A Existência de Deus Através da Ciência – Refutando o Ateísmo – Parte 2
Ciência e Religião são rivais?
Um pouco de ciência nos afasta de Deus. Muito, nos aproxima. (Louis Pasteur) A ciência não é só compatível compatível com com a espiritualidade; espiritualidade; é uma profunda profunda fonte de espiritualidade. (Carl Sagan) Motivação:
A metafísica, ramo fundamental da filosofia, está incluída no conceito de ciência? 2. Religião e superstição são a mesma coisa? 3. O positivismo, ou cientificismo, é coerente com a própria existência da ciência? 4. Acreditar em Deus é o mesmo que acreditar no Coelhinho da Páscoa? 5. O que é a “guerra entre ciência e religião”? 6. O ateísmo pode coexistir com a moralidade e a razão? 7. É verdade que a argumentação filosófica básica a favor da existência de Deus, da imortalidade da alma e da moralidade baseada na lei natural é bastante simples? 1.
O argumento cosmológico afirma que “tudo tem uma causa, logo o universo tem uma causa, a saber, Deus”? Ora, se tudo tem uma causa, então o que causou Deus? 9. O que os filósofos queriam dizer quando afirmaram que a moralidade depende da religião? Significa que Deus arbitrariamente decide ordenar uma coisa ou outra, “só porque ele tá a fim”? E a única razão para obedecer é o medo do inferno? 10. É possível ser ateu e naturalista e, ao mesmo tempo, ter uma justificativa racional cogente para crer na moralidade ou racionalidade? 11. É possível continuar sendo ateu após compreender adequadamente tanto os pontos de vista religiosos como as dificuldades inerentes à própria posição de ateu? 8.
Bibliografia: 1.
A Última Superstição – Uma Refutação do Neoateísmo – Edward Feser
— Parte 2 — Antes de prosseguirmos para a demonstração da existência de Deus através da razão, mais precisamente da metafísica (do grego antigo μετα (metà) = depois de, além de tudo; e Φυσις [ physis] = natureza ou física), ainda preciso discutir algumas coisas. Prometo que valerá a pena e, mesmo que o leitor não compreenda os argumentos metafísicos em favor da existência de um Ente Supremo, no mínimo perceberá que a religião possui fundamentos filosóficos bastante sólidos, e não se apoia apenas em “fé cega”. Sabemos que a metafísica está incluída no conceito de ciência segundo Aristóteles. Além disso, apesar de alguns secularistas rejeitarem a validade da metafísica (o chamado positivismo ou cientificismo , como veremos depois), conseguirei demonstrar que a própria ciência empírica moderna não faria sentido sem a metafísica, pois esta é a única que pode dar validade para os próprios pressupostos da ciência empírica moderna. Falarei mais a respeito depois. Muitos secularistas gostam de igualar religião e superstição, quando na verdade a superstição não é religião em si, mas no máximo a corrupção da verdadeira
religião — assim como a tirania não é o governo em si, mas apenas a corrupção do governo, assim como o trabalho assalariado só muito remotamente e nas piores circunstâncias é comparável à escravidão e assim como a prostituição não é em nenhum sentido relevante nem remotamente comparável ao casamento, apesar de algumas analogias extremamente superficiais. Naturalmente, há pessoas que negam que essas diferenças tão óbvias sejam reais: marxistas, anarquistas, feministas radicais e outros frequentadores de favelas intelectuais que tomam por profunda argúcia a incapacidade de fazer as mais elementares distinções conceituais. Ao que parece, pode-se acrescentar a esses as fileiras dos “pensadores” secularistas. Quando os “neoateus” e outros da mesma laia garantem com toda a seriedade que acreditar em Deus é o mesmo que acreditar no Coelhinho da Páscoa, ou que o ensino religioso é equivalente à exploração infantil, lembram-me do calouro de filosofia que certa vez contou com orgulho sua “descoberta” de que não havia nenhuma diferença real entre chamar uma menina para sair e ligar para uma acompanhante, já que “é tudo uma questão” de dar algo em troca de sexo. Em ambos os acasos, propor tal análise é prova não de ter profunda compreensão filosófica, mas apenas de ser um jumento superficial e presunçoso. A tarefa dos próximos artigos é, portanto, mostrar que: 1. A pretensa “guerra entre ciência e religião” é na verdade uma guerra entre sistemas filosóficos ou metafísicos rivais, a saber, a cosmovisão clássica de Platão, Aristóteles e Tomás de Aquino de um lado e o naturalismo moderno de outro; 2. A cosmovisão naturalista, de que depende o secularismo – ou ateísmo –, torna a moralidade e a razão impossíveis, mas elas são perfeitamente compreensíveis na cosmovisão clássica, a única aliás em que são compreensíveis; e 3. O secularismo não pode, portanto, deixar de manifestar o irracionalismo e a imoralidade que atribui falsamente à religião, ao passo que a perspectiva religiosa consagrada no teísmo filosófico clássico não pode deixar de mostrar-se louvável para qualquer ser humano racional e moralmente digno que o compreenda corretamente, liberto das calúnias e das caricaturas vendidas pelos secularistas. Nada do que se segue requer do leitor conhecimento prévio de filosofia nem de história da filosofia, mas em alguns pontos a discussão ficará um pouco abstrata e técnica, embora, creio, jamais enfadonha, e a importância vital das abstrações e tecnicalidades ocasionais para lidar com problemas de religião, moralidade e
