Contracapas: não nã o fo fora ram m po pouc ucos os os qu que e se de deix ixar aram am se sedu duzi zir r po por r monstos e criaturas fantásticas: Plínio, o Velho; Alexandre, o Grande; Aristteles; !anto A"ostinho; #sidoro de !e$ilha; %arco Plo; Gesner; &heodor de 'r(; 'r( ; )a* )a*ela elais; is; 'os 'osch; ch; +an +ante te Ali Ali"hi "hieri eri; ; or or"e "e -ui -uis s 'or"es; C.mara Cascudo/ &estem &es temuno unos s elo eloq0e q0ente ntes s de men mental talida idades des e $is $is1es 1es de mundo, os monstros acompanham a humanidade há s2culos 3 e pode4se dizer que che"am at2 mesmo a fazer parte dela/ 5squecidos por +eus, histria das criaturas fa*ulosas, 2 tam*2m uma histria da humanidade, so* um dos seus aspectos mais poderosos: a ima"ina6ão/ 5!785C#+9! P9) +58! 5ste li$ 5ste i$ro ro pod ode e se ser r li lido do co como mo um uma a hi hist str ria ia da das s repr re pres esen enta ta61 61es es al ale" e"r ric icas as do dos s me medo dos s e de dese seo os s da humanidade/ Pode ser entendido tam*2m como um relato sa*oroso da err.ncia das criaturas fantásticas por este mundo/ %as a leitura su"ere que se trata, acima de tu tudo do, , de um uma a ch cha$ a$e e or ori" i"in inal al e ef efic icie ient nte e pa para ra compreender 9! mecanismos de heran6a do ima"inário ao lon"o da histria/ %ar( +el Priore nasceu em <=>, no )io de aneiro, e 2 professora de histria do 'rasil na 8ni$ersidade de !ã !ão o Pa Paul ulo/ o/ ? au auto tora ra de di di$e $ers rsos os li li$r $ros os, , en entr tre e eles @istria das mulheres no 'rasil Conte Co ntexto xtoB5d B5dito itora ra da 85 85!P, !P, pr2 pr2mio mio a* a*uti uti << <
Cop(ri"ht I zooo *( %ar( +ei Priore Capa 5ttore 'ottini so*re detalhes de "ra$uras de &heodor de 'r( s2c/ HV#4HV##E Jndice remissi$o %aria Claudia Car$alho %attos Prepara6ão #sa*el or"e Cur( )e$isão Carlos Al*erto #nada Carmen !/ da Costa Ana %aria 'ar*osa +ados +ad os #nt #ntern ernaci aciona onais is de Cat Catalo alo"a6 "a6ão ão na Pu* Pu*lic lica6ã a6ão o cliFE C.mara 'rasileira do -i$ro, siF, 'rasilE +el +e l Pr Prio iore re, , %a %ar( r( Pa Para ra os me meus us tr trKs Ks mon onst stri rinh nhos os ador ad orad ados os: : Pe Pedr dro o Au Au"u "ust sto, o, Pa Paul ulo o Le Lern rnan ando do e #s #sa* a*el el 5squec 5sq uecido idos s por +eus : mon monstr stros os no mun mundo do europeu europeu e i*ero4americano uma histria dos monstros do Velho e do o$o %undo s2culos HV#4HV###E B %ar( +el Priore/ M !ão Paulo Companhia das -etras, zooo/ 'i*lio"rafia/ #!' D=4NO4<<>4D i/ -i -ite tera ratu tura ra fa fant ntás ásti tica ca M @i @ist str ria ia e cr crít ític ica a >/ %onstros / &ítu &í tulo lo/ / li li/ / &í &ítu tulo lo: : %o %ons nstr tros os no mu mund ndo o eu euro rope peu u e #*ero4americano: uma histria dos monstros do Velho e do o$o %undo s2culos HV# 3 HV###E QQ4QR= C#!+4R/ !eres fantásticos: Lolclore RQQQ &odos os direitos desta edi6ão reser$ados U 5+#&9)A !C@A)CW -&+A/ )ua 'andeira Paulista NQ> C/ R> Q=R>4QQ> M !ão Paulo M !P &elefone E RDO4QDQ
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LaxE RDO4QD e4mail: editoraXcompanhiadasletras/com/*r editoraXcompanhiadasletras/com/*r Jndice Jn #/ #ntrodu6ão ii/ ii / %o %ons nstr tros os: : o es espe pelh lho o da das s tr tre$ e$as as no 9c 9cid iden ente te medie$al N iii/ A am*í"ua $itria da razão e as armadilhas da natureza R< i$/ o reino, sem limites, do inslito O $/ %on onst stro ros s e ma mara ra$i $ilh lhas as no 'ra rasi sil l co colo loni nia al NN $i/ $i / As di dia* a*l lic icas as cr cria iatu tura ras s da no noit ite: e: $a $amp mpir iros os, , lo*isomens e outros a*antesmas Q> $ii/ Conclusão >R Pequeno anexo >N otas >< Jndice remissi$o A"radecimentos !ou !o u pr prof ofun unda dame ment nte e "r "rat ata a ao c cPq Pq; ; se sem m a *o *ols lsa a de auxílio U pesquisa inte"rada teria sido impossí$el o estu es tudo do *i *i*l *lio io"r "ráf áfic ico o que re res sul ulto tou u ne nest ste e li li$r $ro/ o/ A"rade6o, i"ualmente, Us *i*liotecárias da Lunda6ão Calouste Gul*enYian Paris pelo paciente e caloroso auxí au xíli lio o pr pres esta tado do na nas s co cons nsul ulta tas s qu que e al ali i re real aliz izei ei so*re os monstros na literatura de cordel setecentista/ %eus pedidos, muitas $ezes apressados, foram sempre atendidos com extrema "entileza/ &enho tam* ta m*2m 2m um uma a dí dí$i $ida da in inte tele lect ctua ual l co com m -u -uís ís da C. C.ma mara ra Cascudo, cuo centenário de nascimento se cele*rou em <
des"renhados e o pa$oroso cerco de tre$as, som*ras e temores/ )as"ando a escuridão espectral, um "rito: Z%onstro, dá4me a minha crian6a[\ ? o ui$o an"ustiado de um dos persona"ens de 'ram !tocYer, em +rácula, que se ou$e/ 9 clássico da literatura de terror interro"a ao historiador: de onde as sociedades extraem a mat2ria para seus sonhos] 9 simples prazer de sentir medo explicaria a presen6a de representa61es monstruosas na literatura e na arte ocidentais] As monstruosidades terão sido sempre as mesmas] 5 os homens comportaram4se ha*itualmente da mesma maneira em face de animais e homens compsitos, assom*ra61es da ima"ina6ão humana, que parecem ter sido esquecidos por +eus] 5squecidos por +eus mas normalmente presentes, pois a humanidade nunca deixou de amar os monstros/ 5 hoe mais do que nunca/ A cultura contempor.nea aca*ou por torná4los familiares, trazendo4os para nosso cotidiano e pri$acidade/ A manifesta6ão mais e$idente desse interesse 2 o desen$ol$imento de uma enorme curiosidade em rela6ão a pintores, mo$imentos artísticos ou 2pocas em que se criaram monstros/ @á cada $ez mais li$ros e exposi61es consa"radas aos Zfazedores de horrores\ como 'osch, 'rue"hel, @ans 'aldun", Peter @u(s, Arcim*oldo, 5nsor, L0ssli e outros/ +esco*rem4se antecessores do surrealismo, como Charles4Germain de !aint Au*in, pintor de *or*oletas com corpos semi4humanos/ A "rande imprensa, o cinema, a tele$isão, a pu*licidade, as histrias em quadrinhos, mecanismos ela*oradores de no$as formas de conhecimento, deram espa6o aos monstros, industrializando ima"ens e sonhos fantásticos/ eles, as estátuas se animam, homens e animais "i"antescos in$adem o cotidiano, os mortos re$i$em, os $ampiros se multiplicam, seres hí*ridos ou pr24histricos escapam de suas reser$as naturais, do fundo do mar, de sel$as som*rias/ %onstros resultam da radia6ão at^mica ou che"am de outros
planetas/ 9utros, em $ez de pro$ocar an"_stia, pro$ocam o riso, encontrando lu"ar tanto nos pesadelos de nossa sociedade como em suas *rincadeiras/ 9 riso não lhes 2 mais fatal, como o amanhecer 2 fatal U noite, aos $ampiros e aos fantasmas/F 5xaminado superficialmente, o fen^meno poderia ser descartado como mero escapismo/ o entanto, numa era que se caracteriza pela ciKncia e pela tecnolo"ia, 2 impressionante constatar o fascínio pelos sím*olos e moti$os monstruosos, que trazem de $olta a no6ão de um uni$erso encantado e fantástico/ %ais um dos fen^menos sintomáticos da profunda crise que se instalou no pensamento ocidental, o interesse por monstros re$ela quanto nossa $eneranda cren6a no racionalismo e no mecanicismo, *em como na $isão de pro"resso ine$itá$el, está fra"mentada/ Para a"ra$ar esse dilema, so*re$eio a escalada tecnol"ica, que parece reduzir ainda mais o si"nificado do indi$íduo/> @omens são su*stituídos por telas de computador e máquinas/ 5is por que monstros, como *em diz os2 Gil,R existem não para nos mostrar o que não somos, mas o que poderíamos ser, pois $i$emos tempos em que não sa*emos mais distin"uir com nitidez o contorno de nossa identidade em meio a diferentes pontos de referKncia, que antes de$ol$iam uma ima"em está$el de ns mesmos/ ? como se acima deste mundo, onde se afirma a re$anche da carne e da natureza, hou$esse outro menos familiar: o reino dos monstros/ #ma"inemos outra cena: $i$emos num am*iente aparentemente claro, slido, tranq0ilizador/ Vemo4 nos, então, diante de um ser estranho, assustador, inexplicá$el/ Conhecemos, assim, o sin"ular frisson pro$ocado pelo conflito entre o real e o possí$el/ ? preciso crer no inacreditá$el/ 9 monstro, persona"em fantástico, 2 o homem que a*andonou a humanidade para encontrar4 se com a fera/ ! participamos de sua existKncia pelo horror que ele nos inspira/ A diferen6a entre nosso olhar so*re os monstros e aquele de nossos antepassados 2 que hoe sa*emos que
a narrati$a so*re o monstruoso não passa M qui6á, para muitos M de fantasia: trata4se de uma simples histria/ 9 leitor de outrora conhecia um estado de alma am*í"uo diante do monstro que a mentalidade moderna fez aparentemente desaparecer/ Por um lado, ele se per"unta$a se a histria era mesmo $erdadeira/ 5le aplica$a de modo rudimentar as re"ras da crítica histrica: uma narrati$a $erdadeira era relatada por uma testemunha di"na de f2 e esta$a de acordo com as tradi61es ancestrais e as cren6as reli"iosas] !e a resposta fosse positi$a, o monstro, de fato, existia/ +i$ididos entre o deseo de adesão U $erdade e a sedu6ão do ima"inário, nossos antepassados muito pro$a$elmente acredita$am em monstros, para "ozar do medo que a narrati$a so*re essas > R criaturas fantásticas oferecia, e que o narrador dessas histrias tam*2m se oferecia/ 9 passeio para o qual o con$ido, leitor, em*ora não tenha nenhuma pretensão terica, 2 representati$o da import.ncia do tema da teratolo"ia e de como sua fun6ão na sociedade $ariou atra$2s dos tempos/ ele não exponho teses complexas, atendo4 me simplesmente a costurar, com "osto, uma sucessão de ima"ens a al"umas quest1es, num quase in$entário cronol"ico/ !/ Contrariando a tradi6ão que exi"e do historiador uma rela6ão fria entre pesquisa e pro*lemática, resol$i me dar prazer, deleitando4me com um assunto que em*alou o sono dos meus filhos durante anos/ á disse al"u2m que o prazer do historiador de$e ser um dos motores de sua pesquisa, e que uma rela6ão de simpatia M mesmo de "ulodice ou de u*ila6ão M com o o*eto de suas inda"a61es ser$e, so*retudo, para fazK4lo entender melhor os homens e a sociedade so*re a qual tra*alha/= ão me utilizei, no texto, de fontes primárias nem de documentos ori"inais/
Gra6as, contudo, U a*undante produ6ão historio"ráfica estran"eira, pude $isitar, ainda que de forma esquemática, duzentos anos de fascinantes monstruosidades, que me permitiram res"atar do fundo cultural europeu, dos s2culos x$i ao HV###, al"umas estruturas mentais por meio das quais se conce*iam os monstros e sua diferen6a/ 9 importante 2, no entanto, perce*er que as ima"ens literárias ou artísticas recolhidas, al2m de so*re$i$erem no interior de determinados sistemas de pensamento, sempre resumiram as tendKncias de certas correntes de id2ias, esta*elecendo a continuidade de uma tradi6ão/ 5scrito com prazer M o mesmo que, espero, terá o leitor em lK4lo M, este li$ro não se prop1e a pensar a teratolo"ia como um dos mitos edKnicos, ausentes ou presentes, no uni$erso mental luso4*rasileiro, fazendo eco a preocupa61es inau"uradas por !2r"io 'uarque de @olanda em Visão do Paraíso/O ão se trata aqui de interpretar a presen6a de monstros na dispersa por2m ampla documenta6ão que $ai do s2culo HV# ao HV### como Zmito\, pois para nossos antepassados os monstros não eram uma representa6ão, e sim um fato/ ão eram mist2rio, mas concretude/ !ua materialidade, para ns hoe uma quimera, um sonho, fazia parte daquele senso do possí$el ou do sa*er empírico posto em prática por marinheiros e colonos no período das na$e"a61es ultramarinas/ N +iante dessa questão, nossas interpreta61es esposam a da historio"rafia francesa, que $em examinando homens e id2ias, na era moderna, como seres que se de*atiam em meio a um uni$erso sem limites, onde tudo esta$a por conhecer, onde tudo era eni"ma e pro*lema/ Como *em diz -ucien L`*$re,D ha$ia Zexcesso de plantas, de animais, de corpos minerais, de doen6as, de tudo/ 9 possí$el não se distin"uia do impossí$el\ 9s cronistas e $iaantes afirma$am, mão so*re o cora6ão, ser $erdade o que diziam/ 5m nome de sua experiKncia pessoal] )aramente/ Com freq0Kncia, em nome da experiKncia de outrem, de al"u2m di"no de f2, de quem se ou$ira uma histria
Zde $erdade\ so*re monstros e monstren"os/ Vi$ia4se num mundo de Zmais ou menos\ de ou$ir dizer/ +o ou$ir dizer que restará solidamente encra$ado mesmo entre os homens doutos e sá*ios, ou entre os na$e"antes empíricos que foram os portu"ueses, at2 o dia em que os primeiros fisiolo"istas come6aram a construir o edifício de uma ciKncia fundada na o*ser$a6ão e na experiKncia, dando início U prudente marcha do conhecido em dire6ão ao desconhecido/< A histria de monstros e outros esquecidos de +eus o*ri"a a um percurso mais lon"o na mat2ria histrica em *usca do que teria inspirado a pluma de tantos fazedores de monstros no mundo luso4americano/ &ais autores nos con$idam a $oltar ao passado para entender o que se conhecia so*re os monstros na 5uropa, na mesma 2poca em que os cronistas coloniais os encontra$am por toda parte/ = Passeio por um uni$erso inslito e ao mesmo tempo cotidiano, passeio pelas Zmarcas de nossos medos\,Q essa histria dos monstros esfor6a4se por penetrar e desco*rir no espírito do passado o porquK de o ima"inário ser tão importante, tão di"no de interesse e de poder quanto o $isí$el/ Afinal, reflexo do tempo presente mais do que do passado, a histria, como diz Pierre Chaunu,\ tem por missão fornecer U nossa memria, U nossa cultura, U nossa inteli"Kncia, os alimentos de que elas necessitam para $i$er; o ima"inário constituindo4se, sem d_$ida, no pão nosso de cada dia/ ii/ %onstros: o espelho das tre$as no 9cidente medie$al
A rmantícora: a mantícora 2 um animal que $i$e na Jndia, possui fisionomia humana, cor de san"ue, olhos amarelos, corpo de leão, cauda de escorpião e corre tão rápido que nenhum outro animal pode lhe escapar/ %ais do que qualquer alimento, ela "osta de carne humana/ As mantícoras se acasalam de tal maneira que ora uma fica em*aixo, ora outra/ 'runetto -atini, -i$ro do &esouro >ORE +urante a #dade %2dia, quando a maior parte do mundo era considerada terra inc"nita, momento em que as fronteiras do mist2rio ainda não tinham sido de$assadas pelas no$as desco*ertas científicas e enquanto a razão não domina$a o uni$erso, uma $ida intensa fer$ilha$a nos quatro elementos/ Vindos do caos, os seres que aí se de*atiam po$oa$am as mitolo"ias, nutriam as supersti61es, a"ita$am os espíritos e toma$am forma "ra6as ao pincel dos artistas e ao martelo de escultores/ 9 uni$erso romano que precede a #dade %2dia "tica era so*re4humano/ 5le se desen$ol$era como uma esp2cie de O N apocalipse, so* o si"no da *esta, do medo e do mist2rio/ 5le era tam*2m especula6ão, "eometria e n_meros/ Loram os raciocínios e cálculos mais rí"idos então desen$ol$idos que suscitaram os mais desa*ridos trans*ordamentos da ima"ina6ão/ &odos os prodí"ios e monstros da &erra reuniram4se em seu _*ere/ 5 isso porque foi nesse período que o 9riente transmitiu ao 9cidente uma s2rie de ornamentos a*stratos e um *estiário fantástico que ele assimilou e inte"rou a seus sistemas culturais/ A arte, com sua decora6ão exu*erante, seus monstros, sua fauna, sua humanidade que parece pertencer menos U natureza que a al"um reino in$entado e Us re"i1es da ima"ina6ão sem limites, instalou4se numa arquitetura de admirá$el esta*ilidade/> 9 mundo
"tico irá, em compensa6ão, *uscar as propor61es e as medidas humanas/ a arte e na literatura, a fisionomia da $ida será perquirida no entrela6amento entre natureza e espírito/ )edesco*erta como ima"em especular da ordem di$ina, a realidade expressa nas formas materiais traduzia a mais intensa espiritualidade/ %as esse mundo possuía tam*2m uma face monstruosa, presente tanto na arte como na narrati$a literária/R 9ra, ao lon"o dos períodos romano e "tico, o 9cidente medie$al acreditou que nos confins da &erra $i$iam ra6as fa*ulosas/ Viaantes europeus como icollo, %atteo e %arco Polo, Gio$anni Pián del Carpini ou Guilherme de )u*roucY, homens que cruzaram rotas de cara$ana atra$2s da sia, li"ando a China U 5uropa durante o s2culo xiii, confirma$am a existKncia de mara$ilhas e *izarrias nunca dantes $istas/ Pián del Carpini, por exemplo, dizia ter sido testemunha ocular de um ciclope, criatura com um s *ra6o, mão no meio do peito e um _nico p2 que, ao untar as extremidades, locomo$ia4se como uma roda/ Vale, contudo, lem*rar que a $isão trazida na *a"a"em por ne"ociantes, em*aixadores, missionários, artesãos e soldados que esti$eram no 9riente $inha em*e*ida no olhar que á tinham os "re"os so*re a Jndia/ 8m deles, Ct2sias de Cnido R
cuos ca*elos, *rancos at2 os trinta anos, paradoxalmente ene"reciam com o passar do tempo; homens com orelhas tão "randes que lhes caíam so*re as costas, como melenas/ 7uanto aos animais fa*ulosos, Ct2sias descre$e a antropfa"a mantícora, com ca*e6a de homem, corpo de leão, cauda de escorpião e trKs fileiras de dentes; os "rifos e os unicrnios, "uardiães de montanhas de ouro; as "i"antescas formi"as, dotadas de pin6as e capazes de $oar/O !uas @istrias do 9riente ti$eram tão lon"a fortuna que o famoso paleontlo"o francKs Geor"es Cu$ier, inspirado em Ct2sias, discutiu at2 morrer, em DR>, se o unicrnio não passaria de uma ima"em deformada do rinoceronte/ +epois das campanhas de Alexandre, o Grande R>O a/ C/E, um "e"rafo de nome %e"astenes foi en$iado como em*aixador U corte de Chandra"upta, primeiro rei da Jndia, morador de Patna, cidade situada Us mar"ens do Gan"es/ Lra"mentos de sua o*ra so*re$i$eram "ra6as a Plínio, que ser$iu de referKncia a todos os teratlo"os latinos que escre$eram entre os s2culos iii e xiii: !olinos, %acr*io, %arciano Capela, santo A"ostinho, #sidoro de !e$ilha, &omás de Cantimpr2, Vicente de 'eau$ais e outros/ N o momento em que Ct2sias e %e"astenes escre$iam, a D < cren6a na existKncia de monstros esta$a tão disseminada que se expunham no Partenon, de Atenas, as Zmandí*ulas\ das "i"antescas formi"as indianas, *uscadoras de ouro/ 8m pouco mais tarde, !caurus, "enro de !ila RD4ND a/ C/E, transporta$a para )oma os ossos do monstro marinho que, se"undo se acredita$a, "uarda$a Andr^meda/ %as $eamos como Plínio, o Velho, descre$ia em NN d/ C/ as monstruosas Zmara$ilhas\ a$istadas na Jndia por Ct2sias e %e"astenes:D Prximo aos citas que $i$em no orte, não lon"e do
lu"ar onde se le$anta o $ento Aquilon seu antro, dizemE $i$em os arimaspes, que tKm como si"no distinti$o um _nico olho no meio da testa/ Por causa das minas de metal, eles mo$em "uerras incessantes aos "rifos, esp2cie de monstros alados que, a crer nas lendas, extraem ouro das "alerias; seu empenho em defendK4lo s se i"uala U $ontade dos arimaspes em rou*á4lo T///b 9s primeiros antropfa"os $i$em a dez dias de $ia"em para al2m do rio 'oristene e *e*em em cr.nios humanos, ser$indo4se de sua ca*eleira como de uma toalha do*rada so*re o peito/ Para al2m do país dos citas antropfa"os, num "rande $ale do monte #ma$us, encontra4se uma re"ião chamada A*arimon, onde $i$em homens sel$a"ens com p2s $irados para trás na companhia de animais sel$a"ens/ a Al*.nia nascem seres com olhos de cor indecisa, com ca*elos *rancos desde a inf.ncia e que enxer"am melhor U noite do que de dia/ 9s sauromatas, enfim, a treze dias de $ia"em de 'oristenes, s comem um dia a cada trKs T///b o po$o dos psilas tem um poder estranho: seu corpo 2 naturalmente dotado de um $eneno fatal cuo odor adormece as serpentes T///b al2m do país de asamons T///b existem os andr"inos, que carre"am seus dois sexos e fazem nas rela61es sexuais ora papel de mulher, ora de homem/ Aristteles acrescenta que possuem o seio direito masculino, e o esquerdo feminino T///b %e"astenes inclui entre os indianos n^mades uma esp2cie de homens a quem chama de ciritas/ &Km *uracos no lu"ar das narinas e p2s flexí$eis como o corpo das serpentes/ !e"undo ele, na extremidade oriental da Jndia, na dire6ão da nascente do Gan"es, encontra4se a na6ão dos astomos, homens sem *oca e co*ertos de pKlos que se $estem com folhas; $i$em apenas da respira6ão e do cheiro, não *e*endo nem comendo; no decorrer de suas lon"as $ia"ens, le$am diferentes odores de raízes, de flores e de macieiras sel$a"ens para que, caso tenham necessidade, isso não lhes falte T///b o país dos calin"e, outro po$o da Jndia, as mulheres conce*em aos cinco anos e s $i$em at2 os oito/ Ct2sias T///b fala ainda de uma
esp2cie de homens que possuem apenas uma perna e saltam com espantosa li"eireza; chamam4se a eles prprios ciápodes porque deitados de costas durante a canícula se prote"em U som*ra do prprio p2/ !ão $izinhos dos tro"loditas/ 8m pouco a ocidente destes, existem $ários homens sem ca*e6a; tKm os olhos nos om*ros T///b Ct2sias cita $árias montanhas ha*itadas por homens com ca*e6a de cão; $estem4se com peles de animais e ladram em $ez de falar; armados de "arras, alimentam4se de a$es e quadr_pedes que ca6am; são os cinoc2falos/ %as quem foi Plínio, o Velho, pai criador de tantas histrias de monstros] 8m romano, a*sor$ido por seu tra*alho militar e *urocrático e decidido a escre$er uma enciclop2dia dos conhecimentos humanos/ &rata4 se, sem d_$ida, de um curioso persona"em ori"inário de Como, nascido na classe dos ca$aleiros, ami"o do imperador Vespasiano, oficial de ca$alaria na Germ.nia, procurador de finan6as na 5spanha e autor de RN $olumes escritos em latim, nos quais cita outros O autores latinos e R>N não latinos/ A edi6ão princeps de sua @istria natural foi pu*licada em Veneza em O<, se"uida de tradu61es em $árias lín"uas M italiano em NO, francKs em =OO, in"lKs em OQ e espanhol em O> M, que inau"uraram a lon"a s2rie de %ira*ilia e de Curiosa, >Q > manuscritos iluminados e depois pu*licados, florescentes durante a #dade %2dia e o )enascimento/ 5las alimentaram ainda, durante o período clássico, a pintura de *elos o*etos e de tesouros exticos, como testemunha a ZAle"oria dos quatro continentes\, de an $an essel, no qual aparece um dos $olumes de Plínio/ 5n"rossaram, i"ualmente, a tradi6ão pictural das Vanitas, que por preteri6ão cele*ra$am as riquezas Us quais era preciso renunciar para a prpria sal$a6ão/ A heran6a de Plínio não pára aí: a
amizade entre "olfinhos e homens, os *anhos de leite de mula de %essalina, a in$en6ão do $idro inque*rá$el, o eni"ma da constru6ão das pir.mides, o antar de p2rolas de Clepatra, os contos e histrias so*re lo*isomens constituíam4se num estoque sem fim de ima"ens mais tarde reutilizadas/ !ua preocupa6ão em fixar datas, esta*elecer filia61es, discorrer so*re "enealo"ias deu lu"ar a monstros e heris fa*ulosos nos anais da humanidade/ A @istria natural acolheu todas as fá*ulas fundadoras que s2culos de reescritura e empr2stimos irão remodelar, dotando4as por $ezes de si"nifica61es no$as/Q o decorrer dos tempos, essas representa61es monstruosas sofreram al"umas transforma61es li"adas ao espírito da 2poca; mas, no conunto, permaneceram inalteradas at2 o s2culo x$i/ !eu poder de sedu6ão era tão "rande que, at2 finais da #dade %2dia, elas irão o*cecar os cart"rafos, os moralistas, os $iaantes utpicos, como %ande$ille ou &homas de Cantimpr2, ou os $erdadeiros $iaantes, como %arco Polo, que afirma$a ter $isto cinoc2falos nas ilhas Andamam/ 9ferecendo "rande di$ersidade na monstruosidade, os po$os exticos repertoriados e di$ul"ados por Plínio in$adiram a literatura erudita, as narrati$as de $ia"em ou as epop2ias exaltando a id2ia de cruzada, em que encarna$am o pa"anismo/ %oradores dos confins da &erra, fato que, aliás, tranq0iliza$a, não fariam mais que al"umas *re$es incurs1es ao 9cidente medie$al/ uma delas impressionaram santo A"ostinho, um dos primeiros a perce*er a import.ncia dos monstros no ima"inário das popula61es/ 5 ele per"unta$a4se: seriam os monstros simultaneamente homens e criaturas de +eus] !e a inquestioná$el autoridade de Plínio esti$esse correta, seriam eles filhos de Adão] A per"unta se"uinte: por que razão interferiam na harmonia da Cria6ão] )esposta: como monstros, tinham al"o a Zmostrar\/ 5les mostra$am monstra monstrareE , manifesta$am ostenta ostentareE, prediziam portenta pra4ostendereE e anuncia$am
prodi"ia pro4dicereE antecipadamente tudo o que +eus amea6ara realizar futuramente no tocante aos corpos humanos/ %onstros mostra$am, portanto, o que poderia acontecer aos homens e os insti"a$am a pensar como seriam se não fossem como eram/ 5ssa etimolo"ia 2 aceita por santo A"ostinho na medida em que ele não $ia nos monstros mais do que a expressão da $ontade de +eus/ Ao discutir a existKncia de ra6as monstruosas, a preocupa6ão a"ostiniana 2 manter a unidade da esp2cie humana e, por meio dela, "arantir a sal$a6ão para todos os filhos de +eus/ 5 santo A"ostinho retoma a 'í*lia para explicar essa questão U luz da teolo"ia: Per"unta4se, al2m disso, se 2 crí$el que dos filhos de o2 ou melhor, de Adão, de quem esses tam*2m procedem, se haam propa"ado certas ra6as de homens monstruosos de que a histria dos po$os dá f2/ Asse"ura4se, com efeito, que al"uns tKm um olho no meio da testa, que outros tKm os p2s $irados para trás, que outros possuem am*os os sexos, a mamila direita de homem e a esquerda de mulher, e que, ser$indo4se carnalmente deles, alternati$amente "eram e dão U luz/R 9 filsofo que escre$era entre R e >O e que dizia que >> >R tudo o que sur"e no mundo e aparece na histria emana da f2 repete a lista de po$os monstruosos adotada por Plínio, mas ressalta: Zão 2 necessário acreditar em todos esses "Kneros humanos que dizem existir\ 5sse comentário em al"u2m tão inclinado a crer ce"amente em fatos estranhos e acontecimentos inslitos e que encheu sua o*ra de uma $asta cole6ão de mira*ilia chama a aten6ão/ Para melhor compreendK4lo, o*ser$emos que santo A"ostinho a*orda a questão dos monstros a partir do pro*lema da
descendKncia de o2/ Pois se o dil_$io teria reno$ado toda a popula6ão da &erra, essas ra6as monstruosas descenderiam, elas tam*2m, do patriarca/ &oda$ia, reais ou não, tais seres lhe eram _teis e ele não se esqui$a$a de afirmar que sua possí$el existKncia não lhe pareceria a*surda/ ão apenas os monstros concorreriam para dar $ariedade U harmoniosa *eleza do uni$erso como tam*2m auda$am a fortificar a tese a"ostiniana se"undo a qual a apari6ão de um homem monstruoso não de$eria ser considerada um erro da natureza, melhor dizendo, de +eus/ o interior de um pensamento que reconhecia um +eus criador de todas as coisas, fazia4se necessário inocentá4-o de qualquer equí$oco/ 5is por que A"ostinho denuncia a $aidade dos filsofos que, apalermados diante de eclipses ou monstros, procura$am interpretá4los com outras raz1es que não a $ontade di$ina ou o supremo deseo do Criador/ %as, como tornar +eus responsá$el pelos monstros]= Partindo da id2ia da *eleza harmoniosa do todo, santo A"ostinho prop1e uma curiosa a*orda"em: os nascimentos monstruosos podem explicar os po$os monstruosos/ ?, pois, por uma "rada6ão mínima que se passa de li"eiras diferen6as M mais de cinco dedos nos p2s e nas mãos, por exemplo M a seres muito diferentes de ns/ A l"ica do santo homem era mais ou menos a se"uinte: se não caíssemos na loucura de ima"inar que Zo Criador en"anou4se na conta"em dos dedos\, por quK, então, pensar que a monstruosidade de po$os inteiros foi um erro] ão conhecemos as raz1es para tal escolha, mas não conhecemos, tampouco, as raz1es pelas quais uma crian6a nasceria com mais dedos do que outra/ !em d_$ida, +eus o*edece apenas a uma exi"Kncia de sua arte, aperfei6oando, assim, o mosaico do uni$erso/ 9 pensamento de A"ostinho 2 coerente; os monstros, homens ou ra6as, faziam parte do mundo e concorriam para sua *eleza/ %esmo se não pudermos explicar por que +eus os criou, de$emos confessar nossa i"nor.ncia e recusar a id2ia de considerá4los erros
