Universidade Católica de Brasília Pró-reitoria de Graduação Curso de Psicologia Disciplina de Psicologia Institucional Relatório de Trabalho Final
Algo sobre a desinstitucionalização da Loucura
Estudantes:
Argus Tenório Clarice Dantas Daniela P. Brum Leandro Freitas Lhorena Mayhara Mariana Araújo
Professor:
Alex Reinecke de Alverga Alverga
Taguatinga, 4 de junho de 2012
Algo sobre a desinstitucionalização da loucura
Como trabalho final da disciplina de Psicologia Institucional, a turma se dividiu em grupos para problematizar relatos de intervenção inspiradas na Análise Institucional (AI) em diferentes campos de atuação. Nosso trabalho resultou numa apresentação para a turma e neste relatório “livre”, cujo ponto de partida (ou fonte de pontos de entrada) foi o artigo “ A reforma psiquiátrica e os desafios na desinstitucionalização da loucura ”, de Alverga e Dimenstein (2006). Neste artigo, os autores começam por apontar alguns impasses para a “gestão de uma rede de atenção em saúde mental para cuidar em liberdade”. Mas, para discutir a desinstitucionalização, analisam a reforma como vem se dando no Brasil. Ou seja, a reforma que caminha no sentido da “reinserção social”, pautada num ideário moderno de cidadania e/ ou direitos humanos. Em seguida, apontam para a insuficiência de modelos que visam essa reabilitação do louco, mas que, porque dentro de uma certa racionalidade, negam sua loucura. “[...] a perspectiva da ressocialização ou reabilitação alcança o que a desinstitucionalização aponta? Ou a ideia de reabilitação traz em si ideias ligadas à institucionalização da loucura, à norma, à razão, ao sujeito autônomo, à identidade e cidadania, enfim, promessas lançadas na constituição de sociedades modernas que destoam do desinstitucionalizar?” (ALVERGA; DIMENSTEIN, 2006, p. 303)
Os autores sugerem ainda a necessidade não só da afirmação dos direitos sociais, mas também da criação de sociabilidades outras e formas outras de relacionar-se com a loucura. Trazem assim, para a discussão, fotografias advindas de intervenções em serviços substitutivos que buscaram captar os “desejos de manicômio” e deram corpo ao debate, este que invoca os nomes do pós-estruturalismo francês: Derrida e seu desconstrucionismo; Guattari e a produção de subjetividade; Foucault e a Disciplina que dá lugar ao que Deleuze atualiza como Controle. Confinamento e controle são duas palavras que sozinhas indicam o cerne da problemática da reforma psiquiátrica, dizem os autores. As fronteiras dos territórios institucionais se desfazem e dão lugar a uma espécie de atravessamento fugidio das instituições, manicomiais inclusas. A nosso ver, toda a discussão do texto aponta para uma sofisticação e reedição do Manicômio e seus regimes esquadrinhantes da figura do louco, em todos os espaços, através do “desejo de manicômio” e constituindo o que Palpert (1990) chamou de “manicômio mental”. Por fim, a materialidade múltipla que envolve a des e institucionalização é apontada. Não sendo, portanto, desvalorizadas as “lutas por financiamento, avanços técnicos e organizacionais”. A desinstitucionalização, dizem os
autores, implica também abandono do lugar de especialista, o que envolve também abandono de uma série de tristezas que mantém as subjetividades manicomiais, pelo fascismo em nós, pela negação da vida. Muitas são as entradas e saídas possíveis que o grupo pôde fazer através da discussão no texto, a partir da disciplina. Os temas eram mais ou menos desconhecidos por todos nós, e exigiram certo estudo e pesquisa. Escolhemos, para falar algo sobre a desinstitucionalização da loucura (Leandro), falar também algo sobre (1) a construção da subjetividade na loucura (Mariana Araújo); (2) do desejo de manicômio (Argus); (3) da determinação histórica da loucura (Clarice Dantas); (4) e do que é loucura (Daniela Brum). Um pouco de Basaglia
Algo sobre construção da subjetividade na Loucura “A Análise Institucional remete a um conjunto de saberes e dispositivos em que o sujeito é radicalmente desnaturalizado, desidealizado, desessencializado; ou seja, apreendido como instituição, efeito ou resultante provisória de discursos e práticas.” (RODRIGUES, 2004, p. 25)
