Aurora, De F. W. Murnau (1927) - Olavo de Carvalho

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Apostilas do Seminário de de Filosofia Filosofia - 13

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Aurora,

de F. W. Murnau (1927): cinema e metafísica

Aula do Seminário de Filosofia (30 jan. 1997). Gravação transcrita por Marcelo Toasco Al!u"uer"ue e editada por Alessandra #onrru"uer.

F. W. Murnau

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Murnau filmando

Murnau (esq.) aviador na I Guerra Guerra


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Cenas de Aurora

Aurora$ de %. &. Murnau ( Sunrise$ 19'7)$ !aseado no roance de erran

uderan$ Viagem a Tilsit $ * para i o el+or ,ile do undo. uando se v "ue o /rande isenstein nada ais ,aia senão juntar ia/ens co tanto es,orço para produir$ por associação$ al/ua patriotada a serviço da propa/anda counista$ a2 * "ue a arte de Murnau nos surpreende por sua capacidade de conduir$ atrav*s do jo/o de ia/ens$ a al/o "ue est acia de toda ia/e e eso acia de nossa capacidade de e4pressão e palavras. A traa se desenvolve e trs n2veis5 o persona/e (o ser +uano)$ a naturea e o so!renatural$ tudo per,eitaente encai4ado e se nen+u apelo a ua lin/ua/e indireta ou 6+er*tica6$ no sentido de o!scura$ e!ora +aja ali /randes doses de +eretiso no sentido de al"uiia espiritual.  tea de Aurora * o jo/o entre as decis8es +uanas$ as ,orças da naturea e a isteriosa providncia "ue tudo ordena se alterar a orde aparente das coisas$ se produir acontecientos de orde ostensivaente so!renatural$ e jo/ando apenas co os eleentos naturais.  ,ile coeça co dois aantes  u ,aendeiro de Tilsit e ua turista  toando a decisão ais ar!itrria "ue se possa ia/inar$ ua decisão "ue não * ,undada e coisa nen+ua5 ,u/ir$ sendo preciso$ para isso$ atar a ul+er do ,aendeiro. ssa decisão !rota de ua pai4ão oent:nea$ ua e4trava/:ncia ,undada nu ero desejo$ "ue não corresponde ao sentido de vida ne da ul+er (a oça "ue "uer ,u/ir co o ,aendeiro)$ ne do ,aendeiro e não est encai4ada lo/icaente no "uadro noral de possi!ilidades de suas vidas. A possi!ilidade noral seria tudo não passar de u epis;dio ,ortuito$ al/o coo u naoro de ,*rias - o "ue realente a coisa era

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no ,undo.
 resuo do ,ile * o pro/ressivo retorno desse undo 2tico = realidade "ue o persona/e +avia a!andonado. Ap;s a"uele !reve instante e "ue ele pre,ere o ia/inrio ao real$ por todo o resto do tepo o "ue veos são as operaç8es do destino para devolv-lo = vida real. Mas esse retorno não * ,cil. a,inal$ ele tin+a se tornado u estran+o. le tenta retoar a condição de arido$ coo "ue di5 6u não sou u assassino$ eu não sou u estran+o6$ as ele$ de ,ato$ não * ais o eso. le ter de reencontrar sua vel+a identidade$ e evidenteente isso não * tão ,cil. Teos então duas cenas decisivas5 a"uela e "ue na casa de c+ ele o,erece u !olin+o a ela$ e ela aca!a não aceitando? e a cena do casaento a "ue eles assiste na i/reja.

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* "ue ele estava ao lado da"uela ul+er "ue at* poucas +oras atrs j nada si/ni,icava para ele. @e certo odo$ ele te a2 ua recapitulação de toda a sua e4istncia.

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fim, que executam a intenção dele, isto é, afogam realmente a mulher que ele antes tinha tentado afogar. Veja; aquilo que ele sonhou, já não é mais ele que está executando, é um poder imensamente maior que o dele, ou seja, ele pediu e o céu executou. Nesta hora, ele tem de fazer a aposta decisia para salar aquela mulher que ele quisera matar. !nquanto ai retornando para casa, dá"se a tempestade, e nesse retorno é que se dá tam#ém o retorno dele $ plena posse do sentido da sua ida. !le ai dizendo uma série de %sins% a tudo aquilo a que antes tinha dito %não%. &as quem se op'e a esse sim, quem é o tentador que lhe oferece noamente o não( )gora já não é o dem*nio+ é o prprio -eus, para sa#er se ele quer mesmo.  filme é teologicamente exato ao mostrar que o dia#o age dominando a imaginação, a fantasia e os desejos, enquanto -eus age atraés dos acontecimentos reais, do reino da natureza transformado em mensageiro do so#renatural.  personagem será então o#rigado a reafirmar com muito mais força sua adesão a todos os alores que haia desprezado. ! terá agora de arriscar a sua prpria ida para defend/"los e, mais ainda, arriscar de certo modo a prpria salação de sua alma; pois não pode eitar o sentimento de reolta contra os céus quando pensa que a mulher morreu, e ele se sente preso numa armadilha terr0el montada pelo dia#o, que executou o pedido do qual ele já tinha desistido. !le tem de reafirmar e apostar tudo de noo, desta ez lutando contra todas as pro#a#ilidades aparentes. Aurora, na erdade, transcorre para trás. ) mudança do fazendeiro para a cidade,