da natureza/ %as A"ostinho separa4se de Plínio quando este pretende explicar os fen^menos pela Zfor6a e maestade da natureza\ Para o autor de A cidade de +eus, a maestade s pertence ao Criador, e a for6a 2 um dom que 5le dá U natureza/ Loi unicamente +eus que imprimiu, a tantas coisas que $emos, Zqualidades tão admirá$eis e tão $ariadas que apenas seu "rande n_mero nos impede de admirá4las\/ Loi 5le quem fez este Zmundo repleto, c2u e terra, á"uas e ares, de in_meros mila"res\ O 5 se sou*2ssemos olhar sua o*ra não nos cansaríamos de admirá4la/ 9 resultado das reflex1es a"ostinianas 2 que as ra6as monstruosas $ão poder ser tratadas como mira *ilia, o que santo A"ostinho não desea$a exatamente/ Contudo, ele era um "rande admirador dessas curiosidades mara$ilhosas da natureza, exausti$amente in$entariadas pelos autores latinos/ !u*traindo Us ra6as de monstros o estatuto de realidade, que na tradi6ão clássica era realmente o seu, fazendo de sua existKncia al"o de pro$á$el e de incompreensí$el, ele as torna$a mara$ilhosas ao mesmo tempo que as inte"ra$a ao sistema de representa61es exi"ido pela 'í*lia/ A hesita6ão do texto a"ostiniano 2, quanto a isso, característica: 2 preciso acreditar nessas ra6as não porque os autores anti"os as mencionassem, mas porque a cren6a em sua existKncia auda$a a compreender os nascimentos monstruosos/ Aliás, não era nem mesmo preciso acreditar na existKncia de > >= todas as ra6as monstruosas descritas/ !erá que elas existem] ão existem] A prudKncia recomenda$a não e$itar nem uma nem outra posi6ão/ 9s monstros seriam cria61es estranhas da natureza e de +eus/ -imitando, pois, a cren6a a um certo ní$el de realidade, A"ostinho a*ria as portas para a admira6ão diante das mara$ilhas incompreensí$eis da
Cria6ão/ 5le situa$a o monstro no espa6o terrestre, ainda que os preparando para que se tornassem fa*ulosos/ !anto A"ostinho foi um dos primeiros a apontar o pro*lema da dismorfia dos corpos, mais tarde desen$ol$ido por #sidoro de !e$ilha =NO4OROE/N um dos capítulos de seu 5timolo"ias, esp2cie de síntese dos sa*eres anti"os, reli"iosos e profanos a respeito da terrí$el sel$a em que se mo$iam os monstros, o *ispo espanhol determina quatro "randes famílias: aquela dos monstros indi$iduais, a das ra6as monstruosas, a dos monstros fictícios e a dos homens animais ou *estas humanas/ 9s crit2rios utilizados para tais classifica61es *asea$am4se no tamanho anormal ou na pequenez extraordinária dos mem*ros do corpo, na ausKncia ou no excesso de mem*ros, nas modifica61es parciais ou na reunião de $árias deformidades/D Primeiro enciclopedista cristão, #sidoro tornou4se a fonte fecunda na qual $ários autores se a*asteceram e constituiu, ao mesmo tempo, a autoridade atrás da qual estes se entrincheira$am quando se trata$a de contar histrias quase inacreditá$eis/ !uas o*ras inspiraram compila61es em lín"ua $ul"ar que coloca$am a ciKncia ao alcance de lei"os/ +e homens como Plínio, santo A"ostinho e #sidoro, os compiladores medie$ais sentiam4se de$edores, mas tam*2m herdeiros/ !eus textos eram uma esp2cie de tesouro da ci$iliza6ão no qual telo"os e cientistas iriam *e*er/ A partir dos s2culos xii e xiii, monstros e mara$ilhas penetraram no domínio da arte reli"iosa/ !e antes eram considerados apaná"io dos textos clássicos so*re os confins da &erra, nos quais se localiza$a a Jndia ou os po$os pa"ãos, eles passaram então a ser considerados, como desea$a santo A"ostinho, criaturas de +eus/ o tímpano da i"rea de Vezela(, na Lran6a, a passa"em da pre"a6ão missionária de %ateus U inte"ralidade dos po$os 2 representada por +eus a*en6oando todos os filhos de Adão, inclusi$e as ra6as monstruosas/< o
deam*ulatrio da catedral de !ens, seres fantásticos e homens se com*inam na melhor tradi6ão estilística/ 8m ciápode a"arra4se ao prprio p2, enquanto uma sereia se"ura a cauda, adaptando4se U mesma cur$a em que se misturam elefantes e camelos/ 5m Paris, na i"rea de !ão ulião, o Po*re, sereias e esfin"es imo*ilizam4se nas saliKncias dos capit2is/ o portal da i"rea de !ão +enis, em Chartres, uma fita recheada de criaturas $i$as, quimeras, centauros, "rifos, entrela6a4se U $erdura esculpida na pedra/ os *aixos4rele$os da catedral de -(on pululam "ár"ulas com lon"os pesco6os, hí*ridas de lo*os, la"artas e morce"os/ 9utros milhares de fi"uras que iluminam os textos sa"rados dos manuscritos lit_r"icos parecem simultaneamente en"enhosos e ele$ados espiritualmente: 2, por exemplo, o caso do filsofo com ca*e6a de porco que, mandí*ula na mão, medita introspecti$o, ou o o$em mestre de m_sica, meio homem, meio "alo, que dá uma li6ão de r"ão a um centauro/ -ar"amente representados, tais monstren"os aca*aram por tornar4se familiares a seus contempor.neos/>Q ? *om não esquecer que durante a #dade %2dia o ensino da reli"ião se fazia de maneira audio$isual/ A pala$ra, pre"ada do p_lpito, predomina$a, mas a parte da fi"ura6ão era considerá$el/ 9s de$otos tinham mais prazer em Zler\ na pedra e no mármore uma $asta e estupefaciante $ariedade de formas heterclitas do que $er isso em manuscritos/ 9 importante 2 que al2m de enfeitar capit2is, prticos e iluminuras, os monstros passaram a encontrar seu lu"ar em >O >N *estiários M li$ros que soma$am histrias e descri61es de animais $erdadeiros e ima"inários M, fazendo com que a erudi6ão enciclop2dica e o pensamento reli"ioso se reunissem/> esses
*estiários, a Knfase na moralidade, apre"oada pela #"rea catlica, passa a dar no$o sentido ale"rico aos monstros/ Vale ainda lem*rar que o m2todo de interpreta6ão que consistia em emprestar U teratolo"ia um sentido edificante remonta pelo menos aos esticos/ !eu ardente deseo de conciliar a filosofia com a reli"ião popular os conduziu a *uscar nas entidades mitol"icas um si"nificado espiritual; e em suas a$enturas um ensinamento so*re os *ons costumes/>> um desses li$ros, por exemplo, datado do s2culo xiii e depositado em estminster, #n"laterra, os pi"meus sim*olizam a humildade; os "i"antes, o or"ulho; os cinoc2falos, a discrdia; os homens com *ei6os pendurados, a mentira etc/>R Passou4se a considerar os monstros como prodí"ios morais numa 2poca em que uma interpreta6ão ale"rica do mundo se eri"ia em sistema de pensamento/ 9ra, tais fá*ulas intercam*iá$eis M al"uns autores associa$am as orelhas "randes U melhor audi6ão da pala$ra di$ina, ou os cinoc2falos precariamente $estidos a humildes pre"adores M permitiam denunciar de forma satírica as fraquezas dos contempor.neos/ o -i$ro dos homens monstruosos, de &homas de Cantimpr2, que $em U luz no s2culo xi$, os latidos inarticulados dos cinoc2falos são associados U cal_nia, e os homens sem ca*e6a, aos co*radores de impostos que s pensa$am em encher a prpria *arri"a/ Como #sidoro, Cantimpr2 tam*2m acredita$a em monstros e redi"iu durante quinze anos uma enciclop2dia, +e nature, cuo terceiro $olume, mencionado acima e fartamente ilustrado, lhes 2 consa"rado/ unto com esses homens eruditos, que não se contenta$am em reproduzir informa61es conhecidas, mas iam *uscar nos países su*metidos ao #slã, ou na Gr2cia, maiores informa61es, o campo dos sa*eres so*re a teratolo"ia aumenta$a/ 9s *estiários s faziam ampliar a curiosidade so*re uma enorme quantidade de animais, reais ou ima"inários, pertencentes U fauna do or*e então conhecido/ Por exemplo: o *estiário de %arcotelius, a*ade e filho natural de Lilipe, o 'om,
incluía, entre a fauna fantástica á conhecida, o alpido, criatura com rosto de dem^nio, dentes de morsa, patas de "rifo, representado a co6ar prosaicamente a orelha com a ponta da cauda/ 9u o cardeal do mar: imenso peixe dotado de ca*e6a humana coroada por uma mitra que, se"undo uma histria relatada por Pretorius, teria aparecido em RR no litoral da Pol^nia/ +epois de ter entretido *ispos locais, com os quais se comunicara por "estos, a*en6oou a todos, desaparecendo a se"uir num sonoro e ele"ante mer"ulho/> &ransformados em outra face desses mundos, onde terror e encantamento se mistura$am, os $olumes ma"nificamente decorados por "randes artistas da 2poca com*ina$am a reprodu6ão da ima"em e o texto em forma de fá*ula/ A fauna dos eruditos não era a mesma dos pintores, mas, "ra6as a seu aspecto fantástico, elas aca*a$am por se so*repor/ Aí $emos desfilar o prodí"io da hiena com uma pedra no olho, homens com oito dedos em cada mão, elefantes com *ico em lu"ar da trom*a, a anfis*ena, serpente com uma ca*e6a em cada extremidade, as serpentes da #ndia com cornos de *ode e pedras preciosas na ca*e6a, o *asilisco com ca*e6a de "alo e corpo de co*ra/>= 9 *estiário era fundamental, pois ele transmitia as características de animais fa*ulosos, como a fKnix ou o unicrnio, a sereia, o centauro, a salamandra ou o peixe4serra, que aca*a$am colorindo manuscritos iluminados comuns nas *i*liotecas de con$entos e mosteiros/ As fá*ulas soma$am4se Us á mencionadas considera61es morais, e cada animal transmuta$a4se em sím*olo tam*2m decifrado pelos cl2ri"os, com a auda das sa"radas escrituras/ A notoriedade desses animais, que ser$iam de suporte U exe"ese, encontra$a >D ><
se assim refor6ada/ 9s textos dessa tradi6ão erudita forma$am a espinha dorsal da cren6a em monstros e permitiram sua instala6ão na literatura narrati$a, conferindo4lhe credi*ilidade/>O 8ma das mais fecundas fontes de inspira6ão so*re os monstros, nessa 2poca, foi o )omance de Alexandre, um conunto de cartas supostamente escritas por Alexandre a sua mãe, 9límpia, e a seu preceptor, Aristteles/ &raduzidas para o latim pelo arcipreste -2on em D=Q d/ C/, tornaram4se, depois de *uriladas por -am*ert de &ours e Alexandre de 'erna(, leitura o*ri"atria/ As campanhas e conquistas do "rande rei ser$iam como pretexto para tratar de mil prodí"ios e mara$ilhas ocorridos na lon"ínqua Jndia/ &al como nos mapas do período, considerados capazes de dar uma ima"em fiel do mundo, as fantásticas a$enturas de Alexandre eram $istas como pá"inas fi2is da histria/ As afirma61es aí contidas não eram colocadas em d_$ida/ 5m torno de Alexandre passea$a toda uma fauna antropomrfica cua descri6ão era capaz de pro$ocar $erti"ens/>N Al2m dos Zcomedores de carne humana\ que o rei fez prender para que não se dispersassem pelo mundo, ele te$e de enfrentar o assalto de dra"1es, de porcos $oadores dotados de afiados dentes, de pássaros4ti"res, de le1es de quatro cores e sa"itários, de homens e mulheres possuidores de seis *ra6os e seis pernas, de "i"antes e *lKmias/ %as al2m desses monstros ha*ituais aparecem ainda homens misteriosos com ca*e6a de ca$alo hipoc2falosE, ca*e6a de touro ou de leão, outros com patas de ca$alo, mulheres *ar*adas e outras com cauda que lhes saía do um*i"o/ 8m mundo di"no de um filme de terror ou de uma tela de 'osch salta das pá"inas da sua histria: os ph(toi, com *ra6os em serra; os ochlites, altos, cal$os e ma"ros como lan6as; as lasci$as ondinas capazes de arrastar para imensos sor$edouros dFá"ua suas armadas inteiras/ 'em mais $ariados e interessantes do que as histrias eruditas, esses textos pro$oca$am a fascina6ão do p_*lico; cada autor procura$a, assim, tirar partido do sucesso da
histria anterior acrescentando no$os persona"ens ou no$os monstros U sua $ersão do romance do famoso "o$ernante/ >D Contudo, ressalta$am sempre o $i"or espiritual de Alexandre, que lhes permitia entre$er na *eleza dessas coisas o rosto de +eus/ 9 sucesso das histrias em torno dele foi tão "rande que estas circularam at2 o s2culo x$ii acompanhando os pro"ressos da imprensa em toda a 5uropa/ 9 )omance de Alexandre 2 muito representati$o do interesse que a #dade %2dia tem pelos monstros e da cren6a que lhes 2 de$otada/ &al$ez sea uma questão mal colocada procurar sa*er se, então, os homens acredita$am ce"amente na existKncia das ra6as monstruosas; melhor seria dizer que para eles existiam di$ersos modos de cren6a, que $aria$am se"undo a di"nidade de seus o*etos/ !e as e$idKncias cotidianas não lhes asse"ura$a a existKncia desses seres fantásticos, eles aceita$am os testemunhos que os descre$iam se tais descri61es fossem portadoras de uma razoá$el dose de realidade/ 9utro canal de transmissão so*re as histrias de monstros, a meio caminho entre a literatura erudita e os romances, eram os pequenos op_sculos manuscritos contando $ia"ens ao 9riente nas quais se constata$am fatos i"norados em outras re"i1es/ &eodofrido, mon"e de -uxeuill, en$iado em O=N ao monast2rio de Cor*ie, fundado pela rainha 'atilde, redi"e seu +e Asia et de uni$ersi mundi rota, no qual cita a maior parte de animais estranhos que po$oa$am o 9riente/ 8m certo +icuil, professor na corte de Carlos %a"no, termina seu +e mensuris or*is terrae enumerando en"uias de trezentos p2s, unicrnios, ciclopes, homens com a ca*e6a no peito etc/>< 9utra lenda que te$e importante papel no sentido de disseminar os conhecimentos existentes so*re os monstros foi a do Preste oão/ 5sse so*erano mítico, reinando em al"uma parte da sia ou do orte da frica, teria escrito, na 2poca das primeiras
RQ R Cruzadas, uma lon"a carta na qual descre$ia seu país/ 5ssa carta apcrifa tomou formas di$ersas e te$e enorme sucesso/ !eu conte_do não se acanha$a em fazer circular riquezas amais $istas nem em acumular uma fauna real, s que pro$eniente de diferentes re"i1es: camelos, le1es, ti"res, ursos, á"uias, serpentes/ 9 preste, senhor de fa*ulosos tesouros, ha*ita$a um palácio de 2*ano e cristal cuo teto era reco*erto de pedras preciosas e as colunas, de ouro/ 8tilizando o "rande patrim^nio da teratolo"ia ocidental, a carta acrescenta ao á conhecido ima"inário fantástico histrias so*re Go" e %a"o", "i"antes encarre"ados de "uardar as portas do Paraíso,RQ as amazonas e monstros indeterminados, cuos nomes parecem capazes de nos fazer sonhar: camethurnus, metha"allinari, thinsirite///R o s2culo xiii, entre o ad$ento dos mon"is com a in$asão de GKn"is han e aquele, em ROD, da dinastia %in", que fechou as portas da sia, os europeus lan6aram4se a desco*rir o 9riente/ Antes hou$e al"uns $iaantes, mas nada parecido com essa idade de ouro das explora61es europ2ias/ 5stas foram incenti$adas pelas miss1es en$iadas pelo papa #nocKncio i$ aos *ár*aros que ha$iam in$adido desde a China at2 a @un"ria/ 5sses homens conta$am o que $iram e o que não $iram/ )e"istram sua curiosidade so*re as ra6as monstruosas e sua decep6ão por não se confrontar diretamente com os monstros descritos por Plínio e outros Zanti"os\ Contudo, eles ou$iam no$as histrias que acrescenta$am Us anteriores, transformando seus relatos de $ia"em em $erdadeiros romances/ A primeira "era6ão 2 constituída por Gian del Pian Carpini >=E, ícolass Ascelín >OE, !imão de !aint47uentin >NE e Guilherme de )u*roucY >=RE, os Polo >NE, Gio$anni de %ontecor$ino >DQE, Pascal de Vitria RRDE
e Gio$anni di %ari"noli R>E/ +epois do fechamento da China, se"uiram ainda na dire6ão oeste @ans !chilt*er"er R 9 melhor exemplo de curiosidade pelo assunto 2 o de ean de %ande$ille c/ ROQE, que descre$eu com sensí$el ha*ilidade o mundo oriental, suas mara$ilhas e seus monstros/ As Via"ens de %ande$ille, ori"inalmente um manuscrito oferecido a oão !em %edo, foram uma compila6ão li$resca, traduzida em dez lín"uas europ2ias, que te$e no$enta edi61es at2 o ano de OQQ e se apro$eita$a enormemente das informa61es compiladas por #sidoro de !e$ilha, por !olino, pelos romances de Alexandre, pelas histrias do Preste oão e outros/RR 9 autor apresenta4se como destruído pelo reumatismo, achacado pela "ota e pela artrose e dotado de um caráter delicadamente co$arde que contrasta de modo en"ra6ado com o de outros $iaantes, descritos com as cores da audácia e da cora"em/ !em amais ter ido muito lon"e, %ande$ille insistia na $eracidade de relatos que lhe teriam sido transmitidos por íntimos, di"nos da maior confian6a: Zdisseram4lhe\ que perto da ilha de %ilstoraY mora$am "i"antes de >D ou trinta p2s de altura, que se $estiam com peles e comiam carne crua/ %ais ao sul, existiriam mulheres Zcru2is que porta$am pedras preciosas nos olhos\R= 9 sucesso de sua o*ra de$e4se ao fato de ter sa*ido preparar um concentrado de histrias Zmara$ilhosas\, po$oadas de persona"ens fantásticos, que pu*licou em lín"ua $ul"ar: Z5 há, tam*2m na ilha de &rapo*ana, "randes montanhas de ouro cuidadosamente "uardadas por formi"as que separam o ouro das impurezas/ 5ssas formi"as são tão "randes quanto cachorros\,RO Ao sul do rio Lison ficaria o $ale Zencantado, peri"oso ou do dia*o\, onde se ou$ia, sem cessar, o ruidoso *arulho das hostes demoníacas e era considerado uma das entradas para o inferno: Zo meio desse $ale, há um rochedo e so*re esse rochedo uma ca*e6a do dia*o, horrí$el de $er\/
9 -i$ro das mara$ilhas foi iluminado por ean de 'err(, nos R> RR primeiros anos do s2culo x$, que nele fez desfilar di$ersos dra"1es $oadores, serpentes comedoras de crian6as, ciápodes, *lKmias, centauros e outras tantas criaturas que fecunda$am a ciKncia medie$al com pura fantasma"oria e poesia da ima"ina6ão/ Como se pode $er, a +ante, )a*elais, 'osch e 'rue"hel não faltaram precursores/RN ão 2 preciso lem*rar que o desen$ol$imento da imprensa proporcionou a tais no$idades uma difusão imensa/ Como *em diz Claude -ecouteaux, as tradi61es se transmitiam de s2culo em s2culo com uma const.ncia impressionante, enriquecendo4se U medida que se desco*riam as literaturas "re"as e ára*es e as narrati$as das Cruzadas acorda$am na ima"ina6ão o "osto pelo exotismo/ A partir do s2culo xi$ o cenário mudou radicalmente so* o efeito de $árias calamidades/ Peste e"ra de RD, que matou um ter6o da popula6ão europ2ia, sucederam4se o Grande Cisma e a interminá$el Guerra dos Cem Anos/ A inquieta6ão era "eral/ As cren6as milenaristas e a an"_stia em face da che"ada iminente do Anticristo multiplica$am o mal4estar social/ )e$oltas ur*anas e rurais de$asta$am um 9cidente mais a*erto do que nunca Us epidemias/ #nicia4se uma in$asão demoníaca U qual o incipiente )enascimento dará uma coerKncia, um rele$o e uma difusão nunca dantes $istos/ A cren6a nos lo*isomens torna$a4se uni$ersal, enquanto se tinha por autKntica a existKncia de dra"1es e de criaturas fantásticas/ esse quadro, a"udizam4se as no61es formais de *em e de mal, passando4se a atri*uir as ori"ens monstruosas U influKncia positi$a ou nefasta de +eus ou do dia*o/ 8m delírio místico apoderou4se, assim, das interpreta61es so*re a ori"em "en2tica
dos monstros/ Para dar um exemplo: o rei de Lran6a, )o*erto, o Piedoso, casou4se com 'erta de 'or"onha, uma prima em quarto "rau, e $iu4se excomun"ado pela C_ria )omana, que declarou a união ile"ítima so* pretexto de parentesco/ 9 cardeal +amiano, *ispo de )a$ena, assinala$a que o si"no indel2$el da clera di$ina com tal contra$en6ão foi o nascimento de um filho com o pesco6o e a fisionomia de "anso, o qual a rainha dera U luz/ !e a puni6ão di$ina permitia tal transforma6ão do produto da concep6ão, não era menos plausí$el acreditar que +eus, U ima"em e semelhan6a das di$indades pa"ãs, se ser$ia de monstros para ad$ertir so*re as calamidades iminentes/RD 9u, ainda, que !atã interferia diretamente na o*ra di$ina/ 9s "Knios do *em e do mal, em permanente rixa, aca*a$am por criar seres perfeitos/ 9u monstros e deformidades/ !e, na 'í*lia, +eus anunciara que faria o homem U sua ima"em e semelhan6a, o monstro si"nifica$a uma ruptura com esse princípio/ %ais al2m, o -e$ítico anuncia$a que os homens marcados por sinais físicos não poderiam oferecer ser$i6os a +eus/ essa l"ica, o mudo re$elaria, no silKncio da *oca, as marcas de sua intimidade com o inferno, onde pin6as de ferro lhe teriam arrancado a lín"ua/ 9 surdo, insensí$el U pala$ra de +eus, seria sensí$el unicamente aos rumores infernais/ 9 ce"o ti$era os olhos queimados pelo calor do inferno/ 9 aleiado de$eria seu desequilí*rio Uquele de sua alma/ 9 corcunda traria o peso de sua maldi6ão Us costas, so*re a qual se senta$a, de tempos em tempos, seu mestre, o dia*o/ A cren6a nas for6as demoníacas era tão profunda que mesmo a ciKncia classifica$a os poderes do dem^nio e suas formas de inter$en6ão na fa*rica6ão de monstruosidades/ 9 mali"no, por um sortil2"io, sea suprimindo a crian6a, sea por uma falsa "ra$idez, podia su*stituir o feto por um monstro; ele podia, ainda, en$iar ao corpo do feto uma doen6a que deformaria sua ima"em, dando4lhe a aparKncia de um
monstro; ele podia tam*2m introduzir no _tero a semente fecunda de animais, "erando criaturas zoomorfas/ &ais cren6as, entre outras, consa"radas por uma lei da !or*onne de RD, depois pelo demonlo"o acques R R= !prean"er, "rande inquisidor da Alemanha, e posteriormente pelo papa #nocKncio V###, ti$eram por resultado a destrui6ão impiedosa de crian6as com anomalias e, muitas $ezes, da prpria mãe/ 7uanto ao restante da família, fica$a su*metido a in_meras práticas de purifica6ão/ A mulher que desse U luz uma crian6a malformada era imediatamente suspeita de ter contraído um casamento oculto ou de ter conhecido carnalmente o dia*o, so* um dos aspectos $enerados pela ma"ia ne"ra/ A mão de !atã era capaz de deformar os corpos se"undo leis que s existiriam no inferno/ 7ualquer marca $isí$el so*re uma das partes do corpo era si"no sutil de uma alian6a infernal/R< Al2m da cren6a em animais e homens monstruosos, "erados pela $ontade de +eus ou do dem^nio, a teratolo"ia medie$al se"uia outros caminhos para tratar as monstruosidades/ Pensa$a4se que o cruzamento de esp2cies diferentes produzia monstros tanto entre animais como entre homens/ Por sua $ez, esses indi$íduos inslitos assim conce*idos en"endrariam seres que lhes seriam semelhantes, dando ori"em U teoria das monstruosidades hereditárias/Q Al"uns s2culos antes, Aristteles afirmara que, em re"ra "eral, os filhos se pareciam com os pais em suas anomalias/ &al opinião era compreensí$el, pois a Anti"uidade clássica tinha uma concep6ão sin"ular so*re a ori"em da semente: o líquido seminal era secretado por todo o corpo/ 5is por quK, em seu A "era6ão dos animais, Aristteles afirma$a que o
mem*ro ausente de um dos pais de$eria faltar U crian6a, uma $ez que a parte faltosa não poderia ter secretado os "enes nescessários a sua reprodu6ão/ @ou$e autores que ao final da #dade %2dia e a partir da direta o*ser$a6ão da realidade matizaram tal asser6ão; foi o caso de &ia"o de Vitr(/ %as nas mentalidades populares a mis2ria física de tantos mar"inalizados era confundida com monstruosidade ou prodí"io/ 5is por que em R se apre"oa$a em !andersdorf, 'a$iera, o nascimento de uma menina com duas ca*e6as, quatro p2s e quatro *ra6os; em 9 nascimento de monstros interessara $i$amente a !e*astião 'randt/ 9 autor da c2le*re A nau dos loucos escre$eu, entre os anos de <= e
a #tália mer"ulhada na "uerra, os eruditos concluíram que o chifre sim*oliza$a o or"ulho e a am*i6ão; as asas, a le$iandade e a inconst.ncia; as "arras, a usura e a rapina; os olhos, a a$areza; os dois sexos, a sodomia/ 9 ípsilon redentor indica$a, contudo, que as $irtudes ainda eram possi$elmente recuperá$eis/ essas circunst.ncias, como não acreditar em monstros] Claude appler lem*ra muito *em que o mundo parecia saturado RO RN de coisas pasmosas, incenti$ando U desco*erta diuturna de mara$ilhas, umas mais impressionantes que as outras/= -on"e de se mostrarem incr2dulas, as pessoas se"uiam manifestando uma impressionante capacidade de assom*rar4se, de admirar4se e se"uiam reproduzindo as fá*ulas com as quais se deleita$am/ RD iii/ A am*í"ua $itria da razão e as armadilhas da natureza %onstros não são homens; e se o são, tam*2m são filhos de Adão/ !anto A"ostinho, A cidade de +eus, HV#, D Ao lon"o do s2culo xi$, homens como icolau 9resme e @enrique de @esse a*riram fo"o contra o que considera$am supersti61es/ %al"rado tais esfor6os, a cren6a em monstros te$e $ida lon"a/ em os conhecimentos proporcionados pela expansão ultramarina puseram fim a essa tradi6ão/ 5 mais: o*ras li"adas a ela continua$am a ser repetidamente editadas, como 2 o caso do -i$ro da natureza, de Conrado %e"en*er" N=E, fartamente ilustrado com ciápodes, mulheres *ar*adas e homens com seis *ra6os, enquanto autores modernos insistiam nas $elhas interpreta61es/ 7ue lu"ar teriam, então, o
extraordinário e o ina*itual no interior da ordem da natureza proposta pelos homens do )enascimento] a $erdade entre ciKncia e ma"ia, o pensamento renascentista oscila$a/ Cometas, monstros, dia*os, feiticeiras, poderes misteriosos eram seriamente discutidos por homens R< doutos/ 5ntre a ma"ia natural, que era a arte de produzir efeitos mara$ilhosos "ra6as ao sa*er superior do ma"o, e a ordem ha*itual dos e$entos as fronteiras eram tKnues/ 9 pro"resso da consciKncia decididamente não passa$a pela reei6ão do o*scuro, do $a"o e do *izarro em detrimento do racionalismo triunfante/ 9 ponto de $ista de dois cosm"rafos do s2culo x$i M ou sea, de especialistas modernos em astronomia descriti$a M, !e*astião %unster e Andr2 &he$et, compro$a como era difícil afastar4se da autoridade dos autores ditos Zanti"os\ so*re os monstros/ &he$et =Q>4 %e"ando ter $isto a mantícora nas costas do mar Vermelho, ele apro$eita para reproduzi4la em sua o*ra, tal como ela á tinha sido impressa no mapa de @eresford a partir da descri6ão feita por Ct2sias/R A _nica diferen6a 2 que na no$a $ersão ela não mostra$a seu ra*o de escorpião, nem seu apetite antropofá"ico/ 9 francKs tem, contudo, de onde extrair tanta informa6ão/ a introdu6ão de sua @istria uni$ersal, &he$et cita o Pol(histor, de !olinus, essa esp2cie de $ersão portátil da imensa o*ra de Plínio, como sua melhor fonte/ !enhor de uma pena prolífica e
"ozand "oza ndo o de "r "ran ande de pr pres estí tí"i "io o, o ca cart rt" "r raf afo o fo foi, i, cont co ntud udo, o, du dura rame ment nte e at atac acad ado o po por r su sua a i" i"no nor. r.nc ncia ia e cred cr edul ulid ida ade de, , po poi is, al2 l2m m de re reco corr rrer er U tr trad adi6 i6ão ão inau in au"u "ura rada da pe pelo lo au auto tor r da @i @ist str ria ia na natu tura ral, l, &h &he$ e$et et colo co loca ca$a $a4 4se co como mo te tes ste temu munh nha a oc ocul ular ar da me mesm sma/ a/ 9 procedimento não era, toda$ia, $ão ou in"Knuo/ 8m dos do s po pont ntos os co comu muns ns U ma maio ior r pa part rte e da das s hi hist str ria ias s do )enascimento 2 a autoridade que elas procuram extrair da experiKncia pessoal ou, mais exatamente, do reconhecimento ptico/ 9 fato de ter $isto com os prprios olhos *asta$a para "arantir os testemunhos mais in$erossímeis/ A precedKncia da $isão so*re os outros sentidos, como o demonstrou Lran6ois @arto",= representou uma constante epistemol"ica da cultura "re"a, de @omero a Aristteles, su*sistindo no seio das da s pr prát átic icas as hi hist str ric icas as da #d #dad ade e %2 %2di dia/ a/ 'e 'ern rnar ard d Guen2e tam*2m demonstrou a perenidade da hierarquia $isa, audicta, lecta, e nesse sentido os $iaantes do início do )enascimento pertencem, na maioria, a essa cultura histrica fundada no primado do olhar, que se alterna$a com o ou$ir4dizer, 9 mesmo procedimento encontraremos entre os cronistas de monstren"os de nosso mundo luso4americano, que, tal como co mo se seus us con onte temp mpor or.n .ne eos eu eur rop opeu eus, s, re reme meti tiam am ao estoque de ima"ens acumuladas nas $is1es de Plínio ou @erdoto menos para recolher dele uma informa6ão do que para reafirmar um olhar, uma $oz que tudo ustificaria/O ão se trata apenas de testemunhos da sensi*ilidade real, mas de um lu"ar o*ri"atrio de toda a retrica descriti$a/ Para o Zfilsofo natu na tura ral\ l\, , ta tal l pr prát átic ica a co cons nsis isti tia a nu num m im impe pera rati ti$o $o cate"rico: Z5u $i, então 2 assim[\ 9 olhar, fonte de cer certez tezas as int intele electu ctuais ais, , com como o *em su* su*lin linha ha Lra LranY nY -estrin"ant, deri$a$a de uma pro*lemática de autoridade, e não do re"istro de uma percep6ão/ 9 impe im pera rati ti$o $o do ol olha har r pe pess ssoa oal l ac acom ompa panh nha$ a$a4 a4se se mu muit ito o eficazmente do tra*alho de compila6ão enciclop2dica, asso as soci cian ando do4s 4se e in inex extr tric ica$ a$el elme ment nte e a es este te/ / Ap Apen enas as a partir do momento em que a o*ser$a6ão direta fará al"uns pro"ressos 2 que o monoplio do olhar será colocado em questão/N