Observamos, desde a Reforma Psiquiátrica italiana até hoje, que o título de louco toma conta do sujeito internado e passa a fazer parte de sua identidade; ele é visto por os outros assim, bem é classificado desse modo por várias ciências tais como a psicologia e psiquiatria, que “comprovam cientificamente”, através de suas teorias a interiorização da loucura, a desrazão e a menor valia do louco como ser humano, e assim justificam atos sobre ele, como afirma Basaglia: “Sua tarefa [a dos “técnicos” e especialistas de então], que é definida como terapêutico-orientadora , é adaptar os indivíduos à aceitação de sua condição de „objetos de violência‟, dando por acabado que a única realidade que lhes cabe é serem objeto de violência se rejeitarem todas as modalidades de adaptação que lhe são oferecidas. O perfeccionismo técnico-especializado consegue com que o rejeitado aceite sua inferioridade social com a mesma eficiência com que antes impunha, de maneira menos incidiosa e refinada, o conceito de diversidade biológica, que sancionava por outra via a inferioridade moral e social do diferente” (1968-2001, p. 102)
Assim o louco tem sua subjetividade negada enquanto sujeito com subjetividade única ou singular, passando a ser s ujeito que pensa “como louco”, objetando assim seu próprio sentir, já que o encara como patológico. Com isso, acatar ordens de pessoas consideradas “sãs” parece bem justificado e até necessário. A partir daí, a subjetividade passa a se pautar e se moldar por as relações de poder, dentro da instituição.
Essa nova subjetividade do louco ocorre na diminuição de tenções entre equipe de tratamento e paciente, no Hospital Psiquiátrico de Gorizia (Itália) ou no São Vicente de Paula (Brasília). Com isso, resta agora o paciente aguardar sua “cura”, já que ele mesmo, pelos processos manicomiais, não pode deixar de viver-se como “corpo doente”. Bem como cabe ao sistema promover a cura do paciente, o que justifica o uso de diversos artifícios, inclusive práticas abusivas, os conhecidos horrores do manicômio, que se não curam o louco, “sossegam-no”, técnicas estas que se pautam no desvalor do louco (o que importa é enquadrar, não importa como). A internalização da violência, a identificação do sujeito com o regime institucional que o tutela, isso entendemos como institucionalização. O organizante pode servir de expansor das fronteiras do instituído, pois ele tem o poder da inovação, assim, dá nova roupagem para as instituições para que estas possam perdurar sem grandes questionamentos. É o que mostra Basaglia quando fala da inserção dos “técnicos”, no Hospital Psiquiátrico em que trabalhou, a quem o poder foi consedido de modo a escamotear as contradições sociais O problema não é a loucura (doença) em si, o problema é a relação que se trava com o paciente, pois ela estigmatiza o louco e confirma a perda social do individuo. Confirma sua inutilidade que existe a partir do momento que a pessoa apresenta seu estado desrazoado. “Tais consequências (refiro-me aqui ao nível de destruição e de institucionalização do paciente internado nos manicômios provinciais) não podem ser considerados como evolução direta da doença, mas sim do tipo de relação que o psiquiatra, e através dele a sociedade, estabelece com o doente [...] Este esboço de análise dos diversos modos de abordar e viver a doença mental [...], demonstra que o problema não é a doença em si (o que é, quais são as causas, quais os prognósticos), mas simplesmente de determinar qual tipo de relação que se instaura com o doente.” (BASAGLIA, 1968-2001, p. 107)
A partir desses aspectos entende-se que a desinstitucionalização ainda se encontra pautada nos saberes psiquiátricos e psicológicos. Continua a violência por que continua a objetividade da ciência que protege a subjetividade contraditória dos ditos “não loucos”, ou seja, o padrão de “normalidade” que rotula as pessoas entre louca e sãs continua a existir. Continua também por que ainda há a detenção do poder (o que é normal ou não; a tentativa de curar o louco”, bem como a abjeção das ações dele e por este mesmo). Essa violência continua, porém, no contexto da desinstitucionalização, representadas no cuidado (vigilância), “aceitação”, terapia e até mesmo sedação (no sentido de o remédio ser uma maneira de abrandar e controlar o louco). Ou seja, a desinstitucionalização ainda visa a adaptação do louco.