planejada no começo, não se realiza, e tudo o que é importante acontece no retorno da cidade para o campo, onde ele ai noamente #otar os pés no chão.  filme tem algo de %romance de formação% 1 Bildungsroman2, g/nero tipicamente alemão, que tem como conclusão a formação da personalidade humana, onde o indi0duo, atraés de seus erros, se transforma num homem de erdade. 3m exemplo é Os Anos de Aprendizagem de Wilhelm Meister; 4erman 4esse tam#ém fez isso em O Lobo da Estepe e em Demian. 5ão romances cuja 6nica conclusão é o crescimento humano em direção $ maturidade. &as esse crescimento é sempre uma diminuição, é sempre o indi0duo oltando $ terra, depois de haer sonhado alguma maluquice e iajado por um céu de mentira. 7 uma apologia caracteristicamente germ8nica do %pão"pão, queijo"queijo% como alor supremo da exist/ncia. ) idéia, portanto, é de que o sentido da exist/ncia está colocado na prpria exist/ncia+ ela tem sentido em si mesma, e não num outro mundo colocado acima deste, como o mundo imaginário que a amante oferece ao personagem, e que é mais ou menos como o mundo da falsa ocação teatral de 9ilhelm &eister. &eister tem o sonho de ser ator, mas ele não sere para ser ator, ele não é um ator, ele é um #urgu/s no fim das contas, e sua desco#erta de que é um #urgu/s de classe média alta, um slido #urgu/s, é a erdadeira educação dele. ) ida


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cotidiana do #urgu/s, na medida em que é real, e pelo simples fato de ser real, tem em si uma força mágica superior a toda imaginação, porque não é constitu0da de imagens, tem uma tridimensionalidade que a fantasia não tem.  imaginário como alternatia oferecida pelo tentador dia#lico é um mundo #idimensional, um mundo s de imagens, imagens no meio da néoa. ) cena em que o fazendeiro e a amante conersam no p8ntano remete $ carta : do uando cai a tempestade e a mulher se afoga, nada no filme nos permite interpretar que foi -eus que a fez cair propositadamente para ensinar algo ao personagem. -eus não aparece, não há a menor insinuação de um sentido religioso eidente enolido no caso. Ns simplesmente emos a tempestade, emos o que aconteceu. Não podemos dizer que foi uma causa diina, ou uma causa natural fortuita, mas em qualquer dos casos esse acontecimento se encaixa não na ordem das causas, mas na ordem do


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sentido, e e força causal diina não aparece como causa eficiente e sim s como causa final, que age atraés da com#inação natural das causas eficientes. >ualquer que seja a causa, para o personagem, aquele acontecimento tem um sentido muito n0tido, não su#jetiamente, mas o#jetiamente, dentro da ida real dele. ! que sentido é esse(  da intenção maligna da qual ele já haia desistido, e que é realizada justamente no instante em que ele a tinha renegado e em que ele a temia. s seus pensamentos iram aç'es no exato instante em que ele não os aceita mais. !ste sentido não é su#jetio, não é o personagem quem interpreta as coisas assim+ elas simplesmente são assim, em si mesmas e o#jetiamente. 5em precisar recorrer $ idéia de uma proid/ncia que propositadamente está %fazendo acontecer% isto ou aquilo " e esta é uma das coisas mais #onitas do filme " o eento tem um sentido o#jetio, e este sentido, por meios puramente naturais, ai na direção indicada pela intencionalidade diina, que é a reconquista do sentido da ida. 7 uma espécie de ironia da natureza, e por momentos o personagem se sente 0tima desta ironia. !la pode ser premeditada ou fortuita, isso não a torna menos ir*nica. ?ara ele, naquela hora, pouco interessa se foi o dia#o que fez choer, para prejudicá"lo, ou se a natureza inocentemente e quase que mecanicamente produziu a chua. ) tempestade é ir*nica nos dois casos, e em am#os os casos faz sentido. 4á a0 uma distinção muito n0tida entre o a ordem das causas e a ordem do sentido. 5 que esse sentido não é su#jetio, não é apenas humano, é um sentido real; dentro do contexto dos acontecimentos, a tempestade tem uma significação n0tida, é uma ironia cruel da natureza, pouco importando se foi intencional ou não. Na erdade, se não foi intencional é até mais cruel, porque então o destino do personagem parece mais a#surdo ainda. -e repente, ele cai totalmente dentro do a#surdo que ele mesmo haia premeditado. 5e houe intencionalidade por trás dos fatos, foi uma intencionalidade pedaggica, e se não houe, foi uma coincid/ncia ir*nica. !ssa ironia já aparece no episdio do cachorro. ?or que o cachorro, na hora que eles ão sair de #arco, sai latindo atrás da dona( 7 porque ele anteiu que ia acontecer uma desgraça( u é simplesmente porque ele quer ir atrás da dona(  filme nada diz a esse respeito. Voc/ está lire para interpretar como quiser. &as como quer que se interprete a causa que fez o cachorro se moer, o que importa não é a causa, mas o sentido que esse episódio acaba tendo no conjunto. ?or qu/( ?orque, ao retornar para deixar o cachorro em casa, o homem poderia ter desistido da iagem e do plano assassino.  cachorro aparece ou como uma casualidade ou como uma intencionalidade, que poderia ter salado a mulher antecipadamente e #loqueado o curso posterior dos acontecimentos. ?oderia, mas falhou.  cachorro não tee força suficiente, é um elemento natural demasiado isolado e fraco para por si determinar o rumo dos acontecimentos.  cachorro, pura sanidade natural, é impotente para deter o mal; para isso será preciso a mo#ilização de todos os elementos da natureza @ a tempestade.


