (veja 4.3; 10.1; 20.7). Deus salva famílias (cp. Gn 7.1; 18.19; Êx 20.6, 7; SI 103.17; At 16.31). Uma vida comprometida com Deus se estende além da própria existência. Refugio (mahseh) é paralelo a mibtah- õz; a mesma combinação é encontrada em Salmos; o tema do refúgio é importante no Saltério (cp. SI 2.11; 7.1 [2]; 34.8[9]; 52.7[9]). De acordo com Gamberoni, “[A palavra tem] uma espécie de faixa semântica: proteção, por vezes do perigo intenso, mas com uma tendência clara para o sentido de ‘abrigo’, quer na natureza, numa ins tituição, ou numa sociedade. Também fica implícito um elemento de ‘fuga’, uma vez que existe uma variação constante necessária entre os lugares que constituem o habitat”.103A ligação com a expressão-chave “temor do S e n h o r ” no versículo 27 sugere que, neste caso, o refúgio se refere à proteção dos laços da morte. “Forte segurança” e “refúgio” são paralelos precisos, mas o mesmo não pode ser dito de “no temor do S e n h o r ” e “seus filhos”. Estes devem ser estendidos a seus paralelos sinônimos: os filhos têm uma forte confiança “no temor do S e n h o r ” e ali os pais encontram refúgio. 27 O provérbio repete 13.14, exceto pelo fato de que temor do S e n h o r (veja 14.26) substitui o seu sinônimo “o ensino dos sábios”.104 Usando as metáforas de uma fonte de vida e armadilhas da morte, o provérbio continua chamando o discípulo (veja 1.4) a entrar com reve rência no reino santo do S e n h o r e dos ensinos inspirados dos sábios. 102. Em Jerem ias 17.7 o verbo e este substantivo se encontram em paralelism o sinônim o. Em oito vezes mibtah se refere a formas falsas de segurança (Jó 8.14; 18.14; 31.24; Pv 21.22; 25.19; Jr 2.37; 4 8 .13; Ez 29 .1 6 ); em um a o casião se refe re a um lar seguro (Is 32.18; contrastar com 18.14), e seis vezes ao S e n h o r , a única fonte verdadeira do sentim ento de segurança ( S I 40.5[6]; 65.6[7]; 71.5; Pv 14.26; 22.19; Jr 17.7). 103. J. G am beroni, TDOT, 5:67, s.v. hãsâ. 104. A LXX traduz “ o ensino do sábio” em 13.14 com o “lei do sábio”, e “temor do S e n h o r " em 14.27 com o “ m andam ento do S e n h o r ” , sugerindo que ela interpreta o “ m andam ento do S e n h o r ” com o um sinônimo exato de “tem or do S e n h o r ” (veja 9.10; S I 111.10).
Nesse reino, ele encontra vida abundante (v. 27a), que salva ele próprio e a outros da morte (v. 27b; cp. 15.31; 20.21). 28 Acima de todos os outros, o rei deve viver no temor do S e n h o r . Como o principal magistrado no governo civil, ele “fornecia ao povo a liderança, o controle e o apoio esperados de seu governo”.105 Se ele fracassar na sabedoria que vem do temor do S e n h o r , sofrerá a extinção social. Na (be; veja 14.23, 26) multidão (rofe; veja 5.23) de súditos ('Sm; veja 11.14), que se encontram unidos sob seu governo, está o esplendor (hadrat\ veja n. 47) de um rei (melek; veja 1.1; 8.15, 16). Contrastando com isso,ficar semm um povo (le'õm, um paralelo poé tico de '5m; veja 11.14) enche... de terror (veja 10.14). Potentado (rãzôn; veja 8.15) é o equivalente poético de melek. Como o preâmbu lo esclarece, os provérbios são dirigidos aos jovens de Israel, não ape nas aos governantes em início de carreira (veja pp. 107s.; 1.4, 5). A Mulher Sabedoria exortou o povo em geral a aceitá-la, pois ela lhes prometia as mesmas competências que capacitam os reis para gover nar (8.4, 15). O rei funciona como tipo, um exemplo, para qualquer líder. De modo implícito o provérbio incentiva o discípulo a ser uma pessoa competente ao qual o povo se dedica, não um insensato, o qual o povo abandona. A competência do rei inclui ter uma bondade confiá vel (20.28), ser justo (16.10; 29.4; 14), reto (16.12), sincero (16.13), puro e gracioso (22.11), criterioso (25.2), inescrutável (25.3), separado dos perversos (20.8, 26; 25.5; cp. 14.35) e prudente (31.4). Um rei como esse anda em orgulho majestoso cercado por seu exército (30.31). O rei que perde a lealdade do povo é derrubado, como descobriu Roboão (1 Rs 12.1 -20). Bridges afirma a respeito de Cristo: “Quão grande, então, é a honra de nosso Rei celestial na multidão incontável de seu povo” (cp. 2Ts 1.10; Ap 7.9, 10). No entanto, o provérbio deve ser considerado com o ensino bíblico segundo o qual os números grandes têm pouco valor quando o S e n h o r está presente (e.g., SI 33.16, 17). 29, 30 O versículo 29 caracteriza o paciente em contraste com o impaciente, e o versículo 30 intensifica as conseqüências do entendimen to e da insensatez nas questões de vida ou morte (v. 30). Essa ligação semântica é apoiada por referências à fisionomia, mas o versículo 29 fala da fisionomia exterior da pessoa, um rosto relaxado (= “paciência”) em 105. Culver, TWOT. 1:508, s.v. m Slak. 106. BDB, p. 67, s.v. 'epes: V. Hamp, TDOT, 1:362. s.v. ephes.
contraste com falta de fôlego (= “irritável”) e o v. 30 fala dos correlatos interiores, “um coração calmo” em contraste com “podridão nos ossos”. Brongers liga o par de provérbios tomando paralelos os termos “calma” e “paciência” e também “irritável” e “paixão ardente”.107 29 O provérbio admoesta à paciência em contraste com a impaci ência, pois a primeira conforma a vida à ordem moral com grande dis cernimento, enquanto que a última leva o indivíduo a exibir e praticar a insolência imoral mais intensa. Paciência Çerek'appayim\ lit., “longo de rosto”) é derivada do verbo h'ryk e o singular ’ap significa “relaxar o rosto”, uma expressão facial de paciência (Pv 19.11; Is 48.9).108 Nas dez ocorrências dessa expressão hebraica, além de suas quatro ocor rências no livro de Provérbios (14.29; 15.18; 16.32; 25.15), é sempre usada com referência a Deus (Êx 34.6, 7; Nm 14.18; 2Cr 30.9; Ne 9.17; SI 86.5, 15; Jr 15.15; J1 2.13; Jn 4.2; Na 1.3). Nestas passagens ela é usada com os outros atributos benevolentes de Deus que o levam a ter compaixão e não fazer sobrevir o desastre sobre os pecadores. A pessoa paciente permanece tranqüila quando é injustiçada; ela controla suas emoções de modo a pensar e agir de acordo com a piedade e a ética. Não é “agitada e impelida” a reagir com exagero para se desfor rar ou buscar vingança em vez de confiar no S e n h o r . 109 Ele é como Deus, cuja paciência o levou a acampar no meio dos israelitas pecadores (Êx 34.6, 7) e não fazer sobrevir a destruição sobre ninivitas arrependi dos (Jn 4.2). A paciência dá espaço para o pecador se arrepender e abandonar os seus delitos (2.13). Uma vez que a paciência é peculiar ao caráter de Deus, não dos seres humanos, é caracterizada como grande (rab\ veja 4.10) competência (t?bünâ; veja p. 148). Contrastando com isso, ser irritável (cfsar-rüah\ lit. “curto de espírito”; veja 14.17), a julgar pelo uso do termo em Miqueias 2.7 e por um paralelo ugarítico, significa chegar ao seu limite da tolerância da injustiça social tão rapidamente a ponto de dar ocasião ao pecado.110 Exalta (mêrim\ “levanta”, “erige”; 107. H. A. Brongers, ‘7„m 'n in der biblisch-hcbraischen Sprache” , OtSl 18 (1973) 277. 108. A pesar de confundir 'appayim. com raiva, a Targ. traduz erek com o “aquele que relaxa”. Enquanto em nossa língua um a “cara com prida” indica um a pessoa em burrada ou taciturna, em hebraico, indica um rosto relaxado, o sinal exterior de paciência (veja Gruber, Aspects o f Non-verbal Communication , pp. 483, 506-7). G ruber tam bém acredita que se refere a um a pessoa feliz e am igável, e Sasson (Jonah, p. 282), baseando-se em G ruber, im agina um a personalidade franca, cordial e generosa. 109. M cKane, Proverbs, pp. 468-69. 110. Qsr ocorre oito vezes com rcps(Nm 21.4; Jz 10.16; 16.16; Zc 11.8) e com seu sinônimo rwh (Êx 6.9; Jó 21.4; Pv 14.29; Mq 2.7). Em Zacarias 11.8 e num paralelo ugarítico quase idêntico
veja 4.8) significa, neste caso, “mostrar loucura extrema”.111 Seus para lelos em 12.23; 13.16 são “proclama a estulticia” e “espraia a sua loucu ra”. Loucura ( ’iwwelet; veja pp. 167-168) é uma metonímia para os atos e conseqüências associados à insolência moral (5.23; 14.24). Ele cria a loucura e se toma a sua presa (cp. 14.17). Em sua incredulidade ele parte em busca de vingança com impiedade e audácia e, ao fazê-lo, prejudica a si mesmo, como Roboão descobriu (1 Rs 12.1 -24; cp. Gn 34). 30 O segundo elemento do par de provérbios intensifica a fisiono mia da paciência para a sua calma interior e disposição tranqüila. A serenidade preservará a vida do discípulo, mas a irritação o matará. Um coração (lêb\ veja pp. 140-143) calmo (II marpê', não I marpê’ [= “remédio”; veja 4.22] segundo HALOT)ul é vida (hayyim\ veja pp. 158-161), referindo-se aqui à vida física, o princípio de animação, em contraste com a morte física, como demonstrado pelo qualifícador no corpo todo (besãrim veja 4.22; 5.11).113 O plural excepcional beéãrím indica “a vida física na totalidade de suas funções e no caráter comple to da variedade de suas relações”.114 Mas a paixão ardente (q in â ; veja 3.31)'15 é podridão nos ossos {i^qab 'asãmôt), uma condição que se deteriora até à ruína e à morte (veja 12.4). Enquanto em 12.4 “osso” está no singular, aqui se encontra no plural, combinando com “carne”. O “corpo todo” e os “ossos” se encontram quebrados, uma frase estereotipada que se refere tanto aos aspectos materiais quanto psicoespirituais da natureza humana. A agitação interior, uma mente rancorosa, que se preocupa apenas consigo mesma e que se exaspera, é como o câncer nos ossos que faz apodrecer os elementos mais firmes do corpo e encurta a vida da pessoa (cp. Eclo 30.24).116 (citado por R. D. Haak [“A Study and New Interpretation o f qsr nephesh", JBL (1982) 16163]) a im paciência é equiparada a pecar por ira. Haak acredita, questionavelm ente, que a expressão idiom ática tem o sentido de im potência em Êxodo 6.9 e Jó 21.4 mas reconhece que em Provérbios 14.29 tem o sentido de im paciência que se m ove na direção do pecado. 111. HALOT , 3:1204, s.v. rwm . 112. HALOT, 2:637, s.v. II m arpê’. Também é atestado em Eclesiasles 10.4. Porém BDB (p. 971, s.v. m arpê’) não faz distinção entre as duas raízes, chegando à conclusão de que Provér bios 14.30 se retere a uma mente saudável e tranqüila. 113. W. Cosser. “The Meaning o f ‘Life’ (Hayytm) in Proverbs, Job, and Ecclesiastes”, GUOST 15 (1955) 48. 114. D elitzsch, Proverbs, p. 224. 115. Rashi traduz qin'â com o “ um hom em de calm a” (M. Lyons, “ R ashi’s Commentary on lhe Book o f Proverbs" [en treg u e com o c u m p rim e n to p arcial dos re q u isito s para a graduação de rabino. 1936], p. 82). 116. De acordo com M einhold, Sprüche, p. 244.
31 As paixões ardentes da pessoa colérica, provocadas por sua rivalidade para com seu próximo, transbordam para a opressão e/ou difamação dos pobres indefesos e, com isso, impugnam o nome e a reputação de Deus. Neste provérbio quiástico os sujeitos se encontram na estrutura externa. Aquele que oprime ou difama ('õSêq um jogo de palavras intencional; veja n. 49) ao pobre (dãl; veja 10.15; cp. 17.5a, em que rãS é usado num provérbio semelhante) zomba do (ou abusa verbalmente; hêrêp) significa denegrir a importância, o valor e/ou a capacidade de alguém ou algo. Escarnecer do pobre implica insultar ou blasfemar seu Criador 'õéêhü; veja 8.26.117 O antecedente do sufixo “seu” pode ser escamecedor ou pobre (veja 22.2), mas o antecedente mais próximo é “pobre”. A criação da humanidade funciona como a base filosófica para a ética social (veja pp. 119-120). O sujeito antitético, aquele que é bondoso para com (hõnên\ veja 14.21), significa que ele considera o recipiente digno de favor, o aceita ativamente e realiza atos de bondade para com ele. O necessitado Cebyôn) era “pra ticamente um indigente, o trabalhador pago por dia no mundo antigo, completamente dependente de outros para a sua sobrevivência”." 8 A palavra é um sinônimo de dãl “o pobre” e 'ãnifãnãw (veja 3.34; 14.21b; 19.17a; 22.9b; 28.27a; 28.8b); não se tem a intenção de fazer distinção, mas a razão para seu uso não fica clara."9 O predicado antitético, honra a Deus (mekabbedô\ veja 3.9) classifica o benfeitor como aque le que dá peso social a Deus. O pobre e o necessitado possuem uma condição exaltada com toda a humanidade em função do seu Criador (veja também 17.5; 22.2; 29.13), cuja honra inseparavelmente está ligada à sua obra (cp. Jó 31.15; Mt 25.40,45; Tg 3.9; Uo 3.17,18). Aquele que desonra a Deus não ficará impune, e a pessoa que lhe dá honra não ficará sem recompensa (3.9, 10). Os provérbios que louvam a generosi dade para com os pobres (14.21, 31; 19.17; 22.9; 28.27) são dirigidos a todos aqueles que são capazes de ajudar os necessitados e salvá-los da fome. Em 28.3 um homem pobre difama e/ou oprime outro homem pobre! 32 As conseqüências radicalmente diferentes de ajudar a comuni dade ou de ser culpado de um comportamento antissocial com referên cia ao S e n h o r conduzem a unidade à sua conclusão climática. O per 117. E. Kutsch, TDOT, 5:211, s.v. haraph II. N o paralelo 17.5a é usado o seu sinônim o i g (“es carnecer” ). 118. W. R. Domeris, NIDOTTE. 1:228, s.v. 'ebyôn. 119. W hybray, Wealth andPovertv, p. 22.
