A construção do eu na Modernidade Da Renascença ao Século XIX Pedro Pedro Luiz Luiz Ribeiro de Santi
O cHoíoi.
ÊtUfom
V Que características deste século são resultados de mudanças dc fut ocorridas nos últimos cinqüenta anos? A sensação dc fcagmenlaçào do eu visão que as pessoas têm dc si m esm as é resultado p a r t i c u l a r d e su pers pe rson onal alid idad adee ou é um p ad rão rã o ge geral ral na soci so cied edad adee contemporânea? Diversas mudanças na culnira nos ultimes 300 anos fizeram com qu fosse altamente desgastada nossa capacidade de olha pnos pn os O momento em q vivepios c dc compreendermos as raí/es de s u . l s crises no passado. Os teni| grande desenvolvim ento tecnológico e uma cnorm •atuais têm essa mistura de grande carên cia de reflexão filosófica. Há problema- estritamente atuais, mas as bu buss ' da atualidade vêm de longe. str u çã o do d o «e na M otlernuUuk\ otlernuUuk\ Pedro Luiz Ribeiro de Santi. neste neste A c o n stru ífo rfi e ce uma ferramenta ferramenta para professores professores e a limos limos que pr pret eten enda dam m trata tra tarr o tem te m p p m i-vd i-v d en enttÀ ttÀ I atual com uma perspectiva histór histórica. ica. Com olhos voltados pa para ra os pm cientifica, de Santi Santi acaba p poo r faze faz e r um u m resu re sum mo d E da Psicologia com o um a área cientifica, história do pensamento filosófico nos últimos 500 anos. A leitura d | fundamentação fundam entação para para que alunos alunos de Psicologia Psicologia possam compreender compreender o surgiment surgiment S d e sua própria profissão, mas também fornece material pa para ra q u e a lun lu n o s interessados de quaisquer outras áreas possam compreender as raízes da vi sã fiomem mem de si mesmo no século XXI XXI Com exemplos do fio exem plos na música, nu literatura! " i pintura e no comportamento, de Santi Santi narra a trajetória da construção ópria imagem do homem. Asaocnçôo ca tarin eos e
■045518* 1501 Aoanrfii nSo Uft eo ní
Pedro Pedro Luis Luis Ribeiro de Santi, Santi, plrsantifiruol.cojn.br plrsantif iruol.cojn.br C Pedro Pedro Luís Ribeiro Ribeiro de Santi. Santi. 19%, 200 2000,2 0,2003 003,2 ,200 001, 1, 2005, 2005,2009. 2009. Dados Imcrnackinais de CulittoKttçiUi «U Publicação (61P) (Câmara Brasileira du Livro, SP. Brasil)
1 50 5 0 .1 .1 5235c
d e S a n t i , P ed e d ro ro L u í s R i b e i r c . A Cons ons t r ução do ' eu' r.a Moder oder ni dad dade. Da Renas enas c ença ao sécu sécull o XI X / Pedr o Lui s Ri Ri bei r o de Kant i . - - Ri Ri bei r ão Pr et o : Hol os, Edi t or a. 1990. 134 p. : 11. ; 21 1 . 1 5 0 . 1 . 22.. P s i c o l o g i a - T e o r i a . I. Título.
ISB ISBN 85 8 6 6 9 9 - C4-7 789566 699047
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Primeira capa: Mt Mtchcfon fongvlu. lu. O despe sperta rtar du du escre screve ve". ". Um Je qua quatro tro escravos c.iculpid c.iculpidos os /mr Lfichelan&do Lfichelan&do para o túmulo de Júlio ll l l A obro, obro, inacaba inacabada, da, sugere sugere ifuc o acru acruvo vo procura libe libertarrtar-se se do pedra, pedra, Uhíma capa: Ammb Ammbol oldo do.. “A prim rimavera "
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2009 Proibida a reprodução tnial ou parcial. Os infratores scrào processados na fürmi tia lei. Hiikrs Edituni Rua Coronel Coronel Fernando Ferreira Ferreira l eite eite 102 14.026-020 Ribciriio Preto , SP Telefon Telefone. e. 0.++ 0.++ I6.323 I6.3234.K 4.K0H 0H33 ! Fax: Fax: 0.++. 16.3234. 16.3234.8084 8084 Pmai Pmaill holo« holo«@ @holoscdito*a.cünü holoscdito*a.cünü)r )r www. ww.ho losed 11or ora. a.co coin.b in.br r ‘To Todo doss neste mundo mund o dizem dizem eeu, u, eu, eu. eu. Se você fi/c fi /crr alguma pergunta, voc vocêê obterá corno resposta, eu li/ li/,, cu vim, cu vt, eu expenenciei expenenci ei Quem é esse esse eu-1 Se você reconhecer o divino comum nos milhões de pessoas, entâo você compreender compre enderáá o ver verckid ckideiro eiro cu
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Pedro I.uis I. uis Ribeiro de Satui Satui
SUMÁRIO Prefácio de l.uís C láudio Fig Figuei ueiredo redo 7 1. Introd uç ão 9 2. A Pa ssag em da Idade M édia ao Ren ascimento
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3 .0 Humanismo Humanismo no Renasci Renas cimento mento 20
4 O Encontro com a M ultiplicidade 25 5 Os Proced imen tos de C onten ção de Eu 36 6. A Po sição de C ritica ritica à A parência 7. O Discurso do M étodo 8. O Eu c o N àn -bu
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9 O s M oralistas oralistas do Século XV II 76 1 0 .0 Público Público e o Privado Privado 83 11. 11. Tem pestad e c ímpeto: O Ro m antismo 91 12. A A uto-C ritica ritica da Raz ão 99
13 .0 Posit Positivi ivismo smo 102 14. Os Diverso s C am inho s para a Psicologia
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15. Figuras Figuras do R om antism o no sécu lo XIX 110 16. Alguns Des dob ram entos que Levaram Levaram ã Psicologia 120 17. C on su m aç ão da C rise da Subjetividade Subjetividade
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18. 18. C onclusã onc lusãoo 131 19. Bibli Bibliogr ograf afia ia 132
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A Construção do eu na Modernidade
Pedro Luis Ribeiro de Santi
PREFÁCIO conteúdos dc Teorias c Sistemas Psicológicos ou de História História da Psicologi Psicologia, a, disciplinas que integram os Cursos Curs os de Psicologia no Brasil, Brasil, estão cada cada vez mais m ais valorizados valorizado s e vêm sofrendo sofrend o nos últimos tempos algumas algum as transformações transformações m uito positivas. positivas. Hoje reconhece-se que estas matérias nào podem ser consideradas com i secundárias e marginais, marginais, mas que ocupam lima lima posiç po sição ão fundamental fundam ental na form fo rmaç ação ão do psicó p sicólog logo, o, h pre p reci ciso so que qu e o aluno alun o de Psicologia c futuro profissional saiba inserir-se e inserir suas crenças crenç as c práticas em um um contexto contex to histórico e social muito complexo complex o e sem o qual nossas teorias, habilidades c técnicas nào poderiam ter vindo a existir e a funcionar com alguma eficácia Na N a m e d id a cm q u e as m a t é r i a s m e n c i o n a d a s f o r a m conquistando uma maior consideração, foram também mudando de fisionom ia Não se trata trata mais de ape nas tran sm itir aos alunos alunos informações lacluais sobre autores e obras célebres da História da Psicologia (o que é importante), nem de apenas rastrear a origem das idems idems psicológi psicológicas cas nos campos da filosofia filosofia cd a s cicncias cicn cias naturais (o que q ue também c de interesse). Trata-se Trata -se agora ago ra de con textual izar histórica c sociologicamente o nascimento e o desenvolvimento tio universo psi, de forma a tornar inteligíveis as produções e transformações teóricas e técnicas desse campo. Assim Assim sendo, as disciplina de Teorias e Sistemas, História da Psicologia c. cm a guns casos, como com o tia tia USr. US r. Psicologia Psico logia Geral, além de colocarem os alunos em contato com as diversas escolas c correntes da Psicologia contemporânea cm seus processos de constituição e mudança mudança,, passaram passaram a desem penhar a importantíssima importantíssima tarefa tarefa dc colocá-los colocá-los cm contato com os com plexos culturais de que as Psicologias faz;m jxute. Tal como sào oferecidas na UNTP e na USP (enlre muitos outros exemplos cue conheço, mas dc que não estou tão próximo).
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A Construção do eu na Modernidade estas disciplinas disciplina s converteram-se converteram -se em oportunidades indispensáveis de aproximar o alunado do vastissimo vastissimo eatnp ea tnp od e fenômenos culturais culturais no qual se formaram as subjetividndes modernas e contemporâneas. Foi neste campo c cm resposta às diversas demandas provenientes destas subjetividades que as Psicologias foram sendo criadas e desenvolvidas. Quando se tenta, contudo, oferecer uma disciplina com este alcance e esta esta ambição, am bição, depara-se depara -se com uma dificuldade operacional: como organizar didaticamente uni material tào diverso quanto é, de fato, necessário -textos de filosofia, textos dc religião, textos de liter literatur aturaa (ficção (ficç ão e poesia), composições m usicais e reproduções de obras dc ano-, de modo a oferecer aos alunos uma viagem rica, interessante mas viável e relativaroentc segura pelos terrenos da cultura ocidental ocidental moderna? moderna ? O trabalho de Pedro Luiz Ribeiro de Sant Santii é um coadjuvante valiosissimo para o professor que enverede por este caminho e sc coloque estas questões. Aqui Aqui encontram-se exemplos bem escolhidos dos complexos culturais que. do século XVI em diante, foram condicionando as formas de viver c experimentar o mundo dos homens ocidentais. Estes exemplos, exem plos, hem ordenadas orden adas c bem bem interpretados interpretados nas suas linhas linhas mais decisivas mediante comentários breves nius elucidativos do Autor, Autor, retratam retratam os quadros sucessivos sucess ivos em que nos fomos tornando tornand o o que hoje somos. Trata-sc. portanto, de uma contribuição generosa para o ensino da Psicologia e que, estou certo, terá uma boa acolhida pelos prof pr ofes esso sore ress c alun al unos os que com ela tiver tiv erem em contato co ntato.. ju j u l h o , 199 19 9 # I uís Cláudio Figueiredo Livre Docente d c Psicologia Psicologia Geral Geral Universidade de São Paulo
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Pcdru Luis Ribeiro de Santi Santi
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INTRODUÇÃO F
1—/s 1—/ste te livro livro nasceu nasc eu dc uma um a pe p e sq u isa is a iniciada et» agosto de 1995 que tinha a finalidade dc produzir produ zir material didá tico pani o curso “ Teorias Teorias e Sistemas Psicológicos” Psicológicos” , que ministro no primeiro ano do curso de Psicologia desde 1992. lk>a parte deste canso c dedicado ao estudo das condições que levaram ao surgimento da Psicologia, no final do sé culo XIX XIX. Desde então, tenho tentado ampl iar este trabalho trabalho,, organizando organiz ando textos, textos, combinando combinan do trechos dc obras dc comentadores com entadores c adicionando a dicionando novos textos originais dc cada época. Combinando a preocupação com a abertura dc vias vias de comun co municação icação com os alunos e uni uni interesse pess pe ssoa oal, l, com co m freqü fre qüên ênci ciaa uso us o outros ou tros recur rec urso soss que qu e não nã o apen ap enas as text te xtos os teóricos, como literatura geral, filmes, referencias à ‘história dos costum cos tumes' es' e, muito especial mente, mente, a audição audiçã o de música dc época. P-ssa reunião entre uma Linguagem teórica c mais abstrata com outras mais imediatas e prazerosas não apenas mostrou-se produtivo, atendendo atendend o um pouco uma das necessidades mais comuns do estudante universitário de hoje. o aumento de sua cultura geral. Pia também deixa evidente para o aluno a relação entre os problemas filosóficos ilas ilas várias épocas, époc as, que se refletem refletem cm toda a expressão expre ssão humana dos hábitos á arquitetura, da música à visão dc si mesmo Tenho Tenho procurado procurado digerir d igerir esta esta experiência dc mais mais dc quatro anos através da produção dc um texto didático. Para isso, há que se paga pa garr o preç pr eço o de d e uma u ma simpl sim plifi ifica caçã ção o inevi ine vitá táve vel, l, quan qu ando do se com co m pila pi lam m fontes fragmentadas e, sobretudo, quando se tenta tomar urr texto sobre u historia do pensamento humano acessível á linguagem Je alunos dc graduação. A esperança maior deste In ro é a dc convidar, dc um lado. os alunos dc Psicologia a pensar nas relações dessa área de pens pe nsam am e nto nt o com co m o rest re stan ante te do conh co nhec ecim imen ento to c em suas su as cond co ndiç içõe õess de surgimento. De outro, c o n v i d a r o público leitor geral u
A Construção do eu na Modernidade compreender e refletir um pouco sobre a história dos problemas filosóficos que resultaram no perfil do século XX. Nesse sentido, a Psicologia é apenas uma faceta de um contexto mais geral com o qual todo todoss t êm con tato A lastam o-n os de uma posição posi ção “substancialista”, que levasse a crer que o mundo psíquico seja uma coisa dema e imutável, a qual a ciência fmalmente teria vindo desv desvel ela* a*.. Assim, Assim, colocamos colocamo s no livro a questão ques tão da construção con strução do muudo psicológico, assim como com o a Psicolo Psic ologia gia como co mo uma instância instâ ncia de produç pr odução ão de conhecimento conhecimento cientifico cientifico Ao menos, creio creio que este livro livro permite introdu/ir os alunos â idéia de que a compreensão da questão psicoló psic ológic gicaa é m uito ui to anterio ant eriorr á sua form fo rmul ulaçã ação o cm lima lingu lin guage agem m científica. Ao público leigo geral, compreender que. antes oa visão de si mesi mesir. r.o o que se tem hoje na cultura ocidental, já hou houve ve inúmeras maneiras diferentes de ver a si mesmo e de compreender a posição do homem no universo. * Desde que o homem pensa, ele pensa sobre si mesmo, mesm o, sobre o qu quee é alma, desejo, dese jo, liberdade, liberdade, etc. etc. Mas foi foi apenas no final fin al do século sécu lo XIX qie surgiram os projetos de se realizar uma ciência da mente, iu>$ moldes que conhecemos hoje. Parti uir.a primeira aproximação com o campo da Psicologia, é essencial que se procure pensar no motivo pelo qua! qua! nasceu a demanda por um profissional, dentro dos moldes da ciência, para dar coma das crises de identidade ou do controb con trob dos comportament comportamentos. os. Como se sabe, a Psicologia é composta de utna grande quantidade de teorias diferentes, que mal conseguem se comunicar entre si. Este estado não parece ser passageiro, mas próprio da Psicologia e de outras ciências humanas. Ao compreendermos o sentido do surgimento da Psicologia, talvez também possamos entender o motivo dessa dispersão. Essa história è imer.sa imer.sa Ela remonta rem onta à filosofia filoso fia grega e acompanha acomp anha toda tod a a reflexão filosófica posterio p osteriorr e, mai.s recenteme recente mente, nte, alcança alcança as teorias teoria s psiquiátricas psiquiátrica s até até o inicio de nosso século. Por isso, isso, tomamos algumas teses sobre o assunto para organizar nosso perc pe rcur urso so.. E stá long lo ngee de no noss ssaa p rete re ten n são sã o real re aliz izar arm m o s u m a o bra br a
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Pedro Luis Ribeiro de Santi totalizadora ou sequer cc nos aproximarmos disso. Trata-se simplesmente de perseguir um fio nesta rede. na esperança de que ele convide os leitores ti explorar outras vias. Como será possível pee r c e b e r cada p ca da ép époc ocaa tem um nú núm m er eroo de cor corren rentes tes de pe pens nsam amen ento to par p aral alel elas as e um nú núm m ero de for formas mas dc ex expr pres essã sãoo de dess sses es po pont ntos os de vist vi sta. a. A seleção dos dos autores e temas ob obede edeceu ceu àorientaçã àorien tação o dc alguns comentadores clássicos, dc um lado. e a motivos menos nobres, dc outro, como com o o ponto po nto de vista do conhe co nhecime cimento nto prévio prévio do autor. autor. Muitas discussões essenciais sào apenas mencionadas, como a questão da Modernidade, algumas algum as passagens da própria histó história ria:: muitas questões qu estões para pa ralel lelas as às vezes veze s sequ se quer er sào m en encio ciona nada das. s. Peço descu des culp lpas as ao leitor leito r mais bem informado e reafirmo o caráter meramente didático deste projeto. A tese hàsica que orienta este percurso é a de l.uis Cláudio Figueiredo, cm "Psicologia. Uma introdução"* Fie pro propõe põe a idéia idéia de que houve duas pré-condições para o surgimento dc uin projeto de Psicologia conto ciência. A primeira seria o surgimento de uma noção clara de subjetividade subjetividad e privada (ou seja. seja. u n a afirmação da id idéi éiaa de qu quee as pessoas sào indivíduos livres e. enquanto tais, indivisíveis, separados, independentes un3 dos outros c donos de seus destirtos A segunda seria a de que essa concepção de sujeito teria entrado em crise, gerando assim um sujeito cm crise de identidade c a procura dc um profissional que lhe pudesse restituir a estabilidade. Ue momento, essa tese poce parecer obscura. mas gradativamente ela irá irá sendo send o explicitada. explicitada. Dc uma forma genérica, podemos dizer que a noçio dc subjetividade privada data do inicio da Modernidade, ou se|u. do Renascimento. Será justamente na passagem da Idade Média para o Renascimento que q ue iniciaremos esse percurso. A afirmação do sujeito chegará a seu ponto máximo no século XVII e, a partir de então, iniciará iniciará uma um a longa long a crise até o tlnal do século XIX XIX. No final do sécu sé culo lo XIX. XIX . surg su rgirã irãoo os m m e iro ir o s pr proj ojet etos os de O livro "Psicologia. Unia fnirodução. Figueir Figueiredo. edo. L.C. 19 1991 91.. EDUC, EDUC, Sào Paulo” :òi rccditudo como como "Psicologia. Uma (nova) introdução. Figueiredo. L.C & ped pedro. ro. 19 1998 98,, Sào Paulo. E D U C Apói Ap ói a primeira primeira versào publicada. Figueiredo Figueiredo j á desenvolv desenvolveu eu teses teses mais complexas complexas s*bre s*bre o lema, como em *1 invenção do Psicológuo
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A Consuxiçào do eu na Modernidade Psicologia, já com algumas características c aracterísticas definitivas da diversickde diversickde que marca esta ciência ciên cia Wundt cria cond co ndiçõ ições es para a eriaçào de uma uma Psicologia experimental, enquanto Freud cria a Psicanálise. A esta lese, que mostra os modos de afirmação do eu ccsdc o século XVI, acrescento uma observação minha; a de que, desde o inicio do Renascimento, alguns autores já se dedicam a mostrar as fracucias e insuficiências do eu Isto indicaria ind icaria a po ssibilida ssib ilidade de de que que a Modernid Mo dernidade ade incluísse proccd .mcntos de auto-crítica e dissolução do eu , além dos clássicos procedimentos dc auto-afirmação.
1'cct x) Lu is R IHelro de Surti
2 A PASSAGEM DA IDADE MÉDIA AO RENASCIMENTO Nesta parle, par le, m u a -se -s e d e es po p o r que nossa concepção concepção aluai do que seja o "eu "e u ” não cm po p o ssh ss h ei na Idade Idade Média Média
Renascimento, como já é clássico dizer-se. nasce o humanismo moderno. De acordo com a tese de l.uis Cláudio Figueiredo, seria neste período que passaria a se afirmar uma concepção de subjetividade privada -aí incluída a idéia de liberdade do homem e d e sua posição como centro do mundo mund o Voltemos Voltemos alguns passos: pas sos: o que qu e signif sig nifica ica dizer diz er que qu e a noçã no ção o de ‘subj su bjet etiv ivid idad adee p ri\ ri \ ad ad a‘ pa p a s s a a e x i s t i r ? P o r q u e tal ta l c o n c e p ç ã o n ão s e r i a p o s s í v e l anteriormente, no mundo medieval? Pode provocar alguma estranheza a idéia de que a noção de priv pr ivac acid idad adee não n ão existis exi stisse se em um num nu m dete de term rmin inad ado o mom m omen ento. to. Nossa No ssa intimidade, nossa nossa existência enquanto enquan to sujeitos isolados isolados -ou -o u . até mais. mais. solitário solit ários— s—parec pa recee no-, clara, clara , certa. " T e r u m tempo para si” , sem estar trabalhando ou estudando (produzindo, dc urn modo geral), possui um grande g rande valo r em nossas no ssas vida vi da s’ . Certamente, Certamen te, essa essa é uma das
*A privacidade tomará diversos aspectos: em primeiro lugar temos nosso pensam pensament entos, os, que que tmri tmrila lass vezes vezes anotem ano temos os em segre segredo do:: se lem lemos uma uma cas casaa ou um quarto para nós, pode-se ouvir uma música, amimar gavetas, estar com uma roupa confortável (muitas vezes velha c acabada, mas neste caso nào há problema, pois não há ninguém olhando): se dividimos nosso quarto com outras pessoas, sempre podemos tomar um longo banho, fazer a barba ou as unhas, ou outras coisas mais
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A Construção do eu na Modernidade pouc po ucas as co cois isas as pckts pckt s q u ais ai s luta lu tam m os ho hoje je -ti prec pr eciso iso g aran ar anti tirr no nossa ssa priv pr ivac acid idad ade, e, dia di a n te da aha ah a ex exig igên ência cia atual atu al pa para ra que q ue ded d ediq ique uem m o s toda tod a a nossa energia c tempo às atividades consideradas “úteis”. Há até quem diga, e nào são poucos, que nosso excessivo individualismo è um cos grandes problemas da convivência social atual. Dentre os prob pr oblem lemas as qu quee de deriv rivar ariam iam disso, dis so, po p o de derí ríam amos os enu enume merar rar:: a impo im posiç sição ão dos interesses pessoais sobre os coletivos, a insensibilidade ao que nào nos di2 respeito imedialamentc. a solidão, a falta dc um sentido para pa ra a vida, vid a, o des d esre resp spei eito to g en ener eral aliz izad adoo às à s leis, o cres cr esci cim m en ento to c o m o reação a tudo isso isso dc m ovimentos ovim entos ideológicos ideológicos ou religiosos religiosos dogmáticos e violentos, caracterizados pela intolerância para com aquilo que c diferente dc si ou do grupo, ctc. Existem as nações, grupos religiosos, familiares, ctc, mas a menor unidade seria a pessoa. O termo ‘indivíduo’ remete a isto, somos o “átomo” indiviso do mundo humano. Este sentimento de individualidade se mostra, mostra, em outro o utro exemplo caricato, quando estamos prol pr olun undd amen am ente te infeliz inf elizes es e nos no s sent se ntim imos os inco in comp mpree reend ndid idos os,, pas p assa sand ndoo por po r uma um a do dorr q ue prov pr ovav avel elm m en ente te ning ni ngué uém m jam ja m a is passou pas sou antes. ant es. Se um amigo a quem confidenciamos co nfidenciamos nossa dor do r diz nos compreender e já ter pa passa ssado do pela m esm es m a ex expe peri riên ênci cia, a, en ench chem emoo-no noss de orgu or gulh lhoo e reagimos dizendo que clc nào entendeu nada, nosso sofrimento é incomparavelmente incom paravelmente maior que o dele dele!! Assim, Assim, quer q uer pelos valores positivos, quer pelos negativos negativo s que que lhe atribuamos, parece-nos certo que o sujeito isolado c a unidade básic bá sicaa dc va valo lorr e refer re ferên ência cia de tudo. tud o. A ind in d a assim as sim,, sc d erm er m o s uma um a olhada na história dos costumes ou da filosofia, veremos que rtcin sempre foi assim. Esta afirmação do “eu” parccc ter-se construído gradati gradativamcnt vamcnte. e. através dc séculos’ . ü “eu” nem sempre foi soberano. soberano. Sc nos dirigíssemos à filosofia da Grécia G récia clássica (scculo V A.Cd. certamente já encontraríamos algo que poderíamos chamar dc humanismo, humanismo, com c omoo uma valorização valorização do ser humano já nà nàoo submetido submetido ao poder dos deuses (como na filosofia dc Sócrates ou no teatro de Euripcdes), a criação do direito e da democracia, etc. Mas o 1É sempre sempre bastante compl srado srado aftnnamuw aftnnamuw que detenmnada idéia tenha tenha surgido pela pela prim primei eira ra ve vez em tal tal mom momen ento to ou em de deter term minad inadoo au autor tor Sempr empree acha acham mos alguém que jã afirmara tal idéia aníenonncntc. Este recuo parece ser infinito. Assim Assim,, sempre trabalhamos com uma margem dc d c aproximação aproximação o, vale vale dizer, dizer, erro. erro.
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Pediu) Pediu) Luis Ribei Ribeiro ro ile Santi humanismo, entendido entendido como com o a colocação colocação do homem hom em como medi medida da dc todas as coisas e centro do mundo, parece ter tomado a forma que tem lioje no Renascimento, surgindo dc dentro da Idade Media Ainda que não entremos cm detalhe na discussão do pen p ensa sam m e n to m e d iev ie v al ou g reg re g o, va vale le a p en enaa de dest stac acar arm m os d g u n s momentos mom entos privilegiados privilegiados na direção da tese que desenvolvemos. Fm A s Jun Ju n tes do S e lf, Charles uma obra recer.te, chamada As C harles Taylor Taylo r realiza realiza uma análise profunda do nascimento nascim ento do sentimento característi característico co da Modernidade: o de que possuímos possuímo s uma um a inlerior inlerioridade. idade. O ponto dc partida da análise análise dc Taylor c Platão. Platão. T ntant a-ss de mostrar como, para ele, a razão c a percepção de uma ordem absoluta. Ser racional significa ver a ordem como cia é. Não há como ser racional e estar enganado sobre a natureza ao mesmo tempo. Podemos Podem os já reconhecer aqui o nível nível dc certeza pelo qual aspir aspiraa a Modernidade, representada sobretudo pela figura de Descartes. No en entan tanto to,, en enqq u an anto to pa para ra De Desca scarte rtess a o rdem rd em está est á 'de 'd e n t r o ' de nós, para Platão Pla tão ela resi re sicc cc n o ab abso solu luta tam m en ente te Bo Bom. m. H em Santo Agostinho que Taylor encontra a grande passa pa ssage gem m pa para ra a infer in ferio iorid ridad adee Santo Sa nto A go gost stin inhh o c assu as sust stad ador oram amen ente te moderno, considerando que viveu entre os scculos IV' e V dc aossa era. era. Todo Todo o seu pensamento pensam ento seria permeado perm eado pelas p elas noções dc TnternoTnternoextemo’: espirito/matéria, alto/batxo, etemo/tcmporal. imutável/ mutante, etc. Aqui aparece um movimento inédito: com a desvalorização do corpo e de tudo o que é mundano, com a correspondente valorização da alma como com o algo interno, interno, a basca por Deus passa a ser feita dentro de nós. Deus não deve ser procurado no que qu e vemos, vemo s, mas no próprio próp rio olhar. olha r. Lie sei ia a própria próp ria luz interi interior or.. Santo Agostinho estaria, com isto, inaugurando uma experiência radical: "A reflexão radical traz paru o primeiro plano uma espécie tJe presença para a pessoa, pessoa, que c insepa inseparáve rávell do fato de esta pessoa pessoa scr o ag agente ente da exp experiê eriênci ncia, a, algo cujo acesso acesso ê, par sua própria natureza, assimétrico: há uma diferença crucnl entre entre a forma forma dc cu experiment experimentar ar minha ;»li ;»li\\ idade, pensamento pensamento e sentimento, e a fu mia pela qual você ou qualquer outro o faz: É isso que rr.e rr.e toma toma um scr que pode lalur de si na primeira pessoa”, (p. (p. 174} 15
A Coustmção do eu na Modernidade A experiência experiê ncia passa a ser altamente altamente subjetivada subjetivada e dependente de nós. A tradição moderna teria levado esia concepção ao extremo, pass pa ssan ando do a rcfc rc fcri rirr-se se a obje ob jeto toss inte in tern rnos os c. a o m e sm o tem te m po, po , a um ‘eu penso' pen so' totalmente separado do ' externo’. Mas ist isto o já é adiantar demais nossa discussão. Em uma imagem que reconhecemos como caricatural e bast ba stan ante te insu in sufi fici cien ente te da conc co ncep epçã ção o de m undo un do medi me diev eval al no O ciden cid ente te apenas como pano dc fundo para introduzirmos as idéias do Renascimento-, poderíamos dizer que ela se caracteriza por considerar considera r o mundo mun do organiza do cm tom o dc um centro. 1laveri 1laverin n uma ordem absoluta, representada por Deus e Seus legítimos representantes na terra; a Bíblia e a Igreja. Cada coisa existente estaria relacionada n ecessariamente ecessariamen te a esta esta ordem superior. superior. Em última última instância, cada ser formaria parte de uma grande engrenagem que seria a criação divina. Aí sc encontraria o sentido de twlo\ A possibilidade da crença na liberdade humana huma na é muito restnta. já j á que qu e tudo tud o faz p arte ar te dc um pla p lano no maior ma ior,, de d e um tixlo perf p erfeit eito o disposto disp osto por Deus. Deu s. A noção no ção de justiç jus tiçaa na Idade Ida de Média, Média , por po r exemp exe mplo, lo, c a da colocação de cada ser no lugar que lhe é próprio. Tatnpoueo haveria lugar para a privacidade. Ma medida em que a onipresença e a
MUSICA - Cunlu Crcgoríanu A audição e co mpreensão do canto gregoriano presta-se de forma exemplar a tentativa dc apresentar o espírito medieval. Ele c um canto em uníssono, uníssono, ou seja. seja. trata-se trata-se dc um coral onde todos cantam rigorosamente a mesma coisa. Sua letra é, invariavelmente, um texto sagrado e já conhecido pelos ouvintes: ouvin tes: trata-se d a reafirmação do já ‘ Issc rcmctc á parábola segundo a çual um passante veria vários homens erguendo uma parede; um deles de aparência aparência destilada e outro está visivelmente satisfeito. satisfeito. O passante pergunla pergunla a cada um o que está fazendo; fazendo; o primeiro primeiro responde “estou empilhando tijolos” t o segundo “estou construindo construindo uma catedral” catedral” O segundo segundo sente-sc parle dc uma uma obra obr a maiur. maiur. o sentido sentido de sua ação transcende transcende em muito o imediato, está ligado a um lodo (o rtligúrc, de leligião -religar.l. O prim primei eiro ro está está só, só, o senti sentido do de sua sua ação ação esgota gota-s -see nel nelaa mes mesm ma.
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Pedro Luís Ribeiro de Santi Santi sabido e da apresentação dc dc um mundo mund o sem novidades, Associando Asso ciando-se ao caráter da letra, letra, não nã o lia lia propriamente propriam ente um a melodia, mas apenas apen as uma sinuosa linha melódica que nào se repete; nào há refrão ou pass pa ssag agen enss brus br usca cas, s, de f o n r a qu e o o u v inte in te não con co n seg se g u e " seg se g u rarra rse” em em nada. nada. Ele nào pode pod e se se loc ali/a r e nào deve "prestai atenção” ou estar conscien te do que ouve, ouve, mas se deixar levnr levnr por este mar ou rebanho. rebanho. H oje, ouvim os o canto canto gregoriano de forma muito diferente diferente da que o caracteriza; caracteriza; nós o utilizam os para meditar, ou relaxar relaxar.. De forma geral, poderíamos dizer que, na música, a melodia liga-se ao que qu e há de mais ma is espiritual espiritual -o sopro da voz, o sublim e, a uma nota que se sustenta idêntica idêntica c linea linear. r. O ritmo, cm oposição, oposição , representa rep resenta mais proximamente o corpo e seus movimentos, ele chama à dança, ao que é mais instável. Na Grécia, a música era atribuída a Dioniso, deus da em briaguez, do vinho, do teatro, etc. Ela conteria, con teria, assim , um elemento diabólico, excitante. Ao ser assimilada pela igreja, o que é atribuído ao Papa Gregóric, no século VI D.C., a música é filtrada, retirando-se dela ao máximo seus elem entos ento s ritmicos; ela passa a se restringir á pura emissão vocal, sem haver sequer instrumentos dc acompanhamento 56 56 . Ainda no contexto medieval, med ieval, surge um ou tro iipo de música mú sica que, dc outra forma, reafirma a certeza e a necessidade dc um centro e de uma referência externa. externa. Nela, a voz vo z da melodia e acompanhada acompa nhada por po r um u m a seg se g u nda, nd a, que qu e sustenta sus tenta uma um a m esm es m a nota. nota . cham ch amad adaa lbo lb o rd ã o ' (segundo Aurélio, “uma nota grave, prolongada e constante”, mas "tamb ém um pau grosso qi.e qi.e serve como arrimo, arrimo, am paro”) paro” ). Trata-se Trata-se pro p rop p riam ri am ente en te d e m ante an terr uma refe re ferê rênc ncia ia,, um u m cent ce ntro ro em tom to m o do qual qu al a melo melodi diaa pode pode voltear voltear sem juinai juinaiss se p e r d e r J á se encontra encontra ne nesse sse 5 A respeito respeit o desta des ta teoria teori a sobre a música, música, ver ( ) som e o senado, de J.M. Wisnick isnick ( I 989). Ao longo des.e texto, sempre sempr e que fizer alguma al guma referência refer ência à música, procurarei indicar ao menos um exemplo em nota de rodapé, com o tiiuki da peça e a fonte a que recorr recorri. i. Como exempl e xemplos os de Canto Gregoriano, Grego riano, c oetí" tí" e procure ouvir as faixas faixas “Roraie coe e "Ave \f«rw", do ‘Cantos do Pró prio do 'Gradual? 'Gradual? Rom R om atum atu m '", no Cf) “Corno Gregoriano. Cboralschola J e s Wiener Hofburgkapelle, Hofburgkapell e, Plmnog Plmnograru, raru, 1984 1984”” . 6 Como exemplos, exe mplos, ouça a fari f ariaa Natus est, extraído do CD "Nova Cantua. Canções Latinas da Alia idade Média, Harmonia Mundi, 1990” e a faixa Pwsque Pw sque bete b ete da dana* n e>m\ extraído do CD "LoveS fludoru. Música do Codex Codex Montp Mo ntpdl dlier ier -Século -Séc ulo XIII, III, Harmonia Mundi, Mundi, 1994 1994”” 17
A Construção do cu na Modernidade último tipo de música a raiz do cânone -música -mú sica com duas ou mais vozes na qual a mesma melodia é cantada de forma defasada entre elas e repetida, de forma que sempre se pode ouvir cada Frase m us icalica l- e da polifonia do Renasci Renasciment mento. o. TF.X F.XTO ANEXO - Jo J o h n o fS a lls ll s b u r y (Século Xíl)
No text te xto o que se segue seg ue ptxleptx le-sc sc ver ve r a rigid rig idez ez de um mund mu ndo o concebido como hierarquizado por unia ordem superior. Não cabe ao homem questioná-la ou pretender escolher ou mudar o lugar lugar que lhe cabe. O CORPO SOCIAL SOC IAL (“The Bo Bodv Soda So dal”) l”)
"U ma comunidade, de acordo aco rdo com Plutarco. é um certo corpo dotado de vida pelo benefício do favor divino, que opera impelido pela mais elevada eqüidade c que c regulado pelo que pode ser chamado de poder pod er moderador modera dor da da razáu. Aqueles Aqueles que em nos estabelecem e implantam a prática da religião c nos transmitem transmitem a devoção a Deus. Deus. preenchem o lugar dn dn alma nu corpo corpo da comunidade. E assim, aqueles que presidem a prática da religião devem ser considerados e venerados como a alma do corpo. Pois, Pois, quem duvida de que os ministros da santidade de Deus sào Seus representantes? Além disso, desde que a alma é como se fosse o príncipe do corpo e legisla sobre todo o restante, etnAo aqueles aos quais nosso autor chama os prefeitos da religião presidem 0 corpo inteiro... O lugar da cabeça no corpo da comunidade é ocupado pe peUi príncipe, príncipe, que se subm submete ete apenas apenas a !> !>eeus e àqueles àqueles que estilo a Seu serviço e O representam na torra, da mesma forma que, no corpo humane, a cabeça cabeç a c animada e governa gov ernada da pela almu. O lugur do coração c preenchido pelo senado, do qual procede procede o ir.ííio de boas c mas obras. obras. Os deve deveres res dc olhos, olhos, ouvidos e língua sào cumpridos pelos juizes e governadores das províncias. Oficiais e soldados correspondem ás mãos. Aqueles que sempre servem ao príncipe sáo semelhantes aos flancos. Oficiais financeiros e comerciantes podem ser comparados com o estômago e os intest int estin inos os.. .. Os camponeses correspondem correspondem aos pcs. pcs. que sempre semeiam a terra, e precisam mais especificamente especificamente dos cuidados c das preocupações da 18
Pedro Luís Ribeiro de Sant: cabeça, já que, enquanto enq uanto caminham caminham sobre u tc-ni tc-ni trabalhando traba lhando com seus corpos, eles sc deparam fieqilenternaitc com pedras de hcsilação e, por isto, mercccrr. mais ajudas proteção que os demais com toda justiça, desde que são eles que erguem, suster.tiun c movem adiante o peso de todo o corpo... Entãc, c só então, a saúde da comunidade será sólida c florescente quando os membros mais aliou protegem os mais baixos, e os mais baixos respondem respondem fiel e plenamente plenamente na mesma medida ás justas demandas de seus superiores, de modo que todos c cada um operassem como que membros uns uns dos outros por por u r a espécie de reciprocidade, reciprocidade, c cada um um considerasse que seu próprio interesse era mais bem atendido por aquilo que ele soubesse ser mais vantajoso vantajoso para os outros”. 4
O que pretendemos destacar deste texto é a concepção de uma relação orgânica entre todos os seres, sua irterdependência. Em tal universo, não faz sentido pensarmos que uma pessoa teria a liberdade de optar pelos rumos de sua vida. O homem nâo seria, assim, propriamente propriam ente sujeit sujeito. o.
