© 2013 2 013 Sua Emi Eminência nência Gyalwa Gyal wa Dokhamp Do khampaa Título original: original: Moo Moonn in the mirror: The quintessen quin tessence ce of o f prajna pra jna param p aramita, ita, the heart hea rt sutra (part (par t 1) Todos os direitos desta edição são reservados à 2AB Editora Ltda. Supervi Supervisão são Editori Editorial: al: Vítor Barreto Tradução: Lúci Lúciaa Brito Brito Preparação de texto e revisão da tradução: Lama Jigme Lhawang Foto do d o autor: a utor: cortesia do escritório escritório de d e Sua Eminênci Eminênciaa Gyalwa Gyal wa Dokhamp Do khampaa Revisão: Revisão: Vinícius nícius Melo Mel o Projeto Projeto gráfico: gráfico: Aline Aline Haluch e Raphael Raphael Niemeyer Niemeyer | Studio Studio Creamcrackers Creamcracke rs Capa: André Beltrão | Studi Studioo Creamcrackers Creamcrackers Produção Produção de ebook: S2 Books Books Impresso no Brasil Printed Brasil Printed in Brazil DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP) D658l Dokhampa, Gyalwa. A lua no espelho : uma visão incomum da Prajna Paramita / Gyalwa Dokhampa ; edição e revisão de Lama Jigme Lhawang ; tradução de Lúcia Brito. – 1. ed. – Teresópolis, RJ : Lúcida Letra, 2013. 148 p. ; 18 cm. Inclui glossário. Tradução de: Moon in the mirror : the quintessence of Prajna Paramita, the heart sutra (part 1). ISBN ISBN 978-85-66864-04-5 1. Budismo tibetano. 2. Sutra. 3. Tantra. 4. Dharma (Budismo). I. Lhawang, Lama Jigme. II. Brito, Lúcia. III. Título. CDU 294.3 CDD 294.3 Índice para catálogo sistemático: 1. Budismo Budismo 294.3 2 94.3 (Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araujo – CRB 10/1507)
Sumário Capa Folha de rosto Créditos Prefácio Introdução O Sutr Sutr a do Coração Cor ação Compaixão e sabedor sabedoria ia O coração cor ação do ensinamento ensinamento do Buda Buda Vivendo na Prajna Paramita neste momento Assim eu ouvi certa vez Os cinco agregados cinco agregados Nãoo só conhecimen Nã conhecimento, to, mas a maneira como com o de fato vemos as coisas co isas O agregado agregado das sensações sensações O agregado das percepções A vaziez dos pensamentos e das emoções Vendo com os olhos da Prajna Paramita A lua no espelho Tudoo já é perfeito Tud per feito Compaixão surgida da sabedor sabedoria ia O mantra do cor ação da Prajna Par Par amita Glossário
Lama Jigme Jig me Lhawang Lhawang informações sobre lançamentos
Prefácio Neste livro, S. Ema. Gyalwa Dokhampa aborda um dos principais sutras da grande tradição Mahayana do budismo e também o ensinamento fundamental tanto para o Sutra quanto para o Tantra dessa tradição – o Coração da Perfeição da Sabedoria. Em uma linguagem simples e profunda, Sua Eminência nos guia em uma jornada maravilhosa e incomum pelo universo secreto de nossa mente, r evelando evelando cada aspecto aspecto da vida cotidiana cotidiana como uma expressão mágica, mág ica, lúdica e inseparável inseparável do nosso mundo interno interno.. Sua Eminência nos ajuda a percorrer o trajeto para dentro de nossa mente-coração usando de exemplos simples como a vida em família, a relação com a sociedade, as questões econômicas, culturais e sociais de nosso tempo. De forma descomplicada, indica a ponte entre os caminhos do Sutra e do Tantra – uma visão muito importante a ser apreendida e realizada por todo praticante do budismo tântrico – e nos mostra a Perfeição da Sabedoria (Prajna Paramita) como sendo a própria essência de todo o budismo tibetano em seus incontáveis métodos e abordagens, meditações, mandalas, mandalas, deidades, deidades, mantras e o rações. raçõ es. O budismo tibetano em sua totalidade segue a grande tradição indiana do budismo, desenvolvida principalmente até o século XI nas universidades budistas de Nalanda e Vikramashila, e também a extraordinária linhagem dos mahasiddhas da Índia, iogues de conduta incomum e inconcebíveis poderes espiritua espir ituais. is. Em particular, a linhagem Drukpa do budismo budismo tibetan tibetanoo traça o seu surgiment surg imentoo desde desde a transmissão tr ansmissão do grande pandita e mahasiddha indiano Naropa até o tibetano Marpa Lotsawa. O mestre indiano Naropa foi um dos maiores eruditos da Universidade de Nalanda, e após deixar o conforto acadêmico e monástico, treinou arduamente como mendicante espiritual por mais de dez anos ao lado de seu mest m estre, re, o mahasiddha mahasiddha Tilopa, tornando-se um dos 84 gr g r andes andes mahasiddhas mahasiddhas indianos. Sua Santidade Gyalwang Drukpa, líder supremo da escola Drukpa, é considerado o 12º renascimento do fundador dessa linhagem, o tibetano Tsangpa Gyare Yeshe Dorje, que por sua vez é
r econhecido econhecido como co mo uma reenc r eencarnação arnação do mahasiddha mahasiddha e pandit panditaa indiano Naropa. O quarto renascimento dos Gyalwang Drukpas foi Kunkhyen Pema Karpo, um dos maiores mestres de realização e erudição er udição na histór história ia do budismo tibetano, tibetano, reconhec reco nhecido ido e louvad lo uvadoo por po r todas as linhagens dessa tradição himalaica. Entre os principais discípulos de Kunkhyen Pema Karpo está Latsewa Ngawang Zangpo, o primeiro Yongdzin Rinpoche. Yongdzin Rinpoche teve três grandes discípulos: Ngawang Tenphel (o primeiro Gyalwa Dokhampa), Ngawang Gyatso (o primeiro Taktsa Taktsang ng Repa Rinpoche) Rinpoche) e Konchok Konchok Gyalpo (o primeiro prim eiro Dorzong Dorzo ng Rinpoche). S. Ema. Gyalwa Dokhampa foi reconhecido como a nona reencarnação dos Gyalwa Dokhampas por S. S. o Dalai Lama, S. Ema. Thuksey Rinpoche (já falecido) e também por seu próprio guru raiz, S. S. Gyalwang Drukpa. Batizado por S. S. Gyalwang Drukpa com o nome de Jigme Padma Nyinjadh (A Destemida Compaixão Nascida do Lótus), é a reencarnação direta do oitavo Gyalwa Dokhampa (Dongyu Nyima), Nyima), guru gur u raiz da r enomada mestr mestr a inglesa Jetsunma Jetsunma Tenzin Tenzin Palmo, uma cor ajosa iogue io gue ocidental ocidental que passou 12 anos anos em retiro r etiro espiritual em uma caverna dos Himalaias indianos. Desde a infância, Gyalwa Dokhampa recebeu intenso treinamento espiritual, concluindo diversos retiros sob a orientação de seus mestres. Durante nove anos, estudou história, lógica, filosofia e psicologia budista na Universidade Tango, no Butão, onde concluiu seu mestrado, recebendo a gradua gr aduação ção máxima de acharya, mestre mestre em filosofia filoso fia budista. budista. A linhagem espiritual da qual S. Ema. Gyalwa Dokhampa é um dos principais detentores e herdeiros espirituais, traz consigo as transmissões das técnicas meditativas dos caminhos do Sutra e do Tantra do budismo indiano, contemplados neste livro por meio da essência da Perfeição da Sabedor Sabedoria, ia, abordad abor dadaa a partir par tir das duas duas perspect per spectivas. ivas. Repleto de sabedoria, A sabedoria, A lua no espelho espel ho é é um livro para levarmos no bolso, para termos acesso a qualquer qualquer hora hor a e situação, situação, útil para par a todo tipo de desafio externo externo ou interno de nossa vida. Ele contém contém a quintessência da Perfeição da Sabedoria, pronta para ser aplicada a cada instante de nossos dias. Agradecemos especialmente à S.S. o atual Gyalwang Drukpa, nosso guia espiritual e o coração que nos move mo ve em direção a uma vida plena plena de significado, bondade e realização espiritual. Somos grat gr atos os também à S. Ema. Gyalwa Dokhampa por sua incansável dedicação e paciência em nos ensinar esse caminho profundo, e à comunidade budista Drukpa Singapure, que transcreveu e publicou estes ensinament ensinamentos os – or iginalmente concedidos concedidos por Rinpoche Rinpoche em Cingapura, Cingapura, em dezembro de 2011. 2011. Nesta nova edição do livro para o continente americano, o texto do Sutra do Coração foi traduzido por mim do tibetano para o português. Foi incluída uma introdução detalhada, de minha autoria, sobre a história e a classificação filosófica desse ensinamento da tradição budista, além de importantes notas de rodapé e um glossário aperfeiçoado, construído a partir das mais variadas escrituras sagradas sag radas em língua tibetana. tibetana. Nossos mais sinceros agradecimentos à Ven. Bhikshuni Lobsang Trinley e a Trevor Stockinger,
que revisaram e corrigiram todo o original em língua inglesa, oferecendo sugestões valiosas. Também agradecemos à tradutora Lúcia Brito, que se prontificou com muita alegria a traduzir estes preciosos precio sos ensinamentos ensinamentos para o por tuguês. tuguês.
Lama Jigme Lhawang Julho de 2013 Comunidade Drukpa Brasil Recife, Brasi Bras il
Introdução A Perfeição da Sabedoria no Sutra e no Tantra Lama Jigme Lhawang
Há 2,5 mil anos, no país que hoje é conhecido como Índia, um príncipe chamado Siddhartha Gautama, sentado em meditação ao pé de uma figueira, atingiu a mais perfeita e elevada compreensão da natureza da vida e da mente, purificou todas as negatividades e se libertou dos condicionamentos e automatismos da vida comum, passando então a ser chamado de o Buda, ou seja, o “Desperto” “Desperto” do sono so no da ignor ig norância. ância. Tendo Tendo compreendido com preendido a natureza natureza ilusór ilusó r ia da existência existência cíclica na qual todos os seres se encontram e vendo claramente como desmontar todo esse processo de aprisionament aprisio namento, o, o Buda Buda se levantou levantou de sua meditaç meditação ão e passou a ensinar ensinar o nobre caminho, o mét m étodo odo perfeito que conduzir conduziráá aqueles aqueles que o praticarem a ver a realidad r ealidadee delusória tal tal como ela realment r ealmentee é. O Buda ensinou por cerca de 45 anos na Índia. Esses ensinamentos, chamados de Buddhadharma (ensinamento do Desperto), foram guardados na memória de seus principais discípulos e posteriormente transcritos, formando o que hoje é chamado no budismo tibetano de os 84 mil ensinamentos do Dharma, proferidos pelo Buda de acordo com as diversas disposições mentais e inclinações espirituais dos seres. Os discípulos da Sangha (comunidade espiritual) do Buda ouviam os ensinamentos completamente atentos, com profunda afeição e reverência. Decoravam e mantinham os ensinamentos em suas mentes, repassando-os posteriormente para os monges mais novos em uma tradição oral.
Os três giros da roda do Dharma No budismo Mahayana, os ensinamentos foram classificados segundo os “três estágios do giro da roda do Dharma”. O primeiro giro da roda do Dharma ocorreu quando o Buda fez o seu primeiro sermão, compartilhando os frutos de sua realização com os seus cinco primeiros discípulos no Parque dos Cervos em Sarnath, ao lado de Varanasi, na Índia. Nesse discurso, o Buda apresentou as
Quatro Nobres Verdades, alicerce de todo o seu ensinamento. O segundo gir o da roda r oda do Dhar Dhar ma, de acor acordo do com uma das versõ versões es encontradas encontradas nas escrituras escrituras do Mahaya Ma hayana, na, ocor r eu quando quando o Buda Buda ofereceu ofer eceu os ensinamentos ensinamentos sobre sobr e a vaziez (shunyat (shunyataa em sânscrito) sânscri to) e o caminho das perfeições transcendentais (paramita em sânscrito), em resposta às perguntas do Venerável Shariputra e do Venerável Shubuti, para uma congregação de discípulos no Pico dos Abutres em Rajagriha, atual Rajgir, no estado indiano de Bihar. Esses ensinamentos são os Sutras da Perfeição da Sabedoria (Prajna Paramita em sânscrito), a base do Veículo Excelente dos bodhisattvas – a tradição tr adição Mahayana. O terceiro giro da roda do Dharma, conforme uma das versões do Mahayana, ocorreu inicialmente na morada dos deuses e nagas,1 nagas,1 onde o Buda proferiu a Doutrina do Significado Definitivo, a transmissão dos preceitos finais, para Indrabhuthi, rei de Oddiyana. A principal escritura do terceiro giro é o Tathagatagharba Sutra (O Discurso do Útero do Tataghata), a base para o Utaratantra Shastra ( Shastra (O O Sublime Subli me Tantra Tantra)) de Maitreya e a Coleção de Hinos de Hinos de Nagarjuna. A ênfase é o treinamento na Perfeição da Sabedoria (Prajna Paramita), como subjugar as emoções perturbadoras sem maiores dificuldades e como reconhecer a verdadeira natureza da realidade tal como ela é. Esse ensinamento contém análises que conduzem ao reconhecimento dos componentes, das bases psicofísicas, dos campos de atividade, dos órgãos dos sentidos e da consciência como manifestações naturalmente puras do Tathagatagarbha Tathagatagar bha – o Útero do Tataghata – a essência da natur natureza eza de Buda. Buda. É dito que todas as categorias de ensinamentos têm sua base e podem ser explicadas por meio do primeiro discurso do Buda Shakyamuni, pois as Quatro Nobres Verdades formulam a estrutura básica do caminho que conduz à iluminação completa. O segundo giro da roda do Dharma, referente à Perfeição da Sabedoria, seria uma explicação mais detalhada da quarta Nobre Verdade, o caminho. O terceiro giro tem como base a realização da quarta Nobre Verdade e equivale a uma explicação mais detalhada da terceira Nobre Verdade, a cessação, particularmente em termos de natureza última da realidade, o reconhecimento da natureza de tudo tal como realmente é. Dessa categoria surge o Veículo Adamantino, ou Vajrayana. Assim, os primeiros ensinamentos estabelecem a fundação para os ensinamentos posteriores, e esses ensinamentos posteriores aprofundam e complementam os ensinamentos iniciais.
A s tradições da Visão Profunda e da Vasta Conduta O budismo Mahayana se desenvolveu na Índia a partir de duas tradições principais – Visão Profunda e Vasta Conduta, fundadas respectivamente por Nagarjuna e Asanga, dois dos maiores sábios budistas. A escola da Visão Profunda, de Nagarjuna, surgiu no século II d.C., tornando-se conhecida como
Madhyamaka (Proponentes do Caminho do Meio). Ela ensina a vaziez de todos os fenômenos externos e internos, e propõe a abordagem da realidade livre dos extremos do niilismo (visão da aniquilação) e do existencialismo (visão da permanência), tomando como base que todo e qualquer posicionamento, tese tese ou asserção filosó fi losófico fico é falho por ser uma elabor ação mental mental dependent dependentee de um contexto contexto e r eferencial conceitual conceitual e, por po r tant tanto, o, não-absolut não-absol uto. o. A escola da Vasta Conduta, de Asanga, surgiu no século IV d.C, dando início à grande tradição Yogachara. Em sua vasta literatura, encontram-se as bases para toda técnica de treinamento da mente do budismo Mahayana Sutrayana e Mahayana Tantrayana. Posteriormente, ramificações filosóficas dessa tradição foram classificadas como escola Chittamatra (Mente Apenas). Uma das principais asserções dessa última escola é que todos os fenômenos são apenas mente, ou seja, projeções mentais. Algumas vezes é dito que a tradição Madhyamaka é a fundação para a acumulação de sabedoria e o cultivo de lucidez, e que a tradição Yogachara é a fundação para a acumulação de mérito e o cultivo de meios hábeis. hábeis.
A Prajna Prajna Paramita Parami ta Dentro do conjunto de escrituras do budismo Mahayana, encontra-se a literatura referente à Prajna Paramita ou Perfeição da Sabedoria. Muitas escrituras da tradição Mahayana não existem mais no original em sânscrito. No caso da literatura da Prajna Paramita, chegaram até nós apenas três volumes principais, e esses volumes se encontram preservados de forma completa na versão em tibetano. Na literatura budista tibetana, a Prajna Paramita aparece na seção dos sutras do canône Kangyur, composto pela tradução das Palavras do Buda. No cânone Tengyur do budismo tibetano, composto pela tradução tradução dos do s tratados, tratados, encontra-se o comentári comentárioo chamado chamado O Ornamento Ornamento da Realização Manifesta Manifest a ( Abhisamaya Abhisamaya Alamkara Alamkara em sânscrito), de Asanga, que faz referência aos 17 principais sutras da literatur literatur a da Prajna Paramita Par amita.. O ensinamento deste livro refere-se ao Sutra do Coração da Perfeição da Sabedoria, a essência de todos os sutras da literatura da Prajna Paramita, listado entre os 17 sutras da Perfeição da Sabedoria presentes no cânone tibetano. O tema central central dos sutras da Prajna Paramita é a união entre a co mpaixão e a sabedoria. sabedori a. De acor acordo do com a definição do Buda, a Prajna Paramita é a visão e o conhecimento da mente de um Buda, é a percepção direta de shunyata baseada no desejo de beneficiar todos os seres, também chamada de bodhicitta última. A percepção de shunyata destituída de bodhicitta não é considerada a verdadeira prática da Prajna Paramita. Assim, essa sabedoria não é apenas a realização direta da vaziez, mas a realização direta em união com bodhicitta (aspiração de tornar-se um Buda para liberar todos os
seres da existência cíclica). Essa união entre sabedoria e método estabelece o caminho dos bodhisattvas na tradição Mahayana. Mahayana. O termo sânscrito “Prajna” significa literalmente “conhecimento excelente”, uma inteligência natural natural que discerne os fenômenos precisament pr ecisamente, e, desde desde uma for ma gr osseira osseir a até o aspecto aspecto mais m ais sutil, sutil, quando os reconhece tais como eles realmente são. Dependendo do contexto, prajna pode significar sabedoria, compreensão, inteligência, discernimento ou discriminação. O Buda ensinou que, para trilhar e realizar o caminho da iluminação, precisamos desenvolver três tipos de prajna: a prajna originada do ouvir ou estudar, a prajna originada da reflexão ou contemplação e a prajna originada do cultivo ou familiarização. Já o termo sânscrito “Paramita”, que sugere a tradução “ação transcendental” ou “perfeição da ação”, significa literalmente “ter atravessado para o outro lado”, “ter chegado na outra margem” ou “ter ido para além”. Pode-se dizer que paramita se refere à experiência direta de transcender a fixação nos conceitos de sujeito, objeto e ação que se estabelece na interação entre o observador e a realidade observada, como entidades autossuficientes e separadas. Ter chegado à outra margem sugere ter atravessado o oceano da ignorância ou mente deludida, chegando assim à margem do despertar, ao estado completamente presente e destituído de fixações dualísticas.