verso (rãSã!\ veja p. 164) é derribado (yiddãheh). Dhh ocorre seis vezes, cinco delas em Salmos, e indica fazer alguém ou algo ser arrui nado pela remoção de sua estabilidade e segurança (cp. S I 35.5; 3 6 .13[14]; 62.3[4]). Pelo (be ) indica o agente da sua queda, a saber, seu próprio mal (rã'ãtô), provavelmente uma palavra de sentido duplo para a atividade prejudicial e antiética em relação a outros e ao dano que ele causa a si mesmo (veja 1.16). Mas o reto ( saddiq ; veja pp. 149-152) se refugia no S e n h o r (ou em Deus; hõseh; veja n. 52), deri vado do mesmo lexema que o substantivo traduzido como “refugio” em 14.26 (cp. Is 57.13). No (be) indica, neste caso, a circunstância em que o reto se mostra um adorador do S e n h o r , como sendo em sua morte ( môtô ; veja n. 53). Assim como “seu próprio mal” remete a “os perver sos” assim também no verseto B “sua morte” remete a “o reto”. Ape sar de “reto” e “perverso” serem paralelos antitéticos perfeitos, não se pode dizer o mesmo sobre “se refugia [no S e n h o r ] em sua morte” e “é derribado pelo seu próprio mal”. Esses conceitos devem ser projetados apropriadamente nos seus paralelos antitéticos. A pessoa perversa, que perece pelo seu mal, não crê no S e n h o r nem mesmo quando está mor rendo, e os retos, que confiam no S e n h o r mesmo quando estão morren do, não são derrubados por nenhum mal, incluindo a morte (cp. Gn 5.24; S I 4 9 .14[ 15], 15[ 16]; 73.24). Rashi comenta, “Quando morrer, ele terá certeza de que entrará no Jardim do Éden”.120 Meinhold reconhe ce com relutância que esse provérbio vê um refúgio para os retos que se encontra além dos limites da morte.121 Ele acredita que é excepcio nal, mas na verdade o provérbio é inteiramente coerente com o restan te do livro (veja pp. 161-164). 7. Confirmando ajustiça com uma língua branda (14.33- 15.4) 33 No coração do perspicaz a sabedoria repousa, e 1 no meio dos insensatos ela se revela.1 120. Lyons, “ R ashi’s Commentary on Proverbs", p. 82. 121. M einhold, Sprüche, p. 245. 1. Ou “ mas” . 2. A LXX, seguida pela Sir., G em ser (Sprüche, p. 67), Plüger (Sprüche, p. 167) et al. fornece criativamente uma antítese esperada ao acrescentar o negativo: “no coração dos insensatos ela não é discernida”. A Targ. chega ao mesmo fim acrescentando “loucura": “E no meio dos insen satos a loucura é revelada”. A Vulg. apresentou o verbo como Hifil, et indoctos quoque erudiet, “e instruirá também os incultos" (cp. 12.16). Toy (Pmverbs, p. 301) coloca “loucura” no lugar de “se revela”. D. W. Thomas (“The Root y d in Hebrew”, JTS 35 [1934] 302-3), seguido por McKane
34 A retidão exalta uma nação,
mas o pecado é uma condenação para os povos .3 35 O favor do rei vemA a um servo prudente, mas sua fúria arruina5 um [servo] vergonhoso.6 15.1 Uma resposta branda desvia o furor, mas uma palavra dolorosa incita a ira. 2 A língua dos sábios adorna1 o conhecimento, mas a boca dos insensatos derrama estulticia. 3 Os olhos do S e n h o r estão em todo 8 lugar, contemplando [vigilantemente] os maus e os bons. 4 O alívio9 da língua é uma árvore de vida, mas a perversidade nela fratura o espírito . l0
(Proverbs, p. 466), associa ycT com o árabe uict (cp. 10.9) (i.e., “é suprimida”), considerando o árabe, não o hebraico. Ross (Proverbs, p. 991) acredita que "e entre os insensatos ela se revela" pode ser irônico ou sarcástico (i.e., o insensato abre a boca e deixa escapar aquilo que pensa ser sabedoria). Cada uma dessas alternativas corrompe o significado claro do TM. 3. Um a vez que o paralelo antilético gôy é o objeto do verbo, o genitivo "... dos povos” (le 'um m im ) provavelm ente é um genitivo de objeto mediado (IBHS, pp. 146-47, P. 9.5.2d). 4. A preposição lamede implica num verbo de m ovim ento (IBHS, p. 224, P. 11.4.3d). 5. O TM traz tihyeh ("ocorrerá” ). A LXX traz te de kea u to u e u stro p h ia a p h a ireita i atim ian. Gemser (Sprüche, p. 112; cp. HALOT, 1:241, s.v. hw h) relroverteu aphaireitai para fihauieh (Piei de hõwã “fazer cair/queda” ) como no aramaico e no árabe. 6. Lit. “aquele que leva a si m esm o a ser envergonhado” . 7. A raiz triliteral é uma forma secundária da biliteral tb. Supondo obter um paralelismo mais apropriado ao contrastar o discurso harm ônico e tratável com um discurso desenfreado. Toy (Proverbs, p. 309) et al. corrigem tê(íb para ta ttip , “gotejar” . M. D ahood (Proverbs and Northwest Semitic Phiiology [Roma: Pontificai Biblical Institute, 1963], pp. 32-33) alega que tê(tb é um a form a secundária de y tp “ gotejar". ClifTord (Proverbs, p. 151) nota que “cm hebraico, a boca destila mel, mas nunca a língua” . G R. Driver (“Problems in the Hebrew Text o f Proverbs”, Bib 32 [1951] 181), tom a por base os cognatos sem íticos e propõe o significa do “deixar claro, anunciar". M as a tradição unânim e textual e de tradução não precisa de aprim oram ento. “ A pergunta aqui não é ‘M uita conversa ou pouca?’, mas sim ‘Refletida ou irrefletida?’”(K idner, Proverbs, p. 106). 8. Antes do genitivo indeterminado, kol é usado de forma indefinida ou distributiva (GKC # 127c). 9. Ou “calma”. Marpê’ pode ser 1 rp' (“cura”; veja 12.18; 13.17; de acordo com LXX, Sir., Targ.. KJV, NJPS, NIV, McKane [Proverbs, p. 483], Meinhold [Sprüche. pp. 247-48]) pois esse conceito terapêutico corresponde adequadamente à m etáfora “árvore da vida”, forma um bom paralelo com “ fraturar”, que implica na necessidade de cura, e corresponde a 12.18. Entretanto, pode ainda ser II rp ’ (“calma”; veja 14.30; e também Vulg., Delitzsch [Proverbs. p. 229], Gemser [Sprüche, p. 68], Plõger [Sprüche, p. 178]), pois esse conceito corresponde adequadamente ao contexto mais amplo (veja 15.1) e também cura os entèrmos e levanta os prostrados (veja 3.18; 11.30). E provável que a intenção seja fazer um jogo dc palavras: uma língua suave e calmante é um remédio para um espírito fraturado. 10. Lit. “é uma fratura no espírito” .
Depois de um provérbio educativo que introduz a unidade (14.33), o par de provérbios liga a sabedoria à ética de uma nação e à responsabi lidade do rei de recompensar as autoridades boas e castigar as perversas (14.34, 35). Porém, por meio dos sinônimos “fúria” (14.35) e “furor” (15.1), uma seqüência sobre o modo de falar, adverte acerca das pala vras dolorosas que incitam a ira e acerca dos efeitos benéficos de uma língua dócil no reparo dos estragos (15.1 -4). Os versículos 1 e 2, também um par de provérbios, estão ligados pelo tema em comum do discurso construtivo versus o destrutivo e por sua sintaxe idêntica." O primeiro provérbio do par aponta para os frutos do discurso construtivo, e o segun do para suas raízes no caráter de um indivíduo, seja ele um sábio ou um insensato. Juntos eles ensinam que uma resposta branda (v. 1) não com promete a verdade, o “conhecimento”, mas sim a adorna (v. 2); e que as palavras pungentes (v. 1) promovem a insensatez, não o conhecimento (v. 2). O versículo 3, que está ligado ao versículo 2 pela raiz “bom” (#>), confere a esta unidade uma dimensão teológica ao observar a vigilância do S e n h o r em relação aos bons em contraste com os perversos, apresen tando a resposta do rei correspondente aos servos prudentes e aos ver gonhosos. A ligação de recompensas e castigos, implicitamente pelo S e n h o r e explicitamente pelo rei, volta a associar o S e n h o r no céu com seu representante na terra (veja 14.27, 28), como Whybray observou.12 O versículo 4 encerra a unidade afirmando que uma língua dócil pode curar a fratura causada por uma língua perversa. 33 Este provérbio educativo introdutório compara a revelação da sabedoria para o perspicaz e para o insensato e contrasta a forma como ambos reagem a ela. Ao contrário da introdução da unidade anterior (veja 14.1) e em harmonia com o prólogo, a sabedoria (hokmâ; veja pp. 124-126) é personificada (veja pp. 132-136). No coração (Zêò; veja pp. 124, 125) do perspicaz (nãbôn; veja 1.5), que tem uma percepção aguçada de uma situação e de seu resultado pela fé no conhecimento inspirado que o mestre sábio possui acerca da ordem moral de Deus e que pratica esse conhecimento, a sabedoria repousa (tãnüah). Nâah significa se assentar em paz num lugar determinado, e tem nuanças de um caráter final e/ou vitória, salvação. De acordo com Stolz, no Qal ela significa “assentar-se” ou, de modo mais abrangente, “ter descan 11. N o com eço de cada verseto se encontra uma construção gen. adjetival ou atributiva que constitui o sujeito, seguido de um verbo no Hifil com um objeto direto. 12. W hybray, Proverbs , p. 224.
so”,13 e o paralelo em Provérbios 21.16 sugere a nuança “chegar a um estado de descanso”. Coppes propõe que nüah possui nuanças soteriológicas (i.e., conquistar e governar; em Nm 11.25; 2Rs 2.15; SI 125.3; Pv 14.33; Ec 7.9; Zc 6.8).14O vau conjuntivo, que combina os versetos do provérbio, significa e e/ou mas. O significado conjuntivo indica a presença de paralelos sintéticos que empregam o padrão de avaliação + :: +; a sabedoria exerce funções reveladoras tanto para os perspica zes quanto para os insensatos. O significado disjuntivo aponta para a presença de paralelos antitéticos que empregam o padrão de avaliação + :: -; os perspicazes e os insensatos diferem radicalmente em sua ma neira de responder à sabedoria. No meio dos (ou entre, beqereb\ cp. Pv 15.31) é o significado da expressão hebraica quando o objeto está no plural, como é o caso aqui; com um objeto singular quer dizer “no cora ção de” (Pv 26.24).15A Mulher Sabedoria se revelou no meio da mul tidão aglomerada de insensatos às portas da cidade, mas eles não ti nham coração para ela (cp. 1.22; 17.16). Além disso, não significa “no coração de” pois os insensatos (kesilim \ veja p. 167), que são por natureza intratáveis e insolentes, odeiam o conhecimento e não têm nenhuma inclinação para a sabedoria (veja 2.22; 17.16). Ela se revela (tiwwãdêa') é a tradução mais apropriada do niphal yãda'.'6 Descan sar e governar no coração de alguém são atos bastante diferentes de ingenuamente “se manifestar” a um grupo de pessoas (veja 1.20-33; 8.1-36). Esse provérbio educativo admoesta os jovens a irem além da revelação da sabedoria pelo mestre sábio e darem à sabedoria um lugar final de descanso em seu coração. 34 O provérbio identifica a sabedoria (v. 33) com a ética e expand sua preocupação do nível individual para o nível nacional. Seus parale los quiásticos e antitéticos apresentam os sujeitos retidão ( sedãqâ ; veja pp. 150-152) e pecado, em sua estrutura externa. Eles admoestam a nação implicitamente a conformar sua vida aos padrões morais de Deus ao exercer a lealdade comunitária em relação àqueles com quem pos suem uma relação institucionalizada, tanto dentro de suas fronteiras quanto com outras nações, e a não ser remissa ao se comportar de 13. Stolz, TLOT, 2:723, s.v. nüah. 14. Coppes, TWOT, 2:562, s.v. nüah. 15. As cláusulas cm Jerem ias 31.33, “Na mente [no meio deles: tfiquirb&m ], lhes im primi rei as m inhas leis, tam bém no coração [w ^al libbSm] lhas inscreverei” não são sinônim as; antes são duas situações distintas. 16. H ALOT, 2:391, s.v. y d '.
modo egoísta, apresentando uma conduta antissocial para com eles. Os predicados constituem a parte central e apresentam a motivação. O primeiro exalta ( t?rômêm\ veja 4.8; cp. 14.29) uma nação (gôy), o que descreve uma pessoa quando de suas afiliações políticas e territori ais.17 A partir de sua postura de servir aos outros, não a si mesma, a nação estimada oferece liderança política e moral e obtém os benefíci os de poder, paz e prosperidade de seu prestígio. A maioria dos lexicó grafos acredita que hesed em Levítico 20.17 e Provérbios 14.34 signi fica “vergonha” ou “desgraça” tomando por base o verbo aramaico hsd “envergonhar”, “zombar de”, e o contexto desses dois textos, bem como seu uso como verbo no Piei em 25.10.18 Mas Van Leeuwen argumenta corretamente que hesed negativo significa, mais provavel mente, “culpa” ou “condenação” em Levítico 20.17, e que o Piei denominativo em Provérbios 25.10 quer dizer “declarar culpado”. Esse sig nificado também faz jus à interpretação da LXX de Eclesiástico 14.2 (kataginõskein [“apresentar uma acusação contra”, “acusar”, “sen tenciar”]).19 A subjugação, inimizade e escassez implícitas para os povos (t'um m tm \ veja 14.28), um paralelo comum para “nação” se deve ao pecado (hattã't\ veja 1.10; 5.22; 10.16). Em outras passagens do Antigo Testamento essa antítese é desenvolvida com referência espe cífica a Israel (Dt 28.1-14, 15-68; Am 1, 2, etc.). Em última análise, a exaltação de uma nação depende de sua piedade e ética, não de sua grandeza política, militar e/ou econômica. Em seus assuntos externos, uma nação pecaminosa rompe tratados, dissemina sua propaganda, mente e intimida as nações mais fracas, entre outras coisas. Em seus assuntos internos, ela permite que seu sistema judicial se desintegre, levando crimi nosos e preguiçosos a serem recompensados, e cidadãos honestos a se rem intimidados e sobrecarregados com impostos excessivos. 35 Essa postura moral de uma nação depende em grande parte de 17. R. C lem ents, TDOT, 2:427, s.v. gôy. 18. Cp. BDB. p. 340; HALOT. 1:336; H. J. Stoebe, TLOT, 2:449; P. Nel, NIDOTTE, 2:210, s.v. hesed. R. Van Leeuwen (Context and Meaning in Proverbs 25-27 [SBLDS 96; Atlanta: Scholars, 1988], p. 58, n. 3), eom base no verbo Piei em 25.10, argumenta que hesed significa “culp a” ou “condenação". A credita que esse significado se encaixa em L evítico 20.17 e Provérbios 14.34 e faz ju s à versão da LXX de Eclesiástico 14.2 (kataginõskein “ fazer uma acusação forma! contra", “ acusar” , “sentenciar"). G G erlem an (“ Das Ü bervolle M ass”, VT 28 (1978] 151-64) argumentou a favor do significado “uma medida que excede o limite”, mas para apoiar esse sentido argum enta dubiam ente que çedeq em Provérbios 14.34 tem o sentido de “ser adequado, em m oderação”. 19. Van Leeuwen, Context and Meaning in Proverbs 25-27, p. 58, n. 3.
suas autoridades. Além dessa ligação temática, o par de provérbios (vs. 34, 35) pode ser ligado pelos sinônimos questionáveis “condenação” (hesed; porém, veja v. 34) e “vergonhoso” (mêòtâ; v. 35). O favor do rei reto sôn-melek; veja 11.1; 14.28) vem a um servo (' ebed; veja 11.29) prudente (maékil; veja p. 146). As nuanças de 'ebed variam de um escravo mantido em cativeiro (veja 11.29) até um oficial numa posição de confiança em vários níveis, como o padeiro-chefe do faraó, o copeiro e o “capitão da guarda” (Gn 40.20; 41.12).20Alças de cânta ros do tempo da monarquia de Israel atestam a fórmula “X 'ebed de Y”, na qual “X representa o nome de um oficial do rei, enquanto que Y é o nome do rei”.21Em Provérbios 14.35, 'ebed indica um “oficial do rei” o qual possuía uma obrigação moral e dívida para com o rei. Mas sua fúria ardente (we'ebrãtô; veja 11.4; cp. Am 1.11) arruina [veja n. 5] um [servo] vergonhoso (veja 10.5), o antônimo de maskil em Provér bios 10.5; 17.2. Os provérbios “reais” (e.g., 14.28; 16.15; 19.12; 22.11, 29; 23.1-3; 24.21, 22; 25.6, 7, 15) têm por objetivo servir de exemplo para os regimes monárquicos e todas as outras formas de administração (veja 8.4 e 15). O provérbio admoesta o rei a promover competência, lealdade e eficiência nos empreendimentos e a não tolerar a má adminis tração e a corrupção (cp. 16.13, 15; 19.12). Também admoesta os ofici ais a se mostrarem competentes e incisivos em suas ações diante de ameaças e a serem nomeados para promoção ao não se exporem a es cândalos e críticas. Cristo ensinou essa lição em suas parábolas das dez virgens, dos talentos e das ovelhas e cabritos em Mateus 25 (cp. Jo 12.26). 15.1 Este versículo funciona como uma seqüência esclarecedora para 14.35. Por um lado, instrui o oficial a desviar o furor do rei com uma resposta branda e, por outro, adverte o rei a não usar palavras pungentes em sua fúria contra a incompetência, a fim de evitar a ira destrutiva (veja 16.14). Esse provérbio antitético implica que o discípu lo tem controle emocional para dar uma resposta gentil e branda, nâo dura e dolorosa, num diálogo cheio de potencial para a manifestação da raiva. O autocontrole é necessário a fim de desviar e não incitar emo ções possivelmente danosas e insensatas que destroem as relações so ciais (veja 14.17, 29). Rak ( branda; veja 4.3) ocorre 18 vezes e indica a qualidade de ser fundamentalmente gentil, temo e delicado (cp. 2Sm 20.