Em nome de Deus, queima! Em nome de Dalgalarrondo, interna!
Algo sobre o Desejo de Manicômio “E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música” (Nietzsche)
Nós vimos no decorrer da disciplina que desejo é visto pela maior parte das correntes da AI como produção. Numa delas, na esquizoanálise, temos o desejo entendido não como falta nem descarga nem “suporte” do gozo, mas como construtivismo; o desejo se dá por agenciamentos (DELEUZE, 1988), e não numa relação sujeito-objeto. “Todo agenciamento é, em primeiro lugar, territorial” ( Idem) Um território, como estado de coisas, é um produto agenciado, por conseguinte desejado. E tem nele os caminhos de sua saída e entrada, do movimento de des-reterritorialização (ritornelo) (D&G, 1997), que se dá por bricolagem, isto é, agenciamento de enunciação (sempre coletivo) e agenciamento de corpos (maquínico), um irredutível ao outro. Dessa forma entendemos os “‟desejos de manicômio‟, que perpassam todo socius e alimentam as instituições, que se fazem presentes cotidianamente nas práticas e concepções no campo da saúde mental”. (ALVERGA; DIMENSTEIN, 2006). Diríamos que o desejo de manicômio agencia a construção do território da “saúde mental”, mais no restantes do socius. Nós não saberíamos dizer, porém, se a criação e manutenção de um território manicomial, num CAPS e num lar e no que seja, se dá mais pelo desejo de manicômio ou pelo exercício de poder, na visão foucaultiana. É bem verdade que é um desejo que se efetua em paixões tristes, que diminuem a capacidade de agir e cuja inspiração são necessárias ao exercício do poder, à “docilização dos corpos”. Talvez não seja a questão de saber se o ovo ou a galinha vem primeiro. Mas se “dado determinado efeito, qual é a máquina que poderá produzi -lo? E dada uma máquina, para que ela pode servir?” (D&G, 2010, p.13) O que, agenciado, serve para construção de territórios livres da istitucionalização? Repetimos aqui uma das questões levantadas na conclusão de nosso textobase. A resposta foi o indicativo da necessidade de criação de novas sociabilidades, novos territórios isentos, tanto quanto possível, do “desejo de manicômio.” (ALVERGA; DIMENSTEIN, 2006) E o que serve para a efetuação do desejo de manicômio? Uma resposta a esta pergunta apareceu quando líamos o texto-base. Durante o mesmo semestre previsto pra cursar a disciplina de Psicologia Institucional, de cujo
trabalho final este texto é parte, a maioria de nós cursa também Psicopatologia Geral I, uma disciplina nascida no interior do próprio manicômio. Sem querer entrar no trabalho vasto do Foucault sobre a loucura e o “poder psi” , achamos pertinente o seu parágrafo, em A Microfísica do Poder, que resume o decreto que inaugura a doença mental na “casa dos loucos”: “Sabemos sobre a sua doença e singularidade coisas suficientes, das quais você nem sequer desconfia, para reconhecer que se trata de uma doença; mas desta doença conhecemos o bastante para saber que você não pode exercer sobre ela e em relação a ela nenhum direito. Sua loucura, nossa ciência permite que a chamemos de doença e daí em diante, nós médicos estamos qualificados para intervir e diagnosticar uma loucura que lhe impede de ser um doente como os outros: você será então um doente mental” (FAUCAULT, 1979 apud AMARANTE; SOALHEIRO, 2008, p.310-311)
Com algumas reedições e mudanças superficiais, essa continua sendo a Psicopatologia que estudamos, essencialmente reguladora e normativa. Um dos seus grandes arautos no Brasil, e para nós, é Paulo Dalgalarrondo. Segundo ele próprio (2008, p.11), seu livro vem sendo adotado em diversos cursos de graduação e pós-graduação Brasil a fora, sobretudo de Psicologia e Psiquiatria. O que sinaliza um pouco do alcance dos escritos. Já no prefácio à primeira edição de seu livro, publicado pela editora oficial da Associação Brasileira de Psiquiatria, Dalgalarrondo fala da Psicopatologia geral , de Jaspers, editado primeiramente em 1913, como a obra maior da Psicopatologia: “É o „grande tratado‟, cuja força primordial é ter lançado as bases metodológicas da disciplina: bases a um só tempo clinicamente rigorosas e filosoficamente muito bem