FICHA TÉCNICA
COORDENAÇÃO
Fernanda Rocha César Carvalho TEXTOS
Alunos dos 2º e 3º ciclos do Agrupamento de Escolas Gomes Teixeira de Armamar do ano letivo 2010/11 ILUSTRAÇÕES
Arminda Cardoso CAPA E PAGINAÇÃO
Carla Cabral
Cinco contos, escritos a muitas mãos. É com prazer que lemos estas páginas, o resultado de um frutuoso trabalho orientado pela equipa da biblioteca escolar, escolar, com os nossos alunos do quinto ao nono ano. Estou certa cer ta que os jovens escritores a vão ler com redobrado orgulho, chamando a atenção de pais e amigos para a ideia que sugeriram, a frase da sua autoria, o palavra adequada que encontraram. Esta singela colectânea de cinco contos bem poderia assumir o título do seu primeiro conto, O Livro Mágico. Pelos valores que nos transmite, assumidamente positivos e que queremos na vida das nossas crianças – a liberdade de imaginação, a generosidade e confiança na amizade, o humor. Pelo trabalho coletivo que representa, uma verdadeira aventura com os amigos, pela escrita, na busca da ideia aceite por todos, da palavra cer ta. Na escolha dos temas, reconhecemos os nossos jovens, as suas preocupações, pr eocupações, as suas vivências e também os seus receios. r eceios. Estão pois de parabéns todos os que contribuíram para nos proporcionar os bons momentos das novas leituras que se seguem. Era uma vez… A diretora do agrupamento Cristina Mexia
As histórias que se seguem são o resultado final do trabalho realizado com todas as turmas do agr upamento, do quinto ao nono ano de escolaridade, no Atelier de Escrita Criativa, dinamizado na Biblioteca Escolar pela professora Fernanda Rocha (professora bibliotecária) e pelo professor César Carvalho Carv alho (professor do primeiro ciclo) em articulação com as disciplinas de Estudo Acompanhado, Blocos de Atividades e Língua Portuguesa. A atividade consistiu na criação de histórias originais, partilhadas pelas turmas de cada nível escolar, subordinadas a temas escolhidos pelos alunos e teve como objetivo estimular o gosto pela escrita e desenvolver competências de trabalho de equipa. Consideramos que o produto final é digno de ser lido por todos, razão pela qual decidimos partilhar as histórias neste pequeno livro. A professora bibliotecária Fernanda Rocha
O LIVRO MÁGICO 5º ano
Era uma vez um menino chamado Rodrigo que recebeu um livro na biblioteca da sua escola. Gostou tanto do livro, que até dormia com ele. O livro era mágico, porque fazia sonhar, sonhar, viajar até países longínquos, quentes e belos. Um dia o menino sonhou que o livro se tinha transformado numa andorinha. No país onde ela vivia já era Outono, por isso decidiu viajar para países mais quentes.
Nas asas da andorinha o Rodrigo viajou tanto até que encontrou um país do seu agrado e que até lhe parecia mágico. Nesse país havia muitas crianças, animais, paisagens deslumbrantes e coloridas, rios de água cristalina, jardins floridos e muito sol, mas nem tudo era perfeito. Nesse país havia um Dragão devorador de imaginação porque, quando era pequeno, os pais não o deixavam imaginar coisas boas nem ir à biblioteca. Ele era um dragão mau, porque tinha tido uma infância muito infeliz, longe dos livros e dos amigos. O Dragão vivia numa gruta húmida e escura que ficava no cume de uma montanha. Não tinha amigos e muito menos visitas, porque todos tinham medo dele, já que devorava a imaginação de todos os que se aproximavam. Quando chegou àquele país, o Rodrigo viu que, apesar de haver muitas crianças, estas eram muito tristes e os seus olhos não brilhavam e pensou: “Porque será que estas crianças têm um ar tão triste? “. O Rodrigo pressentiu que algo estava errado naquele lugar lug ar e com aquelas crianças. Decidiu perguntar a um grupo de meninos e meninas que estavam sentados no chão a olhar uns para par a os outros se queriam brincar com ele. Os meninos responderam admirados: “- Brincar? O que é isso?”. O Rodrigo ficou muito espantado com esta resposta, porque ele brincava todos os dias e era estranho que num lugar tão bonito as crianças não soubessem o que significava brincar. brincar. Perguntou então aos meninos por que razões tinham os olhos tão tristes e não sabiam o que era brincar e eles contaram-lhe a história do Dragão devorador de imaginação que existia no seu país. O Rodrigo, como era uma criança generosa e simpática, decidiu ajudar os meninos da terra mágica que tanto gostariam de poder ter a capacidade de imaginar imaginar..