PINTURA - (iiotto Questões para discussão 1. Qual c a diferença entre a raeditaçàu solitária dc um monge medieval e a experiência experiênci a de solidão solid ão dc um homem do scculo XX? 2. Procure identificar alguma forma atual dc entender entend er o inundo inundo que sena se na impensável na Idade Média. 3. Hoje Hoje ainda existe a idéia de de “corpo social"? so cial"?
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A Construção
3 O HUMANISMO NO RENASCIMENTO \'e \' e s t a p a rte rt e , intr in tro o d u zim zi m o s o tem te m a da valorização do homem como um todo e de coda indivíduo, no Renascimento, &n função da perda das referências sólidas medievais
I n ic ie m o s esta parte parte por por unia unia definiç definição ão de humanismo: humanismo: “O tetmo tetmo ‘humanismo’ ‘humanismo’ ê derivado de humanitas, que no tempo tempo de Cícero (106 43 a.C.) designava a educação do homem enquanto considerado em sua condição propriamente fxiideia: a educação humana, correspondendo á palavra p alavra grega fxiideia: por po r meio de discip dis ciplina linass liberai libe rais, s, relativa rela tivass a ativid ati vidad ades es exclusivas do homem e que o distinguiam dos animais. (...) As chamadas ‘humanidades1 - poética, retórica, retórica, história, ética ética c política- possam, possam, desse modo, modo, a constituir, constituir, sob a inspiração dos antigos, a base de uma educação destinada a preparar o homem paro o exercício da liberdade." (...) “Outro fundamento fundamento do humanismo renascentista renascenti sta foi a convicção de que o inundo natural 6 o reino do homem. Esse naturalismo conduziu, paraleliur.ente á afirmação tio valor espiritual do homem e que o torna livre, á exaltação do valor do corpo t dos seus prazeres."7 Fica Fica ev idente, idente, pela pela passagem passagem acima, acim a, que houve hou ve um a mudança na concepção do lugar do homem no mundo. Há agora uma grande valorização do homem c, ao mesmo tempo, a idéia de que cie tem que buscar uma formação, ele deve sc constituir enquanto humano. Erasmo de Rotterd Rotterdan, an, 7 José Américo Pessãnha, "VkJa e obra” (p. vi). Em Erasmo Coleção “Os Pensadores”, 1991,
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Pedro Luís Rihciro de Sauti Se o homem nào nasce com seu destino predestinado, ele se deve formar, educar. Nasce a necessidade do “cuidado de si”. É comum que tenhamos uma nuçào da passagem da Idade Média para o Renascimento R enascimento em termos de história: com a diminuição diminuição do poder da igreja c advento da reforma, a crise do sistema feudal e o nascimento nascim ento das cidades e rotas de comércio, com ércio, a expansão expansã o marítima, marítima, etc. Mas rararneiite consideram-se as mudanças dc modo de vida das pessoas p essoas implicadas nessas transformações politicas politicas e econômicas. econômicas. HA toda uma linha de investigação histórica, cue se dedica especiftc espe ciftcam amente ente ao escud escudoo da história dos do s costume costu mes, s, da vida cotidiana das pessoas e, o que nos interessa mais no momento, da idéia que elas tiniram dc si mesmas. Tudo leva a crer cre r que a diminuição do poder da igreja c a abertu abertura ra operada sobre o mundo fechado dos feudos foi acompanhada por uma crise da concepção fechada de mundo que vigorava. Se os honens acreditavam ter um ponto de referência referência externo (um centro do muid m uido) o) sobre o qual podiam se apoiar, agora já não podiam cor.tar com essa certeza. Numa nova caricatura, poderíamos dizer que, sob um poder absoluto, não liá liberdade, o que é terrível, embora seja rclativairiente fácil “co “com m pree pr eend nder er'' o munci muncio, o, pois há referencias referencia s claras: o que qu e c certo e o que é errado está prc-definido, cabendo, no máximo, máx imo, tomar um partido partido ou outro. Já num mundo mund o aberto, sem referências r eferências absolutas, absolutas, surge a idé idéia ce liberdade, mas ao mesmo m esmo tempo, a de solidão e responsabili responsabilidade. dade. Se o homem nào pode mais contar com uma resposta dada por uma autoridade absoluta, absoluta, ele deverá buscar busca r ou constru co nstruir ir suas próprias próprias resp respos osta tas, s, liste ê um dos principais deméritos do humanismo. Isso não quer dizer que o homem do Renascimento fosse ateu, mas. de certa tómia. Deus parece ter se afastado para o céu. deixando o mundo a cargo dos homens. Na Idade Média, é truito comum a representação plástica do mundo como uma esfera cujo centro é Deus, Cristo ou, o que é tnenos ortodoxo, a Virgem Maria; já no Rena Re nasc scim imen ento to,, há inú in ú m eras er as repre rep rese sent ntaç açõe õess do d o mun m undo do nas quais quai s Deus paira sobre ele, que tem agora ao centro o próprio homem. É também comum que no Renascimento comecem a surgir as assinaturas dos artistas em suas obras de arte, o que quase não existia existia no período anterior Quando Quand o pensamos pensam os nos pintores pintores mais antigos antigos que conhecem conhe cemos os no ocidente moderno m oderno,, vem-nos a mente m ente Cii Ciiootto, tto, por 21
A CanstnçSo Jo cu na Mixianidade exemplo, ainda que ele estivesse bciratulo o Renascimento, tendo vivido entre os séculos X O c XI XIV'. Nào era o ser humano hum ano que criava, cie era apenas um instrumento da criação divina: como numa representação representaçã o do Papa Papa G rtgó rtgório, rio, na qual o Espírito Espírito Santo lhe sopra a música que esul a escrever, No co conn tex te x to ren renas ascen centis tista, ta, nà nàoo há m ais ai s ap apen enas as um umaa certa cert a cena bíblica que importa, importa, mas mas a m io do sujeito sujeito que deixa sua marca na obra. Assim, surgem su rgem os nomes mais conhecidos conh ecidos do Renascimento, Ren ascimento, como Leonardo da Vinci ou Michc.angelo, que, mais que artistas, são gênios dc inúmeros talemos. Sào homens que se formam e que deixam seu traço pessoal tia obra que criam. Sem sofrer restrições porr pa po parte rte da igreja igre ja cm suas in inve vest stig igaç açõe õess sobr so bree a an anat atom omia ia hu huma mana na ou sobre os astros, o homem ahre-sc para um mu mundo ndo novo -que -querr cm suas viagens |>e!o mundo, mundo , qu quer er pelo estud es tudoo da natureza. Em anexo, trechos trechos dc um livro de 14 14#6 #6.. bastante bastan te expressivo como concepção do humanismo renascentista. T E X T O AN A N EX EX O -
Pico Delia Mirando!a
DISCURSO SOBRE A DIGNIDADE DO HOMEM
“Já o sumo pui. pui. Deu euss arquiteto, linha construído, segundo s egundo leis de arcana sabedoria, este lugar do mundo como nós o vemos, augustissimo augustissimo templo t emplo da divindade. Tinha embelezado a zona supcr-cclcstc com inteligências, avivado os globos êtéreos com alma? eternas, povoado com unia multidão dc animais dc toda a espécie espécie as partes partes vis e termenutres do mundo inferior. Mas. consumada a obra. o Artífice desejava que houvesse alguém capaz de compreender a razão de uma obra lào grande, que amasse a beleza c admirasse a sua grandeza Por isso. uma vez tudo realizado, como Moisés e Timcu atestam, pensou por por último em ena en a r o hom homem. em. Dos arquétipos, arquétipos, contudo, não ficara nenhum sobre o qual modelar a nova criatura, nem dos tesouros Unha algum para oferecer cm herança ao novo tiiho, nem dos lugares de todo o mundo restara algum no qual se sentasse este contemplador do universo. universo. Tudo estav estavaa já ocupado, tudo tud o tinha sido distribuído distribuí do nos sumos, nos médios t nos ínfimos graus. Mas não teria sido digno da paterna potência não se superar, como sc fosse 22
Pedro Luis Ribeiro de Santi inábil, na sua última obra. não era próprio da sua paciência permanecer permanecer incerta incerta numa numa ob obnn nec neces essá sária ria,, por por falta falta de de deci cisã são, o, nem seria digno do seu bcrcfico amor que a quem estava destinado a louvar nos outros a liberdade divina fosse constrangido a lamcnta-lacm si mesmo. bstabele bstabelecen cen,, port portan anto to,, o óptim óptimoo Artíf Artífice ice qu que, e, àquele àquele a quem nada dc cspecificamerle próprio podia oferecer, fosse comum tudo o que linha sido dado parcclarmente aos outros. Assim, tomou o homem como obra dc natureza indefinida e, colocando-o no meio do murdi rd i. talou-lhc deste modo odo:: ‘Ó Adã Adão» o» não te demos nem unt lugar determinado, determinado, nem um aspecto que te seja preprio, nem tareia alguma especifica, a fim dc que obtenhas e possuas aquele lu&ar, aquele aspecto, aquela tarefa que tu seguramente desejares, tudo segundo o teu parecer e a tua decisão A nature nat ureza za bem bem defini def inida da dos Outr Outros os seres é refreada por leis por nós prescritas. Tu, pelo contrário, não será constrangido por nenhum? nenhum? limitação, dcte-tninu-la-ás pata ti, segundo o teu arbítrio, a tnço pod poder er tc entreguei. Coloqueite no cer.tno do munco para qje daí possas olhar melhor tudo que há no mundo. Não tc fizemos celeste nem terreno, nem mortal ncir. in lorlal. a fim de que tu, árbitro e soberano artífice, te plasmasses e
eus está “antes" do mund m undoo como com o criador " Fm Pico delia MirandoJa, Discurs Discurso o sobre sobre a Ji^nuiode Ji^nuiod e do hdntc hdntcm. m.
A Construção do eu na Modernidade c "depoi "depois” s” d d c como com o juiz, mas é visto visto como tendo tendo criado o mundo e o deixado deixado funciona fun cionarr po porr suas suas próprias lets lets.. Daí surgirá a possibilidade do conhecimento das leis naturais; sc Deus interviesse a cada momento com milagres, milagres, seria seria impossível o projeto de conhecimen co nhecimento to e previsão sobre os fenômenos naturais. Já a liberdade, dom maior dada ao larmetn, fará com que ele ele tenha que passar a tentar descobrir os caminhos do bem, definir o que c certo e errado. Este é o campo da moral, que será muito estudado nos séculos seguintes. A colocação do homem ho mem no ceniro do mundo mund o nos traz traz ainda a idéia dc que todas as coisas existem pam sua contemplação e uso TomjTo mj-se se natural para o homem matai matai'' animais ou devastar dev astar a natureza na medida de seu interesse A relação do homem com relação ao mundo se tomará cada vez mais a de exclusão. O homem jutga-se quase como Deus, relativamente acima do mundo, e as coisas (c mesmo o corpo humano) serão tomadas como objetos. Figueiredo’ Figueiredo’ observa a peculiaridade dessa dessa posição do homem Tdc c o centro c é livre para tomar-sc o que quiser, mas ele não è propri pro priam ament entee nada. Há uma um a ne nega gativ tivid idad adee no ho home mem m e é just ju stam amen ente te es.se .se vazio que ocup o cupaa o lugar do centro ce ntro;; o mundo mun do já não é fechado, já não há estabilidade possível, o homem deve contmuamcntc tomarsc, constituir-se, mover-se: "Este imenso espaço de liberdade será lambem o espaço das virtudes que consistem desde então no bom uso desta liberdade, è ainda o espaço de urna aventura scir. destino certo, sem arrimos nem garantias. É, finalmemc, o espaço insólito da da ignorância, da ilusão, do erro. da duvida duvi da e da suspeita.” (p, 24) Qu Mtks QuMt ks para p ara disc discus ussã sãoo I. Co Como mo foi possível conciliar a crença em um Deu Deuss onipotente c a crença na liberdade do homem'1 2- Como Como u valoriza valorização ção do homem homem contribuiu contribuiu para o aumento do conhecimento conhecimento sobre a natureza? 3. líntie o mundo medieval c o mundo renascentista, qual parec pa recee ge gerar rar mais angústia angústia no homem? Por quê? Em A invenç invenção ão do psicólogo.
Pedro Luis Ribeiro dc Santi
4 O ENCONTRO COM A MULTIPLICIDADE Trabalhamos, testa parte, o encontro com a diversidade th. mundo. O confronto com a diferença diferençafe~ cont cont que o homem homem se s e perguntass perg untassee sobre si.
erivamos do lema anterior outro que o acompanha. Ainda segundo Figueiredo, a multipLidcade c uma característica do Renascimento. A abertura do mundo irouxe o conhecimento de civilizações civilizaçõ es novas, com seus costumes, I nguas, hábitos alimentares. alimen tares. etc. Isto, é claro, acompanha os novos valores segundo os quais o homem (cada um) deve buscar seu caminho. Citando novamente Figueiredo: D
“Há algo de maravilhoso e inquictante na intinirude cias variações, O que se pode esperar íqj.tunainente íqj.t unainente dc um mundo infinilamentc diverso e surpreendente? Tudo. A credulidade c a liberdade dc imaginação do honrem renascentista não devem serju se rjulgad lgadas as a partir parti r de modelo modelo 'científico* 'científico* dos do s séculos posterio posteriores; res; elas não sào sào índice índicess de inge ingenu nuid idad adee e ausência de espirito espirito crítico. São form forma* mad iras iras e tolerantes de relação com com u diferença, dif erença, as mais ajustadas ajust adas a esse momento partic artic-u -ula larr de aber abertu turra do mundo undo."'*® ."'*® (p 34> Introduzimos com isso. uma outra imagem significativa do que se seguem ganh ganham am urna de A inve invenç nção ão do psic psicólo ólogo, go, Essa imagem e as que suas melhores expressões na obra dc Rabclais. Gttrgán Gttrgántuu tuu e Pantagrue Pantagruell (veja adiante). í9.
A Construção cio eu na Modernidade período, perío do, a feira feir a de rua. Ainda que a feira já fosse fos se uma instituiçã insti tuição o medieval, agora seu conteúdo está revestido com a abertura da Europa á diversidade cultural do mundo conhecido. Pode-se imaginar unia feira feira renascentista com as novidades nov idades trazidas das das mais diversas div ersas partes do mundo recém-dcscobcrtas Aliir. Aliir.er. er.tos tos básicos da cozinha, como a batata, o tomate, o cacau; temperos variados; tecidos e tinturas; pessoas pess oas e anim an imais ais de diversa dive rsass partes par tes são trazidos trazid os á Europa no n o mesmo mesm o espirito de exotismo, A própria própr ia idéia de comércio, com ércio, como intercâmbio intercâm bio de bens. circulação de mercadorias ou necessidade da criação de valores de troca, expressa bem o movimento da época. A feira dc rua contém um elemento elemen to de festa festa popular, popular, desordem c gritaria diante de uma um a profúsào de mercadorias, mercadorias, Difíci Difícill nisto -c - c isto isto é significativo do perío pe ríodo do-- devia ser a atribuição dc valor val or a cada coisa; coisa; quanto qu anto vale um cocar indigena. indi gena. que importância im portância ele tinhu em seu contexto contex to original? Quanto vale uma pequena estátua que representa a divindade de uma certa cultura? Corno Corno crcr na fídcdigntdade fídcdigntdade do produto oferecido? oferecido? Dc modo idêntico, podemos imaginar o espanto do liomcm ocidental ao deltoutar-se com as religiões e costumes distintos pelo mundo. Duas atitudes básicas podem ter sido tomadas diante desse conlmnto. Uma e mais convencional e reassegura as certezas sobre si; consideraria a diferença «na erro. Se o outro pensa de forma diferente da minha, ele está errado; cahe. por isso. catequizá-lo, conduzi-lo á verdade. verdade. Caso ele se recuse, justifica-sc justif ica-sc a utilização utiliz ação de meios, digamos, mais convincentes, convin centes, dado dad o que se trata trata de seu próprio bem. A chama cha mada da “con “ conqui quista sta da Amé A méric rica” a” mostrou mos trou muito mu ito bem como com o se processa processa isso isso e quais são suas suas conseqüências, com um e xtem xt em inio in io nuissivo de culturas. A outra atitude parece ser tnais auto-críiica e parece ter tido um lugar considerável no Renascimento. Diante do confronto com a verdade do outro, acaba-sc por se colocar cm questão a própria verdade, verdade, nâo para substitui-la, mas para tomá la não mais como com o única, única, mas com uma dentre as possíveis. Ou ambas verdades são válidas, válidas, ou ambas inválidas. Ilá um brilhante estudo dc Todorov sobre este tema. em A conquista da América. Nele é analisada a questão do confronto eom o outio através do que considera ter sido, mais do que o maior genocídio já perpetrado, um acontecimento fundador da Modernidade. Modernidade. a
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1'edm I .uís R:hcm> de Sanli A tese de Todorov é a de que tanto os espanhóis quanto os nativos tinham ama absoluta incapacidade dc enirar em contato com o outro enquanto tal. Cada Cad a um tomava o outro de modo mod o auto-reíerente: alguns astecas astecas tomavam Corte? Corte? como com o o deus e imperado imp eradorQu rQuetzak etzakoatl, oatl, cujo retomo estava estava predito: predito: os nativos de nações dominadas dom inadas violentamente pelos pe los astecas aste cas viam vi am tão somen som ente te a troca troc a d e um algoz alg oz mais violen vio lento to por po r um outro ou tro erron err oneam eament entee toma to mado do com c omoo itKtios violelo. violel o. Qu Quanto anto aos a os espanhóis, espanhóis, ou tomavam os nativos como objeto o bjeto desumanizado, a scr scr escravizado ou o u morto mo rto gratuita gratuita mente, ou pensavam ter encontrado encontrad o na América o paraíso terrestre, terrestre, ou ainda ainda insist insistiam iam -com o Colo C olom m bo bo-- na crença crenç a de que haviam de alcar.çado alcar.çado as as Índias, denominando denomin ando os nativos de “indios". De toda a forma, os espanhóis realizaram a conquista, subjugaram os nativos de muitas mu itas etnias (c aniquilaram completamente completam ente outras >, qu quee possuíam uma população popu lação quantitat quan titativam ivamente ente muito super.oi a de de soldados espanhóis. espanhóis. Além disso, o imperador impe rador asteca Montezum Mon tezumaa cntrcgou-se aos espanhóis c parece ter entregue sua nação sem resistência. Eis uma bela passagem na qual Todorov interpreta este fato: “O cncontm de Montezuma com Cortcz. dos índios com os espanhóis, ê. unlcs de mais r.ada, um encontro humano; c não há razão para surpresa surpresa se os especialistas especialistas da d a comunicação comunicação humana levam a melhor melhor Mas essa essa vitória, vitória, dc que somos todos originários, europeus e americanos dá ao mesmo tempo urn grande golpe em nossa capacidade dc nos sentirmos ern harmonia com 0 mundo, de pertencer a uma ordem préestabelecida; tem por efeito recalcar profundarneme ú comunicação do homem com o mundo, produziT a ilusão de que tuda comunicação é comunicação inter-humana; u silêncio dos deuses pesa no campo dos europeus tar.to quarto no dos indios Cunhando dc um lado, o europeu perdia de outro: ímpondo-se em toda a Terra pelo que era sua superioridade, arrasava cm si mesmo ,1capacidade dc integração no mundo Durante os séculos seguimos sonhará com o bom selvagem; mas o selvagem já estava morto, ou assimilado, c o sonho estava condenado á esterilidade. A vitòna já trazia em si 0 germe dc sua derrota, mas Corte/ não podia saber disso.” (p. 93-94)
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A Construção do eu nu Modernidade* A vitória vitó ria dos d os espanh e spanhóis óis teria se dado dado por sua maior ma ior habi Iidade idade cm entendei o modo de pensar pens ar do outro, tirando tirando proveito disso. Todorov insinua que este teria sido o mais importante fator da dornttwção do do europeu sobre o mundo: ele seria capa/ de dissimular e mentir. Em nossos termos, ele ê eapa 2 de criar um distanciamento entre sua ação e sua intenção, de acordo com seus interesses. Todorov chega a comparar com parar a caoaeicadc c aoaeicadc comunicativa com unicativa dcC ortez com as prescrições prescrições dc Maquiave! em O príncipe , escrito na mesma cpoca. Nesta habilidade comunicativa, neste auto-distanciamcnto e neste uso pu p u ram ra m ente en te func fu ncio iona nall da ling li ngua uage gem m , estarU estar U fund fu ndad adaa a M oder od erni nida dade de.. Temos, como em relação a Rabclais. uma posiçào intermediária: o europeu teria uma quase total incapacidade dc entrar em contato com a alteridade, buscando dominar e assimilar o outro; por outro lado, ele parece ter sido mais capaz que outros povos paia sair de seu próprio ponto de vista vista e procurar procu rar compreender o do outro, ainda ainda que para domina-lo. Todorov também també m indica indica que os europeu euro peuss cstariam acostumados a operar um descentramento, desde que seu centro religioso, Jerusalém, era. dc fato, fora de seu continente. N’a c o n c lu s ã o d c sua su a o b ra, ra , Todoro Tod orov v a p r e s e n ta - n o s e sta st a formulação paradig mática sobre sob re a questão do outro: outro: “Pois o outro deve ser descoberto. Coisa cicna de espanto, já que o homem nunca nunca está só, só, e niu seria seria o que é sem sua dimensão social. E, no entanto, é assim: para a criança que acaba dc nascer, seu mundo õ 0 mando, c o crescimento é uma aprendizagem aprendizagem da exterioridade e da sociabilidade, sociabilidade, podese dizer, um pouco grosseiramente, que a vida humana está contida entre dois extremos, aquele aq uele onde onde o eu invade o mundo mundo c aquele onde o mundo acaba absorvendo o eu, na forma dc cadáver ou dc cinzas. F, corno a descoberta do Outro tem vànrxs graus, desde o outro coino objeto, confundido com o eu, mas mundo que o cerca, até o outro comu sujeito, igual igual ao eu, diferente dele, com infin infin itas itas nuançai nuan çai intermediárias, podc-sc muito bem passar pass ar a vida toda sem nunca nunca chegar ã descoberta descobert a plena plena do outro {sup {supon ondo do-s -see que ela possa possa ser plena plena). ). Cada Cada um de nós deve recomeçá-la. pur rua vez; as expencncias anteriores não n ão nos dispensam disso. Ma? podem ensinar quais silo os eleitos do desconhecimento, (p. 243)
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Pedro Pedro Luis Luis Ribeiro Ribeir o de Saot i Sc voltamos voltamos agora a imagem da têira têira e do comércio, verem os que aqui impera o convívio com uma inédita diversidade de coisas. Essa festa, no entanto, traz u problema», referido antes, de atribuição dc um valor justo ju sto a cada coisa. coisa. A s coisas estão fora de seus seus contextos, onde talvez possuíssem um valoi justo, mas nesse encontro fortuito da leira já não se pode pensm ern seu valor original. Ainda nesse sentido, pcnsc-sc na reação das pessoas diante do relato relato dos viajantes sobre sobre as coisas incríveis que viram. viram. Uma Um a vez mais, a credulidade das d as pessoas seria ahaiada. ahaiada. Como Com o distinguir d istinguir relatos confiáveis de outros mentirosos ou fantasiosos? A descrição de um tamanduá parecerá tão absurda ou possível quanto a de um dragão do mar; mar; os relatos sobre cidades feitas de ouro (o Eldo rado) tocarão nas fantasias sobre o paraíso reencontrado nessas terras distantes e selvagens (onde, em se plantando, tudo dá...). PINTURA - Roseli e ArrimhoUlo Reíértmo-nos, na parte anterior, a artistas como da Vinci c Michelartgelo. Nesta, o pintor que nos ocorre é Bosch. Ele nasceu em 1450 1450,, quase no mesmo ano que Leo nardo nard o da Vinci Vinci (1452), mas, enquanto da Vinci parece estar em casa no Renascimento, fiosch pa p a re c e s o fre fr e r m ais ai s os e f e i to s da fra fr a g m e n taç ta ç ã o . S eu s b ió g r a f o s informam-nos que Boscli nasceu justamente diante de uma feira, mas ele não se sentia em casa. Parece que seu mundo de valores era era medieval m edieval c que, ao ab rir suas janelas jan elas,, lhe lhe parecia estar assistindo o apocalipse, o caos. Assim, curiosamente, ele acaba expressando melhor que seus contemporâneos a fragmentação do século. Suas pint pi ntur uras as mostr mo stram am corp co rpos os d ilace ila cera rado dos, s, em corr. co rr.bin binaçõ açõcs cs alucin alu cinad adas. as. Com freqüência, ele c tomado como um pré-surrealista, mas ele pr p r o v a v e l m e n te a c r e d ita it a v a s e r um h i p e r - r e a l is t a , m o s tra tr a n d o a degradação dos tempos, o fim do mundo da ordem. Há outro pintor que trabalha a fragmentação, mas -talvez já no século por po r ter te r n asci as cido do já sécu lo XVI, XV I, quase XO anos depois dc B o sc h sem o mesmo tum apocalíptico. Ele c Arcimboldo, com suas composições dc retratos utilizando fragmentos de coisas. Sua série mais conhecida é a das quatro estações, onde constrói expressões humanas combinando elementos típicos dc cada epoea. O efeito è
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A Construção
MÚSICA - A POMFONÍA A polifonia é um tipo dc música típica do Renascimento. Assim como com o o canto gregoriano expressava expre ssava bem o espírito medieval, a polifonia encarna seu tempo tempo O termo significa "muitas vozes” vozes ” e é just ju staa m ente en te com co m o se n coro co ro em uniss un isson ono o do grego gre goria riano no sc tivess tiv essee estilhaçado; estilhaçado; cada ca da voz canta uma melodia melod ia diferente, por po r vezes também uma letra letra diferente Podem scr quatro ou muitas mais vozes, vozes, gerando um efeito efeito ruidoso, quase q uase já nào musical. musical. No entanto, elas elas convivem. convivem . Através do século XVI, vai aumentando a capacidade dos compositores de harmonizá-las. Há uma peça de especial interesse dentro do que temos trabalhado. Ela sc chama Voulez ouyr les cris de Paris? (“Querem ouvir ouv ir os gritos dc Pan Pa n sT ’), deClé deC lém m ent en t Janeq Jan equin uin1 1-'. Nela, Nela, emee cantores canto res perg pe rgun untam tam-n -nos os.. por p or um minuto min uto,, sc quer qu erem em os ouv ou v ir os gritos grit os de Paris, Suas vozes são um pouco defasadas entre si. mas tudo c compreensível. Após a introdução, há um breve silêncio e então começamos a ouvir uma gritaria onomatopaica que se passa numa feira feira,, com vários vendedores chamando cham ando a atenção para o seu produto. Eventua Eventuall rr.c rr.cnt ntcc. as voze vo zess unem-se unem -se por instantes cm tom o de um tema para, para , cm segu se guid ida, a, se disp d isper ersa sare rem m de novo. nov o. Adiant Ad iante, e, outro ou tro tem te m a sur s urge ge e. novamente, desagrega-sc, como muna rapsódia. Tudo é muito
11 En 14. Ensaio saios, s, t , Cap. I. p. 14 La a Rata RatattUe, Ue, extraídas de “Les cris de 11 Voulez ou)r les cris de Paris? c L Paris, Harmonia Muoclí. 1982”.
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Pedro Luis Ribeiro de Sunti engraçado c carnavalesco (c inevitável pensarmos na situação da gravação em um estúdio moderno, em que músicos educados na rigidez dc conservatórios conservató rios grasnem, gritem e. é claro, claro, desafinem, com a leitura rigorosa da partitura). O centro da prod p rodução ução poli poli fônica 6 a Espanha que, por p or ter sofrido a invasão muçulmana, muçulmana , traz traz em sua cultura cultura muito muitoss elementos assimilados. Há músicas de uma extrema melancolia, lamentando a perda pe rda d a felic fe licida idade de e d a orde or dem m (id (i d a s viag vi agen enss e guer gu erras ras111. Em anexo, anexo , está o começo de um dos livros tti ttiaais dehochados dehoc hados do século XVT. Nele podemos reconhecer, desde a referência constante no Renascimento ã cultura clássica grega, até o tom irreverente r. viscer v isceral al do mundo m undo menos men os idealizado e n a is is próximo da experiência imediata imediata dos pra/eres pra /eres do d o corpo corpo Trata s? s? de um mundo de exageros, deboche e excessos, habitado por gigaites. TEXTO TE XTO ANE ANEXO XO -
François /tabelais
CARGÂNTUA E PANTAGRDEL “AO LEITOR Antes mesmo de In . leitor leitor amigo. amigo. Despojai-vos de ioda má vontade. Não escand escandaliz alizeis, eis, peço peço,, comi comigo go:: Aqui não há nem mal nem falsidade. Sc o mérito é pequeno, na verdade, outro intuito nau tive. no entretanto, A não ser rtr, e lazer nr portanto. Mesmo das aflições que nos consomem Muito mais vale o nsc do que o pranto Ride, amigo, que rir c próprio do homem.” (p. 31).
•'PRÓUXJODO AUTOR AUTOR Bched Bc hedorc» orc» ilustr ilustrese ese preciosíssimos bexigue bexiguento ntoss ípois ípois a Vos, não a outros se dedica o meu engenho]: Akébiades. no diálogo dc Platão intitulado O Banqueit, louvando o seu '* Ouça Rodrigo Rodrigo Martinez, Martinez, Pues fíie fíie/t, /t, para éfia, Por P or la las vrVm/í dc Sfadrid 6 A l aiva aiva ivnid, ivn id, extraidas extraidas de “£/ “£ / Concioaero de Paiaeio, dc grupo Herpérion XX, XX, AstréC'Audi AstréC'Audivis. I991 I991""
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A Construção do cu 11a Modernidade preceptor preceptor Sòcialcs Sòcialcs (sem controv controvérs érsia, ia, prínc príncipe ipe dos filósof filósofos) os),, entre outras coisas disse scr clc semelhante aos "silcnos". SUcrtos, para os antigos eram caixinhas, tais como as que hoje vemos nas vendas dos boticários, tendo pintadas umas figuras alegres e frívolas, como liarpius. sátiros, gansos ajaezados, lebres chifrudas, paios com cangalhas, bodes voadores, veados atrelados e outras figuras semelhantes, nascidas da imaginação, próprias para provocar o riso como fazia Sileno, mestre do excelent excelentee fiaeo. Dentro delas, porém, guardavam-se drogas valiosas corno o bálsamo, a âmbarcinzento, 0 amorno, o almíscar, jóias c outras preciosidades. Tal se dizia scr Sócrates, porque, queni o visse por fora. e estimando estiman do apenas a aparência exterior, nâo lhe daria dari a mini mini mo valor tanto clc era feio de corpo c ridículo em sua aparência, com nariz pontudo, olhos dc boi. cara de bobo, simples cm seus modos, rústico em suas vestes, parvo de riquezas, infeliz com as mulheres, inapto para todos os ofícios da república, sempre rindo, sempre tomando seus tragos, por causa disso, senipie brincalhão, sempre dissimulando o seu divino saber. Quem abrisse aqucái caisj, porém, lá dentro encontraria um bálsamo bálsamo celeste e inaprcci inaprcciãvel ãvel um emendime emendimento nto mais mais que humano, virtudes maravilhosas, coragem tnvcncivci sobriedode sem igual, contentamento certo, segurança perfei perfeita, ta, incríve incrívell desprendi desprendiment mentoo com com ivlncao ivlncao n tudo tudo que que os os humanos tanto ptvzairt, ludo aquilo que tanto oobiçant c em pro proll do do quê quê corr correm, em, trabalham, trabalham, navegar navegaraa c batalha batalham m Se não acreditais, por que não fareis o mesmo com estas novas e divertidas crônicas':' Eis que. ditando-as, não pense penseii senão em vós, vós, que porventura porventura hebeis hebeis como eu bebo bebo.. forque, nu 001oposição deste deste livro livro senhonl, senhonl, não perdi, e jamais ompníguéi um outro tempo, do que aquele que gasto para tomar tomar a minha refeição corporal, a saber, bebendo e comendo. comendo. São estas as horas mais adequadas para escrever sobre essas altas matérias e ciências profundas, como hem fez sabei' Homem, paradigma dc todos os tilõlogos, c Ênto, pai dos poetas poetas Jat Jatin inos os.. assim assim como como testemu testemunha nha Horac Horacio. io. embora embora um grosseirão tenha dito que os seus “Odrcs"' cheiravam mais a vinho do que a azeite. Coisa idêntica disse um bulio dos meus livros; mas merda para ele1O odor de vinho. õ. como ê mais saboroso, mais agradável, avais atraente que o do azeit a zeite1 e1
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Pixlro l ms Ribeiro Rib eiro de Sann
(jiat (jiatto, to, “A Cura de Lázaro Lázaro " fc. 1305 1305). ). Giotto introduz na pintu pin tura ra uma expressividade e uma dramaticidttde inexistente em períotfa períotfaxx anterior anterior cia pintur pintura, a, mus mus suo temática ainda era centraitnenie religiosa.
Bosch, "O Juíz Ju ízo o F in a l” (c (c.. 1500). 1500). Cheias dejigu dej iguru russ irnagtn irnagtnàri àrias as e muitas grotescos. f t u c t lança mão de uma grande liberdade estética, com dt-uorções fisicas, para representar os distorções de caráter. Da lin li n c i. "As "A s Prop Pr opor orçõ ções es da Figu Figura ra H um ana an a " O homem homemjtossn gradativamente a ser a medida de todas as coisas O cvrp/j humano c valorizado e é apresentado em proporções geométricas. geométricas.
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A Construção do eu na Modernidade
Arc A rcim imbo bofdo fdo,, "A primavera primavera ". O to do è formado por um con/ttnio de frag fra g m ento en toss evo ev o cativas da estação. A represe represent ntação ação e poiifõn po iifõnica ica e ped p edee diversas perspectivas de ívdin
Rvmhr Rvmhrand andi, i, “A lição lição de anatomia do Dr. Tulp Tulp " (163 (16321 21.. O jog jo g o do !u: (daro/escum) permite r im foco foco obje o bjetim tim sobre so bre o objeto objeto da pintura. pintura. Nuda Nuda disperso a percepção. Assim como no pro/cto carlexiuna, temos a busca po p o r representa representações ções claras clara s e distin distinta tas. s.
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Pedro Luís Ribeiro de Sanü l; sinto-me muito muis lisonjeado, quando se diz que gasto mais vinho do que azeite, do que ficou Dcmóstenes quando dele disseram que gustu gustuvu vu mais azeite azeit e do que vinho. vinho. Para mim, só me sinto honrado e jubiloso por ter fama de sei um bom copo e um hom companheiro: graças a isso sou bem recebido cm todos os bons grupos de pantagruclistas. (..) li agora di verli-vos. verli-vos. meus queridos, e lede alegremciue. para para satisfaçã satisfação o do corp corpo o c beneficio beneficio dos dos rin rins. Mas Mas escutai escutai,, sem vergonhas e que n úlcera vos corroa: tratai de beber poí mim, que eu começarei, começar ei, sem mais mais demora ” fp. 33-3 33-361 61 + Vemos, com Rabclais, a valorização do nso e de toda forma de prazer corporal, em confronto com a tendência nascente (e que dominará o século XVII) dc só respeitar a seriedade, a contenção e a mente. Talve Talvezz convenha conven ha lembrar lemb rar exatamente neste neste momento, mo mento, como Umbcrto Eco deixa claro, no eixo de seu romance uO Nome da Rosa”, Rosa” , o risco que a visão ortodoxa ortodo xa considerav co nsideravaa liavcr no riso, riso, também no final final da Baixa Idade Média. Na tentativa tentativ a de conte co nterr o riso -o praz pr azer er >observ obse rv amos o esfo es forç rço o em obter ob ter o aulo au lo-c -con ontro trole. le. Ao mesmo mes mo tempo, vemos a valorização renascentista da cultura greco-romana. Q lIfStt lIfSttks ks p ara discus discussã são o
1 Qual Qual c a importância da feira dc rua no universo do Renascimento? 2 Que tipo dc reação foi gerada pelo confronto com outras culturas? 3. Por que no Renascimento o homem perdeu suas certezas?
A Construção do «ru na Modernidade
5 OS PROCEDIMENTOS DE CONTENÇÃO DO EU Acompanhamos, Acompanham os, nesta parte, pa rte, algum algu m as das medulas tomadcs para o restabelecimento restabelecimento de referencias ftarr a colocação do homem no mundo. mundo. Elas estarão estarão voltadas voltadas ao próp pr óprio rio eu. na figura do auto-controie.
A nova no va valorização do ser humano e a imposição de que
J T x .
ele construa sua existência e descubra valores valores segundo os quais qua is viver, viver, aliada aliada a toda a dispersão c fragmentação do mundo, que qu e apontamos acima, levarão levarão a tentativa de criação criação de d e mecanismos para o dominio c formação formação do eu. eu. É na forma formação ção destes destes procedimentos - ‘modos de se s e r" - que poderemos poderem os começar a reconhecer reconhecer os rumos que levar levarão ão à Psicologia, Psicologia, Citando Citan do uma vez mais Figueire Figueiredo: do: “(...) t.k> importantes ou até mais importantes do que a abertura de espaços de liberdade mdividua. com se vê acontecendo ao longo do processo dc desintegração tios 'civilizações fecha das’, são as tentativas de circunscrever estes espaços. Assim sendo, sendo, as as experiênci experiências as subjetivas subjetivas nn sentido moderno moderno do termo e que vieram a se converter em objeto dc um saber c de uma intervenção psicológicos devem a sua emergência tanto ás vivências de diversidade diversidade e ruptura como às às tentativas dc orde or de nação e costura, ou seja, a todas ai praticas reformistas que bnph bnphca cava vam m urna urna subjeti jetivi viddad adee indiv indivku kual aliza izada da c uma uma tens tensão ão sus us tentada entre áreas ou dimensões de ]he herda rdade de e áreas áreas ou dimen sões sões dc submissã submissão. o. (... (...)C )Como omo se vê, vê, o ‘indivíduo', indivíduo', ao cont contra rato to do que o termo sugere, nasce da dispersão c traz uma cisão interior inscrita em sua natl)reza.'’l', 14.4 invenção do psicológico, p, 59.