HALOT,
2 :7 7 5 , s.v.
'ebed.
2 1 . W. F. A lbright, "T he Seal o f Eliakim and the Latest Prcexilic History o f Judah, with Som e O bservations on E/.ekiel”, JBL 51 ( 1 9 3 2 ) 7 9 .
3.31). Com resposta (m a'aneh)22 ela significa uma resposta que alivia e conforta o ouvinte tanto na substância quanto no estilo (Jó 32.3; Pv 25.15).23 Em 25.15 o termo é usado com referência à língua em parale lo com “paciência” ('erek'appayim\ veja 14.29), e em Jó 41.3 (40.27) é usado de modo sarcástico com referência à forma como o crocodilo nâo fala a respeito daqueles que tentam capturá-lo. Essa reação refle tida e compassiva ao oponente sem abrir mão da verdade (veja 15.2; Lv 19.17, 18) desvia (yãêíb] veja 12.14) o seu furor ( hêmâ ; veja 6.34) decorrente do sentimento de injustiça (veja 6.34) e, deste modo, restau ra seu bom humor e bom senso. Mas uma palavra dolorosa ( udebar’eseb\ veja 5.10; 10.22; 14.23) se refere a um modo de falar que inflige dor psicológica (veja 5.10; 10.22; 14.23). Incita (ya'aleh) indica, essen cialmente, o movimento físico de mover para cima e, no Hifil, “fazer subir”. Em Ezequiel 24.8, tendo hêmâ como seu objeto, a frase é combi nada com “tomar vingança” (linqõm nãqãm). Aquifuria ( ’ap; veja 11.22; 14.17, 29) indica o nariz com referência à sua expressão física que é característica da raiva.24 No verseto A “furor” se refere ao ardor emoci onal interno da raiva e “agitação” e “furia”, no verseto B, refere-se à sua expressão externa. Para mostrar o perigo da furia a LXX acrescenta: “a furia mata até mesmo os sábios” no início do provérbio (cp. Ec 10.4). O discurso brando é como óleo sobre a pele ferida (cp. Jz 8.1-3); o discurso doloroso tem o efeito de óleo derramado sobre o fogo (cp. lRs 12.116).25 Por seu modo de falar grosseiro, Nabal incitou o furor de Davi; por suas palavras brandas Abigail pacificou Davi e salvou sua casa (ISm 25.10-13,23-31). Davi atribui o modo dela falar ao S e n h o r (25.32-34). 2 Este versículo dá continuidade ao tema de uma “resposta” boa em contraste com uma “palavra” má ao mencionar seus dois instru 22. O significado principal de 'Snâ é reagir, não responder verbalm ente e, cm geral, tem um sentido benéfico (veja Labuschagne, TLOT, 2:928, s.v. 'nk). 23. A s nuanças de ra k , in bonam parlem, bem com o in malam partem , variam com a substância que é modificada: com carne, aquela que é macia, não dura (Gn 18.7); com ramos, fragilidade (E z 17.22); com o lhos, algum tipo de suavidade (G n 29.17); com o coração, tim idez (D t 20.8) e incapacidade de resistir a oposição intensa (2C r 33.17); com o corpo de criança, fraqueza c fragilidade (G n 33.13); com a mente de crianças, sensibilidade e maleabi lidade não endurecidas pela experiência (Pv 4.3); com os pais, bondade, com paixão e extrema ternura de sentimentos para com os membros da família (Dt 28.54, 56). A passagem também diz que os pais amáveis e refinados são “sensíveis” (Snôg) e que a esposa nâo ousaria colocar a sola dos pés no chão. 24. M. 1. G ruber, Aspects o f Nonverbal Communication in lhe Ancienl Near Easl (Studia Pohl 12/1, II; Rom a: Pontificai B iblical Institute, 1980), p. 489. 25. M einhold, Sprüche, p. 247.
mentos, a lingua (veja 6.17) e a boca (veja 2.6) e suas origens, que estão arraigadas no caráter dos sábios (hflkãm im; veja p. 145) em contraste com o caráter dos insensatos ( kesílim ; veja p. 167), geniti vos de posse inalienável.26 A primeira adorna [ou toma atraente; têfib o Hifil dey(b\ cp. (ôb; veja 3.27; 11.27] o conhecimento (d a a t\ veja p. 125). O Hifil deytb significa tomar o estado ou função de algo apropri ado ao seu ser, propósito ou situação; sua nuança exata depende do objeto.27 Com o objeto “conhecimento” significa “preparar”, “enfei tar”, “embelezar” o conhecimento internalizado da ordem moral, a liga ção de ato e destino, e com relação às “palavras”, como sugerido pelo sujeito “lingua”, ela significa adornar sua substância boa (cp. Dt 5.28 [= 18.17]; SI 36.3[4]), supostamente pela arte curativa branda e suave de falar elogiada no versículo 1. A Targ. traz “toma o conhecimento agra dável”. Os sábios têm uma língua controlada por emoções afetuosas e pensamentos sensatos e, portanto, falam de um modo que toma atraen te o seu conhecimento internalizado da ordem moral. Em vez de agredir as pessoas com seu conhecimento da relação de causa efeito na ordem moral de Deus, os sábios a declaram com bondade, sensibilidade e su avidade, visando salvar sua audiência, não condená-la e destruí-la. O conteúdo e a forma do seu modo de falar o tomam convincente (veja 25.1). Contrastando com isso, a boca dos insensatos descontrolados derrama (yabbia'; veja 1.23) cheia de agitação e raiva, a estulticia evidente ( ’iwwelet\ veja pp. 167-168), uma abstração para o seu discur so moralmente insolente que destrói a pessoa e/ou a comunidade. 3 Este versículo está ligado ao versículo 2 pela raiz tb (“adornar” y(b e “os bons”, (wbym), associando a retórica correta à ética correta e fornecendo a base teológica para a ordem moral afirmada nos provér bios ao seu redor. O verseto A ressalta a presença irrestrita de Deus no espaço, e o verseto B sua avaliação moral irrestrita de cada indivíduo. O antropomorfismo os olhos do S e n h o r {'ênê YHWH; veja 5.21; p. 81) indica sua presença numa situação e sua avaliação da mesma. O pri meiro qualificador, estão em todo ( bekol\ veja n. 8) lugar (mãqôm ), poderia ter um significado mais restrito como “cidade natal” (Rt 4.10), “sepultura” ou “templo”, mas aqui, em paralelo com “os maus e os 26. IBHS, p. 145, P. 9.5. Ig. 27. Tendo lâm padas com o objeto o Hifil deyfft significa “prcparar"/“arranjar” (Êx 30.7); com cabeça, “enfeitar”/"ataviar”/"adom ar” (2Rs 9.30); com colunas, “ preparar”/“adom ar” (O s 10.1); com o rosto, “adornar” sendo alegre (Pv 15 .13).
bons”, um merisma para toda a humanidade, apresenta o seu sentido geral. Essa qualificação se refere aos atributos incomunicáveis (nãohumanos) do S e n h o r como sendo ilimitados ou infinitos no tocante ao tempo e ao espaço (cp. IRs 8.27; S l 139.7-10; Is 66.1-2; Jr 23.23, 24; At 17.28, 48). O segundo qualificador contemplando [vigilantemen te] (sõpôt) significa “supervisão de um posto de observação elevado”.28 Esse atributo divino comunicável de ser vigilante ocorre 18 vezes, nove delas no Qal e nove no Piei. Nos dois graus ele significa “observar com atenção, estar vigilante”, de modo que nada escape do vigia, com a nuança específica no Qal de “ver o que é feito”, como é o caso aqui (Pv 31,27).29 O verbo implica que o sujeito tomará as medidas apropri adas de acordo com a situação (Gn 31.49; Jó 15.22; S l 66.7), a saber, quer se trate dos maus (ra im \ 1.16), que destroem a sociedade, ou dos bons (fôbim\ veja pp. 151-152), que a constroem. O Deus que não pode ser visto, mas que vê todas as coisas, sonda e penetra com discer nimento todas as situações e faz distinção entre os bons e os maus, a fim de ajustar a História recompensando os primeiros e castigando os últimos, garantindo assim a ordem moral (veja 5.23; cp. 15.11; 16.2; 17.3; 21.2; 24.12; cp. 20.27). O provérbio ensina “que nenhum ato de bondade é trivial demais, nenhuma contravenção é banal demais, para chamar sua atenção e receber sua bênção ou sua condenação”.30 4 A palavra-chave “língua” retoma o versículo 2. O provérbio en cerra esta seção sobre o valor do modo de falar brando ao observar seu poder de curar o discurso prejudicial. Os paralelos antitéticos O alívio (m arpê’; veja n. 9) da língua (lãSôn\ veja 15.2) e a perversidade (selep; veja 11.3) nela (i.e., “na língua”) não são precisos, sugerindo que a língua curativa das pessoas boas, que têm integridade (veja 13.6; 15.4), não busca distorcer ou subverter a verdade, inclusive a ordem moral e, com isso, uma comunidade ou indivíduo (cp. Sl 5.9[ 10]; 12.14[2-5]; 73.8, 9). O significado alternativo de marpê’ indica que essa língua é tranqüila (ou calma), não agitada. A metáfora é uma árvore de vida (veja 3.18; 11.30) estimula o apetite para restaurar o Paraíso em um mundo destruído, por meio do discurso curativo que concede vida eterna àqueles que “se alimentam” dele. A língua perversa das pessoas 28. A. Wolters, “Sopiyâ (Prov 31:27) as Hymnic Participle and Play on Sophia". JBL 104 (1985) 578, n. 7. 29. No PieI significa “veja o que vem ” (cp. ISm 4.13; Is 21.6; Jr 48.19; Lm 4.17; Na 2.2). 30. A itken, Proverbs , p. 244.
más e traiçoeiras fratura (Seber; veja n. 10) o espirito (berüah; veja pp. 143-144). Em outras passagens Seber pode ser uma metáfora extin ta para destruição (16.18; 17.17; 18.12), mas como antônimo de “remé dio” (cp. SI 60.2[4];Jr 10.19; 14.17; 30.12,15) provavelmente mantém o seu significado original de “fraturar”. O termo é usado de maneira concreta para um membro do corpo ferido (Lv 21.19; 24.20), para a terra rasgada por um terremoto (SI 60.2[4]), e para o vaso estilhaçado de um oleiro (Is 30.14). “O espírito” mostra que é usado metaforicamente, sig nificando que o discurso perverso destrói a vitalidade, supostamente da quele a quem é dirigido. O provérbio pressupõe que a língua das pessoas boas pode curar o espírito ferido e danificado causado pela língua perver tida dos perversos (cp. Is 57.14-21, esp. vs. 15, 16, 19; cp. Ef4.25). 8. A importância da instrução (15.5-19) 5 Um insensato rejeita a instrução de seu pai, mas todo aquele que atende à correção é astuto.1 6 A2 casa do reto é um grande depósito de riqueza, mas no3 salário dos perversos está a ruína.4 7 Os lábios dos sábios espalham5 o conhecimento; 1. A form a pode ser analisada gram aticalm ente com o um Qal estativo im perfectivo (de acordo com GKC, P. 47i, 63n) ou com o Hifil interno, "‘faz a si mesmo ser prudente” (IBHS, p. 439, P. 2 7 .2 0 - A pesar de em 19.25 y a 'r im ser um im perfeito incipiente (= “ se tom a sábio” ), norm alm ente a conjugação prefixai indica o presente habitual em Provérbios e aqui é paralelo a um a cláusula nom inal (veja tam bém ISm 23.22). 2. A Targ.. Sir. e a LXX (que traz o plural) acrescentam “em” (= “na[s] casa[s] do justo”) e omitem o “em” inicial no verseto B, produzindo uma leitura mais fácil. Gemser (Sprüche. p. 69) explica de modo plausível a perda do bete inicial com o uma haplografia, mas não explica sua inserção no verseto B. A metáfora do TM e Vulg. é a leitura mais difícil e, portanto, a preferível. A LXX acrescenta outro provérbio sobreposto àquele encontrado no TM: “em retidão abundante há grande força, mas os ímpios em toda a sua raiz perecerão na terra". A Vulg. acrescenta esse ponto de vista mais religioso ao final do v. 5. 3. Ou seja, “em relação a” . 4. O Nifal ptep. pode ser considerado um relativo independente e um gerundivo (“aquilo que é ruinoso", IBHS , pp. 621 ,3 8 7 , PP. 37.5.a, 23.3d). 5. Uma vez que zrh não é usado em outras passagens com discurso, G R. Driver (“ Problems in ‘Proverbs’”, ZAW 50 [1932] 144) corrigiu a forma para yãzõrú a partir de zrr e ligou-a com uma palavra árabe usada para “tagarela”. Toy (Prvverhs, p. 305) se queixou que o Piei zrh é usado em outras passagens para a dispersão destrutiva e, apelando para a LXX e Símaco, corrigiu para y iç ^ rü a partir de n$r, “guardar/preservar”. Dahood (Proverbs and Northwest Semitic Philolog}’ [Roma: Pontificai Biblical Institute, 1971]) corrigiu para yãzurú “ fluir” e Scott (Proverbs, p. 100) para yôrú (= “ensinar, disseminar"). Das suas 25 ocorrências no Antigo Testamento, 22 são expressões idiomáticas em relação a “dispersar um povo” (cp. 20.8, 26) usando linguagem de guerra santa. Em Provérbios 1.17, porém , z h r no Pual tem um sentido neutro, e num provérbio picante se pode esperar uma m etáfora surpreendente.
8 O s a c r ifíc io d o s p e r v e r s o s é u m a a b o m in a ç â o a o S enh o r, m a s a o r a ç ã o d o s h o n e s to s e n c o n tr a o s e u fa v o r . 9 U m a a b o m in a ç â o a o S enho r é o c a m in h o d o p e r v e r s o , m a s q u a n to a o q u e b u s c a a r e tid ã o , e le o a m a .
10
D is c ip lin a d o lo r o s a a g u a r d a a q u e le 6 q u e a b a n d o n a a v e r e d a [ d a v id a ] ; o q u e o d e ia a c o r r e ç ã o m o r re rá .
11 S h e o l e A b a d o m e s t ã o à p l e n a v i s t a d o S e n h o r ; q u a n to m a is o c o r a ç ã o d o s s e r e s h u m a n o s ?
12 O e s c a m e c e d o r n ã o g o s t a d e s e r c o r r i g i d o ; 1 p a r a 8 o s s á b i o s e l e n ã o v a i.
13 U m c o r a ç ã o a l e g r e t o r n a o r o s t o a t r a e n t e , m a s n a a n g ú s tia 9 h á u m e s p ír ito q u e b r a n ta d o .
14
U m c o r a ç ã o p e r s p ic a z p r o c u r a o c o n h e c im e n to , m a s a b o c a '0 d o s in s e n s a to s s e a lim e n ta d e u lo u c u r a .