O Sutra do Coração O termo “sutra” se refere aos discursos proferidos pelo Buda, ou seja, às palavras do Buda preservadas por meio da tradição oral e posteriormente transcritas pela comunidade espiritual. O termo “coração” sugere que, no vasto corpo de sutras da literatura da Prajna Paramita, esse texto é a essência, uma apresentação concisa de toda a coleção de sutras referentes a esse tema. Ele é o coração dos ensinamentos ensinamentos que se referem r eferem ao caminho e ao r esultado esultado da Perfeição da Sabedoria, a essência de sua prática, a união do método perfeito e da realização completa, da compaixão e da sabedoria sem início, meio e fim. O Sutra do Coração é o ensinamento perfeito para o percurso completo do caminho espiritual até atingirmos a iluminação. Se contemplarmos esse sutra em um nível mais profundo, podemos vir a reconhecer seu significado implícito, ou seja, sua relação perfeita com os cinco estágios no caminho da iluminação – acumulação, conexão, visão, familiarização e não mais aprender –, como também a r elação com o caminho Vajrayana. Vajrayana.
O Veículo Adamantino A grande tradição Mahayana é subdividida em dois veículos: Mahayana Sutrayana e Mahayana Tantrayana. No Sutra do Diamante, a Perfeição da Sabedoria (Prajna Paramita) é comparada a um diamante (vajra em sânscrito) indestrutível, que corta a apreensão, fixação e apego dual à realidade dos fenômenos, e estabelece sua verdadeira natureza vazia e luminosa, livre de qualquer elaboração
mental. Dessa visão experiencial surge, a partir do Mahayana Sutrayana, o Vajrayana (Veículo Adamantino), o Mantrayana (Veículo do Mantra) ou o Tantrayana (veículo do Tantra). S.S. Gyalwang Drukpa, o líder supremo da linhagem Drukpa, destaca que no Vajrayana há uma grande ênfase no aspecto feminino da Prajna Paramita, que é a Grande Mãe de todos os Budas, e de todos os iogues e mestres que se iluminaram. A Prajna Paramita é também a grande mãe que nutre seus filhos para par a que cheguem cheguem ao despertar despertar e continua continua a nutri nutri-los -los depois do despertar. despertar. S.S. o Dalai Lama, o líder espiritual do povo tibetano, diz que a diferença entre as várias abordagens, abor dagens, veículos veículos e linhagens espirituais são determ determinada inadass pelos métodos e técnicas técnicas espiritu espiri tuais, ais, e não pela sabedoria, uma vez que a sabedoria é a única mãe de todos os mestres das tradições espirituais do budismo. Assim, diz Sua Santidade, o Sutrayana e o Mantrayana são diferentes quanto ao método, mas não quanto quanto à sabedor sabedoria. ia.
A grande luminosidade O grande mestre indiano Aryadeva revelou, em uma canção espiritual, o significado da Prajna Paramita: Por meio da visão vi são desperta despe rta e espontânea espontâne a livre de artifícios artifíci os e máculas máculas Reconheça sua mente como sendo a raiz rai z de ambos samsara e nirvana. Não produzida por causas e condições, condiç ões, Não nascida, naturalment nat uralmentee serena, sua natureza é a vaziez. O significado da Prajna Paramita Não deve ser procurado p rocurado em nenhum outro lugar. lugar. Ela está est á presente dentro dent ro de você próprio. própri o. Não é convencionalmente convenci onalmente real e nem adornada adornada de características. característ icas. Essa natureza nat ureza é a grande luminosidade l uminosidade.. S. Ema. Gyalwa Dokhampa intitulou este livro de A de A Lua no Espelho Espel ho,, a partir par tir da perspect per spectiva iva da Prajna Paramita de que os fenômenos são vazios de existência independente, mas são vividamente aparentes. Sua aparência é clara e vívida, ainda que destituída de uma realidade separada daquele que a observa. Portanto, todas as coisas são descritas como aparecendo de modo ilusório. Nas escrituras da Prajna
Paramita, encontramos 12 analogias tradicionais para a natureza vazia, mas vividamente aparente: (1) uma ilusão, (2) uma miragem, (3) uma cidade de gandharvas, (4) um arco-íris, (5) um reflexo no espelho, (6) uma lua refletida na água, (7) um eco, (8) um sonho, (9) uma distorção visual, (10) um truque ou uma ilusão de ótica, (11) um relâmpago, (12) uma bolha de água. A água. A Lua no Espelho Es pelho surge surge desses exemplos, unindo o reflexo no espelho, que ainda que apareça clara e vividamente, não tem qualquer substancialidade e existência intrínseca, e a lua refletida na água, que aparece claramente, mas também não tem qualquer realidade independente. Possamos todos nós realizar nossa natureza como a do espelho imaculável ou do lago sereno, límpido e translúcido onde tudo tudo pode aparecer, mas nada pode macular macular ou pertu per turr bar.
1 Espécie de seres elementais, metade humanos e metade serpentes, que vivem nos lagos e oceanos.
O Sutra do Coração Coração (tradução do tibetano)
Bhagavati Bhagavati Prajna Paramita Hridaya Sutra O Sutra do Coração da Bem-Aventurada Perfeição da Sabedoria Indescrit Indesc ritível ível,, inconcebível inconc ebível e inexprimíve inex primívell Perfeição Perf eição da Sabedoria. própria essência do espaço não nascido e incessante. O campo campo de atividade at ividade da própria sabedoria primordial autoconhecedora. autoconhecedora. Mãe dos Vitorios it oriosos os dos três t rês tempos, t empos, a você presto homenagem! [Homenagem [Homenagem ao Cor ação da Perfeição da Sabedor Sabedoria, ia, de autor autoria ia do mestre indiano Rahula. Rahula.]] Na língua da Índia: Bhagavati Prajna Paramita Paramit a Hridaya Na língua do tibete: ti bete: Tchom den dê ma shê rab kyi pha rol tu tchin t chin pê nying po [Em português: O Coração da Bem-Aventurada Perfeição da Sabedoria.] Assim eu ouvi certa vez: O Bem-Aventurado estava em Rajagriha, no Pico do Abutre, junto com uma grande comunidade de monges e uma grande comunidade de bodhisattvas, e, naquela ocasião, o Bem-Aventurado penetrou no samadhi sobre a variedade de fenômenos chamado de a percepção do profundo. Naquele momento também o bodhisattva mahasattva, o Poderoso Senhor, o Nobre Avalokiteshvara contemplou plenamente a prática da profunda perfeição da sabedoria e viu com grande clareza que até mesmo os cinco agr egados são completament completamentee vazios de existência existência intr intr ínseca. ínseca. Então, pelo poder do Buda, o Venerável Shariputra dirigiu-se ao bodhisattva mahasattva, o Poderoso Podero so Senhor, o Nobre Avalokite Avalokiteshva shvarr a, e disse: “Como “Como deve treinar treinar qualquer qualquer filho fi lho ou o u filha desta desta família que deseje se empenhar empenhar na prát pr ática ica da profund pro fundaa perfeição da sabedor sabedoria?”. ia?”. Tendo sido assim questionado, o bodhisattva mahasattva, o Poderoso Senhor, o Nobre
Avalokiteshvara dirigiu-se ao Venerável Shariputra e disse: “Shariputra, qualquer filho ou filha desta família que deseje se empenhar na prática da profunda perfeição da sabedoria deve ver claramente dessa maneira: deve ver perfeitamente que até mesmo os cinco agregados são vazios de existência intrínseca. Forma é vazio, essa vaziez é forma; vaziez não é outra coisa senão forma, forma também não é outra coisa senão vaziez. Do mesmo modo, sensações, percepções, formadores mentais e consciência são todos vazios.2 vazios.2 “Portanto, Shariputra, todos os fenômenos são vaziez; não têm características definidoras; não nascem, não cessam; não são maculados, não são imaculados; não são deficientes e não são completos. “Portanto, Shariputra, na vaziez não há forma, nem sensações, nem percepções, nem formadores mentais, mentais, nem consciência. Não Não há olho, olho , nem ouvido, o uvido, nem nariz, nem língua, l íngua, nem cor po, nem mente. Não há forma, nem som, nem odor, nem sabor, nem textura, nem objetos mentais. Não existe elemento constituinte do olho e assim por diante até não haver elemento constituinte da mente, inclusive nenhum elemento constituinte da consciência mental. Não existe ignorância, não existe extinção da ignorância, e assim por diante até não haver envelhecimento e morte, nem extinção do envelhecimento e da morte. Do mesmo modo, não existe sofrimento, origem, cessação ou caminho; não existe sabed sabedor oria, ia, nem realização e não r ealização. ealização. “Portanto, Shariputra, uma vez que os bodhisattvas não têm nada a atingir, eles confiam nessa perfeição da sabedoria e nela permanecem. Não tendo obscurecimentos em suas mentes, eles não têm medo, e, por irem completamente além de qualquer engano, atingirão o fim do nirvana. Todos os Budas que residem nos três tempos também atingiram o pleno e perfeito despertar da inexcedível iluminação ao confiarem confiar em nessa perfeição da sabedor sabedoria. ia. “Portanto, deve-se saber que o mantra da perfeição da sabedoria – o mantra da grande visão desperta, o mantra inexcedível, o mantra igual ao inigualável, o mantra que pacifica completamente todo o mal-estar – é verdadeiro porque não é enganoso. O mantra da perfeição da sabedoria é r ecitado ecitado assim: Tadyatha om gate gate paragate parasamgate bodhi svaha! Shariputra, é dessa maneira que um bodhisattva mahasattva deve treinar na profunda perfeição da sabedoria.” Então, o Bem-Aventurado retornou de seu samadhi e louvou o bodhisattva mahasattva, o Poderoso Senhor, o Nobre Avalokiteshvara, dizendo que isso é excelente. “Excelente! Excelente! Ó filho desta família, é assim mesmo; é assim que deve ser. Deve-se praticar a profunda perfeição da sabedoria exatament exatamentee como com o você mostrou. mo strou. Dessa Dessa maneira até os tathagata tathagatass se r egozijarão egozij arão..” Quando o Bem-Aventurado proferiu essas palavras, o Venerável Shariputra, o bodhisattva mahasattva, o Poderoso Senhor, o Nobre Avalokiteshvara, junto com toda a assembleia, inclusive os
mundos dos deuses, humanos, asuras e gandharvas, todos se regozijaram e saudaram o que o BemAventur ventur ado havia dito. Isso conclui o sutra Mahayana, chamado O Coração da Bem-Aventurada Perfeição da Sabedoria. Sob a proteção do Rei Trisong Detsen, em meio ao oitavo século, o tradutor tibetano (lotsawa) Bhikshu Rinchen Dê traduziu esse texto com o mestre (pandita) Vimalamitra. Ele foi editado pelos tradutores (lotsawas) e grandes editores Gelo, Namkha e também por outros. Esse texto tibetano foi copiado de um afresco afr esco de Gegye Chemaling, Chemaling, um dos templos templos do glor glo r ioso Samye Vihara Vihara [no Tibete]. Tibete]. Traduzido do tibetano pelo Lama Jigme Lhawang (Gabriel Jaeger) e editado pela tradutora Lúcia Brito, agosto de 2013.
2 Nessa tradução, optou-se pelo termo “vaziez” em vez de “vacuidade”, para o sânscrito “shunyata”, e “vazio” para o sânscrito “shunya”.
Compai Compaix x ão e sabedoria sabedoria O Sutra do Coração é considerado um dos ensinamentos mais profundos do budismo Mahayana e também do budismo budism o Vajr Vajrayana. ayana. A tradição Vajrayana ajr ayana – na qual se inser e a Linhagem Drukpa tem suas origens no Mahayana, e é importante observar que seus ensinamentos não existem de modo independente das práticas mahayanas de bodhicitta, a mente altruística de iluminação, e da Prajna Paramita, a Perfeição da Sabedoria. Bodhicitta se refere ao elemento de compaixão, e Prajna Paramita ao elemento de sabedoria das tradições Mahayana e Vajrayana. Deixando de lado os métodos hábeis3 hábeis3 do Vajrayana, não existe o caminho Vajrayana na ausência da fundação do Mahayana. Assim, o Sutra do Coração, que encapsula os ensinamentos da Prajna Paramita, é muito respeitado nas práticas do Vajrayana. O Sutra do Coração representa a visão da sabedor sabedoria ia última. As As prát pr áticas icas baseadas baseadas nessa visão r epresentam epresentam a compaixão co mpaixão – o método – dentro do Vajrayana. Compaixão e sabedoria são os dois ensinamentos essenciais do Mahayana e do Vajrayana, e são colocada colo cadass em prátic pr áticaa por meio de métodos hábeis. Sem compaixão e sabedor ia, não existe Mahay Mahayana ana e nem Vajrayana. Por isso, compaixão e sabedoria são consideradas as duas asas do Mahayana e do Vajrayana. E você não pode ter uma asa sem ter a outra.4 outra.4 Se praticar apenas a compaixão, você poderá ficar muito feliz e calmo dentro do samsara, mas amais atingirá a liberação, porque não possui sabedoria para perceber o samsara como ele realmente é. Por outro lado, se possuir apenas sabedoria, você poderá se liberar, mas isso só servirá para você mesmo e não para o benefício dos outro s seres. Colocando em termos bem claros: se você não tiver compaixão, não terá interesse em ajudar ninguém. Estará interessado apenas em si mesmo. Por outro lado, se não tiver sabedoria, não saberá como ajudar os outros mesmo que tenha a intenção. Isso porque você está sofrendo e não possui sabedoria para oferecer o tipo de ajuda de que os outros necessitam. A maior ajuda que você pode oferecer ofer ecer talvez seja alimento alimento e dinheir dinheiro, o, mas indo além disso, se alguém estiver estiver mentalment mentalmentee infeliz,
você não poderá ajudar. Isso porque você não sabe como lidar consigo mesmo e com as suas emoções. Você não consegue entender a verdadeira natureza dos fenômenos e a verdadeira natureza de sua mente. Embora andem lado a lado, compaixão e sabedoria às vezes são praticadas separadamente no Mahayana. Por exemplo, quando você realiza a recitação ou a prática de generosidade no Mahayana, não é necessário que se visualize como um Buda, tampouco que tenha entendimento da vaziez. Assim, quando quando está praticando praticando a generosidade g enerosidade e ofer ecendo ecendo aos outros, outro s, você ainda pode ter ter o pensamento pensamento de “eu” de “estou doando algo doando algo a outro ser senciente que está sofrendo”. Você está doando, mas sem a compaixão ou o entendimento perfeitos. E quando pratica a meditação unidirecional que investiga a vaziez, você pode analisar a natureza operacional da mente, mas pode deixar de gerar a compaixão de forma adequada enquanto medita. Logo, a compaixão e a sabedoria são praticadas separadamente.5 separadamente.5 Algumas práticas do Vajrayana também funcionam assim. Mas na maioria das práticas do Vajrayana, a compaixão, através dos meios hábeis, e a sabedoria, através do entendimento de shunyata (vaziez), são praticadas em conjunto. Shunyata se refere ao entendimento de que nada no universo existe de modo independente. Explicarei isso de forma detalhada mais adiante. Mas por exemplo, ao mesmo tempo em que está visualizando a forma do Buda em uma prática (isto é, utilizando meios hábeis), você também deve ter o entendimento de shunyata. A visualização deve ser entendida como um reflexo no espelho – algo que existe muito claramente e que ao mesmo tempo não existe. Esse é o entendimento adequado de shunyata, praticado junto ao método hábil da compaixão. No Vajrayana, essa é a forma adequada de praticá-lo.
3 O termo sânscrito “upaya” ou “meios hábeis” significa, de forma geral, o meio, o método ou a técnica usada para se realizar algo. Na tradição Mahayana é dito que método e sabedoria são necessários para se alcançar a iluminação. No Mahayana as cinco primeiras paramitas (generosidade, disciplina ética, paciência, perseverança e estabilidade mental), como também as técnicas yogues de visualização e outras técnicas do Vajrayana, são consideradas práticas relacionadas aos meios hábeis, e a sexta paramita – o discernimento transcendental – é considerada a prática da sabedoria que vê a realidade tal como ela é, que realiza as coisas tais como elas são em sua natureza vazia. S. S. o atual Gyalwang Drukpa diz que a união desses dois aspectos – sabedoria e meios hábeis – é o que chamamos de “bodhicitta”, a mente-coração do despertar de onde se desenvolve toda a prática do Mahayana e do Vajrayana. Em seu comentário sobre o Sutra do Coração, intitulado Uma clara exposição da intenção de Nagarjuna, o mestre Drukpa do século XVI, Kunkhyen Pema Karpo, o quarto Gyalwang Drukpa, explica que a plateia que ouviu o Sutra do Coração pela primeira vez gerou inicialmente a mente altruística de iluminação (bodhicitta), para só então ter condições de entender os ensinamentos sobre a perfeição da sabedoria. 4 Chandrakirti, mestre budista indiano do século VII, fez uma bela e famosa analogia na conclusão do sexto capítulo do texto Suplemento para o Caminho do Meio, comparando a necessidade de se desenvolver sabedoria e compaixão à necessidade do pássaro de ter duas asas para voar. 5 Aqui Rinpoche está falando da prática de “dana” (generosidade) e de “prajna” (discernimento) e não de seus aspectos paramitas. Uma vez que a simples generosidade (dana) se torne uma dana paramita (perfeição da generosidade), necessariamente prajna paramita será inseparável nseparável dela.