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Pedro Luis Ribeiro de Santi Impoc-se ao homem, a partir ele agora, escolher o seu caminho. Essa escolha implica cm uma construção da identidade, e todos os exemplos exem plos m ostram-nos como isso exige exige um esforço bruta brutal, l, quase sobrehumano; sobrehumano; o homem hom em deve deve dom inar a dispersão que o mundo 6. () ( ) carnaval de Rabelais será contido, contido, o corpo c suas funções serão calados cm favor da coesão e da oídem do sujeito. Durante a Idade Media, era relativamente difícil explicar como era possível ser responsabilizado por pecar: se a pessoa não em livre e apenas cum pria os os planos de Deus, com o responsabilizarespon sabilizala? No Renascimento, Renascimento , a questão pode ser equacionada de outra forma: forma: Deus fez o homem Itvre para que ele possa ser julgado; ele pode escolher um bom caminho e ser recompensado po: isso, mas pode ser desviado desviado dele por tentações tentações e dispersões - e o mundo mund o rcnascetui sta as oferece em em quan:idade e, então, ser responsab ilizado e punido po p o r isso. A q uest ue stão ão passa pas sa a ser; o que qu e eu d e v o ser? C om o devo de vo me fo m a r? F.m term term os mais psicológicos, como construir uma identidade? Há vários exemplo s de modos dc constituição de identidade no Renascimento. Talvez o mais conhecido seja o de Dom Quixote de La Mancha, personagem dc Cervantcs, que sc identifica com o ideal ideal do cavaleiro attdante medieval e procura afirmar-se. A evocação evocação deste exemplo já sugere que a afirmação de uma identidade coesa pode po de asse as sem m elha el harr-se se à alu a luci cina naçç ão, ão , na n a m edid ed idaa cm que cia deve de ve impo im porrse sobre o inundo, ele próprio em frangaLhos. Passemos agora a um exemplo concreto de procedimento vislumbrado no século XVI para a constituição dc uma identidade coesa, que consiga nüo se deixai levar pela pela disnersào. disnersào. O pensamento pensam ento religioso, religioso, adaptando-se adaptando -se aos tempos como sempre, pnxluzirá. sobretudo sobretu do através de Santo Inácio de Loyola. procedimentos para a afirmação da identidade iden tidade sobre sob re a dispersão do sujeito. guiand o-o de volta a Deus. Santo Inácio con verteu-se á religião já adulto. Ele havia sido sido militar, c uma das características mais marcantes que impôs a seu sistema foi a disciplina. Tendo fundado a Companhia de Jesus, imprimiu imprimiu um u m traço distintivo dos jesuitas jesu itas até hoje, hoje, sua iniciativa iniciativa prática e pregação militante. Santo Inácio parte do mundo renascentista, reconhecendo a liberdade hmrana, mas constata a perdição do homem e buscará
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A Construçilo do eu na Modernidade mostrar-lhe mostrar-lhe o caminho do d o reencontro reencontro com a ordem orde m . Seu procedimento, pro p ropr pria iam m en ente te hu huma manis nista, ta, taz. taz. escol esc olaa até hoje: o ho hom m em é livre para ser o que é e parece estar perdido; ele precisa e pode. portanto, dirigir sua livre vontade ao caminho cam inho correto para se encontrar. O que ele precisa e de um manual dc instruções, uma tccniCH para dirigir sua ação. Em Os Exercidos Espirituais, são propostos uma série de procedimentos, com a duração de 28 dias. cujo cumprimento rigoroso deverá levar o praticante à iluminação. Uma vez mais. vale a pena reproduzir alguns trechos da obra: obra:
TEXTO ANEXO - Santo Ignácio de Loyola EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS “ I* Anotação. Por esta expressão, expre ssão, Exercícios Espirituais, enlendc-se qualquer qualquer modo modo dc cxainrnar cxainrnar a consciência, meditar, contemplar, oraj vocal ou menialmcnte, c outras atividades espirituais, dc que adiante falaremos. Porque; assim como pass passea ear, r, caminhar caminhar c correr correr são exercíc exercícios ios corp corpora orais, is, também também sc chamam exercícios espirimais os diferentes modos de a pessoa pessoa sc prepara prepararr c dispor paru paru tira tirarr de si todas todas as afeiçõe afeiçõess desordenadas, e, lendo-as afastado, procurar e encontrar a vontade de Deus. *ia disposição da sua vida para o bem da mesma mesma pessoa.” pessoa.” (p. 11 11-2 -2). ). ”5* Anotação. Muito aproveita ao exercitatue entrar neies com grande ânimo c liberalidade pum com seu Criador e .Senhor, ofercccndo-dic todo o seu querer e liberdade, para que sua divina majestade sc sirva de sua pessoa e dc tudo quanto possui, possui, conforme confor me a sua santíssima Vontade." Vontade." (p. (p. 15). “EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS PARA PARA 0 HOMEM HOMEM SE VENCER A SI MESMO E ORDENAR A PRÓPRIA VIDA. SEM SE DETERMINAR POR NENHUMA AFE1ÇÀO DESORDENA DESORDENADA** DA**(p. 27). PRINCÍPIO E FUNDAMENTO FUNDAMENTO O homem é criado paia louvar, reverenciar e servir a Deus Nosso Senhor, e assim salvar a sua alma. E as outras coisas sobre a face d.t terra sào criadas para o homem, pura que o ajudem » alcançar o fitn para que é criado. Donde sc
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Pedro LuLs Ribeiro dc Saati segue que hà dc usar delas tanto quanto o ajudem a atingir o seu fim. c há de privar-se delas tanto quanto dele o afastem. Pelo que é necessário tornar-nos indiferentes a respeito de todas us coisas criadas cm tudo aquilo que depende da escolha escolha da nosso li\'reli\' re-arbít arbítrio, rio, e não lhe c proibido. IX* ta. nume ira que, dc nossa parte, não queiramos mais saúde que doença, riqueza que pobreza, honra que desonra, vida longa que breve, e assim por diante cm tudo o mais, desejando e escolhendo apenas o que mais nos conduz ao fnn para que somos crindos." (p (p 28). 28). "REGRAS PARA PARASENTIR SENTIR VERDADEIRAMLNTE VERDADEIRAMLNTE COMO SE DEVE DEV E NA IGREJ IGREJA A MILITANTE
I" regra. Renunciando a lodo juízo própno, devemos estar dispostos c prontos a obedecer em tudo á verdadeira esposa de Cristo Nosso Senhor, isto é, a santa Igreja hierárquica, nossa màe.'’(p. 188) "9' regra. Louvar tlnalmente todos os preceitos da sarna Igreja, e estar disposto para procurar razões em sua defesa, e nunca para os criticar," “ 13*regra regra Para Para em tudo acertar, devem devemos os estar sempre dispostos a ercr que o que nos parece braneo é negro, sc assim o determina a Igreja hierárquica; persuadidos de que entre Cristo Nosso Senhor -o esposo- e a Igreja -sua Esposa não ha senào um mesmo Espírito, que nos governa governa e dirige pura a salvação das nossas almas. Porque é pelo mesir.o Espírito c mesmo Senhor, Senhor, autor dos dez mandamentos, que se dirige e governa a santa Igreja, nossa Mãe." "15* regra. Habitualn-jcnte nào devemos falar muito dc predest predestina inação ção.. Mas Mas se se cm algum algumaa ocasião se falar falar diss disso, o, faça faça-sc de maneira que os os simples simp les fiéis f iéis não caiam em algum erro. Algumas vezes isso acontece, quando concluem: “Se já está determinado que me vou condenar ou salvar, nào são as minhas ações hoas ou más que hão de mudar esta determinação". E com este raciocínio tornam-se negligcnics e descuidam as obras que conduzem á salvação ç ao proveito espiritual das da s suas almas." (p. 192) 92) “ 17* regra. Igualtnentc Igualt nentc não devemos tnsistir tnsistir tanto nn graça a ponto dc se produzir o veneno que q ue nega a liberda liberdade. de. Pode-se Pode-se com certeza falar fal ar da fc c da graça, mediante o auxilio auxilio
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A Construção do eu na Modernidade divino, para maior louvor de sua divina Majestade, mas não de tal forma forma nem por tais modos, mormente cm nossos tempos tão perigosos, que as obras c o livrc-arbitrio sejam prejudicados prejudicados ou mesmo mesmo negados." negados." (p, (p, 193). * Assim, u liberdade humana é reconhecida apenas para se lhe atribuir a causa da perdição humana. Curiosamenie, a salvação implica justam ente em abrir mão mã o de forma absoluta absoluta dessa liberdad liberdade, e, transferindo-a á autoridade religiosa com Ioda a boa-vontade c determinação. A submissão do sujeito deve ser absoluta, esse c o preç pr eço o a pag pa g ar pelo pe lo repo re pous uso o num nu m a cert ce rtez ezaa sem conf co nflit litos os.. Exigc-.se Exigc-.se disciplina, dedicação e, sobretudo, que se abra mão da própria experiência imediata em favor da palavra da Igreja. Se, ao fim dos 28 dias, a iluminação não chegou, isso nào se deve a uma falha do método, mas certamcnte à pouca fé e à fraqueza da vontade do excrcitantc'5. F. bastante bastant e visível o quanto qua nto parte par te daqui a insp iração iraçã o de um gênero literário de bastante sucesso no final do século XX, chamado "Psicologia "Psico logia de auto-ajud auto -ajuda" a" A crença na liberdade liberdade humana hum ana absoluta, absoluta, que di/ que podemos atingir quaisquer que sejam nossos objetivos, envolve um forte sentimento dc culpa: se somos o que fazemos de nós, esta esta infelicidade na qual nos encontramo encon tramoss foi produzida por nós, nós, nós a merecemos. A premissa do título dc urn urn livro como “Só é gordo quem quer", poderia scr derivada em "só c pobre quem quer”, ou "Só é brasileiro brasileiro quem quer", etc. etc. A única determinação reconhecida para pa ra nos n osso so scr s cr é a própr pró pria ia von v onta tade de;; toda to dass as det d eter erm m inaç in açõe õess histó hi stóric ricas as,, sociais, genéticas, etc, são simplesmente negadas. A cada época, a falta de sentido dc nossa existência mostrase preza fácil das “autoridades dc plantão” a nos oferecer generosamente seu manual de como viver. Mais importante do que esta esta produção, c a percepção de como a Modernidade parece implicar Santo Inácio antecipa dc forma espantosa alguns dos mais importantes pensa pensado dores res do século século XVII: II: Desca Descarte rtess e Hob Hobbe bes. s. Mai Maiss perto perto dc nós. antecip antecipaa também as Psicologias humanistas ou dc auto-ajuda c ainda alguns cultos Marketi ting. ng. religiosos e procedimentos de Marke
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Pedro Luis Ribeiro Ribeir o de Santi Santi neste sentimento de va/io e cria a demanda por nos formarmos continuamente
MÚSICA - UMA POLIFONIA MAIS COMPORTADA Uma vez mais, a m úsica nos auxiliará na exemplificação exemplificação de um conceito. No final do século XVI, a polifonia parece gradativamente tornar-se mais bem comportada. As vozes múltiplas vão sendo harmonizadas e não sc tem mais a impressão de ru do: elas simplesmente .sâo disciplinadas, dispostas de tal forma que componham um todo equilibrado, listamos a um passo da “fuga” (estilo próprio ao século XVIF). Mesmo as letras parecem mais comportadas, evocando a contra-reforma. contra-reforma. Não será possível retomar ao universo do canto gregoriano, mas sera possível buscar orcem dentro da diversidade, como vimos através atrav és de Santo Ináci Inácio. o. F.is uma curio cu riosa sa letra, compo com posta sta por Mate M ateoo Flocha, Flocha , HI HI Vie Viejo jo,, La s E nsaia ns aiada das. s. num gênero que tem o evocativo nome dc Las
EL FU F U E G O 1®-
Ua (ca F lecha , L I lle jo
Corrcd, corred. pecadores! No No os os tardeis a traer luego luego agua al fuego, agua ul fuego' fuego, fuego. fuego! Este fuego que se enciende es d maldito peccado. peccado. que al que no hulla ocupado sicmpre para st Io prende. Qualquier que de Dios pretende salvacíon, procure luego agua al fuego. agua al fuego fue go" " e "Et fuego
extraídas dc "Las Ensaiadas, Sony M u ú c , 1991”. Ambas são ainda polifonias, compostas dc vários fragmentos temáticos c mesmo de vários idiomas, mas pode sc notar, cspecialmente na segunda, o quanto as vozes ja estâo harmonizadas, submetidas a tina composição composição rigoro rig orosa. sa. Ouça também o inicio da "Missa Papae MarccUi". dc Paleslnna, extraída dc "Baroque. Paiestrina e Moateverdi, EMT Classes, 1995”. "I a i \egrina",
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A Construção do eu na Modernidinle Fucgo, fucgo, fucgo! Venid presto, pcccadores, a matar aqucstc fticgo; I laced peniten penitencia cia lucgo lucgo de todos vuestros emiresRcclamen essas campanas dentro cn vuestros coraçoncs. Dandán, dandán. dandán... Poné en Dios Ias aficiones, todas las gentes humanas. Dandán. dandán, dandán Uamad essos aguadores, luego, luego, sin lardar! Y ayúdennos a rnatar este fucgo, No os tard tardeis eis en tracr tracr luego luego dcnlro de vuestru conciencia mil cargos de penitencia de buen' agua. y ansí matanõis Ia fragua dc vuestros maios deseos, y los cnemigos fcos huyrán. A expressão ‘salada" ê especialmente própria para delinir a polifo po lifonia nia,, n este es te caso. M esmo esm o já sc trata tra tand ndo o de urna m úsica ús ica mais contida, não faltam misturas dc temas musicais, idiomas aparentemente, trata-se trata-se de uma coleção de trechos trechos dc canções unidos ao gosto do compositor. compositor. Já mais ao final do século, encontramos encontram os uma música propriamente equilibrada e muito bonita, um dos melhores frutos da religião, a música sacra. * Tomemos Tom emos agora outro exem plo hem mais cruel cruel c naturalista de procedimento dc afirmação do sujeito; O Príncipe, obra dc Maquiavel do começo do século XVI, Trata-se de uma sene de pres pr escr criç içõe õess so b re com co m o bem be m gove go vern rnar ar.. Em noss no sso o con co n tex te x to - i s t o poder po deria ia sc tr t r a d u /ir /i r assim: ass im: que qu e tipo dc sujei su jeito to utri tri princ pr incip ipcc deve dev e ser? ser ? Como Co mo deverã dev erã ser se r seu s eu “ euM?. Seu princípio c o de que o mundo (figurado pela figura do
Pedro l.nis Ribeiro de Sarri povo po vo)) é volúv vo lúvel el -volt -vo ltan andd o -se -s e para pa ra aquil aq uiloo que repre re presen sentar tar seu interess inter essee mais imediato , sem memória, egoísta e, enfim, nau. A grande preo pr eocu cupa paçã çãoo de Maq M aquia uiave vell c a fragm fra gmen entaç tação ão da Itália e a sua su a invasão inva são po p o r b árb ár b aro ar o s. É n e c e ssár ss ária ia a imp im p o siçã si çãoo de um suje su jeito ito fort fo rte. e. O governan gov ernante te não tem outra opção opçã o que sc afirmar à força, força, criar criar alianças mais pelo temor temo r do que qu e pelo amor. como com o única única form formaa tlc tlc estabelecer uma umdade a dispersão dispers ão O valor primeiro de tudo ser seráá a obtenção obten ção e manutenção do poder centralizado. Para tanto, não há que se ter vergonha por fa/er qualquer coisa nc*ie sentido, mesmo matar a quem quer que r que qu e represente uma ameaça am eaça ao poder. O principio principio ético c o da afirmação do poder. Maquiavel foi foi tomado tomad o como co mo imoral e desumano desuma no
TEXTO ANEXO - M co ló
M a c h ia r e il ilii
C) PRÍNCIPE é que os homens, com satisfação, mudam dc senhor pensando pensando melhora melhorarr c esta crenç crençaa faz com que que lan lancem mão mão dc armas contra o senhor atual, no que se engana enganam m porque, pela própria próp ria experiência, experiên cia, percebem percebe m mais tarde ter ter piorado a situação.” situação.” (p. 11) 11) "E quem conquista, querendo conserva-los (o poder c o domimo] deve adotar duas medidas: a primeira, primeira, fazer fazer com que a linhagem l inhagem do do antigo príncipe seja extinta; aoutra, outra, aquela de não alterar alterar nem as suas leis nem os impostos: por por tal forma, dentio dc mui curto lapso de tempo, o território conquistado passa a constituir constituir um corpo corpo todo todo com com o prin princi cipa pado do antigo.” antigo.” (p. 13) “E que, em verdade, não existe modo seguro para conservar tais conquistas, senão a destruição. E quem se tome senJior de uma cidade acostumada a viver livre e não a destrua. es|>er s|>ere ser destruí destruído do por cia, cia, porque a mesma mesma sempre
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A Construção do eu nu Modernidade encontra, para apoio dc sua rebelião, o nome da liberdade c o de suas antigas instituições, jamais esquecidas seja pelo decurso do tempo, tempo, seja por po r bcneficios recebidos. Por quanto quanto se faça e proveja, se não se dissolvem ou desagregam os habitantes, eles nào esquecem aquele nome nem aquelas instituições, e logo, a cada incidente, a eles recorrem como fez Pisa cem anos apôs estar submetida aos florentmos" (p, 30). “Deve, pois, um príncipe não ter outro objetivo nem outro pensamento, pensamento, nem tomar qualquer outra coisa por fazer fazer scnào a guerra e a sua organização e disciplina, pois que c essa a única arte que compete a quem comanda. E c ela dc tanta virtude, que nào só mantém aqueles que nasceram principes, como também também muitas vezes vezes faz faz os homens homens de condição privada subirem àquele posto: ao contrário, vé-se que, quando os principes pensam mais nas delicadezas do que nas armas, perdem o seu Estado,” (p. 85) “Resta ver agora quais devam ser os modos e o proceder proceder dc um príncip príncipee para com com as súdi súditos tos c os amigos amigos c, c, porque porque sei sei que muitos muitos j á escreve escreveram ram a respe respeito ito,, duvido não ser considerado consider ado presunçoso escrevendo ainda sobre o mesmo assunto, máxime quando irei disputar essa matéria à orientação orient açãoj á por outros dada aos principes. Mas, sendo sendo minlta minlta intenção intenção escrever escrev er algo de de útil para quem por tal se interesse, pareceu pareceu-me -me mais conve convenie niente nte ir em busc buscaa da verd verdad adee extra extraída ída dos fatos c nào à imaginação dos mesmos, pois muitos conceberam repúblicas e principados jamais vistos ou conhecidos como tendo rcalmente existido existido Em verdade, verdade, há tanta diferença de como se vive e como se deveria viver, que aquele que abandone o que faz por aquilo que sc deveria fazer aprendera antes o caminho de sua ruma do que o dc sua preserv preservação ação,, eis eis que que um um homem homem que que queira queira em todas todas as suas suas palavras palavras fazer fazer profi profissã ssão o de bondad bondade, e, penler-scpenler-sc-áá em meio a tantos que não são bons. Donde è neeessáno, a um príncipe que queira se manler. aprender a poder nào scr bom e usar ou nào da bondade, segundo a necessidade ” (p. 89-90) “ Um príncipe não deve, pois, temer a má má íama dc cruel, desde que por ela mantenha mantenha seus súditos unidos c leais (P- 95) “Nasce Nasce dai uma questão: se é melhor scr amado que temido ou o contrario. A resposta é de que seria necessário
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Pedro Luis Ribeiru de Santi ver uma coisa c ou Ira, mas, como é difícil reuni-las. em tendo que faltar uma das duas é muito mais segure ser temido do que amado. Isso porque dos liomens pode-se dizer, gcralmcntc, que sào ingratos, volúveis, volúvei s, simuladores, simuladores, temenfes do perigo, ambiciosos de ganho; e, enquanto lhes fizeres bem, bem, são todos todos teus. teus. ofcrcccm ofcrcccm-tc -tc o próprio próprio sarguc, sarguc, os bens, bens, a vida. vida. os filhos, filhos, desde que, que, como se disse acima ac ima,a ,a necessidade esteja longe de ti: quando esta se avizinha, porem, revoltamse. E o príncipe que confiou intciramcntc cm suas palavras, encontrando-sc destituído de outros meios do defesa, está perdi perdido: do: as amiza amizades des que se adquirem adquirem por dinhe dinheiro iro,, e não não pela pela grandeza grandeza e nobreza nobreza de alma, alma, sào sào comp comprad radas as mas com elas não sc pode contar e, no momento oportuno: nào se toma toma possível utilizá-las. E os homens têm menos enos escrúpulo em ofender a alguém que sc faça amar do que aquem aque m sc faça temer, posto que a amizade é mantida por um vinculo de obrigação que, por serem os homens maus. é quebrado em cada oportunidade oportunidade que a eles eles convenha; mas o tem temor or c mantido pelo recei receio o de de castigo castigo que que jamais sc aban abando dona na." ." (p. (p. 96) 96) “Náo se deve, pois, deixar passar esta ocasião, a fim dc que a Itália conheça depois de tanto tempo, um seu redentor. redentor. Nem posso posso exprim ir com que amor ele teria teria recebido em todas aquelas províncias que tem sofrido por essas invasões estrangeiras, com que sede dc vingança, com que obstinad obstinadaa fé. com com que piedade, com q que ue lágrim lágrima? a?,, (^uais portas se lhe fechariam? Quais povos lhe negariam obediência? Qual inveja se lhe oporia? Qual italiano lhe negaria c seu favor? A todos repugna este bárbaro domínio. Tome, portanto, a vossa ilustre casa esta esta incumbência i ncumbência com aquele aquel e ânimo e com aquela esperança com que sc abraçam as causas justa ju stass (p. (p. 14 146) * Sem dúvida, por mais que possa parecer esranho. há uma serie de pontos em comum com um entre este este procedim ento t o prescrito por Santo Inácio. Ainda que um afirme o valor do humano e o outro o retom o a Deus, ambos amb os crêem na necessidad necess idadee tia tia afirmaç afirmação ão do sujeito através de procedimentos radicais e estreitos. Mas com Maquiavel, estamos diante d iante de um mundo mu ndo sem ideal, no qual a imposição imposição do sujeito sc faz faz necessária po r uma concepção conce pção naturalista n aturalista e egoíst egoístaa do homem: homem :
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A Construção do eu na Modernidade não há apenas o elogio do homem como no Renascimento. É disso que trataremos na próxima parle. Acrescento ainda uma diferença essencial entre os dois: Santo Inácio pensa que seu procedimento è acessível a todos, enquanto enqu anto que Maquiavel, ao menos nessa obra, refere-se a afirmação de um único sujeito, em detrimento detrimen to dos demais. Ele trata trata da constituição con stituição do Estado, como Hobbes, no século seguinte, a quem antecipa. Questões para discussão 1. C om o se relacion a a crença iu i liber liberdade dade do hom em e a tentati tentativa va de submcté submcté--
lo a uma ortletn ortletn disciplinar rígida rígida no século XVI? 2. Quais são as semelhanças entre Santo Inácio dc Loyola c Maquiavel? 3. Quais podena pode nam m ser as relações relações entre os ‘Exercícios Espirit Espirituais’ uais’ e as Htua tuais terapias tlc autu-ajuda?
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Pedru Luis Ri beiro de Santi
6 A POSIÇÃO DE CRÍTICA À APARÊNCIA Nesta N esta p a rle, rle , p rocu ro cura ram m o s m o stra str a r guc ci tendência à glorificação do eu não n ão é absolut absoluta. a. Alguns pensadores pensad ores já começ começam am a denunciar denunciar como ilusórias suas pretensões cade ver maiores. A Modernidade contém uxnto pro p roce ced d im en tos to s p a ra a co n stru str u ção çã o ao eu i/uuntn pam a sua desconstrução.
, XVI 1A Ikind a no século séc ulo XV I que possui uma ríq ic /a aparentemente infinita-, podemos identificar ainda outra poitura quanto quan to ao ao valor do ser ser humano. H á uma série série de autore au tore squ e critic criticam am a pretensão do homem etn ser tão iileal e que apontam, comojá o fizera Maquiavel, para urna eventual maldade c vaidade humanas. Esta Esta posição possui relações comp lexas com o humanismo. Fm um certo sentido, afirma-o, em outro, arrasa-o. A primeira vista, pode parecer que esta vertente estaria excluída da Modernidade, mas veremos que esta última pteeisa de tais procedimentos. Ao menos alguns pesquisadores, como Harold Bloom, reconhecem justam ente em alguns destes autores -sobretudo Shaltespeur Shaltespeuree os fundamentos fundamentos mais expressivos expressiv os da Modernidade. Modernidade. Dentre os lemas que temos trabalhado, podemos retomar dois. Em primeiro lugar, o que acabam os dc tratar acima, a formação do “eu” . Montaigne, Mon taigne, a quem já citamos citamo s acima, diante dian te da instabilidade instabilidade c insegurança dc tudo, acaba por fazer fazer renascei um ou tro dos movimentos movim entos do pensamento pen samento grego: o ceticismo. Não podendo confiar confiar ou acreditar em nada. Montaigne sc retira da vida social, isola-se e passa pa ssa a escr es crev ever er dura du rant ntee anos an os,, c até o fim de sua vida, vida , sua famosa fam osa obra En E n saio sa ios. s. Não se trata apenas de um livro, inas da própria formação do sujeito Montaigne. F.lc descreve a si e ás suas 47
A Construção do eu na Modernidade experiências, copia e cita textos dc seus autores favoritos e afirma que escreveu o livro apenas para si c para os anugos. A escrita será um momento de interiorizaç&o, dc digestão de experiências. O ceticismo toma ao menos dois aspectos no período. Um d eles el eséé chamad cha madoo dc ‘'fid ‘'fideism eism o” o”.. Ele implica implica em numa critica ao valor valor crescente atribuído ao homem, mostrando sua insignificância; mas esta diminuição do homem teria o sentido dc fazê-lo voltar novamente a Deus. Assim, de um lado. o homem home m é insignificante diante dian te de Deus e, de outro, segund seg undoo alguns dos fidetstas, a razão hu huma mana na é interior á fc. Mas lambem, há propriamente propriam ente um ceticismo que não se contenta contenta em mudar mud ar o centro de lugar (do (do Homem Hom em de volta para Deus) qualquer possibilidade dc crença em alguma referência absoluta pare pa rece cerá rá insust ins ustent entáve ável.l. Embo Em bora ra Monl. Mo nl.ug ugne ne se de decla clare re cató ca tólico lico,, sua obra leva-nos a crer que ele se filia ao segundo grupo. O eu não é para par a ele uma um a refe re ferên rência cia a priori, prio ri, co com m o o será pa para ra De Desca scartes rtes,, mas sim algo incon inconstante stante c sempre inacabado. Ele Ele se forma continuam contin uamente ente num processo reflexivo. reflexivo. Trata-se da introspecçào, daquela conversa proveitosa consigo mesmo, que q ue Ftloo tloom m reconhece oomo o cânone ocidental o cidental (aquilo que caracterizaria a Modernidade ocidental), É como se. a partir de então, Montatgne já não fizesse mais parte do do mundo; ele se torna ou pensa como com o se fosse fosse um ponto ponto de vista alheio, do qual é possível realizar a critica do mundo, nele nüo se incluindo propriamente. Lm um certo sentido, este é um dos pontos mais altos de autonomia a que poderia aspirar o "cu“ p. Monlaigne vive a diversidade e busca afirmar-se afirm ar-se enqua enq uant ntoo ser particulur, particulur, com co m o se p< poutros por mim. Acredito de bom grado que o que está nas outros possa possa divergir divergi r essencial mente mente daqui Io Io que esta cm mim. Não obrigo ninguém a agir como ajo c concebo mil c uma maneiras 17 Talvez alguém sc lembre neste ponto pont o dos alquimistas alquimistas mediev medievais, ais, que igualmente i solavam-sc do mundo e voltavamvoltavam-sc sc para si. Embora Embora possamos hoje pensar que o processo dc mutação c purificação alquimica signifique um processo de nueriorização do alquimista -desde que lemos .d obra c»i nrgru dc Yourcenar-, eles própnos não o tomavam assim. A alquimia não era metáfora ou símbolo, m » coisa coisa em si. Seria, portanto, portanto, um anacronismo compará-la com um procedimento de auto-analise ou cunstmçâo de si.
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Pedro Luis Ribeiro dc Santi diferentes diferen tes de viver; e, conlrunamcntc ao que o:orre o:o rre em geral, geral, espantam-me bem menos as diferenças entre nós do que as semelhanças. semelhanças. Nào imponho a outrem nem mci m ci modo dc vida vida nem meus princípios, encaro-o tal qual c, sem estabelecer comparações. comparações. (...) pela imaginação ponho-me muito bem cm sua pele c os estimo c honro tanto mais quanto divergem dc mim. Aspiro particularmcntc a que julguem tarda qual como é. sem estabelecer paralelos com modelos tirados do comum. Mrnha fraqueza nào altera absolutamente o apreço cm que deva ter quem possui força e vigor. "Há pessoas que só aconselhariam aconselhariam aquilo que imaginam poder imitar". Embora me arraste ao nivel do solo, nào deixo dc pcrcchcr nas nuvens, por mais mais alto alto que que se elevem elevem,, certas certas almas almas que se distin distingue guem m pelo heroís heroísmo mo.. Já é muito para para mim ter o julgam julgamento ento just justo, o, ainda que não o acompanhem minhas ações, e manter ao menos meno s assim incorruptível essa qualidade Já
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A Construção dó eu na Modernidade
TEXTO ANEXO ANEXO - E r a s m o d e R o lter lte r d a m ELOGIO DA LOUCURA “Embora os homens costumem ferir a minha reputação e eu saiba muito bem quanto o meu nome soa mal aos ouvidos dos mais tolos, orgulho-me de dizer que esta Loucura, sim, esta Loucura que estais vendo é a única capaz dc alegrar os deuses c os mortais. A prova incontestável do que afirmo está em que não sei que súbita e desusada alegria brilhou no rosto de todos ao aparecer cu diante deste numerosíssimo auditório." {p. 7). “Pois bem, quem desejaria sacrificar-se ao laço matrimonial, se antes, como costumam fazer em geral os filósofos, refletisse bem nos incômodos que acompanham essa condição? Qual c a mulher que se submeteria ao dever conjugal, se todas conhecessem ou tivessem cm mente as perig pe rigosa osass dores dor es do parto c as penas da educação? educa ção? Sc, Sc, portanto, deveis a vida ao matrimônio matrimônio e o matrimônio à Irreflexão Irreflexão, que Cuma das minhas sequazes, avaliai quanto me deveis. Alem disso, uma mulher que já passou uma vez pelos pelos espin espinhos hos do inso insolúv lúvel el laço laço.. c que anseia anseia por tornar tornar a passa passarr por por eles eles,, não o fará, fará, talvez cm virtude virtude da assis assistên tência cia Esquecimen imento to,, minha da ninfa Esquec minha cara companheira? companhe ira?"" (p. (p. 16). “Coragem, “Coragem, vamos vamos!! Dissimular, enganar, fingir, fechar os olhos aos defeitos dos amigos, ao ponto de apreciar e admirar grandes vícios como grandes virtudes, não será, acaso, avizinhar-se da loucura? Beijar, num transporte, uma verruga da amiga, ou sentir com prazer praze r o fedor do seu nariz, e pretender pretender um pai que o filho zarolha zarolha tenha tenha dois olhos de Vènus, não será isso unia verdadeira loucura? Bradem, pois. quanto quiserem, ser uma grande loucura, c acrescentarei que essa loucura é a única que cria e conserva a amizade.” amizad e.” (p. (p. 29). “O que dissemos da amizade também pensamos c cora inais razão dizemos do matrimônio. Trata-se (como deveis estar fartos dc saber) de um laço que só pode ser dissolvido pela morte. Deuses eternos! Quanto Qua ntoss divórci div órcios os não sc verificariam, ou coisas ainda piores do que Odivórcio, sc a união do homem com a mulher não se apoiasse, nío fosse alimentada pela adulação. pelas carícias, pela complacência. complacência.