15 T o d o s '2 o s d i a s d o a f l i t o s ã o i n f e l i z e s , 13 m a s u m c o r a ç ã o a l e g r e 14 é ' 5 u m b a n q u e t e c o n t i n u a m e n t e . 6. Lit. “ é para aquele". 7. Lit. “ am or que é correção para ele". 8. A LXX e Sir. trazem “com ” (< 'et; cp. 13.20; 22.24), não “para" ( W; cp. 6.6), interpre tando ySlêk como uma metáfora para “associar-se com ”. (Tanto o TM quanto a LXX sugerem que o escam ecedor evita o círculo dos sábios.) O TM é preferido pois a LXX tende a ser mais criativa, e a LXX poderia su g erir que o escam eced o r foi até os sábios e considerou sua conversa desagradável, o que é pouco provável. 9. Lit. “na dificuldade dolorosa do coração” . 10. Lendo Q e a LXX; K lê pny, “ m as o rosto” . O verbo sing. masc. favorece Q. 11. A LXX traz “sabe” (< .ytf; veja 10.21 para a mesma leitura simplificada). D. W. Thomas (“Textual and Philological Notes on Some Passages in the Book o f Proverbs”, in WIANE, P. 285) corrige o TM com hesitação para y d 'h , interpretando y d de acordo com um cognato árabe, "buscar, desejar, pedir, exigir”. McKane (Proverbs, p. 478) qualifica isso como indicação de que ele busca a companhia da estulticia. Rejeita II r h , “associar-se com”, pois em Provérbios a forma é Qal ptep. (cp. 13.20; 28.7; 29.3). Essas alternativas e correções do TM são desnecessárias. 12. Pressupondo que o artigo neste estilo poético é om itido com 'n y (G K C # l2 7 c ). 13. Através de com ipçSes textuais não intencionais e equívocos relacionados a defeitos na escrita e/ou usando de liberdade interpretativa, a LXX moraliza o provérbio e contrasta os perversos com os bons: “o tem po todo” (< kol-yôm) “os olhos dos perversos” (hoi ophthêalmoi tõn kakõn <'yny r'ym ) “estão procurando o m al” (prosdechontai kaka < rB'ôt rã'â), “ m as os bons estão sempre tranqüilos” (hoi agaíhoi hlsyvhazousi dia pantos < we(ôb m isbit tmyd). 14. G enitivo epexegético (IBHS, p. 151, P. 5.3c). 15. Para sim plificar o texto quanto à sua m etáfora difícil “um coração alegre é um banquete”, Fichtner ( BHS ) propôs le(6b (“o coração alegre tem” ). N o entanto, Provérbios é caracterizado por metáforas rígidas.
16 M e l h o r u m p o u c o c o m o t e m o r d o S e n h o r
do que um grande tesouro e tumulto com ele. 17 Melhor uma pequena porção de vegetais com amor do que um boi cevado com ódio. 18 Uma pessoa irada levanta contenda, mas uma pessoa paciente16 apazigua uma disputa 17 19 O caminho de um preguiçoso é como uma cerca de espinhos, mas a vereda dos honestos 18 è uma estrada construindo. O tema de toda esta nova unidade é a importância da educação. Depois de um provérbio educativo introdutório que menciona o pai como o mestre e seu filho como o discípulo, a unidade consiste de duas subunidades de sete versículos. O primeiro trata das conseqüências de se aceitar ou rejeitar a instrução (15.6-12), e o segundo da superioridade do coração às circunstâncias (15.13-19). No entanto, o versículo 5 tam bém forma uma estrutura com o versículo 12, ligando ambos à primeira unidade parcial. a. As conseqüências de se aceitar ou rejeitar a instrução (15.5-12) Os versículos 5 e 12 formam uma estrutura ao redor da subunida de. A palavra-chave y k h (correção) forma um i n c l u s i o e ajuda a traçar o desenvolvimento que contrasta o filho sábio que aceita a correção 16. Lit. “ paciência” . Com um sujeito concreto no verseto A a qualidade abstrata represen ta um a p essoa (M . D ahood, Psabns 111: 101-150 [A B ; G arden C ity, N.Y.: D oubleday, 1970], p. 411). 17. A LXX fornece um exem plo extraordinário de um a tradição dupla desse provérbio. Acrescenta à primeira, que é semelhante ao TM: makrothymos a n ir katasbesei kriseis, ho de asebès egeirei mallon: “um homem paciente aplacará uma contenda, mas o ímpio [as] susci ta” . Nesta alternativa, a ordem é invertida, dando a últim a palavra ao ímpio, nâo ao paciente. É provável que represente a LXX original, à qual foi prefixada uma tradução estritam ente conform e com o proto-TM . A Targ. que, dc outro m odo, segue a T M , traz “aplaca” e não “acalm a”, e a Sir. traz “suscita”, não “ incita”, sugerindo que as versões aram aicas foram influenciadas pelo original grego. 18. A LXX traz tBn andreiõn, “do diligente”, que tom a harúçím em 10.4 e 13.4, a antítese esperada de 'ã^Sl. McKane (Proverbs, p. 482) et al. preferem essa leitura, recusando o TM e explicando que é uma leitura moralizante. M as por que o TM que, cm outras passagens, em co n traste com a L X X , não m o raliz a (cp. 15.6), esco lh e m o ra liz a r n este caso ? O m ais provável é que, com sua tradução livre, a LXX tenha criado a antítese desejada, da m esma m aneira com o no v. 20 assim ilou o verseto B a 10. Ib, criando, m ais uma vez, um a antítese precisa, que muitos estudiosos reconhecem com o uma leitura secundária. Plõger ( Sprüche, p. 183) observa que os mestres sábios consideram os sábios, retos, diligentes e outros indivíduos sem elhantes com o um único grupo que contrasta com os insensatos, os perversos, os pregui çosos, e o restante, de modo que as designações individuais são intercambiáveis.
com o insensato (v. 5) subindo até o escamecedor que aborrece a sa bedoria (v. 12). Três pares de provérbios desenvolvem o argumento dentro dessa estrutura. O primeiro contrasta as riquezas dos retos com a mina dos perversos (vs. 6, 7). O segundo, que se encontra no centro da subunidade, apresenta os sentimentos morais do S e n h o r como razão teológica para o primeiro (vs. 8, 9), o terceiro baseia isso em sua onisciência e intensifica as conseqüências para vida ou morte (vs. 10, 11). O padrão negativo de avaliação e o tema da jornada ligam o versí culo 12 aos versículos 10, 1 1 .0 versículo 11 reflete o versículo 3, que também é o penúltimo versículo desta unidade. 5 O provérbio educativo introdutório motiva o jovem a memorizar e aceitar a instrução repreensiva dos pais (veja 1.8) ao qualificar todo aquele que a rejeita como insensato e todo aquele que atenta para ela como prudente. Em seus paralelos quiásticos antitéticos o sujeito do verseto A, um insensato ( ^wil; veja pp. 167-168), é paralelo ao predica do do verseto B, é astuto (ya'rim\ veja p. 147), e o predicado do verseto A, rejeita (yin’as; veja 1.30) a instrução de seu pai (müsãr 'ãbiw\ cp. 1.2,8) é paralelo ao sujeito do verseto B, todo aquele que atende (Sõmêr; veja 2.8) à correção (ou repreensão; tôkahat\ veja 1.23). 6 ,7 O v. 6, que emprega termos éticos no singular, e o versículo 7, que emprega termos sapienciais no plural, formam um quarteto. A casa do reto acumula grande riqueza que também beneficia outros, e o cora ção do sábio acumula e armazena conhecimento (2.1; 9.8, 9; 10.14; 13.1) a fim de distribuí-lo ampla e generosamente. Contrastando com isso, os perversos arruinam todos com seus negócios, e os insensatos, aos quais falta a receptividade para o conhecimento distribuído, não são retos nem proveitosos. 6 O provérbio intensifica o motivo para ser reto e não perverso ao declarar o lucro do primeiro e o prejuízo do último. Ele estimula o ape tite ao retratar a casa (bêt; veja 1.13; 11.29), o lugar indispensável do reto (saddiq; veja pp. 150-152), como um grande (rãò; veja 14.29) depósito de riqueza (hõsen), uma metáfora para uma residência que abriga grandes quantidades de produtos e bens preciosos. A raiz hsn ocorre seis vezes, uma como verbo (Is 23.18) e cinco como este subs tantivo (Is 23.18; 33.6; Jr 20.5). Em metade dessas ocorrências é usa da com ’çr (“tesouro”; veja 10.2); em Ezequiel 22.25 c o m y ^ ã r (“coi sas preciosas”) e em 22.4 em paralelo com a coroa real. O hõsen de
uma cidade é especificado em Jeremias 20.5 como “todos os seus pro dutos iyãgã'), todas as suas coisas preciosas (y^çãr), todos os tesouros ( 'ô§erôt)'\ Assim, hõsen é um termo mais abrangente que seus sinôni mos.19 Isso é necessário, pois os retos ajudam a outros. A expressão no salário (ou salário, rendimento, bit?buat\ veja 3.9, 14) pode significar “safra/colheita”, porém o mais provável é que, paralela a “riqueza”, atenue seu sentido para produto, lucro, benefícios, acumulados por meio das atividades pecaminosas dos perversos (rõSã'; veja p. 164). No en tanto, o mestre sábio assemelha aquilo que os perversos consideravam lucro à ruína (ne'kãret; veja 11.17,29). E impossível se determinar com certeza se a referência é à ruína de perversos e/ou dos seus oprimidos. O paralelo antitético, que fala da grande riqueza dos retos generosos, suge re que a referência é a ambos (veja 10.2; veja também 8.18,21; 10.3, 6, 30; 11.3,5-7,18; 12.3,21,28; 13.6,9,21,25; 14.11,14,24,32; 21.7; 22.8). 7 Além de ter casas repletas de grandes riquezas para beneficiar outros, os retos, chamados aqui pelo termo sapiencial “sábios”, arma zenam conhecimento em seu coração para distribuí-lo ampla e genero samente por meio de seu discurso. A última atividade dos sábios é fun damental para a primeira. O suprimento das necessidades físicas dos outros é temporário e não os toma autossuficientes. Nos dois sentidos, os retos/sábios contrastam nitidamente com os perversos/insensatos. Apesar de sábios (hakãmim\ veja p. 145) e insensatos ( kesilim\ veja p. 167) serem paralelos antitéticos exatos, os termos lábios (siptê; 4.24) e coração dos (lêb; veja pp. 140-143), a fonte de conhecimento e sua expressão, se complementam e devem ser entendidos nos dois parale los antitéticos (cp. 15.14). Se a sede das faculdades espirituais não estiver em ordem, não se pode esperar nenhum conhecimento dos lábi os (4.23, 24; 6.16-19; 13.14; 16.23). A metáfora incompleta espalham (y^zãru; veja n. 5) significa a criação de uma situação em que algo é lançado ou espalhado livre e amplamente. Seu conceito básico é ex presso no ato de Moisés espalhar sobre a água o pó feito com os restos do bezerro de ouro (Êx 32.20) e no ato de joeirar o grão a fim de permitir que o vento leve embora a palha (Rt 3.2; cp. Pv 20.8,26). Com essa dispersão livre e ampla os sábios propagam o conhecimento (dã'at; veja p. 125). Contrastando com isso, o coração e os lábios dos insensa tos não são moralmente reto[s] (lõ’-kên; veja 11.19) em seus pensa mentos, sentimentos e expressão (cp. 2Rs 7.9; Jó 9.35; Is 16.6; Jr 8.6; 19. Está relacionado ao árabe, m ahsan, de onde vem o nosso term o “ m agazine” .
17.6; 48.30). Convém supor, como H A L O T e B D B que kên significa “reto”, não “assim, desse modo” (p ace NIV, NRSV), pois constitui um bom paralelo antitético de “conhecimento” e qualifica mais apropriada mente “coração” do que “espalham conhecimento”.20 Meinhold reco nhece as duas opções, mas prefere “assim” ao parafrasear de modo questionável “assim construindo”.21 8, 9 O par de provérbios dos versículos 8, 9 volta ao tema dos “retos” e dos “perversos”. O versículo 9 apresenta a base teológica para o versículo 8. Os tesouros dos retos estão arraigados em seu favor com o S e n h o r , e a ruína dos perversos em sua rejeição por ele. O par está ligado pelas palavras-chave “abominaçâo” e “perversos” nos ver sículos 8a e 9a e pelos sinônimos “retos” e “honestos” nos versículos 8b e 9b. O S e n h o r aborrece o sacrifício da pessoa ímpia e egoísta (v. 8a) porque abomina o seu estilo de vida (v. 9a), e aceita as orações do honesto (v. 9b) porque ele busca a retidão. 8 P erversos veja p. 164), em contraste com honestos (y6S ãrim ; veja p. 152), e é um a abom inaçâo ao S e n h o r ( tô'ab a t ; 3.32) em contraste com encontra o seu fa v o r (veja 11.1) são paralelos an titéticos precisos. No entanto, sacrifício (zebah ) e oração (fíp illa t)22 é uma frase estereotipada quebrada que se refere aos dois atos essen ciais de adoração: o abate de um animal de valor e a oferta acompa nhada de uma oração pedindo favor (cp. Dt 26.1 -15; 1Rs 8.22-63; 2Cr 29.27, 28; Sl 4.6[7]; Pv 15.29; 21.3, 27; 28.9, 13 passim).0 provérbio não diz “Sacrifício é uma abominaçâo ao S e n h o r , mas oração obtém o seu favor”.23Se zebah tem o seu sentido mais específico de uma refei 20. HALOT, 2:482, s.v. kèn; BDB. p. 467, s.v. II kên. Dc acordo com Whybray, Proverbs, p. 226. 21. Meinhold, Sprüche, pp. 249-50. 22. A raiz fpilku significa “avaliar", “estimar” e, na raiz Hilpael no qual fipillâ está baseado, “buscar uma avaliação ou exame para si mesmo”. Pode significar um “pedido de avaliação, um exame” para outros (= “intercessão” [Sl 35.13; 84.8(9), 9(10); 109.4]) ou para si mesmo (= “petição”; veja E. Speiser, “Stem PLL in Hebrew”, JBL 82 [1963] 301-6). Quase metade de suas ocorrências se dá no Saltério, nos salmos de petição (cp. 6.9[ 10]; 17.1) ou nos salmos de reconhecimento (cp. 65.2[3]). Seus paralelos são “súplica por misericórdia” (^h in n ã , tah"nun, tah°núni; Sl 6.9[ 10]; 86.6; 143.1) e “súplica por socorro” (rinnd; Sl 17.1; 61.1 [2]; 88.2(3]; saw‘â-, 39.12(13]; 102.2(3]: dirríâ; 39.12(13]). As posturas mencionadas associadas à oração incluem: “ficar em pé” ( l Rs 8.22). “ajoelhar-se” (IRs 8.50), "‘prostrar-se com o rosto em terra" (Is 44.17), “ lançar-se ao chão” (Ed 10.10); “curvar-se” (Is 44.17), “humilhar-se" (2Cr 7.14), “estender as mãos” (IRs 8.38, 54) c “erguer as mãos” (Sl 141.2). Às vezes é mencionado em relação a chorar, jejuar, ou jejuar em panos de saco e cinzas. 23. L. Perdue, Wisdom and Cull: A Criticai Analysis o f the Views o f Cult in the Wisdom Literalures o f Israel and the Ancient Near Easl (Missoula: Scholars. 1977), p. 157.