O Rodrigo voou pelo céu azul da terra mágica montado numa andorinha que, na verdade, não era mais do que o seu companheiro indispensável: o livro. Como gostava muito do seu livro, porque já o tinha lido muitas vezes e imaginados mil histórias, pensou em despertar a curiosidade do dragão e resolveu deixá-lo na entrada da gruta. O dragão ouviu um barulho diferente e resolveu ir ver o que se passava. Qual não foi o seu espanto quando viu, na entrada da sua casa, um objecto de forma for ma rectangular muito colorido. Aquele objecto tinha qualquer coisa que o atraía. Ao pegar nele espalhou-se pelo seu corpo um pó muito brilhante como estrelas. Foi então que algo incrível aconteceu: à medida que o dragão ia desfolhando as páginas do livro, as crianças, pouco a pouco, foram recuperando a sua imaginação e a caverna, caver na, que era escura e assustadora, assustador a, foi-se transformando num lugar alegre e colorido. A partir desse dia o dragão tornou-se mais feliz e passou a organizar festas de leitura na sua gruta. FIM
A VERDADE 6º ano
Era o primeiro dia de aulas do Miguel na nossa escola. O ano lectivo já decorria há alguns meses. O Miguel, mesmo contrariado, tivera que acompanhar os pais no regresso às suas origens. Era um rapaz de doze anos, alto, com cabelo loiro e rebelde e grandes olhos azuis. Azuis, mas tristes!... Na sala, sentado num lugar junto à janela, o rapaz não revelava qualquer interesse pela aula. A sua atenção estava virada para aquilo que se passava lá fora. O vento empurrava as folhas e fazia com que as gotas de chuva esbarrassem, com força, nos vidros da janela; nuvens escuras deslocavam-se para Sul e com elas viajavam os pensamentos do Miguel: os amigos, as idas ao futebol e aos treinos no estádio, as corridas pela praia, pr aia, as ondas cavadas...
A transferência do Miguel veio alterar a rotina da nossa turma. Embora as raparigas tivessem gostado da chegada do novo colega, com os rapazes não foi bem assim: ele passou a ser o centro das atenções, pela novidade que transportava mas também pelo mistério que o envolvia. Os dias foram passando e o Miguel continuava a ser o rapaz distante, triste e misterioso. Eram sempre os pais que o iam levar e buscar à escola, dificultando, aos colegas, uma aproximação. Os intervalos eram passados na biblioteca e evitava participar nos trabalhos de grupo. O Miguel insistia em viver isolado. Porque seria? Nunca ninguém tinha descoberto a razão da sua súbita transferência, não obstante as tentativas que iam fazendo. Nos intervalos, as meninas faziam-lhe perguntas e ele ignorava-as; ignorav a-as; os rapazes avançavam av ançavam com hipóteses: “será que fugiste?”, “foste expulso?”… por toda a escola, corriam várias teorias: “foi um processo disciplinar”, “ andava metido nas drogas”, “roubou”… muitos boatos. Um dia, caiu uma bomba na turma: roubaram a pen da professora de Inglês, que continha o próximo teste de avaliação. “Foi o Miguel!”, pensaram todos, pois nunca tinha acontecido nada assim, anteriormente. O Miguel leu nos olhares dos colegas o que todos estavam estav am a pensar. pensar. Afinal, ele era o único aluno novo na turma… O ambiente tornou-se muito mais pesado, em redor do rapaz. Chegava a ser insuportável! Uma grande raiva raiv a apoderou-se do Miguel. Como era possível estar tudo a acontecer de novo. Começava a pensar que o mundo estava contra contr a ele, pois estava, na verdade, inocente... seria incapaz de roubar r oubar o que quer que fosse. A campainha soou e todos saíram da sala, menos ele. Nesse momento, o Miguel ainda tinha menos vontade em se juntar aos colegas.