O coração do do ensinamen ensi namento to do Buda Vamos começar a discutir o texto do Sutra do Coração pelo título – Bhagavati Prajna Paramita Hridaya Sutra. A maioria dos ensinamentos traduzidos para o tibetano começam com o nome em sânscrito. Isso Isso para par a enfatizar enfatizar que os ensinamentos ensinamentos fo ram ensi ensinados nados pelo próprio própr io Buda Buda ou por outro outross grandes mestres da Índia, e que não foram compostos por alguém nos Himalaias ou algum outro lugar. O título inicia com “Bhagavati”, que se refere a um Buda plenamente iluminado.6 iluminado.6 A seguir, Prajna Paramita. “Prajna” significa sabedoria, enquanto “Paramita”, como nas Seis Paramitas, significa “o que foi para o outro lado” da liberação do samsara ou o u existência existência cíclica. cíclica. “Hridaya” “Hridaya” significa significa cor ação ou quintessência. Alguns mestres explicam que esse ensinamento é o coração de todos os ensinamentos do Buda. Por isso é chamado de hridaya. Por que é chamado de coração? Porque é a Prajna Paramita, a paramita da sabedor sabedoria. ia. Não Não só é a paramita parami ta da sabedoria, sabedoria, mas a Prajna Paramita do Buda, sendo assim o entendimento completo da Prajna Paramita. Os bodhisattvas e os arhats também têm entendimentos da Prajna Paramita em diferentes níveis, mas eles não são o seu pleno entendimento. Só o Buda possui o pleno e completo entendimento da Prajna Paramita. Sendo assim, com esse sutra estamos nos referindo ao nível de entendimento do Buda. Foi assim que os mestres explicar explicar am esse ponto do título. título. Por convenção, o ensinamento essencial da sabedoria é considerado o aspecto feminino ou maternal de todos os Budas, ao passo que a prática da compaixão é considerada o aspecto masculino ou paternal de todos os Budas. É assim porque sem possuir, antes de qualquer coisa, a semente da compaixão, você jamais poderá aspirar à iluminação. Ainda que busque a iluminação, se a compaixão não o apoiar durante as práticas, você acabará se desencorajando facilmente. Você se sentirá cansado e achará que a prática é muito difícil. Por outro lado, sem sabedoria, você não consegue romper ro mper a escravidã escr avidãoo da existência existência cíclica cíclica e atingir atingir a liberação e a iluminação. Ao combinar a semente paterna da compaixão, que representa os meios hábeis (upaya), com o
útero útero materno materno,, que representa a sabedor sabedoria ia em nível de Prajna Paramita, você pode se tornar tor nar um Buda. Buda. No momento em que entende tudo de forma plena, sem fabricação, você se torna um Buda.
6 A primeira palavra no título do Sutra do Coração, em sânscrito, é “bhagavati”, forma feminina da palavra “bhagavat”. Esse é um epíteto comum do Buda, frequentemente traduzido como “Bem-Aventurado” ou “Abençoado”. Nesse caso, o feminino Bhagavati se refere à Prajna Paramita, a Perfeição da Sabedoria. Os comentaristas indianos interpretam “bhaga” de duas maneiras: uma implicando destruição, outra implicando implicando fortun fo rtuna. a. Entre Entre os o s muitos muitos si s ignifi gnificado cadoss de d e bhaga bhag a na l iteratura indian indiana, a, destacam-s d estacam-see o de ser um nome para o sol s ol e para a lua, além de poder significar fortuna, felicidade, prosperidade, bem-estar, dignidade, majestade, excelência, domínio, glória, fama, força, sabedoria e beleza. Quanto ao sentido de destruição, a Perfeição da Sabedoria destrói os dois obscurecimentos – os obscurecimentos das aflições mentais (klesavarana) e os obscurecimentos cognitivos (jneyavarana), como também os Quatro Maras – o Mara dos Agregados, o Mara das Aflições, o Mara da Morte e o Mara Filho de Deus. “Vat” é um sufixo denotando possessão. “Vat” ou “van” (Bhagavan) é também interpretado por alguns comentaristas budistas indianos não só como um sufixo de posse, mas também como proveniente da segunda sílaba da palavra sânscrita “nirvana” (a transcendência, extinção de todo mal-estar), significando assim transcendência. É por essa razão que os tibetanos traduziram o sânscrito Baghavati como Tchomdendêma – A Conquistadora/Destruidora/Dominadora (Tchom) Bem-Aventurada/Afortunada (den) Transcendente (dê) ou A Transcendente e BemAventurada Aventurada Conquistado Conquistadora. ra.
Vivendo Viven do na Prajna Paramita Paramit a neste nest e momento momento Às vezes você pode se perguntar: “Por que é tão necessário entender a Prajna Paramita?” É importante entender que a Prajna Paramita não é algo alheio à sua vida, mas sim algo que você pode praticar agora mesmo. Ela não exige vinte ou trinta anos de prática, tampouco um alto nível de experiência. Não se trata disso. Estamos vivendo na potência da Prajna Paramita neste momento. Nossa vida, nossa casa, nossas emoções – todas as coisas são objetos da Prajna Paramita. Nosso mundo é permeado por shunyata (vaziez), todavia não percebemos que a realidade é vazia de existência independente. Por não percebermos isso, tudo parece muito sólido. A dor é experimentada como real, a decepção parece real, a felicidade parece real e sólida. Como essas coisas são vistas como sólidas, elas nos causam dor. Por exemplo, se meu amigo é sólido, a felicidade que obtenho dele também é sólida. Se meu amigo faz algo que me irrita, ou não faz algo que eu imagino que um amigo deva fazer, isso pode gerar dor. Essa dor resulta de minha projeção equivocada de solidez, pois a realidade não é sólida e não existe de modo independente. Em outras palavras: nossa consciência geralmente não percebe a verdadeira natureza natureza da realidade. Além do mais, a pessoa que você vê como um amigo pode ser vista por alguém como uma má pessoa ou como um inimigo. O mesmo vale para outras coisas, como definições de grandes ou pequenas quantidades, pessoas ricas ou pobres, sensações de felicidade ou de sofrimento. Diferentes seres podem ter visões muito diferent difer entes es sobre a mesma coisa. coi sa. Nós também transformamos constantemente nossas definições. Por exemplo, o que hoje significa felicidade para nós, pode significar algo diferente amanhã. Hoje você pode pensar que algo o faz feliz, mas quando vivenciar essa mesma coisa amanhã, pode pensar: “Talvez não seja essa a felicidade que eu quero. Talvez eu queira algo diferente.” Presumimos que nossa felicidade é algo que existe de modo independente. Pensamos que ela é real,
e devido a essa percepção, a decepção parece real. Ficamos presos no que projetamos. Se você entender a Prajna Paramita, entenderá a verdadeira natureza de tudo, tais como a dos r elacionamentos, elacionamentos, das emoções, emo ções, de uma casa, de uma flor etc. etc. Por meio da Prajna Paramita, você vai entender que nada existe de modo independente e que tudo é resultado de condições interdependentes. Mesmo um objeto como uma casa é permeado pela Prajna Paramita. Uma casa não existe de modo independente, por si só. Ela existe devido aos pilares, às paredes e a tudo mais que foi montado junto. Só assim existe uma coisa convencionalmente chamada de casa. Uma coisa que é chamada de casa não existe de modo inerente a si mesma.7 Uma flor também também é um objeto da Prajna Paramita Parami ta.. Embor Emboraa a flor pareça real r eal e independen independente te – você você pode ver uma flor amarela com muitas pétalas, por exemplo –, no momento em que a vê, você na verdade está vendo as condições interdependentes e combinadas do que lhe parece uma flor. Se você separar as pétalas e tudo o mais, não restará nada do que é chamado de flor. A flor não existe de modo independente. Esse é o ponto de vista externo. O ponto de vista interno é “você”, o sujeito que disse que aquele objeto é uma flor. Seu pensamento é o seguinte: existe uma flor amarela, e você é aquele que está dizendo que aquele objeto é uma flor amarela. Você rotula o que gosta e o que não gosta, e então fica apegado aos rótulos que atribuiu. Quando vê a pessoa ou coisa que rotulou como algo de que não gosta, você fica contrariado e irritado. O entendimento de que as coisas que existem de modo convencional dependem sutilmente do rótulo e do pensamento também é Prajna Paramita.
7 Kunkhyen Pema Kharpo, em seu comentário sobre o Sutra do Coração, explica que os fenômenos não são vazios por serem destruídos pelas condições, mas sim porque sua própria natureza é vazia. Tudo está em processo.
Assim Assi m eu ouvi ouvi certa vez Vamos discutir agora as linhas preliminares do Sutra do Coração. O texto começa com: “Assim eu ouvi cer ta vez.” vez.”8 Quem ouviu? o uviu? Nos sutras da tradição do Budismo Antigo, tradicionalmente é Ananda quem ouviu e registrou os ensinamentos. Nos sutras do Mahayana e do Vajrayana, tradicionalmente são Vajrapani e outros bodhisattvas que ouviram e registraram os ensinamentos. Em alguns ensinamentos do Mahayana e do Vajrayana, os textos descrevem Vajrapani como um dos oito bodhisattvas. Os outros são Avalokiteshvara, Manjushri, Maitreya, Kshitigarbha, Akashagarbha, Sarvanivaranavishkambhin e Samantabhadra. Mas alguns outros textos mencionam também os arhats chamados Ananda, Shariputra Shariputra ou Maudgalputra Maudgalputra A partir de uma perspectiva perspectiva mais profunda, pr ofunda, esses esses arhat ar hatss são o s próprio pró prioss bodhisattvas. Assim, alguns dizem que foi um arhat que ouviu, enquanto outros dizem que foi um bodhisattva. A seguir, o Sutra do Coração diz: “O Bem-Aventurado”, o Buda, “estava em Rajagriha, no Pico do Abutre”. O termo em sânscrito para “o Bem-Aventurado” é “Bhagavat”, muitas vezes traduzido como “o Abençoado”. Essa tradução faz parecer que alguém abençoou o Buda e então ele se tornou o Abençoado. É melhor traduzir como “o Bem-Aventurado”, “o Iluminado” ou “o Desperto”. Bhagavat significa aquele que destruiu todos os conceitos dualistas. Quando os conceitos dualistas são destruídos, a percepção surge automaticamente. Quando a escuridão se vai, a luz do sol se manifesta. Portanto, Baghavat não só é aquele que destruiu todos os conceitos dualistas, mas também aquele que é dotado de todas as qualidades qualidades que surgem surg em disso. Rajagriha é o local da Índia onde o Buda girou a roda do dharma pela segunda vez. De acordo com a tradição Mahayana, o Buda girou a roda do dharma três vezes. A primeira foi em Sarnath, onde ensinou as Quatro Nobres Verdades. A segunda foi em Rajagriha, onde ofereceu diversos ensinamentos sobre a Prajna Paramita. A terceira foi em Shravasti,9 Shravasti,9 onde o nde ensinou ensinou sobr e a natureza natureza de buda.
O local lo cal específico específico onde o Buda ensinou ensinou em Rajagriha Rajagr iha é conhecido como Pico do Abutr Abutr e. Tal nome deve-se deve-se a dois motivos. Em Em primeir pr imeiroo lugar, a mont mo ntanha anha tem tem o formato for mato de um abutre. abutre. Em segundo, de acordo com a tradição Mahayana, quando o Buda ministrou o ensinamento, uma luz emanou de seu coração, sendo avistada pelos Budas dos dez diferentes universos. Esses Budas disseram a seus discípulos que o Buda Shakyamuni estava concedendo um ensinamento e que eles deveriam ir lá para ouvir. Assim, esses bodhisattvas chegaram e cobriram toda a montanha. Para os seres puros, eles apareceram como bodhisattvas. Para os seres impuros, eles apareceram como abutres. Desse modo, muita gente viu toda a montanha cheia de abutres quando o Buda deu o ensinamento. Por isso ela é chamada de Pico do Abutre. Quando Quando mestr mestr es realizad r ealizados os visitavam o Pico do Abutr Abutr e, não subiam até até o topo como nós. Ao Ao olhar o lhar o Pico do Abutre, eles viam todas as rochas como os sutras e textos do Dharma. Por respeito, não conseguiam subir, e em vez disso prostravam-se pro stravam-se no sopé da mo ntanha ntanha.. Alguns professores falam que nas primeiras cinco linhas estão os cinco aspectos auspiciosos de um ensinamento. “Assim eu ouvi certa vez” refere-se ao bom auspício da época. Buda é o professor auspicioso auspicioso,, a Prajna Pr ajna Paramita é o ensinamento ensinamento auspicioso auspicioso,, os bodhisattv bodhisattvas as e a comunida com unidade de de monges são a assembleia auspiciosa. Por fim, o Pico do Abutre é o local auspicioso. Assim, nessas linhas, estão descritos cinco aspectos auspiciosos de um ensinamento. Junto com os bodhisattvas dos outros mundos na forma de abutres, e a grande comunidade de monges, bodhisattvas e seres divinos deste mundo, o Buda entrou em meditação sobre “a variedade de fenômenos chamada de percepção do profundo”, esse que é o nome da meditação. Deixe-me explicar o significado dessa frase. Para nós, o estado meditativo é aquele em que relaxamos na natureza da mente e a fixação nos objetos é diminuída. Quando você está fora da meditação, tudo fica muito sólido, muito real. Para os bodhisattvas, quando despertos do estado meditativo, as coisas deixam de ser tão sólidas e passam a ser como uma ilusão. Todavia, a apreensão dual ainda está ali. Para o Buda, não existe meditação ou não meditação. O Buda está sempre no estado natural, onde as coisas são como uma ilusão e não há qualquer fixação dual. Entretanto, para o benefício dos seres sencientes, dizemos que o Buda está na meditação da Prajna Paramita. E, devido ao poder da bênção do Buda, Avalokiteshvara também entra na mesma meditação sobre a vaziez dos cinco agregados, isso que explicarei explicarei mais adiante. adiante. A seguir, passaremos o foco para as bênçãos.10 bênçãos.10 No Sutra do Coração, o Buda abençoa Avalokiteshvara e Shariputra. Existem três tipos de palavras autênticas do Buda, sendo as bênçãos um desses tipos. O primeiro tipo é chamado de “palavras autênticas proferidas pela boca do Buda”. No sutra, essas palavras aparecem no final, quando o Buda deixa o samadhi e confirma a autenticidade do que foi dito, proclamando: “Excelente! Excelente!” O segundo tipo é chamado de “palavras resultantes das bênçãos do Buda”. No sutra, essas palavras aparecem quando, pelo poder das bênçãos
provindas da realização do Buda, Shariputra profere suas perguntas e Avalokiteshvara confere a resposta, descortinando toda a explicação. O terceiro tipo é chamado de “palavras resultantes da permissão do Buda”. No sutra, elas aparecem quando o compilador inicia a narrativa com a frase “assim eu ouvi certa vez”, identificando o local e a plateia, e também no final, quando o Buda afirma que a explicação estava correta com as palavras “é assim mesmo; é assim que deve ser”, confirmando a veracidade do que foi dito e dando permissão para que o ensinamento seja tomado como palavras dele mesmo. Prosseguindo no texto, por meio das bênçãos do Buda, o Venerável Shariputra pergunta a Avalokiteshvara: “Como deve treinar qualquer filho ou filha desta família que deseje empenhar na prática da profund prof undaa perfeição da sabedor sabedoria?” ia?” Na verdade, verdade, Shar Shar iputr iputr a indaga como um bodhisattv bodhisattvaa ou aqueles que pertencem ao caminho do bodhisattva devem praticar e treinar a profunda Prajna Paramita.11 Paramita.11 Avalokiteshvara então responde: “Qualquer filho ou filha desta família que deseje empenhar na prática da Prajna Paramita deve ver os fenômenos : deve ver perfeitamente que até os cinco agreg ag regados ados são vazios de existência existência intrínseca.” intrínseca.”
8 “Evam maya shrutam ekasmin samaye”, literalmente, “certa vez ouvi estas palavras”, é uma declaração dita no início dos sutras atestando sua autenticidade, indicando que tal discurso foi ouvido diretamente do próprio Buda, em uma ocasião específica, por um de seus principais discípulos da sangha dos arhats ou da sangha dos bodhisattvas. Em seu comentário sobre o Sutra do Coração, Kunkhyen Pema Karpo explica que essa primeira frase refere-se à ocasião (“certa vez”) em que o ensinamento foi conferido e que “estas palavras” incluem a totalidade do que será explicado. Diz também que o sânscrito एवं एवं, evaṃ (་བཾ་ em tibetano) indica os discursos mãe (referentes à sabedoria) e pai (referentes aos meios hábeis) dos 84 mil ensinamentos do Dharma. Esses foram ensinados como um antídoto para os 84 mil tipos de delusões e têm como fonte a sabedoria e a vaziez, e os meios hábeis e o grande êxtase espiritual (vam), respectivamente. 9 E também em diversos outros lugares e em diferentes momentos, de acordo com a literatura do Tantra. 10 S.S. 10 S.S. Gyalwang Drukpa diz que “as bênçãos são como raios de sol. Os raios do sol não discriminam a estrutura e os tamanhos das diferentes moradias. Seus raios brilham sobre tudo, de forma imparcial. Os seres dentro de suas casas são tocados ou não pelos raios do sol dependendo unicamente de sua disposição em abrir as janelas. Quanto mais abertas estiverem, mais luz poderá entrar”. De acordo com os comentários tradicionais do Sutra do Coração, essas bênçãos algumas vezes empoderam um bodhisattva ou um shravaka a ensinar o Dharma, ou fazem com que palavras do Dharma surjam magicamente do espaço ou de uma brisa refrescante na forma de sons musicais. 11 Em 11 Em seu comentário sobre o Sutra do Coração, Kunkhyen Pema Karpo explica que a frase “um filho ou uma filha desta família [ou linhagem]” refere-se àqueles que despertaram a insuperável bodhicitta do Grande Veículo, o Mahayana.