Zão há\, dizia &he$et no prefácio de sua Cosmo"rafia do -e$ante, Zsa*er mais acertado do que aquele que nos 2 dado pela $isão/\ 9u ainda: Z+e todos os sentidos da natureza, o olhar humano 2 o mais ati$o\/D 5 apro$eita para contar de seu enco en cont ntro ro co com m a ma mant ntíc ícor ora, a, qu que e de desc scre re$e $e co como mo Zu Zum m monstro "rande como um ti"re, mas sem cauda, cua ca*e6a era como a de um homem Q adulto\ e de outros encontros mais com lo*isomens atacados de melancolia que $a"a$am entre sepulcros de cemit2rios, com pi"meus com*atentes de "ruas, com elefantes africanos e dra"1es que se ataca$am mutuamente, por aí afora/ !e*astião %unster de #n"elheim< foi, como &he$et, um dos autores mais lidos do )enascimento/ Professor em 'asil2ia, !uí6a, esse "rande erudito ensina$a he*reu, teolo"ia, "eo"rafia, astronomia e matemática nessa cidade/ !ua fascinante Cosmo"rafia, pu*licada em =, continha descri61es de todos os países e de todos os po$os, de suas leis e institui61es, merecendo tradu61es em italiano, francKs e latim e reedi6 ree di61es 1es suc sucess essi$a i$as s par para a ate atende nder r ao int intere eresse sse de leitores at2 o s2culo x$iii/ %unster reproduz $árias histrias so*re "rifos, formi"as "uardiãs de ouro, entre ent re out outras ras len lendas das, , ar" ar"ume umenta ntando ndo, , por por2m, 2m, que Zos anti an ti"o "os s in in$e $ent ntar aram am $á $ári rios os mo mons nstr tros os es estr tran anho hos s qu que e fizeram $i$er na Jndia/ &oda$ia, nin"u2m no 9cidente nunca $iu tais mara$ilhas/ %as eu não teria a audácia de du$idar do poder de +eus, que 2 mara$ilhoso em suas o*ras e inefá$el paciKncia\ A desconfiada o*ser$a6ão expressa no texto 2, contudo, es$a es $azi ziad ada a pe pelo lo po pode der r da das s il ilus ustr tra6 a61e 1es s de mo mons nstr tros os: : nos li$ros ilustrados, ciclopes, ciápodes, *lKmias e cinoc2 cin oc2fal falos os hip hipnot notiza iza$am $am lei leitor tores es sei seisce scenti ntista stas/ s/Q Q 5ssa 5s sas s re repr pres esen enta ta61 61es es nã não o de deix ixa$ a$am am ne nenh nhum uma a d_ d_$i $ida da quanto U existKncia de tão fantástica fauna/
%unster $i$ia na mesma cidade que um terceiro erudit eru dito o cha chamad mado o Con Conrad rado o ol olffh ffhart art, , mai mais s con conhec hecido ido como -icostenes/ 5ste pu*lica em ==N o Prodi"iorum ad ostentaorum chronicon, com o recenseamento detalhado de monstros e mara$ilhas que assom*ra$am a &erra em meio a a*undantes pranchas ilustradas, mais numerosas do que as da o*ra de %unster/ #nspirando4 se em %unster e !chedel, que á repetiam a tradi6ão, -icostenes s fez remontar suas histrias mais lon"e no tempo/ )enunciando ao pensamento cosmol"ico e enciclop2dico que $icea$a na 2poca em que escre$eu, -ico -i cost sten enes es pr pref efer eriu iu re reno no$a $ar r la la6o 6os s co com m o mu mund ndo o da ma"ia/ 9 su*título da edi6ão alemã 2: Z#mpenetrá$eis mara$ilhas que +eus criou e dotou de si"n si "nif ific ica6 a6ão ão pa part rtic icul ular ar: : as es estr tran anha has s cr cria iatu tura ras, s, monstros e horrendos fen^menos que desde o início do mundo nos ad$ertem como si"nos da clera di$ina\/ essa que 2 uma das mais curiosas o*ras do s2culo HV#, não se sa*e o que mais admirar: a certeza do autor que, sem nenhum em*ara6o, afirma que os prodí"ios são le"ião ou o zelo paciente com que passou $inte anos a reuni4los] Apontando como marco cronol"ico para o sur"imento de ra6as monstruosas a constr con stru6ã u6ão o da tor torre re de 'a* 'a*el, el, -ic -icost ostene enes s dis discor corda da daqueles que, como A"ostinho de @ipona, $iam nesse e$ento uma pro$a da $ariedade do mundo/ 5le seria, ao co con ntr trár ário io, , um uma a pr pro$ o$a a da cl ler era a de +e +eus us e do merecido casti"o de seus filhos/ #niciando e terminando seu li$ro com duas s2ries de monstros, Conr Co nrad ado o -i -ico cost sten enes es *u *usc sca a pr pro$ o$ar ar qu que e el eles es er eram am o testemunho permanente dos a6oites com os quais, de tempos em tempos, o !enhor fusti"a$a a humanidade/ A pro$a mais e$idente, se"undo ele, esta$a nas repeti rep etidas das "ra "ra$ur $uras as rep repres resent entand ando o a ra6 ra6a a de hom homens ens andr"inos que ilustram, ao lon"o do li$ro, os casos de he herm rmaf afro rodi diti tism smo o co com m os qu quai ais s o sá sá*i *io o su suí6 í6o o se defrontou/ esse período, assiste4se na $erdade a um curioso paradoxo: se a $i $isã são o a" a"os osti tini nian ana a to torn rnar ara a ta tais is mo mons nstr tros os tã tão o
aceitá$eis durante a #dade %2dia que esta não hesitou em reproduzi4los em sua arquitetura, transformando4os em ale"orias da sociedade humana, o s2culo do humanismo, a*andonado U cren6a em dem^nios e na perse"ui6ão a *ruxas e here"es, passa a $er nos monstros uma amea6a do %al/ !e a #dade %2dia se esfor6ara por a*rir o cora6ão a essas imundas criaturas, porque elas faziam parte da o*ra de +eus, al"uns autores da #dade Clássica as considera$am sím*olos da f_ria di$ina e au"_rios de e$entos terrí$eis/ Como era de esperar, o desen$ol$imento da imprensa e a > R posse de uma enorme massa de informa61es recolhidas pelas $ia"ens de explora6ão fizeram nascer uma no$a onda de o*ras so*re zoolo"ia, compará$el aos tratados em ordem alfa*2tica so*re os conhecimentos do mundo, esp2cie de enciclop2dias a$ant la lettre do s2culo xiii/> !e a maioria dos autores da #dade %2dia eram cl2ri"os, os do s2culo x$i eram m2dicos/R Conrad Gesner nasceu em Wurique em =O, fez seus estudos em Paris e !tras*our" e pu*licou em =< o seu @istoria animalium, um calhama6o de QQ pá"inas contendo in_meras "ra$uras/ 9 li$ro, mais tarde pu*licado em francKs, italiano e alemão, trazia uma infindá$el lista, em ordem alfa*2tica, de animais descritos com in_meros detalhes/ 9 hipoptamo, por exemplo, 2 apresentado como pertencente a uma ra6a de ca$alos, pro$a$elmente em fun6ão de seu nome/ 5ntre os animais do o$o %undo, Gesner destaca o arctophitecus, assim descrito: 5xiste na Am2rica uma fera extremamente disforme que os ha*itantes chamam de haut e os franceses, "uenon, tão "rande quanto um enorme macaco africano/ !eu $entre 2 caído, sua ca*e6a e seu rosto são como os de uma crian6a, T///b e quando 2 capturado "rita
como uma criancinha/ !ua pele, de cor cinza, 2 a$eludada como a de um urso; ela s tem trKs "arras em cada p2, tão lon"as quanto quatro dedos, que lhe permitem su*ir nas mais altas ár$ores/ As express1es Za$eludada como a de um urso\ e as trKs "arras dão a solu6ão: trata4se da prosaica pre"ui6a, que Gesner Z$ira\ empalhada e, portanto, de p2/ 9 interessante 2 que o haut de Gesner de$e ter se inspirado na terrí$el fera hom^nima com que &he$et ilustrara sua $ia"em ao 'rasil/ Confundida com a mantícora antropofá"ica do 9riente, a pre"ui6a o*ser$ada pelo cosm"rafo nos trpicos esta$a lon"e at2 do inofensi$o parente re"istrado por ele mesmo no -e$ante[ Gesner conta, com al"uma freq0Kncia, histrias fantásticas, especialmente aquelas narradas pela autoridade dos clássicos, mas tende a a*andonar a id2ia da existKncia de Zhomens monstruosos\, matizando, toda$ia, que em di$ersos momentos Zal"uns esp2cimes de macacos\ ha$iam sido confundidos com Zhomens *izarros\/ 5m*ora a*orde o assunto com certa precau6ão, não resiste em ir *uscar, no territrio da fá*ula, o indefectí$el unicrnio, cua tradi6ão literária era imensa e que conta$a ainda com uma men6ão na 'í*lia: Che"amos, finalmente, U histria de um animal mencionado por di$ersas "entes em todas as partes do mundo por causa de suas "randes $irtudes; conseq0entemente, con$2m comparar com certa aten6ão os di$ersos testemunhos so*re esse animal para a *oa satisfa6ão daqueles que $i$em e a fim de que se resol$a para eles a principal questão que se coloca: existe o unicrnio] Gesner cita as descri61es de Plínio, o Velho, e de 5liano so*re o chifre do fantástico animal, comparando4o aos cornos dos Z*urros sel$a"ens\ da Jndia, dos quais se faziam copos má"icos: Z!e um homem *e*e num tal copo, ele não ficará amais doente; mesmo se ferido, não sofrerá; ele poderá atra$essar o fo"o sem queimar4se, pois não sentirá nada, nem morrerá se colocarem $eneno nesse
copo\ Gesner confirma tam*2m que os unicrnios eram atraídos por $ir"ens, mas acrescenta uma histria posterior, atri*uída U autoridade de um certo oannes &zetzes: um o$em mance*o teria se $estido de mulher, se adornado de ias e se enchido de perfumes para seduzir um unicrnio/ 9s ca6adores não mataram o quadr_pede, limitando4se a extrair o precioso chifre/ 5 Gesner conclui: Zin"u2m amais $iu tal animal na 5uropa, e mesmo os romanos, que faziam $ir toda sorte de animais para seus triunfos militares, nunca mostraram um unicrnio ao po$o = de )oma T///b %as de$emos nos fiar na pala$ra dos $iaantes, daqueles que $ão muito lon"e, pois o animal de$e existir em al"um lu"ar so*re a &erra, uma $ez que seus chifres existem/ +i"amos\, afirma, empurrrando4o para o que eram então os confins da &erra, Zque ele circule na Jndia, na Ará*ia ou no país dos mouros\/ 9s famosos chifres que con$enceram Gesner podiam encontrar4se na loa de qualquer *oticário *em a*astecido e $aliam seu peso em ouro/ !a*emos hoe que se trata$a de presas de nar$al/ Al"uns anos aps a morte de Gesner, fulminado por uma epidemia de peste *u*^nica em =O=, desco*riu4se a $erdadeira natureza do chifre, que foi imediatamente *atizado de 8nicornum falsum e declarado sem $alor/ 9s *oticários rea"iram apre"oando as $irtudes do 8nicornum $erum, encontrado de*aixo da terra e de colora6ão marrom e não *ranca, como seu antecessor/ a realidade, trata$a4se de defesas de mamutes, utilizadas então para reconfortar os doentes ricos e manter crescente a receita dos *oticários/ 7uando se conheceu, finalmente, a natureza do 8nicornum $erum, as pessoas á tinham perdido a f2 nas $irtudes medicinais do chifre, *ranco ou marrom, do unicrnio/
9utro animal mítico a ser mencionado por Gesner 2 a Za$e4do4paraíso\/ 5le não pudera o*ser$á4la diretamente, mas Z$ira\ um desenho en$iado por um certo Conrad Peutin"er pro$ando que tal mara$ilha existia/ Chamada de manucodiatam pelos nati$os das Zilhas %oluchis\ a a$e4do4paraíso não podia amais ser $ista porque não tinha patas, mesmo que Aristteles não admitisse a existKncia de pássaros sem patas T///b 5la não as tem, pois $oa muito alto no c2u/ !eu corpo e sua ca*e6a parecem, pelas dimens1es e forma, com a andorinha, mas as asas e a cauda a*ertas são maiores do que as do falcão e lem*ram as da á"uia/ 9 dorso do macho possui um *uraco no qual a fKmea coloca os o$os, possuindo ela tam*2m no $entre um *uraco análo"o; os o$os são, assim, chocados/ A cauda do macho tem um lon"o fio de cor preta, nem completamente redondo, nem inteiramente quadrado, mas semelhante ao usado pelos cordoeiros: a fKmea fica presa por esse fio enquanto choca/ 7uando Gesner escre$e, sa*ia4se á que o pássaro em questão existia e que ele tinha patas anormalmente "randes para uma a$e do seu tamanho/ Antonio Pi"afetta, o $iaante italiano que acompanhara %a"alhães, o $ira em seu há*itat e o descre$era quando de seu retorno U 5uropa/ Carlos $ fez imprimir sua cr^nica, mas Gesner não a lera/ 9utra histria contada por Gesner so*re animais fantásticos ori"inou, cem anos mais tarde, al"umas descri61es do esuíta !imão de Vasconcellos so*re o *eia4flor *rasileiro/ &rata4se do Z"anso das ár$ores\ #nspirado na descri6ão feita por Conrad $an %e"en*er" e nas opini1es de Al*erto, o Grande, so*re a a$e, Gesner reproduz um trecho da &opo"raphia hi*ernica, que !(l$ester Giraldus Can*rensis redi"ira trezentos anos antes: essa re"ião, a natureza produz numerosos pássaros de forma mila"rosa/ Parecem4se com os "ansos dos p.ntanos, mas são menores/ 5les saem de peda6os de madeira *oiando no mar/ &ais passarinhos, prote"idos por conchas, aí ficam presos pelo *ico e, quando
suas penas crescem, al6am $^o/ Vi, com meus prprios olhos, mais de milhão dessas a$ezitas, unidas a um pau U deri$a, ainda prote"idas por suas conchas, mas á plenamente formadas/ Gesner tinha um ami"o in"lKs: o eclesiástico, m2dico e *ot.nico illiam &urner= que tinha d_$idas so*re essa histria, d_$idas que s faziam aumentar diante das per"untas de Gesner/ ZCheio de desconfian6a\, conta, O N per"untei a um padre, chamado 9cta$ianus, irlandKs por nascimento, que eu sa*ia di"no de f2, o que pensa$a so*re a histria contada por Giraldus/ 5le urou4me so*re os 5$an"elhos que tudo o que Giraldus escre$era so*re os pássaros era $erdadeiro; que ele tinha $isto e tocado, ele mesmo, as a$ezinhas ainda não formadas e que se eu ficasse em -ondres por mais um ou dois meses ele me traria al"umas dessa esp2cie/ &urner transmitiu essa resposta ao ami"o suí6o e este a transcre$eu em latim no seu li$ro: ZPer ipsum, quod profite*atur 5$an"elium, respondit $erissimum esse\ 9 que quer que tenha pensado anteriormente, Gesner não podia du$idar da pala$ra de um padre, urando so*re os 5$an"elhos e afirmando ter tido em mãos ele mesmo tal mara$ilha da natureza/ !ua descri6ão do mara$ilhoso pássaro certamente inspirou, no 'rasil colonial, a do padre !imão de Vasconcellos so*re o *eia4flor, i"ualmente capaz de incrí$eis metamorfoses: misto de pássaro e *or*oleta, ele fica$a com o *iquinho preso ao tronco de uma ár$ore at2 *rotarem as flores das quais se alimentaria/O Gesner te$e um contempor.neo e sucessor, nascido seis anos depois dele/ A diferen6a 2 que o italiano 8lisse Aldro$andi so*re$i$eu a ele por quarenta anos e conce*eu sua o*ra depois da morte de Gesner/N
Aldro$andi nasceu em 'olonha, em de setem*ro de =>>, e, diferentemente de Gesner, pertencia a uma família rica que "oza$a de "rande prestí"io na cidade/ Aos dezessete anos come6ou a estudar direito e artes li*erais, indo depois para Pádua, onde se formou em filosofia e medicina/ 5m =< foi denunciado U #nquisi6ão como her2tico, sendo o*ri"ado a partir para )oma a fim de se explicar/ ? então que encontra o "rande naturalista francKs )ondelet, que inspirou, definiti$amente, seu interesse pelo colecionismo e pelo estudo das mira*ilia/ 9s elementos dessa influKncia encontram4 se no seu @istoria monstrorum, pu*licado em O>, RN anos depois de sua morte/ Al2m de conter todas as informa61es zool"icas, histricas, culturais e mitol"icas possí$eis so*re cada animal, o alfarrá*io discutia as ra6as monstruosas, as Zmonstra "entium\; nem tão monstruosas assim, pois os filhos sempre se pareciam com os pais: ZPodemos, certamente, chamá4las monstros, mas para os ha*itantes dos países onde $i$em elas não tKm esse nome, pois não lhes inspiram nenhum espanto\D 5 mais: muitos monstros nasciam em desertos onde não podiam ad$ertir nin"u2m/ Com essa l"ica, Aldro$andi renuncia$a U id2ia de que os monstros eram puros pressá"ios, empurrando os estudos teratol"icos em no$a dire6ão/ !e"undo ele, a import.ncia das causas físicas, de mudan6as na histria da 5uropa e das desco*ertas "eo"ráficas e climáticas permitia apresentar no$as conclus1es/ 9s tradicionais cinoc2falos seriam, em seu raciocínio, macacos capazes de imitar o homem/ 5 os sátiros e centauros, apenas dem^nios que toma$am essa aparKncia para en"anar os homens; mas, afinal, em tempos em que o cristianismo ha$ia $encido o pa"anismo, esta$a4se li$re de tais amea6as[ a 2poca em que $i$eram Gesner e Aldro$andi, notícias so*re animais e mara$ilhas das re"i1es recentemente desco*ertas che"a$am U 5uropa/ ão ha$ia a*und.ncia de informa61es por raz1es *anais, como a dificuldade de circula6ão de li$ros e
impressos, mas, aqui e ali, $iaantes e cronistas descre$iam, com o olhar europeu, o que ima"ina$am estar $endo/ 9 m2dico e *otanista francKs Charles -2cluse,< conhecido tam*2m por Carolus Clusius, a quem se atri*ui a introdu6ão da *atata no Velho Continente, foi pro$a$elmente o primeiro a descre$er um pin"0im, so* o nome de Z"anso de %a"alhães\/ 5le menciona i"ualmente os espantosos peixe4*oi, o pássaro dodo e o lKmure/ 9s espanhis, por sua $ez, en$ia$am relatrios minuciosos, como foi o caso da pioneira @istoria "eneral ( natural de las Jndias, de D < Gonzalo Lernandez 9$iedo ( Vald(/ Passa"ens foram impressas em !alamanca, em =R=, mas a edi6ão completa s apareceu em DR=/ 9 esuíta os2 de Acosta, de retorno pouco depois U 5spanha, pu*licou em =DD um curto li$ro consa"rado a pro*lemas aparentemente complicados: como os animais encerrados na Arca de o2 teriam che"ado U Am2rica] 9u a que "i"antes pertenceriam os ossos que encontrara no o$o %undo] Lilipe ii pro$a$elmente leu essa o*ra/ 5m todo caso, deseoso de informar4se melhor so*re os no$os domínios, ele en$iou seu m2dico, Lrancesco @ernandez, ao %2xico para recensear animais, plantas e minerais/ @ernandez consa"rou muitos anos a essa pesquisa, mandando fazer mais de >QQ ilustra61es para o li$ro/ )edi"ido em latim, este foi finalmente impresso, mas de maneira incompleta, em )oma, no ano de O>D/ 9s holandeses tam*2m se interessaram em desco*rir a natureza e seus se"redos no o$o %undo e, em ORN, o conde oão %aurício de assau en$iou dois homens ao 'rasil/ &odos os dois eram m2dicos: o holandKs Guilherme Piso, da cidade de -eiden, íntimo das disciplinas m2dicas e mineral"icas, e o alemão or"e %ar"ra$e, de -ie*stad, perto de %eissen, na
!ax^nia, i"ualmente preparado para a tarefa/ 5m*ora ti$esse apenas >N anos quando de sua partida, ele conhecia *astante *em o li$ro de Gesner a ponto de referir4se $árias $ezes a ele em sua o*ra so*re a zoolo"ia sul4americana/ 5ra tam*2m um astr^nomo amador muito há*il, mas, infelizmente, suas o*ser$a61es so*re o c2u austral amais foram pu*licadas/ 5m O, $oltando para a 5uropa, %ar"ra$e passa pela frica 9cidental, onde cai doente e morre/ Piso reuniu todos os seus escritos, le$ando4os para os Países 'aixos e entre"ando4os a oão de -aet, um dos diretores da Companhia @olandesa das Jndias 9cidentais, que os pu*licou em OD/ A o*ra continha quatro partes, redi"idas por Piso, so*re os pro*lemas m2dicos do que 2 hoe o 'rasil setentrional e =Q oito partes, escritas por %ar"ra$e, so*re a histria natural da mesma re"ião/ 8m ano depois, oão %aurício de assau comprou todas as ilustra61es ori"inais da Companhia, oferecendo4as como presente ao "rande eleitor, Lrederico Guilherme de 'randem*ur"o/ %ar"ra$e dá a primeira descri6ão dos numerosos animais do o$o %undo e acrescenta outros detalhes Uqueles que á eram conhecidos, como o lhama e os *eia4flores/ 5le faz, so*retudo, uma declara6ão capital cua import.ncia s foi reconhecida mais tarde: nenhum dos animais americanos 2 idKntico aos europeus/ +os cronistas portu"ueses que escre$em no 'rasil colonial, como 2 o caso de Am*rsio Lernandes 'randão ou frei Vicente de !al$ador, nenhum ficou conhecido fora de Portu"al como o foram esses dois autores/>Q A o*ser$a6ão das mara$ilhas da natureza continuou a o*cecar o 9cidente moderno, e estas se"uiam sendo mat2ria so*re a qual se sonha$a/ 5m OQ>, nascia em Geisa, na Alemanha, o futuro padre esuíta Athanasius ircher/ #nstalado em )oma, ele ensinou matemática e he*raico at2 OR, quando resol$eu
a*andonar o ensino para dedicar4se ao estudo da arqueolo"ia e dos hier"lifos/ Pouco tempo depois de ter se aposentado, in$enta a lanterna má"ica/ Posteriormente, ircher 2 cati$ado por notícias e estudos so*re animais, $ulc1es e planetas/ +esse seu interesse resultaram trKs li$ros/ 9 primeiro 2 o curioso Via"em estática, pu*licado em O=O, em que o autor, conduzido pelo ano Cosmiel, analisa as condi61es de $ida nos planetas, *aseado em concep61es astrol"icas/ 9s animais são analisados em A arca de o2, datada de ON=/ 5le enumera todos os animais em*arcados, tendo assim Zescapado ao dil_$io\ e reproduz as aulas em que $iaaram at2 as á"uas *aixarem/ Aquele so*re os $ulc1es compreende dois $olumes in4flio: +os mundos su*terr.neos, em que tenta explicar os $ulc1es pela existKncia de numerosas "rutas = su*mersas, normalmente inundadas de á"ua ou de fo"o/ Al"umas eram ha*itadas por dra"1es, o que explica$a a raridade dos ditos monstros/ Al"uns deles, encontrados por heris, pertenciam a esp2cies que tinham cometido o erro de sair U superfície da &erra, não encontrando depois o caminho de $olta, pois terremotos teriam o*struído sua passa"em para o centro da &erra/ Autores como Gesner e Aldro$andi, entre os demais citados, são os mais representati$os da literatura científica do período/ Perce*emos como seus textos, marcados pela $isualiza6ão, emprestam extratos da natureza para materializá4los em sonhos ou em pesadelos/ ? como se, U for6a de olhar a $ida com excessi$a curiosidade, tais autores a $issem mudar de rosto, transformando4se e recompondo4se no plano do onírico, do fe2rico e do fantasma"rico/ ada parece ar*itrário na constru6ão desse outro mundo que s eles conhecem/ %undo que se constitui U ima"em e semelhan6a do mundo sensí$el, mas apoiado em aparKncias, eri"ido para al2m da l"ica e da razão pensante, U mar"em da *iolo"ia: humanidades,
faunas e floras monstruosas ou mara$ilhosas cua *izarria parece fundar4se num íntimo e transcendente conhecimento dos trKs reinos da natureza/ +urante o )enascimento, os monstros saltaram da zoolo"ia para os espetáculos e os textos literários/ +a #n"laterra $Km os exemplos mais representati$os/ esse caso, exorcizar a an"_stia diante da inse"uran6a política e econ^mica que se $i$ia no s2culo x$i e no início do x$ii parece ter sido uma das fun61es das ima"ens fantásticas e monstruosas/> @omens e mulheres pertencentes Us classes su*alternas, em *usca do Znunca dantes $isto\ empurra$am4se nas feiras para $er os adestradores de ursos ou de *a*uínos recentemente che"ados da frica/ 5m A tempestade, de !haYespeare, &rinculo ar"umenta com Cali*an: g estranho peixe[ !e esti$esse na #n"laterra, como esta$a outrora, eu não precisaria mais do que exi*ir uma pintura deste peixe para que todos os idiotas e curiosos me atirassem uma moeda de prata/ -á, este monstro nos enriqueceria; lá, *asta um estranho animal para tornar um homem conseq0ente/ &ais pessoas não dariam um centa$o para socorrer um mendi"o estropiado, mas dariam dez para $er um índio morto/ 9 peixe4cardeal ou um índio nas ruas dacapital não permitiam Us pessoas mais simples participar de lon"ínquas $ia"ens a$enturescas] 9telo não entret2m +esdKmona contando4lhe so*re cani*ais e *lKmias] Cali*an, ele mesmo, não 2 um ser monstruoso, o*ra de uma feiticeira]>> Prodí"ios e monstros circula$am tanto em pe6as de teatro como em *rochuras *aratas que anuncia$am nascimentos monstruosos e apari61es no c2u/ 'en onson refere4se a esse "osto pelo inslito no final do prlo"o de Cada homem com seu humor, quando interpela os espectadores: ZVs que tantas honras fazeis aos monstros, poderíeis amar os homens]\ 5m =<, &homas ashe pu*lica uma curiosa *rochura, intitulada 9s terrores da noite, na qual se sucedem,
entre a ironia e o *om senso, as id2ias correntes da 2poca: a noite, o mal, o príncipe das tre$as, o inferno/ Por meio delas, o autor *usca explicar os sonhos, esse Zfer$ilhamento de espuma da fantasia que o dia não di"eriu\, *em como as Z$is1es e apari61es\ noturnas/>R As lentes do olhar U noite equi$aleriam a lentes de aproxima6ão, capazes de transformar cada raio de luar num "i"ante/ 9 humor melanclico, por sua $ez, seria o responsá$el por en"endrar Z$árias coisas deformadas em nossa ima"ina6ão\ o período elisa*etano, o monstruoso e o inexplicá$el enraízam4se na som*ra e associam4se aos terrores da noite/ o primeiro ato de _lio C2sar, de !haYespeare, Casca descre$e a acumula6ão de prodí"ios que inundaram a noite => =R romana: um som*rio leão que, mirando4o com um olhar extraordinário, cruzou seu caminho sem fazer4lhe mal, uma tempestade de "otas de fo"o, a mão esquerda de um escra$o que ardeu como $inte tochas, cem mulheres transformadas em espectros que assistiram a uma ciranda de homens em fo"o/ Z7ue não se di"a que são coisas naturais e que se podem explicar\, pondera, Zpois para mim são pressá"ios de "randes transforma61es/\ Aqui, o monstruoso 2 aquilo que escapa U ordem natural/ 9 mesmo ponto de $ista 2 confirmado por 'en onson, que, em 9 alquimista, critica os des$ios da norma, que Zfo"em U natureza\/ 9 monstro li*era todas as possi*ilidades, criando an"_stias, enquanto a razão oscila/ &anto na literatura como no teatro, o superlati$o e o aterrorizador se unem ao mal2fico para criar $is1es ale"ricas como aquela de 'rutus, no mesmo _lio C2sar, so*re a a*stra6ão corporificada que 2 a Zconspira6ão\ liderada por encapuzados que che"am U noite/ 5 ele per"unta: Z5ncontrarás tu uma ca$erna *astante escura para esconder tua face monstruosa]\:
5dmond !pencer, outro autor teatral in"lKs do final do s2culo HV#, fa*rica$a, ele tam*2m, persona"ens extraídos dos *estiários medie$ais, mas tratados na forma maneirista de sua 2poca/ a mais importante de suas pe6as, A rainha das fadas, o persona"em Lantastes, misto de sá*io e melanclico dedicado Us ati$idades intelectuais, 2 um criador de monstros e de animais fantásticos/ > 5ntre os textos satíricos que proliferam paralelamente Us querelas reli"iosas que sacodem a #n"laterra, al"uns atores sociais são transformados em monstros/ ? o caso, por exemplo, dos esuítas descritos por +eYYer, na tradi6ão dos monstros compsitos, com Zuma fisionomia de harpia, a ca*e6a de uma raposa, o corpo co*erto de pele de cordeiro, a $oz de mandrá"ora, cuos "ritos transpassam a ponto de matar quem os ou$e\: %ais al2m, confundindo o monstruoso e o demoníaco, o padre da Companhia de esus não Z2 nem um pássaro, nem -e$iatã, mas a essKncia do dia*o e mostra cores mais $ariadas do que um arco4íris\/ +entro da mesma tradi6ão, na Alemanha, %elanchton faz imprimir um folheto com a ima"em de mula escamosa, de cuas náde"as *rota um repu"nante dem^nio, sim*olizando o papado/>= Criando uma atmosfera de tons *ruxuleantes e som*rios, na qual todos os excessos e trai61es parecem possí$eis, teatro e literatura colocam em cena espíritos do mal e f_rias, transformando a inquieta6ão social em amea6ador pressentimento da re$olu6ão puritana que "runhia Us portas da #n"laterra/ a mesma 2poca, um m2dico autodidata escre$eu um li$ro que re$olucionou o campo da monstruosidade no )enascimento/ &rata4se de Am*roise Par2/>O ascido na pequena localidade de 'our"4@ersent, Lran6a, em =Q>, Par2 interessa4se desde cedo pela medicina, instalando4se, em =R>, como Z*ar*eiro\ em Paris/ Como resultado de seus conhecimentos so*re hemorra"ias e m2todos de amputa6ão de mem*ros postos em prática durante o cerco de Carlos $ a %etz, foi