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&as em todos os instantes o que se / é que, não importando a causa, o sentido é n0tido. ! esse sentido não é su#jetio. -e fato, a ação do cachorro naquele momento poderia ter impedido a desgraça. >uase impediu. ! esta é outra caracter0stica desse filme+ o tempo todo oc/ tenta preer o que ai acontecer em seguida, e essa preisão toma o aspecto de um oto de fé+ oc/ deseja que as coisas tomem um certo rumo, oc/ torce pára que isso aconteça @ e, nunca acontecendo o que oc/ deseja, no fim o resultado é, pelos meios mais impremeditados e surpreendentes, exatamente aquele que oc/ desejaa. Na hora em que oc/ sa#e que o sujeito ai tomar o #arco para matar aquela inocente mulherzinha, oc/ deseja que ele não faça isto. ! na hora em que o cachorro começa a latir e ai atrás, o cachorro está realizando de certa maneira o seu desejo, mas ele falha. Nesta cena, todo mundo acila+ oc/, o cachorro, o personagem, a mulher A ela tam#ém não sa#e direito o que ai acontecer. !la tam#ém está numa interrogação.

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especialmente para que as coisas se resolessem desta ou daquela maneira. ) simples somatria de causas naturais e humanas é suficiente para criar um sentido. ) proid/ncia está a0 para qu/, então( ?ara criar e manter o sentido. ) proid/ncia, sendo so#renatural, não precisa no entanto recorrer a meios so#renaturais. -o simples jogo das causas naturais e humanas em n6mero indefinido, haerá um resultado  . Não era necessário uma premeditação para aquele caso espec0fico+ estaa já tudo ordenado, de tal modo que o homem, que é um ser pensante e que tende sempre a criar uma unidade de sentido em sua ida, aproeitaria, para realizar esse sentido, os acontecimentos quaisquer que fossem. -esta maneira, o próprio car!ter "ortuito dos acontecimentos # de certo modo superado. 5ão fortuitos quanto $ sua causalidade eficiente, isto é, $quilo que os desencadeou, mas não quanto $ sua causa final. u seja+ um monte de causas eficientes dispersas de modo fortuito podem concorrer a uma causa final de natureza fundamentalmente #oa. !ste é um elemento da filosofia de Eei#niz 1?rinc0pio do Fem &aior $. Não sei se &urnau pensou em Eei#niz nessa hora, mas para ser lei#niziano não é preciso ter lido Eei#niz+ é uma questão de personalidade e de afinidade espiritual espont8nea. !m todo caso, não é in6til lem#rar que, antes de se dedicar ao cinema, &urnau estudou filosofia e teologia. Num outro filme dele, %abu, há uma mensagem de sentido aparentemente contrário+ a causalidade humana e natural concorrendo para um desenlace trágico. Gsso tam#ém pode acontecer. -e qualquer modo, se tudo termina em comédia 1quando tudo termina #em é comédia, por mais que a gente sofra2 ou em tragédia é coisa que não é decidida na ordem das causas eficientes, mas na ordem da causa final, e com isso escapamos da famosa pol/mica entre determinismo e lire"ar#0trio. )s duas coisas de certo modo se exigem mutuamente; não há como conce#er uma sem a outra. !xiste determinismo na medida em que certas causas desencadeadas ão fatalmente produzir certos resultados. ?odemos tomar as causas naturais que aparecem neste filme, como o comportamento do cachorro e a tempestade, como simples resultados de leis naturais. 4á processos naturais que explicam esses fatos. ?ode estar tudo predeterminado na ordem das causas eficientes, mas nada pode estar predeterminado com relação ao fim, $ finalidade. Não haeria nenhum sentido em criar um ser capaz de escolher, capaz de agir, capaz de ter culpa inclusie, se a finalidade de ida dele já estiesse dada infalielmente de antemão. Gsso seria um nonsense+ não é necessário um ator consciente para desempenhar um papel mec8nico; não seria preciso um ser tão inteligente quanto o homem para desempenhar esse papel. ?ortanto, existe uma certa margem de mano#ra dentro mesmo do determinismo da natureza.  sentido da ida existe, mas sua realização pelo homem é eminentemente fal0el.


