RESUMO CRÍTICO WALTZ, Kenneth N. Teoria das Relações Internacionais. Lisboa: Editora Gradiva, 2002. Cap. V. p. 113-142. “Estruturas políticas”.
Em meio a Guerra-Fria, no ano de 1970, Kenneth N. Waltz1 desenvolveu a teoria neorealista sobre as relações internacionais. O próprio autor a define como uma teoria sistêmica, construída a partir de proposições puramente teóricas e gerais diferentemente da teoria empirista que é o método utilizado no realismo clássico (baseado no experimentalismo). Waltz a constrói com argumentos análogos a teoria microeconômica, pois considera que estruturalmente a microeconomia e o sistema internacional são similares. Ambas as teorias abstraem fatores que são considerados como não influenciadores da análise. No caso do neorealismo a análise centra-se na própria estrutura internacional e todos os outros atores são abstraídos (estruturas econômicas e sociais, líderes políticos, entre outros). “A sua omissão não implica a sua falta de importância. São omitidos porque queremos descobrir os efeitos esperados da estrutura no processo e do processo na estrutura” (WALTZ, 2002, p. 118). Igualmente: “(...) as estruturas são definidas não por todos os atores que florescem dentro delas, mas pelos mais importantes. Ao definirmos a estrutura de um sistema escolhemos um ou alguns dos muitos objetos que compõe o sistema e definimos a sua estrutura mediante esses objetos”. (WALTZ, 2002, p. 132). Esta estrutura é dividida em três diferentes níveis de análise: o primeiro nível baseia-se no princípio ordenador do sistema internacional, a anarquia. O segundo nível é relativo às unidades que compõe a estrutura, no caso, os Estados: unidades entendidas como semelhantes quanto a sua tarefa na estrutura, porém diferentes quanto a sua capacidade frente a tal tarefa. Essa tarefa é a garantia de sua própria sobrevivência no sistema internacional, configurando a estrutura como de auto-ajuda: “Os estados são parecidos nas tarefas que enfrentam, apesar de não o serem nas suas capacidades para as desempenharem” (WALTZ, 2002, p.136). Já o terceiro nível define-se justamente pela distribuição das capacidades pelas unidades do sistema.
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“Kenneth Neal Waltz (Ann Arbor, Michigan, 1924) é um professor da Columbia University e um dos mais importantes estudiosos de Relações Internacionais (RI) em atividade hoje. Foi um dos fundadores do Neorealismo, ou Realismo Estrutural, na teoria das Relações Internacionais.” Disponível em: . Acesso em: 25 maio. 2011.
Dessa forma, caracteriza-se o sistema como uma estrutura composta por unidades que interagem. Tal interação resulta em uma disposição das unidades que não é fruto das próprias unidades, mas propriedade do próprio sistema. “O conceito de estrutura baseia-se no fato das unidades justapostas e combinadas de forma diferente produzirem diferentes resultantes” (WALTZ, 2002. p. 116). Ou seja, dada às combinações entre as unidades o que ocorre são mudanças na estrutura, e não da estrutura. Essa própria dinâmica da estrutura tece a resposta para a pergunta central do autor: O porque da existência de guerras ao longo de toda a história no sistema internacional. Através da busca pela sobrevivência (fruto do constrangimento gerado pelo sistema internacional nas suas unidades), há certa flexibilidade entre as capacidades dos Estados, configurando uma balança de poder, a qual seria um “jogo” das unidades pela estabilidade nas relações internacionais (o autor considera a bipolaridade como mais estável para o sistema por diminuir as possíveis alianças existentes na multipolaridade e também por trazer mais transparência nos atos políticos). O dilema da segurança se encaixa na teoria por conseqüência do constrangimento, ou seja, através da busca pela sobrevivência os Estados não se submetem a cooperação sem salvaguardas com os outros Estados e estão sempre em eminência de guerra: “O motivo da sobrevivência é visto como a base de ação num mundo onde a segurança dos estados não é garantida (...)”. (WALTZ, 2002, p.130). Outro aspecto trabalhado pelo autor é a definição de soberania: “Dizer que um estado é soberano significa que ele decide por si mesmo como irá enfrentar os seus problemas internos e externos, incluindo se quer ou não procurar a assistência de outros e ao fazê-lo limitar a sua liberdade chegando a compromissos com eles”. (WALTZ, 2002, p. 136). Quando trata da soberania, citando os problemas internos e externos, o autor trata de deixar clara a diferença entre a política nacional e a política internacional de um país: “A política nacional consiste em unidades diferenciadas desempenhando funções específicas. As relações internacionais consistem em unidades semelhantes duplicando as atividades uma das outras” (WALTZ, 2002, p. 137). Deixando evidente que em seus argumentos o conceito de estrutura e unidade inserida nessa estrutura estão sempre presentes. O neorealismo foi construído em um momento em que o interesse econômico e ideológico estava em intenso debate devido à dicotomia entre EUA e URSS na Guerra Fria. Dessa forma, a teoria realista clássica estava em crise, por não tratar desses assuntos. Waltz constrói sua teoria
tentando suprir as carências do realismo no que cerne questões das esferas fora da política por meio dessa própria esfera. Basicamente, as questões relativas à sobrevivência no sistema anárquico, à dinâmica da balança de poder, ao dilema da segurança, à importância das potências são tratadas no novo realismo, todavia, difere quanto ao método teórico (sistêmico) e quanto ao nível de abstração, pois omite as especificidades dos Estados e a importância dada ao estado de natureza humano. Em sua obra, ao longo de todas as argumentações muitas das analises tornam-se repetitivas: relação entre as unidades, característica da estrutura como anárquica, disposição das capacidades dos Estados no sistema além da analogia com a microeconomia trazer argumentações falhas como: “(...) o paralelo com a teoria de mercado é exato. Firmas e estados são unidades semelhantes. Através de todas as suas variações de forma, as firmas partilham certas qualidades: são unidades egoístas que, dentro de limites impostos pelo governo, decidem por si próprias como enfrentar o seu ambiente e como trabalhar para alcançar os seus fins” (WALTZ, 2002, p. 138). Nesse trecho, o autor trata de limites impostos pelo governo para questões econômicas, porém, ao se fazer a analogia quanto ao sistema internacional, quem seria o governo que traria imposições ao Estado que tenta garantir sua autosobrevivência na estrutura? Pode-se conferir uma inexatidão quanto a analogia, pois o sistema não opera sobre a unidade, o próprio neorealismo abstrai as especificidades do Estado, tratando todos de maneira igualitária quanto a função, e trazendo a diferenciação quanto a capacidade da unidade perante a outra. Dessa forma, a analogia à um limite resultante da hierarquia característica da política interna para as questões econômicas, com uma capacidade estatal a qual se desloca pela capacidade de outra unidade traz uma incongruência na análise. A analogia tratada por Waltz traz ilustrações positivas visando amenizar a abstração de sua teoria, porém, as questões econômicas estão muito relacionadas a política interna dos países, a qual envolve a existência de um líder e de uma hierarquia quanto as instituições, além de envolver atores internacionais abstraídos da análise neorealista, dessa forma, a analogia não se torna tão pontual deixando a argumentação teórica essencialmente generalizada quanto a aplicabilidade para o sistema internacional.