elaboradas.” (p.11) Num dos primeiros capítulos, sobre a “Definição de psicopatologia e ordenação dos seus fenômenos”, a Psicopatologia aparece como “um conhecimento que se esforça por ser sistemático, elucidativo e desmistificante [...]; permanentemente sujeito a revisões, críticas e reformulações”. A nosso ver, essa abertura a “revisões, críticas e reformulações” que o autor denota acaba servindo de manutenção à própria disciplina, que dessa forma mantém sua essência normativa intacta. Movimentos semelhantes eram previstos já na sociologia comteana, em termos de dinâmica mantenedora da estática ou progresso conservador da ordem... Dalgalarrondo prossegue, no mesmo capítulo, dizendo que: “O estudo da doença mental, como o de qualquer outro objeto, inicia pela observação cuidadosa de suas manifestações. A observação articula-se dialeticamente coma ordenação dos fenômenos. Isso significa que, para observar, também é preciso produzir, definir,
classificar, interpretar e ordenar o observado em determinada perspectiva, seguindo certa lógica.” (p. 29, grifos nossos)
Malgrado os capítulos introdutórios do livro apontem alguns limites da ciência reconhecidos por ela própria; apresentarem uma gama de critérios de normalidade que o profissional pode escolher a “seu arbítrio”, [acrescentaríamos que ele escolhe a partir do lugar que fala]; apontarem várias correntes diferentes da psicopatologia, nos capítulos seguintes, que apresentam funções mentais normais e patológicas, “seguindo certa lógica”, a abertura se estreita. As partes do livro dedicadas ao Delírio (“alteração do juízo de realidade”) são especialmente emblemáticas: “Desde Aristóteles, os elementos propriamente intelectivos do pensamento dividem-se em três operações básicas: os conceitos, os juízos e o raciocínio. [...] O que caracteriza o pensamento normal é ser regido pela lógica formal e orientar-se segundo a realidade e os princípios de racionalidade da cultura na qual o indivíduo se insere.” (DALGALARRONDO, 2010, P. 193-196)
Permanece, pois, o “monólogo da razão sobre a loucura”, a sobrecodificação poderosa das experiência do Fora, do desvio. Tanto no que tange ao pensamento, quanto à afetividade, à linguagem, às sensações. Assim como Ondina Pena: “Entendemos que os atendimentos psicológicos são muitas vezes completamente ineficazes por trabalharem no sentido de re-enquadrar em uma matriz simbólica renegada exatamente aquelas pessoas são de dissidentes dessa matriz. Esse ato é, por si só, violento, se entendermos por violência todo tipo de agressão, simbólica ou real, infringida a pessoas que, de uma forma ou de outra, buscam se constituir fora dos limites da matriz que normatiza a existência e define como abjetas determinadas formas de vida.” (2012)
Nós também não temos a solução para a desinstitucionalização da loucura, mas a Psiquiatria, pela sua própria essência, pode funcionar menos como uma técnica de cuidado do que como uma enorme máquina de amolação de facas e de corte, reprimindo os desvios em nome de “uma certa lógica”, um certo modo de vida. Não cremos, pois, na possibilidade de um território desinstitucionalizado sem o expurgo ou puro e simples abandono da psicopatologia, esta que chega pra nós; e da psiquiatria, quaisquer que sejam as reformas a que ela se submeta; e mesmo da psicologia e da psicanálise, no que coadunam com as outras duas. Algo sobre o que é loucura
Um marco foi na Renascença que vem a partir da ação, do fazer; seria algo imediato, que tem um personagem principal: a Nau dos Loucos. “É a Nau dos Loucos, o bestial barco que tem por tripulação criaturas bizarras, lunáticos, selenitas, enfim doidos varridos em geral. No comando da Nau, a nossa velha conhecida elite dotada de poder ” (Rodrigo Silva). Os loucos eram expulsos da cidade através desse barco e partiam das cidades para lugares longínquos, onde quem eram expulsos eram os loucos, onde a utilidade social deles era a não perturbação dos moradores da cidade (que não eram loucos), visando a segurança dos mesmo. De acordo com Foucault essa vontade de embarcar os loucos no navio de destino bem longe daqui estava abrindo um caminho para o pensamento do homem