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Podemos dizer que o cachorro "não teria" outra alternativa senão ir atrás da dona, porque esse é seu instinto, e a chuva também não teria outra alternativa senão cair naquele preciso momento. O homem é que tem a alternativa de entender ou não entender o que está se passando e de dirigir a vida dele num sentido que esteja harmonizado com quadro natural, com o seu dever e o sentido da sua vida. Para realizar o sentido de sua vida, ele precisa compreender o que se passa em torno, e compreender em quê essas coisas o inluenciam. Os atos !como por eemplo a amante, que não eistia na vida do personagem e que chega de érias a um determinado local num determinado momento, ou seja, az uma interven#ão$ vão se sucedendo e vêm do ambiente em torno. O indiv%duo mesmo é que entende ou não entende. & para não entender, basta ele se desligar por um momento deste tecido denso da causalidade e entrar num outro mundo onde ele próprio é a 'nica causa( que é o mundo imaginário, um mundo inteiramente l)gico e n%tido, onde ele inventa as causas e os eeitos se seguem da maneira mais l)gica poss%vel. * a l)gica do plano criminoso proposto pela visitante+ n)s matamos a sua mulher e vamos para a cidade, e você vai morar lá comigo e vamos dan#ar naquela boate onde sempre vou, etc., etc., etc. udo isso é muito l)gico, de maneira linear. -as, no retorno  vida real, as causalidades não são mais lineares, mas concomitantes e em n'mero inabarcável. / coneão entre elas pode ser percebida ou não, porque o indiv%duo mesmo é um elo de muitas cadeias causais cruzadas. 0ma coisa é acontecer uma chuva e outra coisa é acontecer a chuva na hora em que você está ali. -esmo do ponto de vista puramente natural, do ponto de vista %sico, não é a mesma coisa chover sobre um terreno onde não há nenhum ser vivo, sobre um terreno onde há plantas, sobre um terreno onde há bichos e sobre um terreno onde há gente. /s conseq1ências da chuva atalmente serão dierentes nesses vários casos. 2o caso aqui presente, chove na hora em que está ali eatamente aquele cidadão, portanto essa chuva já não é igual para todos, ela tem signiicados dierentes. &le poderia não ter compreendido a situa#ão. Poderia icar tão idiotizado pela morte da mulher que não sentisse sequer a ironia da situa#ão, não tirasse a li#ão moral nela impl%cita. &le consente em tirar esta li#ão porque continua dialogando moralmente com a natureza, perguntando+ "O que você quer de mim3", ou seja+ coniando no sentido da vida mesmo quando este sentido se tornou invis%vel por eeito dos erros que ele pr)prio cometeu. Ora, a natureza nunca responde totalmente, mas é o ser humano que completa as suas respostas. & na medida em que responde, responde assumindo o sentido e as implica#4es todas, as implica#4es reais que aquilo tem. Ou então antasiando em cima, inventando, ugindo do dever e do sentido da vida. 5uando vemos que tudo isso oi dito s) com imagens mudas, notamos que este ilme é realmente uma obra6prima assombrosa. 2o sentido de jogar com um monte de causas


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para provocar um eeito inal, eiste uma analogia entre Aurora e A Tempestade de 7ha8espeare, mas a dieren#a é que nesta há um agente regendo as causas, que é o mago Pr)spero, enquanto que aqui, não. /qui não aparece mago nenhum, você sequer sabe quem está dirigindo a cena ou mesmo se ela está sendo dirigida. O que você sabe é que ela az um sentido tremendo. Perguntar se isso oi premeditado ou não, neste caso, é inteiramente ocioso, porque a pergunta não é essa. / pergunta não é quem está dirigindo e com que prop)sito, a pergunta é+ O que precisamente está acontecendo3 * uma chuva como qualquer outra3 2ão. * a chuva que acontece neste momento e mata a mulher que o sujeito queria matar meia hora atrás. O momento em que isso acontece não é indierente. / vida real é justamente essa densidade na qual todos os fatores são absolutamente inseparáveis, e a 'nica coisa que está realmente em jogo é se você vai aceitar essa densidade ou se vai ugir para um outro mundo, plano e sem gravidade, o mundo da antasia subjetiva. * justamente esse drama que dá ao ilme todo seu valor e seu impacto. / hist)ria que o personagem havia inventado ele pr)prio entendia pereitamente, mas, e esta outra hist)ria que de fato lhe acontece3 7ão tantos os atores em jogo, que ele não poderia ter uma eplica#ão completa. Para entender tudo o que aconteceu, ele precisaria ser 9eus. :magine o n'mero de causas que teriam de ser investigadas para se saber por que houve toda essa convergência de acontecimentos. :sso nunca ninguém terá. &m nenhum momento haverá uma eplica#ão completa de tudo que aconteceu. 2o entanto, longe de compreender isso no sentido vulgar das "limita#4es do conhecimento humano", temos a% uma indica#ão preciosa sobre a natureza mesma da realidade+ a realidade s) é real quando, nela, o conjunto inito dos elementos conhecidos, e que em si mesmos podem não azer sentido, é abarcado por um ininito que, incognosc%vel em si mesmo, dá a unidade e o sentido do quadro inito. 7empre que o inito se echa em si mesmo, pretendendo ser auto6eplicativo, estamos no reino da antasia l)gica otimista e prometéica. &sempre que o inito se dissolve num ininito sem sentido, estamos no reino da antasia macabra. * na articula#ão sensata do inito no ininito que se encontra o conhecimento da realidade. O sentido da vida do personagem não apenas não é subjetivo+ ele é, por assim dizer, um sentido histórico. O personagem é este homem e não outro, ele teve esta vida e não outra, enim ele não está livre para sentir o que quiser na hora em que quiser. &le vai sentir de acordo com o que aconteceu antes e de acordo com o que ele pretende que aconte#a depois. ;ustamente na hora em que o indiv%duo voltava para casa, esperando retornar  sua paz doméstica depois de tudo aquilo que viveu, depois da tenta#ão e do remorso, nesse instante incide a chuva e ela tem esse sentido porque se encaia na seqüência desse antes e desse depois, e não porque o indiv%duo "sentiu" isto ou aquilo. 2a verdade, ele