recomendado por #sa*el de Al*ret a @enrique ii, que o con$erteu em cirur"ião real/ Par2 ser$iu sucessi$amente a Lrancisco ii, Carlos ix, quando de$e ter cruzado com &he$et, e a @enrique iii/ 5m == foi nomeado mem*ro do Col2"io de !ão Cosme, apesar da resistKncia dos professores da !or*onne, que não podiam tolerar que fosse ele$ado a tal di"nidade quem nem sequer fala$a latim/ !eu li$ro, %onstros e prodí"ios, pu*licado em =N=, suscitou a ira da faculdade de medicina e uma autKntica querela por atentado aos *ons costumes que s terminou diante do Parlamento/ 5m =N 5m seu tratado so*re os monstros, ele enumera as causas que pro$oca$am deforma61es e des$ios or".nicos nos homens ou nos animais/ 5las eram, se"undo ele, treze: as duas primeiras li"a$am a monstruosidade a um pressá"io/ o primeiro caso, o = == pressá"io proclama$a a "lria de +eus; no se"undo, anuncia$a um si"no de sua clera como foi o caso do filho de )o*erto, o Piedoso, nascido com cara e pesco6o de "anso/ !e"uiam4se outras raz1es comumente admitidas na 2poca, como a excessi$a quantidade de sKmen, a mistura de $ários semens, a corrup6ão e podridão de certos resíduos no _tero feminino, as enfermidades acidentais ou hereditárias/ A d2cima se"unda explica$a4se pela ima"ina6ão excessi$a da mãe durante a "ra$idez/ Crian6as de pele escura, nascidas de mães *rancas, eram atri*uídas U contempla6ão de quadros ou pinturas so*re mouros/ 5m =N M ele exemplifica M nascera na cidade de 'ois4 le4)o(, Lran6a, um menino com cara de sapo, pois sua mãe ti$era uma rã nas mãos pouco antes de conce*er/ 8ma menina co*erta de pKlos, disforme e repulsi$a, era conseq0Kncia de uma ima"em, em que são oão
aparecia co*erto de peles de urso, fixada aos p2s da cama de sua mãe/ A d2cima terceira razão pela qual se en"endra$am monstros era a participa6ão ati$a do dia*o e de *ruxos: Z@á *ruxos e ma"os, en$enenadores, mal$ados, astutos, en"anadores que realizam o dito pacto que fizeram com os dem^nios, de quem são escra$os e $assalos\>D 9 que 2 um monstro no )enascimento] Par2 explica$a como um Zdes$io\ em rela6ão ao curso normal da natureza/ Al"o para al2m da natureza e do ordinário das coisas/ +essa forma, concorda$a com A"ostinho, que dizia que nada era Zcontra a natureza\: ZComo pode ser contra a natureza o que se produz por $ontade de +eus, no momento em que a $ontade de um tão imenso Criador 2 a natureza de todas as coisas criadas]\>< 5ssa defini6ão, se"undo ean C2ard,RQ funda a equi$alKncia entre o raro e o monstruoso/ 9ra, o raro podia ser tanto o que acontecia esporadicamente como o que fosse sin"ular: assim, a $irtude do ímã 2 rara, mesmo que ela amais deixe de se manifestar/ Assim tam*2m o curso natural das coisas 2 ao mesmo tempo o comum, o que acontece ha*itualmente e, mais especificamente, aquilo que se conforma U ordem da natureza/ 5sta, por sua $ez, realizando as formas criadas por +eus, tinha o poder de trazer U luz seres que reproduziam um arqu2tipo, di$ersificando4o/ 5ssa capacidade de $aria6ão, lon"e de amea6ar a ordem da natureza, auda em sua constitui6ão, pois, afinal, o que seria dela se todos os seres, entre si, fossem a*solutamente idKnticos] ão ha$eria mais ordem, mas confusão/ 9 curso natural das coisas determina$a precisamente essa composi6ão de semelhan6as e diferen6as que li"a cada coisa a seu "Knero enquanto asse"ura sua sin"ularidade/ Correlati$amente, o monstro 2 o ser no qual a diferen6a tende a acentuar4se em detrimento da semelhan6a/ &al defini6ão alar"a$a enormemente o campo da monstruosidade/ 5ram consideradas monstruosas as ra6as de homens que supostamente $i$iam em lon"ínquas para"ens,
distanciados da forma comum de homens: os arimaspes, dotados de um _nico olho; os astomes, sem *oca, que $i$iam de perfumes; os ciápodes, donos de um _nico e imenso p2, e ainda os "i"antes, an1es e todos aqueles cua confi"ura6ão física, ou os mores, afasta$am4se do comum, como os tro"loditas ou os antropfa"os/ +a mesma maneira tinham4 se por monstros seres $i$os que, semelhantes aos pais, se afasta$am da forma comum de seu "Knero: assim o a$estruz, um pássaro, mas um pássaro que não $oa/ 9u o peixe4$oador, que, como o nome indica, $oa, ou ainda o tucano, cuo *ico 2 desproporcional em compara6ão aos outros pássaros/ #ndo mais lon"e, a ciKncia não se limita$a aos seres $i$os/ 5m rela6ão Us chu$as, uma chu$a de san"ue ou de rãs seria um monstro/ 5m rela6ão aos meteoros, um cometa ou um eclipse mereceriam a mesma denomina6ão etc/ o que diz respeito U participa6ão do dem^nio na fa*rica6ão de monstros, Par2 encontrou um se$ero anta"onista no c2le*re =O =N alquimista Paracelso/ 5ste se recusa$a a admitir a inter$en6ão tan"í$el e material do mali"no, fosse como íncu*o ou s_cu*o no ato da "era6ão, considerando4a impossí$el/ 5m seu &ratado das mol2stias, estende4se so*re os malefícios que podiam exercer os dem^nios, mas para ele tudo não passa$a de uma a6ão espiritual/ 5m se tratando de puras a*stra61es pri$adas de carne, o _nico poder que podiam exercer era aquele de mo$imentar os corpos e mudá4los de lu"ar, mas era4lhes impossí$el tocá4los/ Paracelso compara sua influKncia U dos astros so*re os fen^menos naturais/R %as se Paracelso se op1e tão claramente U teoria da "Knese demoníaca 2 porque ele tem um sistema terato"Knico prprio, exposto no seu +a "era6ão humana/ Partindo da existKncia de monstros duplos,
ele se coloca a per"unta: como homens podem $ir ao mundo com duas ca*e6as, mem*ros e dedos em excesso] 5 responde que isso se relaciona a acidentes com o Zlicor $ital\/ 9 processo seria o se"uinte: a semente destinada U ca*e6a, por exemplo, separa4se em duas correntes, enquanto aquelas que de$em formar as outras partes do corpo se"uem untas, resultando, naturalmente, na apari6ão de anomalias/ 7uanto a outras monstruosidades relacionadas com a fi"ura de tal e qual animal, sup1e4se que estas se de$iam U in"estão de *e*idas ou alimentos que continham um "erme de qualquer *icho; esse "erme, e$oluindo no seio de uma esp2cie diferente, le$aria U produ6ão de um monstro/ @a$ia ainda outra teoria teratol"ica so*re a qual o alquimista se manifestou: a de que os astros podiam ser responsa*ilizados por nascimentos monstruosos/ 5ndossada por $ários astrlo"os, a tese propu"na$a não ser raro o aparecimento mais freq0ente de monstros nos países quentes/ !ão er^nimo á tinha esse ponto de $ista/ Para o renomado ceno*ita, a do6ura do clima "aulKs explica$a a raridade dos hí*ridos que pulula$am, ao contrário, na frica 5quatorial/ 9s astrlo"os, por sua $ez, eram cate"ricos: trata$a4se do distanciamento que VKnus toma$a do zodíaco/ 9utros calcula$am que, se a -ua se encontrasse em certa conun6ão no momento em que a mulher conce*esse, resultaria um ser disforme, como os que $emos retratados nas "ra$uras Zcientíficas\ de +0rer e @ans 'ur"Ymair/R> Podemos, tal$ez, nos per"untar como a #"rea permitiu o desen$ol$imento da astrolo"ia, pois nesse ní$el ela amea6a$a diretamente a f2/ ão apenas a ciKncia das estrelas trazia para o 9cidente cristão uma das formas mais desmoralizantes de idolatria, como, colocando4se so* a dependKncia dos astros, a #"rea deixa$a o cristianismo no mesmo ní$el de outras cren6as/ A poderosa institui6ão, toda$ia, rea"iu: Cecco dFAscoli foi queimado na fo"ueira porque ousara interro"ar as estrelas para audá4lo a calcular a data do nascimento de Cristo/ %as, como
á o demonstrou 'urcYhardt em sua o*ra clássica,RR nunca, desde a Anti"uidade, a astrolo"ia foi tão considerada: o papa _lio ii não fizera calcular por astrlo"os o dia de seu coroamento] Paulo iii, a hora de cada consistrio] 9 humanismo, na $erdade, fa$oreceu enormemente o papel da astrolo"ia, cuo sa*er confirma$a, por mil testemunhos, a concep6ão astrol"ica da causalidade; essa concep6ão penetrou toda a filosofia da natureza, da mesma maneira que deu *ases para a constru6ão das id2ias de enciclopedistas e telo"os, da física e das ciKncias naturais/ A id2ia da estreita rela6ão entre o microcosmo e o macrocosmo se"uia em $i"or, sendo o fundamento da histria natural e daquela dos monstros/R A *ordo dos mais $ariados textos so*re a natureza, a medicina, o teatro, os astros ou a reli"ião, toda uma constela6ão de id2ias teratol"icas atra$essou inclume o período medie$al e renascentista/ 9s monstros, eles mesmos, não ti$eram de Zressuscitar\ numa ou noutra 2poca, pois eles amais ha$iam desaparecido da memria e da ima"ina6ão dos homens/ 7ualquer que =D =< fosse sua forma, filhos da desordem e da deformidade, inimi"os do *elo, eles pareciam in$estidos de uma missão especial/ 9*eto fa*uloso, incapturá$el e inexprimí$el, foram considerados, ao lon"o desses tempos, como um a$iso di$ino ou um pressá"io funesto/ i$/ o reino, sem limites, do inslito a &eo"onia de @esíodo, as harpias são di$indades aladas, e de ca*eleira lon"a e solta, mais $elozes que os pássaros e os $entos; no terceiro li$ro da 5neida, a$es com cara de donzela, "arras encur$adas e $entre imundo, pálidas de uma fome que não podem saciar/ +escem das montanhas e conspurcam as mesas
dos festins/ !ão in$ulnerá$eis e f2tidas; tudo de$oram, "uinchando, e tudo transformam em excremento/ or"e -uis 'or"es, 9 li$ro dos seres ima"inários !eria pueril ima"inarmos que os naturalistas e *ilo"os do s2culo x$ii, os mais arrai"ados Us formas tradicionais do sa*er, tenham dado as costas U natureza, passando a considerar a ciKncia como pura "inástica ou contorcionismo l"ico/ 5les continua$am con$encidos de que a experiKncia era o _nico meio para compreender os fatos e a primeira $irtude do sá*io/ Pensa$am, ainda, que a autoridade dos anti"os, como Plínio ou Aristteles, não podia continuar sendo um ar"umento decisi$o/ o tocante Us monstruosidades, contudo, a experiKncia OQ O continua$a a pre"ar pe6as e as certezas pareciam cada $ez mais distantes/ Lortunio -iceti, m2dico do s2culo HV##, afirma$a, por exemplo, que Ztodos os filsofos de$iam se"uir o ul"amento dos sentidos nas coisas da natureza\/ 9 sentido e a experiKncia permitiam4lhe descre$er, com muita seriedade, que, Zdepois que um celerado ti$era rela61es sexuais com uma $aca, esta ficara cheia e dela nascera um menino, a*solutamente idKntico a um homem, inclinado apenas, como a mãe, a pastar e ruminar as er$as do campo\/ 5m OR<, quando um "rupo de m2dicos se reuniu na cidade de Adresse para examinar o caso de Zdois irmãos monstruosos $i$endo num mesmo corpo\ as conclus1es não foram muito melhores: a criatura se ori"inara Zde uma constela6ão extraordinária que se encontra$a nos c2us quando de sua concep6ão\/ Volta$a4se Us teses de Paracelso de que a concep6ão do Zo$o humano\, microcosmo do corpo, poderia ser influenciado pelo mundo astral ou sideral/
%as o que si"nificaria, finalmente, para esses sá*ios e doutores a tal ZexperiKncia\ e o Ztestemunho dos sentidos\, capazes de explicar4lhes a ori"em e a causa das monstruosidades] ? preciso, inicialmente, lem*rar as condi61es em que essas o*ser$a61es eram feitas/ ão se trata$a de experiKncias metdicas, mas sim de constata61es que os m2dicos iam fazendo ao lon"o de sua prática, ao sa*or dos acidentes que poderiam ad$ir U sua clientela/ !e o doente se curasse, a"radecia4se a +eus, distri*uíam4se felicita61es e não se pensa$a mais no assunto/ !e, ao contrário, ele morresse, era preciso, para entender al"uma coisa, fazer uma autpsia/ 5sta era condenada pelos costumes da 2poca e, ademais, se ti$esse de fazer uma autpsia em cada doente que morresse, a $ida inteira de um m2dico não seria suficiente/ Apenas os fatos excepcionais chama$am a aten6ão do prático/ 5is por que a literatura m2dica a*unda$a em casos surpreendentes en$ol$endo O> criaturas consideradas, então, monstruosas/ A elite m2dica europ2ia não se reunira em torno de um feto desco*erto petrificado no a*d^men de uma mulher sexa"enária e $i_$a ha$ia muito tempo] ? preciso su*linhar tam*2m que o m2dico muitas $ezes não era testemunha ocular do caso que descre$ia/ A maior parte das crian6as monstruosas que ornamentam a literatura m2dica do s2culo x$ii nascera em áreas rurais, lon"e de qualquer m2dico/ 5las entraram no mundo científico tendo como passaporte um atestado assinado por um $elho padre, um cirur"ião *ar*eiro ou uma parteira/ 9 dito certificado era encaminhado ao m2dico da cidade mais prxima, que, em $ez de se mexer para constatar se de fato a crian6a tinha ca*e6a de elefante, duas asas de á"uia e p2s de "alinha, preferia dissertar doutamente so*re os erros da faculdade formadora do _tero feminino num monstro que ele amais $iu, mas so*re o qual não para$a de falar/
5is por que Lortunio -iceti não hesita em acreditar que uma serpente podia copular com uma "alinha; e que dos o$os, em $ez de pintinhos, saíam co*rinhas/ Afinal fora _lia, uma empre"ada, que o $ira[ Como não acreditar que um o$o de "alinha pudesse conter uma ca*e6a de homem eri6ada de serpentes, quando se sa*ia que esse o$o fora desco*erto em Autun, na casa de um ad$o"ado chamado 'aucheron, por uma criada que prepara$a uma omelete] 9 o$o foi en$iado ao *arão de !2neche(, que o ofereceu, por sua $ez, ao rei Carlos ix, que se encontra$a, nesse momento, em %etz, cidade importante no ordeste da Lran6a/ 9ra, o raciocínio era l"ico: se 2 $erdade que o rei Carlos ix, cua existKncia amais foi colocada em d_$ida, este$e em %etz, cidade lorena conhecida por todos, e se 2 $erdade que para preparar4se uma omelete 2 preciso que*rar o$os, o que 2 de notoriedade p_*lica, 2 $erdade tam*2m que o o$o em questão continha uma ca*e6a de homem eri6ada de serpentes/> OR +entro dessa l"ica, se um monstro rural de formas incertas encontrasse em seu caminho um m2dico desconhecido, ami"o de um doutor importante na cidade, e o se"undo quisesse fazer dessa histria uma *oa ocasião para tornar4se famoso, sua fortuna esta$a "arantida[ 9 Zcauso\ seria recolhido por um erudito nos menores detalhes/ 8m sá*io como Par2, -iceti ou qualquer outro o retomaria, pu*licando4o/ !ua ima"em seria en"enhosamente ilustrada por um "ra$ador que nunca $ira nada parecido pela frente, mas que su*stituiria o testemunho dos sentidos pela for6a da ima"ina6ão/ 9 monstro entra$a pomposamente na tradi6ão como um fato uni$ersalmente reconhecido, cuo exame se impunha a qualquer um que quisesse refletir so*re os poderes da natureza/ essa perspecti$a, -iceti che"a a concluir que o o$o de %etz era o resultado do auntamento entre um homem e uma "alinha, explicando: a semente humana, corrompendo4se, formara a ca*e6a e as serpentes,
pois a semente retida se transforma$a num peri"oso $eneno/ 5le mesmo $ira um "ato morrer depois de in"erir a clara do dito o$o/ ão era isso se"uir docilmente as li61es da experiKncia, para explicar os monstros e outros fen^menos da natureza] -em*remos que -iceti, falecido em O=N, era um dos mais importantes professores de Pádua e que seu c2le*re tratado +e monstrorum causis, natura et diferentiis, pu*licado pela primeira $ez em OO, te$e reedi61es em OR, OO= e OOD antes de ser traduzido para o francKs, em NQD/ 9 que aconteceu entre o fim do )enascimento e o início dos tempos modernos 2 que o m2dico ou o sá*io do s2culo x$ii dispunha de uma massa considerá$el de fatos, al"uns remontando a @ipcrates, @erdoto, Aristteles, Plínio e tantos outros, esp2cie de tesouro comum, continuamente enriquecido/ 9 leitor aí encontra$a, misturadas, informa61es so*re um em*rião semelhante a um o$o desco*erto por @ipcrates; a crian6a ne"ra, de O @erdoto, nascida de pais *rancos; as fecundas uni1es entre homens e animais relatadas por Plutarco e por Plínio; o *oi caído do c2u e o*ser$ado por A$icena; a "ra$idez de uma mulher "ra6as a um *anho de piscina, contada por A$erris; a histria de outra que ti$era sete filhos de uma $ez, na $ersão de &ro"uio Pompeu, cinq0enta, na de Al*erto, o Grande, e setenta, na de A$icena, e outras centenas de Zcausos\/ 9s sá*ios modernos não hesita$am em apropriar4se dessas informa61es, animados pelo mesmo "osto do mara$ilhoso que á inspirara autores durante a #dade %2dia/ Aldro$andi, em seu %onstrorum historia, che"a a felicitar4se porque Ztrit1es, sereias, nereidas e outros monstros do mesmo "Knero, al"uns outrora considerados fa*ulosos, re$elaram4se, toda$ia, tal como tinham sido $istos e descritos\ ão ima"inemos, contudo, que esses homens não ti$essem nenhum senso crítico/ 7uando repetiam um fato extraordinário, não
o le$a$am inteiramente a s2rio/ !o*re a histria da mulher que parira setenta filhos de uma $ez, o padre ean )iolan ustifica, em OQ=, que A$icena não Z$iraF apenas Zou$ira\ a informa6ão/ 7uando -iceti lK em Plínio que uma mulher copulara com um elefante, dando U luz um elefantinho, ele, ceticamente, ne"a4se a acreditar/ 5 por quK] Porque, como todos sa*iam, o elefante era um animal considerado muito casto, tendo por há*ito esconder4 se para realizar o ato sexual; como poderia ele, descaradamente, en"ra$idar uma mulher][R e Para separar a $erossimilhan6a daquilo que á se sa*ia, era necessário o apoio de slidas *ases de espírito crítico/ !ão exatamente essas *ases que faltam no s2culo x$ii/ -iceti apenas rea"e U histria de Plínio porque ela 2 contrária ao que, então, se conhecia so*re a $ida dos elefantes/ 9 *om senso não resistia U erudi6ão de enormes *i*liotecas constituídas so*re textos dos anti"os e eis por que se continua$a acreditando, com Plínio, que uma menina tinha nascido dos amores de um homem e uma 2"ua, ou O= com C2lio )odí"io, que uma o$elha parira um leão/ a falta do *om senso, assassinado pela erudi6ão, falta$a aos homens de ciKncia acreditar que a natureza tinha leis re"ulares e acessí$eis U razão humana/ %as essa con$ic6ão fundamental lhes era a*solutamente estran"eira/ A concep6ão de natureza que se exprime, com maior ou menor clareza, entre "rande parte dos m2dicos da primeira metade do s2culo HV## re$ela uma imensa confusão de posi61es/ 9 contraste entre o do"matismo com que pensa$am as doen6as e as incertezas com que se de*atiam ao refletir so*re as opera61es "erais da natureza 2 incrí$el/ 9 que se sa*e 2 que raros eram aqueles que a considera$am um conunto de fen^menos materiais, sensí$eis e mensurá$eis/ 9 exemplo de Galileu passa$a lon"e da maioria dos estudiosos de
monstros e de outros assuntos/ Para estes, exercer sua ciKncia si"nifica$a confrontar4se com um lado da natureza no qual a mat2ria ser$ia de suporte a toda sorte de for6as ocultas/ &ais for6as misteriosas tanto podiam ser instrumento direto da $ontade di$ina quanto podiam ser, ainda, expressão de harmonias e rela61es dissimuladas entre as diferentes partes do uni$erso, i"ualmente incompreensí$eis,= !e quisesse explicar a forma6ão de um monstro, o m2dico podia recorrer a +eus, 5le mesmo, U alma do mundo, Us influKncias dos corpos celestes, U alma da semente fecundante, ao calor inato do corpo humano, U faculdade formadora do _tero, e por aí afora/ 5le podia descartar explica61es so*renaturais, mas nada lhe permitia reeitar as teses indecifrá$eis *aseadas no que seria uma manifesta6ão da natureza/ 5m meio a esse com*ate nas tre$as, a questão da monstruosidade passa a ser relacionada, no s2culo x$ii, a pro*lemas de hereditariedade/ esse período, a hereditariedade M conhecida entre *ilo"os como similitudo ou semelhan6a dos filhos com os pais M 2 explicada de acordo com Galeno, que a distin"uia em trKs formas: a semelhan6a por esp2cie, a semelhan6a por sexo, a semelhan6a pela fisionomia/ 8m homem en"endraria um homem, um ca$alo, outro ca$alo/ Por quK] !e"undo Aristteles, trata$a4se de um efeito da alma, essa Zforma\ de em*rião, que, saída da alma dos pais, não podia "erar outra coisa senão sua prpria forma/ %as, nesse quadro, como fica$am os hí*ridos e os monstros] á $imos que os *ilo"os do s2culo HV## acredita$am piamente no cruzamento de esp2cies diferentes; o o$o de %etz, analisado por -iceti, não os deixa$a mentir[ !e"undo Aristteles, insistentemente in$ocado, o produto seria sempre parecido ao pai/ Com efeito, para ele, uma $aca emprenhada por um homem podia parir um homem perfeito/ ão se ne"a$a que o calor e as qualidades da semente masculina o permitissem/ A $aca, por sua $ez, entra$a como um se"undo a"ente; o calor de seu corpo audaria a or"anizar as partes do
corpo humano/ Aliás, não ha$ia nada de chocante nisso, uma $ez que o leite das $acas alimenta$a crian6as[ %as o monstro torna$a4se em*ara6oso, pois ele era precisamente aquele que não se parecia com seus pais/ Lortunio -iceti, retomando conceitos á expostos, explica$a que sua causa tanto podia ser Zo *om +eus\ como Zo corpo celeste, que por seu mo$imento perp2tuo, e por meio de sua luz, "o$erna e re"e tudo o que se faz aqui em*aixo\ 9utra causa seria o calor da Zmatriz da mãe\ ou pro*lemas com Za $irtude formadora, constituti$a e reor"anizadora das partes do corpo do animal\/ A classifica6ão de -iceti distin"ue dez tipos de monstros repartidos em dois "randes "rupos: monstros uniformes por excesso, mutilados, de natureza ou sexo du$idoso, disformes, sem formas e enormesE ou monstros com $árias formas da mesma esp2cie, de esp2cies di$ersas do mesmo "Knero: crian6as4lo*o; de diferentes "Kneros prximos: crian6a4"anso4rã; de esp2cies diferentes: homem4dia*oE/ Cada tipo de monstro tinha suas causas OO ON particulares que se di$idiam em causas materiais: semente insuficiente em quantidade ou qualidade, _tero materno muito estreito, falta ou excesso de alimenta6ão, doen6a do em*rião/ %as ha$ia, tam*2m, as causas Zformais\: ausKncia de $irtude formadora, a6ão da ima"ina6ão materna/ 8m carneiro com cara de homem ou um homem com cara de ca$alo seriam atri*uídos ao fato de que a alma da semente de"enerara em outra natureza/ Por outro lado, se uma mulher que ti$esse $isto la"ostas durante a "ra$idez desse U luz uma crian6a e uma la"osta, atri*uía4se o fato U for6a de sua ima"ina6ão/ 9s auntamentos irre"ulares "era$am, comumente, seres perfeitos da esp2cie paterna, asse"urando o poder fecundante do
macho/ Por outro lado, uma fKmea que ti$esse se acasalado duas $ezes sucessi$amente, uma de forma re"ular e a outra de forma irre"ular, poderia parir um monstro duplo/ %as as classifica61es de -iceti não são ori"inais e de$em muito a Par2/ !ua ori"inalidade reside em certa precisão de análises e na sutileza das pesquisas so*re as Zcausas\ que não se encontra em seus predecessores/O !eus princípios manti$eram4se por muito tempo/ 5 as duas ordens de causas, materiais e formais, foram, por lon"o tempo, unanimemente adotadas/ A existKncia de "Kmeos cuos corpos esti$essem "rudados será, normalmente, explicada pela quantidade excessi$a de semente para um em*rião mas insuficiente para dois/ A pilosidade excessi$a de uma Zmenina *ar*ada\ era atri*uída U ima"ina6ão materna, que, tratando4se de um a"ente superior, impedia com freq0Kncia a $irtude formadora de realizar seu pro"rama ori"inal/ Pois a ima"ina6ão nascia das $irtudes da alma sensí$el: uma *oa alma en"endra$a *ela ima"ina6ão e $ice4$ersa/ 9ra, $eamos como se da$a a a6ão da ima"ina6ão/ Apresenta$a4se U mulher al"o de seu a"rado; tal o*eto excita$a seu apetite/ 5ste, por sua $ez, mo$ia e comanda$a a potKncia motriz executora das $ontades da dita mulher/ &al potKncia a"ita$a os espíritos, que rece*iam no c2re*ro a ima"em co*i6ada, fecundando a se"uir o em*rião e imprimindo4lhe a ima"em que lhe fora consi"nada/ Apesar das dificuldades, explica61es de -iceti como essa acima e$ita$am as teses astrol"icas e mantinham4se no domínio do Znatural\/ á não eram mais tempos em que o nascimento de uma crian6a disforme era necessariamente atri*uído ao com2rcio sexual entre a mãe e o dia*o, le$ando a primeira direto U fo"ueira/ 9 prprio -iceti s acredita$a em monstros pro$enientes de apenas trKs ou quatro animais diferentes como expressão do esti"ma sat.nico/ 5m seu entender, se *em que +eus &odo4 Poderoso fosse a Zcausa primeira distante\ da existKncia de monstros, so*ra$a outra causa suficientemente distante para que a questão
continuasse, mais tarde, a suscitar interro"a61es/ A faculdade formadora, a"ente da causa final, tinha conexão direta com a mat2ria para que qualquer erro fosse caracterizado como de responsa*ilidade direta da Pro$idKncia di$ina/ Gra6as U Zfaculdade formadora\, a questão dos monstros afasta$a4se do .m*ito teol"ico e restrin"ia4se, pouco a pouco, aos domínios das Zquest1es naturais\/ esses tempos, este não era um m2rito ne"li"enciá$el/ !e qualquer pessoa afirmasse que Za $erdadeira causa do nascimento de monstros 2 a clera di$ina\, poder4se4 ia responder, respeitosa mas firmemente, que isso era sem d_$ida $erdadeiro, mas que a ciKncia não podia responsa*ilizar4se por uma causa dessa ordem/ Como *em diz acques )o"er,N assim se apresenta$a no s2culo x$ii o pro*lema da "era6ão dos animais e, por conse"uinte, da fa*rica6ão de monstros/ Ao final do s2culo x$ii, a ciKncia á era ser$ida por um "rupo exclusi$o de homens que lhe eram inteiramente consa"rados, dotados de meios de comunica6ão relati$amente rápidos e com todo o apoio do poder do 5stado, das uni$ersidades e das academias aos quais ser$iam/ %as para que hou$esse, de fato, pro"ressos era preciso mudar o espírito científico/ OD O< 5 este, pelo $isto, em*ora capaz de manusear com facilidade o microscpio rec2m4in$entado, custa$a a di"erir as no$as exi"Kncias da ciKncia/ ão 2 preciso su*linhar que para os no$os sá*ios todo conhecimento exi"ia experiKncia/ a esteira de +escartes ou de -ocYe, não ha$ia m2dico, *ilo"o ou literato que não proclamasse a necessidade de consultar e de se"uir o conhecimento empírico/ %uito em *re$e, seria necessário pre$enir4se contra a ima"ina6ão dos modernos, fecunda em tentar le"itimar suas experiKncias, pois se aceita$a como empírica toda sorte de histrias fantásticas/
9 primeiro passo dado foi no sentido de reeitar em *loco a massa de fatos herdados do passado, dos anti"os/ 9 desprezo pela erudi6ão, si"no distinti$o do espírito moderno, permitia reconhecer imediatamente os aclitos da no$a ciKncia, aqueles que rene"a$am a tradi6ão, $ista então com maus olhos/ Contudo, ha$ia muitos que mistura$am os canais e apoia$am as o*ser$a61es de -eeuenhoeY, o in$entor do microscpio, com teses extraídas de Al*erto, o Grande/ Ao comentar, em OD, um nascimento m_ltiplo, o ornal dos !á*ios, he*domadário francKs, compara$a4o ao caso de uma condessa holandesa que teria dado U luz RO= filhos, de uma _nica $ez/D 9 ornalista matiza$a: o caso não era totalmente compro$ado/ )ea61es como essa marca$am a reei6ão, ainda que tímida, Us $elhas fá*ulas/ %as não as descarta$am inteiramente, uma $ez que era preciso su*stituir o anti"o acer$o pelo que se considera$am fatos reais/ As pu*lica61es esta$am cheias deles, 9 ornal dos !á*ios, mais uma $ez, fornecia aos leitores uma farta colheita, cuidadosamente selecionada entre as cartas dos leitores e os melhores autores da 2poca/ Al"uns dos tais Zfatos\ parecem surpreendentes 5m OND, por exemplo, uma o$em mia$a, salta$a e perse"uia camundon"os depois de ter in"erido san"ue de "ato quente/ 5m ON<, uma menininha espirra$a pedras pelos olhos/ 5m OD, tratou4se de um o$o recheado de NQ estrelas, depois, de outro contendo a ca*e6a de um hom_nculo/ +ecididamente esse era o ano dos monstros, anuncia$a o ornal[ 5m OD escre$iam da #n"laterra contando a cpula de um rato com uma "ata/ 9 resultado: hí*ridos de "ato e rato, preciosa contri*ui6ão ao estudo dos monstros/ 5m OD=, um camponKs en"olira um camundon"o $i$o, "uardando4o no $entre durante no$e meses, para expeli4lo $i$o oito dias antes de entre"ar a alma a +eus/ 9 ornal da