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Pedro Pedro l.uis l.uis Ribeiro de Santi Santi pela volúp volúpia, ia, pela simula simulação ção,, cm sum suma, por toda todass as minh minhas as sequazes e auxiliares? Ah! como seriam poucos os matrimônios, sc o noivo noi vo pnideniementc pnideniemen tc investigas investigasse se a vida e os segredos dc sua futura «ira-metade «i ra-metade,, que que ihc parec parecee o retraio da discrição, da pudicicia e da simplicidade! Ainda menos numerosos seriam os matrimônios duráveis, a; os maridos, por po r inte in tere ress sse, e, por com co m plac pl acên ênci ciaa ou por po r burr bu rric ice, e, não ignorassem a vida secreta dc suas esposas. Cos:uma-se achar isso uma loucura, e com razão; mas é justamente justa mente essa loucura l oucura que toma o esposo qnend qne ndo o da mulher, e a mulhe mulher, r, do esposo, mantendo a paz domestica c a unidade da família. Comeia-se um marido'' Toda a gente n e o chama de como, enquanto o bom homem homem,, todo atenci atencioso oso,, fica fica a consolar consolar a cara metad metade, e, e enxugar com seus temos beijos as lágrimas tingd tin gdas as da mulher mulher adúltera. Pois não é melhor ser enganado eng anado dessa dessa forma do que rocr-sc dc bílis, fazer barulho, pôr tudo de pernas para o ar, ficar furioso, abandonando-sc a um ciúme funesto e inútil? Afinal de contas, nenhuma sociedade, nenhuma união grata e durável poderia existir exi stir na vida, sem a minha intervenção intervenção:: o povo povo não suport suportari ariaa por muito muito tempo tempo o piínc piíncipc ipc,, nem nem o pat patrão rão o servo, nem a patroa a criada, nem o professo* o aluno, nem 0 amigo amigo o amigo, nem o marido a mulher, nem o hospedeiro hospedeiro o hóspede, nem o senhorio o inquilino, etc., se não se enganassem reciprocamente, nào se adulassem, nao fossem prud prudcn cntc tcm mcntc cntc cúm cúmplic plices es,, temp temper eran ando do tudo tudo com um grikvin grikvinho ho dc loucura.“(p. 30-31). "Quando se reflete atcntamcnle sobre o gênero humano, e quando sc observam como de ema alta torre (jusUmientc a maneira pela quul Júpilcr costuma proce procede der, r, segundo dizem os poetas) todas as calamidades a que eslà sujeita a vida dos mortais, nào sc pode deixar de ficar vivamente comovido. Santo Deus! Que c, afinal, a vida humana? Como é miserável, como ê sórdido o nascimento! Como é penosa a educação! A quantos males, está exposta a mtancia! Como sua a juventude! Como é grave a velhice! Como è dura a necessidade da morte! Percorramos, ainda uma vez, esse deplorável caminho. Que horrivel c variada multiplicidade dc males! Quantos desastres, quantos incômodos se encontram na vida! Enfim não há prazer que nào tenha o amaigor dc muito fel, Quem poderia descrever a infinita serie dc inales que o homem causa ao homem, como
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A Construção do cu na Modernidade etfj etfjut utnn a pob rez*. rez *. a
prisão,
a inlã i nlãniu niu,, u Jcsotiiit, Jcso tiiit, ys (ormcn (ormcntO tOS, S,
a inveja, as traições, as injúrias, osconflitos, as fraudes, cte ? Eu não saberia dizer-vos que delito teria o homem cometido para merecer merecer tão tão grande grande quantid quantidade ade de male males, s, nem que deus deus furioso o teria constrangido a tiaster cm tão horrível vale de misérias.” |p 47 j. “Às vezes, c urti louco :jue sc ri de outro louco, divertindo-s divert indo-see ambos mutuamente. Também Também não é rano rano ver-se ver-se um mais louco rir-se muito muito de outro menos menos do que ele. Mas na minha opinião o homem é (ante mais feliz quanto mais numerosas são as suas modalidades de loucura, contanto que não saia da espécie que no» c peculiar e que c tão espalhada que cu não saberia diicr sc haverá, cm todo o gênero humano, um indivíduo que seja sempre sábio c não tenha também a sua modalidade. Sc alguém, ao ver uma abóbora, a tomasse por uma mulhe mulher, r, dir-se-ia ser o pobrezinho um louco. A razão disso è que semelhante perturbação raras vezes costuma aparecer entre nós Mas quando um marido imbecil adora ador a a mulher, mulher, julga jul gand ndoo-aa mais mais fiel fiel do que Pcnélope, mesmo que cia lhe faça crescer na cabeça um bosque de chifres, e intimamente intimamente se felicita, f elicita, bendizendo bendizendo enormcmentc o seu destino c dando graças a Deus por o ter unido u semelhante Luerécia - ninguém ninguém acàa que sc trate dc loucura, loucura, porque isso, hoje cm di dia, a, c a coisa mais natu natura rall deste deste mundo undo.. “ (p. 63). ♦ Através do humor, Erasmo opera uma implacável desconstrução de todo um sistema de valores valores tomado tomadoss como com o óbvios. Trata-sc do dcsvclamento e desnaturnli/ação de costumes tomados como naturais. Este E ste tipo tlc tlc discurso discu rso produz uma espécie de ruido de fundo constante constante á tentativa de afirmação afirm ação dc qualquer idéia dc verdade. verdade. Já que falamos de Erasmo, além Je O elogio da Loucura uma das obras obras mais atro a troad ador oras as dc valores valores edesveladora de hipocr hipocrisi isias as sociais c que garante ao autor um lugar de destaque na vertente critica-, é oportuno dizer que ele também pertence a outra tradição literária: a dos autores de manuais de boas maneiras. Estes manuais dizem dizem respeito respeito jus lamente â questão ques tão do :ontrole do corpo. Em O pro p roce cess sso o c iviliz iv iliza a d o r , de Elias, c na Histór H istória ia da vida p riva riv a d a , dc
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Pedro Luis Lui s Ribeiro de Santi Santi Aries & Uuby, encontramos analises de A c ivtltd iv tltd a d e p u e r il c de outras obras dc Erasmo que, a um só tempo, nos mostram como o corpo passa a ser progressivamente alvo dc auto-controle e observação, e revelam o quanto este processo foi longe e nos compreende. É impossível impossível nào rirmos diante das recomenda recom endações ções sobre como lidar com nossa glutonicc c eventual necessidade dc arrotar, urinar ou soltar gazes (em casos urgentes, estes últimos devem ser encobertos com uma tosse boa dica,. dica,.,). ,). Estamos de volta ao grotesco grotesco e nos parece inimaginável inima ginável hoje que os os próprios termos sejam incluídos incluíd os num manual. Já no século XVIII, estas expressões desapareceram. No N o sso ss o riso á leitur lei turaa de dest stes es ve velh lhos os m an anua uais is no noss m ostra os tram m o q u an anto to o prin pr incí cípp io q ue os rege re ge ioi io i efic ef icaz az c ag agee cm nó nós; s; as no norm rmas as q u e no noss indicam que as funções corporais devem ser ocultas são absolutamente absolutamen te automatizadas a utomatizadas e, por que qu e nào dizer, inconscientes. inconscientes. Creio que será será interessante interessante agora evoc e vocar ar como com o Elias Elias trabalha trabalha o conceito conc eito de 'civilização*. 'civilização*. A civilização expressa-se em uni conjunto extenso dc formas formas dc exp expressão ressão com as quais o homem home m ocidental ocidental se identifica: identifica: a tecnologia, a religião, as condut con dutas as c pu punições nições no caso dc desvios, os modos modo s de viver cm conjunto, etc. Ela representaria representaria tudo aquilo que a nossa sociedade considera ter de superior às demais cultur culturas, as, O processo civilizador se se ten a dado, com o já indicamos nas parte pa rtess an ante terio riore res, s, às custa cu stass de d e um u m rigor rig oros osoo sistem sis temaa dc d c con c ontro trole le social socia l que inibe a expressão das funções corporais e dc grande parte dos impulsos. Trata-se da modelagem dc determinados modos dc ser transmitidos sobretudo pelos pais. Entre os séculos XVI e XVII, se teria processado intensamente a produção de códigos de inserção social e seu não cumprimento sempre seria acompanhado pelas acusações de “doença”, “ doença”, “crime" ou alguma forma forma dc desagrado que leva à exclusão do convívio. Elias observ observ a que, na medida em que a expressão dos d os desejos e emoções intensas cm geral vai sendo constrangida, con strangida, os olhos olho s passam a adquirir um papel essencial como forma dc contato. Vale a pena inserir inserir aqui uma um a passagem rclativamcntc longa: longa: "ReconhecidariictUc, essas emoções de fato tem, em forma “refinada”, racionalizada, seu lugar legitimo c prccisamcntc definido na vida cotidiana da sociedade civilizada. E isto c . . muito característico característico do tipo de transformação transf ormação através do qual
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A Construi;ào do eu na Modernidade sc civilizam as emoções. Paiu dar um exemplo, u beligerância e a agressão encontram expressão expr essão socialmenle permitida aos jogos jogo s esportivo esportivos. s. E elas se manifesta manifestam m especialinente especialinente em particip participar ar como como "espectado "espectador" r" (como (como por exem exemplo plo,, em lutas lutas de boxe), boxe), na identifi identificaçã cação o imaginána com com um pequeno pequeno núme número ro de combatentes, a quem uma liberdade moderada e prccisamcntc prccisamcn tc regulamentad regula mentadaa é concedida paru liberação dessas emoções. E este viver viv er de emoções assistindo ou mesmo mesmo apenas escutando (como, por exemplo, a um comentário no rádio) c um aspecto particularmcntc característico da sociedade civilizada. Esse aspecto determina em parte a maneira maneir a como sc escrevem livras c peças dc teatro e influencia dccisivamente o papel do cinema em nosso mundo. Essa transformação do que, inicialmcntc, sc exprimia cm uma manifestação ativa c freqüentemente agressiva, no prazer passivo c mais controla controlado do de assistir assistir (isto é. é. cm mero mero prazer prazer do olho), já c iniciada na educação e nas regras de condicionamento condicionamento dos jovens. (...) F. altamente altame nte caracterí carac terístico stico do homem civilizado civili zado que seja proibido por autocontrole soeialmcntc incukado de, espontaneamente, tocar naquilo que deseja, ama. ou odeia. Toda Toda a modelação modelação dc seus gestos -pou -p ouco co importando como o padrão possa diferir entir as nações ocidentais no tocante a detalhes- c decisivamente influenciada por essa necessidade.(p. 200) Desde o Renascimento, afirmou-se a auto-percepçào de um *eu' individual fechado, separado c cm oposição a um ‘mundo externo’, ai compreendidos os objetos e as outras pessoas. A observação de Filias sobre a imposição de um contato indireto, intermediado pelo olhar, com os objetos com a proibição do toque, parec pa recee basta ba stant ntee expr ex pres essi sivo vo dian di ante te d a pres pr esen ença ça intens int ensaa da telev tel evisã isão, o, do computador e dos experimentos em realidade virtual. No limi li mite te do scculo scc ulo XVI ao a o XVII, XV II, exat ex atam amen ente te cm IMM), surge sur ge uma das obras mais importantes jamais escritas, H a m le t , de Shakespcarc. Ainda que boa parte dos elementos da obia já esteja insinuada no texto de Erasmo c Maquiavcl, çertamente vale a pena apresentar trechos também dessa obra. que sintetiza e encerra este eess o civili civilizador. zador. 10Flia Flias, s, cm O pm eesso
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PedroL Ped roLuis uis Ribeiro de Sant Santii perío pe ríodo do,, lanç la nçan ando do-n -nos os já no sécu sé culo lo XVII. XV II. TEXTO TEXTO ANEX ANEXO O -
Hlllitim Hllliti m Shak Sh akes espe pear aree
H A Ml.ET
“HAMLET “HAMLE T Ser ou não ser eis a questão. Será Será mais nobre sofrer sofr er na alma pedradas c flechadas do deslino fer f ero/ o/ ou pegar pegar em armas contra o mar de angústias. E, cornbaicnòo-o, darlhe fim? Morrer; dormir. Só isso. E com o sono -dizem extinguir dores do coração e as mil mazelas naturais a que a cíirnc 6 sujeita; eis uma consumação ardentemente ardent emente desejável Morrer -dormir-dorm ir-,, dormir! Talvez Talvez sonhar. sonhar. Ai está o obstáculo! Os sonhos que hâo dc vir no sono da morte quando quan do tivermos tivermos escapado ao tumulto vital nos obrigam a hesitar: c é essí reflexão reflexão que da á desve desventu ntura ra uma uma vida táo longa Pois que querii rii suportaria o açoite c os insultos do mundo. A afronta do opressor, o desdém do orgulhoso. As pontadas do amer humilhado, as delongas da lei, A prepotência do mando, e 0 achincalhe que que o mérito paciente paciente recebe dos inúteis inúteis pode po dend ndaa ele próprio, encontrar seu repouso eonr um simples punhal* Quem agüentaria fardos, gemendo e suando su ando numa vida servil servil,, Sedào porque o terror de alguma coisa após a morte o paii nào descoberto, dc cujos confins jamais voltou nenhurn viajante- nos confunde a vontade, nos faz preferir c suportar os males que já temos, a fugirmos pura outros qu; desconhecemos? E assim a reflexão faz todos nós covardes, E assim o matiz natural da decisão se transforma no doentij pálido do pensame pensamento. nto. E empreit empreitadas adas dc vigor vigor e cora corage gem m, refletidas demais, saem dc seu caminho perdem o nome de ação (.. (.. H p . 88-8 88-89 9). No trec tr echo ho acim ac ima, a, vem ve m os lla ll a m let le t mono mo nolog logar. ar. São muilo mu iloss e extensos seus monólogos monó logos que expressam uma característica essencial essencial tia tia Modernidade: a interioridade. A reflexão, o desdob ramento rame nto sobre sobre si, si, cria a possibilidade de um diálogo diálog o construtivo, con strutivo, mas Shakcspeare já expressa pela voz de seu herói o quanto este mergulho para dentro sc dá às custas da ação. A consciência de si traz ao homem a consciência de sua vaidade c um distanciamento melancólico da experiência imediata.
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A Construção do cu na Modernidade No trech tre cho o abaix ab aixo, o, pode po dem m os ver ve r este es te liomern inter in terior ioriza izado do rccusando-se a ser tomado como um objeto de manipulação. Quase pode po dem m os pen p ensa sarr em uma um a critic cri ticaa ao a o que qu e virá a ser se r o pro p roje jeto to cien c ientifi tifico. co. L'í Hamlet insiste insiste paia paia que (iuil (iu ilde denst nstem em toque toque uma flauta; flauta; este recusa-sc, afirmando nâo dominar a técnica do instrumento) HAMLET Pois veja só que coisa mais insignificante insigni ficante você você me considera! Lm mim você quer tocar; pretende conhecer dentais os meus registros; pensa poder dedilhar o coração do meu mistério Se acha capar cap ar dc me me fazer soar, soar, da nota not a mais mais baixa baixa ao topo topo da esca escala. la. Há Há muita muita música úsica,, uma uma voz excel excelen ente, te, neste pequeno instrumento, e você é incapaz dc fazê-lo falar, Pelo sangue dc Cristo!, acha que cu sou mais fácil fácil dc tocar tocar do que uma uma flauta? Pode Pode me me chamar do instrumento instrumento que quiser qui ser pude mc dedilhar dedilhar quanto quanto quiser, quiser, que não vai vai me arrancar arrancar o menor som.., som.., (p. 111)”, 111)”, ‘'HAMLET 'HAMLET - Esse Esse crânio já teve língua um dia, e podia cantar. cantar. E o crápula o atira ai pelo chão, como se tosse a queixada de Caim. o que cometeu o primeiro primeiro assassinato. assassinato. Pode ser a cachola dc um politiqueiro, isso que esse cretino chula agora; ou ate o crânio de alguém que acreditou ser mais que Deus (...) Pode scr. F. agora sua dona é Madame Verme; desqueixado e com o quengo martelado pela pá de um coveiro. Uma bela revolução, se tivéssemos capacidade dc entende-la. A educação desses Ossos terá cuslado tão pouco que só sirvam agora para jogar a boch bocha? a? Os meus meus doem doem,, só de pens pensar ar nis nisso so.. (...)” (...)” "-Mais um! Talvez o crânio dc um advogado! Onde foram parar seus sofismas, suas cav ilações, seus mandatos e chicanas? Por que permite agora que um patife estúpido lhe arrebente a caveira com assa pá imunda e não o denuncia por lesões corporais? Hum! um! No seu tempo, esse sujeito sujei to talvez talvez tenha sido um grande comprador de terras, com suas escrituras, fianças, termos, hipotecas, retomadas dc posse. Será isso a retomada final dc nossas posses? O teimo dc nossos termos, termos, será termos termos a caveira nesses termos? Os liadores li adores continuarão avalizando só com a garanlui desse par dc identificações? As escrituras dc suas Icrras Icrras dificilmente caberiam nessa cova; o herdeiro delas náo mereceria um pouco mais?" (p ( p . 168-1 168-169 69). ). "HAMLET -Deix -De ixaa eu ver. ver. (pega o crânio) Olá. pobre Yonclt! Lu o conheci, Horacio oracio.. Lm rapaz de infinita infinita graça, graça, dc espantosa fantasia, Mil vezes me carregou nas na s costas; e agora, me causa
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Pedro Luis Ribeiro de San» horror só de lembrar! lembrar! mc revoltas o estômago' estô mago' daqui daqui pendiam pendiam os lábios que eu beijei não sei quantas veze». Yorick, onde andam agora as tuas píudus? Tuas cantigas? Teus lampejos de alegria aleg ria que faziam a mesa explodir expl odir etn etn gargalhadas? gargalhadas? Nem uma gracinha gracinh a mais, zombando zo mbando da tua tua própria própria dentadura ?Que falta de éspinto! éspinto! Olha, vai vai até o quarto quarto da minha Dama c diz diz a ela que, mesmo que se pinte com dois dedos de espessura, este é o resultado final; vc se ela ri disso! (...)' (... )'
1. Quais são as relações entre a origem da valorização do indivíduo c o ceticismo? 2. Quais foram as principais criticas dirigidas ao "eu”já r.o século XVI? 3. Quats sàn as relações entre a civilização e o auto-controle?
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A Construção do eu na Modernidade
7 O DISCURSO DO MÉTODO Acompanharemos, Acompanh aremos, nesta part parti. i.', ', através atrav és do exemplo mm!ciar mm !ciar de Descartes, Descartes, como o eu chega a seu ponto de máxima afirmação no século XVII, Ao A o eu será atribuída uma posição posiçã o transcendente ao mundo material: com Isto. nascerá o projeto da produção de um conhecimento objetivo, neutro, independente da subjetivida subjetividade, de, u ciência.
titulo desta parte refere-se a uma das obras mais importantes da história h istória da filosofia, filosofia, escrita escrita por Descartes, Descartes, no século século XVII. Hla será nossa principal referência aqui. F.m mais um u m a das caricatura caric aturass que temos feito nesse percurso, percurso , sécu lo XVII tentou organizar racíonalmente pode po dería ríamo moss dize di zerr que qu e o século a desordem do século anterior anterior.. Boa parle do doss filósofos mais mais conhecidos conhe cidos liojc liojc são daquele século c. c. embora seus sistemas sejam profundamen profu ndamente te diferentes, diferentes, há algumas características próprias do século. século. Quase Q uase que invariavelmente, suas obras procuram criar um método para a compreensão do mundo eiti sua totalidade. Para isso. o inundo será dividido, analisado, hierarqui/ado metodicamente. É comum que o primeiro prim eiro capí ca pítul tuloo de uma um a dessas des sas obr o bras as trate tra te daqui daq uilo lo que qu e o auto au torr pensa pen sa ser a coisa mais importante do mundo (a causa de todas as demais coisas): coisas): em geral, este lugar é ocupado por Deus. O segundo segu ndo capitulo trataria da segunda coisa mais importante do mundo: a alma, por exemplo, exemplo, t assim por diante, diante, até até que todo todoss os seres do inundo tivessem tivessem ganho seu lugar. Trata-se daquele mesmo esforço que já apontamos, etn capítulos anteriores, pata controlar a desordem. Dada a insegurança
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Pedro Luis Ribeiro de Santi do ceticismo, é necessário encontrar algum pon.o de referência confiável con fiável sobre o qual qual edificar edifi car a existência. A razão razão humana hum ana buscará bu scará cnconLrar a ordem das coisas para dominá-las c, sobretudo, dominar a si mesma. O discurso do método, aliás, foi o primeiro livro de iilosofia a ser escrito nào em latim, latim, mas m as na língua frances francesaa do autor, o que mostra que a racionalidade estava no caminho dc se tomar mais difundida e integrada à vida comum. Assim conto Santo Inácio, Descartes De scartes acredita acredita qu quee o caminho cam inho para pa ra a verd v erdad adee é acessív ace ssível el a qual qu alqu quer er um. de desd sdee que tod to d os são livres livr es para par a d irig ir igir ir sua vo vonta ntade de ao cam ca m inho in ho corret cor reto. o. A diferen dife rença ça é qu que, e, cm Santo Inácio, a verdade é Deus e o caminho cam inho è a meditação, meditação, enquanto enquan to que Descartes opera um deslocamento c refere-se à verdade enquanto tal e o caminho encontra-se no correto uso das leis matemáticas e geométricas. Descartes é reconhecido como o filósofo mais expressivo desse movimento c um dos fundadores da Mudernidade: seu pens pe nsam amen ento to asso as socia cia-se -se à origem orig em do Ilum Ilu m inism in ismoo e, posteri post eriorm ormen ente, te, da ciência. Por outro lado. não faltam aqueles que o tomam como o criador dc um racionalismo exagerado, distante da experiência. Hlc seria o maior ma ior represen rep resentante, tante, juntam jun tament entee com EJlatão. latão. da filosofia da representação, que exclui o corpo e seus impulsos, pretendendo que o mundo mund o seja seja totalmcnte racionalizável, submetido subm etido a séries de causa e efeito. efeito. Tentemos, como com o já fizemos fizemos com Maquiavd, compreendê-lo cm seu contexto. Descartes nasceu em 1596, mergulhado aa efervescência que já descrevemos. Com dez anos, ingressou cm um colégio de jesu je suít ítas as,, ou seja se ja,, sob a orien or ienta taçã çãoo do pe pens nsam amen ento to ce Sant Sa ntoo Inácio. Quando Icmos O Discurso do Método, publicado em 1637, encontramos exatamente o depoimento de algucrr que passou boa parte pa rte da vida em bus b usca ca de uma um a refer re ferênc ência ia confiá con fiável vel c não a en encon contro trou: u: cada fí lòsofo d iria iri a uma u ma coisa, sem nunca n unca entrar entra r em acordo acordo com outros; cada livro informava difcreniemente; cada cultura tinha suas leis pr p r ó p r ias ia s e a lgo lg o q u e f o s se c o n s i d e r a d o c e r to aqu aquii p o d e r ia ser se r considerad con sideradoo errado muna cidade vizinha Enfim, p.-ra onde quer qu er que olhasse, tudo o que via era desordem e dúvida. É uma percepção dc mundo que em nada difere du de Montaigne, por exemplo. A solução encontrada por Descartes foi iniciar um processo
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A Construção da eu na Modernidade de dúvida metódica, ou seja, ele se se propôs prop ôs a refletir sobre cada coisa que há no mundo, m undo, procuran p rocurando do sabei sabei sc cia llte llte poderia fornecer for necer uma verdade segura. O método será o mais semelhante possivcl com o da matemática c da geometria. Uma vez firmado um ponto de referência, tudo mais deverá vir por dedução. A busca é por idcias claras c distintas. Para Para nào corr co rrer er riscos e ajudar a distinguir com clareza idéias que fossem totalmcntc verdadeiras, de tomou o seguinte principio: àquilo que fosse falso, ele consideraria falso; àquilo que fosse incerto, seria tomado igualmente como falso falso.. Apenas algo realmente seguro poderia passar por po r seu crivo. criv o. Penso que podemos associar este procedimento com duas características da pintura p intura barroca do século XVII: a busca dc rca li/a r retratos altamente realistas e detalhados, e a técnica do claro/escuro. Nas pintu pi nturas ras há uma um a alta d efin ef inir irão ão d e luz luz. sobr so bree seu obje ob jeto to tema. tem a. enquanto enqua nto o fundo. cm geral, geral, c escuro. escuro. Quase nào se pode duvidar duvida r de nada, nào há há meios tons Vejam Vejam-se -se,, sobretudo, sobretudo , as obras de Caravaggio Caravag gio ou Vermeer. em todos eles. há a representação fotográfica do tema; sobre ele, ele, recai recai um foco bem definido de luz, luz, enquanto que o fundo é indefinido c deixado na escuri escuridão. dão. No proc pr oced edim imen ento to de Descar Des cartes tes,, uma um a u uma, uma , as coisa co isass iam se mostrando enganadoras enganad oras FIc FIc procedeu seu exame exam e de de dentro para fora e, e, assim, em primeiro prim eiro lugar lugar,, percebeu percebe u que as opiniões das pessoas comuns e de "especialistas” eram duvidosas; depois percebeu a variabilidade das leis e regras morais. Já uão podendo contar com certezas extemas. passa a interrogar a si si mesmo mesm o (reencontra-se aqui o movimento que identificamos na passagem da Idade Média ao Renascimento). Renascimento). Em primeiro luga lugar, r, averiguou sc seus órgàos do sentido lhe proporcionavam informações seguras, c chegou à conclusão de que não. Interrogou, então, seus sentimentos c viu que o que cies lhe transmitiam não era nada objetivo. E cntüo se perguntou sc a sua sensação de ter cc rtc/a rtc /a sobre algo garantia a verdade correspondente corresponden te e, ainda uma vez, concluiu que não. Este movimento de recuo metódico, em que parece que Descartes vai ficando cada vez mais acuado, aparentemente aparentemen te chegaria ao ceticismo absoluto abso luto dc Montaigne. M ontaigne. Mas então Descartes dá seu "pulo do gato". Depois dc duvidar de todas as coisas. Descartes diz que,
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Podro Luis Ribeiro de Santi
realmentc. tudo u que tomou como objeto de seu pensamento cra incerto, mas que algo lhe parecia indubitável: enquanto duvidava, seguramente existia ao menos a atividade de duvidar e se havia esta ação, ela deveria ter um sujeitn , uin "cu pensante". Fsta é a conclusão de Descartes: diante dc toda a dúvida do mundo, o único pom po m o dc segur seg uran ança ça e refe re ferê rênc ncia ia que qu e tem te m os é o de um “cu “c u ", não enquan enq uanto to corpo, pois sua sua existência também foi foi colocada em dúvida, mas utn eu eu puramente pensante, uma alma racional ca pe/ pe / de produzir produ zir p en se, se , representações corretas corretas do mundo. mundo. Dai a famosa famosa fraje V e pen d o n e je j e s u b " (eu penso, logo existo). Teriamos, Teriamos, com com isso, isso, o ponto máximo máx imo do humanismo enquanto já valor do homem nu mundo c sua posição enquanto centro. O homem já cra reconhecido como centro do mundo; agora, ele mesmo tem um centro, sua razão, sua aufoconsciênda. A partir do “cu". Descartes deduzirá a existência do corpo c dos demais ”cus“. Mas, em primeiro lugar, lugar, deduzirá deduzi rá a própria existência dc Deus. Deus e deduzido como uma causa necessária para a existência do homem, mas, se sua existência tem que ser deduzida do d o cu, qual dos do s dois será mais important importante? e? Assim, sc de inicio os caminhos caminh os de Descartes Descartes edu Montaignc M ontaignc sc assemelham, eles acabam dc formas radicalmentc distintas: em Montaignc temos a incerteza sem fim c a necessidade de construir continuamente um eu; em Descartes, a dúvida é superada pela suposição da existência prévia de um eu absoluto, um sujeito que subjaz (a origem dos termos é a mesma) a tudo. Retomemos a referencia que fizemos a Santo Agostinho no prim pr imeir eiro o capitu cap itulo lo.. Dentr De ntree os diver div erso soss pont po ntos os de conta co ntato to entre en tre ele e Descartes, Descartes, vale dizer que ele também teria teria antecipado Je certa forma o debate de Descartes contra os céticos e mesmo a solução dada por po r este es te últim últ imo, o, em uma um a form fo rmul ulaç ação ão que qu e Taylor Tay lor denom den omina ina ‘proto‘proto cogito’, Agostinho sente que precisa defender-se dos céticos, pois as crenças cristãs seriam arrasadas se eles conseguissem provar que de fato não sabemos nada. Daí surge a argumentação que costum amos amo s atribuir como originária o riginária dc Descartes D escartes e ponto ponto chave de sua argumentação etn favor do cogito: mesmo o cético não pode duvidar dc sua própria existência, caso contrário não seria possível sequer que ele se enganasse. O ponto máximo da dúvida metódica (a chamada cham ada dúvida hiperbólica) cartesi cartesiana ana consistia consistia justamenle justam enle na
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A Construção do cu na Mudcmidadc
hipótese de um Deus enganador que pudesse insuflar falsidade em nossas representações, representações, Sto Ago Agostinho stinho parece antever antev er este ponto limite da dúvida e fornecer a mesma resposta que Descartes: tomar a certeza cia primeira pessoa como fundamento indubitável contru os céticos. O conhecedor e o conhecido são idcnticos. trata-se da evidência da auto-presença ed itaçõe õess m etafísica eta físicass de Descartes A semelhança com as M editaç vão alem: a afirmação daquela verdade inquestionável ainda nào garante a verdade das coisas e dc Deus. A garantia para estas verdades 6 dad dadaa pela concepção dc que. sendo imperfeitos im perfeitos,, devemos ter sido originados de um ser perfeito, em muito superior a nós. O mergulho merg ulho que o homem dá dentro de si o eleva a uma verdade acima acima dele. A conclusão dc Taylor è a de que no universo agostiniano. a seguinte equação deve ser feita: “Deus = a verdade existe". É justamente neste último ponto que se pode começar a diferenciar Descartes de Agostinho, já que. até agora, pod podíamos íamos incluir incluir o primeiro quase que lotalmcnte na tradição do segundo. Em Descartes, a fonte da moral vale dizer, a verdade verdad e é de detinit tinitivam ivamen ente te interna. Descartes tambem deduz. Deus, como Agostinho, de nossa imperfeição, mas Deus jã não é o fim do caminho, para onde tudo tende, mas ele serta um passo em meu caminho, uma garantia para as idéias evidentes que tenho cm mim. É no eu que tudo se encerra. I>esde Descartes, só será considerado verdadeiro aquilo que pass pa ssar ar pelo criv c rivoo (ob ( obse serv rvaç ação ão ou o u ex expe perim rimen enta taçã ção) o) da razão raz ão hu huma mana na O lug lugat da verdade verdade c o e u e nà nàoo mais tex texto toss ou repre represe senta ntant ntes es do do sagrado. A Modernidade se ergue diante da descrença progressiva da possibilidade dc acesso imediato a qualquer transcendência.
TEXTO ANEXO - R e n é
D e sc a rte rt e s
O DISCURSO DO MÉTODO "O bom senso c a coisa do mundo melhor melhor partilhada, pois pois cada quíd pensa estar tão bem prov ido dele que mesmo os que sáo mais difíceis dc contentar em qualquer outra coisa não costumam desejar tc-lo mais do que o tem. E não é verossímil que todos se enganem a ta tall respeito, respeito, mas isso antes antes testemunha que o poder de bem julgar c distinguir o verdadeiro do falso. 62
Pedro I.uis Ribeiro de Santi Santi que é propc«me propc«mente nte o que se denomina o bom senso senso ou u razão, C natural mente igual cm todos os homens, c, destarte, que u diversidade de nossas opiniões não provém do fato de serem uns mais racionais racionais do que outros, mas somente somente dí conduzirmos □ossos pensamentos por vias diversas e nào considerarmos as mesmas coisas. Pois nào é suficiente ter o espirito bom. o prin princi cipa pall è apli aplicá cá-lo -lo be bem. As maio maiores res almas almas sâo sâo capa capaze zess dos dos maiores vícios, tanto quanto das maiores virtudes, c os que só andam muito Icnramcntc podem avançar muito mais, se seguirem sempre o caminho reto, do que aqueles que correm c dele se dista distanciam. nciam.”” (p_2 (p_29) 9) ”E bom saber algo dos costumes de diversos povos, a fun fun de que julguemos os nossos mais sàmenie sàmenie enào enào pensemos que tudo quanto é contra os nossos modos é ridiculo e contrário à razão, como soem proceder os que nada viram. Mas quando empregamos demasiado tempo cm viajar, aeabíimo-nos tomados estrangeiros em nossa tmra; c quando somos demasiados curiosos das coisas que se praticavam nos séculos passados, ficamos ordinariamente muito ignorantes das que se praticam no presente.” (p. 31) ‘"Comprazia-me sobretudo com as ma emáticas. por causa da certeza e da evidência de suas razões; mas nào notava aindu seu verdadeiro emprego c, pensando que serviam apenas is artes mecânicas, espantava-mc dc que, sendo seus fundamentos tào firmes e tão solidos, não se tivesse edificado sobre cies nada dc mais elevado. (...)" ”I)a Filosofia nada direi, senão que, vendo que foi cultivada pelos mais exoelsoB espíritos, que viveram desde muitos séculos c que, no entanto, nela não sc encontra aindu uma só coisa sobre a qual não se dispute e. por conseguinte que não seja duvidosa, eu nào alimentava qualcuer qualcuer presunção dc acertar melhor do que os outros; e que, considerando quantas opiniões diversas, sustentadas por homens doutos, pode pode haver haver sobre sobre uma c mesm mesmaa maté matéria ria,, sem sem que jamais jamais poss possaa existir mais dc uma que seja verdadeira, verdadei ra, rcpulav rcpulavaa quase como falso tudo tudo quanto quanto era somente veros ver ossím símil" il" (p. 32) “F certo que. enquanto mc limitava a considerar os costumes dos outros homens, pouco encontrava que mc satisfizesse, pois advertia neles quase tanta divcisidade como a que notara anteriormentó anteriormentó entre ent re as opiniões opiniões dos filéN filéNof ofos os De modo que o maior proveito que dai tirei foi cpuc. vendo unta
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A Construção do cu na Modernidade porç porção ão de cois coisas as que. que. embo embora ra nos nos pareça reçam m muito uito extr extrav avag agan ante tess c ndiculas. não deixam de ser frequentemente acolhidas e aprovadas por outros grandes povos, aprendi a nào crcr demasiado ftnncmcntc em nada do que mc fora ilKulcado só pelo pelo exem exempl plo o c pelo pelo cost costu ume; e assi assim m, pouc pouco o a pouc pouco, o, livre-i-nie de muitos erros que podem ofuscar a nossa hiz natural c nos tomar tnenos capazes de ouvir a razão. Mas. depois que empreguei alguns anos cm estudar assim no livru do mundo e em procurar adquirir adquirir alguma experiência, experiência, tom tomei ei um dia a resolução dc estudar tambérn a mim próprio e de empregar todas as forças de meu espirito na escolha dos caminhos que devia seguir. O que mc deu muito mais resultado, parece-me, do que se jamais tivesse mc afastado dc meu pais e de meus livros." (p. 33) “Achava-mc, então, na Alemanha, para onde fora atraído atraí do pela ocorrência das guerras, que que ainda não findaram, findaram, e, quando retomava retomava da coroação coroação do imperador para o exército, o inicio do inverno deteve-me num quartel, onde, nào encontrando nenhuma ífcqucntação que me distraísse, c nào tendo, alem disso, por felicidade, quaisquer soliciludes ou paixõ paixões es que me peit peitur urba bass ssem em,, per perm manec anecia ia o dia dia inte inteir iro o fech fechad ado o sozinho num quarto bem aquecido onde dispunha dc todo o vagar vag ar para mc entreter com os meus pensamentos. pensamentos. Entre eles. um dos primcims fra que me lembrei lembrei de considerar que, amiúde. nào há tanta perfeição nas obras compostas dc várias peças e feitas feit as pela mão dc diversos mestres, como naquelas cm que um só trabalhou.*' (p. 34) “O primeiro [principio] era o de jamais jam ais acolhe a colherr nlguma nlguma coisa cois a como verdadeira que cu não conhecesse evidcnlcmcntc evidcnlcm cntc como tal; isto é, de eviiar cuidadosamente a precipitação c a prevenç prev enção, ão, c de nada inclui inc luirr em meus meu s ju j u íz o s que nào sc apresentasse tão clara e tão disliiitanientc a meu espirito que eu nào tivesse tivess e nenhuma ocasião oca sião de pô-lo cm duvida." duv ida." (p. 37) 37) “E enfim, como r.ão basta, antes de começar a reconstruir a casa onde sc mora, dcrruhà-la, dcrruhà-la, ou provcr-sc de materiais e arquitetos, ou adestrar-se a si mesmo na arquitetura, nem além disso, ter traçado cuidudosíunente o seu projeto; mas cumpre cambem ter-se provido de outra qualquer onde â gente possa alojar-se comodamente durante o tempo cm que nela se trabalha: assim, a fim de não permanecer perm anecer irresoluto em minhas minha s ações, enquanto enqua nto a razão razã o me obrigasse a sc-lo, cm meus juízos, c dc não deixar de viver
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Pedro I uis Ribeiro de Santi Santi desde entào o mais fclurmcntc possivel, formei para mim mesmo uma moral provisóna. que consistiu apenas em três ou quatro máximas máximas que eu quero vos participa' ” "A primeira era obedecer às leis e aos costumes de meu país, retendo contcntemente a religião en que Deus me concedeu a graça de ser instruído desde a intãncia, e govemando-me, ern tudo o mais, segundo as opiniões mais moderadas c eis mais distanciadas do excesso, que fossem frequentemente acolhidas cm prática pelos mais sensatos daqueles com os quais teria de viver." L
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A Construção do cu na Modernidade dormimos, sem que haja nenhum, nesse caso. que seja verdadeiro, resolvi fazer de conta que todas as coisas que até então haviam entrado no nteu espirito não eram mais verdadeiras que as ilusões de meus sonhos. Mas, logo cm seguida, adverti que, enquanto eu queria assim pensar que ludo era foJ foJso, cumpria necessariamente necessariamente que eu. que pensava, fosse alguma coisa. E, notando que esta verdade: eu peruo, togo existo, era tão firme e tão certa que todas as mais extravagantes suposições dos céticos nau seriam capazes de a alwlar. julguei que podia aceitá-la, sem escrúpulo, como o prime primeiro iro pnnc pnncipio ipio da Filo Filoso sofia fia que procu procurav rava.” a.” (p. (p. 4 6 ) %..) compreendi por af que (cu) ern uma substância cuja essência ou natureza consisle apenas no pensar c que, para para ser, ser, não necess necessita ita de nenh nenhum um luga lugar, r, ne nem m depende de qualquer coisa matcnal. De sorte que esse cu, isto é, a alma, pela qual qual sou sou o que sou, é inteiram inteirament entee distinta distinta do corpo c, c, mesmo, que é mais tãcil de conhecei do que ele e, ainda que este nada fosse, cia não deixaria de ser tudo o que é.“ (p. 47) * A evidência do eu com o única referência estável dará origem a todo o projeto científico. O homem passa a ter segurança quanto à sua possibilidade de alcançar um conhecimento objetivo do mundo. A verdade já não será procurada nas escrituras sagradas ou em iluminações místicas místicas.. So poderá ser considerado verdadeiro verdadeiro algo que tenha passado pelo crivo da observação e racionalidade humanas. M Ú S IC I C A - B a c h : o b a r r o c o e a f u g a
C o m o passar pass ar do tempo, a música vai-se vai-se tomando mais complexa complexa c. por isso. faremos farem os apenas referências brev brev es ao estilo. No sécu s éculo lo XVII, surge a música barroca, ultamentc intelectualizada e estilizada. Nela, a tendência à construção de composições mais equilihradas afirma-se. A música sacra c a ópera, reoém-criada, serão suas maiores expressões. Mas somos obrigados, neste caso. a scr menos fiéis á cronologia. A música que parece melhor se relacionar com o movimento que descrevemos em Descartes c a dc utn compositor nascido já em 16 1685 85 e que criou propriam pro priamente ente no século XVIII: Joliann 66
Pedro l.uis l.u is Ribeiro de de Santi Santi Sebastian Bach. Sem duvida um dos maiores compositores que já existiu. Bach possui uma espantosa espa ntosa quantidade quantid ade e qu qualida alidade de de uhras, uhras, em vários estilos, Dc certa forma, assim como Descartes, ele representa representa o início da Modernidade, M odernidade, por ter sistematizado os ons musicais, musicais, tais como os conhecem os e usamos hoje hoje,, Dentro da riqueza de sua música, destaca-sc a produção de fugas. As fugas são um estilo no qual as vozes são rígida c matcmatKumenie matcma tKumenie dispostas, dispostas, hm geral, g eral, há uma primeira linha melódica, melódica, chamada ponto, a qual se segue uma segunda voz cm contraponto, ou seja, em imitação cm outro instrumento ou escala ou mverida, mas sempre em uma relação direta dc equivalência com a primeira. É comum que, no inicio da obra, seja apresentado um tema fechido; a partir dai. o restante da composição realizará um desenvolvimento lógico lógico das possibil po ssibilidades idades do tema. tema. Nào aparecera nenhum tema que não estivesse comido enquanto possibilidade no início. Ao final, è rcapresentado o teina. Trabalha-se com tcnsào e distensão dc forma totalmente controlada c o ouvinte jamais será abandonado sem referências; o eentio sempre reaparece'' . Bach ainda possui outro interesse, pata nossas finalidades. Elcécom Elcéc ompletam pletamcntc cntc diferente diferente do mito românti romântico co que temos do arista, arista , não possuindo nada dc atormentado ou louco t l e era um humera hum era a da musica, um funcionário da Igreja sem afetações o que não o impediu impediu de criar uma obra grandiosa, plena da retórica protestante. Sc não sc acredita acre dita cm c m Deus ou ouvin vindo do Bach. nào .s .se acreditará acreditar á de outra maneira1 man eira111. Questões Questões para p ara discussão discussão 1. Como Descartes escapa ao ceticismo? 2. Quais são us relações entre o “cu“, tal como definida por Descartei, e o corpo? 3. Quais são as relações entre o método cartesiano c o de Santo luácio de Loyola? J1Procure ouvir ouvi r dois exemplos exemplos importantes de Barroco. Um é o trecho trecho iricíal iricíal de "Vespro delia Beata Vergine”ée Monteverdi, extraída do do CD "Banque. Palvsfrtna Palvsfrtna e Mantewrdi, Mantew rdi, EMI Classics, Classics, 1995” . Mas Mas ouç ouçaa também o ‘'Prelú ‘'Prelúdio dio bem Tem Tempv pvmd mdo o fl f l i w l). l). e fuga fuga em dó-menor”, extraídas do CD "Ocravo bem J.S. Bach, ECM. 198 19888.” 21 Um bom exemplo c a “Inttvxiuçào “Inttvxiuçào”” da Paixão Segundo S egundo São Mateus. Mateus. LMalhüus Malhüus -Passio -Passion, n, Deutsche Cirammophon, 1973” ‘ L
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A Construção Construção do eu na Modernidade Modernidade
8 O EU E O N Ã O EU A afir afirma maçã ção o do eu dá-se
eus Ias de uma sombra projetada Surge uma uma zona zona de exclusão represem repres em cíve ível pela loucura ou pela ntimreza animal do homem.