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poderia não sentir, ele poderia icar idiotizado. -uitas pessoas, diante de um sorimento desse tipo, na hora em que a vida realiza sua antasia macabra, enlouquecem e não querem pensar mais. /% elas perdem a percep#ão do sentido do que está acontecendo, mas esse sentido continua presente e pode ser reconhecido por quem, de ora, observe o que se passa. O pre#o do sentido da vida é entender o que está acontecendo, por mais que doa. -as entender sempre apenas do ponto de vista humano e sem ter a eplica#ão global. Ora, isso é muito importante para o estudante de ilosoia, pelo seguinte+ em qualquer investiga#ão do tipo meta%sico que se a#a, a tendência humana é sempre voar direto para o problema da providência, do determinismo, da intencionalidade divina, tratando desses temas de uma maneira genérica e abstrata, sem ter este arraigamento prévio do sentido da vida pessoal, o qual é, evidentemente, o 'nico intermediário pelo qual se poderia chegar  compreensão da intencionalidade divina. 7e você não compreende sequer o que os acontecimentos representam dentro do enredo da sua vida, como é que você vai entender as inten#4es do &scritor que produziu a obra3 7e você não entende nem a hist)ria, como é que você vai entender a psicologia do /utor3 * rid%culo que pessoas de alma tosca, incapazes de apreender e assumir responsavelmente o sentido de suas pr)prias vidas, se metam a opinar sobre quest4es ilos)icas simplesmente porque leram onstrua a hip)tese de que eista um 9eus, de que &le conhece seus pensamentos e de que &le pode, como neste caso, tornar realidade os seus piores pensamentos. ?ocê deseja conhecer esse 9eus3 / maioria das pessoas, a%, já não vai querer mais. * melhor não saber. 7urge aqui a amosa emo#ão da "máquina do mundo" do >arlos 9rummond de /ndrade, quando o indiv%duo, ap)s ter investigado e perguntado a vida inteira, na hora em que o 0niverso vai inalmente se abrir e mostrar tudo, ele diz+ @ "2ão quero mais saber". "como defuntas crenas convocadas presto e fremente não se


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produ!issem a de novo tinir a neutra face que vou pelos caminhos demostrando# e como se outro ser# não mais aquele habitante de mim há tantos anos# passasse a comandar minha vontade que# $á de si vol%vel# se cerrava semelhante a essas flores reticentes em si mesmas abertas e fechadas& como se um dom tardio $á não fora apetec'vel# antes despiciendo# bai(ei os olhos# incurioso# lasso# desdenhando colher a coisa oferta que se abria ratuita a meu enenho) A treva mais estrita $á pousara sobre a estrada de *inas# pedreosa# e a máquina do mundo# repelida# se foi miudamente recompondo# enquanto eu# avaliando o que perdera seuia vaaroso# de mãos pensas)" !rechos de "/ máquina do mundo" 6 >arlos 9rummond de /ndrade, em +laro ,nima$

O acesso ao conhecimento de ordem meta%sica tem de passar primeiro por um conhecimento de ordem moral e ética que não consiste em "seguir" uma moral ou uma ética já dada e pronta, mas, ao contrário, em de ato desejar compreender a pr)pria vida e realizar o seu sentido, assumindo o dever com todas as or#as, porque é na vida real que se vai encontrar o elo entre o natural e o sobrenatural. & onde mais poderia agir o tal sobrenatural, se não osse no real, neste mundo hist)rico e humano onde vivemos3


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/ natureza já está dada, é um ato que está diante n)s. &la já está resolvida, se não de maneira eterna, pelo menos de maneira habitual ( embora haja um coeiciente de indeterminismo na natureza, pelo menos no plano macrosc)pico, no plano da natureza vis%vel, as coisas uncionam segundo uma certa regularidade na qual você não interere. / intererência do homem nos processos naturais é m%nima. Pois bem, onde mais você vai intererir3 2o sobrenatural3 2ão, o sobrenatural é 9eus, é onipotente, você não pode meer lá. &ntão, você não pode meer, na verdade, nem na natureza e nem no sobrenatural. ?ocê está colocado, por assim dizer, na natureza, mas um pouquinho acima dela, na medida em que pode energar a natureza como um todo e perguntar sobre alguma coisa que está para além dela, mas aonde você não pode chear. &ntão, onde você está3 &atamente entre um e outro. &ntre um conjunto que você energa mas não entende e outro que, se conhecer, vai entender, mas não conhece. / natureza é vis%vel e cognosc%vel, está diante de n)s, mas n)s não a entendemos, porque não parece ter intencionalidade. As vezes parece que, outras vezes parece que não, então você não sabe. >omo é que vamos saber3 Bom, precisamos interrogar o que está além da natureza, aquilo que está acima dela e que a determina. &m suma, precisamos conversar com o /utor da hist)ria. 7e você conhecesse o /utor da hist)ria, tudo estaria eplicado( mas você não O conhece. /quilo que você conhece, você não entende e aquilo que você entende, não conhece. 9eus é pereitamente compreens%vel( na hora em que você come#a a pensar em 9eus, você vê que tudo az um sentido tremendo, mas n)s não O vemos, não O escutamos e não O conhecemos. & tudo aquilo que vemos, escutamos e conhecemos nem sempre az sentido. ?ocê tem o ato em baio e o sentido em cima. ?ocê desejaria subir para este sentido. -as onde está o elo3 ,m você, porque você também eiste materialmente, ou seja, você é objeto de conhecimento seu, você conhece o seu pr)prio corpo, a sua pr)pria vida, eatamente como você conhece a natureza. & qual é o sentido da sua vida3 ?ocê tem a realidade da sua vida, mas qual é o sentido dela3 >om rela#ão a você mesmo, você também está dividido. ?ocê conhece a realidade da sua eistência, mas não o sentido dela. O sentido, é claro, az sentido, mas você não o conhece. & a vida você conhece, mas não sabe se az sentido. &ntão, você é esse elo, porque a cada instante você pode ligar a esera dos atos com a esera do sentido. >omo é que você az isso3 >ompreendendo o sentido que os atos imp4em, não abstratamente e em si mesmos, mas com rela#ão  sua vida hist)rica. 7) na medida em que vai aceitando compreender esse sentido que está na sua pr)pria vida, você tem ao mesmo tempo a abertura para aquele la#o maior que há entre o natural e o sobrenatural. / rela#ão que eiste entre a sua vida e o sentido da sua vida é a mesma que eiste entre a natureza e 9eus. 7endo você o 'nico elo, há algo que tem de se resolver na sua esera e na sua escala antes de você poder azer a sério qualquer indaga#ão de ordem meta%sica.