Os cinco agregado agreg adoss O texto diz que os bodhisattvas que praticam a Prajna Paramita “devem ver perfeitamente que até os cinco agregados são vazios de existência intrínseca”. Tradicionalmente, os cinco agregados são forma, for ma, sensações, sensações, percepções, for madores mador es mentais mentais e consciência. Entr Entree os cinco agregados, apenas o agregado da forma pertence ao reino físico. Os restantes têm a ver com a mente. De acordo com os ensinamentos do Buda, a mente tem milhares de diferentes tipos de estados. No Abhidharmasamuccaya de Asanga esses eventos mentais são agrupados em 51 categorias.12 categorias.12 Por exemplo, às vezes desenvolvemos sentimentos de felicidade e equilíbrio, e outras vezes desenvolvemos sentimentos de tristeza e desequilíbrio. Também temos diferentes percepções discriminadoras. Voltamo-nos à forma, às sensações, às percepções, aos formadores mentais e à consciência como agregados porque muitos elementos precisam ser reunidos antes que possam ser fundados. Por exemplo, para haver haver a for ma de um prédio, é preciso junt j untar ar pilar es, cimento cimento e aço. Dizer que os agregados são “vazios de existência intrínseca” é diferente de dizer que eles não existem de modo algum. Não é como uma xícara vazia de onde se tirou a água. Não é como uma fogueira onde as toras são consumidas. Natureza intrínseca significa que forma, sensações, percepções, formador for madores es mentais mentais e consciência consciência não existem existem por si só. Em outras palavras, você experimenta felicidade porque os seus pensamentos, bem como outros aspectos de sua mente, combinam-se para projetar felicidade. Assim, não é correto dizer que uma coisa chamada felicidade existe por si só, além de você. Não há uma coisa externa com existência independente chamada felicidade. Da mesma maneira não existe algo externo com existência independente que se chama beleza ou feiura, sucesso ou fracasso. A natureza desses conceitos não é essa. Vamos discutir mais concretamente a vaziez do primeiro dos cinco agregados, o agregado da forma. Creio que hoje em dia seja difícil entendermos a Prajna Paramita porque estamos muito
acostumados a olhar as coisas físicas externas como existindo de maneira real e sólida. Entender a vaziez da forma é muito difícil, em especial se algumas de nossas práticas espirituais não são realizadas junto com o entendimento adequado da vaziez. Nesse caso, apenas reforçamos a visão de que as coisas são sólidas por meio de nossas práticas espirituais. Por sorte podemos tentar aprender sobre sobr e a vaziez vaziez da forma form a com a ajuda dos exemplos exemplos a seguir. Uma casa, casa, por exemplo, não existe de modo indep i ndepende endent nte, e, ela é form fo rmada ada por muitos component compo nentes. es. A madeira em geral é um dos desses componentes. A madeira usada nas casas vem de florestas. Mas flor estas estas não existem existem por sua própria própr ia natureza, natureza, pois são compostas co mpostas por por diversas árvor es. A forma for ma das florestas provém do agrupamento das árvores. Assim, não podemos dizer que, independente dos componentes reunidos, exista qualquer coisa que possua uma forma distinta. O conceito de casa – assim como o conceito de floresta – é resultado de uma reunião de fatores, resultantes eles mesmos da reunião de outros fatores. A casa não existe por sua própria natureza, tampouco a madeira que é usada para construir a casa ou as árvores ou florestas de onde vem essa madeira. Dito isso, a casa, a madeira e as flor estas estas podem existir de mo do interdependent interdependentee e projetivo, pr ojetivo, mas não existem existem com base apenas apenas em sua pró pria natureza. No Vajrayana, temos manuais de meditação chamados sadhana (meios de realização). Nesses manuais é frequente a presença do mantra em sânscrito “panca skandha tams ca svabhava sunyan”, em que “panca skandha” significa “os cinco agregados” e “svabhava” significa “vazio de existência intrínseca”. Quando recitamos o mantra no Vajrayana, estamos invocando essa experiência, essa percepção das coisas, de de nós mesmos e da realidade r ealidade ao nosso redor. redor . Como um exemplo adicional de vaziez, vamos falar da beleza, beleza, que é um atributo que imputamos imputamos a uma forma observada ou imaginada. Se você vê alguém bonito, não pode dizer que a beleza não existe, que não existe uma pessoa bonita. Dizer isso seria como afirmar que a beleza é um completo nada, o que contradiz a nossa experiência direta. Essa mera nulidade não é a shunyata de que fala o Buda. A Shunyata de que fala o Buda é a originação dependente. Ou seja, a beleza que você observa é composta por muitos fatores diferentes. Dentre esses fatores, os principais são as suas projeções e conceitos, que funcionam como um espelho. Você tem um conceito, e esse conceito muda o tempo todo. Dependendo dos seus conceitos e das suas sensações no momento, provenientes de marcas habituais, você experimenta beleza ou feiura. É uma experiência convencional que depende de causas e condições. O padrão de beleza europeu mudou com o tempo, por exemplo. Há alguns séculos, o ideal de beleza para os europeus não era uma silhueta esguia e alta, como podemos observar atualmente. Beleza Beleza era er a uma silhueta silhueta farta e curvilínea. cur vilínea. As pessoas pessoas achavam bonito bonito um cor po exuberante exuberante e roliço r oliço,, e desejavam desejavam esse tipo de for ma. O Buda diria: em termos relativos, a beleza existe, mas você deve entender que ela não é
inteiramente autoexistente, não existe de modo independente e autônomo. Seus conceitos e projeções desempenham um papel muito importante. Esse é o significado da vaziez da forma. Nossos conceitos e projeções pro jeções desempenham desempenham um papel papel muito impor impo r tant tantee na definição definição do modo como experi experiment mentamos amos e interpr interpret etamos amos as coisas. co isas.
12 O Buda descreve, nos sutras, 84 mil eventos mentais humanos diferentes. Cada um se refere a uma delusão em particular. Por isso se 12 O diz que o Buda concedeu 84 mil ensinamentos diferentes do Dharma como antídotos para cada uma dessas delusões. Nos tantras, essa lista é relacionada a cada um dos 84 mil canais que conduzem os ventos energéticos referentes a cada uma das delusões. Na literatura Abhidharma dos sutras, encontramos diferentes sistemas de agrupamento desses eventos mentais. No Abhidharmasamuccaya de Asanga, os eventos mentais são classificados em 51 tipos. O Abhidharma Kosha de Vasubandhu lista 46 categorias de eventos mentais.
Não só conhecimento, mas a maneira como de fato vemos as coisas Talvez alguns de nós já tenham um entendimento conceitual ou teórico da sabedoria da vaziez. Mas para realmente praticar a Prajna Paramita não podemos ter apenas um entendimento teórico. A sabedoria da vaziez deve formatar nossa visão das coisas dentro da experiência direta cotidiana. Entretanto, não enxergamos as coisas dessa maneira. Por exemplo, quando vemos uma pessoa, um carro ou uma bolsa bonita, nos ocorre que a beleza que vemos é resultado de nosso conceito sobre o que é beleza? É devido a esse conceito que desejamos aquela pessoa, aquele carro ou aquela bolsa. Essas questões quase nunca passam passam pela nossa no ssa cabeça. Sempre pergunto a um amigo empresário como o valor de um imóvel é definido. Imóveis são apenas um terreno, uma pedaço de terra – como podem se tornar caros, valiosos e desejáveis? Meu amigo diz que a demanda cria o valor. Se todo mundo deseja uma certa propriedade, ela se torna valiosa. Você se dispõe a pagar milhões de dólares porque acha que aquele imóvel tem uma localização muito boa. Entretanto, você jamais pensa que o valor que atribui à propriedade é o resultado de uma consciência coletiva projetando a ideia de que aquele é um imóvel muito bom. Para você, aquilo aquilo parece muito muito r eal.13 eal.13 Essa é também uma noção comum a respeito de sucesso nos negócios. Buscamos o sucesso e a riqueza como se eles fossem independentes de nós. Entretanto, a percepção de riqueza é relativa. Aqueles que você considera muito ricos talvez se comparem a outras pessoas mais ricas que eles e não se achem ricos. E você pode se sentir muito rico, embora outros mais ricos que você possam se sentir pobres. Como não praticamos a Prajna Paramita, tudo parece muito real, e você pode seguir facilmente adiante acreditando nisso. Só que quando você acredita que as coisas são reais, a dor também parece real. Quando as coisas não saem de acordo com os seus desejos, a insatisfação é sentida como algo real e sólido.
Por exemplo, se eu for para uma região bem remota do meu país, o Butão, e disser às pessoas, “Esta é uma bolsa Gucci, e ela custa dez mil dólares”, as pessoas vão rir de mim. Vão pensar que eu estou louco. Quem pagaria dez mil dólares por uma bolsa? O que ela tem de tão especial? É apenas uma bolsa de couro. Elas não fazem ideia do que seja uma bolsa de grife, nem entendem o prestígio da marca da bolsa. Porém, nós que vivemos no mundo moderno temos a ideia do prestígio da grife e aceitamos o que é anunciado como um objeto de valor. Não estou dizendo que seja errado usar uma bolsa Gucci. Você pode usar uma bolsa Gucci, dirigir um carro de luxo, mas deve fazer isso com os olhos abertos. É por isso que Sua Santidade Gyalwang Drukpa costuma dizer: “Ame com os olhos e não cegamente. ceg amente.”” De modo semelhante, no Butão existe um traje tradicional que é feito com fios de ouro e custa cerca de dois mil dólares. É a Gucci dos butaneses. Não há nada de errado com esses bens materiais externos. Você apenas tem que entender e estar ciente de como essas coisas funcionam em nossa mente. No passado, as pessoas costumavam oferecer meio quilo de ouro ao falecido 11º Gyalwang Drukpa, Tenzin Kenrab Gelek Palzangpo. Sua Santidade carregava o ouro por uns dez ou 15 dias. Então, de repente jogava-o fora pela rua. Para ele estava tudo bem, pois Sua Santidade entendia plenamente que todo rótulo se deve à percepção pública. O Gyalwang Drukpa não tinha por que se sentir culpado por carregar todo aquele ouro. Ele não achava que o ouro fosse tão precioso e nem que ele não não devesse tocá-lo tocá-lo por medo de se apegar.14 apegar.14 Os Os conceitos de evitar e aceitar destinam-se aos iniciantes, que possuem níveis de consciência convencionais e não permanecem dentro de uma visão contínua da vaziez. Nos níveis mais elevados do caminho, onde a visão da vaziez é estável, quem vai dizer que o ouro é precioso? O ouro não diz que é precioso. Somos nós que pensamos que o ouro tem valor valor de acor acordo do com nossas nor mas e convenções. convenções. Sempre fui curioso a respeito do conceito de dinheiro. É apenas papel impresso, mas de algum modo se tornou torno u importa impor tant ntee para todo mund m undo. o. As As pessoas fazem muitas muitas coisas por dinheir dinheiroo – chegam até a matar por esse pedaço de papel. De modo semelhante, por que os mercados mundiais de ações sobem e descem tanto, dependendo da confiança das pessoas? Afinal de contas, o mercado de ações não é nada mais do que o conjunto dos pensamentos e conceitos das pessoas refletidos no mercado, conforme indicado por seus investimentos. Nada é realmente físico. Quando os mercados sobem e descem, em geral não é porque haja menos grãos de arroz ou maçãs no mundo. Não há nada apoiando esses altos e baixos a não ser nossos conceitos – todavia, vivemos embutidos neles. É por isso que o Buda Buda afirma que somos “verdadeiros “verdadeiro s magos”.
13 Kunkhyen Pema Karpo, em seu comentário sobre o Sutra do Coração, comparou a ausência de sabedoria da Prajna Paramita à 13 situação de uma pessoa com catarata nos olhos. Como a doença provoca linhas finas na superfície do olho, a pessoa vê algo que se parece com um fio de cabelo em um iogurte que está dentro de um recipiente limpo. Sobre o desenvolvimento da sabedoria da Prajna Paramita, Kunkhyen Pema Karpo afirma: “É como ir da visão do fio de cabelo no iogurte puro à visão de nada mais que o iogurte puro.” Ele descreveu o processo em fases. Primeiro, a pessoa vê e acredita que há um fio de cabelo no iogurte. Depois, vê a aparência de um fio de cabelo em cima do iogurte puro, sem acreditar na existência do fio. Por fim, é “como ver apenas o iogurte puro”, sem nenhum fio de cabelo. 14 As 14 As normas éticas monásticas budistas (vinaya), criadas durante a vida do Buda e ainda hoje seguidas por monges e monjas, incluem o voto de evitar o manuseio de ouro e prata, e de tentar viver de esmolas para se privar do comércio e preservar um estilo de vida simples. Nessa história, o 11º Gyalwa Drukpa parece desafiar publicamente as convenções sociais e monásticas referentes ao ouro a fim de ensinar a sabedoria engajada da Prajna Paramita.
O agregado ag regado das das sensaçõ sensa ções es Agora Agor a vamos falar das sensações sensações15 15 – – da vaziez das sensações. Mesmo as emoções – as reações que o deixam feliz e as que o deixam triste – são totalmente definidas por você. Não são algo inerentemente causado por coisas externas. Claro que gostamos de culpar outras pessoas pelos problemas, gostamos de transformá-los na causa de nossa infelicidade. Pensamos dessa maneira e então acreditamos nesses pensamentos. Mas, na verdade, o criador número 1 de nossas sensações somos nós mesmos. No Butão, Butão, existe o Mosteiro Mosteiro Ninho Ninho do Tigre, Tigr e, sendo sendo necessário caminhar caminhar durante durante muitas hor horas as para se chegar até ele. Muitos turistas sentem um grande senso de realização quando chegam ao topo. Sentem-se excitados e orgulhosos por ter conquistado uma parte dos Himalaias. Mas ao lado dos turistas está o guia, sentindo-se cansado e ao mesmo tempo entediado, pois ele sobe até lá umas quarenta vezes por ano. Para ele, não há nada de novo e emocionante para se ver. Mesmo quando duas pessoas param no mesmo lugar e olham a mesma vista da mesma montanha, elas podem experimentar sensações inteiramente diferentes devido às suas diferentes percepções e conceitos. De modo semelhante, quando uma centena de pessoas olha para o Buda, elas não sentem a mesma coisa. Elas sentem coisas diferentes. Algumas podem ver um grande professor a quem respeitam. Outras podem ver o Buda como um ser muito compassivo. Outras ainda verão a imagem do Buda como uma mera pintura himalaia, ou verão uma estátua do Buda apenas como uma bela peça de decoração para colo car na entrada de sua sua casa. Embora as sensações sejam vazias de existência inerente, isso não quer dizer que você não tem sentimentos ou que tem um coração de pedra. Se você oferecesse alimento ao Buda Shakyamuni, ele não diria que o alimento é vazio ou que o sabor do alimento é vazio. Em um sentido relativo, o alimento alimento e o sabor existem. existem. De modo semelhante, nossas sensações e nossa discriminação de certo e errado são vazias apenas do ponto de vista último, pois toda ação é uma combinação de inumeráveis fatores, e os próprios
conceitos conceitos de certo e err er r ado são uma combinação de inumeráveis fator fatores. es. Porém, Por ém, em ter ter mos r elativos, elativos, o Buda indicou formas de conduta, algumas de acordo com as regras da sociedade, e outras para o desenvolvimento e apoio espiritual. Afinal, neste momento, vemos o mundo a partir de uma perspectiva perspectiva relativa e precisamos de algum apoio. apo io. Vamos voltar às diferentes sensações que as pessoas têm ao olhar uma imagem do Buda. Em sentido último, o Buda não é apenas uma estátua, uma obra de arte ou ainda uma pessoa. Nos ensinamentos do Mahayana, existem muitas palavras para descrever a visão de mundo segundo a Prajna Paramita. Pode-se dizer que o Buda é inseparável do dharmakaya.16 dharmakaya.16 O O dharmakaya nada mais é do que o estado de shunyata, a vaziez da existência inerente. Assim, do ponto de vista último, uma vez que o Buda é a verdadeira personificação do shunyata, todos os seres são, portanto, permeados pelo Buda. Todos os fenômenos podem ser vistos como o Buda, todos os pilares e flores também podem ser vistos como o Buda. Todas as coisas, sendo vazias, bem como sendo uma experiência da mente, possuem o que é conhecido como natureza de Buda.17 Buda.17 Por enquanto, observar uma estátua do Buda ou recitar um mantra nos dá apoio, e nos ajuda a chegar ao ponto em que somos capazes de entender e permanecer no significado mais profundo das coisas. Por exemplo, quando vamos a um templo e vemos a imagem do Buda olhando para nós de modo bastante amoroso, experimentamos uma sensação mental de paz interior. Mas isso não significa que só quando você vai a um templo o Buda está lhe abençoando. O Buda está sempre lhe abençoando e a todo mundo igualmente, 24 horas por dia, ainda que você não se interesse por ele. Então por que só nos sentimos abençoados quando vemos os Budas em um templo? Não é o Buda que necessita de apoio. Somos nós que precisamos do apoio da verdade r elativa elativa para nos no s ajudar em nossa prática, até até que possamos entende entenderr a verdade última.
15 Em seu comentário sobre o Sutra do Coração, Kunkhyen Pema Karpo define o agregado das sensações (vedana skandha, em 15 sânscrito) sânscrito) como c omo “uma impressão impressão mental” mental”.. Asanga, em seu Abhi Ab hidharmasamu dharmasamuccay ccaya, a, diz que há uma uma impressão impressão experiencial experiencial (anubhavah, em em sânscrito) quando se dá uma nota mental surgida a partir dos resultados de ações positivas ou negativas. 16 Dharmakaya, 16 Dharmakaya, literalmente “corpo da verdade”. No mahayana é dito que o Buda não tem um corpo no sentido convencional, porém, é dotado de dois corpos ou aspectos principais (kaya, em sânscrito) – dharmakaya (corpo da verdade) e rupakaya (corpo da forma). Quando classificado a partir da perspectiva das três portas – corpo, fala e mente –, dharmakaya refere-se à mente, e rupakaya se subdivide em dois, sambhogakaya (corpo do completo desfrute), referente ao aspecto da fala, e nirmanakaya (corpo de manifestação), referente ao aspecto do corpo físico. Em outros sutras, encontramos também a descrição de quatro kayas – esses três e swabhavikakaya (corpo essencial). Nos tantras encontramos menção a cinco kayas, correspondentes às cinco sabedorias das cinco famílias de Budas: vajrakaya (corpo diamantino), swabhavikakaya (corpo essencial), dharmakaya (corpo da verdade), sambhogakaya (corpo do completo desfrute) e nirmanakaya (corpo de manifestação). 17 No 17 No verso 29 do Caminho do Bodhisattva, Bodhisattva , um texto clássico do budismo Mahayana, Shantideva, um grande erudito budista e siddha indiano do século VIII, escreveu: “Se a mente é livre de quaisquer objetos apreendidos, segue-se que todos os seres devem ser tathagatas”, a partir do ponto de vista de sua natureza última. (Tathagata é um dos principais epítetos do Buda, em que ele se refere a si mesmo com esse termo, que significa “aquele que foi para a talidade”, ou seja, aquele que passou a ver a realidade como ela é).