ção de comunhão entre os adoradores, a divindade e a comunidade (veja 7.14), então com “os perversos” é um oxímoro. Os perversos esperam manipular Deus através de ritual mágico, não obter a sua mi sericórdia ao confessar e renunciar seus pecados (28.13). Estão dis postos a oferecer tudo, menos aquilo que o S e n h o r pediu, a saber, o seu coração. Em seu raciocínio obscurecido, acreditam que Deus deve mudar e baixar os seus padrões para acomodá-los. Os honestos, que rejeitam a magia, empregam a oração e o sacrifício como os meios que o Deus gracioso e santo instituiu para manter seu relacionamento com a huma nidade pecaminosa. Moisés (cp. Êx 32.7,8), os profetas (cp. ISm 15.22; Is 1.10-17; Jr 7.22,23; Os 6.6; Am 5.21-25), o salmista (cp. S I 50.8-14) e o Senhor Jesus Cristo (Mt 23.23) rejeitam as atividades cúlticas con taminadas pelo pecado e não adoçadas pelo anseio de servir outros. 9 O critério para o favor de Deus não é ingenuamente o cumpri mento escrupuloso do ritual, mas a busca zelosa por servir os outros também. A estrutura interna desse paralelismo quiástico apresenta o comportamento humano de ser perverso ou reto, e a estrutura externa, a repugnância ou atração do S e n h o r . Sua estrutura externa apresenta o predicado no verseto A, é um a abom inação ao S e n h o r (tô'abatYH W H; veja 3.22; 15.8), em antítese com o sujeito e predicado do verseto B, ele am a intensamente e busca (y e ^ h ã b ; veja 1.22). Sua parte central apresenta o sujeito do verseto A, o cam inho do perverso (derek rãSã'', veja 1.15; p. 164), em paralelismo antitético com o nominativo absoluto do verseto B, quanto ao que busca , como numa perseguição ou caça da (m era d d êp ; veja 11.19) a retidão (s ed ã q â ; veja pp. 150-152). Aque le que busca a retidão e aquele que o ama se complementam mutua mente. Deus ama aquele que é “impelido a uma busca ativa, persisten te e até mesmo perigosa pela retidão”.24 Essa é a verdadeira adoração que Deus procura (Ml 3.16-18; Jo 4.23, 24). 10, 11 O versículo 10 intensifica as conseqüências da instrução para a morte, e o versículo 11 baseia sua certeza e retidão na onisciência do S e n h o r . O versículo 10 está relacionado ao versículo 5 pelas palavras-chave “instrução” (m ü sã r ; vs. 5a, 10a) e “correção” (tô ka h a t ; vs. 5b, 10b). “Rejeitar a instrução é loucura (v. 5a) pois conduz à morte (v. 10b).”25 Também está ligado ao v. 9 pelos termos correlatos “cami 24. Plaut, Proverbs, p. 170. 25. K. Heim, “Structure andContext in Proverbs 10:1-22:16” (dissertação de Ph.D., University of Liverpool, 1996), p. 175.
nho do perverso” (v. 9a) e “que abandona a vereda” (v. 10b). “O ver sículo 10 apresenta a conclusão dos versículos 8, 9: ‘obedeça a (esta) instrução antes que seja tarde demais!’.”26 Finalmente ele está ligado aos versículos 11, 12. Os três paralelos são sintéticos, não antitéticos, com o padrão negativo de avaliação e inclusive um provérbio “me lhor é”, um padrão que combina com 11.29-31 que encerrou aquela unidade. Ele está ligado ao versículo 12 pela palavra-chavey k h 10 Este provérbio sintético intensifica o versículo 5a. A conseqüên cia irreversível de se rejeitar a instrução é a morte eterna, a disciplina mais severa de todas. Esse insensato despreza a instrução e apóstata do caminho da vida (veja 2.13). Também intensifica o versículo 9; após tata, desprovido da presença beneficente de Deus (v. 9a), ruma irreversivelmente para uma morte eterna (v. 10b). Na hora da morte, suas orações se mostrarão inúteis. Em 12.28 diz-se que a retidão se encon tra no caminho da vida, sugerindo uma ligação entre “retidão” no versí culo 9b e “vereda [da vida]” no versículo 10a. O adjetivo dolorosa (rã ' ; veja 1.16) traduz a palavra que indica a qualidade de ser repulsivo ao gosto de alguém em termos morais e/ou físicos, e ligado a disciplina (m üsãr; 1.2) adquire a nuança específica de ser dolorosa, aflitiva, se vera.27 A guarda aquele que abandona Çõzêb\ 2.13, 17) se refere a um apóstata. A vereda ( 'õrah\ veja 1.15) nâo é qualificada como sendo boa (cp. 2.8, 13, 19,20; 3.6; 5.6; 8.20; 10.17; 12.28; 17.23) ou má(cp. 1.19; 4.14). O paralelo “morrerá” mostra que se trata da vereda [da vida] (10.17; 15.31; cp. 12.28). O que odeia (éô n ê ’; veja 1.22) a cor reção (yãm ut; ou repreensão; veja 1.23; 15.5) m orrerá (tôkahat; veja 5.23; 10.21), uma morte eterna sem Deus, o fim trágico e inevitável dos apóstatas que se endureceram contra a verdade. 11 A última palavra do versículo 10, “morrerá”, forma a transição para os termos iniciais do versículo 11, Sheol e Abadom. A vigilância do S e n h o r sobre o reino dos mortos implica que ele é o agente que enviou os apóstatas para lá. Seu julgamento é reto porque sua onisciência se estende a todo coração humano. Como em 11.31, o provérbio emprega um argumento a fo rtio ri. A vigilância de Deus se estende ao reino dos mortos nas profundezas da terra, o lugar mais distante possível do céu, e ele será encontrado em todos os cantos desse lugar de trevas absolu 26. Heim, “ Structure and Context”, p. 175. 27. BDB, p. 948. s.v. I rS '\ HALOT, 3:1251, s.v. rã'.
tas, envolto em mistério e segredo e sem nenhum valor aparente para a humanidade ou para Deus (SI 88.11, 12[12, 13]; 139.8). Quanto mais transparentes, então, não são para ele os corações humanos, que vivem agora à plena vista do céu e servem a seus interesses vitais, ainda que sejam inacessíveis à visão humana (1 Sm 16.7; 1Cr 28.9; Jr 17.10; ICo 4.4, 5; 1Jo 3.20). Sua onisciência do coração humano e a ligação desse conhecimento com a sepultura conferem ao argumento um tom amea çador. Sheol (veja p. 160) é uma palavra poética para a sepultura. E Abadom ( w a 'ab a d d ô n ; veja 15.11; 27.20; Jó 26.6) intensifica retoricamente a sepultura como o lugar de destruição; a raiz ’bd significa “pe recer”.28 Em quatro ocorrências, três delas na literatura sapiencial, for ma um substantivo composto com Sheol (Pv 15.11; 27.20; Jó 26.6, em que a frase estereotipada é separada), em uma ocasião aparece como paralelo de qeber (“sepultura”; SI 88.11 [12]), e uma vez é combinado com niãw et (“morte”; Jó 28.22). “Não há nenhuma autoridade para a opinião (De.) de que o Abadom é o nível mais inferior de Sheol.”29 À p len a vista ( neged ; lit. “diante de”) é “um tanto mais forte e distinto que lipnê (‘perante’)” e, associado com o S e n h o r {YHíVH), “tem a ideia secundária de ser ‘aberto’ ou ‘conhecido por”’.30 (Cp. “os olhos do S e n h o r ; 15.3). Quanto mais ( ’ap ki\ veja 11.31), que introduz a parte mais importante do argumento a fo rtio ri (veja 11.31), o coração (libbôt; veja pp. 140-143) dos seres hum anos ( ben ê 'ã d ã m ; veja p. 139, 8.4)? Os olhos do governante moral, que sondam, penetram e tudo veem, testam as motivações que dirigem as ações dos seres humanos (16.2; 17.3; 21.2; 24.12), e ninguém pode deixar de dar a resposta que ele exige (cp. vs. 8-10). O provérbio pressupõe que o S e n h o r pode e irá ordenar a vida e a morte com retidão. 12 Este versículo encerra a subunidade por meio de sua ligaçã com os versículos 5 e 10,11. O insensato desdenhoso do versículo 5 é intensificado agora para o escamecedor obstinado. O apóstata que aban dona o caminho da vida (v. 10) encontra um complemento no escame cedor que se recusa a acompanhar os sábios. O dito visa motivar os jovens a darem ouvidos à instrução dos mestres sábios citando e con trastando o “escarnecedor” com os “sábios” e, assim, constitui um pro 28. Abadom se refere a uma personificação da morte em Jó 28.22; em Apocalipse 9.11 é o nome do anjo do abismo. 29. Toy, Proverbs, p. 307. 30. BDB. p. 617, s.v. neged.
vérbio educativo que exerce a função de ja n u s ao introduzir a nova subunidade. O tema do provérbio é o esca m eced o r (lês; veja pp. 169170). Seus paralelos sintéticos apresentam de modo quiástico em sua estrutura externa os predicados negativos não gosta (lõ^ye^hab; veja 1.22) e não vai (lõ'yêlêk; ou evita; veja 1.11, 15; 14.7), passando de suas inclinações, o cerne de seu problema, para a sua conduta.31 Sua parte central apresenta seus qualificadores ser corrigido (ou “repre endido”; hôkêah; veja 3.12; 15.5, 10) e pa ra os sábios ('el-hakã m im ; veja p. 145), uma conjunção que implica que os sábios não apenas con formam suas vidas com os ensinos dos mestres sábios, mas também determinam o que é certo para aqueles que vêm e andam com eles. O escamecedor é indesculpável, pois todos os sábios espalham livre e amplamente o seu conhecimento salvador (15.7). No entanto, ao des prezar com arrogância esse conhecimento, o escamecedor permanece no caminho escuro da morte (15.10-11,31), não no caminho iluminado da vida (2.7,20; 3.23; 4.12,18). O provérbio também oferece ao discí pulo discernimento acerca do coração humano. Se o indivíduo não ama a correção e rejeita a companhia dos sábios, seu coração está na egolatria, na lisonja e na frivolidade, não em Deus, na verdade e na retidão (cp. Jo 3.20; G1 4.16). b. A sup erio rid a d e do vencedor às circunstâncias (15.13-19) Os versículos 13-19 tratam da superioridade da condição espiritual de uma pessoa às suas circunstâncias. Sua primeira unidade parcial apresenta a superioridade do coração para triunfar sobre as circuns tâncias (vs. 13-17). A unidade parcial final, um par de provérbios, apon ta para a pessoa pacífica em contraste com a irascível, e o honesto em contraste com o preguiçoso, como exemplos concretos das disposições espirituais que triunfam sobre as circunstâncias ou são derrotadas por elas (vs. 19, 20). (1) A superioridade do coração às circunstâncias (15.13-17) Esta subunidade consiste de dois pares de provérbios (vs. 13, 14, 16, 17) e de um versículo que serve como um ja n u s e liga ambas (v. 15). No texto hebraico, a anáfora “coração” no início das linhas liga 31. A consonância do lamede brando em seis das sete palavras acentuadas combina com o conceito de movimento.
verbalmente os versículos 13,14, bem como o tema das manifestações favoráveis e desfavoráveis do coração (v. 13) e sua origem no ser ou não perspicaz (v. 14). Os versículos 16, 17 estão ligados pela anáfora em cada verseto de “melhor... do que” (0 b ... m in ), bem como pela epífora “com” (bô) no final de cada verseto e pelo conceito de que as atitudes espirituais são mais importantes que as circunstâncias. O ver sículo de ja n u s dá coesão ao todo pelas palavras-chave tôb lêb (“um coração alegre”; v. 15b). Além disso, a r a i z ( “adornar”; v. 13; “me lhor”; vs. 16,17) liga toda a subunidade. Entendido de forma holística, o coração alegre que adorna o rosto (v. 1) não depende da saúde ou da riqueza, mas supera diariamente qualquer tipo de aflição ou privação (vs. 16,17). A vitalidade espiritual do coração é derivada da busca pelo conhecimento do mestre sábio (v. 1 4 ) , que envolve o temor do S e n h o r (v. 16) e o amor pelos outros (v. 1 7). Até aqui os provérbios afirmaram, sem qualificação, a ligação entre a sabedoria e a prosperidade, e entre a perversidade e a privação, mas esta subunidade qualifica de modo significativo a ligação entre ato e destino. 13 Os paralelos do versículo 13 pressupõem que o coração (lêb veja pp. 140-143) afeta tanto a aparência exterior da pessoa quanto o seu espírito interior. Um coração alegre (éãm èah ; veja 2.14) indica uma psique entusiasticamente contente ou jovial, e sua antítese implica dor psíquica. Torna... atraente (yêtib', “torna bom”; veja 15.2) o rosto (pãnim ; veja 7.13, 15) pressupõe que todas as suas feições ganham vida, como pretendido pelo Criador. M as na angústia (übe'a$sebatlêb; veja 10.10) indica a psique atormentada e perturbada decorrente de se viver com insensatez, não com sabedoria (veja 15.5-12). Ela é equiparada a um espírito (rúah; veja pp. 143-144; 15.4; 17.22; 18.14) quebrantado (nekê'â). N k ’ no N ifal com m in significa surrado, açoitado (Jó 30.8; SI 109.16), e seus derivativos adjetivais querem dizer “batido, quebrado”; em decorrência disso, o indivíduo cai em depressão. “Um coração perturbado apaga o espírito, tomando impossível o fluxo da ener gia vital.”32O provérbio seguinte explica a origem da alegria que aviva e da dor que deprime (cp. Pv 13.12,17; 14.10,13; 15.15,30; 17.22; 18.14; 25.13,20,25; Sir. 13.25,26). A antítese imprecisa pressupõe que o estado espiritual do ser interior de uma pessoa é manifestado na vitalidade, ou na falta da mesma, nos olhos da pessoa, no seu sorriso verdadeiro e afins.
14 O segundo par de provérbios determina implicitamente as ori gens da alegria ou da perturbação espiritual do coração ao ser perspi caz e buscar o conhecimento. O coração do perspicaz pode ser distinguido do coração do insensato pelos seus desejos e discursos opos tos. Um coração persp ica z (ou criterioso, nãbôn\ veja p. 147) se mani festa naquilo que procura (veja 2.4) mediante o ouvir para se satisfa zer com conhecim ento (d ã 'a t ; veja p. 125), não em expressar impen sadamente as próprias opiniões. M as a boca dos insensatos (k es ilim ; veja 15.2) completa o coração, e esses paralelos imprecisos devem ser estendidos a seus paralelos antitéticos (veja pp. 85-86). O significado de se alim enta de ( y i r e h ) é controverso. Alguns exegetas acreditam que o sentido de r 'h “se alimentar de” (veja 10.28) é inapropriado com boca, porque em Provérbios a boca normalmente é uma metonímia para o proferimento do discurso, não para a ingestão de algo. Propõe como significado para o termo “estar determinado a, estar ocupado com, praticar”, como é supostamente o caso no Salmo 37.3, em que seu objeto é a fidelidade ( ^ m ü n ã ), e no caso de Oseias 12.2( 1), em que é paralelo a “persegue” (rd p ). No entanto, r'h também pode significar “alimentar” nesses dois casos, e segundo a lei da parcimônia, nâo con vém estender o seu significado. Além disso, no livro de Provérbios a boca também é o órgão da alimentação (cp. 30.20). Em 15.14 o insen sato tem sua natureza corrupta gratificada metaforicamente ao se ali mentar da loucura ( ’iw w elet ; veja pp. 167-168) tanto em seu sentido de insolência moral contra a ordem moral quanto nas conseqüências trágicas de desafiá-la (veja 5.23; 12.23; 14.8, 24; 15.2). No entanto, além de ser uma metáfora para alimentar, também é provável que a “boca” seja usada como metonímia para o discurso do insensato. Nes se caso, o insensato não busca o conhecimento do mestre sábio, mas encontra satisfação em declamar suas próprias opiniões. 15 Este provérbio, que funciona como um ja n u s , dá continuidade ao tema da condição espiritual do coração, mas passa das suas mani festações (vs. 13, 14) para sua importância maior que o bem-estar ma terial (vs. 16, 17). Na estrutura externa de seus paralelos quiásticos e antitéticos, “todos os dias” contrasta com “continuamente”; em sua parte central “infelizes” se contrapõe a “coração alegre”; e entre eles “aflito” contrasta com “banquete”. O provérbio não contrasta os aflitos que são inocentes e explorados, com um coração alegre. Antes, o afli gido em sua saúde e/ou riqueza pode ter um coração alegre que lhe
permite suportar e superar suas circunstâncias (cp. 2Co 4.8; 6.9-10; Hb 10.34). “Se o v. 13 mostra que nossa atitude predominante influen cia toda a nossa personalidade, esse dito faz que influencie toda a nossa experiência.”33 Todos os dias (k o l- ^ m ê ) segmenta a vida inteira do aflito inocente Çãni; veja 3.34) em sua experiência diária de se encon trar fisicamente infeliz (r ã 'im ; veja “mal” em 1.15). A expressão coração alegre (tôb-lêb\ veja “boas” em 2.9) ocorre em outras duas ocasiões (lRs 8.66 [= 2Cr 7.10]; Et 5.9). Esses dois textos ligam a expressão a sãm êah (“contente”), sugerindo que é um sinônimo de “coração contente” (veja 15.13) e de m isteh (“banquete”). Tub-lêb que é, essencialmente, um equivalente de 0b-lêb, também ocorre em Deuteronômio 28.47 e Isaías 65.14 com relação à celebração ale gre em banquetes. Outras construções envolvendo tb e lêb também se referem a um “coração jovial” decorrente de comer e beber (Jz 19.6,9, 2 2 ;R t3.7; IS m 25.36;2Sm 13.28; 1R s21.7;Et 1.10;Ec9.7).34Nesses outros textos, com exceção de Ester 5.9, refere-se à alegria baseada no favor material de Deus, sugerindo que o coração alegre em Provér bios 15.15a supera a adversidade econômica em 15.15b. E o oposto da aflição e do espírito deprimido em 15.13 (cp. 15.4). A metáfora é um banquete (m iste h , do radical sth , “beber”) é uma sinédoque para uma refeição suntuosa, composta de comida e vinho, que celebra ocasiões especiais como um casamento (cp. Jz 14.12,17), o aniversário de uma pessoa (Gn 40.20), um tratado (Gn 26.30), a cessação de hostilidades (2Sm 3.20, 21), ou a honra de convidados especiais (Gn 19.3). C onti nuam ente (tã m id ; veja 5.19) coloca a gratificação metafórica suntuo sa e deleitável do desejo humano lado a lado com a condição constante de privação econômica do aflito. 16 A palavra-chave (ôb (“alegre”/ ‘melhor”) liga os versículos 15 e 16 e, com o versículo 17, outro provérbio “melhor (tôb )... do que”, su gere que o coração alegre em meio ao infortúnio tem como base o temor do S e n h o r ( v . 16) e o amor (v. 1 7 ). O versículo 16 ensina o discípulo a priorizar a religião, não o tesouro. M elhor ((ôb] veja 12.9) um pouco (veja 6.10), o oposto de grande tesouro, com o tem or do 33. Kidner, Proverbs, p. 115. 34. Não implica “ser incapaz de percepção, decisão ou açâo” (pace I. Hõver-Johag, TDOT, 5:307, s.v. (6b), como mostra a conversa perceptiva de Boaz e o seu conselho sensato (Rt 3.715). No caso de Nabal, o texto esclarece sua incapacidade mental acrescentando que ele estava “mui embriagado” (ISm 25.36).