ocidental,de assombrar talvez a sua imaginação e dar um certo fascínio sobre ele. E por outro lado temos o Classicismo, no século XVI, que também teve uma importância na loucura. De acordo com Foucault, a loucura passa a ser considerada e entendida em relação a razão e para Pelbart (1990) a loucura é a desrazão, onde elas estão recusando e em outro momento estão se fundamentando. E que sem a razão não podemos ter uma concepção de loucura, tendo sentido no campo da razão. A razão, diz que a loucura é um momento essencial de sua própria natureza. Ainda segundo Foucault: “a verdade da loucura é ser interior à razão, ser uma de suas figuras, uma força e como que uma necessidade momentânea a fim de melhor certificar-se de si mesma”. (1997: 36). Partimos para outra época, séc. XVII, onde temos agora outra „solução‟ para os loucos, os internatos, com o mesmo propósito da Nau dos Loucos, a única diferença que não levam pra outro lugar, outra cidade, mas parte da ideia de reclusão e deixando sociedade livre de loucos andando por ai, pelas ruas. E de acordo com Foucault, esse estabelecimento, o internato, não é um estabelecimento medico e sim uma estrutura semijurídica, que vai decidir, julgar e executar, resultando na reclusão. Voltando um pouco, faremos uma comparação entre os modelos da Idade Media e o Classicismo, este inventou o internato como parecido a Idade Média fez para os leprosos, e com o espaço vago deixado pela falta de leprosos, os internos ocuparam esse espaço vago. E que hoje conhecemos como manicômios, e falando em hoje, temos uma questão a ser levantada: A relação do louco com a loucura, se os dois andam de mãos dadas.
E Pelbart faz um pequena reflexão o que significa de fato a utopia asséptica de uma sociedade onde os loucos não estariam mais dentro de asilos nem discriminados, o que acontecera com os loucos e com a loucura? Definiremos uma identidade para ele, atribuir direitos, reconhecimento, como fazemos com os índios, homossexuais, entre outros, e outra pergunta seria que essa libertação dos loucos não seria somente um estratégia política. Podemos considerar louco como um indivíduo marginalizado da sociedade, “excluído, recluso descriminado por ela. E loucura como uma dimensão essencial de nossa cultura: a ameaça [...] tudo aquilo que a civilização enxerga como o seu limite, mas nem sempre o louco ficou com o papel de ficar com a loucura. Onde a desrazão não nasceu com o louco nem coincide com ele” (PELBART, 1990, p. 134). Isso quer dizer que o louco teria a obrigação, o dever e carregar a loucura sendo que não necessariamente pode ser assim. E por fim o autor aborta uma sugestão que seria acabar com os manicômios físicos (instituição) e também o manicômio mental. No interior da Psiquiatria (isto é, disciplina científica contemporânea para a qual a loucura, no final do século XVIII, se tornou objeto de conhecimento). Vem trazendo um conceito bem nuclear que é qualificando a loucura como “doença mental” que pretende dar conta do fenômeno lo ucura. A “doença mental assume a feição de uma entidade natural manifestada por sintomas”. Por exemplo: “alterações” do pensamento, da linguagem, da motricidade, da emotividade dentre outras alterações. A medicina tenta revelar a essência da loucura fazendo uma análise da seguinte maneira: fazendo uma qualificação de estágios e termos de classificação como “mania”, “depressão'' “paranóia” entre tantas outras classificações de termos de análise. Se tem várias teorias contemporâneas sobre a natureza da loucura. Uma dela é a de Carl Wernicke que vem discorrer que doenças mentais são doenças celebrais: ''Isto é, a doença mental não é concebida por analogia com as doenças orgânicas mas ela própria, qualquer que seja a sua forma, se situa entre as últimas.Os sintomas, na qualidade de índices, são remetidos pelo especialista à (s) sua (s) causa (s) cujo suporte é orgânico. O esquema etiológico proposto ou postulado (i.e., a explicação da origem da patologia) consiste em reduzir as doenças mentais a fenômenos produzidos por distúrbios cerebrais.” (FRAYZE-PEREIRA, João. O que é loucura. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1985).