O agregado das percepções Como mencionei m encionei um pouco antes, antes, mesmo as percepções18 percepções18 convencionais convencionais de certo e errado e de bom e mau são em gr g r ande par par te as percepções de nossa cultura cultura e de nossos nosso s conceitos. Diferentes Diferentes culturas culturas possuem diferentes percepções. Por exemplo, exemplo, no passado, quando quando os britânicos iam aos ao s Himalaias no Tibete, os habitantes locais batiam palmas ao vê-los, gesto que em sua cultura serve para afugentar obstáculos. O bater de palmas significava “vão embora, demônios ingleses”. Todavia os britânicos sentiam-se bem recebidos porque entendiam as palmas como aplauso, conforme a cultura britânica. Por outro lado, quando quando os o s tibetanos tibetanos expressavam o cumpriment cumprim entoo r espeitoso espeitoso de sua cultura, cultura, botando botando a língua para fora, os britânicos ficavam aborrecidos e irritados. Como se pode ver, certo e errado existem nas sociedades como conceitos convencionais dentro da cultura. Eles podem ser aceitos e defendidos como reais, mas do ponto de vista último, certo e errado não existem de modo inerente. Certo e errado existem apenas na dependência de causas e condições. Existe Existe uma histór história ia sobre sobr e um homem com visão normal nor mal que foi parar em um vale de cegos. cegos. Todos os cegos do vale achavam que o forasteiro tinha um órgão extra – os olhos. Ele era visto como deficiente. Quando quis casar com a filha de um cego, disseram que ele teria que remover os olhos para se tornar normal. Com isso o forasteiro fugiu. Naquela sociedade, remover os olhos era o certo. De modo semelhante, mas talvez menos extremo, as sociedades reais – inglesa, chinesa, malaia – veem o certo e o errado de maneiras diferentes. Desse modo, podemos nos perguntar se deveríamos nos aborr abor r ecer quando quando os o s outros outro s não entendem entendem a nossa definição definição de certo. É realmente realmente necessário necessário que as outras pessoas tenham tenham o nosso ponto de vista? vista? Quando entramos em discussões, temos dificuldade para entender como os outros não conseguem ver que estamos certos. De modo semelhante, os outros têm dificuldade em entender por que não conseguimos ver as coisas do ponto de vista deles. Isso acontece porque certo e errado também dependem de conceitos individuais. Em sentido último, estamos tão certos quanto errados. Porque, em sentido sentido último, não é nem uma coisa, co isa, nem outra.
Assim, dizemos que em sentido último tudo é o caminho do meio.19 meio.19 Apenas Apenas pelas fabricações da existência relativa as coisas se tornam boas ou más. Em termos relativos, alguém se torna um bom amigo por meio de nossa fabricação, enquanto esse mesmo alguém pode tornar-se inimigo através da fabricação de uma outra pessoa. Ambas as visões se devem à fabricação. Outro exemplo simples. Quando fomos à Índia em peregrinação, os banheiros ao longo do percurso eram em geral muito malcheirosos. Sua Santidade Gyalwa Drukpa ensinou-nos a praticar a visão da Prajna Paramita – aquela imundície baseava-se em nossa percepção. As moscas são atraídas por esse tipo de odor. As duas percepções são individuais. Na realidade, o cheiro tem uma natureza que não é aquela fabricada por nós. Por isso dizemos que, em sentido último, tudo é da natureza do caminho do meio, livre dos extremos da existência inerente e da inexistência. Apenas pelas fabricações mentais e projeções as coisas se tornam boas ou más. Isso é chamado de caminho do meio. Você também pode chamar esse entendimento de natureza de buda, shunyata, mahamudra e assim por diante. diante. Até mesmo os votos das três principais tradições budistas – Budismo Antigo, Mahayana e Vajrayana – diferem. Se essas normas existissem de modo independente e absoluto, não poderia haver haver diferença. Por que o Buda ensinou ensinou nor mas diferentes? Por Porque que o Buda sabe sabe que diferentes diferentes seres possuem diferentes aspirações, diferentes capacidades e diferentes maneiras de obter a iluminação. Todas as três principais tradições são igualmente importantes. Você não pode dizer qual é a mais importante ou a menos importante. Cada tradição se adequa a diferentes pessoas. Tais diferenças às vezes são comparadas a diferentes tipos de remédio. Um tipo de remédio nem sempre é melhor do que os outros. Por exemplo, só porque um remédio é mais forte do que outro, não significa que ele seja bom para uma determinada pessoa. O remédio mais forte pode até matar, pelos seus efeitos colat col aterais erais também também serem mais severos. severo s. Desse Desse modo, modo , o Buda Buda concede ensinament ensinamentos os diferentes para pessoas diferentes. Por conseguinte, existem diferentes votos. Por exemplo, nos votos do Budismo Antigo, você não tem permissão para tocar em ouro se é bhikshu ou bhikshuni, ou seja, um monge ou monja completamente ordenado. Por que existe a necessidade de tal voto? Porque, como bhikshu ou bhikshuni, você não deve se apegar a ouro, ficando distraído da prática do Dharma por querer mais riqueza ou temer a perda da riqueza. No Budismo Budismo Antigo Antigo essa é uma nor norma ma clara, pret pr etoo no branco. No No Mahayana Mahayana as as regr r egras as são mais flexíveis. Se for para o benefício dos seres sencientes, sem qualquer intenção autocentrada e egoísta, é permitido permitido tocar tocar em ouro. ouro . Por quê? Porque no Mahayana trabalha-se para eliminar o pensamento de eu e o egoísmo. Não é sobre o que eu go eu gost stoo ou o u sobre o que que eu não eu não gosto. É sobre o que pode ser feito para o benefício dos outros. outro s. O apego não surge sur ge se você não se preocupa consigo mesmo. m esmo. Assim, Assim, você tem tem permissão para tocar em ouro o uro caso o seu ato ato seja inteiramente altruísta. altruísta.
No Mahayana, considera-se que existem dez ações negativas. Mas é permitido cometer as sete ações menores em casos especiais e extremos.20 extremos.20 No Vajrayana, quando você não tem conceitos dualistas, tocar em ouro ou pedra é a mesma coisa, não faz diferença para você. A norma não é algo externo, que existe de modo independente. As normas são estabelecidas de acordo com quem você é e com o seu nível de realização espiritual. No fim, quando você se torna iluminado, não existe norma alguma. Você é livre. Quando se torna um Buda, você não tem mais que recitar Om Mani Padme Hung nem fazer prostrações, a não ser que isso sirva de exemplo compassivo para o benefício dos seres. Os dois agregados restantes – formadores mentais e consciência21 consciência21 – foram mencionados nas entrelinhas dos demais agregados. Quando analisamos mais profundamente, vemos que os cinco agregados são coemergentes, surgem inseparáveis uns dos outros. Por exemplo, não há como ter uma sensação na ausência de uma consciência ciente dessa experiência, e não há como ter percepção ou qualquer tipo de cognição na ausência de marcas ou tendências habituais que nos dirigem a ver e perceber as coisas de uma determinada forma, isso que é o trabalho e operação do agregado dos formadores mentais.
18 Kunkhyen Pema Karpo em seu comentário sobre o Sutra do Coração define o agregado das percepções (samjna, em sânscrito) como 18 Kunkhyen a qualidade mental que apreende e se baseia em estruturas conceptuais que discriminam, rotulam e categorizam os fenômenos. 19 O Caminho do Meio foi mencionado primeiramente pelo próprio Buda no cânone páli em seu primeiro discurso, Colocando em 19 Movimento a Roda do Dharma, no qual ele usa o termo “majjhima patipada” para indicar a necessidade de se evitar os dois extremos da autoindulgência e da automortificação. Em outro discurso, o Kaccayanagotta Sutta, o Buda aborda a necessidade de se evitar os extremos do eternalismo e do niilismo. Essa questão foi aprofundada durante séculos em uma das principais escolas filosóficas indianas, a Madhyamaka (proponente do Caminho do Meio), que postula uma abordagem da realidade livre desses dois extremos, tomando como base que todo e qualquer posicionamento, tese ou asserção filosófica é falho por ser uma fabricação mental dependente de um contexto e referencial conceitual, e portanto, não é absoluto. 20 As 20 As dez ações não virtuosas são: matar, roubar e apresentar conduta sexual imprópria (ações de corpo); mentir, caluniar, falar de forma grosseira e falar algo inútil/fofoca (ações de fala); ter pensamentos de avareza e cobiça, pensamentos maliciosos/maldosos e convições errôneas (ações de mente). As três ações não virtuosas inaceitáveis no Mahayana são as ações de corpo: matar, roubar e conduta sexual imprópria. 21 Kunkhyen 21 Kunkhyen Pema Karpo em seu comentário sobre o Sutra do Coração define o agregado dos formadores mentais como “os agentes que causam a formação manifesta de eventos mentais”, e o agregado da consciência como “aquilo que é ciente dos aspectos de um objeto”.
A vaziez dos pensamentos e das emoções Para ver os pensamentos e emoções como vazios de existência independente, você tem que vê-los com olhos de sabedoria. Se você tem sabedoria, co co nsegue ver coisas que em geral não se vê. Consegue ouvir coisas que normalmente não se consegue ouvir. É assim que a Prajna Paramita é tradicionalmente descrita. O ensinamento último do Buda diz: se você diz que viu o Buda, você não viu o Buda; se você ouviu os ensinamentos do Buda, você não ouviu os ensinamentos do Buda. Isso é a Prajna Paramita. Você não pode ver a vaziez, shunyata ou o dharmakaya com os olhos físicos. Você tem que que efetivá-la efetivá-la e realizá-la. Esse Esse processo pro cesso é ver com olhos o lhos de sabedor sabedoria. ia.22 22 Tendo isso em mente, podemos falar sobre emoções, em especial emoções negativas. No Vajrayana, é dito que as emoções negativas, como a raiva e o ciúme, não passam de sabedoria. Não são nada mais que a natureza de buda, se você é capaz de reconhecê-las como tal. De modo semelhante, quando alguém se torna um buda, isso não significa nada mais que a efetivação do entendimento completo dos fenômenos. Não significa que essa pessoa se tornou um deus ou que possui superpoderes. Em outras palavras, no momento em que você entende completamente o mundo inteiro sem fabricações, naquele instante de consciência, você é um buda e está no nirvana. Porém, quando você ainda tem tem que chegar a esse entendimen entendimento, to, esse mesmo mund m undoo é ignor ig norância, ância, e você está está no samsara. Se o Buda Shakyamuni estivesse aqui agora, como esteve há 2,5 mil anos, ele estaria no samsara ou no nirvana? Se você disser samsara, como ele poderia estar, se é um ser iluminado? Samsara ou nirvana é algo que depende totalmente de você ser ignorante ou iluminado – depende de você entende entenderr o mundo plenamente plenamente ou permanece per manecerr ignor ante. ante. Não Não é nada além disso.23 23 É por isso que digo que o Vajr Vajrayan ayanaa tem forte for te embasament embasamentoo no Sutr Sutr a do Cor ação, devido ao papel central da sabedoria que realiza a vaziez. O Sutra do Coração diz que não só as formas físicas e os seus atributos são vazios de existência inerente, mas todos os fenômenos, inclusive os pensamentos, as emoções, as percepções e a consciência, são igualmente vazios de natureza inerente. Assim,
formas são shunyata e pensamentos são shunyata. Além disso, o Buda e shunyata não podem ser separados. Em shunyata, a verdadeira natureza do ego é entendida de tal maneira que só existe altruísmo. Não existe algo como “eu “eu sou o Buda Shakyamuni”, ou “eu “eu realizo shunyata”, ou “eu “eu gosto go sto disso”, ou “essa é a minha terra minha terra pura do Buda Amitabha”. Se você realiza shunyata – a Prajna Paramita –, não existe nada além de permanecer na natureza primordial, não há como permanecer em outro estado diferente dessa natureza. Isso porque, quando você realiza a inexistência do eu, eu, não pode mais dizer “eu “eu existo”, ou mesmo “eu “eu realizei a inexistência do eu”. eu”. Essas afirmações seriam contraditórias. Portanto, a realização última não é “eu “eu existo” e nem “eu “eu não existo”. A realização última está além desses conceitos e além de qualquer pensamento dualista. É por isso que dizemos que o verdadeiro Buda é shunyata. Shunyata permeia tudo e todos. Desse modo, você pode ver diferentes tipos de deidade no Vajrayana: algumas aparecem com um aspecto irado, outras aparecem com um aspecto luxurioso. Elas são assim porque nós temos essas emoções, essas estruturas conceituais. No Vajrayana, os Budas não são meros objetos externos para os quais se reza. Eles devem ser imaginados, fundidos com a sua identidade pessoal e visualizados como você mesmo, e praticados a fim de que você entenda a sua própria natureza. Ao meditar sobre eles, você pode aceitar e entender a natureza de sua própria raiva, luxúria, ciúme etc. E a partir desse entendimento direto, ao transcender seu autoconceito e autoimagem comuns, geralmente mantidos em cativeiro por emoções perturbadoras, você se transforma. Bem, mas isso é só a teoria, o entendimento conceitual a ser realizado pela prática...
22 No Sutra do Diamante o Buda diz: “Aqueles que me veem como uma forma física ou me conhecem através de palavras e sons 22 tomaram um caminh caminhoo equivocado. equivocado . Tais Tais pesssoas não me percebem perceb em verdadeiramen verd adeiramente.” te.” 23 O 23 O segundo Gyalwang Drukpa, Kunga Paljor, em sua obra chamada Uma Carruagem da Visão Não Dual, afirma que toda noção de samsara samsara e nirvana, nirvana, escravidão escravidão e li l iberdade, coisas coisas a serem abandonas abandonas e co isas a serem adotadas, aflições deludidas e sabed oria oria ocorre oco rre a partir do ponto de vista das duas verdades – a verdade ficcional relativa e a verdade real última - como sendo coisas diferentes. Quando as duas verdades são realizadas pela sabedoria não dual, elas são tomadas com base na liberdade das elaborações mentais de estabelecimento e negação, e de aceitação e rejeição. Por isso, a visão de que elas não são diferentes, mas sim inseparáveis, é o que determina a indivisibilidade do samsara como o campo puro do nirvana, a escravidão como uma expressão natural de liberdade e as aflições deludidas como uma exibição espontânea da sabedoria primordial. A diferenciação anterior, diz Gyalwang Je, segue o princípio do sistema sistema do d o Sutra, e essa última última segue seg ue o princípio princípio do sistema sistema do d o Mantra, M antra, também chamado d e caminho caminho do Tantra, ou Vajrayana. Vajrayana.
Vendo com com os os olhos olh os da Prajna Prajn a Paramit Par amita a No modo Vajrayana de lidar com as emoções por meio da prática, não aplicamos os antídotos na mesma hora em que a raiva ou outras emoções negativas surgem, como se faz em algumas práticas do Mahayana. Por exemplo, quando vem a raiva, os praticantes do Mahayana podem aplicar um antídoto antído to24 24 que que se oponha à emoção perturbador a, tal tal como compaixão ou o u o entendiment entendimentoo do que deu deu origem à raiva. No Vajrayana, quando surge felicidade ou raiva, elas são deixadas em seu estado natural. Geralment Geralm entee não deixamos pensament pensamentos, os, as percepç per cepções ões e as emoções emoçõ es em sua própr pr ópria ia natur natur eza. Por exemplo, quando vemos alguma coisa, como uma flor, costumamos pensar que é uma flor. Então pensamos que ela é bonita. Surge uma cadeia de pensamentos. No verdadeiro caminho Vajrayana, seja qual for a emoção que surja, nós a deixamos como é, sem qualquer fabricação adicional. A seguir deixamos que desapareça de volta na natureza da mente, como uma onda que retorna ao oceano. Você não pode extirpar uma emoção (como a raiva) como um cirurgião e se livrar dela para sempre. Você precisa encarar as suas emoções. É olhando claramente para as suas emoções e entendo-as que você consegue realizar a natureza de buda. Por isso, da próxima vez em que a felicidade surgir, tente não rotular como felicidade, tente não aceitar e nem rejeitar. Apenas deixe as coisas como são. Caso contrário, na mesma hora você começará a projetar, a fabricar. Você tem que tenta tentarr viver sem fabr icações, de modo que possa entend entender er a verdadeira natureza dos fenômenos. Como se faz isso? Quando olhamos com os olhos da Prajna Paramita, vemos que, em nossa visão convencional, acreditamos que o “eu” existe e, uma vez que o “eu” existe, os objetos externos que o “eu” per per cebe devem devem existir. existir. Ent Então ão r otulamos as emoções emo ções que surgem surg em em tor no desses objetos. O que o “eu” gosta go sta é felicidade, felicidade, o que o “eu” não não gosta g osta é sofriment sofr imento. o. Alto e baixo, limpo e sujo – tudo isso são conceitos dualistas. No Vajrayana, existem algumas deidades com cabeça de porco. Isso é para mostrar que limpeza e sujeira também são conceitos
dualistas. Quando eu era jovem, gostava de ler histórias em quadrinhos. Havia uma história em quadrinhos sobre uma garota rica que tinha um porco como animal de estimação. Ela mantinha o porco muito limpo. Dava banho nele e o perfumava, mas o porco ficava muito infeliz e sempre gostava de ir para a lama. Luxo, para o porco, era estar na lama. Para nós, porém, é diferente. Então, quaisquer que sejam as qualidades externas, é nossa mente que as manifesta. Nossa mente manifesta conceitos como comprido, curto, bom, mau, felicidade, tristeza, riqueza, pobreza. Tudo isso são manifestações da mente, e a própria mente também não existe de modo intrínseco. Você não pode apontar onde está a mente. Onde está o criador dos pensamentos e das emoções? Só porque acredita que as qualidades externas existem você consegue “provar” que a mente existe. E só porque acredita que a mente existe você consegue “provar” que as qualidades externas existem. É um círculo de existência interdependente. Se não existe o branco, você não pode definir o preto; se não existe direita, não existe esquerda. É como mágica. Todos os fenômenos devem ser entendidos assim. Ao relaxarmos a mente na natureza de Buda, evitamos pensar sobre passado, presente ou futuro. Quaisquer pensamentos que surjam não são rejeitados e nem aceitos, apenas fluem pela mente. Não há rejeição e nem aceitação, o pensamento é apenas deixado sem fabricação. Deve-se fazer isso em primeiro lugar, antes de qualquer processo de visualização. Isso é ver com os olhos da Prajna Paramita.25 Paramita.25
24 Isto é, antídotos usados para remediar ou curar aflições mentais, tais como a raiva, a inveja e o apego, através de meditações sobre a 24 Isto compaixão, a equanimidade, a impermanência e assim por diante (descritos no Treinamento da Mente Sutrayana, ou Lojong em tibetano). 25 O 25 O grande siddha indiano Tilopa diz em uma de suas canções espirituais:“Deixe de lado o que passou [passado]. Deixe de lado o que pode vir [futuro]. Deixe de lado o que está acontecendo agora [presente]. Não tente descobrir nada [não há nada a ser alcançado]. Não tente fazer qualquer coisa acontecer [não há razão para qualquer fabricação mental]. Relaxe, agora, e descanse [em seu estado natural].”