#n"laterra anuncia$a o nascimento de xifpa"os com a ca*e6a transparente so* a manchete: Z? do orte que $em a luz[\ Ainda no mesmo ano, di$ul"ou4se o caso insti"ante de um macr*io holandKs, com >Q anos, que te$e a "rata surpresa de $er crescer de no$o todos os seus dentes/ 9 caso do ornal dos !á*ios está lon"e de ser isolado/ As Atas filosficas pu*licadas em -ondres manifestam o mesmo "osto pelos monstros, mas a fleu"ma *rit.nica exi"ia que fossem, pelo menos, autKnticos in"leses/ As 5fem2rides "erm.nicas, pu*licadas pela Academia dos Curiosos da atureza, formi"a$am, por sua $ez, de histrias mara$ilhosas no mais puro estilo de Al*erto, o Grande/ 9s prodí"ios mais comumente aceitos eram aqueles creditados U ima"ina6ão das mulheres/ 9$os de "alinha "era$am milhafres, uma crian6a parecia4se com uma $aca, outra com um lo*o, outra com um macaco, sem que isso parecesse inacreditá$el/ A muito sisuda @istria da Academia )eal de CiKncias, na Lran6a, conta como uma crian6a nascera com um rim na ca*e6a porque sua mãe não satisfizera o deseo de comer tal i"uaria; como uma o$elha nascera com pKlos de lo*o no lu"ar do tosão; um menino sem os olhos ou um $eado com escamas de crocodilo em fun6ão de sustos sofridos por suas "enitoras/ &udo isso se explica$a muito naturalmente/ %ais difícil era compreender como uma mulher pode dar U luz uma cadelinha sem interromper a "ra$idez e apesar dos maus4tratos que lhe infli"ia o marido; ou explicar o caso do menino que nascera com um _nico olho, N resultante da união dos outros dois, e com um mem*ro sexual masculino na testa/ A explica6ão] Z!ua mãe, "rá$ida, ima"inou $i$amente tal $ara Tsicb pendurada U sua fronde ao esfor6ar4se em aproximar um olho do outro num sonho, *rincando com seu marido ou olhando fi"uras relati$as Us festas de Príapo/\ VK4se, com nitidez, como esse final de s2culo HV##
oferecia todas as nuances possí$eis entre a credulidade mais in"Knua e a prudKncia científica mais ri"orosa/ Com rela6ão a isso, $ale ressaltar as rea61es suscitadas por uma a$entura que fez *astante *arulho em O
onipotKncia, não admitiria $er seus desí"nios contrariados por qualquer for6a demoníaca/ 9s monstros, afinal, s existiam por sua ordem/ 9 tiroteio atin"iu adeptos do mecanicismo, que defendiam a id2ia de uma natureza passi$a, incapaz de sair de seu funcionamento preciso e re"ulado, enquanto al"uns diziam que +eus deixa$a a"ir as causas naturais para tornar os homens mais atentos U perfei6ão com que foram conce*idos/ 9 pro*lema dos monstros não era no$idade para a ciKncia; tão anti"o quanto o pro*lema do mal, ele se tornara uma de suas faces/ A partir dos finais do s2culo x$ii, toda$ia, ele "anha uma import.ncia particular, e isso so*retudo porque os monstros são al$o de exames cada $ez mais detalhados/Q !a*e4se que o "osto pelas mira*ilia não tinha decididamente desaparecido, a ul"ar pelos $ários exemplos extraídos do ornal dos !á*ios e de outras pu*lica61es de sociedades científicas/ %as os pro"ressos do espírito científico não permitiam mais que se dissertasse so*re um monstro que não ti$esse sido $isto com os prprios olhos/ As Academias passam a examinar, por interm2dio de suas untas, os monstros que lhes são en$iados: anatomistas os dissecam cuidadosamente e re"istros icono"ráficos não deixam escapar o menor detalhe/ &udo 2 cuidadosamente desenhado, pintado, aquarelado/ 9s sá*ios passam a tentar determinar a natureza e a a6ão das causas que os teriam en"endrado/ Para toda uma cate"oria de deformidades, continua4se a N> NR supor a inter$en6ão da ima"ina6ão materna/ Conhece4 se a histria relatada por icolau de %ale*ranche, adepto do racionalismo de inspira6ão di$ina, so*re a crian6a que teria nascido toda retorcida, pois sua mãe assistira ao suplício de um condenado na fami"erada roda/ %al"rado sua "rande autoridade, explica61es como a
do famoso oratoriano não tinham mais cr2dito/ ão apenas porque hou$e a*usos e porque fica$a difícil acreditar em tal poder da ima"ina6ão, mas porque no caso de crian6as semelhantes a animais tais similitudes desapareciam diante de exames realizados com seriedade e sem preconceitos/ A id2ia que se conser$a$a era a de que o Z"erme\, semente ou o$o, teria sofrido um acidente durante a "esta6ão/ 9 acidente considerado mais *anal dizia respeito ao esma"amento de dois "ermes "Kmeos, cua conseq0Kncia era um monstro total ou parcialmente duplo/ &al como as duas menininhas, inteiramente distintas mas li"adas do peito ao um*i"o, de que fala o ornal dos !á*ios em ON>/ A causa mais natural para o esma"amento seria uma contra6ão excessi$a do _tero/ !e"undo o "rau dessa contra6ão, dois "ermes poderiam desen$ol$er4se completamente continuando soldados um ao outro, ou então um deles se desen$ol$ia, apenas parcialmente, o que "eraria seres de duas ca*e6as com um mesmo tronco, duas *acias e quatro pernas li"adas ao mesmo tronco etc/ 5ssa explica6ão, confirmada em NQQ pelo exame de $ários monstros apresentados U Academia francesa, tornou4se oficial/ Para os adeptos da teoria animalculista espermática, acredita$a4se que o monstro duplo pro$inha de dois animálculos introduzidos excepcionalmente no mesmo o$o/ +e qualquer maneira, duas con$ic61es formais de$iam ser respeitadas: a primeira, que não se forma$a no monstro nenhuma mat2ria or"anizada que não $iesse de "ermes preexistentes; a se"unda, que apenas o acaso era responsá$el pelo auntamento de tais "ermes e pela o*litera6ão de al"umas de suas partes/ 5ssa explica6ão satisfazia ao senso comum, o que não era exatamente uma $irtude para uma teoria científica/ )apidamente, ela $ai *ater de frente com uma dupla dificuldade: de ordem metafísica e experimental/ A dificuldade metafísica residia na no6ão mesma de monstro/ 5spontaneamente, aos olhos dos homens, os monstros si"nifica$am uma desordem na
natureza/ 9 sá*io, por sua $ez, ne"a$a4se a responsa*ilizar +eus diretamente e preferia atri*uir tal desordem ao acaso/ %as, ao poupar +eus da acusa6ão de inusti6a, acusa$am4o de impotKncia/ 9 acaso interferia nos desí"nios do Criador, o que era considerado inadmissí$el/ 9lhando a questão de mais perto, perce*ia4se que o $erdadeiro esc.ndalo esta$a no homem e na temeridade que o fazia conce*er a usti6a di$ina U ima"em da humana, impondo a +eus os limites de nosso espírito/ o$as querelas animaram o am*iente intelectual/ 5nquanto uns $iam nos monstros um espelho da ordem $isí$el da sa*edoria di$ina, outros os perce*iam como marcas da infinita li*erdade de +eus perante a impotKncia radical dos homens/ Para aqueles que acredita$am que +eus a"ia por meio de $ontade simples, eterna e imutá$el, capaz de a*ra6ar indi$isi$elmente o presente e o futuro, os "ermes dos monstros foram produzidos, no início, como aqueles dos animais perfeitos T///b não há nada no mundo, afora o mal moral, que não tenha +eus por autor e que ele não tenha produzido positi$a e li$remente/ +e nada ser$iria dizer que +eus produziu monstros, mesmo querendo que estes não existissem, pois foi o*ri"ado a fazK4lo para satisfazer U simplicidade das leis da natureza/ ão que autores como )2"is, dono da opinião expressa acima, recusassem fornecer aos monstros causas acidentais: eles N N= admitiam que um _tero muito estreito desse ori"em a crian6as corcundas ou mancas, que a ima"ina6ão materna en"endrasse crian6as4macaco, ou que os monstros duplos pro$iessem de dois "ermes colados um contra o outro/ %as tais acidentes não podiam ser atri*uídos ao acaso independente da $ontade di$ina, que reinaria sozinha, li$re e a*soluta no mundo e
incompreendida dos homens, incapazes de ul"ar seus poderosos desí"nios/ Ainda em meados do s2culo HV###, em plena 2poca das -uzes, a natureza dos monstros e os o*eti$os de +eus ou da natureza continua$am a ser discutidos/ 9 flamen"o ean Palfn, em NQR, não hesita$a em dizer que tinha certeza de que existiam e sempre existiram monstros humanos, citando in_meras fontes da Anti"uidade para dar le"itimidade a sua opinião/ !eu lon"o in$entário inclui uma imensa di$ersidade, desde Zos $ários monstros que foram deixados para trás, quando os construtores da torre de 'a*el se dispersaram\, at2 uma criada romana que Zdeu U luz um monstro que consistia unicamente de uma mão\/ +e toda maneira, diretamente ou não, os monstros $Km de +eus e de sua $ontade una e simples/ 5 tratar4se4 ia realmente de monstros, ou seria o limitado entendimento humano que $ia tais criaturas assim] $/ %onstros e mara$ilhas no 'rasil colonial 5 se quereis ou$ir das naturezas e qualidades das alimárias que há na terra natural de cá, dai4me aten6ão e pode ser que $os fa6a arcar as so*rancelhas de espantado/ Am*rsio Lernandes 'randão, +iálo"os das "ratidezas do 'rasil Ao lon"o da #dade %oderna, as $aria61es de com*ina61es possí$eis tiradas de diferentes reinos da natureza, pareciam simultaneamente infinitas e saídas do inslito, pois o monstro era considerado um ser composto de partes irracionalmente e antior"anicamente li"adas entre si/ 5le era, como *em diz %arcel 'rion, um ludus naturae, um o"o da natureza/ Presentes em todo o 9cidente cristão, monstros e monstren"os fariam a rota de tantos na$e"adores em dire6ão ao 9este, che"ando unto com os primeiros colonizadores U terra *rasilis/ 5 eles não $inham ss/ Acompanha$am4se do olhar que os europeus tinham so*re a Am2rica/ 9 9cidente cristão ora acha$a que o o$o %undo era ha*itado por seres que, de fato, descendiam de
NO NN %ois2s, ora pensa$a que o no$o continente era o endere6o fixo do dem^nio e, por isso mesmo, uma fá*rica de monstren"os em permanente produ6ão/ )azão, aliás, pela qual o ma"istrado *ordelKs Pierre de -ancre, encarre"ado de ul"ar processos de feiti6aria, reconhecera nas *ruxas francesas resquícios dos dia*os ca6ados e expulsos do o$o %undo/ As mali"nas criaturas teriam $oltado U 5uropa para $in"ar4se de seus perse"uidores/ Para definir as características das no$as terras, multiplicaram4se as o*ras de cart"rafos, cosm"rafos e coro"rafistas, autores de mapas4m_ndi, de li$ros de $ia"em, de "rossos tratados ou simples mono"rafias que de$eriam representar a $erdadeira e então no$a ima"em do ur*e terrestre/ &ais ima"ens fizeram o *alan6o do conhecido e do desconhecido, permitindo analisar de que forma no61es "eo"ráficas, *ot.nicas e etno"ráficas se inte"raram ao patrim^nio cultural da 5uropa/ 9s primeiros Zdesco*ridores\ mostra$am4se, em seus relatos, menos impressionados pela "randeza da natureza americana e muito atentos U ori"inalidade de seus ha*itantes/ Colom*o, por exemplo, utiliza so*re as 'ahamas o mesmo $oca*ulário empre"ado no c2le*re romance de ca$alaria Amadis de Gaula para pintar ilhas ima"inárias/ !ua tendKncia foi em*elezar a realidade, mencionando apenas o que era positi$o e escondendo o resto: os cani*ais, os r2pteis e os animais ferozes/ A natureza americana foi reduzida pelo na$e"ador "eno$Ks a al"uns elementos de *ase que pontilham seu texto com freq0Kncia: a á"ua, a *risa, as ár$ores e o canto dos pássaros/ %as se Colom*o dá uma id2ia imperfeita e Us $ezes irreal do espa6o fíFsico, ele sou*e, ao contrário, fazer uma descri6ão *astante completa dos americanos/ Che"a a ponto de reconhecer que,
diferentemente do que anuncia$a o -i$ro das mara$ilhas de %arco Polo, ele não encontrara ali ra6as monstruosasR em*ora ti$esse $isto U dist.ncia trKs sereias menos *elas do que ima"inara que pudessem ser/ Para a maior parte dos $iaantes, a terra era a mesma de um lado e de outro do mundo; o o$o %undo físico não podia ser mais do que um prolon"amento do Anti"o/ ele, de$eriam encontrar4se as mesmas pedras, ár$ores, climas, plantas/// mas os homens[ !ão eles o pro*lema: conheceriam +eus] A que esp2cie pertenciam] Comem4se entre si] @a$eria monstros entre eles] 9s primeiros Zdesco*ridores\, quer se tratasse dos portu"ueses na frica ou nas Jndias, dos espanhis, franceses ou italianos na Am2rica, todos o*edeciam a uma tendKncia natural do espírito humano, que consiste em trazer o desconhecido para o conhecido/ +iante do no$o, ele tende a ape"ar4se aos raros elementos que lhe permitem e$ocar realidades familiares/ Laz4se, então, referKncia ao que se conhece pessoalmente ou indiretamente, pelos textos de outrem/ Assim, as realidades raramente são descritas por si mesmas, mas em termos de semelhan6as ou diferen6as, quer dizer, compara6ão/ 5ssa a*orda"em, como $eremos adiante, aparece com freq0Kncia nos cronistas so*re a Am2rica portu"uesa/ 8m deles, Ga*riel !oares de !ouza, destaca$a, por exemplo, a semelhan6a de climas que permitiu a precocidade "en2tica de $árias esp2cies importadas da 5uropa e aclimatadas ao 'rasil: $acas, ca$alos, "alinhas, o$elhas e cana4de4a6_car, laraneiras, arroz/ &udo da$a mais a*undante e rapidamente/ %as, quanto aos homens, os resultados podiam surpreender e fu"ir U semelhan6a/ +escre$endo a presen6a de franceses na Am2rica portu"uesa, ele conta: 9s quais se amance*aram na terra onde morreram, sem querer $oltar para a Lran6a e $i$eram como os "entios, com muitas mulheres/ +os quais e dos que $inham todos os anos U 'ahia e ao rio de !er"ipe, em naus de Lran6a, se inchou a terra de mamelucos que
nasceram, $i$eram e morreram como "entios, dos quais há hoe muitos descendentes que são louros e al$os e sardos, e ha$idos ND N< por índios tupinam*ás e são mais *ár*aros que eles/ 5 não 2 de espantar serem esses descendentes dos franceses al$os e louros pois que saem a seus a$s/ %as 2 de mara$ilhar trazerem do sertão, entre outros tupinam*ás, um menino de idade de dez anos para doze, no ano de =DO, que era tão al$o que deo ser muito não podia olhar para a claridade e tinha os ca*elos da ca*e6a, pestanas e so*rancelhas tão al$os quanto al"odão/ Lilho de índios, considerados pelo autor luso Zmuito pretos\ e sem nenhum antecedente francKs, o "aroto al*ino não che"a$a a ser considerado exatamente um monstro/ %as trata$a4 se, com certeza, de um ser *izarro[ !e al"uns autores insistem nos aspectos familiares, outros, ao contrário, su*linham o inslito, o mara$ilhoso e o diferente/ Paulmier de Gonne$ille, comerciante que $em ao 'rasil em =QR e le$a o filho de um cacique cari para a Lran6a, fica extasiado diante do que chama de Zprodu61es da natureza\: o país 2 f2rtil, dotado de animais, pássaros, ár$ores e outras coisas sin"ulares, desconhecidas da cristandade/ A no6ão de sin"ularidade ou de prodí"io aparece com muita insistKncia nos textos do período/ Ao lar"o da foz do Amazonas, Vesp_cio considerou4se diante de um prodí"io dos "randes, pois a >= l2"uas da costa ainda na$e"a$a so*re as á"uas doces do "i"antesco rio/ 9utro caso em*lemático do prestí"io das Zsin"ularidades\ 2 o li$ro do nosso á conhecido Andr2 &he$et/ +epois do p2riplo ao -e$ante entre =< e ==>, quando 2 sa"rado ca$aleiro do !anto !epulcro, o franciscano $olta U Lran6a/ ? então
con$idado para outra $ia"em, dessa $ez ao o$o %undo, na companhia de um ca$aleiro da 9rdem de %alta, nin"u2m menos do que icolas +urand de Ville"ai"non/ A a$entura da Lrán6a Austral, fundada numa ilhota da *aía do )io de aneiro, reduziu4se a um curto $erão passado, se"undo ele, Zentre os mais sel$a"ens do DQ uni$erso\, de = de no$em*ro de === a R de aneiro de ==O/ &endo adoecido lo"o que pisou nas praias cariocas, aca*ou repatriado no mesmo *arco que o trouxera ao 'rasil/ +essa *re$e estada nos trpicos, ele le$ou material para um se"undo li$ro, mais cheio de no$idades do que o precedente e que o tornou uma cele*ridade/ As sin"ularidades da Lran6a Antártica apareceram em fins de ==N, foram traduzidas em alemão e in"lKs e suscitaram, a lon"o prazo, empr2stimos e imita61es polKmicas/ A qualidade da documenta6ão so*re a fauna, a flora e os mores dos índios meridionais somou4se U fantasiosa descri6ão do autor so*re as amazonas, os antropfa"os e o ha(, á mencionados por sá*ios anti"os e modernos, de Plínio a Gesner/ As amazonas, 2 *om não esquecer, são citadas na carta apcrifa do Preste oão e quando não são encontradas no orte da frica deslizam para as Am2ricas/ 9s antropfa"os fazem pensar nos Zcomedores de carne humana\ mencionados no )omance de Alexandre, presos e punidos pelo poderoso monarca/ 9 fato de nossos índios não serem co*ertos Zdos p2s U ca*e6a\ por pKlos os afasta$a dos astomos, ca*eludos moradores da Jndia/ 9 ha( lem*ra muito a famosa mantícora $ista pelo mesmo &he$et nas costas do mar Vermelho e representada em sua Cosmo"rafia uni$ersal/ a rica ilustra6ão que acompanha o no$o li$ro, cenas decoradas com artefatos indí"enas acoto$elam4se com pranchas *ot.nicas consa"radas U mandioca, U *ananeira e ao a*acaxi, asse"urando ao conunto da o*ra sucesso na corte francesa entre amadores de curiosidades e
poetas/O A redu6ão de seres considerados prodi"iosos, como as amazonas, os antropfa"os, o tucano e a pre"ui6a, a um modelo conhecido, *em como sua inclusão em frisas e "ra$uras decorati$as, não excluía a fascina6ão exercida so*re &he$et por uma estranheza na qual o medonho e o admirá$el se mistura$am/ esse período, a sin"ularidade era ustamente reconhecida por essa D tensão entre horror e esfor6o/ 5sfor6o para compreender o que era desconhecido/ 5 horror pelo espetáculo que as criaturas exticas sempre suscitaram/ +entre os europeus capazes de detectar monstros no 'rasil encontrou4se tam*2m o renomado "ra$ador &heodor de 'r(/ A cole6ão denominada Grandes $ia"ens re$ela quanto esse artista sa*ia que a ima"em 2 necessária ao texto; que ela lhe 2 um complemento indispensá$el e uma esp2cie de luz $i$a proetada so*re a narrati$a da histria/ Protestante e ori"inário de -i`"e, na '2l"ica, ele *em compreendera o interesse da "ra$ura, a talho4 doce ou em co*re, utilizada pelos editores flamen"os para a propa"anda catlica durante as Guerras de )eli"ião que $arreram a Lran6a/ A utiliza6ão desse recurso fez o sucesso de sua empresa e permitiu4lhe formar um conunto quase enciclop2dico com as primeiras narrati$as de $ia"em que ele fez questão de ilustrar a fim de melhor colorir os textos/ +e 'r( era, de fato, um artista antes de ser um editor; perse"uido e exilado em !tras*ur"o, ele aí adquiriu uma t2cnica de desenho e reprodu6ão quase perfeita/ !eu encontro em -ondres com )ichard @acYluit, um misto de diplomata e espião, autor de um li$ro so*re as na$e"a61es da na6ão in"lesa, foi decisi$o/ 9s fundos iniciais para suas Grandes $ia"ens $ieram da cole6ão @acYluit, at2 então sem ilustra61es/ Vale su*linhar que o o*eti$o de +e 'r( era ilustrar as $ia"ens de protestantes,
espectadores das atrocidades cometidas pelos espanhis em nome do papa, na Am2rica/ A histria da Am2rica, se"undo +e 'r(, de$ia ser$ir para o prazer do leitor: este que durante o )enascimento 2 um curioso, á$ido so*retudo por colecionar sin"ularidades/ %as ser$ia, tam*2m, para incitar a medita6ão so*re a *ondade de +eus e so*re os ensinam2ntos que se podiam tirar do espetáculo de po$os infelizes e *ár*aros/ 5les teriam sido conduzidos ao o$o Continente por um dos filhos de o2, aparentemente Chã, e portanto não tinham conhecimento de +eus/ !eus corpos eram ele"antes e harmoniosos/ 5ram "randes, ro*ustos, coraosos e á"eis, mas dissimulados e sem pala$ra/ +iferentemente da dos africanos, sua pele era considerada *a6a e sua, daí o empre"o de tintas para ornamentá4la/ o final do terceiro li$ro da cole6ão há uma importante "ra$ura, denominada 9 inferno *rasileiro/ 5la reproduz outra "ra$ura, esta impressa por ean de -2r(, para acompanhar seu texto escrito em =D= e que explica: Z+urante sua $ida os po*res sel$a"ens são terri$elmente afli"idos pelo espírito mali"no o qual eles chamam Yaa"erreE que, como $i, $árias $ezes os ataca/ T/// b eles dizem que $isi$elmente os $Kem em forma de *esta ou a$e, ou em outra forma estranha\/N 9 tema fantástico da cena 2 uma transferKncia dos cdi"os europeus so*re a monstruosidade, que +e 'r( traduziu usando o filtro da leitura reli"iosa/D A cena a*re4se so*re uma paisa"em litor.nea, na qual o mar faz a linha do horizonte com o c2u/ 8ma sua$e montanha do*ra4se so*re a costa/ +uas meias palmeiras fazem a *orda da ima"em, esp2cie de anela para a esplanada infernal/ 8ma pir.mide humana amontoa corpos atormentados/ 8m deles inclina4se so* os "olpes desferidos por um monstruoso e sarcástico dem^nio/ %isturando o zoomorfo ao antropomorfo, ele possui todos os atri*utos hediondos de seus con"Kneres/ !o*er*amente enfeitado com asas escamosas, chifres, "arras, cauda *ifurcada, coxas
peludas e sexo ornado com uma ca*e6a dia*lica, parece cristalizar todos os $ícios da natureza humana/ +ois outros monstros ras"am os c2us, de olho em suas $ítimas: um, meio pássaro, meio serpente, tem a pele co*erta de escamas e um *ico pontudo/ 9utro, asas enormes a*ertas, escarra seu $eneno/ -em*ra um dos monstros alados descritos nos *estiários da #dade %2dia/ Prximos aos *arcos, ao lar"o, pululam peixes4 $oadores que "anharam *icos, chifres e tamanho como se D> DR pertencessem a uma zoolo"ia fantástica/ 9 ha( aparece no centro da "ra$ura com uma explica6ão extraída do li$ro de ean de -2r(: Z9 maior Tanimalb que os sel$a"ens chamam ha( 2 "rande como um cão dFá"ua com a face de um macaco, prxima daquela do homem; o $entre pendente como o de uma porca prenhe, o pKlo cinza4esfuma6ado como o da lã do carneiro ne"ro, a cauda *em curta, as pernas peludas como as do urso e as "arras muito lon"as\: < +ois no$os monstros foram acrescentados por +e 'r(/ 8ma das criaturas $oando so*re um dos sel$a"ens lem*ra, estranhamente, o dem^nio que fizera 5$a comer do fruto proi*ido: ele 2 possuidor de corpo de serpente, seios pendentes e asas de morce"o/ 5sses elementos pro$Km de um fundo oriental apropriado pelo 9cidente cristão no momento das á mencionadas $ia"ens no s2culo xiii/ A China exportou então, em ima"ens, hordas de dia*os com asas de morce"o e seios de mulheres; exportou, tam*2m, dra"1es com asas mem*ranosas, "i"antes com orelhas e chifre _nico na fronte/Q 9s monstren"os de +e 'r( metamorfosea$am, portanto, parte das formas que uniram o 9riente e o 9cidente/ 9utro dia*o *ar*udo fusti"a, com um "alho de palmeira, um acuado sel$a"em reclinado so* os
duros "olpes/ Pin6ado dos *estiários medie$ais, ele está aí para lem*rar a fi"ura animal do *ode: acusado de fornicador, or"ulhoso e de*ochado/ 9s monstros zoomorfos pareciam ter saído dos tratados de Par2, Aldro$andi ou Gesner que circula$am na 5uropa, enseando discuss1es so*re o hi*ridismo/ As $árias esp2cies de dem^nios não deixa$am d_$idas: eram cruzamentos entre o dia*o e certos animais/ uma prancha, dessa $ez emprestada de +e 'r( e pu*licada por seu "enro, %atheus %2rian, em ORQ, a horda de monstros assassinos aumenta/ Aqui, temos um dem^nio com corpo de mulher, ca*e6a de *atráquio e asas de li*2lula/ -á, um outro com ca*e6a de a$e de rapina e corpo de "ente/ As for6as do mal estão representadas por asas de morce"o, ca*e6as de sapo e corua, corpos ondulantes como o das serpentes: empr2stimos em*lemáticos da *ruxaria e das práticas daqueles que compactua$am com o mali"no, por meio de quem atormenta$am os homens/ Lantástico e real continua$am a coexistir na cultura e na "eo"rafia dos s2culos x$i e x$ii, e seu *animento s foi decretado no s2culo x$iii, quando a carto"rafia á des$endara a maior parte do planeta/ esse momento, os monstros não tKm muito mais onde esconder4se/ @á, toda$ia, autores portu"ueses que antes disso demonstraram ceticismo com a leitura fantástica que se fazia do mundo/ Lrei Gaspar da Cruz, escre$endo em =O<, critica$a os que acredita$am que os pi"meus fossem descendentes dos citas, acostumados a se *ater, montados em "ruas, por *ocados de ouro/ 9 mesmo autor contradiz a existKncia dos ciápodes e de outros seres fa*ulosos, concluindo: Z#sso e outras tantas coisas tidas por fa*ulosas desde que a Jndia foi desco*erta por portu"ueses\: A o*ser$a6ão da realidade permitia que se ras"asse a diáfana cortina da fantasia/ %as a $erdade 2 que nem todos os $iaantes *e*eram da ta6a da razão com a mesma sede/ 5 hou$e outros tantos que $iam monstros e monstren"os em toda parte/ Garcia de )esende, por exemplo, persistia em acreditar em prodí"ios e mara$ilhas/ um memorial rimado, feito
em =R, dizia: 5 so*re a terra $imos monstros e no c2u, "randes pressá"ios e coisas so*renaturais/ Pro$a disso 2 que em pleno s2culo x$i, au"e das $ia"ens ultramarinas portu"uesas, um certo oão Afonso descre$e, em sua cosmo"rafia so*re a frica, an"olanos com a ca*e6a no peito como as *lKmias de Plínio, homens monculos, cinoc2falos e sátiros cua presen6a podia ser constatada no ca*o da 'oa 5speran6a/ 9utro $iaante, oão Gal$ão, capaz de o*ser$a61es muito D D= criteriosas so*re "Kiseres nas ilhas %olucas, anotara, com i"ual interesse, a presen6a de Zuns homens a que chamam dará que dará, que tKm ra*os como carneiros\ e outros possuidores de espor1es, nos artelhos, como os "alos/ A +escri6ão histrica dos trKs reinos de Con"o, %atam*a e An"ola, escrita e pu*licada entre O= e ONQ pelo padre oão Antonio Ca$azzi de %ontecuccolo, reproduzia um tipo de monstro que Ga*riel !oares de !ouza tam*2m reconheceria nas costas *rasileiras/ &idos por Zfantasmas ou homens marinhos\, tais medonhas criaturas afo"a$am pescadores e mariscadores, mordendo4lhes a *oca, os narizes e Za natura\: a frica, o monstro a$istado era uma fKmea: 5m primeiro lu"ar um há que os europeus chamam peixe4mulher e os naturais n"ulu4a4maza, *onito de nome mas horrendo de forma/ &em o focinho escancarado, mas pequeno em compara6ão com um outro que parece ser o macho/ ul"o ser esse o tritão afamado nas fá*ulas da mitolo"ia, podendo a fKmea considerar4se uma náiade dos anti"os/ 9s dentes parecem4se com os de um cão; as *ar*atanas U semelhan6a de *ra6os che"am at2 a metade do corpo aca*ando com cinco dedos de mat2ria cartila"inosa e
malfeitos/ 9 ra*o tem mais de trKs palmos e os seios, donde suponho $ir o nome, parecem4se com os de uma mulher T///b &al peixe, como pude $erificar, tem uma pele que desce da nuca at2 o come6o do ra*o, co*rindo4o U maneira de manta/ ul"o que ele se enrola nela e tam*2m a*ri"a suas crias para amamentar/ Com as costelas fa*ricam4se contas furadas e enfiadas como as de um ter6o, timo rem2dio contra a corrup6ão do ar e contra as flux1es do san"ue/ Por2m, para que tenham essa propriedade 2 preciso que o animal não tenha tido com2rcio com outro e que as contas seam feitas com as duas _ltimas costelas/ 5stas o*ser$a61es são fruto da experiKncia, como tam*2m a propriedade de dois pequenos ossos prximos das orelhas, que são _teis contra numerosas doen6as/ > Pena que Gesner não tenha tido acesso Us mila"rosas costelas do n"ulu4a4maza, que teriam sido fortes concorrentes do afamado unicornum $erum[ 9 fantástico e o real se"uiam coexistindo, mesmo entre os ha*ituados na$e"adores portu"ueses e mesmo que as $ia"ens e os Zdesco*rimentos\ tenham audado a infundir um no$o conceito de natureza *aseado nas semelhan6as entre o Velho e o o$o %undo/R o 'rasil colonial e at2 o s2culo xix, se"undo -uís da C.mara Cascudo, dizia4se existir no alto rio 'ranco e na fronteira da Venezuela e Guianas uma família de homens que não tinham ca*e6a e com os olhos no trax, descendente direta das *lKmias descritas por Plínio e santo A"ostinho/ o s2culo x$i, sir alter )alei"h, na$e"ador in"lKs que le$ou, em =D=, o ta*aco para a 5uropa, dizia tK4los a$istado na Guiana, localizando4os como moradores de Caora/ 9 li$ro de )alei"h, pu*licado em =