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V ^ /u iii ii i ü form formaa de destacar destacar a importâ importância ncia que passa passa a ter a afirmação do eu como co mo único ponto dc referência para a existência humana desde o scculo XVII. vale a pena fazermos uma breve referência á loucura. loucura. A referência referê ncia chave chav e nesse tema tem a é a ob obr.» fundamentai dc Michel Foucault, dos anos 60 de nosso século: A historia da loucura. De forma muito simplificada, simplificada, poderíamos poderíam os dizer que foi foi apenas no século XVII que surgiu nossa forma atual de relação com a loucura, num certo sentido, a loucura surgiu nesse século. Isso não quer di/cr que, antes disso, não houvessem pessoas que alucinavam ou que fossem descontrolada descont roladamente mente violentas, violentas, etc. etc. A questão ques tão c que antes do século XV1 XV 11 ou em culturas nào ocidentais, a forma dc sc compreender o que se passava passa va com essas pessoas era diferente. Não havia havi a o metlo que qu e temos temo s hoje do louco, a idéia de que isso fosse uma doença e, sobretudo, nuo existia a idéia idéia dc que ele devesse scrafasta scraf astado do do convívio convív io social e isolado isolado num hospíci hospício, o, fim determinadas culturas, culturas, o louco pode ter sido tomado como um visionário: visionário: como aquele que transcende a experiência imediata, imediata, entra em contato com outra dimensão da verdade que, ao regressar, a comunica aos demais. demais. Ele pode ainda ter sido tomado como um possesso pelo demônio ou simplesmen simplesmente te como um um bobo bobo.. ü pnnc pnncipu ipull c observar observar que. que. até o scculo X VJI. JI. a peida ila ila ra/ão ra /ão por um homem não produzia o efeito de medo que passou então então a gerar Por que surgiu o medo da loucura? A idéia fK fKirec irecee scr a seguinte: segu inte: no inun in undo do medieval med ieval,, a garan gar antia tia sobre a ordem do mundo c lodus as suas certezas era dada por algo externo ao próprio homem, ou seja, seja, por Deus. Deus. Se um homem hom em perdia a razão, razão, via coisas que ninguém mais via via ou pensava o que ninguém
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Pedro Luís Ribeiro de Santi mais pensava; isso isso era um problem prob lemaa dele que não afetiva afetiv a aos demais. Ele deveria estar tomado pelo demônio. As pessoas podiam até ter medo de serem tomadas também, mas a loucura não ameaçava a crença em Deus e. assim, as verdades aceitas. Depois do processo que descrevemos, descrevem os, desde o fim da Idade Media c sobretudo sobretudo depois dc Descartes, a situação mudou totalmente. Desde cntào, a única garantia c ponto de referência do homem é a sua crença cm um “eu pens pe nsan ante” te” ob obje jetiv tivoo c co cons nscie cient nte. e. A pa part rtir ir de desse sse momen mo mento, to, qu qual alqq u er coisa que pudesse pôr em questão a lucidez e a estabilidade do cu, seria tomada como allamcnlc ameaçadora. Agora é toda a estabilidade do mundo m undo que qu e está em jogo jog o na identidade do eu. È preciso criar mecanismos para afirmá-lo e defendê-lo. O afastamento a fastamento do louco do convívio social social perece perece servir mais aos outros do que qu e a cie. cie. No scculo XVII, nào liá liá qualquer qualquer perspectiva de tratamento, trata-se simplesm simplesmente ente de um isolamento isolamento por medo m edo do contágio. Foucault mostra-nos que os primeiros hospícios foram os antigos lep leprosários remanescentes da d a Idade Média, o que acaba sendo altamente expressivo da associação feita com aquele mal tcrrivcl e contagioso. O louco será tratado como com o um animal, anim al, como como alguém que per p erde deuu a alma. alm a. pois esta iden id entif tific icaa-se se co com m o eu e s u j racionalidade. Nào se pod podee pe pens nsar ar em um eti eti louco; louc o; sc há loucu lou cura ra,, o eu subm su bmerg ergiu. iu. H a m let le t no I embremo-nos do último trecho de Ha no texto anexo, em que ele antecipa esta noção: n oção: se ele fez fez algo estando estan do louco louco,, c o próprio próp rio eu que foi ofendido c nào pode ser responsabilizado. Descnha-sc novamente nov amente aquela referência á pintura barroca com co m o estilo estilo do cla c laro ro escuro: não há ta/ão relativa, ou sc c sâo c dono dc seu eu, ou se é louco e aliena ali enado do absolutamente, absolutam ente, Rolo lugar de cxcluiSo que assume, assum e, não há música que represente a loucura no século XVII. Como já dissemos, ela c dominada pela racionalidade matemática. Concluindo, o nascimento de nossa representação moderna da loucura c contemporâneo contem porâneo c correlato ao momento mom ento de maior afirmação afirmação do eu, enquanto sujeito consciente c livre para conhecer a verdade. TEXTO TEXTO ANEXO ANEXO -
Thomas Hobbes
Outra referência essencial sobre o que habita o espaço excluído ao eu é a obra do filósofo inglês Thoma» Hobbes. Num
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A Construção do cu na Modernidade certo sentido, ele tem um projeto semelhante ao de Descartes: cm sua obra mais importante, L e v i a t h a n ( 1 6 5 1 ) , t e n t o u sistematizar idéias a respeito da natureza humana c do Estado. Assim, Assim, com o Descartes, Descartes, ele acredita que o homem deve se gu ir o caminho da racionalidade. O eu social social justam ente impõe-se sobre a natureza humana, que deve ser dominada totalmente. Mas o que caracteriza e diferencia Hobbes de seus contemporâneos é a visão “naturalista” c assustadora que ele nos dá da natureza humana. A seguir, apresento algumas das principais idéias dc D o Hobbes, referindo-me a outro dc seus livros, chamado Do cidadão ("De eive"): "(...} Pois todo homem é desejoso do que é bom para ele, c ioge do que é mau. mas, acima de tudo, do maior entre os males males naturais, que é a morte c isso ele faz por um certo certo impulso da natureza, com lauta certeza como uma pedia pedi a cai." cai. " (p. ] 0) D o cida ci dadã dão, o, um perfil do que Hobbes traça, ao longo de Do seria seria o homem home m tora da sociedade, em um virtua virtuall estado de natureza. Em um estado de natureza, ou seja, na ausência dc um poder constituído constituído ou d e compromissos entre entre os homens que determinassem o que pertence a quem. todo homem teria o direito de de fazer e ter ludo o que quisesse, pois a natureza “deu a cada um o direito a tudo”. E o que o homem naturalmcntc naturalmcn tc buscaria? Como Com o vimos na citação acima, o homem procura o que é bom para ele, evitando o que é mau. A idéia chave aqui é a da busca de um bem para si. si. O que está cm jogo é o seguinte: seguinte: desde sempre, sempre, sc disse que que o homem busca o b a ti ou a felici felicidade dade,, não há nenhuma novidad n ovidadee nisso. nisso. A questão c que, como temos visto, a idéia idéia dc uma referencia externa que servia conto padrão e definição definição do bem b em está desaparecendo. A busca bu sca do bem já não toma tom a a forma forma dc busca de um bem comum. com um. Sem Se m essa referencia externa e com a progressiva importância atnbuida ao eu, a busca agora é a do bem para si. si. Em I lobbcs, lobbc s, o homem hom em é visto corno um ser egoísta, movido mo vido pela busca bu sca do d o praze p razerr c pela fuga fuga dos perigos per igos dc morte. Isto Isto frequente freq uentemente mente 0 levará a ser violento c a entrar em guerra, iinpondo-se iinpondo- se sobre os denta den tais is 1lobbcs c ainda mais especifico na seguinte passagem:
%.,) Assim cheguei u duas máximas da natureza humana -
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Pedro Pedr o Luis Lui s Ribeiro Ri beiro dc San Santi ti
uma que provem de sua parte concupiscentc. que deseja apropnar-se do uso daquelas coisas nos quais tod>s os outros têm comum interesse -outra, procedendo da parte racional, que ensina todo homem a fugir de um uma dissolução antinatural, como sendo este o maior m aior dano que possa ocorrer à natureza.” (P-6) Alguns homens se contentariam cm um apenas o que lhes fosse necessário, permitindo aos outros o mesmo. Outros, porém, movidos movido s pela vangloria, vanglo ria, procurariam procurar iam sobrepor-se aos aos demais, surgindo surgin do assim inevitavelmente o conflito e a vontade de ferir. O homem teria uma eterna inclinação pura ampliar seu poder no primeiro homem, esta inclinação serviria á sua auto-defesa, à qual tem todo o direito; no segundo, ela serviria serviria à sua vangloria. vangloria. Hobbes conclui que, desse estado de coisas, resultaria uma eterna guerra de todos contra con tra todos todos Ncuhum Ncuhu m homem poderia pod eria se se sentir seguro em poder manter seu bem maior: stui vida. Há, assim, um paradoxo fundamental entre as duas máximas da natureza humana; sobreviver sobrev iver e o desejo dese jo de apropriar-sc de tudo tudo por vanglória. Referi-mc Referi-mc acima ao estado de natureza natureza como “virtu “virtual", al", pois pois Hobbes nào se refere e. aparentemente, nào pensa que um tal estado tenha existido ou possa existir, trata-se de uma natureza vislumbrada a partir de seus contemporâneos. Lentos cm Do ci d id ã o uma série de referências ao homem vulgar que é imprudente, procura sempre tirar proveito prov eito dos outros, admira adm ira sistemas filosóficos apena apenass pelo pru/ pr u/er er que extrai de suas rctoriquices, ele. ele. Enfim, Hobbes H obbes convida-nos (dc fato. convida-nos: há um apelo feito ao leitor) a encarar dc frente os motivos que levam os homens ao convívio social. A primeira conclusão conc lusão fundamental é que a sociabil so ciabilidade idade nào n ào faz par parte te da natureza humana: “Pois aqueles aquel es que perserutarent perserutarent com maior precisão as causas pelas quais os homens se reúnem c se deleitam deleitam uns nu companhia dos outros facilmente hão de notar que isto nào acontece porque naturalmcntc não poderia soreder dc outro modo, mas por acidente Isto porque, porque, se um home homem m devesse deve sse amar outro por natureza -isto è, enquanto homem-, não podería poderíamo moss encon encontra trarr razão para que todo todo hom homem não ame ame igualm igualmeiU eiUee todo homem, por po r ser tão homem q uinto uinto qualquer qualquer
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A Construção do cu na Modernidade outro, ou para que freqüente mais aqueles cuja companhia lhe confere honra e proveito.” (p. 3) F:m seguida, seguida, investigan in vestigando do com grande gran de ironia o que os homens fazem quando quand o se reúnem, reúnem, Hobb H obbes es nos apresenta quais acredita serem serem os fundamentos desta união: "Assim esclarece a experiência a todos aqueles que tenham considerado com alguma precisão maior que a usual os negócios humanos, humanos, que toda reunião, por mais livre que seja, seja, deriva quer da miséria reciproca, quer da vã gloria, de modo que as partes reunidas se empenham cm conseguir algum benefici beneficio, o, ou aquele aquele mesmo mesmo eudokimein que alguns estimam e honram junto jun to àqueles com quem conviveram ” (p. 5) L, mais adiante: "{...) Devemos portanto concluir que a origem de todas as grandes e duradouras dur adouras sociedades não não provêm da boa vontade reciproca que os homens tivessem uns para com os outros, mas do medo reciproco que uns tinham dos outros, (p. 6i Antes dc prosseguirmos nu exposição dc como Hobbes entende a construç con strução ão da sociedade, gostaria de acrescentar acrescen tar algo ainda D o cid ad adão ão.. Hobbes sobre a natureza do homem. No Capitulo Cap itulo 5 dc Do discute os motivos pelos quais os governos de certos animais, considerados políticos por Aristóteles, são bem fundados numa concórdia ausente no governo humano. As conclusões são as seguintes: seguintes: nos homens, hú disputa por honra hon ra c precedência, vale dizer vangloria, gerando gerand o ódio ód io c inveja: inveja: nos animais, o bem -comum -comu m não se diferencia diferencia do particul particular, ar, enquanto no homem alguma pruemincncia pruem incncia é condição para p ara seu gozo; o uso u so da razão leva alguns homens home ns a querer inovar, trazendo a discórdia; os homens possuem a arte da palavra, condição para os movimentos da mente, que, contudo, pode levar os hom ho m ensã ens ã guerra cm seus seus maus usos, usos, os animais não sabem sabem distinguir dano ou injúria, não censurando assim aos seus semelhantes; e. por Um, o poeto entre os homens não c natural como entre os animais. Esla análise de Hobbes é surpreendente, pois não só nos leva ã conclusão dc que qu e o Iximem Iximem distingue-se fundamentahnente fundame ntahnente dos demais
fVdro Luis> Ribeiro de Santi
animais políticos, não tendo contato con tato com as leis leis naturais natura is como com o aquelas aquelas,, como sugere que aquilo que caracteriza a natureza humana -sua razão, sua sua fala fala c sua sua ânsia por glóna- é justa m ente en te o que qu e o totna inapto para a vida social. Uma paz. duradoura só poderia ser conquistada por um esforço metódico da reta reta razão razão vencendo vencend o as pa p a ix õ e s - para p ara ap a p reen re ende derr as leis nan n anira irais is e a con co n stit st itu u içã iç ã o de um u m poder pod er centralizado c coercitivo que subjugasse as inclinações inclinações individua individuais, is, como veremos a seguir. Retornando à linha que desenvolvíamos, desenvo lvíamos, o estado de natureza natureza acarreta a guerra de todos contra todos, pondo em perige a sobrevivência. Hobbes conclui então que é racional - e é, por isse, isse, a prim pr imeir eiraa lei fund fu ndam amen ental tal d a natu na ture reza za:: p rocu ro cu rarm ra rm o s a paz. pa z. se ela :or possív po ssível. el. Caso Ca so cont co ntrá rári rio, o, dev de v em o s nos no s p rep re p arar ar ar para pa ra a guerr gu erra. a. A lei seguinte é clara: é preciso que os homens renunciem ou transfiram seu direito a todas as coisas para que se possa chegar à paz. Mesmo que não haja um Estado constituído, é possíve a realização de acordos entre indivíduos. Transferir significa decla-ar a outro que não se vai vai m ais resistir resistir a ele naqu ilo de que se trate. trate. Aqui Aqui surge a idéia, essencial cm I lobbcs. de contrato: “O ato de dois. ou mais, que mutuamente se iransferem direitos chama-se contrato." (Cap. 2, p 1) Um contrato nestes moldes pode estabelecer a paz en.re algumas pessoas, mas ccrtamcntc é insuficiente para a garantia de uma paz generalizada. Para tanto, será necessária a constituição de um estado civil. F. importante dizer também que esta transferencia e contrato tem um limite; todo homem preserva o direito à sua sobrevivência e proteção de seu corpo. F„sta idéia é essencial, pois deixa claro que não se trata trata de pensar pe nsar que o homem pode deixar de de ser egoísta, m as de reafirmar reafirm ar que. se ele cede seu direito a tudo, iss isso se deve à sua preocupação, ainda egoista. em sobreviver. Se ocorrer qualquer qualqu er ameaça neste sentido ele terá o direito (ou a obrigação obr igação?) ?) de quebrar o contrato, retomando ao estado de guerra. Airula sobre o contrato. Hobbes diz; "(...) "(...) Mas em primeiro lugar, lugar, é evidente que o consentimento de dois ou três três não pode corna cornarr suficient suficientee uma uma tal segurança, porque
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A Construção do eu na Modernidade bas basta tará rá som somar do outr outro o lad lado um único nico ou alg alguns uns poucos, os, para para se alcançar uma garantia indubitável de vitória, o que animara o inimigo inimigo a nos atacar. Por isso é necessário, a fim de que se possa possa obter a segurança almejada, que o número daqueles que cooperam cooperam cm assistcnc ia mútua mútua seja lào grande grande que o acréscimo de uns poucos do lado do inimigo não venha a constituir tópico tópico suficiente para assegurar-lhe assegurar-lhe a vitória." (Cap. (Cap. 5. p. 2) Assim, Assim , para que haja a instituição do Estado. Estado. é necessário necessário que uma significativa maioria ou mesmo mesm o que todos os homens hom ens transfiram transfiram seu direito direito natural natura l a tudo a um soberano ou a uma assembléia, a quem caberá a função de juiz ju iz e legislador, legislador, de definir defin ir o que é bom c o que é mau e o qt»e cabe a cada homem. Notc-se que este soberano está dc certa forma excluído exclu ído do contrato social, pois pois ele não abre mão m ão de nada nada e, a rigor, rigor, como co mo já tinha direito a tutlo tutlo,, também ta mbém não ganha nada. Aqueles que realizaram a transferência, por sua vc/, submetem-se igual e irrestritamenlc a este podei centralizado. Ao comentar a extensão do poder do soberano, sober ano, I lobbes lob bes nos assinala: "H muito evidente, por tudo que já dissemos, dissemos, que em toda cidade per perfe feit itaa (is (isto é naqu naqueela em que que ne nenliu lium cida cidadã dão o tem tem o dir direeito ito de utilizar utilizarsuas suas faculdades, a seu artw artwtriu, triu, paru paru sua próçri próçriaa conserv conservação ação ou seja, seja, onde es esti aholido o direito au glàdio privado) reside um um po poder supr supreemo em algué lguém m.o maicr maicr que os hom homens ens ten tenham ham dire ireito ito ,1conf confen enrr tão grande que que nenhum mortal mortal pode ter sobre si mesmo mesmo E-Steè o que chamam um maior. E-Steè chamamos os dc absoluto absoluto,, o maior que homens pois poisam am tra transferir rir a um homem, (Ca (Cap. 6, p, 10) Com a instituição deste deste poder, todas as inclin inclinaçõe açõess individu ais estão canalizadas e direcionadas. Numa definição de lei, que Hobbes dá cm Leviathau, podemos compreender a idéia que ele faz da função do Estado: "Pois o uso das leis (que não sàu senão regras autorizadas), não é atar a pessoas de Iodas as açòes voluntárias; mas dirigi-las c mantê-las cm tal tal movimento, ovimento, em que elas não não se machuquem por seus próprios desejos impetuosos ou indiscrições, assim como bu buliz lizas são são colo coloca cada dass não não para dete deterr os viaja iajan ntes tes, mas para para mantê antê-los em seu caminho." (leviathan, p. 388)
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Pedro Luis. Ribeiro de Santi
Num N umaa sintcsc: o homem, homem , para par a Hobbes, Hob bes, é um surd su rdee certa forma desoonectado desoon ectado com as leis naturais, naturais, aquilo que mais ma is o caracteriza. caracteriza. Sua razão, fala e desejo dc poder é o que mais o afasta desia natureza, cm especial quando há um mau uso, um excesso no excrcicio destas faculdades, faculdades, Este E ste excesso c expresso expres so dc forma privilegiad privilegiadaa pela busca da vangloria, sempre definida como um abuso, como um excesso referente à busca de glória. glória. Trala-sc dc uma um a falta dc medida medida na busca bu sca dc algo a principio legitimo, um prazer supérfluo e nocivo. Este ser, assim, clarameme claramem e inapto para o convívio conv ívio social (pois viveri viveriaa cm eterno estado rle rle guerra), é compelido, co mpelido, acim ac imaa de tudo pelo medo de ser morto a umr-sc a outros homens. Para isto. abre nrâo de suas aspirações de sobrcpor-sc aos demais dem ais com a cond condição ição dc que estes fe feça çam m o mesmo, submelendo-se a um poder central que regulara suas açòes. Em um Estado assim constituído, não há lugar para vontades (no sentido cm que Hobbes usa o termo, quase sinônimo dc ações) particulares. O Estado contem as vontades como as margens de um rio contém suas águas, evitando que elas se dispersem. O eu scra, assim, o dique construído para conter a natureza humana, que busca a afirmação dc algo que escapa ao próprio eu: uma busca de prazer sem fim, Assim, embora Hobbes tenha pontos cm comum com Descartes, sobretudo a crença na possibilidade dc um autodominio autodomin io completo com pleto pela razão, razão, seu seu principio éjustam éjus tam ente ent e não desprezar a animalidade do liumein.-3 Q u e s tõ e s p u r a d is c u s sã o
!. Lm que sentido Foucault diz que a loucura foi criada no século XVII? 2. Qual é a função do medo medo no inferesse do homem cm viver viverem em comunidade, segundo Hobbes? 3, Com qual forma de governo o Estado, tal como 1lobbcs j define, mais se parec pa rece: e: a de demo mocra cracia cia,, o socia socialism lismoo ou ou uma uma dit ditad adur ura? a? Pur Pur quê? quê?
73 Essa ‘an anim imali alida dade de’’ fo foii rep repres resenta entada da niusicalm niu sicalmentc entc Procure Procu re ouvir “/wermórfe pour pou r l.e tnaruiçe tnaruiçe forcè "\ dc Charpentier, extraída tfc “Gntods ComposUeurx fiartxfue*. Charpentier. Harmonia Mundi. France”. Destaquc-sc. sobretudo, o humor, a dissonância e distorção i|ue antecede a imita ção dos animais. Nem tudo no século XVII à ordem: algo lembra ainda a polif po lifon onia ia e a frag fragme menta ntação ção da ex expe periê riênc ncia. ia.
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A Construção do eu na Modernidade
9 OS MORALISTAS DO SÉCULO XVII A v a lori lo riza za çã o do e u liv li v re e ind in d ete et e rm ina in a d o impõe impõe a tarefa de sua fo sua form rm a ç ã o . Sua S ua educ ed ucaç ação ão implicará no aprendizado e adaptação a determinadas normas de conduta. O comportamento humano passa a ser alvo de uma observarão rigorosa.
termo ‘moralista’ tem um sentido próprio em nosso contexto, Na medula cm que a referência inoral gradativamente vai deixando dc scr a Igreja e a própria concepção dc auto-controlc tefere-se cada vez menos a Deus, c na própria sociedade que sc prod pr oduz uzirã irãoo no norm rmas as e meca me canis nismo moss d c vigia vig ia sobre sob re seu se u cumpri cum prime mento nto.. Os moralistas são. neste contexto, pessoas dedicadas à observação do comportamento humano e. no que diz respeito ao controle do comportamento, que mantém alguma relação com os procedimentos de controle a que nos referimos através dc Santo Inácio e aos manuais m anuais de boas maneiras nascidos nasc idos no século XVI. Talvez os moralistas m oralistas sejam sejam os primeiros a merecerem o titulo de “psicólogos", não pelo pro p roce cedd imen im ento to cien ci entí tífi fico co,, m as p ela el a o b serv se rvaç ação ão acu ac u rad ra d a sobr so bree os costumes e motivos humanos . Trata-se, também, de uma série dc autores que procuraram codificar as regras dc conduta do scr humano. O termo ainda sc aplica a autores que denunciam as hipocrisias c farsas na ação de muitos homens. homens. Dois desses moralistas, para tom tomarmos armos dois caminhos caminho s de certa forma opostos, são La Fontaine (aquele das fábulas) e La Kochefoucauld. La Fontaine tem uma obra conhccidissima como fabulista mas, erroneamente, hoje sua obra é associada cxclusivamcnte á literatura infantil. É certo que ele pretendia atingir adultos também.
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Pedro Luis Ribeiro de Santi com o seu humor eventual c a referencia a determinadas figuras sociais o atestam. Suas fábulas costumam conter uma ‘moral da história*, de conteúdo edificante. Ele procura mostrar como comportamentos considerados bons moralmente {hoje diríamos, poli po litic ticam amen ente te co corre rreto tos) s) são reco re com m pe pens nsad ados os,, enq enqua uant ntoo qu quee os maus ma us sào punidos. Há, assim, por trás de sua obra uma determinada concepção de certo e errado que ele procura impor. É nesse sentido de formação moral que ele passou a ser lido para crianças. A utilização freqüente de animais como personagens serve para par a disfa dis farç rçar ar um po pouc ucoo a crítica crít ica a det d eter erm m inad in ados os gmpo gm poss ou o u pessoa pes soass que, por vezes, expõe ao ridículo. F.in algumas passagens, temos a unpressào de que ele estaria, de fato. atacando as inslituiçõcs c a natureza humana, mas no conjunto, parece que o qae ele realmente prete pr etend ndia ia era uma um a refo re form rmaa ou o u form fo rmaç ação ão moral mo ral do eu eu,, no senti se ntido do qu quee temos trabalhado. Tomemos algumas fábulas.
TEXTO TEXTO AN ANEX EXO O-
I m F o n t a i n e
OS ANIMAIS ENFER EN FERMO MOS S !>A PESTE PEST E - (Fábulas) (Fábulas) “Um mal que semeia o terror, um mal que o céu, em seu furor, inventou para punir os pecados du terra: a Peste (o nome dota eu quase não dizia), dizia), capa/ cap a/ de recobrir recobrir o Aquaon Aqu aontc tc num dia, dia, aos animais declarou declarou guerra Os qu quee não não pereceram pereceram,, perderam perderam vigor, vivendo em mórbido langor. Nem mesmo de buscar o seu próprio sustento sentiam o menor alento. Rapos Raposas as c lobos, lobos, para pa rado dos, s, não se an anim imav avam am a caçar. caçar . Ond Ondee os pombos pomb os enamorados'7Foram enamorados'7Foram amar noutro lugar De Devido vido á melancólica melancólica situação, tomou a palavra o leão: 'Nossos pecados, nossos vícios, sào responsáveis por tudo isto isto Para Para aplacar u cólera dos céus, céus, insisto insisto qu quee serão necessários alguns sacrifícios, ou pelo menos um: que morra o mais culpado, pois a história nos tem mostrado que assim deve ser feito. Nada de indulgência: examinemos a consciência. Eu. por exemplo, mc acuso de ser mesquinho: devorei muito carne it inlio que nunca me fc* ofensa. Antes fosse isso só... Já provei o sabor do pastor! Sou pecador, eu sei, mas isto não dispensa cada qual de acusar-se, a fim de sabermos quem tem a menor culpa, para desta sorte saber
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A Construção do cu ria Modernidade quem qu em merece merece u morte ’ 'Bondoso 'Bond oso rei, não sacrificaremos' disse diss e a raposa‘alguém t i o nobre e tão gentil! gentil! Devorar um carneiro, animal animal imbecil, será pceado? Ó não! Antes, presente régio, um verdadeiro privilégio, Quanto ao pastor, fizestes hem, pois para nós. nós. os an anim imais ais,, tais tais indivíd indivíduos uos são mui prejudic prejudiciais iais.. Agistes, pois. como convém' Aplausos coroaram o sábio discurso. Vieram em seguida um urso. um tigre e outras terríveis terr íveis feras fer as assassinas: porem, seus crimes crimes e chacinas, suas suas açòes infames, seus atos malvados, não eram lidos nem como veniais pecados... Por fim, chegou a vez do burro, que falou: ‘Passando um dia junto ao prado de um mosteiro, o demônio a fome mc aumentou. Senti-me dev eras tentado. E como resistir, naquela circunstânc ia'? Quando vi, cu já havia dado uma bocada...’ ‘Oh, que pecado1\ pecado1\ grita a assembléia indignada Um lobo falastrão recrimina a arrogância, a estupidez daquele maldito animal, um sarnento, de quem provinha todo o mal. •Seu pecadilho fot julgado imperdoável. Comer erva sagrada! Crime abominável abomi nável!! Que morra morra esse ser detestável! detestável! O veredicto foi de uccitaçSo geral. Segundo o teu estado, rico ou miserável, branco ou preto, preto, scras scras per peran ante te o tribunal.” tribunal.” (Vo (Vol, 2. p. 2323-26 26)) A GARÇA
(Fábulas)
"Embora j à fosse hora dc pensar no almoço, almoço, a garça garça mal voltava seu longo pescoço, para o rio, ao longo do qual, com suas longas pernas e seu longo bico. passeava, displicente. O pesqueiro pesqueiro era rico: rico: carpas carpas e lúci lúcios os.. Afin Afinal, al, po porr que não lhe lhe importavam tào linos petiscos? É que d a . planejando opiparo jantar, esperav esperavaa a fome aumentar. Vend Ve ndoo que que não haviam riscos, os peixes seentr se entrcti ctinha nham m cm mil brinc brincade adeiras iras.,., até que se cansaram, desaparecendo desaparecend o A fome. então, veio correndo. Onde as carpas c os lúcios? E as percas ligeiras? Nenhum peixe que ví lhe serve dc manjar: este não tem bom paladar, aquele é por demais pequen pequeno; o; c a carne carne de deste ste aq aqui? ui? ve verdad rdadeiro eiro ve venen neno! o! "Foss "Fossee cu ave qualquer, não haveria mui em comer esses peixes dc gosto trivial. Acontece que sou uma garça-rcal c. portanto.
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Pedro Luis Ribeiro de Sanu Sanu exigente, altiva e reltnada.” Muito Muito tempo ficou ficou a esperar, c ao final, constatando a ausência total de peixes bons ou maus, acabou obrigada, na falta dc algo especial, a procurar urn caracol... Quem »c acomoda bem. acha um lugar ao sol, c quem almeja além. pt>dc tudo perder. Se o melhor não se pode ter. o jeito é co contc ntcnta ntar-s r-see com o menos menos ruim ruim.. Nã Não c só para par a as as ga garç rça* a* a lição que iestes. mas se aplica igualmentc aos humanos.’ (\fel.2 (\f el.2,p. ,p. 32-33 32-33)) * L bastante visivel visivel o Uxn de crítica crític a irônica pres pr esen ente te nas fabtl f abtlas, as, mas La Fontainc ó cuidadoso, nào denuncia frontalmente ninguém. Essa c uma de suas diferenças com La Rochefoucauld, a quem possa po ssamo moss a no noss refer ref erir, ir, qu quee leva sua criti cr itica ca ao p o n to cru cr u cial ci al.. Sua forma de expressão foi a "máxima’, um texto pequeno, cm geral de um único parágrafo que funciona como um provérbio. La Rochefoucauld escreve centenas delas, mas suas idéias acabam todas retornando retornando ao mesmo tempo: tempo: o principal principal motor m otor da vida vida humana e sua vaidade, ou seja o amor a seu próprio eu. Ele sc encontra naquela mesma linha dc Erasmo e Shakespcarc, como alguérr que denuncia com humor irônico o quanto o cu c pretensioso c iludido sobre si. Consta, inclusive, que seu principal livro, M ã x i n , a s c reflexões diversas, cra utna das leituras favoritas dc Nict/schc, o que o alinha em uma serie serie de autores não huma hu manistas nistas de muito m uito peso. peso. Vale a pena divcrtimio-no div crtimio-noss um pouco (tium certo ser tido, tido, rindo de nós mesmos) com a denúncia arrasadora de La Rochefoucauld. T EX T O A N EX O -
La R o c h t f o u c a u í d
SELEÇÃO DE MÁXIMAS E REFLEXÕES "Nossas virtudes são, o mais frequentemente, apenas vícios disfarçados. 3 Por mais descobertas que sc façam façam no pa pari ridd o amor-própr amor-pr ópr o, restam ainda terras desconhecidas. S As puixòes são os únicos oradores que persuadem sempre. Elas são conto unia arte da natureza natureza cujas ang angras ras são infalíveis infalíveis;;
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A Couslrução do eu na Modernidade c o homem mais simples que tem paixão persuade persua de melhor que o mais eloqüente que não a tem. 10 Todos nós tenros força suficiente pat a suportar os males do outro. 3 1 Se nós nào tivéssemos faltas, nào teríamos teríamos tanto prazer em observá-las nos outros. 35 O orgulho c igual em todos os homens, há apenas diferenças quanto aos meios e á maneira dc exprcssá-lo. 42 Nós náo temos força suficiente para seguir toda a nossa razão. 43 O homem crê frequentemente se conduzir embora seja conduzido; e enquanto que por seu espirito ele tende a um fim, seu coração cor ação o entranha entranha insensivelmente insensivelmente a um outro. 49 Nào se é nunca tão feli felizz, nem tão infeliz quanto quanto se imagina. 72 Se o amor é julgad jul gado o pela maior parte de seus efeitos, efeitos , de d e se purc purcce ce mais com o ódio ódio dn que com com a amiza amizade. de. 110 Nào se dá nada tão liberalmcnte quanto seus conselhos 133 As únicas boas cópias são aquelas que nos fazem ver o ridículo dos maus originais. originais. 135 Algumas vezes se é tão diferente dc si-mcsmo quanto dos outros 194 As faltas da alma são como as fendas fendas do do corpo: por mais mais cuidado que se tome cm curá-las, a cicatriz cicatriz aparece sempre, e elas estão estã o sempre em pen p engo go de reabr ir. 195 C) que nos impede freqüentemente de nos abandonarmos a um só vício, é que temos muitos deles. 200 A virtude não iria tão longe se a vaidade nào a acompanhasse. 207 A loucura nos segue por por todo o tempo da vida. Sc alguém pare pa rece ce sábi sá bio, o, é a p ena en a s p orqu or quee suas su as lou lo u cu ras ra s são proporc proporciona ionais is á sua sua idad idadee e à sua fort fortu una. 218 A hipocrisia hipocrisia c uma homenagem homenagem que o vicio vicio rende à virtude. 228 O orgulho não quer dever, e o amor-próprio náo quer paga pagar. r. 230 Nada é tão contagioso quanto o exemplo, c nós não fazemos nunca grandes bens nem grandes males que não produzam produzam semelhante semelhantess Nós imitamos as boas boas ações por emulação, c as más pela mahgn ma hgn idade dc nossa natureza que a vergonha retinha prisioneira, c que o exemplo põe em liberdade. 237 Ninguém merece ser louvado pela bondade se nào tiver
Pedro Luis Ribeiro de Santi força para ser mau: ioda outra bondade bondade e apciuu umii preguiça ou impotência da vontade. 308 A moderação foi foi tomada tomada unia virtude para limitara limitara ambição dos grandes homens, c para consolar as pessoas mediocres de sua pouca fortuna c de seu pouco mérito. 3 11 11Se Se hii hii homens cujo ndicul ndi culoo jamais jama is apareceu apareceu,, é porque nã nãoo se procurou hem. 361O ciúme nasce sempre com com o amor. amor. mas ncr* ncr* sempre morre com ele. .368 A maior parte das mulheres honestas $5o tesouros escondidos, que estão cm segurança apenas porque não são procuradas. procur adas. 377 A maior falta dc penetração não é não chígar até o fim, mas ultrapassá-lo. 389 O que toma a vaidade dos outros insuportável, é que ela fere a nossa. 457 Nós ganharíamos mais em nos deixar dei xar ver tais como somos, que em tentar parecer o que não somos. 458 Nossos inimigos se aproximam mais dc verdade, nos julgamentos que fazem fazem dc dc nós, nós, do que nós mes mesm mos. os. 459 Há vários remédios que curam o amor, nws nenhum é infalível. 496 As discussões não durariam tanto se o erro estivesse de um lado só. [Máximas suprim supr imida idass depois da prim p rimeir eiraa cdM,ào ,ào| Algumas vezes é agradável a um marido ter uma mulher ciumenta: ele ouve sempre falar do que mais mais ama. ama. 18 Na adversidade adversidade de nossos melhores amigot. encontramos sempre alguma coisa que nào nos desagrada 47 A conf confiança iança que se tem em si faz nascer a naior parte parte ddaa que se tem nos outros. 60 Quando Quando não sc encontra encontra seu repouso repouso em si-mesmo, si-mesmo, é inútil procurá-lo procur á-lo em out outro ro lu lugar ar.. * A idéia é basicamente a mesma. O reconhecimento de que o amor-próprio amor-p róprio seria seria o principal motor de nos n ossa sa ação. ação. Neste sentido, o eu não seria neutro, como pretende Descartes, mas sempre interessado e desejanle. Tal concepção coloca cm cheque o projeto cientifico. cientifico . Adiante verem v eremos os que a crítica dc I -a Rochelbucault também també m
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A Construção do cu na Modernidade
teve ura prosseguimento nos séculos seguintes. Em conclusão, penso que podem os considerar o século XVII XVII como o primeiro c aquele em que mais é apresentado como tema a afirmação e eonstrução do eu, quer para levá-lo a seu ponto mais alto, quer para denunciar esse novo no vo soberano. soberano. Nos séculos seguintes, seguintes, o eu eu tomará tom ará aspectos mais refinados e complexos e. gradaiivamente, gradaiivamen te, sua soberania será posta cm cheque. Qurvtõcs para discussão 1. Quais seriam as condições que tulvc/ tul vc/ tenham facilita f acilitado do o surgimento surgimen to no século XVII dc filósofos que se tornaram conhecidos corno •‘moralistas”? 2. Como o discurso crítico pòe em risco o projeto de Descartes? 3. Porquê as 'Máximas' dc La Rochcfoucauld nos fa^em rir?
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10 O PÚBLICO E O PRIVADO O eu, entendfdo como totalidade, passa a ser visto comi>uma exterioriàad exterioriàade. e. O que fora for a excluído, emerge como mundo intimo.