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Ora, quando entendemos isso, cada um de nós pode também colocar a seguinte pergunta: Quais os fatos que foram determinantes do meu destino? E, se você começa a contar sua história direitinho, ver que houve fatos que determinaram o seu destino real, sem que você opinasse a respeito, sem que fosse consultado e !s ve"es sem que sequer os percebesse# $a vida dos outros a gente percebe isso muito bem% na nossa, é preciso um esforço# &or e'emplo, você monta um arma"ém# (epois de uma crise econ)mica no *+mbia, que muda o comércio internacional de um produto, seu arma"ém afunda# ocê n-o precisa conhecer essa crise econ)mica toda, você n-o precisa saber onde ela começou e você n-o precisa saber o tamanho dela# ocê sabe apenas que seu arma"ém afundou# .gora, eu pergunto a você: você quer ver o tamanho do inimigo que liquidou seu arma"ém? Quer ver o tamanho do elefante que pisou em cima de você, ou n-o? Quer conhecer realmente o que determina sua vida? $ote que n-o estamos falando de causas sobrenaturais, estamos falando de causas sócio/econ)micas# $esse momento, a maior parte das pessoas bai'a os olhos como o personagem da 01quina do 1undo0# $-o quer ver, e n-o querendo, volta ! condiç-o de animal"inho 2 o bichinho vivente cu3a vida n-o tem sentido, cu3a vida n-o precisa ter sentido, e que só espera morrer o mais rpido poss4vel# . partir desse momento, mesmo o esforço que o su3eito faça para atender aos seus impulsos vitais, seus dese3os, estar atendendo apenas a um instinto de morte# Qual é o resultado final da vida biológica? . morte# 5 o 6nico resultado a que a vida biológica pode levar# &ortanto, na hora em que você limita sua vida ao biológico, por encantadora que ela ainda possa parecer, você sabe que est indo apenas na direç-o da morte e de mais nada# . ren6ncia ao sentido leva embora consigo a própria vida# 7onhecer o sentido da vida pressup8e conhecer o sentido das coisas que v-o acontecendo enquanto ela se passa# 1as a apreens-o desse sentido !s ve"es implica o conhecimento de forças terr4veis, forças de escala histórica, social, planetria ou supra/ planetria# 9uponha, por e'emplo, que os planetas e'erçam alguma influência sobre a sua vida# 9uponha que um planeta se deslocando em sua órbita planetria possa causar um efeito na sua vida# 7omo é que você vai dialogar com um monstro desse tamanho? . maior parte das pessoas n-o dese3a, por medo, levantar os olhos para ver o que determina a sua vida# 1as a aquisiç-o do sentido da vida pressup8e a aquisiç-o do sentido do cenrio cósmico em que você est% n-o em si mesmo, como se fa" ecologicamente, mas como cenrio da peça que é a sua vida# &artindo do ponto onde você est, a consciência pode ir se alargando em c4rculos concêntricos cada ve" maiores, para compreender gradativamente o con3unto de fatores que determinam ob3etivamente a sua e'istência# E ! medida que esta consciência se amplia, mais n4tido se torna o dever pessoal que d sentido ! sua vida# E a4 você n-o busca mais proteç-o