Outro significado para loucura é a desorganização da ''personalidade individual'' que vem propor a seguinte ideia que a personalidade do indivíduo torna-se, portanto o habitat natural da doença e o critério no qual ele será julgado. E a partir disso se julgam se é louco ou não.
“Portanto, o indivíduo é doente sempre em relação: em relação aos outros, em relação a si mesmo. Isto significa que o próprio da loucura como “doença mental”, conforme a expressão médica, é ser rebelde a uma definição positiva. Em outras palavras, é teoricamente muito difícil, senão impossível, definir a loucura em si mesma, como um fato isolado.'' ( FRAYZE-PEREIRA, João. O que é loucura. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1985)
Lembrando que já vem de nossa própria cultura que a loucura é algo que não se tem normalidade e a falta de muitas coisas como a saúde mental; que a loucura é concebida nos quadros da “anormalidade”. A sociedade vem normalizar qualificar colocar nos seus padrões as suas vontades ou seja impor uma exigência. O anormal (o anormal é condicionado pelo normal), é acionado por ele (o anormal é condição do normal). ''Doença só tem realidade e valor de doença no interior de uma cultura que a reconhece como tal ” (Doença Mental e Psicologia)''.
Isto pode ser facilmente demonstrado quando abordamos o conceito de normalidade e de anormalidade e observamos que o anormal é uma virtualidade inscrita no próprio processo de constituição do normal e não um fato ou uma entidade autônoma que definiríamos pela identificação de um conjunto de propriedades delimitadas e imutáveis. O anormal é uma relação: ele só existe na e pela relação com o normal. Normal e anormal são, portanto, termos inseparáveis, um depende do outro para que exista. E é exatamente por esses aspectos que considera tão difícil definir a loucura em si mesma. ''Ao procurar compreender as condutas através do contexto singular de cada cultura, essa concepção, ao mesmo tempo que pretende relativizar antropologicamente os costumes, absolutiza o desvio como a essência das doenças. Em outras palavras, qualquer que seja o conteúdo cultural de expressão da loucura (todas elas equivalentes tanto do ponto de vista ético como científico), o louco seria, segundo essa abordagem, essencialmente um caso de desvio ou de inadaptação. Nesse sentido, independentemente da diversidade cultural, a loucura é concebida como um problema eterno.'' ( FRAYZE-PEREIRA, João. O que é loucura. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1985 )
A noção de que sintoma mental intrinsecamente ligada ao contento social e particularmente ético no qual é elaborada. Ou melhor, a sintomatologia se torna o ponto de partida do psiquiatra para a conceituação de qualquer forma de “doença mental”, presente no contexto social. Segundo a etnografia a loucura significa um defeito da capacidade humana universal de simbolização e que esta define a humanidade bem como a cultura, ser louco significa ser des-humanizado (des-culturado), isto é, aquele que rompeu com a natureza humana. A ainda a todas essas abordagens a compreensão de que a loucura é muito mais histórica do que se pode acreditar. Algo sobre a determinação histórica da loucura
A doença mental como máscara da loucura surgiu recentemente na história da civilização ocidental. Considerando “História da loucura” de Foucault o autor faz um apanhado sobre a gênese da loucura em que a retrata de forma não convencional, consideram a priori a razão. A partir deste contexto o autor retrata a loucura como o ato que criou a distância entre a razão e aquilo que a nega como tal, isto é, a não-razão, sendo assim, a loucura emerge da relação com uma razão que necessita dela (loucura) para existir como razão. Considerando que a história da loucura não é a mera história de um tipo psicológico, isto é, do louco, mas a história daquilo que tornou possível o próprio advento de uma Psicologia e psiquiatria, podemos dizer também que além