A professora aproximou-se dele e perguntou-lhe per guntou-lhe se tinha alguma coisa para lhe dizer, dizer, visto que ainda se mantinha na sala. Ele apenas conseguiu balbuciar que os colegas o acusavam mas que não tinha sido ele e que isso lhe causava uma grande revolta. Nesse momento, alguém bateu à porta. Era a Anabela que tinha visto o Tiago a roubar a pen da professora e a guardá-la no bolso da sua mochila. Imediatamente, a Anabela perguntou à professora se podiam ir ver se a pen estava mesmo na mochila do Tiago, o que se confirmou confir mou de imediato. A Anabela explicou que não tinha dito nada mais cedo, por receio do que o Tiago poderia fazer, pois este tinha-a ameaçado. O Miguel agradeceu, emocionado, a coragem da colega e contou-lhe que a razão por que tinha mudado de escola tinha a ver com uma situação idêntica a esta, só que, dessa vez, ninguém tinha tido a coragem de contar a verdade. A partir desse momento, o Miguel e a Anabela tornaram-se amigos inseparáveis. FIM
A FUGA 7º ano
O Alberto e o Leandro tinham acabado de recolher à sua cela, ao fim de mais um dia igual a tantos outros. A cela situava-se na ala Este da prisão de Monte-Razo. O edifício era antigo, a pintura estava descascada e cheia de caruncho provocado pela humidade. De noite, o silêncio era profundo e só se ouviam as baratas e as ratazanas a roerem os cobertores e as revistas que pertenciam aos prisioneiros. Posters de mulheres semi-nuas e de carros e fotos da família decoravam as paredes e, ao mesmo tempo, tapavam as fendas. A um canto da parede, o “calendário” feito de riscos cortados pelo meio indicava muitos dias... e os dois amigos continuavam fechados naquela penitenciária! Já há algum tempo que andavam a magicar uma forma de fugirem da prisão, mas nunca tinham encontrado uma solução.
Numa noite, o Leandro teve uma ideia genial. No dia seguinte, quando fossem trabalhar na lavandaria da prisão, esconder-seiam dentro do cesto da roupa suja. O Alberto Alber to ficou a pensar na sugestão do amigo e, ao fim de algum tempo, concordou com ele. — Se calhar, é melhor esperarmos uns dias para podermos planear melhor. melhor. — disse o Alber to que era mais sensato. — Tens razão, talvez seja melhor esperar. — concordou o Leandro, enquanto matava uma barata que se passeava passeav a no seu colchão. — Esta não serve para a minha colecção! É muito pequenina! O Leandro era uma pessoa estranha e sinistra. Tinha o bizarro hábito de guardar, numa caixa, quase todas as baratas que matava. O Alberto detestava aquele hábito mas já se tinha habituado. Os dois amigos estavam presos há cinco meses, mas já lhes parecia uma eternidade. Tinham sido presos pr esos numa situação tão ridícula que nem queriam que se soubesse na prisão: ao tentarem assaltar uma ourivesaria, tinham sido surpreendidos por um caniche que estava à porta com a dona. Este mordeu-lhes e a sua dona deulhes com a mala na cabeça com toda a força. As pancadas foram tais, que ficaram atordoados no chão, até serem presos pela polícia.
Chega o dia da fuga. Os dois reclusos estão muito ansiosos. Logo que acabam de almoçar, dirigem-se para a lavandaria, onde costumam trabalhar. A certa altura, o guarda de serviço tem que ir à casa de banho, como era hábito àquela hora. Os dois prisioneiros aproveitam, então, como o planeado, a oportunidade para se meterem dentro do cesto. Tudo está a correr conforme o previsto, quando o Leandro se lembra que não pode fugir sem as suas queridas baratas. O Alberto nem quer acreditar no que está a acontecer!... — Tens mesmo que ir buscar a porcaria das baratas? — sussurra o Alberto, furioso. — Não posso viver sem elas... Elas completam-me! — responde o Leandro, Leandr o, a começar a chorar. — O que te está a fazer falta é uma namorada! Deixa lá as baratas. Lá fora, há muitas. — Sem elas, prefiro ficar cá. Não há baratas como aquelas. Deixa-me ir buscá-las que lá fora ar ranjo uma namorada. — pede o Leandro. — Se continuas com a história das baratas, nenhuma rapariga te vai querer e os guardas ainda nos apanham... — Eu já venho! E depois, ainda te dou um euro, para ires ao McDonald’s. Dito isto, o Leandro salta do cesto e desata a correr em direcção à cela. Para que as botas não ecoem nos corr edores, vai descalço, em bicos de pés, parecendo uma bailarina. Entra na cela esbaforido e, à pressa, pega na caixa das baratas. Na lavandaria, o Alberto desespera, com o nervosismo e com o cheiro da roupa suja. Pudera, os reclusos de Monte-Razo não são muito amigos do chuveiro e só mudam de roupa de quinze em quinze dias. O cheiro é de morrer! — E ele que nunca mais vem... ainda vai ser apanhado pelo guarda! — pensa o Alberto.