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na inconsciência covarde fingida no começo, mas que com o tempo se torna inconsciência mesmo;, e sim no dever, que lhe infunde coragem cada ve" maior# .contece que, quando alguém fa" isso, vê que é quase um milagre tomar alguma decis-o em meio a todos esse fatores enormemente poderosos# $essa hora, o indiv4duo é obrigado a en'ergar a realidade mais brutal da vida humana: a fragilidade do poder individual# . e'pans-o da consciência pressup8e uma retraç-o das pretens8es e uma perda do egocentrismo, e neste ponto a maior parte das pessoas volta atrs# &ara n-o perder aquele falso senso inicial de segurança, aquela ilus-o de que ele próprio é o centro do mundo, de que ele próprio decide livremente sua vida, o su3eito fecha os olhos ante a mquina do mundo, bai'a a cabeça, e da4 para diante é igual a um carneiro, ou um porco, ou um ganso% mas um carneiro, um porco ou um ganso que continua com a ilus-o de que é uma grande coisa# $esse sentido espec4fico, o personagem do filme aceita o mais plenamente poss4vel a condiç-o humana# Ele entende e assume o que se passa# Ele entende que sua vida é determinada por um dilogo, um confronto, com forças infinitamente poderosas, forças que podem inclusive fa"er com ele uma piada sinistra# .lis, o t4tulo do filme, Aurora, nascer do sol, tem um motivo bastante óbvio# O personagem do filme é o verdadeiro twice born, o renascido em (eus, o renascido no reino do Esp4rito# 5 óbvio que h fatores que ele pode ignorar, mas que 3amais o ignoram# $ós podemos ignorar os fen)menos cósmicos, ou históricos, mas eles nos atingem% nós n-o sabemos deles, mas eles sabem de nós# 7omo um 3udeu na .lemanha na"ista: ele podia ignorar o <=hrer, mas o <=hrer n-o o ignorava# 7omo um crist-o na >99: ele pode ignorar 9tlin, mas 9tlin o conhece muito bem# Em certo momento, esse cenrio assume de fato uma configuraç-o sinistra# E você ag=enta en'erg/la? ocê quer saber, ou n-o? $esta passagem é que se decide se o homem vai ser digno da condiç-o humana ou se ele vai se imputar aquela autocastraç-o espiritual, que é a pior perda por que um su3eito pode passar, e que nenhuma reparaç-o material pode compensar# O homem que desistiu de saber pelo quê s-o determinadas sua vida, sua biografia, desistiu dessa vida e dessa biografia# Ele 3 n-o lhe d mais valor, 3ogou/a no li'o# .gora, no m'imo, ele est redu"ido a uma criança que, ignorando tudo em volta, pede milagres ou amaldiçoa o destino, a socieadde, o próprio (eus% (este ponto em diante, só um milagre, mesmo# 1as o pedir milagre é uma coisa amaldiçoada pelo próprio 7risto# 01aldita a geraç-o humana que pede prod4gios0# E como é que o su3eito vai obter prod4gios se n-o quer sequer olhar para a nature"a em torno, olhar para o mundo real onde esses prod4gios se sucedem a todo instante? .qui é preciso citar uma frase do velho @urd3ieff n-o gosto dele, mas ele tem uns achados verbais incr4veis;, que di" que a maior parte das preces consiste em pedir que dois mais dois dêem cinco# O indiv4duo n-o sabe e'atamente o que pedir# Ora, se ele


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n-o olha nem a realidade em torno, ele n-o sabe onde est, portanto também n-o sabe o que quer# ai pedir uma coisa qualquer, uma bobagem# .o fa"er isso, est recusando o dom do Esp4rito, est cometendo o pecado primeiro: 0Eu n-o quero ser um ser individual consciente e responsvel, eu quero ser um bichinho que n-o sabe de nada, quero permanecer no estado de inocência animal#0 Ele quer pecar contra o Esp4rito e ainda quer que (eus faça um milagre? Aodos os pecados s-o perdoados, menos esse# 5 por isso que ve3o uma blasfêmia profunda na apologia vulgar da 0vida simples0, das 0pessoas simples0# Esse é um aspecto que nunca foi muito bem estudado# . autêntica simplicidade evangélica consiste 3ustamente em pedir pouco, em n-o precisar de muito, e n-o em levar a vida de um bichinho que ignora o mundo que o cerca# Este ignorar é recusar o dom do Esp4rito, e este é o pecado que n-o é perdoado nem nesta vida nem na outra, o pior dos pecados# Audo é perdoado menos o pecado contra o Esp4rito 9anto# Qual é este pecado? . ignor+ncia voluntria 2 e ainda h quem chame isso de 0simplicidade evangélica0# . falta de interrogaç-o sobre o sentido da vida, a depreciaç-o desta busca ou sua reduç-o a uma curiosidade acadêmica, como se algo desligado do ei'o da vida, isto é o despre"o pelo Esp4rito# 9e o su3eito fa" isso e depois vai ler a B4blia, vai re"ar, ele est perdendo tempo# 5 uma besteira: ele 3 informou a (eus que n-o quer nada com Ele# Essa desespirituali"aç-o é a total absorç-o do indiv4duo nas tarefas de subsistência, incluindo as tarefas de pra"er, que também s-o para subsistência# ocê precisa de uma certa quota de pra"er se'ual, gastron)mico, etc#, simplesmente para sobreviver, assim como, para sobreviver, precisa de uma certa dose de esforço dolorido# Enquanto o indiv4duo est limitado a essas duas coisas, ele optou pela vida natural, n-o quer saber do sobrenatural# 9e ele quiser saber do sobrenatural, ter de passar por essa interface, que é o sentido da vida dele mesmo# &ara você saber o sentido de uma coisa, primeiro precisa saber que coisa é esta# 0Que é que eu sou?0, 0Onde é que eu estou?0, 0Que é que eu estou fa"endo aqui?0, 0Que é que est me acontecendo?0 e 0Em que rumo est indo o curso da minha vida?0 &or e'emplo: ocê dese3a realmente saber todos os impulsos hereditrios malignos que herdou de seus antepassados? .ssassinos, estupradores, traficantes, contrabandistas, pro'enetas, dedos/duros 2 quer? Quer ver tudo isto? . isto (ante chama descida aos infernos: reconhecer as possibilidades inferiores que ainda est-o em você# ocê quer ver isto? $-o, n-o quero# di" a maioria# Ent-o, se n-o quer, n-o adianta ir re"ar, porque a funç-o do Esp4rito 9anto é revelar precisamente isso para você# &elo olhar firme e inteligente é que você supera todo o mal que h em você: se você é capa" de saber, de olhar, você 3 est acima do seu próprio mal interior% agora, se você n-o quer ver, você ainda est em bai'o# $-o temos medo daquilo que nos é inferior# 9ó quando você quer ver esse con3unto é que, pelo simples fato de ser vistas, essas possibilidades