S enhor [veja pp. 153-154] do que um grande ( m ê ... rõ ò ; veja 14.29) tesouro ( ’ôsãr ; veja 10.2) e tumulto (úm ehüm â)?s Uma vez que con
trasta com “o temor do S e n h o r ” , se refere em outras passagens à in quietação interior, mas suas outras formas de uso na guerra santa suge rem que esse pânico interior se manifesta “na corrida e caçada ruidosa, selvagem e tempestuosa dos escravos de mamom ” .36 Esse comporta mento tempestuoso provavelmente envolve a opressão de outros, como os filisteus que, em sua confusão total, feriram uns aos outros com suas espadas. Em Amós 3.9, os grandes tumultos (m ehüm m ôt rabbôt) so bre Samaria são usados em paralelo com as “opressões” ('a$úqim ) no meio dela. A ligação com o versículo 15 sugere que a pobreza econômi ca com lucro espiritual é melhor que a pobreza espiritual com lucro econômico (cp. 10.2). Os ditos “melhor... do que”, que associam a ri queza material com a perversidade e a pobreza material com a verda deira religião mostram que a ligação entre causa e conseqüência pode ser moralmente transtornada por um período (veja pp. 161-164). Além disso, uma vez que o mundo pode parecer temporariamente transtor nado, a riqueza material não é invariavelmente resultado do favor divi no, nem a pobreza é intrinsecamente resultado do desfavor divino. Po rém, uma vez que o S e n h o r sustenta a ordem moral, mais cedo ou mais tarde o mundo será corrigido de modo que os retos sejam recompensa dos com benefícios materiais e os perversos com falência material, num futuro que se estende além da morte.37 17 Este provérbio, que contrasta duas refeições, baseia o banquete do coração alegre no amor, e não no alimento. Sua menção de um boi cevado combina com a festa no versículo 15 e seu estilo melhor... do que (0b... m in), bem como seu reconhecimento da existência de pou 35. S fhúm â é derivado da raiz bi-radical *hm. que se desenvolveu no hebraico nas formas secundárias hmm e húm. Tendo o S e n h o r como sujeito desses verbos, eles sào, tecnicamente, termos para despertar pânico, “terror santo” (Êx 14.24; Js 10.10), c o substantivo indica o pânico interior e exterior na derrota (Dt 7.23; ISm 5.4). Com sujeitos humanos, o verbo também indica o pânico que acompanha destruição (Et 9.24; Jr 51.34). Mas somente em Provérbios 15.16 o substantivo é usado em relação à confusão destrutiva, ao pânico e ao tumulto que as pessoas infligem sobre si mesmas e outros em seu zelo por juntar grandes tesouros (veja H.-P. Milller, TDOT, 3:419-22, s.v. hmm). 36. Delitzsch, Proverbs, p. 234. 37. Para uma refutação do ponto de vista de que os ditos “melhor... do que” se tomaram amplamente difundidos em Israel quando o povo israelita ficou desiludido com a assim chamada glória do império salomônico c com as estruturas injustas estabelecidas durante esse regime, que tiveram continuidade com os governantes subsequentes, veja Van Lceuwen, “ Wcalth and Poverty", HS 33 (1922) 32.
cos bens com virtude o liga ao versículo 16. Este segundo elemento do par ilustra “pouco” com “a refeição frugal de um viajante”, substitui “temor do S e n h o r ” por “amor” para com os outros e “tumulto” por “ódio”. O provérbio ensina que o amor de uns para com os outros, que alegra o espírito e fortalece os laços de amizade durante as circunstân cias de maior privação, é melhor que as circunstâncias ideais acompa nhadas de ódio, que acarreta em ressentimentos amargurados e rivali dade que rompem os laços de amizade. Uma pequena porção ( ruhat) provavelmente é uma expressão derivada da raiz acadiana que signifi ca “consumir, destruir”, ^ruhâ se refere a uma mesada ou à porção de alimento de um viajante em sua jornada .38 O coletivo de vegetais (yãrnq) os qualifica como sendo provenientes de uma horta (Dt 11.10; lRs 21.2). “A refeição de vegetais de um viajante” indica a refeição mais modesta em quantidade e qualidade. Com amor (we ’ahabâ-Sãm; lit., “e o amor está presente”; veja 1 .2 2 ) indica que a refeição é acompanhada do sentimento interior de estimar outros e desejar sua companhia. Um boi cevado (m issôr 'ãbüs; veja 7.22; 14.4) representa o rei dos ani mais domesticados com seus melhores atributos e funciona como uma sinédoque para as mais excelentes iguarias (cp. Lc 15.23).39 Com ódio (weé in ’â-bô, lit. “e ódio com ele”; veja 1 0 . 1 2 ) indica a emoção interior, aversão aos outros no banquete seleto e desejar se livrar deles. (2) Dois vencedores (15.18, 19)
18,19 Além de sua ligação temática pelos dois tipos de indivíduo, o amoroso (v. 18) e o paciente (v. 19), que vencem as suas circunstânci as ou sucumbem a elas, os versículos 18,19 também estão ligados pela assonância dos termos iniciais ’erek e 'õra.h. em seus versetos B. O último também compartilha de uma assonância e raiz verbal com urühâ no v. 17, ajudando a ligar a segunda subunidade parcial à primeira por meio do som e do sentido. 18 0 primeiro vencedor é o indivíduo amoroso, cuja recompensa é a paz, em contraste com o colérico. O conceito de “ódio” no v. 17b 38. ‘“ ruftá ocorre cinco vezes em outras passagens, quatro delas no mesmo contexto, a saber, a “porção” diária que Joaquim recebeu no exílio (2Rs 25.30 [2x] = Jr 52.34 [2x]). Em Jeremias 40.4 é usado para os mantimentos que o comandante babilônio da guarda imperial deu a Jeremias para sua viagem (HALOT, 1:87, s.v. ^rúhá). 39. A NVI traduz a única outra ocorrência do verbo 'Sbús, que é usado em relação às aves na mesa de Salomão como “seletas” (lR s 4.23[5.3]).
forma a transição para o primeiro contraste de pessoas que dominam ou não as suas circunstâncias. Uma pessoa ( ’f$; p. 139) irada (hêmâ; veja 6.34; 15.1), incapaz de controlar a indignação que ferve dentro dela, age de maneira insensata (veja “irritável” em 14.17; cp. 3.31; 22.24; 25.28). Ela levanta (j^gâreh-Y0contenda (ou dissensão; rríãdôn; veja 6.14), um sinônimo de “controvérsia” (rib ) . 41 Mas uma pessoa paciente ( erek ’appayim; veja 14.29), que governa suas paixões (16.32; 19.11; Ec 7.8-9), apazígua (yaSqif; i.e., “causa ou promove um estado de paz e tranqüilidade”) uma disputa (rib; a primeira de 1 2 ocorrênci as em Provérbios), que é associada a raiva em Provérbios 30.33; Isaías 57.16, e dá ocasião a todo o tipo de injustiça.42 Tanto Liedke43 quanto H ALOTconcordam que em Provérbios 15.18; 17.14; 18.6; 26.17, 21; 30.33 rib tem um sentido não legal. E usado como um paralelo sinônimo de “contenda” mãdôn; 15.18; 17.14; 26.21; Jr 15.10; Hc 1.3, de “con tendas, rixas” (m assa’; Is 58.4) e de “açoites” (mahalumôt; Pv 18.6). Os pacientes, que são equiparados aos sábios (veja 14.29), pacificam as controvérsias e contendas o mais rápido possível, a fim de trazer “tranqüilidade” (Salwâ\ 17.1) de modo que o bom senso possa prevale cer e a injustiça possa chegar ao fim. Jerônimo deixa claro que “aquele que é paciente apazigua as contendas já suscitadas: qui patiens est mitigat suscitatas”. A pessoa paciente é maior que a irada, pois pode governar a situação caótica, que o irascível suscitou com sua incapaci dade de dominar as próprias paixões (cp. 25.28). 19 O segundo vencedor é o honesto, cuja recompensa é um pro gresso desimpedido, em contraste com o preguiçoso. O caminho (derek\ veja 1.15) do preguiçoso Çãsêl; veja p. 170) è como uma cerca de espinhos (kim sukat hãdeq; lit. “como uma sebe de abrolhos ou cerca de espinhos” ) .44 Isaías 5.5 fala de uma vinha protegida pelo obstáculo 40. Três vezes no Piei e sempre com müdôn (15.18; 28.25; 29.22). 41. Além desta passagem, grh no Piei somente em 15.18; 28.25; 29.22 e sempre com mSdôn. Com be (“em”/“com”) grh no Hitpael indica “lutar contra” (28.4) ou, mais especificamente, “se envolver na batalha" (Dt 2.5, 9, 19, 24). É um equivalente de “excitar" ( ô r i r , 10.12), “acender” (harhar , 26.21), “incitar" (Silliah , veja 6.14. “semeando”). 42. R'b está associado a um insensato (20.3), em paralelo com fazer o mal (3.30), designado como “soltando-se” e comparado a água contida rompendo uma represa (17.14), retratado como surgindo pelo torcer do nariz (30.33), expresso como uma incandescéncia ardente (26.21), e alimentado por fofocas (26.20). 29.22a é uma variação de 15.18a. enquanto que 29.22b ressalta a perversidade da contenda. No Egito a pessoa irada e descontrolada é o modelo daquele que cai em erro (cp. 22.24, 25) (também Meinhold, Sprüche, p. 255). 43. G Liedke, TLOT, 3:1234, s.v. rib. 44. Xfêukâ é uma forma secundária de mesukâ. Em Miqueias 7.4 o substantivo composto é
considerável de uma sebe de espinhos e abrolhos, da qual as pessoas preferem não se aproximar. A símile indica uma barreira intransponível e, mais especificamente, que espeta e machuca. O preguiçoso quer alcançar seus alvos e superar seus obstáculos, mas sua disposição es piritual o impede de fazer qualquer coisa; a seus olhos, tudo é difícil, doloroso e/ou perigoso demais para ele dedicar seus esforços (22.13; 26.13). Mas a vereda (we>õrah; veja 1.15, 19) dos honestos (y6sãrim; veja p. 152), que têm a disposição espiritual para conformar sua vida aos ensinos do mestre sábio, é uma estrada (selulâ). SPlulâ indica uma estrada que foi construída, preparada e livrada de obstáculos de modo a facilitar o trânsito (cp. Is 57.14; 62.2). As estradas que não são aplainadas fazem as pessoas tropeçar (cp. Jr 18.15). A metáfora indica que as pessoas que conformam suas vidas à sabedoria inspirada não encontram nenhum obstáculo que as impeça de alcançar seus alvos (cp. 4.12). Essa antítese imprecisa entre o preguiçoso e o honesto mos tra que o preguiçoso não é honesto (veja 6 .6 -11). Jesus chamou o servo indolente de “mau” (Mt 25.26). 9. Conseqüências da retidão e da perversidade (15.20-29) 20 Um filho sábio fa z um pai alegre, mas um ser humano1 insensato é aquele que despreza a sua mãe. 21 A loucura traz alegria para aquele que não tem nenhum juízo, mas uma pessoa entendida torna o [seu] percurso reto. 22 Os planos são frustrados2 sem conselho, mas com uma multidão de conselheiros cada plano3 tem êxito. 23 Um indivíduo tem alegria na resposta apropriada da sua boca, e quão boa é uma palavra no tempo certo! 24 O caminho da vida leva para cima4 o prudente, dividido em duas metades. Pode ser derivado de II áük “barrar, bloquear”, ékk “ser pontiagudo” (HALOT, 2:605, s.v. mesukâ), ou de I súk, e seus cognatos em árabe são swk “transpassar, perfurar” e Sauk “espinhos” (HALOT, 2:745, s.v. Swk). 1. Todas as versões antigas e alguns mss. trazem bên, e não o termo do TM, 'ttdüm, provavelmente para harmonizar 15.20b com 15.20a c 10.1b. 2. Lit. “a frustração dos planos não tem conselho”. 3. A sintaxe hebraica permite a discordância entre o sujeito plural e o verbo singular para designar cada um. 4. A frase adverbial consiste da preposição lamede, he diretivo e do substantivo ma'al (“o alto” ) e é usada de forma adverbial. McKane ( Proverbs, p. 479) argumenta - apesar das
e assim se desvia da sepultura embaixo . 5 25 O Senhor arranca da terra a casa dos orgulhosos
mas coloca no lugar a divisa da viúva.