Entretanto, o Leandro, com todas as cautelas e com a caixinha c aixinha do seu “tesouro” debaixo do braço, entra na lavandaria e esbarra no guarda que, aliviado, acaba de regressar da casa de banho. — Que se passa “Barata”?! Porque tens as botas na mão?! Porque estás tão corado?! Onde está o “Caniche”?! O que trazes aí debaixo do braço?! “Estou feito…”, pensa, desesperado, o Alberto quase a sufocar dentro do cesto. — Tenha calma Senhor Guarda! Tirei as botas para não acordar as minhas amigas. Se continua a falar tão alto, elas acordam mesmo. Quer vê-las? — reponde o Leandro, Leandr o, abrindo a caixa. — Tens aí o quê? Não, não abras!... Imediatamente, o guarda, denunciando a terrível e providencial fobia que sempre teve por baratas, desmaia e cai para dentro do cesto da roupa lavada. O Leandro aproveita, então, para voltar a entrar no cesto, mesmo a tempo de o homem da carrinha da roupa suja chegar para os levar a caminho da liberdade. — Ó Leandro, deves-me um euro… FIM
O AMIGO VIRTUAL 8º ano
Cassiopeia: Já não aguento mais! Os meus colegas cada vez me incomodam mais… Cyborg: O que se passou, desta vez? Cassiopeia: Descobriram o meu maior segredo! Cyborg: O teu maior segredo!? E eu sei qual é? Cassiopeia: Não. Nem a ti contei... e agora, toda a gente sabe. A Filipa foi, mais uma vez, o alvo do riso dos colegas. coleg as. Era o divertimento diver timento normal nos últimos tempos, mas naquele dia foi pior. Decorria a aula de Inglês. Na folha do caderno, viam-se nascer corações e frases apaixonadas que a Filipa dedicava ao rapaz que, nos intervalos, lhe enchia os olhos e aquecia o coração. Estava tão distraída, que nem reparou que o Francisco estava a espreitar o que ela desenhava. Depois de uma gargalhada estridente, todos ficaram a saber: a Filipa estava apaixonada!
Cyborg: Se toda a gente sabe, também me podes contar contar.. Cassiopeia: Não me sinto à vontade… Cyborg: Então porquê? Já me contaste tantos segredos... Cassiopeia: Mas este é diferente, é um segredo mais íntimo. Cyborg: Afinal de contas, não somos tão amigos como eu pensava. Cassiopeia: Claro que somos! Talvez amanhã te conte. Cyborg: Já que estás tão triste, amanhã, podíamos encontrarnos pessoalmente. O que achas? Cassiopeia: Não sei… os meus pais estão sempre a dizer-me que é perigoso… Cyborg: Perigoso?! Nós já nos conhecemos há tanto tempo, não confias em mim? Não somos os melhores amigos? A Cassiopeia estava muito hesitante, mas o Cyborg insistiu muito e ela, com medo de perder o único amigo que tinha, aceitou encontrar-se com ele e contar-lhe o seu grande segredo. No dia seguinte, a Filipa acordou com um friozinho na barriga bar riga e arranjou-se mais do que o normal. Afinal, ia encontrar-se com o seu grande amigo. Conforme haviam combinado, vestiu uma camisola vermelha.