A lua lua no espelho espel ho O elemento elemento crucial cr ucial da meditaç meditação ão é entender entender como com o todas essas condições – ignor ância, pro projeções jeções – se untam para dar origem aos fenômenos. Normalmente, não reconhecemos quais condições estão ali, pois muitas condições variadas se juntam para que as coisas existam. Por isso, precisamos possuir definições distint distintas as do que é r eal e do que não é real. r eal. Quando fazíamos visualizações, Sua Santidade o 12º Gyalwang Drukpa costumava dizer: “Vocês são injustos, pensam que Tara não existe, que Amitabha não existe, nem a terra pura de Tara ou de Amitabha. Você acham que elas não existem. Mas, quando pensam sobre o mundo de vocês, vocês, ele existe de um modo bastante real. Como pode ser assim, se o mundo de vocês é composto de muitas condições diferentes reunidas?” Em outras palavras, a existência dessas deidades depende de numerosas condições, tais como sua habilidade para imaginá-las em meditação. A existência de outros objetos materiais depende igualmente de numerosas condições, inclusive da nossa habilidade de percebê-los. Portanto, todos são vazios de existência inerente. No sentido relativo, as terras puras estão ali, experiências de céu e inferno estão ali, e tudo parece realmente existir de modo independente. No sentido absoluto, uma casa ou o nosso mundo não existem por si só. De modo semelhante, as terras puras não estão ali de modo inerente; elas são a natureza de nossa mente. m ente. Elas não existem de mo do independen i ndependente. te. Quando vê a lua refletida no espelho, você diz que essa lua não é real. Embora o espelho e a lua tenham se juntado na mesma superfície, você sabe que a lua no espelho não é real. Mas e quanto à lua “real”? De modo semelhante, a lua real é composta de muitas coisas reunidas, só que não reconhecemos isso. A fim de se entender isso, a visualização do Vajrayana sempre tem um elemento chave. Quando você se visualiza como um Buda, isso deve ser muito claro. Você e o Buda são visualizados como existentes, exatamente como esta casa. Todavia, você tem que entender que isso é apenas como o reflexo da lua em um espelho. Existe e ao mesmo tempo não existe. Mas isso não é um truque
psicológico. Por meio dessa visualização, você entenderá que tudo que vê é similarmente composto de causas e condições. A casa que você vê existe, a bondade existe, a riqueza existe, mas ao mesmo tempo não existem de modo inerente e independente. É por isso que a frase mais famosa do Sutra do Coração afirma: “Forma é vazio, essa vaziez é forma.” Elas não podem ser separadas. Isso é shunyata. A visualização da forma é crucial. Lentamente, por meio da visualização e do entendimento direto, você começará a ver que as coisas existem devido à reunião de causas e condições, e por conseguinte, entenderá que as coisas não podem existir de modo independente. Continuando com o sutra: “Portanto, Shariputra, todos os fenômenos são vaziez. Não têm características definidor definidoras. as.”” Em out o utras ras palavras, os fenômenos não existem existem de modo m odo independe independent ntee e, portanto, não podem ser definidos. Por isso, “não nascem, não cessam”. Além disso, “não são maculados, não são imaculados”. Conforme expliquei, a maculação externa, tal como estar sujo, também é um conceito da mente. De modo semelhante, é ensinado que a natureza de buda não fica suja por você ser uma pessoa negativa. E nem fica limpa por você ser uma boa pessoa. A natureza de buda está além de todos os conceitos de bom e mau. Jamais pode ser tocada por nossos conceitos. Pode-se fazer uma analogia com o céu. Pode haver nuvens negras ou nuvens brancas no céu, mas isso não significa sig nifica que que o céu fique fique branco ou negro. negr o. Nos ensinamentos do Vajrayana sobre a yoga da deidade, na introdução à natureza da mente, costuma-se mostrar aos alunos um cristal que reflete cores diferentes dependendo das condições de iluminação. De modo semelhante, nossa mente pode sentir emoções como raiva, ciúme, tristeza e felicidade, da mesma maneira que o cristal refratando a luz. O cristal vai refratar uma cor em especial, dependendo do ângulo ou da cor da luz que nele incide. Mas o fato de o cristal exibir muitas cores diferentes significa que a natureza do cristal não é de nenhuma dessas cores. A verdadeira natureza da mente não pode se tornar inerentemente suja ou limpa porque pureza e impureza são conceitos dualistas. São verdades relativas. Assim, o sutra diz: “Não são maculados, não são imaculados. Não são deficientes e não são completos. Portanto, Shariputra, na vaziez não há forma.” Não podemos dizer que de maneira nenhuma existe forma. Em vez disso, podemos dizer que “forma é vazio, essa vaziez é forma”, ou que “raiva é sabedoria e sabedoria não realizada é raiva”. É como ter duas faces. Nossa verdadeira natureza, quer você a realize ou não, não muda. Não fica mais pura ou impura. A questão é se você realiza isso ou não. É por isso que o sutra diz que não existe língua, nem corpo, nem mente e assim por diante. Não existir corpo significa que o corpo também é composto de muitos fatores – mãos, braços, pernas. A mão é feita de cinco dedos e da palma. Não existe mão de modo independente. Em um nível simples, a Prajna Paramita pode ser explicada e analisada. Mas a verdadeira Prajna Paramita não pode ser entendid entendidaa por meio de uma explicação explicação ou o u de um estudo. estudo. Ela Ela deve ser realizada
pela prática. Deve vir de dentro. Ela não pode nem sequer ser colocada em palavras. Por meio desse sutra e de sua explicação, temos apenas um vislumbre do que é a Prajna Paramita.26 Paramita.26
26 Rahula louva a Prajna Paramita da seguinte forma: “Indescritível, inconcebível e inexprimível Perfeição da Sabedoria. A própria 26 essência do espaço não nascido e incessante. O campo de atividade da própria sabedoria primordial autoconhecedora. Mãe dos (Budas) Vitoriosos dos três tempos, a você presto homenagem!”
Tudo já é perf p erfei eito to O Sutra do Coração prossegue: “Não há olho, nem ouvido, nem nariz, nem língua, nem corpo, nem mente. Não há forma, nem som, nem odor, nem sabor, nem textura, nem objetos mentais. Não existe elemento constituinte do olho e assim por diante até não haver elemento constituinte da mente, inclusive nenhum elemento constituinte da consciência mental. Não existe ignorância, não existe extinção extinção da ignorância. igno rância.”” Observe o termo “não existe extinção da ignorância”. Se um dia você realizar a natureza de sua mente, a natureza da sua raiva, a natureza dessa casa, tudo, naquele momento, se tornará shunyata, o perfeito caminho do meio. E, embora eu diga que tudo vá se tornar shunyata, a verdade é que tudo sempre foi shunyata. Assim, do ponto de vista último, não há e nunca houve ignorância. Não há ignorância, nem bom, nem mau – tudo já é perfeito. Apenas por meio da fabricação e da projeção transformamos a realidade em amiga ou inimiga, boa ou má. Mas tudo já é perfeito por sua própria natureza. É por isso que no Vajrayana enfatizamos a visão pura. Devemos visualizar a nós mesmos, aos gurus, aos professores e a todos os seres como Budas e bodhisattvas a fim de nos familiarizarmos com o modo como as coisas realmente são em sua vaziez. É por isso que dizemos que a raiva e outras emoções negativas têm a natureza da sabedoria desde tempos sem princípio. Não é que se tornem sabedoria quando realizamos isso. Sua própria natureza é sabedoria desde tempos sem princípio. O Sutra continua: “Não existe envelhecimento e morte”. A fim de falar sobre envelhecimento e morte, deve-se nutrir um conceito de existência interdependente do “eu” e do ego. Só então você pode dizer “eu envelheço”, “eu estou doente”, “eu morro”. Por isso o Sutra do Coração declara: “Não existe envelhecimento e morte, nem extinção do envelhecimento e da morte. Do mesmo modo não existe sofrimento, origem, cessação ou caminho, não existe sabedoria, nem realização e não r ealização.” ealização.” O sutr sutr a diz que essas coisas não existem existem por que, de de acordo acor do com co m a Prajna Pr ajna Paramita, uma uma
vez que você rotula algo como mácula, como nirvana, como samsara, você já está projetando. Você á está fugindo da ver dadeir dadeiraa natureza natureza das coisas. coi sas. Às vezes, as pessoas me perguntam: como se sabe quando o samsara começa? Do ponto de vista r elativo, elativo, o Buda Buda diz que não existe existe princípio pri ncípio para o samsara e que, até até se estar iluminad il uminado, o, não existe existe fim para par a o samsara. Mas Mas do pont po ntoo de vista vista último, jamais houve ho uve um samsara. Nós Nós pensamos pensamos de modo m odo ignorante que vivemos no samsara. Por exemplo, podemos ter um sonho lindo ou um sonho terrível, mas quando acordamos do sonho, não faz sentido falar se o sonho foi real ou não, quando ele começou e assim por diante. Isso porque o sonho nunca existiu. Sempre foi um sonho, e nós já acordamos. Assim, o Sutra prossegue: “Portanto, Shariputra, uma vez que os bodhisattvas não têm nada a atingir, atingir, eles confiam nessa perfeição da sabedor sabedoria ia e nela permanece per manecem. m.”” Isso significa sig nifica que você deve permanecer nesse tipo de sabedoria não dualista. Em algumas práticas do Mahamudra, existem súplicas ao guru ou ao Buda. As súplicas dessas práticas não dizem “eu quero me tornar iluminado”, mas sim “o que quer que ocorra em minha mente e minha vida, possa eu não aceitar, nem rejeitar, mas possa eu ser capaz de deixar tudo na natureza tal como ela é”. Essa é a súplica das práticas do Mahamudra e do nível de prática de Guru Yoga og a do Mahamudr Mahamudra. a. É por isso que “os bodhisattvas não têm realização”. Realização aqui equivale a dizer “eu quero me tornar iluminado”. Mas em sentido último, quando você diz “eu”, você já está na natureza dualista, e não permanecendo na natureza última. Por isso, a fim de meditar sobre a Prajna Paramita ou nela permanecer, você deve permanecer na natureza das coisas sem esperança ou medo – sem esperança de ficar iluminado, sem medo medo de cair no samsara. samsar a. Assim, no Sutra da Prajna Paramita os bodhisattvas não têm realização, nem não realização, nem esperança de realização, nem medo de não realização. Eles têm a perfeição da sabedoria. Sem obscurecimentos da mente, eles não têm compreensões equivocadas. Você não terá esperança ou medo se tiver entendimento de shunyata. shunyata. Muitos mestres não ensinam a Prajna Paramita porque acham que ela é avançada demais. Embora meu professor, Sua Santidade Gyalwang Drukpa, em geral não ensine a Prajna Paramita diretamente, como um tema específico, específico, da maneira que estou estou fazendo aqui, com fr equência equência eu o vi colocar col ocar muitos elementos da Prajna Paramita nos ensinamentos que concede. E Sua Santidade sempre diz que, mesmo que você não tenha entendido a Prajna Paramita plenamente – mesmo que entenda só um pouquinho dela –, ela pode relaxar por completo a rigidez de sua mente, de modo que você pode aos poucos ir se tor tornand nandoo destemido. destemido. Neste exato instante, somos muito rígidos a respeito das coisas externas – sucesso, beleza, felicidade, sofrimento, amigos, inimigos e assim por diante. A rigidez domina nossa mente. Queremos arrumar tudo do lado de fora, arrumar o mundo, limpar o mundo. Quando percebemos
que não podemos fazer isso, i sso, ficamos ficamo s decepcionados. decepcionados. Mas Mas se você souber so uber de verdade que felicidade e sofrimento são manifestações de sua mente, você se tornará totalmente destemido. Você terá confiança em sua vida. Com essa confiança, você pode usar sua bolsa Gucci. Você não tem que se sentir indignado com ela, apegado a ela ou aprisionado a ela. Você pode desfrutar das coisas materiais. Pode ter muito espaço em sua mente e seus pensamentos.27 pensamentos.27 Quando Milarepa, o grande santo que ficou iluminado em uma só vida por meio das práticas do Vajrayana, estava meditando em uma caverna, ele viu muitas demônias atacando-o. Ele ficou apavorado e começou a recitar mantras irados. Mas de nada adiantava recitá-los, as demônias ficavam cada vez mais assustadoras. Então, uma das demônias perguntou a ele: “O que o seu professor lhe ensinou? Se você percebe que não sou nada mais que a verdadeira natureza de sua própria mente, sou sua protetora e serva. Caso contrário, sou sua pior inimiga, e existem muitos demônios mais perigosos chegando logo atrás de mim.”
27 O sublime mahasiddha indiano Tilopa disse a seu discípulo, o grande pandita e siddha Naropa: “Filho, não são as aparências que lhe 27 O prendem, mas sua fixação a elas é que lhe aprisiona. Corte suas fixações, ó Naropa!”
Compai Compaix x ão surgida da sabedoria sabedoria Agora darei uma explicação adicional. O Vajrayana possui muitos significados externos, internos e secretos. A maioria das pessoas veem apenas o significado externo. Veem um vajra (punhal ritualístico) apenas como um punhal que deve se carregar por aí. Mas você alguma vez já viu algum grande gr ande mestre carregando carr egando um enorme enor me punhal punhal vajra consigo? consig o? Eu nunca nunca vi. vi. Deve-se entender o sentido por trás das coisas. Por exemplo, nas práticas do Vajrayana, cria-se um círculo de proteção quando o ritual começa. Para o círculo que serve de proteção externa, visualizamos uma muralha de fogo. A proteção interna é um sentimento de compaixão que subjuga qualquer pensamento negativo. Mas o círculo de proteção secreto é o seguinte: como não percebo a natureza de minha mente e não permaneço na natureza não fabricada de minha mente, eu crio um componente dual – “eu” existo e “os outros” existem. Devido a esse pensamento, surge “eu gosto” e “eu desejo”. Assim o que o “eu” gosta torna-se deus, o que o “eu” não gosta torna-se demônio. Há demônios e demônias porque eu não permaneço em minha natureza. Isso cria apego. Cria medos, fantasmas fantasmas e espíritos. Assim, Assim, a proteção pr oteção última no cír culo não é para deter os o s fantasmas, fantasmas, pois eles são uma só coisa quando permaneço na natureza não fabricada de minha mente e todas as distinções de “eu” e “fantasmas” desaparecem. Esse é o círculo de proteção último. Por isso eu digo: nada de medo. De onde vem o medo? O medo vem da esperança. A esperança vem do pensamento dualista. É assim quando não se realiza a natureza da mente.28 mente.28 No desenvolvimento da compaixão existem dois pontos de vista. Em muitas tradições, a compaixão é enfatizada com prioridade, e a sabedoria vem em segundo lugar. Por exemplo, a compaixão é desenvolvida primeiro pela meditação sobre o sofrimento dos seres nos reinos dos infernos e dos animais. Trabalha-se, então, para se desenvolver um entendimento sobre a causa do sofrimento. Na linhagem Drukpa, porém, a abordagem abor dagem é de cima para baixo. Primeir o entende entendemos mos shunyat shunyataa e então se desenvolve a compaixão. Se você entender de verdade que todo sofrimento que experimenta é resultado de não permanecer na natureza de sua mente, você será capaz de ver que os outros estão
passando passando pelo mesmíssimo m esmíssimo sofriment sofr imento. o. Assim, Assim, a gr ande compaixão compaixão surge sur ge automaticament automaticamentee por meio da sabedoria desenvolvida. Essa é a compaixão que vem da realização da sabedoria. Esse é o tipo de abordagem abor dagem enfatizada enfatizada pela linhagem Drukpa. Drukpa. O texto da Prajna Paramita diz que todos os Budas e bodhisattvas, “não tendo obscurecimentos em suas mentes, não têm medo, e por irem completamente além de qualquer engano, atingirão o fim do nirvana. Todos os o s Budas Budas que residem r esidem nos três tempos também atingir atingir am o pleno e perfeito per feito desper desper tar tar da inexcedível inexcedível iluminação, ao confiarem confiar em nessa perfeição da sabedor sabedoria. ia. Por Porta tant nto, o, deve-se saber que o mantra da perfeição da sabedoria...” Vamos discutir o significado de “mantra”. “Man”, em sânscrito, significa “mente”. “Tra” significa proteção. Assim, mantra significa proteger a sua mente da fabricação de conceitos conceitos dualistas dualistas ordinário or dinários. s. Todos os Budas ficaram iluminados por meio do entendimento da Prajna Paramita. Portanto, devemos conhecer o mantra da grande visão desperta (vidya mantra). Ele é chamado de mantra da grande visão desperta porque é a sabedoria da iluminação. Arhats possuem conhecimento e bodhisattvas de diferentes bhumis29 bhumis29 também têm conhecimento. Até nós mesmos temos conhecimento – sabemos cozinhar, sabemos dirigir, sabemos conduzir negócios –, mas é essa a grande visão desperta, a sabedoria completa? Não. A Prajna Paramita é o nível de conhecimento ou sabedoria do Buda, é a completa sabedoria da iluminação, o mantra inexcedível. Ela é o mantra inexcedível, inexcedível, porque esse tipo de sabedor sabedoria ia não é excedido excedido por po r nenhum nenhum outro nível de conheciment conhecimento. o. O sutra diz “o mantra ig ual ao inigualáv inig ualável”, el”, mas na verdade verdade dever dever ia dizer “o mantra mantra que igualou ig ualou o inigualável”. De modo geral, os Budas não são iguais. São diferentes na forma. Por exemplo, Vajrapani tem um vajra. Manjushri tem uma espada. Avalokiteshvara tem duas cabeças, quatro braços e assim por diante. Diferentes Budas têm diferentes formas. E nós somos diferentes dos Budas por sermos pessoas comuns e não realizadas. Mas em shunyata, na visão não dualista, todas essas coisas desiguais tornam-se iguais. Falando em termos relativos, podemos dizer que existe o espaço aéreo tailandês e o espaço aéreo cingapurense, mas, de um ponto de vista mais amplo, tudo é um espaço aéreo indiferenciado. Assim, do ponto de vista do Buda, tudo é igual.
28 O grande pandita indiano Chandrakirti afirma, em sua obra Introdução ao Caminho do Meio, capítulo 1, verso 3: “Primeiro, com o 28 O pensamento de ‘eu’, surge a fixação a uma individualidade. E, então, com ‘isto é meu’, desperta-se o apego as coisas. Sem qualquer controle, rodopi rodo pia-se a-se tal como co mo uma uma roda d’água. d’á gua. À compai compaixão xão para com estes seres vagueadores, eu me curvo”. curvo”. 29 Bhumi 29 Bhumi significa nível, estágio. O caminho do bhodhisattva tem dez bhumis, ou níveis. A realização do décimo bhumi é a iluminação completa, ou seja, aqui o bodhisattva se torna um Buda.