ciência oferecerá ampla recompensa ao leitor paciente. Em certo sentido, a argumentação filosófica básica a favor da existência de Deus, da imortalidade da alma e da moralidade baseada na lei natural é bastante simples. Porém, esses temas se tornaram cada vez mais obscurecidos a partir do momento em que os pensadores do pretenso “Iluminismo”, assim como seus predecessores, começaram a turvar o entendimento do homem ocidental, e atualmente a concepção que o cidadão médio (inclusive o intelectual médio) tem da religião é circundada por uma cortina de fumaça filosófica quase impenetrável de premissas não examinadas, falsidades, clichês, caricaturas, preconceitos, propaganda e confusão mental generalizada. É necessário considerável esforço intelectual para dissipar esta poluição cultural (pegando emprestado o feliz conceito criado por R. Emmett Tyrrell). Todo mundo “sabe” que o argumento cosmológico a favor da existência de Deus afirma que “tudo tem uma causa, logo o universo tem uma causa, a saber, Deus” e que é possível refutá-lo facilidade perguntando: “Bom, se tudo tem uma causa, então o que causou Deus?” – só que isto não é o que afirma o argumento cosmológico e nenhum dos filósofos que o defenderam – nem Aristóteles, nem Tomás de Aquino, nem Leibniz, nem nenhum outro – jamais cometeu uma falácia tão estúpida e óbvia. Todo o mundo “sabe” que afirmar que a moralidade depende da religião significa que Deus decide arbitrariamente ordenar uma coisa ou outra (“só porque ele tá a fim”, aparentemente) e a única razão para obedecer é o medo do inferno – só que dizer que a moralidade depende da religião não significa isto, pelo menos não no pensamento dos filósofos importantes que defenderam essa afirmação. E assim por diante. Para corrigir ideia tão disseminadas e enfadonhas, é necessário explicar como a tradição filosófica clássica entende o que é ser a “causa” de alguma coisa, o que significa descrever algo como “bom” ou “mau” e muitos outros tópicos filosóficos cuja compreensão foi enormemente distorcida pelos filósofos modernos e por seus sucessores. O que começou como má filosofia e propaganda antirreligiosa nos escritos de pensadores da Modernidade e do Iluminismo se cristalizou em uma espécie de pseudossenso comum, com mentiras e confusões tão profundamente imbricadas no pensamento contemporâneo, que poucas pessoas chegam a perceber que há alternativas a elas. Os pensadores secularistas, em geral, não conhecem nada que não seja
uma caricatura absurda das ideias religiosas tradicionais, ignoram completamente que exista algo além dessas caricaturas e assim não se dão ao trabalho de procurar nada além de espantalhos para atacar. Eles simplesmente não sabem do que estão falando e não sabem que não sabem. Se as coisas estão tão más com relação às pessoas que deveriam conhecer essas coisas — acadêmicos, escritores, filósofos, cientistas e outros intelectuais — não surpreende que o leitor culto médio seja tão ignorante quanto elas. O tratamento filosófico detalhado que darei ao longo destes artigos é, pois, imprescindível para que o trabalho seja feito adequadamente. O plano para os próximos artigos é passar um “curso intensivo” de história da filosofia ocidental, ainda que altamente seletivo, sendo nosso interesse tanto as tendências que levaram em direção ao que chamo de cosmovisão filosófica “clássica” subjacente à tradição religiosa ocidental como aquelas que se afastaram dela; investigar as principais ideias metafísicas de Platão e Aristóteles e de suas respectivas escolas de pensamento; e explicar como essas ideias foram desenvolvidas e utilizadas pelos pensadores escolásticos, especialmente Tomás de Aquino, para articular uma explicação sistemática abrangente da existência de Deus, da imaterialidade e imortalidade da alma e da base natural da lei moral. Acredito poder garantir isto: se fizer o esforço de entender as ideias contidas nestes artigos, mesmo que acabe não concordando comigo que a existência de Deus, a imortalidade da alma e a base da moralidade na lei natural são racionalmente inevitáveis, você vai entender como pessoas razoáveis podem estar convencidas disso. Além disso, quero enfatizar que não nego nem por um momento que haja ateus, secularistas e naturalistas bem-intencionados, que são (fora sua rejeição da religião) razoáveis e moralmente admiráveis. O que nego é que tenham ou possam ter – saibam eles ou não – qualquer justificativa racional cogente , sendo ateus e naturalistas, para crer na moralidade ou na racionalidade e também nego que possam racionalmente continuar secularistas, naturalistas ou ateus se vierem a compreender adequadamente tanto os pontos de vista religiosos que rejeitam como as dificuldades inerente à própria posição. É claro que não sou tolo a ponto de acreditar que não é possível que pessoas razoáveis deixem de concordar comigo depois de ler estes artigos. Por melhor que sejam seus argumentos e por mais corretas que sejam suas conclusões, não
se pode esperar que nenhum artigo, ou nenhum livro, por si só, qualquer que seja seu tema, convença todas as pessoas razoáveis, certamente não todas de uma vez, sozinho, ou depois de uma única leitura; o modo como nós seres humanos passamos a acreditar nas coisas, para o bem ou para o mal, é muito mais complexo que isso. (Não existem “balas de prata” na filosofia, assim como não existem no assassinato de Kennedy.) Ainda assim, rogo aos leitores secularistas que pelo menos considerem que o que tenho a dizer nestes artigos é apenas a ponta de um iceberg intelectual e que, se estudarem com profundidade as obras (sem dúvida muito melhores) de outros autores da tradição de pensamento que os meus argumentos representam, descobrirão que rejeitaram a religião com muita, muita pressa – e talvez tenham cometido um erro terrível ao fazê-lo. — Fim da parte 2 —