As aulas pareciam não acabar, os professores falavam em câmara lenta. Foi um dia interminável. Quando, finalmente, soou o toque, a Filipa apressou-se e correu para o “Café Tá-se Bem”. A Filipa sentou-se no lugar mais discreto do café, mas de onde via bem quem entrava. Os seus olhos não paravam de procurar procur ar um rapaz alto, loiro e de olhos azuis, com a mesma idade que ela, e que trouxesse vestida a camisola vermelha combinada. Depois de muito esperar, a Filipa, Filipa, já com as lágrimas nos olhos, decidiu abandonar o café. Não parava parav a de pensar que o Cyborg se tinha desiludido com a sua aparência e tinha desistido de se aproximar dela. Era uma rapariga insegura e escondia os bonitos traços do seu rosto com os caracóis dos seus longos cabelos negros. Sem saber para onde irir,, a Filipa, dominada pela tristeza de ter desiludido a única pessoa que julgava gostar dela, deu consigo em frente à praia. Sentou-se na areia e, olhando o mar, recordou as conversas que tinha tido com o Cyborg. Começou a pensar se realmente ele teria sido sincero com ela, nas longas conversas que tinham tido, nos últimos meses. O som das ondas a rebentar na areia trouxe-lhe um pensamento que ela tentou afastar: afinal, o seu ombro amigo era um rapaz como os outros, só se importava com a aparência física e a dela tinha-o desiludido. Os seus pensamentos foram interrompidos, quando uma mão lhe tocou no ombro. Olhou imediatamente para trás e, para seu espanto, vislumbrou um homem que lhe pareceu ter a idade do seu pai, e que tinha um ar afável. Apesar de o sol já se ter posto, e estar a escurecer, a Filipa viu claramente a cor da camisola do homem que a abordara: vermelha!
A Filipa pensou “não acredito, isto não pode estar a acontecer”. Antes que a ela tivesse tempo de falar, o Cyborg disse, com um sorriso sinistro: — Olá Filipa! Vi-te no café, mas decidi seguir-te até aqui, para podermos estar a sós. A Filipa, naquele momento, percebeu tudo. Aterrorizada, tentou levantarlev antarse mas o seu corpo cor po estava paralisado, par alisado, com medo. medo. Isto era um pesadelo! O Cyborg, com uma força descomunal, agarrou-a e arrastou-a. Ela tentou debater-se, no entanto, não tinha força suficiente. Era apenas uma menina e ele, o Cyborg, era um homem! Procurando salvar-se, a Filipa gritou desesperadamente e os seus gritos ecoaram pela praia deserta. Enquanto gritava, o seu corpo cor po desistiu de resistir e, pela sua mente, passaram, como num filme, todos os momentos marcantes da sua vida. Viu a sua infância, os momentos de ternura com os pais, lembrou os convites dos amigos para sair que nunca aceitou, as brincadeiras que ela nunca compreendeu e que tanto a magoaram, os colegas de turma, os livros, o caderno que fora arrancado das suas mãos… e o Bernardo, o rapaz dos seus sonhos. A Filipa ia sendo arrastada para a estrada, perante a indiferença de algumas pessoas que passeavam junto à praia. Talvez julgassem que ela e o Cyborg fossem mesmo pai e filha. No entanto, ela gritava cada vez mais. Sabia que não havia retorno, ia ser levada por um homem que se fizera passar por um amigo e que, afinal, era um monstro.