A
J L v partir partir du du disposição disposição do ”cuMcom ”cuMcom o centr centro o do mundo no século XVII, com frcqiicncia considerado como o século da inauguração da Modernidade, derivaram-se diversos caminhos da formação de nossa experiência atual. Acompanhar todos estes caminhos camin hos ao longo dos séculos seguintes c quase impossí impossível, vel, de forma que só poderemos apontar algumas das tendências que conduziram i\ Psicologia. Psicologia. Quase qualque qu alquerr opção por autores autore s parecerá parecerá incompleta incompleta e mesmo arbitrária, seguindo as preferências pessoais do autor. Procuremos Procurem os dc todo o modo desenvolver desen volver alguns destes destes fios. fios. Talvez seja prudente partirmos dc um dos temas mais clássioos na história do século XVIII; o da relação entre a.s esferas públ pú blic icaa e priva pr ivada da.. C o m o vim vi m os n o s capí ca pítu tulo loss anter an ter ores, ores , no século séc ulo XVII. o eu passou a scr tomado como centro do mundo: a própria essência do homem foi foi identificada á sua racionalidace c consciência. O eu pòde acreditar-sc como sendo a totalidade da experiência humana; tudo que não se identificasse a ele serie tomado como loucura. Não era admissível a referencia a algo que habitasse um espaço fora do eu. assim como com o na pintura barroca barro ca a figur figuraa impunhase na técnica do “claro/escu ro", restando um vazio representativo representativo no fundo.
No sccu sc culo lo XVIH. as mais ma is dive di versa rsass fontes fon tes nos suge su gerem rem que qu e este espaço excluído ao eu passou a scr gradativammte iluminado. O eu deixará de d e ser tomado tom ado como com o totalidade totalidad e e, cada vez vez mais, mais, tomará o aspecto de uma apresentação social, social, uma um a auto-imazem cultivada e
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A Construção do eu na Modernidade civilizada que qu e encobre, encob re, no entanto, algo mais ma is que babita babita c constitui con stitui as as pesso pe ssoas as e q u e elas el as proc pr ocur uram am m ante an terr cm segredo. segr edo. Este será o espaço da privacidade, que só foi foi tomado tom ado possível possível desde que a crença cm um Deus onipresente c onisciente deixou de dominar o experiência do homem ocidental. ocidental. A privacidad privacidadee abarcará todo um universo de desejos e pensamentos anti-sociais, que devem ser ocultos pela etiqueta e pelas boas maneiras. A Modernidade assiste assiste a uma um a dessacrali/açã dessac rali/ação o do mundo mu ndo e á imposição dc valores cada vez mais pragmáticos e fundados no homem. Hobbes já abrira este espaço para a privacidade no século antenor. anten or. ao afirmar que o que interessa ao Estado Estado é manter ma nter o controle controle sobre as ações dos homens: seu pensamento pode permanecer em total liberdade. Dai derivam deriva m várias imagens im agens caricaturais caricatura is sobre o este século. Ao mesmo tempo em que cie é considerado o século das luzes, com os desdobramentos desdobram entos do racionalismo r acionalismo cartesiano, cartesiano, ele é também o século século do artifício. Por exemplo, as roupas da corte são altamente rebuscadas, rebuscadas, cheias de adereços c armações, armações, de forma forma que dificilmente po p o d e-sc e- sc sab sa b er c o m o seri se riaa o asp as p ecto ec to real rea l do corp co rpo o q u e o veste ve ste.. Floresce também no período cada vez mais ma is a etiqueta e a multiplicação das regras dc conduta que, cm geral, servem para que se estabeleça uma hierarquia e uma precedência entre as pessoas. is tó r ia da vida vi da p r i v a d a (Vol. 3), há um série dc Na H istó exemplos hilariantes de como. cm todos os níveis sociais passa-sc a distinguir disting uir estas esferas e o preço que sc paga pelo dc&r dc&res espc pcit ito o a esta delimitação. Conta-se, por exemplo, sobre a asouade, uma espécie dc festa popular de execração pública destinada u punição daqueles que deixam vazar sua privacidade: um certo homem que estava beb b eben end d o com co m am igos ig os c repre rep reen endi dido do em públi pú blico co e levad lev ado o p a ia casa cas a aos tapas por sua mulher; no dia seguinte, cie é retirado de casa á força, força, é montado num asno asn o com vários v ários enfeites enfeites degradantes degradan tes e desfila desfila pela pe la cida c idade de com co m o alv a lvo o da d a hum h um ilhaç ilh ação ão da com co m unid un idad adee - s e ele el e tives tiv esse se se limitado a apanh ap anhar ar da mulher m ulher na privacidad priva cidadee de seu lar. lar. não haveria have ria pr p r o b le m a ... .. . F. p r e c iso is o s a b e r m a n ter te r cm s e g r e d o d e t e r m in a d o s pra p raze zere res. s. lig açõe õess Perig Pe rigos osas as,, de Chaudcrlos de Lados O romance As ligaç (qu e ganhou uma versão cinematográfica cinem atográfica brilhante brilhan te cm 1987), 1987), talvez
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Pedro Pedro lu l u i s Ribeiro Ribeiro de Sant Santii represente ao máximo o distanciamento entre, de um lado, a construção c a manutenção de uma imagem social e. de outro, o universo perverso oculto sob as máscaras. Seu formato é o de urra troca troca de cartas, o que é um artificio com um na époc épocaa assim com o o do diáno intimo-, dando ao leitor a impressão pra/erosa de estar invadindo um território privado privad o e, assim, proibido. proibido. O autor au tor afirm a que que as cartas publicadas são verídicas ve rídicas e que sua publicação publicação destina-se a uma “finalidade didática": mostrar como acabam as pessoas más. Tudo isso soa como um disfarce disfa rce do autor auto r para amenizar a ironia com que descreve os jogos jog os de poder e vaidade únicos valores presen pre sentes tes na corte. D< motie tienn-AI AIph phon on se-F se -F r a n ç o is S a d e T E X T O A NE N E XO X O - D
A referencia a este romance nos leva a evocar outro autor do século. Dona D onatien-A tien-A 1phonsepho nse-Fran François çois Sade. cuja obra revela o fim fim da possibilidade de buscar uma fundamentação para a moral apoiando-se na fé ou na crença cm um Deus transcendente. Com isto, desmascaram-se também alguns aspectos da natureza humana. Detenhamo-nos Detenhamo-no s por algum tempo em uma observação sobre sobre o pensamento de Sade. "De sua sexualidade ele fc f c / uma ética, esta ética ele manifestou cm uma obra literária; c por este movimento refletido de sua vida adulta que Sade conquistou sua verdadeira originalidade"2* O século XVlll XV lll c conhecido conhec ido como o século das das luxe luxes, s, o sécu século lo em que a razão, livre de qualq qu alquer uer cocrção mora! ou religiosa, religiosa, estendeuestendeuse sobre todo e qualquer objeto, inclusive sobre si mestna, interrogando-se sobre seus seu s limites enquanto enqu anto pertencente, como outro outro fenômeno fenôm eno qualquer, ã grande referen re ferencia cia do scculo: scculo: a natureza. natureza. Neste Neste quadro, Sade aparece aparece como um homem hom em do seu tempo -a não ser ser qu que se considere cons idere que ele tenha levado os princípios princ ípios iluministas iluministas a um al ponto, ponto , te t e r “estic “es ticad ado o a cord co rda” a” em tal medi me dida da em e m seus se us questio que stiona name ment ntos os à moral, que ele tenha rompido com este quadro de referências 23Simonc 3Simo nc de Bcauvo Bcauvoir, ir, p. 15
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A Construção do eu na Modernidade prqjeiamlo-.sc nos no s século séc uloss seguint segu intes es com co m o um pensad pen sador or aind a indaa original. De inicio, é importante esclarecer que esta análise da obra dc Sadc é extrumumente limitada, limitada, c que tomaremos tomaremos apenas duas d uas dc ph ito o sop so p h ie d ons on s le b o u dnir dn ir (A suas obras: La phit (A filosofia na alcova) ia fortu rtune ness d e la ve vertu rtu (Os infortúnios da virtude). e Les iafo La p h ilo il o s o p h ie d a n s le b o u d o ir é uma obra pedagógica Trata-s Trata-see de edu e ducar car uma jovem, certamente certam ente bem dotada e disposta, disposta, a per p ercc o rre rr e r os m elh el h o res re s cam ca m inh in h o s p ara ar a a o b ten te n ção çã o d c praze pr azer. r. Nas Na s prim pr imeir eiras as lições, liçõ es, os instrut inst rutore oress depa de para ram m -se -s e com uma um a certa cer ta resis re sistên tência cia da aluna que antepõe an tepõe sua educaçã ed ucação o anterior, anterior, os princípios morais m orais que lhe foram transmitidos por seus pais (note-se que o pai de Eugéníe, nossa heroina, concordou com sua reeducação, num bom exemplo da hipocrisia que Sadc sempre denuncia). Cada principio moral apresentado apresentado por p or Eugénie é imediatamente desmontado p or Dolmanoé, Dolmanoé, seu principal mestre. Assim, no decorrer do texto, as idéias de que assassinato, incesto, estupro, assalto assa lto ou qualquer qualq uer forma de satisfação sexual devam ser evitados em nome da moral acabam por se desmanchar diante de uma argumentação implacável que caminha sempre no mesmo sentido. Em um ecrto ponto dc sua doutrinação. Eugénie pergunta se, então, não haveria diferença entre o bem e o mal. A resposta de Dolmancc c definitiva: “'Ah, não não duvide duvi de disso, Eugénie, estas palavras pal avras dc dc vicio e virtude nos dão apenas idéias puramente locais. Não há nenhuma ação, por niais singular que vocé possa supô-la. que seja verdadciramente criminosa, nenhuma que sc possa realmentè chamar virtuosa. Tudo está em razão dc nossos costumes e do clima que habitamos, o que é crímc aqui frequentemente é virtude a umas cem léguas de distância, e as virtudes de um outro hemisfério poderiam bem ser crimes para nós." (p. (p. 79) Assim, para Sadc, todo princípio moral universal é uma quimera. quimera. Não existe existe um juiz ju iz transcendente q ue sustcnic sustcnic uma um a conduta necessária. Se a virtude se apoia na religião, ela não se apoia em nada, nada, desde que Sade sustenta que que Deus não existe. existe. A única instância a que sc pode apelar c a natureza, à qual o homem pertence, como qualquer outro animal, e a quem mesmo u morte não importa, pois
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Pedro Luis Ribeiro de Santi esta não passa de uma transmutação que não cessa de se operar. A felicidade já não pode ser buscada em uma referência externa, externa , mas nos “caprichos “capricho s da imaginação", imagin ação", contra con tra os os quais quai s nenhum nenhum limite possui legitimidade para impor-sc. Em conclusão á >ua argumentação, Dolmancc diz: diz: “Fôda. Eugénic, Fòda pois, meu caro anjo, teu corpo pertence só a você; não ninguém akm de você d o mundo que tenha o direito de gozar tkl tklcc c o lazer gozar como bem bem tc pareça." (p. (p. 84 84)) Antes de abordarmos abordarm os com um pouco pou co mais m ais de calma a questão questão da imaginação, gostaríamos de levantar uma questão que poc em dúvida a interpretação que demos á abordagem da moral por Si.dc. Concomitantemcnle a esta crítica de Sadc a qualquer moral, surge um “elogio ao crime", crime" , como com o no seguinle trecho trecho;; “Esses princípios c seus gostos são levados por mim alc c fanalismo, e o fanatismo c a obra das perseguições dc meus tiranos tiranos (. ..) O crime crime é a alma da lubricidude. Que seria um goze goze que não fosse acompanhado pelo crime9 Não é a idéia dc objeto da libertinagem que nos move, é a idéia do maP.M É um tanto desconcertante nos depararmos com a idéia de crime depois d epois dc o próprio Sade ter demonstrado dem onstrado a ausência ausência de critérios critérios para par a p en ensa sarm rmos os cm vício víc io ou virtud vir tude. e. H av aver eria ia,, ao co cont ntrá rário rio do qu quee viemos desenvolvend desenv olvendoo ate aqui, aqui, no “ Fazer o mal” um preceito m ira iraii de SadcV Não parece ser possível, neste momento, responder dc modo mais definitivo, mas gostaríamos dc apontar duas linhas dc idéias que poderiam nos conduzir a uma solução para esta quesão: 1. A primeira prim eira possibilidade possibilida de eslá na própria próp ria citação acim ac im r: na idéia de que o fanatismo de Sade seria fruto da perseguição de seus tiranos, poderíamos pensar que o elogio ao crime se inscreve nào como princípio moral transcendente, mas como resistência a uma determinada configuração co nfiguração social:
MCarta de Sade a sua esposa, citada ci tada por Simone dc Bcauvoir, Bcauvoir, p. 40.
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A. Constru Cons trução ção do eu na Modernidade Modernidade “Em uma sociedade criminosa, « preciso preciso ser ser criminos criminoso.’1 o.’1(p, (p, 58) 2. Uma outra possibilidade lesa à idéia dc que para Sade toda a sexualidade seria, seria, em si. crime, desvio, ou, como com o diz Simone Simon e de Beauvoir: “Sade è o único a descobrir a sexualidade conto egoísmo, tirania, crueldade; cm um instinto natural, ele apreende o convite conv ite ao crime." crime. " (p. (p. 101) 101) Apenas para concluir este ponto, gostaríamos de lembrar que cm “iev inforturtes de la vertu ", Sophic (Justinc), ao ouvir os conselhos dc La La Dubois Dubois -ou tra de suas ‘me stras’stras’- para que abandonasse sua virtude inflexível, argumenta que isto não poderia ser cobrado dela na medida em que esta é sua natureza. La Dubois não consegue cootra-argumentar... Retomando ã linha que seguíamos, gostaríamos de nos n os voltar agora para ã questão da imaginação e da fantasia cm Sade. Cremos pode po derr dize di zerr qnc qn c Sade Sa de acre a credita dita que o home ho mem m só pode po de scr s cr feliz seguin seg uindo do sua imaginação e que cie realiza uma separação clara entre fantasia (que tomaremos como sinônimo de imaginação) e o objeto em que ela se realiza. Num dado momento, ao discutir o amor, Dolmancé rverimina-o rverim ina-o COtno uma prisão e afirma afirm a que q ue tiào tiào há amor am or que resista a uma boa reflexão. reflexão. Além disso, insiste cm que q ue o objeto dc amor pode ser substituído substituído indefinidamente, por vezes com vantagem, mostrando assim um certo desprezo por este. Já a fantasia ocupa um lugar privi pr ivileg legiad iado o na obte ob tenç nção ão de prazer. praz er. Por Po r exem ex emplo plo,, quan qu ando do Mada Ma dame me de Saint-Ange relata a forma de prazer que mais agradava a seu idoso marido. Eugénie cspanta-sc, qualificando-a de “fantasia extraordinária", ao que fXMmancc responde: “Nenhuma pode scr qualidade assim, minha cara. todas estãu na natureza; cia se satisfez criando criand o formas, f ormas, diferenciando diferenciando seus seus gostos. Conto suas figuras, e nós não devemos mais nos espantar da diversidade que ela colocou em nossos afetos (...) A imaginação imaginaçã oé o aguiIhào dos prazeres; naqueles destas espécies, cia regula tudo, ela c o que move tudo; ora, não c através através dela dela que se goza?” (p. 101) 101)
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Pedro 1 üis Riticiro de Santi fi tia fantasia que a particularidade de» apetites se apresenta, ela é a "natureza" de cada um. E a fantasia tornada ato que produz o gozo. gozo. Depois deste quadro dcsilusor pintado por Sade. poderíamos pensar pen sar que ele pregasse uma um a res olução nos costumes, costum es, já que não liaver liaveria ia mais qualquer qualque r fundamento legítimo legítimo para a moral. Mas não é isto que acontece. Sade diz que, se saíssemos por ai mostrando mo strando nossos desejos desejos pelo inundo, seriamos presos ou mortos, o que qu e seria estúpid estúpido. o. Ele prega prega então uma hipocrisia socia social: l: quando em e m público, público, devemos jogar jog ar o jogo social, social, pig p igar ar impostos, cumprir com nossas obrigações civis c mantermos um comportamento adequado a nossa cultura, porem, quando retirados à vida vida pnvada, pn vada, não haveria haveria qualquer qualqu er motivo para que abríssemos abríssemos mão de qualquer um de nossos desejos. A alcova 6 o lugar preservado para o crime. O pensamento de Sade é amoral por desqualificar toda tentativa tentativa de fundamentar um critério absoluto dc moral, depois dele, dele, a moral passou a ser fundamentada etn valores propriamente ligados á convivência humana. Luís Roberto Mon/ani, a partir de seu interesse pela obra de Sade Sade - a u to r que certamente certamente laz parte parte da vertente critica busca retirar o estigma de aberração que pesa sobre sua obra e considera-a como a expressão máxima máx ima de outra corrente da ModemK odemKkuf kufe. e. que nuoa nu oa carteaan carte aana. a. Segundo Mon/ani. "o homem ho mem da Modcnikladc Modcnikladc c dominado por por seu seu desejo" O homem sempre buscou o bem para si: na Idade Média, o bem era identificado identificado com i» i » idea ideais is religioso religiosos. s. únicos únicos para todos tod os Com a perda destes valores (a que já nos referimos várias vezes no decorrer dest destee trabalho) a busca do bem perde seu seu objeto absoluto e passa a scr a procura de um bem fxiro si s i e ela toma a forma de busca pelo prazer. Esta seria uma outra via para entender o nascimento do individualismo e da valorização absoluta do ’cu‘. Mas, além disso, por po r esta es ta via afir af irm m a-se a- se a prese pr esenç nçaa de lima cons co nsta tant ntee inqui inq uietu etude de no homem, que o impele a buscar satisfação nos objetos mais variados indefinidameiitc, Starobinski toma este movimento de busca pelo pra p raze zerr como co mo uma u ma celeb ce lebraç ração ão da libe l iberda rdade de huma hu mana na (no sécu sé culo lo XVIII). Mon/ani. no entanto, recorrendo de Hobbes a Sade, mostra-nos que o homem não é dono deste desejo, sendo pelo contrário atravessado por po r peste. pes te. Daria Da ria-se -se;; então, ent ão, na M odern od ernida idade de,, o c m h itc it c entre en tre estas est as ordens de dissolução e as constantes tentativas de apropriação pelo ‘eu’, que mais desejaria não desejar.
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A Construção do eu na Modernidade MÚSICA - M o z a r t Penso que q ue esta es ta exp exposiç sição entre en tre mun m undo do público e mun m undo do privado pude pu de scr sc r ilustr ilu strada ada pela pel a obra ob ra dc Mo Mozart. zart. C omo om o sc sabe, sa be, sua su a obra ob ra é extremamente ampla am pla e variada, variada, sobretudo se considerarmos que ele morreu com pouco mais do que 30 anos. Sua biografia |á é marcada desde a infância pelo caráter artificioso; desde os cinco anos de idade, idade, componha e sc apresentava por toda a Europa como um prodígio, capa/ de tocar mesmo de olhos vendados. Mozart trabalhou para a corte e devia fazer uma uma música mú sica que a agradasse. Boa parte de sua obra é composta de peças leves, gostosas, relaiivamcnte relaiivamcnte fáceis fáceis de serem memorizadas mem orizadas e reproduzidas A té hoje, hoje, ele é um rios rios músicos mú sicos clássicos clássico s com ternas ternas mais conhecidos conh ecidos.. Esta música deve ser s er acessível tto tto gosto gos to do leigo (dizem que a música de Mozart pode desfrutada cm diversos níveis de profundidade, do leigo ao especializado). Cito, como exemplo, talvez a peça mais conhecida de todo o repertório clássico, a Pequena serenata norurna, cujo tema inicial, oscilando entre a tônica e a dominante, prod pr oduz uz um impa im pacto cto imed im ediato iato,, send se ndoo sem se m pre pr e utiliza util izada da em conc co ncer erto toss de divulgação divulga ção para para um público não especializado.3 espe cializado.3** Por outro lado (e Mozart tem vários), sua obra possui também momentos de inspiração ins piração profunda e densa, densa, quase q uase romântica. romântica. Estas peças já exigem uma concentraçã conce ntraçãoo maior do público públi co c não se prestam tão bem a concer con certos tos cm parques pa rques.. Nelas, N elas, transpira transp ira a vida vid a mais mai s intima de Mo Mozart. zart.33*’ Questões Questões para pa ra discussão discussão 1 Qual é o papel papel da distinção entre mundo» mundo» público c privado na formação da subjetividade moderna? 2 Sade c imoral imoral (vai contra contra a moral moral dominante dominante ►uu amoral amoral (não possui nenhum critério moral)'* 3 A partir dc Sade, que idéia pode scr feita sobre a natureza natureza humana? 35Ouça 0 Primeiro Movimento da “Pequena serenata noturna", no CD "Eme kieine Nachlmusik, Deutsche Grammophon, 1983" * Como exemplo, exemplo, pode-se ouvir a eenada eenada ceia com o fantasma fantasma do Comendador, Comendador, na ópera "Don Ciiôvanni" (no CD "Don Giovami* Ücrlincr Ptiilamvoniken. DeuL euLschc schc Grantmopiion, Grantmopiion, 1986"). 986"). Nessa cena, temos três três cantores cm uma ária cheia de drarnaUcidade, onde Doti Qiovami cnthmta o comendador que o assassinara no início da ópera, tendo vindo para lcvá-lo para o inferno.
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Pedro I.uis Ribeiro dc Sanli
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TEMPESTADE E ÍMPETO: O ROMANTISMO
A,
O iluminismo, que reconhecia nu razao a essência do homem c na m'-tura sua maior realização. recebe a critica tio romantismo; a essência humana seria sua natureza puiuonal. puiuonal . surgindo surgindo a ânsia ânsia pelo retorno retorno ao mundo natural
-potitamos -potitamos,, no inicio inicio da parte anterior, anterior, for fo r que meios o século XV XVII IIII passou a iluminar ilumina r o espaço excluído excluíd o ao cu cu. Ao longo do século, surgiram tendências de pensamento que chegaram mesmo a inverter a relação de importância existente, privilegiando privilegiando justumente justume nte o que estava excluido. Uma das imagens mais recorrentes desse século foi a de que o real c encoberto por um véu. Impòe-se a necessidade de desvclá-lo ou revelá-lo. O eu passa cada vez mais a ser tomado com co m o uma um a máscara que encobre encob re a verdade. verdade . A vida social social urbana urban a c civilizada- será acusada de afastar o homem de sua verdadeira natureza. Este último termo, aliás, é essencial na compreensão do Romantismo: Roman tismo: ele representa utna espécie esp écie de saudosismo saudosismo de um estado natural perdido pelo homem, que seria preciso reencontrar. A natureza u que se refere, é preciso dizer, e altamente idealizada. Quando vemos pinturas clássicas do período, sempre pode po dem m os co cont ntem empl plar ar uma um a natu n aturez rezaa amen am enaa e aeolh ae olhcé céora ora:: os pa pass sseio eioss pelo pe lo campo cam po pa pare rece cem m se pa passa ssarr sempr sem pree nu num m clim cl imaa ideal, ideal, en enso solar larad adoo c sem sem inset insetos. os. A referência referência óbvia, ainda ainda que implí implícit cita, a, ca c a d a natureza entendida como com o o jardim do Éden Éden.. Neste Ne ste sentido sen tido,, o Ro Rom m an antis tism m o nasc na scee com co m o um movim mov imen ento to dc critica à Modernidade, Mode rnidade, ou ao menos men os como com o uma um a critica critica ao Iluminismo. luminism o.
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A Construção do eu na Modernidade com seu seu exacerbado racionalismo. racionalismo. Recusando Recusand o o princípio cariesia cariesiano no segundo o qual o homem sc caractcn/a oomo um ser pensante, o romantismo roma ntismo fez ressaltar que a essência essênc ia humana está em sua natureza passio pa ssiona nal. l. F.ss F.ssee m ovim ov imen ento to,, q u e este es tend ndee do final do sécu sé culo lo XVIII XV III a meados do XIX, apresentará apresentará uma idéia idéia de natureza já não tio t io amisto amistosa: sa: da literatura de Goelhc à pintura dc Iiuner. podemos assistir a uma natureza violenta, que ultrapassa em muito a potência da vontade consciente. O eu é invadido por aquilo que procurava excluir. A separação entre as esferas pública e privada levava à concepção dc que aquilo que m ostramos socialmcnte é o que tentos dc “bom”, “bom” , do ponto pon to dc vista vista do convívio social social,, enquanto que o privado envolvia a idéia do que era cxcluido à expressão pública, algo potência potê ncia Intente anti-so ant i-social. cial. O unive un iverso rso “crim “c rimin inos oso" o" dc d c Sadc Sa dc não nã o deixa dúvidas a este respeito. Mas há uma contrapartida; não é difícil perceb per ceber er que, qu e, neste ne ste mesm m esmo o sentido, aqu a quilo ilo que mostra mo stramo moss sociaü soci aüne nente nte possa po ssa ser se r con c onsi sid d erad er ado o “ falso fa lso", ", por po r op o p o siçã si ção o àqui àq uilo lo q u e esco es cond ndem emos os e que representaria nossa verdadeira natureza. O que é excluído do eu pode afigurar-sc como o mais legítimo e puro em nós. O Romantismo acabará por realizar dc fato uma forte crítica á racionalidade, sem escapar ao campo da Modernidade, no entanto. A figura de um eu profundo, interior, puro, aquém da corrupção da influência do meio: m eio: a crença crenç a ainda em unia u nia individualidad e absoluta, irredutível a qualquer explicação e controle, acaba por se mostrar um modo a mais dc afirmar afirma r um sujeito como fundamento fundamento.. O titulo deste Capitulo c uma referência a um movimento cultural c artístico do fina finall do d o século sécu lo X VIII, VI II, do qual qua l Goeth G oethcc fez parte, o Siurm und Drang ("tempestade e impeto"). Quando pensamos bo b o je em r o m a n t ism is m o , em g e ral ra l v e m - n o s à m e n te im a g e n s d c delicailcza e suavidade amorosa; o título do movimento alerta-nos que o romantismo” está está muito longe longe disso. disso. Para passarmos uma idéia dc como se apresentou o romantismo, faremos uma longa referência a uma das primeiras Her/her . novelas de Goetlte, Her/her.
7 O romantismo tem as mais diversas diversas fomtas, fomtas , sendo, na realidade, realidade, um titulo que que se refere a expressões expres sões ha> ha>tiuitc tiuitc distintas. Certamente Certa mente,, ao kmgo do século XIX. um de seus formatos seiá este delicado, de seu sentido mais usual.
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Pedro Luis Ribeiro de Santí
TEXTO ANEXO - Johu Jo hunn nn W olfgang G oethe Johann Wbligang Wbligan g Ooeth O oethee nasceu nas ceu em 1749 c morreu m orreu cni c ni 1K32. F.lc c considerado o maior escritor da língua alemã c sua obra é muito extensa, sendo dividida em vários períodos. Werther pertence pertence às suas sua s obras ob ras de juven juv entud tudee foi escrito escr ito em 1774— 774—c possu po ssuii um forte forte componente autobiográfico. Seu formato também c o de troca de cartas. cartas. Em alguns algu ns trechos, trata-se de um diário intimo, intimo , causando causand o no leitor, uma srez mais, a impressão de cumplicidade. Através cesse texto, poderem pod erem os ter contato com a sensibilidade se nsibilidade romântica român tica c perceber como com o muito m uito do que nós pensamos hoje sobre a relação relação amorosa tet tetn n conto modelo o romantismo. A situação inicia iniciall c a de um jovem jov em culto da cidade cid ade que se cansa cansa dc sua vida urbana c busca refúgio na natureza. Já se trata de uma disposição romântica. Ele se refugia na fazenda de um amigo, que o recebe de bom grado. Ao longo dc toda a história ck sc correspwidc com um amigo da cidade. Wilhclm. ao qual confidencia suas idéias. WERTHER
•Maio. 22 A vida bumanu não passa de um sonho. Mais dc uma pessea já penso pensou u isso. isso. Pois Pois essa essa impressão impressão também também acom acompan panha-m ha-mcc por toda toda part parte. e. Quand Quando o vej vejo o os estreitos estreitos limite limitess onde onde sc achaii encerradas as faculdades ativas c investigadoras do homem, e como todo o nosso labor visa apenas a satisfazer d o s s í s necessidades, as quais, por sua vez, não têm outro objetivo senão prolongar prolon gar nossa mesquinha existência; quando verifi verifico co que o nosso espírito só pode encontrar tranqüilidade quanto a certos pontos nossas pesquisas, por meio de uma rcsignaçàs povoada povoada de sonh sonhos os,, como como um presidiário presidiário que adornasse adornasse de figuras niulticolondos c luminosas perspectivas as parede da sua célula... célula... tudo isso, Wilhclm, Wilhclm, faz-mc emudecer Concentrome e encontro um mundo em num mesmo mesmo!! Mas, Mas, também ai.é um mundo de pressentimentos e desejos obscuros e nào de itnagen itnagenss nítidas nítidas e forças. Tudo udo flutua flut ua vagamente vagamente nos met s sentidos, e assím. somndo e sonhando, prossigo na minha viagem viag em através através do mundo.'" mundo.'" ip. 19) Poderíamos Poderíam os nos lembrar, aqui, d e 1lamlc 1lamlct, t, com seu desencanto
A Construção do eu tu Modernidade com relação relação ao mundo c o desenvolvimento de um sentido profundo dc interioridade. Este elemento alinha o romantismo romantism o como critica ao ao humanismo e sua crença no valor c na liberdade do homem. Pouco tempo depois, Wcrlher escreve, escreve, comovido: “Junho, 16
A razão por que eu não lhe tenho escrito? E é você que mo pergunta, pergun ta, você que se incluí entre os sábios? Pode bem adivinhar adivinhar que sou sou feliz, c mesmo... Em duas palavras, palavras, conheci alguém que tocou o meu coração. Eu... cu não sei sei o qu quee diga. , É um anjo! . . . Bolas! Já sei que todos dizem isso da sua amada, não é verdade? Entretanto, c-me impossível dizer a você o quanto cia é perfeita; nem por que c tão perfeita. Só isto basta: da tomou conta de lodo o meu ser. (...) T udo quanto acabo de dizer não passa de pobres abstrações que não dfio dfio a menor ideia ideia da sua individualidad individualidadee ’tp. tp. 26-27) 26-27) Quando Quan do seu amigo am igo propôs a visita a uma fazenda fazenda vizinha, vizinha, já havia avisado a Wcrthcr Wcrthcr que ele não n ão se devia apaixonar, pois a moça mo ça já era no noiva iva,, o qu quee en então tão lhe de deix ixar araa indife ind iferen rente. te. Como já seria dc sc esperar, a impossibilidade impõe uma pred pr edisp ispos osiç ição ão a uma atração atra ção irres irr esist istív ível: el: "Achei original tudo quanto ela disse, vendo cm cada palavra novos encantos, novos raios de inteligência iluminar sua fisionomia, que transbordava de contentamento cont entamento à medida que que cia sc sentia compreendida compreendida por mim.’-(p 30 30)) Tendo a oportunidade dc dirigir-sc a ela em uma dança de salão, salão, ele ele procura procura conferir a situação do noivado, noivado, t i a responde com clareza estai noiva de um rapaz chamado Alberto. Embora ele jã tivesse sido avisado sobre isto, acaba por cnrolar-se nos passos da dança momentaneamente, recuperando então o controle. A partir daqui, grndativamcnte Werther vai perdendo o controle sobre si. A principio, procura manter-se próximo a Carlota. mesmo sabendo que seu sentimento não é correspondido. Ela. por sua vez, parece gostar de ter um rapaz tão interessante -e que, sobretudo, jamais sc toma inconveniente- a lhe fa/cr companhia durante as ausências do noivo.
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Pediu l.ui> Ribeiro de Santi Como cm de se esperar, ele começa a alimentar fantasias de reciprocidade c nos dá uma verdadeira aula sobre a idealização do objeto amoroso e sobre a construção do eu: “Nilo, eu nuo nuo me engano! engano! Linos nos seus olhos nega* um verdadeiro verdadeiro interesse por mim c pela minha sorte. Sim, eu sinto que meu coração pode crçr que ela... Ousarei, poderei pronunciar estas pala palavr vras as que que resu resum mem o par parai aiso so?. ?... .. Eu Eu sint sinto o que que ela me ama! Ela meara»! F quanto eu me valonzo valonzo a meus próprios olhos, olhos, quan to... eu pusso dizer is isccoa você, você, que que saberá comprcaidcrcomprcaidcr-mc. mc. .quanto .quanto eu me adoro a inim mesmo, depois que ela me ama! (...) E, no entanto, quando ela, com tanto calor cal or e afeto, fala do seu noivo..,c como se eu fosse um homem despojado de todas as honranas e dignidades, e ao qual arrebatassem a prupna espada, (...) Ela me c sagrada. sagrada. Todo odo desejo des ejo emude em udece ce em sua presença. presença. Não sei sei o que sinto quando estou junto dela; dela; c como se toda a minha alma estivesse subvertida.” (p. 48-9) Numa Nu ma con co n vers ve rsaa com A Iberto, que q ue ele e le reco re conh nhec ecee ser um rapa ra pa// razoável, apresenta utn verdadeiro manifesto romântico: ” Oh! essa gente razoável! razoável! -excla -ex clamei mei eu. eu. sorrmdo. sorrmdo. - Paixão Paixão I Embriaguez! Loucura! F. vocês se conservam conservam tào calmos, cal mos, tãc indiferentes, indiferentes, vocês, voc ês, os homens da morai! Esminram o bêbado; bêbado; repelem o louco, cheios de asco; c passam adiante, como c sacrificudor. agradecendo a Deus, como o fariseu, por nãc haver feito vocês iguais a um desses desgraçados!.,. Tenho me embriagado mais de uma vez, as minhas paixões foçarair sempre pela loucura, c disso não me arrependo, porque se' assim cheguei a compreender, cm uma certa medida, a razão por que, que, em todos os tempo tempos, s, semp sempre re fora foram m trat tratad ados os como omo cbno cbnoss c como loucos os homens extraordinár extraordinários ios que realizarani realizarani grandes coisas, as coisas coi sas que pareciam impossíveis... impossíveis... Mas, ainda nu vida ordinária, nada mais intolerável do que a todo momento ouvir gritar, sempre que um homem pratica uma açào intrépida: nobre e imprevista: "Esse homem está bêbado! E um louco! louco! One vergonha, ó todos vocês que qu e vivem em jejum' jeju m' Que vergonha, ó homens sensatos!” (p. 59) Mcrgulliado Mcrgu lliado em sua su a paixão, Wcrther percebe perce be a fragilidade do eu:
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A Construção do eu nu Modernidade "Que é o homem, esse semi semi deus tão louvado? louvado? Não lhe faltam as forças precisamente quando !hc sào mais necessárias? Quando de d e toma alento alento na alegria, ou se abisma abisma na dor, dor, não sc imubiliza em ura ou em outro sentido sentido e retoma a banal e fna consciência de si mesmo, no momento exato cm que aspira a pcrdcr-se pcrdcr-se na plenitud plenitudee do infinito?” infinito?” (p. (p. 119) Sc, inicialmentc, Werther se sentia feliz pelo simples fato de sentir sua paixão, na medida em que o tempo passa e este sentimento não encontra expressão, ele passa quase que a intoxicá-lo e nasce um sentimento progressivo de amargura. Agora Werther sofre iniensamente c procura fugir deste sofrimento distanciando-se dc Carlota. Como era previsível, ele não agüenta a distância por muito tempo, tempo, mas quando volta, volta, clcjá clc já perdeu a possibilidade possibilidade de se controlar e passa passa a dar alguns vexames públicos na presença dc Carlota, chorando ou levantando c partindo bruscamente de algum encontro social. Km um último últim o encontro encon tro crucial com ela. ao declarar-lhe de clarar-lhe pela prim pr imeir eiraa vez ciar ci aram am en ente te seu se u amor, am or, o u v e a segu se guin inte te “ inte in terp rpre reta taçã ção” o” bast ba stan ante te ag agud uda, a, po porr sin s inal al qu quee lhe dei d eixa xa ab abso solu luta tam m cn cnte te ofe o fend ndid ido: o: “-Apenas um momento de sangue-frio, Werther! Você não sente que é tudo por sua culpa, que você se perde voluntariamente? Por que hei de ser eu, Werther, eu. que pertenço pertenço a outro, precisame precisamenfe nfe eu? Temo Temo,, temo temo muitíssimo que seja apenas u impossibilidade dc mc possuir que faça você desejar-me desejar -me com tanto ardor! ardo r!” (p. 136 36)) A partir deste momento, ambos concordam co ncordam cm que não mais mais se devem ver. Werther, percebendo que nào possui mais controle sobre si. decide tomar a última atitude que ainda parece ter sob controle: controle: suicidar-se. suicidar-se. Klc planeja incluir Carlota no n o suicídio, suicídio, solicitando so licitando as pistolas pistolas dc caça de sua su a família fam ília c, afinal, dc fato fato sc suicida. suicida. Algumas cartas são deixadas para amigos e. è claro, para Carlota: MF. a última última vez! vez! É a última última vez que uhro os olhos. olhos. Ai dc miin, miin, eles nào verão mais o sol. que sc cscomle aguça nas nuvens de um céu sombrio... Tomai luto, ó natureza, porque o vosso filho, 0 vosso amigo, o vosso amante aproxima-sc do fim f im Ó Carlota. Carlota. só às rmpc rmpcc.ss c.ssóe óess confusa conf usass dc um um sonho sonho è comparáv comparáveL eL..