outras criaturas míticas, entre os indí"enas da Amaz^nia: ZAs lendas das amazonas, de homens sem ca*e6a e com a cara no peito, de outros que tKm o terceiro p2 no peito ou possuem cauda do con_*io das índias com os macacos coatás etc/ são idKnticos produtos da fantasia sonhadora dessa ra6a de homens\/O A hi*ridez, ou confusão fisiol"ica, como diz Cascudo, entre os monstros europeus e o fa*ulário indí"ena resultou, se"undo ele, num Zno$o mosaico de pa$ores\/N Veamos al"uns: @ans !taden cita o Geuppa( e o #n"an"e; Andr2 &he$et, o A"nan e o aa"erre; ean de -2r(, o aa"erre e o A("an; Anthon( ni$et, o Coropio e o A$assat( ou A(asat(; $es dF5$reux, o onipotente eropari, o urupari, DO DN o Curupari, o &a"uai*a, o &emoti, o &aulimana; e ohannes de -aet, anotando4o, incluiu o Curupira, a %acaxera e o %aran"i"oana; )olox 'aro, o @oucha, o Curupira, o %acachera, o #urupari, o Anhan"a, o &a"uari/ !e"undo C.mara Cascudo, tais mitos $i$eriam na memria indí"ena e mesti6a, Zadaptados, assimilados, confundidos\/D !e"undo nosso etnlo"o, Geuppa(, #urupari, Geopar(, #eropar(; Curupira, Curipira, Coropio, Curupari; A"nan, A("nan, #n"an"e, An"an"a, Anhan"a são, e$identemente, os conhecidos urupari, Curupira e Anhan"a/ 9 primeiro, senhor do culto mais $asto, comum a todas as tri*os, filho e em*aixador do !ol, nascido de mulher sem contato masculino, re"enerador,
dono de rito exi"ente e precau61es misteriosas, lo"o foi identificado pelos esuítas catequistas como o dia*o, contra quem se construiu o erudito, europeu, *ranco e artificial &upã, mencionado entre outros por *re"a, Anchieta, Azpicuelta a$arro, A**e$ille, &he$et e +F5$reux:< Z7uando o tro$ão ri*om*a$a, a que chama$am &upã, assusta$am4se e ns apro$eitá$amos o lance para dizer4lhes que era +eus quem fazia assim tremer o c2u e a terra, a fim de mostrar sua "randeza e poder\/>Q os +iálo"os das "randezas do 'rasil, uruparim aparece como sendo a _nica identidade assom*radora para os índios no remoto s2culo x$ii/ Gaspar 'arl2us o chama 8rupari e, na senda de %arc"ra$e, rotulou4o de dia*o/ !e"undo C.mara Cascudo, em OR, urupari assumira o posto sat.nico com toda a pompa e circunst.ncia, fundindo Zo mito ameríndio com os detalhes que cercam a fi"ura de -us*el\: Pensam que os dia*os estão so* o domínio de eropar(, que era criado por +eus e que, por suas maldades, +eus desprezou, não querendo mais $K4lo, nem aos seus/ +izem tam*2m que eropar( e os seus Taclitosb tKm certos animais que nunca se $K, que s andam U noite, soltando "ritos horrí$eis, que a*alam todo o interior ota da di"italiza6ão: aqui, o texto 2 interrompido e se"uem4se $árias ima"ens com as se"uintes le"endas:
/ As tenta61es monstros como utiliza$am das desfi"urar as espectador de monstruosidade e
de !anto Ant^nio/ 9s fazedores de 'osch, 'rue"hel e 'aldun" se formas mais repulsi$as para o*ras da cria6ão de +eus/ Ao seus quadros, lem*ra$am que a a fei_ra eram máscaras do dia*o/
DD >/ Gra$uras que ilustram folhetos de cordel do s2culo HV###, chamados em Portu"al de Zpap2is $olantes\/ elas, a fun6ão decorati$a 2 tam*2m ale"rica: os monstros desi"nam uma realidade que lhes 2 exterior, anunciando pressá"ios, desastres naturais e mudan6as de dinastia/ R/ Lolha de rosto de um papel $olante, su*linhando a existKncia e a morte de um monstro/ A imprensa audou a multiplicar as histrias so*re monstros, inau"urando um mercado de consumo em torno da fascina6ão pelo horror/ota da +i"italiza6ão: conte_do da dita folha de rosto: )5-AjA% +5 @8 L9)%#+AV5-, e horrendo %9!&)9 !#-V5!&)5, que fo( $isto, e morto nas $izinhan6as de erusal2m, traduzido fielmente de huma, que se imprimio em Palermo no )e(no de !icília, e se reimprimio em Geno$a, e em &urin/, a que se accreseenta huma carta, escrita de Alepo so*re esta mesma mat2ria/ Com o retrato $erdadeiro do dito *icho/ Por / L/ %/ %/ -is*oa 9ccidental, / Centauros e outros monstros compsitos, meio homens, meio animais, sempre ha*itaram a ima"ina6ão da humanidade: eram manifesta61es do poder dos deuses e dos dem^nios/ =/ 5m*ora esta "ra$ura so*re a mulher africana date do s2culo HV###, aofundo $Kem4se representantes das ra6as monstruosas descritas durante a #dade %2dia/
ean de %ande$ille foi um dos cronistas localizou entre a frica e a sia/
que
as
O/ Ao lado/ 9 ciclope 2 um dos persona"ens dos *estiários medie$ais inspirados em Plínio e !olinos/ 9 pensamento cristão, contudo, não se contentou em assimilar a heran6a "eo"ráfica e etno"ráfica da anti"0idade pa"ã, mas procurou re$esti4la da autoridade *í*lica/ %onstros como o ciclope eram tidos como descendentes dos filhos de o2/ N/ ascimentos monstruosos como o da mulher re$estida de pKlos eram atri*uídos U ima"ina6ão materna/ D/ Ao lado/ 9 *ispo do mar: monstro capaz de falar, nascido da tradi6ão clássica e difundido por narrati$as de $ia"em e ima"ens/ Antes da Zdesco*erta\ do índio americano, o homem sel$a"em ou sil$estre $i$ia nas florestas europ2ias e co*ria4se de folhas e peles/ Q/ As ra6as monstruosas: ori"inalmente ha*itantes dos confins da &erra e mais tarde Ztransportadas\ por Ct2sias de Cnide para a Jndia, tKm sua existKncia confirmada, na #dade %oderna, por enciclop2dias e cosmo"rafias/ As $ia"ens ultramari nas se encarre"am de espalhá4las pelo mundo/ Ao se deparar com os restos de um *anquete antropofá"ico, Colom*o acredita ter che"ado U terra dos cinoc2falos: homens com ca*e6a de cão/
/ a capa da Phísica Curiosa, de Gaspar !chott, os sátiros con$i$em ami"a$elmente com a lhama sul4 americana, numa mostra de que a o*ser$a6ão empírica e a tradi6ão não eram consideradas contraditrias entre si/ >/ As sereias, monstros marinhos que mi"raram da tradi6ão "re"a para as descri61es feitas so*re a monstruosa #pupiara das costas *rasileiras/ R/ Ao lado/ %ulheres serpentes, entidades ct^nicas li"adas ao %al desde o ardim do ?den/ / esta "ra$ura so*re os índios *rasileiros $K4se afi"ura do Zhomem sel$a"em\: sua ima"em foi trazida das florestas europ2ias para as praias da Am2rica portu"uesa/ =/ %ulher africana/ Ao fundo, ima"ens que caracteriza$am a frica como a terra de monstros por excelKncia: *lKmias e hermafroditas/ O/ As o*ser$a61es do m2dico Am*roise Pare não deixa$am d_$idas: no final do s2culo HV#, crian6as eram en"endradas pelo dem^nio e traziam as marcas do coito infernal/ ota da di"italiza6ão: a se"uir, retoma4se o texto/ o que ou$i infinitas $ezesE com os quais con$i$em, e por isso os chamam !oo oropar(, Zanimal de oropar(F e crKem que esses animais ser$em aos dia*os ora de homens, ora de mulheres, e por isso ns os chamamos !uccu*es e #ncu*es, e os sel$a"ens u"nam eropar(, a mulher do dia*o, Aua eropar(, o homem do dia*o/ @á tam*2m certos pássaros noturnos que não cantam, mas que tKm um piado queixoso, enfadonho e triste, que $i$em sempre escondidos, não saindo dos *osques, chamados pelos índios 8(ra eropar(, pássaros do dia*o, e dizem que os dia*os
com eles con$i$em, que quando p1em 2 um o$o em cada lu"ar, e assim por diante, que são co*ertos pelo dia*o e que s comem terra, conta$a assom*rado $es dF5$reux, minucioso cronista de criaturas fantásticas da &erra de !anta Cruz/> o Curupira, explica C.mara Cascudo, foi o primeiro duende sel$a"em que a mão *ranca do europeu fixou em papel e comunicou aos países distantes/ 5m carta de !ão Vicente, em R de maio de =OQ, cita$a4o os2 de Anchieta/ A maioria dos cronistas coloniais o inclui entre os entes mais temidos pelos indí"enas/ 9s "uerreiros, aliados aos portu"ueses no con$í$io dos acampamentos e nas lon"as marchas sertão adentro, conta$am4lhes seus pa$ores/ 9 nome de Curupira era mencionado entre sussurros de medo/ !o* sua *atuta cur$a$am4se as ár$ores e os animais/ 9*edeciam4no Anhan"a, responsá$el pela ca6a de porte, e Caapora, entidade protetora da ca6a mi_da, al2m de %*oitáta, senhor das rel$as e ar*ustos/ Curupira Zo espírito dos pensamentosF como o denomina$a padre !imão de VasconcellosE ficou chefiando, indiscuti$elmente, todos os assom*ros da floresta tropical/>> Jndio pequeno, de ca*elo $ermelho ou de ca*e6a pelada, poderoso senhor da ca6a e dono das matas cuos se"redos sa*e e D< defende, o Curupira tem, contudo, uma característica física que o aproxima de nossos $elhos e conhecidos ciápodes: tem os p2s tornados ao a$esso, dedos atrás e calcanhar para a frente lem*rando os monstren"os ha*itantes da lon"ínqua Jndia, e"ressos da carto"rafia e da cr^nica medie$al pintados por Plínio, A"ostinho ou Aulo G2lio/ Pois essa ra6a assom*rosa cá $i$ia tam*2m: Crist$ão de Acosta, o sacerdote que acompanhou Pedro &eixeira, em OR<, em sua descida do rio Amazonas, de 7uito a 'el2m, ou$iu dos tupinam*ás
relatos estupefacientes/ Vi$iam para o sul seus $izinhos, os %atuic2s, com os calcanhares para diante, deixando rastros Us a$essas/ 9 esuíta missionário !imão de Vasconcellos não esqueceu essa "ente estranha em sua Cr^nica da Companhia de esus no 5stado do 'rasil e explica$a, em OOR, que essa Zcasta de "ente nasce com os p2s Us a$essas de maneira que quem hou$er de se"uir seu caminho há de andar ao re$2s do que $ão mostrando as pisadas; chama4se %atui_s\/ !o*re o Coropio ou Curupira conclui C.mara Cascudo: Vi"iando ár$ores, diri"indo as manadas de porcos4do4 mato, arrancadas de $eados e pacas, asso*iando estridentemente, passa a fi"ura es"uia e torta do Curupira, o mais $i$o deus da floresta tropical, presente Us histrias infantis, aos episdios de ca6a, aos acidentes de luta do homem T///b 2 o explicador dos mist2rios, passando seus ca*elos de fo"o, seus p2s $irados como os 5notocetos de %e"astenes, re"istrados em 5stra*ão, seus dentes azuis, seus asso*ios a6oitantes, na memria de todas as recorda61es/>R á Anhan"a, o espírito malfazeo, encontra4se nas cartas de Anchieta, *re"a e Lernão Cardim/ !taden, por seu turno, chama$a4o #n"an"e/ &he$et o*ser$ou em ==D que o monstren"o não tinha forma positi$a, 9 certo era atormentar os $i$os: ZVKem muitas $ezes um mau espírito ora numa forma, ora em outra, o qual nomeiam em sua lín"ua A"nan e os perse"ue freq0entemente dia e noite, não apenas a alma, mas tam*2m, o corpo\/> Alma sem repouso, espírito errante, si"nificando dia*rura, malefício, feiti6aria, o Anhan"a, An"a ou A"nan define4se, se"undo C.mara Cascudo, como a coisa má, o medo sem forma e sem nome possí$el/ Pero de %a"alhães G.nda$o, no seu @istria da Pro$íncia !anta Cruz,>= pu*licado em =NO, refere4se a um medo *em palpá$el, lem*rando em suas formas e cur$as o n"ulu4a4maza, $isto mais tarde nas costas africanas/ 9 pa$or pro$ocado pelo aparecimento de um monstro marinho, a pupiara, numa praia em !ão
Vicente: Loi causa tão no$a e tão desusada aos olhos humanos a semelhan6a daquele fero e espantoso monstro marinho que nesta pro$íncia se matou no ano de =O, que, ainda que por muitas partes do mundo se tenha notícia dele, não deixarei, toda$ia, de a dar aqui outra $ez de no$o, relatando por extenso tudo o que acerca disto passou; porque na $erdade a maior parte dos retratos ou quase todos em que querem mostrar a semelhan6a de seu horrendo aspecto, andam errados, e al2m disso, conta4se o sucesso de sua morte por diferentes maneiras, sendo a $erdade uma s/// 9 autor acompanha seu texto de uma ima"em do monstro Ztirada pelo natural\: ca*e6a e focinho de cão, seios femininos, mãos e *ra6os humanos e patas de a$e de rapina/ o meio do corpo, uma cloaca/ A #pupiara estaria lon"e de su"erir a *eleza das sereias capazes de seduzir incautos marinheiros/ !e G.nda$o se coloca$a apenas como narrador de uma histria que dizia estar Zsepultada em silKncio\, Ga*riel !oares de !ouza apresenta4se como al"u2m dotado de "rande intimidade com o assunto e como testemunha Zquase\ direta da existKncia do monstro: O o esuíta Lernão Cardim, escre$endo em =
questão de dar maiores detalhes so*re os monstros: os homens teriam *oa estatura, em*ora olhos enco$ados/ As ZfKmeas\, formosas de lon"os ca*elos, pareceriam mulheres/ Z9 modo que tem em matar\ explica, meticuloso, 2: a*ra6am4se com a pessoa, tão fortemente, *eiando4a e apertando4a consi"o que a deixam feita toda em peda6os T///b e como a sentem morta dão al"uns "emidos como de sentimento, e lar"ando4a fo"em; e se le$am al"uns comem4lhe somente os olhos, narizes, pontas do dedos dos p2s e mãos, e as "enitálias e assim os acham de ordinário pelas praias com essas coisas menos/>N 9utro esuíta, Lrancisco !oares, al2m de conce*K4los como monstren"os rui$os, reproduz al"umas informa61es de seu cole"a, no li$ro +e al"umas cousas mais notá$eis do 'rasil, alertando que esses ha$iam Zde muitas maneiras; e se os naturais dizem que os $Kem, $Kem assom*rados e muitos morrem de pasmo\>D Lrei Vicente de !al$ador repete a histria que $em desde G.nda$o, diferenciando, toda$ia, os monstros marinhos de tu*ar1es, pois estes preferiam, Us tenras extremidades, comer pernas e *ra6os dos desa$isados índios pescadores/ Para Anthon( ni$et, marinheiro in"lKs U ca6a de ouro e de pau4*rasil, ele era uma Zimensa coisa\ com Zescamas no dorso, "arras medonhas e cauda comprida\ que a$an6ara em sua dire6ão, Zlan6ando fora a lín"ua lon"a como um arpão\/>< !eu retrato dá a familiar impressão de um dra"ão demoníaco tão $i$o e a"ressi$o quanto aqueles pintados, al"uns anos antes, por @ans %emlin"/ &al como ocorreu na 5uropa, U 2poca de Lortunio -iceti, a ciKncia se defronta$a com uma face da natureza na qual se escondia a $ontade de +eus/ 5ssa $ontade de$eria ser decifrada a partir da experiKncia e do Ztestemunho dos sentidos\, este mesmo que tantas $ezes era capaz de pre"ar pe6as nos sá*ios/ 5is por que a #pupiara, á parte inte"rante da Ztradi6ão\ so*re teratolo"ia nas terras *rasileiras, quase cem anos depois, mereceu por
parte de outro esuíta, o padre Valentino !tancel, uma leitura mais Zcientífica\: o litoral prximo ao mar, num lu"ar dito 5spírito !anto, onde nossos padres possuem uma residKncia, foi $isto um monstro marinho, o qual creio nunca antes foi $isto semelhante na terra/ #am ao mar índios nossos para pescar quando de repente, o"ado U terra, perce*eram um "rande ser dormindo/ 5sta$am persuadidos inicialmente de que se trata$a de um animal terrestre, ou de um homem dormindo profundamente/ Certamente porque não ha$ia luz suficiente, eles se aproximaram e $iram um monstruoso a*orto da natureza pe"o pelo sono/ Assim como o monstro dormia de costas, eles tentaram capturá4lo/ %as um cachorrinho que esta$a com eles latiu intempesti$amente e acordou o monstro, que então $iu a armadilha preparada contra si e os índios armados, prontos para atacar/ 5r"ueu4se o monstro em p2, naquele lu"ar <>
homens, era em forma de cachorro, com o nariz em forma de focinho; possui duas s2ries de dentes a"udos/ 5ra horrí$el, sem pKlos, e sem nada que respeitasse a audi6ão, sem orelhas/ 9s olhos tinham pálpe*ras e eram o*lon"os, como os dos "atos ou felinos; o pesco6o era circular, como o dos homens, um pouco mais lon"o/ 9s *ra6os eram mais curtos/ ão tinha mamas, ao contrário do que costuma ter a sereia/ 9s dois dedos eram de carne cartila"inosa, com uma pele unindo4os entre si, como os p2s dos patos/ +e*aixo dos *ra6os ha$ia lon"os ca*elos, como pode ser $isto na fi"ura/ A pele do corpo at2 o um*i"o era áspera e "rossa; não era *ranca mas fosca, como a dos elefantes ou dos peixes que chamamos tu*ar1es/ A partir da cintura ou do um*i"o ele se fazia em peixe, com escamas duras/ 7uanto ao aparelho "enital, ao contrário dos outros semihomens, que o tKm a*aixo do um*i"o, ele tinha como que um tu*inho passando pela cauda; parece que tam*2m se ser$ia disso para os excrementos/ !olicitei uma anatomia mais cuidadosa desse monstro, mas não foi possí$el por ausKncia de ha*ilidade dos índios, ou de curiosidade do padre que lá residia, que deixou de lado uma coisa tão diferente e extica, não se"undo o meu querer, como se a idade a$an6ada lhe des$iasse a aten6ão para outras coisas/RQ 9 padre !tansel foi missionário no 'rasil durante a se"unda metade do s2culo x$ii/ 5ra matemático, filsofo, formado em Pra"a e no Col2"io )omano da Companhia de esus/ +esde sua che"ada ao 'rasil, tra*alhou no Col2"io da 'ahia e pu*licou na 5uropa al"uns li$ros escritos na Col^nia/ +entre estes, o %ercurius 'rasiliensis, que não che"ou a ser impresso mas ficou "uardado na *i*lioteca de Athanasius ircher, seu professor e correspondente em )oma, á nosso conhecido por escre$er so*re dra"1es e $ulc1es no centro da &erra/ 9 mais curioso 2 que Am*roise Par2, ao reproduzir a ima"em de um monstro marinho em seu &ratado, opta por uma ima"em muito semelhante U do ha(, á reproduzida pelos
$iaantes franceses &he$et e -2r(, s que ele lhe dá um ra*o de leão e a pele de escamas de tartaru"a, $oltando ao estoque de ima"ens que Ct2sias deixara so*re a manticora/ o s2culo x$iii a mesma histria se transformara, em fun6ão tal$ez da tradi6ão de Zquem conta um conto aumenta um ponto\ 9 terror perdura$a, mas quem o inspira$a era um monstren"o na forma de menino Zde trKs ou quatro anos\, da cor dos índios, de fei61es disformes e "rosseiras, Za ca*e6a pouco po$oada de ca*elos\ e há*il na arte de escapar de tiros e perse"ui61es que lhe eram mo$idas/ 5ra tão horripilante que causa$a desmaios naqueles que cruza$am seu caminho, conta$a, impressionado, o frade Ant^nio de !anta %aria a*oatão/R 9s monstros marinhos, que tanto impacto causaram entre colonos na Am2rica portu"uesa, constituíam a pedra de toque da autKntica experiKncia da $ia"em ou da estada no o$o %undo/ 9 encontro com a Zcoisa\ inesperada era, na realidade, esperado, pois $inha precedido, no espírito do $iaante, da tradi6ão escrita ou oral/ ão ha$ia re"ras para o encontro com o monstro; < <= *asta$a encontrar um testemunho di"no de f2 que anunciasse como fato se"uro a presen6a de tal e tal monstruosidade/R> A erudi6ão europ2ia, por seu turno, trata$a de dar respaldo U existKncia de tais criaturas, confundindo muitas $ezes o real e o ima"inário/ Guilherme )ondelet =QN4OOE, por exemplo, foi capaz de descre$er com a precisão de um taxionomista o peixe4*oi; mas incluiu em sua @istria completa dos peixes, pu*licada em =DD, tanto o monstro marinho com chap2u cardinalício como as nereidas/ +uzentos anos mais tarde, em pleno s2culo das -uzes, ca*eria a ean4%are )o*inetRR continuar confirmando a existKncia de homens
marinhos, a"ora a partir de Zo*ser$a61es\/ 8m re"istro que amarra *em a histria da #pupiara 2 o do á mencionado $iaante Von %artius, que, no início do s2culo H#H, soma a o*ser$a6ão natural com o ul"amento crítico so*re a in"enuidade dos índios *rasileiros e a rela6ão de seus medos com o imponderá$el/ 9s monstros que descre$eu são entidades poderosas e in$isí$eis mas tam*2m il"icas e antinaturais no mundo sel$a"em: Al2m do curupira que infesta as matas, tornando4as pouco se"uras, crKem os indí"enas que as á"uas dos "randes rios são infestadas por outros dem^nios, chamados ipupiaras/ 5sse termo, que si"nifica Zsenhor das á"uas\, 2 o mesmo que usam os ha*itantes do interland para um monstro de p2s $irados para trás ou tendo uma terceira coxa a sair4lhe do peito, de quem a "ente, tanto mais se aproxima, quanto mais crK afastar4se dele, saciando seu dio no $iandante solitário, a quem arrocha com os *ra6os at2 sufocá4 lo/ 7uando um índio adormece e desaparece na á"ua, puxado por al"um acar2, dizem eles que isso 2 o*ra do mal$ado ipupiara/ 9 monstro de marinho passa a flu$ial, e seu corpo escamoso passa a ter anomalias podais/ A tradi6ão, tão presente na lon"a e metamrfica histria da ipupiara, tinha, aliás, enorme import.ncia na constitui6ão do mara$ilhoso, aparecendo, com recorrKncia, nos textos dos cronistas que escre$em so*re o 'rasil/ A @istria natural, repositrio de fá*ulas fundadoras que s2culos de reescrita remodelaram, continua$a a inspirar relatos, a"ora dotados de no$as si"nifica61es/ Ao mencionar que se encontra$am salamandras nas fornalhas dos en"enhos *rasileiros, por exemplo, Am*rsio Lernandes 'randão demonstra conhecer Plínio, que afirma$a que esse misterioso animal, frio como "elo, era o _nico capaz de apa"ar o fo"o/ 9 amor conu"al do peixe camaropin U sua companheira teria se inspirado num dos capítulos escritos pelo almirante romano so*re a simpatia e a antipatia entre Zanimais da á"ua\/ 9 choco do acar2
pelos olhos 2, i"ualmente, apropriado das afirma61es de Plínio so*re o crocodilo africano, *em como as explica61es so*re o la"arto sinim*u M que s se alimenta$a de $ento, como um Astome ou um !auromata M são idKnticas Us que a @istria natural traz so*re o camaleão africano/ 7uanto ao .m*ar, produto de ár$ores su*marinas das quais se apascenta$am as *aleias, 'rand^nio, o persona"em principal dos +iálo"os da "randeza do 'rasil, afasta4se tanto de Plínio como de 5liano, o mais eloq0ente dos cronistas da tradi6ão ao explicar que este pro$inha das ár$ores marinhas das quais se alimenta$am as *aleias/ 9 primeiro afirma$a que o produto, $indo das terras do orte, era extraído da Zmedula\ dos pinheiros/ 9 se"undo explica$a tratar4 se de excrementos perfumadíssimos das *aleias, encontrados flutuando so*re o mar so* a forma de ceráseo con"lomerado/ o s2culo x$i, o "rande *ot.nico Andr2 Cesalpini, contempor.neo de 'rand^nio, diria que o .m*ar era uma pedra preciosa, esp2cie de enxofre natural/ A id2ia de que o .m*ar era um mineral, $omitado pelas fontes su*aquáticas ou expelido das entranhas da &erra, $ai pre$alecer entre os meios
ou capacidade dos "ermes de se desen$ol$erem so* condi61es fa$orá$eis M para contar so*re peixes "erados espontaneamente por influKncia de determinados astros, insistindo na influKncia dos si"nos celestes so*re o reino animal/RN Plínio inspira4se no ato então insu*stituí$el para contar que a f_ria das á"uias amaz^nicas era tão terrí$el que persistia em suas penas, capazes de destro6ar passarinhos mi_dos/ Coreal, outro $iaante estran"eiro, retoma as lendas so*re o ha(, acrescentando4lhe as características do la"arto sinim*u, de 'rand^nio, que as emprestara do camaleão africano de Plínio: o *icho passa a não comer nem *e*er, $i$endo de ar, como al"uns mem*ros de ra6as fantásticas[ iuhof mistura as pe6as do que*ra4 ca*e6a, parecendo *rincar com o o"o da natureza: os monstros que a$istara no 'rasil são uma mistura de raposa com tamanduá, queixada com tatu, la"arto e li*2lula com face humana/ o esuíta portu"uKs !imão de Vasconcellos $olta a Plínio/ Por quK] Porque o sá*io romano considera$a que tudo que existia de$ia ou ser$ir ao homem ou ser$ir4lhe como li6ão de moral/ #d2ia que $ai ao encontro do primeiro li$ro da 'í*lia, o que tornara a o*ra de Plínio aceitá$el pela #"rea nos s2culos se"uintes/ Pois *em, !imão de Vasconcellos $olta a Plínio para denominar Zmatu(uís\ os homens de p2 $irado que o romano localizara em
$iaantes, fossem eles nacionais ou estran"eiros/ o momento em que tais cronistas escre$em, o conhecimento consistia em reconstituir a rede de semelhan6as e diferen6as produzida pela natureza: 2 esse, por exemplo, o procedimento de G.nda$o/ 8ma e outras são constituti$as da ordem do mundo/ o menor dos seres elas se entrela6am e im*ricam/ Compreende4 se, pois, a razão pela qual os homens eram, nessa 2poca, tão atentos ao que chama$am de sin"ularidade; quer dizer, a qualidade prpria a cada coisa que amais 2 a*solutamente a mesma e que entret2m com o uni$erso uma íntima rela6ão/RD 5is por que o título mesmo do li$ro de &he$et: As sin"ularidades/ / / %as não ima"inemos essa totalidade im$el/ 9 dinamismo da natureza e a plenitude da $ida se comunicariam a cada uma de suas partes/ Assim, cada coisa, pelo fato de sua diferen6a, seria um n_cleo de for6as prprias que, pelo o"o de semelhan6as, capturaria as ener"ias do todo, que a seu turno fecundaria o conunto/ 9 menor sintoma da natureza seria tam*2m o si"no dos mo$imentos da natureza inteira/ 8m $ento, o "rito de um pássaro, a cor de um la"arto assinalariam, ao homem que conhecesse a lin"ua"em dos si"nos, transforma61es que ele poderia pre$er no mundo natural/ ? isso que entende o homem do final do s2culo x$i ou x$ii quando ele fala, por exemplo, em Zmáquina do mundo\/ 5ssa suposta mec.nica nada tinha de mecanicista/ A máquina do mundo << era ustamente essa íntima conspira6ão de todas as partes que uma $ida poderosa inspira$a e anima$a; o a"enciamento harmonioso do "rande animal ou do imenso ser $i$ente que era o "lo*o/ Por isso +FA**e$ille podia mencionar, sem ferir a prpria inteli"Kncia, a existKncia de um la"arto capaz de $i$er simultaneamente na terra, no mar e no ar/ Compreende4se, nessa perspecti$a, o interesse que o
período tem pelos prodí"ios e monstros que eram assimilados, quer a mara$ilhas, quer a pressá"ios/ um e noutro caso o prodí"io seria um si"no da esp2cie particularmente di"no de aten6ão/ %esmo se as causas naturais de sua produ6ão fossem $erificá$eis e sua produ6ão, re"ular, ele continua$a raro/ &al qualificati$o referia4se, paralelamente, aos fen^menos pouco freq0entes ou contrastantes com os ha*ituais/ esse sentido, a passa"em de um cometa ou um eclipse eram considerados prodí"ios, mas uma tempestade fora das características normais tam*2m podia sK4lo/ %as os que, entre os fen^menos á conhecidos, aconteciam mais raramente, eram $istos como Zmais\ prodi"iosos/ 5ra, por exemplo, o caso de monstros e monstren"os, para quem o o"o das diferen6as e semelhan6as que constituía a ordem da natureza parecia estar de ponta4ca*e6a/ 5is por que ha$ia monstros que pareciam reunir em si os tra6os animais de esp2cies diferentes, como o ha( descrito por Coreal: ca*e6a antropomorfa, corpo de cachorro, cauda de r2ptil, mamas pendentes e "arras afiadas, como se a natureza, presa da $erti"em da semelhan6a, não a controlasse mais/ @a$ia outros monstros que s pertenciam a uma esp2cie, mas cuas partes esta$am dispostas de tal maneira que a natureza parecia ter esquecido a arte da composi6ão: era o caso dos homens marinhos/ 9utros, como o Zmacaxera\, não se pareciam com nada, fazendo pensar que uma o*sessão pela diferen6a se apossara da natureza/ 9utros, enfim, eram simplesmente informes, como um peixe "elatinoso e transparente, citado por +FA**e$ille; como se, di$idida em contrários, a natureza se ti$esse tornado impotente/ +e todas as maneiras, a natureza parecia estar entre"ue a uma $iolKncia estranha a seu curso re"ular, o que exi"ia desses homens uma explica6ão/ 5ssa $ontade de reconhecer uma si"nifica6ão nos efeitos extraordinários, ou melhor, de medi4los se"undo sua maior ou menor re"ularidade, tornou4se cada $ez mais clara ao lon"o dos s2culos x$i e x$ii/ 5ssa prática constituiu a "rande no$idade dos
tempos/ A no6ão de mara$ilhoso não perdia nada de sua sedu6ão; mas ela se re$estia de no$o sentido/ Para $iaantes, cronistas ou homens de ciKncia, s ha$ia mara$ilha se seu espanto pudesse con$erter4se em pesquisa, em cr^nica so*re a sin"ularidade/ 9 espanto relati$iza$a4se, então: não era mais a natureza que espanta$a os homens, mas estes que se espanta$am com a natureza/ Assistiu4se, nesse contexto, a uma cisão: se por um lado ainda era possí$el aos se"uidores de santo A"ostinho continuar a admirar a natureza como o*ra de +eus, extraindo de seu mara$ilhamento no$as oportunidades de "lorificar o !enhor, por outro, os homens de ciKncia eram confrontados com um uni$erso de coisas/ ão com um mundo feito apenas de si"nos e pressá"ios a ser decifrados/ A medita6ão do piedoso era diferente daquela do c2tico/ Am*os, contudo, ainda $iam a natureza como um "rande eni"ma/ Loi preciso esperar o s2culo xix para que ela fosse tratada como um pro*lema/ QQ Q V#/ As dia*licas criaturas da noite: $ampiros, lo*isomens e outros a*antesmas &endo ou$ido, $árias $ezes, que no $ilareo de %ede"a(a, na !2r$ia, os ditos $ampiros faziam morrer um "rande n_mero de pessoas su"ando4lhes o san"ue, rece*i ordens e a missão do comando superior de sua %aestade para esclarecer essa questão/// / Ll0cYin"er, Visum et repertum, NR> 5ntre os s2culos HV# e x$iii, o mara$ilhoso Continuou a estender4se so*re o continente europeu, colorindo esses tempos de "randes transforma61es econ^micas, sociais e políticas/ &empos em que os homens conheceram epidemias, "uerras ou fomes com seu corteo de ruínas, incKndios, cadá$eres corrompendo4se nas ruas e estradas e aproximando os $i$os e os mortos/ esse mundo que esta$a,