26 Os planos de uma pessoa perversa são uma abominação ao S enhor, mas as palavras agradáveis são puras.6 21 Todo aquele que é ávido por lucro é aquele que arruina a sua casa, mas o que odeia subornos viverá.1 28 O coração do reto pondera [sua] resposta ,8 mas a boca dos perversos deixa escapar coisas más.9 29 O Senhor está longe dos perversos, mas ele ouve a oração dos retos. 20-29 A última unidade da seção A da Primeira Coleção Salomônica, que é estruturada por provérbios educativos quase idênticos que introduzem as duas unidades (10.1; 15.20), termina voltando ao con evidências unânimes dos manuscritos e da Sir., Targ. e Vulg. - que, tendo em vista as expressões "para cima" e “embaixo" não serem traduzidas explicitamente na LXX, devem ser removidas do texto original a fim de esclarecer o provérbio de modo a não interpretar "vida" como imortalidade bendita e “morte” como uma existência de castigo depois da morte. Na verdade, porém, a leitura criativa da LXX, que não traduz o texto hebraico palavra por palavra, represen ta o texto como escapar do Hades (hodoi zBSs dianogmata synetou hina ekklinas ek tou hadou sõthê: “Os pensamentos do sábio sâo caminhos de vida, para que ele se desvie e seja salvo do Hades”). Fichtner omite corretamente a LXX das notas textuais da BHS. Não há nenhuma evidência de que o TM tenha sofrido a influência de conceitos antissaduceus como se diz ocasionalmente (veja 12.18; 14.32). Além disso, a remoção dessas palavras diminuiria a paronomásia do provérbio. Quatro das suas oito palavras começam com as consoantes Im e ms 7 começa e termina com essas letras (veja Gemser, Sprüche, p. 69). As consoantes brandas dào uma sensação de movimento. 5. Somente aqui e em Deutcronômio 28.43, em que é repelido, “mais e mais descerás”, sem o prefixo lamede, que provavelmente foi removido por haplografia em razão do lamede final cm mis& 'ôl. 6. A LXX parafraseia o verseto de forma ímpar; hagrtõn rhSseis semnai, “os ditos dos puros são considerados com honra” . 7. Começando com o v. 27 há uma série de inversões na ordem dos capítulos na tradição da LXX. A. J. Baumgartner (Étude critique sur Vétat du texte du livre des Proverbs daprés les principales traduetions anciennes [Leipzig: W. Drugulin, 1890], p. 147) acredita que esse desarranjo se deve a casualidades externas sofridas por seu texto. 8. Lit. “pondera para responder”, um complemento verbal para completar a situação do verbo. A LXX, a Sir. e a Taig. provavelmente parafraseiam la'°nôt como “infiel”; é questionável se consideram *múnim (pace BHS). Fichtner (BHS) propõe desnecessariamente lirtimôt (“coi sas agradáveis”). Delitzsch (Proverbs, p. 238) explica a Vulg. obedientiam como sendo errone amente derivado de ‘Sná (“comprometer-se"). 9. Ou “coisas nocivas”.
traste predominante da seção entre os retos e perversos. A primeira subunidade da seção trata da alegria no processo educativo (vs. 20-23), uma transição suave da “importância da educação” (15.5-19). Sua se gunda subunidade apresenta o envolvimento do S e n h o r ao preservar os retos e eliminar os perversos (vs. 25-29), dando à seção toda uma forma teológica. O versículo 24 funciona como umjanus entre as subunidades. a. Alegria na educação (15.20-23) O provérbio educativo introdutório e estruturado no versículo 2 0 substitui “filho” por “ser humano” e “tristeza para sua mãe” por “des preza a sua mãe” no paralelo em 10.1. A catábase de bên para 'ãdãm infere que o apóstata foi deserdado como “filho” (cp. 4.3)? A palavrachave “alegria” (émh) estrutura a primeira subunidade sobre a alegria na educação bem-sucedida, capacitando o discípulo a seguir a trajetó ria da alegria dos pais em um filho educável para a alegria do filho em dar conselhos sábios. O objetivo essencial do empreendimento educa cional (v. 2 0 ) que está ligado à ética (v. 2 1 ) e é promovido pelo conselho e a humildade (v. 23), é a conduta correta e o discurso construtivo (v. 23). A unidade parcial consiste em dois pares de provérbios ligados informalmente. Os versículos 20,21 são ligados por émh e os sinônimos “insensato” (v. 2 0 a) e “loucura” (v. 2 1 b); o versículo 2 1 confere à ins trução dos pais um teor ético. Heim observa que cada uma das suas quatro caracterizações da sabedoria é constituída de duas palavras: bn hkm (“filho sábio”), ksyl'dm (“humano insensato”), hsr Ib (“sem juí zo”) e jS tbwn (“pessoa entendida”). O versículo 2 2 avança da instru ção dos pais aos jovens para a necessidade do conselho de um adulto. A natureza dialógica do conselho intensifica o ato de dar respostas boas e eficazes dentro dele (v. 23). A palavra-chave ysr (“tomar reto”; vs. 19, 21) fortalece a ligação entre a unidade sobre a “importância da educação” (15.5-9) e esta unidade. 20 O provérbio educativo introdutório é semelhante aos de 1 0 . 1 1 2 . 1 ; 13.1, e a palavra-chave sãmêah (“alegre”/ ‘alegra”) o liga à intro dução da subunidade anterior (veja 15.13). Um fdho sábio fa z um pai alegre repete 10.1a. Mas o ser humano (ükesll; veja p. 167) insensa to ( 'ãdãm; veja p. 139) indica rebaixar sua condição àquela de um indivíduo desmembrado de sua herança familiar. Aquele que aborrece a correção é semelhante a um animal irracional ( 1 2 . 1 ), mas, ainda
assim, sua humanidade não pode ser negada. 10 No lema do livro (1.7), o objeto de despreza (bôzeh; veja 1.7) é “sabedoria e instrução”. A mudança para a sua mãe Çimmô\ veja 1 .8 ; 1 0 . 1 ), que é parte da ex pressão estereotipada quebrada “pai e mãe” nos pontos de junção do livro (veja 1 .8 e 1 0 . 1 ), sugere a inseparabilidade dos pais e dos ensinos de Provérbios (veja 1.7, 8 ; cp. 23.22, 23; 30.17). “Alegrar” e “despre zar” não podem ser equiparados com precisão, sugerindo que o filho que faz seus pais se alegrarem não os despreza e que aquele que os despreza, lhes causa tristeza. Infelizmente a pessoa que precisa da ins trução deles é levada, por sua opinião exagerada sobre a própria impor tância, a sentir que é melhor que seus pais piedosos e, portanto, mostrase intratável e incorrigível. Trata-se da marca inconfundível do ignoran te. A motivação indireta do dito de agradar os pais é retomada mais explicitamente em 23.15,16,24,25; 27.11. 21 Èãmêah (“alegrar”/ ‘alegria”) marca o movimento da alegria dos pais para a alegria do próprio indivíduo. A insolência moral da lou cura ( ’iwwelet ; veja pp. 167-168) traz alegria (êim hâ ; lit. “é alegria”; veja 10.28) para aquele que não tem ju ízo moral para sobreviver (lahasar-lêb ; veja 6.32; 10.23). Mas uma pessoa ÇiS veja p. 152) en tendida (fíbünâ; veja p. 148) torna... reto (y6yaSSer; veja 1.3), que em outras passagens tem como objeto “veredas” ('o ^h õ t, 3.6; 9.15) ou “caminho” (derek\ 11.5), [seu]percurso ( lãket ; veja 1.11) no caminho reto preparado que conduz para cima, para a vida (v. 24). A antítese imprecisa “a loucura traz alegria” e “toma o [seu] percurso reto” deixa claro que a pessoa insensata, que encontra alegria em zombar da or dem moral, desvia-se temerariamente do caminho do dever e da vida, mas a pessoa entendida se mantém firme rumo à alegria diante dela (cp. Hb 12.2). O provérbio pede que o discípulo recorra ao discerni mento a fim de que suas inclinações (v. 2 1 a) e ações (v. 2 1 b) sejam corretas (veja 2.3). O sábio traz alegria para os pais no presente (v. 2 0 ) e para si mesmo no futuro (v. 2 1 ). 22 Na idade adulta, os conselheiros tomam o lugar dos pais. Pla nos [mahaSãbôf, veja 6.18] são frustrados (hãpêr ), o que significa, essencialmente, “fazer dar em nada” 11 sem (belõ ’; veja 5.23)12 o con 10. Meinhold. Spriiche. p. 256. 11. A raiz prr ocorre 43 vezes no llifil e três no Hofal. Significa essencialmente “dar em nada” . Sua tradução depende do seu objeto, sempre um substantivo abstrato: “quebrar”/ “romper" uma aliança (Gn 17.14 + cerca de metade das suas ocorrências), ordens (Nm 15.31),
selho claro e confidencial de amigos íntimos (sôd; veja 3.32) ao corri girem uns aos outros em amor, até chegarem a decisões sábias em decorrência de sua reunião. Os planos da pessoa arrogante, teimosa e obstinada, com base na sua opinião exagerada de si mesma, conduzem ao fracasso, pois sem a correção tendem a ser egoístas e pouco realis tas. Mas com uma multidão (überõb\ veja 5.23) de conselheiros (yô'asím ), que têm a autoridade para aconselhar um plano de ação (veja 1 2 .2 0 ; 13.10), cada plano tem êxito (ou é executado; tãqúm', veja 6.9 ) . 13 “Os planos [plural] fracassam por falta de conselho [singu lar], mas um plano [singular] é bem-sucedido em função dos conselhei ros [plural] . ” 14 É necessário ter vários conselheiros a fim de compen sar as fraquezas, ignorância e limitações de cada indivíduo. Cada deci são é bem-sucedida porque surge da humildade e da confiança à medi da que os membros se sujeitam a ser corrigidos por meio de conselhos claros e honestos. O provérbio semelhante em 11.14 se refere a uma nação, mas este é tão geral que pode se referir a qualquer situação aber ta a conselhos.15 Os planos em vista, neste caso, são aqueles decididos numa assembleia que inclui o conselho do S e n h o r (3.32); no final, somen te o desígnio dele permanecerá (Pv 19.21; cp. Is 9.7[6]; At 15.6, 31).16 23 O caráter dialógico do conselho leva a esse provérbio sobre alegria de se dar uma resposta apropriada. O provérbio conclui de for ma climática a subunidade sobre sãmêah (“alegria”). Os pais se ale gram quando seus filhos recebem o seu bom conselho (v. 2 0 ), e os adultos sábios se alegram em aceitar o conselho ético (vs. 22, 23) e também ao dá-lo (v. 23). Além disso, na idade adulta um indivíduo leis (SI 119.26), irmandade (Zc 11.14); “anular” votos (Nm 30.9[10]); "frustrar” planos (Jó 5.12); “anular” o juízo (Jó 40.8); “colocar de lado” o desfavor (SI 85.5[6]); “desfazer” os sinais dos adivinhos (Is 44.25); “dissipar" o conselho (2Sm 15.34; 17.14; Is 14.27; Ne 4.9; Ed 4.5) e semelhantemente fazer “fracassar" projetos (Jó 5.15; Pv 15.22) (E. Kulsch. TLOT, 2:1031-32. s.v. prr). 12. EP ên é um sinônimo de belõ' (veja 13.23; 19.2) e be'epes (veja 26.20). 13. Qüm significa, essencialmente, “levantar-se, erguer-se”, mas se desenvolve com uma riqueza de significados em todas as línguas semíticas, entre eles, “ser enchido” (BDB, p. 878, s.v. qüm). Essa nuança é usada em paralelo com “sucederá/acontecerá” tihyeh (Is 7.7). Isaías também emprega o termo como um antônimo de "frustrar” (p rr. Is 8.10; veja McKanc, Prophets and Wise Men [Londres: SCM, 1965], pp. 79, 82). 14. Clifford, Proverbs, p. 154. 15. O correspondente estrangeiro do New York Times, T. L. Friedman (The Lexus and the Olive Tree [Nova York: Anchor, 1999], pp. 230-34) confirma que, a fim de ser bem-sucedido, um pais ou empresa deve ter uma abertura interna e uma disposição para mudar. 16. O conselho pode ser público (I 1.14) ou particular (Pv 3.32; 11.13; 20.19; 25.9), constituído de pessoas boas ou perversas (Gn 49.6; Ez 13.9).
sábio ( ’ís; veja p. 139) se alegra (éimhâ; veja 15.21) na resposta apro priada (bem a'aríêh; veja 15.1) da sua boca (piw; veja 15.14). Ao contrário da tradução “resposta” em nossa língua, que pode indicar uma réplica que não é bem-sucedida, ma'anêh se refere a uma respos ta correta e verdadeira a uma circunstância. O substantivo ocorre seis vezes com referência a uma réplica sábia que “responde” (i.e., corres ponde) à situação, como o paralelo explica. “É usado para a verdadeira correspondência (xxix. 19), para a réplica oportuna (Jó xxxii.3,5), para uma resposta adequada (cp. 28a, xvi. I ) . ” 17 Os três amigos de Jó repli caram, mas não acharam em sua boca uma resposta (m a'anêh\ refuta ção) para ele (cp. Jó 32.3, 5). Uma palavra eficaz é dada no tempo certo em resposta a alguma situação desafiadora (veja 12.23). O ad vérbio exclamativo quão (m ah) ressalta a alegria de se acertar em cheio. Boa ((ôb\ veja pp. 151-152) significa, neste caso, que a palavra (dãbãr, veja 1 .6 ) é constituída com tanta excelência que é benéfica tanto para aquele que fala quanto para aqueles que ouvem e, portanto, considerada desejável por todos. No tempo certo (be'ittô; veja 5.19) se refere a uma ocasião apropriada considerada uma oportunidade. 18 No texto hebraico, o provérbio é organizado de forma quiástica com as expressões para o discurso oportuno e eficaz, ocupando a parte central, e sua avaliação como algo que traz alegria e benefício, constituindo a estrutura externa. Não é uma palavra apressada (29.20), mas sim uma palavra preparada e atenciosa que sai da boca, pressupondo que o ora dor armazenou conhecimento para proferir a palavra apropriada na ocasião certa (10.14). “Uma resposta como essa que, de acordo com as circunstâncias, detém a boca de [s/c/ ou] traz um beijo (xxiv.26), é um lance feliz, uma dádiva do alto” . 19 Numa situação acalorada, essa palavra é uma resposta branda (15.1). b. Janus (15.24)
24 O termo sapiencial “perspicaz” (maékil) e a metáfora do cami nho ligam o versículo que funciona como um janus nesta unidade à subunidade anterior (veja 15.21), e a palavra-chave “vida” (hyh) na primeira frase de 15.24 e a última palavra de 15.27 formam um inclu17. Delitzsch. Proverbs, p. 236. 18. L. J. Coppes, TIVOT, 2:680, s.v. 'et. 19. Delitzsch, Proverbs, p. 236. “Não diga algo quando não é o momento certo para isso" (Ankhsheshonq 12:24, AEL, 3:169).
sio com a segunda subunidade (vs. 24-27). Dentro dessa estrutura en contra-se um par de provérbios que destaca o S e n h o r (vs. 25, 26).20 Este provérbio sintético intensifica as recompensas da retidão passan do da alegria presente para a vida eterna num relacionamento com o S e n h o r . O caminho ('õrah; veja 1.15, 19) da vida (hayyim; veja pp. 158-161) se refere ao estado ou condição que produz a comunhão eter na com o Deus vivo. Leva [lit. “é”] para cima (lem a'lâ ;21 veja n. 4) como uma antítese para “embaixo” em relação à sepultura implica na vida eterna acima e além da sepultura.22 Para (le) indica o prudente ou criterioso (m ãékil ;veja pp. 145s.) como o beneficiário para o qual o caminho da vida é preparado e no qual ele anda. E assim (lem a'an; veja 2 .2 0 ), que marca a conseqüência lógica de estar no caminho da vida que leva para cima, a pessoa bem-sucedida se desvia [veja 3.7] da sepultura (mis§e 'ôl\ veja p. 172). Embaixo [le] mã(tâ (veja n. 5) é o antônimo de lema!lâ (veja 15.24a; Dt 28.43). A salvação da sepultura é mais do que ser poupado de uma morte prematura, pois, de outro modo, o caminho da vida é engolido pela morte, um conceito impensá vel em Provérbios. c. Os destinos do justo e do perverso (15.25-29) A referência ao S e n h o r nos versículos 25a e 29a forma um inclusio ao redor desta subunidade e confere profundidade teológica à uni dade e à seção como um todo. O S e n h o r protege aqueles que andam no caminho da vida e se aproxima deles para ouvir suas orações em meio às crises. Esta subunidade consiste de duas subunidades parciais. A palavra-chave byt (“casa”) associada à ruína dos perversos, estrutu ra a primeira subunidade parcial (vs. 25a, 27a). Os ditos de Yahweh constituem um quarteto nos versículos 25, 26. A segunda subunidade parcial conclui a Seção A, que apresentou os retos em contraste com 20. Cp. Heim. “Structure and Context in Proverbs 10:1-22:16” (dissertação de Ph.D., Uni versity o f Liverpool, 1996), pp. 180-81. 21. Lema'el& ou úlema'elâ ocorre 35 vezes, sem contar a forma com preposições que muda ligeiramente o seu significado, provavelmente para marcar o lugar, que é externo à declara ção, por exemplo, acima (cp. Dt 28.13; Ed 9.6; Ez 41.17) ou voltado para um lugar ou nível mais elevado (Êx 25.20; 37.9; Ec 3.21; Is 8.21; Ez 1.11; 41.7; 43.15). A maioria das versões modernas (NAB, REB, NJPS, NIV, NRSV) opta pelo último sentido. A fim de expressar a ideia de “sempre para o alto/cada vez mais elevado”, o advérbio deve ser repetido (le m a elâ em a'elâ, Dt 28.43; Ez 41.7; pace Van Leeuwen, Proverbs, p. 151). 22. Pace Cosser, “The M eaningof ‘Life'(kayyím) in Proverbs, Job, and Ecclesiastes”, GUOST 15(1955)53.
o s p e r v e r s o s u s a n d o p a r a is s o u m a d is p o s iç ã o q u i á s t i c a d e “ r e t o s /p e r v e r s o s ” :: “ p e r v e r s o s / r e t o s ” a s s o c ia d a à s p a la v r a s q u e d ir ig e m a o u tr o s e a o S e n h o r , r e s p e c ti v a m e n te .