O mantra do coração da Prajna Paramita Vamos discutir o mantra da Prajna Paramita. O texto diz: “O mantra da perfeição da sabedoria é recitado assim: Tadyatha om gate gate paragate parasamgate bodhi svaha!”. “Tadyatha” significa “é assim”.30 assim”.30 “Gate gate” significa “atravesse, atravesse”, no caso, atravesse os conceitos dualistas e a ignorância. “Paragate” significa “atravesse para o outro lado”, ou seja, não apenas “vá”, mas “vá além” dos conceitos dualistas e da ignorância.31 ignorância.31 “Parasamgate” significa “atravesse plenamente”, pois até os arhats – que não possuem realização plena – não devem parar, mas ir adiante como aqueles que seguem o caminho do bodhisattva. “Bodhi svaha” significa que, uma vez que tenha atravessado, você se tornará “bodhi”, que significa “iluminado”.32 “iluminado”.32 Essa é uma versão das explicações explicações do mantra. mantra. Existe outra maneira de traduzir, conforme os cinco estágios da iluminação dos ensinamentos do Mahayana. O primeiro estágio é a acumulação de mérito, quando o praticante possui forte desejo de superar o sofrimento e renunciar à vida mundana. O segundo estágio é a conexão, ou aplicação, o caminho da sabedoria para reconhecer shunyata, em que o praticante começa a meditar e adquire conhecimento conhecimento analítico sobre sobr e shunyat shunyata. a. O primeiro prim eiro “gate” do mantra refer e-se ao primeiro prim eiro estágio estágio,, o da transição do desejo de superação do sofrimento de um ser humano comum ao caminho da acumulação acumulação de mérito. mér ito. O segundo “gate” refere-se refer e-se ao segundo estágio, o da tr tr ansição ansição do caminho da acumulação acumulação ao caminho da conexão conexão ou o u aplicação. aplicação. O terceiro estágio é o caminho da visão, sendo também o primeiro bhumi, quando o bodhisattva pratica meditação samadhi profunda sobre a natureza da realidade e realiza shunyata. No mantra, “paragate” corr esponde a esse estágio estágio.. O quarto estágio, o caminho da meditação ou familiarização, abrange do segundo ao décimo bhumi, quando o bodhisattva purifica gradualmente sua experiência e aperfeiçoa ainda mais sua realização através do cultivo e da familiarização. Esse estágio é representado no mantra pelo termo “parasamgate”. Do segundo ao décimo bhumi, temos estágios de familiarização, em que o
bodhisattva-mahasattva se familiariza com a prática. Se você não se familiarizar com a prática, voltará ao antigo estilo de vida, às antigas conceitualizações. No caso dos bodhisattvas, após terem atingido o nível de realização do primeiro bhumi, ainda que não retornem à experiência ordinária dos seres, eles também têm que continuar a se familiarizar e se aprofundar com shunyata para r ealizar a iluminação completa. completa. O quinto quinto estágio, que represent r epresentaa a realizaçã r ealizaçãoo do décimo bhumi, é o caminho do não mais aprender, ou a consumação, quando o bodhisattva já se purificou e se realizou por completo. O termo “bodhi svaha” do mantra corresponde a essa parte do quinto estágio. No décimo bhumi, o bodhisattvamahasattva se torna um Buda. Portanto, o termo “bodhi svaha” do mantra se refere à consumação da iluminação. Há também uma terceira explicação sobre o mantra. Em alguns ensinamentos se diz “Tadyatha” e a seguir “om gate gate paragate parasamgate bodhi svaha”. A síbala mântrica “om” contém o som de três letras distintas: “A”, “U” e “M”, que representam o corpo, a fala e a mente. “A” representa a mente iluminada. “U” representa a fala iluminada. “M” representa o corpo ou forma iluminada. Outro modo de descrever é que “A” representa o Buda como a mente iluminada, “U” representa o Dharma como a fala iluminada e “M” representa a forma iluminada da Sangha.33 Sangha.33 Nessa formulação, o primeiro “gate” se refere a destruir a maneira ordinária de ver as coisas, destruir a crença de que de que todos os fenômenos existem de modo independente. O segundo “gate” se refere à visão não dualista, ver sem ver, ver a verdadeira natureza das coisas, que surge após a destruição da crença na existência independente dos fenômenos. “Paragate” significa atravessar o samsara como fazem os arhats. “Parasamgate” significa atravessar plenamente e além, como fazem os bodhisattvas. “Bodhi svaha” significa atingir a iluminação total de corpo, fala e mente. Em outras palavras, o iluminado atingiu maestria e completa realização experiencial da Prajna Paramita. Dessa maneira, toda atividade atividade,, seja pacífica ou irada, ir ada, será benéfica para todos os seres sencientes. sencientes. Existem várias versões diferentes do Sutra da Prajna Paramita, com tamanhos variados. A mais longa tem 100 mil estrofes,34 estrofes,34 a a média tem 25 mil estrofes,35 estrofes,35 e e a curta tem oito mil estrofes.36 estrofes.36 Uma versão ainda mais curta é o Sutra do Coração aqui abordado. E a versão supercompacta está encapsulada na letra sânscrita “a” (pronunciada “ah”). A letra “a” é usada como prefixo de negação no sânscrito e na maioria dos outros idiomas indianos. Por exemplo, “sambhava” significa “nascido” e “asambhava” significa “não nascido”. Na versão em sânscrito do Sutra da Prajna Paramita, existem trechos onde se usa a palavra “anirudh”, que significa “não cessante” ou “incessante”. O prefixo “a” nesse contexto implica a negação da existência, ou seja, abrange o significado da negação da existência inerente e independente de causas e condições. É por isso que em algumas práticas de sadhana você primeiro visualiza a deidade, depois se
familiariza com a natureza e qualidades da deidade por meio da recitação do mantra, a seguir visualiza a dissolução das projeções da deidade em sua mente, e por fim diz a palavra “Ah” e relaxa na natureza de sua mente. Assim, a palavra “Ah” usada nas práticas também contém todo o significado do Sutra do Coração da Prajna Paramita, que é shunyata, a vaziez de onde a deidade surge, surg e, onde ela permanece e para para onde o nde ela vai vai depois que se dissolve. Vamos encerrar com a discussão do trecho: “‘Shariputra, é dessa maneira que um bodhisattva mahasattva deve treinar na profunda perfeição da sabedoria.’ Então, o Bem-Aventurado retornou de seu samadhi e louvou o bodhisattva mahasattva, o Poderoso Senhor, o Nobre Avalokiteshvara, dizendo que isso é excelente. ‘Excelente! Excelente! Ó filho desta família, é assim mesmo; é assim que deve ser. Deve-se praticar a profunda perfeição da sabedoria exatamente como você mostrou. Dessa Dessa maneira até os tath tathagatas agatas se regozijarão rego zijarão’”. ’”. Por que o Buda diz “é assim mesmo”? Porque o que Avalokiteshvara diz está correto. “É assim que deve ser” significa que até o Buda entende e realiza exatamente assim. Por isso deve-se praticar a Prajna Paramita exatamente como ela foi revelada por Avalokiteshvara, e os tathagatas se regojizarão. Tathagata é aquele que foi além, que realizou a natureza da mente. Você se torna um Buda pela percepção da natureza iluminada, que é a verdadeira natureza. Tathagata às vezes é uma forma for ma abreviada de se referir referi r também também à natureza natureza de Buda Buda de todos todos os seres. ser es. “Quando o Bem-Aventurado proferiu essas palavras, o Venerável Shariputra, o bodhisattva mahasattva, o Poderoso Senhor, o Nobre Avalokiteshvara, junto com toda a assembleia, inclusive o mundo dos deuses, humanos, asuras e gandharvas, todos se regozijaram e saudaram o que o BemAventur ventur ado havia dito. dito .” Isto Isto conclui co nclui o sutra. Depois de tudo isso, devemos praticar. Acontece que, no fim das contas, não importa o quanto você aprenda, você nunca saberá 100% enquanto não experimentar por si mesmo. O quanto você realmente entende depende de sua prática. Se os Budas pudessem ajudar, lançando você dentro do paraíso, eles o fariam. Eles são bondosos. Infelizmente, nem eles podem fazer isso. Eles não podem fazer isso por você. Podem apenas apenas lhe mostr mostr ar o caminho. Assim, dentro dentro de nosso próprio pró prio nível, devemos devemos praticar para realizar r ealizar nossa iluminação.
30 Também “deste modo” ou “desta maneira”. Kunkhyen Pema Karpo em seu comentário sobre o Sutra do Coração diz que, quando 30 Também citado no início, “tadyatha” indica que o mantra é um vidya mantra, ou seja, um mantra da visão desperta, tais como os vidya mantras das deidades masculinas e femininas do veículo do mantra secreto, o Vajrayana. No mantra secreto, os vidya mantras são usados com a função função de despertar vi v idya, dya , ou o u seja, profundo profundo conhecimen conhecimento, to, insight nsight e vi v isões experienciai experienciaiss da d a real idade. dad e. 31 Com 31 Com relação a “paragate”, Kunkhyen Pema Karpo diz que “para” (para o outro lado, para além) significa o lado em relação ao qual “não há nada mais elevado”. E “gate” (ir, atravessar) significa cultivar e familiarizar-se com o verdadeiro significado do texto raiz do Sutra Sutra do Coração, que q ue é esse outro lado em relação ao qual não há nada mais mais elevado. elev ado. 32 O sânscrito “bodhi” significa “despertar” ou “estado desperto” e “svaha” signfica literalmente “que assim seja”. Outra forma de 32 interpretar bodhi svaha, diz Kunkhyen Pema Karpo em seu comentário, é o engajar-se no caminho da Prajna Paramita a partir da perspectiva de bodhi, o estado desperto, no qual toda e qualquer atividade é direcionada para o benefício e alívio do mal-estar, insatisfação e sofrimento de todos os seres. 33 Também 33 Também é interpretado como representação dos três kayas do Buda – dharmakaya (corpo da verdade), samboghakaya (corpo do completo desfrute) e nirmanakaya (corpo de manifestação). 34 A 34 A Perfeição da Sabedoria em 100 mil estrofes (sânscrito: shatasahasrika prajnaparamita; tibetano: shes rab kyi pha rol tu phyin pa stong phrag brgya pa). 35 A 35 A Perfeição da Sabedoria em 25 mil estrofes (sânscrito: ashtadashasahasrika prajnaparamita; tibetano: shes rab kyi pha rol tu phyin pa stong). 36 A Perfeição da Sabedoria em oito mil estrofes (sânscrito: ashtasahasrika prajnaparamita; tibetano: shes rab kyi pha rol tu phyin pa 36 brgyad stong pa). pa).
Glossário Amitabha (‘od dpag med, em tibetano):
Literalmente, “Radiância Imensurável”. É um dos Budas Sambhogakaya das cinco famílias de Buda, de cor vermelha, associado à direção oeste, pertencendo à família Padma, ou Lótus. As práticas r elacionadas a Amitab Amitabha ha enfatizam enfatizam a transfor mação de desejo e apego em sabedor sabedoria ia discriminat discrim inativa. iva. Arhat (dgra bcom pa, em tibetano):
O termo em sânscrito significa, sig nifica, literalm literalment ente, e, “digno de r everência”, ou seja, “reverendo”. De De acordo acor do com a tradução para a língua tibetana, significa o “destruidor do inimigo”. É aquele que derrotou (bcom pa) o inimigo (dgra) das aflições mentais do orgulho, inveja, ódio, delusão e desejo, libertando-se da existência existência cíclica e atingindo o nirvana. De De acordo acor do com co m o Mahayana, ahayana, a realizaçã r ealizaçãoo de um arhat é obtida por meio do veículo dos ouvintes (shravaka), que tem como meta o caminho da liberação individual individual (prat (pr atikmoksha). ikmoksha). phyug, em tibetano): Avalokiteshvara (spyan ras gzigs dbang phyug, O sânscrito Avalokiteshvara significa, literalmente, “o soberano que mira os mundos”. Também Avalokita (Zelador Universal), Padmapani (Portador do Lótus), Lokeshvara (Soberano Universal) e Mahakarunika (Grandiosa Compaixão). Como o nome sugere, ele é o “senhor que lança um olhar sobre o mundo com um interesse compassivo”. Portanto, é frequentemente chamado de o Buda ou o bodhisattva da Compaixão. Quando visto como bodhisattva, é um dos oito principais e mais próximos bodhisattvas discípulos do Buda. Avalokiteshvara fez um grande voto de escutar as preces de todos os seres em momentos de dificuldade. Para efetuar isso, assumiu um compromisso adicional: não não atingir o estado estado búdico final até todos os seres estarem liberados l iberados da existência existência cíclica e não haver mais nenhum ser no samsara. Devido a esse grande voto compassivo, é considerado a corporificação da Grande Compaixão. Ele vem em diferentes formas, algumas pacíficas, como Arya Avalokiteshvara (Nobre Avalokiteshvara, a forma principal), Ekadashamukha (Avalokiteshvara de 11 Faces, com faces adicionais para ensinar nos dez planos de existência), Sahasrabhuja Saharasnetra
(Avalokiteshvara de Mil Braços e Mil Olhos, que vê e ajuda a todos), Cintamani Chakra (Avalokiteshvara tal como uma Joia que Realiza Desejos, aquele que segura a cintamani, joia realizadora de desejos), e algumas formas iradas, como Hayagriva (Avalokiteshvara com Cara de Cavalo, que tem a habilidade de curar doenças, especialmente as causadas por nagas) e Mahakala (Grande Negro, protetor irado do Dharma). Naropa, um mahasiddha indiano, e suas reencarnações, incluindo Gampopa, todos os Gyalwang Drukpas, como também os Dalai Lamas e suas várias encarnações, são considerados manifestações autênticas de Avalokiteshvara. Bhikshu (dge slong, em tibetano):
Em sânscrito, significa “mendicante espiritual”. Em tibetano significa, literalmente, “mendicante virtuoso”, não só no sentido de ser um praticante da virtude, mas também de mendigar pelo bom coração e virtude de outros, ou seja, proporcionar que o outro cultive a virtude ao satisfazer a necessidade básica do renunciante, através da generosidade. De forma geral, é um monge budista plenamente plenamente ordenado. o rdenado. Bhikshuni (dge slong ma, em tibetano):
Feminino de bhikshu, uma monja budista plenamente ordenada. Bhumi (sa, em tibetano):
Cada um dos dez níveis o u estágios estágio s de bodhisattva na tr tr adição Mahayana. Bodhicitta (byang chub kyi sems, em tibetano):
A mente do despertar. É definida como a mente que se dirige a atingir a iluminação completa para o benefício de todos os seres. É dividida em bodhicitta ficcional e bodhicitta real. A bodhicitta ficcional é subdivida em bodhicitta da aspiração e bodhicitta da aplicação. Na bodhicitta da aspiração, cultivase as quatro qualidades imensuráveis da compaixão, amor, alegria e equanimidade. Na bodhiccita da aplicação, cultiva-se as seis paramitas da generosidade, disciplina ética, paciência, esforço jubiloso, estabilidade mental e sabedoria. A bodhicitta real compreende a realidade última, a união de compaixão e sabedoria em seus aspectos de luminosidade e espacialidade, e a inseparabilidade entre aparência e vaziez. Bodhisattva (byang chub sems dpa’, em tibetano):
Literalmente, “guerreiro do despertar”, aquele que baseia toda a sua prática espiritual sobre a fundação de bodhicitta e segue o caminho Mahayana das seis paramitas, com a intenção de levar todos os seres à iluminação. Há os bodhisattvas em treinamento, que são aqueles que seguem o caminho espiritual Mahayana baseados no cultivo de bodhicitta, e há os autênticos bodhisattvas, que são aqueles que realizaram bodhicitta (mente do despertar) e shunyata (vaziez) diretamente e penetraram penetraram no pr imeiro imeir o bhumi bhumi (nível) dos do s bodhisattvas bodhisattvas no caminho Mahayana. ahayana. Buda (sangs rgyas, em tibetano):
Literalmente, o Desperto ou o Iluminado. Na língua tibetana, um ser plenamente iluminado, que desper desper tou do sono da ignor ância (sangs) (sangs) e consumou co nsumou a realização, os o s potenciais potenciais e as qualidades qualidades desse despertar de forma perfeita e completa (rgyas). Na literatura Mahayana, Buda algumas vezes referese ao Buda histórico, Siddhartha Gautama ou Buda Shakyamuni, e outras vezes à natureza de Buda, à cidadela ou ao útero do Buda (tathagatagarbha), de onde todos os seres iluminados surgem e onde residem, além de espaço, tempo, nome e forma. Esse é o primeiro objeto de refúgio entre as Três Joias – Buda, Dharma e Sangha. Dharma (chos, em tibetano):
O segundo objeto de refúgio, os ensinamentos do Buda, a verdade última, o caminho que leva à iluminação. O Dharma, em meio aos seus diversos significados, é uma das Três Joias (tib. dkon mchog gsum), a Joia do Dharma (tib. chos dkon mchog). É também uma das Seis Joias (tib. mkon mchog drug). O objeto (sânsc. Dharma; Dharma; tib. tib. chos) chos) é um dos do s “seis objet o bjetos” os” (tib. yul yul drug) dr ug) conhec co nhecidos idos pelas “seis consciências (tib. rnam par shes pa drug) pela mediação das “faculdades sensoriais” (tib. dbang po drug). Dharma é um dos “12 ayatanas” (tib. skye mched bcu gnyis), que são as fontes da consciência. Dharma é um dos “18 dhatus” (tib. khams bco brgyad), que são as bases para a consciência. No Tripitaka, Tripitaka, no gr g r upo de textos textos do Abhidharma, Abhidharma, Dharma é definido definido como “aquilo “aquilo que é o objeto da mente” (tib. yid kyi yul), que recebe impressões cônscias. Em outras palavras, significa especificamente o objeto (tib. yul) conhecido pela consciência mental (tib. yid kyi rnam par shes pa) por meio do “poder sensorial mental” (tib. yid kyi dbang po). No Abhidharma, dharmas são explicados como qualquer coisa que possa vir a ser conhecida pela consciência da mente. A palavra sânscrita Dharma provém da raiz “dhr”, que significa “suportar”, “apoiar”, “segurar”, “manter”. O termo Dharma é classificado como possuindo dez diferentes significados (tib. chos kyi don bcu). Vasubhandu, em seu tratado Vyakhya Yukti Yukti (tib. rnam par bshad pa’i rig pa), classifica esses dez significados da seguinte forma: (1) conhecível (tib. shes bya), (2) caminho (tib. lam), (3) nirvana (tib. nya ngan ‘das pa), (4) objeto mental (tib. yid kyi yul), (5) mérito (tib. bsod nams), (6) vida (tib. tshe), (7) ensinamento espiritual (tib. ssung rab), (8) objetos materiais (tib. ‘byung ‘gyur), (9) r egulação/preceitos (tib. nges), (10) religião/tradição relig ião/tradição espir itual itual (tib. chos lugs). Dharmakaya (chos sku, em tibetano):