Na estrada, estava uma Ford Transit branca. Ouvia-se o motor a trabalhar. A porta da carrinha abriu-se. A Filipa foi empurrada para o seu interior interior.. Ouviram-se duas vozes masculinas: — Ernesto, arranca! Já temos a mercadoria. — Vamos então. Mais uma! Ah, ah, ah! Subitamente, um grupo de jovens cercou a carrinha. Entre eles, estavam o Bernardo e o Francisco! Eram os colegas da Filipa que chegaram a tempo de impedir que o pior acontecesse. O Bernardo, com muita coragem, abriu a porta da carrinha, agarrou as mãos da Filipa e puxou-a contra o seu peito. Antes que ela tivesse tempo de falar, o Bernardo disse-lhe: — Tem calma. Já vamos tirar-te daqui! — Mas… és mesmo tu, Bernardo?! — Sim! Viemos salvar-te! Começaram a ouvir-se as sirenes da polícia que se aproximava cada vez mais. Os raptores tentaram fugir. Em vão. Estavam encurralados e, rapidamente, o Cyborg e o seu cúmplice foram imobilizados e detidos. Enquanto isso, o Bernardo levou a Filipa para longe de toda aquela confusão. Ela ainda não tinha entendido bem tudo o que lhe havia acontecido. Estivera tão próxima de um pesadelo e agora estava ali, como num sonho, protegida pelo rapaz que a fazia suspirar suspir ar.. Estava perdida nos seus pensamentos, quando o Bernardo Bernar do lhe perguntou com ar preocupado:
— Estás bem? Fizeram-te mal? — Não, Bernardo… agora estou bem. Estou é muito curiosa… como me descobriram?! Como sabiam sa biam o que se passava?! — Vi-te sair do café bastante abatida e decidi ir atrás de ti, para saber o que se passava. Quando cheguei à praia, vi aquele homem a aproximar-se e logo percebi que estavas em perigo. Chamei os meus amigos e, felizmente, conseguimos chegar a tempo. Com os olhos a brilhar, a Filipa agradeceu e deu-lhe um abraço apertado. Depois daquele dia, a vida da Filipa mudou. Em casa, passava pas sava mais tempo com os pais e menos tempo a navegar na internet, os serões passaram a ser mais animados. Na escola, os colegas começaram a aproximar-se dela e ela não os afastou, conversava com eles, até participava nas suas brincadeiras e saídas em grupo. Agora, sabia que os amigos reais eram muito mais fiáveis que os amigos virtuais. Embora tivesse apagado aquele dia da sua memória e não gostasse de falar disso, porque achava que as coisas que não são ditas são como se nunca tivessem existido, a Filipa sabia que tinha tido muita sorte. A sua história teve um final feliz mas poderia não ter sido assim. FIM
O MISTÉRIO DA FONTE VERDE 9º ano/CEF
Era o último dia de aulas e todos estavam ansiosos pela partida para S. João Bento. O Frederico, a Joana, o Diogo, a Francisca e a Melissa acordaram cedo e ansiosos e acabaram de meter tudo dentro das mochilas. Combinaram, por SMS, encontrar-se na estação do autocarro, às 8 horas da manhã. Já estavam todos juntos e faltava o Frederico. Era sempre o mesmo… — Vamos ligar ao Freddie. — disse o Diogo, preocupado. — Ainda perdemos o autocarro por causa dele. — Estamos todos à tua espera. Demoras muito? — perguntou a Melissa, ao telemóvel. — Esqueci-me dos calções de praia e tive que voltar para trás. — respondeu o Frederico, ofegante. — Estou quase a chegar! — Despacha-te! O autocarro está quase a partir. — disse a Melissa.
Cinco minutos depois, chega o Frederico, a tempo de entrar no autocarro que já estava a fechar a porta. Muito cansado, sentouse ao pé dos amigos que se riam do seu ar afogueado. Como a viagem era longa, ao fim de algum tempo todos adormeceram, pois tinham acordado muito cedo. Todos dormem profundamente quando a Joana acorda e se apercebe de que já tinham passado para além do seu destino. Muito aflita, acorda os seus amigos e diz: — Já passámos S. João Bento! E agora, o que vamos fazer? Já é tão tarde! Onde vamos passar a noite? O Diogo foi imediatamente falar com o motorista e pediu-lhe para parar na povoação mais próxima. Quando saíram do autocarro, depararam-se com uma pequena aldeia... parecia fantasma, não se via ninguém e, aparentemente, não tinha nenhuma pensão. — Estou a ficar com medo! — disse a Melissa, preocupada. — Calma, Melissa. — disse o Frederico. — Vamos resolver o problema. Temos Temos que procurar alguém que nos possa ajudar ajudar.. — Olhem além uma luz acesa. E se fôssemos lá? — sugeriu a Francisca. — Vamos lá, então. Não temos outro remédio. — respondeu a Joana.