A ú lt im a
p a la v r a , Sm ', f o r m a u m a tr a n s i
15.30, 31 ). 25 Este versículo qualifica o versículos 24 ao sugerir que os opres sores se aproveitam dos fracos no caminho da vida antes do tempo em que o S e n h o r ( YHWH\ veja 1.7), que é como um fogo consumidor que devora os perversos sem destruir seu povo (veja Ex 3.1-15), finalmente os aniquila(cp. Is 1.10-17;5.9;Am2.6-8; Mq 2.1-11). Neste paralelis mo quiástico o sujeito e o verbo, “o Senhor arranca da terra” (yissah; veja 2 .2 2 ), contrastam com “[ele] coloca no lugar” e o objeto da primei ra frase, “a casa dos orgulhosos”, em sua estrutura externa, contrasta com “a divisa da viúva”. Casa (bêt; veja 15.6) é uma sinédoque para os meios indispensáveis para uma pessoa se manter (cp. Et 7.10; 9.5-10; SI 109.9-15; Jr 22.13-30). Quando é arrancada da terra, seu proprietá rio é eliminado para sempre. Dos orgulhosos (gê'im\ veja 8.13) funcio na como uma metonímia para os opressores violentos que exaltam a si mesmos em oposição a Deus e afligem aqueles que são criados à ima gem de Deus (cp. SI 94.2; 140.5[6]). Provérbios 16.19 adverte para não compartilhar de seus despojos. Mas [ele] coloca no lugar (weya$sêb\ veja 8.2) significa que o Senhor coloca a viúva em determinada terra que sustenta a vida, mas não quer dizer “mantê-la/protegê-la” (cp. Gn 35.14; Js6.26; ISm 15.12). Em suas outras duas ocorrências com divi sa {j^büi, cp. 22.28; 23.10, 11; Dt 19.14; 27.17; Jó 24.2), que também é uma sinédoque representativa da propriedade essencial para a vida, nçb no Hifil é usado para criar, estabelecer, as fronteiras das nações (veja Dt 32.8; SI 74.17). Pouco a pouco, os desonestos mudam os mar cos de divisa de lugar até que, a menos que haja uma correção, passam a ter um pedaço consideravelmente maior de terra. Depois que os mar cos de divisa da propriedade da viúva forem movidos, o Senhor o s restaurará (cp. Is 5.8). Da viúva Çalmãnâ) se refere a “uma mulher que foi privada de seus protetores (marido, filhos e, com frequência, também irmãos) ” .23 Sua necessidade fundamental era ser protegida da ç ã o p a r a a u n id a d e s e g u i n te ( v e j a a p a l a v r a - c h a v e Sm ' e m
23. Como uma pessoa sem um protetor, dinheiro ou influência, a viúva é mencionada com frequência com o órfão (yã tô m , Jó 22.9; 24.3; 31.16, 17; SI 94.6; ls 10.2; Ml 3.5), o estrangeiro (g?r, SI 94.6; Zc 7.10; Ml 3.5), o jomaleiro (ia k tr, Ml 3.5), o pobre (dal, Jó 31.16; Is 20.2; ‘Sní, Jó 24.4, 9; Is 10.2; Zc 7.10); o necessitado ('ebyôn, Jó 24.4; 31.19), e os levitas (Dt 14.29) (H. A. Hoffner, TDOT. 1:288, s.v. alm Snâ).
exploração. Uma viúva podia receber a propriedade do seu marido fa lecido, mas também era possível que não tivesse força para trabalhar nessa terra. Normalmente, tanto em Israel quanto na Mesopotâmia, ela era assimilada pela família de seu marido,24 mas em certas circunstân cias voltava para a casa de seu pai (Gn 38.11; Lv 22.13; Rt 1.8-14). No nível horizontal, o S e n h o r incumbiu a comunidade de prover proteção para ela (cp. Êx 22.22-25[21-24]; Dt 10.18; 14.28,29; 16.11, 14; 24.17, 19-21; 26.12,13; 27.19; Lv 19.9; Rt 4; Jó 24.3; Pv 14.21; 19.17; 23.10; Is 1.17,23; 10.2; Jr 7.6; 22.3; Zc 7.10; Ml 3.5; lTm 5.3-15). Desde os tempos mais antigos, por todo o antigo Oriente Próximo, da Mesopotâ mia ao Egito, no regime monárquico essa responsabilidade recaía, em última análise, sobre o rei.25No entanto, no Antigo Testamento, o S e n h o r age de maneira ímpar e assume o lugar do protetor no nível vertical. O próprio S e n h o r , aquele que é digno de confiança, não o acaso capricho so ou as garantias incertas da sociedade, assume a responsabilidade de tirar dos orgulhosos a sua família, fama e fortuna e de restaurar a vida à viúva (23.10, 11; S I 68.5[6]; 146.9; Jr 49.11; lTm 5.5).26 Neste pro vérbio ela funciona como uma sinédoque para todos aqueles que se en contram vulneráveis aos arrogantes e cobiçosos (cp. 14.31; 15.15; 19.17; 22.9, 22; 23.10). Quando estavam fracos demais para ter uma voz, Deus falou a favor dos pobres e necessitados por meio de Moisés (cp. Dt 19.14; 27.17), dos profetas (Os 5.10) e dos mestres sábios (Jó 24.2; Pv 15.25; 22.28). 26 Este versículo está ligado ao versículo 25 pela palavra-chave “ S e n h o r ” e apresenta a sua base teológica. Implicitamente, “os orgulho sos” do versículo 26 são qualificados agora como “perversos” e, por tanto, como uma abominação ao S e n h o r , e “a viúva” que representa todos os fracos e oprimidos é caracterizada como “pura” e, portanto, encontra o seu favor. Os planos (mahsebôt\ veja 15.22) de uma pes soa perversa (rã'; veja 1.16) são uma abominação para o S e n h o r (tô'abat YHWH\ veja 3.32). Repelido por eles, o S e n h o r retira sua pre sença beneficente, abandonando os perversos à morte certa e eterna (cp. 1.20-33; 6.16-19; cp. S I 1.6). Agradáveis (i.e., benéficas,«... ri&am; 24. F. Fcnsham, “Widow, Orphan, and the Poor in Ancient Near Eastera Legal and Wisdom Literature”, JNES 21 (1962) 129-39; reimp. in SA1W, “ Widow", p. 168. 25. F. Fensham, “Widow, Orphan, and the Poor in Ancient Near Easlem Legal and Wisdom Literature”, in SAIW, p. 161. 26. Whybray, Proverbs, p. 235.
2.10) qualifica palavras Çimrê; veja 1.2) que são tão deleitáveis ao S e n h o r a ponto de lhe darem prazer e alegria (cp. 2.10; 3.17; 9.17; cp. 24.4; gn 49.15; 2Sm 1.26; SI 81.2[3]; 141.6; Ct 3.7) e, portanto, sua presença beneficente no caminho da vida. A antítese imprecisa “planos de uma pessoa perversa” e “palavras agradáveis” implica que os pri meiros elaboram palavras desagradáveis e que as palavras agradáveis são uma expressão exterior de uma pessoa boa (cp. 6.18; 12.20; 20.11). São puras (f h õ r i m ) traduz uma raiz que significa ser livre de qualquer contaminação, substância estranha, que é diferente da natureza essen cial de algo. O ouro puro sem nenhuma liga (Ex 25.11; cp. Jó 37.21; SI 12.6[7]). Thr é usado com mais frequência como um termo cúltico e, em várias ocasiões é traduzido como “limpo” no sentido de o S e n h o r santo não tolerar nenhuma impureza em sua presença.27 Seu antônimo é (ãmê' (“imundo”/ ‘impuro”). Somente aqueles que são puros/limpos podem participar do culto (Lv 7.19,20), e os animais oferecidos como sacrifício devem ser de raça pura (cp. um cavalo puro-sangue, um cão de pedigree; Dt 12.15, 22). Este conceito passa com facilidade para suas formas figurativas de uso, referindo-se àquilo que é eticamente puro (cp. Ec 9.2). Neste provérbio, thr funciona como uma metonímia para as palavras que encontram o favor do S e n h o r (veja rõçô/i; p. 534; cp. Ml 3.16), a antítese de “abominação”. A prova dos “verdadeira mente” necessitados é que seus planos e discursos não possuem ne nhuma impureza antiética, como mentiras, distorções e aspereza, que ferem a outros. Essas palavras resplandecem diante do S e n h o r como o ouro puro em seu santuário, e para aqueles que as ouvem são doces para o paladar e curativas para os ossos (Pv 16.24). 27 Este versículo está ligado ao versículo 25 pela palavra-chave “casa” e apresenta o suborno para exemplificar de maneira concreta como os orgulhosos (v. 25) e uma pessoa perversa (v. 26) arruinam a sua casa. No texto hebraico seu provérbio antitético quiástico apresen ta os predicados “arruina a sua casa” em contraste com “viverá” na estrutura externa, e os sujeitos “todo aquele que é ávido por lucro” em contraste com “aquele que odeia subornos” em sua parte central. Todo aquele que é ávido por lucro (bôsêa bãsa'; veja 1.19) é representado como um malfeitor homicida em 1.10-19, e aqui, através de seu parale lo, como um trapaceiro corrupto, mais provavelmente um funcionário
público. Ê aquele que arruina a sua casa Çõker bêtô\ veja 11.29; 15.6) é esclarecido no versículo 25 que mostra a destruição como sen do decorrente da mão poderosa de Deus. Mas o que odeia (wêsômê’; veja 1.22) subornos (m attãriõt ) como paralelo antitético de “aquele que é ávido por lucro”, detalha a sua prática específica. Êxodo 18.21 equipara o “lucro” a subornos. Fora da literatura sapiencial, m a ttã n â , ou o coletivo singular m a ttãn, refere-se a um “presente” (i.e., algo dado voluntariamente a outrem) pelo qual o doador espera ou não receber algo em troca, como quando um pai à beira da morte distribui presentes a seus filhos (Gn 25.6; 2Cr 21.3; cp. Et 9.22; Ez 46.16, 17) ou quando Siquém ofereceu “dádivas” além do dote aos filhos de Jacó, em troca de sua irmã Diná (Gn 34.12). Em suas formas de uso teológicas, é Deus quem concede as dádivas (Nm 18.6,29; SI 68.19[20]). Na litera tura sapiencial, porém, os “presentes” são sempre usados para influen ciar o julgamento ou a conduta de outrem, como para abrir caminho até a presença do rei (Pv 18.16), para obter o favor de um governante (19.6), ou para apaziguar seu furor (21.14). Em Eclesiastes 7.7 ele visa corromper o julgamento e/ou a conduta daquele que recebe os presen tes. O paralelo, “ávido por lucro” exclui o sentido favorável de um pre sente desinteressado ou mesmo um sentido neutro; antes se refere ao suborno dado para obter alguma vantagem à custa de outrem. Em re sumo, no livro de Provérbios é um sinônimo de Sõhad (veja 6.35; 17.8, 23) e um paralelo desse termo em 21.14. O paralelo “ávido por lucro” deixa em aberto se a referência é a dar ou receber suborno; ambos são moralmente incorretos (cp. Êx23.8; Dt 16.19; SI 15.5; Pv 17.8; Ec 7.7; Is 1.23; 5.23). Saadia observa que Abraão e Elias recusaram até mes mo presentes neutros a fim de proteger a reputação de Deus e a sua própria (Gn 14.23; 2Rs 5.16).28 Ao aceitar o presente e comprometer seu mestre, Geazi arruinou sua casa (2Rs 5.27). Viverá (yihyeh; veja 4.4) é uma antítese imprecisa de “arruina a sua casa”, sugerindo que “viverá” implica na continuação da sua casa e que “arruina a sua casa” implica na perda de sua vida. 28,29 Estes provérbios estão ligados pelas palavras-chave organi zadas de forma quiástica “reto” (vs. 28a, 29b) e “perversos” (vs. 28b, 29a), e formam um inclusio com 10.2, 3. O versículo 28 contrasta o discurso desses dois tipos éticos opostos e o versículo 29 apresenta a
razão teológica para ser reto, não perverso, a saber, que na aflição o S e n h o r salva os retos, e não os perversos (correspondendo a 10.3). 28 Este versículo sugere que o coração forma os pensamentos maus ou as palavras puras (v. 26), é a fonte da cobiça ou da generosi dade (v. 27), e é a chave para se dar respostas boas e eficazes (v. 23). O coração (têb; veja pp. 140-143) do reto (éaddiq\ veja pp. 150-152) pondera (yehgeh; veja 24.2) [sua] resposta (la'anôt; veja 15.23). Aqui hgh tem o significado de “ponderar, refletir”, “meditar” (cp. SI 63.5, 6[6, 7]; 77.11, 12[ 12, 13]) pois o discurso refletido contrasta com as palavras precipitadas. A pessoa sábia tem uma resposta preparada (veja 15.23), mas ainda pensa demorada e cuidadosamente sobre aquilo que diz e como deve dizê-lo (veja 15.2). Mas a boca dos perversos {dpi r^s&im; veja 10.6, 32; 11.11) deixa escapar (yabbia; veja 15.2) coi sas (rã'ôt\ veja 1.16) más (i.e., moralmente repulsivas) ou prejudiciais. O “coração” interior e a “boca” exterior, como em 15.7, 14 - observe a inversão de planos maus e das palavras agradáveis em 15.26 - se com plementam (veja 4.23; cp. 10.20, 31). “Deixa escapar coisas perver sas” pressupõe que “pondera sua resposta” tem como objeto “coisas boas”. A LXX, Targ. e Sir. interpretaram essa expressão com o signifi cado de “coisas fiéis”, ressaltando a referência social do versículo. O provérbio toma por certo que os retos são circunspetos e têm autocon trole para refletir e não reagir de acordo com as emoções, ao contrário dos perversos que desejam apenas expressar sua maldade (cp. 10.31, 32; 15.1, 2); eles “ponderam” em como espoliar outros com sucesso (24.2). 29 O provérbio deixa de falar de pessoas e passa a falar de Deus, dando a razão teológica para ser reto. Nas crises o S e n h o r se aproxima para responder às orações dos retos (cp. SI 145.18), que falam de modo construtivo na comunidade, mas se mantêm afastados das orações dos perversos que falam de maneira destrutiva aos seus vizinhos (15.28; cp. S134.6-8[7-9], 16[17], 18,19[19,20]). O S e n h o r (YHWH; veja 15.26) está longe (rãhôq) significa que sua presença beneficente está distan te dos perversos veja 15.28). A antítese imprecisa de “lon ge” e “ouve” na estrutura externa e de “oração dos retos” e “dos per versos” infere que ele é inacessível aos perversos e que faz ouvidos moucos para seus clamores (cp. 15.8; 28.9; Is 1.15). Mas ele ouve (yiSmã'\ veja 1.8) significa que ele oferece seu ouvido exteriormente e responde interiormente a oração (tep illa t; veja 15.8) dos retos
(saddiqim;veja 15.28). Provérbios não vê os perversos se arrependen do; se o fizessem, seriam retos. A presença de Deus é desejada ao longo de toda a Escritura (cp. Ê x 33.15; SI 10.1; 22.2[3]; 119.115). Declarações acerca da presença ou distância do S e n h o r não são de clarações teológicas que restringem sua onipresença, mas sim declara ções religiosas sobre a disponibilidade do seu favor (veja p. 116).
PR OV ÉRBI OS VOLUME 1 ■CAPÍTULOS 1 AIS
O l i v r o d e P r o v é r b io s m a n t é m - s e , em m e io à s u p e r f i c i a l i d a d e d e NOSSA ÉPOCA, COM O UMA FONTE DF. ENSINAMENTOS PARA QUE CADA SER HUM ANO APRENDA A VIVER SOB D E U S E DIANTE DOS OUTROS. U M ESTUDO F.XEGÉT1CO SÉRIO E PROFUNDO, COMPLETO, MAS AINDA p r á t ic o .
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ISBN 978-85-7622-367-2
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