aparentemente, de ponta4ca*e6a, os monstros se"uiam multiplicando4se/ A pu*lica6ão do tratado de demonolo"ia %alleus maleficarum, em D, apro$ado pelo papa #nocKncio $iii, a*riu as portas para o aparecimento de uma coorte de no$as e assustadoras criaturas/ esse texto, a #"rea reconhecia le"itimamente a existKncia de mortos4$i$os/ Loi o suficiente para que almas do outro mundo, $ampiros e lo*isomens in$adissem os sonhos e as realidades dos homens modernos, tornando4se elementos constituti$os de sua maneira de ser e pensar/ Cou*e U )eforma protestante oficializar o que poderíamos considerar como proto$ampirismo/ Acredita$a4se, nessa 2poca, que os defuntos, mortos de peste, reputados por autode$orar4se dentro de seus t_mulos, eram capazes de, por meio de artifícios má"icos, pro$ocar a dist.ncia a morte de pessoas $i$as/> Al"umas testemunhas, dentre elas o prprio -utero, afirma$am ter ou$ido os cadá$eres Zmasti"ar\ em suas tum*as/ a Pr_ssia e na Alemanha, essas estranhas criaturas, em cua *oca se passou a colocar uma pedra ou uma moeda para impedi4las de mascar, rece*eram o nome alemão de aschzeher/ predadores ou parasitas/ A tese "anhou for6a, pois na !uí6a telo"os reformistas, como Cal$ino e -a$ater, insistindo em que apenas a feiti6aria era capaz de trazer os mortos de $olta ao seio dos $i$os, aca*aram por incenti$ar a cren6a em que espectros e espíritos noturnos não eram almas de mortos mas, sim, dem^nios que toma$am a aparKncia de entes falecidos/ Assim, os mortos4$i$os, reconhecidos como aclitos de !atã, "anha$am direito de cidadania na cultura europ2ia in$adindo, com sua horrenda mas sedutora ima"em, "rande parte do Velho %undo/ os 'álcãs, na Gr2cia, na parte oriental do #mp2rio Austro@_n"aro e na )_ssia, o s2culo x$ii foi um período capital para a propa"a6ão de cren6as relati$as aos $ampiros/ %anifesta61es de mortos4 $i$os tinham sido anteriormente atestadas em quase toda a 5uropa ocidental, em países como a
#n"laterra, a Lran6a, a 5spanha e Portu"al/ !e"undo ean %ari"n(,R os países do -este europeu, particularmente po*res e possuidores de re"i1es montanhesas de difícil acesso, tornaram4se, por excelKncia, Zterras de $ampiros\/ Afastados das conquistas científicas do )enascimento, do pro"resso material resultante do aparecimento da *ur"uesia, Q> QR possuíam uma popula6ão maoritariamente constituída por camponeses analfa*etos/ 5stes passaram a ser o p_*lico4al$o das narrati$as e de histrias so*re $ampiros contadas por $iaantes/ 8m se"undo fator, de ordem reli"iosa, cola*ora$a para empurrar os $ampiros na dire6ão desses altos e som*rios picos, prote"idos por la"os "elados: enquanto nos países latinos de o*ediKncia catlica a #"rea, "ra6as U #nquisi6ão, mo$ia uma luta sem tr2"uas contra a heresia e a supersti6ão e, nos países protestantes, os !tuart perse"uiam *ruxas numa ca6ada nunca dantes $ista, no 9riente as i"reas de rito ortodoxo *izantino tinham uma atitude *em mais condescendente em rela6ão Us cren6as so*renaturais, che"ando a inte"rá4las na litur"ia, como no caso dos *rucolacos "re"os/ %as quem eram tais *rucolacos, antepassados de nossos atuais $ampiros] a Gr2cia, a opinião se"undo a qual os mortos podiam ser preser$ados de toda corrup6ão cada$2rica e sair de suas tum*as era *em anti"a/ +a$a4se a esses Znão4mortos\ o nome de $r(YolaYas, rapidamente afrancesado para *roucolaques/ &rata$a4se, "eralmente, de pessoas que não tinham sido inumadas em terra consa"rada porque ha$iam cometido suicídio ou sido excomun"adas/ #nicialmente inofensi$as, essas almas penadas s *usca$am deixar seu en$elope corpreo; *asta$a que a #"rea anulasse a senten6a de excomunhão para que ti$essem paz/ %as a cren6a em lo*isomens e em
mortos4$i$os M predadores aos quais ainda não se da$a o nome de $ampiros M modifica4se rapidamente a partir do s2culo HV#/ 5timolo"icamente, a pala$ra $r(YolaYas, termo emprestado da lín"ua esla$a, si"nifica$a lo*isomem/ Assim, no s2culo x$i, do litoral dos 'álcãs aos Cárpatos, utiliza4se indistintamente o mesmo termo para desi"nar os inofensi$os mortos4$i$os e os peri"osos lo*isomens/ A cren6a nestes _ltimos, seres humanos capazes de metamorfosear4se em lo*os, tinha, por sua $ez, raízes na demonolo"ia medie$al/ !i"ismundo ROD4RNE, rei da @un"ria e chefe do !anto #mp2rio )omano4Germ.nico, fizera a #"rea reconhecer oficialmente sua existKncia no Concílio 5cumKnico de / Cem anos mais tarde, o fen^meno "anhara tal amplitude em toda a 5uropa que a #"rea romana decidiu realizar uma a$alia6ão oficial/ 5ntre =>Q e os meados do s2culo x$ii $erificaram4 se RQ mil casos de licantropia no continente europeu/= 9s países mais atin"idos eram a Lran6a, na 5uropa ocidental, e a !2r$ia, a 'oKmia e a @un"ria, na 5uropa oriental/ 9 rumor era de que os lo*isomens, aps a morte, se torna$am famintos mortos4$i$os, a su"ar impiedosamente o san"ue de suas $ítimas/ Cada país empre"a$a uma terminolo"ia para desi"nar esses temidos predadores, pois a pala$ra $ampiro ainda não existia/ @istrias so*re o fen^meno circula$am por todas as capitais europ2ias, a ponto de a re$ista francesa -e %ercure Galant dedicar4lhe, em outu*ro de O<, um n_mero inteiro/ o fim do s2culo x$iii, o $ampirismo se espraiara por todos os países do -este e o pa$or que inspira$a era transmitido por notícias que não deixa$am marcas na documenta6ão oficial/ Loi preciso esperar as primeiras d2cadas do s2culo x$iii para que sur"issem relatrios e testemunhos pioneiros, re"istrados por escrito, que dariam enfim le"itimidade ao que era então considerado uma supersti6ão sem fundamento/ Portu"al te$e, ele tam*2m, sua constela6ão do que um etnlo"o chamou de Zentidades estranhas\/O Aí era freq0ente a familiaridade com dia*retes que
re$olutea$am nas á"uas ou nos roda4 moinhos de $ento, dia*licos alaridos nos telhados em noite de tempestade, choro de crian6as mortas, *ruxas metamorfoseadas em morce"os ou em *or*oletas, almas do outro mundo a arrastar4se nas estradas desertas portando luzinhas acesas,N mouras encantadas a indicar tesouros enterrados/D 9 lo*isomem, por exemplo, aparece desde o s2culo x$, no Cancioneiro de Garcia de )esende: Z!ois danado lo*isomem[ Primo dF#saac afu\/< Cem anos mais tarde ressur"e nos $ersos de Lrancisco de !á de %iranda: Q Q= 'ento, maus lo*os são homens 5 mais os dFessas montanhas, 7ue há cem mil lo*isomens; Cuida$a eu que eram patranhas/ o s2culo x$iii, cou*e aos m2dicos lusos atestar a existKncia desses seres pálidos, s2timos filhos a quem não foi dado por padrinho o irmão mais $elho, cuo fadário se cumpria Us sextasfeiras/ 'raz -uís de A*reu, em seu Portu"al m2dico, editado em N>O, explica$a: 5stão sueitos os homens a um delírio melanclico, lupino e noturno, a que $ul"armente chamam os doutores licantropia; e se define: uma a6ão depra$ada das faculdades retrices Tsicb que representam o homem de*aixo da esp2cie de lo*o/ Por for6a desse delírio se o*ri"am os que o padecem a romper em todas as a61es do lo*o; e especialmente os inclina essa melancolia ferina a andar de noite, como lo*os, por lu"ares o*scuros, tristes e f_ne*res e at2 pelos cemit2rios e adros desenterrando os mortos e ce$ando4se nos corpos f2tidos e corruptos/Q @istrias de lo*isomens existiram em "rande profusão em todo o país, reproduzindo4se os mesmos episdios fundamentais com al"uns elementos destacados
$ariando de lu"ar para lu"ar/ &ais criaturas podiam nascer da $ontade das fadas ou das feiticeiras, de coit co itos os in ince cest stuo uoso sos, s, so so*r *ret etud udo o en entr tre e pa padr drin inho hos s e afil af ilha hada das s, de ra raz1 z1es es i" i"no nora rad das as/ / %e %er" r"ul ulha hada das s em tristeza profunda, eram tam*2m reconhecí$eis por ter orel or elha has s ma mais is co comp mpri rida das, s, $e $ent ntas as ar arre re*i *ita tada das, s, te tez z amar am arel elad ada a e os ca ca*e *elo los s de co cor r pa pard rda, a, co com m la lai$ i$os os escuros/ +epois de transformados em animal, o que ocorria sempre U noite, e depois de espoar4se numa encruzilhada, tinham de correr por sete fre"uesias, $isitando sete cemit2rios, sete outeiros e as sete partidas do mundo/ a desa*rida correria, iam apa" ap a"an ando do as lu luze zes s qu que e en enco cont ntra ra$a $am m pe pelo lo ca cami minh nho o e pedindo Us pessoas com que cruza$am para que*rar4 lhes a maldi6ão/ 9u$indo por trKs $ezes ZA$e4%aria\, o cão sat.nico arre*enta$a e sumia/ 9 sino4saimão si" s i"no no de !a !alo lomã mãoE oE er era a a ma maio ior r ar arma ma co cont ntra ra se seus us malefícios/ o 'rasil permaneceu a ustificati$a do casti"o por li"a61es sexuais incestuosas, consistindo sua sina em chupar san"ue de crian6a de peito e de animaizinhos no$os/ ão há, contudo, na nossa tradi6ão etno"ráfica refe re ferK rKnc ncia ias s U ne necr crof ofa" a"ia ia de dete tect ctad ada a pe pelo los s m2 m2di dico cos s setecentistas/ 5stes, por sua $ez, insistiam em ser essa a especialidade de lo*isomens e de suas irmãs, as *ruxas, Zasseclas de 'elze*u\, como dizia o á mencionado A*reu, capazes, elas tam*2m, de de$orar Zcor Zc orpo pos s mo mort rtos os de pou ouco co te temp mpo\ o\, , ou de Zr Zroe oer r as partes dos cadá$eres á corruptos\/> &ransformadas em *o *or r*o *ole leta tas s no notu turn rnas as, , de es esp2 p2ci cie e am ama are rela lada da e crepuscular, *ruxas como a pernam*ucana Anna acome, denunciada ao !anto 9fício da #nquisi6ão em =
A explosão do $ampirismo na primeira metade do s2culo x$iii M esp2cie de idade de ouro do san"uessu"a M te$e, contudo, um cenário *em preciso/ 5m NQ, uma epidemia de peste arrasou a Pr_ssia/ 5m %arselha, na Lran6a, entre N>Q e NRQ, a Peste e"ra foi extraordinariamente mortífera/ a !2r$ia, U mesma 2poca, "rassa$a a peste *o$ina, fatal para os animais e, i"ualmente, para os homens/ +o momento em qu que e se co cont ntas asse sem m mu muit itos os mo mort rtos os su susp spei eito tos s nu num m mesmo $ilareo, pensa$a4se QO QN imediatamente na presen6a de um morto4$i$o/ )epresentantes do poder p_*lico procediam a in$esti"a61es sistemáticas so*re casos de $ampirismo, che"ando at2 a a*rir tum*as nos cemi ce mit2 t2ri rios os U ca cata ta do dos s pr pres esum umí$ í$ei eis s cu culp lpad ados os pe pela la calamidade/ 5is por que na ustria, na !2r$ia, na Pr_ssia, na Pol^nia, na %orá$ia e na )_ssia s se fala fa la$a $a na naqu quel eles es qu que e er eram am, , se se"u "und ndo o Al Alfr fred edo o &a &aun una( a(, , Za*antesmas su"adores de san"ue\/= +ois casos espetaculares $Km o"ar á"ua nesse moinho: o primeiro en$ol$e um camponKs h_n"aro, Pedro Plo"ooitz, acusado de ter se tornado $ampiro depois de morto, em N>=, e de ter pro$ocado a morte de oito pessoas no pequeno $ilareo de izilo$a; o se"undo tem como prota"onista Arnaldo Paole, falecido ao cair de uma charrete em N>O, transformado posteriormente em $ampiro e a quem se cred cr edit ita$ a$a a o de desa sapa pare reci cime ment nto o de "r "ran ande de pa part rte e do dos s ha*itantes da cidadezinha de %ede"(a, *em como de seu "ado/ 9 primeiro caso foi al$o de um relatrio oficial, em lín"ua alemã/ ? nele que aparece, pela primeira $ez, o termo $ampiro, orto"rafado como $anpir/O 9 ca caso so de Ar Arna nald ldo o Pa Paol ole e te te$e $e ma maio ior r re repe perc rcus ussã são o e a*ri a* riu4 u4se se, , so so*r *re e el ele, e, um uma a in in$e $est sti" i"a6 a6ão ão of ofic icia ial l em deze de zem* m*ro ro de N NR R/ / Co Coma mand ndad ado o pe pelo lo m2 m2di dico co mi mili lita tar r
Ll0cYin"er e endossado por $ários oficiais da comp co mpan anhi hia a do ar arqu quid idu uqu que, e, o do docu cume ment nto o fin inal al fo foi i apre ap rese sent nta ado ao co cons nse elh lho o de "u "uer erra ra de 'e 'el" l"r rad ado/ o/ Pu*l Pu *lic icad ado o em N NR> R> e in in_m _mer eras as $e $eze zes s re reed edit itad ado, o, o rela re lat tri rio o in inti titu tula lado do Vi Visu sum m e re repe pert rtum um su susc scit itou ou o maior interesse entre os diri"entes da 5uropa ocidental; nele, os m2dicos descre$iam, com pormenores, a a*ertura de t_mulos e as condi61es nas quais encontra$am os cadá$eres/ +aí seu título em latim/ 9 sucesso do assunto foi de tal ordem que trechos inteiros eram transcritos e reproduzidos em re$istas, dentre as quais a renomada %ercure @ist @i stor oriq iqu ue et Po Poli liti tiqu que/ e/ 9 im impe pera rad dor au aus str tría íaco co Carl Ca rlos os i$ aco comp mpan anho hou u com "r "ran ande de at aten en6ã 6ão o o ca caso so Plo" Pl o"o oo oi itz en enqu quan anto to -u -uís ís x$ pe pedi dia a ao du duqu que e de )ichelieu QD notícias circunstanciadas so*re os resultados finais da enquete/ 9s dois Z$ampiros\, Plo"ooitz e Paole, fizeram correr *astante tinta em toda a 5uropa/ -e Glaneur, por exemplo, re$ista holandesa muito lida na co cort rte e de Ve Vers rsal alhe hes, s, ex expu punh nha a co com m re requ quin inte te de deta de talh lhes es o ca caso so Ar Arna nald ldo o Pa Pao ole no n_ n_me mero ro de R de mar6o de NR>/ A pala$ra $ampiro, então orto"rafada como Z$amp(re\, foi empre"ada pela primeira $ez em fran fr ancK cKs s e, no me mesm smo o an ano, o, o -o -ond ndon on o our urna nal, l, nu num m arti"o pu*licado no dia de mar6o de NR>, adaptou4a para o in"lKs/ 5sses dois casos e outros tantos similares insp in spir irar aram am to toda da um uma a lo lon" n"a a s2 s2ri rie e de tr trat atad ados os e de Zdisserta61es\ so*re a questão do $ampirismo, pro$ocando infindá$eis polKmicas nos círculos literários e científicos/ 9s de*ates, por sua $ez, atra at ra$e $ess ssar aram am de no no$o $o os Pi Pire rene neus us e ch che" e"ar aram am at at2 2 Portu"al/ +essa $ez na pena da curiosíssima fi"ura de Pedro or*erto de Arcourt e Padilha/ Lidal"o da casa real, ca$aleiro professo na 9rdem de Cristo e secretário da %esa do +esem*ar"o do Pa6o, descendente pelo lado paterno de uma das mais ilustres famílias espanholas e pelo lado materno de
uma estimada criada da infanta dona #sa*el, Pedro de Arcourt e Padilha 2 autor de )aridades da natureza e da arte, uma impressionante colet.nea de *izarrias e curiosidades tão ao "osto do s2culo x$iii,N pu*licadas em -is*oa no ano de N= Passeando pela intrincada floresta de fen^menos naturais, entre os quais se destacam inquietantes casos de Zsimpatia e anti an tipa pati tia\ a\ en entr tre e $e $e"e "eta tais is, , an anim imai ais s e mi mine nera rais is ou sinistros episdios de ma"ia natural e artificial, o sá*io luso demonstra$a sua intimidade com a literatura estran"eira que então circula$a no pachorrento Portu"al/ !eus textos são pontilhados de alus1es que $ão de Al*erto %a"no e Plínio, o Velho, a -a$oisier, irYer sicE M o nosso á conhecido irschner M e aos %essieurs @enrio @en rion, n, fam famoso oso ana anatom tomist ista a ou )2a )2amur mur, , c2l c2le*r e*re e por suas experiKncias com incu*a6ão artificial/ Q< !eu alentado $olume termina com uma s2rie de pá"inas consa"radas aos $ampiros, que nelas adotam sua forma afrancesada M $ampires M e demonstram o extraordinário interesse que o tema $inha despertando na península/ ão era para menos/ essa mesma 2poca, uma s2rie de tratados á tinha percorrido os "a*inetes de leitura do lado de cá dos Pireneus e eram folheados por nosso fida fi dal" l"o, o, D qu que e nã não o he hesi sito tou u em po posi sici cion onar ar4s 4se e no de*a de *ate te in inte tern rnac acio iona nal l qu que e pr proc ocur ura$ a$a a ex expl plic icar ar o qu que e eram, finalmente, tais criaturas noturnas/ %as de que de*ate se trata$a] 8m primeiro tratado, pu*licado no final do s2culo HV##, em -eipzi", a +isser +is sertat tatio io his histor torica icaphi philos losoph ophica ica de mas mastic ticati atione one mortuorum ON
um tratado que se tornou c2le*re, o +e masticatione mortuorum in tumulis li*er, tam*2m pu*licado em -eipzi" em N>D, %ichae )anft refuta as teses de seu antecessor, ale"ando que, se os mortos podiam a"ir so*re os $i$os, eles não podiam de forma al"uma aparecer so* forma palpá$el; e que os dem^nios não pssuíam nenhum poder para ha*itar os corpos dos defuntos/ +entre os numerosos tratados editados aps o caso Arnaldo Paole $ale citar, ainda, a +isser +is sertat tatiop iophis hisica ica de cad cada$e a$eri* ri*us us san san"ui "uisu" su"us, us, de ohann Christian !tocY #ena, NR>E, e a +issertatio de $ampiris ser$iensisi*us, de ohann @einrich Wopft @alie, NRRE, capazes, untamente com outros tant ta ntos os, , de tr tran ansf sfor orma mar r o $a $amp mpir iris ismo mo nu num m do dos s ma mais is anim an imad ados os as assu sunt ntos os de co con$ n$er ersa sa na nas s un uni$ i$er ersi sida dade des s e sal1es europeus na se"unda metade do s2culo x$iii/ +os autores citados, Padilha mostra conhecer monsieur )anft, *em como outro autor que em pouco temp te mpo o fa fari ria a fo fort rtun una: a: do dom m Ca Calm lmet et ON ON>4 >4N N=N =NE/ E/ 5s 5sse se mon"e *eneditino da a*adia de !enone, c2le*re exe"eta da 'í*lia, interlocutor de Voltaire, cele*rizou4 se por trazer U luz uma das mais polKmicas o*ras da 2poca, o &rait2 sur les re$enants en corps, les excommuni2s, les oupires ou $ampires, *roucolaques de @on"rie, de %ora$ie etc/, pu*licado em dois $olumes em Paris, no ano de NO/>Q Pretendendo iluminar a questão e refutar a cren6a no $amp $a mpir iris ismo mo, , do dom m Ca Calm lmet et ac aca* a*ou ou po por r re repe pert rtor oria iar r um n_mero a$assalador de exemplos, *em como por disc di scor orre rer r so so*r *re e qu ques est1 t1es es pr prát átic icas as re rela lati ti$a $as s ao aos s há*itos do monstro: Z8m homem realmente morto poderia aparecer em seu prprio corpo]\ !e"undo o cioso *eneditino, sim/ @á cerca de sessenta anos, explic exp lica$a a$a, , na @un @un"ri "ria, a, Pol Pol^ni ^nia, a, !il !il2si 2sia a e %or %orá$i á$ia a assi as sist stia ia4s 4se e ao re reto torn rno o de mo mort rtos os qu que e nã não o ap apen enas as fala$am e anda$am, mas que infesta$am os $ilareos, ataca$am homens e animais, su"a$am4lhes o san"ue at2 torn to rná4 á4lo los s do doen ente tes s e ma matá tálo los/ s/ +e +epo pois is de Z$ Z$is isto tos s e reco re conh nhec ecid idos os\, \, el eles es er eram am ex exum umad ados os, , pr proc oces essa sado dos, s, empala emp alados dos, , de" de"ola olados dos e, fin finalm alment ente, e, que queima imados dos/ / 8m dos casos que relata 2 *em específico so*re o
tratamento dispensado ao san"uinário Zmorce"ão\/ 8m pastor da cidade de 'lo, na 'oKmia, depois de morto insistia em Zchamar\ pessoas suas conhecidas que, passados oito dias, $inham a falecer/ !eus $izinhos o desenterraram, atra$essaram4lhe o cora6ão com uma estaca/ 9 pastor4$ampiro, contudo, prosse"uia com seus ataques noturnos rindo4se, per"untando por que lhe dispensa$am tal tratamento e a"radecendo por lhe terem dado um pau para defender4se contra Zcães rai$osos\/ Apesar da medida saneadora da $izinhan6a, ele continuou Zassustando e sufocando mais do que fizera at2 então\/ 9 morto4$i$o foi, então, entre"ue aos cuidados de um carrasco, que o transportou, aos "ritos e ainda empalado, numa charrete para fora da cidade/ !e"undo Calmet, Zle cada$re hurloit comme un furieux S remuoit les pieds S les mains comme $i$ant; S lorsquFon le per6a de nou$eaux a$ec des pieux, li etta des tr`s "rands cris S rendit du san" tr`s $ermeil S en "rande quantit2/ 5nfim on le *rula S cette execution mit fim aux apparitions S aux infestactions de ce spectre\/> !e"undo o mesmo Calmet, o exame físico dos $ampiros re$ela$a4os, sempre, com tez a$ermelhada, possuidores de mem*ros flexí$eis e do*radi6os sem nenhuma marca de ri"or mortis, sem $ermes nem podridão; mas não sem horrí$el e nausea*undo fedor/ 9s capítulos se sucedem com títulos *em diretos: Z%ortos da @un"ria que su"am o san"ue dos $i$os\, ZCr^nica de um $ampiro, extraída de cartas udias\, ZVestí"ios do $ampirismo na Anti"uidade\, Z%ortos4 $i$os na #n"laterra\ e at2 na Am2rica do !ul: mais especificamente, no distante Peru/ 9utros eclesiásticos que ocupa$am altos car"os na hierarquia da #"rea aca*aram, unto com dom Calmet, por consa"rar in$oluntariamente o $ampirismo/ Loi o caso de Giuseppe +a$anzati, arce*ispo de Lloren6a e patriarca de Alexandria, com sua +issertatione sopra i $ampiri ápoles, NNE e do prprio papa 'ento xi$, Prspero -am*ertini, que dedicou al"umas pá"inas a tais entidades para refutar sua existKncia, na se"unda edi6ão do $olumoso +e
ser$orum +ei *eatificatione et de *eatorum canonizatione )oma, N> Acredita$a4se na $olta dos mortos, nos exorcismos, em *ruxas e feiti6os, em lo*isomens e nas Z$exa61es\ impostas por !atã/ 9 dia*o, como suas crias, os $ampiros e os fantasmas, era, por excelKncia, ha*itante de um uni$erso insondá$el, lu"ar em que o normal desaparecia em *enefício de fen^menos incompreensí$eis, espa6o em que os limites físicos, mas tam*2m morais, do homem se eclipsa$am/ 7ualquer leitor que se de*ru6ar so*re as )aridades da natureza e da arte perce*erá, rapidamente que as histrias de Pedro de Arcourt e Padilha tKm uma si"nifica6ão simultaneamente histrica e social, na medida em que traduzem a curiosidade e o fascínio que exerciam tantos persona"ens ima"inários/ 'oa razão para recontá4las, dirá o historiador[ o 'rasil $ários ritos, cercando o enterro e os cuidados com defuntos, tinham por o*eti$o e$itar sua transforma6ão em mortos4$i$os, em zum*is, como acontecera ao pastor *oKmio mencionado por dom Calmet/ !e nossa tradi6ão não menciona $ampiros setecentistas, ela "uardou, contudo, histrias de seres a"ressi$os, comedores de crian6as, portadores de unhas em "arra prprias para "irar o alimento entre os dentes, masti"ando presas pequeninas ou "randes: o mapin"uiri, o qui*un"o, o papa4fi"o, o capelo*o/ &odos, entre lo*isomens e de$oradores de "ente, *em $i$os e reais na memria dos moradores de zonas rurais, como que a nos lem*rar o pa$or que a
antropofa"ia inspira$a aos narradores e cronistas coloniais/ 9 desen$ol$imento de uma literatura monstruosa, tal como a de Arcourt e Padilha, continua$a articulado com um procedimento mental corrente na #dade %oderna: a $ontade de reconhecer uma si"nifica6ão nos efeitos inslitos e extraordinários e de medi4 los, se"undo sua maior ou menor re"ularidade/ &anto em Portu"al como no restante da 5uropa ocidental, a no6ão de mara$ilhoso, como á demonstrei, re$estiu4 se de um no$o sentido para os homens de letras e de ciKncias/ ão existiam mara$ilhas a seus olhos se estas não pudessem con$erter4se em cr^nica, em texto narrati$o/ Por outro lado, para as camadas su*alternas > R da popula6ão e tam*2m para as parcelas letradas resistentes U Zre$olu6ão científica\, a mara$ilha e a teratolo"ia a ela associada se"uiam tri*utárias da $ersão de santo A"ostinho ou Am*roise Par2; ou sea, a natureza consistia, fundamentalmente, num uni$erso de si"nos di$inos a ser decifrados/ %esmo com o ad$ento do #luminismo, no restante da 5uropa, e da #lustra6ão, em Portu"al, esse sistema de representa61es continua$a a $icear com incrí$el $i"or na literatura setecentista, dando mostras da resistKncia de certas cate"orias mentais ao a$an6o da razão/ 9 interessante 2 que as classes su*alternas $ão encontrar na Zliteratura de cordel\ M e nos chamados pap2is M um excelente instrumento de media6ão cultural, capaz de introduzi4las na literatura teratol"ica consumida pelas elites letradas, tão *em representadas pela fi"ura de Pedro or*erto de Arcourt e Padilha/ ? nesta sementeira que proliferaram outros monstros capazes de assustar "ostosamente 9!!9! antepassados/ Chama$am4se pap2is os folhetos de cordel $endidos,
"eralmente, nas feiras ur*anas por ce"os cantadores de seu conte_do, de acordo com um pri$il2"io concedido por dom oão $/ !e"undo %ário Cesarini,>R a literatura de cordel foi $ítima do poder que, em pleno )enascimento luso, $eio monopolizar o ensino da lín"ua portu"uesa/ Cinq0enta anos depois de impresso o primeiro li$ro em Portu"al, tanto o &ri*unal do !anto 9fício da #nquisi6ão como a Companhia de esus impuseram as primeiras "ramáticas =RO4QE, e com elas uma esp2cie de lín"ua oficial, que co*ra$a o *animento de express1es consideradas pa"ãs ou atentatrias Us suspeitas de )oma, então e"ressa do Concílio de &rento e de suas demandas sulfurosas/ +iz ele que Ztodo um imenso espa6o cultural, ao lon"o de s2culos *em mais $i$o do que o latinrio que imp1e a retrica, 2 punido pelo fo"o ou atirado ao nada durante trezentos anos\/ 5m seu entender, a literatura de cordel ou Zos pap2is\ tornaram4se um territrio de re$anche contra o autoritário monoplio lin"0ístico controlado pelos esuítas e por outras ordens reli"iosas/ %as não s re$anche contra o autoritarismo lin"0ístico; como no resto da 5uropa, a literatura de cordel M em forma de small ou chap *ooYs #n"laterraE, romances 5spanhaE, canards Lran6aE ou VolYs*uch AlemanhaE M constituiu um territrio consa"rado Us histrias so*re a desordem dos elementos, aos crimes a*ominá$eis e Us execu61es que se lhes se"uiam e aos fen^menos que trans"rediam as leis naturais/> Pu*licados em tira"ens que atin"iam at2 > mil exemplares, em papel *arato e formato in octa$o, os textos de cordel portu"ueses ser$iam aos leitores para uma utiliza6ão rápida e fácil, funcionando, no mais das $ezes, como uma Zliteratura de escape\/ esse estado, furta$am4se a uma leitura que "erasse inquieta6ão e pudesse destruir as con$ic61es ha*ituais ou as id2ias á esta*elecidas/ Vendidos muito *aratos, em torno de Zoito ou dez $int2ns\, os folhetos de cordel cruzaram o Atl.ntico em dire6ão Us Am2ricas/>= &ais pu*lica61es, editadas pelo li$reiro Crom*er"er
em !e$ilha, eram expedidas com o nome de plie"os sueltos, sendo presen6a corriqueira nas em*arca61es que $inham para o 'rasil ou para os portos espanhis/>O 5ntre as a$enturas de !er"ias de 5splandian ou de Amadis de Gaula, as fac2cias da !erra6ão da $elha ou do &estamento de Clara -opes, ou ainda as des$enturas da Gi"anta de Coim*ra, fi"ura$am curiosas )ela61es so*re o aparecimento de monstros e monstren"os, nas quais o mara$ilhoso zool"ico e teratol"ico res"ata$a referKncias extraídas de textos difundidos ao lon"o da #dade %oderna; referKncias estas que teriam freq0entado a literatura dos sal1es letrados e so*re$i$ido U $itria am*í"ua da razão, a*ri"adas no seio dessa literatura de pre6os modestos e de lar"o consumo/ 5ntre elas há, por exemplo, a )ela6ão do monstruoso peixe que nas praias do &eo apareceu em O de maio deste presente ano = de ND, oferecida ao p_*lico por %anoel da Concei6ão, li$reiro morador na rua do -oreto; ou ainda a )ela6ão $erdadeira de espantosa fera que há tempos a esta parte tem aparecido nas $izinhan6as de Cha$es, os estra"os que tem feito e dili"Kncias que se fazem para apanhá4la, se"undo as notícias participadas por cartas de pessoas fidedi"nas daquela pro$íncia, -is*oa, na 9ficina de oão Lelipe, ano de NOQ/ Vale destacar que, apesar da especificidade de cada caso teratol"ico aí narrado, o prlo"o de muitos pap2is era idKntico, re$elando uma tendKncia da imprensa da 2poca de apropria6ão de parte de textos á pu*licados, numa forma prática de poupar os "astos com a impressão; o mesmo se da$a com as "ra$uras que, sofrendo pequenas modifica61es, ser$iam para ilustrar histrias diferentes/ Por meio de ima"ens assustadoras, os textos enuncia$am a