Um dos três corpos do Buda, o corpo da verdade, a verdadeira natureza de buda, que é a realidade transcendental e a verdade última. Guru (bla ma, em tibetano):
Um mestre espiritual. O termo “guru” surgiu no Rigveda como um adjetivo utilizado para indicar algo “pesado”, seu oposto seria “laghu”, “leve”. O termo detém um lugar especial no hinduísmo, significando “um lugar sagrado do conhecimento” (jnana) e aquele que confere o conhecimento. O
adjetivo significa “pesado, de peso, profundo” e é usado no sentido de “repleto de conhecimento”, “repleto de sabedoria espiritual”, “repleto de boas qualidades, como falam as escrituras, e de autorrealização”, “repleto de conhecimento e sabedoria”. Uma outra notável interpretação etimológica do termo “guru”, encontrada nos Upanishads, baseia-se na representação metafórica da escuridão e da luz, na qual o guru é visto como aquele que dissipa a escuridão. Em alguns textos a sílaba “gu” é descrita como “escuridão” e “ru” como “luz”, ou seja, mudando da escuridão para a luz, respectivament respectivamente, e, abrangendo assim um campo semântico e etimológico etimoló gico da palavra pro fessor. No No budismo tibeta tibetano no o sânscrito gur u foi traduzido traduzido como co mo “lama”. “La” “La” significa “elevado” em termos de realização espiritual e sabedoria transcendente. “Ma” significa compaixão maternal, como a de uma mãe por seu filho. Na união da sabedoria e da compaixão, um lama tem a capacidade de guiar espiritualmente outros seres, tendo-os em grande estima e compaixão, como se fossem seus próprios filhos. (rgyal dbang, em tibetano): ti betano): Gyalwang (rgyal “Soberano entre os vitoriosos”, título honorífico do detentor supremo da Linhagem Drukpa, S. S. Gyalwang Drukpa e de outras linhagens, tais como Gyalwang Rinpoche (S. S. o Dalai Lama) e Gyalwang Karmapa (S. S. o Karmapa). Vitorioso, nesse contexto, refere-se aos seres espiritualmente r ealizados e vitori vitorioso ososs frente à ignorância igno rância e às aflições menta mentais. is. Mahamudra (phyag rgya chen po, em tibetano):
Literalmente, Literalmente, “Grande Selo”, um dos do s ensinamentos ensinamentos profundos pr ofundos do Vajrayana para se obter introdução direta dir eta à natureza natureza e à essência da mente. Mahayana (theg pa chen po, em tibetano):
O “veículo universal” ou “grande veículo”, seguido pelos guerreiros do despertar (ou bodhisattvas), que leva ao fruto da consumação de um Buda perfeito e completo (ou Samyaksambuddha). Envolve a prática de bodhicitta, em que a liberação do indivíduo é em favor da liberação de todos os seres, como também o cultivo progressivo do entendimento e experiência de shunyata, a natureza vazia, porém por ém luminosa, de todas as coisas. Manjushri (‘jam dpal, em tibetano):
Bodhisattv Bodhisattvaa da Grande Gr ande Sabed Sabedor oria, ia, um dos oito principais e mais próximos pró ximos bodhisat bo dhisattv tvas as discípulos do Buda. Literalmente, significa suave ou gentil (‘jam) glória (dpal). Também conhecido como Manjushri Kamarabhuta (A Juvenilidade da Glória Gentil) ou Manjughosha (Suave Melodia). É também o Buda da Sabedoria, a corporificação do discernimento transcendental. Sua tradição descende descende e foi transmitida transmitida a partir do grande g rande mestre indiano Nagarjuna Nagarj una (séc. (séc. 2). 2). Mantra (sngags, em tibetano):
A raiz “man” provém do sânscrito manas, que significa “intenção” ou “direcionamento mental”,
enquanto o sufixo “tra” exprime um instrumento de enganchar, um recurso de “acionamento” que protege a mente. Um mantra é uma proteção mental expressa através de uma série de sílabas místicas que invocam a energia de um Buda ou bodhisattva. A repetição (sânsc. japa) de mantras no Vajrayana é tão importante que o budismo esotérico também é chamado de Mantrayana, o Veículo do Mantra. Existem também os dharanis, mantras mais longos, e as sílabas semente (sânsc. bija), que sintetizam a essência da mente iluminada ou da natureza última da realidade. Milarepa (10401123) (mi la ras pa, em tibetano):
Um dos mais famosos e respeitados iogues e poetas da história do budismo tibetano. Principal discípulo de Marpa, obteve a iluminação em uma única vida. Entre suas obras, está a renomada Cem Mil Canções de Milarepa Mi larepa.. ti betano): Nirvana (mya ngan las ‘das pa, em tibetano): A extinção do samsara, cessação permanente do sofrimento samsárico e, por conseguinte, obtenção da bem-aventurança, e liberação da existência cíclica e das emoções aflitivas, como também de suas causas. Na língua tibetana foi traduzido como a transcendência de todo o mal-estar. rol tu phyin pa, em tibetano): Prajna Param P aramita ita (pha rol Perfeição da Sabedoria ou Discernimento Transcendental. É o coração da realização do Buda, o ensinamento sobre a onisciência completa, associado ao segundo giro da roda do Dharma ensinado pelo Buda em Rajgir, na Índia. Também se refere ao conjunto de sutras Mahayanas da literatura da Prajna Paramita. Quatro Nobres Verdades (catvaryaryasatya, em sânscrito, ‘phags pa’i bden pa bzhi, em tibetano):
O mal-estar, sofrimento e insatisfação, sua origem, cessação e caminho para a cessação. Esse ensinamento foi oferecido pelo Buda Shakyamuni em seu primeiro discurso, conhecido como Sutra do Colocar em Movimento a Roda do Dharma. Dharma. Refúgio (sarana, em sânscrito, skyabs, em tibetano):
Fonte de refúgio, abrigo e proteção, lugar de confiança, objeto de apoio. Tomar refúgio no budismo significa tomar refúgio refúgi o nas Três Jo ias, isto é, no Buda, Buda, no Dhar Dhar ma e na Sangha. Sangha. Sadhana (sgrub thabs, em tibetano):
Literalmente, “meio de consumação”, um método de se realizar algo. Em geral, refere-se a uma prática tântrica em relação a uma deidade central e sua mandala, empreendida em busca de realização e poderes espirituais (siddhis, em sânscrito). Um guia ou manual de prática espiritual para transcender o ego, realizar a união de compaixão e sabedoria e atingir o despertar da iluminação completa. Samantabhadra (kun tu bzang po, em tibetano):
Literalmente, Literalmente, significa “todo-bondoso” “todo-bo ndoso” ou “bom por completo”. Por Portan tanto, to, “Perfeito”. Bodhisat Bodhisattv tvaa da Virtude Universal e Grande Conduta, a personificação da vasta e profunda conduta do Mahayana. Samantab Samantabhad hadrr a é um dos oito o ito principais pr incipais e mais pr óximos óximo s bodhisattvas bodhisattvas discípulos discípulos do Buda. Como um Buda, Buda, ele representa o princípio primor primo r dial de onde surgem todos todo s os Budas (ou o Adhi Buddh Buddha). a). Sangha (dgen ‘dun, em tibetano):
Comunidade espiritual. Em tibetano, significa literalmente os “aspirantes” (‘dun) da “virtude” (dge) ou “motivados pela virtude”. É o terceiro objeto de refúgio entre as Três Joias – Buda, Dharma e Sangha. Em sentido estrito, consiste de monges e monjas, mas no sentido mais amplo também inclui a comunidade com unidade budista budista dos bodhisatt bo dhisattvas vas e a comunidade com unidade budista budista laica. Shakyamuni, Buda (séc. 5 a.C.) (sh’akya thub pa, em tibetano):
Literalmente “o sábio dos Shakyas”, fundador do budismo. Nasceu em Lumbini com o nome de Siddhartha Gautama e foi criado no pequeno reino de Kapilavastu, ambos localizados no atual Nepal, perto da fronteira com a Índia. Seu pai era o rei Suddhodana, do clã Shakya, e sua mãe era a rainha Mayadevi, uma princesa Koliya. Na noite da concepção, a rainha Mayadevi sonhou que um elefante branco com seis presas havia penetrado seu corpo pelo flanco direito. Dez meses mais tarde, seu filho nasceu enquanto ela viajava para o reino de seu pai para dar à luz, conforme o costume da época. O menino mais tarde foi casado com sua prima Yasodhara, e eles tiveram um filho, Rahula. Aos 29 anos de idade, após ver o sofrimento samsárico na forma da velhice, da doença e da morte, ele decidiu renunciar ao reino e buscar a superação do samsara por meio de práticas ascéticas. Por seis anos, praticou ascetismo extremo na companhia de cinco ascetas. Posteriormente descobriu o Caminho do Meio, um caminho de moderação, afastado dos extremos da autoindulgência e da automortificação. Abandonou a automortificação e, após meditar sob a árvore bodhi, atingiu a iluminação suprema aos 35 anos de idade, tornando-se conhecido como Buda Shakyamuni, ou “O Desperto do Clã dos Shakyas”. Ensinou por 45 anos, viajando pela planície do Ganges, que hoje se estende por Uttar Pradesh e Bihar, na Índia e no sul do Nepal. A crença espiritual fundada por ele se tornou conhecida como budismo, sendo aberta a todas as raças e classes, sem estrutura de castas. O Buda teve um leque variado de discípulos e devotos, de nobres a párias. Aos 80 anos de idade, entrou no parinir vana, vana, deixando deixando seu corpo, corpo , que foi cr emado por seus discípulos. discípulos. Shunyata (stong pa nyid, em tibetano):
No decorrer decor rer dos discurso s do Buda Buda na literatura Mahayan Mahayana, a, um elemento previamen pr eviamente te não enfatizado enfatizado pela tradição mais antiga foi adicionado, indicando tanto a noção da “ausência” ou “vazio” (shunya, em sânscrito) de um “si” (sânsc. atman). A raiz substantivada do termo conota o próprio vazio/ausência em si próprio ou vacuidade/vaziez (sânsc. shunyata). O sânscrito shunya ocupa o campo semântico “zero”, ou seja, a ausência de qualquer coisa, o “nada”. Sua forma substantivada é
shunyata, conotando o ponto “zero”, ou melhor, a própria “ausência” em si, dando sentido para os termos “vacuidad “vacuidade”, e”, “vaziez” “vaziez” e “nada”. Quando Quando buscamos buscamos analisar as r aízes etimológicas etimológ icas da palavra, podemos refletir sobre o termo shunyata separando suas sílabas: shu-nya-ta. A raiz sânscrita “shu” denota “expandir”, “crescer”, “avolumar-se”, “ter saliência”, “intumescer”. A raiz sânscrita “nya” denota “estado de”, como em “dainya”, significando um “estado aflitivo/miserável”. “Consistir”, “oferecer” ou “conceder”, como em dhanya, significando “fortuna/riqueza”, no sentido de ser “constituída” de tais qualidades e, portanto, capaz de “oferecer/conceder” tais características. Também “pertencer a”, “fazer parte de” ou “estar relacionado com”, como em “janya”, significando pertencer a uma mesma família, raça ou país, em contraste com o antônimo “anya”, que significa “sem relação”, r elação”, “oposto”, “diferente de”. Portanto, poderíamos traçar para shunya algo como um “estado/natureza expansível/avolumado/grande”. Talvez então possamos encontrar alguma relação com um “espaço vazio”, originando a noção de “ausência”, como em “shunya-vajin” (um [cavalo] sem cavaleiro), “shunya-rajya” (um [reino] sem rei) ou “shunya-bhava” (“ausência de existência”). Pode significar “despr “despr ovido”, como co mo em “bhava-shun “bhava-shunya” ya” (despro (desprovido vido de afeição, apego), “lajja-shunya” “lajja-shunya” (desprovido (despro vido de vergonha) verg onha) ou “hetu-shu “hetu-shunya” nya”,, “desprovido de razão”. r azão”. Também Também pode significar sig nificar “destitu “destituição”, ição”, como com o em “muska-shunya” (destituído de testículos), “vrksa-shunya” (destituído de árvores) ou “sarashunya” (“destituído/desprovido/carente de valor”). Traz a noção de “vazio” em “shunya-geha” (casa vazia), “shunya-madhya” (cavidade central ou centro vazio), “shunya-pala” (proprietário de um lugar vago/vazio), “shunya-sala” (saguão vazio), “shunya-hasta” (de mãos vazias) e “shunyalaya” (“habitação vazia”). Em todos esses casos, o termo parece indicar a “ausência” do próprio objeto ao qual está servindo como adjetivo. Possuindo raiz nesse campo semântico, encontramos a palavra shunya significando também “nulo” e a própria cifra numérica “zero.” O afixo sânscrito “ta” tem o sentido de “estado de ser”, “condição” ou “natureza de”. Este transforma o termo raiz em um substantivo e reforça o sentido de “esta coisa”, “isto em si”. Gramaticalmente, funciona como um sufixo substantivador de um termo, tal como os sufixos “dade/são/ção” da língua portuguesa. Portanto, temos para shunyata a “ausência em si”, “vacuidade”, “vaziedade/vaziez”, “destituição”, “desprovimento”, “carência”, “falta”, “nulidade” e assim por diante. O grande pandita budista indiano Prasastrasena, Prasastrasena, em seu comentário sobre sobr e o Sutr Sutr a do Cor ação, intitulado intitulado Arya prajna paramita parami ta Hri Hridaya daya Tika, define dois tipos de shunyata: “Há dois tipos de shunya (vazio): o shunya (vazio) do espaço incomposto e o shunya (vazio) que, a partir da realidade real das coisas (paramartha), é [o aspecto] autoconhecedor individual, livre de um apreendedor e [daquilo que é] apreendido [, o qual é r econhecido] econhecido] a partir do conhecimento conhecimento primor pr imor dial. Quanto Quanto aos ao s cinco agregados, agr egados, o que é visto visto é vazio livre livr e de apreendedor apreendedor e apreendido. Esse Esse é o significado do que é conhecido conhecido como co mo tal tal [vazio].” [vazio].”
ti betano): Seis Param Par amitas itas (pha rol tu phyin pa drug, em tibetano): A prática Mahayana principal do bodhisattva. Também são conhecidas como as Seis Perfeições ou Seis Transcendentais, a perfeição de seis qualidades: generosidade, disciplina ética, paciência, esforço esfor ço jubiloso , estabilidad estabilidadee mental mental e sabedor sabedoria ia ou discernimento. Súplica (gsol ba ‘debs pa, em tibetano):
Literalmente, uma prece, pedido ou solicitação rogado a um Buda, bodhisattva, deidade meditacional, protet pro tetor or do Dharma ou mestre espiritual. Sutra (mdo, em tibetano):
Os discursos do Buda de acordo com os três giros da roda do Dharma. Tara: (sgrol ma, em tibetano):
Literalmente, “Libertadora”. O nome deriva de sua qualidade especial provinda de aspirações feitas em uma vida passada frente ao Buda, de se manifestar continuamente em corpo feminino como um princípio de liberação. Há 21 aspect aspectos os diferentes diferentes de Tara, cada um com atributos atributos particulares, nome, mudra, r oupas, mantr mantr a e qualidades qualidades específicas. específicas. Vajrayana (rdo rje theg pa, em tibetano):
Veículo do Diamante indestrutível, ou Veículo Adamantino Secreto, em geral sinônimo de Mantrayana (Veículo do Mantra) e Tantrayana (Veículo do Tantra). Tem o nome de Veículo do Diamante porque é o caminho de realização da natureza adamantina indestrutível, a essência da mente, e almeja realizar essa essência clara e imutável da realidade (natureza de Buda), conforme simbolizado pelo vajra (diamante) que é a base de tudo. É chamado de caminho do mantra secreto devido à estrutura singular, que contém práticas internas, externas e secretas (não visíveis). Foi desenvolvido a partir do budismo Mahayana, mas abrange os três yanas (Hinayana, Mahayana e o próprio Vajrayana). Enfoca o entendimento da realidade relativa e da realidade absoluta, a união entre as duas verdades – ficcional e real. A verdadeira natureza do mundo fenomenal é a vaziez, e a partir e inseparavelmente dessa vaziez o mundo fenomenal aparece. A vaziez não é “vazia”, um nada, e sim r epleta epleta de grandes g randes qualidades qualidades e grande g rande potenciais presentes presentes em nossa no ssa verdadeira natureza. natureza. Este glossário gloss ário foi gerado pelo projeto Dharma Enciclopédia, Encicl opédia, formado por um grupo de tradutores tradut ores e rofessores brasileiros do Dharma das principais tradições e línguas pelas quais os ensinamentos foram originalmente compilados compilados – como o páli, sânscrito, chinês chi nês e tibetano. tibet ano. www.dharma.org.br
Lama Lama Jigm Jig me Lhawang Lhaw ang Lama Jigme Lhawang, responsável pela edição e revisão dos ensinamentos contidos em “A lua no espelho”, é o fundador e diretor espiritual da Comunidade Budista Drukpa Brasil e o presidente de Honra do Instit Inst ituto uto Live to Love Brasil, Brasil, a representação brasileira do Live do Live to Love Foundation, Foundation, uma organização humanitária presente em mais de 17 países. Lama Jigme iniciou seu treinamento no budismo aos 14 anos de idade, em 1995, em Porto Alegre, sua cidade natal. Em 2003 viaja para a Índia com o intuito de continuar seu treinamento no budismo. Em janeiro de 2004 recebe sua ordenação laica por S.S. Dalai Lama e em fevereiro de 2004 é ordenado monge por S.S. Trulshik Rinpoche, o líder e autoridade máxima da Linhagem Nyingma do Budismo Tibetano, já falecido. Em 2012, é ordenado um lama (professor espiritual) pelo líder e autoridade máxima da Linhagem Drukpa, S.S. Gyalwang Drukpa, que o nomeou como o guia espiritual responsável pela comunidade Drukpa Americas, os centros e grupos ligados a S.S. Gyalwang Drukpa no continente americano. Formado com bacharelado em Estudos Budistas e Línguas Himalaicas pela Kathmandu University, atua atua como tradutor tradutor oral or al e literário literár io da língua líng ua tibet tibetana. ana. É especialist especialistaa na área do equilíbrio emocional emocio nal e do cultivo da atenção plena e é professor formado e autorizado pelo Cultivating Emotional Balance (Cultivo do Equilíbrio Emocional), um programa de formação baseado em evidências científicas criado cr iado pelos pel os pr ofessor ofess or es Dr. Paul Ekman e Dr. Dr. B. B. Alan Wallace. Wallace.
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