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ent-o s-o queimadas, passam a fa"er parte do seu mundo cognitivo e você de certo modo 3 est colocado acima delas# Ent-o, se formos pensar a ferro e fogo, a idéia que se tem ho3e da preocupaç-o 0realista0 com o cotidiano repet4vel é uma fuga do Esp4rito, uma sucess-o de analgésicos# Quando acontece uma grande desgraça, o indiv4duo se pergunta 0por que isso aconteceu a mim?0# Boa pergunta, mas antes de perguntar pela desgraça, 3 devia ter perguntado uma série de outras coisas# $-o, ele dei'a para fa"er perguntas só quando acontece a desgraça# Ora, a desgraça pode ser complicada, e ele talve" n-o a entenda# . situaç-o do personagem do filme é uma situaç-o evidentemente ideal, portanto artisticamente simplificada# 5 o indiv4duo que nunca tinha pensado em nada e repentinamente tem de entender tudo# E ele entende# Ora, ele entende porque é um filme, é um esquema simplificado, simbólico, da vida# $a verdade, se o indiv4duo passar a vida toda ignorando solenemente tudo o que se passa, quando ocorrer a desgraça ele também n-o vai entender, vai ficar ainda mais burro do que estava antes# $-o acredito que dei'ar tudo para o 6ltimo minuto possa adiantar, e'ceto no filme# $o filme, h um idiota 3ogado de repente numa situaç-o trgica, onde ele tem de entender tudo e realmente entende, e, na hora em que entende, sua compreens-o tem uma funç-o catrtica# $a hora em que toma consciência do que aconteceu, ele descarrega o mal que havia na situaç-o e esse mal instantaneamente se converte em bem e sua esposa é resgatada# Eu n-o nego que possa haver, neste sentido, uma atuaç-o mgica do ser humano sobre o cenrio histórico e até mesmo o cósmico, na medida em que entende o mal e, entendendo, o e'pressa e sublima de alguma maneira, e'atamente como di"ia Ahomas 1ann, que algumas previs8es a gente fa" 3ustamente para que n-o aconteçam# 1as, e se ninguém quer ver o mal? .4 vai acontecer mesmo# 9e você n-o quer ver, você dei'a tudo atuando na esfera da mecanicidade, das causas que 3 est-o atuando independentemente de você e que v-o chegar fatalmente !s suas finalidades# 9e você percebe e absorve este impacto, é poss4vel que a sua tomada de consciência tenha uma funç-o catrtica capa" de beneficiar muitos seres humanos em torno# 5 por isso que em geral profetas e grandes m4sticos s-o pessoas que tendem a ser mais tristes do que alegres, porque sabem o que est se passando# &odem antever certos resultados que os outros n-o antevêem e 3 sabem o que vai dar errado# 1aomé olhava para um su3eito e sabia que o su3eito 3 estava no inferno, sabia que n-o podia fa"er nada por ele, ent-o chorava# 1as esta é uma 6ltima inst+ncia# $-o é preciso antever o su3eito no inferno, mas um su3eito na c+mara de gs ou num pelot-o de fu"ilamento é imposs4vel que n-o ha3a ninguém capa" de antever# Entretanto, nas situaç8es em que esse mal se apro'ima, muitos esperam para tomar consciência no 6ltimo momento#


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Aoda tragédia tem esse elemento: ver ou n-o querer ver# $a tragédia antiga, esse n-o ver n-o envolve culpa# . tragédia antiga parte do princ4pio de que e'iste uma certa limitaç-o da inteligência humana# 5 um caso e'tremo, onde, mesmo agindo no melhor de suas capacidades, o homem n-o conseguiria entender, ent-o ele se torna uma v4tima inocente do 3ogo cósmico# $a esfera crist-, 3 n-o se admite isso e sempre h um sentido culposo, e por isso mesmo o gênero trgico n-o floresce muito aqui# $o mundo crist-o, o que n-o quis ver tem culpa# 9empre h uma margem de manobra: as coisas poderiam ser de outra maneira# &ode haver um desenlace horr4vel, mas n-o trgico, porque n-o fatal#


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Direção: F.W. Murnau Roteiro: Carl Mayer Baseado no romance Die Reise Nach Tilsit ("Viagem a Tilsit") de Hermann Sudermann Cinematografia: Charles osher and !arl Struss Música: Hugo ieseneld Montagem: Harold #. Schuster Produção: William Fo$

%a&'is &rinci&ais: George O'Brien   marido anet Ga!nor  * es&osa Margaret "i#ingston  * mulher da cidade

+,-!S Se oc/ 0uer sa1er mais so1re a ida e a o1ra de F. W. Murnau2 d/ uma es&iada nestas es&l/ndidas &3ginas: htt&:44home.earthlin5.net467a5re4murnau4inde$.html htt&:44888.h1ieleeld.de4194murnau4start.htm htt&:44guru5ul.ucc.american.edu4dshe&4modern;students4n8<9=a4home.htm

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Aurora, De F. W. Murnau (1927) - Olavo de Carvalho

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