cr^nica do prodi"ioso e do mara$ilhoso incenti$ando a participa6ão do leitor num o"o de si"nos a decifrar/ &anto a "ra$ura como o prlo"o de$eriam su"erir4lhe a correta compreensão do texto, sua usta si"nifica6ão/ Am*os constituíam um lu"ar de memria na qual se cristaliza$a uma histria, um ensinamento, uma propa"anda, ou *em correspondia a uma metáfora do texto inteiro, e$itando que uma leitura descontínua e irrequieta pudesse fu"ir de seu contexto/ Por trás da decifra6ão de tão curiosas manifesta61es naturais, os textos re$ela$am cren6as comuns Us classes letradas ou su*alternas no que diz respeito U existKncia e ao si"nificado dos monstros: ZProdi"iosa 2 a natureza na cria6ão de seus indi$íduos, assim terrestres como aquáticos, sendo tanta sua $ariedade que, por mais que os naturalistas se empenharam em sua descri6ão, foi essa mat2ria muito superior Us suas for6as\, inau"ura um desses pre.m*ulos, comum a duas histrias diferentes/ A descri6ão dos monstros 2 propositadamente impressionante/ 8m tem mais de dez palmos de alto, com "rossura proporcionada/ As pernas com um c^$ado de altura, "rossas, roli6as, sem feitio de *arri"a T///b e co*ertas de uma cor cinza e escamosa/ As unhas dos p2s fendidas como al"uns animais quadr_pedes, e da mesma mat2ria, mas formando com ela, em cada, uma meia lua/ &odo o resto do corpo, excetuando meios *ra6os, peito e *arri"a, era co*erto de pena cinzenta T///b A ca*e6a com fei6ão humana, mas disforme, os olhos "randes, redondos e com cor de alham*re/ 9 nariz pendente e comprido como *ico de á"uia/ A *oca muito ras"ada e em lu"ar de dentes um osso que corria am*os os queixos T///b sendo notá$eis todos os mem*ros deste animal eram ainda mais notá$eis os om*ros/ +e cada um nascia uma ca*e6a de á"uia com olhos e *icos perfeitos com um pesco6o tão comprido que se punham quase na altura da ca*e6a principal/ Am*os co*ertos de penas so*re o ne"ro T///b 9 peito e $entre, liso e luzidio que de
noite nos lu"ares escuros lan6a$a de si um resplendor so*re o qual se di$isa$a perfeitamente uma cruz///>N 9utro monstro que fez sua apari6ão no Para"uai em NR= tinha, por sua $ez, Zno$e $aras de altura, o rosto de homem, mas tão disforme que causa$a horror; o peito lar"o, a pele como concha de tartaru"a antes de colhida/ As pernas compridas e del"adas, os p2s de unhas fendidas como de *oi T///b 8m ra*o como Us $ezes se costuma pintar o dem^nio, comprido, ca*eludo e cheio de ns/ &razia na mão direita uma pena e na esquerda, uns cadernos de papel escrito\/>D 5m erusal2m, em NOR, sur"iu um Zmonstruoso animal\, misto de elefante, leão, "rifo, "alo e serpente, como que saído do c2le*re quadro de Lrans Lloris de Vriend, A queda dos anos re*eldes, pintado duzentos anos antes/ os2 Lreire %ontarroio %ascarenhas foi autor de pap2is excitantes, com compridos e desafiadores títulos: 9 maior monstro da atureza aparecido na costa da O N &artária setentrional no mKs de a"osto de NR< ou otícia de um portentoso monstro daAnatlia, impresso em -is*oa em N>N, ou da )ela6ão de um formidá$el monstro sil$estre na $izinhan6a de erusal2m/ Pelos títulos a$alia4se o estilo e a mat2ria do texto, adu*ado de pormenores mara$ilhosos, postos umas $ezes em prosa, outras em $erso, em portu"uKs ou em castelhano/ ? o caso, por exemplo, da Verdadera )elacion ( ue$o )omance que refiere la horrorosa fi"ura de un %onstruo Pescado, que el dia ocho de a"osto de este ako passado se desco*ri en la orilla del %ar U dist.ncia de sete milias de la ciudad de Lermo, del !ekorio de Venecia/ 9 monstruo era realmente coisa estupenda: com cara de "ente,
uma tum*a com ca$eira no dorso, espadas, .ncoras e luas "ra$adas no $entre, al2m de trKs ppp si*ilinos, setas em $ez de unhas, cornos, u*a e tetas/ ada escapou ao desenhista para fazer $i*rar a ima"ina6ão dos leitores/ 8m )omance conta$a como se dera a pesca do Zfen^meno\ em meio de um temporal desfeito, e descre$e4o depois em redondilha maior, pondo o eni"ma U conta de +eus: !o*re que pueda ser esto dudo que alcance nin"una mente, por capaz que sea U resol$er esta duda, este eni"ma, este encanto por que el mas docto se ofusca, hasta que +is, si con$iene com su poder lo descu*ra/>< A$iso celestial, aceno fren2tico da mão de +eus, essas apari61es não deixa$am nenhuma d_$ida quanto a seu si"nificado/ 9ra Za6oite da +i$ina usti6a\, ora Zsím*olo, em*lema, compKndio de calamidade e ruínas\ en$iado pela ZPro$idKncia +i$ina\, a histria do aparecimento do monstro prepara o leitor para uma mensa"em moralizante: sea a necessidade de lutar pela con$ersão dos mu6ulmanos, sea o incremento da f2 catlica, sea a torcida pelo Zmau sucesso das armas otomanas na P2rsia\, sea ainda a necessidade de maior caridade cristã/ 9 texto do folheto amais omitia um recado do &odo4Poderoso[ 9 horror do monstro, tantas $ezes reproduzido numa xilo"ra$ura ilustrati$a, de$eria incitar quer U cren6a nesses prodi"iosos fen^menos da natureza, quer no terrí$el ul"amento do !enhor, que a tudo assistia/ Al2m de fazer circular muitas informa61es extraídas de o*ras eruditas entre as camadas m2dias e su*alternas, consumidoras desse tipo de entretenimento moralizante, os pap2is faziam o caminho in$erso: le$a$am aos letrados histrias de "osto Zpopular\/ A Cpia de uma carta escrita da cidade de Galloa( no reino da 5sccia, de autoria de um o*scuro G/ Vander P/, em NRR, a$an6a temas
mara$ilhosos que foram, posteriormente, retomados por Arcourt e Padilha/ 9s Vampires da !2r$ia ou cadá$eres chupadores de san"ue que saindo das tum*as $Km es"otar o humor aos $i$os, o 'icho prodi"ioso de Constantinopla ou o sin"ularíssimo indi$íduo que Zdormia so*re os prprios p2s\, passa$a a pão e á"ua, não ria nem chora$a, pro"nostica$a o futuro e descendia de um passa"eiro clandestino da arca de o2, são assuntos extraídos de pap2is e mais tarde reapro$eitados, ou rearranados, no )aridades da natureza e da arte/// 5 quanto ao prazer de sentir medo] 5sp2cie de literatura de edifica6ão, tais folhetos prendiam a aten6ão e a respira6ão dos leitores, enquanto narra$am seus casos, mer"ulhando4os num mundo de e$entos fantásticos e de fantasma"orias sem limites/ Para aqueles que pertenciam Us classes su*alternas, a presen6a de tais monstros era lida e decodificada como um casti"o ou ad$ertKncia/ Para as elites letradas, por2m, renitentes U che"ada da D < mecaniza6ão do mundo e U laiciza6ão, si"nifica$a uma Zsalutífera pro$a\ de que, naqueles tempos, a física podia ser sin^nimo de ma"ia natural/ A maior parte dos an^nimos autores desses folhetos $olantes procura$a atin"ir dois p_*licos com uma s caadada/ 5m suas opini1es so*re os a*antesmas iam, assim, das afirma61es peremptrias ao humor sutil, do relato empírico ao Zdi$ertimento\: Austemo4nos a crer que tem ha$ido no mundo muitos monstros em di$ersos tempos; mas que nunca hou$e nele propa"a6ão de esp2cies monstruosas/ 9 monstro de que $os dou notícia 2 um dos raros que tKm $isto os s2culos; se $os parecer in$erossímil, eu $ola não dou por arti"o de f2; se ti$erdes por sem sa*or a sua narra6ão, supra esse defeito a $ontade que tenho de $os mandar de tão lon"e este di$ertimento; e
porque não sea tam*2m enfadonha por dilatada, a +eus que $os "uarde/RQ A mal conhecida produ6ão de folhetos de cordel, esp2cie de a$esso da literatura t2cnica nascida durante o )enascimento luso, te$e, se"undo Cesarini, um florescimento espetacular entre os s2culos x$i e x$iii/ %as 2 preciso destacar que, apesar dos a$an6os t2cnicos o*tidos num período anterior com as na$e"a61es ultramarinas, ou com o ad$ento do ideário iluminista racionalista, o que era considerado por "rande parte da popula6ão mara$ilhoso, inslito, *izarro se"uiu multiplicando4se/ &ais Zsi"nos inquietantes\ M como aparecem qualificados em $ários pap2is M referenda$am nefastos acontecimentos econ^micos e políticos/ A rela6ão entre o aparecimento de monstros e o empo*recimento de Portu"al de$ia parecer l"ica; todos os contratempos indica$am a necessidade de arrependimento, todos os percal6os eram pro$as Us quais o po$o de$eria su*meter4se/ 5ram eles: o desastre de Alcácer47ui*ir, a união das coroas i*2ricas, os terrí$eis >Q impostos co*rados por prepostos de Lilipe ii a Lilipe i$, os le$antes de ?$ora, o reino atri*ulado de Afonso $i rei impotente que $K o irmão usurpar4 lhe a mulher e o poderE, o empo*recimento dos a"ricultores do orte, que ti$eram de entre"ar seus campos para o plantio da u$a, atendendo assim Us demandas do tratado de %ethuen, o terremoto de -is*oa, a conspira6ão dos &á$ora, a execu6ão de %ala"rida e tantos outros fatos que pareciam completar o retrato de uma parcela da humanidade impotente para com*ater calamidades e enfrentar prodí"ios, acreditando na possi*ilidade de um ul"amento di$ino/ A rela6ão entre a teratolo"ia e as dificuldades materiais da $ida de$ia parecer plausí$el em tempos em que se ha*ita$a um país que $i$ia so* o terror da #nquisi6ão, da ditatura da
escolástica e do o*scurantismo reli"ioso/ 8m papel datado de NR e de autoria de um certo oão Veloso so*re o nascimento de Zdous animais monstruosos\ dá *em a medida da acolhida e do cr2dito que possuíam tais folhetos de cordel/ +iz ele: ão reparem V/ %/ em que somente lhes dou notícias de nossa terra, sucedendo no mesmo tempo nos reinos estranhos, outras deste "Knero T///b pois como $erdadeiro portu"uKs não admito na minha casa dro"as de fora do reino/ ! escre$o o que se pode $er e examinar, e não me sir$o de notícias de terras para donde 2 difícil a correspondKncia e a $erifica6ão; porque lá dizem, de lon"as terras, lon"as mentiras/R 9s monstros portu"ueses eram, pois, *em Z$erdadeiros\ e não conheciam imita61es/ 5xplica61es para sua existKncia não falta$am/ +i"a4o o "uarda4 mor da &orre do &om*o, oão Couceiro de A*reu e Castro, que em pleno s2culo x$iii su*linha$a: > Como +eus 2 autor da natureza, todas as suas produ61es assim perfeitas, como imperfeitas, são o*etos da +i$ina Pro$idKncia, que costuma pro"nosticar a raridade dos sucessos com a di$ersidade dos nascimentos e dos meteoros, e não 2 usto se despreze por acaso da natureza, o que 2 re"ulado pelo seu Autor, como nos tKm mostrado as histrias de semelhantes monstros/ udicioso "uarda4mor[ $ii/ Conclusão Cemit2rios silenciosos de t_mulos "retados, capelas em ruínas co*ertas de mus"o, $elhas mans1es assom*radas cuas portas "emem se tocadas pelo $ento, p.ntanos mer"ulhados em *rumas, "rutas _midas e escuras, encruzilhadas que le$am a lu"ar nenhum e onde se ou$e a corua piar: 2 em tais lu"ares que costumamos colocar esses seres diferentes, seres inquietantes, nossos monstros/ 9 monstro e$oca a id2ia de ilusão e de fantasma"oria, a no6ão de medo
e horror, a perplexidade humana diante de manifesta61es inexplicá$eis/ A pala$ra monstro 2 am*í"ua, pois reco*re realidades diferentes: na #dade %2dia, ela e$oca a id2ia de diferen6a, de estranhamento, mas tam*2m de emana6ão do poder do Criador/ +urante o )enascimento, a de mara$ilha e prodí"io e, i"ualmente, a de for6a mal2fica e a*ismo de$orador/ +urante o s2culo x$ii, ela se re$este de credulidade científica, en$ol$endo, contudo, as armadilhas da razão/ o x$iii se"ue oscilando entre o tratado m2dico e o tratado teol"ico/ +iferentemente de hoe, os monstros no passado não se >> >R dissipa$am diante de exorcistas munidos de crucifixo e á"ua *enta, de armas saídas da fic6ão científica ou da inter$en6ão de um super4heri a ras"ar os c2us/ 5ram persona"ens cotidianos que inte"ra$am a $ida social, o ima"inário político e reli"ioso/ Aquilo que podia parecer um epifen^meno tinha, no entanto, raízes em moti$a61es histricas, permitindo4nos, tantos anos depois, redesco*rir as estruturas mentais de uma 2poca/ +uzentos anos de literatura nos re$elam as rupturas e permanKncias das id2ias, das mentalidades e dos comportamentos em face dos monstros/ @á nessa traetria uma quase uni$ersalidade de ima"ina6ão so*re os monstros em todas as sociedades, do passado e do presente/ 9 que le$a a pensar que eles tKm, aí, um papel importante; os homens, todos eles, o*ri"am4 se a construir mentalmente al"o que lhes dK medo/ 5 esse medo pode ter suas fontes na reli"ião, na ciKncia ou na política/ A histria de nossos medos, e por conse"uinte de nossos monstros, nos introduz no Zmara$ilhoso\ como cate"oria de análise e no ima"inário como
Zterritrio\ de pesquisa/ Am*os, *em o sa*emos, fen^menos constantemente reno$ados e em processo de permanente rein$en6ão, no qual se encontram, contudo, estruturas notá$eis de esta*ilidade e de recorrKncia/ 9 domínio do ima"inário 2 constituído pelo conunto de representa61es que trans*ordam do limite imposto pelas constata61es da experiKncia e do encadeamento deduti$o que estas autorizam/ 7uer dizer que cada cultura, e cada sociedade, possui seu ima"inário/ 5m outras pala$ras, o limite entre o real e o ima"inário re$ela4se $ariá$el, enquanto o territrio por ele atra$essado continua, por tudo e em tudo, idKntico, pois ele não 2 outro senão aquele da experiKncia humana, do mais coleti$amente social ao mais intimamente pessoal: a curiosidade de lon"ínquos horizontes no espa6o e no tempo, terras e mares nunca dantes $istos, an"_stia inspirada pelo desconhecimento do futuro, em seres extraordinários, aten6ão aos sonhos/> Por fim, 2 importante ter em conta as $árias M insisto, $árias M fun61es do ima"inário teratol"ico no seio de uma dada sociedade; por que 2 que ele foi produzido e consumido] ão há d_$ida de que ha$ia certa fun6ão de compensa6ão/ 9 ima"inário teratol"ico ser$ia como contrapeso U re"ularidade e U *analidade do cotidiano/ !er$ia, tam*2m, para contra*alan6ar as duras condi61es de $ida na qual *racea$a a maior parte da popula6ão da %etrpole portu"uesa ou da Col^nia, assim como das capitais e do mundo rural no restante da 5uropa, entre os s2culos x$i e x$iii/ 9utra ser$entia foi a de resistKncia Us cate"orias racionalistas impostas pelo humanismo/ 9 escapismo para um uni$erso de monstros ou de *ichos fantásticos ameniza$a o impacto das desco*ertas científicas e a ditadura da experiKncia/ 9utro uso, ainda, foi o do prazer de sentir medo/ A literatura teratol"ica, relatando fatos estranhos e aterradores, prontos para arrepiar ou para fazer suar frio, diri"ia4se a um p_*lico apreciador de emo61es fortes/ Poderíamos, hoe,
aproximá4la da Zimprensa marrom\ ou dos realit( shos, mas não encontramos, aí, nem a poesia, nem o pitoresco dos textos, nem o frescor in"Knuo de seu estilo/ s $ezes cruel, outras, c^mica ou emocionante, Us $ezes fantasma"rica ou extra$a"ante, a literatura so*re monstros nos ensina, mais do que muitos tratados eruditos, so*re as mentalidades e a cultura entre os s2culos x$i e x$iii/ 5la mer"ulha no mais profundo do inconsciente coleti$o, do qual extrai as aspira61es, os recalques e os terrores de diferentes "rupos sociais/ Vale, por fim, dizer que, dentre suas muitas tarefas, ca*e tam*2m ao historiador conhecer de onde as sociedades extraem a mat2ria para os prprios sonhos/ > >= Pequeno anexo teratol"ico para estudiosos, curiosos e afins &exto: Z)elatam de hum formida$el e horrendo monstro sil$estre que fo( $isto e morto nas $izinhan6as de erusalem, traduzido fielmente de huma que se imprimio em Palermo no )eino de !icilia e se reimprimio em Geno$a, e em &urim; a que se acrescenta uma carta escrita de Alepo so*re a mesma mat2ria\ Com o retrato $erdadeiro do dito 'icho/ -is*oa 9cidental, na oficina de oseph Antonio da !(l$a, N>O/ >N otas / #&)9+8j9 pp 4OE / 9*ri"atrio para a compreensão do tema da teratolo"ia na arte 2 o li$ro de Gil*ert -ascault, -e monstre dans lFart occidental: un pro*l`me esth2thique/ Paris, lincYsiecY,
>/ !o*re o colapso da cren6a na ciKncia e a emer"Kncia do fantástico, $ea4 se o ensaio de atleen A"ena, Z9 retorno do encantamento\, em 9 5stado de !/ Paulo, DBBD, n DN, pp/ >4/ R/ os2 Gil, %onstros/ -is*oa, 7uetzal, <<, p/ Q/ / 5ssa 2 a opinião que, aliás, compartimos com -ouis Vax, em seu -Fart et la litt2rature fantastiques/ Paris, P8L, N/ O/ !ão Paulo, Companhia 5ditora acional, < !ão as o*ser$a61es de -ucien L2*$re no arti"o supracitado, p/ D=/ Q/ 5mpresto aqui o título do li$ro de Geor"es +u*(, An QQQ au >QQQ: sur les traces de nos peurs/ Paris, &extuel, <<=/ / Pierre Chaunu, prefácio de Certitudes et incertitudes de lFhistoire, dir/ Gil*ert Gadoffre/ Paris, P8L, / #dem, Lormations et d2formations M la st(listique ornamentale dans la sculpture romane/ Paris,
Llammarion, N/ )udolf ittYoer, -F9rientfa*uleuz Paris, &hames S @udson, <<, p/ >=/ D/ Plínio, o Velho, @istoires de la nature/ Paris, 2r^me %ilion, 4=/ >/ !o*re os monstros exticos e a literatura erudita, $er Claude -ecouteaux, de cua o*ra empresto informa61es, op/ cit/, pp/ O> e passim/ R/ A cidade de +eus Contra os pa"ãosE/ Petrpolis, Vozes, em co4edi6ão com a Ledera6ão A"ostiniana 'rasileira/ !ão Paulo, <> / #*idem/ =/ )eproduzo aqui id2ias de ean C2ard, em seu *elo -a nature et les prodi"es M -Finsolite au HV#F si`cle, en Lrance/ Gene*ra, +roz, N4 O/ #*idem, cap/ xxi, p/ =OO/ N/ !o*re o *ispo espanhol, $er o arti"o de )u( de 9li$eira Andrade Lilho, ZA respeito dos homens e dos seres prodi"iosos\, in )e$ista da 8!P, n <, set/4out/4no$/ <<, pp/ NO4DR/
D/ #sidoro, 5t(molo"iae, H#, R/ 9xford, / %/ -indsa(, </ 5mile %.le, -Fart reli"ieux du H###F si`cle en Lrance/ Paris, Armand Colin, , p/ OD/ >Q/ ean @2ritier, -e mart(re des affreux/ Paris, +eno2l, <<, p/ >/ Ver so*re essa questão )udolfittYoer, %ar$els of the 5ast, ournal ofthe ar*ur" e Courtauld #nstitutes =<>E, principalmente o capítulo dedicado U moraliza6ão das ra6as fa*ulosas nas artes e na literatura medie$al/ >>/ !o*re a tradi6ão moral nas artes plásticas medie$ais, $er ean !eznec, -a sur$i$ance des dieux antiques/ Paris, Llammarion, R/ Ver tam*2m 'estiaires du %o(en A"e/ Paris, !tocY, / Paul Lierens, em -efantastique dans lFartflamand/ 'ruxelas, -e Cercle dFArt, <N, p/ N/ >=/ ur"is 'altrusaitis, )2$eils etprodi"es, op/ cit/, pp/ RN4D/ >O/ Claude -ecouteaux, op/ cit/, p/ >=/ >N/ ? o que ean C2ard diz so*re o )omance de Alexandre, op/ cit/, p/ =O/ >D/ Claude -ecouteaux, op/ cit/, pp/ >=4RD/ > #*idem/ RQ/ !o*re o assunto, $er effre( erome Cohen, 9f "inats, sex, monsters and middle a"es/ -ondres, 8ni$ersit( of %innesota Press, << R/ !o*re o tema, $er o pequeno mas o*ri"atrio li$ro de acqueline Pirenne, -a l2"ende du ZprKtre ean\/ !tras*our", Presses 8ni$ersitaires de !tras*our", <<>/ R>/ Claude appler, %onstruos, demonios e mara$ilias a fines de la 5dad %edia/ %adri, AYa#,
his *ooY/ -ondres, <<, e / 'ennet, &he disco$er( of !ir ohn %ande$ille/ o$a orY, <=/ Paul Lierens, em -efantastique dans lFartflamand/ 'ruxelas, -e Cercle dFArt, <N, insiste que %ande$ille teria $iaado pela &erra !anta, 5"ito e sia, morando por R anos fora de sua #n"laterra natal/ &ese discutida por autores que o sucederam, como 2 o caso de Claude appler e Christiane +eluz, citados neste capítulo/ R/ ? o que afirma Christiane +eluz em sua introdu6ão a Vo(a"e autour de la &erre/ Paris, -es 'elles -ettres, <>/ RO/ #*idem, p/ >>O/ RN/ 5sta 2 a opinião de Paul Lierens, op/ cit/, p/ >/ RD/ C/ -ecouteaux, op/ cit/, p/ D/ RQ R R %artin %onestier, -es monstres/ Paris, &chou, </ C/ -ecouteaux, op/ cit/ R/ Apud Claude appler, Z#nterpr2tation polítique du monstre chez !2*astien 'randt\, in %t/ &/ +a$ies, op/ cit/, pp/QQ4<, QR/ / Apud ean @2ritier, op/ cit/, pp/ DQ4/ =/ ohn 'locY Lriedman, em seu &he monstrous races in medie$al art and thou"ht/ Cam*rid"e, %ass/B -ondres, @ar$ard 8ni$ersit( Press,
*uscar homens sel$a"ens, tal como eles aparecem no )omance de Alexandre/ O/ Claude appler, op/ cit/, p/ N=/ ###/ A A%'JG8A V#&g)#A +A )AW9 5 A! A)%A+#-@As +A A&8)5WA PP/ R<4OQE / 9 li$ro de %e"en*er" foi seis $ezes reeditado em um quarto de s2culo, se"undo / -e(, em Ces *Ktes quifirent nos l2"endes/ Paris, Lrance45mpire, / Citado por )udolf ittYoer, in -F9rientfa*uleux/ Paris, &hames S @udson !A)-, < e passim/ Apud )udolf ittYoer, op/ cit/, p/ =R/ / 9 Pol(histor, de !olinus, constituía uma $ersão a*re$iada da o*ra de Plínio, o Velho, que, por ser editada em latim, esta$a fora do alcance da maior parte dos leitores/ +estinado a suscitar a curiosidade do leitor, o li$ro de !olinus ensina$a4 o, tam*2m, a mara$ilhar4se diante do espetáculo da natureza/ !o*re &he$et, $er o clássico de LranY -estrin"ant, -Fatelier du cosmo"raphe ou lFima"e du monde U la )enaissance/ Paris, Al*in %ichel, <</ =/ Ver seu ensaio -e miroir dF@2rodote 5ssai sur la r2presentation de lFautre/ Paris, Gallimard, N>/ O/ 'ernard Guen2e, @istoire et culture dans lF9ccident m2di2$al/ Paris, Au*ier, / N/ LrancY -estrin"ant, edi6ão crítica da Cosmo"raphie du -e$ant de Andr2 &he$et/ Gene*ra, +roz, / Q/ Apud )udolf ittYoer, op/ cit/, p/ =R/ / Ver o capítulo so*re -icostenes escrito por ean C2ard em seu -a nature et les prodi"es, op/ cit/, pp/ DO4</ >/ Passo a apro$eitar aqui informa61es colhidas na o*ra de ill( -e(\ Ces *Ktes qui firent nos l2"endes/ Paris, Lrance45mpire,
R/ )eproduzo informa61es extraídas de il( -e(, op/ cit/, pp/ =O e passim/ / il( -e( explica que o texto *í*lico ori"inal se refere ao )eFem, que 2 um tipo de *oi sel$a"em, o aurochs; mas os tradutores, i"norando a pala$ra "re"a correspondente, traduziram por monoYeros, que se tornou unicornus em latim $ul"ar/ =/ =Q4OD/ O/ Pe/ !imão de Vasconcellos, Cr^nica da Companhia de esus do 5stado do 'rasil, >F ed/ -is*oa, DO=, , p/ cxli$/ A primeira edi6ão 2 de OOR/ N/ As informa61es so*re Aldro$andi são tam*2m extraídas da o*ra de ill( -e(, op/ cit/, pp/ << e passim/ D/ Apud ean C2ard, -a nature et les prodi"es, op/ cit/, p/ ==/ =>O4OQ >Q/ !o*re o mara$ilhoso e os cronistas da Am2rica portu"uesa, $er o clássico de !2r"io 'uarque de @olanda, Visão do paraíso: os moti$os edKnicos no desco*rimento e coloniza6ão do 'rasil/ !ão Paulo, 5ditora acionalB !ecretaria de Cultura, CiKncia e &ecnolo"ia, / 5mpresto aqui informa61es desen$ol$idas por %arie &h2rKse ones+a$ies em Z-e monstre: expression de lFinsecurit2 dans la litt2rature et les spectacles de la )enaissance an"laisF in %onstres et prodi"es au temps de la )enaissance, or"/ %arie &h2r`se ones4+a$ies/ Paris, 8ni$ersit2 Paris4 !or*onneBCentre de )echerches sur la )enaissanceB ean &ouzot, O4RD/ >>/ 9 mundo elisa*etano po$oado por "Knios maus e *ons, fadas, dem^nios, feiticeiras, fantasmas e conuradores foi analisado por Lrances A/ ates em seu &he occultphilosoph( in the 5liza*ethan a"e/ -ondres, ar*ur" #nstitute, R/ %/ &/ ones +a$ies, op/ cit/, p/ >N/ >/ 'ernard &annier, Z8n *estiaire mani2riste: monstres et animaux fantastiques dans -a reine des f2es dF5dmond !pencer, in %onstres et prodi"es, op/ cit/, pp/ ==4O=/
>=/ Apud ur"is 'altrusaitis, -e %o(en A"e fantastique, op/ cit/, p/ RR/ >O/ Am*rois2 Par2, %onstruos (prodi"ios, introduccin, traducci^n ( notas de #"nacio %alaxeche$erría/ %adri, 5diciones !iruela, N/ #"nacio %alaxeche$erría, #ntrodu6ão, in %onstruos ( prodi"ios, op/ cit/, pp/ >4R/ >D/ Am*rois2 Par2, op/ cit/, p/ NN/ > Apud ean C2ard, Z&2ratolo"ie et t2romancie au x$iF si`ceF in %/ &/ ones4+a$ies, op/ cit/, pp/ =4 =, O/ R> RR RQ/ #*idem/ R/ !o*re as id2ias de Paracelso <4R/ R>/ Apud ur"is 'altrusaitis, -e %o(en A"e fantastique, op/ cit/, p/ O/ RR/ A cultura do )enascimento na #tália/ !ão Paulo, Companhia das -etras, <<, cap/ ## da quarta parte, p/ >R/ R/ ean !eznec, op/ cit/, estudou muito *em a tradi6ão astrol"ica e a tradi6ão física, pp/ e passim, de que fa6o uso neste pará"rafo/ #V/ 9 )5#9, !5% -#%#&5!, +9 #!g-#&9 pp O4NOE / Apud acques )o"er, -es sciences de la $ie dans la pens2e fran6aise du HV###2me si`cle/ Paris, Armand Colin, / A mesma histria, com al"umas $aria61es, 2 repetida por um incrí$el persona"em luso: Pedro de Arcourt e Padilha, em seu )aridades da natureza e da arte di$ididas pelos quatro elementos/ -is*oa, Lrancisco -uís A$eiro, N= ! que na o*ra do autor portu"uKs o fato acontece na casa do c^nsul da Lran6a em -is*oa, %onsieur de %onta"nac, e do o$o,
posto por um Z"alo muito $elho\, nascera um pinto com ra*o de la"artixa/ R/ Apud acques )o"er, op/ cit/, p/ RO/ / 5ssa informa6ão será repetida no 'rasil setecentista pelo m2dico pernam*ucano Lrancisco unes, em seu &ratado do Parto @umano, por mim analisado em ZA maternidade da mulher ne"ra no período colonial\/ 5studos do C5+@A-, n / !ão Paulo, LL-C@B8!P, Q/ &rata4se de uma $i"orosa pesquisa so*re a histria das teorias da concep6ão entre os s2culos HV## e HV###/ V/ %9!&)9! 5 %A)AV#-@A! 9 ')A!#- C9-9#A- PP/ NN 3 QE / 5m -FArtfantastique/ Paris, Al*in %ichel, / !o*re o 'rasil col^nia como a morada do dia*o, $er -aura de %ello e !ouza, 9 +ia*o e a &erra de !anta Cruz/ !ão Paulo, Companhia das -etras, / =/ As sin"ularidades da Lran6a Antártica/ 'elo @orizonteB!ão Paulo, #tatiaiaB5dusp,
)enaissance/ Paris, Al*in %ichel, <<, e -es sin"ularitez de la Lrance Antarctique M -e 'r2sil des canni*ales au HV#\ si`cle M Choix de textes, introduction e notes/ Paris, %aspero, Q=/ D/ )eproduzo aqui id2ias de LranY -estrin"ant em seu -e hu"uenot et le sau$a"e M -FAm2rique et la contro$erse coloniale en Lrance aux temps des Guerres de )eli"ion/ Paris, Aux Amateurs de -i$resBlincYsiecY, <=/ a tradu6ão á citada, encontra4se no capítulo x, p/ / Q/ Vea4se, so*re a mi"ra6ão de formas orientais, 0r"is 'altrusaitis, -e %o(en A"e fantastique M Antiquit2s et exotismes dans lFart "othique/ Paris, Llammarion, R/ >/ A"rade6o ao professor -uís de 'arros %ott a "entil indica6ão deste documento/ R/ !o*re esse tema 2 o*ri"atrio o li$ro de -uís de Al*uquerque et alii, 9 confronto do olhar M 9 encontro dos po$os na 2poca das na$e"a61es portu"uesas/ -is*oa, 5ditorial Caminho, <</ / Ver seu Geo"rafia dos mitos *rasileiros/ 'elo @orizonteB!ão Paulo, #tatiaiaB5dusp, Q/ O/ Via"em pelo 'rasil $ol/ ###, apud -uís da C.mara Cascudo, op/ cit/, p/ DN/ N/ -uís da C.mara Cascudo, op/ cit/, p/ D=/ R
R= D/ #*idem, p/ >/ #*idem, p/ =/ >Q/ Apud -uís da C.mara Cascudo, op/ cit/, p/ =/ >/ #*idem, p/ =O/ >>/ ? a conclusão a que che"a C.mara Cascudo, op/ cit/, p/ D/ >R/ #*idem, p/ DD/ >/ Apud -uís da C.mara Cascudo, op/ cit/, p/ NN/ >=/ 'elo @orizonteB!ão Paulo, #tatiaiaB5dusp, O/ Ga*riel !oares de !ouza, otícia do 'rasil/ !ão Paulo, s/ d/, t/ i, p/ N/ Lernão Cardim, &ratados da terra e "ente do 'rasil/ 'elo @orizonteB!ão Paulo, #tatiaiaB5dusp, p/ =Q/ >D/ -is*oa, Vária fortuna e estranhos fados/ !ão Paulo, 'rasiliense, / !o*re monstros, $er eppler, op/ cit/, p/ >, e Giulia 'o"liolo 'runa, Vis*oocF: pesci, monstri marini e sa$a"es of the northe 8na testimonianza etnostorica su"li eschimesi in europa neslla seconda metá del cinquecentoF in %iscellanea di storia delle esplorazioni H#H/ GKno$a, <<, pp/ =N4O=/ RR/ 5m seu Consid2rations philosophiques sur la "radation naturelle des formes de lFKtre f/// ou les essais de la nature, de NOD, citado por Vic de +onder, em seu -e chant de la sir`ne/ Paris,
Gallimard, s/ d/, p/ / R/ !o*re a $ia"em de !pix e %artius, $er de aren %acYno -is*oa, A o$a Atl.ntica de !pix e %artius: natureza e ci$iliza6ão na $ia"em pelo 'rasil DN4 D>QE/ !ão Paulo, @ucitec, </ RO/ '/ @eu$elmans, +ans le silia"e des monstres marins/ Paris, Plon, <=D, p/ DN/ RN/ !o*re a panspermia e outros casos em que se acredita$a que "ermes de $ida flutua$am no ar, ao sa*or dos $entos, en"ra$idando at2 as mulheres incautas, $er Pierre +armon, -e m(the de la procr2ation U lF."e *aro que/ Paris, !euil, 4>> / !o*re esse período, $er ean +elumeau, -a peur en 9ccident/ Paris, La(ard, / 5mprestarei aqui $árias informa61es extraídas de ean %ari"n(, !an" pour san", le r2$eil des $ampires/ Paris, Gallimard, s/ d/, especialmente a partir da p/ RR, em que o autor desen$ol$e a tese de que na #dade %oderna o $ampiro 2 $isto como um Zaclito de !atãF R/ 9p/ cit/, p/ R / Para entender as rela61es entre a #"rea, os fantasmas e os mortos4$i$os, $er Claude -ecouteaux, Lant^mes et re$enants au %o(en "e/ Paris, #ma"o, , e de Gal %ilin, -es chiens de +ieu/ 'rest, Centre de )echerche 'retonne et Celtique, <