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Pedro Luis Ribeiro dc Santi talvez, o sentimento sentimento que sc experimenta experimenta ao dizer. "Lis a minha derradeira manhã!” A derradeira! Carlota, esta palavra derradeira, náo a entendo. Não estou aqui em todo o meu vigor? E amanhã, vcr-mc-ào vcr-mc-ào estendido sobre a terra. Morrer! Morrer! Que é isto? Veja, c como sc sonhássemos quando falamos da morte, morte, Vi momer momer muita muita gente, mas a humanida humanidade de c tão limitada que se mostra incapaz de conceber o começo c o fim da sua existência. Neste Nes te momento, ainda me pertenço! pertenço! Pertcnço-lhc, também, 6 ntinha bem amuda. E, bastará um instante separados, perdidos um para o outro,, para sempre, talvez .. . . , Não, Não, Carlo Carlota. ta. não!.. não!.. Corno Corno poderei poderei ser aniquilado? Como poderá vocc v occ scr aniquilada? aniqu ilada? (... ) Não Nã o esto es tou u son so n hand ha ndo, o, não estou est ou d elir el iran ando do.. Ao aproximar-me do túmulo, meus olhos vêem niais claro. Nos subsistiremos! Nós nos tomar tomaremos emos a ver! ver! Vere Vereii sua mãe; sim, sim, eu verei, eu a encontrarei, encontrarei, abrirei nve nveu coraçã cor ação o diante diante dela! dela! Sua mãe! Aquela dc quem você é a perfeit perfeitaa imagem,” (p. 152-4) 152-4) Assim, após a dissolução do eu, surge a fantasia Je dcspcrsonali/ação em um reencontro místico em um plano superior e mais puro. Trata-se de um reencontro com a origem, figurada na referência á mãe de Carlota. * O honrem romântico crê-se único, suas experiências mais prof pr ofun unda dass p arec ar ecem em-l -lhe he inco in com m unicá un icáve veis is e radi ra dica calm lmen ente te individ ind ividuais. uais. Desta concepção dc experiência huniana. nasce a idéia de ‘gênio’, entendido como um sujeito sujeito especial mente dotado dc alguma característica; esta não pod e scr aprend ida ou transm itida, n as pcrt pc rtcn cncc cc à essên ess ênci ciaa m esm es m a deste des te mdivi md ividu duo. o. TrataTra ta-sc sc de um dom do m , um presen pre sente te (cm inglês, inglê s, o term te rmo o gr/? gr/?,, traduz tradu z os dois do is sentidos). sentid os). Fslc homem não tem opção a não scr viver para a realização de seu destino. Talvez Talve z possamos possam os exem e xem plificar a idéia de gênio recorrendo a um dos primeiros músicos românticos; Beethoven. Beethoven. MLIS MLISIC IC A -
Be B e e th o v e n
A música c a biografia dc Beethoven trazem-nos fores
A Construção do cu na Modernidade elementos român ro mânticos ticos Consta que foi foi ele que criou o mito do maestro atormentado, autoritário e totalinentc mergulhado na música diante da orquestra. Ainda cm Mozart, as luzes do teatro permaneciam acesas durante a execução da música c mesmo algumas manifestações man ifestações mais ma is ruidosas da audiência audiên cia eram admissíveis. adm issíveis. A partir partir de Bccihovcn, as lu/cs são apagadas e exige-sc o mais absoluto silêncio. O fato de que Beethovcn, um dos maiores compositores existentes, tenha perdido gradaiivamente sua audição cl»ega a uma tragtcidade patética. Esta tragicidade c acentuada pelo fato dc que ele tetiha continuado a compor c de forma ainda mais intensa. Sua música parece expressar dc forma direta o tormento ou entusiasmo cm que sc encontrava no momento da composição. As peças frequentemente mudam bruscamenie de andamento, revezando temas perturb per turbado adoss com melodias melo dias suaves. suav es. A sensib sen sibilid ilidad adee românt rom ântica, ica, com sua nostalgia por um universo univers o perdido, produz com Beethove B eethoven n peças dc uma profunda melancolia*. Beethovcn nào sc revelou um gênio desde cedo. Foi apenas quando já adulto, no início do século XIX, que sua obra floresceu, Mas, uma vez revelado seu talento, a realização de sua obra passou a ser o centro de sua existência. Sua correspondência no fim da vida o revela triste c desencantado; a idéia de suicídio lhe ocorre, mas c afastada com a justificativa de que ele linha urna obra a realizar. O sofrimento do eu é menos importante do que a realização desse dom maior que sc lhe perpassa. Questões Questões para discuWiu discuWiu
1. Qual é a criti critica ca do Romantismo Romantismo ao llumini lluminismo? smo? 2. Qual Qual é a diferença diferença entre entre a definição dc Romatismo do limd limdn n século XV1I1 c a forma como o definimos hoje, no sentido comum? 3. Como a noçào de "gemo" contribuiu pnra n desenvolvimento do individualismo?
Abertur tura a Cori Corioi oiai aito to,, da Sinfonia Simphon onie ie No. No. 8, 31 Como na faixa faixa Aber Sinfonia n 8 ("‘Simph Rcrliner Philamionien, Deutsche Graiurnophon, 1086"), Ouca também o r( iLIíorow Iío rowitz itz Perfonn.s Perfonn.s Beethoven, Sony Clássico, Adagio. da Sonata ao L uar(i 1974)l
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12 A AUTO-CRÍ riCA DA RAZÃO No interio interiorr do próprio próprio itumini ituminism smo, o, svrge um movimento de auto-crítica ás pvssíbitidades. da razão alcançar o conhecimento pleno.
^ ^ ) u a n d o dizemos dizemos que. que. no scculo scculo XVI XVIII II,, se inic inicia ia um um proc pr oces esso so de crisc cr isc da noção no ção de subj su bjeti etivid vidad adee afirma afir mada da até o scculo sccu lo anterior, não nos referimos referimo s apenas a ataques externos ou ã valorização valorização daquilo que escapa ao cu. No interior da própria racionalidade ilurninista, a razão será tomada como objeto de investigação c suas prete pr etens nsóc ócss quan qu anto to ã possi po ssibi bilid lidad adee de alca al canç nçar ar a verdad ver dadee plena ple na será posta po sta em chequ che que. e. Descartes havia debruçado sua razão sobre os objetos do inundo e tinha chegado á conclusão de que todos eram incertos restando como único pomo fixo c absoluto o próprio próprio eu, enquanto ser pens pe nsan ante te Com Co m Immanu Imm anucl cl Kant, Ka nt, uni dos do s auto a utore ress mais ma is da história histó ria da filosofia, o próprio pensamento será tornado como objeto de investigação. Neste movimento reflexivo (a razão pensa sobre si próp pr ópria) ria),, trata-se trat a-se de inves inv estig tigar ar as pos p ossib sibili ilida dade des, s, os o s limit li mites es da razão, impostos por sua piópria constituição. Sua principal obra a este respeito c a Crític Crítica a Ja razão pura, a qual faremos apenas uma referência extremamente simplificada. Kant Kant chega à conclusão conclusã o dc que o pctisar c organizad orga nizado o por categorias, estruturas que organizam tudo o que nos chega do inundo. Por exemplo, exemp lo, a categoria da relação '‘causa '‘causa e efeito” , leva leva o pensamento pe nsamento a crer que. quando um evento segue-se a outro, o primeiro é causa do segundo, mesmo que eles se jam jam independentes. independentes. Neste sentido sen tido,, todo o nosso no sso conh co nhec ecim imen ento to sobr so bree o mund mu ndo o seria condicionado e “formatado” por nossas estruturas cognitivas.
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A Construção do eu na Modernidade Assim, chega-se à conclusão dc que nunca temos acesso a coisas etn si, si, mas apenas à fenômenos Ou seja, ao mundo mu ndo tal tal como com o somos pu u r a nás. Kant nào duvida da cupa7cs dc apreendê-lo, como se dá p existência das coLsas cm si exteriores ao homem, mas o eu pensante jam ja m ais ai s pode po deria ria ter aces ac esso so a elas. ela s. Isto nào significa sign ifica que a razão é inútil inútil ou que devesse deixar d eixar de procurar compreender compre ender o mundo, mundo, Ela Ela deve aprender aprende r a manter-sc em seus limites, limites, dentro dos quais poderá produzir produ zir um conhecimento confiável. A razão deve abster-se de questões transcendentais, que ultrapassam em muito seu alcance, tais como a existência de Deus, da alma ou da liberdade. Sobre tais assuntos, podemos discutir interminável mente men te acumulando acumuland o razões a favor e contra cada uma sem nunca chegarmos a uma conclusão. Sua área de açào deverá manter-se no limite dos fenômenos, àquilo de que temos uma apreensão direta. Sua tarefa já será mais humilde, ao invés ilc chegar à verdade absoluta, ela deve procurar prod pr oduz uzir ir hipóte hip óteses ses,, mode mo delos los teóric teó ricos os atra at ravé véss dos d os quais qu ais seja possív po ssível el organizar e dar sentido aos fenômenos. Toda teoria, assim, é necessariamente uma criação humana provisória, que a qualquer momento pode ser superada por outra que a abarque e dê conta dc um maior número de fenômenos; este movimento é infinito. Não a qualquer perspectiva de que se chegue a uma teoria que coincida com o mundo, mundo, O pensamen pensa mento to de Kant, na seqüência seqü ência das idéias dc Descartes, Desca rtes, será uma «las principais influencias no modo dc sc produzir ciência no scculo XIX. Vejamos como um autor do século XX, Cassircr, descreve o procedimento da razão no século XV1I1: "Fie consiste em partir dc fatos solidamente estabelecidos pela observação, mas não basta que os falos estejam ‘ao lado’ uns dos outros, é preciso que eles se encaixem uns ‘nos' outros, que u simples convivência sc revele, bem considerada, como dependência, que da forma de agregado se passe á forma de sistema. Esta forma sistemática nlo pode evidentemente ser imposta o exterior aos fatos; é preciso que da sobressaia. Os ‘princípios* princípios* que nós nós precisamos precisamos procur pr ocurar ar cm toda parte, e sem os quais nenhum domínio dc um conhecimento seguro é possível, não são tais ou tais ponto de partida escolhidos arbitra»iamente
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Pedro Luís Ribeiro dc Santi pelo pelo pensame pensamento nto e aplica aplicados dos a for força ça à expe experiê riênc ncia ia coiureta coiureta para para mode modellar1 ar1’.” Ainda segundo seg undo Cassirer. o trabalho do pensamento pensamento deve seguir do particular para o universal, supondo-se que o primeiro esta já submetido subm etido a um principio prin cipio universal. univ ersal. Os O s principios a que >e >e chega cheg a não possu po ssuem em,, no enta en tant nto, o, o cará ca ráte terr d e absolu abs olutos. tos. Eles sào relati rel ativo vos, s, ou melhor, prov isórios, e apontam aponta m para p ara um limite circunstancial circunstancial da ra7ào, que p
!. Quais são os limites que Kant vê no projeto dc eomecimento de Descartes? 2. O que significa o trabalho de produzir teorias no pensamento dc Kant? 3. Segundo Kant, c poss po ssiv ivd d obtermos obtermos um conhecimento objet.vo do mundo?
Cassirer. p. 62. EMc tipo de colocação c freqüentement freqüentementee encontrado encontrado em Frcud. Frcud. por por exemplo.
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A Construção do eu tw Modernidade
13 O POSITIVISMO inicio do século XIX, nasce o modelo cientifico para o produção de conhecimento com bases seguras.
jVü
A
í. a . parlir da cri criti tica ca de Kant, se irá irá desen har no século XIX um modelo para a produção de conhecimento a um só tempo racional e empírico. empírico. O senso comum ainda hoje o toma como sinônim o de verdade: a ciência nos moldes positivistas. Dizer que algo c cientifico significa dizer qie ê reconhecido pelas autoridades no assunto com o certo e indubit indubitávcl ávcl.. Nào N ào se trata trata de opinião ou crença, mas de algo provado. O que hoje chamamos com freqüência de ciência teve seu modelo mo delo formulado fo rmulado por po r Auguste Comte. Com te. Jilósofo francês. Assim como com o Kant. Kant. Comte acred ita na possibilida possibilidade de de a razão conh ecer o mundo m undo c, como ele, pensa que isto será possivcl desde que o homem se mantenha dentro d entro do d o uni uni verso dos objetos o bjetos tais com o lhe são acessíveis. Comte nào fala em termos de fenômenos, mas de algo semelhante, os objetos po positivo, vo, devem os entender aqueles que sc p o s itiv it iva a s. Por positi apresentam diretamen te aos nossos nossos órgãos do sentido. sentido. Quando Comte denomina seu pensamento com o nome de po p o siti si tiv v ism is m o , ele q u e r com co m isto e n fa tiz ti z a r seu c a rá ter te r de c o n cret cr eto, o, verdadeiro ou útil útil,, por p or oposição oposição às abstrações abstraç ões m etafísicas da tradição filosófica. filosófica. Com o positivi positivismo, smo, afirma-se afirm a-se a concepçã conc epção o de que cada ciência deve inicialmenie definir seu objeto, que deve scr necessariam ente positivo, locali localizado zado no tempo e espaço, observável, em última última instância. instância. Uma U ma vez definid o o objeto, toda cicncia tem os mesmos métodos: a observação c a experimentação. Inspirado pela tradição tradição humanista hum anista de que os coisas do mundo deveriam deve riam scr pensadas p ensadas cm termos de sua utilidade para o homem, assim com pelo distanciam ento entre o sujeil sujeilo o do conhe c onhecime cimento nto e o objeto, objeto, prescrito p rescrito
Hcdxú Luis Ribeiro de Santi po p o r Desca Des carte rtes, s, a ciên ciê n cia ci a posi po siti tivi vist staa visa vis a sem se m p re a prev pr evisã isãoo e o cont co ntro role le sobre seu objeto. A ciência deve gerar tecnologia. É curioso curioso observar que. segundo segu ndo este moud mo udo, o, sena sen a intposs intpossii ve vell a realização de uma um a Psicologia científica, na medida em que a mente m ente não sc apresenta conto um objeto positivo. A alternativa, e mesmo isto pode ser questionado, seria a própria experiência da mente para cada pessoa Comte Com te descartava descartava a Psicologia c concebia como projetos viáveis a sociologia c a fisiologia. fisiologia. Sem dúvida, dú vida, muitos muitos dos problemas da Psicologia, sobretudo em sua origem, vinculam-se justamente a esta questão da impossibilidade de apreendei a mente. Comte soa pr p r o f é tic ti c o n e s te a s p e c to. to . D ive iv e r s a s lin li n h a s da P s ico ic o log lo g ia t e n tar ta r ã o arduamente satisfazer aos critérios positivistas, enquanto outras decididamente nào poderão fazê-lo. Sobre crias últimas, sempre recairá a crítica dc serem pouco cientificas c a isto sc seguirá a tentativa dc desautorizá-las. Paru Comte. a possibilidade dc o homem fazer cicncia no século XIX deve-se á sua evolução. Ele vê na listória das tentativas do homem de compreender o mundo um desenvolvimento que teria atingido seu ponto culminante com a ciência Nos primórdios da civilizaç civilização, ão, o homem hom em teria teria tentado com preend pree ndera era natureza natureza recorrendo recorrendo á mitologia, à religião. religião. Fenôm F enômenos enos naturais tinhím tinhí m sua causa atribuída a seres c intenções sobrenaturais. Este sena sen a um modo mo do de pen pensam samento ento mágico má gico e infantil. infantil. Com o passar p assar do tempo, o homem teria teria passado a entender o mundo de lôrma filosófica ou metafísica, procurando identificar essências transcendentais transcend entais para exp licir lici r o mundo. Um passo já j á teri te riaa sido sid o dad d adoo com co m rela re laçã çãoo à rel r elig igiã ião, o, uma um a vez qu q u e esta e stass ess e ssên êncc ias ia s po p o s s u íam ía m u m a rac ra c i o n a lid li d a d e c n ào se r e c o rria rr ia m ais ai s á idé id é ia de intcncionulidade, ma* ainda se mantinha ma ntinha n explicação de algo natural po p o r algo al go invisíve inv isível.l. Finalmente, o homem teria podido passar a compreender fenômenos naturais, buscando sua causa tão somente na própria natureza e em suas leis. Esta seria a função da ciência: procurar conhecer as leis que regem a natureza, inclusive o homem. A frase frase estam pada na bandeira b-asilcira b-asilcira - “O rdem e pro p rogg r e s s o " - é d e insp in spir iraç ação ão dire di reta ta d o p o siti si tivv smo. sm o. Ele El e tev te v e gran gr ande de inlluência nos fundadores dc nossa república. Comte crê que liá liá ordem na natureza e. embora nào possamos ter uir conhecimento direto
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A Construção do eu na Modernidade dela, podemos inferi-la através dos fenômenos. Estas idéias idéias dc Com te podem sc t confrontadas, confrontadas, com co m interesse interesse ao nosso tema. com c om a posição de Nictzsche que é radicalm entc oposta. oposta. Para Para este último, o nascimento da d a racionalidade, qu e toma tom a o lugar do do mito -m ovim ov imento ento simbolizado simbolizado por Sócrates-, teri teriaa sido sido um momento ilc grande perda e afastamento da verdade. Voltaremos a tratar do pen p ensa sam m ento en to de N ictzs ict zsch chee adian adi ante. te. Tomemos algumas passagens expressivas de Comte:
TEXTO ANEXO - Au A u g u s U f C o m te CIRSO l)E FILOSOFIA POSITIVA "II - Para Para cxpliear convenicatcmeiite a verdadeira verdadeira natureza natureza e o caráter próprio da filosofia positiva, ê indispensável ter, de inicio, uma visào geral sobre a marcha progressiva do espirito humano, considerado em seu conjunto, pois uma concepção qualquer só pode ser bem conhecida por sua história. No estado teológico, o espírito espírito humano, humano, dirigindo csscncialmente csscncialment e suas investigações para par a a natureza intima dos dos seres, as causas primeiras e finais de todos os efeitos que o tocam, cm uma palavra, para os conhecimentos absolutos, apresenta os fenômenos como produzidos pela ação direta e continua dc agentes sobrenaturai sobrena turaiss mais ou menos numerosos, cuja intervenção arbitrária explica todas as anomalias aparentes do universo. No universo universo metafísi metafísico, co, que que no no fundo fundo nada nada mais é do que simples modificação geral do primeiro, os agentes sobrenaturais são substituídos por forças abstratas, verdadeiras entidades (abstrações personificadas) inerentes aos diversos seres do mundo, c concebidas como capazes de engendrar pot elas próprias todos os fenômenos observados, cuja explicação consiste, consiste, então, em dctcmiinar. dctcmiinar. para par a cada um. ntidade correspondente. Enfim, no estado positivo, o espirito humano, icccndo a impossibilidade de obter noções absolutas, renuncia a procurar a origem e o destino do universo, a conhecer as causas intimas dos fenômenos, para preocuparse unicamente em descobrir graças ao uso bem combinado do raciocínio c da observação, suas leis efetivas, a saber,
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Pedro l.uís Riheiaide Santi suas relações invariáveis de sucessão e de similitudc. A explicação dos fatos, reduzida entào a seus termos reais resume-se de agora cm diante na ligação estabelecida entre os diversos fenômenos particulares c alguns fatos gerais cujo número o progresso da ciência tende cada vez mais í diminuir. Vemos, pelo que precede, que o caráter fundamenta da filosofia positiva é tomar todos os fenômenos comr sujeitos a leis naturais invariáveis, cuja descoberta precisa c cuja redução redução ao menor número possível constituem consti tuem o objetive objetive de todos os nossos esforços, considerando comr absolutamente inacessível e vazia de sentido para nós s investigação das chamadas camas, sejam primeiras, sejanr finais, Ê inútil insistir muito sobre um principio, hoje tãc familiar a todos aqueles que fizeram um estudo um poucc aprofundado das ciências de observação. Cada um sabe que. em nossas explicações positivas, ate at e mesmo as mais perfeitas, perfeitas, não temos de modo algum a pretensão dc expor as camas geradoras geradoras dos fenômenos, posto que nada mais faríamos entàc entàc além de recuar a dificuldades. Pretendemos somente analisar analisar com exatidão as circunstâncias dc sua produção c v inculálas umas ãs outras, mediante relações normais dc sucessão e dc similitude. Seria fácil multiplicar exemplos, inúmeros durante o andamento deste curso, porquanto este c o espin es pintn tn que agora dinge exclusivamente as grandes combinações intelectuais. Para citar apenas neste momento um único dentre os trabalhos contemporâneos, escolherei a bela scríc dc pesquisas do Sr. Fouiier Fouiier sobre a teoria do calor. calor. Ofcrcce-nos a verificação muito muito sensível das observações gerais precedentes. Neste trabalho, trabalho, cujo caráter filosófico é tào eminentemente positivo, as leis mais importantes e precisas dos fenômenos termológicos cncontram-se desvendadas, sem que o autor tenha inquirido inquirido uma única vez sobre a natureza natureza intima inti ma do calor, sem que tenha mencionado, a nào ser para indicar sua vacuidadc, a tão agitada controvérsia controvérsia entre ent re os partidários partidários da matéria calôrica e aqueles que fazem consistir o calor cm vibrações dum éter universal. No entanto, trata-sc nessa obra das mais altas questões, muitas das quais nunca nem mesmo tinham sido colocadas, prova capaz dc que o espirito humano, sem se lançar em problemas inaleançávcis, c restringindo-se a
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A Construção do cu nu Modernidade investigações investigações de ordem inteinunente positiva, positiva, pode encontrar aí alimento inesgotável para sua atividade mais profunda.” 4
MÚSI MÚSICA - Puf>anini e Liszt Com relação ã música, penso que qu e seja possível di7er que “o positi po sitivis vism m o nuo dá samba sam ba”” . Nã Nãoo tenh te nhoo nen nenhum humaa refer re ferên ência cia de um estilo, autor ou peça musical que possa expressá-lo. A presença do po p o siti si tivi vism smoo n esta es ta área ár ea refe re fere re-s -see à tcc tc c n ica ic a ; q u er d e p rod ro d u ç ão de instrumentos, quer da execução das peças. O século XIX guarda o registro de fantásticos virtuoses cm seus instrumentos como Lis/t ou Paganini, mas que musical mente men te eram românticos. Na virada virad a para o século XX, nascerá uma música propriamente experimental: o dodccafonismo. Seu fundador, Arnold Shòinbcrg, eru um austríaco contemporâneo de um movimento forte na cidade chamado “nco positivismo” Questões para discussão 1, Que condições deve cumprir um forma de produção dc conhecimento para para que que seja consid considera erada da cientifica cientifica pelo pelo positiv positivism ismo? o? 2. Por quê. segundo Comte. seria impossível rcali/ar uma psicologia cientifica? J . Como compreender compreender a frase da hnndc hnndcii ra bfasi Icira Icira "Ordem c Progresso” Progresso” do ponto de vista positivista?
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Pedro Lubí Ribeiro de Sano
OS DIVERSOS CAMINHOS PARA A PSICOLOGIA Nesta parte, c apresentado um conjunto de referencias jue ju serviriam com como o instrumen instrumentos tos i e serviriam para par a a compreensã compr eensão o Jn multiplicidad multip licidadee de sistemas da Psicologia. c
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V 'orno 'orno já dissemos, desde a colocação cio cu no centro do mundo por Ik-scartcs, diversos caminhos Se desenvolveram na história do pensamento c dos costumes; estes caminhos frequentemente cruzam-se. misturam-se c voltam a distanciar-se. A partir dos pomo po moss dc vista vista principais p rincipais que apresentamos nas parte pa rtess anterio ant eriores res sohre a quest qu estão ão da subjetiv subj etivida idade, de, poderíamos poder íamos deriva der ivarr alguns modos de scr do cu; Da questão dos costumes, perderíamos derivar um eu moral , atento ao auto-con trole cm função fun ção dc exigênc ex igênc as sociais. Por este viés, a noção do eu é dada pelo reconhecimento externo, ele busca bu sca auto au to-u -ulir lirm m ar-s ar -see e, p ara ar a tal, tal , investe inv este na aparên apar ência cia c obed ob ediê iênc ncia ia a regras dc conduta pregadas por aqueles que toma co n o autori autoridades dades,, moldandomold ando-sc sc aos ideais ideais que tem cm tomo de si; si; um cu social, social, digamos. Este Este eu ê um grande consum con sum idor ido r dc mexia exia,, de livros de de auto-ajuda c de biografias de personagens públicos dc sucesso (cum o perdào da ironia). Ele busca sempre algo ou alguém (um horóscopo ou uma tipologia psicológica) que lhe diga quem ele ê. Aqui o cu c tomado como objeto, cie deve sujeitar-se a padròes. -Tendo sua expressão máxima no romantismo, veríamos o eu interiorizado , que representaria cm grande medica a questão do individualismo e da profundidade. Ele realizaria uma certa ruptura
A Construção do cu na Modernidade com os valores externos e um um movimento de reflexão , no sentido da construção construçã o de si. si. Ele partiria partiria de um desenca d esencanto nto com as aparências aparê ncias e descobriria (ou criaria?) níveis de profundidade no homem. () eu romântico corresponde ao sentimento dc possuirmos algo absolu lamente único ún ico que, por mais que se tente, tente, não sc deixa deix a conhecer ou controlar lotalmentc. -Finalm -Fin alm ente, ente , do Ilumini Iluminismo, smo, ainda que critic critico, o, derivaríamos derivaríamos o eu epistêmico. Trata-se do sujeito do conhecimento; o cientista, enquanto enqua nto sujeito dessubjeti vado, vado, ou seja, seja, capaz de despir-se d espir-se dc todos os seus seus desejos e particularidades particularidades e scro sc robje bjetivo tivo cm suas observaçòcs e experimentos com os fenômenos naturais. Ele acredita poder sei neutro, não interferir interferir naquilo sobre que se debruça Oò esengaja esen gajam m ento do eu, eu, característico cara cterístico da M odernidade, a que se refere Charles Ch arles Taylor evidenciasse aqui com mais clareza Do eu cpistêmico, resultaria um modo dc scr absolutamente pres pr esen ente te p ara ar a nós: nó s: trata tra ta-s -see do " v e s tir ti r a cam ca m isa is a da em p resa re sa”, ”, q ue costumamos remeter á cópia do modelo dc produção oriental dos chamados “tigres asiáticos”, mas que retoma de forma atualizada a experiência experiên cia medieval: a de que cada um possui o seu lugar dentro de uma ordem maior c não há lugar para a determinação individual. E s t e ' e u ' s e a n u la en q u a n to d e te r m in a n te d e sua su a a ç ã o . FIc se identifica com a instituição a que está e stá ligado e “já “já não tem nem fimdc-semana” dc-sem ana” ; sua vida é absorvida e qualquer recusa a uma um a solicitação é teimada como traição. Sc a religião, a família, e as organizações polít po lític icas as repre rep rese sent ntam am ainda ain da instit ins titui uiçõ ções es que q ue se alim al imen enta tam m e exe e xerc rcem em pa p a r a e s te m o d o d c s e r, n ão h á d ú v id a d e q u e , do i n i c i o da industrialização no século passado à produção em escala atual, o trabalho tem exigido um tipo de engajamento semelhante. Fstc tipo refere-se ainda ao movimento cartesrano de tomar o próprio ‘eu' com o sujeito sujeito capaz de tomar a natureza com o objeto de conhecimento c uso: e aqui surge o desdobramento, o próprio eu acaba por se tomar objeto de urna técnica. Nisto, evidcncia-sc uma semelhança com o cu moral. Retomemos por um momento u tese de Luís Cláudio Figueiredo que temos como referência. Fm A i n v e n ç ã o d o ps p s ico ic o ló g ico ic o , o autor propòc um triângulo cujos vértices seriam formados pelo Romantismo, o Liberalismo, c a Disciplina (regime
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Pedro Luís Ribeiro de Santi disciplinar) disciplinar),, em um a concepção muito próxima próxim a à exposta aqui. Penso Penso que a definição de três três modos de colocação do eu que fizemos fizemos ac in a pode po de ser sobr so brep epos osto to ao triâ tr iâng ngul ulo o d a figur fig uraa adian ad iante. te. Na tese tes e d e Figu Fi guei eire redo do,, os div di v erso er soss proj pr ojet etos os de Psicolo Psic ologia gia pode po deria riam m scr sc r com co m p reen re endi dido doss com c om o herd he rdei eiro ross dess de ssas as três tendê ten dênc ncias ias básic bá sicas as que. que . aliás ali ás,, quas qu asee sem se m pre pr e apre ap rese sent ntam am elem el emen ento toss d e m ais ai s de uma delas combinados. Podcriamos “perguntar” a cada linha da Psicologia como ela se posicionaria neste triângulo, se em algum vértice ou lado. Isso forneceria uma perspectiva dc compreensão sobre sua origem e algumas das diferenças mais ou menos radicais entre elas. Não N ão sc tra tr a ta aqui aq ui d e c ria ri a r uma um a “tip “t ip o log lo g ia", ia ", o que qu e mu to agradaria ao eu moral em nós. Dificilmente, Dificilm ente, insistimos, podc-sc pod c-sc achar um “tipo puro" de qualquer tuna destas destas tendências, mas procuremos acompanhar algumas possibilidades de desdobramento e presença simultânea de algumas das tendências deste esquema ao longo do século XIX. Nesse século, a critica ao humanismo chegará a seu pont po nto o culm cu lmina inant nte, e, uo mesm me smo o tem t empo po em e m que qu e a idéia idé ia dc indiv in dividua idualida lidade de se aprofunda Deste duplo movimento mov imento surgirá a demanda por um um prof pr ofiss issio iona nall da d a “cr “ crise ise de ident ide ntid idad ade" e"..
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15 FIGURAS DO ROMANTISMO NO SÉCULO XIX O romantismo romantismo atoume diversas uspet ias, ias, todo todoss pa p a rece re cen n d o c r itic it ic a r os p r o jeto je to s do Modernidad Mod ernidadee -c -com omo o n próp pr ópria ria ciência ciênc ia e remeter a algo maior e anterior ao eu. c - ^ o m o já menciona V mencionamos, mos, o r omanti omanti smo refe refere re-s -scc a manifestações bastante diversas. No século XIX. ele assumirá aspectos diferentes. Muitos deles são anti-humanistas, no sentido em que o eu aparece reduzido diante dc um elemento maior, como a paixã pai xão, o, uma caus ca usa, a, uma um a nação. naçã o. etc. etc . Por outro lado. o roma ro mant ntism ismo o é essencial no desenvolvimento do sentido de iitterioridadc e prof pr ofun undid didad adee da d a alm a lmaa huma hu mana na,, cons co nstit titui uind ndo o se em uma um a das da s bases base s do que poderíamos chamar de individualismo. Vejamos alguns desenvolvimento desenvo lvimentoss da questão do anti anti humanismo A concepção conce pção de paixão, nascida nascida no romantismo romantism o já do século XVIII, tomará uma forma filosófica classieu com Arlhut Schopcnliíiu Schopcnliíiuer. er. Fm sua obra obr a mais conhecid con hecida. a. Qm umio um io como vontade vontade e representação, ele nos apresenta a idéia de que o mundo é constituído por estes dois elementos elemen tos vontade e representação. A prime pri meira ira seria ser ia uma essên es sência cia unive un iversal rsal,, uma energ e nergia ia que subja s ubjazz a tudo: tudo : a segunda e assimilável assimiláv el à "idéia" "idéia" em Plutuo Plutuo.. Cada coisa existen exi stente te c. em última última instância instância,, uma um a manifestação manifes tação da vontade, v ontade, inclusive inclusive o homem. A vontade seria a coisa em si, que Kant postulara como inacessível. Aqui Aqui se introduz o elemento elem ento anti-humanista. O homem, que acreditava ser a obra prima da criação, centro do universo e dono de uma vontade consciente, Iív t c para se s e torn to rnar ar o qu q u e bem qui q uise sess sse, e, vê110
Pedro Luis Ribeiro Ribeiro de Santi
Fragonard. ' Os acasirs feli felize zess da ba lan ço ' A natureza natureza idealizada é mixitada. O ocw no balanço balanço liio liio lia li a m e leve ama cena que traz, por iráX um pajent i/iutsc ocvllo ocvl lo leva a uma indiscrição.' o Mif Mifwi wini niho ho cjiw voa c deixa deixa w r n i/ue a dana tentava J i'.\eonde '.\eonder r
Goya. oya. "O sono da nr.dn produz pro duz monstros f 1 7 9 7 /I7 /I 7 9 S ). Para além da dimensão e alcance do “e u ", Goya mostra-nos u emergência de unia dimensão escura e profunda profu nda do homem
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urna tempestade de n e v e H o turbilhão da imagem une desenha um roda moinho, fslumbra ifslum bra se um barco à ntercc das forç fo rças as da natureza natu reza tão superiores às do Humeni
Redo Redon, n, “Orfeu Orf eu ", Redon mostra a i xtfoeça de Orfeu (e. 1903) -despedaçado /telas baca ba cant ntes es-- levada pe p e lo flu fl u x o de um rio. rio. Estamos Estamos distan distantes tes de Da Vinci: aqui, o Homem dis solve-se e também não se vislumbra outra referên cia para p ara pôr pôr em seu lug lugar.
Pedro Lu is Ribeiro Ribeiro dc Sanli Sanli sc diante de uni dcspojtunento total de sua importância: ele não seria mais do que um invólucro que porta a vontade e que pode ser, sem maiores problemas, substituído. lista essência do mundo escapa totalnieiite á sua percepção consciente. Teríamos apenas acesso aos fenômenos fenôme nos que a expressam A existência existên cia liumana ganha o aspecto de relativa gratuidade, o que leva Schopcnhauer a ser considerado um pensador pessimista. Tomemos alguns treclios dc sua obra.
TEXTO ANF.XO
-\rlhur Schopenhauer
O MUNDO COMO VONTADE E REPRESENTAÇÃO VIDA F, MORTE “Espero que os tivs j> j>i inteiros livros hajam hajam feito co npreender npreend er que o mundo como representação é o espelho da vontade, no qual a vontade se reconhece a si mesma com um» clareza e uma precisão que vão gradualmente crescendo: no homem esta consciência atinge u perfeição, mas a essênciadu homem não encontra a sua expressão completa, salvo na concaicnação das ações que ele pratica c é a razão que torna o indivíduo capaz de abranger de relance e irabstrato a unidade consciente ila soa conduta. A vontade, considerada puramente em si mesma, c inconsciente; ê uma simples lendêneúi cega e inesistivcl. a qual qual encontramos tanto na natureza do reino r eino inorgânico inorgânico e do vegetal e nas suas leis, como também na parte vcgctaliva du nossa vida: mas pelo acréscimo do mundo da represcnlnçào que sc desenvolveu pelo seu uso. elu adquire a consciência do seu querer quer er e do objeto objeto do seu quer querer er;; reconhece reconhece que aquilo aquil o que que q uerr não e outra coisa senão s enão o mundo c a \ ida ida como são: dizemos, por isso. que o mundo \isi\el e a sua inagem ou a sua objetividade, e como o que a vontade quer é sempre a vida, pois que a vida pura a representação é u manifestação da vontade, resulta que é indiferente e constitui puro plcunas plcunasmo mo se, se, em vez de dizer dizer simples simplesme mente nte “» vontade vontade", ", dissermos "a vontade de viver". Sendo a vontade a coisa coi sa cm si. a substância, substância, a essência do mundo; c a vida, o mundo >isivel o fenômeno, fenômeno, mio mio sendo
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A Construção do cu na Modernidade mais que o espelho da vontade, segue-se daí que a vida acompanhará a vontade com a mesma inseparabilidadc com que a sombra acompanha o corpo: onde houver vontade, haverá também vida, mundo. A vida está, portanto, assegurada ao quercr-viver, e por quanto isto subsista cm nós, nio devemos preocupai-nos pela nossa existência nem mesmo diante da morte. Rem vemos o indivíduo nascer c morrer, mas o indivíduo é apenas um fenômeno; nào existe senào pelo conhecimento submetido ao principio de razão, que é o princípio de individlMÇâo; nesta ordem de idéias, ccrtamentc o indiv iduo recebe a vida como um dom; oriundo do nada e despojado do seu dom pela morte, ao nada retoma Vias para quem. como nós, contempla a vida do ponto de vista filosófico, isto é, das Idéias, nem a vontade ou a coisa em si de todos os fenômenos, nem o sujeito dos conhecimentos, espectador dos fenômenos, fenômenos, são de qualquer forma tocados pelo nascimento uu pela morte. morte. Nascer e morrer são coisas que pertencem ao fenômeno da vontade, c aparecem nas criaturas individuais, manifestando fugitivamente, e no tempo, aquilo que em si não conhece tempo c deve exatamente manifestar-se manifestar -se sob esta forma forma com o fim de poder objetivar a sua verdadeira natureza. (...) (...) mas a vontade de viver dc que o indivíduo não constitui constitui por assim di/er. di/er. mais mais que um exemplar ou uma parcela singular de manifestação, nào é perturbada perturbada com a morte do ser indivi individua dual, l, tanto quanto quanto nào o c o conjunto conjunto da natur naturez eza. a. Pois que não c pelo indivíduo, mas unicamente pela espécie que a natureza se interessa e é dela unicamente que estuda seriamente a conservação, circundando-a dc grande luxo de preocupaç preocupações ões e por meio meio da supcr-ab supcr-abund undânc ância ia ili ilimit mitada ada dos dos germes e do poder imenso do instinto de reprodução. (...) A natureza está sempre pronta a abandonar o indivíduo que nào somente está exposto a perecer dc mil modos e pelas causas mais insignificantes, como também c, desde o princ pri ncip ipio, io, desti de stina nado do a uma perda perd a certa, cer ta, para a qual qua l c arremessado por ela mesma, apenas haja satisfeito a missão que tem de conservar a espécie. Com isto a natureza exprime ingenuamente esta grande verdade, que sào as Idéias e nào os indivíduos que tém uma verdadeira verdadeira realidade, isto é, sào a objetivi obje tividade dade perfeita per feita da vontade. vontade.1 1" (p 30-4) ♦
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Pedro L
PINTURA -
u l s
Ribeiro de S a n t i
Turner e Friedrich
Vale a pen Vale penaa fazermos também tamb ém unia rápida rápid a referência referê ncia á pintura pintura romântica rom ântica tio tio século XIX. Nela. manifesta-se m anifesta-se também tamb ém esta colocação coloc ação cm persp pe rspectiv ectivada ada importância do homem, Um dos principais pinto pintores res românticos é o inglês Turner, cuja obra representa freqüentemente a grandiosidade das forças da natureza diante da impotência humana. Um de seus temas mais comuns é o de tempestades, sobretudo no mar. Olhando a pintura de longe, parece que nada está sendo representado c qoc estamos diante de um borrão azul, marrom ou cinza. Ao nos aproximarmos, no entanto, passamos a distinguir uma tempestade no mar com sua agitação e neblina. Na tempestade, pode po dem m os por ve veze zess divi di visa sarr um ba barco rco,, tota to talm lmen ente te à mer m ercê cê da dass forças que o dominam. Não é preciso fantasiar muito para estabelecermos uma relação entre esta representação e a da fragilidade da r»zão humana diante da fúria da natureza. No pin pi n tor to r alem al emão ão Fried Fr iedric rich, h, p od odem emoo s iden id entif tific icar ar o u tro tr o tipo tip o de imagem interessante. Fm sua pintura, em geral, temos também paisa pa isage gens ns,, rnas estas est as são sã o tranq tra nqüi üila las. s. O q u e ch cham amaa a atenç ate nção ão é ifie ifi e a pres pr esen ença ça está sempr sem pree d eslo es loca cada da do cent ce ntro ro d a pint p intura ura.. A visão visã o perdese na imensidão da paisagem e o homem agora c que ocupa ama posiç po sição ão m argi ar gina nal,l, qu quas asee qu quee dc fundo. Alguns Alguns outros aspeetos significati significativos vos do romantismo roman tismo poiem p oiem ser acompanhados por seus músicos.