À medida que se iam aproximando da casa, o latido de cães vadios tornava-se mais intenso e os jovens iam ficando cada vez mais assustados. A casa que, inicialmente, lhes parecia ser a sua salvação, era, afinal, uma casa velha e em ruínas, com caruncho nas portas, musgo nas paredes e vidros partidos. Olharam uns para par a os outros, um pouco desorientados e sem saber o que fazer. fazer. — Vamos mesmo bater à porta? — disse a Joana, com receio. — Tem mesmo que ser. Não temos para onde ir. — respondeu o Diogo. O Diogo aproximou-se da porta, bateu, e esta abriu-se, com um estranho rangido. A aragem provocada pela porta aberta apagou a chama que tremelicava num candeeiro antigo. — Está muito escuro! Eu não entro. — disse a Melissa. — Tenho aqui uma lanterna, na mochila. — disse o Frederico. — Vamos entrar! Entraram, pé ante pé, uns atrás dos outros, caminhando sobre um chão que não parava de ranger. — Bolas! — sussurrou sussurr ou o Diogo, muito aflito, tentando afastar com as mãos algo que lhe tinha batido na cabeça. ca beça. — O que foi Diogo? — perguntou a Francisca. — Sei lá! Acho que andam aqui bichos. — Que horror! — disseram, em conjunto, as meninas. O Frederico apontou a lanterna em todas as direcções e descobriu que era apenas um morcego. Num canto da sala, algo volumoso estava tapado por um pano branco cheio de pó. Levantaram o pano e depararam-se com dois sofás em mau estado, mas que serviam para par a descansarem um pouco daquela estranha aventura. Já estavam todos encostados nos sofás quando, de repente, se ouviu um estrondo que os fez ficar em pânico.
Imediatamente, perceberam que o barulho vinha do andar superior da casa. Procuraram as escadas e subiram todos, com curiosidade, mas também algum receio. Quando chegaram ao andar de cima, depararam-se com uma pedra, do tamanho de uma maçã, que parecia ter um papel a envolvê-la. Olharam lá para fora e viram um vulto a fugir. fugir. O Freddie pegou na pedra e desembrulhou desembr ulhou o papel. Apontou-lhe a lanterna, que parecia estar a perder per der a carga e, antes que se apagasse, ainda conseguiu ler o que estava escrito: “No ponto mais alto da Lua, procurem na torr e da capela a sombra que se revela.” Uma vez que a noite já ia longa, dirigiram-se para a sala, onde se encontravam os sofás velhos e empoeirados, e resolveram aproveitá-los para descansarem. Seguiu-se uma noite fria, com o vento a assobiar pelas frestas da porta, os lobos uivavam ao longe e as janelas batiam insistentemente, parecendo criar uma melodia assustadora. Na alvorada, foram acordados pelos raios de Sol que passavam pelos vidros partidos da única janela que existia na sala, fazendo parecer que a noite tinha apenas sido um sonho… no entanto, a noite havia sido bem real e a prova disso era o papel amarrotado que o Freddie guardara no bolso. Os cinco amigos decidiram sair da casa e explorar a povoação, para procurarem procur arem algo para comer comer.. Ao chegarem ao centro da aldeia, encontraram uma pequena mercearia que tinha a porta aberta e não estava lá ninguém. Começaram a achar estranho o facto de não verem ninguém em lado nenhum… nem mesmo na mercearia! Viram alguma comida nas prateleiras. Parecia que já não entrava ali ninguém há algum tempo, pois estava tudo cheio de pó e teias de aranha. Como estavam cheios de fome, pegaram em alguma comida e comeram, cheios de vontade.
De seguida, dirigiram-se à capela, que se encontrava em ruínas, e foram procurar o ponto mais alto a que se referia o papel. Subiram à torre e a Joana disse: — Acho melhor voltarmos cá à noite pois, agora, não há Lua e não conseguimos ver a sombra de que fala o papel. — Boa ideia! — respondeu o Diogo. E assim foi! O resto do dia foi passado a explorar a aldeia... e a ver aumentados o nervosismo e a curiosidade. A noite chegou e, quando a Lua já ia alta, regressaram à capela, voltaram a subir à torre e repararam que faltava o Freddie, mas não acharam estranho porque era costume ele ficar para trás. Voltaram taram a ler o papel que o Freddie tinha dado à Melissa: “No ponto mais alto da Lua, procurem na torre da capela a sombra que se revela.” Olharam para todos os lados e repararam que a sombra da torre se reflectia no cemitério. Olharam para lá e viram um vulto. — Mas, quem será aquele? — perguntou a Francisca, amedrontada. — Se calhar é o Freddie! Deve andar perdido, para variar… — respondeu o Diogo. — Não me parece! Acho que a sombra a que se refere o papel é precisamente aquela. Vamos lá ver o que é! — sugeriu a Joana.