verdade dessa Psicologia estar inscrita na história da loucura, é o próprio saber psi que paradoxalmente pretende dizer a verdade sobre a loucura. A loucura e suas manifestações não são rígidas, elas variam durante toda a história, tanto em fonte quanto em manifestação e manifestantes da desrazão. A loucura é produto social, é maneira da estrutura social se manifestar, através das práticas e discursos sobre ela. Ao Incorporarmos a separação instituída historicamente entre loucos e não-loucos, temos também a divisão entre aqueles que estão autorizados a saber (os especialistas) e todos os demais homens (os não-especialistas). Como consequência dos processos históricos nas sociedades atuais o louco acabou se apossando do papel social do excluído que nunca poderá se opor ao que o exclui, pois cada um de seus atos se encontra constantemente circunscrito e definido pela doença. Atualmente, a própria Psiquiatria se encontra dividida: desde os que encaram a loucura como uma doença correlacionada a distúrbios bioquímicos até os que a negam totalmente como doença; desde os que justificam o confinamento da loucura nos hospícios até os que se engajam em práticas de luta pelos direitos dos loucos, entre outros aspectos. A história da loucura nos revela que se a loucura é atualmente considerada patologia ou anormalidade pelo mundo ocidental é porque a coexistência de seres diferenciados se tornou uma impossibilidade. Devemos, portanto considerar não só fatores dissonantes de um padrão a ser seguido, mas quais os fatores políticos e sociais que fazem com que tais indivíduos sejam marginalizados e excluídos do convívio de indivíduos diferentes a eles. Algumas concepções de loucura no decorrer da historia, pegando algumas citações de Foucault, que diz que por volta do sec. XV no final da Idade Média, onde estava acontecendo o desaparecimento da lepra, onde os loucos eram o que estavam doentes, potanto estiveram reclusos da sociedade,com o fim da lepra surgiu um espaço vago no confinamento pois não tinha mais loucos(por estarem doentes) para estarem confinados, então partimos do presupostos dos valores e das imagens atribuidas as pessoas
com lepra e o sentido de exclusão do mesmo na sociedade. Esse foi um marco do valor de loucura. A Psicologia Institucional é extremamente importante porque é fundamental que o estudante de psicologia saiba questionar, saiba analisar e então, propor melhorias para o indivíduo. Nesta aprendemos conceitos sobre a análise institucional, que irá nos direcionar, incentivar a desmistificar o que entendemos por instituições e questionar o papel dela em nossa sociedade.A proposta então, não é a inércia, reproduzir, não é fazer o papel de instituído. A idéia, é que nós, psicólogos sejamos o instituinte, aquele que sabe que a sociedade está em constante mudança. E que precisamos ora acompanhá-la, ora fazer com que ela nos acompanhe. A mudança surge conforme a necessidade. É um exercício diário pensar naquilo que nos é necessário e o que não é. Referências
ALVERGA, Alex Reinecke de; DIMENSTEIN, Magda. A reforma psiquiátrica e os desafios da desinstitucionalização da loucura. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v.10, n.20, p.299-316, 2006. AMARANTE, P.; SOALHEIRO, N. I. As instituições da desinstitucionalização: reflexões foucaultianas para a construção de uma prática da liberdade. In: VEIGA-NETO, A.; ALBUQUERQUE JÚNIOR, D. M.; SOUZA FILHO, Alípio de (orgs.). Cartografias de Foucault. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. BASAGLIA, Franco. A instituição negada: relato de um hospital psiquiátrico. Rio de Janeiro: Graal, 1968-2001. DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Acerca do ritornelo. [Tradução de Suely Rolnik]. In: _______. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol. 4. São Paulo: Editora 34, 1997. DELEUZE,
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capitalismo
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