MÚSI MÚSICA CA -
H a g n s r e C h o p i n
Da música romântica do inicio do século XIX, gostaria de destacar destac ar duas linhas dc expressão. De um lado, lado, persistem os elementos elementos do amor romântico c, de outro, surge a expressão do nacionalismo. Sabemos que a primeira metade do século foi marcada pela luta de diversas nações por sua unificação ou independência Com Ricltard Ricltard Wagner, Wagner, podemos podem os acom aco m pan panhar har como a música música pôde pô de ser se r utili ut iliza zada da co com m o forma for ma d e ação aç ão po polít lític ica, a, Em sua busca de mobiliza mo bilizarr o povo alemão, alem ão, ele não lançou mão do discurso políl polílic ic.» .» ou filosófico, mas sim da música ou, para ser mais preciso, de um espetáculo denominado denom inado por p or ele mesmo m esmo como com o uma ‘obra de arte total’: total’: a ópera. Nela, unem-se recursos literários, musicais, dramátios e
A Construção do eu na Modernidade mitológicos mitológicos para produzir p roduzir um efeito de envolvimento e sedução seduçã o po porr todos os sentidos pela mensagem veiculada. As óperas de Wagner recorrem quase senipre a temas mitológicos germânicos» buscando no fundo da alma dc cada homem o apelo do originário. Sua música remete-nos á pintura romântica. Temos a impressão de estarmos estarm os diante de algo informe, envolvente, com poucas figuras melódicas definidas onde nos possamos possam os ancorar. ancorar. Não é uma música a ser compreendida ou captada por nossa atenção, mas ela prete pr etend ndee just ju stam amen ente te distr di straí aí-la -la e pe pega garr-no noss de desp spre reve veni nido dos. s. Q ua uand ndoo ouvimos, por exemplo, a abertura da ópera Tristãu e /solda30, pode po dem m os ter a impr im press essão ão,, inic in icial ialmc mcnt ntc. c. dc qu quee não há m elodi elo diaa e que q ue o volume é baixo demais; pouco depois, vemo-nos envolvidos em uma intensidade sonora que nos arrasta irresistivelmente. A letra da ária chamada "Morte dc Isolda" sintetiza a experiência de Goctlie e Schopenhauer M orte ri rie Isnldn Isnldn - Kichard IYagncr "Como c doce c delicado o seu sorriso, como abre os olhos gentis -vêem, amigos? Não vêem? Como ele brilha, sempre mais luminoso, luminoso, como como se ergue alto, cercado cercado de estrelas estrelas ?Não veem? Como o seu coração orgulhosamctile se expande e. pleno pleno e sublime sublime,, lhe lhe pulsa no peito? peito? Como dos dos seus seus lábi lábios os,, em um encanto suave, sua ve, um doce alento escapo escapo delicadamente -Amigos! Olhem! Não sentem, não vêem? Seiei a única a escutar esta melodia, que maravilhosa e suave, suspirante de alegria, inteiramente reveladora, doce e conciliadora dele se escapa c cm mim penetra, cheia dc Ímpeto, ecoando sublime ao meu redor? redor? Ressoando Ressoando niais claras, claras, para envolver-me envol ver-me Unia, ia, são talvez as ondas de brisas suaves? Talvez as nuvens de encantadoras rragràneia rragràneias? s? Como se enfunam e fremem ao meu redor, deverei respirar, deverei escutar? Deverei saboivar, afogar-me afogar-me con contente? tente? h,vai h,vaiar ar docemente docemente nesta fragrãneia? Na vaga ondejante, na rima sonora, no cosmo inflante da respiração universal - mergulhar, submergir- privada dos sentidos -volúpia suprema!”
41 Ouça. por exemplo, “Polonaise o heróica" ou ou “Noturno em mi-bemoT. 116
Pedro Luís Ribeiro dc Santi Outro compositor compositor a expressar expressar o nacionalis nacionalismo mo e o amor e s sua música foi o poloncs Chopin, com suas polonaises c noturnos. Nele, en enco cont ntra ramo moss ainda ain da o parad pa radigm igmaa do roma ro manti ntism smoo co com m o delicadeza, delicadeza , por po r sua su a p róp ró p n a fragi fra gilid lidad adee pessoa pes soall '1. '1. + Co mo última referência ao romantismo, Como ro mantismo, gostaria dc citar un de seus desenvolvimentos, que terá repercussões mais imediatas e próx pr óxim imas as á Psico Ps icolog logia ia o da idéia de nive ni veis is dc prof pr ofun undd idad id adee da d a a ln a humana. Com Edgar Edg ar Alan Poe. autor american am ericanoo nascido nascido cm 1910. o gênio mcrgullia m crgullia na alucinação alucina ção e, de lá, lá, trás a fonte fon te de sua inspiração. Como c quase tipico do artista mmántico, ele morre antes das quarenta atr atros. os. Todo Todo o século XIX foi foi fortemente forteme nte marcado marc ado pelo cort co rtoo de lerrnr e pela invasão do lado escuro da alma humana -como em Dr. Jeckill c Mr. 1lide. Frankcnstein ou Drácula, por exemplo. Uma famosa famosa frase frase do pintor G oy oyad adefin efin e isto isto muito liem liem:: “O “O so n o da razão razão produz pro duz m on onstr stros os". ". Poe, Po e, no ent e ntan anto to,, par p arec ecee Ler sido sid o um do doss prim pr imeir eiros os e mais influentes. Tomemos trechos dc seu poema mais conhecido: O corro.
TEXTO ANEXO - E d g a r
A la n P o e
O CORVO Numa Numa meia-n meia-noite oite ag agres reste, te, quando eu lia, lia, lento lento c tnste. tnste. Vagos, curiosos tomos dc cicncias ancestrais, E já quase adormecia, ouvi o que parecia O som dc alguém que batia levemente a meus umbrais. “Uma visita” cu me disse, "está batendo a meus umbrais É só isro, c nada mais”. Ah,, que bem disso me lembro! Ah lembro! hra hra no frio dezembro, E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais. Como cu queria a madrugada, todu a noite aos livros dada, Para esquec esq uecer er lcm vftol) a amada, hoje enti entiee hostes celestiaiscelestiaisEssa cujo nome sabem as hostes celestiais. -S iegf gfri ried ed tciy tciyl! l! -Tr -Trlsta lstan n und * Ouça, de Richard Wagner, "Tannhaitser -Sie Isolde OcutsclK'Grammophon. 1988."
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A Construção do eu na Modernidade
Mas Mas sem nome aqui jamais! jamais ! (...) (...) E, mais forte nuir. instante, já nem tardo ou hesitante, '‘Senhor", eu disse, "ou senhora, decerto tne desculpais; Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo, Tao leve mente batendo, batendo por meus umbrais; Que mal ouvi... “E abri largos, franqueando-os, meus umbrais, Noite, Noite, im imite e nad nadaa mais. ais. A treva enorme fitando, fiquei perdido receando. Dúbio c tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais. iguais. Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita, E a única única palavra dita foi um nome nome cheio cheio dc aisEu o disse, o nome dela, c o « o disse os meus meus ais ais.. Isto só e nada mais. (...) Abri enlao a vidraça, c cis que. com muita negaça. Entrou grave c nobre um corvo dos bons tempos ancestrais. Não fez nen nenhum hum cumprim cumprimento ento,, não não pan anoou ne nem m um mome momento nto Mas com ar sereno e lento pousou sobre os rncus umbrais. Num alvo busto busto de de Atcna Atcna que que há por sobr sobree meus meus umbra umbrais. is. Foi, pousou, c nada mais E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura Com o solene decoro dc seus ares rituais. “Tens o aspecto tosquiado", disse eu. “mas de nobre e ousado, O velho corvo emigrado lá das trevas infernais! Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais.” Disse o corvo, corvo, “Nunc “Nuncaa mais1 mais1’. Pasmei Pasmei dc ouvir este rato ra to pássaro falar falar tão claro, claro, Inda que pouco sentido tivessem palavras tais. Mas deve scr concedido que ninguém terá havido Que uma ave tenha tido pousada nos seus umbrais. Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais. Com o nome “Nunca mais”. (...) Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo À ave que na tumba alma cravava os olhos falais, Isto c mais ia cismando, a cabeça reclinando No No ve velud ludoo onde a luz luz punha punha va vaga gass sombra sombrass de desig sigua uais. is. Naqu Naquel elee veludo veludo onde onde entr en tree as som sombras bras de desig sigua uais. is. Reclinar-se-á nunca mais! mais! (...) ■Profeta*’, disse cu, “profeta -ou demônio ou ave preta! Fosse diabo ou tempestade quem te trouxe a meus umbrais, A este luto e este degredo, a esta noite e este segredo.
Pedro Luís Ribeiro de Santi esta casa dc ânsia e medo, dtze a esta alma a quem atrais Sc há um um bálsamo longínquo para esta alma a quem quem atrais' atra is'”” Disse o corvo. "Nunca mais". (...) "Que esse grito nos aparte ave ou diabo”, cu disse. “Parte! Toma á noite e á tempestade! Toma ás trevas infernais! Não Não deixes deixes pena pena que ateste ateste a mentira que diss disses este te!! Minha volidào me reste! Tira-tc de meus umbrais Tira o vulto de meu peito c a sombra de meus umbrais!” Disse o corvo, “Nunca mais". F. o corvo, corvo, na noite noite ínimdu, ínimdu, está ainda, ainda, está ainda No No alvo alvo busto dc dc Atena Atena que há sobre os os meus meus um umbrais rais.. Seu olhar lem a medonha dor dc um demônio que sonha. E a luz lança-lhe a trisionha sombra no chão maise mais: L a minh\i min h\ilma lma dessa sombra que no chão há mau ma u e mais. mais. Libertai-se-á... nunca mais! [Tradução de Fernando Pessoa] * O poema de Poc é marcado por uma profunda melancolia. A perda parece remeter a um tempo mítico de plenitude perdida. O corvo c a presença persistente da lembrança que paraasa e assusta. Ele talvez seja a voz da consciência que martiriza, que lembra e afirma a perda, mas não deixa a lembrança ir embora Questões para discussão 1. Em que sentido Schopenhauer c anti-humanista? 2. Relacione a pintura de Turner e a música dc Wagner. 2. Como os contos de icrror do século XIX podem ser relacionados com o nascimento da Psicologia?
A Construção do eu na Modernidade
16 ALGUNS DESDOBRAMENTOS QUE LEVARAM À PSICOLOGIA
P
\e.u \e .ua a parte, parte, apre apresent sentara aram m (dgu (dgutt ttu uts idéias idéias que que levaram mais dlretamente à Psicologia, leremos leremos como, como, na maior part partee das casas, casas, há uma camhimiçdo das referências romântica românticas, s, disciplinarex e liberais
X odem os idcnttltc idcnttltcar, ar, desde o século XV III, alguns alguns movimentos da história história da medicina que contêm elementos românticos que desembocarão desemb ocarão na n a Psicologia Psicologia profunda. L impo importante rtante dizer qoc o interesse destes movimentos c curar e lançar a luz da razão sobre a doença, assim, eles não podem ser considerados exclusivamente tributários do romantismo, mas m as também do movimento cientifico. cientifico. Anton Mesmer talvez seja o pai desta tendência, que se irá desenvolver durante o século XIX XIX com a investigação investigação sobre a hipnose e a ocorrência (espantosamente freqüente) de casos dc dupla ou múltipla personalidade O nome dc Mesmer tornou-se conhecido em meados do século XVII1. XVII1. ao participar participa r de um processo para julgítr se um exorcista ex orcista chamado Gassner seria urn charlatão. Mesmer atesta a boa vontade e os efeitos curativos de Gassner, mas explica que seus sucessos nào se deviam a forças sobrenaturais, mas ao uso inconsciente de uin uin magnetismo animal, que circularia do exorcista exo rcista ao ao exorcizado. Sua Sua tese tese de conclusão do curso dc d c medicina havia sido sobre a influência dos astros sobre nós. Não se trataria de uma influência
Pedro Luis Ribeiro de Santi mística, mas ele magnetismo. Fm sua prática, ele observara que a aproximação de irnâs sobre órgãos doentes produzia uma melhora no quadro. Gradativamente, percebe que a simples presença do médico já prudu/ia tal efeito, mesmo sem imu. A partir de então, passou pas sou a postu po stular lar q ue todo to do coTpo possuí pos suíaa tal ener en ergi giaa e que a doe d oenç nçaa deveria ser uma perturbação ou rebaixamento dela. Assim, a cura deveria consistir na transmissão de energia saudável do médico ao pacie pa ciente nte.. Isto dev d evia ia ser feito atra at ravé véss de d e m anip an ipul ulaç açõe õess ou do cont co ntat ato o intermediado por objetos “bons “bon s condu co ndutores" tores" de energ energia ia.. A inspiração de Mesmer é iluminista; ele cré tratar de algo como a eletricidade, mas sua prática acaba por descambar para um aspecto de espetáculo. Kle cria tudo um clima em torno de seus atendimentos, solicitando que seus vários paciente» “nervosos" esperassem longamcntc por ele muna sala de espera. Como era de se esperar, depois dep ois de d e algum tem po um deles del es tinha um ataque: era isto que d e esperava. Ele Ele levava este paciente a uma sala sala fechada fechada e escura, com uni fundo musical envolvente, c manipulava-o, conduzindo condu zindo-o -o a urna crise. O paciente melhorava depo s da descarga c certamente saía com a impressão de ter assistido a um milagie ou a uma mágica. Tornou-se célebre também o recurso cuc criou para atender um maior número de pacientes quando a demanda cresceu demais cm Paris: ele mandou construir uma tina (haquet). cm tomo da qual dispunha dispunh a até 130 130 pacientes, pacien tes, que segurava seg uravam m uma haste de metal metal cuja outra ponta estava estav a mergulh me rgulhada ada nela. nela. Então Então aproximavaaproxim avase e mergulhava suas mâus na água. contando que a energia seria conduzida até todos. Compreensivelmcn Comp reensivelmcnte, te, passou-sc a consulerá-lo consulerá-lo um charlatão e ele acabou sofrendo um processo semelhante àquele através do qual tomara-se conhecido, rend re nd o sido sido desacreditad desacr editado, o, retiro retirou-se u-se para uma cidade pequena peq uena e aderiu aderiu a uma prática médica comum até tnoner. tnone r. Um de seus seguidores, Puiseguir, desenvolveu seu mctotki até ã hipmise. Dest Destu síntese en tre rom antismo c ciên c a. n ascerá o espiritismo, que parte da observação de fenômenos paranormais, como a telccinese {a capacidade de mover objetos á distância), recorrendo a explicações místicas. Sabemos também que, já no fim do século, este este movimento movimento desembocará cm Charcot, u n dos d os mestres
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A Construção do eu na Modernidade de Freud. Freud. que utilizará a hipnose para manipular manipu lar sintomas histéricos histéricos *
Podemos Podem os ainda indicar, indicar, no caminho em direção á Psicologia, uma corrente que pode ser identificada como uina articulação entre o liberalismo e a disciplina -na linguagem que propusemos, entre o eu epistcmico c o eu moral moral Recorrendo uma vez mais á Histó Hi stória ria tia vida privada , podemos observar que, no final do século XIX, a medicina medicina ocupa ocu pa o lugar da religiã religião o com o referência moral. A ciência ciência vai-se vai-se pre p re star st ar a justificar justifica r os tnais tnais primários preconceitos preconceitos morais. morais. Como já havíamos visto, desde o século XVIII, não é mais possi po ssivc vcll fund fu ndam amen entar tar a tnoral tno ral na fé. Desd De sdee lá. a moral mo ral passo pas sou u a busc bu scar ar fund fu ndam amen ento to tu» sim s imple pless conv co nvív ívio io entre en tre os hom ho m ens, en s, com co m o é po p o s s i v c l c o n s t a t a r na Critica da razão prática , dc Kant, na tleclaração universal dos direitos do homem e, enfim, na difusão tia democracia dem ocracia ao longo do século século XIX. XIX. Mas a busca busca de um fundamento fundamen to para pa ra os critério crit érioss morais morai s encon enc ontra tra u m apoi ap oio o supo su posta stame mente nte segur seg uro o no estudo da biologia, derivando derivan do dai uma concepção de natureza humana. Em termos simples, a proibição ilc determinado ato, com a justif jus tifica icativ tivaa de que qu e ele sen se n a um peca pe cado do,, parece pare ce não surtir sur tir mais ma is efeitos efe itos gerais e eficientes. Ao invés disso, se tal ato for considerado pre p reju judi dici cial al a saúd sa údee pela ciência, provavelmente irá sc generalizar a idéia de que tal ato é errado O que está está cm jog o aqui é este deslocamento deslocam ento aparentemente aparentem ente válido entre o saudável e o bom, contra o não saudável e o mau. Se esta idéia idéia parece óbvia, hasta conferirmos a que ela serviu serviu para par a pefce pe fcebe bemu muw w o nível nív el de mani ma nipu pulaç lação ão ideológ ideo lógica ica a que qu e se pode pod e chegar com cia. cia. Tomemos como com o exemplo a questão da sexualidade. sexualidade. Curiosamcnic. Curiosam cnic. as prescrições médicas a esse respeito respeito no século XIX XIX coincidem totalmente com as da Igreja Igreja.. Assim, Assim, sobre a identificação inquestionável sobre □ função biológica dos órgãos genitais, afirmasc uma idéia de normalidade e anormalidade. A vida sexual serve à reprodução c qualquer uso dela em ou tio sentido deve ser tomado tom ado como uma dcgcncraçào dcgcnc raçào (elimologicamente, (elimologicamen te, "um desvio com relação á orig ori g em ), uma perversão perversão (um desvio desvio com relação relação ao bom caminho). caminho). Todas Todas as denominações denom inações que possuímos hoje neste campo datam desta
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Pedro Luis Ribeiro de Santi época c trazem sua marca: heterossexualidade, homossexualidade, sadismo, masoquismo, etc. Surge, assim, toda una sombra moral sobre a definição sexual de cada pessoa; que estabelece o medo dc ser errado errad o e anti-natural, anti-na tural, c, portanto, excluído ex cluído socialmente. socialmente. Os ramos desse ponto de vista ainda estào muito presentes. Em 198 1981, ein um congresso médico sobre a sexualidtdc. foi colocado a um palcsirantc a questão do sentido do prazer tu relação sexual. Depois de alguns momentos, momen tos, em um silencio embaraçoso, embaraçoso, ele arriscou a seguinte hipótese; é que o ato sexual sexual seria uma ccisa tão nojenta noje nta c aversiva. aversiva . que o prazer serviria como unia espéc ie de de compensação.,. com pensação.,. Um episódio episó dio clássico, neste sentido, é relata relatado do com detalhes H istó tória ria da vida p r iv a d a : as prescrições contra a masturbação. em His A masturbação m asturbação seria considerada, n o limite, uma perversão; perversão; e a este mal uso da sexualidade, sexualidade, são atribuídos pelos mcdicos mcd icosos os mais m ais diversos malefícios: a degeneraçào degen eraçào mental c moral, a impotência, o vicio. Com Co m ba b a s e n e s te d i a g n ó s t ic o c i e n tíf tí f i c o , c o n t a - s e d e p a i s / c i o s o s e desesperados por seus filhos recorrerem a métodos drásticos, como o uso de lençóis semelhantes a camisas de força, cautcrizações da gland gla ndee *ki do clitòris clitò ris e, no limite, a cxtirpaçSo destes des tes órgãos tentadores. tentad ores. Qutstôcspani discussão
1. Em que sentido Mesmcr c cientista? 2. Como Como a Medicina, Medicina, no século XIX, XIX, passa a ocupar 0 Imrurdu Igreja como referência moral? j . A Medicina continua ocupando esse lugar hoje? Justifique.
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A Construção do cu na Mi>demidude
17 CONSUMAÇÃO DA CRISE DA SUBJETIVIDADE Em conclus conclusão, ão, será exposto aquele aquele que parece ser o ponto mais alto da crise dos valores humanistas e de toda a Modernidade, o pensamento de Sietzsche, Sietzsche,
P
ara concluirmo s o percurso deste livr livro, o, retomamo retom amoss a idéia inicial: para a constituição da Psicologia, no final do século XIX, foi necessária a constituição e a crise da noção de subjetividade. Esta noção de subjetividad subjet ividadee está está estreitamente estreitam ente relacionada à história do humanismo modem mo demo, o, que acreditou que o homem cra o centro do do universo e livre para determinar seu destino. Acompanhamos alguns dos movimentas de consumação destas duas condiçòes, No século sécu lo XIX, o huma hu manis nismo mo foi ataca ata cado do por po r divers div ersas as frentes. Apenas para citar algumas, com as quais nào trabalhamos, podemos m enciona enc ionarr Karl Marx e Charles Danvin Marx Marx nega a liberdade humana com a concepção de que o homem é determinado por leis econôm icas que desconhece. Darwin nega a centr central al idade idade do homem hom em no mundo, inserindo-o em uma série natural da cadeia evolutiva Talvez o ponto culminante ila destituição do cu do lugar a que havia sido elevado no século XVII tenhu-sc dado através de e ncon ontra tramo moss talvez Nie N iel/ l/sc sch h e. filósofo filó sofo nascido em ! H44. Em sua obra enc um dos discursos mais corrosivos sobre qualquer certeza que se pret pr eten end d a Ter sobre sobr e si. si. K o alvo al vo-c -cha havc vc dc Niet Ni etzsc zsche he c pre p reci cisa sam m ente en te o eu. eu. Se o cu cra tom tomado ado como com o a base sobre u qual todo o conhecim conh ecimento ento do mundo mu ndo podia ser ser atingido, atacá-lo significa demolir dem olir todo o edifício JL
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Pedro Luís Ribeiro de Santi da Modernidade, Estariamos diante de uma incerteza scmclhaile àquela dc Montaignct no século XVI. Desde Nietzsche, parece ter-se difundido cada vez mais a idéia de que o ‘eu ‘e u ‘ não c uma substância, mas um órg órgão ão responsável poo r n o s s a a d a p t a ç ã o ao in p inuu n d o . E le n ã o p o s s u i r i a q u a lq u e r transcendência transcend ência e teria teria uma um a certa tendência a superestimar seu va valor lor e independência. F.m Para além além do bem e do mal, Niçt/schc Niçt/schc apoita par p araa o e q u ív ívoo c o dc D esca es cart rtes es qu que, e, b a s ead ea d o cm um p re reco conc ncei eito to gramatical, derivou a existência dc um sujeito paia toda a ação. Nus Med M edit ita a ções çõ es filo fi losó só fic fi c a s. Descartes rcali/ou seu conhecido “pulo do gato" para escapar do ceticismo. Seu procedimento consistia na dúvida sistemática á procura de alguma verdade indubilável; ao perc pe rcee be berr que q ue.. sobr so bree tod todoo c qu q u alq al q u er o b |eto |e to sobr so bree o qua quall v ol olta tava va seu pen p ensa sam m e nt ntoo , pa paira irava va algu al gum m a s om br braa de dú dúvi vidd a, v o ltou lt ou-s -scc pare o próp pr óprio rio pr proc oced ed intento inte nto e const con stat atou ou que qu e nào n ào pod p odia ia hav h avee r dúvid dú vidaa quanto qu anto à existência da própria próp ria ação dc duvidar. duvidar. O pulo do gato consistiria na conclusão derivada da gramática de que para toila toila ação deve h a 'cr 'c r um sujeito. A partir desta exigência, estaria fundada a constatação da existência existênc ia de uma primeira prim eira certeza: a certeza cert eza du du existência dc um 'eu', ao menos enquanto scr pensante. Niet/sclic afirma que cila conclusão não c dc forma alguma necessária. Para ele, a ação é tudo Seria necessário resgatar este caráter con constitutivo stitutivo do "Eu penso, logo log o existo", negando sua pretensa evidência. Restituir o ‘eu’ ao lugar de pronome significa tomar o ‘eu’ em relação relaçã o ao *tu *t u \ ao ‘nó nós’ s’,, etc, etc, Tnita-sc dc revel re velar ar que o ‘.si-mesrro’ ‘.si-mesrro’ c um um dado reflexivo, advindo da relação com um ‘nào nào-eu’, -eu’, um ouro ou ro.. Esta recolocação do ‘cu* parece estar i n s e r i d a em uma descrença quase que generalizada no projeto da Modernidade. Em A g e n e a l o g i a d a m o r a l. encontramos alguns
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A Construção do eu na Modernidade no mundo, eles buscaram transformar sua mediocridade em mérito. A moral procura criar um homem estável, confiável, capaz dc fazer prom pr omess essas as,, impo im pond ndo o um csta cs tanc ncam am cnio cn io tu> lluxo llu xo das da s forças. for ças. Estes Estes seriam homens do ressentimento, ressentimento , imoxica imo xicado doscom scom seus seus pró p róp p n o s impu im pulso lsoss que q ue nào n ào pod p odem em expre ex pressa ssar. r. Neste Ne ste sent se ntid ido, o, m esm es m o a inteligência c a interioridade seriam apenas sinais de fraqueza: " I odos os instintos que não sc descarregam para fora valtiur,ise [mm dentro -isto -isto é o que chamo dc interiorização do homem, É assim que no homem cresce o que depois se denomina sua sua ‘aJm ‘aJma\ a\ (p. (p. 90)" 90 )"”” Assim, nasce a má*con.scicncia, que inibe a ação e se desdo des dobra bra etn mais má-co má -consciê nsciência ncia.. Somo S omos, s, por po r isto, isto, “hom “h omen enss ck ck> desconhecimento”, por nào nos termos nunca procurado e por nos alienarmos em uma estabilidade estabilidade felsilicadora. Em Para além do bem c do mal , Niet/sche prossegue com a exposição de nossa hipocrisia e o hábito de mentir, que nos caracterizam como artistas. Mas. além disso, a critica à moral c tio ‘eu ' mais aparente c aprofundada através da crítica crítica à concepção conce pção de um ‘eu ’ transcendente (como já desenvolvemos desenvolve mos nas partes anteriores) e. afinal, com a critica ã coisa cm si. Niet/sche de.scrê de toda c qualquer existência cm si e toda a experiência humana é colocada em tennos tlc interpretação dentro dc uma tlada perspectiva. Nào resta nada sólido. A isto isto a tradição tradição filosófica denom deno m ina dc niilismo. Segundo Hcidegger. filósofo alemão do século XX. o termo niilismo remete ctimologicamente ao "nada”: em termos filosóficos, remeteria remeteria à descrença descren ça definitiva definitiva cm qualquer scr supra-scnsívcl, supra-scnsívcl, “tudo seria nada”. Enquanto o pensamento metafísico liga-sc à crença de que há um determinado determina do alvo a scr atingido atingid o pela existência, o niilismo depara-se com que nào há tal alvo. Nictzs Nic tzsch chee refererefe re-se se frequen freq uentem tement entee ao term o niilism nii lismo, o, muita m uitass vezes rcfcrindo-sc a um certo pessimismo pessimism o e uma atitude negativa perante av ida id a como com o em Schopenhauer Schopenhauer.. Mas o niilismo dc Scbopetihaucr Scbopetihaucr ainda c fraco; sua negatividade mostra que seus valores ainda estão ligados ao universo perdido Nictzsche propóe, em contraparlida. um niilismo niilismo
Morai. n Nictzsche, Nictzsche, etn Genealogia do Morai.
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Pedro Luis Ribeiro de Santi radical, no qual a revelação da ausência de sentido último das coisas levasse a um lançar-se â vida. Citemos Hcidcggcr: “Nietzsche serve-se do termo ■mílismo’ para designar o movimento histórico cujo remo ck c k foi o primeiro a reconhece reconhecer, r, pelos pelos séculos séculos precede precedentes, ntes, próprio a determin determinar ar os sécu século loss posteri posteriore oress c cuja interpretaçã interpretaçãoo ele definiu brevemente pa parr estas palavras: palavras: ‘Deus está está morto’. mort o’. O que quer d izer iz er o D c j s enstão’ perdeu seu poder sobre o ente c sobre a destinaçio do homem. O ‘Deus cristão’ é designação própria para designar o 'supra-sensível' cm geral c suas diferentes interpretações, os ‘ideais’ e as ‘normas’, os ‘princípios’ c is ‘regras’, as ‘finalidades’ c os 'valores', erigidos sob o ente paru paru dar á totalida totalidade de do en ente te um fim fim, uma ordem ordem e como como se
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A Construção do cu tu Modernidade
Neste Ne ste sentido» segu se gund ndoo H eide ei degg ggcr cr,, a crit c ritica ica ao aoss va valo lore ress c à cosmologia de Nictzsche manteriam-no vinculado ainda á Modernidade. Eis como Nictzsche expressa a radicalidade de sua critica: “A falsidade de um juízo não chega a constituir, para nós, uma objeção contra ele; c talvez nesse ponto que a nossa nova linguagem linguag em soa mais mais estranha. Á questão c cm que medi da ele promove ou conserva a vida, conserva nu ale mesmo cultiva cultiv a a espécie; espécie; c a nossa no ssa inclinação básica básica c afirmar afirmar que os juízos mais falso falsoss (ent (entre re os os qua quais is os j uízo uízoss sintétic sintéticos os a príori príori)) nos são os mais indispensáveis, que. setn permitir a vigência das ficções lógicas, sem medir a realidade com o mundo mundo puramente inventado do absoluto, do igual a si mesmo, o homem não poderia v iver -qu -q u e renunciar aos juízos falso falsoss eqüivale a renunciar ã vida, vida, negar negar a vida. Reconhecer a inverdade i nverdade como condição de vida: isto significa, sem dúvida, enfrentar de maneira perigosa os habituais sentimentos de valor; e uma filosofia que se atreve a fazê-lo coloca-se, apenas por isso, além do do bem e do mal. (p. ] 1-12)"” Viveríamos, assim em um registro de ficções necessárias, e a ética da existência se deslocaria da busca pela verdade para a do bem vive vi verr c con c onvi vive ver. r. Talvez Tal vez aqu aquii estej es tejam amos os toca to cand ndoo uma um a ex e x p eriê er iênn cia não moderna Para voltarmos à nossa discussão original, tomemos um trecho dc uma obra de Nietzschc onde se explicita o despojamento das pretensões do cu. TEXTO ANEXO - Fricdnch Hllhelm Nietzuche SOBRE VERDADE E MENTIRA NO SEN IIDO LXTRA-MORAL “Em algum remoto nticãu do universo cintilante que se derrama cm um sem-número de sisicinas solares, havia urna vez um astro, cm que animais inteligentes inventaram o conhecimento. Foi o minuto mais soberbo c mais mentiroso Jí Pura além da ÍHrm e do mal,
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Pedro Luis Ribeiro de Santi Santi da “históri “históriaa uni univv ersal ersal’’'; mas também também foi somente somente um minuto. Passados poucos lôlegos da natureza, congelou-se o astro e os animais inteligentes tiveram de morrer. Assim poderia alguém inventar uma fábula c nem pur isso tena ilustrado suficientemente quão lamentável, quào fantasmagórico e iúgaz. quáo quá o sem finalida finalidade de e gratuito gratuito fica o intelecto humano humano dentro da natureza. I louve eternidades, cm que não eslava; quando de novo cie tiver passado, nada terá acontecido. Pois não há para aquele intelecto nenhuma missão mais vasta que que conduzisse conduzisse alem da v ida humana. humana. Ao contrário, ele e humano, c somente seu possuidor c genitor o toma tão pateticamente como se os gonzos do mundo girassem nele. Mas se pudéss pudéssem emos os entender-nos entender-nos com a mosca, mosca, perceberí perceberíamo amoss então que também cia bóia no ar com esse pálhos e sente em si o centro voante deste mundo mundo Não há nada làn dcspre/ivel c mesquinho na natureza que, com um pequeno sopro daquela força do conhecimento, não transbordasse logo como um odre; e corno todo transportador de carga quer ter seu admirador, mesmo o mais orgulhoso dos homens, o filósofo, pens pe nsaa ver po porr tod to d os os lad la d os os o lhos lh os do u n iver iv erso so tclescopicamentc em mira sobre seu agir c pensar. É notável que o intelecto seja capaz disso, justam justameut eutee ele.q ele .que ue foi concedido concedido apenas apenas como nvcio aux auxilia iliaii aos mais infelizes, delicados e perecíveis dos seres, para firmáfirmálos um minuto minuto na existên existência cia (...)” t p. 3 1)* *
MÚSICA
Hizf Hiz f t f Suiii‘
Km uma última referência à música, gostaria de destacar dois caminhos, tomados toma dos na segunda metade do século XIX. XIX. De um lado, parece que, a partir dc Wagner, houve uma espécie de esgotamento das possibilidades do universo mutical desenhado desenh ado por p or liach. O esquem esqu emaa das tonalidades e compassos comp assos pareci pareciaa não term ter m ais desenvo dese nvolvimen lvimentos tos possiveis. L'm L'm dos caminhos caminho s tomados pela pe la mús m úsic icaa desd de sdee en e n tão tã o foi a tenta te ntativ tivaa de be bebb er em fontes fon tes popula po pulares, res, ou nacionais. Neste sentido, vale a pena mencionar a sensualidade am oure rest st uh oiseau oise au rebei re beiié” ié”,, da ópera “Gi/rnem, de '**O *Ouuça "L ‘amou
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A Construção do cu na Modernidade espanhola espanhola na ópera Carmem , do francês francês Bizet” Bizet” . Aliás Aliás,, diga-se diga-se de p a s s a g e m , n e s s a ó p e r a e s t á p r e s e n t e u in d o s e l e m e n t o s para pa radi digm gm átic át icos os d a co c o n stit st itu u ição iç ão da P sica si caná nális lise: e: a hister his teria. ia. De outro lado, no final do século surge uma música extremam extremamente ente m elancólica e dissonante, dissonante, já quase quase atonal. que sugere o quão quebrado e sem referências encontrava-sc o eu. Citamos aqui, como exemplo, F.rik Satie. Parte de sua obra tem um tom humorístico marcado, com músicas para bordéis c experimentos “riemificos”, com a série chamada “embriões dissecados”, De oura parte pa rte,, ele poss po ssu u i p eças eç as d e um a m e lan la n coli co liaa p rofu ro fun n d a, m a s sem a tragicidadc tragicidad c romântica, rom ântica, trata-sc trata-s c dc um sentimen sen timento to dc dese d eseng ngate1 ate17 7. Questões para discussão 1. Por quê identificamos em Nietzscbe o ponto máximo da crise do “eu”? 2. Qual é o significad sign ificado o de niilismo? 3. Qual é a função do “eu” para Nietzsche?
” Um exemplo seria a “GymnopeJie n' J, de Satie” Satie”,,
Pedru Lu b Ribeiro de Sanb
CONCLUSÃO TA raçamos, em em linha linhass gerais, gerais, alguns _ mo dos de se se pensar o sujeito que foram condições para para o surgimento surgime nto da Psicologia, Psicologia, Como Co mo dissemo disse moss ru rui introdução, não n ão nes ocupamos dc uma história h istória das praticas médicas ou terapias prévias a ela. Nosso interesse foi o de ressaltar a implicação imp licação da Psicologia nr. Modern Mo dernidad idadee ocidental A Psicologia Ocidental tem com o fundamento a subjetividade. As Psicologias Psicologias procuraram procuraram respond res ponder er de diversas formas às dem andas anda s surgidas da erise da subjetividade sub jetividade moderna mo derna Realmente, nào é ã toa que suas linhas principais tenham tido inicio no fim do século século XIX. Em alguns caso ca sos,as s,as teorias alinham -se a uma ou algum as destas tendências, quer para afirmar a subjetividade, em alguma dc suas acepções, quer para, de fato, pò-la cm questão. Ao lermos alguma teoria psicológica poderíamos ter em mente, como um instrumento instrumen to dc reflexão, algumas perguntas relativas relativas à posição dessa teoria no contexto histórico. Qual a concepção dc homem ou mente c envolvida cm dada teoria? Ela acredita na liberdade? O eu c o objeto privilegiado de estudo? Ela se pretende cientifica nos lermos positivistas? Qual é sua perspectiva ética? A resposta a este tipo de pergunta pode-nos ajudar a nos situarmos diante deste d este campo cam po inevitavelmente Làu disperso, com c om o o da Psicologia. Psicologia. Alétn disso, poderemos passar a ver que uma determinada teoria pode po de ter te r n a scid sc ido o d ep o is d c o u tra tr a s e se a p rese re sen n tar ta r c o m o “ últim últ imaa pa p a lav la v ra”, ra ”, “ n o v o p a rad ra d igm ig m a” ctc. ct c.,, c aind ai ndaa assi as sim m ser se r trib tr ibu u tári tá riaa de concepções nem tão novas, ou ser altamente comprometidas com crenças que talvez ate mesmo desconheça.
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A Consiruçàu do eu na Modernidade
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