Desceram a torre tor re e, ao aproximarem-se do vulto, perceberam que era er a uma criança. A Joana, cheia de medo, pediu logo que se fossem embora dali mas a Melissa, ao aperceber-se aper ceber-se de que a criança estava muito magra e assustada foi ter com ela. — Está tudo bem? — perguntou ela, preocupada. A criança deu um salto e olhou para os quatro amigos. Parecia que os esperava havia algum tempo... mas aparentava medo e ansiedade. — Quem são vocês? — perguntou ela. — Eu sou a Melissa, e estes são a Francisca, a Joana e o Diogo. Dio go. — explicou. — E tu, quem és? — Eu sou a Katy Katy,, — respondeu ela. — Vocês sabem onde estão? — Não! Tu por acaso podes explicar-nos o que se passa nesta aldeia? — questionou ques tionou o Diogo. — Hum… está bem! Vocês estão em Fonte Verde e todas as pessoas da aldeia estão lá em baixo, naquela mina. — respondeu ela, apontando para um buraco na frente dela. — Mas... estão todos ali em baixo, porquê?! — perguntou a Joana. — Bem, porque quase todas as pessoas da aldeia trabalhavam lá em baixo. Houve uma derrocada lá dentro e aqueles que estavam cá fora, entraram para acudir. O governador, com medo de ficar com as culpas, mandou tapar a entrada da mina com aquelas pedras e fugiu deixando todos lá presos. Só eu é que consegui sair, por entre as pedras, porque sou mais pequenina. Já passaram vários dias. Não sei quantos. Tenho estado sempre aqui, à espera de ver alguém. Só saio daqui para arranjar comida para par a todos. Ontem, quando vos vi passar, tive de vos chamar à atenção e, por isso, escrevi aquela mensagem e atirei-a pela janela. Não me quis aproximar porque estava com medo, mas tive esperanças de que me pudessem ajudar. ajudar. É preciso ter coragem cor agem e força para tirar as pedras que tapam a entrada e as outras que estão lá mais para dentro; e se vocês tiveram coragem para
interpretar a mensagem também podem fazer o resto. — Claro que te vamos ajudar, não te preocupes! — respondeu prontamente o Diogo. — Tu também és muito inteligente e corajosa! — Mas, afinal, estavas aí parada a olhar porquê? — perguntou a Melissa. — Acho que algum animal não se apercebeu do buraco e caiu. — explicou a Katy. — Ok, vamos lá tentar remover as pedras e libertar as pessoas. — disse a Joana. Desceram o buraco e descobriram que, afinal, não era er a um animal que tinha caído, mas sim o Freddie, Freddie, que andava perdido. Como já era habitual, não ligaram, e apenas lhe contaram tudo o que tinham descoberto. Começaram, então a dura tarefa de retirar as pedras que impediam a saída das pessoas da mina. Passaram-se horas! Os jovens já estavam exaustos, mas a cer teza de que estavam a cumprir uma missão de valor animava-os e continuavam sem pensar no suor, nas dores e nos arranhões arr anhões que uma vez por outra as arestas ar estas das pedras iam provocando. Conseguiram retirar as pedras e, para felicidade de todos, as pessoas começaram a sair lentamente... estavam muito fracas! Quando todos estavam fora da mina, os poucos habitantes da pequena aldeia agradeceram, emocionados, aos cinco amigos, por lhes terem salvo a vida. Dirigiram-se, então para o centro da povoação e fizeram um piquenique gigante, onde se comeu de tudo um pouco, aliás, “de tudo, muito”, porque era preciso restabelecer todas as energias perdidas. No final, todos regressaram às suas casas e os cinco amigos tiveram honras de gente importante: dormiram na melhor casa da aldeia.
Na manhã seguinte, despediram-se, pois queriam apanhar o autocarro para S. João Bento, para as suas merecidas férias. As pessoas convidaram-nos a regressarem, re gressarem, sempre que o desejassem e, em conjunto, acenaram, dizendo adeus, para as cinco caras que se viam através do vidro traseiro do autocarro. “Adeus, Fonte Verde! Estes dias ficarão marcados, na nossa memória, para sempre”, suspiraram os jovens, ao mesmo tempo. FIM
Agrupamento de Escolas Gomes Teixeira Armamar 2 1 0 2 l i r b A
Biblioteca Escolar de Armamar